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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA - GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 99

ANO DE 1963 29 DE ABRIL

VIII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 99 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 27 DE ABRIL.

Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Exmo. Srs.Fernando Cid Oliveira Proença
Luís Folhadela de Oliveira

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente comunicou que estavam na Mesa requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados António Santos da Cunha, Alexandre Lobato e Martins da Cruz.
O Sr. Deputado Alfredo Brito foi autorizado a depor, como testemunha, num tribunal do Porto.
O Sr. Deputado Gonçalves Rodrigues falou, na tribuna, sobre o 35.º aniversário da entrada do Sr. Prof. Oliveira Salazar para o Governo da Nação.

Ordem do dia. - Concluiu-se a votação da proposta de lei de revisão da Lei Orgânica do Ultramar Português, sendo aprovadas alterações às bases LVIII, LXI, LXIII, LXV.III, LXXXI, Lxxxvm e XCII.
Foi também aprovada uma base nova, XVI-A.
Foram revogadas as bases LXXXII, LXXXIV, LXXXV e LXXXVI da Lei Orgânica do Ultramar Português.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada. Eram 16 horas.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Âgnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Marques Lobato.
Alfredo Maria de Mesquita Guimarães Brito.
André Francisco Navarro.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António Burity da Silva.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos.
António Magro Borges de Araújo.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Maria Santos da Cunha.
António Martins da Cruz.
António Moreira Longo.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
Armando Cândido de Medeiros.
Armando José Perdigão.
Artur Aguedo de Oliveira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Artur Proença Duarte.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Augusto José Machado.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves.
Carlos Emílio.
Tenreiro Teles Grilo.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.

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D. Custódia Lopes.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco António Martins.
Francisco António da Silva.
Francisco José Lopes Roseira.
Francisco de Sales de Mascarenhas Loureiro.
Henrique Veiga de Macedo.
James Pinto Buli.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Mendes da Costa Amaral.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Sousa Birne.
Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos.
José Augusto Brilhante de Paiva.
José Fernando Nunes Barata.
José Manuel Pires.
José Maria Rebelo Valente de Carvalho
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Pinheiro da Silva.
José Pinto Carneiro.
José dos Santos Bessa.
José Soares da Fonseca.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela de Oliveira.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Herculano Chorão de Carvalho.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel João Correia.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Irene Leite da Costa.
Mário de Figueiredo.
Paulo Cancella de Abreu.
Quirino dos Santos Mealha.
Sebastião Garcia Ramires.
Virgílio David Pereira e Cruz.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 77 Srs. Deputados. Está aberta a sessão.

Eram 16 horas 10 minutos.

Antes da ordem, do dia

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Diversos a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Júlio Neles que preconizava a criação de uma escola técnica no Entroncamento.

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa três requerimentos, respectivamente dos Srs. Deputados António Santos da Cunha, Martins da Cruz e Alexandre Lobato, a pedir certos elementos ao Governo. Vão ser remetidos ao Governo.
Está na Mesa um ofício da 2.º vara cível do Porto a pedir autorização à Câmara para que o Sr. Deputado Alfredo Brito possa depor naquele tribunal no próximo dia 29, pelas 12 horas. O Sr. Deputado Alfredo Brito não vê inconveniente para a sua actuação parlamentar em que a referida autorização seja concedida, pelo que vou consultar a Câmara sobre se autoriza ou não o Sr. Deputado em questão a ir depor no dia e hora indicados.

Consultada a Assembleia, foi concedida autorização.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalves Rodrigues, ao qual peço o favor de falar da tribuna.

O Sr. Gonçalves Rodrigues: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: determinaram as circunstâncias que o encerramento desta sessão legislativa coincidisse com o trigésimo quinto aniversário da entrada do Sr. Presidente do Conselho para o Governo da Nação. Não pode esta Assembleia nem o País ficar indiferente perante uma efeméride que é sempre momento adequado à meditação.
Há 35 anos entrava no Terreiro do Paço um homem que, por voto repetidamente expresso da Nação, ainda de lá não conseguiu sair. Eis um fenómeno de longevidade política para o qual não julgo se encontre paralelo no Mundo moderno e que decerto há-de ter uma explicação profunda, que não será precisamente a ditada pela simplicidade apaixonada dos seus detractores habituais.
Onde ir buscar, portanto, a raiz essencial do fenómeno? No homem? No devir histórico? Na conjunção casualmente .harmoniosa de um e outro? Creio que nenhum desses factores bastará como explicação, já que o homem se revela, e a história se desenvolve, em função de uma comunidade organizada, herdeira de uma tradição multissecular, ciosa da sua personalidade e dos seus direitos, fortemente individualista e avessa a jugos de qualquer espécie. Há que considerar pois, simultaneamente, o homem e o povo; e ambos no seu momento histórico, e em recíproca reacção. Singular encontro de vontades que leva a um desvio não menos singular na direcção da história, pela força de uma personalidade e com o consenso do povo que nela instintivamente reconhece um poderoso agente do bem comum.
Eis uma reprodução terrena do mistério trinitário, mais vulgar do que se pensa na estrutura da realidade natural ou social. O povo gera em si próprio a Fala, o Verbo, a Acção - como quiserem -, que melhor convém em dado momento às exigências mais íntimas da sua essência vital e histórica, e une-se-lhe espiritualmente num acto de fé criadora, na esperança de uma redenção. Perdoe-se-me o sabor teológico do símbolo que decerto me envergonharia se pretendesse ser um empolado panegírico, mas que sinceramente corresponde a uma explicação meta-histórica pessoal. É que só por uma osmose desse tipo, raras vezes conseguida, se pode justificar uma longevidade que a nossa época é levada a considerar abstractamente anacrónica, e nós sabemos concretamente que tem a sua razão de ser.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Numa época caracterizada pela instabilidade mercurial das ideias e dos sentimentos e em que o apetite instintivo da matéria pela multiplicidade das formas tenderia naturalmente a exacerbar-se no plano político - a permanência granítica de um homem representativo de ideias sociais e políticas e de princípios mo-

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rais a que sempre permaneceu fiel é quase pedra de escândalo e signo de contradição.
O homem surgiu no momento exacto - e esse, era o derradeiro. E o povo português, durante tantos anos impotente espectador do festim- suicida das facções, reconheceu-o à primeira voz. Falava a linguagem dura do cirurgião que sabe que o doente tem direito à verdade inteira. Falava de cátedra, com saber reconhecido, honestidade transparente, firme intento de servir.
Olhando para trás, quem de entre os da minha idade, e quem de entre os mais velhos, se não recorda do alívio maravilhado, do espanto com que no meio do pânico geral se ouvia a voz de uma racionalidade cristalina, de uma inteligência criticamente equipada para a análise dos problemas que afligiam a sociedade portuguesa, capaz de diagnosticar, de eliminar, de escolher e de sarar? Quem se não lembra da fé que, como avalancha maciça, logo desabou das montanhas para os vales, invadindo pousadas e palácios, reanimando corações abatidos e inflamando irrequietos ímpetos juvenis? Quem não teve a sensação de que a atmosfera se carregara de uma energia quase numinosa e de que o Sol português rompera e rodopiara mais uma vez no céu nublado de angústia que há tanto estávamos habituados a suportar?

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Para a minha geração, que o conhecera ainda só como professor, o aparecimento de Salazar na arena política foi saudado com uma expectativa complexa, feita de muitos elementos heterogéneos, mas convergentes.
Predominava, na desoladora paisagem cultural de então, o puro deslumbramento ao contacto de uma inteligência lucilante; havia a «fúria» doutrinária, no sentido camoniano, que via subitamente surgir-lhe diante dos olhos o homem predestinado, 1homme qui vient de um livro então em voga de Valois; o ímpeto revolucionário de uma juventude que crescera entre os escombros do solar arruinado, se corrigira do decadentismo elegíaco dos poetas de 90 com a nova interpretação do mito sebastianista, filosofia nacional da esperança, tal como a definira Sardinha. Tudo cristalizado na visão de um mundo ideal a restaurar ou a erguer a pulso, na avidez do reencontro com os valores perdidos da tradição.
Por cima dos séculos, estendíamos mãos solidárias a todas as gerações que, através dos tempos, haviam levado a cabo a tarefa de defender, reconquistar, reconstruir Portugal.

