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REPUBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 156
ANO DE 1952 22 DE ABRIL
V LEGISLATURA
SESSÃO N.° 156 DA ASSEMBLEIA NACIONAL
EM 21 DE ABRIL.
Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Exmos. Srs.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
José Guilherme de Melo e Castro
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 11 horas.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente anunciou estarem na Mesa, remetidas pela Presidência do Conselho, para os efeitos do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, nos Decretos-Leis n.º 28:722, 38:723 e 38:724.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Carlos Moreira, sobre interesses de algumas populações que desejam voltar a pertencer à circunscrição municipal de Mesão Frio; Amorim Ferreira, acerca da reforma do ensino nas Escolas de Belas-Artes: Ribeiro Cazaes, que enviou para a Mesa um requerimento dirigido ao Ministério do Exército, e Elísio Pimenta, que apresentou três requerimentos, dirigidos um ao Ministério da Justiça e dois ao Ministério da Economia.
Ordem do dia: - Continuou a discussão na generalidade das Contas Gerais do Estado relativos a 1950 e das contas, da Junta de Crédito Público referentes ao mesmo ano.
Usou da palavra o Sr. Deputado Dias da Fonseca.
Encerrado o debate, a Assembleia aprovou as propostas de redução referentes às contas em diversão, subscritas, respectivamente, pelos srs. Deputados Linhares de Limas e João Luís Augusto das Neves.
Na Segunda parte da ordem do dia prosseguiu a discussão do Decreto-Lei n.º 38:704, referido à [...] de diversos produtos ultramarinos.
Usou da palavra o Sr. Deputado Vaz Monteiro.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 13 horas e 43 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 10 horas e 50 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Adriano Duarte Silva.
Afonso Enrico Ribeiro Cazaes.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Alberto de Sousa Pinto.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Tavares.
António Augusto Estevas Mendes Correia.
António Cortês Lobão.
António Joaquim Simões Crespo.
António Maria da Silva.
António de Matos Taquenho.
António Raul Galiano Tavares.
António dos Santos Carreto.
António de Sousa da Câmara.
Armando Cândido de Medeiros.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Montero Belard.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Délio Nobre Santos.
Diogo Pacheco de Amorim.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
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Frederico Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas
Vilar.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique Linhares de Lima.
Herculano Amorim Ferreira.
Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
João Carlos de Aseis Pereira d« Melo.
João Luís Augusto das Neves.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
Jorge Botelho Moniz.
José Dias de Araújo Correia.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.
José Garcia Numes Mexia.
José Guilherme de Maio e Castro.
José Luís da Silva Dias.
José dos Santos Bessa.
Luís Maria Lopes da Tonseca.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Domingues Basto.
Manuel França Vigon.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Maria Júnior.
Manuel Maria Vai.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Meneses.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
Mário de Figueiredo.
Miguel Rodrigues Bastos.
Paulo Cancela de Abreu.
Ricardo Vaz Monteiro.
Salvador Nunes Teixeira.
Titos Castelo Branco Arantes.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 62 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 11 horas.
Antes da ordem do dia
Deu-se conta do seguinte
Expediente Telegramas
Setenta a apoiar a exposição enviada à Assembleia Nacional pelas empresas de camionagem.
Dos produtores de caie das regiões de Angola a dar o seu apoio à actuação dos organismos da mesma província e da metrópole acerca do Decreto-Lei n.º 38:704.
O Sr. Presidente: - Enviados pela Presidência cio Conselho, e para cumprimento do disposto no § 3.° do artigo 109.° da Constituição, encontram-se na Mesa os n.ºs 85 e 86 do Diário do Governo. 1.ª sério, de 14 e 15 do corrente, que contêm os decretos-lei n.ºs 38:722:38:723 e 38:724.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Carlos Moreira.
O Sr. Carlos Moreira: -Sr. Presidente: completou-se em 10 do corrente um ano sobre a data em que aqui. nesta Assembleia, levantei a minha voz para dirigir um apelo ao Sr. Ministro do Interior e no Governo.
Tratou-se, Sr. Presidente e Srs. Deputados, do fender os justos e bem legítimos interesses de algumas populações que desejam voltar a pertencer â sua Multisecular circunscrição municipal - o concelho de Mesão Frio -, de que foram arrebatadas em 1837, nas circunstâncias que já tive ocasião de referir e documentar.
A vontade dos povos. Sr. Presidente, quando não contrarie interesse mais alto, que no presente caso ninguém alegou, nem existe, deve ser respeitada e satisfeita, como é timbre de uma compreensiva justiça política.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Julgo saber que o assunto mereceu, e continua a merecer, a desvelada atenção do Sr. Ministro do Interior.
Não ignoro que a lei prescreve o cumprimento de diversas formalidades e o preenchimento de determinadas exigências para resolver um assunto de melindre e importância como este.
Não sei bem ao certo a quem imputar demoras que vêm excedendo, sem dúvida, os limites do razoável.
Apenas continua a interessar-me que as exigências e formalidades a que me referi sejam cumpridas em espírito de boa, pronta e leal colaboração, de forma a habilitar o Governo a proferir o justo veredicto no caso que lhe está submetido pela Câmara Municipal do conselho de Mesão Frio.
É na, convicção de que assim acontecerá que ponho termo às minhas considerações.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Amorim Ferreira: - Sr. Presidente as Escolas Superiores de belas-artes de Lisboa e do Porto continuam a funcionar nos termos do Decreto n.° 1:760 publicado em 1931, com a alteração introduzida pelo Decreto-Lei u.° 34:607. de 1945. que consistiu na criação das cadeiras de Urbanologia e de Projectos e Obras de Urbanização.
Em Janeiro de 1950 apresentou o Governo uma proposta de lei. subscrita pelo actual Sr. Ministro da Educação Nacional, com um desenvolvido relatório preambular, no qual se lê:
Entende o Governo não dever demorar-se a reforma do ensino artístico, que a opinião esclarecida reclama. Por isso envio à Assembleia Nacional «proposta de lei que visa a- renovação orgânica dos cursos de Arquitectura, de Pintura e de Escultura.
Sobre esta proposta incidiu largo parecer da Câmara Corporativa. A discussão na Assembleia Nacional iniciou-se em 12 de Abril de 1950. e na sessão do dia 20 fez, ontem dois anos) terminou a discussão na especialidade. Como não tomei parte na discussão, impedido por razões de carácter material, sinto-me à vontade para recordar as palavras com que o nosso ilustre colega Prof. Mário de Figueiredo iniciou o seu discurso, com que encerrou a discussão na generalidade:
Tem a discussão na generalidade sobre a proposta de lei relativa ao ensino das Belas-Artes decorrido com uma elevação excepcional.
O decreto da Assembleia Nacional, que correspondi? muito aproximadamente à proposta de lei apresentada pelo Governo, foi, promulgado como Lei n.º 2:06. de 10 de Julho de 1950, que apesar disso e não obstante próprio Governo, alguns
meses antes, afirmar que não devia demorar-se a reforma do ensino artístico, a
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«opinião esclarecida reclama», não foi posta em execução até agora.
As Escolas aguardam há dois anos que se execute a reorganização promulgada. Os inconvenientes destas situações transitórias, sobretudo em estabelecimentos de ensino, suo bem conhecidos, para que seja necessário insistir neles. Nomeadamente na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, que deveria ter no corpo docente, pela antiga organização, dezassete professores e Jóia assistentes e só tem nove professores e um assistente, isto é, metade do que deveria ter, para uma população escolar de quatrocentos alunos.
Não parece razoável, Sr. Presidente, que se deixe passar mais um ano lectivo sem dar execução à lei promulgada, ou, melhor, sem que o Governo, que propôs essa lei, dê execução ao seu próprio pensamento.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-Faltam cinco meses para começar novo ano lectivo, e este prazo não ó demasiadamente grande para se preparar a instalação e execução da nova orgânica do ensino das Belas-Artes em Portugal. Estou certo de que S. Ex.ª o Ministro da Educação Nacional, autor da proposta de lei, não deixará de atender ao* factos apontados com o seu esclarecido critério.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Ribeiro Cazaes: - Sr. Presidente: quando nesta Assembleia se discutiu, na especialidade, a proposta de lei n.° 186, relativa à organizarão geral da aeronáutica militar, teci breves considerações acerca da designação de «general chefe do estado-maior das forças aéreas» para classificar, como era definido no corpo do artigo 10.°, quem, em campanha, exercesse o comando de todas as forças aéreas em operações.
As minhas palavras queriam significar, como certamente todos os membros da Assembleia Nacional compreenderam, uma declaração de voto sobre o assunto, pois tal designação era contrária à tradicional concepção portuguesa de comando.
Não quis discutir então se julgava necessárias as disposições em vigor sobre comando e promoções, mas admiti logo que não seriam suficientes, aproveitando até a ocasião (tendo em vista, assim, evitar rasteiros juízos) para afirmar que, nivelando por cima, se ia de encontro aos anseios da geração a que pertenço, aos desejos dos homens que desde 1920 souberam distinguir o mando do comando, confiando aquele, as mais das vezes, aos outros, para bem da República e variados interesses, com uma ingenuidade de que, valha a verdade, só tarde se aperceberam, mas merecendo-lhes sempre o comando especiais cuidados.
Agora também não é ainda oportuno falar sobre o necessário e suficiente, como se diz em matemática, para chegarmos a uma solução capaz de tão importante problema da defesa nacional, e quero acentuar bem que somente o desejo de servir, colaborando lealmente com os chefes responsáveis, ditou as minhas considerações quando se discutiu a proposta de lei n.º 186.
É que, estando ao alcance de todos os que pensam a quem terão de entregar seus filhos pura o maior sacrifico humano o melindre de que só reveste este aspecto a defesa nacional, sem termos do invocar o direito de defender o que ó nosso, mas orientados pelo simples bom sonso, somos levados a considerar que é trabalho utilíssimo tomar todas as disposições que tendam a dissipar quaisquer dúvidas que possam surgir sobre capacidade de comando.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Apesar da abundância de marechais, que devaneios e faltas de senso tem feito surgir por esse Mundo fora; apesar de tantas atitudes incompreensíveis, que nos fazem pensar muitas vezes que a Terra se transformou num imenso manicómio, uma pequena notícia publicada há dias na imprensa de todos os países mostra claramente que não se presta u fantasias o problema grave do comando.
Passo a lê-la:
Admite-se que o Departamento da Defesa preferiria que o general Eisenhower fosse substituído no comando das forças da N. A. T. O. pelo general Ridgway, actualmente no comando supremo do • Extremo Oriente. Ao que parece, o Pentágono informou recentemente a Casa Branca e o Departamento de Estado da sua preferência. Alegar-se-ia no Departamento da Defesa que o general Gruen-ther, actual colaborador directo de Eisenhower no S. H. A. P. E., embora esteja perfeitamente ao corrente dos problemas práticos da organização da defesa europeia, nunca foi comandante supremo de um organismo importante, tendo sido sempre 2." comandante e chefe de estado-maior de um general mais experiente. Em contrapartida, o general Ridgway. desde que assumiu o comando em Tóquio, tem manifestado grande capacidade em matéria de decisão e responsabilidade.
No que disse quando nesta Assembleia se discutiu a organização geral da aeronáutica militar tive em vista, especialmente, solicitar a atenção do Governo para tão importante assunto. Agora u mesmo desejo me anima, e, na previsão de se tornar necessário ir mais além, a fim de ficar habilitado a apresentar um aviso prévio sobre comando e promoções, deponho nas mãos de V. Ex.ª, Sr. Presidente, o seguinte
Requerimento
«Requeiro que pelo Ministério do Exército me sejam fornecidos os seguintes elementos:
1.º Informações que permitam verificar como se preenchem as condições para as promoções a oficial superior e ao generalato e, em especial, como "funcionam os diferentes cursos do Instituto de Altos Estudos Militares, com as disposições de ordem interna que os regem, tão detalhadas quanto possível (horários, lições magistrais, provas e condições em que se efectuam, precauções para um recto juízo, etc.);
2.° Relações respeitantes ao tempo de serviço com tropas, mas só considerando, para o efeito, o que tenha sido prestado nas unidades militares, devendo estas ser devidamente apontadas, bem como registado o posto em que ali serviram, dos actuais oficiais do E. M. E., a partir de major, inclusive;
3.° Disposições que tenham já sido tomadas ou que se preparem para evitar que, em virtude da independência das promoções nas diferentes armas, se verifique o facto de subordinados passarem, de um momento para o outro, a comandar quem era seu superior hierárquico, sem que motivos disciplinares o justifiquem ou provas especiais o imponham».
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador foi muito cuprimentado.
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O Sr. Elísio Pimenta:-Sr. Presidente: pedi a palavra para enviar para a Mesa os seguintes requerimentos:
«Requeiro que, pelo Ministério da Justiça, me seja fornecida nota do número de processos instaurados nos tribunais judiciais durante os anos de 1950 e 1951 e até Abril do ano corrente com base em autos de transgressão levantados pelos serviços florestais, e bem assim do resultado final daqueles que foram julgados».
