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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 203

ANO DE 1961 24 DE FEVEREIRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

VII LEGISLATURA

SESSÃO N.° 203, EM 23 DE FEVEREIRO

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Exmos. Srs.
Fernando Cid Oliveira Proença
António José Rodrigues Prata

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário das Sessões n.º 201.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente comunicou que recebera, da Presidência do Conselho, para cumprimento do disposto no § 3.° do artigo 109.º da Constituição, o Decreto-Lei n.° 43 500.
Foi autorizado o Sr. Deputado João Augusto Marchante a depor, como testemunha, na 1.ª vara cível da comarca de Lisboa.
O Sr. Deputado Rodrigues Prata ocupou-se da desigualdade de vencimentos dos professores de serviço eventual dos liceus e das escolas técnicas.
O Sr. Deputado Saraiva de Aguilar defendeu a restauração de algumas comarcas.
O Sr. Deputado Urgel Horta tratou da situação dos operários e empregados da Fábrica de Tabacos do Porto.

Ordem do dia. - Prosseguiu o debate acerca da proposta de lei que insere o plano de viação rural, com, uma intervenção do Sr. Deputado Calapez Garcia.
O Sr. Presidente considerou encerrado o debate na generalidade.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 16 horas e 20 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Afonso Augusto Pinto.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Aires Fernandes Martins.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto da Bocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calapez Gomes Garcia.
António Calheiros Lopes.
António Carlos dos Santos Fernandes Lima.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Cortês Lobão.
António Jorge Ferreira.
António José Rodrigues Prata.
António Maria Vasconcelos de Morais Sarmento.
António Pereira de Meireles Rocha Lacerda.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Máximo Saraiva de Aguilar.
Artur Proença Duarte.
Avelino Teixeira da Mota.
Belchior Cardoso da Costa.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Coelho.

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Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António Muñoz de Oliveira.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Henriques Jorge.
João da Assunção da Cunha Valença.
João de Brito e Cunha.
João Carlos de Sá Alves.
João Cerveira Pinto.
João Maria Porto.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Pais de Azevedo.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Dinis de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José de Freitas Soares.
José Garcia Nunes Mexia.
José Hermano Saraiva.
José Manuel da Costa.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Rodrigo Carvalho.
José Rodrigues da Silva Mendes.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Laurénio Cota Morais dos Reis.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Luís Tavares Neto Sequeira de Medeiros.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel José Archer Homem de Melo.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Tarujo de Almeida.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário de Figueiredo.
Martinho da Costa Lopes.
Paulo Cancella de Abreu.
Rogério Noel Peres Claro.
Sebastião Garcia Ramires.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Urgel Abílio Horta.
Virgílio David Pereira e Cruz.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 85 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o Diário das Sessões n. 201.

Pausa.

O Sr Presidente: - Como nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer qualquer reclamação, considero-o aprovado.
Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Da Junta de Freguesia de Alcafozes a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Franco Falcão na sessão de 21 de Fevereiro.
Do Sindicato do Pessoal dos Tabacos do Porto a pedir que seja revogado o decreto que manda encerrar, em 1962, a fábrica, de tabacos daquela cidade.

O Sr. Presidente: - Enviado pela Presidência do Conselho, para cumprimento do disposto no § 3.° do artigo 109.° da Constituição, está na Mesa o Diário do Governo n.° 38. 1.ª série, de 14 do corrente, que insere o Decreto-Lei n.° 43 505, que actualiza as disposições de natureza sanitária a que devem obedecer a instalação e o funcionamento de parques de turismo ou campismo, casas de abrigo ou outros locais em que se pratique o campismo e mantém em vigor, na parte que não for contrariada pelo presente diploma ou pelo Decreto n.° 43 506, a Portaria n.° 16 334.
Está também na Mesa um ofício do juiz de direito da 1.ª vara cível da comarca de Lisboa pedindo autorização à Câmara para que o Sr. Deputado João Augusto Marchante possa depor num julgamento naquele tribunal. O Sr. Deputado João Augusto Marchante não vê qualquer inconveniente para a sua actuação parlamentar em que a referida autorização seja concedida.

Consultada a Assembleia, foi concedida autorização.

Pausa.

Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Rodrigues Prata.

O Sr. Rodrigues Prata: - Sr. Presidente: na sessão de 22 de Janeiro de 1958 - são passados mais de três anos - usei da palavra nesta Assembleia para focar a injustiça flagrante da diferença de tratamento que a lei impunha aos professores de serviço eventual do ensino secundário, conforme actuassem no ensino liceal ou no ensino técnico.
Julguei então ter demonstrado a situação de desfavor em que se encontravam os professores de «serviço eventual do ensino técnico em relação aos do ensino liceal. Todavia, passaram-se três anos e é com justificadas apreensões que sou obrigado a afirmar que as coisas não estão hoje como então, pela razão singela de que estão ainda piores.
Afirmei que para concorrer a professor de serviço eventual, quer para os liceus, quer para as escolas de ensino técnico, era necessário que o candidato possuísse uma licenciatura: a adequada à regência de determinado grupo de disciplinas.
Afirmei que os professores de serviço eventual em qualquer dos ramos de ensino - liceal ou técnico - eram obrigados a prestação de igual número de horas desserviço semanal. Pareceu-me de justiça realçar que o professorado do ensino técnico é obrigado, normalmente, a fazer determinado número de horas de serviço nocturno, serviço mais penoso que o normal, isto é, o diurno.
Afirmei que para iguais exigências literárias e pedagógicas, para igual regime de horas de trabalho semanais, para iguais obrigações e responsabilidades, não se poderia compreender que se atribuíssem vencimentos diferentes. Contudo era isso que se verificava; os pro-

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fessores de serviço eventual auferiam, nos liceus 3200$ e nas escolas de ensino técnico 2800$.
Mais afirmei que um grande número de candidatos a professores de serviço eventual requeriam a sua nomeação, simultaneamente, à Direcção-Geral do Ensino Liceal e à Direcção-Geral do Ensino Técnico Profissional.
Posso inclusivamente afirmar que, no sentido de evitar que um candidato fosse colocado, no mesmo dia, por duas Direcções-Gerais do mesmo Ministério, em dois locais diferentes, o que já aconteceu, as colocações do pessoal feitas por uma das Direcções-Gerais são comunicadas à outra, que, assim, exclui do seu concurso os candidatos já nomeados. Tal actuação confirma totalmente a tese que defendo: os candidatos a professores de serviço eventual no ensino secundário são os mesmos, iguais em tudo no que se refere a exigências legais, quer sirvam no ensino liceal, quer no ensino técnico.
Todavia, se em 22 de Janeiro de 1958 afirmei que não entendia por que razão os professores colocados nos liceus auferiam 3200$, enquanto os seus colegas das escolas técnicas recebiam 2800$ mensais, menos percebo ainda que após os reajustamentos de Dezembro de 1959 a diferença de vencimentos mais se acentuasse.

