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REPUBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 214

ANO DE 1961 26 DE ABRIL

ASSEMBLEIA NACIONAL

VII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 214, EM 25 DE ABRIL

Presidente: Ex mo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Ex mos. Srs.
Fernando Cid Oliveira Proença
António José Rodrigues Prata

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 35 minutos.

Antes da ordem do dia. - Usaram da palavra os Srs. Deputados Agostinho Gomes, que se referiu a problemas de interesse para a Madeira; Castilho Noronha, sobro assuntos referentes ao progresso e desenvolvimento do Estado da índia; José Sarmento, que chamou a atenção do Governo para a necessidade de serem revistos os estudos nas Faculdades de Ciências; Armando Cândido, acerca da actividade da Federação dos Municípios da Ilha de S. Miguel; Sousa Rosal, para se referir às tributações a que estão sujeitas as pensões de reserva, reforma ou aposentação dos servidores do Estado; Feres Claro, quanto a determinadas anomalias que se registam em alguns serviços públicos, e C alheiros Lopes, que chamou a atenção do Governo para a necessidade de ser fornecida energia eléctrica a região de Benavente.

Ordem do dia. - Iniciou-se a discussão na generalidade do projecto de lei do Sr. Deputado Santos Dessa sobre períodos de evicção escolar.

Usou da palavra o Sr. Deputado Santos Bessa.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada. Eram 16 horas e 26 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Adriano Duarte Silva.
Afonso Augusto Pinto.
Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Aires Fernandes Martins.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calapez Gomes Garcia.
António Calheiros Lopes.
António Carlos dos Santos Fernandes Lima.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Cortês Lobão.
António Jorge Ferreira.
António José Rodrigues Prata.
António Maria Vasconcelos de Morais Sarmento.
António Pereira de Meireles Rocha Lacerda.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Aguedo de Oliveira.
Artur Máximo Saraiva de Aguilar.
Artur Proença Duarte.
Avelino Teixeira da Mota.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.

Fernando Cid Oliveira Proença.

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Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco José Tasques Tenreiro.
Frederico Bagorro de Sequeira
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Augusto Marchante.
João de Brito e Cunha.
João Carlos de Sá Alves.
João Certeira Pinto.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Pais de Azevedo.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Pereira Jardim.
José de Treitas Soares.
José Garcia Nunes Mexia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Hermano Saraiva.
José Mamel da Costa.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Rodrigo Carvalho.
José Rodrigues da Silva Mendes.
José dos Santos Bessa.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Laurénk Cota Morais dos Reis.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Luís Tarares Neto Sequeira de Medeiros.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel José Archer Homem de Melo.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Angelo Morais de Oliveira.
Mário de Figueiredo.
Martinho da Costa Lopes.
Paulo Cancella de Abreu.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Rogério Noel Peres Claro.
Sebastião Garcia Ramires.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Tito Castelo Branco Arantes.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Amaro Salgueiro dos Santos Galo.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 84 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram, 16 horas e 35 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Agostinho Gomes.

O Sr. Agostinho Gomes: - Sr. Presidente: muitos têm sujo os depoimentos, quer por escrito, quer oralmente feitos, em que se afirma, e intransigentemente se defende, atesta conjuntura grave da vida nacional, a unidade e integridade "agrada da Pátria.

A gente da nossa terra, a boa gente portuguesa, em cuja alma existe o germe que fez os nossos heróis de antalhar, vivendo intensamente a angústia do momento, só tem este grito, firme e caloroso e uno, desferido no Portugal da Europa, da África, da Ásia e da Oceânia: "Aqui é Portugal!". Um povo com oito séculos de história, nunca interrompida, sabe donde vem; e tem justa que o deixem caminhar sem tutelas, porque sabe para onde vai.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - Escreveu Afrânio Peixoto que as duas maiores epopeias dos Portugueses foram: os Lusíadas e o Brasil. Uma, fê-la o talento de um homem; a outra, ergueu-a o génio de um povo que todo se deu para que uma nação irmã, vinculada pelo sangue e pela língua, se constituís-se, pujante de vida, numa afirmação bela de lusitanidade.

Se não foram então precisas lições estranhas que nos indicassem caminhos a percorrer, antes dêmo-las ao Mundo, cheias de frutos opimos, altivos da nossa tradição e cônscios das nossas responsabilidades, repudiamos ensinamentos alheios cujos resultados, aliás, por si só atestam os erróneos princípios em que assentam. Não nos fechamos em ideias, quaisquer que elas sejam, de valor real e efectivo, porque essas quisemo-las sempre e queremo-las também "agora. Rejeitamos, porém, aquelas, venham donde vierem, que sabemos pela triste experiência sofrida, aqui ou ali, perto ou longe, ontem ou hoje, trazerem consigo o vírus de morte para os indivíduos, para as sociedades e para as nações.

O passado não significa para nós uma estagnação de vida; é um património que, defendendo-o por sagrado, procuramos sempre enriquecer com as conquistas válidas da inteligência e sabedoria dos homens.

É braseiro que aquece sem ser fogo que queime; é facho que ilumina sem ser luz que cegue.

Debruçamo-nos sobre o passado não para nele apenas nos narcisarmos, mas para assegurarmos o fio que nos libertara, embora feridos em nossos corpos do dédalo mortal do ódio e ambições em que vivem os povos.

Disse o Sr. Presidente do Conselho que o momento era de segurarmos numa das mãos a charrua e na outra a espada. Acrescentarei: e na alma a Cruz e na vida o Evangelho.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O Orador: - A batalha dos Atoleiros venceu-a a força das armas do Condestável e as mãos em prece de um de Santa Maria.

Ajoelhe Portugal inteiro aos pés da sua rainha e padroeira e peca-lhe mais uma vez ò milagre da sua protecção.

Que nós, os Portugueses, façamos por merecê-la.

O momento não é de hesitações, mas, sim, de acção conjunta, para que possamos vencer as gravíssimas dificuldades que a maldade de alguns criaram à nossa volta.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não queiramos atraiçoar a memória dos nossos maiores, que sempre souberam sobrepor a própria vida os altos interesses da Pátria.

Para longe os nossos egoísmos!

A Pátria em perigo chama-nos; gritemos bem forte Presentes!

Portugal continuará a ser o que todos desejamos que seja.

Com a ajuda de Deus e o esforço unido de todos nós as nuvens negras e sinistras que se acastelam, densas no firmamento da terra lusitana cedo serão dissipadas

Tenhamos fé e venceremos.

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Sr. Presidente: nesta hora cruciante da nossa historia, a Madeira, que vibra de indignação com as barbaridades sem nome praticadas em Angola contra irmãos nossos, por hordas selvagens a soldo de estrangeiros, expressa, por mim, o seu total apoio ao Governo da Nação, nele depositando a sua plena confiança.

Vivamente protestamos contra as decisões daquela organização internacional que, criada para assegurar a paz entre os povos, pretende imiscuir-se nos negócios internos da Nação, numa violação manifesta dos nossos direitos de Estado soberano.

Juntamos a nossa voz à de todos os bons portugueses, de aquém e além-mar, para dizermos sentida e ternamente: "Obrigado, Salazar!".

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: não obstante as preocupações que ao Governo trazem os dolorosos acontecimentos da nossa província ultramarina de Angola não cessam as obras de valorização de todo o território nacional.

Há oito dias, na Repartição Técnica da Direcção-Geral da Aeronáutica Civil, foram abertas as propostas do concurso feito para a construção na Madeira do aeródromo de Santa Catarina, na freguesia de Santa Cruz.

15 uma obra de vastíssimo alcance para o desenvolvimento económico do arquipélago, há tanto tempo ansiosamente desejada por todos os madeirenses.

Foi a Madeira uma das primeiras terras de Portugal que teve uma corrente turística em grande escala, alimentada não só pelos barcos que necessariamente ancoravam na baía para se abastecerem, e eram muitíssimos, mas ainda pelos estrangeiros, que. por longos períodos se fixaram na ilha para gozarem a amenidade do seu clima e o encanto das suas paisagens.

Hoje, porém, tudo mudou.

São raros os navios que por lá passam; faltava-nos um cais acostável com fornecimento de óleos à navegação, que, por isso, desviou seus rumos, em especial para as vizinhas ilhas Canárias.

(Direi, como esclarecimento, que em breve estarão concluídas as obras do nosso porto com os seus depósitos de combustível).

Rareando os barcos, escassearam os turistas, mesmo os de fixação, porque não lhes é fácil obter passagem de ida ou de volta, muito embora quisessem sujeitar-se a um transbordo aqui em Lisboa. Por outro lado, as exigências da vida moderna não permitem demoras em viagens. A nossa época é de velocidade.

Tendo a aviação encurtado as distâncias tornou-se impossível a uma terra, por melhores que sejam as suas belezas, conseguir, sem carreiras aéreas, um fluxo turístico.

A perspectiva actual da economia madeirense é deveras preocupante. Nunca foi rica, mas mantinha um certo equilíbrio, quer pelas suas poucas indústrias e o turismo, quer, nos últimos tempos, pelos dinheiros enviados pelos seus emigrantes no Curaçau e na Venezuela. Infelizmente a emigração para estas regiões já terminou. Do Curaçau quase todos os madeirenses regressaram e na Venezuela está fortemente condicionado o envio de divisas.

A nossa pequena indústria, pela concorrência que sofre nos mercados, está agonizante.

Só um turismo bem estruturado poderá trazer à Madeira um maior desafogo económico.

Para isso precisamos em primeiro lugar de comunicações rápidas com as outras partes do Mundo.

Ò Governo, no Plano de Fomento para 1959-1964, assim o reputa, quando firma ser "da maior urgência

dotar a ilha da Madeira com um aeroporto que satisfaça as necessidades do turismo, fonte de receita principal da sua economia".

No mesmo Plano de Fomento previa-se já a construção de um duplo aeródromo no Porto Santo e na Madeira, pelo facto de ser quase impossível nesta última I 1 li a encontrar-se um local para uma pista com extensão conveniente. "Considera-se, lê-se no programa geral do plano, que a construção de um aeródromo em Porto Santo é essencial à economia da Madeira, pois só com ele se poderão satisfazer totalmente as necessidades do turismo local e desenvolvê-lo a ponto de evitar que o fluxo de turistas ingleses se desvie no Inverno para as Canárias ou para as Baleares".

Por razões várias teve que dar-se preferência de construção ao aeroporto do Porto Santo, que já está em pleno funcionamento, com uma pista de 2000 m, podendo atingir os 3000 m.

Ë digna de relevo a rapidez com que foram executadas as obras; tendo começado a avaliação dos terrenos em Julho de 1959 e em Novembro a empreitada, em Agosto de 1960 já S. Ex.ª o Ministro das Comunicações, sem querer fazer uma inauguração- oficial,, porque essa .reservava-a, para quando a Madeira tivesse o seu aeroporto, tomava parte munia das primeiras viagens dos "aviões da T. A. P. paxá, com a sua ilustre presença, reclamada pelos Madeirenses, solenizar o início das nossas carreiras aéreas.

Enquanto o aeródromo de Santa Catarina não é uma realidade as ligações Porto Santo-Madeira estão sendo feitas por um pequeno navio - o Lisbonense, que era utilizado na travessia do Tejo.

Foi a única solução que de momento o Sr. Ministro das Comunicações encontrou, compreendendo, porém, por experiência própria, que não podia ser a definitiva. Os minutos do embarque e desembarque no Porto Santo em .pequena embarcação são, por vezes, assustadores para os passageiros. E a própria viagem, além de ser demorada -um mínimo de quatro horas-, em muitos dias torna-se dramática.

Há estrangeiros que compram passagem de ida e volta de avião para a Madeira, mas o regresso fazem-no por via marítima; já se não querem expor a novo tormento ... Os Madeirenses estão sumamente gratos ao Sr. Eng.º Carlos Ribeiro por todo o carinho, esforço e generosidade que tem posto no problema das suas comunicações aéreas, mas ousam pedir-lhe que seja encontrada outra solução para as ligações entre Porto Santo e Madeira.

Duas hipóteses se apresentam: ou helicópteros ou aviões anfíbios.

Se a primeira é talvez impraticável, resta-nos somente a segunda.

Estou certo que S. Ex.ª continua a ponderar o assunto cuidadosamente. A Madeira espera ficar a dever-lhe, em breve, mais esta atenção.

Feita a ligação entre Porto Santo e Madeira por aviões já os turistas, nacionais e estrangeiros, acorreriam às nossas ilhas em maior mi mero.

Tememos que se faça tarde para o turismo madeirense, pois por toda a parte a propaganda turística cada vez mais se intensifica. Nem se argumente que em breve teremos o aeródromo de Santa Catarina e, portanto, que as coisas se mantenham como estão. Até lá passar-se-ão dois anos - tanto é o tempo calculado, para a conclusão das obras -, e dois anos é o suficiente para perdermos uma posição já enfraquecida.

E eu ouso até afirmar que todos os sacrifícios e dinheiros consumidos e a consumir com os aeródromos poderão não ser compensados pelo menos com a amplitude que desejaríamos. Quem tarde acorda a noite o espreita; não queremos que tal aconteça.

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Por isso pedimos e insistimos no nosso pedido.

Sr. Presidente: antes de concluir as minhas considerações, que sei já vão sendo longas, quero apresentar alguns números referentes ao aeródromo de Santa Catarina, cujo custo, só de construção., é de cerca de 70 000 contos.

Ver-se-lo, assim, as vastas proporções de tal empreendimento.

A área abrangida é de 500 000 m2, havendo nela 191 casas de moradia, com um número de habitantes superior a 1000. Julgo não haver memória em Portugal de uma tão grande deslocação de pessoas em virtude de uma obra, nem mesmo nas grandes barcagens efectuadas.

As expropriações a cargo da Junta Geral foram de 30 000 contos, sendo a comparticipação do Ministério das Comunicações de 2400 contos. Faltam cerca de 3000 contos, que esperamos nos venham a ser concedidos.

Para calcularmos como a Madeira põe todo o interessse na construção do .seu aeródromo basta dizer que as expropriações foram iniciadas em 15 de Janeiro último e deverão ficar totalmente concluídas em meados do próximo mês de Maio.

Para o realojamento da população deslocada estão a ser construídas 118 casas, sendo 32 por conta da Junta Geral do Distrito.

Se uma palavra de justo louvor é devida aos técnicos da Junta encarregados das expropriações, por levarem a cabo tão rapidamente a sua difícil e delicada missão - até hoje, e já estão pagas três quartas partes das expropriações, nenhuma reclamação judicial foi interposta -, maior louvor merece a população da zona abrangida pela alta. compreensão do sacrifício que lhe era pedido.

O Sr. Agnelo do Rego: - Muito bem!

O Orador: - O aeródromo de Santa Catarina ficará custando menos pelo dinheiro do que pelas lágrimas daqueles que se vêem privados de suas terras, a que se sentiam ligados por laços de amor e .de tradição.

Tem-se falado na imprensa da Madeira na necessidade de os seus aeroportos serem abertos ao tráfego internacional. Não creio que seja outro o pensar do Ministro das Comunicações. Se eles são feitos principalmente para servir o turismo, mal seria que a sua utilização se restringisse às carreiras nacionais.

Irei ainda mais longe: a autorização que companhias estrangeiras em devido tempo venham a pedir para realizaram excursões turísticas directas à Madeira nunca d verá ser negada, antes prontamente concedida, desde que fique assegurado o interesse nacional.

Esta aí a política aeronáutica, e só esta, que convém ao turismo da Madeira. Mas para que tanto falar se nós sabemos que o Governo da Nação vela e defende os interesses de todas as parcelas do território da Pátria?

Sr. Presidente: na hora em que o mundo dos ódios, da inveja, das injustiças, da barbaridade, dos crimes mais hediondos se lança contra nós quis a gente madeirense se fizesse ouvir nesta Assembleia o seu depoimento.

Envolvi-o na expressão dos seus maiores anseios porque, apesar de tudo, espero em Deus que breve amaine a tempestade e que não cesse o ritmo de progresso da vida nacional.

Tenho dito.

Vozes 1 - Muito bem, muito bem !

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Castilho Noronha: - Sr. Presidente: sendo esta a primeira vez que tenho a honra de falar na presente sessão, quero cumprir o indeclinável, mas grato, dever de apresentar as minhas respeitosas saudações a V. Ex.ª, que, com tanto brilho, vem ocupando em sucessivas legislaturas a presidência, impondo o seu nome, aureolado de raro prestígio, às nossas mais estremadas benevolências.

Quero também saudar deste lugar o nosso considerado leader, Dr. Mário de Figueiredo, em quem dir-se-ia a idade não tem poder de atenuar sequer o vigor das suas poderosas faculdades intelectuais, que tão vantajosamente se afirmaram ao longo da sua brilhante carreira de homem público.

Para VV. Ex.ª também, Srs. Deputados, vão as minhas saudações, com protestos de uma leal e afectuosa camaradagem.

Sr. Presidente: na sessão desta Assembleia de 13 de Maio de 1959 referi-me, a largos traços, ao valor e à importância de várias obras e empreendimentos realizados no Estado da Índia que singularmente assinalam os anos que se seguiram ao odioso bloqueio económico de que a União Indiana lançou mão, na errada convicção de que, reduzindo-nos à miséria e à fome, conseguiria os seus inconfessáveis fins.

O tal bloqueio, porém, pondo a descoberto as potencialidades do Estado da índia, contribuiu muito para o desenvolvimento do país em vários sectores.

Dizia eu nessa ocasião que, a juntar-se a tantos melhoramentos que tornavam desafogada a nossa situação, estava o grandioso plano de obras que o ilustre governador-geral general Vassalo e Silva ao cabo de poucos meses da sua governação havia elaborado e publicado.

