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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 135

ANO DE 1971 4 DE AGOSTO

X LEGISLATURA

(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)

SESSÃO N.º 135 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 3 DE AGOSTO

Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Exmos. Srs. João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Amílcar da Costa Pereira Mesquita

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 130 e 131 do Diário das Sessões.
Deu-se conta, do expediente.
Foi presente a Assembleia, para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, o Decreto-Lei n.º 329/71.
O Sr. Deputado Oliveira Ramos louvou a medida tomada pelo Governo acerca do pagamento das férias aos professores eventuais.
O Sr. Deputado Eleutério de Aguiar falou sobre problemas de remunerações e reforma dos regentes escolares.
O Sr. Deputado Prabacor Rau preconizou a extensão aos alunos do ensino técnico da faculdade, já concedida no ensino liceal, de pedirem a revisão das provas escritas de exame.

Ordem do dia. - Prosseguiu a discussão na especialidade e votação da proposta de lei de imprensa.
Foram discutidas e aprovadas as bases X a XVII.
No debate, que incidiu sobre o conjunto de propostas da comissão eventual, intervieram os Srs. Deputados Teixeira Canedo, Per es Claro, Ulisses Cortês, Cunha Araújo, Pinto Balsemão, Camilo de Mendonça, Pontífice Sousa, Júlio Evangelista, Moura Ramos, Alberto de Alar cão, Almeida e Sousa, Aguiar e Silva, Salazar Leite, Oliveira Dias, D. Custódia Lopes, Homem de Mello, Ricardo Horta, Barreto de Lara, Roboredo e Silva e Montalvão Machado.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 50 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Moutenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Lopes Quadrado.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Augusto Domingues Correia.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Delfim Linhares de Andrade.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.

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Francisco Correia das Neves.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco José Pereira Finto Balsemão.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Mancada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Gustavo Neto Miranda.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João António Teixeira Canedo.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Duarte de Oliveira.
João José Ferreira Forte.
João Lopes da Cruz.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Ruiz de Almeida Garrett.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Coelho de Almeida Cotta.
José Coelho Jordão.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José João Gonçalves de Proença.
José Maria de Castro Salazar.
José dos Santos Bessa.
José da Silva.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Júlio Dias das Neves.
Luís António de Oliveira Ramos.
D. Luzia Neves P era 5o Pereira Beija.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baessa.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui de Moura Ramos.
Rui Pontífice Sousa.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teodoro de Sousa Pedro.
Teófilo Lopes Frazão.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.
Vítor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 77 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n.ºs 130 e 131 do Diário das Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para reclamações sobre estes Diários, considerá-los-ei aprovados, com II ressalva - que tem sido usada nos últimos dias em consideração do muito que as atenções de VV. Ex.ªs têm sido solicitadas por outras matérias, - que até amanha qualquer de VV. Ex.ªs que encontre alguma rectificação a indicar, poderá fazê-lo directamente aos serviços de redacção do Diário das Sessões.
Estão, portanto, aprovados os n.08 130 e 131 do Diário das Sessões com esta ressalva.
Deu-se conta do seguinte

Expediente

Carta

De um grupo de sócios do Sindicato Nacional dos Jornalistas apoiando ais declarações de voto dos seus representantes na Câmara Corporativa, a propósito do parece sobre a proposta e o projecto de lei de imprensa.

Comunicado

Da Associação de Futebol de Braga acerca das deliberações tomadas no último Congresso da Federação Portuguesa de Futebol.

Telegramas

De Soares Maganinho, de Júlio Marques da Silva e do presidente da Câmara Municipal de Tomar apoiando a intervenção do Sr. Deputado Dias das Neves sobre as deliberações do último Congresso da Federação Portuguesa de Futebol.
Quatro telegramas de Gentil Marques, em representação de algumas revistas, exprimindo o voto de que a lei de imprensa venha a permitir o desenvolvimento da imprensa portuguesa não diária.
De Maria Virgínia Fialho Jesus acerca da detenção de seu marido.
Do Dr. Duarte Vidal apoiando a actuação do Sr. Deputado Sá Carneiro na sessão de 28 de Julho.
Da Federação dos Grémios da Lavoura da Província da Beira Litoral apoiando a intervenção do Sr. Deputado Santos Bessa sobre a difícil situação da lavoura da região do Mondego.

O Sr. Presidente: - Para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, está na Mesa, enviado pela Presidência do Conselho, o Diário do Governo, 1.ª série, n.º 197, datado de 31 de Julho último, que insere o Decreto-Lei n.º 329/71, que autoriza a Administração-Geral do Porto de Lisboa a contratar com uma surpresa a concessão do direito de construir e explorar em regime de serviço público um terminal portuário destinado à movimentação, armazenagem, embalagem, desembalagem, mistura e operações conexas, incidindo sobre fluídos a granel, com excepção dos derivados da destilação do petróleo bruto utilizados como combustíveis ou como lubrificantes de motores.
Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Ramos.

O Sr. Oliveira Ramos: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquando da celebração, em Aveiro, do congresso do Ensino Liceal, o Sr. Ministro da Educação prometeu dar solução ao magno problema do vencimento dos professores eventuais durante as férias de Verão.
Em Janeiro de 1970, usando da palavra na Assembleia Nacional, pouco depois da entrada do Prof. Veiga Simão para o Governo, tive ocasião de denunciar a necessidade do Estado pagar aos docentes eventuais os doze meses do ano, pondo cobro a uma injustiça que de longe vinha.

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Posteriormente, outros Sr s. Deputados ventilaram o tema e eu fiz uma pergunta ao Governo sobre o estado da questão.
A resposta proveniente das esferas superiores mostraria que o velho caso era objecto de cuidado estudo, estudo que deu origem ao anúncio da sua próxima resolução, realizado pelo Sr. Ministro da Educação, em Aveiro.
Porque as férias grandes estavam à porta, nos últimos tempos aguardava-se, ansiosamente, em meios do ensino secundário, a concretização da nova política de vencimentos.
Pois bem, como é sabido, no Conselho dê Ministros, de terça-feira passada, ficou assente que os docentes eventuais, com determinadas habilitações e serviços, adquiririam a categoria de professor extraordinário e, como tal, passavam a receber ordenado em Agosto e Setembro.
Sinto-me, portanto, na obrigação de relevar, aqui, a disposição do Executivo, toda ela impregnada de justiça, de bom espírito social, de atenção à causa da instrução pública. Ela honra o Governo do Prof. Marcelo Caetano, dignifica o Ministro da Educação e dá resposta azada a um movimento de opinião traduzido, com grande relevo e acuidade, em importantes órgãos de informação e, bem assim, nesta Câmara.
Trata-se, é certo, da satisfação de uma necessidade evidente, mas de uma necessidade que, por incompreensível razão, fora sucessivamente esquecida. Daí a significação do novo decreto, o qual veio ao encontro da justa reivindicação de toda uma classe, a saber, de centenas de professores espalhados pelas nossas vilas e cidades, cujo esforço garante o normal funcionamento dos centros de educação onde trabalham.
Como amiúde sucede nas coisas humanas, a despeito de se ter vencido um problema grave, outros continuam em aberto. Todavia, no sector educacional, fica a esperança, eu diria a certeza, de que, apoiado pelo Sr. Presidente do Conselho e pela Nação, o Prof. Veiga Simão saberá enfrentar as dificuldades subsistentes com a determinação, o sentido! das genuínas carências e a inteligência que tem revelado na gestão da sua operosa e difícil pasta ministerial.
O orador foi cumprimentado.

O Sr. Eleutério de Aguiar: - Sr. Presidente e Sus. Deputados: De acordo com um decreto-lei há dias aprovado em Conselho de Ministros, cidadãos deste País,
servidores do próprio Estado, ficaram com uma pensão de reforma assegurada da ordem dos 273$. Nem mais nem menos: 273$ é o montante da «reforma» que o decreto-lei aprovado pelo último Conselho de Ministros e anunciado como concedendo regalias aos regentes escolares garante e estes agentes de ensino ...
Antes, porém, de prosseguir, justificando a afirmação que encerra algo de insólito mós tempos que vão correndo, desejo esclarecer que as considerações a fazer, a seu propósito não pretendem pôr em causa o esforço que o Governo vem desenvolvendo para vencer a batalha da educação, salientando-se o projecto de reforma de todo o sistema de ensino, em adiantada fase de estudo, e que, como já aqui foi várias vezes reafirmado, resistiu à discussão pública, ganhando maior autenticidade.
No último Conselho de Ministros foi aprovado um decreto-lei que confere aos regentes escolares o direito à aposentação e à admissão a concurso, independentemente de idade, para escriturários-dactilógrafos de 2.ª classe, com preferência, em igualdade de classificação, mós provimentos em lugares do Ministério da Educação Nacional e absoluta nas «nomeações para o preenchimento de vagas dos quadros de pessoal auxiliar dos serviços e eababelecimentos de ensino oficial.
Subscreve, inteiramente, as palavras oportumamente proferidas, mesto Câmara, pelo Sr. Deputado Ramiro de Queirós, quanto ao espírito de justiça que presidiu à concessão do direito de reforma e demais regadias. Mas não posso deixar de acrescentar alguns reparos, na medida em que a referida iniciativa governamental não veio, como se esperava e se impunha, resolver o angustioso problema dos regentes escolares, e tanto assim é que 273$ é o montante dai pensão de reforma que assegura a alguns, que nem sequer a todos eles ...
Efectivamente, uma vez que a idade máxima para inscrição na Caixa Geral de Aposentações será a que corresponder à possibilidade de o subscritor perfazer o mínimo de quinze amos de serviço até atingir o limite de idade previsto na lei para o exercício do cargo, e, dado que a gratificação mensal atribuída aos regentes dos postos escolares, agora considerada vencimento para o efeito da aposentação, é de 900$, aplicada a fórmula, em vigor no respectivo cálculo, verifica-se que, naquele período, apenas se assegura uma pensão de 273$. Entretanto, ainda em conformidade com a mesma disposição legal, se o regente escolar puder habilitar-se a uma reforma correspondente a trinta anos de serviço, indemnizará a Caixa em 8100$, acrescidos dos juros compostos, para vir a usufruir de uma pensão de 657$ ...
Por outro lado, o decreto-lei agora aprovado mão assegurai o direito à reforma a» todos os regentes escolares. Na verdade, apesar de o mínimo de quinze anos estipulado não se aplicar aos regentes que dentro de cento e oitenta dias, a contar da entrada em vigor deste decreto-lei, requeiram a sua inscrição na Caixa Geral de Aposentações, desde que, com o serviço já prestado, possam, ter completado ou completar igual tempo até o momento em que requererem ou lhes seja imposta a aposentação, a medida legislativa deixa de fora elevada percentagem desses algentes de ensino, tantos quantos não forem titulares efectivos de um posto escolar, pois esta é condição expressa, e, bem assim, todos os que, de qualquer forma, não consigam preencher as referidas condições.
Para melhor se avaliar do que afirmo, haja em vista que, segundo as «Estatísticas da Educação - Continente e Ilhas», do Instituto Nacional de Estatística, relativas a 1969, ano mais recente que me foi possível consultar, prestaram serviço no ensino oficial, instruindo cerca de 60 000 alunos, 3274 regentes escolares, numa percentagem superior a dez por cento do pessoal docente, sendo 1187 agregados e, por conseguinte, não abrangidos pela disposição legal agora adoptada.
Como é sabido, o problema destes agentes de ensino surgiu em consequência, por um lado, de uma lei obsoleta que impunha mínimos de alunos para a criação de uma escola e, por outro, devido à falta de professores habilitados com o curso normal para o magistério primário. De forma alguma pretendo advogar tal situação no nosso ensino. Mas o certo é que o Estado, apesar do carácter transitório que atribui ao serviço dos regentes escolares, não tem podido prescindir da sua colaboração. A falta de professores é cada vez mais aflitiva e o Diário do Governo continua a inserir avisos de concursos para lugares de regentes, apesar do recurso à lei da acumulação, que disfarça ou atenua o mal, mas não o resolve, não obstante o esforço despendido por quantos se colocam nesse regime de prestação de serviço docente.
Ora, se o Estado não pode prescindir da colaboração dos regentes escolares, há que pagar-lhes convenientemente, sendo injusta uma gratificação de 900$ para quem

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exerce oficialmente funções docentes, tanto mais que o vencimento mínimo da tabela dos servidores do Estado, anexa ao Decreto-Lei n.º 49 410, de 24 de Novembro de 1969, é de 1900$. Acresce, em abono desta opinião, que o próprio decreto agora aprovado assegura aos regentes escolares, como já se viu, o direito à admissão a concurso para escriturários-dactilógrafos de 2.ª classe, a que corresponde o vencimento de 2200$, podendo ascender à categoria imediatamente superior, auferindo 2600$. E não se pode esquecer que os regentes escolares, na sua grande maioria, têm habilitações superiores às que são exigidas por lei para o exercício de tais funções, sujeitando-se a exame de aptidão profissional, que não é tão acessível como à primeira vista pode parecer, principalmente a partir das limitações impostas pelo Decreto-Lei n.º 44 560, de 8 de Setembro de 1962.
Afigura-se-me que o problema pode ser enunciado com simplicidade da seguinte forma:

1. Devido à falto de professores, o Estado mão pode prescindir da colaboração dos regentes escolares;
2. Não lhes pagando em conformidade com cus exigências da função que lhes possibilita -, o Estado está abrando brecha arada mais profunda no pessoal docente, circunstância agravada pelo facto de muito regentes prestarem serviço, inclusive, em escolas!

Por isso, tenho para mim que o referido decreto pouco veio adiantar, pois, além do direito à reforma, deveria fixar, pelo menos, o vencimento mínimo da tabela do funcionalismo, que é de 1900$, exactamente o que aufere um servente, aproveitando-se a iniciativa, paira se estabelecerem meios de valorização profissional, com cursos de reciclagem e outras medidas susceptíveis de garantirem maior rentabilidade ao seu trabalho, não deixando, por outro lado, no ostracismo muitos que, ao longo de uma vida ao serviço da Nação, deram o melhor que possuíam e que o Estado considerou suficiente, ainda mantidos à margem de qualquer benefício e quantos deles à míngua de (recursos para assegurar a própria sobre vivência!

O Sr. Ramiro Queirós: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Ramiro Queirós: - Eu tenho estado a ouvir, com todo o interesse - o interesse que o assunto me merece e a pessoa de V. Ex.ª também -, as palavras que tem estado a proferir.
A lacuna que V. Ex.ª refere, no que diz respeito aos regentes que o teor do decreto-lei não abrange, só dela tive conhecimento após a minha intervenção. Nem por isso entendo dever alterar ou corrigir a palavra que proferi:
ficaria ela, porém, incompleta se V. Ex.ª me não permitisse este despretensioso aparte para me solidarizar inteiramente com V. Ex.ª
Estou, polis, de acordo com V. Ex.ª e felicito-o vivamente pela- sua oportuna e justa intervenção.
Aliás, estou convencido de que o Governo não deixará de o ouvir, resolvendo, pelo meio adequado, o problema.
Muito obrigado, Sr. Deputado Eleutério de Aguiar.

O Orador: - Sr. Deputado: Nada. me tinha a agradecer. Eu é que, depois de ouvir V. Ex.ª, duplamente grato fico por verificar que, tal como eu pensava, V. Ex.ª não teria tido oportunidade de ler o decreto.
Este problema preocupa-me sobremaneira, até porque a solução adoptada pode ser entendida como uma forma menos realista de encarar aspecto tão delicado do magistério primário e receio a sua repercussão no espírito idos demais educadores, que aguardam justa melhoria de vencimentos e de condições de trabalho, precisamente numa altura em que tanta expectativa se tem gerado em torno da projectada: reforma escolar, a qual não poderá resistir à falta de executores, desde os responsáveis pelo ensino de base aos que ocupam a cátedra nas Universidades.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, recordando, por sinal, uma senhora regente escolar que, ao longo de trinta e um anos, prestou serviço docente bem qualificado em postos e escolas da minha terra, chegando a adquirir mobiliário e a pagar renda pelas salas onde ministrou ensino em variais localidades e que também se vê frustrada na esperança que sempre acalentou de um dia se lhe prestar justiça.
Pensando nessa senhora e em todas quantas, como ela,, apesar das limitações de ordem pedagógica que se lhes possam ter apontado, garantiram o ensino oficial por esse País fora, eu apelo para o Governo esperando seja revisto o montante da gratificação ou vencimento dos regentes escolares, bem como o condicionalismo legal agora estabelecido. É que eu não posso aceitar, impávido e sereno, que servidores do próprio Estado nada usufruam ou recebam apenas 273$ de pensão de reforma ...
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Prabacor Rau: - Sr. Presidente: O ensino liceal era, e não sei se ainda o é, um ensino considerado de mais nível, frequentado, em regra, por alunos filhos de pais com mais posses. Era, em suma, um ensino destinado a uma classe que se considerava melhor.
Para a escola técnica, isto é, para os cursos do comércio e da indústria, iam, permita-se-me o termo, os filhos da plebe e da gente mais simples.
Andar no liceu era mais chique do que ser aluno do ensino profissional.
Era assim e, repito, não sei se ainda é.
Mas estas considerações nada têm com o assunto que quero, respeitosamente, levar até junto do ilustre Ministro da Educação Nacional, que tão sobejas provas tem dado de querer acabar com as enfermidades do ensino em Portugal.
Sem mais aquelas é este o caso anómalo:
No ensino liceal, os alunos, aquando dos exames, podem pedir a revisão da classificação das suas provas escritas, se não concordarem com as notas que lhes foram atribuídas em determinada disciplina.
No curso técnico do comércio ou indústria, os alunos não podem solicitar revisão das provas escritas. Nas chamadas escolas técnicas os professores são infalíveis e os alunos mesmo quando tenham a certeza de que houve erro na classificação de uma prova escrita erro que até pode ser involuntário, e admitimos sempre que um caso destes nunca é erro propositado - não têm qualquer apelo, se não o aceitar, quantas vezes, uma reprovação injusta.
No ensino liceal já se admite e aceita que o professor que classifica os pontos pode errar, ou ter um critério enviezado na atribuição das notas nas provas escritas, e,

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assim, é permitido aos alunos ou aos encarregados de educação - não sei bem - pedirem a revisão de provas, o que se me afigura absolutamente justo.

Pois se até um réu pode recorrer da sentença de um tribunal ou pedir a revisão de um processo, porque é que os rapazes e raparigas das escolas comerciais e industriais não têm o direito de solicitarem a revisão das suas provas escritas?

Porquê esta desigualdade entre os alunos do liceu e os do ensino técnico?

Porque se não dá o mesmo direito aos alunos das escolas profissionais, para quem, quase sempre, uma reprovação pesa mais que para um aluno do liceu?

O Sr. Brás Gomes: - V. Ex.ª dá-me licença? O Orador: - Faz favor.

O Sr. Brás Gomes: -Eu felicito-o pelas suas palavras pertinentes, Sr. Deputado Prabacor Rau.

Esta e outras incoerências como esta enfermam os dois estatutos, do ensino liceal e do ensino técnico.

Eu próprio tive ocasião de chamar aqui a atenção para o caso dos preparadores; todos sabem que tanto os liceus como as escolas técnicas possuem hoje laboratórios dos mais bem apetrechados das escolas secundárias, invejando até outros países, material moderno do mais eficiente. Mas enquanto no ensino técnico esse material está a cargo de preparadores com habilitação específica, no ensino liceal está a cargo de serventes, contínuos, que os reitores elevam à categoria de preparadores; eu chamei a atenção para isso numa intervenção que fiz aqui há meses nesta Assembleia.

Claro que estes assuntos, tenho a certeza, estão a ser considerados na actual reforma do ensino, e aguardamos que S. Ex.ª o Ministro os considere, tal como disse o ilustre Deputado:

Roma e Pavia não se fizeram num dia. Aguardemos, portanto, os novos estatutos.

O Orador: -Muito obrigado pela sua achega.

Aqui deixo o pedido para que o são direito de um aluno pedir a revisão das provas escritas de exame seja extensivo aos alunos das escolas comerciais e industriais.

Estou certo de que só por esquecimento se tem permitido esta desigualdade de tratamento entre os alunos do .ensino secundário.

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado que ainda estava inscrito para usar da palavra antes da ordem do dia consentiu em diferi-la para a sessão da noite, pelo que podemos passar imediatamente à

Ordem do dia

Continuação da discussão e votação na especialidade da proposta de lei de imprensa.

Entramos na ordem do dia com a base x, em relação à qual está na Mesa uma proposta de alteração.

Vão ser lidas a base e a proposta de alteração.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE x

(O direito de circulação de impressos)

1. É livre a circulação dos impressos publicados de harmonia com as disposições legais.

2. Considera-se que há circulação de um impresso quando tenham sido distribuídos pelo menos seis exemplares, ou ele tenha sido afixado ou exposto em lugar público, ou colocado à venda.

3. É proibido distribuir, divulgar, vender, afixar ou expor publicamente e ainda importar, exportar, deter em depósito ou anunciar, para algum daqueles fins, qualquer impresso que:

a) Contenha texto ou imagem cuja publicidade integre crime contra a segurança exterior ou interior do Estado, ou ultraje a moral pública, ou constitua provocação pública ao crime ou incitamento ao emprego de violência;

b) Haja sido suspenso de acordo com o disposto nesta lei;

c) Não tenha sido submetido a exame prévio, ou neste tenha sido reprovado, nos casos excepcionais em que, segundo o presente diploma, tal exame se estabelece;

d) Seja clandestino.

4. Os textos ou imagens que, nos termos do número anterior, não devam circular serão apreendidos por mandado judicial ou, quando a urgência e a gravidade das circunstâncias o justifiquem, pela autoridade administrativa.

5. A autoridade administrativa, como colaboradora do Ministério Público, remeterá a este os elementos probatórios do ilícito que se quis prevenir ou remediar.

Propomos que a base X seja substituída por outra com a seguinte redacção:

Só o tribunal competente para o julgamento dó crime cometido através da imprensa pode ordenar a apreensão da publicação que contenha o escrito incriminado e determinar as medidas que julgar adequadas para obstar à sua difusão como preliminar no incidente do respectivo processo, nos termos da lei geral que o regule.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 29 de Julho de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

O Sr; Presidente: - Estão em discussão conjuntamente.

Pausa.

O Sr. Teixeira Canedo: - Sr. Presidente: Estamos a discutir uma base de bastante importância em todo o contexto desta lei e que é precisamente aquela que considera o direito de circulação de impressos.

Este direito faz parte do direito de liberdade de imprensa, pois não se compreende um direito de expressão de pensamento através da imprensa sem que seja reconhecido o direito, que no mesmo se integra, da livre circulação dos impressos.

Ora, esta base, podê-la-emos dividir em três partes distintas:

Uma primeira, constituída pelos n.ºs 1 e 2, diz propriamente respeito a um direito de circulação.

O n.º 3 da base consubstancia as primeiras limitações que esta lei contém. Limitações que neste caso se referem ao direito de circulação de impressos.

Os n.ºs 4 e 5 contemplam a sanção que deverá ser aplicada, com urgência, caso seja desrespeitado o n.º 3.

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Ë evidente que é necessário dar um conceito de circulação, para que se saiba quando é que se completam, os crimes de imprensa.

E, assim,, o n.º 2 considera que há circulação quando tenham sido distribuídos pelos menos seis exemplares, ou eles tenham sido afixados ou expostos em lugar público ou colocados à venda. Isto para evitar que o simples manter em depósito impressos* que não se destinam a circular, a vender, a transmitir ao público possam ser apreendidos.

Neste aspecto há um pormenor que me parece ter interesse: o de saber-se qual o conceito de lugar público que vem contemplado no n.º 2. Nos próprios termos da disposição, temos de entender que lugar público é qualquer lugar onde seja livre a entrada do público, e não aquele conceito de lugar público contido no artigo 416.º do Código Penal, ou seja o de qualquer edifício público. Quanto às limitações ao direito de circulação, parece-me que as que foram condensadas nas alíneas a), b), c) e d) são perfeitamente justificáveis. Na alínea a) pré vêem-se os casos de crimes de muita gravidade, como ultraje à moral pública, a provocação pública ao crime e o incitamento ao emprego da violência, e os crimes contra a segurança, interior ou exterior, do Estado; ninguém pode negar que uma limitação da circulação nestes casos se impõe.

Na alínea b) consideram-se os impressos que tenham sido suspensos; nenhuma dúvida se justifica quanto à necessidade desta limitação.

Na alínea c) consideram-se os casos em que os impressos não são submetidos a exame prévio, quando este regime tenha sido instituído.

Na alínea d) considera-se a hipótese de o impresso ser clandestino, o que, ao fim e ao cabo, se reconduz, quanto aos periódicos, à circunstância de não terem sido submetidos a registo.

Quanto às sanções, problema que tem levantado certa celeuma, é evidente que a apreensão se impõe nos casos previstos no n.º 3, e ela poderá ser levada a efeito pelo tribunal em primeira linha e, subsidiariamente, pela autoridade administrativa que em regulamento será determinada.

Vimos discutido que a apreensão pela autoridade administrativa não se justifica.

Ora, esta apreensão é corrente em quase todo o mundo, nomeadamente em França, e é evidente que esta apreensão tem, como resulta do n.º 5, um carácter subsidiário; quer dizer, a autoridade administrativa só apreende naqueles casos em que a intervenção do tribunal, por morosa, não teria o efeito que se pretende alcançar com esta base. Com este aspecto relaciona-se a matéria da base XXII II votar, que se refere à entrega oficial de publicações.

O Sr. Peres Claro: - V. Ex.ª dá-me licença? O Orador: - Faça favor.

O Sr. Peres Claro: - Eu suponho que a observação que V. Ex.ª acaba de fazer, de que esta base X se relaciona com a base XXII, não tem razão de ser, pois a base X fala de impressos em geral e a base XXII apenas em periódicos. Eu entendo, jornais! E digo que não tem razão de ser, porque, pela proposta de lei do Governo, entende-se que há circulação de impressos quando tenham sido distribuídos seis exemplares, pelo menos. E na base XXII, que corresponde, na proposta de lei do Governo, à base XIX,

devem ser entregues, meia hora antes de serem postos em circulação, os exemplares que forem fixados.

Portanto, eu entendo que se trata de coisas diferentes.

O Orador: - V. Ex.ª está um bocadinho atrasado ... Risos.

O Orador: - Porque a base XIX do Governo já foi posta de parte, na medida em que o texto base é o proposto pela comissão. E o texto proposto pela comissão é precisamente a base XXII.

Diz V. Ex.ª que esta base XXII se refere apenas aos jornais. V. Ex.ª aí também está enganado, uma vez que a base XXII .se refere a periódicos e aí, nessa base, acaba-se com a obrigatoriedade da entrega meia hora antes, o que é, digamos, uma grande conquista para as empresas proprietárias dos jornais; e refere-se também à imprensa não periódica, que, conforme V. Ex.ª viu ao discutirem-se logo as primeiras bases, inclui tudo o que não sejam periódicos.

Mas a base XXII relaciona-se, efectivamente, com a base que estamos a discutir, porque quanto aos jornais acabará, se ela for votada, com a necessidade da entrega meia hora antes; quanto à imprensa não periódica, como V. Ex.ª vê no n.º 4 da base XXII, essa imprensa terá de ser entregue até três dias antes.

Qual o alcance, portanto, da base X em relação a este aspecto?

Se vimos bem, a apreensão administrativa dos periódicos só pode ser feita quando, eles mesmos, já estão em circulação, visto que se acabará com a meia hora da entrega antecipada. Quanto à imprensa não periódica, como V. Ex.ª pode ver no n.º 4, terá de .ser entregue até três dias antes.

Mas quanto a esta imprensa, já não será necessária a apreensão administrativa, nem ela se justificará - foi esse o espírito com que a comissão, parece-me, ficou -, uma vez que, feito depósito até três dias antes, o Governo ou a entidade onde for feito o depósito terá possibilidade de solicitar ao tribunal a apreensão dessa imprensa.

O Sr. Peres Claro: - V. Ex.ª dá-me licença? O Orador: - Faça favor.

O Sr. Peres Claro: - V. Ex.ª está, realmente, a raciocinar em termos da comissão eventual. Eu estava a raciocinar em termos da proposta do Governo.

O Governo distinguiu entre impressos avulsos e publicações periódicas.

O Orador: - Se eu pedi a V. Ex.ª o favor de vir para o texto, para cuja votação foi requerida a prioridade, já não poderá falar na base da proposta do Governo ...

O Sr. Peres Claro: - Se insisto em falar com base no projecto do Governo, é por me parecer, segundo as palavras de V. Ex.ª, que neste caso a comissão eventual atraiçoou o pensamento do Governo.

O Orador: -Mas nós não estamos aqui para atraiçoar, nem para deixar de atraiçoar. Fez-se na comissão eventual um parecer, pelo qual não interessa estarmos de acordo ou não com o Governo.

Fomos para a solução que nos pareceu melhor.

O Sr: Peres Claro: - Em certos pormenores não estão de acordo com o Governo ... Está bem!

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O Orador: -Pois, necessariamente, que não. O Sr. Ulisses Cortês: - V. Ex.ª dá-me licença? O Orador: - Faça favor, Sr. "Deputado.

O Sr. Ulisses Cortês: - Queria acrescentar às considerações do Sr. Deputado Teixeira Canedo, e em concordância com ele, que nós não atraiçoámos o pensamento do Governo, nem o espírito da disposição. Apenas fizemos aquilo que cumpria fazer quando fizemos estabelecer que a apreensão, pela sua evidência, devia ser, sempre que possível, judicial, mas quando ela fosse ordenada pela autoridade administrativa, então era necessário que houvesse colaboração das instituições judiciais. Consequentemente, como se recorda o Sr. Deputado Teixeira Canedo, aproveitou-se uma declaração de voto de vencido do distinto jurisconsulto Dr. Arala Chaves, segundo o qual, quando a operação é feita administrativamente, é necessário que se faça a comunicação ao Ministério Público, como colaborador da autoridade judicial, a fim de indicar o ilícito que se quis prevenir ou reprimir.

Houve o cuidado de, tanto quanto .possível, impedir arbítrios e prepotências e, consequentemente,- confiar, na medida do possível, a apreensão de publicações às autoridades judiciais.

E isto, Sr. Deputado Teixeira Canedo?

O Orador: - E sim, Sr. Deputado. Muito obrigado.

O Sr. Cunha Araújo: - Se fizesse favor, podia-me prestar um esclarecimento?

V. Ex.ª está a defender a proposta de alteração da comissão eventual que subscreve?

O Orador: - Exactamente.

O Sr. Cunha Araújo: -E que diz o n.º 4, se não maço muito V. Ex.ª?

O Orador: - V. Ex.ª tem-o na frente ...

O Sr. Cunha Araújo: - É que não condiz com o meu ... Por isso é que eu estou a perguntar.

O Orador: - Ah! ...

Os textos ou imagens que, nos termos do número anterior, não devam circular serão apreendidos por mandado judicial ou, quando a urgência e a gravidade das circunstâncias o justifiquem, pela autoridade administrativa.

O Sr. Cunha Araújo: - Talvez eu tenha ouvido mal ...

O Orador: - Não, não, ouviu muito bem. Só que não é nesta base, é na base xxn, se for votada ...

O Sr. Cunha Araújo: - Este liem, muito obrigado.

O Orador: - Pois, em suma, o que se pode dizer desta base é que a ingerência da autoridade administrativa se limita ao mínimo que foi reputado essencial: exactamente prevenir a prática, através da imprensa, dos crimes previstos na alínea a), crimes que estão previstos na lei geral, e, ainda, crimes específicos previstos nesta lei, e que são: o da difusão de impressos suspensos, o da difusão de impressos não submetidos a exame prévio ou o da difusão de impressos clandestinos. Desta maneira, parece que o direito de circulação está garantido, da melhor forma, para as empresas proprietárias dos jornais. Tenho dito.

O Sr. Pinto Balsemão: -Sr. Presidente: Eu quero, antes de mais, prestar homenagem à comissão eventual, na medida em que, num ponto fundamental da lei de imprensa, soube e quis alterar e ampliar os n.º* 4 (quanto à duração) e 5 (quanto à ampliação) da proposta governamental.

A comissão, como o Sr. Deputado Teixeira Canedo já bem acentuou, deu prioridade à apreensão judicial, e só a evitou em caso de urgência, e, além disso, apoiou ou aprovou o voto de vencido do Procurador Arala Chaves quanto ao n.º 5. Esta solução, no entanto, não me satisfaz plenamente. VV. Ex.ªs sabem que o projecto tem, como princípio fundamental, uma regra: a de que todas as medidas preventivas dos crimes cometidos através d" imprensa são ordenadas pelos tribunais comuns de legislação ordinária. Esse princípio ainda o continuo a defender e, para o defender, faço minhas, com muito prazer, as palavras do Digno Procurador Silva Costa no seu voto de vencido. O Digno Procurador Silva Costa está aqui presente na "Tribuna da Imprensa", e eu aproveitava para lhe prestar a minha homenagem, quer pessoalmente, pela intervenção que ele teve na Câmara Corporativa, quer como presidente do Sindicato Nacional dos Jornalistas, que, ao contrário de outros organismos corporativos com responsabilidades idênticas ou superiores na matéria, teve papel preponderante no estudo e na discussão do projecto e da proposta de lei de imprensa.

E passo a ler, fazendo minhas, com o devido respeito, as palavras do Sr. Procurador Silva Costa, que me parecem particularmente claras:

Em matéria de liberdade de imprensa a experiência da generalidade dos povos comprova que a intervenção da autoridade administrativa atrai inevitavelmente o arbítrio: onde ela se admite preponderam as decisões discriocionárias. Este entendimento parece, aliás, quase pacífico: para justificar a intervenção administrativa o parecer argumenta, sobretudo com razões de natureza pragmática, potencializadas na alegada morosidade da máquina judicial. É fácil contrapor que nada impede se adoptem providências para conseguir neste domínio maior celeridade processual, ou que a apreensão de um impresso ilícito poderá ser determinada como preliminar ou incidente do respectivo processo. E a solução acolhida no parecer tem o grave inconveniente de confundir poder de polícia com poder de acção penal: confere à autoridade administrativa competência para decidir se houve violação da lei e para aplicar a pena da apreensão. Porque, no meu modo de ver, qualquer apreensão implica um julgamento e a apreciação casuística do pretenso ilícito deve caber aos tribunais, advoguei que a apreensão se fizesse sómente por mandato judicial.

Depois destas palavras tão claras, pouco teria a acrescentar por agora. Muito obrigado.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: Ouvi com o maior interesse as considerações que foram produzidas a este respeito.

Começarei por dizer que no mundo económico a liberdade defende-se, não se afirma. Lembrarei esta Câmara que temos para discutir proximamente uma lei de defesa da concorrência, porque o jogo económico da liberdade

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muito demonstra, para não dizer com grande frequência, que conduz à negação da própria liberdade.

Era isso que eu teria acrescentado na sessão anterior se o assunto não tivesse sido esgotado.

A propósito desta base, ocorre-me dizê-lo na mesma. Efectivamente, nós temos de defender a própria liberdade.

Quando está em causa um acto que causa dano à sociedade ou aos indivíduos, não podemos ater-nos exclusivamente a uma mecânica que pode ser lenta e, portanto, demorada. Temos de ser rápidos, porque da mentira ou do insulto sempre fica alguma coisa.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: -Neste caso concreto, eu creio que a comissão foi para soluções mais liberais do que existem em países que são ditos da liberdade, porque a apreensão administrativa é regra. Neste caso, porém, deu-se-lhe forma jurídica, institucionalizou-se, defendeu-se contra o abuso da mesma autoridade.

Não posso fiar-me apenas - e creio que pouca gente pode - no funcionamento processual, que, naturalmente, não é imediato, para a defesa do bom nome do País, das pessoas ou da reputação das instituições.

A liberdade tem de defender-se, porque a liberdade não existe quando é contra a liberdade dos outros. Não há só liberdade de uns, há também a liberdade dos outros, e essa é que é mister defender.

Parece-me que o texto da comissão é corajoso, é honesto e é límpido, pois não teve dúvidas em alterar a proposta do Governo, mesmo em matéria tão delicada.

Não teve dúvidas, como já foi acentuado, em aceitar o texto da Câmara Corporativa, num caso, e o voto do digno Procurador Arala Chaves.

Quero de novo prestar a minha homenagem ao Sr. Deputado Pinto Balsemão pelo seu espírito de desportivismo e de defesa dos seus pontos de vista, ainda quando não tenham vingado, o que sobretudo me apraz registar; mas devo acentuar que, não obstante a declaração que na sexta-feira nos fez de que não havia intenção de desconfiar do sistema de acção da administração pública, infelizmente, sendo, em parte, as suas propostas .a reedição de textos do projecto n.º 5/X que já foram discutidos e aproveitados, naquilo que foi possível, pela comissão eventual, traduzem de facto essa desconfiança.

Não ponho em dúvida, e apraz-me registá-lo, que a sua intenção pessoal nau é essa, mas não há dúvida de que várias destas propostas enfermam deste pequeno pecado; eu não sou daqueles que têm uma ilimitada confiança no Estado, só porque se chama Estado ou Administração, mas reconheço que mal vai a sociedade quando não puder ter um mínimo de confiança no Estado para lhe outorgar a defesa daquilo que é comum e não se trate apenas da defesa de direitos puramente individuais dos outros.

Nestas condições, Sr. Presidente, eu creio perfeitamente justificada a proposta que considero, em termos europeus, mais avançada que a generalidade e, em termos jurisdicionais, perfeitamente justificada e defendida contra abusos, a intervenção da Administração, a presença da Administração, como forma de defesa da liberdade dos outros que possa ser posta em causa pela liberdade individual apenas de um.

Sr. Presidente: Apraz-me também ouvir do Sr. Deputado Pinto Balsemão a confirmação de que afinal a dúvida sobre o respeito pelas instituições corporativas não está tão em causa num Estado que é corporativo como teria parecido no outro dia.

A afirmação da colaboração e importância que teve a presença do Sr. Presidente do Sindicato dos Jornalistas na discussão da lei será, a meu ver, uma prova do respeito e da importância das soluções corporativas.

O Sr. Cunha Araújo: - Sr. Presidente: Se bem me apercebi, a proposta de substituição subscrita pelo Sr. Deputado Pinto Balsemão destina-se a substituir a base x. Não vejo, através dela, como ficará regulado o direito de circulação de escritos e de imagens.

No entanto, posta de parte esta dúvida, desejaria deixar ficar consignado (quanto a ela) que, onde se diz: "o escrito incriminado", se deveria dizer "o escrito suspeito ou indiciado", visto que a incriminação só resulta depois de deduzida a acusação do Ministério Público.

Tenho dito.

O Sr. Teixeira Canedo: -Sr. Presidente: A proposto de alteração do Sr. Deputado Pinto Balsemão seria pertinente se estivéssemos numa sociedade utópica; nessa altura talvez não fosse necessário uma base que limitasse ou que regulasse a circulação de imprensa.

No entanto, temos de lhe prestar a nossa homenagem, porque, efectivamente, o Sr. Deputado Pinto Balsemão está a procurar defender ideias que, estou convencido, correspondem à sua própria maneira de ser.

Todavia, suponho que o Sr. Deputado Pinto Balsemão, ou quem defenda a posição dele, não pode negar que na base x, que a comissão eventual propõe, se garante em absoluto o direito de circulação.

E basta reparar que no n.º 1 diz:

Ë livre a circulação de impressos publicados de harmonia com as disposições legais.

Se se quiser ver bem o problema, verificar-se-á que estas disposições legais não são mais que a base v, que é uma base meramente programática.

Quer dizer: qualquer violação da base V não é imediatamente punível, só o será se constituir crime previsto na lei comum ou qualquer dos crimes em especial previstos nesta lei.

Ora, dizer-se que a intervenção da autoridade administrativa limita por forma drástica a circulação ou a liberdade de expressão do pensamento, parece-nos demasiado ousado. Porque, como já foi acentuado, essa intervenção é meramente subsidiária e, naturalmente, o Sr. Deputado Pinto Balsemão recordar-se-á perfeitamente de que a comissão teve graves dúvidas sobre se deveria adoptar também o n.º 5 do projecto do texto do parecer da Câmara Corporativa, o qual previa, precisamente, a possibilidade de se responsabilizar civelmente o Estado, bem como os agentes administrativos, pelas apreensões ilegais, desde que elas fossem feitas com intenção ilícita ou erro manifesto.

A comissão teve gravíssimas dúvidas sobre este caso, e chegou à conclusão de que era desnecessário este n.º 5, já que, pela lei geral, o abuso do direito ou abuso de autoridade é punido, e, nessas circunstâncias, o Estado será sempre responsável perante as empresas pelos prejuízos que lhes cause através dos seus funcionários.

A dúvida principal que se pôs foi a de considerar directamente responsáveis os funcionários; isso poderia criar da parte desses funcionários um certo receio de livremente poderem apreciar os escritos que lhes eram submetidos, criando-se, dessa forma, mais uma limitação. Além da limitação ao direito de circulação, criava-se, desnecessariamente, uma limitação grave à actividade do funcionário, o qual como é sabido, tem de trabalhar em condições más, sobretudo no aspecto de tempo.

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Chegou-se, por isso. à conclusão de que o Estado seria sempre responsável quando houvesse abuso do direito ou abuso da autoridade ou até erro manifesto, razão esta que levou a não incluir na proposta do texto da comissão eventual o n.º 5 proposto pelo parecer da Câmara Corporativa.

Quanto às limitações postas no n.º 2 ao direito de circulação, bem examinadas, verifica-se que se trata apenas de limitações no caso de serem cometidos, através da imprensa, crimes graves contra a segurança do Estado ou contra os particulares.

Tenho dito.

O Sr. Pontífice de Sousa: - Sr. Presidente: Queria fazer um pequeno apontamento sobre o n.º 4 da base em discussão.

Parece-me que não se deveria usar da expressão "serão . apreendidos por mandado judicial", mas, sim, "deverão ser apreendidos por mandado judicial", ou outra expressão equivalente.

Porquanto "serão apreendidos" contém uma ordem, que a Assembleia não deverá dar, ao poder judicial, que é independente do poder legislativo. A redacção adoptada pela comissão eventual teve naturalmente origem no texto da proposta do Governo e do respectivo parecer da Câmara Corporativa, mas, paru mim, a redacção é inconveniente, assunto que ponho à consideração da Assembleia.

Tenho dito, Sr. Presidente.

O Sr. Júlio Evangelista: -Sr. Presidente: Pedi a palavra para, nos termos regimentais, requerer a V. Ex.ª se digne considerar a discussão desta base suficiente e amplamente esclarecida, estando a Câmara em condições de poder passar à votação.

O Sr. Pinto Balsemão: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Pinto Balsemão pediu a palavra sobre o requerimento?

O Sr. Pinto Balsemão: - É que me parece que esta base talvez não esteja ainda suficientemente esclarecida, Sr. Presidente. E porque há alguns pontos de vista aqui expendidos aos quais- eu gostaria de responder, se V. Ex.ª me autorizasse.

O Sr. Presidente: -Sr. Deputado: Como sabe, uma vez apresentado um requerimento, ele deve ser submetido à Assembleia.

Nos termos do artigo 49.º da nossa lei interna penso que a decisão sobre o requerimento do Sr. Deputado Júlio Evangelista pertence à Assembleia.

Em consequência, pergunto à Assembleia se defere o requerimento do Sr. Deputado Júlio Evangelista no sentido de que a matéria seja considerada suficientemente esclarecida e se passe à votação.

Posto à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vamos, em consequência, passar à votação.

Ponho em primeiro lugar à votação a proposta de alte-, ração à base x, subscrita pelo Sr. Deputado Pinto Balsemão.

Posta à votação, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: -Ponho agora à votação a base X da proposta de lei, segundo a redacção do texto adoptado para fundamento dos nossos debates, subscrita pelos Srs. Deputados Ulisses Cortês e outros.

Posta à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à base XI, em relação à qual também há uma proposta de alteração. Vão ser lidas.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE XI (Garantias da Uberdade de Imprensa)

1. Para garantia da liberdade de imprensa e da não sobreposição dos interesses particulares ao interesse público, o Governo deverá providenciar no sentido de:

a) Impedir a concentração de empresas editoriais ou jornalísticas;

ò) Evitar a acção de terceiros que possa restringir a sua independência;

c) Ser fiscalizada a actividade das mesmas empresas, bem como a tiragem das suas publicações;

d) Obviar à excessiva concentração da imprensa mediante a fixação de um número máximo de publicações periódicas da mesma natureza para cada empresa jornalística;

c) Regular a actividade dos profissionais da imprensa, de forma a assegurar-lhes a autonomia e os meios de trabalho convenientes ao exercício da sua missão;

d) Promover a publicação de obras de reconhecido mérito, quando os seus autores não tenham podido fazê-lo, concedendo para tanto subsídios e prémios.

2. As empresas jornalísticas e editoriais não poderão receber, directa ou indirectamente, subsídios ou quaisquer auxílios de proveniência estrangeira.

Propomos que a alínea c) da base XI seja substituída por outra com a seguinte redacção:

c) Ser fiscalizada a actividade das mesmas, bem como a tiragem e difusão, a divulgar publicamente, das suas publicações.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 29 de Julho de 1971. - Os Deputados: Francisco José Pereira Pinto Balsemão - Rafael Ávila de Azevedo - Joaquim Carvalho Macedo Correia.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão, conjuntamente.

O Sr. Pinto Balsemão: -Sr. Presidente: Já que não pude fazê-lo há pouco, queria, antes de mais, agradecer as simpáticas palavras de homenagem, que me foram prestadas pelos (Srs. Deputados Camilo de Mendonça e Teixeira Canedo e que se referem ao meu espírito desportivo e ao facto de estar aqui a defender Meias que correspondem à minha maneira de ser.

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Só queria acrescentar que não estou aqui apenas pelo espírito desportivo ou para defender ideias que correspondem à manha maneira ide ser.

Estou aqui a defender um projecto que mato é só meu...

Vozes: - Muito bem l

O Orador: - ... um projecto que me parece ser de todo o interesse - pelo menos arte agora mão tem saído assim considerado, mas eu continuo a considerá-lo - para o bem da imprensa portuguesa.

Portanto, o pequeno pecado de desconfiança de que mais uma vez fui acusado, mais uma vez não o aceito, nem o admito. Não estou aqui para desconfiar de ninguém, e muito menos do Governo. Estou aqui para tentar, como todos VV. Ex.ª", chegar a uma conclusão quanto à lei de imprensa que mais convém ao Pais, pela deferência que lhe devemos.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O Orador: - Pelo que respeita à base em discussão, apenas propus uma pequena alteração na alínea c). Essa alteração visa consagrar uma prática internacionalmente aceite. É costume em todos os países ocidentais - Espanha, França, Inglaterra, julgo que nos Estados Unidos da América - haver organismos, constituídos pelas organizações profissionais, ou pelo Governo, que fiscalizam não apenas a tiragem, mas também a venda e difusão dos periódicos. Isto porque um jornal pode tirar 100 000 exemplares e vender 50 000, e, portanto, não basta fiscalizar a tiragem.

Esses organismos prestam um valioso serviço não apenas à causa da imprensa em geral, na medida em que .permitem saber quem lê efectivamente as diversas publicações, mas bambem aos anunciantes, que sabem onde devem anunciar, e não anunciam, portanto, sem terem conhecimento prévio da tiragem e da difusão dos suportes publicitários de que se servem.

Para que. o mecanismo previsto nesta base XI, proposta pela comissão, funcione, será indispensável que sejam divulgados publicamente os resultados da fiscalização realizada..

Se II fiscalização não for divulgada, o Governo pode saber tudo, mas o anunciante, o público e os outros órgãos de informação não sabem absolutamente nada dos resultados dessa fiscalização.

O que .pretendo, apenas, é que esses resultados sejam divulgados publicamente.

Desejaria, ainda, expressar que os largos poderes conferidos nesta base ao Governo sejam utilizados apenas para a salvaguarda do direito dos cidadãos de serem informados de modo claro e verdadeiro.

O Sr. Camilo de Mendonça: -Sr. Presidente: E para uma ligeiríssima observação. Efectivamente, não está em causa a base XI, mas apenas uma proposta de alteração à alínea c) da mesma base. Vou restringir-me, consequentemente, a este aspecto.

Não considero feliz a redacção. Mas isso seria o menos. Nem .considero que o problema, fosse extraordinariamente grave. Há,, porém, um problema. Estamos neste momento, com esta alteração, a discutir principalmente os direitos dos homens que fazem publicidade. Quer dizer: o direito das pessoas que recorrem à publicidade.

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Compreendo que a prática a esse respeito se traduz, fundamentalmente, em bolsas, onde, como em outras, o problema se cote. Não por este processo, que até poderia conduzir a um inconveniente que está permanentemente no nosso espírito aviltar: a concentração de empresais.

Continuo na mesma. A liberdade tem de ser defendida. Se tomaram" demasiado públicos, demasiado evidentes, apenas critérios objectivos que não correspondem, inclusive, a uma amostragem do. valor da influência publicitária, estaremos conduzindo, inexoravelmente, a imprensa paira uma concentração.

Ora, todos nós estamos interessados, naturalmente, em combater o fenómeno da concentração, para defesa da liberdade.

Portanto, por muito respeitável que seja a defesa do anunciante, observo duas coisas: a primeira, é que é realmente muito mais importante paira mim a defesa da existência de varias empresas jornalísticas, que, por esta forma, tenderiam a concentrar-se ...

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - ...a segunda, é que é para mim mais importante considerar a defesa da imprensa regional, que, por esto forma, tenderia também a desaparecer. E para lá disso tudo, subsiste ainda outra questão: é que o método .próprio não - seria, naturalmente, este, e nada obstará a que, ema termos corporativos, a corporação possa vir amanhã a regulamentar esta matéria.

O Sr. Moura Ramos:-Sr. Presidente: Respeita a base XI, ora em discussão, às garantias da liberdade de imprensa, e nela se enumeram algumas providências que, sempre que se torne necessário, o Governo poderá tomar com vista a evitar alguns males, cuja tendência para a sua verificação se nota generalizada noutros países e de que já não estaremos .totalmente imunes.

Isto se pode concluir do parecer da Câmara Corporativa quando afirma que tais males, entre nós, "ainda se não verificam, pelo menos em grande escala ...", e se traduzem na excessiva concentração de empresas e de jornais, na acção de terceiros no sentido de restringir a sua independência, nos abusos por parte das empresas que justifiquem a necessidade da sua fiscalização, bem como na tiragem das suas publicações.

São nobres e sadias as intenções manifestadas nas diversas alíneas da base em apreciação, com vista a assegurar a não sobreposição dos interesses particulares ao interesse público, não deixando, no entanto, de me merecerem algumas reservas quanto à sua eficiência prática e tendente a furtar a imprensa à influência de grupos de pressão, de financeiros nacionais ou estrangeiros.

É que as potências ocultas que dominam ma sociedade contemporânea., ajudadas pela orquestração dos instrumentos de comunicação social, compreenderam de há muito que, nos sistemas políticos baseados na lei do número, só o dinheiro conta, ou conta bastante, podendo influir no número; e que a inteligência não conquista, para as suas ideias, a multidão senão pelo dinheiro, dinheiro que passa a significar meio de comunicação, veículo do pensamento.

E daqui resulta, como corolário lógico, a formação da chamada plutocracia da imprensa a exercer um domínio oculto sobre a maior parte dos jornais, apoderando-se deles e das casas editoras, que a seu modo e no seu exclusivo interesse controlam, manobram e dirigem.

A par da censura oficial - a mais em evidência e por isso mesmo, a mais odiada mas, a maior parte das

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vezes, a mais bem intencionada, pois que lhe compete a defesa do público contra a infiltração de ideias e costumes condenáveis - surge-nos a censura particular, e esta a exercer-se em dois planos: o plano da empresa jornalística como empresa económica e que, muitas vezes, se confunde com a imprensa de partido nos regimes que aceitam os partidos, imprensa de partido cuja única razão de ser é desacreditar o Poder, por intermédio da verdade ou da mentira, para o derrubar em proveito do partido que ela representa; e o plano propriamente do jornalista que, por ideologia, simpatia ou qualquer outra razão, manipula a seu bel-prazer a opinião através da forma como redige a notícia, da extensão e relevo que lhe dá, do comentário ou crítica que lhe acrescenta, do silêncio que observa, etc., empregando quantas vezes a manha subtil para "inocentemente" levar a água ao seu moinho, diminuindo ou distorcendo a verdade, esquecido do amor que deve a esta e da lealdade e objectividade que deve ao público ledor, que quase sempre a ele se entrega confiadamente com armas e bagagens.

A opinião pública pode vir assim a ser corrompida pela plutocracia da informação, .pelo que importa evitar a formação de traste jornalísticos, que as forças ocultas e a fortuna anónima e vagabunda manejem à vontade.

Impõem-se, na verdade, medidas eficazes para fazer frente à guerra económica que, cá dentro como lá fora e em todos os sectores, os agentes da plutocracia, servindo-se de todos os meios, volta e meia tendem a desencadear implacavelmente.

Esta guerra económica, em que se não ouve o troar dos canhões nem o tiroteio das armas automáticas, desenvolve-se em ambiente silencioso e, por isso mesmo, mais pérfido. Sem fazer o ruído que impressiona as massas, a guerra económica cria, porém, um mal-estar que precede e favorece a agitação social.

São, portanto, benvindas, por social e moralmente benéficas, todas as providências tomadas para barrar o caminho à concentração das empresas jornalísticas e à defesa da sobrevivência dessas empresas, pela instituição de normas antimonopolistas, sabido, como se sabe, quanto as forças económicas podem perturbar o Estado, uma vez que os problemas postos pelos interesses económicos e financeiros são idênticos aos postos pelos partidos políticos, razão por que importa canalizá-los para o bem comum sob a direcção de um árbitro independente - o Estado.

Tenho dito.

O Sr. Teixeira Canedo: - Sr. Presidente: Apenas duas palavras para focar um aspecto que me parece de muito interesse.

Esta base, proposta pela comissão eventual, resulta, com alteração profunda, da conjugação da base x, proposta pelo Governo, com a base xi, proposta no texto do parecer da Câmara Corporativa.

O essencial dessa alteração está em que, quer na proposta do Governo, quer na base do texto da Câmara Corporativa, se dizia, no n.º l, que: "o Governo poderá providenciar, sempre que se mostre necessário", ao passo que no texto da comissão eventual se diz que: "o Governo deverá providenciar". Quer dizer: o que era uma mera faculdade para o Governo transformou-se numa obrigação. A comissão eventual entendeu que só assim se garantiria, capazmente, a liberdade de imprensa, porque o Estado terá mesmo de, no regulamento, tratar da matéria desta base, ao passo que pela proposta do Governo ou pelo texto do parecei: a regulamentação poderia não considerar estes aspectos.

A segunda alteração - e que me parece de muito interesse - foi o acrescentamento do n.º 2, que é precisa-

mente o n.º 2 do texto da Câmara Corporativa: "as empresas jornalísticas e editoriais não poderão receber, directa ou indirectamente, subsídios ou quaisquer auxílios de proveniência estrangeira". Parece que só garantindo que " totalidade do capital, sobretudo das empresas jornalísticas, seja português é que se garantirá uma liberdade de imprensa que leve a uma informação correcta e portuguesa da opinião pública. Tenho dito.

O Sr. Júlio Evangelista: -Sr. Presidente: Dois apontamentos apenas, são duas achegas - que reputo da maior importância - à justificação da base que temos neste momento em discussão.

E são elas para sublinhar as alíneas e) f) desta base. A alínea e) inclui, entre as garantias da liberdade de imprensa, "regular II actividade dos profissionais da imprensa, de forma a assegurar-lhes a autonomia e os meios de trabalho convenientes ao exercício da sua missão"; a alínea f), "promover a publicação de obras de reconhecido mérito, quando os seus autores não tenham podido fazê-lo, concedendo, para tanto, subsídios e prémios".

O carácter positivo destas duas alíneas merece ser salientado, porque a liberdade de imprensa não é apenas garantida por intervenção nas empresas, mas pelo prestígio dos profissionais da imprensa, pela sua dignidade, pela sua independência e pela sua autonomia - o que se pretendeu consagrar aqui.

A comissão eventual, Sr. Presidente, quando se debruçou sobre esta base, ainda tentou o acrescentamento de uma nova alínea. Nessa altura, a sugestão pertenceu-me: era acrescentar à base uma alínea sobre o ensino do jornalismo, que a comissão veio posteriormente a entender se devia autonomizar, dada a sua relevância na base que figura, no nosso texto, com o n.º XII. Foi entendido que, além destas inserções sobre a dignidade, garantia e prestígio dos jornalistas, deveria inserir-se a exigência do ensino do jornalismo, também como um dos meios de garantir a Uberdade de imprensa.

Tenho dito, Sr. Presidente.

O Sr. Pinto Balsemão: - Congratulo-me com a interpretação dada ao espírito desta base pelo Sr. Deputado Júlio Evangelista e volto a manifestar a esperança de que o Governo saiba utilizar os poderes que aqui lhe são concedidos por esta Assembleia, pana salvaguardar os verdadeiros interesses da imprensa.

Quanto à proposta de entendia que apresentei, continuo a entender que esta mesma base, quanto à concentração, prevê nas suas alíneas a) e d) medidas específicas/para a evitar e, portanto, nesta alínea c) em discussão não teremos de falar em concentração em especial, visto que ao Governo são conferidos poderes para, por intermédio dias alíneas a) e d), impedir a concentração de empresas jornalísticas, que todos nos já concordámos ser obstáculo à liberdade de informação.

Há, portanto, medidas específicas tendentes a impedir a concentração, que não impedem a necessidade para distingirmos a imprensa verdadeira da imprensa fictícia, da divulgação publicai da respectiva tiragem e difusão, entendida, repito, no sentido de venda. Por isso, mantenho e defendo o acrescento introduzindo à alínea c) desta base.

O Sr. Júlio Evangelista: - Era apenas para registar e agradecer as referências que o Sr. Deputado Pinto Balsemão teve a bondade de fazer às notas que deixei sobre o significado desta base, no respeitante a independência.

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prestígio e dignidade dos jornalistas como garantia da liberdade de imprensa, designadamente nas alíneas em que isso é contemplado.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs desejar usar da palavra, passaremos à votação.

Porque a alínea c), em relação à qual existe a proposta de alteração do Sr. Deputado Pinto Balsemão, não é condicionada pelas anteriores, nem condiciona as demais disposições da base XI segundo o texto adoptado pela Assembleia Nacional para fundamento dos debates, ponho à votação a base XI, segundo a redacção preconizada pelos Srs. Deputados Ulisses Cortês e outros, no seu n.º 1 com as alíneas o), 6), d), e) e/), e no seu n.º 2.

Submetidos à votação, foram aprovados. O Sr. Júlio Evangelista: - Peço a palavra. O Sr. Presidente: - É sobre o modo de votar?

O Sr. Júlio Evangelista:-Não, .Sr. Presidente, era para que ficasse consignado na acta que a aprovação foi por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Ficará consignado na acta que a aprovação foi por unanimidade.

Agora ponho à votação a proposta de alteração dos Srs. Deputados Pinto Balsemão, Ávila de Azevedo e Macedo Correia no sentido de ser dada nova redacção à alínea c) do n.º 1 da base XI.

Submetida à votação, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Ponho agora à votação a alínea c) do n.º 1 da base XI, segundo o texto adoptado pela Assembleia Nacional para base dos debates e conforme é preconizada pelos Srs. Deputados Ulisses Cortês e outros.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos agora passar à base XII.

Em relação a esta base, peço a atenção de VV. Ex.ªs

A Mesa ressalvou desde o princípio a possibilidade de algumas hesitações de numeração, originadas pelo imperfeito paralelismo entre os vários textos que têm sido submetidos sucessivamente à apreciação da Assembleia.

Os Srs. Deputados Almeida e Sousa, Pinto Balsemão, Ávila de Azevedo, Oliveira Dias e Macedo Correia apresentaram uma proposta, que VV. Ex.ªs poderão ler na parte final da 1.ª col. da p. 2666 do Diário das Sessões, n.º 132, a que chamaram proposta de aditamento à proposta de lei n.º 13/X, e chamaram-lhe base XIII-A. Não há dúvida de que ela foca a mesma matéria da base XII do texto adoptado pela Assembleia para fundamento dos seus debates e representa apenas uma proposta de emenda à mesma base XII.

Vão ser lidas as duas: a base XII, segundo o texto que a Assembleia adopta, e a proposta que foi chamada de aditamento de uma base nova e que é, efectivamente, uma emenda a esta base XII.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE XII - (Ensino do jornalismo)

Para assegurar a formação de profissionais de impensa, de harmonia com as exigências culturais, científicas e técnicas da sua missão de interesse público, o Governo promoverá a organização do ensino do jornalismo.

Proposta de emenda à base XII, subscrita pelos Srs. Deputados Pinto Balsemão, Almeida e Sousa e outros:

Para assegurar a formação de jornalistas, de harmonia com as exigências culturais, científicas e técnicas da sua missão de interesse público, o Ministério da Educação Nacional promoverá a organização do ensino superior de jornalismo.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 29 de Julho de 1971. - Os Deputados: Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa - Francisco José Pereira Pinto Balsemão - Rafael Ávila de Azevedo - Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias - Joaquim Carvalho Macedo Correia.

O Sr. Presidente: :- Esclareço a Assembleia que fui eu próprio que pedi ao Sr. 2.º Secretário o favor de ler assim, embora não seja nestes precisos termos que está publicada a proposta no Diário das Sessões, mas pelas minhas primeiras palavras VV. Ex.ª8 compreenderão facilmente por que é que se lê assim.

Estão em discussão.

O Sr. Alberto de Alarcão: - Sr. Presidente: Por estranho que pareça, não existe em Portugal qualquer escola de jornalismo ou, como alguns mais latamente propõem, de ciências de informação. Algumas cadeiras e cursos dispersos por aqui e além não formam escola.

E digo estranho porque quatro dezenas de países em desenvolvimento, pelo menos situados na Ásia, na África na América Latina, do Afeganistão à Venezuela, "tinham instituições que ofereciam uma instrução profissional de tempo completo em jornalismo".

O número de estabelecimentos de ensino de jornalismo existentes actualmente em todo o mundo ascende a 650, "80 por cento têm carácter universitário" (poderia importar definir, aliás, o seu nível), "designadamente nos países socialistas, nos Estados Unidos da América, na Ásia e na Oceânia. Os restantes 20 por cento têm carácter prático (com predominância do ensino das técnicas profissionais em detrimento da cultura geral e das ciências da informação)".

A Portugal, como já afirmámos, desses 650 estabelecimentos de ensino nenhum cabe.

Pôde, pois, uma comissão de jornalistas, designada pelo Sindicato Nacional respectivo para elaborar um "projecto de ensino de jornalismo" entre nós, afirmar que "o jornalismo é actualmente em Portugal a única actividade intelectual para cujo exercício não se exige uma formação específica sancionada em termos legais".

E ainda quando não seja, porventura, exactamente assim, não se deixará de reconhecer razão e veracidade à ponta final da informação.

Os nossos profissionais da imprensa formam-se, têm-se formado, na dura escola da vida - e não se diga que não têm aparecido notáveis jornalistas, que têm honrado a imprensa e dignificado a profissão.

Mas terão os jornalistas e outros profissionais da imprensa em Portugal de se contentarem com tal estádio de coisas? Com a formação obtida no ingrato exercício da profissão? Ou deverão, pela formação cultural e profissional, ascender sempre mais alto e além?

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Nem o projecto dos Srs. Deputados Sá Carneiro e Pinto Balsemão, nem a posterior proposta de lei governamental adiantavam grande coisa a tal respeito.

Contudo, reconhece-o o Sindicato Nacional dos Jornalistas:

O jornalista é (ou deve ser) o técnico da recolha, tratamento redaccional e difusão de informação objectiva. Uma tarefa complexa como a que vem definida deve constituir, enquanto profissão, uma ocupação principal, pois depende de uma consciência profissional, de critérios deontológicos e de experiência continuada. É igualmente pacífico que o exercício dessa actividade deve assumir, em regra, uma forma organizada e permanente, que se traduzirá num contrato de trabalho com uma empresa jornalística ou uma agência noticiosa. Mas tal exercício supõe sobretudo uma competência específica, uma soma de conhecimentos científicos, psicossociais e tecnológicos, uma idoneidade moral que nenhum contrato de trabalho pode só por si garantir.

Sendo assim, parece posta muito legítima e gravemente em causa, e pelos próprios mais directamente interessados: os jornalistas, a actual forma de habilitação para o exercício da profissão.

O mesmo se diga mutatis mutandi a respeito de outros profissionais dos meios de comunicação social.

Tempo houve em que o jornalista, que exercia a sua profissão nos países mais seguros do Mundo e que relatava e comentava os acontecimentos de uma sociedade relativamente estável, que se bastava a si própria, protegida como se sentia das convulsões que sacudiam os países distantes, podia servir admiravelmente a colectividade, possuindo apenas uma modesta cultura literária e o mesmo conhecimento dos negócios públicos que qualquer homem inteligente adquiria sem especial esforço. Além disso, antes de iniciar-se a era da educação das massas, do papel e da franquia postal baratas, os jornais publicavam-se para uma minoria de homens cultos [...].

Mas os meios de informação vieram a ganhar com o tempo a contemporânea característica do "social", de um social generalizado, de "comunicação de massa".

Pode o novo representante das massas, o jornalista, descrever e interpretar a sociedade interdependente, sumamente complexa em que vive, com o simples apetrechamento cultural e técnico de outrora?

Bem parece que não. Uma formação limitada ou empírica é já inadmissível no reconhecimento dessa comissão de jornalistas:

O jornalismo impõe hoje ao que o pratica uma série de exigências de índole profissional e técnica realmente formidáveis, que só podem satisfazer-se se se adoptam novas normas de ensino e de formação. (Wilfrid Eggleston.)

Não admira assim que se reconheça que "lá fora, e já também entre nós, as redacções, saídas da fase artesanal, abandonam cada vez mais a tradição, aliás excelente, de confiarem aos jornalistas veteranos a formação dos colegas jovens (..). O ensino do jornalismo deixou de poder ser uma relação individual de mestre-aprendiz, necessariamente morosa, incompleta e precária".

É evidente que "o ensino do jornalismo sempre existiu, até porque da experiência e do saber acumulados por gerações e gerações de jornalistas é que se formou e continuará a formar-se o património de ensinamento que as escolas de jornalismo utilizam. Mas hoje é a escola que organiza e amplia o conhecimento jornalístico, antes transmitido no interior das redacções ou procurado pela via do autodidactismo - e é ela que, com economia de tempo, responde às exigências decorrentes da crescente complexidade da profissão".

Não surpreenderá que também entre nós se haja assistido, e continue a assistir-se, F* uma notável transformação da imprensa.

Como se reconhece no referido projecto de ensino do jornalismo, acompanhando o desenvolvimento dos meios de transmissão de informações, e o" surto de um mais vasto e exigente público consumidor, os nossos diários viram crescer o número de páginas, multiplicaram-se as revistas e os suplementos especializados.

Honra seja feita e desta tribuna se lhes preste.

Redacções tradicionalmente fechadas abriram-se ao ingresso de candidatos a jornalistas mais bem preparados culturalmente - ou, sendo ao mesmo tempo estudantes, em vias de adquirirem uma preparação escolar até então menos frequente entre os jornalistas.

O número de licenciados na composição das redacções passou da excepção, não à regra, que nem seria desejável, além do mais por não corresponder a uma democratização total do ensino, mas a uma percentagem significativa (20 por cento dos admitidos em 1967 eram licenciados).

As empresas tornaram-se compreensivelmente exigentes no recrutamento do seu pessoal redactorial, sendo de assinalar uma que, com vista à aliciação de novos valores, promoveu um curso de jornalismo. Outras iniciativas semelhantes, episódicas é certo, se concretizaram nos últimos anos, evidenciando uma tendência inelutável no sentido de se criar uma base de formação escolar específica para os futuros profissionais.

Ë admissível, como escreveu alguém particularmente qualificado, que "a existência de instituições de ensino a tempo completo não significa necessariamente" (sublinho necessariamente) "que todos os recrutados para a profissão devam possuir uma preparação académica (...) Quase em toda a parte se admite que o jornalismo não deve ser uma profissão fechada que limite a entrada a possuidores de diplomas e graus. Sempre deve haver lugar para os indivíduos trabalhadores e com talento,- sem preparação formal; mas a corrente principal de profissionais deverá sair das Universidades" (ou equivalentes) "se não agora, pelo menos num futuro próximo. Se as escolas de jornalismo cumprirem a sua missão, os seus diplomados deverão conquistar facilmente a preferência em razão dos seus méritos".

Em conclusão, reconheceram e afirmaram os relatores do referido projecto:

a) Só um ensino sistemático pode assegurar um saber mínimo comum, que identifica uma profissão e lhe assegura a subsistência;

b) Só um ensino sistemático das condições técnicas da objectividade permitirá ao jornalista o exercício responsável da sua missão fundamental, que é a informação objectiva;

c) Só um ensino sistemático pode proporcionar os conhecimentos científicos psicossociais e tecnológicos que habilitem à utilização eficaz dos meios de informação colectiva e garantam uma informação colectiva idónea;

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d) Só um ensino sistemático permite a formação de uma consciência profissional comum que facilite a adopção generalizada de rigorosos critérios deontológicos;

c) Só um ensino sistemático pode gerar o quadro exigido pela investigação das técnicas e das ciências da informação de que dependerá o próprio progresso dos meios de comunicação de massa.

A necessidade de dotar o jornalismo das mesmas garantias exigidas às demais profissões intelectuais é, assim, tanto mais premente quanto é certo incumbir em grande parte aos jornalistas a formação da opinião pública. Tal responsabilidade - na qual se compromete necessariamente a configuração do futuro político e social do País (são ainda palavras da- mesma comissão) - terá de ficar nas mãos de pessoas com sólida competência profissional e com profunda seriedade intelectual.

Como se encontrava (cláusula 5.º do contrato colectivo de trabalho recentemente acordado entre o Sindicato Nacional dos Jornalistas e o Grémio Nacional da Imprensa Diária):

Cláusula 5.a São exigidas como habilitações mínimas para o jornalista (excepto para os que se encontrarem em actividade à data da entrada em vigor deste contrato) o 3.º ciclo dos liceus ou equivalência oficial [...] .

é que não poderia nem deveria continuar.

Bem fez, pois, a nossa comissão eventual em propor para a base XII:

BASE XII

Para assegurar a formação de profissionais de imprensa, de harmonia com as exigências culturais, científicas e técnicas da sua missão de interesse público, o Governo promoverá a organização do ensino do jornalismo.

Poderá, assim, de futuro, vir a ser ultrapassado o estádio actualmente definido pela cláusula 5.º do contrato já citado, para dar lugar ao da sua:

Cláusula 6." Quando houver diplomados por- cursos oficiais de jornalismo, serão revistas as condições de admissão na profissão estabelecidas na cláusula anterior.

Sejam. pois, benvindos esses cursos oficiais de jornalismo, apenas se desejando aditar o voto de que as empresas possibilitem a- minutos exercem a profissão de jornalistas e tenham os requisitos necessários a frequência dos novos estabelecimentos de ensino contemplados na base XII. em boa hora proposta à nossa consideração.

O Sr. Almeida e Sousa: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cumpre-me, como primeiro signatário desta proposta de emenda, apresentá-la.

Poderei dizer apenas que ela reproduz praticamente, palavra por palavra, com três excepções, a base XII da comissão eventual.

Ora, a primeira excepção está nitidamente prejudicada pela derrota que sofremos ao discutir a base, suponho que IV, e portanto a palavra "jornalistas" parece que está fora de questão; com certeza que nos vergamos ao veredicto dos votos e supomos que o assunto será apenas um problema para a Comissão de Legislação e Redacção.

Quanto às outras duas excepções, numa delas substitui-se a palavra "Governo" pela expressão "Ministério da Educação Nacional", posto que em Portugal quem organiza e. promove o ensino superior, pelo menos o ensino superior oficial, é o Ministério da Educação Nacional.

Outra excepção é inserir apenas a palavra "superior" quando se pede a instituição do ensino do jornalismo. Suponho que nenhum de nós pensa que o ensino do jornalismo possa ser instituído a um nível de ensino médio, ou mesmo de ensino secundário. Aliás, mesmo que o fosse nos institutos politécnicos, esses institutos, pela nova reforma, terão grau de ensino superior.

De qualquer maneira, quero congratular-me com a ideia que trouxe a base XII para o texto da comissão eventual e felicitar os seus autores.

Mais nada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Aguiar e Silva. Eu quero dizer à Assembleia que, se mais nenhum Sr. Deputado requerer a palavra depois desta intervenção, dispor-me-ei a dar o assunto por esclarecido, porque me parece que sobre a matéria não há grandes divergências.

Em todo o caso, o Sr. Deputado Pinto Balsemão acaba

de me pedir a palavra e a seguir & intervenção dele darei a matéria por esclarecida.

O Sr. Aguiar e Silva: - Sr. Presidente: Como já aqui foi apontado pelo Sr. Deputado Alarcão e Silva, e certamente estará bem presente à consciência de todos os Srs. Deputados, o nosso ensino apresenta efectivamente uma grave carência neste domínio que agora nos ocupa. Pois não existe entre nós, organizado oficialmente, o ensino do jornalismo, e com a problemática da informação dos nossos dias será altamente desejável a instituição do tal ensino.

Por isso mesmo, a comissão eventual, atenta à importância do problema, tomou a iniciativa de propor uma base cuja substância não estava prevista, nem na proposta de lei nem no projecto de lei dos Srs. Deputados Sá Carneiro e Pinto Balsemão.

Efectivamente, o ensino .do jornalismo tem de contar, hoje em dia, com disciplinas, muitas delas até altamente especializadas, como sejam: as modernas ciências humanas, linguística aplicada, sociologia, disciplinas de psico-

sociologia, etc.

A proposta de alteração apresentada pelo Sr. Deputado Almeida -e Sousa e outros Srs. Deputados apresenta algumas modificações que não me parecem aceitáveis, uma vez que a redacção proposta pela comissão eventual não exclui, necessariamente, a solução proposta pelos Srs. Deputados Almeida e Sousa e outros. Simplesmente pareceu à comissão eventual que, numa base de teor geral, deverá figurar o Governo, e não o Ministério da Educação Nacional. Não pareceu também à comissão eventual que no momento em que a problemática do ensino em todos os seus níveis e graus está em estudo e em discussão, não lhe pareceu também que deveria ficar consignado na base de modo vinculatório. Poderá ser esta solução, será desejável que seja esta solução, simplesmente a redacção proposta pela comissão eventual é muito mais maleável e flexível e portanto é uma proposta aberta ao futuro.

Eu desejaria apenas fazer duas observações em relação a algumas afirmações produzidas pelo Sr. Deputado Almeida e Sousa, pois nem todo o ensino superior em Portugal depende do Ministério da Educação Nacional;

devo lembrar até, certamente não seria necessário, que em vários países, onde o ensino está altamente desenvolvido, há grandes escolas de ensino superior que não dependem do Ministério da Educação Nacional. O caso da França é certamente o mais sintomático. As grandes esco-

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las do ensino superior em França não dependem do Ministério da Educação Nacional, e num país em que os problemas do ensino são hoje tão cruciais, até mesmo no contexto europeu, como é a França, tem-se verificado que as grandes escolas do ensino superior estão a defender tenazmente a sua não dependência do Ministério da Educação Nacional. E curioso que em França, nos últimos dois ou três anos, o ensino universitário se tem degradado e, sensivelmente, as escolas do ensino superior têm visto aumentar o seu prestígio constantemente.

O Sr. Deputado Almeida e Sousa perguntar-me-á porquê. Há várias razões. Ainda há tempos um professor de uma grande escola do ensino superior em França dizia: graças a Deus não estão dependentes do Ministério da Educação Nacional as escolas do ensino superior; viram-se livre do cancro! O cancro é a expressão que se dá actualmente em França à grande massa não qualificada de alunos que, através daquele processo de entrada automática no ensino superior, sem selecção, ocupam lugares para que não estão devidamente preparados, nem muitas vezes têm as qualidades indispensáveis.

Pois as grandes escolas do ensino superior, precisamente porque não foram abrangidas peia reforma Faure, continuam a fazer a selecção dos seus alunos. Os melhores alunos do ensino secundário francês estão hoje a optar decididamente pelas grandes escolas do ensino superior e é curioso, efectivamente, verificar que, à medida quê o prestígio das universidades francesas decai inexoravelmente, aumenta, sobe em flecha, o prestígio das grandes escolas superiores.

Este problema, portanto, é um problema que não é simples, é um problema que tem muitas implicações, pois amanhã poderá ser aconselhável que o ensino do jornalismo não fique dependente do Ministério da Educação Nacional. À primeira vista será razoável, será até desejável. Mas poderá acontecer que seja preferível uma solução contrária.

O Sr. Deputado Almeida e Sousa fez ainda outra observação que desejaria comentar, embora muito rapidamente, a propósito do ensino politécnico e do ensino superior. Disse o Sr. Deputado Almeida e Sousa que pela nova reforma o ensino politécnico é de grau superior.

Eu permito-me lembrar que não há nenhuma reforma ainda!

Há um projecto de reforma que foi posto à discussão no País, e que foi posto à discussão precisamente porque ainda não é um diploma aprovado.

Lembro também ao Sr. Deputado Almeida e Sousa que a criação do ensino politécnico foi objecto de um projecto de proposta de lei subscrito pelo anterior Ministro da Educação Nacional, Dr. José Hermano Saraiva; lembro que esse projecto de proposta está na Câmara Corporativa; ultimamente houve reuniões na Câmara Corporativa para o apreciar. Portanto, o que virá a acontecer é ainda uma incógnita; não se pode falar assim, penso eu, de uma reforma do ensino superior como se fosse uma coisa assente. Portanto, parece-me que, por todas estas razões, a redacção proposto pela comissão eventual, que não exclui, não rejeita, repito, necessariamente, a proposta apresentada pelo Sr. Deputado Almeida e Sousa e outros Srs. Deputados, me parece preferível.

O Sr. Salazar Leite: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. Salazar Leite: - Agradeço imenso as informações que acaba de dar. Interessou-me extraordinariamente as informações que me deu sobre o ensino superior em França. Queria, simplesmente, um esclarecimento: essas escolas de ensino superior dependem de qualquer outro Ministério que não seja o da Educação Nacional?

O Orador: - Depende de outros Ministérios. Por exemplo, a Escola de Administração, onde se formam os quadros da administração francesa; a Escola Parsy Chaussé, que depende do Ministério das Obras Públicas; as escolas militares ...

O Sr. Salazar Leite: - Portanto, são escolas públicas ...

O Orador: - De ensino oficial.

O Sr. Salazar Leite: - Era exactamente esse esclarecimento que desejava, pois V. Ex.ª não fez essa referência, que considero muito importante.

Muito obrigado.

O Sr. Oliveira Dias: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor. Tinha terminado a minha intervenção, mas com todo o gosto me considero no uso da palavra e concedo apartes.

O Sr. Oliveira Dias: - Muito obrigado. Desejava só perguntar ao Sr. Deputado se considera aconselhável que, também entre nós, as escolas de ensino superior deixem de depender do Ministério da Educação Nacional.

O Orador: - Em certos domínios, creio que isso poderá ser uma solução aconselhável, até sob o ponto de vista da eficácia e da rentabilidade desse ensino.

Foi o que se verificou em França. Se o Sr. Deputado percorrer, por exemplo, a imprensa francesa, ainda a deste ano e dos anos de 1969 e 1970, encontrará anúncios de grandes empresas que pedem economistas, matemáticos e licenciados por escolas superiores, fazendo menção explícita de que não querem licenciados pelas Universidades francesas.

O problema põe-se ao nível da eficácia e permito-me lembrar ainda que, recentemente, a Assembleia Nacional francesa deu um grande golpe na Reforma Faure, porque votou de novo o princípio de selecção da admissão às Faculdades de Medicina. Estas, perante o cancro, viram-se na necessidade de, através de vários grupos par-lamentares, pedirem novamente a selecção da admissão àquelas Faculdades.

Este problema, que é muito grave para a Universidade francesa, foi sempre evitado nas grandes escolas superiores. Isto é simplesmente para dizer que, o facto de as escolas superiores não dependerem do Ministério da Educação Nacional, pode implicar problemas muito importantes.

O Sr. Oliveira Dias: - Muito obrigado. Já agora pedia o favor de me dizer, também, se na sua opinião - se possível - as escolas superiores de jornalismo possam vir a depender de outro departamento que não seja o Ministério da Educação Nacional.

O Orador: - Em princípio, não vejo razão absolutamente proibitiva para que não pudesse depender da Presidência do Conselho.

O Sr. Presidente: - O sentido das últimas intervenções mostra que ainda há pontos por esclarecer. Portanto, não considerarei por ora a matéria completamente esclarecida.

Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida o Sousa.

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O Sr. Almeida e Sousa: - Sr. Presidente: Agradeço, em primeiro lugar, ao Sr. Deputado Aguiar e Silva os esclarecimentos que prestou às minhas palavras, que procuraram ser o mais reduzidas possível.

Conheço perfeitamente o ensino francês e sei que grande parte das grandes escolas francesas não dependem do Ministério da Educação Nacional.

Aliás, o prestígio dessas escolas vem de muito de trás e sempre foram prestigiadas e prestigiantes. Nenhuma como a École Polytechnique, de que ainda se não falou aqui.

A essa faltou apenas que Napoleão lá tivesse andado. Mas Napoleão não poderia ter sido seu aluno, uma vez que foi, praticamente, o seu fundador.

Quanto ao facto de, em Portugal, a escola de jornalismo vir a despender do Ministério da Educação Nacional, penso que até aqui todo o nosso ensino superior tem dependido sempre daquele Ministério, e não vejo razão para essa escola não depender daquele departamento. Para mim, será preferível que dependa.

Quanto ao problema que me foi posto do ensino politécnico, apenas o pus como uma coisa futura. Não empreguei u palavra «tem», mas «terão» ... Por outro lado, se o chamei à liça, não é porque pense que a escola de jornalismo se deva confinar ao ensino politécnico. Disse-o aqui no plenário e digo-o agora, porque sinto que a escola de jornalismo deve ser do mais alto nível do ensino português.

Portanto, penso que o ensino politécnico não será suficiente para assegurar o jornalismo de que temos necessidade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E se falei no ensino politécnico, foi também porque fui abordado por algumas pessoas da comissão eventual que me disseram, que era nesse campo que a coisa teria sido estudada, ou, pelo menos pensada.

Como uma primeira etapa, acho muito bem; como uma etapa final, acho que não é suficiente.

Vozes: - Muito bem!

A Sr. D. Custódia Lopes: - É apenas para apoiar a proposta da comissão eventual, que me parece mais acertada e mais Consentânca com as realidades, porquanto eu penso que, se um dia no ultramar se instituir o ensino do jornalismo, ele poderá não depender apenas do Ministério da Educação Nacional: poderá depender até de órgãos locais, do Ministério do Ultramar ou deste e de outro.

Portanto, acho mais razoável a fórmula da proposta, que inclui a palavra «Governo» - «o Governo promoverá a organização» -, porque fica mais de acordo com as realidades e é mais ampla.

O Sr. Pinto Balsemão: - Sr. Presidente: O Sr. Deputado Alarcão e Silva foi claro quanto a dois pontos. O primeiro era o da necessidade urgente de um curso de jornalismo, até porque esta lei, que aqui estamos a discutir e a votar, entrará em vigor quando muito dentro de seis meses. E foi claro quanto ao segundo ponto, que é o da complexidade do ensino do jornalismo.

Afigura-se-me desnecessário acentuar o interesse da consagração na lei do ensino do jornalismo, mas afigura-se-me necessário felicitar a comissão eventual pela iniciativa que tomou de o fazer, visto que nem na proposta governamental, nem no projecto que com o Deputado Sá Carneiro subscrevi havia qualquer menção ao ensino do jornalismo. Penso, portanto, que é uma achega importante a que a comissão eventual trouxe para a lei de imprensa.

Este curso, no entanto, só poderá preencher os requisitos indispensáveis à formação dos jornalistas do nosso tempo se for um curso superior.

Não discuto, por enquanto, se deve ou não estar sob a égide do Ministério da Educação Nacional.

Parece-me que as palavras do Sr. Deputado Almeida e Sousa, que subscreveu, em primeiro lugar, esta proposta de alteração, na sessão de 27 do corrente, são muito claras neste aspecto. O Sr. Deputado disse:

Suponho inquestionável que o curso de jornalismo que queremos tem de ser um curso superior, um curso superior, de pleno direito. Além de tudo o mais - e muito é -, hoje qualquer jornalismo válido tem de se basear essencialmente no sentido crítico, e, pelo menos, na textura actual dos nossos processos de ensino, só o grau superior permite o desenvolvimento no sentido crítico.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Se estamos de acordo no campo da complexidade - e todos acentuámos que o curso de jornalismo discutir a segunda premissa, ou seja, sob a égide de que Ministério deve este curso estar, porque não vale a pena estarmos aqui com soluções, definições ou respostas flexíveis e maleáveis.

Tivemos, na proposta, o cuidado de falar em ensino superior e não em universitário, apenas por uma razão: é que o Governo já optou, definitivamente, por que esse curso se realize sob a égide do Ministério da Educação Nacional.

Eu leio a VV. Ex.ªs as palavras do Sr. Ministro da Educação, quando recebeu os dirigentes do Sindicato Nacional dos Jornalistas, acerca do projecto - notável, aliás - do ensino das ciências da informação. Essas palavras são as seguintes:

Podemos pensar como é que um instituto das ciências da informação, que se propõe agora, se deve inserir no projecto da reforma do ensino.

Há uma questão que, desde logo, se apresenta. O ensino superior em Portugal tem sido, até agora, só a Universidade - erro lamentável em que temos vindo a cair durante largo tempo. Julgo eu que devemos criar outras instituições do mesmo nível, fora da Universidade, as quais até podem ter uma maior maleabilidade e uma maior eficiência.

Deverá esse instituto ser um instituto autónomo, com essa maleabilidade e com essa eficiência, ou deverá ser um instituto universitário perfeitamente integrado e, portanto, perdendo algumas qualidades inovadoras? Eis uma pergunta que ponho, inclusivamente, à vossa consideração.

Portanto, o Governo, pela voz autorizada do Sr. Ministro da Educação, já optou. E já optou por que o curso de jornalismo seja um curso superior, sob a égide do Ministério da Educação Nacional. A única dúvida que subsiste é se esse curso será ou não integrado no ensino universitário clássico.

Não vejo, por isso, qualquer razão para rejeitarmos a proposta do Sr. Deputado Almeida e Sousa, e que eu próprio subscrevi; antes pelo contrário, me parece que numa Casa onde tanto se fala em confiança e desconfiança no Governo seria uma prova de confiança no Governo.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

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O Sr. Júlio Evangelista: - Um ligeiríssimo apontamento: os pontos controvertidos da proposta dos Srs. Deputados Almeida e Sousa, Pinto Balsemão e outros cabem perfeitamente dentro do contexto da base proposta pela comissão eventual.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação.

Ponho primeiramente à votação a proposta de alteração subscrita pelos Srs. Deputados Almeida e Sousa, Pinto Balsemão e outros e que, como já expliquei, foi apresentada no Diário sob o nome de proposta de aditamento de uma base nova, mas é efectivamente emenda à base XII.

Submetida à votação, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Passamos agora à votação da base XII, segundo o texto que adoptamos como orientador do debate, e que é subscrita pelos Srs. Deputados Ulisses Cortês e outros.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Seguem-se as bases XII e ...

O Sr. Pinto Balsemão: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª pediu a palavra para ...

O Sr. Pinto Balsemão: - Para, a propósito da base VIII, pedir autorização para retirar a proposta de eliminação e apresentar uma nova.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, ainda não estava em discussão e creio que a altura própria será depois de anunciada a discussão, mas em todo o caso a Assembleia para decidir tem de a conhecer e portanto será lida.

O Sr. Pinto Balsemão: - Se me desse licença, apenas queria esclarecer o seguinte: eu tinha apresentado uma proposta de eliminação e queria substituí-la por uma proposta de alteração que também já foi distribuída.

O Sr. Presidente: - Pois é, isso tudo terá de ser requerido no momento próprio.

Vamos passar à base XIII. Como a base XIV se relaciona directamente com a base XIII, começa até o articulado com: «O disposto na base anterior não obsta ...», eu vou pôr à discussão conjuntamente as bases XIII e XIV, segundo o texto adoptado como orientador dos debates da Assembleia e as propostas de alteração que foram apresentadas na Mesa.

A votação far-se-á conforme o sentido do debate o aconselhar.

Vão ser lidas as propostas do texto básico e as propostas de alteração.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE XIII

(Limites da liberdade de imprensa)

O uso da imprensa com os fins indicados na presente lei apenas será limitado para assegurar:

a) O acatamento da Constituição, o respeito das instituições, a unidade e independência do País, ou o seu prestígio na ordem interna e no conceito internacional:

b) A defesa da ordem pública interna e da paz externa e as exigências da defesa nacional e da segurança do Estado;

c) A não divulgação de informações que respeitem a matérias de natureza Confidencial ou que, embora sem carácter secreto, possam prejudicar os interesses do Estado, se existirem normas ou recomendações do Governo determinando reserva, ou esta se imponha pela sua própria natureza;

d) O respeito da verdade, a defesa da moral e dos direitos da intimidade das famílias e dos indivíduos;

e) A autoridade, independência e imparcialidade dos tribunais;

f) A prevenção do crime e a protecção da saúde.

Propomos que o n.º 1 da base VIII seja eliminado.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 29 de Julho de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Propomos que a base XIII seja substituída por outra, com a seguinte redacção:

O uso da imprensa com os fins indicados na presente lei terá apenas como limites os decorrentes dos seus preceitos e os que a lei geral impõe aos actos das pessoas e ainda a não divulgação de informações que respeitem a matérias classificadas de muito secreto, secreto ou confidencial, ou que, embora sem esse carácter, possam prejudicar os interesseis do Estado, se existirem normas do Governo determinando reserva.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Agosto de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

BASE XIV

(Discussão e crítica dos actos da Administração)

O disposto na base anterior não obsta à discussão e crítica das leis, regulamentos e mais actos da administração pública e da organização corporativa e, bem assim, da forma como os respectivos órgãos e agentes lhes dão cumprimento, com vista ao esclarecimento da opinião pública ou à sua preparação para as reformas a efectuar pelos trâmites legais, à boa execução das leis e ao respeito pelos direitos dos cidadãos.

Propomos que o n.º 2 da base XIV passe a ter a seguinte redacção:

O disposto na base anterior não obsta à discussão e crítica dos actos dos órgãos da soberania e dos da organização corporativa e, bem assim, da forma como os respectivos agentes lhes dão cumprimento, com vista ao esclarecimento e preparação da opinião pública para reformas ne-

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cessárias a efectuar pelos trâmites legais, à boa execução das leis e ao respeito pelos direitos dos cidadãos.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 29 de Julho de 1971. - Os Deputados: Francisco José Pereira Pinto Balsemão - Rafael Ávila de Azevedo - Joaquim Carvalho Macedo Correia.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Pinto Balsemão tinha pedido a palavra. Agradeceria que esclarecesse a Assembleia, também, em relação à proposta de alteração que ele e outros Srs. Deputados subscreveram e que vêm a p. 2666, col. 1.ª, do Diário das Sessões, n.º 132, a que é que ela efectivamente se reporta, porque os Srs. Deputados mencionam o n.º 2 da base XIV e a base XIV nem no texto adoptado pela Assembleia, nem no texto da proposta de lei tem n.º 2.

O Sr. Pinto Balsemão: - Queria pedir autorização paira1 retirar a proposta, de eliminação referente à base XIII. Inicialmente havia proposto a eliminação desta base, visto que na proposta de alteração que apresentei para a base V já vinham incluídos, de forma quase idêntica à agora proposta, os limites à liberdade de imprensa. Como essa proposta não foi aprovada, e evidentemente entendo que esta lei deve estabelecer os limites da liberdade de imprensa, vejo-me forçado a pedir autorização à Assembleia para retirar a proposta de eliminação e a apresentar a proposta de alteração. Isto quanto à base XIII.

O Sr. Presidente: - Consulto a Assembleia sobre se autoriza a retirada da proposta de eliminação do n.º 1 da base XIII, que é efectivamente, segundo parece à Mesa, toda a base XIII do texto agora em discussão, requerida pelo Sr. Deputado Pinto Balsemão.

Submetida à votação, foi autorizada a retirada da proposta de eliminação da base XIII.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Pinto Balsemão ainda tinha de prestar à Assembleia um esclarecimento sobre o que é que chama o n.º 2 da base XIV.

O Sr. Pinto Balsemão: - Como V. Ex.ª sabe, as minhas propostas iniciais de alteração referiam-se à proposta de lei do Governo por razões que aqui, tempestivamente, expliquei.

Sucede que na azáfama de emendar essas propostas iniciais esqueci-me de riscar o n.º 2.

Portanto, esta proposta, inicialmente, referia-se ao n.º 2 da base XI do Governo.

A base XI incluíra as duas bases em discussão.

Neste momento, visto que a Assembleia aprovou o texto da comissão eventual com prioridade e com prejuízo dos restantes, tive de alterar a numeração para passar a referir-me às bases da comissão eventual.

Esqueci-me, nessa altura, de riscar o n.º 2, e portanto o texto da proposta de alteração efectivo é: «propomos que a base XIV passe a ter a seguinte redacção».

O Sr. Presidente: - Está muito bem. Portanto, a segunda alteração de V. Ex.ª é à base XIV. Está em discussão conjuntamente.

O Sr. Homem de Mello: - Sr. Presidente: A propósito desta matéria, que é de iniludível importância, consignada nas bases XIII e XIV que estão em discussão, penso que a Câmara deverá ter presentes os seguintes pontos de vista: a lei de imprensa que estamos a votar não é um diploma de vocação definitiva ou imutável, como acentuou o relator da Comissão eventual ao apresentar o respectivo parecer; trata-se de um primeiro e, no meu entender, decisivo passo tendente a atingir a meta que, por certo, todos desejamos alcançar.

Por isso não me dispenso de dizer à Câmara que darei a minha aprovação ao texto sugerido pela comissão eventual, nem me dispensarei, pelas mesmas razões, de deixar aqui consignado o voto de que na próxima legislatura venha já a ser possível rever o texto de molde a liberalizá-lo, progressiva e irreversivelmente.

Tenho dito.

O Sr. Moura Ramos: - Sr. Presidente: Referem-se na base em discussão os limites da liberdade de imprensa, limites que se impõem para salvaguarda e defesa dos superiores interesses nacionais.

Com esta base XIII se encontra ligada a base XXVIII, em que se estabelece o regime de exame prévio só para casos excepcionais e, mesmo assim, em relação a matérias taxativamente enunciadas. Pois tanto bastou para que os fanáticos e teóricos das liberdades, através das suas costumadas e usadas tubas e fanfarras, viessem dizer que as disposições sugeridas na proposta de lei equivaleriam à perpetuação da censura e da repressão e que, a serem aprovadas por esta Assembleia, «acorrentarão a inteligência portuguesa a novas e ainda mais paralisantes e vexatórias servidões».

Tudo isto afirmam, esquecidos da sentença realista de Duguit de que a liberdade de imprensa é uma liberdade teoricamente incontestada, mas uma liberdade particular e profundamente ultrajada, sentença esta que mais valor tem se nos lembrarmos de que foi formulada a partir do que observava no seu país - a França - pátria-mãe da Declaração dos Direitos do Homem! ...

Pois bem: entre nós já o Dr. Salazar, ao abordar o problema da censura à imprensa e lamentando que só visse mais desenvolvidamente tratado o aspecto da dignidade intelectual do jornalista, podia dizer, com a sua sempre acutilante visão dos problemas nacionais, que o assunto era muito mais complexo do que parecia, porque, acrescentava:

Ou de facto a imprensa com as suas irmãs mais novas - a rádio e a televisão - não exercem influência alguma na formação da opinião pública e não vale a pena gastar tanto tempo com estas discussões, ou exercem, e então os governos para os quais, como entre nós, à opinião pública é constitucionalmente atribuída uma função de força social, tem de evitar a sua perversão. E têm também de defender o interesse nacional.

O direito reconhecido ao jornalista ou ao escritor não pode aspirar ao absoluto e tem de ser enquadrado naquelas duas necessidades essenciais. O problema é extraordinariamente difícil e não se lhe encontrou em parte alguma solução satisfatória, porque, além de um aspecto subjectivo que não se pode eliminar - a minha verdade, a tua verdade -, há interesses económicos e interesses políticos vastíssimos e perturbadores da formulação e venda da informação e da doutrina distribuídas ao domicílio, e de que os países têm por vezes de acautelar-se se quiserem salvar a alma e sobreviver. (Discursos, vol. v, pp. 505 e segs.)

A dificuldade do problema não está, pois, na teoria, mas na prática, muito embora para os teóricos das liberdades tudo se poder resolver como por encanto, desde que desapareça de vez a presença reputada de indesejá-

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vel, molesta e perniciosa da censura ou exame prévio, que o mesmo é dizer não deverem existir limites ao direito de informação, censura ou exame prévio a que, no dizer encantadoramente poético do grande poeta e jornalista monárquico que foi Alberto de Monsaraz, «não pode habituar-se quem não renuncie ao encanto de pensar e ao deslumbramento de sentir expansivamente, que são, afinal, as mais formosas dávidas de Deus» (Respiração Mental, p. 16).

Mas o que na prática se observa por esse mundo fora é que a censura particular ou oficial existe por toda a parte, o que equivale a dizer que há limitações ao direito à informação, muitas delas exigidas pelo justo bem comum e que ninguém poderá contestar e que não contraria quanto o Papa João XXIII ensinou na encíclica Pacem in térris, de que «existe um direito natural de todo o ser humano a uma informação objectiva dos acontecimentos públicos».

E mal ia o mundo se assim não acontecesse, pois vivendo nós uma época em que tudo se contesta - a virtude, a família, a pátria, a Igreja e até Deus -, nesta refrega de geral contestação, é preciso que um Estado como o nosso, que se diz ético, surja a defender esses valores supremos e, por conseguinte, a contestar o negativismo demolidor dessa contestação.

Mas o que se não aceita já, até porque constitui ofensa a todo o homem adulto, é a manipulação injustificada da informação, mormente nas sociedades profundamente relaxadas ou moralmente embotadas, onde o indivíduo vive apenas na esfera do seu egoísmo e dos seus interesses materiais, e em que todo o poder reside na opinião pública, pelo que a conquista e conservação desta se torna das coisas mais necessárias ao poder político e ao poder económico e que, muitas vezes, menosprezam o direito de o público ser informado com objectividade e verdade.

Por isso mesmo, e já há uns bons anos passados, Hilaire Belloc podia pertinentemente observar num ensaio que não há censura mais atroz do que a das poderosas cadeias internacionais que dominam a grande imprensa do mundo, de senhores ocultos e vasto poder.

Na verdade, assim é: como estamos numa época em que tudo depende da opinião, compram-se os meios de fabricar essa opinião, opinião que pode ser corrompida pela plutocracia da informação através da «técnica da deformação - irmã gémea dais técnicas de aviltamento denunciadas pela análise penetrante de Gabriel Mareei». Grupos de pressão, coligações de interesses, forças económicas, constituem algumas das formas diferentes em que se pretende dar primazia ao pior dos impérios - o do dinheiro - e que, no dizer expressivo do Dr. Salazar, é considerado «a flor do mal do pior capitalismo».

Desprezando o princípio natural de todo o Estado ético a quem, ma frase de S. Tomás de Aquino, incumbe o dever de preservar a moralidade pública, impedindo a corrupção da mentalidade geral, a imprensa, em vez de dar satisfação a uma exigência fundamental, qual é a de informar com objectividade e servir a verdade - a verdade dos acontecimentos, dos princípios doutrinais e morais -, não hesita, por vezes, antes emprega o seu afã, em difundir mentoras ou meias verdades propositadas, deturpações manifestas para transformar ou até inverter o sentido das coisas, propagandas deletérias feitas umas vezes às escâncaras, outras vezes com manhosa subtileza em notícias e reportagens que procuram atrair a atenção do público ledor.

Daí que assistamos tantas vezes ao abuso das imagens em que a pornografia tem lugar de relevo, à divulgação requintada dos crimes mais hediondos e dos factos mais deploráveis, à exploração mórbida da sensualidade, do emocional e do criminal, que só prejudicam quem lê, mormente a juventude.

E tudo isto se faz em adoração ao bezerro de ouro para assim se obterem grandes tiragens ou com uma finalidade política - a do dessoramento das populações com vista ao seu enfraquecimento e a uma mais fácil conquista do Poder e até, paradoxalmente, para a sua permanência.

Por tudo isto damos o nosso voto à base em discussão, até porque, como um dia disse Salazar:

É um axioma que as liberdades ilimitadas a si próprias se destroem, e por esse facto são em toda a parte mais ou menos restringidas ou condicionadas. (Discursos, vol. v, p. 397.)

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Júlio Evangelista: - Sr. Presidente: Aceitou-se, como não poderia deixar de ser, que a liberdade de imprensa implicava, pela natureza e pela função pública, certos limites que não poderiam deixar de se estabelecer a essa mesma liberdade.

Isto é universalmente consagrado e é universalmente aceite.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - No texto em discussão, sobre os limites da liberdade de imprensa, anotar-se-á que, na proposta original do Governo, esta base implicava dois números: o n.º 1 é o que Constitui actualmente a base XIII e o n.º 2, que a comissão autonomizou, por motivos que adiante direi, constitui agora a base XIV do texto em debate.

Pois estas matérias, Sr. Presidente - a base XIII e a da base XIV -, estão em íntima conexão com a base XXVIII do texto proposto pela comissão eventual, que se reporta ao regime de exame prévio e constitui todo o capítulo V. Efectivamente, ao estabelecer o regime de exame prévio, diz-se que ele se destinará (n.º 3 da base XXVIII) a impedir a publicação das matérias abrangidas na base XIII, nos casos excepcionais em que é previsto.

Há, portanto, íntima ligação nestas bases. Porquê? Porque a Assembleia, ao estabelecer os limites da liberdade de imprensa, dado o melindre da matéria e assentando no pressuposto, universalmente aceite, da indispensabilidade do limites, irá estabelecê-los rigorosamente de acordo com os comandos constitucionais.

Se VV. Ex.ªs repararem na alineação da base XIII, toda essa alineação se reporta a afirmações e a preceitos contidos no diploma fundamental da Nação Portuguesa.

Poderia dizer, Sr. Presidente, que neste caso talvez fosse redundante o preceito, mas não o é. E não o é porque, visto estar em íntima conexão com o regime de exame prévio, importava que ficassem taxativamente e minuciosamente enumeradas as matérias a que o exame prévio se pode reportar, nas condições excepcionais, repito, em que ele é previsto neste diploma.

Poderia dizer e acrescentar que, numa análise sem grande profundidade, quem atentar nos artigos 6.º e 8.º, e também, por exemplo, nos artigos 12.º, 14.º, 22.º e 23.º da Constituição encontrará essas matérias enunciadas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Autonomizou-se, por outro lado, a matéria da base XIV, que na proposta inicial constituía um n.º 2 da base anterior; deu-se-lhe autonomia, tal como se diz

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no relatório da comissão eventual, para lhe imprimir maior dignidade e carácter afirmativo, eliminando-se, por haver perdido razão de ser, a expressão final contida no texto correspondente da proposta de lei.

Epigrafou-se esta base autónoma de «Discussão e crítica dos actos da Administração».

Quer dizer que os limites à liberdade de imprensa, mesmo nos casos excepcionais em que o regime prévio seja estabelecido, vigoram apenas para aquelas matérias taxativamente enunciadas na base XIII, mas não impedem, em nenhum caso, a livre discussão e crítica dos actos da Administração.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É em tal sentido que estas bases efectivamente tem uma interpenetração lógica que importava acentuar perante a Assembleia e o País.

Parece-me óbvia, clarificada e suficientemente esclarecida a posição que tomámos.

O Sr. Pinto Balsemão: - Sr. Presidente: Como todos os Srs. Deputados intervenientes acerca deste assunto, reconheço que deve haver limites à liberdade de imprensa. Penso, no entanto, que esses limites devem ser definidos de forma extremamente rigorosa e penso, também, que na proposta da comissão eventual, na base XIII, estão definidos de forma extremamente vaga. Na verdade, a expressões como «o respeito pelas instituições», «o respeito da verdade», «a defesa da moral», etc., não correspondem quaisquer tipos legais de crimes e sobre elas não existe qualquer jurisprudência formada. Parece, assim, que nas sanções a aplicar, sempre que se considere que tais imprecisos limites foram ultrapassados, se seguirá a via administrativa, o que diminui a garantia das empresas.

O Sr. Júlio Evangelista: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Júlio Evangelista: - É só para ler a V. Ex.ª e à Câmara, no seguimento das observações que acaba de fazer, o artigo 22.º da Constituição: «A opinião pública é elemento fundamental da política e administração do País, incumbindo ao Estado defendê-la de todos os factores que a desorientem, contra a verdade, a justiça, a boa administração e o bem comum.» Se estas matérias são vagas, a Constituição é vaga, dispondo, no entanto, de interpretação acumulada em quase quatro décadas. O mesmo se dirá das restantes alíneas, não obstante a condensação a que procedemos na comissão no sentido de evitar quanto possível interpretações difíceis de objectivar.

O Orador: - Eu não digo que essas matérias sejam vagas, o que eu digo é que se incumbe ao Estado defender a opinião pública o deve fazer de modo mais concreto, e não repetindo a Constituição na lei de imprensa.

Penso, portanto, que há o perigo de que as sanções a aplicar o sejam, por via administrativa, o que diminui as garantias das empresas e dos jornalistas e relaciona-se com as fortíssimas sanções, que a comissão eventual não rejeitou, respeitantes à supressão de periódicos e à interdição definitiva da profissão de jornalista, profissional de imprensa, peco desculpa.

Como já disse, a propósito da enunciação do principio dia liberdade de imprensa, os limites do seu uso devem, em minha opinião, ser cuidadosamente definidos, e apenas os resultantes, em termos precisos, da própria lei de imprensa e os que a lei geral impõe aos actos das pessoas, disto para que sejam os limites a servir a imprensa, e não a imprensa a servir os limites.

Aliás, a Câmara Corporativa, quanto à alínea d) que elimina desta base XIII, diz expressamente:

Reconhece-se que a alínea d) da base XI da proposta (que corresponde à base XIII da comissão eventual), embora certa como disposição puramente programática é imprecisa e vaga, porquanto a verdade, a justiça, a boa administração e o bem comum não são a mesma, coisa para todas as pessoas, pois muitos poderão considerar errada uma administração que outros terão como boa e isenta de defeitos.

Por isso a Câmara sugere a sua eliminação.

Entre os limites propostos pela comissão na sua base XIII apenas um, o constante da alínea c), tem, quanto a mim, razão de ser para permanecer, por ser juridicamente operante.

E o constante da alínea c), no que respeita à não divulgação de informações consideradas confidenciais, secretas ou muito secretas.

Optei, no entanto, pelo texto da Câmara Corporativa quanto a esta alínea c), por me parecer mais conciso e vigoroso do que o do Governo.

Penso que o problema dos limites é um dos pontos candentes desta discussão e penso também que não serviremos o desenvolvimento e o florescimento de uma imprensa - que todos desejamos - se a ameaçarmos com limites tão imprecisos como os propostos pela comissão eventual.

O Sr. Homem de Mello: - Sr. Presidente: Peço desculpa a V. Ex.ª por voltar a intervir, mas não desejava que ficasse a mais pequena dúvida no espírito de qualquer dos membros desta Câmara em relação às razões que motivaram a declaração, que fiz, de apoiar a proposta da comissão eventual.

O circunstancialismo político tem, de vez em quando, estas incongruências e estes paradoxos. Estando eu muito mais próximo do meu colega Pinto Balsemão, vejo-me na contingência de ter de votar as bases XIII e XIV, espantosamente afastado daquilo que afirmou o Sr. Deputado Moura Ramos.

O Sr. Ricardo Horta: - É deveras confortante para mim ver incluir na base XIII, na sua alínea e), a prevenção do crime e a protecção à saúde.

Diz o Sr. Deputado Balsemão que adoptava mais a alínea e). Lamento muito não estar de acordo com ele ao preferir mais f).

Todos nós sabemos, e todo o mundo sabe, que hoje o crime é um flagelo da Humanidade. É de homenagear a comissão eventual por ter a coragem de incluir aqui um princípio básico que traduz factores essenciais das sociedades modernas.

O Sr. Pinto Balsemão: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Pinto Balsemão: - Eu apenas quero lembrar a V. Ex.ª que esta alínea f), sobre a protecção da saúde, não é da iniciativa da comissão eventual, pois já constava da proposta do Governo.

O Orador: - V. Ex.ª disse que adoptava mais a alínea c) do que esta, eu prefiro mais a f).

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Compreendem que hoje a criminalidade é proporcional aos grandes aglomerados populacionais. E quando verificamos aglomerados populacionais a crescer e a criar as condições para os actos de criminalidade, é sempre oportuno que o Governo ponha limites ao conhecimento ou, pelo menos, à expansão dê bases que possam aumentar essa criminalidade.

Este acto da comissão é uma homenagem à imprensa, ao pedir-lhe uma colaboração no sentido deste gravíssimo problema.

A criminalidade é uma constante dos povos que dizem estar em liberdade, em democracia, mas os actos são absolutamente descontrolados, apesar das suas extraordinárias forças de repressão.

Verifica-se, por exemplo, que em certos aglomerados populacionais há 13 000 agentes de repressão, não só em número, como em efectividade de acção. Sabemos que a criminalidade é uma acção puramente da juventude.

Felizmente, a nossa juventude está em situação de impermeabilidade a esses actos reprováveis, mas há pontos mo mundo onde se verifica que os jovens entre os 15 e os 20 anos praticam milhões de crimes contra a sociedade, crimes do sentido de mortes e assassinatos, assaltos à mão armada, roubos de automóveis, etc. As próprias populações desses centros solicitam ao Governo medidas de toda a natureza para a sua repressão, inclusive sacrificando liberdades existentes, algumas das quais eles queriam ter.

Logo, não há dúvida de que o Governo, através da sua comissão eventual, traduz aqui o sentido de alerta neste grande sector social.

Quanto à protecção da saúde, escusado é dizer: já fiz uma referência na minha exposição durante a minha intervenção na generalidade.

Ainda ontem eu verifiquei que, num jornal da tarde, houve uma referência relativamente a um médico do Hospital de Rio Maior. É evidente que essa referência é altamente prejudicial para a classe, e lamento muito que a informação viesse desacompanhada de um depoimento do indivíduo acusado; quer dizer: não teve qualquer defesa no sentido de esclarecer a situação.

O Sr. Barreto de Lara: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça o favor.

O Sr. Barreto de Lara: - Eu tenho estado a ouvir, com grande atenção, as considerações de V. Ex.ª

Desejo, antes de tudo, significar que não intervi ainda na discussão da lei de imprensa porque me sinto, talvez, demasiado confuso perante um espírito formado, todo ele conducente à liberdade- de imprensa, mas prudente, por temer uma liberalização total depois de um longo período de censura administrativa.

Mas, agora, as afirmações de V. Ex.ª fazem com que intervenha no sentido de pedir a V. Ex.ª o favor de me esclarecer num ponto da sua douta consideração.

Vamos partir da hipótese, para comodidade de discussão, de que o Ex.mo Jornalista estava bem informado e que o ilustre médico que naquele jornal se menciona procedeu exactamente como ali se diz.

Quem defende melhor a saúde pública? Esse jornal, trazendo a lume de discussão um médico que traíra então a sua missão (e anoto, repetindo, que não sei se a traiu ou não, embora me sinta inclinado a partir do princípio de que se o jornalista fez tal afirmação é porque partira de bases sólidas e princípios certos, pois tal lho impunha a deontologia profissional), ou escondendo tal acto, só em holocausto ao prestígio da função?

É que estou um tanto perplexo perante o que V. Ex.ª disse, e gostava que mie esclarecesse neste ponto...

O Orador: - Eu não estou ai dizer que o jornal não traduziu a verdade. Eu estou a dizer que havia grande interesse em que se associasse o depoimento ou a defesa do (atacado, no sentado de esclarecer a opinião pública, porque isto é uma notícia que vem e que jamais se apaga...

O Sr. Barreto de Lara: - Mas não ofende a classe medica!

Prestigiar a classe é exactamente expurgá-la dos elementos perniciosos, e não esconder os seus actos...

O Orador: - E quais são os elementos que V. Ex.ª tem para dizer que ele é pernicioso?

O Sr. Barreto de Lara: - Não sei! Não redigi a notícia.

O Orador: - Ah! Não sabe! Mas devia, saber ...

O Sr. Barreto de Lara: - O jornal lançou um repto, o jornal fez determinadas afirmações concretas e concludentes, que eu também li; o médico tem, pois, ao seu dispor, não só as colunas do jornal, através da lei de imprensa, como ainda os tribunais criminais, os tribunais civis, para ressarcir a sua honra e dignidade do gravame que então se cometeu.

O Orador: - V. Ex.ª está convencido de que fica totalmente desconhecida da acção nefasta dele, no público depois desta notícia?

O Sr. Barreto de Lara: - Eu talvez esteja convencido de que sim ...

O Orador: - Muito obrigado! Deus o ouça...

O Sr. Barreto de Lara: - Não posso é partir do princípio que o Sr. Jornalista foi, por deleite ou por revanche pessoal, apenas inventar aquilo ...

De V. Ex.ª, por exemplo, nunca se leram afirmações de desabono, porque V. Ex.ª é um profissional distinto e prestigiado. Nem virão a ler-se, por essa mesma razão. A diferença estará, talvez, aí.

O Orador: - Muito obrigado!

Sobre este sector, o da protecção à saúde, a imprensa tem uma papel extraordinário, tem um papel construtivo, no sentido de dizer ou sugerir ou estudar, como se faz uma táctica, sanitária de um país, como se faz a táctica dos desastres, a cobertura sanitária dos desastres de estrada, como estão apetrechados os hospitais, e a posição desses hospitais, quais são os seus equipamentos, as suas deficiências ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É nisto que a imprensa tem um poder extraordinário para esclarecer a opinião publica, ajudar o Governo, ajudar a Administração a resolver os seus gravíssimos problemas.

Sabem VV. Ex.ªs que o problema assistencial, as mortes, os feridos e os desastres de estrada são hoje um problema gravíssimo.

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O que se passou ontem em Rio Maior passa-se sistematicamente no Algarve, passa-se em todas as regiões do País. É preciso - não há dúvida nenhuma -, para que se não repita o caso de Rio Maior, que se crie uma táctica eficiente, uma táctica capaz de salvar as vidas em perigo, quando procuram os centros hospitalares.

E só assim - meios à disposição e dentro de um esquema sanitário - é que nós podemos levar os médicos e, cumprir, a fazer tudo o que é cientificamente preciso para salvar vidas.

O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Apenas para um pequeno pormenor que me parece não convém deixar passar em julgado para que a lei saia redigida com a correcção devida. O reparo nada tem, em consequência, a ver com a profundidade da discussão ligada aos dois textos em causa.

Eu vou-me referir apenas à redacção da alínea c) do texto apresentado pela comissão eventual, da base que estamos, a discutir.

Faz-se a meu ver aqui uma confusão entre confidencial e secreto. São duas coisas completamente distintas. Confidencial tem uma certa reserva, mas há muita gente com acesso às coisas confidenciais. Secreto já é uma classificação muito mais forte, já é limitado o número de pessoas que têm acesso a material classificado dessa maneira; e se for muito secreto, então é mínimo o número de pessoas que têm acesso a matéria classificada de muito secreta. Consequentemente, a alínea como está redigida diz: «A não divulgação de informações que respeitam a matérias de natureza confidencial, ou que embora sem carácter secreto ...», isto é que não pode ser.

Poder-se-á dizer: «A matérias de natureza secreta, ou que embora sem carácter confidencial ...», mas eu preferiria de outra maneira: «A matérias de natureza confidenciai ou que possam prejudicar os interesses do Estado», e abolir a parte que se refere a secreto.

O Sr. Pinto Balsemão: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Pinto Balsemão: - Eu há pouco defendia ...

O Orador: - Eu sei que na sua proposta está absolutamente correcta a maneira de pôr a questão.

O Sr. Pinto Balsemão: - Que de resto não é minha, é da Câmara Corporativa.

O Orador: - Eu já tinha dado conta que é da Câmara Corporativa.

Para não estar a escrever confidencial, secreto e muito secreto, até porque se nós admitimos que haja restrições para o material classificado de confidencial, pois não merece a pena falar em secreto, nem em muito secreto, pois para essas tem de haver restrições muito mais apertadas.

O Sr. Pinto Balsemão: - Sr. Presidente: Em primeiro lugar, queria agradecer ao Sr. Deputado Homem de Mello o seu apoio moral, lamentando que aquilo a que ele chama as incongruências da política o impeçam de votar naquilo em que acredita.

Há pouco esqueci-me, por razão natural, de fazer a defesa cia proposta para a base XIV. E digo que a razão é natural porque só apresentei esta alteração na hipótese de a alteração proposta para a base XIII não vir a ser aprovada; só assim ela tem razão de ser. No entanto, como a Mesa decidiu, e sempre bem, discutir as duas bases ao mesmo tempo, torna-se necessário desde já justificar a alteração para a base XIV.

Esta justificação é muito simples. Parece-me indispensável incluir uma referência expressa aos órgãos de soberania por duas ordens de razões: em primeiro lugar, porque há que dar ideia clara de que também os actos políticos e não apenas os actos administrativos são susceptíveis de discussão e crítica; em segundo lugar, porque não há motivo para que essa discussão e crítica- não abranja os actos - note-se que estou a falar de actos e não de pessoas - de todos os órgãos da soberania, até porque a matéria de lei de imprensa é da exclusiva competência da Assembleia Nacional.

O Sr. Júlio Evangelista: - Sr. Presidente: Apenas para dois apontamentos, muito breves, suscitados pela discussão que entretanto decorreu.

Primeiramente para informar o Sr. Deputado Ricardo Horta de que esta referência da base XIII à «protecção da saúde» decorre do artigo 6.º, n. º 4, da Constituição Política. Poderia ainda citar a VV. Ex.ªs outros textos constitucionais donde decorrem estes limites à liberdade de imprensa, pois os artigos 12.º, 14.º, 22.º e outros são todos preceitos constitucionais donde decorrem os limites que no texto da comissão eventual, como já no texto do Governo e no texto da Câmara Corporativa se estabeleceram para a moldar. Estou a repetir-me, do que peço me relevem, mas o improvisado do debate assim o vai orientando.

Por outro lado, na actual base XIV «Discussão e crítica dos actos da Administração», a comissão eventual, em virtude da citada autonomização da base, entendeu que deveria eliminar a última frase do preceito, expressão de algum modo pragmática, mas que, verificada a sua autonomização, não se justificava.

Entendo defender a manutenção do actual texto da base XIV em discussão, porquanto nessa redacção se engloba a possibilidade de crítica a todos os actos da vida pública portuguesa susceptíveis de crítica através da imprensa. Não há aqui restrições.

Uma referência expressa aos «órgãos da soberania», como se pretende com a proposta de alteração, por demasiado ampla e impertinente neste preceito, não encontra justificação. O preceito, permitindo a maior largueza de discussão e de crítica, diz: «O disposto na base anterior não obsta à discussão e crítica das leis, regulamentos e mais actos da administração pública e da organização corporativa e, bem assim, da forma como os respectivos órgãos e agentes lhes dão cumprimento, com vista ao esclarecimento da opinião publica, etc.» Está o preceito redigido com uma amplitude que não necessita de justificação, por ser óbvia.

O Sr. Pinto Balsemão: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Tenha a bondade, Sr. Deputado!

O Sr. Pinto Balsemão: - Uma pequena pergunta: V. Ex.ª entende que a Assembleia, por sua iniciativa, deve afastar a possibilidade de crítica de actos seus, que não sejam leis?

O Orador: - Nem a iniciativa foi dela, nem se está a afastar essa possibilidade de crítica. Os actos da Assembleia, como actos políticos, são actos públicos.

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O Sr. Pinto Balsemão: - Não são actos da administração.

O Orador: - São actos públicos, e em sentido amplo actos de administração.

O Sr. Pinto Balsemão: - Não estão aqui actos especificados.

O Orador: - A actividade parlamentar é eminentemente legislativa, e também, por sua vez, fiscalizadora dos actos da Administração.

O Sr. Pinto Balsemão: - Aqui fala-se em leis e actos da administração pública e da organização corporativa.

O Orador: - Pode estar abrangida a Assembleia Nacional ...

O Sr. Pinto Balsemão: - Eu entendo que não.

O Orador: - ... Num sentido amplo, sem referência expressa e impertinente a «órgãos de soberania», até por melindres que me reservo e me permito omitir, por estarem no pensamento de todos, temos conveniência política e legislativa, porventura o dever, de evitar expressões menos apropriadas. Quando se referem leis, regulamentos «e mais actos da administração pública», consagra-se a mais ampla liberdade de discussão e crítica. Nesta expressão cabe o que a lei deve conter.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação.

Ponho à votação a proposta de alteração subscrita, pelo Sr. Deputado Pinto Balsemão no sentido de dar uma nova redacção à base XIII.

Submetida à votação, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Ponho à votação a proposta da base XIII, tal como consta do texto adoptado pela Assembleia, para orientação do debate.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Ponho agora à votação a base XIV, em relação à qual também há uma proposta de alteração dos Srs. Deputados Pinto Balsemão e outros.

Ponho primeiramente à votação a proposta de alteração.

Submetida à votação, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Ponho à votação a base XIV segundo o texto que adoptamos para orientação dos debates, que é o preconizado pelos Srs. Deputados Ulisses Cortês e outros.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Roboredo e Silva: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Roboredo e Silva pediu a palavra para?

O Sr. Roboredo e Silva: - Não é a palavra, é para um esclarecimento a respeito da base que acabámos de votar. Eu pedia a atenção de V. Ex.ª e da nossa Comissão de Legislação e Redacção para o ponto que eu levantei relativamente à alínea c), porque é uma incorrecção que sai da lei, se sair com a redacção que lá está, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - É possível que seja uma questão de nomenclatura, mais ou menos específica para determinados serviços. A Comissão de Legislação e Redacção atenderá ao facto, se entender.

Vamos passar à discussão da base XV. Vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

CAPITULO III

Imprensa periódica e não periódica

BASE XV

(Instituição do registo)

1. Nos serviços centrais de informação haverá um registo:

a) Das empresas jornalísticas;

b) Das empresas editoriais;

c) Das publicações periódicas;

d) Dos profissionais da imprensa periódica;

e) Dos editores da imprensa não periódica;

f) Das agências noticiosas estrangeiras admitidas a exercer a sua actividade em Portugal;

g) Dos profissionais ao serviço da imprensa estrangeira.

2. As entidades a que se referem as alíneas a), b), e), f) e g) não podem iniciar o exercício das respectivas actividades sem obterem a sua inscrição no registo.

3. Também de prévia inscrição no registo depende a publicação dos periódicos, sendo havidos por clandestinos os não registados.

4. O registo é público e será organizado por forma a permitir, em cada momento, uma identificação completa e actualizada das inscrições.

5. A inscrição no registo obedecerá a normas regulamentares a estabelecer e só poderá ser recusada com fundamento na lei.

O Sr. Presidente: - Não se encontra na Mesa qualquer proposta de alteração a esta base. Está em discussão.

O Sr. Pinto Balsemão: - Sr. Presidente: Só umas palavras muito curtas. A comissão eventual propôs a eliminação da necessidade de registo para que os jornalistas possam amaciar o exercício das respectivas actividades profissionais.

Atentatório do princípio constitucional da liberdade de escolha de profissão, restrição anticorporativa e inédita em Portugal, o preceito cuja eliminação é proposta levantou graves e justificáveis objecções por parte do Sindicato Nacional dos Jornalistas e de alguns Procuradores à Câmara Corporativa.

Embora tenha sérias dúvidas sobre as vantagens da obrigatoriedade do registo, relativamente a outras entidades por ele abrangidas, nomeadamente os profissionais da imprensa estrangeira, já que a actividade destes está dependente da regulamentação prevista no n.º 1 da base XXXV do texto da comissão eventual, quero desde já congratular-me, e é nesse sentido que votarei a favor

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do texto aprovado, com a decisão da eliminação do preceito em causa pela comissão eventual.

Muito obrigado.

O Sr. Júlio Evangelista: - Sr. Presidente: É para, por meu turno, me congratular com as afirmações que acaba de produzir o Sr. Deputado Pinto Balsemão. Efectivamente, a comissão eventual, por unanimidade, entendeu que devia desonerar os profissionais da imprensa periódica portuguesa da obrigação prévia do registo para o exercício das suas profissões.

Congratulo-me e agradeço ao mesmo tempo a referência do Sr. Deputado Pinto Balsemão, a esta conquista da comissão.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação.

Posta à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à base XVI, em relação à qual há uma proposta de alteração ma Mesa. Vão ser lidas a base XVI e a proposta de alteração.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE XVI

(Direcção e edição dos periódicos)

1. As publicações periódicas editadas por empresas privadas terão um director, livremente escolhido pela entidade proprietária de entre as pessoas que reúnam os requisitos a definir em regulamento.

2. Compete ao director a orientação da publicação, com direito a decidir sobre todo o conteúdo desta, incluindo a publicidade e exceptuadas as inserções obrigatórias; cabe-lhe igualmente representar a empresa pelo que toca a composição, impressão e circulação do periódico, ou em outras matérias relativas às funções do seu cargo.

3. As publicações periódicas conterão obrigatoriamente, em cada um dos seus números, o nome do director, a indicação da entidade proprietária, da sede da respectiva administração e do estabelecimento onde foram compostas e impressas, e a data da impressão.

4. O director poderá ser coadjuvado por directores-adjuntos ou subdirectores, designados pela mesma forma que o director de entre as pessoas que reúnam iguais requisitos.

5. O director da imprensa diária deverá ter residência permanente dentro da comarca em cuja área se situe a sede do periódico.

Proponho que o n.º 1 da base XVI seja substituído por outro, com a seguinte redacção:

1. Nenhum periódico poderá publicar-se sem que tenha um director, que terá de ser jornalista, de nacionalidade portuguesa, no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos, que não desempenhe funções públicas nem exerça actividade privada noutro periódico ou em qualquer ramo da actividade privada que possa afectar a sua independência e liberdade e que não tenha sofrido condenação por crime doloso.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 29 de Julho de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Propomos o aditamento à base XVI dos seguintes números:

6. Junto da direcção existirá um conselho de redacção, com funções consultivas, que o assistirá em todas as matérias da sua competência.

7. O director será designado pela empresa proprietária do jornal e os membros do conselho de redacção eleitos pelos jornalistas que trabalhem no periódico, segundo regulamento por ele aprovado e homologado pelo director.

8. Os chefes de redacção serão designados pelo director, com voto favorável do conselho de redacção.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 29 de Julho de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Pinto Balsemão: - A lei de imprensa, seja qual for o texto definitivo aprovado - embora pareçam claramente definidas as opções desta Câmara -, procura conceder liberdades, mas, em contrapartida, responsabiliza os jornalistas e, sobretudo, os directores dos periódicos. O director passa, ma verdade, a ter de desempenhar um papel que até aqui poderia evitar. Não se trata apenas de dar o nome, mas de dirigir e orientar efectivamente a publicação. Não se trata mais de apresentar a desculpa da censura, ou de com ela negociar, mas de, quotidianamente, oferecer ao julgamento público um produto que não deva ser norteado apenas por ambições pessoais ou comerciais, pois tem de contribuir para o esclarecimento e estímulo da opinião pública e, consequentemente, para o desenvolvimento da comunidade.

Para fazer um jornal é preciso, portanto, e de ora avante, saber de jornais. O director necessita de viver profissionalmente as vinte e quatro horas de um produto que todos os dias é novo, para, no dia seguinte, estar ultrapassado - produto que, pelas suas características próprias, deve revestir-se de um conteúdo que encerre uma mensagem válida e não se circunscreva as preocupações de venda.

Por tudo isto, parece-me indiscutível que na nova lei de imprensa se procure exigir aos directores dos periódicos determinados requisitos ou qualificações que venham garantir as respectivas capacidade e idoneidade. É nesse sentido que propus a substituição do n.º 1 da base XVI por outro em que se condicione o exercício de cargo de director aos seguintes requisitos:

Que seja jornalista ou profissional da imprensa periódica, como agora se diz;

Que tenha a nacionalidade portuguesa;

Que esteja no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos;

Que não desempenhe funções públicas;

Que não exerça actividade privada noutro periódico, ou em qualquer ramo da actividade privada que possa afectar a sua independência e liberdade;

Que mão tenha sofrido condenação por crime doloso.

O texto da comissão eventual remete este assunto para regulamento.

Afigura-se-me, no entanto, que ele tem importância e dignidade suficientes para figurar na lei de imprensa. E não se me venha dizer que se trata de matéria regulamentar, porque, nessa hipótese, seria obrigado a uma vez mais referir os exemplos do direito de resposta, do

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direito de esclarecimento, da constituição das empresas jornalísticas, etc. que contém matéria tanto ou mais regulamentar do que esta.

Compete, em conclusão, à Assembleia decidir se o director das publicações periódicas deve, por lei, preencher determinadas condições ou se será preferível remeter de novo para regulamento, o qual poderá não apontar mais requisitos do que os actuais, ou seja: nenhuns.

Poderá levantar-se ainda o problema da imprensa regional, mas penso que ele está suficientemente acautelado através da redacção da base que a comissão eventual lhe dedicou, ou seja: «a comissão eventual propõe a adaptação de preceitos da lei de imprensa no que respeita à imprensa regional, nomeadamente quanto à direcção dos periódicos».

Um outro aspecto é o do aditamento da base XVI, respeitante à criação dos conselhos de redacção.

A criação de conselhos de redacção, sugerida na proposta de aditamento que subscrevi, relaciona-se, como é óbvio, com o problema candente da participação dos redactores na empresa, de informação. Já houve quem afirmasse: «Pretender que a informação cumpra a sua missão de informar, livre, independente e honestamente, sem lhe proporcionar outras garantias que as próprias de uma estrutura económica puramente capitalista, é o mesmo que tentar fazer voar um pássaro sem asas» (Alfonso Nieto). Se o produto-jornal pode desempenhar - deve desempenhar - um serviço de carácter público, não é vantajoso que numa empresa de imprensa o poder total esteja concentrado nas mãos dos proprietários. É indispensável distinguir entre as atribuições do capital e as da redacção. O redactor ou jornalista (a expressão abrange quantos informam) desempenha uma função duplamente ingrata: tem de informar, de dar forma a uma realidade não material e em constante mutação; é obrigado a criar para os destinatários do seu trabalho um produto que deve traduzir a verdade, o que implica brio moral, sentido da responsabilidade e competência profissional.

Não significa tudo isto que o poder de decisão deva ser definitivamente transferido para a redacção. Significa apenas que ele deve ser partilhado pelos redactores e que não pode permanecer exclusivamente nas mãos dos capitalistas.

A prosperidade económica da empresa de informação é fundamental para a manutenção da sua independência (é o «capitalismo da imprensa», a que se pode contrapor a condenável «imprensa do capitalismo»), e nada prova que sejam os redactores as pessoas mais qualificadas para a assegurar. O princípio de que «quem paga manda» já não se aplica, todavia, a qualquer empresa evoluída. A direcção é conferida ao grupo, cada vez mais numeroso, a que J. K. Galbraith chama a «tecnestrutura», ou seja «a inteligência que guia a empresa». E se a empresa de informação não quer ficar à margem do progresso económico, nem perder a sua independência, não pode excluir os redactores da gestão, pois eles «fazem parte do cérebro da empresa».

O que se pretende com a proposta de aditamento em discussão é apenas uma tímida introdução destes princípios nas empresas jornalísticas portuguesas. O conselho de redacção, segundo a proposta de aditamento, terá funções essencialmente consultivas, com uma única excepção: a possibilidade de vetar a designação fio chefe de redacção feita pelo director, o qual, por sua vez, é nomeado pela empresa proprietária.

Note-se que em Portugal, em pelo menos uma publicação de grande prestígio, o jornal A Bola, ensaiou-se já uma forma mais ousada de participação do pessoal, através da cedência pelo grupo proprietário de cinco quotas a cinco redactores e de uma ao chefe dos serviços administrativos. A experiência tem sido um êxito.

A criação de conselhos de redacção, parece-me, por outro lado, ser um dos meios mais eficientes para contrariar a irreversível tendência para a concentração de empresas jornalísticas, tendência de que tanto se tem falado aqui durante a discussão da lei de imprensa.

Na verdade, se a concentração de empresas é, paradoxalmente, acompanhada da manutenção da pluralidade de publicações, e visto que uma coisa é o estatuto da empresa (o capital) e outra o das publicações (a redacção), o objectivo a alcançar é conseguir que apesar da unificação do estatuto da empresa, seja preservada a independência dia equipa redactorial de cada publicação da mesma empresa. Para tal, o mais eficiente caminho até agora descoberto é o dos conselhos de redacção, tomando a forma de sociedade de redactores, ou outra. A Assembleia, cabe, por conseguinte, decidir se a lei de imprensa de 1971 deverá ou não atribuir aos redactores o papel que efectivamente lhes compete na concepção e produção do fenómeno informativo.

O Sr. Júlio Evangelista: - Sr. Presidente: Procurarei ser o mais breve possível acerca desta matéria. Na base em discussão, a comissão eventual entendeu que deveria eliminar a figura do editor, tal como já tinha acontecido anteriormente. A figura do editor deixou de ter significado real dentro dos jornais e a comissão entendeu, por isso, que deveria ser eliminada. Em contrapartida, consagrou-se, nesta base, a possibilidade legal de existência de directores-adjuntos e subdirectores dos jornais diários.

Estamos, portanto, em presença da base da comissão eventual e de duas propostas de alteração subscritas pelo Sr. Deputado Pinto Balsemão. Sobre elas, direi o seguinte: o Sr. Deputado Pinto Balsemão, ao propor uma alteração ao n.º 1 da base em discussão, diz, ou pretendeu dizer, que não está a inserir no texto da lei matéria regulamentar, que não lhe objectem constituir, matéria regulamentar, essa enumeração longa, numerosa e exaustiva dos requisitos para se poder ser director de um jornal diário.

Quero dizer ao Sr. Deputado Pinto Balsemão que, efectivamente, isto é matéria regulamentar e que ao argumento por ele invocado - «Não me digam que isto é matéria regulamentar, porque então o direito de resposta e o direito de esclarecimento e de rectificação também são matéria regulamentar» - eu objectarei simplesmente com o texto da constituição. O direito de resposta, o direito de rectificação, o direito de esclarecimento, o direito fie inserção de notas oficiosas, decorrem de imperativos constitucionais.

O Sr. Pinto Balsemão: - Dá-me licença?

O Orador: - Tenha a bondade.

O Sr. Pinto Balsemão: - E todos os pormenores relativos à constituição de empresas jornalísticas? Esses não são constitucionais e são regulamentares ...

O Orador: - Desculpe, nós não estamos a discutir os pormenores da constituição fie empresas jornalísticas. Nós estamos a discutir a base que refere a direcção e edição dos periódicos. E neste momento estamos precisamente a discutir o problema, dos requisitos do director ...

O Sr. Pinto Balsemão: - Dá-me licença? É que V. Ex.ª, para refutar que isto seria matéria regulamentar.

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enquanto o direito de resposta não o seria, por ser imposição constitucional, citou apenas o direito de resposta ...

O Orador: - Não, não, não é só o direito de resposta.

Eu leio a V. Ex.ª ... É muito simples: V. Ex.ª tem aí a Constituição?

Faça o favor, é o artigo 8.º, § 2.º, e, mais adiante, o artigo 23.º da Constituição. O artigo 8.º, § 2.º, diz: «Leis especiais regularão o livre exercício da expressão do pensamento»; e, mais adiante: «Ficará assegurado aos cidadãos o direito de fazer inserir gratuitamente a rectificação ou defesa na publicação periódica em que forem injuriados ou difamados, sem prejuízo de qualquer outra responsabilidade ou procedimento.» Há, aqui, um imperativo constitucional, e, por outro lado, digamos, a matéria em questão - do direito de resposta, do direito de esclarecimento - reveste-se de melindre excepcional, é da tradição portuguesa estar inserida na legislação, e, portanto, não se pode argumentar com o direito de resposta, de rectificação e esclarecimento, ou de inserção de notas oficiosas, para se dizer que os requisitos para o director não são, efectivamente, matéria regulamentar.

O Sr. Pinto Balsemão: - Dá-me licença?

Só duas pequenas observações. É que eu, em primeiro lugar, argumentei não apenas com o direito de resposta estar regulamentarmente inserto nesta lei, mas também com todo o problema da constituição das empresas jornalísticas - que também é matéria regulamentar e também está na lei de imprensa ...

O Orador: - Peço desculpa a V. Ex.ª, mas essa não é matéria regulamentar, é lídima matéria das bases gerais, que esta Assembleia tinha de invocar, porque a constituição das empresas insere-se nas garantias da liberdade de imprensa. (Base IX, já aprovada, e bases XXVI e XXVII, a discutir.) Se não fixarmos o regime de constituição das empresas e não estabelecermos todo aquele enunciado, sobre capital, direcção, administração, etc., evitamos um elemento necessário à garantia da liberdade de imprensa e à conciliação entre os «direitos individuais e o interesse público» decorrente da Constituição e já por nós consagrado na base IX.

Compreende V. Ex.ª a nuance em que nós divergimos ...

O Sr. Pinto Balsemão: - Compreendo perfeitamente. Mas eu, por um lado, entendo que as qualificações do director também são uma garantia de liberdade de imprensa, e, por outro lado, recorrendo ao argumento de V. Ex.ª do imperativo constitucional, chamo a atenção para o mesmo artigo 23.º, em que se diz que: «lei especial regulará os direitos e os deveres, quer das empresas, quer dos profissionais do jornalismo». Portanto, se a lei especial, que julgo ser esta - a lei de imprensa, que estamos a discutir -, definirá os direitos e os deveres dos profissionais, visto que o director é um profissional, não há razão para na lei de imprensa não ...

O Orador: - Mas, perdão, nós não estamos a falar em direitos e deveres, Sr. Deputado Pinto Balsemão, estamos a falar em requisitos.

V. Ex.ª compreende que a expressão «direitos e deveres», dentro da economia desta lei, tem um sentido; «requisitos» é coisa distinta e regulamentar. De outra maneira mão nos entendemos, porque divergimos até no próprio sentido das palavras ...

O Sr. Presidente: - Peço a VV. Ex.ªs o favor de não perderem o vosso tempo na discussão do cabimento da matéria regulamentar, porque é de há muito tempo líquido que o facto de ser mais pormenorizado do que exigiria o carácter essencial da base do regime jurídico não retira constitucionalidade a um preceito de lei.

Portanto, parece-me ocioso e, talvez, fora da ordem levantar uma discussão longa sobre o cabimento de quaisquer disposições submetidas à Assembleia com o argumento de que são regulamentares.

O Orador: - V. Ex.ª relevar-me-á porque, estando no uso da palavra, nada mais fiz que responder a uma objecção antes levantada pelo Sr. Deputado Pinto Balsemão.

E isso que eu peço a V. Ex.ª me releve.

Mas continuando, Sr. Presidente, no desenvolvimento das minhas considerações. A comissão entendeu que não deveria deixar enumerados no texto da base em discussão os requisitos exigidos para se ser director de um jornal, mas remeteu-os para a lei regulamentar.

Por outro lado, e mudando de agulha. Acho aliciante, Sr. Presidente, toda a doutrina que o Sr. Deputado Pinto Balsemão expôs sobre os aditamentos a esta base. Doutrina aliciante, mas que reputo de momento impraticável entre nós. Nada impede, aliás, os directores de constituírem conselhos de redacção, e já neste momento existe, que eu saiba, pelo menos, um exemplo no nosso país. Mas a iniciativa foi do director.

Concordamos todos com a defesa da liberdade de imprensa, mas também há que salvaguardar a liberdade dos directores, aos quais nesta lei impomos obrigações, incriminações e responsabilidades demasiado pesadas.

Por outro lado, nada obsta a que se criem conselhos de redacção, só não é necessário que decorram de uma imperativa cominação legal. Tenho aqui presente, aliás, um número da revista Esprit, de Fevereiro de 1971, em que se refere precisamente a criação do conselho de redacção do jornal Le Monde e donde ressalta com toda a clareza que surgiu de um acordo entre o director e os seus redactores, com uma competência puramente consultiva sobre problemas que «digam respeito aos redactores» (p. 364, «Lê capitalisme de presse en question»). Não surgiu este conselho de redacção de nenhuma imposição legal, mas sim da própria vida vivida dentro do jornal.

O Sr. Montalvão Machado: - Suponho que uma vez, mais haverá que dizer duas palavras apenas mo intuito de indispensável clareza.

Como o Sr. Presidente dizia há pouco, não há nada no domínio das coisas jurídicas que permita distinguir aquilo que é propriamente lei daquilo que é regulamentar, no exacto paralelismo de que não há nada que permita distinguir aquilo que é essencialmente constitucional daquilo que é simplesmente legal.

Quando se insere num texto constitucional uma disposição que não é propriamente de direito político, quer-se dar solenidade constitucional a esse princípio ou a essa norma. Inserir no texto da lei, em exacto paralelismo, determinada disposição que pode acoimar-se de regulamentar quer dar-se a essa norma a solenidade daquilo que é propriamente legal. E nesta Casa demasiadas vezes se tem abdicado em favor de eventual regulamento, com prejuízo manifestado daquilo que devia ter a solenidade e a segurança da própria lei.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - E nesse sentido e com esta economia simples e transparente que se pronuncia o Sr. Deputado Pinto Balsemão quando apresenta as suas propostas, por estas razões que, insisto, são claras e transparentes, não será demasiado cuidado desta Assembleia ao querer na lei aquilo que deve ter a solenidade e a segurança da lei, sem que se deixe para a subalternidade e a eventualidade de mero regulamento.

Votarei as propostas.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação.

O Sr. Roboredo e Silva: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, a palavra o Sr. Deputado Roboredo e Silva.

O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Confesso que esta proposta de aditamento do Sr. Deputado Pinto Balsemão, nomeadamente o seu primeiro número, o n.º 6, agrada-me extraordinariamente e agradava-me mais ainda se, em vez de ter escrito «taxativamente junto da direcção existirá ...», estivesse escrito: «junto da direcção poderá existir um conselho de redacção com funções consultivas que o assistirá em todas as matérias da sua competência».

Penso que, realmente, este número a acrescentar à nossa base tinha relevo, tinha projecção social. Afigura-se-me que ficava bem à Assembleia incluir este número na base. Quanto aos dois outros números, confesso, já para mim não tem o mesmo interesse nem lhes dou a mesma importância. Mas a este primeiro n.º 6, se não fosse uma coisa rigorosamente taxativa, como aqui está, e intercalando a palavra «poderá», dava-lhe o meu voto.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação.

Ponho primeiramente à votação a proposta de emenda ao n.º 1 da base XIV, subscrita pelo Sr. Deputado Pinto Balsemão.

Submetida à votação, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Ponho seguidamente à votação a base XVI da lei de imprensa, segundo o texto adoptado pela Assembleia Nacional, para orientação dos seus debates e que é preconizado pelos Srs. Deputados Ulisses Cortês e outros.

Submetida à aprovação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Ponho agora à votação a proposta de aditamento de três números novos, 6, 7 e 8, a acrescentar ao texto já votado da base XVI, proposta esta subscrita pelo Sr. Deputado Pinto Balsemão.

Submetida à votação, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, razões óbvias aconselham a aproveitar o melhor «possível o tempo; por isso, ainda submeterei a VV. Ex.ªs, nesta sessão, a base XVII, em relação à qual não temos na Mesa qualquer proposta de alterações e que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

BASE XVII

(Edição da imprensa não periódica)

1. Toda a imprensa não periódica, salvo quando expressamente exceptuada na lei, terá um editor responsável pela publicação.

2. Nenhuma publicação que deva ter editor poderá ser posta à venda ou por qualquer outra forma posta a circular sem indicação do nome daquele, do estabelecimento onde foi composta e impressa e da data em que se fez ou concluiu a impressão.

3. Quando a edição for efectuada por uma empresa editorial ou directamente por estabelecimento tipográfico, ou quando se trate de imprensa oficial ou oficiosa publicada por pessoa colectiva de direito público ou entidade equiparada, o nome do editor pode ser substituído, respectivamente, pela denominação da empresa ou nome do estabelecimento ou pela designação oficial do serviço encarregado da edição.

4. No caso de a edição ser mandada executar pelo autor da publicação sem intervenção de um editor devidamente registado, deverá sempre indicar-se, no local onde habitualmente se insere a designação do editor, que se trata de edição do autor.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da .palavra sobre esta base, passaremos à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou encerrar a sessão. Por desdobramento teremos nova sessão esta noite às 22 horas. Claro, a sessão da noite terá a mesma ordem do dia, continuação da discussão da especialidade e votação da lei de imprensa.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Álvaro Filipe Barreto de Lara.
António Júlio dos Santos Almeida.
Fernando David Laima.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
Henrique dos Soutos Tenreiro.
João Manuel Alves.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
José Dias de Araújo Correia.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alexandre José Linhares Furtado.
Armando Valfredo Pires.

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Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Carlos Eugénio Magro Ivo.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Henrique Veiga de Macedo.
João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Jorge Augusto Correia.
José da Costa Oliveira.
José Guilherme de Melo e Castro.
José de Mira Nunes Mexia.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel Valente Sanches.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Rafael Valadão dos Santos.

O REDACTOR - Januário Pinto.

Propostas enviadas para a Mesa durante a sessão:

Propostas de alteração

Propomos que a base XIII seja substituída por outra, com a seguinte redacção:
O uso da imprensa, com os fins indicados na presente lei, terá apenas como limites os ecorrentes dos seus preceitos e os que a lei geral impõe aos actos das pessoas e ainda a não divulgação de informações que respeitem a matérias classificadas de muito secreto, secreto ou confidencial ou que, embora sem esse carácter, possam prejudicar os interesses do Estado, se existirem normas do Governo determinando reserva.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Agosto de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Propomos que à base XX seja aditado um n.º 4, com a seguinte redacção:

Requerida a notificação judicial do director do periódico que não tenha dado satisfação ao direito de resposta, será o mesmo notificado por via postal, para contestar no prazo de dois dias, após o que será proferida em igual prazo a decisão, da qual não haverá recurso; só será admitida prova documental, sendo todos os documentos juntos com o requerimento inicial e com a contestação.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Agosto de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Propomos que no n.º 4 da base XXII a expressão: «até três dias antes daquele em que seja posta a circular», seja substituída por: «no próprio dia em que seja posta a circular».

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Agosto de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Propomos que à alínea a) do n.º 1 da base XXVI seja acrescentado o seguinte:

... e, nas sociedades que empreendam predominantemente publicações de natureza jornalística, ser esse o respectivo fim estatutário, o qual só poderá ser acumulado com a edição de publicações não periódicas.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Agosto de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Propomos que no n.º 2 da base XXX, a seguir a: «os redactores especialmente responsáveis», seja acrescentado: «cujos nomes nelas figurem permanentemente».

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Agosto de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Propomos que no n.º 3 dá base XXX, a seguir a: «os respectivos redactores, que sejam especialmente responsáveis», seja acrescentado, «cujos nomes nelas figurem permanentemente» .

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Agosto de 1971. - O- Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Proposta de aditamento

Propomos o aditamento de uma base, com o n.º XXXI, com a seguinte redacção:

1. A responsabilidade civil será exigível dos responsáveis nos termos da presente lei.

2. As empresas jornalísticas, editoriais e noticiosas serão sempre solidariamente responsáveis pela reparação do dano.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Agosto de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Proposta de eliminação

Propomos a eliminação da base XXXI.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Agosto de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Proposta de alteração

Propomos que o n.º 1 da base XXXII passe a ter a seguinte redacção:

1. Às empresas jornalísticas, editoriais ou noticiosas, através de cujas publicações ou notícias tenham sido cometidos delitos, ou que tenham infringido as

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4 DE AGOSTO DE 1971 2735

disposições desta lei, poderão os tribunais que os julgarem aplicar multas até 500 000$, sendo a sentença respectiva susceptível de recurso até ao Supremo Tribunal de Justiça.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Agosto de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Proposta de eliminação

Propomos a eliminação do n.º 4 da base XXXIII.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Agosto de 1971. - Os Deputados: Francisco José Pereira Pinto Balsemão - Ulisses Crua de Aguiar Cortês - Francisco Correia das Neves - Alberto Maria Ribeiro de Meireles - Gustavo Neto Miranda.

Propostas de alteração

Propomos que a base XXXVI seja substituída por outra, com a seguinte redacção:

Às empresas jornalísticas, editoriais e noticiosas através de cujas publicações ou notícias tenham sido cometidos delitos ou que tenham infringido as disposições desta lei, poderão os tribunais que as julgarem, atendendo à gravidade ou frequência das infracções, aplicar sanções de suspensão até um ano,
sendo a sentença respectiva susceptível de recurso até ao Supremo Tribunal de Justiça.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Agosto de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

Propomos que a base XXXVII seja substituída por outra, com a seguinte redacção:

1. A medida de interdição do exercício da profissão, até um ano, pode ser imposta pelos tribunais competentes aos directores e redactores dos periódicos e aos editores da imprensa não periódica, quando o crime cometido revele grave violação dos deveres inerentes a profissão e for fundadamente de recear, pela personalidade do agente ou por manifesto desprezo pelos limites estabelecidos nesta lei para a liberdade de imprensa, que outros crimes graves ponham directa ou indirectamente em perigo o Estado ou as pessoas.

2. Constituem índices especialmente reveladores da perigosidade uma condenação a pena maior ou três condenações por crimes dolosos cometidos pela imprensa.

3. Da sentença que determinar a interdição do exercício da profissão caberá sempre recurso até ao Supremo Tribunal de Justiça.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Agosto de 1971. - O Deputado, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.

IMPRENSA NACIONAL

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