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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARÍA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIARIO DAS SESSÕES N.º 144
ANO DE 1952 28 DE MARÇO
V LEGISLATURA
SESSÃO N.º144 DA ASSEMBLEIA NACIONAL
EM 27 DE MARÇO
Presidente: Ex. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Ex.mo Srs.Gastão Carlos de Deus Figueira
José Guilherme de Melo e Castro
SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão ás 16 horas e 5 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foram aprovados ou n.ºs 142 e 143 ao Diário das Sessões.
O Sr. Presidente comunicou que recebera da Comissão de Contas Públicas o parecer sobre as Contas Gerais do Estado de. 1950.
Os »Srs. Deputados Santos Bessa e Vasco de Campos ocuparam-se da luta antituberculosa.
O .Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu falou sobre abandono de família e turismo e requereu urgencia para a proposta de lei relativa às normas a- observar na atribuição e utilização de viaturas ligeiras e automóveis oficiais.
Ordem do dia. - O Sr. Deputado Pinto Barriga começou a efectivar o seu aviso prévio relativo à reforma orçamental e política monetária do Governo. Ficou com a palavra reservada.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas e 5 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se a chamada.
Eram 16 horas e 55 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Adriano Duarte Silva.
Afonso Eurico Ribeiro Cazaes.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Finto dos lieis Júnior.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida.
António Bartolomeu Gromicho.
António Cortês Lobão.
António Jacinto Ferreira.
António Joaquim Simões Crespo.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Maria da Silva.
António de Matos Taquenho.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Raul Galiano Tavares.
António dos Santos Carreto.
António de Sousa da Câmara.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Proença Duarte.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Avelino de Sousa Campos.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Mantero Belárd.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Délio Nobre Santos.
Diogo Pacheco de Amorim.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Frederico Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas
Vilar.
Gastuo Carlos de Deus Figueira.
Herculano Amorim Ferreira.
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Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
João Luís Augusto das Neves.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Oliveira Calem.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
Jorge Botelho Moniz.
José Dias de Araújo Correia.
José Garcia Nunes Mexia.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Guilherme de Melo e Castro.
José dos Santos Bessa.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Domingues Basto.
Manuel Hermenegildo Lourinho
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Meneses.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
Mário de Figueiredo.
Paulo Cancela de Abreu.
Ricardo Vaz Monteiro.
Sebastião Garcia Ramires.
Tito Castelo Branco Arantes.
Vasco de Campos.
O Sr. Presidente:- Estão presentes 67 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 5 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n. os 142 e 143 do Diário das Sessões.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado pede a palavra sobre estes números do Diário, considero-os aprovados.
Está na Atesa o parecer da Comissão de Contas Públicas sobre as Contas Gerais do Estado de 1950.
Vai ser distribuído pelos Srs. Deputados e publicado no Diário das Sessões.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Santos Bessa.
O Sr. Santos Bessa: - Sr. Presidente: realizou-se durante a última semana uma série de inaugurações a que os jornais noticiosos deram o devido relevo, mas que me parece que não deve deixar de assinalar-se nesta Assembleia.
Refiro-me, como sabem, à inauguração do Laboratório Nacional de Produção da Vacina B. C. G., à dos três Centros do Profilaxia e Diagnóstico das Zonas Sul, Centro e Norte, à do dispensário antituberculoso da Rua da Constituição e à do Dispensário de Higiene Social do Porto.
Sinto que tenho, como Deputado e como médico, o dever de salientar perante esta Camará este facto extraordinário de, numa só semana, se inaugurar esta série de instituições com que foi notavelmente enriquecido o nosso apetrechamento profiláctico contra doenças de caracter eminentemente social. Regozijo-me com o valor real destas armas no combate à difusão de tantos e tão grandes males que afligem o nosso pais; mas sinto igual prazer pelo significado do acontecimento que é a demonstração clara do alto interesse que vêm merecendo ao Governo da Nação os problemas da saúde pública.
E quero ainda salientar a rapidez com que foram executadas as obras do Laboratório Nacional de Produção da Vacina B. C. G. o dos três centros de profilaxia, coisa que só é possível numa situação política em que os governantes tenham a noção perfeita dos seus deveres e o erário o necessário desafogo para tais empreendimentos. Este aspecto que aqui estou focando não é, claro está, coisa nova nas nossas instituições - tornou-se norma nos nossos hábitos de administração; mas nem por isso deve deixar de exaltar-se e agradecer-se, tão notável é o contraste com o sistema seguido noutros períodos da nossa história política.
Aprovadas em 28 de Abril do 1950 as bases da lei que reorganizou a luta antituberculosa, logo foram transformadas na Lei n.º 2:044, publicada em Julho seguinte, e, muito antes que fossem volvidos dois anos sobre esta data, o Governo procede à inauguração daquelas quatro novas instituições, criadas por essa reforma.