O plano, acentuava eu, era grandioso. Mais do que isso - era arrojado, dada a escassez dos nossos recursos.

Não obstante isso, não obstante tantos outros óbices de vária ordem que ria Índia tornam de difícil execução obras de vulto, como, aliás, o autor do projecto já previa, não obstante tudo isso, o plano está a ser executado num ritmo animador, como atestam as valiosas realizações, às quais está desde já assegurada uma larga projecção no progresso e desenvolvimento do Estado da índia.

Uma das mais absorventes preocupações do Sr. Governador-Geral era a velha cidade. S. Ex.ª concebeu o simpático projecto de dar nova vida a essa cidade, que oferecia o triste e soturno aspecto de uma vasta necrópole. O que se pretendia era reintegrá-la no seu espírito histórico-arqueológico, monástico e religioso, sendo certo que a cidade, como S. Ex.ª disse, é um repositório de valores artísticos, históricos, culturais e religiosos.

O Sr. Ministro da Presidência, que aquando da sua honrosa visita ao Estado da Índia assistiu à inauguração dos trabalhos de reconstituição da velha cidade, exprimiu a sua imensa satisfação pelo magnífico projecto e a sua inteira adesão à feliz iniciativa.

Pois, em poucos meses, uma grande parte desse projecto converteu-se em palpável realidade.

Quem viu a cidade na desoladora situação em que jazia, abandonada por tantos séculos -situação em que mal se vislumbrava ser ela o documentário de tanta grandeza, de tão imarcescíveis glórias -, quem a viu nesse estado e a vê agora nota logo que um sopro vitalizador a bafejou, alterando profundamente a sua fisionomia.

Os arranjos exteriores em cuidada execução abrangem:

a) Aformoseamento do largo entre a Sé Catedral e a Basílica do Bom Jesus, onde se ergue,

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majestosa, a estátua de Luís de Camões,
oferta do Diário Popular;
b) Construção de uma placa central com 3,5 m de raio;
c) Construção de passeios com 5 m de largura, no
comprimento total de 300 m;
d) Asfaltamente de 6000 m2 de pavimento;
c) Construção de 300m de dreno de águas pluviais ;
f) Construção de dois espelhos de água, com 300 m2 cada um;
g) Estabelecimento de água canalizada para toda a área dos trabalhos em curso; h) Instalação de tubos para condutores eléctricos para iluminação das ruas e praças.

A cidade de Goa era notável por um grande número de igrejas e conventos - construções magnificentes que, na sua grandiosidade, evocam o período áureo da vetusta urbe. Com o declínio da cidade ficaram também abandonados à sua sorte os velhos conventos, que tão admirados eram. De sorte que, se não fossem as cerimónias que o cabido celebra diariamente na Sé Catedral e a solenidade da novena e festa de S. Francisco Xavier, que anualmente evoca ao seu túmulo milhares e milhares de peregrinos, esses conventos ruiriam como tantos outros que desapareceram, e a cidade, que outrora foi a capital do império luso-riental, seria hoje um lugar ermo e deserto.
Pois a acção benéfica que visa a reconstituir a velha cidade estendeu-se aos conventos existentes.
Já nesta primeira fase sofreram vultosas beneficiações, que não posso descrever em pormenor, o que muito longe me levaria, a Igreja do Bom Jesus, o Convento de S. Francisco de Assis, a histórica Capela, de Santo António e a Igreja da Cruz dos Milagres.
Entre as obras já executadas na velha cidade e às quais muito sucintamente me referi há uma que é digna de especial menção: é o edifício destinado à instalação do Instituto Pastoral Pio X.
Por indicação do Venerando Patriarca das índias, S. Ex. ª Rev.ma o Sr. D. José Vieira Alvernaz - escreve na sua interessante plaquette o Rev. º Joaquim Luís dos Santos, que vem consagrando os seus melhores esforços a essa obra -, o edifício escolhido para a instalação do Instituto foi o velho Convento de S. Caetano, fundado em 1655 pelo teatino italiano D. Pietro de Avitabile, para residência dos Clérigos Regulares da Divina Providência.
Foi preciso adaptar o velho edifício às exigências da nova finalidade que se tinha em vista, por forma que tivesse capacidade para 50 alunos. Mas tanto não bastava. Foi ainda preciso ampliar o edifício para residência dos professores, para aposentos do prelado, etc.
A obra, que está quase na fase de acabamento, foi executada com esmero, com quartos amplos e espaçosos, tanto para os alunos como para os professores, banhados de ar e luz, contrastando singularmente com as antigas celas, de dimensões acanhadas, que o Convento tinha para residência dos membros da comunidade.
O Instituto contribuirá para estabelecer a tradição missionária e a tradição cultural da velha cidade, que, como é sabido, teve famosos estabelecimentos de ensino.
Breve deve ser inaugurado o Instituto Pastoral no belo1 e majestoso edifício que lhe é destinado.
É de esperar que ele seja um facho, de luz, espalhando-se por essas terras longínquas que outrora foram o teatro da acção benfazeja, de sacerdotes goeses, que, em magníficos gestos de desinteresse e abnegação, as desbravaram, consolidando em muitas delas o reino de Cristo.

Mas não é só a velha cidade que pela construção de novos edifícios, pela reparação dos existentes, pelo seu arranjo urbanístico, não é só a velha cidade, dizia eu, que nos prende a atenção. Bem pode dizer-se que em todos os pontos do País se nota um surto de progresso. Em toda a parte uma actividade febril, um dinamismo construtivo. Em toda a parte se sente o influxo dessa acção renovadora,, que tão necessária era.
No activo das obras públicas figuram a construção de novas estradas, a recons-tituição de pavimentos e o asfaltamente de muitos outros, a construção de novos edifícios, a reparação dos existentes, etc.
Acrescem a tudo isso as valiosas e substanciais comparticipações com que as câmaras municipais e ainda muitas instituições particulares têm realizado obras de vulto, que nunca se fariam sem tais comparticipações.
É que o Sr. General Vassalo e Silva estuda com desvelada solicitude, com carinho, com circunspecção, os problemas que se lhe propõem, inteirando-se in loco das necessidades das respectivas povoações, para o que se desloca frequentes vezes em fatigantes e trabalhosas visitas para pontos distantes e muitas vezes de difícil acesso.
A essas altas qualidades que o Sr. General Vassalo e Silva vem revelando no desempenho do difícil cargo que em boa hora lhe foi confiado figuram justamente encomiásticas referências de individualidades ilustres que visitaram o Estado da índia, como os Srs. Ministro da Presidência, Dr. Pedro Teotónio Pereira, Dr. Francisco Vieira Machado, Dr. Raul Ventura, Dr. Galvão Teles, Dr. Braga Paixão, Leopoldo Nunes, Dr. Padre Silva Rego e muitos outros.
As palavras com que eles enaltecem a figura prestigiosa do Sr. General Vassalo e Silva valem por um eloquente e expressivo testemunho a consagrar a obra que renovará a face do Estado da índia.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. José Sarmento: - Sr. Presidente: desejo chamar mais uma vez a atenção do Executivo sobre a necessidade de se dar satisfação aos anseios mais prementes e justos das nossas Faculdades de Ciências. O Sr. Deputado Eng.º Araújo Correia já há anos que nos seus. magistrais pareceres sobre as Contas Gerais do Estado se tem referido ao problema cruciante das Faculdades de Ciências. Para ilustrar as minhas considerações tomo a liberdade, com a devida vénia, de ler um trecho do parecer das Contas Gerais do Estado de 1958:
Numa época em que a vida pública e social repousa sobre os consideráveis progressos das ciências puras e aplicadas, as Faculdades de Ciências e os institutos superiores técnicos desempenham um papel de primeira grandeza. Do seu labor, quer académico, quer de investigação, podem resultar consideráveis benefícios para a comunidade.
As nossas Faculdades de Ciências estão mal dotadas e imperfeitamente organizadas. Os progressos, tanto na distribuição de dotações como na organização material interna, incluindo as próprias instalações, deixam muito a desejar. Pareço não haver entre nós mentalidade que compreenda as funções das Faculdades de Ciências e o carácter do ensino ressente-se de indiferenças nesta matéria.
Os pareceres todos os anos insistem sobre este ponto, que é fundamental. O que está a fazer-se em quase todo o Mundo a respeito do ensino das ciências é a prova da razão das lamentações feitas há longos anos neste lugar.

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Também II já lia muito que chamo a atenção do Governo sol ire a necessidade de se encarar frontalmemte o problema das Faculdades de Ciências. Salvo erro, levantei-o pela primeira vez nesta Assembleia em 1954. Nessa altura destaquei particularmente que o estudo da Física nas lassas Faculdades continuava a ser feito como há perto de 50 anos. Hoje, e já se passaram 7 anos sobro 19c4, continua .tudo na mesma.

Apontei então que o progresso e desenvolvimento da Física nos últimos 50 anos foi de tal natureza que só &e pode comparar em extensão e profundidade com aquele que se operou entre os fins do século XVI e o limiar do século XX. Se a essa 1.ª fase, relativamente lenta, de desenvolvimento da Física correspondeu no século XIX uma ampla e brusca expansão económica originada pelo surto industrial, hoje estamos a sentir as consequências, muito mais acentuadas ainda, do desenvolvimento da Física operado nestes últimos 50 anos.

A actual revolução industrial em que o Mundo se encontra envolvido, pela sua amplidão e natureza, não só necessita de muitos mais técnicos de nível superior, mas também, e é aqui principalmente que reside a grande diferença, eles deverão possuir uma preparação científica muito mais profunda.

A transformação operada no actual século pelo desenvolvimento da ciência não se limita ao sector industrial, estude-se pelos mais variados domínios. Por isso, para assegurar com êxito a expansão económica do mundo de hoje já não bastam os engenheiros das diferentes especialidades, a eles teremos de acrescentar os físicos, os matemáticos, os químicos, os geólogos, os biólogos, etc.

Estes técnicos de grau superior deverão possuir uma solidíssima preparação de base correspondente à respectiva especialidade e deverão ter capacidade potencial suficiente para se poderem especializar em sectores restritos. Deverão ter um espírito sempre aberto, capaz de, sem grande esforço, poder substituir ideias feitas por outras novas totalmente diferentes. Em suma, deverão possuir um grande poder de adaptação.

Parece-me .ser esta uma das características mais notáveis que deverá distinguir os técnicos de hoje. Tambem será necessário que a maior parte deles tenha profundos conhecimentos matemáticos, aliados, evidentemente, a uma inteligência superior.

Resumindo: o actual técnico de grau superior deverá ser dotado de qualidades natas excepcionais, das quais destaco: inteligência viva e profunda, grande poder de adaptação, grande capacidade de trabalho, curiosidade permanente, seriedade e forte disciplina social e mental. Por isso, na época actual, cada vez se tornará mais difícil conseguir em número suficiente os técnicos de grau superior capazes de manter o actual padrão de desenvolvimento económico dos países altamente industrializados.

Para evitar que eles rareiem, necessário se torna não perder unia só criança que, potencialmente, tenha as qualidades natas para se poder transformar pela educação ou num físico, ou num químico, ou num matemático, etc.

O Sr. Virgílio Cruz: - Muito bem !

O Orador: - Impõe-se, por isso, que desde os bancos da escola primária se esteja atento para se poderem descobrir as crianças de qualidades excepcionais. Com bolsas de estudo se deverão estas encaminhar para o ensino secundário e daí, se as esperanças nelas depositadas se não desvanecerem, deverão ingressar, também com bolsas de estudo, no ensino superior.

Em tolos os graus de ensino as escolas deverão estar sempre atentas, pois quantas vezes o desabrochar das

qualidades do aluno só tarde se manifesta. Quando um adolescente no ensino secundário evidenciar qualidades fora do vulgar, deverá ser solicitamente acompanhado de forma a que se não venha a perder a eventualidade de se obter um bom técnico. No ensino superior maior deverá ser ainda a atenção prestada aos alunos excepcionais. Subsídios, bolsas de estudo, viagens ao nosso ultramar, etc., lhes deverão ser concedidas.

Este esboço de um plano de aproveitamento dos mais capazes para assim se poder assegurar o desenvolvimento económico de um país implica evidentemente escolas suficientes e em número suficiente. Nas considerações que a seguir vou fazer limitar-me-ei ao ensino superior, e, dentro dele, muito particularmente ao ensino ministrado nas Faculdades de Ciências.

Na minha primeira intervenção sobre este assunto, em 1954, apontei a necessidade de uma reforma profunda do plano de estudos das Faculdades de Ciências. Como infelizmente nada ainda se fez nesse sentido, hoje, passados sete anos, mais fortemente ela se impõe, não só pelo avanço da ciência operado neste último período ser notável, mas muito principalmente por nos encontrarmos empenhados num intenso desenvolvimento económico, através do II Plano de Fomento. Ora, como muito bem disse a ilustre Deputada Sr.ª D. Maria Irene Leite da Costa, sem matemáticos, físicos, químicos, biólogos e geólogos dificilmente dos referidos planos se poderá tirar bom rendimento. Aproveito o ensejo para a felicitar por, com tanto brilho e clareza, se ter referido na sua última intervenção ao cruciante problema das Faculdades de Ciências.

Como é do conhecimento público, foi nomeada há cerca de dois anos uma comissão para o estudo da reforma do plano de estudos das referidas Faculdades. A comissão concluiu, há perto de um ano, segundo consta, os seus trabalhos, e até hoje a reforma ainda não foi promulgada. E evidente que há qualquer coisa que emperrou e que impede que a reforma venha a lume. Toma-se, por isso, necessário remover o obstáculo.

Bem sei, infelizmente, que as actuais condições em que nos encontramos - por termos de fazer frente com armas e soldados aos inimigos da Pátria, acarinhados pela perturbadora e criminosa organização intitulada O. N.º U. - não são muito propícias a reformas que impliquem avultados dispêndios. No entanto, destaco que o aumento de despesa que porventura resultar da referida reforma se pode considerar como uma despesa do tipo das despesa» com o Plano de Fomento actualmente em curso. E até se pode considerar como um meio de assegurar a eficiência do referido Plano.

Por isso, mais uma vez chamo a atenção do Governo sobre a necessidade da reforma do plano de estudos das Faculdades de Ciências.

Outro ponto que desejo destacar é o problema das instalações da Faculdade de Ciências de Lisboa.

Como já disse em várias intervenções, distribuídas ao longo dos oito e consecutivos anos que aqui me encontro, urge instalar a Faculdade em novos edifícios. Para dar uma ideia da necessidade de novas instalações aponto, a título demonstrativo, a evolução da população escolar desde o ano de 1920-1921. Nesse ano u população escolar era de 371 alunos; dez anos depois, em 1930-1931, passaram a 7.24; em 1940-1941 já atingia 1200; passados mais dez anos atinge 1621, e, finalmente, em 1959-1960 temos 2275. Nestes números estão incluídos todos os alunos que frequentam a Faculdade de Ciências.

Da sua observação fácil será ajuizar das deficiências das actuais instalações.

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Como disse em intervenções passadas, há já muito que, por falta de espaço, se não pode ministrar o ensino laboratorial com aquele mínimo de eficiência que seria de desejar. Em particular, é no grupo de Física que se notam, no meu entender, as mais graves deficiências. De todas as Faculdades de Ciências do País é sem dúvida a de Lisboa que se encontra em piores condições.

Enquanto se não erguerem as novas instalações destinadas à Faculdade, o actual edifício onde ela se encontra terá de ser utilizado durante alguns anos ainda. Impõe-se, por isso, que este seja conservado e se executem pequenas obras rapidamente amortizáveis.

Uma das mais prementes é a da ampliação da biblioteca, pois, sendo esta uma das de maior movimento capital, é a que menos espaço dispõe.

Apraz-me registar que o Sr. Ministro das Obras Públicas atendeu e está a atender às necessidades mais urgentes do velho edifício da Escola Politécnica. Assim, já foi reformada totalmente a cobertura do edifício, de forma que hoje pode chover a bom chover que no seu interior já não cai pingo de água. As instalações eléctricas de algumas secções foram totalmente refeitas, e hoje a luz eléctrica e a força motriz - encontram-se asseguradas. Além disso, S. Exa., com a visita que há dias fez à Faculdade para ajuizar de outras obras mais urgentes, mostrou bem o interesse que estas lhe merecem. Por isso, estamos plenamente confiantes na sua actuação.

No entanto, impõe-se que no mais curto espaço de tempo se dê início ao anteprojecto das novas instalações. Bem sei que obras de tal envergadura precisam de ser maduramente reflectidas. No entanto, parece que começa a ser tempo de se dar início ao referido anteprojecto. Espero, por isso, que muito brevemente sejam fornecidos ao Ministério das Obras Públicas os elementos necessários para a sua elaboração.

Como a experiência tem mostrado, as previsões sobre o montante das futuras populações escolares tem conduzido a resultados muito diferentes dos observados. Por isso, no meu entender, as construções deverão ser sempre planeadas de forma a possibilitar futuras ampliações.

Felizmente que à testa da Universidade de Lisboa se encontra, actualmente, quem oferece todas as garantias para acompanhar de perto tão grande empreendimento. Apraz-me afirmar que nunca a Universidade de Lisboa teve reitor que tanto a prestigiasse e que simultaneamente tanto tivesse feito para que ela, adquirindo consciência própria, actue como um todo uno e vivo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: só mais duas palavras sobre o reapetrechamento em material de ensino das nossas escolas superiores.

Como é do conhecimento de todos, foi aprovada na Lei de Meios para 1957 e nas outras que se lhe seguiram uma disposição - que iria permitir reapetrechar em material de ensino as Faculdades de Ciências. Infelizmente, devido às necessidades, talvez mais prementes, das escolas técnicas existentes e de outras que foram criadas, passaram-se anos durante os quais nem as Faculdades de Ciências nem as escolas de engenharia receberam qualquer material por couta da Comissão de Reapetrechamento.

