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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES

N.° 231 ANO DE 1973 28 DE FEVEREIRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

X LEGISLATURA

SESSÃO N.° 231, EM 27 DE FEVEREIRO

Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Exmos. Srs.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Amílcar da Costa Pereira Mesquita

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 55 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o n.°228 do Diário das Sessões.
Deu-se conta do expediente.
Para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, foram presentes à Assembleia os Decretos-Leis n.º 54/73, 55/73, 56/73, 58/73, 59/73, 60/73, 62/73, 65/73 e 67/73.
Foram lidas notas de perguntas formuladas pelos Srs. Deputados Moura Ramos e Sousa Pedro.
Foram lidas uma nota de perguntas formulada pelo Sr. Deputado Correia das Neves e a respectiva resposta e ainda uma resposta a uma nota de perguntas formulada pelo Sr. Deputado Ávila de Azevedo, já lida anteriormente.
Foram entregues elementos requeridos pelo Sr. Deputado Leal de Oliveira.
O Sr. Deputado Vaz Pinto Alves teceu algumas considerações a propósito da audiência que o Sr. Ministro das Obras Públicas concedeu aos presidentes das Câmaras do distrito de Viseu e da região do Vouga, acompanhados pelos governadores civis de Aveiro e Viseu e Deputados pelos dois círculos.
O Sr. Deputado Fausto Montenegro agradeceu ao Sr. Ministro das Obras Públicas ter deferido a solicitação que lhe foi feita no sentido de ser construída uma estrada que ligasse os distritos de Aveiro e Viseu.
O Sr. Deputado Eleutério de Aguiar teceu algumas considerações acerca de problemas respeitantes ao arquipélago da Madeira e medidas governamentais.
O Sr. Deputado Alberto de Alarcão analisou a formação Profissional agrária como uma experiência piloto em horto-fruticultura e jardinagem.

Ordem do dia. - Continuou a discussão na generalidade da Proposta sobre agrupamentos complementares de empresas. Usaram da palavra os Srs. Deputados Moura Ramos e Almeida e Sousa.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 50 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Lopes Quadrado.
Armando Valfredo Pires.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Domingues Correia.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando de Sá Viana Rebelo.

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Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João José Ferreira Forte.
João Lopes da Cruz.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Coelho de Almeida Cotta.
José Maria de Castro Salazar.
José dos Santos Bessa.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Júlio Dias das Neves.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luís António de Oliveira Ramos.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Valente Sanches.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Nicolau Martins Nunes.
Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baessa.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Rafael Valadão dos Santos.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
Rui de Moura Ramos.
Teodoro de Sousa Pedro.
Teófilo Lopes Frazão.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 66 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 55 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o n.° 228 do Diário das Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Exas. tem
qualquer rectificação a apresentar a este número do Diário das Sessões, considerá-lo-ei aprovado.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Está aprovado.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Da Liga dos Amigos do Torrão de saudação ao Sr. Presidente e de congratulação com a intervenção do Sr. Deputado Peres Claro.
Dos Srs. Custódio Carvalho Sofia Serrinha, Eduardo Carvalho, José Baptista Rosa Penedo, Manuel Coelho, Manuel Madaleno, Gustavo Stero Maria Baptista, Alberto Baptista, Eduardo Nunes, António Conceição Ismael Vieirinha, António Palma Aires Mendonça, José Alves, Carlos Delgado, Sra. D. Maria Rosa Delgado, Sra. D. Inês Figueira, D. Maria Ernestina Baptista, D. Maria Custódia Guerreiro, José Coelho Alegre, António Fonseca Pinheiro, Manuel Machado, José Peres Santos, Manuel Figueira, António Mira, António Canhau, Jaime Charrua, Manuel Serra, José Calado, Joaquim Marques, João Augusto dos Santos, José Nunes, Ildefonso Moreira, José Madaleno, Joaquim Carneiro, José Mendes Palma e António Mira Santos, de apoio e aplauso às intervenções dos Srs. Deputados Peres Claro e Leal de Oliveira sobre o regadio e construção da barragem das Barras.

Cartas

Do Sr. Edmundo de Sousa Gomes a propósito do alargamento do esquema da Previdência aos empregados domésticos, lembrando as dificuldades dos pequenos empresários artesanais.

O Sr. Presidente: - Para cumprimento do disposto no § 3.° do artigo 109.9 da Constituição, estão na Mesa, enviados pela Presidência do Conselho, os Diários do Governo, 1.ª série, n.ºs 46, 47 e 48, de 23, 24 e 26 do corrente mês, inserindo os seguintes Decretos-Leis:
N.° 54/73, que permite que o pessoal permanente privativo da Força Aérea seja transferido de quadro quando se verifique perda não convenientemente recuperável de aptidão física ou psíquica de que resulte perda de aptidão técnica;
N.° 55/73, que altera a redacção das observações 4.ª e 7.ª à subsecção II da secção I do capítulo IV da tabela de taxas aprovada pelo Decreto-Lei n.° 49 438, de 11 de Dezembro de 1969;
N.° 56/73, que define as normas a observar pelas câmaras municipais, no uso de competência que lhes é atribuída, para a fixação dos períodos de abertura e encerramento dos estabelecimentos de venda ao público, incluindo os supermercados e hipermercados;
N.° 58/73, que dá nova redacção aos artigos 1.° e 2.° do Decreto-Lei n.° 43 400, de 15 de Dezembro de 1960, e ao artigo 72.° das instruções preliminares da Pauta de Importação;
N.° 59/73, que cria o segundo cargo de auditor junto do Tribunal Militar da Marinha;
N.° 60/73, que introduz alterações no sistema de fixação das lotações das embarcações mercantes registadas nos portos metropolitanos;
N.° 62/73, que esclarece dúvidas suscitadas fia interpretação do Decreto-Lei n.° 49 410, de 24

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de Novembro de 1969, na parte relativa à admissão de servidores em categorias a respeito das quais esteja legalmente prevista mais de uma forma de provimento;
N.° 65/73, que fixa os efectivos dos postos de capitães-de-mar-e-guerra e de capitães-de-fragata do quadro do activo dos oficiais da Armada de determinadas classes; e
N.° 67/73, que extingue os postos escolares do ensino primário, substituindo-os por escolas primárias.

Pausa.

Vai proceder-se à leitura de três notas de perguntes formuladas, respectivamente, pelos Srs. Deputados Moura Ramos, Sousa Pedro e Correia das Neves, bem como das respostas até agora recebidas do Governo e referentes às notas de perguntas formuladas pelos Srs. Deputados Correia das Neves, que agora vai ser lida, e Ávila de Azevedo, essa lida na sessão de 6 do corrente mês. Devo acrescentar que a resposta à nota de perguntas formuladas pelo Sr. Deputado Ávila de Azevedo vem acompanhada de extensa documentação que será transmitida directamente ao Sr. Deputado interessado.

Foram lidas. São as seguintes:

Nota de perguntas formulada pelo Sr. Deputado Moura Ramos.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais, pergunto ao Governo:
a) A que resultados levaram os trabalhos realizados, através de aparelhagem para o efeito adquirida, com o fim de investigar o grau de poluição do meio atmosférico lisboeta? Essa cintura industrial que envolve a cidade - zonas do Barreiro, Seixal, Setúbal, Azeitão, Alhandra, etc. - já foi feita idêntica investigação? Em caso afirmativo, quais os resultados? Em caso negativo, por que se não fez: por ser tão evidente a poluição dessas zonas que não careça de confirmação dada pela aparelhagem científica?
b) Pensasse estender esses trabalhos de investigação a zonas consideradas mais industrializadas? E estão nessas previstas as zonas de Maceira-Lis e Pataias, ambas no distrito de Leiria, tão contaminadas pelas poeiras de cimento das fábricas ali existentes? E para quando tal trabalho?
c) Para quando a publicação da legislação adequada impondo vigilância das instalações poluidoras e de outros agentes da poluição como o automóvel (poluidez da atmosfera pelos gases e fumos que lança e pelo barulho que faz através daquilo que já se chama a contestação do e pelo claxon tão denunciadora de indisciplina e falta de civismo) e a obrigatoriedade da existência de dispositivos contra a poluição e da sua manutenção em bom estado de funcionamento?
d) E para quando a adopção de sanções para os proprietários de fábricas e de automóveis que desrespeitam os regulamentos antipoluição, à semelhança do que já se pratica em Espanha?
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 14 de Fevereiro de 1973. - O Deputado, Rui de Moura Ramos.

Nota de perguntas formuladas pelo Sr. Deputado Sousa Pedro.

Pergunto ao Governo, nos termos constitucionais, quais as medidas que estão a ser consideradas com o fim de garantir qualificada assistência otorrinolaringológica aos 160 000 habitantes do distrito de Ponta Delgada, enquanto estiver ausente, por impedimento militar, o seu único especialista.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 14 de Fevereiro de 1973. - O Deputado, Teodoro de Sousa Pedro.

Nota de perguntas formulada pelo Sr. Deputado Correia das Neves.

Conhecida, como é, a sobrecarga de serviço que impende nos tribunais das relações, em especial no de Lisboa, e circulando murmúrios sobre um possível e eventual desdobramento dos actuais, pergunto ao Governo me informe se o problema está a ser estudado ou se pensa vir a fazê-lo em breve, e, em caso afirmativo, se o Governo projecta a instalação de um tribunal de relação na região sul da metrópole, designadamente no Alentejo.
O Deputado, Francisco Correia das Neves.

Resposta à nota de perguntas apresentada pelo Sr. Deputado Francisco Correia das Neves na sessão de 15 de Fevereiro de 1973, enviada pelo Ministério da Justiça.

O Governo tem perfeita consciência da "sobrecarga de serviço que impende nos tribunais das relações, em especial no de Lisboa", conforme o Sr. Deputado sublinha. Os problemas daí decorrentes estão sendo objecto de estudo no Ministério da Justiça, mas nenhuma decisão se pôde ainda fundadamente tomar sobre eles.
Ministério da Justiça, 22 de Fevereiro de 1973. - O Ministro da Justiça, Mário Júlio Brito de Almeida Costa.

Resposta à nota de perguntas apresentada pelo Sr. Deputado Rafael Ávila de Azevedo na sessão de 24 de Janeiro de 1973, enviada pela Presidência do Conselho.

Em cumprimento de determinação de S. Exa. o Presidente do Conselho, tenho a honra de junto remeter a V. Exa. os elementos recebidos da Secretaria de Estado da Informação e Turismo

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destinados a responder à nota de perguntas apresentada pelo Sr. Deputado Rafael Ávila de Azevedo na sessão de 24 de Janeiro último.
Informo ainda V. Exa. de que, através do respectivo ofício de remessa, aquela Secretaria de Estado, após a discriminação dos documentos que constituem os elementos de resposta acima referidos, presta sobre o assunto mais os seguintes esclarecimentos:
Por todos estes documentos se vê que desde 1961 vem sendo negado ao Rádio Clube de Angra autorização para o aumento de potência do seu emissor.
Considerando a necessidade de resolver este e outros problemas idênticos, na resolução dos quais pesavam até há pouco, apenas, razões de ordem técnica e nenhumas de ordem política, o Decreto-Lei n.° 49 272, de 27 de Setembro de 1969, veio, no seu artigo 10.° (e no seguimento da orientação traçada pelos artigos 1.° e 12.° a 14.° do Decreto-Lei n.° 48 686, de 15 de Novembro de 1968), traçar em moldes diversos a competência do departamento governamental responsável pela radiodifusão em Portugal.
Esclarecidas mais recentemente algumas dúvidas suscitadas pela redacção do preceito referido, foi agora elaborada a agenda do próximo Conselho Nacional de Radiodifusão, que vai ser convocado para o próximo mês de Março. Nessa agenda está inscrita a apreciação deste e de outros pedidos.

A bem da Nação.

O Secretário-Geral, Diogo de Paiva Brandão.

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa, enviados pela Presidência do Conselho, os elementos fornecidos pelo Ministério das Comunicações destinados a satisfazer o requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Leal de Oliveira na sessão de 21 de Novembro do ano findo. Vão ser comunicados ao Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vaz Pinto Alves.

O Sr. Vaz Pinto Alves: - Sr. Presidente: É facto sabido que qualquer objectivo, na linha do progresso do País, exige hoje, na verdade, rápido desenvolvimento. Para tanto, é indispensável ter bons programas de acção e trabalho e os meios necessários para os realizar. Mas, além disso, são precisos também homens capazes de dirigir, organizar, planear e construir. Homens, em suma, que saibam ocupar e identificar, no serviço, a actividade que desenvolvem em prol do bem-estar e do progresso harmónico da Nação, auscultando as aspirações das populações, definindo critérios de acção e prioridades, na perspectiva de um futuro que enquadre um programa de desenvolvimento que leve às várias parcelas do País melhores oportunidades de vida e de prosperidade.
Na verdade, não pode, efectivamente, considerar-se aceitável que o desenvolvimento económico e social se continue a concentrar, predominantemente, se não quase em exclusivo, nas regiões de Lisboa e Porto e nas zonas confinantes de influência. Numa política do bem-estar das populações é mister que as "assimetrias regionais" sejam corrigidas por forma que se atinja um maior equilíbrio no conjunto do todo nacional. O Governo, na verdade, tem realizado um grande esforço para que o desenvolvimento se processe aceleradamente, lançando obras e projectando planos que ficam a marcar uma época de crescimento económico e social na nossa vida contemporânea e a atestar a capacidade realizadora dos responsáveis pela acção governativa. Ora, uma das alavancas do progresso são bons meios e serviços de comunicações, sem os quais os povos não prosperam ou só prosperam lenta e dificilmente. Atrevo-me até a adiantar que as vias de comunicação são uma das mais poderosas alavancas para a prosperidade económica e social dos povos. Destas destacam-se as rodovias, como meios de comunicação entre as várias regiões e circulação de bens e produtos. São as veias do desenvolvimento, verdadeiro sistema cárdio-vascular de um país, como muito bem já ouvi dizer. Os povos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, sentem essas necessidades prementes de aproximação entre si. E um competente apetrechamento rodoviário vem permitir a ligação das várias parcelas da região e facilitar uma rápida circulação de bens económicos; em suma, propiciar um estímulo ao desenvolvimento regional, nos aspectos que este pode comportar, desde as actividades industriais e agrícolas até às potencialidades turísticas. Estamos, de facto, a viver uma decisiva hora de viragem para os horizontes do provir, através da abertura de estradas e lançamento de projectos de rodovias a que o Governo meteu ombros com decidida acção e eficácia. Porque, efectivamente, as comunicações no País são um ponto nevrálgico para a promoção económica e social das populações, tive já o ensejo de, nesta Câmara, procurando interpretar o profundo sentir dos povos que me conferiram o mandato de assento nesta Casa, tecer algumas considerações sobre o apetrechamento rodoviário do distrito de Viseu e as suas ligações com outras zonas importantes do País, frisando os contrastes entre regiões mais privilegiadas e regiões menos favorecidas. Referi-me então às rodovias n.ºs 2 e 16 de capital importância para a economia de uma vasta região que corta Viseu nos planos horizontal e transversal e ainda à abertura da estrada n.° 326, a ligar S. Pedro do Sul a Arouca.
Fiz então um apelo ao Sr. Ministro Rui Sanches, ilustre governante, honrem de acção, muito atento aos problemas que mais afligem as populações e procurando sempre, na medida dos recursos do erário nacional, dar rápida satisfação ao que no seu alto critério considera prioritário cm de justiça imediata.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É que, assim como os grandes centros atraem as pessoas, também atraem os capitais e os consequentes equipamentos. Torna-se, por isso, necessário criar as condições apropriadas para uma relativa homogeneidade no desenvolvimento do País, criando novos pólos de promoção social e económica para, vencida a necessidade da emigração, as populações encontrem no espaço português condignas condições de vida e de participação activa.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - Com efeito, uma ligação directa e rápida do interior ao litoral do porto de Aveiro - que patenteia uma posição significativa no conjunto dos actos comerciais e mercantis do País - é de decisiva importância para o desenvolvimento de uma grande parte de todo este hinterland que se desenrola desde a fronteira até ao mar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas, além desta importante via, havia ainda uma outra aspiração dos povos de S. Pedro do Sul e de Arouca: a estrada nacional n.° 326, que rasgará a Gralheira, ligando os dois concelhos, possibilitando uma variante para o Porto e Norte do País. Velha aspiração dos povos dos dois concelhos, várias vezes, através dos seus qualificados representantes administrativos e políticos, exposta ao Governo como elemento propulsor do desenvolvimento de uma zona interior, rica em belezas paisagísticas e potencialidades agro-pecuárias e florestais.
Sr. Presidente: Vêm estas ligeiras considerações a propósito da audiência que o Sr. Ministro das Obras Públicas e Comunicações concedeu aos presidentes das câmaras de Viseu e da região do Vouga, acompanhados pelos Srs. Governadores Civis de Aveiro e Viseu e dos Deputados pelos dois círculos. O Sr. Ministro, como sempre, foi de uma clareza meridiana ao abordar a problemática das comunicações, frente às pretensões que lhe foram expostas pela comissão que se dignou receber.
Com a objectividade que todos lhe conhecemos, teceu considerações sobre os planos a levar a efeito e traçou a política das ligações rodoviárias que interessam aos dois distritos, nos termos já conhecidos através da imprensa, que lhe deu o devido e merecido relevo: a nova estrada Aveiro-Viseu e a ligação de S. Pedro do Sul a Arouca. Pois, Sr. Presidente, não posso deixar de salientar o empenhamento das autoridades administrativas dos dois distritos nas diligências a que se não furtaram para a concretização de tão importante empreendimento - com o apreço que é devido a bem dos povos que servem. Ao Sr. Ministro das Obras Públicas e Comunicações, consagrado estadista, de cujo dinamismo, na acção e preocupação de vencer com realismo e celeridade os imensos trabalhos que lhe estão confiados, muito há a esperar, queremos manifestar o nosso vivo reconhecimento e o do bom povo que represento, cheio de virtudes, que sente e é grato, quando da aliança entre governantes c governados resultam oportunidades de dar satisfação às aspirações da colectividade em que se encontram inseridos interesses fundamentais.

Vozes: - Muito bem! Muito bem!

O Orador: - Honra, pois, ao Ministro Rui Sanches, que relevará focar, ainda, um outro ponto. Consiste numa nota que julgo de grande interesse e oportunidade para o desenvolvimento e a promoção sócio - do planalto central. Trata-se das ligações entre a Guarda, Viseu e Coimbra.

O Sr. Santos Bessa: - Muito bem!

O Orador: - Beneficiando progressivos concelhos destes distritos, e que constituem no seu conjunto uma promissora região com possibilidades e equipamentos
capazes de proporcionar condições de acolhimento e enquadramento às populações e às actividades mais adequadas à economia e ao desenvolvimento dessa região.
É mais este anseio, que tenho auscultado junto das populações deste planalto central e de Viseu, que aqui deixo à alta e generosa compreensão do Sr. Ministro das Obras Públicas.
Mas, Sr. Presidente, não posso dar por findas estas palavras sem um testemunho que é o do inegável e irrefragável esforço que o Governo da chefia do Prof. Marcelo Caetano tem feito em prol do bem-estar do povo português.

O Sr. Albino dos Reis: - Muito bem!

O Orador: - Marcelo Caetano diz-nos, pelo seu exemplo, que há que continuar a trabalhar sem descanso; pois sigamos o abalizado conselho de quem com denodo e decididas acções, sempre retemperado pelo apoio do povo, se tem dado inteiramente ao serviço da causa nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Fausto Montenegro: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Como devia, fiz parte da representação dos distritos de Aveiro e Viseu que no passado dia 22 foi ao Sr. Ministro das Obras Públicas solicitar uma estrada funcional que ligasse os dois distritos pelo vale do Vouga, de Albergaria a S. Pedro do Sul, substituindo a existente, de há muito ultrapassada e a fomentar prejuízos de vária ordem.
Apresentada uma breve mas convincente exposição, que fundamentava o pedido, teve logo como resposta do Ministro o imediato deferimento, acompanhado de uma lúcida exposição dos problemas relacionados com o sector das estradas no País.
Este facto já todos os órgãos de informação o divulgaram, bem como o montante da obra - 300 mil contos - e o prazo imediato da sua construção, acentuando o seu real valor para o desenvolvimento não só dos dois distritos, mas também dos da Guarda e Vila Real pelo intercâmbio comercial e turístico que vai intensificar entre eles.
Muito particularmente a bacia do Douro tem contactos comerciais permanentes com Aveiro, e as estradas que as ligam são a nacional n.° 2 e a que estamos a referir.
É, pois, um empreendimento de alto valor nacional, vindo este anseio de longa data, pelo que, com ampla justificação, e dado não poder aguardar por mais tempo uma solução condigna, se impunha a sua imediata concretização.
Demais, o traçado fora feito para tracção animal, e não para o tráfego actual, que é denso, das pesadas viaturas, como muito bem o reconheceu o Ministro.
Graças ao bem esclarecido e sério programa do Ministério das Obras Públicas pôde o seu muito ilustre titular deferir em bases objectivas e imediatas, pelo que se lhe fica a dever esta feliz e utilíssima realização - considerada desde há muito como mera miragem ilusória.
Se se disputam realizações primárias, não se atrofiam ruem se combatem os legítimos anseios de outras terras e regiões.

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Para estas há também que pedir os justos direitos, de forma que os utentes escolham livremente, e segundo as tendências económicas, geográficas e até sociais, o que melhor convenha ao desenvolvimento da sua economia.
E o País será tanto mais rico quanto melhores e mais vias de comunicação tiver, facilitando assim um melhor intercâmbio.
Bem avisados foram os dinâmicos governadores civis de Aveiro e Viseu ao solicitarem e apoiarem esta representação ao titular das Obras Públicas, com os evidentes resultados que são para os dois distritos e para todo o País.
Este exemplo devia ser seguido pelos seus colegas do Porto e da Guarda, associados ao de Viseu, solicitando, para interesse comum, a estrada marginal do Douro, desde Barca de Alva a Gaia, o que proporcionaria a estes distritos uma permuta comercial e turística de relevante significado.
Para quando uma estrada funcional e moderna que ligue aquelas terras do interior com o Porto, casa-mãe do convívio comercial e afectivo?
Já que várias vezes lancei este apelo, atrevo-me a pedir aos ilustres colegas desses distritos que se interessem pela sua realização.
Se assim for, poderei ficar com a esperança de ser uma realidade.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Não se limitou o Sr. Ministro a atender o pedido que lhe era feito.
Por sua livre decisão, anunciou que outros lanços de estradas nacionais iriam ser construídos muito em breve nos dois distritos.
Inumerou primeiro os de Aveiro, e depois, ao referir-se propriamente aos do distrito de Viseu, começou por lembrar as intervenções por mim feitas neste sector, satisfazendo algumas das minhas petições.
Longe estava eu de pensar, ao ir àquela decisiva e histórica reunião, que os anseios das populações, que aqui represento, seriam naquele dia largamente contemplados, e até que outras soluções estão iminentes.
Este facto vem acrescentar maiores razões ao justo conceito de que goza o Ministro Rui Sanches em bem cumprir a sua missão governativa, que não é só a de cumprir os deveres com zelo, mas a de sentir as necessidades e os anseios das populações, dando-lhes, no momento oportuno, uma afectuosa boa nova.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Se tenho o dever de evidenciar com sinceridade e isenção as carências do meu distrito, também tenho o mesmo dever de agradecer, em seu nome e no meu próprio, as soluções anunciadas para as eliminar.
Por isso, em mim está a ideia - e espero que igualmente todos os intervenientes na referida audiência o reconheçam - de só vir aqui agradecer o que pela minha parte tenho o dever de agradecer, e nunca vir arvorar-me em exclusivo paladino de uma causa.
A gratidão dos povos beneficiados é sempre expressa e esta virtude ainda é cultivada sem que ceda lugar à lisonja, sempre detestada pelos que cumprem o dever com dignidade.
E como sempre temos lembrado com isenção e bons propósitos as carências regionais, assiste-nos o dever de também aqui deixarmos o nosso maior reconhecimento.
Continua o Ministério das Obras Públicas, como numa anterior intervenção o disse, a ir na vanguarda dos estudos do planeamento nacional para solucionar carências regionais ou nacionais, sem se perturbar com simpatias ou interesses secundários.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Para o Ministro das Obras Públicas e seus colaboradores vão o bem-hajam de todas as populações beneficiadas e os votos ardentes de que prossiga a sua admirável tarefa de impulsionador do progresso regional e nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Eleutério de Aguiar: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Através de um comunicado distribuído aos órgãos de informação, soube-se que o Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos se ocupou, na última reunião, de problemas de interesse imediato para o arquipélago da Madeira.
Desconhecem-se, nestes termos, - quais os assuntos estudados pelo douto Conselho. Mas sabe-se que são inúmeros os problemas que, em maior ou menor grau, afectam a economia da nossa região, entre os quais avultam, nestes últimos tempos e com forte incidência, os que directamente respeitam à actividade turística, ou indirectamente com ela se relacionam, erguida como foi à dimensão de placa giratória, centro de interesse de toda a vida local.
Como simples homem comum que pretendemos ser, em todas e quaisquer circunstâncias, conjecturámos em torno dos problemas que a região da Madeira enfrenta, que são inúmeros, complexos e deveras preocupantes, exigindo atenção e sobretudo soluções imediatas, cuja falta vem ocasionando reacções em cadeia, algumas das quais já surpreendidas, em jeito de "duche escocês", a provocar contraditórias ilações.
Já aqui temos apresentado insistentes considerações sobre o fenómeno turístico, suas perspectivas e reflexos actuais e futuros na conjuntura madeirense. Não vamos, por isso, incorrer em risco de redundância, até porque longe de nós o propósito de fazer o ponto à actuação desenvolvida ao longo da legislatura, no estilo de quem pretendesse aproveitar o ensejo para enjeitar responsabilidades.
Recordaremos os números que traduzem as dimensões sempre crescentes do turismo na vida actual da Madeira e, conjecturando ainda, pouco adiantaremos, mais do que suficiente, aliás, para se acentuar a contradição implícita em fresco evento, que poderá constituir oportuno alerta para quantos, porventura minimizando factos concretos, são atraídos apenas pela miragem de optimistas previsões.
Em 1972, o número de turistas entrados na Madeira foi de 109 957, contra 107 831 no ano anterior, correspondendo a 999 447 e 786 577 diárias, respectivamente. Confrontando-se passado recente e futuro próximo, acrescentamos que, em 1970, haviam visitado a ilha 60 000 turistas e que, para 1975, estão previstos cerca de 500 000. Pormenorizamos mais que, além dos 60 000 visitantes registados em 1970, os quais utilizaram o avião como meio de transporte, sendo 40 000 em charters e 20 000 em voos regulares, se

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deverão juntar cerca de 200 000 passageiros em trânsito, por via marítima, podendo considerar-se metade como turistas, com um a dois dias de permanência, movimentando, principalmente, o comércio tradicional do artesanato.
Não obstante o entusiasmo que tais números podem justificar, dificuldades não suficientemente esclarecidas oferecem-se à meditação de quem se sente atraído pela coisa pública, preocupando quantos receiam as consequências de um crescimento acéfalo do turismo, sem a indispensável contrapartida na restante actividade económica e social.
Para melhor se compreender o significado destas palavras, haverá que informar a Câmara do encerramento da actividade da cadeia internacional Hilton, na Madeira, onde explorava uma das mais modernas e categorizadas unidades hoteleiras, construída já em pleno boom turístico.
Razões de vária ordem estarão na base do referido desfecho inglório, identificado com eventuais prejuízos de exploração, a traduzir, de qualquer modo, atitude oportunista de quem, só pretensamente interessado em promover a ilha e o consequente bem-estar da sua gente, revela sobretudo a intenção de explorar, sem mais delongas, em termos exclusivamente comerciais, as suas virtualidades.
Não falta, porém, quem associe o facto a vicissitudes que decorrem da política dos transportes e até das limitações do aeroporto, incapaz de corresponder às exigências da exploração turística, para que a Madeira se estrutura, mas - convém salientar - ainda não atingiu.
Em meados de Janeiro, acompanhados do governador do distrito autónomo, representantes da hotelaria madeirense foram recebidos pelos Secretários de Estado das Comunicações e Transportes e da Informação e Turismo, fazendo sentir as suas apreensões quanto ao futuro do turismo na região, face aos actuais condicionalismos. Conforme se divulgou na oportunidade, teriam afirmado o propósito de se responsabilizarem pelo financiamento dos estudos atinentes ao prolongamento da pista de Santa Catarina, insistindo na necessidade da imediata liberalização da política dos transportes aéreos para o arquipélago.
Eis-nos, assim, em presença de um problema que bem pode ser hierarquizado entre os de interesse imediato para a Madeira.
Como facilmente se conclui, evidencia-se uma das inevitáveis consequências do acentuado desfasamento entre os sectores público e privado, na actividade que vêm promovendo no distrito, com flagrante prejuízo para a sua população, até aqui pouco beneficiada com o turismo, antes sacrificada no jogo das prioridades e dos interesses em disputa.
São, na verdade, incontáveis os prejuízos suportados pela população, desde o constante agravamento do custo de vida, sem que acréscimos aos vencimentos a compensem, pois as estruturas da produção não acompanham o ritmo da procura, circunstância agravada logicamente pelo fraco poder de compra da generalidade dos madeirenses, cuja capitação média é inferior a 10 000$.
Problemas imediatos são também os relacionados com os portos do arquipélago, com o abastecimento de água potável da população do Funchal e dos meios rurais, com a construção de estradas nacionais e cadinhos municipais, bem como a aceleração das beneficiações em curso, acabando-se com a falta de ligações existente em várias localidades e criando artérias para o escoamento da produção de grande parte das explorações agrícolas ainda sobreviventes ao êxodo que mata os nossos campos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E fiquemo-nos por aqui, pois seria fastidioso enumerar toda a série de problemas merecedores de figurarem numa agenda epigrafada de urgente.
Entretanto, acaba de ser anunciada a construção, em Porto Santo, de um complexo turístico, orçado em 150 000 contos, dispondo de 223 quartos em hotel e de outros 108 em três blocos de apartamentos, ficando apetrechado com instalações para a prática de diversas modalidades desportivas e com uma estação dessalinizadora de água do mar.
Diversas vezes focadas as suas necessidades nesta Câmara, desfrutando de público interesse de governantes esclarecidos, alvo de cobiçosas palavras de financeiros e economistas, a verdade é que Porto Santo continua a aguardar a realização de obras imprescindíveis ao seu desenvolvimento.
Reunindo extraordinárias condições para o turismo, a ilha do Porto Santo pode atingir, na opinião dos responsáveis, uma capacidade entre 10 000 e 20 000 camas, estruturando-se sobre uma plano de urbanização, que se afirma deverá estar concluído em Junho próximo, incluindo-se, entre as obras a construir pelo Estado, precisamente o porto de abrigo, sem o qual não pode pensar-se, em termos objectivos, no aproveitamento integral das suas potencialidades, que importa planear em moldes de ser usufruído pela totalidade da população, ao invés do que vem acontecendo na Madeira. População que paga ainda maior tributo ao isolamento, sofrendo, em especial na época de Inverno, as consequências das mais desfavoráveis condições de vida, por falta de comunicações regulares, que ao menos assegurem o abastecimento de bens essenciais.
A título de exemplo, cite-se o que se passa no sector da assistência médica, há dias aqui apresentado também em termos preocupantes, no que respeita a algumas ilhas dos Açores. Pois Porto Santo, com os seus 4000 habitantes, está igualmente à mercê da Providência, visto que o seu único médico se encontra, ele próprio, hospitalizado. E, para se poder ajuizar dos magros recursos económicos da grande maioria da população da ilha, salienta-se que 95 por cento das pessoas que se deslocam ao Funchal para consulta médica fazem-no a expensas da respectiva edilidade, cujas receitas são necessariamente reduzidas.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Nem só as grandes obras impõem os governos à consideração dos povos. A intensa actividade do Governo do Presidente Marcelo Caetano apresenta-nos, ao lado de vultosas realizações em curso ou projectadas para execução a curto prazo, um conjunto de medidas que, parecendo embora de limitado alcance, suscitam o nosso sincero regozijo, pois vão directamente de encontro à satisfação de prementes necessidades detectadas.

Vozes: - Muito bem! Muito bem!

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O Orador: - Na última reunião do Conselho de Ministros foram aprovados diplomas que respeitam a classes dos mais modestos escalões sociais - empregadas domésticas e regentes escolares.
Alargados os benefícios da Previdência à única classe ainda não abrangida, que em 1970 agrupava cerca de 250 000 profissionais, deu-se mais um passo, simples mas concreto, na linha de actuações que vão edificando o Estado social.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - De salientar, por outro lado, o propósito evidenciado com o critério relativo aos descontos a efectuar, praticamente simbólicos, chamando o Estado a si um encargo da ordem dos 100 000 contos para assegurar às empregadas domésticas o esquema de benefícios já usufruídos pelas restantes classes trabalhadoras, designadamente protecção na doença e reforma, na invalidez e na velhice, sem esquecer os seus descendentes e equiparados.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Era nossa intenção adiantar algumas considerações sobre o mundo do trabalho em geral, que foi objecto de uma nossa intervenção no decurso da 2.a sessão legislativa. Estão a tornar-se cada vez mais difíceis as relações entre o capital e o trabalho, bastando notar-se que, em Dezembro de 1971, encontravam-se pendentes nos tribunais 80 000 processos. Argumenta-se contra demoras na conclusão de convenções colectivas de trabalho, e, há poucos dias, realizou-se no Funchal uma significativa reunião de sindicatos, na qual foi deliberado solicitar do Governo a revogação do Decreto-Lei n.° 196/72, responsabilizado por atrasos e limitações que dificultam a vida dos trabalhadores.
O Governo, porém, afirma-se atento ao candente problema. Ao apresentar, na manhã de sábado, os objectivos do Ministério das Corporações para 1973, o Dr. Silva Pinto, dinâmico Secretário de Estado, produziu afirmações de grande importância, a começar pela intensificação da política habitacional, para a qual estão previstos financiamentos da ordem dos 800 000 contos. Referiu-se à próxima constituição de comissões (...), tendo em vista a melhoria da produtividade e a equitativa participação do trabalho no rendimento nacional. Reconheceu estarem em curso 130 processos de contratação colectiva e demonstrou continuar atento às justas reivindicações. Pela nossa parte, confiamos em que serão tomadas as soluções requeridas com a brevidade que a delicadeza dos processos consentir.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Outra decisão do Conselho de Ministros, que não queremos deixar sem um breve comentário, até porque se relaciona com uma classe que nos tem merecido atenção dentro e fora desta Assembleia, é a que determinou a extinção dos postos escolares, já objecto de diplomas ontem publicados na folha oficial.
Ao longo dos tempos foram ensaiadas várias tentativas de solução do problema das regentes escolares,
mas em boa verdade só agora se teve a coragem de atacar frontalmente a realidade, que ultrapassava o âmbito dos interesses de uma classe profissional, para traduzir anacrónico sistema escolar, baseado na tão caricaturada opção do ler, escrever e contar.

Vozes: - Muito bem! Muito bem!

O Orador: - Golpe decisivo num sistema ainda expressivo, pois existiam 2200 postos escolares, a medida anunciada representa vigoroso impulso de promoção de uma classe que, não obstante naturais limitações, se entregou com entusiasmo ao serviço docente. Promoção autêntica que, sem perda de vencimentos, se traduz na obrigação de frequência de curso intensivo, podendo adiantar-se que, nesta data, 375 regentes se preparam já em escolas do magistério primário e 1100 se habilitam com o ciclo preparatório em regime nocturno. Com esta reformulação, impendem sobre o Estado encargos da ordem dos 58 000 contos, mas são incomensuráveis os resultados de tão oportuno investimento.

O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!

O Orador: - Aguarda-se agora que, na linha desta preclara actuação, no âmbito das esperadas providências sobre o funcionalismo, o Governo atente na situação de outra classe, também ao serviço da escola primária, a das auxiliares de limpeza.
Não obstante as vozes autorizadas que se têm pronunciado sobre a sua situação, inclusive nesta Câmara - e presto homenagem ao Sr. Deputado Duarte Amaral -, o certo é que as auxiliares de limpeza, malgrado o diploma de funções públicas que possuem, continuam na marginalidade que lhes impôs o Decreto-Lei n.° 49 410, de Novembro de 1969, ao deixá-las no olvido. Estabelecendo o vencimento mínimo de 1900$, esta verba está muito acima dos 1200$, 750$ e 600$ que auferem tais servidoras do Estado, conforme exercem a sua actividade nas sedes de distrito, nas sedes de concelho e nas restantes localidades.
Registe-se, a propósito, que a designação de auxiliares de limpeza não corresponde de modo algum à realidade comprovada, pois são diversas as tarefas que lhes incumbem, e a mais importante não é exactamente a de conservar limpas e com o maior asseio as salas de aula e demais dependências dos edifícios escolares.
Sucedendo que nos quadros de pessoal em serviço no ensino primário não figuram auxiliares de educação, afigura-se-nos que, paralelamente com a revisão dos seus vencimentos, deveriam ser-lhes ministrados cursos intensivos, que melhor as habilitassem a colaborar na importante missão que cada vez mais impende sobre a Escola.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ficamos, por isso, esperançados na próxima satisfação da justiça que se impõe, pois o Governo continua, como temos visto, a preparar os caminhos que conduzem a uma verdadeira reforma

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do ensino, tomando medidas de insofismável interesse para o progresso e bem-estar do povo português.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem! Muito bem!

O Sr. Alberto de Alarcão: - Sr. Presidente: A formação profissional realizada fora da escola tradicional, muito embora venha completar a acção educativa por ela realizada, não pode ser encarada como um simples prolongamento, por se afastar, em parte, nos objectivos que visa e nos processos e métodos que utiliza.
Revestindo, com efeito, uma forma essencialmente aplicada, a formação profissional visa ministrar, sem que tal envolva menor consideração por uma fundamentação conveniente, conhecimentos práticos indispensáveis para o exercício de uma actividade profissional.
O seu objectivo imediato será a preparação para uma profissão, ou a formação complementar dos já activos, participando por esta forma na valorização dos recursos humanos que haverão de contribuir para o desenvolvimento económico e social do País.
Uma metódica e actuante preparação dos recursos humanos, seja a que nível for, apresenta-se como um dos meios mais eficientes na solução dos problemas da produção no seu sentido mais lato, já que será na capacidade de decisão e eficácia do capital humano que assentará, em última análise, a maior ou menor dimensão do sistema produtivo, por via da produtividade do trabalho.
Daí que nos países desenvolvidos ou em vias de desenvolvimento seja seguida uma atitude de valorização e renovação progressiva dos esquemas de preparação dos recursos humanos, designadamente em resposta às exigências progressivamente acrescidas e diversificadas da renovação tecnológica e da evolução social.
No nosso país não há uma experiência suficientemente estruturada e completa de formação profissional dentro como fora da escola, ainda que sejam de referir os louváveis esforços do Ministério das Corporações e Previdência Social, através do Serviço de Formação Profissional, e do Ministério da Economia, por intermédio, nomeadamente, da Secretaria de Estado da Agricultura.
Uma palavra de muito apreço se registe.
De qualquer forma, sente-se um vazio de soluções, em particular para os jovens que, tendo frequentado o liceu, interrompem os seus estudos no termo do curso geral. Problema que não é de agora, pois que recordar posso o preâmbulo dessoutra disposição legal de 23 de Setembro de 1872 - um século vai decorrido, que se exprimia assim:
Considerando que, enquanto por medida legislativa, se não dá ao ensino secundário uma organização completa e adequada às necessidades da civilização e da bem entendida liberdade, é mister aproveitar melhor os elementos que existem e acudir com pronto remédio à notável decadência de estudos que, feitos superficialmente e só com a mira no ingresso aos cursos superiores, estão muito longe de corresponder aos verdadeiros fins da sua instituição.
Atendendo a que desde já se podem introduzir no plano e regime dos liceus diversos melhoramentos que tornem o ensino mais real e proveitoso para os alunos e mais útil e eficaz para a cultura moral e intelectual do País [...], hei por bem ordenar o seguinte: [...]
Problemas de ontem, problemas de hoje...
Que rumos se oferecem aos que concluíram o antigo 5.° ano liceal, o novo 3.° ano do seu curso geral? Num inventário de cursos profissionais específicos deparamos, a esse nível de escolaridade, com as hipóteses do Magistério Primário, dos Institutos Comerciais e Industriais, das Escolas de Regentes Agrícolas, de instrução de Educação Física, de Enfermagem e outros cursos paramédicos, dos cursos gerais de Pintura e de Escultura, dos cursos ligados à hotelaria e turismo.
E, entretanto, o ingresso na vida activa sugere outras profissões de sentido actual, em resposta a realidades ou a necessidades sentidas.
Tratando-se de alunos com uma formação de base bastante razoável - e cada vez mais assim sucederá -, a criação de cursos que lhes sirvam para o exercício de uma profissão deve fazer-se em função do esquema de actividades económicas previstas ou previsíveis, procurando assegurar um futuro certo à opção que cada qual venha a tomar.
Por outro lado, considerando a diversidade de situações geográficas, pensa-se que certos condicionalismos regionais poderão marcar preferência por esta ou aquela solução, determinando a escolha de curso ou cursos mais convenientes à economia e vida social da região. E esta preferência pode, inclusive, ganhar um sentido normativo, na medida em que se admita que a criação de um determinado curso em dada região pode funcionar como elemento dinamizador de actividade carecida de estímulo e reconhecida como conveniente do ponto de vista económico-social regional. Assim, as actividades produtivas, a iniciativa privada, posteriormente a acompanham.
Nesta ordem de ideias, as hipóteses de cursos profissionais podem estender-se a todos os sectores da actividade económica, mas será em relação ao sector agrário que nos iremos confinar.
A meio da passada semana, desloquei-me à cidade de Faro a fim de contactar com uma experiência piloto de formação profissional agrária em estabelecimentos de ensino secundário que o Ministério da Educação Nacional tem entre mãos.
Razões que possam apontar-se para tal iniciativa, algumas anotarei: os trabalhos neste sector já se encontrarem relativamente adiantados; a renovação da agricultura solicitar, de forma premente, pessoal qualificado; o facto requerer uma vasta reforma das actuais estruturas do ensino agrário ou a criação de formas inovadoras, que poderá interessar testar na prática. Daí, a experiência piloto.
Como se processa ela?
Houve que criar primeiramente um grupo de trabalho (mas para funcionar...), na medida em que três departamentos ministeriais mantinham e mantêm acções de formação profissional agrária, impondo-se a convergência de esforços para um objectivo comum: agrupamento complementar interministerial de iniciativas para nos integrarmos na terminologia dessa nossa ordem do dia.

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Impunha-se definir seguidamente a(s) região(ões) a atingir; as características do curso e a natureza da experiência a levar a efeito; a orgânica de funcionamento; a elaboração provisória dos programas a cumprir.
Situado perante várias hipóteses regionais, o grupo de trabalho entendeu dar prioridade ao Algarve pelas seguintes razões: possibilidades ecológicas favoráveis ao desenvolvimento da agricultura; potencialidades por explorar; possibilidades de mercado próximo para os produtos; necessidade de resposta ao desenvolvimento urbano-turístico.
Estruturas de acolhimento se ofereciam: Divisão Regional do Serviço Nacional de Emprego, liceus e escolas técnicas, Estação Agrária de Tavira, explorações agrícolas em vias de modernização, actividades gremiais interessadas na sua efectivação (grémios da lavoura, estabelecimentos hoteleiros, etc.).
Quanto à natureza do curso, atendeu-se a que o Algarve é caracterizado por uma zona litoral onde as condições ecológicas permitem a obtenção de frutos e produtos hortícolas mais cedo do que em qualquer outra zona do continente, circunstância que pode traduzir-se em apreciáveis vantagens para a valorização e rentabilidade das produções.
Tal não tem acontecido suficientemente, alguns hotéis vêm mesmo abastecer-se a Lisboa de alguns desses produtos possíveis, em resultado de os não encontrarem na região, seja por deficiência produtiva ou dos circuitos de comercialização.
Efectivamente, o sistema de exploração tradicional da terra, a deficiente preparação profissional da maioria das pessoas que se dedicam à agricultura, a pouca capacidade empresarial e espírito de iniciativa não têm tornado possível aproveitar as potencialidades do solo e clima, e obter os desejados resultados. Justificada fica a necessidade de preparação de profissionais que saibam produzir, gerir a exploração, organizar a comercialização dos seus produtos.
Mas não apenas por isso, e para as actividades agrárias tradicionais.
São diversos os aldeamentos turísticos instalados, em curso de execução ou projectados para o Algarve, além de hotéis, campos de golfe, jardins e grandes extensões de relvados.
Actualmente, há engenheiros agrónomos a orientar a execução de jardins e viveiros de plantas, sendo notória a necessidade de outros profissionais, seus colaboradores ou substitutos em empreendimentos de menor dimensão ou responsabilidade, bem como de profissionais conhecedores de plantas ornamentais, extensões relvadas, etc. Tais profissionais deveriam receber uma formação muito prática e orientada para funções bem definidas, diferindo, portanto, dos actuais regentes agrícolas, na medida em que estes têm uma formação mais polivalente e um campo de actuação mais vasto.
Poder-se-ia perguntar: justifica-se uma preparação deste tipo, com formação especializada tão restrita?
Responderei afirmativamente, pois que todo o condicionalismo sócio-económico aponta para a permanência do surto de desenvolvimento turístico do Algarve, bem como de outras regiões do País.
Assim se acresceu a jardinagem e a floricultura à horto-fruticultura, rapidamente estabelecida.
O curso tem carácter terminal, a partir de candidatos habilitados com o 5.° ano liceal ou equivalente, após selecção feita pelos serviços de orientação profissional: duração, 2 semestres; natureza, profissional; frequência máxima prevista, 25 alunos anualmente.
Criado no âmbito de actividades e competência do Ministério da Educação Nacional e sob direcção administrativa e pedagógica de estabelecimentos oficiais de ensino, neste caso o Liceu de Faro, estes cursos de formação profissional agrária contam com a colaboração de técnicos de diferentes departamentos governamentais e com a utilização de serviços, explorações agrícolas e equipamentos, nomeadamente da Secretaria de Estado da Agricultura.
Surge assim como um exemplo de colaboração interministerial que me é grato salientar.
Por sua natureza, os cursos são concebidos para uma formação eminentemente prática, logo à saída das escolas tradicionais, para rapazes e raparigas sem grande - ou mesmo nenhuma - experiência profissional agrária: cinco horas diárias de sessões práticas, para uma outra de sessões teóricas. As primeiras, a processarem-se em exploração a ceder, para o efeito, pela Secretaria de Estado da Agricultura ou a arrendar regionalmente e onde o desenvolvimento das matérias do curso será feito de acordo com o estado das culturas em cada estação ou época do ano; as segundas, de revisão e esclarecimento de exercícios práticos no campo, ministrados nas salas dos estabelecimentos escolares tradicionais, assim abertos para a vida activa da comunidade.
Para além de se reduzirem despesas de instalações e facilitar-se o contrôle administrativo, tenta-se um esforço de aproximação entre dois tipos de formação: a liceal e a técnica, tradicionalmente separadas por intenções diferentes, porventura inacabadas em sua expressão actual. É aspecto que me apraz realçar.
Não documentaremos o currículo disciplinar, são matérias de arboricultura e viticultura, de horticultura, de jardinagem e floricultura, completadas por outros conhecimentos (agrologia, mecanização, etc.) que não vem ora ao caso e que deverão ser apresentadas e desenvolvidas, bem como outras, não apenas em função das actuais características de utilização do solo, mas das potencialidades e futuro ordenamento dos recursos regionais - assim estes sejam devidamente estudados, prospectados, programados.
Ao procurar-se a colaboração de diversos departamentos ministeriais e de organismos oficiais funcionando em compartimentos, por vezes bastante estanques, houve em mente dar um apoio técnico global, por forma a criar-se um curso com características novas de métodos de ensino e de aplicação de conhecimentos para jovens rurais que desejem iniciar-se em actividades agrárias. Vem assim juntar-se a essa outra iniciativa já provada de reciclagem e actualização de conhecimentos de empresários agrícolas adultos largamente experimentados na vida agrária, que, de há três anos a esta parte, têm vindo a ser promovidos com tão felizes resultados pela Secretaria de Estado da Agricultura. Talvez um dia lhe conceda a atenção que bem merecem, em ocasião mais oportuna.
Para nos centrarmos nas mais salientes inovações daqueles cursos se dirá que, no ramo da horticultura,

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se elaborou uma série de exercícios que não só abrangem a maior parte das operações culturais tradicionais no Algarve, como também a aplicação das novas técnicas de forçagem (montagem de estufas, túneis, etc.) que tão intensamente podem contribuir para maior precocidade, qualidade e valor da produção.
No campo da floricultura e jardinagem, pretende alcançar-se uma formação nova no País, até agora só adquirida, e em número reduzido, a nível superior no curso de Arquitectura Paisagista. Intenta-se dar ao aluno a capacidade de interpretar e executar um jardim através de "planta" que lhe venha a ser fornecida, substituindo o amadorismo na jardinagem por cursos profissionais eminentemente práticos voltados à execução. Com os conhecimentos ministrados na matéria (traçado, implantação e manutenção de um jardim, cultura das diferentes espécies para flores de corte ou maciços ornamentais), espera-se poder satisfazer a procura, na região, de profissionais especializados em jardinagem e floricultura.
Conferir-se-á diploma de formação profissional, como convém à modernização da agricultura e profissionalização das actividades.
Um reparo desde já tenho a fazer: na medida em que os que frequentam os cursos contribuem para os cofres do Estado através da aplicação do seu trabalho na exploração pertença dos serviços ou arrendados, afigura-se-me que deverão ter direito a uma gratificação mensal, simbólica que seja, até mesmo para não criar notória desigualdade com quantos frequentam outros cursos profissionais no País.
A direcção pedagógica do curso é da competência .do director do estabelecimento de ensino a que administrativamente se subordina, coadjuvado por um engenheiro agrónomo nos aspectos técnicos específicos. Monitores, recrutados entre regentes agrícolas que reunam qualidades técnico-pedagógicas convenientes, ministrarão os conhecimentos práticos e teóricos possíveis.
A direcção do curso pode organizar visitas de estudo, contactos com estações agrárias, explorações agrícolas, empresas de produção, transformação ou venda de produtos, sessões ou colóquios de tratamento de temas ligados à actividade agrária, convidando para o efeito empresários agrícolas ou técnicos especializados, e nesse sentido me foi dado contactar com esta experiência piloto de formação profissional pós-escolar promovida pelo Ministério da Educação Nacional.
É ainda cedo para um juízo definitivo; a experiência vai ainda a meio e no seu primeiro ano de funcionamento, mas pode ser o radar de uma nova era Para a formação de jovens empresários agrícolas, que irão pacificamente revolucionar os métodos de exploração das actividades agrárias, não já tradicionalmente praticadas, mas intelectual e praticamente orientadas, dirigidas, executadas, profissionalizadas.
Sem menosprezar aspectos de institucionalização, orientação, coordenação de esforços, integração e interdependência de actividades formativas agrárias, saudar esta experiência piloto lançada a algarvias, com a esperança de que germine e se a bem de Portugal.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à

Ordem do dia

Continuação da discussão na generalidade da proposta de lei sobre agrupamentos complementares de empresas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Moura Ramos.

O Sr. Moura Ramos; - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao propor-me intervir no debate sobre a proposta de lei n.° 26/X, relativa aos agrupamentos complementares de empresas, cumpre-me dizer que, por mais inusitado e despiciendo que pareça, não pode nem deve ser levado a mal que eu venha aqui trazer o meu modesto depoimento.
Reconhecendo embora a carência de credenciais bastantes, quer porque não sou grandemente versado em matéria económica, quer porque não sou empresário nem tenho ou jamais tive quaisquer ligações económicas ou financeiras com empresas, não me dispenso, contudo, de me preocupar com os problemas nacionais, estudando-os, e procurar reflectir na busca das soluções reputadas como as melhores para esses problemas. Impulsionou-me ainda a leitura que fiz do claro e esclarecedor parecer da Câmara Corporativa, tão claro e esclarecedor que de douto bem merece o qualificativo. Por tudo isto, aqui estou.
Sr. Presidente: O problema importante, nos dias de hoje, para a nossa economia é o da aceleração do desenvolvimento económico e social.
Segundo é geralmente aceite, o País carece, entre outras medidas ou soluções, de uma nova estrutura empresarial, pois reconhecido está que "as fórmulas através das quais o direito privado tradicional fornece enquadramento ao fenómeno associativo - a sociedade e a associação - não bastam para satisfazer as exigências contemporâneas", pelo que se "impõem novos tipos de colaboração entre as empresas".
Isto se lê no relatório da proposta de lei em apreciação e é confirmado pelo bem elaborado parecer da Câmara Corporativa.
O que é então preciso para tanto? É fazer, antes de mais, o grande esforço de imaginação para sermos capazes de encontrar ou adaptar ao nosso país as fórmulas ou soluções já encontradas por outros países e destinadas a criar incentivos positivos que possibilitem o desencadeamento do processo para a almejada aceleração do desenvolvimento económico e social.
Fórmulas ou soluções essas que se impõem, dadas as deficiências da nossa estrutura industrial e a falta de um melhor doseamento da acção da iniciativa privada e do papel interventor do Estado, isto sem esquecer, conforme já foi observado por alguém com responsabilidades, que "estamos num país onde o Estado se diz interventor para termos de facto muitos dos defeitos das economias liberais".
E não se trata de confiar e querer que o Estado tudo faça, obtendo deste modo soluções de cariz socialista ou socializante hoje tão do agrado de muitos, mais por constituírem moda do que pela sua eficiência prática, sabido como é que tais soluções esterilizam ou matam as iniciativas privadas e sobrecarregam o Estado de funcionários.
O que é necessário e urgente, isso sim, é conseguir as melhores fórmulas de cooperação ou colaboração entre o sector público e o sector privado.

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Efectivamente, sabe-se quanto de importante e decisiva pode ser a contribuição do sector privado no processo de desenvolvimento. Tal contribuição foi, há anos, salientada pelo então Ministro da Economia e Finanças Dias Rosas, em entrevista concedida ao Diário Popular, ao afirmar que: "Sem a confiança e a sensibilidade que permitam uma resposta empresarial adequada, o Governo poderá ter uma ideia orientadora e definir, para ela, os parâmetros tidos como necessários à sua efectivação, mas não realizará verdadeiramente uma política económica; a sua realização exige a reacção indispensável, oportuna e proporcionada do sector privado."
Impõe-se, por isso, como de evidente interesse, que o sector privado se mentalize em ordem a integrar-se de maneira decisiva no caminho progressivo do desenvolvimento, lutando contra hábitos, usos e até preconceitos que enxameada e perniciosamente caracterizam quer a nossa tão marcada maneira de ser individualista limitadora da cooperação e colaboração que importa exista entre as diversas empresas, sobretudo quando pequenas e médias, quer pondo definitivamente de lado aquele mal compreendido paternalismo que leva a pedir tudo ao Estado, muito mais do que um papel supletivo que lhe devia caber. E este pode sintetizar-se naquela fórmula que o Doutor Salazar em 1933 magistralmente apontou e que não resisto à tentação de recordar: "O Estado", dizia ele, "deve manter-se superior ao mundo da produção, igualmente longe da absorção monopolista e da intervenção pela concorrência. Quando pelos seus órgãos a sua acção tem decisiva influência económica, o Estado ameaça corromper-se. Há perigo para a independência do Poder, paira a justiça, para a liberdade e igualdade dos cidadãos, para o interesse geral em que da vontade do Estádio dependa a organização da produção e a repartição das riquezas, como o há em que ele se tenha constituído presa da plutocracia de um país. O Estado não deve ser o senhor da riqueza nacional nem colocar-se em condições de ser corrompido por ela. Para ser árbitro superior entre todos os interesses, é preciso não estar manietado por alguns." (Cf. Discursos, vol. I, p.207.)
E catorze anos após, em 1950, o Prof. Doutor Marcelo Caetano, em conferência proferida na Sociedade de Geografia, podia dizer: "A fórmula única que pode conciliar a necessidade da organização com o princípio da liberdade, a desintoxicação do capitalismo com a manutenção da iniciativa individual e o progresso da técnica com o princípio do espírito, é o corporativismo."

O Sr. Veiga de Macedo: - Muito bem!

O Orador: - Creio ser ainda dentro destas ideias, que constituem como que traves mestras ou balizas orientadoras da nossa política económica, que se devem inserir os propósitos de dar um "correcto dimensionamento das unidades produtivas nacionais", conforme expressão usada no relatório da Comissão de Economia desta Assembleia, propósitos esses que a proposta de lei em apreciação quer atingir através da criação do meio jurídico capaz da realização daquele correcto dimensionamento.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Reservado ao Estado um papel supletivo, cabe-lhe ainda formular as linhas gerais da política económica a prosseguir, fomentar o desenvolvimento da educação empresarial e também regulamentar a vida económica, sobretudo pelo que respeita às pequenas e médias empresas. A dimensão viável das empresas torna-se necessária não só como factor primordial à sobrevivência delas, uma vez que não podem subsistir em termos de participar eficazmente no processo de desenvolvimento se não possuírem um mínimo de actividade económica, quer financeira, quer técnica, quer de gestão.
É que as pequenas e médias empresas, não obstante as suas carências, desempenham acção meritória e podem-na desempenhar em termos de maior validade se procurarem entre si fórmulas de cooperação e colaboração, como já vão aparecendo entre nós.
Ao "reconhecimento do interesse na subsistência das pequenas e médias empresas em sectores onde se verifique a sua viabilidade económica", refere-se o relatório da Comissão de Economia, que se congratula com o aparecimento da proposta de lei n.° 26/X, que constitui o meio jurídico para levar sobretudo as pequenas e médias empresas a agruparem-se, sem perda da sua personalidade jurídica e independência económica, permitindo-lhes, assim, que possam resolver em comum muitas das suas dificuldades e carências. São agrupamentos feitos por motivos de interesse económico e fiscal ou, como na expressão da lei francesa, "verdadeiras famílias de sociedades sob a direcção de uma delas" e para as quais estão previstos incentivos fiscais e estímulos financeiros a conceder pelo Estado.
E bem se compreende que assim seja, uma vez que se as pequenas ou médias empresas agrupadas não tiverem uma certa estrutura ou base financeira, os seus gerentes ou empresários gastarão, por vezes ingloriamente, nos corredores dos bancos e com o fim de angariar fundos para a manutenção e desenvolvimento das suas empresas, o tempo que uma boa gestão e direcção dessas empresas exigia que fosse gasto nos corredores das fábricas ou empresas a dirigirem e a vigiarem o seu pessoal. E isto que, infelizmente, acontece mais do que se julga, condena ao insucesso e à inoperância muitas pequenas e médias empresas, fazendo-as viver de balões de oxigénio, o que constitui um gravíssimo problema a opôr-se a qualquer processo de desenvolvimento.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Trazendo ao debate o nosso modesto depoimento, outra preocupação não houve em vista que não fosse a de exprimir francamente a nossa adesão à proposta de lei apresentada pelo Governo sobre agrupamentos complementares de empresas, dando-lhe o voto de aprovação na generalidade.
E assim fazemos, no convencimento de que tal proposta, quando convertida em lei, poderá firmar um passo em frente, dado para uma decisiva e eficaz aceleração do nosso desenvolvimento económico-social.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Para tanto se requer não só a concessão, em termos capazes, de incentivos fiscais e estímulos financeiros por parte do Estado, mas também uma melhor e maior cooperação e colaboração das empresas que venham a agrupar-se com vista aos fins da proposta de lei em apreço, assumindo os empresa-

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rios as sérias e pesadas responsabilidades que lhes cabem e que o momento actual tanto exige.
Só assim é que a Lei que daqui venha a nascer terá efeitos positivos e não será, na frase lapidar do Prof. Doutor Antunes Varela, mais uma a juntar ao "crematório de muitas ilusões, sem excepção daquelas que o talento dos homens de leis procura assentar em mais sólidos vigamentos".
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Almeida e Sousa: - Continuando um todo jurídico que a base V da Lei de Fomento Industrial anunciou, cumpre-nos hoje apreciar aqui a proposta de lei sobre agrupamentos de empresas. Talvez pelas reminiscências de muitos e muitos duros anos de trabalho, talvez pela presente obrigação do cargo, no desenvolvimento que todos ambicionamos a poucas disciplinas reconheço a necessidade e a urgência que a esta reconheço.
Portugal, e muito mais a sua metade norte, por razões atávicas a que não são estranhas nem a sua situação geográfica, nem a reduzida dimensão do seu mercado, nem o feroz individualismo do seu povo, sempre foi, e comparativamente muito mais o é hoje, um País de pequenas empresas. Muito poucas, quase diria se alguma, atingiram verdadeira dimensão europeia, pelo menos quando consideradas em cada um dos seus ramos. E se assim falamos do País como um todo, muito mais categóricos teremos de ser acerca do Norte, onde nunca floriu muito a protecção do condicionamento industrial.
Talvez por culpa própria, não o queremos, nem interessará discutir. A única coisa que hoje nos deve interessar é a análise serena e sincera do presente, já que deste temos de partir para o futuro onde nos havemos de situar.
Muitos estudos têm sido publicados sobre a dimensão económica das nossas empresas. Todos concordam, aliás. No entanto, não me parece despiciendo que, para nos situarmos correctamente, meditemos um pouco os seguintes números tirados dos arquivos do Grémio dos Industriais Metalúrgicos do Norte: em 1971, das 3259 empresas em laboração na área do Grémio (que cobre todo o País a norte do Mondego, excepto o distrito de Braga) só 31, ou seja, menos de 1 por cento, tinham rendimento colectável superior a 600 contos, enquanto 92 por cento tinham rendimento colectável inferior a 100 contos, 64 por cento inferior a 10 contos e 20 por cento inferior a 1 conto. Acrescentar a estes números seja o que for parece-me perfeitamente supérfluo.
Nos outros ramos industriais, tirando porventura alguns até há pouco ferozmente condicionados, assim como no comércio e na agricultura, o panorama não será muito diverso.
Empresas deste poder económico suponho que ninguém poderá dizer que estejam preparadas para o esforço técnico e financeiro que a sua sobrevivência num mercado alargado vai exigir.
Não foi só em Portugal que isto aconteceu - outros países sentiram o mesmo problema -, mas acreditamos que talvez em nenhum país da Europa ele se terá posto com a acuidade que aqui se põe, já porque é maior o salto do mercado, já porque praticamente não tínhamos qualquer tradição de exportação industrial, já porque a distância, em todos os sentidos que esta palavra pode ter, torna mais difíceis os nossos contactos internacionais.
E, contudo, com a estrutura que possuímos e a partir do que o passado nos deixou, temos de sobreviver. E havemos de sobreviver, não há qualquer espécie de pessimismo no meu sentir.
O que porventura alguns, e quando digo alguns refiro-me a empresas e a homens, deixarão de levar é a vida fácil que muitos até hoje em Portugal têm levado. E disso, em minha opinião, só bem pode vir.
Temos tido até agora muitas unidades industriais de reduzida dimensão e parcas posses, sem qualquer possibilidade de orientação ou querer estratégico. Guerreando-se em todos os campos, querendo fazer tudo à procura de um mercado exíguo e esquivo, longe da tecnologia e da especialização que há muito noutras áreas venceram.
E, contudo (não faço senão repetir o que, mesmo aqui, tantas vezes tenho dito), que enormes possibilidades humanas por aproveitar nessas unidades que hoje, para a nossa economia, bem pouco valem, que meritórios esforços tão mal empregados e tão injustamente pagos!
É necessário polarizar todas as forças que neste país podem ser válidas e, dizendo isto, creio ter dito o essencial acerca da necessidade da proposta que temos em apreciação. Precisamos de unidades industriais porventura maior, mas, sobretudo, mais conscientes e mais disciplinadas, susceptíveis de conhecerem e tirarem proveito do progresso, capazes de atingirem a qualidade e o preço que são necessários para vencer na luta sem quartel da nova economia.
Precisamos de unidades maiores e mais disciplinadas, decerto, mas não podemos, porque então teríamos de partir do nada, deitar fora o que possuímos, não podemos ignorar as virtualidades enormes que se escondem atrás de uma organização crescida noutra época e sob outros signos. São, de qualquer maneira, forças muito grandes que andam desperdiçadas numa luta sem rumo onde nunca prevaleceu orientação.
Se quisermos vencer - e temos de querer! - havemos de polarizar todos os vectores, tantas vezes desencontrados, que constituem a nossa economia. E não vemos bem como o poderemos conseguir sem a racionalização que os agrupamentos agora em causa hão-de permitir.
Nunca em nenhum país do nosso enquadramento social ninguém se atreveu a afirmar que as pequenas e médias empresas, que em toda a parte constituem a grande massa do trabalho, não eram necessárias, nem úteis.
Só cito uma opinião bem qualificada e bem recente, aliás: a do Ministro francês do Desenvolvimento Industrial e Científico, Sr. Charbonnel. Dizia ele, ainda há dias: "a grande indústria não pode prosperar senão num tecido industrial em plena expansão, constituído por médias e pequenas empresas cujo peso em todas as economias é muito importante".
É, aliás, o que está implicitamente reconhecido na base XI da Lei de Fomento Industrial, por esta Assembleia aprovada.
Ora, a proposta que temos presente, visa, em primeiro lugar e sobretudo, à defesa e orientação das pequenas e médias empresas. Não a podemos senão

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aplaudir porque temos de reconhecer que indiscutivelmente é mais fácil e mais rápido polarizar do que criar. E para nós, neste momento, os minutos podem valer séculos.
Há outras formas, sem dúvida, de do pequeno fazer o grande. Na metalurgia, temos larga experiência dos diferentes métodos de o conseguir. Ou por fusão - e então quem poderá reconhecer na grande e rígida peça fundida as pequenas limalhas que se derreteram? - ou por compressão, esta sempre feita em poderosas prensas que tudo esmagam.
Para a matéria inerte, qualquer destes dois métodos poderá constituir a melhor maneira de fazer. Para os homens - e as empresas são feitas por homens, de homens e para homens -, para os homens, eu creio que não, que não é a melhor maneira de fazer. Mais ainda, diria, para os Portugueses.
Nunca foi de bom grado que, fosse por que motivo fosse e fosse em que campo fosse, deixámos perder a nossa própria personalidade para nos fundirmos num todo, por muito próspero e muito brilhante que no-lo ofeceressem, mas em que sentíamos nos iriam matar, pelo menos tal qual temos sido. Se não fôssemos assim, certamente que há muito tempo já teríamos deixado de ser o que, graças a Deus, ainda somos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mais uma virtude da proposta que temos em apreço: estabelecer uma fórmula que permita evitar o desumano e as dificuldades de fusões abruptas que tantas vezes se impõem ao arrepio de quantos as têm que sofrer.
Por vezes, as fusões serão necessárias? Não o negarei, certamente; mas não poderão os agrupamentos que agora se visam constituir a mais humana e mais assimptótica maneira de virem a conseguir-se muito úteis fusões? O tempo tudo ensina, e quem sabe se as ligações condicionadas que agora se estabelecem não virão em muitos casos a transformar-se na integração total que se revele desejável.
Não há dúvida de que os tempos mudaram mais depressa do que muitos de nós conseguimos mudar. Os homens estão agora muito mais perto uns dos outros, e hoje, não deixando de ser o que nos orgulhamos de ser, temos que ser muito mais o que os outros são. Senão não seremos no nosso Mundo, e é nele que temos de viver. Embora reconheçamos que, para nós, o processo foi demasiado rápido no brusco encurtamento, no tempo, da distância que nos separava da Europa.
Por isso, é compreensível que empresas que nasceram, cresceram e viveram num mercado circunscrito e fechado, à sombra de protecções que as defendiam de tudo e de todos, se não tenham apercebido, em tempo oportuno e até ao fim, de modificações profundas acontecidas a distância que se tinham habituado a considerar longínqua e defensora. Os avisos foram sem dúvida repetidos e prementes, mas enquanto não sofre, ninguém se considera doente. Talvez por isso não seja difícil adivinhar que muitas empresas portuguesas não estarão ainda preparadas para aceitar os agrupamentos, que, no entanto, bem úteis lhes seriam.
Prometem-nos, agora, ou melhor, vêm-nos prometendo desde o Acordo de Estocolmo, mercados maiores, à dimensão da Europa em que vivemos. Mas mercados maiores só nos servem na medida em que os soubermos e pudermos conquistar. Mercados maiores exigem produções maiores, produções que a maior parte das nossas unidades industriais não pode pretender. Exigem especialização que se não coaduna com os fabricos variados que cada uma das nossas fábricas tem. Exigem qualidade, boa e sempre igual, que unicamente por especialização e apertado contrôle se pode conseguir e manter.

O Sr. Salazar Leite: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Salazar Leite: - Referiu-se V. Exa., Sr. Deputado, à necessidade absoluta que temos, talvez com mais premência do que o aumento das dimensões da empresa, da conquista de novos mercados.
Ao ouvir essa referência, não podia deixar de fazer também uma referência a uma organização ou entidade, à qual muito se deve, e cada vez mais, na possibilidade da conquista dos novos mercados, que temos absoluta necessidade de conquistar se quisermos diminuir o enorme fosso que nos separa das economias mais evoluídas da Europa.
Refiro-me ao Fundo de Fomento da Exportação.
A atitude que tem assumido o Fundo de Fomento da Exportação em toda a sua actividade demonstra que existe da parte daqueles que o orientam a agressividade necessária que nos levará a conquistar novos mercados, sem o que não podemos, de modo algum, conceber o desenvolvimento industrial que aspiramos para o nosso país.
A experiência que agora se faz, através da lei em discussão, experiência que creio poderá resultar, nunca deixando de ter em vista que as pequenas e médias empresas são tão necessárias para o País como as grandes, uma vez que são como que o complemento do trabalho dessas grandes empresas. Não tendo, de modo algum, necessidade de pôr este ponto de parte, quero crer, e o documento em causa não vem mais do que confirmar aquilo que estava sendo apregoado pelo Fundo de Fomento da Exportação de há um tempo a esta parte.
Sabe V. Exa. com certeza muito bem que, há relativamente pouco tempo, no dia 10 de Fevereiro corrente, foi criada por portaria a possibilidade dos contratos de desenvolvimento para a exportação.
Isto deve-se à acção do Fundo de Fomento de Exportação. Estes contratos para a exportação vão dar às empresas, que deles possam vir a beneficiar, enormes possibilidades de se lançarem em mercados que até aqui nos têm sido vedados. Eu, confesso, espero extraordinários benefícios da aceitação por parte dos industriais desta facilidade que o Governo agora põe nas suas mãos e que permitirá, recebendo grandes benefícios, conseguir para o País os mercados necessários; e, mais ainda, consegui-los sem um grande esforço da entidade privada.
V. Exa., nas referências que fez, assim como o orador que o precedeu puseram bastante ênfase na acção do Estado na orientação das empresas. Devo dizer-lhe que espero essa acção se venha a intensificar cada vez mais.
Só os elementos que estão à disposição das entidades oficiais podem permitir que se oriente o nosso

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esforço industrial num ou noutro sentido. Só esses elementos poderão - dar-nos a ideia de quais os sectores da indústria que devem desenvolver-se e que terão possibilidade de se expandir no mercado alargado que todos nós estamos procurando.
Muito obrigado, Sr. Deputado, por me ter permitido estas considerações, que não fazem mais do que reforçar aquilo que estou ouvindo a V. Exa. com muito interesse.

O interruptor não reviu.

O Orador: - Eu é que tenho de agradecer as palavras de V. Exa., Sr. Deputado. Palavras que intitulo palavras de justiça, que me são sempre muito agradáveis de ouvir, como o são com certeza para todos quantos têm assento nesta Câmara.
Há três anos, quando aqui falei pela primeira vez, referi-me ao Fundo de Fomento de Exportação como uma promissora esperança. Que, três anos depois, V. Exa. possa pronunciar palavras que todos sabemos serem de justiça, que eu próprio as possa confirmar, parece-me que será o maior elogio que poderemos fazer à acção que, neste curto período, o Fundo de Fomento de Exportação tem feito.
Exigem, finalmente, preços competitivos que só o mais barato aprovisionamento e a melhor comercialização permitem.
Tudo isto não está infeliz e iniludivelmente ao alcance de cada uma das pequenas unidades que os números que deixei documentam. É preciso unir esforços, racionalizar produções, fabricar bom, comprar barato e vender bem.
É o que pretende, aproveitando as potencialidades que já há e mantendo a independência de acção que é possível manter, esta lei dos agrupamentos de empresas.
Será necessária? Cremos bem que tudo quanto deixamos dito e, melhor ainda, quanto outros Srs. Deputados aqui disseram, prova à saciedade que uma lei desta índole, nas circunstâncias presentes, é absolutamente necessária. Aliás, confirmação de facto constitui a existência, mesmo antes de ter sido apresentada a actual proposta, de agrupamentos que temos de classificar de semelhantes aos que agora se visam instituir.
E, sendo necessária, e consequentemente útil, será a formulação que nos é proposta a que mais convém?
A experiência não é muita neste campo, nem entre nós, nem mesmo nos países que já promulgaram leis semelhantes. A formulação jurídica não é tão antiga que tenha já deixado tirar todas as ilações, para mais em matéria onde o individualismo e a desconfiança têm indesmentivelmente muita força frenadora. Força que se vai desgastando com o tempo, ao ponto de, hoje, só em França, existirem cerca de três mil empresas que, mais ou menos, invocam as protecções da legislação dos agrupamentos. Daqui por uns anos a experiência será por certo bem maior. Em: nosso entender será mesmo a falta de experiência que apontamos que justificará o carácter que logo à primeira vista ressalta, demasiado fluido e inexpressivo, das bases desta proposta.
Bem sabemos que se trata tão-somente de uma lei, quadro em que há que situar a subsequente regulamentação. Esta, muito mais do que o quadro que agora nos cumpre apreciar, poderá vir a ser mais ou menos efectiva. Mas por tudo quanto dizemos, bem necessário é que muito o venha a ser.
Tudo quanto se possa fazer para incentivar e tornar mais apertada e útil a colaboração interempresarial deve, em nosso entender, ser feito, ainda quando, em determinadas e bem medidas ocasiões, só o possa ser ao arrepio de toda uma mentalidade que não evoluiu quanto devia ter evoluído.
Vimos até aqui o que de bom entendemos tem a proposta em apreço. Cumpre-nos apreciar agora os inconvenientes que porventura possa ter.
Se o campo da nossa economia fosse ainda o que foi no passado, se esta lei se destinasse a jogar em mercado restrito, com certeza que teríamos de pôr sérias reservas a agrupamentos que, se bem dirigidos, não tardariam a conduzir, ramo por ramo, ao domínio mono ou oligopolístico do mercado. Seria então o consumidor que pagaria o entendimento das empresas agrupadas.
Está, porém, a proposta em presença vocacionada para o mercado aberto do futuro, mercado em que o entendimento dos nossos grupos industriais se tem de bater, pelo menos em princípio, com os produtos que as indústrias estrangeiras por certo muito diligenciarão aqui colocar. O problema assim será diferente, pelo menos, sublinhe-se com força, em relação aos produtos que, pelas suas características, admitam a concorrência exterior e "só a esses". Por muito grandes e fortes que possam vir a ser os nossos agrupamentos de empresas, num contexto europeu bem pouco significarão.
No entanto, gostaríamos de frisar o condicionamento que pusemos: para os produtos que, pela sua própria natureza, não sejam susceptíveis de concorrência externa, entendemos que a defesa do consumidor tem de ser devidamente acautelada. E nem tão poucos e tão pouco essenciais serão! Basta que o transporte pese proibitivamente nos seus preços de custo.
Quanto a uma limitação, pelo tamanho ou riqueza, das empresas que possam vir a beneficiar das protecções previstas - no encalce do que estatui a correspondente lei francesa -, pois, apesar de reconhecer que a lei está essencialmente vocacionada para a disciplina e promoção das pequenas e médias empresas (na nomenclatura europeia, de si bem empolada em relação ao que para nós seria de estabelecer), francamente não nos parece que, dada a dimensão de qualquer das nossas empresas em relação à Europa, se deva restringir o benefício.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Somos até de opinião que serão precisamente as nossas maiores empresas (as mais delas médias à escala europeia) que, se bem compreenderem o que lhes é possível tirar desta lei, poderão mais rapidamente alcançar o que, no fim de contas, se pretende: a promoção e o benefício da economia nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas - não quero deixar de lembrar o que, todas as vezes que me tem sido possível, tenho lembrado - um agrupamento, para ser válido, implica sempre reorganização e só valerá na medida em que essa reorganização for profícua e não for travada. Ninguém pode garantir, antes pelo contrário,

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que as reorganizações que se irão processar à sombra desta lei não levem a drásticas reduções dos efectivos de alguns sectores, quando não ao encerramento de algumas unidades.
Condição sine qua non de qualquer verdadeira reorganização, diria mesmo de qualquer progresso industrial, será sempre uma lei do trabalho que permita, sem sacrifícios para ninguém, evidentemente, a mobilidade da mão-de-obra. A lei que temos, tal qual é ou tal qual é interpretada, pois não a podemos, em nosso entender e com toda a sinceridade, ilibar de culpas nem na baixa produtividade de algumas empresas, nem na má situação de alguns sectores.
Há agora a esperança de que, finalmente, o Fundo de Desemprego venha em futuro próximo a desempenhar a missão que nas actuais circunstâncias tem de ser a sua, missão que corresponda, nobre e utilmente, aos sacrifícios que, durante anos sem conta, por ele fizeram e aos direitos que, consequentemente, nele ganharam as empresas e os trabalhadores. Oxalá que a esperança que hoje temos em breve seja promissora realidade.
Cremos bem que será condição necessária do sucesso dos agrupamentos que estamos a discutir.
São estas, Sr. Presidente, algumas das considerações que me parece oportuno aqui produzir em defesa de agrupamentos em que sinceramente vejo valioso instrumento de promoção de inúmeras unidades industriais, comerciais e agrícolas, que, só por si, isoladas, não têm indiscutivelmente os meios técnicos, financeiros e de gestão que são necessários para triunfar no mundo que se aproxima.

O Sr. Alberto de Alarcão: - Muito bem!

O Orador: - Sempre entendi muito injusto que, independentemente, tantas vezes quase ao arrepio do esforço que produzem, no nosso mundo do trabalho se distingam tão claramente os protegidos operários das empresas ricas dos pobres operários de pobres patrões. É com infinita esperança de que esta proposta possa contribuir para a promoção das inúmeras empresas válidas mas pobres que neste País há, que hoje lhe dou, na sua generalidade, a minha aprovação.

Vozes: - Muito bem! Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: O debate continuará na sessão de amanhã. A sessão será à hora regimental, tendo como ordem do dia a continuação, e espero que a conclusão, da discussão na generalidade da proposta de lei sobre agrupamentos complementares de empresas e o início e, possivelmente, conclusão da discussão na especialidade da mesma proposta de lei, no caso de não ser votada qualquer questão prévia tendente a retirá-la.
Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 40 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Fernando David Laima.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
João António Teixeira Canedo.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Duarte de Oliveira.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
João Ruiz de Almeida Garrett.
José Coelho Jordão.
José João Gonçalves de Proença.
José de Mira Nunes Mexia.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
D. Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Manuel Martins da Cruz.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Rui Pontífice Sousa.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alexandre José Linhares Furtado.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António Júlio dos Santos Almeida.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Eugénio Magro Ivo.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Francisco Correia das Neves.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Francisco de Moncada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
João Manuel Alves.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
Jorge Augusto Correia.
José da Costa Oliveira.
José Dias de Araújo Correia.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José da Silva.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Rogério Noel Peres Claro.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Proposta enviada para a Mesa no decorrer da sessão:

Proponho que ao n.°4 da base II da proposta de lei n.° 26/X - Agrupamentos complementares de empresas - seja aditado o texto seguinte:

[...] Desde que o agrupamento emita obrigações é obrigatória a fiscalização da gestão por um ou mais revisores oficiais de contas ou por uma sociedade de revisores oficiais de contas.

Sala das Sessões, 27 de Fevereiro de 1973. - O Deputado, Rui Pontífice Sousa.

IMPRENSA NACIONAL - CASA DA MOEDA PREÇO DESTE NÚMERO 6$40

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