Daqui dirijo, com os meus agradecimentos, as minhas mais efusivas saudações ao Governo por esta realização, e muito particularmente aos Srs. Ministros do Interior e das Obras Públicas, a cujos Ministérios está ligada a execução deste empreendimento.
Estes dois ilustres homens de Estado têm realizado em Portugal, no campo da assistência e no apetrechamento do nosso arsenal de combate à doença e à morte, uma obra de extraordinário valor pelo volume e pela qualidade das realizações.
O Pais recordará os seus nomes como obreiros desta nossa era de renovação e os médicos portugueses guardarão eterno reconhecimento pelos meios que tem posto à sua disposição para melhor realização da sua missão.
Como Deputado pelo círculo de Coimbra, cabe-me particularmente o dever de lhes patentear o meu reconhecimento por terem dotado aquela cidade com um valioso instrumento de combate na luta contra a tuberculoso.
A despeito de Coimbra ter sido das primeiras cidades do Mundo a tomar posição na luta contra esse terrível mal, logo depois da descoberta do bacilo de Koch, foi sempre esquecida, não se sabe bem porquê, pela nossa Assistência Nacional aos Tuberculosos! Na distribuição das instituições desta natureza Coimbra nunca teve a honra de ser designada para sede nem sequer de um simples dispensário!
O arsenal antituberculoso que possui data de 1928 e deve-se à antiga Junta Geral do Distrito e, depois, à de Província da Beira Litoral, em que aquela se transformou, e muito especialmente ao seu ilustre presidente, de cujo entusiasmo e clara visão resultou a construção de dois magníficos sanatórios por onde passaram até hoje mais de 7:800 doentes e a de vários dispensários concelhos, em ligação com o Dispensário Central do Pátio da Inquisição no qual foram registadas e assistidas mais de 8:000 pessoas. Além destes, há que contar com o Dispensário Antituberculoso Dr. Adelino Vieira de Campos, que funciona nos Hospitais da Universidade.
Em todo o distrito, não há senão dois dispensários do Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos!
É, portanto, com o maior prazer, que, como Deputado pelo círculo de Coimbra, agradeço a distinção agora conferida pelo Governo e pelo Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos, dotando aquela cidade com um centro de profilaxia e diagnóstico, com acção sobre toda a zona Centro do País, que veio reforçar o apetrechamento existente e que poderá ter decisiva influência no combate à morbilidade e mortalidade tuberculosas.
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É do conhecimento de todos que ao entusiasmo inicial da luta se seguiu no nosso país uma fase de indiferença e de desinteresse que infelizmente se prolongou por vários anos e que deve ter sido, com outros factores, a razão da subida das nossas taxas da mortalidade pela tuberculose.
Foi já nesta situação que se retomou o entusiasmo pela campanha antituberculosa, multiplicando-se as instituições para assistência aos tuberculosos e fornecendo-lhes melhor apetrechamento.
Não se limitou, porém, a acção dos Governos do Estado Novo à multiplicação do número de camas para assistir a tuberculosos em sanatórios de altitude ou de planície -as quais subiram de 800 em 1926 para 1:400 nos estabelecimentos do Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos e que, somadas às que foram surgindo na assistência aos tuberculosos do Norte e nos sanatórios da Junta de Província da Beira Litoral, totalizam hoje 5:000- nem ao aumento do número dos dispensários destinados à profilaxia e à terapêutica ambulatória de tantos milhares de tuberculosos, o qual passou de 6 para 60 em igual período.
Foram adquiridos aparelhos de raios X para alguns deles e, em 1949, a primeira instalação fixa de micror-radiografia para a cidade do Porto e uma unidade móvel para o mesmo tini, destinada a Lisboa o ao serviço da zona Sul.
Em L950 também se adquiriram duas novas unidades de microrradiografia, ambas fixas o destinadas uma a Lisboa e outra a Coimbra. Ao mesmo tempo operou-se a construção das instituições agora inauguradas.
A criação do Laboratório Nacional de Produção de Vacina B. C. G. e destes três centros de profilaxia são armas novas e das mais eficazes na luta.
O seu aparecimento deve ser registado como uma nova época no combato ao mal e saudado com o entusiasmo correspondente às justificadas esperanças que nelas depositamos.
Por elas se oferecem aos pobres, gratuitamente, a microrradiografia torácica, os testes tuberculínicos e a vacinação contra a tuberculose.
A acção destes centros tem, porém, de ser acompanhada de uma intensa, propaganda no sentido de esclarecer o público do real interesse destas provas o da absoluta inocuidade e bem provada eficácia da vacina, na esteira da preparação e fortalecimento da consciência sanitária da Nação.