Antes da criação da referida Comissão ainda por vezes se conseguia incluir nos orçamentos das Faculdades verbas extraordinárias para um reapetrechamento mais urgente. Mas depois da criação da Comissão nunca mais tal se conseguiu, por se alegar que a referida Comissão é que deveria reapetrechar os laboratórios. Em suma, se o reapetrechamento até essa altura era deficiente, mais deficiente se tornou em seguida.

Os anos foram assim passando numa estagnação completa quanto ao reapetrechamento dos laboratórios das Faculdades de Ciências. Recentemente, iniciou-se o tal reapetrechamento, mas, infelizmente, a Faculdade de Ciências de Lisboa ainda não foi contemplada.

Chamo muito particularmente a atenção das entidades competentes sobre este assunto.

Sr. Presidente: vou terminar. Na última sessão desta Assembleia o ilustre Deputado Sr. Dr. José Saraiva, numa brilhante intervenção, como todas as que tem feito, referiu-se com palavras elogiosas ao Decreto regulamentar n.º 43 099, de 14 do corrente mês. Apontei então, em aparte, que discordava totalmente do meio proposto para se atingir o fim desejado, ou seja "providenciar-se urgentemente no sentido de se especializar pessoal para o exercício dos numerosos cargos dos quadros ultramarinos". Disse que não era com a concessão do diploma de- licenciatura, ou do grau de doutoramento que tal fim se poderia, alcançar.

As medidas a tomar para se obter o fim desejado devem ser outras. Acrescentei mais que a concessão desses graus universitários só às Universidades compete.

Mas se voltei a repetir o que em parte disse na última sessão é porque quero que fique bem assente que, se discordo do meio proposto, concordo plenamente com o fim desejado. Hoje mais do que nunca precisamos de possuir pessoal especializado para o exercício dos numerosos cargos dos quadros ultramarinos. Até disse, mas o serviço taquigráfico da nossa Assembleia, nau o registou, que, se porventura se provasse que para salvar a integridade da. Pátria fosse necessário atribuir o grau de licenciado e o título de doutor aos dez milhões de portugueses, seria eu o primeiro a aprovar tal medida, apesar de saber que isso equivaleria, devido ao nivelamento, à supressão dos" graus universitários.

O Sr. José Saraiva: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com todo o gosto.

O Sr. José Saraiva: - É só para agradecer a V. Ex.ª, em primeiro lugar, a maneira gentil como teve a bondade de se referir à minha intervenção e, em segundo lugar, para efectivamente reconhecer - V. Ex.ª não necessita que o reconheça - que no aparte com que se dignou enriquecer as minhas considerações proferiu essas palavras que acaba de reproduzir e disse mesmo (o que certamente tinha o sentido de uma ironia) que não hesitaria conceder aos dez milhões de portugueses os títulos académicos.

Se alguma prova fosse necessária de que V. Ex.ª o dissera, haveria esta de eu o ter ouvido. Mas devo acrescentar, o que em certo modo desagrava os serviços taquigráficos desta Casa, que a nossa conversação e discussão ocorreu de uma forma um tanto rápida e que os respectivos funcionários, dando-se conta disso mesmo, se nos dirigiram, após á nossa troca de palavras, a pedir a rectificação de qualquer frase. Nós prestámos-lhes essa colaboração e, portanto, aqui a culpa é um pouco de todos nós.

Queria, agradecer a V. Ex.ª ter uma vez mais ao voltar a falar deste assunto ter-se, pelo menos no que me parece essencial, posto de acordo comigo. Acima de tudo, parece necessário frisar que a consciência clara dos objectivos a atingir é o principal nesta matéria. Os meios serão bons quando servirem àquele objectivo.

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Quanto à excelência dos meios, nós não sabemos a repercussão que eles poderão ter sobre a juventude, mas a verdade é que, se eles forem conducentes a atingir o fim que todos reconhecemos como necessário, terão sido inteiramente justificados.

V. Ex.ª parece ter dúvidas que as providências agora tomadas venham a dar o resultado de atrair a juventude para as carreiras do ultramar. Todas as dúvidas são legítimas, e duvidar é sempre permitido. Mas isso não impediria que, em harmonia com o que parece mais provável, os governantes tomassem as medidas conducentes àqueles objectivos, sobre cuja legitimidade não pode haver desacordo.

O Orador: - Agradeço mais uma vez o seu esclarecimento, mas parece-me que V. Ex.ª com ele não modificou nada.

Eu, por mim, continuo a ter dúvidas, ou melhor, tenho a certeza que não é com a concessão de um título que se poderá solucionar certas deficiências.

Termino pedindo que o referido diploma seja modificado de forma a que o direito de concessão de títulos e graus universitários se mantenha exclusivamente nas nossas Universidades.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Armando Cândido: - Sr. Presidente: na ordem das minhas considerações sobre os problemas enunciados no meu requerimento de 3 de Julho de 1959, isto é, depois de me ter ocupado nas sessões de 20 de Janeiro último e de 11 do corrente dos portos e aeródromos açorianos, esta minha intervenção deveria ser dedicada aos transportes marítimos e aéreos para aquelas ilhas.

Mas tenho de alterar a sequência dos assuntos em virtude dos protestos locais contra a execução da portaria publicada no Diário do Governo n.º 290, 3.º série, de 15 de Dezembro de 1960, que estabeleceu- as condições de venda de energia eléctrica naquela ilha.

Não me surpreenderam esses protestos. E não me surpreender um pela única e simples razão de que não vivia iludido. Por isso e com a devida antecedência, através do meu requerimento de 3 de Julho de 1959, pedi informações sobre as tarifas em vigor e perguntei se estava prevista ou em estudo qualquer alteração dessas tarifas.

Quer dizer que não vou desfolhar palavras inúteis sobre os acontecimentos, mas referir alguma coisa do que sei e pronunciar-me ainda objectivamente sobre o mérito ou demérito das soluções encontradas, de modo a que todos aquelês que hoje tocam a rebate no sino do seu entendimento, inclusive os que na imprensa chamaram a terreiro os Deputados pelo círculo de Ponta Delgada, fiquem sabendo de uma vez para sempre que não se dorme neste baluarte, ...

O Sr. Virgílio Cruz: - Muito bem!

O Orador: - ... nem se transige com a ilusão, nem se transaciona com o erro, nem se colhe outro lucro que não seja o de contribuir honradamente para a defesa do interesse geral.

O Sr. Sequeira de Medeiros: - Muito bem !

O Orador: - Sr. Presidente: o espaço de tempo que me é concedido para falar antes da ordem do dia não chega para resumir satisfatoriamente os antecedentes que levaram o Governo à publicação do Decreto-Lei n.º 40 904, de 15 de Dezembro de 1956, pelo qual foi criada a Federação dos Municípios da Ilha de S. Miguel para a produção e distribuição de energia eléctrica. Narrarei um dia, se Deus me der vida e saúde, essa longa e difícil história, sem omitir um capítulo que seja. Agora terei de me limitar aos pontos indispensáveis à boa compreensão das minhas palavras, pois tenho de chegar depressa ao caso mais próximo.

Assim, passo a ler a seguinte passagem do relatório do Decreto-Lei n.º 40 904:

Urgia, entretanto, estruturar também juridicamente a produção e a distribuição de energia eléctrica em S. Miguel, que continuam a efectuar-se em condições deficientes, e para apreciar o regime legal das instalações existentes foi finalmente nomeada uma comissão por portaria de 12 de Maio de 1951, que no fim do mesmo ano apresentou um relatório esclarecendo completamente esse aspecto do problema.

É que esta passagem tem para mim um significado especial. Quem estudou a estruturação jurídica, quem apreciou o regime legal das instalações existentes, em trabalhoso parecer, aliás elaborado gratuitamente - gratuitamente, repito -, fui eu, após ter aceitado o convite que me foi dirigido para o efeito pelo então Ministro das Obras Públicas Eng.º José Frederico Ulrich para presidir à comissão nomeada por aquela portaria.

Não me posso demorar nus alusões a esse aturado trabalho, mas convém que se tome desde já, e sem prejuízo de futura explanação, conhecimento deste facto bem elucidativo:

Tratava-se de saber em dada altura se alguns documentos encontrado(r) e que diziam respeito à central dos Tambores, pertencente ao Eng.º Manuel Pacheco Vieira, lhe .davam ou não certo e determinado direito. Depois de examinar e estudar atentamente esses documentos, não obstante manter com o possuidor da referida central eléctrica velhas e sólidas relações de boa amizade, cheguei à conclusão de que não deveria ser reconhecido o direito em causa. E foi mais tarde a Procuradoria-Geral da República, no parecer votado no seu conselho consultivo em 30 de Abril de 1953, que, discordando da minha opinião, se pronunciou pela existência de tal direito.

Poderá a referência parecer desnecessária. Mas pensei que ela só por si bastará para atestar a inatacável isenção com que procedi ao estudo a que se refere o relatório do Decreto-Lei n.º 40 904, ainda que pese a todo e qualquer magarefe da honra alheia ou derrancado aprendiz daquele Voltaire que ria sinistramente da verdade, ensinando a mentir sem descanso.

Dito isto, adiante, sem rodeios e com a resolução de quem não foge à dificuldade dos problemas nem ao risco de enfrentar as situações criadas.

A comissão a que presidi e de que faziam parte um engenheiro civil e outro electrotécnico, aos quais e dês-te lugar desejo exprimir o meu elevado apreço e reconhecimento pela valiosa colaboração que me prestaram, não fora, afinal, nomeada só para estudar a situação jurídica dos diversos aproveitamentos hidroeléctricos na ilha de S. Miguel, competia-lhe também examinar a orientação a adoptar de futuro no respeitante à produção e grande distribuição- de energia.

Leio a conclusão citada nessa portaria, como sendo uma das conclusões a que chegara o Conselho Superior de Obras Públicas:

O problema da electrificação da ilha poderá ser satisfatoriamente resolvido entregando a produção

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e grande distribuição de energia a uma empresa mista de carácter privado.

E extraio mais este período do texto da mesma portaria:

Trata-se de problemas complexos, cujo estudo exige visitas às centrais em exploração, avaliação das respectivas instalações e equipamento, exame da documentação legal das concessões e, finalmente, diligências junto dos concessionários no sentido de se obter acordo de princípio para uma solução dentro dos moldes requeridos na conclusão do parecer do Conselho Superior de Obras Públicas, que se considera de facto de considerar.

Não prescindo, destas duas passagens da portaria de 12 de Maio de 1951. Também não posso deixar de referir os pormenores que interessam fundamentalmente ao entendimento da questão.

Talvez o projecto, de decreto-lei sobre a electrificação geral da ilha de S. Miguel, que elaborei e apresentei em tempo e a quem de direito, tenha a virtude de condensar os factos iate ao fervoroso e famoso aparecimento da ideia - federação de municípios.

Eis o projecto:

1) A primeira comissão de engenheiros que foi à ilha de S. Miguel por causa do fornecimento de energia eléctrica ao concelho de Ponta Delgada entregou o seu relatório em 23 de Maio de 1930.

A essa comissão outra se seguiu, nomeada por despacho ministerial de 30 de Janeiro de 1934.

Em 1937 uma terceira comissão visitou, os aproveitamentos hidroeléctricos ligados à distribuição de energia naquele concelho com o fim de estudar as bases de um acordo entre os respectivos produtores.

Passados anos a missão instituída pelo Decreto-Lei 11.º 32 426, de 23 de Novembro de 1942, para proceder ao reconhecimento das possibilidades técnicas e económicas dos distritos de Ponta Delgada e Angra do Heroísmo, no que respeita a aproveitamentos" hidráulicos, reuniu os elementos necessários ao estudo dos recursos energéticos de S. Miguel e relatou desenvolvidamente os seus trabalhos, os quais foram apreciados pelo Conselho Superior de Obras Públicas no parecer n.º 2120, de 26 de Outubro de 1950.

Por sua vez, a comissão nomeada pela portaria de 12 de Maio de 1951 estudou a situação jurídica dos aproveitamentos em causa e das linhas de alta tensão, descreveu as instalações, relatou as suas diligências junto dos actuais concessionários com o fim de estabelecer um acordo de princípio para a constituição de uma empresa única capaz de produzir e distribuir em alta tensão toda a energia de que a ilha carece e dispôs as bases de uma orientação futura a adoptar.

A pedido da própria comissão, e com referência ao estudo jurídico por ela efectuado, foi ouvida a Procuradoria-Geral da Eepública.

O parecer do respectivo conselho consultivo tem a data de 26 de Maio de 1952.

Como se vê, ò problema tem merecido todo o interesse e a natural preocupação e as conclusões dos relatórios elaborados mostram-se suficientemente amadurecidas.

2) Através da execução da Lei n.º 2002, de 26 de Dezembro de 1944, e do Plano de Fomento, a produção de energia eléctrica, que de 1941 a 1945 orçou por 200 milhões de kilowatts-hora, subiu para 1400 milhões em 1954.

Uma vez realizados os empreendimentos em curso no Cávado, no Zêzere e no Douro internacional, calcula-se atingir em 1958 o total de 2350 milhões.

Com a proposta de lei n.º 21, enviada à Assembleia Nacional, pretende-se a levar a energia a todas as freguesias e, logo que for possível, a todas as povoações ou locais onde residam e trabalhem portugueses .

Os Decretos-Leis n.ºs 33 158 e 33 59 estabeleceram para a ilha da Madeira um programa de realizações hidroagrícolas e hidroeléctricas no valor inicial de 60 000 contos. As duas centrais inauguradas funcionam com a capacidade de produção de 15 milhões de kilowatts-hora.

As obras na ilha Terceira resultaram da publicação do Decreto-Lei n.º 38 770, de 31 de Maio de 1952, e o seu custo foi estimado em -26 000 contos: 19 500 contos pela Junta Geral do Distrito Autónomo de Angra do Heroísmo e 6500 contos por comparticipação do Estado através do Fundo do Desemprego. Os três escalões que foram projectados estão já em condições de exploração e têm a capacidade total de 3500000 kWh.

3) A Empresa de Electricidade e Gás, a Empresa Eléctrica da Povoação e a Câmara Municipal de Ponta Delgada produzem e distribuem toda a energia eléctrica utilizável na ilha de S. Miguel.

Em Ponta Delgada a Empresa de Electricidade e Gás concorre com o Município.

O facto tem originado conflitos entre as duas entidades sob a forma de protestos e reclamações.

A propósito, observa-se no parecer do Conselho Superior de Obras Públicas que o regime de livre concorrência em que se tem vivido deu lugar ao aviltamento dos preços de venda de energia e, consequentemente, a uma exploração ruinosa, que se traduziu no inconcebível estado em que se encontram as instalações e as linhas.

Várias soluções foram apresentadas e o Decreto n.º 29 413, de 27 de Janeiro de 1939, adoptou uma delas, mas reconhece-se que nenhuma pode convir ao interesse geral.

As redes exploradas pelos três produtores não têm qualquer interligação e as zonas por elas electrificadas encontram-se deficientemente servidas.

Dado o grau de saturação das instalações de distribuição de energia, verifica-se actualmente a impossibilidade de atender qualquer pedido que determine aumento do consumo.

Da potência de transformação instalada em toda a ilha 75 por cento encontra-se em Ponta Delgada e 60 por cento das freguesias rurais estão pôr electrificar. X O consumo específico médio é de 54 kWh por habitante.

A densidade populacional é de 233 por quilómetro quadrado e a taxa de natalidade (34,5) é a maior verificada em Portugal.

O desenvolvimento industrial está longe de satisfazer as exigências demográficas.

A falta de energia impede o aproveitamento intensivo da terra.

4) Os técnicos que tiveram de se pronunciar oficialmente sobre a melhor utilização dos recursos hidráulicos da ilha de S. Miguel para a produção de energia eléctrica são unânimes em preconizar a concentração da produção e grande distribuição numa só empresa.

A ideia de um organismo misto de carácter privado fixa-se no parecer do Conselho Superior de Obras Públicas n.º 2120, de 26 de Outubro de 1950, e1 na portaria de 12 de Maio de 1951.

5) Nas ilhas da Madeira e da Terceira não existiam quaisquer aproveitamentos hidroeléctricos anteriores

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aos que se executaram e estão executando ao abrigo dos Decretos-Leis n.ºs 33 158, 33 159 e 38 770.

Em S. Miguel, a cinco oficinas autorizadas" e quatro centrais em regime de concessão totalizam o número das instalações produtoras.

Esta circunstância figurou como elemento de conjunto no Plano de electrificação geral da ilha, aprovado pelo Conselho Superior de Obras Públicas no parecer n.º 2120. Por isso, o Governo, no propósito de harmonizar o mais possível o interesse particular dos actuais concessionários e detentores das "oficinas autorizadas", deu a todos, por intermédio da comissão nomeada pela portaria a e 12 de Maio de 1951, o ensejo para um entendimento que conduzisse à solução amigável do problema.

Não se chegou, porém, a resultados satisfatórios.

As três entidades produtoras coligaram-se na resposta, a discordando da criação de uma empresa mista de carácter privado para a electrificação geral da ilha de S. Miguel, confiando na esperança de por si e nas condições que o Governo achasse por bem resolverem tão louvável propósito e contando para tanto com o imprescindível apoio, para o que, e desde que lhes fossem concedidas as indispensáveis facilidades, consideravam a ilha dividida em três zonas a seu cargo, unicamente para o efeito de electrificar as freguesias, lugares ou áreas ainda não servidos de cada concelho".