O Sr. Peres Claro: - Muito bem!

O Orador: - Actualmente os professores de serviço eventual dos liceus auferem 4000$ mensais; os professores de igual categoria do ensino técnico são remunerados com 3400$!
Mas porquê, Sr. Presidente?
Por que razão se não emendam os erros? Aceito que existam anomalias de classificação, por força dos emaranhados da lei, conducentes a situações injustas, mas recuso-me a aceitar, por ilógica, a atitude da Administração não emendando os erros que lhe são apontados, permitindo, com a sua soberana e gelada indiferença, traduzida numa inércia desmoralizadora, a manutenção de situações incompreensíveis, por manifestamente injustas.
Não, Sr. Presidente, não se compreende! Não se compreende porque é inaceitável.
A Administração reconhece que o progresso do País depende do progresso que se obtenha não só no desenvolvimento dos valores humanos, mas especificamente na preparação técnica profissional.
O Governo reconhece a necessidade de fomentar, racional e tecnicamente, a indústria nacional, atribuindo verbas volumosas ao ensino técnico. Abriu novas escolas, reapetrechou oficinas e laboratórios, equipou as novas instalações, realizou e continua a realizar uma obra digna e do maior alcance.
Não regateio os justos e merecidos louvores ao Ministério da Educação Nacional quando é caso disso, mas não julgo menos construtiva a acção de crítica quando oportuna e bem intencionada.
Não podemos esquecer que os elementos fundamentais para um serviço eficiente são três: escolas, professores e alunos.
É do domínio público que os quadros dos estabelecimentos de ensino técnico são exíguos e o recurso ao pessoal de serviço eventual é uma imperiosa necessidade.
Afirmei que os professores de serviço eventual prestaram, prestam e continuarão a prestar serviços inestimáveis e que o seu concurso é imprescindível.
Por que razão se minimiza o seu esforço, o seu devotamento, a sua boa vontade, pagando-lhes menos que aos seus colegas do ensino liceal ?
Por que razão o Ministério da Educação Nacional permanece, teimosa e incompreensivelmente, num indiferentismo que quase atinge a ferocidade, persistindo em tratar como a filhos» os professores de serviço eventual do ensino liceal, tratando como «enteados» os mesmos ou outros quando ao serviço do ensino técnico?
Creio bem que ao Ministério das Finanças se poderiam atribuir grandes responsabilidades na resolução deste problema, mas sei que elas recaem, na sua totalidade, no Ministério da Educação Nacional.
Sr. Presidente: em próxima intervenção analisarei em detalhe a situação de desfavor dos mestres do ensino técnico.
Por hoje terminarei, afirmando que o prestígio do ensino técnico profissional, os incontáveis serviços que este prestou à Nação e os muitos que ainda, dele se esperam, a fundamental missão deste ramo do ensino secundário no desenvolvimento industrial em curso, a noção de justiça que nos obriga a tratar com igualdade quem essa igualdade merece, exigem e impõem que os vencimentos. dos professores d» serviço .eventual do ensino secundário - liceal e técnico - sejam igualados. como é justo e desejável para quem tão esperançadamente o vem servindo.
Assim o espero, Sr. Presidente, assim o esperam todos. Aqui fica o meu apelo aos Ministérios das Finanças e da Educação Nacional, confiante na sua elevada compreensão.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Saraiva Aguilar: - Sr. Presidente: as minhas primeiras palavras, que a consciência me impõe, são de respeito e de louvor pela acção inteligente e profícua desenvolvida por S. Ex.ª o Ministro da Justiça, Prof. Doutor Antunes Varela.
Dentro dessa acção de S. Ex.ª ressalta, com extraordinário relevo, a preocupação dominante de amparai-os infelizes desprotegidos da fortuna e reflecte, em larga medida, uma. profunda intenção humanitária e cristã, através da dispendiosa política de novas construções prisionais, assistência médica social e religiosa, organização de trabalho prisional, criação de institutos substitutivos de pena ou da sua prorrogação, liberdade condicional, etc.
Todos estes problemas têm preocupado S. Ex.ª e a eles tem dispensado o melhor do seu labor.
É graças à inteligência, e dedicação destes prestimosos colaboradores, que vivem profundamente os problemas do seu Ministério, que o Chefe do Governo tem conseguido manter a linha de rumo mais conveniente aos supremos interesses da Nação, conduzindo-a incólume através das terríveis provações a que ultimamente temos sido sujeitos na Assembleia das Nações Unidas, no infame caso do atentado ao barco Santa Maria e nos criminosos acontecimentos da nossa província ultramarina de Angola.
Mas passada a tormenta, findas que sejam estas hostilidades, a Nação Portuguesa, com o seu extraordinário comandante, retomará a sua viagem, continuará o seu esforço e a preocupação contínua da vida quotidiana da Nação no sentido do progresso social e recuperação da sua economia.
E de novo esse providencial Chefe do Governo, Salazar, se eleva na defesa intransigente dos direitos sagrados e inalienáveis de Portugal.