«Requeiro que, pelo Ministério da Economia, me sejam indicadas as razões da modificação do regime de proibição da importação de passas de uva, estabelecido para as campanhas de 1948 e 1949, do que resultou a crise por que está a passar uma importante indústria complementar da exploração agrícola, envolvendo já capitais de certo vulto e assegurando trabalho a centenas de trabalhadores».
«Requeiro, pelo Ministério da Economia, o seguinte:
1.º Cópia da exposição dirigida, em Dezembro de 1951, a S. Ex.ª o Ministro da Economia pela Junta de Freguesia de Areosa, Viana do Castelo, no sentido de serem restituídos ao domínio e posse dos proprietários dos terrenos da fertilissima veiga da Areosa determinados tractos de terreno de monte na posse dos serviços florestais, da informação prestada pelos serviços sobre essa exposição e do respectivo despacho;
2.º Nota do número de autos de transgressão às leis e regulamentos florestais levantados nos anos de 1950 e 1951 em relação a cada perímetro florestal e do quantitativo das multas aplicadas e das efectivamente recebidas e ainda do número de autos enviados aos tribunais judiciais;
3.º Nota do número e valor das ajudas de custo-me transportes pagos aos agentes dos serviços florestais durante os anos de 1950 e 1951, especificando-se o número e o valor dos pagos por motivo da comparência dos mesmos agentes nos tribunais judiciais».
Tenho dito.
O Sr. Presidente:-Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente:-A primeira parte da ordem do dia consta da continuação da discussão das Contas Gerais do Estado de 1950 e das contas da Junta do Crédito Público do mesmo ano.
Tem a palavra o Sr. Deputado Dinis da Fonseca.
O Sr. Dinis da Fonseca: - Sr. Presidente: antes de iniciar as minhas ligeiras considerações, quero congratular-me com V. Ex.ª pela elevação e pelo brilho com que decorreu este debate sobre as contas públicas.
Deve-se o facto a uma decisão de V. Ex.ª para evitar o afogadilho com que em anos anteriores fora possível trazer à discussão desta Assembleia assunto tão importante. E esta decisão de V. Ex.ª bem merece ser anotada nesta tribuna.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador:-Considerei sempre a discussão das contas públicas como essencial, não só à função fiscalizadora desta Assembleia, mas à própria ordem administrativa da Nação.
A pontualidade com que as contas públicas tem vindo a lume e justamente tem sido louvada afrouxaria a pouco e pouco se, porventura, não fossem objecto de discussão. Importa vencer a tradição de silêncio sobre os resultados das contas públicas, que durante tantos anos tornou os representantes da Nação cúmplices das irregularidades administrativas e financeiras que se cometiam dentro das gerências.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador:-Quero ainda felicitar o douto Tribunal de Contas pelo meritório esforço de colaboração com a Assembleia, organizando o seu relatório a tempo de ele poder servir de elemento de apreciação na discussão das contas públicas.
Foi pena que, estando esse relatório datado de 17 de Março, a Imprensa Nacional o tenha publicado somente em 9 de Abril e feito distribuir em 14 deste mês, ou soja na véspera de começar a discussão. São deficiências que suponho fáceis de remediar em anos futuros.
O Sr. Melo Machado: - E conveniente ressalvar que a Imprensa Nacional não é a verdadeira responsável por esse atraso, pois não tem pessoal para fazer esse serviço.
O Orador:-O serviço que não cumpre a tempo é o responsável.
O Sr. Melo Machado: - Já não é a primeira vez que eu reclamo aqui contra atrasos de publicações da Imprensa Nacional, que nos fazem falta para melhor podermos tratar certos assuntos.
O Orador:-V. Ex.ª poderá ter razão, mas não é este o momento de tratar aqui deste assunto.
O que eu quero assinalar é que, de qualquer forma, é necessário tomar as providências precisas para que não volte a dar-se este atraso.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-Um relatório de oitenta páginas não pode ser examinado em algumas horas e necessita de nos ser entregue a tempo de poder ser devidamente apreciado.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-Quero ainda fazer minhas as elogiosas referências já aqui feitas ao relatório da Comissão de Contas Públicas e ao trabalho do ilustre Deputado Sr. Engenheiro Araújo Correia, que nos habituou há muitos anos a um trabalho exaustivo nestes seus pareceres.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador:-Peço licença apenas para uns ligeiros reparos que me foram sugeridos durante a sua leitura.
Abre o parecer com um preâmbulo sobre as características da gerência de 1950, em discussão.
Não parece, na realidade, possível fazer um julgamento correcto de qualquer gerência sem que tenhamos em atenção as suas características próprias, isto é, os objectivos que teve em vista, e se encontram definidos no relatório que acompanha o decreto orçamental, características e objectivos que obedecem, naturalmente, ao imperativo da conjuntura, quando esse orçamento foi elaborado.
Suponho que a análise desses objectivos, a maneira como foram atingidos e os resultados, ou influência dos
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Seus resultados, constituem o âmbito da discussão da gerência para o seu correcto julgamento.
EU estou de acordo com uma das afirmações feitas aqui pelo ilustre Deputado Dr. Pacheco de Amorim de que a discussão das contas públicas não pode visar exclusivamente a análise da correcção jurídica do equilíbrio Orçamental. Há um outro equilíbrio mais profundo, o equilíbrio de todos os factores da riqueza social: o capital o trabalho e o crédito.
Segundo creio, o artigo 31.° da Constituição Política considera direito e obrigação do Estado realizar também este equilíbrio e, embora a realização deste não seja função exclusiva do Ministério das Finanças, o que é certo é que às contas públicas vêm parar os reflexos de maior importância.
Vejamos, pois, quais foram as características da gerência de 1900, ou seja, quais os objectivos que se deduzem do relatório do decreto orçamental de 30 de Dezembro de 1949:
1.° OBJECTIVO. - Compressão ou redução das despegas orçamentais. A linha orçamental de 1950 obedeceu já à norma que no final da gerência o Sr. Presidente do Conselho, no sen discurso de 12 de Dezembro, apontou como devendo ser a condutora da nossa administração: c severos nos gastos e moderados nas ambições.
Recordo apenas as tempestades que nalguns sectores tinha levantado essa política de austeridade nos gastos.
2.º OBJECTIVO. - Concentração de esforços e recursos na execução dos planos de fomento ligados à execução da Lei n.° 1:914, que teve na gerência de 1950 o seu termo de vigência.
3.° OBJECTIVO. - Instalação de um largo plano, de fomento indirecto através do Fundo de Fomento Nacional, criado em 1949, mas cuja actividade só começou a exercer-se em 1950.
O ilustre relator das contas públicas ocupou-se no seu parecer especialmente da primeira e segunda característica. Nada nos diz sobre a terceira, e no entanto, Iorque ela constitui matéria nova, suponho muito importante o seu esclarecimento nesta Assembleia; direi mais : julgo indispensável a sua apreciação, como espero mostrar na sequência das minhas considerações.
Quanto à primeira e segunda características, o ilustre relator aplaude inteiramente a política da redução de despesas orçamentais e pareceu-me ainda que aprova a concentração de recursos num modesto plano, condenado abertamente o desvario das grandes obras e a lissipação de investimentos em realizações adiáveis ou produtivas.
Como tenho algumas responsabilidades ligadas ainda gerência de 1950, e gostosamente desejo assumir nesta tribuna as pertencentes aos ilustres titulares da pasta as Finanças que intervieram na mesma gerência, procurei descortinar os financiamentos que o ilustre relator condenava como dissipadores, para me pronunciar sobre mas não o consegui. S. Ex.ª não concretizou quais
O investimentos que considera dissipadores e aqueles; com que está de acordo por considerá-los reprodutivos.
Por exemplo, considera o ilustre relator dissipadores e investimentos directos que figuram na gerência de 250 relativos a hidráulica agrícola, repovoamento florestal e serviços de fomento mineiro e pesquisas de combustiveis? Acha condenáveis os investimentos feitos? a rede escolar, hospitais e estradas? Considerará issipadores os investimentos do fomento indirecto feitos; através do Fundo «Io Fomento Nacional - e que atingiram cerca de 340:000 contos na gerência de 1950 - destinados ao plano hidroeléctrico, à marinha mercante, lndústriais-base e ao fomento ultramarino de Angola
Por mim considero absolutamente de interesse nacional todos estes investimentos.
Mas é possível que o ilustre relator considere atingidos na sua critica genérica alguns desses investimentos, ou outros sobre os quais, à falta de concretização, não me é possível fazer juízo seguro.
Ocupa-se depois o ilustre relator da análise pormenorizada das receitas públicas, trabalho valioso a que é preciso render justiça, documentado com quadros esclarecedores.
Os reparos que vou fazer não têm em vista desmerecer o seu valor.
A p. 26 lê-se o seguinte, analisando-se as receitas ordinárias e extraordinárias:
Nota-se um aumento não muito sensível nas receitas ordinárias cobradas, e, como houve diminuição muito importante nas receitas extraordinárias, deu-se um decréscimo bastante grande nas receitas totais.
Salvo o devido respeito, há aqui um equívoco manifesto.
Para l milhão de receitas extraordinárias previra o orçamento a sua cobertura com o produto da venda de títulos, com 9:500 contos de empréstimos, com 167:000 contos de saldos dos unos económicos findos e com uma pequena quantia resultante da amoedação.
Ora o facto de o Governo não recorrer às reservas dos anos económicos findos, e, em vez disso, ter feito a cobertura com os excessos das receitas ordinárias, não pode significar que tenha havido diminuição das receitas extraordinárias.
É evidente que os saldos dos anos económicos findos estavam realizados, eram reservas do Tesouro, e se. em vez de aplicar essas reservas, o Governo aplicou os excessos das receitas ordinárias, não diminuiu as reservas previstas para cobertura e fez apenas política de maior segurança, poupando aquelas reservas e empregando na cobertura os excessos verificados nas receitas ordinárias.
Igualmente, se, em lugar dos 800:000 contos de empréstimos, se utilizaram para cobertura das despesas orçamentais apenas 319:000 contos, não quer isso dizer que houvesse diminuição muito importante nas receitas totais.
Como VV. Exas. sabem, recorrer aos empréstimos ou recorrer a excessos de receitas ordinária equivale a fazer o equilíbrio entre as responsabilidades que são pedidas à geração presente e as responsabilidades deixadas a gerações futuras.
Creio que, poupando as reservas, o Governo adoptou o melhor critério do administração. Aliás, o próprio relatório do Tribunal de Contas salienta que o produto da venda de títulos ou o recurso ao empréstimos adoptado de modo especial pura as despesas de carácter reprodutivo.
A p.28, o ilustre relator, apresentando um quadro muito interessante das percentagens no total das receitas ordinárias, exprime o conceito de que a tendência da subida deveria ser no imposto directo, parecendo dar a entender que o quadro mostra o contrário, mas, analisando-o bem, vè-se que se tem verificado precisamente a tendência que o ilustre relator considera mais, justa e racional.
Mais grave, porém, considero o equivoco que existe na p.31.
Aí o ilustre relator afirma o seguinte:
Até corto ponto pode dizer-se que o imposto sobre rendimentos, tal como se deduz do quadro, se circunscreve neste capitulo ao que se paga nas duas primeiras rubricas, ou cerca de (J73:UOU contos, números redondos. No conjunto das
receitas ordiná-
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rias, quo se elevaram em 1950 a 4.825:000 contos, verba representa cerca de 14 por cento o que é muito pouco..
Há aqui um lamentável equivoco S. Ex.ª não incluiu entre as receitas gerais cie rendimento o imposto profissional e considerou apenas a contribuição predial e industrial, imposto complementar e aplicação de capitais. Alas ao fazer a soma, em vez dos rendimentos dos impostos, somou as diferenças, para mais, em relação a 1948, e por isso encontrou apenas 673:000 contos, quando, se tivesse somado as cobranças dos impostos, deveria ter encontrado 1.181:000 contos, ou 1.287:000 contos se tivesse incluindo o imposto profissional. Desta forma, a percentagem de 14 por cento deve passar para 24 ou 26 por cento.
A p. 53. a respeito do quadro sobre o rendimento do imposto sobre sucessões e doações, S. Ex.ª atribui o aumento verificado em 1948 às medidas tomadas para elevar os limites ...
Houve equivoco. Essas medidas foram tomadas em 1947 e o aumento de 1948 resultou da taxa de compensação que nesse uno se mandou cobrar.
No relatório das contas públicas de 1948 a p. 7. S. Ex.ª pode encontrar esclarecida inteiramente esta diferença.
Só assinalo este pequeno equívoco para fazer notar o seguinte: a Assembleia votou a Lei n.° 2:022 para isenção das pequenas heranças do imposto sucessório. Um número assinala o beneficio desta lei: o dos processos que beneficiaram dessa isenção, que atingiu 37:092.