O Laboratório Nacional de Produção da Vacina B. C. G. foi entregue, como não podia deixar de ser, ao Instituto Bacteriológico Câmara Pestana, onde, pelo homem que lhe deu o nome, foi fundada a nossa primeira escola de bacteriologia, onde aprenderam o ensinaram os mais respeitados bacteriologistas portugueses, de entre os quais me permito destacar Carlos França, Aníbal o Nicolau Bettencourt e Pereira da Silva, e que está hoje entregue à direcção competente do Prof. Cândido de Oliveira, que à preparação da vacina vem consagrando, desde há anos, um cuidado e uma atenção particulares. A sua experiência, já consagrada pela larga aplicação que entre nós se tem feito da vacina B. C. G. por ele preparada, dá-nos a indispensável segurança e tranquilidade.
Quero, porém, dizer à Assembleia. Nacional que o que acaba de fazer-se não é senão o primeiro escalão desta nova fase da luta.
Precisamos que o mais rapidamente possível se faça a nomeação do pessoal do Laboratório Nacional de Produção da Vacina B. C. G.
Estamos certos de que o ilustre Ministro da Educação Nacional, compreendendo a urgência destas nomeações, de que depende a entrada em funcionamento efectivo do respectivo laboratório, não as demorará.
Torna-se necessário também que pousemos para uma época próxima na instalação do nosso laboratório de produção de tuberculina - outro elemento indispensável da campanha para nos tornar independentes dos laboratórios estrangeiros.
Vozes: - Muito bem !
O Orador:-Não quero concluir sem assinalar o alto interesse que terá para nós, País com tão extensos territórios ultramarinos, a. produção de vacina seca, já fornecida com tão assinalado êxito pelo Instituto Pasteur de Paris.
Permito-me, por isso, chamar a atenção do Governo para este assunto, a fim de se promoverem os necessários estudos para que, em momento oportuno, se complete o apetrechamento do nosso actual laboratório com mais esta modalidade de vacina.
Torna-se ainda imperioso, para completar este primeiro ciclo da luta, promover a aquisição de duas unidades móveis de microrradiografia, uma para o Porto o outra para Coimbra, a fim de que cada um destes centros - que passaram a ter a seu cargo a execução do radiorrastreio das provas tuberculínicas e da vacinação da população das respectivas zonas- exerçam cabalmente a sua função e não se limitem às populações das cidades em que estão instalados. É indispensável estender rápida è continuamente esta acção profiláctica a todas as cidades, vilas e aldeias.
O inquérito que realizei em 1937, através das provas tuberculínicas aos recrutas, demonstrou-me que cerca do metade dos homens que tinham sido apurados para as unidades de Coimbra e da Figueira da Foz, seleccionados por duas inspecções, já tinham sofrido a primo-infecção tuberculosa. A maior parte deles são rurais. Estes meios reclamam a primazia na premunirão.
Mas, além disso, é também necessário não descurar o contínuo apetrechamento do País com mais dispensários e prosseguir na política nobre e elevada do aumento do número do camas para recolher tuberculosos.
É indispensável, Sr. Presidente, não deixar afrouxar o ritmo em que se tem trabalhado, nem quebrantar o entusiasmo pelas medidas de profilaxia e de higiene, que são esteios indiscutíveis da luta e elementos imprescindíveis para garantia da vitória no combate contra a mais mortífera das doenças - esse verdadeiro flagelo social, cujo problema havemos de resolver com o mesmo êxito com que arrumámos outros delicados problemas nacionais.
Vozes: - Muito bem !
O Orador:-Salazar marcou posição na luta com a exortação que fez aos cientistas da X Conferência Internacional da Tuberculose.
Já então estava definida a resolução do Governo de dar combate à peste branca. Depois disso, é manifesta a intensificação dos meios de combate, traduzidos em tantas obras novas e no melhoramento das que já possuíamos.
O ano de 1952 é assinalado logo no seu começo com realizações deste vulto.
Tomamos isso como expressão da decidida vontade de Salazar de dominar o resolver mais um grande problema.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-A nossa fé na sua inteligência, na sua vontade e no seu inexcedível patriotismo dá-nos a certeza da sua vitória.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
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O Sr. Vasco de Campos: - Sr. Presidenta: peço desculpa a V. Ex. ª e à Camará pelo lacto de me ir ocupar do assunto que acaba do focar, com muito mais brilho e proficiência do que eu irei tratá-lo, o meu distinto colega Dr. Santos Bessa. Porém a importância do objectivo em vista justifica a insistência.
A recente inauguração e entrada em funcionamento- no curto espaço de três dias! - dos três Centros de Profilaxia e Diagnóstico da Tuberculose das zonas Sul, Norte e Centro do País obrigam-me a proferir nesta Assembleia algumas palavras de justo reconhecimento.
Como representante da Nação, sobre a qual ainda pesa uma dolorosa taxa de mortalidade por tuberculoso, cumpro o gratíssimo dever de agradecer ao Governo e do um modo especial aos departamentos do Estado que superintendem nestes serviços a louvável prontidão com que estão pondo em execução a lei da luta antituberculosa, aprovada pela Assembleia Nacional nesta legislatura.