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À luz perene da história, a soberania portuguesa tem sido sempre defendida, desde longos séculos e em elevado plano, por grandes homens, que sempre souberam encarnar o verdadeiro sentimento do amor à Pátria.
A fértil imaginação dos países comunistas e seus sequazes há-de necessariamente terminar por ser vencida pela verdade clara e indestrutível da vida vivida nas nossas províncias do ultramar por todos os portugueses, que só conhecem uma bandeira, a bandeira verde-rubra de Portugal.
Come vão longe os pródromos da Revolução Nacional, as horas de fé e de esperança, os dias turvos e os tempos de incerteza, repleta de dúvidas, ansiedades, indecisões e mal-estar das populações.
Tantas coisas novas que temos vivido, certezas firmes, realidades palpáveis que a Nação vai sentindo dia a dia, ano a ano, que aqueles que têm de vida menos de meio século mal se recordam já desse tempo, das nossas faltas, da nossa instabilidade governativa e da insegurança económica, tão precária nesse início da República.
Veio o 28 de Maio e com ele certas medidas de austeridade governativa que se impunham a todos os sectores da vida nacional.
Entre essas medidas de austeridade económica surgiu o Decreto n.° 13 917, de Julho de 1927, que extinguiu 37 comarcas em outros tantos concelhos do País.
Não pretendo discutir ou negar a necessidade na oportunidade da publicação do Decreto n.º 13 917, bem assim as razões que levaram o Governo da Nação a tal medida; isso considera-se ultrapassado, mas uma coisa é certa e posso afirmá-lo desassombradamente: é que na presente conjuntura considero necessário e urgente um estudo e revisão cuidadosa do problema, de maneira a restaurar essas comarcas extintas, criar ainda novas cornareis, tal é a necessidade hoje reconhecida unanimemente.
Apesar do pouco tempo de que disponho para tratar deste assunto antes da ordem do dia, proponho-me trazer a esta Assembleia o tão célebre caso da extinção das comarcas judiciais em 9 de Julho de 1927 pelo Decreto n.º 13 917.
Vão decorridos 38 longos anos e as feridas provocadas por esse diploma nos 37 concelhos atingidos, o descontentamento e a mágoa persistem na alma popular, cacada profundamente no seu espírito simples e bairrista, no seu coração bondoso, sincero e leal; esse povo, sempre presente e confiante no seu guia providencial, espera que, conhecida a verdade, proclamada a necessidade da revisão deste problema, finalmente lhe seja feita justiça, restaurando as suas comarcas.
Os milhares de habitantes desses 37 concelhos, gente de boa fé, continuam esperando, sempre confiantes, a cabal satisfação do seu perene desejo.
Sinto-me contente e feliz por ter a honra, de falar em nome deles, em nome dessa gente humilde, justa e bondosa envolvida, no seu anonimato, ocupada na vida árdua do trabalho do campo, que conserva a sua fé, e apesar da perda da sua comarca, que sem dúvida feriu mortalmente o seu amor bairrista, apesar de tudo, vive a sua alegria e gratidão para com o Governo ao assistir às inaugurações de tantos melhoramentos nas nossas vilas e aldeias.
A totalidade das comarcas extintas abrange concelhos de vida rural que vivem da agricultura quase exclusivamente.
Já Pio XII chamou a agricultura e a vida rural à primeira linha dos problemas da sociedade contemporânea, baseado no espírito de justiça para com o próprio meio rural, postergado em benefício da grande indústria e dos meios urbanos, no necessário equilíbrio dos diversos sectores da actividade nacional e na defesa da própria sociedade rural, depositária de valores de civilização que importa manter.
O problema do êxodo rural, que tanto nos preocupa actualmente, conduz sem dúvida à desagregação da estrutura humana e social da sua gente que vive do amanho da terra.
Daí a necessidade que o Governo sentiu, e muito bem, de levar a esses meios rurais condições de vida capazes de os atrair, ajudar as regiões retardadas através de reformas agrárias actualizadas, um melhor agrupamento regional de economias complementares, numa palavra, numa melhor distribuição de forças produtivas no solo nacional.
A maior parte dos julgados têm hoje movimento justificativo para serem transformados em comarcas de 3.ª classe, e de entre eles focarei um julgado do distrito da Guarda, e mais pormenorizadamente o do concelho de Vila Nova de Foz Côa, e farei um ligeiro estudo comparativo com alguns julgados e comarcas judiciais de 3.ª classe.
Pela simples leitura dos elementos estatísticos que me foram fornecidos pelos departamentos do Ministério da Justiça, a quem dirijo os meus agradecimentos, verifica-se, na verdade, um grande aumento de serviço na maior parte ou quase totalidade dos tribunais comuns.
São diversas as razões de carácter geral que explicam esse aumento, e citarei algumas que considero mais importantes, como sejam: a intensificação das relações comerciais, a maior repartição da riqueza entre os cidadãos, o surto de progresso material que se tem verificado por todo o País, mesmo nas zonas mais distantes dos grandes centros, em especial nas regiões mais beneficiadas pela industrialização, o maior nivelamento de riquezas e o consequente aumento de nível de vida dos aglomerados populacionais.
O aperfeiçoamento de vários serviços de prevenção e repressão ao crime, a melhor eficiência das nossas instituições judiciais, melhoria essa que se vem sentindo no funcionamento dos órgãos de administração da justiça, leva sem dúvida o recurso dos particulares aos tribunais.
Daqui resulta o aumento de serviço nos tribunais, alguns sobrecarregados com excesso de serviço, especialmente os dos grandes centros urbanos, para os quais houve que adoptar medidas de emergência.
Necessàriamente que esse aumento de serviço verificado nos tribunais também se estendeu, concomitantemente aos julgados, a maior parte destes com movimento justificativo da criação de uma comarca de 3.ª classe.
Está na preocupação do Governo a boa administração da justiça, através da pasta respectiva, confiada à inteligência esclarecida do Sr. Prof. Doutor Antunes Varela, que não desconhece esse aumento constante dos serviços dos tribunais; a ele se tem referido S. Ex.ª nos seus discursos, nem ignora o magno problema que se vai criando nas comarcas e nos julgados a que me referi, apesar do aumento do pessoal dos seus quadros, actualizados com vários diplomas.
A este assunto são feitas considerações no relatório do Decreto-Lei n.° 37 047, de Setembro de 1948, onde se lê:

Portugal renovou-se nos últimos vinte anos. A população aumentou largamente e à crónica crise financeira e económica do País sucedeu uma relativa prosperidade. A actividade do Estado no fomento da riqueza nacional produziu os seus primeiros frutos. Estes sintomas, reveladores de pro-

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fundas mudanças na vida nacional, determinaram a expansão dos serviços públicos essenciais.
É axiomático que uma maior população em condições de vida económica mais elevada acarreta, com a maior complexidade da vida social e o desenvolvimento dos meios de produção e distribuição da riqueza, um necessário aumento da jurisdição contenciosa.

