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REPUBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 93
ANO DE 1971 21 DE ABRIL
X LEGISLATURA
SESSÃO N.º 93 DA ASSEMBLEIA NACIONAL
EM 2O DE ABRIL
Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro Amaral Netto
Secretários: Exmos. Srs.João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Gabriel da Costa Gonçalves
Nota. - Foi publicado um 2.º suplemento ao n.º 88 do Diário das Sessões, inserindo o texto aprovado pela Comissão de Legislação e Redacção referente ao decreto da Assembleia Nacional sobre a actividade de seguros e resseguros.
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 5 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 90 e 91 do Diário das Sessões, com um pedido de rectificação do Sr. Deputado Fausto Montenegro quanto ao n.º 90.
Deu-se conta, do expediente.
Usaram da palavra os Srs. Deputados: Sá Viana Rebelo, acerca, do surto da febre-amarela em Luanda; Vasconcelos Guimarães, sobre o Pacto do Atlântico; Miller Guerra, que fés o balanço da discussão da reforma do ensino; Silva Mendes, para se referir aos trabalhos de reforma administrativa, e Duarte de Oliveira, para se referir ao Instituto de Acção Social Escolar.
Ordem do dia. - Em primeira parte da ordem do dia procedeu-se à eleição do 2.º secretário da Mesa.
Feita a contagem dos votos, e sendo escrutinadores os Srs. Deputados Mota Amaral e Fausto Montenegro, verificou-se ter sido eleito por 85 votos o Sr. Deputado Amilcar da Costa Pereira de Mesquita, tantos votos quantos os Deputados presentes.
Em segunda parte da ordem do dia continuou à discussão sobre as contas gerais do Estado do ano de 1969, tendo o parecer da Comissão de Contas Públicas acerca das contas da Junta do Crédito Público referente ao mesmo ano sido recebido na Mesa, para ser publicado em suplemento ao presente Diário das Sessões.
Usaram da palavra, os Srs. Deputados D. Sinclética Torres, Coelho Jordão, Castro Salazar, Ribeiro Veloso, Alberto Alarcão e Lopes da Cruz.
O Sr. Presidente encerrou a sessão ás 19 horas e 40 minutos.
O Sr. Presidente: - Não havendo 2.º secretário eleito, designo o Sr. Deputado Gabriel Gonçalves para exercer aquelas funções e peco-lhe o favor de subir à tribuna
Vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 55 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António Bebiano Correm Henriques Carreira.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Júlio dos Santos Almeida.
António Lopes Quadrado.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Armando Valfredo Pires.
Augusto Salazar Leite.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Eugênio Magro Ivo.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
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D. Custódia Lopes.
Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Bodrigues Bibeiro.
Deodalto Chaves de Magalhães Sousa.
Duarte Finto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Fernando David Laima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do Nascimento de Mabtfaàa Novais.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco Estaves Gaspar de Carvalho.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco de Mancada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João [...] Liebermeisiter Mendes de Vasconcelos [...]
João Duarte de Oliveira.
João José Ferreira Forte.
João Lopes da Cruz.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Paulo Dupuieh Pinto Castelo Branco.
João Pedro [...] Ponte de Lemos Guerra.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Coelho de Almeida Cotfta.
José Coelho Jordão.
José João Gonçalves de Ptoencfl.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José dos Santos Bessa.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Lopo de Carvalho Canoella de Abreu.
D. Luzia Neves Pêra ao Pereira Beija.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Fenreira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Monteiro Bibeiro Veloso.
D. Afaria Raquel Bibeiro.
Olímpio da Conceição Pereira
Pedro Baessa.
Prabaçor Raiu.
Rafael Ávila de Azevedo.
Rafael Volodão dos Santos.
Raul da Silva e Cunha Araújo.Ricardo Horta Júnior.
Rogério Noel Feres Claro.
Rui de Moura Ramos.
D. Sindéttca Soares dos Santos Torres.
Teodoro de Sousa PednO.
Teófilo Lopes Frazão.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortes.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.
O Sr. Presidente: Estão presentes 80 Srs. Deputados.
Está aberto a sessão.
Eram 16 horas e 5 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: Estão em reclamação os n.°s 90 e 91 do Diário das Sessões.
O Sr. Fausto Montenegro: Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: Tem a phlavra o Sr. Deputado Fausto Hontenegro.
O Sr. Fausto Montenegro: Sr. Presidente, peço a V. Ex.ª o favor de mandar substituir no n.° 90 do Diário das Sessões, de 15 do corrente, a p. 1798, col. 1.º, 1. 51, 5 por 6.
O Sr. Presidente: Continuam em reclamação os n.ºs 90 e 91 do Diário das Sessões.
Pausa.
O Sr. Presidente: Como mais nenhum de VV. Exas. tem reclamações a fazer, considero aqueles números do Diário das Sensocs aprovados, com a rectificação apresentada.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegrama do governador civil do Distrito de Castelo Branco associando-se ao voto de pesar da Assembleia pelo falecimento do Deputado Antflo Santos da Cunha;
Telegramas de aplauso íis considerações do Sr. Deputado Fausto Montenegro;
Exposição de João Vieira Santana Júnior sobre a renovação do contrato do Estado com u Companhia de Diamantes de Angola.
O Sr. Sá Viana Rebelo: Sr. Presidente: Luanda acaba de sofrer mais uma provação, bem dura por sinal. Refiro-me ao surto de febre-amarela que ali apareceu, ainda não se sabe como, vitimando algumas dezenas de pessoas, atingindo outras tantas e provocando certa perturbação nos espíritos.
Segundo os entomologistas, não existiam na cidade, até Janeiro passado, os mosquitos vectores da febre-amarela, e de repente começaram a surgir nos hospitais casos clinicamente diagnosticados como de doentes atingidos por aquele mal. E em muitos pontos de Luanda foram detectados os mosquitos que não existiam até então.
De louvar e aqui o faço profundamente convencido de que pratico um acto de justiça a acção desenvolvida pêlos Serviços de Saúde de Angola, francamente apoiados pelo Governo-Geral. Medidas profilácticas foram tornadas com. presteza e centenas de milhares de luandenses logo vacinados em escassas semanas nos postos sanitários espalhados por toda a cidade. Brigadas ambulantes deslocaram-se aos bairros populares, na sua acção de bem-fazer, prospectando e vacinando. Combateu-se o mosquito e a doença por todas as foi-mas, nOo íaltando as boas vontades, o espírito de colaboração, a ordem, os meios e o dinheiro.
Louvor, pois, aos Serviços de Saúde de Angola.
Mas não quero deixar de me referir ao reverso da me-dulha, isto é, à atitude de certo sector de opinião que não deixou passar a oportunidade para denegrir a acção dos- portugueses -naquela parcela de Portugal, atribuindo o aparecimento da febre-amurela a condições de saneamento deploráveis, a desleixos, criminosos, ao desprezo
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pêlos problemas da habitação, tentando criar climas emocionais conducentes à destruição do respeito pelas instituições e pêlos serviços.
E lembro-me das palavras recentemente proferidas no Porto pelo sr. Presidente do Conselho.
Devemos combater a campanha subversiva que tende a minimizar o valor social da chefia e a amesquinhar os que têm de dirigir, orientar e conduzir os seus concidadãos.
Aliás, em entrevista concedida, em 10 de Abril corrente, ao jornal ABC, de Luanda, o sr. Secretário Provincial de Saúde foi claro, no dizer:
Ontem mesmo esteve aqui no meu gabinete um técnico da Organização Mundial da Saúde, de nacionalidade americana, que se encontrava de farias na África do Sul e que, assim, por estar mais perto de Angola, foi designado peja ferida Organização para corresponder ao nosso pedido oficial de nos enviar um seu técnico, com a brevidade possível, para connosco colaborar no estudo de vários problemas emergentes de tudo quanto chamou a nossa atenção a propósito do surto de febre-amarela. que atingiu Luanda.
Pois esse técnico veio ver as nossas- condições, que não considerou assim tão más como o que nos parece a primeira vista, com aquele hábito tão nosso de nos considerarmos em manifesta desigualdade em relação a outras nações. Ele nos afirmou que. em vários países, nomeadamente nos da América Latina, até em capitais com muito maior população e com um nível que se considera bastante alto, as cidades têm de enfrentar problemas exactamente iguais aos nossos.
Isto é, há razão para trabalhar, cada vez mais, no desenvolvimento de Luanda, mas é preciso contrariar vivamente as acusações descabidas que coloquem Angola em posições injustas e possam levar às dúvidas intensas, se não ao pânico, quem de tanto ânimo precisa para aguardar o que o futuro lhe queira destinar. Mais ainda, há que dizer a verdade aqueles que estão longe e precisam de saber o que se passa com os familiares, com as amigos, com os portugueses de Angola, não lhes fazendo chegar notícias alarmantes e acusações verrinosas.
E a verdade é esta, dita, também, pelo Sr. Secretário Provincial de Saúde.
O surto de febre-amarela está em franco declínio, para não se dizer que está virtualmente terminado, conclusão a que se chega, não só porque a população de Luanda está quase toda vacinada, para isto contribuindo,, também, aqueles casos em que as pessoas, por um mecanismo indirecto, ficam autovacinadas, que são as que tiveram a febre-amarela na sua forma benigna, mas também porque o inúmero de mosquitos vectores está reduzido a um mínimo, que já não tem poder para manter uma epidemia.
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Vasconcelos Guimarães: - Sr. Presidente, srs. Deputados: Em resposta a habitual convite da- Organização do Tratado do Atlântico Norte para que membros dos parlamentos de nações signatárias do tratado visitem a sua sede, quis o sr. Presidente responder, afirmativamente, quando ele foi dirigido a Portugal.
Uma missão constituída pêlos Deputados Alberto Meireles, António Bocha Lacerda, Francisco Pinto. Balsemão e por mim deslocou-se a Bruxelas há uns meses atrás, cora o objectivo de visita a sede e quartel-general.
Não terá essa visita, em princípio, saliência política tão relevante que justifique intervenção especial nesta. Câmara. Todavia, problemas de real interesse nacionalizados; à Aliança Atlântica, levam-me a relembrar aos meus ilustres colegas nesta Assembleia a importância daquela organização na defesa, dos princípios comuns ao mundo ocidental.
A esse aspecto fundamental e visto à luz do momento presente, farei referência tão breve quanto possível, o que não impede que desde já se realce a recepção feita à missão parlamentar nacional por parte da Organização do Pacto, que, num curto espaço de dois dias, cumpriu programa em que foi dada uma panorâmica muito completa de actual situação, com especial realce para as relações Leste-Oeste. Neste sentido, a representação nacional em Bruxelas, tanto por parte dos delegados do. Ministério dos Negócios Estrangeiros como pêlos da Defesa Nacional, deu o mais prestimoso, eficiente e amável apoio a missão parlamentar.
Há, aliás, vantagem recíproca nestas visitas, porque a presença de parlamentares portugueses reforça e prestigia o trabalho da delegação nacional, reafirmando o interesse do País, pela Organização de que tão naturalmente è membro, na sua qualidade de «nação europeia, defensora de uma civilização cristã e de uma cultura ocidental.
Se a Nação Portugesa é, como se disse, naturalmente europeia pela sua raiz de origem e como fonte de expansão do pensamento do Ocidente, na pode este conceito desvirtuar a autêntica orientação da política nacional porquanto a expansão portuguesa no Mundo a tornou no conjunto harmónico de integração étnica e moral de espaços diversificados na vastidão do Mundo.
A orientação da política nacional não pode nem deve ser condicionada na sua aplicação a espaços balizados, quando, como no caso português a razão de ordem natural se situa na plurivalência portuguesa geográfica e racial.
Consequentemente1, se fazemos parte de um tratado com raiz essencialmente europeia, todos os conceitos e princípios que nos levaram a criar o mundo português nem hoje nem nunca se situaram ou situam em parâmetros limitados «m espaços definidos cartesianamente: - assim, o conceito português não se coaduna com a defesa de uma política condicionada a espaços, por irreal e falsa;
Um bem comum está na origem da Aliança Atlântica: A união, para desencorajar a agressão e preservar a paz. Mas, apesar disso, .pode bem dizer se que a O. T. A. N. não é ainda, suficientemente conhecida 'entre nós- E quando conhecida, é muitas vezes esquecida. Factores simples. Raciocínios leves, por vezes pueris, conduzem os. espíritos a desviar a atenção para outros problemas, julgando ou admitindo como ultrapassados os perigos que obrigaram a coligações e alianças defensivas.
Na sua origem, no ano de 1949 a ameaça de possível expansão soviética levou alguns países da Europa ocidental a estabelecer uma aliança com os Estados Unidos e Canadá para criação de um sistema de segurança colectiva. Os países europeus foram, come é do conhecimento geral, inicialmente, a Bélgica, Dinamarca, França; Islândia, Itália, Luxemburgo, Países Baixos, e Noruega, aos quais, mais tardei se juntaram a Alemanha Ocidental, Grécia e Turquia.
Da um modo geral, pouco mais, se sabe a respeito dela senão que agrupa várias nações do Ocidente, que dispõe de consideráveis forças militares, que estas, por vezes
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efectuam exercícios conjuntos e que representantes dos países que a constituem se reinem com certo frequência na sede.
Todos temos na consciência a necessidade de viver em paz. Ela tem existido na Europa, embora frágil e sobressaltada. E apesar da grave perturbação subversiva do Portugal ultramarino, ainda nos tem sido possível escolhermos por nós próprios o nosso jeito de viver, os valores, as ideias, os caminhos do destino que sonhamos. Mas, apesar de tudo isto, sentimos a ameaça que pesa sobre esses bens fundamentais.
Durante vinte e um anos a O. T. A. N. conseguiu garantir a segurança da Europa ocidental, manter a integridade territorial dos seus membros e criar um clima de estabilidade e confiança que permitiu efectuar uma recuperação económica espantosa, depois da destruição quase total do após da 2.º Guerra Mundial.
Este estado de espírito levou e leva as massas populacionais, e talvez até alguns dos seus dirigentes, a uma falsa realidade, admitindo que n ameaça passou e que os pontos fulcrais se deslocaram.
Os desentendimentos políticos e económicos dos dois mundos do Leste, a Rússia e a China, em expansão constante, ocasionaram num raciocínio simplista, tão simples quão perigoso, a pensar que a ameaça dos membros do tratado de Varsóvia sobre o Ocidente estava enfraquecendo ou fortemente diminuída. De facto, a ameaça no passado era mais evidente e ostensiva do que é hoje. Parecia até que a O. T. A. N. já não seria necessária e teria terminado a sua missão.
Mas a realidade é, infelizmente, bem diferente.
É um facto que graças à O. T. A. N. foi possível estabelecer um equilíbrio político e militar «nitre o Leste e Oeste. Considera-se esse equilíbrio como a condição essencial do paz e como uma segurança contra os riscos de um inova guerra mundial. Se [...]equilíbrio se desfizesse, nasceria, o perigo de noras tensões e conflitos. Ora os desentendimentos entoe a Rússia e a China em nada diminuíram, por parte daquela, as forcas que permanentemente ameaçam a Ocidente.
E, pior do que isso, em muitos e variados aspectos se vem verificando um desequilíbrio favorável ao Leste.
Recordo que há bem pouco tampo, no parlamento britânico, o Ministro de Estado pana a defesa declamou:
As forcas do Pacto de Varsóvia ultrapassam em muito as do Tratado do Atlântico, não só em homens como também iam. capacidade de fogo. Na Europa existem 60 divisões do Pauto de Varsóvia e 23 da1 O. T. A. N. EA 3500 aviões tácticos ao Oriente europeu e 1500 no Ocidente; a disparidade em tanques é de 22 000 para 6000.
Fenómeno paralelo se passa com as forças navais. Citando o almirante Vau- Rees:
O potencial e o número de unidades, anti-submarinas e de escolta da O. T. A. N. estão em declínio... Se esta situação se mantiver, chegará um momento em que te autoridades da O. T. A. N. deixarão de poder garantir as linhas de comunicação no Atlântico.
Numa estimativa do balanço de forças, afirmou ainda ser a esquadra submarina que totaliza 375 navios, 80 dos quais de propulsão nuclear, a sua parte mais significativa. É de prever que a esquadra russa continuará a aumentar em número de navios e potencial.
Esta capacidade proporcionar-lhes-á mais opções para conseguirem- os seus objectivos do que tiveram no passado. Devem-se esperar maiores esforços e pressões de Moscovo para obter portos e bases no
Assim, para que a O. T. A. N. se possa continuar a desenvolver em bases sólidas, é, antes demais nada, essencial que todos os seus membros aceitem sem (reservas de compromissos políticos assumir a sua quota-parte da defesa colectava e que cada um deles tenha confiança na decisão e aptidão dos outros membros em honrar o compromisso de defesa mútua que voluntariamente aceitaram.
Todavia, o princípio que consiste em desencorajar a agressão e se enraíza na solidariedade e na força da aliança só pode ser atingido se os membros entre si conseguirem manter relações estreadas e fundamentadas na cooperação económico e política.
Uma aliança onde os seus membros ignorem ou finjam ignorar os interesses dos seus comparticipantes, se deixem duvidar por conflitos económicos ou políticos ou desconfiem uns dos outros não poderá ter qualquer eficácia para desencorajar um n agressão, e muito menos para a repelir.
Foi no espirito destes pontos basilares que aceitamos o convite para tomar parte nesse tratado e nos comprometemos a contribuir com forças militares, dado que a adesão política estava automaticamente implícita.
Sem tornar muito extenso o aspecto dessa contribuição, resultante de um 'compromisso assumido, parece conveniente lembrar que temos sido obrigados a desviar verbas do orçamento nacional pana aquisições de material ou manutenção dei forças. Estão neste caso os submarinos e fragatas que a Armada adquiriu, as esquadras de luta anti-submarina que a Força Aérea mantém permanentemente e ainda a preparação da brigada móvel de que o Exército é responsável.
E, repetindo o que tanta vez tem sido dito: quantas despesas militares somos levados a fazer na defesa dos interesses nacionais, que todos gostaríamos ver desviadas para beneficio de desenvolvimento económico ou promoção social?
A forte influência comunista que por todos os continentes deste mundo perturbado em que vivemos se tem coligado pana Atacar Portugal num objectivo frontal de conquiste económica, disfarçada com ideologias de falsa promoção social, estão bem patentes no .aspecto geral da luta subversiva que nos é imposta no ultramar e num aspecto mais restrito em atentados revolucionários no território metropolitano.
O problema tem, todavia, raízes mais profundas. Portugal encontra-se na presença de uma ameaça, não só política, como militar. Esta meaça resulta das doutrinas revolucionárias comunistas; que ao longo dos anos tem semeado universalmente as mais incongruentes falsidades sobre o nosso modo de vida e sobre a nossa acção em todos os campos de actividade. A melhor resposta será, calma, mas persistentemente, mostrar com consciência a superioridade das nossas instituições.
Podemos provar com as nossas palavras e actos que somos partidários do progresso político, do desenvolvimento económico e de uma revolução social ordenada e que no nosso tempo os verdadeiros reaccionários são os regimes comunistas, que, defendendo doutrinas e políticas rígidas, têm conduzido mais a destruir os princípios da Uberdade do que a desenvolvê-los.
E se é este o problema português, é paralelamente de todas as nações da O. T. A. N. Não parece, portanto,
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que a influência e os interesses dos seus membros se possam consignar a região do Atlântico ao norte do trópico do Câncer.
Todos os acontecimentos exteriores a esta zona podem afectar gravemente os interesses colectivos da comunidade atlântica.
Ninguém melhor do que os Portugueses compreendem e sentem, a verdade deste postulado. Somos europeus, nuas a nossa Europa item fronteiras na África e na Ásia.
Se é o Atlântico uma dos zonas quentes do presente, não é só a sua parte norte, é todo ele.
