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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 163

ANO DE 1952 13 DE NOVEMBRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

V LEGISLATURA

(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)

SESSÃO N.º 163, EM 12 DE NOVEMBRO

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Exmos. Srs.
Gastão Carlos de Deus Figueira
José Guilherme de Melo e Castro

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 25 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário das Sessões n.º 162.
O Sr. Presidente usou da palavra para recordar a data do armistício que pôs termo à primeira guerra mundial, prestando homenagem, em nome da Assembleia, aos que morreram pela Pátria.
O Sr. Presidente anunciou estar na Mesa a proposta da lei orgânica do ultramar, com o respectivo parecer da Câmara Corporativa e um relatório do director-geral de Administração Política e Civil do Ministério do Ultramar, Dr. Ferreira Bossa.
O Sr. Presidente deu conhecimento de ter recebido os elementos solicitados ao Ministério do Exército pelo Sr. Deputado Ribeiro Cazaes.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Pinto Barriga, sobre questões do inquilinato; Gaspar Ferreira, que falou acerca do porto e ria de Aveiro; Pinho Brandão, sobre a pista náutica em Aveiro; Miguel Bastos, que fés considerações com referência à viagem do Eminentíssimo Cardeal-Legado à índia; Salvador Teixeira, para requerimentos aos Ministérios das Obras Públicas e das Comunicações, e Vás Monteiro, que se congratulou com o incremento do fomento do ultramar ultimamente registado.

Ordem do dia. - Continuação da discussão na especialidade da proposta de lei de organização geral, recrutamento e serviço militar das forças ultramarinas.
Discutiram-se as bases III a XII, inclusivo.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Ribeiro Casões, Castilho Noronha e Mário de Figueiredo.
O Sr. Presidente declarou encerrada a sessão às 18 horas e 10 minutos.

CÂMARA CORPORATIVA. - Parecer n.º 35/V, acerca do projecto de proposta de lei n.º 517 (lei orgânica do ultramar). Avisos relativos ao movimento desta Câmara.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 16 horas e 15 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Adriano Duarte Silva.
Afonso Enrico Ribeiro Cazaes.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Alberto de Sousa Pinto.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Tavares.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho.
António Cortês Lobão.
António Jacinto Perreira.
António Joaquim Simões Crespo.
António Júdice Bustorff da Silva.
António de Matos Taquenho.
António Pinto de Meireles Barriga.

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António Raul Galiano Tavares.
António dos Santos Carreto.
António de Sousa da Câmara.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Proença Duarte.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos de Azevedo Mendes.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Diogo Pacheco de Amorim.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Frederico Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas Vilar.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique Linhares de Lima.
Herculano Amorim Ferreira.
Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
João Cerveira Pinto.
João Luís Augusto das Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Oliveira Calem.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.
José Garcia Nunes Mexia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Luís da Silva Dias.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Domingues Basto.
Manuel França Vigon.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Vaz.
Manuel de Sousa Meneses.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Mário de Figueiredo.
Miguel Rodrigues Bastos.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteiro.
Salvador Nunes Teixeira.
Teófilo Duarte.
Tito Castelo Branco Arantes.
Vasco Lopes Alves.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 74 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 26 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o Diário das Sessões n.º 162.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Visto nenhum Sr. Deputado desejar fazer qualquer reclamação, considero-o aprovado.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: passou ontem mais um aniversário sobre a cessarão das hostilidades na primeira grande guerra, em que Portugal tomou parte. Portugal cumpriu cavalheirosamente o seu dever de aliado; e, em holocausto a esse dever, tombaram no campo de batalha, em África e em França, muitos soldados portugueses. Penso que a Assembleia Nacional desejará comemorar mais um.i vez essa data o prestar uma vez mais a sua justa homenagem a todos aqueles que para honrar o nome de Portugal expuseram ou sacrificaram então a sua vida. A todos os portugueses que nesse grande conflito afirmaram perante o Mundo a permanência das virtudes tradicionais da nossa raça, especialmente aos que nele perderam a vida e que nele intervieram, em nome da Assembleia Nacional presto comovida homenagem.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Está na Mesa a proposta da lei orgânica do ultramar, acompanhada do parecer da Câmara Corporativa e de um relatório do director-geral Dr. José Ferreira Bossa. Vão ser publicados a proposta e o parecer no Diário das Sessões e baixar às Comissões do Ultramar e de Legislação e Redacção. Estão na Mesa os elementos requeridos pelo Sr. Deputado Ribeiro Cazaes ao Ministério do Exército, que vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Pinto Barriga.

O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: ainda muito longe de estar restabelecido, circunstâncias imperiosas de necessidade]forçam-me a não me esquecer do meu mandato, defendendo nesta tribuna os magnos e justíssimos interesses daqueles para quem o problema do inquilinato ó uma questão de vida ou morte social.
É de justiça salientar a continuidade de acção do Governo, pelas diferentes pastas, no estudo deste problema, em que procurou sempre chegar a soluções de equidade.
Quando levanto a minha voz nesta tribuna, não são criticas que formulo, são lembranças, anotações de dificuldades que trago ao conhecimento público do Governo.
Para Lisboa a alta dos terrenos vendidos para construção e os juros elevados a que se capitaliza neste ramo de investimento, aliados a uma certa e desnecessária sumptuosidade de planificação, acarretam um valor de rendas inadequadas às possibilidades dos respectivos moradores.
A interpretação que tem sido dada na prática forense ao regime de caducidade de arrendamento estabelecido pela Lei n.º 2 030 traz onerosos inconvenientes aos inquilinos e é nitidamente inconstitucional, por contrário ao artigo 5.º do estatuto fundamental, pois1 bastaria assegurar uma revisão dos preços das rendas que evitasse que os proprietários imperfeitos ou administradores estabelecessem quantitativos diferentes, dolosamente, dos normais do mercado.
A super actualização das rendas do inquilinato particular, nestas condições, assegura vantagens excepcionais a esses proprietários, muito fora da protecção que a lei confere aos inquilinos. Cria um problema geral de ordem pública. Há despejos de prédios inteiros, nestas condições, nas cidades de Lisboa e Porto. Não me consta que da aplicação da Lei n.º 2 030 tenham provindo esperadas vantagens para a Fazenda Pública pelo

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cumprimento exacto da legislação fiscal, e este é um caso em que insisto.
Outro escândalo gravoso é a actualização imoderada, por avaliação, de rendas nos arredores de Lisboa e Porto, que traz aos inquilinos pobres uma situação desesperada.
Há que prover, porque a maneira como se está efectuando é ilegal e desumana.
Protejamos o inquilinato, mas não nos esqueçamos também de que uns certos laivos de socialização irreflectidamente lançados sobre a propriedade urbana acabam por a desproprietizar, arremessando-nos muito para fora do regime corporativo em que pretendemos económica e socialmente viver.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Gaspar Ferreira: - Sr. Presidente: pedi a V. Ex.ª que me concedesse a palavra para tratar de alguns assuntos urgentes que interessam à região que tenho a honra de representar.
O primeiro desses assuntos diz respeito ao porto de Aveiro.
Quando em 21 de Abril tive a honra de fazer uso da palavra nesta Assembleia afirmei que com as obras, em curso, do melhoramento da barra, embora somente realizadas numa pequena parte, se tinham obtido já notáveis vantagens, entre as quais se destacava o seu aprofundamento, por forma a já terem tido nela passagem navios de 19 e até 20 pés de calado.
Hoje é com grande satisfação que posso informar a Assembleia de que actualmente o aprofundamento é por forma a já, nos últimos meses, terem podido entrar no porto, vindos directamente dos pesqueiros, todos os lugares e arrastões bacalhoeiros da praça de Aveiro, sem qualquer deles ter tido necessidade de ir a outro porto aliviar a carga.
Isto representou para os armadores uma grande economia, pois que, por exemplo, em 1949 a frota bacalhoeira teve de ir descarregar em Leixões a fim de os navios, assim aliviados, poderem entrar no porto - 153 366 a de peixe, que depois tiveram de ser transportados para Aveiro por via marítima ou terrestre, ocasionando uma despesa média de 11&30 por quintal, ou seja um encargo total de 1:733.030$.
A esperada e já indubitável melhoria da barra valoriza extraordinariamente o porto bacalhoeiro e estimula as actividades marítimas existentes com base nele. Pelo que diz respeito ao valor económico da indústria da pesca de bacalhau em Aveiro, referi-me a ele, embora por forma muito sucinta, quando nesta Assembleia usei da palavra em 21 de Abril. Simplesmente tenho por obrigação rectificar uns números que apresentei então e com que quis demonstrar a progressão daquela pesca.
Vou faze-lo. Os números reais são:

Em 1932 entraram no porto de Aveiro 1420 000 kg de bacalhau, no valor de 2:808 contos;
Em 1946 entraram 11 935 000 kg, no valor de 47:744 contos;
Na campanha do 1949-1950 entraram 12 853 080 kg, no valor, atribuído à descarga, de 77:118.480$;
Na campanha de 1950-1951 pescou a frota bacalhoeira com base em Aveiro 14 288 540 kg (dos quais l 494 700 foram secos fora de Aveiro), no valor, atribuído à descarga, de 85:731.240£ (deste valor, 8:540.680$ correspondem ao peixe seco fora de Aveiro).
São estes números um pouco mais modestos do que os que eu referi em 21 de Abril, por um equívoco de
que humildemente peço desculpa à Assembleia; mas, no entanto, são suficientes para demonstrar plenamente a tese que me propusera demonstrar - a da progressiva e já importantíssima posição sustentada pelo porto de Aveiro como porto bacalhoeiro.
Sr. Presidente: as magnificas perspectivas criadas pela melhoria verificada da barra, a influência primacial exercida já sobre a economia da região pelas actividades ligadas ao porto e por outras por estas influenciadas e a consideração das possibilidades, das tendências e das conveniências económicas da região, com larga projecção no interesse nacional, indicam, manifestamente, como caminho a seguir com urgência, o estudo dos portos de comércio e do pesca de Aveiro, cuja execução deve ser feita por forma a aproveitar integralmente, em toda a extensão das possibilidades oferecidas e sem retardamento, os resultados benéficos que se obtenham das obras em curso do melhoramento da barra.
Este o problema primacial da região, ao qual indubitavelmente cabe o primeiro lugar entre os múltiplos problemas de alto vulto que a ela interessam. Se para todos eles vai o meu muito interesse, especificadamente para aquele, eu peço, com a certeza de ser atendido, a cuidadosa atenção do Governo do Estado Novo, que, com sábia orientação, pelo País trabalha e que com os seus relevantes auxílios tudo impulsiona.
Sr. Presidente: no meu já referido discurso de 21 de Abril tive a pretensão -não sem que reconhecesse a minha insuficiência para tal- de esboçar o alto valor económico da ria de Aveiro e o que de aliciante e próprio é o seu ambiente para a atracção de turistas. Sob este aspecto, referi então que se tornava indispensável, para fomento ali da possível e valiosa indústria turística, proporcionar meios mais abundantes e fáceis do que os que existem para percursos na ria, pousadas onde fosse possível o descanso, possibilidades e facilidades para as diferentes modalidades de desportos náuticos.
Ao falar então, Sr. Presidente, estava muito longe de supor que dentro em pouco eu poderia testemunhar perante esta Assembleia a grandiosidade da extraordinária manifestação que se realizou no dia 3 em Aveiro para entregar ao Sr. Governador Civil a representação de toda a população da cidade, secundada por elementos dos mais representativos de toda a região, pedindo ao Governo a construção em Aveiro duma pista de remo.
Já se fizeram intérpretes daquele pedido nesta Assembleia os ilustres Deputados do distrito, engenheiro André Navarro e Dr. Paulo Cancela de Abreu; mas, porque estou convencido de que a construção da pista de remo seria instrumento valioso para o desporto náutico nacional e a sua construção em Aveiro um elemento importantíssimo de educação e revigoramento da mocidade, ao mesmo tempo que seria um elemento precioso de fomento do turismo, e porque em nenhum outro lugar existe ambiente mais aliciante, cenário mais maravilhoso e tonificante, física e espiritualmente, para praticantes do desporto e para interessados por este e, ao mesmo tempo, para pesquisadores persistentes e incansáveis das belezas naturais, não quero deixar de me associar às palavras proferidas por aqueles ilustres Deputados relativas a tal assunto.
Sr. Presidente: ao principiar no uso da palavra disse que fora para tratar de alguns assuntos de interesse para Aveiro que eu pedira a V. Ex.ª o favor de ma conceder.
Dois desses assuntos estão já apontados. Falta-me um.
Seria incompreensível que eu não aproveitasse a oportunidade para exprimir a S. Ex.ª o Sr. Ministro da Economia os meus agradecimentos pela publicação do Decreto n.º 38 909, de 12 de Setembro, que confere à

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Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos a competência para a coordenação e disciplina das actividades de produção, comércio e indústria do sal.
Espero que com a publicação daquele diploma se entre brevemente na solução apropriada e definitiva do problema, solução que nesta Assembleia já declarei, noutra ocasião, julgar ser de instante necessidade pela gravidade dos aspectos económico e social que o problema salineiro comporta, pelo menos na região de Aveiro. Estou certo de que o Sr. Ministro da Economia, com a sua grande dedicação pelo interesse nacional e com as suas altas faculdades realizadoras, a que o País já tanto deve, não deixará de a impulsionar.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Pinho Brandão: - Sr. Presidente: desejo tão-sòmente associar-me, como Deputado pelo círculo do Aveiro, às palavras proferidas pêlos ilustres Deputados Srs. Engenheiro André Navarro, Dr. Paulo Cancela de Abreu e Coronel Gaspar Ferreira alusivas à construção duma pista nacional de remo.
Entendo também, Sr. Presidente, ser necessário dotar o País com uma pista adequada à prática dos desportos náuticos e julgo que no estudo da sua construção deve encarar-se a possibilidade de essa pista se fazer na cidade de Aveiro.
A situação geográfica desta cidade, a sua maravilhosa e encantadora ria, única no País, e o temperamento da sua gente o dos habitantes dos concelhos circunvizinhos, educados nas lides do mar, dão à cidade de Aveiro o direito de pedir ao Governo da Nação que sejam estudadas as condições excepcionais que militam a seu favor na escolha do local onde se construa uma pista nacional destinada à prática do remo. E é isto apenas o que Aveiro pede.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Miguel Bastos: - Sr. Presidente: há poucos dias saiu a barra, mima linda tarde de sol, um barco português levava a bordo o nobilíssimo Patriarca de Lisboa, que, em representação de Sua Santidade, se dirige à velha terra portuguesa de Geia, para presidir às comemorações do IV Centenário da Morte de S. Francisco Xavier.
Com ele partiu, naquela tarde, um pedaço grande do coração dos Portugueses!
Com ele partiu, seguindo-o e envolvendo-o, uma das páginas mais belas da missão histórica deste povo - dilatar, com o Império, a Fé. Obra de sedução e amor, feita com tal ternura e carinho que, sendo humana, é já uma sombra bendita que vem de mais longe e de mais alto!
A vocação - ela própria constitui um dom natural e por isso tem já o traço e o sabor de uma doação divina.
Percorremos as sete partidas do Mundo e onde estiveram os nossos pés lá ficou erguida para o céu uma cruz.
Na dureza de um trabalho constante pela maior glória da Pátria, a certeza de perpetuidade de um sonho através de uma palavra de amor, doce e carinhosa como n que um dia ouviu, do alto do Calvário, a Humanidade inteira. A certeza de que todo o trabalho material é vão e efémero se não for realizado na sombra amiga de tudo aquilo que é verdadeiro e eterno. Na certeza de
que todo o trabalho material tocará leve e superficialmente os homens se não for acompanhado do sentir que penetra as almas e nelas fica a viver eternamente.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - No esplendor daquela tarde cheia de luz, olhando esta cidade, plena de encanto e magia, toda deitada à beira-mar, donde partiram para a glória os navegadores e o Santo, é possível que se visse, na poeira dourada que o Sol fazia levantar, a própria cruz de Cristo - símbolo de uma fé, símbolo, para nós, da nossa própria cruzada de presença e acção através do Mundo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Hoje não se compreendem bem estas coisas, e por muitos são julgadas filhas do fanatismo ou da loucura de um século de obscurantismo. E, no entanto, na angústia dos dias que vivemos o que continuará a importar essencialmente é determinar o rumo do espírito do homem, entrar na sua alma, porque só dela pode partir a solução dos problemas políticos e económicos que abrasam apaixonadamente o pensamento de todos os responsáveis na hora presente.
Sobre o túmulo de S. Francisco Xavier, a quem Paulo III confiou a missão de restituir a fé ao Oriente, vai orar o Patriarca de Lisboa, por si e pelo mundo cristão.
«Restituir a fé ao Oriente ...» uma legenda que tem mais de quatrocentos anos, mas a que se poderia acrescentar neste instante esta outra: «Restituir ao Oriente, com a fé, a verdadeira paz ...».
Creio que interpreto o sentir de todos os Srs. Deputados ao desejar ao ilustre legado de Sua .Santidade as maiores (felicidades na sua nobre missão, para maior honra e glória da Igreja e de Portugal.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Salvador Teixeira: - Sr. Presidente: pedi a palavra para enviar para a Mesa os seguintes:

Requerimentos

«Roqueiro que pelo Ministério das Obras Públicas me seja dado imediato conhecimento dos estudos já feitos para a construção da ponte sobre o Tejo em Lisboa».
«Roqueiro que pelo Ministério das Comunicações me seja dado conhecimento imediato da média das importâncias cobradas mensalmente pela utilização da Ponte Marechal Carmona, em Vila Franca de Xira, desde que começou a efectuar-se tal cobrança».

O Sr. Vaz Monteiro: - Sr. Presidente: no dia 28 do mês findo tive a enorme satisfação de prestar justa homenagem a um homem que há um quarto de século tudo tem sacrificado aos superiores interesses da Nação, oferecendo patriòticamente a sua alta inteligência, o seu génio reformador, a sua própria saúde.
Em 22 de Maio findo Salazar despachou autorizando o dispêndio de 190:000 contos para obras de fomento no Sul de Angola, depois de meditar sobre o alcance do seu despacho, que, além de satisfazer grandes e antigas aspirações da província de Angola sobre fomento e povoamento, marcou decisivamente um rumo

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de colaboração internacional com os nossos vizinhos das Rodésias.
Pois, Sr. Presidente, venho hoje com enorme alegria comunicar à Assembleia Nacional que aquele célebre despacho de Salazar vai tendo exacto e imediato cumprimento por parte do Ministério do Ultramar.
No gabinete do Sr. Subsecretário de Estado do Ultramar, engenheiro Trigo de Morais, que há mantos anos ao fomento ultramarino vem dedicando a sua muita competência e grande actividade, acabam de ser celebrados dois novos contratos de adjudicação, no valor total de 03:222 contos, para obras de fomento económico das províncias de Angola e Moçambique.
Um dos contratos, no valor de 30:292 contos, refere-se ao fornecimento de 6 locomotivas Garratt para o caminho de ferro de Leste - Moçâmedes, Sá da Bandeira, Cunene, Cuanavala, fronteira da Rodésia do Norte -, e o outro, correspondente a 22:930 contos, é destinado ao fornecimento de 39 comportas automáticas para a barragem do vale do Limpopo.
Foi com o maior contentamento, Sr. Presidente, que chegou ao meu conhecimento a notícia da celebração destes dois contratos.
Por eles se verifica o notável interesse do Governo do Estado Novo pelo progressivo desenvolvimento das nossas províncias de além-mar.
E bastaria este cuidadoso interesse do Governo de Salazar pelo desenvolvimento dos territórios ultramarinos para merecer o nosso inteiro aplauso.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas se a celebração dos dois contratos é motivo para aplaudirmos e nos alegrarmos, como bons portugueses, que somente desejam ver a Pátria engrandecida, há ainda a registar unia particularidade especial na adjudicação destinada ao caminho de ferro de Leste - Moçâmedes-fronteira da Rodésia do Norte.
Pela prontidão com que este contrato foi realizado, verifica-se que não é em vão que Salazar assina os seus despachos em benefício das províncias ultramarinas.
A clarividência de Salazar tem repercussão benéfica e rápida quando encontra colaboração activa, sincera e competente. E porque este facto se acaba de verificar no Ministério do Ultramar, com verdadeira e apreciável
dedicação ao Chefe da Revolução Nacional, eu desejo destaca-lo.
E uma exaltação àqueles que sabem e querem obedecer prontamente às ordens do Chefe da Revolução e é um reconhecimento de quanto se aprecia na Assembleia Nacional o evidente interesse do Governo pelo fomento e povoamento do ultramar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Só colaborando com fé e dedicação ao Chefe e amor u causa pública, e neste caso especial com amor ao ultramar, a Revolução continuará.
E é com estas obras em execução e outras que hão-de surgir a seu tempo que se contribuirá para fortalecer a unidade nacional, para que a metrópole, juntamente com as províncias ultramarinas, continue a formar o mesmo bloco indestrutível da Pátria Portuguesa, de Portugal eterno.
Felizmente, Sr. Presidente, que 'dia a dia ressalta aos nossos olhos de portugueses o desenvolvimento e o progresso do nosso ultramar, movidos pela patriótica actuação do Governo do Estado Novo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Podemos dizer bem alto e orgulhosamente que S. Ex.ª o Presidente da República convocou o Conselho de Estado e resolveu antecipar a abertura da Assembleia Nacional só por motivo dos interesses do ultramar.
Foram quatro propostas de lei relativas às províncias ultramarinas que o Governo desejou submeter à apreciação da Assembleia Nacional que levaram o egrégio Presidente da República, Sr. General Craveiro Lopes, a tomar tão importante resolução.
Como V. Ex.ª, Sr. Presidente, já nos anunciou, serão discutidas e votadas as seguintes propostas de lei: a organização geral, recrutamento e serviço militar das forças ultramarinas; a reorganização do exercício do comércio bancário no ultramar; o Plano de Fomento da metrópole e do ultramar e a lei orgânica do ultramar.
Ë, pois, evidente o interesse do Estado Novo pelas províncias ultramarinas, por nós consideradas parcelas integrantes de Portugal.
E se nos causa contentamento e regozijo verificarmos que o Estado Novo assim se dedica carinhosamente às províncias ultramarinas e se nos é dado ter a satisfação de assistir a unia extraordinária actividade no Ministério do Ultramar para se dar o maior impulso ao fomento económico ultramarino, eu julgo poder informar a Assembleia Nacional que brevemente novo contrato de adjudicação irá ser celebrado para dar continuidade aos trabalhos do caminho de ferro de Moçâmedes à fronteira da Rodésia, e assim continuar em plena execução o célebre despacho de Salazar.
Julgo saber, Sr. Presidente, que a construção de 300 km de linha férrea foi adjudicada e que em breves dias será realizado o respectivo contrato.
Será um contrato de grande e extraordinária importância.
São 300 km de linha de caminho de ferro, que representam uma extensão igual à de Lisboa à cidade do Porto. E a sua adjudicação importa o elevado dispêndio de 100:000 contos.
Bastará a indicação do que deixo apontado, Sr. Presidente, para se fazer ideia da actividade desenvolvida no Ministério do Ultramar pelo fomento dos territórios ultramarinos e pelo imediato e exacto cumprimento do despacho citado de S. Ex.ª o Presidente do Conselho.
Estas palavras de exaltação pela actividade do Estado Novo em benefício do ultramar são proferidas como acto de verdadeira justiça, mas têm a finalidade de pretender que os Portugueses se apercebam de que o desenvolvimento do progresso das províncias ultramarinas vem engrandecer a Nação e fortalecer os laços da unidade nacional.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na especialidade a proposta de lei relativa à organização geral, recrutamento e serviço militar das forças ultramarinas.
Está em discussão a base m segundo o texto da Câmara Corporativa, visto que a Assembleia Nacional votou que a discussão decorresse sobre esse texto.
Sobre esta base foram apresentadas propostas de emendas aos seus parágrafos pelo Sr. Frederico Vilar, que vão ser lidas e constam do Diário das Sessões último.

Foram lidas.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

Pausa.

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O Sr. Presidente: - Não havendo quem peça a palavra, vai votar-se a base m com as emendas propostas pelo Sr. Deputado Frederico Vilar.
Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão a base IV com a proposta apresentada pelo Sr. Deputado Frederico Vilar.
Foi lida.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Submetida à votação, foi aprovada sem discussão, e bem assim a base IV com a eliminação do seu § único.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a base V.

O Sr. Ribeiro Cazaes: - Sr. Presidente: quando se discutiu na generalidade o projecto da proposta de lei agora em causa na especialidade, tentei mostrar que o diploma não dizia respeito unicamente a elementos do Exército classificados nesse documento sob a designação, de facto consagrada, mas talvez impropriamente aplicada hoje; de o forças terrestres».
E pedi especialmente a atenção da Câmara para o facto de ser proposto na base V que os comandos militares das províncias ultramarinas fossem nomeados pelo Ministro do Exército, quando é certo que na base vi se propõe que assumam, no caso de operações de guerra, o comando superior de todas as forças que operem no território, na qualidade de comandantes-chefes, e, nessa mesma base, a Câmara Corporativa tenta regular as suas relações com o governador respectivo.
Ora, se considerarmos:
1.º Que a Lei n.º 2 034 prescreve que todas as forças do ultramar, em caso de guerra, ficam sob a jurisdição do Ministro da Defesa Nacional;
2.º Que hoje, a par do Ministério do Exército, há o Ministério da Marinha e o Subsecretariado da Aeronáutica e que os três ramos das forças armadas -terra, mar e ar dispõem de oficiais que podem assumir o comando superior do todas as forças que tenham de operar em qualquer província ultramarina;
3.º Que nos territórios de além-nfar a aviação comercial já hoje se encontra extraordinariamente desenvolvida e a arma aérea deve assumir ali importância talvez maior ainda do que no continente;
4.º Que desde o tempo de paz devem ser estudados e preparados os elementos de defesa nacional na previsão de qualquer emergência, não parecendo, por isso, que tudo fique devidamente acautelado pelo facto de na base vi se dizer que o comandante militar assumirá as funções do comandante-chefe se o Governo não determinar expressamente o contrário;
julgo ser mais razoável que os comandantes militares das províncias ultramarinas sejam da nomeação do Governo ou, pelo menos, do Ministro da Defesa Nacional. Salazar disse um dia o seguinte:
Mal vai quando determinadas medidas dependem, por sistema, do parecer duma repartição pública ou da assinatura do Ministro.
A simples suspeição dos particulares envenena a Administração.
Creio bem que a nomeação de um comandante militar é assunto de maior melindre do que qualquer daqueles a que Salazar só refere nas palavras que acabo de repetir, e, por isso, tal acto deve rodear-se de especiais cuidados.
Poderia, sobre este importante problema da escolha de comandos, tecer largas considerações, fazendo-me eco das palavras autorizadas do grande Chefe, mas julgo que, se se meditar mesmo somente na posição que os comandantes militares podem ter de assumir perante o governo da província, se concluirá que o assunto não pode ficar limitado à deliberação de um dos ramos das forças armadas.
Espero em breve tratar nesta Casa, com o desenvolvimento necessário, deste problema dos comandos, a propósito do Decreto-Lei n.º 38 916, de 18 de Setembro de 1952, que altera disposições do Estatuto dos Oficiais do Exército.
Por hoje fico-me por aqui, confiado em que quem tem de decidir escolhe o melhor caminho, de forma a arredar as apreensões que tomam certos espíritos, em virtude da questão das relações entre os comandos militares e os governadores respectivos, os quais, com mais ou menos território e mesmo sem parcela alguma dele, são sempre os representantes do Poder, os símbolos vivos da própria Nação.
O comandante militar verdadeiramente digno deste nome deve ter isto sempre presente. E, se assim for, não poderá haver conflitos graves entre essas duas altas autoridades.
Porque na nossa terra a elevação da cultura do povo, e sobretudo das classes dirigentes, tem merecido a maior atenção do Governo - com agrado, sem reservas, dos que se orgulham de ser soldados da Revolução Nacional -, mas, servindo, por vezes, as medidas adoptadas interesses contrários ao fim elevado da missão e mesmo do bem comum (e isto é uma doença que muito está afectando o Exército), permita, Sr. Presidente, que termine as minhas considerações com algumas palavras duma carta de S. Francisco Xavier a D. João III acerca da necessidade de padres para a índia, palavras que se ajustam perfeitamente ao assunto em causa: s... porque de letrados sem experiência nem provas do que é o Mundo não se faz muito fruto nesta terra».
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum dos Srs. Deputados deseja usar da palavra, vai votar-se a base v tal como consta do parecer da Câmara Corporativa.
Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a base VI.
Sobre esta base há na Mesa uma proposta do Sr. Deputado Frederico Vilar para que se substitua o teor que se encontra no parecer da Câmara Corporativa pelo da proposta do Governo.
Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a base VII.
Relativamente a esta base está na Mesa uma proposta de alteração apresentada pelo Sr. Deputado Frederico Vilar, a qual vai ser lida a VV. Ex.ªs e que consta do Diário das Sessões.
Foi lida.

O Sr. Castilho de Noronha: - Sr. Presidente: por motivos que já tive a honra de expor a V. Ex.ª, não pude tomar parte nas sessões em que a presente proposta foi discutida na generalidade.
Se tivesse assistido a essas sessões teria tido a oportunidade de bordar algumas considerações que o Regimento não me permite fazer nesta altura.

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A base VII, que está em discussão, refere-se ao mapa anexo à proposta, do qual constam as forças militares terrestres das províncias ultramarinas normalmente estabelecidas em tempo de paz.
Quem vê esse mapa convence-se logo de que são grandes os encargos que irão pesar sobre os respectivos orçamentos. Interessantes os dados que a Câmara Corporativa fornece no seu bem elaborado parecer.
Quanto aã Estado da Índia, confrontando a sua actual organização militar com a que é proposta no projecto, temos os seguintes aumentos e reduções:

Aumentos:

Um comando de batalhão de caçadores e uma ou duas companhias de caçadores; Um comando de grupo misto de artilharia; Um esquadrão de cavalaria motorizado.

Reduções:

Distrito de recrutamento e mobilização;
Um depósito de víveres;
Carreira de tiro; Praça de aguada.

Justifica-se que no Estado da índia as forças militares tenham a constituição que vem na proposta? Nada posso dizer a este respeito. Não tenho competência técnica para me pronunciar sobre o assunto. E, mesmo que a tivesse, não poderia fazê-lo, visto que nos escassos dois dias que decorreram depois que tive à mão o texto da proposta me seria de todo impossível obter os indispensáveis elementos.
O que, porém, é inegável é que a reorganização dos serviços militares em projecto vai criar ao tesouro da índia uma situação muito difícil.
Enquanto actualmente as despesas militares orçam por 9:000 contos, ou seja 1.500:000 rupias, o encargo futuro, como se lê no já citado parecer da Câmara Corporativa, importará em 31:400 contos, isto é, mais de 0.000:000 de rupias, assim distribuídos:

Contos
a) Despesas com o pessoal (vencimentos) 8:580
b) Outras despesas com o pessoal, material, pagamento de serviços e diversos encargos ................................... 22:820
Total ....... 31:400

Verdade ó que a base XXXII prevê um período de cinco anos para a integral execução das disposições da nova lei e das despesas correlativas.
Uma tal circunstância, porém, não altera a situação.
Decorridos cinco anos, o Estado da índia, com as suas fracas possibilidades financeiras, terá de fazer face às despesas com os serviços militares, que, de 9:000 contos que hoje se gastam, se elevarão subitamente para mais de 31:000.
A receita para o próximo ano é de cerca de 15 milhões de rupias. Quer isto dizer que as despesas com. os serviços militares, importando em 5 milhões de rupias, absorverão um terço da receita total!
E não esqueçamos que em breve pesarão sobre o orçamento do Estado da índia os encargos que o Plano de Fomento do ultramar lhe impôs.
São estas as considerações que entendi dever expor à atenção da Assembleia Nacional.
Disse.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Ribeiro Cazaes: - Sr. Presidente: a propósito do projecto da proposta de lei em discussão, iniciou as
suas considerações neste mesmo lugar o Sr. Deputado Lopes Alves com a seguinte frase do Sr. Dr. Mário de Figueiredo:
Não vale a pena subir a esta tribuna só para dizer que não se aprova ou não se está de acordo com os diplomas em causa.
Creio poder acrescentar que também nem sempre vale a pena subir a esta tribuna para dizer que se aprovam. E daqui a pouco se verá ...
Não é, todavia, o simples impulso de aprovar ou não aprovar que movimenta alguém desta Casa, contrariamente ao que muitos podem pensar lá fora.
O interesse pela causa pública nos move a todos e creio não haver discordância em que, se causam repulsa os que só dizem mal de tudo e merecem desprezo os que de tudo dizem bem, pior são aqueles a quem tudo é indiferente.
O indiferentismo é, sem dúvida, a doença mais grave desta época.
O egoísmo, o materialismo, a redução do valor da opinião pública são os factores mais importantes do agravamento deste mal da vida de hoje.
Recordo, a tal respeito, neste momento a alocução que S. S. Pio XII dirigiu aos participantes do Congresso Internacional da Imprensa Católica no começo do Ano Santo de 1950.
O Santo Padre considera mais funesta a situação dos povos em que a opinião pública está calada porque vícios internos a impedem de se formar do que a daqueles que vivem escravizados pelo totalitarismo, amordaçados por forças exteriores. E não deixa Sua Santidade de referenciar esses vícios, que a consciência dos homens bem formados vê também claramente.
A vaga de cego e dócil conformismo, de indiferença por tudo o que ao bem comum interessa, varre também a nossa terra; e todos sentimos, de olhos postos na gente moça, que tão grave mal é a maior preocupação, talvez até a única, dos homens da nossa idade.
Não sofro de tal doença, graças a Deus. Por isso aqui estou e, desta vez, como de muitas outras, subo a esta tribuna para dizer que aprovo a proposta do Governo na parte a que se refere a base VII, tomando assim posição oposta à Câmara Corporativa, ao Sr. Dr. Mário de Figueiredo, ao Sr. Comandante Lopes Alves, à maioria da secção de Defesa nacional. Repito: eu voto com o Governo.
Mas permita, Sr. Presidente, que diga porquê.
A última parte da base VII diz:
As forças militares terrestres das diferentes províncias ultramarinas normalmente estabelecidas em tempo de paz constam do mapa anexo e terão a constituição e composição a fixar na lei de quadros efectivos das forças ultramarinas.
A Câmara Corporativa propõe várias emendas a este mapa e a secção de Defesa nacional votou, por maioria, algumas outras. A principal alteração, tanto da Câmara Corporativa como da secção de Defesa nacional, consiste na eliminação das unidades de caçadores, substituindo-as por fracções da mesma arma, com designações diferentes.
Na proposta da Câmara Corporativa os batalhões e companhias de caçadores são substituídos por batalhões de infantaria e companhias de atiradores; a secção de Defesa nacional fixa, em título, as armas que em cada província ultramarina devem existir, registando depois a fracção genérica de cada uma delas (companhia, batalhão, etc.).

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Eu desejaria compreender a atitude da Câmara Corporativa e da secção de Defesa nacional. Não a alcanço, confesso.
E peço à Assembleia Nacional que não veja nesta incompreensão e concordância com o Governo uma atitude de simples sentimentalismo, aliás perfeitamente aceitável, cuido eu, da parte de quem está há seis anos no comando de caçadores n.º 5 e ali serviu, em horas que não se esquecem, ajudando ainda à sua reorganização logo- ao alvorecer da Revolução Nacional.
Repito: não compreendo a posição tomada a este respeito pela Câmara Corporativa e pela secção de Defesa nacional.
A Câmara Corporativa só diz sobre o assunto, como já informei aquando da discussão ma generalidade do projecto da proposta de lei, o seguinte:
Não só parece que a organização de caçadores tem de desaparecer, mas ainda, quando assim «não fosse, a actual organização da companhia de infantaria com um pelotão de acompanhamento e a do batalhão com uma companhia de acompanhamento veio aproximar a organização da infantaria de linha da dos caçadores.
Nada mais diz, nem esclarece o que afirma.
Já mostrei que não se verifica em qualquer país essa tendência para desaparecerem as organizações de caçadores e ficou demonstrado, com números, que há uma distância enorme entre as fracções daquele tipo e as similares de «infantaria de linha» (sic).
A secção de Defesa nacional parece ter compreendido isto mesmo e adoptou uma fórmula que permite à Administração fazer o que entender com base nos regimentos, batalhões ou companhias. Assim, onde, por exemplo, se diz no projecto da proposta de lei suma companhia de caçadores», a Câmara Corporativa resolveu propor uma companhia de atiradores e a secção de Defesa nacional julga ter encontrado a solução ideal com esta classificação: «da arma de infantaria, uma companhia».
Ora isto de dizer «de infantaria, uma companhia» não satisfaz de forma alguma.
Há companhias de caçadores, de atiradores, de metralhadoras, de canhões de acompanhamento, antiaéreas, anticarros, de pioneiros, etc., enfim, mais de uma dúzia de tipos de fracções de infantaria com essa designação genérica.
Todas têm composição e armamento diferente.
Deixa-se à Administração a escolha do tipo mais conveniente? Mas ela já escolheu, através do diploma em questão, preferindo fracções de caçadores.
A secção de Defesa nacional julga que todo o problema fica resolvido com o que se prescreve na última parte da base VIT:
... terão a constituição e composição a fixar na lei de quadros efectivos das forças ultramarinas.
Vejamos se isso satisfaz.
Primeiro que tudo, há que perguntar: o que se pretende, sobretudo nas províncias ultramarinas mais pequenas ?
Dispor ali de fracções com certa independência e potencial que lhes permita bastar-se a si próprias em pequenas acções, e, sendo (necessário, cooperar com forças aliadas onde se torne conveniente.
Esta segunda obrigação implica uma orgânica já definida nos exércitos que lado a lado têm de bater-se.
Assim, para melhor compreensão, analisemos o assunto dentro dos limites da fracção «companhia».
E evidente que a base da organização terá de ser, por isso, a companhia de atiradores.
Mas, como ficou demonstrado na discussão na generalidade, as suas possibilidades são muitíssimo limitadas, e para cumprir a missão, que já indiquei, de realizar por si só pequenas acções, terá de ser reforçada convenientemente.
Teremos então uma companhia de atiradores com morteiros, com mais metralhadoras, enfim, com aquilo que for fixado e julgado indispensável, mesmo admitindo que a última parte da base VII permita a elasticidade de dispor na província a considerar de especialistas e de armas de reforço.
Mas perguntarei agora:

Este reforço é permanente ou só se verificará quando for julgado oportuno?
Se é permanente, a companhia perde o nome que das outras a distingue e fica, afinal, sendo uma fracção do tipo a que costuma chamar-se de caçadores; se é provisório o reforço, chamar-se-á, dentro da terminologia militar, agrupamento temporário.
E evidente que o carácter não permanente de organização tem inconvenientes graves. Não há espírito de corpo, não há sólida homogeneidade do organismo, não há unidade, em que cada um se conhece e cada um tem a sua tarefa, orientando todos o seu esforço para o fim comum: o prestígio da sua unidade, que se traduz, afinal, numa melhor eficiência na acção.
Verificando-se que a organização, com carácter permanente, será, pois, dentro do quadro da companhia e com mais importância ainda (basta confrontar os quadros já publicados dos B. C. e dos B. I.) no plano do batalhão- do tipo de caçadores, terei de voltar a perguntar: trata-se, então, de uma questão de nome?
Mas o nome também tem a sua importância, todos o sabem, porque se eu disser, como afinal teríamos de fazer se fosse adoptado o critério da secção de Defesa nacional, uma companhia reforçada com morteiros, metralhadoras, etc., isso não tem o significado espiritual de um nome como: caçadores de Timor, metralhadoras de Macau, regimento de Luanda, etc.
Os factores, digamos espirituais, da organização militar têm muita importância, todos o sabem, e mão há chefe militar que os despreze.
Poderá argumentar-se, por fim, que a técnica e a táctica evoluem de tal forma no momento actual que não há vantagem em fugir de terminologias específicas e devemos manter-nos na designação genérica das fracções das armas.
Valha-nos Deus!
Bem diz S. S. Pio XII quando aponta, em primeiro lugar, no rol dos vícios internos dos povos, o abandono da tradição.
Mas aos que sofrem da doenças «das modas» poderei perguntar: mas querem, assim, ir adiante de quê? Da França? Da América?
Reparem, senhores, que todas as nações mantêm os seus corpos militares tradicionais, das mais variadas características, com os mesmos nomes, os mesmos uniformes e até os mesmos costumes de sempre!
Mas deixemo-nos de sacrificar em altares estranhos.
Já no diploma em discussão, ao tratar-se do recrutamento de formação de quadros, parece que estamos a querer dar satisfações a outrem, nós, que criámos nações e somos, desde sempre, um exemplo bem cristão de unidade imperial.
Para terminar, permita V. Ex.ª, Sr. Presidente, que conte agora uma breve passagem da vida da Revolução Nacional que muitos não conhecem ou talvez conheçam mal, em continuação daquela lembrança a que me referi na discussão do diploma na generalidade, da passagem da monarquia para a República e consequente extinção das unidades de caçadores.

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O espírito da Revolução Nacional, nascido à sombra da velha Universidade de Coimbra, não podia prescindir de Salazar. Rompeu a marcha connosco.
O excessivo e errado sentido de disciplina que informava a nossa ala afastou-nos pouco depois.
Mas a consciência do dever patriótico que nos animava, a segura certeza do caminho a seguir forçava-nos a querê-lo a nosso lado, contra tudo e contra todos.
De caçadores n.º 5, que organizáramos e de que fizéramos o nosso Alcáçar, se ergueram os primeiros brados por
Salazar. A princípio mal ouvidos no meio do tumultuar das paixões, soaram depois como vibrantes toques de clarim, ecoando como aleluias no coração dos melhores e lançando a perturbação nas hostes que já marchavam em cerradas colunas para a conquista do Poder.
Incapazes de vencer-nos pela razão ou em luta em campo raso, cara a cara, as forças adversas lançam mão das armas da calúnia e da intriga para esmagarem os nossos sonhos, as nossas ansiedades.
E começaram então a correr, de lês a lês, as mais torpes misérias em redor de caçadores n.º 5.
Nós não ouvíamos! Nós nada sentíamos!
De olhos postos no altar da Pátria, só pensávamos no cumprimento da missão que nos impuséramos, e dia a dia mais firmemente clamávamos por Salazar.
Mas um dia - bem triste dia - ouvimos dizer que constava por toda a parte que nos íamos revoltar.
sentava-se à nossa mesa e vivia sob as nossas telhas, desde os alvores da Revolução, o Ministro da Guerra coronel Passos e Sousa.
Ao sabermos da calúnia que nos era assacada procurámo-lo logo, no nosso quartel, na nossa casa, para lhe afirmar a nossa estranheza pelo que se dizia e para lhe pedirmos que dispusesse de nós em tudo, até das nossas vidas, como penhor da lealdade e da disciplina com que servíamos, embora na certeza da nossa fé e da nossa esperança inquebrantáveis em Salazar.
O Ministro da Guerra, em resposta, confessou-nos a confiança que em nós depositava, a par da amizade que nos tinha.
Mas ... poucas horas depois o batalhão de caçadores n.º 5 era dissolvido e os oficiais partiam, sob prisão, para vários lados.
Sem armas, sem soldados, vergados sob o peso da calúnia, nem assim nos considerávamos vencidos e não curvámos a cerviz para aceitar as sugestões aliciantes dum honroso regresso ao passado.
Salazar continuava a ser o fulcro em que apoiávamos toda a esperança na realização dos nossos sonhos.
Ele nem o sonhava, talvez! Mas foi assim.
E deu-se aos detentores do Poder a lição, que não era nova, que é de sempre: «Vitória e derrota são palavras vazias de sentido se só a conquista ou a perda de bens materiais alcançam».
Pouco tempo depois era reorganizado caçadores n.º 5 e não tardou que Salazar viesse ocupar o seu lugar - para honra nossa e glória de Portugal.
Verificou-se, assim, que não é de aplicar à gente da Revolução Nacional o velho aforismo, que os que vêm depois, ou melhor, os que se instalam depois, se comprazem em bolsar sobre a vanguarda: «A primeira linha é para queimar».
Quando ouço falar na extinção das unidades de caçadores, não posso deixar de recordar os primeiros passos do regime republicano e os dias em que estivemos a ferros por querermos, acima de tudo, Salazar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados:
Não sei se terei conseguido demonstrar que é um erro a extinção das unidades de caçadores.
Eu não tenho dúvidas a tal respeito.
8e as tivesse, recordaria uma frase do Sr. Dr. Mário de Figueiredo que traduz o caminho do bom senso e os nossos sentimentos de leal colaboração com os Poderes Públicos: «Na dúvida, voto com o Governo».
Disse.

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão a base VII.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Em primeiro lugar quero pôr esta questão: o § 2.º da base VII faz alusão directa ao mapa anexo, de sorte que não sei se V. Ex.ª, Sr. Presidente, desejará que esse mapa anexo seja discutido ao mesmo tempo que se discute a base VII, ou se V. Ex.ª desejará que se vote a base VII, deixando em suspenso qualquer solução relativamente ao mesmo anexo.

O Sr. Presidente: - Quanto a essa questão, penso que podemos discutir agora o § 2.ª do base VII. E, como nele se diz que «As forças militares ... terão a constituição e composição a fixar na lei de quadros e efectivos das forças ultramarinas», nessa altura discutir-se-á o referido mapa anexo, sem que a posição que se tome quanto a esta base prejudique a sua liberdade de apreciação do anexo.
Creio que poderemos seguir aquele método sem qualquer inconveniente.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Disse o Sr. Deputado Ribeiro Cazaes que, na dúvida parafraseando, de resto, uma afirmação que costumo fazer diferentes vezes -, votava com o Governo.
Realmente costumo dizer isso. Quando eu mesmo não conseguir por mim formar a minha consciência por maneira a ter de votar neste ou naquele sentido, voto com o Governo. Presto um voto de confiança em quem já pensou na mesma questão em que eu estava a pensar e decidiu em certo sentido. Primeiro ponto.
Segundo ponto: espero que toda a Câmara acredite que, enquanto não disser que estou aqui a exprimir um pensamento do Governo, quando exprimo um pensamento, esse pensamento é não só meu mas também do Governo, enquanto eu não disser o contrário.
Se, portanto, eu não votar o mapa anexo nos termos em que aparece na proposta do Governo, isso não significa que estou a votar contra o Governo. Significa que estou a votar contra o pensamento expresso pelo Governo na proposta, mas não contra o pensamento do Governo, que pode ter-se modificado entre o momento em que enviou a proposta e o momento em que ela está a ser discutida.
Terceiro ponto: desde que V. Ex.ª entende, e suponho que bem, que o quadro anexo pode discutir-se separadamente, este terceiro ponto reservar-me-ei para discutir então.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se a base VII do parecer da Câmara Corporativa com a alteração apresentada pelo Sr. Deputado Frederico Vilar, e que já foi lida.
Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vou pôr agora em discussão, conjuntamente, as bases viu e IX, em relação às quais não existe na Mesa qualquer proposta de alteração.
Estão em discussão.

O Sr. Castilho Noronha: - Apreciando a base IX, quero, antes de mais nada, exprimir o meu sincero e caloroso aplauso à ideia fundamental e basilar da proposta - unificação da organização militar em todo o território nacional. A proposta não dissimula que se quer

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prosseguir na política de repúdio de diferenças, de distinções odiosas, que, sendo contrárias aos altos e salutares princípios consagrados na nossa Constituição, iriam desfazer a homogeneidade que importa haver na organização do Exército.
A esta elevada finalidade visou a Lei n.º 2 034, de 18 de Julho de 1949, ao contrário do que estabelecia a Lei n.º 1 961, de 1 de Setembro de 1937, permitindo o ingresso na Escola do Exército só aos portugueses de ascendência europeia.
Eram inadmissíveis as restrições impostas aos naturais das províncias ultramarinas.
O Decreto n.º 23 060, de 26 de Setembro de 1933, dispondo no § 2.º do artigo 1.º que os mancebos filhos de pais e mães europeus e de pais não europeus eram obrigados à prestação de serviço na província ultramarina da sua naturalidade, estatuía no § n.º do mesmo artigo 1.º:

Os mancebos que forem apurados definitivamente deverão requerer ao governador da colónia da sua naturalidade adiamento da sua incorporação, fazendo acompanhar o requerimento de um cheque da importância da taxa militar que estiver estabelecida na referida colónia.

Quer isto dizer que nas províncias ultramarinas ainda os mancebos apurados definitivamente não podiam ser incorporados. Para eles, a prestação do serviço militar era substituída pelo pagamento de uma taxa.
Não pode ir mais longe a desigualdade de situação em que eles eram colocados. A taxa que se lhes exigia era o preço por que expiavam o não terem nascido na metrópole?
Um mancebo nascido numa província ultramarina podia reunir todas as condições para a prestação do serviço militar. Ainda mais: podia estar animado da melhor boa vontade para contribuir com o seu esforço para o bem da Pátria. Nada disso lhe valia. A lei embargava-lhe o passo, não o admitindo para o serviço militar.
E o pior é que o pagamento de unia tal taxa não lhe dava nenhum direito fora da terra da sua naturalidade, nem na metrópole nem em outra província ultramarina.
Hoje, felizmente, é bem outra a situação dos naturais das províncias ultramarinas. A já citada Lei n.º 2 034 e mais a Lei n.º 2 056, que ainda este ano foi votada pela Assembleia Nacional, e promulgada em Junho último, orientaram-se, numa tão momentosa e delicada questão, pela política igualitária, a única admissível em face da Constituição.
É à mesma sadia orientação que obedece a proposta em discussão, que na base IX, entre outras coisas, dispõe:

Nas escolas metropolitanas da formação dos quadros poderão ser admitidos naturais das províncias ultramarinas que satisfaçam às condições previstas na lei.
Conforme o desenvolvimento e possibilidade de cada colónia, poderão ser nela organizados cursos de sargentos dos quadros permanentes e de complemento.
A disposição que acabo de ler reconhece aos naturais das províncias ultramarinas o direito de acesso aos postos mais altos no Exército. A cor e a raça deixaram de ser óbices para a ascensão na carreira militar.
Devo, porém, dizer que a base XXV parece afastar-se um tanto da doutrina em que se inspirou a disposição da base IX que transcrevi.
Enquanto nesta se dispõe que nas escolas metropolitanas de formação de quadros poderão ser admitidos naturais das províncias ultramarinas que satisfaçam às condições previstas na lei, naquela estabelece-se que os indivíduos de ascendência europeia que satisfaçam às condições gerais para prestação de serviço militar poderão ser convocados, nos termos das disposições em vigor na metrópole, para as tropas ou para os cursos especiais de preparação militar.
Porque é que os naturais das províncias ultramarinas não poderão ser convocados, tão bem como os indivíduos de ascendência europeia, para as tropas ou para os cursos especiais de preparação militar? E isto tanto mais quanto é certo, como se acentua no lúcido parecer da Câmara Corporativa, que no exército português da metrópole houve e há oficiais de ascendência não europeia, tendo alguns chegado ao generalato.
Mas estarei em erro quando vejo divergência entre as duas bases a que me refiro? Oxalá que assim seja.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: Continuam em discussão as bases VIII e IX.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai proceder-se à votação.
Submetidas à votação, foram aprovadas as bases VIII e IX conforme o texto da Câmara Corporativa.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a base X do parecer da Câmara Corporativa.
Relativamente a esta base há na Mesa uma proposta do Sr. Deputado Frederico Vilar propondo a sua substituição pela base x da proposta do Governo, com as palavras: «nas províncias ultramarinas», em vez de: «nas províncias de Angola e Moçambique».

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado pediu a palavra, vai proceder-se à votação.
Submetida à votação, foi aprovada a base s. conforme o texto da proposta de lei e de harmonia com a proposta de alteração apresentada pelo Sr. Deputado Frederico Vilar.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a base XI do parecer da Câmara Corporativa.
Sobre esta base não há na Mesa qualquer proposta do alteração.
Em virtude do adiantado da hora, vou encerrar a sessão.
A discussão na especialidade continua amanhã.
Se houver tempo, iniciar-se-á ainda a discussão da proposta que regula o exercício da actividade bancária no ultramar.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

António Carlos Borges.
António Maria da Silva.
Délio Nobre Santos.
Jorge Botelho Moniz.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel Maria Múrias Júnior.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Abel Maria Castro de Lacerda.
António de Almeida.
António Calheiros Lopes.

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Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Avelino de Sousa Campos.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Joaquim de Moura Relvas.
José Cardoso de Matos.
José Dias de Araújo Correia.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Finto Meneres.
José dos Santos Bessa.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Marques Teixeira.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Sebastião Garcia Ramires.
Vasco de Campos.

O REDACTOR - Luís de Avillez.

Proposta a que se referiu o Sr. Presidente no princípio da sessão de hoje:

Lei Orgânica do Ultramar

TITULO I

Princípios fundamentais

Artigo 1.º - I. O ultramar português, como parte integrante do território da Nação, abrange as parcelas do mesmo território indicadas nos n.ºs 2.º a 5.º da Constituição e compõe-se de oito províncias ultramarinas, correspondentes à situação geográfica e à tradição histórica.
II. A extensão e os limites de cada uma das províncias ultramarinas constam da lei e dos tratados ou convenções internacionais que lhes digam respeito.
Art. 2.º - I. A organização política e administrativa do ultramar deve ajustar-se à estrutura unitária & corporativa do Estado Português.
II. Essa organização será baseada na igualdade dos cidadãos perante a lei, sem quaisquer distinções, no livre acesso de todas as classes aos benefícios da civilização e na interferência de todos os elementos estruturais da Nação na vida administrativa e na feitura das leis, pelo modo que a lei determinar e atendendo aos regimes especiais ou transitórios previstos nos capítulos n e III do título vil da parte n da Constituição.