Também este aspecto do problema foi focado no relatório que acompanha o Decreto-Lei n.° 39 758, de Agosto de 1954, e onde se lêem estas considerações:

O movimento processual, acompanhando o desenvolvimento do País, duplicou nas últimas décadas. Este aumento é sobretudo sensível nas grandes cidades. Paulatinamente se tem procurado acudir, dentro dos limites consentidos pelo ingresso na carreira judicial de novos magistrados, aos casos mais urgentes, desdobrando em dois juízos alguns tribunais de comarca ou alargando o quadro dos juizes nas comarcas ...

Para simplificação c clareza do meu estudo, com os elementos e dados estatísticos que me foram fornecidos pelo Ministério da Justiça, elaborei uns quadros simples, mas suficientemente elucidativos, em que estabeleço a comparação do movimento de alguns julgados com algumas comarcas de 3.ª classe e com algumas comarcas com e sem julgados anexados.

[Ver Tabela na Imagem]

Nota. - São julgados municipais: Vila Nova de Foz Côa, Carrazeda de Ansiães e Armamar; comarcas com julgados: Meda, Figueira de Castelo Rodrigo e Vila Flor; comarcas sem julgados: Tabuaço, Paredes de Coura, Fronteira, Melgaço, Valença e Vimioso.

Ordem decrescente do movimento

Crime:

1.° Vimioso.
2.° Melgaço.
3.° Vila Nova de Foz Côa.
4.° Carrazeda de Ansiães.
5.° Fronteira.
6.° Melgaço.
7.° Meda.
8.° Vila Flor.
9.° Armamar.
10.° Tabuaço.
11.° Paredes de Coura.

Cível:

1.º Fronteira.
2~.º Melgaço.
3.º Valença.
4.° Paredes de Coura.
5.° Figueira de Castelo Rodrigo.
6.° Meda.
7.° Vila Nova de Foz Côa.
8.° Vimioso.
9.° Carrazeda de Ansiães.
10.° Armamar.
11.° Vila Flor.

Movimento dos julgados

Crime:

1.º Praia da Vitória.
2.º Lousada.
3.° Amares.
4.° Grândola.
5.° Montemor-o-Velho.
6.° Almeida.
7.° Vila Nova de Foz Côa.

Examinando os quadros estatísticos juntos, tiram-se as seguintes conclusões:
1.° Entre onze comarcas e julgados municipais, Vila Nova de Foz Côa apresenta-se em Í3.° lugar em movimento crime;
2.° Em 4.° lugar encontra-se outro julgado, o de Carrazeda de Ansiães;
3.° A comarca a que pertence o julgado municipal de Vila Nova de Foz Côa encontra-se em 7.° lugar e a comarca a que pertence o julgado municipal de Carrazeda de Ansiães fica em 8.° lugar;
4.° Vê-se ainda que depois desses dois julgados se encontram, com menor movimento do que eles, as comarcas de Fronteira, Melgaço, Meda, Vila Flor, Tabuaço e Paredes de Coura;
5.° Quanto ao movimento cível, o julgado de Vila Nova de Foz Côa fica em 7.º lugar e o de Carrazeda de Ansiães em 9.° lugar;
6.° Deve notar-se que quanto ao movimento cível os números são um pouco ilusórios, pois é bem sabido que há papéis cíveis incluídos naqueles números que são distribuídos na comarca, embora respeitem a diligências praticadas nos julgados;
7.° De resto, o que mais importa é o movimento crime para justificar a criação da comarca, sabido como é que são tais processos os que mais pessoas arrastam aos tribunais;
8.° Mas, mesmo que assim não fosse, as divergências que se notam na ordem dos julgados e comarcas entre o crime e o cível conduziriam à conclusão de nas comarcas, por mercê de aí se encontrarem magistrados de carreira, se conseguir que o crime não aumentasse no mesmo ritmo dos julgados;
9.° E assim justificada a criação da comarca (e, no caso focado, em especial o julgado de Vila Nova de Foz Côa), até porque se não compreenderia que, tendo ele mais movimento do que a comarca a que pertence (Meda) e que as comarcas a que o seu concelho cedeu freguesias (Figueira de Castelo Rodrigo, S. João da Pesqueira), continuasse a ser apenas julgado municipal;
10.° Por mercê de criação de novas comarcas verificar-se-ia um maior afluxo de interessados aos tribunais, constatando-se que muitos indivíduos se abstêm de recorrer a eles em virtude de terem de fazer grandes deslocações;
11.° Presentemente já haveria possibilidade de se conseguirem magistrados que preenchessem os lugares a criar com as novas comarcas;
12.° Com isso conseguir-se-ia ainda que muitos licenciados em Direito sé fixassem nas sedes das nossas

