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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 54

ANO DE 1974 24 DE ABRIL

ASSEMBLEIA NACIONAL

XI LEGISLATURA

SESSÃO N.º 52, EM 23 DE ABRIL.

Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Exmos. Srs.
Manuel Homem de Oliveira Themudo
Amílcar da Costa Pereira Mesquita

Nota. - No 1.º suplemento ao n.º 50 do Diário das Sessões, de 17 de Abril, nas assinaturas do parecer da Comissão de Contas Públicas da Assembleia Nacional sobre as contas da Junta do Crédito Público referentes ao ano de 1972, onde se lê «Joaquim Pereira dos Santos Van Dunem», deve ler-se «Joffre Pereira dos Santos van Dunem».

SUMÁRIO: - O Sr Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 5 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi posto em reclamação o n.º 51 do Diário das Sessões, tendo sido aprovado com rectificações.
Foi lido o expediente.
O Sr Presidente declarou estarem na Mesa, para cumprimento do § 3º do artigo 109 da Constituição, enviados pela Presidência do Conselho, os n.º 92, 93 e 94 do Diário do Governo, 1ª série, de 19, 20 e 22 do mês corrente, respectivamente, que inserem os Decretos-Leis n.º 156/74, 157/74, 158/74, 159/74, 160/74, 161/74. 162/74, 163/74, 164/74, 165/74 e 166/74.
O Sr Deputado Constantino de Goes apresentou um requerimento pedindo elementos acerca de problemas do álcool na metrópole.
O Sr Deputado Henrique Tenreiro referiu-se à comemoração do Dia da Comunidade Luso-Brasileira.
O Sr Deputado Almeida Garrett usou da palavra a propósito do incêndio que destruiu parte do edifício central da Universidade do Porto.
O Sr Deputado Botelho Moniz lei considerações sobre alguns problemas do porto de Setúbal.
O Sr Deputado Ávila de Azevedo abordou as dificuldades de comunicações marítimas para os Açores.
O Sr Deputado Coelho Jordão referiu-se à visita ultimamente efectuada por S Exª o Chefe do Estado ao vale do Mondego, desde a barragem da Aguieira até ao porto da Figueira da Foz.
O Sr Deputado Tristão Neves exprimiu a preocupação resultante da praga do piolho do trigo que grassa com grande intensidade na Sub-Região Alentejo.

Ordem do dia. - Na primeira parte começou a apreciação das contas gerais do Estado e das contas da Junta do Crédito Público referentes ao ano de 1972.
Usou da palavra o Sr Deputado Roboredo e Silva.
Na segunda parte procedeu-se à efectivação do aviso prévio sobre a formação profissional agrícola, tendo usado da palavra o Deputado avisante, Sr Magro dos Reis.
Em seguida foi lido o relatório da Comissão de Educação, Cultura e Interesses Espirituais e Morais e da Comissão de Economia sobre o mesmo assunto.
O Sr Deputado Alberto de Atarcão requereu a generalização do debate, que foi concedida.
O Sr Presidente encerrou a sessão ás 18 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 50 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Abílio Alves Bonito Perfeito.
Adolfo Cardoso de Gouveia.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto da Conceição Ferreira Espinhal.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.

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Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alda da Conceição Dias Carreira de Moura d'Almeida.
Alexandre Pessoa de Lucena e Valle.
Alípio Jaime Alves Machado Gonçalves.
Almeida Penicela.
Álvaro Barbosa Ribeiro.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
António Alberto de Meireles Campos.
António Azeredo Albergaria Martins.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António de Freitas Pimentel.
António José Moreira Pires.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Manuel Rebelo Pereira Rodrigues Quintal.
António Manuel Santos Murteira.
António Moreira Longo.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
António Victor Ferreira Brochado.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Assahel Jonassane Mazula.
Augusto Arnaldo Spencer de Moura Braz.
Augusto Leite de Faria e Costa.
Augusto Salazar Leite.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
Delfim Linhares de Andrade.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eduardo António Capucho Paulo.
Eduardo do Carmo Ribeiro Moura.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Filipe César de Goes.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco Elmano Martinez da Cruz Alves.
Francisco Magro dos Reis.
Francisco de Moncada do Cazal-Ribeiro de Carvalho.
Gabriel Pereira de Medeiros Galvão.
Gonçalo Castel-Branco da Costa de Souza de Macedo Mesquitela.
Graciano Ferreira Alves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique Callapez Silva Martins.
Henrique dos Santos Tenreiro Henrique Vaz Lacerda.
Henrique Veiga de Macedo.
Hermes Augusto dos Santos.
Humberto Cardoso de Carvalho.
Jaime Pereira do Nascimento.
João Afonso Calado da Maia.
João Duarte de Oliveira.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Ruiz de Almeida Garrett.
Joaquim António Martins dos Santos.
Joaquim Emídio Sequeira de Faria.
Joffre Pereira dos Santos van Dunem.
Jorge Carlos Girão Calheiros Botelho Moniz.
Jorge Manuel de Morais Gomes Barbosa.
José Alberto de Carvalho.
José de Almeida.
José d'Almeida Santos Júnior.
José Coelho Jordão José Dias de Araújo Correia.
José Joaquim Gonçalves de Abreu.
José Mana de Castro Salazar.
José dos Santos Bessa.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Josefina da Encarnação Pinto Marvão.
Júlio Dias das Neves.
Lia Maria Mesquita Bernardes Pereira Lello.
Luís Augusto Nest Arnaut Pombeiro.
Luiz de Castro Saraiva.
Luiz Maria Loureiro da Cruz e Silva.
Manuel Afonso Taibner de Morais Santos Barosa.
Manuel Gardette Correia.
Manuel Homem de Oliveira Themudo.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Freire.
Manuel Jorge Proença.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Manuel José Constantino de Góes.
Manuel Rosado Caldeira Pais.
Manuel Viegas Carrascalão.
Maria Angela Alves de Sousa Craveiro da Gama.
Maria Clementina Moreira da Cruz de Almeida de Azevedo e Vasconcelos.
Maria de Lourdes Cardoso de Menezes Oliveira.
Mana Luísa de Almeida Fernandes Alves de Oliveira.
Maria Teresa de Almeida Rosa Carcomo Lobo.
Mário Hofle de Araújo Moreira.
Nicolau Martins Nunes.
Nuno Tristão Neves.
Paulo Othniel Dimene.
Rafael Ávila de Azevedo.
Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teotónio Rebelo Teixeira de Andrade e Castro.
Tito Lívio Maria Feijóo.
Tito Manuel Jeque.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

O Sr Presidente: - Estão presentes 104 Srs Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 5 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr Presidente: - Está em reclamação o n º 51 do Diário das Sessões.

O Sr Fausto Montenegro: - Sr Presidente Requeiro algumas rectificações ao n º 51 do Diário das Sessões, segundo uma nota que enviarei para a Mesa, se V Ex.ª o permitir.

O Sr. Presidente: -Será recebida.

Pausa

Continua em reclamação o n º 51 do Diário das Sessões.

Pausa.

Se mais nenhum de VV Ex.ªs tem rectificações a apresentar, considerá-lo-ei aprovado com as rectificações mandadas para a Mesa.

Pausa.

Está aprovado.

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Nota de rectificações apresentada pelo Sr Deputado Fausto Montenegro:

Peço que sejam feitas as seguintes rectificações na minha intervenção.

Na p 991, col 2ª, 1. 30, onde se lê «independentes», deve ler-se, «dependente»,
Na p 992, col. 2ª, l 21, onde se lê «seguros e das», deve ler-se, «seguros das»;
Na p. 993, l 19, onde se lê: «E como sei que», deve ler-se «Como sei que».

Nota de rectificações enviada para a Mesa pelo Sr Deputado Rómulo Ribeiro.

Apresento as seguintes rectificações ao n º 51 do Diário das Sessões, requerendo que as mesmas sejam mandadas publicar.

Na p. 1011, col. 2ª, l 27, onde se lê «que se criem 'galileus'», deve ler-se «que se criem casos de 'galileus'»;
Na p. 1011, col. 2ª, 1. 61, onde se lê «que esclarecimento», deve ler-se «que pseudo-esclarecimento»;
Na p 1011, col 2ª, 1 63, onde se lê «não pode», deve ler-se, «não poderia»;
Na p 1014, col. 1.ª, l 60, onde se lê: «, ou sejam», deve ler-se, «, ou seja,»

Deu-se conta do seguinte

Expediente
Telegramas

Vários de apoio aos Srs. Deputados Fausto Montenegro e Leal de Oliveira.
Do Sr. J Bandeira Beira apoiando a intervenção do Sr. Deputado Alberto de Carvalho.
Dos funcionários da Câmara Municipal da Chamusca apoiando a intervenção do Sr Deputado Bonito Perfeito.
Dos funcionários de finanças de Braga apoiando o Sr Deputado Câmara Pereira.

Carta

Dos funcionários civis da Polícia de Segurança Pública apoiando a intervenção do Sr. Deputado Leal de Oliveira.

Cartão

Dos funcionários da Repartição de Finanças do Concelho de Tarouca apoiando a intervenção do Si Deputado Câmara Pereira.

O Sr. Presidente: - Informo VV. Ex.ªs de que, para cumprimento do disposto no § 3 º do artigo 109 º da Constituição, estão na Mesa, enviados pela Presidência do Conselho, os n.ºs 92, 93 e 94 do Diário do Governo, lª série, datados, respectivamente, de 19, 20 e 22 do corrente mês, que inserem os seguintes decretos-leis.

N º 156/74, que fixa o quadro do pessoal maior e do pessoal auxiliar contratados dos governos civis.
Nº 157/74, que actualiza as condições em que pode efectuar-se a revisão de preços nos contratos de empreitadas de obras públicas.
N.º 158/74, que autoriza o Governo a ordenar a requisição de matérias-primas, produtos ou mercadorias.
N º 159/74, que adopta providências relatavas à admissão de candidatos ao próximo concurso de habilitação para promoção à 3.ª classe da 2.º categoria do quadro geral administrativo dos serviços externos da Direcção-Geral de Administração Local.
N º 160/74, que autoriza o Ministro das Finanças e da Coordenação Económica a conceder, durante o período da vigência do IV Plano de Fomento, adiantamentos reembolsáveis ao Gabinete do Plano do Zambeze, destinados a custear despesas a cargo do mesmo Gabinete.
N.º 161/74, que estabelece o regime legal para a criação de mercados por grosso de frutas, produtos hortícolas e flores.
N º 162/74, que define a competência dos Ministérios das Corporações e Segurança Social e da Saúde em materna de tutela administrativa das instituições particulares de assistência.
N º 163/74, que autoriza a Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, S. A. R L, a emitir, nos anos de 1974 a 1976, obrigações até ao limite de 900 000 contos.
N º 164/74, que altera a redacção do artigo 35 º do Decreto-Lei n.º 47627, de 7 de Abril de 1967, que aprovou a Lê» Orgânica do Laboratório Nacional de Engenharia Civil.
N.º 165/74, que adopta providências destinadas a evitar a propagação e a continuação da existência da espécie denominada Eichhornia crassipes (Mart.), Solms, conhecida vulgarmente por jacinto aquático, jacinto de água ou desma-zelos.
N.º 166/74, que toma obrigatória a concessão de facilidades pelos proprietários ou possuidores de terrenos em que tenha de proceder-se a estudos ou trabalhos preparatórios de construção de vias férreas ou de terrenos que lhes derem acesso.

Tem a palavra para um requerimento o Sr Deputado Constantino de Goes.

O Sr Constantino de Goes: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para enviar para a Mesa o seguinte.

Requerimento

Ao abrigo das disposições regimentais, solicito que, através dos serviços competentes do Ministério da Agricultura e Comércio, me sejam fornecidos os elementos referentes a.