TITULO II

Organização geral

CAPITULO I

Sistema legislativo

3.º - I. Conforme o artigo 149.º da Constituição, em regra as províncias ultramarinas regem-se por legislação especial.
II. A legislação, quer comum quer especial, destinada ao ultramar deve emanar dos órgãos legislativos
indicados nos artigos 150.º e 151.º da Constituição, segundo as normas de competência estabelecidas nos mesmos artigos e na presente lei orgânica.
Art. 4.º- I. A competência legislativa do Ministro do Ultramar abrange todas as matérias que representem interesses superiores ou gerais da política nacional no ultramar ou sejam comuns a mais de uma província ultramarina.
II. Especificadamente declaram-se incluídos na competência legislativa própria deste Ministro os diplomas destinados ao ultramar e concernentes aos assuntos seguintes:

a) O exercício dos direitos, liberdades e garantias a que se referem os capítulos n e m do título VII da parte II da Constituição;
6) As normas especiais de constituição e funcionamento dos organismos corporativos, a que faz referência o § único do artigo 17.º da Constituição, bem como o regime geral das pessoas colectivas de utilidade pública administrativa;
c) A aprovação, nos termos do § 1.º do artigo 151.º da Constituição, dos acordos ou convenções que os governos das províncias ultramarinas negociarem entre si ou com os governos de territórios estrangeiros, neste caso com a concordância do Ministro dos Negócios Estrangeiros;
d) A organização geral dos serviços públicos e especialmente as normas de composição dos quadros de pessoal e do seu provimento;
e) O estatuto político-administrativo de cada uma das províncias ultramarinas;
f) As normas gerais da administração financeira das províncias ultramarinas, incluindo a dos seus serviços comuns, serviços autónomos e' autarquias locais;
g) O estatuto dos funcionários públicos não abrangidos por estatutos especiais que lhes sejam aplicáveis em todo o território nacional, compreendendo naquele os normas gerais de ingresso e de permanência na função pública, seu regime disciplinar, de vencimentos, de aposentação e demais direitos e deveres inerentes à qualidade de funcionário público;
h) A regulamentação das leis votadas pela Assembleia Nacional, nos casos da sua competência, quando dela carecerem;
i) A aprovação do regime jurídico das obras ou planos de urbanização ou de fomento, e respectivos financiamentos, que envolvam a utilização de bens do domínio público do Estado ou acarretem encargos superiores às receitas ordinárias, no respectivo ano disponíveis, da província ou do serviço autónomo a que respeitem;
y) A regulação dos assuntos em que os governadores-gerais discordarem do que tiver sido votado pêlos Conselhos Legislativos ou os governadores das restantes províncias do voto dos respectivos Conselhos de Governo.
III. Quando os problemas a resolver forem de interesse predominantemente local, o Ministro do Ultramar poderá mediante portaria, a título temporário ou permanente nas sempre revogável e sob dependência da sua confirmação, autorizar os Governos das províncias ultramarinas a publicar preceitos reguladores da composição, recrutamento, atribuições e vencimentos ou salários ou outras formas de retribuição do pessoal dos quadros provinciais ou complementares dos seus serviços públicos, contanto que tais preceitos se conformem com a organização geral do ramo de serviço público de que, respectivamente, aquele pessoal depender ou a cujo quadro comum tiver acesso.
Art. 5.º - I. A competência legislativa do Ministro do Ultramar será exercida normalmente precedendo parecer do Conselho Ultramarino.

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938 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 163

II. Desta regra exceptuam-se os casos seguintes:

a) Os de urgência, como tais declarados e justificados no preâmbulo do decreto;
b) Se o Conselho demorar por mais de trinta dias o parecer sobre a consulta que lhe haja sido feita pelo Ministro;
c) Quando sobre o mesmo assunto já tiver sido consultada a Câmara Corporativa, nos termos do artigo 103.º da Constituição;
d) Se a providência a publicar for objecto de portaria, salvo o disposto nos artigos 7.º, 27.º e 43.º, n.º III, alínea a);
c) Quando o Ministro estiver exercendo as suas funções em qualquer das províncias ultramarinas e aí tomar as providências que lhe competirem por meio de diploma legislativo ministerial, conforme a segunda parte do § 1.º do artigo 150.º da Constituição.
Art. 6.º O Conselho Ultramarino tem a organização e as atribuições definidas em diploma especial.
Art. 7.º - I. Precedendo parecer do Conselho Ultramarino, salvo nos casos das alíneas a), 6) e e) do n.º n do artigo 5.º, o Ministro do Ultramar pode anular ou revogar, no todo ou em parte, os diplomas legislativos dos Governos das províncias ultramarinas, quando os julgar ilegais ou inconvenientes para os interesses superiores da política nacional aio ultramar.
II. A anulação ou a revogação serão feitas em portaria publicada no Diário do Governo e obrigatoriamente transcrita no «Boletim Oficial» da respectiva província.
III. Os diplomas anulados são tidos como inexistentes desde a sua publicação, não podendo ser invocados nos tribunais ou repartições públicas.
IV. Antes de anular ou revogar qualquer diploma, o Ministro poderá ouvir o Governo da respectiva província, dando-lhe a conhecer os motivos de divergência, a fim de que o mesmo Governo possa prestar os esclarecimentos que julgar convenientes.
Art. 8.º - I. Nenhum texto legal vigorará no ultramar sem que provenha dos órgãos legislativos indicados nos artigos 150.º ou 151.º da Constituição, conforme as normas da sua competência.
II. Compete ao Ministro do Ultramar a publicação nas províncias ultramarinas dos actos legislativos que nelas hajam de vigorar, oriundos dos órgãos indicados no referido artigo 150.º
III. Nos termos do § 2.º do mencionado artigo 150.º, todos os diplomas para vigorar nas províncias ultramarinas carecem de conter a menção, aposta pelo Ministro do Ultramar, de que devem ser publicados no Boletim Oficial da província ou províncias onde hajam de executar-se. Nos diplomas que forem da iniciativa do Ministro do Ultramar basta a sua assinatura neles para autenticar simultaneamente a menção de publicação que a preceder; nos restantes diplomas a menção poderá ser aposta após as assinaturas e rubricada então pelo Ministro do Ultramar.
IV. A aplicação nas províncias ultramarinas de um acto legislativo já vigente na metrópole depende de portaria do Ministro do Ultramar, na qual poderão ser aditadas as normas regulamentares especialmente exigidas pela ordem jurídica ou pelas condições particulares das províncias em que o acto deva ser aplicado.
V. A publicação no Boletim Oficial das províncias ultramarinas de quaisquer disposições transcritas do Diário do Governo sem observância dos termos deste artigo não produzirá efeitos jurídicos, exceptuando os assentos do Supremo Tribunal de Justiça interpretativos da lei vigente no ultramar.
Art. 9.º - I. Os diplomas publicados no Diário do Governo para serem cumpridos nas províncias ultramarinas só entram em vigor nestas depois de transcritos
no respectivo Boletim Oficial. Essa transcrição será obrigatoriamente feita no primeiro número do Boletim Oficial que for publicado depois da chegada do Diário do Governo.
II. Os referidos diplomas só entram em vigor nas províncias, antes da sua publicação no Boletim Oficial, quando neles se declarar que se aplicam imediatamente o contiverem a menção de que trata o n.º in do artigo antecedente. Neste caso dar-se-á cumprimento à menção aposta com a transcrição ulterior no Boletim Oficial.
III. Em caso de urgência o diploma publicado no Diário do Governo será transmitido telegràficamente e logo reproduzido o seu texto no Boletim Oficial ou em suplemento a este.
IV. Salvo o disposto acerca do Diário do Governo, a obrigatoriedade dos diplomas publicados no Boletim Oficial das províncias ultramarinas nunca depende da sua inserção em quaisquer outras publicações.
Art. 10.º - I. Um Boletim Oficial será editado pelo Governo de cada uma das províncias ultramarinas, em regra semanalmente e de formato idêntico ao do Diário do Governo; nele serão publicados todos os diplomas que na respectiva província devam vigorar.
II. Os diplomas emanados da metrópole, ao serem publicados nas províncias ultramarinas, manterão a data e a menção de publicação constantes do Diário do Governo; os outros que tiverem a sua primeira publicação no Boletim Oficial de qualquer das províncias ultramarinas terão a data do Boletim que os inserir.
Art. 11.º Salvo declaração especial, nas províncias ultramarinas os actos legislativos entram em vigor no prazo de cinco dias, coutados a seguir ao da sua publicação no respectivo Boletim Oficial. Este prazo aplica-se na capital da província e na área do seu concelho, ou do seu distrito, onde houver esta divisão administrativa. Para o restante território o estatuto de cada uma das províncias ultramarinas poderá estabelecer prazos mais longos, consoante as distâncias e os meios de comunicação.

CAPITULO II

Governo e administração geral

SECÇÃO I

Governo Central

Art. 12.º - I. O Governo superintende e fiscaliza o conjunto da administração das províncias ultramarinas, nos termos da Constituição e da presente lei, por intermédio dos órgãos na mesma lei indicados.
II. Ao Conselho de Ministros pertence:
a) Nomear, reconduzir e exonerar antes do termo normal da comissão, sob proposta do Ministro do Ultramar, os governadores gerais e os governadores de província;
b) Exercer as atribuições referidas na alínea a) do n.º II do artigo 59.º e ma alínea a) do n.º I do artigo 73.º do presente diploma ou em outras leis.
III. Ao Presidente do Conselho de Ministros competem, relativamente ao ultramar, as atribuições gerais de que trata o artigo 108.º da Constituição, bem como as do artigo 113.º do mesmo diploma, aio respeitante às propostas que forem da competência do Ministro do Ultramar, conforme o n.º 1.º do artigo 150.º da Constituição.
IV. O Ministro do Ultramar tem a responsabilidade da política nacional no ultramar, pela parte da administração geral que lhe compete e como principal orientador e dirigente da acção dos Governos ultramarinos, para o que usará das atribuições resultantes da Constituição e da presente lei orgânica, sem prejuízo da

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cooperação intermínisterial, na esfera das atribuições de outros Ministros, as quais possam interessar a todo o território português, conforme a lei dispuser.
V. Em relação as serviços públicos cuja acção e cujos quadros estiverem unificados tem todo o território nacional, designadamente os serviços militares do Exército e da Marinha, a lei especificará as atribuições dos respectivos Ministros, na parte respeitante ao ultramar, bem como a interferência do Ministério do Ultramar e dos Governos das províncias ultramarinas na administração dos mesmos serviços.
Art. 13. No uso das suas funções executivas, orientadoras e fiscalizadoras, compete especialmente ao Ministro do Ultramar:
1.º Nomear, contratar, reconduzir, promover, transferir, conceder licenças registadas e ilimitadas, aposentar e exonerar ou demitir, nos termos legais, os funcionários dos quadros comuns dos serviços ultramarinos e do Ministério do Ultramar, e ainda os dos quadros complementares e provinciais ou privativos de qualquer província ou do Ministério sobre os quais, por lei, exerça essas atribuições;
2.º Exercer a acção disciplinar prevista na lei sobre os funcionários, quer do referido Ministério quer do ultramar, incluindo a faculdade de mandar apresentar no Ministério quaisquer funcionários, excepto os magistrados judiciais em exercício de judicatura, cuja presença, por grave razão de interesse público, seja inconveniente para o serviço na província onde estiverem colocados;
3.º Transferir ou promover nos termos legais os funcionários dos quadros provinciais e complementares de uma província ultramarina para os quadros de serviços idênticos de outra província, em regra mediante proposta ou parecer favorável dos governadores interessados;
4.º Aprovar, alterar ou rejeitar as propostas sobre assuntos da sua competência que lhe sejam apresentadas pêlos Governos das províncias ultramarinas;
5.º Autorizar, ouvidos 03 Governos das províncias interessadas ou sobre proposta destes e obtido o parecer das instâncias competentes:
a) A instalação de indústrias que dependam dos mercados externos da província, ou quanto a matérias-primas ou quanto à colocação dos seus produtos;
6) As concessões que envolvam a utilização de bens do domínio público do Estado ou o estabelecimento de comunicações com o exterior da província, bem como a emissão de obrigações das sociedades concessionárias;
c) As obras ou planos de urbanização ou de fomento que envolvam a destinação ou o aproveitamento de bens do domínio público do Estado ou acarretem encargos superiores às receitas ordinárias, no respectivo ano disponíveis, da província ou do serviço autónomo a que respeitem.
6.º Orientar e fiscalizar a organização e a execução dos orçamentos das províncias ultramarinas, nos termos legais, tomando em qualquer tempo as providências que julgar necessárias para assegurar o seu equilíbrio e a ordem financeira;
7.º Verificar pela forma e com a antecedência previstas na lei se concorrem as condições indispensáveis para a abertura de novos créditos, exceptuando os créditos extraordinários, por motivo grave e urgente, nos termos restritos que a mesma lei estabelecer;
8.º Autorizar os Governos dos províncias ultramarinas a negociar acordos ou convenções entre si ou com os governos de territórios estrangeiros, neste caso com a concordância do Ministro dos Negócios Estrangeiros;
9.º Ordenar inspecções, para fins disciplinares ou outros, a todos os serviços públicos do ultramar, quer do Estado quer dos corpos administrativos e pessoas colectivas de utilidade pública administrativa, bem como aos das administrações de interesse colectivo, a que se referem os artigos 59.º a 62.º da Constituição.
Art. 14.º O Ministro do Ultramar tem a faculdade de delegar nos governadores das províncias ultramarinas o exercício, a título temporário ou permanente, mas sempre revogável, dos poderes que lhe pertencem pelo disposto no n.º 1.º quanto a contratar funcionários e conceder licenças registadas) e na segunda parte do n.º 2.º e nas alíneas a] e c) do n.º 5.º do artigo antecedente.
Art. 15.º - I. O Ministro do Ultramar pode anular, revogar, reformar ou suspender as portarias e decisões dos governadores, bem como ordenar a interposição de recurso contencioso para o efeito de anulação de quaisquer direitos resultantes dessas portarias ou decisões, quando as considere ilegais ou contrárias a ordens ou instruções superiores.
II. As portarias ou decisões anuladas são tidas como inexistentes desde o seu início, não podendo ser invocadas nos tribunais ou repartições públicas.
III. A resolução do Ministro relativamente a portarias e decisões dos governadores que tiverem sido publicadas será tomada por meio de portaria inserta no Diário do Governo e obrigatoriamente transcrita no Boletim Oficial da respectiva província.

SECÇÃO II

Administração geral

Art. 16.º - I. A administração pública do território português do ultramar tem como sede o Ministério do Ultramar, organismo central da sua direcção na metrópole, e compreende os ramos de serviço que a lei determina, consoante a situação geográfica e o estado social e financeiro de cada uma das províncias ultramarinas.
II. Estes ramos de serviço, distribuídos segundo as exigências locais e a especialidade das suas funções, constituem organizações hierárquicas, subordinadas ao Ministério do Ultramar, por intermédio da autoridade do governador da respectiva província.
III. Nos casos previstos na lei podem as organizações hierárquicas ultramarinas funcionar como prolongamento das correspondentes organizações hierárquicas metropolitanas, para efeitos de recrutamento de pessoal experimentado, coordenação de métodos, utilização de laboratórios ou outras formas de assistência técnica, sem prejuízo do disposto no número antecedente ou mediante a intervenção do Ministério do Ultramar que a mesma- lei prescrever.
Art. 17.º - I. Cada uma das organizações hierárquicas estabelecidas por lei assenta num quadro geral de funcionalismo próprio, sujeito às regras de disciplina e de competência que a lei definir.
II. O quadro geral de cada uma das hierarquias compõe-se de dois escalões:
a) Quadro comum do ultramar;
6) Quadro provincial ou privativo do cada província ultramarina.
III. Pode a lei criar quadros complementares de qualquer destes escalões para completar a acção de determinados serviços em ramos especiais ou transitórios e eventuais da sua actividade.
IV. As organizações hierárquicas e de quadros de que trata este artigo compreendem os serviços do Ministério do Ultramar e dos organismos dele dependentes na metrópole, nos termos definidos por lei.
V. O disposto neste artigo não prejudica a faculdade de contratar ou assalariar pessoal além dos quadros, nos casos em que a lei expressamente o permitir.

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Art. 18 - I. Os quadros dos funcionários são os que constarem da lei e só estes poderão inscrever-se nas tabelas orçamentais.
II. Os quadros comuns e provinciais são permanentes; os quadros complementares são, em regra, temporários ou eventuais, extinguindo-se no fim da missão & que se destinam ou do tempo por que foram criados.
III. Em cada um dos ramos do serviço público o quadro comum do ultramar terá a composição estabelecida na respectiva lei orgânica, sob o critério de que pertencerão a esse quadro:
a) Os funcionários de categoria superior a primeiro-oficial, administrador de concelho ou circunscrição ou equivalente categoria, que se determinará, na falta de preceito expresso, pelo vencimento de categoria indicativo dela;
ò) Quaisquer outros funcionários para cujo provimento a lei exigir curso superior da especialidade, quando de outro modo não estiver determinado por lei.
IV. Os quadros complementares, que serão em regra providos por contrato ou em comissão, compreendem:

a) Os médicos das especialidades, das missões ou brigadas sanitárias eventualmente criadas e dos serviços locais de saúde que a lei determinar;
ò) Os funcionários eventuais dos caminhos de ferro, obras públicas e outros serviços técnicos;
c) O pessoal das brigadas ou missões com carácter temporário.
O restante pessoal não compreendido nos quadros comum ou complementar de qualquer serviço pertence ao quadro provincial ou privativo.
Art. 19.º - I. As despesas com o pessoal dos quadros comuns do ultramar serão pagas, em conjunto e na proporção das suas receitas orçamentais, pelas províncias ultramarinas onde funcionarem os serviços correspondentes a esses quadros.
II. A metrópole contribuirá para as despesas de pessoal dos quadres comuns do ultramar com a dotação orçamental necessária para o pagamento ao pessoal pertencente aos mesmos quadros comuns que estiver colocado no Ministério do Ultramar, nos termos do seu diploma orgânico.
III. Centralizar-se-á na Direcção-Geral de Fazenda do Ministério do Ultramar a contabilização das despesas com todo o pessoal a que se refere este artigo.
Art. 20.º - I. As nomeações para os quadros dos serviços públicos ultramarinos podem ser:

a) Interinas;
b) Provisórias;
c) Definitivas;
d) Em comissão.

II. As nomeações interinas obedecerão às seguintes regras, além de outras legalmente fixadas:

a) As dos quadros comuns ou complementares dos mesmos serão ordenadas pelo Ministro do Ultramar e as restantes pêlos governadores das províncias ultramarinas ou outras entidades a quem a lei conferir essa atribuição; todavia, em caso de inadiável urgência de serviço público, poderão ser feitas pelos referidos governadores mesmo quando o lugar a prover pertença aos quadros comuns ou seus complementares;
b) As ordenadas pelo Ministro do Ultramar valerão enquanto durarem as circunstâncias que as justificaram; as feitas pêlos governadores ou outras entidades caducam ao fim de um ano, salvas as excepções previstas na lei, e podem ser renovadas, mas, quando o cargo pertencer aos quadros comuns ou seus complementares, é precisa autorização do Ministro do Ultra-mar.
III. As nomeações de ingresso nos serviços públicos ultramarinos terão carácter provisório durante cinco anos, nos termos seguintes:
a) A nomeação inicial será por dois anos, de contínuo exercício, ainda que em diversos lugares do mesmo quadro;
b) Se o funcionário tiver boas informações, será reconduzido por mais três anos, nas mesmas condições do período anterior;
c) Os funcionários assim nomeados provisoriamente têm os deveres e direitos dos funcionários de nomeação definitiva, incluindo as promoções legais.
IV. Salvo o disposto para as nomeações em comissão, o funcionário será nomeado definitivamente, se o merecer, após cinco anos de exercício efectivo das funções, nos termos do número anterior, com dispensa de nova posse, devendo contar-se-lhe a antiguidade desde a primeira posse que haja tomado em virtude da nomeação provisória. Se for militar do Exército ou da Armada o funcionário a nomear definitivamente para cargo civil, a nomeação dependerá da sua desligação do serviço militar, autorizada pelo respectivo Ministro, sobre requerimento do interessado.
V. As nomeações em comissão conferem os direitos e impõem os deveres correspondentes aos cargos apenas durante o prazo da sua duração, sendo-lhes aplicáveis, além do mais que a lei dispuser, as regras seguintes:
a) As funções governativas e as de direcção ou chefia de serviços serão sempre exercidas em comissão por funcionários dos respectivos quadros a quem por lei competir ou por pessoas nomeadas fora dos mesmos quadros que reunam as condições especialmente previstas na lei;
b) Além do preceituado na alínea anterior, outras funções poderão ser exercidas em comissão, quer voluntária quer imposta por escala ou conveniência de serviço, conforme a lei dispuser;
c) Se outro prazo não estiver legalmente fixado, entender-se-á que as nomeações em comissão são válidas por dois anos, contados do dia da posse, podendo, todavia, haver recondução, por períodos iguais e sucessivos, se o Ministro do Ultramar assim o entender, em regra sobre proposta do governador da respectiva província ou da direcção-geral de que o serviço depender;
ã) Os funcionários nomeados em comissão não podem ser exonerados a seu pedido antes de findo o prazo dela ou de qualquer das suas renovações, salvo quando não houver inconveniente; mas em qualquer tempo pode a autoridade que os nomeou dar-lhes a exoneração por conveniência do serviço público;
e) Sem prejuízo do disposto na alínea a), o funcionário que não pertencia ao quadro em que serve em comissão não pode ser reconduzido mais do que três vezes no mesmo cargo; findos os quatro biénios de comissão, se o funcionário o merecer pelas qualidades que revelou e pelas boas informações obtidas, poderá ser nomeado definitivamente para a categoria que no quadro corresponder ao cargo exercido.
VI. No recrutamento dos funcionários adoptar-se-á em regra o sistema dos concursos de provas públicas.
Art. 21.º - I. Na administração das províncias ultramarinas é admitida a prestação de serviço por contrato nos casos seguintes:

a) No exercício anual de cargos incluídos nos quadros permanentes da administração pública, quando a lei reguladora do seu provimento o permitir;
b) No desempenho de funções ou realização de trabalhos com carácter eventual, quer nos quadros complementares dos serviços públicos, quer fora dos mesmos quadros, mas neste caso só quando a lei o permitir, ou, no silêncio desta, quando a autoridade a quem compita ordenar os mencionados, trabalhos entenda ser ne-

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cessário contratar pessoas de alta ou especial competência;
c) Na prestação de serviço ou trabalho assalariado ao dia ou ao mês, e em regra de natureza manual.
II. A lei estabelecerá o regime de cada uma destas formas de contrato, cuja celebração poderá ou não ser precedida de concurso público, conforme for julgado conveniente.
Art. 22.º - I. A organização militar é una para todo o território da Nação Portuguesa, nos termos do § único do artigo 53.º da Constituição.
II. Nas províncias ultramarinas o serviço militar é geral e obrigatório para todos os portugueses, determinando a lei a forma de ser prestado.
III. De acordo com as bases estabelecidas nos termos da alínea a) do artigo 93.º da Constituição, diplomas especiais organizarão os serviços militares no ultramar, com os regimes de transição ou outras adaptações que forem indispensáveis.
IV. Todas as organizações de serviços públicos das províncias ultramarinas, quer directamente administrados, quer concedidos, terão em vista as necessidades supremas da defesa do território, procurando adaptar-se a elas e facilitar a missão das instituições militares.
Art. 23.º A unidade de organização e de quadros de pessoal em todo o território português pode ser declarada extensiva a outros serviços públicos de carácter nacional por diplomas especiais, em que se ajustem as normas do seu funcionamento e se ressalvem as modalidades impostas por circunstâncias locais.

CAPITULO III

Tribunais

Art. 24.º - I. A função judicial é exercida no ultramar pêlos tribunais que o artigo 116.º da Constituição estabelece para todo o território português, os quais têm a organização e competência definidas na lei.
II. Atendendo à extensão do território ultramarino, a lei pode admitir juizes municipais, de competência limitada, em julgados compreendidos nas comarcas.
III. Onde não houver juizes municipais especialmente nomeados pode a autoridade administrativa do concelho ou circunscrição exercer as funções de juiz municipal, nos termos legais.
IV. Nas províncias do continente africano ao juiz municipal compete o julgamento das questões gentílicas, na forma definida por lei.
Art. 25.º-I. Como parte integrante do Estado, as províncias ultramarinas e os seus serviços públicos dotados de autonomia ou personalidade jurídica serão representados junto dos tribunais:

a) Feios agentes do Ministério Público, segundo a sua hierarquia;
b) Pêlos representantes legalmente designados junto dos tribunais especiais.
II. Em virtude da representação que lhes é atribuída, os procuradores da República e seus delegados cumprirão diligentemente, na defesa dos direitos e interesses das províncias ultramarinas, as instruções que pêlos respectivos governadores lhes forem transmitidas por escrito, salvo no respeitante à técnica jurídica ou processual.
III. As funções de consultor jurídico do governador são exercidas nas províncias de governo-geral pelo procurador da República e nas outras pelo seu delegado na comarca da capital ou pelo mais antigo dos delegados, se houver mais de um, competindo-lhe esclarecer, com o seu parecer escrito, todos os assuntos de ordem jurídica da administração pública e as dúvidas de interpretação ou de aplicação das leis sobre que o governador o mando ouvir.
Art. 26.º - I. Terão jurisdição no ultramar como tribunais administrativos:
a) O Supremo Tribunal Administrativo;
b) O Tribunal de Coutas;
e) Em cada província ultramarina um tribunal administrativo, que funciona na sua capital.
II. O Supremo Tribunal Administrativo exercerá a sua competência em todo o território nacional, nos termos legais, e resolverá as questões contenciosas da administração ultramarina, mediante recurso:

a) Dos actos do Governo, e em especial do Ministro do Ultramar, respeitantes àquela administração;
ò) Dos actos dos governadores-gerais ou de província, excepto em matéria disciplinar;
c) Das decisões dos tribunais administrativos das províncias ultramarinas.
III. Ao Tribunal de Contas compete:

a) Exercer as funções de exame e visto em relação aos actos e contratos da competência do Ministério do Ultramar;
b) Decidir, em recurso, as divergências entre os tribunais administrativos e os governadores das províncias ultramarinas em matéria de exame ou visto da competência daqueles tribunais;
c) Julgar, nos termos do artigo 171.º da Constituição, as contas anuais das províncias ultramarinas e as de outras entidades que a lei lhe atribuir;
d) Conhecer, em recurso, das decisões proferidas sobre contas pelos tribunais administrativos das províncias ultramarinas.
IV. Ao tribunal administrativo de cada uma das províncias ultramarinas compete:

a) Julgar os recursos dos actos ou deliberações que forem definitivos e executórios e não tenham natureza disciplinar das autoridades da província, com excepção do governador ou governador-geral, ou dos órgãos dirigentes ou representativos dos serviços autónomos, dos corpos administrativos e das pessoas colectivas de utilidade pública administrativa da província;
b) Decidir quaisquer outras questões contenciosas que digam respeito à administração da província e da sua Fazenda, nos termos que a lei determinar;
c) Julgar as contas dos corpos administrativos e das pessoas colectivas de utilidade pública administrativa e as demais que a lei indicar;
d) Emitir parecer sobre matéria de ordenamento de despesas ou assuntos relativos à administração da província, sempre que o governador o solicitar;
e) Exercer as funções de exame e visto relativamente aos actos e contratos que forem da competência das autoridades da província.
Art. 27.º - I. Fora dos casos regulados nos artigos 123.º, § único, e 150.º, § 3.º, da Constituição, sempre que nos tribunais das províncias ultramarinas se levantar o incidente da inconstitucionalidade de qualquer diploma ou regra de direito, quer por iniciativa das partes quer dos magistrados, se o tribunal entender que a arguição tem fundamento mandará logo subir o incidente em separado ao Conselho Ultramarino, para se pronunciar, observando-se os trâmites legais.
II. Sobre o parecer do Conselho Ultramarino o Ministro do Ultramar usará da faculdade que lhe confere o artigo 7.º da presente lei orgânica.
III. Se o parecer do Conselho Ultramarino for no sentido da improcedência da arguição e o Ministro o homologar, o seu despacho, que será transmitido pela via mais rápida, porá termo ao incidente.
Art. 28.º - I. Nas províncias ultramarinas não se ordenará nem cumprirá mais a pena de degredo, fi-

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cando revogadas quaisquer disposições gerais ou especiais em contrário.
II. Os estabelecimentos penais existentes ou que forem criados no ultramar integrar-se-ão no sistema prisional metropolitano, pela forma que a lei determinar, e terão por fim a defesa da sociedade e tanto quanto possível a readaptação social do delinquente, nos termos do artigo 124.º da (Constituição.
Art. 29.º - I. Na prevenção e repressão da criminalidade e na determinação das penas e medidas de segurança atender-se-á ao estado social das populações das províncias ultramarinas, conforme os estatutos especiais que a Constituição admite.
II. Os diplomas publicados pelos governos das províncias ultramarinas poderão cominar qualquer das penas correccionais, incluindo a multa até 5.000$ ou quantia equivalente em moeda local.

TITULO III

Organização provincial

CAPITULO I

Normas preliminares

Art. 30.º A unidade política será mantida pela existência na capital de cada uma das províncias ultramarinas de um governo-geral ou governo da província directamente subordinado ao Ministro do Ultramar.
Art. 31.º A descentralização administrativa e a autonomia financeira, garantidas pelo disposto no título vil da parte n da Constituição e que o regime geral da presente lei define e organiza de acordo com a situação geográfica e as condições do meio social das províncias ultramarinas, serão ajustadas ao estado de desenvolvimento e aos recursos de caia província, nos termos do estatuto que será promulgado para caída uma delas.
Art. 32.º - I. Conforme a tradição histórica e o preceito do artigo 1.º, n.º 4.º, da Constituição, a província portuguesa da índia designa-se «Estado da índia» e terá organização político-administrativa correspondente, sob a autoridade de um governador-geral do Estado.
II. Tanto a província ultramarina de Angola como a de Moçambique terão também governo-geral.
III. Em cada uma das restantes províncias ultramarina» haverá um governador, que acrescentará a este título apenas a designação geográfica da respectiva província.
Art. 33.º - I. Para os fins da administração local, as províncias ultramarinas dividem-se em concelhos. Transitoriamente, enquanto não for atingido o desenvolvimento económico e social previsto na lei, os concelhos podem ser substituídos por circunscrições administrativas nas regiões que o estatuto ida respectiva província indicar.
II. Onde o justifiquem a grandeza ou a descontinuidade do território e as conveniências da administração, os concelhos e circunscrições agrupam-se em distritos, sob a autoridade do governador do distrito, nos termos legais.
III. Os os distritos em que a política indígena assumir aspectos predominantes as circunscrições e as áreas não urbanizadas dos concelhos poderão também subordinar-se a intendências, para os fins da melhor direcção ou fiscalização da referida política.
IV. Os concelhos podem compor-se de freguesias, correspondentes às localidades que neles houver, com a população e as condições urbanas por lei exigidas.
V. As áreas dos concelhos que não constituírem freguesias, bem como, nas circunscrições, as áreas1 situadas fora da sede, serão atribuídas a postos administrativos, como centros de organização e protecção do povoamento ou para fins de soberania.
VI. A divisão administrativa de cada uma das províncias ultramarinas acompanhará as necessidades do seu progresso económico e social.
Art. 34.º Dando execução à presente lei orgânica e de acordo com ela, um estatuto especialmente promulgado para cada uma das províncias ultramarina* estabelecerá, tendo em conta as circunstâncias peculiares do seu território e população, a constituição e as atribuições dos respectivos órgãos de governo, a sua divisão administrativa, a natureza e a extensão ou desenvolvimento dos seus serviços públicos e das autarquias locais.

CAPITULO II

Governadores-gerais e de província

Art. 35.º - I. A nomeação dos governadores-gerais e de província é feita em Conselho de Ministros, sob proposta do Ministro do Ultramar. Recairá normalmente em indivíduo com curso superior, de mérito já revelado no exercício de cargos ou no estudo de assuntos relativos ao ultramar e que não tenha qualquer interesse na direcção ou gerência de empresas com sede ou actividade na província ultramarina.
II. A comissão dos governadores durará quatro anos, contados da data da publicação do decreto da sua nomeação no Diário do Governo.
III. A falta de recondução dos governadores, feita em decreto publicado trinta dias antes de terminar a comissão, tem o significado legal da exoneração de funções.
IV. A exoneração dos governadores antes de terminado o período da comissão, por a substituição ser conveniente ao serviço público ou a seu pedido, é feita em Conselho de Ministros, sob proposta do Ministro do Ultramar.
Art. 36.º - I. Na falta de governador ou durante a sua ausência da província, assumirá interinamente as funções governativas o vice-presidente do Conselho do Governo, na qualidade e sob a designação de «vice-governador» enquanto o Ministro do Ultramar não exercer a faculdade prevista no n.º II deste artigo.
II. O Ministro do Ultramar pode nomear um funcionário, militar ou civil, para assumir interinamente o governo da província como vice-governador. Esta nomeação será feita por simples despacho e, transmitida pela via mais rápida, será publicada no Boletim Oficial ou em suplemento dele e produzirá efeito durante a vacatura ou ausência, não excedendo um ano.
III. Durante o impedimento temporário do governador ou a sua ausência da sede da província, mas em território desta, o referido vice-presidente do Conselho do Governo representará e fará as vezes do governador, conforme as instruções que dele receber.
Art. 37.º - I. O governador é, em todo o território da respectiva província, o mais alto agente e representante do Governo da Nação Portuguesa, a autoridade superior a todas as outras que na província sirvam, tanto civis como militares, e o administrador superior da Fazenda Pública. Pelo exercício das suas funções responde perante o dito Governo e a verificação da legalidade dos seus actos está sujeita à jurisdição contenciosa.
II. Além do dever geral, inscrito no artigo 157.º da Constituição, e das atribuições que lhe possam ser outorgadas em circunstâncias excepcionais, nos precisos termos da segunda parte do artigo 154.º do mesmo diploma, cada um dos governadores das províncias ultramarinas terá as atribuições, faculdades e prerrogativas

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que forem discriminadas no estatuto da respectiva província, consoante as exigências da sua administração. III. Declarado que seja na província o estado de sítio, o governador poderá assumir, pelo tempo indispensável e sob a sua inteira responsabilidade, as funções de quaisquer órgãos legislativos ou executivos da província, dando imediatamente e pela via mais rápida conhecimento de tudo o que fizer ao Ministro do Ultramar.

CAPITULO III

Órgãos dos governos-gerais

SECÇÃO I

Conselho Legislativo

Art. 38.º A competência dos órgãos legislativos dos governos-gerais abrange todas as matérias que interessem exclusivamente à respectiva província e não estejam atribuídas pelo artigo 150.º da Constituição e pela presente lei à Assembleia Nacional, ao Governo ou ao Ministro do Ultramar.
Art. 39.º - I. A competência legislativa será exercida pelo governador-geral, conforme o voto de um conselho, denominado Conselho Legislativo, que funcionará na capital da província, nos termos do respectivo estatuto.
II. Sobre a regra antecedente prevalecem os preceitos especiais do n.º III do artigo 37.º e dos nem do artigo 43.º, devendo também considerar-se ressalvada a faculdade regulamentaria prevista na alínea a) do n.º II do artigo 45.º
Art. 40.º - I. Os Conselhos Legislativos são corpos electivos de representação adequada às condições do meio social, constituídos por vogais eleitos entre cidadãos portugueses que reunam os requisitos de elegibilidade indicados na lei.
II. O estatuto político do Estado da índia, além de fixar o número de vogais do Conselho, regulará também a sua eleição de modo a garantir representação:

a) Aos contribuintes do Estado que, sendo pessoas singulares ou colectivas de nacionalidade portuguesa, forem recenseados com o mínimo de contribuição directa pelo mesmo estatuto indicado;
6) Aos componentes das comunidades aldeãs e demais associações económicas ou organismos corporativos que funcionarem legalmente;
c) Aos colégios de eleitores do recenseamento geral dos círculos em que o território for dividido.
III. Os estatutos das províncias de Angola e de Moçambique, além de determinarem o número de vogais do Conselho Legislativo de cada uma delas, devem também regular a sua eleição de modo a garantir representação:

a) Aos contribuintes, pessoas singulares ou colectivas de nacionalidade portuguesa, que, por contribuição directa paga na província, estiverem recenseados com o mínimo fixado nos referidos estatutos;
b) Aos colégios de eleitores do recenseamento geral dos círculos em que o território for dividido;
c) À (população indígena, transitoriamente sem dependência de prévio recenseamento, procedendo à eleição dos seus. representantes o Conselho de Governo da província, com base nas listas que lhe serão propostas pêlos governadores de distrito, enquanto a lei não determinar de outro modo.
IV. Afora o caso da alínea e) que antecede, se os eleitores de qualquer das classes indicadas, devidamente convocados, não elegerem os vogais do Conselho Legislativo que a lei atribuir a sua representação, o governador-geral ordenará que, no prazo de trinta dias, se proceda a novas eleições, totais ou parciais, conforme o caso; e se ainda os não elegerem desta vez, elegê-los-á o Conselho de Governo, com base nas listas que lhe serão propostas pêlos governadores de distrito.
Art. 41.º - I. O Conselho Legislativo será presidido polo governador-geral ou .por quem suas vezes fizer, com a faculdade de fazer-se substituir pelo vice-presidente do Conselho de Governo quando entender.
II. As sessões do Conselho Legislativo poderão sempre assistir os vogais do Conselho de Governo, que terão o direito de apresentar propostas e tomar parte nas discussões, mas não votarão.
III. Em caso de empate, o presidente tem voto de qualidade, se dele quiser usar.
Art. 42.º - I. A todos os vogais do Conselho Legislativo, sem distinção, incumbe o dever de zelar pela integridade da Nação Portuguesa e pelo bem da respectiva província, promovendo o seu progresso moral e material.
II. Os referidos vogais são invioláveis pelas opiniões e votos que emitirem no exercício do seu mandato, salvas as restrições que a lei indicar. O estatuto da província estabelecerá penalidades que lhes podem ser aplicadas, inclusive a de expulsão, sem prejuízo da responsabilidade civil e criminal que resultar da lei geral.
III. Por proposta do governador-geral, fundamentada em razões de interesse superior, o Ministro do Ultramar pode decretar a dissolução do Conselho Legislativo, e nesse caso mandará proceder a novas eleições dentro do prazo de sessenta dias, que pode prorrogar até seis meses quando novas razões da mesma natureza o aconselharem.
Art. 43.º - I. O governador-geral determinará a providência que tiver sido aprovada peio Conselho Legislativo por meio lie diploma legislativo, cuja publicação ordenará dentro dos quinze dias seguintes àquele em que o projecto estiver pronto para a sua assinatura.
II. Se o governador-geral não concordar com o que foi aprovado pelo Conselho, adiará a publicação e submeterá logo o assunto a resolução do Ministro do Ultramar, expondo-lhe os motivos da sua divergência
III. O Ministro, depois de ouvido o Conselho Ultramarino, salvo aros casos das alíneas a), b) e e) do n.º n do artigo 5.º, poderá:
a) Aplicar à resolução do Conselho Legislativo o disposto no artigo 7.º quando entender que se verifica algum dos fundamentos no mesmo artigo indicados, e, neste caso, se o projecto for declarado sem efeito apenas parcialmente, poderá autorizar o governador-geral a promulgar a parte válida, sem prejuízo de a outra, devidamente modificada, poder voltar à apreciação do Conselho como novo projecto;
b) Usar da sua competência legislativa e estabelecer sobre o mesmo assunto as bases jurídicas que entender convenientes, sem prejuízo da faculdade regulamentaria do governador.

SECÇÃO II

Conselho de Governo

Art. 44.º - I. Junto do governador-geral, e sob a sua presidência ou de quem suas vezes fizer, funcionará um Conselho de Governo, com atribuições consultivas permanentes.
II. Compõem o Conselho de Governo os vogais seguintes:

a) Secretário-geral;
b) Comandante militar;
c) Procurador da República;
d) Director dos Serviços de Fazenda;
e) Dois vogais nomeados anualmente pelo governador-geral, podendo a escolha recair em funcionários

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públicos ou em outros cidadãos, de reconhecida idoneidade, residentes na província.
III. O secretário-geral é o vice-presidente do Conselho de Governo e substituí-lo-á nestas funções, em caso da sua falta, ausência ou impedimento, o vogal oficial mais antigo no Conselho.
IV. Nas suas faltas, ausências ou impedimentos, os vogais do Conselho são substituídos pêlos directores de serviços designados pelo governador-geral e, quando não houver designação, pêlos seus substitutos na função pública os que forem funcionários, ou por suplentes nomeados os restantes.
Art. 45.º - I. O Conselho do Governo assistirá o governador-geral no exercício das suas funções e emitirá parecer sobre todos os assuntos respeitantes ao governo e administração da província previstos na lei ou que aquele julgar conveniente apresentar-lhe.
II. Salvo no caso restrito do n.º III do artigo 37.º, o governador-geral deverá ouvir o Conselho de Governo ao exercer as atribuições seguintes:
a) Regulamentar a execução das leis, decretos e mais diplomas vigentes na província que disso careçam;
6) Organizar o orçamento da província na fase da avaliação das receitas e demais recursos financeiros, bem como ao fixar as despesas em execução do diploma legislativo que anualmente estabelecer os princípios a que deve subordinar-se o mesmo orçamento e da orientação que o Ministro do Ultramar tenha definido conforme a sua competência;
c) Declarar provisoriamente o estado de sítio em todo ou em parte do território da província no caso de agressão estrangeira ou de grave perturbação interna, dando imediato conhecimento ao Ministro do Ultramar pela via mais rápida;
d) Exercer a acção tutelar prevista na lei sobre os corpos administrativos e as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa.
III. O estatuto de cada província especificará outras funções que o governador-geral deva exercer com o voto consultivo do Conselho de Governo.
IV. O governador-geral pode discordar da opinião do Conselho e providenciar como entender mais conveniente.

CAPITULO IV

Órgãos dos governos de província

Art. 46.º Na sede do Governo das províncias ultramarinas de Cabo Verde, Guiné, S/Tomé e Príncipe, Macau e Timor, e sob a presidência do governador da província ou de quem suas vezes fizer, funcionará um Conselho de Governo, com as atribuições legislativas e executivas que constarem da lei.
Art. 47.º - I. O Conselho de Governo será ouvido pelo governador para o exercício da competência legislativa que o artigo 151.º da Constituição lhe confere, tendo em vista o disposto na presente lei e no estatuto da respectiva província.
II. Uma secção do mesmo Conselho assistirá permanentemente o governador no exercício das suas restantes funções, nos termos que o estatuto de cada uma das províncias determinar.
III. O Conselho de Governo ou a sua secção permanente emitirão parecer sobre todos os assuntos respeitantes ao governo e administração da província que para esse fim forem apresentados pelo governador.
Art. 48.º - I. O governador submeterá ao Ministro do Ultramar a resolução dos assuntos de ordem legislativa em que se não conformar com o voto do Conselho de Governo e proceder-se-á então nos termos dos n.04 n e III do artigo 43.º
II. Quanto aos assuntos de outra natureza será aplicável o disposto no n.º iv do artigo 45.º
Art. 49.º - I. Os Conselhos de Governo das províncias de Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe, Macau e Timor compor-se-ão de vogais oficiais, natos ou designados pelo governador, e de vogais não oficiais, nomeados pelo governador ou eleitos.
II. No estatuto de cada província, atendendo às condições do meio social, será regulada, a forma de constituição e de funcionamento do Conselho de Governo e da sua secção permanente.
III. O governador procurará escolher os vogais não oficiais que lhe couber nomear de modo a dar representação no Conselho aos organismos ou aos sectores da população de considerável importância na economia e na vida pública da província que não tiverem voto nos colégios eleitorais. Para tanto, alguns dos requisitos que a lei geral exigir para ser eleito vogal do Conselho poderão ser dispensados transitoriamente:
a) Em Macau, aos representantes da comunidade chinesa;
b) Nas províncias de Guine, S. Tomé e Príncipe e Timor, aos representantes da população não europeia.

CAPITULO V

Serviços públicos

Art. 50.º - I. Os serviços públicos, quer pertençam à administração ultramarina, quer estejam integrados na organização, mais geral, da administração de todo o território português, devem corresponder em cada província ultramarina' ao estado de desenvolvimento desta e às circunstâncias peculiares do seu território.
II. Sem prejuízo do disposto em leis especiais, o estatuto de cada província ultramarina indicará a natureza dos serviços públicos que nela hão-de funcionar e a extensão que lhes é atribuída de acordo com as normas gerais de organização dos respectivos ramos $e> serviço vigentes no ultramar.
Art. 51.º - I. Na capital de cada província ultramarina, e sob a autoridade do respectivo governador, haverá organismos dirigentes de cada um dos ramos de serviço de administração pública, que terão a categoria e denominação de direcções provinciais nas províncias de governo-geral e de repartições provinciais nas outras províncias, com as excepções seguintes:
a) O gabinete, cujas funções especiais são exercidas sob as directas ordens do governador;
b) A secretaria-geral, que tratará dos assuntos de administração política e civil e poderá superintender em outros que interessem a mais de um ramo de serviço ou não tenham organismo directivo suficientemente categorizado, tais como a Imprensa Nacional, a estatística ou o ensino, conforme o estatuto de cada província determinar;
c) Os serviços militares, os serviços autónomos e os organismos de coordenação económica, que se regerão por diplomas especiais.
II. Quando o interesse financeiro da província e a afinidade dos problemas o aconselharem, poderá determinar-se que a mesma direcção ou repartição provincial reuna mais de um ramo de serviço.
Art. 52.º - I. A comunicação oficial entre as províncias ultramarinas e a metrópole e entre esta e aquelas far-se-á normalmente por intermédio do Ministério do Ultramar.
II. Toda a correspondência oficial deste Ministério será dirigida aos governadores das províncias ultramarinas, e, inversamente, toda a correspondência oficial das províncias ultramarinas deverá ser dirigida ao Mi-

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nistro do Ultramar pelos governadores ou por sua delegação.
III. Nenhum outro funcionário ou organismo público das províncias ultramarinas pode corresponder-se directamente como Governo Central, excepto:
a) Os tribunais, em matéria de recursos ou outros actos do serviço judicial;
b) Os inspectores superiores e outros funcionários de igual ou mais elevada categoria, durante a inspecção ou o desempenho dia missão de que forem incumbidos;
c) Os serviços militares ou outros que estiverem integrados nas correspondentes organizações metropolitanas, nos termos de diplomas especiais em que será regulado o funcionamento no Ministério do Ultramar e nos outros Ministérios interessados de organismos de ligação para facilitar a cooperação interministerial e o expediente daí resultante.
IV. Diplomas regulamentares definirão as diferentes classes de correspondência e a forma da sua transmissão, podendo admitir a comunicação directa e simplificada de dados estatísticos ou meteorológicos e de outros actos de mero expediente.

CAPITULO VI

Património e regime financeiro

SECÇÃO I

Direitos patrimoniais

Art. 53.º As províncias ultramarinas são pessoas colectivas de direito público. Para o exercício dos direitos e cumprimento das obrigações inerentes à personalidade jurídica, na ordem civil, elas estão incluídas entre as pessoas morais a que se refere o artigo 37.º do Código Civil Português.
Art. 54.º Como pessoas colectivas, as províncias ultramarinas têm os direitos patrimoniais que lhes são atribuídos no capítulo vi do título VII da parte II da Constituição, para cujo exercício dispõem das faculdades reconhecidas pela mesma Constituição e pela presente lei orgânica, sujeitas às condições expressas nestes dois diplomas ou em outras leis e sob a fiscalização dos órgãos da soberania.
Art. 55.º - I. A lei regula os poderes que sobre os bens do domínio público do Estado são exercidos pelos governos das províncias ultramarinas e pelos seus serviços autónomos ou dotados de personalidade jurídica.
II. Os bens pertencentes ao património das províncias ultramarinas gozarão do mesmo regime aplicável aos bens do domínio público ou privado do Estado, consoante o seu destino, salvo o regime especial dos terrenos vagos.

SECÇÃO II

Receitas públicas

Art. 56.º - I. São receitas próprias de cada província ultramarina:

a) Os impostos, contribuições ou taxas que vigorarem no seu território e ainda os que, cobrados fora dele, lhe pertençam por disposição expressa da lei, salvo o disposto no artigo seguinte e o que na lei se preceituar acerca dos corpos administrativos;
b) Os rendimentos, juros ou lucros que directa ou indirectamente provenham da posse, exploração ou concessão, nos termos legais, dos bens do seu património;
c) Os rendimentos ou lucros das explorações ou concessões de bens do domínio público autorizadas pelo Estado no território da província, quando esta assumir os correspondentes encargos, conforme a lei determinar;
d) O produto da liquidação das heranças, espólios ou outros bens abandonados existentes no seu território e que a lei mande atribuir ao Estado.
II. São receitas comuns das províncias ultramarinas as resultantes de bens ou serviços comuns ou consignadas a fundos da mesma natureza.
Art. 57.º O Tesouro da metrópole apenas arrecadará, conforme a lei, provenientes do ultramar:

a) Uma contribuição para a defesa nacional incluindo os impostos ou taxas criados para esse fim;
b) As taxas, rendimentos ou comparticipações de serviços ou concessões que o Tesouro metropolitano custear ou garantir;
c) Os juros e amortizações da assistência financeira prestada às províncias ultramarinas.
Art. 58.º - I. Só podem ser lançadas e cobradas as contribuições e demais receitas públicas que tiverem sido autorizadas na forma legal e estiverem inscritas nas tabelas orçamentais, salvo se forem posteriormente criadas ou autorizadas.
II. Nas províncias ultramarinas todas as receitas públicas de qualquer natureza ou proveniência, com ou sem aplicação especial, serão entregues na respectiva caixa do Tesouro, salvo disposição expressa de lei em contrário, e, como receita geral do orçamento da província, serão descritas nas suas contas públicas, em harmonia com a lei.
III. Só com autorização do Ministro do Ultramar poderão constituir-se fundos especialmente consignados a determinados fins.
Art. -59.º - I. A assistência financeira de que as províncias ultramarinas carecerem, por meio de empréstimos amortizáveis ou por outras formas de financiamento, efectuar-se-á nos precisos termos dos artigos 172.º a 174.ºº da Constituição e tendo em vista o § 2.º do artigo 167.º do mesmo diploma.
II. Os empréstimos são da iniciativa e competência dos Governos das províncias ultramarinas e só podem ser validamente contraídos nos termos da lei, dependendo de prévia autorização os seguintes:
a) Do Conselho de Ministros, os que exigirem caução ou garantias especiais;
6) Do Ministro do Ultramar, outros empréstimos de que resultem encargos superiores às receitas ordinárias, no respectivo ano disponíveis, da província ou do serviço autónomo a que respeitem.
III. Relativamente a obras ou planos de urbanização ou de fomento que forem da competência do Ministro do Ultramar ou do Governo, poderão estes providenciar acerca do respectivo financiamento, por sua iniciativa ou mediante proposta dos Governos das províncias ultramarinas.

SECÇÃO III

Despesas públicas

Art. 60.º Constituem encargo do Tesouro da metrópole em relação ao ultramar:
a) A dotação necessária para manter o Ministério do Ultramar e os organismos dele dependentes na metrópole que a lei indicar;
6) As despesas relativas à defesa nacional e à delimitação de fronteiras ou a outras de carácter internacional, as de comparticipação no povoamento e na investigação científica e as de propaganda da cultura portuguesa e da expansão da influência nacional no ultramar;
c) A dotação do Padroado do Oriente e os subsídios às corporações missionárias reconhecidas e aos estabelecimentos de formação do pessoal para os serviços das missões católicas portuguesas e do Padroado;
d) As despesas da residência de S. João Baptista de Ajuda e de outros estabelecimentos ou serviços que, embora funcionando no ultramar, estejam integrados nas organizações hierárquicas da metrópole;

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e) Os subsídios totais ou parciais a empresas de navegação marítima ou aérea ou de outros meios de comunicação com o ultramar.
Art. 61.º Todas as outras despesas de administração ultramarina ficam a cargo da província ou províncias a que respeitem. Designadamente o tesouro de cada província ultramarina custeará:
a) Os juros e outros encargos de empréstimos ou financiamentos resultantes de contrato ou da lei;
b) Os serviços públicos, quer sejam comuns do ultramar quer provinciais, incluindo as despesas de transporte de pessoal ou material inerentes ao seu funcionamento;
c) O fomento do respectivo território, incluindo os encargos legais ou contratuais de obras ou concessões realizadas para o mesmo fim;
d) A emissão de moeda .e de valores selados ou pastais da província;
e) O encargo com as pensões do pessoal das classes inactivas, na proporção do tempo por que nela houver servido;
f) A comparticipação nas despesas de tribunais superiores ou de outros serviços comuns a diversas províncias, em proporção das suas receitas;
y) Os subsídios a empresas que mantenham regularmente a cabotagem ou outros meios de comunicação de interesse público para a província.
Art. 62.º - I. É expressamente proibido realizar despesas que mão tenham, sido inscritas no orçamento da província e bem assim contrair encargos ou efectuar dispêndios de que resulte excederem-se as dotações orçamentais.
II. As verbas autorizadas para certa despesa não podem ter aplicação diversa da que estiver indicada no orçamento ou ao diploma que abrir o crédito.
III. Os governadores e demais funcionários competentes aplicarão as dotações orçamentais de modo a alcançar-se o máximo de rendimento útil com o mínimo de dispêndio.
IV. As despesas públicas da administração ultramarina suo ordenadas pelo Ministro do Ultramar ou pêlos governadores, nos termos da presente lei orgânica e dos diplomas especiais que regularem a execução dos serviços de Fazenda. Dentro de cada província, as mesmas despesas serão ordenadas pelo respectivo governador ou peão órgão competente do serviço autónomo a que respeitarem.

SECÇÃO IV

Orçamento e contabilidade

Art. 63.º A administração financeira de cada uma das províncias ultramarinas está subordinada anualmente ao respectivo orçamento. Os orçamentos de todas elas devem ser elaborados segundo um plano uniforme.
Art. 64.º - I. O orçamento de cada província ultramarina é unitário, compreendendo a totalidade das receitas e despesas públicas.
II. De harmomia com o princípio antecedente, o orçamento incluirá pela totalidade as seguintes receitas e despesas públicas, de que podem ser publicadas à parte desenvolvimentos especiais:

a) As dos serviços autónomos da província;
b) As dos serviços comuns do ultramar;
c) As receitas consignadas ao Tesouro da metrópole pelas alíneas a) e b) do artigo 57.º e as correspondentes despesas do mesmo Tesouro efectuadas na província.
Art. 65.º - I. O orçamento de cada província ultramarina deve consignar os recursos indispensáveis para cobrir o total das despesas, de modo a assegurar sempre o seu equilíbrio.
II. Devem ser tomadas como base da fixação dos impostos o outros rendimentos da província as despesas
correspondentes às suas obrigações legais ou contratuais ou permanentes pela -natureza ou fins delas, compreendidos os encargos de juro e amortização de empréstimos ou financiamentos.
III. O orçamento de cada província ultramarina incluirá somente as receitas e despesas permitidas por diplomas legais.
IV. Não podem ser incluídas no orçamento ou servir de elemento de previsão orçamental, para serem pagas por verbas- relativas a exercícios findos, quaisquer despesas excedentes às dotações autorizadas.
Y. Diploma especial determinará as condições em que no orçamento de qualquer das províncias ultramarinas podem abrir-se créditos para ocorrer a despesas imprevistas ou transferir-se verbas «para suprir a insuficiência de outras autorizadas, bem como os casos restritos em que pode justificar-se a inclusão de verba para pagar encargos relativos a exercícios findos que não tenham sido oportunamente dotados ou pagos.
Art. 66.º - I. O orçamento de cada província ultramarina será anualmente organizado e, por meio de portaria, aprovado e mandado executar pelo governo da mesma província, nos termos da Constituição, da presente lei orgânica e do diploma especial que reger a administração da Fazenda.
II. Para o exercício dos poderes de fiscalização que a lei confere ao Ministro do Ultramar, a bem da ordem financeira, ao seu exame e confirmação deve cada um dos governadores submeter, pela via anais rápida e com o mínimo de antecedência regulamentar, instruído com os elementos necessários, o mapa de avaliação das receitas- e demais recursos da província, sobre que tem de assentar, devidamente equilibrado, o projecto orçamental.
III. A avaliação das receitas e demais recursos disponíveis, em face das leis preexistentes -, é um acto próprio das funções executivas dos governadores, enjeito ao disposto no artigo 15.º e só por esse meio modificável.
IV. O Ministro do Ultramar intervirá na fase preparatória do orçamento, conforme os preceitos antecedentes, com o fim de:
a) Verificar as condições do equilíbrio orçamental e providenciar sobre os meios de o suprir, quando for necessário;
b) Definir a orientação que entenda dever seguir-se ao orçar as receitas ou na fixação das despesas, em vista dos planos de obras ou de fomento e das providências legislativas que forem da competência do Governo.
V. Em diploma legislativo, cuja discussão e voto pêlos Conselhos Legislativos, nas províncias de governo, geral, ou pêlos Conselhos de Governo, nas restantes províncias, deve concluir-se até 30 de Novembro de cada ano, dispor-se-á das receitas avaliadas nos termos dos números antecedentes, definindo-se os princípios a que deve ser subordinado o orçamento, na parte das despesas de quantitativo não determinado por efeito de lei ou contrato preexistentes.
VI. Quando, por qualquer circunstância, o orçamento não possa entrar em execução no começo do ano económico, sem embargo disso, a cobrança das receitas públicas prosseguirá nos termos das leis existentes, e continuarão provisoriamente em vigor, por duodécimos, só quanto à despesa ordinária, o orçamento do ano anterior e os créditos sancionados durante ele para ocorrer a novos encargos permanentes.
Art. 67.º - I. A contabilidade das províncias ultramarinas será organizada como a da metrópole, podendo o Ministro do Ultramar introduzir as modificações que se tornem indispensáveis por circunstâncias especiais.

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II. As contas das despesas públicas coincidirão rigorosamente com a classificação orçamental em vigor.
III. As contas anuais das províncias ultramarinas serão enviadas pelos governadores ao Ministério do Ultramar, nos prazos e sob as sanções que a lei estabelecer, para, depois de verificadas e relatadas, serem submetidas a julgamento do Tribunal de Contas e tomadas pela Assembleia Nacional, nos termos do n.º 3.º do artigo 91.º e do artigo 171.º da Constituição.

CAPITULO VII

Autarquias locais

Art. 68.º - I. Nas províncias ultramarinas a administração dos interesses comuns das localidades está a cargo de câmaras municipais, comissões municipais e juntas locais.
II. A câmara municipal é o corpo administrativo do concelho, de natureza electiva. É presidida pelo administrador do concelho, que é o órgão executor das suas deliberações, nos termos da lei. Tem foral e brasão próprios e pode usar a designação honorífica ou título que lhe forem ou tiverem sido conferidos.
III. Haverá comissões municipais nas circunscrições administrativas; nos termos que a lei definir, poderá havê-las também nos concelhos em que não puder constituir-se a câmara por falta ou nulidade da eleição ou enquanto o número de eleitores inscritos for inferior ao mínimo estabelecido.
IV. São instituídas juntas locais:

a) Nas freguesias; mas, se aí houver organismos devidamente constituídos a quem por lei ou tradição pertença a gerência de certos interesses comuns dos habitantes, poderão ser-lhes confiadas as atribuições das juntas, nos termos que a lei definir;
b) Nos postos administrativos, se na sua sede existir povoação ou núcleo de habitantes com as características exigidas por lei.
Art. 69.º-I. Os concelhos e as freguesias são as autarquias locais propriamente ditas e constituem pessoas colectivas de direito público, com a autonomia administrativa e financeira que a lei lhes atribuir. A sua personalidade jurídica mantém-se mesmo quando geridos pelos órgãos transitórios ou supletivos a que se refere o artigo anterior.

II. As comissões municipais das circunscrições e as juntas locais dos postos administrativos exercem as atribuições e beneficiam de certas regalias dos correspondentes órgãos dos concelhos e freguesias, nos termos que a lei estabelecer.
Art. 70.º - I. A vida administrativa das autarquias locais está sujeita à fiscalização do governo da província, directamente ou por intermédio do governador do distrito, onde o houver, e a inspecção pelos funcionários que a lei determinar, podendo a mesma lei tornar dependentes as deliberações dos respectivos corpos administrativos da autorização ou da aprovação de outros organismos ou autoridades.
II. As deliberações dos corpos administrativos das autarquias locais só podem ser modificadas ou anuladas nos casos e pela forma previstos na lei;
III. Os corpos administrativos de eleição podem ser dissolvidos pelo governo da província, conforme a lei determinar. As comissões e juntas nomeadas podem ser livremente demitidas.

TITULO IV

Ordem económica e social

Art. 71.º A vida económica e social nas províncias ultramarinas será coordenada e regulada superiormente
tendo em vista os objectivos expressos no título viu da parte i e no capítulo V do título VII da parte n da Constituição e, em especial, os seguintes:
a) O metódico aproveitamento dos recursos e possibilidades naturais do território ultramarino para a economia nacional e, no conjunto, para a comparticipação desta na economia mundial;
b) O povoamento do território ultramarino, designadamente promovendo a fixação de famílias nacionais, regulando as deslocações de trabalhadores e disciplinando e protegendo a emigração e a imigração;
c) A elevação moral, intelectual e económica das populações;
d) A progressiva nacionalização das actividades que deverão integrar-se por si e pelos seus capitais no conjunto da economia nacional;
e) A realização da justiça social compatível com as condições económicas e políticas.
Art. 72.º - I. Além do disposto no artigo 2.º da Constituição, não podem ser concedidos nem por qualquer outro modo alienados, no ultramar, os terrenos ou outros bens que estejam afectos ou destinados ao domínio público ou interessem ao prestígio do Estado ou a superiores conveniências nacionais. Designadamente não são permitidas:
a) Numa zona contínua de 80 metros além do máximo nível da preia-mar, as concessões de terrenos confinantes com a costa marítima, dentro ou fora das
b) Numa zona contínua de 80 metros além do nível normal das águas, as concessões de terrenos confinantes com lagos navegáveis ou com rios abertos à navegação internacional;
c) Numa faixa de 100 metros para cada lado, ou mais se a lei especial o determinar, contados ,do eixo da linha ou do perímetro das estações respectivas, as concessões dos terrenos contíguos às linhas férreas de interesse público, construídas ou projectadas.
II. Convindo aos interesses da administração pública e de harmonia com a lei, pode ser permitida:
a) A ocupação, por simples licença administrativa, arrendamento ou outro título precário, de parcelas dos terrenos abrangidos pelo disposto no número antecedente;
A inclusão das referidas parcelas na área das povoações, com expresso assentimento do Ministro do Ultramar, ouvidas as instâncias competentes.
III. O reconhecimento pelo Ministro do Ultramar da conveniência de incluir na área das povoações quaisquer dos terrenos mencionados nos dois números anteriores far-se-á, em regra, ao aprovar os planos de urbanização que os abranjam ou, na falta destes, em face da planta dos terrenos, com a indicação do fim a que serão destinados, com os efeitos seguintes:

a) Fixado assim o modo de aproveitamento dos referidos terrenos, só com aprovação do Ministro do Ultramar fie lhes poderá dar outro destino;
b) As parcelas dos mencionados terrenos que se incluírem na área das povoações poderão ser concedidas nos termos da lei geral, desde que tal concessão esteja prevista e autorizada, embora em conjunto, como fica determinado, mas sem prejuízo do que dispõe o artigo seguinte, nos casos por ele abrangidos;
c) Quando os mencionados terrenos estiverem compreendidos na área das povoações que forem sede de concelho, o Ministro do Ultramar poderá autorizar que o respectivo foral inclua a transferência dos mesmos terrenos para a posse da câmara municipal, sendo por ela sujeitos ao regime da alínea antecedente.
Art. 73.º - I. Nas áreas das povoações marítimas ou nas destinadas à sua natural expansão, exceptuando

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Macau, as concessões ou subconcessões de terrenos ficam sujeitas às regras seguintes:
a) Não poderão ser feitas a estrangeiros sem aprovação em Conselho de Ministros;
6) Serão condicionadas ao efectivo aproveitamento dos terrenos pêlos concessionários ou subconcessionários com as suas instalações industriais ou comerciais ou com prédios urbanos de habitação.
II. Não dependem da sanção de qualquer autoridade os actos de transmissão particular da propriedade de terrenos e dos direitos imobiliários sobre eles constituídos, mas, se a transmissão contrariar o disposto nas alíneas a) ou b) do número antecedente, será anulável nos termos seguintes:

a) Por despacho do governador-geral ou da província, publicado no respectivo Boletim» Oficial até ao fim do semestre posterior à data em que do facto houver conhecimento, se a propriedade do terreno teve origem em concessão ou subconcessão efectuada ao abrigo dos regulamentos da administração pública;
b) Por decisão judicial, quando o direito transmitido se fundar em qualquer outro título de propriedade e também, em todo o tempo, no caso da alínea anterior.
III. São imprescritíveis os direitos assegurados por este artigo e pelo artigo anterior, respeitando-se, porém, os direitos anteriormente adquiridos por outrem e o estipulado em convenções internacionais.
IV. As áreas das povoações marítimas são as que constarem do respectivo foral ou outro regulamento administrativo; as destinadas à sua expansão devem ser delimitadas por meio de providência publicada no Boletim Oficial da respectiva província.
Art. 74.º - I. São consideradas de interesse colectivo e sujeitas a regimes especiais de administração, concurso, superintendência ou fiscalização do Estado, por intermédio do Ministério do Ultramar ou dos governos das províncias ultramarinas, nos termos legais, todas as empresas que visem ao aproveitamento e exploração dos bens que fazem parte do domínio público do Estado no ultramar.
II. As tarifas de exploração, no ultramar, de serviços públicos concedidos estão sujeitas à regulamentação e fiscalização das entidades mencionadas no número anterior, conforme as regras de competência estabelecidas, e só depois da sua aprovação podem entrar em vigor.
Art. 75.º Em coordenação com as indústrias da metrópole e tanto quanto possível como seu complemento económico, será promovido o desenvolvimento industrial das províncias ultramarinas, conforme as necessidades da sua população e o melhor aproveitamento das riquezas do respectivo território. Em obediência a este princípio, diploma especial regulará o condicionamento e a acção fomentadora de novas indústrias no ultramar.
Art. 76.º - I. Os bancos emissores do ultramar, cujas reservas estão constituídas na metrópole, onde têm a sede e a administração central, devem tomar sempre o escudo metropolitano como padrão do valor das suas notas, procurando assegurar a convertibilidade destas na moeda nacional, com as correcções resultantes da situação cambial.
II. Para a realização deste objectivo poderá estabelecer-se, na medida em que for julgado conveniente, a fusão ou o mútuo apoio dos fundos cambiais que houver nas províncias ultramarinas.
Art. 77.º O regime aduaneiro, quer no que interessa às relações comerciais entre a metrópole e as províncias ultramarinas, quer às destas entre si e com os países estrangeiros, constitui problema de interesse comum ou geral, que o Governo, como é da sua competência, nos termos dos n.º" 2.º ou 3.º do artigo 150.º da Constituição, conforme os casos, regulará tendo em
vista os princípios enunciados no artigo 158.º e seu § único da Constituição, e para isso designadamente poderá:

a) Unificar quanto possível em todo o território nacional os direitos aduaneiros nas relações comerciais com os países estrangeiros, exceptuando as três províncias do Oriente, onde, atendendo à sua situação geográfica, poderão adoptar-se regimes especiais;
b) Reduzir gradualmente até à sua completa supressão, à medida que sejam substituídos por outras receitas, os direitos aduaneiros nas relações comerciais entre a metrópole e as províncias ultramarinas e nas destas entre si e com a metrópole, ressalvando as especialidades que forem necessárias para as três províncias do Oriente.
Art. 78.º - I. Serão reservados para empresas nacionais ou supletivamente mantidos pelo Estado os meios de qualquer espécie pêlos quais sejam asseguradas as comunicações regulares entre a metrópole e as províncias ultramarinas ou destas entre si e com a metrópole. Dependem de autorização especial as excepções a esta regra.
II. Os portos ou aeroportos do ultramar que estabeleçam comunicação com países estrangeiros estarão abertos à navegação internacional por via marítima ou aérea, nos termos dos regulamentos ou das convenções aplicáveis.
III. A regra estabelecida no n.º i deste artigo não abrange as mercadorias com destino a país estrangeiro em trânsito directo por outro porto nacional, as quais poderão ser transportadas em navio estrangeiro.
Art. 79.º-I. Nas províncias ultramarinas onde vigorarem os regimes especiais a que se refere o capítulo m do título VII da parte II da Constituição promover-se-ão gradualmente a organização e o aldeamento das populações indígenas, para fins ide assistência,- de defesa e de administração pública, integrando-se nessa organização as autoridades tradicionais dos agrupamentos gentílicos como a lei estabelecer.
II. Serão reconhecidos ou criados regimes especiais de propriedade imobiliária em favor dos indígenas nos terrenos destinados às suas povoações e culturas, sob os princípios seguintes:
a) Tal propriedade, susceptível de título e registo, será respeitada em todas as concessões feitas pêlos governos das províncias ultramarinas, salvo o caso de expropriação por utilidade pública, mediante compensação com outros terrenos disponíveis ou indemnização, nos termos legais;
&) A propriedade assim constituída só é transmissível entre indígenas nos termos do regime especial ou do uso gentílico por ele reconhecido;
c) A referida propriedade só pode caucionar obrigações contraídas perante os organismos de crédito ou de assistência económica estabelecidos por lei em favor dos indígenas. A impenhorabilidade não abrange os frutos, pendentes ou não, que ficam sujeitos à lei geral.
Art. 80.º - I. Nas províncias ultramarinas todos os estabelecimentos de ensino, quer oficiais, quer particulares, devem subordinar-se à orientação e influência cultural das Universidades portuguesas e institutos afins.
II. Será progressivamente desenvolvida a acção de influência cultural e de investigação científica destas Universidades e institutos no ultramar.
III. Nenhum estabelecimento de ensino que, no todo ou ma maioria, seja frequentado por portugueses em território nacional poderá estar filiado em Universidades ou estabelecimentos equivalentes de países estrangeiros ou ensinar exclusiva ou predominantemente seguindo os seus programas. Quando as circunstâncias o justificarem, promover-se-ão os acordos (necessários para

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o reconhecimento por essas Universidades ou estabelecimentos da equivalência dos exames ou dos cursos preparatórios ministrados em estabelecimentos nacionais.
IV. O exercício de profissões para que a lei exige título académico está sujeito ao reconhecimento da categoria científica do estabelecimento que o confere e ao regime de reciprocidade.
V. Nos orçamentos das províncias ultramarinas inscrever-se-ão verbas para a concessão de bolsas de estudo, nos termos regulamentares, que facilitem a frequência na metrópole dos estabelecimentos de ensino que não houver na respectiva província.
VI. O ensino primário ou rudimentar, destinado a formar o carácter das populações nativas e, de acordo com a doutrina do § 3.º do artigo 43.º da Constituição, a pô-las em contacto com ias realidades e os princípios da história e da civilização portuguesas, deve obrigatoriamente conformar-se com os programas oficialmente aprovados.
VII. O ensino primário ou rudimentar pode ser parcialmente {ministrado no idioma vernáculo ou nativo, mas apenas como meio inicial de compreensão e instrumento veicular de difusão da língua portuguesa.
VIII. Promover-se-á o desenvolvimento das relações espirituais entre a {metrópole e as províncias ultramarinas, para seu mútuo conhecimento e aproximação em todos os aspectos da vida intelectual, devendo proteger-se e subsidiar-se as instituições que difundam a cultura portuguesa no ultramar.

TITULO V

Disposições finais

Art. 81.º - I. Como símbolo de soberania e de unidade política da Nação Portuguesa, a bandeira nacional será hasteada, no ultramar, nas residências dos Governadores e de outras autoridades que a lei determine, nas fortalezas e demais edifícios públicos, nos navios e onde quer que se realizem cerimónias que tal justifiquem, devendo também o escudo nacional ser impresso no frontespício do Boletim Oficial das províncias ultramarinas.
II. Cada província ultramarina terá um brasão próprio, aprovado por portaria do Ministro do Ultramar, ouvidas as instâncias competentes. O brasão constituirá a insígnia heráldica do descobrimento português e também a insígnia de senhorio do património da província, servindo, além disso, para marcar o carácter oficial do expediente e da correspondência do seu governo e serviços públicos.
Art. 82.º - I. Serão decretados, de acordo com os preceitos da presente lei:

a) A organização do Ministério do Ultramar;
b) Os diplomas orgânicos dos diferentes ramos de serviço público no ultramar, incluindo a revisão da Reforma Administrativa Ultramarina;
c) O estatuto geral do funcionalismo ultramarino;
d) O estatuto político-administrativo de cada unia das províncias ultramarinas, ouvido o respectivo governador e o Conselho de Governo que estiver em funções segundo a lei vigente, bem como o Conselho Ultramarino.
II. Enquanto não entrarem em execução os diplomas acima mencionados, continuam a vigorar acerca do respectivo assunto as disposições existentes na parte em que se coadunem com os preceitos da presente lei e especialmente será observado o seguinte:

a) Continuam a funcionar os conselhos de governo nos termos da lei actual até que sejam constituídos os órgãos que os substituam;
ò) Continuam os governadores e demais autoridades no exercício da competência actual até que se definam as suas novas atribuições;
c) Continuam em vigor os preceitos dos artigos 208.º, §§ 2.º a 4.º, e 211.º e 212.º da actual Carta Orgânica do Império Colonial Português enquanto não forem integrados em outros diplomas e declara-se revogada a referida Carta Orgânica em tudo mais que por este artigo não fica ressalvado.
Para ser publicada no «Boletim Oficiais» de todas as províncias ultramarinas.

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CÂMARA CORPORATIVA

V LEGISLATURA

PARECER N.º 35/V

Projecto de proposta de lei n.º 517

A Câmara Corporativa, consultada, nos termos do artigo 105.º da Constituição, acerca do projecto de proposta de lei n.º 517, elaborado pelo Governo sobre a Lei Orgânica do Ultramar, emite, pela sua secção de Política e economia coloniais, o qual foi agregado o Digno Procurador Afonso Rodrigues Queiró, sob a presidência do Digno Procurador assessor António Vicente Ferreira, o seguinte parecer:

Apreciação na generalidade

1. Foram recentemente feitas na Constituição alterações que justificam, e até mesmo se pode dizer que impõem, remodelação mais ou menos ampla do regime geral do governo das províncias ultramarinas, hoje constante da Carta Orgânica do Império Colonial Português, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 23:228, de 15 de Novembro de 1933, com alterações introduzidas pela Lei n.º 2:016, de 29 de Maio de 1946.
Efectivamente, na última reforma constitucional (Lei n.º 2:048, de 11 de Junho de 1951), além do mais, houve a preocupação de apagar todos os vestígios, ainda que porventura é expressos na terminologia legislativa, e, portanto, meramente formais, de uma actual concepção «imperialistas, em que os territórios ultramarinos são ainda e colónias B, isto é, territórios e populações sob o senhorio da metrópole; prevaleceu a orientação de atribuir às de novo chamadas «províncias ultramarinas » organização político-administrativa adequada à situação geográfica e às condições do meio social; mexeu-se no sistema vigente da competência legislativa para o ultramar, designadamente abrindo a porta para maior intervenção da opinião e dos interesses provinciais na feitura da legislação local; deu-se segura margem a que se possa repartir por Ministérios diversos do Ministério do Ultramar a superintendência da metrópole em alguns sectores da administração ultramarina; estatuiu-se em termos de os governos ultramarinos, quanto a determinados serviços, poderem receber directrizes de departamentos diferentes do Ministério do Ultramar; foi-se abertamente, sem reticências, para a concepção da unidade económica da Nação, entendida esta como o binómio metrópole-ultramar; concedeu-se ao legislador ordinário maior latitude na fixação das normas e dos trâmites de organização dos orçamentos locais e na definição da fiscalização e superintendência da metrópole nesta matéria; e, por último, estabeleceram-se princípios diferentes quanto à fiscalização judicial e política das contas públicas das províncias.
Justamente uma destas alterações, aquela segundo a qual as províncias ultramarinas terão organização político-administrativa adequada à situação geográfica e às condições do meio social (Constituição, artigo 134.º), inculca que o legislador ordinário, ao estabelecer aã forma de governo» das províncias ultramarinas, como no Acto Colonial se dizia, ou, como agora se preferiu dizer, o seu «regime geral de governo» (Constituição,

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artigo 150.º, n.º 1.º), há-de ser muito menos ambicioso do que o foi o legislador de 1933.
Em 1933, ao redigir-se a Carta Orgânica, foi-se dominado pelo ideal da uniformidade administrativa do Império. O legislador considerou que não havia razão para admitir antagonismos ou diferenças substanciais entre os sistemas político-administrativos de cada uma das colónias portuguesas. Salvas especialidades de mero pormenor, uma só lei deveria reger o governo e a administração de todo o Império. Tal teria de se considerar, aliás - pensava-se -, a resultante da concepção de um império uno e solidário, nos limites do qual o exercício plurissecular da nossa soberania e a prática invariável dos nossos específicos métodos de colonização teriam conduzido à formação de um condicionalismo propício a uma orgânica político-administrativa uniforme. Pode ver-se a apologia eloquente, destas ideias, por exemplo, no relatório do Decreto n.º 26:180, de 7 de Janeiro de 1936, que reorganizou os serviços do Ministério das Colónias.
Tinha-se, aliás, presente a circunstância de que a história mais recente da administração ultramarina militava no sentido da comunidade da forma de governo e administração das colónias. Fixadas, na verdade, em 1914 e em 1920, as bases da administração civil e financeira das províncias ultramarinas, veio a verificar-se que as cartas orgânicas sucessivamente elaboradas para cada uma delas em muito pouco diferiam umas das outras. Era patente que o mesmo ou sensivelmente o mesmo resultado se conseguiria facilmente com um texto único em que, nos lugares próprios, se inserissem os preceitos necessários à contemplação das especialidades de organização de cada uma das províncias ultramarinas. Por este caminho se julgou, deste modo, autorizado a enveredar o legislador da Carta Orgânica, em 1933.
Perante um preceito como o do artigo 134.º da Constituição vigente, continuam a oferecer-se ao legislador ordinário duas possibilidades, ao traçar o regime geral de governo das províncias ultramarinas: elaborar um texto único e pormenorizado, no qual se consignem, nos lugares próprios, as disposições requeridas pelas especiais condições de cada território; ou estabelecer, em primeiro lugar, as bases de que conste apenas o que de comum se possa dispor uniformemente para todos os governos ultramarinos, reservando para diplomas especiais a cada um deles a regulamentação complementar do quê, em matéria de organização político-administrativa, particularmente seja requerido pela situação geográfica e pelas condições do meio social.
A primeira orientação seria naturalmente perfilhada por um legislador que, apesar de tudo, continuasse a acreditar na conveniência da uniformização, da simetria político-administrativa à outrance, e só constrangido aceitasse a pluralidade da legislação colonial neste domínio, que para ele importaria quebra dos laços de solidariedade imperial entre os vários territórios.
A outra orientação, adoptada no projecto de proposta de lei em exame, não só não dá relevo às consequências de desagregação imperial, pretensamente ligadas ao sistema da pluralidade de legislação, como destaca, pelo contrário, a conveniência de o regime geral de governo ultramarino consistir apenas em directrizes ou cânones esquemáticos, convenientes e adequados a todas as províncias sem distinção, tendo-se em conta que são muito diversas as condições económicas, étnicas, sociais e culturais e o meio geográfico de cada um desses territórios. Uma organização político-administrativa uniforme há-de sempre constituir um colete de forças para todas ou para algumas das províncias ultramarinas. Não pode equiparar-se integralmente, por exemplo, a organização que convém a Angola à que convém a Macau ou a que convém a S. Tomé à que deve servir para o Estado da índia. Temos províncias insulares e províncias continentais, temos grandes e temos pequenos territórios, temos províncias densamente povoadas e províncias de fraca densidade de população, temos províncias relativamente próximas da metrópole e províncias longínquas, temos províncias de população ètnicamente a bem dizer homogénea e províncias de população mista, temos terras civilizadas e terras só restritamente civilizadas, temos territórios economicamente progressivos e territórios atrasados. Temos, em suma, um pouco de tudo. Só com prejuízo para a eficiência dos serviços e para os interesses das populações se pode levar longe o princípio da uniformidade, do padrão único político-administrativo ...
Acresce, aliás, ainda que o legislador actual não está nas mesmas condições em que se encontrou o legislador de 1933. O legislador da Carta Orgânica não foi a Assembleia Nacional: foi o próprio Governo. Compreende-se que tenha ido além das simples bases gerais e alcançado o domínio da regulamentação propriamente dita, tanto mais quanto é certo que se deu oportunidade à I Conferência dos Governadores Coloniais de estudar previamente o projecto da Carta Orgânica e de fazer ao Governo sugestões práticas no domínio, quer das grandes linhas de orientação, quer, sobretudo, dos pormenores da organização. Desta vez, pelo contrário, é a Assembleia Nacional que, no uso da competência que lhe está constitucionalmente reservada, vai legislar sobre o regime geral de governo das províncias ultramarinas; e à Assembleia Nacional cabe naturalmente apenas, por força da sua própria índole e composição, aprovar as bases gerais desse regime geral de governo. Sem desprimor para este órgão da soberania, pode dizer-se ainda hoje que «os parlamentos não dispõem de tempo nem se acham à vontade nos assuntos coloniais, estranhos à maioria dos seus membros». Está em melhores condições para regular os pormenores da organização administrativa de cada província, pela sua presumida especialização no conhecimento dos problemas ultramarinos, o Ministro do Ultramar, a quem, portanto, logicamente, o projecto atribui competência para decretar a legislação complementar do regime geral aprovado pela Assembleia Nacional, designadamente para elaborar o que no projecto se chama o a estatuto político-administrativo» de cada província.
O Ministro deverá naturalmente conter-se nos limites do regime geral de governo votado pela Assembleia Nacional, ao legislar, para todas as províncias, além do mais sobre o seu regime administrativo geral (correspondente à actual Reforma Administrativa Ultramarina), sobre a organização geral dos serviços públicos ultramarinos, e ao legislar, por último, em relação a cada uma delas, sobre o seu «estatuto político-administrativo ».
A orientação do projecto não contradiz, no modo de ver da Câmara Corporativa, nenhum dos princípios tradicionais da administração ultramarina portuguesa. Desde cedo, no século passado, se sentiu a conveniência de especializar a administração de cada território ultramarino. Deve considerar-se uma tentativa nesse sentido o Código Administrativo das províncias ultramarinas de 1881, da autoria de Júlio de Vilhena, que pretendeu ser «lei geral para o ultramar», mas «sofreria as modificações reclamadas pelas circunstâncias especiais de cada província». Deste modo, «o projecto ficaria constituindo o código-tipo das províncias ultramarinas. No decreto orgânico de cada província seriam feitas as referências ao mesmo código, pondo em vigor com as alterações convenientes as disposições acomodadas ao estado de civilização de cada uma». «O novo código traçou o círculo em que teria de mover-se a administração

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do ultramar. Dentro do seu vasto perímetro cada província constituiria uma entidade especial com mais ou menos faculdades, conforme as suas condições peculiares».
A reorganização administrativa de Moçambique, de 1907 (Aires de Orneias), constituiu, por seu turno, e essa efectivamente, uma espécie de decreto ou estatuto orgânico da província, o qual, embora moldado nos princípios da Carta Orgânica de 1869 (Rebelo da Silva), lhe introduziu as modificações requeridas pelas condições especiais dessa província da África Oriental.
E foi esta a orientação das leis orgânicas de 1914, 1920, 1926 e 1928. A sua execução é que terá sido deficiente a ponto de ter justificado a orientação uni formizadora do legislador da Carta Orgânica do Império Colonial Português.
Ora a Câmara sabe de um certo mal-estar político subsistente numa ou noutra província, das críticas e representações que de certa ou certas delas intermitentemente têm partido, originadas no sistema de governo e de administração talhado uniformemente para todas, o qual, se quadra com as condições de algumas, é mais ou menos inadequado para essas outras ...
Poderia pensar-se em resolver o problema assim suscitado abrindo ao sistema de 1933 uma que outra excepção e deixando-o em vigor para as restantes províncias. E não faltará quem pense que este seria politicamente o caminho mais aconselhável.
A Câmara concorda, porém, com a orientação do Governo, expressa no projecto em exame, em nome, que mais não seja, da ideia de igualdade. Assim como a metrópole tem a sua organização político-administrativa própria (e como, dentro dela, a têm, outrossim, de certo modo, as ilhas adjacentes), inspirada no condicionalismo que lhe é especial, tenham-na também todos e cada um dos territórios, todas e cada uma das províncias do ultramar português, inspirada por seu turno nas condições específicas respectivas. Não deve haver províncias ultramarinas que vivam à sombra de um estatuto excepcional. Que vivam, sim, simultaneamente de acordo com o regime geral de governo de todas elas e com o seu próprio estatuto.
Assim, de resto, se evita que quanto fosse excepcionalmente concedido só a uma viesse sucessivamente a ser reclamado ou exigido por qualquer das restantes províncias de além-mar.
O projecto tem, pois, além do mais, toda a oportunidade política.
E designadamente no capítulo respeitante à constituição, funcionamento e atribuições dos seus órgãos colegiais de governo e no das atribuições «dos governadores que mais razão haverá para individualizar a organizarão político-administrativa de cada província, por bastante dever depender das suas respectivas condições particulares.
O Decreto n.º 7:008, de 20 de Outubro de 1920, foi a primeira das leis orgânicas do ultramar a enunciar as matérias que exclusivamente deveriam fazer parte das cartas orgânicas coloniais, e já dele constava que estas definiriam, além do mais, a competência do governador e a competência, atribuições e exercício de funções do Conselho Executivo e Legislativo. Orientação idêntica adoptou o legislador de 1926.
Todo o acerto da orientação legislativa agora restaurada dependerá, porém, em último termo, da execução que se venha a dar ao regime geral projectado. O estatuto de cada província não é obra para ser rapidamente feita em Lisboa. Requer, como aliás se prevê, o parecer do Conselho Ultramarino e a audição dos órgãos legislativos de cada província. Nada de os decalcar uns nos outros, como no passado se fez, a ponto de se desacreditar o regime da especialização das cartas orgânicas coloniais.

2. No projecto do proposta de lei dá particularmente nas vistas a instituição, nas províncias de governo-geral, de conselhos legislativos de constituição electiva e de atribuições deliberativas no domínio da legislação local. Teremos, assim, de certo modo, ultrapassada, neste campo, e quanto a estas províncias, a própria orientação adoptada pela primeira legislação republicana e perfilhada até ao Acto Colonial e à Carta Orgânica do Império.
Que pensar da posição tomada pelo projecto neste ponto?
Note-se preliminarmente que a Constituição não a prescreve nem a veda. No artigo 151.º prevê-se apenas a possibilidade de a lei orgânica do ultramar consagrar mais do que um órgão legislativo local. Nada, pois, impediria o legislador ordinário de manter, para o Estado da índia, Angola e Moçambique, o sistema vigente, em que os conselhos locais de governo têm funções apenas consultivas, embora o seu voto se deva, em princípio, considerar vinculante para o governador, quando este exerce a sua competência legislativa.
Considere-se, porém, que o legislador do Acto Colonial e da Carta Orgânica regressou ao sistema clássico dos Conselhos de Governo do tempo da Monarquia, de funções meramente consultivas, para não continuar ingenuamente apegado ao equívoco de supor a existência de elites sociais e económicas locais que realmente estavam ainda longe de existir, e com o objectivo de, por meio de uma disciplina centralizadora, corrigir os alegados desvios e reparar os patentes erros da administração colonial do vinténio anterior, decorrentes do facto de o Terreiro do Paço, instituída em cada território lata autonomia administrativa, financeira e legislativa, se ter dispensado de fiscalizar a administração das colónias e de superintender nela na medida adequada. A sombra do sistema do Acto Colonial e da Carta Orgânica se realizou uma obra ingente de recuperação e de progresso administrativo, financeiro, económico, político e social em todas as províncias ultramarinas e particularmente naqueles três territórios. Decorridos vinte anos sobre a vigência da Carta Orgânica, esses territórios portugueses de além-mar adquiriram nova vitalidade económica e social. Angola, por exemplo, é hoje o centro de consideráveis interesses económicos e viu multiplicada a sua população branca e civilizada, que incorpora elites e valores sociais do nível dos metropolitanos. O mesmo, ou sensivelmente o mesmo, se passa com Moçambique. O Estado da índia conhece a prosperidade económica e financeira, além de que possui desenvolvimento cultural e civilização que o colocam sensivelmente a par dos outros territórios nacionais mais adiantados.
Há, pois, que dar atenção às transformações operadas, justamente, em boa medida, por força das disciplinas impostas à administração ultramarina pelo Acto Colonial e pela Carta Orgânica. Há que dar acrescida audiência aos interesses e à opinião local, através de adequada representação nos órgãos de governo de cada território. A isso visa o projecto ao dar constituição electiva e ao atribuir funções deliberativas, no domínio legislativo, aos conselhos legislativos das províncias de governo-geral, nos termos que adiante, na especialidade, se analisarão.
E não se tema que sejamos assim lançados no plano inclinado que conduz à autonomia, ao self-government colonial, o passo que lógica e historicamente antecede a independência política integral, a plena «descolonização». Não se tema que, sem darmos por isso, vamos alinhar as nossas terras ultramarinas na procissão cons-

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titucional em que as colónias estrangeiras, inglesas sobretudo, vão caminhando para a meta da independência, conduzidas pela mão tutelante das metrópoles europeias. A autonomia, em sentido rigoroso e próprio, exprime a estrutura constitucional daqueles territórios coloniais em que já se vislumbram, com maior ou menor nitidez, um parlamento e um governo próprios, que detêm, a bem dizer, a plenitude das atribuições legislativas (ordinárias) e executivas, conservando a metrópole apenas, quanto às primeiras, o direito de veto e, quanto às segundas, a chefia do governo, por intermédio de um governador por ela nomeado. Este governo é designado de acordo com o predomínio relativo das várias correntes de opinião representadas no parlamento da colónia e está na dependência da sua confiança. Estamos perante um Estado in fieri, um embrião de Estado independente, do modelo democrático-parlamentar. A autonomia vem a ser a exportação para as colónias das instituições parlamentares metropolitanas.
Nada disto cabe no sistema do projecto, nem expressa nem implicitamente. Os conselhos de que se está falando não detêm a plenitude da competência legislativa para o território considerado. Parte da legislação a vigorar no território emana de órgãos legislativos metropolitanos; a competência legislativa dos conselhos ê exercida sob a superintendência e fiscalização da metrópole, que, portanto, se lhes pode inclusivamente substituir; na província não há um governo colegial, constituído de acordo com as correntes de opinião representadas no conselho e dependente dos seus votos: há, antes, um governador, com a plenitude das funções executivas, representando nela a autoridade do Governo de Lisboa e só dele dependente.
O nosso sistema é, pois, uma construção original, com a virtude de dar relevo aos interesses e à opinião pública local, sem comprometer a unidade política de todo o território português. Trata-se de um regime de legislação descentralizada (com um antecedente no antigo regime, quanto ao Estado da índia), que exprime mera necessidade administrativa (lato sensu) e não compromete a unidade política da Nação Portuguesa.
Mantemo-nos fiéis, nestes meados do século xx, à concepção clássica portuguesa em matéria de política e administração ultramarina, sem deixar de dar tradução às novas realidades e às novas exigências sociais 6 políticas, que impõem a intervenção directa dos colonos e dos naturais de cada território na regulamentação e disciplina dos seus próprios interesses: conciliamos os comandos do passado com os imperativos do presente - e, não negando nem uns nem outros, caminhamos calmamente pela senda do futuro, que outros povos colonizadores percorrem em sobressalto, vendo esboroar-se-lhes nas mãos os seus impérios.

3. Se, pois, merecem o aplauso da Câmara Corporativa as ideias dominantes do projecto, já se não pode dizer o mesmo da sistematização que nele se adoptou, a qual lhe parece extremamente deficiente. Para só aludir ao fundamental, a -Câmara Corporativa chama a atenção, em primeiro lugar, para o facto de no projecto se contrapor (título II) organização geral a organização provincial (título III), expressões que se não opõem uma à outra. O que parece ter estado na mente do Governo é o binómio administração central-administração provincial.
Como quer que seja, o projecto não se mantém fiel às epígrafes escolhidas para estes dois títulos e alude a aspectos de organização provincial no título respeitante a organização geral. Assim: alude aos órgãos legislativos provinciais e versa, sob a epígrafe de « administração geral», o essencial da matéria respeitante aos serviços públicos provinciais (que em parte ó depois tratada no título respeitante à organização provincial) e ao respectivo funcionalismo.
No título respeitante à organização geral aparece-nos um capítulo sobre os tribunais, embora não se saiba bem como aí possa caber. E no respeitante à organização provincial, que só às províncias deveria dizer respeito, surge-nos um capítulo sobre as autarquias locais, isto é, sobre a organização local em sentido estrito.
Se, por outro lado, atentarmos nas divisões dentro dos títulos do projecto e na distribuição das matérias por cada uma dessas divisões, mais e mais nos sentiremos descontentes com a sistematização adoptada. Assim, e para só reparar no mais saliente, no título I, relativo aos princípios fundamentais (entenda-se: da administração ultramarina), não encontramos, a bem dizer, nenhum desses princípios. Na capítulo I do título II, respeitante ao sistema legislativo, aparece-nos, de passagem, uma alusão ao Conselho Ultramarino, como se este órgão tivesse que ter apenas funções legislativas. Aí se trata, por outro lado, da aplicação no ultramar dos diplomas em geral, não só, portanto, dos diplomas legislativos, antes também dos diplomas regulamentares. No capítulo vi do título III, por último, as respectivas secções são dispostas por uma ordem ilógica.
De um modo geral, pode dizer-se que o projecto não respeitou, no ponto de vista sistemático, nem as lições que se poderiam colher da consulta da legislação anterior do mesmo género, nem as sugestões que se podem retirar da ciência do direito administrativo colonial.
A Câmara Corporativa entende, por consequência, ser seu dever ordenar as matérias do projecto de proposta que lhe foi submetido de maneira inteiramente diversa.
Antes de mais, cuida que os preceitos da nova lei devem dispor-se em bases, não em artigos. O propósito do legislador é, claramente, o de estabelecer as linhas gerais, o esquema, o regime geral do governo das províncias ultramarinas, a completar por vária legislação da competência, predominantemente, do Ministro do Ultramar. O que o projecto nos apresenta, e na forma em que o faz, não são artigos, são bases, a desenvolver, na maior parte, em legislação complementar.
A divisão fundamental em títulos, perfilhada pelo projecto, deve ser substituída pela divisão em capítulos, já que naqueles não conseguiu o Governo englobar matérias subordináveis à mesma epígrafe comum. A divisão em capítulos é mais flexível e permite, por isso, uma disposição sistemática das matérias muito mais satisfatória.
Um capítulo inicial tratará do território do ultramar português e da sua divisão administrativa em províncias. No segundo capítulo enunciar-se-ão os princípios gerais relativos à administração ultramarina. Dir-se-á, no capítulo III, da administração central do ultramar; no capítulo IV, da administração provincial, e no capítulo V, da administração local. Em rigor, da administração financeira se deveria fazer uma subdivisão do capítulo da administração provincial, mas a extensão do assunto e, pode dizer-se, a tradição legislativa impõem que se lhe dedique um capítulo à parte, que será o sexto. A administração da justiça é também constituída por serviços provinciais, privativos ou comuns, e deveria rigorosamente ser tratada naquele capítulo, mas a mesma tradição manda versá-la em capítulo separado. E o que se fará no capítulo VIII. Os princípios gerais da administração ultramarina, de que tratará o capítulo II, são desenvolvidos e pormenorizados ao tratar-se, no capítulo viu, da ordem económica e social das províncias ultramarinas. Assim um pouco como as constituições modernas deixaram de ser exclusivamente documentos em que, à parte a enunciação dos direitos

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individuais, se define e traça a organização política da Nação, para darem conjuntamente as grandes linhas da sua ordem económica e social, assim as leis orgânicas ultramarinas deixaram de ser documentos em que se enunciam apenas os cânones fundamentais do governo e administração dos territórios ultramarinos, para consignarem também as directrizes fundamentais em matéria económica e social. No último capítulo inscrever-se-ão, a título de disposições finais, as normas sobre aplicação no ultramar das leis e mais diplomas, além de uma disposição transitória respeitante à sobrevivência de certos preceitos da Carta Orgânica.
Quanto às subdivisões dos capítulos em que a lei deverá ser repartida, em parte dar-se-á, na especialidade, a razão delas e noutra parte não devem considerar-se carecidas de justificação expressa.

4. Duas palavras finais sobre a designação oficial a dar à lei em que venha a transformar-se o projecto em exame e aos diplomas especiais que regulem a organização administrativa de cada província.
O legislador tem-se, umas vezes, desinteressado do qualificativo a dar à legislação sobre o regime geral de governo dos territórios ultramarinos, chamou-lhe outras vezes Bases Orgânicas, outras ainda Lei Orgânica, e, por último, Carta Orgânica.
A Constituição não impõe rigorosamente uma designação, embora fale de « lei orgânica» no seu artigo 153.º A Câmara Corporativa preferiria que se mantivesse como apelativo oficial da lei a expressão Carta Orgânica, não apenas em homenagem ao imediato passado legislativo, como em consequência da própria e especial adequação da palavra «Carta» para designar documentos informativos programáticos e fundamentais (Carta das Nações Unidas, Carta de Havana, Carta Constitucional, etc.).
Quanto à designação de «estatuto político-administrativo», parece-nos adequada e talvez melhor que a de «carta orgânica», usada antes, sobretudo se for preferida, como se sugere, para a lei sobre o regime geral de governo das províncias ultramarinas, a designação de Carta Orgânica do Ultramar Português.

II

Exame na especialidade

TITULO I

Princípios fundamentais

ARTIGOS 1.º E 2.º

5. Dois reparos merece, desde logo, à Câmara este curto título. Em primeiro lugar, no artigo 1.º não se inscreve qualquer princípio fundamental do governo e administração ultramarina. Trata-se aí, sim, do território do ultramar português e da sua divisão administrativa em províncias. Não se diz, aliás, quais elas sejam, como parece dever fazer-se numa lei orgânica sobre a sua administração e governo. A Constituição, no artigo 1.º, diz-nos quais são os territórios ultramarinos e no artigo 134.º esclarece que esses territórios se denominam genericamente «províncias». Não nos dá, porém, concretamente a divisão administrativa do ultramar. A lei orgânica é que nos há-de elucidar sobre quais são as províncias ultramarinas portuguesas, e não apenas sobre quantas são elas. A exemplo do que se faz na Carta Orgânica, há-de dar-se, além disso, na nova lei, a delimitação geográfica sumária de cada uma.
São pontos, estes, que não devem ser devolvidos pela Assembleia Nacional, ao tragar o regime de governo das províncias ultramarinas, para a competência do Ministro do Ultramar, como realmente sucederia se só viessem a ser tratados no «estatuto» de cada província.
Quanto ao artigo 2.º, não nos oferece ele os princípios fundamentais da administração ultramarina portuguesa. Remete praticamente para princípios constitucionais comuns à metrópole e ao ultramar, insertos no título I da parte I da Constituição, que não vem, por isso, extraordinariamente a propósito transpor para a lei orgânica.
No modo de ver da Câmara Corporativa, convém resumir, de facto, a seguir à divisão administrativa do ultramar português, o que de especial se pode dispor sobre a administração das províncias ultramarinas. A Carta Orgânica fez também reunião destes princípios nos artigos 85.º a 88.º (secção I do capítulo IV), mas não só foi incompleta na enumeração como escolheu lugar inadequado para a sua inclusão, dentro do sistema que perfilhou. Entende a Câmara que estes princípios devem preceder todo o traçado da organização político-administrativa, que em verdade inspiram.
Que princípios são ou devem ser esses? São sucessivamente, pela ordem, os que se encontram expressos nos artigos 135.º, 136.º, 149.º, 148.º, 134.º e § único do artigo 148.º da Constituição.

TITULO II

Organização geral

CAPITULO I

Sistema legislativo

ARTIGO 3.º

6. I - Este princípio é transferido para o capítulo respeitante aos princípios gerais da administração ultramarina, pois é, de facto, um deles.
As províncias são, por via de regra, regidas por legislação especial em consequência de serem especiais as condições do meio ultramarino em relação ao meio metropolitano. Inclusivamente é ou pode ser diferente o condicionalismo de cada uma das províncias. Daí que se fale de legislação ultramarina como legislação especial em dois sentidos: legislação especial a todas ou a algumas províncias e legislação especial a qualquer delas.
Além da legislação especial, em qualquer destes dois sentidos, há a legislação adaptada (a uma, a algumas ou a todas as províncias) e a legislação estendida. Essa adaptação e essa extensão podem referir-se à legislação metropolitana ou à legislação de uma determinada província.
Há, por último, legislação geral ou comum à metrópole e a todas ou algumas províncias.
Como se sabe, depois que a política de assimilação deixou de ser entendida estritamente, e passou a ser praticada como política a longo prazo, a regra em legislação colonial deixou de ser a da comunidade de direito para ser a da especialização do ordenamento ou dos ordenamentos jurídicos ultramarinos.

II - O projecto não julgou necessário transcrever as disposições constitucionais respeitantes à competência legislativa da Assembleia Nacional e do Governo. Apenas se refere pormenorizadamente à competência do Ministro do Ultramar (artigo seguinte) e à dos órgãos das províncias ultramarinas (artigos 38.º e seguintes).
E tudo uma questão de sistema e o que não foi julgado necessário pelo Governo vem a sê-lo na economia o contraprojecto sugerido pela Câmara.

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Aproveite-se o ensejo para pôr a dúvida seguinte: será lícito que a Assembleia Nacional legisle para todo o território nacional ou sobre matérias comuns à metrópole e a alguma ou algumas províncias do ultramar?
É que, pelo monos à primeira vista, parece que nas últimas alterações à Constituição se lhe retirou competência para, a par com o Governo, expedir legislação geral ou comum para a metrópole e para as províncias ultramarinas e para regular matérias de interesse comum da metrópole e de alguma ou algumas das províncias ultramarinas. Na verdade, a Constituição (artigo 150.º, n.º 2.º) fala em que a competência para legislar nestes casos pertence ao Governo, cabendo à Assembleia reservadamente as matérias a que alude o artigo 150.º, n.º 1.º
Poderia dizer-se, em abono desta interpretação, que provavelmente o legislador constitucional entendeu dever a Assembleia ficar com competência privativa para legislar em certas matérias que, não obstante a sua alta importância, «não exigem, em regra, estudo especializado» e podem, por isso, ser entregues à ponderação de «um órgão sem cultura profunda dos problemas coloniais .
Esta orientação tinha sido expressamente abandonada em 1945 pela Lei n.º 2:009, que, dando nova redacção ao corpo do artigo 28.º do Acto Colonial, distribuiu pela Assembleia Nacional e pelo Governo a competência para legislar, respectivamente sob a forma de lei e de decreto-lei, em matérias de interesse comum da metrópole e de todas ou de alguma colónia.
Desde que a Assembleia Nacional se mantenha, tanto quanto possível, dentro do critério de se restringir à aprovação das bases gerais dos regimes jurídicos, e desde que a iniciativa legislativa caiba, nesta hipótese, ao Ministro do Ultramar, e não a qualquer Deputado, não parece, de jure condendo, que lhe deva ser vedado legislar para o ultramar de todas as vezes que se trate de normas a aplicar a todo o território nacional ou da regulamentação de matérias de interesse comum da metrópole e de alguma ou algumas das províncias ultramarinas. De resto, não há razão para considerar o Governo, no seu conjunto, mais do que a Assembleia, constituído por técnicos de administração colonial, a ponto de só ele ser qualificado para intervir na feitura da legislação comum ou de interesse comum.
Como chegar, porém, legìtimamente, a imputar ao legislador de 1951 o propósito de assim repartir a competência legislativa entre o Governo e a Assembleia, tendo pela frente o obstáculo grave constituído pela letra do artigo 150.º, n.ºs 1.º e 2.º, da Constituição?
Não se encontram elementos de elucidação do problema nos trabalhos preparatórios conhecidos. A discussão parlamentar é omissa neste ponto. A interpretação que nos conduz à solução expressamente consagrada antes da Lei n.º 2:048 pode, porventura, basear-se no preceito do artigo 91.º, n.º 1.º, da Constituição, considerando-o de direito constitucional comum à metrópole e ao ultramar. Por força dele, a Assembleia Nacional poderia legislar para a metrópole e ultramar ou regular matérias de interesse comum da metrópole e de alguma ou algumas províncias ultramarinas. Esta interpretação importaria, porém, que se considerasse lícita a iniciativa de qualquer Deputado, nos termos do artigo 97.º da Constituição, e essa solução não é augurável, embora seja a do direito anterior.
E natural que, à falta de texto favorável, e dadas as necessidades da prática, um «costume constitucional» se venha a formar no sentido de tal legislação ser lícita, embora apenas em seguida a propôs! as do Ministro do Ultramar.
ARTIGO 4.º

7. I - Este número é a reprodução do n.º 3.º do artigo 151.º da Constituição. Nele se dá o critério com base no qual se delimita a competência legislativa do Ministro do Ultramar. A Constituição, depois de se referir a todas as matérias do certo tipo, remete para a lei orgânica para efeitos de nesta se fazer a especificação dessa competência. Isto significa, segundo parece, que cabe ao legislador ordinário definir ou especificar quais são as matérias que representam interesses superiores ou gerais da política nacional no ultramar e quais são as matérias que devem considerar-se comuns a mais de uma província ultramarina.
Isto não quer dizer que o Ministro do Ultramar não possa de todo legislar em matérias diferentes destas, de interesse menos elevado e de alcance menos amplo, que a lei remete para a competência dos órgãos legislativos locais. Fá-lo-á, então, em nome do seu poder de superintendência, que lhe permite substituir-se a esses órgãos, e, de qualquer modo, sem sanção (artigo 150.º, § 3.º).
À lei orgânica compete, pois, especificar aquilo que na Constituição se traduz por uma «cláusula geral». Não tem que reproduzir esta cláusula: há apenas que dar-lhe execução. O n.º I deve, por consequência, ser eliminado.
II - É nas alíneas deste número que o projecto de proposta de lei orgânica procede à especificação da competência legislativa do Ministro do Ultramar. Repare-se, sobretudo, na falta de referência à matéria dos n.OS 1.º, 7.º, 9.º, 10.º e 11.º do artigo 10.º da Carta Orgânica, que dispunha sobre este mesmo assunto. Para todas as omissões há explicação, excepto para a primeira e para a última. Sobre o n.º 1.º dir-se-á mais adiante, na alínea A). Vejamos neste momento quanto aos restantes.
Ao Ministro não pode hoje caber a legislação sobre a organização militar colonial porque se unificou essa organização e a das forças armadas metropolitanas. Não lhe cabe regular o regime monetário e fiduciário das províncias ultramarinas porque essa competência foi transferida para a Assembleia Nacional (artigo 150.º, n.º 1.º, da Constituição). O mesmo se dirá sobre o Estatuto Judiciário do Ultramar, uma vez que, por força do mesmo artigo, a organização dos tribunais cabe exclusivamente à Assembleia. Quanto à aprovação dos empréstimos que não exijam caução ou garantias especiais, de montante superior a certo limite, é que não há razão para que se lhe não faça referência na especificação por este n.º 2.º empreendida. Não se diga que não é matéria legislativa, pois que a autorização de empréstimos ao Executivo é da tradicional competência de órgãos legislativos (cf. Constituição, artigo 91.º, n.º 5.º).
a) Já a Carta Orgânica, nos n.ºs 5.º, 6.º e 8.º do artigo 10.º, especificava matérias deste género, mas realmente não todas as que se impunha referir. (Matérias deste melindre devem ser colocadas de facto fora da competência dos órgãos legislativos locais.
b) As matérias a que esta alínea alude devem considerar-se, efectivamente, senão de interesse superior ou geral da política nacional no ultramar, ao menos matérias comuns às províncias ultramarinas. Pelo que respeita às pessoas colectivas de utilidade pública administrativa (as antigas corporações administrativas), o respectivo regime será, normalmente, traçado nos quadros mais latos do regime administrativo geral das províncias ultramarinas, da competência do Ministro. De qualquer modo, há a notar que as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa são, elas próprias, organismos corporativos morais ou culturais e não têm, por isso, de ser mencionadas à parte.