Mas é sobretudo como módico - e médico de aldeia -, que traz na alma, por dura experiência do ofício, a lembrança de pungentes infortúnios, que eu mo congratulo e saúdo e agradeço a todos, aqueles que estão empenhados em dar combate decidido e porventura eficaz a um dos maiores flagelos do nosso povo.
A acção que estes centros irão desenvolver na luta contra a tuberculose é das mais esperançosas.
Está no seu programa:
a) Organizar o cadastro microrradiográfico da população ;
b) Proceder à vacinação pelo B. C. G. ou por outros meios de imunização e orientar a aplicação da vacina;
c) Efectuar a propaganda da vacinação antituberculosa e dos preceitos relativos à profilaxia da tuberculose;
d) Enviar aos dispensários antituberculosos da respectiva área, ou na sua falta às delegações de saúdo, os indivíduos cujo exame revele lesões pulmonares de carácter evolutivo;
e) Enviar aos serviços da respectiva especialidade os indivíduos afectados por doenças reveladas pelo exame radiográfico que Dão tenham o carácter das lesões referidas na alínea anterior;
f) Colaborar com os dispensários, brigadas móveis e serviços de saúde, de assistência e de previdência em tudo quanto respeite à luta antituberculosa.
E dentro destas funções avulta a novidade entro nós agora posta em prática em larga escala -, da vacinação pelo B. C. G.
O velho aforismo «mais vale prevenir do que remediar» tem neste caso inteiro cabimento.
Se curar é ainda incerto e assaz dispendioso, prevenir será o ideal.
Tendo o B. C. G. atingido, digamos, a maioridade científica, resistindo a críticas, as mais severas; estando provada a sua inocuidade e demonstrada a sua eficácia preventiva ...
O Sr. Jacinto Ferreira: - V. Ex. ª dá-me licença? Peço desculpa, mas isso não está demonstrado. Discordo, portanto.
O Orador:-Poderia demonstrar a V. Ex. º, e largamente, mas não estamos numa academia médica para entrarmos nesta discussão.
O Sr.- Jacinto Ferreira: - Também poderia demonstrar largamente a V. Ex. ª que o não está.
O Orador:-... urge abraçar o método como arma salvadora, capaz de aliviar a nossa assistência pública de pesados encargos e livrar até certo ponto o povo português duma doença temível.
Na campanha que vão empreender os centros do profilaxia e diagnóstico nas suas respectivas áreas, afigura-se-me de toda a vantagem iniciar a vacinação nos pontos vulneráveis, isto é, nas aldeias mais afastadas dos grandes aglomerados urbanos.
É ai que se encontra um grande número de indivíduos facilmente tuberculizáveis os enérgicos.
lia pois necessidade de defendê-los contra o mal, que também lá aparece. A tuberculose vai até ao mais recôndito lugarejo serrano, quase sempre importada da cidade.
E é exactamente ai, onde a medicina não chega o a higiene é ignorada, que os estragos são desoladores.
O aldeão vem até à cidade na ânsia justificada de ganhar a vida, e aqui encontra muitas vezes a ruína; física, e não poucas a moral.
Quando tem a infelicidade de contrair a tuberculose, regressa ao lar, e, procurando ocultar a doença, lá acaba os últimos dias da sua existência, espalhando a morte à sua volta...
Não fantasio, Sr. Presidente e Srs. Deputados: digo simplesmente uma triste verdade ao declarar a VV. Ex.ªs que tenho visto desaparecer por este processo famílias inteiras!
E é por isso que reputo necessário e urgente imunizar as populações rurais contra a tuberculose.
Como seria interessante imunizá-las, se possível fosse, contra todas as influências nefastas de que a cidade é responsável!
Sr. Presidente: aproveito o ensejo para chamar a atenção dos departamentos do Estado competentes para um outro aspecto do mesmo problema.
Quero referir-me à necessidade que há de imunizar contra a tuberculose os indivíduos enérgicos recrutados para o serviço militar.
Todos os anos a Nação manda para as fileiras das nossas forças armadas grande número de rapazes na pujança da vida e em boas condições físicas.
Nos quartéis vão encontrar hoje, felizmente, higiene, boa alimentação, vida sadia.
Pois apesar disso, é importante o número de baixas por tuberculose.
E neste caso são ainda os habitantes das aldeias os mais atingidos.
O facto tem explicação científica: resulta de estes mancebos não terem sido em determinada altura das suas vidas levemente infectados pelo bacilo de Koch.
São anérgicos; não reagem à tuberculina.
Esta aparente felicidade inferioriza-os, sob o ponto de vista sanitário, perante os seus camaradas da cidade.
Investigações feitas neste sentido por alguns ilustres médicos militares levaram a conclusões muito elucidativas.
O nosso colega Dr. Santos Bessa, nas guarnições militares de Coimbra e Figueira da Foz, em 1:057 recrutas encontrou os seguintes números:
a) Indivíduos provenientes das cidades, 26 por cento
de anérgicos;
b) Indivíduos provenientes das vilas, 28,1 por cento
de anérgicos;
c) Indivíduos provenientes das aldeias, 58 por cento
de anérgicos.