Pois apesar desta isenção, as cobranças aumentaram em 1949 e 1950. Quer dizer: com este beneficio, que impediu o lançamento de ruinosos impostos sobre as pequenas economias domésticas, não foi prejudicado o volume dos impostos cobrados através deste imposto, como mostram os respectivos números.
A seguir ocupa-so o ilustre relator do imposto de sisa. dizendo que o número de transmissões em 1950 não progrediu.
Deram a S. Ex.ª com certeza, uma informarão errada, porque os números oficiais mostram que em 1949 o número fie processos foi de 155.000 e em 1950 aumentou para 100:022. Há manifestamente um aumento.
Mas este equivoco também não mereceria qualquer referência se, porventura, não quisesse chamar a atenção da Assembleia para outros aspectos mais importantes.
Como VV. Exas. sabem, fez-se uma campanha contra o Ministério das Finanças, campanha que partiu mesmo de alguns sectores do próprio Ministério, contra a me-dida adoptada de tomar o valor matricial como a base* de liquidação das sisas.
E disse-se, como se continua a dizer ainda, que parecia impossível que o Estado aceitasse uma medida dessas, da qual resultaria para ele, com certeza, um decréscimo de rendimento, porque era evidente que em muitos casos, especialmente nas avaliações directas, se tomava para liquidação do imposto um valor inferior ao real.
Pois, se VV. Exas. compararem os números das cobranças, verificarão que estas não revelaram as anunciadas quebras.
Porque? Porque o acréscimo que poderia resultar das avaliações não era normalmente para o Estado, mas sim para o «mercado negro», com o qual se acabou. Os que beneficiavam do «mercado negro» é que fizeram, e fazem, a campanha contra o Estado.
E todavia, a simplificação, a certeza, a liberdade com que se trabalha hoje em matéria de sisas é incontestavelmente um beneficio que proveio dessa medida.
O ilustre relator diz-nos ainda, sobro sisas, que os valores matriciais carecem de ser revistos nas duas cidades, de Lisboa e Porto, por ter havido avaliação excessivas.
Parece-me - ainda que não possa afirmar isto de uma maneira absoluta que também há a aqui um equívoco de S. Exa.
O que talvez preciso de ser revisto é o factor 24, pelo qual se estabelece a relação entre o valor colectável e o valor fiscal.
E termino as minhas considerações sobre esta matéria assinalando a Assembleia apenas mais um número: a p. 102, onde consta o valor das restituições feitas pelo Estado. Vê-se que elas se elevaram, em 1900, a 8:956 contos.
Sempre existiu legislação a favor das restituições, mas durante largos anos as restituições feitas pelo Tesouro Público aos contribuintes eram objecto de favor.
E em honra aos serviços e à maneira como eles correspondem à decisão do Estado a este respeito que eu quero assinalar este número: 8:906 contos foram restituídos aos contribuintes, sem que estes precisassem de meter empenho, e apenas pelo andamento regular dos processos.
E passarei a mostrar agora à Assembleia alguns dos ensinamentos - dois sobretudo - que me parecem resultar da análise global das contas públicas de 1950.
Volto às cifra! referentes às despesas extraordinárias e ao excesso das receitas ordinárias que lhes serviu de cobertura e noto, realmente, que não pode- deixar de impressionar que fosse possível aplicar 761:000 contos de excesso de receitas ordinárias para cobrir despesas extraordinárias. Creio que se põe o seguinte problema: estará a estrutura ou classificação das receitas ordinárias e extraordinárias feita segundo um critério inteiramente inalterável? Não haverá qualquer coisa :i modificar nesta matéria?
Quanto a mim parece-me que sim. As instalações dos novos serviços, por exemplo, quando correspondem no seu normal desenvolvimento, não deveriam figurar na? despesas extraordinárias, mas sim nas ordinárias.
Creio mesmo não estar em erro afirmando que no discurso pronunciado em 12 de Dezembro de 1959 Ex.ª o Chefe do Governo foi o primeiro a apontar esta necessidade e apenas julgou que não tinha chegado a oportunidade para a indispensável revisão da estrutura orçamental.
Mas mais graves se me afiguram os problemas resultantes da inclusão indiscriminada nas despesas extraordinárias dos investimentos de fomento directo e indirecto e, sobretudo, a confusão estabelecida entre os recurso: ao crédito público, quer seja para cobertura das despesas orçamentais, quer para fins de fomento económico.
Esta confusão avulta após a criação do Fundo de Fomento Nacional. Uma pergunta que surge logicamente da análise das contas públicas porá imediatamente a Assembleia perante a gravidade do problema.
No relatório do Tribunal de Contas, a p. 1896, sob a rubrica «Diplomas que autorizaram o Governo a contrair empréstimos», encontram-se mencionados três diploma? que autorizaram empréstimos. Mais adiante, a p. 2018 encontram-se referidas três emissões no montante de 500:000 contos, feitas durante a gerência.
Parece, assim, que teríamos seis empréstimos. Mas analisando melhor, verifica-se que um dos emprestimos - o de 3,5 por cento de 1950 está repetido, pelo que já podemos baixar para cinco. Mas, além dos 500.000 contos das três operações mencionadas a p. 2018,- ha o produto das operações ligadas ao crédito norte-americano mencionadas a p. 1986 e atribuídas ao Fundo de Fomento Nacional, e de que resultaram somas superiores a 340:000 contos, correspondentes aos
Financiamentos feitos através do mesmo Fundo na gerência de 19590.
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Em face destes números, e mostrando as contas que à cobertura de despesas orçamentais foram aplicados apenas 319:000 contos do produto da venda de títulos, é natural inquirir: para onde foram os restantes milhares de contos produto dos empréstimos feitos?
Poderá a Assembleia aceitar a legitimidade dos encargos que por virtude desses empréstimos derivaram para as despesas gerais ?
Vou mostrar a VV. Ex. que não estamos em face de contas do Estado erradas, mas apenas em face de uma deficiência de clareza, justificável pela nova técnica de fomento económico instalada pela criação do Fundo de Fomento Nacional.
Antes de mais, o seguinte esclarecimento doutrinal. A experiência administrativa e financeira dos últimos anos diz-nos que o recurso ao crédito público não tem apenas por finalidade a cobertura de despesas orçamentais.
Assim, pode o Tesouro recorrer ao crédito público como simples meio de defesa da moeda e dos preços, fazendo recolher os excessos dê capitais imobilizados, e deste recurso lançou mão o Governo durante a guerra, chegando a amealhar, em operações de tesouraria, mais de 3 milhões de contos.
Pode ainda o Tesouro recorrer ao crédito público como meio de activar a circulação deste, ou para intensificar a comparticipação em empreendimentos de interesse nacional através de financiamentos reembolsáveis a curto prazo.
Podemos hoje considerar três formas especiais de actividade fomentadora exercidas pelo Estado:
Financiamentos feitos pelo capital particular com simples garantia ou aval do Estado, de que resulta uma responsabilidade meramente subsidiária, que só virá a tornar-se efectiva se a empresa deixar de honrar os seus compromissos. O Tribunal de Contas menciona e considera dentro desta espécie, por exemplo, o financiamento feito à Companhia das Águas e à Companhia dos Caminhos de Ferro do Norte de Portugal, nos quais o Estado tem apenas responsabilidade de aval;
Temos a seguir financiamentos de fomento directo, ou investimentos do Tesouro em empresas de interesse nacional consideradas reprodutivas ou susceptíveis de aumentar a riqueza nacional;
Finalmente, os financiamentos de fomento indirecto, realizados através do Fundo de Fomento Nacional, cuja actividade principiou, como já disse, na gerência de 1950.
Este Fundo está autorizado a fazer financiamentos a determinadas empresas ou realizações de reconhecido interesse nacional.
Estes financiamentos são reembolsáveis a curtos prazos e têm como garantia os valores que se destinam a favorecer; em representação das operações realizadas pelo Fundo de Fomento Nacional, podem ser emitidos empréstimos de divida pública, também amortizáveis a curto prazo e cujo ritmo de amortização corresponde ao ritmo de reembolso dos financiamentos feitos pelo Fundo às empresas. Tal é a técnica instalada.
Para abastecer o Fundo de Fomento Nacional o Tesouro recorreu, durante a gerência de 1950, além das operações de crédito externo americano, ao empréstimo interno de 3 4/2 por cento, por cujos encargos respondem, nos termos do Decreto-Lei n.º 37:827, de 19 de Maio de 1950, que o autorizou, as operações realizadas pelo Fundo de Fomento Nacional, em cuja representação foi emitido.
Postos estes esclarecimentos, podemos já responder à pergunta: para onde foram os milhares de contos produto dos empréstimos emitidos durante a gerência de 1950?
As operações referentes ao crédito externo americano e o empréstimo de 3 1/2 por cento foram para o Fundo de Fomento Nacional. As duas séries do empréstimo da marinha mercante, para abastecimento do respectivo Fundo, criado em 1946. Convém ainda esclarecer que as operações deste Fundo foram mandadas incorporar no Fundo de Fomento Nacional pelo decreto que criou este último.
Parece, no entanto, não ser possível deixar de figurar de futuro no relatório das contas públicas a destrinça destas várias espécies de responsabilidades assumidas pelo Tesouro; e bem assim um relatório da actividade do Fundo de Fomento Nacional, que deverá considerar-se entre os elementos de apreciação das contas públicas referidos no n.º 3.º do artigo 91.º da Constituição.
Dadas estas explicações, VV. Ex.ª poderão agora compreender e apreciar mais facilmente a dúvida levantada no relatório do Tribunal de Contas referente ao empréstimo da marinha mercante.
Segundo o relatório do Tribunal de Contas, este empréstimo não é dívida pública efectiva, mas divida contraída por terceiro com simples aval do Estado. E diz-nos mais que este empréstimo não deverá mesmo considerar-se dívida, mas simples investimento do Tesouro, porque, em vez de dar lugar a uma entrada de fundos, deu antes lugar a uma saída (ut fl. 2021).
Quem ler este extenso passo do relatório poderá supor que se trata apenas de uma divergência doutrinal, entre a Junta do Crédito Público e o Tribunal de Contas. Se esta suposição correspondesse à realidade, não me sentiria muito à vontade para versar o assunto nesta tribuna. Estariam, nesse caso, em causa as minhas responsabilidades de presidente da Junta, e estas a outros melhor pertenceria apreciá-las e julgá-las.
Não é esta porém a posição de facto.
É certo que a Junta do Crédito Público manteve até 1948 o critério de que realmente se tratava de um empréstimo feito por terceiros com o aval do Estado; mas, estudando melhor os decretos que lhe respeitam e a respectiva obrigação geral, chegou II conclusão de que se tratava de verdadeira dívida pública e, conformando-se com o velho aforismo sapientis est mutare consilio, mudou de critério e no seu relatório de 1949, enviado a esta Assembleia, expôs as razões por que o fazia.
A Comissão de Contas da Assembleia Nacional de que não tenho a honra de fazer parte, estudando a questão, convenceu-se também de que era razoável essa mudança de critério, e assim o propôs nas conclusões submetidas à aprovação desta Assembleia e por ela aprovadas em 30 de Abril do ano passado.
Portanto, neste momento, a posição real é esta: o critério defendido pelo douto Tribunal no seu relatório não é uma divergência com a Junta do Crédito Público, mas uma divergência com uma resolução da Assembleia e até com o próprio relatório de S. Ex.ª o Ministro das Finanças, que, como VV. Ex. poderão verificar a p. 21 desse relatório, mandou incluir, entre o nominal da dívida efectiva do Estado, para maior segurança diz-se em nota, o valor das emissões do empréstimo da marinha mercante, que anda à roda de 500:000 contos nas várias séries emitidas até hoje.
Mas, embora esta seja a posição real, como pode dizer-se que o Tribunal de Contas, ao insistir no assunto, quis apelar de uma Assembleia pouco informada para uma melhor informada, julgo conveniente dar um esclarecimento a VV. Ex. sobre a origem histórica da dúvida e sobre a insubsistência, que se me afigura manifesta, das alegações feitas pelo douto Tribunal:
Vejamos o aspecto da origem histórica da dúvida.
Em 24 de Setembro de 1946 foi criado o Fundo de Renovação da Marinha Mercante, que constituiu a primeira experiência prática da nova técnica de financiamentos indirectos.
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Este Fundo era autorizado a fazer financiamentos aos armadores inscritos na junta respectiva e para abastecer este Fundo era autorizada a emissão de um empréstimo, a que o Estado concedia o aval.
Esta foi de facto a posição tomada no Decreto-Lei n.º 35:876.
Simplesmente, o juro fixado para este empréstimo era de 2,7õ, nessa altura considerado muito baixo pelo mercado, além de que não tinha uma confiança absoluta no futuro da marinha mercante para lhe entregar os seus capitais apenas com o aval do Estado.
