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20 DE ABRIL DE 1961 637

servar ou aumentar a capacidade produtiva da terra ou a facilitar a sua exploração 1.
Lògicamente devem apenas ser apreciados neste parágrafo os quatro primeiros problemas - fixação, forma de pagamento, redução e revisão das rendas -, deixando-se o último para o momento em que se versar a questão das benfeitorias.
Também não se fará agora a análise do n.º 4 da base IV, que proíbe a inclusão na renda de qualquer serviço que não deva ser prestado na ou em benefício directo da propriedade arrendada. E matéria a relacionar com outras proibições, inspiradas igualmente em motivos de interesse e ordem pública e que constam da base viu do projecto. Adiante se lhe fará, pois, referência.

31. Fixação e forma de pagamento da renda. - Preceitua a base IV do projecto, no seu n.º 1, que ca renda anual será fixada em géneros das principais produções dos prédios arrendados, mas o pagamento efectuar-se-á normalmente em dinheiro». Este advérbio normalmente está relacionado com a possibilidade, conferida no n.º 3 da mesma base, de o senhorio poder exigir em espécie o pagamento da renda até um quarto do seu montante.
Afasta-se profundamente o projecto da nossa tradição jurídica no que respeita à fixação imperativa da renda em géneros.
O artigo 1603.º do Código Civil admite, em termos gerais 2, que o preço da locação ou renda consista «em certa soma de dinheiro ou em qualquer outra coisa que o valha, contanto que seja certa e determinada».
Esta regra foi alterada, em relação aos prédios urbanos, pelo Decreto de 12 de Novembro de 1910 (artigo 6.º) e, posteriormente, pelo Decreto n.º 5411 (artigo 37.º), exigindo ambos que a renda seja sempre satisfeita em dinheiro. Ainda o Decreto n.º 9496, de 14 de Março de 1924 (artigos 1.º e 2.º), veio acrescentar que as rendas dos prédios urbanos seriam sempre fixadas em dinheiro e moeda portuguesa correntes à data do pagamento.
Quanto aos prédios rústicos, o Decreto n.º 5411 manteve o princípio geral do Código Civil, estabelecendo, porém, de novo, que, «consistindo a renda em frutos», e não tendo sido paga no devido prazo, será satisfeita em dinheiro pelo preço corrente no tempo do vencimento, com juros desde a mora 3.
Posteriormente a 1919, e em consequência da grande desvalorização da moeda e desactualizarão das rendas em dinheiro, foram publicados vários diplomas legislativos que, com o objectivo de uma actualização, modificaram sensivelmente a forma de pagamento das rendas dos prédios rústicos. Fixaram-se, imperativamente, percentagens em géneros e em dinheiro a pagar pelo arrendatário. Nesta orientação, podem citar-se a Lei n.º 1368, de 21 de Setembro de 1922, a Lei n.º 1645, de 4 de Agosto de 1924, a Lei n.º 1883, de 22 de Julho de 1924, o Decreto n.º 12 339, de 18 de Setembro de 1926, e, finalmente, o Decreto, ainda teoricamente em vigor, n.º 20 188, de 8 de Agosto de 1931, que fixou regras diferentes para os arrendamentos anteriores a 1930, conforme a renda tivesse sido fixada exclusiva ou principalmente em trigo (artigo 1.º) ou em dinheiro (artigo 3.º) 1.
À parte, portanto, certos regimes transitórios, mantém-se em vigor o Código Civil. A renda pode ser fixada em dinheiro ou em géneros e, salvo o disposto no artigo 66.º do Decreto n.º 5411, de sentido muito duvidoso, deve ser paga na forma convencionada.
Não diferem estruturalmente deste critério as soluções das leis estrangeiras. A legalidade da fixação livre da renda em géneros ou dinheiro, com uma ou outra possibilidade conferida ao arrendatário ou ao senhorio de substituir os géneros por dinheiro ou vice-versa, com ou sem a limitação da renda aos produtos do prédio arrendado, com ou sem a possibilidade de se integrarem nela coisas não fungíveis ou serviços pessoais, é admitida na generalidade dos países estrangeiros.
Excepção há uma: a do artigo 3.º da lei espanhola de 23 de Julho de 1942 e a do artigo 7.º do Regulamento de 29 de Abril de 1959, que impõem, qualquer que seja a cultura do prédio, a fixação da renda em determinada quantidade de trigo, para se efectuar o pagamento em dinheiro ou em quantia correspondente ao preço daquele cereal no dia em que a renda deva ser satisfeita 2.
Foi nestas disposições que se inspirou seguramente o Governo.
Não parece à Câmara Corporativa que o regime daquelas leis espanholas seja aconselhável. Nem mesmo em Espanha ele têm sido acolhido com louvores unânimes, e lá verificavam-se, em 1942, circunstâncias excepcionais, que não se verificam hoje em Portugal, e que o poderiam então justificar.
A fixação do padrão-trigo para o pagamento das rendas obedeceu a duas causas: uma foi a desvalorização da peseta, que já se acentuava naquela data (1942).
Mas o escudo em Portugal é das moedas menos desvalorizadas do mundo, e não deve ver-se no projecto do Governo um prognóstico sombrio.
Outra causa, e esta mais importante, era a de ter acabado a Espanha de conceder, em 1942, largas prorrogações dos contratos 3 e de impor, consequentemente,