E o médico da Armada Dr. Raul Ribeiro verificou que dos casos de tuberculoso registados na marinha de guerra de 1944 a 1949, entre as idades de 18 a 22 anos, 76,6 por cento deram-se em indivíduos vindos do campo e só 23,3 por cento em oriundos da cidade.
Diferença notável!
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Impõe-se, portanto, a necessidade de imunizar com o B. C. G. todos os indivíduos anérgicos recrutados para a serviço militar.
Sou de opinião de que a vacinação seja feita pelos centros de profilaxia e diagnóstico e suas brigadas móveis nos concelhos rurais, no espaço de tempo que decorro entre a inspecção dos mancebos e a sua incorporação.
Assim daremos aos recrutas a imunidade que lhes falta para enfrentarem o perigo que os ameaça ao darem entrada nos quartéis e ao tomarem contacto com o ambiente da cidade.
É preciso que, de futuro, o recruta leve apenso à guia de marcha para a sua unidade o boletim de vacinação pelo B. C. K, passado pelo centro de profilaxia e diagnóstico da sua zona.
Nos quartéis os médicos militares encarregar-se-ão de controlar os efeitos da vacina.
E deste modo alcançaremos a experiência precisa paru julgar á eficácia do método.
Pondo em prática estas medidas e entregando a sua execução ao pessoal devidamente apetrechado e especializado dos centros de profilaxia e diagnóstico, entendo que iniciamos uma campanha de profilaxia actualizada, moderna, da qual é lícito esperar resultados salutares.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Pedi a palavra para três fins: o primeiro é regozijar-me por já estar publicada no Diário do Governo a lei do abandono de família; e, a este respeito, posso assegurar à Assembleia que, mesmo antes de publicada, ela já vinha produzindo efeitos benéficos, por intimidação, apesar da forma prudente e limitada dos seus preceitos e sanções.
O segundo fim é solicitar ao Governo que, ainda durante a presente sessão legislativa, envie à Assembleia Nacional as bases da organização do turismo em Portugal, que sei estarem precedidas de um brilhante e douto parecer da Câmara Corporativa, de que foi relator, o Sr. Dr. Luís Supico Pinto.
Trata-se de um problema importante, que há muitos anos exige e aguarda solução.
Dele tive já ocasião de ocupar-me, mediante aviso prévio, nesta Assembleia, e, em generalização do debate, o assunto foi tratado então em todos os seus variados pormenores. Praticamente tudo está por regularizar e, se não fora a actuação eficaz que o Secretariado Nacional da Informação está exercendo sob a elevada e brilhante direcção do Sr. Dr. José Manuel da. Costa, quase não se notava qualquer actividade oficial neste importante ramo da economia, da propaganda o da cultura nacionais.
Finalmente:
Não estava ainda presente na sessão de 25 do corrente quando V. Ex.ª comunicou à Assembleia que tinha recebido do Governo uma proposta de lei relativa ao número e utilização de automóveis do Estado.
Por isto, e já que o Governo julgou preferível trazer à Assembleia este problema de ordem moral e financeira e considera insuficientes a legislação em vigor e as providências adoptadas para suprimir os abusos, requeiro que a mencionada proposta seja considerada urgente, nos termos e para os efeitos do artigo 35.º do Regimento.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu acaba do requerer a urgência para a proposta de lei que o Governo mandou à Assembleia sobre o uso de automóveis do Estado, proposta que foi presente à sessão de 2õ do corrente.
Vou consultar a Assembleia sobre sê considera urgente a discussão dessa proposta de lei para lhe fixar em seguida o prazo dentro do qual a Câmara Corporativa deve dar o seu parecer.
Consultada a Assembleia, foi reconhecida a urgência da proposta de lei.
O Sr. Presidente: - Em face da resolução da Assembleia, fixo à Câmara Corporativa o prazo de oito dias para se pronunciar sobre esta proposta.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Vai iniciar-se a efectivação do aviso prévio, marcado para ordem do dia da sessão de hoje, do Sr. Deputado Pinto Barriga.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pinto Barriga.
O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: o meu aviso prévio desdobra-se num preâmbulo político -critico - e num desenvolvimento técnico - tanto quanto possível construtivo.
Ao anunciar este aviso tive a plena consciência das minhas dificuldades, das minhas insuficiências.
Escassamente documentado, vou viver, este estreito período regimental, num infernal labirinto de conjecturas, de perguntas ansiosamente formuladas, sem a esperança de uma resposta que lhes possa dar cabal solução.
Procurei dados que me alargassem as minhas possibilidades ; requeridos constitucionalmente, não os consegui obter; rebusquei estatísticas nas publicações oficiais ou oficiosas, mas demonstraram-se ao uso demasiadamente unilaterais ou prematuramente envelhecidas ou francamente desactualizadas.
Bem alto proclamo desta tribunas minhas honestas intenções: defender duramente o equilíbrio financeiro e económico que Salazar criou, sobretudo o fundo moral da sua obra, que ninguém, mesmo os seus mais acérrimos adversários, negam e que é como uma muralha gigantesca que protege e condiciona a nossa magnífica, inteira e autêntica independência internacional.
Essa obra de regeneração financeira ficou sendo o património sagrado de todos os portugueses, mesmo daqueles que, como eu, abertamente discordam dos seus pontos de vista sobre a democracia.
Esse clima de alta tensão moral não se pode desvanecer, não pode ser obliterado pela sazão grosseira de apetites prementes, despertados por um dirigismo que, em lugar de os conter, os açula.
Este aviso prévio é como um grito de alarme contra o que eu chamo «o fenómeno da dessalarização»; não é dessalarização no sentido da perda de prestigio político, pois nunca o destino do regime se consubstanciou tanto como agora, com a presença de Salazar no Poder, mas, bem entendido, o meu neologismo «dessalarização» significa um pouco e um corto enfraquecimento no País desse alto tónus moral, uma obliteração na camada administrativa desse sexto sentido e dessa boa dosagem radariana de governação.
Não acuso o Governo nem os seus colaboradores directos de dessalarizar a Administração; increpo energicamente certa massa de dirigentes económicos, de managers, de não terem compreendido o alcance moral
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da obra salazariana, do viverem farisaicamente para os seus próprios interesses, numa ambição mal dissimulada de lucros imediatos, fazendo dos escaninhos da desvalorização monetária um trampolim para a sua cobiça, envilecendo élites o enfraquecendo a classe média, abrindo assim as portas ao comunismo.
20, 39, 52, não são números que marginem apenas os anos desta era, são subépocas económicas da nossa história contemporânea, parecem-nos curtos espaços de tempo, mas constituem como que um mundo de coisas em que se modificou profundamente o conjunto económico lusitano. Salazar não é um homem público para fazer uma programatização banal de «instantâneos», mas ninguém como ele pode compreender que o que se legisla para uma obra em 1929 pode não servir em 1942 e muito menos em 1952.
O equilíbrio e a estrutura financeira que Salazar deixou em boas mãos aos seus sucessores estão perfeitamente intactos, mas tudo mudou de 1928 e 1939 para cá, sofreram profunda alteração as condições económicas, pletorizaram-se as atribuições do Estado, mas invariavelmente a nossa orçamentalogia, qual tabu, manteve fixamente as suas linhas gerais, continuou-se a orçamentar classicamente em volta de um critério de ordinaridade e de extraordinaridade que fez o seu tempo, que perdeu tecnicamente todo o seu significado real e acabou por se tornar essencialmente confusionista.
Um bom equilíbrio orgânico, mesmo quantitativo, tem de se estruturar em volta de um critério tripartido: administração geral, investimentos e extraordinário. À primeira devem corresponder as revelhas atribuições do Estado, antes da sua fase intervencionista; a segunda para nos dar a posição global de um orçamento económico, e a terceira reservando a extraordinaridade para o que é autenticamente extraordinário e um pouco imprevisto, fora da habituação das actuais necessidades intervencionistas e dirigistas. Em intervenções anteriores, que a Assembleia conhece, já esclareci e desenvolvi este meu critério, o que me dispensa agora, num aviso prévio tão longo, de voltar detalhadamente ao assunto.
Naturalmente procurou-se primeiro o equilíbrio quantitativo do orçamento português, num País habituado aos deficits crónicos, mas, afastados estes para sempre, há que alvejar, sem demora, o equilíbrio qualitativo ou orgânico do orçamento lusitano. O orçamento vive, entre nós, centrado sobre uma hierarquia de despesas muito à escala de valores anteriores à segunda guerra, muito para longe de um intervencionismo estadual.
A criação do fundos autónomos, libertos das peias contabilísticas, tem mitigado o anacronismo duma escala de despesas orçamentais, mas também tem ocultado o envelhecimento do orçamento nacional. Há que orçamentar sobre a previsível realidade de 1953 há que construir uma escala de valores conjecturáveis para esse ano, há também que não viver apegado, numa época de profundas mutações, à média quantitativa do cada rubrica, escravizado ao próprio condicionamento dessas rubricas.
Um altíssimo espírito como Salazar nunca supôs eterna o intangível a sua reorganização financeira; pensar o contrário é ofender mortalmente o talento de Salazar, o seu apurado sonso político. Um esboço de programatização anual, permite, com o maior esforço útil, a reierarquização da orgânica do orçamento português, triplicemente cingida a um critério político, económico o social.
O Sr. Ministro das Finanças, pela sua velha dedicação por Salazar e pelas suas extraordinárias qualidades de estadista, que não me canso de admirar, está em condições, como ninguém, de compreender o que há de permanente na obra contabilística de Salazar e de reactnalizar as reformas orçamentais posteriores a 1928, que não devem nem podem considerar-se como um tabu.
Toda essa obra financeira é viva demais para se deixar enclausurar e imutabilizar em conceitos tão pouco dinâmicos.
No desenvolvimento do meu aviso prévio vou agora encarar assuntos que têm estado pertinentes à jurisdição do Sr. Ministro da Presidência. Render-lhe homenagem é o mesmo que prestar culto às suas invulgares qualidades de talento, de trabalho e abnegação, à luta intensa que fere constantemente, na dura faina de congraçar os legítimos interesses particulares com a posição nacional. Não vou com um critério bolorento de tratados, de velhas terminologias, sincopadas, depois de terem vivido muito tempo em sinonimidade: inflação, desvalorização, proporção das reservas em relação à responsabilidade dos emissores.
Quanto, de 1919 para cá, evolucionaram a sintomatologia e patologia monetárias! Como se apetrechou a terapêutica da inflação desvalorizante!
Por toda a parto o desequilíbrio orçamental é fonte generalizada de inflação depreciadora, mas para Portugal não. Porque é que se desvalorizou então a moeda em Portugal?
Será a inflação portuguesa um fenómeno monetário?
Essas interrogações já foram postas duma forma brilhante, na anterior legislatura, por alguns ilustres parlamentares que ainda nos honram como colegas. Está ainda esse debate na memória de todos. Até agora, está por definir o que é a inflação, de tal forma ela é cambiante e polifonne, é ondulante no tempo e no espaço. A inflação é vista por uns nos seus sintomas,- por alguns nas suas causas, por outros nas suas consequências próximas e remotas.
Uns autores, perseguindo a quimera de uma doutrina, procuram construir uma realidade que se adopta a ela e lazer experiências inflacionistas que criem o ambiente económico com que sonham; outros, vêem o fenómeno como ele se passa no seu respectivo conjunto económico e, por estarem demasiadamente perto do objectivo da sua observação, defendem pontos de vista demasiadamente unilaterais, esmagados pela proximidade e contemporaneidade dessa manifestação social.
É bem conhecida hoje a palavra inflação: é uma locução quase popular, definindo um fenómeno complexo, que demanda uma explicação tão prolixa que só poderia ser ajeitada, dando-lhe um sentido prático, numa discussão de ordem puramente académica.
Um termo em uso corrente e popular de. linguagem que vivo algemado à associação de ideias que provoca, se espraia na luz indirecta e no clima que criou em seu redor.
Procedamos com método, deixemos para longe os desenvolvimentos teóricos e lixemos a nossa atenção no problema nacional de inflação, não nos deixando dominar pela atracção que o vocábulo tomou no uso corrente lusitano, que o deforma perante a realidade económica portuguesa.
É de necessidade examinar as causas de inflação em Portugal: o surto exportador foi em primeira plana o expoente máximo de motivação inflacionista. Foi reavivada, por deficiência de fiscalização, por um jogo de arbitragem o especulação dos invisíveis que se mascaravam e se infiltravam na corrente exportadora.
Em posição mais ou menos secundária, uma escassez de géneros, com alta de preços que reclamava meios mais abundantes de pagamentos. Uma velocidade de moeda diminuída pela estagnação o engorgitamento de capitais nos bancos.
Na microeconomia, um crédito abundantizado por vendas a crédito e descontos bancários que não drenavam o pântano monetário e antes o miasmavam pela corrupção dos pequenos e grandes açambarcamentos.
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Concentracionismo dos aproveitadores de inflação, que pela sua impreparação não podiam ter vistas largas de investimentos e antes procuravam a comodidade dos maples das colocações fundiárias urbanas e de uma agiotagem desonzenarizada pela abundância vultosa de capitais, sem o esponjamento, por iniciativa privada, de barragem bancária, sem reabsorção social e fiscal, acompanhada da respectiva redistribuição.
A estagnação desses capitais superabundantes davam à inflação portuguesa as suas características paludosas.
Esse tremedal de capitães ... de capitais, mas não de indústria, por incapacidade relativa e intelectual dos seus possuidores, primarizados nas suas restritas competências, evidentemente que, longe de o talar capitalisticamente, mais o apaluavam.
Vamos agora aos sintomas: a escassez de determinados géneros de primeira necessidade e a dificuldade de reabastecimento, mesmo do supérfluo, haviam de provocar, passando de causa a efeitos, alta de preços que se manteve para além da abundância dos géneros e do desaparecimento do racionamento, fixada já inapagavelmente pela desvalorização monetária, num coeficiente de 2,60. Singular excepção a portuguesa: no drama da inflação mundial, um orçamento em perfeito equilíbrio neutraliza a posição do Estado em relação à moeda. O Estado não utiliza para si o aumento de signos monetários, e por isso a sua posição é singularmente forte.
O câmbio externo não cai em derrocada, o escudo é forte, senhor de si próprio; é uma moeda com perfeita convertibilidade, com garantia duma duradoura convertibilidade. Ai de nós! Essa foi a sua força e a sua fraqueza.