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c) A aprovação e a ratificação de convenções internacionais não aparecia especificada na Carta Orgânica entre as matérias da competência legislativa do Ministro. Hás, de facto, essa atribuição cabe, em geral, ao órgão legislativo (Constituição, artigo 91.º, n.º 7.º). A aprovação será dada em decreto do Ministro do Ultramar, obtida previamente a concordância do Ministro dos Negócios Estrangeiros, que, aliás, como se verá, deverá também ser ouvido logo no momento de os governos ultramarinos serem autorizados a negociar com governos de territórios estrangeiros. Deste modo se garante a necessária unidade de vistas na condução dos negócios externos da Nação.
d) A alínea fala da organização geral dos serviços públicos. A disposição deverá, porém, entender-se com exclusão daqueles que tiverem organização nacional, caso em que a organização deve ser regulada pelo Governo. À matéria desta alínea refere-se a Carta Orgânica no n.º 4.º do § 1.º do artigo 10.º
Na Carta Orgânica (n.º 1.º deste último preceito) dava-se também conpetência ao Ministro para legislar sobre o regime administrativo geral das colónias. No sistema do projecto, não obstante prever-se a existência de estatutos político-administrativos para cada uma das províncias ultramarinas, não desaparece a necessidade de ser traçado, em diploma próprio, o regime-administrativo geral das províncias ultramarinas, compreendendo, além do mais, as matérias relativas a governos subalternos, serviços gerais, corpos administrativos, etc. E tanto é assim que é o próprio projecto a dizer que será decretada a revisão da Reforma Administrativa Ultramarina, de acordo com as disposições desta nova lei [artigo 82.º, I, alínea b)].
É conveniente, pois, não esquecer a menção desta competência, que poderá ser feita nesta mesma alínea.
e) Contende esta matéria com os interesses superiores da política nacional no ultramar, não devendo, consequentemente, entregar-se aos órgãos legislativos de cada. província a faculdade de elaborar o seu estatuto. Em todo o caso, é extremamente útil ouvi-los durante a sua elaboração. O projecto inclui um preceito que torna necessária esta audiência [artigo 82.º, I, alínea d)].
f) Corresponde ao § 1.º, n.º 4.º, do artigo 10.º da Carta Orgânica, com simples diferenças de forma que a Câmara procurará, por seu turno, aperfeiçoar.
g) Reproduz-se a doutrina do n.º 2.º e de parte do n.º 3.º do § 1.º do artigo 10.º da Carta Orgânica. Tem-se o cuidado de excluir os funcionários abrangidos por estatutos especiais, que lhes sejam aplicáveis em todo o território nacional (funcionários de serviços nacionais). A exclusão é óbvia, mas quod abundat non nocet.
h) A Assembleia legisla normalmente sob a forma de bases gerais (Constituição, artigo 92.º). Tal legislação requer, por via disso e em regra, desenvolvimento e pormenorizarão. Estes tanto podem revestir a forma de decreto regulamentar como a forma propriamente legislativa - decreto legislativo do Ministro do Ultramar. A alínea h) quer aludir apenas à regulamentação sob forma legislativa. Deverá redigir-se de maneira a deixar clara a doutrina de que se trata de regulamentação sob forma legislativa, a emanar quando as leis dela careçam e se se tornar conveniente adoptar essa forma.
i) Esta alínea não tem correspondente no artigo 10.º da Carta Orgânica. Como adiante se verá, a propósito da competência executiva do Ministro do Ultramar e do ordenamento das despesas, é este membro do Governo quem tem competência para superintender na realização das obras e dos planos de maior vulto no ultramar. Deve caber-lhe a correspondente competência para legislar sobre o regime jurídico, incluindo as condições de financiamento, dessas obras e planos, não fazendo sentido que ela fosse atribuída aos órgãos legislativos locais. O que parece, como adiante se verá, é não ter de confiar-se necessariamente ao Ministro a superintendência na realização de obras e planos que envolvam a utilização de bens do domínio público do Estado. Pode ela, sem inconveniente, caber aos governadores, sendo bastante o controle ministerial para salvaguardar os interesses nacionais. Se assim se entender, desaparecerá na alínea a referência à utilização do domínio público.
j) Esta alínea sofrerá a alteração de redacção correspondente às emendas sugeridas pela Câmara à parte do projecto que especialmente respeita às divergências entre os governadores e os outros órgãos legislativos locais.
III - Atenua-se a rigidez das alíneas d) e g), no que respeita aos quadros privativos e complementares. Os órgãos legislativos locais, por força destas alíneas, não poderiam em circunstância nenhuma regular a composição desses quadros, o recrutamento dos seus serventuários, as suas atribuições e a retribuição respectiva. Já na Carta Orgânica (artigo 10.º, § 3.º) se encarava a possibilidade de o Ministro delegar a disciplina de alguns desses assuntos nos governos coloniais. Não se pode negar o acerto desta orientação, tanto mais quanto é certo que o preceito consagra todas as garantias de coordenação e (fiscalização por parte do Ministro e de respeito pêlos limites legais, já que a legislação local tem de ser conforme com a organização geral de cada ramo de serviço. A Câmara aprova, por isso, este preceito, que dá competência aos órgãos que melhor conhecem as exigências e condições locais. Ressalva, porém, a necessidade de leves diferenças de redacção.

ARTIGO 5.º

8. I - O advérbio normalmente está a mais. O facto de no n.º II se consignarem excepções é que deixa concluir que o preceito do n.º I constitui apenas uma regra, ou seja, que a competência legislativa do Ministro do Ultramar será exercida normalmente, precedendo parecer do Conselho Ultramarino.
II - a) A Constituição (artigo 150.º, § 1.º) ressalva da necessidade de prévio parecer do Conselho Ultramarino, em primeiro lugar, como já sucedia com o Acto Colonial (artigo 28.º, § 3.º), os casos de urgência. O projecto vai além desta fórmula e exige que a urgência seja não só declarada, mas justificada no preâmbulo do decreto. Renova-se, deste modo, uma ideia que não vingou na Assembleia Nacional, expressa na última proposta de alteração ao Acto Colonial, onde se exigia que a urgência fosse «reconhecida pelo Conselho de Ministros». Pretende-se, por forma algo diferente, limitar a liberdade de juízo do Governo sobre a urgência da legislação ministerial.
Ora, como, no seu parecer sobre essa proposta, a Câmara Corporativa teve já ocasião de ponderar, a publicação de um decreto legislativo por parte do Ministro do Ultramar implica a prévia referenda do Presidente do Conselho e a promulgação do Chefe do Estado, ou seja a intervenção de qualificados juizes da urgência da legislação. Para mais, essa fórmula simples permite que se dispense o parecer do Conselho Ultramarino em casos em que é absolutamente dispensável, como são os da numerosa «pequena legislação» sobre assuntos de solução incontroversa ou de mera rotina.
b) Reproduz os dizeres da Constituição, que são, aliás, sensivelmente os que já constavam do § 2.º do artigo 10.º da Carta Orgânica.
c) Contém um preceito razoável: a consulta do Conselho Ultramarino torna-se, por via de regra, dispensável quando o Ministro entender que, sobre o decreto a publicar, deve consultar a Câmara Corporativa, nos

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termos do artigo 105.º da Constituição. Se estiver reunida a Conferência dos governadores ultramarinos e o Ministro achar conveniente ouvi-la, em princípio deve considerar-se também dispensável a audiência do Conselho. Deve introduzir-se este aditamento ao preceito.
d) Não parece que a mera forma do acto legislativo importe a dispensa de consulta ao Conselho Ultramarino. Note-se ainda que a alínea d) é uma excepção ao n.º I e consigna, por sua vez, excepções.
Não é esta uma redacção que se aplauda.
e) Em rigor, esta alínea seria dispensável ante o que já dispõe a alínea a): na verdade, se o Ministro se encontrar em funções numa província ultramarina e aí tomar providências legislativas, será porque as considera urgentes, a ponto de não deverem aguardar o seu regresso à metrópole e a correspondente consulta ao Conselho Ultramarino. Não há, porém, mal em que o preceito se inclua na lei.

ARTIGO 6.º

9. A Carta Orgânica referia-se ao Conselho do Império Colonial no artigo 15.º, na secção respeitante aos «Órgãos consultivos do Governo Central», aparecendo, assim, a par da Conferência dos governadores coloniais e das Conferências económicas do Império Colonial. Dava uma ideia geral Da índole do Conselho, descrevia as suas atribuições e referia-se mais detidamente aos outros dois órgãos de consulta do Governo.
O projecto não se refere de todo às Conferências e remete pura e simplesmente para diploma especial no que respeita ao Conselho Ultramarino.
Há que observar, no ponto de vista sistemático, antes de qualquer outro, que não é facilmente aceitável que numa lei orgânica do ultramar se aluda só de passagem, e a propósito do sistema legislativo, a um órgão da importância e das tradições do Conselho Ultramarino. Poderá argumentar-se contra este modo de ver alegando que a Constituição se lhe refere também incidentalmente, e somente como órgão de consulta legislativa do Ministro do Ultramar. Mas o Conselho não irá, seguramente, ser reformado no sentido de manter apenas estas funções: o legislador constitucional quis deixar ao legislador ordinário a liberdade de moldar o Conselho como lhe parecer mais conveniente.
Como quer que se pense reorganizar o Conselho Ultramarino, quaisquer que sejam as atribuições que dele se retirem, é certo que ele não poderá deixar de continuar a ser o mais alto órgão permanente de consulta do Governo em matéria de política e administração ultramarina. Não vê a Câmara que seja viável diluir a importância deste órgão em favor dela própria, como já teve ocasião de proclamar no seu parecer n.º 10/V. E, sendo assim, não há mal em que se consigne desde já na lei a função genérica deste Conselho.
Há-de, por outro lado, retirar-se do lugar escondido em que se encontra o preceito deste artigo 6.º Irá ele, no modo de ver da Câmara, situar-se numa secção respeitante aos órgãos consultivos do Governo: a Câmara Corporativa, o Conselho Ultramarino, a Conferência dos governadores ultramarinos e as Conferências económicas do ultramar. Não parece, de facto, conveniente extinguir estes dois órgãos temporários de consulta. Qualquer deles, quando teve ocasião de se reunir, produziu trabalho valioso. Basta lembrar, quanto à Conferência dos governadores, o estudo que fez das disposições da Carta Orgânica, e, quanto à Conferência económica, a colectânea de estudos nela apresentados e discutidos, hoje reunidos em publicação do Ministério. O facto de estas Conferências terem deixado de reunir não prova contra a sua utilidade: provará, sim, que ao Governo precisa de ser lembrada a conveniência de as convocar. Não rigidamente de três em três anos e em Lisboa, mas quando e onde se mostrar conveniente. Sobre os assuntos capitais de administração geral do ultramar ou sobre os seus problemas económicos comuns, impõe-se ouvir a sua própria voz - voz cuja autoridade não pode ser substituída por nenhuma outra, por categorizada que seja.

ARTIGO 7.º

10.I - O artigo corresponde a parte do conteúdo dos artigos 12.º e 13.º da Carta Orgânica. Requer-se agora a audiência do Conselho Ultramarino para a anulação ou revogação dos diplomas legislativos das províncias ultramarinas, que sobretudo pode ser útil nos casos de revogação, baseada, como esta é, na pretendida inconveniência desses diplomas para os interesses nacionais (fórmula que o projecto substitui, sem vantagem, por esta outra r inconveniência para os interesses superiores da política nacional no ultramar). Esta anulação ou revogação deve considerar-se como exercício de faculdades legislativas pelo Ministro - e justifica-se, por isso, a intervenção consultiva do Conselho, nos termos gerais.
Deixa o projecto, muito bem, de aludir à possibilidade de o Ministro anular diplomas legislativos por contrariarem ordens ou instruções superiores: esse é caso de revogação, não de anulação. De resto, na economia do projecto, a legislação provincial passa a provir do governador e de um órgão que não está propriamente sujeito a ordens e instruções superiores - conforme as províncias, o Conselho Legislativo ou o Conselho do Governo.
II - A portaria de revogação, ao contrário do que sucedia pela Carta Orgânica, entrará em vigor nos termos do regime geral da vacatio legis.
Parece acertada a modificação.
III - É o direito anterior e não oferece margem para objecções.
IV - Consagra solução já perfilhada na Carta Orgânica quanto à revogação, agora alargada, e muito bem, à anulação. Em todo o caso, deve dizer-se que este, como está redigido, é um dos tais preceitos de que não há necessidade estrita, pois é evidente que nada pode impedir -senão um preceito expresso- que o Ministro ouça o governo da província interessada quando o entenda necessário. A Câmara inclina-se para que a audição do governo ultramarino interessado seja obrigatória, e não meramente facultativa.

ARTIGO 8.º

11. I - Não pode perfilhar-se este preceito, que não tem antecedente na Carta Orgânica. Não pode, com efeito, prescrever-se que não vigorem no ultramar diplomas organicamente inconstitucionais ou simplesmente em contradição com as normas de competência preceituadas na lei orgânica. Quanto à inconstitucionalidade orgânica, será necessário ter em conta o § único do artigo 123.º e o § 3.º do artigo 150.º da Constituição; e, quanto à simples incompetência, há que distinguir entre a do Ministro que invada as faculdades legislativas dos órgãos legislativos ultramarinos e a destes quando invadam a do Ministro. A inconstitucionalidade orgânica pode nem sequer ser verificada pela Assembleia e, de qualquer modo, é esta que determina os efeitos da inconstitucionalidade. A primeira hipótese figurada de simples incompetência não tem, por seu turno, quaisquer efeitos, considerando-se regulares, por força dos poderes de superintendência do Ministro, os diplomas por este emanados no domínio da competência pela lei fixada para os órgãos legislativos locais. Só a última conduz - e ainda assim não necessariamente - à anulação do diploma pelo Ministro, com eficácia ex tunc.
Consequentemente, por fixar doutrina inexacta, há-de eliminar-se este n.º I.

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II- Consagra-se a doutrina da Carta Orgânica. Mas o preceito deveria consignar, como nesta se faz, a competência dos governadores para publicar os diplomas locais - diplomas legislativos e regulamentares da província.
III - Trata-se da reprodução e desenvolvimento do disposto no § 2.º do artigo 150.º da Constituição, com antecedentes no artigo 28.º do Acto Colonial. A legislação emanada da metrópole é, antes de publicada nas províncias ultramarinas, publicada no Diário do Governo. Como, por força da disposição anteriormente analisada, a publicação nas províncias dessa legislação compete ao Ministro do Ultramar, haverá que dispor sobre a forma de o Ministro determinar essa publicação. Diz este preceito que tal objectivo se consegue através da menção, aposta pelo Ministro, segundo a qual os diplomas devem ser publicados no Boletim, Oficial da província ou províncias onde hajam de executar-se. O projecto entra em seguida em distinções a este respeito, mas sem necessidade. Não há nenhuma espécie de inconvenientes em que se continue com o regime anterior.
IV - Corresponde ao direito vigente, com modificações para pior na redacção. Fala-se agora em normas regulamentares especialmente exigidas para a adaptação. Serão regulamentares apenas quando o diploma que se trate de adaptar seja um regulamento; serão legislativas quando o diploma for um acto legislativo.
V - Norma com antecedente no § 4.º do artigo 91.º da Carta Orgânica. Não há necessidade de ressalvar os assentos do Supremo Tribunal de Justiça. Na verdade, esses arestos não são, nem na metrópole, nem no ultramar, publicados na colectânea oficial das leis por ordem das autoridades com competência normal para ordenar a publicação dos actos legislativos (Chefe do Estado e Ministro do Ultramar, respectivamente), mas por ordem do Supremo Tribunal de Justiça (cf. Código de Processo Civil, artigo 768.º, § 2.º, e Portaria n.º 9:677, de 30 de Outubro de 1940, artigo 3.º).

ARTIGO 9.º

12. I - Corresponde, sem alterações, ao § 1.º do artigo 92.º da Carta Orgânica. Não merece reparos.
II - Não coincide inteiramente este preceito com o correspondente da Carta Orgânica. Neste (§ 2.º do artigo 92.º) dispunha-se que a entrada em vigor nas colónias da legislação emanada da metrópole independentemente da sua publicação no Boletim Oficial só podia ter lugar tratando-se de legislação comum à metrópole e ao Império - legislação, em suma, aplicável a todo o território nacional.
Melhor parece a solução agora consagrada: a entrada em vigor no ultramar de legislação emanada da metrópole independentemente de publicação no Boletim Oficial só (excepcionalmente) terá lugar quando no diploma, seja ele comum, seja ele especial, se declarar que é imediatamente aplicável. O ser o diploma comum a todo o território ou especial a uma só ou a mais do que uma província é circunstância que nada tem que ver com a urgência na sua entrada em vigor.
III - Corresponde ao § 3.º do artigo 91.º da Carta Orgânica, salvo leve diferença de redacção. Este número entende-se para todos os casos de urgência e designadamente para a hipótese encarada no número anterior.
IV - Salva a redacção, aqui se dispõe o mesmo que se prescrevia no artigo 93.º da Carta Orgânica.

ARTIGO 10.º

13. I- Corresponde ao corpo do artigo 92.º da Carta Orgânica. Não faz mal que o Boletim Oficial tenha a forma do Diário do Governo, como também não há mal em que o seu formato seja diferente..
E tanto vale dizer que o Boletim Oficial será publicado em regra semanal ou quinzenalmente como dizer que o será em regra semanalmente ... Pode aproveitar-se este preceito para inserir aquele, aliás, em vigor, segundo o qual no frontispício do Boletim Oficial será impresso o escudo nacional. Como a Câmara virá a propor a supressão do artigo 81.º do projecto, mais se justifica que esta prescrição fique no presente lugar.
II - Corresponde ao artigo 94.º da Carta Orgânica, com alterações de forma. Não é necessário que o diploma de origem metropolitana conserve no Boletim a monção de publicação constante do Diário do Governo.

ARTIGO 11.º

14. Em vez da especificação de prazos que na Carta Orgânica se faz, o projecto orienta-se no sentido de deixar aos estatutos político-administrativos a discriminação dos pontos do território de cada província onde a vacatio legis deva ser mais longa do que a normal de cinco dias. Ainda que estejamos, além-mar também, na era do avião e das fáceis comunicações automóveis, que dão celeridade à distribuição postal, continuará a justificar-se, por muito tempo ainda, a clássica discriminação de prazos para a entrada em vigor das leis e outros diplomas.

CAPITULO II

Governo e administração geral

SECÇÃO I

Governo Central

ARTIGO 12.º

15. I - Este preceito reproduz o disposto no artigo 153.º da Constituição, o qual, por seu turno, não constava do. Acto Colonial, embora não houvesse nisso inconveniente: a sua doutrina constava do n.º 4.º do artigo 109.º da Constituição, que se deveria considerar de direito comum, dando a síntese das atribuições do Governo quanto à administração metropolitana e quanto à administração colonial. Por sua vez, a repartição das atribuições governamentais entre os vários órgãos do Executivo, na medida em que não resultava do Acto Colonial, ficava para a Carta Orgânica. Foi, afinal, por uma questão mais de sistema do que de necessidade que tal se veio dizer expressamente no artigo 153.º da Constituição. De qualquer modo, justifica-se que uma secção respeitante à competência do Governo Central seja introduzida por um preceito como o deste n.º I.
II - Parece que a ordem mais lógica será a de referir primeiro o Presidente do Conselho e só em seguida o Conselho de Ministros. O Presidente do Conselho é um órgão constitucional que se situa em plano superior ao Conselho de Ministros, a que, aliás, normalmente preside, uma vez que os participantes nesse Conselho, os Ministros, são nomeados sob proposta sua e são por ele referendadas as nomeações e exonerações deles, e uma vez que coordena e dirige a sua actividade (Constituição, artigos 107.º, § 1.º, e 108.º).
a) Não oferece dúvidas a disposição desta alínea: é a reprodução da solução já em vigor pela Carta Orgânica e que em parte é imposição constitucional (§ 5.º do artigo 109.º da Constituição). A nomeação, a recondução e a exoneração dos governadores antes do termo normal da comissão são actos que requerem a maior ponderação, bem se compreendendo, por isso, que sejam entregues ao Conselho de Ministros;
b) Só a referência à competência do Conselho de Ministros para autorizar certas concessões a estrangeiros [artigo 73.º, n.º I, alínea a)] se deve manter. A referência ao artigo 59.º, n.º II, deve desaparecer. Até à Lei n.º 2:048 competia à Assembleia Nacional

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aprovar os empréstimos das províncias ultramarinas que exigissem caução ou garantias especiais [Acto Colonial, artigo 27.º, n.º 2.º, alínea b)]. O projecto substitui a autorização da Assembleia pela do Conselho de Ministros. Ora a autorização dada ao Executivo para contrair empréstimos cabe tradicionalmente ao Legislativo, embora seja, por natureza, um acto administrativo. Deve, pois, confiar-se essa competência ao órgão legislativo que concorre com a Assembleia: ao Governo, não propriamente ao Conselho de Ministros. Essa autorização revestirá a fornia de decreto-lei.
III - Nada há a observar, salvo quanto à redacção. Corresponde ao artigo 8.º da Carta Orgânica.
IV - A grande especialidade quanto à intervenção do Governo na administração ultramarina está modernamente, como por demais se sabe, no facto de a generalidade das tarefas da administração central estar entregue, não a vários Ministérios, conforme um critério funcional, mas a um só Ministério, especializado nesses assuntos e capaz de imprimir unidade de direcção superior aos negócios ultramarinos, Ministério hoje entre nós chamado do Ultramar.
Este departamento é algo distinto dos restantes. Enquanto nestes o Ministro é, na generalidade dos casos, o agente da final decisão dos assuntos atribuídos à administração do Ministério, no Ministério do Ultramar o Ministro não é, por via de regra, o órgão que decide definitivamente. As províncias ultramarinas encontram-se a grandes distâncias, os seus negócios são extremamente variados e complexos: o aconselhável é, por isso, deixar a decisão deles no local aos governos respectivos. «É lá, no próprio local, que a grande massa dessas questões tem de ser examinada e resolvida», como se disse no recente parecer desta Câmara sobre as alterações ao Acto Colonial. Ao Ministro fica o papel de direcção política, de orientação e de fiscalização da actividade desses governos. O que não quer dizer que num certo número de matérias, consideradas de interesse ultramarino geral ou de especial importância e complexidade, lhe não deva caber a decisão final, ficando directamente atribuídas à sua gestão.
É este o alcance fundamental da primeira parte do preceito em exame. No final dispõe-se sobre a necessidade de cooperação interministerial na esfera das atribuições do Ministro do Ultramar funcionalmente idênticas às de outros Ministros, quanto à metrópole. Não se requer qualquer preceito sobre este ponto. A cooperação é primacial dever dos Ministros e é de resto assegurada pelo Presidente do Conselho.
Em obediência ao rigor sistemático, torna-se, parece, necessário aludir também ao Subsecretário de Estado do Ultramar, como delegado do Ministro para a decisão dos assuntos da sua competência executiva.
V - Sempre foi constitucionalmente lícito - e é-o claramente hoje, em face do artigo 153.º- retirar da superintendência do Ministro do Ultramar serviços ultramarinos e colocá-los na dependência do Ministro funcionalmente competente para a gestão de serviços da mesma ordem na metrópole, unificando-os em obediência a um critério de assimilação administrativa. A Câmara Corporativa já oportunamente se pronunciou (parecer n.º 10/V) sob o ponto de saber até onde é aceitável que a legislação ordinária se oriente no sentido da unificação dos serviços metropolitanos e ultramarinos, e não se voltará por isso aqui ao assunto.
Na medida em que se constituam serviços nacionais, a parte ultramarina desses serviços fugirá, naturalmente, em maior ou menor medida, da direcção directa dos governadores. Não se exclui, porém, que os governadores dirijam a parcela ultramarina de serviços nacionais, ficando na dependência, para esse efeito, do Ministro competente. É isso bem claro hoje na Constituição, tendo em conta o artigo 153.º e a diferença de redacção entre o artigo 155.º e o antigo artigo 31.º do Acto Colonial. A Câmara faz, porém, votos por que tal orientação não seja frequentemente seguida na prática. Fica assim esclarecido o alcance deste n.º V, que merece aprovação no essencial.

ARTIGO 13.º

16. O artigo contém, sobretudo, a enumeração das atribuições de administração directa e final do Ministro. O papel que lhe cabe de superintender, orientar e fiscalizar não é facilmente redutível a uma enumeração de poderes.
Além da discriminação feita neste artigo, deve incluir-se um número final, prevendo si demais competência fixada noutras leis.
Não se inclui um preceito correspondente ao do n.º 1.º do § 1.º do artigo 11.º da Carta Orgânica - e a explicação está em que, nas termos da alínea a) do n.º III do artigo 18.º, os funcionários de categoria superior a administrador de circunscrição pertencem ao quadro comum do ultramar e estão, portanto, abrangidos pela disposição genérica do n.º 1.º do artigo 13.º
O n.º 1.º deste artigo não suscita objecções, reproduzindo, com simples retoques de redacção, o direito anterior, ou seja: o n.º 2.º e parte do 3.º do § 1.º do artigo 10.º da Carta Orgânica.
A primeira parte do n.º 2.º não tem correspondente no artigo 10.º da Carta Orgânica, mas corresponde, em todo o caso, ao direito vigente. A segunda parte corresponde à parte final do n.º 3.º do § 1.º do artigo 10.º e ao artigo 121.º e seu § 1.º da Carta Orgânica.
O n.º 3.º refere-se a funcionários de quadros já considerados no n.º 1.º Mas, enquanto pelo n.º 1.º o Ministro só transfere ou promove funcionários (dos quadros privativos ou complementares) sobre os quais, por lei especial, exerça essas atribuições, pelo n.º 3.º promove-os e transfere-os para os quadros de serviços idênticos de outra província, mesmo que a lei lhe não atribua especificamente essa competência, se houver acordo dos governadores interessados. Continuará a ter o parecer dos governadores que respeitar apenas ao facto da troca, ou seja, às qualidades do funcionário que entra ou às do que sai, relacionadas com o serviço, devendo ser-lhe estranhas considerações de outra ordem, que ao Ministro cabe apreciar (Portaria n.º 10:651, de 21 de Abril de 1944). A expressão a em regras deve ser eliminada, sob pena de ser preferível eliminar o n.º 3.º e deixar apenas o n.º 1.º em termos de o Ministro ter sempre competência para promover e transferir os funcionários de qualquer quadro. Era, de resto, assim que se dispunha no correspondente preceito da Carta Orgânica.
O n.º 4.º não oferece lugar a qualquer observação. Corresponde ao direito anterior. Quanto às alíneas do n.º 5.º, há a observar:
a) Não deve ser considerada apenas a instalação de indústrias, mas a reabertura, modificações no equipamento e mudança de local dos estabelecimentos industriais sujeitos a condicionamento, nos termos de diploma especial que regule o condicionamento dos investimentos industriais no ultramar. Não convém fazer referência ao regime actualmente em vigor, que pode e talvez deva ser alterado de forma a assegurar-se melhor coordenação da política metropolitana e da política ultramarina de investimentos industriais;
b) O projecto procura delimitar a competência do Ministro e a dos governadores em matéria de concessões em termos diferentes dos da Carta Orgânica (artigo 10.º, § 1.º, n.º 9.º, e artigo 37.º, n.º 11.º). A Carta Orgânica admite que os governadores façam concessões de bens do domínio público, como jazigos minerais, estradas,

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caminhos de ferro de interesse local e pontes. O projecto prescreve que sejam da competência do Ministro todas as concessões que envolvam utilização de bens do domínio público. Não se descobre razão plausível para esta alteração, a não ser a de vincar que os bens do domínio público, no ultramar, pertencem ao Estado e não às províncias ultramarinas. Simplesmente, os governadores, ao fazerem concessões, intervêm, não como órgãos provinciais, mas como representantes do Governo Central, ou seja, portanto, em nome do Estado. O regime em vigor acautela, por conseguinte, devidamente, o interesse deste. Pode-se, pois, sem qualquer inconveniente, conservar o regime do direito anterior (Carta Orgânica e leis especiais).
O preceito também altera a Carta Orgânica no que respeita a concessões para o estabelecimento de comunicações. A Carta Orgânica reservava aos governadores as concessões de navegação fluvial e de cabotagem, qualquer sistema de viação terrestre, exploração de estradas, caminhos de ferro de interesse local, pontes de estradas e ,pontes-cais (citado artigo 37.º, n.º ll.º) e atribuía ao Ministro competência para fazer concessões de cabos submarinos, comunicações radiotelegráficas, carreiras aéreas e vias férreas de interesse geral. O projecto utiliza o critério seguinte para repartir esta competência: distingue entre comunicações internas da província e comunicações com o exterior, atribuindo as concessões das primeiras ao governador e das últimas ao Ministro. Ao regime da Carta Orgânica falta-lhe a homogeneidade do critério territorial do projecto, mas é talvez mais atento à conveniência de confiar rã Lisboa a atribuição de certas concessões importantes, embora restritas a comunicações internas. A Câmara prefere, por isso, a solução vigente.
Sobre as concessões de obras, a Carta Orgânica reservava certas para os governadores (citado artigo 37.º, n.º 11.º) e as concessões de grandes obras públicas para o Ministro. É sistema que pode persistir.
Nada dispõe o projecto sobre a competência para concessões de licença de instalação de depósitos de combustíveis: convém talvez manter o regime actual, reservando a Lisboa a decisão desses assuntos.
c) Corresponde ao n.º 10.º do § 1.º do artigo 11.º da Carta Orgânica, mas difere consideravelmente deste. A Carta Orgânica dava ao Ministro competência para autorizar obras e planos de obras públicas cujo custo excedesse determinados limites, fixados nos artigos 35.º, n.º 6.º, e 37.º, n.º 15.º, abaixo dos quais a competência competia ao governador. O projecto fixa outros limites, que podem aceitar-se sem relutância. Quanto, porém, à circunstância de as obras ou planos envolverem a destinação ou aproveitamento de bens do domínio público, não deve ela entrar na questão da delimitação da competência da metrópole e dos governos ultramarinos. Deve omitir-se, pois, a referência que na alínea se faz ao domínio público.
O n.º 6.º é aceitável, mas pode ser encurtado: a orientação e fiscalização do Ministro em matéria de administração financeira ultramarina só pode ter em vista assegurar o equilíbrio orçamental e conseguir a ordem financeira. Seja como for, aqui é o lugar de fixar apenas a competência do Ministro, não os fins da orientação e fiscalização, de que se trata noutro lugar do projecto.
O n.º 7.º deve ser completado e simultaneamente simplificado, com o objectivo de apenas dar nota da competência ministerial no capítulo das medidas necessárias ia dominar a natural tendência que da parte dos governos ultramarinos não deixaria de manifestar-se no sentido de alargarem a sua acção para além das despesas previstas ou de modificarem, no decurso do ano económico, o plano de administração fixado no orçamento.
A autorização ministerial prevista no n.º 8.º é, material e formalmente, um acto administrativo, ao contrário da aprovação, que, pela sua importância, reveste tradicionalmente forma legislativa. A Carta Orgânica, no entanto, considerava também esta da competência administrativa do Ministro (artigo 11.º, § 1.º, n.º 14.º).
O n.º 9.º (correspondente ao n.º 17.º do artigo que vem de ser citado) deve ser cindido em dois números, para se separarem preceitos que não têm parentesco próximo, ao menos (pelo lado do respectivo objecto.

ARTIGO 14.º

17. Não se torna necessário acentuar que a delegação é revogável, por ser óbvio que o é; como também é óbvio que a delegação pode ser total ou parcial.
A possibilidade de delegação da competência ministerial para contratar funcionários necessários ao exercício de funções nos quadros comuns, nos quadros complementares e nos quadros privativos fundamenta-se naturalmente em que o provimento contratual liga o funcionário à função por períodos curtos.
Quanto à possibilidade da delegação de competência para conceder licenças registadas, justifica-se, uma vez que os governadores estão em boas condições para apreciar dos inconvenientes que ida concessão delas possam resultar.
A delegação nos governadores da competência para mandar apresentar no Ministério quaisquer funcionários não era prevista na Carta Orgânica, pela simples razão de que nesta era atribuída simultaneamente ao Ministro e aos governadores (artigo 121.º). Tão essencial é que os governadores disponham deste poder que o Ministro fará bem em lho delegar permanentemente.
A delegação da competência conferida ao Ministro na alínea a) tinha correspondência no disposto no § 2.º do artigo 11.º da Carta Orgânica, que aliás previa também a possibilidade da delegação da competência do Ministro para transferências de verbas e aberturas de crédito, que igualmente se deve aqui consignar.
Por último, considera o projecto lícita a delegação da competência que lei especial atribua ao Ministro em matéria de condicionamento industrial. Não parece que na parte em que essa matéria seja da competência da metrópole, e tendo em conta as necessidades de superior coordenação da economia ultramarina e até desta com a metropolitana, seja aconselhável permitir que o Ministro delegue os seus poderes de condicionamento.

ARTIGO 15.º

18. I - A doutrina deste n.º I está certa: como superior hierárquico dos governadores, o Ministro superintende na sua actividade e tem naturalmente o poder de anular, revogar, reformar, suspender os actos administrativos da competência deles, como aliás pode agir em idênticos termos em relação aos actos legislativos da competência dos órgãos provinciais. O n.º 7.º do § 1.º do artigo 11.º e os artigos 12.º e 13.º regulavam estas matérias conjuntamente, mas em termos algo diferentes.
Os governadores realizam duas espécies de actos administrativos: constitutivos de direitos uns, não constitutivos outros. Estes últimos são livremente modificáveis, anuláveis, revogáveis, reformáveis e suspensos pelo Ministro, funcionando então integralmente o princípio segundo o qual a Administração deve praticar os actos indispensáveis à salvaguarda do interesse público.
Não assim quando os actos dos governadores forem constitutivos de direitos: tais actos são estáveis perante a Administração. Não pode ela alterá-los com base em

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considerações de oportunidade; e quanto à legalidade, confere-se, neste caso, a sua salvaguarda ou defesa aos tribunais do contencioso administrativo. Ë nesta orientação que aos governadores não resta mais, nesta hipótese, do que recorrer dos seus próprios actos (Reforma Administrativa Ultramarina, artigo 752.º, n.º 3.º, e n.º 4.º do artigo 6.º do Regimento 4º Conselho Ultramarino, aprovado pelo Decreto n.º 32:539, de 18 de Dezembro de 1942), no prazo de seis meses, contados do dia em que o acto recorrido produzir efeito para com o Estado ou para com terceiros (Reforma Administrativa Ultramarina, artigo 800.º, § 2.º). O mesmo deve fazer o director-geral respectivo, precedendo despacho do Ministro, conferindo-lhe a lei o prazo de um ano para o fazer (mesmos preceitos). É esta a doutrina a que se alude neste n.º I, ao falar em que o Ministro do Ultramar pode ordenar a interposição de recurso contencioso para o efeito de anular quaisquer direitos resultantes de portarias ou decisões, quando os considere ilegais. Salvo, pois, alterações do forma, o preceito merece aprovação.
II e III - Correspondem sensivelmente ao direito anterior. Não merecem reparos que não sejam de mera, forma.

SECÇÃO II

Administração geral

ARTIGO 16.º

19. I - Este preceito, ou a correspondente doutrina, melhor colocado ficará ao dispor-se sobre o Ministério do Ultramar, como principal órgão central da administração e governo ultramarinos. Note-se que não é propriamente o Ministério que compreende os ramos de serviço que a lei determina. Esses ramos de serviço compreendem serviços provinciais, serviços centrais do Ministério e serviços ultramarinos gerais, dirigidos todos eles, em último termo, indirecta ou directamente, pelo Ministério: indirectamente os serviços provinciais propriamente ditos, subordinados em primeira linha aos governadores respectivos; directamente os serviços centrais e os serviços ultramarinos gerais, como, por exemplo, os serviços de inspecção superior. O Ministério superintende em todos estes serviços, distribuídos em ramos, conforme a sua natureza e especialidade. No Ministério, para auxiliar ,o Ministro no estudo dos assuntos e na preparação das suas decisões, há, correspondentes a cada ramo de serviço, direcções-gerais.
II - Os ramos de serviço ultramarino (serviços provinciais) encontram-se, de facto, subordinados ao Ministro do Ultramar, por intermédio da autoridade do governador da respectiva província. Os serviços centrais e os serviços ultramarinos gerais, esses estão, como se disse, directamente subordinados ao Ministro.
III - O n.º III, seria, em rigor, dispensável, pois nada impedirá o legislador de prescrever, neste e naquele caso, a coordenação entre os serviços ultramarinos e os serviços metropolitanos correspondentes. Trata-se de formas intermédias entre os serviços nacionais e os serviços provinciais, que pode haver interesse em instituir.

ARTIGO 17.º

20. I- Corresponde quase literalmente ao artigo 70.º do Decreto n.º 28:180, de 7 de Janeiro de 1936. A Câmara, sem alterar o alcance ao preceito, sugere que se fale apenas em ramos de serviço, em vez de em organizações hierárquicas, já que, para efeito de dispor sobre os quadros de funcionalismo ultramarino, não é necessário aludir ao aspecto hierárquico. Igualmente é dispensável falar, a este respeito, de competência e de disciplina.
II - Altera-se o modo de dizer do artigo 122.º da Carta Orgânica para se adoptar sensivelmente a do citado Decreto n.º 28:180 (artigo 70.º, § 1.º). Ë indiferente utilizar uma ou outra redacção.
III-Corresponde sensivelmente ao § 2.º do artigo 123.º da Carta Orgânica.
IV - Preceito dispensável.
V - Corresponde exactamente ao que hoje se dispõe no § 2.º do artigo 122.º da Carta Orgânica. Sem qualquer justificação, omite-se um preceito idêntico ao do § 1.º deste artigo. Tal preceito necessita de ser inscrito na lei para vedar o ingresso a determinados serviços de pessoal sem a necessária preparação, de acordo com o princípio da incomunicabilidade dos quadros.

ARTIGO 18.º

21. I - Corresponde ipsis verbis ao corpo do artigo 123.º da Carta Orgânica e é preceito inquestionável.
II - Contém doutrina óbvia quanto aos quadros comuns e privativos e doutrina que já se deduzia do § 2.º do artigo 123.º quanto aos quadros complementares.
III - Reafirma, em primeiro lugar, o princípio de que os quadros terão a composição estabelecida na lei, que é óbvio e que, em todo o caso, já se encontra expresso no n.º I. A ideia dominante é a de que aos quadros privativos correspondem as categorias inferiores e, de toda a maneira, os funcionários que se iniciam na carreira. Aos quadros comuns pertencerão os funcionários das categorias superiores. O projecto dá agora critérios simples para a delimitação dos quadros comuns, que merecem aprovação.
IV - Corresponde sensivelmente ao já disposto no § 2.º do artigo 123.º da Carta Orgânica. Diz este n.º IV que o provimento nos quadros complementares se faz em regra por contrato ou em comissão. Mas o preceito encontra-se deslocado, devendo associar-se ao artigo 21.º
V - É óbvio, mas também já constava expressamente do artigo 123.º da Carta Orgânica.

ARTIGO 19.º

22. I - Consagra-se aqui um princípio que não parece aceitável à Câmara Corporativa: o da solidariedade interprovincial no custeio das despesas com o pessoal dos quadros comuns do ultramar. Segundo este preceito, cada província não teria rigorosamente de pagar aos funcionários dos quadros comuns que nela prestassem serviço, mas antes de concorrer para uma espécie de caixa comum, na proporção das suas receitas. E, assim, poderia ter de pagar mais ou menos do que aquilo que corresponde à despesa com os funcionários desse quadro que por conta dela prestam serviço.
Não se vê que justificação haja para semelhante solução. O natural é que cada uma delas custeie os serviços de que aproveita, suporte os respectivos gastos com material e com pessoal, seja este dos seus quadros privativos, seja este dos seus quadros comuns. A distribuição do funcionalismo ultramarino por quadros privativos, complementares e comuns não obedece, nem de perto nem de longe, à ideia de separar as respectivas despesas. Os funcionários dos quadros comuns, enquanto prestam serviço numa província, são funcionários que trabalham para ela e que por ela devem ser pagos. A ideia do custeio comum de despesas, pelas províncias ultramarinas, compreende-se para serviços comuns, não para quadros comuns. É esta, aliás, a orientação do projecto ao tratar das despesas públicas das províncias ultramarinas (artigo 61.º).
II e III - Prejudicados em face das objecções ao n.º I.

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ARTIGO 20.º

23. I - Corresponde ao corpo do artigo 126.º da Carta Orgânica, salva leve e irrelevante diferença de redacção.
II - a) Propõe-se, por parte da Câmara Corporativa, a conservação do regime de competência para nomeações interinas consagrado na Carta Orgânica (artigo 125.º, § 1.º, n.º 1.º), por parecer mais adequado. É que leis especiais podem prescrever que seja competente para fazer determinadas nomeações interinas para quadros- complementares o governador e que para fazer idênticas nomeações para quadros privativos seja competente o Ministro.
b) Propõe a Câmara certas alterações relacionadas com a sugestão que faz sobre a alínea a).
III - Coincide com o já hoje disposto no § 2.º do artigo 126.º da Carta Orgânica. Nada há a sugerir em contrário.
IV - A primeira parte corresponde ao § 3.º do artigo 126.º da Carta Orgânica. A segunda parte esclarece o que se dispõe no § 4.º deste mesmo artigo. Há-de fazer-se referência também aos militares do novo ramo das forças armadas, a Aeronáutica Militar. Não é necessária tanta pormenorização como a que na parte final se faz.
V - Corresponde ao § 5.º do artigo 126.º da Carta Orgânica. Contém doutrina incontroversa.
Quanto à alínea a), tem antecedente no corpo do artigo 99.º da Carta Orgânica, que vem esclarecer. Prefere também a Câmara que não se continue a falar em funções de autoridade, e se passe a aludir a funções governativas, expressão de alcance menos amplo. Efectivamente, só para funções de categoria propriamente governativa se compreende a nomeação em comissão, não para os mais modestos cargos, como os de chefe de posto e administrador de circunscrição ou de concelho.
A alínea b) não merece objecções. Mas necessita dizer-se aí que as nomeações para lugares dos quadros complementares poderão ser feitas em comissão.
A alínea c) corresponde, com alterações, ao que se dispõe no § 1.º do artigo 99.º da Carta Orgânica. A Câmara entende que não deve dar-se aos directores-gerais competência para propor a recondução de funcionários nomeados em comissão de serviço. A proposta deve vir do governador, que é quem directamente observa a conduta do funcionário. A solução do projecto pode conduzir a divergências entre directores-gerais e governadores e a que o Ministro reconduza funcionários contra o parecer do governador sob as ordens directas do qual esses funcionários servem.
A alínea d) correponde ao § 2.º do artigo 99.º da Carta Orgânica e só na redacção dele difere.
Por último, a alínea e) é a reprodução da doutrina do § 3.º do mesmo artigo 99.º O que se não torna inteligível é a referência que se faz aqui ao disposto na alínea a).
VI - O n.º VI coincide com o disposto no artigo 127.º da Carta Orgânica. Como o sistema dos concursos de provas públicas é prescrito apenas em princípio, são lícitas outras formas de recrutamento, conforme a lei dispuser.

ARTIGO 21.º

24. I - Corresponde ao artigo 128.º da Carta Orgânica. Não há necessidade de nos afastarmos muito da redacção deste preceito, salvo quanto à alínea c), em que se deve consignar a possibilidade de assalariar pessoal ao mês.
II - Corresponde ao § único do artigo 128.º da Carta Orgânica. Convém prescrever que em regra os contratos serão precedidos de concurso.

ARTIGO 22.º

25. I, II e III - A partir do Decreto-Lei n.º 32:157, de 21 de Julho de 1942, tem-se caminhado no sentido de dar execução ao artigo 53.º da Constituição. A evolução legislativa está hoje praticamente consumada (Decreto-Lei n.º 37:542, de 6 de Setembro de 1949, Lei n.º 2:051, de 15 de Janeiro de 1952, e Lei n.º 2:055, de 27 de Maio de 1952) e constituem serviços públicos nacionais o Exército, a Marinha e a Aeronáutica Militar, salvo, quanto ao ultramar, adaptações indispensáveis.
IV - Corresponde à segunda parte do artigo 111.º da Carta Orgânica e constitui uma aplicação do princípio da nação armada, a que se refere o artigo 55.º da Constituição.

ARTIGO 23.º

26. Este preceito terá guarida na lei no lugar próprio e na forma adequada.

CAPÍTULO III

Tribunais

ARTIGO 24.º

27.I - Corresponde aos artigos 189.º e 190.º da Carta Orgânica, com diferenças de redacção. Tal como na metrópole, a função judicial será exercida no ultramar por tribunais ordinários e especiais. O artigo 116.º da Constituição é, na verdade, direito comum à metrópole e ao ultramar. A organização desses tribunais constará do Estatuto Judiciário do Ultramar e de outros diplomas especiais. A Carta Orgânica, no seu capítulo VI, continha várias disposições sobre a organização judiciária ultramarina, que aquele estatuto e aqueles diplomas especiais respeitariam, no próprio dizer do seu artigo 189.º Sendo a organização dos tribunais, hoje em dia, da exclusiva competência da Assembleia Nacional, não se impõe que nesta lei orgânica se tome partido sobre as bases gerais dessa organização, que constará de diplomas especiais. Será esta, provavelmente, a justificação para o facto de, neste projecto, de ser consideravelmente mais sucinto que na Carta Orgânica.
Em todo o caso, não há razão para que não se consignem na lei ao menos as directrizes constitucionais em matéria de organização judiciária.
II - Está de acordo com a Organização Judiciária vigente, aprovada pelo Decreto n.º 14:453, de 20 de Outubro de 1927. A própria extensão que no ultramar tem muitas vezes de ter a circunscrição judiciária base, a comarca, é que realmente justifica a subdivisão em julgados. Só que não é necessário consignar na lei a razão da medida.
III e IV - A orientação consignada no Estatuto Político, Civil e Criminal dos Indígenas, aprovado pelo Decreto n.º 16:473, de 6 de Fevereiro de 1929, é no sentido de serem criados tribunais privativos para administração da justiça aos indígenas, com vista a ministrar-lha por forma simples, rápida e eficaz. Entendeu-se que o melhor seria confiá-la às autoridades administrativas locais (os indígenas não têm apreço pela divisão dos poderes e a autoridade deverá apresentar-se-lhes como detentora de toda a soberania), com a assistência dos chefes indígenas, conhecedores dos seus usos e costumes, ou seja, do direito predominantemente aplicado na solução dos pleitos entre nativos. A Carta Orgânica ratificou esta orientação no seu artigo 190.º, § 2.º, acrescentando, porém, que, em vez das autoridades administrativas, podem ser investidos nas funções de julgamento de tais feitos funcionários ou tribunais especiais.

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O projecto actual comete, por sua vez, o julgamento das questões gentílicas aos juizes municipais, onde os houver, e, na falta destes, aos administradores de concelho ou circunscrição.
Como se vê, não há grande diferença entre um e outro regime. A Carta Orgânica, é, porém, menos precisa nas designações, quer dos tribunais especiais, quer das autoridades administrativas. Não se encontra fácil explicação para a mudança que se pretende operar e, no modo de ver da Câmara, é preferível deixar as coisas como estão no diploma orgânico em vigor.

ARTIGO 25.º

28. I - Em primeiro lugar, não se torna necessário dizer que é «como parte integrante do Estado» que as províncias ultramarinas são representadas junto dos tribunais pêlos agentes do Ministério Público. Parece que tal se filia no facto de a Constituição (artigo 118.º) consignar que o Estado será representado junto dos tribunais pelo Ministério Público. A Constituição refere-se aí exclusivamente à pessoa jurídica estadual, não a qualquer outra pessoa jurídica pública - não, portanto, às províncias ultramarinas.
Simplesmente, nada impede o legislador ordinário de dispor que outras pessoas jurídicas públicas sejam representadas junto dos tribunais pelos agentes do Ministério Público. E o que realmente sucede com as províncias ultramarinas (artigo 191.º da Carta Orgânica), sem necessidade de ter de se dizer que elas constituem parte integrante do Estado (que o não são mais, de resto, do que outro qualquer ente público). Elas só são parte do Estado no plano do direito constitucional. Fora desse plano, a província é uma pessoa colectiva distinta da pessoa colectiva estadual.
O projecto pretende que os agentes do Ministério Público representem em juízo os «serviços públicos (ultramarinos) dotados de autonomia ou personalidade jurídica». Nenhuma lei dispôs genericamente em semelhantes termos. Não se encontra preceito equiparado no Código de Processo Civil, no Estatuto Judiciário ou na Carta Orgânica. O Estatuto Judiciário metropolitano (Decreto-Lei n.º 37:547, de 23 de Fevereiro de 1944) prevê apenas que o Ministério Público intervenha como parte acessória quando os institutos públicos forem interessados [artigo 103.º, § 2.º, alínea a)], mas este diploma só é aplicável à metrópole.
Parece que não há vantagem em prescrever que o Ministério Público intervenha necessariamente a representar, como parte principal, os serviços públicos personalizados. Os seus agentes são dependentes do Governo, que lhes paga e pode dar ordens e instruções: natural é que façam a advocacia do Estado, pelo Governo representado. Já é menos aceitável que a direcção dos serviços personalizados dê instruções aos agentes do Ministério Público, que dela não dependem. De resto, a eficiência da representação forense será presumivelmente tanto maior quanto maior for a liberdade de escolha do representante. O máximo que poderia ser conveniente prescrever seria que os institutos públicos podem confiar a sua representação ao Ministério Público. Mas o melhor será talvez conservar a regra e deixar que a lei referente a cada um deles disponha sobre o assunto em contrário, se tal for julgado aconselhável.
II - Corresponde este número ao § único do artigo 191.º da Carta Orgânica, com leves diferenças de forma, que se perfilham.
III - Versa este preceito a matéria sobre que hoje dispõe o artigo 207.º e seu § único da Carta Orgânica. Omitida, como no projecto é, a secção respeitante aos magistrados judiciais e do Ministério Público, mal se encontra nele lugar adequado para este preceito, que sem inconveniente pude ficar para o Estatuto Judiciário ultramarino.

ARTIGO 26.º

29. I - a) No Acto Colonial (§ 3.º do artigo 28.º) expressamente se dizia que o Conselho do Império Colonial desempenhava, na forma da lei, as funções de Supremo Tribunal Administrativo em relação ao Império Colonial Português. O preceito que, na Constituição, hoje substitui aquele § 3.º do artigo 28.º - o § 1.º do artigo 150.º- omite a atribuição destas funções ao Conselho Ultramarino. Fica, por via disso, livre ao legislador ordinário confiá-las ao Conselho, como vem sucedendo desde 1911, ou volver ao sistema anterior a esta data, confiando-as ao Supremo Tribunal Administrativo.
A Câmara Corporativa esboçou, no parecer n.º 10/V, a sua oposição à solução que veio afinal a ser perfilhada no projecto em estudo. Chamou a atenção para a especialidade da legislação e da administração ultramarina de um modo geral e ainda para o facto de que esta solução não poderia, em face da insuficiência do quadro dos juizes do Supremo Tribunal Administrativo, deixar de importar a criação de uma nova secção neste tribunal, destinada ao julgamento das questões do contencioso ultramarino. Reconhece-se que a solução vigente não prima pela coerência, pois confia ao Supremo Tribunal Administrativo uma parte do contencioso administrativo ultramarino: o contencioso da administração central. Reconhece-se também que num ou noutro caso surgem problemas de destrinça de competências entre o Supremo e o Conselho Ultramarino, com os quais se acabaria de vez reunindo naquele toda a competência contenciosa em relação ao ultramar, sem distinção entre a administração central e a administração provincial.
Mais razoável nos pareceria, no entanto, propor que e Conselho absorvesse a competência actual do Supremo em matéria ultramarina do que sugerir que este passasse a ser competente para o julgamento de todo o contencioso ultramarino, até agora a cargo do Conselho. A solução do projecto importaria necessariamente a criação de uma secção do contencioso administrativo ultramarino no Supremo Tribunal Administrativo, com exigências idênticas, no plano do recrutamento dos juizes, às que vigoram para o recrutamento dos membros da secção do contencioso do Conselho Ultramarino. Financeiramente, a reforma não oferece vantagens - e é muito duvidoso que as ofereça de outra ordem.
b) O artigo 13.º do Decreto n.º 18:962, de 25 de Outubro de 1930, prescreve que a jurisdição do Tribunal de Contas abrange todo o território português. Diploma especial regularia a passagem para este Tribunal do julgamento de processos e recursos de contas que pertencia à data ao Conselho Superior das Colónias, ao qual era provisoriamente mantida a competência para julgar os recursos interpostos das decisões proferidas pelas entidades que nas colónias julgavam as contas dos exactores da Fazenda e outros responsáveis por dinheiros do Estado, e ainda para julgar as contas dos estabelecimentos que no ultramar desempenhavam serviços de tesouraria. O serviço do «visto» dos actos ministeriais referentes às colónias é que foi desde logo transferido para o Tribunal de Contas.
O artigo 41.º do Decreto n.º 22:257, de 25 de Fevereiro de 1933, mandou cessar a competência do Conselho Superior das Colónias na matéria de julgamento de contas e recursos, que assim passou definitivamente para o Tribunal de Contas, como no Decreto n.º 18:962 se previa.
A última reforma constitucional, por seu turno, instituiu o controle judicial das contas anuais dos gover-

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nos ultramarinos, confiando-o ao Tribunal de Contas (Constituição, artigos 91.º, n.º 3.º, e 171.º).
De sorte que hoje se pode rigorosamente dizer, como no preceito se diz, que o Tribunal de Contas tem jurisdição no ultramar.
c) Corresponde literalmente ao artigo 193.º, alínea b), da Carta Orgânica.
II - A Câmara já expressou atrás a sua relutância em admitir que o Supremo Tribunal Administrativo absorva a actual competência do Conselho Ultramarino. Impõe-se, pois, modificar este preceito, colocando o Conselho no lugar do Supremo Tribunal e omitindo a alínea a).
III - Decorre este preceito do que acima se disse sobre a extensão da jurisdição do Tribunal de Contas em face do direito vigente. Crê-se que se deve aludir também na alínea a) às funções de consulta do Tribunal de Contas, e não apenas às de exame e visto.
IV - Combinando o disposto no artigo 195.º da Carta Orgânica com o disposto nos artigos 661.º e seguintes da Reforma Administrativa Ultramarina e aproximando estes textos do que no projecto se propõe em matéria de competência dos tribunais administrativos ultramarinos, verifica-se que se está substancialmente de acordo com este, salvo leves diferenças de redacção.

ARTIGO 27.º

30. O artigo 123 º da Constituição tem sido invariavelmente entendido no sentido de que os tribunais - todos os tribunais, ordinários ou especiais- têm competência para apreciar, oficiosamente ou em seguida a recurso indirecto, da constitucionalidade ou inconstitucionalidade material, substancial ou intrínseca das normas jurídicas, tendo a sua decisão neste domínio eficácia restrita ao pleito em que for proferida.
A Constituição não consigna, no título respeitante ao ultramar, qualquer preceito que altere, nesta matéria, a competência dos tribunais com jurisdição nas províncias ultramarinas. Nesse título só se refere à inconstitucionalidade orgânica (artigo 150.º, § 3.º), aliás para confirmar o disposto no § único do artigo 123.º
De sorte que se nos impõe considerar as disposições do artigo 123.º e do seu § único da Constituição como de direito comum à metrópole e ao ultramar.
Nenhuma dúvida se tem suscitado quanto à aplicação desse § único a todo o território nacional. O § 1.º do artigo 199.º da Carta Orgânica reprodu-lo praticamente, e parece que a nova lei orgânica o deve, pois, transcrever. Não se ignora que o prestígio dos governadores é afectado de todas as vezes que os diplomas legislativos locais organicamente inconstitucionais são anulados pêlos tribunais das províncias ultramarinas, como realmente o podem ser, em consequência de não serem promulgados pelo Presidente da República. Ë o que sucede quando os órgãos legislativos locais invadem a competência da Assembleia ou do Governo (não, porém, quando invadem a competência legislativa do Ministro, caso em que tem lugar mera ilegalidade, sujeita a sanção hierárquica, que se traduz em anulação pelo Ministro do Ultramar). Trata-se de hipótese relativamente frequente. Conviria submetê-la a regime idêntico ao que a Carta Orgânica reserva para a inconstitucionalidade material - mas o certo é que a Constituição não autoriza a consagração deste sistema e a Câmara não tem coragem para propor solução que dela se afaste.
Pelo que diz respeito à inconstitucionalidade material, o legislador da Carta Orgânica tomou precauções destinadas a salvaguardar o prestígio dos governadores. Precauções exageradas, diga-se de passagem, porque são raríssimos os casos em que a alegação da inconstitucionalidade intrínseca pode verosìmilmente triunfar, e, em todo o caso, precauções que mal se podem considerar conformes com a Constituição. Na verdade, a Carta Orgânica não se cingiu estritamente à letra e à doutrina do artigo 123.º e, depois de o ter transcrito, já com certa modificação menos feliz, no corpo do seu artigo 199.º, acrescentou-lhe três parágrafos, o 2.º, o 3.º e o 4.º desse artigo, que dificilmente se pode pretender estarem de acordo com a doutrina fixada naquela disposição constitucional.
Na verdade, enquanto a Constituição confere a todos os tribunais competência para não aplicarem a legislação que eles próprios julguem materialmente inconstitucional, os §§ 2.º e 3.º do artigo 199.º da Carta Orgânica retiram-lhes essa competência, para lhes deixarem apenas a de remeterem o incidente ao Conselho Ultramarino e a de proferirem despacho prévio sobre a viabilidade da arguição do vício de inconstitucionalidade, vindo o incidente a ser julgado em definitivo pelo dito Conselho. Aliás, a decisão deste, por força do § 4.º, terá eficácia objectiva ou erga omnes, impondo-se a todos os particulares, autoridades e tribunais. O Conselho Ultramarino funciona, no exercício desta competência, como uma espécie de «tribunal constitucional».
Não se nega que, em princípio e de jure constituendo, convenha, em relação ao ultramar, uma solução deste tipo para garantia da constitucionalidade. Boa parte da legislação ultramarina e dos diplomas regulamentares provém dos órgãos da própria província - e é aconselhável evitar atritos entre os tribunais e as autoridades governativas, cujo prestígio mal se coaduna com a divisão e independência dos poderes ... Simplesmente, repetimos, raras hão-de ser as hipóteses em que os diplomas dos governadores ultramarinos possam ser seriamente arguidos de intrinsecamente inconstitucionais.
Seja como for, a verdade é que a constitucionalidade dos mencionados preceitos da Carta Orgânica é mais que duvidosa, não tendo faltado quem tenha pretendido salvá-la sustentando que a Carta Orgânica não substitui um regime por outro, antes apenas acrescentou um a outro regime. O Conselho, no modo de ver de certos, interviria como órgão de consulta do Ministro do Ultramar, cuja vontade se presume ser idêntica à do seu mais alto corpo consultivo quanto a manter-se ou não o diploma em vigor. Até o momento da decisão do Conselho, os tribunais, incluindo aquele em que o incidente tivesse sido levantado, conservariam o poder de apreciar a constitucionalidade do diploma com inteira liberdade, aplicando-o ou não, conforme o seu critério.
Mas não se vê por que estranha razão teria o legislador da Carta Orgânica duplicado os sistemas de controle da constitucionalidade no que respeita à legislação ultramarina. Esta interpretação não representa mais do que uma forma de interpretação ... revogatória de textos demasiado claros em sentido contrário.
O regime da Carta Orgânica em matéria de fiscalização da constitucionalidade material, como de resto aquele que o projecto procura instituir, é, repete-se, de constitucionalidade duvidosa. A Câmara não se furta, por uma questão de honestidade, a pôr este problema. Depois do que se passa a analisar as soluções agora preconizadas, pressupondo a sua regularidade constitucional.
I - Merece este número, além de retoques de redacção, um reparo de fundo, comum ao número II, de que sucessivamente nos vamos ocupar.
II - O projecto parece partir da ideia de que é contraditório conferir ao Conselho Ultramarino poderes para julgar, com efeitos objectivos, o incidente de inconstitucionalidade. A decisão que se traduza em anu-

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lar um diploma inconstitucional, em termos de não mais poder ser aplicado por qualquer instância ou tribunal, não seria intrinsecamente um acto jurisdicional: seria um acto legislativo, que, como tal, deve caber nas faculdades do órgão metropolitano normalmente competente para legislar para o ultramar. A decisão do Conselho não deveria, por via disso, ser expressão da sua jurisdição própria: seria um mero parecer a fornecer ao Ministro do Ultramar, que o teria ou não em conta para efeito de anular ou manter o diploma arguido de inconstitucional.
Sem entrar nas questões de saber o que deve entender-se por jurisdição e o que distingue esta, materialmente, da legislação, recordemos apenas as plúrimas formas de jurisdição objectiva de que a teoria geral do direito nos dá conta, designadamente no campo do contencioso administrativo e do trabalho e no campo da justiça constitucional. Seja como for, a escolha da solução a consagrar não está na dependência do partido que seja lícito tomar sobre a natureza do acto jurisdicional e do acto legislativo. Depende tão só de saber se é aconselhável pôr nas mãos do Executivo - e nem mesmo de todo ele, antes só do Ministro do Ultramar - n decisão de problemas de tal transcendência; ou se, pelo contrário, deve optar-se por que a apreciarão definitiva do incidente da inconstitucionalidade deva caber (já que não aos tribunais) a um órgão como o Conselho Ultramarino, que, não obstante as suas ligações com o Executivo, tem neste domínio independência legislativamente assegurada.
Atente-se em que o problema da constitucionalidade material se pode pôr em relação a diplomas emanados de órgãos metropolitanos diferentes do Ministro: não se recomenda que seja este a anular, a título de inconstitucionais, diplomas emanados do Governo ou da Assembleia Nacional, até porque sempre teria relutância em o fazer. Quanto a ser o Ministro a anular a sua própria legislação arguida de inconstitucional... seria talvez pedir muito à sua objectividade. Tenha-se em conta, para mais, que o problema da inconstitucionalidade pode surgir em pleitos administrativos, nos quais a Administração é parte: confiar nestes casos a decisão do incidente de inconstitucionalidade ao Ministro seria o mesmo que confiar a decisão desses pleitos à própria parte demandada ou recorrida ... Num domínio como o da Administração ultramarina, em que a função legislativa está amplamente atribuída ao Executivo, não faz, pois, sentido fazer dela guarda da constitucionalidade.
O regime perfilhado no projecto não é, pois, em boa verdade, aceitável. Até porque, e por último, em ponto nenhum da Constituição se atribuem ao Governo as funções de fiscal da constitucionalidade das leis e mais diplomas.
III - Em face do que vem de ser observado sobre os números anteriores deste artigo, conclui-se naturalmente pela rejeição deste preceito.

ARTIGOS 28.º E 29.º

31. A Carta Orgânica continha toda uma secção respeitante ao regime preventivo e repressivo dos crimes (artigos 208.º a 212.º), que, feitas as necessárias alterações, convém manter, exceptuando os preceitos sobre delitos de abuso de liberdade de imprensa e limitações da liberdade de entrada e residência nas províncias ultramarinas. O primeiro assunto deve reservar-se para diploma especial e o segundo terá outro lugar na lei orgânica.
Qualquer dos preceitos do projecto sobre o regime preventivo e repressivo dos crimes merece aplauso, feitos, porém, os devidos esclarecimentos que se exprimem nas considerações seguintes, em que se alicerça o texto que é sugerido pela Câmara para substituir o do projecto.
Da unidade da Nação decorre naturalmente o princípio da unidade do sistema penal e prisional. Por isso se propõe que o sistema penal e prisional metropolitano seja estendido ao ultramar.
A circunstância, porém, de esse sistema metropolitano assentar num certo nível de civilização e estado social importa condicionar a sua extensão às províncias ultramarinas pelo nível respectivo das diversas populações.
Propõe-se que a pena de degredo não seja ordenada nem cumprida mais nas províncias ultramarinas. Na verdade, na medida em que ela se traduzia praticamente numa deportação ou envio puro e simples para esses territórios, envolvia o perigo de lançar no seio deles elementos de grave perturbação e corrupção.
Ao encontro desta ideia foi, de resto, já o Decreto n.º 20:877, de 13 de Fevereiro de 1932, retomando-a a Reforma Prisional de 1936, em vigor.
Há, porém, que entender a supressão do degredo apenas com esse significado. Na verdade, dispondo o País de vastos territórios ultramarinos, mal se compreenderia que não fossem aproveitados para neles se organizarem estabelecimentos penais visando os seguintes fins:
a) Maior segregação de delinquentes, designadamente políticos ou comuns de difícil correcção, aos quais naturalmente convém cortar todas as ligações com o meio em que desenvolveram ou podem desenvolver a sua actividade criminosa. Tais delinquentes «degredados» no ultramar estarão sujeitos no resto a um regime inteiramente semelhante ao da metrópole;
b) Maior intimidação relativamente a delinquentes autores de muito graves infracções, pela cumulação de um regime de prisão com o afastamento para regiões remotas;
c) Facilitar a correcção de delinquentes primários ou de todos aqueles cuja criminalidade deriva sobretudo de razões de ambiente (social, moral, económico, etc.), ou seja, do tipo chamado pela criminologia «exógeno», pela criação de condições de regeneração e readaptação a nova vida social.
Estes últimos estabelecimentos serão de tipo predominantemente aberto e têm uma importância tanto maior quanto é certo que se podem e devem integrar em planos de colonização: o trabalho destes criminosos permite o aproveitamento de zonas climàticamente duras ou onde a colonização é incipiente.
Este pensamento de utilizar, com as devidas precauções, delinquentes para aproveitamento e exploração de terrenos incultos e, de um modo geral, para dar os primeiros passos na colonização de certas regiões, é velho na história portuguesa, encontrando tradução inclusive nas Ordenações. Em dias de hoje não deixa de ser especificamente defendido. Ainda recentemente o Prof. Ataliba Nogueira sugeriu esta forma de reacção criminal como processo de colonização interna no Brasil. Um estabelecimento penal com este objectivo está em construção na região de Silva Porto, Angola. Substituirá a colónia do Tarrafal.
Há-de acentuar-se que se trata de estabelecimentos que, na sua estrutura, são fundamentalmente idênticos aos eventualmente criados na metrópole com o mesmo fim.
Decorrida a pena cujo cumprimento tenha lugar nestes estabelecimentos, deve fazer-se, por serviços a determinar, um juízo sobre a possibilidade de os criminosos se poderem integrar, em plena liberdade, na

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respectiva província ultramarina (ressalvando-se, é claro, o direito de os interessados se dirigirem para qualquer parte do território nacional, nos termos gerais). Deve, pois, nesta medida, ser revogado o artigo 212.º da Carta Orgânica.
Finaliza-se a apreciação dos artigos 28.º e 29.º sugerindo que o n.º 2.º deste último preceito receba a redacção que substancialmente resulta da combinação do disposto no artigo 46.º, n.º 2.º com o disposto no artigo 210.º da Carta Orgânica.

TITULO III

Organização provincial

CAPITULO I

Normas preliminares

ARTIGO 30.º

32. Este preceito deverá ser transferido para uma divisão respeitante aos princípios gerais da administração ultramarina e corrigido na redacção, de forma a harmonizar-se com o disposto no § único do artigo 148.º da Constituição.

ARTIGO 31.º

33. Trata-se também de um princípio geral da nossa administração ultramarina, consignado no artigo 148.º da Constituição, o qual, na lei orgânica, deve agrupar-se, com outros princípios, numa divisão que lhes será reservada. E não é necessário complicar o preceito, com redacção diferente da que lhe dá a Constituição. O legislador da Carta Orgânica obedecia ao preceito constitucional, designadamente:
a) Dando composição diferente aos Conselhos de Governo de Angola e Moçambique e aos do Estado da índia, Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe, Macau e Timor e fazendo ainda distinções na composição do Conselho de cada uma destas seis últimas províncias;
b) Facultando (depois de 1946) ao Ministro o direito de restringir o seu controle sobre os governos ultramarinos, enquanto organizadores dos orçamentos provinciais, sempre que tal se mostrasse possível em face de circunstâncias variáveis de província para província.

ARTIGO 32.º

34. I - Não há qualquer necessidade de se dar na lei a razão por que se designa «Estado da índia» essa nossa província asiática. As leis não são para nelas se resumirem capítulos de história: são juízos de valor e comandos, que ganham com a simplicidade. Deixemos, pois, para outras oportunidades e lugares o lembrar as honras dessa província e o evocar a tradição do título do seu governador, que é governador-geral desde Albuquerque.
Depois, também não merece aplauso que se diga, como no preceito se diz, que essa província terá organização político-administrativa correspondente à designação. À parte o sentido técnico-jurídico da palavra «Estado», não se lhe conhece outro que determine qualquer específica forma de organização político-administrativa. Não há, por conseguinte, vantagem em perfilhar o modo de dizer do projecto.
II - E o direito vigente, a que corresponde uma já antiga tradição.
III - Bastará dizer que em cada uma das províncias de Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe, Macau e Timor haverá um governador (que é como se diz no artigo 154.º da Constituição).

ARTIGO 33.º

35. O actual artigo 156.º da Constituição, cuja redacção foi sugerida por esta Câmara, veio substituir o artigo 32.º do Acto Colonial, que tinha o defeito de não fazer qualquer referência à divisão administrativa das colónias e de não mencionar todos os corpos administrativos (consequentemente, de não sugerir, ao menos, quais fossem as autarquias locais).
O preceito constitucional vigente é omisso em todos estes aspectos e expressamente remete para o legislador ordinário. Compete pois à lei orgânica do ultramar dar o esquema de toda a administração local: divisão administrativa, autoridades subalternas, autarquias locais e corpos administrativos.
O projecto utiliza este preceito para traçar a divisão administrativa provincial, embora, sem preocupação pelo sistema, aluda também a uma das autoridades subalternas. A Carta Orgânica continha sobre a divisão administrativa ultramarina, mera directriz genérica (artigo 234.º).
I - Diz a Reforma Administrativa Ultramarina, no seu artigo 2.º, que «para efeitos administrativos, as colónias portuguesas dividem-se em circunscrições ou concelhos». O projecto perfilha substancialmente a mesma divisão básica. A Reforma Administrativa Ultramarina deu-nos, comezinhamente, nos artigos 7.º e 8.º, o critério a que deve presidir a criação de concelhos; de circunscrições administrativas, enquanto, por seu turno, o projecto, a exemplo do que sucedeu com outras leis orgânicas, denuncia um plano municipalista. Só transitoriamente (tem-se o cuidado de o dizer no projecto), enquanto não for atingido o desenvolvimento económico e social previsto na lei, os concelhos podem ser substituídos por circunscrições administrativas nas regiões em que o estatuto da respectiva província indicar. O que não quer, certamente, dizer que o legislador pense que seja possível realizar em curto prazo a assimilação municipalista de todos os territórios ultramarinos portugueses. O sistema municipal só se compreende para áreas total ou predominantemente habitadas por brancos ou equiparados, o que está longe de suceder em todas as de Angola, Moçambique, Guiné ou Timor. Extensas regiões destas províncias são povoadas, a bem dizer, só por indígenas, cuja vida municipal não poderia ser senão fictícia. A nossa política, nestes territórios, tem de continuar a ser a tradicional, apenas suspensa em parte do século XIX assimilador: deixar que os concelhos correspondam a autênticas realidades sociais e económicas, a aglomerados de brancos e de civilizados em povoações de categoria semelhante às das vilas e cidades da metrópole.
No território habitado pelo gentio tem de continuar o sistema que no final do século passado e no início do actual passou a utilizar-se como forma de ocupação administrativa: o sistema das circunscrições civis ou administrativas, na área das quais uma autoridade administrativa subalterna concentra na sua mão a generalidade das atribuições executivas do governador da província.
Estas populações irão sendo sucessivamente assimiladas e, por outro lado, a população metropolitana irá povoando essas regiões. O desenvolvimento económico modificará a feição dessas terras sertanejas: nessa medida a circunscrição irá sendo substituída pelo concelho. E aqui temos a razão da segunda parte deste n.º i, que consagra, afinal de contas, as directrizes da tradicional política portuguesa, na África e em Timor, em matéria de municipalismo.
II - O projecto elimina pura e simplesmente a circunscrição provincial, a província da legislação de 1933, para manter apenas o distrito, onde o justifiquem a

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grandeza e a descontinuidade do território e as conveniências da administração. É claro que a alteração no apelativo dos territórios ultramarinos, que deixaram de ser «colónias» para se chamarem «províncias», não consente que a nomenclatura da Reforma Administrativa Ultramarina seja agora respeitada. Mas isso não importa, compreensivelmente, que a «província» de 1933, como autarquia local, se não mantenha no domínio da nova lei orgânica, mudando embora de designação.
E que designação deverá dar-se-lhe? Não há remédio senão o de regressar ao «distrito», denominação que se deu até 1933 e desde 1835 à autarquia colocada entre o concelho e a província ultramarina. Serão distritos enormes, sem dúvida: mas além-mar o padrão de medida não pode ser o mesmo ou raramente é o mesmo da metrópole... A actual junta provincial, como corpo administrativo da província, passará, por seu turno, a chamar-se, de acordo com a tradição das leis anteriores a 1933, «conselho de distrito». A autoridade subalterna «governador de província» chamar-se-á de novo «governador de distrito».
Os actuais distritos chamar-se-ão, de ora avante, intendências, e as autoridades subalternas respectivas «intendentes administrativos».
Aproveite-se o ensejo para esclarecer que a Câmara propõe conservarem as restantes autoridades subalternas as suas designações actuais, acrescentando-lhes o regedor para as freguesias.
III - Do que deve tratar-se neste artigo há-de ser só da divisão administrativa fundamental ou básica. Fora da ordem estará, portanto, pronunciarmo-nos sobre a necessidade de criar uma divisão administrativa específica para efeitos restritos de política indígena.
IV e V - Nada substancialmente inovam estes preceitos. Já a Reforma Administrativa Ultramarina previa que o concelho se dividiria em freguesias, agrupando as suas povoações e inclusivamente a sua parte não urbana (artigo 7.º, §§ 3.º e 4.º). A parte não urbana dos concelhos poderia ser e as circunscrições no seu todo seriam necessariamente divididas em postos administrativos (artigo 7.º, § 4.º, e artigo 10.º).
Parece que a melhor solução é a de dispor que os concelhos e as circunscrições, uns e outras, na parte não urbana serão divididos em postos, e serão divididos, em freguesias na parte restante, correspondentes às localidades que neles houver com as condições urbanas e a população por lei exigidas, ou a parcelas de grandes localidades, que convenha dividir para efeitos de administração paroquial. O projecto tem em relação a esta solução o defeito de só admitir a freguesia, quanto às circunscrições, na localidade sede da circunscrição. Ora outras localidades na circunscrição poderá naturalmente haver a que convenha conferir a regalia da administração paroquial.
Não se vê, por último, que vantagem há em consignar que os postos são centros de organização e protecção do povoamento e que terão, além disso, fins de soberania. Trata-se, como toda a gente sabe, de uma forma de desconcentração da acção dos administradores de concelho ou de circunscrição, com vista a prolongada até às últimas e escondidas aldeias indígenas. É isto o essencial. De resto, em relação à área do muitos postos, dificilmente se poderá pensar em povoamento europeu.
VI - Não é novo também este preceito. É praticamente a reprodução do artigo 4-º da Reforma Administrativa Ultramarina.

Artigo 34.º

36. Já, na generalidade, nos referimos ao alcance genérico dos estatutos político-administrativos das províncias ultramarinas. O Decreto n.º 7:008, de 20 de Outubro de 1920, que pela primeira vez, como dissemos, dispôs sobre o âmbito das cartas orgânicas coloniais, reservava para estas a definição da competência do governador, das condições de exercício do respectivo cargo, da composição, atribuições e exercício de funções dos Conselhos Executivo e Legislativo e do Tribunal Administrativo, e, finalmente, a organização das secretarias dos serviços da colónia, tem toda a organização administrativa, na parte que transcendia a lei orgânica geral, era definida na carta orgânica de cada colónia: os demais assuntos seriam,- na verdade, regulados num código administrativo e em outros diplomas especiais da colónia. As bases orgânicas da administração colonial, aprovadas sucessivamente pelo Decreto n.º 14:421, de 20 de Setembro de 1926, e pelo Decreto n.º 15:241, de 24 de Março de 1928, reproduzem com certas adaptações este preceito e fixam taxativamente o âmbito do código administrativo de cada colónia: a organização da administração dos distritos e das outras divisões administrativas e a constituição, competência e exercício das funções dos concelhos de distrito, instituições municipais, comissões urbanas e o respectivo contencioso.
A Carta Orgânica e a Reforma Administrativa Ultramarina uniformizam a disciplina jurídica destas matérias e é este sistema que o projecto visa, por seu turno e de novo, alterar no sentido da especialização. Não se pensa, porém, em restaurar os antigos códigos administrativos coloniais: continua a julgar-se adequado um regime administrativo geral. Apenas se trata de restabelecer, de certa maneira, o regime de «cartas orgânicas» múltiplas, de acordo com o condicionalismo próprio de cada província (artigo 134.º da Constituição).
O elenco, feito por este artigo, das matérias que devem, fazer parte dos estatutos provinciais não está completo em relação às remissões que o próprio projecto para elas faz em vários pontos. Será, por isso, preferível não dar ao preceito um carácter taxativo. Afinal de contas, há-de vir a constar do estatuto toda a regulamentação da organização político-administrativa local que seja susceptível de variar com a situação geográfica e as condições do meio social e não se encontre expressa nem na lei orgânica nem no diploma que regular o regime administrativo geral do ultramar.
Por último, acentue-se que este preceito deverá ocupar na lei lugar diferente daquele que o projecto lhe reservou.

CAPÍTULO II

Governadores-gerais e de província

ARTIGO 35.º

37. I - Corresponde este preceito, com leves diferenças de redacção, ao artigo 19.º da Carta Orgânica. «A escolha dos governadores coloniais só deve recair em pessoas que tenham revelado, inequivocamente, qualidades de carácter, tino administrativo e bom senso político», escreveu um dia certo Procurador a esta Câmara, bem se compreendendo, portanto, as cautelas que devem presidir à sua nomeação, expressas, além domais, no facto de ter de ser feita em Conselho de Ministros.
II - Reproduz-se aqui o corpo do artigo 20.º da Carta Orgânica. Trata-se de assegurar, pela considerável duração da comissão do governador, a continuidade administrativa.
III - É o texto do actual § 1 -º do artigo 20.º da Carta Orgânica. Como se vê, o silêncio da Administração não importa a recondução, mas a exoneração. Para o prestígio da pessoa dos governadores é preferível a exoneração tácita à exoneração expressa.
IV - Corresponde à matéria dos §§ 2.º e 3.º do artigo 20.º da Carta Orgânica. A exoneração dos governa-

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dores antes do final da sua comissão é, nos termos da Carta Orgânica, da competência do Conselho de Ministros, sob proposta do Ministro do Ultramar, se se basear em conveniência de serviço; e é da competência do próprio Ministro se tiver lugar a pedido do governador. A razão desta diferença de regime está em que se entendeu que só a primeira forma de exoneração pode contender com o prestígio pessoal do governador e ter até alcance político, convindo, por isso, assegurar a maior ponderação na adopção de semelhante medida. A verdade é, porém, que, salvo casos excepcionais, filiados em reais conveniências particulares, o pedido de exoneração tem alcance político, sendo conveniente submeter o assunto à ponderação do Conselho de Ministros. O melindre político e pessoal de uma exoneração a pedido pode ser igual ou superior ao de uma exoneração por conveniência de serviço.
Parece, por consequência, de aprovar o regime proposto para as exonerações a pedido dos governadores.

ARTIGO 36.º

38. I - Nos termos do artigo 24.º da Carta Orgânica, na falta do governador ou na sua ausência da província, enquanto o Ministro não designa um encarregado do governo, exercerá as suas funções o vice-presidente do Conselho de Governo. Este número prevê um regime semelhante. Só que ao encarregado do governo se daria agora o nome de vice-governador, importado do organização administrativa de certos territórios dependentes estrangeiros. Não sabe a Câmara de interesse atendível em que se modifique a terminologia vigente, sobretudo quando, como no caso sucede, à mudança de designação não corresponde qualquer .alteração de funções. A designação «encarregado do governo» tem tradições: encontramo-la, pelo menos, no decreto de 1907 sobre a organização administrativa de Moçambique.
II - Desce o projecto ao cuidado de prescrever a forma que deve revestir o diploma de nomeação do vice-governador (ou antes, segundo a Câmara, do encarregado do governo). Não se opõe, cremos nós, à forma de simples despacho o disposto no § 6.º do artigo 109.º da Constituição. Pretende mais este número que se vincule o Governo a nomear novo governador, ou a fazê-lo regressar à província, dentro de um ano. Embora tal prazo pareça suficientemente amplo, não parece à Câmara que neste ponto se requeira a vinculação do Executivo. Trata-se de domínio essencialmente político, onde o melhor é não impor normas que tenham, num caso ou noutro, de ser francamente violadas ...
III - Não prevê a Carta Orgânica a substituição do governador quando este se encontrar temporariamente impedido de exercer as suas funções ou se achar ausente da sede do governo da província. Apenas prevê, para esta última hipótese, e quando a ausência deva durar mais de quarenta e oito horas, a comunicação do facto ao Ministro - certamente para este providenciar nos termos que lhe parecerem adequados. Na legislação anterior à Carta Orgânica adoptava-se expressamente a solução que o projecto agora consigna, e que realmente merece todo o aplauso.

ARTIGO 37.º

39. I - Este preceito foi-se buscar, com leves diferenças de redacção, ao artigo 30.º da Carta Orgânica e funda-se no artigo 154.º da Constituição, segundo o qual «em cada uma das províncias ultramarinas haverá, como autoridade superior, um governador ou governador-geral». O artigo 30.º da Carta Orgânica era o primeiro de uma secção em que se fazia a destrinça da competência executiva dos governadores. Por isso, além da afirmação da superioridade hierárquica destes em relação a todas as outras autoridades, esse artigo dava em dois traços os tipos de atribuições que lhes cabiam: civis, militares, financeiras e de política indígena, a que sucessiva e discriminadamente se referiam em seguida os artigos 33.º, 34.º, 35.º e 36.º
Desde que no projecto se julgou preferível não enumerar as atribuições dos governadores (vide n.º II deste artigo), deixando o tratamento desse assunto para os estatutos provinciais, parece não se dever alongar este número com mais do que a afirmação da superioridade hierárquica do governador que haverá em cada província. Acrescente-se a isto uma norma de conteúdo idêntico à do actual artigo 22.º da Carta Orgânica (com referência expressa ao Subsecretário de Estado do Ultramar, seguramente devida), que indubitavelmente tem, e só tem, lugar na lei orgânica. O mesmo, de resto, se diga da norma do artigo 2-1.º e de -aproveite-se o ensejo de o declarar- outras mais, sobre vários aspectos do governo das províncias ultramarinas, esquecidas do projecto, mas que a Câmara Corporativa, por seu turno, não se esquecerá de introduzir nas emendas que sugere.
Anote-se ainda que, de toda a maneira, no projecto se julgou adequado omitir a função que aos governadores de certas províncias sem dúvida continuará a caber de protectores dos indígenas. Só a circunstância de essa função não ser comum a todos os governadores poderá explicar esta omissão.
A parte final deste número é a adaptação do já hoje disposto no final do corpo do referido artigo 30.º da Carta Orgânica. Aí se consagra a responsabilidade política dos governadores perante o Governo e a garantia da fiscalização contenciosa dos seus actos. Hão-de também incluir-se na lei preceitos de teor semelhante aos dos artigos 25.º e 26.º da Carta Orgânica e outrossim se incluirá um preceito que, sobre todos estes pontos de vista, regule a situação do vice-presidente do Conselho de Governo, quando transitoriamente investido nas funções governativas.
II - Segue o projecto, neste ponto, aliás essencial, orientação absolutamente diversa da adoptada pelo legislador da Carta Orgânica. A uniformidade é substituída pela especialidade. Sobre o assunto já a Câmara se pronunciou, em mais de um passo. Salva a redacção, perfilha-se a doutrina deste número.
III - Corresponde ao § único do artigo 18.º da Carta Orgânica, com irrelevantes diferenças de redacção.

CAPITULO III

Órgãos dos governos-gerais

SECÇÃO I

Conselho Legislativo

ARTIGO 38.º

40. É evidente que a este preceito não podem fazer-se críticas que não sejam respeitantes à sua situação no sistema do projecto. Estão elas implícitas na ordenação que pela Câmara será dada às matérias e no lugar que lhe reservará.

ARTIGO 39.º

41. I - A Constituição reza hoje que«as funções legislativas de cada um dos governos das províncias ultramarinas, na esfera da sua competência, são exercidas sob a fiscalização dos órgãos da soberania e, por via de regra, conforme o voto de um conselho em que haverá representação adequada às condições do meio social» (artigo 152.º). O projecto, aplicando este preceito às províncias de governo-geral, diz que a competência do governador-geral será exercida conforme o

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voto de um Conselho Legislativo. Este Conselho não terá funções meramente consultivas: deliberará sobre as propostas que o governador ou os membros do Conselho de Governo lhe apresentarão, cabendo ao governador como que promulgar o diploma que nele for votado.
Se assim é, como parece que realmente se pretende, as coisas, neste domínio, irão passar-se de maneira um pouco diferente daquela por que se passavam nos termos da Carta Orgânica. De acordo com esta, os Conselhos de Governo vinculavam, em princípio, o governador com o seu voto, no exercício das faculdades legislativas deste. A iniciativa legislativa pertencia exclusivamente ao governador, que poderia delegá-la em um dos vogais oficiais do Conselho. Os vogais, em geral, esses só tinham o direito de apresentar propostas no governador (artigo 76.º da Carta Orgânica).
O sistema da Carta Orgânica constituiu, digamos, uma modalidade intermédia entre o sistema que se adoptou na Monarquia e o que veio a adoptar-se no primeiro vinténio da República. O Acto Adicional de 1852 admitiu, como se sabe, a legislação local e prescreveu ao mesmo tempo que o governadores ouvissem os respectivos Conselhos de Governo; mas os pareceres deste não seriam vinculantes, como se depreende da, lei orgânica de 1869, do Código de 1881 o do Decreto de Maio de 1907. Por seu turno, a legislação de 1914, 1920 e 1926 (quanto a esta ultima a conclusão só se obtém confrontando-a com as cartas orgânicas complementares) conferiu aos correspondentes Conselhos competência deliberativa e nos seus vogais o direito à apresentação de propostas. Os seus votos eram, em princípio, vinculantes para os governadores.
«Como no parecer desta Câmara n.º 10/V se referiu já, foi a partir de 1928 que se adoptou a fórmula que actualmente vigora: aos governadores compete legislar, mas a publicação dos diplomas legislativos depende do voto de aprovação dos Conselhos de Governo, cujos vogais, salva a restrição acima mencionada, não têm iniciativa legislativa. O governador pode, porém, não se conformar com o voto do Conselho de Governo e pedir o seu suprimento ao (Ministro do Ultramar.
O legislador constitucional não impôs a solução que o projecto perfilha, uma vez que o artigo 152.º tem redacção idêntica à do antigo artigo 30.º do Acto Colonial e que no artigo 151.º se remete para a lei ordinária para efeitos da definição dos órgãos legislativos que deverão instituir-se nas províncias ultramarinas. À sombra do disposto nestes preceitos se poderia, portanto, legislar agora em termos idênticos aos da Carta Orgânica. O Governo propõe, porém, afinal de contas, que nas províncias ultramarinas de governo-geral haja dois órgãos legislativos - o governador e o Conselho Legislativo (designação que se foi buscar ao Decreto n.º 7:008), sendo a legislação local normalmente expressão da vontade conjunta desses dois órgãos.
Assegurada a legitimidade do controle e superintendência dos órgãos da soberania, não pode haver desvantagem no sistema agora proposto, como na generalidade já se teve ocasião de dizer.
II - Este preceito não precisa de ser incluído na lei. As excepções que consigna à regra da comparticipação do Conselho Legislativo no exercício da competência legislativa do governador são óbvias. De qualquer maneira não vem a propósito ressalvar a faculdade regulamentar do governador ao tratar-se da sua competência legislativa.

ARTIGO 40.º

42. I - Prescreve-se constituição exclusivamente electiva para o Conselho Legislativo. E a primeira vez, na história da nossa administração ultramarina, que tal constituição é adoptada para os conselhos legislativos com funções de consulta ou deliberativas de qualquer província. É certo que só com boa vontade se poderá chamar eleição a designação que, em Angola e Moçambique, aos Conselhos de Governo compete fazer de representantes da população nativa. Simplesmente essa forma de escolha é transitória, segundo o projecto deixa transparecer.
Os Conselhos de Governo de 1869 eram assembleias de composição a bem dizer exclusivamente oficial e os de 1881 seriam compostos exclusivamente por membros de nomeação régia. O Conselho de Governo de Moçambique, segundo a reforma de 1907, foi uma assembleia mista de funcionários e representantes natos das actividades económicas. E, passando da Monarquia à República, verifica-se que os Conselhos de Governo da legislação de 14 eram também assembleias mistas de elementos oficiais natos e de elementos não oficiais igualmente natos ou eleitos pêlos corpos e corporações administrativas, estabelecimentos e associações de classe, de modo a obter-se a representação dos grupos, profissões e interesses predominantes da população. Constituição idêntica tiveram os Conselhos Legislativos da legislação de 1920 e os Conselhos de Governo de 1926-1928.
Sensivelmente na mesma ficaram, neste aspecto, as coisas com a Carta Orgânica (redacção primitiva do artigo 52.º e redacção deste preceito ao depois dada pela Lei n.º 2:016): o Conselho de Governo continuou sendo, em todas as províncias, uma assembleia mista, de nomeação e de eleição (individualista e corporativa).
Não obstante afirmar-se neste artigo do projecto que os Conselhos Legislativos de Angola, Moçambique e do Estado da índia são corpos electivos, o projecto tem o cuidado de no artigo seguinte prescrever que às suas sessões poderão sempre assistir os vogais de outro órgão dessas províncias - este, por seu turno, consultivo no domínio das funções executivas do governador e de feição predominantemente burocrática-, com direito de iniciativa e de intervir nas discussões, mas sem voto. Este facto concorre para aproximar os propostos Conselhos Legislativos dos órgãos correspondentes anteriores mais do que à primeira vista se poderia ser inclinado a supor. Dadas as funções deliberativas desses Conselhos, convém não desamparar o governador perante órgãos que não deixarão de criar por vezes embaraços à sua actuação. Como elementos que especialmente esclarecerão os Conselhos Legislativos das propostas governativas, os membros do Conselho de Governo devem realmente ter assento nessa Assembleia.
Este n.º I acentua, por último, que nos Conselhos haverá representação adequada às condições do meio social, como aliás também é tradicional. O n.º II dá justamente ao legislador dos estatutos a faculdade de adequar essa representação a tais condições, variáveis nas três províncias de governo-geral.
II e III - Estes números esclarecem-nos de que os Conselhos Legislativos terão constituição, a fixar no estatuto respectivo, variável conforme as condições de cada uma das três províncias de governo-geral, e de que esse mesmo estatuto regulará a eleição dos respectivos membros, tendo igualmente em conta as condições peculiares de cada unia delas. Verifica-se, porém, que, neste último capítulo, os estatutos têm de conformar-se com directrizes sensivelmente uniformes, salva a representação das comunidades aldeãs na índia e a representação das populações nativas em Angola e em Moçambique.
De um modo geral conclui-se que se pretende combinar uma representação orgânica com uma representação individualista; e, como não é aconselhável a criação de duas assembleias - corporativa uma, de re-

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presentação individualista a outra-, não parece má ideia a de organizar uma só, baseada nas duas formas de representação.
Simplesmente, não parece que no projecto se imponha a representação de todas as actividades que convém ver intervir na eleição dos membros dos Conselhos Legislativos. Não se mencionam, à parte, as associações literárias ou científicas, nem as corporações morais (como os estabelecimentos missionários), e é natural que se não tenha pensado em considerá-las englobadas na expressão «organismos corporativos», que o projecto toma, das vezes em que a usa, no sentido restrito de organismos económicos. Esquece-se também, por outro lado, a necessidade de dar representação aos corpos administrativos.
IV - Este número tem como fonte directa o artigo 64.º da Carta Orgânica. Deve ser simplificado na sua redacção. Note-se que a lei orgânica é omissa sobre u duração do mandato dos vogais do Conselho Legislativo, matéria que não deve ficar para os estatutos, pois há-de, compreensivelmente, ser uniforme para as várias províncias. A Gamara sugere que esse mandato tenha a duração de três anos, com vista a adequar frequentemente o Conselho à evolução da vida económica e social das províncias. Era, de resto, esta a duração do mandato dos vogais não oficiais nos Conselhos de Governo da Carta Orgânica (artigo 65.º).

ARTIGO 41.º

43. I - A presidência do governador (que, aliás, faz parte do Conselho Legislativo) ou de quem suas vezes fizer é tradicional. A possibilidade de se fazer substituir na presidência pelo vice-presidente do Conselho de Governo é também do direito anterior.
II - Contém este número a fórmula de transacção entre a tradicional composição mista dos (Conselhos e a sua actual forma exclusivamente electiva. Aqui se prescreve, na verdade, que os vogais do Conselho de Governo presentes às sessões do Conselho Legislativo terão o direito de apresentar propostas.
É este o único ponto do projecto onde, em relação aos Conselhos Legislativos, se trata do direito de apresentação de propostas; porém, só para conferir o direito de iniciativa aos membros do Conselho de Governo. Nada se diz quanto à iniciativa do governador. Seria, porém, anómalo conferir iniciativa a elementos declaradamente estranhos ao Conselho Legislativo e não a conferir ao seu presidente. Propósito do projecto há-de ter justamente sido, pois, o de lhe dar o direito de iniciativa, embora o não tenha consignado na devida forma.
E quanto à iniciativa dos vogais do Conselho Legislativo, deverá ela ser consignada na lei?
A experiência do funcionamento das assembleias políticas contemporâneas revela-nos que a iniciativa legislativa conferida aos seus membros é uma regalia que se vai tornando dia a dia mais platónica, uma vez que não é normalmente exercida. Essas assembleias limitam-se, a bem dizer, a discutir, a emendar e a votar as propostas que lhes são apresentadas pela Administração. É esta que está habilitada a preparar devidamente as propostas de lei, que são a expressão final, a resultante de estudos mais ou menos complicados e demorados, levados a cabo por diferentes repartições e conselhos de constituição predominantemente técnica.
Por outro lado, por toda a parte se reconhecem hoje em dia os perigos resultantes de se entregarem aos membros de tais assembleias poderes para proporem a diminuição das receitas, designadamente dos impostos, ou para aumentarem as despesas com projectos da sua iniciativa.
Consequentemente, a tendência é actualmente toda no sentido de reservar, de direito ou de facto, a iniciativa das leis à Administração, deixando-se para a representação política uma função menos vistosa, mas nem por isso menos importante: a discussão, emenda e votação das propostas governativas, à luz do interesse geral.
E o que é impraticável - ou pouco menos - e perigoso nos parlamentos metropolitanos sê-lo-á mais ainda nas assembleias ultramarinas, dentro das quais a impreparação técnica é presumivelmente maior, por serem restritas as elites locais, e em territórios onde o volume das obras a realizar e dos serviços a instituir ou a melhorar dá para alimentar indefinidamente a imaginação legislativa dos membros de tais assembleias, com os consequentes riscos para a boa ordem financeira desses territórios.
A prudência aconselha, por conseguinte, que se não consigne a iniciativa dos vogais dos conselhos legislativos. Não será esse, fundamentalmente, um sacrifício grave. Conservarão o que mais importa, a faculdade de debater as medidas legislativas que aos Conselhos sejam propostas, alterando-as ou emendando-as eventualmente; e de examinar e criticar com largueza, a propósito disto, a administração do respectivo território.
III - O projecto é omisso acerca da generalidade das regras de funcionamento dos Conselhos Legislativos. Consigna apenas uma ou outra e, entre estas, a de que o presidente tem voto de qualidade, se dele quiser usar, em caso de empate nas votações.
Segundo a Carta Orgânica, o presidente não tem voto (artigo 78.º). Quando houver empate nas votações adiará a decisão do assunto para outra sessão; e se nesta houver ainda empate procederá então o governador como entender. Este sistema explica-se para um Conselho de funções apenas consultivas, de que o governador, rigorosamente, não é membro.
O projecto não prevê a solução para o caso de o presidente não querer usar do seu voto de qualidade. As leis orgânicas de 1914 e 1920 solucionavam expressamente a hipótese: a persistência do empate na sessão seguinte importava a rejeição da proposta. É ponto este a regular no estatuto de cada província, que, aliás, de uni modo geral, disciplinará todo o funcionamento dos Conselhos Legislativos.

ARTIGO 42.º

44. I - É tradicional inscrever mus leis orgânicas obrigações de teor semelhante a esta. Até 1928, o dever era só de zelar pelo bem da respectiva colónia. A Carta Orgânica juntou-lhe o de zelar pela unidade do Império. A fórmula do projecto é mais ampla: dispõe que é dever dos vogais zelarem pela integridade da Nação Portuguesa. Acima do bem da província está o da Nação, e não apenas o do ultramar, legenda que hoje substitui a de Império Colonial Português. A fórmula «integridade da Nação Portuguesa» não satisfaz e será desejavelmente substituída pela de «bem geral da Nação», que é mais lata.
II - Preceito tradicional e necessário. As restrições ao princípio da inviolabilidade pelas opiniões emitidas são hoje expressas na Carta Orgânica, enquanto, pelo contrário, o projecto remete toda esta matéria para os estatutos provinciais. O mesmo quanto às sanções pelos abusos no exercício da liberdade de opinião. Rigorosamente não deveria ser assim: a matéria deveria ser tratada na lei, e não em decreto.
III - É tradicional que a lei consigne a faculdade de dissolução. Esta, não obstante as votações do Conselho não vincularem estritamente o governador, pode especialmente tornar-se necessária em face de um comportamento sistematicamente abusivo nas suas deliberações.

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Quanto às novas eleições, o projecto acompanha o que na Constituição se dispõe no artigo 87.º e seu § único. Compreende-se que se alinhe um regime pelo outro.

ARTIGO 48.º

45. I - Corresponde ao artigo 44.º da Carta Orgânica, mas mão pode deixar de se afastar do nele disposto, dadas as diferentes atribuições do Conselho Legislativo. A redacção (proposta não é, no entanto, integralmente satisfatória. Na verdade, não parece feliz dizer-se que «o governador-geral determinará a providência» que tiver sido aprovada pelo Conselho Legislativo. Parece que o projecto perfilhou este modo de dizer socorrendo-se do formulário provisório dos diplomas paira o ultramar, que consta do Decreto n.º 38:805, de 16 de Junho de 1951, no qual se utiliza, de facto, a palavra determinar, em vez de mandar, como se usava, por força do Decreto-Lei n.º 23:228, de 15 de Novembro de 1933. À Câmara afigurasse que não há necessidade de se utilizar no preceito em apreciação justamente a palavra usada no formulário dos diplomas legislativos. Em vez disso, poderá preferivelmente dizer-se que «o governador-geral expedirá», sob forma de diplomas legislativos, as disposições votadas pelos Conselhos Legislativos.
Quanto ao prazo a que o preceito alude, é afinal equiparado ao do artigo 98.º da Constituição, respeitante à promulgação pelo Chefe do Estado dos projectos aprovados pela Assembleia Nacional.
II e III - O veto do governador às disposições aprovadas pelo Conselho Legislativo importa a obrigação para ele de submeter a sua divergência com o Conselho ao Ministro do Ultramar, para que a resolva. Resolvê-la-á este ouvindo previamente o Conselho Ultramarino (salvo naturalmente nos mesmos casos em que pode legislar sem a sua audiência). Tudo ponderado, o Ministro concluirá logicamente por uma de duas: ou que as disposições votadas pelo Conselho Legislativo da província são total ou parcialmente dignas de aprovação - e ordenará ao governador que as promulge total ou parcialmente (conforme os casos); ou que tais disposições não são realmente, de um modo geral, aproveitáveis - e então legislará sobre o assunto nos termos que entender mais convenientes (salva, naturalmente, a hipótese de entender preferível abster-se de qualquer regulamentação).
É isto que a lei, no entender da Câmara, deverá dispor.
A alínea a) do n.º III não faz grande sentido ao remeter para o artigo 7.º, que se refere a muito outra coisa, a anulação ou revogação ministeriais de diplomas legislativos provinciais. Ora mão se trata neste ponto de anular ou revogar qualquer diploma legislativo que, na hipótese, ainda não existe.
Quanto à alínea b), não se requer a consignação da ressalva, feita na sua parte final.

SECÇÃO II

Conselho de Governo

ARTIGO 44.º

46. Na história da nossa administração ultramarina a instituição dos Conselhos de Governo remonta a 1836. A ideia inicial foi a de pôr à disposição dos governadores a consulta regular dos elementos de maior experiência administrativa da colónia e a capacidade dos que, de qualquer modo, representassem a opinião e os interesses dos colonos. Com esta exclusiva índole se mantiveram os Conselhos de Governo até 1907.
Entretanto, surgia ao lado deste Conselho um corpo administrativo da província. A reforma, de 1869 deu-lhe o nome de Junta Geral, mas reservou a sua instituição para as províncias de Angola e do Estado da índia. O Código de 1881 intentou estendê-la a todas as províncias ultramarinas.
A reforma de 1907 para Moçambique reúne as atribuições consultivas dos Conselhos de Governo e as deliberativas das Juntas Gerais, e confere-as ao Conselho de Governo. É nesta modalidade que a instituição vem a ser consagrada em 1914.
Em 1920 opta-se por outra solução: haveria um Conselho Executivo, de funções consultivas, correspondente aos antigos Conselhos de Governo da legislação de 36 e 69, e um Conselho Legislativo, que, à parte as funções legislativas, tinha a natureza de corpo administrativo da colónia, com funções deliberativas em todos os casos e assuntos que a esta dissessem respeito.
A legislação de 1926 e de 1928, por seu turno, regressou ao sistema de 1907 e 1914: Conselho de Governo ao mesmo tempo corpo administrativo e órgão consultivo. O Acto Colonial, porém, acaba com as funções deliberativas dos Conselhos de Governo, aos quais conserva apenas funções consultivas (artigo 31.º). A Carta Orgânica manteve-se naturalmente fiel a este sistema (artigo 50.º).
A Constituição, por último, mantém a orientação do Acto Colonial: as funções administrativas em cada província ultramarina não se dividem entre o governador e qualquer corpo administrativo: pertencem exclusivamente ao governador (artigo 155.º). Este é assistido no desempenho delas por um corpo consultivo, que o projecto designa por Conselho de Governo.
É a este Conselho de Governo que se refere o artigo 44.º do projecto em exame. Note-se que tal Conselho, nas províncias do governo-geral, corresponde, não ao Conselho de Governo da Carta Orgânica, mas à sua secção permanente (artigos 80.º e seguintes).
I - Corresponde ao corpo do artigo 80.º da Carta Orgânica e não oferece margem a reparos.
II - Da composição do Conselho de Governo que o projecto adopta resulta que ele continua a corresponder à ideia que inicialmente, em 1836, presidiu à sua instituição. Entre este Conselho e a secção permanente do Conselho de Governo da Carta Orgânica há, quanto à composição, estas diferenças:
a) Surge-nos o secretário-geral em vez do vice-presidente do Conselho de Governo, que só em Angola e Moçambique era o secretário-geral;
b) Passa a fazer parte do Conselho de Governo o comandante militar da província. Pela Carta Orgânica, o comandante militar, quando estivesse na capital, fazia parte do Conselho, mas não da secção permanente;
c) E diverso o número de vogais nomeados e o âmbito do seu recrutamento: pela Carta Orgânica, nas colónias de governo-geral, da secção permanente faziam parte três vogais escolhidos pelo governador entre os membros do Conselho de Governo.
A Câmara acha bem que se ponha o secretário-geral a fazer parte do Conselho de Governo, uma vez que ela própria propõe que haja secretário-geral em cada uma das províncias de Angola, Moçambique e Estado da índia. Acha igualmente bem que o comandante militar faça parte do Conselho e não vê razão que possa desaconselhar a solução agora proposta quanto ao número e ao campo de recrutamento dos vogais nomeados ou escolhidos.
III - A diferença entre o agora projectado e o disposto na Carta Orgânica está em que o substituto do vice-presidente é hoje o vogal mais antigo no serviço da província e passaria a ser o vogal mais antigo no Conselho. Será talvez preferível a fórmula em vigor. A não se querer atender à hierarquia relativa dos membros

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do Conselho nas funções oficiais que desempenham, será justo atender ao tempo de serviço na província e não no Conselho.
IV - Não se compreende bem o objectivo da alteração que o projecto introduz no regime das substituições para os vogais oficiais natos. Segundo a Carta Orgânica, a substituição faz-se pelos substitutos na função pública (artigo 60.º). É o que parece lógico. A substituição por directores de serviço designados pelo governador, e só na falta desta designação pêlos substitutos na função desempenhada pelos vogais oficiais natos, é coisa que se não entende.

ARTIGO 45.º

47. I - A fórmula utilizada para, de um modo geral, se definirem as atribuições do Conselho de Governo é a combinação do que se dispõe hoje no artigo 38.º e § único do artigo 51.º da Carta Orgânica e no artigo 155.º da Constituição. Quanto ao fundo do preceito, nada haverá que alterar.
II e III - A ressalva que logo no início do n.º II se faz não é em rigor necessária, dado o disposto no lugar próprio sobre os poderes do governador em estado de sítio.
A Carta Orgânica dispõe no artigo 84.º, n.º 1.º (com referência ao artigo -37.º) sobre os casos em que o governador deverá ouvir a secção permanente (e quem diz esta diz o próprio Conselho). A lista desses casos não coincide integralmente com a que vem agora proposta. Dado que as atribuições dos governadores serão enunciadas no estatuto de cada província, bem se compreende que seja também nele que se pormenorizarão os casos em que se torna obrigatório para o governador ouvir o Conselho. Em todo o caso, o projecto considera necessário prescrever desde já que o exercício de determinadas atribuições dos governadores tem de ser precedido do parecer do Conselho.
Só merece reparos o disposto na alínea b) do n.º II, que, aliás, não consta do elenco correspondente da Carta Orgânica. Incidem eles sobre o ponto do preceito em que se requer a audição do Conselho na fase da avaliação das receitas. Há-de acentuar-se que, na sua maior parte, as receitas se avaliam por métodos automáticos fixados na lei, não ficando a Administração com arbítrio considerável nas previsões. Só quanto a receitas novas ou a receitas cobradas em circunstâncias diferentes das dos anos antecedentes é que pode haver margem para desacertos. Se assim é, não deve impor-se a submissão a Conselho das previsões feitas. Basta a faculdade que o governador normalmente tem de o ouvir para poder socorrer-se nesta matéria da sua consulta. De resto, a composição do Conselho não dá garantias de que ele possa estar devidamente informado sobre o rigor ou verosimilhança das previsões feitas no domínio das receitas.
Já o mesmo se não pode dizer quanto à oportunidade de sujeitar a parecer do Conselho o orçamento das despesas. Este órgão pode realmente dar úteis indicações ao governador sobre critérios a adoptar na dotação dos serviços e na fixação das verbas para execução da política enunciada pelo diploma legislativo de autorização de receitas e despesas, quanto às despesas extraordinárias. Compreende-se que, no exercício de tão delicada competência, o governador seja assistido pelo Conselho de Governo. Tudo estará em dar ao preceito a conveniente redacção.
Não a um reparo, mas a um comentário, dá, por sua vez, ensejo a alínea c). O governador poderá declarar provisoriamente o estado de sítio. Mas a sua declaração em forma compete só à Assembleia Nacional (artigo 91.º, n.º 8.º, da Constituição) ou ao Governo no exercício da nua competência legislativa, designadamente se não estiver reunida a Assembleia. Deve ser por isso que no projecto se não inscreveu a competência do Ministro do Ultramar para declarar o estado de sítio, como a Carta Orgânica, por seu turno, indevidamente fez (artigo 11.º, § 1.º, n.º 15.º). Em vez do Ministro intervirá o Governo ou a Assembleia.
IV - Corresponde ao artigo 39.º da Carta Orgânica. Este artigo também não dá eficácia vinculante aos pareceres do Conselho de Governo ou da sua secção permanente; mas sempre lhes confere eficácia superior à que o projecto lhes atribui. Na verdade, enquanto este dispõe que o governador pode discordar da opinião do Conselho e providenciar como entender, a Carta Orgânica preceitua que o governador, sem embargo de também poder tomar resoluções contra a opinião do Conselho ou da secção, há-de comunicá-las ao Ministro e justificá-las devidamente.
Parece desejável que as coisas continuem nos termos em que estão, para defesa do prestígio dos Conselhos de Governo e para o próprio bem da administração da província. O regime do projecto só se justifica para as hipóteses em que os governadores os ouçam facultativamente.

CAPITULO IV

Órgãos dos governos de província

ARTIGO 46.º

48. Quanto às províncias de governo-geral, prevêem-se, como se viu, um Conselho Legislativo e um Conselho de Governo, respectivamente com funções legislativas e com funções consultivas em matéria de administração e governo. Para as restantes províncias, o projecto, à semelhança do que em relação a todas se prevê hoje na Carta Orgânica, prevê um Conselho de Governo, simultaneamente com funções legislativas e com funções executivas. Estas últimas poderão ser desempenhadas por uma secção permanente do Conselho de Governo.
Ao contrário do que sucede com os Conselhos Legislativos, que são de constituição electiva, os Conselhos de Governo das províncias de governo simples são de constituição mista. Parte-se, pelo visto, do princípio de que não é possível encontrar entre a sua respectiva população (naturais e colonos) elementos elegíveis em número bastante para se formar com eles um conselho de funções exclusivamente legislativas, tornando-se, por isso, aconselhável formar com elementos eleitos e elementos nomeados um conselho misto, que naturalmente acumulará as funções executivas com as funções legislativas. É difícil ajuizar até que ponto este critério é justo, designadamente a respeito de províncias como Cabo Verde ou Macau. De qualquer modo, é de esperar que nos respectivos estatutos se disponha no sentido de dar à população e corporações locais a representação adequada às condições do meio local.
Este artigo deixa para a lei a definição da competência legislativa e da competência executiva. A lei só pode ser a lei orgânica que, efectivamente, a elas alude nos n.ºs I e II do artigo seguinte, mas de maneira imprecisa, como já se verá.

ARTIGO 47.º

49. I - Diz-se aqui que «o Conselho de Governo será ouvido pelo governador para o exercício da competência legislativa que o artigo 151.º da Constituição lhe confere» - mas acrescenta-se: «tendo em vista o disposto na presente lei e no estatuto da respectiva província». É pouco claro este aditamento. Querer-se-á dizer que o Conselho pode ser moldado pelo estatuto da província, quanto à sua competência legislativa, em figurino diverso do Conselho Legislativo das províncias

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de governo-geral? Parece que sim. O próprio facto de este preceito falar em que o- Conselho de Governo «será ouvido» pelo governador para o exercício da sua competência legislativa induz a ver nesse Conselho uni órgão meramente consultivo. A Constituição não se opõe, de resto, a que o legislador ordinário distinga as províncias de governo-geral das províncias de governo simples quanto à índole dos conselhos que devem intervir no desempenho das funções legislativas (cf. artigos 151.º e 152.º).
A fórmula adoptada pelo projecto é, porém, suficientemente imprecisa para comportar outro entendimento, consentindo que no estatuto de cada província de governo simples se prescreva sobre o funcionamento do respectivo Conselho de Governo em termos que se aproximem daqueles por que se rege a actividade dos Conselhos Legislativos das províncias de governo-geral.
II - A secção permanente há-de competir emitir parecer, nos casos previstos na lei e sobre todos os assuntos respeitantes ao governo e administração da província que para esse fim lhe forem apresentados, como hoje sucede, aliás. Não é necessário, para dizer isto, remeter para o estatuto de cada província.

ARTIGO 48.º

50. I e II - Cf. as observações feitas ao artigo 43. e ao n.º IV do artigo 45.º do projecto, aqui inteiramente aplicáveis.

Artigo 49.º

51. I, II e III - Aqui se revela, de um modo especial, a inspiração do projecto no disposto na Carta Orgânica sobre a constituição dos Conselhos de Governo. Também nestes entram vogais oficiais, natos ou designados pelo governador, e vogais não oficiais, nomeados pelo governador ou eleitos (Carta Orgânica, artigo 52.º). Embora seja realmente aconselhável deixar para os estatutos a forma de constituição dos Conselhos de Governo, especialmente na parte relativa aos vogais não oficiais, convém fixar na lei orgânica certas directrizes, de modo a assegurar-se uma representação adequada às condições do meio social respectivo. O n.º III dispõe a este respeito quanto aos vogais não oficiais nomeados pelo governador. Mas nada diz quanto a quem intervirá na escolha dos vogais a eleger. O pensamento implícito no n.º III parece ser ou poderá ser este: os vogais eleitos sê-lo-ão pelos colégios eleitorais do recenseamento geral dos círculos em que o território da província for dividido e, naturalmente, também pelos contribuintes recenseados. Quanto aos vogais não oficiais nomeados pelo governador serão escolhidos por este de modo a dar representação aos organismos de considerável importância na economia e na vida pública da província e aos sectores da população nacional e comunidades estrangeiras que não tiverem voto nos colégios eleitorais.
Quem atentar no n.º III há-de notar que a sua segunda parte não se coaduna com a primeira. Não assim na redacção proposta pela Câmara.
Também não é claro, no n.º III, a que a lei geral se refere quando prevê que seja ela a fixar os requisitos de elegibilidade dos membros do Conselho. A não se fixarem na lei orgânica -como realmente não se fixam-, só poderiam ser fixados por leis especiais (os estatutos).

CAPITULO V

Serviços públicos

ARTIGO 50.º

52. I e II - São diferentes as exigências de cada província quanto à extensão dos serviços públicos a utilizar e até, em certa medida, quanto à sua natureza, pois há-os que não se requerem numa província e são indispensáveis em outra ou outras. Embora a Carta Orgânica não acentuasse esta doutrina geral, não há dúvida de que o legislador sempre por ela se orientou na criação dos serviços públicos coloniais e no desenvolvimento que lhes deu.
A doutrina do n.º I é válida em relação aos serviços provinciais propriamente ditos e em relação às parcelas provinciais dos serviços públicos nacionais. De acordo com ela, o estatuto de cada província, quanto aos serviços propriamente provinciais, e diplomas especiais, quanto aos serviços nacionais, disporão sobre a natureza e extensão dos que vão funcionar em cada província, guardando sempre, é claro, as normas gerais de organização do respectivo ramo de serviço vigentes no ultramar. O n.º II não distingue entre uns e outros serviços, dispondo genericamente que será no estatuto de cada província que se indicarão a natureza e a extensão de todos os serviços que nela funcionarão. Parece, porém, quanto aos serviços nacionais, que tal função deverá caber a legislação especial, respeitante a cada um deles, designadamente porque se trata de serviços dependentes de Ministérios diferentes do Ministério do Ultramar e é ao Ministro do Ultramar exclusivamente que compete elaborar o estatuto de cada província.

ARTIGO 51.º

53. I e II - Os serviços provinciais são dirigidos e coordenados por organismos que funcionam na sede do governo da província e estão a cargo de funcionários na imediata dependência do governador. São estes organismos centrais que estudam e preparam as decisões administrativas do governador e que, uma vez elas tomadas, velarão por que se lhes dê execução.
O projecto pretende uniformizar, neste ponto, a organização administrativa das provinciais ultramarinas, conforme a categoria do seu governo. E, assim, nas províncias de governo-geral não haveria, além do gabinete e da secretaria-geral, senão direcções provinciais, enquanto nas restantes só haveria repartições provinciais. A Carta Orgânica (artigos 96.º e seguintes) dispõe que, em princípio, mas apenas em princípio, só nas colónias de governo-geral haverá direcções de serviços. De um modo geral os negócios provinciais seriam tratados por direcções de serviços, repartições centrais de serviços e repartições técnicas de serviços.
Concede-se que não seja necessário distinguir entre repartições centrais e repartições técnicas de serviços e que basta, portanto, falar em repartições provinciais. No resto, não parece que se deva seguir o projecto. Dado, na verdade, que nas províncias de governo-geral haverá serviços de restrito desenvolvimento e considerando a eventual inoportunidade de os reunir a outros, subordinados a direcções, não convirá afastar-se a possibilidade de instituir repartições provinciais. O preferível, portanto, é ficar por uma afirmação de princípio, dispondo que, em regra, só nas províncias de governo-geral haverá direcções provinciais de serviços.
Quer o projecto que os negócios de administração política e civil sejam tratados, não por direcções ou repartições provinciais, como no regime da Carta Orgânica, mas por uma secretaria-geral (à frente da qual estaria, naturalmente, um secretário-geral). Nessa secretaria se tratariam ainda os assuntos que interessam a mais de um ramo de serviço e se superintenderia em serviços de fraco desenvolvimento ou de limitado campo de acção.
Que pensar do que quanto a este ponto dispõe o projecto?
Não se dá pela existência de argumentos realmente sérios em favor da substituição dos organismos «direcção

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provincial» ou «repartição provincial» pela «secretaria-geral», para superintender nos negócios de administração civil. É certo que já tivemos, no século passado, secretarias-gerais, por força da lei orgânica de 1869. Mas as secretarias-gerais de 1869 eram verdadeiramente secretarias para o expediente da generalidade dos negócios públicos provinciais. A lei de 1914 transferiu esse expediente para secretarias distintas, tendo os funcionários delas encarregados o nome de chefes de serviços da colónia, agentes imediatos do governador na administração dela. Desapareceu, a partir daí, o organismo «secretaria-geral» e não pode pensar-se em restaurá-lo com a índole inicial, dada a magnitude actual dos negócios do governo de cada província. A «secre-taria-geral» do projecto não é, por isso, mais do que uma secretaria ... especial, uma direcção ou repartição central, ao lado das outras, mas diferentemente «baptizada». Haverá vantagem nesta modificação meramente terminológica?
Supomos que não, apesar de o projecto curar de pôr esse organismo a tratar do remanescente de assuntos e serviços, fora da superintendência das restantes secretarias. Note-se, porém, que, sem mudar o nome ao organismo, pode ele perfeitamente tratar do que for comum a todos os serviços, assim como pode superintender em serviços de restrito desenvolvimento. Aliás não se vê por que razão só esta secretaria, e não as restantes, há-de poder reunir tais serviços, quando é certo que podem ter muito mais afinidades com qualquer destas últimas.
A aprovação do projecto neste ponto conduziria, para mais, a uma completa descaracterização da figura do secretário-geral, tal como hoje existe na administração ultramarina. Como bem se sabe, esta figura foi restaurada pela Lei n.º 2:016, não no plano dos directores ou chefes de serviços, mas no plano governativo propriamente dito, com vista a aliviar os governadores (de Angola e de Moçambique) do absorvente despacho respeitante a todos os departamentos colocados na sua dependência. A necessidade de uma espécie de vice-governador nessas duas províncias e porventura também no Estado da índia, pequeno em extensão mas pleno de dificuldades governativas, não é satisfeita pelo projecto, uma vez que reduz de categoria e Junção o actual secretário-geral.
E diga-se, a propósito, que, em relação às províncias de governo simples, é necessário inscrever na lei orgânica um artigo do teor do artigo 102.º da Carta Orgânica, segundo o qual o governador, por meio de portaria publicada no Boletim Oficial, e tomando a responsabilidade de tudo, poderá delegar nos directores ou chefes de serviços a resolução de negócios administrativos que por estes devem ser tratados.
Para finalizar a apreciação deste artigo, note-se que a Carta Orgânica previa organismos especiais de direcção e coordenação dos serviços militares, como serviços provinciais. Estes serviços são hoje parcelas de serviços nacionais, que como tais são dirigidos de acordo com o disposto em diploma especial.
Quanto aos serviços autónomos e aos organismos provinciais de coordenação económica, têm formas especiais de direcção, através das quais mantêm contacto com o governador.

ARTIGO 52.º

54. Este preceito dispõe, além do mais que se não contesta, que, normalmente, a comunicação oficial entre a metrópole e as províncias ultramarinas se fará por intermédio do Ministério do Ultramar. Isto significa que nem outros Ministérios, nem qualquer organismo público, poderá corresponder-se oficialmente com o governo de qualquer província ou com organismo público desta que não seja através do Ministério do
tramar. Eis no que, porém, se não vê qualquer vantagem. O que apenas interessa dispor - e está disposto na Carta Orgânica - é que a correspondência oficial da província, do seu governo, de qualquer organismo público ou de qualquer funcionário, com a metrópole, passe normalmente pelo governador e pelo Ministério do Ultramar. Assim se preserva a hierarquia no ultramar e a subordinação do governador ao Ministro. Ressalvam-se, naturalmente, as hipóteses das várias alíneas do n.º III.
A Carta Orgânica exceptuava os funcionários que fossem membros da Assembleia Nacional da regra de que nenhum funcionário em serviço na colónia poderá corresponder-se directamente com o Governo Central. Tal excepção não aparece agora no projecto, e parece que com boa razão. Na verdade, fora dos períodos de funcionamento efectivo da Assembleia Nacional (durante estes os funcionários que forem Deputados não podem, aliás, exercer os respectivos cargos), não há justificação para que os funcionários Deputados à Assembleia Nacional estejam, quanto a esta regra, em posição diversa da dos restantes funcionários.
A alínea a) do n.º III corresponde à alínea c) do § 2.º do artigo 103.º da Carta Orgânica, com leve diferença de redacção, sem alcance prático.
A alínea b) corresponde à alínea b) desse mesmo § 2.º, com esta importante diferença: de ora avante os funcionários a que o preceito alude correspondem-se directamente com o Ministro, sem obrigação de informarem o governador, não apenas quando em missão oficial, mas antes, de um modo geral, quando em serviço de inspecção.
A Câmara concorda com que se assegurem, como deste modo se faz, os meios de dar independência aos inspectores superiores, embora, em contrapartida, acentue que é este um cargo que só pode ser ocupado por pessoas da maior competência e isenção.
A alínea c) corresponde de certo modo à alínea d) do mencionado § 2.º, mas vai mais além, dispondo, de um modo geral, para todos os serviços nacionais. A este propósito parece bastante prescrever que é lícita a comunicação oficial directa destes serviços com o Ministério respectivo, nos termos da legislação especial que lhes diga respeito (como é o caso, para os- serviços militares, com o Decreto-Lei n.º 37:542, de 6 de Setembro de 1949). Os organismos de coordenação interministerial a que a alínea, por último, se refere, não têm propriamente que ver com o assunto da correspondência.
CAPITULO VI Património e regime financeiro

SECÇÃO I

Direitos patrimoniais

ARTIGO 53.º

55. O capítulo VI do título da Constituição respeitante ao ultramar português, que versa sobre o regime financeiro, começa com um artigo, o 165.º, respeitante à personalidade colectiva das províncias ultramarinas. O projecto de lei orgânica em apreciação, por seu turno, inicia também a matéria respeitante à administração financeira das províncias ultramarinas (designação da Carta Orgânica substituída desnecessariamente pela de «património e regime financeiro») por um artigo, o 53.º, sobre o mesmo assunto.
Este artigo, numa sistematização rigorosa, deveria estar colocado no capítulo respeitante aos princípios gerais da administração ultramarina, como, aliás, sucedia na Carta Orgânica. Mas não há desvantagem especial em que se inclua na divisão em que se encontra.

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Há até para isso uma certa justificação. É neste capítulo, na verdade, que se trata das bases gerais em que assenta a autonomia financeira das províncias ultramarinas, pela constituição reconhecida no artigo 148.º Ora, em regra, o pressuposto prático da autonomia financeira é a personalidade jurídica. De um ente que tenha autonomia financeira podemos mesmo dizer que tem personalidade financeira.
Diz a Constituição no mencionado artigo 165.º, e diz o projecto no presente artigo, que as províncias ultramarinas são pessoas colectivas de direito público. Isto quer dizer (grosso modo, para não entrarmos em discussão aberta sobre o alcance da personalidade jurídica pública por oposição à personalidade jurídica privada, aqui fora de lugar) que as províncias representadas pelos seus órgãos e agentes têm poderes jurídicos públicos, têm, em suma, competência propriamente dita.
O projecto acrescenta que as províncias «estão incluídas entre as pessoas morais a que se refere o artigo 37.º do Código Civil». Referência despropositada se tem de considerar esta: o artigo 37.º do Código Civil não resolve o problema de saber se as províncias ultramarinas (antigas colónias, a que o artigo expressamente alude) são ou não pessoas morais, pois diz que o Estado, as colónias, as províncias, os concelhos, as freguesias e quaisquer corporações administrativas e fundações ou estabelecimentos de beneficência, bem assim as associações ou instituições das igrejas, são havidas, quanto ao exercício dos direitos civis respectivos, como pessoas morais ou colectivas. O conceito de pessoa moral é antes dado polo artigo 32.º do Código Civil, que as reduz às corporações de direito privado e utilidade pública. Mas outros preceitos alargaram o âmbito da classificação, incluindo nela, entre outros entes, o Estado e as províncias ultramarinas (cf., por exemplo, o artigo 822.º, n.ºs 1.º e ,2.º, do Código de Processo Civil), além de que a doutrina, tendo em conta a razoabilidade de lhes aplicar os preceitos ou, de um modo geral, o regime das clássicas pessoas morais, considera englobadas na classificação todas as pessoas colectivas se direito público e ainda todas as fundações (pessoas colectivas de direito privado e utilidade pública). Ficam de fora apenas, portanto, as pessoas colectivas de direito privado e utilidade particular ou de fim lucrativo.
Em resumo, portanto, deve o artigo ser amputado da sua segunda parte, por inexacta ou, em todo o caso, por desnecessária.

ARTIGO 54.º

56. Embora com desrespeito pelas exigências do sistema, a Constituição engloba no capítulo VI do título VII da parte II disposições respeitantes à capacidade civil e judiciária das províncias ultramarinas. Daí que, quer a Carta Orgânica, quer o presente projecto, se refiram igualmente a este assunto. A Carta Orgânica fazia-o numa secção sobro «princípios gerais» da administração financeira (artigos 152.º e 153.º). O projecto associa no mesmo preceito -o artigo 54.º- esta matéria à dos direitos patrimoniais, a que, quer a Constituição, quer a Carta Orgânica, se referem em disposições especiais (respectivamente artigos 167.º e 154.º). Convém seguir a tradição e englobar todos estes princípios numa secção sobre os princípios gerais da administração financeira.

ARTIGO 55.º

57. I - As províncias ultramarinas não têm domínio público. Pertencem ao domínio público do Estado os bens enumerados no artigo 49.º da Constituição e «quaisquer outros bens sujeitos por lei ao regime do domínio público» (artigo 49.º, n.º 8.º).
Sendo assim, é natural que a lei regule os poderes que sobre os bens dominiais situados no ultramar cabem aos governos ultramarinos e a outras entidades de direito público. Não necessita isto de ser dito nesta lei orgânica, ao que parece, por ser óbvio.
II - Este preceito é igual e claramente desnecessário.

SECÇÃO II

Receitas públicas

ARTIGO 56.º

58. O projecto traia sucessivamente das receitas públicas e das despesas, para só no fim tratar do orçamento e contabilidade. A Carta Orgânica tratava primeiro dos orçamentos coloniais, depois, e pela ordem, das receitas, das despesas, da contabilidade e da fiscalização. A ordem mais lógica leva-nos a tratar primeiro do orçamento, onde se prevêem as despesas e as receitas, depois das despesas, já que são estas que, dentro de determinados limites, determinam as receitas; em seguida das receitas; logo após da contabilidade; e, finalmente, da fiscalização. Transija-se, porém, na lei com a ordenação tradicional das matérias seguida na Carta Orgânica, nos termos da qual as receitas aparecem antes das despesas. E, aliás, esta a ordenação legal das matérias nos orçamentos ultramarinos e no Orçamento Geral do Estado.
I - O artigo 169.º da Constituição impõe que na lei orgânica do ultramar se estabeleçam as receitas que pertencem às províncias ultramarinas, separadamente ou em comum, bem como as atribuídas à metrópole. É ao que, quanto as primeiras, dá execução este n.º I.
Percorrendo as várias alíneas deste número, verifica-se que alude apenas às receitas efectivas -receitas patrimoniais, taxas e impostos-, esquecendo as chamadas tecnicamente receitas não-efectivas, as receitas provenientes de empréstimos e de outras operações de crédito. Embora no artigo 59.º se disponha sobre elas, há-de fazer-se-lhes, por uma questão de sistema, referência neste lugar.
E note-se, por último, que se omitiu uma disposição em que se diga que serão receitas públicas, próprias das províncias ultramarinas, quaisquer outras importâncias que a lei como tais considere, a exemplo do que sucedia na legislação de 1914 e de 1920: é o caso dos reembolsos, reposições, multas, etc.
a) Trata-se de fórmula sensivelmente igual às que vêm sendo usadas desde 1914;
b) Aqui se englobam todas as receitas provenientes do património provincial, incluindo os rendimentos das explorações directas ou das concessões de serviços de utilidade pública, de feição industrial ou comercial, no número dos quais, como dos mais importantes, se contam estabelecimentos públicos de crédito e de depósito e os institutos de emissão das províncias. Salva, pois, a redacção, o preceito é de aprovar;
c) Se bem que o Estado seja o titular dos bens do domínio público situados no ultramar, as províncias ultramarinas podem ser autorizadas a explorar qualquer das suas parcelas - arrecadando consequentemente as receitas dessas explorações. E pode o Estado autorizá-las a conceder, ou conceder ele mesmo directamente, a exploração de bens dessa espécie, com a obrigação para a província de assumir os encargos da concessão; nesses casos justifica-se perfeitamente que os rendimentos de tais concessões sejam próprios da respectiva província, guardados sempre os termos da lei.
II - Na medida em que existam bens ou serviços comuns das províncias ultramarinas, comuns deverão ser naturalmente os seus rendimentos. Em termos idênticos, na medida em que legalmente se constituam fun-

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dos comuns, comuns se têm de considerar as receitas desses fundos, isto é, as contribuições ou taxas a eles consignadas. Nestas condições está, hoje em dia, o Fundo de Defesa Militar do Império Colonial, criado pelo Decreto n.º 30:117, de 8 de Dezembro de 1939.

ARTIGO 57.º

59. a) O Decreto n.º 30:117, de 8 de Dezembro de 1939, criou um Fundo Comum de Defesa do Ultramar, administrado pelo Ministério do Ultramar e hoje pelo do Exército. Instituiu-se desse modo unia certa e por demais necessária solidariedade das províncias ultramarinas no que respeita ao custeio das despesas com a defesa de cada uma delas. As receitas deste fundo não são, porém, receitas da metrópole; são receitas comuns das províncias.
Vem agora o projecto procurar instituir, em vez deste, um sistema nos termos do qual a metrópole receberia das províncias ultramarinas uma contribuição para a defesa nacional.
A prevalecer a orientação do projecto -e ela deve realmente impor-se-, há-de ter-se em conta que essas receitas cobradas pela metrópole no ultramar devem aparecer no Orçamento Geral do Estado como receitas consignadas à defesa nacional.
Das receitas provenientes do ultramar e destinadas à defesa e das receitas gerais da metrópole na parte adequada disporá o Governo Central para custear, na metrópole ou no ultramar, as despesas militares, todas as desposas militares.
E neste sentido que se poderá falar de um orçamento único da defesa nacional. A metrópole inscreverá no seu orçamento as verbas necessárias ao custeio dos serviços militares, onde quer que estes se instalem e funcionem, servindo-se das suas receitas gerais e de uma comparticipação dada por cada província, determinada por percentagem sobre as suas receitas ordinárias.
Já em 1914 se procurou instituir a solidariedade intercolonial no custeio das despesas militares ultramarinas. Mal compreendido, este sistema veio a ceder o passo a tendências particularistas. O diploma acima referido, que instituiu o Fundo Comum de Defesa, representou uma reacção salutar contra a visão particularista das questões de defesa militar que dominou algumas províncias e se impôs ao legislador. A fórmula agora de novo advogada exprime o ponto de vista mais razoável.
Este sistema teria, na verdade, as seguintes vantagens:
1) Permitiria organizar a defesa nacional independentemente dos recursos de cada território, concentrando os meios onde se torne mais necessário;
2) Legitimaria a colaboração ultramarina no custeio das despesas militares da metrópole, que têm volume superior ao requerido para a defesa exclusivamente metropolitana e se destinam fundamentalmente a assegurar a defesa conjunta da metrópole e do ultramar;
3) Harmonizar-se-ia com a feição nacional que acabaram por assumir os serviços do Exército, da Marinha e da Aeronáutica Militar.
b) Esta alínea não oferece margem para reparos. Se e na medida em que a metrópole custear a instalação de explorações ou garantir concessões, deve ter o direito de receber os lucros, as rendas, as participações e as anuidades respectivas.
c) E óbvia a solução.

ARTIGO 58.º

60. I - Corresponde ao artigo 168.º da Carta Orgânica, com leves alterações, mais ou menos dispensáveis.
II - Corresponde ao artigo 167.º da Carta Orgânica, com aperfeiçoamentos de redacção.
III - O recurso à constituição de fundos tem de ser excepcional e devidamente justificado. É necessário, em princípio, restringir a margem de utilização desse expediente, obrigando os serviços a submeter-se às regras e limitações do Tesouro Público. É por isso que o projecto dispõe que só com autorização do Ministro do Ultramar poderão constituir-se fundos especialmente consignados a determinados fins.

ARTIGO 59.º

61. I - Sobre o assunto dispõem os artigos 172.º e 174.º da Constituição, que o melhor é reproduzir na lei, nos lugares próprios.
II e III - A solução tradicional é a de atribuir às próprias províncias competência para contraírem empréstimos e realizarem outras operações de crédito destinadas a obter capitais necessários ao governo delas. Dentro da província, o órgão competente para tomar a iniciativa dos empréstimos e outras operações de crédito há-de ser o governador. E talvez se imponha assimilar a (posição do governador à do Governo metropolitano, no que respeita à necessidade de prévia autorização da assembleia representativa. Sucede que, como já se notou, certos planos e certas obras de maior vulto são da própria competência do Ministro do Ultramar. Poderá este providenciar acerca do respectivo financiamento, por sua iniciativa ou mediante proposta do governador (neste caso com audição do Conselho Legislativo ou do Governo, segundo nos parece dever propor).
É tradicional que a metrópole, no exercício do seu poder de contrôle, sancione, mediante prévia autorização, os compromissos de maior importância. O Acto Colonial, no seguimento do disposto nas bases de 1914 e de 1920, atribuía ao Parlamento metropolitano a autorização dos empréstimos coloniais que exigissem caução ou garantias especiais [artigo 27.º, n.º 1.º, alínea b)]. No § 1.º do artigo 172.º da Carta Orgânica dispunha-se em conformidade com este preceito constitucional.
Nos restantes empréstimos, a Carta Orgânica distinguia entre aqueles cujo total fosse superior a dois duodécimos da receita anual da colónia, ou que, de qualquer modo, tivessem de ser amortizados em período que excedesse o exercício em que fossem contraídos (n.º 11.º do § 1.º do artigo 10.º e artigo 172.º, § 2.º), e os demais, que constituiriam uma espécie de dívida flutuante. Aqueles requeriam prévia autorização do Ministro e os segundos não requeriam naturalmente qualquer autorização da metrópole.
Não inclui hoje a Constituição um preceito idêntico ao do citado artigo 27.º do Acto Colonial, sem que por isso se deva extinguir o contrôle da metrópole quanto aos empréstimos mais importantes. Assim, o projecto substitui a Assembleia Nacional pelo Conselho de Ministros. Parece, porém, que é melhor falar no Governo, que dará a autorização sob a forma de decreto-lei, como já houve ocasião de dizer.
Os empréstimos que não exijam caução ou garantias especiais requererão autorização do Ministro do Ultramar, dada, como oportunamente se disse, no uso da sua competência legislativa (ou seja, portanto, por meio de decreto), sempre que para a sua amortização se não disponha no ano em curso de receitas ordinárias e qualquer que seja o seu montante, tal como no projecto se propõe e a Câmara aprova.
O projecto não deve referir aqui os empréstimos de serviços autónomos, pois se está tratando apenas da administração financeira das províncias, e não de qualquer outro ente.

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SECÇÃO III

Despesas públicas

ARTIGO 60.º

62. a) Corresponde à alínea b) do artigo 180.º da Carta Orgânica. A metrópole custeará não só as despesas com a Secretaria de Estado do Ultramar propriamente dita, como também as respeitantes aos organismos dependentes do Ministério que a lei indicar (hoje aqueles a que alude o artigo 193.º do Decreto n.º 26:180, de 7 de Janeiro de 1936).
Tratando-se embora de despesas com serviços de interesse nacional, a tradição é realmente no sentido de ser só a metrópole a suportá-las.
b) A metrópole paga tradicionalmente as despesas de «soberania» e de «civilização», conceitos vagos, em que cabem hoje em dia as despesas que a metrópole deve suportar na realização, no ultramar, de actividades ou serviços de utilidade nacional ou que, embora de utilidade predominantemente ultramarina, representam uma forma de colaboração da metrópole no seu progresso e civilização. É seu dever, na verdade (artigo 133.º da Constituição), desempenhar a função histórica de colonizar as terras dos Descobrimentos sob a sua soberania e de comunicar e difundir entre as populações ali existentes os benefícios da sua civilização, exercendo também a influência moral que é adstrita ao Padroado do Oriente.
A Carta Orgânica fazia incluir nestas despesas, especificadamente, as despesas com a delimitação de fronteiras, as do Padroado do Oriente e as da Residência de S. João Baptista de Ajudá.
Em vez desta rubrica genérica, o projecto prefere um puro critério taxativo, que pode ter os seus inconvenientes, deixando de fora despesas de tipo imprevisto, que se venha a revelar justo inscrever no orçamento metropolitano. Por isso se sugere a conservação da clássica fórmula «despesas de soberania».
Quanto às despesas relativas à defesa nacional, serão despesas inscritas no orçamento metropolitano, nos termos atrás sugeridos: isto é, para serem suportadas pelas receitas gerais da metrópole e pelas receitas consignadas provenientes do ultramar.
Quanto às despesas com o povoamento de territórios ultramarinos, devem caber à metrópole na medida em que esse povoamento contribui para resolver um problema metropolitano, o problema demográfico, e na medida em que, dessa maneira, se desempenha da função histórica de colonizar as terras dos Descobrimentos (como na Constituição se diz). A colonização, no sentido de povoamento, pode ser livre, mas a verdade é que tem de ser em larga medida mais ou menos dirigida ou fomentada, para ser eficiente. Daí despesas com a preparação de colonos, com transportes, com a criação de serviços públicos no destino, com subsídios de vária ordem ... A metrópole custeará total ou parcialmente esta forma de povoamento.
A metrópole fará também dispêndios com o estudo dos problemas ultramarinos e com a investigação científica relativa a terras do ultramar, bases, um e outra, em que assenta uma política ultramarina eficaz. Além de institutos, escolas, comissões e juntas de carácter permanente, têm feito obra complementar de relevo, desde 1945, missões de estudo, constituídas por professores, investigadores, técnicos, tirocinantes e pessoal auxiliar, com vista a aperfeiçoar o conhecimento das possibilidades económicas e de colonização dos territórios ultramarinos, a criar no ensino metropolitano o interesse pelos estudos coloniais e a elaborar estudos e projectos com interesse para a colonização europeia nesses territórios.
Compete, por outro lado, à metrópole realizar obra de estreitamento das relações espirituais entre ela e o ultramar por meios adequados, procurando expandir a cultura metropolitana e avigorar a sua influência nas terras ultramarinas portuguesas.
A todas estas matérias se refere a alínea b), que deverá sofrer algumas modificações de redacção.
c) A alínea está de acordo com o direito vigente interno e internacional e sofrerá apenas as modificações indispensáveis à sua simplificação.
d) São consideradas de soberania as despesas com a Residência de S. João Baptista de Ajudá. Este território faz administrativamente parte da província de S. Tomé e Príncipe, encontrando-se o residente subordinado ao governador desta província. A razão de serem as respectivas despesas suportadas pela metrópole está no significado da nossa permanência nesse pequeno território, que de maneira nenhuma se relaciona com os interesses exclusivos da província mencionada, a cargo da qual, por isso, não devem ser postas.
Reza a alínea, além disto, que ficam a cargo da metrópole as despesas de «outros estabelecimentos ou serviços que, embora funcionando no ultramar, estejam integrados nas organizações hierárquicas da metrópole». Note-se, antes de mais, que não parece exacto equiparar testes estabelecimentos ou serviços à Residência de S. João Baptista de Ajuda, a qual, como acima se viu, não está directamente integrada em qualquer organização hierárquica da metrópole, não devem, pois, equiparar-se estas rubricas.
Seja como for, além de estabelecimentos e serviços, há que mencionar explorações de interesse público ou concessões que a metrópole garanta no ultramar.
Entre os estabelecimentos a que se alude aqui, contam-se os estabelecimentos penais integrados na organização penal metropolitana, não obstante estarem situados além-mar. As passagens e manutenção dos delinquentes metropolitanos que os tribunais ou os serviços prisionais competentes para lá remeterem hão-de naturalmente ser custeadas pela metrópole. O projecto não o diz, mas há que consigná-lo.
e) Preceito idêntico ao do artigo 180.º, alínea e), da Carta Orgânica, que poderá, porventura, ser aperfeiçoado na redacção.

ARTIGO 61.º

63. Há, de um modo geral, coincidência entre este artigo do projecto e o artigo 179.º da Carta Orgânica. A Câmara introduz-lhe algumas pequenas alterações que julga necessárias.

ARTIGO 62.º

64. I - Corresponde ao disposto no artigo 175.º da Carta Orgânica. Não há reparos a fazer, salva a redacção.
II - Coincide com o artigo 173.º da Carta Orgânica.
III - Corresponde ao § único do artigo 175.º da Carta Orgânica. Este preceito visa assegurar a economicidade na utilização das verbas.
IV - A Carta Orgânica dispõe, no artigo 174.º, que «o governador da colónia é o ordenador das despesas inscritas no orçamento». Há, porém, segundo o direito vigente, despesas que não têm de ser ordenadas e outras que o são pelo Ministro do Ultramar: «As despesas certas, salvo qualquer caso de dúvida ou reclamação, não carecem de ordenamento ou autorização do governador ...» (artigo 33.º do Decreto n.º 17:881, de 11 de Janeiro de 1930). Quanto às variáveis, as respeitantes a projectos de obras novas ou de grandes reparações e a aquisição de materiais ou de quaisquer artigos que importem em quantia superior a certo limite, são liqui

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dáveis e pagos depois de resolução do próprio Ministro (artigo 34.º do decreto citado).
O projecto prevê expressamente esta dupla competência. Naturalmente, a lei virá a dispor que pelo Ministro serão ordenadas as despesas respeitantes às obras e planos da sua competência.

SECÇÃO IV

Orçamento e contabilidade

ARTIGO 63.º

65. Corresponde este preceito ao artigo 155.º da Carta Orgânica e é imposição do artigo 168.º da Constituição. Ter um orçamento privativo, diferente do Orçamento Geral do Estado e do orçamento de cada uma das restantes províncias, eis no que, em primeiro lugar, se concretiza a autonomia financeira de cada província ultramarina, pela primeira vez expressamente reconhecida na legislação de 1914.
Não se mencionai á neste artigo que o orçamento é anual porque para tal há oportunidade no artigo 66.º

ARTIGO 64.º

66. I e II - Os preceitos deste artigo dão execução ao disposto no artigo 168.º da Constituição, que impõe a organização dos orçamentos provinciais de harmonia com o principio consignado no artigo 63.º do mesmo texto constitucional, princípio da unidade, segundo o qual todas as receitas e todas as despesas devem ser inscritas num único orçamento - no caso, o orçamento de cada província ultramarina.
Como é sabido, o artigo 63.º da Constituição, embora afirmando o princípio da unidade, entende-o em termos de ser compatível com a existência de orçamentos de serviços autónomos; entende-o, portanto, num sentido impróprio ou formal.
Assim se tem de entender também em relação aos orçamentos ultramarinos. O que se exige é que no orçamento de cada província se incluam as suas receitas e despesas pela totalidade, mesmo as dos serviços autónomos, com orçamentos próprios, que podem ser publicados à parte.
Nos termos em que a Constituição entende o princípio da unidade, não são vedadas as consignações de receitas, contanto que estas sejam incluídas no orçamento. De sorte que pode no ultramar haver consignação de receitas, devendo estas ser incluídas no orçamento da província. Não há necessidade de o declarar.
Também não há necessidade de declarar que farão parte do orçamento as receitas e despesas que competem à província nos serviços comuns do ultramar. De resto, estes serão, por via de regra, financeiramente autónomos.
E, por último, parece que, não sendo suas, não devem caber no orçamento as despesas feitas e as receitas cobradas pela metrópole na província.
Em resumo (e é quanto basta dizer na lei) o orçamento de cada província ultramarina é unitário e compreende, por via disso, todas as suas receitas e despesas, mesmo as dos serviços autónomos, de que podem ser publicados à parte desenvolvimentos especiais. É a fórmula constitucional: é a melhor fórmula.

ARTIGO 65.º

67. I - Corresponde também este preceito ao disposto no artigo 163.º da Constituição, enquanto remete para o seu artigo 66.º Note-se que, ao impor-se aqui a adequação das receitas às despesas, se prescreve apenas um equilíbrio formal: as despesas totais hão-de ter no orçamento a contrapartida de receitas efectivas ou provenientes de operações de crédito. No que concerne aos orçamentos provinciais, esta isto expressamente afirmado no § 2.º do artigo 2.º do Decreto n.º 17:881, citado.
II - Dado que o orçamento serve, além do mais, para adaptar as receitas às despesas, as receitas hão-de ser calculadas tendo em conta o seu destino, que é ocorrer ao cumprimento de obrigações legais ou contratuais ou permanentes por sua natureza e fins. É o que se diz no artigo 65.º da Constituição. O projecto considera, e bem, que este princípio deve também presidir à estimação das receitas das províncias e virá, por isso, expresso na lei orgânica.
III - Corresponde ao artigo 158.º da Carta Orgânica, salva insignificante diferença de redacção, aliás imposta pelo artigo 168.º, § 1.º, da Constituição.
IV - Corresponde ao artigo 159.º da Carta Orgânica, salva a redacção. Trata-se de um preceito que visa evitar a legalização de despesas que excederem as dotações de cada ano, dotando-a no ano seguinte ou abrindo no próprio ano em que a despesa foi feita um crédito para a satisfazer.
V - Verifica-se que o projecto deixa para a lei que reger a administração financeira o tratamento da matéria respeitante- a transferências de verbas e a aberturas de créditos, já hoje, aliás, regulada por diploma especial (Decreto n.º 35:770, de 29 de Julho de 1946). Do mesmo modo, deixa para diploma especial a enunciação dos casos em que pode justificar-se a inclusão, nos orçamentos, de verbas para pagar encargos relativos a exercícios findos. Sem objecção.

ARTIGO 66.º

68. Consignam-se neste artigo os trâmites fundamentais que se entende deverem ser seguidos na preparação do ornamento. Há-de dispor-se, Naturalmente, sobre quem tem a iniciativa da organização dele, sobre a avaliação das receitas, sobre a fixação das despesas, sobre os órgãos a quem compete votá-lo, sobre quem terá competência pura em último termo o aprovar e mandar executar, sobre os prazos em que devem decorrer tais trâmites e sobre o controle metropolitano ao longo de todo este processo.
São bem conhecidos os trâmites fundamentais inicialmente fixados pelo Acto Colonial e pela Carta Orgânica para a preparação do orçamento, bem como o alcance do controle metropolitano instituído para todo o decurso dessa fase da administração financeira de cada colónia. A iniciativa do projecto de orçamento caberia ao governador, que o faria discutir no Conselho de Governo. Subia então esse projecto ao Ministério para efeito de revisão e aprovação. Revisto e aprovado pelo Ministro, competia finalmente ao governador mandá-lo executar, por meio de diploma legislativo.
A este sistema (que surgiu como reacção contra alegados abusos da exagerada autonomia financeira anteriormente praticada) censurou-se principalmente a acentuada restrição que impunha à personalidade financeira das colónias, restrição que, se em certas circunstâncias e quanto a certas colónias, seria indispensável, foi seguidamente reputada menos adequada para a generalidade dos territórios ultramarinos e para circunstâncias normais da respectiva Fazenda. Daí que em 1945-1946, pelas Leis n.ºs 2:009 e 2:016, tal sistema tenha sido alterado em sentido mais benévolo para a autonomia financeira das colónias.
E, assim, ao lado do regime inicial, que impunha a aprovação ministerial do orçamento, instituiu-se outro, segundo o qual o controle metropolitano se poderia em princípio limitar a uma simples autorização dada ao governo da colónia para a elaboração do seu orçamento. Em vez de o governo da colónia enviar a Lisboa um projecto acabado de orçamento, enviar-lhe-ia, simples-

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mente, aprovadas pelo Conselho de Governo, as bases em que pretendia elaborá-lo. Aprovadas pelo Ministro essas bases (eventualmente com modificações ou aditamentos), organizariam os serviços o orçamento propriamente dito, competindo no governador, por último, aprová-la e mandá-lo executar.
Neste último regime, como facilmente se vê, a intervenção da metrópole é menos absorvente.
O Ministro determinaria, anualmente, as colónias em que os orçamentos seriam elaborados por autorização e aquelas em que ficariam sujeitos a aprovação, conforme, naturalmente, entre outras circunstâncias, a experiência que sã atribuísse às entidades que, na colónia, têm intervenção na preparação desses documentos.
A última reforma, constitucional eliminou o preceito do Acto Colonial (§3.º do artigo 40.º) segundo o qual o orçamento da colónia não entraria em vigor sem autorização ou aprovação expressas do Ministro. Não se pretendeu -é evidente- com tal alteração isentar os governos ultramarinos de todo e qualquer controle metropolitano na organização do orçamento, documento em que, afinal do contas, se traça o programa anual da administração da província e em que se tomam decisões que podem afectar seriamente a sua ordem financeira e mesmo a económica. Apenas se julgou dispensável a fixação, no texto constitucional, dos termos em que se operará a fiscalização e superintendência do Governo Central na fase da organização do orçamento, remetendo a Constituição (artigo 169.º, n.º 2.º), nesse ponto, justamente para a lei orgânica.
Ora bem. O projecto em apreciação equipara todas as províncias no que respeita aos trâmites de preparação do orçamento e quanto ao respectivo controle metropolitano - e parece que se lhe não deve dirigir censura nesse ponto. Não há realmente motivos para se admitir que as capacidades e a experiência burocrática sejam sensivelmente diferentes de província para província. O governo de cada província elaborará, pois, pelos serviços competentes, o seu orçamento, de harmonia, com as leis existentes, os interesses da província e as instruções o ordens do Ministro do Ultramar. Não se requer, para tanto, qualquer autorização. A autorização resulta, só dá lei para todas as províncias, sem distinção.
Em segundo lugar, com vista, a dar ao Ministério ocasião de rever a fornia como se observaram as leis e princípios que regem a avaliação das receitas, o projecto prevê o envio imediato a Lisboa dos respectivos mapas de avaliação. Se tal se torna necessário para evitar que se façam avaliações despropositadas ou simplesmente aventurosas e se comprometa o equilíbrio financeiro (como no passado tantas vezes sucedeu), parece que idêntica, providência se deveria, incluir quanto às previsões das despesas, a fim de se verificar em que medida se fez criteriosa distribuição das verbas pelos serviços e pelas obras.
Simplesmente, se tal se prescrevesse, quer quanto às receitas, quer quanto às despesas, ficaria sem alcance prático a intervenção dos Conselhos Legislativo ou de Governo. Que significado pode ter a intervenção, que o projecto prescreve, de tais Conselhos, a votar, no final do processo de preparação do orçamento, aquilo sobre que já se exerceu a intervenção tutelar da metrópole?
O diploma, legislativo, cuja discussão e votação no projecto se prevê, nunca poderia, ter o alcance do, autorizar receitas ou despesas que Lisboa tivesse antes decidido não deverem cobrar-se ou pagar-se.
Dita pelo Ministro a última palavra, os Conselhos Legislativo ou de Governo não devem ter nada mais que ver com a preparação do orçamento. Hão-de, por isso, intervir, sim, mas antes do o Ministro do Ultramar ter sancionado o diploma de autorização de receita
e despesa e introduzido neste as modificações e aditamentos reputados indispensáveis ou convenientes - de qualquer modo sem o direito de recusar o cumprimento das eventuais ordens e instruções de Lisboa, recebidas enquanto o orçamento vai sendo preparado.
Ao Ministério será enviado o diploma legislativo, antes de publicado, em que se conterá a autorização das receitas a cobrar e das despesas a pagar e em que se definirão os princípios a que deve ser subordinado o orçamento, na parte das despesas cujo quantitativo não é determinado em harmonia com as leis, instruções ou ordens preexistentes. Acompanhá-lo-ão, como elementos de informação, o projecto orçamental e os demais elementos necessários para se poder realizar utilmente o controle do Ministério.
De posse destes, o Ministro verificará em que medida se deu cumprimento às instruções e ordens que ao governador tenha enviado, designadamente quanto à inclusão de verbas para realização de obras e planos da sua competência; em que medida se fez uma correcta avaliação das receitas; em que medida, por último, é criteriosa a distribuição das dotações pelos serviços e a repartição das verbas pelas obras, operação em que, aliás, o governador terá assistido pelo Conselho de Governo, como se viu quando se tratou da competência consultiva deste órgão. No que respeita a obras extraordinárias, como se disse, o diploma legislativo fixará os princípios a que deve subordinar-se o orçamento. O Ministro apreciará não só, quanto a este ponto, a razoabilidade desses princípios, como, inclusive, a tradução que o governador lhes dá no projecto orçamental.
A Câmara Corporativa, em obediência a estas directrizes e ponderando que, deste modo, se dá satisfação à autonomia provincial na maior medida possível, compativelmente com a necessidade de deixar à, metrópole a fiscalização e superintendência convenientes para assegurar a ordem financeira das províncias, sugere texto diferente para este artigo.
Como há-de facilmente notar-se, o regime que se propõe aproveita da lei metropolitana a sugestão de que a assembleia, representativa provincial não há-de ter, em matéria financeira, em relação ao governador, poderes superiores aos da Assembleia Nacional em relação ao Governo. Na metrópole, com efeito, é a Administração quem avalia as receitas e quem fixa as despesas. O Legislativo intervém, entre 25 de Novembro e 15 de Dezembro, para autorizar o Governo a cobrar as receitas e a pagar as despesas previstas pelo Governo. A Assembleia não discute o orçamento propriamente dito; não discute o orçamento das receitas nem o orçamento das despesas. A previsão das receitas ó mero problema de contas; não oferece interesse, por isso, submetê-la, a discussão política. Quanto ao orçamento das despesas, há que distinguir as de quantitativo determinado de harmonia com leis preexistentes (correspondentes às dotações dos serviços) e as que se podem chamar extra ordinárias, cujo quantitativo não e fixado de harmonia com as leis preexistentes. Quanto às primeiras, entende-se que a distribuição delas é sobretudo problema técnico, a resolver tendo sobretudo PUI conta a necessidade de assegurar a eficiência dos serviços: não intervém na discussão dele, por via disso, a Assembleia. Quanto às últimas é que se dá, na Constituição (artigo 91.º, n.º 4.º), ao Parlamento ocasião de definir os princípios a que deve, nessa parte, subordinar-se o orçamento.
Aplicando ao ultramar este regime, teremos qualquer coisa como o que no texto do contraprojecto se refere, por onde se verá que se reserva aos Conselhos Legislativos ou de Governo papel de relevo em matéria de despesas extraordinárias.

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E, finalizando, note-se que o preceito do n.º III é estritamente supérfluo e que o n.º VI precisa de ser um pouco modificado no que respeita às receitas, tendo em conta o disposto no § 2.º do artigo 70.º da Constituição.

ARTIGO 67.º

69. Ao contrário do que sucede na Carta Orgânica (artigo 184.º), o projecto não fixa as bases relativas à fiscalização administrativa e judicial dos orçamentos das despesas) provinciais. Alude apenas à fiscalização judicial e política das coutas. É uma falha a suprir.
I - Este preceito é imposto ao legislador pela própria Constituição (artigo 170.º).
O projecto limita-se a acrescentar-lhe a indicação da autoridade competente para introduzir as modificações nas regras da contabilidade que se tornem indispensáveis.
II - Coincide com a disposição do artigo 182.º da Carta Orgânica. É lógico: executado o orçamento, para se concluir da forma como se observaram as limitações orçamentais no capítulo dos gastos públicos, é necessário que as contas coincidam rigorosamente com a classificação orçamental em vigor.
III - Nada há a observar. O preceito reproduz o do artigo 171.º da Constituição. Acrescenta apenas que a remessa das coutas ao Ministério se faz nos prazos e sob as sanções que a lei estabelecer. Estes prazos e estas sanções eram directamente fixados na Carta Orgânica (§§ 1.º a 4.º do artigo 183.º), mas parece realmente que esta matéria deve reservar-se para o diploma que regular a administração da Fazenda das províncias ultramarinas.