O certo é que um ano depois, em Maio de 1947, o Governo publicava um novo Decreto, o n.º 36:271. em que o empréstimo aparecia já transformado em autêntica dívida pública.
Assim, o $ único do artigo 4.º diz textualmente:
Serão aplicáveis aos títulos deste empréstimo os preceitos legais sobre divida pública, incluindo o regime de liquidação do imposto sobre as sucessões e doações.
Entre os preceitos legais da dívida pública figura o artigo 57.º da Lei n.º 1:933, que consigna ao pagamento dos encargos de qualquer empréstimo os rendimentos gerais do Estado.
Pelo § único do artigo 6.º do mesmo decreto-lei era cometido à Junta do Crédito Público todo o serviço do novo empréstimo, e, para que não restassem dúvidas, o artigo 6.º prescrevia:
Anualmente serão inscritas no orçamento de despesa do Ministério das Finanças as importâncias necessárias ao pagamento dos encargos dos juros, amortizações e remição diferida deste empréstimo...
Era a fixação do empréstimo, que fora autorizado com simples aval, em verdadeira dívida pública, assumindo o Estado a obrigação de principal pagador.
Isto mesmo confirmam os termos da respectiva obrigação geral.
Já foram feitas nove emissões deste empréstimo, os termos da obrigação geral são iguais em todas elas e por isso leio a VV. Ex.ª8 parte do texto da última, publicada no dia 7 do mês corrente (p. 1910 da 2.a série do Diário do Governo).
Depois de indicar que esta 9.a série, no valor de 100:000 contos, tem as regalias, isenções e direitos consignados no Decreto n.º 36:271, diz o seguinte:
Declaro eu, Artur Águedo de Oliveira, Ministro das Finanças, que a nação portuguesa se constitui garante e principal pagadora pela presente obrigação geral ...
Esta obrigação geral foi sujeita ao visto do Tribunal de Contas, que lho concedeu.
Apesar da transformação em verdadeira dívida pública, a praça não subscreveu o empréstimo porque o juro oferecido de 2,70 era considerado baixo, e por isso o Tesouro teve de apresentar-se como único subscritor, visto ter se obrigado a colocar as obrigações (artigo 5.º do Decreto n.º 36:271).
Deixou assim de ser dívida pública para se converter em investimento do Tesouro?
Não, apenas a operação se desdobrou em duas: um empréstimo de dívida pública, cujo certificado de dívida inscrita foi mandado averbar à Fazenda Nacional, e um investimento do Tesouro no Fundo de Renovação da Marinha Mercante. Este tem por contrapartida os reembolsos que se esperam do mesmo Fundo; aquele tem por garantia as receitas gerais do Estado, nos termos do artigo 57.º da Lei n.º 1:933. E não pode dizer-se que deste empréstimo não resultou entrada de fundos, porque o certificado da divida inscrita averbado à Fazenda Nacional ( correspondente à 8.ª série foi já mandado averbar ao Fundo de Fomento Nacional, pela razão já indicada da incorporação das operações da marinha mercante neste último Fundo) é um valor realizável pelo seu desdobramento em títulos e colocação subsequente no mercado, à cotação que esta julgar aceitável. Da doutrina do douto relatório do Tribunal de Contas, a ser aceite, resultaria apenas o descrédito dos certificados de dívida pública averbados a Fazenda Nacional e ao Fundo de Fomento Nacional, dificultando a colocação dos títulos por eles representados.
Acresce que entre o empréstimo da marinha mercante e o empréstimo de 3,5 por cento emitido durante a gerência de 1950 para abastecimento do Fundo de Fomento Nacional não existe diferença substancial. Se pode dizer-se que o empréstimo destinado à marinha mercante foi emitido em representação das operações realizadas pelo Fundo de Renovação da Marinha Mercante, o empréstimo de 3,5 por cento foi emitido para abastecer o Fundo de Fomento Nacional e em representação das operações realizadas por este Fundo (artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 37:354, de 26 de Março de 1949, e artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 37:827).
E no entanto não se levantou quanto a este empréstimo dúvida semelhante à suscitada pelo douto relatório do Tribunal de Contas quanto ao destinado à marinha mercante ...
Sr. Presidente: vou terminar. Apenas mais um minuto para concluir as minhas considerações.
A história do empréstimo da marinha mercante, que acabo de fazer a VV. Ex.ªs, mostra que o respectivo Fundo não teria recebido o financiamento de que carecia se o Estado, oportunamente, não tivesse recorrido aos seus rendimentos próprios, ou seja aos contribuintes, para poder financiar o Fundo da Marinha Mercante e assim não interromper o ritmo das suas realizações.
E, porque assim aconteceu, não ficará mal que do alto desta tribuna reclame, dos justos louvores que se erguem a aclamar as notáveis realizações da nossa marinha mercante, a quota-parte que nesses triunfos cabe a esses heróis desconhecidos que são os contribuintes portugueses.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador:-E, já que se consideram justificados largos dispêndios para festejar o aparecimento dos nossos grandes transatlânticos, parece-me que não seria abusar demais que nos convites para viagens de propaganda fossem incluídos os contribuintes portugueses, na pessoa dos quarenta maiores contribuintes de cada distrito.
Essa viagem representaria a legítima e oportuna glorificação dos sacrifícios que tornaram possível a grandiosa epopeia da nossa regeneração financeira e nacional.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Não está mais ninguém inscrito para o debate sobre as Contas Gerais do Estado e as da Junta do Crédito Público.
Vai ser lida à Assembleia uma proposta de resolução sobre as Contas Gerais do Estado relativas a 1950.
Esta proposta de resolução está assinada, em nome da Comissão de Contas Públicas, pelo Sr. Deputado Linhares de Lima.
Leu-se. É a seguinte:
«Para efeitos do n.º 3.º do artigo 91.º da Constituição, tenho a honra de, em nome da Comissão de Contas Pu-
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blicas, submeter à aprovação da Assembleia Nacional as seguintes bases de resolução:
a) A cobrança das receitas públicas durante a gerência de l de Janeiro de 1950 a 31 de Dezembro do mesmo ano foi feita de harmonia com os termos votados na Assembleia Nacional;
b) As despesas públicas, tanto ordinárias como - extraordinárias, foram efectuadas em conformidade com a lei;
c) O produto de empréstimos teve a aplicação estatuída nos preceitos constitucionais;
d) Foi mantido durante o ano económico o equilíbrio orçamental, como dispõe a Constituição, e é legitimo o saldo de 29:586.725510 apresentado nas contas respeitantes a 1950».
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Vai agora ler-se a proposta de resolução que foi enviada para a Mesa pelo Sr. Deputado João das Neves sobre as contas da Junta do Crédito Público de 1950.
Foi lida.
É a seguinte:
A Assembleia Nacional:
Considerando que as contas da gerência de 1950 fecharam com saldo positivo e que as despesas extraordinárias da mesma gerência foram satisfeitas em grande parte com o excedente das receitas ordinárias sobre as despesas da mesma natureza:
Considerando que o montante das despesas extraordinárias de fomento económico durante a gerência de 1950 excederam em muito a importância das emissões feitas durante a mesma gerência e que o aumento da divida pública, no montante de 411:884.589020, foi determinado exclusivamente pela continuarão da anterior política do Governo no sentido de fomentar e desenvolver a economia nacional, correspondendo às exigências dos superiores interesses nacionais:
Resolve:
1.º Reconhecer que durante a gerência de 1900 a política do Governo em relação à dívida pública continuou a revelar um alto critério administrativo e respeitou escrupulosamente a Constituição e as leis;
2.° Dar a sua aprovação às contas da Junta relativas à mesma gerência e reconhecer a exactidão do nominal da dívida efectiva nelas expressa».
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à segunda parte da ordem do dia, que consta da continuação da discussão do Decreto-Lei n.° 38:704. referente à sobrevalorização de alguns produtos ultramarinos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vaz Monteiro.
O Sr. Vaz Monteiro: - Sr. Presidente: depois de ter ouvido os nossos ilustres colegas acerca do Decreto-Lei n.° 38:704, em discussão, desejo primeiramente manifestar-lhes a muita consideração que lhes tributo e o respeito que me merecem as suas opiniões.
Não pedi a palavra para rebater algumas das suas considerações com o propósito intransigente de fazer prevalecer a minha maneira de pensar sobre um problema que todos nós reputamos da maior importância nacional.
Move-me somente o intento de esclarecer a Assembleia Nacional, não terá de se decidir no final desta discussão.
Sou movido apenas pelo superior interesse da Nação, pelo mesmo deseja que todos sentimos sem nisso haver
discordância, do engrandecimento de Portugal como grande potência colonizadora no Mundo.
E devo desde já dizer que sinto a maior satisfação ao verificar, tanto pelas palavras dos Srs. Deputados como pêlos ofícios e telegramas das associações comerciais da metrópole e do ultramar de que tive conhecimento, que todos estamos de acordo em que se deve intensificar o povoamento e desenvolver as propriedades agrícolas e as instalações industriais e comerciais do ultramar.
É consolador verificar que Todos estamos interessados em atingir a mesma finalidade nacional.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-A nossa discordância está apenas nos meios a utilizar.- Na verdade, temos de proceder & escolha destes e considerar que todas as opiniões e interesses materiais são de respeitar, na medida em que for possível e não seja afectado o bem comum.
Seria condenável a minha atitude se subisse a esta tribuna para defender aquela finalidade nacional sem atender aos meios, aos interesses que estão em jogo.
É indispensável, Sr. Presidente, que Portugal continue cada vez com mais intensidade a firmar os seus créditos de país essencialmente colonizador e civilizador.
Não queiramos perder esta oportunidade que a conjuntura económica internacional nos oferece para realizarmos em África obras de fomento e povoamento.
É urgente realizar essas obras para ocupar o mato africano e colocar o nosso excedente demográfico.
Já nesta Assembleia se reconheceu esta necessidade imperiosa ao discutir-se o aviso prévio do nosso ilustre colega Sr. Dr. Juiz Armando Cândido.
Entregou-se ao Governo a resolução deste grande problema nacional, mas sugeriu-se que parte das maiores valias deveria ficar retida nas respectivas províncias ultramarinas, para se realizarem obras reprodutivas e de povoamento. E indicou-se também que a fixação de parte dos lucros naqueles territórios é uma velha aspiração das populações do ultramar.
As populações que lá vivem e se fixaram sempre ambicionaram esta justa e legitima aspiração. E o Governo, publicando o Decreto-Lei n.° 38:704, deu plena satisfação à grande maioria das populações ultramarinas.
O decreto do fomento e do povoamento é pelo ultramar e pela Nação, e não contra o ultramar ou contra a Nação.
Vozes: - Muito bem!
O Orador - Já desta tribuna afirmei que ilustres Ministros das Colónias do Governo do Estado Novo se preocuparam com a resolução do magno problema do povoamento ou colonização europeia em África. Mas a verdade é que a Revolução Nacional ainda não encarou a resolução do problema do povoamento de Angola e Moçambique tão decididamente e com tanta amplitude como agora se pretende resolver com as providências tomadas no Decreto-Lei n.° 38:704.
Se a Assembleia Nacional preconizou estas medidas, depois de largamente as discutir em várias sessões aquando do referido aviso prévio da autoria do Sr. Deputado Armando Cândido, agora só tem de se congratular com a publicação, daquele decreto e decidir pela sua ratificação.
Esta será a solução lógica que a Assembleia Nacional deverá tomar, no meu modesto entender.
No entanto não quero deixar de fazer algumas considerações, que julgo necessárias para esclarecer alguns pontos que possam ter causado a impressão de que no decreto nem tudo fora previsto com a cautela o atenção doridas.
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Diz-se, em oposição ao Decreto Lei n.° 38:704, que o cerceamento do lucro se vai reflectir na iniciativa privada, pelo facto de esta ficar na impossibilidade, ou maior dificuldade, de fazer lace à concorrência.
É evidente que o lucro é necessário paru fazer face à concorrência. Porém, devo acrescentar que este decreto não vem amputar de maneira sensível o capital dos exportadores; vem quase exclusivamente congelar ou reter no ultramar uma parte dos lucros provenientes das vicissitudes da conjuntura económica internacional, precisamente para que o lucro possa desempenhar essa função de fazer face à concorrência.
Na verdade, o decreto dirige-se, sobretudo, àqueles que, com falta de visão no futuro, desviam esses lucros para fins improdutivos, sem pensarem nas flutuações económicas.
São esses os que podem amargamente queixar-se contra si intervenção prudente e previdente do Governo.