Sr. Presidente, termino estas considerações com as habituais inteligentes e sensatas palavras do Presidente do Conselho, Sr. Prof. Marcelo Caetano, que, quando um director de importante jornal do pais irmão, o Brasil, inquiriu qual o fundamento da hipótese de Portugal estar a fazer sugestões de formação do Pacto do Atlântico Sul, respondeu:
Portugal não tomou a iniciativa, nem pensa torná-la, de propor qualquer novo acordo plurilateral para a defesa do Atlântico Sul. Tem, porém, o Governo Português chamado constantememte a atenção Idos membros da O. T. A. N. para o absurdo que representa a delimitação da aliança ao chamado Atlântico Norte, como se os perigos que ela se destina a prevenir e a combater se detivessem numa linha convencional que o adversário respeitasse.
Claro que há interesse comum «os estados ribeirinhos do Atlântico Sul» e que seria acertado que eles os considerassem em comum também.
Mas de um pacto formal de aliança militar nunca se falou com eles.
Foram estas as palavras do Presidente do Conselho.
Mas, atrevo-me a perguntar, até quando as «falas» das Nações Unidas no ataque injusto e revoltante, por falta de inteligência e verdade, contra Portugal, nos obrigarão a estar «dados».
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Miller Guerra: - Agora que se avizinha o termo do período de discussão pública ida reforma do ensino, é a altura de reflectir sobre o acontecimento.
Na verdade, trata-se de um acontecimento.
Em primeiro lugar, pelos textos publicados pelo Ministério da Educação Nacional; em segundo lugar, pelo debate a que deram origem. Começo pelo debate. Ouvi dizer que mesmo se a reforma não se executasse, já havia prestado um serviço inestimável: ter atraído as atenções como nenhuma ainda o fez; ter provocado interesse, adesão e crítica de norte a sul do País. Centros de cultura, associações, estabelecimentos de ensino, entidades públicas e privadas promoveram reuniões, conferências, colóquios, onde se discutiram os problemas levantados pela reforma e, de uma maneira geral, pela educação. A imprensa, aquela que não perdeu o sentado das inovações, nem as receia, animou o movimento causado pela resolução liberal do Ministro Veiga Simão, ao submeter os projectos à apreciação de todos.
O relevo dado à matéria pelos jornais, revistas e semanários, demonstra (contra o que se proclama) que a imprensa está à altura da sua missão. Compenetrou-se da importância do seu papel no esclarecimento e informação da opinião pública, de uma forma que os cépticos e os censores decente não esperavam.
O debate provou, sem sombra de dúvida, que, apesar de termos atravessado umas décadas de silêncio e de informação orientada, não nas mentalidades se obliterou o gosto pelas ideias e o interesse pela controvérsia sincera e leal. Provou-se outra coisa: que é possível expor ao exame público os projectos do Governo, deixando-os discutir, e até demolir, sem risco de desordem ou subversão. Que os timoratos (aproveitem a Dição da experiência, e deixem de nos repetir que estamos impreparados para usar da liberdade crítica de ideias e programas.
O Ministro Veiga Simão e os seus colaboradores têm jus à nossa homenagem.
Se eu sei louvar quem o merece, também sei criticar, quando me deixam. Tenho duas objecções a fazer ao projecto ida reforma de ensino superior.
A primeira respeita à autonomia das Universidades; a segunda, de que me ocupei numa intervenção anterior, refere-se ao silêncio do projecto sobre as novas Universidades.
Ambos os pontos foram já largamente comentados na imprensa e em reuniões várias. A opinião dominante afirma que a autonomia prevista é imperfeita e equívoca, e que a omissão das novas Universidades é uma lacuna, inesperada num documento que contém novidades e algumas ousadias.
Faço-me intérprete de ambas as criticas, mas reputo a última mais penetrante do que a primeira. Aliás, os factos ligam-nas uma a outra, visto a autonomia ter pouco alcance se não se criarem outras Universidades.
A autonomia é uma prerrogativa excelente se for bem usada, isto é, se contribuir para o progresso e diferenciação dos estabelecimentos de ensino universitário, provocando a emulação entre eles. Mas o tipo institucional Coimbrão-napoleónico-latino, secularmente centralizador, uniforme, rígido, dominado pela burocracia e pela cátedra vitalícia, não colhe grande benefício com a autonomia, a não ser para as Universidades se enclausurarem com mais facilidade dentro do muro das regalias e privilégios. Só com a fundação de novas Universidades a autonomia se torna proveitosa.
Novas Universidade, quer dizer, Universidade de tipo anglo-saxónico, dedicadas de preferência à tecnologia e às ciências sociais e humanas, com professores novos nas ideias e na idade.
Pensa-se erradamente que para criar Universidades basto estender ou ramificar os existentes. Se assim se fizer, multiplicam-se ad eternum os defeitos que é preciso suprimir. As Universidades não se auto-reforma. O sopro inovador item de vir de fora, como a história exemplifica e os acontecimentos actuais confirmam.
O projecto de reforma do ensino superior, ao que parece, pretende conciliar os dois tipos institucionais, «enxertando» nas Universidades tradicionais algumas características das anglo-saxónicas, como a autonomia e os departamentos.
Por outro lado, talvez deposite confiança de mais nos institutos politécnicos, como agentes indutores da modernização. Amanhã os institutos, por diferenciação gradual, ascenderiam ao uivei universitário, exercendo uma influência reformadora sobre as antigas Universidades.
Se entendi bem as intenções do projecto, a reforma universitária resultará de duas acções convergentes, uma interna (autonomia, departamentalização, etc.), outra externa (os institutos politécnicos).
Salvo o devido respeito, parece-me mais expedito e eficaz criar novas Universidades do que ficai- esperando, (quantos anos?) pelas reformas determinadas por via indirecta.
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Sr. Presidente: Não quero ir mais longe longe: louvores ao Ministro-reformador, nem nas objecções. Remato com uma nota de optimismo. Como em qualquer instituição, é fácil descobrir na Universidade, ao lado da falange conservadora e reaccionária, fanaticamente apegada às sombras do passado, uma ala progressista, com ardente vontade renovadora.
O Sr. Casal-Ribeiro: - Fanaticamente virada para o futuro.
O Orador: - E inevitável que se produzam estados de tensão entre elas, que tanto podem determinar o movimento como a paragem. O resultado final depende das influências exteriores, as quais decidem a sorte incerta da Universidade, do ensino e de todo o mais...
O Sr. Pinto Machado: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faça o favor.
O Sr. Pinto Machado: - Sr. Prof. Miller Guerra, eu não fazia ideia que ia tratar hoje deste assunto; faltei a semana passada, cheguei hoje de fora e era minha intenção e ó, se Deus o permitir, quê antes do termo, 30 de Abril, parece-me, do período que o. Sr. Ministro da Educação Nacional concedeu para a discussão da reforma, também fazer algumas considerações, um pouco à maneira de revisão, de balanço do que se disse nestes três meses.
Contudo, em relação ao que V. Ex.ª disse, não queria deixar de lhe dar o meu apoio em dois aspectos: um que também, gostam de nessa altura focar, que é o facto de o Ministro se ter disposto a apresentar à discussão do País um projecto de reforma, creio que isto foi uma atitude eminentemente educativa; em. segundo lugar, referindo-me ao que V. Ex.ª afirmou sobre as possibilidades de forma da nossa Universidade, e porquê á isso não tencionaria aludir, queria dizer que tudo depende do que se pensa quando se fala em reforma.
Tenho visto ás ideias mais variadas sobre o assunto; há, por exemplo, professores que pensam que a reforma se limita à melhoria das condições de trabalho no seu serviço; é o limitado horizonte que dão à reforma da Universidade.
Quando (realmente se entende uma reforma profunda, uma (reforma no novo, mão tenho dúvidas nenhumas de que o caminho único que se mós abre é a criação de novas Universidades, e também lamento que não venha uma palavra nesse sentido no projecto de reforma do ensino superior.
Muito obrigado.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado, pela excelente achega que deu às minhas palavras; eu antecipadamente já sabia quais são as convicções de V. Ex.ª sobre esses dois aspectos fundamenitalíssimos, e se insisto na criação de novas Universidades, é porque estou profundamente convencido de que sei esse facto não há reforma da Universidade no sentido em que V. Ex.ª o entendeu também, de reforma do modo de. viver dos homens, e não apenas reformas ou reformazinhas, que se limitam a modificar umas tantas coisas. insignificantes ou quase insignificantes. A botelha da educação ganha-se, ou perdesse, no terrena da sociedade e da política. Tenho fé que a vamos, ganhar.
O orador foi cumprimentada.
O Sr. Silva Mendes: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dois acontecimentos ocorridos na última semana, na vida nacional, levam-me a usar da palavra nesta Câmara, pois eles são mais um passo na consolidação de uma política que se afirma dia a dia mais consciente do caminho que segue e sempre disposta a trilha-lho por
muito árduo que ele pareça.
Com a isenção com que, há meses, levantámos o problema da reforma administrativa nesta mesma tribuna, queremos hoje referir a linha de orientação traçada pelo Sr. Presidente do Conselho na primeira reunião do Conselho Coordenador da Função Pública, pois ela condiz, uma vez mais, com as aspirações dos que, com mágoa, sentem ultrapassados os métodos de trabalho dessa mesma função.
Palavras que ecoaram fundo nos corações dos que querem e lutam por um progresso renovador da gestão pública ouviram-se pronunciadas pelo Chefe do Governo: «Simplificar tudo, no sentido de poupar incómodos, dinheiro e tempo, deve estar, presente no espírito dos que têm de coordenar, emitir pareceres, apresentar sugestões; «trabalhar para que ao menos os agentes da função pública não. fiquem em situação desfavorável em relação aos empregados e operários das empresas particulares», sem esquecer que o aumento de salários deverá corresponder sempre a uma maior produtividade de trabalho, meta a atingir, definida com clareza e simplicidade invulgares por quem tem, neste momento, sobre os seus ombros, a tarefa ingente de nos governar.
Nós sabíamos, e connosco estavam todos aqueles que sofrem as dificuldades de uma máquina administrativa complicadíssima, que a reforma não consiste numa lei. mas sim numa acção constante, à empreender por todos.
O que desejávamos, sim, era aquilo que nos foi dado ouvir, afirmado pelo Sr. Presidente do Conselho, pois não haverá, depois do que com tanta clareza- foi expresso, motivo para confusões ou desculpas, como. aquelas que várias vezes ouvimos a responsáveis por sectores importantes da vida administrativa de que não havia uma linha de rumo traçada.
Teremos todos de começar por fazer um exame de consciência relativo aos nossos métodos de trabalho e produtividade, pois os males de que enferma a vida pública não têm as suas raízes somente no funcionário que executai, normalmente subqualificado, mus sim naqueles que, sendo mais responsáveis, em nada contribuem para que tudo caminhe segundo as normas agora, anunciadas e os desejos tantas vezes referidos pelo Sr. Presidente do Conselho.
As palavras e a linha de orientação troçada pelo Chefe do Governo deverão servir de meditação aos que engendram, através de circulares e esclarecimentos, uma complicação paralisante da vida normal do País e criam uma atmosfera de mau estar edesanteabamento que às vezes até nos dá a impressão, não queremos arriscar a palavra «certeza», da que aquilo que se pretende não é caminhar depressa e cem segurança, mas não retardar um progresso que nunca se pode coaduar com as exigências burocráticas que nos asfixiam:
Conservemos, com intransigência se for necessário, é que de bom temos na orgânica administrativa, mas não esqueçamos que a palavra mais usada nas afirmações de Marcelo Caetano é: ...
Simplifiquemos.
Que bom seria que tivesse ficado mandada nas consciências dos que dirigem e orientam, e parece-nos que o primeiro de uma série de passos que urge dar sem demora
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1831 21 DE ABRIL DE 1970
seria a criação de serviços de aperfeiçoamento profissional que possam promover uma melhor formação e valorização dos funcionários públicos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O segundo acontecimento que queria (registar e tem já aprovação do Conselho de Ministro situa-se no sector da educação e refere-se concretamente à criação do Instituto de Acção Social Escolar.
Do alcance deste decreto, dado que a sua execução deverá corresponder ao espirito com que o Chefe do Governo tem definido o caminho a seguir pelo sector da educação, apercebem-se já os que se viram, privados do acesso ao ensino e à formação cultora! por falta de recursos. E muitos são os que poderiam hoje servir a Nação nos seus quadros mais qualificados, se na altura própria houvesse legislação adequada que os ajudasse a dar um rendimento pleno da sua capacidade intelectual.
Que foi professor em meios atirais sabe bem quantos ficaram, ao longo dos anos, sem lhes ser facultado um dos mais sagrados direitos do homem - o de cultura.
Podem pairar nuvens negras do céu de Portugal, mas não deixemos de registar que também se vislumbra um Sol que a todos aquecerá.
Aguardemo-lo confiadamente.
O orador foi cumprimentado.
O Sr. João Duarte de Oliveira: - Sr. Presidente: Falar sobre ensino é correr o risco de dizer lugares-comuns.
Mas a vida é feita deles. Julgo proveitoso repeti-los quando eles representam o senso comum.
E que, neste mundo onde a memória dos homens também está em crise, a verdade, pura ser aceite pelo maior número, tem de ser dita muitas vezes, como quem propagandeia uma mercadoria.
É a verdade aqui e agora é que a desigualdade diante do ensino é contrária à justiça; que essa desigualdade de promoção humana exclui da sociedade muitos homens, esteriliza inteligências e caracteres.
Pois, apesar disso, o acesso aos estudos secundários e superiores não tem estado aberto a todos. Ele tem sido ainda, em grande parte, função do dinheiro, e não do mérito.
E tal facto, mesmo olhado só no seu lado económico, é um erro grave. O investimento ma educação dá sempre origem a uma curva de produtividade ascendente. Pois é bem certo ser esse um compartimento da actividade humana onde não funciona a lei do decrescimento da produtividade
O Sr. Presidente do Conselho, a propósito da ligação entre estes valoras - educação e economia - disse-nos, ainda há pouco, o seguinte:
Se deixássemos de fazer fomento económico, escasseariam as receitas para promover a educação. Mas sem educação, não há fomento económico.
O «espantalho dia pobreza», que nos persegue há séculos, tem-nos impedido de investir devidamente no homem, criando um círculo vicioso: não investíamos o indispensável porque éramos pobres; éramos pobres porque moo. investíamos.
Sr. presidente: Não se pode julgar um Governo pelos Decretos-Leis. que promulga.
Nem a sociedade é mate justa e melhor só porque tom leis virtuosas. A via legislativa, por si só, não conduz tais reformas.
As leis têm de ser executadas, de ter vida. E a sua execução, muitas vezes, exige coragem. É por isso que não são só homens inteligentes que fazem falta; também precisamos de homens corajosos que realizem as leis.
Tudo isto vem a propósito do decreto-lei, aprovado em Conselho de Ministros, que cria o Instituto da Acção Social Escolar.
Democratizar é termo sonoro que a maior parte de nos ouve com gosto. Democratizar não é tornar todos iguais; é dar oportunidades iguais a todos. E o decreto referido é um passo enorme nessa direcção.
O Instituto oca criado é definido como um organismo que se integra no vasto plano do Governo, tendente a alargar os benefícios do ensino a um número cada vez maior de portugueses, independentemente da sua situação económica. Ele á um poderoso elemento de auxílio aos estudantes de menores recursos. A sua acção é decisiva para o estabelecimento de uma efectiva igualdade de oportunidades de acesso ao ensino e de promoção cultural entre todos os portugueses.
Com efeito, o instituto, conforme o artigo 1.º do decreto que o cria, terá por fim possibilitar os estudos, para além da escolaridade obrigatória, a quem tenha capacidade intelectual para os prosseguir, bem como proporcionar aos estudantes em geral condições propícias para tirarem dos estudos o máximo rendimento.
Assim, pois, a Acção Social Escolar tem por objectivo, por um lado, a concessão de auxílios económicos aos alunos carecidos de recursos (bolsas de estudo, subsídios, empréstimos, isenções) e, por outro, a prestação de serviços aos alunos em geral (saúde escolar, assistência médica e medicamentosa, alojamento, alimentação, transportes, seguros, fornecimento de material didáctico, campos de férias, informação, serviço de emprego);
Mas este programa exige dinheiro. Pois é consolador verificar que o Instituto já está dotado com a verba de 30 000 contos para o presente ano económico, prevendo-se que essa verba orçamental venha a ser gradualmente
aumentada em função do número de estudantes a abranger e do alargamento dos benefícios a conceder.
Pois também desta vez ficamos com a certeza da execução da lei.
O Estado Social é um regime de acção.- E sobretudo à sua dinâmica que provoca a aceitação unanime do povo. Todos nós temos assistido a reformas salutares neste seu ainda curto .período de vigência. O Governo de Marcelo Caetano tem dado. provas ao País de que governar é agir, que é a acção que ilumina o pensamento e garante a sinceridade intelectual. Por isso ele é verdadeiro:
A democratização do ensino está em marcha, prudentemente, como é regra política; ela é uma realidade que nos enche de alegria.
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Presidente: -Vai passar-se à
Ordem do dia
A primeira parte da ordem do dia tem por objecto a eleição de 2.° secretário da mesa posto que se encontra vago em virtude da dispensa concedida pela Assembleia ao 2.° secretário anteriormente eleito,
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Foi lida. E a seguinte:
Ao abrigo do § 1.° do artigo 8.º do Regimento, apresentamos como candidato à eleição para 2.° secretário da Mesa desta Assembleia o Sr. Deputado
Amílcar da Gosta Pereira Mesquita.
Lisboa 'e Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 20 de Abril de 1971. - Os Deputados: José Coelho de Almeida Coita, - João Bosco Soares Mota Amaral - Custódia Lopes - José Joio Gonçalves de Proença - Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
O Sr. Presidente: -Interrompo a sessão por 15 minutos.
Eram 16 horas e 50 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão
Eram 17 horas e 5 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se & chamada para a eleição, por escrutínio secreto, do 2.° secretário para a Mesa da Assembleia Nacional.
Procedeu-se à chamada.
O Sr. Presidente: - Convido para escrutinadores os Srs. Deputados Mota Amaral e Fausto Montenegro.
Fez-se o escrutínio.
O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Assembleia. Para a eleição do 2.° secretário da Mesa entraram na urna 85 listas, todas com a única candidatura apresentada e nenhum voto negativo.
Declaro, portanto, eleito para 2.° secretário da Mesa, com 85 votos, o Sr. Deputado Amílcar Mesquita, ao qual peço o obséquio de subir à Mesa para tomar o seu lugar. Agradeço ao Sr. Deputado Gosta Gonçalves a colaboração que prestou aos trabalhos parlamentares.
Vamos passar à segunda parte da ordem do dia.
Continuação do debate sobre as contas gerais do Estado de 1969. Por se relacionar também com este debate, informo a Assembleia de que deu entrada na Mesa o parecer da Comissão de Contas Públicas acerca das pontas da Junta do Crédito Público referentes ao mesmo ano. Vai ser publicado, para- maior celeridade, em suplemento «o Diário das Sessões e oportunamente será submetido à apreciação da Assembleia.
Tem a palavra a Sr.* Deputada Sinclética Torres:
A Sr.ª D. Sinclética Torres: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao intervir na discussão das contas gerais do Estado, começo por render as minhas homenagens ao ilustre Deputado Araújo Correia, que mais uma vez, como vem sendo hábito, nos apresentou um trabalho que só por falta de tempo não podemos dedicar-lhe toda a atenção que seria necessária e aconselhável.
O conteúdo das suas páginas criteriosamente elaboradas, não só para nos dai- conhecimento da panorâmica geral da economia de todo o espaço português, mas também para orientar o rumo a seguir se quisermos atingir um perfeito equilíbrio económico-social, são testemunho da sua inteligência, do seu saber, e dedicação à causa nacional.
Quem como eu vive plenamente confiante no êxito do programa de continuidade renovada que o Governo definiu e está cumprindo não pode ficar indiferente, por
inércia ou comodismo, aos problemas que considera alicerces básicos para a integridade e segurança da Nação.
Como a minha, muitas e mais autorizadas vozes se fizeram ouvir nesta Câmara contra o exagero das despesas supérfluas «por serem gastos sumptuários ou ainda por irem alimentar a execução de obras que poderiam ser adiadas para melhores, dias».
Durante algum tempo pareceu-me ver surgir uma certa parcimónia nos gastos, até porque surgiram muitas reacções concordantes e construtivas. Mas foi sol de pouca durai; logo após um período de pausa e meditação, não faltaram reacções repelentes e nefastas.
Em Angola, a energia dos gastos supérfluos continua como se estivéssemos num período festivo e de bonança, numa atitude diametralmeinte oposta a que o Governo preconiza e faz, como tivemos ocasião de verificar quando o Prof. Marcelo Caetano visitou as ilhas de Cabo Verde.
E deveras lamentável a indiferença em que vive uma boa maioria estes momentos tão graves e tão decisivos para o futuro da Nação.
Através do documento em discussão verifica-se que a província atravessa um período de franco desenvolvimento.
Aumentaram as indústrias extractivas, só tenho a lamentar que as bebidas tenham maior desenvolvimento que os géneros destinados a alimentação. Só em cerveja industrializaram-se 618110001, o que corresponde a 547 744 contos.
No capitulo das importações é também pena que haja uma diferença para menos que mo ano anterior (1968) de 18 840 contos de trigo.
Sendo o pão o principal alimento, não me parece lógico
certas limitações, até porque o pão que se come em Angola, por (razões que estão fora do meu alcance, é de péssima qualidade.
Sobre os exportações são consoladoras os perspectivas, se considerarmos quanto esse aumento vai contribuir para o equilíbrio1 da balança d« pagamentos. . No que respeita às dívidas da província era de prever o aumento por todas as razões e ainda dadas as condições especiais em que se vive actualmente. Não deixarei, contudo, de pedir desta tribuna ao Governo que se analisem com imparcialidade e visão todos os compromissos de dívida que a província venha, a efectuar, sobretudo se são efectivamente necessários e urgentes.
Sei que presentemente preocupa o Governo da província o problema da habitação.
Mas o problema da habitação, especialmente das populações débeis, é universal. Este mundialmente reconhecido que é difícil, se não impossível,. eliminar de uma cidade os bairros económicos, ou seja os muceques ou o bairro de lata, do caniço ou das favelas.
O que convém é melhorar as condições de habitação dos moradores desses bairros, tornando-os funcionais e higiénicos. Refiro-me, é evidente, aos bairros suburbanos, que se multiplicam à volta das cidades.
Em Angola é Luanda a cidade que mais aflitivamente enferma desse mal, devido ao crescente aumento do êxodo rural de grandes massas humanas sem recursos e sem qualificação profissional. E, se acrescentarmos que a cidade não tem condições suficientes para receber estes contingentes e outros de origem diferente, lutando com falta de esgotos, abastecimento de água, pavimentações, etc., nada nos custa compreender que too intricado problema constitua um quebra cabeças para' o Governo e uma fatalidade para as populações, que terão de suportar, além das péssimas condições de habitação, as infalíveis doenças provenientes de uma situação n todos os títulos indesejável.
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Há DO problema da habitação três aspectos a considerar:
1.° Habitação rural:
Não basta que o regedor tenha uma casa funcional, e quem diz regedor diz agente sanitário ou missionário, é necessário que nas regedorias toda a população deixe de viver sem um mínimo de condições necessário, isto é, sem água, sem luz e sem sanitários.
De uma mineira geral, é este o caminho que se tem seguido e as populações correspondem normalmente muito bem a esse trabalho de verdadeira promoção social.
Estou neste momento a recordar aquele distrito de Carmona, que visitei primeiro sozinha e depois gostosamente acompanhando alguns ilustres colegas, e saúdo deste lugar o coronel Lencastre, que, com a noção exacta dos grandes problemas que a Nação enfrenta, está realizando roeste aspecto um belíssimo trabalho mas regedorias do seu distrito, pelo qual suo justas estas palavras de apoio e estímulo e, em nome dessas populações envolvidas nesse manto de compreensão e fraternidade humana, aqui fica o meu bem-haja!
Outro aspecto do problema habitacional é a habitação urbana.
Embora o Governo tenha procurado resolver o problema das casas para funcionários, ainda temos muito que realizar, mas é sem dúvida de considerar a evolução dos verbas despendidas para o efeito:
Contas
Em 1965 ................ 4 215
Em 1966 ................ 6 253
Em 1967 ................ 3 655
Em 1968 ................ 4 170
Em 1969 ................ 15 091
Em 1970 ................ 28 065
Conforme se verifica, houve uma quebra em 1967 de seis mil e tal contos para lares mil e tal contos, mas progressivamente recuperados nos três anos seguintes, chegando-se a 1970 com 23 065 contos.
Não há dúvida de que para as necessidades é pouquíssimo, mas estou certa de que o Estado beneficiaria muito mais os seus funcionários se todas os construções fossem resolúveis.
O Estado também ganharia porque deixava de se preocupar com a manutenção das casas; limitava-se a receber as amortizações e, com elos, construiria novas cosas para funcionários.
Desconheço as razões por que não se segue este princípio e continue a haver imensos funcionários em casas do Estado sem ser em regime de propriedade resolúvel.
À construção particular, de longe muito maior que a oficial, tem o inconveniente de as rendas serem excessivamente elevadas: cerca de 50 por cento dos vencimentos e mais.
No entanto, a doença crónica da cidade é a construção clandestina, que, no dizer do vereador Dr. Fernandes Vieira, é a mais criminosa caminhada que se está a dar no equilíbrio urbanístico da cidade de Luanda, com gravíssimas repercussões nos sectores sanitários e de abastecimento de água e energia.
Fico contudo admirada como, entre Janeiro e Agosto de 1970, foi possível construírem-se 1861 edifícios clandestinamente para alugar, e não faltam fiscais, dia e noite para impedir a colocação de uma cosa de madeira nos arredores da cidade para albergar uma pobre família sem recursos!
Está-se mesmo a ver que por detrás da clandestinidade existe um repugnante jogo de interesses que importa destruir. E, se na verdade ia humanamente perdoável a construção de moradias modestas para o proprietário morar com o seu agregado familiar, já não se pode admitir que outros mais bem afortunados, alguns até de elevado potencial financeiro, sigam impunemente o caminho da clandestinidade e construam, em transgressão armazéns, prédios de razoável porte ou comboios de casas para de seguida os darem de arrendamento por preços exorbitantes».
Há, toa verdade, necessidade absoluto de criar-se pelo menos um condicionalismo legal que desencoraje tão perniciosos e imorais empreendimentos».
Finalmente, o terceiro tipo ide habitação é a suburbana, os típicos muceques que, como disse, jamais poderão desaparecer por completo, visto que estão sempre a chegar novos aglomerados populacionais dos arredores para a cidade.
Soube que se comprou um teremos no valor de 144 000 contos para efectivamente tentar resolver o problema dos muceques, que constitui um cinturão de insalubridade sob o ponto de vista higiénico-social para a cidade de Luanda.
Tenho para mim que esta importância deveria ser utilizada em obras mais prementes e necessárias.
Em primeiro lugar porque os terrenos adquiridos são áreas cedidas gratuitamente pelo Governo para certos e determinados fins e que nunca foram utilizados. E se o Estado (necessito agora dessa área para obras sociais, não tinham mais que fazer senão readquiri-las ou, quando muito, fazer a expropriação, como, aliás, item feito a outros terrenos comprados pêlos proprietários e que, no entanto, ficam desvalorizados com a cedência ao Estado, quando as necessidades assim o exigem.
Por outro lado, não me parece que este problema se resolva com a transplantação desses numerosos bairros, cerca de 50 em Luanda, com uma população que oscila entre 230 000 e 300 000 pessoas, sempre com tendência n aumentar, como disse.
De resto, a ideia de afastar nada Tez para mais longe grupos de autóctones é um erro político-social que' pode muito bem ser explorado pelo inimigo atento aos mais pequenos deslizes.
Se começamos com estes sistemas, estamos, sem querer, a fomentar a criação de bairros para nativos e bairros para europeus, o que, alem de o nunca desejarmos nem termos feito, contraria a nossa vocação histórica de comunhão inter-racial indiscutivelmente comprovada.
Não posso, neste momento, deixar de lembrar o coronel Sousa Teles, governador do distrito da Beira, que numa conversa amena - mas com a inteligência e entusiasmo das almas bem formadas - tão bem defendeu e compreendeu a necessidade de fixar as populações nos locais onde tradicionalmente se encontram, melhorando-lhes as condições de habitação, justamente porque o convívio permanente com classes mais evoluídas contribui muito para o seu desenvolvimento social, além de outras razões humanamente de considerar. Materialmemte está mau, para não dizer péssimo, porque a maioria dessas pessoas trabalha ou estuda no centro das cidades, antes de tudo teríamos de assegurar-lhes os meios de transporte compatíveis com os parcos proventos.
Mas havendo necessidade urgentíssima de melhoramentos- no centro e arredores da- cidade, por que havemos de arranjar tantos e tão complexos problemas em zonas tão afastadas?
Penso que o problema dos bairros suburbanos ficaria praticamente resolvido ou atenuado, se, em lugar de os mudar para longe, abríssemos por todos eles ruas principais e transversais, esgotos, se puséssemos água e luz, vários balneários e cantinas públicas.
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Os bairros populares económicos também precisaram de ser aumentados e, acima de tudo, criar-se um tipo de moradia para esses bairros cujo valor seria o mais económico possível e com um mínimo de conforto.
Evitar-se-ia assim a construção nesses bairros de belas moradias no valor ide 300 a 700 contos, como que a zombar de quem acreditou na sua falsa pobreza quando foi pedir um talhão naquele bairro, e a aguçar o apetite a outros seguirem o exemplo em prejuízo dos mais necessitados
Também o Governo se tem interessado ma construção desses bairros populares; só á de lamentar que aumentando as necessidades, as verbas despendidas venham diminuindo consideravelmente desde 1967, «orno se segue:
contas
Em 1962 ................ 14 618
Em 1963 ................ 21 725
Em 1964 ................ 18 034
Em 1965 ................ 29 628
Em 1966 ................ 85 822
Em 1967 ................ 26 666
Em 1968 ................ 19 060
Em 1969 ................ 19 686
Em 1970 ................ 9 647
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sendo o Instituto de Assistência Social um serviço que ,como o próprio nome indica, actua sobre. as populações mais necessitadas, não quero deixar de pedir que nos próximos anos seja orçamentado por este serviço um aumento substancial, de forma a poder satisfazer os inúmeros encargos que tem, e em que se contam, além da assistência propriamente dita, 8 creches e jardins infantis, 4 internatos para raparigas, 2 internatos para rapazes, 9 internatos para velhos, 5 internatos para inválidos e.6 centros sociais.
Não posso deixar de me referir ao problema da Casa dos Rapazes de Luanda, onde por não existirem ainda casas de correcções para a delinquência juvenil, convivem os julgados em tribunal e os pobres sem defeitos, o que de forma alguma é aconselhável.
Este é um dos graves problemas que o Instituto desejaria ver resolvido.
Julgo que, enquanto não beneficiai de qualquer aumento, como se impõe, poderia dispensar-se, o pagamento de cerca de 3000 para defesa nacional, pois, sendo um serviço de beneficência, colabora com a Defesa Nacional, recebendo e cuidando de todos aqueles que sofrem os consequências de guerra, principalmente crianças, que atingem o elevado número de 1000 entre os 3 e os 5 anos! Só em Luanda.
Ainda porque o Instituto conhece de perto as necessidades dos economicamente débeis, pois é o único serviço público na província que no momento presente tem estabelecimentos e penetração nos muceques, gostaria que tivesse, e faço votos para que um representante no Conselho Económico Social, tenha, que é praticamente o órgão legislador da província, para o esclarecer devidamente e evitar H. saída de diplomas que tanto afectam a classe pobre, como sucedeu com o último diploma da assistência médica e medicamentosa, que se teima manter em vigor tal como está, e que tivesse um representante na Junta Provincial de Habitação para se informar e informar das condições para obterem uma casa e quais os mias pobres.
Vou terminar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, aprovando o parecer das conta* gerais do Estado na generalidade.
Não posso, contudo, deixar de me referir ao que alguém afirmou acertadamente:
 Nação vale pelo valor intelectual e social do seu povo e pela satisfação que o mesmo povo deve sentir.
Esta é uma preocupação que trago latente. Não sou advogada do povo, faço parte integrante dessa massa incógnita em corpo e alma, e sei que falar deles ou por eles deste lugar é incutir-lhes confiança, satisfação e fé, ë enviar-lhes H prova irrefutável que a Nação inteira sente e compreende os seus anseios e necessidades.
Oxalá que assim suceda!
Disse.
A oradora foi muito cumprimentada.
. O Sr. Coelho Jordão: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao falar na discussão das contas gerais de 1969 quero, antes de mais, felicitar a Comissão que subscreve o respectivo parecer e, em especial, o seu relator, engenheiro Araújo Correia, a quem testemunho a mais profunda e sincera admiração, com a minha homenagem pela forma brilhante, objectiva, esclarecido conhecimento dos problemas, isenção e sentido construtivo com que faz a apreciação e crítica da administração pública, constituindo assim um documento notável de meditação e orientação.
A Lei de Meios estabeleceu, na ordem de precedência das despesas, logo a seguir aos encargos com a defesa nacional, os investimentos públicos previstos ma parte prioritária do III Plano de Fomento e definiu a política de investimentos, considerando, as «critérios de maior reprodutividade e do mais adequado aproveitamento dos recursos disponíveis». E alem de investimento sociais e culturais (saúde, investigação, ensino, assistência escolar, etc.), considera também a «melhoria do bem-estar rural».
Na política de bem-estar rural são consideravelmente: os estradas e caminhos; electrificação, abastecimento de água e saneamento; construção de edifícios para fins assistenciais e habitação, e tudo que se destine à valorização local e à elevação do nível de vida das respectivas populações. .Todos os investimentos considerados nesta alínea do bem-estar rural «ao do mais mito significado, pois tem como meta final a valorização da pessoa humana. A análise deste sector merece-nos, por isso, especial atenção.
A acção do Governo verificou-se através da concessão de comparticipação, que foram, de 78 188 contos em melhoramentos urbanos, 241 993 contos em melhoramentos rurais e 37 741 contos em águas e esgotos; em 1968 foram, respectivamente, de 72 104, 141 561 e 56 060 contos. O total pago foi, portanto, de 858 867 contos em 1969 e 269 725 em 1968.
Além, destas comparticipações, foram concedidos subsídios de 93 038 contos para águas em 1969 e 64 424 contos em 1968.
As comparticipações e subsídios concedidos em 1969 - 447 409 contos foram superiores em 118 208 contos às de 1968.
Com a electrificação rural foram pagos comparticipações no valor de 62 500 contos em 1969 e 48 778 contos em 1968.
Daqui se pode concluir que as verbas destinadas a investimentos de bem-estar rural foram superiores a 1968 em 127 080 contos. Este jacto é bem significativo do interesse que ao Governo vem merecendo esta política de valorização do País e das suas populações e entusiasticamente vivido pelo Sr. Ministro das Obras Públicas.
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Vale a pena analisar mais em pormenor cada uma das rubricas. Assim, ma «Viação Rural» (estradas municipais e caminhos públicos) foram pagos 173512 contos, mais 68 029 coutos, do que em 196S. Se incluirmos nestas verbas outras obras rurais, verificamos que o montante das comparticipações atingiu *220 584 contos ou seja, mais 62 por cento do que mo ano anterior.
As verbas despendidas na- vigência dos II Fiamos de Fomento e Intercalar (1959-1967), em viação rural, foram de 810 071 contos, ou seja, uma média de 90 000 contos por ano, o que vem pôr em evidência a importância que está a ser dada a este problema.
No entanto, nas condições da vida actual, haverá que «acelerar ainda mais o ritmo de execução do plano de viação rural», pois não poderá- haver, ainda, povoações isoladas ou mesmo povoações com acessos precários por onde não possa passar com facilidade e comodidade o trânsito automóvel, dando-lhe possibilidades de aumentar o rendimento do trabalho através de fácil ligação dos meios de produção com os meios de consumo.
No abastecimento de água das populações rurais, o total de comparticipações pagas foi de 90 169 contos, enquanto em 1968 foi de 82 746 contos, não atingindo, portanto, um aumento de 9 por cento. O aumento referido, apesar de pequeno, não se terá traduzido também num correspondente aumento de trabalhos realizados, nem tão-pouco terá acompanhado o crescente aumento de custo destes trabalhos.
O abastecimento de água domiciliário, que se tem incrementado, deverá justificar-se pela influência que tem na melhoria do nível sanitário das populações e na valorização social e económica do País. Nem sempre é fácil encontrar nascentes que permitam estes abastecimentos, resultando, na maioria dos casos, em investimentos extraordinariamente grandes na pesquisa de novas fontes de abastecimento para acompanhar os aumentos de consumo.
For isso, e como refere o relator do parecer, o abastecimento a largas áreas, partindo de fontes de abastecimento permanentes, como sejam os aproveitamentos hidroeléctricos ou as pequenas albufeiras, será a forma mais económica de levar para a frente este melhoramento. O aproveitamento do Mondego virá resolver o problema de extensa zona, que compreenderá vários concelhos e até o caso de muitas indústrias. Este aspecto é muito importante porque não se pode pretender uma valorização de qualquer região pela instalação de novas indústrias se não se dispuser de caudais suficientes para satisfazer as suas necessidades.
Tem este sector do bem-estar rural vindo a ter as suas dotações mais reforçadas de ano para ano, mas que não pode corresponder todavia a um aumento proporcional de trabalhos realizados, em virtude da elevação progressiva dos custos unitários. Dai que a execução dos planos de trabalhos não possa imprimir aquele ritmo desejado, de forma a, num prazo razoável, poder estar resolvido o caso das povoações mais populosas.
São estas obras, viação rural, águas e esgotos, embora comparticipações pelo Estado, realizadas pelas camarás municipais, para as quais também têm de contribuir com uma participação.
Vêem-se as câmaras em graves dificuldades para poder corresponder a esta obrigação, quando não mesmo em efectiva impossibilidade, em virtude da difícil situação financeira que atravessam.
As receitas camarárias não subiram na proporção das despesas, que, além das suas despesas próprias de funcionamento, se vêm sobrecarregadas com responsabilidades de funcionamento de serviços estranhos ao município.
Pode verificar-se que entre 1964 e 1968 (ainda não se têm os elementos de 1969) o aumento médio da receita ordinária das câmaras foi- de 55,2 por cento, enquanto no mesmo período as receitas ordinárias do Estado aumentaram 66,4 por cento. Dos 22 distritos do continente e ilhas adjacentes 15 tiveram um aumento inferior a 50 por cento. Por outro lado, aquela média de 55,2 por cento é altamente influenciada pelos concelhos industrializados- e grandes centros urbanos.
Analisando os mapas de receitas ordinárias dos municípios, verificamos que existem dois fortes pólos de crescimento - o de Lisboa e o do Porto. Assim, o aumento das receitas ordinárias dos municípios da zona de Lisboa no referido período de 1064-1968 foi de 92 por cento, enquanto o do Porto foi de 89,9 por cento. Esta situação, porém, estará hoje já bastante mais agravada, c mais se agravará ainda num futuro próximo.
Para além daqueles dois grandes pólos, aparecem depois alguns (concelhos isolados com taxas de crescimento altas - Câmaras Municipais de Coimbra (98,1 por cento), Marinha Grande (98,4 por cento), Guimarães (63,5 por cento), Figueira da Foz (61,2 por cento) e pouco mais.
A percentagem média de aumento destes grupos, constituídos por 22 concelhos, atingiu desta forma 89,2 por cento, donde facilmente se concluirá que a média dos outros concelhos, em número de 280, será muito inferior à média geral de 55,2 por cento.
E esta situação de empolamento dos distritos de Lisboa e Porto cresce continuamente. Pela análise da verba principal e adicionais às contribuições do Estado, verifica-se que naqueles dois distritos, em 1969, a percentagem que lhes coube foi de 72,6 por cento do total, tendo sido de 71,7 por cento em 1968 e 70,5 por cento em 1967. Daqui se conclui da concentração que está a dar-se nestas regiões.
E se pormenorizarmos mais a análise das receitas e despesas de todas as câmaras, rapidamente chegaremos à conclusão de que grande número delas não terá receitas mais que para pagar nos funcionários e suportar determinados encargos que lhe estão cometidos (encargos que poderiam e deveriam ser suportados por outros departamentos oficiais), e, no fim, o que resta apenas dará para tapar alguns buracos nas- estradas e caminhos.
Os municípios ainda são hoje a expressão mais natural e mais válida da administração da comunidade e neles assenta toda a validade de uma política. Constituem ainda uma máquina poderosa, que consegue a participação das populações na realização dos planos de promoção e desenvolvimento, grandes ou pequenos, na conjugação de esforços para a concretização de tarefas que, de outra forma, seriam difíceis de levar a bom termo.
A vitalização destas instituições é fundamental para, com o seu apoio, se poder executar as tarefas definidas no III Plano de Fomento e se promover o desenvolvimento económico das regiões, e a valorização das suas populações. Ë, por isso indispensável ver todo o plano das suas receitas e não menos importante libertá-las de certos encargos que bem caberiam em outros departamentos.
Caso contrário, como poderão eles fazer face às participações que lhes competem na execução das obras do plano de fomento? E não se- agravará, o que já vem acontecendo, a não utilização das comparticipações que são atribuídas às câmaras pelo Governo, para execução de obras urgentes e indispensáveis, por falta de verbas
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próprias daquelas, atrasando-se assim o desenvolvimento do País e acentuando-se tis assimetrias, que tanto se desejaria ver reduzir?
Ao verificar-se o aumento de receitas que a Conto Geral do Estado nos vem oferecendo, gostar-se-ia também que igual situação se verificasse nas contes dos municípios.
O outro sector importante, já referido, é o da electrificação rural, o qual vem consignado no plano de fomento como fundamental na melhoria das condições de vida das populações e do nível da economia rural. O numero de freguesias por electrificar é ainda bastante elevado, contando-se por algumas centenas, sendo difícil, com o ritmo de execução que se tem vindo a verificar, poder, dentro de um período curto, dotar estas populações de um bem que é parte integrante do progresso e da vida actual.
Se a estrada é uma ambição legítima dos povos, que hoje já desejam que seja alcatroada, a electricidade é indispensável, pois permite todo um mundo de possibilidades e comodidades que os povos já não podem dispensar.
Os investimentos feitos em 1969, neste sector, foram de 118 238 contos, sendo 62 500 contos de comparticipação do Estado, 40 153 contos das autarquias locais e 15 585 contos das empresas privadas, o que representa uma comparticipação de 52,8 por cento do Estado, 33,8 por cento das autarquias e 13,4 por cento das empresas privadas. Em 1968 as verbas despendidas foram de 111 823 contos, sendo 59 386 contos do Estado (53,3 por cento), 36 726 contos das autarquias locais (32,9 por cento) e 15 211 contos das empresas privadas (13,7 por cento).
A participação do Estado baixou de 1968 para 1909 tendo em contrapartida subido a participação das autarquias.
No plano de fomento previa-se, para que a electrificação de todos os lugares com mais de 100 habitantes sã fizesse num prazo aceitável, um investimento anual da ordem dos 170 000 contos.
As verbas gastas em 1968 e 1969 foram assim bastante inferiores ao programado, o que provocará atrasos que dificilmente poderão vir a ser recuperados.
Dos investimentos feitos salienta-se, pelo seu pequeno montante, o das empresas privadas. Enquanto as autarquias locais, com as graves dificuldades financeiras que a travessam, despenderam 40 158 contos, as empresas privadas, concessionárias de extensas áreas onde há numerosas povoações por electrificar apenas despenderam 15 585 contos. No entanto, é ler os relatórios de gerência e verificar os lucros volumosos que todas apresentam ...
Fez-se a reestruturação da rede primária, e é agora imperioso que se faça a reestruturação da rede secundária e da pequena distribuição, mas com os olhos postos em primeiro lugar ma electrificação rural e com o sentido de que só os câmaras ou federações de municípios, sem preocupações de lucros nem de instalações luxuosíssimas, - mas apenas com o fim de servir, poderão levar a cabo tão ingente tarefa.
A electrificação rural e principalmente a distribuição aos pequenos núcleos populacionais, quantas vezes muito dispersos, mão é rentável, pelo que as empresas concessionárias evitam sempre, o mais que podem, instalar estas redes. Parece que, pela sua condição de concessionárias, isto é, pela situação de privilégio que lhe é dada, deveriam ser obrigadas à electrificação de toda a zona que lhe é concessionada. Mas isto - não acontece, e mesmo que as câmaras queiram fazer elas próprias a exploração da electricidade, os empresas opõem a maior resistência a largar a concessão.
As empresas concessionárias, apesar de quase só electrificassem as povoações cujos consumos garantem- lucro, mão são obrigadas a fornecer a iluminação pública além de determinado quantitativo, sempre baixo, pelo que se as câmaras não suportarem os excedentes da referida iluminação, encontramos esta, apagada a maior parte do tempo.
De tudo isto resulta que nos concelhos onde a pequena distribuição não é feita pelas câmaras ou federações de municípios existam grande inúmero de povoações sem estarem electrificados.
Um outro problema, e muito grave, surge nos concelhos onde a distribuição de energia eléctrica é municipalizada. A empresa distribuidora da rede secundária, fornecedora das câmaras, da energia em A. T., que vive também na prática em regime de exclusivo, impõe os preços de venda o as condições do contrato. Não vale a pena doutra, nem as câmaras alegarem os argumentos mais válidos.
No entanto, essas mesmas empresas, fornecedoras exclusivas das câmaras, podem concorrer dentro do concelho no fornecimento de energia era A. T. as actividades industriais (que dão melhor lucro), numa concorrência desleal, porque, tendo preços de venda fixados por lei, sempre que é preciso conquistar um cliente, aqueles não são respeitados.
Dando a electrificação doméstica do meio rural prejuízo e sabendo-se que é a venda de energia industrial que poderá equilibrar a exploração, veja-se a situação imoral e difícil criada as câmaras.
Na reestruturação da rede secundária e da pequena distribuição não deve deixar de se atender a esta situação, definindo bem que dentro da área onde as câmaras ou federações de municípios são distribuidoras de energia nenhuma empresa poderá, seja a que título for, fazer qualquer fornecimento de energia que não seja à câmara ou à federação.
De outra forma não andaremos para u frente com a electrificação da metrópole.
Junto este meu apelo ao de tantos colegas que aqui já têm trazido também os graves problemas da electrificação dos seus concelhos e dos seus distritos e que vivem a angústia de tantas das suas aldeias não disporem deste bem.
O distrito de Coimbra ainda tem dezenas de povoações por electrificar, e, no condicionalismo actual, serão necessárias também dezenas de anos para o conseguir.
Pretendemos o desenvolvimento do País, a elevação das condições de vida das populações rurais, e não apenas o enriquecimento de alguns. Para isso, como afirma o ilustre relator das contas públicas, o abastecimento de energia em termos correctos de preço e segurança promove a descentralização industrial, tão necessária num país que pretende firmar o seu desenvolvimento económico na base de uma indústria progressiva e eficiente, e é factor importante da promoção das populações.
Desenvolvimento regional - Um dos objectivos do III Plano de Fomento é a correcção progressiva dos desequilíbrios regionais de desenvolvimento no processo do desenvolvimento da economia regional.
A consecução de uma política neste sentido terá de Jazer-se através de uma acção deliberada do Governo, por meio de investimentos públicos criadores de infra-
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estruturas fundamentais, pela orientação através de incentivos fiscais, pela cedência de terrenos, pela localização de pólos industriais, pelo aproveitamento de todos os pólos naturais de desenvolvimento.
A execução de determinados melhoramentos ruçais, como estrados, electrificação, abastecimento de água, pode contribuir, e contribui, para uma política de desenvolvimento regional.
Mas outras infra - estruturas, a cargo exclusivamente do Estado, são fundamenteis também.
Ora, enquanto este objectivo do Plano de Fomento se vá reforçado nas Leis de Meios para 1970 e 1971 e se vê frequentemente editado como propósito do Governo, na realidade verificamos tudo se concretizar no sentido de um acrescimento cada. vez maior da zona de Lisboa.
Refere-se no parecer que dos 2 922 616 contos de contribuição industrial liquidada por verba principal e adicionais, no continente, cerca de 2 123 400 contos, ou seja -, cerca de 71 por cento, pertencem a dois distritos - evidentemente Lisboa e Porto -, mas, mesmo assim, Lisboa representa l 554 922 contos (53,2 por cento) e o Porto apenas 568485 contos (19,4 por cento).
Se analisarmos, porém, a evolução, nos últimos anos, das verbas relativas à contribuição industrial, verifica-se que o distrito de Lisboa teve, em 1965, 849200 contos e, em 1969, l 555 000 contos, enquanto o Porto passou de 400 000 contos para 568 000 contos, Setúbal de 74 500 contos pana 114 000 contos, Aveiro de 83 200 contos para 140 000 contos, Coimbra ide 44 000 contos para 82 000 contos e os outros distritos passaram de 259 000 contos para 376 000 contos.
[Ver Tabela na imagem]
Distritos
1966
1967
1968
1969
Se considerarmos n percentagem, da contribuição industrial e adicionais que corresponde a cada distrito, verificamos que só o distrito de Lisboa tem 53,2 por cento, isto é, mais de metade do resto do Pais. O Porto, apesar de ser o segundo grande pólo de concentração económica, apenas represente 19,4 por cento do total. Mas se juntarmos os distritos de Lisboa, Porto e Setúbal, temos que 76,5 por cento da verba total pertence a estes duas grandes zonas, ficando paro o resto do continente 24,5 por cento.
As receitas da contribuição industrial e adicionais passaram no mesmo período de l 767 000 contos para cerca de 3 milhões de contos, o que representa um aumento de l 233 000 contos, dos quais 706 000 contos couberam ao distrito de Lisboa e 168 000 contos ao distrito do Porto, restando para, todos os outros distritos do continente apenas um aumento de 359 000 contos.
A situação é semelhante no que diz respeito a todos os outros sectores, como o imposto profissional, contribuição predial, rústica e urbana, o imposto complementar, etc.
São uma série de índices por onde se pode aferir a grande concentração que existe à volta de Lisboa e Porto.
E esta tendência que devia ser contrariada, como é o objectivo da política governamental definida nos planos de fomento, para que amanha o Pais não seja um deserto apenas com aquelas duos grandes acrópoles.
No entanto, parece estarmos a assistir a um agravamento acentuado desta situação, com domínio absoluto da zona de Lisboa. Esta zona detém, já hoje, como se viu, quase 60 por cento da contribuição industrial do País, o que significará que mais de metade da indústria do Pais se localiza ali. Mas, apesar disso, estão anunciados grandes investimentos, como uma refinaria em Setúbal, um grande estaleiro também para Setúbal, o novo aeroporto, a sul do Tejo. Tudo isto mais vem acentuar a situação existente. A C. P. ainda há dias anunciou o seu pleno de obras, paca o que chamou o nó de Lisboa, que, a realizar-se, irá contribuir para um crescimento rápido do parque industrial da zona Sul (Lisboa - Setúbal).
Se a nova refinaria ou o estaleiro em vez de se localizarem em Setúbal, o fosse na zona Centro, onde há portos que oferecem possibilidades paro esse efeito, isso contribuiria para a descentralização que se anuncia pretender e promoveria o desenvolvimento de uma região com imensas potencialidades económicas e humanas.
O Sr. Ribeiro Veloso: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faz favor.
O Sr. Ribeiro Veloso: - Tenho estado a ouvir V. Ex.ª com muito prazer, mas, perante a sua insistência em falar no Centro do Pois, queria fazer uma pergunta que é esta:
V. Ex.ª entende por País só Portugal continental?
O Orador: - País, continente. Eu no princípio referi que era o continente.
O Sr. Ribeiro Veloso: - È que quando se está a referir ao País entendo em geral, e de certo modo fazia-me confusão que dissesse o Centro do Pois, pensado talvez em Coimbra.
O Orador: - No princípio referi-me ao continente.
A localização da Refinaria no Centro teria repercussões enormes no desenvolvimento de toda a indústria da região. Assim, a indústria tem o preço do combustível tanto mais coro quanto mais afastada estiver das refinarias, e de tal forma isto é importante que influencia, pelo peso que tem nos custos de produção, a sua localização.
Daqui se pode ver a força de atracção que esta instalação vai ter, com efeitos negativos para a zona centro.
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Ao ler-se, na imprensa, esse plano de trabalhos da C. p, encontra-se, além do caso de Lisboa propriamente dito, a instalação do caminho de ferro para a margem sul do Tejo, através da ponte, e depois uma rede completa em toda a zona que fica entre aquela margem e Setúbal.
Tudo isto contribuirá para que denta em breve o parque, industrial do Pais se encontre instalado à volta de Lisboa.
Dentro da política de desenvolvimento regional, o distrito de Coimbra tem potencialidades enormes, que, aproveitadas, serão decisivas no crescimento económico do Centro.
Não deixa de ser preocupante, ao tornar-se conhecimento dos números que o recenseamento da população vai formando, verificai: a forte diminuição que se deu em quase todos os concelhos da província, a que não fez excepção o distrito de Coimbra.
E esta verdadeira torrente poder-se-ia ter atenuado neste distrito se tivessem sido aproveitadas as possibilidades da região, promovida na execução de infra-estruturas básicas e orientada por uma política de incentivos cie ordem vária a localização de determinadas indústrias.
Eu creio - que não podem existia: dúvidas algumas nu espírito de quem se tenha- debruçado sobre os problemas de desenvolvimento económico do Centro de que existem dois pólos fundamentais para a aceleração da sua promoção. São eles: a Universidade, virada para o exterior e apoiando, pêlos seus laboratórios, pela investigação, por um corpo docente altamente científico, as indústrias - mesmo os mais especializadas -, além da preparação, que pode fazer, de técnicos de que as actividades industriais tanto necessitam; o porto da Figueira da Foz, indiscutivelmente o pólo de maior potencialidade e de maior repercussão em toda a zona. Ainda recentemente aqui trouxe ao conhecimento desta Câmara a evolução do seu trafego comercial, que cresceu a um ritmo não verificado em qualquer outro porto comercial.
[Ver tabela na imagem]
Anos
Toneladas
Aumento em relação ao ano anterior Percentagens
Mas, se estes números já são significativos, eles tomariam uma expressão totalmente diferente se o porto já dispusesse das infra-estruturas mínimos que pudessem comportar todo o movimento de mercadorias que pretende utilizá-lo.
Deve referir-se que em toda a zona Centro os sectores ligados à indústria vêem no porto da Figueira da Foz a solução para a expansão dos suas actividades e ansiosamente aguardam a possibilidade de o poderem utilizar sem restrições. E tantas são elas, a começar pela indústria de celulose, que já em 1970 exportou por ele 85 000 t; a indústria de madeiras - serradas, toros e postes telefónicos; a indústria de resinas, que já por ali exporta grande quantidade de aguarrás (mais não exporta; como desejaria, por falta de cais); a indústria de cerâmica vermelha e de refractárias do distrito de Leiria, que só poderá expandir, a exportação quando o puder fazer através do porto da Figueira da Foz; caulinos; a exportação de diversos minérios; vinho; etc.
As suas ligações directas cora Leiria e com todo o interior das Beiras, quer através de estradas, quer de caminho de ferro, tornam-no, sem dúvida,, o porto natural dessas zonas e, ao mesmo tempo, um pólo dê atracção de actividade de vários sectores.
As obras em curso permitirão a ampliação da capacidade de utilização do porto, mas, dada a pressão do seu hinterland, prevê-se que dentro de pouco tempo -dois anos, se tanto ele esteja colmatado.
O investimento que a fase seguinte exige pode ser grande, mas o progresso da região exige que não se protelem as obras.
As forcas vivas do distrito agradeceram ao Sr. Presidente do Conselho os melhoramentos em curso e saíram do seu gabinete cheios de entusiasmo e confiança no futuro do porto.
A existência de uma rede de esteadas que sirva o Centro é também indispensável.
Assim:
A renovação da estrada de Viseu a Coimbra;
A renovação da estrada Figueira- Leiria, já bastante melhorada, é certo, mas sem oferecer as condições exigíveis para o trânsito que a utiliza;
A construção de uma estirada que ligue à Cova da Beira, Covilha a Coimbra e à Figueira, permitindo - lhes a utilização fácil do porto da Figueira da Foz; estradas esta já iniciada e, segundo cremos, já determinado pelo respectivo Ministério o estudo do projecto do troço restante. Esta estrada tem uma grande importância para o desenvolvimento da economia daquela zona;
A renovação da estrada de Vilar Formoso a Coimbra, que constitui, no estado em que se encontra, um triste contraste com as estradas percorridas pêlos milhares de turistas que da Europa vêm a Portugal.
Uma boa estrada que ligue Viseu a Coimbra e à Figueira é indispensável para o desenvolvimento desta zona do interior, permitindo a saída fácil dos seus produtos, principalmente a exploração das suas ricas reservas de minérios.
Enfim, o estudo e execução de uma rede de estradas conveniente constitui uma das infra-estruturas importantes para o desenvolvimento do Centro do Pais.
O equilíbrio regional, objectivo a atingir, necessita assim de uma acção poderosa e coordenada do Governo, porá corrigir tendências de concentração, como é o caso de Lisboa, e para que se dê um grande impulso na «industrialização descentralizada», como se afirma no parecer.
E um último ponto quero ainda abordar - a balança comercial.
A balança comercial em'1969 acusou um déficit de 12 736 700 contos, muito superior ao verificado em 1968, que foi de 11 941 000 contos. Na última década, este saldo negativo tem sido progressivo, tendo-se agravado em -1970.
Esta situação resulta de não ter sido possível equilibrar as importações com as exportações. Enquanto as importações montaram a 37 262 000 contos, as exportações foram de 24 526 000 contos, tendo as exportações tido um aumento em relação a 1968 de 2 610 000 contos e os importações um aumento de 3 404 000 contos.
A importação de produtos alimentares atingiu a cifra de 5 096 000 contos, sendo o maior valor dos últimos quatro anos.
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[Ver Tabela na Imagem]
Salientam-se no parecer a importação de cereais, com 1550 milhares de contos (1 438 000 em 1968), açúcar com 582 000 contos (641 000 em 1968) e oleaginosas com 939 000 contos (779 000 em 1968).
O alto valor das importação de cereais diz respeito, principalmente, a trigo em grão, cerca de 610 000 contos, a milho, 775 800 contos (em 1966 foram 566 000 contos) e arroz, 138 800 contos. A elevada importação de trigo resultou das más condições do ano agrícola, que reduziu a produção a 51,1 por cento em relação ao ano anterior (382 000 t). Outro tanto não se pode dizer com a produção de milho, que se apresenta sensivelmente constante ao longo de decénio (547 000 t), e, no entanto, a importação atingiu a elevada verba de 775 000 contos.
A produção de arroz tem subido em resultado da entrada em exportação dos novos regadios do Sul.
A exportação teve um aumento de 11 por cento em relação ao ano anterior, sendo os principais produtos da nossa exportação o vinho (1718 milhares de contos), a cortiça a importação de cereais, com 1550 milhares de contos (l 438 000 em 1968), açúcar com 582 000 contos (641 000 em 1968) e oleaginosas com 939 000 contos (779 000 em 1968).
O auto valor de importação, de cereais diz respeito, principalmente, a trigo em grão, cerca de 610 000 contos, a milho, 775 800 contos (em 1966 foram 566.000 contos) e arroz, 138800 contos. A elevada importação de trigo resultou das mm condições do «uno agrícola, que reduziu-a produção a 51,1 por cento em relação ao ano anterior (382 000). Outro tanto não se pode dizer com a .produção de milho, que se apresenta sensivelmente constante ao longo do decénio (547 000 t), e, no entanto, a importação atingiu a elevada verba de 775 000 contos.
A produção de arroz tem subido em resultado da enteada em exploração dos novos regadios do Sul.
A exportação teve um aumento de 11 por cento em relação ao ano anterior, sendo os principais produtos da nossa exportação o vinho -(1718 milharás de contos), a cortiça (1641 milhares de contos), os têxteis (1352 milhares de contos), as conservas de peixe (1097 milhares de contos), as madeiras (745 milhares de contos), os resinosos (478 milhares de contos), os derivados do tomate (864 milhafres de contos) e a celulose e aglomerados (1249 milhares de contos).
Nota-se um acréscimo progressivo na exportação de vinho, na celulose e aglomerados, o que, quanto o estes últimos, se deve acentuar nos próximos anos.
O autor do parecer, ao analisar a situação da balança comercial, diz que «o problema português, hoje como no passado, é essencialmente um problema de produção», para concluir que «deverão ser desviados os investimentos para as empresas mais produtivas e melhorado o rendimento do trabalho, para não se manter este desequilíbrio».
As importações de produtos derivados da agricultura atingiram cerca de 5753 milhares de contos, o que bem pode dar ideia da importância deste sector na balança comercial.
Ora, muitos dos produtos importados poderiam, ser produzidos no País, contribuindo para o equilíbrio da balança comercial e para a; melhoria da situação da nossa lavoura.
O aproveitamento conveniente e intensivo dos regadios, a orientação da lavoura para a introdução de novas culturas e de movas (técnicas, a modernização dos métodos de exploração, ensinando-a e apoiando-a na comercialização dos seus produtos ou na sua industrialização, são um vasto campo, que encerra possibilidades enormes.
Faz pena ver extensas áreas, onde se despenderam verbas avultadíssimas, que poderiam contribuir para a valorização da produção agrícola e se encontram abandonadas ou entregues a culturas tradicionais sem qualquer interesse económico.
Nos novos regadios do Sul começa a introduzir-se a cultura do arroz, que dentro de pouco tempo motivará a ruína daquela cultura nos campos a norte do Lis, quando podiam é deviam estes regadios ser aproveitados para uma exploração intensiva de culturas industriais, muito mais valiosas e de maior interesse para o Pais.
Mas os 15 000 ha de riquíssimos solos do vale do Mondego aguardam os investimentos necessários para poderem permitir uma exploração racional de novas culturas, que aumentarão o rendimento do trabalho e contribuirão para a valorização da produção agrícola nacional. E, nas condições actuais da economia portuguesa, não poderemos desperdiçar assim este rico potencial.
O plano do Mondego vai entrar em execução com construção, da barragem da Aguieira, como já foi anunciado. A realização dias obras provocará uma reconversão de culturas, novos sistemas de comercialização e a instalação de unidades industriais para o aproveitamento e valorização dós novos produtos cultivados. É um trabalho extenso, que deve ser realizado com antecedência, e cremos que pouco ou nada, neste momento, está feito.
A valorização humana das populações deve acompanhar também todo o desenvolvimento económico. É de inteira justiça referir o trabalho extraordinário que os cursos de extensão agrícola familiar da Direcção-Geral dos Serviços Agrícolas têm desenvolvido no distrito neste sentido, sendo dignos do maior louvor, mas impõe-se, porém, o desenvolvimento deste serviço, de forma que maior número de grupos - de trabalho façam a cobertura com -, peta da região e se estendam o mais possível a todos os distritos.
É toda uma problemática complexa que tem de ser equacionada e estudada com tempo bastante, para na. altura precisa tudo poder arrancar simultânea e harmònicamente.
Só assim, virados para uma nova agricultura de mercado, a todos os níveis, poderemos reduzir a importação de produtos alimentares, aumentar o valor da exportação desta actividade e promover essa classe de lutadores, verdH/deiros heróis, que são os nossos trabalhadores da terra.
Figura na lista da exportação uma nova rubrica que está a tomar posição de relevo no quadro da exportação. É a celulose e aglomerados de madeira, cuja exportação, como já se referiu, foi de 1 249 000 contos em . 1969. Em 1970, o valor bruto da produção deste sector ultrapassou os 2,5 milhões de contos, dos quais se destinaram à exportação (só celulose) 1 330 000 contos.
Dada a importância desta actividade e a gravidade dos problemas que a rodeiam, vale a pena um pouco na análise da conjuntura, até porque dentro em breve passará a ocupar o primeiro lugar na exportação, ultrapassando assim a cortiça.
O autor dó parecer, com o seu lúcido espírito e profundo conhecimento destes - problemas, diz «que não é ousado nem fantasista estimar possibilidades de exportação de produtos florestais -celulose, papel e outros, como folheados, prensados e mais em pelo menos meia dúzia de milhões de contos numa dezena de anos». E continua: «Aqui está um poderoso auxiliar da exportação à espera do uso da inteligência e do labor dos homens», e lança um repto:
A Assembleia Nacional faria bem em debater esto magno problema de que depende uma parcela dó
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bem-estar, e pode servir de base à colheita de cambiais que possam enfrentar as desventuras de falhas aos invisíveis.
Correspondendo assim ao seu apelo, não me escusarei de dar o meu contributo sobre tão magno problema, tanto mais que já na última legislatura aqui o tratei.
A evolução da produção de celulose no País, nos últimos cinco anos, foi a seguinte:
[Ver Tabela na imagem]
Anos
Milhares de toneladas
Valor bruto da produção Milhares de contos
Ao valor bruto da produção, 1 905 000 contos, em 1970, correspondeu um valor acrescentado de 895 000 contos, isto é, praticamente 50 por cento.
Desta produção destinam-se à exportação 304 0001 e 1 114 000 contos em 1969 e 311 000t e l 330 000 contos em 1970.
O sector dos painéis de partículas e de fibras teve a seguinte evolução:
[Ver Tabela na imagem]
Anos
Milhares de metros cúbicos
Milhares do contos
Desta produção destinaram-se a exportação, em 55 600t, no valor de 135 000 contos.
O ritmo anual de expansão no período de 1965-1970 (quantidades) foi de 18,7 por cento para a celulose e 25 por cento para os painéis.
A indústria de celulose exportou em 1969 cerca de 80 por cento da sua produção, tendo o ritmo das exportações aumentado a taxa média anual de 30 por cento.
No mesmo período a taxa de aumento de exportação de painéis de partículas foi de 46 por cento.
O volume global da importação mundial foi de 13 289 milhares de toneladas em 1967 e 14 720 milhares de toneladas em 1968, e no mercado europeu, para onde se dirigem as nossas exportações, foi de 8091 e 9025 milhares de toneladas, respectivamente, em 1968 e 1969.
Os principais fornecedores do mercado europeu são o Canadá, com 11 por cento, os Estados Unidos da América, com 9 pôr cento, a Escandinávia (Suécia, Finlândia e Noruega), com 65 por cento, e Portugal, com 2,4 por cento.
A posição de Portugal na exportação para a Europa de painéis de partículas e de fibras é, em relação à importação global, de 1,7 por cento e 2,5 por cento, respectivamente (1969).
O consumo de papel e cartão na Europa cresce a uma taxa anual de cerca de 6,5 por cento, o que se traduz em acréscimos de consumo anuais da ordem de 1,5 milhões de toneladas.
O consumo de madeiros no mercado europeu tem subido a ritmo acelerado, prevendo-se que na Europa, em 1975, a produção possa atingir 270 milhões de metros cúbicos e o consumo atinja 365 milhões de metros cúbicos, o que significa que haverá um déficit, de 95 milhões de metros cúbicos, déficit que se irá acentuando com repercussões nos diversos sectores de actividade, inclusive o de celulose e aglomerados.
O mercado da celulose apresenta - se, assim, sem qualquer limitação paira o escoamento da nossa produção e para a expansão da indústria portuguesa. A acrescentar, deve considerar-se ainda o facto de as pastas de origem nacional em especial de eucalipto - figurarem entre as melhoras dos respectivos tipos.
A expansão da indústria da pasta de eucalipto verificou-se à taxa de 24 por cento no período da 1964-1970, mas atendendo às dificuldades previstas no fornecimento da matéria - prima (eucalipto), na sua taxa média anual de expansão não ultrapassará no período de 1971-1978 15 por cento, o que em 1978 permitirá uma produção de 575 000t, com um valor bruto de 2 473 milhares de contos (aos preços de 1970).
No entanto, a indústria corre o grave risco de ver ainda mais (reduzido o seu ritmo de expansão, por falta de matéria prima, se a tempo forem tomadas medidas que incentivem a florestação.
O consumo de madeira, no Pais, em 1970, foi de 6 300 milhares de esteres de pinho e 2 000 milhares de esteres de eucalipto, dos quais foram para a indústria de celulose 600 00 t e 1 520 000t de pinho e eucalipto, respectivamente.
Do inventário florestal verifica-se que a produção lenhosa média anual é de 8,5 milhões de esteres de pinho e 1,4 milhões de esteres de eucalipto.
Daqui se conclui já que se está a dar uma descapitalização na floresta de eucalipto, o que irá ter as suas consequências num futuro próximo, e que, a manter-se o ritmo de cortes verificado ultimamente, implicará uma redução nas existências, já em 1972, superior a 2 milhões de metros cúbicos.
A pressão na procura conduz a prática de cortes prematuros, com uma quebra na rentabilidade dos povoamentos.
O problema da florestação aparece, assim, com uma acuidade grande, aliás perfeitamente analisada nos trabalhos da comissão ad hoc para o programa florestal do Plano de Fomento, e convenientemente definida na política de florestação.
Da área florestada) do Pote apenas 10 por cento é administrada pelo Estado, pelo que a florestação da propriedade privada reveste neste contexto importância primordial.
Previa-se no Plano de Fomento, para o período da sua vigência, a florestação de uma área de 304 000 ha, a que corresponderia uma arborização média anual de 50 000 ha, exigindo um investimento médio amuai de 188 000 contos, financiado, em parte, pelo Estado.
Como o programa era progressivo, previa-se para 1969 uma arborização de 38 000 ha e um financiamento de 110 000 contos.
Estes programas, porém, não têm vindo a cumprir-se, não tendo havido praticamente qualquer acção incentivados da ponte do Estado, apesar de nos programas de execução do Pleno de Fomento vir expressa a necessidade de se considerar a aceleração da arborização.
Os 2 000 000 ha de terrenos- com aptidão florestal não podem, numa altura em que os saldos negativos da balança comercial aumentaram a um ritmo acelerado, perma-
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necer incultos ou utilizados por culturas marginais, quando devidamente aproveitados pela floresta poderiam contribuir poderosamente para o desenvolvimento económico do Pais.
O parecer refere a necessidade urgente de tomar medidas drásticas ao sentido de promover um aumento na produção para consumo interno e exportação.
Ora, o problema da florestação é dos mais urgentes para não se comprometer o futuro de uma indústria com possibilidades de taxas elevadas de expansão, e que pode fornecer cambiais, tão necessários ao equilíbrio da balança comercial.
A não se tomar uma posição de arranque imediato, a indústria que poderia expandir-se a uma taxa superior à determinada paira as indústrias transformadoras (9 a 11 por cento) não excederá, nos próximos quinze anos, provavelmente, a taxa anual média de 4,7 por cento, no conjunto, e 3,2 por cento para a pasta de eucalipto.
E assim, em 1980, em. vez dos 1 250 milhares de toneladas de pastas celulósicas, das quais 940 000 t de eucalipto, que se poderiam produzir se a arborização se fizesse ao ritmo do plano, apenas se Conseguirá dispor, aos ritmos actuais de arborização, de 850 000 t no total, das quais 540 000 t de pasta de eucalipto.
Desta situação resultará, em 1980, uma diminuição de 32 por cento das possibilidades da indústria de pastas de celulose, com uma diminuição de 1800 milhares de contos (aos preços de 1970). Os números referidos são bem expressivos para mão carecerem de mais qualquer comentário. Poderá, assim, desperdiçar-se tão avultado valor, mais acrescentado ainda se a indústria papeleira se desenvolver e virar para a exportação?
Termino com um voto de aprovação na generalidade das caritas públicas, e juntando ao apelo do ilustre relator o meu, no sentido de que a este sector da florestação seja dado o incremento necessário, activando-se assim um, dos meios possíveis de aumentar a exportação, e o de aumento de cambiais, não faltando para isso, estou certo, «nem o uso da inteligência nem o labor dos homens».
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Castro Salazar: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O parecer que estamos a apreciar sobre as contas gerais do 'Estado referentes ao ano de 1969, de que foi relator o Sr. Engenheiro Araújo Correia, a quem saúdo e felicito pelas altas qualidades de inteligência e saber mais uma vez patenteadas neste documento, chama a nossa atenção para o facto de as receitas ordinárias da província de S. Toma e Príncipe terem tido, em relação ao ano anterior, um aumento invulgar de 40 001 contos, tendo atingido nesse ano a cifra de 148 327 contos, a mais alta verificada até então na arrecadação de receitas. Esta tendência, aliás, começou a esboçar-se em meados de 1968, tendo já então as receitas ultrapassado as de 1967 em 20 182 contos, observando-se em dois anos um aumento de 68 por cento nas receitas ordinárias de S. Tomé e Príncipe.
A que atribuir esta subida no valor das receitas arrecadadas?
Já o ano passado tive a oportunidade de me referir aos factores que influenciaram fortemente a economia de S. Tomé e Príncipe em 1968 e mais acentuadamente ainda no ano seguinte, os quais foram a prestação de serviços ao exterior, em consequência do papel desempenhado pela província como base de auxílio humanitário às vítimas da guerra civil da Nigéria, e a alta cotação do cacau. Estas circunstâncias puramente acidentais deixaram de se verificar em princípios de 1970 com a liquidação da guerra do Blafra e a descida lenta, mas permanente, das cotações do principal produto de exportação de S. Tomé e Príncipe: o cacau.
À prestação de serviços ao exterior conduziu a um aumento extraordinário da receita proveniente da cobrança de taxas, atingindo o quantitativo de 40 628 000$. Foram as taxas alfandegárias e as de tráfego aéreo que, como é óbvio, atingiram os valores mais elevados, respectivamente, 15 693 000$ e 22 142 000$.
A alta cotação do cacau, cujo preço unitário subiu de 17 700$ a tonelada para 23 963$, foi outro factor a que se fica devendo o aumento das receitas em 1969; de facto, muito embora a quantidade de cacau exportado tivesse baixado consideravelmente em relação a 1968 (cerca de 2800 t menos), o valor de exportação deste produto aumentou em 2 378 000$.
Verificamos ainda nas contas que estamos examinando, que os encargos orçamentais sofreram um agravamento de 25 770 000$, sendo de salientar que a manutenção e trabalhos de conservação do Aeroporto, como resultado do aumento de tráfego aéreo, custaram ao Tesouro a importância de 12819000$. No total a despesa ordinária de S. Tomé e Príncipe no ano de 1969 foi de 111 307 000$.
O Governo da província não podia esquecer que as circunstâncias de ordem externa que influenciaram, favoravelmente a economia de S. Tomé e Príncipe nos anos de 1968 e 1969 eram meramente ocasionais, e imprevisível o tempo durante o qual se manteriam; por isso usou o Governo de bem avisada cautela tanto na previsão das receitas como na fixação das despesas ao elaborar o orçamento geral da província. Assim se justificam os saldos de 22 789 000$ e 35 277 000$ com que foram encerradas as contas de 1968 e 1969.
No capítulo «Despesas ordinárias» chamam a nossa atenção as verbas orçamentadas com destino à saúde a educação, que perfizeram 20 794 contos e excederam em 4251 contos as que lhes haviam sido consignadas no ano anterior. As verbas destinadas a fazer face às despesas com a saúde e educação vêm sofrendo um aumento apreciável dá há uns anos para cá, o que revela a preocupação do Governo da província pela promoção social das populações e o esforço que nesse sentido vem sendo realizado.
Verificamos também que os encargos com a dívida continuam a aumentar, atingindo 14 275 contos, superior em 1516 contos ao ano 'transacto. Os encargos provenientes dos empréstimos para a execução dos planos de fomento continuam a ser para a província um grave problema, e vão-se agravando de ano para ano. prevendo-se que dentro em breve possam atingir 20 e 25 por cento da despesa ordinária, situação que se tornará verdadeiramente insustentável e incompatível para a capacidade financeira da província. Em seis anos os encargos totais com a dívida quase duplicaram, crescendo a taxa média anual a nível superior ao do crescimento do produto interno, dado que a «produtividade dos investimentos realizados é inferior aos encargos anuais que a (província suporta com os empréstimos efectuados na metrópole.
Referi-me em tempos nesta mesma tribuna às condições pouco favoráveis em que foram contraídos os empréstimos destinados ao financiamento dos primeiros planos de fomento e aplicação do seu produto em obras de pequena reprodutividade ou mesmo de rentabilidade nula, bem assim às repercussões que esses factos têm tido na vida financeira da província, pelo que me dispenso de o fazer novamente. Limitar-me-ei a chamar mais uma vez para este problema a atenção do Governo.
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E de justiça salientar que a situação criada pêlos encargos da dívida tem merecido do Governo o maior interesse, e foi devido Em grande parte à compreensão do então Ministro das Finanças, o nosso ilustre colega Dr. Ulisses Cortês, que foi possível atenuar um pouco os encargos com a dívida, ao publicar-se, em 1967, o Decreto-Lei n.° 47 825, desagravando de juros e ampliando o prazo de amortização do empréstimo que fora contraído para financiamento do II Plano de Fomento. No entanto, a medida tomada não se mostrou suficiente para sanar a situação, sendo necessário e urgente que ela abranja os empréstimos concedidos para o financiamento do Plano Intercalar e III Plano de Fomento. Só assim a província terá possibilidade de amortizar todos os empréstimos contraídos dentro dos prazos e, ao mesmo tempo, manter as necessárias disponibilidades financeiras que hão-de fazer face aos investimentos indispensáveis à elevação do nível de vida das populações.
Sr. Presidente: A província de S. Tomé e Príncipe, mercê do condicionalismo que ia sua situação insular lhe impõe, depende, de uma maneira absoluta, das comunicações marítimas e aéreas com o exterior. E pela via marítima que chegam à província a maior parte doa bens de consumo de que a população - carece e os materiais e equipamentos indispensáveis ao seu desenvolvimento e é só por esta via que a S. Tomé e Príncipe é possível comercializar os seus produtos. Não obstante, são inúmeras as dificuldades criadas ao transporte de mercadorias para S. Tomé e ao escoamento dos seus produtos para a metrópole. Já o ano passado neste mesmo lugar me referi à discriminação incompreensível e intolerável que as nossas companhias de navegação impõem à província quanto ao transporte de mercadoria destinada a ou a embarcar em S. Tomé, atitude que é contrária aos interesses da população e lesa a economia da província. A situação, mo que diz respeito ao escoamento de produtos destinados à metrópole, é má, mas agravou-se extraordinariamente no 2.° semestre do ano passado, por os navios nacionais que escalam os portos de S. Tomé e Príncipe não disporem da «praça» para transportar a totalidade das mercadorias a exportar, nomeadamente copra, coco - note e óleo de palma. Os navios escalam S. Tomé, como lhes é imposto pela Junto Nacional da Marinha Mercante, mas, alegando falta de espaço, carregam apenas uma pequena porção da mercadoria (quando carregam) em relação à totalidade - e dos pedidos feitos antecipadamente, resultando daí a acumulação de mercadoria em. armazém sujeita sucessivos adiamentos de embarque, com graves prejuízos não só para os exportadores, que assim ficam impedidos de cumprir compromissos contratuais, mas também para os pequenos empresários locais, que pela mesma razão vêem adiado o pagamento dos seus produtos. Para ilustrar o que acabo de referir, direi a VV. Exas. que em 7 de Novembro o navio Arraiolos embarcou em S. Tomé carga que aguardava embarque para Lisboa há cerca de seis meses, è a situação só não tem sido mais grave graças aos constantes apelos feitos pelo Governo da província à Junta Nacional da Marinha Mercante para resolução dos casos mais urgentes e à boa vontade desta em os resolver. Pelas mesmas razões são inúmeras as dificuldades de abastecimento de produtos originários da metrópole, Moçambique e África do Sul. Ainda não há muito uma firma de S. Tomé teve durante mais de três meses mercadoria no valor de 400 contos retida no porto de Lourenço Marques a aguardar reembarque, por o seu transporte para S. Tomé ter sido sucessivamente recusado pêlos navios que durante esse espaço de tempo escalaram aquele porto. A dificuldade de meios de transporte que assegurem um escoamento regular dos produtos e o abastecimento das ilhas está relacionado, em parte, com os deficientes instalações portuárias da baía de Ama Chaves (S. Tomé), onde os navios ficam ao largo e as operações de carga e descarga se tornam, morosas e por vezes difíceis. Durante os dois primeiros planos - de fomento investiram-se no porto de Ana Chaves cerca de 50 000 contos sem que o problema portuário ficasse resolvido, pois os navios continuam a não poder atracar e as mercadorias a serem baldeadas em batelões -, sujeitas a todas as espécies de riscos, altos preços- da barcagem e elevada taxa de seguras.
Vários estudos se têm feito no propósito de se dotar a ilha de um porto de - mar com cais acostável para navios de longo curso, que satisfaça as suas necessidades, e tudo parece indicar ter-se encontrado o local mais favorável para a construção do futuro porto de S. Tomé. A sua construção em Morro Carregado, a 20 km da cidade de S. Tomé, parece ser a que reúne os melhores requisitos, quer por razões de profundidade das águas do mar, condições de abrigo, facilidade de manobra e fácil acesso terrestre.
A rentabilidade económica do empreendimento está calculada em 14,2 por cento e a rentabilidade financeira em 5,66 por cento, em contraste com a rentabilidade financeira do porto de Ana Chaves, que nos primeiros seis anos da sua existência foi de 0,5 por cento.
Estando já concluídos os estudos da localização do porto de tango curso em Morro Carregado e elaborado o respectivo projecto, aguarda-se com justificada ansiedade a decisão final da sua construção, dado que dela depende a concretização de alguns projectos de empreendimentos, dos quais salientamos a indústria da pesca, de extraordinário interesse para o progresso económico da província. Uma palavra mais para me referir ao problema dos comunicações aéreas e à necessidade de se ampliar o Aeroporto de S. Tomé.
Desde que es aviões da TAP deixaram de escalar o Aeroporto de S. Tomé, e a ligação com a metrópole (e o resto do Mundo) passou a ser feita semanalmente através de Luanda, têm eido enormes 09 prejuízos de ordem moral e material sofridos pela população de S. Tomé e Príncipe, prejuízos que seriam muito maiores se o Governo da província não tivesse tomado a iniciativa de assegurar mais uma ligação semanal com o exterior através de Cabinda, utilizando para isso um pequeno avião de sete lugares do Serviço de Transportes Aéreos de S. Tomé e Príncipe.
A solução adoptada pela TAP, no sentido de resolver o problema dias ligações aéreos de S. Tomé com o exterior, quando os seus aviões de longo curso deixaram de escalar o Aeroporto da ilha, solução que se dizia transitória, mas parece querer tornar-se definitiva, não serve os interesses de S. Tomé e Príncipe, tornando-se necessário para que esses interesses sejam devidamente servidos de restabelecer as carreiras directas com a metrópole, utilizando por exemplo o mesmo tipo de aviões a jacto da carreira da Guiné e Cabo Verde, enquanto o Aeroporto de S. Tomé não permitir a sua utilização por aviões de longo curso.
Impõe-se ainda a ampliação do Aeroporto de S. Tomé de molde a poder ser utilizado por todos os tipos de aviões comerciais, pois, dada a situação geográfica da ilha, ele poderá servir de aeroporto alternante (e de escala) não só aos aviões das nossas carreiras de África como aos das linhas de outros países a quem foram negadas facilidades nos aeroportos da maior parte das nações africanas, além da importância deste melhoramento para o desenvolvimento turístico das ilhas. Contudo, o custo da ampliação do Aeroporto de S. Tomé excede as possibilidades.
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financeiras da província, permitindo-me sugerir que as despesas sejam custeadas pela Direcção - Geral da Aeronáutica Civil, dado o interesse nacional de que se reveste a sua ampliação.
Vou terminar, Sr. Presidente, dando o meu voto de aprovação na generalidade as contas gerais do Estado de 1969.
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Ribeiro Veloso: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Comissão de Cantas da Assembleia Nacional mais uma vez cumpriu com extraordinário brilho a sua missão, e é com muito prazer que lhe apresento as maiores felicitações peio trabalho realizado. Seria, porém, injusto se não distinguisse com essas felicitações o Ex.mo Presidente - e relator da Comissão, Sr. Deputado Araújo Correia, que com devoção inexcedível se entrega totalmente ao difícil e vasto trabalho de analisar as contas do Estado e de formular sobre elas um reluto circunstanciado, que torna fácil e atraente a sua apreciação e me permite sem dificuldade e em consciência dar a minha aprovação às mesmas.
Atendendo a que o número de Deputados inscritos para Mar hoje sobre as contas gerais do Estado é muito grande, limitar-me-ei a comentar parte das contas de Moçambique e a apresentar algumas considerações que as mesmas me motivaram.
Da analise do relatório das contas de gerência relativo a 1969 verifica-se que o Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos aprovou inicialmente determinado programa amuai de financiamento, ao abrigo da Lei n.° 2133, de 20 de Dezembro de 1967, para a parte do III Plano de Fomento o executar naquele ano.
Ora, desse programa teve expressão orçamentai um programa mais restrito no valor de 680 470 contos. Este programa restrito sofreu, contudo, posteriormente, diversas alterações, o que obrigou a cinco reuniões do Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos, reuniões essas que se realizaram em 19 de Setembro, 3 de Outubro e 5 de Dezembro de 1969 e 6 de Janeiro e 14 de Fevereiro de 1970 e que deram, respectivamente, azo às Portarias n.º s 24 369, 24 390, 24 487, 77/70 e 131/70, conduzindo a um programa no valor de 928 990 contos. Porém, deste valor final de 928 990 contos só foram despendidos 662 983 contos, ou seja, menos 17 487 contos que o programa inicialmente orçamentado.
Isto significa que, aparentemente, poderiam ser poupadas as energias que se consumiram desde a formulação das propostas pela província até à publicação das mencionadas portarias, após terem sido tomadas as decisões pelo Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos, como se poderia ter evitado também, uma nova mobilização de capital, já que o saldo final foi superior em 17 47 contos ao valor do reforço o programa inicialmente aprovado.
E, dentro do princípio enunciado pelo Sr. Presidente do Conselho na primeira reunião do Conselho Coordenador da Função Pública, de que uma preocupação deve estar sempre presente: a de simplificar - tudo no sentido de poupar incómodos, dinheiro e tempo», principio que me merece todo o aplauso, parece que se poderia dar ao Governo da província a possibilidade de resolver directamente o problema de movimentar as verbas dentro do valor total orçamentado, reforçando as das rubricas que o carecessem, à custa das rubricas em que se verificasse não ser possível atingir os montantes aprovados, e tudo isto desde que nas alterações a levar a efeito não fossem excedidos os limites fixados no programa inicialmente aprovado e para o qual não se julgue provável conseguir a respectiva cobertura financeira.
Haveria assim um «programa óptimo» e um «programa real» aprovados ambos pelo Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos; o Governo da província estaria autorizado a movimentar da forma mais conveniente as verbas do «programa real», tendo só como limites o total orçamentado para esse programa e o valor de cada uma das rubricas do «programa óptimo», e só quando se verificasse a necessidade de algum destes limites ser excedido, é que novamente o Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos teria de se pronunciar.
E nossa convicção de que, se em 1969 o Governo da província tivesse, dentro da autonomia que a lei lhe confere, o poder de resolver o problema enunciado e que é da competência do Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos, o saldo da verba extraordinária não atingiria tão elevado valor.
E isto seria assim, cremo-lo nós, por estarmos convencidos de que as formalidades que conduziram à publicação de quatro das portarias mencionadas, em que só houve transferência de verba de certas rubricas para outras dentro do programa aprovado, teriam sido consideravelmente menores e as autorizações através do Governo da província teriam sido dadas com muito mais antecedência e, portanto, a tempo de permitir que os reforços autorizados pudessem ser aplicados dentro do respectivo ano.
Consideramos que é fundamental, Sr. Presidente e Srs. Deputados, como já tive ocasião de o dizer aqui o ano passado, que o Plano de Fomento se cumpra, pois só desse modo poderemos completar parte das infra-estruturas da província e com elas conseguir a melhoria das condições de vida da sua população.
Precisamos de aumentar a produção em todos os sectores para se conseguir o equilíbrio da nossa balança de pagamentos; mas esse aumento de produção está ligado às infra-estruturas de que a província carece e, portanto, às questões em execução ao abrigo do III Plano de Fomento. Mas não bastará aumentar a produção, pois é necessário que se consigam mercados para a sua colocação, o que significa que só com preços competitivos poderemos concorrer ao mercado exterior. E os preços competitivos não poderão resultar somente da existência de mão-de-obra barata, mas deverão resultar fundamentalmente da melhoria da técnica utilizada na produção. Se o conseguirmos, poderá então toda a população viver a vida a que tem direito dentro do mundo civilizado a que pertencemos.
Concordamos inteiramente com a afirmação do relator do parecer, Sr. Deputado Araújo Correia, de que «a metrópole deveria adquirir no ultramar uma grande parcela dos consumos susceptíveis de serem produzidos no ultramar., e o ultramar deveria adquirir na metrópole tudo o que fosse susceptível de aqui ser produzido».
Muito se tem conseguido já quanto a isto, mas há que incrementá-lo constantemente, pois, deste modo, ligando cada vez anais os nossos interesses, consolidaremos a unidade que constituímos. Foi para mim consolador ler num dos jornais diários do dia 15 do corrente que na Secretaria de Estado do Tesouro foi assinado o contrato entre o Estado Português e uma companhia industrial da Póvoa de Varam para o fornecimento de condutores eléctricos destinados ao empreendimento de Cabora Bossa, no valor aproximado de 320 000 contos.
Além deste, outros fornecimentos de materiais no valor de centenas de milhares de contos são feitos pela metrópole para a obra de Cabora Bassa, o que significa que
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a energia de Gabara Bossa começa a contribuir já para o desenvolvimento industrial do Portugal europeu.
Naturalmente que esta obra e afinal todas as outras obras em curso que se englobem dentro das infra-estruturas da província exigem a importação de centenas de milhares de contos de materiais e bens de equipamento que são indispensáveis poro a execução das mesmas. Mas, além destes materiais e destes bens de equipamento que são necessários directamente nas obras, há também necessidade de importar bens de consumo para satisfazer o aumento do poder de compra que a execução das obras acarreta para um grande sector da população da, província.
Como muito bem diz o Ex.mo relator do parecer a propósito da eventual possibilidade de se fazerem economias na importação de material de transportes e de têxteis, «o próprio progresso induz importações deste tipo», mas, simplesmente, vou ainda um pouco mais longe, afirmando que o progresso não se coaduna muito com economias.
Concordo e acho absolutamente necessário que devemos poupar tanto quanto possível em tudo que represente esbanjamento de dinheiro, mas julgo que só poderão atrair-se a Moçambique capitais para a indústria se aos capitalistas for mostrada, como é, neste parecer, a capacidade de aquisição da população da província.
E serão mesmo os números mais expressivos da importação, como, por exemplo, o das matérias têxteis e respectivas obras, que atinge o valor de 14,2 por cento do total, com l 068 702 contos, que motivará o interesse exterior pela construção de fábricas para abastecimento deste mercado. Igualmente o poderia afirmar quanto a máquinas e aparelhos e material eléctrico, que representam 16,1 por cento do total, com l 209 656 contos em que uma grande parte se poderia produzir na província, representando um incentivo ao investimento de capital dos industriais portugueses ou estrangeiros que nos são afectos. São estes números que atraem o capital, e o que é preciso não é retrair as importações, mas fomentar as exportações.
Haverá, naturalmente, que dar garantias aos capitalistas que ali vão investir o seu dinheiro, àqueles que levam o seu dinheiro para Moçambique, de transferirem rapidamente e sem quaisquer dificuldades os lucros do capital ali investido, caso o queiram transferir, fixando-se a priori um limite superior, bastante folgado, que poderiam atingir os lucros cuja transferência não seria nunca entravada, nem atrasada.
Retrair as importações significa ofuscar no exterior o verdadeiro quadro da situação de Moçambique e tomar menos atractivo para os industriais e capitalistas não moçambicanos o investimento em fábricas que produzam o que os números oficiais garantem que ali se importa.
Haverá sim e somente que eliminar a importação do supérfluo e de tudo que sirva para mostrar ostentação, pelo que apoiamos as medidas tomadas pelo Governo nesse sentido.
Não nos devemos, portanto, admirar com a diferença existente entre o valor das importações e o das exportações, ou então admirem-nos, sim, com o surto de progresso que isso representa. A província não estava preparada para dar satisfação às solicitações de toda a espécie que o seu enorme e extraordinário desenvolvimento acarreta e é nossa convicção que, com alguns ajustamentos e com a conclusão das grandes obras de fomento em curso e projectadas para muito breve início e, bem assim, com as que a actividade particular está bambem a levar a efeito, rapidamente se caminhará para a normalidade. Muito virá a contribuir para se atingir essa normalidade, como muito bem se diz no parecer, a execução da obra do Massingir, da barragem de Massingir.
Esta obra, cuja execução foi prevista em 1925 e aprovado o projecto, ao tempo, pelo Conselho Superior de Obras Públicas, com o parecer de que «é perfeitamente exequível e economicamente recomendável», vai finalmente construir-se.
Passaram-se quarenta e seis anos após a sua concepção pelo engenheiro Trigo de Morais, mas este lapso de tempo, se trouxe prejuízos por não ter sido já construída juntamente com a do colonato do Limpopo, tem, pelo menos, a vantagem, ao ser agora construída pelo Governo de Marcelo Caetano, de ser um marco de garantia da nossa persistência e da continuidade da nossa política em África. Não é uma obra qualquer a que se prebende construir e seja adjudicação está para ser anunciada, pois foram já devidamente estudadas as propostas do respectivo concurso público.
Trata-se de uma barragem de terra em que os aterros são de 9 650 000 m e as escavações de 3 980 000 m. A área da bacia de recepção no local da barragem será de 67 540 km1, ou seja ligeiramente superior a dois terços da área de Portugal europeu.
Irá armazenar 2 844 milhões de metros cúbicos, inundando em território português 15 078 ha e 64 ha em território sul africano. O seu custo é da ordem dos 800 000 contos, mas uma vez construída, permitirá encarar com segurança a rega de 97 000 ha e eliminar o salgamento dos águas junto de João Belo.
A barragem tem de construir-se, porque sem ela podia estar condenado todo o aproveitamento do vale do Limpopo, isto é, sem a barragem poderia uma série de anos secos lançar na miséria uma zona que hoje é francamente promissora. Mas a decisão do Governo foi tomada ao fazer a abertura do concurso público, pois, naturalmente, como disse, só o estudo dos propostos tem demorado a adjudicação. Convirá dizer que, segundo estudos feitos, com a construção da barragem e da rega que ela permitirá «o valor bruto das produções com base mós preços actuais subirá em 760 000 contos anuais e o rendimento líquido das explorações sofrerá também um aumento da ordem dos 350 000 contos». À influencia desta obra no valor económico da província é extraordinária, porque, além de permitir que novas zonas sejam cultivadas, já que a terra é boa e só a água lhe falta, vai ainda permitir um maior rendimento de todo o capital até hoje investido no vale do Limpopo, onde, para exemplo no Mundo, patenteando a nossa política de igualdade, os agricultores se não distinguem pela raça, mas somente pela sua rectidão e qualidades de inteligência, de aptidão e de trabalho.
E exactamente porque somos um povo em que a convivência de raças se faz com harmonia e igualdade, em que os direitos do homem são respeitados, parece-nos estranho que o mundo nos não compreenda.
Igualmente nos parece estranho que, passando dos homens para os nações, se pense que teremos de continuar a respeitá-las, a servi-las, quando algumas ou muitas delas, não nos respeitam nem nos servem a nós. Isto vem a propósito, ainda, da nossa balança de pagamentos e da sua situação deficitária. Efectivamente apetrechamos um porto de mar, o porta da Beira1, com o material e cais de acostagem necessários e suficientes para nos servir e servir os nossos vizinhos.
Investimos no Caminho de Ferro da Beira, centenas de milhares de contos para se estabelecer ligação eficiente com esses mesmos vizinhos. Entenderam então algumas nações do mundo civilizado, e em especial a nossa aliada Inglaterra, que era necessário fazer o bloqueio do porto da Beira para impedir que mercadorias, algumas dessas mesmas nações que concordaram com o bloqueio, chegas-
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sem à Rodésia. E assim sã fez, assim se tem feito! E o capital investido no porto e no respectivo caminho de ferro deixou de dar o rendimento a que tem direito.
Mas, pesar do movimento de mercadorias ter diminuído confrangedoramente, temos de continuar a manter toda a máquina em funcionamento, não só para servir as outras moções, Malawi e Zâmbia, como ainda para servir a própria Rodésia no dia em que tal bloqueio terminar.
E quem nos paga isto? Quem nos paga o prejuízo que tivemos e estamos a ter? Por que há-de toda uma população laboriosa e honesta, que é a população de Moçambique, estar a ser - prejudicada pelos caprichos de um mundo que se diz civilizado? E agora que o Malawi ficará a ser servido pelo caminho de ferro que o liga a Nacala, por passar para este porto granule parte do movimento das suas mercadorias, ficará o Caminho de Feno da Beira e o respectivo porto a servir somente a Zâmbia, além do serviço que a própria província exige. E é coso para perguntar se não deveria então atribuir-se à Zâmbia parte ou mesmo a totalidade dos prejuízos que anualmente - passamos a ter enquanto o bloqueio se mantiver, já que será a única nação estrangeira que do porto e caminho de ferro se servirá.
Soubemos pêlos jornais que vem muito brevemente a Lisboa o Ministro dos Negócios Estrangeiros da Inglaterra. Que S. Ex.ª venha em boa hora e se sinta feliz entre nós são os meus votos, porque, apesar de tudo, nos mantivemos sempre amigos fiéis de nossa velha- aliada. E formulo ainda votos de que desta vinda de S. Exa. ao nosso pais resulte um reforço dessa amizade secular.
Com as dificuldades de transferência de capitais de Moçambique para o exterior tem a população da província retido ali as economias que consegue fazer. Começa por depositá-las em estabelecimentos de crédito, para aplicá-las, logo que lhe seja possível conseguir empréstimo, na aquisição de um ou mais andores ou de uma ou mais moradias.
