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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 115

ANO DE 1971 1 DE JULHO

ASSEMBLEIA NACIONAL

X LEGISLATURA

(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)

SESSÃO N.º 115, em 30 de JUNHO

Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Exmos. Srs.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Amílcar da Gosta Pereira Mesquita

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 55 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 111 e 112 do Diário das Sessões, com algumas rectificações.
Leu-se o expediente.
O Sr. Presidente informou estarem na Mesa elementos em satisfação de dois requerimentos apresentados pelo Sr. Deputado Sá Carneiro.
A Sr.ª Deputada D. Luzia Beija manifestou o júbilo do distrito de Setúbal com a decisão tomada pelo Governo de localizar na área de Sines a nova refinaria do Sul.
O Sr. Deputado Almeida e Sousa assinalou a passagem do centenário do nascimento de Alfredo da Silva.
O Sr. Deputado Eleutério de Aguiar referiu-se à visita do Sr. Ministro das Corporações e Previdência Social e da Saúde e Assistência ao Brasil.

Ordem do dia. - Prosseguiu a discussão na especialidade e votação das alterações à Constituição Política.
Foram aprovadas alterações aos artigos 5.º a 8.º, inclusive.
No debate, que decorreu sobre o texto sugerido pela comissão eventual, intervieram os Srs. Deputados Ulisses Cortês, Oliveira Dias, Roboredo e Silva, Neto de Miranda, Júlio Evangelista, Alberto de Alarcão, Camilo de Mendonça, Almeida Cotia, D. Custódia Lopes, Vaz Pinto Alves, Duarte do Amaral, Coita Dias, Cunha Araújo, Alberto de Meireles, Agostinho Cardoso, Duarte de Oliveira, Henrique Tenreiro, Cancella de Abreu e Albino dos Reis.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 Horas e 45 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar da Gosta Pereira Mesquita.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira. António Júlio dos Santos Almeida. António Lopes Quadrado.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Armando Valfredo Pires.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Domingues Correia.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.

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Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Fernando David Laima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Mancada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Gustavo Neto Mimada.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Duarte de Oliveira.
João José Ferreira Forte.
João Lopes do Cruz. João Manuel Alves.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Jorge Augusto Correia.
José Coelho de Almeida Cotta.
José Coelho Jordão.
José da Costa Oliveira.
José de Mira Nunes Mexia.
José dos Santos Bessa.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Júlio Dias das Neves.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luís António de Oliveira Ramos.
D. Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
Manuel Valente Sanches.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Miguel Pádua Rodrigues.
Bastos Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baessa.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Rogério Noel Peres Claro.
Teodoro de Sousa Pedro.
TeófiLo Lopes Frazão.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 83 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 55 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n.ºs 111 e 112 do Diário das Sessões.
Acerca do n.º 111 do Diário das Sessões, recebi uma carta do Sr. Deputado Magalhães Mota, o qual, prevenindo a hipótese de não poder estar agora presente, enviou nota de algumas rectificações que tem a fazer ao texto da sua intervenção publicado nesse Diário. Vão ser remetidas à redacção do Diário das Sessões, para os efeitos convenientes.

O Sr. Pinto Castelo Branco: - No n.º 112 do Diário das Sessões, p. 2256, cal. 2.ª, 1. 17, onde se lê: «estranhamente», deve ler-se: «entranhadamente»; na mesma página e coluna, 1. 16 (a contar do fim), onde se lê: «outros», deve ler-se: «vários»; na p. 2257, col. 1.ª, 1. 22, onde se lê: «de», deve ler-se: «pela»; na mesma página e coluna, 1. 14 (a contar do fim), onde se lê: «a própria vocação», deve ler-se: «a vocação»; na mesma página e coluna, 1. 2 (a contar do fim), onde se lê: «com efeito», deve ler-se: «para o efeito»; na p. 2258, col. 1.ª, 1. 9 (a contar do fim), onde se lê: «conveniência», deve ler-se: «convivência»; na mesma página, col. 2.ª, 1. 6 (a contar do fim), onde se lê: «Embora este possa», deve ler-se: «Embora possa»; finalmente na p. 2259, col. 1.ª, 1. 3, onde se lê: «limitação da», deve ler-se: «limitações do».

O Sr. Barreto de Lara: - No Diário das Sessões, n.º 112, consta que assinei as propostas de alteração aos artigos 72.º, quanto à eleição do Chefe do Estado, e 135.º, quando, na verdade, não assinei essas duas propostas de alteração.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso será verificado pelos originais e o lapso será corrigido, se assim é. Em todo o caso, será desde já remetido para o Diário das Sessões, e eu mandarei verificar qual a origem do lapso, que é sempre possível.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Para mais completo esclarecimento do Sr. Deputado Barreto de Lara e da Assembleia, informo que se verifica ter havido lapso da Imprensa Nacional, e não estar a sua assinatura nas propostas indicadas.

O Sr. Gonçalves de Proença: - Também eu, Sr. Presidente, requeiro que seja retirado o meu nome das propostas de alteração «os artigos 5.º e 121.º, pois não as subscrevi.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum de VV. Ex.ªs tem qualquer reclamação a apresentar aos n.ºs 111 e 112 do Diário das Sessões, considero-os aprovados, com as rectificações apresentadas.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Exposição

De familiares de presos políticos da cadeia de Caxias pedindo melhoria de condições.

Cartas

De Ulisses António Carneiro apoiando a inclusão do nome de Deus na Constituição. De Luís de Almeida sobre o mesmo assunto.

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Telegramas

De um grupo de pessoas que se intitulam da Comissão Nacional de Socorro aos Presos Políticos.
De vários sindicatos sobre a proposta de lei de imprensa.
Da Câmara Municipal de Mértola apoiando a intervenção do Sr. Deputado Leal de Oliveira rã sessão de 27 do corrente.
Da comissão concelhia de Sines da Acção Nacional Popular apoiando a intervenção do Sr. Deputado Miguel Bastos em defesa do aumento do número de Deputados pelo círculo de Setúbal.
Da Comissão Municipal de Cuemba apoiando a intervenção do Sr. Deputado Neto Miranda em defesa da proposta de lei de revisão constitucional.
De Celestino Bragança, do Grémio do Comércio e Indústria de S. Tomé, de Pedro Cabral, de Tobias Gravide e da comissão de província da Acção Nacional Popular de S. Tomé e Príncipe apoiando a intervenção do Sr. Deputado Castro Salazar na sessão de 25 do corrente.
Do delegado, em S. Nicolau,, da Associação Comercial, Industrial e Agrícola do Barlavento de Cabo Verde e do Leal Senado de Macau apoiando a proposta de lei do Governo de revisão constitucional.
Da Junta Distrital de Cuando-Cubango apoiando as intervenções dos Srs. Deputados por Angola sobre a revisão constitucional.
Do Município do Mossuril apoiando a intervenção do Sr. Deputado Ribeiro Veloso sobre o mesmo assunto.
Da Comissão Municipal de Mavanga e da Câmara Municipal de Tete apoiando as intervenções dos Srs. Deputados por Moçambique sobre o mesmo assunto.
Do presidente da Câmara Municipal de Santa Maria, do presidente da Câmara Municipal da Praia, do presidente da Acção Nacional Popular da ilha do Fogo, do presidente da Câmara Municipal da Santa Catarina, do presidente da Câmara Municipal da ilha do Fogo, das forças vivas de S. Filipe (ilha do Fogo), da direcção da Cooperativa Agrícola da Ilha de Santo Antão, da comissão da Acção Nacional Popular da Ribeira Grande, das forças vivas e da população de S. Lourenço (ilha do Fogo), da população da freguesia de Nossa Senhora da Ajuda (concelho da ilha do Fogo), dos habitantes da freguesia de Santa Catarina (ilha do Fogo), da Câmara Municipal da Ribeira Grande, do Vulcânico Clube do Fogo, do presidente da Câmara de S. Nicolau, do presidente da comissão concelhia da Acção Nacional Popular da Ribeira Brava, dos comerciantes e agricultores do concelho de Santa Catarina, do presidente da Acção Nacional Popular, do Futebol Clube de Lubango, da comissão da Acção Nacional Popular e da Câmara Municipal de Pereira de Eca apoiando as intervenções dos Srs. Deputados do ultramar em defesa da proposta de lei do Governo sobre a revisão constitucional.

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa, fornecidos pelo Ministério do Interior, através da Presidência do Conselho, os elementos destinados a satisfazer o requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro na sessão de 4 de Fevereiro do ano corrente.
Estão também na Mesa, fornecidos pelo Instituto Nacional de Estatística, através da Presidência do Conselho, os elementos destinados a satisfazer o requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro na sessão de 18 de Fevereiro último. Vão ser enviados a este Sr. Deputado.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada D. Luzia Beija.

A Sr.ª D. Luzia Beija: - Sr. Presidente: Foi com intenso júbilo que na tarde do passado dia 8 o distrito de Setúbal tomou conhecimento da decisão do Conselho de Ministros, messe dia reunido, que localizava na área de Sines a nova refinaria do Sul e o complexo petroquímico.
É o eco desse júbilo - apoteòticamente manifestado ao Presidente do Conselho na sua visita do dia 26 à linda vila alentejana - que a voz de uma representante do mesmo distrito traz hoje a esta Câmara para agradecer ao Governo a sua importante e justa decisão. Decisão que uma verdadeira política regional e corrigindo penosas assimetrias de desenvolvimento será o motor de arranque de uma vasta região do Sul que poderá, de agora em diante, dar generosamente aos seus filhos as mesmas oportunidades que, em amargas decisões, agora se buscam em terras estranhas.
O novo pólo de desenvolvimento com a refinaria, indústria petroquímica e subsidiárias, o movimento de um grande porto de mar e todas as actividades complementares num complexo desta natureza constituirão uma poderosa alavanca impulsionadora para todo o Alentejo e farão de uma região de fraca densidade populacional um grande centro urbano, porventura a maior cidade alentejana, a necessitar, desde já, de poderosas infra-estruturas.
Bem haja, pois, o Governo pela imediata criação do Gabinete da Área de Sines para elaboração dos estudos e planos necessários a tão grande empreendimento e as oportunas medidas logo tomadas contra a especulação de terrenos.
À consideração do recém-criado Gabinete pomos a nossa preocupação - ao lado da premência das infra-estruturas técnicas, mas nunca em plano inferior - das infra-estruturas necessárias ao aglomerado populacional. A habitação, os serviços de saúde, as escolas, as creches e outros equipamentos sociais necessários a uma vida verdadeiramente humana têm de ser necessàriamente uma preocupação básica num Estado social.
E também, tanto quanto possível, a salvaguarda da natureza e da actividade piscatória tradicional, bem como da pureza das águas e da atmosfera, por medidas de anti-poluição, para que, ao abrirmos mão destas riquezas naturais, não tenhamos de pagar um preço demasiado alto pelo benefício recebido.
Das entidades, organismos e serviços respectivos esperamos que tomem possível à população a fixar no novo aglomerado não só um melhor uivei de vida, mas também a satisfação dos anseios que conduzem a um integral e harmónico desenvolvimento humano.
Continuamos, assim, agora na perspectiva jubilosa desta grande realização, a esperar com a mesma confiança e a dar também o nosso esforço e a maior colaboração, enfrentando as grandes responsabilidades de um distrito em permanente ascensão.
Em nome, pois, do distrito de Setúbal, dos concelhos do sul do meu distrito, que votando nos seus Deputados votaram e confiaram em Marcelo Caetano, dos concelhos do Alentejo, que vêem finalmente soar a sua hora - muito obrigada, Sr. Presidente do Conselho, pela feliz decisão em tão boa hora tomada!
Tenho dito.

A oradora foi cumprimentada.

O Sr. Almeida e Sonsa: - Sr. Presidente: Tenho para mim, e sempre que oportuno o tenho afirmado, que, se, como povo, pecamos em relação ao nosso destino, é muito mais e muito mais frequentemente por pensarmos

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em termos de passado do que em termos de futuro. E quantos me conhecem não me poderão arguir, com justiça, de horror à História.
Fiel à opção da minha vida, creio firmemente que, nas gerações presentes e futuras, a Pátria precisa bem do exemplo de luta e de vitória dos poucos industriais portugueses que souberam vencer. Quanto a mim, seria muito útil que lhes déssemos, desde já, no nosso pensamento o lugar que a História ainda lhes não deu. Mas por que mão lhes darmos, na história que fazemos ensinar, o lugar a que têm direito e que tanta utilidade pode ter para a mentalização de que imperiosamente necessitamos?
Outros mais sabedores e mais responsáveis, com especial relevo para o venerando Chefe do Estado, já fizeram elogio, que palavras minhas nunca poderiam conseguir, do homem que há hoje 100 anos nasceu nesta cidade de Lisboa.
Para além do eco que morre, de todas as palavras que foram proferidas, ficou a data marcada por uma obra gigantesca que, honrando a Nação, honra sobretudo os que o quiseram continuar.
Nessa obra, mais do que o máximo mundial de dimensão que estabelece, falam-me os milhares de empregos que criou, famílias portuguesas que vão viver melhor do que a média dos portugueses; falam-me as centenas de milhares de contos que, numa manifestação de confiança que nos confunde, ficaram dispersais Portugal além, promovendo as indústrias subsidiárias a quem foram confiados obras e equipamentos; falam-me sobretudo a afirmação e a propaganda de potencialidade de que muito há-de beneficiar a indústria portuguesa, tão carecida de crédito na hora que se aproxima.
Alfredo da Silva está lembrado e bem lembrado no dia do seu centenário. E está lembrado da única forma por que, estou certo, ele gostaria de ser lembrado, como verdadeiro industrial que era: continuando a sua obra, criando e distribuindo sempre mais riqueza. Sempre mais!
Alfredo da Silva morreu, mas a sua obra a bem da Nação não morreu ainda, nem morrerá tão cedo. Para além das riquezas que continua a criar e a distribuir, ficar-nos-á sempre o seu exemplo de iniciativa, de trabalho e de luta, fé e esperança que nos legou.
Recordo aqui a classificação dos homens que fazia e escreveu o velho Ford: «Duas espécies de homens vejo no Mundo: os pioneiros e os rotineiros. Estes atacam sempre aqueles. Acusam-nos de açambarcar todas as oportunidades, quando de facto nem rotineiros poderiam ser se os pioneiros lhes não rasgassem os caminhos.»
Rasgando amplos e variados caminhos, criando, repito, riquezas de que largamente continuamos a usufruir, Alfredo da Silva foi um pioneiro singular que bem mereceu bem merece e bem merecerá ainda da Nação. Que os seus representantes, que somos, lhe não consagrassem aqui, pelo menos, este simples preito parecer-me-ia mal e é esta a razão das minhas palavras.
Tenho dito.