Simplesmente a comissão encarregada das negociações objectou com acerto:

a) Nenhuma das. entidades produtoras está em condições de realizar por si e sem o apoio financeiro do Governo, segundo se depreende, as obras para a electrificação total da sua zona;

b) A solução despreza as regiões actualmente electrificadas, esquecendo a reserva de energia necessária ao desenvolvimento das suas necessidades ;

c) Não se atinaria com a forma pacífica de este produtor poder executar, na zona pertencente àque outro produtor, as obras imprescindíveis ao aumento do seu volume de produção capaz de satisfazer os seus compromissos ;

d) Existiria o risco de uma zona ficar, em relação às exigências do seu consumo, mais provida de energia do que as restantes;

e) Prejudicar-se-ia, por falta de conveniente interligação entre os três sistemas de produção, o mais racional aproveitamento dos recursos energéticos, designadamente na altura das estiagens;

f) Comprometer-se-ia o ritmo e a unidade de execução do plano contido no relatório da missão técnica dos aproveitamentos hidráulicos dos Açores, expondo-o às conveniências de cada produtor, sempre prontos a adiantarem a sua razão e a sobreporem o seu interesse ;

g) Continuariam a Empresa de Electricidade e Gás e a Câmara Municipal de Ponta Delgada com uma duplicação escusada de linhas de transporte de energia em alta tensão.

h) Há que rever o problema à luz das realidades presentes.

As "oficinas autorizadas" não gozam de estabilidade de exploração. As licenças que lhes dizem respeito têm carácter precário e revogável. Quatro dos cinco aproveitamentos desse género existentes em S. Miguel nem licenças possuem. Aplica-se-lhes o prazo de validade de 50 anos, a contar de 1902, segundo o Decreto-Lei n.º 27 820.

O facto apreciado no seu conteúdo de tolerância demonstra a boa vontade do Governo.

Mas os actuais concessionários e detentores das "oficinas" não aceitam ,a concentração da produção e da grande distribuição numa empresa única. Esta atitude carrega o problema, embaraçando-lhe especialmente o aspecto da distribuição em baixa tensão, com o erro economico das duplicações de redes e explorações independentes de zonas ricas e de zonas pobres.

Assim, o plano de electrificação geral, que poderia ser executado em bloco, terá duas fases: a primeira, compreendendo a expropriação dos terrenos, obras, equipamentos industriais e instalações anexas das "oficinas autorizadas" e de todas as redes de alta e baixa tensão das duas empresas existentes, a afectação das redes da Câmara Municipal nos termos do n.º 2 do artigo 1.º da Lei n.º 2030, de 22 de Junho de 1948, a compra de energia produtível nas centrais concedidas e a execução de parte dos novos aproveitamentos; a segunda, destinada ao resgate das centrais pertencentes às empresas, à oportuna utilização do preceito citado quanto à central da Câmara e ao completamento das obras novas.

7) Os Decretos-Leis n.ºs 33 159 e 38 770, referentes às ilhas da Madeira e Terceira, prevêem a entrega das obras hidroeléctricas e da sua exploração às juntas gerais dos respectivos distritos autónomos.

Quanto à ilha de S. Miguel, dados os aspectos particulares que o problema ali reverte, prefere-se habilitar a Junta Geral do Distrito Autónomo e entrar na constituição de uma empresa mista do tipo indicado pelo Conselho Superior de Obras Públicas, permitindo-lhe, entretanto, explorar as "oficinas autorizadas", as redes de distribuição em alta e baixa tensão, requerer as necessárias expropriações e comprar, pelo preço que for fixado pelo Ministério da Economia, a energia produtível nas centrais em regime de concessão.

8) O Governo não podia deixar em ponto morto o Plano da electricificacão geral da ilha de S. Miguel e muito menos limitar-se a negar licenças para novos aproveitamentos.

Para mais, no relatório doe Decretos-Leis n.ºs 33 158 e 33 159 diz-se que as obras hidroagrícolas e hidroeléctricas da ilha da Madeira fazem parte "do vasto plano de conjunto que o Governo da Nação se propôs realizar nas ilhas adjacentes, seguindo uma ordem que parece a mais conforme com os interesses nacionais.

Nestes termos:

Usando da faculdade conferida pela 2.ª parte do n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:

Artigo 1.º A designação de "oficinas autorizadas" e "oficinas hidráulicas" empregada no Decreto de 27 de Maio de 1911 inclui-se na expressão "obras destinadas a aproveitar o uso industrial das águas correntes" contida no Decreto-Lei n.º 27 820, de 5 de Julho de 1937.

Art. 2.º Deixam de ter validade os diplomas de licença respeitantes às "oficinas autorizadas" e à exploração das redes de distribuição em alta e baixa tensão existentes na ilha de S. Miguel.

Art. 3.º A Junta Geral do Distrito Autónomo de Ponta Delgada é autorizada a participar na constituição de uma empresa mista de carácter privado para a electrificação geral daquela ilha, segundo o plano aprovado pelo Conselho Superior de Obras Públicas e nos termos a fixar pelo Governo.

Art. 4.º Enquanto não se constituir a empresa, o mesma Junta poderá explorar as "oficinas autorizadas"

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e as redes de distribuição em alta e baixa tensão, cujas licenças caducam com a publicação do presente decreto-lei, as "oficinas" abrangidas pelos .antigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 27 820 e comprar, ao preço que for fixado pelo Ministério da Economia, a energia produtível nas centrais concedidas necessária às exigências do consumo.

Art. 5.º Para os fins indicados no artigo anterior, é atribuída àquele corpo administrativo a faculdade de expropriar os terrenos, obras, equipamentos industriais e instalações anexas das a oficinas autorizadas" e as redes de alta e baixa tensão pertencentes à Empresa de Electricidade e Gás e à Empresa Eléctrica da Povoação.

Art. 6.º São afectadas à referida Junta,, nos termos do n.º 2 do artigo 1.º da Lei n.º 2030, de 22 de Junho de 1948, as redes de distribuição de energia de alta e baixa tensão pertencentes à Câmara Municipal de Ponta Delgada.

Art. 7.º A Junta só poderá apropriar-se das redes depois de depositar o montante da compensação fixado nos termos do artigo 41.º do Decreto n.º 37 758, de 22 de Fevereiro de 1950.

Art. 8.º Todos os novos aproveitamentos hidroeléctricos serão realizados pela Junta Geral ou concedidos à empresa que se constituir à medida que forem solicitados.

Art. 9.º É declarada a utilidade pública urgente das expropriações necessárias à consecução dos objectivos do presente decreto-lei.

Art. 10.º Este diploma entra imediatamente em vigor revoga o Decreto n.º 29413, do 27 do Janeiro de 1939".

Numa pequena, mota a seguir no texto desta proposta, escrevi o seguinte:

"Falta dotar a Junta Geral com os meios financeiros indispensáveis, à semelhança do que se fez através do Decreto-Lei n.º 38 770 em relação à Junta Geral do Distrito de Angra do Heroísmo".

O grande fim em vista com este projecto de decreto-lei disse em informação posterior - era o de trazer os concessionários à colaboração a que se tinham esquivado. Quando eles vissem que o Governo estava na declarada e firme disposição de ir com o problema para u frente, dispondo-se a resolvê-lo só por si, se necessário fosse, logo desejariam participar na constituição da empresa mista de carácter privado, que foi sempre a ideia posta superiormente.

Sr. Presidente: e foi após a apresentação daquele projecto de decreto-lei, no qual se salvaguardava - será bom acentuar - a superiormente indicada constituição de uma empresa mista de carácter privado, que começou a parte anais singular de toda esta história.

A Câmara Municipal, que era uma das três entidades produtoras - e distribuidoras de energia, sem consultar os outros dois produtores e distribuidores, com os quais tinha chegado a acordo sobre a hipotética divisão, da ilha em zonas, oferece-se para entrar numa federação de municípios e defende a ideia com base neste esquema sedutor:

Com a federação de municípios o capital não teria de ser renunerado. Na empresa mista a renumeração atingiria, a soma de 3360 coutos. A administração da empresa custaria 420 contos. A federação encarregar-se-ia da administração gratuitamente. O mesmo aconteceria quanto à fiscalização, que seria também gratuita., uma vez Constituída a federação, e importaria em 1.80 contos, no caso da empresa. Também as contribuições e impostos seriam de 50 contos, contra 220 contos.

Por sua vez, os outros dois concessionários, conhecedores da atitude da Câmara Municipal, não por esta os ter informado, mas por boca de estranhos, dirigem-se aos Ministros competentes, prontificam-se a fazer parte da empresa mista preconizada na portaria dê 12 de Maio de 1951, como sendo a melhor forma a adoptar.

A comissão encarregada por esta portaria ainda se encontrava, em exercício. A portaria, por consequência, estava, também em vigor.

Já não tinha razão de ser a solução de força contida no projecto do decreto-lei por mim apresentado. O conteúdo da portaria ganhava vida, em face das declarações dos dois concessionários dispostos a submeterem-se.

Coube-me então o dever moral e legal de discordar da ideia federação de municípios, alinhando razões, em vez de ilusões:

O Estado favorecerá as actividades económicas particulares (artigo 32.º da Constituição).

As necessidades colectivas da população dos concelhos só poderão constituir objecto de municipalização quando a iniciativa privada as não proveja satisfatoriamente (artigo 165.º do Código Administrativo).

O Estado reconhece na iniciativa privada o mais fecundo instrumento do progresso e da economia da Nação (artigo 4.º do Estatuto do Trabalho Nacional).

O volume das obras a executar para o preenchimento total do programa de electrificação da ilha de S. Miguel traduzia-se em muitas dezenas de milhares de contos (130000 contos, aproximadamente).

As câmaras municipais da ilha de S. Miguel são pobres e teriam de recorrer ao financiamento total por meio de sucessivos um préstimos a contrair na Caixa Geral de Depósitos com o aval do Estado.

Esses empréstimos importariam o pagamento du juros e amortizações, redundando em encargos elevados.

O pagamento de tais encargos corresponderia a uma verdadeira remuneração do capital investido.

O Estado não teria qualquer vantagem ou conveniência em mobilizar tanto dinheiro para se sobrepor inteiramente à iniciativa privada através das câmaras municipais da ilha de S. Miguel.

O Sr. Sequeira de Medeiros: - Muito bem!

O Orador: - A economia da ilha nada lucraria com a libertação do capital particular empregado na produção de energia eléctrica, pois esse capital não seria utilizado na instalação ou no desenvolvimento de outras indústrias, mas na procura da terra, aumentando-lhe o preço e complicando-lhe o sistema de arrendamento até ao ponto da mais encarniçada especulação.

Ë conhecida nos meios rurais a dificuldade no recrutamento de valores para a administração municipal. Além disso, e em relação ao problema, a Câmara Municipal de Ponta Delgada tinha a vantagem da sua posição de produtora de energia e o peso do seu quadro de técnicos e funcionários. Não ficaria aquela. Câmara, realmente, em situação de preponderância?

O concelho rural pode, em regra, não possuir administradores da craveira intelectual dos que dirigem os concelhos urbanos, mas existe uma intuição de fundo eminentemente combativa, que brota da alma de todo aquele a quem se confia os destinos da sua pequena pátria, a intuição bairrista, sempre mais ardorosa quanto mais diminuta for a área territorial afecta ao sentimento de mandar. Como prevenir os inevitáveis conflitos ?

O Sr. Júlio Evangelista: - Muito bem!

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O Orador: - Não serviria a distância até ao continente paia multiplicar as facilidades de disputa?

Nada haveria a temer quanto ao investimento do capital privado, viesse esse capital de onde viesse, pois todo ele ficaria rigorosamente submetido às cláusulas expressas nos cadernos de encargos das concessões a outorgar.

Argumentei, previ e preveni.

Todavia, o desejo de acertar por parte do Governo, porventura fundado em razões que não lhe pareceram só razões de momento, a boa fé e a ilusão de outros, e até, da parte de alguns, a apressada e falaz vontade de inchai em o próprio nome, preferiram a solução federação de municípios, e esta foi por diante.

O certo é que estamos em presença do facto consumado, e até eu, uma vez decretada a solução que combati, tenho ajudado a Federação, empenhando, por vezes, os meus esforços junto da Caixa Geral dos Depósitos para que lhe sejam concedidos os empréstimos necessários.

Mas chegou a hora de saber quem tinha razão. E que se é saturar e útil confessar o nosso erro, não é menos salutar, nem menos útil, demonstrar a razão que nos assiste.

Afinal a Federação de Municípios tem, no próprio decreto-lei que a criou, a negação de federação. For força do disposto no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 40904, existe, tem de existir, um director-delegado dos serviços municipalizados de nomeação ministerial, que possui, segundo o artigo 5.º, o direito de sustentar as suas propostas junto de entidades estranhas à Federação.

Afinal, e a atender, pelo menos, à justa remuneração necessariamente atribuída ao director-delegado, a administração, por parte da Federação, não é plenamente gratuita.

Afinal a Federação tem de remunerar o capital investido através dos juros e das amortizações que tem de pagar nos seus prazos à Caixa Geral de Depósitos.

Afinal a Federação tem de assegurar a sua viabilidade económica como a empresa industrial", segundo a própria expressão usada no decreto-lei que a criou.

Afinal a magia aliciante das tarifas baratas não passou de lenda esfarrapada pelo vento das realidades.

O Sr. Sequeira de Medeiros: - Muito bem!

O Orador: - Afinal não era preciso recorrer à solução federação para se chegar ao quadro das tarifas hoje em rigor.

Afinal o pretenso argumento do pretenso caso local a resolvi pretensamente pela constituição da federação, degenerou num meio de preparar um autêntico caso de especial relevância, tantas são as reacções agora provocadas, avultando, entre todas, a do comércio da cidade do Ponta Delgada, que se sente agravado e pede a revisão das tarifas.

Afinal não valeu a pena falar do milagre dos lucros, que por força da lei geral jamais poderão ser procurados pela Federação.

Afinal e devido às dificuldades de financiamento, aliás previstas e por mim dadas como inevitáveis, a solução feleraão de municípios tem atrasado -irremediavelmente a execução do plano de obras gizado para a electrificação geral da ilha de S. Miguel. A simples leitura desta parte das informações que. me foram, pronta e honestamente, prestadas pelo engenheiro director-delegado da Federação em 18 de Setembro de 1959, são de uma eloquência que não admite réplica.

Por outro lado, não era possível à Federação iniciar a sua actividade sem dispor de fundos de qualquer natureza. E a Federação não dispunha, na altura em que o director-delegado tomou posse do cargo, de um centavo sequer.

Estava, com efeito, previsto que o financiamento da Federação fosse assegurado por empréstimo até ao montante de 67 000 contos, segundo reza o artigo 29.º do já citado Decreto-Lei n.º 40 904. Mas, porque o referido decreto-lei não assegurava à entidade prestamista as necessárias garantias, o primeiro-pedido de empréstimo, feito em Março de 1957, por sugestão do director-delegado ainda antes da sua posse, não mais pôde ter andamento.

O problema só se resolveu com a publicação do Decreto-Lei n.º 41 527, de 11 de Fevereiro de 1958, que, além de possibilitar a concessão dos empréstimos, veio promulgar as disposições necessárias para que a Federação pudesse desenvolver a sua actividade, uma vez que, entretanto, se tinha reconhecido que as disposições do Código Administrativo que regulam a organização e o funcionamento dos serviços municipalizados e das federações de municípios não asseguram a plena eficiência da Federação dos Municípios da Ilha de S. Miguel, como tão judiciosamente se reconhece no preâmbulo do citado Decreto-Lei n.º 41 527.

Só após a publicação deste último decreto-lei foi, portanto, possível submeter à aprovação de SS. Exa. os Srs. Ministros da Economia e do Interior o Regulamento Interno da Federação, contendo o quadro do seu pessoal maior, menor, especializado e operário.

Aprovado o referido regulamento por portaria de 31 de Março de 1958, só em Abril puderam, pois, começar a preencher-se os quadros do pessoal e a dar à Federação verdadeiras possibilidades de estudar os problemas a resolver, estabelecer planos e organizar programa de actuação. Entretanto tinham passado dezasseis meses sobre a data do decreto que criou a Federação.

Sublinho: dezasseis meses de atraso contados sobre a data da publicação do decreto que criou a Federação, fora os atrasos posteriores que teremos um dia de verificar e de somar.

Afinal está a ver-se que não havia da minha parte qualquer incompreensão ou obstrucionismo, mas o simples e indeclinável dever de evitar as incompreensões das ilusões e os obstrucionismos das incompreensões.

Coloquemos, entretanto, cada facto em sua razão e cada razão em seu lugar.

Não conheço por enquanto, na íntegra, as queixas dos que protestam.

Dizem-me, por exemplo, que durante várias noites o comércio apagou as luzes das montras e os anúncios luminosos por ter achado as tarifas novas demasiado pesadas para as suas disponibilidades económicas.

Ë um pormenor que se lamenta e cuja repetição não é de desejar.

Pelo telegrama que recebi do presidente do Grémio do Comércio de Ponta Delgada sei que vem a caminho uma exposição, naturalmente baseada em razões porventura atendíveis, porventura não atendíveis, ou só atendíveis em determinada medida, mas, sem dúvida e em qualquer dos casos, dignas da atenção do Governo.

A informação que tenho sobre o presente aumento das tarifas e que me foi fornecida na já referida data de 18 de Setembro de 1959 é a seguinte:

Pelo que respeita ao valor das novas tarifas não é possível, por enquanto, dar elementos concretos, uma vez que elas dependerão fundamentalmente de três grandezas: preço de compra da energia a ad-

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quirir, preço da energia de produção própria, volume dos investimentos a levar a efeito nas obras de transporte, transformação e distribuição de energia.

A primeira grandeza deve estar a ser fixada pelo Governo e a segunda apenas se conhece na parte relativa à produção térmica, faltando a Hidroeléctrica do Cávado (encarregada do estudo dos aproveitamentos) fixá-la definitivamente na parte de produção hidráulica, em face do esquema definitivamente escolhido.