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comarcas, com o que se resolveria o problema do congestionamento de advogados em várias comarcas;
13.° A importância do concelho de Vila Nova de Foz Côa pode aquilatar-se pela sua grande área, de 38 104 ha, com população de cerca de 18 000 habitantes, sendo a sede 5000, situada num vasto planalto limitado pelos rios Douro e Côa a norte e nascente e pelo vale fértil da Veiga, prolongamento dos ricos e produtivos vales de Chaves e da Vilariça, a sul e poente.
A sede do concelho é atravessada pela estrada nacional n.° 102 e servida pela estação de 1.ª classe do Focinho, dos caminhos de ferro do Douro, que lhe está a 6 km de distância.
Possui carreiras diárias de camionetas, que se dirigem de manhã no sentido de Foz Côa, com regresso à tarde, e a ligam aos concelhos vizinhos de Meda e S. João da Pesqueira e a Vila Franca das Naves e Celorico da Beira, na linha dos caminhos de ferro da Beira Alta.
Com muito comércio e com a única indústria de esteios de lousa para vinha existente no País, onde trabalhem cerca de 700 pessoas diariamente.
A sua igreja matriz, estilo manuelino, rica de traça, com paramentos de grande valor, e o seu pelourinho, também manuelino puro, são considerados monumentos nacionais.
As repartições do tribunal sofreram recentemente obras de reparação e adaptação, dispondo presentemente de boas instalações, com ampla sala de audiências, de secretaria e gabinetes do juiz e delegado.
Termino, Sr. Presidente, e em nome de todos os concelhos atingidos pela extinção das comarcas, submetendo ao Governo da Nação o pedido de estudo cuidadoso do problema, com vista à criação de novas comarcas e à justa reparação a tantos concelhos tão duramente atingidos.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Urgel Horta: - Sr. Presidente: foi na sessão da Assembleia Nacional de 12 de Janeiro do ano findo que, pela última vez, tive ocasião de me ocupar do problema suscitado entre a Companhia Portuguesa de Tabacos - sociedade arrendatária das antigas fábricas do Esta Io, ao abrigo do Decreto-Lei n.° 41 386, de 22 de Novembro de 1957 - e o pessoal da sua fábrica do Porto.
O problema em questão, que é complexo e delicado em todos os aspectos em que se observe, girava e envolvia, dentro de determinado período, a aplicação de uma ordem emanada do conselho de administração da Companhia Portuguesa de Tabacos, consistindo no licenciamento do pessoal tabaqueiro pertencente à fábrica de Porto na razão de dez unidades mensais, com início em 1 de Abril de 1959.
Sustada semelhante medida, cujos prejuízos são fáceis de calcular, todo o pessoal exultou de contentamento, por ver assim afastado o espectro da fome e da miséria, que parecia aproximar-se.
Uma nova aurora raiava na sua imaginação, esquecidos já os momentos de sério alarme e profunda inquietação que durante longos meses haviam dominado o seu espírito.
1962, data marcada para encerramento da fábrica, vinha ainda longe e a fé não os abandonaria, mantendo-se bem viva a esperança da existência de uma plataforma resolutória do seu problema baseada no sentimento da justiça que lhes assistia, a fim de não perderei n o pão necessário à vida das suas famílias.
E no meio da incerteza o pessoal mantinha st serenidade de sempre, aliada à confiança depositada no conselho de administração da Companhia Portuguesa de Tabacos, onde há tantos anos exercia a sua actividade.
Sr. Presidente: perante V. Ex.ª tive então de aqui manifestar o meu vivo agradecimento ao Governo, e muito especialmente ao Sr. Ministro da Presidência e ao Sr. Ministro das Finanças, pelo interesse e atenção que haviam manifestado em face de problema de tanta acuidade, nesse agradecimento envolvendo o conselho de administração da Companhia, pela atitude tomada, digna do mais franco elogio, na revogação da ordem de licenciamento.
Mas, Sr. Presidente, como na vida existe, as mais das vezes, um encadeamento contínuo de dificuldades, algumas bem fáceis de vencer e outras quase insuperáveis, eu terminava a pequena intervenção realizada em Janeiro de 1960 afirmando: «Resolvido um problema, num encadeamento aceitável e compreensível, outros surgem pedindo solução».
Na verdade, Sr. Presidente, o litígio mantido entre a Companhia Portuguesa de Tabacos e o seu pessoal do Porto está ainda longe de uma solução que possa garantir o futuro dos seus operários e, concomitantemente, o das suas famílias.
Em variadas intervenções por mim realizadas na Assembleia Nacional, a primeira das quais em 11 de Março de 1909, a segunda em 18 do mesmo mês, a terceira em 5 de Junho e a quarta em 30 de Junho do mesmo ano, desenvolvidamente tratei, nos seus múltiplos aspectos, o assunto em questão, demonstrando à evidência a razão que assistia aos humildes empregados da Companhia, seus fiéis e dedicados servidores durante uma longa série de anos, agora ameaçados na sua existência por uma medida que a partir de 1962 os atirará para o desemprego, com todo o seu cortejo de graves dificuldades e perigosas consequências.
Não pretendo neste instante reeditar tudo quanto afirmei perante a Câmara, mas ouso repetir, dentro do espírito da verdade que me anima, que o encerramento da Fábrica Portuense de Tabacos, e o consequente afastamento da sua actividade do numeroso pessoal que ali se emprega, cria uma situação revestida de extraordinária delicadeza para quantos um dia julgaram que a modernização da maquinaria fabril não seria caminho aberto às escabrosidades de um lar, onde as carências aniquilam e abastardam os mais fortes caracteres.
Compreendemos bem o que vale e o que representa a actualização de uma indústria, seja qual for o seu instrumento. É absolutamente honesto e justificado o anseio dos lucros como justa remuneração do capital investido no desenvolvimento actualizado de uma empresa; mas não é aceitável, não é admissível, semelhante acerto de coutas quando não são encarados com o merecido e devido respeito os encargos devidos ao pessoal que nestas empresas trabalhava à data inicial de uma modernização imposta pelas circunstâncias da vida de hoje, onde os humildes não podem, nem devem, ser esquecidos, como é lema seguido pelo Estado que nos governa.
O caso presente acusa aspectos de uma delicadeza que urge considerar com a maior atenção, visto no problema estar envolvido o próprio Estado, dono das fábricas de tabacos, arrendadas por força do Decreto-Lei n.° 41 385, de 22 de Novembro de 1957, onde, sob a rubrica «Garantias do pessoal operário e não operário», se afirma:

Art. 17.° Ao pessoal da indústria dos tabacos é aplicável a legislação do trabalho, da previdência

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social e do abono de família relativa às actividades industriais e comerciais.

§ 1.° Na admissão pelas empresas do pessoal para as fábricas, escritórios e armazéns será garantida prioridade para o que tenha estado ao serviço das sociedades que terminam a sua actividade em 31 de Dezembro de 1957, ao qual ficam assegurados todos os direitos resultantes do tempo de trabalho a estas prestado.
§ 2.° Os actuais reformados continuam a perceber os subsídios que lhes vêm sendo atribuídos.