Vozes: - Muito bem. muito bem!

O Orador: - Esta a visão. Da realidade que veio a dar-lhe forma temporal não vou f alar-vos, porque é dos livros. Não vim aqui fazer história, vim fazer um depoimento e uma saudação.
Nos 35 anos decorridos houve os altos e baixos inevitáveis: horas de rotina necessária e morna, em que a voz do comando parecia coar-se através de uma enorme manga de alpaca, e horas de exaltação e frémito que de um jacto redimem todas as outras, arrastadas e enervantes.
Daquelas, pouco há a dizer que não esteja dito. Submetidos a um processo sistemático, por vezes discutível e excessivo, de desintoxicação política, caminhávamos para o bocejo colectivo de uma habitualidade teoricamente recomendável à sociologia embrionária do século passado, mas incompatível com os efeitos já bem observáveis da crise moral que atacava o Ocidente nas suas raízes mais profundas.
A habitualidade como ideal de vida colectiva era uma utopia nostálgica de quem fora jovem antes da primeira guerra mundial e à qual o redemoinho dos acontecimentos se encarregou de dar um desmentido feroz. E ainda bem!, direi eu. Ainda bem por ele e ainda bem por nós.
O professor eminente, na sua modéstia exemplar, bem gostaria de se amoldar a um ideal de governação burguesa, a redigir pacatamente aos serões o manual da perfeita dona desta pequena casa lusitana para eventual uso dos delfins. (Risos). Mas os homens, só forçados por estímulos externos se erguem à sua verdadeira medida, só na resposta a um desafio atingem a estatura que a Providência lhes assinalou como própria sua. E tal os homens, assim as Pátrias. Salazar cresceu com Portugal, Portugal cresceu com Salazar ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ... porque, dali por diante, a união íntima estabelecida pela visão inicial, três vezes, pelo menos, se afirmou em deslumbrante plenitude - na guerra civil de Espanha, na segunda guerra mundial e, mais do que nunca, meus senhores, mais do que nunca, hoje.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Nos intervalos, curtos ou longos, parasitas do habitat social, os vermes, as bactérias, quando não os vírus, trabalhavam incessantemente, afeiçoados à visão de uma farta mediocridade, resignados à ideia de um Portugal amputado, de um Portugal menor.
Não podem estas palavras apressadas perder-se em pormenores sobejamente conhecidos. Como síntese lapidar da problemática em causa, basta ler o artigo do próprio professor Salazar, publicado há pouco na revista International Affairs.
Considero esse artigo um dos mais importantes documentos saídos da sua pena, pela densidade das ideias, pela lucidez meridiana do raciocínio, pela penetração crítica incomparável, pelo esplendor que irradia da serenidade e do perfeito equilíbrio da exposição.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Ali está, maravilhosamente delineado, um auto-retrato mental, a imagem modelar e intemporal do homem clássico.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Consciência das limitações próprias e confessada modéstia dos resultados; marcha progressiva para uma justiça social mais ampla, necessariamente subordinada às realidades económicas; análise original de certos aspectos do temperamento português; uma racionalidade consciente do seu quilate soberbamente impermeável aos estribilhos correntes - eis alguns pontos e características que ali denunciam na personalidade rara as preocupações do sociólogo, do economista, do moralista e do educador de um escol.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Uma apreciação que queira fugir ao tipo de panegírico oficial, com que eu não seria capaz de transigir, e pretenda esboçar ao menos um juízo independente sobre a obra realizada, terá de considerar, no homem.

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as limitações intrínsecas do cerebral isolado, que na ordem política podem operar como vantagem ou como desvantagem; e não ignorará as limitações impostas pela natureza do material humano e dos grupos sociais com que teve de trabalhar, e ainda os obstáculos derivados da actividade crescente dos seus opositores de base.
A obra realizada nem sempre se identificará rigorosamente com os princípios invocados, aos quais, no entanto, como disse, sempre permaneceu fiel e lhe garantem a adesão espontânea e ardorosa da grande maioria da Nação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas o homem de princípios é também um mestre de realismo político e a mais decidida negação do ideólogo. Isto lhe tem permitido manter um sábio equilíbrio oportunista na diplomacia mundial que lhe garantiu os mais profícuos resultados.
Mas somos obrigados a reconhecer ainda que, no nosso mundo vário, a superioridade natural do político realista, a sua capacidade de captação dos homens e de adaptação às circunstâncias seriam ainda assim insuficientes para lhe permitirem a permanência no Poder por tão dilatado período, se efectivamente o vigor da inteligência não fosse interiormente acalentado por um grande, incandescente, imorredoiro sentimento - o seu amor a Portugal.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: -De nada lhe valeriam engenho e arte, a austeridade do viver, a agudeza do intelecto, se nos três ou quatro grandes momentos da sua existência ele não tivesse sido o intérprete oportuno, eloquente e exacto, do sentimento nacional ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ... se a Nação se não persuadisse de que, pela boca dele, ela própria pronunciava as palavras do grande monólogo interior donde surgem as decisões que imprimem carácter e dão sentido à vida de um povo.
Nesses momentos de transfusão espiritual é que ele se faz o porta-voz de uma consciência histórica que proclama a solidariedade das gerações e rasga à Nação os rectos caminhos da dignidade e da fortaleza.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Então, os que o não traem e nos não traem recalcam todos os ressentimentos que a vida diária lhes acumulou no peito, calam as querelazinhas que afastam do terreiro da fé e da honra os outros - os títeres ambiciosos que não são capazes de representar mais do que as suas próprias e ridículas ambições ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ... os que poderão talvez saber muito de Portugal, mas não o sentem bastante para quererem para ele viver e por ele morrer.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A esses se juntam outros ainda, que diariamente o traem e nos traem ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ... já não digo os apóstatas da Pátria, que venderam a alma sabe Deus a que danado Belzebu, mas os sacerdotes do bezerro de oiro, os supremos egoístas a quem só interessa a segurança das vidas e das burras; os tecnocratas desenraizados em cuja hierarquia de valores não figura a soberania dos fins morais e espirituais; os comandantes que não comandam e os dirigentes que abdicam da sua missão; os aduladores profissionais e os que da política fazem balcão imundo; e até aquele fragmento de ectoplasma pútrido que nesta Casa se infiltrou das trevas exteriores.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Estes, que ora se revelam em sua perfídia, egoísmo, covardia ou tibieza, estiveram sempre connosco, comungaram sacrilegamente do nosso pão e do nosso vinho, foram o perpétuo e secreto entrave de tanta aspiração irrealizada.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Apesar de tudo, Salazar deixou indelevelmente gravada neste pedaço de história a sua marca pessoal. Portugal é bem diferente, e ele o será também. Tivemos todos as nossas esperanças, as nossas vitórias e também os nossos desalentos e até desilusões; que vida humana e que história nacional é isenta de uns ou de outros?
A sociedade sobre que ele actuou transformou-se radicalmente e nem sempre para bem, sem culpa sua, e não deixou de opor-lhe resistências que não foi possível vencer.
A obra era ciclópica e ao lado deste Atlas não abundavam os Titãs: muito pigmeu houve mesmo que julgou agigantar-se à sombra dele.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Assim chegámos ao ponto culminante em que, frágil argila humana, quase que tem de aguentar o Mundo sobre os ombros. Eis a sua hora mais alta! Quem o poderia substituir aqui? Uns verão nele apenas o avisado político ou o habilidoso estratega; outros seguilo-ão como a um juiz bíblico, Moisés a caminho do Egipto. Mas já não é sómente um chefe, condutor de um povo. Para todos quantos ainda prezem no novo mundo mecanizado a permanência de um humanismo espiritual e inquiridor, afirmativo e céptico, que se realiza na liberdade e no amor e constitui a essência do que chamamos civilização, ele é um dos últimos grandes representantes do Ocidente em trágico recuo, guião desfraldado da mais nobre de todas as resistências.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O «vento da mudança» em vão soprará sobre a babel confusa das Nações Unidas. Nós continuaremos firmes na convicção de que não há marcha uniforme, de pura necessidade histórica, de um universo alinhado em nome do progresso. Há, sim, histórias variadas de grupos e sociedades que são veículos de uma tradição social.
Nenhuma história universal até hoje escrita passou de um aglomerado inorgânico de capítulos nacionais meramente justapostos, ou a simples tentativa de dar carácter de universalidade a critérios particulares de culturas ou grupos individualizados. Esta forma de imperialismo cultural tornaria os factores de uma civilização subsidiários da evolução e das conquistas de outra.