O Sr. Abrantes Tavares: - Sobre os desvios dessa gente a que V. Ex.ª se refere o director-geral de Fazenda de Angola tem uma opinião diferente da de V. Ex.ª; para esclarecimento, leio o relatório referente às contas de 1950 e que vem no Boletim Oficial n.° 37, de 15 de Setembro de 1951:
Frente a uma tarefa gigantesca e melindrosa, surge então o problema financeiro - problema que, sendo delicado nos países já formados, sobe de ponto nos que, como Angola, começam a formar-se e onde os rendimentos são avidamente absorvidos gelas actividades criadoras de riqueza. Assim, a tributação tem de ser cautelosa porque ela não vai procurar o capital aforrado e mobilizado nas caixas de crédito, mas aquela parcela de rendimento que foi irresistivelmente lançada à terra para engrandecer a província e os empreendimentos dos seus colonos.
O Orador:-Os contribuintes que procederam dessa maneira não têm nada que se queixar contra o decreto.
Quanto aos outros, ficam com os seus direitos levemente cerceados em prol do bem comum; mas sem qualquer prejuízo para as suas empresas, pois que esses lucros congelados ou retidos serão aplicados integralmente em melhorias ou investimentos que tornam as empresas mais aptas para fazer face i competição económica, com a vantagem de esses investimentos serem feitos de colaboração entre os representantes da colectividade e os interessados.
Devemos também considerar que as províncias ultramarinas estão ainda com uma economia que ensaia maior progresso, mas que ainda está numa das primeiras fases; e, portanto, pertence ao Estado evitar que os actos praticados por alguns possam desencadear uma situação critica na economia ultramarina, de que dificilmente conseguiria libertar-se.
Compete ao Estado, como representante da colectividade, defendê-la contra actos irreflectidos dos seus maus componentes. Estes imprevidentes, não pensando no futuro nem se preocupando com as crises cíclicas da economia, abandonam o alargamento ou aperfeiçoamento das próprias instalações ou propriedades agrícolas, comerciais ou industriais e depois acabam por ficar pelo caminho.
Os reflexos destes atingem os outros. E o decreto, defendendo uns contra u imprevidência, defende igualmente os outros contra aqueles reflexos.
O Sr. Botelho Moniz: - Não vi essa destrinça no decreto. Vejo que ele se aplica à generalidade dos produtores.
Bons e maus pagam pela mesma bitola, quer apliquem ou não utilmente as suas receitas...
O Orador: - Aplica-se a uns por causa dos outros.
O Sr. Botelho Moniz: - O Sr. Deputado Carlos Mantero respondeu antecipadamente a V. Ex.ª na sua primeira intervenção. Porque alguém praticou um crime numa vila qualquer manda-se prender todo Portugal. Estará isto certo?
O Orador: - São esses os que podem queixar-se amargamente contra a intervenção prudente e preventiva do Governo. Quanto aos outros, ficam com o seu débito levemente cerceado em prol do bem comum.
O Sr. Botelho Moniz: - O bem do Estado nem sempre significa bem comum . . .
O Orador : - É esta a obrigação do Estado, imposta pela Constituição Política.
No seu artigo 31.° a Constituição estabelece que o Estado tem o direito e a obrigação de coordenar e regular superiormente a vida económica e social e no artigo 30.° estabelece que a propriedade, o capital e o trabalho desempenham uma função social, em regime de cooperação económica e solidariedade, podendo a lei determinar as condições do seu emprego ou exploração conformes com a finalidade colectiva.
Ora, Sr. Presidente, a finalidade de Portugal colonizador consiste, sem dúvida alguma - e aqui não há discordâncias - , em fomentar e povoar os territórios ultramarinos.
E para se alcançar esta finalidade colectiva dos Portugueses resolveu o Governo publicar o Decreto-Lei n.° 38:704.
Por este decreto se vão obter receitas para obras destinadas u intensificação do fomento e do povoamento e se vai promover melhor e mais eficaz emprego dos recursos disponíveis, para aumentar a produtividade das actividades económicas das nossas províncias de além-mar.
Não se nega que muitos tenham investido parte dos Lucros nas províncias onde esses lucros foram produzidos. Seria cometer grave injustiça.
O Sr. Carlos Moreira: - Essa tem sido a regra em Angola e em Moçambique, onde os nossos colono têm empregado todos os seus lucros.
Por isso mereciam ser melhor tratados.
O Orador: - O que o decreto pretende é que essa orientação se torne extensiva a todos.
O Sr. Abrantes Tavares : - A reforma tributária de Angola, que entrou em vigor no ano de 1950, não se refere ao rendimento liquido, mas sim ao rendimento ilíquido presumível.
O Orador : - Pena é que o imposto incida somente sobre o rendimento ilíquido presumível, pois se incidisse- sobre o rendimento exacto maior seria a receita do Estado.
O que se pretende é que essa orientação se torne extensiva a todos e que não deixem de ser abrangidos aqueles que exportarem produtos sobrevalorizados.
O Decreto-Lei n.8 38:704 é inteiramente favorável ao desenvolvimento do ultramar.
Tem sido combatido alegando-se que não atende ao custo de produção, que nos últimos anos se tem elevado bastante; e argumenta-se também que a sobrevalorização, na sua quase totalidade, está já absorvida Pela tributação.
O Sr. Botelho Moniz : - Ninguém disse tal coisa nem poderia dizê-lo, porque toda a gente sabe que no cálculo do imposto incidente na sobrevalorização são abatidos os aumentos dos impostos.
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O Orador: - Eu vou procurar esclarecer a Assembleia Nacional.
Acerca destes dois assuntos lê-se no preambulo do Decreto-Lei n.° 38:704 que para lhe dar execução é necessário ter
...em consideração o custo da produção e a desigualdade dos sistemas tributários e pautais existentes nas várias províncias e a justiça de, por consequência, não estabelecer novos encargos iguais para todas, mas sim em função das condições reais de cada uma.
Bastaria esta parte do preâmbulo para se ficar a saber, que ao executar-se o decreto se atenderia às despesas da produção e à tributação existente.
lias devo esclarecer que em Angola e Moçambique é conhecido o rendimento liquido das explorações, e portanto têm de ser conhecidos os salários e as restantes despesas da produção.
Em Angola há fiscais dos impostos que mensalmente colhem as informações necessárias à fixação do rendimento. O assunto está regulado pelo Diploma Legislativo n.° 2:152, de 4 de Junho de 1949, que é um diploma regulamentar do Decreto n.° 37:210. de 6 de Dezembro de 1948, e permite aos interessados reclamarem para comissões de recurso, mediante elementos fornecidos pela sua escrita.
Em Moçambique não há fiscalização exterior por parte Já Fazenda, mas há comissões de fixação de rendimento, nas quais estão igualmente representados os contribuinte.
O assunto está regulado em Moçambique pela Portaria n.° 4:051, de 22 de Maio de 1940, portaria regulamentar do Decreto n.º 30:117, de 8 de Dezembro de 1939, criando o imposto de rendimento e a forma da sua execução.
Em Moçambique não haverá tanta precisão como em Angola no conhecimento do rendimento liquido das explorações ; mas a verdade ë que este rendimento é tributado, e portanto deve ser conhecido.
Não há, pois, motivos para apreensões, quer em Angola quer em Moçambique, quanto ao conhecimento do custo da produção.
O Sr. Botelho Moniz: - Ainda se se tributasse pelo rendimento liquido, estaria bem; mas fazer-se a tributação sobre coisas quo não se ganham, não está certo.
O Orador:-Isso não tem o mais ligeiro interesse para a questão que estamos a discutir; o rendimento presumível é sempre inferior ao exacto.
O Sr. Botelho Moniz: - Esse «sempre» é torva de expressão. Suponho que há interesse em considerar este aspecto: se a modalidade de aplicação do decreto fosse outra e mais justa talvez os reclamantes pudessem estar de acordo com a maneira suave, prática e simples de cobrança.
O Orador: - Não vejo em que a tributação seja injusta. Analisemos agora como é que o custo da produção será considerado à face do decreto da maior valia.
O Sr. Abrantes Tavares: - Eu posso ajudar V. Ex.ª a esclarecer esse ponto com as palavras do próprio director-geral de Fazenda de Angola:
Verifica-se, pois, que, enquanto os impostos no ano de 1949, em número de dois, produziram a quantia de 29:866 contos, no ano de 1950, já em número de cinco, produziram 94:150 contos e estão
O Orador:- A que espécie de imposto está V. Ex.ª a referir-se?
O Sr. Abrantes Tavares: - Estou a referir-me aos impostos directos gerais.
O Sr. Botelho Moniz:- Portanto, entre 1949 e 19-51 verificou-se um aumento de cinco vezes. O Estado não ficou esquecido em matéria de maior valia de impostos...
O Orador: - Eu estou a tratar do imposto que incide directamente sobre a explorarão agrícola, mineira e industrial.
O Sr. Abrantes Tavares: - Mas veja V. Ex.ª a diferença que vai de 1949 - 29:866 contos - para 1951 - 131:690 contos.
O Orador: - A tributação a que V. Ex.ª, Sr. Deputado, se refere envolve toda a província e não se limita aos exportadores A tributação das maiores valias já existia. E daqui o supor-se que a sobrevalorização já foi absorvida pelo Estado.
Mas o engano é fácil de ser esclarecido.
As maiores valias dos produtos da exportação não surgiram a seguir à guerra da Coreia. A grande alta de preços já vem desde os primeiros anos da guerra mundial.
E assim o que em Moçambique foi criado o imposto suplementar de guerra pelo Decreto n.° 33:303, de 3 de Dezembro de 1943, cuja denominação foi alterada para imposto suplementar por determinação ministerial (observação 6 ao mapa n.º 9 das alterações à tabela de receita do projecto do orçamento daquela província para 1047). Este imposto rendeu as seguintes receitas:
1946 5:442.458550
1947 6:499.409560
1948 9:547.887540
1949 1.3:488.850545
1950 10:206.544550
Este imposto de rendimento recai sobre o excesso que o último rendimento atribuído pelas comissões de fixação acusar em relação à média das fixações feitas nos últimos três anos anteriores, depois de corrigida com um aumento de 40 por cento.
E para Angola foi criado o imposto sobre o excesso de lucros provenientes da exportação de mercadorias, pelo Decreto n.° 35:767, de 26 de Julho de 1946.
Nos anos em que vigorou este imposto sobre excesso de lucros foram arrecadadas as importâncias seguintes:
1947 25:523.653,56
1948 29:334.040,27
1949 18:441.724,51
A partir de 1 de Janeiro de 1950 foi extinto o imposto sobre o excesso de lucros na exportação, pelo artigo 44.° do Decreto n.° 37:215, de 16 de Dezembro do 1948, que aprovou a reforma tributária de Angola.
Mas diz-se que, se foi suprimido, por um lado, o imposto sobre excessos de lucros na exportação, por outro lado, foi criado pela reforma tributária o novo imposto sobre explorações agrícolas, pecuárias, mineiras e do sal, que veio agravar a situação do contribuinte, absorvendo-lhe grande parte da sobrevalorização.
Ora, Sr. Presidente, não há como recorrer ao rendimento da cobrança de um e outro imposto, durante os anos da sua vigência, para saber se o imposto sobre as explorações agrícolas veio realmente agravar a tributação e absorver parto das maiores valias.
Já deixei indicado o rendimento da cobrança feita em 1947, 1948 e 1940 do imposto sobre excesso do lucros na exportarão, cuja média atingiu 24:433 contos.
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798 DIÁRIO DAS SESÕES N.º 159
Pois querem VV. Exas. saber, Sr. Presidente o Srs. Deputados, qual foi o rendimento da cobrança feita pelo novo imposto sobre explorações agrícolas, imposto em que tanto se tem falado como argumento decisivo paru demonstrar que veio agravar muito o contribuinte?
Rendeu as seguintes importâncias:
Contos
Em 1950 10:467
Em 1951 17:972
Como se vê, a receita proveniente deste imposto sobre explorações agrícolas é muito inferior à receita que se obtinha com o imposto sobre excesso de lucros na exportação. Ao passo que o imposto extinto rendeu em média anual, 24:433 contos, a mesma média obtida pelo novo imposto é apenas de 14:219.
E aqui está como a realidade se apresenta. Estes números oficiais rebatem por si o que se tem pretendido fazer crer, isto é, que uma boa parte da sobrevalorização já está absorvida pelo Estado, apontando-se como absorvente de grande parte das maiores valias o novo imposto sobre as explorações agrícolas, criado pela reforma tributária de Angola.
Pelo que estes números traduzem, verifica-se claramente que o imposto sobre explorações agrícolas desagravou a tributação, e não veio agravá-la.
E pelo conhecimento oficial que hoje existe, como já disse, e é possível obter com suficiente aproximação do rendimento das empresas e do custo da produção, não me parece também que seja necessário montar uma máquina burocrática tão dispendiosamente cara que absorva grande parte da receita cobrada.
Sr. Presidente: os assuntos depois de esclarecidos tomam sempre outro aspecto.
A tributação do rendimento das explorações a que me referi diz respeito aos serviços de Fazenda: vamos agora ver os direitos de exportação, que são cobrados pêlos serviços aduaneiros.
