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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETÁRIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 130

ANO DE 1971 29 DE JULHO

ASSEMBLEIA NACIONAL

X LEGISLATURA

(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)

SESSÃO N.º 130, EM 28 DE JULHO

Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Exmos.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Amílcar da Costa Pereira Mesquita

Nota. - Foi publicado um suplemento ao n.º 138 do Diário das Sessões inserindo o texto aprovado pela Comissão de Legislação e Redacção referente ao decreto da Assembleia Nacional sobre a revisão constitucional.

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 55 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o n.º 1S7 do Diário das Sessões, com rectificações dos Srs. Deputados Themudo Barata, Miguel Bastos e Veiga de Macedo.
Deu-se conta do expediente.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Duarte do Amaral, acerca das remunerações das auxiliares de limpeza das escolas primárias; Peres Claro, sobre a mão-de-obra especializada e qualificada, e Dias das Neves, para se referir à prática dos desportos.

Ordem do dia. - Na primeira parte foi considerado definitivo o texto da Comissão de Legislação e Redacção para o decreto da, Assembleia Nacional sobre a forma de resolução das contas da Junta do Crédito Público relativas a 1969.
Na segunda parte continuou a discussão na generalidade da proposta e profecia de lei sobre a liberdade de imprensa.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Duarte de Oliveira, Pinho Brandão, Miller Guerra, Casal-Ribeiro, Oliveira Dias, Sá Carneiro e Aguiar e Silva.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 45 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar da Gosto Pereira Mesquita.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Júlio dos Santos Almeida.
António Lopes Quadrado.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Armando Valfredo Pires.
Augusto Domingues Correia.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Eugénio Magro Ivo.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Fernando David Laima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.

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Francisco Correia das Neves.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco José Pereira Finto Balsemão.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Moncada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
Henrique Veiga de Macedo.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João António Teixeira Canedo.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Duarte Liebermeister Mendes Vasconcelos Guimarães.
João Duarte de Oliveira.
João José Ferreira Forte.
João Manuel Alves.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
João Ruiz de Almeida Garrett.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Coelho de Almeida Cotta.
José Coelho Jordão.
José da Costa Oliveira.
José João Gonçalves de Proença.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José dos Santos Bessa.
José da Silva.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Júlio Dias das Neves.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
D. Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Valente Sanches.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Olímpio da Conceição Pereira Pedro Bessa.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui de Moura Ramos.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teófilo Lopes Frazão.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 93 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 55 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o n.º 127 do Diário das Sessões.

O Sr. Themudo Barata: - Sr. Presidente: Na p. 2557, col. 1.ª, 1. 28, onde se lê: "que nos termos", deve ler-se: "posto que nos termos"; na mesma página e coluna, 1. 90, onde se lê: "Ministério do Ultramar", deve ler-se: "Ministro do Ultramar"; ma mesma página e coluna, 1. 41, onde se lê: "pulverização nas", deve ler-se: "civilização das".

O Sr. Miguel Bastos: - Sr. Presidente: E apenas para pedir que seja rectificada a minha intervenção na p. 2552, col. 1.ª 1.. 2 (a contar do fim), onde se lê: "Já mais além", deve ler-se: "Já por ir mais além".

O Sr. Pinto Machado: - Sr. Presidente: Solicito as seguintes correcções neste Diário em discussão: na p. 2546, col. 2.ª, 1. 30, onde se lê: "entendido este como", deve ler-se "entendido como"; na mesma página e coluna, 1. 4 (a contar do fim), onde se lê: "em consequente", deve ler-se: "com consequente"; na p. 2548, col. 2.ª 1. 15 (a contar do fim), onde se lê: "das técnicas", deve ler-se: "do técnico", na mesma página e coluna, 1. 14 (a contar do fim), onde se lê: "os técnicos", deve ler-se: "estes lhes".

O Sr. Veiga de Macedo: - Sr. Presidente: Na p. 2557 do Diário posto em reclamação, col. 2.ª, 1. 33, onde se lê: "Tais questões", deve ler-se: "questões".

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para apresentar reclamações ao n.º 127 do Diário das Sessões, considero-o aprovado.
Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegrama de Gentil Marques em nome do Grémio Nacional da Imprensa não Diária acerca do diploma em discussão.
Telegrama do Presidente da Câmara dos Representantes da República da Colômbia agradecendo as atenções dispensadas aquando da sua recente visita;
Exposição assinada por Ferreira de Castro e outros acerca do diploma em discussão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte do Amaral.

O Sr. Duarte do Amaral: - Sr. Presidente: Dirigi-me mais de uma vez ao Ministério da Educação Nacional, pessoalmente ou por escrito, para tratar do caso da remuneração das auxiliares de limpeza das escolas primárias.
Há quem considere este assunto de somenos, sem categoria, portanto, para ser tratado nesta Assembleia. Deixá-lo! Eu não tenho a mesma opinião, e por isso continuo.
Em Fevereiro do ano passado requeri àquele Ministério alguns esclarecimentos sobre o assunto. Devo dizer que, se nas primeiras e aconselhadas tentativas de o fazer por via directa não logrei resposta, obtive, não só quanto a perguntas oficialmente formuladas, como em conversas com o actual Ministro da Educação Nacional, os esclarecimentos pretendidos e a esperança de que o problema seja estudado com vontade de fazer justiça a estas humildes servidoras do Estado.

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Verificaram-se, na verdade, situações que, se algum dia tiveram explicação, hoje não podem conceber-se. As remunerações das auxiliares de limpeza das escolas primárias eram, e creio que são ainda, de 1200$ por mês para as das capitais de distrito, de 750$ para as das sedes de concelho e de 600$ para as das outras localidades. O horário de trabalho não está estabelecido por lei, mas há um despacho ministerial que o situa entre um máximo de oito horas e um mínimo de seis horas e meia por dia. Sabe-se também que nas férias do Natal, nas da Páscoa e nas de Verão esses horários não são cumpridos, por as escolas estarem fechadas, como se sabe que o trabalho é diferente de uma para outra escola, por estar relacionado com o número de salas de aula e de professores, com a existência de cantinas, de delegação escolar, etc.
A contemplação do panorama quanto a remunerações de categorias congéneres, tanto por parte do Estado (serventes de liceus e de escolas técnicas, por exemplo) como por parte das actividades particulares, e mesmo quanto à remuneração dos serviços das empregadas domésticas, demonstra que o pagamento das auxiliares de limpeza, que, afinal, não exercem só essa função, deve ser urgentemente revisto e deve-o ser não só quanto às que trabalham nas capitais de distrito, como, principalmente, às que servem nas sedes de concelho e nas escolas rurais.

A Sr.ª D. Luzia Beija: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com certeza, minha senhora.

A Sr.ª D. Luzia Beija: - Muito obrigada por me deixar interromper as judiciosas considerações de V. Ex.ª
Quero apenas apoiar o que V. Ex.ª está dizendo, porque (também eu conheço bem o problema dessas humildes funcionarias, que merecem uma melhoria nas suas condições de vida, na sua remuneração.

O Orador: - Muito obrigado, minha senhora, pela honra que me deu ao reforçar esta minha reclamação.
Os meios de comunicação já nivelaram muito o custo de vida em todo o País, mas é mesmo assim conhecido que certos centros da vizinhança de grandes cidades ou de regiões industriais são multas vezes de vida miais cara do que numerosas capitais de distrito ou de concelho. Cito, por exemplo, que a vida em Cascais, em Sintra, em Almada, não é mais barata do que mesmo em Lisboa e quanto mais cara é do que a vida em Bragança, em Viseu ou em Vila Real de Trás-os-Montes. Cito que a vida no Entroncamento, em Vizela, em Pevidém, em Cacilhas, na Covia da Piedade, não é mais barata do que em muitas capitais de distrito da metrópole. Cito, finalmente, que a vida em Guimarães é a mais cara de todas as terras do Norte do País.
Por que hão-de, por isso, estas humildes servidoras do Estado receber menos num sítio do que nos outros? Quanto paga um particular por uma empregada doméstica por este País fora, quando a encontra, e dando-lhe ainda tecto e comida?
O problema do número de salas de aula que servem, do número de cantinas e das horas que, por consequência, dão ao Estado, esse, sim, poderá valer, se valer a pena manter uma mecânica complicada para remunerar diferentemente estas servidoras do Estado. Mas o critério da localização das escolas, esse, acarreta injustiças inadmissíveis.
Quanto às férias, argumento muito usado como justificação para a baixa remuneração desta classe, não me parece que deva ser considerado de forma diferente dos outros casos idênticos que o Estado regula.
Sr. Presidente: Além das carências a que estão condenadas as auxiliares de limpeza das escolas primárias, carências que, relativamente às mais idosas, incapazes já de se adaptarem a nova vida, têm aspectos de verdadeira miséria, este tratamento é provocador da fuga para os grandes centros e da emigração e deixará dentro de algum tempo as escolas sem estas modestas mas indispensáveis servidoras.
O simples enunciado do problema dá-me a esperança de que o Governo, no louvável caminho que vem seguindo de dar solução a estes grandes pequenos casos de que ainda hoje pelos jornais tivemos novos exemplos, resolverá também este problema que hoje aqui volto a pôr. Dá-me a esperança? Não, Sr. Presidente, dá-me a certeza!

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Ramos.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Acabam de nos informar que o Sr. Deputado Oliveira Ramos tem estado doente e não havia a certeza de comparecer na sala, apesar de se ter inscrito para falar; e, efectivamente, não está connosco.
Tem a palavra o Sr. Deputado Peres Claro.

O Sr. Peres Claro: - Sr. Presidente: Sensível a tudo quanto signifique congregação de esforços, na certeza de que melhor e mais barato se trabalhará se cada um abdicar dos seu pequeninos tronos para em grupo encontrar as soluções de interesse geral, não posso deixar de aplaudir aqui a assinatura do protocolo que veio estabelecer recíproco reconhecimento e, naturalmente, melhor aproveitamento das actividades promovidas pelos Ministérios das Corporações e do Exército quanto à preparação de mão-de-obra qualificada.
Reforçaram a minha decisão alguns contactos profissionais que me tem sido possível fazer nas províncias ultramarinas com operações militares, ultimamente com mais frequência em Moçambique. E aí notória a falta de operários capazes e dos mais variados mesteres em empresas privadas e nos serviços públicos; também as escolas técnicas, as escolas de artes e ofícios e as escolas agrícolas, às quais incumbe formar muitos desses operários, carecem de mestres para o ensino oficinal. No entanto, na última década, por força das circunstâncias que nelas se vive, passaram pelas províncias ultramarinas milhares de rapazes com formação profissional suficiente para solucionar muitos dos casos em aberto e dar aos distritos menos evoluídos, mas efervescentes, todos na ânsia de progredir, as estruturas humanas necessárias à vida de uma comunidade civilizada.
Acentua-se no preâmbulo do protocolo a que atrás me referi que a mão-de-obra qualificada pelo Exército - 37 por cento do pessoal incorporado-, em cerca de cem profissões passíveis de equivalência no mercado do emprego, não conseguia essa equivalência para efeitos legais após a passagem à disponibilidade. Por outro lado, a mão-de-obra qualificada pelo Serviço de Formação Profissional do Ministério das Corporações, ao ingressar nas fileiras do Exército, tinha de percorrer todos os degraus da preparação técnica incluída no curriculum da formação militar, como qualquer indiferenciado.

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A partir de agora, porém, o Ministério das Corporações passará a reconhecer a validade da preparação dada pelos centros de instrução de especialidades do Ministério do Exército, para efeitos de concorrência no mercado de emprego, e o Ministério do Exército aceitará nas fileiras, como especialistas já formados tecnicamente, os trabalhadores qualificados pelo Serviço de Formação Profissional do Ministério das Corporações. Além destes, são também anualmente incorporadas muitas dezenas de jovens preparados nas oficinas escolares, cujos conhecimentos não se limitam ao modo de fazer, porque têm um suporte teórico apropriado, temperado cada vez mais, necessariamente e felizmente, por uma cultura de raiz clássica.
Todos estes jovens, repito - e é isto que pretendo afinal dizer, têm estado longos meses como militares nas províncias ultramarinas, sendo todavia reduzido o número dos que lá ficam depois de passarem à disponibilidade. Não vale já a pena procurar as razões ou formular as hipóteses do retraimento, pois a criação recente de serviços locais de emprego no ultramar e o propósito, declarado pelo Sr. Ministro das Corporações, de se estabelecer entre esses serviços e os abrangidos pelo protocolo e ainda os do Secretariado Nacional da Emigração uma interligação interessada no povoamento ultramarino dá-nos a esperança, quero mesmo dizer, dá-nos a certeza, de que a nossa mão-de-obra especializada passará finalmente a ser fixada e canalizada para o ultramar, onde tão necessária é, sendo de aconselhar, até se estabelecer uma corrente natural de circulação, que se facilite a sua transferência e a sua fixação, como em tão larga medida se faz com os agricultores.
Permito-me, porém, apontar dois pormenores que não escaparam à minha breve observação, tão perturbadores são da marcha regular dos serviços ultramarinos. Sobre eles formulo dois votos:

1.º Que não sejam criados lugares por diploma ministerial sem prévia cobertura orçamental da província a que se destinam;
2.º Que não sejam estabelecidas novas condições de remuneração sem se garantir a sua aplicação àqueles que entraram mais cedo para os serviços públicos.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Dias das Neves: - Sr. Presidente: Desde muito novo que fomos educados e aprendemos pela prática que o desporto é uma escola de virtudes cujo exercício contribui para a formação do carácter e da personalidade dos homem.
Uma escola onda, a par do cultivo da força, da arte e habilidade naturais, do engenho e da inteligência, se cultivam virtudes, como a justiça, a lealdade, a moral, o sentido de equidade e respeito pelos outros e todas as que estão na base de uma formação integral e nas quais assentam o carácter e a personalidade do homem e o dignificam, como pessoa humana.
A prática de qualquer desporto, desde o miais rudimentar ao mais evoluído,, e o exercício das virtudes apontadas contribuem igualmente para» a formação do espírito desportivo, o espírito superior que fomenta o entendimento entre os homens e, consequentemente, entre as nações.
Hoje, mesmo dos extraordinários meios de comunicação, que permitem que qualquer manifestação realizada num dos quatro cantos do Munido possa ser vista e observada directa e simultaneamente nos outros cantos, fantástico domínio da técnica pelo homem, que nos permite estar a ver, no momento em que se realizam, desembarques e acções idos astronautas na Lua. Hoje - dizíamos -, o desporto constitui um extraordinário meio de aproximação entre os povos, desempenhando uma função social e política dia maior importância, na medida, em que do confronto dessas virtudes e da aceitação delas resulta uma maior compreensão entre os homens, pelo conhecimento mútuo dos seus problemas, da sua maneira de ser e de estar no mundo.
Assim sendo, é que assistimos ao longo do nosso planeta ao interesse das nações e ao empenho dos seus governantes no desenvolvimento permanente de uma sã vida desportiva, com vista não só ao desenvolvimento físico do homem, mas principalmente em ordem à sua formação integral, e a realizar um Confronto internacional dos mais variados desportos.
As nações procuram, pois, através das suas escolas das variadas instituições e dos seus dirigentes, promover todas as acções necessárias à obtenção desta finalidade, que se nos revela da maior transcendência na vida colectiva nacional.
De todos aqueles a quem cabe maior responsabilidade neste fenómeno é aos dirigentes desportivos, que são responsáveis pela organização, direcção e orientação das actividades e guardiões do espírito que deve impregnar toda a actividade desportiva.
Na realidade, o dirigente desportivo tem de ser solidamente formado nas virtudes que suo a essência do próprio desporto, tem de ser conhecedor d»s técnicas da actividade que dirige e respeitador de todos quantos estão comprometidos nessa actividade, mas. e essencialmente, possuidor, pelo exercício dessas virtudes, de uma integridade de carácter e dotado de uma personalidade, espírito de decisão e de justiça que lhe permitam estar à altura de orientar, dirigir e defender contra todos os interesses alheios, confessados ou não, a actividade que se propôs dirigir.
A não ser assim, os dirigentes que manejam ou se deixam manejar por interesses que são contrários à própria actividade que dirigem estão a atraiçoar o espírito que deve presidir a essa actividade e a contribuir para a sua destruição.
Foi, pois, com a maior preocupação que tomámos conhecimento através da imprensa diária, e especialmente da desportiva, das resoluções de um congresso da Federação. Portuguesa de Futebol, órgão superior de direcção deste sector de actividade desportiva, sector a quem o País já deveu que o seu nome fosse glorificado em todo o Mundo, resoluções, dizíamos, que na maioria dos jornais da especialidade, se não na totalidade, e nos outros, são qualificadas com adjectivos como imoralidade, iniquidade, injustiça, antidesportivas, contra toda a ética desportiva, de escândalo, etc.
Não nos cabe a nós julgar das actuações dos dirigentes que compõem estas instituições e seus órgãos directivos, mas cremos que o interesse nacional que emana do valor dessa actividade nos manda perguntar se um sector desportivo com a importância do futebol pode estar entregue a dirigentes que negam a sua própria função e atraiçoam o espírito e a ética de um desporto que são obrigados, porque nele voluntariamente se comprometeram, a defender.
E, se toda a imprensa diária da especialidade e outra fazem esta acusação, poderão os altos interesses morais e materiais em jogo estar à mercê de dirigentes que a si

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próprios se negam, negando o próprio espírito, que é a essência do desporto?

O Sr. Casal-Ribeiro: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Pois com certeza.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Eu tenho estado a ouvir atentamente as palavras de V. Ex.ª Quis o destino que eu tivesse tido funções de dirigente desportivo, quer em clubes, quer na própria Federação Portuguesa de Futebol, a que V. Ex.ª está a aludir.
Eu queria apenas manifestar o meu inteiro apoio às considerações de V. Ex.ª e chamar a atenção de quem de direito para, eu não encontro outro termo, o ridículo que representa, num país com as dimensões do nosso, com o número de clubes que nós temos e até com os próprios atletas jogadores de futebol inscritos, ter-se aumentado, o mais arbitrariamente possível, o número de clubes da 1.º divisão para dezasseis e da 2.ª divisão para trinta e dois. Eu queria dar apenas esta pequena achega, de antigo dirigente desportivo, federativo e de clube, às considerações que V. Ex.ª está a tecer com tanta razão e com tanto brilho.
Muito obrigado.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado Casal-Ribeiro, pela sua intervenção, que me parece realmente a intervenção de um homem justo, que ao desporto tem dedicado uma grande parte da sua actuação e que tem merecido de todos os desportistas portugueses a sua apreciação como dirigente consciencioso e isento e porque neste caso também V. Ex.ª deu prova da isenção a que realmente nos habituou. Muito obrigado, portanto.
Dizia eu que, perante estas perguntas, cremos ter de se fazer um apelo a S. Ex.ª o Ministro da Educação Nacional, a quem, em última análise, caberá homologar estas decisões e resoluções, para que, com o seu espírito superior e com a força da autoridade de quem todos os dias está a combater a sã batalha da educação, lutando por uma juventude melhor e mais bem formada, se digne ordenar as providências necessárias para evitar que resoluções como estas, apodadas de injustas, imorais e iníquas, possam comprometer irremediavelmente o esforço do País na promoção desportiva das suas gentes. Deixo aqui o apelo, na certeza de que as coisas serão repostas no seu devido lugar.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Interrompo a sessão por alguns minutos.

Eram 16 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 16 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à

Ordem do dia

A primeira parte da ordem do dia, como VV. Ex.ªs, estão lembrados, compreendia a apresentação de reclamações sobre as ultimais redacções da Comissão de Legislação e Redacção para dois decretos da Assembleia Nacional.
Acaba, porém, de ser verificado que no decreto relativo à revisão constitucional há um lapso tipográfico, e parece-me conveniente que seja rectificado antes de VV. Ex.ªs se pronunciarem sobre o texto.
De qualquer maneira, se o apresentasse agora os Srs. Deputados que notaram esse lapso tipográfico, que desde já posso dizer que consiste na omissão de um número num dos artigos (número que a Assembleia visou) e que, por lapso, não está impresso, reclamariam contra ele, e seria necessário que voltasse aqui o decreto revisto.
Por isso, parece-me preferível retirá-lo da ordem do dia de hoje.
Em consequência, e em execução da primeira parte da ordem do dia, está apenas em reclamação o texto aprovado pela nossa Comissão de Legislação e Redacção para o decreto da Assembleia Nacional, sob a forma de resolução, acerca das contas da Junta do Crédito Público relativas ao ano de 1969.
Se algum de VV. Ex.ªs tem quaisquer reclamações a apresentar ao abrigo do disposto no artigo 43.º do Regimento, tem a bondade de o fazer. Têm a palavra para isso.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Não há reclamações apresentadas. Em consequência, nos termos da parte final do § 2.º do artigo 43.º do Regimento, considera-se definitivo o texto redigido pela Comissão.
Na mais breve oportunidade marcarei para ordem do dia a apresentação de reclamações sobre o outro texto.
Vamos passar à segunda parte da ordem do dia: continuação da discussão na generalidade da proposta e projecto de lei sobre a liberdade de imprensa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte de Oliveira.