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A verdade é que no areópago nova-iorquino têm assento representantes de povos em todas as fases de desenvolvimento, desde o primitivismo mais tosco ao mais avançado industrialismo. Mas já alguém disse que, apesar do toda a cibernética prodigiosa do nosso tempo, ainda ninguém conseguiu inventar uma máquina criadora de valores morais.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não me alongarei sobre os aspectos particulares da actividade desta Assembleia, que tão devotadamente com ele tem colaborado na defesa desses mesmos valores e na sua aplicação mais ampla a zonas cada vez maiores do grande espaço geográfico e humano que recebemos e queremos transmitir aos vindouros, mais forte na sua estrutura económica e social, mais firme na sua alma portuguesa.
A juventude que ali está resgatando na luta e na dor tanto pecado de omissão, tanto desvio inconsciente, há-de coroar com o seu- esforço ingente o sacrifício do homem que daqui comovidamente saudamos, ao comemorarmos esta data histórica, e que decerto não desejará para si outro título que o de servo dos servos de Portugal.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Por detrás deste palácio, um poema esculpido foi mandado erigir, depois da segunda guerra mundial, pelas mães dos filhos que Salazar soube poupar aos horrores da guerra. Um dia, ele fará erguer uma outra estátua - às mães que sem um murmúrio lhe entregam agora os seus para, com ele, salvarem Portugal.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

(Aplausos).

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: só encontro um comentário. Em sinal de respeito e de admiração, interrompo a sessão por 10 minutos.

Eram 16 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 16 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na especialidade a proposta de lei de alterações à Lei Orgânica do Ultramar.

Vou pôr em discussão a base LVIII. Sobre esta base não há na Mesa qualquer proposta de alteração. Vai ler-se.

Foi lida. É a seguinte:

BASE LVIII

I- .....................
II - O governador apresentará, antes do início do ano económico, ao Conselho Legislativo uma proposta do diploma em que serão definidos os princípios a que deve obedecer o orçamento na parte das despesas de quantitativo não determinado por efeito da lei ou contrato preexistente.
De harmonia com o que for votado, o governador organizará o orçamento que mandará executar.
III - Quando, por qualquer circunstância, o orçamento não possa entrar em execução no começo do ano económico, a cobrança das receitas, estabelecidas por tempo indeterminado ou por período que abranja a nova gerência, prosseguirá nos termos das leis preexistentes e, quanto às despesas ordinárias, continuarão provisoriamente em vigor, por duodécimos, o orçamento do «ano anterior e os créditos sancionados durante ele para ocorrer a novos encargos permanentes.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Soares da Fonseca: - Sr. Presidente: pedi a palavra não para apresentar qualquer justificação, mas para dar explicação da proposta do Governo. Nela se mantém o n.º I do texto em vigor, ao mesmo tempo que se actualiza o n.º II e se suprimem os n.08 III e IV, passando, assim, para n.º III o actual n.º v. A base assim redigida é consequência necessária da autonomia financeira, que já votámos para as províncias ultramarinas. Essa autonomia obriga à actualização desta base. Xão há, portanto, nada propriamente de novo, mas apenas uma consequência daquilo que já se votou.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai passar-se à votação.
Vai votar-se a base LVIII tal como consta da proposta do Governo.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vou pôr em discussão a base LXI, sobre a qual há na Mesa uma proposta de alteração apresentada pelo Governo.
Vai ser lida a proposta, do Governo e depois a proposta de alteração à sua própria proposta.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE LXI

I -
II - A iniciativa dos empréstimos pertence ao governador, com autorização do respectivo Conselho Legislativo.
Relativamente, porém, a obras e planos que forem da competência do Ministro do Ultramar, poderá este providenciar acerca do respectivo financiamento, por sua iniciativa ou mediante proposta do governador, ouvido neste caso o Conselho Legislativo ou o de Governo.
III - .....................
IV - ......................
V - .......................

Proposta de alteração

A iniciativa dos empréstimos pertence ao governador, com autorização do respectivo Conselho Legislativo.
Relativamente, porém, a obras e planos que forem da competência do Ministro do Ultramar, poderá este

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providenciar acerca do respectivo financiamento, por sua iniciativa ou mediante proposta do governador, ouvido neste caso o Conselho Legislativo.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Joaquim de Jesus Santos: - Pedi a palavra para dar um pequeno esclarecimento. Na comissão eventual viu-se, efectivamente, que a base em análise proposta pelo Governo não estava conforme com a nova organização e constituição dos órgãos legislativos das províncias ultramarinas.
Com efeito, deixaram de existir nas províncias de governo simples os Conselhos de Governo com funções legislativas, passando a existir Conselhos Legislativos, como sucede e já sucedia nas províncias de governo-geral.
Daí que, efectivamente, não estivesse bem a parte final do n .º n, pelo que o próprio Governo veio apresentar a necessária alteração.
E porque o Governo se antecipou, a comissão eventual não apresentou qualquer proposta de alteração, não obstante ter verificado o lapso. Isto só o que importava esclarecer a Câmara.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai passar-se à votação. Vai votar-se a base LXI com a proposta de alteração apresentada pelo Governo.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Ponho agora em discussão a base LXIII, sobre a qual não há na Mesa qualquer proposta de alteração. Vai ler-se.

Foi lida. E a seguinte:

BASE LXIII

I- .....................
II- .....................
III- .....................
IV - As despesas da administração provincial serão ordenadas nos termos da presente lei e dos diplomas especiais que regularem a execução dos serviços de Fazenda.
V - O tribunal administrativo de cada província fará a fiscalização judicial do orçamento das despesas, nos termos e na medida que a lei determinar. A fiscalização administrativa cabe ao Ministério do Ultramar, que a fará por meio de inspecções e pelo visto das entidades competentes, e aos governadores.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Soares da Fonseca: - Sr. Presidente: tal como disse há momentos sobre a base LVIII, as alterações introduzidas na proposta do Governo para a base em discussão resultam de se ter votado a autonomia financeira das províncias ultramarinas. Deste modo, adapta-se o n.º V do texto vigente à nova mecânica orçamental derivada da aludida autonomia. Elimina-se assim o n.º v, que atribui ao Ministro do Ultramar competência para dar aos governadores instruções no sentido da fiscalização administrativa dos orçamentos das despesas, e o n.º VI passa a n.º V. mantendo integralmente a sua actual redacção.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai passar-se à votação. Vai votar-se a base LXIII.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Ponho agora em discussão a base LXVIII, sobre a qual há na Mesa uma proposta de alteração. Vão ler-se.

Foram lidas.

São as seguintes:

BASE LXVIII

I - A inconstitucionalidade material dos diplomas legais será, no ultramar, apreciada pelos tribunais nos termos do artigo 123.º da Constituição.
II - A inconstitucionalidade orgânica e formal dos diplomas sujeitos à promulgação do Chefe do Estado só poderá ser apreciada, nos termos daquele preceito constitucional, pela Assembleia Nacional, por sua iniciativa ou do Governo.
III - A inconstitucionalidade orgânica e formal de quaisquer outros diplomas será apreciada pelo Conselho Ultramarino reunido em sessão plenária.
IV - O processo a que deve obedecer a apreciação da inconstitucionalidade será o fixado no Regimento do Conselho Ultramarino.