É conveniente que a Assembleia Nacional seja esclarecida sobre a maneira como foi acompanhada a subida dos preços da exportação pêlos direitos e mais imposições cobrados nas alfândegas.
E esse esclarecimento só poderá ser dado pêlos valores oficiais que eu vou ler à Assembleia.
Angola:
Café
1949 - 12 por cento ad valorem mais $20 por quilograma:
1952 -14 por cento ad ralarem.
Sisal
1949 e 1952 - 12 por cento ad valorem.
Semente de algodão:
1949 e 1952-4 por cento ad valorem.
Manganês:
1940 e 1952-1 por mil ad valorem.
Moçambique:
Copra:
1949 - 6,5 por cento ad valorem, mais 12650 por tonelada;
1952 - 8 por cento ad valorem, mais 2550 por tonelada.
Sisal:
1949- 4 por couto ad valorem, mais 12650 tonelada;
1952 - 3.5 por cento ad valorem, mais 2550 por tonelada.
Semente de algodão:
1949 - 7,5 por cento ad valorem, mais 12550 por tonelada;
1952 - 8 por cento ad valorem, mais 2550 por tonelada.
Castanha de caju:
1949 - 8,5 por cento ad. valorem, mais 12650 por tonelada:
1932 - 9,5 por cento ad valorem, mais 2550 por tonelada.
S. Tomé:
Cacau:
1949 e 1952 - 3 por cento ad valorem, mais 060(9) por quilograma.
Copra :
1941 e 1952 - 27.5 por cento ad valorem.
Por estes elementos oficiais, indicativos da verdadeira; tributação alfandegária em 1949 e 1952, se poderá verificar se os direitos se mantiveram ou foram elevados ou reduzidos.
O Sr. Abrantes Tavares: - Só faltou a V. Ex.ª inferir o imposto complementar, que rendeu em 1951 28:862 contos.
O Orador: - O imposto complementar incide sobre o conjunto dos rendimentos que excedam 60 contos anualmente. Não incide somente sobre as maiores valias.
Quanto ao manganês, o imposto passou em 1952, 1 por cento ad. rufarem.
O Sr. Manuel Vaz: - Não é 1 por cento umas 1 por mil.
O Orador: - Muito obrigado. Sr. Deputado Manuel Vaz. pela sua observação. O imposto sobre o manganês e de l por mil. e não l por cento.
O Sr. Botelho Moniz: - Perdão era de 1/2 por cento ad valorem em 1949 e passou a 2 por cento em 1952.
O Sr. Manuel Vaz: - E 1 por mil, números oficiais.
0. Sr. Botelho Moniz : - Exactamente, e passou a 2 por mil em 1952, mas isso é a taxa estatística de exportação. Os números que apontei referem-se ao imposto mineiro e estão certos. Nada de estabelecer confusões entre contribuições totalmente diversas.
O Sr. Abrantes Tavares: - Apesar do mento pautai, posso dar a VV. Exas. os números referentes aos direitos de exportação desde 1945 até 1950: os de 1951 não possuo.
Posso dizer que todos os rendimentos de exportação ascenderam de 85:118 contos em 1949 a 133:275 em 1950.
O Orador:- Porque foram ad valorem. Ainda bem que assim sucedeu. E. além disso, aumentou o volume das exportações.
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22 DE ABRIL DE 1952 N.º 799
O Sr. Abrantes Tavares: - E isto apesar do desagravamento pautal.
Orador: - Sr. Deputado Abrantes Tavares: os direitos são ad valorem e aquilo que V. Ex.ª afirma só prova o contrário do que pretende!
O Sr. Abrantes Tavares: - Parece!
O Sr. Botelho Moniz: - Exactamente porque os direitos de exportação são ad valorem, aumentam na proporção do acréscimo dos preços. Não pode haver dúvida de que se paga mais dinheiro ... O argumento do Sr. Deputado Abrantes Tavares está certíssimo.
O Orador: - O estudo dos problemas só é profícuo na presença dos seus verdadeiros elementos.
Como se vê por estes elementos, em Angola manteve-se a tributação alfandegária para o sisal, a semente do algodão e o manganês e apenas se alterou para o café.
Em S. Tomé e Príncipe a tributação manteve-se tanto para o cacau como para a copra.
Na província de Moçambique a alteração deu-se em todos os produtos, mas devemos notar que apenas se deu um ligeiro agravamento na copra; nos restantes produtos a tributação foi desagravada.
Desapareceu a taxa de cabotagem e parte de outras taxas foi integrada nos direitos, simplesmente para simplesmente para da mecânica aduaneira.
Desta integração de parte das taxas nos direitos resultou também um leve agravamento no café de Angola.
Mas. como se poderá verificar efectuando as respectivas operações, da diminuição das taxas e do aumento dos direitos, quando resultou um desagravamento ou agravamentos, estes' foram de valor insignificante.
Fica assim desfeita a nuvem que a este respeito se levantou e que parecia obscurecer a virtuosidade do decreto que estamos a discutir.
Desejo agora fazer referência às possíveis alterações que tenha havido com os encargos da mão-de-obra anterior e posteriormente ao ano de 1049.
Antes de apresentar os números elucidativos que consegui colher seja-me permitido, Sr. Presidente, fazer umas breves considerações.
Tem-se pretendido negar a existência da maior valia, argumentando com o enorme aumento do custo chi produção.
Como, porém, ainda não estivesse provado esse aumento desmedido, levou o nosso ilustre colega Dr. Tito Arantes a enunciar o principio de direito: o ónus da prova pertence a quem alega o facto.
No entanto. Sr. Presidente, eu posso lançar alguma luz sobre esse problema, ficando deste modo a Assembleia Nacional melhor esclarecida.
Quanto a esses encargos de mão-de-obra indígena empregada na produção, eu vou ler os elementos oficiais de que disponho e pêlos quais se poderá verificar que não tem havido aumento apreciável desde 1047.
Referem-se à província de Angola, onde os artigos de vestuário em relação aos anos de 1947-1940 e 1051 tiveram os seguintes preços em angolares :
[ver tabela na imagem]
Anos
Vestuário
O Sr. Botelho Moniz: - Camisolas, calões e mantas para os pretos - mas agora tangas para os brancos ...
O Orador: - Não estou de acordo com V. Ex.ª, Sr. Deputado Botelho Moniz.
Relativamente ao salário diário e à alimentação diária, não excederam em 1951 a despesa de 1947.
É evidente que há outros encargos de mão-de-obra, como sejam a hospitalização e assistência dispensadas aos trabalhadores, mas por estes números se poderão avaliar os encargos com a mão-de-obra indígena e verificar que, apesar de constituírem uma avultada despesa, ainda não absorvem a maior valia de certos produtos de exportação.
Mas eu desejo esclarecer, tanto quanto me é possível, para que a Assembleia Nacional possa ficar habilitada a formar o seu juízo acerca da oportunidade, da importância e da exequibilidade do Decreto-Lei n.° 38:704.
Para esse fim vou apresentar os quadros com as exportações totais dos últimos anos das províncias de Angola. Moçambique e S. Tomé e Príncipe, para VV. Ex.ª poderem apreciar a desproporção entre o aumento da tonelagem e o desmedido aumento do valor.
Angola
Exportação total
[ver tabela na imagem]
Anos Toneladas
Valor Contos
Valor médio por tonelada
Escudo
Aumentos em onze anos:
Percentagem
Tonelagem 74,2
Valor 634,8
Moçambique
Exportações total
[ver tabela na imagem]
Anos toneladas valor contos valor médio por tonelada Escudos
Percentagem
Tonelagem 72,9
Valor 339,8
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800 DIARIO DAS SESSÕES N.º 159
S. Tomé
Exportação total
[Ver tabela na imagem]
Anos Toneladas Valor contos valor médio por toneladas Escudos
Aumentos em oito anos:
Percentagem
Tonelagem 85,6
Valor 375,9
Dispenso-me de fazer quaisquer comentários sobre a desproporção que os números acusam entre o aumento da tonelagem e a subida do valor dos produtos de exportação.
As respectivas percentagens só por si elucidam a Assembleia Nacional.
O Sr. Abrantes Tavares: - V. Ex.ª dispensa-se de fazer algumas considerações.
Em todo o caso, a Junta de Exportação da colónia de Angola fez as considerações que eu peço licença para ler, e que são as seguintes:
E se nos demorámos um pouco a demonstrar esta verdade, não foi só porque ela representa uni dos aspectos característicos da actual fase da vida económica de Angola - foi também porque injusticadamente só criou, em alguns sectores da opinião pública, a ideia de que a presente prosperidade económica do território si: apoiava exclusivamente na alta dos preços de alguns produtos.
Os números apresentados, que, referindo-se apenas às tonelagens, excluem qualquer influencia, da evolução das cotações, bastam para revelar com suficiente dureza uni fenómeno que pode ter escapado à observação superficial de alguns: a real elevação do rendimento da terra angolana pelo desenvolvimento predominante das explorações mais remuneradoras, e isto sem prejuízo do natural aumento das tradicionais culturas dos géneros chamados pobres. Angola produz agora mais em quantidade e, sobretudo, produz muito mais em qualidade.
Este é um dos significados da desproporção entre a curva dos valores e u das tonelagens, que a alta das cotações contribuiu apenas para acentuar. E esta parece-nos ser a primeira conclusão a tirar dos números relativos as exportações efectuadas ao longo do último decénio, que atingem o seu ponto culminante em 1951.
Aqui tem V. Ex.ª a explicação.
O Orador : - A alta só se deu com relação a certos produtos, e pena foi que não se desse em referência a outros.
Devo esclarecer V. Ex.ª, Sr. Deputado Abrantes Tavares, que a desproporção entre a curva dos valores e u das tonelagens é tão grande que não se poderá atribuir apenas a melhoria da qualidade, mas sim a alta das cotações internacionais.
Porém, não quero deixar de apresentar um outro quadro com os aumentos de 1949 em relação ao ano de 1943, visto que o ano de 1949 assinala um surto ascensional muito grande da valorização dos produtos exportados :
Aumentos de 1949 em relação a 1943
Aumentos em relação a 1912
[ver tabela na imagem]
Peso valor Preço médio por tonelada
Quer dizer, de 1943 a 1949, em Angola e em S. Tomé. o valor total da exportação mais que triplicou e o valor médio dos produtos subiu para mais do dobro; em Moçambique o valor total da exportação de 1949 ficou em duas e meia vezes mais o de 1943 e o valor médio dos produtos aumentou de 73,2 por cento.
Vou agora referir-me a um assunto que diz respeito à justiça do decreto em discussão.
Uma vez verificado que o custo da produção se manteve sensivelmente o mesmo de 1949 para 1951. é relativamente fácil demonstrar que o sobrelucro acompanhou a sobrecotação.
Se esta correspondência se não verificasse, talvez se pudesse pôr em equação o problema da justiça do Decreto-Lei n.° 38:704.
Como se sabe, o sobrelucro é, no caso presente, o beneficio para além do justo lucro, em consequência da alta dos preços a partir de 1949.
No caso do decreto que estamos a discutir a sobrevalorização vem a ser o excedente que se verificar sobre
o preço que os produtos de exportação obtiveram 110 ano de 1949.
Uma coisa é, portanto, o sobrelucro, ou lucro excessivo, e outra coisa é a sobrevalorização. ou sobrecotação.
E evidente que pode haver sobrecotações e não se verificarem lucros e muito menos sobrelucros: quer isto dizer que os produtos podem ser exportados a altas cotações sem contudo deixarem lucros, grandes ou pequenos.
Tudo isto é verdade, mas falta acrescentar que as altas cotações vão sempre melhorar a situação financeira das empresas.
Do que ouvimos na última sessão ao nosso ilustre colega Carlos Mantero poderia ficar a ideia de que o Decreto-Lei n.° 38:704 era injusto, pois se aplicava à sobrevalorização dos produtos, às sobrecotações, mas infelizmente não se verificava a existência de sobrelucros.
Embora eu tenha muita consideração e estima pelo nosso ilustre colega Sr. Carlos Mantero Belard e admire a sua inteligente actividade comercial e parlamentar, seja-me permitido manifestar a minha discordância.
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22 DE ABRIL DE 1952 N.º 801
Eu posso afirmar que há realmente sobrevalorização e simultaneamente sobrelucros.
O Sr. Carlos Mantero: - E que o lucro não existe senão no fim das contas. Enquanto as contas finais de unia exploração não estão apuradas não se sabe se houve lucro ou prejuízo. A lei, porém, tributa a diferença entre duas dotações, que supõe ser a sobrevalorização ou sobrelucro, mas que muitas vezes não passa de prejuízo.
O Orador: - Se V. Ex.ª tem a máquina montada, já sabe quanto há de despesas fixas.
O Sr. Carlos Mantero: - Não há despesas lixas idênticas em todas as propriedades agrícolas. Elas divergem de propriedade para propriedade, como, por exemplo, as despesas de transporte dos produtos do ponto de origem para o de embarque, o número de trabalhadores por hectare, etc.