O Sr. Duarte de Oliveira: - Sr. Presidente: Seja a liberdade uma qualidade inerente ou inscrita na natureza humana, como me ensinaram, seja uma faculdade que é preciso conquistar, como hoje se diz, essa palavra mágica tem servido de pretexto para os maiores cometimentos da história humana.
Por ela o homem se torna consciente da que é, do que vale, de qual o seu destino. Pressuposto necessário da sua dignidade, desde sempre foi a pedra de toque para se fixar o valor do homem como tal e traduzir a riqueza de um povo e a expressão última de humanidade. Reconhece-se, pois, que o conceito de liberdade é um dos substratos de todos os valores humanos. Porém, quantas vezes ele tem sido aproveitado para se preconizarem caminhos, destruir princípios, abater bandeiras e desmoronar costumes que sempre foram, e são, a moldura dentro da qual a liberdade ganha a sua admirável dimensão. Não poucas vezes a liberdade tem apenas servido como propulsora da libertinagem. Daí que tenhamos de consagrar como princípio indiscutível, porque absolutamente certo, que aquela só o será verdadeiramente quando profundamente responsável, prevenindo e tornando defesa a última. É preciso ter sempre presente que o caminho da liberdade é o mesmo do encarceramento.
Sr. Presidente: Á evolução cultural, económica e social provoca transformações profundas nas estruturas e instituições dos povos. Essas transformações influem, de maneira premente, a vida da comunidade política, sobretudo nas relações dos cidadãos entre si e nas suas relações com o Poder. Vai nascendo uma noção mais clara da dignidade humana, uma maior consciência dos direitos da

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pessoa. Mais homens se dão conta de que, neste mundo contingente, não há certezas absolutas. Sente-se mais vivamente que eliminar uma opinião, que pode até ser a verdadeira, pela autoridade, é esquecer que o nosso pensamento se corrige e completa, confrontando-o com o dos outros; que a confiança no julgamento próprio aumenta, se o submetermos ao juízo público.
Não é um mundo que acaba; é um mundo que começa. E, nesse mundo novo, uma censura prévia, como regra, não tem mais razão de ser.
O Estado social está a interpretar estes sinais dos tempos e a colaborar na edificação desse mundo novo. Nesta hora, pois, uma lei de imprensa impõe-se ao Estado social como uma exigência do seu próprio ser. Ela situa-se no centro da linha de rumo de um Estado moderno.
A proposta de lei que vamos discutir será, se for aprovada, a lei fundamental da liberdade de imprensa. Ela é a consequente do melhoramento nas mentes e nas instituições portuguesas. Ela reflecte o actual estado saudável da vida política portuguesa.
E porque assim é, deveremos, na apreciação e julgamento que vamos realizar, movimentar-nos fugindo das abstracções puras, que, embora merecendo o nosso respeito, constituem apenas os nossos ideais.
Nós, políticos que somos, temos de ser realistas, muito mais, que ideólogos ... ou fantasistas.
Vamos legislar agora e aqui. Legislar nesta hora, neste momento histórico.
Quão longe estamos da sociedade de indivíduos, da sociedade liberal, da burguesia que arrancou do século XVIII e que conquistou a liberdade de imprensa. O liberalismo, como é sabido, surgiu como reacção contra o absolutismo. Era uma ideologia que combatia outra, à qual pretendia substituir-se. Era uma sociedade que sucedia a outra sociedade. E agora? Hoje, a burguesia liberal finou-se.
Neste momento histórico há aquilo a que se chama as «sociedades de massas», onde o homem se caracteriza pela despersonalização e homogeneidade, perante as quais o Poder não pode ficar desarmado, abandonar meios de intervenção, indispensáveis à convivência social e até à defesa das liberdades de cada um. Hoje contesta-se tudo e também, como no liberalismo, combate-se uma ideologia, pretende-se acabar com uma sociedade, com a nossa sociedade, que até se poderá chamar de consumo, ou, talvez melhor, de um ângulo próximo, de produção. E que se preconiza em sua substituição? Nada. Não é uma sociedade que quer substituir-se a outra, o que se quer é o fim de uma sociedade. Pretende-se, se isso é possível, o nada, o puro niilismo.
Sr. Presidente: Já ouvi aqui tantas vezes falar em Estado de direito a propósito, da revisão constitucional, da liberdade religiosa e, agora, da Uberdade de imprensa que, a título de curiosidade apenas, ouso lembrar que os países socialistas se consideram a si próprios também Estados de direito, e aí a informação é propaganda, sempre feita com a finalidade ide fortalecer o regime socialista. Lá, a imprensa visa jantes a eficácia do que a verdade.
E isto dá também a ideia de quão tange estamos desses conceitos puros que, no actual estado da vida dos povos, não tem o conteúdo que lhes foi citado pelos seus teorizadores.
Deliram-se as fronteiras entre os três poderes do Estado com invasão mútua da esfera de competências, chegando mesmo a assistir-se, em todo o mundo, à politização do Judicial, perfeitamente parificado aos outros poderes, que é chamado cada vez mais a julgar a legalidade do Executivo e a constitucionalidade das leis.
Sociedade de massas, sociedade técnica e pluralista, a sociedade contemporânea conduz-nos ao Estado-providência.
Esta, a breve trecho, parcial ou esquemàticamente, a realidade em que está situado o mundo de hoje.
Um governo responsável, consciente e sábio, tem de ser capaz de descobrir o justo equilíbrio dos modos de actuação, que não são de certo os de um socialismo de opressão, de ideologia unitária, ou os de um liberalismo cândido e ultrapassado.
Mas, para além disso, para lá do facto de estarmos a fazer uma lei para os tempos presentes, estamos a legislar para a Nação portuguesa, onde há circunstancialismos de pessoas, de fenómenos, de situações, que nos impõem uma lei portuguesa.
Sr. Presidente: Nós, Portugueses, nunca fomos educados - e esta asserção recua ao século XIX - para uma liberdade de informação, agravada esta circunstância com o facto de vivermos há mais de 40 anos em regime de censura prévia à imprensa.
Mas o fenómeno, tão característico da hora que passa, de intensificação de relações internacionais ao nível individual tem levado a nossa gente a aprender e a contactar outros povos, outros horizontes, e a criar uma dimensão mais larga do seu valor. Consciencializado o nosso povo das novas perspectivas e da largueza de outras culturas, o Estado social que nos rege fez germinar a necessidade de dimensionar em novos moldes, de disciplinar por caminhos mais largos todo o seu rico património, de modo a esse povo dar a colaboração necessária a quem tenha de marcar e de definir os princípios norteadores de uma civilização e de uma política.
Esta necessidade constitui pressuposto imprescindível da participação dos Portugueses na obra que se projecta e que vem sendo definida pelos poderes públicos. Alicerçadas as traves mestras do pensamento político que nos define, há que dar oportunidade de tornar o mesmo planificado pela participação activa e vivida de quantos, e somos todos, têm que cooperar, vivendo e visando os caminhos que temos de percorrer.
E o Governo, atento às realidades do momento, entendeu que esta caminhada só poderá ser frutífera e eficaz se a todos for reconhecido o direito de dialogar, de criticar, apontar, corrigir, defender ou atacar posições, diplomas que se promulgam, factos que importam ao conhecimento de todos, para que todos se consciencializem, conheçam, experimentem e vivam as causas, motivações e princípios que lhes deram origem, os expliquem, os justifiquem.
O actual Governo tem vindo a ensinar-nos que dialogar é hoje palavra de ordem; que aceitar correcções é hoje norma de convivência; que aceitar críticas é hoje forma de construir; que permitir, pelo diálogo, a busca de soluções é hoje forma de governar; que somos todos responsáveis nos objectivos comuns. E, assim, a sociedade portuguesa viu-se, da noite para o dia, senhora de uma maior possibilidade de participação política.
E a lei de imprensa surgiu, em meu parecer e como atrás disse, como resultante deste novo modo de governar.
Pois, Sr. Presidente, apesar de tudo, o primeiro pensamento que me ocorreu da leitura da proposta do Governo foi o de que este praticou um acto de verdadeira coragem. Tenho ouvido que se trata de uma lei de transição. Pois eu repudio vivamente essa afirmação, e considero-a uma lei verdadeiramente progressiva, ou progressista, conforme se prefira.

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A sua aprovação, diga-se o que se disser, impede o Estado de dominar, de controlar a imprensa.
Sabido que a informação constitui hoje uma força social de grande poder - já apelidada hiperbòlicamente de quarto poder -, não há Estado nenhum que possa alhear-se da sua função, que é de carácter público.
Nenhum Governo, sob pena de se negar a si próprio, poderá deixar entregue às flutuações dos interesses e dos subjectivismos esse meio de comunicação social. A informação é uma «mercadoria» delicada, cujo «comércio» exige cautelas, até porque o seu «consumo» é susceptível de perverter a opinião pública, de ter efeitos nocivos sobre a integridade moral dos cidadãos. A informação é, mesmo, um sistema ou mecanismo social que exige regulamentação.
Não quero tomar partido na querela sobre a natureza do direito à informação, mas é hoje doutrina incontroversa que o exercício de um direito sofre os limites da sua função social, que o bem individual tem de ser sempre articulado, cedendo ou atenuando-se perante o bem comum.
É hoje, pois, inaceitável a ideologia individualista, onde o ordenamento jurídico e o próprio Estado devem apenas proteger os interesses e direitos individuais e a garantia constitucional da liberdade dos indivíduos, onde o único critério para o seu exercício é o interesse individual. Mas eu chamo a atenção da Assembleia para este facto sintomático: é que já nos regimes liberais a chamada «liberdade de imprensa» foi sempre instrumento indirecto de poder para os grupos apostados em conquistá-lo, mante-lo, ou influir no seu exercício.
Inaceitável também a ideologia colectivista, onde falar de liberdade de imprensa é absurdo. A imprensa tem um só fim: a propaganda da ideologia oficial e a consolidação da ditadura.
Só a ideologia do Estado social convém às. sociedades e, conseguintemente, à sociedade portuguesa.
Pois a proposta de lei que o Sr. Ministro da Justiça nos enviou enquadra-se perfeitamente nessa ideologia. Ela presta todo o culto possível ao princípio da liberdade de imprensa; ela interpreta os interesses gerais; pondera a necessidade de defesa da ordem pública; acautela os superiores interesses da comunidade, conciliando verdade e utilidade, Uberdade e responsabilidade, o individual e o colectivo.
Da proposta estão inelutavelmente expulsas as possibilidades avassaladoras do Poder. O Estado é, reconhecidamente, o tutor normal do bem comum, que garante o exercício da liberdade de imprensa. Ele não é inimigo dessa liberdade. Seus inimigos, numa perspectiva caracterizadamente capitalista, poderão ser os grupos estranhos, os grupos ideológicos e políticos, os mais variados grupos de pressão, máxime os económicos, mas é justo verificar que a proposta, dentro das [permissões constitucionais e legais, preveniu a defesa da liberdade de imprensa de tais grupos e, dentro daquelas suas funções atrás apontadas, previne também os desvios anti-sociais da imprensa.
Não podemos nunca esquecer que os jornais e a restante imprensa são uma tribuna que pertence a todos os que escutam a sua palavra. Esta é, assim, uma verdadeira instituição pública, que tem reflexos imediatos no bem-estar material, moral e intelectual dos cidadãos e que, portanto, deve estar sujeita àquele mínimo contrôle ditado pelo interesse público. Mas, repare-se bem, até em defesa dos que nela trabalham.
A proposta de lei de imprensa responde fielmente à nossa realidade social, que é a que conta, e às exigências do nosso tempo.
Não seria difícil a qualquer de nós fabricar uma lei de imprensa com disposições de encher as primeiras páginas dos jornais, capaz de criar um momentâneo impacte favorável e repercussão estridente em certos meios da opinião pública.
Fàcilmente se poderiam enunciar problemas cuja discussão nesta Casa traria ao Deputado ou Deputados que a suscitassem fama, eco público, pois esta tribuna até poderia servir de meio de propaganda individual.
Mas temos de ter sempre presente que esta Casa está muito para além de nós, que somos políticos ao serviço de um ideal, sim, sempre condicionado, porém, pelas realidades do anuindo em que vivemos e da Nação que servimos.
Um cidadão consciente e responsável não pode embarcar em veleidades teóricas, desligadas do concreto da existência.
Mais, graças a Deus, aqui dentro, todos somos responsáveis e conscientes.
Sr. Presidente: Uma das acusações, mesmo a maior, que vim fazer à proposta de lei dizia respeito a que era vaga e imprecisa na definição dos limites à liberdade de imprensa (base XI) e que esses mesmos direitos figuravam também na base IV.
Mas o curioso é que essas imprecisões eram, do mesmo modo, assacadas ao projecto dos Srs. Deputados, nomeadamente na parte do n.º 1 do artigo 1.º onde se utilizam expressões como «furacão de força social» e «integridade moral dos cidadãos» e no artigo 2.º onde se fala de «interesse nacional», etc.
Para além de eu considerar que os conceitos inseridos naquelas bases têm o conteúdo preciso que a doutrina tradicionalmente estabeleceu e o peso e a medida que a jurisprudência jurisdicional ou de administração pública lhes tem fixado, que essas expressões têm âmbito bem delimitado, inconfundível e certo, julgo que essas acusações resultam de um desconhecimento das modernas técnicas legislativas. Todos sabemos que as leis estabelecem o quadro geral da abstracção dentro do qual hão-de movimentar-se os casos concretos, que aquele ilumina. Aquelas bases traduzem uma motivação exacta, correcta e justamente necessária para- que tenhamos a definição precisa do desenvolvimento, modo e termos da comunicação pela imprensa.
Hoje legisla-se por cláusulas gerais. Os juízes hoje não podem ser, nem são, em parte alguma, meros especialistas da técnica jurídica. Compete-lhes uma função axiológica. Tem de ser garantida uma larga maleabilidade aos julgadores na sua função actual, e hoje indiscutível, de criadores de direito. O juiz não é, não pode ser, um tecnocrata - palavra na moda -, cultor fetichista da lei, num mundo onde a actividade judicial tem de ser a consciência ética da comunidade.
Sr. Presidente: A proposta de lei é de tal modo clara., precisa, define a esfera de actuação num processo comunicativo com tal largueza e liberdade, que eu até penso que as críticas formuladas são fruto de um subconsciente «medo à liberdade» de que fala Erich From.
Ser livre é sentir sobre os ombros o próprio destino. E nós, nesta matéria, estávamos desabituados.
Em resumo, direi que a proposta de lei em discussão responde exactamente à nossa realidade social e às exigências do nosso tempo.
Nunca houve, e hoje, nesta sociedade que se precipita no futuro, não pode haver leis perfeitas e, sobretudo, definitivas, se referidas a um ideal teórico.
Mas ela é a mais conveniente para conduzir à perfeição relativa do campo de actividade social a que se destina.

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A proposta de lei que iremos discutir, não tenho dúvidas em afirmá-lo, é, quanto a mim, a mais importante que desde há mais de quarenta anos a esta parte saiu das mãos de um Ministro da Justiça portuguesa.
Só um Governo confiante no ambiente saudável da vida política, no vigor das instituições que nos regem, na melhoria educacional e cívica do povo, na segurança que lhe advém da adesão colectiva das populações, poderia servir à Nação uma lei liberal, ousada, moderna, carregada de novidade, como é a proposta em apreço.
São lá tratados convenientemente os três pilares fundamentais em que se deve apoiar um ordenamento jurídico da informação para garantir uma suficiente dose de liberdade de imprensa. O equilíbrio desejado entre a empresa, profissão, público, porá a salvo o nosso direito de leitores de sermos correctamente informados.
É por isso que eu entendo que aquela proposta desperta em nós sentimentos de crença no direito e na justiça; ela é mais uma contribuição importante na conformação do Estado de direito social ou Estado social de direito.
Ela encerra, bem dúvida, implícito nos seus termos, um voto de confiança na dignidade dos profissionais da imprensa portuguesa. Tal é também o meu sentimento.
Decorre, de quanto disse, que dou conscientemente, serenamente, a minha inteira adesão à proposta do Governo que vamos apreciar.

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Pinho Brandão: - Sr. Presidente: Está em discussão na generalidade a chamada «lei de imprensa».
E para essa lei temos na nossa frente nada menos que quatro textos: a proposta de lei n.º 13/X, que é o texto do Governo, da autoria do Sr. Ministro da Justiça; o projecto de lei n.º 5/X, da autoria dos Srs. Deputados Francisco Sá Carneiro e Francisco Balsemão; o texto constante do parecer da Câmara Corporativa, e, finalmente, o texto apresentado pela comissão eventual desta Assembleia, nomeada por V. Ex.ª, Sr. Presidente, para estudo da referida proposta e do projecto.
Este último, elaborado embora com base na proposta do Governo, resultou do estudo atento, minucioso e reflectido tanto da proposta como do projecto, como ainda do texto do parecer da Câmara Corporativa.
Sr. Presidente: No início desta minha intervenção quero, antes de mais, felicitar o Governo pela apresentação da sua proposta, reveladora do desejo de governar não só para o País, mas também com o País, tendo em atenção as sugestões e as legítimas aspirações dos seus habitantes, e reveladora ainda da receptividade do Governo para a colaboração de todos os portugueses dignos deste nome, colaboração atinente à solução dos grandes problemas da administração pública, mediante uma opinião pública objectiva, formada em informação verídica.
O Sr. Presidente do Conselho, estadista eminente e já verdadeiramente benemérito da Pátria pelos ciclópicos trabalhos que vem realizando em benefício da comunidade lusa, mais uma vez cumpriu a sua promessa, promovendo a publicação de uma lei de imprensa tendente à comunicação livre entre o Poder e o País.
Sr. Presidente: O articulado da proposta contém e consigna os princípios fundamentais em que deve assentar uma lei de imprensa e constitui nesta matéria documento notabilíssimo, motivo por que não só o Sr. Presidente do Conselho, como ainda o Sr. Ministro da Justiça, autor da proposta, merecem desta Câmara o mais vivo apreço por iniciativa tão relevante.
Na vendada, a proposta foi elaborada com seriedade e elevação - é liberal, porque proclama a liberdade de imprensa e garante o exercício dessa liberdade, e é realista porque tem em atenção as condições da actual conjuntura nacional, em que avulta a subversão terrorista, nas mossas províncias ultramarinas.
É que, Sr. Presidente, mal do País e de (todos nós se, em vez de leis que tenham em conta AS realidades nacionais e os vários aspectos sociais e humanos dessas realidades, se publicam normas jurídicas utópicas baseadas exclusivamente em princípios apriorísticos, romanticamente formulados e com desconhecimento e desprezo do meio social a que se destinem.
Mas quais são esses princípios fundamentais contidos na proposta, parte, dos quais também, contidos mo projecto, embora naquela expressos com mais amplidão e largueza, e acolhidos no texto elaborado pedia comissão eventual, príncipios esses que conduzem necessariamente à aprovação da proposta na generalidade?
Porém, antes de avançar na exposição, embora sumária, desses princípios, quero, deixar aqui também uma palavra de justo apreço não só pelo projecto dos Srs. Deputados, como ainda pelo parecer da Câmara Corporativa emitido sabre a proposta e o projecto - parecer com grande investigação, revelador das magníficas qualidades de trabalho e inteligência do seu autor. Àqueles e a este patenteio a minha homenagem, que torno extensiva a todos os Dignos Procuradores signatários do parecer, alguns dos quais o assinam com importantes declarações de voto.
Sr. Presidente: Os princípios fundamentais contidos na proposta e adoptados pela comissão eventual, alguns com alterações por esta introduzidas, são: o direito à liberdade de imprensa, com garantias e limites dessa liberdade, ao acesso às fontes de informação, ao sigilo profissional, à publicação e circulação de impressos e à constituição de empresas jornalísticas e editoriais; a aplicação das normas penais comuns e do processo penal comum aos crimes de imprensa e seu julgamento em tribunais comuns; a função pública e social da imprensa, com as consequentes regras respeitantes à formação das empresas, ao direito da rectificação e esclarecimento, de resposta e de inserção de notas oficiosas do Governo e de comunicações oficiais dos órgãos da administração pública, e a inscrição no registo das empresas jornalísticas e editoriais das publicações periódicas, dos profissionais da imprensa periódica, dos editores da imprensa não periódica, das agências noticiosas estrangeiras a exercerem a sua actividade no País e dos profissionais ao serviço da imprensa estrangeira.
Excepcionalmente, a proposta e o projecto adoptam o regime do exame prévio ou consulta prévia, limitado na proposta às matérias do n.º 1 da base XI e no projecto às notícias de carácter militar, havendo divergência entre aquela e este quanto aos respectivos pressupostos.
Como já se afirmou, uma parte dos referidos princípios são adoptados ou perfilhados peita proposta e pelo projecto, emborca «regulados naquela e neste por forma divergente, divergência cuja apreciação terá o seu lugar mais apropriado ma discussão na especialidade.
Sr. Presidente: Como é sabido e resulta do artigo 37.º do Regimento desta Assembleia, a discussão na generalidade versa sobre a oportunidade e a vantagem dos novos princípios legais e sobre a economia da proposta e do projecto, podendo a oposição na generalidade concretizar-se em questão prévia que vise retirar o assunto da discussão por inoportuno ou inconveniente.
Ora, não tenho dúvidas em afirmar que os princípios legais contidos na proposta e no projecto são oportunos

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e vantajosos e por isso, por este lado, somos conduzidos à aprovação na, generalidade dos dois documentos.
Mas é útil e vantajoso que toda a discussão na especialidade se faça apenas sobre um f/esto tomado por base, com as alterações que sobre esse texto sejam porventura propostas.
É que, indiscutivelmente, não é prático e é altamente inconveniente discutir e votar sucessivamente a proposta e o projecto, pela possibilidade de confusões, algumas certamente inevitáveis. O que nos parede mais prático e razoável (e pelo menos é superior método de trabalho) é que se submeta, como base de discussão na especialidade, apenas um texto, podendo apresentar-se ao mesmo todas e quaisquer propostas de alteração, contendo ou não matéria dos Gestantes textos.
A Assembleia tem à sua frente, como já se referiu, quatro textos: o da proposta do Governo, o do projecto, o da Gamara Corporativa e o da comissão eventual.
Poderá alegar-se que a comissão eventual não tem competência para, por si, apresentar, para base de discussão na especialidade, um texto por ela própria elaborado e que, portanto, a Assembleia, não podendo decidir que a discussão na especialidade se faça de preferência sobre este texto, apenas tem à sua frente os três textos restantes - o da proposta, o do projecto e o da Câmara Corporativa.
Mas, quanto a mim, não há razão para assim pensar, porque tal competência resulta necessariamente da circunstância de a comissão eventual ter sido constituída para estudo da proposta e do projecto, sem quaisquer limitações, e desse estudo ter resultado a conveniência de um novo texto que, integrando os princípios informadores da proposta e do projecto, altera aqui e acolá a regulamentação desses princípios e introduz alguma matéria nova que se julgou necessária.
Por outro dado, não me parece lícito que, podendo a Assembleia decidir que a votação se faça sobre o texto sugerido pela Câmara Corporativa (segunda parte do artigo 36.º do Regimento), a mesma Assembleia não possa decidir que a votação se faça sobre o texto sugerido por uma comissão dessa mesma Assembleia. E o que mais se poderia afirmar é que o caso - o de a comissão eventual poder propor ou não à Assembleia que a discussão na especialidade se faça sobre o seu texto - não tenha sido expressamente contemplado no Regimento, e então estaríamos em presença de caso omisso, que V. Ex.ª, Sr. Presidente, teria de resolver, na sua alta competência e nos termos da alínea l) do artigo 31.º do Regimento; e parece-me, salvo o devido respeito, que nessa resolução V. Ex.ª não poderá deixar de ter em conta que, se a Assembleia pode decidir que a votação se faça sobre o texto da Câmara Corporativa (segunda parte do artigo 36.º do Regimento), com mais forte razão o pode fazer que a votação se faça sobre um texto fornecido por uma sua comissão especialmente encarregada do estudo do assunto.
Mas todas estas razões, Sr. Presidente e Srs. Deputados, embora me pareçam de rigor legal e interessem aos espíritos exigentes desse rigor, pecam, quanto a mim, por serem demasiadamente próprias do mero jurista.
Nós estamos, Sr. Presidente, numa câmara política em que mais do que o que é interessa o que deve ser.
E eu lembro neste momento, Sr. Presidente, um facto que pode agora iluminar os nossos passos, o qual se passou já no distante ano de 1881 na Câmara dos Deputados do extinto regime deste país, a qual, como se sabe, também tinha o seu Regimento. Ora, esse Regimento impedia que durante o funcionamento da Câmara tomasse parte nas respectivas sessões qualquer elemento a ela estranho, como era natural.
Aconteceu, porém, que se encontrava numa das tribunas da Câmara o ilustre Deputado brasileiro Joaquim Aurélio Nabuco de Araújo, chefe do Partido Abolicionista e eminente parlamentar; e, então, o Deputado António Cândido, no uso da palavra e em discurso notável, pediu ao Presidente que consultasse a Câmara sobre se permitia que, dispensando-se o Regimento, o Deputado brasileiro Joaquim Nabuco fosse convidado a entrar na sala da Câmara dos Deputados e a assistir à sessão, o que foi deferido pelo Presidente e deliberado pela Câmara.
Ora isto, Sr. Presidente, revela que na verdade se tem entendido, cá mesmo no País, que as Assembleias Legislativas têm competência para dispensar o seu próprio Regimento, que é tão-só um simples regulamento interno do funcionamento dessas Assembleias por elas próprias elaborado e por elas próprias dispensado quando o entendam - o mesmo não é nem tem de ser promulgado pelo Chefe do Estado, não é nem tem de ser publicado no Diário do Governo; é, sim, publicado e distribuído aos Deputados por ordem apenas dos Presidentes das Assembleias.
E neste caso, Sr. Presidente, o que me parece ser do mais relevante interesse são as razões políticas de, não tolhendo ampla liberdade aos Deputados de apresentarem quaisquer propostas de alteração ao texto que sirva de base à discussão na especialidade, se adoptar, para base dessa discussão o texto que a Assembleia, no conjunto de vários, julgue mais conveniente, mais completo e mais perfeito.
O relevante interesse político está na liberdade de escolha por parte da Assembleia quando em presença de vários textos.
Ora, a Assembleia Nacional teve como seu órgão de trabalho para estudo dos textos em discussão uma comissão que, efectivamente, estudou esses textos, especial e pormenorizadamente, em várias e seguidas reuniões, decorrentes desde 3 de Junho até 23 de Julho corrente, a qual concluiu, no respectivo parecer, por recomendar à Assembleia, para base de discussão, o texto por ela própria elaborado, elaboração a que chegou aproveitando muito da proposta do Governo e algo do projecto e do texto da Câmara Corporativa.
Entendo, por isso, Sr. Presidente, que a proposta e o projecto devem ser aprovados na generalidade, mas que a base da discussão na especialidade se faça sobre o texto sugerido pela comissão eventual. E neste sentido que dou o meu voto.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Miller Guerra: - A lei de imprensa abre um campo vasto à discussão, excedendo aquele a que legal e aparentemente se circunscreve.
A imprensa é considerada hoje uma faceta dos meios de comunicação social e, para muita gente, continua a ser o mais importante de todos. Desde que foi inventada, tornou-se um poderosíssimo agente de difusão de ideias, levantando questões graves sobre a sua influência na propagação de novas formas de cultura, sobretudo das ideologias políticas, sociais e religiosas. Ainda agora, no tempo que corre, a suspicácia das autoridades e poderes constituídos a seu respeito demonstra claramente, por contraste, a força imensa da imprensa na manutenção, ou na alteração, da chamada ordem dos espíritos e da sociedade.