Proposta de alteração

Propomos que a base LXVIII tenha a seguinte redacção:

I - A inconstitucionalidade material das normas jurídicas será, nas províncias ultramarinas, apreciada pelos tribunais de conformidade com o disposto no corpo do artigo 123.º da Constituição.
II - A inconstitucionalidade orgânica ou formal dos diplomas promulgados pelo Presidente da .República, bem como dos diplomas legislativos ministeriais e portarias do Ministro do Ultramar, a que se refere o § 1.º do artigo 150.º da Constituição, só poderá ser apreciada pela Assembleia Nacional e por sua iniciativa ou do Governo, determinando a mesma Assembleia Nacional os efeitos da inconstitucionalidade, sem ofensa, porém, das situações criadas pelos casos julgados.
III - Sempre que nos tribunais das províncias ultramarinas se levantar um incidente de inconstitucionalidade orgânica ou formal de qualquer outro diploma, quer por iniciativa das partes, quer dos magistrados, se o tribunal entender que a arguição tem fundamento, subirá o incidente em separado ao Conselho Ultramarino, para julgamento.
IV - Recebido o processo, seguir-se-ão os trâmites legais e no final será lavrado acórdão sobre a inconstitucionalidade do diploma, mandando-o observar ou determinando que se não aplique.
V - A conclusão do acórdão do Conselho Ultramarino será telegràficamente comunicada

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à província ou províncias interessadas, a fim de que, uma vez publicada no respectivo Boletim Oficial, se lhe dê cumprimento.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 23 de Abril de 1963. - Os Deputados: Albino Soares Pinto dos Reis Júnior - José Soares da Fonseca - Joaquim de Jesus Santos - Bento Benoliel Levy - Alberto da Rocha Cardoso de Matos - António Burity da Silva - Alberto Pacheco Jorge - Alberto Maria Ribeiro de Meireles.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - A base em discussão e as alterações propostas por alguns Srs. Deputados dizem respeito ao incidente da inconstitucionalidade material e da orgânica ou formal das normas jurídicas, bem como dos diplomas promulgados pelo Chefe do Estado e dos ministeriais a que se refere o § 1.º do artigo 150.º da Constituição.
Trata-se, pois, de um problema constitucional, sério e de transcendente importância, que se entendeu necessário enfrentar na própria Carta Orgânica vigente, através da base em referência.
Sobre os n.ºs e II que nela se contêm, nada se me oferece dizer, pois aí não se infringe, antes se respeita, a doutrina do artigo 123.º e seu § único da Constituição, embora quanto a este parágrafo, naquela proposta de alterações e na da Câmara Corporativa, se ampliem os casos em que o conhecimento do incidente da inconstitucionalidade é da competência exclusiva da Assembleia Nacional.
O mesmo não sucede, porém, em relação ao n.º III da base e aos n.ºs IV e V seus consequentes, na parte em que entregam ao Conselho Ultramarino o julgamento daquele incidente, mesmo quando se trate de inconstitucionalidade orgânica ou formal deduzida - como, bem ou mal, pode acontecer- por qualquer das partes ou contemplada pelos próprios magistrados nos processos comuns pendentes nos tribunais ordinários de 1.a ou 2.a instâncias no ultramar.
Fez-se e renova-se isto, em lugar de deixar reservada para aquele Conselho Ultramarino apenas a competência jurisdicional que lhe confere o n.º 3.º da base LXVII da Carta Orgânica para julgar os recursos interpostos dos tribunais administrativos do ultramar e dos actos governativos.
Tenho opinião e voto comprometidos neste sentido, pois, quando da discussão da actual Carta Orgânica, em 1953, rejeitei esta mesma base, por ela estabelecer também aquela ilegítima e injustificável invasão de poderes.
Não vou agora deter-me na exposição dos fundamentos da minha atitude, pois o tempo urge e já os expus então; e do mesmo modo procedi perante a comissão eventual numa das suas 23 reuniões.
E bem certo que lá diz a locução latina Sapientis est mutare concilium; mas eu, como não sou sapiente, mantenho agora a atitude de então, e, por isso, rejeito os n.ºs III, IV e V da base LXVIII.
Nesta conformidade, requeiro a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que se digne pôr à votação em separado cada um dos números que constituem esta base.
Tenho dito.

O Sr. Joaquim de Jesus Santos: - O problema do controle da constitucionalidade das leis é, sem dúvida nenhuma, e como muito brilhantemente salientou o Sr. Deputado Cancella de Abreu, um problema verdadeiramente transcendente. A comissão eventual estudou-o, portanto, como não podia deixar de ser, com todo o carinho e com o melhor cuidado. Desse estudo inferiu que a formulação desta base devia traduzir-se na aceitação pura e simples do texto sugerido pela Câmara Corporativa, já porque lhe pareceu bem estruturado e devidamente fundamentado no respectivo e muito douto parecer, já porque subscreve esse parecer um dos mais ilustres constitucionalistas do direito português.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Há, efectivamente, divergências profundas entre o texto da proposta do Governo e o texto sugerido pela Câmara Corporativa. A principal é esta: quanto à inconstitucionalidade orgânica e formal, a proposta do Governo, que trata do problema no seu n.º II, refere-se apenas à inconstitucionalidade dos diplomas sujeitos à promulgação do Chefe do Estado, enquanto o mesmo n.º II do. texto da Câmara Corporativa se refere também aos diplomas legislativos ministeriais e às portarias do Ministro do Ultramar. Quer isto dizer que a formulação da Câmara Corporativa tem um campo de aplicação mais amplo.
Posto isto, vejamos qual é o esquema fundamental da apreciação e controle da inconstitucionalidade das leis. Distingue-se - e a distinção já não é nova - entre inconstitucionalidade material, substantiva ou objectiva e inconstitucionalidade orgânica e formal, conforme ela resulte ou da ofensa objectiva dos preceitos e princípios constitucionais ou se traduza num vício de mera forma ou derive do facto de um determinado órgão não ser constitucionalmente o competente para criar o respectivo diploma legal.
Pois bem: para a apreciação da inconstitucionalidade material segue-se inteiramente a norma constitucional de serem os tribunais ordinários a fazer a sua apreciação. Quanto a inconstitucionalidade orgânica e formal, segue-se também, e em princípio, o regime estabelecido na Constituição. Na verdade, e quanto àqueles diplomas que são promulgados pelo Chefe do Estado, e ainda quanto aos diplomas legislativos ministeriais e portarias do Ministro do Ultramar, a fiscalização é exercida pela Assembleia, estando-se, portanto, inteiramente dentro do regime constitucional.
Devo esclarecer a Câmara de que os diplomas legislativos ministeriais que referi são aqueles diplomas que o Ministro do Ultramar publica no exercício das suas atribuições legislativas quando se encontra nas províncias ultramarinas. É a forma através da qual o Ministro do Ultramar exerce a sua função legislativa quando tem o seu gabinete no ultramar. Daí o chamar-se-lhes diplomas legislativos ministeriais, para os distinguir dos diplomas legislativos dos respectivos órgãos locais. Ali não se publicam nem leis, nem decretos-leis, nem decretos regulamentares, mas sim diplomas legislativos.
Portanto, nesta parte, a formulação sugerida pela Câmara Corporativa traz, realmente, algo mais, pois sujeita ao controle desta Assembleia os diplomas emanados do Ministro do Ultramar.
Por outro lado, sendo o Ministro do Ultramar o presidente do Conselho Ultramarino, não estaria bem que fosse um órgão de que. ele é presidente que apreciasse a inconstitucionalidade dos seus diplomas.
Quanto aos diplomas emanados de órgãos meramente locais, preferiu-se também o parecer da Câmara Corporativa, por se afigurar que ele dá a melhor solução para o caso. Todos esses diplomas são controlados, na sua constitucionalidade, pelo Conselho Ultramarino. E claro que poder-se-ia ter ido para uma solução parecida com aquela que se aceitou no n.º II, isto é, sujeitar esses diplomas também ao controle desta Assembleia.

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E houve até alguns ilustres Deputados que brilhantemente suscitaram o problema, mas mesmo esses declararam, desde logo, que viam nessa solução grave inconveniente, que se traduziria em trazer ao primeiro plano da vida nacional um conflito secundário, que se situava num domínio c num plano puramente local.
Por estas razões e depois de devidamente estudado o problema, a comissão eventual decidiu-se pela sugestão da Câmara Corporativa.
Uma outra divergência que também se encontrou entre a proposta do Governo e a sugestão da Câmara Corporativa acha-se compreendida no n.º I.
Enquanto a proposta do Governo refere «a iuconstitucionalidade material dos diplomas legais», o texto sugerido pela Câmara Corporativa refere «a inconstitucionalidade material das normas jurídicas».
À comissão pareceu que o texto da Câmara Corporativa era mais perfeito, e por isso o adoptou, pois entendeu que o que está verdadeiramente em causa, no que respeita à inconstitucionalidade material, é a regularidade das normas jurídicas, e não dos diplomas em que eles se contêm.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai proceder-se à votação.
Conforme requerimento do Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu, vão votar-se em primeiro lugar os n.ºs I e II da proposta de alteração apresentada pela comissão eventual.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Vou agora pôr à votação os n.os. III, IV e V da proposta de alteração.

Submetidos à votação, foram- aprovados.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Requeiro a V. Ex.ª que no Diário das Sessões fique constando que estes números foram aprovados por maioria.

O Sr. Soares da Fonseca: - Eu requeiro que fique consignado no Diário das Sessões que estes números foram aprovados com exclusão de apenas um voto, porque este modo do dizer é mais realista.

O Sr. Presidente: - Ficará exarado no Diário das Sessões que foram aprovados por unanimidade menos um ...

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Muito obrigado a V. Ex.ª

O Sr. Presidente: - Vou pôr em discussão a base LXXXI, sobre a qual há na Mesa uma proposta de eliminação. Vão ser lidas a base e a proposta de eliminação.

Foram lidou. São as seguintes:

BASE LXXXI

I -.....................
II - O Estado manterá, como lhe parecer conveniente, nas províncias ultramarinas, escolas primárias, complementares, médias, superiores e centros de investigação científica. Nas escolas primárias é autorizado o emprego do idioma vernáculo ou local como instrumento de ensino da língua portuguesa.
III - .................
IV - ..................
V - ...................
VI- ....,..............

Proposta de eliminação

Propomos que no n.º II da base LXXXI seja eliminada a expressão «vernáculo ou».

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 23 de Abril de 1963. - Os Deputados: Albino Soares Pinto dos Reis Júnior - José Soares da Fonseca - Joaquim de Jesus Santos - Bento Benolicl Levy - Custódia Lopes - Alexandre Marques Lobato - Alberto da Rocha Cardoso de Matos-António Burity da Silva - Alberto Pacheco Jorge.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Joaquim de Jesus Santos: - Sr. Presidente: pedi a palavra apenas para fazer um pequeno apontamento.
Como a Câmara deverá certamente ter-se apercebido, a alteração é aparentemente sem importância. Todavia, a comissão eventual entendeu aceitar a sugestão feita no parecer da Câmara Corporativa, eliminando a expressão «ou vernáculo», porque se entendeu que o vocábulo «vernáculo» dava a ideia de um classicismo que efectivamente parece não se verificar nas línguas locais. Esta a razão pela qual a comissão eventual se decidiu pela sua eliminação.
Quero dizer: manteve-se a preocupação expressa pelo Governo de respeitar nas escolas primárias o uso do idioma local. Simplesmente, eliminou-se o termo «vernáculo», que poderia dar a ideia de um classicismo que nele não se verifica.
Disse.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer uso da palavra, vai passar-se à votação.

Vai votar-se em primeiro lugar a proposta de eliminação.

Submetida à cotação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vai agora votar-se o resto da base LXXXI como consta da proposta do Governo.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vou pôr em discussão a base LXXXVIII, sobre a qual não há na Mesa qualquer proposta de alteração.

Vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

BASE LXXXVIII

I - ..................................................
II - Todos os diplomas emanados dos órgãos metropolitanos para vigorar nas províncias ultramarinas deverão conter a menção, aposta pelo Ministro do Ultramar, de que devem ser publicados no Boletim Oficial da província ou províncias onde hajam de exe-

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cutar-se. Esta menção será escrita no original do diploma e assinada pelo Ministro do Ultramar.
III- ....................
IV- .....................

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Soares da Fonseca: - Sr. Presidente: a Câmara Corporativa sugeriu que para este n.º II da base em discussão se mantenha o texto vigente. A comissão eventual não perfilhou essa sugestão e todavia concordou com ela. E que o texto governamental limita-se a substituir duas palavras no texto vigente e pareceu preferível evitar-se a incomodidade de qualquer proposta de alteração. Faço, em todo o caso, o apontamento para significar que do facto não resulta a intenção de limitar a iniciativa da Comissão de Legislação e Eedacção em rever a redacção do texto que se votar.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer uso da palavra, vai passar-se à votação.

Vai votar-se a base LXXXVIII conforme a redacção que lhe deu a proposta do Governo.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vou pôr em discussão a base XCII, sobre a qual há na Mesa uma proposta de alteração. Vão ser lidas a base e a proposta de alteração.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE XCII

I - Serão revistos na medida do necessário, de acordo com os preceitos desta lei:

a) A organização do Ministério do Ultramar;
b) Os diplomas orgânicos dos diferentes ramos de serviço público no ultramar, incluindo a Reforma Administrativa Ultramarina;
c) A Lei Orgânica e o Regimento do Conselho Ultramarino ;
d] O Estatuto do Funcionalismo Ultramarino;
e) O estatuto político-administrativo de cada uma das províncias ultramarinas, ouvido o respectivo governador e o Conselho Ultramarino em sessão plenária.
II - Enquanto não forem publicados os diplomas complementares desta lei, continuarão em vigor as disposições vigentes.
Especialmente será observado o seguinte:
a) Continuam a funcionar os Conselhos Legislativos e de Governo nos termos da lei actual até que estejam constituídos os que os substituem;
b) Continuam os governadores e demais autoridades no exercício da competência actual até que se definam as suas atribuições;
c) Continuam em vigor as bases LVI a LXIV, na actual redacção, enquanto não estiver publicada a lei especial sobre administração financeira das províncias ultramarinas.

Proposta de alteração

Propomos que na base XCII:

1.º Seja adoptado o texto sugerido pela Câmara Corporativa ;
2.º Se adite ao n.º II uma nova alínea, com a seguinte redacção:

d) O Conselho de Governo, nas províncias de governo-geral, e a Secção Permanente do Conselho de Governo, nas províncias de governo simples, serão obrigatoriamente ouvidos pelo governador antes de se pronunciar sobre o estatuto político-administrativo, nos termos da alínea c) do n.º I da base X.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 23 de Abril de 1963. - Os Deputados: Albino Soares Pinto dos Reis Júnior - José Soares da Fonseca - Joaquim de Jesus Santos - Bento Benoliel Lcoy - Alexandre Marques Lobato - Alberto da Rocha Cardoso de Matos - António Burity da Silva - Alberto Pacheco Jorge.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Joaquim de Jesus Santos: - Sr. Presidente: a proposta de alteração quanto ao n.º I é bem simples. Traduz-se, afinal, na adopção da sugestão da Câmara Corporativa. E porquê?
Apenas porque se entendeu que a sua formulação é mais correcta. À comissão pareceu, com efeito, que a proposta do Governo contém uma redundância inteiramente inútil. Desde que a revisão se há-de fazer de conformidade com esta lei, parece óbvio que tem de ser feita até aos limites necessários.
Daí que por uma questão de rigor formal se tivesse adoptado o texto sugerido pela Câmara Corporativa. E claro que isto não quer dizer que na própria sugestão apresentada pela Câmara Corporativa não haja certas expressões que pareceram não ser inteiramente felizes. Assim, por exemplo, no n.º n: «Enquanto não forem publicados os diplomas complementares desta lei. continuarão em vigor as disposições vigentes».
Há aqui uma repetição de duas expressões inteiramente iguais: «em vigor» e «vigentes». Entendeu-se não ser necessário apresentar qualquer proposta de alteração, mas permitiu-se chamar a atenção da Comissão de Redacção para o facto.
Houve um Sr. Deputado que sugeriu esta alteração formal: «Enquanto não forem publicados os diplomas complementares desta lei, continuarão em vigor as disposições actuais».
Foi sugerida pelo Sr. Deputado Amaral Neto e conseguiu o acordo de toda a comissão. Já não é assim quanto ao n.º II da proposta de alteração, no qual se diz que se adita ao n.º II uma nova alínea com a seguinte redacção:

d) O Conselho de Governo, nas províncias de governo-geral, e a Secção Permanente do Conselho de Governo, nas províncias de governo simples, serão obrigatoriamente ouvidos pelo governador antes de se pronunciar sobre o estatuto político-administrativo, nos termos da alínea c) do n.º I da base x.

Qual a razão deste aditamento?
Conforme já aqui se aprovou, os governadores, quer os governadores-gerais, quer os governadores de província de governo simples, são obrigados a ouvir o Conselho Económico e Social e o Conselho de Governo antes de serem, por sua vez, ouvidos pelo Ministro para a elaboração do estatuto político-administrativo de cada província.
Como, presentemente, ainda não existem nem funcionam quer o Conselho Económico e Social, quer o Conselho de

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Governo, houve necessidade de aditar esta alínea d), tornando obrigatória, para os governadores, a audição dos organismos do mesmo tipo agora existentes, antes de serem chamados pelo Ministro a dar a sua opinião sobre os estatutos político-administrativos das províncias ultramarinas que por força desta lei terão de ser promulgados.
Isto o que tinha para dizer, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão:

Pausa.

O Sr. Presidente: - Sé mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai passar-se à votação.
Vai votar-se a base com as alterações propostas pela comissão eventual.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vou pôr agora em discussão duas bases novas, sugeridas pelo artigo 2.º da proposta, que vão ler-se.

Foram lidas. São as seguintes:

Art. 2:º No fim da secção I do capítulo IV incluir-se-ão duas novas bases, com a seguinte redacção:

BASE ...

As províncias participarão na elaboração de programas gerais tendentes a assegurar o desenvolvimento contínuo e harmónico da sua economia, compatível com o equilíbrio global da balança de pagamentos e a estabilidade do valor da moeda.

BASE ...

Em cada província haverá uma Comissão Técnica de Planeamento e Integração Económica, que funcionará na dependência directa do governador.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Soares da Fonseca: - Farei duas breves notas, Sr. Presidente, acerca destas bases novas. A primeira nota é para dizer que, segundo creio, estas bases novas são das mais importantes da proposta no que toca ao firme propósito de promoção económico-social das províncias ultramarinas.
E, todavia, foram das menos discutidas na comissão eventual, tanto o espírito da proposta do Governo e a sua plena aceitação pela Câmara Corporativa se harmonizam com o sentimento profundo e os vivos anseios da comissão eventual no mesmo sentido. Tudo comungou aqui pela realização de um ideal comum.
A segunda nota, Sr. Presidente, é para dizer que rigorosamente, segundo a proposta de alteração do artigo 2.º acabado de ler, estas bases deverão inserir-se no fim da secção I, capítulo IV.
A Câmara Corporativa sugeriu outra redacção, que à comissão eventual pareceu preferível, e, portanto, a votação sobre esta base não deve significar nenhuma obrigação quanto à localização das mesmas bases no contexto geral da proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai passar-se à votação. Vai votar-se o artigo 2.º da proposta de lei.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vou pôr agora em discussão o artigo 3.º da proposta de lei, bem como a proposta de alteração do próprio Governo.

Foram lidos. São os seguintes:

Art. 3.º São revogadas as bases LXXXIV, LXXXV e LXXXVI da Lei n.º 2066, de 27 de Junho de 1953.

Proposta de alteração

Em cumprimento de despacho de S. Ex.ª o Presidente do Conselho, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que o Governo substitui, na proposta de lei n.º 18/VIII [revisão da Lei n.º 2066, de 27 de Junho de 1953 (Lei .Orgânica do Ultramar Português)], a redacção do artigo 3.º pela que consta do parecer que acerca da mesma proposta foi emitido pela Câmara Corporativa (parecer n.º 9/VIII).

O Sr. Soares da Fonseca: - Parece-me que deve aprovar-se a proposta de emenda do Governo ao seu próprio texto e, por isso, a comissão eventual não sugeriu qualquer alteração. Na verdade, a base LXXXII, inicialmente omitida, carece de ser também revogada.
A matéria não careceria de qualquer intervenção, mas eu desejaria que V. Ex.ª, Sr. Presidente, a propósito dela, me consentisse um ligeiro apontamento.
Estamos a votar revogações. Uma coisa há, porém, que me parece nem a lei nem os factos poderão revogar.
Refiro-me, Sr. Presidente, aos vínculos espirituais criados no ambiente aberto e franco da comissão eventual, que permitiu um estudo aturado e consciencioso da proposta.
Em boa hora teve V. Ex.ª a feliz iniciativa de se criar a comissão!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Foi mercê deste condicionalismo que a discussão no plenário decorreu como se viu e deu lugar a relativamente poucas intervenções. A generalidade da Câmara estava elucidada. As assinaturas das propostas de alteração, que se processaram de modo que nelas interviessem todos ou quase todos os membros da comissão, que era numerosa, são também testemunho dos resultados ali obtidos em larga, por vezes viva, mas sempre bem intencionada e leal discussão.
Tudo isto pôde passar-se assim devido, em primeiro lugar, à inteligência, à bondade, à paciência, ao fino trato e ao perfeito tacto do seu ilustre presidente, o Sr. Conselheiro Albino dos Reis, a quem devo e quero, publicamente, apresentar aqui, no plenário, as minhas mais sinceras homenagens de vivo apreço e alta consideração.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Depois são de salientar merecidamente o muito interesse, o inteligente esforço, a plena dedicação, a inteira lealdade e a exemplar assiduidade de todos os

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membros da comissão - o que muito me alegrou e apraz publicamente registar.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Albino dos Reis: - As palavras que o Sr. Deputado Soares da Fonseca proferiu obrigam-me a quebrar o silêncio em que me tenho mantido nesta Assembleia. É que eu, como há pouco o Sr. Deputado Gonçalves Rodrigues, caí nisto de ter mais prazer em ouvir do que em falar. Mas não podia deixar, pelo gosto que tenho de fazer justiça, de a prestar a quem a merece. Quero dizer a V. Ex.ª, Sr. Presidente, e á Câmara que efectivamente os trabalhos da comissão eventual decorreram num ambiente em que cada um pôde manifestar com perfeito à-vontade as suas opiniões, e que todos ali, sem distinção de raças, sem distinção de origem dos seus mandatos, se manifestaram para que ficasse bem clara a sua condição de verdadeiros portugueses.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Os problemas foram tratados não só no seu aspecto formal, mas também no seu aspecto político, e este trouxe por vezes momentos de emoção na comissão eventual, mas mesmo nesses momentos pôde verificar-se que todos tinham o propósito de afirmar aquilo que sentiam, quer dizer, a sua qualidade de portugueses e acima de tudo a verdadeira unidade nacional. A todos quero felicitar, mas de uma forma muito especial aos Deputados que vieram à Assembleia Nacional pelas províncias ultramarinas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: tenho de felicitar V. Ex.ª pela inspiração que teve de constituir uma comissão eventual tão numerosa para apreciar a proposta de lei de revisão da Lei Orgânica do Ultramar Português e felicito V. Ex.ª porque os seus resultados estão patentes e já aqui foram salientados pelo Sr. Deputado Soares da Fonseca, leader desta Assembleia, a quem daqui por momentos me vou referir de uma forma especial.
Os trabalhos dessa comissão, que reuniu 23 vezes, tornaram possível a discussão no plenário, quero dizer, facilitaram a discussão e a votação consciente dos textos submetidos à apreciação da Assembleia Nacional.
Sr. Presidente: a minha missão como presidente da comissão eventual foi muito pequena e muito facilitada.