Haveria todo o interesse em que essas pequenas ou grandes economias fossem também desviadas para aplicação na indústria, de que a província tanto carece. Mas a população já não o foz porque ficou com medo de o fazer, medo de que não mais saiba o que foi feito do seu capital. Infelizmente, mais de um exemplo houve na província em que os accionistas penderam todo o dinheiro que investiram na aquisição das acções - para o estabelecimento da indústria, sem ao menos terem tido o prazer de verem montados os respectivos estabelecimentos industriais ou metidos na cadeia os responsáveis por tão grande dissipação dos dinheiros que lhes foram confiados. E para a população ganhar de novo confiança é necessário que surja legislação adequada que garanta, a protecção do capital que ela aplicar, ou o Governo tomar a iniciativa de montar ou participar na montagem de indústrias, cedendo depois a sua posição, no todo ou em parte, a pequenos accionistas, que facilmente seriam atraídos não só pelo juro que soubessem ser compensador, como também muito diminuto ou nulo o risco de penderem o seu dinheiro.
Outro exemplo que há e também mau, que igualmente atemoriza os que possuem pequenas economias e os impede de investi-las na indústria, é o de saberem que indústrias que estão montadas, a funcionar, não pagam dividendo do capital investido, e isso sempre por razões muitíssimo justificadas. Não se pode assim pensar que o pequeno capitalista estará disposto a aplicar na indústria o seu capital enquanto não for convenientemente garantida a sua protecção. E se isto for feito pelo Governo, estou plenamente convencido de que o capital acorrerá e que muito contribuirá, desse modo, para o fomento da actividade industrial, que, como sabemos e os números do douto parecer o mostram claramente, é indispensável em Moçambique.
E a população corresponderá porque sabe que fomentar o desenvolvimento da província é' contribuir para o seu progresso e, econcomitantemente, para a sua defesa e dar apoio, portanto, àquela juventude heróica que ali nas fronteiros afectadas pelo terrorismo mantém altaneira a tremular ao vento a bandeira de Portugal.
Vozes: - Muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Alberto de Alarcão: - Sr. Presidente: Uma vez mais pedimos a palavra paro- intervir na ordem do dia, na apreciação dais contas gerais do Estado de 1960. E do ultramar ... passarei à metrópole.
Não se tratará de relembrai- a necessidade de progressos económicos acelerados no fomento e diversificação das produções, precisão que muitos sentem na magreza dos seus rendimentos, na carência de produção nacional, na insatisfação das procurais internos ou no crescente recurso ao comércio internacional, no encarecimento de bens e prestação de serviços.
Nem sequer de recordar de momento as luminosas palavras do parecer sobre o tema «Energia», no seguimento, aliás, de muitas há largo tempo escritas e nem sempre atentamente meditadas. E aí estão as importações maciças de electricidade nesta estiagem, um pouco mais prolongada, a lembrar a conveniência de acelerar o ritmo de construção de barragens de regularização interanual que nos defenda da inconstância do olima e das importações maciças de energia, com sério reflexo na balança de pagamentos.
Felizmente que o País voltou a acordar para a electrificação nacional.
Nem ainda de lembrar o que muito a propósito da silvicultura no parecer se contém.
Trata-se sim de chamar a atenção para alguns dualismo do desenvolvimento económico-social em tenra metropolitana, que podem condicionar o êxito de uma política equilibrada de crescimento económico e de progresso social do conjunto.
A ela vamos.
E iremos começar pela agricutura, suporte que ainda é de apreciável montante da população, depois de ter sido da esmagadora maioria dos nossos antepassados.
Actividade ou modo de vida que ainda emprega ou ocupa, nas estimativas mais recentes, cerca de l milhão de portugueses residem t es no- metrópole, depois de ter sido actividade ou profissão exercida por mais de milhão e meio em meados deste século. Com seus familiares não andará certamente longe de interessar «directamente» cerca de 3,5 milhões de metropolitanos acantonados nesta nesga da Europa, mas da qual, dificilmente embora, subsistem muitos mais.
Actividade cuja crise de crescimento e adaptação aos nossos tempos ninguém contesta nesta época de tão generalizada- contestação (nem sempre, aliás, infundada), situação que haverá de ter-se por anormal, mas pacífica, de não haver quem lhe oponha suas reservas mentais.
Não surpreende, porém, tal unanimidade de opiniões face as estruturas da produção e comercialização agrárias, face aos condicionalismos do clima e do sol, às sujeições dos mercados e à falta de habilitações especializadas da maioria dos seus «profissionais» ou activos - a começar pelo estrato empresarial agrícola na sua generalidade.
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Porque actividade mais do que nenhuma outra ligada ao solo, é por este que iremos começar as considerações.
Segundo o parecer sobre as contas gerais do Estado de 1969, o número de prédios rústicos ascendia a 10,8 milhões, assim distribuídos:
Prédios rústicos (Número)
Regiões e sub-regiões: Norte:
Litoral 1 787 185
Interior 1 756 777
3 493 903
Centro:
Litoral 2 898 224
Interior 2 628 685
5 526 909
Lisboa:
Litoral 233 967
Interior 439 792
678 489
Sul:
Alentejo 185 524
Algarve 241 401
426 925
Continente 10 121 285
Açores 356 228
Madeira 335 715
Metrópole 10 813 223
11 milhões de prédios rústicos ma metrópole.
Estes são os reconhecidos. Mais de 10 por activo agrícola - a tornarem-se as últimas estimativas, muitos mais por agricultor - empresário (patrões + isolados), se tomarmos o número dos estatisticamente declarados «agricultores» do ultrapassado recenseamento de 1960:
Regiões e sub-regiões:
Norte:
Litoral 20,2
Interior 40,5
27
Centro:
Litoral 37,5
Interior 36,8
37,2
Lisboa:
Litoral 11,3
Interior 24,5
17,4
Sul:
Alentejo 11,7
Algarve 13,1
12,5
Continente 28,8
Açores 23,8
Madeira 50,4
Metrópole 29,1
Hoje a relação acusaria valores certamente superiores, dado o êxodo do próprio estrato empresarial agrário.
Alcançava-se na região de planeamento do Centro, isto é, em toda a região das Beiras, o montante médio de 37 prédios rústicos por agricultor, ainda que outros estratos sociais do mundo rural possam eventualmente participar também na exploração de prédios rústicos. E na Madeira, 50 prédios rústicos por agricultor.
A anedia metropolitana fica-se por 29.
Ano média por prédio (números)
Como se afirma do parecer, «o número de (prédios rústicos é», assim, «muito grande» «Os distritos a norte do Tejo», como a Madeira, «caracterizam-se por propriedade muito dividida.»
Se não vejamos ao que as áreas totais nos conduzem, por prédio reconhecido:
Regiões e sub-regiões: Norte:
Litoral 0,41
Interior 0,61
0.51
Centro:
Litoral 0,35
Interior 0,65
0,51
Lisboa:
Litoral 3,38
Interior 1,54
2,18
Sul:
Alentejo 12,78
Algarve 2,10
6,74
Continente 0,88
Açores 0,66
Madeira 0,24
Metrópole 0,85
A volta de meio hectare, em média, por prédio rústico nas duas regiões Norte e Centro de planeamento, um quarto de hectare no arquipélago madeirense.
E conhecido que «em certas zonas há contribuintes com muitos prédios dispersos, bodos de pequena área e a distâncias que não asseguram explanação lucrava». «Quem examinar as cifras de uma longa série de anos ficará surpreendido naturalmente com o fraco grau de emparcelamento - que é uma grande necessidade» a impor-se à consciência dos agricultores minifundiários de quase todo o Norte do continente e ilhas adjacentes. Bom é recordá-lo tuna vez mais e sempre.
E as cifras ainda não dizem tudo, como se reconhece no parecer, «dada ia proverbial falta de legalização de divisões de propriedades que continuam em (regime comum).
[Portugal é assim] «um país de propriedade rústica dispersa, sem dimensão que permite exploração racional» agrária em grande parte do território. «Este e outros condicionamentos também, são responsáveis pêlos fracos rendimentos» da agricultura, actividade a que não sabemos se lhe havemos de chamar económica ... se, [...] verdadeiramente e afora algumas excepções de solos, produtos e/ou estruturas, de antieconómica. Que o diga a grande maioria dos nossos agricultores.
Não admira por este forma que «a crise tradicional da agricultura, que toma aleatórias e, em muitos casos, deficitárias as explorações, não permita a elevação dos valores colectáveis» desta actividade.
«O rendimento colectável rústico desenvolve-se com morosidade» e permanece baixo nas regiões subdesenvolvidas do interior metropolitano:
Regiões e sub-regiões:
Norte:
Litoral 0,484
Interior 0,183
0,303
Centro:
Litoral 0,404
Interior 0,198
0,274
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21 DE ABRIL DE 1971 1847
Lisboa:
Litoral 0,283
Interior 0,345
0,312
Sul:
Alentejo 0,224
Algarve 0,195
0,219
Continente 0,292
A modernização agrária que começa a afirmar-se em algumas zonas - litorâneos da metrópole terá de ser levada também às regiões potencialmente mais favorecidas do interior serrano, se quisermos desenvolver esses espaços rurais e agrícolas e incrementar o nível da vida e as condições sociais dos seus habitantes (1 575$ e 1 327$ de rendimento colectável rústico, respectivamente, por activo agrícola da região norte, no litoral e no interior e, respectivamente, 1 848$ e 1 381$ para idênticas capitações nas sub-regiões do Centro).
Modernização que haverá de conceder-se não apenas em temos de reformas das estruturas fundiárias, mas também arganizativas e de orientação das produções e sua tecnologia, sem esquecer o que pode esperar-se da criação de circuitos válidos de comercialização e industrialização dos produtos, nesta economia agrária de mercado que começa a difundir-se por algumas zonas mais privilegiadas do Norte do País.
Mas aí o agricultor, o lavrador verdadeiramente profissional, deverá ter sempre uma palavra a dizer na participação para o seu próprio - e não alheio - desenvolvimento e do mundo agrário, assim sejam suficientemente acarinhados e vividos os cursos de formação profissional para empresários agrícolas que a Secretaria de Estado da Agricultura em boa hora iniciou nesta terra.
Também a organização corporativa da lavoura bem precisa de uma aragem de renovação que a vitalize e permita a participação efectiva de quantos se encontram forçadamente agremiados à sua sombra, mas isso levar- - nos - ia longe do que ora nos propusemos tratar.
De outro modo continuarão a despovoar-se maciçamente de gentes os terras interiores para se acantonarem como o vêm fazendo nesta faixa litorânea do País, e particularmente a volta dos dois mais importantes centros urbanos:
Regiões e sub-regiões
Norte:
Litoral 2 080 436
Interior 552 918
2 613 351
Centro:
Litoral 1 356 098
Interior 1 064 683
3 420 781
Lisboa
Litoral 1 778 714
Interior 462 121
2 240 835
Sul:
Aleijo 667 938
Algarve 312 509
980 447
Continente 8 255 414
Açores 327 806
Madeira 268 069
Metrópole 8 851 289
que mostrem tendência a virem a aglutinar a esmagadora malária da população metropolitana, se não for instaurado o competente processo - de descentralização económica, social e administrativa.
Não admira que por via de tal tendência cresçam desmesuradamente os rendimentos colectáveis urbanos das regiões litorais:
[Ver tabela na imagem]
Regiões e sub-regiões
Rendimentos colectivos urbanos contos
O litoral e o interior, a civilização urbana e a civilização rural, a cidade e o campo começam a estar bem marcados e diferenciados em terras do continente.
As cifras do distrito de Lisboa para os rendimentos colectáveis urbanos: 3 061 000 contos, em. números redondos, mais os do Porto: 1 040 000 contos, em valores arredondados, perfazem perto de 70 por cento do rendimento colectável urbano do conjunto.
Em contrapartida, distritos há no continente que não alcançam 35 000 (Bragança: 33 158 contos em 1969) ou restam aquém dos 50 000 (Vila Real: 48 166; Viana do Castelo: 48 794; Guarda: 49 233 contos).
Os rendimentos colectáveis urbanos aumentam, os rústicas estagnam: enquanto estes se mantém à volta de 2,5 milhões de contos desde meados da década passada, os urbanos passaram, no mesmo período, de 4,5 a 6 milhões de contos, crescendo em espiral aos arredores dos grandes centros, como consequência do afluxo das populações à cidade e sua urbanização.
«Os problemas que as cifras sugerem dão ideia das deficiências estruturais em matéria de propriedade rústica e urbana [...]. Há uma concentração de rendimentos na propriedade urbana que prossegue aceleradamente» em Lisboa e Porto, enquanto ca parcela mais pobre do País usufrui muito fracos rendimentos».
E tempo de se começar olhando para este extremado desequilíbrio urbanístico que tende a instalar-se em terra portuguesa, impondo-se o ordenamento do território e a promoção de um efectivo desenvolvimento económico e social regional que vai tardando.
Não importa, evidentemente, fazer de cada aldeia, vila ou cidade - como alguns, os anais directamente interessados, por certo desejariam - um pólo de desenvolvimento, mas seguir uma política de promoção dos que fo-
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rem efectivamente escolhidos para suporte e arranque do processo de crescimento económico e progresso social em sua região.
Mais vale estabelecer uma política qualquer em tal matéria do que não praticar política alguma, e quanto mais aedo se aplique tanto melhor e mais pacificamente haverá de ser entendida, aceite e vivida por quantos tenham os olhos limpidamente postos no progresso e futuro do País. Depois, só haverá que prosseguir.
À designação dos presidentes das comissões de planeamento regional e a constituição das comissões consultivas regionais bem pode ter constituído o primeiro passo para a regionalização harmonizada do desenvolvimento económico e do progresso social em terra metropolitana. Assim seja.
Mas não pode confinar-se a uma agricultura, ainda que modernizada, a única actividade motora do desenvolvimento de qualquer espaço territorial da Nação.
Às demais actividades económicas, à indústria nomeadamente, muito haverá que pedir-se e tanto mais quanto se admita que ainda temos braços a mais e equipamentos a menos em nossa agricultura.
Daí a justificação para uma sucinta análise regionalizada da atribuição dessoutras actividades, colectadas, porventura, menos apropriadamente sob o título de «contribuição industrial» em nossa legislação fiscal.
Efectivamente, são os seguintes o número de contribuintes e a verba principal segundo as actividades que concorrem para a formação da contribuição industrial:
[Ver tabela na imagem ]
Designação
Número de contribuintes
Verba principal
Contos Percentagens
Efectivamente, mesta terra de pequenos comerciantes natos, o «comércio, bancos, seguros e operações sobre imóveis», participa com 45 por cento da verba principal da colecto «contribuição industrial», e as «indústrias transformadoras», com apenas 36 por cento. Mas certo é que vem em progressivo aumento a sua contribuição para o produto (P. I. B.) e para a colecta, a denotar um certo surto de industrialização entre nós.
De 1956 até agora, no decorrer destes catorze anos, o produto interno bruto a preços constantes evoluiu do seguinte modo (v. p. 37, metrópole):
[Ver tabela na imagem]
Sectores de actividade
Milhares de contos
Percentagens
Como se afirma no parecer, estas cifras mostram as dificuldades da lavoura, por um lado, e, por outro, implicam uma industrialização, que, embora lenta, vai influindo na vida nacional. E esta industrialização descentralizada que necessita de um grande impulso.
Pena é que as indústrias transformadoras não hajam todo o (progresso esperado em 1969. Há largo campo para actividade ordenada na esfera ide acção destas indústrias. Basta uma simples leitura da tabela da importação para avaliar das possibilidades em matéria de fabricos internos. Não é só a imobilização de grandes investimentos em actividades de relação capital-produto sem grande interesse. O somatório de pequenos fabricos pode concorrer para o produto industrial, aliem de influir no equilíbrio dos pagamentos.
Mas vejamos o que o parecer nos faculta sobre a distribuição regionalizada destas actividades colectadas em contribuição industrial.
Uma primeira afirmação nos integra na realidade metropolitana: «o total da matéria colectável atingiu 14 130 000 contos, um grande aumento em relação a 1968 [...]. Os rendimentos colectáveis têm aumentado muito nos últimos anos. É de salientar a participação do distrito de Lisboa (7 525 000 contos)», ou 53 por cento do total. Suficientemente elucidativo.
Mas há mais: «pode desde já dizer-se que em 1969, dos 2 922 616 contos de contribuição industrial liquidada por verba principal e adicionais no continente, cerca de 2 123 400 contos, ou 71 por cento, pertencem a dois distritos». Lisboa e Porto centralizam assim quase toda a actividade não agrária metropolitana - e haveria de juntar-se-lhe também a das regiões circunvizinhas polarizadas por estes dois centros da actividade económica, nomeadamente os distritos de Braga, Aveiro e Setúbal: perfazer--se-ia assim nestes cinco distritos do continente 84 por cento do total da verba principal e adicionais.
O resto pouco mais é que mundo agrário:
[Ver tabela na imagem ]
Regiões e Sub-regiões:
Contribuição Industrial Verba Principal o adicional!
Norte
«Isto significa a concentração das indústrias e comércio passivos de contribuição» nas zonas polarizadoras do litoral.
«Não se notam melhorias nos últimos anos, apesar dos esforços no sentido de descentralizar a vida industrial.»
A verba principal e adicionais da contribuição industrial ultrapassam os 3 milhões de contos (3 001 788).
Lisboa e Porto ocupam os primeiros lugares no continente com 1 554 922 e 568 485 contos. «A percentagem correspondente aos distritos de Lisboa e Porto atinge
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72,6 por cento do total (era 71,7 por cento em 1968 e 70,5 em 1967). Quer dizer, as liquidações na contribuição estão ainda a concentrar-se nos distritos de Lisboa e Porto.» Isto de curto prazo, que a médio ou longo a evolução é bem mais marcada.
«Na medida em que sobe a influência de Lisboa e Porto diminui a de outros distritos. Aveiro ocupa posição dominante, nas inferior a 5 por cento.» Só alcança, aliás, 140 330 contos de contribuição industrial colectada; segue-se-lhe Setúbal com 113 953 contos de colecta e Adicionais.
Mas Guarda, Portalegre e Vila Real não alcançam 20 000 contos de verba principal e adicionará e Bragança fica-se por 8433 contos.
Um mínimo de condições e requisitos é evidentemente necessário para a indústria e outras actividades económicas se poderem instalar e vingar.
Mas quando a capitação dessas contribuições (verba principal e adicionais), a traduzir de algum modo rendimentos originados em tais actividades, começa a apresentar diferenças da ordem dos 970$ por habitante em Lisboa para 34$ em Bragança, ou de 21126$ e 1420$ por contribuinte nos mesmos distritos, fica-se na dúvida se este dualismo de estruturas económico-sociais não irá agravar sobremodo o processo de desertificação de vastos espaços interiores do País, em benefício de outros sem dúvida bem mais fadados, mas porventura demasiado restritos em número e área para supor-te das novas actividades produtivas a instalar no continente.
Compreensívelmente, os homens e as suas profissões acompanham esta tendência de acantonamento em certos espaços, abandonando outros .ao seu destino.
Vejamos o que se passa com o «imposto profissional».
O imposto profissional colecta os rendimentos da população activa por conta de outrem e por conta própria acima fie certo montante de rendimento.
O número de contribuintes ascende a 486 580, os rendimentos tributados a 24 865 472 000$. Mas também aqui o dualismo é regra:
[Ver tabela na imagem]
Regiões e sub-regiões
Contribuintes Números
Rendimentos tributados
Contos
No distrito da Lisboa concentra-se 40 por cauto do número destes contribuintes e a eles respeitam 58 por cento do total de rudimentos tributadas em tal imposto no continente. Os números para o distrito do Ponto são, respectivamente, de 20 e de 23 por cento. Em conjunto: 60 e 76 por cento dos totais do continente.
As capitações destoes rendimentos profissionais eram, em [...], respectivamente, de 74 e 63 contos, face a uma média (largamente influenciada. peio número daqueles) de 56 000$ no continente.
Entre as actividades por conta própria contam-se, fundamentalmente, os profissões liberais ou equiparadas (médicos, engenheiras, advogados, arquitectos, desenhadores, agentes técnicos de engenharia, contabilistas, certos professores e explicadores, solicitadores, administradores de bens alheios, parteiras, etc.), em inúmero que excede ligeiramente 20 000.
Mas a sua distribuição, acompanhando as populações e as actividades económicas, é igualmente irregular, pois que 66 por cento destes contribuintes e 74 por cento dos rendimentos tributados aos mesmos dois distritos pertencem.
«O estudo do imposto profissional «bravas das cifras mostra talvez mais do que os elementos referentes a outros impostas» até agora apresentados «a grande concentração de Lisboa».
Mais há mais.
São colectadas no imposto complementar 63809 pessoas em nome individual, correspondendo-lhe um rendimento global declarado de 23 637 247 contos.
Uma análise igualmente regionalizada permite reconhecer as diferenças:
[Ver tabela na imagem ]
Regiões e sub-regiões
Imposto complementar Pessoas singulares
Contribuintes Número
Rendimento declarado
Contos
«É extraordinária a influência de Lisboa, em especial nos rendimentos de pessoas singulares, que somam 15 313290 contos», num total de 23282629 no continente: mais de metade (54 por cento) do número de contribuintes, 66 por cento dos rendimentos declarados.
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Igualmente para as pessoas colectivas:
[Ver tabel na imagem]
Regiões e sub-regiões
Imposto complementar
Pessoa colectivas
Contribuinte Número
Rendimento declarados Contas
A influência dos distritos de Lisboa e do Porto no conjunto da metrópole pode apreender-se através da análise do seguinte quadro resumo:
[Ver tabela na imagem]
Distritos
Pessoa singulares
Pessoas colectivas
Contribuintes Números
Rendimentos Contos
Contribuintes Número
Rendimentos Contos
«Quase 62 por cento dos rendimentos de pessoas singulares concentram-se em Lisboa [...]. Repare-se que os rendimentos de pessoas singulares» no resto da metrópole «são de montante idêntico ao do distrito do Porto e menos de um terço dos de Lisboa.
As cifras no caso das pessoas colectivas são semelham-te» [...].
Deste modo se verifica, «través dos dados do imposto complementar, que se concentram em Lisboa e Porto cerca de 81 por cento dos rendimentos de pessoas singulares e 73,7 por cento dos de pessoas colectivas».
Uma análise desta natureza (e outras poderiam ser produzidas) parece ter cabimento pôr um duplo motivo:
Primeiro, porque são conclusões que se impõem da análise da contabilidade e finanças públicas e tiveram acolhimento no parecer sobre as contas gerais da Nação - que para a Nação devem ser dadas a conhecer;
Em segundo lugar, porque importa ter bem presente uma panorâmica e uma perspectiva tendência! de evolução no espaço metropolitano, agora que se anuncia a apreciação do aviso prévio sobre ordenamento do território.
Pena é se, pela especificidade dos problemas, as «províncias ultramarinas» não encontrem quem delas cuide em termos também do seu «ordenamento».
Terá a palavra o ultramar.
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Lopes da Cruz: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A apreciação das contas gerais do Estado permite analisar a situação financeira e económica e verificar as tendências da sua evolução. Assim, os dados fornecidos pelas do exercício de 1969, confrontados com os de anos anteriores e com as perspectivas da situação actual, propiciam a verificação do sentido de progresso ou o seu retardamento, e algumas dos suas causas.
1) No aspecto financeiro, mantém-se a tendência para um equilíbrio que é habitual.
Em cada uma das parcelas do todo nacional as receitas do Estado superam as despesas, apresentando saldos positivos e revelando equilíbrio e segurança orçamental.
As balanços de pagamentos também revelam certo equilíbrio, com saldos positivos no conjunto, mas a apreciação das verbas que compõem esta balança mostram a grande fragilidade do seu sector mais importante - o da balança comercial.
O equilíbrio mantém-se principalmente à custa das receitas dos serviços a emigração e o turismo na metrópole e os transportes em Moçambique.
Como se trata de receitas de carácter precário) por dependentes de factores externos dificilmente controláveis, a suo persistência no decorrer dos anos, sem que se manifestem tendências diversas, antes progressivamente se acentuam, é de mode a causar sérias preocupações e a exigir medidas adequadas à sua modificação.
2) A balança comercial do espaço português á tradicionalmente deficitária, mantendo-se essa tradição em todas as parcelas territoriais, com as excepções de S. Tomé e Príncipe e de Angola, as quais apresentaram' saldos positivos.
No ano em análise nova subida se verificou no saldo negativo, que se elevou a 17 692 400 contos para todo o espaço português, cabendo à metrópole a verba de 12735 700 contos - ou seja, 72 por cento do total - e n Moçambique a quantia elevada de 3409958 contos, sendo os dois maiores contribuintes para o elevado déficit.
Verifica-se que não conseguimos produzir aquilo de que necessitamos, e a tendência tem sido a do aumento gradual desse desequilíbrio, cada vez se elevando mais os saldos anuais negativos entre as importações e as exportações.
3) Nas relações entre a metrópole e o ultramar também a tendência tem sido sempre a de a primeira exportar mais do que importa das outras parcelas, mostrando desequilíbrios, mal-estar e atritos que em nada contribuem para a unidade nacional, pelo descontentamento que geram.
O problema das transferências do ultramar para a metrópole é grave, tem sido debatido nesta Assembleia com frequência e em vários tons, não se adivinhando solução capaz de o eliminar.
O Governo tomou algumas medidas corajosas no sentido da gradual solução, que Item levantado protestos e desagrado, tanto de sectores da metrópole como de cada uma das províncias do ultramar.
Foram restringidas as importações de produtos metropolitanos não considerados indispensáveis no ultramar, numa tentativa de equilíbrio das importações com as exportações, sendo o corte «nas importações de vinhos o que
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mais clamores levantou, pelo volume dos valores e pela repercussão no sector produtivo e comercial da metrópole.
Mas também em Moçambique o desagrado de tais medidas se fez sentir, pela escassez do produto junto do consumidor habitual e pelas dificuldades surgidas no sector comercial respectivo, a Atravessar crise grave.
Serão as medidas restritivas impostas as únicas possíveis para ajudar a resolver as dificuldades?
Embora de resultados mais morosos, mas de efeitos mais seguros, ou farás poderão contribuir validamente para que o equilíbrio seja encontrado. Se a metrópole adquirir ao ultramar maiores quantidades e valores de mercadorias de que necessita e agora recebe de países estrangeiros e até adversos, o seu contributo para a melhoria das transferências far-se-á sentir, sem que surjam atritos e dificuldades como as resultantes das restrições.
Alguns produtos são susceptíveis de propiciar, a relativamente curto prazo, benefícios sensíveis.
Assim, na proposta de lei de autorização de receitas e despesas para 1971, uai rubrica relativa ao «Fomento de culturas para reforçar ofertas insuficientes», diz-se que, na metrópole, o milho registou já um déficit de 400 000 contos no último ano, e a importação de sementes oleaginosas atingiu 600 000 contos na média do último triénio.
Ora, o ultramar podia suprir capazmente, e em prazo relativamente curto, todas essas carências da metrópole, dessa forma se contribuindo para a melhoria do problema das transferências do ultramar e para a diminuição dos deficientes crónicos da balança de mercadorias da zona do escudo, dado que a maioria dos valores desses produtos vêm de países estranhos.
Também o tabaco em rama consumido peias indústrias da metrópole pode vir do ultramar, onde se produz de boa qualidade, e tem dificuldades de expansão por falta de mercados.
Se a solidariedade mamona! não é palavra vã, tudo quanto se fizer nesse sentido será utilíssimo para todos.
Mas para isso torna-se indispensável uma coordenação intensa de esforços dos vários departamentos do Estado, da metrópole e do ultramar, no sentido de se estruturarem devidamente os sectores produtivos das diferentes parcelas, actuação essa que tem sido por de mais descurada.
Por não ser tradição nossa essa coordenação de esforços, é-me particularmente grato assinalar que, em data recente, os directores dos Institutos dos Cereais de Angola e Moçambique se deslocaram a Lisboa para se conjugarem as actuações com os organismos competentes da metrópole no sentido da orientação da produção e colocação do milho, do ultramar, e outros cereais. São de desejar os melhores resultados para tão louváveis esforços.
4) Na análise das contas gerais da província de Moçambique, o notável parecer emitido é francamente pessimista. E mesmo no ano que está a decorrer mantêm-se os mesmos problemas de desequilíbrio analisados no parecer, causando sérias apreensões a todos quantos trabalham na província a evolução da sua economia.
A diferença entre a entrada e saída de cambiais atingiu um valor negativo muito elevado.
As dificuldades nas transferências para a metrópole, com todos os inconvenientes para os interesses de Moçambique e da metrópole, mantêm-se inalteradas.
Medidas restritivas a importações da metrópole e de outros países, impostas com o fim de fomentarem produções locais para consumos criados, ainda não fizeram sentir internamente os seus efeitos benéficos, estando de momento a provocar crise grave em diversos sectores.
Porque tais medidas não foram progressivas, e não estão a ser devidamente acompanhadas pêlos organismos estaduais encarregados de fomentar a produção, o sector particular sente-se desorientado e desacompanhado, e terá de ser muito mais moroso, por carência de estruturas governamentais eficientes e adequadas, a corresponder aos incentivos restritivos.
Por outro lado, as restrições terão de provocar, de momento, decréscimo nos réditos da província, pela diminuição das receitas alfandegárias, consequentes aos cortes nas importações, e pela diminuição de rendimentos internos tributáveis nos sectores Atingidos com as restrições.
Daí que, ou terão de sofrer diminuição as despesas do sector público, com todas as desvantagens inerentes, ou outros sectores produtivos sofrerão uma maior carga tributária que lhes pode ocasionar dificuldades incomportáveis.
Não será, pois, de se procurar antes dinamizar os organismos provinciais ligados ao sector produtivo mais capaz de responder prontamente a incentivos, e que é o agrícola, reduzindo as medidas restritivas ao que é realmente dispensável, sem o avolumar de prejuízos para os sectores em dificuldade?
5) A curto prazo não se vislumbram novas actividades na província que possam propiciar uma evolução rápida favorável ao desenvolvimento económico, com a excepção de nova empresa têxtil.
Os benefícios que hão-de resultar do aproveitamento da fonte de energia do grandioso empreendimento de Cabora Bassa afiguram-se distantes.
As indústrias extractivas, que são o recurso de países em fase atrasada de desenvolvimento para aumentarem os seus rendimentos, só poderão desenvolver-se com outras infra-estruturas necessárias, que só agora se estão a processar na província, sendo igualmente longínquos, os resultados a obter.
Assim, actividades produtivas capazes de causarem impacte considerável no desenvolvimento de Moçambique não se vislumbram a curto prazo.
Mesmo quanto aos benefícios que todos ansiosamente esperamos retirar da energia abundante e barata das obras do Zambeze, necessário se torna desde já tomar público quais as zonas que irão ser beneficiadas, e em que desta provável, para que as iniciativas dos particulares que pretendam instalar actividades industriais possam estruturar-se a tempo, e se evitem concentrações industriais em regiões inadequadas, e se processe uma dispersão sã e equilibrada por vários pólos de desenvolvimento, através de toda a província.
6) Da análise das principais exportações de Moçambique se conclui serem as actividades agrícolas as que contam quase exclusivamente.
Assim, parece ser no sector agrícola que se afigura possível actuar de forma a obterem-se resultados mais rápido».
A maioria dos produtos são exportados sem qualquer industrialização. Impõe-se sejam tomadas medidas no sentido de os valorizar.
A castanha de caju e a amêndoa respectiva preparada pelas indústrias instaladas caminham a passos largos para se tornarem o maior valor de exportação. Todavia, e necessário sanear-se muito do que de defeituoso ocorre no sector.
No sentido de fomentar o aproveitamento interno da amêndoa, foram fixados preços de aquisição o produtor, ou melhor, preços pêlos quais a castanha é entregue aos industriais.
Em 1959, há doze anos, portanto, quando a comercialização da castanha era livre, os industriais chegavam a
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adquiri-la a 3400$ a tonelada, e nessa altura a cotação dos mercados externos oscilava entra 4000$ e 4500$ a tonelada.
Entretanto os preços dos mercados externos subiram apreciavelmente, tendo ido até 6000$ e 7000$ por tonelada, na campanha de 1969-1970. Mas, apesar disso, foram fixados preços de opção para a industria da província a adquirir, de 3300$ ou 3200$, conforme os casos, na campanha referida. Tal critério proteccionista, por exagerado, nunca pode conduzir ao fomento da produção, antes levará ao desinteresse e eventual abandono dos produtores.
Por outro lado, os comerciantes que adquirem ao produtor não podem exportar enquanto os industriais considerarem necessárias as quantidades existentes para o seu abastecimento, e na campanha referida a indústria reservou a totalidade da produção. Todavia, os industriais não a utilizaram toda nas suas indústrias, e desse modo houve uma retenção de «castanha no valor de cerca de 400 000 contos, com o consequente retardamento da entrada de divisas, conforme foi referido por S. Ex.ª o Governador--Geral da província, em resposta a uma notável intervenção efectuada no Conselho Legislativo pelo vogal eleito pelo distrito de Moçambique, engenheiro Manuel Vieira Pereira, da qual extraí os elementos analisados.
Não terá sido por força dessa retenção que resultou a diminuição de 355 634 contos nas exportações da castanha em 1969, relativamente a 1968? Os valores aproximam-se muito.
Ainda quanto à castanha de caju, em 1970 foram apresentados dois pedidos para a montagem de indústrias de descasque na cidade de Quelimane, para absorção da que é produzida no distrito da Zambézia. Ambos foram indeferidos, após oposição deduzida por todos os outros industriais já instalados na província, todos eles manifestando a opinião de que a capacidade de laboração já autorizada para outros locais absorve toda a produção.
Todavia, a maior parte da castanha produzida na província não é industrializada, conforme se verifica pêlos valores exportados de castanha e .de amêndoa. Assim, fica a impressão de que os industriais requereram aumento de capacidade de laboração, que só instalarão quando bem lhes convier, e, entretanto, lesam-se os interesses da província pela perda nos valores de exportação e pela possibilidade de se criarem indústrias em outros centros, delas bem carecidos.
Voltando ao problema dos preços de aquisição ao produtor.
Moçambique tem condições naturais propícias à produção de amendoim, de que já teve razoáveis exportações. Os preços pagos são baixos, atendendo-se aos dos mercados externos, e pequenas as produções por hectare cultivado.
Actuando o Instituto dos Cereais no sentido de garantir um melhor preço do que o actual e disseminando o ensino de melhores práticas culturais e distribuição de melhores sementes, não será de prever um rápido e substancial aumento de produção?
Um outro produto que de ano para ano mais pesa no gasto de divisas é o trigo, que presentemente ronda 150 000 contos anuais.
Não será possível aos serviços do respectivo sector, mediante uma escolha adequada de sementes e locais de cultivo, incrementar em, prazo breve a expansão da sua produção?
As exportações de copra são de valor que oscila entre 200 000 e 300 000 contos. Se toda ela fosse industrializada na província, o valor, acrescido de óleo e outros derivados, seria da ordem dos 70 por cento. Não será possível incentivar-se a sua rápida- industrialização interna?
Em 1969 foi feito o pedido para instalação na província de uma fábrica de sacaria e talas de ráfia sintética por uma empresa da metrópole. Já em 1966 havia sido concedida uma autorização semelhante a outra empresa radicada na província, sucessivamente prorrogada, vindo a ser indeferidos os pedidos em princípios de 1970, por se haver entendido serem prejudiciais is embalagens de fibras naturais da província. Todavia, é necessária a aquisição no exterior de- avultadas quantidades e valores de fibras naturais cara a laboração da indústria existente em Moçambique, tendo-se revelado a produção interna manifestamente insuficiente.
A empresa que fez o pedido em 1966 e nada fez até 1969, a mão ser solicitar prorrogação de prazos, é precisamente a mesma e única que industrializa os fibras naturais.
Produtos há que é desaconselhável, por várias razões, serem exportados em sacaria de fibras (naturais, e a província está a proceder a importações, com tendência para aumentar, de sacaria de ráfia sintética.
Por que não autorizar a instalação de mais essa indústria, fixando-se um prazo curto para a sua instalação a qualquer das empresas interessadas, ou mesmo a ambas, procurando elas exportar os excedentes pana os países limítrofes?
E, a ter de se fazer escolhas, não deveria a mesma recair sobre a empresa que não exerce a actividade de fabricação de sacaria de fibras naturais, para que uma concorrência saudável se estabelecesse?
São tão poucas as perspectivas de instalação de novas indústrias em Moçambique, e está tão carecida delas a província, que o não aproveitamento dos que se mostram realmente interessados prejudica seriamente a sua economia.
7) Porque o momento presente é de dificuldades, tudo o que em prazo curto ou médio se possa fazer para provocar um indispensável desenvolvimento económico interno é «altamente meritório.
Além das medidos restritivas tomadas quanto às importações, outras se impõem que fomentem a produção, principalmente do que se revelar mais capaz de responder com brevidade.
Assim, impõe-se uma política adequada dos esbelecimentos de crédito no que respeita à sua concessão, canalizando-o para os sectores mais aconselháveis.
Impõe-se uma revisão justa dos preços de aquisição ao produtor de tudo aquilo que se deseja incentivar, designadamente a garantia de aquisição.
É necessária uma reestruturação dos circuitos comerciais, de forma que certas zonas da província não sejam abastecidas por países vizinhos, em vez de o serem de produtos da outras zonas internas, embora distantes.
E indispensável que todos os organismos estaduais de assistência à agricultura sejam dinamizados, aproveitando-se os poucos técnicos de que dispomos para o desempenho de funções técnicas, retirando-lhes as burocracias, que lhes absorvem quase todo o tempo disponível, confiando estas a outros funcionários.
Para um fomento industrial é preciso conceder facilidades que estimulem todos os que pretendem investir nesse campo, mas dentro dos princípios de garantia de uma sã concorrência, eliminando-se proteccionismos concedidos que travam o desenvolvimento, só de atender em casos de comprovada e indispensável necessidade.
Para que se realize uma equilibrada e necessária ocupação de todo o território, e não o empolamento de certas regiões em detrimento de outras que vêem escoar-se as matérias-primas produzidas, é necessária a criação de um
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cada vez maior número de pólos de desenvolvimento, criando-se-lhes as estruturas de base indispensáveis.
E pela conjugação de várias medidas devidamente estudadas, e não apenas através de restrições, também necessárias mas insuficientes de per si, melhores dias virão e a grave crise económica actual ir-se-á dissipando.
Vozes: - Muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Dou por concluído o debate sobre as cantas gerais do Estado do ano de 1969. No entanto, a Assembleia «tem ainda de tomar a sua resolução quanto a elas, o que reservo para melhor oportunidade.
Vou, pois, encerrar a sessão, mão sem prevenir os Srs. Deputados interessados em participar no aviso prévio sobre o ordenamento do território de que o mesmo deve ser efectivado ainda esta semana.
Amanhã haverá sessão à hora regimental, tendo como ordem do dia o início da discussão na generalidade do projecto de lei do Sr. Deputado Cancella de Abreu sobre a recuperação de deficientes.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 40 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Albino Soares Finto dos Reis Júnior.
Bento Benolied Levy.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
João António Teixeira Canedo.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
José Dias de Araújo Correia.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José da Silva.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Júlio Dias das Neves.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Bui Pontífice Sousa.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Alexandre José Linhares Furtado.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
Artur Augusto de Oliveira Fomentei.
Augusto Domingues Correia.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Francisco Correia das Neves.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
João Manuel Alves.
João Buiz de Almeida Garrett.
Jorge Augusto Correia.
José da Costa Oliveira.
José Guilherme de Melo e Castro.
Luís António de Oliveira Ramos.
Lufe Maria Teixeira Pinto.
Manuel Valente Sanches.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
O Redactor - Luiz de Avillez.
IMPRENSA NACIONAL
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