Crê-se que dentro de muito poucos meses será possível fornecer elementos completos pelo que respeita a preços.

Pelo que se refere à estruturação das tarifas pode, desde já informar-se que haverá tarifas para fornecimento em alta e baixa tensão.

Nestas últimas o preço da energia variará conforme as aplicações: usos domésticos, aquecimento, usos comerciais, força motriz, etc... Todas as tarifas serão do tipo degressivo por escalões de consumo.

Enfim, a sua estruturação será absolutamente idêntica à de todas as tarifas aprovadas no continente de há quinze anos para cá.

Nenhuns outros elementos me foram fornecidos até agora.

Não há, quanto às tarifas de venda de energia eléctrica na ilha de S.º Miguel, nada de semelhante com o que se passa relativamente às tarifas de venda na cidade do Porto, onde existe entre a respectiva Câmara Municipal e duas empresas fornecedoras de energia um contrato cuja validade está a ser discutida nos tribunais.

Em S. Miguel a questão e outra.

A energia eléctrica vendia-se a preços demasiado baixos e absolutamente incompatíveis com a necessidade de melhorar as instalações produtoras e as redes de distribuição já existentes e de proceder à construção de novas centrais e ao lançamento de novas redes.

Havia tarifas por contador para a iluminação, força motriz e aquecimento; havia tarifas por avença, segundo a potência das lâmpadas, e havia tarifas para a força motriz, segundo a potência dos motores.

Enquanto a Empresa de Electricidade e Gás e os Serviços Municipalizados de Ponta Delgada cobravam pela iluminação 1$ por kilowatt-hora, a Empresa de Electricidade da Povoação cobrava 1 $60.

O quadro que vou entregar para ser publicado como anexo às considerações que estou formulando dará melhor ideia das condições de venda de energia eléctrica que existiam na ilha de S. Miguel.

Não podia ser, não podia continuar assim.

O aumenta das tarifas era inevitável,, fosse qual fosse a solução escolhida para a electrificação geral da ilha de S. Miguel.

Tudo está em saber se as, novas tarifas estão fora do geral e normal das tarifas vigentes nas demais zonas electrificadas do País, ressalvadas as condições próprias de cada zona para a produção; transporte, e distribuição de energia, as datas em que foram aprovados os diferentes regimes tarifários e o facto de a Federação não passar de uma "empresa industrial" que partiu do nada, à custa de empréstimos contraídos na Caixa Geral de Depósitos, que já montam, segundo me dizem, a 67 000 contos.

Ora, confrontando, por exemplo, as tarifas de consumo doméstico aprovadas para a ilhas de S. Miguel com as tarifas em vigor nas outras zonas electrificadas do País, exceptuando a cidade do Porto, que usufrui de um regime muito especial, e alguns outros casos que se afastam por razões muito particulares do nível tarifário geral, como sejam os respeitantes aos concelhos da Guarda e Viseu, chega-se à conclusão de que as condições de venda de energia na ilha de S. Miguel acompanham as demais, salvo diferenças impostas pelas condições já ressalvadas.

Para usos domésticos no distrito do Funchal, onde as obras de electrificação têm sido muito caras, existem quatro escalões, distribuídos, respectivamente, pelas seguintes importâncias: 2$20, 1$50, $70 e $50. Talvez tenha interesse o quadro tarifário em vigor naquele distrito, pelo que peço para ser também publicado como anexo.

A tarifa doméstica geral no concelho de Coimbra reparte-se por três escalões. Assim, e respectivamente por cada kilowatt-hora, os preços são de 2$20, l$10 e $275.

Mas já no concelho de Santarém os preços são de 2$40, 1$50 e $60; no de Tavira 3$, 1$80 e 1$90, e no concelho de Ponte de Sor 2$50, l$20 e $50.

Julgo desnecessário aludir a mais regimes tarifários, a não ser o da Federação dos Municípios da Região de Basto, também dividido por três escalões para usos domésticos, a saber: 2$40, l$20 e $40.

Agora - agora haverá que considerar a situação especial do custo de vida na ilha de S. Miguel, "onde tudo que vai do. continente se vende com o insuportável aumento proveniente de alcavalas alfandegárias verdadeiramente incompreensíveis e inconcebíveis entre parcelas deste mesmo Portugal.

O Sr. Sequeira de Medeiros: - Muito bem!

O Orador: - Haverá que considerar a verdadeira situação do comércio local e contribuir para o seu legítimo e natural desafogo, tomando as medidas que porventura as circunstâncias exigirem.

Haverá, possivelmente, que simplificar algumas normas burocráticas, de modo a que os serviços se tornem mais acessíveis e menos complicados.

Haverá que considerar, realmente, com o mais profundo e atento cuidado as condições de produção, transporte e distribuição de energia eléctrica na ilha de S. Miguel, revendo, se necessário for, essas condições em face das estritas exigências económicas da exploração por parte de uma federação dê municípios e em face da própria economia da ilha.

Haverá também que confiar na seriedade dos administradores da Federação e na competência dos seus técnicos, em relação aos quais, a uns e outros, julgo do meu dever supor que não fazem nem farão do caso o caso da Federação, mas um caso subordinado no interesse geral.

Haverá ainda e sempre que esperar do Governo o governo justo.

Haverá, finalmente, que perguntar se a Federação, uma vez amortizados os empréstimos contraídos ou a contrair e , realizadas todas as obras planeadas para a inteira electrificação da ilha de S. Miguel, ou mesmo antes de tudo pago e da realização total das obras, chegará um dia a apresentar à aprovação superior um novo plano de tarifas baseado na virtude de lhe estar vedada a procura de lucros com os serviços de produção, transporte e distribuição de energia a seu cargo.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.

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QUADROS ANEXOS

As tarifas de venda em vigor na data em quê a federação tomou conta da exploração das redes eram as seguintes:

Tarifas em vigor em 15 de Janeiro de 1958


[ver quadro na imagem]
Serviços municipalizados R.E.G Ponta Delgada Vilas E.P.P

Tarifas de venda de energia eléctrica no distrito do Funchal
[ver quadro na imagem]
Eacalões Usos Domésticos Comercial e Industrial Força motriz Industrial Agrícola Montra anucios e arralafos Edificios Publicos

Especial para pobres 1$70
Iluminação pública $50

(a) Variável consoante a potência do contador.
(b)Aplicâvel das 23 horas às 8 horas.

O Sr. Sousa Rosal: - Sr. Presidente: a tributação a que estão sujeitas as pensões de reserva, reforma ou aposentação dos servidores do Estado solicita uma revisão que a humanize e de um esclarecimento que a liberte de engenhosas e forçadas interpretações.

A mentalidade que preside à sua colheita parece estar impregnada "do desejo de conseguir, de qualquer modo, receitas para a (Caixa Geral de Aposentações, como quem desconhece a fragilidade económica dos seus contribuintes, a natureza do tributo e as obrigações do Estado para com os seus servidores.

Todas as tributações, e esta mais do que qualquer outra, têm os seus limites físicos e morais, que uma vez ultrapassados podem ser factores de empobrecimento e de desespero, pondo até em dúvida a sua legitimidade, quando não isenta aquele mínimo considerado indispensável a uma existência digna " não pesa devidamente o seu fim económico e a na função social.

Concede o Decreto-Lei n.º 4.1 654, rectificado pelo Decreto-Lei n.º 41 958, ambos de 1058, o direito aos oficiais de reserva quando prestem serviço requererem a rectificação das suas pensões por serviços prestados depois de 1 de Outubro de 1954, e à medida em que forem completando anos de serviço até a pensão atingir o quantitativo estipulado para o vencimento dos oficiais do activo de igual patente e quadro.

Assim se deu, de certo modo e em parte, razão às considerações que fiz nesta Assembleia na sessão de 2 de Dezembro de 1904 a propósito do Decreto-Lei n.º 39 843, o qual tem dado motivo à publicação de sucessiva legislação esclarecedora e complementar, e ainda hoje, passados mais de seis anos, mantém um clima de dúvida e controvérsia.

A mais recente é a que resulta da intervenção da Caixa Geral de Aposentações nos domínios da administração das pensões de reserva, após a publicação do Decreto-Lei n.º 41 958, impondo ao Ministério do Exército uma interpretação dos §§ 1.º e 2.º do seu artigo 1.º reguladores da actualização de quotas e do pagamento dos débitos apurados por este motivo.

Os parágrafos a que me refiro dizem o seguinte:

§ 1.º A revisão implica a actualização de quotas descontadas desde 1 de Outubro de 1954 pelo período a que disser respeito e sujeita de futuro os interessados à contribuição de 6 por cento a favor da Caixa Geral de Aposentações.

§ 2.º O pagamento do débito apurado nas revisões pode ser feito nas pensões, nos termos do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 41 387.

A Caixa Geral de Aposentações tem a opinião que por força destes parágrafos "a revisão implica a actualização das quotas descontadas desde 1 de Outubro de 1954, em relação ao período ou períodos de serviço prestado na situação de reserva, ou seja ao pagamento da quotização calculada à taxa em vigor à data do Decreto-Lei n.º 41 654 (6 por cento) sobre o vencimento que serve de base à revisão, levando-se em conta as quotas que já tiverem sido pagas".

Deste seu entendimento resulta praticamente que os oficiais beneficiados pela revisão feita nos termos do Decreto-Lei n.º 41 958 contraem um débito constituído pela aplicação da taxa de 6 por cento sobre o vencimento que serviu de base à revisão, desde a data da contagem do tempo de serviço prestado a partir de Outubro de 1954, acrescido de juros de mora à razão de 4 por cento e diminuído das importâncias das quotas pagas, sem que elas tenham sido tidas em conta no cálculo dos. juros. A liquidação deste débito é feita num número de prestações fixadas sem consulta prévia aos devedores.

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Este procedimento não se tem como sendo a fiel interpretação do Decreto-Lei n.º 41 958, e está mesmo em flagrante contradição com o fim que com ele se teve em vista e desconhece os regimes diferentes a que estavam sujeitos os oficiais da reserva à data da publicação do Decreto-Lei n.º 41 654 e as circunstâncias de modo e tempo que rodearam a efectivação dos seus propósitos.

Os Decretos-Leis n.ºs 41 654 e 41 958 vieram preencher uma lacuna aberta por insuficiente redacção do Decreto-Lei n.º 39 843, de 1954, quanto à actualização das pensões dos oficiais da reserva em serviço, exceptuados, certamente por lapso, da actualização geral de vencimentos concedidos pelos Decretos-Leis n.ºs 39 842 e 39 843, por não ter estado presente no espírito do legislador quando da sua redacção a condição de actividade dos oficiais da reserva, que continuaram sujeitos ao regime de gratificações. Trata-se, no fundo, de regularizar uma situação de vencimento que estava pendente desde 1954.

Que assim é, não só nos dizem os próprios Decretos-Leis n.ºs 41 654 e 41 958 e as circunstâncias que acompanham a sua publicação, mas também o procedimento excepcional havido para com os oficiais da reserva em serviço na Guarda Nacional Republicana, Polícia de Segurança Pública e Guarda Fiscal, os quais, por despachos ministeriais, beneficiaram, à margem do Decreto-Lei n.º 39 843, do alimento de 100 por cento fixado para os oficiais do activo, medida que não abrangeu simultaneamente e inexplicavelmente os restantes oficiais da reserva igualmente ao serviço, e que só pela publicação dos Decretos-Leis n.ºs 41 654 e 41 958 saíram da posição de inferioridade em que encontravam quanto a remunerações.

A posição criada pelas leis de revisão de pensões de reserva perante o problema dos descontos não difere essencialmente daquela em que são colocados todos os servidores do Estado pagos pelo seu orçamento geral, incluindo os oficiais da reserva, quando se dá um aumento de remuneração em que inteiramente cabe aos serviços dos respectivos Ministérios a interpretação e a aplicação da lei, e nunca estes tomaram autorização por retroacção.

Não estando expressamente designado na lei o preceito retroactivo, não se justifica a sua aplicação nitidamente caracterizada pela contagem de juros.

Pode deduzir-se sem esforço que a intervenção da Caixa Geral de Aposentações, além de ultrapassar os limites da sua esfera de acção, não está conforme a lei e o habitual.

Vendo bem, não se trata de facto de um aumento de tempo de serviço, mas sim de estabelecer uma norma para actualizar vencimentos regulados por determinada fórmula em que obrigatoriamente se faz figurar o tempo de serviço e que no caso é puro artifício, visto que não se altera a data da inscrição, sucedendo tantas vezes contarem-se para efeito de revisão 40 anos a quem já tinha 41 e mais com os seus direitos e obrigações devidamente regularizados perante a Caixa Geral de Aposentações.

Apenas se trata de estabelecer um condicionalismo para a situação de actividade dos oficiais da reserva e nada mais.

Condicionalismo que ofende de certa maneira os direitos básicos, que fazem depender o valor da pensão para o mesmo posto e quadro do tempo de serviço efectivamente prestado, e que está dando origem a maiores vencimentos no mesmo quadro e posto a quem tem no total menos anos de serviço e até a quem é menos graduado, só pela circunstância estranha à vontade dos atingidos com este desequilíbrio, só por ter sido possível fazer mais algum tempo de serviço a partir de certa data.

A atitude da Caixa Geral de Aposentações deve estar influenciada pela ideia de que as pensões de reserva estão subordinadas a determinações que vigoram para a reforma e aposentação, que se processam completamente na sua jurisdição burocrática e que deseja dar vida em meio estranho igualando o que é diferente, como algumas vezes se tem feito por desconhecimento das particularidades inerentes às funções que podem ser atribuídas aos oficiais da reserva.

No caso devia ter-se deixado ao Ministério do Exército a iniciativa de aplicar a lei segundo a sua interpretação e responsabilidade, sujeitas às fiscalizações que impendem sobre os seus serviços, visto que na lei da revisão não se previam indemnizações que justifiquem a intervenção directa da Caixa Geral de Aposentações na gerência de verbas do Orçamento Geral do Estado consignadas ao Ministério do Exército, mas simples actualização de quotas no espaço de tempo abrangido pelo novo regime de abonos, para o cálculo da qual o Ministério do Exército tinha competência e autoridade suficientes.

Não se pode negar à Caixa Geral de Aposentações o direito de discordar da orientação do Ministério do Exército neste caso particular dos descontos, em que está sem dúvida interessada e por tal competente para provocar um esclarecimento, mas nega-se a autoridade para impor uma interpretação, vinculando a ela sectores não subordinados, que outras relações não têm que não advenham da obrigação de efectuar os descontos devidos e enviá-los a tempo e horas. Mas terá ao menos razão na urdidura da indemnização que pede? Julgo que não.

O Decreto-Lei n.º 41 958 obriga a actualizar quotas desde 1 de Outubro de 1954 pelo período a que disser respeito. Ora o período a que a actualização diz respeito não pode ser outro do que aquele que é contado a partir da data em que a revisão produz os seus efeitos. E esta só produz os mais efeitos desde 1 de Junho de 1958, como claramente diz o artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 41 958.

O Decreto-Lei n.º 41 958 esclarece no seu artigo 1.º a validade e define o regime em que deve processar-se a revisão de pensões e no artigo 2.º fixa o início da produção dos seus efeitos. Ambos com o seu carácter genérico e normativo colocam os abonos e os descontos no mesmo plano de execução.

Não se pode entender o desdobramento de entendimento quando se deseja fixar um prazo para os encargos diferente do fixado taxativamente para os benefícios. De outra maneira se tornaria mais evidente e pesada a injustiça que se pratica ao reconhecer o direito à revisão a partir de 1 de Outubro de 1954 e os seus benefícios só a partir de 1 de Junho de 1958.

A lei na sua redacção não o permite, nem há preceito estabelecido que faculte aplicar um regime de descontos a um regime de vencimentos diferente do que foi estabelecido para esse regime. E muito menos sobre vencimentos que não se receberam nem sequer existiam à data a que foram referidos.

A actualização a que o Decreto-Lei n.º 41 958 se quer referir não deve ser outra senão aquela que resulta do ajustamento natural do regime anterior com o que passou a vigorar, mencionada na previsão do desencontro da data em que se inicia o direito ao novo abono com aquela em que tem lugar a sua efectivação, às vezes abrangendo um longo período para os oficiais da reserva que não são abonados de pensão por receberem outros vencimentos por Ministérios onde prestam serviço não militar.

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O próprio preâmbulo do Decreto-Lei 11.º 39 842, que, com o Decreto-Lei n.º 39 843, está na génese das leis da revisão, opõe-se a qualquer interpretação que conduza a uma prática que resulte retroacção das quotas, e não tem outro significado o procedimento da Caixa Geral de aposentações.

Diz-se no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 39 842:

Dessas modificações, feitas para harmonizar o sistema de aposentações com a revisão de vencimentos, não resulta qualquer diminuição de encargos que aquele traz para o orçamento e que se manterão, se não se agravarem ainda durante longos anos, sem possibilidade de compressão, têm apenas como intuito adaptar o cálculo das pensões aos novos vencimentos sem retroacção de quotas.

Não pode ter qualquer significação ou efeito para definir diferente actualização e período o simples facto de a Caixa Geral de Aposentações alterar o sentido da lei ao substituir, no seu parecer interpretativo, período a que disser respeito por período ou períodos de serviço prestado.

Outro conceito que carece de consistência na arquitectura do débito encontrado péla Caixa Geral de Aposentações é o princípio de que se parte ao afirmar que à data do Decreto-Lei n.º 41 654 era de 6 por cento a taxa em vigor para os oficiais da reserva. Que não o era não o desconheceu o legislador quando no decreto-lei estipula que a contribuição de 6 por cento só sujeita de futuro os interessados, nem se justifica pela situação de facto. E esta apresenta-se à data da publicação do Decreto-Lei n.º 41 654 sob três regimes diferentes, pelo que me lembro:

Oficias que não eram subscritores por se encontrarem na reserva antes da vigência do Decreto-Lei n.º 28 404 e os que passaram posteriormente e que por força do mesmo decreto-lei continuaram isentos;

Os que eram subscritores e descontavam 4 por cento, nos termos do Decreto-Lei n.º 28 404, e mantiveram esse desconto por determinação do Decreto-Lei n.º 39 843;

Oficiais que descontavam já 6 por cento pelo facto de estarem ao serviço de outros Ministérios, beneficiando das percentagens aprovadas para o aumento de vencimentos dos quadros activos.

Como consequência desta errada suposição, resultou o seguinte:

Aos oficiais que não eram subscritores sucedeu que, para além do encargo que já suportavam por abate no cálculo da sua pensão de uma compensação para a aposentação, sofreram mais um duplo desconto, visto que em virtude das instruções para a aplicação do Decreto-Lei n.º 28 404 deixaram na Fazenda, por abate na pensão, a importância correspondente à contribuição para a Caixa Geral de Aposentações.

Aos oficiais subscritores aconteceu que foram sobrecarregados com uma taxa indevida agravada com juros e jurinhos de mora durante o tempo que se levou a reconhecer a justiça que emana, dá revisão das pensões de reserva, mas não se reconheceu simultaneamente a obrigação de indemnizar os interessados durante esse lapso de tempo da diferença de vencimentos nem de juros.

Só para os oficiais da reserva em serviço em Ministérios diferentes ao do Exército é válida a pressuposta percentagem de 6 por cento, pelo facto de terem
sido abrangidos pelo aumento de vencimentos que tocou às classes activas, consequentemente abrangidos pela taxa que para elas estava fixada.

Isto valeu-lhes terem sido isentos de juros, do que resultou pagarem menos exactamente aqueles que receberam mais, embora colocados no mesmo plano de direitos e obrigações.

Quanto à contagem de juros, também se tem como inconsistente, não só pela irresponsabilidade dos atingidos na demorada regularização das suas pensões como também pelo facto de serem lançados sobre uma importância que não foi usufruída, por não ter sido sequer materializada e só teoricamente existiu para avolumar um débito.

Se não houve falta de pagamento em tempo competente de valor devido, e juro é o prémio estipulado por efeito da cedência, gozo ou aluguer de um determinado capital por certo tempo, não há obrigação vencida ou suspensa nem objecto, de incidência.

Na falta das circunstâncias determinantes para o vencimento de juros e na ausência de lei especial que autorize a sua contagem, esta não tem razão de ser.

Posso nesta altura das minhas considerações, afirmar, como já o fizeram tantos outros por outras vias e modos, que a concepção da Caixa Geral de Aposentações para constituir o débito que atribui por virtude da revisão das pensões de reserva, que se aproxima por vezes da dezena de contos, não está devidamente fundamentada quanto ao tempo abrangido pela actualização, quanto aos vencimentos sobre que deve incidir, quanto à contagem de juros e quanto à taxa a aplicar.

O pagamento deste débito, ainda por cima, não tem sido nada suave, mas, pelo contrário, embora se faça nos termos do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 41 387, de 1957, única disposição da lei para que o Decreto-Lei n.º 41 958 remete para lei diferente o que estipula para actualização de quotas, e mesmo assim limitando a sua aplicação à forma de pagamento.

A Caixa Geral de Aposentações não se julga obrigada a consultar os interessados sobre a preferência consentida para o pagamento do débito de pronto ou em prestações, nem tem como boa a ideia que essa preferência tenha qualquer efeito no cálculo de juros. Tem mantido, é certo, os descontos dentro do limite de 25 por cento fixado, mas não tem tido em conta o despacho acordado entre o Ministério do Exército e o Subsecretário de Estado do Tesouro, de Julho de 1959, que recomenda que:

... os oficiais de reserva que estando em comissão de serviço desde 1 de Outubro de 1954 e por esse facto estavam a ser abonados de uma diferença de vencimentos ao abrigo do Decreto-Lei n.º 40 872 não devem por motivo de terem requerido ao abrigo dos Decretos-Leis n.ºs 41 654 e 41 958 perceber um quantitativo líquido da quota para a Caixa Geral de Aposentações inferior ao líquido que lhes estava sendo abonado do antecedente.

O desconhecimento deste despacho tem provocado, por vezes, o abaixamento das pensões depois de melhoradas para além dos abonos anteriores à revisão, dando origem a embaraços fáceis de prever para quem vive no aperto dos seus fracos quantitativos e é ao mesmo tempo desmoralizante sentir aumentar dificuldades, embora por certo tempo, justamente quando coube a vez de as diminuir.

O desacordo a que me venho referindo com a Caixa Geral de Aposentações tem dado azo a muitas exposições e requerimentos e pareceres dos serviços competentes do Ministério do Exército e ainda se mantém

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por falta de argumentação convincente produzida pela Caixa Geral de Aposentações e porque não se lhe reconhece autoridade que chegue para impor uma opinião a um serviço público da mesma categoria.

Esta circunstância, tem impedido que os serviços do Ministério do Exército se julguem habilitados a informar para despacho os requerimentos em que se reclama contra a legalidade da contribuição exigida. Requerimentos que vão perdendo validade para efeito de recurso por ultrapassagem de prazos.

Estamos na presença de um desentendimento de doutrina e de jurisdição paralisante do sagrado direito de recorrer para os tribunais por quem se julgou lesado, ilegalmente, pela Administração.

Este direito, apesar de contrariado pelo artigo 33.º do Decreto n.º 16 669, de 1929; que só permite recurso das deliberações da Caixa Geral de Aposentações por via hierárquica, é susceptível de ser exercido com fundamento num acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido em recurso administrativo que o considera inconstitucional naquilo que ofende o n.º 4.º do artigo 109.º da Constituição.

Este estado de coisas solicita uma intervenção urgente de quem tenha autoridade para interpretar a lei posta em causa, e só o pode de direito fazer a fonte de onde esta nasceu.

A iniciativa a tomar devia também considerar todos os prejuízos e consequências produzidas, de modo a permitir uma nova contagem de prazo para recurso, na hipótese de continuar a haver motivo para tal, e estender aos sargentos reformados ao serviço, remunerados por uma insignificante gratificação, as regalias que resultam da publicação dos Decretos-Leis n.ºs 41 654 e 41 958 para os oficiais.

Julga-se que esta iniciativa, já está tomada, faltando apenas materializá-la com a publicação do respectivo diploma, sendo de esperar que não demore, atendendo à justiça que propõe praticar.

Note-se certa coincidência de pensamento e acção por parte da Caixa Geral de Aposentações para com os oficiais de reserva com o que lhe é permitido pelos Decretos-Leis n.ºs 26 115, 26 503, 28 404 e 42 046 para os reformados e aposentados, estabelecendo um paralelismo que não existe de facto, reparando bem nas actuações de efectividade a que podem ser compelidos os oficiais de reserva. É para remunerar uma situação de efectividade que as leis de revisão foram feitas.

Constata-se mais uma vez certa deformação mental, provocada pelo hábito de lidar com as leis de aposentação e os seus problemas.

Sr. Presidente: consinta-me V. Ex.ª mais uns minutos para fazer um breve comentário que esta deixa me solicita, para focar a dolorosa condição em que são colocados os reformados e aposentados ao passarem a esta situação, no desejo de contribuir para que seja revisto e encarado com mais humanidade o débito atribuído.

No caso as queixas vão para a dureza da lei, em virtude do artifício que procurou para reduzir ainda mais as pensões de reforma e de aposentação.

A dureza da contribuição é avolumada pelas incidências anteriores.

Ao princípio era permitido atingir na reforma e na aposentação vencimentos superiores aos pagos na actividade por razões que derivavam da duração do tempo de serviço prestado e da natureza dele.

A esta limitação acrescentou-se uma diminuição de 1/9 sobre os vencimentos básicos para o cálculo da pensão.

Nos casos de ajustamento de vencimento por causa do aumento do nível de vida, a percentagem que beneficia as pensões é sempre inferior ao índice geral de valorização que se encontrou e se aplica para as classes activas.

Nos seus efeitos práticos, a legislação aplicável para a arquitectura do débito que recai sobre os reformados e aposentados, mandando aplicar a percentagem de 1 por cento - inicialmente 2 por cento - sobre os vencimentos estabelecidos a partir de 1 de Janeiro de 1936 ou 1 de Janeiro de 1938, conforme se trata de civis ou militares, e mais a de 6 por cento sobre o aumento a que tiveram direito em 1 de Janeiro de 1959 em relação ao número de anos de serviço prestado, traduz-se, no geral, na redução permanente da pensão, sabido como é que o índice médio de vida para os aposentados se mantém dentro dos 8 anos a que correspondem as 96 prestações mensais em que o débito é pago.

Com uma mão se tira o que se dá com a outra, sem justificação que abale a justiça que provém dos direitos conquistados em longos anos de serviço, protegidos por legislação que não se revoga por falta de fundamento moral, mas que se destrói por portas e travessas.

Os únicos argumentos que se apresentam para justificar o pesado encargo criado aos reformados e aposentados provém da ideia de que os servidores do Estado devem assegurar pelos seus próprios recursos as obrigações da Caixa Geral de Aposentações.

Ideia errada, não só quanto à sua praticabilidade pelo aumento permanente da esfera de acção da Caixa Geral de Aposentações, que, diga-se de passagem, ainda deixa em claro vários sectores e particularidades, atestado pelos inúmeros requerimentos pendentes solicitando, com razão, direito à inscrição ou rectificação da sua data, mas também sob o ponto de vista de justiça social, fortemente proclamada e imposta pelo Estado nos deveres patronais para com os trabalhadores nas actividades ou empresas particulares, não podendo por isso o Estado furtar-se a dar o mais nobre e instante exemplo.

Responsabilizam-se deste modo os servidores do Estado pela política de imprevidência que se praticou durante tantos anos, lançando sobre eles a mais injusta e violenta das contribuições se tivermos bem presente os descontos feitos anteriormente à criação da Caixa Geral de Aposentações que a Fazenda reteve como compensação dos encargos de aposentação e que novamente vem cobrar com usura, sem considerar a pobreza dos contribuintes, a oportunidade e o quantitativo pedido, que tantas vezes anda na casa dos 40 contos e até por vezes a ultrapassa.

Se ao menos em troca deste sacrifício se actualizassem as pensões com o custo da vida ao mesmo nível com que se providencia para as classes activas e revertessem por morte para sua mulher e descendentes necessitados, ainda se podia encontrar na dureza da lei um lenitivo para os males produzidos.

Não parece que a prática seguida seja a maneira mais compreensiva e justa para reduzir os subsídios com que o Estado reforça o orçamento da Caixa Geral de Aposentações.

Seria melhor entendida uma providência geral de aumento de percentagem e que englobasse até a continuação do desconto para a Caixa Geral de Aposentações por parte dos reformados e aposentados, o que, aliás, se faz camufladamente por via do Decreto-Lei n.º 39 843.

Para os militares o choque psicológico é mais violento, e já tem tido consequências graves para os que provêm da reserva sem comissão e serviço ao sentirem-se de repente devedores de dezenas de contos e forçados por este facto a reduzir ainda o seu fraco nível de vida a que já se tinham habituado e que julga-

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vam assegurado pelo convencimento de que a pensão de reforma era igual à da reserva.

Outra reclamação que se encontra pendente, com direito e fundamento para ser atendida, respeita ao acréscimo de 0,14 por cento por cada período de 30 dias de serviço prestado em campanha ou no ultramar sobre o soldo da efectividade de posto com que o oficial foi considerar o na passagem à reserva ou à reforma.

O direito a este acréscimo foi estabelecido pelo Decreto n.º 4211, de 1918, confirmado no Decreto-Lei n.º 20 247, de 1931, limitado apenas no seu quantitativo quando fizer ultrapassar em mais de 25 por cento o soldo de efectividade.

O Decreto-Lei n.º 28 404, que alterou as condições de passagem à reserva e reforma, não revoga nem estabelece qualquer incompatibilidade ou limitação sobre o seu abono. Porém, nas instruções publicadas para aplicação do Decreto-Lei n.º 28 404 e aprovadas por despacho ministerial de 1940 foi estabelecido, arbitrariamente, que a pensão e o acréscimo de 0,14 por cento não podem exceder o vencimento da efectividade do posto com que os oficiais foram considerados no cálculo para encontrar a pensão de reserva ou de reforma.

Este despacho, além de desrespeitar direitos reconhecidos por lei em virtude de serviço" especiais e considerados perigosos, é manifestamente ilegal, por não, ter poder para revogar a lei, o que tem sido por mais de uma vez confirmado em acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, lançados sobre recursos que têm contestado a sua razão e legitimidade.

A Administração, porém, não reconheceu nos fundamentos dos acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo motivo para pôr de lado um despacho sem valor legal e injusto, ao mesmo tempo que cumpre as sentenças proferidas contra a posição em que se colocou.

Esta atitude inexplicável provoca as mais desconexas e irritantes situações em presença do mesmo direito.

Os que passaram à reserva antes da publicação do Decreto-Lei n.º 28 404 continuam, sem excepção, a beneficiar do aumento de percentagem de 0,14 por cento quando não abrangidos pela revisão.

Os que passaram posteriormente e ganharam o recurso posto perante o Supremo Tribunal Administrativo também beneficiam de 0,14 por cento até ao limite de 20 por cento para além do vencimento.

Os que não recorreram por inadvertência, falta de meios monetários ou porque estavam confiados que a Administração perfilharia generalizando o que fosse reconhecido como legal e justo pelo Supremo Tribunal Administrativo, continuaram a ser medidos pelo despacho ministerial de 1940 e colocados em posição de inferioridade apesar de abrangidos pela força da mesma lei.

Com o Decreto-Lei n.º 41 654 quis-se dar foros de legalidade: ao despacho de 1940, tão tristemente posto em causa pelo Supremo Tribunal Administrativo, estabelecendo como limite o vencimento do activo para o somatório da pensão com o aumento da percentagem de 0,14 por cento.

Logo o Ministério do Exército deu deferimento aos requerimentos pendentes, na base de que o limite fixado era o do actual vencimento, até que um parecer da Procuradoria-Geral da República disse que o vencimento limite não era o actual vencimento, mas sim aquele em vigor na data da passagem à reserva ou reforma.

Isto dei lugar a reconsiderações sobre os deferimentos produzidos, ficando sem efeito as suas consequências e mantendo-se a situação de privilégio para os que ganharam os recursos contenciosos.

A Administração, que não reconheceu valor aos acórdãos bem fundamentados do Supremo Tribunal Administrativo, apressou-se a dar cumprimento a parecer de puro carácter interpretativo, que não pode invalidar preceitos legais anteriores não revogados.

Estamos na presença de um procedimento discriminatório que inferioriza tantos dos que têm mais e melhores serviços prestados à Nação.

Além de se ofender a lei e a razão, coloca-se o Estado na posição de mau pagador, que só salda os seus compromissos por sentença judicial, e dá nota da sua fraca sensibilidade moral, por não tirar das sentenças as ilações que solicitam.

Não se quis acabar com as irregulares situações criadas pelo desacordo entre o entendimento do Supremo Tribunal Administrativo nos Decretos-Leis n.ºs 41 654 e 41 958, com que se pretendeu revogar efectivamente o artigo 9.º do Decreto n.º 20 247, e manteve-se o mesmo clima de desacordo já revelado posteriormente à sua publicação pelo Supremo Tribunal Administrativo, que considera que só para as futuras passagens à reserva ou reforma as novas disposições legais têm validade.

Assim, continuam a ter razão de ser os recursos, fomentando-se novas consequências discriminatórias, que não podem deixar de provocar os mais acerbos desabafos.

Nada justifica a atitude tomada contrariando um abono reconhecido por instância qualificada como irrevogado. De mais a mais já deixando de ser contado, e neste momento abrangem um número muito limitado de oficiais, e que são cada vez menos.

Com um pequeno encargo e alguma boa vontade se podia pôr cobro a um procedimento que permite dar só a uns aquilo que por direito pertence a todos que estão abrangidos pelas mesmas disposições da lei.

Também se me afigura oportuno chamar a atenção para os inválidos de guerra, que, em dada altura, foram privados da regalia de promoção e de vencimentos que lhes eram concedidos pelo Código dos Inválidos.

O momento aconselha a reconsiderar, para proteger dignamente aqueles que estão pagando generosa e decididamente à Pátria a mais alta e nobre contribuição - tributo de sangue - na defesa da nossa soberania e território tão traiçoeiramente acometidos por irresponsáveis instigados pelo comando internacional do comunismo, com a complacência, se não com a conivência, de inconscientes, que não distinguem onde estão os seus próprios motivos de sobrevivência.

A série de considerações que acabo de fazer procuram englobar alguns dos mais prementes reparos de que sou eco desta Assembleia, para serem ouvidos mais além do que os servidores do Estado afastados dos quadros activos, e nos quais gastaram o melhor da sua inteligência e energia, se julgam com razão para fazer, e quase todos por ofensa a situações criadas por lei e abaladas pela fluidez e critérios de circunstâncias não requeridas por motivos essenciais para manter equilibrada a vida administrativa do Estado.