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Não se trata, porém, apenas de jornalistas, mas de todos os que criam e divulgam a cultura; não se trata só de jornais, mas de toda e qualquer forma em que se materialize o pensamento, da palavra oral à escrita, do gesto significativo à expressão artística.
Estas noções são tanto mais necessárias quanto é certo que o espírito tecnocrático tende a invadir o campo da imprensa periódica, começando a olhar-se para o jornalista como um técnico da informação. Naturalmente que a especialização expõe o jornalista à manipulação das empresas e das influências políticas. A tecnologia da informação é um perigo a acrescentar a outros que impendem sobre a profissão e de que ela se defende pelo sentido humanista que a impregna e, por outro lado, pelo apego do público à liberdade, criando uma atmosfera favorável ao intercâmbio das ideias e ao florescimento da independência intelectual.
Daqui deriva que a liberdade de imprensa só tem alcance e valor se está inserida «numa estrutura sócio-política respeitadora das liberdades públicas, de que a liberdade de exprimir o pensamento escrito é sómente uma das faces.

O Sr. Sá Carneiro: - Muito bem!

O Orador: - A liberdade é um conceito e uma prática indivisível, que se não pode separar em pautes ou fragmentos.
A informação tem dois aspectos principais, derivados das características da sociedade moderna, das transformações da vida política e, finalmente, do progresso técnico.
O primeiro aspecto é a tão falada objectividade. O conceito é ambíguo, como o prova ser utilizado pelos Estados autoritários e, simultaneamente, pelos seus opositores. A objectividade pura, descarnada, não existe, mesmo mas ciências exactas. O que se deve esperar e exigir é a exactidão, garantiria pela honestidade e competência do informador.
O segundo aspecto é o carácter universal da, informação. Está dito, mas convém, repeti-lo, que as relações entre os homens tendem a estender-se ao Universo, de modo que as separações naturais ou históricas perdem a importância de outrora. Assim, as fronteiras erguidas contra as ideias são impotentes para evitar a sua difusão. «Ideia perseguida, ideia propagada: lei perpétua do munido moral, permanentemente esquecida pelo Poder.» Alexandre Herculano escreveu isto em 1871, precisamente há um século. Que diremos nós, na época das informações quase instantâneas? Que valor possuem os métodos de prevenção do contágio doutrinal? Apetece responder que não possuem nenhum, porque as ideias se infiltram, rompem as muralhas protectoras, penetram e conquistam os espíritos.
Não é tanto assim. Infelizmente, a cenoura é eficaz e, por isso, tem tantos partidários. Realmente é uma excelente arma defensiva de todos os monopólios ideológicos.
Nós, Portugueses, estamos bem colocados para ajuizar a eficácia da censura. Com alguns períodos intermediários de Uberdade, sofremos os seus rigores há perto de quatro séculos. Antigamente exercida em nome da pureza da fé e da conservação do sossego público, exerce-se modernamente em nome da unidade nacional e em razão da impreparação cívica do povo.
Sempre que lá fora se operavam mudanças culturais, cá dentro era motivo para fechar a entrada às novas formas de pensar e agir, apertando o sistema opressivo. O resultado traduziu-se nos atrasos culturais que se foram acumulando, impedindo a actualização das instituições e das mentalidades.
A censura evitou, decerto, as convulsões mais ou menos profundas por que outros povos passaram. Poupou-nos incómodos e conflitos, mas estas vantagens imediatas são desvantagens a distância, porque afectam as gerações vindouras, limitando-lhes o horizonte mental e isolando-as das grandes correntes da história.
Fizeram-nos, e fazem-nos, muita falta os confrontos com modos diferentes de viver e considerar o mundo; a discussão nascida da heterogeneidade das ideias; a livre oposição às ideologias oficiais; a variedade das opiniões, das crenças e dos gostos. O que hoje se denomina pluralismo combateu-se como se fosse um adversário corruptor dia paz pública, dos valores tradicionais, da unidade. Porém, a unidade verdadeira, sólida, incontestável, provém da diversidade de pensamento e de atitudes e não da monotonia das concordâncias. Mas, para alcançar este estado superior de unidade, era preciso que o principal veículo do pensamento, a imprensa, usufruísse a liberdade necessária para noticiar, comentar e criticar os actos e acontecimentos.
A notícia por si só não chega - o comentário é indispensável, porque aí o jornalista mostra a sua capacidade de análise, a sua visão dos sucessos, as suas concepções próprias.
O jornal de qualidade é principalmente isso: um juízo independente acerca do quotidiano.
Deixar sair a notícia e cortar o comentário é a prática mesquinha dos aparelhos de censura, sejam os oficiais, sejam os da redacção dos periódicos. E, valha a verdade, esta última é quase tão má como a primeira, porque é oculta, e contra ela o jornalista e o público estão desarmados, porque é a força do poder económico privado sobre a frágil Uberdade intelectual.
Acabamos de tocar num ponto que merecia atenção, pois fala-se pouco dele: as consequências da censura para o pensamento criador. Não se trata já do resultado imediato do exame prévio das produções escritas ou orais, mas do efeito que o estorvo à manifestação das ideias exerce no processo psicológico de formulação, relacionação e expressão, ou seja, no próprio pensamento.
Lia-se há dias nos jornais que não se é incomodado pelas ideias que se possuem. Eis uma falsa ideia clara. Sem dúvida nenhuma o Estado, ou qualquer autoridade, não deve violar a intimidade das pessoas. Mas como preservar o espírito, se se lhe impedem as manifestações? Be que vale, e o que representa, o pensamento, quando se lhe cortam as possibilidades de expressão?
A vida psíquica resulta da interacção dos processos internos com o mundo, é um tecido de relações e não produto isolado te autónomo do cérebro humano. A reflexão é uma forma de comportamento social interiorizado; portanto, o sentir, o pensar, o querer, são processas psicológicos indissociáveis dos processos sociais.
Suprimindo os actos expressivos (linguagem verbal, gestual ou a conduta social), atinge-se infalivelmente a própria consciência, o foro íntimo de cada um.
E é justamente neste ponto que se localiza a gravidade maior da censura e os estragos que produz. A acção repressiva visa o pensamento, porque o pensamento é o seu verdadeiro inimigo.

O Sr. Sá Carneiro: - Muito bem!

O Orador: - Como diz Georges Curdeau: «Cette action ne se limite pas à obtenir que la masse travaille, vote ou chante le louange du regime, elle atteint l'esprit.» O Po-

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der não intenta sómente neutralizar um adversário real ou potencial, procura modificar o espírito formando adeptos.
Eis porque se pode ser perseguido pelas ideias ainda quando se não manifestam. Os censores penetram nas consciências servindo-se de meios indirectos, mas eficazes. E não toco, porque seria despropositado, nos meios de fazer falar pela violência, desde as drogas aos maus tratos e à ternura.
Um poeta do século XVI, António Ferreira, que experimentou a censura inquisitorial, descreveu, num terceto, as tribulações da consciência perseguida. Diz assim:

A medo vivo, a medo escrevo e falo;
hei medo do que falo só comigo;
mas ainda a medo cuido, a medo calo.

Como é que a criação literária, artística, científica, as ideias sociais e políticas, numa palavra, a cultura intelectual, pode prosperar nos períodos históricos dominados pela censura?
Talvez seja fácil governar quando o povo está obrigatoriamente calado e quieto, mas a herança político-cultural destes períodos costuma ser pesadíssima, porque os grupos sociais que se sentem arriscados a perder os posições são capazes de alimentar soluções totalitárias.
Porém, felizmente, há outros grupos que a pouco e pouco reconhecem afinidades entre si, virando os olhos mais para o futuro do que para o passado.
Aproximamo-nos do instante em que será preciso escolher entre as tendências conservadoras e antimodernas e o movimento progressivo, exercendo nos espíritos e nas instituições influências que mobilizem as energias cativas.
A opinião pública começava a impacientar-se com as delongas da publicação da lei de imprensa, pois considera-a como que a expressão e o símbolo dos novos tempos.
A história dos adiamentos da publicação da lei traduz a dúvida de conferir ao povo português um direito inscrito nas consciências e nos costumes dos países adiantados. O caso não era para menos, porque durante quarenta e cinco anos os indivíduos quase se desobrigaram de pensar e de tomar resoluções políticas -alguém as tomava por eles.
Vai chegando a hora de ajuizar do valor e alcance do sistema.
A crítica do passado é necessária para imprimir um sentido novo ao presente. Não se procura demolir, mas analisar; não se cuida de denegrir, mas de avaliar, não se pretende abater uma história que teve lances consideráveis, mas simplesmente iluminar pontos obscuros. Só se destrói o que se substitui. De um sistema político-económico fez-se um templo, tornando absolutas as normas doutrinais e a vontade de um homem falível.
A lei de imprensa deve permitir essa análise, ventilando assuntos que até agora gozaram do privilégio da intangibilidade. Os Portugueses querem saber como foram governados perto de meio século; querem conhecer o seu passado sem a interferência autoritária da censura, nem as deformações da informação oficial.

O Sr. Correia da Ganha: - Muito bem!

O Orador: - Durante esse período, o cidadão sentiu-se quase impotente perante os Poderes Públicos.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Perdão... Eu, como cidadão, nunca me considerei impotente.

O Orador: - V. Ex.ª não é a maioria. É uma pessoa considerada, mas, em todo o caso, uma pessoa única.

O Sr. Casal-Ribelro: - Está bem! V. Ex.ª pode considerar-se impotente, mas eu nunca me considerei impotente!

O Orador: - É certo que poderia aderir; é verdade que podia participar colaborando, mas não dispunha de meios eficazes de manifestar as suas opiniões e, muito menos, de reivindicar o que o sistema político não previra.

O Sr. Mota Amaral: - Muito bem!

O Orador: - A liberalização compreende duas fases: a primeira é a apreciação crítica do passado; a segunda, a edificação do futuro.
A revisão da Constituição Política, a lei sobre a liberdade religiosa e a lei de imprensa são passes no caminho novo. Talvez se não tenha podido ir mais adiante, mas isto é ainda insuficiente. Diria que são etapas que alargam os limites da acção, permitindo que o País respire mais livremente, mas o essencial é a formulação de um projecto ou programa que corporize as aspirações e expectativas, especialmente das camadas sócio-económicas mais ou menos subalternizadas a certas influências dominantes.
Se acaso for possível efectuar a transição conservando a estabilidade e o sossego, tão apreciados por aqueles que têm de ceder para que a evolução se faça, tanto melhor. Mas que considerações desta ordem não embaracem as decisões!
Não há dúvida que, em frente de interesses contraditórios, de grupos de pressão e de influências várias, a conservação da ordem pode ser uma defesa e até uma virtude, mas um dia será preciso correr os riscos inerentes a todo o processo de mudança, abandonando as certezas repousadas pelos arrebatamentos criadores de novas formas de convivência.
Perguntar-se-á o que tem a ver isto com a lei de imprensa. Respondo: tem tudo. Só é possível executar os grandes trabalhos colectivos com a adesão consciente do povo, e isso alcança-se por intermédio do esclarecimento, da troca de ideias, do debate público.

O Sr. Sá Caneiro: - Muito bem!

O Orador: - Confiemos em que as formas antigas de participação na vida pública hajam acabado, sendo substituídas por outras que respeitem o pensar e o querer do cidadão e dos grupos.
Os impedimentos ao intercâmbio intelectual eram relativamente fáceis de suportar na época em que uma nação podia manter-se mais ou menos isolada das outras. Porém, o isolamento, o «esplêndido isolamento» como alguém lhe chamou, tornou-se precário, porque as relações entre os homens, as comunidades nacionais e os continentes são dia a dia mais densas e os povos mais solidários. Sobretudo as nações menos adiantadas sentem-se atraídas - ia a dizer fascinadas - pelas maravilhas da civilização actual, sendo incapazes de se opor à influência das culturas estranhas, reputadas mais brilhantes e promissoras.
A comparação entoe o que se passa dentro e fora das fronteiras leva à aceitação (tardia!) das ideias dos estrangeirados, como se dizia mo século XVIII.
Pretender a (prosperidade e a justiça e, simultâneamente, levantar dificuldades à informação e à divulgação da cultura é querer coisas inconciliáveis; é preparar o terreno para a manutenção do statu que e da vida prosaica.

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É preciso deixar que os contrates, as antinomias e as contradições latentes na sociedade portuguesa, cobertas pelo ma ato diáfano da Concordância e do silêncio, se desenvolvam e venham à superfície. A existência de um povo é salutar quando pode exprimir os seus anseios, associar-se voluntariamente ao processo político, determinando, ele próprio, os fins colectivos.

O Sr. Correia da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Tem de reconhecer-se que a máxima dificuldade do movimento evolutivo reside mia antítese entoe a participação de todos mo progresso social e o temor de algumas camadas políticas do abrandamento do sistema repressivo.
Esta situação contraditória sacrifica o bem-estar do maior número à tranquilidade de poucos.
As contradições resolvem-se com a vitória das tendências progressivas.
Há anos atrás era comum perguntar se o Regime podia subsistir sem censura, ao que se respondia de dois ânodos: os adversários opinavam que ele ruiria nesse instante; os adeptos mais ferrenhos asseveravam o contrário, mas não consta que tentassem suprimi-la.
Há uma terceira resposta que pode fazer-nos sair da alternativa. Consiste em submeter a questão à prova dos factos. Termine-se com a censura, e observe-se o resultado. O que a especulação é incapaz de resolver, resolvê-lo-á a prática social.
Estou persuadido de quê o Governo saía vitorioso da prova, porque já conquistou a maioria da opinião pública pelo que realizou e, principalmente, pelas esperanças que se depositam nele.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A lei de imprensa não significa o fim da censura, nem o da atormentada existência do direito à expressão do pensamento em Portugal, mas abre um horizonte que pode ser a terra prometida - a simples liberdade de viver democraticamente.
O orador foi cumprimentado.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Forque vem especialmente a propósito, não queria deixar de expressar, antes de iniciar breves considerações sobre a lei de imprensa, a minha profunda mágoa pelo desaparecimento do número dos vivos, visto que a sua obra e o seu talento perdurarão, do Dr. Augusto de Castro, diplomata ilustre, escritor insigne e português dos melhores.
Ao Diário de Noticias, que ele serviu durante quase meio século, apresento, bem como o toda a imprensa portuguesa, os meus dolorosos respeitos pelo infausto acontecimento que enlutou as letras e o espírito nacional.
Sr. Presidente: Serei muito rápido nas considerações a produzir sobre a proposta de lei em discussão: a liberdade de imprensa. Apenas breves palavras, o enunciar de algumas dúvidas e de alguns receios e, para começar a minha inquietação de ver, em tão pouco tempo, discutir em se, em estilo maratona, trás assuntos tão delicados e tão importantes - a dizer vitais - para o futuro da Nação: a alteração à Constituição, a liberdade religiosa e, agora, a lei de imprensa.

O Sr. Correia da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Eu sei que esta última, mais do que qualquer outra, vem sendo há longo tempo objecto de estudos e constitui natural anseio dai próprias imprensa e de alguns políticos que pensam assim contribuir para a mentalização do País num estalo novo, mais liberal, mais descomprimido, como tenho ouvido chamar a toldo quanto resulta de uma abertura que se vai processando, não sem alguns inconvenientes, mas, segundo parece, de acordo com as novas fórmulas encontradas para dirigir e orientar o País, dentro da renovação adoptada na continuidade que se impõe.
Pensa-se que, desta forma, a imprensa poderá exercer melhor as suas funções informativas e formativas, e mão «ou eu que nego o facto, apesar de todas as reticências que possa pôr, mais quanto à oportunidade da entrada em vigor da lei em discussão do que quanto ao fundamento da argumentação dos que defendem a cessação da censura prévia -, salvo casos especiais, aliás previstos na proposta presente agora a esta Assembleia.
Desejo, para já, prestar a minha homenagem aos profissionais da imprensa, aos seus dirigentes e orientadores, pois considero que, na sua esmagadora maioria, estão uns e outros cheios das melhores intenções.
Confio, portanto, no bom critério e no patriotismo daqueles a quem está entregue, a pesada e importantíssima tarefa de esclarecer, informar e formar a opinião pública da Nação, tal como confio no bom critério e na autoridade que o Governo saberá exercer quando - e oxalá tal não venha a suceder - houver desvios que afectem a execução do importante diploma em análise.
Pessoalmente, e para além de não achar oportuna a entrada em vigor de medidas liberalizantes e inadequadas a um país em guerra, guerra que é decisiva para a sua unidade histórica e que do exterior lhe foi imposta, não me impressionou nunca a ideia do regime até aqui adoptado, e quase impunha para levar a cabo toda a obra de reconstrução iniciada há tão largo tempo. Mas seguindo uma linha de rumo da qual não tenciono afastar-me, ponho, neste caso, acima da minha opinião pessoal aquilo que o Governo, após aturado estudo, entende constituir uma necessidade para obter melhores frutos na tarefa ingente a que meteu ombros, e que, segundo julga, trará ao País benefícios, aliás só possíveis partindo de tudo quanto foi feito nos quarenta anos do Estado Novo, apesar das grilhetas, da escravidão e de outras coisas mais, sob a chefia do Doutor Salazar, a quem não me canso, hoje mais do que nunca, de render homenagem, por tudo quanto por nós trabalhou, e que constituiu, por assim dizer, a rampa de lançamento para a obra de actualização e desenvolvimento em curso.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Estudada, portanto, atentamente, a proposta do Governo e ressalvados os aspectos que já referi quanto à oportunidade da sua entrada em vigor, dou a minha aprovação na generalidade ao diploma em discussão, reservando-me na especialidade para aceitar e votar quaisquer emendas que possam vir a parecer-me mais capazes de corresponderem ao pensamento de quem é profundamente contrario a tudo quanto seja «uma falsa ideia clara» de liberdade susceptível de conduzir o País àquilo de que saiu, e a que ninguém por certo quer ver regressar.
Confio, repito e insisto, na acção do Governo, e também no trabalho daqueles a quem fica entregue a tarefa que sairá facilitada, segundo parece, da aprovação da lei de imprensa.
Não desejaria -, porém, e de certo comigo estarão todos os bem-intencionados, voltar a assistir àquele tipo de liberalizações em que se multiplicavam os assaltos às re-

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dacções, o empastelamento dos tipos dos jornais visados, e em que a «liberdade» era usada e concedida em nome de ideias destrutivas, demagógicas e muitas vezes anárquicas.
Só porque era um jornal monárquico, assisti a mais do que um assalto à redacção de O Dia, à destruição de máquinas e mobiliário; à agressão de quem nele trabalhava, e de quem o dirigia: o grande jornalista e homem de bem Moreira de Almeida.
A casa de meus pais, na Bua de António Maria Cardoso, era paredes meias com o prédio onde funcionava o referido jornal, e eu, na inocência da minha idade, assistia atónito a actos daquela natureza! Dizia-me então meu pai, entre preocupado com o plano inclinado em que estava o País e a fina ironia que tantas vezes usava, «que tudo aquilo era consequência das liberdades políticas a que nos tinha conduzido um regime de partidos, cujas ditaduras internas cegavam tanto homem de bem e de talento»!
Ora são essas liberdades de imprensa, ou sejam do que for, que ninguém, conscientemente, quer ver regressar, pelo menos nesta Assembleia; nem os que legislam, os grandes responsáveis; nem os que informam, afinal as grandes vítimas; uns e outros portugueses, que embora seguindo rumos autónomos e com acções específicas bem diferentes, têm como missão servir!
O País não pode nem quer retornar para uma situação banida, graças mais ainda à mentalização do seu próprio povo, do que à acção de um regime ou de um homem, por maior que tenha sido.
E de tudo quanto o Doutor Salazar fez - e tanto foi - o maior trabalho realizado foi ter dado a Portugal e aos seus filhos a consciência, que parecia perdida, do que pode fazer-se quando se acredita na força da própria razão.
Há verduras que passam, assim como epidemias - as mais graves - que se vencem; renovam-se métodos que a própria experiência vai melhorando e adaptando, de forma que do enunciado primitivo apenas fique o que serve a Pátria de todos nós, tarefa que, por certo, ninguém desdenhará, embora seguindo por caminhos apenas convergentes num ponto, mas ponto essencial - o supremo interesse nacional, bem inestimável que urge preservar para a continuidade de Portugal.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Oliveira Dias: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi com alvoroçada esperança que a grande maioria dos portugueses atentos aos acontecimentos políticos - e cada vez mais são, felizmente - soube que, enfim, iria votar-se nesta Assembleia uma lei de imprensa.
Aspiração antiga das camadas intelectuais, há muito se radicara, também, em vastas camadas populares mais ou menos conscientes do direito que lhes assiste a uma informação objectiva, completa e verídica.
É que, meus senhores, vai-se generalizando também entre nós a ideia de que a liberdade de imprensa é factor essencial de progresso e, ao mesmo tempo, sintoma de maturidade cívica.
Vive-se, por toda a parte, a consciência da necessidade da participação de todos na vida pública. Pois essa participação só se torna efectiva, à escala local e à escala nacional, na livre troca de ideias, de sugestões, de críticas, por forma a todos poderem dar o seu contributo à grande tarefa de edificação do bem comum.
Não faltará quem venha empolar os riscos da Uberdade de imprensa e, então, recordar-se-á que vivemos há quarenta anos em regime de censura prévia e que são imprevisíveis as consequências de uma brusca liberalização.
Anotando, desde já, a consequência hoje generalizada dos inconvenientes de tal regime, ocorre perguntar quais serão as consequências de uma lei chamada da liberdade de imprensa que, na prática, deixe as coisas como dantes.
Muitos estaremos de acordo em que o regime da censura prévia, com as arbitrariedades que tem exercido, é, em grande parte, responsável pela «compressão» criada na vida portuguesa, permitindo que, sob a «capa» do bem comum, se tenham abrigado obscurantismos, irregularidades e desvios.