CAPITULO VII

Autarquias locais

ARTIGO 68.º

70. Versa este artigo sobre os corpos administrativos ultramarinos, de que se prevêem apenas três espécies: câmaras, comissões municipais e juntas locais. Além destas, a Reforma Administrativa Ultramarina reconheceu a junta provincial como corpo administrativo da província.
I - Desaparecida a província como autarquia local, convirá instituir na sede dos distritos, nas províncias ultramarinas onde os haja, um corpo administrativo para gestão dos interesses comuns dessa circunscrição. A administração descentralizada deve ter representação na gama dos interesses públicos que se situam entre o concelho e a província propriamente dita. Serviços e obras haverá que são de interesse predominantemente distrital, sobre os quais há-de deliberar um corpo administrativo que, segundo a tradição, se poderá chamar conselho de distrito.
Previa a Reforma Administrativa Ultramarina a existência de freguesias, como autarquias locais, mas não curou de designar o corpo administrativo que a representasse. Na índia a legislação local confiou a administração dos interesses comuns das freguesias às juntas administrativas das gãocarias ou a juntas locais. Salvo, porém, o caso da administração paroquial pelas juntas administrativas das comunidades aldeãs, parece que se deve consagrar em todo o território nacional o tradicional corpo administrativo da freguesia - que será, assim, a junta de freguesia.
O n.º I deve, pois, ser modificado de acordo com estas observações.
II - O legislador da Reforma Administrativa Ultramarina teve em conta que deveria variar com o desenvolvimento económico, importância política e população o grau de administração própria a conferir aos concelhos. A autonomia é maior nos concelhos mais desenvolvidos, politicamente mais importantes e mais povoados, e vai-se restringindo de acordo com a importância decrescente desses factores.
É assim que só há câmaras municipais (corpos inteiramente electivos) nos concelhos que forem capital de província ultramarina de governo-geral e nos concelhos de 1.ª classe de mais de 2:000 habitantes europeus ou equiparados.
A fim de evitar a criação de câmaras municipais para que não seria possível eleger elementos capazes entre a população é que a Reforma Administrativa Ultramarina atribuiu comissões municipais aos concelhos de 1.ª classe de população inferior a 2:000 habitantes e aos de 2.ª classe de mais de 1:500 e juntas locais aos restantes. A autonomia é menor nas comissões municipais do que nas câmaras municipais e maior naquelas do que nas juntas locais, segundo se depreende da composição que a cada um destes corpos administrativos a lei fixa. Trata-se de formas rudimentares da instituição municipal típica, a câmara municipal, colocadas no caminho de uma futura vida municipal perfeita e de uma rede municipal completa. A Reforma de 1907, a Lei n.º 277, o Decreto n.º 7:008 e a legislação posterior tinham também admitido já uma discriminação das instituições municipais, embora em termos diferentes, que não vale a pena recordar.
O projecto não respeitou o esquema vigente da orgânica municipal. Neste número e no seguinte dispõe-se que nos concelhos só pode haver câmaras municipais e comissões municipais, estas na falta ou nulidade da eleição ou enquanto o número de eleitores inscritos for inferior ao mínimo estabelecido.
Não se descortina qualquer vantagem na alteração da orgânica em vigor, que perfeitamente se adapta às realidades sociais de cada classe de concelhos, à sua importância política, ao seu desenvolvimento económico e à sua população civilizada. Por isso se propõe que o estatuto de cada província preveja a existência de três classes de concelhos, de acordo com estes factores.
Este n.º II sugere-nos alguns reparos mais.
Enquanto a Reforma Administrativa Ultramarina dispõe que o presidente da câmara é nomeado pelo governador, o projecto atribui a presidência ao administrador de concelho. Pelo regime actual, os administradores de concelho são, em regra, administradores de circunscrição, comissários ou comandantes de polícia. O regime em vigor é preferível: o presidente da câmara deve ser, em princípio, um munícipe, embora nomeado pelo governador, e não uma autoridade administrativa, transitoriamente ligada à autarquia.
Não parece, por último, necessário consignar-se a matéria da parte final do n.º II. E tradição da administração ultramarina portuguesa a concessão de foral (propriedade imobiliária livre na área do concelho): mas é matéria para a legislação sobre terrenos no ultramar. Quanto a brasão, designações honoríficas e títulos, poderá adequadamente dispor a Reforma Administrativa Ultramarina.
III - Se as circunscrições continuam a ser estabelecidas em regiões predominantemente habitadas por indígenas, se, por definição, falta aí uni núcleo populacional branco que possa aspirar à vida municipal, se se trata de extensa? áreas povoadas de negros, não poderão ser senão fictícias aí as instituições municipais. A administração municipal subentende pequenas áreas, interesses comuns muito vivos dos vizinhos do concelho, autêntica solidariedade de interesses; e nada disso há nas circunscrições. Não parece, pois, que deva haver

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nas circunscrições administrativas instituição municipal (comissão).
Note-se que o projecto se esquece de dar qualquer directriz sobre a constituição das comissões municipais (como aliás das juntas locais), convindo dispor a esse respeito na lei orgânica.
IV - A Câmara sugere que ao corpo administrativo da freguesia se chame junta de freguesia. E, como já se disse, teremos freguesias, nas localidades que houver nos concelhos e circunscrições com determinadas condições urbanas e certa população, podendo também as grandes localidades repartir-se por diferentes freguesias.
O projecto pretende que haja também juntas locais nos postos administrativos, se na sua sede existir povoação ou núcleo de habitantes com as características exigidas por lei. Estas localidades são, porém, classificáveis como freguesias, e terão, portanto, à sua frente juntas de freguesia.

ARTIGO 69.º

71. I - Não deixa de ser estranho que, depois de ter atribuído à circunscrição e ao posto órgãos próprios, o projecto não acabe por lhes reconhecer (quanto às localidades sedes de posto, apenas eventualmente) a categoria de autarquias locais.
De acordo com as observações atrás feitas, sugere a Câmara Corporativa que se considerem autarquias locais nas províncias ultramarinas, os distritos, os concelhos e as freguesias, os quais terão personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira, nos termos que a lei declarar.
A especificação da parte final deste número não é necessária porque a doutrina é unânime a esse respeito.
II - Este número desaparecerá, em face da posição tomada pela Câmara quanto aos pretensos corpos administrativos das circunscrições e dos postos.

ARTIGO 70.º

72. Os preceitos do artigo 70.º são alguns dos que hão-de ser desenvolvidos na Reforma Administrativa Ultramarina e até, talvez, todos ou alguns deles, tenham lá melhor cabimento do que na lei orgânica.

TITULO IV

Ordem económica e social

ARTIGO 71.º

73. Este artigo corresponde ao artigo 213.º da Carta Orgânica, com redacção algo diferente, mas com idêntico conteúdo. Aparece como inovação uma referência especificada ao povoamento do território ultramarino. Mas sem grande necessidade, pois esse ponto é considerado na remissão genérica que no artigo actual, como aliás no artigo 213.º, § único, da Carta Orgânica, se faz para o título VIII da parte I da Constituição, e designadamente para o artigo 31.º Não há mal, porém, em que conste uma referência específica ao povoamento neste preceito do projecto.

ARTIGO 72.º

74. Corresponde ao artigo 9.º do Acto Colonial e ao artigo 222.º da Carta Orgânica e dá hoje execução ao artigo 161.º da Constituição.
I - Não se requer nem vem rigorosamente a propósito a referência ao artigo 2.º da Constituição.
A lei orgânica é apenas uma das leis em que se dá execução ao preceituado no artigo 161.º da Constituição. Pode mesmo dizer-se na lei orgânica que leis especiais regularão este assunto e que, desde já, esta lei coloca fora da possibilidade de serem concedidos certos terrenos ou outros bens.
A alínea c) merece unia nota. Enquanto o Acto Colonial e a Carta Orgânica consideravam inconcedível simplesmente uma faixa do 100 metros ou superior, se lei especial a determinasse, para todos os lados, de terrenos contíguos ao perímetro das estações das linhas férreas construídas, projectadas ou que para esse fim os governos entendam dever reservar, o projecto refere-se também a uma faixa de 100 metros para cada lado, ou mais, se a lei especial o determinar, contados do eixo das linhas férreas. A Lei de 9 de Maio de 1901 sobre o domínio do Estado no ultramar referia-se apenas a uma faixa «não inferior a 50 metros por cada lado». O mínimo ascende assim de 50 para 100 metros, em desconformidade com essa lei, mas em conformidade com o artigo 4.º, alínea c), n.º 4.º, do Decreto n.º 33:727, de 22 de Junho de 1944, sobre concessões de terrenos nas colónias continentais de África, hoje vigente.
II - Corresponde às alíneas a) e b) do § único do artigo 9.º do Acto Colonial e preceito correspondente da Carta Orgânica. Harmoniza-se com o § único do artigo 161.º da Constituição. Bastará dizer, na alínea a), que será permitido o uso ou ocupação, «a título precário», das parcelas referidas no número anterior.
III - Corresponde à alínea c) do § único do artigo 9.º do Acto Colonial e a disposição análoga da Carta Orgânica. Toda esta regulamentação deve ser simplificada, nos termas propostos pela Câmara. Quanto especialmente à alínea e) deste número, não é este o seu lugar.

ARTIGO 73.º

75. I - Esta disposição vem de trás, do Acto Colonial e da Carta Orgânica. Há razão para se exceptuar Macau do regime aqui consignado, dado que a população dessa província é predominantemente estrangeira e será levada a desinteressar-se de nela investir capitais pela demora do processo de concessão ou subconcessão. Em regra o que se passa é preferir-se Hong-Kong para esses investimentos, uma vez que aí se lhe dão maiores facilidades.
II - É suficiente um preceito nos termos em que nos aparece na Carta Orgânica (§ 1.º do artigo 223.º).
III - Altera o disposto sobre o mesmo assunto no Acto Colonial e na Carta Orgânica. Não é necessário ressalvar os direitos adquiridos, garantidos pelo simples jogo do princípio da não-retroactividade das leis. Não é também necessário aludir ao primado das convenções internacionais. Na verdade, na medida em que o Estado se obrigue em termos diferentes dos aqui prescritos, por convenção internacional, o direito internacional assim criado deve considerar-se recebido na ordem interna, prevalecendo contra o direito interno propriamente dito, mesmo posterior, dado que não é de presumir que o legislador queira revogar as normas recebidas.
IV - Corresponde ao § 3.º do artigo 10.º do Acto Colonial e ao § 3.º do artigo 223.º da Carta Orgânica. Apesar de diferentes na redacção, valem sensivelmente o mesmo.

ARTIGO 74.º

76. I - É praticamente reprodução do artigo 59.º da Constituição, com as necessárias adaptações. Corresponde ao artigo 219.º da Carta Orgânica.
II - E a extensão ao ultramar do disposto no artigo 62.º da Constituição. Disposição idêntica à do artigo 225.º da Carta Orgânica.

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ARTIGO 75.º

77. Só uma política decorre logicamente da concepção unitária da Nação Portuguesa: a direcção económica, na medida em que se torne necessária, visará assegurar o bem comum nacional, isto é, o máximo rendimento, global da Nação e a melhor justiça social topográfica, na órbita de todo o território português.
Se, pois, o Estado, ao abrigo do artigo 31.º da Constituição, considera necessário fomentar o desenvolvimento das indústrias, há-de fazê-lo de harmonia com os princípios básicos da unidade e da coordenação, como aliás já na Lei n.º 2:005, de 14 de Março de 1945, se teve ocasião de dispor.
Quanto ao condicionamento dos investimentos industriais (a que a Carta Orgânica se referia no artigo 226.º), a Câmara Corporativa chamou recentemente a atenção para a necessidade de que seja efectivado, tendo-se em conta a unidade económica da Nação e a coordenação entre o desenvolvimento industrial de todas as suas parcelas. Ë quanto a este respeito convém dispor.
O projecto contém, a respeito do desenvolvimento e condicionamento industriais, reminiscências de concepções superadas, designadamente a de que as indústrias ultramarinas são acessórias das indústrias metropolitanas.
Ao artigo há-de, pois, dar-se redacção diferente.

ARTIGO 76.º

78. I e II - Com vista à unidade da economia portuguesa, o projecto estabelece que os bancos emissores do ultramar tomem sempre o escudo metropolitano como padrão do valor das suas notas, procurando assegurar a convertibilidade destas na moeda metropolitana, com as correcções resultantes da situação cambial. Que se quer dizer com isto?
Não se quer certamente significar que a unidade monetária de qualquer das províncias ultramarinas -escudo, angolar, pataca ou rupia- deve ser equivalente a uma unidade monetária da metrópole, isto é, a uni escudo metropolitano.
Quer-se dizer mais: quer-se que a unidade monetária em todas as províncias se chame «escudo» de ora avante. Não mais haverá angolares, rupias ou patacas, mas escudos apenas.
Em segundo lugar pretende significar-se que se deve assegurar a convertibilidade das notas ultramarinas sobre a base do escudo metropolitano, mas com as correcções resultantes da situação cambial.
Há, porém, vantagem em estabelecer-se a conversão, a câmbio fixo, dos escudos metropolitanos em moedas ultramarinas e vice-versa - o que levará à formação de uma verdadeira «zona do escudo», isto é, de uma zona dentro da qual o escudo metropolitano poderá livremente converter-se, a um câmbio previamente fixado, em qualquer dos escudos circulantes nas províncias e, mutatis mutandis, estes no escudo metropolitano. Por outras, palavras: há vantagem na criação de uma zona dentro da qual o escudo metropolitano seja o que a libra é dentro da zona do esterlino. O apoio dos fundos cambiais facilitará a realização deste objectivo.
A Câmara Corporativa pondera os melindres que tem a rigidez das disposições deste artigo do projecto, ao estabelecerem que as reservas dos bancos emissores serão estabelecidas na metrópole e que a unidade monetária de todas as províncias será o escudo.
Com vista a acentuar o carácter tendencial que em matéria de unidade monetária no ultramar o preceito deve ter, a Câmara dá-lhe redacção levemente diferente.

ARTIGO 77.º

79. O tradicional sistema das tarifas preferenciais, bilaterais ou recíprocas, hoje vigente nas relações comerciais entre a metrópole e ultramar e entre as várias províncias ultramarinas (artigos 228.º e 229.º da Carta Orgânica), deve ser, nos termos do § único do artigo 158.º da Constituição, substituído por um regime de assimilação aduaneira, em que as províncias se comportam como simples regiões mais ou menos distantes dentro de um território único - o território nacional -, com a máxima mobilidade possível dos factores produtivos e dos bens em geral. Metrópole e ultramar formarão, no limite de realização desta política, um território aduaneiro único.
Isto não quer dizer que o regime aduaneiro da metrópole em relação ao estrangeiro, quer ele seja liberal, quer ele seja proteccionista, se aplique sem restrições no seu comércio externo a todas e cada uma das províncias e em relação a todos os factores de produção ou produtos, o que poderia prejudicar um ou outro território ultramarino.
A substituição do velho pelo novo sistema não pode ter lugar de um golpe - e é por isso que a Constituição prevê apenas a gradual redução ou suspensão dos direitos aduaneiros e que o princípio da liberdade de circulação dos capitais e das pessoas seja actuado tanto quanto possível.
Não é necessário dispor sobre a competência para legislar nestas matérias: valerão sem reserva os princípios gerais em matéria de competência legislativa, fixados na Constituição e na lei orgânica: trata-se de competência do Governo.

ARTIGO 78.º

80. I - O artigo 230.º da Carta Orgânica diz apenas respeito ao tráfego marítimo entre os portos de uma colónia ou de colónias portuguesas e reserva-o à bandeira nacional que de modo regular os sirva. O artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 24:458, de 3 de Setembro de 1934, acrescentou que o tráfego marítimo da metrópole para as colónias e vice-versa é também reservado para a bandeira nacional que de modo regular sirva os seus portos. Um e outro preceito consagram restrições à regra.
O n.º I não se refere, agora, apenas ao tráfego marítimo, mas a todas as demais formas de comunicação entre territórios nacionais: estão neste quadro a navegação aérea e a radiotelegrafia. Parece, na verdade, que as razões que conduziram à solução adoptada pela lei vigente em matéria de tráfego marítimo valem também para os restantes meios de comunicação. Todos estão, em maior ou menor medida, ligados à necessidade de afirmar a soberania e o prestígio nacional.
Salva a redacção, é, pois, de aprovar este preceito.
II - Trata-se, afinal de contas, de um preceito desnecessário. Não se requer efectivamente disposição que diga estarem os portos e aeroportos ultramarinos abertos à navegação marítima e aérea, o que sucede por força do direito internacional geral ou convencional recebido na ordem jurídica interna portuguesa.
III - É a reprodução do disposto no artigo único do vigente Decreto-Lei n.º 38:428, de 13 de Setembro de 1951, com leve e injustificada diferença de redacção.
A lei deve exceptuar também da norma do n.º I o transporte de livros, revistas ou jornais em navios estrangeiros.

ARTIGO 79.º

81.1 - Corresponde praticamente ao disposto no artigo 235.º da Carta Orgânica. Dá-se agora, entre as formas de organização das populações indígenas, par-

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ticular relevo ao aldeamento, que aliás encontra os maiores obstáculos no nomadismo indígena e na própria escassez das populações. Não se nega, porém, a necessidade do prosseguir nessa tradicional política, dado o interesse que oferece, designadamente, para fins de administração pública em geral.
II - Mal se pode pensar em aldeamento sem propriedade, especialmente sem propriedade individual de terrenos, nos quais os indígenas se fixem para a agricultura ou para a apascentação de gados. Talvez por via disso, o projecto associa as duas matérias no mesmo artigo. Mas não é indispensável ligar os dois assuntos na lei.
O preceito refere-se apenas à propriedade indígena individual, não à forma tradicional da propriedade colectiva, (reservas indígenas), que há-de ser aqui mencionada. A lei impõe que quer uma forma de propriedade, quer a outra, terão de ser respeitadas nas concessões feitas pelo Estado (Constituição, artigo 143.º, e Decreto n.º 33:727, de 22 do Junho de 1944, artigo 48.º). Uma e outra têm interesse social e económico: não é necessário combater a exploração comunitária do solo; o que é necessário é combater a sua exploração divagante.
O projecto dá, quanto à propriedade individual dos indígenas, certos tópicos do regime que entende ser adequado a fomentá-la e a preservá-la.
Que seja susceptível de título e registo: mas que seja resolúvel na hipótese de falta de exploração pelo período que a lei determinar. E está bem que se proíba, como aliás já se proíbe hoje (Carta Orgânica, artigo 239.º, § único), a alienação dos terrenos a não indígenas ou a caução por eles de obrigações que não sejam contraídas em organizações, de crédito reconhecidas por lei.
A parte final da alínea c) é dispensável, dado que os frutos (pendentes), embora sejam bens imóveis por disposição da lei, são tratados como móveis nos contratos que os tenham por objecto para no futuro serem separados. O indígena, para quem a ideia, da apropriação fundiária não é suficientemente viva, tem forte sentimento da propriedade móvel, designadamente dos frutos das suas culturas. Saberá ser cuidadoso na intervenção em actos jurídicos que possam fazer-lhe correr o risco de ver penhorados os frutos, pendentes ou não, dos seus terrenos.

ARTIGO 80.º

82. I - Não parece adequado dispor-se que os estabelecimentos de ensino nas províncias ultramarinas se devem subordinar à orientação e influência cultural das Universidades portuguesas e institutos afins. Quando muito, dispor-se-á, aliás de acordo com o direito e a política vigentes, que será promovido o desenvolvimento das relações entre os estabelecimentos de ensino, de educação, de cultura e de investigação científica do ultramar com os similares da metrópole. As Universidades e institutos afins, rigorosamente, não têm funções de «orientação» quanto aos estabelecimentos ultramarinos de ensino. E a influência que possam ter não é coisa sobre a qual se possa legislar.
II - O preceito refere-se a actividades de serviços públicos de ensino e investigação metropolitanos, assunto que não tem de ser tratado no lei orgânica do ultramar. De resto, trata-se de mera directriz política, que não deixará de estar presente no programa dos homens de governo.
III - Não se sabe bem o que venha ,a ser a «filiação» de que o preceito trata. E não vem ia propósito dispor que se promoverão acordos internacionais para o reconhecimento, por Universidades ou outros estabelecimentos estrangeiros de ensino, de equivalência dos exames ou dos cursos preparatórios ministrados em estabelecimentos nacionais: a lei orgânica não tem por missão tratar deste problema em relação a todos os estabelecimentos nacionais de ensino, e, mesmo em relação aos estabelecimentos ultramarinos, o assunto é dos que não requerem preceito expresso a regulá-lo.
O que pode realmente dispor-se é que nenhuma escola particular ultramarina, frequentada no todo ou na maioria por portugueses, possa ensinar exclusiva ou predominantemente segundo programas de escolas estrangeiras. Ficam assim ressalvadas as escolas para ensino de estrangeiros.
IV - Será preciso consignar tal preceito na lei?
V - O preceito merece aplauso e pode, sem inconveniente, inscrever-se na lei. Mas há que ir mais além na política de equiparação dos escolares ultramarinos aos metropolitanos, quanto a dificuldades no ingresso nas escolas superiores. É clamorosa a desigualdade filtre uns e outros no que respeita às provas de aptidão. Como é evidente, não é justo que os escolares ultramarinos tenham de vir à metrópole prestar tais provas, dadas a contingência delas e o custo elevado das passagens. Essas provas devem ser organizadas na província. Deve dispor-se aqui a esse respeito.
VI - Há melhor redacção para o preceito no Estatuto Missionário, e é essa redacção a que a Câmara sugere.
VII - Sem reparo, salva a redacção.
VIII - Doutrina incontestada, a que não faltará lugar na lei.

TITULO V

Disposições finais

ARTIGO 81.º

83. I - Disposição sem direito a assento na lei orgânica, a que ascenderia agora, vinda da Reforma-Administrativa Ultramarina (artigo 180.º, § 1.º). Depois ..., não há ligação entre a primeira e a segunda parte: a primeira tratando da bandeira, a segunda do escudo nacional. Sobre a obrigação de se imprimir este no frontispício do Boletim Oficial dispõe hoje o Decreto n.º 27:195, de 14 de Novembro de 1936. lista parte do preceito terá lugar no ponto onde na lei se falar do Boletim Oficial, a propósito da publicarão e aplicação das leis e mais diplomas no ultramar.
II - Corresponde ao artigo 180.º da Reforma Administrativa Ultramarina e por lá pode ficar sem inconveniente.

ARTIGO 82.º

84. I - Não é necessário dizer-se que a legislação ó que deve ser emanada para complemento da lei orgânica.
II - Sem objecções, excepto quanto ao artigo 212.º da Carta Orgânica: este deverá ser suprimido, como pé sugeriu no lugar próprio.

85. Não tem o projecto de proposta que conter a menção final sobre a publicação no Boletim Oficial de todas as províncias ultramarinas. Essa menção é para ser aposta pelo Ministro do Ultramar no original do acto legislativo, não no projecto de proposta ou mesmo nesta (artigo 150.º, § 2.º, da Constituição e artigo 91.º, § 1.º, da Carta Orgânica). O que se requer, como é sobejamente sabido (embora nem sempre lembrado...), é a sua assinatura na proposta, já que se trata de diploma em que a Assembleia só pode legislar mediante proposta do Ministro do Ultramar (Constituição, artigo 150.º, n.º 1.º).

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III

Conclusões

Em conclusão, a Câmara Corporativa, afastando-se do sistema do projecto do Governo, mas mantendo a sua orientação, propõe para este a redacção seguinte:

Carta Orgânica do Ultramar Português

CAPITULO I

Do território e divisão administrativa do ultramar português

BASE I

O território da Nação no ultramar é o que actualmente lhe pertence e divide-se, para efeitos administrativos, nas oito províncias seguintes:
a) Na África:
1) Cabo Verde, que compreende todas as ilhas que formam o arquipélago do mesmo nome;
2) Guiné, que abrange as regiões indicadas na Convenção luso-francesa de 12 de Maio de 1886 e fixadas, por troca de notas diplomáticas, em 29 de Outubro e 4 de Novembro de 1904 e 6 e 12 de Julho de 1906;
3) S. Tomé e Príncipe, que é formada pelas ilhas de S. Tomé e Príncipe, pelos ilhéus adjacentes, incluindo as Pedras Tinhosas, e pelo Forte de S. João Baptista de Ajudá;
4) Angola, que abrange todos os territórios que actualmente lhe estão atribuídos, situados ma África Austral Ocidental;
5) Moçambique, que é constituída por todos os territórios portugueses situados na África Oriental.
b) Na Ásia:
6) Estado da índia, que compreende os territórios de Goa com as ilhas de Angediva, S. Jorge e Morcegos, na costa do Malabar; Damão, com os territórios de Dadará e Nagar Aveli, na costa do golfo de Cambaia, e Diu, com os territórios continentais de Gogolá e Simbor, na costa do Guzerate;
7) Macau, que é constituída por Macau e suas dependências, conforme o que for o direito de Portugal e o tratado com a China de 1 de Dezembro de 1887.
c) Na Oceânia:
8) Timor, que abrange a parte oriental da ilha de Timor, o território de Ocusse-Ambeno, a ilha de Atauro e o ilhéu de Jato, tendo por limites terrestres os designados na Convenção luso-holandesa de 1 de Outubro de 1904 e na sentença arbitrai de 25 de Junho de 1914.

CAPITULO II

Princípios gerais relativos à administração ultramarina

BASE II

I - As províncias ultramarinas, como parte integrante do Estado Português, são solidárias entre si e com a metrópole.
II - A solidariedade entre as províncias ultramarinas e a metrópole abrange especialmente a obrigação de contribuir por forma adequada para assegurar a integridade e defesa de toda a Nação e os fins da política nacional definidos no interesse comum pelos órgãos da soberania.

BASE III

As províncias ultramarinas reger-se-ão, em regra, por legislação especial.

BASE IV

São garantidas às províncias ultramarinas a descentralização administrativa e a autonomia financeira compatíveis com a Constituição e com o seu estado de desenvolvimento e os recursos próprios.

BASE V

As províncias ultramarinas têm organização político-administrativa adequada à sua situação geográfica e às condições do meio social, definida num estatuto especialmente promulgado para cada uma delas. Nele se estabelecerá, além do mais que se torne necessário, a constituição, o funcionamento e as atribuições dos respectivos órgãos de governo, a sua divisão administrativa e a natureza, extensão e desenvolvimento dos seus serviços públicos.

BASE VI

Em cada uma das províncias ultramarinas será mantida a unidade política, pela existência de uma só capital e do governo da província.

CAPÍTULO III

Da administração central

BASE VII

São órgãos centrais de administração ultramarina a Assembleia Nacional e o Governo, que detêm a competência definida nas bases seguintes e dispõem da colaboração da Câmara Corporativa, do Conselho Ultramarino, da Conferência dos governadores ultramarinos, das Conferências económicas do ultramar português e dos conselhos técnicos do Ministério do Ultramar e de outros Ministérios, como órgãos consultivos.

SECÇÃO I

Da competência da Assembleia Nacional

BASE VIII

Em relação à administração ultramarina, compete à Assembleia Nacional:
1) Legislar, mediante propostas do Ministro do Ultramar, nos assuntos que devam constituir necessariamente matéria de lei segundo o artigo 93.º da Constituição, e ainda nos seguintes:
a) Regime geral de governo das províncias ultramarinas;
b) Definição da competência do Governo da metrópole e dos governos ultramarinos quanto à área e ao tempo das concessões de terrenos ou outros que envolvam exclusivo ou privilégio especial;
c) Autorização de contratos que não sejam de empréstimo quando exijam caução ou garantias especiais;
2) Tomar as contas das províncias ultramarinas, respeitantes a cada ano económico, as quais lhe serão apresentadas com o relatório e decisão do Tribunal de Contas, se este as tiver julgado, e os demais elementos que forem necessários para a sua apreciação.

SECÇÃO II

Da competência do Governo Central

BASE IX

I - O Governo superintende e fiscaliza o conjunto da administração das províncias ultramarinas directamente ou por intermédio do Presidente do Conselho, do Conselho de Ministros, do Ministro do Ultramar e Subsecretário de Estado da mesma pasta, e eventualmente por intermédio de outros Ministros, nos termos, da presente lei.

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II - Ao Presidente do Conselho competem, relativamente ao ultramar, as atribuições gerais expressas no artigo 108.º da Constituição e a apresentação à Assembleia Nacional das propostas do Ministro do Ultramar elaboradas sobre as matérias a que se referem o n.º 1.º do artigo 150.º da Constituição e a base VIII desta lei.
III - Ao Governo pertence:
a) Legislar quando, nos termos da Constituição, tiver de dispor por meio de decreto-lei para todo o território nacional ou se o diploma regular matéria de interesse comum da metrópole e de alguma ou algumas das províncias ultramarinas;
b) Aprovar os empréstimos das províncias ultramarinas que exigirem caução ou garantias especiais.
IV - Ao Conselho de Ministros pertence:
a) Nomear, reconduzir e exonerar antes do termo normal da comissão, sob proposta do Ministro do Ultramar, os governadores-gerais e os governadores de província;
b) Exercer as atribuições referidas na base LXXXII da presente lei.
V - O Ministro do Ultramar tem as atribuições de administração geral que esta lei lhe confere e é o principal orientador e dirigente da acção dos governos ultramarinos, cabendo-lhe a competência definida nas bases X e XI.
VI - Diplomas especiais especificarão, quanto ao ultramar, a competência de outros Ministros em relação a serviços públicos cuja acção e cujos quadros estiverem unificados em todo o território nacional, bem como a interferência do Ministro do Ultramar e dos governos das províncias ultramarinas na administração desses serviços.

BASE X

I - Consideram-se incluídos na competência legislativa do Ministro do Ultramar os diplomas concernentes aos seguintes assuntos:
a) O exercício dos direitos, liberdades e garantias a que se referem os capítulos II e III do título VII da parte II da Constituição;
b) A constituição e regimes gerais de funcionamento dos organismos corporativos, morais, culturais e económicos ;
c) A aprovação e ratificação dos acordos ou convenções que os governos das províncias ultramarinas negociarem com os governos de outras províncias ou territórios, nacionais ou estrangeiros, obtida, neste último caso, a concordância do Ministério dos Negócios Estrangeiros;
d) O regime administrativo geral das províncias ultramarinas e a organização geral dos serviços públicos ultramarinos, abrangendo a composição dos quadros do seu pessoal e o estabelecimento do regime do seu provimento;
e) O estatuto político-administrativo de cada uma das províncias ultramarinas, ouvido neste caso o seu Conselho de Governo, em funções segundo a lei vigente;
f) A administração financeira das províncias ultramarinas, incluindo a dos seus serviços comuns, a dos serviços autónomos e a dos corpos administrativos e pessoas colectivas de utilidade pública administrativa;
g) O estatuto dos funcionários públicos não abrangidos por estatutos especiais que lhes sejam aplicáveis em todo o território nacional, compreendendo as normas de ingresso, de permanência na função, o regime disciplinar, de vencimentos, de aposentação e demais direitos e deveres inerentes à qualidade de funcionário público;
h) A regulamentação das leis votadas pela Assembleia Nacional, quando dela careçam e seja conveniente realizá-la por via legislativa;
i) O regime jurídico, incluindo as condições de financiamento, das obras ou planos de urbanização ou de fomento da sua competência;
j) A solução por via legislativa das divergências entre os governadores-gerais e os Conselhos Legislativos, ou entre os governadores de província e os Conselhos de Governo, sobre a oportunidade, conveniência ou legalidade das providências legislativas por esses Conselhos aprovadas;
l) A aprovação de empréstimos que não exijam caução ou garantias especiais e de que resultem encargos superiores às receitas ordinárias, no respectivo ano disponíveis, da província ou do serviço autónomo a que respeitem.
II - O Ministro do Ultramar poderá, mediante portaria, a título temporário ou permanente, autorizar os órgãos legislativos das províncias ultramarinas a emanar diplomas, dependentes da sua confirmação, reguladores da composição, recrutamento, atribuições e vencimentos, salários ou outras formas de retribuição do pessoal dos quadros provinciais ou complementares dos seus serviços públicos, observando-se sempre os limites postos pela organização geral do respectivo ramo de serviço.
III - O Ministro do Ultramar pode, no exercício da sua competência legislativa, anular ou revogar, no todo ou em parte, os diplomas legislativos dos governos das províncias ultramarinas, quando os reputar ilegais ou inconvenientes para os interesses nacionais.
A anulação ou a revogação serão feitas em portaria publicada no Diário do Governo e obrigatoriamente transcrita no Boletim Oficial da respectiva província.
Os diplomas anulados são tidos como inexistentes desde a sua publicação, não podendo ser invocados nos tribunais ou repartições públicas.
Antes de anular ou revogar qualquer diploma, o Ministro do Ultramar deverá ouvir o governo da respectiva província, dando-lhe a conhecer os motivos da sua divergência, a fim de que o mesmo governo possa prestar os esclarecimentos que julgar convenientes.
IV - A competência legislativa do Ministro do Ultramar será exercida precedendo parecer do Conselho Ultramarino, com excepção dos casos seguintes:
a) Os de urgência;
b) Aqueles em que o Conselho demore por mais de trinta dias o parecer sobre a consulta que lhe haja sido feita pelo Ministro;
c) Aqueles em que sobre o mesmo assunto já tiver sido consultada a Câmara Corporativa, nos termos do artigo 105.º da Constituição, ou a Conferência dos governadores ultramarinos;
d) Quando o Ministro estiver exercendo as suas funções em qualquer das províncias ultramarinas.
V - O Ministro do Ultramar poderá usar da sua competência legislativa quando se encontre no ultramar em exercício de funções, se estiver expressamente autorizado pelo Conselho de Ministros ou se verificarem circunstâncias tais que imperiosamente o imponham.
VI - Os diplomas a publicar no exercício da competência legislativa do Ministro do Ultramar revestirão a forma de decreto, promulgado e referendado nos termos da Constituição, adoptando-se a forma de diploma legislativo ministerial quando o Ministro estiver exercendo as suas funções em qualquer das províncias ultramarinas e de portaria nos outros casos previstos na lei.

BASE XI

I - No uso das suas funções executivas, compete ao Ministro do Ultramar:
1.º Nomear, contratar, reconduzir, promover, transferir, conceder licenças registadas e ilimitadas, aposen-

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tar, exonerar ou demitir, nos termos legais, os funcionários dos quadros comuns dos serviços ultramarinos e do Ministério do Ultramar e ainda os dos quadros complementares e privativos de qualquer província ou do Ministério sobro os quais, por lei, exerça essas atribuições;
2.º Exercer a acção disciplinar prevista na lei sobre os funcionários, quer do Ministério, quer do ultramar, e, salvo quanto aos magistrados judiciais em exercício de funções, mandá-los apresentar no Ministério quando a sua presença seja considerada inconveniente para o serviço na província onde estiverem colocados;
3.º Transferir ou promover, nos termos legais, os funcionários dos quadros privativos e complementares de uma província para os quadros de serviços idênticos de outra, mediante proposta ou parecer favorável dos governadores interessados;
4.º Aprovar, alterar ou rejeitar as propostas sobre assuntos da sua competência que lhe sejam apresentadas pêlos governos das províncias ultramarinas;
5.º Autorizar, ouvidos os governos das províncias interessadas ou sob proposta destes e obtido parecer das instâncias competentes:
a) A instalação, reabertura, modificações no equipamento e mudança do local de estabelecimentos industriais sujeitos a condicionamento, nos termos de diploma especial;
b) As concessões de cabos submarinos, comunicações radiotelegráficas e radiotelefónicas, carreiras aéreas, vias férreas de interesse geral e grandes obras públicas, bem como a emissão de obrigações das sociedades concessionárias, e ainda a concessão de licença para o estabelecimento de depósitos de combustíveis usados pela navegação marítima e aérea;
c) As obras e planos de urbanização ou de fomento que acarretem encargos superiores às receitas ordinárias, no respectivo ano disponíveis, da província ou do serviço autónomo a que respeitem.
6.º Orientar e fiscalizar a organização e a execução dos orçamentos das províncias ultramarinas, nos termos legais;
7.º Autorizar transferências de verbas e aberturas de créditos, nos termos da lei;
8.º Autorizar os governos das províncias ultramarinas a negociar acordos ou convenções com os governos de outras províncias ou territórios, nacionais ou estrangeiros, neste caso com a concordância do Ministro dos Negócios Estrangeiros;
9.º Ordenar inspecções, sindicâncias e inquéritos, para fins disciplinares ou outros, a todos os serviços públicos do ultramar em que superintenda, quer do Estado, quer dos corpos administrativos e pessoas colectivas de utilidade pública administrativa;
10.º Superintender e fiscalizar as empresas de interesse colectivo, nos termos da Constituição, da presente lei orgânica e de outras leis;
11.º Exercer as demais funções que por lei lhe competirem.
II - O Ministro do Ultramar tem a faculdade de delegar nos governadores das províncias ultramarinas, a título temporário ou permanente, o exercício dos poderes referidos no n.º 1.º (quanto a contratar funcionários e conceder licenças registadas}, na segunda parte do n.º 2.º, na alínea c) do n.º 5.º e no n.º 7.º
III - O Ministro do Ultramar pode anular, revogar, reformar ou suspender a todo o tempo as decisões dos governadores não constitutivas de direitos, bem rumo ordenar a interposição, no prazo legalmente fixado, de recurso contencioso para anularão das decisões dos governadores constitutivas de direitos que repute ilegais.
As decisões directamente anuladas pelo Ministro suo tidas como inexistentes desde o seu início, não podendo ser invocadas nos tribunais ou repartições públicas.
A resolução do Ministro relativamente a decisões dos governadores que tiverem sido publicadas será tomada por meio de portaria inserta no Diário do Governo e obrigatoriamente transcrita no Boletim Oficial da respectiva província.
IV - Ao Subsecretário de Estado do Ultramar, quando este cargo estiver provido, compete, dentro dos termos da delegação que lhe for dada pelo Ministro, decidir, de acordo com a orientação deste, os assuntos da sua competência executiva que devam ser resolvidos por meio de despacho.

SECÇÃO III

Da organização do Ministério do Ultramar

BASE XII

I - O Ministério do Ultramar, como principal órgão central da administração o governo ultramarinos, terá organização adequada ao desempenho das funções que ao Ministro são atribuídas pela Constituição e pela presente lei.
II - Aos serviços do Ministério do Ultramar corresponderão um quadro privativo e quadros comuns aos serviços do ultramar.
III - Junto do Ministério funcionarão os órgãos deliberativos, consultivos ou de informação técnica que forem reputados necessários ao exercício das atribuições ministeriais. Completam a sua acção e são dele considerados dependentes os organismos que a lei determinar.

SECÇÃO IV

Dos órgãos consultivos do Governo

BASE XIII

O Governo e o Ministro do Ultramar poderão consultar a Câmara Corporativa sobre diplomas a publicar ou sobre propostas de lei a apresentar à Assembleia Nacional, uns e outros aplicáveis ao ultramar.

BASE XIV

O Conselho Ultramarino é o mais alto órgão permanente de consulta do Governo em matéria de política e administração ultramarinas. A sua organização e atribuições serão definidas em lei especial.

BASE XV

I - A Conferência dos governadores ultramarinos reúne quando e onde o Ministro do Ultramar julgar conveniente, durante o período que for reputado necessário, para a discussão dos assuntos que na ocasião mais interessem ao governo e administração geral do ultramar e seja vantajoso tratar em comum.
II - As reuniões da Conferência não são públicas e a elas presidirá o Ministro do Ultramar ou o Subsecretário do Estado do Ultramar. Poderão assistir, com direito de voto, além dos governadores das províncias ultramarinas, o secretário-geral do Ministério e os directores-gerais.

BASE XVI

I - As Conferências económicas do ultramar reunir-se-ão quando e onde o Ministro do Ultramar determinar para, a, discussão dos assuntos, por ele fixados, que mais interessem à, vida económica ultramarina no seu conjunto.
II - As Conferências serão presididas pelo Ministro do Ultramar e terão um vice-presidente por ele nomeado. Cada província enviará uma delegação nomeada pelo governador.

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CAPITULO IV

Da administração provincial

SECÇÃO I

Normas gerais

BASE XVII

I - Em cada uma das províncias ultramarinas haverá, como autoridade superior, um governador ou governador-geral.
II - O governador goza em todo o território da província das honras que competem aos Ministros do Governo da Nação, tendo nele precedência sobre todos os funcionários civis ou militares que sirvam ou, por outros motivos, estacionem na província ou por ela transitem, excluído o Presidente da República, o Presidente do Conselho, os Ministros e o Subsecretário de Estado do Ultramar.

BASE XVIII

I - A nomeação dos governadores é feita em Conselho de Ministros, sob proposta do Ministro do Ultramar. Recairá normalmente em indivíduo com curso superior, de mérito já revelado no exercício de cargos públicos ou no estudo de assuntos relativos ao ultramar e que não tenha qualquer interesse na direcção ou gerência de empresas com sede ou actividade na província.
II - A comissão dos governadores durará quatro anos, contados da data da posse.
III - O governador presta declaração e compromisso de honra perante o Ministro do Ultramar, ou, se ao tempo da nomeação estiver na província ultramarina, perante a pessoa de quem receber o governo.
IV - A falta de recondução dos governadores, feita em decreto publicado até trinta dias antes de terminar a comissão, tem o significado legal de exoneração de funções.
V - A exoneração dos governadores antes de terminado o período da comissão é feita em Conselho de Ministros, sob proposta do Ministro do Ultramar.

BASE XIX

I - Na falta de governador ou na sua ausência da província, assumirá as funções governativas o vice-presidente do Conselho de Governo, enquanto o Ministro do Ultramar não designar um encarregado do governo. A designação deste será feita por simples despacho a publicar no Boletim Oficial da respectiva província.
II - Durante o impedimento temporário do governador ou a sua ausência da sede do governo da província, mas em território desta, representá-lo-á o vice-presidente do Conselho de Governo, conforme as instruções que dele receber.

BASE XX

I - Os governadores e encarregados de governo respondem pelos seus actos politicamente perante o Governo e civil e criminalmente perante os tribunais.
II - As acções cíveis, comerciais e criminais em que seja réu o governador ou o encarregado de governo enquanto durarem as suas funções só poderão instaurar-se na comarca de Lisboa, salvo quando para a causa seja competente outro tribunal, da metrópole ou de diversa província, ou quando houver o privilégio de foro.

BASE XXI

I - Os governadores podem em qualquer tempo anular, revogar, reformar ou suspender as suas decisões não constitutivas de direitos, bem como interpor, no
prazo da lei, recurso contencioso das suas decisões constitutivas de direitos, se as reputarem ilegais.
II - As decisões dos governadores podem ser contenciosamente impugnadas pelos interessados com base em incompetência, excesso de poder ou violação de lei, regulamento ou contrato administrativo.

BASE XXII

I - Os governadores das províncias ultramarinas terão, além das fixadas na Constituição e na presente lei, as atribuições, faculdades e prerrogativas que lhes forem conferidas no estatuto da respectiva província.
II - E supremo dever de honra dos governadores, em cada um dos territórios ultramarinos, sustentar os direitos de soberania da Nação e promover o bem da província, em harmonia com os princípios consignados na Constituição e nas leis.
III - Declarado que seja na província o estado de sítio, o governador podem assumir, pelo tempo indispensável e sob a sua inteira responsabilidade, as funções de qualquer dos restantes órgãos da província, dando imediatamente e pela via mais rápida conhecimento de tudo o que fizer ao Ministro do Ultramar.
IV - Em circunstâncias excepcionais, os governadores poderão exercer as atribuições pela Constituição ou por esta lei pertencentes à Assembleia Nacional, ao Governo ou ao Ministro do Ultramar, que restritamente lhes forem outorgadas por quem de direito para determinados assuntos.

SECÇÃO II

Dos órgãos das províncias de governo-geral

SUBSECÇÃO I

Do governador-geral

BASE XXIII

I - Em cada uma das províncias ultramarinas do Estado da índia, Angola e Moçambique haverá um governador-geral.
II - Os assuntos relativos às suas funções executivas poderão ser decididos, na medida em que lhe forem designados pelo governador-geral e de acordo com a sua orientação, por um secretário-geral, que terá a categoria de inspector superior de administração ultramarina e será nomeado pelo Ministro do Ultramar em comissão amovível, sob proposta do governador-geral. A nomeação recairá em pessoa com um curso superior e que já tenha desempenhado cargo ultramarino de categoria não inferior à de chefe de serviço.

BASE XXIV

I - A competência legislativa dos governadores-gerais abrange todas as matérias que interessem exclusivamente à respectiva província e não sejam da competência da Assembleia Nacional, do Governo ou do Ministro do Ultramar.
II-A competência legislativa dos governadores-gerais será por eles exercida sob a fiscalização dos órgãos da soberania e, por via de regra, conforme o voto do Conselho Legislativo da província, nos termos dos números seguintes.
III - Se o governador-geral concordar com as disposições votadas pelo Conselho Legislativo, expedi-las-á sob a forma de diploma legislativo, ordenando a sua publicação dentro dos quinze dias seguintes àquele em que o projecto votado estiver pronto para a sua assinatura.
IV - Se o governador-geral não concordar com o que foi votado pelo Conselho Legislativo, adiará a publi-

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cação e submeterá logo o assunto a resolução do Ministro do Ultramar, expondo-lhe os motivos da sua divergência. O Ministro, ouvido, nos termos gerais, o Conselho Ultramarino, poderá:
a) Determinar ao governador-geral a publicação, total ou parcial, das disposições votadas pelo Conselho Legislativo, sem prejuízo de a parte desaprovada pelo Ministro poder voltar à apreciação deste Conselho como nova proposta;
b) Legislar sobre o assunto nos termos que entender mais convenientes.

SUBSECÇÃO II

Do Conselho Legislativo

BASE XXV

I - Nas províncias de governo-geral funcionará, com atribuições legislativas, um Conselho Legislativo.
II - O Conselho Legislativo é uma assembleia de representação adequada às condições do meio social da província. Constituem-no vogais eleitos trienalmente entre cidadãos portugueses que reunam os requisitos de elegibilidade indicados na lei.
III - O estatuto político-administrativo de cada uma das províncias de governo-geral fixará o número de vogais do seu Conselho Legislativo e regulará a sua eleição de modo a garantir adequada representação:
a) Aos contribuintes, pessoas singulares ou colectivas, de nacionalidade portuguesa, recenseados com o mínimo de contribuição directa no mesmo estatuto indicado ;
b) Aos organismos corporativos e demais associações económicas, culturais e morais que funcionem legalmente, incluindo, quanto ao Estado da índia, as comunidades aldeãs;
c) Aos corpos administrativos;
d) Aos colégios de eleitores do recenseamento geral dos círculos em que o território da província for dividido.
Os estatutos das províncias de Angola e de Moçambique devem garantir também representação à população indígena, transitoriamente sem dependência de prévio recenseamento, procedendo à eleição dos seus representantes o Conselho de Governo, na forma preceituada por esses estatutos.
IV - Quando, devidamente convocados, os eleitores não escolherem os seus representantes ao Conselho Legislativo, ordenará o governador-geral que se proceda a novas eleições, totais e parciais, conforme o caso, no prazo de trinta dias, e, se ainda desta vez os não elegerem, elegê-los-á o Conselho de Governo.

BASE XXVI

I - O Conselho Legislativo funcionará na capital da província e será presidido pelo governador-geral ou por quem suas vezes fizer, com a faculdade de fazer-se substituir pelo vice-presidente do Conselho de Governo quando entender.
II - Em caso de empate, o presidente tem voto de qualidade, se dele quiser usar.
III - A iniciativa de apresentação de propostas para a discussão em Conselho Legislativo pertence ao governador-geral.
IV - Às sessões do Conselho Legislativo poderão assistir os vogais do Conselho de Governo, que terão o direito de apresentar propostas, devidamente autorizadas pelo governador, e de tomar parte nas discussões, mas não votarão.
V - As demais disposições sobre o funcionamento do Conselho Legislativo serão estabelecidas no estatuto político-administrativo da respectiva província.

BASE XXVII

I - A todos os vogais do Conselho Legislativo, sem distinção, incumbe o dever de zelar pelo bem geral da Nação e da respectiva província, promovendo o seu progresso moral e material.
II - Os membros do Conselho Legislativo são invioláveis pelas opiniões que emitirem no exercício do seu mandato, salvas as restrições que a lei indicar. O estatuto da província estabelecerá as penalidades que lhes podem ser aplicadas, inclusive a de expulsão, sem prejuízo da responsabilidade civil e criminal que resultar da lei geral.
III-Por proposta do governador-geral, fundamentada em razões de interesse superior, o Ministro do Ultramar pode decretar a dissolução do Conselho Legislativo, devendo nesse caso mandar proceder a novas eleições dentro do prazo de sessenta dias, que pode prorrogar até seis meses quando razões da mesma natureza o aconselharem.

SUBSECÇÃO III

Do Concelho de Governo

BASE XXVIII

I - Junto do governador-geral funcionará permanentemente um Conselho de Governo, com atribuições consultivas.
II - Compõem o Conselho de Governo o secretário-geral, o comandante militar, o procurador da República, o director dos Serviços de Fazenda e dois vogais escolhidos anualmente pelo governador-geral, podendo a escolha recair em directores ou chefes de serviços ou em outros cidadãos, de reconhecida idoneidade, residentes na província.

BASE XXIX

I - O Conselho de Governo será presidido pelo governador-geral ou por quem suas vezes fizer. O secretário-geral é o vice-presidente do Conselho de Governo e substituí-lo-á nestas funções, nas suas faltas, ausências ou impedimentos, o vogal oficial mais antigo no serviço da província.
II - Nas suas faltas, ausências ou impedimentos os vogais natos do Conselho são substituídos pêlos seus substitutos na função pública e os vogais nomeados pêlos seus suplentes.
III - O estatuto político-administrativo da província incluirá as demais normas respeitantes ao funcionamento do Conselho de Governo.

BASE XXX

I - O Conselho de Governo assistirá ao governador-geral no exercício das suas funções executivas, competindo-lhe emitir parecer em todos os casos previstos na lei e de um modo geral sobre todos os assuntos respeitantes ao governo e administração da província que para esse fim lhe forem apresentados pelo governador.
II - O governador-geral deverá ouvir o Conselho de Governo ao exercer as atribuições seguintes e as demais que forem especificadas no estatuto político-administrativo da província:
a) Regulamentar a execução das leis, decretos-leis, decretos e mais diplomas vigentes na província que disso careçam;
b) Organizar o orçamento da despesa ordinária a apresentar ao Conselho Legislativo;
c) Declarar provisoriamente o estado de sítio em todo ou em parte do território da província, no caso de agressão efectiva ou iminente por forças estrangeiras ou no de a segurança e a ordem pública serem gravemente perturbadas ou ameaçadas, dando imediato conhecimento ao Ministro do Ultramar pela via mais rápida;

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d) Exercer a acção tutelar prevista na lei sobre os corpos administrativos e as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa.
III - O governador-geral comunicará ao Ministro do Ultramar as resoluções que tomar contra o voto consultivo do Conselho de Governo, justificando-as devidamente, nos casos em que é obrigado a consultá-lo, e providenciará como entender quando o tenha ouvido facultativamente e discordar da sua opinião.

SECÇÃO III

Dos órgãos das províncias de governo simples

SUBSECÇÃO I

Do governador

BASE XXXI

I - Em cada uma das províncias ultramarinas de Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe, Macau e Timor haverá uni governador.
II - O governador, por meio de portaria publicada no Boletim Oficial, e tomando a responsabilidade de tudo, poderá delegar nos directores ou chefes de serviços a solução dos negócios administrativos que por estes devam ser tratados.
III - Aplicam-se aos governadores os preceitos da base XXIV, respeitante aos governadores-gerais, substituindo-se a referência feita ao Conselho Legislativo pela referência ao Conselho de Governo.

SUBSECÇÃO II

Do Conselho de Governo

BASE XXXII

I - Em cada uma das províncias de governo simples funcionará, com atribuições legislativas e consultivas, um Conselho de Governo.
II - O Conselho de Governo a que esta base se refere é uma assembleia de representação adequada às condições do meio social de cada uma das províncias de governo simples. Compõem-no vogais não-oficiais, nomeados pelo governador ou eleitos, e vogais oficiais, natos ou designados pelo governador.
III - O estatuto de cada província regulará a constituição do seu Conselho de Governo, respeitando as directrizes seguintes:
a) Os vogais eleitos sê-lo-ão pelos colégios de eleitores do recenseamento geral dos círculos em que o território da província foi dividido e pêlos contribuintes portugueses recenseados com um mínimo de contribuição directa;
b) Na escolha dos vogais não oficiais que lhe couber nomear, o governador procurará dar representação aos organismos de considerável importância na economia e na vida pública da província e aos sectores da população nacional e comunidades estrangeiras que não tiverem voto nos colégios eleitorais.

BASE XXXIII

I - O Conselho de Governo funcionará na capital da província e será presidido pelo governador ou por quem suas vezes fizer. O Conselho de Governo terá um vice-presidente, escolhido pelo governador de entre os membros do Conselho e confirmado pelo Ministro do Ultramar.
II - As demais normas sobre o funcionamento do Conselho de Governo serão incluídas no estatuto político-administrativo da província,

BASE XXXIV

O Conselho de Governo será ouvido pelo governador para o exercício da sua competência legislativa, de acordo com a Constituição, a presente lei e o estatuto da respectiva província, e cabe-lhe o desempenho das funções consultivas que na base XXX são atribuídas ao órgão do mesmo nome das províncias de governo-geral.