Ao Governo, em especial à inteligência clarividente e formação cristã do Sr. Ministro das Finanças, recentemente postas à prova nas providências que teve por bem ao tomar a iniciativa de dar um pouco mais de conforto às pensionistas do Estado, remeto estas anotações, para serem consideradas no que tiverem de certo e for razoável.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Peres Claro: - Sr. Presidente: nos últimos anos têm sido notórios os esforços do Governo no sentido de conceder ao funcionalismo público mais algumas

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regalias, que nos tempos de hoje se podem já chamar direitos. Também há pouco esteve nos propósitos do Governo a simplificação burocrática dos serviços, e por ambas estas medidas pode afirmar-se que a Administração está atenta aos problemas da sua engrenagem, embora reagindo sempre com umas delongas com que não se conformam os nossos desejos, mas certamente justificadas pela complexidade do mecanismo montado. Onde essas delongas são, porém, mais evidentes é na coordenação de serviços. Parece ser essa uma pecha nacional, que sempre aqui tenho combatido, pois considero infrutuoso qualquer trabalho de conjunto que não obedeça a um só plano de acção e a uma orientação única. Chega a ter-se, por vezes, a impressão de que os serviços se desconhecem uns aos outros, de que os Ministérios funcionam em compartimentos estanques, de que o que se inova aqui não se segue acolá, exactamente porque a iniciativa foi de outrem. Se existe na máquina do Estado algum sector próprio para o trabalho de coordenação de diplomas, de disposições, de orientações, não está a funcionar bem. E se não existe, forçoso é, imperioso é, que passe a existir, pois, por sua falta, há pormenores quisilentos, perturbadores do tonus do funcionário e que facilmente poderiam ser removidos. Cito um bastante esclarecedor:

Pelo artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 26 115, de 23 de Novembro de 1935, ao provimento dos lugares de chefia entre o funcionalismo público passaram a ser admitidos apenas indivíduos com curso superior adequado. Não pretendo aqui discutir a razão ou a sem razão do pensamento que informou o artigo, mas apenas acentuar que há já uma longa série de diplomas, a partir de 1941, a permitirem que o provimento dos lugares de chefe de secção possa, recair, mediante concurso de provas públicas ou por livre escolha, em primeiros-oficiais não diplomados com cursos superiores, admitindo embora que, em primeiro concurso nuns casos e em segundo noutros, possa haver opositores licenciados do mesmo quadro ou estranhos. Posso citar, entre outras, a

O artigo 7.º do Decreto n.º 31 317, de 13 de Junho de 1941 Direcções-Gerais da Contabilidade Pública, da Fazenda Pública, do Tribunal de Contas e das Contribuições e Impostos);

A alínea a) do artigo 1.º do Decreto n.º 36 320, de 2 de Junho de 1947 (Direcção-Geral da Aeronáutica Civil);

Os artigos 24.º e 29.º do Decreto-Lei n.º 36 933, de 24 de Junho de 1948, em conjugação com o Decreto-Lei n.º 29 996, de 24 de Outubro de 1939 (l.ª Repartição da Direcção-Geral dos Serviços Industriais);

O artigo 15.º do Decreto n.º 37 092, de 9 de Outubro de 1948 (Inspecção-Geral dos Produtos Pecuários);

O artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 37 142, de 8 de Novembro de 1948 (Direcção-Geral dos Combustíveis);

O artigo 42.º do Decreto n.º 39 711, de 29 de Junho de 1954 (Laboratório. Nacional de Engenharia Civil);

O artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 40 805, de 17 de Outubro de 1956 (Instituto Nacional de Estatística);

O artigo 73.º do Decreto-Lei n.º 41 380, de 20 de Novembro de 1957 (serviços administrativos da Direcção-Geral dos Serviços Pecuários);

O artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 34 133 e o artigo 49.º do Decreto n.º 34 134, de 24 de Novembro de 1944 (redacção do Decreto-Lei n.º 41 412 e do Decreto n.º 41 413, de 30 de Novembro de 1957) (Secretariado Nacional da Informação);

A alínea g) do artigo 26.º do Decreto n.º 41 542, de 28 de Fevereiro de 1958 (Emissora Nacional);

O § 1.º do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 41 582, de 10 de Abril de 1958 (Direcção-Geral dos Serviços Florestais e Agrícolas);

O artigo 6.º das Portarias n.ºs 16 598 e 16 599, de 22 de Fevereiro de 1958, e 16.663, de 14 de Abril de 1958 (vários serviços do Ministério do Ultramar);

A Portaria n.º 16 804, de 5 de Agosto de 1958 (Direcção-Geral da Economia, deste Ministério);

O artigo 56.º do Decreto-Lei n.º 39 749, de 9 de Agosto de 1954 (redacção do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 43 582, de 4 de Abril de 1961) (Polícia Internacional e de Defesa do Estado).

Há, como se verifica, uma tendência bem acentuada para uniformizar as condições de acesso aos lugares de chefia em moldes diversos dos fixados no Decreto-Lei n.º 26 115, mas, porque este continua em vigor, há desigualdade de tratamento entre funcionários verdadeiramente chocante, e que resulta afinal da tal falta de coordenação que atrás apontei.

Poderia ainda citar, pela mesma razão, diferenças de exigência de habilitações para ingresso em vários serviços.

Pelo citado Decreto-Lei n.º 26 115, podem ser providos nos lugares de dactilógrafos e de escriturários de 2.ª classe indivíduos com a 4.ª classe primária, mas diplomas parcelares e posteriores exigem para dactilógrafo o 1.º ciclo liceal ou equivalente, assim como para escriturários, os quais noutros serviços só podem ser admitidos com um curso profissional.

Serviços há que admitem os seus aspirantes com qualquer curso profissional, mas outros exigem o 5.º ano dos liceus ou habilitação equivalente.

Isto é dito apenas como exemplo, mas eu poderia entrar em crítica mais profunda se citasse a preferência legal, mas inconcebível, dada a indivíduos com estudos liceais para preenchimento de lugares que exigem específica aptidão profissional, e que só pelo Decreto-Lei n.º 43 000, de 1 de Junho último, veio a caducar.

Há, porém, mais alguma coisa a fazer (e parece não ser pouco) no aspecto da coordenação de serviços, da lei igual para todos os funcionários.

Sr. Presidente: embora os tempos não vão de feição para falar-se em aumento de despesas, quero, todavia, aproveitar a oportunidade de estar a tratar do funcionalismo público para secundar o caso a que o nosso colega Dr. Rodrigues Prata, por mais de uma vez, tem aqui feito referência. Trata-se dos professores de serviço eventual das escolas técnicas com as mesmas habilitações dos do ensino liceal e ganhando algumas centenas de escudos a menos por mês.

No momento em que se está a fazer o esforço hercúleo de erguer o País a um plano industrial de relevo e em que se insiste na necessidade de preparar operários e empregados através do ensino escolar para essa tarefa, neste momento, dizia, não faz sentido que se pague melhor aos professores provisórios dos liceus, empurrando, assim, para lá muitos dos que fazem falta nas escolas técnicas. Se tivesse de haver uma situação de favor, era no ensino técnico, e não no liceal.

Outro problema a este ligado é o do pagamento aos mestres do ensino técnico, sobre quem recai a grande responsabilidade da preparação oficinal dos futuros operários, mas que são mais mal pagos do que numa oficina particular, onde as suas responsabilidades se-

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riam até menores. Impõe-se a revisão dos vencimentos dos mestres, como se impõe a revisão das variadas categorias em que estão distribuídos, e que constitui outra flagrante injustiça social.

Também conviria atender a quantos continuam a reclamar que lhes seja contado tempo de serviço que prestaram para efeitos de aposentação, acabando-se com situações deprimentes, como, por exemplo, a de alguns agentes du Inspecção de Trabalho que, tendo longos anos de serviço, só vêem contados alguns, bem poucos.

E, por último, desejo exprimir um voto, que deixará alguma vez de ser utópico: o de que aos funcionários públicos seja atribuído o vencimento de um 13.º mês no fim do ano, como já faz a maioria das empresas particulares, de forma a permitir-se que uma numerosa classe de trabalhadores tenha também o seu Natal, vivido sem a amargura da data impossível de festejar ou sem" o espectro de meses ainda mais apertados, se a festa se fez mesmo, sem o recurso ao deprimente pedido de «broas» a um e a outro.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O orado foi muito cumprimentada.

O Sr. Galheiros Lopes: - Sr. Presidente: tornou-se já um lugar comum a afirmação, largamente difundida nas nossas publicações oficiais, nos relatórios das propostas de lei, nos discursos pronunciados nesta Assembleia, enfim, de maneira geral, sempre que se trata de buscar as formas de alcançar o progresso do País, de que um dos principais elementos desse progresso a que todos aspiramos reside numa urgente, franca e positiva aceleração da electrificação, não sómente dos grandes aglomerados populacionais, mas dos próprios meios rurais.

Tem-se procurado concretizar a solução deste problema, através dos Planos de Fomento e da larga legislação existente sobre o assunto. E, nomeadamente, pela Lei n.º 2075, de 21 de Maio de 1955, foi determinado que e o Governo impulsionará ás obras de pequena distribuição de energia eléctrica ...» mediante a concessão de comparticipações sob várias modalidades, em especial concedidas às câmaras municipais.

Todavia, este propósito do Governo, tão favoravelmente recebido pelas autarquias locais e por todas as populações desta nossa terra onde não chegou- ainda o enorme benefício da electricidade, nem sempre é acompanhado e luta, para ser posto em execução, com más vontades, por vezes tanto mais inconcebíveis quanto as vemos pai tirem de quem, como era de esperar, deve ter o maior interesse na difusão e consumo da energia eléctrica.. Permitir-me-ei roubar alguns minutos ao precioso tempo desta Assembleia apontando aqui e solicitando as providências de quem de direito para um lamentável e incompreensível exemplo de dificuldades postas à execução do pensamento do Governo expresso na citada Lei n.º 2075.

Quero referir-me, Sr. Presidente, à verdadeira luta travada desde há cinco anos pela Câmara Municipal de Benavente e a Junta de Freguesia de Santo Estêvão para conseguirem da. empresa concessionária de energia eléctrica da região - a Hidroeléctrica Alto Alentejo- as facilidades necessárias, o mínimo de boa vontade, digamos mesmo a noção do seu papel de empreza de utilidade pública, para se conseguir levar a electricidade à referida povoação de Santo Estêvão.

A freguesia du Santo Estêvão, pela sua população e pela actividade agrícola e mesmo já industrial que a caracterizam, é uma das mais importantes daquela região. Tanto no que respeita à iluminação como nas possíveis aplicações agrícolas e industriais, a energia eléctrica constitui há muito uma necessidade premente, que a Câmara Municipal, desde 1955, logo após a promulgação da Lei n.º 2075, procura satisfazer.

Efectivamente, em 31 de Agosto do referido ano foi pela Câmara entregue na Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos o pedido da comparticipação prevista na base II da citada lei.

Completado o pedido com o projecto, orçamentos e pedido de licenciamento em 15 de Outubro seguinte, foi o processo apreciado nas repartições competentes e acrescentou-se-lhe, em 26 de Dezembro desse mesmo ano, um requerimento, dirigido a S. Ex.ª o Ministro da Economia, solicitando a comparticipação para a instalação da linha aérea, á 30 KW, Benavente-Santo Estêvão.

Decorrido cerca de ano e meio, em 25 de Abril de 1957, respondeu a Repartição de Fomento da Electrificação às instâncias da Câmara Municipal de Benavente, para a aceleração do assunto, informando que «o pedido está inscrito no plano de comparticipações a executar no corrente ano» e prometendo tomar na devida consideração o interesse manifestado, com vista a antecipar-se o referido estudo.

Voltou a Câmara a insistir no caso e, em Setembro de 1957, em resposta a um inquérito da Secção de Comparticipações da Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos, informou que a obra mais urgente no concelho de Benavente é a da electrificação de Santo Estêvão.

Simultaneamente com estas diligências outras eram feitas junto da empresa concessionária, verificando-se a necessidade de alterar o caderno de encargos respeitante ao fornecimento da energia ao concelho de Benavente, visto não estarem nesse documento previstas linhas de baixa tensão. Feita a alteração do caderno de encargos, assentou-se na percentagem com que as diversas entidades custeariam a obra: 60 por cento de comparticipação do Estado, 5 por cento da Câmara e o restante a cargo da empresa concessionária.

Anunciada na região a boa nova deste acordo, rejubilaram a Câmara, a Junta de Freguesia e toda a população de Santo Estêvão com a realização - que julgavam próxima - do grande melhoramento por que há tantos anos se trabalhava. À Hidroeléctrica Alto Alentejo informou, em determinada altura, ser possível a inauguração da .electrificação de Santo Estêvão ainda no Natal de 1960. Contudo, vão já decorridos mais quatro meses depois desta data - e Santo Estêvão continua às escuras ...

Em certa altura desta lamentável história surge o que, como comecei por apontar, pode considerar-se como incompreensível má vontade de uma empresa que tem por missão (e, haverá quem suponha, por interesse próprio) concorrer por todos os meios para que se espalhe na área que controla a electricidade, que é, afinal de contas, a sua razão de existência. Não sucede, porém, assim, ao que parece.

Efectivamente, em Janeiro último, quando tudo parecia resolvido pelo acordo das comparticipações a que atrás me referi, a Hidroeléctrica Alio Alentejo oficiou à Câmara de Benavente comunicando ser impossível a realização da obra nas condições assentes, visto a Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos ter reduzido consideravelmente o orçamenta apresentado pela empresa. Ao mesmo tempo a referida Hidroeléctrica informava que iria pedir orçamentos a três empresas cujos nomes, aliás, não indicava.

Decorrido tempo, a Hidroeléctrica, com base no orçamento mais baixo dos que pedira às tais três empre-

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sas não reveladas, orçamento superior ao estipulado pela Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos, assim evidentemente posta em cheque, passou a exigir à Câmara para realização da obra não sómente os 5 por cento de comparticipação que foram estabelecidos no acordo, mas também a importância de 47 474$30, referente à diferença entre a comparticipação fixada pelo Estado segundo o orçamento da Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos e o tal novo orçamento apresentado pela empresa consultada pela Hidroeléctrica.

Sem a satisfação destas exigências, que a Câmara não pode aceitar e são contrárias ao que foi estabelecido pela Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos, a empresa concessionária não se manifesta disposta a dar seguimento à obra, privando assim a freguesia de Santo Estêvão de um melhoramento tão importante, como tal reconhecido pelo Estado e que as populações locais há muito consideram uma das mais instantes necessidades sob todos os aspectos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Reconheceu-se, entretanto, que não era legal a consulta ou concurso privado feito, como referi, pela empresa concessionária para a obtenção de orçamentos, e foi aberto concurso público, cujas propostas foram abertas no dia 20 último.

Ignoro ainda o resultado deste concurso. Mas qualquer que ele tenha sido, não posso deixar de registar aqui a estranheza suscitada em toda a população do concelho de Benavente pela atitude da empresa concessionária do fornecimento de energia eléctrica a grande número de terras do distrito de Santarém e que, sem ter em consideração as obrigações, pelo menos morais, que este privilégio lhe impõe, tem levantado as dificuldades que expus à electrificação ide Santo Estêvão. Mas as reclamações na sua área de exploração são numerosas. Ainda há pouco foram apresentadas reclamações pelos concelhos de Almeirim e Alcanena.

No distrito de Santarém há quatro concessionários de fornecimento de energia eléctrica, pois só com a Hidroeléctrica Alto Alentejo se verificam estas dissidências, com manifesta intenção de não cumprir as disposições contratuais que subscreveu.

A verdade é que a sua atitude neste caso não tem explicação fácil, pois a mesma empresa nunca fez qualquer objecção aos orçamentos apresentados para a electrificação de outras localidades do concelho.

Seria mesmo de esperar da sua parte alguma parcela de boa vontade na electrificação, da região, para corresponder à tolerância com que se têm sofrido, sem as reclamações que seriam naturais, os deficientes fornecimentos de energia, os cortes constantes da mesma, que tantos prejuízos causam à população e à indústria local. Nem sequer se reclamou por mão terem sido ainda substituídas as linhas da vila de Benavente, que se encontram em péssimas- condições.

Torna-se mais frisante este caso se o compararmos com a acção da empresa concessionária do fornecimento de energia eléctrica às regiões vizinhas, onde existem povoações mais pequenas, como, por exemplo, Pegões, a escassos quilómetros de Santo Estêvão, e que desde há anos se encontra electrificada.

Tudo isto me parece digno de reparo e merecedor das atenções das entidades estaduais competentes. A realização desta obra, que há cinco anos a freguesia de Santo Estêvão aguarda, não pode ser protelada por mais tempo. - E seja quem for que a ela se esteja opondo, guiado por visão errada da sua posição de concessionário, de um serviço, de interesse público, mostra não corresponder aos propósitos do Governo de alargar a todo o País os benefícios do progresso económico e social, para que a electrificação tanto contribui.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Vai iniciar-se a discussão na generalidade do projecto de lei do Sr. Deputado Santos Bessa sobre períodos de evicção escolar.

Tem a palavra o Sr. Deputado Santos Bessa.

O Sr. Santos Bessa: - Sr. Presidente: entendi no meu dever apresentar este projecto de lei que não visa senão a pôr em dia a matéria de que tratam os artigos 38.º, 39.º, 40.º e 41.º e seu § único do Regulamento dos Serviços da Direcção-Geral de Saúde Escolar, aprovado pelo Decreto n.º 23 807, de 28 de Abril de 1934.

Em primeiro lugar, Sr. Presidente, quero declarar a V. Ex.ª que, em obediência ao purismo da nossa língua, desejo fazer uma proposta na altura própria para se substituir a designação de «projecto de lei sobre períodos de evicção escolar por motivo de doenças infecto-contagiosas» por «períodos de afastamento da frequência escolar por motivo de doenças infecto-contagiosas».

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não me ocupo dos demais artigos desse regulamento porque não é meu propósito apreciar a orgânica da Direcção-Geral de Saúde Escolar nem o trabalho realizado pelos que dela dependem, e que tão valioso tem sido nalguns sectores.