Este artigo nos seus parágrafos encerra a garantia dada ao pessoal antigo na conservação das regalias que lhe eram asseguradas pelo Decreto n.° 13 857, de 11 de Maio de 1927; mas perante o encerramento da fábrica portuense, cuja extinção parece ser um facto, o direito outorgado no § 1.° seria letra morta, pois a fábrica que substituirá as extintas terá a sua localização em Lisboa, onde está a ser construída, e o pessoal do Porto irá para forçado licenciamento, que é o desemprego, tão injusto como combatido nos seus perniciosos efeitos. Reveste-se de uma premente necessidade evitar semelhante facto, visto a idade adiantada da grande maioria dos trabalhadores da indústria não lhes dar possibilidades de obter emprego em ramo diferente da actividade que praticavam.
Por outro lado, a obtenção da reforma toma aspecto de reconhecida impossibilidade, visto a quase totalidade dos profissionais tabaqueiros não poder atingir a idade legal exigida para a aposentação.
E outro motivo existe, além de muitos, que obriga a rever a situação tão embaraçosa para quantos labutam nessa indústria: a sua natural e bem justificada inadaptação a uma actividade completam ente diferente da que sempre praticaram.
Todo este somatório de razões, e muitas outras que me dispenso de apresentar, demonstra, com toda a clareza, a necessidade existente numa revisão acertada e justa do problema, que a alguns milhares de pessoas acarreta prejuízos e dificuldades, que não podem bem compreender ou avaliar os que possuem vida despreocupada e tranquila, esquecendo a triste e dolorosa miséria em que irão mergulhar os lares de muitos e honrados chefes de família, que, no exercício do seu esforçado labor, sempre cumpriram o seu dever.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas nós, Sr. Presidente, que somos detentores de um espírito dominado pela fé e pela crença em Deus, temos confiança, nos homens, que, irmanados em sentimentos iguais aos nossos, saberão encarar o problema dentro da realidade e da objectividade indispensável à sua. melhor e mais justa solução.
Hoje, como sempre, confiamos na acção do Governo, com alta projecção na vida do povo português, sempre aprestado e atento na defesa dos direitos e das obrigações que a todos cabem.
Estamos absolutamente certos, inteiramente convencidos, de que o Sr. Ministro das Finanças, estadista de nobres qualidades e altas virtudes, não esquece o problema que aflige a gente humilde que vive à sombra de uma indústria onde exerce actividade compatível com a profissão que há largos anos abraçou.
Há que confiar na sua inteligente e meritória acção, bem guiada na merecida defesa daqueles que, dentro da verdade, reclamam a justiça que lhe assiste.
Sr. Presidente: na acção do Sr. Ministro das Finanças, em franca colaboração com o conselho de administração da Companhia Portuguesa de Tabacos, reside a chave solucionatória de tão ingente problema, envolvendo prementes razões de ordem social e humanitária.
É o conselho de administração da Companhia Portuguesa de Tabacos constituído por personalidades de alta envergadura, que ao regime têm prestado assinalados serviços, serviços que se desdobram em realizações de extraordinário vulto no campo assistencial.
Dentro da verdade que as minhas palavras encerram, espero que o Governo e a Companhia, em perfeito acordo, saibam dar solução conveniente e própria ao pedido que lhe dirigem ordeiramente homens que sempre souberam manter o culto do trabalho honrado e digno, observando e praticando a doutrina, que orienta a humanidade nos desígnios que o Evangelho encerra.

E,- se assim suceder, ter-se-á realizado acto de extraordinário benefício para com uma classe sempre pronta a trabalhar pelo progresso e pelo bem da Nação.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei relativa ao plano de viação rural.
Tem a palavra o Sr. Deputado Calapez Garcia.

O Sr. Calapez Garcia: - Sr. Presidente: a imerecida honra de usar da palavra, nesta tribuna, leva-me a dirigir cumprimentos respeitosos à pessoa altamente prestigiada de V. Ex.ª
Cumpro um dever, mas cumpro-o desvanecido e jubiloso pela oportunidade de poder publicamente transmitir a V. Ex.ª toda a minha admiração, admiração e agradecimento pela maneira, compreensiva e afável como V. Ex.ª trata todos os membros desta Câmara, admiração pelas vossas elevadas qualidades intelectuais e, ainda, a que resulta do exemplo de portuguesismo em todas as horas dado por V. Ex.ª no exercício das suas altas funções.
Digne-se aceitar, Sr. Presidente, com as minhas homenagens, o tributo respeitoso do meu maior apreço.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: ao trazer o meu humilde contributo para o estudo da proposta de lei em discussão, não posso, como parcela, que são - por nascimento e por habitat,- desse meio rural visado, deixar de louvar o departamento de Estado - que o elaborou, pretendendo efectivar, assim, mais um anseio das regiões rurais do País. E quando em frente desse departamento se encontra um homem com a grandeza moral, a competência técnica e o espírito de servir de S. Ex.ª o Ministro das Obras Públicas, engenheiro Arantes e Oliveira, todos nós temos a certeza, da rápida concretização desse desígnio. Deus lhe dê muitos anos de vida e a nós a sua continuidade nesse Ministério.
Aos agradecimentos que todo o País, muito sinceramente, lhe prodigaliza, quero juntar, neste momento, os do distrito de Beja que aqui represento, porque S. Ex.ª soube avaliar com justeza o seu condicionalismo económico-social e preconizar as medidas necessárias para a sua radical transformação. Só lamentamos as divergências, estranhas ao Sr. Ministro, que têm demorado a execução de planeamentos de âmbito regional, mas de verdadeiro interesse nacional!