1) Que quantidades e qualidades de álcool têm sido importadas pela metrópole em cada um dos unimos cinco anos (1969-1973),
2) Qual o custo discriminado das importações referidas;
3) Qual a quantidade, qualidade e custo do álcool já importado ou a importar em 1974,
4) Se o Governo ou a Administração-Geral do Álcool mandou elaborar algum es-

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tudo sobre o problema do álcool na metrópole, desde quando o mesmo está pronto e quais as conclusões a que chegou,
5) Se se concluiu estar ultrapassada a produção de álcool através do figo, por ser menos rentável que através de melaços de cana ou de beterraba;
6) Se a AGA pôs a concurso o projecto e orçamento para uma fábrica de álcool e em que data Quais as firmas que concorreram e qual foi a escolhida. Qual o montante previsto para o empreendimento e se o local já foi escolhido ou qual o mais radicado pelo estudo referido em 4,
7) Que entidades estão autorizadas a produzir álcool na metrópole; quais as que o estão produzindo e para que capacidade foram dadas as autorizações, e em que quantidade, e qual a percentagem que a cada uma cabe na produção anual;
8) Se esta percentagem ou quota de produção foi definida pelo Governo ou a AGA e em que medida pode ser alterada;
9) Se o preâmbulo do Decreto n.º 47 318, de 24 de Novembro de 1966, prevê a produção de álcool por outras entidades além das existentes e a partir da matéria-prima melaços de cana ou de beterraba;
10) A partir de que matéria-prima se item produzido álcool na metrópole nos últimos cinco anos, discriminando-se, no caso de ser mais de uma, a proporção entre das;
11) Se as fábricas existentes estão apetrechadas ou aptas a produzir álcool a partir de melaços de cana ou de beterraba, de graduação igual ou superior a 96º, e álcool absoluto,
12) Se surgiram, e em que datas, estudos ou propostas de entidade ou entidades que se propunham produzir álcool em quantidade e qualidade a partir de outra indústria já montada, de forma a obstar às importações havidas ou a haver do produto.

O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Tenreiro.
Em virtude do significado da efeméride de que o Sr Deputado deseja ocupar-se, convido-o a subir à tribuna.

O Sr. Henrique Tenreiro: - Sr. Presidente, Srs Deputados Comemora-se oficialmente a 22 de Abril, em Portugal e no Brasil, o Dia da Comunidade Luso-Brasileira e é, portanto, com justificada satisfação que tomo a palavra nesta Assembleia para me referir ao significado de tão grata efeméride, que marca para ambos os povos um facto histórico - a descoberta, pelos nossos navegadores, das terras de Santa Cruz, no ano de 1500.
Pode afirmar-se que, ao longo de perto de cinco séculos, os dois povos se têm irmanado cada vez mais, criando a maior comunidade católica do Mundo, solidamente vinculada pelo sangue, pela cultura e pela mesma língua.
Assinada que foi em 7 de Setembro de 1971 a Convenção sobre a Igualdade dos Direitos e Deveres entre Brasileiros e Portugueses, surgiu com ela uma nova e notável página de profundo significado nas relações entre as duas pátrias.
Deu-se assim decisivo passo para a concretização de uma série de medidas de largo alcance que vieram fortalecer ainda mais os já indestrutíveis laços que unem as duas nações atlânticas.
A Comunidade Luso-Brasileira vive um permanente ideal, enraizado no mútuo respeito pelas suas leis e princípios constitucionais Portugal ama o Brasil e sempre viveu intensamente todas as alegrias e vicissitudes do povo brasileiro.
Irmanados no melhor espírito de compreensão e de fraternidade, os dois países prosseguem, esforçadamente, no mundo agitado dos nossos dias, o caminho do progresso e do bem-estar das suas populações.
Os territórios que constituem as duas pátrias encontram-se em franco desenvolvimento, e daí, talvez, as incidências das campanhas movidas por certos sectores que pretendem menosprezar a acção que ambos os países vêm exercendo.
Não tenhamos dúvidas de que representaria uma vitória para os inimigos do Ocidente uma brecha que surgisse no seio das seculares relações de amizade recíproca que têm norteado o bom entendimento e os princípios fundamentais desta singular união entre dois povos.

O Sr Barreto de Lara: - Muito bem!

O Orador: - Portugal enfrenta neste momento, em algumas parcelas do seu território, ataques vindos do exterior e dos que, acenando com a liberdade dos povos, pretendem apossar-se desses territórios, que há mais de quatro séculos são legitimamente portugueses.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É bem notória a incompreensão de algumas nações sobre as realidades portuguesas, mas não é por isso que abrandará a nossa força, o desenvolvimento do País e, em especial, das nossas províncias ultramarinas, nem esse facto contribuirá para destruir a unidade nacional e a paz interna ou desfazer os laços de amizade que sempre têm unido os destinos de Portugal e do Brasil.
Certa imprensa do país irmão tem dado acolhimento a insinuações e a interpretações a que não devemos, porém, dar importância, pois nada significam e não traduzem, na sua essência, os sentimentos de amizade e de compreensão que sempre existiram entre o povo brasileiro e o povo português.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Jamais certas campanhas internacionais poderão enfraquecer a nossa fé inabalável no destino comum das duas pátrias.
Sr. Presidente, Srs Deputados Neste Dia da Comunidade Luso-Brasileira, em que no Congresso de Bra-

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sília e nesta Câmara de Deputados se elevam as vozes de brasileiros e de portugueses para enaltecer o alto significado de uma data histórica, lembramos a chegada dos nossos navegadores a terras de Santa Cruz e a primeira missa celebrada em Porto Seguro, há quase cinco séculos, na presença de um punhado de heróis de um povo que está decidido de qualquer maneira a não permitir que as relações entre os dois países irmãos sejam perturbadas.
Mas não pode o Ocidente esquecer-se que certos países do Leste procuram, por todos os meios, obter posições de qualquer natureza nos países africanos, principalmente naqueles que estão virados ao Atlântico. A rota do Atlântico Sul poderá, portanto, estar ameaçada, e essa ameaça visará também o continente sul-americano.
A presença de Portugal, ontem e hoje, em África e a situação privilegiada das ilhas de Cabo Verde, da Guiné e de Angola têm constituído sempre um forte obstáculo à expansão imperialista de certas nações e impedido a perturbação da paz social de outros países, que nem sequer pensam no perigo de desagregação e nas crises internas que daí lhe podem advir.
Há, pois, necessidade absoluta de uma esclarecida e actuante compreensão para com a nossa política ultramarina, que visa a continuidade de uma paz duradoira nos territórios africanos e assenta em princípios de amizade, desenvolvimento e progresso social entre os povos.
Sr. Presidente, Srs Deputados: Da tribuna desta Assembleia Nacional, que representa mais de vinte e cinco milhões de portugueses de várias raças e credos, desejo exprimir o muito sincero e amigo apreço pelos largos milhares de portugueses que vivem no grande Brasil, ajudando-o no seu desenvolvimento e colaborando intensamente com os seus irmãos brasileiros para o progresso da sua segunda pátria, na certeza de que o abraço de amizade que daqui lhes enviamos une as duas nações numa só vontade de continuar a maior comunidade de sentimentos e ideais que no Mundo existe.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Só a História poderá dizer o que é esta sólida amizade de duas pátrias, já irmanadas pela mesma língua, pela mesma religião e pelos mesmos anseios de progresso e de paz.
Nesta hora de autêntica exaltação luso-brasileira, vai mais uma vez realizar-se a romagem a Belmonte, terra onde nasceu Pedro Álvares Cabral, numa autêntica homenagem à fé e à esperança que norteou, naquela época longínqua, os destinos dos nossos antepassados.
Saudemos, efusivamente, a data que estamos comemorando como mais um padrão da jornada que Portugal e o Brasil estão a percorrer lado a lado.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Almeida Garrett: - Sr. Presidente: Na madrugada do dia 20 um violento incêndio destruiu grande parte do edifício central da Universidade do Porto, devorando biblioteca, consumindo arquivos, arrasando instalações, a coberto das circunstâncias que, como em tantos edifícios antigos, propiciam a propagação rápida dos fogos acidentais.
Como se não lhe bastasse ter de contar com o esforço e a coragem que hoje são indispensáveis para viver com honestidade intransigente o quotidiano da função universitária, e Universidade do Porto, que o vinha conseguindo com notável normalidade e ambiente, sofre hoje provações que, para além da solidariedade na condolência, requerem prontas actuações do Governo que lhe permitam continuar a desempenhar o papel a que ganhou direito por trabalho e mentos próprios.
No balanço das perdas, e para além dos danos irrecuperáveis nos documentos e obras de arte, foi decerto a Faculdade de Economia a grande vítima. Perdeu-se a maior parte da sua biblioteca, precisamente o seu núcleo centrai de teoria económica, finanças, direito fiscal, estatística, econometria, investigação operacional, economia portuguesa, teoria da produção, do comércio e dos transportes, economia agrária, economia do trabalho e esse milagre de esforço e persistência que era a biblioteca de desenvolvimento económico, magnífico instrumental bibliográfico que nada ficava a dever ao que de melhor se poderia exibir em qualquer parte. Perderam-se iodas as revistas da especialidade, as valiosas enciclopédias e digestos, as obras de informação estatística, as próprias colectâneas de legislação para uso escolar corrente.
E com tudo isso perderam-se quase totalmente os ficheiros completíssimos que durante quase vinte e um anos a dedicação inultrapassável do Prof. Fernando de Seabra conseguira elaborar, orientando e animando o trabalho dos seus colaboradores, mas, e sobretudo, ocupando-se, directa, sacrificada e amorosamente, da construção dia a dia de um biblioteca eficaz, viva e actuante na formação de docentes e alunos.
Perdeu-se tudo isso Mas não se perdeu a fé nem a coragem, que uma e outra não dependem dos golpes do destino, da reacção dos homens, mas da vontade de prosseguir no caminho escolhido.
Caminho que vai continuar a ser prosseguido com fé e com coragem. Uma fé e uma coragem que não esmorecem, nem esmorecerão, mesmo que a escala de valores, que dá às coisas, nestes pobres tempos e a todos os níveis de responsabilidade, lugares inaceitáveis, reduza a mera notícia provinciana a perda irreparável de parte tão importante da única Universidade metropolitana que tem vindo sempre a cumprir com absoluto normalidade e fidelidade as suas obrigações - mesmo que a aceitação qualificada dessa escala de valores, dizia, lhe entristeça a alma e segrede à sua revolta o canto da desconfiança e do desalento.
A Universidade do Porto preparava-se para apresentar no dia 21, em exposição pública, o panorama da sua magnífica actividade nos campos da investigação e da docência. Não lho consentiu o destino, mas nem por isso desiste do seu propósito de continuar a ser verdadeiramente uma Universidade, que é a única maneira que conhece de honrar validamente um passado ilustre, mesmo correndo o risco de que isso a obrigue a uma opção incómoda em face de transigentes formas de agrado passageiro a ventos históricos de rumo e intensidade mais adivinhados que seriamente pressentidos.