Limito-me sómente a actualizar o que diz respeito à profilaxia das doenças contagiosas na população escolar, com a intenção de evitar que, sem qualquer justificação de ordem sanitária, os alunos continuem a ser prejudicados na sua frequência escolar pelas imposições de um regulamento que está já há muito ultrapassado.

Na exposição que fiz à Câmara em 26 de Janeiro do corrente ano, quando anunciei o projecto de lei, defini claramente as razões que me determinavam e os objectivos que visava. Não vou, por isso, repetir agora o que então afirmei. Serei breve, Sr. Presidente, tanto mais que a hora vai adiantada e há problemas importantes sobre os quais a Câmara tem ainda de se pronunciar.

Devo declarar que pouco mais tenho a juntar e o pouco que tenho a dizer, além do que disse na apresentação do meu projecto, não se destina nem a reforçar aquilo com que o justifiquei nem a fazer a história da nossa luta contra as doenças infecto-contagiosas nos vários sectores da vida nacional, nem sequer a pormenorizar os objectivos a atingir. Isso, como é óbvio, diz mais particularmente respeito à especialidade do que à generalidade da matéria. Aliás, o douto parecer da Câmara Corporativa veio completar aquilo que eu aqui disse e é suficientemente esclarecedor de alguns pontos que omiti aquando da apresentação do projecto.

Em todos os países as doenças infecciosas da população escolar pesam seriamente entre as causas do absentismo escolar. As crianças nas idades em que frequentam as escolas têm uma grande receptividade para as doenças infecto-contagiosas.

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Não vale a pena referir aqui os números respeitantes às doenças infecciosas de declaração obrigatória, nem à mortalidade que elas originam entre nós.

A criança vem ao mundo protegida por anticorpos maternos contra muitas doenças infecto-contagiosas, mas essa protecção é efémera, dado o carácter passivo dos anticorpos que foram fabricados pela mãe na sua luta contra as infecções e que passaram ao filho através da placenta para exercer igual acção protectora. Passados poucos meses a sua concentração baixa a níveis que ficam aquém de uma acção protectora eficaz.

Contra algumas dessas doenças dispomos nós de meios para criar um estado de imunidade específica activa e duradoura que pode garantir a continuação daquela protecção inicial e noutras de processos específicos para exercer passivamente igual protecção.

Os reforços vacinais, é sobretudo as infecções espontâneas, mesmo as que originam quadros subclínicos, podem asse ciar-se e suceder-se para garantir protecção duradoura eficaz contra esses agentes infecciosos.

Algumas, porém, não estão ainda ao alcance dessa protecção vacinai artificial e, mercê da extraordinária difusão dos seus agentes causais, constituem o grupo das chamadas doenças obrigatórias. E o caso das doenças virósicas, representadas pelo sarampo, o trasorelho, a varicela e a rubéola. E, ao lado destas, outras há de natureza bacteriana e que também ainda não se encontram sob a protecção vacinai de qualquer natureza.

É o caso da escarlatina, da meningite cerebrospinal, etc., para as quais não dispomos de vacinação capaz.

Quer dizer: há um grande número de doenças infecciosas que mais frequentemente atacam as crianças em idade escolar contra as quais não podemos exercer acção imunizante.

Mesmo dentro daquelas, em a podemos exercer, em que as vacinas são de manifesta utilidade, registamos em cada ano um notável número de casos de doença, porque a maioria das crianças ou não é sujeita à vacinação ou não faz a aplicação com a oportunidade exigida ou não mar têm a sua imunidade através dos necessários reforços.

Entre nós temos um esquema vacinai que foi organizado por uma comissão a que tive a honra de pertencer, aprovado pelo Ministério da Saúde e Assistência e que apresentei depois ao Simpósio sobre a vacinação contra as doenças infecciosas, uma reunião internacional que se realizou em Paris, em Outubro de 1959.

Estou certo de que quando os médicos e os pais se resolverem a aplicá-lo, larga e rigorosamente, baixará substancial mente o número de casos das sete doenças infecto-contagiosas ali consideradas e que são registados em cada ano na nossa estatística.

O tratamento das doenças infecto-contagiosas veio também. Sr. Presidente, graças aos novos antibióticos que possuímos, resolver muitos dos casos que constituem problema ferio da medicina, reduzindo consideràvelmente os períodos de contagiosidade e a sua intensa difusão. Mercê dessas novas drogas reduziram-se muito os períodos que se consideravam indispensáveis para garantir a não difusão dessas mesmas doenças.

Estamos hoje quase nas vésperas do aniversário daquele regulamento que pretendemos substituir, visto que tem a data de 28 de Abril de 1934, e desde então até esta data foram notáveis os trabalhos realizados no capitule da profilaxia das doenças infecto-contagiosas.

Todos os países se têm dedicado à revisão desse problema, sobretudo nos últimos anos; afirma-se a necessidade de rever todos os regulamentos e leis que dizem respeito ao afastamento das crianças atingidas por doenças infecto-contagiosas da sua actividade escolar e, com esse objectivo, reuniu-se em Paris, em Julho de 1959, o III Congresso Internacional de Higiene Escolar e ali se definiu uma nova orientação ao que ultrapassa os limites que se contêm no projecto que apresentei à Câmara.

Foi verdadeiramente revolucionária a decisão que se tomou, fazendo tábua rasa dos períodos de isolamento da maior parte das doenças da idade escolar.

A evolução que se tem feito é extraordinária e já em 1951 o Comité de Peritos da Organização Mundial de Saúde se pronunciou assim:

Importa que as escolas estejam em condições de modificar os seus regulamentos, de modo a considerar os progressos científicos realizados. Acontece com frequência, que métodos que envolvem perda de tempo continuam a ser aplicados, mesmo que eles tenham sido ultrapassados há muito tempo.

Ora, neste capítulo, foram, sobretudo, os elementos respeitantes aos períodos de isolamento dos doentes e coabitantes que sofreram mais profunda alteração. Não se compreende, por isso, que as crianças continuem impedidas de frequentar a escola por efeito de regulamentos anacrónicos e se não respeitem aquisições cientificamente reconhecidas e exequíveis. A tendência é para uma menor severidade dos períodos de afastamento de frequência.

Em obediência a esta orientação, pretendi, Sr. Presidente, chamar a atenção da Câmara para a situação em que estávamos, com o desejo de que pudéssemos encontrar um texto que nos permitisse consentir que muitas das crianças atingidas por doenças infecto-contagiosas, e que actualmente não podem frequentar as escolas senão ao fim de determinado tempo, não sofressem graves prejuízos com esse facto.

No projecto que apresentei tinha eliminado duas doenças que estavam contidas no regulamento actual, e que eram a tinha e o tracoma.. E entendi que devia eliminá-las porque não me pareceu necessário incluir neste projecto estas duas doenças, porque a frequência escolar já estava vedada aos quê as sofriam.

Na Lei n.º 2036, que esta Câmara também aprovou, na base IV e na base IX, estão contidos os elementos indispensáveis para garantir a não frequência escolar dos doentes atingidos por essas duas doenças e até especificadamente se refere a frequência escolar no n.º 2 da base IV.

Além disso, temos brigadas que se destinam ao tratamento dessas doenças, que em certas zonas do País têm grassado com alguma intensidade. Mercê desses esforços, tem-se reduzido o número de atingidos por essas doenças, e, por isso, parece-me desnecessário manter a sua inclusão no meu projecto, visto que, se em 1934 se justificava a sua inclusão, porque não havia a Lei n.º 2036, agora que existem tais disposições não se justifica - repito - a inclusão dessas duas doenças no meu projecto actual.

Mas as comissões entenderam que a despeito disso se deviam manter essas duas doenças. E como vejo nesse desejo o propósito de se intensificar mais ainda a fiscalização sobre essas duas doenças, adiro aos princípios dos meus colegas dessas comissões, e não me oponho a que seja respeitada a proposta da Câmara Corporativa no sentido de que tais doenças sejam inças, e que são a tuberculose e a lepra.

Outro tanto, porém, não posso dizer de outras duas doenças que a Câmara Corporativa resolveu incluir neste projecto, doenças que não são próprias das crianças, e que são a tuberculose e a lepra.

Nunca, nem mesmo quando a tuberculose grassava com uma intensidade que hoje não se verifica, nem

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mesmo quando não tínhamos organizado o combate à tuberculose, se incluiu a tuberculose dentro do regulamento das disposições sobre o afastamento das crianças atingidas por essa doença.

Tenho-me batido pela profilaxia da tuberculose, mas não vejo que haja necessidade de a incluir na lista das doenças contagiosas da idade escolar. Outro tanto, e ainda com mais forte razão, direi da lepra. Creio que seria grave responsabilidade a inclusão de qualquer delas, nesta altura, neste projecto de lei.

Em nenhum país do Mundo, nem mesmo naqueles em que a tuberculose e a lepra grassam com carácter endémico, elas está o incluídas dentro deste grupo de doenças que são reguladas pela lei de afastamento das crianças da frequência escolar.

E, por isso, Sr. Presidente, me oponho à sua, inclusão neste projecto de lei.

Queria dizer a VV. Ex.ªs que propus, e as comissões aceitaram, o aditamento de um parágrafo ao artigo 1.º, que respeita aos portadores de germes virulentos, e de um novo artigo, que se refere à colaboração a prestar pelos directores e professores das escolas na prevenção destas doenças infecto-contagiosas.

Este novo artigo justifica-se porque, infelizmente, em muitas regiões e em muitos sectores do nosso ensino nós não dispomos de médicos escolares para assegurar a fiscalização das doenças infecto-contagiosas. Temos de dar aos professores meios para o fazerem, e, por isso, propus este aditamento, que dá aos professores o direito legal de colaborarem com o médico, afastando, provisoriamente os alunos atacados de doença infecto-contagiosa da frequência escolar.

Não queria, Sr. Presidente, terminar estas minhas considerações sem manifestar publicamente aos presidentes das duas comissões com que tive de trabalhar e aos colegas que delas fazem parte os meus agradecimentos pela boa camaradagem que sempre se revelou, mesmo em momentos em que um certo calor animou a discussão.

Tudo o mais que tenho a dizer reservo-o para a especialidade.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.

Amanhã haverá sessão com a mesma ordem do dia de hoje: continuação do debate acerca do projecto de lei do Sr. Deputado Santos. Dessa sobre períodos de evicção escolar e discussão na generalidade e, se for possível, na especialidade da proposta de lei que aprova o Regulamento de Viação Municipal.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alberto Cruz.
Américo da Costa Ramalho.
Antão Santos da Cunha.
António Barbosa Abranches de Soveral.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões..
Belchior Cardoso da Costa.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Coelho.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Fernando António Munoz de Oliveira.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Maria Porto.
João Pedro Neves Clara.
Joaquim Mendes do Amaral.
José António Ferreira Barbosa.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José Gonçalves de Araújo Novo.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Tarujo de Almeida.
Ramiro Machado Valadão.
Urgel Abílio Horta.

O REDACTOR - Luís de Avillez.

Propostas enviadas para a Mesa no decorrer da sessão:

Proposta de emenda

Propomos a seguinte .emenda ido § único do artigo 2.º: em lugar de: «disporão dos serviços técnicos necessários», diga-se: «organizarão os serviços técnicos necessários».

Os Deputados: - Francisco Cardoso Carlos Monteiro do Amaral Netto - José Guilherme de Melo e Castro - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de emenda

Propomos a seguinte emenda ao artigo 3.º: em vez de: «cantões com extensão entre 4 km e 8 km», diga-se: «cantões de extensão, em regra, não inferior a 4 km nem superior a 8 km».

Os Deputados: Francisco Cardoso de Melo Machado - Carlos Monteiro do Amaral Netto - José Guilherme de Melo e Castro - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de substituição

Propomos a substituição do artigo 24.º e seu § único pelo seguinte:

Art. 24.º A zona de terreno pertencente a qualquer via municipal é a que tiver sido adquirida para a sua implantação.

Os Deputados: Francisco de Melo Machado - Carlos Monteiro do Amaral Netto - José Guilherme de Melo e Castro - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de substituição

Propomos que no § único do artigo 33.º se substituam as palavras «parecer dos respectivos serviços municipais» por «voto favorável do conselho municipal».

Os Deputados: Francisco de Melo Machado - Carlos Monteiro do Amaral Netto - José, Guilherme de Melo e Castro - Virgílio Pereira e Cruz.

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Proposta de substituição

Propomos que o § único do artigo 39.º seja substituído pelo seguinte:

§ único. O disposto nos n.ºs 4.º e 5.º não prejudica o direito de, quando necessário, depositar materiais para cargas ou em descargas de veículos, contanto que sem demoras além das indispensáveis a esta:; operações.

Os Deputados: Francisco Cardoso de Melo Machado - Carlos Monteiro do Amaral Netto - José Guilherme de Melo e Castro - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta do emenda

Propomos a seguinte emenda ao corpo do artigo 42.º: intercalar as palavras «u veículos e animais» a seguir a «Não é permitido».

Os Deputados: Francisco Cardoso de Melo Machado- José Guilherme de Melo e Castro - Carlos Monteiro ao Amaral Netto - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de aditamento

Propomos o seguinte aditamento ao corpo do artigo 44.º:

Igualmente cumpre aos proprietários de terrenos irrigados estabelecer os desvios ou drenagens necessários para evitarem inundações ou infiltrações das águas de rega prejudiciais aos leitos dessas vias.

Os Deputados: Francisco Cardoso de Melo Machado - José Guilherme de Melo e Castro - Carlos Monteiro ao Amaral Netto - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de emenda

Propomos a seguinte emenda ao corpo do artigo 46.º: suprimir as palavras «grades com bojo nas janelas nem».

Os Deputados: Francisco Cardoso de Melo Machado - Carlos Monteiro do Amaral Netto - José Guilherme de Melo e Castro - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de substituição

Propomos a substituição do artigo 57.º pelo seguinte:

Art. 57.º Os atravessamentos sobre as vias municipais por conduções aéreas ou obras de qualquer natureza não poderão ser estabelecidos ou reconstruídos a altura inferior a 5 m, a contar do nível do pavimento, e os existentes a altura menor poderão ser mandados levantar para aquela altura, pelas câmaras municipais e a expensas suas, quando se verifique constituírem prejuízos para o trânsito.

Os Deputados: Francisco Cardoso de Melo Machado - José Guilherme de Melo e Castro - Carlos Monteiro do Amaral Netto - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de substituição

Propomos a substituição do n.º 1.º do artigo 58.º pelo seguinte:

1..º Dentro dás zonas de servidão non redificandi limitadas de cada Indo da estrada por uma linha que dista, do seu eixo 6 m e 4,5 m, respectivamente para as estradas e caminhos municipais.

As câmaras municipais poderão alargar as zonas de servidão non redifícandi até ao máximo de 8 m e 6 m, para cada lado do eixo da via, respectivamente para as estradas e caminhos municipais, na totalidade ou apenas em alguma ou algumas das vias municipais.

Os Deputados: Francisco Cardoso de Melo Machado - José Guilherme de Melo e Castro - Carlos Monteiro do Amaral Netto - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de substituição

Propomos a substituição do § 1.º do artigo 59.º pelo seguinte:

§ 1.º Os muros de vedação e os taludes de trincheira poderão ser encimados por guardas vazadas até às alturas indispensáveis para defesa dos produtos das propriedade. A superfície mínima de vazamento será de 50 por cento da superfície da guarda;

Os Deputados: Francisco Cardoso de Melo Machado - José Guilherme de Melo e Castro - Carlos Monteiro do Amaral Netto - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de emenda

Propomos a seguinte emenda ao n.º 2.º do artigo 59.º: suprimir a palavra «poder».

Os Deputados: Francisco Cardoso de Melo Machado - José Guilherme de Melo e Castro - Carlos Monteiro do Amaral Netto - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de substituição

Propomos a substituição do artigo 57.º pelo seguinte:

Art. 57.º Os atravessamentos sobre as vias municipais por conduções aéreas ou obras de qualquer natureza não poderão ser estabelecidos ou reconstruído I a altura inferior a 5 m, a contar do nível do pavimento, e os existentes a altura menor poderão ser mandados levantar para aquela altura.

Proposta de emenda

Propomos a seguinte emenda ao n.º 1.º do artigo 71.º: substituir o texto da proposta pela seguinte redacção:

1.º A cortar as árvores e a demolir, total ou parcialmente, ou beneficiar, as construções que ameacem desabamento, precedendo sempre vistoria.

Os Deputados: Francisco Cardoso de Melo Machado - José Guilherme de Melo e Castro - Carlos Monteiro do Amaral Netto - Virgílio Pereira e Cruz.

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Proposta de emenda

Propomos a seguinte emenda ao corpo do artigo 75.º: substituir o texto da proposta, pela seguinte redacção:

Art. 75.º As câmaras municipais podem promover, a expensas suas, a redução de altura dos muros das vedações dos prédios confinantes com as vias municipais para a fixada no artigo 59.º deste regulamento, ou o corte de árvores, se tais vedações ou árvores prejudicarem a vista de panoramas interessantes ou apresentarem inconvenientes para a via municipal ou para as condições de visibilidade do trânsito, desde que os proprietários não procedam a essa redução ou corte no prazo que lhes for fixado.

Os Deputados: Francisco Cardoso de Melo Machado - José Guilherme de Melo e Castro - Carlos Monteiro do Amaral Netto - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de eliminação

Propomos a eliminação da alínea b) do artigo 79.º

Os Deputados: Francisco Cardoso de Melo Machado - José Guilherme de Melo e Castro - Carlos Monteiro do Amaral Netto - Virgílio Pereira e Cruz.

Proposta de eliminação

Propomos a eliminação dos §§ 1.º e 2.º do artigo 82.º

Os Deputados: Francisco Cardoso de Melo Machado - José Guilherme de Melo e Castro - Carlos Monteiro do Amaral Netto - Virgílio Pereira e Cruz.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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