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Sr. Presidente: depois de esta proposta de lei ter sido tão brilhantemente comentada pelos ilustres oradores que me antecederam, e após o douto parecer da Câmara Corporativa, nada mais me atreveria a acrescentar, se não fora considerar minha obrigação dar o mais sincero aplauso a este diploma, que reputo primacial no desenvolvimento do meio rural metropolitano.
Será de inteira, justiça que afirme o nosso júbilo logo na apreciação do preâmbulo. Na verdade, a antecipação prevista quanto à realização do programa de viação rural resolverá uma dificuldade, uma grande dificuldade, porque realmente não se vê como se conseguiria prender, à zona onde nasceram, populações» que por mais dezoito anos ficariam privadas de entrar em contacto com regiões de maior civilização, sem garantias de colocação, em nível, económico compensador, dos seus produtos e sem fruírem a mais pequena parcela das comodidades actuais», continuando em deprimente isolamento que nem lhes garante a mais elementar assistência na doença, na invalidez e até na morte.
Quem, como eu, assiste dia a dia à luta heróica destes homens obscuros que acarretam a dorso de muares, ou no seu, tudo o que necessitam para a sua sobrevivência, não contando o trabalho pelo seu valor - horas perdidas de trabalho, em andanças por veredas e atalhos - não pode deixar de regozijar-se com a publicação de um diploma atinente à resolução de alguns dos seus problemas. Acontece, até, que este isolamento pesa tanto no espírito dos que têm deficientes comunicações, em épocas de chuva impraticáveis para qualquer meio de transporte, que o fatalismo psicológico do «medo de a doença vir e o remédio não chegar» preside a todos os actos da sua vida. Claro que tal clima é mais um factor a favorecer o abandono do campo pela cidade, triste abandono, que exige aplicação rápida de todos os meios profilácticos aconselhados. E estes são, sem dúvida, os que puderem dar às populações, no ambiente em que nasceram os meios necessários ao seu progresso económico e à sua tranquilidade espiritual.
Embora reconheçamos as dificuldades económicas, que poderão obstar à rápida e eficiente resolução deste problema da viação rural, desejamos, tal como a Câmara Corporativa, que «o menor prazo possível» contido na base I seja, realmente, um breve prazo.
Em referência à alínea II do § 1 da base I, quero chamar à atenção do legislador para o conceito de «povoação com mais de 100 habitantes», nela incluído. Na realidade, nas nossas zonas rurais especialmente nas de orografia mais acentuada, aglomerados populacionais importantes não formam, propriamente, uma povoação, no seu conceito clássico de casas e arruamentos. Dispõem-se, sim, ao longo de um vale, condicionados à riqueza que aquele lhes confere, a aforamentos ou, ainda, a actividades económicas locais, formando núcleos populacionais, na ordem das centenas e, às vezes, até de um milhar de habitantes.
Não nos parece justo sacrificar estas zonas no conceito clássico e por isso nos permitimos fazer este reparo, que julgamos de acordo com o espírito da proposta de lei em discussão.
Quanto à base II da proposta, parece-nos insuficiente uma classificação de estradas e caminhos municipais alheada de futuras realidades previstas nos planos de fomento. Quero referir-me às redes de estradas nas zonas destinadas a repovoamento florestal ou já arborizadas. Muitas dessas zonas não são, nem serão, pertença do Estado e, por essa razão, não podem os serviços florestais solucionar os problemas da suas redes rodoviárias. Não podemos compreender como se poderá efectuar um repovoamento florestal, se não assegurarmos, ab initio, um acesso fácil a essas regiões, que garanta a rentabilidade dos capitais investidas, quer pelo Estado, quer pelos particulares, nessa tão instante como importante fonte de riqueza nacional.
Como flagrante exemplo do que refiro, recordo, por melhor conhecimento loca], as zonas das bacias hidrográficas do Mira e do Guadiana, e, bem assim, as restantes do maciço montanhoso que separa as províncias do Baixo Alentejo e Algarve.
Basta olhar para qualquer mapa rodoviário para sentirmos uma dolorosa sensação de carência que, infelizmente, corresponda à confrangedora realidade. São milhares e milhares de hectares, alguns cobertos por montados e outros destinados à futura arborização, sem disporem da mais elementar via de comunicação. Pergunto: como poderá efectuar-se este repovoamento em ritmo aceitável, se estas regiões não forem dotadas de redes rodoviárias eficientes para o transporte de produtos de tão difícil manuseamento. Como poderão os proprietários colaborar activamente no plano, sã aquilo que habitualmente produzem sofre a desvalorizarão devida a esta fatalidade geográfica?
Notório como é o interesse público do problema, parece lógico dever atribuir-se às autarquias locais a sua resolução. Mas como de antemão sabemos da fragilidade dos seus recursos económicos, só do Estado poderá vir, nesse aspecto, a solução de tão magno problema; por isso, e dada a boa vontade expressa, em toda a proposta que estamos a apreciar, parece-nos mais que justificada a inclusão destas redes rodoviárias nos futuros enquadramentos de estradas e caminhos municipais, atendendo, porém, ao pressuposto propósito de onerar o menos possível os parcos recursos dos municípios.
Importante problema de ordem geral, com especial interesse para o meu distrito, é o que se aborda no n.° 2 da base III e que se refere às possibilidades de exceder, no sentido favorável, as características técnicas legais das estradas e caminhos municipais.
Na verdade, uma viação automóvel, com pesadas a grandes máquinas agrícolas, mal se compadece, hoje, com a estreiteza normal das estradas e caminhos por onde, todos os dias e a todas as horas, essas máquinas têm de deslocar-se.
Por isso, associando-nos, com o maior prazer, a essa possibilidade que se dá ao Ministro das Obras Públicas de autorizar que sejam excedidas as características técnicas legais.
No entanto, parece-nos que o critério exposto na proposta e defendido pela Câmara Corporativa, filiando essa excepção especialmente em conveniências de ordem urbanística, deverá, antes, ser substituído ou, pelo menos, alargado a conveniências de ordem prática. Nestas condições, isto é, sempre que se verifiquem conveniências desta ordem, as câmaras municipais deverão beneficiar das facilidades financeiras previstas no plano até que, atendendo ao que a própria Câmara Corporativa reconhece, sejam actualizadas as características técnicas das estradas e caminhos municipais, hoje ainda regulamentadas por diploma há quinze anos em vigor.
Achamos também que, além da revisão preconizada na classificação dos caminhos municipais, deve fazer-se nova classificação das estradas municipais, condicionada à opinião das autarquias locais, por serem estas quem melhor conhece as necessidades regionais e para quem mais frequentemente, apelam as populações necessitadas.
São de louvar a permissão de associação de municípios para a resolução de problemas comuns, o auxílio técnico garantido por intermédio das direcções-gerais, a preocupação de dar prioridade em benefícios às zonas menos evoluídas, enfim, todo o conteúdo das restantes bases, a revelar conhecimento cabal da aflitiva