O Sr. Botelho Moniz: - E também não há produções agrícolas certas. Talvez o Sr. Deputado Vaz Monteiro consiga que se publique um decreto-lei obrigando os cacaueiros a não darem menos de 5 quilogramas de cacau por ano ...Depois do tabelamento dos preços, só faltaria a produção agrícola fixa ...
O Orador: - Cada propriedade tem as suas despesas fixará inclusivamente a despesa de transportes: e as variações, se as houver, não têm influência decisiva.
Continuando: devo dizer que poderia ler à Assembleia Nacional relatórios de empresas ultramarinas nos quais se verifica haver sobrelucros num montante elevadíssimo.
Mas não quero servir-me de casos concretos. Não quero ferir susceptibilidades.
Neste lugar sirvo a Nação. E posso servi-la sem recorrer à indicação de nomes.
Vou portanto generalizar a minha demonstração sobre a existência de sobrelucros a partir do ano de 1949.
A construção que vou fazer tem um pouco de empírica e simplista, mas já dá uma ideia da realidade dos sobrelucros.
Vou partir da presunção de que em 1049 as empresas já tinham um lucro remunerador.
Parto desta premissa porque é um facto notório. Nos termos de direito, não me cabe o encargo da prova. Dá-se aqui uma inversão do ónus da prova.
Admitida esta premissa, firmada a priori, vou procurar demonstrar que esses lucros de 1949 subiram extraordinariamente em 1951.
Para esse efeito escolho um produto para sobre ele incidir a minha análise: o sisal de Angola. E vou admitir, para facilitar o meu exame analítico, que a tonelagem do sisal exportado em 1951 foi a mesma que
em 1949. Isto para que se não diga que não se tomaram em consideração as despesas variáveis que são provocadas pelo aumento da produção.
Praticamente o único encargo que substancialmente veio onerar o custo da produção foi o gravame alfandegário ad valorem.
É certo que há que considerar outros encargos, mas esses não tiveram um peso sensível, tanto mais que, como já disse, vou admitir por hipótese ai identidade de tonelagens exportadas em 1949 e 1951.
Contos
As 19:336 toneladas de 1949, se fossem exportadas em 1951, ao preço de 14.1745 por tonelada, produziriam ........ 274:068
Vamos diminuir-lhes os direitos de exportação, já indicados, de 12 por cento ad valorem . . . 32:888;
Diferença a favor do exportador 241:180
Em 1949 as 19:336 toneladas tiveram o valor de....... 104:889,
Diminuindo-lhes 12 por conto de
direitos ad valorem .... 18:586
Diferença a favor do exportador 136:303
Devido à sobrevalorização de 1949 para 1051 resultou uma diferença em favor do exportador na importância de ... 104:877
Sobrou aos exportadores do sisal em 1951 a elevada importância de 104:877 contos para fazer face aos novos encargos que possivelmente tenham surgido de 1940 para 1951, e já depois de terem pago os direitos aduaneiros.
Temos pois de concluir que a sobrecotação produziu sobrelucros.
Há ainda a considerar que aumentou a tonelagem da exportação e que as despesas fixas quase se mantêm as mesmas, quer se produza mais ou menos. Portanto o aumento da produção vai reflectir-se inversamente no custo de cada unidade produzida.
Eu vou elucidar VV. Exas., Sr. Presidente e Srs. Deputados, sobre a situação compreendida entre 1045 e 1051. Neste ano a ascensão dos preços continua, como poderão verificar nos três quadros seguintes, relativamente a Angola, Moçambique e S. Tomé e Príncipe.
Nestes três quadros se discriminam a tonelagem e o valor dos produtos sobrevalorizados e exportados desde 1045 a 1951 e que já se encontram abrangidos pelo Decreto-Lei n.° 38:704.
A sua leitura dá-nos a conhecer a subida rápida do preço dos produtos no ano de 1940 e depois a sua ascensão até 1951.
Angola Exportações (metrópole e estrangeiro)
[ver tabela na imagem]
Anos
Caiu (a) Sisal(b) semente de algodão
(a) Café em grão, moído e resoluto
(b) Inclui despachados
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802 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 156
Moçambique Exportações (metrópole e estrangeiro)
[ver tabela na imagem]
Anos
Copra Sisal (a) castanha de caju semente de algodão
(a) Inclui os desperdícios.
S. Tomé e Príncipe Exportações (metrópole e estrangeiro)
Anos
Cacau Copra
Verifica-se assim que o ano de 1949 e assinalado por uma grande valorização dos produtos.
Neste ano de 1949, na província de Angola, o caiu atinge o preço médio de l18915 por tonelada, ou seja mais 89323 por tonelada do que em 1945. O sisal atingi-o preço por tonelada de 8.0105, ou mais 4.5075 do que em 1945. A semente de algodão alcança o valor por tonelada de 1.165, contra 5005 em 1945.
O Sr. Botelho Moniz: - V. Ex.ª consegue considerar separadamente os casos da semente de algodão e da fibra de algodão?
Não sei se V. Ex.ª se recorda de um argumento que já aqui apresentei e para o qual pedi especialmente a atenção de V. Ex.ª A semente de algodão, segundo parece. é proveniente do mesmo algodoeiro que produz a fibra. Ora na fixação do preço do algodão em fibra exportado para a metrópole adoptou-se cotação bastante inferior à internacional. De forma que houve redução sensível da cultura e da produtividade. Consequentemente, baixou o lucro dos agricultores na nossa África. O Governo acudiu, e muito bem, conforme frisei aqui há tempo, elevando um pouco o preço do algodão em fibra. Apesar disso, continuou muito abaixo das cotações mundiais.
Portanto, o Estado deveria agora deixar nos agricultores. como compensação do baixo preço do contingente de exportação de fibra para a metrópole, o acréscimo havido na cotação internacional da semente. Era isto que seria justo fazer-se. Infelizmente não se fez... e arriscamo-nos a grandes importações de algodão, por falta de produção ultramarina.
O Orador: - O preço estabelecido pelo Governo para a metrópole foi o que ele entendeu ser suficientemente
remunerador. E as exportações para a metrópole não são abrangidas pelo Decreto-Lei n.° 38:704.
O Sr. Botelho Moniz: - A exportação de sementes de algodão faz-se para o estrangeiro - e nunca paru :. metrópole. Nada de confusões!
O Orador: - Eu não fiz confusão. Sr. Deputado Botelho Moniz. O que eu disse e repito é que a fibra do algodão exportada para a metrópole tem o preço remunerador que o Governo fixou. E quanto à semente que é exportada para o estrangeiro teve uma sobrevalorização que fica abrangida pelo decreto em discussão.
E o manganês sobe de 1005 por tonelada em 1945 para 7115 em 1949.
Em Moçambique sucedo o mesmo com o valor da copra do sisal, da castanha de caju e da semente de algodão.
O Sr. Carlos Mantero: - Em 1949 a cotação média da copra em Londres foi de £ 92-15-00 e a última cotação foi de £ 59-00-00. Como vê, foi um terço menos do que em 1949.
O Sr. Abrantes Tavares: - sobre o manganês e com quanto eu não possa garantir a V. Ex.ª que seja exacta a informação, mas porque pode de certo modo perturbar a apreciação do caso, eu direi que era extraído a céu aberto, exportando-se com terra. Só quando as empresas obtiveram a garantia do mercado é que começaram u apetrechar-se para o aperfeiçoamento do produto, por forma a fazer a exportação do minério separado.
Portanto, embora possa haver um aparente aumento de preço, elo não existiu efectivamente, mas apenas melhoria da qualidade do produto.
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22 DE ABRIL DE 1952 803
O Sr. Botelho Moniz: - Mas há mais. O transporte do minério de manganês nos caminhos de ferro do Estado aumentou 495 por tonelada. Portanto grande parte da sobrevalorizacão é absorvida por este encargo.
Custara 763 por tonelada em 1949. Custa agora 1255. Apliquem também ao Estado o imposto de maior valia...
O Orador: - As observações feitas pelo Sr. Deputado Abrantes Tavares responderei que o Decreto-Lei n.º 38:704 tem como objectivo melhorar a qualidade dos produtos, e, portanto, as empresas que melhoraram e procuram melhorar a qualidade de produção nada terão a recear, porque o lucro congelado é precisamente para ser aplicado nesse fim.
Em S. Tomé e Príncipe o cacau subiu em mais do dobro dos valores de 1945 para 1949, e a copra. com o valor de 2.9175 por tonelada em 1945, subiu para 3.419-5 em 1949.
Em 1951 a subida dos preços é enorme, como se verifica nos quadros que acabo de apresentar.
Mas, Sr. Presidente, a ascensão dos preços é cada vez maior. No ano corrente os preços continuam a subir.
Eu tenho elementos referentes aos meses deste ano de 1952 que vou apresentar e que mostram que as cotações dos produtos sobrevalorizados continuam na alta.
Estes elementos, em toneladas e preço por tonelada, assim o demonstram:
Moçambique:
Copra - 5.758$/t, em 7:847 toneladas (Março, 1952).
Sisal - 15.461$/t, em 2:278 toneladas (Março, 1952).
Castanha de caju -3.362$/t, em 21:805 toneladas(Março, 1952).
Semente de algodão- 1.444$/t, em 8:602 toneladas(Março, 1952).
Angola:
Café -26.104$/t, em 3:552 toneladas (Fevereiro e Março, 1952).
Sisal - 14.277$/t, em 988 toneladas (Abril, 1952).
Semente de algodão - 2.090$/1, em 697 toneladas(Março, 1952).
Manganês - 9900/t, em 10:769 toneladas (Abril, 1952).
S. Tomé:
Cacau -20:739/t, em 1:423 toneladas (Março e Abril, 1952).
E assim de 1949 para 1952 obtemos já os seguintes preços por tonelada:
[ver tabela na imagem ]
Designação
Em presença desta ascensão dos preços, todos temos de nos regozijar: o produtor e o exportador, pelos lucros que lhes advêm por tão altas cotações; o Estado, pelas receitas que vai cobrar em benefício do fomento e do povoamento.
E não nos devemos esquecer de que tanto as obras a realizar pelo Estado nas províncias ultramarinas com aquelas receitas consignadas como os investimentos obrigatórios irão contribuir enormemente para civilizar os povos autóctones.
Nós temos uma alta e imperiosa função a desempenhar nas nossas províncias ultramarinas, que nunca é demasiado repetir: a de civilizar o indígena.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Como potência colonial temos um poder--dever, que se resume no direito de explorar essas vastas zonas para o progresso material e espiritual dos povos que as habitam e simultaneamente no dever de efectivar essa exploração em benefício desses povos.
Quer dizer: o nosso esforço em trabalho, em técnica, em capitais, tem o direito incontroverso de uma justa remuneração; mas dever-se-á sempre ter em vista que a exploração também tem de ter em atenção os interesses dos indígenas, que se traduzem numa melhoria material e espiritual.
Cabe agora analisar, Sr. Presidente, se as maiores valias contadas a partir do ano de 1949 foram .realmente investidas na sua maior parte em obras de fomento e, portanto, teriam assim contribuído para assegurar o futuro das empresas, para intensificar o povoamento, para civilizar o indígena e para combater o perigo da inflação.
Analisarei então o que em Angola se passou.
As minhas considerações não vão afectar de modo algum a extraordinária obra realizada em Angola pêlos colonos nem podem significar que estes grandes portugueses não tenham colaborado sempre com o Estado na civilização do indígena e no progresso material daquela província.
Vou apresentar números estatísticos que nos apontam a necessidade que há de ir mais atém e, simultaneamente, impedir que o egoísmo de alguns venha, ainda que levemente, esbater a obra grandiosa que a tenacidade e o patriotismo dos colonos conseguiu realizar em Angola.
Apresento esses números porque entendo que eles justificam a necessidade da existência do Decreto-Lei n.° 38:704. E estou certo de que Angola saberá reconhecer aquilo que eles exprimem, apesar do seu pedido de suspensão do decreto.
Falo assim, Sr. Presidente, porque, sem desdouro algum para as outras províncias ultramarinas, onde o amor à Pátria está constantemente a ser revelado, Angola é onde o nosso portuguesismo vibra sempre mais intensamente e onde as reacções da sua personalidade característica poderão ser consideradas rudes e audaciosas, mas teremos do dizer que são nitidamente sinceras e cheias da franqueza e lealdade, que inspiram confiança, que atraem e nos unem.
Para esta gente quo ajudou a fazer Angola, o presentemente a faz progredir o desenvolver e lá vive e labuta, bastará que tenha conhecimento dos números incluídos nas três alíneas a). b) c) vou passar
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a ler, não sendo necessárias mais considerações para justificar na existência do decreto.
a) Valor da exportarão - 7.1.51507 contos.
Sendo:
1949 - 1.793:012 contos.
