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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA
DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 51
ANO DE 1970 4 DE DEZEMBRO
ASSEMBLEIA NACIONAL
X LEGISLATURA
SESSÃO N.° 51, EM 3 DE DEZEMBRO
Presidente: Ex.mº Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto
Secretários: Ex.mºs
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Bosco Soares Mota Amaral.
SUMARIO: - O Sr. Previdente declarou aberta a sessão às 15 horas e 46 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o n.º 49 do Diário das Sessões, com algumas rectificações.
O Sr. Presidente referiu-se á instalação, na Câmara dos Deputados do Brasil, de uma comissão especial para elaborar as medidas legislativas necessárias a integração sócio-económica e cultural dos povos de língua portuguesa, para tornar realidade a Comunidade Luso-Brasileira.
O Sr. Presidente deu ainda conhecimento da sua actuação, em nome da Assembleia, por motivo do falecimento do general De Gaulle.
Deu-se conta do expediente.
Foram lidas notas de perguntas apresentadas por vários Srs. Deputados e algumas respostas do Governo.
O Sr. Deputado Dias das Neves agradeceu o voto de pesar exarado no Diário das Sessões pelo falecimento de seu pai.
O Sr. Deputado Roboredo e Silva referiu as atenções de que foi alvo na Câmara dos Deputados do Brasil aquando da sua recente visita ao Rio de Janeiro..
O Sr. Presidente associou-se as palavras do Sr. Deputado Roboredo e Silva.
O Sr. Deputado Homem de Mello deu conta a Câmara das impressões colhidas na 25.º sessão ordinária da Assembleia Geral das Nações Unidas, no que se refere às atitudes dessa organização para com Portugal.
O Sr. Deputado Oliveira Dias falou sobre as negociações de Portugal com o Mercado Comum, recentemente iniciadas em Bruxelas, pedindo a Câmara um apoio ao Governo relativamente a essas negociações.
O Sr. Presidente solicitou a Câmara que se pronunciasse sobre as conclusões apresentadas pelo Sr. Deputado Oliveira Dias na sua intervenção. Submetidas à cotação, foram aprovadas.
O Sr. Deputado Miller Guerra teceu considerações a propósito da anunciada construção de um hospital em Lisboa, defendendo a criação nele de uma nova Faculdade de Medicina.
Ordem do dia. - Continuou o debato na generalidade da proposta de lei de automação de receitas e despesas para 1971.
Usou da palavra o Sr. Deputado Roboredo e Silva.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre José Linhares Furtado.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Júlio dos Santos Almeida.
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António Lopes Quadrado.
António Pereira de Meireles da Bocha Lacerda.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Júlio de Boboredo e Silva.
Armando Valfredo Pires.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Eugênio Magro Ivo.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Fernando David Laima.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco Correia das Neves.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Moncada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique Veiga de Macedo.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Duarte de Oliveira.
João José Ferreira Forte. João Lopes da Cruz. João Manuel Alves.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
João Ruiz de Almeida Garrett.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Augusto Correia.
José Coelho de Almeida Cotta.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José João Gonçalves de Proença.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José da Silva.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Júlio Dias das Neves.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
Manuel Valente Sanches.
Maria Raquel Ribeiro.
Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baessa.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Rafael Valadão dos Santos.
Ricardo Horta Júnior.
Rogério Noel Feres Claro.
Rui de Moura Ramos.
Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teodoro de Sousa Pedro.
Teófilo Lopes Frazão.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 85 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Juram 15 horas e 45 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Está em reclamação o Diário das Sessões, n.º 49, relativo à sessão de 26 de Novembro.
O Sr. Ribeiro Veloso: - Sr. Presidente: Na p. 1025 desejava fazer duas rectificações: uma delas é na col. 1.ª, 1. 27, pois onde está: "vicando", deve ler-se: "vincando"; a outra, na col. 2.ª, 1. 8, é para onde está: "cristão", se ler: "cristãos".
O Sr. Ávila de Azevedo: - Sr. Presidente: No último parágrafo da col. l.ª da p. 1024, 1. 9, onde está: "corte", deve ler-se: "coorte".
O Sr. Themudo Barata: - Sr. Presidente: Na p. 1020, col. 1.ª, 1. 2, a contar do fim, a última palavra não é "como", mas sim "uma".
O Sr. Presidente: Continua em reclamação.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Também eu tenho uma rectificação a fazer: na p. 1013, col. 2.ª, 1. 24, deve ler-se: "mínimo", em vez de "domínio".
Como mais nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra sobre esto Diário das Sessões, considerá-lo-ei aprovado com as rectificações indicadas, que ficam registadas para o efeito.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Informo VV. Ex.ªs de que, durante o interregno parlamentar, recebi um ofício da Câmara dos Deputados do Brasil, com data de 14 de Maio, comunicando-me a instalação, naquela nobre Casa, de uma comissão especial para elaborar as medidas legislativas necessárias e, integração sócio-económica e cultural dos povos da língua portuguesa, para tornar realidade a Comunidade Luso-Brasileira, e solicitando o envio de subsídios para orientação dos trabalhos do movo órgão técnico. Mais tarde recebemos um exemplar do Diário do Congresso Nacional brasileiro contendo o texto integral da acta da instalação da referida comissão.
Peço a especial atenção da Assembleia para estes factos, cuja relevância será desnecessário encarecer e que justificarão da nossa parte, em breve oportunidade, correspondentes actos.
Informo VV. Ex.ªs de que enviei à Assembleia Nacional de França um telegrama de condolência pelo falecimento do general De Gaulle em nome da nossa Assembleia e recebi em resposta expressivo agradecimento. Pelo mesmo motivo assisti, em representação da Assembleia Nacional, às exéquias celebradas em Lisboa, o que me foi agradecido por carta do Sr. Embaixador de França.
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Deu-se conta do seguinte
Expediente
Exposições
Do Grémio Nacional dos Industriais de Serração de Madeiras sobre o problema dos incêndios nas matas nacionais.
Da Federação Portuguesa de Cinema de Amadores sobre a proposta de lei de protecção do cinema nacional.
Sobre a classe dos sargentos.
Sobre a situação dos subsidiados pelo Comissariado do Desemprego.
Telegramas
De familiares de presos políticos sobre medidas de segurança.
Da assembleia geral do Grémio Nacional da Imprensa Diária discordando do projecto de lei de imprensa dos Srs. Deputados Sá Carneiro e Pinto Balsemão.
Das juntas de freguesia da região de Vizela pedindo a criação do concelho de Vizela.
Da directora e professoras da Escola Preparatória da Marquesa de Alorna lamentando o trágico desaparecimento de quatro Deputados na Guiné.
O Sr. Presidente: - Vão ser lidas as notas de perguntas apresentadas por vários Srs. Deputados e oportunamente enviadas para a Mesa, com as respostas do Governo até agora recebidas.
Foram lidas. São as seguintes:
Resposta às perguntas formuladas na Assembleia Nacional pelo Sr. Deputado Luis António de Oliveira Ramos na sessão de 21 de Abril de 1970:
O n.° 2 do artigo 11.° do Decreto-Lei n.° 48 807, de 28 de Dezembro de 1968, permite o abono aos professores agregados de ensino liceal e aos professores extraordinários do ensino técnico profissional durante os doze meses do ano. O n.° 3 do mesmo artigo determina, no entanto, que "os professores de serviço eventual ou provisórios não abrangidos pelo número anterior vencem enquanto prestarem serviço docente ou de exames".
Encontram-se em curso neste Ministério estudes tendentes a actualizar os quadros dos estabelecimentos de ensino, de modo que os professores eventuais só sejam contratados quando o serviço for realmente de natureza episódica e não permitir solução diversa da que consta do n.° 3 do artigo 11.° do Decreto-Lei n.° 48 807, acima referido.
O Ministro da Educação Nacional, José Veiga Simão.
Resposta do Ministério do Interior a nota de perguntas apresentada pelo Sr. Deputado Artur Augusto de Oliveira Pimentel e lida na sessão de 21 de Abril de 1970:
1. Acerca da nota de perguntas apresentada pelo Sr. Deputado Artur Augusto de Oliveira Pimentel, cumpre-me observar, antes de procurar informar quanto às questões concretamente postas, não parecer inteiramente exacta a afirmação que, no intróito da mesma nota, se faz, nos termos seguintes:
... Verificando-se que o problema se reveste de interesse sobretudo para aqueles municípios em cuja área se situam importantes e rendosas instalações pertencentes a empresas cujas sedes se acham localizadas em concelhos diferentes ...
2. Com efeito, devendo a distribuição do imposto de comércio e indústria a que alude o artigo 712.º do Código Administrativo ser feita com justiça, isto é, dando-se a cada concelho com direito a participar no respectivo produto a parcela deste que corresponda ao valor da actividade nele exercida, não se afigura que o problema interesse especialmente aos municípios em cuja circunscrição administrativa se situem "importantes e rendosas instalações" pertencentes a empresas com sede em concelhos diferentes.
Parece, antes, que a justa distribuição do imposto em causa interessa, por igual, a todos os municípios, que devem ter uma quota-parte da quantia liquidada ao contribuinte, e não especial ou fundamentalmente a qualquer deles em si mesmo considerado.
Convém, ainda, anotar que a noção de "importantes e rendosas instalações" é sobremaneira subjectiva.
Se os resultados de toda a actividade comercial ou industrial fluem do binómio "compra-revenda" ou "produção-venda", consoante se trate da primeira ou da segunda, e se esta última sé desdobra nos sectores "Produção" e "Comercialização dos bens produzidos", está por demonstrar qual dos dois tipos de actividade se deve considerar prevalecente na obtenção do rendimento. Uma vez que comprar sem se vender, ou produzir sem vender, se consubstancia em esterilidade económica e, consequentemente, em ausência de lucro, põe-se, efectivamente, a questão crucial de saber se é na comercialização (revenda ou venda dos bens produzidos) ou, antes, na aquisição ou produção dos bens que reside a maior fonte dos resultados positivos das explorações.
E daqui emerge logo um factor de grande dificuldade para determinar quais as instalações de certa empresa que devam reputar-se mais "importantes e rendosas": aquelas a partir das quais se adquirem os bens a revender ou a vender após transformação industrial?; ou as que asseguram, principalmente, a comercialização, visto ser o preço de venda que incorpora o lucro?, ou, ainda, aquelas onde se procede a transformação das matérias-primas?
Há muito que se procura encontrar um critério de definição da justa valorização das diversas instalações de empresas com actividades em mais do que um concelho e que se mostre capaz de, com carácter de objectividade e generalidade - seja qual for a empresa que esteja em causa, requisitos indispensáveis para se poder reputar seguramente válido, e não gerador de puras apreciações subjectivas -, revelar a valia relativa de tais instalações e o seu real contributo para a obtenção do lucro tributável, que, no fundo, seria o que essencialmente importaria apurar.
A comissão referida no § 4.° do artigo 712.° do mencionado Código tem pedido, a todos quantos assistem às respectivas reuniões o seu contributo para o estabelecimento de critério mais aperfeiçoado do que os que tem utilizado após intenso estudo do problema. Até hoje, porém, as sugestões recebidas, se permitiram introduzir algumas correcções nos critérios por ela própria definidos, não se revelaram idóneas para firmar orientação que possa reputar-se perfeita, ou mesmo mais apropriada do que a decorrente daquelas.
3. Posto isto, e não obstante a nota de perguntas em apreço estar dirigida à averiguação do pensa-
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mento do Governo acerca dos pontos nela focados, pensamento que, como é óbvio, desconhecemos, diremos o que a experiência de alguns anos na presidência da comissão acima citada, por delegação de V. Ex.ª, nos suscita quanto às questões afloradas:
a) Conforme resulte do que se expôs no n.° 2 desta informação, a fixação, por via legislativa ou simplesmente administrativa de um critério único de distribuição do imposto de comercio e indústria não parece viável, se por critério único se entender basear-se a distribuição, em todos os casos, em determinada espécie de elementos respeitantes às empresas.
Na verdade, dizer, por exemplo, que a distribuição do imposto deve efectuar-se com fundamento no valor relativo das instalações possuídas pela empresa em cada um dos concelhos parece-nos certo e fácil. E é, alias, o princípio que tem norteado tal distribuição.
Mas estabelecer com generalidade quais os elementos objectivos que, quanto a toda e qualquer empresa, servem pana mostrar, na sua justa medida, o referido valor, seria desconhecer a multiplicidade de tipos de empresas comerciais e industriais existentes e de situações que surgem em consequência da inteira liberdade de organização interna empresarial.
Pensamos, pois, ter de haver mais do que um critério quanto aos elementos a considerar mo apuramento do valor da actividade exercida em cada concelho ou das instalações através das quais é prosseguida, embora tombem entendamos que o seu número tem de ser limitado ao mínimo indispensável para abarcarem grandes grupos de empresais relativamente às quais se mostrem satisfatoriamente adequados, sob pena de se cair em inconveniente e insuportável - para a Administração e para as próprias empresas - indagação casuística da situação de cada contribuinte do imposto de que nos ocupamos, quanto ao peso das instalações exploradas nos diversos concelhos na obtenção dos resultados alcançados em cada exercício. Tarefa manifestamente incomportável, tanto no aspecto material - o próprio Estado a afastou ao concentrar o apuramento dos lucros tributáveis em contribuição industrial no concelho da sede dos empresas ou naquele em que se situe o principal estabelecimento - como no da produtividade e economicidade da distribuição;
b) Seria desejável que a distribuição do imposto assentasse "nos lucros reais apurados em cada concelho em face da respectiva contabilidade regularmente organizada".
Todavia, soo raras as empresas que fazem apuramento de resultados por concelhos onde mantêm instalações. Regra geral, apenas lhes interessa determinar o lucro obtido com o conjunto das suas instalações, ou seja o resultado das suas actividades globalmente consideradas, ou, quando muito, o de certo sector dessas mesmas actividades que pode não ser explorado - e normalmente não é - a partir de uma só instalação localizada num só concelho. Alias, para efeitos de contribuição industrial, o apuramento do lucro é feito em globo, e não por concelhos, nada obrigando, portanto, as empresas ao cálculo de lucros parcelares por instalações ou por grupos de instalações localizadas em certa circunscrição administrativa.
Mas mesmo as pouquíssimas empresas que determinam lucros por concelhos não o fazem com rigor tal que possibilite reputarem-se esses lucros como "lucros reais". Acresce que, ainda nos casos em que semelhante apuramento - trabalhoso e sem interesse para a generalidade das empresas - fosse efectuado com preocupação de perfeição, ele estaria sujeito a diferentes critérios de imputação de certos encargos, que nenhum preceito legal estabelece e variam de empresa para empresa.
Por outro lado, dizendo a lei que o produto do imposto "será repartido pelas câmaras municipais dos concelhos onde as empresas possuem a sede, escritórios de administração, filiais, sucursais, agencias, delegações ou qualquer outra forma de representação própria permanente", e não podendo deixar de se reconhecer aos municípios dos concelhos onde as empresas mantenham instalações enquadráveis nas que a lei menciona o direito de participar na distribuição, não se vê como seria possível determinar a quota-parte a atribuir aos concelhos onde as empresas não obtivessem lucros - situação que tem sido comunicada frequentemente à comissão referida no § 4.° do artigo 712.° do Código Administrativo ser a que se verifica em algum ou alguns dos concelhos onde as empresas exercem actividade.
A esta objecção podem, é claro, opor-se duas ordens de considerações.
A primeira será a de que, quando as empresas apurem lucro no final do exercício, é porque todas as suas actividades foram lucrativas, não sendo, portanto, admissível que digam ter tido prejuízo em um ou em uns concelhos e lucro noutro ou noutros. Talvez teoricamente esta posição possa sustentar-se, mas faltaria, então, determinar a forma de imputação do lucro global a cada um dos concelhos, mesmo àqueles em que, concretamente, se comprovassem despesas superiores as receitas. E a verdade é que há conhecimento de empresas que têm perfeita consciência de possuir dependências em certo ou certos concelhos das quais não auferem qualquer lucro, mas que conservam em actividade por razões de conveniência. Esta conveniência poderia, ainda, reputar-se um factor do lucro obtido no conjunto das explorações. Mas não é susceptível de ser adequadamente traduzida numa simples "contabilidade regularmente organizada" que nos dê a conhecer qual foi, afinal, o lucro real produzido pela instalação que os elementos contabilísticos vulgares apontam como de-
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ficitaria. E se fàcilmente se compreende não ser possível à Administração incumbir-se, ela própria, de proceder, mediante actuação directa junto de cada empresa, à determinação do lucro real em cada concelho, também julgamos evidente não dever impor-se ao contribuinte o ónus de organizar complexa e dispendiosa contabilidade em tal sentido orientada e que não terá qualquer interesse para ele.
Outra residirá numa inversão do problema: se se entender que a distribuição do imposto deve fazer-se em função dos lucros reais apurados em cada concelho, e este critério se mostra contrário à letra da lei, pois a solução consistirá em alterar a lei e harmonizá-la com a orientação que se reputa desejável. Simplesmente, o fundamento lógico e jurídico da participação no produto do imposto de comércio e indústria devido por determinada empresa é o exercício, na circunscrição municipal, de qualquer actividade passível de contribuição industrial, ou imposto de natureza especial que a substitua (artigo 710.° do Código Administrativo). Ora, desde que a empresa possua, num dado concelho, instalação destinada ao exercício de actividade que reina os requisitos apontados e efectivamente a desempenhe a partir de tal instalação, deverá o município respectivo participar no produto do imposto municipal que à mesma empresa seja de liquidar com referência ao conjunto das explorações por ela mantidas. E porque, como se viu, não é fácil determinar a parcela do lucro real imputável a cada uma das instalações, pelo menos através de uma simples "contabilidade regularmente organizada", não resta outro caminho senão o de recorrer a diverso critério de distribuição que se mostre apto a solucionar o problema.
Pelo exposto, parece manifestamente inviável lançar mão dos "lucros reais apurados em cada concelho" para distribuir o imposto de comércio e indústria liquidado nos termos do artigo 712.° do Código citado;
c) A apreciação da conveniência ou inconveniência da admissibilidade de recurso das resoluções da comissão a que alude o § 4.° do artigo 712.° do Código Administrativo não pode dissociar-se das posições que se tomem sobre outras questões, designadamente as que o Sr. Deputado autor da nota de perguntas refere nas respectivas alíneas a) e b).
Segundo a óptica que temos dos problemas expressos e implícitos nas mencionadas alíneas, já exteriorizada, cremos que a instituição do regime de recurso apenas resultaria em envolver o órgão a quem se entregasse a revisão das deliberações da comissão nas mesmas dificuldades em que esta se tem visto para desempenhar a ingrata missão que lhe foi confiada.
A sujeição à critica dos critérios da comissão está assegurada pela possibilidade de presença nas suas reuniões de representantes das câmaras municipais dos concelhos interessados. Não são, infelizmente, muitos os corpos administrativos que usam do direito que a lei lhes concede, mas não porque lhes sejam postos quaisquer entraves ao seu exercício. Pelo contrário, nunca se discutiu, sequer, a qualidade ou o número dos representantes que cada município entende fazer participar nos trabalhos da comissão. E têm comparecido a defender os pontos de vista das câmaras técnicos de várias formações (juristas, economistas, contabilistas e outros), além de presidentes e funcionários qualificados das mesmas câmaras, os quais, muitas vezes, não deixam também de ser técnicos de reconhecida competência em domínios com interesse manifesto para os assuntos a debater. Os problemas são amplamente estudados por todos os presentes, aos quais largamente se explicam os critérios adoptados pela comissão e os seus fundamentos, justamente para que possam ser objecto de toda a análise e discussão.
Mas é evidente que a natureza consultiva dos votos dos representantes municipais não faculta a imposição à comissão de soluções que ela não tenha por correctas, podendo, assim, entender-se que não está devidamente garantida a prevalência de orientações por aqueles reputadas mais conformes com os interesses dos concelhos seus representados.
Não pode, porém, esquecer-se que a comissão não é um, órgão de recurso para defesa de interesses antagónicos, tomada a expressão no verdadeiro significado. A sua função é, antes, a de resolver sobre a forma considerada correcta de distribuição do imposto de comércio e industriai único interesse que está em jogo, e somente quando sejam divergentes as opiniões dos dirigentes dos serviços municipais sobre o assunto. A composição que a lei assinala à comissão (§ 3.° do artigo 706.° do Código Administrativo) e o modo que prevê, como normal, da determinação da quota-parte de cada concelho (§ 3.° do artigo 712.°) mostram estar em causa, tão-sòmente, um problema de ordem técnico-administrativa, alheio a um conflito de interesses.
Assim se compreende que às resoluções da comissão a lei haja atribuído carácter definitivo.
Em todo o caso, diremos que o inconveniente que pode apontar-se à instauração de regime de recurso das deliberações da comissão é apenas o de tal providência determinar, inevitavelmente, maior morosidade na solução final das divergências que se verifiquem entre os funcionários que, em primeira mão, devem decidir quanto à distribuição do imposto.
Na verdade, seria mais uma entidade a intervir no problema, manifestamente complexo e em que predomina o campo do discutível, obrigando a maiores exigências burocráticas na organização dos processos
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relativos às reclamações e, por isso mesmo, à ampliação dos serviços que actualmente têm a seu cargo o expediente relacionado com o funcionamento da comissão, os quais, aliás, já se podem considerar insuficientes para o volume actual dos trabalhos inerentes à execução do disposto nos artigos 706.° e 712.° do Código Administrativo.
Por outro lado, o número de reclamações interpostas para a comissão ao abrigo do § 4.° do mencionado artigo 712.° não tem sido elevado, conforme se vê pelo quadro seguinte:
[Ver Tabela na Imagem]
Não está concretamente determinado o número de empresas abrangidas pelo citado preceito legal. Mas um calculo efectuado com base em elementos recolhidos para análise da evolução do imposto de comércio e indústria permitiu estimar, em 1967, aquele número em cerca de 1500. Partindo deste dado, conclui-se que a intervenção da comissão se verificou em percentagens de casos de distribuição da dita imposição tributária que variam entre 3,79 (1968) e 7,59 (1966).
Esta circunstância pode inculcar, num aspecto, não ser significativo o inconveniente atrás apontado à admissibilidade de recurso das deliberações da comissão - até pelo pressuposto de que não se recorreria de todas as resoluções, quer por desinteresse das entidades com legitimidade para o fazer, quer por se fixar uma "alçada" para o recurso.
Mas, no caso de se confiar apenas no desinteresse dos possíveis recorrentes, todos os processos teriam de sofrer tramitação apropriada a admissibilidade do recurso.
O mesmo já não sucederia se se optasse por um valor mínimo aquém do qual não haveria recurso, conforme, aliás, sugere o Sr. Deputado Oliveira Pimentel. Nesta hipótese o inconveniente seria, de facto, de menor peso, se bem que desconheçamos em que medida, por não dispormos de elementos sobre os valores dos impostos de comércio e indústria cuja distribuição tem sido objecto das reclamações resolvidas pela comissão.
E que, regra geral, desconhece a comissão quais as quantias que estão em causa nas reclamações, cujo montante as mais das vezes nem sequer consta do respectivo processo. Hás mesmo quando é conhecido, o certo é somente se discutirem e analisarem os critérios de distribuição apropriados para cada caso, os elementos que servem de base, de acordo com o critério reputado certo, ao cálculo das percentagens de distribuição e a exactidão dos ditos elementos e percentagens. Isto, de resto, é o que realmente importa apreciar, independentemente das importâncias a cuja distribuição haja de proceder-se.
Daí que também nos pareça não se justificar que o sistema de recurso a instituir-se deva ficar subordinado a qualquer valor, pois importa é saber como deve distribuir-se o imposto devido, tendo em conta o valor relativo das actividades desenvolvidas pelo contribuinte em cada concelho, e não quanto deve dar-se a cada concelho.
Mas, para melhor esclarecimento do assunto, ainda anotaremos que muitas das reclamações até agora presentes à comissão não resultam propriamente de discordância com os critérios por ela adoptados, mas de deficiente interpretação e aplicação desses critérios por parte de alguns funcionários dirigentes de secretarias municipais, ou de se pretender fazer prevalecer determinada solução que, no entanto, noutros casos idênticos em que se mostre menos favorável a certo concelho não se pretende ver adoptada.
Tem havido também, é claro, divergências dos pontos de vista da comissão, mas sem que sejam apresentadas soluções concretas e solidamente baseadas substituindo, com vantagem e maior justiça, as perfilhadas pela mesma comissão, podendo até afirmar-se que tais divergências resultam sempre da não consideração de alguns aspectos relevantes do problema.
Do que se disse parece fluir que deve pôr-se a questão de saber se da instauração do regime de recurso das deliberações da comissão resultariam benefícios compensatórios do inconveniente apontado;
d) A distribuição do imposto de comércio e indústria situa-se no puro plano da actividade interna da Administração, visto não envolver qualquer relação jurídica tributária nem ter implicações de alguma espécie na esfera jurídica dos particulares.
Sendo, portanto, um acto meramente interno, embora respeitando a duas ou mais autarquias locais, não haverá motivo para nele se fazer intervir entidade estranha à própria Administração.
Assim, se se entender vantajoso facultar recurso das deliberações da comissão, cremos que ele deverá ser apreciado e decidido, em última instância, por outro órgão da Administração.
Com as precedentes observações, submetemos à consideração de V. Ex.ª a nota de perguntas do Sr. Deputado Oliveira Pimentel.
Lisboa, 21 de Abril de 1970. - O Chefe da 2.ª Repartição da Direcção-Geral de Administração Política e Civil, Cristiano Simões de Maia Alves.
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Despacho de S. Ex.ª o Ministro
Parece-me suficientemente esclarecedora a informação da 2.ª Repartição sobre a nota de perguntas do Sr. Deputado Oliveira Pimentel.
Julgo que ela própria pode servir de resposta, pois nada mais pode adiantar o Ministro, a não ser que tanto ele próprio, como os serviços do Ministério, estão à disposição do Sr. Deputado para qualquer ulterior informação complementar.
Lisboa, 14 de Maio de 1970. - Gonçalves Rapazote.
Está conforme.
Lisboa, 19 de Maio de 1970. - O Chefe da 2.ª Repartição, Cristiano Simões de Maia Alves.
Nota de perguntas
Os acidentes de trabalho e as doenças profissionais eram reguladas pela Lei n.° 1942, de 27 de Julho de 1936, e pelo Decreto-Lei n.° 27 649, de 12 de Abril de 1937.
Em face do anacronismo desta legislação, aliás ainda vigente, a Assembleia Nacional aprovou uma nova lei para regular os referidos acidentes de trabalho e doenças profissionais:
Lei n.º 2127, de 3 de Agosto de 1965.
A referida lei, na sua base LI, n.° 1, diz:
Esta lei entra em vigor com o decreto que a regulamenta e será aplicável:
a) Quanto aos acidentes de trabalho, aos que ocorrerem após aquela entrada em vigor;
b) Quanto às doenças profissionais, aquelas cujo diagnóstico inequívoco se faça à data referida na alínea anterior.
Estabelece também a nova lei aprovada a revogação de lei e do decreto citados de 1936 e 1937, respectivamente.
Passaram quase cinco anos sobre a Lei n.° 2127, publicada em 3 de Agosto de 1965, e esta não entrou ainda em vigor porque não pôde ainda ser publicado o decreto que a regulamentará, com prejuízo para os sinistrados e doentes profissionais.
Pergunta-se ao Governo se é possível apressar a publicação deste decreto regulamentador.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 23 de Abril de 1970. - O Deputado, Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Nota de perguntas
A recente lei sobre a livre circulação de mercadorias entre as ilhas adjacentes e o continente tornou premente a necessidade de facilitar as exportações da ilha da Madeira.
Acontece que é cada vez menor o número de navios estrangeiros que aportam ao Funchal e ali embarquem carga directamente para países estrangeiros (Inglaterra, Países Baixos, etc.). Os vinhos, bordados e outras exportações essenciais são feitas através de Lisboa e transbordadas aí para navios estrangeiros que escalam com frequência a capital do País.
Todavia, estas mercadorias em trânsito pagam fretes marítimos elevados, bem como taxas e despachos alfandegários também onerosos no porto de Lisboa.
Pode o Governo, na sequência da lei acima citada e com o fim de impulsionar as exportações madeirenses, promover uma redução no custo dos fretes marítimos em relação às mercadorias a exportar para o estrangeiro, através do porto de Lisboa e vindas das ilhas adjacentes, nos navios das carreiras das referidas ilhas? -
Pode o Governo promover uma redução ou abolição de certas despesas cobradas na Alfândega e no porto de Lisboa para estas mercadorias em trânsito e destinadas a exportação?
Nota. - Um exportador de vinhos que pretendia enviar vinho da Madeira para a Exposição de Osaca, via Holanda, verificou que a via Lisboa lhe custaria 50 por cento mais do que a primeira.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Abril de 1970. - O Deputado, Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Resposta à nota de perguntas apresentada pelo Sr. Deputado Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso em sessão da Assembleia Nacional de 28 de Abril último, no que se refere ao âmbito do Ministério das Finanças:
1.° Relativamente à "redução no custo dos fretes marítimos em relação às mercadorias a exportar para o estrangeiro, através do porto de Lisboa e vindas das ilhas adjacentes, nos navios dos carreiras das referidas ilhas", tal constitui matéria a que são estranhos os serviços dependentes deste Ministério.
2.° No que respeita à "redução ou abolição de certas despesas cobradas na Alfândega e no porto de Lisboa para estas mercadorias em trânsito e destinadas a exportação", no que concerne às que oneram tais mercadorias no porto de Lisboa, isso constitui matéria do âmbito da Administração-Geral do Porto de Lisboa.
Relativamente às "despesas cobradas na Alfândega de Lisboa", mostra-se que:
a) Para as mercadorias a que se alude não há necessidade de processar qualquer despacho na Alfândega de Lisboa, pois podem vir acompanhadas do despacho de exportação corrido ma alfândega da procedência da mercadoria, limitando-se os serviços aduaneiros em Lisboa a conferir, pela guia do despacho de exportação que acompanha a mercadoria, o seu embarque e consequente saída do País, a fim de informar a alfândega da procedência da efectividade da exportação;
b) Da formalidade, que se deixa referida, resulta a isenção do imposto de transacções que seria devido se, porventura, não se efectivasse a sua salda do País e, além disso, a certeza desta saída, circunstância que interessa ao Instituto Nacional de Estatística;
c) A possível despesa a efectuar ma Alfândega de Lisboa só poderá provir da cobrança de emolumentos pessoais aduaneiros, da cobrança de emolumentos à Guarda Fiscal e dos honorários do despachante interveniente;
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d) Acerca dos emolumentos pessoais aduaneiros, estes, somente, são devidos quando os serviços são requeridos pela parte que deseja se efectuem fora das horas do expediente normal ou fora dos locais de trabalho; esta despesa pode ser eliminada se a mercadoria for apresentada ma Alfândega e dentro das horas de expediente;
c) Relativamente aos emolumentos da Guarda Fiscal - o movimento de mercadorias nas condições citadas tem sido relativamente pequeno -, desde que essas mercadorias entrem nos entrepostos, a Guarda Fiscal vigia as respectivas entradas e saídas sem qualquer oneração; quando as ditas mercadorias são descarregadas para cais livres ou batelões, torna-se necessária vigilância fiscal, vigilância que, sendo feita por pessoal da Guarda Fiscal fora das horas de servido, como tal está sujeito ao pagamento dos emolumentos estabelecidos ma tabela publicada no Diário do Governo, 1.ª serie, n.° 298, de 23 de Dezembro de 1969.
f) Sobre os honorários do despachante interveniente, este actua como mandatário do exportador, o qual pode eliminar esta despesa se efectuar o trabalho por si ou por intermédio de um seu empregado devidamente habilitado, de conformidade com os n.ºs 1.° e 2.º do artigo 426.° da Reforma Aduaneira, aprovada pelo Decreto-Lei n..° 46 311, de 27 de Abriu de 1965.
No que respeita aos serviços referidos mas alíneas d) a f), além das soluções propostas, sugere-se que as companhias transportadoras tomem a iniciativa de proceder à operação de trânsito, no porto de Lisboa, em conjunto - visto es mercadorias estarem, a seu cargo desde o embarque nos portos das ilhas adjacentes até aos portos estrangeiros, no destino -, procedimento este de que resultaria uma única despesa para a totalidade dos mercadorias nestas condições, em vez de, efectuando-se os serviços parcelarmente, corresponder, poeticamente, a cada operação a despesa que incidiria sobre o todo.
Secretaria de Estado do Orçamento, 6 de Novembro de 1970. - O Secretário de Estado do Orçamento, Augusto Victor Coelho.
Nota de perguntas
Nos termos regimentais, formulo ao Governo, pelo Ministério das Finanças, a seguinte nota de perguntas:
1.ª Foi negada autorização a empresas seguradoras para o aumento de capital social mediante incorporação de reservas livres ou de saldo do fundo de reavaliação?
2.ª Em caso afirmativo, tal decisão corresponde a critério de ordem geral ou, pelo contrário, de aplicação restrita às empresas do ramo segurador?
3.ª Na segunda hipótese, poderão ser conhecidos os fundamentos ou razões em que se apoia o critério discriminativo em relação a empresas de outros sectores, nomeadamente o bancário, e mesmo a empresas de seguros, em época ainda recente?
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 29 de Abril de 1970. - O Deputado, Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Elementos de informação requeridos pelo Sr. Deputado Alberto Maria Ribeiro Meireles em sessão da Assembleia Nacional do 29 de Abril último, colididos através da Secretaria de Estado do Tesouro:
Prestam-se os elementos informativos referentes ao requerido através deste Ministério:
Estão pendentes no Ministério das Finanças diversos pedidos de empresas seguradoras para aumento de capital social, sob diversas formas. Estes pedidos não têm tido andamento por se entender que não é este o momento oportuno para a sua apreciação, uma vez que está em preparação a legislação que há-de regular no futuro a actividade seguradora e que, em particular, contém disposições sobre o capital social destas empresas.
Tal legislação visa objectivos de reestruturação da actividade seguradora, conforme se acentua no parecer da Câmara Corporativa, e por isso se julga pouco conveniente que os pedidos pendentes sejam despachados antes de publicada essa legislação. Em qualquer caso, não há propriamente negação de autorizações pedidas, mas apenas o não andamento dos processos respectivos.
Exceptua-se um caso único: o do pedido de uma companhia de seguros, aliás já despachado em 8 de Abril de 1969, pelo que se acredita que não tenha sido ele que originou as perguntas agora formuladas. Tal pedido foi indeferido porque o saldo da conta de flutuação de imóveis regista alterações patrimoniais meramente potenciais ou estimativas.
Por conseguinte, as circunstâncias em que se processa actualmente a apreciação dos pedidos de aumento de capital das empresas seguradoras não têm paralelo em qualquer outro ramo da actividade económica e nem sequer põem em causa a questão de se saber se é ou não admitida a incorporação de reservas livres.
No que se refere à outra questão posta - admissibilidade ou não do aumento de capital através do saldo do fundo de reavaliação -, supõe-se que com esta expressão se queira significar a incorporação do saldo de contas chamadas flutuação de valores - flutuação de imóveis, flutuação de títulos ou flutuação de câmbios. Ora, quanto a estas, suscitam-se algumas dúvidas no plano técnico, as quais estão a ser objecto de estudo pêlos serviços competentes e oportunamente terão uma solução nesse plano.
Não há, por conseguinte, um critério discriminatório em relação a empresas de outros sectores ou a empresas de seguros, em época recente. Logo que a legislação de seguros esteja aprovada e em vigor, as empresas poderão proceder aos ajustamentos de capital, desde que os mesmos se façam tendo em atenção os objecti-
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vos que o Governo visa com essa legislação e que a Câmara Corporativa expressamente apoiou no parecer que formulou.
Ministério das Finanças, 18 de Agosto de 1970. - O Ministro das Finanças, João Augusto Dias Rosas.
Nota de perguntas
Nos termos constitucionais e regimentais, pergunto ao Governo se foram tomadas todas as providências possíveis para - na ordem imediata e na ordem futura - acautelar a situação económica de cerca de oitocentos mineiros, com a idade média de 47 anos e na sua grande maioria atacados de silicose, que foram despedidos pela empresa da mina de S. Pedro da Cova, como primeiro passo para seu encerramento definitivo.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 30 de Abril de 1970. - O Deputado, Vasco Maria de Pereira Pinto da Costa Ramos.
Resposta da Secretaria do Estado da Indústria às perguntas do Sr. Deputado Vasco Maria de Pereira Pinto da Costa Ramos:
1) As minas de antracite de S. Pedro da Cova, cujo alvará data de há mais de um século (1854), durante largos anos tiveram vida próspera e prestaram, efectivamente, boas serviços à economia nacional.
Nesse tempo, era ao carvão que recorria em grande parte a indústria nacional para a geração da força motriz, sendo também ele o principal fornecedor de calorias para os usos domésticos.
2) A exploração contínua do jazigo durante décadas foi agravando, naturalmente, os condições de rentabilidade da exploração. Concorria para isso o progressivo esgotamento dos reservas, a concomitante necessidade de explorar veios em condições estruturais menos favoráveis, o encarecimento dos transportes pelo alargamento das zonas de extracção, quer em extensão, quer em profundidade, e ainda o aumento do teor de cinzas do carvão extraído de que resultava o aumento percentual, na produção final da lavadaria, das qualidades inferiores em detrimento dos tipos de carvão mais ricos e de mais fácil colocação no mercado.
Paralelamente, foi-se generalizando a utilização pela indústria da energia eléctrica da rede nacional, cuja disponibilidade vinha crescendo, assim como se verificou o incremento da utilização do fuelóleo em muitas industrias, por ele dar maior comodidade aos industriais e exigir menores investimentos do que a queima do carvão. Até nos usos domésticos o carvão foi preterido pela electricidade, particularmente na região nortenha, onde era de custo médico no escalão inferior. E ultimamente a expansão rápida do emprego de gases liquefeitos trouxe novo e sério competidor. A situação descrita é, alias, comum a todos os países industrializados da Europa, o que tem levado ao encerramento de muitas minas com recursos de qualidade incomparàvelmente superior à de qualquer das minas nacionais.
3) Nestas circunstâncias, a política até há pouco seguida pelo Governo, de protecção aos carvões nacionais, carecia de revisão.
A construção da central térmica da Tapada do Outeiro foi um resultado dessa política; visava o duplo objectivo de resolver o problema do consumo das antracites nacionais pobres e de constituir reserva e apoio do sistema eléctrico nacional.
Sucedeu, porém, que as condições reais de exploração da rede eléctrica nacional, com os aproveitamentos hidroeléctricos que foram sendo construídos e a falta de ocorrência de grandes secas nos últimos anos não permitiu, na pratica, garantir o consumo das antracites no ritmo desejado. Ficou a caber à central da Topada do Outeiro apenas a função de ocorrer às faltas de produção nos períodos das grandes estiagens, em conjunto com a central térmica do Carregado (queimando fuelóleo das refinarias nacionais sem outra colocação no Pais e do qual há largos excedentes nos marcados mundiais). Por razões de apoio, em energia é sempre dada prioridade a central da Topada do Outeiro sobre a central do Carregado, mas este último, pela sua localização junto de um grande centro de consumo sem outros centros, bem de funcionar, por vezes, por razões técnicas de garantia de tensão no sul da rede.
Por outro lado, o encarecimento da mão-de-obra mineira e dos materiais consumidos pelas minas fez subir cada vez mais o custo da tonelada de carvão.
O Governo, ainda na linha definida de manutenção da actividade das minas, criou uma taxa sobre carvões estrangeiros geradora de fundos com que tem subsidiado as minas nos últimos anos.
4) Assim, as minas de S. Pedro da Cova só poderiam sobreviver, e mesmo assim por curto prazo, dada a escassez das reservas, mediante um regime de protecção do Estado com ajudas financeiras importantes, mantendo-se apenas uma situação de puro artifício em que a própria empresa não acreditava.
Com efeito, os accionistas tinham já reembolsado parte do capital investido, e a empresa dispunha de avultados e valiosíssimos bens imobiliários.
5) O jazigo, como se viu, não tem reservas hoje economicamente recuperáveis fora du colocação protegida dos seus carvões na central da Tapada do Outeiro.
O campo de explorado activa apresenta as escassas reservas certas da ordem do meio milhão de toneladas. Na totalidade do couto mineiro o conjunto de reservas certas e prováveis acrescentará naturalmente um pouco mais a esta tonelagem.
Mas se já aquelas 500 000 t não encontram condições para a sua extracção e consumo, muito menos se pode pensar em investimentos para a preparação de novos campos de exploração para a recuperação dos restantes.
As minas tinham, portanto, de fechar.
6) Por isso, a empresa apresentou, e insistentemente solicitou, o pedido de paralisação de lavra, nos termos do artigo 1.° do Decreto n.º 27 540, de 26 de Fevereiro de 1937.
7) O Ministério da Economia fez depender o deferimento do pedido do rigoroso cumprimento, por parto da empresa, das leis do trabalho em vigor e vem acompanhando a situação e a sua evolução pelos serviços competentes dos Ministérios da Economia e das Corporações e Previdência Social.
8) Como bem aponta o Sr. Deputado, a situação dos mineiros com menor grau de habilitações literários e profissionais, de idade avançado e atingidos por doença profissional é a que causa mais preocupações, uma vez que os outros profissionais tem
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colocação assegurada noutras minas, até em bem melhores condições de remuneração e trabalho.
Quanto aos primeiros, o Governo assegurará a sua protecção, tendo especialmente em vista que a empresa, não tendo transmitido, em momento oportuno, a responsabilidade de cobertura dos encargos de doenças profissionais, tem, no entanto, uma situação patrimonial que lhe permite - segundo os seus próprios dados - assegurar o pagamento da totalidade das indemnizações devidas, o que irá ser devidamente fiscalizado.
O Secretário de Estado da Indústria, Rogério da Conceição Serafim Martins.
O Sr. Presidente: - Estão ainda na Mesa as respostas a uma nota de perguntas apresentada pelo Sr. Deputado Oliveira Ramos e lida na sessão de 21 de Abril. Vêm de 18 instituições de previdência, cada qual respondendo de per si às perguntas formuladas.
Dada a repetição de respostas, perfazendo volumoso expediente, as mesmas ficam na secretaria à disposição dos Srs. Deputados que delas queiram inteirar-se. Ao Sr. Deputado Oliveira Ramos foram entregues fotocópias de todos estes documentos.
O Sr. Dias das Neves: - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Dias das Neves: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para agradecer a V. Ex.ª e, na pessoa de V. Ex.ª, a toda a Câmara o voto de pesar que fez exarar pelo falecimento de meu pai ocorrido no mês de Novembro.
O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Desejava comunicar à Câmara um facto que julgo digno de relevo, ocorrido quando, em Junho deste ano, tive de me deslocar ao Brasil, em rápida visita, para fazer uma palestra no Real Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro, a propósito do Dia da Raça, ou Dia de Portugal.
Tendo ido a Brasília, a pedido do nosso embaixador, para assistir a recepção que ali ofereceu às altas autoridades e Corpo Diplomático, tive ocasião de ser apresentado ao Presidente da Câmara de Deputados, Dr. Geraldo Freire. Questão de delicadeza ou de espontânea simpatia, o Dr. Geraldo Freire manteve permanente contacto comigo enquanto estivemos na residência do embaixador e foi, inclusive, tomar parte num almoço ali mesmo decidido - a recepção começou ao meio-dia - que o chefe do Estado-Maior-General das forças armadas, almirante Murillo do Valle e Silva, insistiu em me oferecer.
No decorrer deste almoço, o Presidente da Câmara de Deputados perguntou-me se eu já conhecia o Palácio do Congresso e, em face da minha resposta negativa, convidou-me para o visitar após a refeição. Ali compareci, como combinado, e depois de ser recebido pelo Presidente no seu gabinete e ter sido apresentado a alguns Deputados, o Dr. Geraldo Freire disse-me aproximadamente o seguinte:
"Está a começar o Plenário e muito gostaria que assistisse uns momentos à nossa sessão; terá o seu lugar numa cadeira de Deputados, pois isso é regimental, simplesmente não poderá usar da palavra, porque o nosso Regimento não o permite, o que considero lamentável e merecedor de ser revisto, por não conforme com o que me parece dever constituir a estrutura da Comunidade Luso-Brasileira."
Entrados na sala das sessões, o Dr. Geraldo Freire assumiu a presidência, que estava ocupada por um dos seus assessores, e anunciou a minha presença, depois de eu já ter tomado lugar numa cadeira da primeira fila.
Não interessa falar das palavras generosas que me foram dirigidas; importa, sim, frisar, e é essa uma das razões que me levam a esta intervenção, que discursaram, ou melhor, fizeram curtas mas veementes alocuções, três Deputados, dois do Partido Governamental, um dos quais membro da Comissão Especial para o Estudo dos Assuntos Culturais e Económicos da Comunidade Luso-Brasileira, e o leader da oposição, todos tendo pronunciado palavras muito expressivas de carinho, respeito e consideração pelo nosso país, com afirmações de "amor fraternal e filial", e que, terminada a fala dos três ilustres Deputados, o eminente Presidente fechou com considerações muito simpáticas, deferentes e amigas para nós, abandonando a presidência para me acompanhar de novo ao seu gabinete, onde ainda outros Deputados me foram apresentados, de todos tendo ouvido agradáveis apreciações para a nossa terra.
Confesso que me sensibilizou profundamente esta manifestação espontânea, sem qualquer preparação, pois não mediou tempo para isso, da Câmara de Deputados Brasileira, entendendo que nela não pode deixar de reconhecer-se um significado de muito realce para o prestígio de Portugal no Brasil e uma prova do manifesto e compreensivo respeito e amizade, que felizmente se encontram em meios altamente qualificados da vida brasileira para com a Nação Portuguesa. O homem em si nada representou; a oportunidade foi aproveitada para homenagear o País, e no fim de coutas a Assembleia Nacional, na pessoa de um dos seus componentes.
Soube posteriormente que dois distintos Senadores, no Plenário do Senado, no dia 10, fizeram alusão à Festa Nacional Portuguesa, com calorosas intervenções de fino recorte literário, repassadas de muito afecto, apreço e solidariedade para com o nosso país, vincando particularmente os laços de sangue, de cultura e respeito pela tradição que ligam os dois povos irmãos.
Além destes aspectos que mencionei de tanta consideração pela nossa pátria, afigura-se-me importante pedir a atenção de V. Ex.ª, Sr. Presidente, e dos Srs. Deputados para a conveniência de se pensar numa reciprocidade quanto aos nobres Deputados brasileiros (nobre é o título de que usufruem no Congresso Deputados e Senadores) e logicamente também, quanto a estes últimos, permitindo-lhes sentarem-se entre os seus pares portugueses no nosso hemiciclo, e por que não adiantarmo-nos, se é que ainda vamos a tempo, no sentido de lhes ser igualmente permitido o uso da palavra nos nossos plenários?
Como o Regimento da Assembleia não é mais do que uma regulamentação do que a Constituição estabelece quanto às atribuições e funcionamento da Assembleia Nacional, parecia-me que, estando em curso a revisão da Constituição, este ponto seria de considerar na altura própria, se se reconhecer que ali deva ser incluído, particularmente depois dos esclarecimentos que sobre nacionais brasileiros nos prestou ontem o Sr. Presidente do Conselho na sua extraordinária comunicação.
Creio que a medida, juntamente com outras sobre as quais suponho que o Governo projecta legislar, não poderia deixar de contribuir, de forma bem significativa, para uma maior, mais estreita e eficiente aproximação entre o Brasil e Portugal, aproximação por que todos ansiamos para dar realidade positiva e operosa à nossa Comunidade.
De resto, a recente atitude da delegação brasileira na Assembleia Geral da O.N.U., no seu 25.° aniversário, quanto às pérfidas e agressivas propostas sobre o caso
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português, foi de tilo fraterna e compreensiva, razão da nossa verdade que não creio que alguém entre nós a possa esquecer.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Depois, sem pretender ser especioso, julgo ainda que não deveria deixar de aqui fazer referência ao explosivo crescimento do Brasil, quer populacional, cultural e social, quer nos aspectos industrial, cientifico e de aproveitamento das suas imensas potencialidades, que tornam já hoje este imenso e próspero país fonte inexaurível de mocidade e energia criadora, numa grande realidade, e transformá-lo-ão, seguramente, em algumas dezenas de anos, num dos mais ricos e poderosos do orbe, para honra e glória suas e da Comunidade Luso-Brasileira.
Só é triste, para não dizer lamentável, que a nossa emigração, e refiro-me à que se canaliza para o estrangeiro, e não, necessariamente, àquela que deveria seguir para as províncias de além-mar - se é que esta se deva assim designar -, não volte a orientar-se para o portentoso Brasil, porque o enfraquecimento da notável projecção que durante tantas décadas ali teve a colónia portuguesa, e que já é um facto, acentuar-se-á cada dia mais em prejuízo do prestígio de Portugal. Trata-se de problema sério para o qual, todavia, se não enxerga solução próxima e válida.
Moo desejaria terminar sem uma palavra de louvor para a actividade cultural ao Real Gabinete Português de Leitura, verdadeiro templo de lusitanidade, que através de cursos rápidos de bom nível, iniciados em 1068, muito vem contribuindo para não deixar fenecer o estudo da história, da literatura, das ciências e até da geografia de Portugal e necessariamente também do Brasil, e das profundas raízes sobre ais quais se vivifica a árvore frondosa da cultura luso-brasileira. Atingia já naquela altura uns quatro milhares o número de jovens que têm frequentado esses cursos. Esta iniciativa tão frutuosa, como o próprio Gabinete, pêlos altos serviços que presta à presença espiritual e cultural portuguesa no Brasil, suo dignos do apoio oficial e do da Fundação de Calouste Gulbenkian sempre pronta a apadrinhar grandes obras de cultura e humanidade, que, aliás, já tem sido concedido àquele Gabinete. Importa, portanto, que a ajuda continue.
Também não quereria deixar de louvar o esforço que apesar de tudo se faz ainda na Colónia Portuguesa, através do seu Conselho Superior, para manter em bom nível o nome de Portugal, como o exemplifica a ida propositada de individualidade portuguesa em 10 de Junho de coda ano, para, no Rio de Janeiro, proferir uma conferência alusiva ao Dia da Raça, Dia de Portugal e também dia do imortal Luís Vaz de Camões, aproveitando a ocasião para nessa cerimónia receber e fazer brilhar um orador brasileiro de alta envergadura intelectual e ou política.
Neste ano foram mesmo dois os intelectuais brasileiros que proferiram discursos: o Senador Passarinho, Ministro da Educação e Cultura e o Dr. Clovis Ramalhete, ambos grandes amigos de Portugal.
Só foi pena que a representação portuguesa tivesse sido tão modesta, mas a culpa foi de quem indicou o nome, e não do próprio, que não pretendia nem desejava a tarefa que lhe foi cometida.
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Creio que VV. Ex.ªs registarão com especial agrado, juntando-a às notícias que tive o gosto de lhes comunicar logo na abertura da sessão, a informação das atenções de que foi alvo o nosso 2.° vice-presidente, quando recebido na Câmara dos Deputados tio Brasil, assim como terão apreciado saber como o Dia da Comunidade Luso-Brasileira foi celebrado no Senado daquele grande país nosso irmão. Estas manifestações de sentimento, expressão natural de realidades profundíssimas, são outros tantos factos a assegurarem que a Comunidade Luso-Brasileira só se reforçará e ganhará em incremento e alentos com o correr dos tempos.
Espero que VV. Ex.ªs me autorizem a comunicar à Câmara dos Deputados brasileira que foi com agrado que tiveram conhecimento das suas cortesias para com o nosso 2.° vice-presidente.
Vozes: - Muito bem!
O Sr. Homem de Mello: - Sr. Presidente: Dentro de alguns dias deverá encerrar-se, em Nova Iorque, a vigésima quinta sessão ordinária da Assembleia Geral da organização multinacional denominada "Nações Unidas".
Na qualidade de vogal da Comissão de Negócios Estrangeiros desta Casa tive a oportunidade de fazer parte, pela primeira vez, da delegação portuguesa àquela Assembleia Geral.
Ao chegar a Nova Iorque, logo referi ao representante permanente de Portugal junto das Nações Unidas - a cuja prudente e esclarecida actuação me apraz render a devida homenagem - que era minha intenção participar nos trabalhos da Assembleia Geral animado do mais sereno propósito de leal, disciplinada e aberta colaboração, o que não poderia invalidar o desejo de, posteriormente e já apenas na qualidade de Deputado, aqui prestar o depoimento que a minha consciência de homem, público viesse a indicar-me.
Pouco importa o que haja sido essa actuação, ainda que eventualmente recheada de um ou outro aspecto positivo, mas, por certo, não isenta dos defeitos inerentes a humana condição. O que importa é que, neste momento, sinta apenas - a responsabilizar o que me. proponho dizer à Câmara - a independência do meu espirito de observação, caldeada por um portuguesismo de que não seria capaz de abdicar e por uma experiência, intensamente vivida, que não poderá deixar de ter radicado significativas implicações.
Em política, a objectividade é um mito, próprio dos néscios e dos ingénuos.
Aos ensaístas e doutrinadores pode estar reservado o campo sereno das cogitações objectivas, na sua qualidade de construtores teóricos de scciedades-tipo de maior ou menor viabilidade prática. Mas ao estadista que, tendo abraçado uma causa, pugna quotidianamente pela manutenção ou conquista do poder, encontra-se vedado o clima sereno ida especulação teórica, na medida em que, na constante defesa e progressão da estratégia que adopte, há-de sempre vir a entroncar-se o interesse da comunidade. No dizer insuspeito, mas esclarecido, de Disraeli, acrescentaria que o homem político só o será verdadeiramente desde que actue por paixão, ou seja, por amor àquilo que em última instância lhe está confiado: o interesse nacional.
Esta declaração liminar visa a afastar qualquer tentativa - já não digo da parte de terceiros, mas da minha própria - no sentido de me apresentar ante os meus pares como uma espécie de "cidadão do mundo" que houvesse assistido aos trabalhos da Assembleia Geral como observador independente capaz de extrair conclusões "objectivas" resultantes de uma serena passagem pêlos auditórios da O. N. U. Não; falo aqui - como tive a honra e o grato privilégio de falar além - na qualidade de portu-
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guês, sentindo na própria carne as afrontas e as injustiças cometidas contra Portugal.
Sabe-se que nunca fui patrioteiro, que não aderi nem adiro a psicoses nacionalistas mais ou menos doentias, que não aceito monopólios de verdade, nem "unidades nacionais" fabricadas a custa de mordaças ou imposições. Amo o meu país com a paixão própria de um filho, mas com o discernimento forjado pela inteligência, pela cultura e pelo enquadramento na sociedade e na época em que vivo. Amor ao País tão firme, mas tão consciente que não é de molde a que se obnubile a clareza do raciocínio, se afrontem as regras da lógica, se deturpem os próprios factos, se escamoteie a realidade, no intuito de poder extrair conclusões somente válidas para deleite próprio ou mistificado consumo interno. Amor ao País que torna possível - uma vez proclamado o estado de espírito que me domina - partir de um contexto em que os factos sejam respeitados e as premissas não se apresentem adulteradas capciosamente, de molde a demonstrar que a razão de Portugal, tão escassamente reconhecida, pode ser validamente oposta e sustentada face a maioria que domina o areópago internacional.