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A Universidade do Porto foi, é e prepara-se para continuar a ser simplesmente uma Universidade Todo o Noite do Pais sabe o que ela representa para ele e como sempre se quis confinar na específica missão que lhe compete. Aos homens que a compõem, docentes e discentes, que a amam e, por isso, a servem, cumpre-lhes cerrar os dentes, enxugar as lágrimas e lançar-se de novo ao trabalho da sua reconstrução, expansão e prestígio. Aos de fora, aos que já tanto disseram e mostraram da sua ajuda e solidariedade, como os que, imediata e graciosamente, ofereceram instalações e meios, 6 oeste momento devida uma palavra de profunda gratidão. Ao resto do País, empenhado através do seu Governo numa acção de expansão cultural e educativa de que a Universidade tem de ser mesmo veículo fundamental, resta dizer-lhe que a Universidade do Porto não se limita a esperar, tem a certeza de que será rapidamente habilitada com os meios indispensáveis à prossecução da sua tarefa no campo da educação e da cultura. Ou não continuasse sempre a ser certa a sabedoria popular de que mais vale investir em realidades do que entregar-se a fantasias.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr Botelho Moniz: - Sr. Presidente. São tão importantes os problemas ligados aos diversos aspectos do desenvolvimento sócio-económico do País que bem se justifica a conveniência, muitas vezes sentida pelos membros desta Câmara, de para alguns deles chamar em determinadas oportunidades a especial atenção do Governo.
A discussão, aliás ampla, que aqui se efectuou no início desta sessão legislativa, precedendo a votação da proposta de lei relativa ao IV Plano de Fomento, incidiu fundamentalmente, como não podia deixar de ser, sobre os objectivos e os domínios de actuação do Plano, bem como sobre os critérios gera» orientadores da sua execução; mas a batalha do desenvolvimento exige uma atenção continuada e persistente ao nível dos problemas concretos, pelo que, em meu entender, a nossa colaboração neste campo terá de continuar a processar-se ao longo de toda a legislatura, como reflexo do interesse que tais problemas não podem deixar de merecer-nos e do nosso empenho em contribuir para que o Governo e o País alcancem as metas programadas neste IV Plano.
Com toda a razão se afirma, em termos que bem dispensam exaustivas demonstrações, que o desenvolvimento económico não é possível sem infra-estruturas adequadas, e parece também não dar lugar a dúvidas a afirmação de que os portos desempenham um papel fundamental como infra-estrutura económica, papel hoje em dm particularmente acentuado na parte que se (relaciona com o desenvolvimento industrial.
No capítulo respectivo do próprio Plano de Fomento, depois de se recordar que «os portos detêm posição do maior relevo na vida económica do País, dada a sua função de centros de interligação entre os transportes marítimos e os transportes terrestres», se acrescenta, muito pertinentemente, que «as funções portuárias se ampliaram no último pós-guerra os portos, de simples ponto de interligação, transformaram-se em zonas preferenciais de localização industrial, beneficiando da redução dos custos de transporte das matérias-primas e da proximidade de grandes mercados consumidores».
É por isso, Sr Presidente e Srs. Deputados, que me propus hoje solicitar a atenção do Governo para o problema do porto de Setúbal, cujas possibilidades e meios de acção me não parece terem sido até agora objecto do aproveitamento e do incremento exigidos pelo crescimento industrial da zona que lhe é adjacente.
Não se trata de criar um novo porto e, através dele, uma nova zona industrial - acções que, noutros casos (como, por exemplo, o de Sines), bem se justificam e francamente se aplaudem, como pólos indispensáveis ao bem ordenado desenvolvimento do Pais. Trata-se, neste caso, de aproveitar e equipar de maneira adequada um porto já existente, que pelas suas condições naturais é o segundo da metrópole e que pelo seu movimento comercial é o terceiro, mas se encontra, por virtude desse subaproveitamento, a larga distância dos outros dois. Trata-se de colocar este porto em conduções de servir convenientemente uma zona industrial já existente e em crescimento acelerado, que é, além disso, uma das mais importantes do País, como todos sabemos através de elementos estatísticos que são do domínio público.
Quando em Dezembro passado tive oportunidade de intervir na discussão da proposta de lei relativa ao IV Plano de Fomento, referi, apenas a título indicativo, entre os problemas de infra-estruturas existentes no distrito de Setúbal, o da «definição de uma política de exploração coordenada para os portos de Lisboa e Setúbal».
Essa referência situava-se na linha de orientação, que se sabia existir da parte do Governo, de encarar em conjunto o desenvolvimento e a exploração dos dois portos, orientação que o próprio Plano de Fomento veio confirmar. Com efeito, indica-se no Plano como primeiro propósito da política do sector o de «desenvolver e explorar um sistema portuário principal constituído pelos portos de Leixões-Viana do Castelo-Aveiro, Lisboa-Setúbal-Sines, dimensionado e organizado de modo a garantir as funções de centros de interligações e de zonas industriais e ainda as funções secundárias ligadas ao transporte de passageiros, à pesca e ao turismo náutico».
Permita-se-me aqui um parêntesis para referir que outro objectivo apontado oeste capítulo do Plano é o de desenvolver e explorar um sistema portuário especializado em funções ligadas à pesca, no qual se inclui o porto de Sesimbra, actualmente integrado na jurisdição da Junta Autónoma do Porto de Setúbal. Não desejaria, a este propósito, deixar de sublinhar quanto me parece importante, adequado e urgente que ao porto de Sesimbra sejam proporcionadas as condições necessárias para desempenhar convenientemente a sua função de porto de pesca e também as funções ligadas ao turismo náutico para que igualmente está indicado e que em nada parecem colidir com os objectivos previstos no Plano.
Voltando, porém, ao problema do futuro do sistema portuário Lisboa-Setúbal, importa recordar que a determinação oficial de promover o respectivo estudo vem já de há anos, sem que, no entanto, tenha até agora produzido os resultados concretos que a região de Setúbal espera.

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Data de 20 de Março de 1969 a portaria do Ministro das Comunicações, publicada no Diário do Governo, 2ª série, de 10 de Abril seguinte, através da qual se determinou a primeira constituição de uma comissão incumbida da actualização do plano geral de desenvolvimento do porto de Lisboa. E acertadamente se dispunha nessa portaria que a actualização em causa deveria incluir a coordenação com os planos de desenvolvimento do porto de Setúbal e, bem assim, da chamada península de Setúbal.
Em 2 de Julho do mesmo ano nova portaria do Ministro das Comunicações, publicada no Diário ao Governo de 9 deste mês, ampliava a constituição da citada comissão.
Em 3 de Outubro de 1970 outra portaria do titular da mesma pasta, publicada em 13 desse mês, acrescentava mais um membro à comissão, aproveitando para precisar melhor a sua competência.
Finalmente, em 8 de Novembro de 1972, uma quarta portaria, subscrita pelo Secretário de Estado das Comunicações e Transportes e publicada em 10 do mesmo mês, actualizava a composição da comissão a que me estou referindo.
Do ponto de vista que interessa a estas considerações, dois aspectos, sobretudo, ressaltam da análise desta série de determinações ministeriais.

Um, o de que das duas últimas portarias desapareceu a referência ao porto de Setúbal, ainda que no seu preâmbulo elas se reportem às portarias anteriores,
Outro (e este susceptível de causar maior estranheza), o de que em nenhuma das composições estatuídas para a comissão, e não obstante ela ter sido ampliada mais do que uma vez, se previu a inclusão de qualquer representante da Junta Autónoma do Porto de Setúbal.

No valioso parecer subsidiário da Câmara Corporativa sobre o capítulo «Transportes e comunicações», do IV Plano de Fomento, em que se sublinha a complementaridade dos portos de Lisboa e de Setúbal e se prevê a «conveniente intensificação do movimento» deste último porto, refere-se também que o Governo tem entre mãos «importante estudo que mandou elaborar sobre a expansão do porto de Lisboa». Julgo poder acrescentar, por minha parte, que esse estudo respeita também, pelo menos em título e nalgumas referências que contém, ao desenvolvimento do porto de Setúbal, mas que a atenção que concretamente dedica a esse desenvolvimento não será porventura das mais aprofundadas.
Nada há a opor, evidentemente, à ideia de uma exploração coordenada dos portos de Lisboa e Setúbal. Dessa coordenação só deverá resultar uma utilização mais adequada das possibilidades dos dois portos e, consequentemente, uma maior rentabilidade do conjunto. Mas o que não se compreenderia é que, em primeiro lugar, o propósito de uma exploração coordenada fosse motivo para uma prejudicial dilação no conveniente aproveitamento do porto de Setúbal; e, em segundo lugar, que a coordenação viesse a traduzir-se numa simples absorção administrativa por uma entidade de grande dimensão, em cujas preocupações o porto de Setúbal viesse a ter um lugar meramente secundário e não adequado aos interesses da região que serve e da economia do País.
As circunstâncias atrás apontadas levar-nos-iam, se mais nada houvesse, a alimentar alguns receios a tal respeito. O arrastar do assunto no tempo, o silêncio das últimas portarias quanto ao porto de Setúbal, a subalternização a que nos estudos este porto parece votado, a ausência de participação de qualquer representante seu nesses mesmos estudos-tudo parecia querer conduzir-nos à visão melancólica de um porto cada vez mais perdido na bruma, cada vez mais esquecido, mais entregue a si mesmo e às limitações dos seus recursos próprios, como se, na batalha do desenvolvimento, pudéssemos prescindir de uma tal infra-estrutura.
Mas, felizmente, dois pontos de luz se abrem neste horizonte brumoso por um lado, a referência concreta e actualizada do IV Plano de Fomento aos objectivos de desenvolvimento e de exploração coordenada dos portos de Lisboa e Setúbal; por outro lado, o conhecimento de que o processo chegou finalmente às mãos do Governo, certamente instruído com os pareceres que as entidades mais qualificadas na matéria terão emitido sobre o estudo de base.
Daqui apelo, portanto, para o Governo, e em especial para a esclarecida atenção do Sr. Ministro das Obras Públicas e das Comunicações As gentes da minha região confiam no seu superior critério para que o porto de Setúbal ultrapasse o lento e pouco significativo crescimento em que injustamente tem sido forçado a viver e possa de facto contribuir, em toda a medida das suas potencialidades, para o esforço de desenvolvimento económico em que o País se lançou e em que nenhum dos recursos que possui pode ser desprezado.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Ávila de Azeredo: - Sr Presidente, Srs Deputados: Não sei se sabem que se quiserem adquirir uma passagem pelo mar para os Açores, se quiserem gozar dos prazeres de uma viagem marítima, deixou de existir navio de passageiros na ligação entre o continente e as ilhas o Angra do Heroísmo, o último barco das carreiras, acaba de ser alienado Assim, as pessoas que não possam tomar o avião por impossibilidade médica, as pessoas de mais débeis recursos económicos, as pessoas que não gostam ou mesmo receiam o avião - ficam impedidas de se deslocar no trajecto entre Lisboa e os Açores Mais ainda os Açorianos nestas condições têm fatalmente de permanecer amarrados ao seu isolamento, à sua triste sorte, ao seu descontentamento de insulares.
Como se sabe, a necessidade, a procura ansiosa de comunicabilidade das ilhas com o mundo exterior condiciona toda a vida social, toda a actividade económica, todas as relações humanas -e podíamos ainda acrescentar-, todas as possibilidades de sobrevivência do homem ilhéu. Decerto que as carreiras aéreas resolveram os problemas mais instantes das pessoas que podem viajar habitualmente de avião. Nesta perspectiva não podemos esquecer, nem deixar de louvar, as oportunas providências do Governo, quer no estabelecimento dos itinerários regulares, quer na construção dos aeroportos Muito brevemente todas as ilhas disporão de campos de aterragem. Neste momento as ilhas adjacentes são uma