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Eleutério de Aguiar:-Sr. Presidente e Srs. Deputados: Nos últimos dias muito se falou nesta Casa das relações luso-brasileiras e os intervenientes no debate sabre a revisão constitucional que se detiveram na disposição que garantirá a dupla cidadania aos 100 milhões de indivíduos que deste e do outro lado do Atlântico falam a língua de Camões puseram em justo relevo o alto interesse de tal medida.
Porque comungo inteiramente das ideias e dos sentimentos expressos nessa matéria e certo de que importa cada vez mais concretizar na prática os peregrinos propósitos que as leis fundamentais contemplarão, através de um assíduo intercâmbio nos mais variados sectores da vida, acompanhei com o mais vivo interesse a visita que o Ministro Baltasar Rebelo de Sousa acaba de realizar ao Brasil.
E isto porque, muito para além dos contactos estabelecidos com os principais responsáveis do país irmão, sempre da maior repercussão política, e de uma nova presença governamental portuguesa junto dos nossos inúmeros compatriotas lá radicados, também de flagrante oportunidade, a estada do titular das pastas das Corporações e Previdência e da Saúde e Assistência no Brasil ficou sobremaneira assinalada com um conjunto de medidas de extraordinário alcance social.
Efectivamente, de outra forma não podemos qualificar o plano básico de actividades acordado entre o governante português e o seu colega brasileiro, mo intuito de incrementar a colaboração entre os dois países, no campo da pesquisa médica e da saúde pública, conforme se acentuou no comunicado oficial divulgado no termo da visita.
Acresce, por outro lado, a importância dos trabalhos realizados com vista à elaboração das normas administrativas e das de procedimento, destinadas a dar execução ao acordo de Previdência Social e ao ajuste complementar de 18 de Outubro de 1969, assinado entre os dois Governos, assegurando aos trabalhadores portugueses e brasileiros o direito à assistência médica e medicamentosa, enquanto se encontrarem, temporàriamente, no território do outro Estado contratante, direito extensivo aos seus dependentes que os acompanhem na deslocação.
Estabelecida, no que respeita a esta modalidade, a forma de indemnização das despesas entre os dois Estados, ficou também assente que, em caso de transferência para um terceiro, os trabalhadores conservarão os benefícios adquiridos, sendo regulamentados e considerados em reciprocidade de tratamento os seguintes direitos: assistência médica e incapacidade de trabalho transitória, velhice, invalidez, tempo de serviço, morte e natalidade. A este conjunto de benefícios se espera se junte o da completa isenção de deduções fiscais de remessas de prestações do Brasil para Portugal, em completa reciprocidade com o que ocorre no caso contrário.
Perante o alcance político e social das medidas em causa, estou certo, Sr. Presidente, de que se encontra perfeitamente justificada esta referência parlamentar, que me permite reiterar o mais alto apreço pela acção governamental do Dr. Rebelo de Sousa, na coordenação de duas pastas que englobam problemas fundamentais e cuja solução adequada constitui, sem dúvida, exigência prioritária entre as que hão-de satisfazer-se na prossecução do Estado social.
Sucede, ainda, que recentemente o Dr. Rebelo de Sousa deslocou-se à ilha da Madeira, onde são prementes as necessidades nos sectores sobre os quais mais directamente incide a sua acção, e posso afirmar não só da oportunidade da visita, mas também da confiança que os meus conterrâneos depositam na satisfação daquelas.
Praticando uma forma de governo em que as palavras de doutrina política e de orientação técnica se consolidam na acção, bem na linha do Sr. Presidente do Conselho, foram várias as decisões então tomadas, qualquer delas de inegável interesse, designadamente na reformulação da política hospitalar, com vista a atenuar as deficiências do antigo hospital enquanto o novo não entrar em funcionamento, aproveitando as instalações sanatoriais, a trans-

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formação destas em centro de doenças torácicas, a instalação de creches e centro de formação profissional acelerada, que permitirá a preparação de mão-de-obra indispensável numa região em que o problema se apresenta agudo, em consequência da emigração, e a construção da colónia de ferias de Porto Santo.
Recordando os momentos passados em Câmara de Lobos, o mais flagrante paradoxo da minha terra, pois encerra potencialidades incalculáveis e alberga o mais grave drama social que imaginar se possa, desejo reiterar, agora nesta tribuna, o meu apelo ao Ministro Rebelo de Sousa, ao seu colega das Obras Públicas e ao Secretário de Estado da Informação e Turismo, para que, urgentemente, seja encontrada a solução conjunta que o caso requer.
Não tendo querido deixar de assinalar o depoimento directamente recolhido e que à minha região respeita, bem como a justa expectativa ali criada, termino, Sr. Presidente, congratulando-me com os resultados práticos da visita do Ministro Rebelo de Sousa ao Brasil e com as perspectivas que, tão auspiciosamente, se abrem, com vista ao fortalecimento dos laços que unem Portugueses e Brasileiros.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Não está mais nenhum Sr. Deputado inscrito para usar da palavra no período de antes da ordem do dia.
Vamos passar à

Ordem do dia

Continuação da discussão na especialidade e votação das propostas de alterações à Constituição Política.
Vai ser lida a proposta relativa à nossa redacção do artigo 5.º do título I da Constituição.
Foi lida. É a seguinte:

TÍTULO I

Artigo 5.º

Nos termos regimentais, propomos que o artigo 5.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:

Art. 5.º O Estado Português é unitário, podendo compreender regiões autónomas com organização político-administrativa adequada à sua situação geográfica e às condições do respectivo meio social.
§ 1.º A forma do regime é a República corporativa, baseada na igualdade dos cidadãos perante a lei, no livre acesso de todos os portugueses aos benefícios da civilização e na participação dos elementos estruturais da Nação na política e na administração geral e local.
§ 2.º A igualdade perante a lei envolve o direito de ser provido nos cargos públicos, conforme a capacidade ou serviços prestados, e a negação de qualquer privilégio de nascimento, raça, sexo, religião ou condição social, salvas, quanto ao sexo, as diferenças de tratamento justificadas pela natureza e, quanto aos encargos ou vantagens dos cidadãos, as impostas pela diversidade das circunstâncias ou pela natureza das coisas.
§ 3.º São elementos estruturais da Nação os cidadãos, as famílias, as autarquias locais e os organismos corporativos.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotta - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Cotta Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a proposta de alteração ao artigo 5.º

O Sr. Ulisses Cortês: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ulisses Cortês.

O Sr. Ulisses Cortês: - Sr. Presidente: Vamos prosseguir o debate sobre a revisão constitucional, livre e objectivamente e sem o uso de expedientes e de métodos que não enobrecem nem prestigiam a Assembleia Nacional.
E permita-me V. Ex.ª que lhe renda as minhas homenagens, não só pela imparcialidade e alta autoridade com que tem dirigido os trabalhos legislativos, mas também pela legalidade e firmeza com que soube reconduzi-los à dignidade e correcção que devem revesti-los.
O artigo 5.º da proposta, segundo a redacção que lhe foi dada pela comissão eventual, corresponde sensìvelmente à proposta do Governo e está Intimamente ligado aos artigos 133.º a 136.º do texto governamental.
Difere ligeiramente no corpo do artigo e insere no § 1.º a palavra «religião» para evitar qualquer privilégio de carácter confessional.
É mais uma forma de reconhecimento no plano religioso, da personalidade própria das províncias ultramarinas.
Dou, assim, a minha aprovação ao texto sugerido pela comissão eventual, salientando a sua transcendente importância no contexto geral da proposta, sobretudo na parte relativa ao ultramar.
E terminarei, assim, as breves considerações que sobre esta disposição me propus formular.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Dias.

O Sr. Oliveira Dias: - Sr. Presidente: Agora que ainda estamos no início da discussão na especialidade da revisão constitucional, verifico a ausência no hemiciclo de vários Deputados subscritores do projecto n.º 6/X, na sequência da decisão ontem tomada pela Câmara, que, depois de o Sr. Presidente ter declarado aprovados na generalidade a proposta e os projectos, julgou de acolher, por maioria, um requerimento que, na prática, redunda na rejeição, na generalidade dos mesmos projectos, do que resultaram condições que consideraram impeditivas de colaboração válida na discussão da especialidade.
Lamento que assim tenha sucedido. Entrei na vida política - e como eu muitos - na convicção - e só enquanto essa convicção se mantiver continuarei a cola-

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borar - de que se iniciara na vida portuguesa uma nova era marcada pela tolerância, pela abertura, pelo diálogo, conforme foi dito pelo Sr. Presidente do Conselho no discurso da sua posse.
Essa grande directriz não foi seguida por esta Câmara ao afastar da discussão na especialidade os projectos de revisão.

Vozes: - Não apoiado!

O Orador: - Quase todos estiveram de acordo em que a vivacidade com que decorreu a discussão na generalidade prestigiara a Câmara, mas a maioria não hesitou em afastar da especialidade os projectos.
Foi um mau serviço ao País e ao Sr. Presidente do Conselho.

Vozes: - Não apoiado!

O Orador: - Como eu muitos se sentirão frustrados.
É lamentável que, por exemplo, na discussão do artigo 5.º, que se está a discutir, não possamos ter presente o texto do projecto n.º 6/X.
É lamentável que os principais responsáveis pela elaboração deste projecto não estejam presentes.
Ninguém lucrará com tal ausência.
A Assembleia ficará mais pobre - porque ninguém, certamente, negará o brilho das suas intervenções.
Acresce, que, na relação a alguns dos pontos contidos no projecto n.º 6/X - e não dos de menos importância -, o próprio Assistimos, assim, a uma negação - da responsabilidade da Câmara - na ordem prática da liberalização e abertura que fora anunciada ao País.
Tenho dito.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Disse e muito mal!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado! Julguei que V. Ex.ª usasse da palavra para discutir o artigo 5.º, mas afinal fez considerações que, permita-me que lho diga, estão ligeiramente deslocadas ...
Há uma coisa em que posso acompanhar V. Ex.ª é em lamentar que alguns Srs. Deputados tenham querido, segundo anunciaram e V. Ex.ª confirma, provàvelmente em nome deles, abandonar estes trabalhos.
Isso é com SS. Exas. ...
Quanto às redacções do artigo 5.º, é perfeitamente lícito a qualquer Sr. Deputado, ainda hoje, em relação ao texto que está pendente de votação, apresentar as propostas de alteração que julgar convenientes, desde que tenha nove companheiros para o efeito.

O Sr. Roboredo e Silva: - Peço a palavra!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Roboredo e Silva.

O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Vou-me referir ao § 2.º do artigo 5.º
Não vou fazer qualquer proposta necessàriamente, porque para a fazer teria de a assinar eu e outros Srs. Deputados e estaria, com certeza, essa alteração na Mesa.
Mas vou fazer algumas considerações, ou, melhor, alguns comentários que deixo ao critério da Assembleia apreciar e, fundamentalmente, ao critério da nossa comissão eventual, que tão esplêndido trabalho produziu.
Penso que este parágrafo deveria terminar «em condição social», na quinta linha. A razão desta minha opinião é a dúvida, ou, melhor, o receio, nas circunstâncias actuais, e perante possíveis exigências futuras que se me afigura poderem surgir, de que a redacção proposta impeça constitucionalmente que algum dia as mulheres possam ser chamadas a prestar serviço militar. De resto, o forte personalismo manifestado por muitas jovens, nomeadamente universitárias, com grande vigor em várias atitudes e actuações, desde a contestação a outras actividades, por vezes parece que mais vivamente até que os próprios rapazes, aconselha a que não se façam discriminações que estariam certas em 1933, quando a Constituição foi plebiscitada, mas, a meu ver, já não o estão hoje.
Convém lembrar que o serviço militar para mulheres existe em vários países.
E como governar é prever, penso que deixar a abertura na Constituição seria prudente.
O artigo 44.º da Lei n.º 2135 (ver Lei do Serviço Militar) aflora timidamente os voluntários do sexo feminino, o que está longe de satisfazer o problema que enunciei.

O Sr. Neto de Miranda: - Peco a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Neto de Miranda.

O Sr. Neto de Miranda: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Vou limitar-se estritamente u ordem do dia, tanto mais que V. Ex.ª já fez observações que se julgam oportunas.
Está em discussão, e posto por V. Ex.ª, o artigo 5.º, na redacção da proposta da comissão eventual.
Na comissão eventual, de que tive a honra de fazer parte, este artigo 5.º foi objecto da maior ponderação, quer quanto à oportunidade da sua discussão naquele momento, quer quanto ao seu conteúdo. A oportunidade derivada da interligação que ele tinha com o artigo 133.º da proposta do Governo e o seu conteúdo de ele, por si só, enunciar um princípio, mas por forma mais expressiva do que constava no artigo 134.º da actual Constituição.
Tal como consta do parecer da comissão, este artigo 5.º contém uma norma fundamental, onde se reafirma a unidade política do Estado Português, o que não é prejudicada pela autonomia caracterizada por uma maior descentralização administrativa dos territórios, através de uma organização política e administrativa, a qual se há-de conter nos Estatutos das províncias, como requer o artigo 133.º proposto.
No entanto, pareceu conveniente melhorar a redacção proposta do artigo 5.º, reforçando o sentido unitário do Estado Português com a participação de regiões autónomas, a que a adversativa «mas» podia retirar precisamente esse significado.
Por outro lado, quando na proposta se dizia que a organização de regiões autónomas seria de natureza «política e administrativa», achou-se preferível substituir esta expressão por «político-administrativa», mantendo-se assim a expressão consagrada pelo actual artigo 134.º da Constituição, pela base V da Lei Orgânica e pelos decretos que promulgaram os estatutos político-administrativos das províncias ultramarinas, princípio que a futura Lei Orgânica respeitará.
Assim, e por sugestão aceite sem reservas, a redacção do artigo 5.º passou a ser a que acabou de ser lida pelo

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Sr. Secretário da Mesa, e que V. Ex.ª, Sr. Presidente, pôs à discussão.
Entendo que as alterações feitas correspondem melhor à economia da (proposta na articulação do artigo 5.º com os artigos 133.º a 136.º
Relativamente aos §§ 1.º, 2.º e 3.º, apenas no § 2.º se entendeu conveniente significar que a igualdade perante a lei também envolve o direito de ser provido em cargo público independentemente da religião que se professe.
Nestes termos, Sr. Presidente, eu dou o meu voto favorável à proposta, tal como está apresentada.

O Sr. Júlio Evangelista: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, o Sr. Deputado Júlio Evangelista.

O Sr. Júlio Evangelista: - Sr. Presidente, pouco mais terei de acrescentar sobre a matéria em discussão, mas não queria privar V. Ex.ª e a Câmara de uma declaração que, espero a bondade de V. Ex.ª, me permita fazer. O precedente foi criado, e, se V. Ex.ª não se importa, permita que mais alguém aborde o problema, aliás de extremo melindre. Não queria deixar de nesta Câmara, referir com particular acento um alto serviço que o Sr. Deputado Oliveira Dias acaba de nos prestar. A Câmara reagiu, e, por isso, as palavras do Sr. Deputado Oliveira Dias foram da maior utilidade, porque permitem a todos nós, num sereno exame de consciência, dizer que a atitude da Mesa, a que nobilìssimamente V. Ex.ª preside, foi de correcção extrema no dia de ontem e na sessão de ontem. Foi de uma legalidade intocável. Sublinho aqui as palavras do Sr. Deputado Ulisses Cortês, ao prestar as minhas homenagens a V. Ex.ª e à legalidade correcta com que actuou.

Vozes: - Apoiado! Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso não é matéria da ordem do dia.

O Orador: - Eu sei, Sr. Presidente, e por isso mesmo pedi a V. Ex.ª a benevolência do precedente aberto. As regmats do (número foram, aliás, inteiramente respeitadas ontem. Ao número, quem o invoca como argumento tem de lhe obedecer.

Vozes: - Apoiado! Apoiado!

O Orador: - E o número ontem manifestou-se pujantemente, manifestou-se vigorosamente, nesta sala.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Pausa.

O Orador: - Posto isto, Sr. Presidente, duas palavras sobre o tema do artigo em discussão.
A comissão eventual, Sr. Presidente, viu-se perante a proposta do Governo, dizendo que «o Estado Português é unitário», acrescentando «mas poderá compreender regiões autónomas», e o texto da Câmara Corporativa, que, estabelecendo uma nuance, preconizava: «... o Estado Português é um diário, compreendendo as regiões autónomas ...» Entre a proposta e a sugestão da Câmara Corporativa há efectivamente um escalonamento de texto, de letra, que alguma coisa implica ou alguma relação tem com o espírito e o fundo do preceito.
A comissão optou por uma terceira fórmula. Nem adoptou a fórmula do Governo, «o Estado Português é unitário, mas poderá compreender regiões autónomas», mera a da Câmara Corporativa, «o Estádio Português é unitário, compreendendo regiões autónomas», para votar o texto seguinte e que está em discussão:- «... o Estado Português é unitário, podendo compreender regiões autónomas ...»
Desta subtileza:, que implica a redacção definitiva adoptada pela comissão e que ìntimamente está relacionada, noutro, passo, com o artigo 134.º, que mais adiante iremos discutir, algo de significação temos de tirar, e é aquela; Sr. Presidente, de que as regiões autónomas mão estão adversativamente colocadas em face do Estado unitário Português. Estão complementarmente. São desenvolvimentos da unidade do Estado Português.
E passo a outro ponto.
Se bem entendi as palavras do Sr. Deputado Reboredo e Silva, se bem interpretei o seu pensamento, pretende eliminar do § 2.º do artigo 5.º todo o texto que diz, ao referir a igualdade dos cidadãos perante a lei: «... salvas, quanto ao sexo, as diferenças de tratamentos justificadas pela natureza e, quanto aos encargos ou vantagens dos cidadãos, as impostas pela diversidade das circunstâncias ou pela natureza das coisas.»
Suponho que era isto que S. Ex.ª pretendia. Queria prestar a minha homenagem ao Sr. Deputado Reboredo e Silva, à maneira elegante como pôs a questão, e apenas dizer que, quando a lei fala nas diferenças justificadas pela natureza, elas são mesmo justificadas pela natureza». É a natureza que as justifica! Não se podem tratar igualmente coisas desiguais e a lei da natureza é inelutável. Por isso, este preceito se impõe perante a inedutabilidade das condições e das circunstâncias a que se refere, porque mão se podei, repito, violentar a natureza.

O Sr. Roboredo e Silva: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Um momento, Sr. Deputado Roboredo e Silva. V. Ex.ª a seguir poderá voltar a pedir a palavra.
Entretanto, Sr. Presidente, queria ainda acrescentar que a comissão eventual, ainda não campo do artigo 5.º, introduziu uma alteração que está directamente ligada com uma alteração semelhante proposta para o artigo 134.º da Constituição. Aqui, onde se fala em regiões autónomas com organização «política e administrativa» adequada, a comissão preferiu uma outra forma de expressar o pensamento: regiões autónomas com organização «política-administrativa».
Pois, também aqui, Sr. Presidente, há certa nuance na hierarquia da autonomia.
Efectivamente, ao dizer-se organização «política e administrativa», a comissão, como a assembleias mão pode ser alheia, não podemos ser alheios às interpretações que o texto constitucional comporta, pois não podemos ser alheios, até, ao que certos sectores da opinião, mais ou menos válida, possam pensar, ainda que os textos não contenham em si mesmos interpretações insidiosas. A comissão quis claramente, de acordo com o Governo, deixar expresso que era a organização político-administrativa que estava em causa.
Nada mais tenho a acrescentar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Roboredo e Silva: Se quer usar da palavra, eu inscrevo-o na sua vez, mas V. Ex.ª compreenderá: se mão faiou como aparte terá de falar pela ordem das inscrições.

O Sr. Roboredo e Silva: - Não um deixaram falar como aparte, o que era a minha intenção, muito obrigado.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto de Alarcão.

O Sr. Alberto de Alarcão: - Sr. Presidente: Limitar-me-ei nas considerações ao artigo 5.º em apreciação. Matéria relativamente delicada me traz à fala neste quase abrir da apreciação na especialidade.
Delicada porque fui precisamente um dos subscritores do projecto de lei n.º 6/X de revisão constitucional, posto à consideração da Câmara Corporativa e da nossa comissão eventual, mas que mal ficaria se obrigasse todos e cada um dos Srs. Deputados proponentes a ter de aceitar, na especialidade, a totalidade e a integralidade dos preceitos propostos ou, inclusive, impossibilitasse a revisão de pensamento face à consideração dos argumentos entretanto trazidos à consideração ou colação desta Assembleia. Isto é: impossibilitasse o exercício prático do direito de liberdade de pensamento, sua evolução e expressão, e votação em conformidade.
Esta era precisamente uma das matérias: a do § único do projecto de Lei n.º 6/X, que na generalidade subscrevi, propus, em que há bastante tempo admitira que pudesse vir a preterir na votação por texto que, em consciência tivesse mais completo, melhor, mais digno ou mais justo.
Não logrou acolhimento na comissão eventual o texto do parágrafo proposto, com o que me congratulo, pois que há muito escrevera a defesa - e já o comunicara a meus pares - da expressão formal do § 2.º do texto da proposta governamental.
Começa a ser pacificamente entendido e aceite pela generalidade dos cidadãos o direito à igualdade de todos perante a lei e a negação de quaisquer «privilégios, discriminações, diferenciações ou desigualdades em si próprios objectivamente injustificados e injustificáveis» face ao «sistema de valores» admitidos e à «comum consciência social».
Mas em quase todos os domínios que se prendem aos do § 2.º do artigo 5.º ora em apreciação são admitidos desvios ou excepções que a consciência aceita, a própria Constituição reconhece e consagra e a legislação traduz.
Assim, e a título meramente exemplificativo, admito «igual admissibilidade ao provimento nos cargos públicos» como consequência lógica do princípio de igualdade perante a lei, mas aceito também que se atenda às habilitações ou nos serviços prestados à Nação, como a apreciação do projecto de lei sobre integração social dos indivíduos deficientes nos deve ter vindo, aliás, recordar - quem se sacrificou pela Pátria bem merece o reconhecimento de todos nós.
Também a igualdade perante a lei e a negação de qualquer privilégio ou discriminação começam a ser requeridas, em muitos países do Mundo e também enfare mós, por cidadãos do sexo feminino, mais não me repugna que se possam conceder - se solicitadas e aceites - diferenças de tratamento justificadas pela natureza, em casos como os de dispensa de trabalho em período de nascimento de filhos, de que os homens não conseguem exercer o processo, ou de dispensar de prestação de serviço militar ou sua prestação em serviços auxiliares).
E aceito, ainda, diferenças quanto aos encargos ou vantagens dos cidadãos, impostas pela diversidade das circunstâncias ou pelas natureza das coisas, - em casos como os dos impostos profissional e complementar em função dos rendimentos, ou da passagem gratuita de atestados a indigentes, ou de isenção ou redução de propinas nos estabelecimentos oficiais de ensino a filhos dos conhecidos «econòmicamente débeis» ou de famílias mumerosas para o nível de rendimentos do agregado familiar, etc. Isto, a título meramente exemplificativo, que outros casos não poderia ir buscar.
«O princípio da igualdade jurídica não impõe [não deve impor assim] um tratamento absolutamente parificado de todos os cidadãos, uma igualdade, de facto entre todos eles. O princípio em causa apenas requer paridade de tratamento quando sejam iguais as condições objectivas e subjectivas. A diversidade das circunstâncias implica uma diversidade de tratamento legislativo - não parecendo assim, inclusive, vedada, no plano constitucional, a possibilidade de leis individuais ou pessoais e, muito mais, de leis providência: e alguns dos nossos queridos mortos, dos mortos desta legislatura da Assembleia Nacional aí estão a testemunhar a justiça de leis porventura pessoais, de leis-providência.
Por outro lado, a natureza das coisas justificará que a lei não seja aparentemente igual para todos os cidadãos. A isso se podem impor, com efeito, óbices de ordem natural, biológica e moral, considerada esta segundo os padrões da civilização cristã. Ponto é que esses desvios se não possam interpretar como expressão de privilégios ou de encargos ligados às pessoas como tais» [Diário das Sessões, 4.º suplemento ao n.º 88, de 31 de Março de 1971, p. 1770-(18), amenos que se hajam imolado no altar da Pátria.
Estas, algumas das razões por que há bastante tempo me decidira nesta matéria pelo texto do § 2.º da proposta de lei n.º 14/X, que é, com ligeiro aditamento, o proposto agora a nossa consideração.
Dou-lhe, assim, a minha aprovação na especialidade.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Camilo de Mendonça.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: Antes de me referir expressamente ao artigo em discussão, permita-me V. Ex.ª, na esteira do Sr. Deputado Oliveira Dias, que reaja às considerações que ouvi.
Deu esta Câmara um exemplo de independência e de autenticidade e fui eu porventura dos que mais lutaram no sentido de um esforço de compreensão e mútuo entendimento e de respeito pelas ideias dos outros. Discordando, embora, da maior parte das soluções que se propunham para além da proposta e que a comissão não pôde aceitar, lutei sempre por um esforço de compreensão dos pontos de vista e das ideias dos outros, pela aceitação de tudo que fosse possível.
Eu não sou liberal! Mas verifico agora que, em nome da defesa de um liberalismo, se não aceitam, por outra parte, as regras do jogo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E as ausências que acabam de apontar, e eu verifico, não dignificam seguramente, neste momento, o respeito pelas regras do jogo que se diz aceitar.
De resto, Sr. Presidente, tenho presente o artigo 16.º do Regimento, que diz exactamente que implica perda de mandato a falta a quinze sessões sem justificação. Não sei se num caso destes, e depois do que foi dito, poderá haver justificações da falta.
Em qualquer parlamento do Mundo, problemas destes surgem todos os dias. Nos parlamentos ditos democráticos é normal que assim aconteça. É estranho no nosso, porque não é democrático, segundo dizem os de fora; porque é mais democrático que os outros, apenas por isso.

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Rejeito, portanto, a ofensa prestada a Mesa e à Câmara pelas declarações feitas. A maioria pronunciou-se, e «a maioria significativíssima», que em qualquer parlamento não seria necessária. A cada um de nós cumpre agora honradamente aceitar as regras do jogo, a decisão da maioria.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: O texto proposto para o artigo 5.º é uma demonstração do espírito aberto do Governo. Uma das preocupações manifestadas nesta Câmara era no sentido de em relação a este artigo, encontrar motivos para duvidais, temores ou hesitações, perante algumas palavras ou expressões da proposta. A redacção que a comissão eventual acabou por adoptar corresponde exactamente àquela que algum dos mais qualificados defensores dessa doutrina tinham como a melhor. Também neste caso, como em muitos outros, o Sr. Presidente do Conselho, dando a sua aprovação à proposta da comissão eventual, deu exemplo de abertura e compreensão, que tenho pena se esteja a ser manifestado mesta Câmara fundamentalmente pelos autores do projecto n.º 7/X, a que por isso presto a moinha homenagem, sem prejuízo também de alguns do n.º 6/X, que aqui continuam, como aos outros, a merecer igual respeito da minha parte.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: Dizia eu que a redacção encontrada nas duas ou três expressões em que foi mexida é uma prova da abertura do Governo, é uma prova da compreensão dos anseios que foram manifestados, é mais um aspecto em que o Governo transigiu. Espero, por isso mesmo, igual compreensão a este respeito por parte de quantos tenham duvidais em relação àquilo em que se não pode transigir.

O Sr. Almeida Cotta: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Cotta.

O Sr. Almeida Cotta: - Sr. Presidente: Desejaria debruçar-me apenas sobre as matérias da ordem do dia, no estrito cumprimento dos deveres. E, assim, direi que a novidade do artigo 5.º, em relação à actual legislação, consiste, sobretudo, na designação de regiões autónomas, que, nos termos do artigo 133.º, salvo erro, podem vir a ser dadas às províncias ultramarinas.
Não devo, aio entanto, dar por findas as minhas considerações antes de lastimar a ausência de qualquer Sr. Deputado, seja qual for o motivo.
Acho, no entanto, que outros não existirão, alem dos determinados pela falta de saúde ou por afazeres inadiáveis, pois de contrário teria de entender que realmente falha o verdadeiro espírito democrático.
Quero, outrossim, frisar, que esta Assembleia serve o Pais e só o País, como, aliás, os restantes órgãos de soberania.
Por último, queria associar-me às palavras do Sr. Deputado Júlio Evangelista, quando sublinhou a dignidade que a Presidência continua a pôr na presidência dos nossos trabalhos.
Muito obrigado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada D. Custódia Lopes.

A Sr.ª D. Custódia Lopes: - Sr. Presidente, é sobre o artigo em debate que vou falar, e, embora o Sr. Deputado Júlio Evangelista a ele se tenha referido, acho que tenho, como mulher, uma palavra a dizer. Já na redacção do actual § único do artigo 5.º se afirma o princípio da igualdade de sexos; simplesmente, enquanto na redacção anterior as restrições previstas se referiam exclusivamente à mulher, devido à sua natureza e ao bem da família, agora, na redacção proposta, as restrições referem-se a ambos os sexos em razão da sua natureza, pelo que se me afigura preferível, pois, que assim mais vincado está o justo princípio da igualdade.
Acho que o problema posto pelo Sr. Almirante - que as mulheres poderão ser excluídas do serviço militar- ninguém poderá extrair do actual texto, até porque já há uma lei de serviço militar voluntário. Poderá, é certo, fundar opiniões de que alguns serviços militares sejam excluídos em relação ao sexo. Dentro dos serviços militares há muitos que as mulheres podem exercer, substituindo homens válidos, que poderão exercer outras funções que estarão mais de atoando com a sua natureza.
Peço licença para ler um pouco daquilo que disse quando foi da Lei do Serviço Militar. Eu disse isto:

Não se exige na presente proposta de lei a obrigatoriedade do serviço militar feminino, nem tão-pouco que a mulher pegue em armas em operações de com bate, como já vai acontecendo em alguns países. Certamente porque nem a índole da mulher portuguesa se encontra preparada para um tal trabalho coercivo, nem a Nação, felizmente, necessita, por ora, de tal medida.
A mulher portuguesa, que, em momentos difíceis da vida da Nação, tem dado já sobejas provas de abnegação e coragem é, nesta conjuntura nacional, chamada a colaborar em regime de voluntariado, apenas em serviços militares que se coadunam com a sua natureza física e psicológica, os quais estão hoje entregues a um largo número de homens válidos, que, uma vez libertos, poderão ir reforçar os campos operacionais, cada vez mais necessitados, à medida que o tempo vai passando.

Tenho a impressão que isto responde ao que o Sr. Almirante Roboredo quis dizer. Muito obrigado.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Vaz Pinto Alves: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vaz Pinto Alves.

O Sr. Vaz Pinto Alves: - Sr. Presidente: Subscrevi a proposta dia comissão eventual por ia honroso convite de V. Ex.ª ter participado nos trabalhos da comissão. E quero significar a minha adesão ao artigo 5.º e dizer também que o Governo demonstrou estar aberto e compreensivo a todas as sugestões que, efectivamente, podiam ser tomadas em conta, e que o foram no trabalho que a comissão eventual apresentou.
Já aqui foi referido o conteúdo do artigo 5.º, a que, repito, dou o meu acordo, e limitar-me-ei nas minhas considerações ao § 1.º e ao § 3.º do respectivo artigo.
O § 1.º do artigo 5.º reafirma a forma da República corporativa do Regime, baseada na igualdade dos cidadãos perante a lei ... e na participação dos elementos estruturais da Nação na política e na administração geral e local.

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República corporativa significa que a colectividade não é ela toda tão-sòmente formada por indivíduos isoladamente considerados, mas por todo um tecido de corpos sociais intermédios em que os indivíduos se agrupam e através dos quais exercem direitos políticos: participam na vida local e na Administração. Em suma, a representação corporativa reparte-se, deste modo, por dois sectores: o da administração e o da legislação.
Daqui resulta uma certa descentralização, que se traduz na faculdade de os corpos sociais intermédios elaborarem normas regulamentares - regulamentos autárquicos, posturas, contratos colectivos, etc. - que o Estado reconhece e respeita.
O artigo 3.º constitui uma explicitação dos elementos estruturais e uma afirmação incisa ao mencionar que eles são os cidadãos, as famílias, as autarquias locais e os organismos corporativos. Deferência que envolve uma garantia da sua existência jurídica, por um lado, e ainda «para aumentar neles a edificação da orgânica necessária ao exercício do poder político», por outro.
Considero este artigo 3.º na linha lógica da institucionalização unitária e corporativa do Estado Português, vindo precisar que, ao lado dos corpos sociais intermédios, das famílias, das freguesias, dos municípios, das corporações existem também os cidadãos com os seus direitos e os seus deveres, e que a nossa concepção orgânica não é a de um corporativismo integral ou estrito, reconhecendo, igualmente, no indivíduo a participação na Administração e «na feitura das leis. A participação do cidadão é, também, deste modo, um elemento de base na nossa estrutura constitucional.
Corpos intermédios e cidadãos constituem aquela sociedade global e moral que nós vamos encontrar noutros lugares da Constituição dotada de uma ordem jurídica e de uma organização económica e professando uma religião. Mas estas últimas considerações terão o seu lugar apropriado, que se desenvolverá a propósito de outros temas.
Muito obrigado.

O Sr. Duarte do Amaral: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte do Amaral.

O Sr. Duarte do Amaral: - Sr. Presidente: Este é, segundo creio, o primeiro artigo que. directa ou indirectamente, interfere com o problema do ultramar.
Quero voltar a assinalar agora o que expus na generalidade e é que, de uma maneira geral, apoio tudo o que o Governo propõe sobre o ultramar e a que neste artigo se refere. Igualmente dou o meu apoio à parte restante da redacção proposta para; o artigo 5.º e seus parágrafos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Roboredo e Silva, se ainda deseja usar dela.

O Sr. Roboredo e Silva: - Já que V. Ex.ª quer ter a bondade de me dar a palavra, mais uma vez aproveito a generosidade. Há pouco, a minha intenção era um pequeno aparte, e esse aparte tinha como objectivo dizer apenas que eu não tinha feito qualquer proposta, mas sim um comentário onde demonstrava a minha apreensão pela redacção com que iria ficar o § 2.º do artigo 5.º e, designadamente, a expressão que vem a seguir, «quanto ao sexo, ou seja, as diferenças de tratamento justificadas pela natureza».
Liguei isto ao aspecto constitucional, que poderia implicar amanhã - mas Deus permita que não tenhamos nunca necessidade de utilizar tal exigência -, a necessidade de impor o serviço militar obrigatório para as mulheres como, aliás, sucede noutros países que se vêem obrigados a enfrentar graves crises nacionais, crises essas que, inclusive, podem contender com a própria independência da Nação.
Agradeço os esclarecimentos que me foram prestados; agradeço também a intervenção do Sr. D. Custódia Lopes, que reproduziu uma declaração que fez aqui, quando se discutiu a Lei n.º 2135, ou seja, a Lei do Serviço Militar.
Mas tive o cuidado de frisar (que essa lei aflora vagamente, a respeito do sexo feminino, o serviço militar voluntário e nada diz, por (consequência, sobre serviço militar obrigatório. E repito o meu ponto e aquilo que desejaria, prevendo o pior que, repito, creio firmemente em Deus que nunca nos veremos obrigados a tal - é que se amanhã tivéssemos de lançar mão de uma lei de emergência ela fosse anticonstitucional.
Era só esta a parte que eu queria esclarecer.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Cotta Dias: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cotta Dias.

O Sr. Cotta Dias: - Sr. Presidente: Considerações de ordem regimental impedem-me de me pronunciar sobre as circunstâncias de que se rodeou o requerimento que ontem, aqui foi soberanamente votado. Considerações de elegância, e nem todas de ordem pessoal - e por isso as respeito mais -, impedem-me de entrar em observações sobre algumas afirmações que me abstenho de classificar e que fora da ordem do dia aqui foram proferidas.
E, posto isto, como disse o Sr. Deputado Ulisses Cortês, volto ao nosso debate.
A proposta do Governo quanto ao corpo do artigo 5.º foi objecto de larga discussão na comissão eventual, cujo relato é elucidativo quanto às razões justificativas da sua aprovação e das alterações introduzidas. Aí se diz que se trata de uma norma fundamental, onde se reafirma a unidade política do Estado Português, sem prejuízo da necessidade de uma maior descentralização na administração dos territórios ultramarinos.
Foi particularmente posta em relevo, com nitidez que exclui todas as dúvidas, a preocupação de afirmar a unidade do Estado Português. As alterações visaram, ainda, reforçar mais a expressão dessa unidade. Por isso se subtraiu a adversativa «mas» e se substituiu a expressão «autonomia política e administrativa» por «autonomia político-administrativa».
Não deixou, no entanto, de ser frisado que o texto da proposta não oferecia em si quaisquer dúvidas quanto à referida unidade, assumindo, por isso, as modificações que referi quanto ao aspecto de aperfeiçoamento formal.
Quanto à previsão de existência de regiões autónomas e à qualificação das províncias como tais, a matéria encontra-se suficientemente esclarecida no preâmbulo da proposta do Governo, no discurso do Sr. Presidente do Conselho - ao apresentar a proposta a esta Assembleia- e no parecer da Câmara Corporativa. Aliás, este ponto foi largamente referido no debate na generalidade, pelo que não vale a pena fazer-lhe nesta altura novas referências.
Quanto ao § 1.º, contém ele, na proposta do Governo, simples ajustamentos formais que não levantaram dúvidas à comissão eventual nem parece que as justificassem.

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No § 2.º a proposta do Governo procurou restringir ao mínimo os termos em que pode ser admitida uma discriminação de tratamento em razão do sexo, a qual, aliás, deixou de ser reportada especificamente à mulher.
A Constituição tem de se ir adaptando à evolução dos tempos. Aliás, em meu entender, a fórmula da proposta não compromete, de maneira alguma, a unidade da família, de resto expressamente afirmada no § 3.º «elemento estrutural da Nação» e constitucionalmente regulada nos artigos 12.º e seguintes.
O que se não podia deixar de afastar era a possibilidade de normas hoje aberrantes, como o preceito do Código Penal que pune a abertura de correspondência do marido pela mulher, mas não a desta por aquele, ou a que permite ao marido denunciar os contratos de trabalho da mulher.
Quanto à chefia ida família - poder funcional que está na preocupação de todos nós -, essa está expressamente prevista no artigo 19.º da Constituição.
A comissão não aceitou já a supressão Ida referência à natureza como fundamento de diversidade de direitos e deveres para os indivíduos de sexo diferente, por considerar que, se, em alguns casos, as discriminações estabelecidas na lei serão injustificadas, noutros têm perfeita razão de ser: basta pensar na prestação do serviço militar e no exercício de funções que envolvam, por exemplo, a utilização de grande força física.
A comissão incluiu ainda entre os privilégios proibidos aqueles que se baseiam na religião. Não parece haver objecção legítima neste ponto, embora a proibição de discriminação por motivos religiosos conste já do n.º 3.º do artigo 8.º
Também não se considerou conveniente a supressão da parte final do preceito - «e quanto aos encargos ou vantagens dos cidadãos as (diferenças) impostas pela diversidade das circunstâncias ou pela natureza das coisas». Não se trata aqui de uma restrição às proibições previstas na primeira parte da disposição, mas de uma limitação suplementar ao legislador ordinário.
O chamado princípio de igualdade perante a lei significa que o legislador deve tratar igualmente o que é igual e desigualmente o que é desigual. Ao proibir certos privilégios, a Constituição exclui expressamente que determinados critérios (nascimento, religião, sexo, raça, etc.) fundamentem discriminação de tratamento. Para lá disso, desigualdade das situações que fundamentem regimes jurídicos iguais ou desiguais, mas esses juízos terão de possuir um mínimo de racionalidade.
Como se diz na parte final do actual § único do artigo 5.º e do § 2.º da proposta, as diferenças quanto aos encargos ou vantagens dos cidadãos terão de ser impostas pela diversidade das circunstâncias ou pela natureza das coisas. Neste aspecto, o princípio da igualdade perante a lei, ou melhor, da igualdade da lei para todos, significa a proibição do arbítrio do legislador, como hoje é reconhecido pela jurisprudência e pela doutrina dos países jurìdicamente mais evoluídos.
Por uma curiosa intuição, o nosso texto constitucional antecipou-se em tal ponto a essa doutrina e a essa jurisprudência. Não é por isso aqui que deve ser alterado.
Por tudo o que foi dito, a votação do texto, tal como consta do parecer, corrobora posições claras da comissão, cujo fundamento não foi abalado por nenhum argumento.

O Sr. Cunha Araújo: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cunha Araújo.

O Sr. Cunha Araújo: - Aberto o precedente, em consequência de um audacioso golpe de desrespeito ao nosso Regimento, a propósito da discussão deste artigo 5.º, embora não goste de «agredir os caídos», não posso deixar sem o meu mais vivo repúdio as suspeitas contra a legitimidade dos votos aqui emitidos ontem, tão infelizmente referidas pelo Sr. Deputado Oliveira Dias, que, ao que me tem parecido, se devia encontrar entre os que mais respeitosamente tinham obrigação de acatar o princípio democrático de que emanou.
Associo-me, por isso, às considerações dos Deputados Júlio Evangelista e Camilo de Mendonça.
Quanto à matéria do artigo em discussão, dou-lhe a minha inteira aprovação na especialidade.

O Sr. Alberto Meirelles: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Meirelles.

O Sr. Alberto Meirelles: - Pedi a palavra, Sr. Presidente, não obstante sentir ainda as fortes limitações que uma crise momentânea, espero, me trouxe, mas que não me fizeram, penso eu, perder totalmente a lucidez, para um esclarecimento -que julguei ser devido - ao Sr. Deputado Roboredo e Silva.
As dúvidas que pôs, sempre atento às necessidades, aos imperativos da defesa nacional que estão no seu espírito, parece-me não serem fundadas, neste caso.
O § 2.º define e refere a igualdade perante a lei, num dos aspectos que foi, historicamente, dos mais discutidos e dos mais debatidos: a, igualdade dos cidadãos perante os cargos públicos. O provimento nos cargos públicos que, através dos tempos, como VV. Ex.ªs sabem, foi objecto de privilégio fundado em muitas espécies de coisas, de circunstâncias, deixou de o ser, e bem, no nivelamento social. Pois é isso exactamente que a Constituição, na esteira, de resto, da Constituição de 1911, traz neste artigo 5.º, § 2.º: é a igualdade dos cidadãos perante o provimento dos cargos públicos, isto é, o direito do cidadão perante esse cargo; não é pròpriamente uma restrição que sucede quanto ao sexo - não -, é o entender que o direito de ser provido nos cargos públicos, e bem, nega qualquer privilégio de nascimento, de raça e até de religião, de sexo ou de condição social, é evidente, mas ressalva, quanto ao sexo, as diferenças de tratamento justificadas pela natureza. Não é um privilégio que estabelece quanto ao sexo, é o reconhecimento da inconveniência, no estado actual da sociedade, pelo menos, e do entendimento que temos das coisas, de certos cargos serem providos a indivíduos do sexo feminino.
Não que sejam menos aptos para eles, pois cada vez mais a mulher se vem revelando mais apta para o exercício de cargos públicos, alguns apenas, e eu lembraria principalmente aqueles que estão na órbita do Sr. Deputado Roboredo e Silva. Nós não consideraríamos, por ora, possível que uma senhora fosse comandante-chefe das Forças Armadas, ou chefe ido Estado-Maior Naval. Poderá ser um génio capaz de o ser. Pois é essa discriminação que se faz quanto à natureza do sexo, as diferenças de tratamento são justificadas por essa natureza. É ,isso apenas, porque me parece, e repito, que, de qualquer maneira, se se estabelece um privilégio para a mulher, não se repõem as coisas da natureza no seu lugar próprio e, de qualquer maneara, também se impedirá que a mulher seja chamada a prestar, eventualmente, o seu serviço nas forças armadas, de acoplo com a natureza e o sexo.

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Parece-me, portanto, que não há qualquer colisão. O § 2.º contempla situação totalmente diferente. E a garantia dos direitos do cidadão perante o Estado, não o contrário.

O Sr. Alberto de Alarcão: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Alarcão.

O Sr. Alberto Alarcão: - Sr. Presidente: Relativamente ao § 3.º deste artigo 5.º em apreciação gostava de juntar igualmente uma palavra.
Afirma o parecer n.º 22/X da Câmara Corporativa acerca da proposta de lei n.º 14/X de revisão constitucional que «não se suscitam dúvidas sobre quais são os elementos estruturais da Nação. Não se impõe, portanto, que a Constituição o diga - e sobretudo que o diga desta forma quase incidental».
Prefiro, pela muita consideração pessoal que me merece o ilustre relator do parecer e pela consideração dos restantes membros da Câmara Corporativa, não comentar que se diga de «forma quase incidental» do aparecimento deste § 3.º do artigo 5.º, quando o articulado do artigo expressamente se refere a «elementos estruturais da Nação».
Oxalá pudesse também partilhar do optimismo, e julgo que muitos outros portugueses e talvez até, Srs. Deputados, acerca de se não suscitarem quaisquer dúvidas sobre quantos e quais sejam esses elementos estruturais da Nação.
Se assim é, importa esclarecer e precisar no texto fundamental e no local próprio o que se deva entender por «elementos estruturais da Nação».
A questão reside precisamente no conceito que se tenha e forme da Nação.
Parafraseando o Sr. Deputado (ao tempo) Pinto de Mesquita:

Eu pergunto o que se deva entender por nação: se é o conjunto de indivíduos [...] ou o conjunto de corpos morais estruturalmente organizados.

Ou de ambos e algo mais conjuntamente.
É evidente que a Nação somos, primeiramente, bodos nós: povo, quantos nascemos à sombra desta Casa Lusitana, de famílias portuguesas, e não enjeitamos a Pátria que nos transmitiu o ser, nos moldou para a vida e nos legou história, tradição, usos, costumes, ideais, valores.
Da Nação é, sem dúvida, o território, e a Constituição Política lhe consagra o primeiro do seu articulado.
Mas a Nação é, sobretudo, gente:

Art. 3.º Constituem a Nação todos os cidadãos portugueses residentes dentro ou fora do seu território [...].

E mais do que gente, é povo: «Povo, está bem de ver, tomado aqui não no sentido de aglomerado amorfo de indivíduos autónomos, das concepções individualistas e, ainda menos, de classe e fracção social, mas» - como o definiu ao tempo o Sr. Deputado Cerqueira Gomes - «no de sociedade organicamente considerada na sua constituição natural e histórica» (Diário das Sessões, n.º 122, de 17 de Junho de 1969, p. 986).
Por isso pode e deve entender-se que seja algo mais do que gente - cidadãos da Pátria Portuguesa.
Não afirmou Salazar, em 1929?

Diante das ruínas morais e materiais acumuladas pelo individualismo revolucionário; diante das tendências de interesse colectivo que aquelas provocaram por toda a parte, no espírito do nosso tempo; diante das superiores necessidades da Pátria Portuguesa, a reorganização constitucional do Estado tem de basear-se em nacionalismo sólido, prudente, conciliador, que trate de assegurar a coexistência e actividade regular de todos os elementos naturais, tradicionais e progressivos da sociedade. Entre eles devemos especializar a família, a corporação moral e económica, a freguesia e o município. As garantias políticas destes três factores primários devem ter a sua consagração na Constituição Portuguesa, de modo que influam directamente ou indirectamente na formação dos corpos superiores do Estado. Só assim este será a expressão jurídica da Nação na realidade da sua vida colectiva.

Mas, como afirmou também o Sr. Deputado (ao tempo) José Saraiva:

A Nação é mais que a soma aritmética dos indivíduos, mas também é mais que a soma aritmética das instituições. Há interesses que são de todos, mas que nenhum grupo colocado dentro da sua finalidade institucional pode interpretar. Não vejo a legitimidade de nenhuma corporação, em especial para se ocupar, por exemplo, de problemas ligados com a unidade do mundo português. A legitimidade para votar aí vem do simples facto de ser português, ou seja, é anterior a qualquer enquadramento corporativo.

Sendo assim, entendo que são «elementos estruturais da Nação» sem, aliás, a explicarem cabalmente - os cidadãos, as famílias, as autarquias locais e os organismos corporativos.
No local próprio se devem inserir os preceitos próprios.
De outro modo, quantos e quais são os «elementos estruturais da Nação» a que se refere o corpo do actual artigo 5.º ou o § 1.º das propostas governamental e da Câmara (Corporativa, e da nossa comissão eventual?
Serão esses mi serão outros ao sabor dos interesses, interpretações e conveniências de cada qual? E quem os define? Fica ao sabor de cada um?
É por isso que dou também a minha aprovação ao § 8.º deste artigo 5.º em apreciação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, continua em discussão a proposta de alterações ao artigo 5.º

Pausa.

O Sr. Presidente:-Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir esta proposta, passaremos à votação. E como, do debate, não me pareceu deduzir que VV. Ex.ªs queiram fazer diferença entre os vários elementos da proposta, ponho à votação, conjuntamente, a proposta de alterações relativamente ao corpo do artigo e aos seus §§ 1.º, 2.º e 3.º

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos passar ao artigo 6.º, em relação ao qual há também uma proposta de alterações que vai ser lida.

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Foi lida, é a seguinte:

TÍTULO I

Artigo 6.º

Nos termos regimentais, propomos que os n.ºs 1.º e 3.º do artigo 6.º da Constituição Política passem a ter a seguinte redacção:

Art. 6.º ..................
1.º Promover a unidade e estabelecer a ordem jurídica da Nação, definindo, fazendo respeitar e assegurando o exercício dos direitos, liberdades e garantias impostos pela moral, pela justiça ou pela lei em favor das pessoas, das famílias, das autarquias locais e das pessoas colectivas, públicas ou privadas.

............................

3.º Promover o bem-estar social, procurando assegurar a todos os cidadãos um nível de vida de acordo com a dignidade humana.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Coita - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Coita Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Crua de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

O Sr. Presidente: - Está em discussão. Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Cotta.

O Sr. Almeida Cotta: - Sr. Presidente, eu queria apenas chamar a atenção da Câmara Corporativa para o seguinte: esta proposta de alteração ao artigo 6.º da Constituição Política foi apresentada pelo projecto de lei n.º 6/X e foi acolhida, julgo que, se não na sua completa letra, pelo menos no seu completo espírito, pela comissão eventual.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: -Continuam em discussão as propostas de alteração ao artigo 6.º
Tem a palavra o Sr. Deputado Vaz Pinto Alves.

O Sr. Vaz Pinto Atoes: - Sendo a soberania do Estado limitada pela moral e pelo direito (artigo 4.º), a lei constitucional deverá definir quais os domínios em que é legítimo o seu exercício; fixar ao Estado fins preciosos; atribuir-lhe incumbências e deveres determinados. Ora, o artigo 6.º em discussão impõe .ao Estado certos fins que são, no seu n.º l, estabelecer a ordem jurídica e fazê-la respeitar pela segurança. Quer dizer: ao enunciar as linhas mestras da concepção do Estado nas suas relações com os elementos estruturais e pluralistas da Nação pretende-se expressar e reforçar todo um conjunto de directrizes e circunstâncias que integram um Estado social de direito, dentro da concepção corporativa do regime, no respeito pela moral, pela justiça e pela lei, garantindo a defesa do exercício dos direitos legítimos das pessoas, das famílias, das autarquias e das pessoas colectivas. Incumbências como instrumento político da realização dos interesses, nacionais, e que não traduzem, por certo, uma enumeração exaustiva, pois vamos encontrar noutros locais atribuições que ao Estado são cometidas a fim de assegurar a realização de tarefas e necessidades colectivas (artigos 12.º, 14.º, 10.º, 22.º, 31.º, 32.º, etc.). Esta disposição foi introduzida pela comissão eventual nomeada para o estudo da revisão, como resultado do contributo dos autores do projecto n.º 6/X, aproveitando-se assim, como de resto, se procurou fazer noutros passos dos projectos, as sugestões propostas pelo referido projecto para este artigo.
Outrossim, o n.º 3 do artigo a que nos vimos reportando consagra outra sugestão do projecto n.º 6/X.
Fórmula que melhora substancialmente a actual disposição constitucional e traduz uma oportuna directriz que mais se ajusta às actuais preocupações em matéria de política geral e social. Bem-estar social como um dos fins do Estado, que tem de chamar a si a tarefa de estimular a satisfação das necessidades colectivas e que se atinjam as metas de um nível de vida compatível com as profundas exigências da dignidade humana.
E efectivamente uma redacção mais feliz, na medida em que usa uma linguagem que não aflora distinção de «classes mais desfavorecidas», quando o que está em causa é assegurar um digno padrão de vida a todos os portugueses em coexistência com o princípio da liberdade individual, dentro do seu uso legítimo e limitado pelos interesses do bem comum.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Alberto Alarcão: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Alarcão.

O Sr. Alberto Alarcão: - Sr. Presidente: Uma das funções fundamentais de todo o Estado moderno que se preze é o de assegurar aos cidadãos e às famílias o bem-estar social - bem-estar que não se resume apenas na busca de melhores condições de vida material, mas tem componentes espirituais que, de igual modo, importam ao homem, a todos os homens, para sua realização pessoal e comunitária, para felicidade em sua vida social. A prossecução do bem-comum, a efectivação do bem-
estar geral exercita-se pela justiça social, que não dispensa, aliás, a promoção económica dos países.
Anteriormente, ou seja, no regime liberal individualista, era doutrina corrente que a actividade de um governo se limitava apenas a garantir a propriedade, a liberdade e a ordem entre os indivíduos a que presidia. Não lhe competia, portanto, interferir na economia nem ocupar-se, directa ou indirectamente, dos casos concretos, das pessoas em particular, sendo a sorte e o destino destas entregues aos caprichos da fortuna e da incerteza, determinada e regida pelo poder do mais forte, pela astúcia dos mais hábeis, pelo arrojo dos mais intrépidos e mais audazes; ou então uns poucos eram confiados à caridade.
Era a lei do mais forte, do fatalismo económico, que impendia fatalmente sobre o homem; algo da herança atávica da selva, do homem oriundo do gorila. Era como que a lei da selecção das espécies que Darwin descobriu regendo o reino animal, aplicada, no campo económico, ao género humano.
Hoje, porém, esta concepção encontra-se ultrapassada. E a evolução da sociedade rumou por uma dupla via. Uma, o socialismo, por reacção ao liberalismo económico, quer encarregar o Estado de todos os cuidados de que necessita o cidadão (por incompetente que o acha), confiando para isso àquele toda a propriedade da qual despoja o particular.
A outra corrente, que parece ser equilibrada e, segundo o senso comum das gentes, se mantém num meio e justo termo, a igual distância do liberalismo e do socialismo,

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pretende ensinar-nos que a função essencial de um governo responsável é não só garantir a liberdade e a ordem, mas procurar, através de todos os meios ao seu alcance, o bem-estar, a felicidade integral (dentro do relativismo humano), de todos e cada um dos governados. Constitui, assim, seu dever inalienável arrancar os indivíduos ao destino cego, das mãos injustas e egoístas, para os proteger por meio de uma razão clarividente, lúcida, equitativa e justa, tanto dos abusos e prepotências dos mais fortes como da tirania de um Estado omnipotente e infalível que, sob a capa dos benefícios materiais, despoja o homem do que ele tem de mais digno, alto e inalienável.
Pois o bem geral não consta apenas de ordem e liberdade, mas também, essencialmente, de um mínimo de conforto e dignidade de que todo o cidadão possa sempre dispor e usufruir.» (Angelo dos Santos, O Estado Social. Analiso à Luz da História, Lisboa, ed. do autor, 1970.)
Nos países «onde a industrialização e o aparecimento do proletariado se foram processando lentamente, desde os meados do século XIX, dentro de quadros políticos e jurídicos tradicionais e com surpresa para instituições impróprias e inadequadas a esses novos aspectos da vida, a publicização dos problemas da economia e do trabalho operou-se com dificuldade, com resistência e com dor».
«Mas em Portugal», continua o Sr. Presidente do Conselho, em discurso pronunciado a 22 de Maio de 1969 na União de Grémios dos Comerciantes do Porto, «pôde colher-se a experiência alheia. A Constituição de 1933 corresponde aos alvores da nossa fase industrial e ia presidir aos passos mais largos do nosso moderno desenvolvimento, com as suas repercussões sociais. O Estado corporativo foi, pois, concebido como fórmula política, onde os produtores desde logo ocupam lugar destacado [porventura até demasiado destacado de início] e onde as preocupações de justiça social são fins colectivos fundamentais. Como já tive ocasião de dizer, o Estado corporativo é um Estado de justiça social. (Marcelo Caetano, Pelo Futuro de Portugal, Lisboa, Ed. Verbo, 1969, pp. 190 e 191.)
E pretende converter-se num «Estado social». Social, mas não socialista.
Como haveria igualmente de reconhecer, em discurso proferido no Palácio Mauá, de S. Paulo, em sessão promovida pelas associações económicas desse estado brasileiro, «hoje em dia o Estado não pode deixar de ocupar posição-chave na economia nem de regular as actividades económicas no sentido de as encaminhar para maior benefício público e maior consciência da justiça social». (Idem, ibidem, p. 254.)
E na sua segunda palestra pela rádio e televisão, em 10 de Fevereiro de 1969, havia reconhecido:

Há que promover o progresso de uma Nação desejosa de recuperar atrasos, fomentando a riqueza, melhorando a distribuição dos rendimentos, valorizando cada vez mais os homens, procurando recursos que tornem isso possível, e tudo sem destruir equilíbrios cuja rotura possa abrir crises de dificílima solução. (Idem, ibidem, p. 86.)
Para que todos os portugueses possam ter melhores condições de vida é preciso que a Nação seja mais rica produzindo mais bens. Só se reparte o que há. E não se pense que bastaria dividir igualmente aquilo que neste momento existe para passar-se a viver melhor. O bem-estar de um país não depende do gozo momentâneo de algumas comodidades, mas do progresso na produção, que só a conjugação constante do capital, da técnica e do trabalho pode assegurar. (Idem, ibidem, p. 87.)
Temos de escolher entre a estagnação e o progresso, e daí resultam certas opções difíceis. Mas se as não tomamos, ficamos eternamente presos a situações ultrapassadas. Há que enfrentar tempos novos, e isso pode implicar sacrifícios. Mas não devemos hesitar quando se trate de abrir caminhos para o bem-estar e educação populares. Isto para mim é um dogma. Posso ter de avançar devagar, por falta de meios, mas procurarei sempre avançar. (Idem, ibidem, p. 103..)

Haveria de comunicar mais tarde, em sua terceira palestra pelos meios áudio-visuais de comunicação social:

[...] mau grado as dificuldades apontadas se procurará manter e, se possível, acelerar o ritmo da política social que acompanhe, e até estimule, o desenvolvimento económico e assegure mais equitativa distribuição de rendimentos. (Tdem, ibidem, pp. 61-62.)

Não se estranhará, portanto, que em histórico discurso, proferido da varanda da Câmara Municipal do Porto, :i 21 de Maio de 1969, houvesse afirmado:

O Estado deve tomar resolutamente na sua mão os comandos da vida económica para a nortear, para a impulsionar, para a disciplinar. E sabemos como é grande o risco desse entorpecimento quando as estruturas se anquilosam na rigidez do estatuto legal e as funções se cumprem ao ritmo da burocracia.
É por isso que defendo um Estado social - mas não socialista. Social na medida em que coloque o interesse de todos acima dos interesses dos grupos, das classes ou dos indivíduos. Social por fazer prevalecer esse interesse mediante a autoridade que assente na razão colectiva. Social enquanto procura promover o acesso das camadas deprimidas da população aos benefícios da vida moderna e proteger aqueles que nas relações de trabalho possam considerar-se em situação de fraqueza. Mas não socialista, pois que se pretende conservar, dignificar, estimular até, a iniciativa privada e animar as empresas a fazer aquilo que o Estado nunca poderá realizar sózinho.
Creio, meus senhores, que estamos de acordo. Como estamos de acordo em que a Administração cultive cada vez mais o espírito de serviço público, isto é, a ideia de que existe para servir o público como instrumento de realização do bem comum. (Idem, ibidem, pp. 162 e 163.)

Ao Estado incumbe, pois, promover o bem-estar social.
«O Estado corporativo que a nossa Constituição consagra é, necessàriamente, um Estado social, isto é, um poder político que insere nos seus fins essenciais [e deles estamos agora a cuidar] o progresso moral, cultural e material da colectividade, numa ascensão equilibrada e harmoniosa que, pela valorização dos indivíduos e pela repartição das riquezas, encurte distâncias e dignifique o trabalho» (idem, ibidem, p. 24), já o havia S. Ex.ª afirmado, a 10 de Outubro de 1968, ao receber em audiência neste Palácio de S. Bento os presidentes das corporações.
Ao Estado incumbe, pois, não apenas passivamente «zelar pela melhoria das condições das classes sociais mais desfavorecidas [...]», como a Constituição ainda hoje consagra, mas activamente «promover o bem-estar social, assegurando a todos os cidadãos um nível de vida de acordo com a dignidade humana».

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E nós fomos eleitos aceitando de algum modo essas condições de propositura:

É preciso que, cá dentro e lá fora, fique bem claro se o povo português prefere um clima de ordem pública e de paz social em que as reformas necessárias ao fomento do Pais, à promoção social e ao bem-estar dos Portugueses vão sendo feitas com resolução e com firmeza, mas com segurança também, ou a turbulência revolucionária de que se não pode esperar mais do que violência, despotismo, confusão e, afinal, miséria e fome.
Estas são as opções fundamentais que neste momento são propostas aos Portugueses [...] (Idem, t bufem, pp. 318 e 319.)

Estas foram, efectivamente, as opções postas lá fora, ao eleitorado português, pelo Sr. Presidente do Conselho em sua quinta palestra pela rádio e televisão, nas vésperas do acto eleitoral que nos conferiu o mandato.
Todos nós conhecemos a resposta:

É indubitável que o País deseja continuidade da ordem, da paz social, da moeda estável, do progresso económico seguro, da defesa do ultramar.
Mas é patente igualmente que todos desejam mais rapidez nas decisões, mais vivo ritmo no desenvolvimento económico e cultural, mais directo ataque às questões fundamentais de que depende o bem-estar geral. (Idem, ibidem, p. 67.)

Iremos agora cá dentro, nesta Assembleia, trair a confiança do eleitorado e rejeitar as premissas da opção que nos conferiu o mandato?
Quero crer que não. Mas na liberdade, ao critério da consciência de cada qual, deixo a resposta...
Não me parece que careça, por minha parte, de maior ou melhor justificação.
Estou tranquilo.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão a proposta de alterações ao artigo 6.º, n.ºs 1.º e 3.º
Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir esta proposta passaremos à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos passar ao artigo 7.º, que vai ser lido.

Foi lido. É o seguinte:

Foi lido. J3 o seguinte:

TITULO II

Artigo 7.º

Nos termos regimentais, propomos que o artigo 7.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:

Art. 7.º A lei determina como se adquire e como se perde a qualidade de cidadão português. Este goza dos direitos, liberdades e garantias consignados na Constituição, salvas, quanto aos que não sejam nacionais de origem, as restrições estabelecidas na Constituição e nas leis.
§ 1.º São privativas de «portugueses originários as funções de Presidente da República, de Conselheiros de Estado, de Deputados e de Procuradores à Câmara Corporativa, de membros do Governo, de juizes dos tribunais supremos, de procurador-geral da Republica, de governadores das províncias ultramarinas, de agentes diplomáticos, de oficiais generais das forças armadas e a participação no colégio eleitoral para a designação do Presidente da República.
§ 2.º Os estrangeiros gozam em Portugal dos direitos e garantias reconhecidos pela Constituição aos Portugueses, se a lei não determinar o contrário. Exceptuam-se os direitos «políticos, salvo o exercício de funções públicas com carácter predominantemente técnico, e os direitos públicos que se traduzam num encargo para o Estado, observando-se, porém, quanto aos últimos, a reciprocidade de vantagens concedidas aos súbditos portugueses por outros Estados.
§ 3.º Sob reserva de igual tratamento era favor dos portugueses no Brasil, os cidadãos brasileiros podem ser equiparados aos nacionais para o efeito do gozo de direitos, exceptuados aqueles a que se refere o § 1.º deste artigo; o exercício de- direitos políticos, porém, só será permitido aos cidadãos brasileiros que tenham a sua residência principal e permanente em território português.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotta - José Gonçalves de Procura - João Duarte de Oliveira -António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Cotta Agostinho Dias - Bento Benolicl Levy-Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Vcloso - José Maria de Castro Salazar - Ãlvaro Filipe Barreto de Lara.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Agostinho Cardoso: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Cardoso.

O Sr. Agostinho Cardoso: -Sr. Presidente: Aproveito esta oportunidade para congratular-me vivamente pelo significado que no plano das realidades assume o § 3.º deste artigo, que na revisão constitucional vamos votar - como afirmação e confirmação da existência de uma comunidade luso-brasileira.
Orgulho-me de ver no Brasil o país irmão, rico de potencialidades, voltado ao progresso e ao futuro, que lhe aparece rico de promessas e de esperanças.
Orgulho-me de ver no Brasil o maior país católico do Mundo, que herdou a nossa fé cristã e a fé dos nossos antepassados comuns.
Orgulho-me de ver como no Brasil a língua portuguesa que vamos também em comum celebrar em 1972, na glorificação de Camões - a língua portuguesa dizia - ali soube assimilar e absorver os milhares e milhares de emigrantes falando outras línguas.
Orgulho-me porque a existência do Brasil no Mundo é o testemunho incontestado da capacidade realizadora, no passado, de uma política que hoje firmamos com sangue, suor e lágrimas, no ultramar português.
Orgulho-me, finalmente, porque o Brasil é a afirmação do luso-tropicalismo de que nos fala Gylberto Freire de um estilo de estar no Mundo através dos séculos e de permanecer no Mundo em todos os continentes, daquilo, afinal, a que se pode e tem o direito de chamar lusitanidade.

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O Sr. Roboredo e Silva: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Roboredo e Silva.

O Sr. Roboredo e Silva: -Sr. Presidente: Volto, tal como no que respeitou ao artigo 5.º, a fazer um comentário. Não é, por consequência, qualquer proposta, que deixaria à apreciação da Assembleia, como disse há pouco, e principalmente à apreciação da nossa comissão eventual.
Esse comentário refere-se nomeadamente ao § 1.º do artigo 7.º e também ao § 3.º do mesmo artigo.
O comentário é o seguinte:
§ 1.º do artigo 7.º:
Vedar o acesso aos postos de oficial general das forças armadas aos portugueses não originários pode corresponder, em meu juízo, a desviar vocações da carreira das armas, e nos tempos que correm essas vocações já são cada vez mais raras.
Por outro lado, não se me afigura curial que possam ser admitidos nas escolas militares, se é que sem aquela possibilidade de acesso a frequência de tais escolas os possa interessar, sendo-lhes assim permitido atingir o posto de coronel, que não lhes fica vedado.
Nesta hipótese houve tempo mais que .suficiente para avaliar das suas qualidades militares e de patriotismo e lembro que ao generalato só se acede por selecção e decisão do Governo.
Não me parece favorável aos interesses do País esta disposição.
§ 3.º do artigo 7.º:
Afigura-se-me, quanto aos cidadãos brasileiros, que bastaria dizer que tenham residência em território português, omitindo-se as palavras principal e permanente, que nem me parecem coerentes, pois, se a residência é permanente, não é principal nem secundária, é apenas residência.
Tenho dito.

O Sr. Vaz Pinto Alves: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vaz Pinto Alves.

O Sr. Vaz Pinto Alves: - Sr. Presidente: Poucas palavras devo pronunciar depois do que aqui foi dito. E sómente para acentuar que no § 2.º estabelece-se o princípio da equiparação entre nacionais e estrangeiros, salvos ,os limites aí imediatamente impostos (direitos políticos, direitos públicos que se traduzam num encargo para o Estado) e aqueles que sejam estabelecidos pela lei. No § 3.º fixa-se a regra da equiparação entre Portugueses e Brasileiros, mas condicionada pela reserva de reciprocidade que no § 2.º se reporta apenas aos direitos públicos que envolvam encargo para o Estado.
E evidente que a intenção é a de instituir um regime mais favorável para os Brasileiros e que a reserva de reciprocidade só deve funcionar quanto aos direitos de que os estrangeiros em geral se encontrem excluídos. Mas a fórmula usada é susceptível de sugerir outra coisa.
Poderia dizer-se: «Sob reserva de igual tratamento em favor dos portugueses no Brasil, os cidadãos brasileiros podem ser equiparados aos nacionais para o efeito do gozo de todos os direitos», exceptuados aqueles a que se faz referência no § :1.º e última parte do § 3.º
Queria acrescentar ainda, Sr. Presidente, de que é com vivo júbilo que vejo consagrada na nossa lei fundamental uma disposição que tende cada vez mais a aproximar os laços de solidariedade em todos os seus aspectos entre
Portugal e o Brasil. Solidariedade e comunidade; que seja vivida, hora a hora, minuto a minuto, para engrandecimento e aproximação das duas nações. Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Duarte de Oliveira: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para me referir apenas ao § 3.º, pois é quanto a mim a única inovação digna de realce que também é de regozijo para todos nós como representantes legítimos do povo português.
Hoje será consagrado um autêntico estatuto do cidadão luso-brasileiro. Reservas recíprocas e materiais impedem um estatuto jurídico e político pleno. São exigências de duas soberanias distintas, paralelas.
A aprovação deste parágrafo será a consagração de uma autêntica comunidade luso-brasileira, de que tanto se tem í alado, sem resultados concretos verdadeiramente significativos, como acontecerá se aprovarmos a alteração. As reservas são recíprocas, pois os artigos 145.º, § único, e 199.º da Constituição brasileira reservam para cidadãos brasileiros exactamente aquilo que a nossa Constituição, no § 1.º, reserva para cidadãos portugueses.
Aprovo e congratulo-me.

O Sr. Alberto Alarcão: - Peco a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Alarcão. O Sr. Deputado Roboredo e Silva, se não se importa, como é a segunda vez, falará depois dos que se inscreveram para falar a primeira.

O Sr. Alberto Alaroão: - Sr. Presidente: Congratulamo-nos com a proposta de aditamento do § 3.º do artigo 7.º da proposta governamental, que propõe conceder aos cidadãos brasileiros, sob reserva de igual tratamento e excluídas certas funções privativas de portugueses ditos «originários», equivalência de direitos aos dos nacionais portugueses, inclusive os de cidadania em matéria política, no caso de terem «residência principal e permanente em território português».
Se na transitoriedade e mobilidade da vida algumas dúvidas podem surgir quanto à interpretação do conceito «residência permanente», que deve querer referir-se mais ao cidadão residindo permanentemente que à sua própria habitação - não é esta que está em causa em termos de exercício de direitos políticos -, menos justificado se nos afigura também a nós, como u Câmara Corporativa, a adjectivação «principal» que a antecede.
O que vincula a presença ao território português do cidadão brasileiro, e a sua possível e assaz fácil integração e participação social e cívica, não será tanto o de tratar-se de «residência principal» ou não - e importaria definir, e por quem, o que se entende por «principal» -, mas o carácter «permanente» ou «habitual» (para usar a designação estatisticamente consagrada nos recenseamentos populacionais) da sua presença em território português.
Estas... algumas dúvidas de expressão formal que me surgiram e muito grato ficaria se viessem a ser posteriormente consideradas pela nossa prestigiosa Comissão de Legislação e Redacção, a quem, desde já, antecipadamente dou a minha concordância.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Roboredo e Silva.

O Sr. Roboredo e Silva: - Apenas duas palavras, Sr. Presidente, sómente para dizer que eu não desconhecia que estávamos a tratar com reservas, de reciprocidade.

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Simplesmente, o nosso caso, presentemente, é tão flagrante sobre carência de concorrentes às escolas militares, que uma abertura neste campo parecia-me extraordinariamente favorável. Ia ao encontro, primeiro, das nossas necessidades, segundo, mostrávamos, na verdade, aos vários países (porque não estamos só a tratar de Brasileiros, estamos a tratar de todas as outras nacionalidades) uma abertura que, a meu ver, poderia ser ponderada e reconhecida como uma concepção de facilidades e de direitos que não eram usuais nem eram apresentados pelos outros.
Muito obrigado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Tenreiro.

O Sr. Henrique Tenreiro: - Sr. Presidente: Como já falei na generalidade, quero-me congratular, mais uma vez, pela feliz ideia do Governo em introduzir no texto da proposta igual tratamento para os cidadãos brasileiros equiparados aos nacionais e, a mim, que me ligam laços profundos de amizade e de família a brasileiros, é com o maior júbilo que dou o meu voto, do coração, ao artigo, 7.º, § 3.º

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cunha Araújo.

O Sr. Cunha Araújo: - Sr. Presidente: Embora a muito me arrisque ao falar de improviso sobre matéria que tenho de primordial importância, entendo que naquilo em que está posto o coração, é justamente com o coração que devemos falar, pondo na nossa boca, como forma de exprimir, sentimentos que estão muito dentro de nós.
Nestas circunstâncias, embora me não sinta à altura de poder aqui definir em palavras precisas o alto significado, o transcendente significado, do que se encontra estabelecido no § 3.º do artigo em discussão, pois não quero deixar este momento sem deixar bem vincados nesta Câmara os meus sentimentos de inteira adesão aos sentimentos fraternos que inspiraram o legislador, nesta reciprocidade de direitos entre cidadãos portugueses e brasileiros.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Ramos.

O Sr. Oliveira Ramos: - Sr. Presidente: Não quero deixar passar a ocasião em que se vai conceder o direito de cidadania, em Portugal, aos Brasileiros, para fazer algumas considerações sobre o assunto.
E isto, fundamentalmente, por duas razões. Em primeiro lugar estive durante vários anos directamente ligado ao ensino da história do Brasil na Universidade do Porto, em segundo lugar porque me ligam ao Brasil laços de sangue. Portanto, é com sumo júbilo que eu, eleito pela região nortenha do País, origem de grandes massas de luso-brasaleiros, aqui me congratulo com o articulado em discussão.
E quais as razões desse júbilo? Quais os motivos que levam o povo português a comungar da decisão do Governo?
Fundamentalmente, creio eu, é a existência, por um lado, de laços notórios de sangue e de história, entre Portugueses e Brasileiros, laços através dos séculos vincados, primeiro por uma história comum, depois, pela prática da mesma religião e pelo uso de idêntica língua, enriquecida pelo contributo de uns e de outros (aí está a significá-lo, por exemplo, a pujante literatura brasileira). Por outro lado, não resta dúvida que entre Portugueses e Brasileiros existem, para além da história e da língua, que fundamentalmente os unem, afinidades nos comportamentos vitais. Finalmente, uns e outros, comungam na esperança de construir, hoje, uma comunidade u escala do futuro. E sinal da vitalidade, da existência concreta de tal comunidade, é justamente a promulgação destas medidas, na sequência de outras já aprovadas no Brasil.
Estas, principalmente, as> razões que mu levaram a usar da palavra e que me levam a apoiar, sinceramente, a medida em discussão.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão o artigo 7.º Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum de VV. Ex.ª deseja usar da palavra para discutir a proposta de alteração ao artigo 7.º, pô-la-ei à votação.
Ponho primeiramente ú votação a proposta de alterações abrangendo o corpo do artigo e os seus §§ 1.º e 2.º

Submetidos à votação, foram aprovados. O Sr. Cancella de Abreu: - Peço a palavra. O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Cancella de Abreu: - Sr. Presidente: Para a aprovação do § 3.º, dado que o Regimento desta Câmara não permite que seja aprovado por aclamação, proponho a V. Ex.ª que a aprovação seja feita em pé pelos Srs. Deputados.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Ponho à votação a redacção proposta para o § 3.º do artigo 7.º e, deferindo, com muito gosto, o requerimento do Sr. Deputado Cancella de Abreu, peço aos .Srs. Deputados que aprovam a mesma redacção para o § 3.º do artigo 7.º o favor de se porem de pé; os que a rejeitam conservam-se sentados.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vamos agora passar ao artigo 8.º, que compreende propostas de alterações a vários números e a alguns parágrafos. Como se trata de matéria extensa, se VV. Ex.ª não me manifestarem outro desejo, a minha intenção é pôr primeiramente à discussão as alterações aos n.º 8.º, 9.º, 10.º, 11.º, 19.º e 21.º do artigo 8.º
Pô-los-ei à discussão e seguidamente à votação.
Em separado discutiremos e votaremos os parágrafos do mesmo artigo incluídos na proposta de alterações.
Vai ser, portanto, lida a proposta de alterações ao artigo 8.º, que se refere aos vários números do mesmo artigo.
Foram Tidos. São os seguintes:

TITULO II

Artigo 8.º

Nos termos regimentais, propomos que o artigo 8.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:
Art. 8.º .......................................................................
................................................................................
8.º Não ser privado da liberdade pessoal nem preso preventivamente, salvo nos casos e termos previstos nos §§ 3.º e 4.º;

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9.º Não ser sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare puníveis o acto ou omissão, bem como não sofrer pena mais grave do que a fixada ao tempo da prática do crime, nem medida de segurança fora dos casos previstos em lei anterior;
10.º Haver instrução contraditória, dando-se aos arguidos, antes e depois da formação da culpa e para aplicação de medidas de segurança, as necessárias garantias de defesa;
11.º Não haver pena de morte, salvo no caso de beligerância com país estrangeiro e para ser aplicada no teatro da guerra, nos termos da lei penal militar, nem apenas ou medidas de segurança privativas ou restritas da liberdade pessoal, com carácter perpétuo, com duração ilimitada ou estabelecidas por períodos indefinidamente prorrogáveis, ressalvadas as medidas de segurança que se fundem «m anomalia psíquica e tenham fim terapêutico;
19.º O direito de resistir a quaisquer ordens que infrinjam os direitos, liberdades e garantias individuais, se não estiverem legalmente suspensos, e de repelir pela força a agressão particular, quando não seja possível recorrer à autoridade pública;
21.º Haver recurso contencioso dos actos administrativos definitivos e executórios que sejam arguidos de ilegalidade.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a proposta de alterações aos n.ºs 8.º, 9.º, 10.º, 11.º, 19.º e 21.º do artigo 8.º da Constituição, a qual está subscrita pelo Sr. Deputado Albino dos Reis e outros.

Tem a palavra o Sr. Deputado Cotta Dias.

O Sr. Cotta Dias: - No texto aprovado na comissão quanto a este preceito fundamental inscrevem-se importantíssimas inovações, cujo significado já foi posto em realce no debate na generalidade.
Pela primeira vez, depois de em 1951, se haver acrescentado à enumeração dos direitos constitucionais o direito ao trabalho, são propostas alterações para o artigo 8.º
Terá interesse notar aqui, aos que não fizeram parte da comissão, que nela foi sensível a preocupação de ir tão longe quanto possível na defesa constitucional da situação jurídica dos indivíduos. Algumas das modificações «sugeridas mão foram, no entanto, aceiteis, porque, como já aqui foi dito e repetido, por um lado, a revisão dos direitos .e garantias individuais não pode ser feita apenas no plano constitucional e porque, por outro, a evolução neste domínio tem de efectuar-se com a prudência suficiente para que o caminho encetado não acabe por ficar decisivamente comprometido.
Não interessa que as constituições afirmem solenemente direitos e princípios que depois não possam ser respeitados na prática, nem que tolham os movimentos do legislador a ponto de impedir o ajustamento às necessidades e circunstâncias. As constituições têm de manter um mínimo de ajustamento com as realidades. Quando umas e outras entram em conflito, são sempre as últimas que acabam por prevalecer. E vem assim a perder-se mesmo aquilo que se poderia ter conquistado com moderação.
As inovações aceites, já aqui o disse, parecem-me ser aquelas que rigorosamente correspondem às necessidades e às possibilidades do momento. (Mas nem por isso deixam de representar, como também tive oportunidade de assinalar, um larguíssimo progresso.
Previram-se sobretudo garantias precisas das pessoas perante o poder, em matérias fundamentais como as da duração das penas e medidas de segurança, da prisão preventiva e da impugnação dos actos administrativos, que estou em dizer que pouca gente esperaria que o Governo propusesse.

O Sr. Ulisses Cortês: - Peço a palavra. O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Ulisses Cortês: - Sr. Presidente: Os preceitos em discussão foram objecto de ampla, viva e exaustiva análise da comissão eventual e não vou reiterar com desenvolvimento o exame já efectuado com a necessária amplitude.
A importância, direi mesmo a transcendência, dos preceitos em debate exige, no entanto, que se lhes dedique mais apurada atenção.
Dou, evidentemente, a minha aprovação ao texto da comissão, na qual se consagram solenemente alguns princípios essenciais sobre direitos, liberdades e garantias individuais: as condições de privação da liberdade pessoal, nomeadamente no que respeita à prisão preventiva; a irretroactividade da legislação criminal, e a instrução contraditória.
Desejo, todavia, aproveitar a oportunidade para uma declaração de princípio que se impõe à minha consciência.
No n.º 11.º do artigo 8.º admite-se a pena de morte, no caso de beligerância com país estrangeiro e para ser aplicada no teatro das operações.
Ora, Portugal é um país pioneiro na abolição da pena de morte.
O movimento generoso e idealista que se registou em Portugal no sentido da humanização das penas iniciou-se no Acto Adicional, que suprimiu a pena última para os crimes políticos, e pela Lei de 1867, que a eliminou para os crimes civis.
A Constituição de 1911 aboliu-a de modo total e radical, dispondo que ela em caso algum poderia ser estabelecida. No entanto, em 1916, por virtude da nossa participação na 1.ª Guerra Mundial, essa pena foi restaurada, em caso de beligerância com país estrangeiro e para ser aplicada no teatro das operações.
A verdade é que até hoje não foi aplicada, se são exactas as minhas fontes de informação.
Citarei, a propósito, a excelente monografia sobre o problema, do Plrof. Binaga da Cruz:
Seria com a maior satisfação de consciência que eu veria eliminada a pena capital de entre as sanções penais, tanto mais que a experiência mostra que no nosso país ela representa uma inutilidade que macula a pureza do nosso estatuto fundamental.
Acresce que na sistemática calúnia internacional contra Portugal somos apontados entre as Nações que conservam a pena de morte, esquecendo deliberadamente os nossos títulos de precursores da doutrina abolicionista que reivindicamos com verdade e orgulho.
Afirmei a minha posição como político e como jurista.
Exprimi um voto profundo da minha sensibilidade.
Dispensar-me-ei, no entanto, de formular qualquer proposta de alteração.
Muito obrigado.

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O Sr. Roboredo e Silva: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Roboredo e Silva,

O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Hoje já estou a falar de mais, o que é contra os meus hábitos, todavia o assunto é tão melindroso que não poderia deixar passá-lo em julgado.
Todos sabemos que fomos pioneiros da abolição da pena de morte entre os países civilizados. Só fixámos e tínhamos, a meu ver, que introduzir neste texto que a pena de morte era apenas aplicada no teatro de operações e em caso de guerra com país estrangeiro, porque senão poderia ser duvidosa a interpretação que havia pena de morte em Portugal.
Eu devo informar a Assembleia que a este respeito não estava preparado com dados positivos, mas, tanto quanto fiei, só há um país civilizado, um país do Ocidente, onde não há pena de morte em tempo de guerra. De resto, todos os outros o têm.
E não vale a pena dizer os que têm a pena de morte sem ser em caso de guerra, pois isso é sabido de todos, e são muitíssimos.
E, se formos para os países recentes, para os chamados jovens países, então sabemos que em todos ela existe. Mata-se a torto e a direito, como quem vai ali comer um prato de lentilhas.
Mas indo directamente ao caso da pena de morte em campanha, em tempo de guerra e no teatro de operações, Sr. Presidente, eu penso que o caso é muito sério.
VV. Ex.ªs sabem que através de um crime de traição em campanha e no teatro de operações a traição de um só homem pode liquidar a vida de milhares de soldados, pode fazer perder uma batalha, e nessa batalha pode, inclusivamente, perder-se a independência.
Como é que se pode sugerir que se evite a pena capital, que terá de ser aplicada no próprio teatro de operações por um tribunal marcial criado para esse efeito e onde o traidor é fuzilado imediatamente?
O Código de Justiça Militar prevê cautelosamente todos os casos em que a pena de morte pode e deve ser aplicada no teatro de operações, em campanha.
E todos esses casos, se VV. Ex.ªs se forem debruçar sobre o Código de Justiça Militar e que eu agora necessariamente não tenho de cor, todos eles, dizia, são de capital importância para a sobrevivência da Nação.
Eu não preciso dizer, pois está no espírito de nós todos, e de resto, como católico praticante que sou, não admito que outrem a não ser Deus tenha a vida dos homens na Sua mão. Mas nos (tempos que estão correndo e em casos como essa miserável sabotagem do rápido do Porto que se tivesse conseguido os seus fins, pois era no sítio escolhido que se deveriam cruzar dois comboios de passageiros, (poderia ter aniquilado, imolado a vida ide centenas
para não dizer mais de um naallhar de pessoas inocentes -, põe-se à minha consciência, mesmo à minha consciência de cristão, se num caso destes não seria para considerar quase estado de guerra ou de campanha e aplicar a pena correspondente.

O Sr. Ulisses Cortês: - Nesse caso, não é aplicada pena de morte.

O Orador: - Eu sei muito bem que não é, Sr. Deputado. Isto é um desvio, é um comentário só para dar mais força aos meus argumentos sobre o caso de guerra com país estrangeiro.
Mas a minha reacção, como militar e como cidadão, é esta: em tempo de guerra e em campanha, a pena de morte é essencial para dar o exemplo, para que não haja traidores, e traidores houve-os Sempre na terra portuguesa, infelizmente e com grande mágoa o digo.
Muito obrigado.

Vozes: - Apoiados.

O Sr. Ulisses Cortês: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Cunha Araújo: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Pediram a palavra os Srs. Deputados Ulisses Cortês e Cunha Araújo. Uma vez que já está de pé, tenha V. Ex.ª, Sr. Deputado Ulisses Cortês, a bondade de usar da palavra.

O Sr. Ulisses Cortês: - Sr. Presidente: Serão muito breves e muito sóbrias as minhas considerações.
Em primeiro lugar, quero dizer que ouvi com muita atenção e sempre com admiração as palavras judiciosas, as palavras varonis do ilustre Deputado Roboredo e Silva. Mas quero acrescentar, Sr. Presidente, que me parece que esta discussão é puramente académica, dados os termos em que pus a questão.
Eu afirmei princípios, mas imediatamente afirmei, também, que não apresentaria nenhuma proposta de alteração à Constituição.
Podia prolongar indefinidamente esta discussão. Podia dizer ao Sr. Almirante Roboredo que, tecnicamente, juridicamente, está demonstrado que a pena de morte não tem sequer eficácia para intimidação geral e para a prevenção de delinquência e que ela é uma inutilidade; que em Portugal, felizmente, há poucos traidores e isso está demonstrado pela circunstância de a lei nunca ter sido aplicada.
Mas, Sr. Presidente, não quero prolongar esta discussão. Apenas defini uma atitude de homem, de jurista, de técnico sobre o problema, que, neste momento, é vivamente agitado no (Mundo no sentido da abolição da pena de morte.
Devo informar a Câmara que, neste momento, por exemplo, existem na América do Norte mais de 800 pessoas condenadas ia morte, algumas por traição, e que essa pena não pôde ainda ser aplicada, de tal maneira é viva a reacção da sensibilidade pública.
Mas, Sr. Presidente, eu dei expressão à minha consciência, estou de bem com a minha consciência. Termino por aqui as minhas considerações.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cunha Araújo.

O Sr. Cunha Araújo: - No entendimento de que não há «lógicas jurídicas temíveis», anais apenas argumentações jurídicas irrefutáveis, depois do que, rentàvelmente, aqui foi dito acerca das liberdades individuais, a uma concepção individualista, acho que aquelas que se encontram consignadas no texto em apreciação são em muito consentâneas com o primado do social que sobretudo nos preocupa.
Nestes termos, entendo ficarmos detentores das liberdades suficientes em que o Estado não poderia ir miais além, aceite como está o princípio de que ao indivíduo terá de sobrepor-se a sociedade ema que se integra e, neste aspecto, se justificaria a pena de morte para punir os crimes que contra ela se cometam, como acaba de referir o Deputado Roboredo e Raiva, já que, tal como sucede

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com o corpo humano, devem ser amputados os membros apodrecidos, nas sociedades ou nos indivíduos, desde que comprometam a saúde do corpo.
Mas esta matéria não está em discussão, felizmente, por isso limitarei, para acabar, a dar a minha inteira aprovação na especialidade ao texto em discussão.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Roboredo e Silva: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Roboredo e Silva.

O Sr. Roboredo e Silva: - Pedia palavra, Sr. Presidente, primeiro, para agradecer ao Sr. Dr. Ulisses Cortês aquela elegância de palavras ultragentis, que já não é a primeira vez que faz favor de me dirigir em pequenos diálogos, digamos assim, que aqui temos nessa Casa.

com o corrpo -humano, devem ser amputados os membros apodrecidos, nas sociedades ou TIOS indivíduos, desde que comprometam .ª saúde do corpo.

iMas esta matéria não está em discussão, felizmente, por isso me limitarei, para acabar, a d-ar a minha inteira aprovação na especialidade ao texto em discussão.

IMuito obrigado, .Sr. Presidente.

O Sr. Roboredo e Silva: - Peço II palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Roboreido e Silva.

O Sr. Roboredo e Silva: - Pedi a palavra, Sr. Presidente, primeiro, para agradecer ao Sr. Dr. Ulisses Cortês aquela elegância de palavras ultragentis, que já não é a primeira vez que faz o favor de me dirigir em pequenos diálogos, digamos assim, que aqui temos tido nesta Casa.
Segundo: Também compreendi que V. Ex.ª só frisava princípios, como jurista e como técnico, disse. Pois respondi, também, frisando princípios, e respondi não como jurista, mas como técnico. E necessariamente que também não esqueci que V. Ex.ª não fez nenhuma proposta, limitou-se a pôr o «eu ponto de vista. Eu também não fiz qualquer «proposta, limitei-me a pôr o meu ponto de vista, até porque não está em causa alterar aquilo que está aqui no articulado.
Muito obrigado.

O Sr. Almeida Cotta: - Peço u palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Cotta.

O Sr. Almeida Cotta: - Sr. Presidente: Nesta matéria, desejaria sublinhar os progressos que nela se introduziram.
Quanto a sua consignação constitucional, nada se oferece dizer. A enumeração dos direitos é exemplificativa, outros podendo e devendo, portanto, considerar-se. Quanto ao exercício desces mesmos direitos, alguns serão objecto de formulação na lei ordinária, precisamente para que não sejam impunemente violados ou tardiamente reparados.
Ficará, portanto, ao cuidado de todos os órgãos de soberania a garantia desses direitos. Os fundamentos das posições que acerca deste assunto podem ser tomadas não se justificam em. minutos. De um lado, existe o predomínio de conceitos ideológicos na pretensão de dominarem as realidades; de outro lado, as realidades desejam seguir a par e passo com o direito em demanda da conquista das liberdades reais.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum de VV. Ex.ª deseja usar da palavra, vamos passar à votação das propostas de alteração ao artigo 8.º do título II da Constituição, subscritas pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros, que consistem em dar novas redacções aos n.º» 6.º, 9.º, 10.º e 19.º e em acrescentar um n.º 21.º ao corpo deste artigo 8.º
Submetidas à votação, foram aprovadas.

O Sr. Presidente: - Em relação ao artigo 8.º, as propostas de alterações ainda abrangem quatro parágrafos. Em relação a um destes parágrafos, o 3.º, está na Mesa uma proposta de outra alteração.
Para tornar mais cómodo o trabalho de VV. Ex.ªs, eu porei primeiro à discussão, e depois à votação, as propostas de alteração relativas aos §§ 1.º e 2.º, que vão ser lidos.
Foram lidos. São os seguintes:

Art. 8.º .......................................................................
§ 1.º A especificação destes direitos, liberdades e garantias não exclui quaisquer outros constantes da Constituição ou das leis, entendendo-se que os cidadãos deverão sempre fazer uso deles sem ofensa dos direitos de terceiros, nem. lesão dos interesses da sociedade ou dos princípios da moral.
§ 2.º Leis especiais regularão o exercício da liberdade de expressão do pensamento, de ensino, de reunião e de associação e dá liberdade religiosa, devendo, quanto à primeira, impedir, preventiva ou repressivamente, a perversão da opinião pública na sua função de força social e salvaguardar a integridade moral dos cidadãos, a quem ficará assegurado o direito de fazer inserir gratuitamente a rectificação ou defesa na publicação periódica em que forem injuriados ou infamados, sem prejuízo de qualquer outra responsabilidade ou procedimento determinado na lei.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão as propostas de alterações consignadas nestes §§ 1.º e título, que acabam de ser lidos.
Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir as alterações propostas aos §§ 1.º e 2.º do artigo 8.º, pô-las-ei à votação.
Submetidas à votação, foram aprovadas.

O Sr. Presidente: - Vamos agora passar aos §§ 3.º e 4.º, em relação aos quais, além das propostas subscritas pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros, há uma proposta apenas limitada a nova redacção do § 3.º, subscrita pelos Srs. Deputados João Duarte de Oliveira e outros.
Vão ser lidas.
Foram lidas. São as seguintes:

§ 3.º A lei poderá autorizar a prisão preventiva em flagrante delito ou por crime doloso a que corresponda pena de prisão superior a um ano e ainda nos casos em que seja aplicável medida de segurança privativa da liberdade. A prisão preventiva sem culpa formada está sujeita aos prazos estabelecidos na lei, e só pode ser ordenada havendo forte suspeita da prática do crime.
§ 4.º Fora dos casos de flagrante delito, a prisão em cadeia pública ou a detenção em domicílio privado ou estabelecimento de alienados só poderá ser levada a efeito mediante ordem por escrito da autoridade judicial ou de outras autoridades expressamente indicadas na lei, donde constem os fundamentos objectivos da prisão ou detenção, devendo em ambos os casos, submeter-se a prisão sem culpa formada a decisão de revalidação e de manutenção, ouvido o arguido,

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nos prazos estabelecidos na lei. A prisão não será ordenada nem será mantida quando possa ser substituída por quaisquer medidas de liberdade provisória, legalmente admitidas, que sejam suficientes para a realização dos seus fins. O não cumprimento das condições a que ficar subordinada a liberdade provisória poderá determinar a prisão preventiva do arguido.
Poderá, contra o abuso do poder, usar-se da previdência do habeas corpus.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotta - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Caxtelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Cotta Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro. V cioso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

§ 3.º A lei poderá autorizar a prisão preventiva em flagrante delito ou por crime doloso a que caiba pena de prisão superior a um ano. A prisão preventiva sem culpa formada está sujeita aos prazos estabelecidos no, lei e só poderá ser ordenada havendo forte suspeita da prática do crime.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 30 de Junho de 1971. - Os Deputados: João Duarte de Oliveira - José Coelho Jordão - Álvaro Barreto de Lara - Gabriel Gonçalves - Leal de Oliveira - Aníbal Mesquita - Delfim Ribeiro - Silva Mendes - Lopes da Cruz - Gustavo Neto Miranda - Vasconcelos Guimarães.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão, conjuntamente.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Duarte de Oliveira.

O Sr. Duarte de Oliveira: - Peço a prioridade para a votação da proposta de alteração subscrita por mim e por um grupo de Deputados.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª pediu a prioridade para a votação, mas a discussão ainda nem está iniciada. V. Ex.ª não deseja usar da «palavra para a discussão de qualquer destas propostas?

O Sr. Duarte de Oliveira: - Desejo usar da palavra.

O Sr. Presidente: - Então, tenha a bondade. O requerimento que V. Ex.ª inicialmente fez é na altura da votação que será oportuno apresentá-lo. Se V. Ex.ª agora deseja discutir qualquer destes textos tenha a bondade de aproveitar a oportunidade.