1950 -2.169:018 cornos.
1951 - 3.189:277 contos.
b) Receitas cobradas de impostos e direitos de exportação e importação -1.243:894 contos.
Sendo:
[ver tabela na imagem ]
Imposto sobre excesso de lucros na exportação
1919
1959
1951
Total dos três anos
Decomposição da receita de 1.243:894 contos, cobrada nos três anos:
Percentagem
Imposto de lucros sobre a exportação (até 1949) 1.5
Imposto sobre explorações agrícolas 2.3
Imposto de rendimento 6.2
Imposto do selo 8.5
Direitos de exportação 33.5
Direitos de importação 48
100
c) Investimentos de fomento e automóveis (1.230:245 contos).
Sendo:
[ver tabela na imagem]
1949
1950
1951
Total dos três anos
Equipamentos agrícolas
Decomposição da despesa com investimentos de fomento e com automóveis, de 1.230:245 contos:
Percentagem
Agricultura 7.1
Indústria 8.9
Diversos 46.1
Automóveis 37.9
100
Continuando na sequência do meu pensamento em atribuir ao decreto-lei em discussão as vantagens que já enumerei de procurar assegurar o futuro às actividades
O café entra neste total com 2.825:842 contos.
económicas, de promover a intensificação do povoamento europeu, de civilizar as populações indígenas e de controlar a inflação, vou agora referir-me ao flagelo inflacionista.
É já sabido que a inflação atormenta presentemente :is pessoas que em Angola vivem somente dos seus ordenados e vêem aumentar assustadoramente o custo da vida, sem saberem como lhe hão-de fazer frente.
Para a Assembleia Nacional ficar esclarecida eu vou prestar as seguintes informações:
De 1949 a 1951 a circulação fiduciária de Angola aumentou 56 por cento; os números representativos em angolares são:
1949 409:439.600,00
1900 491:071.171,50
1951 640:000.000,00
Em presença deste aumento da circulação fiduciária de Angola, não teria o Governo motivo e obrigação de tentar por-lhe cobro?
Que respondam aqueles que estão a sofrer as consequências da inflação.
Eu vou esclarecer a Assembleia Nacional, servindo-me da opinião conceituada de um nosso ilustre colega nesta Assembleia de que o Governo tomou as medidas julgadas mais suaves, e até mais políticas, pura opor resistência ou controlar a inflação.
O nosso colega Sr. Engenheiro Araújo Correia, na conferência que realizou, em 7 do corrente, na Associação Comercial do Porto, da série do curso de estudos económicos c financeiros, produziu afirmações que se relacionam intimamente com a doutrina do Decreto-Lei n.° 38:704.
Afirmou então o Sr. engenheiro Araújo Correia, ilustre economista e financeiro, que quando factos revelam uma situação inflacionária os países a combatem por todas as formas possíveis.
Diversos tom sido dos métodos a aplicar de maneira : imobilizar ou congelar os meios monetários que possam perturbar o circuito rendimentos consumos. Entre eles indicou a emissão de empréstimos para fixar excessos monetários, e indicou também o recurso ao imposto até altas percentagens sobre os lucros, como é seguido nos Estados Unidos, na Inglaterra e noutros países.
E. segundo a sua douta opinião, o método mais suave, e até o mais aconselhado sob o ponto de vista psicológico, é o de reduzir ao mínimo possível o imposto e alargar até ao limite máximo o congelamento, no sentido de servir os interesses da comunidade, quer pelo emprego por parte dos seus detentores em fins produtivos quer de outro modo.
O Sr. Armando Cândido: - Os lucro- nem congelados são mas sim consignados à ordem.
O Sr. Botelho Moniz: - Consignar ou congelar é neste caso, precisamente o mesmo, pois haverá sempre demora na aplicação dos fundos. E no que respeita essa aplicação, julgo mais competente o administrador de uma empresa para saber com exactidão de que melhoramentos ela precisa do que uma pessoa que pode estar a 1:000 léguas de distância.
O Orador: - Muitas vezes o Estado possui elementos que eles não tom e até lhes pode ser útil para os ajudar.
O Sr: Botelho Moniz: - Dispensa-o ajudas, nunca pedi nem peço.
Suplico apenas que não queiram fazer-me feliz a força.
A iniciativa privada, nas suas actividades próprias realiza melhor e mais depressa que e Estado. É mais competente do que ele. Não deve depender de autoridade
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ações, que podem ser negadas sistematicamente, conduzindo por forma indirecta à obrigação de reaver os créditos em títulos de empréstimo forçado a juro de 3 por cento. Não deve ser obrigada a realizar obras que considere ruinosas sob o ponto de vista comercial, agrícolas ou industrial.
O Orador:- Este método, aconselhado pelo nosso ilustre colega Araújo Correia como sendo o mais suave e o mas político, foi aquele que o Governo adoptou ao elaborar o decreto das maiores valias, destinado a controlar, inflação e a impulsionar o fomento e o povoamento.
Para melhor esclarecer a Assembleia Nacional da maneira de se executar o Decreto-Lei n.° 38:704 e da suavidade da sua tributação, eu vou exemplificar:
Suponhamos uma sobrevalorização de 100 contos.
Esta importância é assim dividida:
Contos
Livre para o produtor-exportador 25
Percentagem a retirar 75
É assim dividida a percentagem de 75 contos:
20 por cento para o Fundo de Fomento e Povoamento 15
50 por cento para o congelamento 37,5
30 por cento livre para o exportador 22,5
Finalmente os 100 contos de sobrevalorização ficam divididos pelas seguintes importâncias:
contos
Livre para o exportador-produtor 25
Livre para o exportador-produtor 22,5
Congelado para investimentos 37,5
Imposto para o Fundo do Fomento e Povoamento 15
100
Exposto assim o funcionamento do decreto, já não há razoes para lhe atribuir o peso exagerado que se supôs o que, a meu ver, deveria ter sido uma das causas da oposição que se moveu contra a sua execução.
Sr. Presidente: creio ter esclarecido suficientemente a Assembleia 'Nacional para poder apreciar da necessidade do decreto e da sua grande influencia no desenvolvimento do fomento, do povoamento europeu e da civilização do indígena e no controle da inflação monetária.
Por estas razões eu estou convicta mente convencido de que o Decreto-Lei n.° 38:704 é um dos mais importantes diplomas que o Governo do Estado Novo tem publicado pelo Ministério do Ultramar.
Entendo pois que bem merece ser ratificado pela Assembleia Nacional sem a mais leve alteração. Eu votarei nesse sentido.
Não desejo terminar, Sr. Presidente, sem ler à Assembleia Nacional um telegrama no qual Salazar faz o seu depoimento acerca do decreto em discussão.
Eu esforcei-me por esclarecer a Assembleia, mas, devido à minha insuficiência, é natural que tivesse deixado ficar em suspensão algumas dúvidas.
Com a leitura do telegrama do Sr. Presidente do Conselho, que vou fazer, tudo ficará devidamente esclarecido
S. Exa. o Presidente do Conselho enviou o seguinte telegrama à Associação Comercial de Luanda, em resposta às representações que lhe foram feitas a propósito Decreto-Lei n.º 38:704, e que ontem veio publicado jornal diário de Lisboa:
Acuso recepção telegramas acerca matéria Decreto 38:704 que logo comuniquei Ministério Ultramar. Sr. Subsecretário começou imediatamente estudo objeções formuladas e irá comunicando Sr. Exa. Governador Geral maneira resolver dificuldades práticas se apresentem.
Não desejo nem poderia por este meio examinar considerações ordem geral apresentadas referidos telegramas mas não posso deixar de em nome Governo frisar seguinte : parece não poder negar se excepcional valorização alguns géneros exportação tanto metrópole como províncias ultramarinas devido circunstancias também excepcionais do momento internacional.
Governo julga essencial não perder-se de vista certos preços são transitórios e que não pode nem deve basear-se sobre eles conjunto económico. Não só sobrevalo-rizações são em grande parte estranhas esforço produção como seus efeitos sobre economia da província, administração pública e vida e trabalho populações podem a certo prazo ser muito graves aconselhando prudência a tomar providências evitem suas piores repercussões.
Não seria ver questão sua verdadeira luz abstraindo do interesse geral que o caso envolve e que deve ser defendido embora se necessário com diminuição parcial lucros para sector ou sectores especial e excepcionalmente favorecidos.
Razão fundamental do Decreto 38:704 não é diferente da do Decreto 38:405 aplicável produtos metropolitanos e no igual se prevê tributação até 60 por cento sobrevalorizações ainda que não se tenha verificado atingirem níveis compatíveis a alguns géneros ultramarinos.
Não posso duvidar de que fundamentos diploma sejam compreendidos como foi compreendida providência excepcionai tomada pelo Decreto 38:659 que se espera deixe de onerar actividades exportadoras daqui e dai logo que situação Portugal na, União Europeia de Pagamentos o permita.
Quanto porém execução aludidos decretos espero se acreditará que nada está mais longe pensamento Governo do que intervir abusivamente na actividade privada entorpecê-la ou enredá-la com formalidades excessivas.
Deseja-se apenas imprimir orientação geral consentânea bem comum e maior progresso economia província e seus habitantes.
Seria injusto crer que esforços destes sua vitalidade e entusiasmo patriótico não estão sempre presentes espirito Governo e confia-se plenamente que sob orientação superior S. Ex.ª governador-geral serviços serão conduzidos formas execução não lesem interesses produção angolana.
Governo não descuidará problema nem deixará de estudar todas sugestões úteis sejam apresentadas sentido melhor e mais fácil execução pensamento geral».
Termina aqui o depoimento de Salazar que eu quis trazer à Assembleia para elucidação completa do pensamento que informa o Decreto-Lei n.° 38:704. Tinha pensado, antes de ler na imprensa este telegrama, apresentar à Assembleia algumas sugestões de natureza regulamentar para a boa execução do decreto.
Porém, desde que S. Ex.ª o Presidente do Conselho entregou ao Sr. Subsecretário de Estado do Ultramar o estudo das objecções já formuladas, eu desisto daquele propósito.
Todos temos absoluta confiança no Sr. Engenheiro Trigo de Morais para ficarmos a saber que serão atendidas as reclamações justas e que o decreto será executado de maneira a serem bem resolvidas as dificuldades práticas que se apresentarem.
Na verdade, a alta envergadura moral e intelectual do Sr. Engenheiro Trigo de Morais, as sobejas provas que tem dado, ao longo da sua vida pública, de sacrifício pelo bem comum e o seu profundo conhecimento dos problemas coloniais nos seus múltiplos aspectos dão-nos garantia indefectível de que a regulamentação do Decreto-Lei n.° 38:704 será realizada com espirito equidade e inteligência e sentido das realidades.
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Vem corroborar esta minha convicção o facto, da maior importância, de o actual Sr. Subsecretário de Estado do Ultramar ser de ha muito ura propugnador do espirito do decreto, que ele defendeu e preconizou com brilho nu sua celebro conferência proferida no Instituto Superior Técnico.
É pois a pessoa ideal para regulamentar o decreto, pela intima comunhão espiritual que existe entre o homem e a ideia.
Sr. Presidente: se todos estamos de acordo com os altos objectivos nacionais que o decreto pretende atingir e a Assembleia Nacional já recentemente votou uma moção nesse sentido; se para controlar a inflação monetária o método do imposto suave e simultaneamente da congelação é o que menos afecta os interesses que se apresentam em jogo; se a boa execução do decreto depende em grande parte da regulamentação e das instruções que tiverem de ser dadas, e S. Ex. 1 o Presidente do Conselho confiou o exame das sugestões e alvitres que já foram formulados a um membro do Governo que tem incontestavelmente jus à nossa confiança e à nossa admiração, lógica e patrioticamente a Assembleia Nacional só tem uma resolução a tomar: a ratificação pura e simples do decreto.
Este é o meu voto.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem ! O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - O debate prosseguirá na sessão da tarde.
Está encerrada a sessão.
Eram 13 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Alberto Cruz.
António de Almeida.
António Bartolomeu Gromicho.
António Carlos Borges.
António Jacinto Ferreira.
António Pinto de Meireles Barriga.
Artur Proença Duarte.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Jerónimo Salvador Coastantino Sóorates da Costa.
José Gualberto de Sá Carneiro.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Ricardo Malhou Durão.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Abel Maria Castro de Lacerda.
Alberto Henrique de Araújo.
Américo Cortês Pinto.
António Calheiroe Lopes.
António Júdice Bustorff da Silva.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Avelino de Sousa Campos.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João ALpoim Borges do Canto.
João Amial
João Cerveira Pinto.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim de Oliveira Calem.
José Cardoso de Matos.
José Finito
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel Lopes de Almeida.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Pedro de Chaves Cymhran Borges de Sousa.
Sebastião Garcia Ramires.
Teófilo Duarte.
Vasco de Campos.
Vasco Lopes Alves.
O REDACTOR - Luís de Avillez.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA