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DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 150 1096

E, se não fora a preocupação - neste caso bem compreensível - de referir tudo quanto no relatório exprime um contributo esclarecedor, daríamos já por encerrada a matéria desta primeira parte em que dividimos a nossa exposição. Mas convém ainda destacar uma última passagem -no n.º 16- onde aparece uma nova razão justificativa:

Não se tomam, nem seria prudente tomar, posições definitivas em matéria tão delicada. Sabe-se bem que a vida social, na riqueza e multiplicidade das suas manifestações, é por demais complexa para que seja possível atingir, sem a lição da experiência, o perfeito enquadramento corporativo das várias actividades nacionais. No propósito de não sacrificar as conveniências da vida à tentação de soluções rígidas e geométricas, atende-se já ao critério «do grande ramo de produção» no que se refere à Corporação da Pesca e Conservas.

Toca-se aqui num ponto fundamental, que é o necessário afeiçoamento das instituições corporativas à realidade da vida. E, na verdade, se há sistema de organização social que parta essencialmente dessa premissa, esse é, com certeza, o sistema corporativo, que todo se informa e estrutura numa base institucional.
Mas precisamente porque assim acontece, porque a ideia corporativa parte da multiplicidade e variedade da vida, na ordem económica ou em qualquer outra, é que mais transparente se impõe a obrigação de respeitar o que de real e permanente se contém nas estruturas económicas, tanto em relação às instituições que nelas gravitam, como aos laços estreitos de solidariedade que as prendem umas às outras.
Nestes termos, a organização corporativa pode e deve orientar ou coordenar as instituições sobre as quais incide directamente, mas sempre num sentido «natural», num sentido conforme à natureza - homens ou coisas-, sem contrariar as constantes humanas e sociais que a mesma natureza criou e faz perdurar.
Ora neste ponto parece residir exactamente o vício original da proposta de lei: violentar algumas constantes informadoras da vida económica - aqui e em toda a parte, porque se trata de «constantes» - ao impor o enquadramento das actividades económicas em determinada direcção, quando elas, natural e es-pontâneamente, já estão organizadas e vinculadas segundo a direcção oposta.
Tal violentação só se afiguraria admissível perante circunstâncias ponderosíssimas, como, por exemplo, a de ser essa orientação espontânea das instituições um verdadeiro perigo para a paz social ou para qualquer outro aspecto do bem comum da Nação. Mas, obviamente, aqui não estão em causa razões desse quilate, e tudo está até em favorecer ao máximo o estreitamento das relações de interdependência, para melhor coordenar as actividades em ordem a um progresso do rendimento social.
E, para terminar, uma ligeira referência à projectada Corporação da Pesca e Conservas, porque para ela se atendeu ao critério dos grandes ramos de produção, «no propósito de não sacrificar as conveniências da vida à tentação das soluções rígidas e geométricas». Apenas para dizer que não pareceria admissível outro qualquer enquadramento para essas actividades, desde que se lhe quisesse dar integração corporativa.
A este respeito, pois, deixa-se apenas em suspenso uma simples pergunta:
Se fosse possível integrar, sem esforço, a «pesca e conservas» em qualquer dos grandes grupos -agricultura, indústria e comércio - ter-se-ia enveredado
já, neste caso especial, pelo caminho «dos grandes ramos da produção»?

86. Entremos na segunda parte do nosso exame crítico, concentrando-nos sobre os argumentos postos em defesa do critério «da função económica» quanto às actividades agrícolas, industriais e comerciais.
Vamos seguir, a par e passo, o raciocínio desenvolvido no relatório, comentando separadamente cada grupo de afirmações mais destacadas.
O fundamento essencial e mais genérico da tese «das grandes actividades económicas» é posto por esta forma:

Ao perfilhar-se como regra o critério da função económica houve o propósito de respeitar a tradicional autonomia e a específica feição económica e social que as realidades sempre outorgaram às grandes actividades nacionais. Mormente no que toca à agricultura, não se descobre vantagem, pelo menos na fase inicial do funcionamento das corporações, em contender, através da integração na orgânica corporativa, com a sólida unidade sociológica do mundo rural, que a força da tradição, o carácter peculiar da vida do campo e dos seus problemas e a psicologia particularista dos homens da lavoura têm mantido através dos tempos sem grandes roturas (n.º 12).

Impõe-se marcar já uma primeira atitude, sem reticências, confessando abertamente que se concorda por inteiro com o quadro traçado no relatório no concernente às especialíssimas características do mundo agrícola. Também assim se visiona a vida do campo e a psicologia rural; e não podemos, pois, desprender-nos dessa realidade em toda a crítica que vai iniciar-se. Mas já não se compreende muito bem que o relatório faça dessa notória peculiaridade da agricultura o fulcro da sua tese sobre uma corporação da lavoura e que possa declarar ao mesmo tempo que «não se descobre vantagem, pelo menos na fase inicial do funcionamento das corporações, em contender ...» com essas mesmas peculiaridades.
Realmente, se o carácter muito particularista da vida campesina é razão de invocar como justificativa duma corporação da agricultura, então sê-lo-á sempre, porventura ainda mais, após o funcionamento deste organismo coordenador, que se presume dever reforçar a coesão psicológica existente. E, por isso, não se entende como, passado que fosse o período inicial do funcionamento das corporações, já pudesse ser propício «contender» com esses dados, que ainda hoje são válidos, ao menos no nosso país.
Mas, voltando à ideia central desta tese, diremos que não se nega a verdade do panorama agrícola, tal como no-la apresenta o relatório. O que se questiona, isso sim, é ser essa uma razão mais forte a sobrepor-se a outras cadeias íntimas e reais que também as próprias actividades da agricultura evidenciam quando se compartimentam em conjuntos bem individualizados e formam, para assim dizer, verdadeiros blocos que, procedendo da terra úbere, se desprendem dela e se autonomizam.
Parece, pois, que este problema particular da agricultura se pode reduzir a estas duas questões fundamentais:

1.º Pôr em confronto esses laços de horizontalidade, que ligam todos os produtores agrícolas, sem excepção, pelo lado material e pelo «espírito», com as relações muito estreitas que os vários ramos diferenciados das actividades agrícolas desenvolvem no seu interior, (...)