1 O caso especial de expropriação parcial do prédio (base IX, n.º 3) já ficou atras estudado.
2 Já era assim no nosso antigo direito. Vide Coelho da Bocha, ob. cif., § 833.
3 Esta inovação tem dado lugar a dúvidas, pois parece incompreensível que ao arrendatário seja lícito, com a simples mora de um dia, substituir os géneros por dinheiro, e não tenha essa faculdade, dado o regime do artigo 702.º do Código Civil, quando se prontifique a efectuar o pagamento dentro do prazo convencionado. Não interessa aqui o estudo, da questão.

1 Quanto às rendas estipuladas em trigo, têm sido .publicadas disposições especiais no nosso direito. O Decreto-Lei n.º 30 579, de 10 de Julho de 1940, estabeleceu que «serão liquidadas e pagas pelo seu equivalente em escudos ao preço da tabela oficial».
Este regi-me foi reafirmado em várias campanhas cerealífera?, entre outros, pelos Decretos-Leis n.ºs 32 189, de 11 de Agosto de 1942 (artigo 35.º), 32 898, de 9 de Julho de 1943 (artigo 17.º), 34737, de 6 de Julho de 1945 (artigo 15.º), 36469, de 15 de Agosto de 1947 (artigo 15.º), 36993, de 31 de Julho de 1948 (artigo 15.º), 38850, de 7 de Agosto de 1952 (artigo 1.º), e 39 742, de 31 de Julho de 1954 (artigo único).
2 O Código Italiano de 1942 permite II fixação da renda em géneros produzidos pelo prédio (artigo 1639.º), devendo, neste caso, o pagamento ser efectuado nos termos convencionados. Nos acordos económicos colectivos e nos contratos colectivos tem-se introduzido em Itália alguns desvios à regra daquele artigo: a renda deve ser estabelecida em géneros e, se se convencionar dinheiro, não deve a quantia ser fixa, mas designada com referência a determinada quantidade de produtos, como, por exemplo, o valor de 100 quintais de trigo.
Nos arrendamentos a cultivadores directos (familiares) a regra é a de que a renda deve ser fixada em géneros, com a obrigação para p arrendatário de entregar os géneros ou o seu valor em dinheiro. E esta a solução que mais se aproxima da lei espanhola de 1942.
Em França, o artigo 22.º do Ordonnance, de 4 de Dezembro de 1944, atribui ao arrendatário a faculdade de escolher, no momento da conclusão do contrato, o pagamento em dinheiro ou em géneros.

3 Cf. as 1.ª e 2.ª disposições adicionais e transitórias da Lei de 23 de Julho de 1942 e, posteriormente, as Leis de 4 de Maio de 1948 e de 15 de Julho de 1954. Cf. ainda os artigos 10.º e 91.º do Regulamento de 1959.