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realidade administrativa, apenas a duas horas de voo da Portela de Sacavém Nunca foi tão íntima a ligação afectiva de continentais e insulares.
Mas não se podem suprir com o avião as vantagens do transporte marítimo Por aquelas razões que acima evoquei e até para corresponder a certa clientela turística que preteria conhecer os Açores num navio que escalasse todas as ilhas.
Já lá vai o saudoso tempo em que de quinzena em quinzena, em dia e hora exactos de cada mês, largava do cais de Santos um paquete da extinta. Empresa Insulana de Navegação, uma companhia marítima que se pôde orgulhar de, celebrar o seu centenário. Eu sei que era um barco ronceiro, um barco que transportava passageiros como transportava cargas e animais, um barco compartimentado em três classes, um barco cuja passagem ficava assinalada por espessas nuvens de fumo, um barco que fundeava nas pequenas e nas grandes enseadas do arquipélago soltando fortes roncos de satisfação, um barco com que Madeirenses e Açorianos se tinham familiarizado como se pertencesse ao seu ambiente doméstico. A chegada do navio aos portos das ilhas era acontecimento de tal importância na monotonia da vida insular que passou a ser incluído no calendário litúrgico, com intenção humorística, «o dia de S Vapor» Nas ilhas mais pequenas, como no Corvo, acorre toda a população ao cais de desembarque.
Porém, há anos a esta parte começou a dança dos navios sem escalas nem horários certos, com intervalos imensos entre as suas partidas e chegadas, com tarifas exageradas, com descuidos flagrantes no bem-estar e na comodidade dos passageiros, com avarias frequentes que os deixavam ao sabor das ondas no meio do oceano. Mas, mesmo com estas clamorosas deficiências, ainda se podia contar com um navio de passageiros na carreira dos Açores.
Como solução do navio de passageiros para os Açores, atrevia-me a sugerir a aquisição de um navio de pequena tonelagem, uma espécie de ferry-boat, rápido, confortável, dotado de uma classe turística e uma classe económica, que servisse ao mesmo tempo aos Açorianos com necessidade de viajar pelo mar e aos continentais que visitassem os Açores em viagem de recreio. Os planos deste navio teriam de ser cuidadosamente estudados para não se repetirem os fracassos anteriores. A sua construção seria precedida de um inquérito em que se ouvissem os utentes e tivessem igualmente a palavra os empresários como os tripulantes qualificados da marinha mercante em serviço nos Açores.
Sr Presidente. Todavia, não são apenas os navios de passageiros que reclamam a atenção dos armadores e das autoridades marítimas. Recebi um angustioso telegrama dos agricultores da ilha Terceira lamentando que não podem fertilizar os seus pastos na época própria por falta de transporte para os adubos! Chegou também às minhas mãos, provinda da vila das Velas, uma queixa subscrita por todos os comerciantes que tinham as prateleiras das suas lojas vazias por não haver praça para as mercadorias nos navios que, de tempos a tempos, escalam aquele porto. Outros clamores se levantam constantemente dos habitantes da ilha Graciosa.
Pelas notícias que chegam ao meu conhecimento, a fusão de três companhias numa empresa de grandes dimensões, a Sociedade de Transportes Marítimos, anima-nos, com a esperança de se cuidar, finalmente a sério, das carreiras de navegação para os Açores Sei, igualmente, que tanto o Sr. Ministro da Marinha como o Sr. Presidente da Junta Nacional da Marinha Mercante estudam as providências mais adequadas para pôr termo a esta aflitiva situação. Esperemos que elas não demorem.
Que as comunicações marítimas entre o continente e as ilhas venham a dispor de navios apropriados tanto a passageiros como a cargas, que os itinerários sejam rigorosamente cumpridos, que se estabeleça uma organização eficiente, como aquela que se manteve nas carreiras insulares durante mais de meio século. Beneficiaram as ilhas da primeira carreira de navegação a vapor da nossa marinha mercante. Parece que se não deve esquecer nem prejudicar uma experiência tão honrosa do comércio marítimo em Portugal.

Vozes: - Muito bem!

O Sr José Coelho Jordão: - Sr Presidente, Srs. Deputados Visitou S Ex.ª o Sr Presidente da República, na última semana, acompanhado do Sr. Ministro das Obras Públicas e. das Comunicações, do Sr Secretário de Estado das Obras Públicas e do Sr Subsecretário de Estado das Comunicações e Transportes, o vale do Mondego, desde a barragem da Aguieira até ao porto da Figueira da Foz, podendo assim verificar o andamento dos trabalhos, apreciar os projectos e conhecer da sua programação.
Toda a obra do Mondego, que constitui a base fundamental para o desenvolvimento de uma vasta zona e que tão ansiosamente tem sido solicitada, encontra-se em vias de execução.
A barragem da Aguieira está já em fase acelerada de construção A sua albufeira irá armazenar cerca de 500 milhões de metros cúbicos de água, que permitirão a produção de energia eléctrica e irão fornecer os caudais necessários à rega de 15 000 ha de terrenos do Baixo Mondego.
A incerteza em que a lavoura do Baixo Mondego tem vivido, e ainda vive, quanto ao resultado das suas culturas, sempre ameaçadas por cheias tardias ou temporãs ou por falta de água, nos anos mais secos, para rega, desaparecerá num futuro próximo, logo que as obras de regularização do no e de rega e enxugo estejam concluídas.
A gama de culturas que nestas condições se podiam fazer era muito limitada, todas pouco rentáveis ou mesmo deficitárias, sem possibilidades de se poder optar por uma lavoura mais evoluída, mais mecanizada ou mesmo para novas culturas.
A execução das obras do vale do Mondego dependia da construção prévia da barragem, que, jubilosamente, os agricultores vêem começar a erguer.
Em Montemor-o-Velho, centro geográfico de todo o vale do Mondego, o Sr Presidente da República e a sua comitiva subiram ao Castelo, onde apreciaram os planos das obras e puderam admirar uma paisagem maravilhosa, na vastidão e grandeza de todo o vale, onde amanhã será possível fazer novas culturas e contribuir «para uma agricultura mais rica,

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que, associada à indústria e produzindo para grandes mercados, contribuirá para a revitalização do mundo rural» e para reduzir as vultosas importações agrícolas, que, de ano para ano, têm vindo a subir.
E cabe aqui salientar a importância do Castelo de Montemor, situado a meio do eixo industrial Coimbra-Figueira, que, devidamente aproveitado com a construção de um auditório e de uma pousada, muito contribuirá para a valorização turística do Centro do País.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Na Figueira da Foz foi visitado o porto e apreciado o projecto de expansão deste, assim como os projectos da nova ponte.
Numa exposição de quadros, gráficos, planos de expansão e anteprojectos ou projectos em estudo, organizada pela Direcção-Geral de Portos, pôde apreciar o Sr. Presidente da República o crescimento rápido que teve este porto desde que foram inauguradas as obras da 1.ª fase, em Outubro de 1966. À medida que foram sendo melhoradas as condições de acessibilidade ao porto, oferecidas novas infra-estruturas e renovados os meios operacionais, as actividades económicas do hinterland têm dado resposta pronta, como bem demonstrado é pelos seguintes números, referentes ao tráfego marítimo de mercadorias.

1964-1968 - cerca de 18 000 t, no valor de cerca de 43 000 contos
1969-1973 - cerca de 131 800 t, no valor de 496 000 contos
1973- 187 800 t, no valor de 746 900 contos.

A acrescentar a estes números há ainda um tráfego local de abastecimento à navegação que frequenta o porto e que se situa nas 30 000 t anuais.
Igualmente o sector piscatório tem evoluído progressivamente, tendo o valor da pesca atingido, em 1973, 146 000 contos, com cerca de 24 000 t.
Se considerarmos também o valor da construção naval executada nos seus estaleiros, o valor total movimentado no porto aproxima-se do milhão de contos.
O porto da Figueira é factor primacial para o desenvolvimento do Centro do País, pela sua influência catalizadora na instalação de novas indústrias e desenvolvimento das actuais. As mercadorias movimentadas são cada dia mais diversificadas, quer na exportação, quer na importação.
A prospecção de petróleo que se está a fazer na plataforma continental conta nele o seu principal apoio.
Para poder, no entanto, dar uma resposta eficiente e em tempo oportuno a toda esta procura torna-se necessário o prosseguimento da construção de determinadas infra-estruturas. Os planos apresentados pela Direcção-Geral de Portos reflectem o conhecimento de todos os problemas e o seu estudo obedeceu a critérios objectivos realisticamente perspectivados para o futuro.
Contudo, o ritmo de crescimento de todos os sectores - mercadorias e pescas - impõe a execução imediata de determinadas obras, entre as quais a doca de pesca e o aumento dos cais comerciais.
Observou ainda o Sr. Presidente da República a maqueta da nova ponte - que irá substituir a actual, que já não oferece condições para o trânsito que a utiliza -, que se apresenta de linhas elegantes, com quatro faixas de rodagem e passeios para peões, sem preocupações de expansão futura, que, pela sua localização, extensão e concepção, em que foi considerada a expansão do porto para montante e as ligações rodoviárias a Coimbra, ao Norte e a entrada na cidade, virá a constituir também uma obra pública de muita grandiosidade, que facilitará o trânsito no eixo litoral Leiria-Aveiro e virá influenciar o seu desenvolvimento.
Todo este conjunto de obras que envolverão centenas de milhares de contos contribuirá para corrigir ràpidamente atrasos no desenvolvimento desta região e para dar uma expressão regional ao Centro do País mais significativa, com influência decisiva nos campos económico e social.
Nos programas autonomos, cujo regulamento foi publicado em 30 de Março último, e que constitui uma das inovações da Lei de Meios para 1974, estabelecidos com o fim de se «poder recorrer a processos mais dinâmicos, esperando deles uma resposta franca, que se traduzirá em desenvolvimento económico acelerado», destaca-se como prioritário o programa autónomo do desenvolvimento do vale do Mondego.
Sendo também uma das finalidades dos programas autónomos o poder-se dispor «de instrumentos adequados para garantir mais racionai afectação de recursos a fins diversos concorrentes entre si», certamente o programa autónomo do vale do Mondego não deixará de incluir nele o próprio porto da Figueira da Foz, tão grande é a interdependência desta e da regularização de todo o rio.
Todas as medidas ultimamente tomadas sobre os problemas do Mondego são a expressão do interesse do Governo pelo desenvolvimento da Região Centro e a justificada promoção de Coimbra a capital regional.
A visita do Sr. Presidente da República teve um alto significado para a população do distrito de Coimbra, que sente renovado o estímulo para continuar a trabalhar para o progresso do seu distrito e de Portugal, e reforçada a sua fé na concretização breve de uma obra que contribuirá sobremaneira para maior riqueza dos seus lares.
Com o direito próprio que me dá o mandato recebido desses povos, desejo manifestar a S. Exa. o Sr Presidente da República, que não se poupa a sacrifícios para manter a unidade e o bem-estar do povo português, o nosso vivo reconhecimento pela sua visita.
Ao Sr. Ministro das Obras Públicas e das Comunicações, principal responsável e impulsionador desta grandiosa obra do Mondego, o testemunho de vivo agradecimento dos referidos povos.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Tristão Neves: - Sr. Presidente: Ouso levantar hoje aqui a minha voz para um problema de muita acuidade que se está a passar na sub-região Alentejo, e que traz preocupado elevado número de agricultores que tanto se esforçam par cuidar das suas terras.
A área desta região corresponde a 2 351 000 ha, aproximadamente à quarta parte do total do continente, e em que a cerealicultura ocupa um lugar

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destacado, normalmente nesta zona, com 600 000 ha anuais.
Trata-se de uma praga de piolho do trigo pertencente às espécies Rhopalosiphum cali L. e Sitobion avenae F, que está a infestar grandes extensões de cultura cerealífera.
Esta praga grassa com grande intensidade, deixando, ao que parece, as searas como que queimadas ou improdutivas quando da sua colheita e, segundo a opinião dos técnicos, nada tem a ver com o piolho que ataca a cultura de oleaginosas do tipo do cártamo, que normalmente se tem conseguido debelar com aplicações de insecticidas.
Podemos esclarecer que os serviços oficiais competentes estão atentos à situação, que, por ora, só reclama uma desinfecção maciça das searas, quando a infestação atinge certa intensidade, o que em muitos sítios se tem verificado.
De pouco serve a um agricultor proceder ao tratamento da sua seara se o seu vizinho contíguo estiver sujeito à mesma praga e não proceder da mesma forma.
A cobertura através do insecticida, segundo preconizam os técnicos, deverá fazer-se por via aérea, forma mais eficaz e rápida, mas implicitamente mais onerosa, chegando a custar cerca de 400$ por hectare.
Perguntar-se-á como pode este tratamento ser feito só com os próprios meios financeiros de uma actividade que se debate, inequívocamente, com senos problemas de elevação de custos, hoje ainda substancialmente agravados por uma crise energética que leva os combustíveis, os adubos e a maioria dos componentes que entram na formação do produto agrícola a níveis de custos nunca antes alcançados.
Não fora o desajustamento do preço de garantia dos cereais relativamente aos seus custos de produção e a situação não seria grave, pois o que é indispensável é que os produtos agrícolas vendidos suportem com folga as vicissitudes de qualquer praga, doença ou condições climatéricas adversas que possam eventualmente surgir.
Não me deterei aqui a fazer, sequer, uma pálida análise do que tem sido a evolução dos preços destes cereais, pois é manifestamente reconhecido pela maioria dos portugueses que o quilograma do pão tabelado não enriquece o lavrador, mas, antes, o empobrece.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Perante isto, desejo exprimir a minha preocupação e apelar para S. Exa o Sr. Ministro da Agricultura e do Comércio, que sabemos à altura deste momento político e com uma visão económica dentro dos cânones actuais, coadjuvado pelos Srs. Secretário e Subsecretário de Estado da Agricultura e do Comércio, respectivamente, que também não são estranhos a todos os problemas agrícolas, que se esforce no sentido de tornar possível quanto antes as seguintes medidas.

