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2 DE JULHO DE 1971 2347

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Ulisses Cortês: - Como já acentuei, a moderna concepção do Estado não é a do Estado neutro, puramente contemplativo, da ideologia liberal, nem a do Estado tentacular dos regimes de tipo colectivista.
É a do Estado intervencionista, agente do progresso económico a garante do interesse geral.
Sem dúvida que a iniciativa privada é o motor essencial da actividade produtiva.
Mas o Estado, embora a título excepcional, tem de intervir em sectores de primacial interesse colectivo, através de empresas públicas, de sociedades de economia mista e do financiamento das actividades particulares.
E tem de intervir em nome do interesse da sociedade, para ocupar sectores estratégicos ou para evitar desvios coordenáveis de carácter económico.
No artigo 33.º, em discussão, consagra-se uma concepção actualizada do Estado, que corresponde à doutrina hoje comum e que não consente o anacronismo dos retrocessos.
Ao aprovar o artigo 33.º, que se discute, coloco-me numa posição de vanguarda e na defesa dos Estados, portador de ideais, animados de uma ética e impregnados dos mais altos valores humanos.
Tenho dito.

O Sr. Veiga de Macedo: - O artigo 33.º da Constituição vigente consagra um princípio do maior interesse, que define com perfeito rigor. A doutrina desse preceito mantém plena actualidade, não me parecendo que o novo texto agora proposto pelo Governo se mostre concebido em termos de todo aceitáveis.
Por isso, a Câmara Corporativa sugere lhe sejam introduzidas alterações, sendo de salientar aquela que visa estabelecer que o Estado só poderá tomar a seu cargo actividades económicas de primacial interesse colectivo quando, dessa forma, se consigam benefícios sociais superiores aos que seriam obtidos em regime de simples iniciativa privada.
As razões aduzidas pela Câmara Corporativa afiguram-se irrespondíveis e, por isso, para elas chamo a atenção da Assembleia.
Sem a limitação preconizada pela Câmara, poderá abrir-se a grave possibilidade de o Estado intervir na vida privada com ofensa dos princípios essenciais da ordem social consagrada na Constituição. Numa época em que o Estado tende a invadir domínios de vida próprios dos particulares, tudo deve fazer-se no sentido de salvaguardar a livre iniciativa e de se afastarem, assim, abusos do poder e as tendências dos serviços públicos para saírem fora do âmbito natural da sua acção.
É de admitir que o Estado tome a seu cargo a exploração de actividades económicas de primacial interesse colectivo? A resposta terá de ser positiva ou negativa, conforme com sua intervenção se consigam ou não benefícios sociais superiores aos que se alcançariam através da iniciativa privada.
Não basta, para se legitimar tal intervenção, que as actividades económicas se revistam de fundamental interesse colectivo, porque, mesmo neste caso, se a iniciativa particular consegue benefícios sociais mais expressivos, é a esta, em princípio, que deve caber a sua exploração. E isto porque a colectividade não pode ficar lesada, nos resultados sociais da exploração, só porque o Estado entende dever tomar a seu cargo quaisquer actividades económicas, com a alegação de que estas assumem primordial interesse colectivo.
Além disso, como se define este interesse colectivo? Como poderá pensar-se que ele é acautelado quando, com a intervenção estadual, não se atingem resultados superiores aos que se obteriam pela iniciativa dos particulares?
Avaliar-se-á melhor o perigo do preceito contido no artigo 43.º da proposta de lei se se pensar que, ao seu abrigo, se pode, com a maior facilidade, entrar no caminho de progressivas nacionalizações. Quantas actividades económicas entregues, e bem, à iniciativa privada, poderiam, assim, de um momento para outro, ser absorvidas pelo Estado?
Não me digam que o Estado, cônscio das suas responsabilidades, não enveredará por esse caminho, pois a dar-se valor a este argumento não se tornariam necessários muitos dos preceitos constitucionais, em especial os relativos às garantias, aos direitos e às liberdades individuais.
Acresce que o Estado só deve ser produtor de bens ou serviços (para preencher supletivamente a falta da iniciativa particular ou quando esta não se mostre capaz dessa produção a custos favoráveis.
Nem de outra forma o Estado fugirá ao perigo de suspeições ou acusações graves.
A este respeito importa ter presente as afirmações do Presidente Salazar feitas em 16 de Março de 1933, no discurso sobre «Conceitos Económicos da Nossa Constituição», do qual a Câmara Corporativa reproduz alguns passos significativos.
Não há dúvida de que o «Estado deve manter-se superior ao mundo da produção, igualmente longe da absorção monopolista e da intervenção pela concorrência». Na verdade, «quando, pelos seus órgãos, a sua acção tem decisiva influência económica, o Estado ameaça corromper-se». Além disso, «o progresso não está em o Estado alargar as suas funções despojando os particulares, mas em o Estado poder abandonar qualquer campo de actividade por nele ser suficiente a iniciativa privada».
Nem outra é a doutrina social da Igreja, quando proclama o princípio da subsidiariedade, aliás, consagrado também no Estatuto do Trabalho Nacional, onde se prevê que «o Estado deve renunciar a explorações de carácter comercial ou industrial... quer concorram no campo económico com as actividades particulares, quer constituam exclusivos, só podendo estabelecer [...] essas explorações em casos excepcionais, para conseguir benefícios sociais superiores aos que seriam obtidos sem a sua acção [...]».
Claro é que o Estado deverá impedir que as conveniências gerais sejam afectadas pela acção das entidades: que explorem actividades económicas, e que estas, por isso, exerçam influências nefastas, o que seria particularmente chocante no caso de actividades de primacial interesse colectivo. Assim, o Estado faltaria ao seu dever se consentisse monopólios de direito ou de facto não impostos por indiscutíveis razões de ordem pública e se não tomasse todas as providências para evitar que os poderes económicos exorbitem do seu campo de acção ou exerçam pressões contrárias ao bem comum.
Mas este é problema diferente do que está em causa. Com efeito, o que se discute agora é saber se o Estado pode incluir no sector público actividades económicas só porque são «de primordial interesse colectivo».
Entendo que não, pois, como frisa a Câmara Corporativa, «há que combinar esta ideia com a que inspira a formula actual do artigo 33.º». «Na verdade», conclui a mesma Câmara, «se a propriedade privada de certos meios de produção de primacial interesse colectivo for de ordem a pôr em perigo o bem comum ou a causar grave detrimento, impõe-se que para o evitar, e, portanto, para conseguir benefícios sociais superiores aos que se

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