SUBSECÇÃO III

Da secção permanente do Conselho de Governo

BASE XXXV

I - Em cada província de governo simples funcionará, junto do governador e por ele presidida, uma secção permanente do Conselho de Governo, à qual compete emitir parecer nos casos previstos na lei e sobre todos os assuntos respeitantes ao governo e administração da província que para esse fim lhe forem apresentados pelo governador.
II - A constituição e funcionamento da secção permanente serão regulados pelo estatuto de cada província, atendendo às condições do meio social.

SECÇÃO IV

Dos serviços públicos da administração provincial

BASE XXXVI

I - Os serviços públicos da administração provincial podem estar integrados na organização mais geral da administração de todo o território português, mas, por via de regra, constituem organizações próprias de cada província ultramarina, directamente subordinadas ao governador e por intermédio deste ao Ministro do Ultramar.
II - Quer os serviços nacionais, quer os serviços provinciais propriamente ditos, devem corresponder em cada província ao seu estado de desenvolvimento e às circunstâncias peculiares do seu território. De acordo com esta directriz, diplomas especiais disporão sobre a natureza e extensão dos serviços nacionais que hão-de funcionar em cada província ultramarina, enquanto sobre os serviços propriamente provinciais regerá o seu estatuto, guardadas sempre as normas gerais de organização do respectivo ramo de serviço vigentes no ultramar.
III - Os serviços provinciais podem, nos casos previstos na lei, para efeitos de recrutamento de pessoal, coordenação de métodos, utilização de laboratórios ou outras formas de assistência técnica, funcionar como prolongamento dos correspondentes serviços metropolitanos.
IV - Todas as organizações de serviços públicos das províncias ultramarinas, incluindo os concedidos, terão em vista as necessidades supremas da defesa do território, procurando adaptar-se a elas e facilitar a missão das instituições militares.

BASE XXXVII

I - Na capital de cada província, e sob a autoridade do respectivo governador, haverá organismos dirigentes de cada um dos ramos de serviço de administração provincial, que terão a categoria e a denominação de direcções provinciais de serviços e de repartições provinciais de serviços. Havendo nisso conveniência, poderá a lei prescrever que a mesma direcção ou repartição provincial reúna mais de um ramo de serviço.
Em regra, só nas províncias de governo-geral haverá direcções de serviços.
II - Os serviços nacionais, os serviços autónomos e os organismos de coordenação económica são dirigidos de acordo com os diplomas especiais que lhes digam respeito.

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III - As direcções provinciais de serviços serão dirigidas por directores de serviços, enquanto as repartições provinciais são dirigidas por chefes de serviços. Uns e outros despacham directamente com o governador e, em nome dele, expedem as ordens necessárias para o cumprimento das suas determinações.
IV - Cada governador tem sob a sua directa superintendência uma repartição de gabinete, dirigida, nas províncias de governo-geral e em Macau, por um chefe de gabinete, de livre escolha do governador, e nas restantes províncias pelo seu ajudante de campo ou secretário.

BASE XXXVIII

I - Toda a correspondência oficial das províncias ultramarinas para o Governo Central deverá ser dirigida ao Ministro do Ultramar, salvo o disposto em diplomas especiais quanto aos tribunais e serviços nacionais dependentes de outros Ministérios.
II - Só os governadores se correspondem com o Governo Central; nenhum funcionário em serviço na província nem qualquer organismo público pode corresponder-se directamente com ele, excepto:
a) Os tribunais, em matéria de recursos ou outros actos de serviço judicial;
b) Os inspectores superiores e outros funcionários de igual ou mais elevada categoria, durante a inspecção ou o desempenho da missão de que foram incumbidos;
c) Os serviços nacionais, nos termos dos diplomas especiais que lhes digam respeito.
III - Diploma regulamentar definirá e regulará as diferentes classes de correspondência e a forma da sua transmissão, podendo admitir a comunicação directa e simplificada de dados estatísticos ou meteorológicos e de outros de mero expediente.

SECÇÃO V

Dos funcionários ultramarinos

BASE XXXIX

I - Cada ramo de serviço da administração provincial assenta num quadro geral de funcionalismo próprio.
II - Os quadras gerais do funcionalismo de cada ramo de serviço compõem-se de dois escalões:
a) Quadro comum do ultramar;
b) Quadro privativo de cada província ultramarina.
Pode a lei criar quadros complementares de qualquer destes escalões para completar a acção de determinados serviços em ramos especiais ou transitórios e eventuais da sua actividade.
Dentro dos quadros gerais pode haver quadros especiais com designações próprias de cada serviço, nos termos legais.
III - Os quadros dos funcionários são os que constarem da lei, e só estes poderão inscrever-se nas tabelas orçamentais.
IV - O disposto nesta base não prejudica a faculdade de contratar ou assalariar pessoal além dos quadros, nos casos em que a lei expressamente o permitir.

BASE XL

I - Os quadros comuns e os privativos de cada província são permanentes; os quadros complementares são, em regra, temporários ou eventuais, extinguindo-se no fim da missão a que se destinam ou do tempo por que foram criados.
II - Pertencem aos quadros comuns do ultramar:
a) Os funcionários de categoria superior a primeiro-oficial, a administrador de concelho ou de circunscrição ou equivalente categoria, que se determinará, na falta de preceito expresso, pelo vencimento de categoria indicativo dela;
b) Quaisquer outros funcionários para cujo provimento a lei exigir curso superior da especialidade, quando de outro modo não estiver determinado por lei.
III - Os quadros complementares compreendem:
a) Os médicos das especialidades, das missões ou brigadas sanitárias eventualmente criadas e dos serviços locais de saúde que a lei determinar;
b) Os funcionários eventuais dos caminhos de ferro, obras públicas e outros serviços técnicos;
c) O pessoal das brigadas ou missões com carácter temporário.
IV - Aos quadros privativos pertencem todos os funcionários não compreendidos nos quadros comuns ou complementares.

BASE XLI

I-As nomeações para os quadros dos serviços públicos ultramarinos podem ser:
a) Interinas;
b) Provisórias;
c) Definitivas;
d) Em comissão.
II - As nomeações interinas obedecerão às seguintes regras, além de outras legalmente fixadas:
1.ª Competem ao Ministro do Ultramar as dos quadros comuns; competem ao Ministro do Ultramar ou aos governadores, conforme a lei determinar, as dos quadros complementares; competem, salvo as excepções consignadas na lei, aos governadores, ou a outras entidades a quem a lei conferir essa competência, as dos quadros privativos.
Em caso de inadiável urgência de serviço público, poderão as nomeações interinas da competência do Ministro ser feitas pelos governadores;
2.ª As nomeações interinas feitas pelo Ministro do Ultramar valerão enquanto durarem as circunstâncias que as justificaram; as feitas pelos governadores ou outras entidades caducam ao fim de um ano, salvo as excepções previstas na lei, e podem ser renovadas, mas, quando se tratar de nomeações interinas feitas pelo governador em casos de inadiável urgência para quadros comuns ou complementares, a renovação só pode ser feita com autorização do Ministro do Ultramar.
III - As nomeações de ingresso nos serviços públicos ultramarinos terão carácter provisório durante cinco anos, nos termos seguintes:
a) A nomeação inicial será por dois anos, de contínuo exercício, ainda que em diversos lugares do mesmo quadro;
b) Se o funcionário tiver boas informações, será reconduzido por mais três anos, nas mesmas condições do período anterior;
c) Os funcionários assim nomeados provisoriamente têm os deveres e direitos dos funcionários de nomeação definitiva, incluindo as promoções legais.
IV - Salvo o disposto para as nomeações em comissão, o funcionário será nomeado definitivamente, se o merecer, após cinco anos de exercício efectivo das funções, com dispensa de nova posse, devendo contar-se-lhe a antiguidade desde a primeira posse que haja tomado em virtude da nomeação provisória. Se o funcionário a nomear definitivamente for militar do Exército, da Armada ou da Aeronáutica, a nomeação dependerá da prévia desligação do serviço militar, autorizada por quem de direito.
V - As nomeações em comissão conferem os direitos e impõem os deveres correspondentes aos cargos apenas durante o prazo da sua duração. São-lhes aplicáveis, além do mais que a lei dispuser, as regras seguintes:
1.ª As funções governativas e as de direcção ou chefia de serviços serão sempre exercidas em comissão por funcionários dos respectivos quadros a quem por lei com-

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petir ou por pessoas estranhas aos mesmos quadros que reunam as condições especialmente previstas na lei;

2.ª Poderão ser feitas em comissão as nomeações para lugares dos quadros complementares, assim como também poderão ser exercidas em comissão, quer voluntária, quer imposta por escala ou conveniência de serviço, outras funções que a lei indicar; ; ;

3.ª Se outro prazo não estiver legalmente fixado, entender-se-á que as nomeações em comissão são válidas por dois anos, contados do dia da posse, podendo, todavia, haver recondução por períodos iguais e sucessivos, se o Ministro do Ultramar assim o entender, em regra, sol) proposta do governador da respectiva província;

4.ª Os funcionários nomeados em comissão não podem ser exonerados, a seu pedido, antes de findo o prazo dela ou de qualquer cias suas renovações, salvo quando não liou ver inconveniente, mas em qualquer tempo poderão ser exonerados por conveniência de serviço público;

5.ª O funcionário que não pertença ao quadro em que serve em/comissão não pode ser reconduzido mais do que três vezes no mesmo quadro. Findos os quatro biénios de comissão, se o funcionário o merecer pelas qualidades que revelou e pelas boas informações obtidas, poderá ser nomeado definitivamente para a categoria que no quadro corresponder ao cargo exercido.

BASE XLII

O recrutamento dos funcionários far-se-á, por via de regra, mediante concurso de provas públicas.

BASE XLIII

I - Na administração das províncias ultramarinas é admitida a prestação de serviço por contrato nos casos seguintes:

a) No exercício anual de cargos incluídos nos quadros da administração provincial, quando a lei reguladora do seu provimento o permitir;

b) No desempenho de funções ou realização de trabalhos com carácter eventual, dentro ou fora dos referidos quadros, quando a lei o permitir, ou ainda, no silêncio desta, quando a autoridade a quem compita ordenar os trabalhos entenda ser necessário contratar pessoal de alta ou especializada competência;

c) Na prestação de serviço ou trabalho assalariado, ao dia ou ao mês, e em regra de natureza manual.

II - A lei estabelecerá o regime de cada uma destas formas de contrato, cuja celebração será em regra precedida de concurso.

BASE XLIV

Salva a hipótese de missão especial, os provimentos pelo Ministro do Ultramar mencionarão apenas a província onde os funcionários devem servir, competindo ao governador a colocação nos lugares da categoria q m; lhes couber.

BASE XLV

O estatuto dos funcionários ultramarinos respeitará as normas desta secção e incluirá todas as demais sobre a sua situação, direitos, deveres e garantias.

CAPÍTULO V

Da administrado local

SECÇÃO I

Da divisão administrativa e das autoridades administrativas subalternas

BASE XLVI

I - Para efeitos administrativos, as províncias ultramarinas dividem-se em concelhos. Enquanto não for atingido o desenvolvimento económico e social previsto na lei, os concelhos são substituídos por circunscrições administrativas nas regiões que o estatuto da respectiva província indicar.

II - O estatuto de cada província deverá prever a existência de três classes de concelhos, em harmonia com a importância que para eles advém da sua população, actividade mercantil ou industrial u condições urbanas.

III - Os concelhos e as circunscrições administrativas dividem-se em postos, correspondentes às áreas não urbanas, e em freguesias, correspondentes às localidades que neles houver, com a população o as condições urbanas por lei exigidas, ou a áreas em que convenha dividir grandes localidades.

IV - Os concelhos e circunscrições agrupam-se em intendências, em distritos ou em intendências e distritos, conforme as conveniências administrativas e segundo se dispuser no estatuto de cada província.

V - A divisão administrativa de cada província ultramarina acompanhará as necessidades da sua economia e população.

BASE XLVII

No distrito e na intendência as autoridades administrativas superiores são, respectivamente, o governador de distrito e o intendente administrativo. No concelho a autoridade é exercida pelo administrador do concelho e na circunscrição pelo administrador de circunscrição. No posto administrativo a autoridade cabe ao chefe do posto e na freguesia ao regedor.

SECÇÃO II

Das autarquias locais

BASE XLVIII

Nas províncias ultramarinas os distritos, os concelhos e as freguesias são autarquias locais, com personalidade de direito público, autonomia administrativa e financeira, nos termos que a lei determinar.

SECÇÃO III

Dos corpos administrativos

BASE XLIX

I - Nas províncias ultramarinas a administração dos interesses comuns das autarquias locais está a cargo de conselhos de distrito, câmaras municipais, comissões municipais, juntas locais e juntas de freguesia.

II - O conselho de distrito é o corpo administrativo do distrito; a câmara municipal, a comissão municipal e a junta local são os corpos administrativos do concelho, conforme a sua classe, a sua população e a sua importância política e económica. A junta de freguesia é o corpo administrativo da freguesia; porém, se aí houver organismos devidamente constituídos aos quais, por lei ou tradição, pertença a gerência de certos interesses comuns dos habitantes, poderão ser-lhes confiadas as atribuições das juntas de freguesia, nos termos (pie a lei definir.

III - Os vogais das câmaras municipais e das juntas de freguesia são eleitos; os dos restantes corpos administrativos são natos, de nomeação ou eleitos, conformo a lei designar.

Sem prejuízo do disposto no § único do artigo 7.º da Constituição, os estrangeiros com residência habitual no território por tempo não inferior a cinco anos, sabendo ler e escrever português, podem fazer parte dos corpos administrativos, até ao máximo de um terço dos seus membros. Têm de ser diferentes as nacionalidades dos estrangeiros que façam parte do mesmo corpo administrativo.

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IV - O governador de distrito é o presidente do conselho de distrito e o executor das deliberações deste. São de nomeação os presidentes dos restantes corpos administrativos.

BASE L

I - Cada corpo administrativo municipal tem a sua secretaria privativa, dirigida pelo respectivo chefe, e as, secções e serviços indispensáveis ao expediente e execução de todas as deliberações, nos termos da lei administrativa geral.

II - Os corpos administrativos podem organizar autonomamente os serviços de interesse comum que a lei designar.

BASE LI

As deliberações dos corpos administrativos só podem ser anuladas, revogadas, suspensas ou modificadas nos casos e pela forma previstos na lei.

CAPITULO VI

Da administração financeira das províncias ultramarinas

SECÇÃO I

Princípios gerais

BASE LII

As províncias ultramarinas são pessoas colectivas de direito público, com a faculdade de adquirir, contratar e estar em juízo.

BASE LIII

Cada uma das províncias ultramarinas tem activo o passivo próprios, competindo-lhe a disposição dos seus bens e receitas e a responsabilidade das suas despesas e dívidas e dos seus actos e contratos, nos termos da lei.

BASE LIV

Constituem património de cada província ultramarina os terrenos vagos ou que não hajam entrado definitivamente no regime de propriedade privada ou no domínio público, as heranças jacentes e outros bens imobiliários ou mobiliários que não pertençam a outrem, dentro dos limites do seu território, e ainda os que adquirir ou lhe pertencerem legalmente, fora do mesmo território, incluindo as participações de lucros ou de outra espécie que lhe sejam destinadas.

BASE LV

I - As províncias ultramarinas administram-se com autonomia financeira, mas estão sujeitas u superintendência e fiscalização do Ministro do Ultramar.

II - A autonomia financeira das províncias ultramarinas fica sujeita às restrições ocasionais que sejam indispensáveis por situações graves da sua Fazenda ou pelos perigos quê estas possam envolver para a metrópole.

III - Ao Ministro do Ultramar pertence retirar, nas circunstâncias indicadas no n.º n, a autonomia financeira a qualquer das províncias.

BASE LVI

A metrópole presta assistência financeira às províncias ultramarinas, mediante as garantias necessárias.

SECÇÃO II

Dos orçamentos provinciais

BASE LVII

A administração financeira de cada uma das províncias ultramarinas está subordinada a um orçamento privativo. Os orçamentos de todas elas devem ser elaborados segundo plano uniforme.

BASE LVIII

I - O orçamento do cada província ultramarina é unitário, compreendendo a totalidade das suas receitas e despesas, mesmo as dos serviços autónomos, de que podem ser publicados à parte desenvolvimentos especiais.

II - O orçamento de cada província ultramarina deve consignarmos recursos indispensáveis para cobrir o total das despesas, de modo a assegurar sempre o seu equilíbrio.

III - As despesas correspondentes a obrigações legais ou contratuais da província ou permanentes por sua natureza ou fins, compreendidos os encargos de juro e amortização da sua dívida, devem ser tomadas como base da fixação dos impostos e outros rendimentos da província.

IV - O orçamento de cada província incluirá sómente as receitas e despesas permitidas por diplomas legais.

V - Não podem ser incluídas no orçamento ou servir de elemento de previsão orçamental, para serem pagas por verbas relativas a exercícios findos, quaisquer despesas realizadas além das dotações autorizadas. O diploma especial que reger a administração da Fazenda determinará os casos restritos em que pode justificar-se a inclusão de verba para pagar encargos relativos a exercícios findos que não tenham sido oportunamente dotados ou pagos.

VI - A lei que reger a administração financeira ultramarina regulará as condições e termos em que no orçamento de qualquer das províncias ultramarinas podem transferir-se; verbas e abrir-se créditos.

BASE LIX

I - O orçamento de cada província ultramarina será anualmente organizado, votado e mandado executar pelos órgãos da província, nos termos desta base s do diploma especial que reger a administração da Fazenda.

II - Ao governador, por intermédio dos serviços competentes, cabe a organização do projecto orçamental referente à gerência futura, prevendo as receitas a cobrar e as despesas a fazer, de harmonia com as leis existentes, os interesses da província e as instruções o ordens do Ministro do Ultramar.

III - Ao Conselho Legislativo ou de Governo, conforme as províncias, compete autorizar o governo da província, até 15 de Outubro de cada ano, a cobrar as receitas e a pagar as despesas públicas na gerência futura, definindo no respectivo diploma legislativo de autorização os princípios a que deve ser subordinado o orçamento, na parte das despesas cujo quantitativo não é determinado em harmonia com as leis, instruções e ordens preexistentes.

IV - O diploma legislativo de autorização será remetido ao Ministério do Ultramar, acompanhado do projecto orçamental e demais elementos necessários, para efeitos de aprovação, que deverá ser dada, com as modificações e aditamentos reputados convenientes, até 30 de Novembro.

V - Compete ao governador, até 31 de Dezembro, aprovar e mandar executar o orçamento, por meio de portaria.

VI - Quando, por qualquer circunstância, o orçamento não possa entrar em execução no começo do ano económico, a cobrança das receitas estabelecidas por tempo indeterminado ou por período que abranja a nova gerência prosseguirá nos termos das leis preexistentes, e continuarão provisoriamente em vigor, por duodécimos, só quanto à despesa ordinária, o orçamento do ano anterior e os créditos sancionados durante ele para ocorrer a novos encargos permanentes.

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SECÇÃO III

Das receitas provinciais

BASE LX

I - São receitas próprias de cada província ultramarina:

a) Os impostos ou taxas arrecadados no seu território e os que, cobrados fora dele, lhe pertença III por disposição expressa da lei, salvo o disposto no n.º III desta base e o que na lei se preceituar acerca dos corpos administrativos;

b) Os rendimentos da posse, exploração directa ou da concessão dos bens mobiliários ou imobiliários do seu património ;

c) Os rendimentos das explorações ou concessões de bens do domínio público do Estado por este autorizadas no território da província, quando esta assumir os correspondentes encargos, conforme a lei determinar;

d) O produto da liquidação de heranças, espólios e outros bens abandonados existentes no seu território, que a lei mande atribuir ao Estado;

e) O montante de empréstimos e outras operações de I rédito feitas pela província;

f) Quaisquer outras importâncias que a lei como tais considerar.

II - São receitas comuns das províncias ultramarinas as resultantes de bens ou serviços comuns e as consignadas a fundos da mesma natureza.

III - À metrópole serão atribuídas, nas províncias ultramarinas as receitas seguintes:

a) Uma contribuição para a defesa nacional, na proporção das receitas ordinárias do nada uma delas;

b) As taxas, rendimentos ou comparticipações de serviços, explorações ou concessões que a metrópole custear ou garantir;

c) Os juros e amortizações da assistência financeira prestada às províncias ultramarinas.

BASE LXI

I - Só podem ser lançadas as receitas que tiverem tido autorizadas na forma legal e estiverem inscritas nas tabelas orçamentais, salvo se tiverem sido posteriormente criadas ou autorizadas.

II - Todas as receitas de uma província, de qualquer natureza ou proveniência, com ou sem aplicação especial, serão, salvo disposição expressa em contrário, entregues na respectiva caixa do Tesouro, vindo no final a ser descritas nas suas contas anuais, em harmonia com a lei.

III - Nas províncias ultramarinas só com autorização do Ministro do filtram ar se podem constituir fundos especialmente consignados à realização de determinados fins.

BASE LXII

I - Compete às províncias ultramarinas criar, alterar ou suprimir impostos e taxas no sou território, observados os princípios da Constituição, da presente lei orgânica, da lei geral e das convenções internacionais.

II - Na organização do imposto indígena ter-se-á em atenção:

a) A forma que melhor se coadune com o estado social, os usos e costumes, tradições e necessidades dos indígenas e o meio natural em que vivem;

b) A aplicação obrigatória de uma determinada percentagem do produto anual do imposto a obras de protecção, assistência, educação e instrução dos indígenas e a melhoramentos de ordem material que os interessem.

BASE LXIII

I - Cada província ultramarina tem competência Dará contrair empréstimos ou realizar outras operações de crédito destinadas a obter capitais necessários ao seu governo.

II - A iniciativa dos empréstimos pertence ao governador, com autorização do respectivo Conselho Legislativo ou de Governo, conforme os casos. Relativamente, porém, a obras e planos que forem da competência do Ministro do Ultramar, poderá este providenciar acerca do respectivo financiamento, por sua iniciativa ou mediante proposta do governador, ouvido neste caso o Conselho Legislativo ou de Governo.

III - Dependem de prévia autorização do Governo, dada em decreto-lei, os empréstimos que exigirem caução ou garantias especiais; dependem de prévia autorização do Ministro do Ultramar, dada por decreto, outros empréstimos de que resultem encargos superiores às receitas ordinárias, no respectivo ano disponíveis, da província a que respeitem.

IV - As províncias ultramarinas não podem contrair empréstimos em países estrangeiros. Quando seja preciso recorrer a praças externas para obter capitais destinados ao governo de qualquer província ultramarina, a operação financeira será feita exclusivamente de conta da metrópole, sem que a mesma província assuma responsabilidade para com elas, tomando-as, porém, plenamente para com a metrópole.

V - Os direitos do Tesouro Público ou dos estabelecimentos de crédito, por dívidas pretéritas ou futuras das províncias ultramarinas, são imprescritíveis.

SECÇÃO IV

Das despesas provinciais

BASE LXIV

I - Constituem encargos da metrópole em relação ao ultramar:

a) A dotação necessária para manter o Ministério do Ultramar e os organismos dele dependentes que a lei indicar;

b) As despesas consideradas de soberania, incluindo as de defesa, nacional, as da Residência de S. João Baptista de Ajuda, as que se fizerem com a delimitação de fronteiras e as do comparticipação no povoamento, no estudo de problemas ultramarinos, na investigação científica .e no estreitamento das relações espirituais entre a metrópole e o ultramar;

c) A dotação do Padroado do Oriente e os subsídios às corporações missionárias católicas reconhecidas e aos estabelecimentos de formação e repouso do seu pessoal;

d) As desposas com estabelecimentos, serviços e explorações ultramarinas integradas em organizações hierárquicas da metrópole e com concessões no ultramar por esta garantidas;

e) Os subsídios lotais ou parciais a empresas de navegação marítima ou .aérea e a outras que explorem os meios de comunicação com o ultramar;

f) As passagens e manutenção dos delinquentes enviados pela metrópole para estabelecimentos penais do ultramar.

II - Constituem encargo da província ou províncias a que respeitem todas as despesas que esta base não põe- a cargo da metrópole, designadamente:

a) Os juros, anuidades de empréstimos e encargos que tiver assumido por contrato ou lhes forem impostos por lei;

b) As dotações dos serviços provinciais, incluindo as d espigas de transporte de pessoal ou material inerentes ao seu funcionamento;

c) O fomento do respectivo território, incluindo os encargos legais ou contratuais de obras ou concessões realizadas para o mesmo fim;

d) As despesas com o fabrico da sua moeda e de valores selados ou postais;

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e) As pensões do pessoal das classes inactivas, na proporção do tempo por que nelas houver servido;

f) As despesas com o Conselho Ultramarino e outros órfãos ou organismos anexos ou dependentes do Ministério que a lei determinar, com tribunais superiores e com outros serviços comuns a diversas províncias, em proporção das suas receitas ordinárias;

g) Os subsídios a empresas que mantenham regularmente a cabotagem ou outros meios de comunicação de interesse para uma ou mais províncias;

h) As passagens e manutenção de delinquentes enviados pelos tribunais ou serviços competentes para estabelecimentos penais que funcionem noutras províncias.

BASE LXV

I - Nas províncias ultramarinas é expressamente proibido realizar desposas que não tenham sido inscritas nos orçamentos e bem assim contrair encargos ou efectuar dispêndios de que resulte excederem-se as dotações orçamentais.

II - As verbas autorizadas para certa despesa não podem ter aplicação diversa da que estiver indicada no orçamento ou no diploma que abrir o crédito.

III - Os governadores e demais funcionários competentes aplicarão as dotações orçamentais de modo a alcançar-se o máximo de rendimento útil com o mínimo de dispêndio.

IV - As despesas da administração provincial são ordenadas pelos governadores ou pelo Ministro do ultramar nos termos da presente lei orgânica e dos diplomas especiais que regularem a execução dos serviços da Fazenda.

V - O Ministro do Ultramar dará aos governadores as instruções que julgar convenientes para a execução do orçamento das despesas.

VI - O tribunal administrativo de cada província realizará a fiscalização judicial do orçamento das despesas nos termos e na medida que a lei determinar. A fiscalização administrativa cabe ao Ministério do Ultramar, que a realizará por meio de inspecções e pelo visto das entidades competentes, o aos governadores.

SECÇÃO V

Da contabilidade e fiscalização das contas provinciais

BASE LXVI

I - A contabilidade das províncias ultramarinas será organizada como a da metrópole, com as modificações que o Ministro do Ultramar considere indispensáveis por circunstâncias especiais.

II - As contas das despesas públicas provinciais coincidirão rigorosamente com a classificação orçamental em vigor.

III - As contas anuais das províncias ultramarinas serão enviadas ao Ministro do Ultramar, nos prazos o sob as sanções que a lei estabelecer, para, depois de verificadas e relatadas, serem submetidas a julgamento do Tribunal de Contas e tomadas pela Assembleia Nacional, nos termos do n.º 3.º do artigo 91.º e do artigo 171.º da Constituição.

CAPITULO VII

Da administração da justiça no ultramar

SECÇÃO I

Dos tribunais do ultramar

BASE LXVII

I - A função judicial é exercida no ultramar por tribunais ordinários e especiais. Diplomas especiais regularão a sua organização e competência.

II - São tribunais ordinários o Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais de 2.ª e 1.ª instância, que terão a competência territorial e material fixada por lei.

III - Não é permitida a criação de tribunais especiais com competência exclusiva para julgamento de determinada ou determinadas categorias de crimes, excepto sendo estes fiscais, sociais ou contra a segurança do Estado.

IV - A lei pode admitir julgados municipais compreendidos nas comarcas.

V - Para a resolução de questões entro indígenas podem ser investidos nas funções de julgar funcionários ou tribunais especiais ou as autoridades administrativas locais.

BASE LXVIII

I - As províncias ultramarinas serão representadas nos tribunais:

a) Pêlos agentes do Ministério Público, segundo a sua. hierarquia;

b) Pêlos representantes legalmente designados junto dos tribunais especiais.

II - Em virtude da representação que por esta base lhes é atribuída, os procuradores da República e seus delegados cumprirão diligentemente, na defesa dos direitos e interesses das províncias ultramarinas, as instruções que pelos respectivos governadores lhes forem transmitidas por escrito, salvo no respeitante u técnica jurídica ou processual.

BASE LXIX

I - Têm jurisdição no ultramar como tribunais administrativos:

a) O Conselho Ultramarino;

b) O Tribunal de Contas;

c) Um tribunal administrativo na capital de cada província.

II - Os tribunais administrativos têm jurisdição própria e são independentes da Administração.

III - Ao Conselho Ultramarino compete resolver os recursos:

a) Dos actos dos governadores-gerais ou de província, excepto em matéria disciplinar;

b) Das decisões dos tribunais administrativos das províncias ultramarinas.

IV - Ao Tribunal de Contas compete:

a) Exercer as funções de consulta, exame e visto em relação aos actos e contratos da competência do Ministro do Ultramar;

b) Decidir, em recurso, as divergências entre os tribunais administrativos e os governadores das províncias ultramarinas em matéria de exame ou visto da competência daqueles tribunais;

c) Conhecer, em recurso, das decisões proferidas sobre contas pelos tribunais administrativos das províncias ultramarinas;

d) Julgar, nos termos dos artigos 91.º, n.º 3.º, e 171.º da Constituição, as contas anuais das província» ultramarinas e as de outras entidades que a lei lhe atribuir.

V - Aos tribunais administrativos das províncias ultramarinas compete:

a) Julgar os recursos dos actos das autoridades administrativas da província, com excepção do governador, governador-geral ou de quem suas vezes fizer, das decisões ou deliberações dos organismos dirigentes dos serviços autónomos, dos corpos administrativos e das pessoas colectivas de utilidade pública;

b) Decidir quaisquer outras questões contenciosas que digam respeito à administração da província e da sua Fazenda, nos termos que a lei indicar;

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c) Julgar as contas dos corpos administrativos e das pessoas colectivas de utilidade pública administrativa e as demais que a lei indicar;

d) Emitir parecer sobre matéria de ordenamento de despesas ou assuntos relativos à administração da província, sempre que o governador o solicitar;

e) Exercer as funções de exame e visto relativamente aos actos e contratos que forem da competência das autoridades da província.

BASE LXX

I - Sempre que nos tribunais das províncias ultramarinas se levantar o incidente de inconstitucionalidade material de qualquer diploma, quer por iniciativa das partes quer dos magistrados, se o tribunal entender que u arguição tem fundamento, subirá o incidente em separado ao Conselho Ultramarino para julgamento.

II - Recebido o processo, seguir-se-ão os trâmites legais, lavrando-se a final acórdão sobre a inconstitucionalidade do diploma, mandando-o observar ou mandando que se não aplique.

III - A conclusão do acórdão do Conselho Ultramarino será talegràficamente comunicada à província ou províncias interessadas,, a fim de que, uma vez publicada no respectivo Boletim Oficial, se lhe dê cumprimento.

IV - A inconstitucionalidade orgânica ou formal da regra de direito constante de diplomas promulgados pelo Presidente da República só poderá ser apreciada pela Assembleia Nacional e por sua iniciativa ou do Governo, determinando a mesma Assembleia os efeitos da inconstitucionalidade, sem ofensa porém das situações criadas pelos casos julgados.

SECÇÃO II

Da prevenção e repressão dos crimes no ultramar

BASE LXXI

I - Para prevenção e repressão dos crimes haverá na legislação ultramarina penas e medidas de segurança que terão por fim a defesa da sociedade e tanto quanto possível a readaptação social do delinquente.

II - Será estendido ao ultramar o sistema penal e prisional metropolitano, na medida em que o seu valor preventivo e repressivo se adapte ao estado social e modo de ser individual da população ou parte da população das diversas províncias.

III - A pena de degredo não se ordenará nem cumprirá mais nas províncias ultramarinas. Poderão, todavia, ser criados no ultramar estabelecimentos penais, visando uns maior segregação e intimidação, outros mais fácil correcção de criminosos primários ou de tipo exógeno. Tais estabelecimentos enquadrar-se-ão, na medida do possível, em planos de colonização interna ultramarina.

Cumprida a pena, far-se-á, pelos serviços competentes o determinar, um juízo sobre a possibilidade da integração dos delinquentes, em plena liberdade, na respectiva província. Quanto àqueles delinquentes cuja integração na província se tenha julgado indesejável, não será permitida a sua permanência nela durante os cinco anos que se seguirem ao seu cumprimento.

IV - Os diplomas legislativos das províncias ultramarinas poderão cominar, independentemente de autorização do Ministro do Ultramar, qualquer das penas correccionais. As portarias regulamentares poderão cominar as penalidades mencionadas no artigo 486.º do Código Penal, com as modificações vigentes na metrópole, incluindo multa até 5.000$ ou quantia equivalente em moeda local.

CAPITULO VIII

Da ordem económica e social das províncias ultramarinas

SECÇÃO I

Do regime económico geral do ultramar

BASE. LXXII

I - A vida económica e social das províncias ultramarinas é superiormente regulada e coordenada tendo em vista os objectivos expressos no título viu da parte I e no capítulo V do título VII da parte II da Constituição, e em especial os seguintes:

a) O metódico aproveitamento dos recursos e possibilidades naturais do território ultramarino;

b) O povoamento do território ultramarino e o desenvolvimento das populações nativas;

c) A elevação moral, intelectual e económica das populações;

d) A progressiva- nacionalização das actividades;

e) A realização da justiça social compatível com as condições económicas e políticas.

II - Pertence à metrópole, sem prejuízo da descentralização das (províncias ultramarinas, assegurar pelas decisões dos órgãos competentes a conveniente posição dos interesses que devem ser considerados em conjunto nos regimes económicos dos territórios ultramarinos.

SECÇÃO II

Das relações económicas das províncias ultramarinas com a metrópole e com o estrangeiro e das relações delas entre si

BASE LXXIII

I - A organização económica do ultramar deve integrar-se na organização económica geral da Nação e comparticipar, por seu intermédio, na economia mundial.

II-Serão gradualmente reduzidos ou suspensos os direitos aduaneiros nas relações comerciais entre a metrópole e as províncias ultramarinas e destas entre si.

III - Serão quanto possível uniformizados em todo o território nacional os direitos aduaneiros nas relações comerciais com o estrangeiro.

IV - Será facilitada a circulação das pessoas dentro de todo o território nacional, sendo, porém, lícito recusar-se a nacionais e a estrangeiros a entrada em qualquer província e ordenar-se a sua expulsão, conforme estiver regulado, se da sua presença resultarem graves inconvenientes de ordem interna ou internacional, ressalvando-se sempre a possibilidade de recurso unicamente para o Governo.

V - Serão tanto quanto possível facilitadas as transferências de capitais entre todas as parcelas do território nacional.

BASE LXXIV

O desenvolvimento das indústrias e o condicionamento dos investimentos industriais serão promovidos na metrópole e no ultramar em harmonia com os princípios básicos da unidade e da coordenação.

BASE LXXV

I - Os bancos emissores do ultramar terão a sede e administração central e constituirão as suas reservas na metrópole.

II - A unidade monetária em todas as províncias ultramarinas será o escudo. Os bancos emissores procurarão assegurar a convertibilidade das suas notas em escudos metropolitanos e destes naquelas, segundo a paridade que for fixada pelo Governo, tomando em conta a situação da balança de pagamentos.

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III - Para os efeitos do número anterior poderá estabelecer-se, na medida em que for julgado conveniente, o apoio mútuo dos fundos cambiais que houver nas províncias ultramarinas.

BASE LXXVI

I - Serão reservados a empresas nacionais ou aos serviços do Estado que os explorem os meios de comunicação regular entre a metrópole e as províncias ultramarinas ou destas entre si. Ao Ministro do Ultramar é reservada a faculdade de consentir em excepções a este princípio.

II - As mercadorias com destino a país estrangeiro em trânsito directo por porto nacional poderão ser transportadas em navio estrangeiro.

III - É permitido o transporte de correspondência, livros, revistas ou jornais em navios estrangeiros.

SECÇÃO III

Das concessões nas províncias ultramarinas

BASE LXXVII

As concessões do Estado ou das autarquias locais na esfera da sua competência, ainda quando hajam de ter efeito com a aplicação de capitais estrangeiros, serão sempre sujeitas a condições que assegurem a nacionalização e demais conveniências da economia nacional. Diplomas especiais regularão este assunto para os mesmos fins.

BASE LXXVIII

São consideradas de interesse colectivo e sujeitas a regimes especiais de administração, concurso, superintendência ou fiscalização do Estado, por intermédio do Ministro do Ultramar ou dos governos das províncias ultramarinas, nos termos legais, conforme as necessidades da segurança pública, da defesa nacional e das relações económicas e sociais, todas as empresas que visem ao aproveitamento e exploração dos bens que fazem parte do domínio público do Estado no ultramar.

BASE LXXIX

I - Nem o Estado nem as autarquias locais podem conceder no ultramar a empresas singulares ou colectivas:

1.º O exercício de prerrogativas de administração pública;

2.º A faculdade de estabelecer ou fixar quaisquer tributos ou taxas, não se incluindo a cobrança de rendimentos públicos cuja arrematação for permitida por lei;

3.º A posse de terrenos ou o direito exclusivo de pesquisas mineiras, com a faculdade de subconceder a outras empresas.

II - Nos territórios ultramarinos onde actualmente houver concessões da natureza daquelas a que se refere esta base observar-se-á o seguinte:

a) Não poderão ser prorrogadas ou renovadas, no todo ou em parte;

b) O Estado exercerá o seu direito de rescisão ou resgate, nos termos das leis ou contratos aplicáveis.

BASE LXXX

De futuro a administração e exploração dos portos ou aeroportos do ultramar são reservadas para o Estado. Lei especial regulará as excepções que devam ser admitidas dentro de cada porto ou aeroporto a determinadas instalações de serviços.

BASE LXXXI

As tarifas de exploração dê serviços públicos concedidos estão sujeitas à regulamentação e fiscalização do Estado, por intermédio do Ministro do Ultramar ou dos governos provinciais, conforme as regras de competência estabelecidas, e só depois da sua aprovação podem entrar em vigor.

BASE LXXXII

I - Não podem ser concedidas nem por qualquer outro modo alienadas, no ultramar, as parcelas de terrenos ou outros bens afectos ou destinados ao domínio público ou que interessarem ao prestígio do Estado ou a superiores conveniências nacionais. Leis especiais regularão este assunto, ficando desde já estabelecido que não são permitidas:

a) Numa zona contínua de 80 metros além do máximo nível da preia-mar, as concessões de terrenos confinantes com a costa marítima, dentro ou fora das baías, com excepção de Macau;

b) Numa zona contínua de 80 metros além do nível normal das águas, as concessões de terrenos confinantes com lagos navegáveis ou com rios abertos à navegação internacional;

c) Numa faixa de 100 melros ou superior, para cada lado, se lei especial a determinar, contados do eixo da linha ou do perímetro das estações respectivas, as concessões de terrenos contíguos às linhas férreas de interesse público construídas, projectadas, ou que para esse fim os governos entendam dever reservar.

II - Quando convenha aos interesses do Estado e de harmonia com a lei, podem ser permitidos:

a) O uso ou ocupação, a título precário, de (parcelas dos terrenos abrangidos nesta base;

b) A inclusão das referidas parcelas na área das povoações, com expressa aprovação do Ministro do Ultramar, ouvidas as instâncias competentes. Podem as parcelas assim incluídas na área das povoações ser concedidas, em harmonia, com a lei e o disposto no n.º III desta base, desde que a concessão mereça a aprovação expressa do Ministro do Ultramar, ouvidas as mesmas instâncias.

III - Nas áreas da» povoações marítimas ou nas destinadas à sua natural expansão, exceptuando Macau, as concessões ou subconcessões de terrenos ficam sujeitas às regras seguintes;

a) Não poderão ser feitas a estrangeiros sem aprovação do Conselho de Ministros;

b) Serão condicionadas ao efectivo aproveitamento dos terrenos pelos concessionários ou subconcessionários com as suas instalações industriais ou comerciais ou com prédios de habitação.

IV - Não dependem da sanção de qualquer autoridade os actos de transmissão particular da propriedade de terrenos e dos direitos imobiliários sobre eles constituídos; mas, se a transmissão contrariar o disposto no n.º III desta base, será anulava! por simples despacho dos governadores-gerais ou de província, publicado no Boletim Oficial nos seis meses seguintes àquele em que do facto houver conhecimento, sem prejuízo da anulação em qualquer tempo, pêlos meios ordinários, nos termos do n.º V desta base.

V - São imprescritíveis os direitos que esta base assegura, ao Estado.

VI - As áreas das povoações marítimas e as destinadas à sua natural expansão são as que constarem do respectivo foral, se nele estiverem incluídas, ou de outro regulamento administrativo, publicado no Boletim Oficial da província interessada.

SECÇÃO IV

Da educação, ensino, investigação científica e cultura no ultramar

BASE LXXXII

I - Serão promovidos a expansão e o progresso do ensino, da educação, da cultura e da investigação científica no ultramar, tendo em vista o sentido nacional da

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nossa função colonizadora e o desenvolvimento das relações daquelas actividades com os similares da metrópole.
II - O Estado manterá, nas províncias ultramarinas, escolas primárias, complementares, médias e institutos de investigação científica e poderá criar, quando se torne aconselhável, escolas superiores e institutos de alia cultura.
O ensino oficial especialmente destinado aos indígenas é inteiramente confiado às missões católicas.
III - É livre no ultramar o estabelecimento de escolas particulares paralelas às oficiais, ficando sujeitas à fiscalização do Estado e podendo ser por ele subsidiadas, ou oficializadas para efeito de concederem diplomas quando os seus programas e categoria do respectivo pessoal docente não forem inferiores aos dos estabelecimentos oficiais similares.
Nenhuma escola particular, frequentada no todo ou na maioria por portugueses, poderá ensinar exclusiva ou predominantemente segundo programas de escolas estrangeiras.
O ensino indígena em escolas particulares deve obrigatoriamente conformar-se com os programas oficialmente aprovados.
IV - O ensino ministrado pelo Estado, pelas missões católicas e pelas escolas particulares visa, além do revigoramento físico e do aperfeiçoamento das faculdades intelectuais, à formação do carácter, do valor profissional e de todas as virtudes morais o cívicas, orientados aqueles pêlos princípios da doutrina e moral cristãs, tradicionais do País.
No ensino indígena visar-se-á especialmente a perfeita nacionalização e moralização deles e a aquisição de hábitos e aptidões de trabalho, de harmonia com os sexos, condições e conveniências das economias regionais.
V - Nas escolas frequentadas no todo ou na maioria por portugueses, não especialmente destinadas ao ensino de línguas estrangeiras, será obrigatório o uso da língua portuguesa.
É autorizado o emprego que se torne estritamente essencial dos idiomas nativos como instrumento de ensino da língua portuguesa.
VI - Nos orçamentos de cada uma das províncias ultramarinas inscrever-se-ão verbas para concessão de bolsas de estudo que facilitem a frequência na metrópole ou noutra província dos estabelecimentos de ensino que lhes faltarem.
VII - Os candidatos ao ingresso em escolas que não existam na província onde residam, para cuja frequência se exija exame de aptidão, prestarão as respectivas provas, exclusivamente escritas, nessa província. Essas provas serão remetidas u metrópole para efeitos de julgamento.

SECÇÃO V

Do serviço militar no ultramar

BASE LXXXIV

I - Nas províncias ultramarinas o serviço militar e geral e obrigatório para todos os portugueses, determinando a lei a forma de ser prestado.
II - Diplomas especiais organizarão os serviços militares no ultramar, de acordo com o princípio da unidade, com as restrições julgadas indispensáveis.

SECÇÃO VI

Das populações indígenas

BASE LXXXV

I - O Estado garante por medidas especiais, como regime de transição, a protecção e defesa dos indígenas nas províncias do Angola, Moçambique, Guiné, S. Tomé e Timor, conforme os princípios de humanidade e soberania, as disposições desta secção e as convenções internacionais. As autoridades e os tribunais impedirão e castigarão, nos termos da lei, todos os abusos contra a pessoa e bens dos indígenas.
II - O Estado estabelece instituições públicas, e promove a criação de instituições particulares, umas e outras portuguesas, em favor dos direitos dos indígenas ou para a sua assistência.
III - Haverá nos territórios ultramarinos, quando necessário e atendendo ao estado de evolução das populações, estatutos especiais que estabeleçam, sob a influência do direito público e privado português, regimes jurídicos de contemporização com os seus usos e costumes, se não forem incompatíveis com a moral, os ditames de humanidade ou o livre exercício da soberania portuguesa.

BASE LXXXVI

I - Será organizado e mantido constantemente em boa ordem o registo geral ou recenseamento das populações indígenas.
II - Nas províncias ultramarinas onde houver populações indígenas promover-se-ão gradualmente a organização e o aldeamento dessas populações para fins do assistência, de defesa e de administração pública, integrando-se nessa organização as autoridades tradicionais dos agrupamentos gentílicos, como a lei estabelecer.

BASE LXXXVII

I - O Estado constituí reservas de terreno para serem exploradas pelos indígenas, nas províncias onde os houver, de acordo com os seus usos e tradições, ao mesmo tempo que lhes reconhece a propriedade e posse individual dos seus terrenos e culturas, respeitando-as em todas as concessões por ele feitas.
II - A propriedade individual imobiliária indígena é susceptível de título e registo, mas é resolúvel na hipótese de falta de exploração pelo período que a lei determinar.
III - A propriedade individual imobiliária indígena só é transmissível entre indígenas, nos termos do direito consuetudinário gentílico.
IV - A propriedade individual imobiliária indígena não pode por qualquer forma ser obrigada, salvo para caucionar débitos contraídos perante os organismos de crédito ou assistência económica estabelecidos por lei em favor dos indígenas.

BASE LXXXVIII

I - O trabalho dos indígenas contratados para serviço do Estado ou dos corpos administrativos é remunerado.
II - São proibidos:
1.º Os regimes pelos quais o Estado se obrigue a fornecer trabalhadores indígenas a quaisquer empresas de exploração económica;
2.º Os regimes pelos quais os indígenas existentes em qualquer circunscrição territorial sejam obrigados a prestar trabalho às mesmas empresas por qualquer título.
III - O Estado sòmente pode compelir os indígenas ao trabalho em obras públicas de interesse geral da colectividade, em ocupações cujos resultados lhes pertençam, em execução de decisões judiciárias de carácter penal ou para cumprimento de obrigações fiscais.
IV - O regime do contrato de trabalho dos indígenas assenta na liberdade individual e no direito a

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justo salário e assistência, intervindo a autoridade pública somente para fiscalização. E assegurada aos indígenas liberdade de escolha do trabalho que melhor entenderem, quer de conta própria, quer de conta alheia, nas suas terras ou nas que para esse efeito estão destinadas. O Estado pode, porém, encaminhá-los para método? de trabalho por conta própria que melhorem a sua condição individual e social.

CAPÍTULO IX

Disposições finais e transitórias

SECÇÃO I

Da aplicação no ultramar das leis e mais diplomas

BASE LXXXIX

I - A publicação dos diplomas que hajam de ser aplicados às províncias ultramarinas é da competência do Ministro do Ultramar ou dos governadores respectivos, conforme se trate de diplomas das atribuições da Assembleia Nacional e do Governo Central ou dos governadores locais.
II - Todos os diplomas emanados de órgãos metropolitanos para vigorar nas províncias ultramarinas carecem de conter a menção, aposta pelo Ministro do Ultramar, de que devem ser publicados no Boletim Oficial da província ou províncias onde hajam de executar-se. Esta menção será escrita no original do diploma e assinada pelo Ministro do Ultramar.
III - A aplicação às províncias ultramarinas de um diploma já vigente na metrópole depende de portaria do Ministro do Ultramar, na qual poderão ser feitas as alterações e aditadas as normas especialmente exigidas pela ordem jurídica ou pelas condições particulares das províncias em que o diploma deva ser aplicado.
IV - A publicação no Boletim Oficial de qualquer província de disposições transcritas do Diário do Governo sem observância dos termos desta base não produzirá efeitos jurídicos.

BASE XC

I - Em cada província ultramarina será publicado um Boletim Oficial, em regra semanalmente. Nele serão insertos todos os diplomas que nela devam vigorar. Terá formato idêntico ao do Diário Ho Governo e no seu frontispício será impresso o escudo nacional.
II - Os diplomas publicados no Diário do Governa para serem cumpridos nas províncias ultramarinas só entram em. vigor nestas depois de transcritos no respectivo Boletim Oficial. Essa transcrição será obrigatòriamente feita no primeiro número do Boletim Oficial que for publicado depois da chegada do Diário do Governo.
Os referidos diplomas só entram em vigor nas províncias ultramarinas, antes da sua publicação no Boletim Oficial, quando neles se declarar que se aplicam imediatamente. Neste caso, dar-se-á cumprimento à menção aposta com a transcrição ulterior no Boletim Oficial.
Neste, como nos demais casos de urgência, o diploma publicado nu Diário do Governo será transmitido telegràficamente e logo reproduzido o seu texto no Boletim Oficial ou em suplemento a este.
III - Salvo o disposto acerca do Diário do Governo, a obrigatoriedade dos diplomas publicados no Boletim Oficial das províncias ultramarinas nunca depende da sua inserção em quaisquer outras publicações.

BASE XCI

Os diplomas emanados da metrópole, ao serem publicados nas províncias ultramarinas, manterão a data da publicação no Diário do Governo; aqueles cuja primeira publicação for feita no Boletim Oficial das províncias ultramarinas terão a data do número em que forem insertos.

BASE: XCII

As leis e mais diplomas entrarão em vigor nas províncias ultramarinas, salvo declaração especial, no prazo de cinco dias, contados da publicação no respectivo Boletim Oficial. Este prazo aplica-se na capital da província e na área do seu concelho ou da sua intendência. Para o restante território o estatuto de cada província poderá estabelecer prazos mais longos, consoante as distâncias e os meios de comunicação.

SECÇÃO II

Disposição transitória

BASE XCIII

Enquanto não forem publicados os diplomas complementares desta lei, continuarão em vigor as disposições existentes na parte em que se coadunem com os seus preceitos. Especialmente será observado o seguinte:
a) Continuam a funcionar os conselhos de governo nos termos da lei actual, até que estejam constituídos os órgãos que os substituem;
b) Continuam os governadores e demais autoridades no exercício da competência actual, até que se definam as suas atribuições;
c) Continuam em vigor os preceitos dos §§ 2.º a 4.º do artigo 208.º da Carta Orgânica do Império Colonial Português, enquanto não forem integrados noutro diploma.

Palácio de S. Bento, 6 de Novembro de 1952.

António Vicente Ferreira.
Albano Rodrigues de Oliveira.
Francisco José Vieira machado. (A orientação do legislador de 193l permitiu que as colónias resistissem vitoriosamente a uma crise gravíssima, e foi sob a legislação promulgada naquela orientação que os territórios de além-mar alcançaram o grau de prosperidade em que se encontram.
Permitiu ainda que os laços de unidade de Portugal europeu e ultramarino se estreitassem em muito mais fortes elos.
Tive a honra de servir o País como Subsecretário e como Ministro no domínio da orientação de 1931. Não me parece que seja necessário ou útil retrogradar para a orientação de 1914. A orientação que durante vinte anos presidiu aos destinos do ultramar é a melhor para a Nação. Não a devemos repudiar, antes nela devemos persistir.
O caso do Estado da índia, se justifica um regime especial, não pode impor uma mudança radical de orientação.
Não me desejo alongar nesta declaração, e por isso limito-me a deixar consignado que não posso dar o meu voto a uma orientação que, na minha maneira de ver. representa um perigoso retrocesso).
José trintão de Bettencourt.
Afonso Rodrigues Queiró, relator.

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13 DE NOVEMBRO DE 1952 999

AVISOS

Determino que cessem a partir de hoje os efeitos dos avisos convocatórios publicados nos 7.º e 25.º suplementos ao n.º 157 do Diário das Sessões, de 28 de Maio e 4 de Outubro findos, sendo o primeiro a parte que diz respeito ao Digno Procurador Afonso Rodrigues Queiró.

Palácio de S. Bento, 10 de Novembro de 1952.

O Presidente,

Marcello Caetano.

Nos termos do § 2.º do artigo 29.º do Regimento da Câmara Corporativa, convoco para se reunir no dia 13 do corrente, pelas 15 horas e 30 minutos, a secção de Finanças e economia geral e os Dignos Procuradores, agregados, Afonso de Melo Pinto Veloso, António Passos Oliveira Valença, Eduardo de Arautos e Oliveira, José do Nascimento Ferreira Dias Júnior, Luís Quartin Graça e Albano Rodrigues de Oliveira.

Palácio de S. Bento, 10 de Novembro de 1952.

O Presidente,

Marcello Caetano.

Nos termos do § 2.º do artigo 29.º do Regimento da Câmara Corporativa, convoco para se reunir no dia 13 do corrente, pelas 15 horas, a secção de Finanças e
economia geral.

Palácio de S. Bento, 10 de Novembro de 1952.

O Presidente,

Marcello Caetano.

Nos termos do § 2.º do artigo 29.º do Regimento da Câmara Corporativa, convoco para se reunir no dia 14 do corrente, pelas 15 horas, a secção de Política e economia coloniais.

Palácio de S. Bento, 10 de Novembro de 1952.

O Presidente,

Marcello Caetano.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

Página 1000

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