1) Comparticipação estadual no custo do tratamento aéreo da cultura cerealífera onde a infestação o justifique e, se necessário, torná-la obrigatória,
2) Actualização do regime cerealífero em termos justos e fundamentados nos efectivos preços de custo dos cereais, que correspondam aos legítimos anseios da lavoura

Sr. Presidente: Tais actuações julgo-as essenciais, indispensáveis e urgentes para a produção dos cereais necessários ao nosso abastecimento quotidiano, bem como para a sobrevivência de um importante sector da agricultura portuguesa com forte incidência na economia nacional.

Vozes:- Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vamos passar à primeira parte da

Ordem do dia

Discussão das contas públicas referentes ao ano de 1972.
Tem a palavra o Sr. Deputado Roboredo e Silva.

O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seguindo a norma que estabeleci na legislatura anterior, debruçar-me-ei designadamente sobre despesas militares e transportes marítimos, e agora também sobre transportes aéreos.
Aproveitarei para fazer algumas considerações de carácter geral, como a matéria permite, e do que peço já vénia a V. Exa., Sr. Presidente, e aos Srs. Deputados, até pela maior extensão da minha fala.
Não desejaria omitir uma palavra de muito apreço e alta consideração para a nossa Comissão de Contas e designadamente para o seu ilustre presidente, que bem merece o nosso respeito e gratidão pelo esforço que há tantos anos vinha fazendo, também como relator, na preparação dos relatórios da Comissão, em que com tanta clarividência fazia pertinentes observações e sugestões em múltiplos aspectos da vida económica nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A este respeito, ou seja, o pouco ou muito caso que o Governo faça do que se diz na Assembleia, seria injusto não inserir aqui uma palavra de saudação e de agradecimento ao Sr Presidente do Conselho por ter criado os Ministérios da Energia, com atribuições de coordenação em todo o espaço nacional, e o da Agricultura. Não tenho pretensões de que as minhas sugestões nesta Casa, aquando da apreciação do IV Plano de Fomento e da Lei do Plantio da Vinha, tenham tido alguma influência na decisão, mas, de qualquer forma, aparentemente, fez-se caso do que aqui foi dito.
Parece-me, e não hesito em adiantar algumas ideias, apenas com espírito de colaborar, que se impõe dar ao Ministério da Indústria e Energia, com a brevidade possível, estrutura que lhe permita cumprir a sua importantíssima missão nesta época de grave crise energética mundial.
Afigura-se-me, assim, que há que nele integrar várias atribuições dispersas por outros Ministérios Notoriamente, tem de fazer-se uma eficaz e operosa coordenação com o Ministério do Ultramar, sem a qual não será possível realizar uma política nacional de energia, isto é, abrangendo todos os territórios que constituem a Nação. Também a Junta de Energia Nuclear terá de adaptar-se à sua integração no Ministério da Indústria e Energia, intensificando as suas

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actividades de investigação. Por mim preferia vê-la transformada em Direcção-Geral, à semelhança das outras que constituem o Ministério.
O novo Ministério, além da sua organização interna, terá de enfrentar problemas complexos, em que se salientam os de abastecimento de combustíveis e energia eléctrica. Não obstante o nosso colega Sr. Deputado Hermes dos Santos já lhe ter feito a referência merecida, ate pela acção que pessoalmente desenvolveu como membro do Governo, não desejaria deixar sem uma nota pessoal a assinatura dos contratos de prospecção de petróleo off-shore no continente e a adjudicação da grande refinaria a levantar no complexo de Sines, pois significarão alcançar-se, se bem sucedidas as prospecções, como é de esperar, autonomia em tão vital matéria.
Quanto aos problemas do sector eléctrico, além da oportuna continuação de criação de novos centros produtores - convencionais e nucleares -, cuja programação poderá ser necessário rever em face das pesadas subidas de preço dos agentes energéticos primários - ocorre-me voltar a falar na central térmica à boca da mina para queimar as linhites de Rio Maior -, haverá certamente que reformular a política de tarifas e de corrigir os actuais desequilíbrios no sector da distribuição, intensificando os programas de electrificação, de forma que não haja mais aglomerados populacionais sem abastecimento de energia, verdadeiras manchas ou nódoas escuras da nossa terra, inaceitáveis no fim do terceiro quartel do século XX. O meu distrito e o meu próprio concelho são prova clara desta afirmação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nesta matéria ainda me permitiria dizer que as grandes distribuidoras que funcionam a contento geral devem ser apoiadas e até acarinhadas, desde que a sua idoneidade não deixe quaisquer dúvidas. É que a electrificação é, pelas suas características, um empreendimento sempre em marcha e não uma obra que termina, e isto em qualquer país do Mundo.
Finalmente, desejaria sugerir que, para alcançar os grandes objectivos pretendidos neste campo da electrificação, fosse criado, tal como existe, por exemplo, para a indústria, um Fundo de Fomento de Electricidade, ou mesmo, numa perspectiva mais ampla, um Fundo de Fomento de Energia.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Eu quero, neste momento, afirmar que acompanho o Sr. Presidente do Conselho com toda a sinceridade e o veemente desejo de que o seu fardo lhe seja o menos pesado possível neste momento tão complexo da vida nacional, em que importa manter o equilíbrio em que temos vivido. Creio que todos os portugueses verdadeiramente conscientes assim o desejarão.

O Sr. Jorge Proença:- Muito bem!

O Orador:- As dificuldades económicas, a inflação assustadora e o não menos galopante aumento de custo de tudo o que é essencial à vida e correspondentes implicações sociais que são inevitáveis, além da política geral interna e externa de um país que enfrenta em África um terrorismo cruel há treze anos, e cuja esclarecida posição não consegue ser compreendida até pelos que deviam ser amigos e mesmo interessados, pois o problema transcende as fronteiras nacionais.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -..., levam-me a reconhecer que só um grande homem, com uma agilidade mental fora de série, uma vontade sem limites e declarada habilidade política, pode manter a nau do Estado no rumo certo, através do mar proceloso em que navega. Aqui lhe apresento, pois, a minha modesta homenagem.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E recordo nesta altura o sentido do que por outras palavras já li ou ouvi algures.
A cruz de Cristo sempre serviu de farol a um povo nobre e indómito que construiu uma nação imortal e projecta-se ainda, graças a Deus, no meio do fermento de destruição e de morte que campeiam no mundo, na fé e na heroicidade do Portugal soldado, marinheiro e missionário que na actualidade continua a ser.

A Sra. D. Teresa Lobo: - Muito bem!

O Orador: - E ainda acrescentaria o que o padre António Vieira disse uma vez sobre o poder de adaptação e de aventura dos Portugueses «Deus deu-nos uma terra pequena para nascer e o mundo inteiro para morrer.»
Francamente, bem desejaria que os nossos irmãos de todas as raças e credos, designadamente os jovens, se debruçassem sobre estas verdades e nelas meditassem nos seus momentos de lazer. Pretensiosismo? Talvez, mas acima de tudo um forte sentimento de portugalidade e de amor à minha terra que morrerão comigo. Perdõe-se-me o desabafo.
E já que falei em jovens, tenho de aqui deixar uma palavra de total reprovação aos pouquíssimos que pelas suas loucuras anárquicas prejudicam a grande massa que apenas quer trabalhar e habilitar-se com a necessária ferramenta para, com confiança, enfrentar o futuro.

O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!

O Orador:- Para aqueles poucos impõem-se severas medidas de disciplina, como aliás para todos os desmandos, venham donde vierem, que pretendam perturbar a tranquilidade dos espíritos e a paz pública.

O Sr. Jorge Proença: - Muito bem!

O Orador: - Continuo a pensar que a chamada «crise do petróleo», como já noutra oportunidade aqui referi, poderá fazer regressar ao Pais grande número de emigrantes, e certamente na sua maioria rurais, os quais poderão ser reintegrados no trabalho agrícola e muitos encaminhados para o ultramar.
Abro agora um parêntesis para lembrar que as estimativas para 1974 dizem que o acréscimo do preço

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do petróleo atingirá um valor correspondente a 2% do PNB nos países da OCDE e que os países do golfo Pérsico produtores de petróleo deverão dispor de 50 a 60 biliões de dólares livres para colocação, a acrescentar aos fundos já existentes no mercado. Assim, os países europeus terão de pedir emprestados uns 45 biliões de dólares para atender às exigências da sua balança de pagamentos. E os países do Terceiro Mundo sofrerão com esta situação um deficit de uns 10 biliões de dólares, que só o auxílio internacional pode colmatar. De outra forma, serão aumentadas as suas dificuldades, incluindo as alimentares, de que já sofrem.
As repercussões desta conjuntura sobre a economia portuguesa são, pois, inevitáveis, particularmente sobre a balança de pagamentos.
Também coerente com outras afirmações, julgo que deveria ser ajudado pelo Estado o desenvolvimento de grandes propriedades agrícolas (sempre o emparcelamento!) em regime de cooperativas e com o máximo de mecanização, orientadas por técnicos capazes e tudo sob contrôle do Estado.
Presentemente, apenas grandes propriedades serão rentáveis, como o exemplifica o que se passa em vários países da Europa, onde o pequeno lavrador só subsidiado sobrevive.
Era preciso encarar imediatamente o problema, se é que o não foi já, no qual haverá que investir grandes somas. E como pesam tanto na balança comercial os produtos agrícolas que importamos, a medida tem aspectos da maior urgência e manifesto alcance nacional.
Fala-se constantemente no desenvolvimento da indústria, esquecendo-se por vezes que é da agricultura que nos vêm os alimentos, quando o mundo prevê carências alimentares sucessivas perante a explosão populacional. Recordo que a população de 1900 a 1920 aumentou 200 milhões e de 1950 a 1970 - os mesmos 20 anos - de 1100 milhões. As pessoas não se alimentarão de frigoríficos, de televisores, de máquinas de lavar loiça ou de varão de aço, mas antes daquilo que é indispensável à sobrevivência humana, como cereais, carne, leite, fruta, etc.
Parece que se chega a olvidar que a terra é a mãe da humanidade, que desde o nascimento até à morte dela depende.
O homem da terra retira os alimentos, as fibras para tecer fazendas e vestir-se, os materiais para construir a sua habitação e até os medicamentos com que evita ou debela as doenças.
E aqui surge novamente o custo desses produtos essenciais à vida, que para ser controlado em limites aceitáveis cada vez mais exigirá, como disse, a intervenção do Estado nos grandes empreendimentos agrícolas e na protecção ao pequeno proprietário rural, através da fixação de preços compatíveis e outras medidas, para que o seu apego à terra, que, felizmente ainda existe, não venha a perder-se totalmente. Tudo isto exige mais do que nunca a abolição de despesas supérfluas e o adiamento de grandes obras os projectos que não sejam de imediato benefício para as populações. Afigura-se-me que o IV Plano de Fomento terá de ser revisto à luz das realidades que se nos deparam e o Governo assim o terá entendido nomeando para o efeito uma comissão destinada ao estudo dessa revisão.
Tenho insistido em que temos de viver num ambiente de austeridade, devendo vir o exemplo dos altos níveis oficiais e necessariamente também dos não oficiais, que não podem divorciar-se da gravidade do momento.

A Sra. D. Teresa Lobo: - Muito bem!

O Orador: - Um país que enfrenta uma situação muito delicada, em que estão em causa o bem-estar e a defesa de numerosas populações portuguesas e até a pretensa posse por bandoleiros de algumas áreas de território que nunca deixou de ser nosso, tem de, com convicção, fazer sacrifícios.
A ostentação é inadmissível, para não dizer intolerável. Não quero repetir-me a falar em automóveis de elevado preço quando, desde o mais alto escalão até ao menor com direito a carro, os tipos de viaturas deveriam ser bem definidos, nem às deslocações ao estrangeiro com exagerado número de pessoas, para não mencionar a verdadeira necessidade ou apenas escassa vantagem de certas deslocações. Se neste país houvesse um autêntico sentimento de patriotismo e de noção das responsabilidades gerais, responsabilidades que todos temos no difícil momento que se atravessa, muitos casos de ostentação pública e particular poderiam ser evitados. Por exemplo, excessos de hospitalidade oficial com frequentes comezainas que já ninguém oferece lá fora; reuniões ou chás de caridade, em regra organizados por senhoras, que são pretexto para a exibição de vestidos caríssimos e jóias riquíssimas e de cujos magros resultados nem vale a pena falar, quando os participantes, na maioria dos casos, poderiam, sem qualquer transtorno, contribuir individualmente com ofertas pecuniárias iguais ou superiores às que das festas se apuram.
Não sou demagogo, mas não hesito em dizer certas verdades. Quem não deve não teme. Entendo que todos têm direito a descanso e a distracções, particularmente quando trabalham, mas certos pretensos divertimentos com várias feições, que são sobretudo manifestações espaventosas, considero-os, presentemente, reprováveis.
Nunca tolerei que alguém se apresentasse como detentor do monopólio do patriotismo, e, por mim, sou apenas um português que vive com alguma reflexão e certa angústia o momento que o País defronta; não pretendo, portanto, dar lições de qualquer espécie, mas apenas chamar a atenção dos Portugueses, em todos os níveis, para os deveres que a salvação da Pátria exige. Penso que, se todos, repito, todos, fizermos um grande esforço durante um período que nessas condições não precisaria talvez de ser muito prolongado, se houver discernimento generalizado, elasticidade na actuação e decisões corajosas e firmes dos governantes, poderíamos encarar o futuro com mais tranquilidade, uma vez tomadas e postas em execução medidas que se impõem e que algumas delas há muito venho preconizando.
As forças armadas têm de ser prestigiadas como merecem - tenho dito numerosas vezes nesta Casa que elas são o espelho em que se reflecte a própria Nação - e, porque a carreira das armas, sendo sobretudo uma vocação e um sacerdócio, deverá ser desprendida de egoísmos e ambições materiais, haverá que reconhecer-lhe esse altruísmo. Elas têm a sua missão bem definida no artigo 53.º da Constituição

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- defesa da integridade nacional e manutenção da ordem e da paz pública -, não podendo nem devendo, a meu ver, imiscuir-se na política. Como chefe militar, que fui, assim o entendi sempre.
Não conheço qualquer país, das chamadas democracias do Ocidente, onde o militar possa «virar» político sem passar prèviamente à reserva ou demitir-se das forças armadas. Uma das nossas fraquezas, em meu entender, é a de designar oficiais do activo para cargos políticos e, terminados esses mandatos mais ou menos longos, voltarem ao serviço das suas armas.
É compreensível que o vírus político fique entranhado nas pessoas e daí a sua natural tendência, apesar de militares, de se envolverem em questões políticas. Por mim, repito, os homens das forças armadas deverão ser apenas militares, e já terão muito com que se ocupar, dada a evolução das armas e dos equipamentos, da táctica e até da própria estratégia, única forma de estarem actualizados nos seus estudos, doutrinas e técnicas profissionais. Depois, o exercício de cargos políticos cria situações delicadas que os regulamentos - até o de disciplina militar - verdadeiramente não contemplam.
Eu sei que não somos tão ricos em valores como desejaríamos e que, por vezes, haverá que recorrer a militares, mas, quando assim tiver de ser, os interessados deveriam abandonar definitivamente o serviço activo, logo que nomeados para o cargo político. É indispensável frisar que defendo princípios e nunca esteve nem está no meu pensamento qualquer caso individual. É preciso que isto fique bem claro.
Quem me conhece mais intimamente sabe que há muito advogo até que os próprios cargos de Ministros das pastas militares sejam civis. Pois o de Ministro da Defesa considero-o fora de discussão. Os Ministros precisam de ser sobretudo políticos convictos, administradores esclarecidos e homens prestigiosos; para os problemas técnicos dispõem dos seus gabinetes e, mormente, dos seus chefes de estado-maior e toda a estrutura do estado-maior, onde em regra trabalham dos mais distintos elementos das respectivas corporações militares.
O Ministro militar acaba sempre, por maior que seja a sua isenção, por sofrer de alguma deformação profissional.
Todo este raciocínio não leva qualquer envelope, insisto. Trata-se simplesmente de uma concepção da vida militar que cada vez vive mais entranhada nos meus sentimentos.
E diria mais umas palavras sobre coisas militares. A instrução e disciplina militares têm grandes virtudes; a actual juventude prestando serviço multar, o que suporta com maus dificuldade é ter de calar-se muitas vezes e aceitar e cumprir o que lhe determinam. Não são as marchas, nem o peso do equipamento, nem a dureza da instrução. Ela sente-se, parece, diminuída por não poder retorquir livremente, explicar ou justificar mesmo sem motivo ou razão.
Ora, sobre este traço do carácter dos jovens na época da contestação, só as forças armadas têm poder de disciplina, uma vez que a família e a escola o não conseguiram.
Este ambiente, todavia, é nitidamente favorável àqueles cuja necessidade mais urgente é a de encontrar na vida algo que os guie e em que possam apoiar-se, ainda que transitoriamente.
A contestação é palavra que entrou no quotidiano, com pezinhos de lã, como o povo costuma dizer, com a finalidade de permitir a participação dos que a usam na discussão de quase tudo, ainda que nada conheçam da matéria, mas sobretudo da actuação governamental ou da Administração, usando ideologias mais ou menos agressivas.
Dentro do que é equilibrado, a contestação com uma orientação construtiva e sadia deveria considerar-se útil, mas esse equilíbrio não é fácil de encontrar, dada a desorientação que certas doutrinas materialistas e subversivas desencadearam. E, acima de tudo, se a ela presidisse aquele espírito nacional em que os valores morais são devidamente reconhecidos.
Alguém disse.

A juventude está a ser desorientada por murtas e variadas gentes; por certos professores que procuram arrancar até com violência aos jovens aquilo que faz parte da natureza racionai humana o amor de Deus e da Pátria; por outros ensinadores que evitam sistematicamente enfrentar estas realidades fundamentais em todo o ser inteligente. Importa, e sem medo, denunciar este crime contra nós mesmos.

E ainda.

O mundo de hoje ri-se estultamente de certa linguagem, de certos homens do passado. Concretamente, dos mártires da Igreja, dos heróis da Pátria. Mas criou diabolicamente outro martírio e outro heroísmo: aquele martírio e aquele heroísmo que se colocam directamente ao serviço da desordem e do mal.

Para terminar este apontamento sobre questões mais ou menos ligadas à actividade militar não posso deixar de fazer uma referência, ainda uma vez mais, às indústrias militares. Por que não se transformam as fábricas nublares em empresas públicas de capital misto, ficando assim em condições de competir em todos os campos, inclusive o nível de salários a pagar aos seus operários, que é uma das graves dificuldades de que enfermam? Diria que quase dói o coração por se verificar que nessas magníficas Oficinas Gerais de Material Aeronáutico, de Alverca, se não esteja construindo um ou dois tipos de avião não sofisticado e helicópteros. As Oficinas têm apetrechamento e gestão técnica e administrativa para isso e até para mais! Chego a pensar que perdemos a noção da gravidade do momento que atravessamos e da nossa capacidade de conceber e de fabricar uma grande parte do que nos é indispensável para nos mantermos fortes onde e sempre que for preciso. Julgo que a coordenação de muitas vontades e entusiasmos poderia neste âmbito até trazer surpresas agradáveis sobre novas armas. Lembro-me do Centro de Estudos Especiais da Armada e do que tem produzido com recursos mais que insignificantes, aliás bem mal aproveitados.
Repito que, sem dispormos aqui, e principalmente no ultramar, de verdadeira força, não há soluções de qualquer espécie. Cada vez menos a política pode ser conduzida de harmonia com os interesses das nações se não possuírem poderosas forcas armadas, variáveis em elementos constitutivos, consoante a geografia e a estratégia que esta impõe.

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E já que falei no ultramar, umas rápidas considerações, que a meu ver são pertinentes e já noutra intervenção aqui apontei.
Preocupam-me as exigências que se estão fazendo para explorações mineiras em áreas das províncias infestadas pelo terrorismo, onde a segurança é precária e que por isso não podem avançar, pois só as despesas que aquela segurança acarretaria excedem em muitos casos as previsões financeiras gerais.
A facilitação das licenças de concessões e dos privilégios que mereçam é indispensável. Tais licenças deveriam passar a ser da competência dos governos locais, de harmonia com a política nacional definida sobre a matéria. E nem me quero referir ao escandaloso Fundo de Fomento Mineiro nas condições em que se processa!
Além do melhor conhecimento do ambiente para a outorga dessas concessões, que os levaria a dar as maiores facilidades onde as condições prevalecentes não fossem encorajadoras, também resultariam em melhoria dos bens que se fixam nas províncias, nos impostos cobrados e na situação cambial. E os trâmites oficiais seriam mais rápidos. O empate burocrático nesta e noutras actividades empresariais é quase inacreditável, neste período de incertezas e intranquilidades.
Os investimentos em África, criadas as condições que indiquei, far-se-iam mais afoita e amplamente.
O nosso inimigo n.º 1, principalmente em África, será a falta de desenvolvimento económico. Temos de nos convencer todos de que essa tem de ser mais uma batalha a juntar às duas que combatemos mais acentuadamente na metrópole - as da educação e da saúde - e nas três províncias de África, além daquelas, que também ali se combatem, a do terrorismo assassino.
Parafraseando a célebre frase de Erasmo, mas ao contrário, diria. Quando o ouro não fala, não há eloquência que tenha o menor significado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Governar é, sobretudo, prever, e prever requer imaginação, e se esta é sempre necessária, em períodos de crise ainda o é mais.
A inflação é favorável ao capital, trazendo óptimas oportunidades ao empresário para realizar investimentos. Há aumentos da taxa de lucro e de vendas.
Os detentores de rendimentos fixos, aposentados e pensionistas, assistem à redução da sua capacidade de aquisição, constituindo para eles verdadeira aflição estes períodos críticos.
E aqui surge o espectro das rendas da casa anteriores a 1942, que, sem comentários, menciono mais uma vez. Por outro lado, há a vertiginosa subida das rendas modernas.
A inflação e a possível deterioração da balança de pagamentos - menores remessas de emigrantes e redução do turismo - poderão vir a ter sério impacte na actividade financeira da Administração. E os reflexos dos elevadíssimos preços do petróleo e matérias-primas na balança comercial agravarão a situação de permanente desequilíbrio desta balança e consequentes repercussões sobre a de pagamentos.
Parece que no nosso caso haverá que seguir com atenção redobrada a evolução que se processa e administrar com mão de ferro os dinheiros públicos. Por isso os meus insistentes pedidos de maior austeridade nos gastos não essenciais. E também pediria medidas de economia que deveriam ser acompanhadas por uma campanha de estruturação simples e clara que fosse até junto do povo, o bom povo de Portugal, explicar quão importante é poupar e não desperdiçar. Isto para in extremis não ter de recorrer-se ao congelamento de preços e salários, como ainda recentemente se anunciou na Venezuela - país muito rico em petróleo - por um período de três anos.
Gostaria de saber que benefícios colheu o Estado dessa especulação desenfreada que ocorreu na Bolsa durante 1973, em que, segundo se diz, se fizeram fortunas imensas sem trabalho e quase sem risco, porque o capital empregado nem custava a ganhar!
Se existe um imposto de transacções para a generalidade do que se adquire, porque não se estabelece uma forte taxa ou imposto para os negócios especulativos que se processem nas actividades nacionais?
Em resumo, o que pretendo são medidas enérgicas contra todas as especulações, venham donde vierem.
Por outro lado, importa que a Administração, através dos seus agentes, seja honesta, devendo punir-se severamente todas as tentativas de corrupção ou suborno.
E passo à análise rápida das contas de 1972, e destas, particularmente, às despesas militares.
O valor total das receitas foi de 42 103 000 contos, números redondos, e as despesas elevaram-se a 42 067 000 contos. O produto nacional bruto a preços constantes cresceu à taxa de 6,9% e admite-se que em 1973 se tenha processado a uma taxa pelo menos igual. O saldo positivo da balança de pagamentos foi de 8 206 000 contos, ainda mais 341 000 contos que em 1971.
Importa apenas frisar que as receitas ordinárias cobradas e as despesas homologadas apresentaram um saldo positivo de 13 220 000 contos, que cobriu em grande parte as despesas extraordinárias, inclusive todas as despesas de defesa desta classificação, que, aliás, não revelaram diferença sensível em relação a 1971. Foram, segurança incluída, de 10 118 000 contos.
As despesas de defesa ordinárias e extraordinárias atingiram 13 865 000 contos (todas as cifras indicadas são em números redondos), ou seja o correspondente a 33,9% do total dos pagamentos realizados pelo Tesouro, o que está muito longe dos 40% ou mais apregoados em muitos meios, particularmente estrangeiros, que deveriam ser mais cautelosos nas suas apreciações. Terminarei esta parte correspondente à metrópole mencionando que a circulação monetária atingiu em 31 de Dezembro 36 103 000 contos, mais 4 200 000 contos que na mesma data de 1971, e que o comércio com o ultramar sofreu um decréscimo de 1 880 000 contos.
Os encargos orçamentais com a dívida pública em relação às despesas totais foram de 6,4%, a percentagem menos elevada desde 1968.
Da conta provisória, publicada no dia 3 de Abril, recolho os números seguintes, relativos a 1973, que tem interesse, julgo eu, aqui registar:
Receitas ordinárias 43 356 500 contos, que, com as extraordinárias, perfizeram um total de 50 038 000 contos, finalmente, alcançámos os 50 milhões de contos!
O saldo entre as receitas ordinárias e as despesas homólogas pagas foi de 15 859 600 contos, mais de 2 600 000 contos em relação a 1972, e que cobriram

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de longe as despesas extraordinárias de defesa, no montante de 11 884 000 contos, sensivelmente superiores, aliás, às de 1972, como era de esperar, mas, quando se souber da totalidade das despesas de defesa, verificar-se-á certamente uma percentagem, em relação às receitas totais, inferior a 30%.
O saldo positivo da balança de pagamentos é estimado em quantia ligeiramente superior à de 1972.
Verifica-se assim como é possível um esforço no sentido de satisfazer maiores e imperiosas necessidades militares resultantes da luta antiterrorista, sem deixar de atender também ao imperioso desenvolvimento económico do País.
O acréscimo das despesas de defesa em relação a 1972, convém não esquecer, foi afectado, em boa parte, pelo aumento de vencimentos que se processou neste ano e pelo encarecimento de tudo o que se compra, ou seja a inflação e a ganância de muitos energúmenos.
Passo agora a fazer uma análise rápida das despesas militares, ou melhor, das despesas com as forças armadas para sua própria defesa, nas diferentes parcelas ultramarinas.
As receitas ordinárias totais foram, em 1972, de 23 150 000 contos e as extraordinárias de 4 850 000 contos, representando, no seu conjunto, 28 milhões de contos.
A metrópole e o ultramar tiveram, globalmente, de receitas totais um pouco mais de 70 milhões de contos.
Sublinha-se que, de todas as parcelas da Nação, só Angola teve saldo positivo na sua balança comercial.
Por serem de maior relevância e as mais significativas no índice de progresso dos territórios, indicam-se as receitas ordinárias de Angola e de Moçambique, que foram, respectivamente, de 11 166 000 e 10 533 000 contos. Foram estes dois Estados que contribuíram para as despesas militares com verbas mais substanciais, mas, como se verificará, está longe, bem longe, de ser pesada essa contribuição, em percentagem das receitas gerais.
Na despesa ordinária os encargos militares totais das províncias ultramarinas atingiram 2 281 125 contos, o que representa 10% das receitas homólogas.
Na despesa extraordinária apenas Angola contribuiu com o montante correspondente ao imposto extraordinário para a defesa, que rendeu 565 645 contos, e mais 100 000 contos de dotação extraordinária. Este imposto deve ter baixado de 35 % no ano corrente.

s encargos militares, por províncias, foram

Cabo Verde 5421 contos,
Guiné 2203 contos,
S. Tomé 5813 contos,
Angola despesa ordinária, 1 074 743 contos, ou cerca de 9,6% da receita homologa. Acrescentando o imposto extraordinário a que me refém de 565 645 contos e mais os 100 000 contos de dotação extraordinária, perfaz o conjunto destas verbas, em relação às receitas totais, cerca de 13 % como encargos de defesa;
Moçambique, 1 162 909 contos de despesa ordinária, representando 11,1% das receitas de igual classificação;
Macau o encargo com as forças armadas foi de 25 363 contos, cerca de 6,5 % da receita,
Timor despesas militares, 4673 contos, ligeiramente inferior a 1971, correspondendo a 2,5 % da receita ordinária.

Pode, pois, afirmar-se que está longe de ser gravosa, como disse, a contribuição do ultramar para as despesas com a sua defesa militar, particularmente se a compararmos com a da metrópole.
O desenvolvimento económico das duas grandes províncias de África, mormente de Angola, permite, sem prejuízo do seu progresso económico-social, que é espectacular, como é sabido e reconhecido até pelos estrangeiros honestos que nos visitam, que a contribuição para encargos de defesa aumente, como certamente se terá verificado em 1973.
Como me excedi nos comentários iniciais, já fui relativamente sintético na apreciação das despesas militares e terei de o ser igualmente no que respeita a transportes marítimos e aéreos.
Ora, ao intervir na discussão do IV Plano de Fomento fiz algumas referências à marinha mercante e portos e assim darei uma ideia geral do panorama internacional, até porque a evolução que se está processando nos navios de carga, com predomínio de porta-contentores, levará certamente a alterar o que foi projectado para o hexénio do IV Plano de Fomento (61 navios e 18 milhões de contos). Mas, desde logo, sem omitir os aspectos nacionais que se me afiguram de mais saliência.
Direi, pois, que os navios mercantes construídos no mundo em 1973 atingiram cerca de 30,4 milhões de toneladas deadweight ou seja mais 14% do que em 1972. Nos últimos dez anos o aumento foi de 400 %. O Japão ocupou o primeiro lugar dos construtores, com cerca de 50%, mas a Espanha está em quarto lugar, com 1 560 000 t, contra 420 000 t em 1972!
A evolução do deslocamento de petroleiros não pára. Já se constróem navios de mais de 500 000 t e recentemente soube-se que foi encomendado ao Japão um navio ultrapassando as 700 000 t.
O crescimento constante da tonelagem dos petroleiros compreende-se muito fàcilmente traduzindo em números o custo do frete. Se o custo do transporte por tonelada for fixado, por exemplo, no índice 100 para um navio de 20 000 t desce para 50 se for de 60 000 t, para 35 se atingir 100 000 t e para 20 ao alcançar as 500 000 t.
No que respeita à marinha mercante nacional, como se sabe, em Maio de 1973, a frota atingiu 1 milhão de toneladas com a entrega do primeiro petroleiro de 135 000 t. Neste ano de 1973 foram aumentados à marinha mercante 16 navios, sendo 9 de carga geral, 3 petroleiros e 4 porta-contentores, e já em 1974 mais um porta-contentores. Todavia, e como foram abatidas 26 unidades, das quais 9 navios de passageiros, a tonelagem bruta total no dia 1 deste mês de Abril não tinha aumentado em relação a Maio de 1973, mantendo-se ligeiramente superior ao milhão.
Importa dizer que em 1973 foi substancialmente aumentado o Fundo de Renovação da Marinha Mercante e fixaram-se normas para a fusão das empresas de navegação, factos que merecem particular relevo. Das fusões já resultou que três empresas armadoras são detentoras de cerca de 93 % da tonelagem, mas entre elas sobressai a Soponata, com uns 40 %

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Informarei ainda que estão em construção para Portugal nove navios, deslocando 363 131 AB, dos quais três petroleiros, quatro navios de carga geral e dois frigoríficos. Destes nove navios três estão a ser construídos em estaleiros nacionais.
Para o estrangeiro, e isto é reconfortante de acentuar, estão em construção, na Setenave e nos Estaleiros de Viana do Castelo doze navios, correspondendo a 2 400 000 t, números redondos, e na Lisnave, construções de partes de navios, um casco e um navio de carga geral de 12 200 t de porte, cujo conjunto empregará 84 000 t de aço.
Creio que esta informação interessa à Câmara, pois dá-nos uma ideia da intensa actividade que se processa nos nossos estaleiros, com as correspondentes vantagens económicas, em que sobressai a entrada de divisas - contratos para o estrangeiro - ou poupança das mesmas - construções para a marinha nacional.
Finalmente, e até porque só consegui elementos de 1972, neste ano transportou-se em navios estrangeiros afretados um total de 613 491 t de carga, sendo 162 686 t de cargas líquidas. Daqui se vê como interessa continuar a aumentar a tonelagem nacional.
E ainda indicarei que trazemos três navios graneleiros no tráfego internacional, com a tonelagem de 86 749 t de porte.
Vou agora referir algumas generalidades sobre transportes aéreos.
Nos anos de 1971 e 1972 - os últimos de que vi estatísticas - houve um incremento substancial no transporte aéreo regular mundial.
Deste tráfego (excluída a União Soviética, cujos elementos não conheço), cerca de 50 % coube aos Estados Unidos da América.
Entre os 123 Estados que fazem parte da Organização da Aviação Civil Internacional (OACI), Portugal ocupa o 20.º lugar, o que tem certa relevância.
O papel do tráfego não regular assume uma elevada percentagem do transporte aéreo, cerca de 32 % do total.
Estima-se, ao contrário do que muitos pensam, que o lucro global, após a satisfação de todos os encargos, não tenha excedido 1,5 % da receita.
Esta rápida análise é feita com o objectivo principal de dar uma ideia, aliás sem ser novidade, da importância crescente do transporte aéreo e da sua fraca margem actual de rentabilidade, que, com a chamada «crise do petróleo», terá ainda tendência para diminuir.
O avião oferece, primordialmente, velocidade e, portanto, economia de tempo. Nas regiões onde a rede de superfície e mais que modesta, como sucede em muitos países em vias de desenvolvimento, ou separados por mares e oceanos, o transporte aéreo tem primazia.
Todavia, é o mais caro dos meios colectivos de transporte, o que para numerosos utentes supera a comodidade e a rapidez.
Tudo indica que o transporte aéreo mundial continuará a crescer a ritmo considerável, por várias razões, entre as quais sobressaem o aumento mundial da população, o aumento do produto nacional bruto, e, daí, o maior poder de compra individual, o aumento de tempo livre para viajar e a internacionalização da indústria e do comércio.
Prevê-se que em 1980 os passageiros transportados dupliquem em relação ao presente e em 1990 sejam seis vezes maiores.
Quanto ao transporte de carga, estima-se o seu crescimento a uma taxa superior à do transporte de passageiros.
A importância do transporte aéreo para o turismo não precisa de ser salientada por ser bem conhecida, mas já se põem muitas reservas a certos tipos de «tudo incluído», o chamado «IT», e aos voos charters, que têm fortes repercussões sobre o tráfego regular.
Ainda uma palavra sabre as infra-estruturas de apoio, cuja importância para a segurança e rapidez são fundamentais.
Compreendem serviços meteorológicos, controle de tráfego aéreo, comunicações, ajudas à navegação e aeroportos.
Os aeroportos constituem já importantes estrangulamentos, pelo tempo gasto no acesso e morosidade no processamento de passageiros e carga. Afigura-se-me ser assunto que está sofrendo cuidada revisão internacional.
No que respeita à condução e manutenção dos aviões, as empresas constituem uma indústria, diria, de ponta. Necessitam de pessoal e meios de alto nível técnico, que rareiam nos países menos desenvolvidos. E apresentam problemas complexos de coordenação e contrôle.
Em estudos realizados pela IATA (Associação do Transporte Aéreo Internacional), o capital previsto como necessário para as empresas de aviação assume proporções astronómicas, pelo que se considera que, se não houver grandes melhorias de rentabilidade, duvidosas, aliás, como se disse, as perspectivas da indústria são nitidamente desfavoráveis.
As empresas terão, assim, de depender substancialmente dos seus Governos.
Este largo intróito teve como finalidade pôr em foco no ambiente geral a nossa transportadora nacional (TAP).
A evolução do seu tráfego nos últimos seis anos foi superior à das empresas da OACI. Mas as transferências interterritoriais, a partir de 1972, projectaram-se adversamente, baixando sensivelmente a taxa de crescimento anterior nas carreiras para Angola e Moçambique.
A TAP dispõe de 21 aviões a jacto (3 adquiridos em 1973), incluindo 3 Caravelle, que são os de menor utilização média horária, por voarem nos troços mais curtos dos serviços regulares.
Salvo para os quadrirreactores B-707 (existem 9), o número de unidades de cada tipo é reduzido.
Importa dizer que, ao contrário do que sucede com a grande maioria das companhias de aviação nacionais europeias, em que são ou o Estado ou os municípios a construir as infra-estruturas operacionais de que necessitam, a TAP tem sido obrigada a construí-las por sua conta, particularmente no Aeroporto de Lisboa.
Nestas infra-estruturas, nos aeroportos continentais, investiu cerca de 600 000 contos e já vários milhares nos do ultramar.
Por outro lado, dada a baixa frequência com que opera para o estrangeiro, não tem dimensão para montar serviços próprios nos aeroportos que visita, recorrendo a contratos locais, o que é maus oneroso do que se pudesse ter serviços próprios