Vozes: - Não apoiado!

O Orador: - Muito facilitada porque todos procuraram facilitar o mais possível o exercício da minha missão de presidente. Não foi necessária, em nenhuma vez, a minha intervenção para manter dentro daquela comissão a necessária disciplina. A extensão, a seriedade e o interêsse pelo assunto transcendente em discussão impuseram, naturalmente, uma muito viva consciência a todos os membros dessa comissão eventual.
A todos presto a minha homenagem, mas quero referir-me, de uma maneira muito especial, ao leader desta Assembleia, o Sr. Dr. Soares da Fonseca, que nessa comissão não foi verdadeiramente o leader desta Assembleia, mas sim, efectivamente, o relator da comissão.
E raríssimas vezes, suponho que uma apenas, ele teve de afirmar o non possumus, dizendo que não podia transigir com certa tendência da comissão num ponto que
ele considerou de pequena importância, mas que poderia causar na opinião pública das províncias ultramarinas uma certa perturbação. Só nesse ponto, ele teve de afirmar, como leader, a sua impossibilidade de transigir, porque de resto pôs sempre as questões com uma tal liberdade, com uma tal franqueza, com um tal conhecimento dos problemas e com uma tal agudeza de espírito, que a todos nos encantou. Conseguiu, talvez por isso mesmo, conciliar a adesão de todos os membros da comissão eventual. Os trabalhos dessa comissão foram extraordinariamente facilitados pela maneira como o Dr. Soares da Fonseca estudou os problemas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E, pois apenas um acto de justiça, neste momento, apresentar ao Dr. Soares da Fonseca os meus sinceros agradecimentos e os meus melhores cumprimentos.
E ao Sr. Dr. Joaquim de Jesus Santos é também justo felicitá-lo pelo encargo que lhe foi cometido, deveras trabalhoso, e do qual se desempenhou com muito brilho.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Antes de terminar as minhas considerações, quero apresentar a V. Ex.ª, Sr. Presidente, os meus cumprimentos, os meus respeitos e as minhas homenagens pela forma superior como tem dirigido esta Assembleia.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Com a sua superior inteligência, com o seu altíssimo espírito, com aquela tolerância que a todos nos encanta, V. Ex.ª Sr. Presidente, é credor da admiração e da gratidão de todos nós.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Nesse lugar, deveras espinhoso, e sei bem que é assim, V. Ex.ª tem usado quase de uma paternidade, e essa sua, forma de actuar fez com que conquistasse a simpatia, o respeito e a homenagem de nós todos.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai proceder-se à votação.

Vai votar-se o artigo 3.º com a alteração apresentada.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 4.º, sobre o qual há na Mesa uma proposta de alteração. Vão ser lidos o artigo e a proposta de alteração.

Foram lidos. São os seguintes:

Art. 4.º O Governo, pelo Ministro do Ultramar, fará nova publicação da Lei n.º 2066, de 27 de Junho de 1953, donde constem as alterações introduzidas por esta lei.

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Proposta de alteração

Propomos que o artigo 4.º tenha a seguinte redacção:

O Governo, pelo Ministro do Ultramar, fará publicar uma edição oficial da Lei Orgânica do Ultramar Português, inserindo no lugar próprio as alterações introduzidas pela presente lei.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 23 de Abril de 1963. - Os Deputados: Albino Soares Pinto dos Reis Júnior - José Soares da Fonseca - Joaquim de Jesus Santos - Bento Benoliel Levy - Alexandre Marques Lobato - Alberto da Rocha Cardoso de Matos - António Burity da Silva - Alberto Pacheco Jorge.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Joaquim de Jesus Santos: - Sr. Presidente: a alteração proposta pela comissão eventual respeitante ao artigo 4.º traduz-se na aceitação do texto sugerido pela Câmara Corporativa, por lhe parecer que é mais perfeito e mais rigoroso.
Na realidade, o artigo 4.º proposto pelo Governo diz assim: «O Governo, pelo Ministro do Ultramar, fará nova publicação da Lei n.º 2066, donde constem as alterações introduzidas por esta lei». Nos termos da proposta sugere-se que o Governo faça uma publicação oficial da Lei Orgânica.
Em boa verdade, não é uma nova publicação da Lei n.º 2066 que se pretende, visto que esta já foi alterada pela Lei n.º 2076 e, agora, por esta em discussão.
Com isto, Sr. Presidente, chegámos ao fim. E não queria terminar sem dizer também uma palavra mais.
A apreciação desta lei pôs-se desde logo a todos os Deputados componentes da comissão eventual como um problema de primeira grandeza no plano da política nacional. E foi partindo desta premissa que toda a discussão se desenvolveu.
Houve, é certo, algumas divergências em problemas de pequena monta, divergências que por vezes foram vivas e atingiram alta emoção. Mas nunca, no decorrer da discussão, se desviou do nosso pensamento a ideia de que acima de todos os interesses estava e está o interesse superior da unidade intangível da Pátria.
Quero crer, Sr. Presidente, que a lei agora aprovada pode ser e deve ser o instrumento capaz de possibilitar a realização dos mais caros anseios de todos nós, fazendo de Portugal, cada vez mais, uma grande e próspera nação.
Espero - todos nós esperamos - que aqueles que vão ter a responsabilidade de lhe dar execução sejam suficientemente prudentes e sejam suficientemente portugueses para que aquilo que em todos nós foi anseio e preocupação permanentes venha a ser a magnífica realidade - que a Pátria continue grande e próspera, una e indivisível, sejam quais forem as contingências da vida.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer uso da palavra, vai votar-se o artigo 4.º da proposta do Governo conforme a proposta de alteração.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: chegámos ao fim dos nossos trabalhos, muito embora não chegássemos ao extremo das possibilidades de funcionamento da Assembleia. Continuaremos em funcionamento até ao dia 29, inclusive, mas, já que hoje foi votada esta lei sobre alterações à Lei Orgânica do Ultramar, não haverá sessão na próxima segunda-feira, dia 29. como lhes disse extremo limite até ao qual, por virtude da Constituição, pode funcionar a nossa Assembleia.
Não fazia tenção senão de pedir um voto de confiança para a Comissão de Legislação e Redacção redigir os diplomas que ainda estão pendentes de redacção definitiva e que peço desde já.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Se nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer uso da palavra sobre este pedido, considero concedido à Comissão de Legislação e Redacção o voto de confiança para redigir os diplomas que ainda não têm redacção definitiva.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Não tencionava dizer mais nada, a não ser exprimir a VV. Ex.ª os meus votos de paz neste período que agora vai decorrer até que, por disposição legal ou por convocação extraordinária, que não se espera, tenhamos de voltar aos trabalhos desta Assembleia.
Não posso, entretanto, depois de agradecer à imprensa, à rádio, nomeadamente à Emissora Nacional, o interesse com que sempre têm acompanhado a vida da Assembleia, deixar de agradecer a VV. Ex.ª a maneira como apoiaram as palavras que foram dirigidas ao presidente pelo facto de haver constituído a comissão eventual e pela maneira como dirigiu os trabalhos da Assembleia. E uma grande deferência que não esqueço.
Quero dizer-lhes, ainda, que em certo momento temi por haver constituído ou provocado a constituição da comissão eventual. Temi, porque tive a impressão de que a comissão eventual tinha matado, ou de alguma maneira teria suprimido, as vantagens do plenário, que são, naturalmente, colocar diante dos olhos da opinião e de todos o movimento das questões que aqui vêm para ser debatidas com a mais larga, creio mesmo, forte afirmação de independência.
Mas como aconteceu que esse embate de opiniões ocorreu na comissão eventual, tive medo de, com a constituição da comissão eventual, ter de alguma maneira feito desaparecer o interesse perante a opinião pública do plenário da Assembleia.
Felizmente que o desenvolvimento ulterior da discussão no plenário mostrou que realmente as questões que ali, na comissão eventual, puderam ser discutidas com calor não deixaram de ser postas aqui e, portanto, de ser leva- das até ao conhecimento da opinião geral. Desde que isso sucedeu, fiquei contente, tão contente como hoje, quando reparei que realmente era cumprimentado pelo facto de haver constituído, ou antes, provocado a constituição da comissão eventual.
Não se ocultou nada que devesse ser conhecido pela opinião pública em geral, não se ocultou nada no plenário da Assembleia. Não se ocultou nada do que de essencial se passou no ambiente da comissão eventual.