Enquanto a América procurava defender-se com uma higiene cambial, pondo os seus frigoríficos económicos a trabalhar, congelando os invisíveis ou, com mais propriedade, condensando-os, para os visibilizar economicamente, nós, de mão na algibeira do colete, deixávamos roubar por esse pègre internacional de traficantes cambiais, que fizeram de Lisboa uma espécie de Tânger europeia, uma placa giratória de capitais em que os não aliciavam para colocações demoradas, mas nos surdiam para especulações, momentâneas, indesejáveis e inaproveitáveis para a nossa economia.
O próprio Banco de Portugal, num relatório que nunca será demais encarecer, dava um alto grito de alarme: «Com respeito a estes invisíveis, uma fiscalização mais apertada, que permita identificar os que não convenham à nossa economia, pode levar a negar-se-lhes representação em moeda nacional».
Por lapso não enumerei, há pouco, uma das causas da reinfecção inflacionista.
É que no nosso sistema bancário de emissão o Banco de Portugal foi colocado virtual, mas não legalmente, na obrigação de ter reservas-ouro para cobrir as circulações continentais e ultramarinas. O caso é sobretudo vultoso para o Banco de Angola, onde as reservas de valia-ouro estão muito longe de chegar a um milhar de contos, ficando as suas reservas nas unidades das centésimas ao estabelecer-se a proporção com as suas responsabilidades.
Dizia reinfecção porque os mesmos motivos que causualizaram a inflação continental acentuavam-se pela troca de cambiais provenientes de exportação, por notas, nas províncias ultramarinas, e, como sempre, Angola, desgarrada de um certo bom senso e prudência económica, numa euforia de prosperidade, lançava sobre o continente cambiais sobre cambiais, de poder de compra deferido por congelação ou por dificuldade de trocas mal absorvidas por importações que não fossem bastante de coisas um tanto supérfluas. Não discuto de momento a centralização de reservas no emissor continental; só ponho a nu e a claro essa cascata de inflação.
A seu tempo, neste debate, ocupar-me-ei em cheio do problema. Acabamos de examinar já a sintomatologia da inflação portuguesa; resta-nos ver as lesões profundas que deixou na orgânica e conjunto económicos portugueses, para completarmos o quadro patológico inflacionista e finalmente tentarmos, embora sem os dados seguros que tem o Governo, aterapêutica monetária respectiva.
A inflação em Portugal caiu em cheio sobre a classe média, sobretudo sobre os que viviam de rendimento certo, como os pensionistas.
O Estado, fiscalmente desarmado, foi a sua primeira vítima. A previdência não estava apetrechada actuariamente para recuperar as degradações monetárias das suas reservas.
O fenómeno inflacionista em Portugal deu-se em circunstancias tais que permitiram uma realta do juros para as obras particulares e públicas de fomento, embora os bancos regurgitassem de dinheiro que não podiam legalmente aplicar a esses investimentos de longa duração e também porque as reservas das caixas de previdência foram e são absorvidas por empréstimos estaduais.
Felizmente a economia portuguesa não correu o perigo das marchas desordenadas para as colocações abrigadas contra a desvalorização monetária, porque a situação desafogada do Tesouro e a nossa estabilidade cambial criaram um ambiente de segurança e tranquilidade.
Uma inflação desvalorizante, deixou um desequilíbrio profundo, com sectores abrigados, meio abrigados e inteiramente a descoberto contra a desvalorização.
Sr. Presidente: reconheço que a importância do assunto e o desejo que tenho de o apreciar largamente não me permitem concluir nesta sessão as minhas considerações.
Peço, portanto, a V. Ex.ª que, se não vir nisso qualquer inconveniente, me reserve a palavra para a sessão de amanhã.
O Sr. Presidente: - Fica V. Ex.ª com a palavra reservada para a sessão de amanhã.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Anunciei ontem que ia ser distribuído hoje o parecer sobre as Contas Gerais do Estado relativas a 1950. Efectivamente foi feita essa distribuição. Repito a minha instância aos Srs. Deputados no sentido de começarem a fazer desde já a sua preparação para o respectivo debate, que se deve iniciar numa das últimas sessões antes de férias.
A ordem do dia da sessão de amanhã é a continuação do aviso prévio do Sr. Deputado Pinto Barriga.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 40 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Alexandre Alberto de Sousa Pinto.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Calheiros Lopes.
José Luís da Silva Dias.
Manuel Maria Múrias Júnior.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Miguel Rodrigues Bastos.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Ricardo Malhou Durão.
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Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Abel Maria Castro de Lacerda.
Alberto Cruz.
António Carlos Borges.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Gaspar Inácio Ferreira.
Henrique Linhares de Lima.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
João Cerveira Pinto.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Cardoso de Matos.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.
José Pinto Meneres.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel França Vigon.
Manuel Lopes de Almeida.
Teófilo Duarte.
Vasco Lopes Alves.
O REDACTOR - Leopoldo Nunes.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA