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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA-GERAL PA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA
DIÁRIO DAS SESSÕES
N.° 254 ANO DE 1973 26 DE ABRIL
ASSEMBLEIA NACIONAL
X LEGISLATURA
SESSÃO N.° 254, EM 25 DE ABRIL.
Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto
Secretários: Exmos. Srs.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Amílcar da Costa Pereira Mesquita
Nota. - Foi publicado um suplemento ao n.° 247 do Diário das Sessões que insere o parecer da Comissão de Contas Públicas da Assembleia Nacional acerca das contas da Junta do Crédito Público referentes ao ano de 1971.
SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 10 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foram postos em reclamação os n.ºs 247, 248, 249, 250 e 251 do Diário das Sessões. Atendendo ao número de Diários, o Sr. Presidente considerá-los-á ainda em reclamação na sessão seguinte.
Deu-se conta do expediente.
Para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, foram presentes à Assembleia os Decretos-Leis n.°s 182/73 e 183/73.
O Sr. Deputado Joaquim Macedo defendeu a prioridade das questões económicas e teceu diversas considerações a esse respeito.
O Sr. Deputado Nogueira Rodrigues referiu-se aos diversos problemas da Universidade de Luanda, nomeadamente nos capítulos do pessoal docente e instalações definitivas.
O Sr. Deputado Camilo de Mendonça interrogou a Mesa acerca da possibilidade de o projecto de lei sobre a revisão do regime de rendas de prédios destinados a habitação em Lisboa e Porto ser discutido na presente Legislatura.
Ordem do dia. - Na primeira parte terminou a discussão na generalidade da proposta de lei de reforma do sistema educativo.
Usavam da palavra os Srs. Deputados Dias das Neves, Pinto Machado e Veiga de Macedo.
Na segunda parte iniciou-se a discussão na especialidade e votação da proposta de lei de reforma do sistema educativo.
A votação incidiu sobre o texto sugerido pela Câmara Corporativa, segundo requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Veiga de Macedo e aceite pela Assembleia.
Foram aprovadas, com alterações, as bases I, II, III e IV.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Veiga de Macedo, Camilo de Mendonça, Dias das Neves e Roboredo e Silva.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 20 horas e 5 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 16 horas e 5 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Júlio dos Santos Almeida.
António Lopes Quadrado.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Domingues Correia.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Eugénio Magro Ivo.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
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D. Custódia Lopes.
Delfim Linhares de Andrade.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando David Laima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Moncada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
Henrique Veiga de Macedo.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Duarte de Oliveira.
João José Ferreira Forte.
João Manuel Alves.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
João Ruiz de Almeida Garrett.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Coelho Jordão.
José da Costa Oliveira.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José da Silva.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Júlio Dias das Neves.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luís António de Oliveira Ramos.
D Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Nicolau Martins Nunes.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baessa.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Rafael Valadão dos Santos.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui de Moura Ramos.
Rui Pontífice Sousa.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teodoro de Sousa Pedro.
Teófilo Lopes Frazão.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.
O Sr. Presidentes Estão presentes 85 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 10 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n.ºs 247 248, 249, 250 e 251 do Diário das Sessões.
Em relação a alguns destes números do Diário das Sessões há notas de rectificações, enviadas para a Mesa, por escrito, por serem bastante extensas. Serão publicadas no Diário das Sessões.
Como se trata de cinco números do Diário das Sessões, informo VV. Exas. de que amanhã ainda os considerarei em reclamação, para á hipótese de algum de VV. Exas. não ter tido tempo hoje, ou até agora, de se inteirar totalmente das suas matérias.
No entanto, aqueles de VV. Exas. que tenham rectificações a apresentar a estes números do Diário das Sessões, poderão manifestar-se.
O Sr. Dias das Neves: - Sr. Presidente: Desejo apresentar a seguinte rectificação ao n.° 250 do Diário das Sessões:
Na p. 5037, col. 2.ª, l. 39, onde se lê: "predial", deve ler-se: "judicial".
Na p. 5038, col. 1.ª, l. 13, onde se lê: "turísticas", deve ler-se: "históricas".
O Sr. Presidente: - Continuam em reclamação.
Pausa.
Amanhã ainda poderão ser apresentadas reclamações sobre estes números do Diário das Sessões. Fica por isso até amanhã suspensa a sua aprovação, sendo desde já tomadas em conta as reclamações do Sr. Deputado Dias das Neves e as apresentadas por escrito pelos Srs. Deputados D. Custódia Lopes, Themudo Barata, Alberto Alarcão e Ribeiro Veloso.
Nota de rectificações ao n.° 248 do Diário das Sessões enviada para a Mesa pelo Sr. Deputado Themudo Barata:
Na p. 5002, col. 2.ª:
L. 21: a seguir a "permitir" intercalar "alterar a orientação";
L. 27: a seguir a "eliminar" acrescentar "uma simples palavra";
L. 36: a seguir a "base" acrescentar "outro número";
L. 47: substituir "permitido" por "permitir";
L. 51: substituir "povoações" por "populações mais";
L. 52: substituir "forçados" por "frustrados";
L. 54: suprimir "entre aquilo";
L. 56: substituir "construção" por "concessão";
L. 58: substituir "domínio" por "regime".
Na p. 5003, col. 1.ª:
L. 15: suprimir "não necessariamente privada";
L. 17: substituir "também a" por "também de";
L. 18: substituir "que a proposta" por "e a proposta";
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L. 26: substituir "numa" por "uma";
L. 31: substituir "mentalização" por "orientação".
Na p. 5003, col. 2.ª:
L. 21: substituir "organização" por "orientação";
L. 21 e 22: substituir "sob as acepções" por "com as excepções".
Na p. 5005, col. 1.ª:
L. 47: substituir "artigo seguinte" por "artigo segundo";
L. 56: a seguir a "prazer de" acrescentar "ver";
L. 59: a seguir a "direitos de" acrescentar "diversas".
Na p. 5009, col. 1.ª:
L. 24: substituir "envolver" por "envolver-me" e "jurídicos o" por "jurídicos com o";
L. 50: substituir "aqueles velhos romances em" por "dum daqueles velhos políticos romanos".
Na p. 5009, col. 2.ª:
L. 1: substituir "voltadas" por "votadas";
L. 3: substituir "ainda tempo" por "alguns deles ainda ocasião".
Nota de rectificações ao n.° 248 do Diário das Sessões enviada para a Mesa pelo Sr. Deputado Alberto de Alarcão:
Na p. 4999, col. 2.ª, l. 10 e 11, onde se lê: "desejo fazer a minha proposta de alteração", deve ler-se: "desejo fazer minha a proposta de alteração".
Nota de rectificações ao n.° 249 do Diário das Sessões enviada para a Mesa pelo Sr. Deputado Themudo Barata:
Na p. 5021, col. 2.ª:
L. 5: acrescentar: "classificação das povoações 'em ordens', pois...";
L. 7: substituir "quer" por "quando";
L. 8: a seguir a "expressão" acrescentar "em ordens";
L. 13: substituir "confinados" por "confinantes";
L. 15: substituir "ponto" por "porto";
L. 19: substituir "confinado" por "confinante".
Na p. 5024, col. 2.ª:
L. 12 e 13: substituir "e de interesse rústico" por "terrenos rústicos".
Na p. 5027, col. 2.ª:
L. 7: substituir "uma solução" por "uma observação".
Nota de rectificações ao Diário das Sessões n.° 249 enviada para a Mesa pelo Sr. Deputado Ribeiro Veloso:
Na p. 5015, col. 2.ª, l. 31, onde se lê: "Ministro", deve ler-se: "Ministério".
Nota de rectificações ao n.° 250 do Diário das Sessões enviada para a Mesa pelo Sr. Deputado Alberto de Alarcão:
Na p. 5060, col. 1.ª, l. 19: em vez de "de mais", deve ler-se "demais";
Na p. 5060, col. 2.ª, l. 15: em vez de "além", deve ler-se "alemã";
Na p. 5060, col. 2.ª, l. 19: em vez de "oeste agrícola", deve ler-se "Oeste agrícola";
Na p. 5060, col. 2.ª, l. 61: em vez de "inicitivas", deve ler-se "iniciativas";
Na p. 5061, col. 2.ª, l. 8 e seguintes: a citação termina em comunidade, devendo entender a frase seguinte como comentário do próprio;
Na p. 5061, col. 2.ª, l. 28: em vez de "na ignorância do individualismo", deve ler-se "na ignorância e no individualismo";
Na p. 5063, col. 1.ª, l. 3 a 9: igualmente não são citação, não devendo estar compostas à margem nem ter-se-lhe acrescentado "[...]" no final;
Na p. 5063, col. 2.ª, l. 24: onde se lê: "cársica", deve ler-se: "karstica", tal como se continha na obra citada;
Na p. 5063, col. 2.ª, l. 27: onde se lê: "olhos d'Água do Poço Ão", deve ler-se: "olhos d'água" do Poço Ão;
Na p. 5063, col. 2.ª, l. 44: a citação, as aspas, terminavam em "aspirações" e não após os "..." impressos entre parêntesis rectos.
Nota de rectificações ao n.° 250 do Diário das Sessões enviada para a Mesa pela Sr.a Deputada D. Custódia Lopes:
Na p. 5044, col. 2.ª, l. 22, onde se lê: "destinam-se", deve ler-se: "destina-se";
Na p. 5045, col. 2.ª, l. 47, deve ser substituída por "que não podem ultrapassar e que fica aquém da atingida por outros com o mesmo grau de cultura que seguiram outros caminhos profissionais".
Nota de rectificações ao n.° 251 do Diário das Sessões enviada para a Mesa pelo Sr. Deputado Themudo Barata:
Na p. 5080, col. 2.ª:
L. 40: substituir "no uso desta" por "na";
L. última: substituir "parto" por "começo".
Na p. 5081, col. 1.ª:
L. 25: substituir "1 200 000" por "1 800 000";
L. 29: substituir "população de" por "ocupação de";
L. 32: substituir "empresários" por "empresariais";
L. 43: substituir "nas restantes" por "nessas como nas restantes";
L. 44: substituir "profissionais" por "tradicionais";
L. 46: substituir "culturas" por "explorações";
L. última: substituir "profissionais" por "tradicionais".
Na p. 5081, col. 2.ª:
L. 15: substituir "aprove" por "prove".
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Na p. 5082, col. 2.ª:
L. 57: substituir "profissionais" por "tradicionais".
Na p. 5085, col. 1.ª:
L. 35: substituir "que a da" por "a da".
Na p. 5087, col. 1.ª:
L. 7 e 8: substituir "Moçambique - a norte, na Guiné" por "no norte de Moçambique, na Guiné".
Nota de rectificações ao n.° 251 do Diário das Sessões enviada para a Mesa pelo Sr. Deputado Alberto de Alarcão:
Na p. 5083, col. 1.ª, l. 28: deve acrescentar-se uma vírgula a seguir a "forma";
Na p. 5083. col. 1.ª, l. 32: deve suprimir-se a expressão "em";
Na p. 5084, col. 1.ª, l. 32 e 33: em vez de: "O rentavelmente é um conceito que comporta", deve ler-se: "O economicamente é um conceito que comporta, ou pode comportar";
Na p. 5084, col. 1.ª, l. 35: em vez de: "continua", deve ler-se: "contínuo";
Na p. 5086, col. 1.ª, l. 3 e 4, em vez de: "há outros limites de prazo, nomeadamente", deve ler-se: "há outros limites, de prazo nomeadamente".
Nota de rectificações ao n.° 252 do Diário das Sessões enviada para a Mesa pelo Sr. Deputado Themudo Barata:
Na p. 5099, col. 1.ª:
L. 50: a seguir a "ilustre colega" acrescentar "arquitecto Carlos Ivo".
Na p. 5099, col. 2.ª:
L. 5: substituir "apuramento" por "aforamentos".
Na p.5102, col. 1.ª
L. 28 substituir "adquirindo" por "sentindo".
Na p. 5104, col. 1.ª
L. 35: substituir "tradicionais" por "em termos excepcionais";
L. 39 a 41: ler "usos e costumes, quando é da máxima exigência em não o conceder aos indivíduos mais evoluídos...";
L. 43: a seguir a "põe" acrescentar ", a preocupação de defesa do" e depois segue o texto;
L. 47: eliminar o "e" a seguir a "histórica";
Na p. 5106, col. 1.ª:
L. 8: a seguir a "apropriado" acrescentar "referir aqui os princípios gerais".
Na p. 5106, col. 2.ª:
L. penúltima: substituir "rendas ou foros" por "arrendar ou aforar".
Na p.5107, col. 1ª
L. 10: a seguir a "parques" acrescentar "par"
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegramas
Do pessoal administrativo da Universidade do Porto apoiando a intervenção do Sr. Deputado Oliveira Ramos.
Da Câmara Municipal de Óbidos de felicitações ao Sr. Deputado Meneses Falcão pela sua intervenção acerca do turismo na região de Leiria.
Da Sr. D. Ermelinda Fernandes Carreira e dos Srs. José Lopes Carreira, António Borges Luís, João Nunes Carreira, Vasco da Gama Nunes Coelho, Luciano Pereira, Faiano Braguez e Horácio Esposa apoiando a intervenção do Sr. Deputado Malafaia Novais acerca da ligação da estrada Tondela-Carregal do Sal.
Cartas
Da Acção Católica Rural de S. João das Lampas enviando cópia da exposição remetida ao Sr" Ministro da Educação Nacional em que preconiza a inclusão mo novo sistema de ensino dos princípios indispensáveis sobre as diversas formas de associação e cooperação.
O Sr. Presidente: - Para cumprimento do disposto no § 3.° do artigo 109.° da Constituição, está na Mesa, enviado pela Presidência do Conselho, o Diário do Governo, 1.ª série, n.° 95, de 23 de Abril corrente, insere os seguintes Decretos-Leis:
N.° 182/73, que altera a redacção da capítulo 15.° da Pauta dos Direitos de Importação;
N.° 183/73, que permite a requisição ao ministério da Saúde e Assistência de tecnicamente qualificados para o exercício "funções atribuídas ao Corpo de Inspecção Assistência na Doença aos Servidores Civis Estado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Macedo
O Sr. Joaquim Macedo: - Sr. Presidente: nesta Casa há quatro anos profundamente empenhado em apoiar o movimento de renovação que então se anunciava. Suponho não ter deixado, através da minha actuação na Câmara, qualquer dúvida a este respeito.
Terão notado VV. Exas. nas minhas intervenções dominância de temas económicos, o que a minha experiência, voltada para as actividades industriais, facilmente explica. Há, no entanto, outra razão que entendo conveniente explicitar, através de umas quantas reflexões pessoais sobre a sociedade e as grandes motivações dos comportamentos individuais e colectivos.
Essas reflexões conduziram-me à convicção de que as sociedades tendem a adoptar fatalmente as estruturas políticas mais adequadas ao seu nível de desenvolvimento económico e cultural. Essa evolução paralela e harmoniosa das estruturas sociais e dos correspondentes regimes políticos pode, no entanto, ser coarctada por intervenções autoritárias do Poder constituído, mas à custa de tensões graves, cuja manutenção prolongada pode gerar violentos conflitos.
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Temos então, em lugar de um desenrolar contínuo e pacífico de transformações, uma sucessão de períodos de estabilidade artificial e enganosa e de saltos violentos, regeneradores do equilíbrio perdido. Penso ter sido suficientemente claro quanto à minha decidida opção por soluções reformistas que conduzam a uma evolução pacífica e permanente.
A tarefa dos detentores do Poder Político não deve ser, pois, a de travão de uma evolução natural, mas, ao contrário, a sua primeira, obrigação é a de estarem atentos, não a simples modas evidentemente transitórias, mas às tendências profundas de evolução social que se adivinham, para adaptar as estruturas à nova sociedade que nasce.
Suponho que não deixa dúvidas a ninguém, que observe com um mínimo de atenção o mundo que nos rodeia, de que nos encontramos numa viragem da história. E nem surpreende que assim aconteça. As sociedades tradicionais viveram dominadas inteiramente por profundas carências materiais que condicionavam completamente os comportamentos individuais e colectivos. A dura luta pela sobrevivência constituía a grande e muitas vezes única motivação. E nem sequer a existência de pequenos núcleos de pessoas de alio nível económico proporcionava exemplo diferente, pois estas, em regra, não vivendo pessoalmente as carências gerais, mas, conhecendo-as nos outros, subordinavam-se à preocupação de as evitar. O ter dominava completamente o ser.
E desse forte condicionalismo derivou uma sociedade espartana, pelo hábito das privações e, na ausência de esquemas públicos de previdência, pela preocupação de poupar, humilde e submissa perante a riqueza e o poder, como preço natural da sobrevivência, para garantia da qual se consentem os maiores sacrifícios. Se juntarmos a este quadro o predomínio das actividades agrárias, de influência normalmente conservadora, a dispersão da maioria da população por pequenos aglomerados rurais, e um nível cultural muito baixo, temos completadas as condições para a manutenção de um tipo de sociedade naturalmente estratificada e rígida.
A descoberta e domínio recentes dos mecanismos do crescimento económico e a rápida evolução do progresso técnico vieram desmoronar completamente este equilíbrio e esta estabilidade tradicionais. Os governos passaram a fazer do desenvolvimento económico condição essencial para a eliminação sucessiva e gradual das carências, o seu primeiro objectivo. Aliás, às sociedades estáticas e submissas, que aceitavam como fatais e insuperáveis as dificuldades materiais de toda a ordem, mesmo as mais graves, sucederam-se sociedades reivindicativas e exigentes de bem-estar e de segurança crescentes. É facto comprovado que efectivamente o homem se resigna perante as condições de maior despojamento material, enquanto está convencido do carácter imutável e fatal dessa situação, abandonando completamente essa passividade ao verificar que, afinal, é possível a mudança dessas condições.
Esse progresso económico contínuo, apesar de se ter iniciado a ritmo acelerado há poucas décadas, produziu já, nos países desenvolvidos, níveis de vida completamente insuspeitados em passado recente. Não surpreenderá isso se atentarmos que uma taxa de crescimento anual de 5 % duplica o volume de riqueza colectiva aproximadamente em catorze anos, de modo que cada geração desfruta de um nível de vida quatro vezes superior ao da anterior, em igual Idade. E níveis de crescimento de 10%, como os que se observam no Japão, dão origem a aumentos de riqueza de oito vezes, no intervalo de duas gerações.
Eis-nos, pois, nalguns países, já no limiar da sociedade da abundância, enquanto outros dela se aproximam a passos largos. O alto nível de riqueza colectiva e a generalização de oportunidades de obtenção de rendimentos que dele deriva, aliados a esquemas de segurança social, que eliminam situações anormais de necessidade, fizeram desaparecer o risco de sobrevivência material e estenderam quase a todos um nível de satisfação de necessidades que já ultrapassa de longe as consideradas essenciais. Desaparecido esse espectro que nas anteriores gerações condicionou inteiramente o comportamento social, não surpreende que estejam a surgir sociedades inteiramente novas, norteadas por quadros de valores diferentes dos tradicionais. À estabilidade sucedeu a mudança, e não apenas na decoração exterior do homem, mas também no trabalho, na residência e nos hábitos, impulsionada por um progresso técnico estonteante. Essa multiplicação de oportunidades de ganho e o espectáculo de prosperidade geral evidente que afastam o anterior receio de privações presentes ou futuras graves fazem aumentar a independência das pessoas, antes submissas perante quem reconhecessem poder auxiliá-las, e afastar o espectro das dificuldades materiais. Ao espartanismo de vida, o novo clima de facilidades económicas faz substituir uma busca, muitas vezes incontrolada, de prazer.
Por outro lado, as novas gerações começam a ser muito sensíveis à qualidade de vida, rejeitando profissões penosas e combatendo a deterioração do ambiente natural, provocada pela intensa actividade industrial e pela acumulação de detritos, ligada a padrões muito elevados de consumo. A poluição passou muito rapidamente a constituir preocupação muito generalizada.
Eis-nos assim a viver um tempo de transição, em que, aos problemas novos que despontam e aos quais os jovens são tão sensíveis, não sabemos oferecer senão soluções clássicas e ultrapassadas.
Mas, com esta sociedade avançada, coexistem largas zonas atrasadas, de ritmo de evolução tão lento, que o fosso que as separa das nações progressivas, em lugar de se esbater, aumenta dia a dia. E as diferenças não se medem já apenas em termos estatísticos de consumos médios individuais. São concepções diferentes de vida que estão em jogo, e, portanto, os desníveis revestem acentuações muito mais de qualidade do que de quantidade. É como que a imagem da ficção científica de Huxley, no Admirável Mundo Novo: ao lado de uma sociedade altamente refinada no plano da técnica e das comodidades de vida, as reservas onde se vive a vida tradicional, com todas as suas dificuldades e privações.
E aqui desemboca este longo exórdio com que macei a paciência de VV. Exas.: a imperiosidade de um crescimento económico muito rápido, salvaguardadas as cautelas que o exemplo dos países mais avançados aconselha. Vivendo em contiguidade geográfica com regiões muito desenvolvidas é indispensável não deixar que o nosso atraso tenha repercussões na qualidade de vida que podemos sob pena de nos esvaziarmos da população em pro-
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veito das sociedades progressivas. A experiência recente da nossa emigração deve constituir motivo de profunda reflexão para nós.
Daí que defenda a prioridade dos problemas económicos. Não em visão exclusivamente tecnocrática de procura do progresso material como um fim em si mesmo, mas como meio de acesso a um tipo de sociedade diferente, em que os problemas materiais perdem a sua importância dominadora para deixarem surgir novas preocupações generalizadas de cultura e de liberdade de vida.
A outra nota que desejaria sublinhar é a de que, aceitando a eminência de uma sociedade nova, se devem buscar as estruturas políticas que a ela se ajustem, com abertura de espírito e participação de todos nas soluções que também a todos comprometem e implicam.
Tenhamos bem presente a máxima evangélica, tantas vezes comprovada através da história, de que "não se pode guardar vinho novo em odres velhos".
Era, efectivamente, a estes dois pontos que se dirigiam estas minhas congeminações: a necessidade de rápido progresso económico para termos acesso à nova sociedade que se adivinha e a procura de estruturas políticas que acompanhem essa evolução social.
E não pressinto na actividade económica o dinamismo indispensável. Muito ao contrário, continuamos a assistir ao espectáculo de uma agricultura arcaica, vivendo ainda em grande parte voltada para o autoconsumo e que vemos lentamente definhar, sem que se adivinhem ainda as mudanças estruturais inevitáveis e urgentes.
No plano industrial votámos o ano passado um documento essencial, que consubstancia uma nova política que o Governo em boa hora e muito louvavelmente entendeu por bem propor. Dispenso-me de repetir os elogios que na ocasião lhe teci.
Simplesmente, lançar as bases de uma nova política industrial, mais adequada aos condicionalismos que vivemos, é muito, mas não é tudo. É necessário aplicá-la e, uma vez que ela repousa basicamente na iniciativa privada, temo bem que esta continue a revelar a - falta de dinamismo de que tem dado provas. Por isso tenho defendido nesta Casa com particular empenho, em várias ocasiões, a intervenção supletiva do Estado na actividade produtiva, em colaboração com capitais particulares, para colmatar essa deficiência. Permitam-me VV. Exas. que na despedida da actividade parlamentar volte a insistir no problema.
Sabemos que o investimento em Portugal é baixo, quando comparado, mesmo em valores relativos, com níveis europeus. Estatísticas da O.C.D.E. recentes indicavam para o período de 1966-1970 o valor de 18,6% para Portugal contra 24,8 %, 27,2% e 25,6%, respectivamente para a Espanha, Grécia e Turquia e 24%, 27,2% e 25,4% para a Suécia, Suíça e Alemanha, para citar países em diferentes níveis de desenvolvimento.
Há escassez de investimento e, por outro lado) uma grande abundância de capitais disponíveis, como todos verificamos, que por falta de aplicações suficientes se encaminham demasiado para o consumo, com todo o cortejo de pressões inflacionistas que daí resultam. Também criticamos os detentores de aforro pela sua declarada preferência pelo investimento imobiliário e por esta recente corrida à especulação bolsista; mas, de facto, que outras alternativas lhes são oferecidas?
Bem poucas, efectivamente. De facto, a nossa estrutura industrial repousa principalmente sobre sociedades familiares, as quais, para assegurarem o domínio dos empreendimentos, se fecham aos capitais alheios.
Na falta, pois, de grupos industriais dinâmicos suficientes e que para alimentar essa iniciativa se abram à participação de muitos pequenos accionistas tenho defendido a intervenção do Estado sob a forma de constituição de sociedades de economia mista. E, como mostra o exemplo italiano do IRI, os capitais públicos podem actuar simplesmente como catalisador dos capitais particulares, pois que os primeiros são, neste caso, apenas um décimo dos últimos. Aliás, também em Portugal se verificou, no caso das hidroeléctricas, que a presença do Estado constitui factor de confiança muito importante para motivar o afluxo das. pequenas poupanças.
À defesa das empresas de economia mista corresponde normalmente a crítica de que se trata de uma tendência socializante. Seria conveniente não nos esquecermos, porém, da existência de empresas deste tipo em Portugal - e também de que elas constituem um importante sector na economia -, além da Itália, da Espanha, da França e da Alemanha, por exemplo.
Mas as empresas mistas exigem, para constituírem factor de dinamização da vida económica, que sejam geridas segundo as regras das sociedades privadas e lhes seja dada grande autonomia na escolha de dirigentes. O preenchimento destes lugares não pode ser a recompensa de favores políticos, mas resultar de uma verdadeira selecção por mérito. Só colocando essas empresas dentro de objectivos de lucro se pode aferir verdadeiramente a eficácia e acerto da sua gestão. E a existência de capitais privados força, exactamente, a atender-se fortemente à sua remuneração.
No caso português não conheço a extensão do sector de economia mista existente, mas suponho não ser já insignificante a sua importância, pelo que se me afigura indispensável desde já a existência de uma estrutura de coordenação. Tentei introduzir um aditamento nesse sentido na Lei de Fomento Industrial, mas não logrei obter a concordância da Câmara. Contra ele foram invocadas razões que continuam ainda a não me convencer, - inclusive a de que punha em perigo a elegância da lei ... Nunca me apercebi, realmente, da gravidade desse perigo!
Não pretendo significar com a minha insistência que a solução funcione como panaceia para os nossos problemas industriais. Seria, certamente, apenas uma de entre outras. A corrente emigratória que nos esvazia, a, ligação que em boa hora estabelecemos com o Mercado Comum, o desequilíbrio crescente da nossa balança comercial e a necessidade, que no princípio desta intervenção aflorei, de podermos ter acesso, pelo aumento do nosso nível de rendimento, a uma sociedade nova que se anuncia bem exigem que nos empenhemos com urgência e com decisão em vencer o desafio do desenvolvimento económico.
O Sr. Nogueira Rodrigues: - Sr. Presidente: A educação constitui sector das actividades nacionais reputado como dos mais influentes na evolução harmónica dos países. São consideráveis as fracções dos produtos nacionais brutos investidos neste campo. Facultando a cada indivíduo o acesso ao saber, é ainda função
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fundamental de um sistema educacional promover a formação do pessoal qualificado necessário à eficaz concepção e execução dos diversos programas de trabalho que integram a actividade comunitária:
Consciente destes factos, tem a Nação acompanhado o processo de elaboração da reforma do ensino que vem sendo concretizada pelo Ministério da Educação Nacional
Ora, se são sempre de encarecer as incidências de uma reestruturação educacional, torna-se clara a relevância que assume em casos como o do Estado de Angola, não só pelo esforço de promoção das populações, que se insere como ponto basilar na política ultramarina portuguesa, como pela carência em meios humanos que advém dos elevados valores das taxas de desenvolvimento que se têm verificado e que se podem prever em face das potencialidades.
É sobre a cúpula do sistema educacional angolano que nos propomos falar.
Antes disso, parece conveniente tecer rápidas considerações sobre o panorama educacional angolano.
À data do início da actividade escolar dos Estudos Gerais Universitários de Angola, em 1963-1964, com 286 alunos, a população escolar da província era de 153 088 no ensino primário, 11 447 no ensino liceal e 9549 no ensino técnico. Encontrava-se o sector educacional numa fase de arranque por um mais rápido crescimento do número de alunos nos diversos níveis, como reflexo de uma política de maior investimento no ensino. Assim, os números em 1971-1972 eram de 464 837, 60 997 e 2385 nos níveis primário, secundário e superior, respectivamente, havendo a assinalar entretanto a existência do ensino médio, cujas actividades se iniciaram no ano lectivo de 1969-1970, abrangendo os domínios do comercial, industrial e agrícola e com uma população escolar em 1971-1972 de 1375 alunos.
Em resumo, no ensino primário passou-se em oito anos de 153 088 para 464 837, a uma taxa média anual de crescimento de 16%. O ensino secundário viu os seus alunos aumentar de 20 996 para 60 997, a uma taxa anual de 14%. A população universitária aumentou de 286 para 2385, a uma taxa de 31%.
Embora de forma simples, os números apresentados permitem avaliar do esforço feito na promoção do acesso ao ensino. Cálculos mais cuidados certamente que mostrariam índices mais baixos, à escala europeia, mas tornar-se-á ocioso acentuar as dificuldades a demover numa política de cobertura escolar do território angolano. Torna-se no entanto necessário ultrapassar alguns obstáculos, e Angola, estamos certos, crescerá também neste sector, factor fundamental da evolução do conjunto.
Porém, ao prever-se uma maior afluência ao ensino, é evidente a necessidade de corpos docentes mais numerosos, bem como a ocorrência de um incremento no número de candidatos à frequência do ensino superior. A Universidade terá de funcionar assim, não só como fonte mais fecunda de professores dos outros graus de ensino, mas servindo também de última, e principal instância de elaboração do saber para aqueles que se revelarem mais aptos nos graus inferiores, que são tantos mais quanto maior for, logicamente, o acesso ao ensino.
Longe do espírito destas palavras minimizar a missão da Universidade, considerando-a como uma
"fábrica" de bacharéis em número que satisfaça as encomendas em termos de necessidades dos corpos docentes dos outros graus de ensino. Somente pretendemos manifestar a convicção de que a Universidade fomenta o desenvolvimento do ensino a todos os níveis, mas tem de se precaver a tempo contra a realimentação que se processa a cada momento, dimensionando-se de acordo com ela e com as características da colectividade em que se integra, mas nunca abdicando do nível de actuação que se exige a instituições da sua natureza.
A Universidade de Luanda, criada em 1962, sob a égide do Governador-Geral Venâncio Deslandes, tem orientado a sua actividade no sentido de estabelecer uma estrutura sólida, adoptando em cada estágio do seu desenvolvimento fórmulas que, ajustando-se ao desempenho digno da sua função, lhe permitam projectar-se para o futuro segundo critérios de racionalidade. Assim, às tarefas inerentes à missão da Universidade em cada momento têm-se adicionado as importantes acções de prever a evolução da conjuntura angolana, planear de acordo com as capacidades próprias e com os condicionalismos exteriores e executar os programas estabelecidos. Tais preocupações são comuns a quem tenha de administrar uma actividade colectiva, mas ganham acentuada relevância num organismo com a dimensão e a missão delicada de uma Universidade em formação.
No que respeita à actividade no presente, parece-me razoável analisá-la em três pontos: no sector docente (ensino propriamente dito), no sector de investigação e no sector de interligação Universidade-meio exterior.
No domínio do ensino, são ministrados quase todos os cursos das Universidades da metrópole, e sobre o seu nível elementos autorizados se têm pronunciado muito favoravelmente.
A investigação é tida como actividade enquadrada nos objectivos de uma Universidade. Só uma instituição persorutante do sector universal que é objecto da ciência a que se dedica pode facultar a um professor a qualificação suficiente para incutir nos seus alunos o espírito científico, impedindo a sua própria cristalização, e, o que é mais grave, contribuir para a da própria instituição que serve. Sabemos que este aspecto está presente nos dirigentes da Universidade de Luanda, e, embora não seja de esperar que nesta base da sua existência (preparação do pessoal, instalações provisórias e consolidação da sua orgânica) apresentasse já estruturas perfeitas de investigação, é facto que uma política realista de aproveitamento dos recursos disponíveis tem permitido a realização de trabalho útil. Para tanto tem contribuído a colaboração das Universidades metropolitanas, nomeadamente através do envio de professores em comissão de serviço, que têm sido a base humana das realizações ao longo destes anos.
Para além da sua actuação intrínseca, é hoje inegável a projecção da Universidade no exterior. Como exemplos poderemos citar o caso do Museu de Mineralogia e Geologia, situado em lugar bem central de Luanda, e que, mercê dos moldes modernos em que está instalado, convida o visitante a debruçar-se sobre os temas a que dizem respeito os diferentes mostruários, ficando esclarecido mediante a leitura de quadros criteriosamente dispostos acerca dos recursos geológicos de Angola e do seu grau de utilização.
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Um outro exemplo, o das publicações úteis dos cursos de Agronomia e Silvicultura, fornecendo informação rica a um sector importante de Angola.
Ainda um outro aspecto, o Gabinete de Estudos Psicotécnicos, com curto tempo de vida, mas com tal acolhimento que está neste momento a braços com dois milhares de inscrições para exames de orientação profissional. Noutro aspecto ainda, e este de larga divulgação recentemente na imprensa angolana, a realização de um corso de extensão universitária sobre a elaboração de um plano director, realização esta em colaboração com a Câmara Municipal de Luanda. É pois um facto a existência, de uma relação Universidade-meio exterior, em termos que excedem o simples fornecimento anual de um contingente de licenciados e bacharéis.
Tem resultado das afirmações públicas de dirigentes da Universidade angolana a preocupação dominante de se estruturar, por forma a assegurar a sua capacidade de resposta às solicitações que a prosperidade recente de Angola motivará. Tal modo de pensar conduz à recusa de soluções, por vezes mais fáceis ou espectaculares, mas que não apresentam garantias de servir, a longo prazo, as necessidades do Estado.
Deduz-se das suas declarações que os factores que mais preocupam são os do pessoal (nomeadamente o do pessoal docente), o da instauração de um esquema de organização que permita uma gestão eficaz e o das instalações.
No capítulo do pessoal docente, é de encarecer, como já fizemos, o contributo essencial das congéneres metropolitanas, materializado, nomeadamente, pelo envio de alguns dos seus professores em regime de comissão de serviço. Sem esta solução teria sido difícil atingir o nível obtido de realização.
Todavia, impõe-se o estabelecimento de quadros próprios, pelo que tem sido fomentada com especial cuidado a preparação científica e pedagógica de pessoal docente. Tal política conduziu já à prestação, com êxito, de provas académicas de mais de trinta docentes, de entre professores catedráticos, extraordinários e doutorados. É também de cerca de trinta o número de licenciados que estagiam, actualmente, no estrangeiro, preparando o seu doutoramento.
Quanto à gestão, houve já o cuidado de contratar uma firma especializada metropolitana no sentido de efectuar os estudos necessários a uma melhoria do sistema.
Pelo que depreendemos, porém, constitui problema mais preocupante, de momento, o das instalações. Dispersa por três pólos (Luanda, Nova Lisboa e Sá da Bandeira), a Universidade de Luanda tem processado os seus trabalhos em ambiente físico provisório. E se é certo que foram atingidos, como referimos, níveis condignos de realização, não o é menos que há que evitar a protelamento de tomadas de decisão para a adopção de soluções definitivas.
No caso presente, é manifesto o interesse da instituição em construir as instalações definitivas das suas dependências de Luanda. Para lá de outras razões, há um motivo que torna premente o início breve dos trabalhos de construção. A população discente universitária ultrapassa, hoje, os três milhares de alunos e as previsões levam a admitir que se atinjam, em 1979, os sete milhares, só no núcleo de Luanda.
Este número é reputado como sendo o limite para o funcionamento de um núcleo universitário. Nestas condições, projecta-se o desenvolvimento e autonomia progressiva dos núcleos de Nova Lisboa e de Sá da Bandeira, duas novas Universidades em embrião. Antes disso, porém, ter-se-ão saturado as possibilidades das instalações provisórias de Luanda, tendo já sido encarada publicamente a hipótese de limitação do número de alunos de Ciências e Engenharia no ano lectivo de 1974-1975.
Ouvimos já pôr em causa a racionalidade económica da existência de uma Universidade em Angola. Fundamenta tal atitude a comparação entre o custo de uma Universidade e o custo das bolsas necessárias ao envio de jovens para as Universidades metropolitanas, ou mesmo estrangeiras. Embora cônscios de que tal posição não tem aceitação, referimo-la até porque desse modo poderemos testemunhar assim quanto nos é cara a existência da Universidade de Luanda.
Referimo-la, mas não concordamos com os fundamentos invocados. Se é inconveniente a separação dos jovens do meio ambiente em que vivem e onde se deseja se formem como homens, há ainda a apontar que a presença da Universidade, contribuindo de forma decisiva para a formação de um espírito cultural, promoverá rapidamente as condições atractivas, ao melhor nível, das cidades angolanas, especialmente naquelas em que se situam núcleos universitários.
E, se é notório o esforço da Universidade de Luanda no sentido de adaptar os seus ensinos e as suas investigações à realidade de Angola, é também natural que o mesmo aconteça em outras Universidades, em relação à conjuntura que mais proximamente as rodeia.
Assim, foi o reconhecimento do facto de nos parecer incontestável a razão de ser da existência do ensino superior em Angola que nos levou a esta intervenção. Nela procuramos reflectir a atenção com que Angola acompanha os primeiros anos da sua Universidade. É ainda o interesse que dedicamos aos seus problemas que nos leva a proferir as afirmações seguintes:
A primeira, dirigida à Universidade de Luanda, na pessoa do seu magnífico reitor, professor catedrático Ivo Soares - que com visão, esclarecimento e muita inteligência, a que alia dotes de coragem e sacrifício pessoal, tem lutado por fazer da Universidade de Angola o que Angola carece -, tem por fim testemunhar a percepção da população angolana acerca de quão importante é para si a Universidade de Luanda, da validade de que se tem revestido a sua acção e da confiança que deposita na idoneidade do trabalho a desenvolver na consolidação de uma Universidade que a sirva em moldes modernos, beneficiando das congéneres metropolitanas, evitando praticar os mesmos erros e adoptando as soluções aplicadas com sucesso, sempre que se adaptem às realidades de Angola.
A segunda tem por fim formular votos para que não faltem à Universidade de Luanda os meios necessários para dotar Luanda, Nova Lisboa e Sá da Bandeira das instituições universitárias de que Angola carece.
Especificamente, no que respeita à construção das instalações definitivas do núcleo de Luanda, de que sabemos estão em curso a elaboração dos projectos e anteprojectos, foram já apresentadas as propostas da Universidade enumerando os meios necessários forma a integrarem-se no IV Plano de Fomento.
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O ensino não pode ser encarado em termos de rentabilidade no sentido de apurar qual o rendimento do capital investido. É indispensável à comunidade. Não podemos discutir quanto investimos. O problema terá de ser posto em termos de melhor forma de utilização do capital investido, tendo em vista os objectivos a atingir.
Acabamos, assim, por manifestar a certeza de que o Governo, na pessoa de S. Exa. o Sr. Ministro do Ultramar, que sempre tem apoiado a actividade da Universidade de Luanda, cuidará, com o habitual carinho, da melhor forma de solucionar os momentosos problemas que se lhe depararão nos próximos
Srs. Deputados: - Srs. Deputados: Vamos passar à ordem do dia
O Sr. Camilo de Mendonça: - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente - O Sr. Deputado Camilo de Mendonça pediu a palavra para?
O Sr. Camilo de Mendonça: - Era para interrogar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.
O Sr Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: Acabámos de receber há dias o parecer sobre o projecto de lei n.° 8/X, acerca da revisão do regime das rendas de prédios destinados a habitação em Lisboa e Porto. Eu queria interrogar a Mesa para saber se efectivamente este projecto de lei é ou não ainda discutido nesta sessão legislativa.
O Sr. Presidente: - Não vejo possibilidade de esse projecto de lei ser trazido à atenção da Câmara, para discussão, antes do termo da sessão legislativa, que, como V. Exa. sabe, é daqui a cinco dias.
O Sr. Camilo de Mendonça: - Nesses termos, eu suponho que, em virtude do artigo 100.° da Constituição, o projecto decai e terá de ser reposto para poder ser discutido. Será exacta a minha interpretação?
O Sr. Presidente: - O que o artigo 100.° da Constituição diz é que as propostas ou projectos não discutidos não carecem de ser renovados dentro da mesma legislatura. Como a legislatura está a acabar...
O Sr. Camilo de Mendonça: - Consequentemente, têm de ser repostos, não é verdade?
O Sr. Presidente: - Parece que é assim.
O Sr. Camilo de Mendonça: - Nessas circunstâncias podem os assustados ficar tranquilos.
O Sr. Presidente: - Pois, como ia dizendo, vamos passar à
Ordem do dia
cuja primeira parte tem por objecto a conclusão da discussão na generalidade da proposta de lei de reforma do sistema educativo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Dias das Neves.
O Sr. Dias das Neves: - Sr. Presidente: A proposta de lei n.° 25/X, em discussão, é, pelo seu significado, pela influência que pode vir a ter na formação da sociedade portuguesa do futuro, aquela que, na legislatura que ora acaba, tem maior importância no contexto legislativo desta Câmara, logo após a proposta de alteração da Constituição Política.
Ao tomarmos parte na sua discussão, move-nos o propósito firme de colaborar com o Governo, e com S. Exa. o Ministro da Educação Nacional, cujos esforços e intenções de dotar o País com um sistema educativo adequado às necessidades presentes, com vista à preparação do futuro, são bem patentes, sem perder de vista que tal sistema terá de desenvolver-se em termos de se não perder o comboio da Europa, preservando, contudo, os valores intrínsecos, morais e espirituais, que constituem o património nacional, nem a estrutura pluricontinental e plurirracial da Nação Portuguesa.
Entendemos que na hora actual a reforma de qualquer sector de actividade tem de revestir um carácter essencialmente dinâmico, adequando-se as realidades económicas e sociais em plena evolução. O actual estádio de evolução da sociedade portuguesa, cuja aceleração do desenvolvimento é uma realidade indiscutível, mercê da superior orientação governativa imprimida por S. Exa. o Presidente do Conselho Prof. Marcelo Caetano, exige, neste como noutros sectores, uma reforma adequada de sistemas e estruturas que, assentando no que é essencial da continuidade, realize a evolução que se impõe.
O sistema educativo português reflecte, hoje, ao que parece, a crise de todos os sistemas educativos mundiais, em especial os europeus, que não resistem à pressão do volume de alunos que o procuram e muito menos aos seus modos contestatários nos ramos superior e secundário.
Neste sentido, muitas medidas se projectaram já nesses países e outras entraram em execução, noutros estão em curso, para execução a breve trecho, estudos que visam a remodelação estrutural dos sistemas escolares.
O Governo da Nação, ao pretender colocar o ritmo do desenvolvimento nacional ao ritmo do desenvolvimento europeu, desafio que a si próprio e às forças vitais da Nação impôs, não podia alhear-se da remodelação que se impunha no seu sistema educativo, sabendo que este é causa e efeito do mesmo desenvolvimento.
A reforma do sistema educativo afigura-se-me, pois, necessária e oportuna.
Todo o sistema educativo contido na proposta em discussão assenta em dois princípios fundamentais, que S. Exa. o Ministro Veiga Simão tem proclamado desde que iniciou a sua "batalha da educação" - o princípio da igualdade de oportunidades perante a educação e a democratização do ensino, fazendo deste último, conforme palavras suas, o "ideal que para nós só se extinguira com o último sopro de vida", e que expressa como "a base de uma filosofia que advoga o acesso dos bens da cultura de todos os cidadãos, em função exclusiva dos seus méritos, independentemente das condições sociais e económicas de cada um".
São princípios que ninguém discute, razões que todos aceitam, só que da enumeração dos princípios à reali-
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zação na prática há todo um longo caminho que tem de ser percorrido, com passos seguros, na senda do progresso.
O sistema educativo proposto resultou de um projecto do sistema escolar, que S. Exa. o Ministro Veiga Simão classificou de aberto, equitativo, diversificado, individualizado e inter-relacionado, e que foi posto à apreciação da Nação inteira, que sobre o mesmo se pôde pronunciar.
Esta atitude pareceu-nos salutar na medida em que teme pelo menos dois aspectos positivos:
1) Suscitar a crítica com vista à melhoria do sistema;
2) Permitir a participação de todos na construção do seu próprio futuro.
Só foi pena que não pudesse chegar ao nosso conhecimento todo o conjunto de respostas que influíram em algumas mudanças em relação ao projecto inicial, o que poderia ter sido feito, pelo menos em resumo, num necessário relatório que antecedesse a proposta, a cuja falta já a Câmara Corporativa, no seu extraordinário e bem elaborado parecer, se referiu.
O princípio da igualdade de oportunidades perante a educação, entendido no sentido moderno, não é mais uma igualdade de acesso à educação, mas trata-se cada vez mais de uma igualdade de resultados.
Assim entendido, o princípio obriga à generalização do ensino pré-escolar como condição primeira, para que à entrada do sistema escolar se apresentem todos com a mesma formação, que faça depender os futuros resultados apenas da capacidade de cada um.
É uma medida de longo alcance social, cujos frutos havemos de saber colher. É que uma generalização deste ensino tem certamente esta vantagem, mas aparece também ao mesmo tempo como uma forte preponderância num esquema de planeamentos estatal do ensino, que importa evitar, pois é à família que caberá, nestas idades, a educação dos filhos.
Daí que aceitemos a medida, mas apenas como meio supletivo, quando à família seja de todo impossível realizar essa educação.
O ensino primário é considerado obrigatório em todos os sistemas educacionais de todos os países. Porém, os mais evoluídos consideram já nitidamente insuficiente o nível de conhecimentos ministrados por este ensino aos cidadãos, por forma que possam desempenhar um papel útil na sociedade.
A educação de base, visando dar a cada indivíduo uma preparação mínima, engloba para além do ensino primário já uma parte do ensino secundário.
O sistema contido na proposta, que inclui no ensino obrigatório o ensino primário e o ciclo preparatório, está entrando decisivamente no entendimento moderno deste preceito, o que levará o alargamento da escolaridade obrigatória para oito anos, portanto com saída aos 14 anos, idade em que os alunos terão de escolher um dos dois caminhos: via escola ou via trabalho.
Ligado a este problema da educação de base, está o de generalização do ensino secundário a camadas cada vez mais vastas da população escolar. É que à saída do ensino básico perde-se para o ensino uma parte, que não é mais pequena, dos que terminam o ciclo preparatório e que vão seguir, pelas mais variadas razões, pela via do trabalho.
Para estes se estabelece, no n.° 7 da base II, o seguinte
Os alunos que abandonem o sistema escolar no termo do ciclo preparatório [...] poderão ingressar em cursos de iniciação ou formação profissional.
Aqui suscita-se uma pergunta: Onde se faz esta iniciação profissional? Quem faz? E nem os n.ºs 1 e 5 da base XIV resolvem esta questão, e poderemos concluir que, se o aluno abandona o sistema educativo, então, a iniciação profissional será feita em centros especiais de aprendizagem, ou nas empresas.
A ideia de dar pelo menos uma formação manual, e mais recentemente uma iniciação completa às técnicas de produção, em centros de aprendizagem especiais não é uma ideia nova. Durante todo século passado, países europeus, mais evoluídos, como a Inglaterra, Alemanha, Suécia, etc., utilizaram o sistema que pouco a pouco abandonaram.
A aprendizagem num estabelecimento de ensino é um elemento permanente dos sitemas modernos de formação de trabalhadores especializados.
Isto faz com que o problema da escolha entre aprendizagem no seio da indústria e no seio da escola esteja hoje totalmente ultrapassado e a solução desejável seja uma harmonização das duas fórmulas. A cooperação entre a indústria e o ensino tende a tornar-se cada vez mais estreita e mais geral, e, nos sistemas mais avançados, prevêem em certos domínios uma formação assegurada conjuntamente pelas empresas industriais e comerciais e pelas escolas profissionais; por isso nos parece a colocação da Iniciação profissional para os alunos que terminam o ciclo preparatório fora do sistema educativo também ultrapassada, pelo que perfilhamos a solução da Câmara Corporativa.
Acresce, ainda, que no nosso país, dadas as assimetrias de desenvolvimento regional e a concentração industrial e comercial nas duas maiores cidades do País, a colaboração das empresas na iniciação profissional é muito restrita por falta de dimensão, por falta de estrutura e por falta de todas as condições necessárias a uma mesma formação.
O desenvolvimento do País a partir de certo nível exige o aproventamento de todas as capacidades e conduz à necessidade de dispor de um número cada vez maior de pessoal habilitado em graus de ensino secundário e médio, e se o sistema escolar não deve subordinar-se ao desenvolvimento económico, a verdade é que não pode ignorá-lo sem correr o risco de desajustamento perigoso.
O Governo, ao procurar dotar cada concelho com, pelo menos, uma escola preparatória e de ensino secundário em todas as localidades onde se justifique, pelo nível de desenvolvimento e as potencialidades em recursos económicos e humanos as imponham, dispõe já de 316 escolas preparatórias, 156 escolas técnicas e 90 liceus, está fazendo um esforço grandioso e a todos os títulos louvável para conseguir uma rápida e eficiente democratização do ensino.
Entretanto, a generalização do ensino secundário põe um problema de muita gravidade e de solução, senão impossível, pelo menos muito difícil: o do equilíbrio entre a qualidade e o desenvolvimento do ensino. É que, ao pretendermos acelerar rapidamente a difusão do ensino secundário, corremos o risco de à quantidade ser sacrificada a qualidade.
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Situa-se neste contexto o problema de preparação dos professores. Todos sabemos que, por muito bem estruturado que seja um sistema educativo, ele está condenado a um sério fracasso, se não puder contar com os professores necessários para a sua execução.
A conveniente preparação dos professores para os diversos escalões do ensino constitui a única garantia do nível de acção educativa.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - É, portanto, com forte regozijo que verificamos que o sistema educativo proposto atribui a mais alta importância a este assunto, e faz questão numa perfeita preparação pedagógica dos agentes docentes aos níveis pré-escolar, primário e secundário através das escolas de magistério primário, Escola de Educadores Infantis, escolas normais superiores - e institutos de ciências de educação.
Para além desta preparação pedagógica, indispensável e necessária, impõem-se, porém, medidas tendentes à dignificação da função docente, revendo-se a situação de todo o pessoal docente, principalmente dos professores primários e do ciclo preparatório, liceal e técnico, onde cerca de 70% é eventual, sem qualquer preparação pedagógica e já com reduzida preparação científica.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O sistema educativo proposto estabelece um esquema de formação de professores que me parece do maior interesse, apenas com um senão: de que o professor se faz no convívio diário e permanente com os alunos, vivendo-os, e não ainda agarrado aos livros, com as suas próprias preocupações académicas.
Está demonstrado que nos primeiros graus do ensino não há grande prejuízo em diminuir um pouco a qualidade do ensino, desde que antecipadamente se faça a preparação dos professores e a preparação metodológica e didáctica das matérias.
O sistema só começará a produzir os seus professores dentro de quatro a seis anos; entretanto, correm-se os riscos de diminuir um pouco a qualidade do ensino ou de perder talentos e capacidades potenciais ocultas na massa populacional que não tenha acesso ao ensino secundário; ficaria para sempre perdida, com prejuízo para a Nação. A opção está feita, e não podemos deixar de apoiá-la.
As medidas preconizadas na proposta de lei para a formação dos professores, cujos frutos esperamos que sejam os melhores, não conseguirão ser mais do que belas manifestações de intenção se aos professores não for feito pagamento justo.
O Sr. Serras Pereira: - Muito bem!
O Orador: - Enquanto o professor primário entrar na sua profissão com todas as habilitações legais exigidas, e se lhe pagarem 3400$ mensais, para no fim de trinta anos atingir 4830$, a profissão não constituirá incentivo para ninguém e afastará todos aqueles cuja realização vocacional atraiu, que não podem dedicar--se, e revoltará os que, estando, não têm já possibilidades de sair. Importa rever o sistema de diuturnidades, para compensar a falta de acesso destes servidores do Estado, assunto que foi objecto da minha menção anterior.
Ainda assim fica em aberto o tipo e a duração do ensino secundário e da sua estruturação em face dos dois objectivos últimos do ensino - facilitar o desenvolvimento das qualidades pessoais, finalidade principal, e fornecer mão-de-obra qualificada, atentas as necessidades do desenvolvimento económico, e que não podem ser ignoradas.
Até hoje, as tendências, nos países em vias de evolução, do ensino secundário têm procurado responder às necessidades de mão-de-obra. Uma política deste género pode admitir-se, apenas e só, com o carácter temporário correspondente a uma fase de crescimento económico com utilização de técnicas menos avançadas, porém, em fases mais evoluídas já se não admite esta perspectiva.
Por um lado, perante a evolução constante das técnicas, uma das qualidades mais necessárias, hoje em dia, é a aptidão para mudar de especialização e de trabalho, a todos os níveis, mesmo nos superiores - isto implica um sistema de ensino aberto e diversificado, que permita uma rápida mobilidade dos alunos, não só no plano horizontal, como num sistema de equivalências curriculares que permitam acesso a novos graus.
Verifica-se, por outro lado, que hoje é o técnico de mais vasta e sólida cultura geral aquele que é preferido nos postos de mais responsabilidade, não só porque os seus conhecimentos assentam numa base mais ampla mas também porque os pode aplicar a um maior conjunto de problemas.
Em Portugal, até ao momento presente, de há vinte e cinco anos para cá, ter-se-á dado preferência ao desenvolvimento do ensino técnico profissional, a quem o País fica devendo os mais altos serviços, pois, durante este período, forneceu os técnicos a todos os níveis, que proporcionaram o desenvolvimento económico, que sem refutação possível foi dado obter neste período, e que, a par de uma formação especializada, procurou dotar com uma formação geral mínima necessária.
Neste período, as escolas técnicas passaram de 50, em 1945, para 156, em 1972, e dos 37 000 alunos de então passaram a ser 177 000. No plano financeiro o esforço não foi menor, pois se passou de uma dotação de 26 000 contos para 644 000 contos, em 1970.
E, apesar deste esforço, não se queixaram ainda os trabalhadores portugueses de um excesso de técnica. Porém, se pensarmos que, em 1970, pouco mais de 35% dos 70 000 alunos aprovados na 4.ª classe prosseguiram estudos secundários, podemos sentir bem quanta riqueza potencial imensa de valores humanos é perdida para todas as actividades do nosso país e de como se justifica todo o esforço neste sector.
O caminho percorrido pelo ensino técnico dignifica-o como ramo de ensino, ao serviço da Nação, que tem realizado a sua missão e é expressão de uma opção política tomada no momento em que se iniciou o estudo no I Plano de Fomento, a que se seguiram mais três, e sem o qual a realização destes Planos não poderia ter ido tão longe.
Será que o actual estádio de desenvolvimento económico do nosso país justifica outra orientação para este ramo de ensino? Aqui fica a pergunta, para a qual as entidades responsáveis certamente terão já encontrado a resposta.
Se, como se afirma, o ensino profissional imprime um estigma de inferioridade em relação ao ensino li-
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ceal, a causa não é ser intrinsecamente superior ou inferior, pois o que são é diferentes, preparam para caminhos diferentes.
O que terá dado o carácter de inferioridade às escolas técnicas foi sempre a falta de uma regulamentação conveniente das profissões a que se dirigiam, mas também o facto de, durante o século passado, se terem utilizado as escolas industriais como ocupação nos estabelecimentos penitenciários, ou para fins filantrópicos, para proporcionar ajuda aos órfãos, a crianças pobres e desempregadas, tudo com vista à obtenção de uma mão-de-obra boa e barata.
Não é, pois, o ensino que é inferior, mas sim o mau que dele terão feito entidades responsáveis, embora com as melhores intenções. Só a partir da 1.ª Grande Guerra se olharam estas escolas segundo uma óptica mais favorável, e elas terão contribuído, nas últimas décadas, para o aproveitamento e formação de muitos milhares de jovens, que sem elas teriam ficado pela escolaridade obrigatória.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Outra razão porque parece um ensino inferior será porque se ocupou sempre das crianças provenientes das famílias com economias menos favorecidas, chegou onde o liceu não quis ou não pôde chegar, mas isso também não impediu que pela via do ensino técnico atingissem o nível superior pessoas que hoje ocupam lugares proeminentes nos altos postos da vida nacional.
No actual sistema educativo, ao alargar-se a base de recrutamento pela difusão do ciclo preparatório e do ensino secundário por todo o País, e com o estabelecimento dos actuais cursos gerais, em que se retira aos cursos professados tudo o que é profissionalizante em favor de uma cultura geral, procurando-se promover mais uma equivalência global do ensino secundário para efeito de continuação de estudos e entrada na profissão, está procurando evitar-se os malefícios de uma educação que se pensa exclusivamente técnica.
Neste ponto situa-se a encruzilhada da mão-de-obra especializada necessária às actividades económicas a este nível etário, como podemos verificar através da pirâmide de emprego do nosso país. Como se faz a aprendizagem? Quem faz?, são perguntas a que o sistema proposto não responde, pois os n.ºs 5 e 6 da base VII da proposta estabelecem como finalidade do ensino secundário preparar para a sequência dos estudos, ou entrada na vida prática após adequada formação profissional.
Entendemos que este procedimento contradiz em parte o princípio de igualdade de oportunidades.
O princípio de igualdade de oportunidades será respeitado, sim, se puderem coexistir os dois ramos e, simultaneamente, ser oferecido às crianças um ensino secundário onde, através de uma conveniente orientação escolar, possam ser encaminhadas para um ou outro ramo, sem todavia se perder de vista que a evolução das crianças não é um processo estandardizado e que a orientação que é válida hoje poderá não ter sentido amanhã, quando, num salto de desenvolvimento físico e psíquico, o equilíbrio, antes orientado, seja desfeito.
Por isso, sem contrariar o esquema apresentado no projecto, defendi e continuo a defender que o ensino profissional tem o seu lugar próprio no sistema o que é o mesmo dentro do sistema educativo.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Assim se conseguirá uma continuidade educativa onde ressalta que a formação profissional, tal como a escolar, não podem ser abandonadas ao arbítrio de instituições e organismos económicos privados, mas devem ser integradas numa unidade onde o futuro da criança deixe de ser jogo de rivalidades de dois ou mais ministérios, algumas religiões, alguns milhares de patrões e instituições diversas.
O Sr. Eleutério de Aguiar: - Muito bem!
O Orador: - As escolas secundárias polivalentes constituirão, pois, um dos elementos da maior importância para a realização desta igualdade de oportunidades, desde que ministrem um ensino diversificado e permitam uma rápida mobilidade dos alunos.
Têm de proporcionar a todos uma preparação geral que lhes permita amanhã ingressar no ensino superior em condições equiparadas, mas não podem deixar de fornecer aos que o desejem os princípios válidos de uma formação tecnológica com vista à sua futura inserção na vida profissional.
Ainda assim a realização do princípio da igualdade de oportunidades exige o afastamento de outros factores exteriores, como a debilidade da economia familiar, o afastamento dos locais de ensino, a falta de ambiente familiar, pela sua função sócio-cultural que, a par da orientação escolar, é absolutamente necessário realizar através de bolsas de estudo, casas de estudantes, subsídios de transporte e toda uma gama de auxílios para os mais variados fins.
Nesta matéria o I. A. S. E. tem já desempenhado nestes dois anos da sua existência uma vasta obra. Contudo, penso que cada vez mais a acção deste Instituto deve ser supletiva e apenas em casos especiais, pois só uma elevação geral dos padrões da vida dos Portugueses, que há-de resultar do processo de desenvolvimento em curso, há-de permitir a livre escolha de acordo com as reais capacidades dos alunos. Há, pois, um longo caminho a percorrer ainda.
Uma nota apenas sobre o ensino permanente, por me parecer sector da mais alta importância no sistema educativo proposto, pois, organizado na sua forma de educação recorrente, transformará definitivamente a educação, que até há pouco era privilégio de alguns, num direito de todos.
Precursora desta modalidade de ensino foi a acção denodada e brilhante do nosso prezado colega nesta Câmara Dr. Veiga de Macedo, que, quando Subsecretário de Estado da Educação Nacional, promoveu, no seu vasto plano de educação popular e na sua campanha de educação de adultos, uma obra do maior alcance nacional. Para além da escolaridade obrigatória dos quatro anos, possibilitou a alfabetização de uma percentagem da população portuguesa nunca mais atingida e, o que é mais importante, despertou para o ensino das crianças pais que, não tendo nunca sido motivados, ignoravam totalmente os benefícios de educação sem grande preocupação por isso.
Com este ensino permitirá dar-se aos indivíduos possibilidades de ultimar os seus estudos ao longo da vida, ascender a níveis de cultura e graus profissionais mais elevados.
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A rápida evolução técnica e científica são razões fortes que impõem o ensino permanente.
Não é possível dar hoje aos jovens uma formação completa e muito menos definitiva, dada a complexidade da técnica actual e a sua grande mobilidade, e se o tentarmos os programas tomarão uma amplitude incomportável para os alunos.
Um aspecto que merece a nossa maior atenção, neste momento em que novos caminhos se abrem à educação, consiste na nova interpretação que se pretende dar àquilo que se chama educação recorrente, que para muitos tem já um significado muito mais extenso do que a simples educação de adultos.
Esta pressupõe, na forma de educação recorrente, uma alteração nos escalões tradicionais do ciclo da vida entre períodos de escolaridade e período de trabalho, para responder às necessidades nascentes da sociedade moderna e às disposições dos indivíduos.
Neste esquema se incluem os cursos complementares, as Universidades abertas, de que hoje tanto se fala.
Cada vez mais se pensa que a educação não deve ser considerada como monopólio da juventude, e que convém pôr em causa a existência de programas reservados exclusivamente ou principalmente aos jovens.
Além disso, mesmo ao nível primário, o conteúdo dos programas escolares não deve ser apenas determinado pela ideia de que a escolaridade acabará no momento em que o aluno atinja uma certa idade: devem ser definidos e expostos em função da hipótese de que um indivíduo fará um uso recorrente dos meios de ensino colocados à sua disposição durante uma grande parte da sua vida.
Tudo indica que a educação permanente não vai ser apenas um prolongamento do sistema educativo normal, mas constitui uma parte central desse sistema.
Assim se conseguirá um aumento de possibilidades e uma maior igualdade de oportunidades durante a educação.
Feitas as contas, parece que este conceito de educação recorrente faz realçar a criação de um novo direito cívico adaptado às necessidades de uma sociedade em rápida evolução. Trata-se de conceder a cada indivíduo um direito à educação, que ele pode em princípio decidir exercer ao longo da sua vida. Segundo as suas preferências para esta ou aquela, repartirão entre o seu tempo de trabalho e os seus prazeres.
Verdadeira revolução inovadora poderemos considerar o tratamento que a proposta dá ao ensino superior, quando a um esquema unificado a que se submetia a Universidade se substitui um esquema diversificado, onde coexistem as Universidades, os Institutos Politécnicos, as Escolas Normais Superiores e outros estabelecimentos equiparados.
A nova estruturação do ensino superior irá permitir uma melhor distribuição dos candidatos por vários cursos de índole superior, e permitirá também, através de uma regionalização das escolas e cursos respectivos, conseguir a desmassificação da Universidade, problema maior que hoje aflige esta instituição.
Dos novos estabelecimentos de ensino superior, a Escola Normal Superior, ao formar os professores do ciclo preparatório, vem preencher uma grave lacuna do nosso sistema educativo e permitir uma mais adequada formação pedagógica e científica orientada a docência, que me parece de maior relevo realçar.
Os Institutos Politécnicos, cuja criação já tinha sido proposta pelo Ministro Hermano Saraiva, que transformou num projecto de proposta de lei, parecer favorável da Câmara Corporativa, são estabelecimentos de ensino onde será ministrado de matérias que podem e devem ser tratadas a nível superior, sem excluir que para além deste sejam tratadas nas Universidades.
A referida evolução tecnológica, no domínio das mais variadas actividades económicas, impõe a utilização de técnicas cada vez mais avançadas, cujo suporte de conhecimentos as coloca no plano do ensino superior.
Assim nos parece que o ensino politécnico irá estar ligado às diversas actividades económicas, das quais depende e, ao mesmo tempo, é motor, e a quem irá fornecer técnicos de nível superior.
A distribuição deste tipo de ensino por alguns centros urbanos do nosso país com maiores potencialidades quanto ao futuro desenvolvimento económico, vem ao encontro de uma necessidade de descentralização do ensino superior e constitui um motor das actividades económicas nele instaladas ou a instalar. Será, penso eu, um elemento decisivo ma execução de um processo de desenvolvimento regional ordenado, se simultaneamente forem tomadas as outras medidas que se impõem para efectivar o processo.
É, pois, uma medida de grande projecção política e social, no plano do ensino e no plano económico geral, que desejamos realçar por nos parecer dos momentos mais relevantes da proposta.
O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: A reforma do sistema educativo que estamos a discutir é fruto de um longo processo de estudo e meditação, a que não são de modo nenhum alheios os trabalhos do Ministro Leite Pinto, que, mercê da sua inteligente visão dos problemas da juventude integrados no contexto da Nação terá dado à educação em Portugal o maior impulso de sempre, e do Ministro Galvão Teles, que na sua acção coordenadora dotou o Ministério da Educação das infra-estruturas e órgãos de apoio, que permitiram já ao Ministro José Saraiva e a S. Exa. o Ministro Veiga Simão efectuarem e empreenderem a reforma que dia a dia se tornava mais necessária.
Ela contém, em si, todos os elementos que podem contribuir para fazer singrar Portugal no caminho de um futuro digno e próspero que todos desejamos; só necessita que no plano dos programas e dos cursos a estabelecer os professores e outros agentes que o hão-de executar interpretem bem o pensamento de S. Exa. o Ministro da Educação e realizem a evolução que se deseja na continuidade dos princípios e valores que fizeram de Portugal nação cristã, prestigiada e admirada entre os povos.
Dou, pois, a minha aprovação na generalidade, reservando, porém, para a especialidade a oportunidade de formular alguns esclarecimentos mais sobre as perguntas que deixo em suspenso.
Vozes: - Muito bem!
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O Sr. Pinto Machado: - Sr. Presidente: Tenho perfeita consciência de que, neste ocaso da X Legislatura, os minutos, porque preciosos, não devem ser desperdiçados. Por isso quase me tinha decidido a abster-me de intervir no debate em curso. De facto, que poderia eu dizer que não tivesse sido dito ao cabo de tantos discursos? Se, por fim, resolvi subir a esta tribuna, foi por ter reconhecido que alguns aspectos importantes, quer da proposta de lei n.° 25/X, quer da problemática em que se integra ou com que se relaciona, merecem ser iluminados por luz mais viva.
Um sistema educativo nacional, na sua concepção discussão e funcionamento, bem como na avaliação contínua dos seus resultados, deve ligar-se a duas referências fundamentais, que são sua âncora, seu motor e sua meta: uma ideia do homem e uma ideia de nação.
"Todo o ser humano é pessoa, ou seja, uma natureza dotada de inteligência e vontade livre; e por isso é sujeito de deveres e direitos que dimanam directa e simultaneamente da sua própria natureza. Por serem assim universais e invioláveis, de forma alguma se podem alienar" (João XXIII, Pacem in Terris, n.° 9). Deste personalismo decorre que o bem comum "consiste principalmente na defesa dos direitos e deveres da pessoa humana" (obra cit., n.° 60), pelo que "a função primordial de qualquer poder público é defender os direitos invioláveis da pessoa e tornar mais viável o cumprimento dos seus deveres" (Pio XII, Radiomensagem de Pentecostes, 1941).
A educação constitui elemento nuclear do bem comum, já que ela é precisamente o processo por que se opera a formação de cada ser humano, que o torna apto à sua realização plena pelo exercício responsável da liberdade. A educação é, pois, um direito fundamental do homem.
A educação deve ter quatro características essenciais: ser integral, ser personalizada, ser interior e ser permanente.
O Sr. Carvalho Conceição: - Muito bem!
O Orador: - A educação deve ser integral, visto que a unidade da pessoa exige uma formação que desenvolva todas as suas capacidades e atenda a todas as suas aspirações. No âmago dessas capacidades e dessas aspirações está a sua abertura aos outros, em dom livre e total de si mesmo, dom que é o modo específico pelo qual se realiza o crescimento pessoal. De facto, se é pela posse que se cresce no ter, é pela oblação que se cresce no ser - ora é o ser, e não o ter, que é. "A pessoa é uma existência capaz de se libertar de si própria, de se descentrar para se tornar disponível aos outros" (Emmanuel Mounier, O personalismo, Moraes Editores, 3ª edição, Lisboa, 1970, p. 65). A educação, para ser autêntica, tem de promover a união de cada um com todos, pela qual o homem se liberta.
A educação deve ser personalizada, já que, se todas as pessoas são iguais em natureza e, portanto, em dignidade, cada pessoa é única, é acontecimento singular, irrepetível e insubstituível. A educação de cada homem deve, pois, adaptar-se ao seu ser próprio.
A educação deve ser interior, isto é, operar-se de dentro, porque, se os outros são indispensáveis ao
desenvolvimento integral de cada um, se pode ser autor do seu próprio crescimento. Na sua educação cada qual deverá agir como sujeito, activa e livremente, por convicção pessoal, e não deixar-se manipular como objecto passivamente obediente a imposições estranhas.
A educação deve ser permanente, pois a capacidade de progresso pessoal é incessante, o desenvolvimento do ser não tem limites em ninguém, o contínuo ultrapassar-se é o sal da existência.
Uma pessoa, ao nascer, é recebida e integrada numa família e numa nação.
A família é uma sociedade cujo vínculo é o próprio sangue. Este laço define biológica e burocraticamente a família, mas não basta para a caracterizar como realidade viva no plano moral. A comunhão de sangue apenas vale enquanto prefigura uma solidariedade radical, que constitui o autêntico cimento da unidade familiar e a norma suprema para julgar da sua real consistência. De familiares entre quem reina a indiferença ou até impera a malquerença dizemos que "nem parecem família", e os amigos verdadeiros consideramo-los "como se fossem família".
É precisamente em referência à família, como família ampliada, que melhor se compreende o que é nação. Como acontece com todas as realidades vivas, sobretudo as mais complexas, não é fácil definir nação. Nação implica um solo, um povo e uma história. Mas o elo vivo da unidade nacional é a solidariedade efectiva de todos os cidadãos na construção da biografia de cada um, na definição e execução das tarefas colectivas e na fruição dos bens que delas resultam. A unidade nacional não se decreta, vive-se, e é a sua vivência o agente do seu próprio fortalecimento.
O Sr. Almeida Garrett: - Muito bem!
O Orador: - "Só quando uma bandeira representa o bem-estar e a justiça para o povo poderá ser respeitada como símbolo de uma pátria", afirmou recentemente o Governador e comandante-chefe das Forças Armadas da Guiné, general António de Spinola, em alocução dirigida a seiscentos novos soldados africanos que juraram bandeira em Bolama (O Século, 4 de Abril de 1973, p. 5).
A unidade nacional, que é a maior força de uma nação, não é estática, pois a sua intensidade é directamente proporcional ao grau de solidariedade de facto existente entre todos os seus membros. Tudo o que reforça essa solidariedade fortalece a unidade nacional - e, portanto, a nação -, e tudo o que a diminui enfraquece-a. Por isso, as práticas discriminatórias que dêem privilégios a uns, mas despojem os outros do que legitimamente lhes cabe, que reconheçam a uns direitos que não reconhecem aos outros, que concedam só a uns o gozo e só a outros o sacrifício, que à mesa da mãe-pátria dêem lugar apenas a alguns, deixando aos restantes as migalhas caídas no chão - em suma, todos os actos que, atentando contra a justiça, firam a solidariedade nacional e desse modo sejam ocasião de escândalo e facto de enfraquecimento da união mútua -, devem e têm de ser consideradas eminentemente antinacionais e criminalmente punidas em conformidade.
Vozes: - Muito bem!
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O Orador: - Tal como o Sr. Deputado Almeida Garrett, também eu considero que "uma só atitude é humanamente digna e politicamente válida: pensar claro e falar claro" (Diário das Sessões, n.º 247, de 11 de Abril de 1973, p. 4986). Apenas acrescento que é ainda indispensável actuação clara - diria, cristalina -, rigorosamente coerente com o pensamento que se defende, pois é no terreno existencial da vida vivida que cada um se define decisivamente perante Deus, perante os homens e perante si mesmo. Na hora grave que Portugal e o Mundo atravessam são necessários, sem dúvida, pensadores esclarecidos e esclarecedores. Creio, porém, que as grandes mensagens já foram concebidas e comunicadas. Do que sobretudo se carece é de homens que as encarnem com pureza imaculada e delas nos falem pela exemplaridade eloquente da sua vida. Talvez que a situação de rotura que dilacera o mundo moderno seja devida em grande parte a ser hoje aguda, intolerável e universal a consciência da contradição profunda entre os altos princípios oratoriamente proclamados e os actos concretamente realizados pelos que têm sido os senhores da história.
Uma pessoa, ao nascer, é recebida e integrada numa nação, do que lhe resultam desde logo direitos - aliás já era sujeito deles ainda antes de nascer - que à comunidade nacional compete respeitar -e garantir. Um dos mais fundamentais é o direito à educação. Como cada pessoa é ser "para" cuja originalidade se desenvolve, exprime e realiza em relação de comunicação com os outros, de disponibilidade aos outros, de serviço dos outros, a sua educação deve proporcionar-lhe conhecimento verdadeiro e suscitar-lhe amor autêntico à nação de que faz parte: eis a educação nacional, forja de cidadãos ao serviço do seu país na construção de uma vida em comum fundada na verdade, guiada pela justiça, movida pelo amor e realizada na liberdade (cf. João XXIII, Pacem in Terris, n.° 35).
O Sr. Pinho Brandão; - Muito bem!
O Orador: - Quanto a mim, são estas, Sr. Presidente, as traves mestras que devem sustentar um sistema educativo e que não se podem perder de vista ao analisar a proposta de reforma que o Governo propõe à consideração da Assembleia Nacional.
No seu parecer, a Câmara Corporativa estranha que o texto da proposta "não venha precedido de preâmbulo, ou não venha acompanhado de relatório justificativo que facilite a hermenêutica da proposta de lei e, implicitamente, o acesso à respectiva filosofia, para não falar já de mais fácil entendimento da matéria regulada em algumas bases" (parecer n.° 50/X, Actas da Câmara Corporativa, n.° 146, X Legislatura, 1973, p. 1974).
E no relatório da nossa Comissão de Educação Nacional, Cultura Popular e Interesses Espirituais e Morais - de que faço parte -, elaborado e apresentado ao plenário pelo Sr. Deputado Aguiar e Silva, afirma-se que "muito contribuiu também para dificultar o trabalho da Comissão o facto de a proposta de lei não vir acompanhada de qualquer relatório preambular" {Diário das Sessões, n.° 246, de 7 de Abril de 1973, p. 4955).
Associei-me a estes reparos, embora essa falta não me tenha afectado apreciavelmente a compreensão da filosofia e da economia do diploma governamental, pois, como refere a Câmara Corporativa no seu aludido parecer, "a proposta beneficia, quanto ao seu entendimento, do facto de ter sido divulgada, nas suas linhas gerais, através dos dois documentos programáticos dimanados do Ministério da Educação Nacional, há mais de dois anos, de ter sido precedida de constantes alusões ministeriais ao relevo e urgência do tema e, da larguíssima consulta feita praticamente a todos os sectores interessados do País" (p. 1974).
A mim, o que me fez falta foi a proposta não ser precedida de exposição descritiva e crítica do sistema educativo vigente, visto esse conhecimento ser indispensável para se julgar da oportunidade e alcance da reforma que o Governo propõe.
Ter-me-ia sido muito útil que o parecer da Câmara Corporativa houvesse preenchido a lacuna.
O sistema educativo actual não difere essencialmente, em seus objectivos, organização e pedagogia, do existente nos princípios do século, o que significa' que se mantém um modelo de educação escolar concebido para serviço e conservação de um tipo de sociedade já desaparecido. As reformas posteriores, mesmo quando mereceram essa designação, foram sempre parcelares e sem integração orgânica num todo coerente. Disto resultou uma descoordenação e até desconexão entre os diferentes ramos, níveis e graus de ensino, com manifesto prejuízo da formação global dos alunos, sua reorientação no sistema e suas possibilidades de ascensão social.
O carácter fechado do sistema no que respeita a reingresso a partir do mundo do trabalho e a passagem de um ramo para outro agrava-se pelo facto de cada um dos diversos tipos de ensino ter cursos preestabelecidos e de estrutura curricular única. Os efeitos desastrosos desta extrema rigidez atingem importante dimensão dada a ausência de orientação educativa e vocacional.
Na prática, existem dois sistemas educativos paralelos e independentes, a que correspondem duas dignidades de ensino e duas metas sociais: a auto-estrada liceu-Universidade, que conduz aos postos de comando na sociedade, e o caminho térreo do ensino técnico, que conduz às posições subordinadas.
Ora, o ingresso num ou noutro destes dois sistemas não depende das capacidades reais dos estudantes, mas sim de condicionamentos sócio-económicos, com grave ofensa dos direitos das pessoas e forte prejuízo do interesse nacional.
Como do Brasil se diz no relatório que precede o anteprojecto de lei elaborado pelo grupo de trabalho nomeado pelo Ministro da Educação e Cultura para estudar a reforma do ensino primário e secundário, também em Portugal as escolas pós-primárias foram agrupadas "em ramos paralelos que, reflectindo ainda uma vez a estratificação social, mantinham o dualismo de ensino (secundário) para os nossos filhos e ensino (profissional) para os filhos dos outros" (P. José de Vasconcelos, Legislação Fundamental - Ensino de 1.° e 2.° graus, Lisa - Livros Irradiantes S. A., S. Paulo, 1972,. p. 16).
A absoluta dependência do sistema educativo de um centralismo burocrático implacável acentua a sua rigidez, adia sine die adaptações conjunturais urgentes e esteriliza a capacidade inovadora dos professores, por estes reconhecerem que o exercício de tal capacidade, além de inútil, é perigoso para a sua segurança profissional.
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A função docente, alvo dos maiores encómios em discursos de circunstância, é retribuída com remunerações irrisórias, dada a sua altíssima relevância social, as qualificações e tarefas exigidas aos seus agentes e o custo, dia a dia mais elevado, dos meios indispensáveis à sobrevivência.
O Sr. Carvalho Conceição: - Muito bem!
O Orador: - Mal paga, a função ficou desprovida de interesse económico; burocratizada e exercida em condições radicalmente antipedagógicas, esvaziou-se de atractivo humano e cultural.
De tudo isto resultou, como era inevitável, uma penúria de professores, o que levou ao remedeio de recrutar muitos sem um mínimo de competência científica e pedagógica, mais se deteriorando a qualidade do ensino e mais se desprestigiando a função. Um testemunho público recente é bem expressivo quanto à situação do professorado liceal.
Foi ele prestado pela Dr.a Amélia de Matos, do Liceu de D. Duarte, de Coimbra, na audiência concedida pelo Ministro da Educação Nacional a uma representação de professores liceais de todo o País que foi manifestar-lhe a sua satisfação pelo decreto-lei que estabeleceu as diuturnidades por que há tantos anos lutavam.
Disse aquela professora:
A geração a que pertencemos habituou-se a não contestar e a não exigir: solicita, aguarda e, no fim, se vê deferidas as suas pretensões, agradece! Tempos difíceis lhe deixaram impressão no carácter estes vincos de obediência, resignação e reconhecimento. Entre as presentes e em quantas aqui gostariam de estar, mas não puderam comparecer, V. Exa. pode encontrar quem arrasou a saúde para enfrentar um exame de admissão ao estágio organizado em moldes verdadeiramente desumanos; quem durante dezenas de anos permaneceu na situação de agregada, sem ganhar nas férias; quem passou a considerar como sinónimo de "férias" a palavra "incerteza", pois não sabia se no ano escolar seguinte era colocada ou não; quem, começando o ano lectivo em 1 de Outubro, recebia o primeiro ordenado em Janeiro ou Fevereiro do ano seguinte; quem, após trinta anos de bom serviço, aguardava ainda uma efectividade e tinha um ordenado e um horário exactamente igual aos que iniciavam a sua carreira docente.
Assim, a geração a que pertencemos, quando reconhece que os ventos da história mudaram de direcção e alguém chegou a esta Casa com a intenção de colocar o professor - o principal agente da educação e do ensino - no seu devido posto, não pode deixar de se regozijar e de lamentar não ter nascido vinte anos depois! (O Século, 13 de Abril de 1937, p. 5.)
O Sr. Pinho Brandão: - Muito bem!
O Orador: - Testemunho semelhante poderia ser apresentado pelos professores dos outros ensinos, até pelos docentes da Universidade, que vivem, exclusivamente ou quase, do seu vencimento. Como é possível tratar assim os que têm nas mãos o futuro do País?!
Do ponto de vista curricular, avultam deficiências sérias de organização e conteúdo, este muitas vezes desactualizado pelos progressos da ciência e da técnica, pelo desenvolvimento da cultura e pelas transformações económicas, sociais e políticas. A centralização já referida impede as indispensáveis flexibilidade, diversificação e renovação dos currículos, e cedo os torna reumáticos, estereotipados e caquéticos.
Na didáctica predomina, ou é exclusivo, o verbalismo abstracto de índole meramente informativa e mnésica. Não há, ou é insuficiente, o espaço para a observação pessoal dos factos e sua interpretação e para a aplicação dos conhecimentos à resolução de problemas da realidade circundante. O ensino enche cabeças, mais que as forma, esvazia-se de sentido educativo, e a relação professor-aluno reduz-se a circuito cibernético de emissão, recepção e contrôle. A adopção de livro único em muitos tipos de ensino refinou esta antididáctica.
Os exames, naturalmente, têm cunho exclusivamente selectivo, aprovando ou rejeitando em função da quantidade de informação acumulada. Aliás, a carência de material didáctico, de professores e de especialistas em ciências de educação impede uma aprendizagem activa, em que se associem harmoniosamente trabalho pessoal e trabalho de grupo.
A insuficiência acentuada de instalações escolares obriga a concentrações massificantes de alunos, e número significativo de estabelecimentos de ensino de todos os níveis são funcionalmente inadequados e até se encontram em mau estado de conservação.
A resultante de todos estes factores reciprocamente influentes é um ensino de muito deficiente qualidade e de produtividade baixíssima, com elevado número de repetências e desistências e, consequentemente, elevados custos por aluno diplomado. Para se ter uma ideia de quanto custa ao erário público este desperdício de luxo bastará indicar que, no ano lectivo de 1960-1961, só as reprovações no ensino primário terão custado à Nação - e apenas em termos de vencimentos pagos ao pessoal docente- 100 000 contos [cf. Instituto de Alta Cultura, Centro de Estudos de Estatística Económica: Projecto Regional do Mediterrâneo - Evolução da Estrutura Escolar Portuguesa (metrópole) - Previsão para 1975].
As deficiências pedagógicas afectam sobretudo os alunos pertencentes a classes sócio-economicamente débeis, visto que a falta de elementos favoráveis e a actuação de factores desfavoráveis ao seu desenvolvimento físico e psíquico torna-os particularmente sensíveis a um ensino mal ministrado, eles que precisamente necessitam de uma pedagogia de alta qualidade.
O Sr. Carvalho Conceição: - Muito bem!
O Orador: - É em tais alunos, pois, que a selecção opera as grandes ceifas (cf. ob. cit., p. 26), o que significa que para eles os cursos são mais longos, alongamento este incomportável com os recursos económicos dos pais - daí a grande percentagem de desistências nos alunos destas classes sociais. Temos, portanto, um sistema educativo que, em vez de estar ao serviço da justiça social, mantém e reforça as injustas desigualdades existentes entre filhos da mesma pátria; um sistema educativo que, em vez de ser agente de mobilidade social, é, pelo contrário, factor activo de imobilismo.
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Em face desta situação, trágica e alarmante, não admira que uma das palavras de ordem apontadas à acção do Governo de Marcelo Caetano pelo Sr. Presidente da República tenha sido a de realizar a democratização do ensino - "democratização do ensino" foi precisamente esta a expressão usada pelo Sr. Almirante Américo Tomás no discurso que proferiu na sessão solene de abertura da X Legislatura (cf. Diário das Sessões, n.° 3, de 2 de Dezembro de 1969, p. 22).
O Sr. Pinho Brandão: - Muito bem!
O Orador: - Foi, pois, S. Exa. que introduziu a expressão na vida parlamentar e na vida governativa. Democratização do ensino significa, no entendimento actual, o acesso de cada pessoa às modalidades e graus de ensino correspondentes às suas capacidades e tendências, independentemente da condição sócio-económica.
O Sr. Pinho Brandão: - Muito bem!
O Orador: - Dada, porém, a influência de factores desta natureza no aproveitamento escolar e no tempo de escolaridade -como já se referiu -, não é possível uma autêntica democratização do ensino sem democracia económica e social. É certo, porém, que com uma acção social escolar eficiente, uma distribuição geográfica criteriosa de estabelecimentos de ensino dos diversos níveis e ramos, uma didáctica adequada, uma orientação educativa competente e um sistema escolar aberto é possível aumentar consideravelmente as oportunidades de muitos que, de contrário, as terão quase nulas.
O Sr. Presidente da República reconheceu com lucidez que um dos aspectos em que é mais gritante e intolerável a desigualdade efectiva entre os Portugueses é o da satisfação do direito à educação. Actuar no sentido de cada vez melhor o garantir a número cada vez maior é exigência da dignidade das pessoas, da solidariedade nacional e do desenvolvimento económico, social e cultural do País.
Com este mandato do mais alto magistrado da Nação, o Sr. Presidente do Conselho anunciou, em comunicação radiotelevisiva de 17 de Janeiro de 1970, pronunciada a propósito da remodelação ministerial operada dias antes, que o Governo estava empenhado em travar a "grande, urgente e decisiva batalha da educação" (Marcelo Caetano, Mandato Indeclinável, Editorial Verbo, Lisboa, 1970, p. 95). "Aqui as dificuldades são múltiplas, porque aos defeitos das estruturas, às carências que não podemos remediar de um dia para o outro, se juntam estados de rebeldia ou de inconformismo, e, em certos sectores, mesmo de obstrução sistemática, que dificultam a acção dos governantes." (Ob. cit., pp. 94-95.)
E no acto de transmissão de poderes, realizado em 15 de Janeiro de 1970, o Prof. Veiga Simão, que o Presidente do Conselho chamara ao Governo para realizar a reforma global do sistema educativo, declarou quase a terminar o seu discurso:
Não estamos decididos a perder tempo, pois o sistema vigente atingiu o ponto de rotura, e não queremos assistir, como principal responsável, à sua total desagregação (Prof. Doutor Veiga Simão: Batalha da Educação. Discursos Pronunciados em 1970 pelo Ministro da Educação Nacional).
Do que tem sido a acção reformista do Ministério da Educação Nacional nos anos de 1970, 1971 e 1972 colhe-se pálida, mas expressiva, ideia pela leitura da lista de decretos e decretos-leis promulgados (e em execução), incluída no parecer da Câmara Corporativa (p. 1975), e que mereceu a esta Câmara o seguinte comentário:
Por esta simples enunciação, que poderia ser mais completa (em todos os graus de ensino [...] as medidas tomadas por simples despacho, ao abrigo da legislação permissiva de experiências pedagógicas -Decreto-Lei n.° 47 587, de 10 de Março de 1967 -, são em elevado número), se avalia bem a extensão dos objectivos reformadores do Governo em matéria de educação, bem como a dimensão dos esforços que indiscutivelmente têm sido despendidos ob. cit., p. 1975).
A resposta do Governo, apresentada pelo Ministro Veiga Simão, foi comunicada ao País em 6 de Janeiro de 1971, tendo-se então anunciado a publicação, para discussão pública, de dois textos programáticos: o Projecto do Sistema Escolar e as Linhas Gerais da Reforma do Ensino Superior. Esta consulta, que se prolongou por alguns meses, teve duas grandes vantagens:
1.° Criar na Nação a consciência do problema e, portanto, empenhá-la no seu estudo e resolução - no relatório do Projecto Regional do Mediterrâneo, já citado, escreve-se, a p. 3:
Considera-se primeira condição necessária para realizar uma política de educação a existência de uma consciência nacional do próprio fenómeno em causa.
2.° Obter dos 1700 documentos colhidos e da participação de cerca de 40 000 pessoas (Parecer da Câmara Corporativa, p. 1975) dados que aperfeiçoassem os textos ministeriais apresentados.
A proposta de lei n.° 25/X, subscrita pelo Ministro da Educação Nacional, corresponde ao projecto do sistema escolar, substancialmente modificado de acordo com os resultados apurados no debate público. Ao ser analisada pela Assembleia Nacional deve ter-se presente, pois, que se trata, de facto, de uma proposta apresentada também pela Nação e que visa a reforma global do sistema educativo, tendo-se vencido a tentação de pôr remendos, de "obrar por retalhos", na expressão de Ribeiro Sanches (Ribeiro Sanches: Sobre a Inhibição de Se Tomarem Grãos na Faculdade de Cânones em Coimbra, Paris, 18 octobre 1766. Em Ribeiro Sanches: Dificuldade Que Tem Um Reino Velho para Emendar-se e Outros Textos. Selecção, apresentação e notas de Vítor de Sá. Editorial Inova, Lda., Porto).
Em relação ao projecto do sistema escolar, a proposta de lei n.° 25/X mostra os seguintes aperfeiçoamentos principais:
1) Enunciação dos princípios fundamentais que informam o sistema educativo;
2) Institucionalização da educação pré-escolar em termos mais imperativos e sua extensão de dois para três anos;
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3) Escolaridade obrigatória unificada e diferenciada do ensino secundário;
4) Todo o ciclo preparatório de observação e orientação, e não de observação, nos dois primeiros anos e de orientação nos dois últimos;
5) Institucionalização do ensino especializado de deficientes ou inadaptados;
6) Escolas secundárias unificadas pluricurriculares - com acesso directo ao ensino superior após conclusão do ciclo complementar -, em vez de três tipos distintos de liceu - clássico, técnico e artístico-, a impor encaminhamento profissional precoce, segregação social e condições desiguais de acesso ao ensino universitário;
7) Institucionalização da educação permanente;
8) Tratamento mais cuidado da formação de pessoal docente de todos os níveis de ensino, com excepção do superior, mas incluindo o destinado à educação de deficientes e inadaptados; institucionalização da sua formação permanente.
A Assembleia, por estudo directo do texto e pelas exposições dos Srs. Deputados que me antecederam nesta tribuna, conhece bem os aspectos inovadores da proposta, pelo que me dispenso de os referir. Mas já me parece útil chamar a atenção para a sua economia geral, que não só está livre dos erros estruturais do sistema vigente, como responde ao que se deve esperar de uma organização educativa moderna, que tem de dar satisfação a duas características fundamentais da sociedade de hoje e, mais acentuadamente ainda, da de amanhã:
1) Exigência crescente de efectivação do direito a uma educação ao longo de toda a vida;
2) Modificações, cada vez mais rápidas, do statu quo, em resultado do progresso acelerado da ciência e da técnica, e da mobilidade crescente das pessoas e das ideias.
Os aspectos da proposta que mais se conformam com estas características são os seguintes:
a) Expansão da escolaridade, através do estabelecimento da educação pré-escolar, do alargamento da escolaridade obrigatória de seis para oito anos, do aumento de um ano no ensino secundário, do acesso directo ao ensino superior e da institucionalização da educação pós-graduada e permanente;
b) Ensino integrado, com formação geral humanística e científica a preceder e a acompanhar diferenciações curriculares;
c) Personalização do ensino, por adaptação às capacidades, tendências e interesses pessoais, nomeadamente no ciclo preparatório (observação e orientação educativas), no ensino secundário (disciplinas optativas) e no ensino superior (amplo alargamento do leque de cursos, uns de curta e outros de longa duração).
Este modelo de sistema educativo, na sua forma menos perfeita apresentada no projecto do sistema escolar, mereceu, juntamente com as linhas gerais da reforma do ensino superior, a seguinte apreciação do Secretariado da O. C. D. E.:
The two documents reflect a very sound and advanced approach to the problem of new structures of higher education. They correspond in many ways, and sometimes rather closely, to O. E. C. D. ideas on this subject as they have been formulated both in some of the O. E. C. D. documents and in discussions of country representatives (O. E. C. D. Secretariat: Portugal - Projected Educational System and Guidelines of the Reform of Higher Education. Comments by the O. E. C. D. Secretariat. Paris, 23 April 1971).
Ao dar, jubilosamente, a minha aprovação na generalidade à proposta de lei n.° 25/X sobre a reforma do sistema educativo, é-me grato prestar calorosa e sinceríssima homenagem aos dois governantes que, em perfeita unidade de pensamento e acção - como ainda recentemente o declarou publicamente o Prof. Veiga Simão na cerimónia de transmissão de poderes que se seguiu à tomada de posse dos novos secretários de Estado em serviço no Ministério da Educação Nacional ("o Prof. Marcelo Caetano [...] vem dando à nossa acção, não apenas total apoio e forte incentivo, mas a acompanha dia a dia com desvelado carinho e adesão permanente" - Diário de Notícias, de 6 de Abril de 1973, p. 1] -, são os grandes autores desta reforma histórica na vida nacional: os Profs. Marcelo Caetano e Veiga Simão.
O Sr. Pinho Brandão: - Muito bem!
O Orador: - Se for fielmente executada, a reforma do sistema educativo constituirá agente poderoso de democratização da sociedade portuguesa e do seu afeiçoamento às grandes forças de pensamento e acção que, hoje, moldam o mundo de amanhã. Por isso não admira que, entre outros, a combata quem, como o fidalgo Roussin do romance de Ferreira de Castro, está "sempre a maldizer o presente, sempre exaltando os arrojos e as glórias do passado, como se mantivesse, em todas as horas, a mesma posição dos que vão de costas nos comboios e só vêem a paisagem que para os outros já desapareceu" (Ferreira de Castro: A Missão. Livros de Bolso Europa-América, n.° 5, p. 66).
"Por mim, atrevo-me a dizer que estamos demasiadamente presos à memória dos nossos heróis - nunca, aliás, querida e venerada em excesso -, demasiadamente escravizados a um ideal colectivo que gira sempre à roda de glórias passadas e inigualáveis heróismos. O nosso passado heróico pesa de mais no nosso presente. A querermos agarrar-nos às concepções dos tempos heróicos corremos o risco de aparecermos como braços desocupados num mundo novo que nos não entende."
Estas lúcidas e oportunas advertências, formuladas por Salazar em 1933 (prefácio, datado de 16 de Janeiro de 1933, ao livro Salazar, António Ferro. Empresa Nacional de Publicidade, 3.ª edição, pp. 39 e segs., cit. por Francisco Sarsfield Cabral em Uma Perspectiva sobre Portugal, Moraes Editores, Lisboa, 1973, p. 13), não foram, infelizmente, devidamente atendidas. Os nossos antepassados, os verdadeiramente grandes, foram perscrutadores do
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futuro e, pela sua acção, rasgaram caminhos e desvendaram horizontes novos a Portugal e ao Mundo. Sentarmo-nos comodamente e, de costas voltadas para o devir, venerá-los como mortos em vez de, de pé e em marcha para a frente, os fitarmos como exemplos vivos de quem nos vem acicate e luz para construirmos um futuro melhor, é, na melhor das hipóteses, manifestação de muito mau gosto.
Antes de concluir, não queria deixar de fazer referência breve a dois aspectos que, sendo embora, por sua natureza, extrínsecos ao sistema educativo, condicionam, contudo, o êxito efectivo da execução da reforma.
Como disse, o sistema agora proposto pelo Governo está concebido de modo a satisfazer o direito inalienável de todos os portugueses à educação, proporcionando a cada um formação integral e a cultura e a habilitação profissional que melhor se harmonizem com as suas capacidades, tendências, interesses e aspirações. Porém, por mais lata que seja a expansão da escolaridade e mais qualificado o ensino ministrado, permanecerão ainda factores decisivos de desigualdade de oportunidades que se situam fora do alcance do sistema educativo. Este pode atenuar a intensidade dos seus efeitos, mas não eliminá-los.
Refiro-me, evidentemente, às desigualdades sócio-económicas profundas e profundamente chocantes entre os Portugueses e às consequências altamente perniciosas e interpotenciáveis de um conjunto de influências negativas (alimentares, higiénicas, afectivas, intelectuais, etc.) que afectam de modo importante e, a partir de certo momento e grau, irreversível o desenvolvimento físico e psíquico das crianças de meios de débil condição económica e social. È algumas destas influências deletérias - há que acentuá-lo - actuam já antes do nascimento.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A este tema geral dedicou-se a Conferência Internacional da Educação, reunida pela U. N. E. S. C. O., em Genebra, em Setembro de 1971, na qual participaram noventa países, tendo-se reconhecido unanimemente que as probabilidades de uma criança ter sucesso nos estudos estão directamente dependentes das características do meio social em que se integra. O número de Junho de 1972 da revista Courrier, publicada por aquela organização, é totalmente dedicado a este problema. Aí se lê que em Portugal, e no ano de 1963 apenas 7,4% dos estudantes do ensino superior provinham das classes menos favorecidas (p. 23), e que um adolescente de um meio social favorecido tem uma probabilidade de entrar naquele nível de ensino cento e vinte noves vezes maior que a de um adolescente oriundo de meio social carecido (p. 22).
E a notável experiência psicopedagógica realizada há alguns anos na Escola Comercial de Ferreira Borges, de Lisboa, levou à conclusão de que "a maioria dos alunos em atraso ou insucesso escolar vive, trabalha e desenvolve-se num meio sócio-económico caracterizado por complexa trama de situações desfavoráveis à sua educação e ao rendimento do ensino" (Educação - boletim informativo do Gabinete de Estudos e Planeamento da Acção Educativa, vol. 1, n.° 2, Dezembro de 1969, p. 83).
O outro factor extrínseco condicionante do êxito da reforma a que me quero referir é o grau de possibilidade efectiva de expressão do pensamento e de circulação das ideias, dentro e fora das escolas. Sem liberdade nessa expressão e nessa circulação não se pode fomentar, através do ensino - como louvavelmente consigna a proposta de lei -, o espírito crítico e criador. E mesmo que fosse possível, tal fomento seria improdutivo, por falta de oportunidade de exercício da crítica e manifestação do pensamento criador.
Desta breve análise se conclui que a autêntica efectivação do direito universal e inalienável à educação só pode ser alcançada num contexto de plena democracia económica, social e política. Para este ideal - que nenhum país atingiu, mas de que alguns já não estão muito longe, enquanto a grande maioria mal o enxerga- caminha-se por aproximações sucessivas, sem dúvida. Mas para que elas sejam firmes, isto é, não venham a sofrer involução e sejam motor de ulterior avanço, têm de ser globais e não se limitar exclusivamente a um ou outro sector da vida colectiva.
Sr. Presidente: É mais que tempo de terminar. E faço-o afirmando que, quanto a mim, o sentido nuclear da educação é despertar e desenvolver um amor vital pela verdade. Por ele orientado, cada um partirá ao encontro dos outros - pois "a verdade de cada um só existe quando em união com todos os outros" (Emmanuel Mounier, ob. cit., p. 35) - e, nesse encontro, a si mesmo se encontrará.
A verdade é invencível. Por isso a temem os violentos.
No discurso que Alexandre Solzhenitsin escreveu para ser lido na cerimónia de entrega do Prémio Nobel da Literatura, e à qual não pôde estar presente - passagens desse texto foram recentemente recordadas pelo Sr. Ministro do Interior, o que muito apreciei, pois o escritor russo tem sido heróico defensor da liberdade de expressão do pensamento -, disse a terminar:
Não esqueçamos que a violência não vive só, que é incapaz de viver só: está intimamente associada, pelo mais estreito dos laços naturais, à mentira. A violência encontra o seu único refúgio na mentira, e a mentira o seu único apoio na violência. Todo o homem que elegeu a violência como meio deve inexoravelmente eleger a mentira como regra [...] E uma vez que a mentira seja confundida, a violência surgirá em toda a sua nudez e fealdade. E a violência então desaparecerá [...] Os Russos gostam dos provérbios que falam da verdade: "Uma palavra de verdade pesa mais que o Mundo inteiro." ("El grito de Solzhenitsin, Gaceta Médica Espanola, Octubre de 1972, p. 252).
"Uma palavra de verdade pesa mais que o Mundo inteiro." Só a verdade vale o preço da vida - crer nisto é o sentido profundo da educação.
Numa tarde de Dezembro, de 11 de Dezembro de 1969, subi pela primeira vez, emocionado, as escadas desta tribuna. Vou descê-las agora pela vez última, com redobrada emoção. Boa sorte, Portugal.
Vozes: - Muito bem!
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O Sr. Veiga de Macedo: - Sr. Presidente: O problema da Universidade quase deixou de ser um problema da Universidade. Transformado em problema político de primeira grandeza, dele tentam apoderar-se, para fulcro da sua acção ou das suas manobras, as forças que há muito se empenham em criar um clima favorável à instauração entre nós de ideologias e práticas opostas à lei, à maneira de ser do povo português e ao interesse nacional.
Que o problema tem e deve ter significado político ninguém o contesta. O que se contesta é que ele sirva de pretexto para actividades subversivas ou de ponto de partida para se infiltrarem na vida da Universidade e do Estado elementos apostados em destruir os fundamentos da ordem social e política.
Em torno da questão universitária está a fazer-se uma exploração política, por vezes de marcado sentido demagógico, que importa denunciar. Questão complexa e melindrosa sobre a qual se têm debruçado os mais altos espíritos, alguns a reduzem a fórmulas simplistas ou slogans aliciantes que enganam e desorientam.
Um dos pontos mais explorados para o efeito é o do acesso à Universidade.
Entendem alguns que todos devem ascender ao ensino superior, enquanto outros se pronunciam por um acesso muito circunscrito e em termos que comprometeriam gravemente legítimas aspirações e interesses.
Creio que nem a uns nem a outros assiste razão.
A Universidade há-de ser uma instituição aberta a todos, embora nem todos queiram ou devam frequentá-la.
Obrigar, de uma maneira ou de outra e sejam quais forem as razões invocadas, a ingressar na Universidade aqueles que nisso não estão interessados seria violar uma liberdade fundamental.
Um comunista dirá que não há liberdade contra o Estado ou que a pessoa só é livre na medida em que se integra no Estado, cabendo, por isso, a este o direito e o dever de impor, em cada caso, a carreira profisional que tiver por mais conveniente. Não vale a pena discutir o que pressupõe uma concepção do homem que a tão pouco reduz a sua dignidade.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, nem todos possuem qualidades de inteligência e de trabalho para atingirem os planos mais elevados da ciência e da técnica, o que, só por si, naturalmente e sem a menor quebra de justiça, torna inviável a admissão de muitos na Universidade. Em relação a estes, o seu não ingresso na instituição universitária não traduz a menor discriminação pessoal, nem qualquer lesão do interesse público.
Ressalvadas as limitações que mencionei, creio que o acesso aos graus superiores da instrução e da cultura deve ser propiciado a todos. Sou, pois, por uma Universidade aberta que acolha quantos mostrem estar em condições de tirar para si e para a Nação o proveito compensador dos encargos por esta suportados.
Compreende-se, assim, me repugnem os exageros de selecção para o ingresso na Universidade em que alguns países têm caído.
É a Rússia que mais longe tem levado o rigor no estabelecimento e aplicação dos critérios que presidem à admissão no ensino superior. Não há que estranhar o facto, pois ele está na lógica da doutrina que informa o Estado soviético.
A Universidade russa é, como se sabe, uma Universidade ao serviço exclusivo do Estado e do Partido, cabendo-lhe, nos termos da Lei do Ensino Superior, aprovada em 1961 pelo Conselho de Ministros da União Soviética, entre outras atribuições ligadas à produção, à cultura e à ciência, a de "formar especialistas altamente qualificados, educados no espírito do marxismo-leninismo" e a de "levar a bom termo as investigações necessárias à resolução dos problemas suscitados pela edificação do comunismo".
A Universidade, em cada ano, admite apenas o número de alunos que o "Gosplan" indica em função das necessidades gerais. O método conduz a uma selecção implacável.
Por isso, o Doutor Guilherme Braga da Cruz, mestre da mais alta estirpe intelectual e moral, cuja vida constitui exemplo vivo de dignidade e carácter e de devoção ao ensino...
O Sr. Camilo de Mendonça: - Muito bem!
O Orador: - ...pôde escrever, apoiado em notável trabalho dos professores belgas Drèze e Debelle, que, na Rússia, "a questão da Universidade perante o assédio das massas não chega sequer a pôr-se" e que, "em mais do que em nenhum país capitalista, a Universidade é aí uma instituição aristocrática' destinada a preparar a classe dirigente do país e do partido ('a aristocracia comunista') e aberta exclusivamente ao número exacto de técnicos previstos como necessários nos planos de desenvolvimento".
Referi-me ao sistema russo para mostrar que ele não poderia ser aplicado entre nós, tal a dureza da restrição que envolve para a liberdade das pessoas.
Mas, sendo assim, como obter, sem gravame para os direitos de cada um, o funcionamento da Universidade com a eficiência que o número excessivo de alunos torna difícil ou impossível?
Coando novos estabelecimentos de ensino superior? Sem dúvida que é medida a que importa recorrer quanto antes. Mas não se pense que o problema terá assim cabal e definitiva solução.
Estabelecendo o numerus clausus para a entrada na Universidade? Repugna-me uma resposta afirmativa.
O sistema só poderia aplicar-se em circunstâncias muito especiais e desde que criadas condições polivalentes de acesso que não existem entre nós.
Mas se, abertas as portas da Universidade a todos os que a procuram, se verifica que alguns alunos, muitos ou poucos, não possuem capacidade para seguirem o curso, verificar-se-á um de entre dois males: ou esses alunos ficam para trás e, depois de constituírem durante anos um peso morto que, além do mais, prejudicará a qualidade e o rendimento do ensino, acabam por desistir, ou a escola, para se libertar deles, lamentavelmente contemporiza, conferindo-lhes de qualquer maneira o almejado diploma. Dois males, qual deles o pior.
Vozes: - Muito bem!
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O Orador; - Em 1967, os Ministros da Educação dos Estados europeus pertencentes à U. N. E. S. C. O., reunidos em conferência, ocuparam-se largamente destes candentes assuntos.
Partindo da verificação do crescente aumento de estudantes nos ensinos secundário e superior em todos os países europeus, a Conferência reconheceu que os governos vêm praticando a planificação do ensino, quer esta seja puramente previsional e indicativa, quer se traduza na fixação de contingentes de alunos, no quadro do plano geral dó desenvolvimento.
Foi ainda reconhecido que em numerosos países "on n'échappe pas soit à une régulation quantitative, soit à une selection plus sévère en coors d'études".
Na verdade, por vezes, seguem-se critérios muito apertados de inspiração socialista, que vão longe de mais para quem, como eu, se compraz em pôr o acento tónico na pessoa e na iniciativa individual e não no Estado e no seu poder de intervenção.
Por mim, tenho como certo que, acima de tudo, importa fazer um grande esforço para impedir que a democratização do ensino seja afectada, quer pelo estabelecimento de critérios susceptíveis de levaram a uma selecção injusta por classes sociais, quer pela instauração de condições que não permitam um ensino de qualidade e assim obstem à efectivação prática do direito à educação.
Mas então nem todos podem ascender à Universidade?
Penso que devem ter acesso à Universidade todos os que o mereçam e que, quando imperiosas razões de carácter geral, e só essas, justifiquem providências selectivas, tudo há-de fazer-se para impedir qualquer sombra de discriminação resultante do nível económico ou posição social.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Depois do que deixo dito, a questão de saber se a Universidade deve apelidar-se de elitista ou democrática aparece-me destituída de significado. Ficou bem claro que a Universidade, tal como a entendo, não se destina aos ricos com sacrifício dos que o não são, o que constituiria clamorosa injustiça. Mas também não se destina tão-somente aos últimos, porque isso não seria menos injusto. Destina-se, como diz Karl Jaspers, "exteriormente, talvez a todos, mas, por vocação, apenas aos melhores. O fito é que os elementos mais dotados de cada geração consigam chegar a um pleno desabrochamento e a uma produção criadora [...]. Não se pode prever quem constituirá o escol. Não se poderia favorecer a priori uma categoria de estudantes sem correr o risco de perder talvez os melhores: os mais assíduos, intensamente dominados pela ideia da verdade, para quem o estudo e a pesquisa não são simples ocupação ou um dever fastidioso, mas a questão vital de participar na elaboração do mundo, ao serviço da ciência e da verdade. Os melhores não se reconduzem a um tipo de homem, mas constituem uma variedade imprevisível, marcados pelo destino".
À comunidade de professores e estudantes, assim erguidos pelos seus méritos e sacrifícios a este plano de estudos e de investigação, já se chamou aristocracia intelectual. Mas impõe-se reconhecê-la como aristocracia de base e sentido democráticos, desde que as possibilidades de acesso oferecidas aos que a formam tenham sido as mesmas que todos tiveram e desde que, com a efectivação do acesso, se não hajam perdido de vista os superiores interesses da comunidade. A democracia não pode ser senão igualdade de oportunidades para todos e diferenciação de postos e responsabilidades consoante os méritos de cada um.
Por isso, Jaspers acentua que "esta aristocracia intelectual não é uma aristocracia sociológica: é uma liberdade que encontra em si mesma a origem. Ela reside tanto no nobre como no operário, tanto no rico como no pobre, mas sempre com uma igual raridade".
E aqueles que, pelas razões referidas, não quiseram ou puderam ingressar na Universidade? Não se me afigura lícito que se lhes recuse a possibilidade de prosseguirem os estudos para que se encontrem preparados.
É este um dos pontos que ao Governo deve merecer especialíssima atenção. Trata-se de questão prioritária.
Já não insisto na necessidade de reformar todos os ensinos pré-universitários dentro de um plano global de remodelação do sistema educativo. Neste sentido se prenunciou, por exemplo, o Ministro da Educação do país vizinho ao declarar que "não basta uma reforma universitária, porque grande parte dos males específicos que afectam a Universidade de hoje entra, no começo de cada ano lectivo, através das suas portas, aos ombros de novos contingentes que nela se incorporam".
Mas, de qualquer maneira, há, como disse, um problema que precisa de ser defrontado, antes de mais. Sem que ele se resolva, nenhuma reforma geral da Universidade poderá vingar.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O Governo preocupou-se em tempos com esse problema, mas, de um momento para o outro, parece tê-lo abandonado.
Na verdade, em Janeiro de 1970, enviou à Câmara Corporativa um projecto de diploma sobre ensino politécnico. A Câmara pronunciou-se através do seu parecer n.° 28/X, de Julho de 1971. E embora eu não concorde dom diversas soluções preconizadas, ou no projecto ou no parecer, como, por exemplo, com as designações bem infelizes que num e noutro se escolheram para qualificar o ensino em causa, há que registar como desserviço o esquecimento a que foi votada a iniciativa.
No relatório desse projecto salientavam que o ensino politécnico iria ampliar de forma muito sensível as possibilidades de acesso à cultura e contribuir para "descongestionar os cursos universitários, libertando a Universidade de tarefas sem interesse para ela, e permitindo-lhe assim consagrar-se à sua superior função".
Não pode negar-se a estes propósitos, enunciados debalde há três anos, o mais vivo e flagrante interesse.
Ainda bem que a proposta de lei em debate retoma a ideia, embora com algumas modificações, a mais importante das quais é a de se atribuir a categoria de superior ao ensino politécnico.
Urge agora dar pronta e integral execução a esta providência, que não consente mais delongas ou hesitações.
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Mas não se pense que basta criar escolas superiores extra-universitárias apenas para serem ministrados certos ensinos impostos por exigências da vida moderna ou pelo aparecimento de novos saberes. Há que instituir escolas dessa índole para uma larga gama de conhecimentos, mesmo para alguns dos que, a outro nível, são cultivados na Universidade. Por outras palavras: o ensino superior não universitário deve abranger quer os novos saberes, quer os saberes tradicionais, sempre que as circunstâncias o justifiquem.
Este pensamento não terá a concordância de alguns elementos pertencentes a classes profissionais com formação universitária. Não terá essa concordância, por confessadas, embora duvidosas, razões de prestígio e também pela preocupação de evitar formas de concorrência profissional, ainda que a nível diferente.
Conheço casos bem reveladores dos motivos que até agora impediram a criação de escolas não universitárias no plano dos saberes tradicionais. Não os refiro para que se não abram feridas mal cicatrizadas ou reavivem ressentimentos de classe ainda latentes.
Estou, pois, com aqueles que aspiram a ver ultrapassado este preconceito e entendem que "não há ramos de ensino privilegiados; que não há ramos nobres do saber, pertença da Universidade, e ramos plebeus, pertença de outras escolas (sejam elas médias ou superiores): há apenas diferentes graus de ensino (e, eventualmente, dentro do mesmo grau de ensino, diferentes níveis de ensino) em que os mesmos ramos do saber científico podem ser professados".
Este movimento de criação de institutos ou escolas de ensino superior não universitário deve ainda ser acompanhado de um esforço tendente à perfeita integração da Universidade na sua própria e específica missão: a preparação científica e cultural em alto nível. É dizer que o ensino universitário há-de ser organizado tendo como escopo a licenciatura.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Não resisto, por isso, a manifestar aqui as apreensões que me suscitam os Decretos n.ºs 48 627, de 12 de Outubro de 1968, e 443/71, de 23 de Outubro: creio que eles depreciaram a instituição universitária ao desviarem certas Faculdades da sua finalidade essencial.
Com isto não quero dizer que eu seja contra a existência de bacharelatos nas Faculdades. Tudo está em que os planos de estudo não deixem, de qualquer forma, de visar a licenciatura.
O problema é muito delicado e reveste-se de especiais dificuldades. Dorotea Furth, num trabalho sobre o ciclo curto do ensino superior, publicado recentemente na revista L'Observateur de l'O. C. D. E., escreve:
Em princípio, o problema seria resolvido se pudesse ser definida uma equivalência entre a primeira parte (Í.° ciclo) dos estudos universitários longos e o ensino fornecido nos estabelecimentos do ensino curto.
E conclui:
Na prática não se encontrou ainda solução válida, e muitas tentativas falharam.
Importa, pois, tirar das experiências alheias as lições que comportam.
Às breves considerações que formulei sobre o ensino superior juntarei ainda uma nota: o problema do acesso a esse ensino não aparece só no termo dos cursos secundários. Aí adquire uma expressão mais viva, por vezes dramática, mas ele surge logo nos primeiros anos de escolaridade e projecta-se, depois, ao longo de todo o ensino, secundário.
A ausência de uma criança na escola de base constitui ofensa mais grave ao chamado princípio da democratização do ensino do que a não admissão na Universidade de um aluno com o curso do ensino secundário, que, então, já possui habilitações de apreciável utilidade para a vida.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Por isso, no preâmbulo do Decreto-Lei n.° 38 968, de 17 de Outubro de 1952, se acentuou que, "na execução do Plano da Educação Popular será posto todo o interesse, até porque não pode esquecer-se que, com a expansão do ensino primário, se alarga a base de recrutamento daqueles que, nos diferentes ramos de actividade, hão-de ser elementos condutores da vida social e constituir, pela sua preparação e formação, o escol intelectual e moral do País".
Esta ideia obteve recente consagração na Conferência dos Ministros da Educação dos Estados da Europa membros da U. N. E. S. C. O. Aí se observou, com singular pertinência, que "quanto mais larga for a base de selecção em cada grupo de ensino, maior é a possibilidade de encontrar indivíduos capazes de atingirem altos padrões de cultura".
Mas logo se acrescentou:
A democratização dos estudos não deve fazer-se á todo o preço, ao preço, por exemplo, da superlotação das escolas não providas de meios humanos e materiais suficientes. O direito à educação implica a satisfação prioritária de tais necessidades, mas de modo que a procura social não seja frustrada directamente pela impossibilidade de acolher todos os candidatos ou indirectamente pelo abaixamento da qualidade do ensino.
Aqui está, autorizadamente proclamada, uma verdade que me leva a apelar para todos no sentido de juntarem os seus esforços àqueles que as autoridades vêm desenvolvendo para estabelecerem ou restabelecerem as condições de facto indispensávis à real efectivação do direito ao ensino e à educação.
Refiro-me à necessidade de se assegurar, quanto antes, o normal funcionamento das escolas superiores, onde, de há anos, se vêm produzindo sérios acontecimentos. A circunstância de a situação se prolongar pode contribuir para que nos espíritos mais acomodatícios se instale uma certa forma de habituação, mas não diminui nem a acuidade nem a nocividade da crise que vem sendo apontada pelos responsáveis.
Ainda há poucos meses o Sr. Secretário de Estado da Instrução e Cultura denunciou, magistralmente, a origem e a extensão das actividades subversivas em diversos centros universitários e deu notícia das medidas enérgicas previstas para as contrastar. Antes e depois disso, o ilustre Ministro da Educação Na-
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cional produzira declarações públicas com idêntico alcance, como, aliás, as fizera já o seu também ilustre antecessor.
Contudo, o mal persiste. A iniciativa continua a pertencer aos agitadores e, não obstante saber-se que eles constituem minoria insignificante, não tem sido possível pôr cobro a uma acção revolucionária fomentada e desenvolvida por conhecidos inimigos do País e da ordem social e política vigente.
Em virtude deste estado de coisas, traduzido em greves, em boicotagens de exames, em agressões a alunos, professores e encarregados de educação, em ofensas às autoridades, em enxovalhos e acusações infamantes que não poupam sequer as mais altas magistraturas políticas, na contestação da legitimidade da nossa luta nas frentes africanas e no ataque a quem persiste em proclamar a unidade nacional como valor impostergável no espaço e no tempo, em virtude deste estado de coisas ou da persistência deste estado de coisas, dizia, todos devemos intensificar o nosso apoio ao Governo para que a execução das necessárias reformas do ensino e, em especial, do ensino superior e universitário, não venha a ser comprometida. Sabe-se que os fautores das perturbações académicas Visam apenas fins políticos, denunciados, de modo inequívoco, em actos, em palavras, em publicações e através de diversas expressões da arte.
Há professores que não cumprem os seus deveres? Quem o ignora?
Entidades responsáveis o têm afirmado, sem pouparem qualificações severíssimas e, até por vezes, generalizadas com menos justiça. Mas os maus professores não abandonarão nem serão obrigados a abandonar as suas cátedras pelo simples facto de se decretar uma reforma, que, mesmo em condições normais, não pode ter plena execução em curto espaço de tempo. Urge, pois, chamar à ordem os que manifestamente não cumprem e se tornam motivo de escândalo por não cumprirem.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O mesmo se diga daquela activa e activista minoria de alunos, "democraticamente" em à-vontade próprio de "maioria esmagadora", que, pelos vistos, vai conseguindo limitar a acção dos agentes da autoridade e ditar "a sua lei" na vida interna das escolas e até, por vezes, fora delas.
Aludirei ainda a comunicados que algumas escolas universitárias têm enviado para os órgãos da informação. Neles se deu conhecimento de perturbações registadas e, por vezes, da suspensão das actividades docentes. Mas, até agora, que me lembre, não foram trazidas ao conhecimento público as providências tomadas não só para restaurar a ordem nessas escolas como para chamar à responsabilidade aqueles que infringiram as leis e os regulamentos.
Ora, o País tem o direito de saber não apenas o que se passa de anormal, mas também de ser informado sobre as causas dos distúrbios e sobre as providências adoptadas para lhes pôr termo. E mais do que isso: tem o direito de reclamar que se saneie o ambiente e se instaurem condições de trabalho fecundo e de são convívio entre mestres e alunos.
Sou, sem qualquer reserva, pela reforma ou -melhor- pelas reformas do ensino. Elas impõem-se e não podem ser retardadas, nem contrariadas.
Mas reformas de envergadura e profundas como as que, por exemplo, são de preconizar para o ensino superior hão-de ser precedidas e acompanhadas por outras que visem imediatamente a normalização da vida universitária no plano administrativo e pedagógico e conduzam ao afastamento dos professores que não ensinam e dos alunos que não estudam - e, em especial, daqueles que não deixam ensinar ou estudar.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Como até agora não foi possível fazer isto, direi que importa consegui-lo quanto antes, pois, de contrário, as reformas necessárias e justas correm o risco de não passar das colunas da folha oficial.
Creio que não se estranhará me acolha à singular autoridade das palavras com que o Sr. Presidente da República encerrou a sua última mensagem e que, aliás, traduzem preocupações idênticas às manifestadas pelo Sr. Presidente do Conselho em diversas declarações públicas:
É igualmente indispensável que não se tolere mais o que de incrível se tem passado nas escolas. Elas existem para que os professores ensinem devidamente e os alunos aprendam com todo o interesse. Não pertencem nem a uns, nem a outros. São pertença da Nação.
O Sr. Ribeiro Veloso: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: Todas estas matérias são "bem largas". Já nem sei, como o grande Vieira, se me vai sobejando o tempo ou se vou eu sobejando a ele.
Sei, isso sim, que o tempo, e muito dediquei aos problemas em debate, não me chegou para alcançar maior brevidade e melhor sistematização ao expor as minhas ideias.
Mas não quero abusar mais da generosa atenção da Câmara.
Por isso, encerro já esta intervenção, prestando calorosa homenagem ao Governo por ter enviado à Assembleia a proposta de lei sobre a reforma do sistema educativo. Mal se compreenderia que matéria de tão transcendente significado não fosse submetida à apreciação e deliberação da Câmara. Só assim poderá dizer-se que o País foi ouvido através da autêntica representação nacional.
E não me dispensarei de expressamente reconhecer e salientar o largo, decidido e perseverante empenho que o Sr. Presidente do Conselho e o Sr. Ministro da Educação Nacional vêm consagrando ao estudo e resolução dos problemas do ensino, o que a presente proposta de lei eloquentemente testemunha.
O Sr. Camilo de Mendonça: - Muito bem!
O Orador: - Esta palavra não a poderia eu calar sob pena de grave injustiça.
Mas também seria menos justo que, ao finalizar a apreciação de uma reforma tão corajosamente voltada ao futuro, não recordasse os governantes que, no passado, se votaram ao serviço da educação nacional. Por todos cito, emocionadamente, os Ministros Pires de Lima, Leite Pinto e Galvão Teles, credores - tão profunda e vasta foi a sua obra - do respeito e reconhecimento de quantos têm a cultura como elemento decisivo na ascensão do homem e no progresso dos povos.
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O Sr. Agostinho Cardoso: - V. Exa. dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Agostinho Cardoso: - Desejo tomar a iniciativa de citar o nome de V. Exa. como uma das pessoas que muito trabalhou ao lado desses Ministros da Educação Nacional.
Vozes: - Muito bem! Muito bem!
O Orador: - Muito obrigado. Sinto-me confundido com as suas generosas palavras, que, no entanto, endereço a quem elas mais são devidas: ao grande Ministro com quem trabalhei e ao escol admirável de professores e de colaboradores que me foi dado ter a meu lado numa campanha de verdadeira educação popular.
Bem haja, Sr. Dr. Agostinho Cardoso!
Vozes: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não está mais nenhum de VV. Exas. inscrito para a discussão na generalidade da proposta de lei de reforma do sistema educativo; não foi presente qualquer questão prévia tendente a retirar da discussão esta proposta de lei; considero-a, portanto, aprovada na generalidade.
Passaremos agora à segunda parte da ordem do dia, que é a votação e discussão na especialidade da proposta de lei.
No entanto, antes de passarmos a esta segunda parte, interrompo a sessão por alguns minutos.
A sessão foi interrompida. Eram 18 horas e 20 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Vamos passar à segunda parte da ordem do dia.
Vamos ocupar-nos da discussão na especialidade votação da proposta de lei de reforma do sistema
Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Macedo.
O Sr. Veiga de Macedo: - Ao abrigo do disposto no artigo 36.° do Regimento, proponho, em nome da Comissão de Educação Nacional, que a votação da proposta de lei n.° 25/X se faça de preferência sobre o texto sugerido pela Câmara Corporativa.
O Sr. Presidente: - Peço a atenção de VV. Exas. Compete à Assembleia decidir se a votação deve fazer-se, de preferência, sobre o texto sugerido pela Câmara Corporativa.
Submeto esta proposta do Sr. Presidente da Comissão de Educação Nacional, Cultura Popular e Interesses Espirituais e Morais à vossa consideração.
Submetida à votação, foi acordado fazer-se a votação sobre o texto da Câmara Corporativa.
O Sr. Presidente: - Este texto sugerido pela Câmara Corporativa afasta-se, mormente nas primeiras bases, do texto de numeração análoga da proposta de lei do Governo.
Eu receio que seguindo a prática habitual de ler o texto da Câmara Corporativa em paralelo com o texto da proposta do Governo, base por base, VV. Exas. possam ser induzidos em fortes confusões. O motivo é que pelo menos as três primeiras bases da Câmara Corporativa são compostas de matérias respigadas de bases da proposta de lei, com que não têm correspondência directa na numeração.
Por isso, para clareza da discussão, vamos passar a ler os textos da Câmara Corporativa - como textos de base da votação - e as propostas de alteração relativas aos mesmos textos apresentadas por diversos Srs. Deputados.
A preferência é para o texto da Câmara Corporativa, a prioridade na votação é para as alterações supervenientes a esse texto.
Vamos entrar na base I. Vão ser lidas a sugestão da Câmara Corporativa e a proposta de alterações apresentada pelo Sr. Deputado Veiga de Macedo e outros Srs. Deputados.
Foram lidas. São as seguintes:
CAPÍTULO I
Princípios fundamentais
BASE I
1. A educação engloba não só as actividades integradas no sistema educativo, mas ainda todas as acções não organizadas que contribuam para a formação dos indivíduos, nomeadamente as que se exercem no âmbito das sociedades primárias e de outros grupos sociais e profissionais.
2. A educação compete à família e, em cooperação com ela ou na falta dela, ao Estado e outras entidades públicas, à igreja católica e demais confissões religiosas e aos particulares.
3. A acção educativa é um processo global e permanente de formação dos cidadãos que oferece possiblidades múltiplas de satisfazer as aspirações e tendências individuais, mediante um sistema diversificado, mas sem prejuízo da integração de todos num conjunto de valores humanos e culturais comuns.
Proposta de alterações
Base I
Propomos para a base I da proposta de lei n.° 25/X, segundo o texto sugerido pela Câmara Corporativa, a seguinte redacção:
1. A educação nacional visa a formação integral dos Portugueses, preparando-os, pela valorização das suas faculdades espirituais e físicas, para o cumprimento dos seus deveres morais e cívicos e a realização das finalidades da vida.
2. A educação engloba não só as actividades integradas no sistema educativo, mas quaisquer outras que contribuam para a formação dos indivíduos, nomeadamente as que
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se desenvolvem no âmbito da família e das demais sociedades primárias e outros grupos sociais ou profissionais.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 6 de Abril de 1973. - Os Deputados: Henrique Veiga de Macedo - Fernando Dias- de Carvalho Conceição - Custódia Lopes - Manuel de Jesus Silva Mendes - Rogério Noel Feres Claro - Júlio Dias das Neves.
O Sr. Presidente: - Esclareço que a base I sugerida pela Câmara Corporativa contém matéria que na proposta de lei constitui os n.ºs 1 e 2 da base II.
Estão em discussão, conjuntamente, a redacção sugerida pela Câmara Corporativa e a proposta de alteração dos Srs. Deputados.
O Sr. Veiga de Macedo: - Ao iniciar-se a discussão na especialidade da proposta de lei sobre a reforma do sistema educativo julgo conveniente, na minha qualidade de presidente da Comissão de Educação Nacional, chamar a atenção para os limites que, necessariamente, decorrem da natureza e das finalidades da proposta.
Não se está perante um conjunto de reformas dos diferentes graus e ramos de ensino, mas de uma reforma global do sistema educativo. Essas reformas parcelares serão estabelecidas por diplomas posteriores inspirados nos princípios da reforma geral.
Compreender-se-á, por isso, não ser agora altura de aludir a muitos aspectos da vasta matéria da educação e do ensino. Eles terão cabimento mais adequado no estudo dessas reformas, que hão-de dar o indispensável desenvolvimento às normas que ora forem votadas.
Esta circunstância impôs naturalmente à Comissão um método de trabalho que a levou a não sair fora do âmbito em que forçosamente o estudo da proposta de lei deveria decorrer. Se assim não fizesse, a Comissão dispersar-se-ia e acabaria por se embrenhar na apreciação de aspectos que, embora de interesse, hão-de ser considerados quando as normas da reforma geral do sistema da educação começarem a ser desdobradas nas remodelações parciais e quando estas, seguidamente, forem objecto de regulamentação.
Se agora, no plenário, não se respeitar este método, suscitar-se-ão logo dificuldades ao bom andamento do debate e este poderá deslocar-se para planos que não serão propriamente aqueles em que deveria situar-se. A Comissão, pelo menos, se tal vier a acontecer, sentir-se-á embaraçada sempre que se lhe peça se pronuncie sobre aspectos não directamente relacionados com os preceitos em discussão ou que constituam pontos mais diversificados dos problemas que, por ora, importa apreciar no enquadramento muito geral de uma reforma do sistema educativo e não no de reformas individuais dela decorrentes e muito menos no da regulamentação destas últimas.
O que está em causa agora são os princípios gerais, as regras que definem as linhas mestras da política do ensino, as estruturas fundamentais do sistema educativo.
Terá, porventura, interesse dizer também que a Comissão trabalhou com a maior abertura de espírito e até num ambiente de cordialidade. Exprimiram-se, como é natural, pontos de vista nem sempre coincidentes sobre os temas em análise, mas não pode dizer--se que, dentro dela, se tenham formado correntes ou grupos diferenciados que, ao longo da discussão, se mantivessem sempre inclinados a pronunciarem-se num mesmo sentido.
Para mim, o facto não constituiu surpresa, pois conheço bem todos os seus membros e não duvidei nunca da sua independência de juízos nem do espírito de objectividade com que todos enfrentariam os problemas, sem quaisquer preocupações que não fossem as de servir a causa da educação e de se manterem à altura das responsabilidades do mandato em que a Nação os investiu.
Isto também tinha de se dizer, neste momento, para evitar se atribuam às posições por cada um assumidas significado diferente do que teve.
No pendor destas considerações prévias, acrescentarei que toda a Comissão esteve sempre de acordo em reconhecer a vantagem de uma reforma profunda na educação nacional - reforma que abarque todos os domínios e vá ousadamente tão longe quanto possível, sobretudo na instauração de condições que eliminem quaisquer discriminações relativas aos acessos à instrução e à cultura, o que, além do mais, pressupõe não apenas o alargamento, a todos os níveis, de uma rede escolar apertada, mas ainda a ministração de um ensino de qualidade.
Referirei ainda que a Comissão procurou evitar propostas de alteração que se não justificassem plenamente. Quero com isto significar que se tenha julgado a proposta de lei um modelo na sistematização, na técnica jurídica e na própria redacção? É evidente que não.
A Comissão, em diversos aspectos, concordou com a Câmara Corporativa, que aperfeiçoou bastante a proposta, mas aceitar-se-á que não quisesse ultrapassar certos limites no tocante às alterações a introduzir.
Sem esta autolimitação acabaria a Comissão por apresentar um novo texto. Não teria sido pior e facilitar-se-ia muito a sua tarefa. Não o fez, porém, para afastar suposições bem fáceis de levantar em torno de um tema candente como é o da educação e numa altura em que o problema está por de mais carregado de tensões emocionais e políticas.
No entanto, a Comissão não se esquivou a propor as modificações de forma ou de fundo que reputou essenciais ou mais aconselháveis, embora, e no tocante às primeiras, confie na acção da Comissão de Legislação e Redacção, que terá ainda muito a fazer para melhorar o texto.
A Comissão, sem ter a preocupação de ser mais ou menos progressiva, mais ou menos vanguardista, ou mais ou menos liberal, propõe as soluções que, em consciência, lhe pareceram as que melhor servem os interesses do País.
Admito naturalmente que se formulem críticas ou se façam reparos à acção da Comissão. Só que não poderia considerar justo se desse interpretação incompleta ou defeituosa ao seu pensamento e às suas reais intenções. Os homens e as suas posições não se definem com um mero rótulo e não podem apresentar-se como se desejaria que fossem, mas apenas como são. Quem quebrar esta regra ofende a verdade - a verdade e a justiça. E a verdade e a justiça não estão - ou não deviam estar - ao sabor de simpatias pessoais nem tão-pouco sujeitas às inclinações ou às ideias daqueles a quem mais caiba servir uma e outra. E entre esses estamos também nós, os Deputados da Nação.
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Aqui fica este apontamento, muito natural e respeitoso, que julguei necessário.
Até se chegou a atribuir significado inexacto ao facto de a Câmara Corporativa e a Comissão terem introduzido numerosas alterações ao texto governamental.
Não me cabe falar em nome da Câmara Corporativa, mas posso asseverar, como presidente da Comissão, que esta, desde início, manteve, sem quebra da sua independência e da sua posição, o melhor entendimento com os autores da proposta de lei. Nem poderia deixar de ser assim.
Os pontos de vista que cada um assumiu poderão ter causado estranheza a alguns que esperavam uma concordância plena e a outros que desejariam uma oposição frontal e global à proposta. Se isso desiludiu uns ou outros, não é connosco. De qualquer forma, não poderia nenhum membro da Comissão mudar de opinião só para que certos observadores não vissem evidenciada a falta de justeza com que se habituaram a olhar homens que nesta Casa procuram, cada um no seu estilo próprio, cumprir apenas o seu dever de representantes da Nação.
Aludirei agora a outro aspecto.
Como se viu, a Comissão requereu se procedesse à votação com base no texto da Câmara Corporativa.
A Comissão seguiu esta orientação apenas movida pelo propósito de facilitar a discussão. Quem confrontar os termos da proposta de lei e aqueles em que a Câmara Corporativa formula as suas sugestões facilmente verificará que outro método poderia acarretar contratempos e inconvenientes diversos.
A Comissão começou a estudar os dois textos, sem se pronunciar, logo de início, sobre o que, neste ponto, deveria propor ao plenário da Assembleia. Quando chegou ao termo do seu estudo verificou que os próprios trabalhos, por si, haviam conduzido a tomar para base das alterações que ia sugerindo o texto da Câmara Corporativa. Mas isso em nada envolveu qualquer posição de menor apreço pela proposta de lei. Trata-se apenas de um método de trabalho, aliás diversas vezes seguido pela Assembleia, sem que do facto adviessem interpretações menos justas e verdadeiras para qualquer dos órgãos intervenientes na feitura das leis.
Ainda, se mo permitem, um apontamento mais para esclarecer que a Comissão está à disposição de todos os Srs. Deputados para apresentar explicações sobre os seus pontos de vista. Fá-lo-á no plenário, ou individualmente nos intervalos, das sessões. A Comissão teve ensejo de prestar já esclarecimentos a diversos Srs. Deputados e alguns honraram-na comparecendo às suas reuniões de trabalho e participando, por vezes, nelas.
Compreender-se-á, todavia, que a Comissão só se pronuncie sobre quaisquer eventuais propostas de alteração apresentadas à última hora se o puder fazer em consciência, isto é, se estiver em condições de formular sobre elas um juízo de valor. Se não estiver, pedirá o tempo que for necessário para as estudar, reflectindo ponderadamente sobre os problemas que suscitem.
O novo Regimento, que só entrará em vigor na próxima legislatura, estabeleceu já uma disciplina, embora apertada em demasia, sobre a matéria, mas ao menos tem o mérito de evitar votações precipitadas sobre asuntos que não podem resolver-se dê um momento para o outro sem se correr o risco a soluções inconvenientes e, às vezes, como já aconteceu, gravemente inconvenientes.
Faço esta prevenção não para tolher quaisquer tentativas de melhorar o texto pendente da decisão da Assembleia, mas apenas levado pelo propósito de elucidar até que ponto ou em que medida a Comissão poderá mover-se.
Referir-me-ei agora mais directamente aos assuntos em apreciação.
A Câmara Corporativa inicia a sua apreciação na especialidade chamando a atenção para as deficiências que na sistematização dos primeiros preceitos da proposta de lei logo se manifestam de modo claro.
Assim, a proposta de lei inscreve na base i os princípios orientadores da acção educativa e na base n define a acção educativa, fixa o âmbito da educação e refere ainda as linhas gerais do sistema educativo e os seus objectivos e formas de realização.
A Câmara Corporativa não concorda com esta arrumação, entendendo que se deveria começar por definir com clareza o âmbito da educação, indicar as entidades a quem compete a acção educativa e caracterizar esta última. Por isso, a Câmara sugere que estas matérias passem a constituir a base I, n.ºs 1, 2 e 3.
Quanto à base i da proposta de lei, em que se enunciam os princípios orientadores da acção educativa, a Câmara preconiza que se distribuam as matérias por duas bases, de modo a dar relevância às finalidades essenciais da acção educativa e às especiais responsabilidades do Estado neste domínio.
E isto - acentua-se no parecer - porque na base I relativa aos princípios orientadores se englobam matérias que dizem respeito aos fins e aos meios de realização do processo educativo.
A Câmara não deixa de ter razão, mas penso que não conseguiu, depois, dar o ordenamento mais conveniente e até mais adaptado ao sentido das suas pertinentes considerações.
Não valerá a pena fazer agora uma análise exaustiva do assunto, mas dir-se-á que falta uma definição de educação tão clara e precisa quanto possível', a qual não consta nem da proposta de lei nem do parecer da Câmara Corporativa.
No projecto do Estatuto da Educação Nacional, do Ministro Galvão Teles, a matéria está muito bem sistematizada e nele se definem com propriedade os conceitos que mais interessa individualizar.
Propus, por isso, na Comissão, que a primeira norma da lei sobre o sistema educativo definisse educação nacional como visando "a formação dos Portugueses, preparando-os, pela valorização das suas faculdades espirituais e físicas, para o cumprimento dos seus deveres morais e cívicos e a realização das finalidades da vida".
A Comissão teve, e tem, bem presente, como salientou no seu parecer, seguindo na esteira do que já autorizadamente se escrevera, que a educação "é um termo de vocabulário que resiste à definição". E não se vê como defini-la que não seja pela sua própria acção ou pelas finalidades a que visa.
Já há anos, em congresso internacional de pedagogia sobre os fundamentos filosóficos e teleológicos da educação, o tema foi abordado, tendo-se reconhecido a complexidade da definição da própria pedagogia.
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Então se disse que a pedagogia é uma ciência que trabalha denodadamente para esclarecer o seu objecto. Embora se tenha reconhecido haver já algumas contribuições notáveis neste sentido, não deixou de se salientar que são necessárias ainda novas achegas para se conseguir uma definição adequada da pedagogia. Sabe-se que as concepções gerais sobre a vida imprimem um sentido próprio aos problemas que se levantam no domínio da cultura. A imagem que se tenha de homem e do seu destino há-de forçosamente dar uma correspondente configuração a tudo o que diga respeito à educação e às suas ciências.
Assim, o entendimento de que as ciências do espírito se inspiram no saber decalcado sobre a ideia dos corpos físicos registados na sua eficácia pelo mecanicismo haveria de levar, entre outras consequências análogas, a reduzir a pedagogia a uma técnica ou psicotécnica e esta a uma simples questão psicofísica. Nesta óptica, que vê no homem um mero produto da Natureza, das suas determinações e condicionamentos mediante a mecânica da evolução, á educação acaba por ser encarada como simples técnica, sem qualquer horizonte sobre a esfera dos valores e sobre a ordem teleológica.
A resultado idêntico se chega quando se parte do conceito mecanicista assente apenas na intuição, na improvisação e na inspiração e visando dar mera feição esteticista à pedagogia, como pretendia Schiller na sua Educação Estética do Homem, ou mesmo Rousseau, para quem o ideal pedagógico, e até ético, era o de uma alma bela, cuja liberdade consistia, afinal, no "impulso original criador das emoções e paixões desligadas da disciplina e do jugo social".
A educação fica ainda mais desvirtuada se a encaramos à luz daquele sociologismo pedagógico anti-personalista, que tende a converter o homem em simples elemento integrante do Estado ou em exclusiva função da sociedade, com prejuízo da liberdade.
Difícil, sem dúvida, a definição do conceito de educação, mas não ao ponto de não se saber o que uma política educativa deve visar e o que ela não pode pretender atingir, num país como o nosso, integrado numa cultura de raiz cristã.
Sabemos como certas doutrinas reduziram o ético ao psicológico e este ao fisiológico, e depois ao físico-químico. Sabemos que, no domínio social, toda esta visão redundou na transformação do homem em mero produto das forças materiais, principalmente de ordem económica.
Sabemos - e isto importa ter bem no espírito quando se elabora uma lei sobre educação - que a teoria de Marx não é senão a "consequência última do materialismo mecânico determinista", que significa praticamente a anulação da imagem do homem como centro de energias espirituais e, assim, da própria pedagogia nos seus específicos e autênticos problemas.
Por isso, uma definição de educação votada por um Estado ético haverá forçosamente de não atraiçoar aqueles compromissos implícitos e explícitos num ordenamento jurídico como o nosso e numa cultura com a inspiração e o sentido da nossa.
A Comissão de Educação Nacional, Cultura Popular e Interesses Espirituais e Morais, logo na formulação da sua primeira proposta, como aliás em diversas outras, pôs particular empenho em deixar bem vincado este pensamento.
Se vier a ser aprovada essa sua proposta de alteração ou, melhor, de aditamento, a lei do sistema educativo ficará com uma abertura ou pórtico mais adequado às nobres finalidades que lhe cabe prosseguir.
Por último, direi que, ainda nesta primeira base, deveriam indicar-se as actividades que a educação nacional engloba. Preceito idêntico está inserido na proposta de lei, na base II, n.° 1, o qual, na proposta da Câmara Corporativa, se inclui na base I, n.° 1.
Fez bem a Câmara Corporativa em integrar esta norma na base I. Em todo o caso, e como se viu, não poderia a disposição constituir a abertura da lei do sistema educativo. Esse lugar de relevo pertence, de direito, a uma norma em que se dê expressão às finalidades essenciais da educação - da educação nacional, e não de outra, claro está.
A Câmara Corporativa, no entanto, ao redigir este n.° 2, altera um pouco os termos da proposta de lei. Justifica essas alterações dizendo que, no "n.° 2 da base II, que passa a n.° 1 da base I, parece dever ficar consignado, além da acção educativa exercida por grupos sociais e profissionais, também a que se desenvolve no âmbito das sociedades primárias". Acrescenta ainda a Câmara que "se exclui a referência específica a acções de educação extra-escolar" por se considerarem já abrangidas na alusão a "todas as acções não organizadas que contribuam para a formação dos indivíduos".
A Comissão, no entanto, foi ainda um pouco além da Câmara Corporativa, ao entender que não é necessário, sequer, aludir "às acções não. organizadas", bastando prever, de modo genérico, que "a educação engloba não só as actividades integradas no sistema educativo mas quaisquer outras que contribuam para a formação dos indivíduos, nomeadamente as que se desenvolvem no âmbito da família e das demais sociedades primárias e outros grupos sociais e profissionais".
Acresce que podem conceber-se "acções organizadas" fora do sistema educativo. Assim, a expressão não se adapta às realidades, pelo que a Comissão sugere a sua eliminação.
Sobre a base I é tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Veiga de Macedo, a Mesa gostaria de um esclarecimento, porque a sua dúvida talvez seja partilhada por alguns Srs. Deputados.
Se bem ouvi, V. Exa., referindo-se à proposta de alteração à base I, que subscreveu com outros Srs. Deputados, há pouco disse: "se vier a ser aprovada esta proposta de alteração, ou melhor, de aditamento...".
V. Exa. considera esta uma proposta de aditamento?
O Sr. Veiga de Macedo: - Sr. Presidente: Agradeço a observação que faz. Na verdade tive dúvidas quando subscrevi a proposta em discussão sobre se deveria considerar-se proposta de alteração ou proposta de aditamento. Ao apresentar estas explicações sobre a base I, ocorreu-me aludir a essa dúvida pela forma que chamou a atenção esclarecida de V. Exa. Não atribuo, porém, ao caso, alcance significativo. De qualquer maneira, agradeço a V. Exa.
O Sr. Presidente: - Muito obrigado pelo esclarecimento de V. Exa. Possivelmente, se tivéssemos que a
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qualificar, ela ainda seria melhor qualificada de substituição do que de aditamento.
Continua em discussão.
O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: Ao iniciar-se a discussão na especialidade da lei da reforma do sistema educativo, julgo perfeitamente pertinente chamar a atenção para que, na sequência das grandes e profundas transformações e reformas que vêm a ser introduzidas, particularmente a partir da revisão constitucional e dos textos conexos e subsequentes da Lei do Fomento Industrial e da Defesa, da Concorrência, está a Câmara praticamente a finalizar os seus trabalhos com uma lei da maior transcendência.
Na realidade, o nosso progresso económico depende profundamente da revisão do nosso sistema educativo.
Se época houve em que era o progresso económico que determinava modificações neste sentido, creio estarmos hoje, no quadro em que se agita e move a nossa vida, extraordinariamente carecidos de que, por uma reforma profunda e coerente do sistema educativo, possamos dar um impulso no sentido do desenvolvimento do progresso económico e da justiça social para todos os portugueses.
Eu queria prestar a minha homenagem ao esforço, labor e preocupação constante da nossa Comissão, e particularizava, se mo permitem, na pessoa do seu presidente, Sr. Dr. Veiga de Macedo, lembrando os relevantes serviços que na primeira arrancada da mudança do sistema educativo se lhe ficaram a dever.
Sem essa arrancada não estaríamos hoje em condições de dar o passo importante e decisivo que estamos dando.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Particulizaria também no ilustre relator, uni dos novos Deputados, que mais vincada deixa a sua passagem por esta Câmara, pela sua inteligência, pela sua cultura e pelo seu profundo saber.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Mas, acima de tudo, eu queria acentuar o esforço feito pela Comissão em matéria delicada e complexa, carregada, como disse o Sr. Deputado Veiga de Macedo, de tensões emocionais, para, sem prejuízo de uma elaboração do texto, melhorando aqui e além, poder encontrar pontos de convergência, princípios orientadores, que, servindo, ou sendo conciliáveis com a proposta do Governo, traduziam preocupações ou sentimentos de muitos dos Srs. Deputados.
A esse esforço e a esse mérito eu quero render a minha homenagem.
É este o momento em que esta homenagem, em matéria tão delicada, tem mais profundo sentido, quando estamos a finalizar os trabalhos de uma legislatura.
É evidente que a proposta do Governo tinha estrutura diferente e, ao ser alterada, sem prejuízo de se reconhecer haver sido melhorada em vários aspectos, naturalmente ao Governo preferiria as soluções que longamente tinha estudado. Todavia, isso não obsta a que, de uma forma geral, o Governo não possa dar a sua aceitação às propostas da Comissão que estão presentes à consideração de todos nós.
No caso concreto da base I, que corresponde em parte à base II do Governo, a proposta de substituição como se me afigura melhor dito, na medida em que por homologia com disposições da proposta governativa, vai mais longe do que a da Câmara Corporativa e dispensa alguns dos aspectos desnecessariamente considerados; essa proposta de substituição afigura-se-me dizia, ser caracteristicamente uma daquelas em quê a conciliação dos pontos de vista é ciara e nítida.
O Sr. Presidente: - Continua a discussão.
Pausa.
Se mais nenhum de VV. Exas. deseja usar da palavra, passaremos à votação.
Como proposta de alterações que é, tem a prioridade na votação sobre o texto preferido pela Assembleia aquela que é assinada, para a base I, pelos Srs. Deputados Veiga de Macedo e outros. É, portanto, esta que ponho à votação.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Vamos agora passar à base II, de que vai ser lido também o texto sugerido pela Câmara Corporativa e a proposta de alterações a esse texto apresentada por diversos Srs. Deputados.
Foram lidas. São as seguintes:
BASE II
A acção educativa tem por finalidades essenciais:
a) Assegurar a todos os indivíduos, além do revigoramento físico e do aperfeiçoamento das faculdades espirituais, a formação do carácter, do valor profissional, da consciência cívica e de todas as virtudes morais, orientadas pelos princípios da doutrina e da moral cristãs tradicionais no País;
b) Estimular o amor da Pátria e de todos os seus valores, bem como da comunidade lusíada, na sua diversidade sócio-cultural, dentro de um espírito de compreensão e respeito mútuos entre os povos e no âmbito de uma efectiva participação na sociedade internacional;
c) Preparar todos os portugueses para intervirem na vida social como cidadãos, como membros da família e das demais sociedades primárias e como elementos participantes no progresso do País.
Proposta de aditamento e alterações
Base II
Propomos que a base II da proposta de lei n.° 25/X, segundo o texto sugerido pela Câmara Corporativa, passe a ser a base III, com a seguinte redacção:
1. O sistema educativo é diversificado e comporta um processo global e permanente destinado a promover a formação dos Portu-
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gueses, facultando-lhes possibilidades múltiplas de realizarem as suas aspirações e tendências e de se integrarem no conjunto dos valores humanos e culturais comuns.
2. O sistema educativo tem como finalidades essenciais:
a) Assegurar a todos os portugueses, além do revigoramento físico, o aperfeiçoamento das suas faculdades intelectuais, a formação do carácter, do valor profissional e de todas as virtudes morais e cívicas, orientadas pelos princípios da moral e doutrina cristãs tradicionais no País;
b) Estimular o amor da Pátria e de todos os seus valores, dentro do espírito de compreensão e respeito mútuos entre os povos e no âmbito de uma efectiva participação na vida internacional, bem como fortalecer a consciência da solidariedade entre as comunidades lusíadas dispersas pelo Mundo;
c) Preparar todos os portugueses para participarem na vida social como cidadãos, como membros da família e de outras sociedades primárias e como agentes e beneficiários do progresso do País.
3. O ensino ministrado pelo Estado e o ensino de religião e moral nos estabelecimentos de ensino obedecerão aos princípios estabelecidos na Constituição e na lei da liberdade religiosa.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 6 de Abril de 1973. - Os Deputados: Henrique Veiga de Macedo - Alexandre José Linhares Furtado - Custódia Lopes - Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva - Júlio Dias das Neves - Fernando Dias de Carvalho Conceição - Manuel de Jesus Silva Mendes - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Joaquim José Nunes de Oliveira - Rogério Noel Peres Claro.
O Sr. Presidente: - A base II sugerida pela Câmara Corporativa contém as matérias das alíneas a), b) e c) da base I da proposta de lei.
A proposta dos Srs. Deputados Veiga de Macedo e outros é uma alteração ao texto da Câmara Corporativa, compreende ainda dois aditamentos e propõe finalmente uma recolocação noutra ordem, que será a parte menor das preocupações da Assembleia.
Ponho, portanto, à discussão a base II segundo o texto sugerido pela Câmara Corporativa e a proposta de aditamento e alterações à mesma base II apresentada pelos Srs. Deputados Veiga de Macedo e outros, ainda com a indicação que deve passar, na ordenação final, a base III.
Estão em discussão.
O Sr. Veiga de Macedo: - Quanto ao sistema educativo, a Comissão procurou defini-lo de modo mais preciso e atribuir-lhe as finalidades que na proposta de lei e no parecer da Câmara Corporativa se conferem à acção educativa. Esta acção já foi definida através dos princípios e finalidades da própria educação. Dado este esclarecimento, chamarei a atenção para a referência da proposta de lei (n.° 2 da base II) à "integração de todos numa mesma cultura, assente num conjunto de valores sociais e humanos comuns". A Câmara Corporativa ponderou que "o princípio da integração de todos numa mesma cultura" não parece válido para o caso português, por ser inegável a existência de culturas locais nas grandes áreas heterogéneas do espaço nacional. Por isso, no n.° 3 da sua base I, a propósito da acção educativa, a Câmara sugere uma redacção mais precisa.
Tem razão a Câmara, embora se afigure ter interpretado de modo muito literal a fórmula da proposta de lei. Mas como nesta matéria se torna mister, de modo muito especial, evitar incertezas ou ambiguidades, a Comissão tentou uma redacção mais simples e directa de todo o preceito.
Já aqui, a propósito da revisão constitucional, me pronunciei sobre esta questão, pois muitos pensam que a integração cultural no espaço geopolítico português se pode e deve fazer apenas num sentido. Se os portugueses da Europa já muito ensinaram e têm de ensinar às populações africanas de origem, estas muito têm contribuído e muito poderão ainda contribuir para o enriquecimento da nossa cultura comum.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Por isso, me apraz reproduzir estas palavras admiráveis que negam integrações ou assimilações que não sejam orientadas no duplo e nobre sentido do caldeamento das raças e da interpenetração das culturas.
A Sra. D. Sindética Torres: - Muito bem!
O Orador: - "As populações nativas têm valores espirituais e culturais que importa preservar [...] São riquezas que é mister valorizar, por vezes purificar, nunca destruir. O desprezo destes valores significaria uma perda grave, não apenas para essas populações, mas para a própria cultura lusíada, que resulta da configuração histórica de elementos de muito diversa origem."
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - De qualquer modo, a Comissão procurou dar à redacção do n.º 3 da base I do texto sugerido pela Câmara Corporativa forma mais simples e directa. Creio que o conseguiu no seu n.° 1 da base que sugere passe a ser designada a base III.
Quanto à alínea a) do n.° 2 desta base, a Comissão procurou cingir-se aos termos expressos no artigo 43.°, § 2.°, da Constituição, embora sem deixar de respeitar o desenvolvimento que lhe dá a Câmara e o Governo.
A Comissão propõe, ainda, se dê a redacção mais adequada para a alínea b) do mesmo n.° 2.
A proposta de lei, na alínea c) da base I, prevê, entre os princípios orientadores da acção educativa, o de "estimular o amor [...] pelos interesses da comunidade lusíada". É evidente que não está certo falar em "amor pelos interesses"... Que interesses?! Não são felizes esses termos. Pelo menos, não jogam bem entre si e afectam a própria nobreza do sentimento que se pretende incutir e desenvolver. A Câmara
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Corporativa melhorou a redacção, mas aditou uma alusão à "diversidade sócio-cultural", por entender que a comunidade lusíada "tem feição multirracial e pluricontinental".
A Comissão pensa que, ao falar-se de "amor à Pátria e todos os seus valores", logo se contempla toda a comunidade que integra a Pátria ou, como frisou no seu parecer, logo se abrange "tudo quanto diz respeito ao ser e aos destinos da Nação Portuguesa".
No entanto, a Comissão entendeu aconselhável que na lei do sistema educativo se previsse, entre as finalidades essenciais deste, a de "fortalecer a consciência da solidariedade entre as comunidades lusíadas dispersas pelo Mundo".
Como salientou no seu parecer, a Comissão, dentro da preocupação de dar à lei um sentido social marcado, propôs* uma alteração á alínea c) da base n da Câmara Corporativa, que corresponde à alínea b) da base i da proposta de lei. Sugere-se que se acrescente que o sistema educativo visa também "preparar os Portugueses [...] como 'beneficiários' do progresso do País" e não só como "agentes" desse progresso.
Embora pequena, a modificação tem conteúdo.
Não se conceberia ainda que se não proclamasse o princípio fundamental que deve presidir a toda a educação, isto é, se não enunciasse, na lei básica da educação, a doutrina já consagrada na Constituição e na Lei n.° 4/71, de 21 de Agosto, sobre liberdade religiosa.
Esta lei, na sua base VII, n.° 1, prescreve que o ensino ministrado pelo Estado será orientado pelos princípios da doutrina e moral cristãs tradicionais no País. Este preceito mostra-se perfeitamente integrado no espírito e na letra da Constituição (artigo 43.°, § 3.°) e, por isso, era mister reproduzi-lo, logo no pórtico da lei da educação, a marcar o sentido superior em que o ensino - todo o ensino - deve integrar-se.
Por outro lado, a referência à lei da liberdade religiosa tem interesse prático, porque, além do princípio atrás mencionado, essa lei, nos n.ºs 2, 3, 4 e 5 da base VII, regula a forma da dispensa do ensino da moral e religião para os pais, ou alunos maiores de 18 anos, que a pretendam. Assim, não será necessária qualquer alusão expressa ulterior a este direito dos pais sempre que se faça referência ao ensino da moral e da religião.
Não se torna, na verdade, necessário formular, posteriormente, qualquer ressalva sobre a matéria, como se faz na proposta de lei, e no parecer da Câmara Corporativa, por mais de uma vez, ao adoptar-se a expressão "de acordo com a opção da família".
Aceito que não é forçoso inscrever esta declaração de princípio na lei do sistema educativo, uma vez que já se encontra consagrado na lei fundamental do País e na lei da liberdade religiosa. No entanto, repito, a sua enunciação, de novo, no diploma sobre o sistema educativo tem pleno cabimento e real interesse. Daí a sugestão para aditar o n.° 3 à base II do texto da Câmara Corporativa e base III da Comissão.
Este princípio encontrava-se definido, e muito bem, no projecto do Estatuto da Educação Nacional do Ministro Galvão Teles.
Creio que estas palavras não poderiam ser omitidas quando se vai votar uma proposta da Comissão com este alcance. Se porventura a proposta não fosse aprovada, nem por isso a doutrina que ela contém deixava de vigorar, pois consta já da Constituição e da lei especial sobre liberdade religiosa. Mas convirá, insisto, reproduzi-la na lei que está agora a ser votada pela Assembleia.
O Sr. Presidente: - Continua a discussão.
Pausa.
Se mais nenhum de VV. Exas. deseja usar da palavra, passaremos à votação.
Pausa.
A proposta subscrita pelos Srs. Deputados Veiga de Macedo e outros tem prioridade regimental sobre o texto sugerido pela Câmara Corporativa que VV. Exas. adoptaram como base de votação.
Ponho à votação o n.° 1 da base n proposto pelos Srs. Deputados Veiga de Macedo e outros e que é matéria nova em relação ao texto da Câmara Corporativa, pelo menos na ordenação dela.
Submetido à votação, foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Ponho à votação a proposta de alteração que consiste em dar nova redacção às alíneas a), b) e c) da base II sugerida pela Câmara Corporativa, ordenando-as num n.° 2 segundo a proposta dos Srs. Deputados que nomeei.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Ponho agora à votação o aditamento de um n.° 3 a esta mesma base, segundo a proposta dos mesmos Srs. Deputados.
Submetido à votação, foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Ponho finalmente à votação a proposta de que toda esta matéria, na ordenação final da lei, passe a ser a base III.
Submetida à ovtação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Passamos agora à base III, segundo o texto da Câmara Corporativa, em relação à qual também há uma proposta de alteração, e vão ser lidas as duas.
Foram lidas. São as seguintes:
BASE III
No domínio da acção educativa, compete especialmente ao Estado:
a) Proporcionar uma educação básica a todos os portugueses;
b) Assegurar a todos os cidadãos o direito à educação, mediante o acesso aos vários graus de ensino e aos bens da cultura, sem outra distinção que não seja a resultante da capacidade e dos méritos de cada um, para o que deverá organizar e manter estabelecimentos de ensino, de investigação e de cultura, apoiar pelas formas mais adequadas as instituições particulares que prossigam os mesmos fins e garantir efectivamente a realização do princípio da igualdade de oportunidades;
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c) Facilitar aos pais o cumprimento do dever de instruir e educar os filhos, cooperando com as famílias nesse sentido;
d) Favorecer a liberdade de ensino, em todas as suas modalidades.
Proposta de alterações
Base III
Propomos que a base m da proposta de lei n.° 25/X, segundo o texto sugerido pela Câmara Corporativa, passe a ser a base n, com a seguinte
No domínio da acção educativa, incumbe especialmente ao Estado:
a) Assegurar a todos o direito à educação, mediante o acesso aos vários graus de ensino e aos bens da cultura, sem outra distinção que não seja a resultante da capacidade e dos méritos de cada um, para o que deverá organizar e manter os necessários estabelecimentos de ensino, investigação e cultura e estimular a criação e o desenvolvimento de instituições particulares que prossigam os mesmos fins;
b) Tornar efectiva a obrigatoriedade de uma educação básica generalizada como pressuposto indispensável da observância do princípio fundamental da igualdade de oportunidades para todos;
c) Facilitar às famílias, mediante adequadas formas de cooperação, o cumprimento do dever de instruir e educar os filhos;
d) Garantir a liberdade de ensino em todas as suas modalidades;
e) Fomentar e coordenar as actividades respeitantes à educação nacional.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 6 de Abril de 1973. - Os Deputados: Henrique Veiga de Macedo - Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva - Custódia Lopes - Alexandre José Linhares Furtado - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Júlio Dias das Neves - Fernando Dias de Carvalho Conceição - Manuel de Jesus Silva Mendes - Joaquim José Nunes de Oliveira - Rogério Noel Peres Claro.
O Sr. Presidente: - Esclareço VV. Exas., que, aliás, estarão disso já perfeitamente seguros, que a base III sugerida pela Câmara Corporativa compreende as matérias que, na proposta de lei, eram objecto das alíneas d), e), f) e g) da base I.
Quanto à proposta de alterações dos Srs. Deputados, compreende alterações e aditamentos à matéria sugerida pela Câmara Corporativa.
Estão em discussão.
O Sr. Veiga de Macedo: - Nesta base definem-se os deveres do Estado no domínio da acção educativa.
Na proposta de lei, o preceito da alínea a) estava contido na alínea e) da base I, como princípio orientador da acção educativa. Não há dúvida de que, como reconheceu a Câmara Corporativa, a inserção da norma não era a melhor. Por outro lado, importava dar expressão, de modo nítido, ao direito de todos à educação e enunciar ainda a obrigação de o Estado contribuir para a efectiva realização do princípio da igualdade de oportunidades.
A propósito da segunda parte da alínea a) da base m da Câmara Corporativa, a Comissão, em vez das fórmulas adoptadas pela Câmara e pelo Governo, perfilhou, como se refere no seu relatório, outras mais vinculativas para o Estado.
Por outro lado, quer a proposta de lei [alínea f) da base i], quer a Câmara Corporativa [alínea a) da base III da sua proposta] adoptam uma redacção, pouco incisiva para uma norma que convém redigir em termos muito claros e fortes. Assim; em vez da fórmula "proporcionar uma educação básica á todos os portugueses", a Comissão entende preferível esta outra:
Tornar efectiva a obrigatoriedade de uma educação básica generalizada como pressuposto indispensável da observância do princípio fundamental da igualdade de oportunidades para todos.
Reconheço que esta redacção não obedece àquele estilo que a Comissão procurou imprimir às suas propostas. Mas aqui houve uma preocupação de tornar muito claro o sentido da norma e de vincar bem princípios fundamentais que não poderiam ser enunciados de modo frouxo ou ambíguo. Um pouco habituado a trabalhar na redacção e sistematização de preceitos de ordem legal, não me agrada essa fórmula. Mas não foi possível encontrar outra. E tudo se sacrificou aqui à necessidade de dar nitidez e força a uma disposição desta índole e desta importância.
Nesta base II da Comissão, prevê-se ainda [alínea c)] que cabe ao Estado "facilitar às famílias, mediante adequadas formas de cooperação, o cumprimento do dever de instruir e educar os filhos". Parece que esta redacção é melhor do que a da alínea c) da base III da Câmara Corporativa e da alínea g) da base I da proposta.
Por outro lado, a Comissão entende que a alínea d) da base I da proposta e a alínea d) da base III da Câmara Corporativa carecem de uma formulação mais incisiva no tocante ao dever do Estado sobre a liberdade de ensino. O Estado não deve apenas favorecer essa liberdade, mas garanti-la. Por isso, na proposta da Comissão, em vez do verbo "favorecer" emprega-se o verbo "garantir", que, aliás, se mostra mais de acordo com a Constituição. Esta, no seu artigo 8.°, prevê que "constituem direitos, liberdades e garantias individuais dos cidadãos portugueses", entre outras, "a liberdade de ensino". Daí a alteração preconizada pela Comissão.
Elucidarei ainda que nem na proposta de lei nem no parecer da Câmara Corporativa se inclui qualquer preceito sobre o direito e o dever de o Estado "fomentar e coordenar as actividades respeitantes à educação nacional". Ora uma norma com este conteúdo deve ser enunciada, de modo expresso, num diploma legal sobre o sistema educativo. Daí o que consta da alínea e) da base em discussão, sugerida pela Comissão.
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O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.
Pausa.
Se mais nenhum de VV. Exas. deseja usar da palavra, passaremos à votação.
Pausa.
Parece-me possível pôr em votação, globalmente, não só a matéria referente à base m da Câmara Corporativa, com as alterações preconizadas pelos Srs. Deputados, mas ainda a ordenação definitiva, preconizada pelos mesmos Srs. Deputados.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Passaremos agora à base IV.
Em relação a esta base, além do texto da Câmara Corporativa, que contém as matérias dos n.ºs 3, 4, 5, 6, 7 e 8 da base n da proposta de lei, há ainda uma proposta de alterações subscrita pelos Srs. Deputados Veiga de Macedo e outros, datada de 6 do mês corrente, e há uma segunda proposta de alterações, que acaba de dar entrada na Mesa e que já foi comunicada a VV. Exas. em fotocópias.
Vão ser lidas.
Foram lidas. São as seguintes:
CAPÍTULO II
Estrutura do sistema educativo
SECÇÃO 1.ª
Disposições gerais
Base IV
1. O sistema educativo inclui a educação pré-escolar, a educação escolar, a iniciação e a formação profissional e a educação permanente.
2. A educação pré-escolar tem em vista o harmonioso desenvolvimento psicobiológico, físico e afectivo da criança, sem a sujeitar à disciplina específica e aos deveres próprios de uma aprendizagem escolar.
3. A educação escolar tem por fins específicos:
a) Promover a formação intelectual e moral e o aperfeiçoamento físico dos indivíduos, visando favorecer o enriquecimento da personalidade e fortalecer a consciência cívica e social;
b) Fomentar, através do ensino, o espírito
científico, crítico e criador, a capacidade de reflexão, a disciplina mental e a valorização profissional e despertar o desejo de constante actualização de conhecimentos.
4. A educação escolar é promovida através do sistema escolar, que compreende os ensinos básico, secundário e superior. O ensino básico abrange os ensinos primário e preparatório; o ensino secundário compõe-se de dois ciclos, e o ensino superior pode ser de curta e longa duração e, ainda, de pós-graduação.
5. A iniciação e a formação profissional poderão realizar-se através de cursos integrados no sistema escolar ou funcionando paralelamente a este.
6. A educação permanente é um processo contínuo de aperfeiçoamento cultural ou profissional.
Proposta de alterações
BASE IV
Propomos para a base IV da proposta de lei n.° 25/X, segundo o texto sugerido pela Câmara Corporativa, a seguinte redacção:
1. O sistema educativo abrange a educação pré-escolar, a educação escolar e a educação permanente.
2. A educação pré-escolar tem em vista o desenvolvimento espiritual, afectivo e físico da criança sem a sujeitar à disciplina e deveres próprios de uma aprendizagem escolar.
3. A educação escolar tem por fins específicos:
a) Promover a formação moral, intelectual e profissional e o aperfeiçoamento físico dos indivíduos, visando o enriquecimento da personalidade e o fortalecimento da consciência cívica e social;
b) Fomentar o espírito científico, crítico e criador, a capacidade de observação e de reflexão e a disciplina mental, bem como despertar o interesse por constante actualização de conhecimentos de valorização profissional.
4. A educação escolar é promovida através do sistema escolar, que compreende os ensinos básico, secundário e superior e a iniciação e a formação profissional.
5. O ensino básico abrange os ensinos primário e preparatório. O ensino secundário compõe-se de dois ciclos. O ensino superior pode ser de curta ou longa duração e ainda de pós-graduação. A iniciação e a formação profissional destinam-se a habilitados com o ensino básico ou com o curso geral ou complementar de ensino secundário que optem por essas modalidades de ensino.
6. A educação permanente é ura processo organizado de educação que promove, de modo contínuo, a formação, a actualização e o aperfeiçoamento cultural, científico e profissional.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 6 de Abril de 1973. - Os Deputados: Henrique Veiga de Macedo - Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva - Custódia Lopes - Júlio Dias das Neves - Fernando Dias de Carvalho Conceição - Manuel de Jesus Silva Mendes - Alexandre José Linhares Furtado - Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva - Joaquim José Nunes de Oliveira - Rogério Noel Peres Claro.
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Proposta de alterações
Base IV
Propomos para a base IV da proposta de lei n.° 25/X, segundo o texto sugerido pela Câmara Corporativa, a seguinte redacção:
1. O sistema educativo abrange a educação pré-escolar, a educação escolar e a educação permanente.
2. A educação pré-escolar tem em vista o desenvolvimento espiritual, afectivo e físico da criança, sem a sujeitar à disciplina e deveres próprios de uma aprendizagem escolar.
3. A educação escolar tem por fins específicos:
a) Promover a formação moral, intelectual e profissional e o aperfeiçoamento físico dos indivíduos, visando o enriquecimento da personalidade e o fortalecimento da consciência cívica e social;
b) Fomentar o espírito científico, crítico e criador, a capacidade de observação e de reflexão e a disciplina mental, bem como despertar o interesse por constante actualização de conhecimentos de valorização profissional.
4. A educação escolar é promovida através do sistema escolar, que compreende os ensinos básico, secundário e superior e a formação profissional.
5. O ensino básico abrange os ensinos primário e preparatório. O ensino secundário compõe-se de dois ciclos. O ensino superior pode ser de curta ou longa duração e ainda de pós-graduação. A formação profissional destina-se a habilitados com o ensino básico ou com o curso geral ou complementar do ensino secundário que optem por esta modalidade de ensino.
6. A educação permanente é um processo organizado de educação que promove, de modo contínuo, a formação, a actualização e o aperfeiçoamento cultural, científico e profissional.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Abril de 1973. - Os Deputados: Henrique Veiga de Macedo - Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva - Custódia Lopes - Júlio Dias das Neves - Fernando Dias de Carvalho Conceição - Joaquim José Nunes de Oliveira - Manuel de Jesus Silva Mendes.
O Sr. Presidente: - Estão em discussão.
O Sr. Dias das Neves: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para, em relação ao n.° 5 desta base, fazer algumas considerações.
Entendo que a iniciação profissional, tal como está definida no n.° 2 da base XIV da proposta do Governo, e que a Câmara Corporativa conserva na sua base XVIII, não é passível de tratamento exclusivamente escolar, pois a escola não consegue realizar o meio concreto do trabalho e dele dar conhecimento e fazer a adaptação dos jovens.
Este foi também o entendimento da Comissão de Educação, a que me honro de pertencer, que no n.° 1 da sua proposta para a base XII faz a definição da iniciação profissional que deseja ver incluída no sistema escolar.
Porém, tal como é entendida pela Comissão de Educação a formação profissional referida no n.° 1 da sua base XII, ela também inclui obrigatoriamente a iniciação profissional de que é parte integrante, pelo que não creio haver nada a opor à retirada desta base XII do que se refere à mesma iniciação profissional.
Porém, estou com a Câmara Corporativa quando vem incluir no seu texto, que a Comissão também adoptou, a formação profissional. Efectivamente, não se pode deixar fora da escola a formação profissional, pois se se fizesse, corria-se o risco de ser feita pelas empresas, que se preocupariam apenas com a produtividade do trabalho, e a formação passaria a revestir a simples forma de aprendizagem, despida de qualquer tipo de formação cultural e humanística.
Também me parece que não deve ser feita por outros Ministérios, a não ser em casos muito especiais, pois a formação profissional exige que, a par do domínio de uma técnica de trabalho, seja dada aos alunos que a frequentam uma formação e uma cultura que outros departamentos, que não sejam o Ministério da Educação Nacional, não podem dar, pois essa não é a sua função específica.
Então ficaríamos com a possibilidade de uma colaboração das empresas nessa matéria, e é isso que se deve desejar - uma colaboração íntima entre o Ministério da Educação Nacional e a empresa - para realizar a formação profissional. Só que no nosso país, neste momento, muito poucas empresas reúnem condições de realizar essa colaboração. Salvo raras excepções - e posso citar, em Lisboa, a Lisnave, a C. U. F. e as Oficinas Gerais de Material Aeronáutico.
O Sr. Roboredo e Silva: - E o Arsenal do Alfeite...
O Orador: - E o Arsenal do Alfeite, também. Muito obrigado, Sr. Deputado. Dizia eu, pois, que, salvo uma meia dúzia de empresas desse tipo, não é possível às outras empresas, dada a sua pouca dimensão e a sua deficiente estrutura, oferecer essa colaboração.
Aliás, esta experiência de colaboração das empresas com o Ministério da Educação Nacional está feita, quando no último estatuto do ensino técnico profissional se criaram cursos, chamados "cursos de aprendizagem", em que se matriculavam os aprendizes que entravam nas empresas.
Quando estes aprendizes entravam nas empresas, eram estas obrigadas a fazer a sua inscrição na escola e a fazer a comunicação ao Instituto Nacional do Trabalho.
Foram raros os casos em que se deu essa colaboração e, assim, esses cursos tiveram de terminar, exactamente porque essa colaboração se não fez.
Deram-se até casos curiosos e desagradáveis:
Houve empresas que, tendo aprendizes com a 4.ª classe, e que por esse motivo deviam frequentar os cursos de aprendizagem, os despediram para admitirem
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aprendizes com a 3.ª classe, que não podiam frequentar esses cursos.
Daqui pensar que o sistema preferível é o da inclusão da formação profissional no sistema escolar.
Tenho dito.
O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Apenas para uma ligeira observação.
Eu poria, fundamentalmente, ao Sr. Presidente da Comissão, e sem me repetir, pois quando na generalidade me pronunciei sobre esta lei rendi as minhas homenagens ao extraordinário trabalho e espantoso esforço da Comissão para produzir estas numerosas alterações que apresentou e que merecem a homenagem de toda a Câmara,...
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - ... mas a minha observação é esta: Nós estamos a falar da educação escolar, e na alínea b) do n.° 3 lemos:
Fomentar o espírito científico, crítico e criador, a capacidade de observação e de reflexão e a disciplina mental, bem como despertar o interesse por constante actualização de conhecimentos de valorização profissional.
Ora, este n.° 3, repito, abrange todo o sistema de educação escolar, que vai desde o ensino básico até ao ensino superior universitário.
A palavra "despertar", apenas, satisfará?
Não seria melhor dizer "despertar e acentuar", ou qualquer outra forma?
Até porque na alínea d) já se contém a expressão "visando o enriquecimento da personalidade". Já se aceita, portanto, que há o despertar da personalidade; isso já aí se reconhece.
Eu não pretendo mesmo provocar discussão, para não demorar, visto que nós estamos a correr contra o tempo, mas este "despertar", nesta alínea apenas, uma vez que a alínea é de um número que abrange toda a educação escolar, afigura-se-me pouco.
Muito obrigado.
O orador não reviu.
O Sr. Veiga de Macedo: - Sr. Presidente: Antes de mais, procurarei responder, na medida do possível, à oportuna observação do nosso ilustre colega.
Quanto a esta alínea d), a Comissão tentou melhorar o seu texto. Mas, de acordo com a orientação geral seguida para outros casos, impôs a si própria naturais limitações, aliás na esperança, ou melhor, na certeza, de que a Comissão de Legislação e Redacção saberá introduzir as alterações de forma que se tornem indispensáveis. A alteração proposta pela Comissão insere-se, afinal, na linha da preocupação que acaba de ser manifestada pelo nosso ilustre colega. Repare-se que na alínea b) do n.° 5 da base II da proposta de lei se emprega a expressão "despertar o desejo". A Comissão entendeu que seria preferível falar em "despertar o interesse". Ainda se admitiu, devo dizê-lo, a hipótese de substituir o verbo "despertar" por outro ou aditar-lhe um outro que completasse o sentido que, no fundo, se pretende dar ao preceito. Em todo o caso, acabou por prevalecer a ideia de que a palavra "despertar", muito usada nestes casos, poderia aqui ter um alcance mais vasto do que aquele que normalmente lhe é atribuído na linguagem corrente.
Dito isto, Sr. Presidente, formulo algumas observações sobre o problema mais importante que esta base suscita.
O n.° 1 desta base, na proposta da Comissão, é, à parte o verbo da oração, idêntico ao n.° 3 da base II da proposta de lei.
A Câmara Corporativa, no n.° 1 da base IV da sua proposta, inclui no sistema educativo, além da educação pré-escolar, da educação escolar e da educação permanente, como propõe o Governo, a iniciação e a formação profissional. A Câmara Corporativa segue esta orientação por lhe parecer que "o sistema escolar integrará cursos com tais finalidades".
Para justificação parece muito pouco. Este laconismo da Câmara sobre matéria tão importante correspondeu, de algum modo, à ausência de um relatório do Governo que acompanhasse a proposta de lei. Tudo isto muito dificultou o trabalho da Comissão. No entanto, não pode deixar de se dizer que a solução preconizada pela Câmara Corporativa representa um avanço notável em relação ao que o Governo propõe.
A este assunto me referi quando na generalidade apreciei a proposta de lei. Não vou, pois, reproduzir o que então disse, embora ouse chamar a atenção da Assembleia para o que nessa altura aqui disse. Mas não posso furtar-me a aludir a alguns aspectos do problema para que melhor se compreenda a posição da Comissão.
A proposta de lei admite que "os alunos que abandonem o sistema escolar no termo do ensino preparatório ou dos cursos geral e complementar do ensino secundário poderão ingressar nos cursos de iniciação profissional" (n.° 7 da base III). Na base XIV desenvolve-se este princípio.
A Câmara Corporativa sugere o não só a inclusão, com autonomia, no sistema educativo da iniciação e da formação profissionais, mas ainda que a base XIV da proposta de lei (que é correspondente à sua base XVIII) seja modificada, passando o n.° 1 a ter esta redacção:
Além dos cursos de formação profissional integrados no sistema escolar, serão organizados cursos de iniciação e de formação profissional destinados aos alunos que cessem estudos no sistema escolar...
Para já, chamo a atenção para o facto de a Câmara Corporativa incluir cursos de iniciação e formação profissional no sistema escolar e não os considerar englobados na educação escolar. Ora "a educação escolar (n.° 4 da base IV do próprio texto da Câmara) é promovida através do sistema escolar, que compreende os ensinos básico, secundário e superior".
Sendo assim, estes cursos incluídos como estão na educação escolar, que é uma das modalidades do sistema educativo, não carecem de ser individualizados no elenco das modalidades deste sistema.
Mas a Câmara deve ter tido em vista que estes cursos possam funcionar paralelamente ao sistema escolar (n.° 5 da sua base IV). Estes últimos cursos pertenceriam, assim, ao sistema educativo, mas não ao sistema escolar. É um critério. A Comissão, porém, não o perfilhou.
Repare-se, porém, que no n.° 1 da sua base XVIII a Câmara prevê, como se disse já, "além dos cursos
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de formação profissional integrados no sistema escolar", que sejam "organizados outros cursos de iniciação e de formação profissional destinados, respectivamente, aos alunos que cessem estudos no sistema escolar no termo do ensino básico ou do curso geral ou complementar do ensino secundário".
Mas se estes últimos cursos se destinam aos alunos que cessem tais estudos, a que alunos se destinam os cursos integrados no sistema escolar?
Não se vê que não se destinem aos mesmos alunos. Sendo assim, como se distinguem uns cursos dos outros cursos? Será porque uns ficam no âmbito do Ministério da Educação Nacional e outros fora dele por funcionarem noutros sectores públicos ou em entidades privadas, como empresas?
Mas mesmo aqueles primeiros, na economia da proposta de lei, não estão incluídos no sistema educativo, pois no n.° 1 da base XIV da proposta prevê-se que "serão organizados cursos de iniciação e de formação profissional destinados, respectivamente, aos alunos que abandonem o sistema educativo no termo do ensino básico ou no curso geral ou complementar do ensino secundário". A proposta considera não pertencentes ao sistema educativo os cursos promovidos, isoladamente, pelo Ministério da Educação, como se conclui do simples confronto entre esse n.° 1 da base XIV e o n.° 5 da mesma base.
Anotarei ainda que se suscitam dúvidas quanto ao alcance da definição do n.° 2 da base XVIII da Câmara Corporativa. Aí se diz que "a iniciação profissional tem por finalidade levar os jovens ao conhecimento do meio concreto de trabalho e à sua melhor adaptação a ele" e que "a formação profissional visa habilitá-los ao exercício de uma profissão".
Mas esta definição reporta-se à segunda parte do n.° 1 da mesma base ou a toda a base? Se é a toda a base, abrange os cursos para "os alunos que cessam estudos no sistema escolar" e "os cursos de formação profissional integrados no sistema escolar". A ser este último entendimento o que deve ter-se como certo, ficaram sem definição os cursos de iniciação profissional integrados no sistema escolar referidos no n.° 5 da base IV da Câmara Corporativa, a não ser que esta os tenha incluído na base XVIII, n.° 1, nos cursos de formação profissional. Se assim foi, seguiu-se bom caminho.
Como se vê, não foi fácil a interpretação dos textos sobre os quais a Comissão se debruçou. Não foi, nem é.
No entanto, parece-me não ser difícil estabelecer a diferença mais saliente entre as duas orientações. A Câmara Corporativa prevê cursos de índole profissional dentro do sistema escolar e outros para os alunos que cessem estudos no sistema escolar no termo do ensino básico ou do curso geral ou complementar do ensino secundário.
A proposta de lei considera todos esses cursos como exteriores ao sistema educativo, e, portanto, ao sistema escolar, mesmo os que são promovidos, "isoladamente", pelo Ministério da Educação Nacional.
É caso para perguntar por que razão estes últimos cursos, ao menos, não hão-de figurar no sistema escolar.
É curioso assinalar que o ilustre Prof. Doutor José Sebastião da Silva Dias, no seu notável trabalho A Reforma da Universidade e os Seus Problemas, afirma que não é coisa fácil a discussão do projecto do sistema escolar português, pelo carácter excessivamente genérico do seu traçado. Depois de prestar homenagem a alguns princípios corajosos e sadios do projecto, assinala "um negativo considerável ao 'sistema'", como "as ambiguidades de formulação e as lacunas de conteúdo em tópicos essenciais".
Perante esta situação, e mau grado a Comissão só ter tido conhecimento do parecer da Câmara Corporativa bastante tarde, fez-se um esforço para, também neste domínio, encontrar uma solução mais simples e mais clara.
A Comissão começou por prever que o sistema escolar, que, nos termos do n.° 4 desta mesma base, promove a educação escolar e compreende os ensinos básico, secundário e superior, "oferecesse ainda aos alunos que os preferirem cursos de iniciação e cursos de formação profissional". Os primeiros destinar-se-iam a alunos habilitados com o ensino básico, os outros a habilitados com os cursos geral ou complementar do ensino secundário.
Nesta orientação, chegou a Comissão a entender que, entre os objectivos do ensino secundário (base VII da proposta e base IX da Câmara Corporativa), se previsse, na alínea h), além da finalidade de "preparar o ingresso, nos diversos cursos superiores ou a inserção em futura actividade profissional", esta outra de "assegurar a iniciação profissional". Na linha lógica desta ordem de ideias, previa-se uma nova subsecção, dentro da secção "Educação escolar", sob a rubrica "Formação profissional", em que se definia esta formação como visando habilitar ao exercício de uma profissão e em que se incluiriam os n.ºs 3 e 4 da base XVIII da Câmara Corporativa.
Esta formação teria o nível médio ou mesmo superior de ensino, conforme as circunstâncias. Além disso, previa-se, nesse entendimento inicial da Comissão, uma secção autónoma para a iniciação e formação fora do sistema escolar dos alunos que cessassem estudos depois do ensino básico até ao termo do curso complementar do ensino secundário. Nessa secção, com uma única base, incluir-se-ia o n.° 5 da base XVIII da Câmara Corporativa, de modo a abranger todos os cursos a cargo de entidades públicas ou particulares, mas fora daquele sistema.
Esta orientação tinha, pelo menos formalmente, a vantagem de não colidir tanto com o regime da proposta de lei, tal como ressalta das suas normas. Assim, a seguir ao ensino básico ministrar-se-ia a iniciação profissional, dentro do sistema escolar, de modo a permitir que os alunos nessa altura da sua vida pudessem exercer uma profissão, mas sem deixarem de obter os seus fundamentos técnicos básicos em escolas do Ministério da Educação Nacional e de, ao mesmo tempo, consolidarem e ampliarem a sua cultura geral, embora dentro de certos limites. A formação profissional propriamente dita destinar-se-ia aos alunos com o curso geral ou com o complementar. Esta é a orientação da proposta de lei (base XIV), mas para cursos exteriores ao sistema escolar, e a da Câmara Corporativa (base XVIII e n.° 5 da base V). Todavia, a Câmara, como se disse, quando na base XVIII alude aos cursos dentro do sistema escolar fala só em formação profissional e não já em iniciação profissional.
A Comissão, porém, foi evoluindo e, embora procurasse não afectar a concepção de um tronco comum para o ensino a nível secundário, começou a aproxi-
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mar-se de uma solução que ia um pouco mais longe do que a da própria Câmara Corporativa.
Em primeiro lugar, impressionou a Comissão a definição do conceito de iniciação profissional tal como é dada na proposta de lei e pela Câmara Corporativa, ou seja a de que tem por finalidade levar os jovens ao conhecimento do meio concreto do trabalho e à sua melhor adaptação a ele.
Admite-se que seja assim para os alunos que queiram entrar, em curto espaço de tempo, na vida profissional remunerada.
Mas aqueles que quisessem aprender um ofício, sem entrar logo para as empresas, que facilidades ou que oportunidades sé lhes oferecia? Por outro lado, os alunos com o curso geral ou com o curso complementar não poderiam obter fora dos esquemas polivalentes do ensino secundário -que, no entanto, nunca poderão ser tão diferenciados como seria para desejar- uma iniciação profissional que os levasse à sua rápida adaptação ao meio concreto do trabalho? A uns e a outros só restariam modalidades de formação fora do sistema escolar? Seria injusto que tal acontecesse.
Por isto, e por outras razões que omito para não alongar mais esta explicação ou justificação, a Comissão acabou por se inclinar para a solução de integrar na educação escolar, ou no sistema escolar que a promove, a formação profissional, embora admitindo que cursos de índole semelhante possam e devam assegurar-se por outros meios em conjugação de esforços dos sectores público e privado.
Ao mesmo tempo diligenciou definir, de modo mais apropriado, os objectivos desses cursos, não deixando de prever que neles se procurará garantir uma educação mínima de ordem científica e cultural que facilite a adaptação dos alunos à evolução das condições da vida moderna e à obtenção ulterior de novos e mais amplos conhecimentos, através do sistema escolar ou da educação permanente.
Estas palavras destinam-se a justificar a posição que a Comissão assumiu ao sugerir o que consta da sua proposta inicial relativa ao n.° 4 da base IV. Mas, entretanto, a Comissão pôde dar ainda mais um passo em frente. Fê-lo ao apresentar nova proposta em que, em vez de se referir à iniciação e à formação profissionais, alude apenas à formação profissional.
É que começou a pensar-se que a Comissão pretendia apenas considerar como iniciação profissional a ministração de conhecimentos elementares em regime intensivo de poucas semanas de ensino prático.
Ora, a Comissão nunca assim entendeu a iniciação profissional, principalmente a prevista dentro do sistema escolar. Por outro lado, a Comissão desejava não afectar de modo sensível, nem na formulação da teoria, nem na prática, a concepção do ensino secundário polivalente de tronco comum.
Só por isso é que, de começo, não deixou de fazer referência à iniciação profissional. Mas, uma vez que a sua intenção corria o risco de ser mal interpretada e de conduzir precisamente ao que pretendia, e pretende, evitar, a Comissão resolveu, por fim, apresentar nova proposta de alteração em substituição da primeira, o que significa, como se viu, um afastamento mais acentuado do sistema da proposta de lei.
Note-se que a Comissão, ao fazer esta sua proposta, fez também outra destinada a alterar o que sugeriu quanto à base XVIII da Câmara Corporativa e base XIV da proposta de lei (base XII da Comissão).
Assim, a primeira parte desta base é eliminada e no n.° 4 da mesma base suprime-se a referência à iniciação profissional, para não se pensar que o Ministério da Educação Nacional fica desligado de assumir responsabilidades em cursos de formação profissional que se destinem a assegurar o ensino dos conhecimentos técnicos, mesmo os elementares, transferindo pura e simplesmente essa responsabilidade para as empresas ou para outros sectores públicos. É que a formação profissional propriamente dita abrange a preparação profissional a diferentes níveis e cursos de diversa duração, desde que, mesmo os mais curtos, consigam transmitir um mínimo de conhecimentos para o exercício profissional, acompanhados de outros de cultura geral ou científica.
Este um dos aspectos que a Comissão mais procurou ver devidamente considerado e valorizado no sistema educativo, uma vez que a proposta de lei o não faz convenientemente, embora em nome de uma preocupação de assegurar, até ao extremo, a unidade formal e, por vezes, conceptual da sua construção.
Na verdade, a proposta de lei excluía do sistema educativo todos aqueles que não quisessem ou pudessem prosseguir estudos no termo do ensino básico ou no decurso do ensino secundário. Ora, o Ministério da Educação Nacional não pode enjeitar esses alunos e condená-los a frequentar cursos fora do sistema escolar, concebidos quase tão-somente para uma efectiva e prática preparação profissional. Esses cursos, fora do Ministério da Educação e integrados noutros sectores e nas empresas, tendem sempre, em maior ou menor grau, para uma exclusiva ou quase exclusiva preparação profissional, sem outros horizontes potenciais que não sejam os da directa e imediata aplicação ao trabalho oficinal ou outro.
Assim se acentuaria, de um modo radical, uma discriminação que, por estar assente muitas vezes apenas em razões de ordem económica, que não de capacidade ou mérito pessoal, seria injusta.
Daí a necessidade de a todos os que queiram exercer uma profissão, por mais modesta que seja, se dar uma cultura geral tão desenvolvida quanto possível, e de se garantir àqueles que prematuramente se vêem obrigados a procurar numa actividade profissional o pão de cada dia uma educação de base acrescida e enriquecida que torne mais fácil a sua promoção gradual na vida social e na escala da cultura.
Mas então, dir-se-á, lá se vai a lógica ou o geometrismo do sistema unificado polivalente. Creio que não, pois o sistema polivalente do ensino secundário propriamente dito não é atingido, a não ser na medida em que se pretende, embora por outras vias, alcançar, afinal, os objectivos que ele próprio visa. Parece paradoxal ou contraditório nos termos, mas não é.
Atente-se em que, nesta ordem de ideias, é mais salutar e conveniente prever a formação profissional integrada na educação escolar do que, a nível do ensino secundário e mesmo que se pense que seja a título excepcional ou transitório, preverem-se escolas de formação profissional fora do sistema escolar e, forçosamente, sujeitas a planos de estudo menos compreensivos e amplos do ponto de vista da cultura geral.
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Nem a solução que se preconiza pode considerar-se como levando à manutenção do actual regime marcadamente diferenciado entre ensino liceal e ensino técnico-profissional. Pretende-se que, nesta fase de transição, ela assegure essa mesma transição de modo mais fácil e permita aos responsáveis eventuais rectificações ou mudanças, de acordo com as realidades da vida, sendo certo que estas repelem sempre uma espartilhação compulsiva nos coletes apertados e rígidos dos esquemas abstractos.
Os responsáveis pela proposta de lei quiseram integrar-se - assim o disseram já em 1971 - numa "concepção marcadamente humanística do processo educativo". Só merece aplauso este pensamento de fundo desde que se integre na linha do humanismo cristão que repudia as soluções do sociologismo pedagógico.
Contudo, sabe-se que não é possível, nem aqui, nem em nenhuma parte do Mundo, conduzir todos os alunos para a Universidade. Não é possível, nem necessário, nem mesmo conveniente do ponto de vista pessoal de muitos.
Os autores da proposta de lei tiveram, com certeza, presente também este aspecto. Só que não conseguiram materializá-lo numa fórmula normativa nítida. Como que tiveram - dir-se-ia - certo pudor em pôr a mi uma realidade inamovível que impede a instauração de um sistema escolar perfeito do ponto de vista da teoria de que se parte. Há, na verdade, que ter presente as realidades da vida (mesmo daquelas que podem considerar-se injustas, mas que se não eliminam de um dia para o outro, e muito menos através de uma remodelação do sistema educativo, por mais profunda que seja) e ainda as conveniências, tendências, aspirações e limitações naturais dos próprios interessados.
Se compreendo se envidem esforços para modificar essas realidades e injustiças a fim de que vingue, na máxima extensão, o princípio da igualdade de oportunidades, não vejo já como se possa ignorar ou minimizar todas essas aspirações, interesses e capacidades dos sujeitos da educação.
Lembro, a propósito, que, já em 1967, em notável estudo da Direcção dos Assuntos Científicos da O. C. D. E., se chamava a atenção para o facto de "o dinamismo da evolução e da inovação no domínio escolar ser tal que ameaça romper as estruturas estabelecidas do ensino e provocar a confusão se não for devidamente orientado".
Seja-me relevada ainda a preocupação, porventura exagerada, de fornecer à Assembleia alguns dos numerosos elementos que colhi para melhor poder cumprir a minha missão de presidente da Comissão. Não resisto, por isso, à tentação de informar que na Áustria, segundo o que consta da publicação da O. C. D. E., La Politique et la Planification de l'Enseignement Autriche, "uma grande parte dos titulares dos estudos primários, que são de oito anos, frequenta um curso politécnico de um ano". Aí se diz: "Uma instrução complementar profissional, a tempo parcial, é obrigatória para todos os que iniciam uma aprendizagem ou sont recrutés sous réserve de stage." Os alunos que deixam a escola primária podem ainda ser admitidos numa escola profissional intermediária, onde se qualificam para as mais diversas profissões, sem prejuízo de ulteriores acessos culturais.
Os alunos que, depois do ensino primário, e que ainda há poucos anos andavam à volta de 34% dos da idade correspondente, seguem aqueles cursos politécnicos de um ano. Os programas desses cursos visam preparar os alunos para a sua vida prática, dar uma orientação profissional àqueles que ainda não escolheram profissão e completar a sua educação geral. Para corresponder a esta última preocupação, além do ensino da língua materna e de matemáticas, há o de estudos sociais e de economia, rudimentos de história natural, na medida em que interessam à vida moderna, desenho industrial, higiene e, para as raparigas, noções de economia doméstica e puericultura.
Por outro lado - refere-se ainda na mesma publicação -, há nesse país estabelecimentos, a tempo inteiro, destinados a assegurar, depois do ensino obrigatório, e pelo período de quatro anos, uma formação especializada e a instrução necessária aos alunos para ingressarem directamente no mercado do trabalho como operários qualificados. São as chamadas escolas intermediárias profissionais.
Noutro passo desse trabalho sublinha-se que a procura social da educação não é formulada num vazio económico e que as necessidades de mão-de-obra não podem ser avaliadas sem se tomar em conta necessidades sociais mais largas. Se é fácil avaliar os efectivos escolares no período da obrigatoriedade do ensino, muito difícil se apresenta o cálculo desses efectivos depois desse período. Para este fim tem-se utilizado o método que se pode chamar das "necessidades de mão-de-obra e o da procura social".
Mas estes dois métodos não podem ser adoptados desligando-os um do outro ou apondo-os um ao outro, antes devem ver-se como as duas faces de uma mesma medalha. Nem pode esquecer-se que os desejos dos pais quanto à educação dos filhos se fundam naturalmente, e em larga medida, em perspectivas de carácter económico, pelo que a procura social tende a não desprender-se da avaliação das necessidades de mão-de-obra ou das possibilidades e colocação efectiva e compensadora.
Foi nesta linha de rumo que a Comissão procurou inserir-se. Sem assumir responsabilidades quanto a aconselhar caminhos diametralmente opostos aos preconizados pela proposta de lei, tentou - e julga tê-lo conseguido - encontrar fórmulas de conciliação realista entre os diferentes interesses, tendências e correntes em presença.
Assim, a Comissão pensa que prestou um serviço, ao tentar limar arestas, preencher lacunas, abrir o leque das opções futuras, esbater intenções desprendidas das circunstâncias reais da vida, conciliar as aspirações humanas com as exigências da economia, mormente quando a integração de Portugal no mercado comum faz apelo a uma coordenação efectiva das políticas educativa, económica e social.
Para finalizar, direi que a Câmara Corporativa, no que toca ao n.° 4 da base n da proposta, altera a redacção. Onde está "[...] desenvolvimento psíquico, afectivo e físico da criança sem a sujeitar à disciplina e deveres próprios de uma aprendizagem", sugere se escreva "[...] desenvolvimento psicobiológico, físico e afectivo da criança sem a sujeitar à disciplina específica e por deveres próprios de uma aprendizagem escolar".
A Comissão procurou melhorar a redacção, simplificando-a, e dando-lhe maior amplitude com o
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emprego do adjectivo "espiritual". O preceito ficou assim redigido: "A educação pré-escolar tem em vista o desenvolvimennto espiritual, afectivo e físico da criança sem o sujeitar à disciplina e deveres próprios de uma aprendizagem escolar."
É curioso que a expressão "sem a sujeitar à disciplina e deveres próprios de uma aprendizagem" já fora utilizada no projecto do Estatuto da Educação Nacional, do Prof. Galvão Teles.
Estou a reportar-me ao n.° 2 da base IV em discussão.
Quanto ao n.° 3 da mesma base, a Comissão aproveitou parte das sugestões da Câmara Corporativa e deu ao texto, por vezes, uma outra configuração. Assim, por exemplo, na alínea b) eliminou, por inútil, a expressão "através do ensino" e imprimiu outra ordem às referências nela feitas.
Acerca do n.° 6, a Comissão procurou definir educação permanente de modo mais completo e rigoroso. Se o não conseguiu, deve ter logrado, pelo menos, melhorar a definição da proposta de lei e a da Câmara Corporativa. Esta havia suprimido a designação "extra-escolar" de modo a dar-se uma ideia mais exacta da latitude da educação permanente. Parece criteriosa a sugestão. No entanto, suprimiu a expressão da proposta "forma organizada", que encerra uma ideia de interesse, pelo que a Comissão a manteve sob a designação de "processo organizado". Além destas modificações, a Comissão previu não apenas "o aperfeiçoamento cultural ou profissional", mas ainda o "científico" como fim da educação permanente.
O Sr. Dias das Neves: - Sr. Presidente: Em nome da Comissão de que faço parte, requeiro a retirada da primeira proposta, datada de 6 de Abril.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Dias das Neves acaba de pedir autorização, em seu nome e no dos outros Srs. Deputados subscritores, para retirar a proposta de alteração à base IV que apresentaram, com data de 6 de Abril.
Pergunto à Assembleia se concede esta autorização.
Consultada a Assembleia, foi concedida a autorização para a retirada.
O Sr. Presidente: - A nova proposta de alterações à mesma base apresentada por sete de dez dos Srs. Deputados que assinaram a de 6 do mês corrente e apresentada na Mesa esta tarde, por ser mais moderna que a sugestão da Câmara Corporativa, tem prioridade regimental.
Porque forma um conjunto, ponho em votação, na sua integridade, a proposta de alteração à base IV, sugerida pela Câmara Corporativa e apresentada pelos Srs. Deputados Veiga de Macedo e outros, com data de hoje.
O Sr. Veiga de Macedo: - V. Exa. dá-me licença?
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.
O Sr. Veiga de Macedo: - Não sei se vou a tempo, mas creio que, há pouco, não completei o meu pensamento, pelo menos de maneira explícita.
A observação do Sr. Deputado Roboredo e Silva, por pertinente, parece que poderia ser considerada, dado que é de pura forma, pela nossa Comissão de Legislação e Redacção.
O Sr. Roboredo e Silva: - Estimular, estimular...
O Sr. Presidente: - Pois certamente a Comissão de Legislação e Redacção poderá atender esse ponto.
Submetida a proposta de alterações à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados vou encerrar a sessão.
Peço a atenção de VV. Exas. para o facto de ter sido hoje distribuído na sala o suplemento ao Diário das Sessões, com a última redacção do Regimento da Assembleia, depois de elaborado pela nossa Comissão de Legislação e Redacção, conforme as alterações votadas por VV. Exas. Depois de amanhã submeterei a reclamações este texto.
A próxima sessão será amanhã, à hora regimental, tendo como ordem do dia, na primeira parte, a continuação da discussão na especialidade e votação da proposta de lei de reforma do sistema educativo e, na segunda parte, o início da apreciação das contas públicas e das contas de Junta do Crédito Público relativas a 1971.
Aviso VV. Exas. de que prevejo ser necessário desdobrar a ordem do dia e continuá-la em sessão à noite.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 5 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
João António Teixeira Canedo.
João Bosco Soares Mota Amaral.
José dos Santos Bessa.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Manuel Valente Sanches.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alexandre José Linhares Furtado.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Valfredo Pires.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Francisco Correia das Neves.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João Lopes da Cruz.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
Jorge Augusto Correia.
José Coelho de Almeida Cotta.
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José Dias de Araújo Correia.
José João Gonçalves de Proença.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Proposta enviada para a Mesa no decorrer da sessão:
Proposta de alterações
Base XVI
Propomos que a base XVI da proposta de lei n.° 25/X, segundo o texto sugerido pela Câmara Corporativa, passe a ser a base XVII, com as seguintes alterações:
1. Que os n.ºs 2 e 3 tenham a seguinte redacção:
2. O grau de bacharel obtido nos Institutos Politécnicos, nos Institutos de Educação Artística, de Educação Física e Desportos e de Educação Especial, nas Escolas Normais Superiores e em estabelecimentos equiparados permite a continuação de estudos em cursos professados nas Universidades, em ordem à obtenção do grau de licenciado, mediante a frequência, com aproveitamento, das disciplinas consideradas necessárias.
3. Para efeitos de prossecução de estudos de alunos dos Institutos Politécnicos, das Escolas Normais Superiores ou de estabelecimentos congéneres nas Universidades, poderá ser concedida equiparação do aproveitamento obtido nas disciplinas frequentadas nos referidos estabelecimentos.
2. Que seja aditado um n.° 4, com a seguinte redacção:
4. A concessão das equiparações previstas nos n.ºs 1 e 3 e a fixação das disciplinas a que alude o n.° 2 competem ao Ministro da Educação Nacional, ouvidos os conselhos escolares e sob parecer da Junta Nacional de Educação.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Abril de 1973. - Os Deputados: Henrique Veiga de Macedo - Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva - Fernando Dias de Carvalho Conceição - Custódia Lopes - Joaquim José Nunes de Oliveira - Júlio Dias das Neves - Manuel de Jesus Silva Mendes.
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