O Sr. Correia da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Nunca esquecerei, por exemplo, o choque pessoal que sofri quando, em publicação de índole católica dos meus tempos de estudante, tivemos de suportar o gravame de um corte da censura a parte de um discurso do Papa Pio XII!
No regime de censura prévia ainda vigente, embora abrandado, se pode também filiar, em grande parte, a «instituição nacional» do boato, tão prontos se mostram os Portugueses a aceitar como verídico o que não vem nos jornais, porque, justamente, muitas vezes a verdade lhes não foi revelada.
E os riscos da liberdade de imprensa? Ao exigi-la não estaremos a cavar a ruína da Nação?
Creio que mal vai uma nação que vive, desculpem-me, de «fechaduras». Será como o «sepulcro caiado» de que fala o Evangelho.
Não nego os riscos que comporta uma verdadeira liberdade de imprensa, mas sou dos que julgam que vale a pena combater em campo aberto; e se muitas vezes nos queixámos da falta de políticos e de doutrinadores foi porque lhes não soubemos proporcionar os estímulos de um «confronto livre de pontos de vista», para usar a expressão do recente documento da Igreja, Comunicação e Progresso, sobre a matéria.
Julgo, portanto, urgente a institucionalização da liberdade de imprensa como factor de desenvolvimento e de participação social.
Evidentemente que não defendo - ninguém de bom senso pode defender - uma liberdade anárquica e irresponsável, susceptível de causar danos sérios a pessoas e instituições.
Mas estou com o digno Procurador Manuel Maria da Silva Costa, quando, no seu voto de vencido, formula a questão nestes termos:

Ou se escolhe a liberdade tutelada judicialmente, com todas as suas vantagens, mas também com os seus riscos, ou se prefere a prevenção e repressão por via administrativa, com o perigo inerente de facultar ao poder político a concessão ou negação do direito à informação verdadeira e objectiva.

Ora, louvando embora a iniciativa do Governo, a par da dos Deputados, e reconhecendo a validade de muitos pontos da proposta, é-me forçoso reconhecer que nela se contém aspectos que devem ser revistos pela Assembleia, se efectivamente desejamos estabelecer uma verdadeira liberdade de imprensa.
Uma lei de imprensa que não consagre com clareza e objectividade: o direito de ser informado e de informar, a liberdade de acesso às fontes de informação, a liberdade de criação de empresas jornalísticas, a plena jurisdicionalização da repressão de abusos, poderá ser um passo

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positivo no sentido da instauração da liberdade de imprensa, mas não significará, realmente, a instauração dessa liberdade, como manifestação do direito natural, consignado na Constituição da liberdade de expressão de pensamento.
Tem-se dito que mais vale um arbítrio benevolente no condicionamento na liberdade de imprensa do que uma lei rigorosa. Não estou de acordo. Julgo que vale a pena, nas circunstâncias actuais, a publicação de uma lei da imprensa ainda que, por força dessas circunstâncias, não corresponda integralmente ao que seria para desejar.
Vale a pena e estamos a tempo de aprovar uma lei que, sem afectar a necessária autoridade do Estado, indispensável ao bem comum, respeite este direito essencial dos indivíduos de informar e de ser informados objectiva e veridicamente.
Creio que isto ainda será possível e que a Assembleia o poderá fazer se, arredando preconceitos, tiver presente o verdadeiro interesse nacional, pois que, também neste domínio da mais alta importância na construção do país novo que desejamos, baseado na participação de todos nos negócios públicos, eu julgo possível a harmonização da autoridade do Estado e da liberdade dos cidadãos.
Nem se diga que isto é ingenuidade ou querer andar com velocidade excessiva. Se outros o têm conseguido, não sei por que o não conseguiremos nós, se estivermos efectivamente conscientes da necessidade de instaurar uma verdadeira liberdade de imprensa, sem prejuízo do interesse nacional, tanto mais que podemos aproveitar a lição das experiências alheias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estudei, com o possível pormenor, a proposta e projecto em discussão e, desde já, formulo o voto de que ambos estejam presentes na discussão na especialidade. Na verdade, completam-se e onde se contradizem, julgo indispensável que a Assembleia tome as suas opções caso por caso.

O Sr. Correia da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Só assim, no meu entender, corresponderá, nesta matéria essencial, às responsabilidades em que foi investida pelo eleitorado e se prestigiará no plano nacional e internacional.
A proposta e o projecto completam-se e se, pessoalmente, não posso deixar de dar a minha aprovação à orientação geral do projecto na medida em que julgo que assegura uma efectiva liberdade de imprensa, também não deixo de reconhecer que a proposta contempla domínios que devem ser considerados e de real importância.
Ainda que tal facto possa acarretar mais uns dias de sacrifício, discutamos tudo, tenhamos presentes todas as hipóteses, sem esquecer que, perante nós próprios e perante a Nação, a responsabilidade da aprovação das bases que vierem a ser votadas é da Assembleia, toda ela, e não da comissão nomeada pelo Sr. Presidente, qualquer que seja a validade do seu trabalho preparatório.

O Sr. Correia da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Na discussão da presente lei há vários princípios fundamentais que sempre deveriam estar presentes no nosso espírito: por um lado, o direito de informar e de ser informado, a que já aludi; por outro, a necessidade de, mais do que reprimir, incrementar a acção da imprensa - refiro-me à imprensa séria e objectiva - no reconhecimento do seu importantíssimo papel na sociedade dos nossos dias, na busca de um pleno desenvolvimento.
Mas, se assim é, não vejo como possam aceitar-se alguns aspectos da proposta - a que voltaremos na especialidade -, particularmente no que respeita à possibilidade de uma censura à distribuição, a que se refere a base XIX, e que, por hipótese, significará a apreensão de toda uma edição nos termos da base IX, com os prejuízos inerentes; o regime de exame prévio que, tal como está formulado na base XXIV, poderá ser instaurado pelo Governo discricionàriamente, embora sujeito a uma confirmação da Assembleia Nacional, que poderá tardar largos meses; a repressão por via administrativa dos abusos, quando só aos tribunais deveria caber, como bem prevê o projecto, o que ainda mais se agrava pelo excessivo rigor de algumas das sanções previstas.
Um outro aspecto que julgo indispensável ficar claro desde já na lei é o da livre fundação de empresas jornalísticas, pois de outra forma arriscamo-nos a transferir do Estado para os grandes grupos financeiros o contrôle da opinião, o que seria um efectivo retrocesso.
É corrente objectar-se que a instituição de uma verdadeira liberdade de imprensa poderá redundar em libertinagem, com prejuízos irreparáveis nos indivíduos e nos grupos sociais.
Eu não nego, já o disse, a possibilidade desses riscos; pergunto se não valerá a pena corrê-los, numa sociedade como a nossa, em clima de reformas e desejosa de atingir, finalmente, a «maioridade».
Que essa Uberdade exige de todos um maior esforço, na promoção de uma imprensa honesta e objectiva - sem dúvida! Mas eu pergunto se não vale a pena este combate, se não será preferível a certas águas mornas em que temos vivido.
Meus Senhores: A liberdade de imprensa é flor delicada que bem merece os cuidados desvelados de todos nós, na plena consciência da sua importância para a construção de uma sociedade que para ser mais justa tem de ser mais livre.
Não matemos à nascença essa flor delicada! Seria preferível não a ter semeado!

O Sr. Sá Carneiro: - Sr. Presidente: Competia-me, como signatário e co-autor de um projecto em discussão, fazer a sua análise e comparação com a proposta, nesta discussão na generalidade, produzindo o habitual discurso escrito, tão longo e completo quanto possível. A saturação e o cansaço que caceio serem visíveis em todos nós, por um lado, e, por outro lado, a circunstância de o Deputado Balsemão, também signatário e autor do projecto, haver ontem exposto, completa e elucidativamente, a comparação dos dois textos e as conclusões a retirar dessa comparação, consubstanciando o sentido das opções a tomar, levaram-me a pôr de parte a intenção de escrever o discurso; limitar-me-ei a umas singelas palavras pensadas esta manhã.
É-me grato procurar fazê-lo, tranquilo de que - como disse, recentemente, o Sr. Presidente do Conselho - podemos discutir ideias e métodos sem nos envolvermos em querelas pessoais. Por mim, assim procurei proceder sempre e assim continuarei a proceder.
Fiz parte da comissão eventual designada por V. Ex.ª para o estudo dia proposta e do projecto da lei de imprensa.
Não concordei com o método de trabalho seguido no parecer. Assente, como foi, que não haveria nesse parecer votos de vencido, cada um ficava livre de no plenário, sobre esse ponto e sobre os demais, expor as suas opiniões. Daí que comece por dizer as razões da minha discordância.

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Inicialmente, a Constituição não previa a existência de comissões permanentes, a não ser quanto à verificação de poderes e quanto à redacção dos textos. A possibilidade de as haver foi introduzida em 1945, depois de uma experiência de sessões de estudo que se revelou, creio, completamente ineficaz.
O que foi a vida e a experiência das comissões a partir de 1945 ensinava-o o meu mestre de Direito Constitucional nestes termos:

A comissão que receba um projecto já admitido, ou uma proposta, pode começar imediatamente o seu estudo ou aguardar a chegada do parecer da Câmara Corporativa. Não emito, ela própria, parecer, embora o relator tome nota das deliberações tomadas nas reuniões. Não está previsto o direito de emenda pelas comissões. As emendas que a maioria das comissões aprovar são apresentadas durante a discussão no plenário, sob a responsabilidade individual dos Deputados que dela fazem parte.
Normalmente, o relator e, nos casos mais importantes, o presidente da comissão intervêm na discussão do plenário e pronunciam-se sobre as emendas que não sejam propostas pelos membros da maioria da comissão.

Foi isto assim, é isto assim, porque o Regimento e a Constituição não foram, neste ponto, alterados. Nem se diga que estou a invocar o argumento da autoridade. Não estou, até porque o não aceito. Estou apenas a citar, numa síntese feliz, clava e elucidativa, aquilo que foi - e a meu ver tem de ser - a orientação e o trabalho das comissões. E não aceito o argumento da autoridade, porque cinco anos de experiência na Faculdade de Direito de Lisboa e quinze anos de vida profissional ensinaram-me de sobejo que o argumento de autoridade só se invoca quando se não tem por si a autoridade das razões e dos argumentos; e normalmente só convence aquele que o invoca.

O Sr. Correia da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Revertamos, porém, às comissões.
O Regimento prevê comissões permanentes e assinála-lhes, genericamente uma certa competência, dispondo que, além desta competência, para as permanentes como para as eventuais, poderão o Presidente e a Assembleia conferir-lhe poderes e delegar funções.
E foi assim quanto a projectos, num único caso, creio, na história desta Casa. Em 1937 foi constituída uma comissão eventual para estudar a elaboração de um projecto de regimento e eventualmente de um projecto de lei de revisão da Constituição. Por sinal que o Governo se esqueceu até de que essa comissão trabalhava ainda e apresentou ele uma proposta sem cuidar do labor da comissão, que por sua vez veio efectivamente a apresentar, mais tarde, a proposta a seguir discutida. Não foi este o único sinal característico da revisão de 1937, já que nessa revisão, caso único também na história do nosso direito público, a lei de revisão da Constituição não foi promulgada pelo Presidente da República, que lhe recusou a sua promulgação.
Há ainda, é certo, um paralelo, não na história desta Assembleia, mas na da 1.ª. República, que recentemente foi até invocado. Foi o modo de elaboração da Constituição de 1911. Pois, também aí, só foi possível que a comissão apresentasse no plenário um projecto de revisão da Constituição porque recebeu do plenário essa incumbência expressa e específica.
Tirando estes dois casos, não conheço qualquer caso em que a uma comissão tenha sido cometida a incumbência de harmonizar, entre si vários textos.
No caso da comissão eventual para estudo da revisão da Constituição assim não sucedeu, dado que no despacho em que V. Ex.ª, Sr. Presidente, designa essa comissão, lhe comete apenas o estudo, como era de resto tradicional nesta Casa.
O que é que se passava então até à presente legislatura?
Passava-se que, presente ao plenário uma proposta ou um projecto com o parecer da Câmara Corporativa, a quem competia estudar e dar parecer sobre os textos, era incumbida uma comissão de os estudar, não para duplicar o trabalho da Câmara Corporativa, não para elaborar um novo texto, mas para que no plenário estivessem presentes pessoas especialmente capacitadas para intervir no debate.
Como é que se processava depois o debate?
Normalmente, a comissão nem sequer elaborava nem lia o seu parecer e limitava-se a intervir na especialidade. Foi assim, designadamente, na revisão constitucional de 1959, em que a meu ver, sem prejuízo da formação da vontade da Assembleia, foram aqui discutidos, sem parecer nem texto da comissão, uma proposta e oito projectos de revisão.
Eis porque, em meu entender, não considero de perfilhar o método da comissão. A comissão não tem que apresentar um novo texto, não pode nem deve fazê-lo, pois que essa missão não lhe compete pelo Regimento, e ninguém disso a encarregou. Mas há outro aspecto, que é o aspecto do plenário. Disse que assim se passavam as coisas até à X Legislatura. Efectivamente, a partir da abertura desta legislatura começa a vincar-se a tendência para as comissões produzirem os seus pareceres, lidos aqui ou reproduzidos no Diário das Sessões.
Mas é apenas no caso dia comissão eventual para o estalido da revisão constitucional que a comissão aparece a propor um texto completo. Ainda assim, no entanto, a comissão não recomendou ao plenário que a discussão se firme «obre esse texto; conclui, sim, que a discussão ma especialidade se firme sobre a proposta do Governo, com as alterações e emendas apontadas pela comissão.
Depois disso, e agora no caso que nos ocupa, a comissão vai mais longe e propõe não só um texto, como a recomendação de que a discussão se faça sobre esse texto. Já disse da impossibilidade de o fazer do ponto de vista da comissão. Creio que o próprio plenário mão pode aceitar esta recomendação.
É direito fundamental dos Deputados e volto à lição do Mestre:

[...] discutir e votar as propostas e projectas de Lei e a matéria das resoluções e apreciar os actos do Governo ou da Administração. E este direito que fundamentalmente constitui a função dos Deputados como titulares do órgão colegial que a Assembleia forma. Tem de ser excedido nos termos regimentais, mas, desde que o seja, mão pode o Deputado ver recusado o uso da palavra para as discussões e as apreciações referidas, nem ser impedido de votar nas deliberações.

Ora, o Regimento consagra, efectivamente, como se há-de proceder em face de textos diversos. Regimento que, note-se, não é facultativo, nem afastável pelo voto da maioria, já que o Regimento tem de existir, porque o impõe a Constituição - artigo 101.º -, que não foi alterada neste ponto; e assinala-lhe imediatamente um

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conteúdo específico, que é, designadamente, o de fixar as condições de apresentação de projectos de lei.
For outro lado, face a dois textos, o plenário pode, evidentemente, adoptar um caso base de discussão, pode mesmo ter de encarar três textos, já que a Câmara Corporativa pode propor um contraprojecto e qualquer Deputado perfilhá-lo e requerê-lo para base de discussão. Mas é essa a única hipótese, a única restrição ao direito de discutir e votar projectos e propostas. E foi assim, de resto, que sempre se procedeu. Recordo, designadamente, o caso da Lei n.º 2030 (Lei do Inquilinato), em que, face a um projecto, a uma proposta e a um contraprojecto da Câmara Corporativa, se adoptou como base de discussão para certos pontos a proposta do Governo e, para outros, o contraprojecto da Câmara Corporativa. O que significa adoptar como base de discussão? Significa que em relação a ele se fará a votação prioritariamente, que em relação a ele incidirão propostas de alteração, e que os demais serão discutidos na parte em que, pela votação do texto base da discussão, não ficarem prejudicadas, e só nessa estrita medida.
Portanto, a discussão há-de ser sempre feita conjuntamente, fade a uma proposta ou a um projecto ou a um parecer da Câmara Corporativa. Não é apenas o artigo 36.º do Regimento; é também a própria Constituição que no § 3.º do artigo 103.º isso impõe. O que de resto se compreende; vejamos a situação a que nos conduzia o procedimento adoptado pela Comissão e do qual eu discordei.
Pois teríamos, eventualmente, um texto que nem sequer foi objecto de parecer da Câmara Corporativa, o que também é contrário à Constituição. A Câmara Corporativa deu parecer sobre os projectos, deu parecer sobre a proposta; e apresentou o seu contraprojecto, sobre o qual, evidentemente, não tinha de dar parecer, porque é o resultado do seu parecer. Se vamos considerar um novo texto, teremos a infracção à disposição do artigo 35.º do Regimento, que não permite que aqui sejam discutidos quaisquer textos sem parecer da Câmara Corporativa ou sem que tenham decorrido o prazo para ele ser emitido.
Nem se diga que estou a falar de um incidente passado não estou. Estou a falar de um caso presente, embora não considere encerrado o referido incidente; mas entendo que falar dele só deve ser na altura própria, no órgão próprio, pelo meio próprio. E a altura própria só pode ser, por definição, depois de aparecer uma lei de revisão; o sítio próprio é este e apenas este, já que a Assembleia Nacional é o único órgão competente para conhecer da inconstitucionalidade formal das leis promulgadas pelo Presidente da República; e o meio próprio é o do artigo 123.º, § único, da Constituição.
Só por isso, portanto, eu dizia que não considero o incidente encerrado e que penso, efectivamente, levantar aqui, oportunamente, o problema da inconstitucionalidade formal da lei de revisão.
Mas revertamos ao assunto em análise.
Eu defendi a minha posição, como é meu direito; e é evidente que, em face dela, as mesmas causas conduzirão aos mesmos efeitos.
Adoptei uma atitude consciente e deliberadamente; não por precipitação e imaturidade; pode efectivamente a minha prática e maturidade terem aumentado de então para cá, mas como elas não foram factor que tivesse influência na minha atitude, a atitude manter-se-á.

O Sr. Ulisses Cortês: - Pelo facto de a Assembleia ter seguido os trabalhos como seguiu, VV. Ex.ªs abandonaram os trabalhos. V. Ex.ª está, portanto, a fazer pressão sobre a Assembleia.

O Orador: - V. Ex.ª quer que eu chame a atenção...

O Sr. Ulisses Cortês: - ... Eu chamo a atenção de V. Ex.ª só para este aspecto. De resto, devo dizer-lhe que, juridicamente, a sua argumentação não convence...

O Orador: - Folgo com isso.

O Sr. Ulisses Cortês: - Interrompo V. Ex.ª só para chamar a sua atenção sobre o facto de afirmar que, a manter-se a prática seguida na discussão da proposta de lei de revisão constitucional, seriam os mesmos os efeitos, isto é, V. Ex.ª abandonaria os trabalhos parlamentares, em termos semelhantes aos que então lamentavelmente se verificaram.
Considero o facto como um meio de pressão sobre a Assembleia, contra o qual não podia deixar de insurgir-me.
Não me parece também regimentalmente correcta a interpretação de V. Ex.ª sobre a competência e métodos das comissões parlamentares. Estas comissões não estudam apenas: formulam sugestões, emitem votos, propõem novos textos, aperfeiçoam os diplomas submetidos à sua análise.
Assim se tem trabalhado na presente legislatura, podendo citar os casos das Comissões de Finanças, Economia e Ultramar, que têm prestado úteis contribuições para a eficiência e aperfeiçoamento dos projectos e propostas de lei. Este processo de actuação pretende revitalizar as Comissões, de modo a assegurar-lhes uma acção construtiva e uma profícua colaboração.
De resto, este método foi observado relativamente à proposta de revisão constitucional, e o processo de discussão adoptado foi harmónico com a Contituição e conforme ao Regimento. Não hesito em afirmá-lo como jurista, conhecedor dos princípios da hermenêutica. Corresponde a um caso omisso, que pode ser resolvido por analogia, de acordo com a interpretação mais correcta. Nada proíbe no Regimento que a Comissão estabeleça um texto que sirva de base à discussão, à semelhança do que sucede com a Câmara Corporativa.
A vida não é apenas experiência histórica; é permanente inovação. Não parece também que o texto da comissão de estudo careça de ser submetido, de novo, à Câmara Corporativa. Esse texto é fundamentalmente constituído pela proposta do Governo, que foi já objecto de exame daquela Câmara.
O resto são sugestões da própria Câmara Corporativa, com alguns aditamentos e alterações, normais e correntes na vida parlamentar.

O Sr. Júlio Evangelista: - Muito bem!

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Correia da Cunha: - Não apoiado! O passado tem sido evocado muitas vezes nesta Câmara. Mesmo muitas vezes.

O Orador: - Eu lamento ter de lembrar a V. Ex.ª que, se queria fazer uma interrupção, devia, pelo menos, por imperativo regimental, ter pedido a indispensável autorização.

O Sr. Ulisses Cortês: - A V. Ex.ª não peço coisa nenhuma.

O Orador: - Pois faz V. Ex.ª muito bem... Porque se a pedisse, eu dar-lhe-ia autorização. Agora o que não lhe consinto é aquilo que julgo contrário às mais elemen-

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tares normas, designadamente o que está no Regimento: é que V. Ex.ª faça um aparte não consentido. E está a insistir na infracção, e...

O Sr. Presidente: - E um facto regimental que os Srs. Deputados não podem ser interrompidos sem sua autorização.
Sr. Deputado Sá Carneiro, tenha a bondade de continuar.

O Orador: - ... Pois, como eu ia dizendo, se V. Ex.ª pedir autorização, tê-la-á; mas só se a pedir. De outra maneira, não considero qualquer aparte ou intervenção. Fica já o assunto esclarecido.
Se a não quer pedir, é consigo, não tenho nada com isso.
De resto, se quer contestar, como algum dos membros desta Casa, aquilo que aqui expus, sem fazer qualquer pressão sobre ninguém, pressão que não faço nem tolero,... no uso da minha liberdade e dos meus direitos regimentais - retomando, de resto, o tema versado por um dos oradores desta tarde -, será na altura própria, cuja escolha deixo ao critério de cada um. Já que, evidentemente, autorizações pedidas para interrupções as consentirei todas, como costumo consentir, mas pode ser na altura própria também; ou na discussão, na ordem do dia, mediante a inscrição, ou na discussão, mais tarde, do problema que levantei.
O que se passou na discussão da revisão da Constituição foi uma reacção legítima e fundada, a meu ver, a única possível, ante um processo que qualifiquei e qualifico de anti-regimental e inconstitucional.
Como me parece que factos, argumentos e raciocínios concretos só podem ser impugnados do mesmo modo, sem se invocar genéricos passados ou autoridades, que eu logo disse que não aceitava, eu continuo, tranquilamente, a minha exposição.
Chegamos a 1969, depois de a lei de imprensa ter sido uma constante preocupação durante o Regime, nunca satisfeita. Eu não vou aqui reproduzir as considerações da história dessa preocupação, que expus já em 25 de fevereiro de 1970, mas verifiquei que na primeira legislatura desta Assembleia, logo em 1935, um Deputado - o Deputado Pinheiro Torres - anunciou um aviso prévio sobre a actuação da censura e a situação da imprensa.
Creio que esse aviso prévio nunca chegou a efectuar-se. E conhecido o que aqui já referi quanto ao que se passou em 1959 e à constante referência da preparação de uma lei de imprensa.
E o problema que se me pôs, neste campo, foi o seguinte: eu concebo a Assembleia Nacional essencialmente como uma câmara legislativa, já que, sem iniciativa legislativa própria e sem prerrogativas legislativas próprias, é vão o uso da função fiscalizadora. Não a concebo de modo algum - é uma opinião pessoal, evidentemente, como o são todas as minhas - como uma câmara de eco, destinada a amplificar sobre o País as iniciativas do Governo, os seus propósitos, nem como um coro de louvores ou um muro de lamentações.
A actividade específica, nobre, que a esta Casa, a meu ver, confere o indispensável prestígio, é a actividade legislativa. Actividade legislativa que tem de ser acompanhada da consequente iniciativa, mormente naqueles campos de competência exclusiva da Assembleia Nacional.
É certo que, quando pensei elaborar o projecto de lei de imprensa, eu sabia que o Governo se tinha debruçado sobre o assunto e que tencionava apresentar uma proposta, como fora anunciado. Mas sabia também, pelas declarações sucessivas do Sr. Presidente do Conselho, que essa proposta não iria abolir a censura prévia administrativa. Ora, por um lado, evidentemente que eu reconhecia ao Governo o direito de ser juiz das suas próprias oportunidades, mas isso me dava também a mim o direito de ser o juiz das minhas. De outro modo, se estivesse necessariamente a aguardar a escolha de oportunidade pelo Governo, eu estaria afinal sem oportunidades próprias. Por outro lado, a minha concepção de lei de imprensa é absolutamente incompatível com a existência de qualquer tipo de censura administrativa, prévia ou não.

O Sr. Camilo de Mendonça: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Estou inteiramente de acordo com V. Ex.ª Em princípio e em teoria, não haverá liberdade de imprensa, é certo, se houver censura prévia. Se houver estado de guerra, V. Ex.ª considera o princípio da mesma maneira?

O Orador: - Tanto não o considero que no projecto, que fui um dos co-autores e um dos signatários, previ, que, transitoriamente e enquanto perdurasse o estado de guerra nas províncias ultramarinas, houvesse exame prévio para as notícias de carácter militar.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Mas V. Ex.ª limita as notícias de carácter militar a quê? Este é que é o meu problema...

O Orador: - Às notícias de carácter militar...

O Sr. Camilo de Mendonça: - V. Ex.ª tem uma notícia... O carácter militar o que é? Quando estamos em guerra, estamos todos em guerra, mesmo aqueles que estão em paz, por estarem longe ou esquecidos da guerra.

O Sr. Correia da Cunha: - Mas às vezes não parece...

O Sr. Casal-Ribeiro: - Não se pode dominar a retaguarda!

O Sr. Camilo de Mendonça: - Não parece, infelizmente, a V. Ex.ª e a todos quantos estamos aqui comodamente, enquanto outros se batem. Esquecemo-nos disso...

O Sr. Correia da Cunhar - Eu sei..., eu sei..., mas é que muita gente não sente isso. Eu sinto, e já disse isso, aqui, nesta Casa.

O Orador: - Eu pedia o favor de concentrarem as interrupções no meu texto, senão vamos ter outra vez textos a mais...

O Sr. Camilo de Mendonça: - Por amor de Deus, não vamos ter textos a mais, porque eu não faço textos...

O Orador: - Sr. Deputado Camilo de Mendonça: O que eu disse, de resto, era que...

O Sr. Camilo de Mendonça: - Eu não estou em discordância com V. Ex.ª A única dúvida que tenho é a de saber, entre a atitude de V. Ex.ª e a posição do Governo,

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onde está a divergência; se é de grau, de circunstância ou de oportunidade. Até onde a subversão, que devasta os territórios, que são a maior parte do território português, não afecta toda a vida de Portugal?
Pois, em relação aos princípios, estamos perfeitamente de acordo.
De resto, para V. Ex.ª, como para mim, o problema fundamental mão é esse, mas o da liberdade de imprensa.

O Orador: - Não é?

O Sr. Camilo de Mendonça: - Pois não! É o de saber se estamos a defender a liberdade de imprensa da imprensa ou de empresas de imprensa.

O Orador: - Tudo isso são problemas, efectivamente, a ventilar. Mas o que estava a dizer não tem nada, parece, com o problema que V. Ex.ª levantou. Pois não?

O Sr. Camilo de Mendonça: - Não, certamente.

O Orador: - Também me parecia isso...

O Sr. Camilo de Mendonça: - Parecia-me que se punha uma divergência, quando não me parece que exista...

O Orador: - Mas a divergência era realmente a do intuito que presidia à proposta ou ao projecto e, ainda, antes de eles aparecerem. Eu ainda estava aí... V. Ex.ª adiantou-se um bocadinho e pôs um problema que, a meu ver, era essencialmente um problema de especialidade, que era o de saber quais, em caso de guerra, deverão ser as limitações.
Esse problema, de resto, prende-se com um outro, que é o de saber se, independentemente do estado de sítio, deveremos ou não encarar a suspensão das liberdades e direitos individuais.
A meu ver não devemos, pois temos uma forma clara e específica, que é o estado de sítio, mais ou menos extenso, com maior ou menor suspensão de direitos e liberdades. Só nessa altura, portanto, e nesse esquema, que está (previsto na lei, é que deverá ser imposto exame prévio.
De outro modo, dando ao Governo uma faculdade muito lata de impor o exame prévio sem a suspensão de garantias e liberdades, parece que estamos a dar-lhe realmente uma arma, a meu ver ampla de mais.
Mas isto é uma opinião pessoal.
Compreendo perfeitamente que V. Ex.ª esteja em desacordo e que tenha argumentos melhores do que os meus, mas isso parece-me um problema muito mais de especialidade,

O Sr. Camilo de Mendonça: - Eu não chego a estar em desacordo.
Para mim, a questão é esta: perante a guerra moderna e a forma de que ela se reveste, muitos conceitos se alteraram.
V. Ex.ª estará recordado, por exemplo, que tenha sido defendido, durante a discussão da revisão constitucional, que a pena de morte fosse aplicada não só perante operações militares clássicas, mas também sob o terrorismo?
Discordamos, creio que os dois, dessa solução, mas veja até onde a guerra moderna, baseada na subversão e na infiltração, pode subverter os próprios conceitos clássicos de que estamos a tratar.

O Orador: - Pois evidentemente. O que eu acho é que nessa altura há mecanismos legais próprios e específicos que poderão levar à imposição de exame prévio: é o estado de sítio e a suspensão das garantias.

O Sr. Camilo de Mendonça: - E quem é o juiz?

O Orador: - A Assembleia Nacional é a quem compete declarar ou ratificar a declaração de estado de sítio ou a suspensão de garantias.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Por isso mesmo, nessa altura e perante as formas subversivas, como agora se tem passado ema certos meios, inclusive sindicais, com inusitada gravidade, eu perguntaria se teríamos de pôr à Assembleia Nacional constantemente de quando é que um dirigente sindical é responsável por um estado de subversão e irresponsbilidade militar.

O Orador: - O problema que V. Ex.ª está a pôr, parece-me, não tem nada com o assunto. De resto, o que se prevê no próprio texto do Governo é um estado de subversão generalizada.
Eu já disse a minha opinião, e creio que não vale a pena prolongarmos a discussão, que é de especialidade, nem sequer é de generalidade...

O Sr. Camilo de Mendonça: - De resto, creio que não estamos totalmente em desacordo.

O Orador: - ... O que me parece é que o acordo é um pouco antecipado...
Mas dizia eu que, nestas circunstâncias, sendo, portanto, o Governo o juiz da oportunidade e o Deputado o da sua, e portando desta base de divergência, eu vim a apresentar, depois de um último apelo feito em Fevereiro de 1970, o projecto de lei de imprensa que elaborei e subscrevi juntamente com o Deputado Balsemão.
Perguntar-se-á também se não receei a imaturidade e a falta de prática. Pois não. E porque me parece que este problema da prática dos Deputados se põe em termos muito diferentes do da prática de outros cargos da Administração e da própria prática do Governo. Para mim, o problema põe-se quanto ao mandato de quatro anos. E, portanto, é para o desempenho desse mandato de quatro anos que o Deputado é eleito, é para ele que tem de se preparar, e é a esse prazo limitado que tem de se restringir. Ora, se o Deputado passasse um quarto ou metade do seu mandato a praticar, o outro quarto a aguardar os pareceres da Câmara Corporativa sobre os seus projectos, o restante à espera de que eles entrassem em ordem do dia arriscava-se a ver passados os quatro anos e a levar para casa a prática e os projectos por discutir...

O Sr. Camilo de Mendonça: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Eu suponho que, regimentalmente, passados trinta dias de ter sido pedida urgência, não é preciso estar à espera.
V. Ex.ª está, ao que me parece, a pôr - não directamente - em causa afirmações do Sr. Presidente do Conselho na sua última conversa em família.

O Orador: - Não necessariamente...

O Sr. Camilo de Mendonça: - Está! V. Ex.ª fala em maturidade, fala em experiência, fala em outras coisas...

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O Orador: - Foi um problema muito levantado...

O Sr. Camilo de Mendonça: - Lamento que tenha de ser necessário o Presidente do Conselho vir esclarecer ao País coisas que devia ser desnecessário que ele o fizesse...

O Orador: - Parece-me que, agora, V. Ex.ª se situa completamente fora do assunto, à parte as suas opiniões muito legítimas...

O Sr. Camilo de Mendonça: - São as duas igualmente legítimas, no plano pessoal ...
Eu estou a tirar das afirmações de V. Ex.ª expressões que encontrei nas considerações do Presidente do Conselho.

O Orador: - Mas V. Ex.ª pode tirar as conclusões que quiser...

O Sr. Camilo de Mendonça: - Creio que posso tirar eu e, naturalmente, toda a gente...

O Orador: - É evidente.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Eu estava a comparar para que V. Ex.ª infirmasse ou confirmasse a coincidência fortuita.

O Orador: - Eu comecei por me referir, em termos expressos, à conversa do Sr. Presidente do Conselho. Não lhe estou a responder, estou a pôr sob alguns pontos de vista comuns relacionados com a matéria em discussão e Submetidos à Nação as minhas opiniões, como é de meu direito. Não estou a responder a quem quer que seja.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Não, V. Ex.ª não está a responder, está usar as afirmações dele para fazer uma explanação das próprias...

O Orador: - Não, eu não estou a discutir. Estou a exprimir as minhas opiniões, no uso dos meus direitos de Deputado.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Deputado Sá Carneiro, V. Ex.ª é liberal. Eu, porque não o sou, respeito a liberalidade dos outros, e, portanto, respeito perfeitamente as suas opiniões, concordo ou discordo...

O Orador: - Olhe que é um termo que tem sido sujeito a mutações. Mas não vale a pena falarmos nisso...

O Sr. Camilo de Mendonça: - Qual é o termo?

O Orador: - Liberal...

O Sr. Camilo de Mendonça: - Quando em genética há mutações...

O Orador: - Eu não percebo nada de genética...

O Sr. Camilo de Mendonça: - O senhor é formado em Direito, eu cursei genética ...

O Orador: - Tenho de me confinar dentro do limite de tempo regimental, portanto, se V. Ex.ª tem mais alguma coisa a dizer dentro deste assunto, faça favor; se não, eu continuo...

O Sr. Camilo de Mendonça: - Se V. Ex.ª permite, o que eu estava a dizer era apenas isto: V. Ex.ª pôs-se numa posição, eu respeito perfeitamente o seu ponto de vista...

O Orador: - Mas para isso não valia a pena interromper...

O Sr. Camilo de Mendonça: - ... Eu respeito por uma questão de princípio, por que mão sou liberal...

O Orador: - Acho que não vem nada a propósito uma querela sobre liberalismo, nem lhe vou responder a esse respeito...
Deixa-me continuar, se não se importa?

O Sr. Camilo de Mendonça: - Mas eu só queria fazer esta observação: é que, efectivamente, V. Ex.ª invocou cedias procedimentos desta Câmara, e realmente aí é que há inexperiência de V. Ex.ª, porque anteriormente não esteve cá e eu estive. Por exemplo, na comissão do Plano de Fomento não se passou assim.
V. Ex.ª deu-se ao trabalho, cuidadosamente, de estudar o problema da revisão constitucional, mas houve outras comissões eventuais...

O Orador: - Eu aguardo com muito interesse o seu depoimento a esse respeito, mas só lhe pedia que não se alongasse porque tenho de respeitar o Regimento.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Realmente, até este momento não estamos a discutir a ordem do dia, estamos fora dela.

O Orador: - Parece-me também uma posição infundamentada. De resto, não é com V. Ex.ª, é com a Mesa, e eu continuo, até porque estiava precisamente a falar do projecto e da proposta de lei de imprensa, que é a ordem do dia.

O Sr. Correia da Cunha: - Muito bem!

O Sr. Camilo de Mendonça: - V. Ex.ª está como no momento da discussão do Sr. Camoesas, em que se ia entrar na discussão da ordem do dia...

O Orador: - ... E assim surgiram, portanto, o projecto e a proposta de lei de imprensa.
Estamos hoje aqui a discuti-la, depois de uma sessão cansativa, cuja responsabilidade nos não incumbe, visto que, tendo os Deputados e o Governo apresentado logo no início da sessão os seus textos, aguardámos sete meses quanto à imprensa, cerca de quatro e cinco meses, respectivamente, quanto à revisão da Constituição e à liberdade religiosa os pareceres da Câmara Corporativa, que néon sequer tinham aparecido quando foi decretada a convocação extraordinária. Estamos, pois, a suportar ineficiências alheias com um espírito de sacrifício e de trabalho, de que creio todos temos dado amplas provas.
Os textos em discussão traduzem uma orientação bastante diversa e, consequentemente, disposições muito diferentes.
A ideia de um projecto de lei de imprensa põe-se-me nestes termos: muito mais do que a sua existência, que é imposta pela Constituição, tive dúvidas quanto ao seu âmbito; deveria contemplar apenas a imprensa? Ou, como seria desejável, toda a informação?
Optei pela primeira alternativa, já que, por um lado, não me sentia habilitado a elaborar um projecto de estatuto da informação, embora ele me parecesse necessário. Por outro lado, afigurava-se-me conveniente cindir as matérias, já que, se a regulamentação da liberdade de expressão do pensamento pela imprensa é da competência exclu-

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siva da Assembleia Nacional, outro tanto não acontece quanto aos demais órgãos de informação, que podem ser disciplinados e regulamentados por decreto-lei do Governo.
O Governo perfilhou também este ponto de vista e resolveu apresentar uma proposta confinada exclusivamente à imprensa.
O problema da disciplina legal da liberdade da expressão do pensamento não se põe hoje, creio, numa óptica puramente individual. Não basta regulamentar o direito individual de cada um, exprimir o seu pensamento pela imprensa; hoje essa regulamentação aparece necessariamente ligada ao direito à informação, e daí que não se possa considerar a notícia como uma mercadoria qualquer, a explorar em termos o mais rentáveis possível.
A imprensa será o que forem os jornalistas. Já aqui foi dito ontem.
Por isso, é indispensável e proporcional aos jornalistas, como de resto prevê a Constituição, dignidade e independência e também os meios necessários para que possam desempenhar cabalmente, competentemente, a sua função. Prefiro de longe a designação de jornalista à de profissionais da imprensa adoptada na proposta, devo dizê-lo desde já.
O projecto procurou consagrar o máximo de liberdade com a responsabilidade inerente.
Trata-se de um texto bastante simples, em que se prevêem como limites à liberdade de expressão de pensamentos pela imprensa os impostos pela lei geral aos actos das pessoas, em que se procura acautelar a veracidade da informação, pela preservação da independência do jornalista face ao poder político, face ao poder económico. Daí que se tenha confiado apenas aos tribunais, num sistema repressivo dos respectivos abusos, a aplicação de sanções aos jornalistas e às empresas. E que se tenha também confiado unicamente aos tribunais as apreensões a decretar, preventiva ou repressivamente.
Por outro lado, considerando a atenção que merecem a independência e a dignidade dos jornalistas, procurou também preservá-las em relação ao poder económico.
E aparece aí a obrigatoriedade da existência de um regulamento da profissão -pode bem chamar-se realmente um regulamento deontológico - e a existência dos conselhos de redacção. Efectivamente, a preservação da independência e da dignidade dos jornalistas, como de resto tem salientado o respectivo Sindicato, a cuja acção meritória quero aqui deixar expressa a minha homenagem, visto que deu um contributo utilíssimo para a elaboração da lei e para a consideração das matérias e alterações a encarar no projecto e na proposta, e designadamente, ainda antes do aparecimento do projecto, nos estudos que fez e nas bases gerais que apresentou, mas - dizia - a preservação da dignidade e independência deverá fazer-se através de um estatuto do jornalista, adentro da empresa, que realmente lhes dê possibilidades de exercerem a sua acção, independentemente do poder empresarial, ou seja, do poder económico.
O projecto contém a previsão do regulamento, contém também uma coisa que me parece muito importante nessa óptica, embora se iniciem apenas os primeiros passos, que é a obrigatoriedade dos conselhos de redacção.
Por outro lado, temos de considerar como factor importantíssimo a tentativa de absorção das empresas jornalísticas pelo poder económico, que será corrigida de harmonia com os meios que referi, mias também pelo direito de livre fundação de empresas jornalísticas, ou seja, pela livre obtenção de títulos.

O Sr. Camilo de Mendonça: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Eu estou perfeitamente de acordo com a intenção das considerações de V. Ex.ª, o que não entendo muito bem é como se possam realizar na prática, quando se vende um jornal por centenas de milhares de contos!
Se um jornal é uma empresa comercial e industrial como qualquer outra, que visa ao lucro e ao benefício, como é que V. Ex.ª pode assegurar-me a independência dos jornalistas dentro de uma empresa de que são empregados e escolhidos por ela?
Porque se V. Ex.ª consegue um conselho de redacção com determinadas prerrogativas, automaticamente os empresários, ao constituírem uma empresa, não escolhem jornalistas que não aceitarem determinado condicionalismo. De resto, o conselho de redacção ainda me suscita uma dúvida: é saber se é a posição individual de cada um dos jornalistas, ou uma posição grupalista, sindical, se quiserem, dos mesmos jornalistas, e são coisas diferentes. Eu estou perfeitamente de acordo que o nó górdio da questão, para nós, numa época de concentração de meios económicos, de poderio económico, a liberdade, está, tantas vezes, em nos opormos aos próprios interesses, porque o seu jogo conduz exactamente ao contrário; conduz à liberdade deles que é a antiliberdade dos outros. O que eu mão estou a ver objectivamente, como em regime capitalista, se assegura. Claro, no mundo Comunista é fácil, as empresas são do Estado e o Estado defende os direitos dos trabalhadores. Agora num mundo como o nosso, em que estamos, por um lado, atrasados em relação aos outros e, por outro lado, numa evolução no caminho dos outros, como é que esta questão antinómica se resolve de modo satisfatório?
Porque a sua intenção é exactamente a minha.

O Orador: - Sr. Deputado Camilo de Mendonça, claro que a meu ver, o preço de um jornal, preço de compra, é uma coisa, preço de fundação é outra. Não quer dizer que, se quiser hoje constituir um jornal e for livre d* fazê-lo, ele lhe custe 300 000 ou 500 000 contos.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Se o valor de um jornal é de centenas de milhares de contos, é porque a sua transacção significa alguma coisa.

O Orador: - Ora vejamos: V. Ex.ª conhece muito melhor as normas do condicionamento do que eu.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Onde? Em Portugal ou na França? Onde é que é diferente, na França ou na Itália?

O Orador: - Eu estou a falar de Portugal, desculpe, mas não percebo a...

O Sr. Camilo de Mendonça: - Perdão... O argumento de V. Ex.ª quer dizer que em Portugal tal ocorria por mor de um condicionamento. Eu contesto neste aspecto; e onde não há condicionamento... Não será a valorização operada consequência de se conhecer a intenção de liberalizar a imprensa?

O Orador: ... V. Ex.ª não sabe o que eu ia dizer, porque não me deixou acabar. O que lhe ia dizer é que realmente o valor de uma coisa condicionada tende a empolar.

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Não é um valor do mercado livre. Evidentemente que, se eu mão posso obter mais títulos, ou se posso obtê-los com extrema dificuldade, vou pagar muito caro os títulos que haja disponíveis, e V. Ex.ª sabe, com certeza, isto melhor do que eu. E não vejo que o exemplo de França e Itália seja para aí chamado, até porque não o conheço em pormenor. Em França conheço um pouco e, de reato, era o que ia dizer a seguir.
Esse problema tem sido versado em França, designadamente; e está a tentar-se resolvê-lo através da constituição de sociedades de redactores e do lucro limitado para as empresas jornalísticas.

O Sr. Camilo de Mendonça: - O que V. Ex.ª diz aplica-se, por exemplo, ao France Soir ou ao Figaro?

O Orador: - Não sei. Não conheço como funciona o France Soir.

O Sr. Camilo de Mendonça: - É o maior jornal da Franca; tem uma tiragem de 1 200 000 exemplares.

O Orador: - Não conheço como é que resolveu internamente os seus problemas...

O Sr. Presidente: - O diálogo está incontestavelmente muito interessante para todos os Srs. Deputados e até para a Mesa.
No entanto, o Sr. Deputado Sá Carneiro, que ainda tem algum tempo diante de si, decidirá quanto é que precisa para o seu próprio uso e quanto é que pode conceder aos Srs. Deputados para tornarem mais viva a discussão da matéria.
V. Ex.ª começou a falar eram 18 horas e 10 minutos, posso deixá-lo falar até as 19 horas e 10 minutos e não terei dúvidas em o fazer.
V. Ex.ª, portanto, decidirá deste tempo e aquilatará de quanto precisa para si e quanto pode ceder aos outros.

O Orador: - Eu agradeço o prolongamento que desde já me concedeu e não me importarei nada de partilhar o tempo que tenho disponível com o Sr. Deputado Camilo de Mendonça ou com outro colega que solicite autorização para me interromper.
É, de resto, a vantagem de não ter discurso escrito e de estar aqui a fazer umas considerações normais, pois eu posso abreviá-las ou estendê-las conforme o tempo e o interesse da matéria.

O Sr. Casal-Ribelro: - E de ser liberal...

O Orador: - Lá está V. Ex.ª outra vez com a querela dos liberais.
Pois quem o é não precisa de o dizer.

O Sr. Camilo de Mendonça: - É bom afirmá-lo! É bom afirmá-lo, porque na prática tantas vezes se mostra o contrário...

O Orador: - Não é preciso. Basta demonstrá-lo e eu confio na prática. Na pouca prática que tenho e nas provas que tenho dado, creio eu.
Dizia, portanto, que a notícia, não podendo ser encarada como uma qualquer mercadoria, não pode também a indústria da informação ser explorada em termos de liberalismo económico ou capitalista.
O que realmente é possível acautelar, através do estatuto jornalista da sociedade de redactores...

O Sr. Camilo de Mendonça: - Desculpe... é só uma interrupção, se me permite? Pois não pode...

O Orador: - Pois V. Ex.ª pediu-me autorização, já que a tem.

O Sr. Camilo de Mendonça: - ... ser usada de acordo com as regras do puro liberalismo económico.
Mas então em que regime o será? De intervenção do Estado? Até onde? Por que modo? Esta é a minha dúvida.

O Orador: - Desculpe, eu continuo a dizer-lhe que será também matéria para a especialidade, visto que a própria proposta do Governo prevê intervenção do Estado, embora não a defina, deixa-a para o Regulamento.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Quer dizer: V. Ex.ª está de acordo com a intervenção do Estado.

O Orador: - Estou de acordo com a intervenção do Estado nos precisos termos em que a introduzi no projecto.
Quer dizer: no projecto procuramos traduzir essa intervenção em normativos legais com determinadas imposições.
Parece-me essa a maneira adequada, já que acho que, especialmente no exercício das liberdades, devemos ter leis claras, objectivas e o mais possível justas.
E, portanto, desde logo previmos uns determinados normativos para assegurar a independência dos jornalistas, o que quer dizer também, a veracidade da informação frente ao poder político, frente ao poder económico.
Na proposta, o Governo adopta um critério diferente:
Prevê, efectivamente, a possibilidade de intervenção do Estado, e deixa para regulamento.
E, já que estamos a falar de regulamento, aí também é uma das diferenças entre um texto e outro.
Há uma espécie de falsa ideia feita de que as leis, todas as leis, necessitam de regulamentos. Não é assim. A própria Constituição, salvo erro no § 4.º do artigo 109.º, prevê que o Governo só promulgue a regulamentação das leis que não forem exequíveis por si próprias.

O Sr. Camilo de Mendonça: - E a Assembleia muitas vezes é um exemplo disso.

O Orador: - E, de resto, como sabe, pela sua longa prática, daí não deriva inconstitucionalidade, e, portanto, a Assembleia pode fazer normas que dispensem regulamentos. Não quer dizer que sejam normas regulamentares. São, nos termos do § 4.º do artigo 109.º, normas exequíveis por si mesmas. Foi isso que se procurou fazer no projecto.
Nele, creio que não encontrará normas regulamentares. São normas que procuram dispensar o regulamento, não quer dizer que sejam regulamentares. O Governo, na proposta, deixa grande parte das matérias para regulamentos, posição que não me agrada, visto que muitas das opções fundamentais nessa matéria...

O Sr. Almeida Cotta: - V. Ex.ª dá-me, licença?

O Orador: - Com certeza, Sr. Deputado. Faz favor.

O Sr. Almeida Cotta: - Eu tenho acompanhado com o maior interesse a exposição de V. Ex.ª, e não tenho intervindo porque realmente me parece que a ordem do dia

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não terá sido muito respeitada e não queria contribuir para um desrespeito maior ainda dessa ordem do dia.
Impressionou-me a argumentação de V. Ex.ª sobre os métodos de trabalho, e voltou outra vez à questão do Regimento, e eu queria dizer a V. Ex.ª qual foi o meu raciocínio a este respeito.
Acho muito difícil que qualquer lei não tenha necessidade de regimento, ou de regulamento. Já um decreto regulamentar pode evitá-lo, porque desceu ao pormenor, agora em princípio as leis, mormente as votadas na Assembleia Nacional, são bases, e todas elas naturalmente requerem, para a sua execução, disciplina regimental, esclarecimentos quanto à sua aplicação.
Ora bem, o meu raciocínio para o método de trabalho empregado pela Assembleia Nacional assentou, fundamentalmente, no seguinte: o Regimento prevê a existência de casos- omissos, e a forma de os resolver é que ficou a cargo do Presidente da Assembleia Nacional. E foi assim que muito correctamente e muito legalmente resolveu.
Não queria deixar de dizer a V. Ex.ª isto, que não contribuirá possivelmente em nada para alterar as posições. Em. todo o caso, é bom que a Câmara pondere, sob todos os pontos de vista, este problema, como aliás sucedeu, pois de facto se pronunciou sobre ele na devida oportunidade.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
Muito obrigado, Sr. Deputado, por me ter autorizado a interrompê-lo.

O Orador: - Ora essa, Sr. Deputado Almeida Cotta. Eu já tinha definido a minha posição quanto às interrupções. E tive muito prazer em ceder-lhe alguns dos últimos minutos que me restam, para que V. Ex.ª, tendo pedido autorização em termos perfeitamente correctos, exprimisse a sua opinião pessoal.
Como sabe, a minha é contrária. Já procurei demonstrar que não há qualquer caso omisso, pois o caso está previsto e deve ter uma certa solução. E fi-lo, não, como disse, em relação ao passado, mas em relação a este caso presente e a este parecer da comissão.
Era isto que restava dizer, aproveitando, rapidamente, os dois últimos minutos para concluir.

O Sr. Almeida Cotta: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Almeida Cotta: - Na medida em que não tinha sido previsto este método, e se outro método estaria indicado para resolver problemas destes, isso não quer dizer que um método novo não constitua um caso omisso.

O Orador: - Creio que as posições estão perfeitamente definidas e que não vale a pena voltar ao assunto.
Eu, pela minha parte, expus os meus argumentos e V. Ex.ª marcou a sua posição. Acho que assim é que deve ser.
Pela minha parte, respeito inteiramente as opiniões pessoais, como V. Ex.ª as expôs com toda a correcção.
Não pude, mercê dos limites de tempo regimental, concluir a análise comparativa do projecto e da proposta, mas creio que o que já disse foi suficiente para confirmar que, como signatário do projecto e tendo mantido a sua apresentação depois de conhecido o texto da proposta, perfilho as suas disposições, como as mais consentâneas com uma actual regulamentação da liberdade de expressão de pensamento pela imprensa, que, aliás, nunca será muito actual.
Sinto-me um pouco, nesta discussão, regressar ao século XIX, em que se debatiam idênticos problemas, que se controvertiam idênticas soluções e que nós, hoje, temos aqui novamente de controverter e de debater.
Efectivamente, os problemas actualmente colocados pela imprensa vão muito para além destas preocupações jurídicas. Mas o resolver aqueles constitui o primeiro passo para aceder a um maior desenvolvimento ou maior contacto com esses problemas mais actuais.
Creio que nessa óptica o projecto garante a liberdade de expressão de pensamento dentro da responsabilidade que a lei impõe às pessoas e que garante suficientemente, também, o direito à informação e a protecção que merecem a dignidade e independência dos jornalistas, condição de uma autêntica imprensa e de um verdadeiro direito à informação.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Aguiar e Silva: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: No declínio deste Verão parlamentar - menos quente, afinal, do que aquele que alguns temeriam e outros desejariam... -, é chamada a Assembleia Nacional a pronunciar-se sobre matéria legislativa da mais alta relevância no contexto de toda a vida nacional.
Estamos congregados para analisar, discutir e votar uma lei que, após cerca de quarenta anos de censura prévia, lançará as bases de um novo regime jurídico da imprensa portuguesa, assim se corporizando em garantia institucional o direito já consagrado na nossa Constituição Política. Não se trata de uma lei que abranja toda a problemática da informação - a rádio e a televisão não são por ela consideradas -, nem, ainda menos, uma lei que abarque toda a manifestação do pensamento humano.
É inegável, porém, que contempla a mais importante forma de manifestação desse pensamento, aquela forma que, desde há cinco séculos, mais poderosa e duradouramente tem influenciado o destino da Humanidade e que, ainda hoje, mau-grado as profecias acerca da iminente disparação da galáxia de Gutemberg e mau-grado o advento do «cibernantropo», detém a primazia como meio de criação e difusão do pensamento e da cultura - a imprensa.
O livro, a revista, o jornal, veiculando díspares mensagens e conhecimentos, desde o plano da criação estética até ao da informação quotidiana, inscrevem-se no âmbito de competência da lei que iremos votar, motivo por que ela interessa, directa e substancialmente, a quantos, como autores e leitores, consideram a imprensa como um factor imprescindível da sua vida de homens livres e responsáveis.
Os problemas e os anseios dos homens, mesmo quando se projectam em espaços metafísicos e se designam com nomes iniciados por maiúsculas, adquirem sempre a ressonância, a tonalidade emocional e o teor concreto das situações históricas e existenciais em que são pensados e vividos. O cântico magnífico de Paul Eluard à liberdade, nascido da fé e da agonia de alma de um «resistente» francês, não poderia irromper na atmosfera frívola, descuidada e epicurista da belle époque ... Assim também neste momento da nossa vida política alguns de boa fé - e de outros não cuido agora - se sentirão impelidos a exaltar a liberdade, em particular a liberdade de manifestação do pensamento, e a erguer um implacável requisitório contra a censura, conceituada como funesto elemento gerador de anos de opressão e obscurantismo.
É compreensível esta atitude, porventura até mais emocional do que intelectualmente assumida. Eu, porém, que

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também sou - e inequivocamente o afirmo - adversário do regime de censura prévia, pediria licença para formular algumas observações sobre a matéria.
A instauração do regime de censura prévia, em 1933, correspondeu a uma necessidade da conjuntura política e social desse momento da nossa vida colectiva, e é nessa perspectiva que deverá ser avaliada. Os fenómenos sócio-
políticos que configuram uma dada situação histórica são sempre, embora muitas vezes não explicitamente, solidários entre si.
O sistema político nascido da Revolução de 28 de Maio, que rompeu, nos planos político, social, financeiro e económico, com a herança de um século de governação demo-liberal, era lógica e coerentemente obrigado a romper também com o legado de quase um século de imprensa liberal, visceralmente ligada aos hábitos e vícios do individualismo, do parlamentarismo, do jogo partidário e eleitoral.
Decerto que nesse legado avultam muitos valores positivos e esplendem grandes figuras de jornalistas, como o parecer da Câmara Corporativa não deixa pertinentemente de recordar. Mas, até o século de Luís XIV, que Voltaire considerou como uma das três épocas clássicas da história, tem o seu reverso e as suas misérias... Ao longo da segunda metade do século XIX e das primeiras décadas do século XX são inúmeros os testemunhos qualificados, provindos de escritores e jornalistas, que denunciam o servilismo, a ignorância, o espírito de perfídia, rancor e intolerância que dominavam e irremediavelmente corrompiam grande parte da imprensa do tempo.
Eça de Queirós, cuja obra, cada vez mais viva, continua a fazer sorrir e pensar o homem português dos nossos dias, deixou nos seus romances, desde A Capital e O Conde de Abranhos até a Os Maias e à Correspondência de Fradique Mendes, um extenso e variado depoimento sobre tal processo de degradação. Ora, repito, o sistema político nascido do Movimento de 28 de Maio, que se propunha levar a cabo modificações fundamentais nas estruturas políticas, sociais e económicas do Pais, tinha também de realizar, concomitantemente, uma transformação profunda nos espíritos e nas mentalidades, e decerto não poderia cumprir esses desígnios em alterar o regime jurídico, os hábitos e as tendências da imprensa anteriormente existente.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - No condicionalismo ideológico e político então prevalecente na Europa, o recurso à censura prévia apareceu certamente aos responsáveis pela governação como o meio mais eficaz e expedito para alcançar tal propósito. Infelizmente, por motivos de vária ordem, alguns de carácter internacional, prolongou-se por quase quatro décadas a solução que deveria ter sido rigorosamente provisória.

O Sr. Júlio Evangelista: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Júlio Evangelista: - A exposição de V. Ex.ª tem sido tão erudita e, do ponto de vista formal, tão brilhante, tão convincente, que não resisto a pensar nas doutas afirmações que produziu.
V. Ex.ª leu possivelmente um ensaio de Paul Morand, escritor que não anda na voga, não merece o favor de certos meios, mas que, não obstante certas reservas, é merecedor de admiração. Trata-se do Elogio da Censura.
Nele diz que, se através dos tempos o regime de censura teve agravos e teve inconvenientes, nem por isso deverá ser esquecido o reverso da medalha, que é o de ter constituído para os escritores um dos «requintados constrangimentos» de que falava Paul Valéry. Por exemplo, ao constrangimento da rima e da métrica, para o poeta, ao constrangimento e apuramento do estilo, para o escritor, a censura terá feito incidir um outro constrangimento, de ordem social e de conveniência social. Acrescentava, em linguagem primorosa, que a censura, através de todos os inconvenientes, que aliás todos reconhecemos, obrigou o escritor a fazer da sua pena uma arma de subtileza, de acutilante subtileza.
E, por outro lado, sob o ângulo do leitor: a censura obrigou-o a ler com atenção especial, forçando-o a ler nas entrelinhas, a ler nas meias-palavras, a esforçar-se por apreender aquilo que o escritor quis mas não pôde dizer à vontade.
Não perfilho a doutrina, repito, mas quero dizer a V. Ex.ª e queria lembrar que, ao ouvi-lo com tanto brilho e com tanta elegância, estava a lembrar-me do ensaio de Paul Morand e ainda desta expressão do abade Galianni, quando se dirigia a Madame dÉpinay:

Sabe, minha senhora, o que reputo de sublime oratório? É a arte de dizer tudo sem ir parar à Bastilha.

No entanto, volto à minha e ao nosso tempo: com as limitações indispensáveis, sou pela liberdade de imprensa.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado Júlio Evangelista, pelas palavras gentis que me quis dirigir.
Aproveito, já que citou Paul Valéry, escritor que muito admiro, para lembrar um comentário seu, lembrando palavras, dignas de ponderação, de um dos grandes pensadores do início do século XIX, Xavier de Maistre: «Os sapatos apertados fazem descobrir danças novas».

(Risos do Sr. Júlio Evangelista.)

O Orador: - No fundo, o significado é idêntico.

O Orador: - Os prejuízos decorrentes de tal situação foram de vária natureza - e não será o menor o facto de possuirmos hoje uma imprensa periódica habituada a uma cómoda irresponsabilidade -, embora não haja que ter em conta apenas resultados negativos. É certo que há quem prefira decididamente a aventura dos «barcos ébrios» ao sossego, que às vezes se volve em tédio, das grandes calmarias, se bem que, não raro, tal aventura venha a findar em escolhos e naufrágios ... De qualquer modo, a queixa de António Ferro, dirigida em 1932 ao Prof. Salazar, de que o lápis da censura era como um látego infamante a fustigar-lhe a pele, foi sem dúvida compartilhada por quantos, escritores e jornalistas, tendo bem vivas a dignidade do seu ofício e a consciência do seu valor, viram os seus textos mutilados e estropiados pelos cortes da censura.
É necessário acentuar, todavia, que o regime de censura instituído em 1933, se foi inquestionavelmente autoritário, nunca foi um regime dirigista que, como os regimes totalitários nazi ou comunista russo, impusesse aos jornalistas uma orientação ideológica dogmàticamente definida e aos escritores e artistas um credo estético rigidamente formulado e erigido em «ortodoxia». Pode-se propalar a acusação, mas ninguém será capaz de a demonstrar, de que tal regime autoritário impediu brutalmente a floração de grandes obras literárias. Foi de modo semelhante que os pensadores e críticos iluministas, jacobinos e liberais mal-

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sinaram a literatura barroca, mas a historiografia e a crítica contemporâneas comprovaram a inanidade de tal tese.
É indispensável não confundir, em primeiro lugar, obra literária com panfleto, com escrito propagandístico ou similar, e que de natureza estética possua apenas a máscara. Até sob o regime dirigista russo se escreveram e publicaram grandes obras literárias e, em casos extremos, nem a «cortina de ferro» pôde impedir que os prelos do Ocidente difundissem obras-primas de escritores russos tidos como «revisionistas» e «heréticos». Não há, efectivamente, barreiras e cárceres que logrem suspender o curso das ideias e o voo do génio. Mas é corrente, isso sim, na vida intelectual e artística, a busca de um alibi que possa dissimular a impotência criadora.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Depois, é necessário reconhecer, como há diais escrevia Virgílio Ferreira em A Capital, que há muitos e grandes escritores que foram e são politicamente «reaccianarias», não sofreado contestação que o teor de uma ideologia é um factor não pertinente no universo dos valores estéticos, por muito que pese aos marxistas dogmáticos e aos intolerantes provincianos que apenas sagram com o sinete do talento ou do génio os camaradas de trincheira e os confrades de «capela».
Apesar de todos os prejuízos e resultados nocivos advenientes, repito, do regime de censura, Aquilino Ribeiro escreveu e publicou obras-primas como essa cáustica e irreverente Casa Grande de Romarigães, Miguel Torga e José Régio escreveram alguns dos mais belos poemas da língua portuguesa, e afirmou-se, nos últimos vinte anos, uma magnífica plêiade de romancistas e poetas.
Estas palavras, se pretendem ser um contributo para a apreciação e a avaliação serenas de um passado recente, não são, como decorre de quanto ficou dito, uma defesa. Entendo que, na tarefa de renovação e revitalização da vida política nacional que o Sr. Presidente do Conselho se propôs levar a efeito, com coragem e prudência, a aprovação parlamentar de uma lei de imprensa representa um ponto culminante, pois tal diploma vai possibilitar um novo alento às liberdades públicas e permitir uma respiração mais sadia às manifestações da cultura e da informação. Não haverá sector da vida nacional, pública e privada, que deixe de colher benefícios do regime de imprensa agora proposto, pois a discussão objectiva e fundamentada, o espírito crítico, ai independência de opinião e juízos, quando exercidos tendo em vista o bem comum, não estiolam, antes revigoram e dignificam os indivíduos e as comunidades.
A proposta de lei n.º 13/X, como se lê no seu preâmbulo, apresenta como postulado fundamental o asseguramento da liberdade de imprensa, dentro dos limites «marcados pelo interesse superior da colectividade e pelos interesses individuais dignos de protecção». Em matéria de tal importância e melindre, afrontam-se, como é sabido, duas teorias radicalmente distintas. Uma, formulada primeiramente por Platão, com o vigor dialéctico que lhe é habitual, não no diálogo A República, como, por lapso, se diz no parecer da Câmara Corporativa, mas no diálogo As Leis, e segundo a qual o Estado não pode consentir na difusão de doutrinas que, de qualquer modo, colidam com a verdade do mesmo Estado. Tal teoria, retomada por J. J. Rousseau nessa bíblia do totalitarismo democrático que é Du Contrat Social (ct. liv. IV, cap. VII), informa substancialmente, através da matriz hegeliana, a filosofia política dos estados totalitários contemporâneos.
Outra teoria expressa pioneiramente por Milton no panfleto intitulado Aeropagitica, For the Liberty of Unlicensed Printing, solenemente acolhida e consagrada no artigo XI da Déclaration des Droits de l'Homme et du Cïtoyen, e difundida depois pelo ideário da revolução Francesa e do Liberalismo europeu, proclama a liberdade de imprensa como «um dos direitos mais preciosos do homem», indo mesmo ao ponto de estabelecer que «o direito de manifestar o seu pensamento pela imprensa é absoluto. Não pode ser interdito (apud Jacques Bourquim, la Liberté de la presse, Paris, s. d. pp. 71-72).
Ora, a proposta de lei em apreço, adoptando uma solução que se inscreve tipicamente na filosofia política do Estado social de direito, reconhece expressamente, numa das suas bases, o direito de liberdade de imprensa, mas, em vez de o definir e consagrar em dermos de estrito individualismo, como acontecia no Estado liberal de direito, define-o e situa-o num plano meta-individual, caracterizando o seu exercício como uma função social e uma actividade de interesse público. Desta atitude doutrinária fundamental, cujo espírito informa todo o nosso ordenamento político-jurídico, decorre, logicamente, o estabelecimento, em bases subsequentes, das garantias e dos limiteis do direito de liberdade de imprensa.
Esta intervenção do Estado, consubstanciada em várias medidas jurídico-administrativas na actividade da imprensa - e refiro-me agora, em particular, à imprensa periódica -, poderá suscitar apreensões e reacções hostis em espíritos afeiçoados, por formação ideológica ou até por pendor de temperamento ao credo liberal. E provavelmente não faltará quem, contraditando tal intervenção em nome dos principies, a venha aceitar apenas em nome da conveniência imposta pelas circunstâncias, adoptando assim uma forma de pragmatismo que poderá constituir tão-só um disfarce de um anonalismo oportunista. Pois, eu creio: que semelhante intervenção do Estado se justifica tanto no plano doutrinário como no plano pragmático. E direi porquê.
Vejamos, em primeiro lugar, as razões que derivam da consideração do plano estritamente pragmático. Vai longe o tempo em que o jusracionalismo, firmado nos ditames e nas exigências dia razão, sucedâneo laico da inteligência divina, conduziu à conceituação do direito positivo como uma actualização das normas intemporais e universais do direito natural. A experiência dos povos e os horizontes rasgados por novos sistemas filosóficos vieram demonstrar a historicidade dos próprios «conteúdos jurídicos naturais» e nem o político nem o legislador podem hoje esquecer que não lidam com homens abstractos e com sociedades idealmente situadas fora do tempo e do espaço.
Esta lei, que agora nos cabe discutir e votar, foi elaborada para um pais que viveu, durante perto de quarenta anos, sob um regime de censura prévia; que possui uma imprensa periódica mal preparada, sob vários aspectos, para enfrentar as exigências e as responsabilidades inerentes ao seu novo estatuto; que tem soldados a lutar e a morrer em nome de imperativos nacionais; que sofre, nesta hora tão revolta das sociedades burguesas ocidentais, o assalto de um multiforme terrorismo pré-revolucionário. O Governo e a Assembleia legislam para este país concreto e têm de atender, com realismo e lucidez, ao seu condicionalismo geral.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não se trata de impor ardilosamente uma espécie de determinismo fatalista, expediente bem conhecido de déspotas, ávidos de prolongar indefinidamente o seu

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domínio; trata-se da única atitude inteligente e viável de governantes que, dentro da legalidade, querem alcançar para o meu povo estádios mais elevados de civilização e cultura, evitando o risco das miragens demagógicas e dos prometeísmos mais ou menos bem intencionados.
Atenhamo-nos agora, às razões que podem dimanar da consideração de um plano preponderantemente doutrinário. Em primeiro lugar, impõe-se-nos reconhecer a verdade cada vez mais nítida de uma verificação feita por diversos sociólogos e pensadores contemporâneos e que contradita tanto a doutrina liberal como a doutrina marxista:

Quanto mais o ritmo do desenvolvimento se acelera, mais se agravam os riscos de desintegração social devidos à inovação e mais, por conseguinte, o poder político se estende e se reforça; de cada revolução poder político sai mais poderoso na sua acção, mais complicado na sua organização. A expansão do poder político está estreitamente ligada à aceleração da história. (Cf. Jean-William Lapierre, Essai sur le Fondoment du Pouvoir Politique. Paris, 1968. p. 643.)

Nesta perspectiva, quando as sociedades hodiernas conhecem rapidíssimos processos de estruturação e de estruturação, como poderia o poder político, consubstanciado no Estado, alhear-se dessa poderosíssima força de coesão ou de dissolução social que constituem os meios de informação massificada dos nossos dias? Não é apenas por razões de ordem económica que, na maioria esmagadora dos países, a rádio e a televisão se encontram sob contrôle directo do Estado. Não discuto agora os perigos reais de desumanização do homem acarretados por este Estado funcional moderno, já designado por «Leviatão teleguiado»; mas não se esqueça de que a alternativa só poderia ser a anarquia.
Nos regimes liberais oitocentistas, a imprensa via na intervenção do Estado o pior inimigo da sua liberdade, e o Estado, por sua vez, deixava aos indivíduos e ao livre jogo da concorrência o estabelecimento e a difusão de uma informação verdadeira. No fundo, tratava-se de um utopismo em que confluíam crenças e anseios da «filosofia das luzes» e do individualismo naturalista e romântico.
A análise crítica, deste credo utopista haveria de conduzir, ainda no século XIX, muitos espíritos, já desiludidos das virtudes do liberalismo, a considerar que a imprensa era primacialmente um meio de divulgar o erro, os juízos ligeiros e a intolerância. Leia-se, por exemplo, na Correspondência de Fradique Mendes, de Eça de Queirós, esse irónico e cruel depoimento sobre os jornais, que é a carta a Bento de S. Quando a burguesia passou do regime de concorrência ao regime de oligopólio, quando os meios de fundação e de vida das empresas jornalísticas se alteraram radicalmente, quando as técnicas de informação e publicidade, apoiadas em modernas ciências humanas e em avançadíssima tecnologia, evoluíram tão profundamente, o que poderá restar daquela utópica concepção da liberdade de imprensa?
Uma empresa jornalística necessita, hoje, de vultosos capitais para poder satisfazer as exigências das modernas técnicas de recepção de notícias, de impressão e difusão das suas publicações. O público deseja e requer jornais com atraente apresentação, com bom nível informativo e recreativo, e de preço módico. Neste condicionalismo, onde a competição esmaga os financeiramente mais débeis, é hoje uma recordação de museu o jornalista franco-atirador que, com o seu idealismo e escasso dinheiro, fundava um periódico que se proclamava orgulhosamente uma tribuna da verdade... As empresas menos fortes cedem perante as mais poderosas e, por compra ou por fusão, vão-se formando assim, por esse mundo além, grupos oligopolistas que concentram variados e influentes meios de informação. Até que ponto é que estes grupos, sob a pressão dos seus interesses particulares, não desfiguram a informação objectiva e não prejudicam os interesses públicos?

Vozes: - Muito bem!

O .Sr. Júlio Evangelista: - V. Ex.ª dá-me licença para outro aparte?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Júlio Evangelista: - Continuo encantado a ouvi-lo, de maneira que peço desculpa de mais uma observação. É que, precisamente nos termos em que V. Ex.ª está a raciocinar, estava a lembrar-me de um capítulo de Alfredo Sauvy, em Mythologie de Notre Temps. dedicado, precisamente, à imprensa. E nesse ponto ele asseverava que há uma censura tirânica e irrecorrível, que é a censura do director do jornal, na terminologia francesa redacteur-en-chef. Dessa não há recurso.
Acontece que - asseverava ainda Sauvy -, como há uma pluralidade de jornais e, portanto, uma pluralidade de direcções e censuras daquele tipo, tal pluricensura chega, às vezes, a dar a aparência de liberdade.
Esta observação, que me impressionou - não obstante as reservas que merece -, creio que estava no pendor das observações de V. Ex.ª

O Orador: - Muito obrigado mais uma vez pela sua contribuição Sr. Deputado.
É sabido, por outro lado, que actualmente o baixo preço de um jornal não cobre as despesas do seu custo, sendo evidente que a totalidade desse diferencial unitário sobe à medida que aumenta a tiragem do periódico. As empresas proprietárias de jornais, cujo carácter comercial seria pueril não reconhecer, encontram nas receitas publicitárias o suplemento que lhes permite não só pagar aquele diferencial, mas ainda auferir lucros. Até que ponto é que este suporte publicitário não afecta a independência da imprensa, sabendo-se que, muitas vezes, essa publicidade é concedida por grandes organizações, que, retirando-a, podem pôr em risco a sobrevivência económica de um jornal?
Os jornais, por ricos que sejam e por bem apetrechados que se encontrem de meios humanos e técnicos, dependem essencialmente, quanto à recepção de notícias importantes, de quatro ou cinco grandes agências que monopolizam a informação internacional. Como garantir, nestas condições, a verdade e a objectividade das. notícias? Até que ponto é que a informação provinda de tais agências pode perturbar, perigosa e traiçoeiramente, a opinião pública de um país? À medida que se complicam e se tornam fabulosamente dispendiosos os meios de transmissão das informações, como quando se entra no domínio da chamada «tecnetrónica», mais se restringe a diversidade dos emissores e mais se agrava, portanto, este problema. Que interesses particulares e ilegítimos poderão estar amanhã a controlar grande parte da informação planetária?
Estes e outros problemas similares e correlativos põem, em toda a sua agudeza, a necessidade da intervenção do Estado, como poder político que sobreleva os interesses particulares e que regula soberanamente a sociedade global, a fim de preservar a necessária independência e diversi-

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dade da imprensa, defendendo-a, sobretudo das ameaças de concentração oligopolista e a fim de evitar que a opinião pública seja contaminada por mensagens susceptíveis de perturbarem a paz e a ordem social. Não é isenta de riscos esta intervenção do Estado, que pode ceder à tentação de querer ouvir nos órgãos da imprensa apenas o eco da sua própria voz. É indubitável, porém, que no condicionalismo da informação contemporânea, o Estado social de direito, que, por definição, deve ser imune àquela tentação, representa para o cidadão a mais sólida garantia de poder fruir do direito de ser informado livre e objectivamente.
Tudo isto se reconhece e se contempla adequadamente na proposta de lei n.º 13/X, contrariamente ao que acontece com o projecto de lei da autoria dos Srs. Deputados Sá Carneiro e Pinto Balsemão, a algumas de cujas disposições mais importantes não posso conceder a minha concordância. Na sua judiciosa economia, a proposta de lei especifica cuidadosamente as diversas garantias que salvaguardarão a liberdade de imprensa e que assegurarão que essa liberdade, direito fundamental da pessoa humana, se volva de formal em liberdade concreta, exercida no seio de uma «comunidade política ordenada segundo a justiça social».
Por outro lado, e concomitantemente, a proposta de lei especifica também, cuidadosamente, os limites a que fica sujeito o direito da liberdade de imprensa, de modo a assegurar outros direitos fundamentais da Nação, do Estado e da pessoa humana. Assim, o princípio da liberdade de imprensa traduz-se em critérios de valoração objectiva que, nos limites do possível, permitirão estabelecer abstracta e preventivamente a licitude das diversas manifestações possíveis dessa liberdade, procurando-se de tal modo acautelar as arbitrariedades interpretativas na posterior aplicação da lei a cada caso concreto. Trata-se de determinar de modo positivo - e não apenas de modo negativo, remetendo para a lei geral e, em particular, para a lei penal -, trata-se de determinar de modo positivo, dizia, o significado e o conteúdo da liberdade de imprensa, à luz do nosso ordenamento jurídico-constitucional e das exigências da função ético-social que a imprensa desempenha.
Seria absurdo que um Estado social de direito reconhecesse e consagrasse uma liberdade que atentasse contra os interesses superiores da comunidade e que desconhecesse as necessidades do bem-comum da sociedade e dos seus membros.
O diploma que iremos aprovar, estabelecendo um sistema institucional que substituirá as pessoas pelos processos, vai decerto rasgar novos horizontes à nossa sociedade, em particular à sua vida cívica e intelectual, estimulando a sua capacidade criadora e inovadora, sem descurar, no entanto, a salvaguarda dos valores intangíveis do seu património histórico, cultural e moral. Assim, ele inscreve-se na prossecução do programa político de renovação na continuidade em que a maioria esmagadora do povo português se encontra vitalmente empenhada...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ... processo histórico que tem de ser conduzido com autenticidade e sem subterfúgios.
Não é paradoxal falar-se de uma aprendizagem da liberdade, e a própria obediência constitui um elemento imprescindível do exercício das liberdades concretas. O único factor que degrada a obediência, como escreveu Alexis de Tocqueville, «é o sentimento servil que leva a obedecer». Pois esta lei vai constituir, para todos os portugueses, um magnífico ensejo de aprendizagem da liberdade, e não será esse o menor dos serviços que terão de agradecer ao Presidente do Conselho, que a promoveu, e ao ilustre Ministro, seu colaborador, que a subscreveu.
Deste modo - e deixando para a discussão na especialidade o exame de aspectos parcelares -, considerando os princípios e valores que informam a proposta de lei, considerando a sua economia, a sua oportunidade e a sua conveniência, dou-lhe a minha aprovação na generalidade, declarando ainda que perfilho as alterações e os aditamentos propostos no seu parecer pela comissão eventual constituída para estudo da lei de imprensa.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vou encerrar a sessão. Haverá sessão esta noite, conforme anunciei. Em virtude da hora tardia a que a de agora acaba, fica adiada para as 22 horas e 15 minutos a sessão da noite.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 45 minutos.

Srs. Deputados que entraram, durante a sessão:

Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João Lopes da Cruz.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
José Dias de Araújo Correia.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Rui Pontífice Sousa.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alexandre José Linhares Furtado.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Jorge Augusto Correia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Luís António de Oliveira Ramos.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Rafael Valadão dos Santos.
Teodoro de Sousa Pedro.

O REDACTOR - Luiz de Avillez.

Propostas de alteração enviadas para a Mesa durante a sessão:

Propomos que ao n.º 1 do artigo 1.º do projecto de lei n.º 5/X seja dada a seguinte redacção:

1. A liberdade de expressão do pensamento pela imprensa será exercida sem subordinação a qualquer forma de censura administrativa, autorização, caução ou habilitação prévia, nos termos da presente lei

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e com os únicos limites decorrentes dos seus preceitos e daqueles que a lei geral impõe aos actos das pessoas.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro - Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Propomos que no n.º 1 do artigo 16.º do projecto de lei n.º 5/X a expressão «junto do Ministério da Defesa Nacional» seja substituída pela expressão «junto do Departamento da Defesa Nacional».

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro - Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Nos termos regimentais, propomos que, mantendo as epígrafes, a base I da proposta de lei seja desdobrada em duas, passando a primeira a ter a seguinte redacção:

BASE I

(Definição de Imprensa)

1. Entende-se por imprensa, para os efeitos desta lei, toda a reprodução gráfica de textos ou imagens destinada ao conhecimento do público.
2. Não são abrangidas pelo número anterior as reproduções feitas em discos ou pelo cinema, radiodifusão, televisão e processos semelhantes, bem como os impressos oficiais, e, dentro dos limites da sua utilização corrente, as reproduções de textos ou imagens usados na vida privada e nas relações sociais.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - João António Teixeira Canedo - João Duarte de Oliveira - Manuel Artur Coita Agostinho Dias - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Gustavo Neto Miranda - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Henrique dos Santos Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que a base resultante do desdobramento da base I da proposta de lei passe a ser a base II, com a seguinte redacção:

BASE II

(Classificação da imprensa)

1. A imprensa classifica-se em periódica e não periódica;
2. A imprensa periódica é constituída pelos jornais e outras publicações que, sob o mesmo título, apareçam em série contínua ou em números sucessivos, com intervalos regulares não superiores a um ano.
3. Das publicações periódicas, ou periódicos, presumem-se obras colectivas resultantes do trabalho de profissionais da imprensa ou da colaboração de não profissionais, sob a responsabilidade de um director.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - João António Teixeira Canedo - João Duarte de Oliveira - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Gustavo Neto Miranda - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Henrique dos Santos Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que a base III da proposta de lei passe a constituir a base III, com a seguinte redacção:

BASE III

(Empresas editoriais e jornalísticas)

1. São empresas editoriais as que têm por objecto editar publicações não periódicas, com distribuição directa ou através de livreiros e revendedores, e importar ou distribuir imprensa estrangeira, periódica e não periódica.
2. Constituem empresas jornalísticas as que se destinam à edição de publicações periódicas.
3. As agências noticiosas são havidas como empresas jornalísticas.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - João António Teixeira Canedo - João Duarte de Oliveira - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.

Nos termos regimentais, propomos que a base III da proposta de lei passe a constituir a base IV, com a seguinte redacção:

BASE IV

(Profissionais da Imprensa periódica)

1. Consideram-se profissionais da imprensa periódica, para os efeitos da presente lei, todos aqueles que, por virtude de contrato de trabalho com uma empresa jornalística, fazem das actividades próprias da direcção ou da redacção da imprensa periódica ou das agências noticiosas a sua ocupação principal.
2. Em estatuto próprio serão definidos os requisitos indispensáveis ao exercício da actividade dos profissionais da imprensa periódica e as respectivas categorias, por forma a salvaguardar a sua independência e dignidade.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Crua de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Gosta Evangelista - João António Teixeira Canedo - João Duarte de Oliveira - Gustava Neto Miranda - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Henrique dos Santos Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que, mantendo as epígrafes a base IV da proposta de lei, passe a constituir a base V, com a seguinte redacção:

CAPÍTULO II

Liberdade de imprensa, suas garantias e limitações

BASE V

(Liberdade de Imprensa)

1. A imprensa exerce a função social de permitir a expressão do pensamento, a divulgação dos conheci-

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mentos e a difusão de informações, tendo em couta o interesse colectivo.
2. E lícito a todos os cidadãos utilizar a imprensa de acordo com a função social desta e com o respeito dos direitos de outrem, das exigências da sociedade e dos princípios da moral.
3. A imprensa periódica, enquanto desempenha a função de difundir informações, deve circunscrever-se às que provenham de fonte conhecida, reproduzindo-as com precisão e fidelidade e com exclusão daquelas cuja veracidade não esteja apurada ou que sejam tendenciosas ou manifestamente contrarias aos interesses nacionais.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - João António Teixeira Canção - João Duarte de Oliveira - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Vítor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que a base V da proposta de lei passe a constituir a base vi, com a seguinte redacção:

BASE VI

(Direito de acesso às fontes de informação)

1. Aos profissionais da imprensa, no exercício das suas funções, é garantido o acesso às fontes oficiais de informação.
2. Cumpre às autoridades e seus agentes facilitar o acesso às fontes de informação em tudo que não prejudique o exercício das respectivas funções e o interesse geral.
3. O Estado e as entidades de interesse público devem organizar serviços destinados a proporcionar as notícias e os aparecimentos necessários à informação verídica.
4. O acesso às fontes de informação não implica o direito de examinar processos pendentes, quer judiciais, quer administrativos, nem o de obter copias de documentas que não sejam legalmente destinados a publicação.
5. Os factos e os documentos considerados confidenciais ou secretos por motivos de interesse público ou por respeitarem à vida íntima dos cidadãos não susceptíveis de informação.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês- Júlio Alberto da Conta Evangelista - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - João António Teixeira Canedo - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - João Duarte de Oliveira - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Henrique dos Santos Tenreiro - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.

Nos termos regimentais, propomos que a base VI da proposta de lei passe a constituir a base VII, com a seguinte redacção:

BASE VII

(Direito ao sigilo profissional)

1. É reconhecido aos profissionais da imprensa o direito ao sigilo profissional em relação à origem das informações ou notícias que publiquem ou transmitam, salvo quanto às que interessem à segurança exterior ou interior do Estado ou respeitem à verificação ou punição de crimes públicos.
2. Cabe aos tribunais determinar se o segredo profissional se justifica quanto à origem de informações ou notícias pertinentes a crimes semipúblicos e particulares ou à vida íntima dos cidadãos.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortes - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Manuel Artur Coita, Agostinho Dias - Gustavo Neto Miranda - João António Teixeira Canedo - João Duarte de Oliveira - António de Sousa Vadre Gastelino e Alvim - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Henrique dos Santos Tenreiro.

Nos termos regimentais, propomos que a base VII da proposta de lei passe a constituir a base VIII com a seguinte redacção:

Base VIII

(Direito de publicação)

O autor de textos ou imagens pode publicá-los pela imprensa, desde que a matéria publicada não contrarie a função social desta e sejam observadas as normas legais.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Gustavo Neto Miranda - João António Teixeira Canedo - João Duarte de Oliveira - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Henrique dos Santo* Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que a base VIII da proposta de lei passe a constituir a base IX, com a seguinte redacção:

BASE IX

(Direito à constituição de empresas)

O direito de constituir empresas editoriais ou jornalísticas e de participar nelas será regulado de modo a conciliar os direitos individuais e o interesse público.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Manuel Artur Cotta Agostinho Diais - Jnilu Duarte de Oliveira - João António Teixeira Canedo - Gustavo Neto Miranda - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Henrique dos Santos Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que a base IX da proposta de lei passe a constituir a base x, com a seguinte redacção:

BASE X

(Direito de circulação de Impressos)

1. É livre a circulação dos impressos publicados de harmonia com as disposições legais.

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2. Considera-se que há circulação de um impresso quando tenham sido distribuídos pelo menos seis exemplares, ou dele tenha sido afixado ou exposto em lugar público, ou colocado à venda.
3. É proibido distribuir, divulgar, vender, afixar ou expor publicamente e ainda importar, exportar, deter em depósito ou anunciar, para algum daqueles fins, qualquer impresso que:

a) Contenha texto ou imagem cuja publicidade integre crime contra a segurança exterior ou interior do Estado, ou ultraje a moral pública, ou constitua provocação pública ao crime ou incitamento ao emprego da violência;
b) Haja sido suspenso de acordo com o disposto nesta lei;
c) Não tenha sido submetido a exame prévio, ou neste tenha sido reprovado, nos casos excepcionais em que, segundo o presente diploma, tal exame se estabelece;
d) Seja clandestino.

4. Os textos ou imagens que, nos termos do número anterior, não devam circular serão apreendidos por mandato judicial ou, quando a urgência e a gravidade das circunstâncias o justifiquem, pela autoridade administrativa.
5. A autoridade administrativa, como colaboradora do Ministério Público, remeterá a este os elementos probatórios do ilícito que se quis prevenir ou remediar.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Crus de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Manuel Artur Cotia Agostinho Dias - Gustavo Neto Miranda - João António Teixeira Canedo - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - João Duarte de Oliveira - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que a base X da proposta de lei passe a constituir a base XI, com a seguinte redacção:

BASE XI

(Garantia da liberdade de Imprensa)

1. Para garantia da liberdade de imprensa e da não sobreposição dos interesses particulares ao interesse público, o Governo deverá providenciar no sentido de:

a) Impedir a concentração de empresas editoriais ou jornalísticas;
b) Evitar a acção de terceiros que possa restringir a sua independência;
c) Ser fiscalizada a actividade das mesmas empresas, bem como a tiragem das suas publicações;
d) Obviar à excessiva concentração da imprensa mediante a fixação de um número máximo de publicações periódicas da mesma natureza para cada empresa jornalística;
e) Regular a actividade dos profissionais da imprensa de forma a assegurar-lhes a autonomia e os meios de trabalho convenientes ao exercício da sua missão;
f) promover a publicação de obras de reconhecimento mérito, quando os seus autores não tenham podido fazê-lo, concedendo para tanto subsídios e prémios.

2. As empresas jornalísticas e editoriais não poderão receber, directa ou indirectamente, subsídios ou quaisquer auxílios de proveniência estrangeira.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Manuel Artur Coita Agostinho Dias - João Duarte de Oliveira - Henrique dos Santos Tenreiro - Gustavo Neto Miranda - João António Teixeira Canedo - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos a introdução de uma base nova a seguir à base XI (base X da proposta de lei), com a seguinte redacção:

BASE XII

(Ensino do Jornalismo)

Para assegurar a formação de profissionais de imprensa, de harmonia com as exigências culturais, científicas e técnicas da sua missão de interesse público, o Governo promoverá a organização do ensino do jornalismo.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Gosta Evangelista - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - João António Teixeira Canedo - João Duarte de Oliveira - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Henrique dos Santos Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.

Nos termos regimentais, propomos que o n.º 1 da base XI da proposta de lei passe a constituir a base XIII, com a seguinte redacção:

BASE XIII

(Limites de Liberdade de Imprensa)

O uso da imprensa, com os fins indicados na presente lei, apenas será limitado para assegurar:

a) O acatamento da Constituição, o respeito das instituições, a unidade e independência do País, ou o seu prestígio na ordem interna e no conceito internacional;
b) A defesa da ordem pública interna e da paz externa e as exigências da defesa nacional e da segurança do Estado;
c) A não divulgação de informações que respeitem a matérias de natureza confidencial ou que, embora sem carácter secreto, possam prejudicar os interesses do Estado, se existirem normas ou recomendações do Governo determinando reserva, ou esta se imponha pela sua própria natureza;
d) O respeito da verdade, a defesa da moral e dos direitos da intimidade das famílias e dos indivíduos;

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e) A autoridade, independência e imparcialidade dos tribunais;
f) A prevenção do crime e a protecção da saúde.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - João António Teixeira Canedo - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - João Duarte de Oliveira - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Gustavo Neto Miranda - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que o n.º 2 da base XI da proposta de lei seja transformado numa base nova, com seguinte epígrafe e redacção:

BASE XIV

(Discussão e crítica dos actos da Administração)

O disposto na base anterior não obsta à discussão e crítica das leis, regulamentos e mais actos da administração pública e da organização corporativa e, bem assim, da forma como os respectivos órgãos e agentes lhes dão cumprimento, com vista ao esclarecimento da opinião pública ou à sua preparação para as reformas a efectuar pelos trâmites legais, à boa execução das leis e ao respeito pelos direitos dos cidadãos.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Crua de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - João Duarte de Oliveira - João António Teixeira Canedo - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que, mantendo as epígrafes, a base XII da proposta de lei, passe a constituir a base XV com a seguinte redacção:

CAPÍTULO III

Imprensa periódica e não periódica

BASE XV (Instituição do registo)

1. Nos serviços centrais de informação haverá um registo:

a) Das empresas jornalísticas;
b) Das empresas editoriais;
c) Das publicações periódicas;
d) Dos profissionais da imprensa periódica;
e) Dos editores da imprensa não periódica;
f) Das agências noticiosas estrangeiras admitidas a exercer a sua actividade em Portugal;
g) Dos profissionais ao serviço da imprensa estrangeira.

2. As entidades a que se referem as alíneas a), b), e), f) e g) não podem iniciar o exercício das respectivas actividades sem obterem a sua inscrição no registo.
3. Também de prévia inscrição no registo depende a publicação dos periódicos, sendo havidos por clandestinos os não registados.

4. O registo é público e será organizado por forma a permitir, em cada momento, uma identificação completa e actualizada das inscrições.
5. A inscrição no registo obedecerá a normas regulamentares a estabelecer e só poderá ser recusada com fundamento na lei.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - João António Teixeira Canedo - Gustavo Neto Miranda - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - João Duarte de Oliveira - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que a base XIII da proposta de lei passe a constituir a base XVI, com a seguinte redacção:

BASE XVI

(Direcção e edição dos periódicos)

1. As publicações periódicas editadas por empresas privadas terão um director livremente escolhido pela entidade proprietária de entoe as pessoas que reúnam os requisitos a definir em regulamento.
2. Compete ao director a orientação dia publicação, com direito a decidir sobre todo o conteúdo desta, incluindo a publicidade e exceptuadas as inserções obrigatórias; cabe-lhe igualmente representar a empresa pelo que toca à composição, impressão e circulação do periódico, ou em outras matérias relativas às funções do seu cargo.
3. As publicações periódicas conterão obrigatoriamente, em cada um dos seus números, o nome do director, a indicação da entidade proprietária, da sede da respectiva administração e do estabelecimento onde foram compostas e impressas e a data da impressão.
4. O director poderá ser coadjuvado por directores-adjuntos ou subdirectores, designados pela mesma forma que o director de entre ais pessoas que reúnam iguais requisitos.
5. O director da imprensa diária deverá ter residência permanente dentro da comarca em cuja área se situe a sede do periódico.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - João António Teixeira Canedo - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Gustavo Neto Miranda - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Henrique dos Santos Tenreiro - João Duarte de Oliveira - Victor Manuel de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que a base XIV da proposta de lei passe a constituir a base XVII, com a seguinte redacção:

BASE XVII

(Edição da Imprensa não periódica)

1. Toda a imprensa não periódica, salvo quando expressamente exceptuada na lei, terá um editor, responsável pela publicação.