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situação dos municípios e a garantirem, dentro das actuais limitações, a eficácia rápida deste tão útil e desejado diploma.
Quero destacar também o interesse que deve merecer a orientação revelada quanto ao revestimento betuminoso definitivo, de forma a não se deixarem incompletas as obras pretendidas. E este um ponto de grande importância, que merece o nosso mais justo e decidido aplauso.
E destacarei, igualmente, a intenção de reparar as estradas que se encontram em mau estado de conservação e a criação ou manutenção de serviços de conservação a cargo das câmaras municipais; são eles problemas que revestem a maior importância, porquanto se constata por todo o País a pura perda de obras que foram realizadas com pesados sacrifícios e quase sempre com muito carinho.
Acrescentarei que o justo critério expresso nos n.°s 2 e 3 da base XIII -comparticipação do Estado e Fundo de Desemprego- é o estímulo suficiente e a garantia necessária para uma distribuição equitativa destes imprescindíveis serviços, assegurando-se, assim, uma, capaz e eficiente aplicação dos dinheiros públicos em prol do bem comum.
Contudo, para que as câmaras municipais possam corresponder à presente proposta de lei, é mister, como aqui nesta tribuna foi salientado por todos os oradores intervenientes, desonerá-las de certos encargos injustamente por elas suportados e fazer afluir aos seus cofres receitas de que foram privadas e que, logicamente, só são de sua pertença.
Sr. Presidente: é esta mais unia. etapa na valorização da província portuguesa. Em todos os campos do fomento nacional a arrancada vitoriosa do progresso tem já as suas infra-estruturas ordenadas e ajustadas.
Bestar-me-ia, Sr. Presidente, afirmar que aprovo na generalidade a proposta de lei em discussão.
Acrescentarei, porém, um simples desabafo: faço votos para que o travejamento mestre da arquitectura rural portuguesa, composto, a meu ver, pela presente proposta e pêlos diplomas, já aprovados, de abastecimentos de água, fomento da habitação, electrificação rural, construção de escolas primárias, seja em breve, para todos nós, a consoladora certeza da valorização do País. Que saibam os Portugueses manter-se na intransigente posição de olhar, bem alto e de frente, sem tibiezas e sem temores, para a bandeira que simboliza Portugal. E que nesse olhar, que traduza uma vontade forte de unidade e de independência, saibam deixar que se continue, em paz e sossego, neste sossego que escandaliza, o mundo, a senda do progresso, apoiando, decididamente, os nossos governantes. E, assim, Sr. Presidente, teremos a certeza de que Portugal continuará, cada vez mais firme, a ser Portugal e nós, cada vez mais honrados, a ser portugueses.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Não está mais ninguém inscrito para a discussão na generalidade desta proposta, de lei nem durante ela foi levantada, qualquer questão prévia sobre que haja de incidir votação. Considero, portanto, encerrada a discussão na generalidade.
A discussão na especialidade constituirá a ordem do dia da sessão de amanhã.
Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Adriano Duarte Silva.
Agnelo Ornelas do Rego.
Américo da Costa Ramalho.
Artur Águedo de Oliveira.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
João Augusto Marchante.
João Pedro Neves Clara.
Joaquim Mendes do Amaral.
Jorge Pereira Jardim.
José António Ferreira Barbosa.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Guilherme de Melo e Castro.
José dos Santos Bessa.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Mário Angelo Morais de Oliveira.
Purxotoma Bamanata Quenin.
Ramiro Machado Valadão.
Tito Castelo Branco Arantes.
Vítor Manuel Amaro Salgueiro dos Santos Galo.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

Propostas enviadas para a Mesa no decorrer da sessão:

Proposta de alteração

BASE V

Propomos que o segundo período do n.° 1 da base V passe a constituir um novo número (o n.º 4), com a seguinte redacção:

Competirão aos organismos locais as formalidades da expropriação ou aquisição dos terrenos necessários para as obras.

Os Deputados: Francisco de Melo Machado - Carlos Monteiro do Amaral Neto - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de alteração

BASE XI

Propomos que no n.° 2 da base XI seja adoptada a redacção da Câmara Corporativa, ficando assim redigido:
2. Em casos especiais, designadamente quando as câmaras municipais ou federações de municípios disponham de significativo auxílio gratuito das populações interessadas - nomeadamente em mão-de-obra, transportes e materiais de exploração local -, poderá ser autorizada a execução por administração directa ou por tarefas dos trabalhos de terraplenagens e de empedramento ou de outros de execução simples.

Os Deputados: Francisco de Melo Machado - Carlos Monteiro do Amaral Neto - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de aditamento

BASE XIV

Propomos que a esta base seja aditado um novo número (o n.° 4), com a seguinte redacção:

4. Poderá ainda ser concedido o benefício das disposições desta base às juntas distritais que or-

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gaNizem parques de máquinas nos termos do Código Administrativo.

Os Deputados: Francisco de Melo Machado - Carlos Monteiro do Amaral Neto - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de substituição

BASE xv

Propomos que a redacção desta base seja substituída pela da- Câmara Corporativa, que é a seguinte:

1 Para a execução da presente lei poderá o Ministro das Obras Públicas autorizar a Direcção-Geral Dos Serviços de Urbanização, nas condições que forem por ele estabelecidas:

a) A promover a elaboração, em regime de prestação de serviços, dos estudos e projectos das obras abrangidas por este diploma;
b) A contratar ou assalariar, em conformidade com as leis em vigor, o pessoal técnico, administrativo auxiliar ou menor julgado necessário.

2 Os encargos derivados da aplicação do disposto no número anterior serão suportados pelas dotações destinadas à execução do plano de viação rural, dentro dos limites de percentagem a que se refere o n.° 3 da base V.

Os Deputados: Francisco de Melo Machado - Carlos Monteiro do Amaral Neto - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de substituição

BASE XVI

Propomos que a redacção desta base seja substituída pela da Câmara Corporativa, que é do seguinte teor:

O pessoal técnico contratado ao abrigo da alínea b) do n.° 1 da base anterior poderá ser admitido aos concursos para o preenchimento de lugares da mesma categoria do quadro da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização sem dependência do limite de idade legal, desde que tenha sido contratado com menos de 35 anos e nessa situação se tenha mantido sem interrupção até à abertura do concurso.
O tempo de serviço prestado sem interrupção mi situação de contratado contar-se-á para efeitos de ulterior promoção.

Os Deputados: Francisco de Melo Machado - Carlos Monteiro do Amaral Neto - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de substituição

BASE XVII

Propomos que a redacção desta, base seja substituída pela redacção sugerida pela Câmara Corporativa, que é a seguinte:

As dúvidas e omissões que se verifiquem na aplicação deste diploma serão resolvidas, conforme a sua natureza, por despacho do Ministro das Finanças ou do das Obras Públicas.

Os Deputados: Francisco de Melo Machado - Carlos Monteiro do Amaral Neto - Virgílio Pereira e Cruz.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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