Afigurou-se-me que teria de começar assim, porque devo a todos quantos me elegeram e àqueles que se sentam nas bancadas da Representação Nacional o testemunho autêntico do meu esquema de pensamento e actuação. Cícero haveria de acrescentar: a vós, agora, de me condenar ou absolver l
Sr. Presidente: A Câmara há-de sentir um mínimo de curiosidade na audição do depoimento de quem terá surgido em determinada altura aos olhos de uns tantos como incómodo arauto de rumos diversos daqueles que oficialmente houve por bem seguir-se.
Perdem-se, todavia, na poeira das minhas recordações as injustiças de que possa ter sido vítima, a ponto de sentir o necessário à - vontade para solicitar que me seja consentido voltar a página definitivamente, na certeza irreversível de que não podem ter estado nunca validamente em causa o meu amor a Portugal e a minha dedicação ao ultramar português.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: Ao decidir-me a solicitar a palavra, com o fim de versar o tema "Portugal e as Nações Unidas", interroguei-me sobre qual deveria ser a maior incidência das minhas considerações. E concluí que talvez tivesse algum interesse esboçar ante a Assembleia uma tentativa de explicação e resposta para as dúvidas e perguntas que, não raro, perturbam a tranquilidade de consciência política de muitos portugueses:
Por que vota contra Portugal a esmagadora maioria dos países representados na O. N. U.?
Não seria possível, mediante u na acção diplomática mais interna, ou a ravé de qualquer outro processo, modificar sem [...ilegível...] estado de coisas, de que resul a um, pelo [...ilegível...], aparente isolamento internacional?
O "processo" das Nações Unidas está feito.
Produto do idealismo norte-americano do pós-guerra, a organização nasceu com o fim de transplantar para a ribalta internacional as práticas da democracia americana. Integrada, porém, a União Soviética no grupo dos nações vencedoras, lego aí se iniciou o equívoco que haveria não só de perdurar, mas até de vir a acentuar-se com o decorrer do tempo. Esculpidas ao sabor da democracia, como símbolo reluzente da vitória desta sobre a ditadura, as Nações Unidas começaram por albergar no seu seio o mais feroz e inequívoco exemplo de governo tirânico que alguma vez imperou sobre a face da Terra; constituídas a sombra das bandeiras desfraldadas pêlos "ventos da história", admitiram como membro permanente do seu Conselho de Segurança o mais implacável e porventura o maior de todos os imperialsmos; nascidas no dealbar da chamada libertação dos "povos oprimidos", reconheceram como pedra fundamental do seu xadrez o mais flagrante exemplo de colonialismo que a história regista. Com tamanhos vícios a nascença, as Nações Unidas haviam de não mais saber ou poder libertar-se do seu "pecado original".
A fórmula mágica que os Americanos cultivam quase religiosamente, one man one voto, foi trasladada para a organização internacional, cobrindo de ridículo ou falseando resultados de votações, em que países com menos de 500 000 habitantes surgiam no areópago internacional com expressão idêntica à de impérios albergando centenas de milhões!
Mas não eram só os "princípios" que os Norte-Americanos pretendiam conservar e homenagear: convictos de que a pulverização de Estados das Américas Central " do Sul sempre lhes haveria de proporcionar o domínio numérico da Assembleia, limitaram-se a conceder - ao arrepio do tal princípio ono state one voto - o direito de veto aos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança. A Baseia não deixou os seus créditos por mãos alheios, e, enquanto aguardava que o despertar rios povos colonizados . . . pêlos outros, balcanizasse a África e a Ásia, foi tornando (praticamente sinónimas as duas palavras Dão parecidas, mas de significado quase oposto: o voto e o veto . . .
Com a estrada de todo esse mundo novo, o desequilíbrio dos blocos desfez-se e a América do Norte para não perder completamente o controle da organização - teve de passar a preocupar-se com o sentido dos votos dos novos Estados que as Nações Unidas iam acolhendo . . .
Entretanto, o Ocidente ia-se retirando da África e da Ásia, não só porque a resistência militar contra os frémitos de independência lhe seria penosa e a guerra contra as potências do Eixo o havia deixado exaurido, como também porque sentia e sabia que já havia explorado suficientemente as terras e as gentes que colonizara.
Quer isto dizer que, além de se ter retirado, o Ocidente fê-lo com um complexo de culpa cujo palco não podia ter mais feliz localização do que os auditórios da O. N. U. E ninguém admitiu ou quis admitir que, pelo menos relativamente a Portugal, a realidade fosse diversa e não houvéssemos de seguir exemplos alheios gerados à sombra de circunstâncias que de forma alguma eram as nossas.
Esteva criado o caso português; aí se insere e então se inicia a mais rude e não sei sã a mais decisiva batalha diplomática da nossa história.
Penso que dentro do contexto que acabo de esboçar - e que a minha recente experiência terá ajudado a tomar mais vivo - não será difícil à Câmara um ligeiro esforço de compreensão no sentido de situar autenticamente a posição de Portugal nas Nações Unidas e mo xadrez político internacional, ambos porventura, nuas erradamente considerados idênticos quando são inteiramente diversos.
É claro que não pode deixar de impressionar os Portugueses - sejam os poucos a quem é dada a possibilidade de conhecer e de participar ma vida da Organização, se jam aqueles que apenas pêlos órgãos de informação ou outras fontes acompanham a actividade da O. N. U. -, não pode deixar de os impressionar a expressão das votações que surgem a fustigar as mais variadas resoluções condenatórias daquilo a que lá se chama "a política colonial portuguesa".
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Penso não haver o menor interesse em sofismar a realidade: é indiscutível que o ambiente que se respira na O. N. U. não é favorável a Portugal, para não dizer que nos á inteiramente desfavorável.
A verdade, porém, é que se trata de circunstância muito menos grave do que à primeira vista possa supor-se, embora não fosse prudente considerar despreocupadamente a situação.
A política portuguesa não tem de processar-se à luz das votações da O. N. U. nem tem de se movimentar com o fim de agradar a este ou àquele. A política portuguesa defende exclusivamente o interesse de Portugal.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E claro que, fazendo o País naturalmente parte da comunidade de nações e não sendo possível nem desejável bastar-se a si próprio, afastar-se da convivência com os outros povos, furtar-se a apoios económicos e militares indispensáveis para poder assegurar a soberania política e a integridade territorial, o isolamento internacional, além de inviável, seria pura e simplesmente catastrófico. Daí não ter deixado de sentir um calafrio quando vozes responsáveis surgiram a defender a tese de "orgulhosamente sós".
Mas não se creia, por outro lado, que a circunstancia de nos encontrarmos praticamente insulados nas Nações Unidas seja sinónimo de ostracismo internacional. Se assim fosse, já há muito que teríamos soçobrado - e é bem palpável estarmos a caminhar na esteira da vitória.
A debilidade da nossa posição na O. N. U. não é mais do que uma resultante dos vícios iniciais da organização que o rodar do tempo só poderia, infelizmente, vir a acentuar.
Atentemos rapidamente.
Quando se diz que a África ascendeu à independência, não se caracteriza inteiramente a realidade, porque o que de facto aconteceu foi que a África Negra (e a África Muçulmana, no Norte) alcançou a independência política - ou uma certa forma de independência política para sermos mais exactos . . . Daqui se infere que as reivindicações dessa África relativamente à posição portuguesa jamais serão susceptíveis de acalmia enquanto a Guiné, Angola e Moçambique não se tornarem estados negros, em modelo decalcado dos demais. Enquanto a África não austral vislumbrar a presença de cidadãos de origem europeia detentores de qualquer parcela de poder político, não cessará a sua agressividade e a sua luta contara esses perturbadores do racismo negrófilo, sejam eles de que origem forem. Daqui se conclui facilmente que as votações dos países africanos nunca deixarão de ser "contra Portugal" enquanto houvermos por bem mão renunciar à missão que acreditamos seja nossa e na qual estamos decisiva e definitivamente empenhados.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - No que ao Médio Oriente e à Ásia diz respeito, a situação apresenta-se bastante semelhante, porque o Asiático - duramente explorado e longamente dominado pelo homem branco - sente uma irreprimível tendência para se solidarizar com as reivindicações racistas do africano de cor. E bem visível o ódio ainda entranhado nas vísceras dos distintos representantes da União Indiana na O. N. U. que, não contentes com o esbulho que nos fizeram, surgem sempre como os mais aguerridos arautos da cruzada antiportuguesa.
Impossível, pois, contar com os votos asiáticos. Uma ou outra excepção pode ter o maior interesse e significado fora do contexto da O. N. U., mas dentro da organização - onde apenas contam os votos - torna-se irrelevante.
E a América? E a Europa?
A América -refiro-me neste momento a todo o continente - vota de uma forma geral contra nós ou abstém-se por mero complexo anticolonialista, na impossibilidade de discernir entre o colonialismo que efectivamente verbera e a tão peculiar maneira portuguesa de estar no Mundo, diametralmente diferente daquele. Exceptua-se, evidentemente, o Brasil, que vem, desde há dois ou três anos, apoiando corajosamente a posição de Portugal.
Não parece, assim, que seja possível vir a contar com uma significativa alteração de votos relativamente à maioria dos países americanos, se bem que uma maior flexibilidade da nossa política externa e determinado acelerar do processo de desenvolvimento das províncias ultramarinas portuguesas possa proporcionar algumas adesões ou expectativas benevolentes. Mas aqui é óbvio que "votar contra" não tem o mesmo significado que a posição dos países africanos: a maior parte do continente americano, como se sabe, mantém connosco ás mais cordiais relações. O caso específico dos Estados Unidos - pela importância decisiva de que se reveste - permitir-se-me-á que o deixe para o fim.
A velha e nobre Europa ocidental - a que pertencemos e de que é mister continuarmos a fazer parte integrante - nem sempre vota contra nós, mas quase sempre se recusa a votar a nosso favor.
Havendo descolonizado e tendo-se reduzido, politicamente, à estreiteza geográfica continental, sem significativos núcleos populacionais radicados nos. territórios que outrora dominou, o Ocidente europeu tem dificuldade em nos apoiar: não só não consegue descortinar a diferenciação nítida entre o colonialismo que praticou e a presença multicontinental dos portugueses, como considera de primacial importância não perder a influência junto dos antigos territórios coloniais, cuja neocolonização se apresenta, por vezes, com aspectos bastante sedutores. Votar a favor da política portuguesa seria afrontar a animosidade do chamado Terceiro Mundo. Mas o Ocidente europeu não chegará a ser-nos hostil se soubermos ser coerentes e se demonstrarmos efectiva vontade de realizar a tarefa imensa que nos aguarda.
Despiciendo referir a posição do bloco comunista, cuja agressividade é fruto convergente da nossa impermeabilidade política, da cobiça pêlos territórios que há séculos descobrimos, civilizámos e esternos a desenvolver e da demagógica solidariedade aos países do já referido Terceiro Mundo de que a Rússia carece essencialmente como destinatários do germe revolucionário marxista, como novos mercados a explorar e conquistar e como detentores da maioria dos votos nas Noções Unidas.
Besta analisar a posição dos Estados Unidos.
Com a cisão do mundo do pós-guerra em dois grandes blocos (a China comunista tente desesperadamente formar um terceiro, na maior parte à custa do imperialismo moscovita . . .), tornou-se inviável a uma potência não atómica e de débil expressão demográfica e económica como Portugal traçar a sua própria rota. Temos, a este respeito, operado prodígios que a história diplomática das últimas décadas há-de condignamente assinalar. Mas não podemos aventurar-nos por caminhos demasiadamente independentes, sob pena de soçobrarmos & míngua de capacidade de autodefesa.
Por vocação geográfica e histórica fazemos parte integrante do bloco ocidental, cuja chefia e responsabilidade defensiva pertence aos Estados Unidos da América. Isto significa que nem sequer nos é dada a escolha de leader,
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porque, pelo menos até agora, o Ocidente não pode ter outro.
Poder-se-á tentar e conseguir, em plano meramente pragmático, a suficiente autonomia e independência quanto à condução da política interna, imas não se afigura realista acreditar na susceptibilidade de se ir muito mais além, sob pena ide virmos a ser colhidos de surpresa pela voragem irreversível da força centrífuga que permanentemente se exerce de um para outro dos dois grandes blocos.
De tudo isto parece resultar a conclusão de que ao pedirmos a compreensão e apoio da América do Norte é mister que aceitemos operar também um esforço no sentido de compreendermos as dificuldades em que permanentemente se debate a estratégia da diplomacia americana. Àquilo que para nós, visto apenas das janelas deste Palácio de S. Bento ou das do Largo do Rilvas, se afigura como indiscutível, pode representar, para os Estados Unidos, um esforço inviável de compreensão.
A política externa da América do Norte passa por algumas dezenas de capitais e mão só por Lisboa. Na medida em que os Estados Unidos não podem consentir que a Rússia alcance novas hegemonias - o que, tílias, diga-se em abono da verdade, nem sempre acontece - e também porque carecem de criar novos mercados -, não sendo indiferentes à sedução neocolonizadora, arriscar-se-iam a perder o já precário apoio de alguns países afro-asiáticos no dia em que surgissem na O. N. U. inteiramente ao lado de Portugal. Acresce que qualquer político norte-americano só pode pensar atingir as ombreiras do poder - executivo ou legislativo - desde que conte com o apoio dos votos dos negros. Mercê de uma propaganda sistemática, habilmente conduzida e abundantemente financiada, o eventual apoio à posição ultramarina portuguesa acarretaria, para quem o adoptasse, estrondoso insucesso eleitoral. De pouco nos valeria ter apenas candidatos corajosamente pró-portugueses . . .
Acredito, todavia, que venha a ser possível, com o rodar do tempo, melhorar a nossa posição junto da opinião pública norte-americana (por vezes tão infantilmente influenciável, de molde a permitir que os responsáveis possam apoiar-nos mais afoita e abertamente.
Como se compreenderá, é assunto de extrema delicadeza, que deve ser deixado nas mãos argutas e sob a directa responsabilidade daqueles a quem incumbe a tarefa de dirigir a política externa do País. Sob este aspecto, apenas desejaria que fôssemos mais compreensivos e não emitíssemos juízos de valor apressados. A América merece o nosso respeito e a nossa estima.
Sr. Presidente: É mais do que tempo de concluir.
Acabo de trazer à Câmara as reflexões suscitadas pela extraordinária experiência que me foi dado poder viver.
Considero preferível - e a Câmara por certo me acompanhará - que cada um tire as suas próprias conclusões.
Limitar-me-ei, portanto, a acrescentar que as naturais preocupações, que não me furtei a exprimir, não são de molde n quis fermente no meu espírito qualquer espécie de duvido nem quanto à rectidão do caminho a percorrer, nem tão-pouco quanto ti vitória final que havemos de alcançar.
Vozes: - Muito bem l
O Orador: - Agradeço às Nações Unidas o haverem-me proporcionado o ensejo de poder regressar ao meu país com a consciência ainda mais tranquila do que no momento da partida e com um orgulho ainda maior em poder participar, mesmo que modestamente, na batalha decisiva em que estamos empenhados, batalha decisiva que às gerações vindouras cumprirá reconhecer e por certo celebrar com emoção e orgulho.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Oliveira Dias: - Sr. Presidente: Iniciaram-se no dia 24 de Novembro último, em Bruxelas, as negociações de Portugal com o Mercado Comum, que, segundo o pensamento do Governo, têm, da nossa parte, o objectivo de "promover a progressiva integração da economia portuguesa na economia da Europa Ocidental, em termos de permitir o aumento de eficiência das actividades produtivas nacionais e de favorecer o mais rápido desenvolvimento da economia portuguesa".
A Câmara está, certamente, consciente da transcendência do momento que marca uma etapa da maior importância na luta pelo nosso desenvolvimento económico--social, em coordenação com os nações amigas da Europa.
A política actual do Governo de aproximação e negociações com estas e outras nações amigas em todos os continentes, ordenada à consecução da paz, melhoria de relações com outros Estados, defesa dos nossos interesses e obtenção de mais elevados níveis de prosperidade para os territórios portugueses - política esta que tem encontrado elevada expressão na incansável e certamente profícua actividade do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros -, entendo que merece não só o aplauso, mas o activo apoio da Assembleia.
Assim, proponho que a Câmara:
1) Se solidarize com o Governo no esforço desenvolvido em ordem a intensificar contactos e incentivar a melhoria dos nossas relações internacionais;
2) Exprima o voto de frutuosos resultados para as negociações de Bruxelas, por forma que seja possível conseguir com a C. E. E. o arranjo que melhor possibilite a aceleração do nosso processo de desenvolvimento;
3) Solicite do seu Presidente que transmita ao Governo estes votos.
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: O Sr. Deputado Oliveira Dias concluiu a sua breve intervenção propondo que a Câmara expressasse determinadas formas de apoio à acção política e diplomática do Governo.
Estou perfeitamente consciente da delicadeza que há em pedir à Câmara que se associe a qualquer proposta de resolução ou a qualquer proposta de manifestação de intenções ou de opiniões sem prévio debate esclarecedor. Mas, Bem. embargo de estar também perfeitamente consciente da falibilidade do meu juízo próprio, parece-me que as conclusões do Sr. Deputado Oliveira Dias são suficientemente genéricas e apresentam-se suficientemente coincidentes em objectivos largamente aceitáveis para as poder submeter à atenção da Câmara sem mais discussões.
Nestes termos, vou mandá-las reler, para que VV. Ex.ªs se inteirem melhor, e de novo, delas. E pedirei aos Srs. Deputados que entendam poderem desde já solidarizar-se com as sugestões do Sr. Deputado Oliveira Dias se mantenham como estuo nos seus lugares. Aos demais, que se levantem, a fim de poder concluir se posso, em
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nome da Assembleia, transmitir ao Governo os votos expressos pelo Sr. Deputado Oliveira Dias. Vão ser lidas as suas conclusões.
Foram lidas.
Consultada seguidamente a Câmara, foram aprovadas.
O Sr. Miller Guerra: - Sr. Presidente: Consta que se projecta a construção de um novo hospital em Lisboa. É caso para nos congratularmos, porque as carências são cada vez maiores: em primeiro lugar, pelo aumento das necessidades médicas; em segundo lugar, por diminuição da rentabilidade dos hospitais.
Não é, porém, a análise do estado das instituições hospitalares que motivou esta intervenção. Tencionamos versar a matéria Desenvolvidamente ainda nesta sessão legislativa. Com efeito, mau grado as diligências feitas no passado, as que se tentam no presente e aquelas que se anunciam, a assistência dos hospitais preocupa todos os que por necessidade ou profissão os frequentam.
Aproveitando o ensejo proporcionado pelo hospital que se projecta, tecerei considerações acerca do ensino da medicina, concluindo por um alvitre dirigido a quem de direito, ou seja às entidades governantes.
Presentemente tende a abandonar-se a noção de hospital escolar, porque a função de ensino é comum a todos os hospitais, desde que possuam determinadas características. Ã. função assistencial primitiva somam-se funções educativas e de investigação como tarefa normal, e não se compreende que se construa um hospital de categoria que se não consagre simultaneamente ao progresso cientifico, à assistência e ao ensino.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Em suma, pode afirmar-se que o papel dos hospitais modernos consiste na transmissão e pesquisa do conhecimento e na sua utilização completa, ou, segundo a fórmula habitual, no tratamento, ensino e investigação.
Este enlace da teoria com a prática observa-se no currículo médico e prolonga-se, fortalecendo-se, ao longo da carreira profissional. Daqui decorrem duas consequências: a primeira, é que não se faz bom ensino da medicina em maus hospitais; a segunda, corolário da desta, é que o mau ensino prepara médicos medíocres, e estes, por sua vez, reflectem as suas insuficiências nos hospitais. Assim se estabelece um círculo vicioso, no qual, felizmente, ainda não calmos, mas que infalivelmente nos espera se se não interrompe a marcha da decadência.
Não merece a pena repetir o que disse no aviso prévio que apresentei a esta Assembleia em Abril passado sobre as Universidades tradicionais e a sociedade moderna.
Peço licença para recordar os pontos essenciais: o desproporcionado número de alunos em relação ao corpo docente, às instalações, ao equipamento pedagógico e aos meios financeiros, precipitou catastroficamente a crise que estava latente no ensino superior. Hoje os alunos formam multidões compactas nos anfiteatros, cuja capacidade foi há muito excedida; acumulam-se no teatro anatómico e nos laboratórios, disputando um lugar incómodo; e, pior que tudo isso, invadem as enfermarias e as consultas, onde o objecto de estudo não é o cadáver, a peça anatómica, a preparação histológica, mas seres humanos que generosamente prestam a sua colaboração ao ensino. Aqui, o caso muda de figura: além da questão pedagógica banal, levanta-se um problema ético. O ponto é delicado em extremo e não o desenvolvo por motivos óbvios; mas não prescindo de o assinalar para que se veja o estado a que chegou o ensino da Medicina.
Se todos os estabelecimentos universitários suportam o efeito das improvidências e dos erros passados, no que respeita a modernização e planeamento a Faculdade de Medicina suplanta os demais, em virtude de os prejuízos atingirem ao mesmo tempo o campo universitário e assistência! Já não bastava o mau ensino, era preciso que o prejuízo molestasse os que nada têm a ver com isso - os doentes que esperançadamente procuram os hospitais.
Continuemos. É de sobra conhecido que a medicina experimentou nas últimas décadas um avanço prodigioso. Este surto é simultâneo com o desenvolvimento geral.
A elevação do nível de vida, a extensão dos seguros sociais e a intensificação das aspirações e expectativas aumentou grandemente as necessidades médicas, e daí vem a afluência aos serviços de saúde. Para responder à pressão social e ao progresso das ciências médicas operou-se a transformação dos hospitais nos países avançados, transitando de instituições artesanais para "empresas hospitalares". As principais características são as seguintes: concentração dos meios humanos e materiais, eficiência, rentabilidade, planeamento, predomínio da investigação e procura das soluções inovadoras sobre as práticas e comportamento tradicionais.
Ora, DÓS não acompanhávamos o movimento modernizador ou, melhor dizendo, acompanhámo-lo no que tem de mais fácil e espectaculoso: a construção de hospitais.
Dos elementos propulsores da medicina cuidou-se mal: pouco e, sobretudo, com intercadências e atrasos. Passa-se isto numa época em que o factor humano e científico ocupa- lugar. O resultado da contradição enfare o período de progresso que a medicina atravessa e os limitados meios de que dispomos tornou mais flagrantes as deficiências. Ë preciso agora encarar os tarefeis difíceis da reforma que bem sido diferida - mudar os hábitos e os processos de trabalho, quebrar as resistências, abrir caminhos, meter ombros à grande empresa modernizadora.
Estamos persuadidos de que este desiderato só se alcança no caso die se fundarem hospitais modernos, que incluam também funções educacionais. Os antigos hospitais escolares, por causas e motivos que examinámos noutra altura, suo refractários à reformação. Dizendo de outro modo: as instituições universitárias não se auto-reformam, o que não significa, está bem dei ver, que sejam incapazes de se modificar. Parece-nos, todavia, com proves assente ma história e na- actualidade, que é necessário uma força estimulante externa (a sociedade, o Estado, uma fundação poderosa) que as obrigue a modernizar. Esta é condição sine qua non. A outra é possuírem forças internas (grupos de docentes e discentes) capazes de tomar a iniciativa, dinamizando-os por dentro.
Em qualquer das nossas Faculdades existem pessoas e grupos renovadores, mas são impotentes contra a inquebrantável resistência dos comodistas e conservadores, bem defendidos pelas estruturas tradicionais. O sistema domina sem custo os desejos, a vontade e as iniciativas. Pode consentir pequenas alterações sem alcance, que não modifiquem nem ameacem o statu quo, mas não vai além disso. E o pior é modificações deste teor criarem. a ilusão de se estar reformando, quando, na verdade, se está apenas restabelecendo o equilíbrio perturbado.
A Faculdade de Medicina de Lisboa, que se debate com angustiosas carências de instalações e de meios, pediu uma nova Faculdade há algum tempo. Porém, os seus intentos parece estarem contrariados, porque se vai dar outro destino ao antigo edifício do Campo de Santana. É claro que o reinstalação de parte dos serviços na antiga Faculdade não resolvia as dificuldades, mas atenuava-as.
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Posta de lado a ideia, alvitramos outro solução, esta de acordo com os ideias que vimos defendendo: a criação de uma Faculdade de Medicina, aproveitando pana isso o hospital que se projecta edificar no Restelo.
Mas já que está vencido um dos piores obstáculos à instauração da mova Faculdade, que é o edifício, o hospital projectado preenche simultaneamente duas enormes lacunas - a do ensino e a da assistência. Com efeito, parece um ilogismo desaproveitar a ocasião de resolver dois problemas difíceis e, diríamos, crónicos - formar mais médicos e atender mais doentes. Poucas vezes se terão reunido condições tão propícias para solucionar problemas sócio-médioos, de uma só vez resolvem-se dois.
Segundo a nossa maneira de ver, a nova Faculdade deve ser nova e inovadora, de modo que aí se ensaiem métodos de organização escolar e assistência!, científicos e tecnológicos, modernos e progressivos, os quais, pelas razões que sabemos, são presentemente impraticáveis. Um programa assim pressupõe:
1.° Que a nova Faculdade seja independente e autónoma, isto é, sem sujeição à antiga Faculdade e possuindo autonomia pedagógica e administrativa;
Vozes: - Muito bem!
O Orador:
2.° Que a organização do ensino e da investigação se efectue por departamentos disciplinares, abandonando a arcaica centralização pedagógica, assistencial e de pesquisa na cátedra e nos pequenos e pouco produtivos laboratórios;
3.º Que o recrutamento dos professores se faça por critérios diferentes daqueles que, contra ventos e marés, item prevalecido e que assentam na cooptação, processo paralisante que sustenta as autocracias universitárias;
Vozes:- Muito bem!
O Orador:
4.° Que o corpo docente seja constituído por pessoas novas na idade e nas ideias, e não somente nas ideias, como tantas vezes se pede.
Neste ponto, convém fazer duas reflexões para atalhar aos argumentos habituais dos cépticos que sustentam hão haver gente para os cargos docentes de outra Faculdade. Eu diria (precisamente o contrário - a dificuldade está na escolha, não ao número. Existem na Faculdade de Medicina jovens talentosos com minguadas esperanças de acesso ao professorado. Além disso, há nos Hospitais Civis de Lisboa largo campo de recrutamento, aliás tradicional, porque muitos dos docentes procedem desse reputado estabelecimento. Em outras instituições públicas e privadas há médicos jovens de valor. Por fim, andam dispersos por essas Europa e América dezenas de cientistas médicos e tirocinantes de especialidades várias, alguns possuidores de títulos lá conquistados, que regressariam ao primeiro aceno de uma Faculdade que lhes concedesse meios de estudo e abrisse a carreira docente ou de pesquisa.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - A segunda objecção fundamenta-se no receio de que o número de médicos aumente exageradamente e voltemos a experimentar a situação de há trinta ou quarenta anos - a pletora médico.
Sem entrar em considerações miúdas, pode afirmar-se afoitamente que nos próximos anos os médicos vão faltar. Já agora, quem esteja com atenção ao que se passa no campo da medicina, descobre sem dificuldade sintomas que prefiguram as carências futuras daquilo que hoje se denomina "a mão-de-obra médica". E mais que certo o aumento gradual do consumo de serviços clínicos, como sucede em toda a parte.
A Federação de Caixas de Previdência, que beneficiou da pletora médica no tempo em que foi instituída e a sombra disso explorou os médicos, experimenta agora dificuldade em recrutá-los. A situação vai-se agravar infalivelmente e o que agora sucede em sectores particulares generalizar-se-á.
Uma Faculdade de Medicina leva a erigir um lapso de tempo que oscila entre cinco e dez anos; o médico demora a licenciar-se e a completar o tirocínio pelo menos doze anos. Isto significa que se principiasse já o novo hospital colheríamos os primeiros frutos daqui a uma dúzia de anos. Será exagero asseverar que se devia ter pensado nisto há mais tempo? Que em matéria de previsão e planeamento dos serviços de saúde, previdência e ensino médico dominou o improviso, o isolamento, os pontos de vista particularistas?
E agora o ensejo de dar um impulso à política da saúde, compreendida na sua quádrupla dimensão: hospitalar, saúde pública, previdência e formação médica.
Terá chegado o momento do arranque inovador, ou teremos de continuar esperando?
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua o debate na generalidade sobre a proposta de lei de autorização de receitas e despesas para 1971.
Tem a palavra o Sr. Deputado Boboredo e Silva.
O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Em duas das minhas intervenções da sessão legislativa transacta -Lei de Meios e tomada de contas de 1968 -, a propósito das dificuldades que a Nação atravessa, tendo de bater-se em África numa luta que é total e que envolve ou devia envolver- todos as actividades nacionais e não podendo abrandar, antes acrescer, o seu desenvolvimento económico, que é vital, referi-me sucintamente, mas com a clareza indispensável, tenho essa sensação, à imperiosa necessidade de haver a maior austeridade e economia nos gastos não essenciais em todos os actos da Administração e vida públicas, evitando despesas sumptuárias e doudo assim exemplo aos particulares, para que todos os esforços convirjam no sentido de investir ou gastar no que é reprodutivo.
Por uma questão de coerência e de convicção não poderia deixar de voltar a aflorar esta matéria, até porque me parece que as minhas sugestões, ou melhor, os meus apelos, de pouco serviram, pois não se enxergou, pelo menos eu não a descortinei, a menor redução na intensa vida social dos órgãos do Estado, nas deslocações ao estrangeiro, nas viagens mais ou menos desnecessárias, nos banquetes, nos congressos e outros encontros, quantos deles porventura improdutivos ou, pelo menos, de menor significado.
Não se confundam, todavia, estas considerações com o desejo de qualquer isolacionismo, que hoje é incompatível com o progresso dos povos, designadamente dos
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menos desenvolvidos técnica e economicamente. Limito-me a condenar o que DOO é, presentemente, indispensável nesta contexto.
Seria interessante saber-se quanto se gastou ao longo do ano em actividades dispensáveis nesta fase complexa que a Nação enfrenta. E, entretanto, restringem-se, quando não se recusam, por exaustão de dotações, não o duvido, menores verbas destinadas ao bem-estar e promoção sócio-económica das populações, como estradas municipais, abastecimento de água e de electricidade, esgotos, postos sanitários e caminhos vicinais a povoações carecidas de tudo, onde se vive ainda boja ,em muitos aspectos, como no princípio do século.
Todos sabemos que a grande maioria das câmaras municipais pouco ou nada pode fazer para a resolução destes graves problemas, par ausência da receitas e técnicos. É ponto que precisa de uma solução, que, aliás, se não vislumbra fácil.
Discutem-se, certamente, verbas para fins militares que ajudariam a poupar vidas pela eficiência e segurança que confeririam Às operações, permitindo-lhes alcançar eficazmente objectivos que de outro forma ou DUO o são, ou somente à custa de perdas, porventura, evitáveis. Devo, todavia, sublinhar, nesta altura, que as perdas em combate são modestíssimas se as compararmos, por exemplo, com os 2 008 em acidentes de viação na metrópole em 1969 - pouco menos que as sofridas nas trás províncias marterizadas desde o início do terrorismo até ao fim deste mesmo ano. Depois, há que ter presente que, dispondo os militares da meios apropriados e devidamente coordenadas as suas acções com as autoridades administrativas e policiais, o que numa é de mais acentuar, formando um todo homogéneo que reputo fundamental, seria a forma de se conseguir uma verdadeira e eficaz frente de contra-subversão, que deveria englobar todos os recursos disponíveis.
Por outro lado, a atitude e procedimento dos chamados países evoluídos e cristãos - o tal mundo ocidental -, onde o respeito pêlos valores morais deveria ser um axioma, não me parece que nos sejam tão favoráveis como seria lícito esperar, sendo prudente admitir cada vez mais dificuldades futuras em questões primordiais, como sejam aquisições de certo material e equipamentos que, infelizmente, ainda não fabricamos, apesar de enfrentarmos uma guerra de usura há quase dez anos.
O caso de Cabora Bassa, expressão máxima do nosso desenvolvimento económico para fin pacíficos e de bem-estar das populações, é gritante e significativo. Essa torpíssima campanha dos .nossos inimigos não pára, já produziu alguns frutos, e da sua orquestração, generalizada à nossa posição em África no seu conjunto, merecem especial referência a famigerada conferencia de Roma, de 27 a 29 de Junho, pela bênção que receberam os principais cabecilhas responsáveis pelo terrorismo, e a cimeira dos países não alinhados, que deveria antes chamar-se dos países antiocidente, tais os ataques feitos a várias nações do mundo livre, que teve lugar em Lusaca, em Setembro, e que, como aliás era dê esperar, foi mais um impulso para a terrível intriga,- agressividade e injustiça que se desenvolvem contra Portugal. Sem já falar na O. U. A., por ser cediço o seu repertório contra nós, e na decisão do Conselho Mundial das Igrejas, que brada aos céus, por associar o nome de Cristo a malfeitores, é também credor de uma palavra de reacção indignada o escândalo das sessões da Assembleia Geral do 25.° aniversário da criação da O. N. U., a que prefiro não fazer comentários, por ter já tido divulgação que não podia passar despercebida a ninguém. Será, contudo, ainda possível que Portugal contribua com numerário para as despesas de tão inqualificável areópago?
Voltando ao tema inicial das economias em gastos não essenciais, direi que poder-se-á alegar que não podem comparar-se as menores verbas consumidas em despesas dispensáveis com as muito maiores que as necessidades anteriormente enunciadas exigiriam. Desde logo, em quantitativo assim é, mas os princípios é que se me afiguram distorcidos, e ainda que insignificantes relativamente aos 30 milhões de contos do Orçamento Geral, sempre ajudariam a dulcificar alguns anseios mais prementes.
Estamos fazendo um grande esforço, tem de reconhecer-se, na promoção escolar, sanitária e sócio-económica das populações na metrópole e no ultramar, esforço que, todavia, está longe de ser o que todos desejaríamos para suprir atrasos lamentáveis. No ultramar, então, esta promoção sócio-económica é o verdadeiro motor capaz de reconduzir para junto de nós UB populações forçadas pela coacção inimiga, usando dos mais violentos e cruéis processos, a afastarem-se das suas áreas de vivência, constituindo a melhor forma de pôr em prática uma contra-subversão válida e eficaz, pois não é apenas com meios militares que se soluciona um tipo de guerra revolucionária, como já se reconheceu há muito e se tem, felizmente, exemplificado em várias zonas das nossas províncias ultramarinas, cujos chefes merecem aqui uma palavra de alto apreço e consideração.
Permito-me fazer agora uma alusão pessoal a um problema ligado a tão espinhosa matéria: por num, considero que a cabeça da administração civil e o comando-chefe das Forças Armadas deveriam estar investidos na mesma entidade; refiro-me, desde logo, às províncias onde há terrorismo, por ser, a meu ver, a verdadeira forma de obter eficiente e produtiva coordenação da actividade de autoridades civis, militares, paramilitares e policiais, coordenação que, neste tipo de luta total, é mais que fundamental, pois é questão de vencer ou ser vencido.
Continuando a referir-me à metrópole, desejaria ainda acrescentar algumas palavras, porque o atraso de certas regiões é tão chocante que só mediante tenaz esforço será possível ao menos minimizá-lo, já que não se consegue eliminá-lo de um dia para o outro.
O meu distrito - a Guarda - é presentemente dos mais marcados, para não dizer o mais marcado, por carências e atrasos de todas as espécies. A maioria das câmaras municipais não tem receitas que permitam um mínimo de obras, dependendo totalmente das verbas que lhes venham a ser concedidas extraordinariamente. A Comissão do NE que as ajudou o melhor que pôde desde 1967, ano em que foi criada, viu as suas dotações reduzidas em 1970 e alteradas as suas atribuições, o que lhe dá menores possibilidades de recuperação dos grandes atrasos existentes, que era a finalidade que levou a dar vida à Comissão.
Praticamente, os auxílios dependem agora da Direcção--Geral dos Serviços de Urbanização, cuja vastidão de actividades e limitação de verbas não lhe permitem, evidentemente, promover a recuperação dos tais atrasos, objectivo que não pode ser alcançado por outros processos.
Então como estranhar que esta pobre região metropolitana seja das mais castigadas pela emigração, que afundará a agricultura local, levando as terras, já de tu, na sua grande maioria, pouco produtivas, acidentadas e demasiado parceladas, a um abandono sucessivo, que não se enxerga onde terminará! Não pode esquecer-se que a propriedade está pulverizada e que em numerosas freguesias de solo granítico e terras delgadas a mecanização é praticamente inviável. E se acrescentar que é no meu distrito que se situa uma das zonas de menor pluviosidade do País, onde
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a própria florestação não é rentável. Por isso neste pequeno jardim à beira mar plantado -afigura-se-me que "e deveria antes dizer "ex-jardim"- as diferenças naturais que o constituem são tão grandes, com verdadeiros microclimas, que legislação generalizada não pode cobrir os problemas de áreas tão diferenciadas.
Não posso nem devo deixar de reconhecer que o Governo tem desenvolvido grande actividade e imaginação para atacar vários problemas fundamentais da vida nacional, e não serei eu quem lhe regateie louvores, mas outros também importantes são deixados à sua triste sorte, e, apesar de tudo quanto se diz e proclama, a lavoura continua a braços com uma eme grave, e só os "carolas" - dos que não são land-lorda - conseguem cultivar ainda algumas das suas leiras. Eu sou um deles.
Sabe-se que Roma e Pavia não se fizeram num dia, mas as pessoas cansam-se de esperar por que os ventos soprem de outro quadrante.
Sem ser pessimista, e nunca o fui, como já aqui afirmei noutras ocasiões, confesso que vejo com séria preocupação o futuro agrícola de Portugal, principalmente em certas regiões do Nordeste, afigurando-se-me que não tardará muito que não seja necessário importar a maioria dos produtos agrícolas que antes produzíamos e são indispensáveis ao comum da alimentação da esmagadora maioria dos portugueses. Parece-me mesmo que o enorme desequilíbrio da balança comercial é já em parte devido à importação de bens de consumo, em que têm realce os alimentares, o que é digno de ponderação.
Sendo a população a maior riqueza de um território, não pode desligar-se desta verdade insofismável a grave perturbação que está causando às actividades gerais do País a. emigração maciça, que mão para de processar-se. De resto, o n.º 5.° do artigo 31.° da Constituição dá ao Estado competência para disciplinar a emigração, competência que o Governo já utilizou.
Eu tive recentemente oportunidade de verificar, mais uma vez, que, "pesar da louvável intenção de a disciplinar, traduzida em liberalização, facilidades e restrições contidas nos Decretos-Leis n.°s 49 400, 347/70 e 402/70, continua a saída clandestina de jovens de ambos os sexos, nomeadamente de rapazes que se aproximam da idade militar. Este facto reputo-o gravíssimo e merecedor de reacção apropriada., que me dá a sensação de não se fazer. Como para grandes males grandes remédios (apesar dos mais de 11 milhões de contos de divisas que entram dos emigrantes, comparados com os pouco mais de 3 do turismo - inúmeros dia 1969) e, se não queremos deixar afundar actividades básicas dá Nação, que podem inclusive contender com a sua sobrevivência, nem entravar o seu progresso industrial e económico em que o Governo, como todos nós, está empenhado, têm de encarar-se medidas porventura drásticas, mesmo impopulares, mas de verdadeira salvação nacional. Por mim, considero o engajamento destes jovens crime contra a Nação. Gomo simples apontamento, lembro que e falto de mão-de-obra tem influência declarada nas tendências inflacionistas, o que não pode deixar de se ter presente.
Julgo de assinalar que, há vários "noa, um país da América proibiu a emigração para evitar o despovoamento e decretou que perderiam a nacionalidade aqueles que não regressassem ao país no prazo de três anos. E esse país não enfrentava uma situação de guerra como nos sucede a nós.
Apesar de a emigração constituir uma constante da vida e economia nacionais e, até corto ponto, necessidade reconhecida, mais ainda na época da automatização, o previsto desenvolvimento industrial e económico da metrópole e do ultramar, além d"s necessidades militares, parece aconselhar que se procurem soluções, que sei não serem fáceis, para estancar tamanha hemorragia.
Ocorro dizer que no meu distrito este ano há áreas onde não haverá gente para apanhar a azeitona, que ficará nas oliveiras, nomeadamente nos olivais pequenos e dispersos, que ali são frequentes, e muito dificilmente se encontra um operário de construção civil, carpinteiro, pedreiro, etc., pois tudo emigrou e só por favor e salários muito elevados - o que não seria de reprovar se o equilíbrio de preços entre o que a terra produz e o que se consome fosse realidade - se consegue levantar uma construção. Já nem me refiro ao recrutamento militar, que, creio, ter sido uma surpresa mais alarmante do que se esperava.
De resto, quero afirmar que sou partidário de salários que proporcionem a quem trabalha condições de vida humanamente actualizadas, incluindo providência e promoção social completas, indo-se dessa forma ao encontro de soluções que contribuirão para minimizar a emigração, mais para tonto haverá que rever toda uma problemática económica, que tem como parâmetros básicos, ao que à agricultura diz respeito, a fixação de preços dos produtos agrícolas em níveis que permitam pagar esses salários compensadores, particularmente onde ás reconversões são praticamente inviáveis. Não se pode omitir que hoje ninguém aceita qualquer redução ao salário que já ganhou e por isso variações negativas de preços em percentagens mesmo não drásticas dos produtos da terra não são compatíveis com a manutenção de salários apropriados.
A propósito e voltando ainda ao distrito da Guarda, se bem que o caso possa ser generalizado, o preço da bafaria era há pouco de menos de 1$ por quilograma, quando o quilograma da semente custou 6$, e, juntando-lhe os encargos com adubos, insecticidas, regais e amanho da terra em geral, sem falar no valor desta, que teria direito a ser considerada como capital de investimento que na idealidade representa, a cultura é, sem exagero, ruinosa. Neste distrito, além do vinho, são a batata e algum azeite a base do equilíbrio económico dos numerosíssimos casais agrícolas, na sua esmagadora maioria de muito modestas dimensões, que não têm qualquer defesa se falham os preços de venda destes produtos. O azeite caminha paro uma verdadeira condenação, pelo custo elevado da apanha da azeitona e falta de pessoal para essa seara. Por agora o que tem valido é o preço compensador do vinho, mercê de quatro anos de baixas produções.
Desejaria ainda abordar um ponto que diz respeito ao abono de família, mas que me limito a deixar como uma vaga sugestão.
Quando se estão tomando providências para o seu justo alargamento a todas as famílias portuguesas, parece-me de aventar, e esta seria mais uma forma de ir ao encontro das medidas porventura projectadas para reduzir a emigração e também de acelerar o crescimento da população, que se apresenta tão pouco favorável ao desenvolvimento do conjunto nacional - receio bem que o próximo recenseamento venha a ser uma amarga decepção -, que se estabelecessem escalões no abono de família segundo o número de filhos. Assim, e, por exemplo, até três seria o quantitativo actual, de três a cinco mais 100 por cento e acima deste número 200 por cento por cada filho a mais. Sei que o que se vai pedir ao Estado e ao País para generalizar o abono de família é muito, particularmente em face da crise da agricultura, que com dificuldade vai suportar o encargo fixado, e que, portanto, a modalidade criaria novos problemas financeiros, mas tenho a sensação de que os benefícios que viriam a colher-se no futuro seriam compensadores.
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4 DE DEZEMBRO DE 1970 1067
Há cerca de dez anos que começamos a ser traiçoeira e cobardemente agredidos em África e desde então as despesas militares têm crescido sucessivamente e não me parece fácil evitar tal crescimento ou, ao menos, mante-las no nível actual, o que talvez fosse já satisfatório. Depois, ao cabo de dez anos, ainda não conseguimos reorganizar a nossa indústria militar por forma a bastarmo-nos a nós próprios em material e armamentos ligeiros, munições e equipamentos essenciais para o género de luto que temos de combater.
Há realmente falhas ou descoordenação ou até falta de centralização, oeste caso totalmente defensável, difíceis de compreender!
Mas estas considerações, infelizmente, não nos devem surpreender em demasia, porque, não há muito, quem tem a responsabilidade das decisões, ou pelo menos de as propor, sobre indústria teve a coragem de afirmar, o que só merece louvor, que "novas iniciativas estão sujeitas a um período de extensão incrível por virtude das oposições que são levantadas por unidades já instaladas que jogam com as reservas de mercado atribuídas. Este factor impacienta e faz perder entusiasmo e é tanto mau pesado e prejudicial quando se trate de sectores dominados por grupos industriais ou financeiros poderosos".
Voltando aos assuntos ultramarinos, o inimigo conta cada vez com mais fortes apoios - o desvario e a desvergonha no Mundo são quase gerais - e nós teremos de nos preparar para enfrentar uma guerrilha que pode ser dia a dia mais vigorosa e melhor armada. Julgo portanto que não é pessimismo afirmar que as despesas não diminuirão, ao contrário do que tanto desejávamos.
Isto por um lado, porque por outro, dada a perda de valor aquisitivo da moeda, que é mal generalizado no Mundo - a nossa circulação fiduciária aumentou nos doze meses até Setembro cerca de 2 800 000 contos -, e perante a elevação de preços de tudo o que é essencial, as despesas públicas têm de crescer de forma imparável e não se vá crescimento correspondente para as receitas.
Cabe aqui um parêntesis para repetir um outro apelo por mim feito na sessão anterior, que é a aplicação de uma política severa quanto a alta injustificada e à especulação de preços de géneros e outros bens de consumo indispensáveis. Renovo, pois, este S. O. S., que considero medida urgente e que terá de ser devidamente estruturada para ser eficaz.
Suponho que o titular da pasta das Finanças, cuja lúcida e notável exposição feita há dias aos órgãos da imprensa foi bem elucidativa para o País, não terá, apesar de tudo, encarado com grande optimismo a evolução das contas públicas, até porque os créditos extraordinários para atender a novos encargos que têm surgido no decorrer do ano económico ter-lhe-ão causado sérias preocupações. E já nem falo no modestíssimo crescimento do produto nacional bruto, relativamente ao que estava planeado. Por mim, vejo com certa inquietação a cobertura das despesas com as forças militares extraordinárias no ultramar, que nos anos económicos anteriores tem sido feita na totalidade ou quase com o excesso dos receitas ordinárias cobradas sobre as despesas ordinárias efectivamente realizadas.
Estas considerações têm como objectivo insistir para que se eliminem todos os gastos não essenciais, com particular saliência, repito, para os sumptuários, não só pelo exemplo que o Estado dará aos particulares para os levar a poupar e a investir, como principalmente para conceder ao Governo maior força moral para uma revisão de impostos, que se me afigurava vir a exigir a situação financeira presente, mas que afinal a proposta de lei não confirma efectivamente, porque se aumenta de um lado, reduz de outro, aparentemente de forma mais substancial, o que, pelo seu extraordinário significado, tem de ser motivo de geral satisfação.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Temos todos de nos convencer que a Nação terá de suportar, por prazo imprevisível, uma luta traiçoeira e de desgaste, à qual não podemos furtar-nos, pois estão em jogo o prestígio e a honra da Nação e a lealdade que de nós exigem populações que nunca duvidaram da dignidade da sua pátria.
O Sr. Presidente do Conselho ainda há pouco, no seu magistral discurso de Setembro, discurso que afirma um chefe político de categoria excepcional, que o Destino tão generosamente nos reservou, definiu, com a elevação e clareza habituais, este ponto capital da nossa política nacional, que ontem reafirmou nesta tribuna na sua memorável comunicação à Assembleia Nacional.
Também vem à memória referir que precisam de ser incitadas e incentivadas todas as iniciativas de empresários de reconhecida idoneidade, e, apoiados e acelerados, e não amortecidos, todos os pedidos de novos empreendimentos que se integrem na política industrial estabelecida, nomeadamente os que são financiados do exterior, para se produzir riqueza o mais rapidamente possível. Já é lugar-comum afirmar que o Pais precisa de entrar num surto de real desenvolvimento económico e industrial, e, aqui, não posso deixar de fazer uma referência especial ao Sr. Secretário de Estado da Indústria pela sua coragem para pôr problemas e desassombro nas suas intervenções públicas. Recordo, por exemplo, esta afirmação: "As capitações de consumo não entre nós entre um sexto e um quinto das que se verificam na Europa, o que, em termos de mercado, corresponde a uma população metropolitana da ordem de 1,5 a 2 milhões de centro-europeus." Há, portanto, que actuar, traduzindo as palavras em obras, custe o que custar e doa a quem doer. O momento é crucial, diria vital, para o futuro da Nação. Felizmente que o Governo, pelas afirmações feitas, e pelo que consta do relatório da proposta de lei sobre a matéria,- não terá hesitações na aplicação da política que fixou. E se isto importa na metrópole, não o exige menos o ultramar, onde se projectam ou executam grandes empreendimentos.
Uma burocracia inaceitável, a falta de decisão rápida, aguardando montes de pareceres e informações de múltiplos órgãos e não sei que mais, atrasam o andamento dos projectos, perturbam as fontes de financiamento e prejudicam a economia nacional. Há muito que desbravar nos níveis superiores da Administração, pois a época de celeridade em que vivemos não se compadeça com tais delongas.
O Ministério do Ultramar tem hoje responsabilidades acrescidas e tem de organizar-se a fundo para promover tudo o que em bases sólidas lhe é apresentado para engrandecimento das províncias ultramarinas. Continuamos com o problema das transferências, que é nacional e de uma acuidade talvez nunca atingida anteriormente, para o qual terá de encontrar-se, não obstante a sua complexidade, solução definitiva, pois o que ultimamente se legislou é apenas um primeiro passo, como, aliás, reconhece o próprio legislador, sem, todavia, deixar de se dar o devido relevo à importância que reveste.
Antes de terminar desejo ainda, n respeito da integridade da Nação e do seu futuro como país pluricontinental, repetir que o mar é elemento primordial para a nossa sobrevivência, e que enquanto controlarmos as águas que banham os nossos litorais e nomeadamente
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as de aproximação dos portos comerciais mais importantes de Angola e Moçambique, que servem interesses nacionais e internacionais do seu hinterland, não devemos recear o futuro com demasiada preocupação. Felizmente temos ainda alguns trunfos que nunca usámos. Mas para tanto não podemos descurar o crescimento do nosso modesto poder naval e, sobretudo, e para já, não deixar de construir mais corvetas e navios-patrulhas, que são os mais económicos em todos os aspectos, sem deixarem de ser eficientes para os fins que pretendemos.
As finanças públicas não permitem por agora outras construções mais dispendiosas, sem dúvida necessárias, até para assegurar a protecção da nossa linha de comunicação marítima fundamental, mas a construção de navios daqueles tipos, pelo menos, não pode ser protelada. Necessariamente que n Porca Aérea precisa de dispor de aviões apropriados, que, em colaboração com as forças navais, patrulhem as áreas marítimas de maior relevância.
Concluindo e resumindo, dou a minha aprovação na generalidade à proposta de lei de meios para 1071, mas peço a atenção do Governo para a necessidade, que considero imperiosa, de eliminar ou reduzir drasticamente gastos não indispensáveis, o que significa austeridade na administração.
Por outro lado, é necessário, sem falar nos investimentos do Plano de Fomento, que não podem ser postos em causa, dar possibilidade de vida activa às câmaras municipais dos concelhos mais pobres através de medidas adequadas; atender aos terríveis atrasos e carências do NE metropolitano, dotando devidamente os organismos que dele devem cuidar; recomendar prudência nos gastos públicos, sem deixar de atender, na extensão devida, à educação, saúde, previdência e promoção sócio-económica das populações, e, por último, mas com a prioridade e saliência devidas, não faltar com as dotações indispensáveis e em tempo às forças armadas para cumprirem a sua nobre e alta missão, que é a de defender as populações, os bens públicos e privados que constituem o nosso património e a integridade territorial da Nação.
Aqui lhes rendo a minha grata e respeitosa homenagem.
Quase todos os assuntos sintetizados neste fecho da minha intervenção estão, de uma ou de outra forma, considerados na proposta de lei, mas não os focar neste momento seria falta imperdoável. Esta a razão por que o fiz.
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vou encerrar a sessão. Amanhã haverá sessão à hora regimental, com n mesma ordem do dia: continuação da discussão na generalidade da proposta de lei de autorização de receitas e despesas para 1971.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 43 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
João António Teixeira Canedo.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
José Coelho Jordão.
José Dias de Araújo Correia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José dos Santos Bessa.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel Martins da Cruz.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Bamiro Ferreira Marques de Queirós.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Rui Pontífice Sousa.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Mania de Pereira Pinto Costa Ramos.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Amílcar Pereira de Magalhães.
Antão Santos da Cunha.
Augusto Domingues Correia.
Custódia Lopes.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
José da Costa Oliveira.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Luís António de Oliveira Ramos.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
O REDACTOR - Januário Pinto.
Rectificação ao n.º 47 do Diário das Sessões, apresentada pelo Sr. Deputado Magalhães Mota:
Na p. 972, no ponto 5 do sumário do aviso prévio que apresentou, a alínea e) deverá ficar como segue:
5.
e) Sugestão de uma política de informação adequada a uma sociedade:
De acentuadas assimetrias mo seu estádio actual; e Em vias de desenvolvimento.
Requerimentos enviados para a Mesa durante a sessão:
Requeiro, ao abrigo do Regimento desta Assembleia, n.° 7 do artigo 46.° e alínea d) do artigo 11.°, os elementos a seguir indicados, a fornecer pela Federação Nacional dos Produtores de Trigo:
Discriminação por concelhos do quadro "Dotação para reconversão e melhoria das técnicas culturais" (Decreto-Lei n.º 46 595, de 15 de Outubro de 1965); importâncias remetidas aos grémios da lavoura Até 31 de Maio de 1969; relatório e contas da gerência de 1968 - F. N. P. T., na parte que se refere aos distritos de Beja e Faro, actualizando-se, se possível, os quantitativos com as entregas feitas posteriormente a 31 de Maio de 1969;
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Lista dos vinte principais produtores de trigo por concelho, nos dois distritos atrás mencionados, com radicação do total entregue e "eu valor, discriminando-se as verbas referentes à dotação de reconversão, de baixa de produção e de "trigo semente" (indicar quantidades por produtor).
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Dezembro de 1970. - O Deputado, António da Fonseca Leal de Oliveira.
Requeiro, ao abrigo do título IV "Funcionamento da Assembleia", capítulo I, artigo 19.°, § 8.°, do Regimento da Assembleia Nacional, a seguinte publicação oficial:
Inquérito - Inventário dos Servidores do Estado, Instituto Nacional de Estatística.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 8 de Dezembro de 1970. - O Deputado, António da Fonseca Leal de Oliveira.
IMPRENSA NACIONAL
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PREÇO DESTE NÚMERO 8$8O