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2. Nenhuma, publicação que deva ter editor poderá ser posta à venda ou por qualquer outra forma posta a circular sem indicação do nome daquele, do estabelecimento onde foi composta e impressa e da data em que se fez ou concluiu a impressão.
3. Quando a edição for efectuada por uma empresa editorial ou directamente por estabelecimento tipográfico, ou quando se trate de imprensa oficial ou oficiosa publicada por pessoa colectiva de direito público ou entidade equiparada, o nome do editor pode ser substituído, respectivamente, pela {denominação da empresa ou nome do estabelecimento ou pela designação oficial do serviço encarregado da edição.
4. No caso de a edição ser mandada executar pelo autor da publicação sem intervenção de um editor devidamente registado, deverá sempre indicar-se no local onde habitualmente se insere á designação do editor que se trata de edição do autor.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - João António Teixeira Canção - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Manuel Artur Coita Agostinho Dias - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Henrique dos Santos Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira.

Nos termos regimentais, propomos que a base XV da proposta de lei passe a constituir a base XVIII, com a seguinte redacção:

BASE XVIII

(Inserção de notas oficiosas e de rectificações ou aclarações oficiais)

1. As notas oficiosas do Governo deverão ser publicadas na íntegra e correctamente, com indicação da sua proveniência, por todos os periódicos a que forem remetidas, no primeiro número impresso após a sua recepção.
2. Os periódicos são também obrigados a inserir, no número seguinte ao da sua recepção, as comunicações oficiais que lhes sejam remetidas por qualquer órgão da administração pública paira rectificação ou aclaração de afirmações ou informações inexactas ou menos correctas por eles publicadas sobre a respectiva actividade.
3. A rectificação ou aclaração será feita gratuitamente, na mesma página e local onde tiver sido impressa a afirmação ou informação rectificada ou aclarada, com os precisos caracteres tipográficos desta, e limitar-se-á aos factos nela referidos, não podendo ultrapassar o espaço ocupado por aquela, mas podendo sempre atingir cinquenta linhas, excepto, quanto a este último aspecto, nos casos previstos no n.º 5.
4. A publicação da rectificação ou aclaração não poderá ser acompanhada, no mesmo número, de quaisquer comentários do periódico ou de terceiros.
5. As disposições desta base são aplicáveis às decisões finais proferidas em processos de inquérito ou semelhantes misturados em consequência de acusações ou referências feitas na imprensa a funcionários.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - João António Teixeira Canedo - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Gastelino e Alvim - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Victor Manuel Pifes de Aguiar e Silva - João Duarte de Oliveira - Gustavo Neto Miranda.

Nos termos regimentais, propomos que a base XVI da proposta de lei passe a constituir a base XIX, com a seguinte redacção:

BASE XIX

(Direito de resposta)

1. Os periódicos silo obrigados a inserir a resposta remetida por qualquer pessoa singular ou colectiva quê se considere prejudicada pela publicação de texto ou imagem que a ela tenha de algum modo aludido.
2. O direito de resposta pode ser exercido pelo interessado ou por seu representante legal e, no caso de morte daquele, pelo cônjuge sobrevivo, ou por descendente, ascendente, irmão, sobrinho ou herdeiro do falecido, dentro de trinta dias a contar da data da publicação ou do dia em que a mesma chegue ao conhecimento do interessado.
3. A resposta deverá ser publicada dentro de dois dias, a contar do seu recebimento, se a publicação for diária, ou, se o não for, no primeiro número impresso após a recepção.
4. Aplicar-se-á à resposta o disposto nos n.ºs 3 e 4 da base anterior, com extensão limitada à do texto ou imagem que a tiver provocado, mas podendo atingir sempre cinquenta linhas; estes limites podem ser ultrapassados até ao dobro do espaço do texto ou imagem que provocou a resposta, desde que o interessado e prontifique a pagar a parte excedente pelos preços ordinários, que nunca poderão ser superiores aos da publicação de anúncios no Diário do Governo.
5. O direito de resposta é independente do procedimento criminal pelo facto da publicação, bem como do direito à indemnização pelos danos causados.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - João António Teixeira Canedo - Manuel Artur Gotta Agostinho Dias - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Gustavo Neto de Miranda - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Henrique dos Santos Tenreiro - João Duarte de Oliveira - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que a base XVII da proposta de lei passe a constituir a base XX, com a seguinte redacção:

BASE XX

(Recusa de Inserção de resposta)

1. A publicação da resposta pode ser recusada quando:

a) Não tiver relação com o que houver sido publicado;
b) Pelo seu conteúdo, seja proibida nos termos da lei.

2. Se o periódico deixar de publicar a resposta, poderá o interessado requerer em tribunal a sua publicação.

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3. Na hipótese de o periódico ter deixado de se publicar, a decisão do tribunal e a resposta serão publicadas em um dos periódicos de maior circulação da localidade ou da localidade mais próxima, se naquela não existir outro periódico, a expensas do responsável.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Manuel Artur Coita Agostinho Dias - João António Teixeira Canedo - Gustavo Neto de Miranda - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - João Duarte de Oliveira - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Henrique dos Santos Tenreiro - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que a base XVIII da proposta de lei passe: a constituir a base XXI, com a seguinte redacção:

BASE XXI

(Direito de esclarecimento)

1. Se em qualquer publicação periódica houver referências, alusões ou frases equívocas ou imprecisas que possam implicar difamação ou injúria para alguém, poderá a pessoa que por elas se julgue abrangida requerer ao director da publicação que:

a) Ouvido o respectivo autor, declare inequivocamente, por escrito, no prazo de educo dias, se aquelas referenciais, alusões ou frases respeitam ao requerente, esclarecendo-as devidamente;
h) Publique essa declaração no primeiro número do periódico que for impresso, nos termos do n.º 3 da base XVIII.

2. Quando o director não faça ou não publique a declaração, poderá o interessado pedir ao tribunal que determine a publicação do requerimento referido no número anterior, com a nota de que não foi respondido, ou a publicação da declaração escrita que lhe tiver sido enviada.
3. Se o director do periódico não publicar a declaração ou, publicando-a, este for equívoca, o requerente terá direito à resposta e à respectiva acção criminal e civil, presumindo-se que o escrito em causa se refere ao mesmo requerente.
4. O direito de esclarecimento é extensivo às publicações não periódicas, aplicando-se ao autor ou, não sendo este publicamente conhecido, ao editor o disposto para o director do periódico; o requerimento e a declaração serão publicados, por carta do responsável, em folheto, se assam for acordado, ou, na falta de acordo, em três periódicos à escolha do interessado, não podendo, neste caso, o requerimento e a declaração ter extensão superior a cem linhas.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Henrique dos Santos Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Gustavo Neto Miranda - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira.

Nos termos regimentais, propomos que a base XIX da proposta de lei passe a constituir a base XXII, com a seguinte redacção:

BASE XXII

(Entrega oficial das publicações)

1. Os directores dos periódicos devem mandar entregar à autoridade administrativa local a determinar em regulamento, no próprio dia em que for feita a publicação e no início da distribuição, os exemplares de cada número que naquele diploma forem fixados.
2. É ainda obrigatória a entrega ou remessa de um exemplar do periódico ao Ministério da Justiça e de outro à entidade competente para a instrução preparatória dos processos penais na comarca da sede da administração.
3. Não ficam abrangidas pelo disposto no número anterior as publicações que tratem exclusivamente de assuntos de natureza científica, literária, histórica, artística, religiosa, forense, técnica, profissional, bibliográfica ou meramente publicitária.
4. O editor de qualquer publicação não periódica em que se versem assuntos de carácter político, económico ou social deve mandar entregar um exemplar aos serviços de informação até três dias antes daquele em que seja posta a circular.
5. É obrigatório o envio ao serviço de depósito legal do número de exemplares, a fixar em regulamento, de todas as publicações, no dia da sua distribuição.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Crus de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Gustavo Neto Miranda - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira.

Nos termos regimentais, propomos u introdução de uma base nova a seguir à, base XXII (base XIX da proposta de lei), com a seguinte redacção:

BASE XXIII

(Imprensa regional)

1. A imprensa regional será estimulada de modo a proporcionar-lhe as condições indispensáveis à sua autonomia e expansão.
2. Com vista ao preceituado no número anterior, poderá o Governo estabelecer facilidades fiscais e outras que repute adequadas à organização das empresas, direcção, redacção ou responsabilidades decorrentes da lei.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Henrique dos Santos Tenreiro - João Duarte de Oliveira - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Gustavo Neto de Miranda - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.

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Nos termos regimentais, propomos que a base XX da proposta de lei passe a constituir a base XXIV, com a seguinte redacção:

BASE XXIV

(Publicações para a Infância e a adolescência)

As publicações periódicas ou não, declaradamente destinadas à infância ou à adolescência, ou que possam como tal ser reputadas, ficam sujeitas, no que respeita à disciplina do seu conteúdo, a legislação especial.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Henrique dos Santos Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Gustavo Neto Miranda - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira - João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.

Nos termos regimentais, propomos que a base XXI da proposta de lei passe a constituir a base XXV, com a seguinte redacção:

BASE XXV

(Imprensa estrangeira)

1. A importação, a conservação em depósito, o anúncio, a exposição e a circulação da imprensa publicada no estrangeiro, periódica e não periódica, serão regulamentados de acordo com os princípios fundamentais definidos na presente lei para a imprensa portuguesa e os superiores interesses do País.
2. O mesmo critério se adoptará para definir o estatuto dos profissionais ao serviço da imprensa estrangeira.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Gustavo Neto Miranda - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Henrique dos Santos Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Camilo António de Almeida Gama Lemos do Mendonça - João Duarte de Oliveira.

Nos termos regimentais, propomos que, mantendo as epígrafes, a base XXII da proposta de lei seja substituída pela seguinte:

CAPÍTULO IV

Empresas jornalísticas e editoriais

BASE XXVI

(Pessoas colectivas)

1. As pessoas colectivas podem constituir-se editoras de publicações periódicas e não periódicas quando reúnam os seguintes requisitos:

a) Terem a sede e a direcção efectiva em Portugal;
b) Serem portugueses e residirem em Portugal os administradores ou gerentes das editoras de publicações periódicas;
c) Ser português todo o capital, quando se trate de pessoas colectivas que empreendam predominantemente publicações de natureza jornalística, ou ser português a maioria do respectivo capital social, quando se trate de outras publicações;
d) Serem nominativas todas as acções, nas sociedades anónimas que empreendam predominantemente publicações de natureza jornalística; quando se trate de outras publicações, serão nominativas as acções representativas da maioria do capital a que se refere a alínea anterior.

2. Não ficam sujeitas às restrições do número anterior as pessoas colectivas editoriais estrangeiras, ou nacionais com participação de capital estrangeiro, que exerçam a sua actividade em Portugal à data da publicação desta lei, e ainda as que se dediquem à publicação de revistas de carácter exclusivamente científico ou técnico.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Henrique dos Santos Tenreiro - Gustavo Neto Miranda - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira.

Nos termos regimentais, propomos que a base XXIII da proposta de lei seja substituída pela seguinte:

BASE XXVII

(Pessoas singulares)

As pessoas singulares que pretendam editar publicações periódicas devem ter a nacionalidade portuguesa e residir em Portugal.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Henrique dos Santos Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Gustavo Neto Miranda - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira.

Nos termos regimentais, propomos que, mantendo as epígrafes, a base XXIV da proposta de lei passe a constituir a base XXVIII, com a seguinte redacção:

CAPÍTULO V

Regime de exame prévio

BASE XXVIII

(Pressupostos e âmbito)

1. A publicação de textos ou imagens na imprensa periódica pode ficar dependente de exame prévio, nos casos em que seja decretado estado de sítio ou de emergência.
2. Ocorrendo actos subversivos graves em qualquer parte do território nacional, poderá o Governo, independentemente da declaração do estado de sítio ou de emergência, a fim de reprimir a subversão ou prevenir a sua extensão, tornar dependente de exame prévio a publicação de textos ou imagens na imprensa periódica.
3. O exame prévio destinar-se-á a impedir a publicação das matérias abrangidas na base XIII.

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4. A existência do estado de subversão e a gravidade deste deverão ser confirmadas pela Assembleia Nacional na, primeira reunião que tenha lugar após a ocorrência dos factos.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Henrique dos Santos Tenreiro - Gustavo Neto Miranda - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - João Duarte de Oliveira - Camilo António de Almeida - Gama Lemos de Mendonça.

Nos termos regimentais, propomos que, mantendo as epígrafes à base XXV da proposta de lei seja dada a seguinte redacção:

CAPÍTULO VI

Abuso da imprensa

BASE XXIX

(Crimes de Imprensa)

1. Os crimes que se consumiam pela publicação de textos ou imagens denominam-se «crimes de imprensa» e na sua punição observar-se-ão as normas penais comuns, com as especialidades constantes da presente lei.
2. Os crimes de injúria, difamação ou ameaça dirigidos contra o Chefe do Estado Português ou contra Chefe de Estado estrangeiro, contra membros do Conselho de Estado ou do Governo, ou ainda contra qualquer diplomata estrangeiro acreditado em Portugal, consumam-se com a publicação do texto ou imagem em que haja inequívoca expressão injuriosa, difamatória ou ameaçadora.
3. Os crimes cometidos por meio da imprensa contra as autoridades públicas consideram-se sempre praticados na presença delas.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês- Júlio Alberto da Costa Evangelista - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino c Alvim - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.

Nos termos regimentais, propomos que à base XXVI da proposta de lei seja dada a seguinte redacção:

BASE XXX

(Autoria e cumplicidade)

1. Nos casos de publicação não consentida, será considerado autor do crime, em vez do autor do testo ou imagem, a pessoa que a tiver (promovido.
2. Tratando-se de texto ou imagem não assinado, ou assinado com pseudónimo ou com nome suposto, responderão como autores os directores das periódicos e, quando o periódico tiver secções distritais, os redactores especialmente responsáveis e os editores da imprensa não periódica, caso o nome do autor não seja indicado no prazo que lhes for marcado ou essa indicação não seja exacta.
3. Fora das hipóteses previstas no número anterior as directores dos periódicos e, quando o periódico tiver secções distintas, os respectivos redactores que sejam especialmente responsáveis e os editores da imprensa não periódica são considerados como cúmplices.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.

Nos termos regimentais, propomos que à base XXVII da proposta, de lei seja dada a seguinte redacção:

BASE XXVII

(Responsabilidade dos tipógrafos e Impressores)

1. Os tipógrafos e impressores só incorrerão em responsabilidade pelos actos que praticarem, integradores dos crimes de imprensa, desde que SB tenham apercebido da natureza criminosa da publicação; essa responsabilidade será, em todo o caso, excluída se eles tiverem actuado em consequência de ordens recebidas da entidade directamente responsável, nos termos desta lei, e que exerça legalmente a sua actividade.
2. Quando houverem de responder, de acordo com o número anterior, os tipógrafos e impressores serão punidos como cúmplices.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Gustavo Neto Miranda - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Henrique dos Santos Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - João Duarte de Oliveira - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.

Nos termos regimentais, propomos que à base XXVIII da proposta de lei seja dada a seguinte redacção:

BASE XXXII

(Responsabilidade dos proprietários)

1. Aos proprietários dos periódicos ou de publicações não periódicas em que sejam submetidos crimes de imprensa poderá ser aplicada uma multa por cada infracção.
2. Se os periódicos ou as publicações não periódicas forem propriedade de pessoas colectivas ou de sociedades, as multas são aplicadas aos titulares dos respectivos órgãos ou aos seus agentes ou representantes.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Henrique dos Santos Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Gustavo Neto Miranda - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira.

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Nos termos regimentais, propomos que à base XXIX da proposta de lei seja dada a seguinte redacção:

BASE XXXIII

(Prova da verdade dos factos)

1. No caso de difamação, é admitida a prova da verdade dos factos imputados, salvo quando, tratando-se de particulares, a imputação haja sido feita sem que o interesse público ou o do ofensor legitimasse a divulgação dos factos imputados ou ainda quando estes respeitem à vida privada ou familiar do difamado.
2. Tratando-se de injúria, a prova a fazer, de harmonia com o disposto no número anterior, só será admitida depois de o autor do texto ou imagem, a requerimento do ofendido, ter concretizado os factos em que a ofensa se baseia.
3. Se o autor da ofensa fizer a prova dos factos imputados, quando admitida, será isento de pena; no caso contrário, é, bem assim, quando não concretizar os factos em que ela se baseia ou estes não justifiquem a ofensa, será punido como caluniador.
4. Quando a imputação for de facto criminoso, é também admitida a prova de tal facto, mas limitada à resultante da condenação por sentença transitada em julgado que não tenha ainda sido cumprida.
5. Se a pessoa visada pela difamação ou injúria for o Presidente da República Portuguesa ou algum Chefe de Estado estrangeiro ou seu representante em Portugal, não é admitida a prova das imputações.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Manuel Artur Cotia Agostinho Dias - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Gustavo Neto Miranda - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira.

Nos termos regimentais, propomos que à base XXX da proposta de lei seja dada a seguinte redacção:

BASE XXXIV

Penas aplicáveis

Os crimes de imprensa são punidos com as penas estabelecidas na lei geral agravadas.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Manuel Artur Coita Agostinho Dias - Gustavo Neto Miranda - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira.

Nos termos regimentais, propomos que à base XXXI da proposta de lei seja dada a seguinte redacção:

BASE XXXV

(Outros crimes de imprensa)

São também considerados crimes de imprensa e punidos com as penas a seguir indicadas:

a) A publicação de impressos que não tenham sido submetidos a exame prévio, nos casos excepcionais em que este seja obrigatório, ou que nele tenham sido reprovados, e, bem assim, a publicação de impressos suspensos, mandados apreender ou clandestinos - com as penas correspondentes ao crime de desobediência qualificada;
b) A infracção ao disposto no n.º 3, alínea a), da base X - com prisão até dois anos e multa correspondente;
c) As infracções ao disposto no n.º 3, alíneas b), c) e d), da base x - com prisão até três meses e multa correspondente;
d) A infracção ao disposto no n.º 2 da base XI - com multa de 30 000$ a 300 000$;
e) A infracção ao disposto na base XVIII - com as penas correspondentes ao crime de desobediência qualificada;
f) A falta de publicação de resposta a requerimento das pessoas referidas no n.º 2 da base XIX e a falta da declaração a que se refere a alínea a) do n.º 1 da base XXI ou a falta de publicação dessa declaração nos termos constantes da alínea b) do mesmo número - com multa de 1000$ a 20 000$;
g) A falta de publicação de resposta, quando ordenada pelo tribunal, nos termos regulados nas bases XIX e XX, e a falta de publicação do requerimento e declaração, nos termos dos n.ºs 2 e 4 da base XXI - com as penas correspondentes ao crime de desobediência qualificada.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Henrique dos Santos Tenreiro - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Gustavo Neto Miranda - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira.

Nos termos regimentais, propomos que à base XXXII da proposta de lei seja dada a seguinte redacção:

BASE XXXVI

(Suspensão dos periódicos e cancelamento da sua inscrição)

Em atenção à gravidade ou frequência dos crimes neles cometidos, pode ser determinada a suspensão temporária dos periódicos ou o cancelamento da respectiva inscrição.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Henrique dos Santos Tenreiro - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Gustavo Neto Miranda - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira.

Nos termos regimentais, propomos que à base XXXIII da proposta de lei seja dada a seguinte redacção:

BASE XXXVII

(Interdição do exercício da profissão de director, redactor e editor)

Em atenção à gravidade ou frequência dos crimes neles cometidos, podem os directores e redactores dos

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periódicos e os editores da imprensa não periódica ser interditos, temporária ou definitivamente, do exercício da profissão.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês- Júlio Alberto da Costa Evangelista-Gustavo Neto Miranda - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Henrique dos Santos Tenreiro - Manuel Artur Cotia Agostinho Dias - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira.

Nos termos regimentais, propomos que à base XXXIV da proposta de lei seja dada a seguinte redacção:

BASE XXXVIII

(Processo)

1. A acção panal pelos crimes de imprensa será exercida nos termos estabelecidos mo Código de Processo Penal e legislação complementar; tratando-se, porém, de ofensas conta a Chefes de Estado estrangeiros ou seus representantes em Portugal, o exercício da acção penal depende de pedido do ofendido, feito directamente ou por via diplomática.
2. À instrução do processo são aplicáveis as disposições contidas naquele Código e legislação complementar.
3. Na acusação e defesa observar-se-á o seguinte:

a) Se ao crime corresponder pena maior, aplicam-se as normas reguladoras do processo de querela;
b) Se o crime for o de difamação, calúnia ou injúria, é aplicável o processo regulado nos artigos 587.º e seguintes do Código de Processo Penal;
c) Nos restantes casos, aplicam-se as disposições reguladoras do processo de polícia, correccional.

4. O julgamento será feito pelos tribunais Competentes para conhecer dos crimes como se estes não fossem cometidos através da imprensa.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Gosta Evangelista - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Gustavo Neto Miranda - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira.

Nos termos regimentais, propomos que à base XXXV da proposta de lei seja dada a seguinte redacção:

BASE XXXIX

(Publicação de decisões)

1. As decisões condenatórias por crimes de imprensa cometidos em periódicos serão gratuitamente publicadas, por extracto, nos próprios periódicos, devendo dele constar os factos provados, a identidade dos ofendidos e dos condenados, as sanções aplicadas e as indemnizações fixadas.
2. Nos casos de absolvição ou isenção de pena, o réu tem o direito de fazer publicar a respectiva decisão, também por extracto, à custa do denunciante.
3. Quando o periódico em que foi inserido o texto ou imagem tenha deixado de se publicar, a decisão condenatória ou absolutória será publicada num dos periódicos de maior circulação da localidade, ou da localidade mais próxima se naquela não existir outro periódico, a expensas do responsável.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruas de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Gosta Evangelista - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Henrique, dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Nos termos regimentais, propomos que à base XXXVI da proposta de lei seja dada a seguinte redacção:

BASE XL

(Contravenções)

1. Constituem contravenções, puníveis com multa até 20 000$:

a) A infracção ao preceituado no n.º 3 da base XVI e nos n.ºs 2, 3 e 4 da base XXII;
b) A infracção ao preceituado na base XXII.

2. A aplicação das multas por contravenções é da competência do Governo, com recurso de plena jurisdição, para o Supremo Tribunal Administrativo.
3. Na falta de pagamento voluntário dessas multas, serão as mesmas cobradas coercivamente pelos tribunais fiscais, nos termos do Código de Processo das Contribuições e Impostos.
4. As referidas multas constituem receita da instituição de previdência que abranja os profissionais da imprensa.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Julho de 1971. - Os Deputados: Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Júlio Alberto da Costa Evangelista - Henrique dos Santos Tenreiro - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias - Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça - João Duarte de Oliveira.

Nos termos regimentais, propomos que a base XXXVII da proposta de lei passe a constituir a base XLI, com a seguinte redacção:

BASE XLI

(Publicação do regulamento)

O Governo publicará no prazo de cento e oitenta dias a regulamentação da presente lei.

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