O Sr. Duarte de Oliveira: -Desejo defender a alteração que propus.
Em minha opinião, a comissão eventual foi até onde podia em matéria de direitos, liberdades e garantias.
Assim, considero a proposta de alteração do artigo 8.º, que agora se discute, um passo muito importante nesse capítulo.
Não é segredo para ninguém que, desde há muito, não possuímos as instituições dos países democráticos.
O caminho para lá tem de ser percorrido gradualmente, com segurança e, sobretudo, com prudência.
Colocar as leis, os textos, a, frente, para além dos factos, pode conduzir, e conduz quase sempre, a uma ruptura. É preciso, é urgente, é inteligente evitar o risco, pois, a dar-se aquela, obteríamos o efeito contrário do que se pretende.
Leis projectadas e não admitidas hoje, por precipitadas e importunas, podem ser plenas de oportunidade e aceites dentro de cinco ou dez anos.
Acima da propaganda própria, pessoal, e o desejo de agradar, está a nossa responsabilidade e a coerência política perante os interesses fundamentais do povo português.
A prudência é a virtude maior de um político, como já nos ensinava a sabedoria grega: Se és sábio, ensina-me; se és santo, reza por mim; se és prudente, governa-me.
Os Deputados têm meios de reagir contra possíveis abusos do Poder: perguntas ao Governo e todos os processos de evitar decretos inconstitucionais.
Contudo, parece-me possível a eliminação de uma disposição do § 3.º do artigo 8.º, cuja inserção no texto da proposta pode cercear liberdades que queremos ver garantidas.
Eu e um grupo de Deputados propomos a eliminação IV §, 3.º do artigo 8.º da expressão «e ainda nos casos em que seja aplicável medida de segurança privativa da liberdade».
E vamos dizer porquê:
E sabido de todos que um dos fins da prisão preventiva é evitar a repetição pelo agente de actos criminosos. Sendo assim, (deveria, in abstracto, ser admitida, quando o crime, relativamente u prática do qual existe suspeita, funcione como indício de perigosidade. Este foi o critério que levou a comissão eventual a propor a autorização de prisão preventiva, sempre que caiba aplicação de medida de segurança privativa da liberdade.
Ora, pela nossa lei, a perigosidade dos delinquentes pode justificar ou uma pena de segurança ou uma medida de segurança.
As penas de segurança são aplicáveis aos delinquentes de difícil correcção ou equiparados, e estas excedem sempre o ano, pelo que a proposta em exame as abrange na parte em que permite a prisão preventiva por crime a que caiba pena de prisão superior a um ano e não naquela parte que se refere às medidas de segurança.
As medidas de segurança são aplicáveis nos seguintes casos:

a) Casos em que a perigosidade não é indiciada por crime;
b) Casos em que a perigosidade é necessariamente indiciada pela prática do crime;
c) Casos em que a perigosidade pode ser ou não indiciada pela prática do crime, sem que, no entanto, tal indício seja indispensável.
Nos casos da alínea a) (initnputáveis, etc.), nunca pode haver lugar à prisão preventiva.
Nos casos da alínea b) (vadiagem, sem interesse de maior) e n.º 9.º do artigo 71.º do Código Penal «todos os que tiverem sido condenados por crime de associação de malfeitores, quadrilha ou bando organizado», caberá sempre a prisão maior (artigo 263.º do Código Penal),

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pelo que é inútil falar de medida de segurança, porque a prisão preventiva fundamenta-se na pena aplicável.

Portanto, o problema só tem interesse quanto aos casos da alínea c). E são eles os contemplados no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 44-579, de 19 de Setembro de 1952 (indivíduos que habitualmente comentem, favoreçam ou de algum modo facilitem o exercício da prostituição ou nela intervenham com fins lucrativos); os dos n.ºs 7-º e 8.º do artigo 71.º do Código Penal (os que favoreçam ou exercitem habitualmente a depravação ou corrupção de menores e os que adquirem usualmente ou servirem de intermediários na aquisição ou venda de objectos furtados ou produtos de crimes); os do § 2.º do mesmo artigo 71.º (alcoólicos e outros intoxicados), e ainda os dos delinquentes políticos.
Quanto aos crimes políticos, o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 40 550, de 12 de Março de 1956, estabelece que podem ser submetidos à medida de internamento em estabelecimento adequado, por período indeterminado, prorrogável por períodos sucessivos de três anos, desde que continuem a revelar-se perigosos:

1.º Aqueles que fundem associações, movimentos ou equipamentos de carácter comunista, os que exerçam actividades subversivas ou que tenham por fim a prática de crimes contra a segurança do Estado, ou que utilizam o terrorismo como meio de actuação, e bem assim aqueles que aderirem a tais associações, com eles colaborarem ou seguirem as suas instruções;
2.º Aqueles que possibilitem conscientemente as referidas actividades subversivas, fornecendo local para as reuniões, subsidiando-as ou permitindo a sua propaganda.

E ainda o artigo 8.º:

Se os arguidos forem incriminados também por crime contra a segurança do Estado, a medida de segurança a que se refere o antigo anterior será aplicada em processo penal...
Mas repare-se bem: sabemos que a perigosidade condição ante da aplicação da medida de segurança pode ser indiciada pela prática do crime, mas também pode ser indiciada sem prática de crime. Sendo assim, quanto a estes casos, ficam fora da prisão preventiva aqueles em que não há crime.
Mas então a prisão preventiva não realiza plenamente os seus fins, não é meio adequado para evitar a prática de crimes antes da declaração definitiva de perigosidade.
Haverá outros meios, não constitucionalmente limitados, quando surja absoluta necessidade de detenção em razão da perigosidade, nos raríssimos casos em que esta seja independente do crime. A prisão preventiva, nestes casos, não é, pois, indispensável e a eliminação sugerida tem a vantagem de evitar que se diga que a sua inclusão no § 3.º do artigo 8.º, quando há lugar a medida de segurança privativa da liberdade, teve em vista exclusivamente os delitos políticos, mesmo quando a estes não corresponda a pena de um ano.
E por isso que eu voto pela eliminação da expressão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Continuam em discussão as propostas de alteração. Como VV. Ex.º ouviram ler, trata-se das propostas de alteração aos §§ 3.º e 4.º do artigo 8.º e ainda daquela disposição graficamente destacada relativa ao habeas corpus, que são preconizadas pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros, e da outra proposta de alteração ao § 3.º, que é apresentada pelos Srs. Deputados João Duarte de Oliveira e outros. Continuam em discussão.
Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, vamos passar à votação.

O Sr. Albino dos Reis: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Albino dos Reis: - Os signatários da proposta da comissão não vêem qualquer razão forte para contrariar a proposta que acaba de ser defendida pelo Sr. Deputado Duarte de Oliveira. Nestas circunstâncias, eu pedia a V. Ex.ª para consultar a Câmara, se autorizava a retirada da nossa proposta.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Cancella de Abreu também tinha pedido a palavra. Tem a bondade.

O Sr. Cancella de Abreu: - Pedi-a, Sr. Presidente, só pára um esclarecimento. Aqui, no n.º 112 do Diário das Sessões, no final do artigo 8.º vem o preceito de «poderá, contra o abuso do poder, usar-se da providência do habeas corpus. Eu suponho que isto fará parte do § 4.º, mas, de tal maneira como está aqui transcrito no Diário das Sessões, separado do § 4.º e mais puxado para a esquerda, poderá parecer, ou um novo parágrafo, ou um novo numero, além do n.º 21.º Era isso que eu agradecia ser esclarecido.
Muito obrigado.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª poderia acaso ter notado, há pouco, quando mencionei os preceitos que estavam em discussão, que me referi expressamente a este preceito chamando-lhe: o preceito graficamente destacado e relativo ao habeas corpus. É que, mesmo na Constituição, esse preceito, pela sua disposição gráfica, parece solto do § 4.º Mas como é uma disposição gráfica em passagem de página, realmente a Mesa não tem aqui possibilidades de responder concretamente a V. Ex.ª A única coisa que posso dizer é que o que está em discussão são os §§ 3.º e 4.º e, por expressa indicação minha e também porque foi lido, o preceito, aparentemente solto, relativo ao habeas corpus.

O Sr. Cancella de Abreu: - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Deputado Albino nos Reis que permuta que os outros Srs. Deputados se pronunciem sobre esta matéria antes de pôr a votação o seu requerimento.

Tem a palavra o Sr. Deputado Cunha Araújo.

O Sr. Cunha Araújo: - Sr. Presidente: E uma questão de simples e pura terminologia jurídica, e com vista mais à Comissão de Legislação e Redacção, que me levou a pedir a palavra a V. Ex.ª no caso de vir a ser aprovada a proposta subscrita pelos Srs. Deputados João Duarte de Oliveira e outros, naquele ponto em que diz: ca que caiba pena de prisão superior» e que eu acharia mais apropriado se dissesse: «por come doloso, punível com pena de prisão superior a um ano». Portanto: substituir a expressão, ca que caiba» por «punível».

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O Sr. Duarte de Oliveira: - Peço a palavra. O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Duarte de Oliveira: - Aparentemente, o Sr. Deputado Cunha Araújo poderá induzir a Câmara no sentido de que tem razão, mas efectivamente ele não tem razão e vou dizer porquê. E que a pena de segurança é sempre superior a um ano e a prisão preventiva pode aplicar-se em casos em que a prisão correspondente ao crime cometido é inferior a um ano. Mais, porque existe a -pena de segurança, a prisão preventiva não existe quando ao crime corresponde a pena de um ano, mas ao crime cabe a pena de um ano, porque se soma à prisão da pena de segurança, com a prisão que corresponde exactamente ao crime cometido e é por isso que é conveniente substituir a palavra «corresponder» pela palavra caber».
Não sei se me fiz compreender bem, mas se for necessário eu explico outra vez. E é o seguinte:
«A (prisão preventiva, pela lei, só pode existir quando ao crime caiba prisão de um ano. Mas há indivíduos que cometem crimes aos quais não corresponde a pena de um ano. (Mas esses criminosos, por sua natureza, estão sujeitos a penas de segurança previstas no Código de Processo Penal. E, portanto, ao crime não corresponde a pena de um ano, mas cabe ao criminoso a peca de mais de um ano porque a pena de segurança juntamente com a pena que corresponde ao crime é superior a um ano.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cunha Araújo.

Eu desejaria em todo o caso esclarecer o Sr. Deputado Cunha Araújo que a sugestão de redacção que fez aos .proponentes da alteração ao § 3.º parece não ter sido aceite por eles. Portanto, creio que regimentalmente, se V. Ex.ª deseja fazer vencer outra redacção, terá de apresentar uma proposta. Com esta observação da Mesa tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Cunha Araújo: - Não desejo coisa nenhuma, Sr. Presidente. Neste momento apenas quero agradecer o exaustivo esforço do meu ilustre colega João Duarte de Oliveira para se explicar quanto a uma observação feita com a melhor das intenções. E as minhas desculpas são apresentadas simultaneamente com esta declaração singela de que, afinal, apesar do esforço desenvolvido por S. Ex.ª, eu não cheguei bem a perceber qual o fundamento jurídico para se opor à minha terminologia jurídica, que eu entendia ser mais apropriada no caso subjudíce.
Pois bem, o Sr. Deputado João Duarte de Oliveira respondeu, pois defendeu-se e eu só tenho que o felicitar por isso. No entanto, continuo a entender que a expressão «punível» tem um significado jurídico cujo alcance é indiscutível e não foi tocado sequer nas considerações que V. Ex.ª acaba de fazer.
Muito obrigado.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ª deseja usar da palavra para esclarecer estes pontos, porei agora à apreciação da Assembleia o requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Albino dos Beis para que seja retirado da discussão 10 § 3.º das alterações ao artigo 8.º, que o Sr. (Deputado e outros Srs. Deputados subscreveram como proponentes à Assembleia.
Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Ficam, portanto, pendentes da atenção da Assembleia o texto proposto para o § 3.º pelos Srs. Deputados João Duarte de Oliveira e outros e o texto proposto para o § 4.º, incluindo a referência ao habeas corpus. Parece realmente pertencer ao parágrafo proposto pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros.
Se não for requerida outra coisa, vou pô-los conjuntamente a votação.
Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vou encerrar a sessão.

Amanhã haverá sessão à hora regimental, tendo como ordem do dia a continuação do debate na especialidade das alterações a Constituição Política.
Queria aproveitar a oportunidade para dizer que não me passaram desapercebidas, no princípio da discussão desta tarde, certas referências, naturalmente muito penhorantes, em que alguns Srs. Deputados quiseram arriscar-se a fazer-me lembrar a alínea c) do artigo 1.º do nosso Regimento. Direi apenas que seria o mínimo das obrigações, para quem está a exercer este lugar por confiança de VV. Ex.ªs, fazer das suas reais fraquezas as máximas forças, para corresponder à honra de coordenar o patriótico esforço de VV. Ex.ªs
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 55 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a gestão:

Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
Augusto Salazar Leite.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
João Ruiz de Almeida Gharrett.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Dias de Araújo Correia.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José João Gonçalves de Proença.
José Maria de Castro Salazar.
José Vicente Pizarro Xavier Montavão Machado.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Rafael Vaiadão dos Santos.
Ricardo Horta Júnior.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alexandre José Linhares Furtado.
Amílcar Pereira de Magalhães.
Carlos Eugênio Magro Ivo.
Deodalto Chaves de Magalhães Sousa.
Francisco Correia das Neves.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Henrique Veiga de Macedo.
João António Teixeira Canedo.
João Pedro Míller Pinto de Lemos Guerra.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
José Guilherme de Melo e Castro.
José da Silva.

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Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Rui de Moura Ramos.
Rui Pontífice Sousa.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

O REDACTOR - Januário Pinto.

Rectificações tapredentadas pelo Sr. Deputado Magalhães Mota n.º 111 do «Diário das Sessões»:

A S. Ex.ª o Presidente da Assembleia Nacional, engenheiro Carlos Amaral Netto.
Prevendo a hipótese de não estar presente quando da discussão ao n.º 111 do Diário das Sessões, peço a V. Ex.ª se digne mandar fazer-lhe as seguintes rectificações:

A p. 2245, col. 1.ª, 1. 9.º, a contar do fim, onde se- lê: «Gostaria até de pensar que sim, deverá ler-se: «Gostaria até de pensar que sim ...».
A frase não completada, uma vez que fui novamente interrompido.
Pela mesma razão, julgo que a intervenção do Sr. Dr. Almeida Cotta, que imediatamente se segue, deverá também ser precedida de reticências, ficando «... Podem discutir-se, e tem».
A p. 2245, col. 2.º, 1. 15.ª, onde se lê: «se ele se proporcionar, ficará para outra oportunidade», deverá ficar: «se ela se proporcionar».
A p. 2246, col. 1.ª, 1. 7.ª, a contar do fim, faltou a identificação: «O Orador».
A intervenção do Sr. Dr. Almeida Garrett terminou com o «muito obrigado».
A minha recomeçou precisamente com a expressão «Creio que é, também, tratar os homens como pedras».
A p. 2247, col. 2.ª, na citação do livro da 3.ª classe, onde se escreveu: «Raul», deverá ser: «Rui», e deve ser eliminada a palavra «sua» na frase, que deverá ficar assim: «-Não - dizia ele para a mulher -».
Apresento a V. Ex.ª os meus melhores cumprimentos.

O Deputado, Joaquim Jorge de Magalhães Saraiva da Mota.

Requerimento enviado para a Mesa durante a sessão:

Nos termos do Regimento, rogo a V. Ex.ª que me sejam fornecidas as seguintes publicações editadas pela Casa da Moeda:

Lista das moedas (características e eras);

Modelo A-4 - para o ultramar;
Modelo A-4 - para o continente e ilhas.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 30 de Junho de 1971. - O Deputado, José Maria de Castro Salazar

IMPRENSA NACIONAL

PREÇO DESTE NÚMERO 9$60

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