O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 2545

REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

ANO DE 1963 10 DE DEZEMBRO

VIII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 103 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 9 DE DEZEMBRO

Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Exmos. Srs. Fernando Cid Oliveira Proença
Luís Folhadela de Oliveira

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Leu-se o expediente.

Foram aprovados os n.ºs 95, 96, 97, 98, 99, 100 e 101 do Diário das Sessões, com uma notificação do Sr. Deputado Soares da Fonseca quanto ao Diário das Sessões n.º 96.

Para os efeito do § 3.º do artigo 109.º da Constituição, receberam-se na Mesa, remetidos pela Presidência do Conselho, os n.0 279, 281 e 282 do Diário do Governo, que inserem diversos decretos-leis.
O Sr. Presidente informou estar na Mesa, com o parecer da Câmara Corporativa, a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1964.
O Sr. Presidente informou também que poria em discussão, logo após a da referida proposta de lei de autorização das receitas e despesas, o aviso prévio relativo à política, ultramarina.
Usou da palavra o Sr. Deputado José Alberto de Carvalho, para se referir à presente situação dos professores agregados do ensino primário.

Ordem do dia. - Iniciou-se a discussão na generalidade da proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1964.

Usaram da palavra os Srs. Deputados André Navarro, Pinto Carneiro e Vargas Moniz.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 10 minutos.

CÂMARA CORPORATIVA. - Parecer n.º 13/VIII, acerca do projecto de proposta de lei n.º 503/VIII (autorização das receitas e despesas para 1964).

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada. Eram 16 horas e 5 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto dos Reis Faria.
Alberto Ribeiro da Gosta Guimarães.
Alexandre Marques Lobato.
Alfredo Maria de Mesquita Guimarães Brito.
André Francisco Navarro.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
António Magro Borges de Araújo.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Martins da Cruz.
António Moreira Longo.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Alves Moreira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Artur Proença Duarte.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Augusto José Machado.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves.
Délio de Castro Cardoso Santarém.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Fernando Cid Oliveira Proença.

Página 2546

2546 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Francisco António Martins.
Francisco António da Silva.
Francisco José Lopes Roseira.
Francisco Lopes Vasques.
Jacinto da Silva Medina.
James Pinto Buli.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Mendes da Costa Amaral.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Jorge Augusto Correia.
Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos.
José Alberto de Carvalho.
José Augusto Brilhante de Paiva.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Manuel Pires.
José Maria Rebelo Valente de Carvalho.
José de Mira Nunes Mexia.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Pinheiro da Silva.
José Pinto Carneiro.
José Soares da Fonseca.
Júlio Dias das Neves.
Luís Folhadela de Oliveira.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Irene Leite da Costa.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário de Figueiredo.
Olívio da Costa Carvalho.
Quirino dos Santos Mealha.
Rogério Vargas Moniz.
rui de Moura Ramos.
Sebastião Garcia Ramires.
Virgílio David Pereira e Cruz.

O Sr. Presidente: - Estão presentes os Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Carta dirigida pelo embaixador dos Estados Unidos da América a S. Ex.ª o Presidente dá Assembleia Nacional:

Embaixada dos Estados Unidos - Lisboa, 6 de Dezembro de 1963.

Exmo. Senhor:

Pede-me pessoalmente o Presidente Johnson para expressar ao Governo e povo de Portugal o seu apreço e o de todos os americanos- pela calorosa manifestação de simpatia e interêssse por ocasião da morte do Presidente Kennedy.
Sinto-me particularmente grato e honrado pelas vossas palavras de condolências proferidas a 25 de Novembro, na Assembleia Nacional, e por fazer exarar essa expressão de. simpatia no Diário das Sessões.
Segundo as palavras do Presidente Johnson, «suavizou o nosso sentimento de dor e perda saber que nos corações do milhões, nos lares e nas ruas de cidades e vilas de todo o Mundo, foi tão profundamente compartilhada a nossa tristeza. Este conhecimento deu força à nossa decisão, como americanos e cidadãos do Mundo, de continuar lutando pelas causas da paz e da liberdade, causas às quais John Filzgernld Kennedy dedicou a sua vida. Encontrámos na vossa simpatia a inspiração para de novo nos dedicarmos à continuação e sucesso das políticas do Presidente Kennedy».
Com toda a consideração, subscrevo-me de V. Ex.ª, atentamente, Goorge VV. Anderson.

Cartas e telegramas

Da corporação dos guardas dos estabelecimentos prisionais a congratularem-se com a intervenção do Sr. Deputado Moura Ramos em defesa dos seus interesses.

O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n.ºs 95, 96, 97, 98, 99, 100 e 101 do Diário das Sessões.

O Sr. Soares da Fonseca: - Sr. Presidente: por lapso, compreensível, dadas a rapidez e animação do debate então estabelecido, o Diário das Sessões n.º 96, correspondente à sessão de 24 de Abril, omite um pequeno apontamento por mim feito ao que chamei, salvo erro, escolha de governadores de «certo tipo», como argumento adjuvante da minha defesa de também certo tipo de secretário-geral, escolhido entre funcionários. Este lapso, em si mesmo, não tem importância de maior. Sucede, porém, que o Diário das Sessões, a pp. 2427 e 2428, insere com fidelidade a referência que, em sentido discordante, o Sr. Deputado Vaz Nunes fez àquele meu apontamento. Ora esta referência fica no ar, como costuma dizer-se, se na minha intervenção não está mencionada a argumentação a que o nosso ilustre colega procurou responder. Peço, por isso, que no Diário das Sessões de hoje se faça a rectificação no sentido que acabo de indicar.

O Sr. Presidente: - Continuam em reclamação.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado pediu a palavra sobre os Diários em reclamação, considero estes aprovados.

Estão na Mesa, enviados pela Presidência do Conselho e para os efeitos do § 3.º do artigo 109.º da Constituição, os n.08 279, 281 e 282 da 1.ª série do Diário do Governo, respectivamente de 28 de Novembro, 30 de Novembro e 2 de Dezembro de 1963, que inserem os Decretos-Leis n.º 45391, que permite que seja alterado, quando as circunstâncias o justificarem, o prazo estabelecido no § 1.º do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 34 054 para manifestar a produção do vinho verde, n.º 45 397, que torna aplicável à Junta de Colonização Interna o disposto nos artigos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º e 6.º do Decreto-Lei n.ºs 44 482 (regime de aluguer de material circulante pesado e maquinaria aos empresários agrícolas), e n.º 45 401, que estabelece o regime de amortização dos empréstimos concedidos ao abrigo da Lei n.º 2017 e legislação complementar e destinados a arborizações florestais ou frutícolas, eleva para 50 000$ o limite estabelecido nos §§ 2.º e 3.º do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 45 355 e aplica a todas as associações agrícolas com estatutos

Página 2547

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2547

aprovados pelo Secretário de Estado da Agricultura e sujeitas à fiscalização dos serviços competentes da Direcção-Geral dos Serviços Agrícolas o disposto no § 1.º do artigo 10.º do referido decreto-lei.
Está também na Mesa, com o respectivo parecer da Câmara Corporativa, a proposta de lei de autorização de receitas e despesas para o ano de 1964.

Pausa.

O Sr. Presidente: - «Quero ainda informar VV. Ex.ª8 de que tenciono pôr para discussão na ordem do dia o aviso prévio relativo à política ultramarina, logo depois da discussão da proposta de lei de receitas e despesas.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Alberto de Carvalho.

O Sr. José Alberto de Carvalho: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: normalmente, ao esquematizar-se um processo de desenvolvimento, é primeira preocupação saber qual a posição que deve atribuir-se a este ou àquele sector, a esta ou àquela actividade ou instituição. Estrutura-se para o Mundo, quando se deveria estruturar com vista à prioridade que cabe ao humano, pois em todo o lugar ou em qualquer tempo tudo se terá de processar em relação à personalidade humana, que é quem goza dos bens que o Mundo possui.
Na verdade, sendo o homem o valor primeiro da Criação, é para ele que deve evoluir o mundo material, no sentido de o colocar em posição óptima para atingir o fim supremo para que foi criado. Tem sido, Sr. Presidente, com esta ideia que tenho desenvolvido aqui as minhas intervenções, pensando mais no homem e no seu valor do que nos valores que no caleidoscópio do económico têm cores vivas que atraem as atenções das épocas.
Não é novidade que o homem arrasta pela sua vida as marcas, boas ou más, que recebeu na sua infância, naquela idade em que todo o seu ser se abre para receber as impressões primeiras, que não só lhe trarão o conhecimento do Mundo, como ainda estruturarão todo o seu carácter. São mais fortes e vivas as primeiras percepções adquiridas do que todas as que vierem depois, mesmo no sentido da destruição daquelas.
É assim, pois, que a primeira educação terá forçosamente de ser cuidada, atenta e dada com a melhor orientação, pois só assim conseguiremos formar uma juventude portadora de ideias, confiante nos valores humanos, na justiça e na caridade.
Ora, e isto é fundamental, enquanto se procura dar essa ideia de educação nas nossas escolas primárias, que no País vão sendo apenas, e mau grado, a única chama de cultura que ilumina os cérebros em 80 por cento da nossa população, é certo que ali, em muitos casos, tudo falta para que cintile com eficiente repercussão a centelha germinativa dos ideais. Para educar é necessário e fundamental que haja verdade paralela entre o que se dá e o que se vê, ou seja, que a educação se processe na base do real. Educar em salas de aula onde tudo falta de conforto mínimo é o mesmo que dizer aos habitantes de míseras cabanas que o homem deve viver em casas onde o conforto é sinónimo de direito.

O Sr. Martins da. Cruz: - Muito bem!

O Orador: - Dizer a essas crianças que- tudo e todos se debruçam sobre elas para que a Nação tenha filhos fortes e sadios, dentro de escolas húmidas e frias, onde a voz do mestre tenha de se elevar sobre o sibilar, do vento e o coro da tosse, é criar nesses espíritos em formação uma incredulidade e uma dúvida que jamais ali deveriam entrar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não haverá dúvida alguma de que para que uma educação se processe na base de um sentido aberto e confiante, direi melhor, humano, é necessário haver ambiente material e espiritual nos intervenientes no diálogo a estabelecer.
Aluno e mestre devem poder usufruir do mínimo das condições de conforto e paz espiritual, a fim de que os seus espíritos se encontrem aptos a estabelecer esse mesmo dialogo. Escolas mais ou menos confortáveis, com ar e luz e, bem assim, um amparo alimentar e de agasalho para os que para elas vão carecidos de alimento e roupa, são factores que influem sobre o aluno. Independência económica,- segurança na doença, confiança na profissão que abraçaram e confiança na vida são outros tantos factores que influem sobre o mestre.
Vejamos esta situação no plano docente.
Terminado o seu curso do magistério, os novos professores vêm para a vida com a esperança de que em breve lhes será possível contribuir com a sua ajuda para diminuir o débito material que contraíram para com aqueles que, com sacrifício, tantas vezes tão grande sacrifício, lhes permitiram concluir o curso. E hei-los portadores de esperança, aquela esperança confiante tão própria da juventude, que poderá ser chama aliciante, concorrendo ao quadro de professores agregados, onde aguardarão ansiosamente o início da sua independência. Vã será para muitos esta esperança, hoje em que nos diversos distritos do País vai aumentando o número de professoras sem colocação. E assim, num desespero que a necessidade origina, e a ideia de frustração aumenta, as jovens professoras interrogam-se em busca de solução para um caso cuja existência não admitiam.
E mais tarde, quando chamadas a ocupar um lugar que esporadicamente lhes permite uma vacilante estabilidade, lá longe na serra e no convívio promíscuo de animais ou tabernas, sem casa condigna, entregues aos perigos para cuja defesa não podem encontrar preparação nos seus 18 a 20 anos, as professoras agregadas levam em si o desânimo, a revolta e a chaga do sofrimento, qualidades que de forma alguma são as melhores para o bom desempenho da função de professor, que deve ser toda carinho, confiança e abnegação.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - E em face dessa situação, que forçosamente ocasiona outras situações irregulares, fica aos serviços respectivos o encargo de apreciar com o coração, humanamente, as quebras de disciplina ou de regulamento que delas advêm.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: a actual situação dos professores agregados do ensino primário deve ser resolvida, sob pena de vermos afastados do ensino aqueles que a ele ainda acorrem. Somos um país de mais reduzida escolaridade obrigatória, temos uma média de frequência por lugar ainda bastante elevada, conservam-se inacessíveis aos concorrentes a uma efectividade mais de 2000 lugares que carecem de instalação e temos professores por colocar.
Esta é uma situação paradoxalmente irónica.
Considere-se, com espírito humano, que um professor agregado, deixando de ter direito a qualquer vencimento no dia 15 de Julho de cada ano e que obtenha nova

Página 2548

2548 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

colocação apenas em Janeiro, tem sómente condições para utilizar o seu curso durante seis meses por ano, o que representa uma média de vencimento mensal de 800$. Para tal paga valerá a pena ter estudado onze anos? E será rentável o emprego de capital feito com esse curso?
As professoras das nossas escolas vivem isoladas de todo o contacto com os seus orientadores, que, absorvidos na maior parte do seu tempo pelo julgamento dos processos disciplinares ou pelos serviços administrativos, se vêem impossibilitados de toda a acção orientadora, e, no entanto, recluzem-se as verbas destinadas a esse fim; nas escolas faltam os meios que permitam ensaiar-se um ensino actual, eficiente e atraente, com recurso aos métodos áudio-visuais que a Direcção-Geral procura levar a todas elas, e, no entanto, a verba orçamental destinada à difusão da cultura popular vem descendo gradualmente, passando dos 3500 contos inscritos em 1958 para 2000 contos inscritos em 1963.
Mas será que já atingimos o ponto óptimo neste aspecto?
Alguma coisa há que não está certa e que encontramos quando nos debruçamos no estudo destas questões, sendo necessário e urgente encontrar a solução mais conveniente para corrigir o erro.
Sr. Presidente: está S. Ex.ª o Ministro da Educação Nacional devotado, com entusiasmo e inexcedível interesse, a esquematizar o seu planeamento da educação. Da sua competência e do seu entusiasmo muito é lícito esperar, e é também com entusiasmo e ansiedade que toda a Nação aguarda o anúncio da conclusão dos trabalhos. Porém, sem possibilidades financeiras, tudo será em vão ...

O Sr. Martins da Cruz: - Muito bem!

O Orador: - ... e dessa impossibilidade sofrerá o País, com o ancilbsamento que lhe advirá do seu desenvolvimento técnico.
Espero, pois, que, a par de tão abnegado trabalho ao lado da vontade unânime de todo o povo português, o muito ilustre Ministro das Finanças saberá encontrar a forma de dar corpo à reforma que se prevê, reforma essa que permitirá a todos os que neste sector da vida nacional labutam, alunos e mestres, contribuírem para o progresso da Pátria Portuguesa, tudo podendo fazer, no melhor sentido, para que tenhamos em suficiência os seres pensantes e competentes que possibilitem o desenvolvimento económico e técnico que se exige para uma real integração económica do espaço português.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1964.

Tem a palavra o Sr. Deputado André Navarro.

O Sr. André Navarro: - Sr. Presidente: ligado hoje mais intimamente, por deveres de cargo oficial, a parcela ultramarina do todo português, a minha intervenção na análise da proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1964 poderá revestir, na realidade, expressão um tanto diferente da de anos anteriores, embora vista sob a mesma óptica. E isto porque, encontrando-me mais próximo de região politicamente mais sensível no actual período conjuntural, essa circunstância me faculte visão mais realista do conjunto das linhas de força que comandam a presente conjuntura.
Em primeiro lugar, vamos tentar, para mais rigorosa definição do seu processo evolutivo, fazer uma rápida síntese dos seus antecedentes políticos e económicos.
No findar da grande guerra, apenas um pólo actuante dominava, na realidade, vencidos e vencedores - era ele os Estados Unidos da América. A União Soviética tinha ficado, como os restantes países intervenientes no conflito, quase prostrada pela acção destruidora dos exércitos inimigos, e isto no que se refere não só a meios bélicos e equipamentos industriais, como também em relação a aspectos dominantes das infra-estruturas económicas.
Possuidora exclusiva da bomba atómica, a nação americana, pelo contrário, dispondo ainda de forças armadas vultosas e bem treinadas na arte da guerra moderna e não tendo sido atingida no seu território pelas destruições maciças ocasionadas por bombardeamentos estratégicos e de represália, este grande e rico país dominava, na realidade, a partir de então, a totalidade do mundo civilizado.
Porém, ainda no rescaldo desse conflito que abalou os alicerces de grandes e poderosas nações do globo, reduzindo-as a extensas ruínas, houve um país que soube, desde logo, justificar a sua posição de vencedor, e ele foi a própria Rússia.
Teve o sagaz ditador que então dominava, indiscutivelmente, todo o grande espaço abrangido pelo mundo marxista a habilidade de conquistar, já finda a guerra, todo o Oriente, sem disparar um único tiro, e de incluir dentro das fronteiras do seu vasto império grande parte da Europa balcânica, importante celeiro do Velho Mundo europeu, e ainda cindir a Alemanha, seu inimigo potencial de sempre, tornando assaz difícil a sua reconstituição política e económica.
Dentro do mesmo plano, judiciosamente estudado, em todos os seus pormenores, pelo estado-maior dos seus exércitos, a Rússia apossou-se, ainda, dos mais eminentes cientistas nucleares, químicos e matemáticos alemães, procurando assim conquistar todos os elementos técnicos e científicos com que haveria de reduzir, em curto espaço de tempo, a distância que separava o seu país, quanto a potencial de luta armada, do único presumível competidor na arte da guerra moderna - os Estados Unidos da América. E os tempos que se seguiram demonstraram, com particular evidência, que a conquista desse capital de inteligência haveria de decidir a seu favor, pelo menos durante largo período, os resultados desta competição.
Quando o Norte-Americano acordou, ainda sonolento, do sonho roseveltiano de paz, consentindo recuos inconcebíveis das suas forças armadas vitoriosas, já a Rússia tinha levado. a cabo a triagem técnica referida, nas universidades e laboratórios de investigação e nas grandes empresas da zona ocupada pelos seus exércitos, e, como remate desta atitude absurda, nem mesmo foi tentado evitar que a capital política do mundo germânico ficasse inclusa em extenso lago russo.
Este o resultado da actuação consciente dos assistentes criptocomunistas do presidente americano, já diminuído, então, por grave doença, elementos que vamos encontrar, mais tarde, em postos dominantes da administração e em várias comissões marginais, como a famigerada American Committee on África, de tão triste memória para todos nós, portugueses. E houve o cuidado, que aos técnicos rés-

Página 2549

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2549

pensáveis do mundo comunista nunca escapa, de apagar todos os traços das grandes manobras ofensivas em preparação. E, assim, não consta que qualquer desses sábios alemães, que tiveram quase na mão a destruição, por meios brutais, dos países aliados, fosse incriminado como presumível responsável pelos horrores da guerra, para julgamento de crimes cometidos contra a humanidade.
De resto, estariam então em boa companhia, pois a bomba atómica que deflagrou em Hiroxima e que matou, em poucos segundos, milhares de mulheres, homens e crianças indefesos, foi também considerada, então, simples instrumento para apressar a paz. Como, da mesma forma, tinham sido reputados como instrumentos, dentro do admissível em lutas armadas entre países civilizados, as bombas incendiárias, que transformavam em torresmos milhares de famílias alemãs em fuga, nas regiões devastadas pelos bombardeamentos psicomilitares dos aliados, repetição, em larga escala, do bliiss londrino. Não vale a pena, contudo, relembrar tristes factos que em nada valorizam o homem do século XX e que pouco adiantam em relação ao processo que pretendemos analisar.
Recorda-me que, nessa época, considerada já recuada, porque o tempo voa hoje mais depressa em companhia dos anseios de uma humanidade sempre sequiosa de novos progressos, um sábio estadista que todos lêem, mas que muitos se apostam em dizer que não ouvem, por temor de ofender a opinião pública democrática dos respectivos países, ditava com extraordinária clarividência os perigos imensos que resultariam para a Europa de então da destruição do dique germânico, por via da rendição incondicional, deixando assim espraiar livremente a onda eslava, retida há milénios nas fronteiras do Velho Mundo. E ainda, por essa altura, esse grande expoente do pensamento europeu punha também em guarda os mentores políticos do mundo ocidental para o imenso repositório de possibilidades que era necessária guardar ciosamente para a Europa de amanhã - o continente africano.
E quais foram os caminhos seguidos? Todos nós o sabemos, pela experiência dolorosa já vivida por alguns países, mas talvez a memória de alguns já não seja capaz de reconstituir, mesmo nas linhas gerais, o complexo encadeamento deste processo político que tão dominantemente haveria de influir no futuro europeu. Assim, relembremos um pouco alguns factos já passados, para avivar memórias.
A América do Norte, sob a ameaça da comunicação rápida da Europa, digo melhor, eslavização do Velho Mundo europeu, e assim perante o perigo iminente de perder, em definitivo, precioso ponto de apoio para acções defensivas e ofensivas futuras das suas forças armadas, lançou, e, digamos, com notável êxito, o já célebre Plano Marshall. E, paralelamente com ele, conseguiu converter ao capitalismo alguns dos principais dirigentes da C. G. T. comunista francesa, já que a central operária italiana, de feição marxista, embora não menos importante, estava ainda, contudo, sob o domínio das forças de ocupação e, assim, praticamente neutralizada.

or esta forma começou a reconstituição da Europa, e é bom que se acentue que esta foi levada a cabo com o objectivo fundamental da defesa do conjunto do mundo ocidental, e não apenas de uma das suas parcelas, e dentro da mesma finalidade devem ser consideradas todas as «Natos» subsequentes.
De Gaulle, porém, já nessa época não gostava de ler pela cartilha americana e o estadista alemão a quem a Europa deve o seu milagroso renascimento tinha, talvez, o mesmo sentimento íntimo, mas não podia, nem devia, exteriorizá-lo.
Sob a sua direcção superior, a fracção ocidental desse martirizado país, chave da segurança da Europa, reconstituiu com dinamismo insuperável a sua economia, reconstruindo portos e vias de comunicação, fábricas e laboratórios, escolas e universidades, deixando para depois as habitações e para muito mais tarde toda a série que comporta o sumptuário.
A esse grande estadista, há pouco retirado da vida pública do seu país, com aquela simplicidade e naturalidade que só B permitida aos ímpares da política nestes conturbados tempos que correm, deve a civilização ocidental não ter perdido o fio da sua preciosa tradição e o Mundo o seu, embora instável, equilíbrio político.
A história ditará um dia, quando a perspectiva destes tempos puder ser vista em verdadeira grandeza, qual o extraordinário filósofo e excepcional político europeu a quem o mundo ocidental deve, de facto, a sua salvação.
Nesses tempos difíceis do pós-guerra a França debatia-se ainda numa luta inglória de facções partidárias, de um parlamentarismo ultrapassado, e, em perfeita comunhão com o trabalhismo britânico, que já tinha hipotecado o império a ideais ruinosos, arrastava também, sob a égide do Novo Mundo, Holandeses e Belgas, para uma liquidação forçada da sua missão universalista, que, pelo visto, não tinha nesses países raízes fundas.
O mercantilismo é, de facto, movimento que acompanhou sempre e de perto, em todos os tempos, os grandes senhores da fortuna, e os movimentos destes nunca obedeceram aos ditames de uma missão espiritualista. Assim, o forte troar do canhão deslocou, efectivamente, muito mais para o oeste, nesses tempos, o centro de gravidade do mundo da fortuna. Assim regressaram, sob a égide do comunismo russo e do monopolismo internacional, aos confins da Idade da Pedra, povos malaios, chineses, pa-puas, negros de várias raças e inúmeros outros.
A sua inocência e falta de maturação política não lhes facultou aperceberem-se a tempo do negrume do colonialismo russo nem das subtilezas do autodeterminismo internacionalista ocidental. Hoje já pedem, de mãos postas, esses milhares de infelizes, que os abandone, de vez, a senhora independência. E assim aconteceu e assim ficou a partir de então, em regressivo movimento civilizatório, ao som da batuta russa e de slogans anticolonialistas americanos, mancha imensa da África e do Extremo Oriente asiático.
Mas continuemos a dizer mais algo, referindo mais alguns marcos deste tortuoso caminho do pós-guerra, recuando um tanto para melhor visão de outros aspectos significativos deste complexo processo político.
Quando o bom senso começou a regressar a esta martirizada Europa, os ventos do socialismo já apenas dominavam na gélida Escandinávia. Foi então que a Grã-Bretanha pretendeu salvar, de mãos dadas com a França, o que restava de caminhos abertos à universalidade do génio europeu. Contudo, um acto de força, de todo imprevisto, levado a cabo com simultaneidade pela Rússia e pelos Estados Unidos, instalava o comunismo, mais ou menos disfarçado, no Médio Oriente e Norte de África, flanqueando assim, perigosamente, a Europa pelo sul. Estavam desta forma anulados, por um só golpe, alguns dos principais caminhos que ligavam a Europa ao Extremo Oriente e colocado em iminente perigo o abastecimento do Velho Mundo em combustíveis líquidos. A N.º A. T. O. começava, a- partir de então, a perder grande parte do seu valor defensivo do mundo ocidental. E assim se apagou também, mais tarde, o farol que irradiava a luz da civilização ocidental em terras afastadas do Indostão.

Página 2550

2550 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Gerou-se, a partir deste momento histórico, um clima depressional na Europa, que, na sequência desta política, haveria de permitir à Rússia impor a nova teoria da coexistência pacífica, habilmente ideada pelos seus técnicos para a conquista, sem perda de vidas, do mundo ocidental. E assim foi iniciada a dissolução da resistência ocidental, sem que a Rússia arriscasse um único soldado.
A América do Norte, isolada, por via dos graves erros cometidos pelos seus políticos, foi conduzida a aceitar essa política e procurar nesta situação de paz podre, que VI designada algures por mole, recuperar a posição perdida no domínio bélico, especialmente no que se refere a mísseis de longo alcance.
O coroamento desta política de suicídio lento, em que a América do Norte teve posição de responsabilidade, veio a consumar-se na já célebre conferência de Viena de Áustria, onde, certamente, o russo impôs as linhas gerais desta coexistência pacífica dos dois grandes, linhas que pela sua irregularidade e talvez imprecisão iriam ocasionar, mais tarde, avanços e recuos frequentes das duas partes e com desfechos que o mundo ocidental dificilmente poderia vir a entender.
Foram estes, por exemplo, que levaram os diplomatas russos e missões várias, técnicas umas, de espionagem outras, a fazer várias vezes as malas no Congo, levando num desses recuos os Andrades na sua bagagem, ficando, porém, aí instalado, comodamente, o outro parceiro deste jogo diplomático, protegendo o criminoso Holden Roberto. Como, também, marchas e contramarchas semelhantes viriam a amuar os Fidéis de Cuba, como animariam os Ben-Bela da Argélia.
E já não falo desse itinerante imperador de opereta, sustentado pelos Ingleses durante a guerra, restituído ao trono mais tarde, caído depois nos braços da Rússia, para se instalar agora nos domínios «onusianos» como campeão do anticolonialismo, desempenhando, com rigor, as suas funções de agente soviético encapotado debaixo do manto da realeza, até ao momento em que a Somália russificada seja campo de acção para o desenvolvimento de nova e importante linha de acção comunista dirigida contra a África Oriental, no caminho para ambicionadas minas de ouro. Por agora assiste-se, apenas, aos primeiros preparos.
Assim, o grande erro da política americana, selado no pacto de Viena, foi fundamentalmente este. A troca da amizade sincera dos velhos países da Europa, países donde partiram os descobridores e colonizadores das Américas, por falsas e perigosas relações de coexistência pacífica - que de pacífico nada têm- com os responsáveis pelo estabelecimento, em espaço imenso, da mais dura das escravaturas que foi dado conhecer ao Mundo. E esta errada e perigosa política foi aceite pela América do Norte, com todas as suas ruinosas consequências, apenas, é meu convencimento, para ganhar tempo na corrida pela supremacia dos meios técnicos de destruição.
Por esta forma se criou a contradição entre a posição tradicional da América, intimamente ligada ao Ocidente europeu, e a da América conusiana, atraída para pólo oposto, por ideais congeminados pela psicotecnia subversiva russa, tendo, como guarda avançada, os socialismos britânico, belga e italiano e outros movimentos da mesma índole, mas hoje em parte dominados, embora todos eles desejosos de algo conquistar de prestígio no final desta luta insana entre duas concepções opostas da vida humana - a do homem livre em face do homem escravo.
Não deve, assim, ser entendida de outra forma a posição «neniana» no governo cristão progressista italiano, isto é, de simples ponto de apoio camuflado do comunismo moscovita.
Neste movimento de rapina comandado pela Rússia, não ficou também de fora dele aquele sector largamente influente na política americana - o dos grandes monopólios, que julgam poder conquistar, no decorrer desta luta, repositório assaz valioso de combustíveis líquidos e de variadas matérias-primas em que o solo americano se tem mostrado pouco rico. De resto, já tinham a experiência frutuosa da República da Libéria. Era assim necessário, apenas, uma generalização do método, usando slogans mais aliciantes.
Neste clima habilmente criado pelo comunismo e seus pares, de ilusões e de mentiras, nasceu a guerra pelo cobre, no Catanga, guerra de que saíram vitoriosos os monopolistas americanos.
Os accionistas belgas e ingleses da Union Minière ainda protestaram e o Russo não deixou mesmo de rugir, mas as fronteiras definidas pelo pacto de Viena não o deixaram ir mais além. Contudo, a Rússia, utilizando já novos slogans, não perdeu o fito de conseguir outros êxitos, enquanto prepara os sindicatos congoleses para nova investida.
Assim, como, derivativo, propõe-se iniciar agora, como disse, a campanha pela conquista da riqueza aurífera da África do Sul, para somar estas importantes reservas às já muito vultosas que possui no seu território, permitindo-lhe, num futuro próximo, maior largueza na aquisição de cereais nos mercados do Novo Mundo, que a sua agricultura colectivizada já não é susceptível de produzir em quantitativo suficiente para o sustento dos seus povos. Esta a razão da afanosa ofensiva contra a África do Sul, tomando como pretexto o apartheid sul-africano.
Enquanto a Rússia vai conquistando a África Negra e o mundo árabe, para ajuste final de contas com o seu mais poderoso inimigo, sem sofrer uma única baixa nos seus exércitos, utilizando soldados irlandeses, indianos, suecos, polacos, abexins, noruegueses, coreanos, vietnamianos ou tunisianos com armas compradas para lá da cortina de ferro e aos fabricantes ocidentais, vão os seus serviços secretos amolecendo e dissolvendo as resistências do Ocidente. E fazem-no usando métodos dos mais modernos, fundados nas técnicas psicológicas da condução das multidões constituídas por indivíduos atrasados ou mesmo evoluídos. Se para uns chegam as emissões de Moscovo contando histórias da carochinha em que o cordeiro é sempre a Rússia e o lobo mau o país colonialista, para outros usam métodos mais científicos.
Assim, procuram atingir os alicerces da própria família, actuando sobre a juventude inexperiente e generosa, procurando, por habilidosas vias, mudar-lhe o sentido nobre da vida, animalizando-a e despertando nela baixos instintos.
E para tal conseguir são vários os meios e os métodos de acção. Desde a propaganda das aberrações no mundo das artes e das letras ao desenvolvimento de sentimentos cafreais ao som de batuques, tudo serve para gerar e reproduzir teddy-boys, que ainda hoje se pensa no Ocidente serem apenas produto dos tempos modernos e nada mais. E então esquece-se a larga contribuição que deram para a sua formação as inúmeras B. B. e ainda os gostos impingidos a milhões de indivíduos dos dois sexos através de hábeis ditadores das modas, e como não chegou o centro comunista parisiense, instalaram-se outros na Itália e nas Américas.
E pergunto apenas, para meu esclarecimento, se esses mesmos métodos de sedução e de dissolução da juventude foram, em qualquer época, consentidos na Rússia comunista ou nos países satélites?

Página 2551

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2551

Foi assim, neste clima instável, gerado no Ocidente pela política hesitante dos Estados Unidos, que foram dados os primeiros passos para a constituição de uma terceira força, a do Ocidente europeu.
Estimulando a América do Norte, no decorrer da aplicação do Plano Marshall, a união económica dos vários países do Ocidente europeu e mais tarde o franco apoio dado por este país à Comunidade do Carvão e do Aço e às várias instituições subsequentes, tendentes ao desenvolvimento das actividades produtivas e comerciais da Europa, levou os responsáveis europeus, progressivamente, à definição de um mercado comum.
Este grande espaço económico, já excepcionalmente evoluído e englobando os principais países industriais do continente, progrediu rapidamente no decorrer da liberalização alfandegária de inúmeros produtos das actividades industriais.
Embora dificuldades várias, especialmente ligadas à posição da comunidade britânica, tivessem levado à formação de uma zona de comércio livre, e assim retardado a constituição de uma confederação económica europeia, o que é facto é que as maiores resistências para se atingir um tal objectivo devem estar em breve vencidas.
Haverá ainda que resolver, é um facto, outras dificuldades para se atingir plenamente esse fim. E o caso, por exemplo, das produções agrícolas oriundas de territórios de diferente fertilidade e, consequentemente, com custos de produção muito diversos. Daí as reacções alemãs à generalização das normas do Mercado Comum aos produtos oriundos da agricultura.
Não será fora do admissível que dentro de breves anos esta associação europeia abranja já alguns países do Leste que estiveram ligados durante muito tempo aos grandes mercados consumidores da Grã-Bretanha, da Alemanha e da França. A recente iniciativa alemã de investimentos vultosos a aplicar na Alemanha Oriental, sem qualquer contrapartida política, deve ser vista sob este ângulo.
Se a posição americana foi, assim, durante largo período, estimulante da iniciativa de uma união europeia de feição económica, desde, porém, que o potencial económico da Europa ultrapassou o dos Estados Unidos, começando a afectar as suas actividades agrícolas e industriais dominantes, começaram, desde logo, a verificar-se em vários meios políticos desse grande país reacções profundas contra esta tendência.
A guerra do frango, como a dos têxteis, como ainda a invasão do Volkswagen no mercado americano, provocando graves perturbações na economia das indústrias automobilísticas desse país, são alguns dos sintomas deste mal estar, a pôr de sobreaviso aqueles que julgavam possível formar um todo económico no bloco ocidental, embora cindido pelo Atlântico.
Se a exterisificação de um mercado é, de facto, condição fundamental para a diminuição de custos de produção e correlativamente para o acréscimo de níveis de existência, essa extensificação tem, contudo, um limite, que se verifica até nos domínios da empresa e que é função das possibilidades de racional gestão.
Isto significa que em cada bloco diferenciado do mundo moderno tenderá a constituir-se, possivelmente, um conjunto económico em grande parto auto-suficiente, é um facto, mas terá de manter, porém, com os outros blocos, relações bilaterais destinadas a colmatar deficiências mútuas.
O que fica dito são, contudo, porém, ainda hoje, simples antevisões de caminhos do futuro susceptíveis, segundo penso, de conduzir a humanidade a melhores dias. Não devemos esquecer, para avaliar a urgência de mudar de rumo, que, no presente momento, apenas um terço da humanidade tem alimento e agasalho suficientes. Os dois terços restantes, cerca de 1 300000 almas, apenas vegetam e sofrem os rigores do clima e as injustiças dos seus pares afortunados.
Resumindo: estas são, nas linhas gerais, as principais características da actual conjuntura e que definem, genericamente, o momento que passa no mundo da política internacional.
Os três blocos político-económicos hoje diferenciados têm, neste momento, as seguintes posições quanto a valores humanos. Delas se poderá concluir algo sobre relatividade de situações.
O bloco Russo chinês e dos países satélites compreende cerca de 800 milhões de viventes, com um predomínio acentuado da China comunista, que, só por si. engloba 600 milhões de amarelos. Há que atender que em zona geográfica vizinha se verifica já o reaparecimento do poderoso centro demográfico japonês, dotado de um potencial económico não inferior, antes, pelo contrário, superior sob vários aspectos, ao que possuía antes da guerra mundial.
O bloco europeu, hoje em via de diferenciação activa, compreende cerca de 200 milhões e o americano do norte aproximadamente este número. Os restantes povos, indonésios, indianos - este o maior conjunto, embora ètnicamente muito heterogéneo - e ainda africanos, americanos do sul e outros, perfazem a diferença para os 2 biliões que se julga povoarem, no presente, a terra emersa. Isto, é claro, grosso modo, para fazer, apenas, ideia do balanço demográfico dos blocos diferenciados em presença.
Agora, em mancha rápida, a situação económica e social de cada grupo.
O espaço russo, de certo modo o mais extenso, embora não o mais densamente povoado, está presentemente afectado por dissensão política grave com o conjunto chinês por razões de diferenças nítidas quanto a concepções políticas dentro dos ideais marxistas, o que representa, por parte da Rússia, viragem acentuada no sentido de um socialismo de Estado mais mitigado sob certos aspectos, ultrapassando, em grau de afastamento das teorias de Lenine, a posição tomada pela Jugoslávia.
No sector da vida industrial podemos afirmar, de acordo com o Dr. Martinho Nobre de Melo, que a revolução industrial do Ocidente ultrapassou em benefícios sociais, largamente, a revolução social marxista, e os soldados russos durante a guerra tiveram inúmeras ocasiões de o constatar.
Por outro lado, a colectivização da agricultura, destruindo em grande parte a iniciativa privada da família camponesa e mais sensivelmente nos domínios da cultura e pecuária intensivas, levou às portas da falência a agricultura soviética.
Esta diminuição acentuada do poder económico e o mal-estar social na Rússia levaram os dirigentes soviéticos, embora dispondo de supremacia de certas armas atómicas, a uma atitude de menor intransigência em relação a problemas que, anos atrás, não admitiam qualquer solução de compromisso com o Ocidente. Estão neste caso a posição da Rússia perante a Alemanha Oriental e o caso de Berlim, o recuo indiscutível na crise de Cuba e a retirada das missões diplomáticas do Congo Belga perante a situação criada pelo assassinato de Gizenga e ainda a neutralidade mantida no conflito indo-chinês. quando a América e a Grã-Bretanha tomaram, nitidamente, a posição de auxílio à República Indiana.
Já as recentes tentativas de importação de quantidades maciças de cereais panificáveis americanos devem ser

Página 2552

2552 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

levadas à conta, julgo, embora contra o parecer de muitos, não como sinal de debilidade económica, mas antes como manobra tendente a concentrar nos silos russos material estratégico de excepcional valor.
Por outro lado, a atitude dos dirigentes russos perante a China comunista, cerceando-lhe possibilidades técnicas para o fabrico da bomba atómica e para o desenvolvimento das indústrias pesadas, bem como os ataques ideológicos dirigidos à China nas reuniões dos partidos comunistas, são de facto, como já disse, indícios de uma viragem indiscutível do regime russo, mais por necessidade de defesa perante o colosso chinês, em marcha ascendente de poder militar e industrial, do que propriamente por simpatia com os ideais do Ocidente.
O Russo não ignora que do outro lado das suas fronteiras se, acantona um povo de civilização muito antiga, compreendendo cerca de três vezes a população do seu país.
E agora o que se passa para a bandas do Ocidente?
Aí, o grande bloco norte-americano está hoje flanqueado, perigosamente, desde Cuba até aos confins da América Austral, por um espaço onde o comunismo vem desenvolvendo intensa acção, actuando com completa indiferença perante as inofensivas organizações de defesa interamericanas. Tendo como ponto de apoio fundamental a ilha de Cuba, onde técnicos militares e da guerra psicossubversiva russos e chineses actuam num à-vontade completo, agentes latino-americanos oriundos das diferentes repúblicas da América do Sul vão sendo preparados, cuidadosamente, para a revolução marxista do grande espaço americano.
Os casos da agitação comunista na Venezuela e no Brasil silo, entre os mais recentes, dos mais típicos. E é exactamente nas nações onde estas actividades são mais sensíveis que a ofensiva dirigida pelos agentes russos toma a feição actuante mais dissolvente, criando um clima de intensa reacção contra os monopólios americanos.
Não é, assim, difícil encontrar nas destruições maciças levadas a cabo na Venezuela, em instalações petrolíferas de companhias americanas e em outras unidades industriais, a mão subversiva dos agentes russos, actuando, é claro, como normalmente acontece, através de elementos isolados ou de grupos políticos, mal se adivinhando, contudo, nestes, a sua filiação marxista.
Não é pois de admirar que na procura dos verdadeiros responsáveis pela morte do presidente dos Estados Unidos, cujo cobarde assassinato causou horror em todo o mundo civilizado, se encontrem várias pistas, que vão desde a de fidelistas cubanos até à de segregacionistas texanos, em qualquer das hipóteses, contudo, por via de agentes manejados pelos serviços de espionagem da Rússia Soviética. Esta a razão por que o K. russo e o Fidel cubano sacudiram logo a água do capote.
Não tivesse esse país e seus satélites escolas de vários graus, e até universidades, para preparar esses sabotadores e agentes da subversão internacional, que levaram a cabo, nos últimos tempos, não só esse horroroso crime praticado na pessoa do presidente americano, mas também os morticínios perpetrados, com a maior selvajaria de centenas de famílias portuguesas no decurso dos acontecimentos de 1961, em Angola. São tudo exemplos frisantes do valor actuante desses laureados escolares do assassínio.
A grande América debate-se ainda, como vimos, perante um outro grave problema, o da sua posição, ainda não dominante, na luta pela supremacia das armas estratégicas de longo alcance. E não se sabe até que ponto é que os próprios satélites artificiais, em que a Rússia conquistou notável avanço sobre a posição americana, podem vir a ser utilizados como perigosas armas de destruição.
As recentes declarações do secretário da Defesa dos Estados Unidos deram, na realidade, uma certa confiança ao Ocidente. Mas a atitude de abandono de inúmeras bases de apoio na Europa pode significar, por parte dos Estados Unidos, o cumprimento compulsivo de disposições do acordo de Viena de Áustria e levar, assim, à consecução de um erro, que julgo grave - o de concentrar em espaço limitado todos os meios defensivos e ofensivos de um país.
Psicologicamente, contudo, o efeito de uma tal medida é o do abandono da Europa aos seus próprios destinos. Assim se acentuará a tendência para reforçar a política de alguns dirigentes europeus no sentido da criação de forças nucleares independentes. Isto quanto à preparação bélica dos Estados Unidos.
No domínio económico haverá que notar que a América do Norte, dispondo de equipamento que, no presente, mercê do progresso das actividades industriais europeias e japoneses, já não está sendo utilizado na sua máxima capacidade, circunstância que desperta nos responsáveis dessa grande nação. profundas preocupações pelo avizinhar de grave crise de emprego, que o sector agrícola, pelos atocha acumulados e pelos baixos preços oferecidos ao produtor, pode ainda vir a tornar mais saliente.
Finalmente, o bloco europeu.
Este denuncia, desde a recuperação industrial da bacia do Ehur, uma subida constante do seu processo de reconstituição económica, atingindo, porém, já hoje, níveis também muito próximos da saturação. Isto leva, quer no campo industrial, quer no agrícola, a difíceis e demoradas decisões no seio das várias organizações económicas europeias. São, entre outros sintomas desta situação, a posição alemã no Mercado Comum, no sentido da defesa da sua agricultura, caracterizada por altos custos de produção, e a luta da França no sentido da exclusão da comunidade britânica, como defesa das actividades industriais e agrícolas desse país.
Contudo, o que é indiscutível é que a velha Europa, hoje económicamente remoçada e socialmente com nível bastante evoluído, dispõe já de um potencial económico e financeiro superior a qualquer dos dois blocos, oriental e ocidental americano, e as suas disponibilidades técnicas e culturais permitem antever progressos ainda mais significantes no futuro.
Daí o receio dos dois grandes que a flanqueiam, por ocidente e por oriente, e, talvez, explicação simplificada de atitudes concordantes de Russos e Americanos em vários problemas de interesse vital para a vida política e económica da Europa.
Expresso, nestas breves notas, certamente mal alinhavadas, pelo complexo do enredo e insuficiência de engenho do expositor, o panorama político e económico mundial da actual conjuntura, analisemos agora a posição de Portugal perante este quadro estrutural, como vimos, bastante sombrio.
Disperso o território português por quatro continentes e formada a sua população por fusão íntima de variadas etnias, o multirracialismo e a dispersão geográfica da nossa pátria constituem dois aspectos dominantes da estrutura político-económica nacional.
Tem sido esta circunstância, nos tempos presentes, motivo, porém, de generalizados ataques, no seio de vários organismos internacionais, orientados estes, sempre, pelos que desejariam beneficiar de uma redistribuição de territórios. Seria um novo mapa cor-de-rosa, a traçar na segunda metade do século XX. Apenas os herdeiros presuntivos não seriam, certamente, os mesmos que desenharam o primeiro mapa desta pálida cor.

Página 2553

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2553

Constituindo fundamento da nossa actuação missionária, desde há muitos séculos, a igualdade de direitos das diferentes raças na constituição do corpo nacional, o ataque que pretende atingir-nos não põe já em dúvida esta circunstância, incidindo, antes, sobre definições e conceitos, como o da autodeterminação dos povos e outros, mais fáceis de falsear e de confundir perante a opinião pública internacional.
Com inteligência e competência que nos apraz aqui realçar, o ilustre Ministro dos Negócios Estrangeiros, Doutor Franco Nogueira, não se cansou, durante dias e dias, em reunião com os representantes de algumas repúblicas africanas, de demonstrar as razões da nossa política e a verdade irrespondível da nossa posição ultramarina.
E, segundo se depreende das suas palavras em recente conferência de imprensa, o inconciliável das posições resulta, apenas, de os nossos opositores, não podendo invalidar os argumentos que fundamentam solidamente a nossa posição no domínio da política ultramarina, procurarem, antes, definições que, uma vez aceites e generalizadas ao conjunto das nações reunidas nesse malfadado areópago, a O. N. U., poucas ficariam intactas nos seus territórios nacionais. Umas por dispersão geográfica das parcelas que constituem os respectivos territórios; outras pela inclusão de raças da mais variada etnia e ainda não integradas, digo melhor, fundidas no complexo étnico nacional.
A Dinamarca, por exemplo, teria que libertar a Gronelândia; a Rússia Soviética daria, pela .primeira vez, possibilidades de existência livre a inúmeros países, desde o Báltico até ao Turquestão Chinês.
A índia, essa mescla indecifrável de territórios, de castas e de raças, ficaria reduzida a um nada, como nação.
Os Estados Unidos teriam que libertar o Havai, o Porto Bico e o Alasca.
Assim, várias estrelas teriam de desaparecer da sua bandeira, já não falando do que se passaria no íntimo do seu território continental, devido ao acentuado apartheid racial nos territórios do Sul. E isto já não falando dos elementos indígenas, peles-vermelhas, hoje conservados, apenas, em algumas reservas da natureza.
Perante, pois, este ataque frontal ao território da Nação, Portugal apenas poderá seguir uma só política - a da defesa intransigente de todas as parcelas da Pátria, até ao limite máximo das suas forças materiais, já que as morais não faltarão certamente.
E, por isso, só pode merecer o aplauso unânime desta Câmara a proposta de lei em discussão, incluindo como pensamento director, no capítulo das despesas, a necessidade de conceder, dentro dos limites das possibilidades financeiras, todos os recursos disponíveis para habilitar as gloriosas forças armadas da terra, do mar e do ar ao pleno exercício das suas nobres missões. E como para tal é necessário acrescer, por forma significante, as receitas ordinárias, o povo português já disse, claramente, que aceita todos os sacrifícios que lhe forem solicitados para a defesa da integridade da Pátria.
Os aplausos apoteóticos recebidos por S. Ex.ª o Sr. Presidente da República na sua viagem triunfal ao ultramar e a concentração monumental do Terreiro do Paço, para ouvir a palavra de ordem de Salazar, são respostas iniludíveis da Nação perante os ataques de que está sendo alvo.
Com um espírito de equilíbrio e de justiça que é de realçar, o ilustre Ministro das Finanças, Prof. Pinto Barbosa, promete, assim, continuar na promulgação dos regimes tributários que ainda não foram publicados e, seguindo política financeira de acordo com os princípios fundamentais que há 35 anos vêm sendo rigidamente mantidos, o Governo continua a garantir a solidez da nossa moeda, escudo fundamental para a defesa da Nação no período conturbado em que vivemos.
Mas se o signo que presidirá à estruturação do novo orçamento é dominantemente o da defesa armada do território, o Governo não esqueceu, e muito bem, que, com este mesmo objectivo superior, é mister continuar, e com o mesmo ritmo, o desenvolvimento económico e o progresso social das massas trabalhadoras.
Para tal prevê a inclusão das verbas necessárias destinadas à realização dos investimentos previstos nos Planos de Fomento e em outros com o mesmo fim já estruturados, e isto no conjunto do território metropolitano e ultramarino.
A análise das contas públicas relativas ao ano de 1962 dava nota de um facto, na realidade deveras optimista, que me apraz neste momento realçar.
E que o esforço financeiro feito pela Nação, no sentido de estimular as forças produtivas, tinha nesse ano como resultado um índice de crescimento de 6,1 por cento, nitidamente superior ao do acréscimo do produto nacional do conjunto dos países europeus ocidentais, que, nesse ano, não tinham ultrapassado 3,5 por cento. E a confirmar este índice optimista, embora seja ainda reconhecidamente baixo o nível de vida do povo português, o ilustre presidente do Deutsch Bank, Prof. Hermann Abs, figura do maior relevo nos meios financeiros e económicos mundiais, afirmava há poucos dias, numa notável conferência pronunciada no Instituto de Ciências Económicas e Financeiras, textualmente o seguinte:
Tem sido notado, com especial interesse, que, em Portugal, o aumento de rendimento de largas camadas populacionais se tem verificado sem qualquer desvalorização monetária.
Esta afirmação, partindo de quem partiu, tem, de facto, um valor que é oportuno notar e que com justiça regista os progressos já bem patentes do nível social de vasto sector do trabalho nacional.
As medidas de grande oportunidade promulgadas recentemente pelo Ministério das Corporações, sob a direcção superior do ilustre Ministro Prof. Gonçalves Proença, são de molde a dar a maior confiança na evolução progressista dos ideais corporativos nos domínios do trabalho, concedendo aos operários dos vários misteres garantias que só uma sólida orgânica poderia oferecer-lhes.
Do sindicalismo estático, sem qualquer proveito para as massas operárias e que, durante muito tempo, apenas constituiu base de reivindicações sem qualquer possibilidade de êxito, vai-se assim caminhando para um sindicalismo dinâmico. Neste, o operário encontra-se, cada vez mais, integrado na vida da empresa e dos seus complexos problemas e defendido, por forma efectiva, tanto na doença, como na velhice, como no desemprego e ainda perante as consequências de acidentes de trabalho.
Neste capítulo é da maior justiça destacar a obra a todos os títulos notável da organização corporativa das pescas, que dá, em todos os campos, o maior apoio moral e material aos bravos trabalhadores do mar.
Se atendermos, por outro lado, a que na estrutura do produto bruto nacional a fracção agrícola é ainda dominante e que nessa parcela cerca da quarta parte corresponde à cultura cerealífera, sujeita a profundas oscilações derivadas da irregularidade do clima e da pobreza do solo, facilmente se poderá concluir que o acréscimo atrás mencionado, especialmente consequente de actividades industriais, revela, quanto a este sector, como, também, ao dos serviços, situação ainda mais optimista.

Página 2554

2554 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Não é difícil conseguir, na realidade, com os meios de que dispõem a moderna mecânica e tecnologia agrícolas, um desenvolvimento rápido nos territórios onde predominam solos férteis, e não como entre nós, em que as manchas ricas são mero acidente.
E não devemos olvidar, também, que grande parte dos investimentos até hoje incluídos nos Planos de Fomento se destinaram principalmente a trabalhos correlacionados com infra-estruturas e como tal só rendáveis a prazo muito mais longo.
Nos domínios do agrário, ainda dois trabalhos recentes vieram dar mais perfeito conhecimento da difícil situação da indústria agrícola e assim permitir que se faça maior justiça ao esforço, muitas vezes inglório, por desconhecido, da sacrificada lavoura portuguesa.
Refiro-me aos estudos publicados pelo Instituto Nacional de Investigação Industrial, da autoria do engenheiro agrónomo Santos Loureiro, e a valiosíssima obra Níveis do Desenvolvimento Agrícola no Continente Português, deste mesmo autor e do Prof.. Castro Caldas, publicado sob a égide da Fundação Calouste Gulbenkian.
Da leitura desses valiosos estudos se conclui que as assimetrias espaciais de crescimento no continente se filiam, em grande parte, na irregularidade do clima e do solo.
Assim, os solos aluvionais e de barras castanho avermelhados, de basaltos e de dolorites, os vermelhos mediterrânicos sobre calcários e alguns bons arenitos, onde domina a aptidão agro-pecuária de bom rendimento económico, não abrangem mais do que 11 por cento no continente, o que representa um índice de pobreza bastante claro, especialmente quando posto em confronto com os referentes à maior parte do território europeu ocidental.
E não devemos também esquecer os defeitos graves da nossa estrutura agrária, em grande parte consequentes de graves erros cometidos neste sector pela política completamente à margem da nossa tradição agrária que imperou entre nós, no decorrer do século passado. E ainda, a acentuar este mal de base, a inversão de posições fitogeográficas dos dois principais cereais da nossa economia agrária: o trigo acantonado no Sul do País e o milho no Norte e Centro litorais. Enquanto no Norte do País é frequente obterem-se com o trigo médias de produção que se aproximam dos valores mais elevados da Europa Setentrional e Ocidental, no extenso celeiro do Sul, com excepção de pequenas manchas de barros e terras aluvionais, essas médias são apenas da ordem daquelas que se verificam na orla semiárida do Mediterrâneo.

O Sr. Virgílio Cruz: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao milho, embora nos melhores regadios do Norte se obtenham médias satisfatórias, elas nunca se aproximam, porém, dos resultados colhidos nos regadios do Sul, onde se conseguem produções frequentes da ordem das 10 t por hectare, superiores às anotadas nos melhores terrenos do com belt americano, onde já é larga a difusão dos mais produtivos milhos híbridos.
Para se acrescer, por forma significante, o rendimento do sector agrícola será necessário, assim, além da ampliação das superfícies de regadio, já prevista, em escala tipreciúvul nos territórios ao sul do Tejo, realizar simultaneamente uma hidráulica de enxugo, não menos valiosa debaixo do ponto de vista económico, nas extensas bacias hidrográficas do Norte e Centro do País.
Se efectivarmos, ao mesmo tempo, a abertura de rede de caminhos de montanha indispensável à valorização de muitas centenas de hectares de pousio e. de floresta das regiões do interior continental, ter-se-á influído, então, largamente na valorização da economia agrária de algumas regiões menos beneficiadas, até hoje, do território metropolitano.
Um pequeno exemplo do que pode resultar para a economia de certas regiões ainda pouco evoluídas, como consequência desta política de pequenos melhoramentos,. conjugados com assistência técnica adequada, vem exposto por forma, singela numa interessante publicação da Shell Portuguesa, resumindo os resultados de três anos de assistência técnica no concelho de Sever do Vouga, realizada sob a proficiente direcção do engenheiro Vital liodrigues. Assim, só em relação à cultura do milho de 1959 a 1962, apurou-se um aumento de rendimento bruto de J900 contos em referência a uma área de cultivo de 600 ha.
Deduzindo todas as despesas, incluindo as de assistência técnica, apurou-se, em relação a várias actividades, um saldo bastante animador de 1000 contos.
É exactamente nesse acréscimo substancial de assistência técnica à lavoura que vejo poder fundar-se, num futuro próximo, progresso real da nossa agricultura. Para tal será necessário, contudo, multiplicar o número de unidades escolares do nosso ensino médio e elementar agrícolas e acrescer o número de diplomados do ensino superior, incluindo os cursos de Medicina Veterinária, de Agronomia e de Silvicultura, nas Universidades de Coimbra e do Porto.
Está, porém, em boas mãos a programação deste importante sector da vida nacional. E neste mesmo sentido já foram dados também alguns passos fundamentais no ultramar português. Confiemos no dinamismo, clarividência e senso prático dos ilustres titulares das pastas da Educação Nacional e do Ultramar, Prof. Doutor Galvão Teles o comandante Peixoto Correia, certos de que aos passos já dados se seguirão outros que hão-de permitir às actividades económicas ter à sua disposição, em breve tempo, os elementos técnicos necessários para o seu apoio.
Sejamos, pois, confiantes. Defendendo até ao limite máximo das nossas possibilidades o sagrado território que herdámos dos nossos maiores e valorizando com o nosso árduo labor os torrões pobres da nossa Pátria, continuaremos a ser, decerto, com a ajuda de Deus, o que sempre fomos.
Dou, assim, e neste espírito, o meu voto na generalidade ao diploma em discussão.

Disse.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Pinto Carneiro: -Sr. Presidente: mais um ano de esforço, de luta e de patriotismo está prestes a entrar no seu ocaso, cedendo o lugar ao alvorecer de novas esperanças.
Neste decurso de tempo - proclamá-lo publicamente é imperativo de justiça - o Governo da Nação não se poupou a canseiras, a preocupações e a persistente vigilância na defesa integral daquele património que é nosso por força do direito, da história e da cultura.
E, não obstante as transformações político-sociais que, dia a dia, vão mudando a face do Mundo e atingindo as estruturas económicas dos povos, nós, pela tenacidade da índole nativa, que é uma constante da raça, e pela visão ampla da interpenetração dos acontecimentos internacionais, continuamos a desfrutar de uma admirável estabilidade financeira, que, há mais de três décadas, tem sido

Página 2555

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2555

o fulcro do ressurgimento nacional e agora constitui a alavanca do nosso prestígio no mercado dos capitais estrangeiros.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Das várias rubricas da proposta da Lei de Meios, presentemente submetida à ponderada reflexão desta Câmara, imediatamente aflora a ilação de que, nos vários sectores da vida nacional, o progresso se afirma em ritmo crescente, numa correspondência inequívoca às exigências do presente e numa adaptação inadiável às perspectivas do futuro.
Se, por entre o rumoroso coaxar dos inimigos em fúria e a confusão poeirenta das tormentas políticas em que o Mundo se contorce, a nossa inteligência rasga, com firmeza, o roteiro de um luminoso porvir; se, represando a onda de insídia viscosa que, surdindo em repelão dos charcos internacionais, babuja a dignidade dos povos, o nosso coração, num abraço de fraternidade, abre as asas sobre aqueles pedaços de terra portuguesa que ao sol de além-mar reflorescem em gestas de glória e de bravura; a nossa alma toda, abrindo-se até ao fundo ao anseio de mais ampla solidariedade entre os homens, sem discriminação de credos, de raças ou de cultura, ajoelha, ébria de fé e arquejante de esperança, depondo no altar sacrossanto da Pátria a chama votiva de uma sublime compreensão universal.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: o presente diploma legislativo prolonga vitoriosamente a linha de rumo dos que o precederam, na vontade de servir eficientemente o engrandecimento nacional, no concernente à defesa, ao fomento, à cultura, à conjugação mais harmoniosa dos factores da produção, ao complexo e delicado condicionalismo dos mercados e a uma melhoria mais acentuada do nível social.
Mas desta tribuna, onde floreteia a crítica sem animosidade ou ressentimento e se tece o louvor sem lisonja ou simulação, também se formulam votos, se exprimem desejos e se apontam sugestões.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Assim, Sr. Presidente, na certeza de que interpreto o sentimento de grande parte do povo português, daquele povo modesto e trabalhador cujas mãos calejadas acarinham amorosamente a terra e cujos olhos tristes se humedecem com laivos de desilusão, eu rejubilaria vibrantemente se ao longo da presente proposta da Lei de Meios surpreendesse uma preocupação ainda mais instante e mais efectiva em prol da nossa desprotegida agricultura ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... favorecendo por meios assistenciais, técnicos e financeiros o concurso dos factores geográficos e humanos que a consubstanciam e integram.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Será bom recordar que é ainda nessa multidão anónima, esparsa pelos campos, que reside a melhor reserva moral da Nação.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Todavia, já nos invade o pressentimento de que essa gente de alma lavada, simples e boa, que, no dizer do poeta, tempera a enxada na «safra do coração em veios de água chorada», começa a ser sacudida por ventos estranhos que bem podem ser portadores do germe patológico de fatídicas convulsões.
Sem minimizar a obra já realizada a favor dos meios rurais, notável a muitos títulos, a verdade nua e crua é que névoas sombrias pairam sobre a nossa agricultura e o desânimo ronda a alma daqueles para quem os campos, no seu conspecto de beleza, de esperança e de potencialidade criadora, constituem a preocupação quotidiana.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O trabalhador rural, depois de sofrer as vicissitudes e as inclemências do calendário agrícola, não aufere da faina do seu trabalho o condigno sustento para si e para os seus.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O elevado custo das sementes e dos adubos contrasta com o baixo preço que os produtos agrícolas atingem no mercado.

Acresce que uma boa parte, e por certo a maior parte, do preço de venda é arrecadado por intermediários e oportunistas que. à semelhança de cogumelos perniciosos, proliferam na distribuição e circulação da riqueza.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - No domínio da produção e do consumo é frequente o círculo vicioso: se a colheita é abundante, o seu preço de venda, mercê do livre jogo da oferta e da procura, é diminuto; se o preço se afigura compensador, não há produção para venda, porque as colheitas foram escassas. Em qualquer dos casos, o agricultor amanha a terra, espalha a semente, cuida de todas as fases do ciclo produtivo, investe capital e incorpora trabalho, mas o seu pequeno celeiro continua minguado de riquezas e rico de desenganos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não será descabido referir que o preço pago ao lavrador português é dos mais baixos, se não o mais baixo dos países ocidentais, no tocante à produção pecuária, ao arroz, ao azeite e ao vinho, e pouco mais de sofrível no concernente a outros rendimentos agrícolas.
Rareia a mão-de-obra e a maquinização motorizada, além de não ser consentânea com a natureza de grande parte das regiões nortenhas, também exige investimentos que ultrapassam a capacidade financeira dos pequenos lavradores.
A exiguidade dos salários não seduz o trabalhador rural, mas temos de convir que, nas circunstâncias presentes, o proprietário também não pode pagar mais sem o desequilíbrio ou a derrocada da frágil economia da sua empresa.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Ainda se esfuma na bruma do horizonte o momento em que as indústrias complementares da agricultura representem pólos de fixação demográfica, e a forte concentração das demais unidades fabris no perímetro das grandes urbes constitui atracção irresistível da gente moça, que, alvoroçada, troca a labuta campestre por novas tarefas que se lhe apresentam mais compensadores.
O êxodo rural, engrossando os caudais da emigração legal ou clandestina, com as suas inevitáveis e trágicas

Página 2556

2556 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

consequências familiares e sociais, começa a constituir um grave problema nacional, que urge enfrentar sem delongas e com solicitude.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Transplantado para outros meios, narcotizado pelo traumatismo psicológico da mudança brusca, febricitante pela fascinação do imprevisto, o trabalhador rural sente muitas vezes o desapego de tudo aquilo que antes o enternecera e, na sua modéstia, lhe dera o encanto de viver.
Auscultai a alma desses desenraizados e vereis que em muitos já morreu a saudade da pequena aldeia em que nasceram, da lareira que os acalentou, da escola em que estudaram, da igreja branca que lhes enflorou a infância e bordou de luz doirada os sonhos da juventude.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - E quantas vezes, ao contacto de novos climas, aqueles corações, precocemente tocados pela aragem do Outono, emudecem a voz do sangue e deixam tombar o amor sublime que, embalando os berços, devia transcender a jurisdição da morte! ...

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: o nosso trabalhador rural, por via de regra, vive em casas sem as mais rudimentares condições sanitárias, desprovidas de água, de luz, sem qualquer espécie de conforto que atenue os rigores do frio e o varrer desabrido das ventanias.
A sua alimentação é deficiente para o enorme esforço muscular que desenvolve.
O seu horário de trabalho vai de sol a sol e, não raras vezes, entra pela noite dentro, sob o pálio de oiro do céu estrelado.
A previdência e a assistência ou não existem ou são um clarão furtivo que pouco aquece e reconforta.
O trabalhador rural moureja a vida e, na velhice, pede esmola.

O Sr. Augusto Simões: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sinto que o coração se me confrange quando vejo estendida à caridade, nobre no seu plebeísmo descarnado, aquela mão emagrecida que revolveu pedras, acariciou a gleba, plantou árvores, fez cantar a enxada e gemer o timão do arado, que, numa palavra, despertou fontes de riqueza, tornando a terra mais fecunda, os campos mais produtivos e a paisagem mais bela.
E o entardecer da vida, que para aquele obreiro da natureza deveria ser manso, bento e suave, a ironia do destino ainda o transforma em ricto de miséria e de dor ...

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - As Casas do Povo e os grémios da lavoura, admiráveis no pensamento que presidiu à sua concepção, por falta de meios e por outros motivos também neste aspecto não têm correspondido às finalidades para que foram criados.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - A gente dos nossos campos tem jus a maior amparo. Os seus anseios e as suas angústias não podem ser vozes perdidas no deserto, mas justificado clamor que, instantemente, pede solução para os seus problemas, que são problemas nacionais.

O Sr. Augusto Simões: -Muito bem, muito bem!

O Orador: -Sr. Presidente: sob os auspícios da presente Lei de Meios, dentro de breves dias, um novo ano económico vai começar.
Dando a minha aprovação na generalidade ao diploma legislativo em debate, quero testemunhar o meu voto de confiança no superior critério do Governo da Nação, a minha esperança no advento de melhores dias para o sector primário do rendimento nacional e a minha certeza inabalável na grandeza perene da Pátria.

Tenho dito.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Vargas Moniz: - Sr. Presidente: desde há três décadas, com impecável regularidade, o Governo apresenta anualmente à Assembleia Nacional a proposta da Lei de Meios, que contém os princípios reguladores da gerência financeira para o exercício seguinte.
O facto, pela sua invariável repetição, constitui já prática usual e tradição estabelecida, de tal modo entrou nos hábitos e na normalidade da vida parlamentar.
A circunstância nova - e essa, sim, justifica menção à parte - é a orientação, seguida desde há alguns anos, de fazer acompanhar o texto do diploma de amplas elucidações, destinadas a habilitar a Assembleia com os elementos necessários a um exame fundamentado e a uma decisão esclarecida.
O relatório que este ano antecede a proposta satisfaz cabalmente este objectivo e justifica, pela sua elevação intelectual, justeza de análises e riqueza dos elementos estatísticos, uma palavra de apreço e de louvor.
Cabe proferi-la nesta tribunal, e não me eximirei a faze-lo, apresentando ao Sr. Ministro das Finanças as homenagens da minha admiração.
O relatório é constituído essencialmente por três capítulos: estudo da evolução da economia internacional; análise da conjuntura interna; e justificação da política financeira, no duplo aspecto dos resultados obtidos e dos objectivos a alcançar.
No que se refere à actividade económica em 1963, impõe-se um breve apontamento que julgo não dever omitir para definição das coordenadas em que se insere a conjuntura nacional.
Os acontecimentos de maior relevância foram constituídos pela crise de Cuba e pela ruptura das negociações para o ingresso da Inglaterra no Mercado Comum.
Os Estados Unidos, a braços com um problema de desemprego persistente, viram o seu produto nacional aumentar a cadência reduzida e não conseguiram até agora deter a drenagem de ouro para o exterior.
O desequilíbrio da balança de pagamentos constitui, assim, o aspecto mais preocupante da economia americana e o ponto sobre que se polarizam as atenções mundiais.
Na Europa Ocidental - e salvo diminutas excepções - o produto nacional tem progredido a uma taxa inferior à do ano findo.
Não se nota, porém, desemprego, com excepção da Inglaterra, verificando-se também tendência para o equilíbrio no respeitante ao comportamento das balanças de pagamentos.
No nosso país a expansão económica mantém-se a ritmo apreciável. As taxas de crescimento atingiram no último quinquénio elevada percentagem, susceptível de

Página 2557

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2557

confronto com os números equivalentes da generalidade dos países europeus.
Nota-se, porém, ultimamente uma tendência de afrouxamento, que urge contrariar, e, ao mesmo tempo, uma disparidade sectorial, reveladora, sobretudo, das dificuldades em que se debate a agricultura nacional.
Esta disparidade, a não ser corrigida, pode perturbar as condições de um desenvolvimento harmónico e ter incidências prejudiciais no sector industrial e dos serviços, dada a interdependência que se verifica nestes diferentes domínios da actividade económica.
As trocas comerciais com o estrangeiro denotam também movimento de expansão, tanto nas importações como nas exportações.
Todavia, até Setembro último, o déficit elevava-se a 5200 milhares de contos, contra 4780 milhares em igual período do ano antecedente.
O agravamento foi, assim, de 420 milhares de contos e deve-se, sobretudo, à importação de bens de equipamento e de matérias-primas para a laboração industrial.
Embora estejamos longe dos números desfavoráveis de 1961, o problema do comércio externo português merece urgente atenção.
Impõe-se o que aliás é pensamento expresso do Governo- uma acção intensa e eficaz com vista ao acréscimo das exportações, sem embargo de outras providências a tomar quanto ao comércio importador, na medida em que o consentirem as políticas de liberalização e os compromissos internacionais do País.
A balança de pagamentos, saneada em 1962, através de uma firme e fructuosa orientação, apresentou no último ano elevado saldo credor. As suas tendências actuais são também de equilíbrio.
Em consequência, a posição cambial mantém-se altamente favorável. As publicações mundiais registam o facto, louvando a nossa política monetária e pondo em relevo o prestígio do escudo nas praças internacionais.
Os programas de fomento têm sido, por sua vez, objecto de metódica execução. Os atrasos verificados nalguns sectores estão a ser diligentemente recuperados e justificam-se pela carência - só ultimamente suprida - dos instrumentos de política económica indispensáveis à acção a empreender.
De um modo geral, o juízo a emitir é todavia favorável.
Demonstram-no, em visão global, os números representativos do crescimento económico.
No que respeita à administração financeira, os resultados obtidos são amplamente satisfatórios e merecem o apreço da Assembleia e do País.
As contas de gerência de 1961 revelam sólido equilíbrio e métodos de financiamento que cumpre aplaudir.
Os meios ordinários corresponderam praticamente aos encargos de defesa e os recursos extraordinários puderam ser afectados, na sua maior parte, a aplicações reprodutivas.
As despesas militares não impediram, por isso, o esforço de expansão da economia, e esta finalidade pôde ser alcançada sem se exigirem esforços desmesurados à Nação.
A evolução da pressão fiscal, embora acuse acréscimo, situa-se em limites aceitáveis, como o demonstram de modo persuasivo o quadro a p. 48 do relatório e os números equivalentes insertos no parecer da Câmara Corporativa.
Efectivamente, não obstante os sacrifícios tributários que foi necessário impor e cujo peso importa não minimizar, a carga fiscal eleva-se apenas, em 1962, a 19 por cento do produto nacional, contra 17,5 por cento em 1960.
Para o exercício financeiro que vai iniciar-se, os princípios básicos definidos na proposta em debate podem, talvez, condensar-se do seguinte modo: primado dos encargos de defesa militar em ordem a assegurar a integridade territorial da Nação; conciliação, na medida do possível, desses encargos prioritários com as necessidades do fomento económico - infra-estrutura essencial da arquitectura financeira; realização, sem prejuízo das precedências estabelecidas, de outras despesas extraordinárias, sobretudo no domínio da saúde, da assistência, do ensino, da educação e da melhoria das condições sociais; política de austeridade no que respeita aos gastos normais e despesas correntes do Estado; modernização e aperfeiçoamento do sistema tributário e previsão prudente de outras medidas a tomar no decurso da gerência, para salvaguarda, se necessário, do equilíbrio financeiro.
No referente à ordem de prioridades definida na proposta, a Assembleia já lhe deu, no último ano, a sua adesão e o problema parece incontroverso.
Com efeito, não pode legitimamente discutir-se, na presente emergência, o imperativo indeclinável de defender o património histórico da Nação e a sua integridade territorial nas diferentes parcelas que a constituem.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Esse património constitui legado dos séculos, herança das gerações, e constitui, por isso, valor ã que não pode renunciar-se, quaisquer que sejam os esforços a desenvolver e os sacrifícios a suportar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -As palavras há dias proferidas nesta Assembleia pelo Dr. Veiga de Macedo, e que nela tiveram profunda ressonância, correspondem aos verdadeiros sentimentos do País, ao ardente patriotismo do povo português e à determinação inabalável da vontade nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Relativamente ao prosseguimento da obra de fomento, parece que ela corresponde aos desejos do País e aos seus anseios de prosperidade e de progresso.
São inegáveis os resultados obtidos neste domínio, qualquer que seja a óptica que se adopte ou o sector sobre que incida a nossa atenção.
O esforço de expansão em curso não admite, efectivamente, interrupções ou soluções de continuidade; tem de ser impulsionado a ritmo intenso e com amplitude crescente.
A interpenetração das finanças e da economia constitui, de resto, evidência que não comporta contestação.
O relatório da proposta salienta-o ao observar que «os maiores encargos com a defesa exigem, de forma inadiável, uma rápida aceleração do aumento do produto nacional».
Para alcançar esta finalidade têm-se coberto as despesas militares com os excedentes dos meios ordinários, reservando-se as disponibilidades de crédito para os investimentos produtivos. Esta constitui a orientação criteriosa e a linha de rumo adequada.
Insere-se ela na melhor ortodoxia financeira e foi ela também que tornou possível, a partir de 1961, ocorrer às exigências da defesa, sem prejuízo, ao menos sensível, da política de fomento.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Mas a proposta é de conteúdo mais vasto e encara também, em ampla perspectiva, um esquema de realizações de útil alcance no campo cultural e social, desde o apetrechamento das escolas e universidades e do

Página 2558

2558 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

equipamento hospitalar até ao problema da habitação para funcionários públicos e à elevação do bem-estar das populações rurais.
O programa delineado, não obstante a sua conveniência e oportunidade, depende, porém, dos recursos disponíveis e de modo especial, da evolução dos acontecimentos ultramarinos.
Apesar da prudência das estimativas, e da lição das anteriores gerências, não podem excluir-se factores imprevisíveis que ponham em causa o equilíbrio financeiro. A hipótese é improvável, mas a prudência aconselha que se acautelem todas as eventualidades e se estruture com ante-cedênclia o dispositivo para lhes fazer face.
Daí a doutrina do artigo 3.º da proposta, que, em harmonia com a posição definida no proficiente parecer da Câmara Corporativa, considero indispensável à defesa da estabilidade financeira que a Constituição consagra e que representa desde 1928 a pedra angular do ressurgimento nacional.
Sr. Presidente: poderia continuar as minhas considerações, e talvez devesse fazê-lo, dado que. na proposta há aspectos que solicitam o meu interesse de técnico e correspondem às minhas aspirações de português.
Enquadrarei entre os primeiros as dotações para intensificação da pequena distribuição de energia eléctrica e para a formação profissional, cada vez mais instante nesta época de revolução científica e de incessantes progressos técnicos.
O investimento intelectual é hoje das aplicações mais reprodutivas e de que podem esperar-se mais benefícios para o desenvolvimento das sociedades.
Destacarei ainda o esforço para a intensificação do turismo, que nos últimos anos tem registado uma acentuada progressão e que pode vir a constituir no futuro uma fonte de recursos cambiais de importância decisiva para a prosperidade do País.
O exemplo da Nação vizinha comporta elucidativos ensinamentos e aponta-nos a trajectória a seguir, em esforço complementar do já realizado, com proveitosos resultados.
Não alongarei a minha exposição, que, aliás, excedeu os propósitos que me impus e as dimensões a que desejava limitá-la.
Ela é, de resto, suficiente para justificação dos motivos por que dou a minha aprovação à proposta e votarei na especialidade o conjunto dos seus preceitos.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão. Amanhã haverá sessão à hora regimental, com a mesma ordem do dia.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 10 minutos.

Sr s. Deputados que entraram durante a sessão:

Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António Burity da Silva.
António Calheiros Lopes.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Marques Fernandes.
Armando Cândido de Medeiros.
Armando Francisco Coelho Sampaio.
Carlos Coelho.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Francisco de Sales de Mascarenhas Loureiro.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Joaquim de Sousa Birne.
Jorge Manuel Vítor Moita.
José Luís Vaz Nunes.
José Manuel da Costa.
José dos Santos Bessa.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Herculano Chorão dê Carvalho.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Beis.
Paulo Cancella de Abreu.
Tito Castelo Branco Arantes.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

Sr s. Deputados que faltaram à sessão

Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Antão Santos da Cunha.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Gonçalves de Faria.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos.
António Maria Santos da Cunha.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
António Tomás Prisónio Furtado.
Armando José Perdigão.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Belchior Cardoso da Costa.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
D. Custódia Lopes.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António da Veiga Frade.
Henrique Veiga de Macedo.
João Rocha Cardoso.
Manuel Augusto Engrácia Carrilho.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel João Correia.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Melo Adrião.
Manuel Nunes Fernandes.
Purxotoma Bamanata Quenin.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Urgel Abílio Horta.
Vítor Manuel Dias Barros.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.

O REDACTOR - Luiz de Avilless.

Página 2559

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2559

Proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1964

I

Economia internacional

1. No 1.º semestre de 1963 prosseguiu a expansão da actividade económica nos dois principais pólos das nossas relações económicas externas - a Europa Ocidental e os Estados Unidos da América.
Observou-se, todavia, relativo abrandamento dessa expansão na Europa Ocidental, devido principalmente à contracção do investimento privado e à diminuição do rendimento disponível, que afectou sensivelmente a evolução do consumo privado, embora na generalidade dos países europeus a despesa do sector público em consumo e investimento e ainda a procura externa de bens e serviços tenham exercido acção expansionista.
Por seu turno, a cadência de crescimento da economia dos Estados Unidos da América no 1.º semestre de 1963 parece ter sido ligeiramente superior à observada no ano anterior. De um modo geral, para a expansão observada no 1.º semestre do ano contribuíram todos os componentes da procura. Espera-se, todavia, que se intensifique o papel desempenhado pelo investimento e pela procura externa no crescimento da economia, dadas as medidas tomadas ultimamente pelo Governo Norte-Americano. Prevê-se ainda que a melhoria da balança comercial, aliada ao efeito das medidas tendentes a evitar a saída de capitais, venha a determinar evolução favorável da respectiva balança de pagamentos.

Europa Ocidental

2. O rendimento nacional do conjunto dos países da Europa Ocidental aumentou, em 1962, a taxa ligeiramente inferior à observada no ano precedente.
A avaliar pelos elementos actualmente disponíveis, a economia da Europa Ocidental teria experimentado, na primeira metade do ano em curso, nova quebra de ritmo de crescimento, para a qual contribuiu fundamentalmente o abrandamento da expansão em alguns sectores durante o 1.º trimestre, em consequência do rigoroso Inverno que se fez sentir na generalidade dos países europeus. Saliente-se, em especial, a contracção observada no sector agrícola e da construção e nas indústrias que deles dependem e ainda nos transportes.
Por outro lado, a redução do rendimento disponível, determinada pelo sensível acréscimo do nível de desemprego durante os três primeiros meses de 1963, afectou significativamente o comportamento do consumo privado, que parece ter aumentado, na primeira parte do ano, a ritmo mais lento que no ano transacto na generalidade dos países da Europa Ocidental, excepto no Reino Unido.
De um modo geral, o crescimento da procura global na Europa Ocidental tem sido determinado principalmente pelo comportamento do consumo público, que tende a expandir-se a ritmo mais rápido que o produto nacional na maioria dos países -em especial na Alemanha Ocidental- e ainda pelo acréscimo da procura externa de bens e serviços.
Por seu turno, a formação bruta de capital fixo do sector privado experimentou sensível quebra no 1.º semestre, em consequência fundamentalmente da manutenção de elevada capacidade produtiva por utilizar e da diminuição dos lucros das empresas. Todavia, o investimento global tem registado nítido incremento em alguns países, nomeadamente na Dinamarca, França, Itália e Irlanda, devido principalmente ao acréscimo do investimento público, apesar de afectado pelas condições climáticas adversas nos primeiros meses do ano, dada a importância que nele assume o sector da construção.
Deve ainda assinalar-se que em alguns dos países da Europa Ocidental se tem observado ultimamente tendência para a elevação da importância relativa da construção no total do investimento.

3. Como se referiu no relatório da Conta Geral do Estado de 1962, a produção industrial do conjunto da Europa Ocidental cresceu no último ano à taxa de 4,5 por cento.
No entanto, a expansão do sector industrial sofreu ligeiro abrandamento de ritmo no 2.º semestre de 1962, que se agravou sensivelmente no 1.º trimestre do corrente ano. No decurso dos três meses seguintes, porém, observou-se nítida recuperação da actividade industrial, tendo-se verificado no conjunto da primeira metade do ano aumento a ritmo idêntico ao observado no período homólogo de 1962. Na verdade, o crescimento da produção industrial processou-se durante o 2.º trimestre à taxa anual de cerca de 6 por cento, em relação ao último trimestre do último ano.
Como no ano transacto, observou-se na primeira parte de 1963 sensível disparidade entre o comportamento da produção de bens de consumo e de investimento: persistiu a tendência para expansão a ritmo mais rápido da produção de bens de consumo - nomeadamente, na Alemanha Ocidental e na Suécia.
Saliente-se ainda que a capacidade por utilizar na indústria siderúrgica se mantinha a nível elevado em Junho deste ano, principalmente no Reino Unido. Por outro lado, não houve variação significativa da produção de aço nos países considerados, não obstante o apreciável incremento verificado na Holanda e na Itália.
Por seu turno, nas indústrias metalúrgicas a produção de bens de investimento experimentou, à semelhança do que se verificou no ano precedente, evolução relativamente desfavorável, que se explica pela estagnação da respectiva procura, enquanto nas indústrias de bens de consumo duradouro, especialmente de veículos automóveis, registou-se uma vez mais considerável expansão.
Por outro lado, como já anteriormente se referiu, as desfavoráveis condições atmosféricas têm afectado a produção agrícola e pecuária do conjunto dos países da Europa Ocidental, prevendo-se menos incremento da produção global em relação ao último ano, devido, fundamentalmente, à contracção de 15 por cento esperada na colheita de trigo, cuja qualidade será, aliás, inferior à dos

Página 2560

2560 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

anos anteriores. Todavia, as colheitas de outros cereais e a produção .de frutos e legumes atingiram no corrente ano valores superiores à média dos últimos anos, enquanto a produção de gado registou apenas ligeiro acréscimo.

4. Embora continue a observar-se relativa escassez de mão-de-obra em determinados sectores, prosseguiu, no 1.º semestre do ano em curso, a tendência evidenciada em 1962 pelo mercado de trabalho para abrandamento das tensões a que anteriormente esteve sujeito.
Na verdade, a procura de trabalho flectiu em alguns sectores, em consequência da diminuição da procura de alguns bens e da realização de determinados investimentos com o objectivo de economizar mão-de-obra. E ao aumento da oferta, resultante desta evolução, associou-se o crescimento da população activa, determinado pelos factores demográficos já verificados no último ano, pelo que a procura de trabalho por parte dos sectores em expansão pôde ser satisfeita com regularidade.

5. A melhoria da situação do mercado de trabalho do conjunto dos países da Europa Ocidental reflectiu-se na evolução dos salários, que aumentaram, de um modo geral, a ritmo mais moderado do que em igual período do >ano transacto, com excepção da Suécia e, principalmente, da Itália. Com efeito, neste último país, as tensões inflacionistas, resultantes dos sucessivos aumentos dos custos da produção, a partir do final de 1961, continuaram a apresentar particular acuidade.
Todavia, e à semelhança do que se verificou no decurso de 1962, a elevação dos salários conseguiu ainda exceder o aumento da produtividade na maioria dos países europeus, excepto no Reino Unido.
Por seu turno, o nível de preços manteve-se praticamente estacionário ou registou apenas ligeiro incremento na generalidade dos países, à excepção da Itália, França, Dinamarca, Suécia e Finlândia, onde a subida dos preços no consumidor se processou a taxa superior a 4 por cento, entre Junho de 1962 e Junho de 1963.
Para o abrandamento das tensões inflacionistas nos restantes países contribuiu de forma decisiva, além. da quebra de ritmo no incremento dos custos de produção, o acréscimo moderado dos preços das matérias-primas. Saliente-se, igualmente, que se verificou menor aumento nos preços dos bens do que nos preços dos serviços, uma vez que a elevação dos salários neste sector tem ultrapassado os acréscimos de produtividade de modo mais nítido que no sector industrial.
Importa ainda referir que o aumento do custo de vida nalguns países se deve, em grande parte, à subida das rendas de habitações, para o que tem concorrido a elevação de custos na construção.

6. No decurso do 1.º semestre do corrente ano, a expansão do comércio externo dos países do Ocidente europeu processou-se a taxa praticamente idêntica à observada em 1962.
Todavia, como o incremento das importações foi mais acentuado que o das exportações - 8 e 6 por cento, respectivamente - o déficit da balança comercial para o conjunto daqueles países ascendeu a 5050 milhões de dólares, contra 4016 em igual período do ano precedente.
No comportamento das transacções dos países da Europa Ocidental influiu de forma decisiva o comércio intra-europeu, que manteve o elevado ritmo de crescimento observado no ano findo - cerca de 10 por cento. Por outro lado, evoluiu desfavoravelmente o comércio com os Estados Unidos e o Canadá, em consequência do acréscimo de 5 por cento das importações, a que se associou ligeira contracção das exportações. De igual modo, elevou-se o déficit comercial com terceiros países, uma vez que a expansão das exportações - 2 por cento - foi insuficiente para compensar o incremento superior a 6 por cento nas importações deles provenientes.
Assinale-se ainda que a evolução do comércio no interior da Comunidade Económica Europeia e da Associação Europeia de Comércio Livre se não afastou sensivelmente da observada no ano transacto. De facto, no período em estudo, as trocas no interior destas zonas elevaram-se de 12 e 6 por cento, respectivamente.

7. Note-se, todavia, que as reservas de ouro e divisas do conjunto dos países europeus da O. C. D. E. registaram, no 1.º semestre de 1963, incremento à taxa anual de 6 por cento, para que concorreu principalmente a acumulação das reservas observada na França e, ainda que em menor escala, na Alemanha Ocidental e na Bélgica. Afigura-se, pois, que a sensível elevação do déficit comercial teria sido compensada, no período considerado, pela formação de um superavit em invisíveis correntes e, principalmente, pela entrada de capitais de montante relativamente elevado.

8. Até final do corrente ano não se prevê alteração significativa do ritmo de crescimento da actividade económica na generalidade dos países da Europa Ocidental, excepto no Reino Unido, cuja expansão se tem acentuado no decurso do ano. Em especial, no que se refere ao investimento privado, a julgar pelos inquéritos efectuados, não se estima sensível recuperação até final deste ano. Por outro lado, admite-se que a tendência observada, no 1.º semestre do corrente ano, para o abrandamento do acréscimo do consumo privado e do rendimento disponível persista na segunda metade de 1963, excepto no Reino Unido.
Todavia, importa notar que, em face da melhoria observada na situação do mercado de trabalho, a expansão da actividade económica encontra-se agora menos dependente do comportamento da oferta da mão-de-obra do que nos últimos anos.

9. Após a interrupção, em 29 de Janeiro último, das negociações para a acessão do Reino Unido à C. E. E., o Conselho de Ministros da A. E. C. L., reunido em Genebra em 18 e 19 de Fevereiro do corrente ano, reafirmou a intenção de «trabalhar em conjunto para o estabelecimento de um mercado europeu unificado». Elegeu-se, como via mais adequada para a prossecução desta finalidade, o estreitamento dos laços que unem os países da Associação no âmbito da Convenção de Estocolmo.
Os órgãos executivos da Associação foram encarregados de preparar, com a maior urgência, um programa de acção tendo em vista, nomeadamente, a aceleração do processo de eliminação dos direitos aduaneiros e a celebração de acordos, em base bilateral ou multilateral, destinados à liberalização do comércio de produtos agrícolas. Ainda o Conselho Permanente e o Secretariado foram instruídos no sentido de apressar os estudos em curso sobre o regime de draubaque, direitos fiscais e taxas internas, regras de origem, produtos da pesca, etc. Do mesmo modo deveriam iniciar-se os trabalhos necessários ao estabelecimento de um sistema de consulta e cooperação em matéria de política comercial, económica e financeira ao exame de certos problemas específicos do comércio de produtos agrícolas e a uma mais estreita cooperação entre

Página 2561

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2561

os países da Associação no campo do desenvolvimento económico e técnico.
Assim, na reunião do Conselho Ministerial da A. E. G. L., realizada em Lisboa de 9 a 11 de Maio de 1963, foi decidido, quanto à aceleração do desarmamento aduaneiro, que a eliminação dos direitos sobre produtos industriais deveria completar-se quatro anos antes da data prevista na Convenção, efectuando-se reduções de 10 por cento em 31 de Dezembro de 1963, 1964 e 1965 e suprimindo os restantes 20 por cento no final de 1966. Assim, o calendário de eliminação de direitos ficou praticamente idêntico ao vigente na C. E. E.
Por outro lado, concluíram-se diversos acordos bilaterais sobre produtos agrícolas, de que decorrerá necessariamente aumento considerável das trocas destes produtos, o que se reveste de particular importância para alguns países membros - nomeadamente, para a Dinamarca e Portugal.
Em relação à intensificação da cooperação económica e técnica entre os países membros, o Conselho decidiu criar um Comité de Desenvolvimento Económico, cuja primeira reunião se realizou no decurso do mês de Novembro, para apreciar os trabalhos já efectuados pelo Secretariado e pelos técnicos dos países membros neste domínio.
Finalmente, o Conselho exprimiu a sua intenção de participar nas próximas negociações pautais no quadro do G. A. T. T., com o objectivo de contribuir para uma substancial redução dos direitos aduaneiros e eliminar outros obstáculos ao comércio internacional.
Importa, igualmente, referir que a realização de nova reunião ministerial da A. E. C. L., em Estocolmo, de 11 a 13 de Setembro último, permitiu analisar os resultados obtidos pelas medidas anteriormente adoptadas e reafirmar a decidida intenção de unificação do mercado europeu que orienta a actividade dos países da Associação.

10. Por seu turno, prosseguiu em 1963 a integração económica dos países do Mercado Comum, ao mesmo tempo que se alargava consideràvelmente a sua área de influência através da celebração de acordos e convenções de associação.
Assim, em 1 de Julho deste ano efectuou-se nova redução de 10 por cento dos direitos aduaneiros que incidem sobre as trocas no seio da Comunidade, o que elevou os níveis de desmobilização pautai dos países membros a 60 por cento para os produtos industriais e a 45 por cento para os produtos agrícolas não liberalizados.
Efectuou-se ainda, nesta data, a segunda aproximação à pauta aduaneira comum, o que representa um avanço de dois anos e meio em relação à data prevista no Tratado de Boma. À semelhança do que se verificou na anterior aproximação, e tendo presente as próximas negociações no quadro do G. A. T. T. em 1964, a Comunidade resolveu efectuar, com algumas reservas, um abaixamento linear de 20 por cento nos direitos da pauta exterior comum.
No final de Julho último foi assinada uma convenção de associação com um conjunto de dezoito países africanos, antigos territórios dependentes dos países membros, e na qual se incluem também determinados compromissos relativos a territórios ainda dependentes. Para além da reciprocidade de concessões aduaneiras e do compromisso de liberalização por parte da C. E. E., dentro de certos limites, das importações de alguns produtos (cacau, café, chá, etc.), esta Convenção contém cláusulas de muito interesse no que se refere à promoção do desenvolvimento económico e social daquele conjunto de países.
Assim, no domínio do auxílio financeiro, a Comunidade concederá créditos que, numa primeira fase, atingirão 581 milhões de dói aves e, posteriormente, 800 milhões de dólares. Deste montante, 70 milhões de dólares destinar-se-ão aos territórios ainda dependentes, beneficiando os Estados associados dos restantes 730 milhões de dólares, que serão concedidos nas seguintes condições:

Milhões
do dólares

Créditos não reembolsáveis pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento.................................. 620
Créditos em condições especiais pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento ................................. 46
Créditos em condições normais pelo Banco Europeu de Investimentos.................................... 64

Por outro lado, em 12 de Setembro último foi assinada a convenção de associação da Turquia à C. E. E., em que se prevê a gradual integração daquele país na Comunidade. Numa primeira fase, que em princípio deve durar de cinco a nove anos, a Comunidade concederá um regime preferencial a diversos produtos turcos (tabaco, uvas, figos, nozes, etc.) e o Banco Europeu de Investimentos concederá empréstimos, em condições muito favoráveis, no montante de 175 milhões de dólares, destinados ao plano quinquenal de desenvolvimento que a Turquia iniciou no corrente ano. Na segunda fase, em princípio de doze anos, efectivar-se-á o processo de integração económica da Turquia na Comunidade.
Finalmente, com o objectivo de progredir no sentido da adopção de uma política económica comum, os países da Comunidade têm procurado resolver conjuntamente os seus problemas fundamentais, nomeadamente no que se refere à política monetária e relações comerciais com o exterior - em especial em relação às transacções com os Estados Unidos da América.

11. A brusca suspensão das negociações para acessão do Reino Unido à C. E. E. veio interromper, pelo menos momentaneamente, o movimento de integração dos dois blocos económicos europeus.
Todavia, e como se tem insistentemente afirmado, a integração económica europeia continua a constituir uma das finalidades primordiais da política de alguns países da Europa Ocidental. E esta finalidade assume mesmo particular acuidade em relação àqueles países que, como a Áustria, mantêm estreitas relações económicas com a C. E. E. Deste modo, têm alguns países da A. E. C. L. vindo a efectuar, com o conhecimento dos outros Estados membros, contactos e conversações com vista à definição de fórmulas de entendimento e aproximação à Comunidade Económica Europeia.

Estados Unidos da América

12. A expansão da economia norte-americana processou-se, nos seis primeiros meses deste ano, a ritmo ligeiramente superior ao registado no decurso de 1962. Na verdade, no 1.º semestre de 1963, em relação ao semestre anterior, a taxa média anual de acréscimo do produto nacional bruto situou-se em cerca de 1,9 por cento.
O consumo privado, que representa cerca de 67 por cento do produto nacional bruto, acusou no período em análise acréscimo de 1,7 por cento - contra 2 por cento entre os dois semestres de 1962. Para a expansão registada na primeira metade de 1963 contribuiu principalmente o acréscimo verificado no consumo de alguns bens duradouros - em especial, automóveis e aparelhos domésticos - e serviços.

Página 2562

2562 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Por seu turno, as despesas de investimento dos particulares, que no final de 1962 evidenciaram contracção, parece terem retomado a tendência expansionista anteriormente verificada, conquanto a ritmo menos acelerado, uma vez que continua a verificar-se elevado grau de capacidade produtiva por utilizar: no final do 1.º semestre do ano em curso, a quota de utilização da capacidade produtiva situava-se em cerca de 85 por cento para o conjunto da indústria norte-americana.
Embora o comportamento da construção e do investimento em equipamento tenha constituído a principal determinante da evolução experimentada pelo investimento privado, importa referir o acréscimo evidenciado pelo ritmo de constituição dos stocts, que quase duplicou no decurso do 1.º semestre de 1963.
Igualmente, ainda que de reduzida importância para o comportamento do produto nacional, deve mencionar-se o incremento experimentado pelo resultado positivo das transacções externas em bens e serviços, acentuadamente superior ao verificado entre os dois semestres de 1962.
Assim, parece poder atribuir-se à expansão observada nas despesas do sector público, que representam cerca de 19 por cento do produto nacional bruto, importância decisiva na ligeira elevação do ritmo de crescimento da economia norte-americana no 1.º semestre. Na realidade, as despesas governamentais em bens e serviços registaram, em relação à segunda metade 1962, acréscimo de 2,6 por cento, ao passo que o incremento entre os dois semestres do último ano se tinha situado em 1,6 por cento.

13. Nos primeiros seis meses de 1963, o crescimento da produção industrial norte-americana processou-se, quando comparado com o observado no semestre precedente, a ritmo praticamente duplo do verificado entre os dois semestres do ano anterior - 3,1 e 1,6 por cento, respectivamente.
Assinale-se que esta aceleração da taxa de expansão da produção industrial se acentuou no decurso do período em estudo: o índice relativo ao 2." trimestre ultrapassou o correspondente aos três primeiros meses em cerca de 3 por cento.
Para este comportamento parece ter contribuído a maioria dos sectores industriais, devendo em especial destacar-se os acréscimos obtidos nas indústrias de automóveis - que se veio a reflectir na produção de aço -, de aparelhagem doméstica e de materiais de construção.
Por outro lado, de harmonia com os elementos disponíveis, parece terem-se alcançado resultados satisfatórios em 1963 na produção agrícola dos Estados Unidos. Aliás, a produção tende, a longo prazo, a aumentar mais rapidamente que o consumo, criando ao Governo um problema de difícil solução. Assim, no que se refere ao trigo, embora a produção no 1.º semestre de 1963 tenha sido inferior em cerca de 1 por cento à do ano transacto, os elevados atocha acumulados não parecem susceptíveis de baixar, a menos que se venham a concretizar as notícias recentemente divulgadas relativas à aquisição, em especial pela Rússia e China, de apreciáveis quantidades deste cereal. Por outro lado, o Governo dos Estados Unidos da América tem procurado encontrar mercados para os seus excedentes de trigo através, nomeadamente, dos programas de auxílio aos países do mundo ocidental.

14. Em consequência do ritmo acelerado a que, por motivos de natureza demográfica idênticos aos dos restantes participantes no último conflito mundial, se tem processado o crescimento da oferta de mão-de-obra, o número
de desempregados elevava-se a 6,4 por cento do total de mão-de-obra civil em Junho deste ano. Convém, todavia, notar que se verifica tendência nitidamente contraccionista do nível de desemprego, visto que a economia norte-americana se mostra, de um modo geral, perfeitamente capaz de absorver o elevado acréscimo de mão-de-obra recentemente observado.
Apesar de grande número dos acordos de trabalho, negociados no decurso deste ano, terem estabelecido acréscimo das vantagens de segurança social em substituição de aumentos de salários - como se verificou, nomeadamente, com os acordos dos trabalhadores das indústrias de aço e alumínio -, não se interrompeu a contínua expansão dos salários médios horários, iniciada em meados de 1962.
Assim, no 1.º semestre deste ano o salário médio horário da indústria transformadora ultrapassou em cerca de 2 por cento o correspondente à segunda metade de 1962. Uma vez que, em igual período, os preços no consumidor - como, aliás, os preços por grosso - se mantiveram praticamente estacionários, o referido acréscimo de salários representou efectiva melhoria do rendimento

real da população activa.

15. O déficit da balança de pagamentos norte-americana - valores anuais, ajustados em função das variações sazonais - atingiu no decurso do 1.º semestre deste ano 3200 milhões de dólares, o que representa acentuado agravamento em relação ao período homólogo do ano anterior. Importa, contudo, referir que este resultado foi sensivelmente minorado pela colocação de títulos da dívida pública susceptíveis de serem subscritos em moedas convertíveis.
Ainda, este comportamento da balança de pagamentos deve exclusivamente imputar-se à expansão das exportações de capital a longo prazo, que ultrapassou largamente a melhoria observada na balança de transacções correntes. Por seu turno, esta evolução da balança de capitais filia-se, em grande parte, no aumento da colocação de títulos de empresas estrangeiras no mercado norte-americano - em especial, canadianas e japonesas.
Em virtude dos resultados verificados na balança de pagamentos, as reservas de ouro acusaram nova contracção, situando-se em 30 de Junho deste ano em 15 638 milhões de dólares - contra 16 057 milhões de dólares no final de 1962.

16. Por outro lado, o saldo positivo da balança comercial na primeira metade do ano em curso acusou incremento de 3,5 por cento em relação a igual período do ano anterior. Esta melhoria deve-se ao acréscimo das exportações, ligeiramente superior ao das importações - 2,6 e 2,3 por cento, respectivamente.
O referido aumento nas importações foi, em parte, determinado pela elevação das aquisições de bens de consumo, tendo-se verificado expansão das importações de matérias industriais menos intensa que em anos anteriores.
Saliente-se, ainda, que a elevação das exportações foi acentuadamente prejudicada pela greve dos trabalhadores das docas, no 1.º trimestre deste ano.

17. O contínuo crescimento económico registado a partir do 2.º trimestre de 1961 constitui a expansão mais prolongada da economia norte-americana depois da Segunda Guerra Mundial.
Espera-se, contudo, que a expansão prossiga ainda em futuro próximo, para o que deve contribuir, em grande

Página 2563

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2563

parte, o efeito combinado de três determinantes fundamentais:

a) A elevação das despesas públicas, nomeadamente através das aquisições de equipamento militar e realização de obras públicas;
b) O aumento das despesas de investimento das empresas, uma vez que, num mercado altamente competitivo, as unidades de produção necessitam de constante adaptação às novas aquisições da técnica para manter a actualização dos custos;
c) O programa de redução de impostos, que deverá constituir apreciável incentivo ao consumo e ao investimento.

Para além da elevação da procura interna, parece- ainda possível prever-se que as exportações venham a constituir factor expansionista de importância crescente. Na verdade, dado o avanço técnico da indústria norte-americana e uma vez que os salários tendem a elevar-se menos acentuadamente que os dos restantes países industrializados, aumentará a possibilidade de colocação dos produtos norte-americanos nos mercados externos.
O incremento da actividade produtiva dos Estados Unidos será, como é natural, acompanhado por aumento de procura de mão-de-obra. Em face desta previsão, os poderes públicos daquele país vêm dedicando particular atenção à formação profissional.
Por outro lado, o crescimento das exportações tenderá a elevar significativamente o saldo positivo da balança comercial, o que, conjugado com as medidas já adoptadas para obstar à saída de capitais, permite prever sensível melhoria da balança de pagamentos.
Deste modo, parece lícito admitir que acelere a expansão da economia dos Estados Unidos na segunda metade deste ano e em 1964.

18. Em 1962, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas decidiu realizar, no decurso de 1964, uma conferência sobre comércio e desenvolvimento, em que estivessem presentes todos os países membros daquela Organização.
Assim, estão empenhadas na sua preparação, além do comité especialmente nomeado para o efeito, todas as comissões regionais do Conselho Económico e Social da Organização, que conta ainda com a colaboração de outros organismos internacionais ligados aos problemas do comércio mundial e desenvolvimento económico, como o Fundo Monetário Internacional, o G. A. T. T. e o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento.

e acordo com a agenda provisória, já elaborada, serão estudados nesta Conferência, entre outros, os principais problemas com que depara o comércio internacional em consequência dos diferentes estádios de desenvolvimento económico dos países nele intervenientes e os suscitados por determinados grupos específicos de produtos, com o objectivo de indicar as medidas mais adequadas à resolução de tais problemas, por forma a incentivar o comércio internacional e, através dele, o desenvolvimento das regiões económicamente menos evoluídas.

19. Finalmente, pela importância de que se reveste para as relações económicas do mundo livre, merece especial referência a resolução adoptada na reunião a nível ministerial do G. A. T. T., realizada em Genebra de 16 a 21 de Maio último, com o objectivo de efectivar importantes reduções nas barreiras aduaneiras dos países membros.
Com efeito, no decurso da referida reunião, foi apresentada pelos Estados Unidos da América uma proposta no sentido de uma liberalização significativa do comércio internacional. Com base nesta proposta, acordou-se na realização de negociações comerciais no próximo ano, baseadas no princípio da aplicação da cláusula da nação mais favorecida e no princípio da reciprocidade. De harmonia com a resolução adoptada, essas negociações reger-se-ão essencialmente pelos seguintes princípios:

a) Constituirão matéria de negociação não apenas os direitos aduaneiros, mas também outros tipos de obstáculos ao comércio entre as partes contratantes;
b) Abrangerão todas as categorias de bens:
c) Realizar-se-ão todos os esforços para reduzir os obstáculos que entravam as exportações dos países menos desenvolvidos, não devendo os mais desenvolvidos esperar benefícios, em termos de reciprocidade, por parte dos primeiros;
d) Deverão criar-se, no âmbito das negociações previstas, condições aceitáveis de acesso dos produtos agrícolas aos mercados mundiais;
e) Em princípio, basear-se-ão num plano de reduções pautais lineares substanciais.

Em conexão com este último princípio, deve referir-se que a sua adopção deriva, pelo menos em parte, dos limitados resultados obtidos nas negociações produto por produto nos últimos anos e, ainda, que as excepções às reduções pautais lineares deverão ser em número reduzido e objecto de confronto e justificação. Nos casos em que se verifique existirem disparidades sensíveis nos níveis de direitos aduaneiros, as reduções pautais efectuar-se-ão com base em regras especiais de aplicação automática e geral.
Ainda, no decurso da reunião em causa foi aprovada outra resolução pelas partes contratantes do G. A. T. T. da maior importância para a expansão do comércio dos países em vias de desenvolvimento. Com efeito, foram adoptadas diversas medidas que traduzem o reconhecimento da contribuição que os países altamente industrializados podem fornecer para o fomento da exportação dos países menos desenvolvidos - e, consequentemente, para a expansão das respectivas economias -através da eliminação ou redução significativa dos direitos aduaneiros e outros obstáculos à importação e ao consumo dos respectivos produtos.

II

Economia nacional

A) Metrópole

20. O crescimento médio do produto nacional bruto no quinquénio 1958-1962 processou-se à taxa anual de 5,3 por cento. Saliente-se contudo que as taxas mais elevadas foram alcançadas em 1960 e 1961 - 8,9 e 6,1, respectivamente. De harmonia com os valores provisórios disponíveis, o incremento obtido no último ano situou-se, no entanto, a nível ligeiramente inferior àquele valor médio.

sta expansão do produto nacional, que se tornou possível sem que tivesse sido afectada a estabilidade financeira interna e a solvabilidade externa do escudo, foi acompanhada por um aumento do nível de rendimento real da população activa.
A avaliar pela evolução dos indicadores disponíveis, parece possível prever que o crescimento do produto nacional

Página 2564

2564 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

no ano em curso se não afaste sensivelmente da média dos últimos cinco anos, sem que sofra solução de continuidade a tendência expansionista dos rendimentos individuais.

Formação do produto nacional bruto

21. Para a expansão do produto nacional bruto no último quinquénio contribuiu fundamentalmente o produto formado nos sectores de «Indústria» e de «Energia eléctrica e serviços», que experimentaram taxas médias de crescimento de 6,1 e 7 por cento, respectivamente. Na verdade, o sector de «Agricultura, silvicultura, pecuária e pesca», que tem apresentado evolução muito irregular, registou no período considerado acréscimo médio apenas de 2,4 por cento.
Importa ainda referir que o comportamento do produto nacional bruto tem sido praticamente determinado pela expansão do produto interno, uma vez que as variações dos rendimentos líquidos provenientes do estrangeiro exerceram influência muito reduzida.
De igual modo, a evolução esperada para o produto nacional bruto em 1963 dependerá essencialmente do comportamento dos sectores industriais e dos serviços. Por isso, interessará analisar, seguidamente, com maior pormenor a evolução recente dos diversos sectores da produção.

Agricultura, silvicultura, pecuária e pesca

22. A expansão do produto originado no sector «Agricultura, silvicultura, pecuária e pesca» processou-se nos últimos cinco anos, ainda que de forma nitidamente irregular, a taxa média anual de 2,4 por cento, situando-se a respectiva participação no produto nacional bruto em cerca de 25,5 por cento.
Para este comportamento contribuiu não só a irregularidade das condições climáticas, de influência preponderante na produção agrícola, mas também um conjunto de factores que, não obstante a acção desenvolvida pelo Governo - nomeadamente, através dos planos de fomento -, continuam a afectar decisivamente os resultados da actividade no sector primário. De entre estes importa destacar, por um lado, o reduzido volume de investimentos e de mão-de-obra qualificada e, por outro, a inadequação da estrutura da propriedade e do sistema de culturas tradicional à necessidade de um mais completo aproveitamento dos recursos naturais do País, implícita num processo de desenvolvimento económico acelerado.
Em consequência da sua participação no valor acrescentado pelo sector primário - cerca de 80 por cento -, teve influência determinante na evolução deste valor a produção agro-pecuária, que se expandiu a taxa praticamente idêntica à observada para o conjunto do sector.
Por seu turno, o crescimento da produção silvícola, de importância relevante no total das exportações, processou-se à taxa média de cerca de 2 por cento no decurso do quinquénio anterior.
Finalmente, o acréscimo do produto originado na pesca foi, em média, de 3,1 por cento no período considerado, situando-se a sua participação no valor acrescentado pela «Agricultura, silvicultura, pecuária e pesca» em cerca de 5 por cento.

23. A produção agro-pecuária registou, em 1962, comportamento favorável, em consequência das condições climáticas propícias que influenciaram a produção agrícola e ainda, embora em menor escala, da expansão verificada na produção pecuária.
De acordo com as estimativas actualmente disponíveis para 1963, parece lícito admitir ligeira diminuição do valor global do produto formado no sector da agriculturas pecuária, à semelhança, aliás, como anteriormente se referiu, do comportamento observado neste sector na generalidade dos países da Europa Ocidental. De facto, a produção agrícola foi afectada, nos primeiros meses do ano, por condições climáticas desfavoráveis, que se reflectiram principalmente na colheita de cereais, com excepção do centeio, e na produção de vinho. Em especial, no que se refere a este último, prevê-se produção inferior em 23 por cento à do ano transacto.
Por seu turno, espera-se que a produção de azeite ultrapasse largamente a do ano anterior, que foi de contraste. Deve, ainda, referir-se que se estima apreciável acréscimo da produção de batata.
Quanto à pecuária, julga-se possível prever ligeiro de créscimo da respectiva produção. Efectivamente, a quantidade de gado abatido no continente foi de 53 7001 no 1.º semestre do ano em curso, o que representa quebra de cerca de 3 por cento em relação a igual período de 1962.
Ainda, a avaliar pelos elementos de que se dispõe presentemente, não deve verificar-se variação significativa da produção de lã. Prevê-se, no entanto, apreciável incremento da produção de peles de ovinos, em virtude da expansão da actividade na indústria de curtumes.

24. No ano em curso prevê-se que a produção silvícola se situe a nível sensivelmente superior ao alcançado em 1962. De facto, segundo os elementos fornecidos pelo Instituto Nacional de Estatística, a produção corticeira deverá atingir este ano cerca de 204 000 t, o que traduz acréscimo de cerca de 35 por cento em relação ao ano anterior.
Por outro lado, segundo estimativa da mesma fonte, prevê-se que em 1963 a produção de resinosos, estimulada pela procura externa, que se tem revelado mais activa recentemente, se eleve de 20 por cento.

25. No 1.º semestre deste ano o volume de pesca desembarcada no continente sofreu considerável contracção atingindo sómente cerca de 78 620 t, o que corresponde a um decréscimo de 16,2 por cento quando comparado com o registado no período homólogo do ano anterior, exclusivamente determinado pelos resultados da actividade piscatória nas zonas centro e sul.

26. Tem constituído preocupação constante dos Poderes Públicos a resolução dos importantes problemas que afectam a agricultura portuguesa.
Assim, o Governo tem procurado obviar à escassez de investimentos nesse sector através, nomeadamente, de empreendimentos abrangidos no I e II Planos de Fomento, a que se fará referência mais desenvolvida ao analisar a sua execução. Pela importância de que se reveste, deve desde já mencionar-se o elevado montante de investimentos a efectuar com o Plano de irrigação do Alentejo. De harmonia com este plano, iniciou-se em 1963 a obra de irrigação dos campos do Mira, do Boxo e do Caia, tendo já sido adjudicados empreendimentos no montante de 400 000 contos, a despender de 1963 a 1966 (Decretos-Lei n.º 44 910, 44 986, 45 128, 45 135, 45 195 e 45 196, de 7 de Março, 19 de Abril, 11 de Julho, 13 de Julho e 16 de Agosto últimos). No ano corrente prevê-se que desse total sejam despendidos mais de 200 000 contos.
Com o objectivo de solucionar os problemas da estrutura da propriedade agrícola, a que anteriormente se fez referência, sobretudo no Norte do País, foi aprovada, no úl-

Página 2565

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2065

timo ano, a Lei de Emparcelamento da Propriedade Rústica, encontrando-se actualmente em curso os primeiros trabalhos em várias freguesias do concelho de Ponte de Lima. Atendendo que o início da execução do Plano de rega do Alentejo implicava a revisão do regime jurídico da colonização interna, foi publicado no ano precedente o Decreto-Lei n.º 44 720, de 23 de Novembro, em que se fixa como um dos objectivos da colonização interna a correcção dos defeitos da estrutura agrária, pondo à disposição da Junta de Colonização Interna os meios técnicos e jurídicos adequados.
Constitui ainda preocupação do Governo a criação de empresas agrícolas de carácter familiar bem dimensionadas e económicamente viáveis. Para alcançar este objectivo, prevê-se no diploma acima referido um sistema de ampla colaboração entre os proprietários e a administração pública. Fica, por outro lado, salvaguardado o direito de propriedade, uma vez que a expropriação só terá lugar quando os possuidores da terra não queiram adoptar o comportamento previsto na lei conducente à reorganização agrária.
Tem-se, por seu turno, procurado desenvolver a formação profissional dos trabalhadores agrícolas. Neste sentido foram aprovados no ano corrente programas de instrução profissional a observar nos cursos complementares de aprendizagem agrícola - Portaria n.º 19 892, de 12 de Junho.
Ainda, foi promulgado este ano novo regime cerealífero e do pão - Decreto-Lei n.º 45 223, de 2 de Setembro último -, cuja orientação se integra na política de reconversão agrária que se torna necessário prosseguir em vastas áreas sujeitas à exploração agrícola. Este regime veio fixar um preço ligeiramente mais elevado para o centeio e estabelecer, de acordo com as pretensões expressas pelos produtores de trigo, a eliminação gradual num período de quatro anos dos empréstimos à cultura deste cereal.
Por outro lado, com o objectivo de diminuir os encargos dos agricultores, que resultam das moratórias em vigor, o Governo substituirá temporariamente os lavradores em dívida para com a Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, despendendo assim cerca de 230 000 contos em dois anos, verba que dará lugar a um empréstimo sem juro, com um período de diferimento do reembolso de três anos. Este diploma cria ainda um fundo de apoio à agricultura, que se destina à intensificação da reconversão cultural, para o qual serão canalizadas as quantias libertadas em virtude das reduções de financiamento à cultura do trigo e as provenientes da amortização daquele empréstimo.
Desta forma, prossegue o Governo a sua política de firme apoio financeiro aos problemas da agricultura, tomando compromissos que podem atingir 630 000 contos de crédito adicional à lavoura, além do crédito agrícola normal, ultimamente situado em cerca de 1 milhão de contos.

27. No âmbito do revestimento florestal do País interessa, em especial, referir a publicação no ano em curso de alguns diplomas legais que submetem a regime florestal parcial obrigatório novos terrenos, nomeadamente o Decreto-Lei n.º 44 930, de 21 de Março, que sujeita a este regime vasta área de 13 880 ha no concelho de Odemira.

28. Com o intuito de incrementar a produção pecuária, foi criado, pelo Decreto-Lei n.º 44 419, de 26 de Junho de 1962, o Serviço de Campanha de Fomento Pecuário. Este Serviço destina-se a promover o aumento da produção e a melhoria da qualidade dos produtos; a sua acção desenvolver-se-á pela concessão de empréstimos e subsídios à lavoura é ainda através de trabalhos custeados pelo seu orçamento privativo.

29. Quanto à actividade piscatória, tem o Governo desenvolvido larga acção na expansão da frota pesqueira nacional - nomeadamente no que respeita ao número de unidades, sua modernização c aumento de tonelagem. Em 5 de Abril deste ano foi publicado o Decreto n.º 44 960, que autoriza a Direcção-Geral da Fazenda Pública a emitir, pelo Fundo de Renovação da Marinha Mercante, a obrigação geral representativa da 5.a série do empréstimo de renovação da marinha mercante (II Plano de Fomento), na importância de 85 000 contos.

30. Tendo presente os elementos que anteriormente se alinharam, parece de prever para o ano em curso ligeira diminuição do valor global da produção do sector constituído pela agricultura, silvicultura, pecuária e pesca.
Todavia, a longo prazo, as perspectivas parecem mais favoráveis. Efectivamente, o Plano de irrigação do Alentejo abrirá nova fase na produção agrícola e pecuária. A execução dessa obra possibilitará não só substancial aumento das produções agrícolas existentes, mas também a introdução de culturas de maior rentabilidade. Quanto à produção pecuária, as perspectivas revelam-se também favoráveis, uma vez que as obras de irrigação em curso devem permitir sensível expansão da cultura de forragens. Por outro lado, a colocação no mercado interno dos produtos pecuários parece não oferecer dificuldades, uma vez que se torna necessário recorrer normalmente à importação de carne para o abastecimento público.
Julga-se também possível prever incremento apreciável da produção silvícola, estimulada, quer pela criação de novas indústrias e expansão das existentes - nomeadamente da celulose -, quer pela exportação. E neste sentido tem-se desempenhado acção relevante, nomeadamente através do II Plano de Fomento.
Não obstante a quebra prevista para o corrente ano na produção da pesca, parece legítimo admitir, em futuro próximo, crescimento apreciável da actividade piscatória, em consequência dos resultados favoráveis que necessariamente terão de derivar da renovação da frota pesqueira actualmente em curso.
Envestem-se de especial importância, entre nós, as medidas destinadas a aumentar a produtividade e a produção das actividades primárias - suportes básicos do desenvolvimento económico nos países de industrialização recente - como é o caso de Portugal.
Tais objectivos exigirão acção diversificada, cujos resultados só a longo prazo podem ser completamente conhecidos. Todavia, uma das tarefas a que se terá de conceder prioridade consiste na cabal execução do Plano de irrigação do Alentejo, que abrirá novas perspectivas à actividade agro-pecuária nacional, como anteriormente se referiu.
Por outro lado, tendo em atenção as possibilidades silvícolas do País e a importância dos produtos da silvicultura na nossa exportação, importa prosseguir activamente no revestimento florestal do nosso território.

Indústria

31. No decurso do quinquénio precedente, a produção industrial, que representa cerca de 38 por cento do produto nacional bruto, experimentou acréscimo à taxa média anual de 6 por cento. Nesta evolução desempenhou papel determinante a expansão registada nas indústrias transformadoras - em especial nos sectores da «Metalurgia, indústrias mecânicas e eléctricas» e «Diversas transfor-

Página 2566

2566 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

madoras» - e na construção, a que deve imputar-se a quase totalidade do valor acrescentado pelo sector no período considerado. Foi, portanto, diminuta a importância das indústrias extractivas, cuja produção experimentou, aliás, contracção.
Todavia, deve assinalar-se que este crescimento a ritmo acelerado da actividade produtiva no sector secundário, fruto de uma firme e consciente política de industrialização, se não processou uniformemente no período em referência. Com efeito, o índice da produção, que em 1958 e 1959 aumentou, grosso modo, a taxa idêntica à observada na primeira metade da última década, cresceu a taxa sensivelmente superior nos dois anos seguintes - cerca de 10 por cento-, para se atenuar nitidamente , a respectiva expansão em 1962, em que se verificou acréscimo de 3,2 por cento.
Esta quebra do ritmo de aumento da actividade industrial, no último ano, deve-se não só ao jogo de elementos inerentes ao próprio processo de crescimento, mas também a factores de natureza conjuntural.
Relativamente aos primeiros, e excluindo os resultantes de possíveis desequilíbrios na expansão global da economia nacional, deve referir-se a existência de numerosas empresas de dimensão reduzida e equipamento insuficiente conjuntamente com indústrias novas ou modernizadas de dimensão adequada e dotadas de equipamento eficiente.
No que se refere aos factores de natureza conjuntural que se julga terem desempenhado papel preponderante na contracção do ritmo de crescimento do produto originado na indústria em 1962, deve apontar-se, por um lado, a dificuldade em encontrar novas modalidades industriais e, por outro, a tensão observada no mercado monetário e financeiro - resultante porventura de relativa quebra de confiança que se produziu internamente, e à semelhança do que se vem observando internacionalmente, e, ainda, da incerteza da nossa posição perante a integração económica europeia-, que introduziu novo elemento de hesitação e risco no investimento privado, se bem que determinasse a realização de empreendimentos em melhores condições de produtividade, aptos a enfrentar uma concorrência internacional crescente.
No processo de industrialização em curso no nosso país, tem o Governo desempenhado papel preponderante, quer directamente, através do financiamento de numerosos empreendimentos - nomeadamente através dos Planos de Fomento -, quer indirectamente, actuando como elemento orientador da expansão da actividade produtiva.
Quanto a este último aspecto, merecem especial referência, pela sua importância, as medidas adoptadas no âmbito da política fiscal e de crédito. De entre estas podem referir-se, a título exemplificativo, a concessão de isenção e dedução dos rendimentos sujeitos a contribuição industrial a determinadas indústrias, isenção do imposto de sisa ou redução da respectiva taxa em numerosos casos, isenção de direitos aduaneiros na importação de matérias-primas e equipamentos, instituição de regimes de drau baque e ainda o aval do Estado nos empréstimos contraídos por empresas nacionais no estrangeiro, a que st fará referência mais desenvolvida noutra passagem do presente relatório.

32. No 2.º trimestre de 1963 parece ter-se iniciado sensível recuperação da actividade industrial, após a evolução desfavorável observada nos primeiros três meses do ano. Esta inversão de comportamento deve-se exclusivamente à melhoria evidenciada pela indústria transformadora, embora se tenha atenuado a tendência contraccionista da produção das indústrias extractivas registada no 1.º trimestre, a reflectir, aliás, a crise que afecta, desde há anos, este sector de actividade.
A referida melhoria da indústria transformadora, que se traduziu por acréscimo, no 2.º trimestre, de 5,7 por cento da média dos respectivos índices corrigidos das variações sazonais, em relação ao observado nos três meses precedentes, abrangeu a generalidade das indústrias englobadas no sector, com excepção das indústrias da «Madeira, cortiça e mobiliário» e das «Químicas e dos petróleos».

33. Contudo, deve notar-se que, para o conjunto dos primeiros seis meses deste ano, o crescimento da produção da indústria transformadora foi moderado: a média dos índices mensais acusa expansão de apenas 0,8 por cento, em comparação com o período homólogo de 1962.
Esta quebra do ritmo de expansão foi motivada, fundamentalmente, pela diminuição de 6,7 por cento na produção do sector «Metalúrgicas, metalomecânicas c material eléctrico», a que se aliou a contracção verificada na «Indústria de alimentação e bebidas» e «Diversas transformadoras».
A evolução das «Metalúrgicas, metalomecânicas e material eléctrico» deve-se à redução operada na produção das várias indústrias englobadas no sector, com excepção da de «Cabos e condutores eléctricos» - que experimentou acréscimo de 8,5 por cento.
Na ligeira contracção verificada no grupo de «Alimentação e bebidas» desempenhou papel decisivo a diminuição da produção de conservas de peixe - 36,2 por cento -resultante da escassez de algumas espécies piscatórias, ainda que parcialmente compensada pelos aumentos verificados noutras indústrias alimentares, principalmente na de «Massas alimentícias», que beneficiou de medidas promulgadas pelo Governo em 1962.
Quanto às restantes indústrias transformadoras, o decréscimo mais acentuado registou-se na produção de pneus e câmaras-de-ar, em resultado essencialmente da concorrência de artigos estrangeiros similares.
Em contrapartida, a produção das «Indústrias químicas e dos petróleos» e dos «Produtos minerais não metálicos» experimentou expansão de 8,2 e 10,9 por cento, respectivamente. O incremento do primeiro grupo de indústrias foi determinado pelos acréscimos na produção de ácido sulfúrico, sulfato de amónio e superfosfatos. Contudo, nas outras indústrias do sector - nomeadamente na de resinosos e de tintas e vernizes - registou-se diminuição da respectiva produção.
Por seu turno, para a evolução observada no sector dos «Produtos minerais não metálicos» influiu decisivamente o crescimento da produção de artigos de vidro, porcelanas e faianças.
A estagnação do sector «Madeira, cortiça e mobiliário» resultou, em grande parte, da compensação entre a diminuição da produção de contraplacados correntes e o aumento da produção de rolhas, aglomerados de composição e granulados.
Por outro lado, e como se referiu anteriormente, a crise com que se debate a indústria extractiva parece ter persistido no ano corrente. Efectivamente, no 1.º semestre de 1963, o valor médio dos respectivos índices corrigidos foi inferior em 16,7 por cento ao verificado em igual período do ano anterior.
Quanto à construção, no período em referência, diminuiu o número de edifícios construídos e de pavimentos de, respectivamente, 10 e 5 por cento, o que parece traduzir tendência para a construção de edifícios com maior número de andares.

Página 2567

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2567

34. Tem constituído preocupação constante do Governo a resolução dos problemas de que enferma a nossa actividade industrial.
De facto, apesar da criação de modernas unidades industriais, subsistem ainda, como anteriormente se assinalou, numerosas empresas de exígua dimensão e inadequadamente equipadas, deficiência a que se tem procurado obviar promovendo o estudo da reorganização industrial. Nesse sentido foram nomeadas, de acordo com a Lei n.º 2005, comissões reorganizadoras para várias actividades industriais, tendo a maior parte delas apresentado os relatórios respectivos, com base nos quais foi já elaborado um plano de reorganização da indústria das cutelarias e um plano inicial para a indústria do vidro.
Em 1963, e com idêntico objectivo, foi criada uma comissão reorganizadora para a indústria de moagem de ramas e comissões de estudo para a cortiça e conservas de peixe.
Por outro lado, tem o Estado desenvolvido acção preponderante no campo das infra-estruturas, nomeadamente no sector da energia eléctrica e dos transportes. Encontram-se presentemente em execução alguns aproveitamentos hidroeléctricos e iniciou-se a construção da ponte sobre o Tejo, empreendimento de importância decisiva para a resolução de alguns problemas de desenvolvimento regional.
Igualmente com o objectivo de remediar a carência de mão-de-obra especializada - factor básico de crescimento industrial - têm sido criadas nos últimos anos numerosas escolas técnico-pronssionais.
Por outro lado, tendo em vista o aumento de eficiência no sector mineiro, foi inaugurado no decurso do ano um importante laboratório no Norte do País.
Ainda, no âmbito da política económica adoptada, merecem especial referência os cuidados postos na preparação do novo programa de desenvolvimento, um plano intercalar que cobrirá o triénio de 1965-1967, não só pela reestruturação dos organismos encarregados dos trabalhos preparatórios, mas também pelo recurso à assistência técnica de organizações internacionais que se espera vir a beneficiar. Por outro lado, as possibilidades abertas à indústria pelo alargamento do mercado, decorrente da unificação do espaço económico português e da participação de Portugal no processo de integração económica europeia, virão certamente proporcionar à actividade económica nacional novas e amplas perspectivas de progresso.

35. Dado o comportamento da actividade industrial nos primeiros seis meses do ano e o aparecimento de alguns sintomas favoráveis sobre as expectativas dos industriais quanto à realização de investimentos, parece de admitir que prossiga em 1963 o crescimento da respectiva produção.
A longo prazo, e tendo presentes as medidas adoptadas de forma sistemática pelo Governo em diferentes sectores e a que já anteriormente se fez referência, julga-se legítimo prever que se acelere sensivelmente a expansão industrial. Torna-se, porém, necessário, em face do esforço de defesa que o País vem realizando, e que não se espera diminua num futuro próximo, que se vá operando adequada conversão da nossa actividade produtiva por forma que o interêssse económico desse mesmo esforço se projecte, tanto quanto possível, na formação interna de rendimentos e não se traduza, para além do estritamente indispensável, no escoamento de divisas para o exterior.
Tendo sido enfrentados com êxito, como foram, os acontecimentos que nos atingiram em Março de 1961, importa que se operem com brevidade os indispensáveis ajustamentos que nos permitam prosseguir, sem quebra de ritmo, mas certamente com sacrifícios adicionais, o duplo esforço de defesa do património nacional e de melhoria do bem-estar presente e futuro da sua população.

Energia eléctrica e serviços

36. O produto originado no sector «Energia eléctrica e serviços» experimentou no decurso dos últimos anos expansão apreciável. Com efeito, a taxa média anual de crescimento no quinquénio precedente foi de 7 por cento, embora no ano transacto se tenha registado sensível abrandamento em relação aos anos anteriores.
A participação deste sector no produto nacional bruto sofreu, neste período, sensível variação, passando de cerca de 35 por cento em 1958 para mais de 37 por cento nos dois últimos anos.
Para o comportamento observado contribuiu, principalmente, o crescimento de cerca de 13 por cento do produto originado nos serviços incluídos na «Administração pública e defesa» e nos «Serviços de saúde e ensino», cujo produto no conjunto representou em média cerca de 24 por cento do valor acrescentado pelo sector.
Por sua vez, o comércio por grosso e a retalho, a que coube a maior contribuição para o produto formado no sector terciário - cerca de 21 por cento -, acusou no mesmo período crescimento à taxa média anual de 4,7 por cento.
Saliente-se, por outro lado, que o valor acrescentado pelos transportes e comunicações, cuja participação média no produto global do sector foi de 15 por cento, se expandiu nos dois últimos anos a ritmo mais lento do que nos anos anteriores, em consequência, principalmente, do comportamento dos transportes marítimos e fluviais. De facto, o produto proveniente deste sector registou ligeira contracção em 1961 e aumentou no último ano a taxa, sensivelmente mais baixa do que no triénio de 1958-1960.
Aliás, para o desenvolvimento dos transportes e comunicações tem contribuído decisivamente a acção empreendida pelo Governo, no âmbito da execução dos planos de fomento. Na verdade, entre 1953 e 1958 despenderam-se avultadas somas na beneficiação dos portos nacionais, na modernização da marinha mercante, na actualização dos sistemas de exploração dos caminhos de ferro e, de um modo geral, no desenvolvimento das comunicações e da aviação civil. Por seu turno, o II Plano de Fomento destinou igualmente importantes verbas para investimentos neste sector, tendo-se já despendido nos quatro primeiros anos de execução do plano cerca de 3 700 000 contos.
O Governo tem, por outro lado, dedicado especial atenção ao- aproveitamento dos recursos hidroeléctricos do País, principalmente a partir do início da execução do I Plano de Fomento, no âmbito do qual foram investidos no sector da electricidade mais de 3 300 000 contos. E, através do II Plano de Fomento, prosseguiu nos últimos anos a política de electrificação do País, tendo-se despendido no quadriénio 1959-1962 cerca de 3 060 000 contos. E foi este mesmo sector que veio a beneficiar dos dois primeiros empréstimos do Banco Mundial a Portugal, tendo o Governo, nos termos do acordo relativo ao Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento, garantido a amortização e juros das importâncias mutuadas a empresas privadas ligadas à produção de electricidade.
Paralelamente, o produto formado no sector da «Electricidade, gás e água» registou nítido incremento no

Página 2568

2568 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

quinquénio precedente: a taxa média anual foi de 11,6 por cento, embora se tenha observado sensível abrandamento no ano findo.
Por último, a avaliar pelos escassos elementos de que se dispõe sobre a actividade turística, o seu comportamento nos últimos anos teria desempenhado importante papel na expansão do produto formado no sector terciário. Na verdade, a entrada de turistas estrangeiros cresceu à taxa média anual de 10,4 por cento de 1958 a 1962, embora o seu comportamento tenha sido algo irregular.

37. Tanto quanto pode concluir-se dos indicadores disponíveis, o produto formado nos diferentes sectores englobados na «Energia eléctrica e serviços», durante o 1.º semestre de 1963, parece ter experimentado evolução nitidamente favorável.
De facto, a actividade comercial ter-se-ia desenvolvido de modo apreciável, a julgar pela expansão do valor global dos efeitos liquidados em câmaras de compensação e dos efeitos descontados, em relação ao 1.º semestre do ano anterior - 15 e 7 por cento, respectivamente.
De igual modo, as actividades transportadoras teriam acusado sensível melhoria no período em estudo, nomeadamente a navegação aérea e marítima.
De facto, quanto aos transportes aéreos, o número de passageiros-quilómetro e o de toneladas-quilómetro de mercadorias e correio registaram acréscimos, em relação ao período homólogo do ano anterior, de 26 e 12 por cento, respectivamente. No que se refere aos transportes marítimos, o total dos navios entrados em portos da metrópole, no mesmo período, aumentou de 9 por cento, para o que concorreu decisivamente a elevação de 10,5 por cento do número de navios nacionais entrados.
Por outro lado, os transportes terrestres teriam tido também comportamento favorável, embora menos nítido que os restantes sectores dos transportes. Assim, o número de passageiros-quilómetro transportados aumentou de 6 por cento no caminho de ferro e de menos de 2 por cento na camionagem. Assinale-se, todavia, que o número de toneladas-quilómetro de mercadorias transportadas por via férrea e as receitas líquidas dos transportes ferroviários cresceram cerca de 11 e 4 por cento, respectivamente.
Por seu turno, a produção de energia eléctrica aumentou consideràvelmente no período em referência, atingindo 2572 milhões de killowatts-hora, contra 1959 milhões no 1.º semestre de "1962 - mais 31 por cento. Aliás, esta evolução explica-se pelo irregular regime hidrológico verificado em 1962, em que houve períodos extremamente secos, que afectaram sensivelmente a produção de energia hídrica.
Por último, e a avaliar pelos elementos neste momento disponíveis, o turismo evoluiu muito favoravelmente no 1.º semestre de 1963. Com efeito, entraram no País cerca de 216 000 turistas estrangeiros, o que traduz acréscimo de 43 por cento em relação a igual período do ano transacto,- observando-se igualmente aumento de 39 por cento no número de dormidas em hotéis e pensões.

38. A acção do Governo no desenvolvimento de algumas principais actividades englobadas no sector «Energia eléctrica e serviços» prosseguiu no decurso da primeira parte deste ano - nomeadamente no que se refere à produção de energia hidroeléctrica e à modernização dos meios e vias de transporte.
Efectivamente, de Janeiro a Junho, o montante dos financiamentos realizados ao abrigo do II Plano de Fomento no sector de «Electricidade» atingiu 92 000 contos. Por outro lado, encontram-se em execução novos aproveitamentos hidroeléctricos, nomeadamente os de Távora, da Bemposta e do Alto Babagão. Saliente-se ainda a recente assinatura em Washington de dois contratos, referentes aos primeiros empréstimos do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento a empresas privadas portuguesas, destinados ao financiamento de projectos a executar no sector da «Electricidade», que se prevê venham a atingir cerca de 25 milhões de dólares.
Por seu turno, o montante dos financiamentos efectuados durante o período considerado no sector dos «Transportes e comunicações» e incluídos no II Plano de Fomento foi da ordem dos 444 000 contos. Além da modernização e construção de novas vias, merecem especial referência alguns empreendimentos -como os aeroportos de Faro e. do Funchal e a ponte sobre o Tejo, em Lisboa- cuja construção prossegue a ritmo acelerado. Tem ainda o Governo dedicado especial atenção ao desenvolvimento do turismo, incentivando, nomeadamente, a construção de hotéis e criando as infra-estruturas necessárias.

39. Embora os elementos anteriormente apresentados se refiram apenas a algumas das actividades englobadas no sector «Energia eléctrica e serviços», parece possível prever, para o conjunto do ano, expansão no produto originado neste sector a ritmo superior ao verificado em 1962. A longo prazo, admite-se que o turismo poderá vir a desempenhar importante papel na evolução da economia nacional.
Constituindo o turismo um potencial em parte inexplorado, tem o Governo procurado por vários meios planificar e desenvolver todas as actividades com ele relacionadas. Torna-se, no entanto, necessária, por um lado, a colaboração do sector privado na planificação turística e, por outro, o desenvolvimento das zonas que possam proporcionar maior rendimento a curto prazo. Aliás, espera-se que este sector venha a beneficiar em larga medida da cooperação económica com alguns países europeus.
No que se refere à energia eléctrica, a industrialização e, de um modo geral, o desenvolvimento económico do País continuarão a exigir considerável expansão da produção. Todavia, prevê-se que dentro de cerca de sete anos ficará esgotada a capacidade de produção de energia hídrica, tornando-se, por conseguinte, necessário o recurso a outras fontes de energia para satisfazer o aumento de consumo, problema a que o Governo, aliás, tem dedicado especial atenção.
Por outro lado, há que estruturar em novos moldes a actividade comercial, o que constitui um dos problemas básicos do crescimento económico do País.

Aplicação do produto nacional bruto

40. Com excepção do ano de 1962, a expansão observada no produto nacional bruto nos últimos anos foi fundamentalmente determinada pela evolução da procura interna, uma vez que as variações do saldo negativo das relações com o exterior não influíram de forma decisiva no comportamento daquele valor global.
Assinale-se mesmo que, apesar de o resultado das relações externas ter evoluído em 1961 de forma desfavorável, o acréscimo de 10 por cento observado na procura interna permitiu um incremento do produto nacional bruto da ordem dos 6,6 por cento. A evolução de 1962 foi, contudo, completamente inversa da anteriormente registada. Na verdade, a procura interna acusou ligeira variação negativa - cerca de 1 por cento. Assim, a elevação de 4,9 por cento observada no produto nacional bruto ficou a dever-se exclusivamente à redução

Página 2569

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2569

de cerca de 60 por cento do saldo negativo do movimento com o exterior.
Todavia, como seguidamente se analisará mais pormenorizadamente, espera-se que as diversas componentes da procura interna evoluam, em 1963, de forma mais favorável que no ano anterior. E, uma vez que não se prevê variação sensível do saldo do movimento com o exterior, parece lícito esperar que o produto nacional bruto apresente no ano em curso taxa de crescimento superior à registada em 1962.

Consumo

41. No triénio de 1958-1960 as despesas de consumo absorveram em média cerca de 90 por cento do produto nacional bruto. O consumo privado, representando 78 por cento do mesmo valor global, exerceu influência preponderante na evolução da procura interna, embora as suas taxas de crescimento se situassem, em média, a nível inferior às do consumo público - 3,9 por cento contra 7,2 por cento. Para o ritmo de acréscimo do consumo público contribuiu em grande parte a evolução das despesas militares,- que, no triénio considerado, experimentaram incremento médio superior a 9 por cento.
Aliás, em face das imperiosas necessidades de defesa surgidas no decurso de 1961, o papel desempenhado pelas despesas de carácter militar no comportamento do consumo público acentuou-se extraordinariamente. Na verdade, o acréscimo de 72 por cento das despesas militares determinou uma expansão de 31,6 por cento nas despesas de consumo do sector público.
Todavia, em 1961, a participação do consumo global no produto nacional bruto não se afastou significativamente da anteriormente registada, uma vez que diminuiu ligeiramente a preponderância do consumo privado (75 por cento do total), embora tenha experimentado expansão de 4,6 por cento.
O comportamento das despesas de consumo em 1962 afastou-se acentuadamente, porém, da evolução anteriormente indicada. De facto, o consumo privado acusou uma contracção de 3,2 por cento, o que implicou uma redução da sua participação no produto nacional bruto para 69 por cento. Assim, apesar de o consumo público ter registado acréscimo de 7,2 por cento, o consumo global experimentou uma redução de cerca de 1,5 por cento.

42. Embora as estimativas disponíveis para o ano em curso se refiram apenas às despesas de consumo do sector público - estimativas que traduzem estacionariedade em relação ao ano anterior -, parece possível prever, através da forma como tem decorrido o abastecimento do mercado em bens alimentares, que o consumo privado venha a registar sensível melhoria no decurso de 1963.

a verdade, apesar da expansão da produção agrícola em 1962 - ainda que parcialmente compensada pela quebra, no ano em curso, de algumas das mais importantes produções -, as vultosas importações de diversos bens alimentares que se tornou necessário efectuar, no decurso de 1963, parece traduzirem nítida elevação do consumo privado. Esta evolução é particularmente saliente no que se refere ao trigo, centeio, milho, arroz, batata, óleo, carnes, bacalhau e açúcar. Saliente-se mesmo que, quando o recurso à importação teve de ser reduzido ou diferido por algum tempo, se produziram sensíveis tensões nos mercados dos produtos em causa - nomeadamente nos da batata, azeite e bacalhau.
Conjugando a tendência crescente do consumo privado com os resultados esperados na produção agrícola em futuro próximo, parece de prever acréscimos nas importações de trigo, milho, carne, bacalhau e açúcar. Por outro lado, estima-se que os aumentos da produção de centeio, batata e azeite permitirão fazer face à evolução do respectivo consumo.

Investimento

43. No processo de desenvolvimento económico nacional, a formação de capital desempenha, como variável estratégica, papel da mais relevante importância. Na verdade, tendo em atenção as disponibilidades de mão-de-obra do País e considerando os factores técnicos como integrados na formação de capital, é da expansão desta que depende em boa parte o crescimento do rendimento nacional.
Assim, com vista à criação das condições necessárias à conveniente expansão das aplicações em bens de capital, o Estado adoptou, no decurso dos últimos anos, numerosas medidas, já referidas em relatórios anteriores. Entre elas importa destacar a reforma do crédito e do sistema bancário, a constituição do Banco de Fomento Nacional e a concessão de regimes de isenção e redução tributária. Ainda, tendo em atenção as vantagens que a planificação dos investimentos básicos, nomeadamente no domínio das infra-estruturas, poderia trazer ao crescimento económico nacional, foram postos em execução os planos de fomento, o primeiro dos quais abarcou o sexénio 1953-1958, referindo-se o segundo ao período 1959-1964.
Estas medidas, aliadas a certa elevação da propensão para investir do sector privado - que parece ter resultado, em parte, da intensificação das relações económicas externas do País -, encontram-se entre as principais determinantes da expansão observada nos últimos anos na formação de capital.
Na verdade, a participação da formação bruta de capital fixo no produto nacional bruto, que se situava, em 1957, em cerca de 14,9 por cento, elevou-se a 18,3 por cento em 1961, mercê de um acréscimo médio anual entre aqueles dois anos de 11,3 por cento.

QUADRO I

Participação percentual da formação bruta de capital fixo no produto nacional bruto

(Valores em milhares de contos aos preços de 1958)

[Ver Quadro na Imagem]

Página 2570

2570 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Para esta expansão da formação bruta de capital fixo contribuíram tanto as despesas do sector privado como as do sector público, que no quinquénio de 1957-1961 apresentaram taxas de crescimento de, respectivamente, 11,9 e 7,7 por cento. Por outro lado, foram particularmente salientes os acréscimos obtidos nos sectores das indústrias transformadoras, transportes e comunicações e habitação.
Embora a formação bruta de capital fixo do sector público tenha mantido, em 1962, a tendência ascensional anteriormente registada, a do sector privado acusou, no último ano, contracção de 2,3 por cento, o que, dada a sua preponderância no conjunto, implicou uma diminuição de cerca de 1 por cento das despesas globais em formação de capital. Por outro lado, a contracção no último ano foi fundamentalmente determinada pela redução de cerca de 6 por cento observada no sector das indústrias transformadoras.

44. As estimativas disponíveis para 1963 indicam, porém, que no ano em curso a formação bruta de capital fixo do sector privado virá a retomar a tendência expansionista interrompida em 1962, alcançando um montante que corresponde a acréscimos de 4 por cento em relação ao último ano e de 2 por cento em comparação com 1961. Por seu turno, a formação bruta de capital fixo do sector público deverá registar em 1963 expansão superior a 17 por cento, a mais elevada do último quinquénio.
O incremento das despesas globais na formação de capital estimado para o corrente ano deverá atribuir-se em grande parte à formação de capital no sector das indústrias transformadoras, que se espera venha a ter um acréscimo de 11 por cento.
Aliás, a acentuação da tendência expansionista da formação de capital constitui factor de primordial importância para o crescimento do produto nacional, dado o elevado valor da relação capital-produto que se verifica ainda na economia portuguesa e que é característica dos países em desenvolvimento.
Esta aceleração do ritmo de formação de capital é particularmente urgente no que se refere ao sector primário, cuja evolução tem, nos últimos anos, contribuído de forma muito reduzida para o crescimento do produto nacional metropolitano. E porque este sector poderá não representar
o pólo de maior interesse para o capital privado - facto a que não é, certamente, estranha a sua baixa reprodutividade -, a aceleração da formação de capital no sector primário, que emprega cerca de metade da população activa metropolitana, competirá em parte, pelo menos nas fases de arranque, ao sector público, através nomeadamente de planos de desenvolvimento.
Do mesmo modo, dada a sua baixa reprodutividade directa, a preparação da mão-de-obra especializada terá de ser, em boa parte, financiada pelo Estado. Assim, para a criação desta infra-estrutura social, da maior importância no desenvolvimento económico, há já uma rubrica do II Plano de Fomento, estando já em avançada execução, como complemento, um plano de reapetrechamento escolar financiado directamente pelo Orçamento Geral do Estado.
Na realização dos planos estabelecidos e na preparação de futuros programas importará, contudo, ter em atenção as crescentes necessidades de mão-de-obra especializada impostas pelo próprio processo de desenvolvimento económico.

45. À expansão registada pela formação de capital nos últimos anos não foi, certamente, alheia a execução do II Plano de Fomento, em cujos empreendimentos se despendeu, no quadriénio 1959-1962, cerca de 14 635 000 contos. Saliente-se ainda que o montante despendido em cada. um dos quatro primeiros anos deste II Plano correspondeu, em média, a 29 por cento do valor global da formação de capital fixo.
O volume total dos financiamentos previstos no programa para 1963 do II Plano de Fomento ascende a cerca de 4 223 700 contos. Todavia, no decurso da primeira metade do ano e pelos elementos neste momento disponíveis, as despesas efectuadas teriam atingido apenas 27 por cento daquele montante, o que traduziria ritmo de realização sensivelmente inferior ao observado em anos precedentes. Espera-se, todavia, que uma recolha mais ampla de elementos de informação e que a aceleração da cadência de execução, habitual no 2.º semestre, venham a confirmar que o nível de realização deste programa se não afaste, em 1963, do verificado em anos anteriores.

QUADRO II

Execução do II Plano de Fomento (metrópole)

l.º semestre de 1963 (a)

(Milhares de contos)

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Elementos provisórios fornecidos pelo Secretariado Técnico da Presidência do Conselho.

O valor global despendido em empreendimentos do sector da «Agricultura, silvicultura e pecuária» atingiu 17 por cento da respectiva previsão, sendo de destacar o ritmo de execução particularmente activo dos empreendimentos
referentes a «melhoramentos agrícolas» e «defesa sanitária das plantas e dos animais».
No sector da «Pesca, indústrias extractivas e transformadoras», que detém elevada preponderância no con-

Página 2571

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2571

junto - cerca de 29 por cento do valor global da previsão para 1963 -, as despesas efectuadas representaram 11,1 por cento do previsto, para o que contribuiu decisivamente o facto de ainda não ter sido despendida qualquer verba em empreendimentos de «pesca» e «reorganização industrial».
Inversamente, porém, no sector da «Electricidade» o montante despendido a meio do ano representava já 94 por cento da previsão, devido fundamentalmente ao elevado ritmo de realização dos empreendimentos no sector da «Produção».
Por seu turno, o valor dos gastos efectuados em empreendimentos englobados no sector dos «Transportes e comunicações» atingiu 25 por cento da respectiva previsão, merecendo especial referência o ritmo de realização dos empreendimentos relativos a «transportes marítimos» e «transportes ferroviários».
Finalmente, no sector da «Investigação e ensino técnico», o ritmo de execução (27 por cento) resultou de níveis de realização praticamente idênticos nos empreendimentos referentes a «escolas técnicas» e a «investigação aplicada».

46. Por seu turno, a variação das existências apresenta habitualmente flutuações muito irregulares, que, até 1961, exerceram, de forma geral, influência pouco preponderante na evolução do produto nacional, em virtude de o seu montante ser, em valor absoluto, relativamente reduzido. Esta influência foi, porém, relevante no decurso dos dois últimos anos, em consequência dos acentuados acréscimos experimentados por esta componente do investimento. Em 1962 a variação das existências atingiu 1544 milhares de contos, o que representa incrementos de, respectivamente, 406 e 1845 milhares de contos em relação a 1961 e 1960. Para esta evolução contribuíram em grande parte as acumulações de stocks de produtos siderúrgicos, têxteis de algodão, cortiça e produtos resinosos.
O desconhecimento de estimativas para 1963 e o habitual comportamento irregular da variação das existências anteriormente referido não permitem ainda neste momento formular qualquer previsão para o ano em curso.

47. Analisada, ainda que de forma sucinta, a evolução do investimento, parece conveniente apreciar nas suas linhas gerais a forma como se processou o seu financiamento.
No que se refere ao financiamento dos investimentos englobados no II Plano de Fomento tem-se verificado que, de um modo geral, o recurso às diversas fontes se tem processado de forma sensivelmente diversa da planeada. Na verdade, com excepção do programa de 1959, em que a contribuição efectiva do sector público 1 coincidiu praticamente com a planeada (60 por cento do total), o recurso às fontes públicas atingiu nos três últimos anos níveis compreendidos entre 46 e 69 por cento do valor global despendido em cada ano, enquanto as respectivas previsões se situavam entre 40 e 46 por cento.
Do mesmo modo, no 1.º semestre de 1963, a contribuição das fontes públicas, que se estimara em 63 por cento do valor global, elevou-se a 84 por cento no decurso da execução.

QUADRO III

Execução do II Plano de Fomento (metrópole)

1.º semestre de 1963 (a)

Origem do financiamento

(Milhares de contos)

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Elementos provisórios fornecidos pelo Secretariado Técnico da Presidência do Conselho.

Como em anos anteriores, importa destacar, tanto em valor absoluto como relativo, os financiamentos realizados pelo Orçamento Geral do Estado e instituições de previdência, que, em conjunto, representaram cerca de 68 por cento do total dos financiamentos realizados na primeira metade do corrente ano.
O facto de os capitais privados não acorrerem, na medida em que se previu, ao financiamento dos empreendimentos englobados no II Plano de Fomento parece exigir uma reformulação dos princípios que têm presidido & escolha dos empreendimentos a realizar com tais meios financeiros e das condições que a esses capitais são oferecidas.
Entretanto, e dada a importância dos financiamentos dos Planos de Fomento no processo de crescimento económico nacional, a administração financeira do País teve de providenciar para dispor dos meios financeiros necessários não só ao cumprimento daquilo que para ela constitui um compromisso, mas também para a cobertura dos financiamentos previstos no Plano para o sector privado, mas que este se não mostrou apto ou interessado em financiar.
Acresce que, como se tem referido em relatórios anteriores, os financiamentos realizados pelo Orçamento Geral do Estado no âmbito do II Plano de Fomento constituem apenas parte do considerável volume de recursos que esse orçamento consigna ao financiamento do desenvolvimento económico nacional.
Na verdade, como posteriormente se referirá, o Orçamento Geral do Estado tem financiado, para além do II Plano de Fomento, diversos empreendimentos de natureza social, cultural e económica, reservando para esta finalidade as receitas consideradas mais apropriadas, entre as quais avultam as obtidas por recurso ao mercado de capitais.
Saliente-se, no entanto, que a acção do Estado no campo do financiamento ao desenvolvimento económico

Página 2572

2572 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

tem sido amplamente apoiada pela Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência e Banco de Fomento Nacional, pelo que se justifica referência especial.

48. Como elemento orientador da poupança privada, a Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência tem exercido acção preponderante no processo de crescimento económico nacional, não só pela expansão do crédito concedido, mas também pela intervenção no mercado financeiro através da tomada de títulos.
Assim, no 1.º semestre de 1963, o volume global do crédito distribuído, incluindo a aplicação em títulos, acusou uma expansão superior a 633 000 contos, consideràvelmente mais elevada que a registada em igual período do ano anterior - 28 000 contos.

Crédito distribuído pela Caixa Geral dê Depósitos, Crédito e Previdência

Variação entre 31 de Dezembro de 1962 e 30 de Junho de 1963

Milhares do contos

I. Operações com o sector público ...................... +437
II. Operações com o sector corporativo e de coordenação económica .............................................. +88
III. Operações com o sector privado:
A) Fomento directo da actividade económica ............................... + 161
B) Outras operações ..................... - 53
+108
Variação total...... +633

As operações com os sectores público e corporativo e de coordenação económica, que no 1.º semestre de 1962 tinham experimentado uma contracção de 253 000 contos, registaram no mesmo período do ano em curso um acréscimo de 525 000 contos. Esta expansão foi determinada pela tomada de promissórias de fomento nacional e outros títulos do Estado e, no que se refere ao sector corporativo, pelo incremento do apoio financeiro à viticultura.
Para o acréscimo de 108 000 contos observado no conjunto das operações com o sector privado contribuíram exclusivamente as operações de fomento directo da actividade económica, uma vez que as outras operações - em que predomina o crédito hipotecário - registaram sensível contracção, tal como se verificou em igual período de 1962.
A expansão observada nas operações dê fomento directo da actividade económica foi determinada por acréscimo no crédito distribuído à maioria dos sectores económicos considerados, com excepção da construção urbana e do comércio de vinho do Porto. São, em especial, de anotar os incrementos registados no crédito agrícola, individual e mútuo (93 000 contos) e no crédito industrial (36 000 contos).
Por seu turno, o Banco de Fomento Nacional aprovou, no decurso do 1.º semestre de 1963, operações de financiamento e garantia no montante de 326 milhares de contos. De entre as operações aprovadas na primeira metade do ano corrente, salientam-se os empréstimos directos - 331 100 contos, divididos quase equitativamente entre a metrópole e o ultramar - e as operações diversas, que somaram 129400 contos. Importa, todavia, referir que, no período em análise, não foi concedida aprovação a qualquer operação de participação financeira.
No mesmo período, o volume das operações realizadas pelo Banco alcançou 358 327 contos, evidenciando contracção de cerca de 16 por cento em relação ao período homólogo de 1962.
Como nas operações aprovadas, não foram também realizadas quaisquer operações de participação financeira no período em estudo. No que se refere às restantes operações efectuadas, importa indicar o montante dos empréstimos directos que se repartiram pela metrópole (13 operações) e ultramar (34 operações) de acordo com a seguinte distribuição sectorial:

QUADRO IV

Empréstimos directos realizados pelo Banco de Fomento Nacional

(contos)

(a) Inclui o financiamento a autarquias locais, construção civil e o crédito predial.

Fonte: Banco de Fomento Nacional.

Foram ainda realizadas operações de garantia, no montante de 130712 contos, e operações diversas, num total de 103 354 contos

49. Não se tornando possível analisar, por carência de elementos de informação, o comportamento de todas as fontes de recursos financeiros do sector privado de que o investimento poda dispor, importa, todavia, salientar a acção neste domínio desenvolvida pelo conjunto do sistema bancário através do crédito concedido, que, de um modo geral, tem experimentado evolução favorável.

Movimento de bens e serviços com o exterior

50. O tradicional saldo negativo do movimento com o exterior, que até 1961 se manteve sem variações muito acentuadas, sofreu nesse ano um agravamento de 65 por cento, para o que contribuiu exclusivamente a expansão de 20 por cento das importações de bens e serviços, a que apenas correspondeu um acréscimo de 4,3 por cento nas exportações.
Todavia, no decurso do último ano observou-se nítida recuperação do referido saldo, que atingiu, a preços constantes, o montante de 2757 milhares de contos, o que traduz contracção de 60 por cento em relação a 1961 e de 32,5 por cento relativamente à média anual no período 1957-1960. Para essa evolução concorreu simultaneamente o incremento superior a 20 por cento registado pela exportação de bens e serviços e a contracção de 8,4 por cento experimentada pelas importações.
No corrente ano, embora não se disponha ainda de estimativas sobre as relações económicas externas, parece de prever, a avaliar pelos indicadores relativos às balanças de mercadorias e de serviços, que não deve alterar-se sensivelmente o saldo do movimento com o exterior.
Assim, embora se preveja agravamento do saldo de mercadorias - o principal factor do saldo global do movimento com o exterior-, pensa-se que a melhoria dos saldos das balanças de turismo, transportes e operações governamentais poderá compensar, em grande parte, o referido agra-

Página 2573

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2573

vamento. Todavia, a evolução desta componente da despesa nacional depende ainda, em larga medida, do comportamento do saldo dos rendimentos de capitais, que, pela tendência evidenciada nos dois últimos anos, se espera seja desfavorável.

Situação financeira Preços e salários

51. O nível de preços por grosso em Lisboa manteve-se praticamente estável em 1958 e 1959. Todavia, no ano seguinte subiu de 2,3 por cento, para o que concorreram fundamentalmente os preços dos produtos da indústria química. Em 1961, este índice geral voltou a apresentar-se estacionário, apesar do ligeiro aumento dos preços de combustíveis e lubrificantes, e no último ano registou novo acréscimo (3,5 por cento), devido, principalmente, aos preços dos produtos manufacturados e das bebidas e tabaco, apesar da descida dos preços dos produtos da indústria química.
Relativamente aos preços no consumidor, observou-se no triénio 1958-1960 ligeiro aumento do respectivo índice nas cinco cidades que são objecto de observação estatística,, especialmente no Porto e em Viseu.
Porém, em 1961, a avaliar pela média anual dos índices mensais, o nível de preços no consumidor baixou ligeiramente no Porto, tendo-se mantido praticamente estável nas restantes cidades consideradas.
No ano transacto agravou-se sensivelmente o índice relativo a Lisboa e Porto -respectivamente 4,7 e 8,6 por cento -, enquanto nas outras cidades a elevação do índice foi menos nítida. Para os aumentos observados nas duas principais cidades contribuíram fundamentalmente os preços da habitação, que se elevaram de 22 por cento em Lisboa e 13 por cento no Porto.

QUADRO V

índices de preços

[Ver Quadro na Imagem]

Nota. - Médias aritméticas dos índices mensais do Instituto Nacional de Estatística.

Quanto aos salários, não tem sofrido alteração a tendência ascensional que se delineou a partir de 1955 nas remunerações dos trabalhadores rurais. Essa subida foi particularmente acentuada no último ano, quer nos salários de homens, quer nos de mulheres - respectivamente 17,7 e 14,3 por cento. Por outro lado, os salários por profissões em Lisboa experimentaram também evolução crescente no último quinquénio, a qual se acentuou consideràvelmente nos dois últimos anos, em que os acréscimos foram de 4,4 e 7 por cento.

QUADRO VI

índices ponderados de salários

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Calculados pelo Instituto Nacional de Estatística - Base (100): 1958.
(b) Calculados pelo Banco de Portugal - Base (100): 1948.

52. No 1.º semestre do ano em curso o índice de preços por grosso em Lisboa não experimentou variação sensível em relação a igual período do ano anterior (+0,5 por cento), apesar do acréscimo de 4,8 por cento nos preços dos produtos alimentares, compensado em parte pelas baixas dos preços de bebidas e dos produtos manufacturados que compõem o índice.
No entanto, voltou a registar-se elevação do índice de preços no consumidor, particularmente nítida em Évora e no Porto - respectivamente 4,8 e 3,3 por cento. Como

Página 2574

2574 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

no último ano. esta evolução foi fundamentalmente determinada pelos preços da habitação e da alimentação.
Importa, porém, referir que o índice de preços no consumidor em Lisboa se elevou na primeira parte do ano a ritmo mais lento que no ano transacto (2,7 por cento). E esta expansão explica-se de igual modo pelo aumento dos preços da alimentação e da habitação - 3 e 2 por cento, respectivamente. Em especial, no que se refere à habitação, o índice das rendas, calculado pelo Instituto Nacional de Estatística, confirma este comportamento, tornando-se ainda possível verificar que a expansão foi particularmente sensível nas rendas de casas com quatro ou menos divisões - 9 por cento.
Por sua vez, os salários dos trabalhadores rurais experimentaram novo acréscimo no 1.º semestre deste ano, em confronto com igual período do ano precedente, ligeiramente mais elevado nos salários de homens (6 por cento).
No período em observação os salários por profissões em Lisboa apresentaram-se superiores em cerca de 7 por cento aos registados em igual período do ano anterior.
Embora em menor grau que os salários monetários, os salários reais tiveram nos primeiros seis meses do ano aumento de 4,4 por cento, o que traduz melhoria do nível de vida da população abrangida pelo índice.
53. A avaliar pelos últimos elementos estatísticos disponíveis, a evolução, nos meses mais recentes, dos índices de preços permite esperar que não se agravem sensivelmente na segunda parte do ano, quer os preços por grosso em Lisboa, quer os preços no consumidor nas cidades consideradas. À evolução mensal dos respectivos índices parece até mostrar certa tendência no sentido do abaixamento dos preços, com excepção de Évora e Lisboa, onde se apresentam praticamente estáveis.
No que se refere aos salários, o comportamento dos correspondentes índices permite admitir que continuarão a elevar-se nos próximos meses, principalmente os dos trabalhadores rurais, em virtude do êxodo agrícola que tem vindo a observar-se.

Balança de pagamentos da zona do escudo

54. No decénio 1950-1959 a balança de pagamentos da zona do escudo apresentou saldos positivos de maior ou menor amplitude. Em especial nos dois últimos anos desse período registaram-se saldos superiores a 1 100 000 contos. Contudo, em 1960, o comportamento desfavorável das diversas componentes da balança determinou a formação de ligeiro déficit, que no ano seguinte se agravou de forma sensível, devido principalmente ao excepcional aumento das importações metropolitanas do estrangeiro. No último ano parece ter-se retomado a tendência para a formação de saldos positivos, no que desempenhou importante papel a realização de operações de capital a longo prazo.
Importa, todavia, analisar separadamente o modo como evoluíram nos últimos anos os saldos de transacções correntes e de operações de capital.

55. A balança de transacções correntes da metrópole tem-se caracterizado desde há anos por avultados deficits, determinados por resultados desfavoráveis nos movimentos de mercadorias e nos transportes, que os superavits normalmente apurados nos restantes invisíveis correntes, nomeadamente o turismo e as transferências privadas, têm sido insuficientes para compensar.
For outro lado, a balança de transacções correntes do ultramar tem registado, de um modo geral, consideráveis superavit» em resultado da conjugação dos saldos positivos observados em mercadorias e nos invisíveis correntes.
Porém, enquanto em 1958 e 1959 este superavit do ultramar excedeu o déficit das transacções correntes da metrópole, no triénio seguinte verificou-se o inverso.
Assim, em 1961, as transacções correntes da zona do escudo foram sensivelmente deficitárias, para que concorreu de modo decisivo o comportamento desfavorável das balanças de mercadorias e de invisíveis correntes da metrópole.
Por sua vez, em 1962, a balança de transacções correntes apresentou saldo negativo de 1 125 000 contos, determinado principalmente pelo pronunciado agravamento do tradicional saldo positivo da balança de mercadorias do ultramar, resultante de considerável acréscimo de importações e, ainda que em menor grau, de contracção das exportações. Por outro lado, o acentuado aumento do saldo de invisíveis correntes do ultramar, em consequência de maiores receitas de transportes, foi insuficiente para contrariar aquela evolução. Saliente-se, contudo, a apreciável recuperação da balança de transacções correntes da metrópole, devido à melhoria dos saldos das diversas componentes, com excepção dos rendimentos de capitais. Entre aquelas componentes merece especial referência o turismo, cujas receitas aumentaram de 63 por cento em relação ao ano anterior.

QUADRO VII

Balança de pagamentos da zona do escudo

(Saldos em milhares de contos)

[Ver Quadro na Imagem]

Página 2575

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2575

[Ver Tabela na Imagem]

(a) A partir do 2.º semestre de 1961 inclui as operações de capital do ultramar (saldos: no 2.º semestre de 1961, + 49 milhares de contos: em 1962 + 254 milhares de contos).
(b) Valores provisórios.

Fonte: Banco de Portugal.

56. Por seu turno, o saldo das operações de capital apresentou elevado valor positivo em 1958 e 1959, determinado fundamentalmente por operações a longo prazo do sector público e bancário. Todavia, em 1960, o saldo das operações de capital experimentou nítida contracção, devido à liquidação dos saldos decorrentes da extinção da União Europeia de Pagamentos. E, embora se tenha mantido positivo, foi todavia insuficiente para neutralizar o déficit observado nas transacções correntes:
Por sua vez, em 1961, foram principalmente as operações a longo prazo do sector privado a explicar o apreciável superavit das operações de capital, o qual não impediu, no entanto, a formação de elevado déficit na balança global de pagamentos.
No último ano o saldo das operações a longo prazo do sector público teve acentuada expansão, atingindo cerca de 2 milhões de contos. Por outro lado, elevou-se também sensivelmente o saldo das operações a longo prazo do sector privado, que se situou em 1325 milhares de contos. Deste modo, o comportamento dos movimentos de capitais determinou elevado saldo positivo que excedeu nitidamente o déficit de transacções correntes, pelo que o saldo global da balança de pagamentos conheceu novo máximo em 1962.
Saliente-se, por último, a evolução das importações de capitais a longo prazo do sector privado nos dois últimos anos, nitidamente superiores às registadas até então. Em especial, no ano transacto, atingiram o montante de 1505 milhares de contos, de que a maior parte proveio da área da O. C. D. E. -39 por cento dos países da Europa Ocidental e 50,5 por cento dos Estados Unidos e Canadá.

57. No 1.º semestre do ano em curso ter-se-á invertido a tendência manifestada em 1962 pela balança de pagamentos, a avaliar pela evolução no mesmo período da balança cambial do Banco de Portugal, cuja importância relativa no total das liquidações cambiais da zona do escudo é muito elevada.
De facto, verificou-se um excesso das saídas sobre as entradas de cambiais no montante de 922 milhares de contos, d que representa contracção de 2117 milhares de contos no saldo das liquidações cambiais em relação a igual período de 1962. Nessa variação tiveram preponderância as liquidações nas moedas dos países participantes do Acordo Monetário Europeu, responsáveis por 67 por cento daquele agravamento.
Por outro lado, para a inversão de tendência observada na balança cambial do banco emissor durante os primeiros meses do ano teriam contribuído de modo decisivo a elevação do déficit comercial da metrópole com o estrangeiro e, principalmente, a contracção das operações de capital a longo prazo do sector público, que no 1.º semestre do ano anterior haviam conduzido a um saldo positivo de 1654 milhares de contos.
Importa, todavia, referir que é de prever, para a segunda parte do ano, sensível melhoria dos pagamentos internacionais da zona do escudo, de modo a neutralizar-se ou pelo menos melhorar o saldo das liquidações cambiais no 1.º semestre.
De facto, a evolução da balança de pagamentos nos anos anteriores permite admitir a formação de um excedente no 2.º semestre. Acresce que o saldo negativo da balança comercial da metrópole em Julho e Agosto se apresentou praticamente idêntico ao observado em iguais meses do ano anterior.
Saliente-se, por outro lado, a melhoria recente das liquidações cambiais do Banco de Portugal, que determinou nos primeiros dois meses do 2.º semestre saldo positivo de 334 milhares de contos, para que concorreram decisivamente as liquidações em dólares ( + 1036 milhares de contos).
Deste modo, no final de Agosto a balança cambial do banco emissor apresentava saldo negativo de 588 milhares de contos, que, a julgar pela evolução observada em anos anteriores, se pode considerar recuperável.

QUADRO VIII

Liquidações cambiais no Banco de Portugal

(Saldos em milhares de contos)

[Ver Quadro na Imagem]

Nota. - Não inclui a parte das liquidações multilaterais que corresponde aos pagamentos em dólares no quadro do Acordo Monetário Europeu e às transferências entre o Banco de Portugal e outros bancos centrais, quer para a constituição de coberturas, quer para pagamentos nos termos de acordos bilaterais.

Fonte: Banco de Portugal.

Página 2576

2576 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

A um prazo mais longo parece de admitir que não se virão a registar, pelo menos nos próximos anos, acentuados desequilíbrios na balança de pagamentos, ainda que as importações necessárias para o apetrechamento e a regularidade de laboração da indústria nacional e, de um modo geral, as aquisições destinadas aos empreendimentos inerentes ao processo de crescimento económico se devam elevar sensivelmente.
A considerável expansão da importação de capitais pelo sector privado observada nos últimos anos virá, todavia, a levantar de futuro o problema do pagamento dos capitais e juros. Na medida, porém, em que nessas importações predominarem os investimentos directos e os apports de capital en nature, encontrar-se-ão sensivelmente atenuadas as possíveis repercussões cambiais deles derivadas. Por outro lado, convirá que as importações de capitais sob a forma de empréstimos sejam firmemente orientadas para os sectores mais adequados com vista à defesa da balança de pagamentos, por forma a assegurarem-se as receitas cambiais que compensem o respectivo reembolso e os encargos.
Em última análise, o problema do equilíbrio da balança de pagamentos a longo prazo depende essencialmente do incremento que possa vir a registar-se nas receitas de transacções correntes, nomeadamente das exportações de mercadorias e do turismo, cuja expansão no último ano, aliás, permite antever favoráveis perspectivas. Acresce que as transferências privadas devem elevar-se sensivelmente nos próximos anos, em consequência da acentuada emigração que tem vindo a observar-se.
No que respeita às transacções correntes do ultramar, a necessidade da realização de avultadas importações, indispensáveis ao crescimento económico daqueles territórios, poderá limitar a formação de elevados saldos de transacções correntes, como se tem observado até agora. Espera-se, todavia, que esta evolução possa ser compensada, em grande parte, pelo aumento quer das exportações, quer das receitas de invisíveis correntes do ultramar.

Balança comercial da metrópole

58. As transacções da metrópole com o estrangeiro apresentaram evolução algo irregular nos últimos anos. Na verdade, o respectivo déficit, depois de se apresentar estacionário em 1958 e 1959, elevou-se nos dois anos seguintes, principalmente em 1961, em que atingiu cerca de 9300 milhares de contos - mais 44 por cento que no ano precedente. No entanto, em 1962, registou-se sensível recuperação da balança comercial com o estrangeiro, que determinou a contracção do déficit até ao nível observado dois anos antes - cerca de 6500 milhares de contos.
Importa, portanto, analisar a evolução das importações e exportações que conduziu a estes resultados das transacções metropolitanas com os países estrangeiros.
Assim, relativamente às importações, a tendência que se observou até 1959 para a estagnação do valor importado do estrangeiro inverteu-se nos dois anos seguintes, em que se observaram consideráveis acréscimos - respectivamente cerca de 15 e 23 por cento.
Inversamente, em 1962, as aquisições ao estrangeiro experimentaram contracção de 11 por cento, ainda que se tenham situado a nível superior ao registado anteriormente a 1961.
For seu turno, as exportações da metrópole para o estrangeiro apresentaram-se praticamente estacionárias nos anos que precederam 1960, ano em que se observou nítida melhoria da colocação dos produtos portugueses nos mercados estrangeiros (mais 18 por cento).
No entanto, o ritmo de crescimento das exportações para aqueles mercados flectiu acentuadamente no ano seguinte, o que, em conjugação com o elevado acréscimo das importações, determinou o considerável déficit anteriormente referido. Em 1962 voltou, porém, a registar-se sensível expansão do valor exportado para o estrangeiro - cerca de 15 por cento.
Saliente-se ainda a alteração observada na composição das exportações metropolitanas para o estrangeiro nos últimos anos, principalmente no que se refere aos sucessivos acréscimos da participação dos produtos das indústrias têxtil e metalúrgica no total exportado, que atingiram no último ano, respectivamente, 22,6 por cento e 3,4 por cento.
Por sua vez, a importância do conjunto dos produtos em bruto e manufacturados com origem na silvicultura, bem como a dos produtos minerais na exportação para
o estrangeiro, tem vindo a decrescer nos últimos anos.

59. Como se pode concluir do quadro seguinte, no 1.º semestre de 1963 o déficit comercial da metrópole com o estrangeiro experimentou acréscimo de 9 por cento, em consequência de incremento das importações, superior ao registado pelas exportações - respectivamente 7,2 e 5,4 por cento. Deste modo, o coeficiente de cobertura das importações pelas exportações decresceu ligeiramente, atingindo 52,6 pontos.

QUADRO IX

Balança comercial da metrópole com o estrangeiro

(Milhares de contos)

[Ver Quadro na Imagem]

Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

Contrariamente, no que se refere às quantidades transaccionadas, observou-se incremento mais nítido nas exportações que nas importações (12,9 por cento e 2,6 por cento). Deste modo, o preço médio da tonelada exportada diminuiu 226$, enquanto o preço médio da tonelada importada se elevou de 163$.

Página 2577

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2577

60. Para a evolução das relações comerciais com o estrangeiro, no 1.º semestre deste ano, concorreram de forma decisiva os sensíveis aumentos da importação de máquinas e aparelhos, produtos têxteis, nomeadamente os necessários à laboração da indústria e produtos das indústrias químicas. De igual modo, teve considerável acréscimo o valor importado de .material de transporte, devido à aquisição de duas unidades para a marinha mercante, no valor de 108 milhares de contos. No que se refere a este grupo das importações, saliente-se, contudo, a contracção de cerca de 13 por cento nas aquisições de veículos automóveis.
Por outro lado, entre as aquisições no estrangeiro de produtos alimentares devem destacar-se as de batatas e oleaginosas, que foram, no entanto, mais do que compensadas pela diminuição de 64 por cento na importação de trigo.

61. Por sua vez, a expansão observada nas exportações para o estrangeiro durante o 1.º semestre foi consideràvelmente afectada pela diminuição do valor exportado de azeite, que, em igual período do ano transacto, atingiu valor excepcionalmente elevado. Entre os restantes produtos exportados devem salientar-se os aumentos registados neste período na cortiça em obra, nos resinosos e nos vinhos em relação ao 1.º semestre de 1962. Em especial o comportamento da exportação dos produtos têxteis, que representou 24 por cento do total exportado para o estrangeiro, confirmou a tendência evidenciada, principalmente a partir de 1960, para a elevação da sua importância relativa naquele total.
Para o acréscimo de 5 por cento, em relação a igual período do ano anterior, concorreu em parte a apreciável expansão do valor exportado de produtos de sisal. Contrariamente, as exportações de fios e tecidos dealgodão contraíram-se de 24,5 por cento, em comparação com o período homólogo de 1962, devido principalmente a menores compras dos Estados Unidos da América.
Ainda relativamente a outros produtos industriais que ultimamente têm vindo a desempenhar importante papel no nosso comércio externo, importa referir a pasta para o fabrico de papel, cujo valor exportado aumentou cerca de 22 por cento no período em estudo.

62. Por outro lado, no decurso do 1.º semestre a distribuição do comércio externo por zonas geográficas experimentou sensível alteração em relação a igual período de 1962.

QUADRO X

Comércio da metrópole com o estrangeiro

(Milhares de contos)

[Ver Quadro na Imagem]

Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

Na verdade, aumentou a importância relativa das exportações para os países da A. E. C. L. - de 24,7 para 27,2 por cento- no total exportado para o estrangeiro. Para essa evolução contribuiu principalmente o aumento superior a 20 por cento da exportação para o Reino Unido e, embora em menor escala, a expansão da colocação de produtos portugueses na Suécia e na Suíça.
Por seu turno, manteve-se estacionária a participação das importações originárias da A. E. G. L. no total importado do estrangeiro. Cabe, todavia, referir a nítida expansão das aquisições no mercado suíço, que se elevaram de 37 por cento.
Por outro lado, em consequência do comportamento favorável das transacções comerciais com a A. E. C. L., não apresentou variação sensível o déficit com o conjunto dos países da área, tendo ainda revelado apreciável melhoria o coeficiente de cobertura das importações pelas exportações.
Inversamente, elevou-se de forma considerável o saldo negativo com os países da C. E. E., em resultado de acréscimo das importações superior ao observado nas exportações. Deste modo, manteve-se sem alteração a participação das exportações para a C. E. E. no valor exportado para o estrangeiro, elevando-se ligeiramente a das importações provenientes dessa área.
Por outro lado, diminuiu ligeiramente o coeficiente de cobertura das importações pelas exportações, que não ultrapassou 38 por cento. No que se refere às transacções com os países do Mercado Comum, merece especial referência o apreciável acréscimo da exportação para a Alemanha e para a. França,- enquanto na importação foi particularmente significativo o aumento registado nas aquisições à Holanda, e à Itália.

Página 2578

2578 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Note-se, ainda, a acentuada quebra das trocas comerciais com os Estados Unidos da América, principalmente no que se refere às exportações, que diminuíram cerca de 13 por cento.
Por último, elevaram-se sensivelmente, em relação ao 1.º semestre de 1962, as importações provenientes de alguns países da América Latina, tendo-se observado, por outro lado, importante acréscimo na exportação para o Egipto, Chile, Indonésia, Japão e Vietname do Sul.

63. A julgar pelos últimos elementos disponíveis, que se referem aos oito primeiros meses, parece de admitir que o comportamento da balança comercial com o estrangeiro se apresentará mais favorável na segunda metade do ano. De facto, o respectivo déficit nesse período foi superior em 7 por cento ao observado em período homólogo do último ano, o que traduz melhoria relativamente ao comportamento durante o 1.º semestre.
Todavia, para o conjunto do ano, prevê-se a formação de déficit ligeiramente superior ao observado em 1962, que deverá atingir mais de 7 milhões de contos. Na verdade, a expansão das importações de bens de equipamento, de alguns produtos alimentares e das matérias-primas e produtos semimanufacturados indispensáveis para a laboração da indústria nacional deve exceder o crescimento estimado das exportações, sensivelmente inferior ao observado no último ano.
Torna-se deste modo urgente promover a melhor estruturação da actividade económica nacional, com vista ao incremento das exportações, apresentando-se simultaneamente indispensável organizar convenientemente o respectivo sistema de distribuição nos mercados externos, uma vez que a expansão das vendas ao estrangeiro constitui, a par das receitas provenientes do turismo, uma das vias que permitirão obter melhor posição da balança de pagamentos.

Moeda e crédito

64. O aumento da circulação monetária, que se processou a ritmo regular até 1960, experimentou no ano . seguinte sensível alteração, em consequência do desequilíbrio da balança de pagamentos e de diversos factores acidentais de ordem meramente psicológica. De facto, as pressões a que esteve sujeito o mercado monetário em 1961 determinaram considerável expansão da moeda fiduciária em circulação. A esta evolução não foi alheia a quebra de liquidez do sistema bancário, resultante de levantamentos, com carácter anormal, de elevado montante de depósitos à ordem. No entanto, o apreciável incremento dos depósitos a prazo compensou a ligeira contracção dos meios imediatos de pagamento, pelo que os meios monetários totais se elevaram, ainda que em escala diminuta (l por cento).
Em 1962, retomou-se a tendência observada até dois anos antes, em virtude, principalmente, do aumento das disponibilidades à vista e a prazo. Deste modo, o total dos meios de pagamento experimentou acréscimo de cerca de 11 por cento, ligeiramente mais elevado que os registados no triénio 1958-1960.
Por outro lado, o crédito bancário constituiu o principal factor monetário até 1961, ano em que a sua variação desempenhou papel preponderante na variação dos meios de pagamento, compensando o considerável efeito contorcionista das reservas cambiais. No último ano, porém, atenuou-se sensivelmente a sua influência, sendo imputável à expansão do crédito apenas um terço da
expansão dos meios de pagamento, que se deve na sua maior parte à acentuada progressão das reservas de ouro e divisas.
De facto, em 1962 a melhoria das relações económicas externas actuou no sentido de restabelecer o equilíbrio do mecanismo monetário, determinando nítida recuperação das disponibilidades à vista.
Importa ainda referir que a importância relativa da moeda legal nos meios de pagamento, que se havia elevado sensivelmente em 1961, quase regressou, no ano transacto, ao nível observado nos anos anteriores - 25 por cento.

65. O crédito outorgado pelo sistema bancário registou sucessivos acréscimos no último quinquénio, principalmente até 1960. Todavia, em 1961, observou-se nítida contracção do crédito concedido pela banca comercial, em virtude da quebra de liquidez experimentada no decurso do ano.
Tornou-se deste modo necessário o recurso ao redesconto no Banco de Portugal, em consequência da elevada procura de crédito, em parte para diversas operações em substituição do mercado financeiro. E este acréscimo de redesconto, conjugado com a apreciável expansão dos empréstimos da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, foi suficiente para neutralizar a pressão sobre a banca comercial, permitindo ainda registar uma variação positiva de cerca de 2 800 000 contos no crédito concedido pelo sistema bancário.
Por outro lado, a diminuição das reservas de caixa da banca comercial, em consequência de vultosos levantamentos de depósitos à ordem durante o ano de 1961, concorreu decisivamente para a elevação da taxa de remuneração dos depósitos a prazo, que aumentaram no entanto a ritmo mais lento que nos anos anteriores. A par deste comportamento da taxa de juro dos depósitos a prazo, as taxas das operações de crédito atingiram os limites máximos legais.
No último ano, o mercado monetário, embora activado pela melhoria das relações económicas externas, não pôde regressar ainda à desejada normalidade, em virtude de não se encontrarem integralmente eliminadas as tensões observadas no mercado financeiro um ano antes. No entanto, o montante dos depósitos à ordem e a prazo aumentou de modo apreciável, pelo que o crédito bancário registou nova expansão - 2 024 000 contos, melhorando igualmente a liquidez do sistema bancário.
Por outro lado, em consequência do abrandamento do recurso ao redesconto pelos bancos comerciais, o crédito outorgado pelo Banco de Portugal diminuiu de modo sensível em relação ao ano precedente. No entanto, a importância relativa do crédito no total das reservas e outras garantias do banco emissor manteve-se ainda a nível mais elevado que o observado anteriormente a 1961.
Por seu turno, na Caixa Geral de Depósitos a expansão do crédito processou-se em 1962 a ritmo mais lento que no ano anterior, paralelamente à adopção de determinadas medidas selectivas do ponto de vista sectorial na concessão dos empréstimos. Deve, porém, realçar-se o papel que esta instituição de crédito do Estado tem vindo a desempenhar na actual conjuntura, quer na tomada de títulos, especialmente públicos, quer na realização de operações de crédito a médio e a longo prazo.

66. Durante o 1.º semestre do ano em curso, a expansão dos meios de pagamento prosseguiu a ritmo mais rápido que em igual período do ano findo.

Página 2579

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2579

QUADRO XI

Meios de pagamento

(Milhares de contos)

[Ver Quadro na Imagem]

Fonte: Inspecção-Geral de Crédito e Seguros.

Fará o acréscimo de 4 083 000 contos observado naquele período contribuíram todas as componentes, em especial as disponibilidades à vista, a que se deve imputar 57 por cento da variação total. Saliente-se contudo a expansão superior a 15 por cento experimentada pelos depósitos a prazo, que reflecte a atracção do público por este tipo de depósitos, observada nos últimos anos, em consequência das taxas de remuneração praticadas e da relativa liquidez que proporcionam, dado o prazo a que são, em geral, constituídos.
Por outro lado, ao contrário do 1.º semestre do ano. precedente, a expansão dos meios de pagamento deve-se principalmente ao elevado acréscimo do crédito bancário e ainda à tomada de títulos, nomeadamente promissórias de fomento nacional, uma vez que a variação das reservas de ouro e divisas exerceu efeito relativamente contraccionista. Deste modo, em face dos efeitos conjugados resultantes da expansão do crédito e da contracção das reservas cambiais, observou-se diminuição de liquidez do sistema bancário, o que veio a reflectir-se no incremento da moeda legal em circulação (+ 337 000 contos).

67. Apesar do aumento na moeda legal, a emissão fiduciária experimentou contracção durante o 1.º semestre deste ano, ainda que em menor grau que no período homólogo do ano transacto.

QUADRO XII

Variação da emissão fiduciária

(Milhares de contos)

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Inclui os saldos das contas «Províncias Ultramarinas» - C/ compensação e «Províncias ultramarinas - C/ reserva», a que se refere o Decreto-Lei n.º 44 703, de 17 de Novembro de 1962.

Fonte: Inspecção-Geral de Crédito e Seguros.

Para este comportamento contribuíram de modo decisivo a diminuição das reservas de ouro e divisas, em consequência da evolução da balança de pagamentos, e ainda a restituição, embora parcial, ao banco emissor e de reserva da zona do escudo das disponibilidades em ouro e escudos que, anteriormente à criação do sistema de compensação e de pagamentos interterritoriais do espaço português, se encontravam na posse dos fundos cambiais de cada uma das províncias ultramarinas. Por seu turno, o efeito determinado por estas variações, conjugado com ligeira redução do crédito outorgado pelo banco emissor, não pôde sei- compensado pela expansão

Página 2580

2580 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

resultante de maior utilização das contas de depósito do Tesouro e da Junta do Crédito Público e de bancos e banqueiros e ainda da abertura das contas de compensação a favor do Banco de Portugal, nos termos do De-creto-Lei n.º 44 703, de 17 de Novembro de 1962.

68. Durante os seis primeiros meses do ano em curso o volume de crédito distribuído pelo conjunto do sistema bancário experimentou expansão superior a 1400 000 contos, particularmente significativa quando comparada com a redução de cerca de 800 000 contos observada em período homólogo do ano anterior. Essa evolução deve-se quase exclusivamente ao apreciável aumento no crédito concedido pela banca comercial. Deve ainda referir-se que a importância relativa das operações de carteira comercial no total do crédito bancário apresentou no fim de Junho ligeiro aumento em relação a igual data do ano anterior.

QUADRO XIII

Crédito concedido pelo sistema bancário (a)

(Milhares de contos)

[Ver Tabela na Imagem]

69. Relativamente aos bancos comerciais, o acréscimo do crédito concedido foi determinado pela considerável expansão dos depósitos, principalmente a prazo, durante o semestre em análise, que lhes permitiu satisfazer a crescente procura de crédito à custa de meios próprios.
Por outro lado, o comportamento do crédito reveste-se de especial significado, atendendo a que no mesmo período os bancos comerciais tomaram promissórias de fomento nacional no montante de 250 000 contos, o que veio a reflectir-se na diminuição das restantes componentes das reservas de caixa.

QUADRO XIV

Situação bancária

(Milhares de contos)

[Ver Tabela na Imagem]

Página 2581

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2581

[Ver Tabela na Imagem]

(a) Inclui a Companhia Geral do Crédito Predial Português.
(b) Compreende a Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência e restantes caixas económicas.

Fonte: Inspecção-Geral de Crédito e Seguros.

70. Da observação do quadro que a seguir se insere ressalta a propensão da banca comercial para manter apreciáveis coeficientes de liquidez. De facto, no fim do 1.º semestre do ano em curso, a percentagem das reservas de caixa em relação às responsabilidades à vista excedia o mínimo legal em 4 por cento, atingindo um nível idêntico ao observado em igual data do ano transacto. E, a julgar pelos valores registados nos anos anteriores, esta percentagem tende ainda a elevar-se no decurso do 2.º semestre, devendo atingir o valor máximo no final do ano.
Por outro lado, pode avaliar-se o grau de solvabilidade da banca comercial calculando o excedente dos valores líquidos das coberturas, que atingia no final do 1.º semestre 28 por cento das responsabilidades à vista, valor praticamente idêntico ao registado um ano antes.

QUADRO XV

Bancos comerciais

Liquidez e solvabilidade

(Milhares de contos)

(a) Inclui depósitos a prazo inferior a 30 dias, cheques e ordens a pagar e outras exigibilidades à vista, nos termos da circular n.º 3/1960, da Inspecção-Geral de Crédito e Seguros.
(b) Rubricas discriminadas nas alíneas a) a j) do artigo 60.º do Decreto-Lei n.º 42 641, de 12 de Novembro de 1959.

Fonte: Inspecção-Geral de Crédito e Seguros.

Página 2582

2582 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

71. Por seu turno, o total das disponibilidades líquidas em ouro e divisas do banco emissor sofreu contracção de 490 000 contos, atingindo 21 921 000 contos no final do 1.º semestre do ano em curso. Todavia, a proporção das reservas legais para o total das responsabilidades-escudos à vista não registou variação significativa em relação a 31 de Dezembro último.
E, como consequência da favorável evolução do mercado monetário, o banco central foi menos solicitado no que se refere à concessão de crédito, que experimentou nova redução, ainda que de montante sensivelmente inferior à observada no 1.º semestre do ano precedente.

72. No conjunto das caixas económicas verificou-se, na primeira metade do ano, acentuado acréscimo do volume de depósitos, em especial na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência. Todavia, o volume de crédito concedido pelo instituto de crédito do Estado experimentou reduzida expansão, ainda que mais elevada que a observada no período homólogo do ano anterior. Aliás, esta evolução explica-se em grande parte pelo aumento da tomada de títulos, especialmente públicos, com vista a fornecer o necessário apoio ao financiamento do Plano de Fomento em curso, em face das dificuldades que persistiram no mercado de capitais.
Por outro lado, nas restantes caixas económicas houve, como um ano antes, fraca correspondência entre o acréscimo do volume de depósitos e a variação do crédito concedido, o que se traduziu por acentuada melhoria de liquidez.

73. A avaliar pelos últimos elementos disponíveis, que se referem aos oito primeiros meses do ano, e atendendo ao comportamento do mercado monetário nas anteriores conjunturas, é de prever que a expansão dos meios de pagamento se acentuará na parte final do ano.
Efectivamente, a melhoria que se espera nos resultados das relações económicas externas, durante o 2.º semestre, virá reflectir-se no incremento das disponibilidades cambiais do banco emissor e, segundo se espera, na elevação do total de depósitos no sistema bancário.
Ainda, as perspectivas quanto à evolução dos depósitos, aliadas às dificuldades com que tem deparado o mercado de capitais, devem determinar contínua expansão, durante o 2.º semestre, da procura de crédito junto do sistema bancário, mais com características de financiamento do que propriamente de crédito comercial.
Saliente-se, ainda, que, em consequência da reavaliação em 1962 das suas disponibilidades em ouro, foi restituída ao Banco de Portugal a capacidade creditícia que aparentemente se encontrava diminuída. E, por outro lado, mediante a adesão do País ao Fundo Monetário Internacional, adquiriu-se em contrapartida um «potencial de saque» sobre esta instituição que assegurará a manutenção da liquidez externa do escudo.
Em relação às caixas económicas, estima-se acentuada expansão do crédito, durante o 2.º semestre, nomeadamente por parte da Caixa Geral de Depósitos, uma vez mais em apoio do mercado financeiro. Todavia, enquanto se mantiverem as taxas de remuneração dos depósitos a prazo que vêm sendo praticadas, especialmente pela banca comercial, não se prevê favorável evolução dos depósitos de poupança nestas instituições de crédito, não obstante as isenções fiscais de que gozam.

74. Perante a evolução recente e as perspectivas a curto prazo do mercado monetário e de capitais importará, eventualmente, a adopção de medidas adequadas, assim como a revisão de diversas disposições legais em que se baseia o actual funcionamento daqueles mercados, no sentido de encontrar os ajustamentos necessários com vista, por um lado, a fazer face à presente conjuntura, e, por outro, a evitar maiores dificuldades futuras.
Ainda, encontra-se em fase adiantada o estudo da regulamentação das operações de crédito a médio e a longo prazo, prevista no artigo 34.º do Decreto-Lei n.º 41 403, de 27 de Novembro de 1957, esperando-se deste modo contribuir para o desejado equilíbrio entre os mercados monetário e financeiro. Por outro lado, devem completar-se diversas disposições insertas em diplomas legais já publicados, definindo-se o âmbito de acção de determinados organismos de natureza «parabahcária» que devem ser enquadrados dentro do actual sistema, ao qual deverão conferir porventura maior grau de flexibilidade.
Tendo em vista o prosseguimento do processo de integração económica do espaço português, foi já publicado em 8 de Outubro último o Decreto-Lei n.º 45 296, reorganizando o sistema bancário das províncias ultramarinas.
Por último, através do Decreto-Lei n.º 45 295, da mesma data, alteraram-se algumas disposições do Decreto-Lei n.º 42 641, de 12 de Novembro de 1959, ampliando-se a competência e a composição do Conselho Nacional de Crédito, cuja acção orientadora e coordenadora passou a tornar-se extensiva a todo o território nacional.

Actividade financeira do Estado

75. No decurso de 1961 operou-se significativa viragem na política financeira, em consequência da preocupação de que não fosse consideràvelmente afectado o ritmo de crescimento da economia nacional, não obstante os enormes encargos indispensáveis à defesa da integridade da Nação. Com efeito, tinha sido possível até então fazer face aos encargos correntes da Administração, bem como às necessidades de investimento implícitas no processo de desenvolvimento económico, à custa fundamentalmente da natural expansão das receitas ordinárias, mantendo-se dentro de estreitos limites o recurso a fontes de financiamento extraordinárias.
A partir de Março de 1961 houve, porém, que recorrer a medidas extraordinárias de natureza fiscal, assim como utilizar em maior escala o crédito interno e externo. Todavia, nem por isso foram postos em causa, ainda que momentaneamente, os princípios quê têm presidido nas últimas décadas à gestão das finanças públicas portuguesas e que permitiram assegurar a manutenção da estabilidade financeira interna e a solvabilidade externa do escudo: as despesas correntes e as inerentes à defesa das províncias ultramarinas têm sido, essencialmente, cobertas através das receitas ordinárias, reservando-se os recursos extraordinários e o eventual saldo do orçamento ordinário à satisfação das necessidades de financiamento do desenvolvimento económico.

76. O valor global das receitas ordinárias, que em 1958 e 1959 tinha experimentado acréscimo de cerca de 6 por cento, acusou no ano seguinte aumento de quase 9 por cento. A intensificação do ritmo de crescimento destas receitas foi fundamentalmente determinada pela expansão do produto nacional bruto, que em 1960 se elevou igualmente de 9 por cento.
Este alargamento da matéria colectável, aliado às providências legislativas de natureza fiscal que se tornou necessário adoptar em 1961, em virtude das perturbações

Página 2583

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2583

de carácter militar surgidas em algumas parcelas do território nacional, esteve na origem do incremento de cerca de 13 por cento das receitas ordinárias cobradas naquele ano. Em 1962 a taxa de crescimento das receitas ordinárias
situou-se apenas em 5 por cento, para o que concorreu, por um lado, o elevado incremento registado no ano anterior e, por outro, a quebra observada na taxa de acréscimo da matéria colectável.

QUADRO XVI

Receitas orçamentais do Estado cobradas no quinquénio 1958-1962

[Ver Tabela na Imagem]

Como o quadro anterior evidencia, os réditos englobados nos três primeiros capítulos da receita ordinária - que correspondem, grosso modo, aos rendimentos de natureza fiscal cobrados na execução do Orçamento - ocupam posição preponderante no conjunto: cerca de 76 por cento em 1962. Merece especial referência a tendência contraccionista, observada no último quinquénio, na importância relativa das cobranças provenientes dos «Impostos directos gerais», enquanto se processava a ritmo acelerado o crescimento das receitas englobadas em «Impostos indirectos» e «Indústrias em regime tributário especial».
Assinale-se que, não obstante o decréscimo observado na sua importância relativa, verificou-se expansão da cobrança dos «Impostos directos gerais» à taxa média de 7,3 por cento, no período considerado.
Para esta evolução contribuíram, de um modo geral, todas as receitas englobadas no capítulo, merecendo, contudo, especial referência o incremento experimentado no último ano pela contribuição industrial. O aumento na cobrança deste imposto resultou não só do crescimento da matéria colectável - particularmente nítido nos grupos B e C -, mas também do aperfeiçoamento dos métodos utilizados na sua determinação.
O acréscimo da contribuição industrial nos últimos anos é tanto mais significativo quanto é certo que as deduções nos rendimentos tributáveis concedidas a empresas que procedam a investimentos conducentes a novos fabricos, redução dos custos ou melhoria dos produtos já fabricados, atingiram montantes elevados, como o quadro seguinte permite verificar.

Página 2584

Página 2585

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2585

QUADRO XVII

Nota dos rendimentos relativos aos benefícios concedidos até 31 de Outubro de 1963 em virtude da aplicação dos Decretos n.ºs 40874, de 23 de Novembro de 1956, e 43871, de 22 de Agosto de 1961

[Ver Quadro na Imagem]

Página 2586

Página 2587

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2587

For outro lado, a elevada quebra, em 1962, na expansão dos «Impostos indirectos» ficou a dever-se essencialmente à desmobilização aduaneira inerente ao processo de unificação económica nacional e à nossa participação na integração económica europeia. Para este comportamento contribuiu ainda o elevado montante das isenções de direitos e benefícios concedidos pela aplicação de numerosos regimes de draubaque a importações de decisivo interesse para o desenvolvimento da actividade produtiva do País.

QUADRO XVIII

Isenções de direitos e benefícios concedidos pela aplicação de regimes de draubaque

(Contos)

[Ver Tabela na Imagem]

No incremento das cobranças dos impostos englobados em «Indústrias em regime tributário especial», particularmente significativo no decurso dos dois últimos anos, desempenharam papel relevante as medidas de natureza fiscal promulgadas em 30 de Junho de 1961, nomeadamente pelas suas repercussões sobre os impostos que incidem sobre o fabrico de tabacos e sobre a fabricação e consumo de cerveja. No que se refere aos restantes capítulos da receita ordinária, a sua importância relativa não experimentou, no decurso do último quinquénio, alteração apreciável, embora as respectivas taxas de crescimento tenham acusado comportamento irregular, como o quadro documenta.

77. Dada a importância de que se reveste para a compreensão da actividade financeira do Estado, no quadro que a seguir se insere apresenta-se a evolução da carga fiscal global e a sua estrutura nos últimos cinco anos.

QUADRO XIX

Pressão fiscal global (a)

[Ver Tabela na Imagem]

(a) Cálculos baseados em elementos fornecidos pelo Instituto Nacional de Estatística, cujas séries foram alteradas. Nos impostos incluem-se os impostos directos e indirectos relativos ao Orçamento Geral do Estado, aos serviços autónomos e fundos autónomos, às autarquias locais e serviços autónomos das autarquias locais e ainda & previdência social.

Página 2588

2588 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

O crescimento evidenciado nos dois últimos anos pela pressão fiscal, a contrastar com a relativa estabilidade observada nos anos precedentes, deve atribuir-se fundamentalmente ao acréscimo do ritmo de expansão dos impostos indirectos, em consequência, nomeadamente, das medidas fiscais adoptadas no decurso de 1961 com o objectivo de ocorrer às necessidades impostas pela defesa das províncias ultramarinas e a que anteriormente se fez referência.

78. Analisando, nas suas linhas gerais, o comportamento das receitas ordinárias nos cinco anos precedentes, convirá apreciar, ainda que de forma sucinta, o comportamento das despesas ordinárias e extraordinárias e a forma como se processou a cobertura destas últimas.
As despesas efectuadas por conta do Orçamento Geral do Estado têm vindo a assumir importância crescente no valor global da despesa pública: de 83 por cento em 1958 elevaram-se a 87 por cento deste valor global em 1962.
Por outro lado, a sua importância relativa na despesa nacional aumentou sensivelmente no decurso dos últimos anos, para o que concorreu decisivamente a maior participação do Estado no esforço de desenvolvimento económico nacional, a que se adicionou, em 1961 e 1962, o acréscimo das despesas de carácter militar.

QUADRO XX

Despesas públicas e despesa nacional

[Ver Tabela na Imagem]

(a)- Compreende: Conta Geral do Estado; organismos de coordenação económica; Emissora Nacional de Radiodifusão; Hospitais Civis de Lisboa; Misericórdia de Lisboa; correios, telégrafos e telefones; Fundo do Desemprego; Fundo das Casas Económicas; Fundo de Socorro Social.
(b) Valores rectificados em função da revisão das Contas Nacionais efectuada pelo Instituto Nacional de Estatística.
(c) Valor provisório.

No quadro que a seguir se insere discrimina-se o total, das despesas efectuadas por conta do Orçamento Geral do Estado no último quinquénio, de harmonia com as principais rubricas da classificação funcional, por forma a permitir observar a influência das diversas componentes na sua expansão.
No referido período o valor global das despesas efectuadas por conta do Orçamento experimentou acréscimo médio de 12,6 por cento, em que desempenhou papel preponderante a elevação observada em 1960 e 1961. Pelo incremento registado no primeiro daqueles anos devem responsabilizar-se, de um modo geral, todas as classes de despesas, ao passo que a expansão em 1961 ficou a dever-se, em grande parte, ao aumento excepcionalmente elevado das despesas com os «Serviços de defesa militar e segurança».
Saliente-se, no entanto, que em 1962 foi já possível efectuar gastos de investimentos sensivelmente superiores aos do ano anterior, embora o crescimento das despesas de natureza militar se tenha situado ainda a nível elevado.

Página 2589

2589 10 DE DEZEMBRO DE 1963

QUADRO XXI

Despesas públicas

Conta Geral do Estado

(Milhares de contos)

[Ver Tabela na Imagem]

Página 2590

2590 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Conquanto a participação dos encargos com o serviço da dívida pública no total das despesas tenha evidenciado, no período 3958-1962, ligeira tendência contraccionista, elevou-se de forma apreciável o respectivo ritmo de crescimento no último triénio.
Esta evolução reflecte o recurso mais intensivo aos mercados de capitais interno e externo por parte do Estado, para financiamento da expansão da economia nacional. Na verdade, as receitas obtidas através de empréstimos, no decurso dos dois últimos anos, têm sido essencialmente utilizadas para fazer face às necessidades decorrentes do esforço do desenvolvimento económico em que o País se encontra empenhado, nomeadamente no financiamento de empreendimentos integrados em Planos de Fomento.
Por seu turno, a participação média dos dispêndios com os serviços de defesa militar e segurança no total das despesas efectuadas por conta do Orçamento Geral do Estado, que se cifrou em 29 por cento no período 1958-1960, ascendeu a 40 por cento nos dois últimos anos. O elevado acréscimo dos encargos de natureza militar no biénio precedente foi determinado pelas imperiosas necessidades de defesa da integridade territorial da Nação, a que anteriormente se fez referência.
Finalmente, os encargos com os serviços de administração civil representaram, em média, cerca de 58,2 por cento das despesas incluídas na Conta Geral do Estado no quinquénio de Ï958-1962.
Com o objectivo de permitir uma análise mais detalhada dos montantes gastos com os serviços de administração civil no período considerado insere-se o quadro XXII.

QUADRO XXII

Despesas com os serviços de administração civil

(Milhares de contos)

[Ver Tabela na Imagem]

No período em análise, as despesas com os «Serviços de administração civil» acusaram incremento médio de cerca de 8,7 por cento, que deve imputar-se, em grande parte, ao elevado ritmo a que se processou, em média, a expansão das despesas de investimento -10,7 por cento.
Saliente-se ainda que o comportamento destas foi decisivamente influenciado pelo crescimento evidenciado pelas verbas relativas a investimentos de natureza económica, que no período em referência apresentaram taxa média de acréscimo de 16,3 por cento.

79. Para a acentuada expansão das despesas englobadas na Conta Geral do Estado têm contribuído não só as despesas ordinárias, mas também, e principalmente, as de carácter extraordinário.
Desta forma, e uma vez que o excedente das receitas ordinárias sobre os dispêndios da mesma natureza não tem sido suficiente, principalmente nos dois últimos anos, para cobrir os incrementos da despesa extraordinária, tem-se tornado necessário, como anteriormente se assinalou, mobilizar volume crescente de recursos extraordinários.
De entre estes, destacam-se, pela sua importância, as emissões da dívida pública interna e externa, cujo capital tem aumentado, principalmente a partir de 1962.

QUADRO XXIII

Divida pública

[Ver Tabela na Imagem]

(a) Valores rectificados em função da revisão das Contas Nacionais efectuada polo Instituto Nacional de Estatística.

Página 2591

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2591

80. Apresentada, nas suas linhas gerais, a evolução das receitas e despesas públicas no decurso do último quinquénio, importa agora referir a forma como se processou a execução orçamental na primeira metade de 1963.
Assim, no que se refere às receitas ordinárias, o montante cobrado no 1.º semestre do ano corrente experimentou expansão de 2 por cento em relação ao período homólogo do ano transacto.

QUADRO XXIV
Receitas cobradas
(Milhares de contos)

[Ver Tabela na Imagem]

Este acréscimo, sensivelmente inferior ao registado em anos precedentes, foi, todavia, nitidamente influenciado pela quebra observada nas receitas do «Domínio privado» e «Reembolsos e reposições». Porém, a variação observada neste último capítulo tem significado diminuto, dada a natureza das receitas em causa.
Por seu turno, a contracção verificada no «Domínio privado» explica-se fundamentalmente pela evolução dos réditos provenientes de «Lotarias» e «Caminhos de ferro da Beira». A diminuição nos rendimentos das «Lotarias» resultou da escrituração, na Conta do ano findo, de importantes receitas pertencentes a gerências anteriores, que só em 1962 foi possível transferir de Angola e Moçambique. Por outro lado, a quebra dos rendimentos provenientes do «Caminho de ferro da Beira» deve-se à execução do disposto no Decreto-Lei n.º 43 701, de 17 de Maio de 1961, já prevista, portanto, no plano orçamental.
O produto das cobranças englobadas nos dois primeiros capítulos da receita ordinária experimentou sensível acréscimo no 1.º semestre. Para o incremento evidenciado pelo rendimento dos «Impostos directos gerais» contribuiu a maioria dos impostos englobados neste capítulo. Merecem, todavia, especial referência os aumentos registados nas cobranças da contribuição industrial (+36 milhares de contos) e no imposto sobre as sucessões e doações (+43 milhares de contos).
Por seu turno, a expansão registada no montante dos «Impostos indirectos» provém de acréscimos de cobrança de todas as receitas englobadas neste capítulo, com excepção dos direitos de exportação. No entanto, devem destacar-se os incrementos observados nas cobranças da «Taxa de salvação nacional» (59 milhares de contos) e «Imposto do selo» (29 milhares de contos).

81. Por outro lado, o valor das autorizações de pagamento emitidas no decurso do 1.º semestre de 1963 elevou-se a 6138 milhares de contos, o que traduz acréscimo de 3 por cento em relação ao período homólogo do ano transacto.

QUADRO XXV

Despesas orçamentais

Autorizações de pagamento

(Milhares de contos)

[Ver Tabela na Imagem]

Página 2592

2592 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Para a expansão do montante das autorizações de pagamento emitidas na primeira metade de 1963 concorreram todas as rubricas consideradas, com excepção dos «Serviços de administração civil», cujo decréscimo foi exclusivamente determinado pela contracção observada nas despesas de investimento, nomeadamente nas que respeitam a empreendimentos de natureza económica.

82. Saliente-se ainda que a participação das despesas extraordinárias no valor global das autorizações de pagamento emitidas no 1.º semestre deste ano se elevou a cerca de 42 por cento.
A cobertura das despesas extraordinárias no corrente ano parece, todavia, encontrar-se perfeitamente assegurada, uma vez que, para além do eventual saldo do orçamento ordinário, as receitas da mesma natureza já arrecadadas evidenciam acentuado acréscimo em relação ao ano anterior. De entre estas receitas importa destacar, pela sua importância, a emissão de títulos da dívida pública, cujo montante global ascendeu, nos três primeiros trimestres, a 2182 milhares de contos, como a seguir se discrimina:

Milhares de contos

Certificados especiais de dívida pública (Decreto-Lei n.º 37 440, de 6 de Junho de 1949)............................... 497
31/2 por cento de 1962 - 11 Plano de Fomento (Decreto-Lei n.º 44361, de 23 de. Maio de 1962) ................... 200
3 x/2 Por cento de 1963 - Obrigações do Tesouro (Decreto-Lei n.º 45 142, de 17 de Julho de 1963) ................... 500

Promissórias - Fundo Monetário Internacional(Decreto-Lei n.º 44 484, de 27 de Julho de 1962) .................... 10,9
Promissórias - Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (Decreto n.º 44 936,
de 26 de Março de 1963) ................................ 204,9
Promissórias emitidas a favor de Selignan & Cie e Banque Française du Commerce Extérieur, nos termos do Decreto-Lei n.º 45 044, de 24 de Maio de 1963 .......... 75
21/2 Por cento de 1962 - Província de Angola (Decreto n.º 44 429, de 29 de Junho de 1962)......................... 300
2 1/2 por cento de 1962 - Província de Moçambique (Decreto-Lei n.º 44513, de 17 de Agosto de 1962) .................... 300
3 por cento de 1959 - Empréstimo de renovação da marinha mercante - II Plano de Fomento, 5.ª série (Decreto n.º 44 960, de 5 de Abril de 1963) ........................ 15,5
4 por cento da 19591 - Empréstimo de renovação da indústria da pesca - II Plano de Fomento, 6.ª e 7.ª séries (Decreto-Lei n.º 44728, de 24 de Novembro de 1962,
e Decreto n.º 45 168, de 30 de Julho de 1963) .......... 73
Certificados de aforro (Decreto n.º 43 454, de 30 de Dezembro de 1960) ............................. 5,6

Soma ........ 2 181,9

Importa, contudo, referir que alguns dos empréstimos contraídos em 1963 não representam encargo efectivo para o Tesouro, uma vez que este será reembolsado das respectivas despesas de juro e amortização pelas entidades beneficiárias do produto destes empréstimos.
E o que se verifica com os empréstimos destinados a financiamentos nas províncias de Angola e Moçambique e à renovação da marinha mercante e indústria da pesca.
Assinale-se, igualmente, que as promissórias representativas de parte da participação de Portugal no Fundo Monetário Internacional e no Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento não vencem juros e a sua liquidação, à vista e ao par, se efectuará em data indeterminada.
Assim, excluídas estas operações, a dívida emitida, no decurso dos nove primeiros meses de 1963, elevou-se apenas a 1277,6 milhares de contos.

83. Dada a forma como se processou, na primeira metade deste ano, a execução orçamental e tendo em atenção o comportamento observado em anos anteriores, parece possível prever sensível expansão da actividade financeira do Estado em 1963.
Na verdade, espera-se que o valor global das despesas efectuadas por conta do Orçamento Geral do Estado se eleve acentuadamente em relação a 1962. Em especial, importa referir a melhoria estimada no comportamento das despesas de investimento, em parte determinada pela aceleração da execução do II Plano de Fomento.
Aliás, os elementos disponíveis para os meses de Julho e Agosto parecem confirmar esta previsão. De facto, o valor global das autorizações de pagamento emitidas no período de Janeiro a Agosto do ano corrente ultrapassa o atingido em igual período de 1962 em 9,1 por cento, taxa quase dupla da verificada entre 1962 e 1961 - 4,7 por cento.
Todavia, não se prevê que a expansão no montante das despesas englobadas no Orçamento Geral do Estado seja acompanhada, no ano em curso, por correlativo aumento de receitas ordinárias. Na verdade, no período de Janeiro a Agosto, as receitas ordinárias cobradas apresentaram um crescimento de apenas 1 por cento, enquanto o incremento das despesas atingiu 9,3 por cento.
Saliente-se, contudo, que a evolução das receitas ordinárias deve experimentar alteração favorável no decurso dos últimos meses do ano, em virtude dos ajustamentos a que houve de proceder na execução dos novos diplomas da reforma fiscal.

B) Ultramar - Evolução geral da conjuntura
Angola

84. De acordo com os elementos de informação actualmente disponíveis, apresentam-se favoráveis as perspectivas da produção agrícola de Angola em 1963.
Na verdade, a colheita de café, que no último ano atingiu o volume mais elevado de sempre, deve, na presente campanha, registar acentuado acréscimo, em consequência do aumento do número de plantações.
Por outro lado, espera-se que as exportações de café atinjam valor consideravelmente superior ao observado no ano transacto, uma vez que se têm mantido estáveis as respectivas cotações. Note-se ainda que a sucessiva expansão da produção cafeeira determinou recentemente a apresentação de um pedido de aumento da quota atribuída à província no Acordo Internacional do Café.
Por sua vez, prevê-se sensível expansão da colheita de algodão na .actual campanha, à semelhança do que se verificou em 1962.
Saliente-se que os problemas da produção algodoeira continuaram a merecer a atenção do Governo, tendo sido estabelecido novo regime de cultura e comercialização do algodão do ultramar - Decreto-Lei n.º 45 179, de 5 de Agosto último -, através do qual é assegurada a liberdade de cultura e regulamentado o respectivo comércio entre a metrópole e as províncias ultramarinas.
De entre os restantes produtos agrícolas destinados à exportação merece ainda especial referência o sisal, cuja produção voltou a conhecer novo incremento, devido à melhoria de cotação no mercado internacional.
Embora afectada por condições climáticas adversas, a colheita do milho deve manter-se a nível praticamente idêntico à do ano transacto.

1 Cf. mapa anexo n.º 16.

Página 2593

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2593

85. No que respeita à indústria extractiva, observou-se nítido acréscimo da produção de petróleo, que no 1.º trimestre deste ano duplicou em comparação com igual período de 1962, atingindo 164 000 t. E, uma vez que se encontre resolvido, pelo menos em parte, o problema da colocação do petróleo angolano, espera-se que de futuro a produção atinja 1 200 000 t por ano.
Por outro lado, registou-se relativo decréscimo da extracção de alguns minérios, nomeadamente de cobre, devendo esperar-se, no entanto, que a exportação de minério de ferro se intensifique no decurso do ano.

86. Nos cinco primeiros meses deste ano o volume de pesca desembarcada experimentou ligeira contracção em relação ao período homólogo do ano findo. No que respeita a este sector, anote-se ainda a montagem, actualmente em curso, de novas unidades de salga e seca de peixe e a construção, prevista para breve, de armazéns climatizados e entrepostos de frio, que devem vir a contribuir em larga escala para a expansão da actividade piscatória nos próximos anos.

87. Na indústria transformadora verificou-se durante 1963 nítido acréscimo da produção nos sectores dos derivados de petróleo, da pasta para papel, da sacaria, do açúcar, do tabaco e da borracha, tendo entrado ultimamente em funcionamento uma unidade para o fabrico de pneus e câmaras-de-ar.
Encontram-se, por outro lado, em execução empreendimentos para a produção de margarina e para a laminagem de ferro e aço e estima-se ainda, a curto prazo, a realização de diversos projectos, de entre os quais se destacam a instalação da indústria de ferro ligas para aproveitamento dos excedentes da energia eléctrica de Cambambe, de complexos industriais para a industrialização da banana e do milho e também de linhas de montagem de veículos. Deste modo, apresentam-se amplamente favoráveis as perspectivas da actividade industrial de Angola nos próximos anos.

88. O custo de vida acusou, na primeira parte do ano, sensível agravamento, principalmente em Luanda, em resultado fundamentalmente do aumento das rendas de habitação.
De facto, apesar da elevação do ritmo de actividade na construção civil, persiste o problema habitacional observado no ano anterior, em consequência do aumento da população na capital da província.
Por seu turno, os meios de pagamento da província elevaram-se de 5 por cento, entre Janeiro e Abril do ano em curso, contrariamente ao observado em idêntico período do ano precedente, em que registaram ligeira contracção.
Por outro lado, reflectindo a melhoria da actividade económica .da província, o crédito concedido e os depósitos efectuados nos bancos da província aumentaram consideravelmente nos primeiros meses do ano.

89. O comércio externo global de Angola no período de Janeiro a Maio do corrente ano teve evolução favorável, porquanto as exportações se elevaram de cerca de 39 por cento em relação a igual período de 1962, enquanto as importações se mantiveram a nível praticamente idêntico.
No comportamento das exportações desempenhou papel preponderante o aumento do valor exportado de café e de diamantes, a que deve imputar-se cerca de 75 por cento do incremento total.

Moçambique

90. Em consequência das condições climáticas desfavoráveis observadas no decurso dos primeiros meses e tendo presente os elementos disponíveis, prevê-se que a produção agrícola moçambicana em 1963 se situe a nível inferior à do ano anterior.
De facto, a forte pluviosidade verificada em determinadas regiões, especialmente do Centro e do Sul, prejudicou significativamente algumas das culturas mais relevantes na economia da província, nomeadamente a do algodão, cuja produção na última campanha experimentou contracção de cerca de 25 por cento.
No entanto, a produção de cana sacarina e de oleaginosas tem evoluído favoravelmente, em consequência do aumento da procura externa. Salienta-se ainda que, dada a melhoria de cotações observada nos mercados internacionais, deve admitir-se considerável incremento de produção de sisal no corrente ano.
Espera-se, igualmente, expansão da produção de chá, resultante da instalação de uma unidade fabril destinada a pequenos agricultores no Gorué, e do kenafc, cuja produção deverá permitir não só o integral abastecimento do mercado interno, dispensando as importações de juta, mas também a sua exportação em quantidades apreciáveis.
Por seu turno, não experimentou alteração sensível a colheita dos principais produtos agrícolas destinados ao consumo da província, como o arroz, o milho e a mandioca, o que se deve, todavia, ao aumento da área cultivada.

91. Na produção da indústria extractiva continuou a observar-se ritmo de expansão relativamente moderado. Todavia, a produção de carvão atingiu volume apreciável no 1.º semestre deste ano, tendo a quantidade exportada registado acréscimo de cerca de 30 por cento em relação ao período homólogo de 1962.
A actividade na indústria transformadora, que no ano transacto experimentou ligeiro acréscimo, cresceu acentuadamente nos primeiros meses do ano em curso, principalmente no que se refere à produção de cerveja, refrigerantes, tabaco, têxteis, sacaria, mobiliário metálico, tintas, derivados do petróleo, artigos de vidro e cabos condutores eléctricos.
Por outro lado, a entrada em funcionamento, durante o ano em curso, de novas unidades para a produção de cimento, sacaria e embalagens metálicas, a concretização de alguns empreendimentos nos sectores da moagem, refinação do açúcar e descasque de castanhas de caju e a instalação de linhas de montagem de veículos constituem índices seguros da aceleração do desenvolvimento industrial da província. Merece ainda especial referência o projecto de ampliação da refinaria de petróleos, actualmente a trabalhar em plena capacidade, com vista à expansão do fabrico, nomeadamente no que se refere à produção de asfaltos e gases liquefeitos.

92. Por seu turno, o sector terciário da economia moçambicana parece ter registado evolução desfavorável durante os primeiros meses deste ano. Na verdade, os elementos disponíveis revelam decréscimo das receitas dos caminhos de ferro e da camionagem, em consequência da contracção do volume de mercadorias transportadas - menos 6 por cento. De igual modo, no 1.º semestre de 1963, diminuiu sensivelmente o volume de mercadorias carregadas nos dois principais portos da província, en-

Página 2594

2594 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

quanto o número e a tonelagem de embarcações entradas e o movimento de mercadorias descarregadas se mantiveram praticamente estacionários.

93. Be Janeiro a Maio do corrente ano, os meios de pagamento em poder do público experimentaram ligeira contracção, para que contribuiu exclusivamente a diminuição da moeda legal em circulação.
Por outro lado, no final de Maio, o crédito distribuído pelos bancos da província, na sua maior parte pelo banco emissor, atingiu montante superior em 11 por cento ao observado em igual data do ano anterior.

94. A balança de pagamentos de Moçambique, cujo déficit experimentou apreciável contracção no ano transacto, evoluiu desfavoravelmente nos primeiros cinco meses de 1963. De facto, o respectivo saldo negativo quase duplicou em relação a igual período do ano anterior, atingindo 368 milhares de contos.
O agravamento da balança de pagamentos no período considerado deve atribuir-se, principalmente, ao comportamento da balança comercial, em consequência de acréscimo das importações a ritmo mais elevado do que das exportações e ainda à diminuição das receitas líquidas provenientes dos transportes, superior a 10 por cento. Todavia, registaram igualmente sensível elevação os déficit s relativos a turismo e a rendimentos de capitais.

Outras províncias

95. Cabo Verde. - No ano precedente, a produção agrícola do arquipélago acusou melhoria, pelo que se elevou de modo apreciável a exportação de alguns produtos, tendo concomitantemente flectido a importação de bens alimentares necessários ao seu abastecimento. Admite-se ainda que esta evolução se acentue no ano em curso, em resultado da acção desenvolvida pela Caixa de Crédito Agro-Pecuário, criada no último ano, e das medidas adoptadas com vista à intensificação das culturas existentes e à expansão da actividade pecuária, mediante a introdução no arquipélago de novas espécies.
Por sua vez, as indústrias do sal e dos derivados da pesca beneficiaram recentemente de importantes investimentos que devem permitir nítido aumento da produção e da exportação. Prevê-se igualmente a construção de uma fábrica de congelação e de produção de conservas, farinha e óleo de peixe. Importa também mencionar a construção de um molhe acostável, que virá a facilitar o embarque das pozolanas produzidas na província.
Aliás, o desenvolvimento industrial que se tem vindo a observar permite antever melhores perspectivas para a economia de Cabo Verde, que se tem mantido em extrema dependência da actividade agrícola, sujeita frequentemente a crises resultantes da irregularidade climática.

96. Guiné. - Embora tenham prosseguido, no decurso de 1963, as tentativas no sentido de uma maior diversificação da produção agrícola, o amendoim e o coconote continuaram a ocupar lugar preponderante na balança comercial. Saliente-se, contudo, a elevada expansão evidenciada pela produção de madeira, que vem conquistando, de ano para ano, posição de maior importância.
No ano em curso verificou-se apreciável acréscimo da produção de amendoim e ligeiro decréscimo na quantidade do coconote colhido. A construção, recentemente efectuada, de celeiros para amendoim e arroz em diversas localidades veio criar melhores condições de comercialização destes produtos.
As perspectivas apontadas poderão vir a atenuar as dificuldades cambiais que a província tem defrontado, permitindo-lhe assim prescindir das soluções transitórias a que se tem recorrido.

97. S. Tomé e Príncipe. - De harmonia com os elementos actualmente disponíveis, parece possível prever, em 1963, significativa expansão da economia de 8. Tomé e Príncipe, em que se tinham registado, no ano transacto, resultados desfavoráveis nas principais produções, excepto em relação à copra.
Com efeito, não obstante continuar a verificar-se escassez de mão-de-obra - problema que apresenta particular acuidade na medida em que se não antevê possibilidade de mecanização das culturas actuais -, os investimentos que se têm vindo a realizar no sentido de melhorar a produtividade das explorações agrícolas -nomeadamente a acção das brigadas técnicas agronómicas -, a estabilidade das cotações das oleaginosas, aliada à facilidade da sua colocação, e a recuperação vincada que se processa nos preços internacionais de cacau permitem prever, para o ano em curso, melhoria sensível da economia da província.
De Janeiro a Setembro do corrente ano as importações na metrópole de produtos originários da província atingiu mais de 25 milhares de contos, ocupando lugar de destaque a copra, com cerca de 50 por cento.

98. Macau. - À semelhança do que se tem verificado nos últimos anos, registou-se em 1963 incremento da actividade económica, em consequência fundamentalmente, por um lado, do crescente afluxo de turistas, que determinou a realização de vultosos investimentos na indústria hoteleira, e, por outro, do aumento de actividade industrial, estimulada pela procura externa. Para este acréscimo da procura externa contribuiu a diminuição da concorrência por parte das indústrias de Hong-Kong, resultante, pelo menos em parte, da saturação da capacidade de fabrico das suas unidades.
Na verdade, as exportações realizadas no 1.º semestre do ano em curso atingiram cerca de 251 000 contos, o que traduz aumento de 12 por cento em relação ao período homólogo de 1962. Continuou, porém, a balança comercial a apresentar saldo desfavorável, compensado pelas receitas de invisíveis correntes que afluíram à província, principalmente através do turismo.

99. Timor. - Os elementos neste momento disponíveis sobre a actividade económica da província no 1.º semestre de 1963 são por de mais escassos para permitirem ajuizar do comportamento no referido período.
Apenas se pode referir, quanto a perspectivas, que se espera, em futuro próximo, que se amplifique a evolução favorável evidenciada pela balança comercial no último ano, uma vez que a exportação de café - produto da maior importância na economia da província - experimentou acréscimos de 25 por cento na quantidade transaccionada e de 36 por cento no respectivo valor, no decurso dos oito primeiros meses de 1963, em relação a igual período do ano anterior.
Por outro lado, em face da carência de capital e da inexistência de um sistema de crédito à exportação, foi criado o Fundo de Fomento de Produção e Exportação, que tem como objectivo a concessão de financiamentos reembolsáveis à agricultura, à indústria e ao comércio.
A melhoria das cotações dos produtos de exportação, nomeadamente de café, as perspectivas de desenvolvimento de cultura do tabaco e o aproveitamento das possi-

Página 2595

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2595

bilidades de exploração dos recursos minerais da província parecem constituir factores potencialmente decisivos para a expansão da economia de Timor

III

A proposta de lei de autorização para 1964

Introdução

100. Ao alinharem-se os elementos anteriormente apresentados, teve-se como objectivo principal evidenciar as grandes linhas tendenciais da economia nacional nos últimos anos e em 1963, por forma a obter o quadro geral sobre que terá de planear-se a actividade financeira do Estado no próximo ano.

101. No decurso dos últimos anos, a política económica e financeira do País, como a da generalidade dos países da Europa Ocidental, tem sido fundamentalmente dominada pela preocupação de alcançar um estádio mais avançado de desenvolvimento económico. Daí que todo um conjunto de medidas tenha sido adoptado pelo Governo no sentido de acelerar o ritmo de crescimento da actividade produtiva, nomeadamente: a elaboração e a execução dos I e II Planos de Fomento, a realização de investimentos de natureza vincadamente infra-estrutural para além dos englobados nos Planos de Fomento, a reforma do crédito e a adopção de numerosas medidas de natureza fiscal destinadas a incentivar a expansão económica. E o resultado foi um acréscimo efectivo, a ritmo acelerado, do rendimento nacional na última década.

102. Contudo, em Março de 1961, os acontecimentos que puseram em causa a integridade nacional e que obrigaram, como continuam a obrigar, a afectar à defesa das províncias ultramarinas importante parcela dos recursos da Nação determinaram ajustamentos quanto aos meios indispensáveis à consecução dos objectivos da política económica e financeira.
Com efeito, houve que conferir prioridade à defesa das províncias ultramarinas e, simultaneamente, procurar que não diminuísse de forma sensível o esforço de desenvolvimento económico do País.
No que se refere à política financeira, tinha sido possível até então ocorrer ao financiamento do processo de expansão da economia nacional fundamentalmente através do excedente das receitas sobre as despesas ordinárias, sem que tal tivesse implicado agravamento significativo da pressão fiscal, mantendo-se moderada a mobilização de recursos extraordinários.
Todavia, a partir do momento em que assumiu prioridade absoluta a defesa da integridade territorial do País, houve que aumentar o fluxo de recursos através de medidas extraordinárias de natureza fiscal, por forma que o saldo do orçamento ordinário permitisse a cobertura das despesas de defesa, reservando-se essencialmente os recursos obtidos através dos empréstimos ao financiamento dos investimentos.
Deste modo, teve de ampliar-se o recurso ao crédito. Simplesmente, na medida em que a utilização intensiva de recursos internos pelo Estado, na prossecução dos objectivos anteriormente apontados, poderia repercutir-se desfavoravelmente sobre o comportamento do investimento privado, houve que recorrer ao mercado externo para obter os capitais indispensáveis para que não diminuísse a participação e apoio do Estado no financiamento do processo de desenvolvimento económico nacional.

Autorização geral

103. Através das disposições do capítulo 1.º da presente proposta de lei, propõe-se que o Governo fique autorizado a arrecadar as contribuições e impostos e demais rendimentos e recursos do Estado, de harmonia com os princípios e leis aplicáveis, e a empregar o respectivo produto no pagamento das despesas legalmente inscritas no plano financeiro para o próximo ano. Propõe-se ainda que em igual período sejam também autorizados os serviços autónomos e os que se regem por orçamentos cujas tabelas não estejam incluídas no Orçamento Geral do Estado a aplicar as receitas próprias no pagamento das suas despesas, umas e outras previamente inscritas em orçamentos devidamente aprovados e visados.
Dado o seu conteúdo genérico e identidade com os preceitos correspondentes nas leis de autorização das receitas e das despesas precedentes, não se reconhece necessidade de justificar a sua manutenção.

Equilíbrio financeiro

104. Mantém-se na presente proposta de lei a orientação definida e aprovada nos dois últimos anos, relativamente à inserção de um capítulo especial sobre «Equilíbrio financeiro». É que razões análogas impõem que assim se proceda, já que persiste o acréscimo das despesas extraordinárias motivadas pela necessidade de assegurar a integridade territorial do País.
Na verdade, e como anteriormente se referiu, as despesas de defesa foram fundamentalmente cobertas com o excedente das receitas ordinárias, o que foi considerado «quase um milagre da nossa administração». E até onde é dado prever, o esforço que à Nação terá de pedir-se não parece destinado a afrouxar no ano que se avizinha.
Por outro lado, torna-se também imprescindível, para além do esforço de defesa, não deixar amortecer, mas até intensificar, o surto de desenvolvimento económico iniciado há alguns anos.
Suscita-se, no entanto, a questão de saber se a continuidade dessa expansão será compatível com os encargos prioritários de natureza militar, o que leva por vezes a pôr em dúvida a oportunidade de prosseguir ao mesmo ritmo com os investimentos produtivos.
Esquece-se, porém, ao formular estas dúvidas, que os maiores encargos com a defesa exigem, de forma inadiável, uma rápida aceleração do aumento do produto nacional. Com efeito, sucede que, para um dado montante da procura total, um aumento considerável das despesas correntes do Estado, afectando o volume dos investimentos, pode ter graves consequências quanto, à manutenção ou incremento do ritmo de desenvolvimento económico e, por esta via, comprometer, a prazo mais ou menos curto, o próprio esforço de defesa. E não se deve também esquecer, tanto quanto é dado prever, que não está em causa, no caso português, um esforço momentâneo de defesa.
Perante a fase de desenvolvimento económico em que se encontram todos os territórios nacionais, e atento o actual condicionalismo que nos é imposto, haverá eventualmente que rever certos aspectos da nossa política económica e financeira, desde uma reavaliação das disponibilidades com que se possa contar a uma reorientação desses recursos segundo critérios de investimento ponde-

Página 2596

2596 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

rados à luz das novas necessidades a satisfazer e dos problemas a enfrentar.
Todavia, para além desses aspectos, pensa-se que para a defesa dos superiores interesses nacionais se torna necessário que, sem prejuízo da estabilidade financeira e da indispensável flexibilidade, uma parte cada vez mais elevada de recursos seja reservada e orientada para o desenvolvimento da produção, sem afectar a prioridade que se confere às despesas de defesa.
Por tudo isto, continuam a ser indispensáveis medidas tributárias excepcionais, a par da mobilização de outros recursos, o que implica ajustamento da redacção do artigo 3.º da proposta de lei às circunstâncias presentes e futuras, especialmente no que se refere à arrecadação de receitas e à mobilização de recursos não considerados de forma especificada na previsão orçamental.
Realmente, a evolução dos factos, até onde pode entrever-se, aconselha a admitir que, para além da compressão das despesas não prioritárias, outros meios sejam facultados à administração financeira para cobrir simultaneamente os encargos de defesa e de desenvolvimento económico.
Neste sentido, importa que o Governo fique autorizado a proceder, de harmonia com as exigências dos superiores interesses nacionais, à adaptação dos recursos às necessidades, com vista a assegurar a integridade territorial do País e a intensificar o desenvolvimento económico das suas diferentes parcelas, podendo, inclusivamente, para ocorrer a encargos de defesa, reforçar os rendimentos disponíveis e criar novos recursos.
No decurso do próximo ano podem vir a tornar-se prementes sacrifícios que de momento ainda se não mostram necessários. Mas nem por isso deverá deixar de assegurar-se o cumprimento do princípio do equilíbrio financeiro - consagrado entre nós há 35 anos.
Daí os termos da autorização especial que o Governo propõe à Assembleia.

Política fiscal

105. Concluída no ano de 1963 a publicação dos vários códigos dos impostos directos sobre o rendimento e refundidas, paralelamente, as instituições da administração fiscal e da justiça tributária, vai a política fiscal de 1964 ser fundamentalmente caracterizada e condicionada pela execução de uma reforma em todos os ramos do direito tributário nacional e na própria estrutura orgânica e funcional da fiscalidade.
Se não fora até a característica excepcional da conjuntura em que vivemos, ditada pela economia de guerra e pelas necessidades de planificação e integração do espaço português em termos que superam os índices normais, toda a lei de autorização das receitas e despesas se poderia limitar à aplicação pura e simples dos diplomas, que constituem, agora, o sistema tributário e que se bastam a si próprios para a regulamentação normal da cobrança das receitas.
Acontece porém que, a par das implicações momentâneas de carácter anómalo (que não podem deixar de ser imputadas às gerações presentes, por se integrarem nos deveres gerais de defesa, em todos os sectores, dos interesses nacionais), concorrem ainda algumas particularidades da aplicação dos próprios diplomas e da sua adaptação a situações consolidadas ou de lenta evolução que não dispensam, por alguns anos, a manutenção de normas especiais, posto que transitórias.
Contra a incerteza acerca dos efeitos da reforma no volume das receitas não se compadecem também as exigências actuais da Nação, uma vez que se não pode adiar a satisfação de necessidades vitais e imediatas. Por isso se prevê o eventual recurso a medidas de excepção, se no decurso do ano se reconhecer a insuficiência ou a escassez do alguns resultados.
Sendo o ano de 1964 aquele em que toda a reforma dos impostos directos e da administração fiscal entra, afinal, totalmente em vigor, não se pode esperar desde já, como é evidente, nem o pleno efeito de uma reforma que se projecta para o futuro e que, por atingir toda a vida da Nação, é insusceptível de transformações bruscas, nem a eliminação das hesitações e das incertezas por parte dos serviços ou dos contribuintes, quanto ao verdadeiro sentido das leis ou ao objecto e extensão das obrigações tributárias.
As garantias jurídicas e designadamente as de ordem judiciária dão, porém, a este respeito, toda a tranquilidade de que se carece, certo como é saber-se de antemão irem os serviços executar as leis com verdadeiro espírito de compreensão das dificuldades e irem os contribuintes cumprir o que lhes cabe com elevado espírito de civismo.
A demonstração do acerto daquilo que se afirma vem, a seguir, na exposição dos primeiros contactos com a execução dos diplomas já em vigor.

106. No que se refere ao Código do Imposto de Capitais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44 561, de 10 de Setembro de 1962, que entrou a vigorar no dia 1 de Janeiro do corrente ano, não seria legítimo esperar que se revelasse, logo nestes primeiros meses, de aplicação fácil às realidades tributáveis que há muito reclamavam a instituição de um imposto sobre os rendimentos derivados da aplicação de capitais.
É certo, como oportunamente se divulgou, que na reforma introduzida pelo código se não pôs em causa a concepção e estrutura jurídico-fiscal do antigo imposto sobre a aplicação de capitais, criado pela Lei n.º 1368, de 21 de Setembro de 1922, e posteriormente regulamentado pelo Decreto n.º 8719, de 17 de Março de 1923. Todavia, as alterações revelaram-se tão extensas e significativas que não podem estranhar-se algumas hesitações na interpretação e aplicação de algumas disposições do código. Não basta, com efeito, que este haja adoptado a sistematização uniforme de todos os textos da reforma fiscal, que reproduza a ampla generalidade dos princípios já aceites pelo Decreto n.º 8719, que instaure formas de tributação já familiares aos serviços e ao público.
Dos princípios consagrados, o código extraiu muitos corolários que se afastam ou opõem aos do Decreto n.º 8719, já porque a evolução da conjuntura sócio-económica veio infirmar o acerto dos antigos, já porque, para idêntico, condicionalismo, uma análise mais profunda, solidamente alicerçada na experiência, evidenciou erros ou desvios que urgia corrigir; as formas tributárias já familiares aos serviços e ao público surgem agora fixadas em premissas legais mais sólidas e coerentes, que não raro fazem apelo aos quadros de uma dogmática tradicionalmente esquiva, reclamando ou pressupondo adequada formação jurídica.
Conhecem-se as dificuldades que esta última circunstância veio trazer aos serviços, mas não se vê que fosse preferível abandonar as leis fiscais ao empirismo que, por algumas vezes, orientou a sua elaboração. Se, por um lado, não se atenuariam assim certas dificuldades de interpretação - antes pelo contrário, os obstáculos a vencer, quando radicam em estruturas científicas, podem sempre remover-se com estudo sério e meditado,

Página 2597

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2597

em si mesmo condição indispensável do progresso para que se trabalha.
Tudo se reconduz, bem vistas as coisas, aos anseios de integral jurisdicização das contribuições e impostos. Pensa-se que nunca é avisada a solução que de alguma forma estorva o progresso e a melhoria; prefere-se sempre, quando as dificuldades surjam, promover e incrementar os meios aptos a colher todos os frutos desse progresso.
Entre as dificuldades relacionadas com a jurisdicização mais acabada de que se revestiu o código, figura, com algum destaque, o sistema concebido para as letras e livranças.
Neste, revelam-se de decisiva importância os conceitos de obrigação cambiaria e de obrigação subjacente ou fundamental, que o inspiraram e devem ser sempre tidos em conta na resolução dos vários casos concretos; e, além de haver recorrido a elementos formais diversos, o regime está orientado por algumas considerações novas que se afastam ou excluem algumas outras que afeiçoaram o do Decreto n.º 8719, como, por exemplo, a de que todos os juros, até mesmo os devidos pela mora no pagamento, certificada com o protesto, são matéria colectável da contribuição industrial quando auferidos por um comerciante em virtude de uma transacção que se inclui no seu giro comercial específico.
Os serviços vêm reagindo bem a estas dificuldades. Se ainda subsistem hesitações, o caminho já percorrido legitima que se aguarde para breve uma total adequação ao novo regime. Não devem tardar mesmo algumas apreciações mais detidas sobre a matéria, oriundas de iniciativas não coordenadas de estudiosos ou, na sua falta, promovidas sob os auspícios da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, que, assim, tem procurado fomentar a adaptação rápida dos serviços, iniciando os funcionários novos ou adequando os antigos, cada vez melhor, aos quadros onde se inserem as soluções legais. Dentro em pouco, pois, um esquema de aparência difícil será, por certo, utilizado expeditamente e os diversos casos concretos resolvidos dentro do maior rigor e coerência jurídica.
Muito embora se houvesse visado fixar no código conceitos sólidos e precisos sempre que possível, foi muitas vezes necessário renunciar a esse propósito, adoptando fórmulas elásticas que permitissem uma, justa valoração de todas as situações concretas, uma vez ponderadas as várias circunstâncias que acompanham cada uma. Trata-se de um mero episódio do eterno conflito em que se empenham memorialmente os dois valores fundamentais da ordem jurídica: certeza e justiça. Não podem pretender-se soluções avisadas quando se acolher um destes valores com inteiro sacrifício do outro. Assim, se nunca se perdeu de vista a certeza do direito, algumas das- soluções do código tiveram que abrir brecha a enunciados fluidos que possibilitassem uma, justa apreciação dos vários casos concretos, cujas particularidades não podem muitas vezes valorar-se a contento através de fórmulas rígidas ou anquilosadas.
A justiça que se teve em vista possibilitar com essas fórmulas fluidas não se traduz - nem poderia traduzir-se - numa defesa incondicional dos interesses materiais imediatos dos contribuintes. Se por vezes conduz a dispensar o imposto relativo a uma situação que, a consagrar-se um enunciado menos permeável ao circunstancialismo de facto concreto, ficaria abrangida pelas regras de incidência, outras permite detectar e reprimir a fraude escudada sob o rigor de uma qualificação jurídico-formal que não exclui a efectiva existência de rendimentos tributáveis.
Os primeiros meses de execução do código demonstram que os serviços se compenetraram já do espírito que recomendou a adopção dessas fórmulas elásticas. A lei vem sendo aplicada num clima de absoluta imparcialidade, sem vestígios da tão chamada mentalidade fiscalista, que vulgarmente se atribui a um pretenso excesso da comprovada e quase proverbial dedicação dos funcionários de finanças. O Governo confiou nos executores imediatos do código, entregando-lhes as primeiras linhas de defesa dos interesses dos contribuintes, e tudo indica que o fez com amplo sucesso.
Entre os exemplos que poderiam relacionar-se figura o da doutrina, já firmada por despacho ministerial, de que, não obstante a latitude da fórmula a que se recorreu no n.º 5.º do artigo 6.º do código (que nomeia genericamente os «juros dos suprimentos ou de outros abonos feitos pelos sócios às sociedades»), não eram de considerar para o efeito como «outros abonos» as chamadas prestações suplementares de capital a que se refere a Lei de 11 de Abril de 1901, quando obedeçam estritamente ao condicionalismo nela previsto, nomeadamente à condição exigida pelo respectivo artigo 17.º Ponderou-se que, dada a presunção legal de existência de rendimentos tributáveis calculados a uma taxa mínima de 5 por cento, a verdadeira natureza das prestações suplementares de capital desaconselhava, quando confrontada com a razão de ser do n.º 5.º do artigo 6.º, que esta forma de abonos feitos pelos sócios às sociedades se considerasse atingida pelas regras de incidência do imposto.
Não obstante, podia prescindir-se de recorrer a qualquer outro elemento, além da própria letra da lei, para tributar a situação em causa. O esforço dialéctico que então se realizou no sentido de referenciar a boa doutrina, através de uma consideração atenta das razões que haviam determinado o legislador, conduziu à salvaguarda dos interesses materiais imediatos dos contribuintes logo na via administrativa, quando seria mais fácil e mais cómoda a atitude oposta, que, ao invés, importaria o aumento das multas fiscais.
Não se pretende, pois, na própria via administrativa, conseguir interpretações tendenciosas da lei, que prezem, acima de tudo, os interesses da Fazenda Nacional; pretende-se, sim, aplicar a lei com justiça, defendendo todos os interesses legítimos dos contribuintes, ainda quando seja necessário resistir ao atractivo de uma solução imediata e formalmente certa, para rebuscar, nas zonas mais profundas das intenções e propósitos legislativos, o verdadeiro alcance com que as normas foram pensadas. A fluidez de certos enunciados tem-se revelado, assim, um estímulo notável para a investigação das soluções mais justas, e, portanto, para a melhor compreensão dos justos limites da lei fiscal.
Aliás, constituirá surpresa para alguns a demonstração cabal de que não assistiram à reforma - como se receou nalguns sectores - quaisquer intuitos de aumento das receitas fiscais. Não obstante a dura prova a que vem sendo submetida a gestão financeira do País, tem-se conseguido até agora satisfazer os imperativos decorrentes da situação de guerra sem tecer a urdidura dos novos textos com propósitos latentes de ampliar o volume das receitas. Se tivesse de fazê-lo, o Governo não hesitaria em anunciar esse propósito com clara firmeza, na persuasão, felizmente comprovada, de que ninguém recusaria à Pátria, neste transe difícil, mais alguns sacrifícios materiais, que bem longe estão, aliás, de outros que se oferecem a cada passo

Página 2598

2598 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

nos campos de batalha, enaltecendo aqueles que os praticam em gloriosa renúncia e enchendo de orgulho os que, não sendo solicitados para eles, lutam à retaguarda com o mesmo ânimo inquebrantável.
Que não houve o propósito de aumentar as receitas, demonstram-no os números relativos à cobrança efectuada em 1963 que já se conhecem, quando confrontados com os dos anos anteriores, que decorreram ainda sob a vigência do Decreto n.º 8719.
O aumento que, porventura, se venha a verificar, relativamente aos dois últimos anos, não será de forma alguma significativo e conter-se-á dentro da margem de oscilação normal que a receita apresentava, de ano para ano, no domínio do Decreto n.º 8719.
Não pode esquecer-se, com efeito, que, se novas situações passaram a estar expressamente abrangidas pela incidência do imposto, outras, de grande rentabilidade, lhe foram subtraídas. Teve-se em vista erigir um sistema coerente, que se ativesse apenas às inelutáveis consequências lógicas dos princípios de que se partiu, sem atender a um eventual aumento ou diminuição de receita.
No elenco das situações atingidas pelo extinto imposto sobre a aplicação de capitais, contavam-se a de incorporações de fundos de reserva no capital das sociedades anónimas, por quotas ou em comandita por acções e a de emissão de títulos com reserva de preferência para os accionistas ou quotistas existentes à sua data, ambas introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 33 128, de 12 de Outubro de 1943. Marcados com essa proveniência, deram entrada nos cofres do Estado, 10 630 573$ em 1960, 10 738 200$ em 1961 e 7 666 641$ em 1962.
Como se sabe, a tributação destas situações foi suprimida pelo Código do Imposto de Capitais. Para se fazer ideia do montante da receita que assim deixará de existir, basta ter em conta que o movimento de incorporação de fundos de reserva, desde o início da vigência do código, em 1 de Janeiro, até Setembro, se elevou a um total de 169 800 000$, e que o de emissão de títulos com reserva de preferência para antigos sócios somou, no mesmo período, 75 000 000$.
É certo que a tributação destas situações, que se julgou desacomodada, no imposto de capitais pelas razões que oportunamente se divulgaram, vai ser ressuscitada, ainda que em termos incomparavelmente menos onerosos, no futuro imposto sobre as mais-valias. Aceitou-se realmente que, se tais situações não eram fonte de rendimento, tal como o entende a reforma fiscal, podiam no entanto configurar-se, em certos termos, como verdadeiros ganhos em capital cuja tributação se justificaria através de uma cédula específica. Todavia, esta simples correcção da perspectiva em que vinham sendo encaradas importou, coerentemente estruturada, uma apreciável diminuição da respectiva carga fiscal.
Aliás, o novo imposto sobre as mais-valias, cuja instituição se prevê para breve, atinge apenas, além dos ganhos referidos que correspondem a um tipo definido, mais três tipos diversos: um deles já encarado na legislação vigente e que surge agora reduzido a proporções mais modestas; outro por imposição decorrente da feição da nova contribuição industrial e como seu complemento lógico e indispensável; só o último se apresenta como matéria em certo sentido nova, que as realidades presentes evidenciaram de forma directa, reclamando um tratamento fiscal adequado.
É que, muito embora fosse propósito do Governo instituir a tributação sistemática das mais-valias, houve que renunciar a esse objectivo ao deparar com um sem-número de escolhos, de diversa natureza, que no presente momento ora praticamente impossível remover. Além do mais, uma forma de tributação sistemática de certo tipo de ganhos em capital exige um património de experiência ainda não consolidado entre nós. Preferiu-se, pois, até para não avançar num campo cujos princípios não estão ainda devidamente cimentados, limitar a tributação dos ganhos em capital a quatro tipos de casos que suportam com desafogo essa qualificação em face do conceito de rendimento consagrado na reforma fiscal.
Já se referiu, noutras oportunidades, que o Código do Imposto de Capitais, como, aliás, todos os códigos novos, nasceu impregnado dos anseios que presidem à actual política de fomento. São várias as disposições que os reflectem. Na maior parte dos- casos, trata-se de conceder isenções ou reduções do imposto em circunstâncias que encaminharão os investimentos para aqueles sectores cujo crescimento se mostre mais conveniente aos superiores interesses da economia nacional. E houve sempre presente a preocupação de que o indispensável esforço de incremento da produção que visa a melhoria do bem-estar presente e futuro da população se processe em termos de equilíbrio sectorial e regional.
Algumas vezes, na impossibilidade de identificar directamente os casos que recomendariam uma redução da taxa do imposto, o código aderiu a circunscrever apenas o condicionalismo que legitimaria o benefício, remetendo para o Ministro das Finanças o encargo de certificar em cada caso concreto a sua verificação e conceder depois, se o entender conveniente, a pretendida redução ao interessado através de um despacho de conteúdo individual. Trata-se de um compromisso semelhante ao que atrás se referiu, assumido na encruzilhada dos valores certeza e justiça da ordem jurídica e em termos de facultar ao Ministro das Finanças uma apreciação ponderada de cada caso concreto.
Por ser neste particular semelhante ao antecedente, poderia recear-se que viessem a ser fixados, para este tipo de casos, critérios que se inclinassem com excessivo pendor para a severidade no julgamento da verificação do condicionalismo legalmente previsto, a fim de, na medida do possível, não privar o Tesouro das receitas que tão necessárias lhe são na presente conjuntura. Porém, estes poucos meses de execução do diploma fornecem já elementos bastantes para ajuizar da conduta da Administração neste sector, abonando o escrúpulo com que foi encarada a prossecução desses objectivos fundamentais da política de desenvolvimento económico. Basta referir que empresas de manifesto interesse para a economia nacional beneficiaram já, ao abrigo da alínea c) do artigo 22.º e precedendo parecer favorável dos serviços competentes, de reduções da taxa do imposto, em circunstâncias por assim dizer idênticas, que representariam para o Tesouro o mínimo de 1000 contos de imposto em qualquer dos casos. A possibilidade de redução da taxa do imposto que o código prevê não é, pois, letra morta na medida em que a Administração financeira se mostra compenetrada da sua decisiva importância como instrumento de política económica cujo alcance supera muito as vantagens de um imediato benefício fiscal.
Tudo isto demonstra, afinal, que o espírito do código, por si evidente, não vem sendo distraído na sua execução e que o caminho já percorrido é de molde a justificar as melhores esperanças para o futuro. Reformou-se para corrigir, para adequar os textos às novas condições do desenvolvimento, para erigir em sistema aquilo que, em alguns casos, era a resposta a necessidades prementes, conseguida no sabor de uma inspiração de momento, tantas vezes ge-

Página 2599

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2599

nial; e ainda, não menos, para jurisdicizar integralmente as contribuições e impostos, iniciando, com novo espírito, uma nova era das relações entre os contribuintes e o fisco.
Sob este último aspecto, o Governo supõe haver já conseguido muito até agora e aguarda o futuro com serena confiança. Aliás, existe a consciência de se ter feito tudo o- que era possível para fomentar entre os contribuintes a necessária confiança e a justa compreensão do fenómeno tributário.
Para tanto, têm-se mantido firmes as posições que se definiram e tem-se satisfeito tudo o que se anunciou. A lei vem sendo aplicada com inteira imparcialidade e sempre com a preocupação de salvaguardar os justos interesses dos contribuintes. Em muitos casos, a Administração tem-se mesmo aproximado deles, aceitando-os e julgando-os com uma humanidade que sobreleva notoriamente os ideais de mera justiça formal.
Assim é que - e bastará esse exemplo - nenhum auto de transgressão se levantou no decurso do presente ano por infracções ao disposto no código, como, aliás, em relação aos demais que neste ano entraram em vigor. Também aqui se pode ver uma clara reafirmação do espírito presente na norma do Decreto-Lei n.º 44561, que aprovou o código, e que se reproduz em todos os restantes, ao estabelecer que durante o ano de 1963 só seriam levantados autos de transgressão por infracções ao que nele se dispusesse quando, previamente apreciado o caso pela entidade competente, se reconhecesse ter sido a infracção cometida com culpa grave. Não foi até agora concedida a necessária autorização em caso algum.
Não será ambição desmedida, perante tudo isto, esperar que os contribuintes correspondam ao esforço exemplar da Administração, dando provas de aceitar o imposto na sua verdadeira e alta missão económica e social, com adequada consciência dos seus propósitos, das suas finalidades e dos benefícios que, neutralizando a imediata privação de bens materiais, lhes traz no futuro. No que lhe respeita, a Administração saberá assegurar a execução do diploma dentro do espírito que presidiu à sua elaboração e orientou as suas várias disposições. Será esta porventura, entre todas as demais, a melhor garantia concedida aos contribuintes.

107. Publicado em 27 de Abril de 1962, o Código do Imposto Profissional entrou em vigor, nos termos do artigo 2.º do respectivo diploma preambular, em 1 de Janeiro do corrente ano.
Dentro da orientação geral da reforma fiscal de se tributar o rendimento real dos contribuintes, o imposto profissional respeita hoje ao ano em que o rendimento é obtido, e não àquele em que o imposto é cobrado, como até aqui, fazendo-se a sua liquidação no ano seguinte ao da produção do rendimento ou até no próprio ano, e não no anterior, como acontecia na vigência do Decreto n.º 16 731, de 13 de Abril de 1929.
Deste modo, os rendimentos que serviram de base à colecta do ano corrente foram os auferidos em 1962, deduzidos, no que respeita às profissões liberais, do imposto profissional liquidado aos contribuintes pelo exercício da sua actividade nesse mesmo ano.
A determinação dos rendimentos tributáveis passou a fazer-se com base em declarações dos contribuintes, verificadas por comissões mistas, compostas por representantes da Fazenda Nacional e delegados da respectiva categoria profissional.
Aos contribuintes que exerçam por conta própria qualquer das actividades constantes da tabela anexa ao código é dado, no entanto, e no que respeita ao método de determinação da matéria colectável, optar por um de dois sistemas: ou a entrega pura e simples da declaração dos rendimentos auferidos no ano anterior ou a passagem de recibos, em impressos de modelo oficial, a todos os seus clientes e a sua documentação junto das respectivas declarações. No primeiro caso, as declarações são examinadas pela referida comissão, à qual cabe fixar a matéria colectável; no segundo caso, o papel da comissão é apenas o de verificar a exactidão dos elementos constantes das declarações apresentadas, cabendo-lhe fixar a matéria colectável unicamente quando reconheça haver faltas, insuficiências ou inexactidões nos elementos declarados.
No corrente ano o único sistema utilizável era, naturalmente, o indicado em primeiro lugar, uma vez que a opção pela passagem de recibos das importâncias recebidas não podia nunca ter-se verificado em relação aos rendimentos auferidos em 1962 e que foram tributados em 1963.
Assim, o rendimento colectável dos profissionais que exerceram por conta própria qualquer das actividades constantes da tabela anexa ao código foi, em todos os casos, fixado pelas comissões acima referidas, com base nas declarações dos contribuintes.
Conquanto tivessem sido já anunciados na proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1959 e largamente divulgados os termos em que se ia proceder à reforma dos impostos, não viu o Governo, até agora, por parte dos órgãos da Nação que mais directamente compartilham da responsabilidade na formação da opinião pública, que se esboçasse neles um esforço no sentido de um substancial contributo, tanto no que se refere à construção e à definição de novos princípios ou à contestação dos que então foram definidos, como no que respeita à própria e directa defesa daquilo que se considere o interesse geral. Só em campos sectoriais, verdadeiramente limitados e insusceptíveis, pois, de determinarem só por si os critérios de uma política nacional, se ouviram algumas vozes de crítica justificada ou de sugestão em franco plano de colaboração.
A aproximação, porém, da data em que as disposições do referido código iam começar a ser objecto de obrigações individuais e concretas teve a virtualidade de despertar energias que - só porque o são - o Governo não pode deixar de estimar e de apreciar condignamente, sem embargo do seu carácter tardio.
Independentemente da maior consideração que está a ser dada a sugestões apresentadas directamente nos serviços competentes, não quer o Governo deixar sem esclarecimento os reparos feitos, nas vésperas e logo após a entrada em vigor do referido código, ao espírito de justiça de quem responde pela reforma fiscal ou à justificação das próprias soluções.
Limitadas como foram, as referidas críticas, à tributação em imposto profissional e em imposto complementar dos rendimentos das chamadas profissões livres, a estes dois pontos se circunscreverá o esclarecimento, com a ressalva de que, para um juízo amplo dos critérios de justiça que comandam a reforma em geral e cada uma das suas soluções, não poderá deixar de se fazer referência à situação tributária que do novo código resulta para todos os cidadãos sujeitos a imposto profissional.
Não carece de demonstração o reconhecimento de que os rendimentos do trabalho deverão ser objecto de um tratamento fiscal menos gravoso do que os rendimentos resultantes da pura aplicação de capitais.
O problema, porém, da justa tributação de tais rendimentos não pode ser resolvido isoladamente, certo como

Página 2600

2600 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

é que a justiça, no plano distributivo ou social, só se verifica e oferece a verdadeira virtude de autenticidade do seu objecto quando reportada a todos os componentes da colectividade, quer se trate dos que são susceptíveis, no caso tributário, de suportar impostos, quer dos que, por carência ou incapacidade de meios, se têm de limitar à fruição dos benefícios da acção do Estado.
Já por mais do uma vez se anunciou ser um dos principais objectivos e preocupações da reforma fiscal a concretização de um firme critério de justiça social, não unicamente através de medidas de desagravamento das economias débeis, mas designada e substancialmente de um equitativo confronto entre as fontes do rendimento colectável e a sua relação com os índices gerais de capacidade tributária da Nação Portuguesa.
Não se despenderão agora, por desnecessários, nem tempo nem argumentos para demonstrar a verdade daquilo que resulta de um sereno exame dos números que seguem.
Põem-se em confronto, unicamente, nos vários tipos de tributação parcelar, tais como estão nos diplomas já publicados, as sujeições tributárias dos mesmos rendimentos, conforme provenham do trabalho, da propriedade, da simples aplicação do capital, ou do comércio ou indústria.

QUADRO XXVII

[Ver tabela na imagem]

108. Mesmo que se abstraia do tratamento dado às remunerações do trabalho de mais reduzido montante, julga-se que a diferença entre as taxas dos vários impostos se concretiza, nos seus efeitos, em expressivo e substancial tratamento de favor, justamente dado, aliás, a uma fonte de rendimento cujas características não oferecem, nem no campo económico, nem no campo da justiça pura, a possibilidade de equiparação igualitária em relação a outras.
No que toca aos rendimentos do capital ou da indústria, a diferença entre a taxa de 8 por cento, só aplicável aos rendimentos do trabalho superiores a 300 000$, e a de 15 por cento que sobre aqueles- incide seja qual for o respectivo montante, situa as duas actividades ou fontes de rendimento numa posição que sensivelmente se expressa pela relação de um para dois. Ir mais longe no tratamento diferencial entre os dois sectores ou da consideração das pessoas perante a colectividade, supõe-se facto susceptível de graves consequências ou critério de política menos justificável.
Muitas das razões geralmente consideradas como argumento frontal para justificar o desagravamento fiscal dos rendimentos do trabalho não são exclusivas deste sector da vida económica e têm, pelo contrário, de ser atendidas também, em justa medida, na tributação de rendimentos provenientes de outras fontes. Haja em vista o que se passa com a contribuição predial rústica, em que não se pode ignorar a sujeição dos rendimentos da terra à susceptibilidade permanente de acções indomáveis que tornam precário e fortuito o valor do próprio capital, como ainda a participação activa e por vezes quase exclusiva do trabalho do homem na frutificação da terra.
O invocado problema do tratamento a dar sob o ponto de vista de justiça tributária às transmissões gratuitas do capital produtor de rendimentos sujeitos a contribuição predial e industrial depõe, aliás, contra o sentido da crítica: além de não compreender os casos em que sejam o próprio industrial ou o proprietário que formem por si o capital reprodutivo, à custa de sacrifícios e riscos nem sempre inferiores aos da aquisição do título profissional, sugere um sem-número de considerações que se situam no plano da filosofia e da moral estrutural da nossa colectividade.

109. Mas se o que anteriormente se expôs só afigura de todo incontestável - mesmo partindo do princípio de que a diferenciação de taxas em relação à proveniência dos rendimentos seria igual para todos os rendimentos do trabalho -, mais se evidencia o espírito de justiça, no plano social, consagrado pela reforma no Código do Imposto Profissional, se se tiver em conta que a taxa de 8 por cento, nos rendimentos do trabalho, só se aplica a rendimentos anuais superiores a 300 000$.
Crê-se que aquelas razões - aliás, em grande medida, consideradas pela reforma - e que se verificam mesmo para os trabalhadores que aufiram remunerações superiores a 300 000$ têm mais acentuada e substancial acuidade à medida que os proventos dos trabalhadores sejam inferiores àquele montante. A redução da taxa de 8 por cento que se considerou manifestamente justa para todas as remunerações do trabalho inferiores a 25 000$ mensais tornou-se, assim, fortemente degressiva, chegando a um limite que se considera ínfimo no campo das comparações tributárias: 1 por cento.
Do exame das rubricas compreendidas na primeira metade do quadro I vê-se quão evidente é o tratamento de favor que no novo código foi dado aos rendimentos de trabalho, em todos os casos de remunerações anuais inferiores a 300 000$.

110. Da comparação entre o regime tributário dos rendimentos do trabalho, em vigor até 31 de Dezembro de 1962, e aquele que resulta do novo Código do Imposto Profissional, também se evidencia o substancial desagravamento que, da sucessão dos dois regimes, necessariamente resulta para a maior parte dos contribuintes, ou seja para aqueles que auferem remunerações do trabalho de mais reduzido montante.
Considerados primeiramente os prestadores de trabalho por conta alheia, é abolido não unicamente o regime de distinção entre as formas de remuneração por ordena-

Página 2601

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2601

dos, gratificações e percentagens, mas reduzido também substancialmente o encargo tributário global, pelo menos em relação ao maior número de contribuintes, ou seja em benefício de todos aqueles que, como empregados, aufiram remunerações mensais não superiores a 10 000$. E não serão certamente os empregados com vencimento superior a 120 000$ anuais que terão maior razão de queixa, dado que até 300 000$ a taxa aplicável é, como se disse, inferior a 8 por cento.

QUADRO XXVIII

[Ver tabela na imagem]

111. A benevolência do sistema tributário agora estabelecido em relação ao anterior não é, porém, limitada ao sector dos que trabalham por conta de outrem. Também para as profissões livres se criou um largo benefício em relação a todos os contribuintes que aufiram proventos anuais inferiores a 120 000$.
A tributação dos contribuintes das profissões liberais vinha sendo feita em regime de fixação de contingentes e de repartição, em cada concelho, entre os profissionais da respectiva classe.
Supondo-se que a repartição tenha vindo a ser feita, em cada circunscrição, com a devida justiça, em harmonia com o presumido nível de rendimentos - e nela tinham parte decisiva os representantes das respectivas classes -, nunca os rendimentos inferiores a 120 000$ haviam sofrido até aqui tributação inferior àquela a que ficam agora sujeitos. Pelo contrário, e conforme se verifica do gráfico que se segue, elaborado para quinze contribuintes de Lisboa a quem se tenha feito uma repartição equitativa em função de hipotéticos mas equiparados rendimentos, a tributação dos que auferem menores proventos é agora largamente desagravada.

Imposto profissional (a)

[Ver gráfico na imagem]

a) Gráfico construído a partir do mapa anexo n.º 18.

Ponderadas, com a merecida atenção, todas as reclamações formuladas, havia que aguardar o decurso da execução efectiva do novo regime, contando-se, muito justamente, como os factos se encarregaram de confirmar, com uma serena e esclarecida actuação dos serviços.
Foram em número de 9556 os profissionais tributados pelo rendimento do exercício por conta própria de actividades abrangidas pelo código.
As reclamações contra o rendimento fixado somaram 1693, das quais as comissões distritais, com activa representação das classes profissionais, atenderam 1495, desatendendo apenas 198, o que equivale a dizer que só 2 por cento dos contribuintes que exercem actividade por conta própria foram colectados com base em rendimentos que, em seu entender, não correspondiam ao que efectivamente auferiram. Caberá ainda salientar que em grande parte dos casos as deliberações das comissões distritais foram tomadas por unanimidade e que os representantes de diversas categorias profissionais solicitaram que ficasse consignado nas actas das reuniões o seu apreço pelo elevado espírito de justiça revelado pelos representantes da Fazenda Nacional e pela maneira exaustiva e conscienciosa como estudaram as reclamações apresentadas, bem como pelo ambiente de muita compreensão e forma correcta e leal como haviam decorrido os trabalhos.
Dois pontos, ainda, merecem ser salientados a propósito da execução, no corrente ano, do Código do Imposto Profissional.
O primeiro refere-se ao facto de, nos termos do preceituado no § único do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 44 305, se não ter cobrado imposto profissional pelo rendimento

Página 2602

2602 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

dos contribuintes que, exercendo actividade por conta própria, faleceram até 31 de Dezembro de 1962 ou cessaram a sua actividade até 30 de Novembro desse ano e de, em obediência ao disposto no § único do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 45 117, não terem sido tomados em conta, no englobamento para liquidação do imposto complementar no ano corrente, os rendimentos dos empregados por conta de outrem e dos assalariados e os das actividades que foram tributadas em 1962 em imposto profissional (profissões liberais) e que, pelo código, passaram a ser consideradas exercidas por couta de outrem, quando respeitantes a contribuintes que faleceram ou cessaram a sua actividade até às referidas datas.
O segundo diz respeito à execução amplamente benévola do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 44305, pois nenhum auto de transgressão foi levantado nem nenhuma penalidade foi aplicada aos infractores.
Incidiram todavia muito mais fortemente, as críticas formuladas, sobre a sujeição dos contribuintes das profissões livres a imposto complementar.
Ora, sabendo-se que o imposto complementar ia também ser reformado e porque não tinha sido ainda tornado público, em toda a sua extensão, o critério que em relação a ele foi adoptado, ficou naturalmente prejudicada toda a argumentação que, a este respeito, extemporaneamente se fez.
De resto, tendo-se reconhecido que o regime tributário estabelecido no novo Código do Imposto Complementar só poderia entrar em vigor em 1964, foi publicado, em 8 de Julho do corrente ano, o Decreto-Lei n.º 45 117 contendo as regras a adoptar no englobamento dos rendimentos para a liquidação do imposto complementar em 1963.
Assim, considerou-se como matéria colectável proveniente dos rendimentos sujeitos a imposto profissional, para os contribuintes que exerciam por conta própria actividades constantes da tabela anexa ao código, apenas 50 por cento do rendimento tributado; para os empregados por conta de outrem e assalariados, o rendimento que serviu de base à colecta de 1962, acrescido das gratificações, percentagens e outros abonos percebidos no referido ano, e para as actividades que em 1962 foram tributadas em imposto profissional (profissões liberais) e que a partir de 1 de Janeiro de 1963 passaram a ser consideradas como exercidas por conta de outrem, a importância correspondente a quinze vezes a verba principal do imposto profissional liquidado naquele ano.
Supor como injustas soluções integradas numa reforma de conjunto, que só em conjunto pode ser avaliada, é antecipar critérios de apreciação, se não descrer ostensivamente do sentido de justiça de quem outra preocupação não põe, nos objectivos da reforma tributária, que não seja a justa equiparação das disponibilidades de todos, para que todos contribuam para o bem comum na medida em que o possam e, consequentemente, em que o devam.

112. Anunciada no relatório da proposta de lei de autorização das receitas e despesas para o ano em curso a publicação do novo Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola, foi, em cumprimento do que se estabeleceu, efectivamente publicado o Decreto-Lei n.º 45 104, de 1 de Julho de 1963, que aprovou o novo código, em que se introduziram importantes alterações no regime de tributação do rendimento da propriedade imobiliária e da exploração agrícola.
Também neste diploma, como nos restantes, foi preocupação fundamental subordinar os esquemas fiscais às imposições da política de desenvolvimento económico, conjugando as naturais preocupações doutrinárias com os dados da experiência e procurando, com espírito realista, actualizar e inovar, sem menosprezar a conjuntura e a vantagem de aproveitar quanto possível as estruturas orgânicas e jurídicas anteriores.
Ponto saliente do novo código é a autonomização do imposto sobre a indústria agrícola, incidindo sobre o lucro do cultivador, em face da contribuição predial rústica, que tributa unicamente o rendimento dos prédios rústicos. A distinção entre os dois impostos não só representa um inegável progresso técnico, como ainda era, de certo modo, pertinente ao sistema anterior. Efectivamente, posto que a realidade em que assenta a distinção não tivesse tido expressa consagração jurídica, a verdade é que a contribuição predial rústica vinha incidindo, ao menos tendencialmente, sobre a renda da terra, acrescida do lucro do cultivador.
Estamos perante rendimentos de origens diversas, que podem não afluir a um mesmo património, sendo inegável a necessidade de sobre eles fazer incidir uma tributação separada no sistema parcelar que a reforma adoptou, não só por razões técnicas derivadas das suas diversas natureza, origem e estabilidade, como ainda por imperativos do princípio da personalização do imposto, pela repercussão que tem no imposto complementar.
Por estas e outras razões que constam do relatório do novo código, e foram também explanadas no relatório da proposta de lei de autorização das receitas e despesas para o ano corrente, é que veio a consagrar-se, quanto ao rendimento da propriedade rústica, por um lado, a tributação da renda, e, por outro, a do lucro do cultivador.
Renda e lucro são, como se disse, rendimentos com natureza, estabilidade e origem diferentes.
A renda é a parte do produto que cabe ao capital fundiário, à terra e aos recursos naturais e aos respectivos melhoramentos, compreendendo, entre outros, as construções, as dependências e as benfeitorias.
Por sua própria natureza, a renda sofre flutuações lentas. Pode dizer-se que é a contrapartida da terra e respectivos melhoramentos, supondo-se esta arrendada.
Ora, sobre a terra, ou recursos naturais, e melhoramentos nela incorporados, exerce-se a actividade exploradora, que supõe, em maior ou menor medida, iniciativa e organização, disponibilidades e risco na consecução dos resultados. Desta forma, o lucro da empresa agrícola é semelhante ao lucro da empresa comercial ou industrial, diversificando-se nitidamente da renda, remuneração do capital fundiário, da terra e melhoramentos nela incorporados. Esta separação é nítida, transparente, nos casos em que a titularidade da terra e a da condução da empresa agrícola respeitam a pessoas diferentes; menos definida, menos individualizada, mas não menos real, nos casos em que a titularidade da terra e da exploração pertencem à mesma pessoa ou entidade.
As diversidades de natureza, origem e estabilidade da renda e do lucro impunham, pois, que se desse expressão jurídica autónoma a estas duas realidades, o que se procurou fazer sujeitando a renda à contribuição predial rústica e o lucro ao imposto sobre a indústria agrícola.
Note-se que, pelo que respeita ao lucro agrícola, duas orientações se apresentaram como possíveis: ou sujeitar o lucro agrícola ao imposto industrial que incidiria sobre o rendimento líquido respectivo, em termos semelhantes às empresas comerciais e industriais, ou criar um imposto próprio que atentasse no condicionalismo particular que se verificasse no seu sector de aplicação.
Foi a última solução a consagrada. Por um lado, a impossibilidade de aplicação à indústria agrícola dos métodos de determinação da matéria colectável da contribuição industrial, assentando na perfeita contabilização da em-

Página 2603

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2603

presa; por outro, a íntima conexão entre a renda e o lucro, e, finalmente, a instabilidade da situação e perspectivas da agricultura, impuseram a criação do imposto sobre a indústria agrícola, imposto novo, integrado no Código da Contribuição Predial, estruturado para se amoldar aos particularismos próprios da exploração agrícola.
A estas razões acresceram motivos de ordem estritamente jurídica, em que avultaram a circunstância de os rendimentos da propriedade imobiliária e respectiva exploração serem regulados, tradicionalmente, no mesmo diploma, e a de muitas disposições relativas à contribuição predial serem aplicáveis ao novo imposto.
Aspecto em que se revela nitidamente a preocupação de amoldar o imposto às difíceis circunstâncias em que vive presentemente a agricultura está em ter-se procurado tributar apenas os lucros avultados. Na verdade, nos termos do artigo 319.º do código, estão isentas do imposto as explorações agrícolas, silvícolas ou pecuárias cujo lucro anual não seja superior ar 30 000$.
Um outro objectivo se procurou alcançar com a referida isenção. Na verdade, prevendo o Código do Imposto Profissional a isenção dos rendimentos provenientes do trabalho até um certo limite, haveria, por igualdade de razão, que isentar o lucro agrícola, em correspondente medida, na suposição de que nele normalmente, em maior ou menor extensão, estará incorporado trabalho do explorador e, em muitos casos, da respectiva família, particularmente nas explorações de pequena dimensão.
Importa referir também, nas suas grandes linhas, os traços fundamentais do novo sistema, do ponto de vista financeiro, económico, social e jurídico, aliás já anunciados no relatório do ano passado e explicitamente definidos no relatório do Decreto-Lei n.º 45 104, de 1 de Julho do corrente ano, que aprovou o novo código.
Do primeiro ponto de vista, não se duvida de que a tributação dos rendimento provenientes da terra não acompanhou integralmente o processo de transformação que caracterizou a agricultura nacional nas últimas décadas. Na verdade, não obstante a relativa estabilidade de um rendimento colectável - que compreendia não só a renda fundiária como também o lucro da exploração -, o mais racional aproveitamento da terra, através da intensificação cultural, modernização do equipamento e dos processos culturais, veio a criar situações bem diversas das tradicionalmente contempladas pela legislação da contribuição predial. Da evolução resultou uma crescente importância dos capitais de exploração em relação ao capital fundiário, agravando a de há muito reconhecida inadequação dos métodos de determinação da matéria colectável.
Pelo que se refere à contribuição predial rústica, vem de longa data o reconhecimento de que a base mais perfeita para a tributação é o cadastro geométrico. Ora a avaliação cadastral só passará a determinar a renda fundiária, isto é, a parte do produto que deve ser atribuída à propriedade da terra e respectivos melhoramentos, desinteressando-se da exploração agrícola, silvícola ou pecuária, cujo lucro efectivo, por natureza, não é previsível. Houve, pois, que aperfeiçoar a legislação cadastral e integrá-la no novo código.
Porém, atenta a natural morosidade dos respectivos trabalhos, houve que prever a actualização rápida das matrizes e a vigência de um regime transitório.
Na verdade, quanto às matrizes rústicas, essa necessidade tornava-se imperiosa, dado que a grande maioria dos seus rendimentos estava inteiramente desactualizada, sabido como é que tais matrizes foram estabelecidas há cerca de um século e com base em meras declarações dos proprietários.
A circunstância de os seus rendimentos terem sido objecto de correcções várias, através de factores de aplicação geral, se permitiu reduzir essa desactualização, em muitos casos contribuiu para aumentar a disparidade já então existente entre os rendimentos dos diversos prédios, pelo que não podia dispensar-se nunca a presente actualização.
Daí o ter-se estabelecido no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 45 104, de 1 de Julho último, a correcção dos rendimentos inscritos nas matrizes prediais rústicas dos concelhos onde ainda não vigore o cadastro geométrico, e se haverem fixado os critérios a que deve obedecer a actualização.
Na impossibilidade de avaliar todos os prédios, enveredou-se pelo critério de limitar as avaliações a certo número de unidades, consideradas como prédios-tipo. O rendimento obtido para estes permitiria, em confronto com o seu rendimento matricial, determinar factores médios aplicáveis aos restantes prédios que revestissem as mesmas características, corrigindo-se desta forma os respectivos rendimentos.
A distinção entre prédios grandes, médios e pequenos julgou-se indispensável, por se admitir que a desactualização de rendimento seria mais acentuada na grande propriedade do que na média, e mais nesta do que na pequena.
Verificou-se no decurso dos trabalhos que a grande desactualização dos rendimentos não existe só na grande propriedade, mas também na média e na pequena, sucedendo que, em alguns casos, os resultados da avaliação revelaram percentagens de desactualização da pequena e média propriedade não inferiores às determinadas para a propriedade de grandes dimensões.
Esta circunstância tem a natural justificação no facto de que a iniciação ou a modificação da cultura de um prédio pequeno ou médio, abrangendo, em regra, a sua totalidade, provoca uma alteração, proporcionalmente muito mais sensível do que a modificação feita paralelamente num prédio grande, que em regra é limitada a uma só das suas parcelas ou partes componentes. No entanto, concluiu-se que, em regra, a grande propriedade é a mais beneficiada, até porque é aquela que nas matrizes acusa maior percentagem de rendimentos primitivos.
Verificou-se também que o estado de disparidade a desactualização dos actuais rendimentos era, independentemente dos melhoramentos fundiários existentes nalguns casos, sobretudo consequência da maior valorização que certos produtos agrícolas de algumas regiões do País sofreram após a eclosão do último conflito mundial em relação aos produtos das culturas predominantes não só nessas próprias regiões como nas restantes.
De harmonia com os resultados obtidos através da avaliação dos prédios-tipo e que em linhas gerais se deixam focados, depois de desprezados os resultados de avaliações feitas a prédios que se verificou terem sofrido grandes melhoramentos e a outros que os não sofreram ou ainda acusaram um decréscimo de rendimento pelo facto de terem desaparecido as culturas a que estavam votados, de maior produtividade que as actuais, obtiveram-se factores, coeficientes para cada um dos tipos de propriedade - grande, média, pequena. Os resultados obtidos foram objecto de despacho publicado no Diário do Governo,- 1.º série, de 26 de Setembro de 1963.
Quanto aos prédios inscritos na matriz anteriormente ao ano de 1929, adoptaram-se coeficientes únicos para todos os concelhos do mesmo distrito e para cada um dos três tipos de propriedade, tipos estes diferenciados por

Página 2604

2604 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

escalões de rendimento colectável inscrito na matriz, variáveis de distrito para distrito.
Quanto aos prédios avaliados isoladamente no período de 1930 a 1937, em pequeno número, estabeleceu-se um coeficiente único por distrito para os três tipos de propriedade, por se entender que na avaliação não podia deixar de ter-se usado o mesmo critério, quer se trate de grande, quer de média ou pequena propriedade.
Identicamente se procedeu para com os prédios avaliados posteriormente a 1937, fixando-se um factor único por distrito, necessariamente mais baixo do que o anterior - dado que este também fora - fixado abaixo dos relativos aos prédios inscritos até 1949 - em relação com a época mais ou menos recente da inscrição e avaliação.
Quanto aos prédios dos concelhos ou freguesias que foram objecto de avaliações gerais realizadas posteriormente ao ano de 1942, atendendo a que os rendimentos fixados tiveram por base as médias dos preços dos géneros no triénio 1938 a 1940, estabeleceu-se um coeficiente único de actualização para os três tipos de propriedade dentro de cada concelho, dada a circunstância de, em muitas avaliações, já se ter entrado em linha de conta com a valorização resultante da realização de melhoramentos fundiários posteriormente à elaboração das antigas matrizes.
Crê-se que os factores fixados permitirão uma actualização equitativa dos rendimentos colectáveis.
Deve notar-se que a classificação da propriedade em grande, média e pequena não obedeceu ao mesmo quantitativo de rendimentos, variando de distrito para distrito consoante o grau de parcelamento da propriedade em cada região.
Isto pelo que se refere à actualização das matrizes rústicas.
Quanto à contribuição predial urbana, adoptou-se o princípio da tributação dos rendimentos reais no que respeita à tributação dos prédios arrendados; parte-se, nestes casos, do rendimento efectivo declarado pelo contribuinte, pré vendo-se ainda a tributação dos sublocadores quando a renda que recebem seja superior à que pagam ao senhorio.
Quanto aos prédios não arrendados, manteve-se a tributação com base num rendimento estimado, sujeito a actualização periódica, tendo-se apenas feito alguns aperfeiçoamentos de pormenor. Simplesmente, também aqui era urgente a correcção dos respectivos rendimentos matriciais. Por isso mesmo determinou o artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 45 104, de 1 de Julho último, que até se proceder à renovação das actuais matrizes urbanas, com observância do disposto no artigo 158.º do código, continuarão as mesmas a ser utilizadas, corrigindo-se, pois, os rendimentos dos prédios arrendados pela forma seguinte:

1.º A correcção efectuar-se-á multiplicando-se os rendimentos inscritos na matriz por factores calculados de forma análoga aos referidos no artigo 7.º;
2.º Os índices serão estabelecidos, para cada concelho ou bairro, com base em avaliação de prédios-tipo, seleccionados por época de inscrição e por escalões de rendimentos matriciais;
3.º A avaliação de prédios-tipo terá em vista determinar o seu rendimento colectável por comparação com prédios que se encontram arrendados o que melhor sirvam de padrão.

De harmonia com o disposto neste artigo, considerou-se no referido despacho de 26 de Setembro de 1963 a actualização dos rendimentos da propriedade urbana não arrendada através de factores variáveis segundo a época da inscrição dos prédios na matriz, obtidos mediante a comparação dos rendimentos resultantes da avaliação de alguns prédios-tipo com os respectivos rendimentos matriciais.
Para isso, começou por se fazer o apuramento pela média dos índices de factores por concelhos, para cada escalão de rendimentos e para cada época de inscrição, que se designaram por factores médios.
Procedeu-se seguidamente ao agrupamento daqueles concelhos e freguesias em zonas delimitadas e identificadas por letras de A a E:

A zona A, compreendendo os concelhos de Lisboa e Porto e aqueles cujas proximidades tivessem influência no nível das respectivas rendas: Almada, Barreiro, Cascais, Loures, Oeiras, Vila Franca de Xira, Gondomar, Maia, Matosinhos, Valongo e Vila Nova de Gaia;
A zona B, abrangendo as cedes dos concelhos cuja contribuição industrial tenha sido superior a 2000 contos, por se admitir que o desenvolvimento industrial ou comercial constituiria um dos indicadores mais expressivos de maior influência na fixação do nível das rendas;
A zona C, abrangendo as sedes dos concelhos cuja contribuição industrial estivesse compreendida entre 400 e 2000 contos;
A zona D, incluindo os concelhos cuja contribuição industrial fosse inferior a 400 contos;
E, finalmente, a zona E, constituída pelas freguesias rurais de todo o País.

Posteriormente a esta classificação, apurou-se a média dos factores médios dos concelhos abrangidos por cada uma das zonas, com igual exclusão daqueles que mais se afastassem dos termos médios, constituindo índices comuns a cada zona, que se designaram por factores aproximados.
Notando-se que mesmo assim os factores aproximados continuavam, em certos casos, a apresentar anomalias, procedeu-se à sua correcção por forma a eliminar as principais deficiências de que enfermavam e deliberou-se utilizar um factor médio único para todos os rendimentos - em vez de um por cada escalão -, variável apenas com a época de inscrição e com a zona em que os prédios se situam.
Fez-se assim o apuramento de factores finais de correcção, a que se reconheceram as seguintes vantagens:

a) Simplificar a correcção dos rendimentos, mediante a aplicação de um único factor em vez de um por cada um dos sete escalões em que os rendimentos se haviam inicialmente dividido;
b) Obter um montante de rendimento actualizado sensivelmente igual ao que se obteria pela aplicação de factores por cada um daqueles sete escalões;
c) Evitar o agravamento dos grandes rendimentos, que não é tão sensível com a aplicação do factor único, por ser inferior àqueles que se aplicariam aos últimos escalões;
d) Evitar a anomalia de afectar os pequenos rendimentos com factores maiores do que os que corrigiriam os grandes rendimentos.

Finalmente, atendendo a que nem só a contribuição industrial pode ter influência na delimitação das zonas inicialmente definidas e que mesmo a própria contribuição pode expressar situações diferentes das que foram pre-

Página 2605

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2605

vistas na primeira classificação, consoante as localidades onde as actividades industriais ou comerciais se desenvolvam, sendo certo que em muitos casos se situam em freguesias diferentes das sedes de concelho, deliberou-se ouvir os serviços externos da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos. Assim, através de inquérito organizado, a classificação por zonas inicialmente sugerida foi alterada, nalguns casos, pelo facto de se reconhecer que outros elementos, além dos da contribuição industrial, poderiam influir acentuadamente no nível de rendas de certas localidades.
Com efeito, a existência de zonas balneares ou termais, de zonas turísticas e de localidades com permanência de serviços públicos, de natureza civil ou militar, conduziu à verificação de um contributo importante para o desenvolvimento da propriedade urbana e para a consequente evolução das rendas.
Verificou-se também que algumas actividades económicas de certo vulto se desenvolviam em freguesias rurais, isto é, situadas fora das sedes de concelho, contribuindo para que o nível de vida das respectivas populações, em alguns casos, fosse superior ao daquelas que vivem nas próprias sedes de concelho.
Das correcções nas matrizes prediais rústicas e urbanas levadas a efeito pela forma acabada de descrever poderão os contribuintes reclamar, com os fundamentos previstos no artigo 269.º do código, no prazo de 30 dias, anunciado por editais, logo que as respectivas operações se encontrem concluídas em cada concelho ou bairro.
Da mesma forma poderá o chefe da repartição de finanças propor a avaliação dos prédios cujos rendimentos colectáveis resultantes da correcção sejam, em seu entender, manifestamente inferiores àqueles com que os mesmos prédios deveriam estar inscritos e, bem assim, dos que se encontrem inscritos nas matrizes sem rendimento, ainda que por motivo de isenção.
Concluídas as operações de correcção, a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos anunciará no Diário do Governo a data a partir da qual as respectivas matrizes rústicas ou urbanas, reorganizadas, começarão a utilizar-se para efeitos fiscais.
Princípio comum a ambos os casos, de prédios urbanos arrendados e não arrendados, é o de se deduzirem nos rendimentos, pela primeira vez, encargos médios com energia, porteiros, aquecimento, etc., calculados para todo o País.
Pelo que respeita ao imposto sobre a indústria agrícola, procura-se tributar o lucro líquido da exploração com base em declarações dos contribuintes, corrigidas, quando for caso disso, por uma comissão de verificação, que poderá fixar a matéria colectável. Estabeleceu-se, porém, como vimos, uma isenção de largo alcance, que faz recair o imposto apenas sobre explorações agrícolas, silvícolas ou pecuárias de certa dimensão.
Cumpre fazer referência especial ao regime dos prédios urbanos não arrendados em que se exerçam actividades comerciais ou industriais, sobre as quais não incidirá contribuição predial, porque se entendeu que, fazendo tais prédios parte do capital da empresa, vêm a reflectir-se nos resultados da exploração, onde é tributado o respectivo rendimento.
Em matéria de taxas, unifica-se a da contribuição predial rústica a um nível médio mais baixo do que o anterior, que era de 10 por cento, mantendo-se a da contribuição predial urbana sem alterações, fixada em 12 por cento, atento que nela se incorpora a actual taxa de compensação. Quanto ao imposto sobre a indústria agrícola, fixa-se a taxa de 10 por cento.
A orientação predominante nesta matéria foi a de procurar reduzir as taxas mediante a obtenção de um maior rigor na determinação da matéria colectável, a fim de se conseguir por esta via atingir maior equidade na distribuição da carga tributária, sem afectar gravosamente o nível das receitas públicas.
Daí ter-se imposto a actualização dos rendimentos colectáveis constantes das matrizes prediais, enquanto prosseguem os trabalhos de reavaliação geral, de que estão encarregados os serviços cadastrais.
Obtida, assim, uma primeira uniformização da matéria colectável, pôde francamente encarar-se a fixação de uma taxa única de 10 por cento para a contribuição predial rústica, destinada a substituir as diversas taxas que vêm sendo aplicadas, as quais, tendo em conta certos agravamentos - agora eliminados -, atingiam 8, 10, 16 e 18,175 por cento, consoante os casos. Como as mais reduzidas destas taxas só respeitam aos concelhos submetidos ao regime do cadastro geométrico, logo se vê que a taxa é, para a grande maioria dos contribuintes, muito inferior às que hoje se aplicam.
Não obstante esta considerável redução, acontecerá que, em resultado da melhor determinação da matéria colectável, alguns proprietários fiquem mais onerados do que actualmente.
Julgou-se, porém, conveniente impedir que da reavaliação da matéria colectável pudesse resultar um súbito agravamento da carga tributária pelo que se refere íi contribuição predial rústica e imposto sobre a indústria agrícola e, por isso, no diploma que aprovou o código, se fixou a taxa mais reduzida de 8 por cento para vigorar nos três primeiros anos. Este período reputa-se suficiente, não só para evitar situações de injustiça relativa na fase de ajustamento da matéria colectável, como ainda para permitir aos agricultores que tomem com antecedência as medidas necessárias à melhoria da produtividade, com consequente aumento da sua capacidade contributiva.
A primeira das razões apontadas levou também a reduzir a taxa da contribuição predial urbana para 11 por cento, igualmente pelo período de três anos.
Note-se que durante o período transitório de redução das taxas aplicar-se-á a taxa de compensação criada pelo artigo 10.º da Lei n.º 2022, de 22 de Maio de 1947, a qual será aplicável aos próprios prédios cadastrados com base em tarifas desactualizadas, isto é, de 1936 a 1940.
Pelo que se refere à liquidação e cobrança, importa pôr em relevo que a técnica adoptada se subordinou tanto quanto possível ao princípio da tributação dos rendimentos reais.
Daí que, nos casos em que a tributação recai sobre aqueles rendimentos e em que, por isso mesmo, a cobrança tem de ser posterior à produção da matéria colectável, surgisse a necessidade de admitir uma liquidação provisória, com base nas matrizes, para que não houvesse lugar a dificuldades de tesouraria.
Ainda do ponto de vista financeiro, e pelo que respeita ao imposto sobre a indústria agrícola, apenas convém chamar a atenção para o método de determinação da matéria colectável.
Na verdade, atento que o imposto sobre a indústria agrícola incide sobre rendimentos sensíveis às oscilações da conjuntura, de modo semelhante ao que sucede quanto aos rendimentos das empresas comerciais e industriais, o método de determinação da matéria colectável consagrado tem natureza semelhante ao adoptado para os rendimentos sujeitos à contribuição industrial, atendendo-se, porém, aos particularismos próprios das explorações agrícolas, designadamente no que respeita ao reconhecimento da inexistência ou flagrante deficiência dos respectivos ele-

Página 2606

2606 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

mentos de contabilidade. Foi-se, pois, para o método da declaração dos contribuintes, corrigida, quando for caso disso, por uma comissão de verificação, que poderá fixar a matéria colectável.
Do ponto de vista económico interessa salientar que, tratando-se neste sector de tributar rendimentos provenientes de actividades do maior relevo na vida económica do País, não se abstraiu da política de desenvolvimento em curso, sem esquecer que não compete à reforma fiscal ser por si só o único veículo dessa política.
Daí procurar-se na elaboração do código fornecer estímulos, quer directos, quer indirectos, que, de harmonia com as directrizes fundamentais do desenvolvimento, melhor o servissem e com ele cooperassem. Na verdade, não só se alargaram algumas isenções já concedidas como ainda se criaram benefícios que antes não existiam.
Foi com o objectivo de uma íntima harmonia com a política do fomento em curso que se ampliaram as isenções que vinham sendo concedidas aos casais agrícolas, nos melhoramentos agrícolas, ao povoamento florestal e à reorganização agrária pelo emparcelamento. Idênticos objectivos se verificam na isenção das pequenas explorações e das cooperativas de exploração agrícola, silvícola e pecuária.
Entre as preocupações de ordem social figuram as que se referem ao novo sistema de isenções destinadas a fomentar a construção civil no sector da habitação económica.
O regime anterior, constante de legislação abundante e dispersa, promulgada em várias épocas, contemplava, por forma diversa, as casas económicas, as de renda económica, as de renda limitada, etc., e outras construções não subordinadas a qualquer classificação.
Adopta-se agora um regime único, que corresponde à unidade de objectivo que caracterizou o emprego de variados meios tendentes a resolver o problema da habitação e que aproveitará apenas às casas destinadas a famílias pobres ou de modestos recursos.
Quanto ao regime agora estabelecido em tão importante matéria importa esclarecer alguns pontos.
Os prédios urbanos já construídos, em construção ou a construir em terrenos adquiridos para o efeito até à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 45 104, de 1 de Julho de 1963, que aprovou o código, continuam a beneficiar das isenções temporárias estabelecidas no regime anterior, ou seja no Decreto-Lei n.º 31 561, de 10 de Outubro de 1941, e legislação complementar.
Os prédios urbanos que passem a construir-se de novo e se destinem a habitação passarão a ficar isentos temporariamente, nos termos dos artigos 17.º a 20.º do código. Da mesma isenção beneficiará o acréscimo de rendimento dos prédios urbanos ampliados e melhorados.
Para esse efeito será em breve publicada a portaria aprovando a tabela que especificará não só a duração das isenções, como também as condições em que elas poderão ser concedidas, segundo o § 1.º do artigo 17.º
Como se disse, esta isenção passa a aplicar-se a todos os prédios urbanos, na parte em que sejam utilizados para habitação, «independentemente de qualquer regime jurídico especial», isto é, deixando de ser aplicáveis, a prédios nestas condições, as isenções temporárias consignadas em quaisquer outros diplomas.
Foi ainda, em atenção a preocupações de ordem social, concedida isenção aos contribuintes que não tenham mais do que a casa em que habitem, quando o rendimento colectável desta não exceda 300$, bem como se isentaram os rendimentos colectáveis dos prédios rústicos até 1200$ por cada contribuinte que não possua outros bens imobiliários e naqueles tenha estabelecidas explorações
agrícolas puramente familiares. Trata-se de isenção estranha à mecânica da contribuição predial rústica, mas que pretende atentar na circunstância de que o trabalho familiar incorporado em explorações deste tipo fica, normalmente, sem remuneração equitativa.
Finalmente, ficam isentos de contribuição predial os rendimentos colectáveis rústicos e urbanos cuja soma em cada concelho ou bairro, e por cada contribuinte, seja igual ou inferior a 100$, em vez de 15$, como no direito anterior.
Do ponto de vista jurídico, procurou-se elaborar um código equilibrado, cuidado na forma, preciso nos conceitos, e que resolvesse tanto quanto possível as dúvidas acumuladas por longa elaboração jurisprudencial e administrativa. Julga-se que se conseguiu amplamente esse objectivo.
De destacar, a formulação explícita do conceito fiscal de prédio, cuja importância não necessita de ser posta em relevo como elemento de base, capaz de influir em boa parte na estrutura do código, influenciando importantes soluções de pormenor.
Para isso houve que:

1.º Considerar como prédio determinadas construções ligadas ao solo ou nele assentes com certa permanência, embora não podendo considerar-se imóveis por natureza;
2.º Estabelecer um prazo mínimo que «definisse» a permanência das construções e que excluísse as feitas a título precário, em obras públicas e outras, nas zonas de turismo, praias, etc.;
3.º Rever a classificação dos prédios em rústicos e urbanos, esclarecendo melhor o princípio de que os primeiros são os afectos à agricultura e os segundos são os aplicados a quaisquer outros fins, usando o critério do destino na falta de afectação comprovada e esclarecendo o regime dos chamados prédios mistos, na hipótese de entre as suas partes diferenciadas não poder estabelecer-se relação de acessório e principal.

113. Em 1 de Julho de 1963 foi também publicado o diploma que aprovou o Código da Contribuição Industrial.
Pode dizer-se que em relação à generalidade do sistema tributário as modificações verificadas na estrutura deste imposto foram as mais profundas.
Na linha de pensamento que orientou a reforma dos impostos parcelares sobre o rendimento, a contribuição industrial, que no regime anterior incidia, em regra, sobre o rendimento normal obtido no exercício das actividades de natureza comercial e industrial, passa agora a ter como base de imposição o rendimento real.
Já em 1929 se havia reconhecido a superioridade do princípio da tributação do rendimento real como a base mais conveniente para uma equitativa repartição do imposto. Contudo, optou-se então pela tributação de rendimentos normais, dado que se apresentava inviável, perante as estruturas da época, a aplicação do referido princípio.
Após um longo período de evolução com alterações profundas nas estruturas económicas - tenham-se em conta as modificações ocasionadas no volume e composição do produto nacional, na diversificação das actividades e na dimensão média das empresas, o aumento do número de empresas cuja gestão se apoia em técnicas contabilísticas regulares e suficientemente uniformes, as transformações verificadas na disciplina das actividades económicas e as mais amplas possibilidades de um controle eficaz dos re-

Página 2607

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2607

sultados -, tornou-se praticável a tributação dos rendimentos reais resultantes do exercício das actividades comerciais e industriais, reclamada, de resto, pela política de desenvolvimento económico e pela liberalização do comércio internacional.
Deste modo se substituiu a tributação de rendimentos ou valores normais pela tributação de rendimentos reais.
No regime anterior a contribuição industrial tinha por objecto o exercício de comércio, indústria, arte ou ofício e a base da tributação era, em regra, o rendimento normal proveniente do exercício de tais actividades.
Segundo o código aprovado pelo Decreto-Lei n.º 45103, de 1 de Julho de 1963, o imposto que estamos a considerar passou a ter por objecto «os lucros imputáveis... ao exercício, embora acidental, de qualquer actividade de natureza comercial ou industrial» (artigo 1.º).
Deste modo, passaram a ficar sujeitos a imposto os lucros obtidos através de actos de comércio isolados, que no regime anterior, por não se enquadrarem nos conceitos de comércio, indústria, arte ou ofício, estavam afastados da tributação em contribuição industrial.
Por outro lado, seguiu-se o critério de considerar de natureza comercial ou industrial, para efeito da sua sujeição a este imposto, o exercício por conta própria de actividades não sujeitas a imposto profissional, o que equivale a dizer que se sujeitaram a imposto profissional apenas as profissões liberais e outras a elas assimiláveis e a contribuição industrial todas as demais profissões independentes.
No que toca às sociedades comerciais e civis sob a forma comercial, dado que a sua finalidade é a obtenção de lucros, sujeitaram-se a contribuição industrial por todos os seus rendimentos, qualquer que seja a natureza das respectivas fontes. Porém, em ordem a evitar os inconvenientes de sucessivas tributações, introduziram-se ajustamentos de ordem técnica que permitem considerar adequadamente na tributação do lucro global da empresa em contribuição industrial as colectas nas demais cédulas.
Assim, admitiram-se, quer a dedução nos rendimentos sujeitos a contribuição industrial de rendimentos passivos de outros impostos cedulares, quer o abatimento à colecta daquela, das colectas dos últimos.
Tomando-se como base da incidência os lucros imputáveis ao exercício das actividades de natureza comercial e industrial, optou-se, como já se salientou, pela tributação dos rendimentos reais obtidos no exercício dessas actividades.
Contudo, a aplicação deste princípio mostrou-se impraticável em relação a grande número de pequenas e pequeníssimas empresas, em relação às quais nenhumas exigências era possível fazer em matéria de organização da escrita. Daí que se tenha adoptado, relativamente a tais contribuintes, a tributação de rendimentos normais.
A tributação do rendimento real prevaleceu apenas quanto às grandes e médias empresas.
A diversidade de situações e de exigências que era lícito fazer em matéria de organização contabilística conduziu, porém, a que se restringisse às primeiras a tributação do rendimento real efectivo, ficando as segundas sujeitas à tributação do rendimento real presumido.
No entanto, importa salientar que em ambos os casos o imposto recai sobre o rendimento real, residindo a diferença apenas na maior ou menor confiança no método de apuramento dos resultados.
Deste modo, estabeleceram-se três grupos de contribuintes, a saber:
O grupo A, onde se incluíram as empresas em relação às quais era razoável presumir, quer pelo seu tipo de estruturação jurídica, quer pelo volume do seu capital ou do seu rendimento, quer pela própria natureza da actividade exercida, que disporiam de contabilidade apropriada ou que a organização da mesma lhes poderia ser imposta, sem que tal exigência representasse um encargo excessivo. Abrangeram-se, portanto, neste grupo as grandes empresas e outras que sem o serem estão sujeitas a fiscalização especial. Estabeleceu-se quanto a elas a tributação em função dos lucros reais efectivos, determinados através da sua contabilidade.
O grupo B, onde se incluíram as empresas médias, que, embora tendo escrita, não têm o nível das organizações mais eficientes, com tributação dos lucros que presumivelmente tenham obtido.
O grupo C, relativo aos pequenos contribuintes que, exercendo actividades de modesta projecção económica, ou não têm escrita, ou dela dispõem em condições manifestamente inadequadas. Baseou-se a sua tributação nos lucros que normalmente possam obter.
Fazendo-se incidir a tributação dos contribuintes do grupo A sobre os lucros efectivamente obtidos, impôs-se a definição de lucro, para efeitos fiscais.
Por isso se estabeleceu no artigo 22.º do código que o lucro se reporta ao saldo revelado pela conta de resultados do exercício ou de ganhos e perdas, elaborada em obediência a sãos princípios de contabilidade, e consiste «na diferença entre todos os proveitos ou ganhos realizados no exercício anterior àquele a que o ano fiscal respeitar e os custos ou perdas imputáveis ao mesmo exercício, uns e outros eventualmente corrigidos».
Igualmente se definiram os proveitos ou ganhos e os custos ou perdas, imputáveis ao exercício, incluindo-se nestes apenas os encargos que, «dentro de limites tidos como razoáveis pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, se tornou indispensável suportar para realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto e para a manutenção da fonte produtora» (artigo 26.º do código).
Perante a impossibilidade imediata da normalização das escritas, seguiu-se, nesta primeira fase, o caminho de aceitar a actual realidade contabilística, estabelecendo-se, embora, critérios e normas que garantam uma uniforme determinação da matéria colectável.
Importa também pôr em relevo que para obviar aos inconvenientes resultantes da irregularidade dos rendimentos e do seu seccionamento em períodos anuais se admitiu a solidariedade dos exercícios, permitindo-se que as perdas de um ano possam ser deduzidas dos lucros tributáveis, se os houver, de um ou mais dos três anos consecutivos.
A determinação da matéria colectável tem por base a declaração dos contribuintes.
Quanto aos contribuintes do grupo A, a declaração deve ser assinada por um técnico de contas e o lucro tributável declarado, salvas algumas excepções previstas, só pode ser alterado após exame à escrita.
Relativamente aos contribuintes do grupo B, as declarações apresentadas são objecto de apreciação por parte de comissões, concelhias, de constituição mista (com representantes da Fazenda e dos contribuintes), às quais compete fixar anualmente o rendimento colectável.
Admite-se que os contribuintes possam reclamar desta fixação para comissões distritais.
A matéria colectável dos contribuintes do grupo C é igualmente fixada pelas mesmas comissões concelhias, precedendo declaração do contribuinte, que apenas indicará certos índices de rendimento e apenas será apresentada quando houver variação apreciável desses elementos.
Neste caso, as comissões só deverão rever o rendimento fixado quando se verifique uma variação do rendimento excedente a 25 por cento. Assim se reduziu o trabalho das

Página 2608

2608 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

comissões, sem se afectar sensivelmente a justiça, relativa. Importa também salientar o tratamento dado aos regimes tributários especiais substitutivos da contribuição industrial. Revistos estes, entendeu-se que apenas três eram de manter: o dos tabacos, o dos espectáculos públicos e o do jogo.
Estabeleceu-se para a contribuição industrial a taxa de 15 por cento. Receando-se, porém, uma diminuição de receita, no Decreto-Lei n.º 45 103 conferiu-se ao Ministro das Finanças a faculdade de elevar a taxa até 20 por cento se no ano de 1964 da sua aplicação resultar liquidação global inferior à liquidação feita em 1963.
Para os organismos corporativos, atendendo-se a que a sua matéria colectável aparece sobrestimada e a que visam principalmente fins de interesse público, estabeleceu-se a taxa de 5 por cento.
A arrecadação do imposto, dado o condicionalismo da incidência e da determinação da matéria colectável, passa a fazer-se no ano seguinte ao da produção do rendimento. Como só é possível fazer a liquidação definitiva em Outubro, estabeleceu-se uma liquidação provisória, com prestações cobráveis em Janeiro e Junho, de modo a ficar assegurado o regular abastecimento da tesouraria.
Afastaram-se, no entanto, desta liquidação provisória os contribuintes do grupo C, quer pelo volume reduzido da receita, quer porque, quanto a eles, dado o processo de determinação da matéria colectável, foi possível estabelecer a cobrança em Abril.
Na estruturação deste imposto procurou-se também articular a política fiscal com a política de desenvolvimento económico. E, assim, se estabeleceram incentivos fiscais, dos quais se podem salientar a redução da taxa para as sociedades de desenvolvimento regional, a protecção dispensada aos encargos com análises, racionalização, investigação e consulta, bem como aos donativos a instituições portuguesas de ensino ou investigação científica consideradas de interesse para o progresso industrial ou, em particular, para o aperfeiçoamento do pessoal, organização, equipamento ou processos de fabrico da empresa, o tratamento fiscal concedido às sociedades de participação financeira e ao reinvestimento dos lucros não distribuídos.
Prosseguindo no propósito de se obter uma melhoria de relações entre os contribuintes e o fisco, estabeleceu-se, no diploma que aprovou o código, que durante o ano de 1964 só poderão ser levantados autos de transgressão, precedendo autorização superior, sómente concedida quando se julgue- ter havido culpa grave.
Trata-se de uma medida adoptada em todos os diplomas e que também agora há-de contribuir, necessariamente, para o desejado clima de confiança entre os particulares e os órgãos da administração financeira, na medida em que se facilita aos primeiros a justa compreensão do fenómeno financeiro.
Finalmente, resta dizer que não se deixou de estabelecer um regime de transição que acautelasse devidamente os legítimos interesses dos particulares.
Embora se tenha estabelecido o dia 1 de Agosto de 1963 como data do início da vigência do código, determinou-se que a contribuição industrial paga ou a cobrar em 1963, segundo a legislação anterior, fosse liquidada nesse ano, nos termos dessa legislação, abrindo-se excepção apenas para os contribuintes que em 1962 tivessem sofrido, por efeito de aumento de taxas, um agravamento, em relação ao ano de 1962, superior a 100 por cento.
Prevendo-se que a contribuição industrial a liquidar em 1964 tem já por base o lucro tributável de 1963, determinou-se que no seu apuramento será tomada, como custo do exercício, a importância da contribuição industrial liquidada pelo exercício da actividade nesse ano, nos termos da legislação anterior ao código.
Nada há que dizer, naturalmente, da acção dos serviços o da administração fiscal quanto a este imposto, dado que ele só entra em plena execução a partir de 1 de Janeiro de 1964, o que não significa inacção do sector responsável, pois, pelo contrário, se tem dedicado com o necessário empenho, à preparação dos quadros para uma execução segura e eficiente do novo diploma, e muito particularmente à fixação de regras básicas de actuação, tais como as que respeitam à amplitude dos conceitos de contabilidade sã, às amortizações, aos balanços e a tantos outros problemas cuja solução se pode encontrar nas boas regras da prática corrente do comércio e indústria.

114. Completando a reforma dos impostos directos sobre o rendimento, vai ser publicado o decreto-lei que aprova o Código do Imposto Complementar, imposto que, como já foi afirmado diversas vezes, constituirá o elemento de personalização da tributação directa.
O imposto complementar regulado por esse código, é bem diferente do actualmente em vigor e para a sua nova real feição contribuiu decisivamente a reforma dos impostos parcelares, incidindo agora fundamentalmente sobre rendimentos reais, sobre os quais incidirá também o imposto complementar.
Na verdade, uma tributação assente, na generalidade, sobre lucros normais é inconciliável com a tributação pessoal.
O imposto complementar agora reformado incidirá sobre o rendimento global das pessoas singulares e das pessoas colectivas.
No entanto, a sua estruturação é diferente, consoante a categoria dos sujeitos, com evidente propósito de personalização quando incidindo sobre as pessoas singulares e com fins bem diversos quando sujeitando a imposto desta natureza as pessoas colectivas.
Relativamente às pessoas singulares, passam a estar sujeitos ao imposto, além dos rendimentos produzidos no território nacional metropolitano, os rendimentos produzidos no ultramar e no estrangeiro, no caso de os respectivos titulares residirem no continente ou ilhas adjacentes, ficando os não residentes sujeitos a imposto complementar apenas no que respeita aos rendimentos objecto de impostos parcelares no território do continente e ilhas adjacentes ou outros aí produzidos. Atinge ainda a incidência real deste imposto categorias de rendimentos não compreendidas no objecto dos impostos parcelares, tais como os relativos a pensões e rendas temporárias ou vitalícias ou ainda os rendimentos deles isentos, o que se justifica pelo facto de ser incompreensível a não tributação em imposto pessoal de qualquer dos elementos que integram o rendimento global dos cidadãos.
Por outro lado, atribuir-se-ão, de futuro, ao chefe de família, observadas certas circunstâncias, rendimentos dos seus familiares mais íntimos.
Entre os rendimentos isentos de impostos parcelares e agora tributáveis em imposto complementar merecem uma palavra os vencimentos, resultantes do exercício de funções públicas.
Com o novo código tais vencimentos passam a constituir explicitamente objecto de imposição, mas, mercê das deduções relativas a uma fracção dos rendimentos do trabalho ao mínimo de existência e aos encargos familiares, quando os houver, não serão tributados desde que os respectivos titulares, não tendo outros rendimentos, aufiram vencimentos líquidos anuais que não ultrapassem 75 000$, 100 000$ e mesmo mais do que esta última quantia no caso de serem, respectivamente, solteiros e

Página 2609

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2609

casados sem ou com filhos ou enteados, em certas condições. E, mesmo no caso de se verificar a tributação, importa recordar que a taxa inicial do imposto é apenas de 3 por cento, muito inferior, portanto, à que até agora tem vigorado.
No caso de os funcionários, além dos vencimentos resultantes do exercício da função pública, possuírem outros rendimentos, as múltiplas deduções consagradas, designadamente as relativas a uma parcela dos rendimentos do trabalho e aos encargos de família e o nível relativamente baixo das taxas estatuídas, contribuirão, sem dúvida, para que o encargo tributário seja, em muitos casos, inferior ao resultante da legislação em vigor.
Embora se tenha como certo constituir uma reduzida minoria o número de funcionários que ficarão no futuro sujeitos a imposto directamente pelos seus vencimentos, suspende-se, todavia, a execução do código nesta parte até à revisão geral das remunerações da função pública; assim se acautelam quaisquer eventuais repercussões não previstas que o novo regime possa produzir na economia dos servidores do Estado.
Como se infere do exposto, o critério que presidiu à concessão das isenções em imposto complementar foi bem diverso daqueles que determinaram as isenções nos impostos reais, sendo as isenções em imposto complementar fundamentalmente ditadas pela necessidade de se evitarem acentuados inconvenientes ou iniquidades e por razões de ordem técnica ou de política económica.
Não poderia também manter-se logicamente num sistema de tributação pessoal do rendimento a isenção dos juros das obrigações, dado que se trata de uma isenção real, só susceptível de consideração no respectivo imposto parcelar que tem efectivamente essa natureza.
Para obviar, porém, aos inconvenientes que possam resultar deste novo regime tributário a que ficam sujeitos os rendimentos destas formas de crédito, reduz-se, no Código do Imposto de Capitais, de 15 para 8 por cento a taxa a que aí estavam sujeitos.
Para a determinação da matéria colectável continua a servir de base a declaração do contribuinte, embora bastante simplificada, visto na generalidade não se tornar necessário indicar o quantitativo dos rendimentos, sendo suficiente a menção da respectiva fonte e do local da sua produção. Para o contribuinte verificar como foi operada a liquidação, remeterão os serviços uma nota demonstrativa da mesma.
Várias deduções foram consagradas de modo a obter-se primeiramente o rendimento líquido, deduzidos os encargos obrigatórios, e depois o rendimento colectável, devendo citar-se desde já, entre aquelas a que se atende para determinar esta última espécie de rendimento, a dedução de que beneficiam os rendimentos do trabalho, de modo a atingir-se como que a homogeneização entre eles e os rendimentos da propriedade e do capital.
Também o mínimo de existência e a situação familiar do contribuinte foram tidos na devida atenção. Assim, e no atinente a esta última, são tidas em consideração, para efeitos de deduções no rendimento líquido, o cônjuge do contribuinte e os filhos ou enteados menores, em certas condições, já que, como resulta manifesto, os encargos dos contribuintes solteiros são menores do que os dos casados e os destes variam consoante o número de filhos. Está-se, portanto, perante um regime bem diferente do anterior, que admitia deduções na colecta, e apenas relativamente aos filhos menores.
No entanto, relativamente aos não residentes, não são aceites todas as deduções, e designadamente as relativas a fins de previdência, desenvolvimento regional e bem-fazer, o que é compreensível, visto, quanto a eles, não serem englobados todos os respectivos rendimentos.
As taxas serão adequadas à tributação dos rendimentos reais. De facto, a taxa inicial será de 3 por cento para os rendimentos colectáveis até 50 000$, aumentando 1 por cento por cada escalão de igual montante até 1 200 000$, e por cada escalão de 100 000$ de 1 200 000$ a 3 000 000$, sendo fixados a taxa máxima em 45 por cento e o limite do escalão final em 3 000 000$.
Por último, relativamente ao imposto complementar sobre as pessoas singulares, importa referir: a supressão do adicionamento actualmente em vigor e incidindo sobre os rendimentos do trabalho superiores a 120 000$, quando se verifique a acumulação de cargos ou funções, supressão que resulta de se entender que o fim visado não deverá ser prosseguido com a tributação em imposto complementar, antes o devendo ser com o imposto profissional; e a preocupação de se evitar a dupla tributação, através do método da imputação, relativamente aos rendimentos produzidos nas províncias ultramarinas e tributados também aí em imposto complementar ou mesmo em imposto correspondente, uma vez que ao imposto complementar calculado no continente ou ilhas adjacentes, nos termos do respectivo código, será deduzido o que se prove ter sido liquidado nas províncias ultramarinas relativamente àqueles rendimentos.
No que respeita às pessoas colectivas não foi de menor importância a reforma deste imposto.
O imposto complementar visa neste sector as seguintes finalidades: no que respeita ao imposto complementar sobre as sociedades, visa essencialmente a integração de lacunas na tributação pessoal dos sócios das sociedades, designadamente as que resultem da não distribuição de lucros e da tributação das mais-valias; no que se refere ao imposto complementar sobre as outras pessoas colectivas, visa a substituição do imposto sobre as sucessões e doações do artigo 35.º do Código Civil, cuja manutenção se reconheceu insustentável.
Dados os fins prosseguidos, o imposto incidirá sobre os lucros não distribuídos das sociedades e sobre todos os rendimentos das demais pessoas colectivas e as taxas serão progressivas, não se olvidando na sua fixação, relativamente às sociedades, a necessidade de se não desfavorecer o investimento económico e o carácter eventual das lacunas que o imposto visa integrar; daí a sua exiguidade - 4 por cento sobre os rendimentos até 100 000$; 5, 6 e 7 por cento para a fracção do rendimento, respectivamente, de mais de 100 000$ até 1 000 000$; de mais de 1 000 000$ até 2 500 000$; de mais de 2 500 000$ até 5 000 000$, e, finalmente, taxa máxima de 8 por cento sobre a fracção do rendimento superior a 5 000 000$. Esta exiguidade, que é ainda mais acentuada no imposto sobre as outras pessoas colectivas - as taxas indicadas são reduzidas a metade -, representa inegável vantagem relativamente ao regime vigente.
Um agravamento das taxas é, no entanto, estabelecido relativamente às denominadas sociedades de pura administração, isto é, relativamente às sociedades cujos rendimentos provenientes de bens ou valores por elas mantidos como reserva ou para fruição atinja, na média dos últimos três anos, mais de 80 por cento da média da totalidade dos seus proveitos ou ganhos durante o mesmo período. Este agravamento impõe-se para evitar a fraude, que, por vezes, se não na generalidade, é pretendida com a constituição de tais sociedades: fuga ao imposto complementar por parte dos sócios.
Finalmente a parte III do código tem como objecto o registo de títulos nacionais e estrangeiros, aquele facul-

Página 2610

2610 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

tativo, este obrigatório - aliás, como hoje - , registo que torna possível o englobamento dos respectivos rendimentos em nome dos seus titulares. Importa assinalar as facilidades concedidas neste domínio aos contribuintes e o facto de a taxa sobre o rendimento dos títulos nacionais não registados, embora mantendo-se em 20 por cento, sofrer um aumento relativo, porquanto a taxa máxima do imposto complementar será objecto de redução, como se viu.
O código começará a vigorar em 1 de Janeiro de 1964, devendo o primeiro lançamento, de acordo com os seus termos, efectuar-se no mesmo ano, tendo por base os rendimentos do ano anterior, procedimento que não deverá considerar-se como originando dupla tributação, visto o imposto complementar regulado pelo novo código ser bem diferente do actual, como já foi escrito.
Todavia, os juros das obrigações nacionais ficam sujeitos a imposto complementar apenas quando vencidos posteriormente a 31 de Dezembro de 1964.

115. Um aspecto em que a política fiscal carece de ser especialmente posta ao serviço da política económica é, sem dúvida, o que respeita à necessidade de impedir que II propriedade ociosa de terrenos para construção, com finalidade puramente especulativa, contribua para entravar o desenvolvimento de determinadas regiões do País, onde o surto de novas iniciativas ou o afluxo de turistas possa determinar rápido aumento regional do rendimento por cabeça e, consequentemente, do nível de vida da população.
Na verdade, há que obstar a que determinadas zonas se vejam na impossibilidade de realizar os fins para que foram destinadas, quer como pólos de desenvolvimento industrial, quer como regiões turísticas. Por outras palavras: é necessário impedir a todo o custo que o esforço de desenvolvimento regional, subordinado ao planeamento respectivo, sofra acentuadas limitações.
Os graves prejuízos a que especulações deste tipo podem dar lugar, do ponto de vista do desenvolvimento regional, justificavam, só por si, a intervenção do Governo.
Mas acresce que, numa fase em que mais do que nunca é necessário dar prioridade à defesa, sacrificando o menos possível os investimentos fortemente reprodutivos, o que envolve a criação de apropriados capitais fixos com vultosas imobilizações, o Estado não poderia alhear-se do considerável desvio de disponibilidades monetárias para fins estranhos ao desenvolvimento regional em que, ao fim e ao cabo, vêm a traduzir-se as referidas operações de pura especulação.
Sem se pretender adoptar desde já formas de intervenção extremamente severas, tornava-se, no entanto, urgente pôr em prática, no próximo ano, algumas medidas que, embora de carácter indirecto e de feição moderada; se reputam capazes de desencorajar as tendências não desejáveis.
Para este efeito, o Governo solicita à Assembleia autorização para instituir, e cobrar já no ano de 1964, um imposto destinado a onerar a propriedade de terrenos para construção situados em zonas de rápido desenvolvimento regional e, em especial, nas consagradas à expansão do turismo.
Este imposto deverá incidir sobre o valor dos terrenos, determinado por avaliação, nas datas em que sucessivamente for devido, e será calculado, de dois em dois anos, pelo método de liquidação da sisa, com as necessárias adaptações.
A primeira liquidação só terá lugar depois de 30 de Junho de 1964, o que permitirá aos actuais proprietários de terrenos que licitamente desejem eximir-se à tributação contar com o 1.º semestre do próximo ano para iniciarem a construção de edifícios, ou alienarem os terrenos sujeitos ao novo imposto.
As únicas isenções que se consideram admissíveis num tributo com esta finalidade são as enumeradas nos n.ºs 1.º a 4.º e 11.º do artigo 7.º do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola.
Considera-se adequada ao objectivo a atingir a taxa, não exageradamente onerosa, de 8 por cento.
Quanto à determinação da matéria colectável, liquidação, cobrança, reclamações e recursos e penalidades, prevê-se a adaptação, com os ajustamentos que se mostrem necessários, das disposições sobre sisa constantes do Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações.

116. Não foi só a morosidade dos estudos encetados para a estruturação do imposto de transacções que adiou a publicação do respectivo código.
Na verdade, já se reconhecera que a reorganização da tributação do consumo viria contribuir decisivamente, em coordenação com a reforma dos impostos directos, para a harmonia do sistema tributário português.
Assim há-de ser, não só porque o melhor conhecimento da matéria colectável em que assenta a tributação do rendimento real fornece bases seguras para a realização dos objectivos de justiça fiscal, mas também porque dessa tributação resulta a certeza de que não será excessiva a sobrecarga dos impostos sobre consumos - elemento indispensável como estabilizador do processo de obtenção de receitas destinadas à cobertura dos encargos públicos.
Concluída a reforma dos impostos directos, está chegada a oportunidade de estruturar esse elemento estabilizador. Não é, aliás, inteiramente nova, se aceitarmos a experiência já efectuada. Todavia, esta assentou em princípios diferentes e teve outros objectivos, largamente expostos aquando da publicação dos diplomas que criaram os impostos sobre consumos supérfluos ou de luxo e sobre o consumo de bebidas engarrafadas e de gelados, isto é, com os Decretos-Leis n.ºs 43 764, 44 235 e 44 510, respectivamente de 30 de Junho de 1961, 14 de Março e 16 de Agosto de 1962.
Como se referiu então, a criação do imposto sobre consumos supérfluos ou de luxo teve em vista não só a necessidade de obtenção de meios financeiros para fazer face às despesas de segurança e fomento das províncias ultramarinas, mas também a futura estruturação, em bases mais sólidas, de um imposto geral sobre o consumo, em que não fossem estranhas as reconhecidas vantagens da personalização do imposto pela diferenciação das taxas incidentes sobre algumas categorias de produtos.
Com a publicação do Decreto-Lei n.º 44 510, atrás referido, foram revistas algumas situações de quase total evasão ao imposto, do mesmo passo que se procuraram evitar nítidas distorções nos consumos, inconvenientes e, por isso mesmo, não desejáveis.
Outras situações terão permanecido, aparentemente injustificadas no plano técnico; mas não será necessário lembrar que se não tem em vista, aqui, a criação de um imposto neutral, tanto quanto possa admitir-se a neutralidade dos impostos.
Recorda-se a afirmação já feita de que «a criação de um imposto sobre o consumo de artigo e serviços supérfluos ou de luxo e a adaptação ou actualização dos poucos que já existem entre nós, se é, no momento presente, fundamentalmente baseada na necessidade financeira de ocorrer às despesas com a defesa do ultramar, reveste-se ainda de uma pluralidade de razões que se situam nos campos económico e social e que oferecem uma importante razão

Página 2611

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2611

para lhes retirar o mero carácter de medidas de excepção».
Há, na verdade, que não esquecer a necessidade de incentivar o aforro, restringindo os dispêndios em aquisições supérfluas ou de luxo, numa fase em que todos os esforços e disponibilidades terão de ser encaminhados predominantemente para a realização de investimentos produtivos, em ordem a conseguir-se a continuação dos benefícios do desenvolvimento do País.
Por isso se não estranhou, por justificado, o intervencionismo que se tenha notado nos impostos sobre consumos, definida como foi claramente a posição tomada:

Garantida a defesa das classes econòmicamente débeis, através da exclusão de tributação dos consumos de bens essenciais, preenche-se também através deste imposto uma importante acção de alto sentido social, seguramente firmada na garantia de que os consumidores de artigos supérfluos ou de luxo acabam por colaborar na acção de fomento através do investimento público, cujo financiamento é garantido pelas receitas provenientes deste imposto.

Aliás, os incentivos que possam ter origem na estrutura da tributação dos consumos não são únicos, pois outros são patentes na legislação fiscal.
Por isso se hão-de achar justificadas as diferenciações encontradas na tributação dos consumos na legislação até agora em vigor e na que vier a substituí-la com a instituição do imposto sobre as transacções.
Neste aspecto, e noutros, se colheram úteis ensinamentos, que não deixaram de ter-se em conta nos estudos ainda em curso, embora na sua fase final.
Espera-se, assim, que possa ser posto em vigor nos começos do próximo ano de 1964 o diploma pelo qual será regulada a liquidação e cobrança do imposto sobre o valor das transacções, que por comodidade de expressão pensa denominar-se «Imposto de transacções».
Nas propostas das leis de autorização das receitas e despesas dos últimos anos deu-se nota do que de mais importante se julgou sobre este novo imposto, dos tópicos essenciais a que deveria obedecer a sua ordenação, das vantagens ou inconvenientes da possível adopção de um ou outro critério, teórico apenas ou já posto em prática nas legislações positivas de alguns países da Europa.
Referiram-se em pormenor os motivos que determinaram a sua criação, entre os quais se destacaram a necessidade de ajustamento da tributação às transformações resultantes da nossa comparticipação na Associação Europeia de Comércio Livre, a segurança e defesa nacional, principalmente nas províncias ultramarinas, e ainda a de desenvolvimento e valorização económica que possibilitem o acesso de todos os portugueses a um melhor nível de vida material.
Embora num ou noutro ponto os critérios técnicos a que há-de obedecer a tributação das transacções hão estejam perfeitamente definidos, podem desde já dar-se a conhecer algumas das linhas fundamentais da estrutura do código, que procurou enquadrar-se na já tradicional disposição técnica dos impostos directos, apenas com o objectivo de facilitar a sua aplicação prática pelos contribuintes e pelos funcionários.
Esta forma de sistematização de um imposto de características tão diferentes obrigou a trabalho mais moroso no estudo da codificação a estabelecer para as diversas fases do seu processo evolutivo, que, por definição, não coincidem com as dos impostos directos.
O imposto incidirá apenas no valor das transacções e das operações comerciais a elas assimiladas, o que significa a exclusão do seu âmbito de certas prestações de serviços abrangidas usualmente em idênticos tributos de outros países.
Várias razões ditaram esta orientação.
A estrutura fiscal portuguesa inclui, em diversos dos impostos que a compõem, muitas prestações de serviços cuja revisão seria necessário efectuar ao contemplar esta realidade tributária. Não é viável, em prazo curto, a realização dos estudos preliminares requeridos para o efeito, pelo que se julgou preferível aguardar mais algum tempo para os fazer.
A própria denominação de «imposto de transacções» parece conduzir à exclusão do seu objecto de tudo quanto não possa ser assimilado ao que habitualmente é designado por «negócio», embora se não desconheça que este pode referir-se também a simples prestações de serviços, como sejam, por exemplo, os transportes, os seguros, etc.
Procurou-se, no campo da incidência, submeter as mercadorias importadas a regime paralelo ao das nacionais, deslocando-se em alguns casos do desembaraço aduaneiro para a fase ulterior de transacção pelo importador o momento de sujeição ao imposto.
Não é a regra seguida nas legislações dos mais importantes países europeus.
Entendeu-se, porém, que esta singela alteração poderia desagravar os importadores, na medida em que deixam de desembolsar o imposto no acto do despacho dos produtos e o passam a pagar no mês ou talvez no trimestre seguinte ao da venda.
As exportações estarão por via de regra isentas do imposto, para não colocar os produtos protugueses em condições desfavoráveis de concorrência nos mercados externos, pois o uso seguido é tributá-los nos países do destino.
O imposto de transacções deveria recair no valor pleno das. mercadorias, para poder proporcionar-se à despesa feita pelo consumidor final.
Razões de ordem técnica, como sejam dificuldades de fiscalização, e, principalmente, de natureza económica, derivadas da deficiente estrutura do comércio retalhista português, levaram o Governo a escolher o estádio anterior, ou seja o do grossista, como base de incidência do imposto.
As isenções previstas, além da quase totalidade das exportações, contemplam os produtos essenciais à vida, visando impedir a elevação do seu custo; os medicamentos e os artigos escolares, em atenção ao fim a que são destinados; e, ainda, os principais bens de produção, no intuito de conceder mais uma facilidade à modernização dos equipamentos e ao desenvolvimento económico do País.
Relativamente às taxas, pouco haverá a acrescentar ao que ficou dito no relatório da anterior proposta de lei de autorização das receitas e despesas, onde se procurou justificar a criação de três taxas diferenciadas que possibilitam a introdução no imposto de um princípio de personalização, que, embora descaracterizando-o um pouco, lhe confere um mínimo de justiça social de que, dizem os autores, andam afastados os impostos sobre a despesa.
Pode ainda acrescentar-se que se prevêem baixas e que, por recaírem em matéria colectável apurada em estádio inicial do circuito de distribuição, desaproveitam apreciável parcela do gasto efectivamente realizado, o que se traduz num benefício suplementar em favor do contribuinte de facto.
No aspecto que interessa aos preços a utilizar como base da incidência, ainda em estudo, mas cuja conclusão se deseja pouco demorada, não obstante as dificuldades reais do problema, importa salientar algumas particula-

Página 2612

2612 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 108

ridades tendentes a contemplar situações anómalas dos circuitos de distribuição das mercadorias.
Ainda que não se pretenda que o imposto de transacções em regulamentação sirva para corrigir esses desvios, até porque alguns representam hábitos arreigados de certas especialidades de comércio, julga-se que será conveniente que não venha também a servir como estimulante da criação de estados idênticos em actividades mercantis que seguem ainda os ciclos normais de comercialização.
Disse-se anteriormente que o imposto seria cobrado como regra no estádio da venda por grosso, no armazenista. Quando este não existir, nem por isso as transacções estarão isentas, o que equivale a afirmar que o ponto de incidência tem de ser deslocado para diante (retalhista) ou para trás (produtor).
Não sendo indiferente o sentido da deslocação, no que respeita à justiça do imposto e à possibilidade de distorções dos preços, terão naturalmente de ser encaradas as possíveis correcções de forma a atenuar os efeitos dos desvios que venham a verificar-se.
Merece ainda uma palavra a fiscalização, ao menos naquilo em que os contribuintes necessariamente serão chamados a colaborar com a Administração.
Estando a cargo daqueles a liquidação do imposto, que poderá ser entregue nos cofres públicos no mês seguinte ou após o final do trimestre em que as transacções forem realizadas, pode afirmar-se que em muitos casos o Estado fará um financiamento gratuito equivalente ao valor do imposto liquidado e retido em mão dos grossistas.
Não se desconhecendo esta vantagem, também não pode ser subestimado o valor da cooperação dada na cobrança do imposto. For isso, os incómodos que hão-de derivar daí foram reduzidos ao mínimo possível, tendo sido estudada a forma de aproveitamento dos livros já existentes na contabilidade das empresas e, no que for viável, a utilização dos mesmos elementos para impostos diferentes do de transacções.
O imposto de transacções, na forma por que vai ser estabelecido, é inteiramente novo entre nós e, por isso, irá encontrar dificuldades iniciais, apesar dos cuidados havidos em relação ao aspecto da sua perfeição técnica: Todas elas serão removidas com espírito de verdadeira e justa compreensão por parte dos serviços; ponto é que o contribuinte não enjeite um espírito igual que, no caso presente, se objectiva e situa no próprio campo do cumprimento de obrigações legais e não já apenas no do dever cívico de cooperação para satisfazer interesses nacionais indiscutíveis.

117. Também no decurso do ano corrente foram publicados dois importantes diplomas sobre a organização dos serviços de justiça fiscal e o processo das contribuições e impostos, tendo sido a prática desta dualidade determinada pela experiência da evolução da técnica jurídica, que já consagrou a norma da separação legislativa de tudo o que constitua matéria orgânica dos serviços, a que deva caber a acção da defesa dos direitos tributários, e o que respeite propriamente à forma de processo e ao exercício da referida acção.
Um sistema completo de meios de garantia legal dos direitos tributários, em relação ao Estado e ao contribuinte, deve assentar simultaneamente nos quatro momentos que a acção tributária pode abarcar: a reclamação graciosa; a impugnação judicial; o julgamento das infracções; e a execução fiscal.
A reclamação graciosa - ou reconsideração oficiosa -, enquanto meio indicado para a revisão do acto administrativo pela própria autoridade que o praticou.
A impugnação judicial, que já representa um ataque frontal ao acto administrativo, visando uma apreciação sobre a sua legalidade, independentemente da vontade do agente administrativo, só, em rigor, se pode conceber quando interposta perante autoridade diferente da que praticou o acto: idealmente, perante verdadeiros órgãos judiciais especializados.
O julgamento das infracções, envolvendo a aplicação de sanções, situa-se também no íntimo da actividade judicial, constituindo isto um princípio básico e rígido que só razões particularmente poderosas e excepcionais podem quebrar em favor da atribuição dessa competência penal ou congénere às autoridades administrativas.
E ainda a execução fiscal, necessária, com frequência, na acção tributária, constitui um seu momento importante para a garantia da legalidade. Por um lado, os efeitos práticos e definitivos que dela derivam exigem um especial controle e segurança de métodos; por outro, as perspectivas opostas que ainda aí podem emergir apontam para a entrega da sua ponderação a uma autoridade não administrativa. O que é dizer que, fundamentalmente, é um meio de acção, como a execução em geral, de características judiciais.
A esta óptica, que se pode considerar como resultante da posição do acto tributário perante os princípios gerais de direito administrativo, tendo em conta as particularidades especiais do direito fiscal, acresceram todas as características da reforma fiscal, nomeadamente o reforço das garantias jurídicas do contribuinte e consequente necessidade de reforço das garantias processuais e judiciárias, e a da articulação do regime judiciário com a acção externa da fiscalização dos actos tributários e da verificação do cumprimento das leis.
Nesta base se procedeu à reforma dos aspectos orgânicos e funcionais do processo das contribuições e impostos.
Relativamente à constituição dos órgãos incumbidos do julgamento da legalidade dos actos tributários, seguiu-se a imposição lógica de um sistema de garantias judiciárias, que leva à sua afectação a tribunais especiais, servidos, naturalmente, por uma magistratura autónoma, livre no seu julgamento e especializada, como é exigido pela recta decisão na aplicação de um direito complexo e muitas vezes de difícil penetração.
Assim se manteve o tribunal de 2.ª instância de competência territorial em todo o continente e ilhas adjacentes e se generalizaram os tribunais das 1.as instâncias distritais de competência territorial limitada à área do respectivo distrito administrativo.
Aliás, este princípio não foi inovador. Era já, fundamentalmente, perfilhado na preparação da reforma de 1929, e só por dificuldade de ocasião não foi imediatamente aplicado. Com base nele se procedeu, anteriormente, à ampliação da competência dos Tribunais de Execuções Fiscais de Lisboa e Porto ao julgamento em 1.ª instância das reclamações contenciosas e das transgressões fiscais, tendo ficado de pé, no entanto, uma dualidade de regimes para o continente e ilhas adjacentes, certamente indesejável e que foi possível eliminar agora pela criação de tribunais de 1.ª instância nas sedes dos distritos, solução que se pode considerar como suficiente, já que, se a instalação de tribunais fiscais em todos os concelhos seria coisa impossível, também se pode dizer que era desnecessária, dado que a maioria das funções judiciais e o seu processamento não carecem da presença do tribunal nos próprios lugares onde surjam os conflitos, pois que a concentração e fornecimento de elementos probatórios autênticos podem, com vantagem

Página 2613

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2613

prática e funcional, ser operados pelas repartições concelhias de finanças.
Aos tribunais das contribuições e impostos de 1.ª instância foi atribuída competência para todos os actos de natureza rigorosamente jurisdicional em relação a toda a área do distrito. Por não se considerar como pertencente a esta hipótese a função probatória, imputou-se esta, como regra, às repartições concelhias. Evitam-se, assim, deslocações de testemunhas e declarantes, com frequência custosas ou inúteis. Mas não ficam, por este facto, diminuídas as garantias do contribuinte - quando julgue que só perante o juiz se poderá exactamente apurar a verdade legal -, pois que dispõe sempre desta faculdade de opção; nem tão-pouco a convicção do juiz resultará prejudicada na sua formação, já que lhe não é proibido tomar a iniciativa de se deslocar ao lugar da produção da prova, sempre que o julgue indispensável.

118. A exigência de justiça pela observância do princípio da legalidade é objectivo que só se pode atingir pela sua dupla realização relativamente aos sujeitos da relação fiscal: o Estado e o contribuinte. O que é dizer que a legalidade impõe, no decurso da acção tributária, olhos iguais para as garantias de um e outro, não podendo deixar de corresponder ao seu reforço para o contribuinte um paralelo reforço para o Estado.
Este último lugar foi ocupado pelo Ministério Público das contribuições e impostos, reorganizado e definitivamente configurado, com uma natureza institucional e permanente que anteriormente não tinha, o que, embora lhe deixasse intocada a sua importância, obstava ao cabal desempenho da função que lhe era assinalada.
O Ministério Público das contribuições e impostos, responsável e hieràrquicamente dependente, tem a seu cargo a verificação ou fiscalização do cumprimento das leis; a prevenção contra o perigo ou iminência da sua violação; a promoção do sancionamento legal; e, em geral, da defesa dos interesses colectivos no sector afecto à sua competência.
Internamente, a acção do Ministério Público exerce-se através da representação permanente da Fazenda Nacional nos processos das contribuições e impostos.
Mas os objectivos a que está adstrito não podem verdadeiramente ser realizados confiando-se a sua acção apenas a este aspecto interno. Carece, ainda, de forma complementar, mas primordial em importância, que lhe seja dada uma dimensão externa.
A esta finalidade se obviou ao integrar na sua estrutura o Serviço de Prevenção e Fiscalização Tributária, atribuindo-se-lhe justamente o desempenho da acção externa do Ministério Público das contribuições e impostos.
Procura-se, assim, obter um contacto permanente e vivo com as realidades fiscais, instrumento de uma verificação exacta dos factos tributários, que é condição-base da boa aplicação da lei. E simultaneamente proporcionando uma vigilância da legalidade, uma prevenção da fraude e da evasão, uma actividade de esclarecimento ou de exame de possíveis situações injustas, que se permite dar à função um teor radicalmente diferente do que lhe estaria traçado como limite, se a acção do Ministério Público se restringisse meramente ao campo interno.

119. Na orientação da moderna técnica jurídica em matéria de leis de processo, foi agrupada toda a matéria de natureza formal relativa à realização do direito tributário que não fosse específica de cada um dos impostos, desde a competência em geral para a tributação, formas e prazos de pagamento, relaxes, capacidade tributária e judiciária, até à regulamentação de cada uma das formas de processo.
O processo gracioso de reclamação, proveniente em grande parte do anterior processo de reclamação contenciosa, é, como se disse, de natureza administrativa, dirigido à entidade que praticou o acto, e tem por fim obter a revisão deste. É um processo simples, não formal, rápido e não sujeito a custas.
Abrange duas formas: a reclamação ordinária e a reclamação extraordinária.
A primeira, que substituiu a anterior reclamação contenciosa na parte em que esta se referia à anulação total ou parcial do acto pela entidade que o praticou, viu o seu prazo reduzido a 30 dias, já que o contribuinte dispõe de 90 dias para impugnar judicialmente.
A reclamação extraordinária, ainda da mesma natureza, pode ser deduzida em prazos de seis meses ou de um ano, consoante os casos, mas só com os fundamentos restritos de duplicação de colecta ou de injustiça grave, e equiparados.
O processo de impugnação judicial representa o autêntico processo do contencioso das contribuições e impostos, pelo qual se intenta obter a anulação total ou parcial do acto tributário. E substancialmente análogo à acção declaratória, seguindo em larga medida a tramitação do processo geral de declaração, com as particularidades próprias da natureza do direito fiscal.
O processo de transgressão tem por objectivo a aplicação de sanções relativas a infracções fiscais e a autuação de factos imputáveis ao contribuinte por que não tenha sido possível liquidar o devido imposto em tempo normal.
Procurou-se integrar este processo nas finalidades que a ciência penal tem vindo progressivamente a assinalar no processo penal em geral, harmonizando-se com ele, em especial, o regime do pagamento voluntário das multas. Admitiu-se o seu pagamento espontâneo - que ficou sendo um instituto próprio de multa fiscal - e que se realiza por iniciativa ou acção do próprio infractor. Atribuiu-se aos autos, quando em termos regulares, o valor de princípio de prova que legalmente têm. Mas já é necessária a instrução preparatória nos casos de mera denúncia, participação ou auto incompleto ou sem fé em juízo.
No processo de execução fiscal, procurou-se acompanhar a profunda reforma que se verificou no sector do direito processual e que tornara inapropriado o Código das Execuções Fiscais de 23 de Agosto de 1913. Visou-se orientar a execução fiscal, de paralelo com a evolução verificada, no sentido de um processo mais dinâmico, aberto, utilitário, revestido de garantias, de autoridade e de aumento de termos ou de sentido predominantemente formalista.
A par da integração na moderna técnica processual, teve-se em vista, ao estruturá-lo, respeitar o princípio da sua jurisdicionalidade, mas sem abandonar outros valores processuais, mormente o da celeridade, muito em particular necessário do ponto de vista do Estado. Obedeceu-se, em suma, mais uma vez, à dupla atenção pelas garantias do contribuinte e do Estado.
Neste intuito, a execução é normalmente instaurada na repartição de finanças onde se produziu o relaxe, aí seguindo todos os trâmites processuais de natureza administrativa ou preparatória, só subindo ao juízo das contribuições e impostos quando houver questões de julgamento nitidamente jurisdicionais e, nomeadamente, nos casos de oposição, verificação e graduação de créditos, extinção, anulação da venda e incidente de falsidade.
Destaca-se ainda a medida de autorização excepcional para o pagamento da quantia exequenda até dez prestações semestrais. Este processo adapta-se, por um lado, aos ca-

Página 2614

2614 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

sos de impossibilidade de cobrança imediata, mas, sobretudo, pretendeu resolver o problema posto pelas economias pobres, em relação às quais a cobrança coerciva num só acto pode produzir a ruína económica injustificada do executado.
Os recursos para a 2.ª instância são admitidos de todas as decisões que excedam a alçada dos tribunais de 1.ª instância.
Assim se deu aos direitos do Estado e do contribuinte todo um conjunto de garantias judiciárias que se julga adequado às que lhes correspondem, na reforma fiscal, no plano dos direitos substantivos ligados ao fenómeno da tributação.

120. Foi publicado ainda no corrente ano, como se impunha o anunciara, o diploma em que se fixa a organização da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos.
Em vez de uma renovação profunda e sistemática, procurou-se nela uma revisão e renovação de toda a estrutura dos serviços de administração fiscal e dos meios naturalmente necessários para a integral realização dos fins a seu cargo.
Se na estrutura fiscal se destacou de sobremaneira o objectivo da adequação, ao novo condicionalismo da época actual, de toda a estrutura fundamental do sistema tributário tradicional do País, tornava-se necessário rever a constituição do serviço e dos elementos pessoais que o compõem, no sentido de obter deles aquela adequação indispensável à boa eficiência das novas leis.
Foi, assim, objectivo da reorganização dos serviços das contribuições e impostos criar ou reforçar meios, fundamentalmente dentro dos quadros já existentes, que tornem possível o desempenho material e eficiente de todas as funções, proporcionando aos funcionários, na sua preparação, um acompanhamento constante das exigências técnicas do próprio serviço e do progresso, no campo teórico e prático, da ciência fiscal.
Procurou-se, essencialmente, dotar os serviços de pessoal inteiramente idóneo e suficiente, em qualidade e em número, para que a reforma fiscal possa realizar-se integralmente, como um todo em si mesmo, sem a possibilidade de desarticulação decorrente de eventuais atrasos ou da ineficiência porventura ocorrente em alguns dos sectores da fiscalidade.
No aspecto da preparação dos funcionários, muitas das medidas consagradas foram o resultado de uma experiência positiva mais ou menos longa. No tocante à situação pessoal dos funcionários, teve-se como base segura de orientação que o campo mais eficaz e justo da sua melhoria é o do alargamento das condições de acesso, que passa a fazer-se na máxima medida possível, evitando-se, assim, a estagnação forçada ou a perda do estimulo que decorre da visão de um horizonte porventura fechado a certas melhorias.
Um rigoroso espírito de legalidade não pode, naturalmente, deixar de se considerar como necessário à salvaguarda dos interesses administrados, pois não há verdadeira execução legal fora dos princípios, nem defesa possível contra as distorções para além de uma estrita observação das regras jurídicas, e isto, muito particularmente, se se quiser consubstanciar toda a política em que os serviços de administração fiscal vêm empenhados, no sentido de uma verdadeira conquista da confiança do contribuinte e da sua colaboração espontânea, total e consciente - requisito indispensável para se conseguir uma harmónica realização dos superiores interesses nacionais.
Para além deste espírito de legalidade e para a realização, mesmo, desse objectivo, impõe-se manter os serviços, tanto quanto possível, num estado de perfeição cultural compatível com a elevação das suas funções. Objectivo certamente difícil de alcançar na sua perfeição, mas que nem por isso pode ser descurado. O espírito de colaboração entre os serviços e o público só se conquistará e manterá se aqueles lhe puderem oferecer, com a força e a consciência da autoridade técnica e científica, o convencê-lo da verdade da solução e do espírito com que foi encontrada. Mas para isso é preciso um aperfeiçoamento constante, tanto mais penoso quanto tem de ser feito sincrònicamente com o ritmo de desenvolvimento do País, com o esforço de adaptação aos problemas económicos e sociais que o dia a dia põe à Administração, tanto no plano nacional como no plano das relações externas.
Seria utópico esperar que esses objectivos pudessem ser alcançados ao nível desejável e na extensão julgada necessária dentro dos quadros limitados das estruturas tradicionais, sob pena de desvios de funções ou esbanjamento de energias necessariamente inconvenientes.
Imperioso se tornava, pois, confiar este sector das preocupações da Direcção-Geral a um órgão específico e deliberadamente a elas atento, a que fosse possível o estudá-las e enfrentá-las em profundidade. Só o estudo atento das instituições, a ponderação das implicações respectivas, permitiria ambicionar a conquista de um marcante progresso no campo cultural afecto aos problemas técnicos e científicos da administração tributária. O reconhecimento desta necessidade implicava, como consequência lógica, o preenchimento de uma lacuna que vinha sendo reconhecida; mas num campo onde não havia experiência a recolher, onde se semeava e construía inteiramente de novo, o bom senso e a prudência aconselhavam a postergação de todo o apriorismo e a adopção de um largo campo de experiência susceptível de recolha dos seus ensinamentos no ensaio das soluções. O resultado desta orientação laboriosamente tentada e levada a efeito nos últimos anos culminou na oficialização pelo Decreto n.º 45 095, que reforma a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, do Centro de Estudos Fiscais, órgão inteiramente novo na estrutura deste serviço do Estado.
A sua consagração legal traduzia o reconhecimento dos serviços já prestados até então, a funcionar unicamente no campo de facto, e a certeza de que está apto para desempenhar tarefas que hoje lhe cabem por força de imperativo legal. Asseguram-no aquela experiência de alguns anos, o cuidado que se pôs na sua estruturação, quer no campo da orgânica, quer no campo pessoal, os frutos já produzidos e as mais amplas perspectivas de rendimento abertas pela reforma dos serviços administrativos e judiciais das contribuições e impostos.
De acordo com os preceitos daquele diploma, fica a incumbir II este organismo, como serviço que é da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos:

a) Realizar estudos, pesquisas, inquéritos e trabalhos necessários ao progresso e eficiência dos serviços das contribuições e impostos;
b) Preparar programas e elementos de estudo e organizar estágios, cursos ou sessões de estudo para aperfeiçoamento do respectivo funcionalismo;
c) Organizar um serviço de documentação e consulta dos elementos relativos ao progresso da ciência e técnica fiscal;
d) Preparar e publicar os elementos ou órgãos de divulgação que lhe sejam afectos;
e) Organizar e fomentar a associação de todas as pessoas e entidades interessadas no conhecimento e progresso da ciência e técnica fiscal;

Página 2615

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2615

f) Promover e fomentar a formação e o esclarecimento da consciência cívica em matéria tributária numa base de justiça e de solidariedade.

Funções de estudo, de aperfeiçoamento de pessoal, de divulgação e congregação de esforços e boas vontades só podem ser tentados dentro de um programa sistematicamente elaborado. Para o realizar houve necessidade de a administração fiscal se socorrer, naturalmente, de novos serviços, cuja importância é por de mais evidente para que mereça a pena assinalá-la. Basta, por agora, salientar que a sua missão transcende muito o campo teórico, não só porque não há saber totalmente desinteressado, mas porque toda a solução prática não pode deixar de assentar num conhecimento enraizado.
Num campo como o dos impostos, onde os interesses em jogo exigem uma ponderação cuidadosíssima, onde se torna necessário um equilíbrio permanente nas soluções, não poderia ser diferentemente. É preciso aliar aos tesouros da prática os ensinamentos do conhecimento sistemático e especulativo - no seu aspecto dogmático, filosófico, histórico e sociológico. É preciso divulgá-los, pois só o seu conhecimento pode levar à compreensão da acção desenvolvida. E preciso apreender e demonstrar as coordenadas do momento e das soluções e imperativos impostos pela história. Tal é, em síntese, o serviço que se espera do Centro de Estudos, cuja efectivação corresponde a um espírito administrativo que se julga, sem imodéstia, poder chamar renovador, nas preocupações, nos métodos, nas aspirações.
Tudo isto, aliás, se verifica e espera de todos os serviços da administração fiscal, sempre prontos e aptos a corresponder às solicitações e amplamente receptivos à penetração dos ideais.

121. São naturalmente do domínio comum, e por certo conhecidos em grande parte da sua extensão, os efeitos que da dupla tributação internacional resultam para a expansão das relações económicas entre os países, dado constituírem, por si, um dos maiores entraves, se não o maior, ao movimento dos capitais, das pessoas e dos serviços, ao investimento, às trocas, ao estabelecimento e, de um modo geral, a todo o processamento harmonioso do desenvolvimento económico.
A posição do nosso país nas relações internacionais e perante a própria ordem e conjuntura internas oferece ainda particularidades específicas do maior relevo, provenientes da sua constituição orgânica, que se projectam decisivamente na dualidade de qualificações que lhe podem ser atribuídas no campo da exportação e importação de capitais e que dão, portanto, ao problema maior gravidade do que a que resulta das meras relações entre os Estados.
Internamente, e no que respeita às relações interprovinciais, a função típica da economia metropolitana tem sido, entre nós, na plenitude dos tempos - e hoje mais do que nunca - de verdadeira fonte de exportação de capitais para as províncias financeiramente autónomas. Já, pois, esta característica e o ónus que a mesma implica para a garantia do fomento público e do investimento privado são factores preponderantes a acrescer às necessidades normais dos Estados para que se considere o nosso país, nas relações externas, como importador de capitais.
Esta dupla característica e verdadeira qualidade no que se refere à importação e à exportação de capitais dá, pois, ao problema da dupla tributação uma acuidade especial entre nós, dado que nos compete olhar não apenas aos objectivos da cooperação internacional e da expansão das respectivas relações, mas conjuntamente aos que resultam da integração do espaço português, por forma que a defesa dos interesses puramente fiscais, vista por um lado, não possa comprometer as vantagens que para a economia total devam resultar dos compromissos ou renúncias que é forçoso assumir.
Tem o nosso país participado activamente, no âmbito da O. E. C. E. e, agora, da O. C. D. E., dos estudos do problema da dupla tributação e das fórmulas destinadas à sua eliminação. O Comité Fiscal instituído nessas organizações, e em que o nosso país tem tido permanente representação, acabou agora um projecto de modelo de convenção para servir como norma geral de harmonização dos tratados bilaterais, de direito comum a estabelecer entre grupos de países de relações intensas e de ordens afins, ou, até, em futura evolução, de verdadeira base para uma desejada convenção geral assinada por todos os Estados da O. C. D. E.
No decurso dos trabalhos que têm sido levados a efeito desde 1956 vem, anualmente, o Conselho daquela organização e da que a precedeu - e à medida que aprova os respectivos resultados - recomendando insistentemente aos países associados que adoptem nas suas convenções bilaterais as soluções encontradas como sendo as melhores sob o ponto de vista da cooperação e desenvolvimento. Um paralelo esforço de todos, no sentido da celebração tão urgente quanto possível de convenções desse género, tem sido também objecto de recomendação constante: por um lado, com vista à resolução imediata de um dos maiores entraves à expansão económica entre os Estados; por outro, com o propósito de se obter com a rapidez possível, no campo bilateral, uma experiência segura sobre a qualidade das soluções, para uma próxima generalização até ao campo da totalidade dos Estados membros.
Não tem o nosso país descuidado, naturalmente, essa recomendação, certo como está da premência das necessidades que a impõem e da excelência dos resultados que dela se esperam. A falta de uma experiência segura em campo tão importante, que se reflecte profundamente na economia e nas finanças dos países membros, levou-nos a encaminhar as soluções por planos meramente sectoriais, dado que os resultados dos estudos e o objecto das recomendações eram também ainda limitados a actividades específicas, e nem os trabalhos da nossa reforma fiscal permitiam que se tomasse como base de conversações o nosso regime tributário, por ser precária a segurança das soluções previstas.
Celebraram-se, pois, nos últimos anos, várias convenções sobre dupla tributação em matéria de rendimentos das empresas de navegação marítima ou aérea, com a Argentina, com a Inglaterra, com a União Sul-Africana, e estão em curso as correspondentes conversações com a Espanha, com o Paquistão e com a Suíça. Com este último país, o plano de conversações, inicialmente restrito à matéria da navegação marítima e aérea, foi ampliado com vista à celebração próxima de um acordo geral.
Por notável coincidência que é do maior interesse assinalar, foi em 1963, isto é, no ano em que se completou a nossa reforma dos impostos directos sobre o rendimento, que o Comité Fiscal da O. C. D. E. deu como pronto o já referido projecto geral de convenção que abrange precisamente os impostos sobre o rendimento e sobre o capital e neste mesmo ano aprovado pelo Conselho.
Esta dualidade de ocorrências e a sua concordância no tempo e no objecto libertam-nos, no futuro, das hesitações e verdadeiros embaraços que até aqui se ofereciam à celebração de acordos gerais sobre a dupla tributação.

Página 2616

2616 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Estão, pois, já em curso os trabalhos preparatórios de uma larga acção imediata no sentido de se celebrarem, em breves datas, acordos gerais sobre a dupla tributação em matéria de impostos directos sobre o rendimento e ganhos em capital, com todos os países membros da O. C. D. E. e com alguns, mesmo, estranhos a esta organização.
Dada a impossibilidade de se estabelecer o confronto simultâneo do nosso sistema tributário com a pluralidade de regimes fiscais de todos os países no sentido de se obterem os melhores efeitos do estudo consciente das reciprocidades, vão imediatamente acentuar-se as conversações já em curso com alguns países, por forma a poderem celebrar-se acordos gerais pelo menos com os Estados Unidos da América, com a Inglaterra, com a República Federal Alemã, com a Suíça e com todos os outros países membros da O. C. D. E. cujas conversações possam enquadrar-se imediatamente dentro das possibilidades materiais do plano de trabalhos.
No plano interno, isto é, nas relações entre a aplicação dos sistemas tributários da metrópole e das províncias ultramarinas, está pronto, como já se disse no ano findo, o projecto de diploma destinado a resolver as situações de dupla tributação. A reforma fiscal só agora completada, e a necessidade de se procurar imediatamente a resolução de alguns casos, mais através da harmonização dos sistemas tributários do que através da criação de normas de conflitos, justificou, porém, o retardamento desse mesmo diploma, que deverá enquadrar-se, naturalmente, nos trabalhos de integração de natureza fiscal.
Espera-se ver no ano de 1964 um importante progresso ha resolução desse problema, que atinge agora um grau de acuidade que nunca teve em tão grande extensão.

122. Tem sido orientação do Ministério das Finanças estimular as empresas que visam principalmente a exportação, e, nesse sentido, tem concedido importantes incentivos fiscais, quer em matéria de contribuição industrial, isenção de direitos de importação e concessão de regimes de draubaque, quer no que se refere a direitos de exportação, a cuja progressiva eliminação se tem vindo a proceder nos últimos anos.
Dentro desta política se enquadra o disposto na alínea d) do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 44 016, de 8 de Novembro de 1961, onde se estabeleceu que "a partir de 1 de Julho de 1962, serão livres de direitos de exportação todas as mercadorias com destino às províncias ultramarinas", e, no que se refere à exportação para países estrangeiros, o artigo 13.º da Lei n.º 2111, de 21 de Dezembro de 1961, onde se prevê que "é autorizado o Governo a isentar de direitos de exportação as mercadorias destinadas aos países que, por efeito de acordos, tratados ou convenções, gozem de tratamento especial".
Assim, deixaram de cobrar-se direitos na exportação para o ultramar português a partir de 1 de Julho de 1962, e, dada a adesão de Portugal à Convenção A. E. C. L., deixaram também de cobrar-se na exportação para os países signatários da Convenção os direitos referentes a numerosos artigos pautais, tendo sido igualmente eliminadas as sobretaxas que incidiam sobre a exportação de diversas mercadorias.
Considerando o caso da exportação de mercadorias para países estrangeiros não abrangidas pela referida Convenção e prosseguindo na execução da política anteriormente traçada, foi recentemente publicado o Decreto-Lei n.º 45 269, de 25 de Setembro de 1963, que declarou livre de direitos a exportação de várias mercadorias, designadamente as compreendidas na classe 5.º da respectiva pauta, relativa a "aparelhos, instrumentos, máquinas e utensílios, empregados na ciência, nas artes, na indústria e na agricultura; embarcações e veículos".
Dentro desta mesma orientação continuarão a ser considerados os casos de mercadorias ainda não contempladas, em relação às quais se reconheça conveniência em melhorar as respectivas condições de concorrência nos mercados internacionais.

Defesa nacional

123. Na presente proposto de lei mantém-se inalterado, em relação às Leis de Meios para 1962 e 1963, o capítulo relativo à defesa nacional e confere-se-lhe a mesma prioridade na sua estrutura: é que a necessidade de assegurar a integridade nacional continua a ter, como então, importância primacial na vida da Nação - e, consequentemente, na actividade financeira do Estado.
Daí que se mantenha a disposição através da qual o Governo fica expressamente autorizado a conceder prioridade à satisfação dos encargos com a defesa nacional.
Deve, no entanto, salientar-se que se tem procurado, e se tem conseguido, que o esforço de defesa imposto ao País pela necessidade imperiosa de defesa das províncias ultramarinas não afecte significativamente o ritmo a que se tem processado o desenvolvimento económico nacional. Importa, ainda, ter presente que o vultoso volume de despesas públicas que se tornou necessário realizar para fazer face aos encargos de defesa não se repercutiu de forma inteiramente negativa no comportamento da actividade económica da metrópole e das províncias ultramarinas. Com efeito, está-se perante despesas que em alguma medida contribuem, directa ou indirectamente, para a expansão da economia nacional, e espera-se que de futuro seja possível operar, através de medidas adequadas que venham a ser adoptadas, uma crescente participação da actividade económica nacional no esforço de defesa.

124. Embora o artigo 15.º da presente proposta de lei esteja formulado em termos idênticos aos de disposições análogas insertas nas leis de meios anteriores, o que tornaria dispensável a sua justificação, julga-se oportuno referir, ainda que sucintamente, a forma como se têm efectivado nos últimos anos os compromissos internacionais de carácter militar e o seu comportamento provável em 1964.
De harmonia com a lei de autorização das receitas e despesas para o ano em curso, não foi alterado o limite máximo autorizado pela Lei n.º 2111, de 21 de Dezembro de 1961, para as despesas respeitantes a compromissos internacionais de carácter militar: 4 300 000 contos. Deste modo, atendendo ao elevado volume de encargos a que se tornou necessário ocorrer no decurso do actual período financeiro, estima-se apenas em 96 735 contos o saldo susceptível de aplicação em 1964, como mostram os elementos que a seguir se alinham:

Contos
Lei n.º 2111, de 21 de Dezembro de 1901:

Limite máximo autorizado legalmente......... 4 800 000

Pago em:
1952................... 282 882
1954................... 467 279
1955................... 386 388
1956................... 377 558
1957................... 352 623
1958................... 233 108
1959................... 322 326
1959................... 366 505
A transportar....2 788 669 4 300 000

Página 2617

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2617

Transporte.... 2 788 669 4 300 000
1960............ 430 388
1961............ 414 949
1962............ 309 513
3 943 519

Guias de reposição que não puderam ser abatidas nos anos de:

1952............ 3 573
1953............ 1 744
1954............ 575
1955............ 820
1956............ 340
1957............ 3 157
1958............ 759
1959............ 7 453
1960............ 1 607
1961............ 390
1962............ 20
20 433
3 923 081
376 919
Em 1963:

Foram orçamentados.......... 260 000
Reforço pelo Decreto n.º
45194, de 16 de Agosto
de 1963..................... 20 184
280 184
Reserva para 1964........................ 96 735

Atendendo ao saldo susceptível de utilização na próxima gerência e ao elevado valor das despesas realizadas nos últimos anos para fazer face à participação do País, através da O. T. A. N., na defesa do mundo ocidental, e a que são esses mesmos valores que se procura preservar ao assegurar a integridade das nossas províncias ultramarinas, propõe-se que sómente seja elevado de 200 000 contos o limite máximo de 4 300 000 contos fixado pela Lei n.º 2111, de 21 de Dezembro de 1961, devendo inscrever-se no Orçamento Geral do Estado para 1964 a verba de 260 000 contos destinada à satisfação dos compromissos internacionais de ordem militar, que poderá ser reforçada com a importância afectada a estas despesas e não despendida no ano em curso.

Investimentos públicos

125. Os artigos 16.º e 17.º deste capítulo da presente proposta de lei constituem os preceitos genéricos a que devera subordinar-se a realização de investimentos públicos em 1964, em perfeita correspondência com as disposições idênticas insertas na Lei n.º 2117, actualmente em execução. Não haveria, portanto, lugar neste momento a referência especial. Dada, todavia, a sua particular relevância para a evolução da economia metropolitana, afiguram-se oportunos alguns comentários.
Através do preceituado no artigo 16.º propõe-se que o Governo fique autorizado a inscrever no orçamento para o próximo ano, atenta a prioridade absoluta atribuída aos encargos com a defesa nacional, as verbas destinadas à realização dos empreendimentos programados no âmbito do Plano de Fomento. Por outro lado, ao propor o artigo 17.º pretende o Governo ficar autorizado a limitai-os encargos extraordinários fixados em lei que respeitem a empreendimentos não abrangidos pelo Plano de Fomento, estabelecendo-se no artigo 18.º uma ordem de precedência, idêntica à adoptada para o ano em curso, que constitui um esquema de orientação para a realização destes investimentos. Trata-se, fundamentalmente, de investimentos de infra-estrutura não directamente reprodutivos que ao Estado, pelas características de que se revestem, compete executar.
No quadro XXIX, que a seguir se insere, apresentam-se os investimentos do Estado não abrangidos no Plano de Fomento, discriminando-se, consoante o fim a que se destinaram, o montante total programado, os dispêndios realizados de 1951 a 1962, a dotação inscrita no orçamento actualmente em execução e o total a despender.

QUADRO XXIX

Investimentos do Estado não abrangidos no Plano de Fomento Empreendimentos em curso nos anos de 1962 e 1963

(Contos)

[Ver tabela na imagem]

Página 2618

2618 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

[Ver tabela n imagem]

(a) A inscrever de 1958 a 1965, de conformidade com as disponibilidades orçamentais.
(b) A inscrever sem prazo, de conformidade com as disponibilidades orçamentais.
(c) O Plano devia estar concluído em 1950; porém, desde o seu inicio até ao fim de 1962 gastaram-se cerca de 207 227 contos.
(d) O encargo do Estado é de 37500 contos, a distribuir igualmente pelos anos de 1956 a 1965; o encargo da Junta Geral do Distrito Autónomo é de 12 500 contos.
(e) O Estado contribui com 5 contos para cada uma das 10 000 casas previstas. Não há prazo para a construção.
(f) 8400 contos foram pagos de 1957 a 1960 à Câmara Municipal do Porto pola cedência de uma sua propriedade.
(g) 3750 000 contos a inscrever em despesa extraordinária durante quinze anos (1956 a 1970), sendo 180 000 contos de 1956 a 1958 e 267500 contos do 1959 a 1970, 2 250 000 contos são despesa ordinária igualmente repartida pelos anos de 1956 a 1970.
(h) A 1.ª fase do Plano devia estar concluída em 1955. Porém, até ao fim de 1963 gastaram-se 139490 contos.
(i) 52 000 contos respeitam a Ponta Delgada, a despender de 1956 a 1961 pelo Estado, Junta Geral e câmaras municipais; 22 600 coutos respeitam à Horta, a despender de 1958 a 1962 pelo Estado, Junta Geral e câmaras municipais.
(j) A parte não gasta até 1962 será satisfeita em 1963.
(l) A comparticipação do Tesouro é de 18 000 contos.

No período financeiro precedente, o total das despesas realizadas em investimentos do Estado, não abrangidos no Plano de Fomento, elevou-se a 606 075 contos, o que representa 97,1 por cento da respectiva previsão orçamental. De entre estes investimentos merecem especial referência os efectuados com a rede de estradas do continente (267 500 contos), caminho de ferro da Beira (100 000 contos), edifícios escolares - escolas primárias e cantinas escolares (95 153 contos) e, ainda, melhoramentos rurais - em que o montante despendido (20 011 contos) foi mais do que duplo do orçamentado (8000 contos).
Não obstante o elevado montante de investimentos (5 438 907 contos), que foi possível realizar no decurso dos últimos doze anos, c que o quadro precedente documenta, deve salientar-se que este valor representa apenas parcela diminuta da contribuição do Estado para dotar o País da infra-estrutura indispensável ao processo de desenvolvimento económico em curso. Com efeito, ao montante dos investimentos anteriormente mencionados devem adicionar-se as importâncias gastas na execução do plano de reapetrechamento em material didáctico e laboratorial das Universidades e escolas e do plano de reapetrechamento dos hospitais, de natureza também vincadamente infra-estrutural, e, principalmente, os investimentos financiados por dotações orçamentais no âmbito da execução do II Plano de Fomento, a que anteriormente se fez referência.

126. Ainda, no artigo 18.º da proposta da Lei de Meios para 1964, mantêm-se as duas primeiras rubricas da alínea c), «Educação e cultura», do artigo 19.º da Lei n.º 2117 - «Aceleração na formação de pessoal docente universitário» e «Intensificação da concessão de bolsas de estudo» -, em relação às quais são bastante elucidativos os quadros que a seguir se inserem:

QUADRO XXX

Pessoal docente do ensino superior

[Ver tabela na imagem]

(a) Justifica-se o excedente pelo aproveitamento das disponibilidades das dotações para pessoal dos quadros.

Página 2619

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2619

QUADRO XXXI

Bolsas de estudo

[Ver tabela na imagem]

Do confronto entre as possibilidades financeiras consignadas no orçamento para 1963 e as providências tomadas até final do ano lectivo de 1962-1963 é dado concluir:
1.º Quanto à aceleração na formação de pessoal docente universitário, as disponibilidades financeiras não utilizadas correspondem a 117 unidades;
2.º Quanto à intensificação da concessão de bolsas de estudo, as disponibilidades financeiras não utilizadas em relação a alunos e a estagiários correspondem a 38 e 52 unidades, respectivamente.

127. No artigo 19.º da presente proposta de lei contém-se disposição idêntica ao artigo 20.º da Lei n.º 2117, propondo-se o Governo prosseguir na execução do plano de reapetrechamento em material didáctico e laboratorial das escolas técnicas, liceus, institutos e Universidades e do plano de reapetrechamento dos hospitais. E, à semelhança do que se verificou no corrente ano, considerando o eventual aparecimento de elevados encargos em sectores prioritários - nomeadamente no domínio da defesa nacional -, a execução dos planos anteriormente referidos prosseguirá na medida das disponibilidades do Tesouro. Com o objectivo de permitir apreciar, no que se refere ao reapetrechamento em material das escolas superiores e secundárias, os resultados obtidos, bem como os montantes que se estima venham a ser despendidos no âmbito dos planos já aprovados, apresenta-se o quadro XXXII.

QUADRO XXXII (a)

Reapetrechamento em material das escolas superiores e secundárias

Valores relativos ao período de 1957 a Outubro de 1963

(Contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Elementos fornecidos pela Comissão de Reapetrechamento em Material das Escolas Superiores e Secundárias.

De Janeiro a fins de Outubro do corrente ano, na prossecução do plano de reapetrechamento das escolas superiores e secundárias, efectuaram-se despesas no montante de 3684 contos, com a seguinte discriminação:

Contos
Ensino técnico.................... 2267
Ensino liceal..................... 138
Ensino superior................... 1279

Deve, contudo, ter-se presente que se assumiram em 1963 encargos no valor de 14 222 contos, o que permite esperar que se acelere sensivelmente, nos últimos meses do ano, a execução do plano.
Com o intuito de permitir uma análise mais pormenorizada da acção desenvolvida no âmbito daquele plano, incluem-se, em anexo ao presente relatório, os mapas n.ºs 11 a 15, em que se discriminam as verbas concedidas, por tipos de material adquirido, quanto ao ensino liceal e técnico, e por estabelecimentos, relativamente ao ensino superior.

128. De harmonia com o disposto no artigo 20.º da Lei n.º 2117, prosseguiu no decurso deste ano o reapetrechamento hospitalar, em que se despendeu a importância total de 22 327,5 contos.

Página 2620

2620 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

QUADRO XXXIII

Reapetrechamento hospitalar

(Contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Aprovado definitivamente em 8 de Novembro de 1961.
(b) Aprovado definitivamente em 3 de Janeiro de 1963.
(c) Aprovado definitivamente em 9 de Setembro de 1963.

Merece especial referência o facto de se encontrar já praticamente executado o I Plano de Reapetrechamento Hospitalar, aprovado em Novembro de 1961, e de se ter já iniciado a execução do II e III Planos, aprovados este ano, o que, atenta a actual conjuntura financeira, traduz a importância que o Governo atribui à criação de uma infra-estrutura sanitária adequada, indispensável à consecução dos objectivos económicos e sociais que se propõe atingir. Ainda para que se torne possível apreender o esforço desenvolvido neste sector, importa ter presente que às importâncias anteriormente descritas há que adicionar as comparticipações das autarquias locais, oferecidas ou fixadas.

129. Como em anos anteriores, inclui-se na alínea d) «Outras despesas» do artigo 18.º a rubrica «Realização de melhoramentos e construções para o turismo», que tem servido de cobertura à construção de pousadas.
Não tem sido, porém, através apenas destas construções que o Governo tem procurado estimular a corrente turística, quer interna, quer de estrangeiros.
Importa destacar aqui, em matéria de fomento turístico, a acção desenvolvida pelo Estado através do Fundo de Turismo.
Atento à crescente relevância do turismo na economia .nacional, e em execução da Lei n.º 2082, de 4 de Junho de 1956, o Governo regulamentou pelos Decreto-Lei n.º 40 912 e Decreto n.º 40 913, de 20 de Dezembro de 1956, a actividade do Fundo de Turismo, consignando-lhe, entre outras, as receitas provenientes do imposto de jogo, 20 por cento do produto das receitas ordinárias das regiões e zonas de turismo, e uma fracção da diferença entre os preços dos dois tipos de gasolina existentes no mercado.
Através do Fundo têm sido concedidos, nos termos legalmente estabelecidos, prémios para recompensar realizações ou iniciativas de interesse turístico, financiamentos a órgãos locais de turismo ou a entidades privadas destinados a estabelecimentos hoteleiros ou similares, a instalações de actividades de interesse turístico e a iniciativas que revistam idêntico interesse.
A par desta actividade, tem o Fundo prestado também o seu aval a empréstimos contraídos na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência e a aplicar em instalações hoteleiras ou similares, nos termos previstos no artigo 16.º da Lei n.º 2073, de 20 de Dezembro de 1954, com prestação de garantias ao Fundo por parte dos interessados.
A evidenciar como o fomento turístico tem merecido a atenção do Governo, cabe referir que os auxílios financeiros do Fundo podem revestir a forma de empréstimos ou de subsídios e que, no primeiro caso, além de um longo prazo de amortização, ou não há lugar a pagamento de juros, ou se cobra um juro de taxa muito reduzida.
A partir de 1957 e até Setembro do ano corrente o Estado despendeu através do Fundo o total de 128 389 contos e prestou aval a empréstimos contraídos na Caixa Geral de Depósitos no montante de 113 949 contos como detalhadamente se vê no quadro XXXIV.

Página 2621

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2621

QUADRO XXXIV

(Contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Até Setembro, Inclusive.

O crescimento anualmente verificado no número de turistas estrangeiros entrados no País está registado no quadro seguinte, onde também se indica a permanência média do turista estrangeiro:

QUADRO XXXV

[Ver tabela na imagem]

(a) Até Setembro, inclusive e Incluindo as ilhas adjacentes.
(b) Calculado em relação ao 1.º semestre.

130. Ainda, para completar a visão de conjunto em matéria de financiamentos, apresenta-se um outro quadro contendo a discriminação geográfica, por distritos, dos auxílios financeiros e cauções prestados através do Fundo de Turismo com destino a realizações de interesse turístico.

QUADRO XXXVI

Fundo de Turismo

(Contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Abrange empreendimentos de interesse para mais do que um distrito, como, por exemplo, propaganda turística do Pais no estrangeiro.

131. Finalmente, deve assinalar-se que se vem procedendo em conformidade com o artigo 22.º da Lei n.º 2117, de 19 de Dezembro de 1962, nos termos do qual «o Governo promoverá e acelerará os estudos para a elaboração de um programa de educação e formação, que deverá atender às necessidades nacionais nos aspectos científico, técnico e profissional».
Em discurso pronunciado em 7 de Maio de 1963, anunciou o Ministro da Educação Nacional estarem já em curso os trabalhos de planeamento da acção educativa. E, em nova exposição, de 26 de Julho, esclareceu e precisou os termos em que se vinham desenvolvendo esses trabalhos, que prosseguem.
A leitura dos referidos textos dá uma ideia segura dos fins que se tem em vista atingir, da orientação geral seguida, dos métodos ou processos adoptados. Por isso limitar-nos-emos aqui a algumas breves notas indicativas.
O esforço de planeamento fez-se assentar, todo ele, na indispensável distinção entre os aspectos qualitativos e os aspectos quantitativos. Esses aspectos entrelaçam-se, influenciam-se reciprocamente, mas são distintos, e logicamente a primazia pertence aos primeiros.
Em primeiro lugar, com efeito, há que considerar o sistema educativo na sua estrutura, renovando essa estrutura na medida do desejável e possível, não de forma

Página 2622

2622 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

desconexa ou descoordenada, mas dentro de uma visão do conjunto, em obediência a uma ideia de plano, para que as diferentes partes formem um todo coerente e orgânico. Esta é a planificação qualitativa.
Em segundo lugar, importa definir as exigências que se prevê venham a ser postas, dentro de prazo mais ou menos longo, ao sistema educacional, em numero de escolas, de professores, de diplomados, etc. Esta outra é a planificação quantitativa.
A planificação qualitativa, aliás, deverá desdobrar-se em duas fases. Numa caberá definir um conjunto de princípios ou bases, de directrizes superiores, que formem como que uma carta orgânica do ensino, ou Estatuto da Educação Nacional. Na outra competirá desenvolver os princípios contidos nesse estatuto fundamental, elaborando os estatutos particulares dos vários ramos ou graus de ensino.
Está-se a trabalhar na preparação do Estatuto da Educação Nacional. Organizaram-se para isso grupos de trabalho que têm a seu cargo a elaboração de estudos sobre os vários sectores ou matérias em que incumbe fazer luz. Apresentados esses vários trabalhos, deles se procurará extrair num grupo de trabalho mais restrito as conclusões válidas a integrar, sob a forma de bases, num projecto de estatuto.
Por outro lado, e no que respeita à planificação quantitativa, continua ela a ser estudada, no âmbito do chamado" «Projecto Regional do Mediterrâneo», pelo Centro de Estudos de Estatística Económica, do Instituto de Alta Cultura, em ligação com a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico. Através dessa planificação, procurar-se-á definir as principais exigências de ordem quantitativa que virão a pôr-se ao sistema escolar, no âmbito nacional e no âmbito regional, no período que irá até 1975.

132. O artigo 20.º da presente proposta de lei dispõe, como vem sendo habitual, que o Governo inscreverá como despesa extraordinária em 1964 as verbas necessárias para pagar ao Instituto Geográfico e Cadastral os levantamentos topográficos e avaliações cadastrais a que se refere o Decreto-Lei n.º 31 975, de 20 de Abril de 1942.
No relatório da proposta de lei orçamental de 1963 foram historiados, a traços largos, os projectos e disposições que, desde o início do século passado e durante as duas primeiras décadas do actual, traduziram o reconhecimento, por parte dos governantes, da necessidade do cadastro geométrico da propriedade para uma boa administração do País e como a falta de estruturas técnicas e as dificuldades financeiras dessas épocas impediram a aplicação efectiva de tais projectos. As medidas administrativas e orçamentais promulgadas em 1926 possibilitaram a preparação e estabelecimento daquelas condições e, verificada a sua existência, passou o Governo a conceder, a partir de 1944, para a execução dos trabalhos cadastrais, adequadas dotações anuais, geralmente crescentes, que permitiram aos nossos trabalhos cadastrais atingir um nível de qualidade e produção análogo aos dos mais importantes que se realizam na Europa.
Por força de imperiosas circunstâncias de todos conhecidas, houve, nos dois últimos anos, que reduzir tais dotações, mas não deseja o Governo prejudicar o prosseguimento destes trabalhos e a extensão a áreas crescentes do País dos inestimáveis benefícios de toda a ordem que resultam do cadastro geométrico: a definição geométrica da propriedade, a avaliação racional e sistematizada do seu rendimento, a tributação justa e equitativa; a inventariação da riqueza agrícola e da sua distribuição e evolução, que é base de estudos de planificação agrária; a carta topográfica geral do País em grandes escalas, que é indispensável para o estudo das obras de fomento.
A dotação orçamental de 1963 apresentou uma redução em relação à de 1961. Apesar disso e da consequente redução dos períodos de campanha no continente e nas ilhas adjacentes, os trabalhos do cadastro geométrico efectuados pelo Instituto no ano corrente equivalem sensivelmente aos de anos anteriores, sobretudo se se tomar em consideração que as regiões a norte do Tejo, onde agora esses trabalhos se desenvolvem na sua maior parte, apresentam condições de relevo, arborização, divisão predial e parcelar e diversidade de culturas muito mais desfavoráveis que as das regiões transtaganas. Com efeito, o Instituto, além da revisão geral do cadastro em dois grandes concelhos do Sul do País, apresenta, em 1963, o cadastro original de 3 concelhos do continente e de 5 freguesias das ilhas adjacentes, correspondendo a um total de 52 772 prédios rústicos, e tem em preparação, para apresentar brevemente, os cadastros de 4 concelhos continentais, a revisão geral de outros tantos e os de várias freguesias insulares.

133. Completado, praticamente, o cadastro dos 3 distritos alentejanos (43 concelhos), a intenção geral dos trabalhos em curso no continente é a de, no mais curto prazo, se proporcionar a instauração do regime cadastral na totalidade dos distritos de Setúbal, Lisboa e Santarém. E, realmente, com as operações efectuadas no ano corrente, todos os concelhos destes distritos ainda não integrados naquele regime ficaram atingidos pelos trabalhos do cadastro geométrico em diversas fases da respectiva execução.
Assim, no distrito de Setúbal, onde já cinco concelhos se encontram em regime cadastral (Sines, Santiago do Cacem, Grândola, Alcácer do Sal e Sesimbra), concluem-se, no ano corrente, as plantas na escala 1:2000 dos concelhos do Seixal, Barreiro, Moita e Alcochete e, consequentemente, todo o distrito fica provido do levantamento topográfico-cadastral. As operações de avaliação completam-se nos concelhos de Setúbal, Almada, Palmeia e, possivelmente, Montijo.
No distrito de Lisboa, onde o regime cadastral se estende a oito concelhos (Cascais, Oeiras, Sintra, Loures, Mafra, Sobral de Monte Agraço, Arruda dos Vinhos e Vila Franca de Xira) e já está apresentado o cadastro do de Torres Vedras, apresenta-se neste ano o cadastro do concelho da Lourinhã (16 200 ha, 18 726 prédios) e completam-se as operações de avaliação no de Cadaval e, possivelmente, no de Alenquer. Com a planta do concelho da Azambuja, em todo o distrito se passou a dispor do levantamento topográfico-cadastral (escalas 1:2000 e 1:2500, esta usada sómente no concelho de Mafra).
No distrito de Santarém estavam já apresentados os cadastros de dois concelhos (Constância e Chamusca); apresentou-se neste ano o do concelho de Alpiarça (cerca de 10 000 ha, 3013 prédios) e está-se preparando a apresentação dos de Coruche e Almeirim. Em toda a região distrital a sul do Tejo se fica dispondo do levantamento topográfico-cadastral, na escala 1:5000. As operações de avaliação estão decorrendo nos concelhos de Abrantes e Benavente. Na região do mesmo distrito a norte do Tejo fica-se dispondo dos levantamentos topográfico-cadastrais dos concelhos do Cartaxo e de Rio Maior, completaram-se os trabalhos topográficos nos de Santarém, Alcanena, Torres Novas, Golegã, Vila Nova da Barquinha, Entronca-

Página 2623

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2623

mento e Abrantes; iniciaram-se trabalhos análogos nos concelhos de Ferreira do Zêzere e de Mação, e prosseguiram nos de Vila Nova de Ourem e do Sardoal. Todos os concelhos do distrito, em número de 21, estão, portanto, atingidos pelas operações cadastrais.
No distrito de Portalegre estão apresentados os cadastros de treze concelhos e concluíram-se este ano as operações de avaliação dos dois restantes (Nisa e Gavião).
No distrito de Castelo Branco terminou-se este ano o cadastro do concelho de Idanha-a-Nova (cerca de 140 000 ha).
Efectuou-se nova cobertura fotogramétrica da metade ocidental cio concelho de Castelo Branco (cerca de 70 000 ha) onde se reconhecera que a fragmentação predial tornava, impraticável a representação na escala 1:5000; executaram-se as operações de triangulação e apoio indispensáveis para a restituição na escala 1:2000.
No distrito de Leiria apresentou-se este ano o cadastro do concelho do Bombarral (cerca de 8700 ha, 10 099 prédios) e terminaram-se as operações topográficas nos de Peniche e Óbidos, iniciando-se os inquéritos e estudos para a elaboração dos quadros da avaliação cadastral.
No distrito de Faro completam-se este ano as operações de triangulação cadastral e de apoio fotogramétrico no concelho de Aljezur e efectuou-se a restituição na escala 1:2000 de uma zona de cerca de 4000 ha requerida pela Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos para utilização no estudo e projecto da extensão do Plano de rega do Alentejo ao planalto de Rogil.
Um dos mais relevantes exemplos do interesse geral dos trabalhos cadastrais consiste na economia que a sua aplicação proporciona no estudo e planeamento daquela importante obra de fomento. Também neste ano o Instituto colaborou activamente no levantamento topográfico do perímetro de Estourãos (Ponte de Lima), o primeiro a ser submetido às operações de emparcelamento a cargo da Junta de Colonização Interna.
Em resumo: no continente estão actualmente executados os cadastros de 65 concelhos, que somam uma área de cerca de 3 065 000 ha, isto é, 35 por cento da área total.
Estão disponíveis plantas topográfico-cadastrais de mais 11 concelhos, perfazendo-se, assim, uma área de cerca de 3 870 000 ha, isto é, 44 por cento da área total.
Precede a execução dos trabalhos cadastrais a denominada revisão da rede geodésica, que é praticamente o estabelecimento de uma nova rede com a precisão indispensável para apoiar os levantamentos em grandes escalas exigidas pelo cadastro. Em 1963 completaram-se as observações para esta revisão no distrito de Faro e, assim, a rede geodésica revista passa a abranger todo o território a sul dos distritos de Aveiro, Viseu e Guarda e continuando a progredir nestes distritos. Prosseguiram as delicadas observações para o estabelecimento da nova rede geodésica fundamental e remodelação das redes primordiais complementares de forma a poderem considerar-se concluídas nas regiões central e norte do País e efectuaram-se, para o mesmo fim, determinações astronómicas no vértice fundamental Padreia, na província de Trás-os-Montes. Ficaram quase. concluídas as operações de campo da rede primordial de nivelamento geométrico (de alta precisão).

134. Na ilha da Madeira os trabalhos cadastrais revestem-se de extraordinária dificuldade, em consequência do relevo singularmente áspero, da nebulosidade intensa e persistente e da excessiva fragmentação da propriedade, ainda complicada pelo regime de colónia. Em grandes extensões é indispensável recorrer às escalas 1:1000 e 1:500 para conseguir a conveniente representação topográfica dos prédios.
A parte restritas utilizações da estereofotogrametria terrestre, só se têm empregado os métodos clássicos de levantamento, que, em tais circunstâncias, são necessariamente muito lentos e dispendiosos. Apesar de persistentes diligências, ainda se não conseguira obter a cobertura fotogramétrica da ilha, tarefa que a acidentação e nebulosidade tornam de difícil execução e de custo elevado relativamente às coberturas realizadas no continente. Impõe-se, no entanto, a aplicação da fotogrametria aérea como único processo de acelerar a execução dos levantamentos e, consequentemente, de produzir uma notável economia no custo geral do cadastro da Madeira.
Foi possível, em 1963, alcançar-se quase totalmente esse objectivo. Com efeito, durante dois meses e com base da avião em Porto Santo, pôde uma empresa com que o Instituto estabeleceu contrato para tal fim realizar cerca de 90 por cento do programa da cobertura da Madeira e executar completamente as coberturas das outras ilhas do arquipélago.
No prosseguimento dos trabalhos clássicos de levantamento, completaram-se, neste mesmo ano, os relativos aos concelhos de Machico e do Funchal, pouco restando para executar nos concelhos de Santa Cruz e de Câmara de Lobos. A área destes quatro concelhos é de cerca de 26 000 ha, mas com os trabalhos realizados em outros concelhos obtém-se uma área superior a 30 000 ha, mais de um terço do total da ilha, já dotada de levantamentos topográfico-cadastrais.
A apresentação do cadastro efectua-se, nas ilhas adjacentes, por freguesias. Com o da freguesia de Caniço (4704 prédios), do concelho de Santa Cruz, ficaram este ano apresentados os cadastros de oito freguesias. Os trabalhos de avaliação cadastral estão incidindo em 12 freguesias dos concelhos anteriormente mencionados.
A revisão da rede geodésica da ilha da Madeira prosseguiu e encontra-se quase concluída no que respeita a trabalhos de campo.

135. Os trabalhos cadastrais na ilha de S. Miguel são influenciados por dificuldades análogas às que se encontram na Madeira, mas em grau sensivelmente menor, excepto no que se refere à nebulosidade e precipitação. Mas, sobretudo, têm sido facilitados pela utilização de uma cobertura fotogramétrica parcial da ilha, obtida em 1949.
Em 1963 concluiu-se o levantamento topográfico do concelho de Ponta Delgada e deverá completar-se o do concelho de Lagoa. Dispor-se-á, pois, de planta topográfico-cadastral em 30 000 ha, isto é, cerca de 40 por cento da área total da ilha. Somente se tinham apresentado os cadastros de duas freguesias, mas apresentaram-se este ano os das freguesias de Fajã de Baixo, S. José, S. Pedro e S. Sebastião (num total de 1148 prédios). Em todas as restantes freguesias do concelho de Ponta Delgada estão terminados os trabalhos de campo, topográficos e de avaliação e preparam-se as respectivas apresentações do cadastro.

136. À medida que aumenta o número de concelhos em regime cadastral, crescem os encargos do Instituto na indispensável conservação dos respectivos elementos.

Página 2624

2624 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Actualmente, mais de um milhar de processos de modificação nos limites de prédios ou de alterações nas culturas, instaurados oficiosamente ou a requerimento dos contribuintes, são, por ano, enviados pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos ao Instituto para este promover as correspondentes alterações nos mapas parcelares (1407 processos em 1962). Já é importante o número de funcionários ocupados com o despacho destes processos, quer nas operações de campo, quer em gabinete. Mas são naturalmente crescentes os encargos com este serviço, que tem de desempenhar-se com prontidão, não só para obedecer às prescrições do Código da Contribuição Predial, como também para evitar prejuízos aos contribuintes.
As despesas excedem em muito as receitas do Estado provenientes dos emolumentos criados para as compensar e que, por isso, devem ser rectificados.
Por esta via, a conservação do cadastro é necessariamente muito imperfeita, pois só são atingidos os prédios e locais directamente implicados nos processos referidos. Com efeito, não chegam obrigatoriamente ao conhecimento das repartições de finanças muitas alterações cuja omissão na planta cadastral enfraquece grandemente o seu valor descritivo, mesmo que sejam pouco significativas do ponto de vista fiscal. Bastará referir, como exemplo, as que resultam da abertura ou modificações de traçado de estradas, caminhos, arruamentos e outras obras públicas ou privadas tão frequentes, sobretudo nas proximidades das zonas urbanas.
Em muitos concelhos cadastrais, porém, tem-se efectuado actualizações completas por efeito de revisões operadas nos termos dos artigos 14.º e 16.º do Decreto-Lei n.º 31 975, de 20 de Abril de 1942. O novo Código da Contribuição Predial também prescreve o prazo de cinco anos, a contar daquele a que se refira o primeiro lançamento da contribuição com base nos rendimentos de nova matriz, para proceder à revisão dos elementos da avaliação cadastral de harmonia com as alterações que os prédios e os rendimentos dos mesmos tenham sofrido, embora se preveja a possibilidade de alongamento desse prazo.
Desde 1958 que o Instituto despende uma grande parte da sua actividade no sector cadastral com estas revisões. Foram deliberadamente aplicadas aos 25 concelhos situados a sul do Tejo em que estava instaurado o regime cadastral com tarifas ainda calculadas com base nos preços de géneros, encargos e salários relativos a quinquénios anteriores a 1936, apresentando, naturalmente, notáveis disparidades com as calculadas para concelhos vizinhos e baseados em elementos de pós-guerra. Têm necessariamente incidido quer sobre a avaliação, quer sobre a topografia, de forma que, principalmente nos concelhos em que a planta cadastral era mais antiga, as operações topográficas exigem aplicação de pessoal e despesas que se aproximam do que corresponde aos trabalhos de avaliação.
Dos 25 concelhos referidos, 14 constituem o distrito de Beja, 7 pertencem ao distrito de Évora e 4 ao de Setúbal, representando, no total, uma área aproximada de 1 800 000 ha, com cerca de no 110 000 prédios e mais do dobro de parcelas culturais. Até final de 1962 tinham-se apresentado os elementos cadastrais revistos de 14 concelhos, correspondendo a cerca de 872 000 ha e 72 000 prédios. Durante o ano corrente, apresentaram-se já os elementos análogos relativos ao concelho de Odemira (172 068 ha e 9402 prédios), vão-se apresentar os de Santiago do Cacem (105 862 ha e 5680 prédios) e prepara-se a apresentação sucessiva dos respeitantes a mais 4 concelhos (cerca de 250 000 ha e de 8000 prédios); os trabalhos de campo completaram-se em 3 outros concelhos e ficam muito adiantados nos 2 restantes.
Todos estes trabalhos de conservação e revisão absorvem, como se disse, uma parte muito substancial do pessoal e das verbas destinadas aos trabalhos cadastrais e têm provocado, evidentemente, alguma diminuição no ritmo da entrada de novos concelhos em regime de cadastro geométrico.
Mais vinte concelhos, além dos referidos, se encontram já sob a alçada das determinações relativas à revisão. É necessário dar-lhes cumprimento para se conservar o valimento dos importantes trabalhos já efectuados; mas é também muito conveniente que isso não afecte a extensão progressiva do regime cadastral a novos concelhos do País.

137. As anteriores referências são indicativas do volume e do estado de desenvolvimento dos trabalhos cadastrais, da importância que a sua conservação e o seu progresso apresentam para a Administração e o fomento do País e, consequentemente, da necessidade de dotar o Instituto Geográfico e Cadastral de forma a poder desempenhar-se dos encargos que lhe estão cometidos.

Providências sobre o funcionalismo

138. No âmbito do vasto conjunto de providências que integram a política que visa a melhoria das condições económico-sociais dos servidores do Estado, foi publicado o Decreto-Lei n.º 42 951, de 27 de Abril de 1960, com o objectivo de criar o condicionalismo indispensável à concretização do objectivo, expresso na lei de autorização das receitas e despesas para 1958, de assegurar aos funcionários do Estado e dos corpos administrativos habitação adequada aos respectivos rendimentos.
De acordo com a política definida pelo Governo neste domínio, possibilitou-se, assim, tanto a compra como a edificação de casas para funcionários. Ao mesmo tempo, no que se refere aos recursos financeiros a mobilizar, autorizou-se a Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência (Caixa Nacional de Previdência) a aplicar os capitais afectos ao Fundo Permanente, cujo montante é avultado, na aquisição e construção de casas para habitação de funcionários do Estado e dos corpos administrativos, em regime de propriedade resolúvel e de arrendamento.

139. Assinale-se ainda que a atribuição das casas construídas por iniciativa da Caixa Nacional de Previdência, nos termos do Decreto-Lei n.º 42 951, de 27 de Abril de 1960, se efectua mediante concurso, a que podem concorrer os servidores do Estado, dos seus organismos, instituições ou estabelecimentos autónomos, e dos corpos administrativos, desde que se verifiquem determinadas condições - nomeadamente a de a mensalidade correspondente à casa pretendida não exceder um quarto dos rendimentos do agregado familiar.
Na classificação dos concorrentes são observadas, autónoma e sucessivamente, as seguintes condições de preferência:

1.ª Menor rendimento familiar per capita;
2.ª Mais próximo grau de parentesco das pessoas que constituem o agregado;

Página 2625

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2625

3.ª Mais deficientes condições de alojamento;
4.ª Mais pesados encargos da actual habitação;
5.ª Maior idade;
6.ª Maior número de anos de serviço.

140. Durante o ano em curso prosseguiu a actividade da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, iniciada em 1961, no que se refere à aquisição e construção de habitações para serem atribuídas de harmonia com o preceituado no Decreto-Lei n.º 42 951, a que anteriormente se fez referência.
Assim, concluiu-se em Olivais-Norte a construção de todos os edifícios previstos, que comportam 350 fogos, e procedeu-se à sua distribuição. Contudo, encontram-se ainda em curso as últimas obras destinadas aos Serviços Sociais das Forças Armadas, no valor de 19 184 contos, comportando 64 fogos.
Por seu turno, em Olivais-Sul, efectuada a revisão dos projectos das construções incluídas na 1.ª fase das obras a levar a efeito (292 fogos, mediante o investimento de 35 000 contos), abriu-se concurso para as respectivas empreitadas, que foram adjudicadas nos primeiros meses deste ano, como se previa no relatório da proposta da Lei de Meios para 1963. Ainda, receberam-se da Câmara Municipal de Lisboa alguns dos projectos respeitantes às obras da 2.a fase (293 fogos, o que implicará um investimento de cerca de 34000 contos), admitindo-se que os trabalhos comecem no final do período financeiro em curso.
Entretanto iniciaram-se os trabalhos de construção de edifícios no Porto (174 fogos) e Castelo Branco (42 fogos), o que determinará investimentos de 31 000 contos e 7200 contos, respectivamente.
Em consequência de dificuldades surgidas e que até agora não foi possível remover, não se iniciou ainda a construção prevista de habitações em Vila Real.
Por outro lado, encontram-se em elaboração os projectos de edifícios a construir em Lisboa (22 fogos), Ponta Delgada (60 fogos), Coimbra (90 fogos) e Beja (56 fogos), cujos trabalhos deverão começar em 1964 e em que se estima venham a ser despendidos cerca de 28 100 contos.
Prevê-se, igualmente, a elaboração a curto prazo do projecto relativo a um edifício em Espinho, de 15 fogos, e que a respectiva construção se inicie no período a que respeita a presente proposta de lei.
Por último, encetaram-se negociações com a Câmara Municipal do Porto para aquisição de terrenos destinados à construção de mais de 100 habitações.

141. A elaboração do plano para 1964 obedecerá aos princípios adoptados em anos anteriores: satisfação dos pedidos directamente formulados - preferindo-se, de entre estes, os relativos à aquisição ou construção de habitações em regime de propriedade horizontal -, prossecução da construção de habitação em Lisboa e Porto e sua extensão a outros núcleos populacionais.
Para 1964 prevê-se, concretamente, o seguinte:

1. A conclusão das obras em curso em Olivais-Norte (última empreitada), Olivais-Sul (1.ª fase), Porto e Castelo Branco;
2. O início da construção de um total de 521 fogos em Lisboa, Coimbra, Beja e Ponta Delgada;
3. A elaboração do projecto do edifício a construir em Espinho;
4. A aquisição de terrenos a municípios;
5. A satisfação de pedidos, formulados directamente por funcionários, para a aquisição e construção de habitações.

142. Por outro lado, o Cofre de Previdência do Ministério das Finanças despendeu, até final de Agosto último, 38 603 contos na construção de habitações.
No corrente ano, admite-se que se conclua a construção de um edifício em Olivais-Norte, de 32 fogos, em regime de propriedade resolúvel, e duas moradias no Restelo. Ainda, encontram-se presentemente em construção 15 edifícios em Olivais-Sul, destinados a 128 sócios.
De harmonia com o plano para o próximo ano prevê-se:

a) A realização do concurso para entrega das duas moradias construídas no Restelo;
b) O início da construção de um imóvel na cidade do Porto destinado a beneficiar cerca de 50 sócios;
c) Continuação da construção de quinze prédios da zona Olivais-Sul, possivelmente a concluir só no princípio de 1965;
d) Será dado andamento gradual aos pedidos de inscrição para a compra de moradias ou andares, bem como a construção das primeiras.

143. Ainda merece referência a actividade da Caixa de Previdência do Ministério da Educação Nacional na compra e construção de casas para os seus sócios.
Assim, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 40 674, realizaram-se oito contratos, que implicam una investimento de 2032 contos, e prevê-se a conclusão a curto prazo de mais doze contratos, relativos à atribuição de habitações de um prédio em Lisboa, que importou em cerca de 2286 contos.
Por outro lado, de acordo com o disposto no Decreto-Lei n.º 42 454, encontram-se em fase adiantada de construção oito prédios em Olivais Sul, com no fogos (plano de 1960), em que se prevê venham a ser despendidos 12 500 contos, e admite-se que venham a ser construídos, pelo plano de 1961, 120 habitações, cujo custo deverá elevar-se a 13 300 contos.
Finalmente, deve referir-se a criação de uma nova modalidade de crédito hipotecário, para os sócios que pretendem comprar ou construir casa e podem comparticipar com um mínimo de 25 por cento nas respectivas despesas, recebendo da Caixa o restante. Nestes termos, foram já atribuídos créditos no valor de 5500 contos e celebraram-se três escrituras, que determinam um investimento de 662 contos, e preparam-se mais quatro.

144. Publicou-se em 27 de Abril de 1963 o Decreto-Lei n.º 45 002, que veio dar cumprimento ao que fora programado em lei de autorização das receitas e despesas, assegurando aos funcionários civis do Estado a assistência em todas as formas de doença.
Está pronto para ser publicado o regulamento que há-de possibilitar a execução daquele decreto, prevendo-se que, já no início de 1964, os funcionários civis do Estado possam começar a beneficiar, por forma gradual, dessa assistência.
Tem-se em vista instituir um sistema eficiente, simples e flexível, em que se utilize, para cada aspecto da assistência a prestar, a fórmula mais adequada, excluindo apenas a criação de estabelecimentos ou serviços privativos que possam representar duplicação de outros já existentes.
Esta directriz, todavia, não facilita os trabalhos de organização, tanto mais que importa ter em conta a sobre-

Página 2626

2626 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

carga que pesa já sobre alguns dos estabelecimentos e serviços a utilizar, aos quais não pode deixar de ser exigido um mínimo de requisitos que assegure o nível de assistência que se deseja prestar.
Tanto o desenvolvimento que sé pretende conferir às actividades de natureza profiláctica, como o respeito pelo princípio fundamental, assegurado aos beneficiários, da livre escolha do médico e do estabelecimento que lhes hão-de assistir, sem prejuízo de providências que lhes garantam maiores benefícios quando optem pelos hospitais oficiais ou das Misericórdias, contribuem para avolumar as responsabilidades da organização.
As dificuldades enunciadas aconselham a que a instalação da assistência na doença aos servidores do Estado se faça com a necessária prudência, dividindo o País em zonas e, mesmo dentro destas, alargando gradualmente os benefícios, na medida em que a estrutura e as possibilidades locais permitam o seu desenvolvimento harmónico.
Importa, porém, não esquecer que a assistência na doença representa valioso contributo para a economia da família e é importante elemento para a tranquilidade dos servidores do Estado, de que não seria justo privar por muito tempo ainda os que trabalham longe dos grandes centros. Por isso se prevê que, independentemente da extensão gradual dos benefícios aos funcionários civis das áreas periféricas, todos, sem excepção, possam aproveitar desde início de algumas formas de assistência, designadamente da cirúrgica.
Contribuindo para melhorar a situação dos seus servidores, o Governo está consciente de realizar simultaneamente uma política social de largo alcance que valoriza a saúde e o bem-estar da população portuguesa.

Saúde pública e assistência

145. Entre nós, como entre os Estados modernos, o problema da tuberculose continua a exigir da parte do Estado atenção vigilante e medidas apropriadas.
Na sequência da orientação das últimas leis de meios, o Governo tem reconhecido na assistência à doença carácter prioritário do programa de combate à tuberculose, facultando para a sua realização as disponibilidades compatíveis com outros objectivos que também importa atingir no campo da saúde.
Nem sempre o País se aperceberá de que não obstante a taxa da mortalidade, por tuberculose, ter descido de 64,3/1000 habitantes em 1956 para 35,9/1000 habitantes em 1962, continuam a existir importantes aspectos- da luta contra esta doença, não só no que toca à profilaxia, mas também no que respeita ao emprego de modernos c eficazes meios terapêuticos.
Assim, para o rastreio da radiofotografia do tórax dispõe o Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos de sete unidades no serviço fixo e dezassete unidades em serviço móvel, cujo movimento passou de 446357 em 1955 para 886 413 em 1962, acontecendo que o tempo de serviço e o trabalho intensivo a que têm sido submetidas as unidades existentes levaram a maioria delas até quase ao limite de duração, o que, exigindo conservação dispendiosa, suscita, mais tarde ou mais cedo, necessidade de reequipamento.
Quanto à vacina B. C. G., que vem sendo assegurada pelos centros de profilaxia, brigadas móveis, dispensários-consultas e consultas-dispensários, centros distritais, diversos serviços do Instituto Maternal, Misericórdias e outros estabelecimentos, apresenta aumento considerável nos últimos anos, passando o número de vacinados de 50498 em 1955 para 281402 em 1962. As brigadas de vacinação, que em 1955 eram três, são agora dezasseis.
Tudo indica que neste capítulo novos esforços se tenham de despender, com o espírito de não economizar em profilaxia o que poderia tornar-se mais oneroso em terapêutica.
Estas considerações aplicam-se, nos mesmos termos, ao serviço dispensarial, merecendo salientar-se que as consultas de profilaxia passaram de 18 703 em 1955 para 32 246 em 1962.
Com a finalidade de se avaliar o esforço financeiro que, neste domínio, o Governo vem realizando a partir de 1955, apresentam-se os seguintes elementos sobre as importâncias despendidas no combate à tuberculose:

QUADRO XXXVII

Acção antituberculosa

(Contos)

[Ver tabela na imagem]

Pretende o Governo, apesar das limitações impostas pela actual conjuntura financeira, prosseguir no esforço que vem realizando neste domínio, pelo que propõe que se continue a dar na assistência à doença prioridade no desenvolvimento do programa de combate à tuberculose.

146. Outro problema, com carácter prioritário, que exige também uma importante actuação por parte do Estado, é justamente o da promoção da saúde mental.
Efectivamente, a questão dos doentes mentais, com todas as suas consequências, reveste-se, só por si, de grande relevo, além de que, com as transformações da vida moderna, tende ainda, sucessivamente, a agravar-se, criando certas perturbações nas famílias e nos meios profissionais e reclamando, portanto, do Estado, prudente vigilância relativamente a profilaxia e meios cada vez mais dispendiosos no respeitante à terapêutica.
Não é de somenos importância, neste quadro, o que respeita à psiquiatria e higiene mental das crianças e da adolescência, que constituem, por toda a parte, preocupação actual dos governos.
Para a resolução deste importante problema torna-se, porém, necessário elaborar esquema adequado, tanto mais que, por vezes, é a própria evolução da vida moderna a causa do seu desenvolvimento.
Desta forma, surgiram várias realizações através do País e elaboraram-se, nos respectivos serviços, vários estudos tendentes a atingir o objectivo a que se propõe o Governo com a formulação do artigo 22.º da presente proposta de lei. Daqui importa concluir, por um lado, a

Página 2627

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2627

atenção dispensada pelo Governo a este problema e, por outro, a necessidade de novo e, porventura, maior esforço financeiro.
A demonstração daquela atenção e deste esforço surge, com evidência, dos elementos que se apresentam neste quadro:

QUADRO XXXVIII

Dotações concedidas para a assistência psiquiátrica

[Ver tabela na imagem]

De tudo, parece ressaltar a justificação do preceito da proposta de lei que, afinal, se limita a continuar a orientação iniciada em 1963.
Política do bem-estar rural

147. A formulação do artigo 23.º da presente proposta não se afasta dos preceitos correspondentes das Leis de Meios dos últimos dois anos.
Assim, continuam a ter oportunidade as justificações já apresentadas e desenvolvidas em relatórios anteriores, tendo também pleno cabimento a reafirmação de que, na presente conjuntura, não diminuiu o cuidado com que se encararam os problemas relacionados com o bem-estar das populações rurais.
É de justiça ter presente que o Governo não tem esquecido os aspectos mais relevantes da vida da população dos campos, quer no que directamente se relaciona com a actividade económica, quer no que mais propriamente respeita à higiene e salubridade, ao problema habitacional e, em termos genéricos, à prossecução de melhores níveis de bem-estar.
Ainda, acresce neste momento o facto de que, atentas as inevitáveis consequências impostas pelo esforço de defesa, tem procurado o Governo sacrificar o menos possível a realização dos seus objectivos no que se refere ao desejável progresso das condições da vida rural.
À luz deste critério, e por força das circunstâncias, viu-se o Governo na contingência de não atender, tão amplamente quanto seria seu desejo, às solicitações relacionadas com a satisfação dos referidos objectivos.
Não obstante o valor total dos empréstimos concedidos situar-se a nível inferior ao verificado nos últimos anos, o certo é que revela um esforço financeiro digno de nota, porque traduz o propósito de não interromper a obra de renovação da vida rural, que, a despeito de tudo, vai prosseguindo de maneira compatível com as circunstâncias actuais.
Não se tendo alterado a disciplina legal dos empréstimos aos corpos administrativos, os financiamentos autorizados em 1963, de harmonia com os critérios de prioridade em vigor, ascenderam a 77 169 contos, repartidos pelas rubricas seguintes:

Abastecimento de água........................ 26 737 796$00
Electrificação............................... 17 650 000$00
Saneamento................................... 13 744 000$00
Instalação de serviços....................... 2 300 000$00
Casas para famílias pobres................... 246 000$00
Mercados..................................... 2 500 000$00
Outros fins.................................. 13 991 000$00
77 168 796$00

Funcionamento dos serviços

148. Mantém-se, no artigo 25.º da presente proposta de lei, o preceito, inserto nas leis de autorização das receitas e despesas para 1962 e 1963, nos termos do qual, para além da rigorosa economia a que são obrigados os serviços públicos na utilização das suas verbas, o Governo providenciará no sentido de:

a) Limitar as despesas com missões oficiais aos créditos ordinários para esse efeito concedidos;
b) Cercear o reforço das verbas orçamentais e limitar a antecipação de duodécimos das mesmas verbas aos casos inadiáveis e de premente necessidade;
c) Restringir os arrendamentos de prédios urbanos para instalação de serviços públicos e as aquisições, especialmente de imóveis, veículos com motor e mobiliário, com proibição quanto a artigos de adorno ou obras de arte para decorações ou fins análogos;
d) Sujeitar ao regime de duodécimos as verbas da despesa extraordinária;
e) Subordinar as requisições de fundos à comprovação das efectivas necessidades dos serviços que as processam, mediante a junção de projectos discriminados da aplicação a dar às somas requisitadas.

Disposições que se aplicarão, aliás, a todos os serviços do Estado, autónomos ou não, corpos e pessoas colectivas de utilidade pública administrativa, bem como aos organismos de coordenação económica e corporativos.
E mantém-se o artigo anterior porque permanecem, avolumadas, as implicações sobre a actividade económica e financeira decorrentes do conjunto de problemas que o País teve de enfrentar e que justificaram a sua introdução em Dezembro de 1961. Com efeito, para além do esforço de defesa da integridade nacional que se torna imprescindível manter, à medida que melhor se dotam os serviços e em que se alargam os objectivos económicos e financeiros que o Governo se propõe alcançar, torna-se cada vez mais necessária a definição de uma escala de prioridades e a observância de uma firme e sã disciplina nos gastos públicos.

Encargos dos serviços autónomos com receitas próprias e fundos especiais

149. Por não se ter ainda tornado exequível a reforma dos fundos especiais, propõe-se a manutenção no presente capítulo, como disposição única, dó artigo 28.º da lei de autorização das receitas e despesas em vigor. Nestes termos, continuará sujeita às regras enunciadas no artigo 19.º da Lei n.º 2045, de 23 de Dezembro de 1950,

Página 2628

2628 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

a gestão administrativa e financeira dos fundos especiais, que igualmente se aplicam aos serviços autónomos e aos dotados de simples autonomia administrativa.
Nestes termos, o Governo apresenta a seguinte proposta de lei:

PROPOSTA DE LEI

I

Autorização geral

Artigo 1.º É autorizado o Governo a arrecadar em 1964 as contribuições e impostos e demais rendimentos e recursos do Estado, de harmonia com os princípios e as leis aplicáveis, e a empregar o respectivo produto no pagamento das despesas legalmente inscritas no Orçamento Geral do Estado respeitante ao mesmo ano.
Art. 2.º Durante o referido ano ficam igualmente autorizados os serviços autónomos e os que se regem por orçamentos cujas tabelas não estejam incluídas no Orçamento Geral do Estado a aplicar as receitas próprias no pagamento das suas despesas, umas e outras previamente inscritas em orçamentos devidamente aprovados e visados.

II

Equilíbrio financeiro

Art. 3.º O Governo tomará as medidas apropriadas para garantir o equilíbrio das contas públicas e o regular provimento da tesouraria, ficando autorizado a proceder, de harmonia com as exigências dos superiores interesses nacionais, à adaptação dos recursos às necessidades, com vista a assegurar a integridade territorial do País e a intensificar o desenvolvimento económico das suas diferentes parcelas, podendo, inclusivamente, para ocorrer a encargos da defesa, reforçar rendimentos disponíveis e criar novos recursos.
§ único. Para realização das mesmas finalidades poderá o Ministro das Finanças:

a) Providenciar no sentido de obter a compressão das despesas do Estado e das entidades e organismos por ele subsidiados ou comparticipados;
b) Reduzir ou suspender as dotações orçamentais;
c) Restringir a concessão de fundos permanentes.

III

Política fiscal

Art. 4.º O Governo promoverá, durante o ano de 1964, a publicação dos diplomas relativos à tributação das mais-valias e à adaptação dos regimes tributários especiais que não tenham sido publicados até ao fim do ano corrente, de modo que entre a data da publicação e a entrada em vigor decorra um prazo não inferior a um mês.
Art. 5.º Enquanto não entrarem em vigor os diplomas a que se refere o artigo anterior, as actividades por eles abrangidas serão colectadas pelas leis actuais.
Art. 6.º Em conformidade com o artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 45104, de 1 de Julho de 1963, manter-se-á, no lançamento da contribuição predial a efectuar para cobrança em 1964, a liquidação da taxa de compensação criada pelo artigo 10.º da Lei n.º 2022, de 22 de Maio de 1947.
§ único. Continuarão isentos da taxa de compensação unicamente os rendimentos dos prédios rústicos inscritos em matrizes cadastrais que tenham entrado em vigor a partir de 1 de Janeiro de 1958.
Art. 7.º O valor dos prédios rústicos e urbanos, para efeito de liquidação da sisa e do imposto sobre as sucessões e doações, ficará sujeito ao regime estabelecido no corpo do artigo 6.º da Lei n.º 2038, de 28 de Dezembro de 1949, continuando também a observar-se o disposto no § 2.º do mesmo artigo.
§ único. O disposto neste artigo deixará de aplicar-se a partir da data em que as matrizes rústicas ou urbanas reorganizadas começarem a produzir efeitos fiscais, nos termos do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 45104, de 1 de Julho de 1963.
Art. 8.º Fica o Governo autorizado a manter no ano de 1964 a cobrança do imposto extraordinário para a defesa e valorização do ultramar, que recairá sobre as pessoas singulares ou colectivas que exerçam actividades de natureza comercial ou industrial, em regime de concessão de serviço público ou de exclusivo e, bem assim, outras actividades da mesma natureza, a definir pelo Governo, desde que beneficiem de qualquer privilégio ou de situação excepcional do mercado.
§ 1.º O imposto incidirá sobre os lucros imputáveis ao exercício da actividade comercial ou industrial revelados pelas contas de resultados do exercício ou de ganhos e perdas relativas ao ano de 1963.
§ 2.º Ficarão unicamente excluídas do imposto extraordinário as empresas cuja contribuição industrial, liquidada para cobrança no ano de 1964, ou que lhes competiria pagar nesse ano se não beneficiassem de isenção ou de qualquer dedução, seja inferior a 100 contos em verba principal e as que se encontrem em fase de instalação.
§ 3.º A taxa do imposto será de 10 por cento e sobre a colecta não recairá qualquer adicional ou outra imposição.
Art. 9.º São mantidos no ano de 1964, até à adopção dos regimes tributários especiais previstos no artigo 4.º, os adicionais discriminados nos n.ºs 1.º e 3.º do artigo 6.º do Decreto n.º 35 423, de 29 de Dezembro de 1945.
Art. 10.º Fica o Governo autorizado a instituir e a cobrar já no ano de 1964 um imposto destinado a onerar a propriedade de terrenos para construção situados em zonas de rápido desenvolvimento regional e, em especial, nas consagradas à expansão de turismo.
§ 1.º O imposto incidirá sobre o valor dos terrenos, determinado por avaliação, nas datas em que sucessivamente for devido, e será calculado, de dois em dois anos, pelo método de liquidação da sisa, com as necessárias adaptações, contando-se o primeiro biénio a partir de 1 de Julho de 1962
§ 2.º Ficarão isentas deste imposto apenas as entidades enumeradas nos n.ºs 1.º a 4.º e 11.º do artigo 7.º do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola.
§ 3.º A taxa do imposto será de 8 por cento.
§ 4.º Quanto a determinação da matéria colectável, liquidação, cobrança, reclamações e recursos e penalidades, serão aplicáveis, com os ajustamentos que se mostrem necessários, as disposições sobre sisa constantes do Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações.
Art. 11.º O Governo, no ano de 1964, deverá promover a substituição do actual imposto sobre os consumos supérfluos ou de luxo por um imposto sobre o valor das transacções, com isenção das relativas a produtos alimentícios, matérias-primas, ferramentas, máquinas industriais, artigos escolares, medicamentos e outras que devam considerar-se de consumo primário.

Página 2629

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2629

Art. 12.º Deverá o Governo, durante o ano de 1964, tomar as providências que o não tenham sido até ao fim do ano corrente adequadas à eliminação das causas da dupla tributação e de evasão fiscal entre as várias províncias do território nacional, estabelecendo um regime legal para a resolução dos conflitos e promovendo a harmonização progressiva dos sistemas fiscais em vigor.
§ único. Fica o Governo igualmente autorizado a celebrar em 1964, com quaisquer países estrangeiros, os acordos que se mostrarem necessários para evitar a dupla tributação, a evasão e a fraude fiscal nas relações internacionais e a tomar as medidas de ordem legislativa indispensáveis ao justo equilíbrio das concessões e à fruição dos correspondentes benefícios.
Art. 13.º Durante o ano de 1964 é vedado criar ou agravar taxas e outras contribuições especiais não escrituradas em receita geral do Estado, a cobrar pelos serviços do Estado, organismos de coordenação económica e organismos corporativos, sem expressa concordância rio Ministro das Finanças.

IV

Defesa nacional

Art. 14.º Durante o ano de 1964 será dada prioridade aos encargos com a defesa nacional, nomeadamente aos que visam à preservação da integridade territorial da Nação, para o que o Governo inscreverá no orçamento as dotações necessárias à satisfação das despesas de emergência no ultramar.
Art. 15.º É autorizado o Governo a elevar em mais 200 000 contos a importância corrigida pelo artigo 16.º da Lei n.º 2111, de 21 de Dezembro de 1961, para satisfazer necessidades de defesa militar, em harmonia com compromissos tomados internacionalmente. No Orçamento Geral do Estado para 1964 serão inscritos 260 000 contos para os referidos fins e de acordo com o artigo 25.º e seu § único da Lei n.º 2050, de 27 de Dezembro de 1951, podendo esta verba ser reforçada em 1964 com a importância destinada aos mesmos e não despendida durante o ano de 1963.

V

Investimentos públicos

Art. 16.º O Governo inscreverá no orçamento para 1964, tendo em conta a prioridade atribuída aos encargos da defesa nacional, as verbas destinadas à realização doo investimentos previstos no Plano de Fomento.
Art. 17.º Fica o Governo autorizado, no ano de 1964, a limitar os encargos extraordinários fixados em lei, desde que não correspondam a empreendimentos incluídos no Plano de Fomento.
Art. 18.º Salvaguardadas as disposições dos artigos 14 º, 16.º e 17.º, poderá o Governo inscrever no orçamento para 1964 as verbas que, à margem do Plano de Fomento, esteja legalmente habilitado a inscrever em despesa extraordinária, devendo, com preferência da conclusão de obras em curso, adoptar quanto possível, dentro de cada alínea, a seguinte ordem de preferência:

a) Fomento económico:

Povoamento florestal e defesa contra a erosão em modalidades não previstas no Plano de Fomento;
Melhoramentos rurais e abastecimento de água;
Fomento de produção mineira e de combustíveis nacionais;
Aproveitamento hidráulico de bacias hidrográficas;

b) Saúde pública e assistência:

Reapetrechamento dos hospitais;

c) Educação e cultura:

Aceleração na formação de pessoal docente universitário;
Intensificação da concessão de bolsas de estudo;
Reapetrechamento das Universidades e escolas;
Construção e utensilagem de edifícios para Universidades;

d) Outras despesas:

Aquisição de material estritamente indispensável para a defesa e segurança pública;
Realização de melhoramentos e construções de interesse para o turismo;
Investimentos de interesse social, incluindo dotações para as Casas do Povo.

Art. 19.º No ano de 1964, o Governo prosseguirá, dentro das possibilidades do Tesouro, na execução dos planos de reapetrechamento dos hospitais e das Universidades e escolas.
§ único. Para este efeito, serão inscritas nas despesas extraordinárias dos Ministérios da Saúde e Assistência e da Educação Nacional as verbas consideradas indispensáveis, com cobertura no excesso das receitas ordinárias sobre as despesas da mesma natureza ou nos saldos de contas de anos económicos findos.
Art. 20.º O Governo inscreverá como despesa extraordinária em 1964 as verbas necessárias para pagar ao Instituto Geográfico e Cadastral os levantamentos topográficos e avaliações a que se refere o Decreto-Lei n.º 31 975, de 20 de Abril de 1942.

VI

Providências sobre o funcionalismo

Art. 21.º O Governo continuará a política de intensificação de construção de casas para funcionários públicos e administrativos, nos regimes de arrendamento e de propriedade resolúvel.

VII

Saúde pública e assistência

Art. 22.º Na assistência à doença, o. Governo dará preferência ao desenvolvimento do programa de combate à tuberculose e à promoção da saúde mental, para o que serão inscritas no Orçamento Geral do Estado as verbas indispensáveis.

VIII

Política do bem-estar rural

Art. 23.º Os auxílios financeiros para fomento do bem-estar rural, quer sejam prestados por força de verbas inscritas no Orçamento Geral do Estado, quer sob a

Página 2630

2630 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

forma de subsídios ou financiamentos de qualquer natureza, devem destinar-se aos fins estabelecidos nas alíneas seguintes, respeitando quanto possível a sua ordem de precedência:

a) Abastecimento de água, electrificação e saneamento;
b) Estradas e caminhos;
c) Construção de edifícios para fins assistenciais e sociais ou para instalação de serviços e construção de casas, nos termos do Decreto-Lei n.º 34 486, de 6 de Abril de 1945;
d) Matadouros e mercados.

§ 1.º As disponibilidades das verbas inscritas no Orçamento Geral do Estado para melhoramentos rurais ou qualquer dos fins previstos neste artigo não poderão servir de contrapartida para reforços de outras dotações.
§ 2.º Nas comparticipações pelo Fundo de Desemprego observar-se-á, na medida aplicável, a ordem de precedência estabelecida neste artigo.
Art. 24.º O Governo inscreverá como despesa extraordinária a dotação indispensável à satisfação das importâncias devidas às Casas do Povo, nos termos do Decreto-Lei n.º 40 199, de 23 de Junho de 1955, com a redacção dada aos seus artigos 2.º e 3.º pelo Decreto-Lei n.º 40970, de 7 de Janeiro de 1957.

IX

Funcionamento dos serviços

Art. 25.º Durante o ano de 1964, além da rigorosa economia a que são obrigados os serviços públicos na utilização das suas verbas, o Governo providenciará no sentido de:

a) Limitar as despesas com missões oficiais aos créditos ordinários para esse efeito concedidos;
b) Cercear o reforço das verbas orçamentais e limitar a antecipação dos duodécimos das mesmas verbas aos casos inadiáveis e de premente necessidade;
c) Restringir os arrendamentos de prédios urbanos para instalação de serviços públicos e as aquisições, especialmente de imóveis, veículos com motor e mobiliário, ficando proibido as de artigos de adorno ou obras de arte para decoração e fins análogos;
d) Sujeitar ao regime de duodécimos as verbas da despesa extraordinária;
e) Subordinar as requisições de fundos à comprovação das efectivas necessidades dos serviços que as processam, mediante a junção de projectos discriminados da aplicação a dar às somas requisitadas.
§ único. Estas disposições aplicar-se-ão a todos os serviços do Estado, autónomos ou não, corpos administrativos e pessoas colectivas de utilidade pública administrativa, bem como aos organismos de coordenação económica e corporativos.
Art. 26.º Durante o ano de 1964, continua o Governo autorizado a reforçar os meios de pessoal e material dos serviços de inspecção e fiscalização da Direcção-Geral das Alfândegas, das Inspecções-Gerais de Crédito e Seguros e de Finanças e da Intendência-Geral dos Abastecimentos, de modo a prevenir e reprimir severamente as fraudes fiscais, movimentos ilícitos de capitais e crimes de especulação.

X

Encargos dos serviços autónomos com receitas próprias e fundos especiais

Art. 27.º A gestão administrativa e financeira dos fundos especiais continuará subordinada às regras 1.ª a 4.ª do § 1.º do artigo 19.º da Lei n.º 2045, de 23 de Dezembro de 1950, e observará, na parte aplicável, os preceitos contidos no artigo 25.º da presente lei, umas e outros igualmente aplicáveis aos serviços autónomos e aos dotados de simples autonomia administrativa.

XI

Disposições especiais

Art. 28.º São aplicáveis,, no ano de 1964, as disposições dos artigos 14.º e 16.º da Lei n.º 2038, de 28 de Dezembro de 1949.
Art. 29.º O regime administrativo previsto no Decreto-Lei n.º 31 286, de 28 de Maio de 1941, é extensivo às verbas inscritas no Orçamento Geral do Estado com destino à manutenção de forças militares extraordinárias no ultramar.
Ministério das Finanças, 16 de Novembro de 1963. - O Ministro das Finanças, António Manuel Pinto Barbosa.

Página 2631

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2631

ANEXO - MAPA N.º 1

Despesa imputada ao produto nacional bruto

Preços correntes

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Rectificado.

Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

ANEXO - MAPA N.º 2

Despesa imputada ao produto nacional bruto

Preços de 1968

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

Página 2632

2632 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 108

ANEXO - MAPA N.º 3

Produto nacional bruto, por ramos de actividade

Preços correntes

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Rectificado.

Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

Página 2633

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2633

Produto nacional bruto, por ramos de actividade

Preços de 1958

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

Página 2634

2634 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

ANEXO - MAPA N.º 5

Formação bruta de capital fixo

Preços correntes

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Inclui, além de outros, o «Comércio por grosso e a retalho», «Organismos de crédito e seguros» e «Serviços de saúde e educação.
(b) Rectificado.

Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

ANEXO - MAPA N.º 6

Formação bruta de capital fixo

Preços de 1958

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Inclui, além de outros, o «Comércio por grosso e a retalho», «Organismos de crédito e seguros» e «Serviços de saúde e educação».

Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

Página 2635

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2635

ANEXO - MAPA N.º 7

Produção agrícola

[Ver tabela na imagem]

(a) Milhares de hectolitros.

Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

ANEXO - MAPA N.º 8

Índices mensais da produção industrial (a)

(Base 1958 = 100)

[Ver tabela na imagem]

a) Corrigidos das variações sazonais.
b) Média aritmética dos índices mensais.

Fonte: Associação Industrial Portuguesa.

Página 2636

2636 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

ANEXO - MAPA N.º 9

Balança comercial da metrópole com o estrangeiro

1.º semestre

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

Página 2637

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2637

ANEXO - MAPA N.º 10

II Plano de Fomento (metrópole) (a)

Execução no 1.º semestre de 1963

(Por empreendimentos)
(Contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Elementos provisórios fornecidos pelo Secretariado Técnico da Presidência do Conselho.

Página 2638

2638 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

ANEXO - MAPA N.º 11

Comissão de Reapetrechamento em Material das Escolas Superiores e Secundárias

Ensino técnico

[Ver tabela na imagem]

(a) Carteiras, estiradores, armários para salas de aula e oficinas, bancos, ardósias e tornos de bancada.

Página 2639

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2639

ANEXO - MAPA N.º 12

Comissão de Reapetrechamento em Material das Escolas Superiores e Secundárias

Ensino liceal

[Ver tabela na imagem]

(a) Carteiras, estiradores, armários e ardósias.

Página 2640

2640 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

ANEXO - MAPA N.º 13

Comissão de Reapetrechamento em Material das Escolas Superiores e Secundárias

Ensino superior

[Ver tabela na imagem]

Página 2641

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2641

ANEXO - MAPA N.º 14

Comissão de Reapetrechamento em Material das Escolas Superiores e Secundárias

Planos aprovados e já executados

[Ver tabela na imagem]

(a) Carteiras, estiradores, armários para salas de aula e oficinas, bancos, ardósias e tornos de bancada.

Página 2642

2642 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

ANEXO - MAPA N.º 15

Comissão de Reapetrechamento em Material das Escolas Superiores e Secundárias

Planos aprovados e em execução

[Ver tabela na imagem]

(a) Carteiras, estiradores, armários para salas de aula e oficinas, bancos, ardósias e tornos de bancada.

Página 2643

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2643

ANEXO - MAPA N.º 16

Despesas orçamentais

Autorizações de pagamento

(Por rubricas da classificação funcional)

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

Página 2644

2644 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

[Ver tabela na imagem]

Página 2645

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2645

ANEXO - MAPA N.º 17

Despesa

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

Página 2646

2646 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

[Ver tabela na imagem]

(a) Compreendem:

1) Emissora Nacional de Radiodifusão;
2) Hospitais Civis de Lisboa;
3) Misericórdia do Lisboa;
4) Administração dos Correios, Telégrafos e Telefones;
5) Fundo de Desemprego (os números respeitantes a 1962 são provisórios);
6) Fundo das Casas Económicas;
7) Fundo de Socorro Social.

(b) Não Inclui os elementos referentes às Juntas de Exportação do Algodão, do Café e dos Cereais, extintas pelo Decreto-Lei n.º 43 874, de 84 de Agosto do 1961.

Página 2647

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2647

ANEXO - MAPA N.º 18

Imposto profissional

[Ver tabela na imagem]

Página 2648

2648 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

CÂMARA CORPORATIVA

VIII LEGISLATURA

N.º 13/VIII

Projecto de proposta de lei n.º 503/VIII

Autorização das receitas e despesas para 1964

A Câmara Corporativa, consultada, nos termos do artigo 105.º da Constituição, acerca do projecto de proposta de lei n.º 503/VIII, elaborado pelo Governo sobre a autorização das receitas e despesas para 1964, emite, pela sua secção de Interesses de ordem administrativa (subsecções de Política e administração geral e de Finanças e economia geral), sob a presidência de S. Ex.ª o Presidente da Câmara, o seguinte parecer.

I

Apreciação na generalidade

§ 1-º

Introdução

1. Em anteriores pareceres sobre a Lei de Meios, e de novo no que foi emitido no último ano, a Câmara tem-se ocupado do conteúdo e da índole que esta lei vem assumindo.
A Constituição Política no n.º 4.º do artigo 91.º estabelece que compete à Assembleia Nacional: «autorizar o Governo, até 15 de Dezembro ie cada ano, a cobrar as receitas do Estado e a pagar as despesas públicas na gerência futura, definindo na respectiva lei de autorização os princípios a que deve ser subordinado o orçamento, na parte das despesas cujo quantitativo não é determinado em harmonia com as leis preexistentes».
A primeira parte desta disposição não suscitou, nem suscita, quaisquer dúvidas; é da interpretação da segunda parte que elas têm surgido.
A posição firmada pela Câmara é a de que, sendo a lei de execução anual, não pode compreender disposições de carácter permanente, devendo cingir-se às que se tornem necessárias para orientar a administração financeira na gerência imediata ou às que anunciem programas de acção a iniciar nessa gerência.
Todavia, mesmo dentro desta orientação, e dada a continuidade requerida na execução dos planos governamentais, há margem para uma certa latitude de interpretação.
Ainda para evitar a manutenção de posições nem sempre conformes, é matéria que bem necessitava de ser ponderada, e para o estudo da qual também a Câmara deveria fornecer o seu contributo, se outras fossem as condições em que é chamada a pronunciar-se sobre a Lei de Meios.

2. Sobre este condicionalismo produziu a Câmara, uma vez mais, amplas considerações no parecer sobre o projecto de proposta de lei de autorização de receitas e despesas para 1963. Só há que registar que permanecem as condições deficientes em que a Câmara se pronuncia, por virtude da estreiteza do prazo que lhe é concedido.

Página 2649

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2649

3. Ao pronunciar-se sobre o projecto de proposta de lei de autorização de receitas e despesas, a Câmara não pode deixar de ter presente os resultados da nossa administração financeira neste período dos mais graves na vida da Nação. O aproveitamento sistemático das soluções concebíveis, dentro da obediência aos princípios fundamentais, e a firmeza inalterável na prossecução da política traçada não podem estar alheios do pensamento da Câmara na apreciação da proposta que lhe é submetida, e foi com inteira justeza que autorizadamente se falou do «quase milagre» da nossa administração financeira.
A administração financeira tem sabido, nas circunstâncias presentes, responder às necessidades da Nação e a Câmara, ao reconhecê-lo, congratula-se com a determinação, afirmada no projecto de proposta, de continuidade da política que tem permitido conciliar os pesados encargos de defesa que nos são impostos com as exigências da intensificação do esforço de desenvolvimento económico e social de todas as parcelas do território nacional.

§ 2.º

Considerações gerais sobre a conjuntura económica e financeira

4. Prosseguindo a linha de exposição adoptada em 1955, o projecto de proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1964 aparece precedido de um bem elaborado relatório em que, por forma clara e precisa, não só se apontam as tendências mais salientes da economia da Europa Ocidental e dos Estados Unidos da América, mas também se analisa a conjuntura económica recente dos diversos territórios nacionais. E compreende-se perfeitamente que assim se proceda, dado que a evolução económica do mundo ocidental reflecte-se sensivelmente no nosso país, visto ser dominante a representação desses países no complexo das transacções internacionais da zona do escudo. Com efeito, mostra-se ainda muito acentuada quer a incidência da procura externa no comportamento da maioria dos nossos principais sectores produtivos, quer a dependência da economia nacional do fornecimento exterior de muitos bens de consumo, equipamentos e matérias-primas. Por outro lado, como é evidente, um dos pressupostos fundamentais que deve informar a actividade financeira do Estado é a conjuntura económica global. De resto, num momento em que o esforço de defesa tem de prosseguir sem desfalecimento e tende a absorver uma parte considerável dos recursos disponíveis e em que a prossecução dos objectivos do desenvolvimento económico aparece, além do mais, como condição basilar daquele esforço, julga-se fora de toda a dúvida que importará, mais do que nunca, que o plano orçamental do Estado e a sua execução se conformem com a evolução económica, evitando a formação de certos desequilíbrios sectoriais e corrigindo outros.
Em face da extensão e justeza da análise apresentada no referido relatório, poderia a Câmara, sem inconveniente, limitar-se a apontar os aspectos mais salientes nela focados. Pareceu entretanto justificável, dada a importância singular da conjuntura presente, juntar algumas considerações genéricas e uma ou outra observação de pormenor, como no parecer sobre o projecto de proposta de Lei de Meios para 1963, e chamar ainda a atenção para determinadas tendências da mesma conjuntura económico-financeira ou para certas linhas de orientação da política internacional.

A) Economia internacional

a) A conjuntura na Europa Ocidental

5. O abrandamento do ritmo de expansão da economia europeia verificado entre 1961 e 1962 terá prosseguido pelo menos durante a primeira metade de 1963, indicando-se como factores principais deste comportamento as incidências da rigorosa invernia em vários sectores económicos como a agricultura, a pecuária e a construção. Mas, ainda que a situação dos mercados de trabalho se houvesse modificado - pela redução da procura nalguns sectores, pela realização de investimentos noutros ramos que permitiram economizar mão-de-obra ou ainda pela oferta adveniente do crescimento da população activa -, o certo é que a escassez relativa de trabalhadores qualificados em face dos recursos naturais e financeiros disponíveis constitui um obstáculo à expansão dos países altamente industrializados do mundo ocidental.
Na produção industrial dos países europeus participantes da O. C. D. E. a taxa de crescimento reduziu-se durante o 1.º trimestre do ano em curso, recuperando depois no 2.º trimestre.

QUADRO I

índices da produção industrial (a)

(Base: 1953 = 100)

[Ver tabela na imagem]

(a) Valores corrigidos das variações sazonais.

Origem: Statistiques Générales da O. C. D. E., Setembro de 1963.

Esta recuperação recente parece determinada principalmente pelos sectores das indústrias químicas e de transformação de metais e pela produção de energia, pois os outros sectores evidenciaram quebras mais ou menos acentuadas (indústrias extractivas, indústrias manufactureiras diversas) ou apresentaram aumentos pouco significativos.

6. Não obstante a mencionada alteração na situação dos mercados de trabalho da generalidade dos países europeus, os salários continuaram a subir, ultrapassando os seus acréscimos, em regra, os da produtividade, com as naturais repercussões nos índices de preços. E a evolução dos preços no consumidor parece confirmar inteiramente a opinião expendida pela Câmara no seu parecer sobre a Lei de Meios para 1963 de que naqueles países se enfrenta um processo típico de «inflação contida», menos nuns países do que noutros, e nalguns casos não explicável apenas pelas circunstâncias próprias do respectivo desenvolvimento económico.

Página 2650

2650 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

QUADRO II

índices médios de preços no consumidor

(Base: 1953=100)

[Ver tabela na imagem]

(a) Só o 1.º trimestre.

Origem: Statistiques Générales da O. C. D. E., Setembro de 1963.

É de admitir que para a progressão dos índices médios entre os primeiros semestres de 1962 e 1963 tenha concorrido especialmente a repercussão da invernia sobre os preços de vários produtos alimentares. Mas o quadro anterior revela bem a tendência generalizada de alta do custo de vida, sendo de salientar os casos da Dinamarca, Espanha, Islândia, Itália, Noruega e Turquia, a que se seguem os da Alemanha, França, Irlanda, Reino Unido e Suécia. Nalguns movimentos ascensionais parece, até, haver-se chegado àquele limiar crítico em que das chamadas «inflações contidas» se tende a passar a um processo inflacionista «aberto»; mas a experiência colhida noutras conjunturas semelhantes leva a supor que se adoptem políticas monetário-financeiras capazes de uma contenção razoável dos preços, ainda que com algum sacrifício da progressão da produção nacional de bens e serviços.

7. Quanto às trocas comerciais, refere o relatório do projecto de proposta de lei que no 1.º semestre do ano em curso continuava o sentido de expansão, a uma taxa semelhante à registada entre 1961 e 1962.

QUADRO III

Comércio externo dos países europeus da O. C. D. E.
(Médias mensais em milhões de dólares)

[Ver tabela na imagem]

(a) Espanha só o 1.º trimestre.

Origem: Statistiques Générales da O. C. D. E., Setembro de 1963.

Note-se, ainda, que se evidencia agora uma certa melhoria das razões de troca dos países da E. F. T. A. em relação aos da C. E. E., facto de assinalar em face do movimento contrário que se registou entre 1958 e 1961.

8. Não obstante o considerável aumento do déficit comercial, o montante das reservas de ouro e divisas dos países europeus da O. C. D. E. continuou a progredir no 1.º semestre de 1963, e a uma taxa dupla da verificada em igual período do ano precedente, o que leva a admitir a formação de novos e substanciais excedentes na balança de invisíveis correntes em conjugação, talvez, com melhoria sensível nos movimentos de capitais.

QUADRO IV

Razões de troca

(Base: 1953 = 100)

[Ver tabela na imagem]

Origem : Statistiques Générales da O. C. I. E., Setembro de 1963.

Mas como o aumento das importações foi, no conjunto, muito mais acentuado que o das exportações, o déficit comercial cresceu de maneira bastante sensível. Em todo o caso, os países da E. F. T. A. quase equilibraram o acréscimo das importações com o das exportações, de maneira que o seu déficit apenas se elevou de pouco mais de 1 por cento entre os períodos considerados, resultado que contrasta com o obtido pela Comunidade Económica Europeia.

QUADRO V

Reservas oficiais de ouro e divisas (a)

(Milhões de dólares)

[Ver tabela na imagem]

(a) Compreende a posição ouro no F. M. I. referente à liquidação de quotas.
(b) Este total não correspondo à soma das Importâncias indicadas para os diversos países, em virtude do certos montantes não perfeitamente individualizados.

Origem: International Financial Statistics, do F. M. I., Novembro de 1963.

Página 2651

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2651

Esse comportamento das reservas cambiais dos países europeus da O. C. D. E. veio agravar, sem dúvida, o problema da liquidez internacional. Repare-se, a tal propósito, que a representação desses países passou de 44,2 por cento no fim de 1961 para 45,7 por cento em Junho de 1963, do mesmo passo que o valor das reservas dos Estados Unidos decaíam de quase 10 por cento.
Quando se confrontam as posições de Junho de 1963 com as de Dezembro de 1961, ressalta o caso da França, cujo incremento de reservas representou quase 72 por cento do acréscimo global. E se baixaram entretanto as disponibilidades da Itália, Reino Unido, Finlândia, Suíça e Turquia, bastaram os aumentos registados na Áustria e Espanha para compensar, no conjunto, o efeito dessas quebras, que, aliás, em termos relativos, não atingiram elevados valores, excepto nos casos da Finlândia e da Turquia. Como todos os restantes países puderam acrescer as suas reservas - especialmente Portugal, Países Baixos e Bélgica-, é evidente que a-grande maioria das moedas europeias viu reforçada, ou pelo menos mantida, a sua posição, especialmente em detrimento do dólar americano.

b) A conjuntura nos Estados Unidos

9. No fim do 2.º trimestre do ano em curso a economia americana mostrava tendência nítida para acelerar a sua expansão: de facto, enquanto a taxa média unual de acréscimo de rendimento era, no 1.º trimestre, em relação a 1962, de 3 por cento, essa taxa elevava-se a cerca de 4,5 por cento no período de Abril-Junho, devido principalmente aos impulsos das despesas dos consumidores em serviços, dos investimentos em novas construções e da melhoria das exportações de bens e serviços.
Conforme se refere no relatório do projecto de proposta de lei, os índices da produção industrial acusavam uma progressão continuada e sensível ao longo de todo o 1.º semestre, parecendo também que os resultados da produção agrícola terão sido satisfatórios. Contudo, a taxa de desemprego, avaliada pelo número de desempregados em relação ao total da mão-de-obra civil, mantinha-se ainda bastante elevada, apesar do movimento descensional que começou a notar-se claramente depois de Maio.
Os salários médios semanais nas indústrias manufactureiras mostravam um sentido de alta - cerca de 3 por cento entre os meses de Setembro de 1962 e 1963. Por seu turno, o índice geral de preços no consumidor - que não chegara a, aumentar 1,5 por cento em 1962 - mantinha-se praticamente estabilizado no período de Janeiro-Agosto de 1963.

10. No mercado monetário ter-se-á atenuado um tanto o anterior estado de tensão, apesar da continuidade do crescimento do volume de crédito distribuído, designadamente do crédito ao consumo.
Quanto às bolsas, o índice da Securities and Exchange Commission (base: 1957-1959=100) revela um movimento de recuperação mais ou menos continuado, depois da descida dos valores médios entre 1961 e 1962: o índice, que se situava em 117,9 em Setembro de 1962, subia para 128 em Dezembro desse ano, para 133,7 em Março, 142,5 em Junho e 148,2 em Setembro de 1963, melhoria que interessou mais ou menos todas as grandes classes de títulos abrangidas pelo índice.

11. Será de admitir, seguindo o relatório do projecto de proposta de lei, que a expansão da economia americana continue ainda a curto prazo, por força, nomeadamente, da conjugação dos efeitos favoráveis do aumento, quer das despesas do Estado, quer da formação de capital fixo pelo sector privado e da redução dos impostos. Isto é: a procura interna deverá prosseguir como principal factor de impulso, mas, a avaliar pelos resultados ultimamente obtidos, poderá considerar-se que o incremento das exportações de bens e serviços venha a assumir no processo um papel significativo.
Em todo o caso, a evolução da balança de pagamentos não deixou ainda de suscitar sérias apreensões, se bem que numerosas providências hajam sido adoptadas, tanto para fomentar as exportações de bens e serviços, como para conter certas despesas no estrangeiro e a saída de capitais.

QUADRO VI

Reservas e responsabilidades dos Estados Unidos

(Milhões de dólares)

[Ver tabela na imagem]

(a) Valores corrigidos.

Página 2652

2652 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Como se verifica no quadro precedente, elaborado com base em elementos publicados no Federal Reserve Bulletin de Outubro de 1963, o excesso das responsabilidades em dólares e moedas estrangeiras sobre as reservas totais de ouro e divisas aumentava sensivelmente no período de Janeiro a Agosto do ano em curso, posto que bastante menos do que no período homólogo de 1962.
O acréscimo das responsabilidades em dólares e moedas estrangeiras a curto prazo determinado principalmente pela França (320 milhões de dólares), Argentina (quase 190 milhões), México e Venezuela (à volta de 140 milhões cada um) e Japão (pouco menos de 115 milhões) - ultrapassou largamente o aumento das disponibilidades a curto e longo prazo do sistema bancário, daqui resultando uma variação negativa de 184 milhões de dólares, à qual se acresceu a nova quebra das reservas de ouro.
Atente-se, por último, que a representação das reservas de ouro dos Estados Unidos, relativamente às reservas mundiais, excluído o bloco soviético, tem vindo a decair continuamente: de 44 por cento no fim de 1960 para 41,2 por cento em 1961, aproximadamente 39 por cento em 1962 e cerca de 38 por cento em Junho de 1963.

c) Considerações finais

12. Em face da anotada evolução das reservas dos Estados Unidos e da posição alcançada pela maioria das moedas da Europa Ocidental, em conjugação com as dificuldades de pagamentos externos sentidas por diversos países da América Latina, da Ásia e da África, compreende-se claramente a gravidade assumida pelo problema da chamada liquideis internacional. Não é só a questão do desajustamento do preço do ouro e do apontado desequilíbrio crescente entre o volume das reservas de ouro e o do comércio mundial, ou a da acentuação das assimetrias repartitivas dessas reservas de ouro, o que se põe em causa; levanta-se, com pertinência, o problema da posição de certas moedas nas liquidações internacionais e, até, a necessidade de averiguar em que medida o sistema de pagamentos estabelecido e a acção das instituições especializadas possuem a elasticidade suficiente para apoiar a expansão das trocas de bens e serviços e fazer face a eventuais crises.
Assim, na última assembleia do Fundo Monetário Internacional, realizada em Washington em Setembro findo, ficou acordado que o Fundo e o grupo de países que formam o Clube de Paria (Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, França, Alemanha Ocidental, Itália, Suécia, Bélgica, Holanda e Japão) procederiam ao estudo do problema da liquidez internacional, devendo submeter as suas conclusões na reunião de Tóquio, no próximo ano. Entretanto, prevê-se que se alarguem os prazos de utilização dos saques sobre o Fundo Monetário e que uma parte maior das quotas em moeda nacional de vários países membros se torne transferível, do mesmo passo que, entre os participantes no Clube de Paris, se acordará, talvez, em aumentar o fundo especial constituído para apoio das suas moedas, instituir novas directivas de cooperação monetário-cambial e diminuir o recurso a práticas como as dos acordos de swap. Por seu turno, o Banco Mundial porá em prática, muito em breve, um programa de empréstimos ampliados e «liberalizados», compreendendo, designadamente, moratórias especiais e períodos de amortização maiores para determinadas categorias de empréstimos; créditos agrícolas mais vultosos e frequentes e empréstimos às indústrias privadas com dispensa de aval do Estado.
As opiniões nestas matérias divergem bastante, mas são poucos os que preconizam e julgam possível o retorno a um regime de padrão-ouro, reconhecidas como são as vantagens do padrão divisas-ouro, baseado, além do mais, em taxas de câmbio pouco variáveis, quando não fixas, na estabilidade do preço do metal e no uso generalizado de algumas moedas-chave nas liquidações internacionais.
É certo que o grau de liquidez internacional se acresceu nos últimos anos em consequência, fundamentalmente, do aumento das responsabilidades a curto prazo dos Estados Unidos, aumento este mais rápido até do que o da produção e comércio mundiais; contudo, não parece que o processo deva prosseguir por muito mais tempo, dado o desequilíbrio que ele pressupõe, com as inerentes pressões sobre o dólar ou, em última análise, sobre as reservas-ouro dos Estados Unidos.
Outra ideia é a da criação de uma unidade monetária internacional, certamente apoiada nas principais moedas dos países membros da O. C. D. E. e capaz de aliviar o dólar dos encargos, hoje muito pesados, advenientes da sua posição de principal moeda-chave. Estas intenções recordam o ambicioso projecto Keynes, apresentado quando dos trabalhos que precederam a Conferência de Bretton Woods, em Julho de 1944, demais que na lógica da instituição dessa «unidade de conta» - ainda que sob a forma da mutual currency account proposta pelo Ministro britânico Maudling na assembleia do Fundo Monetário em Setembro de 1962 - sempre haverá que considerar alguma forma de clearing multilateral e o jogo de créditos recíprocos.
Seja como for, o que importa reter é a importância, excepcional a vários títulos, que está assumindo o problema em referência, e que o nosso país não pode deixar de acompanhar.

13. Quanto aos movimentos de cooperação económica europeia, refere primeiramente o relatório do projecto da proposta de lei a decisão tomada pelo Conselho de Ministros da Associação Económica de Comércio Livre (A. E. C. L.), na sua reunião de Genebra em Fevereiro do ano em curso, após a ruptura das negociações entre o Reino Unido e a C. E. E., de continuar a «trabalhar em conjunto para o estabelecimento de um mercado europeu unificado», bem como a de se preparar urgentemente um programa de acção visando, em particular, a aceleração do processo de eliminação dos direitos aduaneiros, a realização de acordos tendentes à liberalização do comércio de produtos agrícolas e a conclusão dos estudos sobre regime de draubaque, regras de origem, direitos fiscais e taxas internas vigentes nos diversos países participantes.
Na reunião de Lisboa, em Maio findo, o Conselho da A. E. C. L. resolveu que a eliminação dos direitos sobre produtos industriais deveria terminar quatro anos antes da data inicialmente estabelecida na Convenção de Estocolmo, para o que se efectuarão reduções de 10 por cento no fim dos anos de 1963 a 1965, completando o processo com a eliminação dos restantes 20 por cento em 31 de Dezembro de 1966. Concomitantemente, o Conselho decidiu a criação de um comité de desenvolvimento económico, tendo por principal objecto «examinar as questões que lhe forem remetidas pelo Conselho relativas ao desenvolvimento económico nos Estados membros, incluindo questões que neste campo estão relacionadas com as circunstâncias criadas pelo desmantelamento das barreiras aduaneiras entre eles, e, em casos apropriados, estudar os modos e meios de promover ou facilitar a colaboração entre os mesmos países em matérias financeiras, técnicas e similares».

Página 2653

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2653

Entretanto, celebraram-se vários acordos bilaterais sobre produtos agrícolas, tendo-se analisado, em Setembro, na reunião de Estocolmo do Conselho da A. E. C. L., os resultados daquelas decisões e reafirmado a intenção de congregar esforços para a desejada unificação do mercado europeu.
Na primeira reunião do Comité de Desenvolvimento Económico, efectuada recentemente em Genebra, em que o nosso país teve oportunidade de apresentar e discutir alguns problemas relevantes ligados ao processo do seu crescimento económico-social, ressaltou claramente o interesse de que os trabalhos técnicos e a cooperação conduzidos no quadro desse Comité podem revestir-se, bem como a importância das oportunidades que por esta forma podem abrir-se, com vantagens recíprocas para todos os países participantes na Associação, e não apenas para aqueles que se encontrem em estádio de subdesenvolvimento relativo.

14. Pelo que respeita à Comunidade Económica Europeia, deve mencionar-se a nova redução de 10 por cento nos direitos aduaneiros acordada em Julho em virtude da qual a desmobilização tarifária entre os países membros se elevou a 60 por cento para os produtos industriais e a 45 por cento para os produtos agrícolas não liberalizados; simultaneamente, procedeu-se a uma segunda aproximação à pauta exterior comum e, tendo em atenção as negociações no quadro do G. A. T. T. para 1964, a uma redução linear de 20 por cento nos direitos dessa pauta, se bem que com algumas excepções.
Refere ainda o relatório do projecto de proposta de lei a celebração em Julho de uma convenção de associação entre a C. E. E. e dezoito países africanos, prevendo a liberalização pela Comunidade, sob certas condições, das importações de vários produtos tropicais e a concessão de vultosos créditos pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento e pelo Banco Europeu de Investimento para financiamento do crescimento económico desses países. Por outro lado, assinou-se em Setembro a convenção de associação da Turquia à C. E. E. em moldes semelhantes aos da Grécia, ou seja, assentando num esquema de integração progressiva, visto tratar-se de associações a título temporário.

15. Ainda no domínio das relações económicas internacionais, deve destacar-se, pelo seu significado, seguindo o relatório em apreciação, a decisão tomada pela assembleia das Nações Unidas em 1962 para realização, no próximo ano, de uma conferência geral sobre comércio e desenvolvimento, onde, certamente, não deixarão de se fazer sentir certos considerandos políticos decorrentes da concorrência leste-oeste e da posição dos dois blocos perante o chamado «terceiro mundo». A colaboração que as grandes organizações internacionais, designadamente a O. C. D. E., o G. A. T. T., o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, vêm prestando na preparação dessa conferência constitui prova bastante da importância que se lhe atribui na actual conjuntura.
Em conformidade com a agenda provisória da conferência, o problema fundamental será o das inter-relações do comércio internacional e do desenvolvimento económico, no sentido do assentamento de processos de actuação susceptíveis de incentivar a expansão das trocas de mercadorias e de, por e com essa expansão, impulsionar e apoiar os processos de crescimento económico-social das estruturas atrasadas.
Também no domínio do comércio internacional e do desenvolvimento económico, a resolução tomada pelas partes contratantes do G. A. T. T. na reunião de Maio em Genebra sobre a realização de novas negociações no próximo ano - o chamado «Kennedy round» - se afigura de singular relevância. E que, de facto, tais negociações obedecerão aos seguintes critérios fundamentais:

1) Basear-se-ão no tratamento de nação mais favorecida e no princípio da reciprocidade;
2) Incidirão sobre todas as categorias de produtos;
3) Abrangerão não só os direitos aduaneiros, mas também os obstáculos não tarifários;
4) Assentarão num plano de reduções aduaneiras lineares iguais, comportando apenas um mínimo de excepções, que serão, por seu turno, objecto de provas de confronto e de justificação;
5) Deverão criar condições aceitáveis de acesso aos mercados mundiais para os produtos agrícolas;
6) Procurarão reduzir os obstáculos que dificultam as exportações das nações pouco desenvolvidas, não devendo os países industrializados contar com o benefício de reciprocidade perfeita por parte daqueles;
7) Terão em conta a faculdade de cada país pedir concessões comerciais adicionais ou alterar as suas próprias ofertas, quando isso se mostre necessário para assegurar o equilíbrio dos interesses desse país e das outras partes contratantes;
8) Atenderão aos problemas de reciprocidade que se suscitem quanto a países cujas tarifas sejam de incidência geral indicutïvelmente mais fraca que as dos outros participantes nas negociações.

Outras decisões relevantes foram ainda tomadas na referida reunião das partes contratantes do G. A. T. T., nomeadamente a da criação de uma comissão especial para estudar novas medidas destinadas a auxiliar as economias em curso de desenvolvimento no reforço dos seus potenciais produtivos e alargamento das respectivas capacidades de exportação.

16. As considerações dos parágrafos precedentes confirmam a opinião expendida pela Câmara quando, no seu parecer sobre o projecto de proposta de Lei de Meios para 1963, considerava que «serão os problemas da liquidez internacional, das integrações económicas e do desenvolvimento dos países atrasados que dominarão a evolução dos próximos anos e hão-de condicionar a cooperação internacional e ser condicionados, por sua vez, pelo menos em princípio, pelo objectivo da liberalização do comércio internacional». Não parece, também, que tenha perdido actualidade a afirmação de que todos esses problemas «estão ainda sujeitos à influência da realidade política que é a existência no Mundo de dois sistemas antagónicos, mesmo que à corrida aos armamentos se substitua a coexistência pacífica» e que, acrescentemos agora, apareçam sintomas de desinteligências ideológicas dentro do bloco comunista.

B) Economia nacional

a) Metrópole

1. A conjuntura económica geral

17. Passando à análise da evolução da economia metropolitana, o relatório do projecto de proposta de lei refere com bastante pormenor os resultados atingidos ao longo do quinquénio de 1958-1962. A Câmara limita-se a con-

Página 2654

2654 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

centrar a sua atenção sobre os comportamentos evidenciados nos anos de 1962 e 1963, sem deixar naturalmente de ter em devida conta as conclusões respeitantes àquele período; de resto, o exame que se oferece no relatório, pela sua amplitude e pela sua profundidade, dispensa quaisquer comentários adicionais.
Segundo os elementos de informação disponíveis, o produto nacional bruto a preços de mercado teria subido, a preços constantes, de 4,9 por cento em 1962, contra 6,6 por cento em 3961 e 8,9 por cento em 1960, admitindo-se no relatório que o seu crescimento no ano em curso «se não afaste sensivelmente da média dos últimos cinco anos», que foi de 5,3 por cento. Ou seja, em 1962, verificou-se um afrouxamento do ritmo de expansão, tal como já se observara em 1961, e~ em 1963 obter-se-á, muito provavelmente, uma taxa de acréscimo da ordem dos 5 por cento.

18. Quanto ao comportamento das diversas actividades económicas, nota-se, em primeiro lugar, que a produção agro-pecuária deverá revelar em 1963 uma «ligeira diminuição do valor global», ao contrário do que se registou em 1962. Este resultado decorrerá, fundamentalmente, do facto de os acréscimos nas colheitas de azeite e tubérculos, em conjugação com o incremento da produção pecuária, não poderem compensar as quebras averbadas nos cereais (exceptuado o centeio) e nos vinhos (cerca de 23 por cento).º Em contrapartida, na silvicultura estimam-se aumentos de 35 por cento na produção corticeira e de 20 por cento na de resinosos, esta estimulada de novo pela procura externa, mas é-nos impossível avaliar a medida em que esta progressão terá compensado aquela contracção global do sector agro-pecuário.
Comentando a evolução recente da agricultura nacional, a Câmara anotara, no seu parecer sobre o projecto de proposta da Lei de Meios para 1963, que «o aperfeiçoamento das suas estruturas, se impõe com urgência, não só porque tal acção não é susceptível de resultados significativos a curto prazo, como também pela necessidade de nos prepararmos para o condicionalismo que irá criar a possível participação do País no movimento de integração económica europeia». E lembrou também a Câmara, entre as providências a tomar para o desenvolvimento da agricultura, que «não serão certamente de menor importância as que se dirigirem à melhoria das condições de comercialização dos produtos agrícolas e à do regime do crédito agrário a médio e longo prazos».
É inquestionável que se deram no ano corrente novos passos na prossecução desses objectivos, designadamente:

a) No quadro do Plano do Alentejo, iniciaram-se as obras de irrigação dos campos do Mira, do Roxo e do Caia, adjudicando empreendimentos no total de 400 milhares de contos;
b) Entraram em execução os primeiros trabalhos de emparcelamento da propriedade rústica em algumas freguesias do concelho de Ponte de Lima;
c) Foi promulgado novo regime cerealífero e do pão, pelo Decreto-Lei n.º 45 223, de 2 de Setembro findo, que alargou também o auxílio financeiro do Estado à lavoura criando um fundo destinado a apoiar a intensificação da reconversão cultural; e
d) Publicaram-se alguns diplomas submetendo novos terrenos a regime florestal parcial obrigatório.

Forçoso é reconhecer, no entanto, que outras providências de mais largo alcance serão necessárias urgentemente para acelerar o progresso da agricultura portuguesa e vir a assentar nela o complexo de novas indústrias que as condições naturais do País permitem e as oportunidades oferecidas pelos mercados internacionais aconselham. Os problemas deste sector requerem, cada vez mais instantemente, a consideração de todos os seus aspectos mais ou menos relevantes dentro de uma visão de conjunto da actividade e das suas relações com outros sectores, a fim de que a acção a empreender se diversifique suficientemente e possa constituir um ataque sistematizado, profundo e simultâneo daqueles aspectos.

19. No domínio da pesca tem-se verificado em 1963, relativamente ao ano anterior, uma acentuada contracção de volume, correlativa de forte elevação dos preços médios na generalidade das espécies de pescado. De facto, entre os 1.os semestres de 1962 e 1963, enquanto a quantidade de pesca desembarcada no continente desceu de 93 835 t para 78 619 t, o correspondente valor aumentou de 409 833 para 421469 contos, donde um acréscimo do preço médio de quase 23 por cento.
Relativamente às indústrias, refere o relatório do projecto de proposta dê lei uma quebra do ritmo de expansão em 1962, apontando-se entre os factores conjunturais mais significativos, «por um lado, a dificuldade de encontrar novas modalidades industriais e, por outro, a tensão observada no mercado monetário e financeiro - resultante, porventura, da relativa quebra de confiança que se produziu internamente, e à semelhança do que se vem observando internacionalmente, e, ainda, da incerteza da nossa posição perante a integração económica europeia -, que introduziu novo elemento de hesitação e risco no investimento privado, se bem que determinasse a realização de empreendimentos em melhores condições de produtividade, aptos a enfrentar uma concorrência internacional crescente».
Esse afrouxamento da actividade industrial prosseguiu ainda no 1.º trimestre de 1963, após o que se iniciou um movimento de recuperação bastante sensível. Em todo o caso, o acréscimo global da indústria transformadora na primeira metade do ano em relação ao período homólogo de 1962 não terá chegado a 1 por cento, em consequência, principalmente, das quebras registadas nos sectores das «Indústrias metalúrgicas, metalomecânicas e material eléctrico», das «Indústrias de alimentação e bebidas» e das «Diversas indústrias transformadoras» e apesar da considerável progressão notada nas «Indústrias químicas e dos petróleos» e nas «Indústrias de produtos minerais não metálicos».
Quanto às indústrias extractivas, não se denunciaram ainda sintomas de debelação da crise com que vêm a debater-se desde há anos os principais subsectores. Durante o 1.º semestre de 1963 ter-se-ia verificado mesmo nova e acentuada quebra dos respectivos índices de produção.
É de admitir que a actividade industrial tenha melhorado na segunda metade do ano, mas a sua recente evolução global suscita alguns cuidados, demais quando a ela se junta a relativa estagnação ou quebra das actividades primárias.
A referida atitude de expectativa por parte dos empresários e a de hesitação ou desinteresse por parte dos detentores de poupanças quanto ao investimento industrial serão, sem dúvida, factores muito importantes daquela situação, mas para ela contribuirão outros elementos.
Há que actuar no sentido de esclarecer empresários e capitalistas, promover estudos para assentamento de planos de reorganização industrial e, o que é fundamental, proceder à sua execução:

Página 2655

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2655

Aplicam-se à indústria as considerações expendidas a propósito da agricultura, ressalvada, naturalmente, a maior extensão das repercussões sociais neste domínio de actividade. Note-se, a este propósito, que no relatório do projecto de proposta de lei se indica tornar-se necessário, «em face do esforço de defesa que o País vem realizando, e que não se espera diminua num futuro próximo, que se vá operando adequada conversão da nossa actividade produtiva por forma que o. interesse económico desse mesmo esforço se projecte, tanto quanto possível, na formação interna de rendimentos e não se traduza, para além do estritamente indispensável, no escoamento de divisas para o exterior».

20. Pelo que respeita aos sectores da Energia eléctrica e serviços, os elementos de informação disponíveis indicam uma evolução muito favorável em 1963. De facto, tanto nos transportes aéreos como nos marítimos e terrestres, verificam-se taxas de acréscimo das actividades altamente significativas, e o mesmo se regista .na produção de energia eléctrica e nos movimentos turísticos. Parece de admitir que a contribuição de outros serviços para a formação do produto interno tenha também progredido, designadamente a dos sectores de «Comércio por grosso e a retalho», «Bancos, seguros e negócios imobiliários», «Propriedade imobiliária» e «Administração pública e defesa».
Sendo assim, poderá pensar-se que a progressão das actividades terciárias em 1963 tenha compensado o afrouxamento da expansão dos outros ramos, visto que, em termos globais, se estima um crescimento do produto da ordem dos 5 por cento, semelhante, por conseguinte, ao obtido em 1962 e à média do quinquénio de 1958-1962.

21. Refere o relatório do projecto de proposta de lei que a procura interna apresentou em 1962 uma variação negativa de cerca de 1 por cento, pelo que o citado aumento de 4,9 por cento do produto nacional bruto proveio exclusivamente da contracção do déficit das transacções externas de bens e serviços, esta decorrente de incremento das exportações e de redução das importações. Pelo contrário, em 1963 a procura interna terá voltado a constituir o principal factor de impulso, pois não se prevê variação substancial no saldo daquelas transacções.
Analisando as componentes da procura interna, verifica-se que em 1962 a diminuição das despesas dos consumidores em bens e serviços, a preços constantes, terá ultrapassado o acréscimo das despesas do Estado, de modo que o consumo global veio a sofrer uma contracção de quase 1,5 por cento. Ora, a avaliar pelas importações de bens de consumo que se tornaram necessárias, nomeadamente de alguns produtos alimentares, e considerando que as despesas do Estado em bens e serviços continuaram a progredir, será lícito concluir que o consumo global em 1963 haja retomado a linha de crescimento vinda dos períodos precedentes.
Na formação bruta de capital fixo, a parte do sector privado acusou em 1962, pela primeira vez desde há muito, uma diminuição algo sensível -quase 2,5 por cento-, que, não obstante o acréscimo do investimento bruto do sector público, determinou uma redução de 1 por cento no total e uma descida na relação entre a, formação de capital e o produto global a preços de mercado de 18,3 para 17,4 por cento. Em 1963, porém, segundo o relatório ministerial, «a formação bruta de. capital fixo do sector privado virá a «retomar a tendência expansionista
interrompida em 1962, alcançando um montante que corresponde a acréscimos de 4 por cento em relação ao último ano e de 2 por cento em comparação com 1961» e, bem assim, «a formação bruta de capital fixo do sector público deverá registar [...] expansão superior a 17 por cento, a mais elevada do último quinquénio». Isto significa que se espera superar a atitude de expectativa ou reticência dos empresários e capitalistas e contrariar a estimativa de contenção do ritmo de expansão do produto nacional bruto, a menos que, como é também admissível, uma parte considerável dos investimentos se haja dirigido para a construção de edifícios e infra-estruturas ou uma outra fracção, também importante, tenha substituído equipamentos gastos e obsoletos ou se, de maneira geral, se não utilizar a plena capacidade o equipamento disponível; aliás, no comportamento da formação bruta de capital fixo em 1963 já se fizeram sentir as despesas de investimento relacionadas com a 1.ª fase da construção da ponte sobre o Tejo. Note-se, ainda, que na execução dos programas previstos para 1963 no quadro do II Plano de Fomento as maiores percentagens de realização, apuradas no fim do 1.º semestre, respeitavam ao sector da «Electricidade», a que se seguiam as correspondentes aos sectores de «Investigação e ensino técnico» e de «Transportes e comunicações».

22. Comentando a execução do programa para 1963 do II Plano de Fomento, à luz dos resultados provisórios respeitantes ao 1.º semestre, o relatório do projecto de proposta de lei refere que as despesas efectuadas teriam representado apenas 27 por cento das previsões, «o que traduziria ritmo de realização sensivelmente inferior ao observado em anos precedentes»; contudo, espera-se que se registe uma recuperação até final do ano.
Por outro lado, ao examinar as fontes de financiamento daquele programa, o referido relatório mostra que a maior parte - cerca de 68 por cento - do montante financiado correspondeu ao Orçamento Geral do Estado e instituições de previdência. E acrescenta-se: «O facto de os capitais privados não acorrerem, na medida em que se previu, ao financiamento dos empreendimentos englobados no II Plano de Fomento parece exigir uma reformulação dos princípios que têm presidido à escolha dos empreendimentos a realizar com tais meios financeiros e das condições que a esses capitais são oferecidas».
A Câmara concorda plenamente com esta conclusão. Todavia, e ao menos pelo que respeita ao sistema bancário, não se pode deixar de assinalar que em 1963 as instituições de crédito tomaram promissórias de fomento nacional no valor de 500 milhares de contos e obrigações do Tesouro no total de outros 500 milhares de contos, o que equivale a um financiamento indirecto bastante vultoso.
Esta observação leva a apontar a necessidade de melhor classificar as verbas financiadas, tendo em consideração a efectiva origem dos recursos, pois de outro modo não se poderá avaliar com satisfatória aproximação a contribuição dada por cada sector financeiro.

2. O comércio externo e a balança de pagamentos

23. Como se mostra no quadro seguinte, a balança de pagamentos da zona do escudo apresentou em 1962 um excedente de 3223 milhares de contos, o qual ultrapassou em quase 300 milhares de contos a soma dos deficits registados em 1960 e 1961. Mesmo descontando o efeito do saldo das operações de capital a longo prazo do sector

Página 2656

2656 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

público e bancário, a balança apresentaria ainda em 1963 um excedente de 1241 milhares de contos.
A melhoria dos resultados das transacções internacionais da zona do escudo entre 1961 e 1962 cifrou-se, portanto, em 5975 milhares de contos, para a qual contribuíram principalmente:

a) A contracção do deficit comercial da metrópole, no valor de 2903 milhares de contos, compensada em 2007 milhares de contos pela redução do excedente das províncias ultramarinas;
b) Os acréscimos de 348 milhares de contos no saldo de «Turismo»- e de 264 milhares de contos nas «Transferências privadas»;
c) A variação positiva de 685 milhares de contos nos diversos invisíveis correntes da metrópole, a que se juntou o incremento de 756 milhares de contos na balança de invisíveis do ultramar;
d) A melhoria de 430 milhares de contos no saldo das operações de capitais a curto prazo e a de 295 milhares de contos no das operações a longe prazo do sector privado;
e) A subida de 1907 milhares de contos no excedente das operações de capitais a longo prazo do sector público e bancário.

Reabsorvidas certas repercussões da «crise» de 1961 e atenuadas outras, não se julga, contudo, de prever, perante os factores determinantes da apontada melhoria e pele menos a curto prazo, que a evolução da balança geral de pagamentos retome a linha de acumulação de excedentes verificada entre 1950 e 1959.

QUADRO VII

Balança de pagamentos da zona do escudo

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Valores segundo a estatística alfandegária. Inclui comércio governamental. (b) Valores segundo a estatística de liquidações.
(c) Compreende remessas de migrantes, donativos, legados e pensões.
(d) Compreende outros serviços e pagamentos de rendimentos e transferências governamentais.
(e) Em 160 e 1961, estimativa.
(f) Em 1960 só metrópole.
(g) Invisíveis correntes e operações de capital não identificáveis.

Origem: Elementos e saldos determinados pelos serviços do Banco de Portugal.

De resto, já em 1963 se voltou a inverter o sentido de comportamento da balança: entre os períodos de Janeiro-Outubro de 1962 e 1963, a balança cambial do Banco de Portugal - em que se repercutem, praticamente, os resultados globais das transacções com o estrangeiro - acusava uma variação negativa de 2327 milhares de contos. Deve, porém, esclarecer-se que, se ao excedente de Janeiro-Outubro de 1962 se abater o efeito das operações de crédito externo efectuadas pelo sector público (no valor líquido de 1654 milhares de contos), a deterioração se reduz a 670 milhares de contos, que possivelmente se atenuará ainda nos dois últimos meses do ano.

Página 2657

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2657

QUADRO VIII

Balança cambial do Banco de Portugal (a)

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Corresponde às operações nas moedas dos países indicados e, bem assim, aos movimentos das contas em escudos em nome de pessoas residentes ou domiciliadas nos mesmos países. Não inclui, porém, a parte das liquidações multilaterais que corresponde aos pagamentos de dólares no quadro do Acordo Monetário Europeu o às transferências entre o Banco de Portugal e outros bancos centrais, quer para a constituição de coberturas, quer para pagamentos nos termos do acordos bilaterais.

Origem: Banco de Portugal.

Há que admitir nos anos mais próximos a formação de alguns deficits cambiais, mais ou menos quantiosos, na sequência das pressões inerentes às necessidades de defesa e às do crescimento económico nacional. Demais, como se nota justamente no relatório do projecto de proposta de lei, «a considerável expansão da importação de capitais pelo sector privado (como também pelo sector público) observada nos últimos anos virá [...] a levantar de futuro o problema do pagamento dos capitais e juros». «Na medida, porém - prossegue o relatório -, em que nessas importações predominarem os investimentos directos e os apports de capital en nature, encontrar-se-ão sensivelmente atenuadas as possíveis repercussões cambiais deles derivadas. Por outro lado, convirá que as importações de capitais sob a forma de empréstimos sejam firmemente orientadas para os sectores mais adequados com vista à defesa da balança de pagamentos, por forma a assegurarem-se as receitas cambiais .que compensem o respectivo reembolso e os encargos.»
Esta opinião é inteiramente perfilhada pela Câmara, pois os critérios definidos para a apreciação de tais operações são, em seu entender, os que melhor se ajustam aos verdadeiros, interesses do País.

24. As operações de comércio externo constituem ainda um dos factores mais significativos das variações de resultados da balança geral de pagamentos da zona do escudo, tal como os seus saldos representam a componente de maior importância destes resultados.
Quanto ao comércio da metrópole com o estrangeiro, mostra-nos o quadro seguinte que a redução do déficit em 1962 - no valor de 2558 milhares de contos - adveio - cerca de dois terços - da diminuição das importações, enquanto as exportações se acresciam de cerca de 12 por cento. Mas entre os períodos de Janeiro-Setembro de 1962 e de 1963 b déficit voltou a aumentar - um pouco mais de 9 por cento - devido ao facto de a expansão das importações ter ultrapassado duas vezes e meia a das exportações.

QUADRO IX

Comércio da metrópole com o estrangeiro

Valores alfandegários

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

Origem: Boletim Mensal do Instituto Nacional de Estatística.

Página 2658

2658 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Consequentemente, a taxa de cobertura das importações pelas exportações decaiu entre os períodos considerados, situando-se um pouco acima de 53 por cento em Janeiro-Setembro de 1963. No entanto, as razões de troca - depois de uma quebra nítida entre 1961 e 1962, que prosseguiu ainda entre os 1.os trimestres de 1962 e 1963 - melhoraram um tanto no 2.º trimestre, em virtude exclusivamente da subida do índice de valores médios da exportação, para decaírem novamente no 3.º trimestre pela conjugação de uma quebra do índice de valores médios da exportação e da alta do índice de valores médios da importação.

QUADRO X

índices do comércio externo

(Base: 1960 = 100)

[Ver tabela na imagem]

Nota. - Os índices foram calculados pelos serviços do Banco de Portugal com base numa «amostra» que representa cerca de 70 por cento das exportações e 63 por cento das importações globais da metrópole. O «índice de valor corrente» corresponde à relação percentual entre os valores correntes da «amostra» no período considerado (ano ou trimestre) e no período tomado para base (o valor anual ou a média trimestral de 1960). O «índice de volume» é um índice de quantidade, ponderado pelos preços do ano base.
Para o incremento das importações entre Janeiro-Setembro de 1962 e de 1963 concorreram principalmente as aquisições de algodão e fibras têxteis, de produtos químicos, de máquinas e aparelhos industriais e de embarcações. Na expansão das exportações pesaram, em especial, os vinhos, os resinosos, as cortiças e as matérias têxteis e respectivas obras.

QUADRO XI

Comércio externo da metrópole, por zonas geográficas

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

Origem: Boletim Mensal do Instituto Nacional de Estatística.

Observando a decomposição do comércio externo da metrópole por zonas geográficas, verifica-se que 65,5 por cento do acréscimo das exportações para o estrangeiro respeitaram aos países da A. E. C. L., enquanto a maior parte da subida das importações se reflectia nos «restantes países» e no Mercado Comum. Em consequência, ao passo que o déficit com os países da A. E. G. L. se reduzia ligeiramente, aumentava de 28,4 por cento o relativo aos «restantes países» e de 7,1 por cento o respeitante ao Mercado Comum.
Nas transacções comerciais entre a metrópole e as províncias ultramarinas o valor das exportações - facilitadas, sem dúvida, pelo novo sistema de compensações e pagamentos interterritoriais - elevava-se de 241 milhares de contos entre os períodos de Janeiro-Setembro de 1962 e de 1963. Mas como as importações aumentaram, entretanto, de 510 milhares de contos, o excedente metropolitano reduziu-se de 269 milhares de contos.
Apreciando os anteriores comportamentos, o relatório do projecto de proposta de lei estima um déficit comercial da metrópole com o estrangeiro em 1963 ligeiramente superior ao de 1962. E formula-se uma conclusão a que a Câmara dá inteiro acordo: «Torna-se deste modo urgente promover a melhor estruturação da actividade económica nacional, com vista ao incremento das exportações, apresentando-se simultaneamente indispensável organizar convenientemente o respectivo sistema de distribuição nos mercados externos, uma vez que a expansão das vendas ao estrangeiro constitui, a par das receitas provenientes do turismo, uma das vias que permitirão obter melhor posição da balança de pagamentos». De facto, parece que se está longe ainda de uma exploração racional e extensa dos mercados externos, mesmo no quadro actual da nossa produção; e para que possam assentar-se com satisfatória justeza os planos de futuras produções, que as condições específicas do País tornam viáveis, indispensável se mostra conhecer as possibilidades de absorção por tais mercados e adaptar a apresentação dos produtos às exigências desses mercados.

25. Vejamos, por fim, a evolução do comércio entre as províncias ultramarinas e o estrangeiro, cuja importância, como vimos, é também primacial no comportamento da balança geral de pagamentos internacionais.
O quadro seguinte, elaborado com base nas estatísticas de liquidações cambiais, mostra que a causa da variação negativa dos saldos entre 1961 e 1962 foi a excepcional expansão das importações (47 por cento), pois que as exportações ainda se acresceram de quase 11,5 por cento.

Página 2659

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2659

QUADRO XII Comércio do ultramar com o estrangeiro

Valores das liquidações

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Não compreende as exportações de diamantes do Angola.
(b) Compreende apenas as operações liquidadas através do sistema bancário da metrópole.

Origem: Banco de Portugal.

Entre os períodos de Janeiro-Setembro de 1962 e de 1963 ter-se-á operado uma sensível melhoria de resultados - apesar de uma quebra das exportações -, devido à contracção muito substancial das importações. Admitindo que o montante das exportações haja recuperado a linha de crescimento anterior, o saldo do comércio ultramarino com o estrangeiro deverá em 1963 vir a aproximar-se dos valores médios atingidos no triénio de 1959-1961, posto que, talvez, sem atingir o nível dos 2 milhões de contos, pois naqueles valores médios se reflectiam ainda as exportações de minérios da Índia Portuguesa.

3. Moeda e crédito

26. Os meios totais de pagamento, imediatos e quase imediatos, que em 1961. haviam subido apenas 641 milhares de contos, voltaram a apresentar em 1962 uma expansão acentuada: cerca de 11,8 por cento, ou sejam quase 6450 milhares de contos. Esta expansão foi acusada principalmente pelos depósitos ;à ordem e a prazo e deveu-se, em 47,4 por cento, ao acréscimo das reservas de ouro e divisas e, em 36,4 por cento, ao do crédito bancário (incluindo a tomada de promissórias).
Simultaneamente, como se mostra no quadro seguinte, a maior parte do incremento do stock monetário global correspondeu à «moeda escritural» criada pelas diversas instituições de crédito na sequência das suas operações de crédito: a representação da emissão monetária do Banco de Portugal desceu de 44,4 por cento em 1961 para 42,8 por cento em 1962, indicando quebra de «liquidez real» do mercado monetário. E a relação entre a referida «moeda escritural» e os meios de pagamentos emitidos pelo Banco de Portugal e Casa da Moeda elevou-se, entretanto, de 1,215 para 1,298, quando em 1958 se cifrava em 0,922.
Por outro lado, confrontando este comportamento do stock monetário com o da produção de bens e serviços deverá concluir-se que baixou de novo a velocidade-rendimento do dinheiro.

QUADRO XIII

Meios de pagamento e seus factores

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

Página 2660

2660 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

[Ver tabela na imagem]

(a) Contas de reserva e de compensação no Banco de Portugal.

Nota. - Sobre a determinação dos valores que constam deste quadro, vejam-se as notas insertas a p. 168 do Relatório do Banco de Portugal - Anexo da gerência de 1962.

Origens: Os valores relativos a 1961 foram calculados sobre elementos das Estatísticas financeiras do Instituto Nacional de Estatística; os de 1962 e 1963 sobre dados do Boletim Mensal do Instituto Nacional de Estatística.
No período de Janeiro-Julho de 1963, os meios totais de pagamento aumentaram de 6,1 por cento, taxa esta superior à registada no período homólogo de 1962.
A maior fracção do acréscimo do stock monetário terá sido determinada pela expansão do crédito bancário (incluindo a tomada de promissórias) e pela constituição de débitos da províncias ultramarinas em «contas de compensação». Notemos, ainda, que foi a «moeda escriturai» que reflectiu a totalidade de tal acréscimo, pelo que a representação da emissão monetária do Banco de Portugal voltou a decrescer, situando-se em 40,4 por cento, e a relação entre a «moeda escritural» e os meios de pagamentos emitidos pelo Banco e Casa da Moeda passou de 1,298 no fim de 1962 para 1,437 em Julho de 1963.
Esta evolução merece ser acompanhada com atenção, pelo que pode revelar de tensão no mercado monetário, como também pelo decréscimo que se vem observando na velocidade-rendimento do dinheiro e, bem assim, na produtividade marginal do crédito bancário distribuído.
No que respeita à liquidez da banca comercial, uma diferente arrumação dos elementos apresentados permite conclusões algo diferentes das apresentadas no relatório.

QUADRO XIV

Bancos comerciais

Liquidez e solvabilidade

(Milhares de contos).

[Ver tabela na imagem]

(a) Valores calculados.

Página 2661

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2661

De facto, como se vê no quadro precedente, o valor da reserva disponível, que se elevara ligeiramente entre 1961 e 1962, decaiu no 1.º semestre de 1963, resultando daí, em conjugação com o montante dos empréstimos contraídos, uma diferença negativa na chamada «reserva livre». Por outro lado, o excesso legal de reservas e garantias sobre as responsabilidades à vista - que diminuíra em 1962 - apresenta sensível recuperação no 1.º. semestre de 1963.
É possível que a análise da situação do conjunto das caixas económicas - em que domina a Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência - mostrasse indicadores muito mais favoráveis, apesar do esforço de crédito pedido à Caixa Geral de Depósitos nos últimos tempos. Em todo o caso, parece visível que se mantém um estado de relativa tensão do mercado monetário, consequente da expansão do crédito bancário e que, em boa parte, deverá atribuir-se a deficiências orgânicas e funcionais do mercado financeiro. Aliás, no relatório em apreciação refere-se: «Perante a evolução recente e as perspectivas a curto prazo do mercado monetário e de capitais importará, eventualmente, a adopção de medidas adequadas, assim como a revisão de diversas disposições legais em que se baseia o actual funcionamento daqueles mercados, no sentido de encontrar os ajustamentos necessários com vista, por um lado, a fazer face à presente conjuntura, e, por outro, a evitar maiores dificuldades futuras» (parágrafo 74 do relatório ministerial).
Citam-se no relatório, a propósito dessas medidas, a regulamentação das operações de crédito a médio e longo prazos e a da actividade de certas instituições «parabancárias». Trata-se, na verdade, de sectores que requerem urgentemente regulamentação, mas há todo um complexo de providências, já previstas, aliás, em diplomas promulgados, que convém pôr em execução.

27. A emissão monetária do Banco de Portugal mostrava, no período de Janeiro-Outubro de 1963, um acréscimo de,- apenas, 22 milhares de contos, quando no período homólogo do ano anterior o aumento fora de 1050 milhares de contos. Verifica-se, entretanto, uma expansão de 456 milhares de contos na circulação fiduciária, o que parece indicar um recrudescimento da preferência pela nota de banco.
Como se pode observar no quadro seguinte, operou-se uma contracção substancial dos depósitos bancários, reflectindo, naturalmente, o referido incremento das notas em circulação os créditos em escudos constituídos nas contas de reserva e compensação das províncias ultramarinas e a constituição de parte do capital do Fundo Monetário da Zona do Escudo.

QUADRO XV

Variação das responsabilidades do Banco de Portugal e seus factores

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Além da variação resultante do movimento de compras e vendas de ouro e divisas, estas verbas reflectem também os ajustamentos contabilísticos a que se referem as cláusulas X a XII do contrato aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44 492, de 29 de Junho de 1962.
(b) Pela amortização Integral dos débitos do Tesouro ao Banco, de conformidade com a 1.ª parte da cláusula XI do contrato acima referido.

Origem: Banco de Portugal.

Página 2662

2662 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Os principais factores de expansão monetária, no período de Janeiro-Outubro de 1963, foram os débitos constituídos em contas de compensação das províncias ultramarinas e a contribuição do banco para a realização do capital do Fundo Monetário, a que se juntou um pequeno aumento da reserva de ouro e divisas, mas os efeitos destes factores foram totalmente anulados pela contracção do saldo do crédito distribuído (incluindo promissórias). Cabe salientar, entretanto, que esta diminuição do saldo do crédito distribuído foi bastante inferior à registada no período de Janeiro-Outubro de 1962, sendo de admitir - em face das circunstâncias prevalecentes no mercado monetário - que as pressões sobre a capacidade prestamista do banco central tendam a acentuar-se.

28. Não obstante alguns aspectos menos favoráveis da evolução da actividade económica e dos meios de pagamento, e ainda a elevação geral dos salários, foi possível manter a estabilidade financeira interna.
Na verdade, entre os períodos de Janeiro-Setembro de 1962 e de 1963, os índices de preços no consumidor em Lisboa e Porto subiram apenas, respectivamente, de 2 e 2,5 por cento, variações estas inferiores às registadas na maioria dos países europeus participantes na O. C. D. E.

b) Províncias ultramarinas

1. Angola

29. Segundo o relatório do projecto de proposta de lei, as perspectivas da produção agrícola desta província para 1963 mostram-se muito favoráveis, nomeadamente pelo que respeita ao café, algodão e sisal, esperando-se também que as exportações de cafés venham a ser muito superiores às de 1962.
Quanto às indústrias extractivas, nota-se que a produção de petróleo duplicou no 1.º semestre de 1963 em relação a igual período de 1962 e prevê-se um acréscimo das exportações de minérios de ferro, devendo manter-se nos níveis usuais as de diamantes.
O volume da pesca desembarcada terá diminuído entre 1962 e 1963, a avaliar pelos resultados obtidos nos períodos de Janeiro-Maio. Salientam-se neste sector a montagem de novas unidades de salga e seca de peixe e a construção prevista de armazéns climatizados e entrepostos de frio, o que fomentará a expansão da actividade piscatória.
No domínio das indústrias transformadoras, registaram-se aumentos de produção, mais ou menos sensíveis, nos derivados de petróleo, pasta para papel, sacaria, açúcar, tabaco e borracha. Esperam-se para breve, ou encontram-se já em execução, numerosos empreendimentos industriais: produção de margarinas, laminagem de ferro e aço, ferro-ligas, industrialização da banana e milho e montagem de veículos.

30. Os meios de pagamento internos aumentaram substancialmente em 1963, segundo os elementos disponíveis para o período de Janeiro-Abril, tendo também o crédito bancário distribuído apresentado uma expansão considerável.
Por outro lado, o custo de vida ter-se-ia agravado de maneira sensível, designadamente em Luanda, devido, em particular, à subida das rendas de habitação.

31. Entre os períodos de Janeiro-Maio de 1962 e de 1963, e segundo as estatísticas alfandegárias, o comércio externo da província revelou uma apreciável melhoria, motivada exclusivamente pelo incremento das exportações: contra um déficit de 156 milhares de contos em 1962, averbou-se em 1963 um excedente de 361 milhares de contos.

QUADRO XVI

Comércio especial de Angola, por zonas geográficas, segundo a estatística alfandegária

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

Origens: Anuário Estatístico do Ultramar e apêndices ao Boletim Mensal do Instituto Nacional de Estatística.

Como se vê no quadro precedente, a maior parte da referida melhoria resultou das operações comerciais com os países estrangeiros participantes da O. C. D. E. e com a metrópole.

2. Moçambique

32. Prevê-se que a produção agrícola desta província apresente em 1963 um pequeno declínio, devido às in-

Página 2663

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2663

cidências de condições climatéricas desfavoráveis, especialmente na cultura de algodão. Esperam-se, no entanto, acréscimos de produção de cana-de-açúcar, oleaginosas, sisal, chá e kenafe e colheitas satisfatórias quanto a arroz, milho e mandioca.
Nas indústrias extractivas a expansão continuou moderada, destacando-se apenas o caso dos carvões, cuja quantidade exportada aumentou 30 por cento entre os l.01 semestres de 1962 e de 1963.
Quanto às indústrias transformadoras, anotou-se um crescimento muito sensível nos primeiros meses do ano, prevendo-se a entrada em funcionamento, muito em breve, de numerosos empreendimentos industriais (cimentos, sacaria, embalagens metálicas, moagem, refinação de açúcar, descasque de castanha de caju, montagem de veículos, etc.). Em contrapartida, o sector dos serviços terá acusado uma quebra nos primeiros meses do ano, reflectida, nomeadamente, na actividade dos portos, caminhos de ferro e camionagem.

33. No período de Janeiro-Maio do ano em curso, os meios de pagamento em poder do público revelaram uma ligeira quebra, apesar da expansão do crédito bancário distribuído.
A balança de pagamentos externos da província continuou a evoluir desfavoravelmente, quase duplicando o seu déficit entre os períodos de Janeiro-Maio de 1962 e de 1963. O incremento do saldo negativo da balança comercial e a quebra das receitas de transportes terão sido os factores fundamentais daquele comportamento.

34. Gomo se revela no quadro seguinte, o déficit comercial da província subiu, entre os 1.os semestres de 1962 e 1963, de 679 para 800 milhares de contos, segundo os valores alfandegários, em consequência exclusivamente da expansão das importações.

QUADRO XVII

Comércio especial de Moçambique, por zonas geográficas, segundo a estatística alfandegária

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

Origem: apêndices ao Boletim Mensal do Instituto Nacional de Estatística.

Repare-se que a subida do déficit se deveu apenas às operações com o estrangeiro, pois que se contraíram os saldos negativos, quer com a metrópole, quer com as outras províncias ultramarinas portuguesas.

3. Restantes províncias

35. Em Cabo Verde, segundo o relatório do projecto de proposta de lei, estima-se que a melhoria da produção agrícola se acentue no corrente ano, na sequência da acção empreendida pela Caixa de Crédito Agro-Pecuário e das providências postas em execução para desenvolvimento, das culturas e da criação de gados.
Refere ainda o relatório os investimentos feitos nas indústrias de sal e derivados da pesca e na construção de um molhe acostável, bem como as perspectivas de instalação de uma fábrica de congelação e de produção de conservas, farinha e óleo de peixe.

36. Quanto à Guiné, registou-se incremento sensível da produção de amendoim, contra uma quebra, embora ligeira, na de coconote. A construção de celeiros para amendoim e arroz em vários pontos do território veio melhorar as condições de comercialização desses produtos.
Admite-se no relatório, em face dessas perspectivas, que as dificuldades cambiais da província se atenuem em breve.

37. Em S. Tomé e Príncipe, prevê-se, segundo o relatório, «significativa expansão da economia», posto que persista a insuficiência da mão-de-obra disponível.

38. A economia de Macau terá registado em 1963 um novo incremento da actividade, «em consequência fundamentalmente, por um lado, do crescente afluxo de turistas, que determinou a realização de vultosos investimentos na indústria hoteleira, e, por outro, do aumento de actividade industrial, estimulada pela procura externa».

As exportações da província acresceram-se notavelmente entre os 1.os semestres de 1962 e de 1963, mas a balança comercial continuou a apresentar saldo negativo, que é compensado, normalmente, pelas receitas de invisíveis correntes.

Página 2664

2664 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

39. Relativamente a Timor, são ainda deficientes as informações disponíveis acerca do comportamento neste ano da economia da província. Mas o relatório do projecto de proposta de lei salienta não só as perspectivas favoráveis das culturas de café e tabaco, mas também a importância da criação do Fundo de Fomento de Produção e Exportação, tendo por objectivo «a concessão de financiamentos reembolsáveis à agricultura, à, industria e ao comércio».

c) Integração económica nacional

40. Prosseguindo a execução dos princípios estabelecidos pelo Decreto-Lei n.º 44 016, de 18 de Novembro de 1961, sobre a unificação dos mercados e a integração económica nacional, foram publicados em 1963 diversos diplomas que importa destacar:

a) Decreto-Lei n.º 44 874, de 7 de Fevereiro, que determina que os produtos derivados de petróleos brutos e resíduos, abrangidos pelo artigo 1.º do Decreto n.º 29 034, procedentes das províncias ultramarinas em condições de beneficiarem da eliminação de direitos prevista no artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 44 016, fiquem sujeitos ao pagamento de uma taxa de nivelamento igual à taxa constante da pauta de importação aplicável aos produtos similares da indústria de refinação de petróleos do continente; e
b) Decretos n.ºs 45 097 a 45 102, de 29 de Junho, que aprovam as listas de mercadorias provenientes do continente e ilhas adjacentes, nas condições referidas no artigo 9.º do citado Decreto-Lei n.º 44 016, que serão livres de direitos aduaneiros de importação nas províncias de Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique e Timor, a partir de 1 de Janeiro de 1964.

41. Por outro lado, e na sequência da publicação dos Decretos-Leis n.ºs 44 698 a 44 703, sobre as condições gerais reguladoras das operações de mercadorias, invisíveis correntes e capitais nos vários territórios portugueses, o exercício do comércio de câmbios nos mesmos territórios, a realização das operações interterritoriais, a criação das inspecções de crédito e seguros ou do comércio bancário e a constituição e funcionamento dos fundos cambiais das províncias, e ainda sobre o novo sistema de compensação e pagamentos, foram surgindo numerosos diplomas e despachos, a completar e regulamentar essas disposições:

a) O Decreto-Lei n.º 44 890, de 20 de Fevereiro, estabelecendo o regime a que ficam sujeitas as operações de importação e exportação de capitais privados entre territórios nacionais;
b) Os Decretos-Leis n.ºs 44 891 e 44 892, também de 20 de Fevereiro, autorizando a celebração de contratos entre o Estado e os bancos emissores ultramarinos;
c) O Decreto-Lei n.º 44 893, ainda de 20 de Fevereiro, estatuindo o regime das operações de importação e exportação de capitais privados entre as províncias ultramarinas e o estrangeiro;
d) Os despachos ministeriais de 21 de Fevereiro relativos aos princípios reguladores das operações cambiais nos diversos territórios e das operações de pagamentos interterritoriais;
e) Os despachos ministeriais de 21 de Fevereiro aprovando as listas de operações de invisíveis correntes e de capitais privados liberalizadas entre os territórios nacionais;
f) Os despachos do Ministro do Ultramar, igualmente de 21 de Fevereiro, autorizando a publicação das listas de operações de invisíveis correntes e de capitais privados liberalizadas entre as províncias ultramarinas e os países estrangeiros participantes na O. C. D. E.;
g) As listas dos bancos comerciais e casas de câmbios autorizados a exercer o comércio de câmbios nos diversos territórios;
h) O Decreto n.º 45 146, de 20 de Julho, que autorizou o Fundo Monetário da Zona do Escudo a emitir 1500 títulos de obrigação, nominativos o do valor nominal de 1 milhar de contos cada um, para realização do seu capital.

Celebrados os contratos entre o Estado e os bancos emissores ultramarinos e o do Estado com o Banco de Portugal, o regime estabelecido pelos citados Decretos-Leis n.ºs 44 698 a 44 703 entrou em execução em Abril, começando, designadamente, a funcionar o sistema de compensação e pagamentos interterritoriais e tendo-se realizado em Agosto a primeira fracção, no valor de 500 milhares de contos, do capital do Fundo Monetário.

42. Quanto à execução dos princípios estabelecidos pelo Decreto-Lei n.º 44 652, de 27 de Outubro de 1962, no qual se programou a acção do Estado «em alguns dos sectores que mais importam ao desenvolvimento global da economia», foi promulgada apenas, até agora, a reorganização do sistema de crédito e da estrutura bancária das províncias ultramarinas, pelo Decreto-Lei n.º 45 296, de 8 de Outubro último. Parece, no entanto, que virão a estabelecer-se, em breve, o novo regime das aplicações de capitais estrangeiros no País e a regulamentação das operações de crédito a médio e longo prazos, cuja importância do ponto de vista do funcionamento dos mercados financeiros poderá ser altamente significativa.
Por último, e no que respeita aos serviços relacionados com a integração e o planeamento económicos nacionais, «devem referir-se as seguintes disposições:

O Decreto n.º 44 944, de 29 de Março, que fixou os quadros do Secretariado Técnico da Presidência do Conselho;
O Decreto-Lei n.º 45 222, de 30 de Agosto, criando a Comissão de Coordenação dos Serviços Provinciais de Planeamento e Integração Económica, destinada a coordenar a acção das comissões previstas no n.º IV da base LXIX da Lei Orgânica do Ultramar;
O Decreto n.º 45 259, de 21 de Setembro, que instituiu em cada província ultramarina comissões técnica de planeamento e integração económica.

§ 3.º

Perspectivas da administração financeira para 1964

43. No parágrafo anterior procurou-se estruturar uma síntese do condicionalismo económico no qual se vai inserir a proposta apresentada. De igual modo se reveste do maior interesse o estudo dos condicionalismos financeiros que precedem a actividade governamental no próximo ano, e daqueles em que irá exercer-se.
Inicia-se essa análise pela evolução que as receitas ordinárias revelam. Após o acréscimo excepcional registado em 1961,. o aumento das receitas ordinárias cifrou-se em 1962 em 5 por cento, percentagem inferior à média do triénio 1958-1960 - 6,6 por cento. O relatório ministerial explica esta atenuação de ritmo de crescimento pelo

Página 2665

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2665

elevado acréscimo verificado no ano anterior e pela quebra na taxa de expansão da matéria colectável. O afrouxamento do ritmo da expansão abrangeu, aliás, todos os capítulos da receita, à excepção dos «Rendimentos de capitais».
Em valor absoluto o aumento atinge, todavia, 543 milhares de contos, sendo a principal contribuição - mais de 300 milhares de contos - dada pelas receitas do domínio privado e pelas indústrias em regime tributário especial, com acréscimos relativos, respectivamente, de 24,4 e 20,5 por cento.
Seguem-se os impostos directos e indirectos, com acréscimos superiores à centena de milhares de contos, mas com taxas de crescimento inferiores à da receita ordinária total. Na tributação directa a elevação das cobranças é devida, na sua quase totalidade, à contribuição industrial (cerca de 130 milhares de contos); e na tributação indirecta, à taxa de salvação nacional (+120 milhares de contos), receitas do selo é estampilhas ( + 113 milhares de contos) e imposto sobre consumos supérfluos ou de luxo (+93 milhares de contos). A registar nos impostos indirectos a regressão dos direitos de importação, com uma redução de 240 milhares de contos, a justificar a necessidade de formas de tributação compensatórias. Tanto os impostos directos como os indirectos viram diminuída a sua posição relativa no conjunto das receitas ordinárias em 1962.
A correcção das séries do produto nacional veio mostrar que o agravamento da carga fiscal foi mais sensível do que indicava a estimativa inserida no relatório do anterior projecto de proposta. Embora se atenuasse a expansão da receita, a quebra do ritmo de crescimento do produto nacional foi, como se previa, ainda mais acentuada, do que resultou novo agravamento da carga fiscal.
No ano corrente a carga fiscal não deve ter sofrido agravamento sensível, mas a manterem-se as necessidades de defesa da Nação, como infelizmente é de prever, e a não querer diminuir-se o auxílio à política de desenvolvimento por forma a perigar o próprio esforço de defesa, é de esperar que não possa ser atenuada a pressão fiscal no próximo exercício financeiro.

QUADRO XVIII

Carga fiscal (a)

[Ver tabela na imagem]

(a) Números revistos do acordo com as alterações das séries do produto nacional apresentadas pelo Instituto Nacional de Estatistica.
(b) Com base na primeira estimativa do produto nacional.

Fonte: quadro XVIII do relatório da proposta.

44. Passando à análise das despesas, verifica-se que a participação das despesas públicas totais na despesa nacional, considerando a correcção das séries desta última, atinge 20,8 por cento em 1961 e ascende a 21,8 por cento em 1962.
O aumento da referida percentagem é devido principalmente às despesas da Conta Geral do Estado que, representando 87 por cento do total, acusam um acréscimo de 10,3 por cento, bastante inferior ao registado em 1961 (38,6 por cento) a ainda ao que se verificou em 1960 (16,3 por cento).
Como se salientou no parecer da Câmara sobre o projecto de proposta de lei para 1963, esta larga participação da despesa pública na despesa nacional, se, por um lado, confere ao Estado a possibilidade de exercer mais ampla influência no nível da actividade económica, por outro lado, traz-lhe novas e maiores responsabilidades.
As exigências da política de defesa da integridade da Nação e a necessidade de acelerar o desenvolvimento económico do País impõem, atentas as interdependências do sector público e do sector privado, um criterioso planeamento da aplicação dos recursos públicos, não só para se obter o seu melhor aproveitamento na satisfação das urgentes e imperiosas necessidades públicas, mas também pelos efeitos sobre a economia privada de um volume já tão apreciável de gastos. Daí que a tarefa de elaboração do orçamento, desde sempre tão melindrosa pela definição dê prioridades que implica, assuma neste momento para o futuro da Nação especial acuidade em consequência das opções básicas que envolve.
No aumento das despesas da Conta Geral do Estado a maior contribuição coube aos serviços de defesa militar e segurança, com uma taxa de expansão de 17,2 por cento, muito, inferior, porém, à de 1961 (60,3 por cento). Enquanto em 1961, do aumento total da despesa, 93 por cento eram devidos aos serviços de defesa e segurança, no ano transacto essa participação desce a menos de 65 por cento. Todavia, o montante atingido por estas despesas afecta necessariamente o ritmo da actividade económica de um país, e só num equilibrado e clarividente aproveitamento de forças, quase ignoradas, da economia portuguesa podemos encontrar explicação para o facto de não se ter sentido mais duramente o esforço que se está levando a efeito.
Nos outros grupos de despesa há a notar um apreciável incremento nas despesas de investimento, em contraposição à contracção que se tinha verificado no ano anterior; nas despesas com o funcionamento dos serviços regista-se também progressão, se bem que mais atenuada.

45. Após as indicações dadas sobre o comportamento das receitas ordinárias e das despesas, pode esboçar-se o quadro da política orçamental em 1962, introduzindo nesta análise os resultados das receitas extraordinárias. Esta observação incidirá igualmente sobre os elementos já disponíveis relativamente à gerência de 1963.
São os seguintes os resultados de 1962, em confronto com os de 1961:

QUADRO XIX

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

(a) Deste total, 496 000 contos respeitam à abertura de um crédito especial, nos termos do Decreto-Lei n.º 44 218, do 2 do Março de 1962, para fazer face a despesas que não chegaram a ser pagas em 1961.
(b) Deste montante, 350 000 contos respeitam à abertura de um crédito especial, nos termos do Decreto-Lei n.º 44 950, do 2 de Abril do 1963, para fazer face a despesas que não chegaram a ser pagas em 1962.

Página 2666

2666 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

Deste balanço da execução orçamental importa salientar que o acréscimo da receita ordinária cobriu o aumento das despesas da mesma natureza e proporcionou ainda um acréscimo do respectivo saldo da ordem dos 250 milhares de contos. Como o incremento da despesa extraordinária se cifrou em 950 milhares de contos, foi necessário acrescer em cerca de 700 milhares de contos a receita extraordinária.
A interpretação destes resultados permite concluir que prosseguiu a política orçamental de procurar financiar os acréscimos das despesas militares com os saldos do orçamento ordinário, mas a flexibilidade dessa política acusa nítida regressão: do aumento da despesa extraordinária só 26 por cento pode ser financiado pelo acréscimo do excedente do orçamento ordinário, quando a correspondente percentagem em 1961 foi de 42 por cento.
E tem de acrescentar-se que o aumento da despesa extraordinária foi muito menor em 1962, pois em 1961 o correspondente acréscimo atingira 2375 milhares de contos.
Esta evolução ajustou-se à previsão feita, com base nos resultados dos primeiros meses da gerência de 1962, no parecer que a Câmara emitiu sobre a Lei de Meios para 1963.

46. Que perspectivas se podem colher da observação da gerência financeira nos primeiros três trimestres do ano corrente?
As receitas ordinárias mantêm-se praticamente ao nível atingido no ano anterior; o acréscimo não atinge 1 por cento. Duas causas avultam na explicação deste comportamento: o atraso na cobrança do imposto complementar e a diminuição dos rendimentos do domínio privado; esta última é derivada das vultosas transferências dos rendimentos das lotarias em 1962 e da diminuição das receitas escrituradas do caminho de ferro da Beira. Os capítulos que apresentam variações positivas mais acentuadas são os impostos indirectos (206 milhares de contos) e as consignações de receitas (108 milhares de contos), este sem significado especial, dada a sua natureza.
Se se quiser corrigir a diferença resultante do atraso da cobrança do imposto complementar, admitindo para este ano a mesma receita que o referido imposto proporcionou no ano transacto, deverá adicionar-se ao montante das receitas ordinárias a verba de 255 milhares de contos, após o que o acréscimo destas receitas subirá a 3,5 por cento, ainda inferior à percentagem de 1962.
Por seu lado, foi mais acentuada a progressão das despesas no período de Janeiro a Setembro. Com efeito, no ano corrente esse acréscimo é de 7,7 por cento, quando no período homólogo do ano anterior fora apenas de 4 por cento.
O esquema que seguidamente se apresenta resume a situação das contas provisórias do Estado, de Janeiro a Setembro, em 1962 e 1963:

QUADRO XX

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

A despesa extraordinária aumenta de mais de 350 milhares de contos, e o saldo do orçamento ordinário, ainda que corrigido do atraso na cobrança do imposto complementar, não pôde até agora fornecer qualquer contribuição para a cobertura desse acréscimo. Acentua-se, portanto, a tendência assinalada na análise das contas de 1962: a possibilidade de utilizar os saldos do orçamento ordinário para cobrir a despesa extraordinária em expansão aproximou-se do seu limite, dentro do quadro tributário vigente.
Os acréscimos de despesa são influenciados pelos gastos com a defesa e segurança, que se elevam em mais de 600 milhares de contos, e pelo aumento de perto de 400 milhares de contos na despesa extraordinária do Ministério das Obras Públicas; em contrapartida, as autorizações de pagamento de despesa extraordinária do Ministério das Finanças sofreram uma redução de cerca de 500 milhares de contos.

47. Para completar o quadro que se vem esboçando importa ainda analisar a evolução das receitas extraordinárias, bem como as perspectivas que se podem antever quanto à mobilização de recursos dessa natureza.
Nos últimos três anos a evolução do produto da colocação de títulos, exceptuados aqueles cujos encargos o Tesouro não suporta, é a seguinte, em milhares de contos:

1960................................ 1 010
1961................................ 1 260
1962................................ 1 307

Por seu lado, a aplicação dos recursos desta natureza na cobertura das despesas extraordinárias no mesmo período é a que se indica seguidamente, também em milhares de contos:

1960................................ 1 129
1961................................ 2 601
1962................................ 1 118

A menor utilização, no último ano, do produto da venda de títulos ou empréstimos é explicada pelo montante das colocações e pelo nível a que chegara, no final de 1961, o respectivo saldo por aplicar. Este saldo subiu de 584 milhares de contos nesse ano para 818 milhares de contos no final de 1962, valor, todavia, muito inferior ao nível médio do triénio 1958-1960, que se cifrava em cerca de 1900 milhares de contos.
Para o prosseguimento da política de desenvolvimento, no sector público, foi possível obter no ano de 1962 apreciável apoio no crédito externo.
Cerca de 1287 milhares de contos de despesa extraordinária foram financiados por empréstimos externos no ano transacto.
Já no final de 1961, mas só utilizado no ano seguinte, foi assinado o acordo relativo à compra de trigo e cevada nos Estados Unidos (Decreto-Lei n.º 44 029, de 15 de Novembro de 1961).
Em 1962 foram emitidas promissórias no valor de 1 104 900 contos de um empréstimo alemão a médio prazo no montante de 150 000 marcos (Decreto-Lei n.º 44 250, de 24 de Março de 1962). Este empréstimo irá sendo convertido num empréstimo a longo prazo, na medida da execução das obras a que se destina esta última operação. Assim, em 16 de Novembro de 1962. nos termos do Decreto-Lei n.º 44 693, foram emitidas já obrigações do Tesouro no montante de 147 300 contos, correspondentes a obras já executadas dentro dos planos aprovados.
No decurso de 1962 foi também contraído um empréstimo junto de vários bancos, americanos, em representação

Página 2667

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2667

do qual foram emitidas promissórias no montante equivalente a 575 600 contos.
Igualmente se celebrou um contrato com o Eximbank para o financiamento das despesas com a construção da ponte sobre o Tejo.
Destes vários empréstimos e descontando aqueles que têm afectação especial, estava por aplicar importância à volta de 900 milhares de contos.
No que se refere a outra fonte de cobertura de receita extraordinária - os saldos dos anos económicos findos -, em 1962 apenas foi aplicada, nos termos do Decreto-Lei n.º 44 218, a verba de 496 milhares de contos para fazer face a despesas que não tinham sido pagas em 1961. O saldo disponível no início deste ano, descontada a importância necessária para satisfação do crédito especial aberto nos termos do Decreto-Lei n.º 44 955, é de 360 milhares de contos.
Relativamente às promissórias do fomento nacional, emitidas nos termos do Decreto-Lei n.º 42 946, o montante da sua emissão no final de 1962 atingia 1336 milhares de contos. Deste total, 750 milhares de contos serviram de cobertura a despesa extraordinária, sendo aplicados em empréstimos para financiar nas províncias ultramarinas empreendimentos incluídos no Plano de Fomento; 500 milhares de contos foram entregues ao Banco de Fomento para aplicações reprodutivas previstas em planos aprovados em Conselho de Ministros; e 86 milhares de contos destinaram-se à substituição parcial das antigas promissórias emitidas pelo Fundo de Fomento Nacional.
Já no decurso deste ano foram colocados títulos do empréstimo de 3 1/2 por cento de 1962 - II Plano de Fomento, no montante de 200 milhares de contos e títulos do empréstimo de 3 1/2 por cento de 1963 - Obrigações do Tesouro, na importância de 500 milhares de contos; foram ainda emitidos certificados especiais de dívida pública no valor de 497 milhares de contos.
No ano corrente foram também emitidas promissórias no montante de 798 milhares de contos, dos quais 500 milhares para a execução do Plano de Fomento e 298 milhares para substituição de promissórias emitidas pelo Fundo de Fomento Nacional.
Relativamente a operações do crédito externo, prosseguiu este ano a utilização dos empréstimos alemão e do Eximbank, este último para o financiamento da ponte sobre o Tejo; com o mesmo fim foi celebrado um contrato com dois bancos franceses no montante de 75 milhares de contos (Decreto n.º 44 936, de 26 de Março de 1963).
A dívida pública, por virtude do maior recurso ao crédito interno e externo, sofreu em 1962 sensível agravamento. A taxa de acréscimo no último ano foi de 21 por cento, no biénio 1960-1961 foi de 8,5 por cento e em 1958-1959 de 3,5 por cento. O seu total (22 600 milhares de contos) corresponde a um terço do rendimento nacional. A subida teria sido ainda mais acentuada se não tivesse sido extinta, por força do novo contrato entre o Estado e o Banco de Portugal, a dívida ao Banco, que ascendia a 980 milhares de contos.
Em 1963, abrangendo as promissórias do fomento nacional, mas excluindo os empréstimos que não representam encargos para o Tesouro (empréstimos para financiamento às províncias de Angola e Moçambique e aos fundos de renovação da marulha mercante. e da pesca), as emissões atingem um pouco menos de 2 milhões de contos. Este total inclui cerca de 205 milhares de contos de promissórias do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento, que não vencem juro.

48. A análise feita nos números anteriores pode resumir-se nos seguintes termos:

a) Tendência para estabilização das receitas ordinárias, pelo que só mediante a contenção do natural acréscimo das despesas ordinárias se poderá manter a contribuição que o saldo do orçamento ordinário vem dando para a satisfação das despesas extraordinárias;
b) Alto nível de despesas extraordinárias, que continuam a crescer, se bem que a ritmo mais moderado;
c) Intensificação do recurso ao crédito interno e externo para fazer face às despesas de fomento.

Não sendo propósito da reforma fiscal o acréscimo de receita, mas antes uma mais justa repartição da carga fiscal, como o acentua uma vez mais o relatório ministerial que acompanha o projecto de proposta, dentro do actual quadro tributário não é de prever modificação da tendência indicada na alínea a).
Embora se possa vislumbrar uma certa melhoria do ambiente internacional relativamente à política ultramarina portuguesa, não devemos esperar ser possível nos tempos mais próximos diminuir por forma apreciável o esforço de defesa e vigilância que nos foi imposto; como, por outro lado, a política de auxílio ao desenvolvimento económico e social não pode atenuar-se sensivelmente, por exigências da própria sustentação daquele esforço e pela necessidade urgente de melhorar o nível de vida da grei, em desfavor no concerto da maioria das nações europeias, do mesmo modo se pode concluir que permanecerá a característica assinalada na alínea b).
Já quanto à alínea c) se não afigura que possa ou deva ultrapassar-se o nível atingido. Dada a situação do mercado financeiro, que se caracterizou na análise da conjuntura económica, não se julga que seja possível intensificar o recurso ao crédito interno, antes poderão surgir dúvidas quanto à manutenção das possibilidades de absorção do mercado ao nível dos dois últimos anos, sem uma acção correctora sobre algumas das causas que estão perturbando o funcionamento do referido mercado.
Quanto ao crédito externo, começou a ser utilizado mais amplamente no ano transacto. Não constitui esta forma de recurso, como se afirmou, «nem cavalo de Tróia nem pedra filosofal». De acordo com as previsões do II Plano de Fomento, o crédito externo permitiu a satisfação de encargos apreciáveis, com despesas de investimento na gerência de 1962 e já na actual. Há que planear a sua mobilização e uso para ordenar os encargos financeiros e cambiais com amortizações e juros. Igualmente se tem de considerar que parte apreciável dos investimentos públicos se situam em sectores de menor reprodutividade, o que, atentas as taxas de juro a que normalmente são obtidos tais empréstimos (o empréstimo alemão constitui excepção), leva naturalmente a maior parcimónia na sua aplicação no financiamento de despesas de fomento do Estado, em comparação com as suas possibilidades de aproveitamento pelos sectores privados de mais alta reprodutividade. O crédito externo vem prestando valioso auxílio no financiamento do desenvolvimento económico, mas no sector público não se julga que devam ultrapassar-se as previsões do II Plano de Fomento, acrescendo-se o ritmo a que vem sendo aproveitado.
Qual o caminho que se abre das conclusões tiradas?

49. Dificilmente se concebe outro que não seja o apontado no projecto de proposta e que se encontra expresso no artigo 3.º e subsidiariamente no artigo 10.º

Página 2668

2668 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

É evidente que um recurso mais intenso à tributação exige ponderada escolha dos sectores de incidência, de modo a evitar-se a afectação do nível de vida das classes de menor rendimento e o desencorajamento de actividades produtoras de bens essenciais. Importa esse caminho sacrifícios, mas a Nação sabe que «atravessamos um momento de dificuldades muito graves, quase ao nível da resistência total da Nação» e tem dado sobejas provas da sua determinação de preservar a integridade nacional.
Pela voz autorizada do Sr. Presidente do Conselho foi afirmado:
As despesas (que somos obrigados a fazer) têm sido cobertas até agora com o excesso das receitas ordinárias, o que é quase um milagre da nossa administração, e ninguém estranharia ou estranhará se tiver de ser de outra forma para o futuro.
Se a uns se pede a vida, a outros não será muito pedir-se-lhes uma parcela da fazenda. E terá de ser assim, se a Nação quiser merecer os primeiros e ser orgulhosa dos segundos.
Definida a linha fundamental da política orçamental tal como a apresenta o projecto de proposta e tomada sobre ela posição pela Câmara, há que examinar a forma adoptada para a sua execução, o que se fará ao analisá-lo na especialidade.

50. Para concluir o exame na generalidade esboça-se o esquema do projecto, como vem sendo habitual nos pareceres da Câmara:

Em matéria de receitas:

Publicados o Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola e o Código da Contribuição Industrial e esperando-se completar a reforma dos impostos directos com a publicação até ao fim do ano corrente da reforma do imposto complementar, que vigorará já a partir de 1 de Janeiro de 1964, o Governo pede autorização para:

a) Promover durante o ano de 1964 a publicação dos diplomas relativos à tributação das mais-valias e à adaptação dos regimes tributários especiais (artigo 4.º), mantendo-se até à entrada em vigor destes diplomas as disposições vigentes (artigo 5.º);
b) Adaptar, de harmonia com as exigências dos superiores interesses nacionais, os recursos às necessidades, com vista a assegurar a integridade territorial do País e a intensificar o desenvolvimento económico das suas diferentes parcelas, podendo, inclusivamente, para ocorrer a encargos de defesa, reforçar rendimentos disponíveis e criar novos recursos (artigo 3.º);
c) Criar um imposto destinado a onerar a propriedade de terrenos para construção situados, em zonas de rápido desenvolvimento regional e, em especial, as consagradas à expansão de turismo (artigo 10.º);
d) Substituir o actual imposto sobre os consumos supérfluos, ou de luxo por um imposto sobre o valor das transacções (artigo 11.º);
c) Manter, dadas as presentes circunstâncias, a cobrança do imposto extraordinário para a defesa e valorização do ultramar (artigo 8.º).

Em matéria de despesas:

1) Prioridade com os encargos da defesa nacional (artigo 14.º).
2) Prosseguimento da política de desenvolvimento económico, atenta a prioridade conferida à defesa da integridade nacional, através da:

a) Execução do Plano de Fomento (artigo 16.º), limitando-se de preferência outros investimentos (artigo 17.º);
b) Continuação, dentro do condicionalismo referido na alínea anterior, de outros planos, com prioridade para a conclusão das obras já em curso nos sectores do fomento económico, saúde pública e assistência, educação e cultura e outros (artigo 18.º); manutenção, no sector da educação, das rubricas «aceleração da formação de pessoal docente universitário» e «intensificação da concessão das bolsas de estudo»; prosseguimento, dentro das possibilidades do Tesouro, dos planos de reapetrechamento das Universidades e escolas (artigo 19.º);
c) Prossecução da política de fomento do bem-estar rural (artigo 23.º).

3) Providências sobre o funcionalismo: continuidade da política de intensificação de construção de habitações para os funcionários públicos e administrativos (artigo 21.º); regulamentação, em breve, do diploma que concede a assistência na doença aos funcionários.
4) Saúde pública e assistência:

a) Manutenção da preferência pelo desenvolvimento do programa de combate à tuberculose e pela promoção da saúde mental (artigo 22.º);
b) Continuação, dentro das possibilidades do Tesouro, da execução dos planos de reapetrechamento dos hospitais (artigo 19.º).

5) Rigorosa administração das despesas, em especial das relativas ao funcionamento dos serviços (artigos 3.º e 25.º).

As medidas indicadas merecem na generalidade a aprovação da Câmara. Ao fazer-se o exame na especialidade se dará conta das observações suscitadas por uma ou outra destas disposições.

II

Exame na especialidade

§ 1.º

Autorização geral

ARTIGO 1.º

51. O artigo 1.º tem a mesma redacção do correspondente artigo da Lei n.º 2117, redacção que se mantém desde 1951.
O preceito, em conformidade com o disposto no artigo 91.º, n.º 4.º, da Constituição, contém a parte fundamental do projecto de proposta de lei de autorização das receitas e despesas. Não necessita o preceito qualquer esclarecimento, tão evidente é a sua justificação. Sobre .ele nada tem a Câmara a observar.

ARTIGO 2.º

52. Reproduz este artigo o correspondente artigo da lei de autorização para 1963. A sua redacção mantém-se desde a proposta de 1951. O artigo não oferece à Câmara qualquer observação.

Página 2669

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2669

§ 2.º

Equilíbrio financeiro

53. Pela terceira vez consecutiva insere o projecto, de proposta de lei este capítulo.

ARTIGO 3.º

54. No parecer da Câmara sobre a Lei de Meios para 1963 houve oportunidade de referir largamente a evolução deste preceito desde o seu aparecimento na Lei de Meios de 1948.
A posição assumida pela Câmara pode resumir-se nestes termos: não se justifica a inclusão na lei, com carácter permanente, desta disposição, pois os poderes, ainda quando especificados, que se solicitam à Assembleia Nacional fazem parte das atribuições normais da administração financeira. Só para ocorrer a situações anormais, e para que a Assembleia Nacional sancione com a sua autoridade uma utilização mais severa dos referidos poderes, se compreende a inclusão do preceito.
E nesta conformidade que a sua inserção na proposta obteve parecer favorável da Câmara nos dois últimos anos.
No projecto deste ano a disposição surge com uma alteração significativa. Até agora, com âmbito mais largo ou mais restrito, os poderes solicitados situaram-se sempre no sector das despesas públicas. No projecto em análise, para além dos poderes em matéria de despesas requeridos nos dois últimos anos, pede-se autorização para proceder à adaptação dos recursos às necessidades, com vista a assegurar a integridade territorial do País e a intensificar o desenvolvimento económico das suas diferentes parcelas, podendo, inclusivamente, para ocorrer a encargos de defesa, reforçar rendimentos disponíveis e criar novos recursos.
Na análise na generalidade evidenciou-se a necessidade de um maior recurso à tributação, dada a evolução das receitas ordinárias e extraordinárias e das despesas extraordinárias, pelo que se torna compreensível a previsão do Governo. Todavia, embora, como o afirmou a Câmara nó seu parecer sobre a Lei de Meios para 1959, o Governo possa legislar sobre matéria tributária por intermédio de decretos-leis, a Câmara tem perfilhado o ponto de vista de que o Governo só deve legislar sobre as aludidas matérias em casos de urgência e necessidade pública.
A disposição proposta especifica que o reforço de rendimentos disponíveis e a criação de novos recursos se fará para ocorrer a encargos de defesa. Deve, pois, aceitar-se que os fins para a satisfação dos quais se admitem novas imposições se integram nos casos previstos. Mas ainda assim, e porque um clima de incerteza não favorece a actividade económica e cerceia as iniciativas, a Câmara teria preferido que o Governo especificasse desde já as medidas que necessita tomar, ainda que sem precisar o grau em que as utilizaria, vindo este a ser determinado pela evolução das necessidades públicas e pelo comportamento das demais fontes de recursos.
Terá de admitir-se, para mais sem conhecimento exacto dos efeitos da reforma fiscal sobre as cobranças, que, numa conjuntura como a que se atravessa, a dificuldade de estimar com precisão a extensão e intensidade das medidas a tomar fosse determinante da solução preferida pelo Governo, e nesse entendimento, e tendo presente a referida conjuntura, julga a Câmara dever dar a sua concordância ao disposto no artigo 3.º do projecto, exprimindo o voto de que o Governo possa, o mais brevemente possível, concretizar as medidas que prevê adoptar, usando no geral os cuidados que em particular teve quanto ao novo imposto previsto no artigo 10.º, para cujo início de aplicação foi dado um prazo de seis meses. Todavia, para marcar devidamente o carácter excepcional da disposição sugere a Câmara que se substitua, no articulado, a expressão «encargos da defesa» por «encargos extraordinários da defesa».

§ 3.º

Política fiscal

ARTIGO 4.º

55. Com a publicação, em 1 de Julho do ano corrente, dos Decretos-Leis n.º 45 103 e n.º 45 104, que aprovaram, respectivamente, o Código da Contribuição Industrial e o Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola, completou-se, praticamente, a reforma dos impostos directos sobre o rendimento. Aguarda-se a publicação, muito em breve, do novo Código do Imposto Complementar, que se anuncia entrará em vigor em 1 de Janeiro de 1964.
Trabalho complexo, delicado e moroso, mas que veio ao encontro de uma necessidade há muito sentida, a nova reforma vai entrar em pleno vigor numa conjuntura anormal, o que justifica a permanência de certas medidas de excepção, dada não só a incerteza quanto aos seus efeitos, mas também o elevado nível de despesas cuja satisfação se impõe ao País.
No parecer sobre o projecto de proposta de Lei de Meios para o ano em curso, a Câmara teve ocasião de fazer algumas considerações sobre os dois diplomas já então publicados (Códigos do Imposto Profissional e do Imposto de Capitais) e sobre os códigos cuja publicação se fez este ano (Contribuição Industrial e Contribuição Predial e Imposto sobre a Indústria Agrícola), pelo que se limita a um breve comentário sobre a sua aplicação.

56. A receita cobrada através do imposto de capitais, de Janeiro a Setembro deste ano, foi de 240 milhares de contos, correspondendo a um aumento inferior a 4 milhares de contos em relação ao período homólogo do ano anterior, o que na verdade comprova a ausência da «mentalidade fiscalista», de que fala o relatório que acompanha o projecto de proposta. Nele se cita, como um dos exemplos de imparcialidade da aplicação do novo código, a não consideração como «outros abonos» (nos termos do n.º 5.º do artigo 6.º - juros de suprimentos ou de outros abonos feitos pelos sócios às sociedades) das prestações suplementares de capital a que se refere a Lei de 11 de Abril de 1901, quando obedeçam ao condicionalismo nela previsto, em especial no seu artigo 17.º Outro exemplo poderá ser colhido na aplicação efectiva que vem sendo dada à possibilidade de redução de taxa do imposto ao abrigo da alínea c) do artigo 22.º, benefício de que já usufruíram algumas empresas de manifesto interesse para a economia nacional.
Como se referiu, deixaram de estar abrangidas por este imposto as incorporações de fundos de reserva no capital de sociedades anónimas, por quotas ou em comandita por acções, e as emissões de títulos com reserva de preferência para os accionistas ou quotistas, que proporcionaram nos últimos anos uma receita fiscal média da ordem dos 10 milhares de contos. Prevê-se a tributação destas situações no imposto sobre as mais-valias, se bem que em condições menos onerosas. Entretanto, ao longo deste ano, na vigência do novo código o valor dos fundos de reserva incorporados atingiu 169 800 contos e a emissão de títulos com reserva de preferência para os accionistas 75 milhares de contos, o que no anterior regime teria produzido apreciável receita.

Página 2670

2670 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

57. A alteração introduzida pelo novo Código do Imposto Profissional, pelo qual este imposto passa a respeitar ao ano em que é obtido e não como anteriormente ao ano em que é cobrado, dificulta o confronto das cobranças. Com efeito, a liquidação passa a fazer-se no ano seguinte ao da produção do rendimento ou até no próprio ano, e não no anterior, como se verificava na vigência da legislação precedente. Deste modo, os rendimentos que serviram de base à colecta deste ano foram os auferidos em 1962, deduzidos no que respeita às profissões liberais do imposto, liquidado aos contribuintes pelo exercício da sua actividade nesse mesmo ano. Até final de Setembro as cobranças deste imposto totalizaram 149 500 contos, menos 14 500 contos do que no mesmo período de 1962.
Foi na aplicação deste imposto às profissões liberais que se suscitaram algumas reacções. Efectivamente, foram estas profissões as que mais sentiram o agravamento desta forma de tributação, tanto mais sensível quanto é certo se encontravam em numerosos casos em posição de relativo favor quanto à tributação dos empregados por conta de outrem. A consideração dos efeitos no imposto complementar do agravamento do imposto profissional também deverá ter influenciado as observações que foram formuladas.
O relatório ministerial apresenta larga cópia de elementos tendentes a demonstrar os princípios de justiça relativa que presidiram à reestruturação deste imposto.
No quadro XXVII do relatório faz-se a comparação, para os vários tipos de impostos parcelares, das sujeições tributárias "dos mesmos rendimentos conforme provenham do trabalho, da propriedade, da simples aplicação de capital, ou de comércio ou indústria. Reelaborou-se este quadro numa forma indiciaria com base na contribuição predial rústica, a de mais baixo nível, excluído o imposto profissional (como a taxa daquela contribuição é de 10 por cento, corresponde a multiplicar por 10 a taxa das várias imposições). Julga-se que esta forma de apresentação dá maior relevo ao confronto que se pretende estabelecer no referido quadro do relatório.

QUADRO XXI

[Ver tabela na imagem]

Dos 9556 profissionais tributados pelo rendimento do exercício por conta própria de actividades abrangidas pelo código, reclamaram contra o rendimento fixado 1693 contribuintes, dos quais foram atendidos pelas comissões distritais 1495, sendo desatendidos 198, cerca de 2 por cento.
Deve referir-se por último que, reconhecida a impossibilidade de entrada em vigor no corrente ano do novo Código do Imposto Complementar, foi publicado em 8 de Julho deste ano. o Decreto-Lei n.º 45 117, com as regras a adoptar no englobamento dos rendimentos para liquidação do imposto complementar, onde, para obviar a agravamentos muito sensíveis, se deu tratamento especial aos rendimentos dos contribuintes que exerciam por conta própria actividades constantes da tabela anexa ao código. Para estes considerou-se como matéria colectável apenas 50 por cento do rendimento tributado; para os empregados por conta de outrem e assalariados, o rendimento que serviu de base à colecta de 1962, acrescido das gratificações, percentagens e abonos percebidos no referido ano e para as actividades que em 1962 foram tributadas em imposto profissional (profissões liberais) e que a partir de 1 de Janeiro de 1963 passaram a ser consideradas como exercidas por conta de outrem, a importância correspondente a quinze vezes a verba principal do imposto profissional liquidado naquele ano.

58. A inovação mais saliente do novo Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola foi, como se referiu, a autonomização do imposto agrícola.
Uma das questões básicas que também mereceu a melhor atenção no Decreto-Lei n.º 46 104, que aprovou o novo código, foi a determinação da matéria colectável.
No que respeita à contribuição predial rústica, a base reconhecidamente mais perfeita é o cadastro geométrico. Mas, dado que a avaliação cadastral cuida da determinação da parte do produto atribuído à terra e seus melhoramentos, desinteressando-se normalmente da exploração, havia que aperfeiçoar e adaptar a legislação cadastral. Impunha-se, entretanto, o estabelecimento de um regime transitório, dada a grande desactualização da maioria dos rendimentos das matrizes rústicas. As correcções dos seus rendimentos que se têm operado, feitas com critérios de aplicação geral, mais têm contribuído para agravar as disparidades existentes. Foi este facto que levou a estabelecer no referido Decreto-Lei n.º 45 104 a correcção dos rendimentos inscritos nas matrizes prediais rústicas dos concelhos onde ainda não vigore o cadastro geométrico.
Adoptou-se, por evidentes razões de ordem prática, o critério de limitar as avaliações a certo número de unidades consideradas como prédios-tipo. O rendimento obtido para essas unidades, confrontado com o respectivo rendimento matricial, determinava factores médios que seriam aplicáveis aos prédios que revestissem as mesmas características. Os resultados assim obtidos foram publicados no Diário do Governo em 26 de Setembro deste ano.
Na contribuição predial urbana para os prédios arrendados adoptou-se o rendimento real, declarado pelo contribuinte, prevendo-se a tributação dos sublocatários quando recebam renda superior à que pagam aos senhorios. Para os prédios não arrendados, manteve-se como base da tributação o rendimento estimado, sujeito a actualizações periódicas. Também aqui se impunha a actualização das matrizes, a que se procedeu em. termos semelhantes aos que se utilizaram na correcção das matrizes prediais rústicas. Os factores de correcção determinados foram publicados no mesmo despacho em 26 de Setembro último.
Das correcções nas matrizes prediais rústicas e urbanas de prédios não arrendados poderão os contribuintes recla-

Página 2671

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2671

mar, com os fundamentos previstos no artigo 269.º do código, no prazo de 30 dias a contar da data que for anunciada por editais a publicar após a conclusão das operações de correcção. Posteriormente será anunciada, no Diário do Governo, a data a partir da qual as matrizes revistas começarão a ser utilizadas para efeitos fiscais.
Tanto a taxa da contribuição predial rústica, como a do imposto agrícola, ambas de 10 por cento, foram reduzidas a 8 por cento nos três primeiros anos de aplicação do novo código. Durante o mesmo período é reduzida de 12 para 11 por cento a taxa da contribuição predial urbana.

59. A orientação de tributar os rendimentos reais que presidiu à reforma fiscal está bem presente no novo Código da Contribuição Industrial, embora as dificuldades de ordem prática limitem ainda a aplicação generalizada desse princípio. Assim, só as empresas de maior dimensão incluídas no grupo À são tributadas com base no rendimento real, sendo usado para as empresas médias
- grupo B - o rendimento presumido, e para os pequenos contribuintes - grupo C - o rendimento normal.
Alargou-se o âmbito do imposto, que passou a abranger também o exercício acidental de qualquer actividade de natureza comercial ou industrial.
De acordo com o critério de sujeitar a imposto profissional sómente as profissões liberais e outras a elas assimiláveis, considerou-se sujeito a contribuição industrial o exercício por conta própria de actividades não sujeitas a imposto profissional.
Atendendo a que nas sociedades comerciais e civis sob forma comercial o seu objecto é o lucro, sujeitam-se a contribuição industrial todos os seus rendimentos, qualquer que seja a sua proveniência, assim se evitando a diversidade de tributações.
Foi fixada em 15 por cento a taxa deste imposto, mas a incerteza sobre o produto da sua aplicação nos novos moldes levou a atribuir ao Governo, por intermédio do Ministério das Finanças, autorização para elevar essa taxa a 20 por cento no ano de 1964 (artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 45103).

60. Sobre a nova estruturação do imposto complementar colhem-se já algumas informações no relatório do projecto.
Tende, o imposto remodelado, a incidir sobre o rendimento global das pessoas singulares e das pessoas colectivas. O imposto recairá, deste modo, sobre rendimentos não sujeitos a impostos parcelares, mas que são parte do rendimento total percebido. De acordo com esta orientação, ficam sujeitos ao imposto complementar os vencimentos dos funcionários. Se esta posição é inteiramente compreensível do ponto de vista teórico, não se pode ignorar a realidade que é o nível relativamente baixo dos vencimentos dos funcionários públicos. Por isso a Câmara não pode deixar de congratular-se com a suspensão desta medida até a revisão das remunerações da função pública, embora por virtude da elevação dos limites de isenção e das baixas taxas de escalões iniciais se deva concluir não serem muitos os que, vivendo apenas da função pública, venham a ficar sujeitos ao imposto.
Dentro do mesmo critério de englobamento de todos os rendimentos, passam a ser objecto de tributação os juros das obrigações, mas, para obviar aos inconvenientes que certamente se fariam sentir no mercado desses títulos, reduz-se a taxa do imposto de capitais que incide sobre estes rendimentos de 15 para 8 por cento.
Em certas circunstâncias serão atribuídos ao chefe de família certos rendimentos dos seus familiares mais íntimos; em contrapartida, e como se impunha, nos limites de isenção dá-se a devida consideração à família. E cabe uma anotação especial a este facto, porque nem sempre se tem dado a aplicação ampla que se justificaria ao n.º 3.º do artigo 14.º da Constituição Política.
A taxa inicial do novo imposto para os primeiros 50 contos de rendimento colectável será de 3 por cento, aumentando 1 por cento por cada escalão de igual montante, até 1200 contos, e por cada escalão de 100 contos para rendimentos colectáveis entre 1200 e 3000 contos, sendo a taxa máxima de 45 por cento e o limite do escalão final 3000 contos. Como é normal neste tipo de tributação, e já se verificava na legislação anterior, é um imposto de taxa progressiva (de progressividade atenuada a partir de 1200 contos de rendimento colectável).
Outra inovação consiste na supressão, quando se verifique a acumulação de cargos ou funções, do adicionamento actualmente em vigor incidindo sobre os rendimentos do trabalho superiores a 120 contos. A finalidade que se pretendia atingir não pode ser objecto de discussão, mas a utilização do imposto complementar para esse fim gerava, em relação à acumulação de rendimentos de outras proveniências, que não o trabalho, uma situação díspar.
No que respeita às sociedades, o imposto complementar visará a integração de lacunas na tributação pessoal dos sócios, designadamente as que resultem da não distribuição de lucros e da tributação das mais-valias; no que se refere às outras pessoas colectivas, visa a substituição do imposto sobre doações e sucessões do artigo 35.º do Código Civil, cuja manutenção se reconheceu não poder subsistir. É esta segunda alteração que permite a eliminação da proposta da disposição constante do artigo 10.º da Lei n.º 2117, em vigor no corrente ano.
As taxas para as sociedades serão, atenta a necessidade de não desfavorecer os investimentos, de 4 por cento sobre rendimentos até 100 contos; de 5, 6 e 7 por cento para a fracção do rendimento, respectivamente, entre 100 e 1000 contos, entre 1000 e 2500 contos e entre 2500 e 5000 contos; e de 8 por cento sobre a fracção do rendimento para além de 5000 contos. Para as outras pessoas colectivas as taxas indicadas são reduzidas a metade.
Mantém-se em 20 por cento a taxa sobre os rendimentos dos títulos nacionais não registados e prevê-se, verificadas certas condições, o agravamento de taxas para as denominadas sociedades de simples administração.
O novo código deverá começar a vigorar em 1 de Janeiro próximo.

61. O artigo 4.º da proposta prevê a publicação no próximo ano dos diplomas relativos à tributação das mais-valias e à adaptação dos regimes tributários especiais. Sobre a imposição das mais-valias já a Câmara teve oportunidade de fazer alguns comentários nos dois precedentes pareceres sobre a Lei de Meios.

62. Deve anotar-se ainda, noutro plano, a publicação, em 1963, de dois diplomas sobre a organização dos serviços de justiça fiscal e o processo das contribuições e impostos, separando-se o que constitui matéria orgânica dos serviços a que cabe a acção de defesa dos contribuintes, do que respeita à forma de processo e ao exercício da referida acção.
A preocupação do reforço das garantias do contribuinte, característica de toda a nova legislação fiscal, e a justiça a obter pela observância do princípio da legalidade, determinaram o correspondente reforço das garantias do outro sujeito da relação fiscal, o Estado, motivo que levou à

Página 2672

2672 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

reorganização do Ministério Público das contribuições e impostos.
Regista-se ainda o agrupamento de toda a matéria de. natureza formal relativa à realização do direito tributário não específica de cada um dos impostos, explicado no relatório do projecto de proposta, pelo desejo de integração na orientação da moderna técnica jurídica em matéria de leis de processo.

63. Foi também publicado, em 29 de Junho de 1963, o Decreto-Lei n.º 45 095, que reformou a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, na qual se procedeu a uma revisão e renovação de toda a estrutura dos serviços de administração fiscal e dos meios para a realização dos fins que lhe estão cometidos.
De assinalar, pela inovação que representa, a oficialização do Centro de Estudos Fiscais, ao qual passa a incumbir:

a) Realizar estudos, pesquisas, inquéritos e trabalhos necessários ao progresso e eficiência dos serviços das contribuições e impostos;
b) Preparar programas e elementos de estudo e organizar estágios, cursos ou sessões de estudo para aperfeiçoamento do respectivo funcionalismo;
c) Organizar um serviço de documentação e consulta dos elementos relativos ao progresso da ciência e da técnica fiscal;
d) Preparar e publicar os elementos ou órgãos de divulgação que lhe sejam afectos;
e) Organizar e fomentar a associação de todas as pessoas e entidades interessadas no conhecimento e progresso da ciência e técnica fiscal;
f) Promover e fomentar a formação e o esclarecimento da consciência cívica em matéria tributária, numa base de justiça e solidariedade.

ARTIGO 5.º

64. Difere este artigo da correspondente disposição da anterior proposta pela supressão do advérbio «plenamente» usado em relação à entrada em vigor de novos diplomas. Igualmente foi retirada a parte final do preceito que estabelecia a possível retroactividade dos diplomas a promulgar: «considerando-se, todavia, provisórias as respectivas liquidações e susceptíveis de rectificação em harmonia com o que neles for estabelecido». Esta parte da disposição proposta não constava já da Lei n.º 2117.
A Câmara dá a sua aprovação ao preceito com a sua actual redacção.

ARTIGO 6.º

65. O extenso e complexo artigo das anteriores leis de meios, que inseria disposições de carácter transitório para vigorarem na maior parte sómente até à entrada em vigor da reforma tributária, desapareceu praticamente com a publicação dos novos códigos, para benefício da clareza e mais fácil compreensão do capítulo da lei sobre política fiscal.
Como se referiu, as taxas da contribuição predial rústica de 10 por cento e da contribuição predial urbana de 12 por cento são, nos termos do § único do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 45 104, reduzidas respectivamente a 8 e 11 por cento nos lançamentos a efectuar para a cobrança em 1964, 1965 e 1966. No corpo do referido artigo 15.º estabelece-se que «só a partir do primeiro lançamento nos termos do código deixará de cobrar-se, na parte respeitante à contribuição predial, a taxa de compensação criada pelo artigo 10.º da Lei n.º 2022, de 22 de Maio de 1947, a qual será havida para todos os efeitos como incorporada nas novas taxas daquela contribuição». Quer dizer: durante o período transitório de redução de taxas é aplicada a taxa de compensação, abrangendo os próprios prédios cadastrados com base em tarifas desactualizadas de 1936 e 1940. Só continuam isentos da taxa de compensação, nos termos do § único da disposição em análise, os rendimentos dos prédios rústicos inscritos em matrizes cadastrais que tenham entrado em vigor a partir de 1 de Janeiro de 1958. Anteriormente ao novo código, nos termos do artigo 6.º, § único, da Lei n.º 2117, estavam isentos de taxas de compensação os rendimentos de todos os prédios rústicos inscritos nas matrizes cadastrais qualquer que fosse a taxa da contribuição predial que lhes correspondesse. A Câmara nada tem a opor a este artigo.

ARTIGO 7.º

66. Enquanto a reorganização das matrizes rústicas, e urbanas não produzir efeitos fiscais, o Governo, como de há muito vem sendo hábito, entende manter sujeito ao regime estabelecido no corpo do artigo 6.º e § 2.º do mesmo artigo da Lei n.º 2038 o valor dos prédios rústicos e urbanos para efeitos de liquidação de sisa e do imposto sobre as sucessões e doações.
Como se referiu, foram já publicados, no Diário do Governo, 1.ª série, de 26 de Setembro último, os factores para correcção dos rendimentos inscritos nas matrizes prediais urbanas e rústicas. Está a proceder-se às respectivas operações de correcção; a sua conclusão será anunciada por edital, a partir de cuja data os contribuintes poderão reclamar, com os fundamentos especificados no artigo 269.º do código, no prazo de 30 dias. Só posteriormente será anunciado no Diário do Governo a data a partir da qual as matrizes rústicas e urbanas, assim reorganizadas, começarão a ser utilizadas para efeito fiscal, momento em que deixará de ter aplicação o proposto artigo 7.º "Ë isto o que se prevê no seu § único.
A disposição corresponde à alínea d) do artigo 6.º da Lei n.º 2117.

ARTIGO 8.º

67. A redacção deste preceito apresenta, em relação ao artigo 8.º da Lei n.º 2117, as seguintes diferenças:

a) Ficarão abrangidas pelo imposto, na redacção proposta, «as pessoas singulares ou colectivas que exerçam actividades de natureza comercial ou industrial em regime de concessão de serviço público ou de exclusivo e, bem assim, outras actividades da mesma natureza a definir pelo Governo, desde que beneficiem de qualquer privilégio ou de situação excepcional do mercado»; na Lei n.º 2117 o imposto incidia apenas sobre as sociedades ou empresas nas mesmas condições;
b) Supressão no § 1.º da expressão «das sociedades ou empresas a que se refere este artigo «a fim de o adaptar à alteração introduzida no corpo do artigo;
c) Exclusão da isenção dos contribuintes a que se refere o n.º 6.º do artigo 29.º do Decreto n.º 16 731, de 13 de Abril de 1929, e das empresas que (nos anos de 1962 ou 1963) tenham sofrido agravamento superior a 100 por cento na contribuição industrial por virtude de alteração das taxas;

Página 2673

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2673

d) Eliminação do § 4.º, no qual se estabelecia que o imposto a liquidar não poderia ser inferior a metade da verba principal da contribuição industrial (do ano de 1963) e, quanto às sociedades ou empresas isentas desta contribuição, a metade da importância da verba principal que lhes competiria não havendo isenção.

A alteração na alínea a) relaciona-se com dúvidas de interpretação do termo «empresas» que com a nova redacção ficam sanadas. Para maior clareza de redacção propõe a Câmara que se intercale a expressão «as que exercem» antes de «outras actividades da mesma natureza».
Suprimiu-se a isenção dos contribuintes de que trata o artigo 6.º do Decreto n.º 16 731, por se considerar que este preceito está tacitamente revogado pelo Código da Contribuição Industrial, e que neste código a exploração agrícola já vem excluída do conceito de actividade comercial ou industrial expresso no § único do seu artigo 1.º A outra supressão de isenção explica-se por se reconhecer que a situação contemplada já não se verifica depois da entrada em vigor do Código da Contribuição Industrial e por virtude da aplicação do disposto no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 45 103, que estabelece:

O código começará a vigorar em todo o continente e ilhas adjacentes decorridos 30 dias sobre a data deste diploma, mas a contribuição industrial paga ou que deva ser cobrada em 1963 nos termos da legislação actualmente em vigor reger-se-á pela mesma legislação, excepto quanto aos contribuintes que no ano de 1962 tenham sofrido, por efeito de aumento de taxas, em relação ao ano anterior, um agravamento superior a 100 por cento, cujas colectas do ano corrente deverão ser corrigidas nos termos do código.

O mínimo a que se referia o § 4.º, agora eliminado, justificava-se quando a tributação da contribuição industrial assentava em rendimentos normais, mas na vigência do código passa a existir coincidência na determinação da matéria colectável da contribuição industrial e do imposto extraordinário de defesa e valorização do ultramar.

ARTIGO 9.º

68. O projecto de proposta sugere a manutenção em vigor dos adicionais discriminados nos n.ºs 1.º e 3.º do artigo 6.º do Decreto n.º 35 423, de 29 de Dezembro de 1945.
No n.º 3.º do citado artigo estabelece-se um adicional de 25 por cento à taxa do imposto único sobre espectáculos de cinema que é de 7 por cento sobre dois terços da lotação oficial da sala; no n.º 6.º fixa-se um adicional de 10 por cento à taxa de 3,5 por cento que incide sobre uma percentagem da lotação, decrescente com esta.
A redacção deste preceito difere do artigo 9.º da Lei n.º 2117, por estabelecer a sua vigência «até à adopção dos regimes tributários especiais previstos no artigo 4.º».
A Câmara dá a sua concordância à disposição, esperando que na referida revisão dos regimes tributários especiais será dada devida ponderação às dificuldades com que se debatem as empresas exploradoras de espectáculos públicos.

ARTIGO 10.º

69. Vem o Governo nesta disposição pedir autorização para instituir e cobrar, já em 1964, um imposto destinado a onerar a propriedade de terrenos para construção situados em zonas de rápido desenvolvimento regional e, em especial, nas consagradas à expansão do turismo.
É de 8 por cento a taxa para o novo imposto que incidirá sobre o valor dos terrenos, determinado por avaliação nas datas em que for devido, sendo calculado de dois em dois anos pelo método de liquidação da sisa, imposto cujo código servirá de paradigma à nova tributação. Do novo imposto seriam apenas isentos: o Estado e qualquer dos seus serviços, estabelecimentos e organismos, ainda que personalizados, compreendida a Misericórdia de Lisboa e os órgãos de coordenação da assistência; as autarquias locais e as suas uniões e federações; as pessoas, colectivas de utilidade pública administrativa, nos termos do artigo 10.º do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola; outras entidades ou pessoas declaradas de utilidade pública nos termos do n.º 4 do artigo 7.º do mencionado Código da Contribuição Predial, e os Estados estrangeiros, nos termos e para os fins referidos no n.º 11 do artigo 7.º do citado código.
O imposto cuja criação se propõe tem por objectivo impedir que a propriedade ociosa de terrenos para construção, com finalidade puramente especulativa, contribua para entravar o desenvolvimento de certas regiões do País.
É compreensível esta preocupação do Governo, embora o novo imposto possa suscitar alguns problemas na sua aplicação prática. Entre estes deve referir-se o da fixação do critério para a definição de «zonas de rápido desenvolvimento regional», embora a redacção do artigo inculque que se pretende abranger fundamentalmente as zonas consagradas à expansão do turismo.
Na tributação das mais-valias atinge-se a especulação no momento da venda; com o novo imposto pretende-se atingi-la quando ela se exerce a largo prazo mediante o protelamento da venda. É compreensível também que o Estado procure obviar aos inconvenientes que resultam do desvio de disponibilidades para fins estranhos ao desenvolvimento regional.
Nem sempre têm sido as melhores, para o próprio turismo, as condições em que se tem processado o desenvolvimento de muitas das nossas zonas turísticas. O interesse que o turismo assume para a nossa economia em geral e, em particular, a contribuição que pode dar para o equilíbrio da balança de pagamentos, sujeita às inevitáveis pressões decorrentes da política de desenvolvimento económico, leva a Câmara a desejar que as medidas agora tomadas no campo fiscal se integrem em plano mais vasto que defina, na totalidade dos seus aspectos, uma política de valorização turística de que o País tanto carece. A Câmara está certa de que o novo imposto não deixará de atender a situações especiais, como aquelas que decorrem da impossibilidade de construção por inexistência de planos urbanísticos já aprovados, excluindo essas zonas de sujeição ao imposto ou isentando os proprietários nessa situação.
Uma outra observação respeita às entidades que ficarão isentas deste imposto. Atentos os fins sociais que prosseguem as instituições de previdência, e a política de fomento da habitação, em que se encontram empenhadas, no sentido de contribuir para resolver o problema da habitação dos agregados de mais fracos recursos económicos, parece justificado que essas instituições sejam abrangidas pela isenção. Estas instituições estão já isentas de contribuição predial, nos termos dos n.ºs 6.º e 7.º do artigo 7.º do Código da Contribuição Predial. Propunha-se a junção dos dois referidos números aos indicados no § 2.º da disposição proposta, alargando-se assim a isenção às instituições de previdência.
Por último, para assegurar o estabelecimento de um critério uniforme na definição das «zonas de rápido desenvolvimento regional» e das «consagradas à expansão

Página 2674

2674 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

do turismo», propõe-se que a definição dessas zonas se faça por lei. Daí a alteração de redacção no corpo deste artigo que a Câmara propõe nas conclusões do parecer. A Câmara, confiando em que o imposto será estruturado tendo em atenção as situações referidas, dá a sua concordância à disposição proposta, com as alterações sugeridas.

ARTIGO 11.º

70. A redacção deste artigo é idêntica à do artigo 11.º da Lei n.º 2117. A diferença em relação à proposta da Lei de Meios do último ano reside no aditamento da especificação da isenção para artigos escolares e medicamentos.
Não foi possível em 1963 promover a substituição do actual imposto sobre os consumos supérfluos ou de luxo por um imposto sobre o valor das transacções, não só pela compreensível morosidade dos estudos para a estruturação do novo imposto, como também pela necessidade de estabelecer a sua coordenação com a reforma dos impostos directos. Tratando-se de um imposto inteiramente novo entre nós, é natural que a sua elaboração mereça especiais cuidados e que num ou noutro ponto haja hesitações, quanto aos critérios técnicos a estabelecer na nova tributação. O relatório que acompanha o projecto refere, contudo, que se espera, possa ser posto em vigor nos começos de 1964 o diploma pelo qual será regulada a liquidação e cobrança do imposto de transacções.
No relatório da proposta de lei para 1963 referiram-se largamente as razões que determinavam a criação deste imposto e os princípios fundamentais que iriam presidir à sua estruturação. Sobre uns e outros teve a Câmara oportunidade, no respectivo parecer, de fazer alguns comentários. Entre os motivos da nova tributação contam-se: a conveniência em proporcionar maior harmonia do sistema tributário português, introduzindo-lhe um elemento de estabilização das receitas não desencorajador das poupanças; a urgência do ajustamento da tributação às transformações resultantes da adesão do País à Associação Europeia de Comércio Livre; a necessidade de intensificar o desenvolvimento e valorização económica do País, e, nas presentes circunstâncias, a imprescindibilidade de assegurar a defesa nacional, designadamente nas províncias ultramarinas.
A Câmara referiu, também, no aludido parecer, alguns aspectos das características do novo imposto sobre transacções, tais como a correcção em obediência ao intuito de personalização da regressividade deste tipo de imposto pela diferenciação de taxas; o ponto de incidência, e eventuais translações.
No aspecto da incidência da nova tributação esclarece o relatório ministerial que acompanha o projecto em apreciação que o imposto recairá apenas no valor das transacções e das operações comerciais a elas assimiladas, ficando portanto excluídas prestações de serviços usualmente abrangidas por este tipo de imposto, por se entender que a tributação dessas prestações requer mais demorado estudo.

ARTIGO 12.º

71. Este artigo corresponde, sem alteração de redacção, ao artigo 13.º da Lei n.º 2117.
Completada a reforma fiscal e publicadas as disposições gerais sobre a integração do espaço económico português, espera-se que em 1964 se possa ir dando cumprimento ao que, sobre dupla tributação e evasão fiscal entre as várias parcelas do território nacional, se dispõe neste artigo.
Quanto à matéria do § único relativa à dupla tributação internacional, o relatório ministerial relata a participação activa que o nosso país tem dado, no âmbito da O. C. D. E., aos trabalhos sobre esta matéria e informa que o comité fiscal daquela organização elaborou um projecto de modelo de convenção para servir como norma geral de harmonização dos tratados bilaterais e de base futura de uma convenção geral a assinar entre todos os Estados membros.
Estão em curso trabalhos preparatórios para uma acção tendente à celebração, em breve, de acordos sobre dupla tributação, em matéria de impostos directos sobre o rendimento e ganhos em capital, com todos os países membros da O. C. D. E. e com alguns estranhos a esta organização.
Sendo difícil um confronto simultâneo do sistema tributário português com o de todos aqueles países, intensificaram-se, por agora, as conversações com vista à realização de acordos gerais com os Estados Unidos, Inglaterra, República Federal Alemã e Suíça.
A Câmara nada tem a observar à disposição proposta.

ARTIGO 13.º

72. Esta disposição tem a mesma redacção do projecto da Lei de Meios para 1963 e da Lei n.º 2117.
De há longos anos consta o preceito das leis de autorização de receitas e despesas e a Câmara espera que após a conclusão dos trabalhos da reforma fiscal seja eliminada a disposição.

§ 4.º

Defesa nacional

ARTIGO 14.º

73. A redacção desta disposição é análoga à do correspondente artigo da Lei n.º 2117.
A persistência das condições que determinaram a inserção deste preceito justifica a sua permanência no projecto. Sobre os reflexos das despesas que nos são impostas, a Câmara permite-se transcrever palavras proferidas por voz autorizada: «A lástima é que tão grandes somas não sejam despendidas em benefícios materiais e de cultura para as populações, em vez de serem só destinadas a garantir a segurança e a paz em que viviam e as circunstâncias tentam agora roubar».
O volume atingido pelas despesas com a defesa não podia deixar de afectar, como se referiu, o esforço de desenvolvimento económico e social. Todavia, no ano findo, devido em parte ao recurso mais intensivo ao crédito externo, a situação pode apresentar alguns sintomas de melhorias. Dada a menor participação das despesas de defesa e segurança no acréscimo de gastos em 1962, as despesas de investimento dos serviços de administração civil, que em 1961 tinham sofrido uma contracção, puderam beneficiar no ano findo de um acréscimo de 336 500 contos, o que corresponde a uma taxa de expansão de 8,7 por cento.
O aumento registou-se na sua quase totalidade nos investimentos com fim económico. Do acréscimo de 727 800 contos nos oito primeiros meses de 1963 cabem às despesas de defesa e segurança 585 400 contos, acusando as despesas de investimento de novo regressão: 129 200 contos. E de esperar, todavia, tal como se verificou no ano transacto, que o último quadrimestre permita recuperar essa diferença.
Não deve ser ainda tão ampla quanto seria de desejar a compensação obtida pela economia nacional através das despesas militares e por isso a Câmara acolhe com satisfação as afirmações do relatório ministerial de esperança de que de futuro seja possível operar, por meios adequados

Página 2675

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2675

que venham a ser adoptados, uma crescente participação da actividade económica nacional no esforço de defesa.
A Câmara mantém a posição que há dois anos assumiu relativamente a esta disposição.

ARTIGO 15.º

74. Dado o elevado volume de encargos com os compromissos internacionais de carácter militar a que houve de ocorrer em 1963, num total de 280 184 contos, o saldo do limite máximo autorizado pela Lei n.º 2111, de 21 de Dezembro de 1961, estima-se em 96 735 contos.
Estando prevista a inscrição no Orçamento Geral do Estado para 1964 de uma verba de 260 milhares de contos, montante igual ao inscrito inicialmente no orçamento em vigor, torna-se necessário elevar o- actual limite de 4300 milhares de contos. O aumento proposto é de 200 milhares de contos, valor no qual se tem também em consideração o entendimento, perfilhado pela Câmara, de que a defesa do mundo ocidental não pode conceber-se numa acepção limitada, de acordo com um critério geográfico estrito. Nenhuma outra observação especial merece o artigo.

§ 5.º

Investimentos públicos

ARTIGO 16.º

75. A redacção deste artigo é análoga à da correspondente disposição da Lei n.º 2117.
No parágrafo onde se esboçam as perspectivas da administração financeira para 1964 foi já analisado o esforço que vem sendo realizado para assegurar a compatibilidade entre o elevado nível atingido pelas despesas militares e o prosseguimento da política de desenvolvimento.
Os resultados da execução do II Plano de Fomento, relativos ao 1.º semestre, mostram, como se referiu nos comentários sobre a conjuntura económica, um atraso nos respectivos financiamentos em relação ao período correspondente do ano anterior. Com efeito, enquanto no 1.º semestre de 1962 os financiamentos atingiam 30,8 por cento das previsões anuais, no 1.º semestre deste ano a percentagem é de 19,3 (a percentagem das importâncias dispendidas é de 26,7). Deve assinalar-se que as fontes públicas de financiamento ocorreram a 84 por cento dos financiamentos realizados, quando se estimara em 63 por cento a sua comparticipação no valor global.
Ao Orçamento Geral do Estado coube cerca de 45 por cento dos financiamentos; a percentagem em relação à previsão é de 22,7, superior à média geral. O Banco de Fomento Nacional, os bancos comerciais e entidades particulares e as caixas económicas, no seu conjunto, apenas tinham financiado 88 milhares de coritos no total previsto de 1162 milhares de contos, isto é, menos de 8 por cento, o que de certo modo reflecte a situação do mercado financeiro, não obstante o valor dos financiamentos indirectos feitos pela banca comercial. Também se não realizou no 1.º semestre qualquer parcela do financiamento previsto através do crédito externo, no valor de 400 milhares de contos. Há, porém, fundados motivos para admitir que, como vem sendo habitual, se tenha registado recuperação sensível na segunda metade do ano.
A Câmara dá a sua concordância ao artigo.

ARTIGO 17.º

76. Repete este artigo o preceito inserto na Lei n.º 2117, e à sua manutenção nada tem a Câmara a observar.
Dado o carácter prioritário dos investimentos abrangidos no II Plano de Fomento, é compreensível que, sem prejuízo de alguns empreendimentos básicos não incluídos no Plano, a necessidade de restrições afecte em primeiro lugar os investimentos não englobados no Plano de Fomento.
Todavia, foi possível ao Governo usar com moderação esta autorização, e a Câmara não pode deixar de se congratular com o facto. Em 1962 as despesas extraordinárias com fomento não englobadas no Plano acusam diminuição que não atinge 69 milhares de contos, sendo de relembrar que as despesas da mesma natureza abrangidas pelo Plano mostram um acréscimo de 456 milhares de contos. Do mesmo modo o confronto dos orçamentos para 1963 e 1962 de investimentos não abrangidos pelo Plano de Fomento, e que constam do quadro XXIX do relatório ministerial que acompanha o projecto, permite verificar uma diminuição apenas de 55 milhares de contos, explicando-se a diferença, praticamente, pela diminuição do subsídio à província de Moçambique para o caminho de ferro da Beira.
A Câmara permite-se lembrar a sua sugestão de ser elaborado um esquema de coordenação dos vários investimentos que permanecem fora do Plano de Fomento.

ARTIGO 18.º

77. A redacção deste artigo é idêntica à da Lei n.º 2117.
A presente ordem de preferências dentro da alínea a) resulta de uma sugestão feita pela Câmara no seu último parecer sobre a Lei de Meios.
A proposta mantém na alínea c) as duas rubricas introduzidas no projecto de proposta de lei para 1963: aceleração na formação de pessoal docente universitário e intensificação da concessão de bolsas de estudo.
O relatório ministerial insere dois quadros a partir dos quais, pelo confronto entre as possibilidades financeiras consignadas no orçamento para 1963 e as providências tomadas até final do ano lectivo de 1962-1963, conclui:

1.º Quanto à aceleração na formação de pessoal docente universitário, as disponibilidades não utilizadas correspondem a 117 unidades;

2.º Quanto à intensificação da concessão de bolsas de estudo, as disponibilidades financeiras não utilizadas em relação a alunos e a estagiários correspondem a 38 e a 52 unidades, respectivamente.

O problema afigura-se merecedor de análise mais pormenorizada. A prioridade estabelecida com a inclusão da rubrica referente à aceleração na formação do pessoal docente visava, como se afirma no relatório que acompanhava o projecto de proposta de lei para o ano em curso, atacar «uma carência que parece traduzir a maior necessidade de momento do ponto de vista docente, e que é orçamentalmente comportável: a carência de assistentes». Em relação a esta categoria de pessoal docente, as Universidades utilizavam no último mês do ano lectivo de 1962-1963 mais 95 unidades do que as consideradas no orçamento.
Subsistem na categoria de professores 212 vagas, e é do encontro deste total com o acréscimo verificado na categoria dos assistentes que resulta o número inserto na primeira conclusão do relatório. O problema das vagas acima referidas é outro, e nem sequer a sua explicação se encontra apenas no campo financeiro. Tem de admitir-se que a presente conjuntura dificulta uma resolução ampla e total da questão, mas o não preenchimento de 40 por cento dos lugares do professorado do ensino universitário

Página 2676

2676 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

traduz uma situação grave para a Universidade portuguesa e para o País, a exigir uma atenção pronta e cuidada sobre as causas desta situação. Às que mais usualmente se apontam são as condições de recrutamento e acesso, de remuneração, bem como as solicitações que exercem instituições privadas e até públicas, oferecendo melhores remunerações e mais fáceis condições de promoção. Este último aspecto vem causando, recentemente, problemas particularmente delicados às Universidades, pelo que se impõe a sua imediata consideração.
Há que proceder a estudo aprofundado e urgente de todo o problema do professorado universitário para que dele não resultem consequências altamente perniciosas para o desenvolvimento económico e social do País e para a cultura nacional.
Mas não é só no ensino universitário que a formação do pessoal docente suscita problemas: a questão não é menos grave nos outros graus de ensino, nomeadamente no ensino secundário liceal. A evolução da composição do corpo docente e a situação em geral deste ramo de ensino levanta sérias preocupações aos educadores e aos pais dos educandos. Por estes motivos a Câmara sugere que na alínea c) deste artigo se refira a formação de pessoal docente em geral, sem especificação do pessoal docente universitário, visto o problema ser comum aos outros graus de ensino.
Por outro lado, como o termo «aceleração» aplicado a formação de pessoal docente poderá dar origem à interpretação errónea de que se está a pretender uma formação menos qualificada, propõe a Câmara a substituição daquele termo por «intensificação» e, para não repetir este último na rubrica seguinte, propõe-se a sua substituição nessa rubrica por «alargamento».

78. Sobre as insuficiências do professorado no ensino universitário pode obter-se uma indicação através do confronto da relação alunos-professores no nosso país e em vários países segundo elementos dos trabalhos do Centro de Estudos de Estatística Económica:

QUADRO XXII

[Ver tabela na imagem]

(a) Inclui a Espanha, Grécia, Itália, Portugal, Turquia e Jugoslávia.

Também a expansão da frequência tem provocado elevação deste coeficiente nos ensinos secundário, liceal e técnico. Assim, no primeiro, a referida relação passou de 18,9 em 1950-1951 para 22 em 1961-1962 e, no segundo, nos mesmos anos lectivos, de 19 para 20,1. Constitui excepção a esta tendência o ensino primário oficial onde o coeficiente baixa de 40,6 no ano lectivo de 1950-1951 para 33,7 em 1961-1962, mas os aspectos qualitativos assumirão, porventura, maior acuidade neste grau de ensino.

79. No que se refere à intensificação da concessão de bolsas de estudo, o Governo deu cumprimento ao estabelecido nesta rubrica, elevando de 105 para 250 o número de bolsas a conceder e duplicando o seu quantitativo que passou de 300$ para 600$ mensais. A Câmara congratula-se com a forma como o problema foi considerado pelo Governo e regista que 232 das 250 bolsas foram já aproveitadas.
Dado que o Governo mantém esta disposição no projecto, a Câmara julga de sugerir que as novas medidas abranjam o ensino liceal; que dispõe apenas de 50 bolsas (para mais de 46 000 alunos em 1961) totalmente aproveitadas, e, também, o ensino técnico-médio.
Julga-se ainda de apontar a necessidade de rever as condições de concessão de bolsas nos ensinos liceal e técnico, pois dificilmente se compreende que, dispondo este último, no seu grau elementar, sómente de 60 bolsas, fiquem 20 por conceder.

ARTIGO 19.º

80. Prossegue a execução do plano de reapetrechamento em material didáctico e laboratorial das escolas técnicas, liceus, institutos e universidades.
O quadro seguinte resume os dispêndios que têm sido efectuados com este plano.

QUADRO XXIII

(Milhares de contos)

[Ver tabela na imagem]

O ramo de ensino que mais tem utilizado as possibilidades oferecidas pelo plano é o ensino técnico, eventualmente o mais carecido de reapetrechamento. Quanto ao ensino superior, só a partir de 1960 começou a aproveitar mais intensamente as possibilidades de reapetrechamento. As verbas mais vultosas neste grau de ensino cabem à Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra e às Faculdades de Medicina e Ciências da Universidade do Porto. Regista-se o maior interesse das Universidades pelo plano que se julga poder beneficiá-las ainda mais largamente.

81. Continuou o plano de reapetrechamento dos hospitais. O primeiro plano, aprovado em fins de 1961, num total de 19 472 contos, encontra-se praticamente executado, pois as despesas efectuadas somam 18 486 contos. O segundo plano, cuja aprovação definitiva se fez em 3 de Janeiro de 1963, prevê dispêndios no montante de 13 827 contos, dos quais foram efectivados 2665 contos. Em 9 de Setembro de 1963 foi aprovado terceiro plano, cujas verbas somam 15 863 contos, tendo sido já aplicados 1177 contos.
No quadro seguinte indica-se a repartição do despendido, nos três planos aprovados, por hospitais centrais, regionais e sub-regionais, e as respectivas percentagens de execução.

Página 2677

2677 10 DE DEZEMBRO DE 1963

QUADRO XXIV

[Ver Quadro na Imagem]

(a) A diferença de 2,9 por cento cabe a hospitais especiais.

No conjunto dos três planos são os hospitais regionais e centrais que absorvem verbas mais volumosas; na execução, os maiores atrasos registam-se nos hospitais sub- -regionais.
A Câmara, em relação aos planos de reapetrechamento, quer dos estabelecimentos oficiais de ensino, quer dos hospitais, só tem de aplaudir o propósito do Governo de prosseguir na sua execução, emitindo o voto de que as circunstâncias não imponham o afrouxamento do ritmo da sua realização, dado que tais planos vão ao encontro de ponderosas necessidades.

ARTIGO 20.º

82. Trata este artigo da autorização para o Governo inscrever, como vem sendo habitual, na despesa extraordinária, as verbas necessárias para o Instituto Geográfico e Cadastral proceder aos levantamentos topográficos e avaliações cadastrais a que se refere o Decreto-Lei n.º 31 975.
O relatório ministerial dá pormenorizada conta dos trabalhos efectuados. Embora a dotação orçamental de 1963 fosse inferior à de 1961, julga-se que os trabalhos do cadastro geométrico efectuados correspondem sensivelmente aos efectuados em anos anteriores, tendo em atenção que esses trabalhos apresentam muito maiores dificuldades nas regiões a norte do Tejo, onde decorrem actualmente a maioria desses trabalhos.
Está pràticamente completo o cadastro dos três distritos alentejanos; e os planos do cadastro incidem presentemente sobre os distritos de Setúbal, Lisboa e Santarém.
No distrito de Setúbal encontram-se já em regime cadastral cinco concelhos (Sines, Santiago do Cacem, Grândola, Alcácer do Sal e Sesimbra); completam-se plantas (na escala l:2000) de quatro concelhos (Seixal, Barreiro, Moita e Alcochete), e concluem-se operações de avaliação em três outros concelhos (Setúbal, Almada e Palmeia), e eventualmente em mais um (Montijo).
Em Lisboa estão em regime cadastral oito concelhos (Cascais, Oeiras, Sintra, Loures, Mafra, Sobral de Monte Agraço, Arruda dos Vinhos e Vila Franca de Xira); foi já presente o cadastro de mais um concelho (Torres Vedras), e deve apresentar-se ainda este ano outro (Lourinhã). Espera-se completar as operações de avaliação no concelho do Cadaval e, possivelmente, no de Alenquer.
No distrito de Santarém tinham sido apresentados os cadastros dos concelhos de Constância e Chamusca; apresenta-se este ano o de Alpiarça e preparam-se dois outros (Coruche e Almeirim). Estão a efectuar-se operações de avaliação em dois concelhos (Abrantes e Benavente). Além disso, terminaram-se os levantamentos topográfico-cadastrais de dois concelhos ao norte do Tejo (Cartaxo e Rio Maior); completaram-se os trabalhos topográficos em sete concelhos (Santarém, Alcanena, Torres Novas, Golegã, Vila Nova da Barquinha, Entroncamento e Abrantes), e iniciaram-se, ou prosseguiram, esses trabalhos em quatro concelhos (Ferreira do Zêzere, Mação, Vila Nova de Ourém e Sardoal).
Além destes três distritos, no de Castelo Branco terminou-se o cadastro no concelho de Idanha-a-Nova e efectuou-se nova cobertura fotogramétrica da metade oeste do concelho de Castelo Branco. No de Leiria apresentou-se o cadastro do concelho do Bombarral e concluíram-se as operações topográficas em dois concelhos (Peniche e Óbidos). Em Faro completaram-se operações de triangulação cadastral e de apoio fotogramétrico no concelho de Aljezur e realizaram-se trabalhos relacionados com a extensão do Plano de rega do Alentejo ao planalto de Rogil.
Na Madeira prosseguem os trabalhos cadastrais, tendo sido utilizada, para acelerar a execução dos levantamentos, a fotogrametria aérea. Relativamente aos trabalhos clássicos de levantamento, completaram-se os dos concelhos de Machico e Funchal e estão quase concluídos os trabalhos dos concelhos de Santa Cruz e de Câmara de Lobos.
Nos Açores concluiu-se o levantamento topográfico do concelho de Ponta Delgada e espera-se completar o do concelho de Lagoa.
Continuaram os trabalhos de revisão da rede geodésica, completando-se no decurso deste ano as observações do distrito de Faro, pelo que a rede revista passou a abranger todo o território a sul dos distritos de Aveiro, Viseu e Guarda, prosseguindo as observações nestes distritos. Avançaram também os trabalhos para o estabelecimento da nova rede geodésica fundamental.
Há a salientar ainda, entre os trabalhos do Instituto Geográfico e Cadastral, os que respeitam à conservação do cadastro. Até final de 1962 tinham sido apresentados os elementos cadastrais revistos de 14 concelhos, correspondendo a 872 000 ha. Em 1963 apresentaram-se os elementos revistos do concelho de Odemira (l72 000 ha), vão ser apresentados os de Santiago do Cacem (105 862 ha) e prepara-se a apresentação de mais quatro concelhos (250 000 ha). Completaram-se os trabalhos de campo em três outros concelhos e ficaram muito adiantados em dois outros. Nestes 25 concelhos, situados ao sul do Tejo, o regime cadastral tinha por base tarifas calculadas de acordo com os preços de géneros, encargos e salários relativos a quinquénios anteriores a 1936.
A Câmara dá a sua concordância à disposição necessária para o prosseguimento de tão importante tarefa.

83. A necessidade de considerar o problema educacional, em toda a sua amplitude, levou a Câmara a sugerir, no último parecer sobre a Lei de Meios, a inclusão de um artigo onde se determinava a elaboração de um plano geral de educação e formação. A Assembleia Nacional perfilhou a sugestão da Câmara, e da Lei n.º 2117 faz parte o artigo 22.º, que estabelece:

O Governo promoverá e acelerará os estudos para a elaboração de um programa de educação e formação que deverá atender às necessidades nacionais nos aspectos científico, técnico e profissional.

O projecto de proposta deste ano não mantém esta disposição, mas tal não significa que ao problema seja atribuída menor relevância ou que não tenha merecido, efectivamente, a atenção do Governo.
Pelo departamento competente foram anunciadas as bases que presidirão aos trabalhos, já em curso, do planeamento da acção educativa. Tem-se em vista o delineamento de um sistema educacional «inspirado em valores que se encontram acima de toda a controvérsia, mas ajustado na sua estrutura às realidades portuguesas actuais e com maleabilidade para se adaptar às realidades novas

Página 2678

2678 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103

que tendencialmente se anunciam». Para este efeito impõe-se definir as exigências da acção educativa nos seus aspectos qualitativos e quantitativos.
Os primeiros deverão ser traduzidos num conjunto de soluções normativas que dêem unidade, equilíbrio, actualidade e poder de adaptação ao futuro do sistema educacional. Prevê-se que neste aspecto a acção normativa se desenvolva em dois planos. No primeiro serão abrangidas as directrizes gerais do ensino que deverão constituir o Estatuto da Educação Nacional: fins da educação; acessibilidade e difusão do ensino; graus e ramos de ensino e seus fins; formas específicas de educação; ensino particular; coordenação entre os vários ramos de ensino; investigação científica; planos de estudo; programas; métodos; formação, recrutamento e situação dos agentes escolares; extensão da escolaridade obrigatória; organização escolar; assistência social escolar; orientação pedagógica; educação de diminuídos; construções escolares, etc.
Foram também já definidas as fases da preparação do projecto de estatuto: elaboração de estudos-base e de estudos especiais e respectiva coordenação.
Relativamente ao aspecto da acção normativa serão revistos, em conformidade com as directrizes do Estatuto da Educação Nacional, os estatutos dos vários ramos de ensino.
A planificação quantitativa está a ser estudada no âmbito do chamado «Projecto Regional do Mediterrâneo», cujos trabalhos, relativamente a Portugal, são realizados pelo Centro de Estudos de Estatística Económica.
A Câmara regista a acção de sistematização e definição de directrizes que se realizou e confia em que, não obstante a magnitude e dificuldade destas matérias, se tenha alargado a via da renovação do sistema educacional - dos mais graves problemas do País, pela sua incidência no futuro da Nação.

§ 6.º

Providências sobre o funcionalismo

ARTIGO 21.º

84. Este artigo do projecto de proposta tem redacção análoga à do artigo 23.º da Lei n.º 2117.
Como se referiu no parecer da Câmara sobre a última Lei de Meios, a disposição tem carácter meramente informativo, não anuncia o início de nenhum programa, e deve corresponder a uma acção duradoura, não parecendo assim de continuar a figurar na lei, mas dada a feição que a Lei de Meios vem tomando - problema cujo estudo se sugeriu - a Câmara, como no anterior parecer, considera admissível a sua inclusão.
Pelo relatório do projecto verifica-se ter prosseguido a actividade da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência na aquisição e construção de casas para os funcionários públicos, actuação que se reveste do maior interesse e significado social.
Concluiu-se já a construção dos edifícios previstos na zona de Olivais-Norte, num total de 350 fogos já distribuídos. Encontram-se em curso nessa zona as obras destinadas aos Serviços Sociais das Forças Armadas, num total de 64 fogos com um dispêndio de 19 184 000$. Foram também adjudicadas as empreitadas da construção de 292 fogos na zona de Olivais-Sul (1.a fase), o que corresponde ao investimento de 35 000 000$. Admite-se, para breve, o começo dos trabalhos respeitantes à 2.a fase da zona de Olivais-Sul, comportando 293 fogos e um dispêndio de 34 000 000$.
Iniciaram-se já trabalhos de construção no Porto (174 fogos) e em Castelo Branco (42 fogos), representando investimento da ordem dos 31 000 000$ e 7 200 000$, respectivamente. Estão em curso negociações com a Câmara Municipal do Porto para a aquisição de terrenos para a construção de mais 100 habitações.
O programa para 1964 é o seguinte:

a) Conclusão das obras em curso em Olivais-Norte (última empreitada dos Serviços Sociais das Forças Armadas), Olivais-Sul, 1.ª fase (292 fogos), Porto (174 fogos) e Castelo Branco (42 fogos) ;
b) Início da construção de 521 fogos, dos quais 315 em Lisboa, 90 em Coimbra, 56 em Beja e 60 em Ponta Delgada;
c) Elaboração do projecto de um edifício em Espinho com 15 fogos;
d) Aquisição de terrenos a municípios;
e) A satisfação de pedidos formulados directamente por funcionários para a aquisição e construção de habitações.
Está-se perante um plano vasto e de largo alcance, cujo prosseguimento vem ao encontro de um dos mais graves problemas com que se debatem os servidores do Estado.
Neste sector é ainda de referir a actuação do Cofre de Previdência do Ministério das Finanças que prevê, para 1964 o início da construção de um imóvel na cidade do Porto para beneficiar 50 sócios, a continuação da construção de 15 edifícios em Olivais-Sul para 128 sócios, a realização do concurso para a entrega de duas moradias construídas no Restelo e o prosseguimento da satisfação dos pedidos para a compra de moradias ou andares ou construção das primeiras.
Merece também anotação a actividade da Caixa de Pré vidência do Ministério da Educação Nacional, que espera efectuar em breve a atribuição de 12 habitações de um prédio em Lisboa, com o custo de 2286 contos, e que tem em fase adiantada de construção oito prédios em Olivais-Sul, com no fogos, representando um investimento de 12 500 contos.
85. É de registar ainda, no campo das providências ao funcionalismo, a publicação, em 27 de Abril de 1963, do Decreto-Lei n.º 45 002, que assegura aos funcionários públicos a assistência na doença. A Câmara congratula-se com a promessa da publicação, em breve, do respectivo regulamento, para que efectivamente os funcionários já possam usufruir em 1964 de um benefício de que tanto carecem e em relação ao qual têm estado em situação de desfavor perante os das actividades privadas.

§ 7.º

Saúde pública e assistência

ARTIGO 22.º

86. Mantém-se neste artigo a prioridade, na assistência à doença, ao programa de combate à tuberculose e à promoção da saúde mental.
No primeiro destes aspectos são apreciáveis os resultados já obtidos, mas a sua conservação e melhoria exige o prosseguimento da acção que vem sendo desenvolvida neste sector. Por exemplo: no rastreio da radiofotografia do tórax começa a fazer-se sentir a necessidade de substituição do equipamento, pois tem sido sujeito a uma utilização intensiva.
O relatório fornece alguns números que permitem avaliar do esforço feito neste sector: em 1955 fizeram-se 446357 radiofotografias, 50498 vacinas B. C. G. e

Página 2679

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2679

18 703 consultas de profilaxia; no ano de 1962 os correspondentes valores são 886 413, 281 402 e 32 246. Também a taxa de mortalidade por tuberculose desceu, entre 1956 e 1962, de 64,3 para 35,9 por mil habitantes.
A importância total orçamentada para este fim teve ligeira diminuição no orçamento para 1963, devido à verba para a assistência aos funcionários civis e seus familiares, pois os subsídios de comparticipação e de cooperação excederam os do ano de 1962 em 1500 contos.
Espera-se que continue o esforço realizado na luta contra a tuberculose, tanto no domínio da terapêutica como no da profilaxia, esta última contribuindo ainda para a diminuição no futuro das despesas com a primeira.

87. Foi publicada em 3 de Abril deste ano a Lei n.º 2118, sobre a saúde mental. A Câmara, no seu parecer sobre o projecto de proposta de lei n.º 512, que serviu de base à referida lei, teve oportunidade de se ocupar largamente deste assunto. Na apreciação desse projecto encontram-se fundadas razões para justificar a continuação da prioridade atribuída a este sector da saúde pública.
Em 1963 as verbas destinadas a este fim acusam já acréscimos. Assinala-se também o aproveitamento do Convento de Lorvão; e espera-se que com a aplicação da nova lei da saúde mental estes problemas passem a ter a atenção que a gravidade por eles atingida impõe.
Do desenvolvimento do apoio à psiquiatria infantil, à criação de serviços-piloto, à formação de pessoal e aos cuidados que merecem os oligofrénicos pràticamente abandonados, é todo um mundo de questões que urge considerar.
A vastidão dos problemas e a escassez de meios para lhe fazer face confere especial relevância à racionalização dos serviços do ponto de vista técnico e administrativo. Há que sistematizar necessidades e meios de acção para as satisfazer; há que definir prioridades e escalonar as soluções. Todos os que com este sector se relacionam deverão ser chamados a colaborar nesta vasta obra do planeamento da saúde mental, problema particularmente agudo nas sociedades contemporâneas. A Câmara exprime ainda o voto de ver, em breve, associados a estas prioridades dois problemas de magna importância neste campo: a assistência materno-infantil e as doenças cardiovasculares. Igualmente urge realizar uma vasta campanha de educação sanitária, que teria certamente .larga e benéfica repercussão em muitos dos aspectos mais graves dos sectores referidos no projecto e dos que se apontaram.

§ 8.º

Política do bem-estar rural

88. Recentemente, no parecer sobre a criação da Junta de Planeamento Económico Regional, teve a Câmara ocasião de se pronunciar sobre os problemas abrangidos neste capítulo da proposta de lei.
No referido parecer salientou-se a flagrante oportunidade da questão perante a indiscutível e geralmente sentida necessidade de regionalizar as políticas de desenvolvimento. Apontaram-se igualmente as linhas segundo as quais, no entender da Câmara, deveria orientar-se essa política: distinção entre a orgânica de planeamento - orientada para a elaboração dos planos, pela selecção e coordenação de aspirações e iniciativas - e a orgânica da execução dos mesmos planos; coordenação com os organismos de política económica já existentes ou a estabelecer, de modo a não isolar a orgânica a adoptar da análise das situações existentes e da formulação paralela dos objectivos a seguir e dos meios a utilizar; necessidade de estudar, com base em critérios objectivos, de homogeneidade, de polarização e de complementaridade, a divisão do território metropolitano em regiões de planeamento e acção com dimensão mínima e adaptadas às condições estruturais prevalecentes e aos problemas a enfrentar.
A necessidade de coordenação recíproca dos planos regionais e destes com o plano global da metrópole e com os planos sectoriais, da responsabilidade dos diversos departamentos, deveria ser efectuada na Presidência do Conselho, u qual não competiria, porém, a elaboração dos planos regionais. A orgânica do planeamento regional deveria ser descentralizada, criando-se em cada uma das regiões órgãos consultivos e de coordenação - onde tomariam lugar os representantes dos interesses públicos e privados -, servidos por departamentos técnicos de planeamento, prevendo-se também a criação de instituições concebidas para realizar ou apoiar os empreendimentos de fomento, quer no que respeita ao equipamento de infra-estruturas, quer aos empreendimentos privados concorrentes, considerando-se ainda a necessidade de organizar em novos moldes a cobertura e coordenação financeira dos empreendimentos públicos.
Explicitava ainda o parecer da Câmara que a estrutura-tipo haveria de considerar-se como maleável para ser adaptada às características de cada região, não devendo, portanto, procurar-se a instituição imediata de uma orgânica completa a criar de novo, antes interessando partir do que já existe, aproveitando diversas experiências fragmentárias de índole regional, integrando-as num esquema de conjunto, e preenchendo progressivamente as lacunas mais salientes. Acentuava-se ainda que a equacionação global do problema não deveria entravar a possível acção imediata ao nível do Ministério da Economia, podendo actuar-se desde logo pelo recurso aos departamentos já existentes, orientando-os para formas de acção conjugadas.
Após o parecer da Câmara não foram ainda definidas pelo Governo as linhas orientadoras e a orgânica a adoptar para a regionalização do fomento económico e social. A importância dos problemas regionais tem, porém, continuado a tornar-se cada vez mais saliente, manifestando-se crescente interesse pelo estudo e acção nesta matéria por parte de entidades, quer públicas, quer privadas. Recentemente o Ministério da Economia anunciou que ia ser criada uma comissão de desenvolvimento económico para o Alentejo e Algarve. Multiplicam-se, aliás, as iniciativas de departamentos oficiais com incidências regionais directas: Plano de rega e valorização do Alentejo, planos das regiões de Lisboa, Aveiro e Faro, coordenação do fomento turístico do Algarve. São ainda de referir os estudos que vêm sendo efectuados na Junta de Colonização Interna e em instituições privadas, como o Centro de Estudos de Economia Agrária da Fundação Gulbenkian. Assinala-se também a crescente polarização de esforços de desenvolvimento à escala regional revelados pela progressiva definição das linhas de progresso da região de Coimbra, pelas Jornadas de Estudos do Nordeste Trasmontano, ou pelas iniciativas de diversas juntas distritais, como as de Beja, Évora, Portalegre, Bragança e Ponta Delgada. Por último deve ainda indicar-se o persistente interesse pelos estudos regionais de entidades como o Instituto Nacional de Investigação Industrial e o Centro de Estudos de Economia Aplicada da Associação Industrial Portuguesa, e também a crescente tendência para a consideração de efeitos regionais de grandes empreendimentos privados ou de economia mista - entre outros, o complexo petroquímico do Norte e os aproveitamentos dos rios Vouga, Mondego e Douro.

Página 2680

2680 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 108

ABTIGO 23.º

89. Esta disposição reproduz o artigo 25.º da Lei n.º 2117. Em relação à proposta do último ano há uma ligeira alteração na primeira parte do corpo do artigo: em vez de «destinados a fomentar», diz-se «para fomento», e inclui-se na alínea c) a construção de edifícios para fins sociais sugerida pela Câmara e aceite pela Assembleia Nacional.
É este um sector atingido pelas consequências da conjuntura que vivemos, pois as verbas destinadas ao fomento do bem-estar rural têm sofrido reduções nos dois últimos anos.
Como se depreende das considerações com que se abriram os comentários a este capítulo, o problema não tem, todavia, desmerecido a atenção do Governo, em correspondência com a importância de que efectivamente se reveste.
Assim, o Governo tem procurado minimizar os efeitos, sobre este sector, do esforço de defesa que nos é exigido, continuando a despender na obra de renovação da vida rural verbas apreciáveis, atentas as presentes circunstâncias.
O relatório ministerial insere os seguintes elementos sobre os financiamentos autorizados em 1963 pela Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência:

Contos
Abastecimento de água ............................................... 26 738
Electrificação ...................................................... 17 650
Saneamento .......................................................... 13 744
Instalação de serviços .............................................. 2 300
Casas para famílias pobres .......................................... 246
Mercados ............................................................ 2 500
Outros fins ......................................................... 13 991
Total ............................................................... 77 169

As principais reduções verificaram-se na verba para mercados e instalação de serviços, mas, por seu turno, o abastecimento de água, electrificação e saneamento, no seu conjunto, beneficiaram de um sensível aumento na importância dos empréstimos que lhe foram atribuídos.
Deve considerar-se, ainda neste sector, a contribuição dada pela acção do Comissariado do Desemprego.
A Câmara nada tem a observar à disposição proposta.

ARTIGO 24.º

90. Este artigo não requer à Câmara qualquer comentário.
Tem como finalidade permitir a inscrição em despesa extraordinária das verbas para satisfação das dotações devidas às Casas do Povo, nos termos do Decreto-Lei n.º 40 199.

§ 9.º

Funcionamento dos serviços

91. Até à data da elaboração deste parecer não foi ainda publicado o Estatuto da Função Pública. A data limite para essa publicação é, nos termos do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 44 652, 31 de Dezembro do ano corrente. A Câmara espera que o estatuto, cuja necessidade tanto se faz sentir, seja em breve uma realidade, para bem da administração pública.

ARTIGO 25.º

92. Este artigo mantém a redacção da disposição análoga do ano anterior com uma pequena alteração de concordância na alínea c) e com a introdução do qualificativo «administrativos» no seu § único, sugerida pela Câmara no seu último parecer sobre a Lei de Meios.
A Câmara mantém nesta matéria a sua posição: trata-se de uma disposição admissível na Lei de Meios só em períodos anormais e para os fins já referidos na apreciação do artigo 3.º A redacção que a esse artigo é dada este ano mais reforça o ponto de vista da Câmara de que, como preceitos transitórios e dada a sua conexão, o referido artigo 3.º e a disposição em análise deviam ser incluídos no mesmo capítulo, no entendimento de que o critério prevalecente deveria ser a afinidade de objectivos.
A conexão entre as medidas preconizadas no artigo 3.º, relativas umas a despesas e outras a receitas, resulta da sua finalidade comum - o equilíbrio orçamental; sendo o artigo 25.º atinente a idêntico objectivo, deveria ser incluído no mesmo capítulo, por coerência lógica e para facilitar a apreciação, em conjunto, da política orçamental perante a situação que tem de enfrentar.
As considerações da Câmara respeitam apenas à localização, que não ao artigo em si, sobre o qual a Câmara nada tem a observar.

ARTIGO 26.º

93. De harmonia com os comentários feitos no parecer sobre o projecto de proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1963, a Câmara julga que esta disposição não deve figurar na Lei de Meios. O aparecimento deste preceito na proposta de lei para 1962 era admissível na medida em que constituía uma excepção compreensível pela natureza das funções cometidas aos serviços abrangidos na disposição. A Câmara sugere assim que seja retirada esta disposição.

§ 10.º

Encargos dos serviços autónomos com receitas próprias e fundos especiais

ARTIGO 27.º

94. Relativamente a este artigo, a Câmara mantém a sugestão, que tem formulado em sucessivos pareceres, de se transferir o preceito para diploma de carácter permanente, dado que ele vem sendo inserido nas leis de autorização de receitas e despesas desde a Lei n.º 2045, de 23 de Dezembro de 1950.
A redacção do projecto de proposta difere da do ano anterior, pois eliminou-se no início do preceito a expressão: «Enquanto não for promulgada a reforma dos fundos especiais».
A expressão suprimida pode, com efeito, considerar-se dispensável na medida em que, certamente, após a reforma dos fundos especiais, a sua gestão administrativa e financeira obedecerá a condicionalismo diverso do estabelecido no artigo 19.º da Lei n.º 2045.
A Câmara emite, uma vez mais, o voto de que a referida reforma, por necessária, seja levada a cabo tão breve quanto possível.

§ 11.º

Disposições especiais

ARTIGO 28.º

95. Também em relação a esta disposição a Câmara mantém a posição, que tem defendido, de promover-se a sua transferência para diploma de carácter permanente.
A disposição respeita à situação dos funcionários consulares habitando casas arrendadas pelo Estado em países onde se verifiquem condições sociais e económicas anor-[Continuação]

Página 2681

10 DE DEZEMBRO DE 1963 2681

mais e a certas regras a observar nas construções abrangidas pelo plano de povoamento florestal. A sua permanência há quinze anos nas sucessivas Leis de Meios parece abonar o ponto de vista da Câmara.

ARTIGO 29.º

96. Aplicam-se inteiramente a este preceito as considerações feitas a propósito dos artigos 27.º e 28.º Apenas se anota que a protecção aos refugiados deixou de constar desta disposição. Passa, portanto, a não ser aplicável às verbas inscritas no orçamento com esse fim - protecção aos refugiados - o regime administrativo previsto no Decreto-Lei n.º 31 286. O relatório ministerial não refere as causas desta supressão, mas, certamente, ela é devida ao facto de não se reconhecer necessário manter as aludidas despesas em regime especial.

III

Conclusões

97. A Câmara Corporativa, tendo apreciado o projecto de proposta de lei de autorização de receitas e despesas para 1964, considera que na sua formulação foram observados os preceitos constitucionais e que a sua orientação corresponde às necessidades e condições prováveis da Administração durante aquele ano e apresenta as seguintes conclusões:

1) Dá parecer favorável à aprovação do projecto de proposta na generalidade;
2) Sugere, dada a sua finalidade comum, a junção num mesmo capítulo dos preceitos dos artigos 3.º e 25.º, cuja inclusão no projecto aceita1 devido ao excepcional condicionalismo presente;
3) Propõe que no corpo do artigo 3.º se substitua a expressão «encargos da defesa» por «encargos extraordinários da defesa»;
4) Propõe que se intercale no corpo do artigo 8.º a expressão «as que exercem» antes de «outras actividades da mesma natureza»;
5) Propõe que se intercale no corpo do artigo 10.º a expressão «definidas por lei» a seguir a «zonas de rápido desenvolvimento regional» e que se juntem os n.08 6.º e 7.º do artigo 7.º do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola aos indicados no s 2.º do mesmo artigo 10.º;
6) Propõe que as duas primeiras rubricas da alínea c) do artigo 18.º passem a ter a seguinte redacção: «Intensificação da formação de pessoal docente» e «Alargamento da concessão de bolsas de estudo»;
7) Chama em especial a atenção para as observações feitas na segunda parte deste parecer a respeito dos artigos 3.º, 9.º, 10.º e 17.º, alínea c) do artigo 18.º e artigos 21.º e 24.º;
8) Propõe a supressão do artigo 26.º;
9) Entende deverem ser transferidas para diplomas de carácter permanente as disposições contidas nos artigos 27.º, 28.º e 29.º

Palácio de S. Bento, 5 de Dezembro de 1963.

Afonso de Melo Pinto Veloso.
Afonso Rodrigues Queirò.
António Armando Gonçalves Pereira.
Armando Manuel de Almeida Marques Guedes.
Joaquim Trigo de Negreiros.
António Jorge Martins da Motta Veiga.
António Trigo de Morais.
Eugénio Queirós de Castro Caldas.
João Faria Lapa.
Luís Quartin Graça.
Pedro Mário Soares Martinez.
Manuel Jacinto Nunes, relator.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

Página 2682

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×