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29 DE ABRIL DE 1963 2497

Agradeço os cumprimentos que me foram dirigidos pelo facto de haver constituído ou provocado a constituição desta comissão. E agora, como se diz na Sala dos Actos Grandes, em Coimbra, depois de se receberem as insígnias doutorais, nunc restai primum. Agora só me resta concluir, agradecendo a colaboração e a simpatia com que VV. Ex.ªs sempre me trataram, pedindo a Deus que dê a cada um a paz.
Tenho medo de falar de paz, porque isto de falar de paz constantemente cheira a Leste, onde a paz interior, que- é a verdadeira paz, não é buscada, mas onde se procura apenas uma paz da Rússia, feita pela escravização do Mundo, ou ao menos pela possibilidade desta escravização através do desarmamento do Mundo, mantendo-se armada a Rússia.
Peço a Deus que lhes dê, que nos dê, a paz cristã .... a paz interior que não elimina a guerra e até pode impô-la quando feita em defesa de ideais morais de civilização ou de Pátria.
E essa a paz que desejo a VV. Ex.ªs e a mim próprio e é essa paz com, se quiserem, um conteúdo mais vasto, a paz que desejaria se encontre para o mundo português, através de tudo o que fizermos e através da lei que acabámos de aprovar.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Esses os votos que exprimo para VV. Ex.ªs e, se mo permitem, mais ainda do que para VV. Ex.ªs e para mim próprio, para a nossa querida Pátria.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Espero que nos encontremos aqui em Novembro, ou antes, se o interesse público assim o exigir, com a mesma disposição de trabalhar e com o mesmo espírito com que sempre pudemos conviver durante esta sessão legislativa.
Os meus cumprimentos e as minhas saudações.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão.

Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Alberto dos Reis Faria.
António Calheiros Lopes.
Armando Francisco Coelho Sampaio.
Artur Alves Moreira.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Carlos Coelho.
Délio de Castro Cardoso Santarém.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António da Veiga Frade.
Francisco Lopes Vasques.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João Rocha Cardoso.
Jorge Augusto Correia.
Jorge Manuel Vítor Moita.
José Alberto de Carvalho.
José Dias de Araújo Correia.
José de Mira Nunes Mexia.
Júlio Dias das Neves.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Beis.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Rogério Vargas Moniz.
Rui de Moura Ramos.
Tito Castelo Branco Arantes.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

Sr s. Deputados que faltaram à sessão:

Antão Santos da Cunha.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Gonçalves de Faria.
António Marques Fernandes.
António Tomás Prisónio Furtado.
Belchior Cardoso da Costa.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Jacinto da Silva Medina.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Luís Vaz Nunes.
José Manuel da Costa.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Manuel Augusto Engrácia Carrilho.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Melo Adrião.
Olívio da Costa Carvalho.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Urgel Abflio Horta.
Vítor Manuel Dias Barros.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

Requerimentos enviados para a Mesa c- a que o Sr. Presidente se referiu:

«Ex.mo Sr. Presidente. - Com vista a uma futura intervenção e considerando o elevado montante habitualmente alcançado pelo valor da exportação da nossa resina e, bem assim, o extraordinário interesse de que tal exportação se reveste, sobretudo para os pequenos e médios proprietários rurais, que na resinagem obtinham a mais certa e por vezes até a maior receita da sua precária exploração; e atendendo ainda a que nas campanhas de resinagem do ano findo e do ano corrente, pelo menos no Minho, se tem verificado uma enorme baixa de procura ou mesmo quase desinteresse por parte dos industriais e exportadores, requeiro que, pelo Ministério da Economia, me sejam fornecidos os seguintes elementos:

1) Qual o valor das exportações de resina em cada um dos últimos cinco anos;
2) Qual o número de incisões, e do seu preço médio, por distritos:

a) Na campanha de 1962 e na actual de 1963;
b) E em cada uma dos três anos anteriores.

3) Quais as providências tomadas para debelar a grave crise existente neste tão importante sector da vida nacional.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 27 de Abril de 1963.-O Deputado, António Maria Santos da Cunha.»

«Nos termos do disposto no artigo 96.º da Constituição Política da República Portuguesa, requeiro que, pelo

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Ministério do Interior, me sejam fornecidos com urgência os seguintes elementos:

1) Cópia dos relatórios anuais da gerência da Câmara Municipal de Penamacor relativos ao período que decorre de 1 de Janeiro de 1955 a 31 de Dezembro de 1962;
2) Cópia da deliberação da mesma Câmara que autorizou a venda a um dos seus vereadores de 8000 m2, de terreno, propriedade do Município, na vila de Penamacor, destinado à construção civil, com indicação do respectivo preço e com a informação sobre se este preço é habitual naquela vila para terrenos semelhantes;
3) Cópia da deliberação da mesma Câmara que autorizou a cedência a um dos seus vereadores do estabelecimento de ensino secundário, que era propriedade municipal, com o respectivo alvará ou autorização, e com indicação do respectivo preço daquela cedência, se esta tiver sido onerosa; se tiver sido gratuita, indiquem-se as razões que a aconselharam ou impuseram;
4) Informação sobre a elaboração do projecto do edifício destinado àquele estabelecimento de ensino, com indicação do preço pago ao arquitecto autor do projecto e nome deste;
5) Relação dos projectos das diversas obras públicas elaboradas naquele período de 1 de Janeiro de 1955 a 31 de Dezembro de 1962, com indicação do nome dos seus autores e respectivo preço;
6) Relação de todas as empreitadas de obras públicas adjudicadas naquele dito período de 1 de Janeiro de 19,55 a 31 de Dezembro de 1962, com indicação do nome dos empreiteiros a quem foram atribuídas e do custo de cada uma delas;
7) Cópia dos contratos de arrendamento das propriedades da mesma Câmara Municipal, ou confiadas à sua administração para fins beneficentes, donde constem os nomes dos arrendatários, as respectivas rendas e data da fixação destas;
8) Cópia das deliberações da mesma Câmara que decidiram ou aprovaram a venda de árvores nas matas municipais nos últimos cinco anos, com indicação da quantidade de árvores ou do peso da madeira, consoante a modalidade da venda, e informação sobre os preços praticados e a identidade dos compradores;
9) Constituição da mesma Câmara Municipal naquele período de 1 de Janeiro de 1955 a 31 de Dezembro de 1962.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 27 de Abril de 1963. - O Deputado, António Martins da Cruz.»

«Requeiro que me seja fornecida, pela Presidência do Conselho, relação completa de todos os órgãos consultivos de âmbito nacional dependentes de todos os Ministérios civis, com indicação dos respectivos diplomas orgânicos, suas alterações e aditamentos, organizada em ordem ao critério de que, mesmo especificamente metropolitanos e na dependência de Ministério com competência aparente e exclusivamente metropolitana, também consultam sobre matérias que comportam interesses ou incidências ultramarinas, designadamente nos sectores económico e educacional.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 27 de Abril de 1963. - O Deputado, Alexandre Marques Lobato.»

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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