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As tarifas que pratica no campo internacional são as estabelecidas pela IATA e aprovadas pelos Governos. No âmbito nacional têm sido fixadas de acordo com o Governo e atendido à promoção turística e a razões sociais.
Têm, portanto, os utentes nacionais usufruído condições mais favoráveis aos de outros países em ligações comparáveis.
Em conclusão, a TAP tem problemas estruturais de receita média baixa, consequência do tipo de tráfego que transporta.
Estando o tráfego charter ou transporte de massa em pleno desenvolvimento -estima-se que para lá de 1975 seja de 50 % o tráfego intereuropeu -, haverá, tal como se fez para algumas linhas regulares, que negociar acordos bilaterais, que serão a única defesa.
A TAP, para satisfazer os objectivos nacionais como grande transportadora aérea, necessitará de importantes investimentos, e para atrair capital precisa de ser uma empresa rentável, com lucros atractivos. Como as ligações de longa distância são as economicamente mais favoráveis, parece que deverá manter-se como única transportadora na exploração das linhas a longa distância - para o ultramar e para o estrangeiro. Destas últimas, há algumas que têm interesse político que ultrapassa questões de rendimento positivo. Haverá, pois, que as definir, para efeitos de programação e reapetrechamento da frota aérea. Daqui a necessidade, se o não foi já, de o Governo fixar a política e estratégia que a TAP terá de seguir.
E sobre aeroportos, como a eles me referi na apreciação do IV Plano de Fomento, limito-me a renovar o pedido que então fiz ao Sr. Ministro das Comunicações, de cuja alta compreensão das necessidades metropolitanas nunca duvidei, para incluir no Plano e com alguma prioridade o Aeródromo da Guarda, que naquele Plano não era contemplado. Lembro-me de ter dito que, depois de Bragança, era a cidade do interior que mais precisava de um aeródromo, até porque as ligações terrestres, ferroviárias e rodoviárias, são morosas e pouco cómodas.
Termino, dando a minha aprovação às contas de 1972 e solicitando a atenção do Governo para os pontos que referi e ainda para o aumento de 400% no custo da instalação de um telefone (como se o telefone não fosse hoje quase uma ferramenta de trabalho), aumento que parece pretender competir com a extorsão praticada pelos produtores de petróleo! Não há melhor solução do que passar empresas particulares a empresas públicas para pagar tudo mais caro sem ser mais bem servido. E já nem quero falar no aumento de 150% por palavra nos telegramas citadinos, que se tiverem apenas dez palavras, com a taxa fixa, o aumento sobe para 300%!
Faço votos para que os bons resultados obtidos nas contas, e igualmente nas de 1973, já publicados a título provisório, continuem a verificar-se, apesar de todas as incertezas que o mundo nos apresenta e que estão bem longe de ser tranquilizadoras.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vamos passar à segunda parte da ordem do dia - aviso prévio sobre a formação profissional agrícola.
Tem a palavra o Sr. Deputado Magro dos Reis.

O Sr. Magro dos Reis: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por sentir necessária uma total compreensão das razões que me levaram a apresentar este aviso prévio, acho conveniente debruçar-me com alguma minúcia numa explicação prévia.
Tenho sentido uma preocupação pessoal com a evolução da nossa agricultura, em que, devido à falta de formação profissional de base, alguns agricultores procedem a investimentos em que, desconhecendo os requisitos mínimos indispensáveis ao êxito dos empreendimentos, vêm, mais tarde, a suportar enormes prejuízos, impossíveis de remediar Estas dolorosas experiências são frequentes em horticultura e pecuária, devido às inovações técnicas a que estes dois sectores têm estado sujeitos.
O imobilismo em que se encontram a maioria dos serviços de assistência técnica em que por falta de estímulo, más chefias, ou por rotina, senão falta de mentalidade adaptada à época em que vivemos, não garantem aos agricultores o apoio que necessitam dentro deste ultrapassado conceito de acção técnica.
O facto de estar provado, que a assistência técnica aos agricultores, não tem hoje razão de ser. As modernas técnicas de extensão rural, com recurso à animação e participação e o apoio em acções globais, com técnicas de formação vária, exige que aos agricultores seja imediatamente facultada uma nova mentalidade que os coloque na situação de poderem beneficiar, produzindo os alimentos que a Nação necessita.
O atraso verificado na publicação da reforma da Secretaria de Estado da Agricultura e sua entrada em execução, com manifesto receio de que com esta iniciativa viesse a proceder-se de modo idêntico. Neste sector têm-se anunciado algumas medidas, e depois, por razões que desconhecemos, mas certamente com razão, não são publicadas! Este receio, não é só partilhado por nós, grande número de técnicos e agricultores se interroga acerca destas atitudes.
A reforma foi anunciada e criada uma comissão que certamente apresentou algumas conclusões! O atraso na sua publicação vai causando em todo o sector um desânimo, pois as acções que vão iniciar-se não poderão assentar em serviços, que, além de bem estruturados, se encontram imobilizados.
Se pensarmos na lei de orientação agrária e no crédito agrícola poderemos, sem receio, fazer as mesmas considerações.
Quisemos, assim, pressionar para, à luz das discussões, comunicações e conclusões a que chegarmos, mais uma vez darmos a compreender, à semelhança do que sucedeu com a proposta de lei do plantio da vinha que iniciativas isoladas e independentes não terão o impacte económico e social que a Nação exige.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Temos uma experiência pessoal na formação profissional agrícola, levantando-se-nos o problema, se poderíamos ficar indiferentes a um assunto de tão grande importância. Essa experiência, devido ao número de agricultores beneficiados e realizações materiais resultantes, é deveras importante para me poder eximir a tamanha responsabilidade!
Sentirmos, tanto eu como outros colegas, que, numa época em que todos nós falamos de participação, como um meio de aperfeiçoamento humano, com vista a um desenvolvimento global, desejarmos con-

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tribuir para um dispositivo legal que, vindo a servir-se de nós como executores, tenha algo de nós próprios em aceitação e sugestões. Damos a garantia de contribuirmos para uma legislação que assenta na realidade, e não aceitamos um documento mais ou menos bem arquitectado, constituindo um êxito político, mas impossível de executar, por desenquadrado.
A experiência alcançada, e já ia vão alguns anos, tem-me demonstrado e feito compreender da importância da formação profissional agrícola como instrumento de orientação política.
Um técnico experimentado, com elevado poder convincente e grande experiência profissional, poderá orientar a formação profissional, que vai realizando de acordo com a sua própria formação política de base. Um exemplo, o corporativismo agrícola, hoje considerado indispensável ao rápido desenvolvimento da nossa agricultura, como aliás tem sucedido noutros países, e que tanto pode ser aproveitado numa linha de participação com base na entreajuda na procura de benefícios económicos e sociais, como numa linha puramente diferente de política democratizaste de um homem igual a um voto, ou mesmo numa outra orientação colectivista de pura integração sem que haja qualquer tipo de participação financeira.
A nossa agricultura é ainda um centro de virtudes, que convém não deixar destruir. Fazer formação profissional agrícola sem que se conheçam estas realidades, aproveitando experiências e copiando programas de outros países, para, do mesmo modo, serem introduzidos no nosso ambiente agrícola, pode ser extraordinariamente grave. Cada país tem a obrigação de legislar para a realidade do seu ambiente.
No entanto, não vá pensar-se precipitadamente que pretendo criar homens frustrados ou anões intelectuais. Desde que aos agricultores seja facultada a formação de base indispensável a uma normal evolução humana, não haverá receios, por mais fundamentados que possam surgir, razão por que apelo para um enquadramento social a montante e a jusante.
Mas se toda a formação profissional agrícola surge desacompanhada, estritamente técnica e sem um entendimento comum de orientação filosófica, então poderão surgir surpresas inesperadas.
Sei da surpresa que alguns dos Srs. Deputados e outros sentiram ao terem conhecimento de que um técnico dos serviços agrícolas, integrado na Secretaria de Estado da Agricultura, talha feito uni aviso prévio a um assunto da competência desta sem que tivesse havido uma informação anterior. Fi-lo intencionalmente, pois, além de revelar uma maneira de ser que me é própria, não quis sofrer a pressão favorável ou contrária. Sou Deputado eleito pelo meu círculo eleitoral, por mim, pelo que valho de muito ou pouco, respondendo em consciência perante os meus eleitores.
Como técnico, respondo perante os serviços em que me encontro, não vamos, pois, confundir uma coisa com outra!
Para acalmar os ânimos, poderei informar que o «período a partir de 1950 foi muito importante para a agricultura francesa, no que diz respeito ao anseio agrícola e formação profissional, com diversos trabalhos governamentais e debates parlamentares».
A formação profissional agrícola é, efectivamente, uma ferramenta técnica de desenvolvimento, como igualmente o é o ensino técnico-profissional ou a formação profissional acelerada dos operários industriais. Mas, dado o seu impacte político e peso financeiro, merece que a Assembleia Nacional, beneficiando da experiência de alguns dos seus membros e da formação política de todos os Srs. Deputados, possa beneficiar a legislação que venha a permiti-la.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cada um de nós entrou nesta sala com uma determinada missão, consequência da linha de rumo que vinha trilhando na sua vida profissional ou de sociedade.
Assim nos guindámos ao prestígio suficiente, para nos nossos círculos sermos os escolhidos, para na luta árdua que tivemos de travar, e no meu distrito assim foi, chegarmos a esta sala.
Na continuidade da acção anterior, e conforme vontade expressa, é conveniente que cada um continue a ser aquilo que efectivamente é. Esta a linha de orientação estabelecida para num próprio, para me evitar problemas de consciência, de, quando passados quatro anos, à saída de S. Bento, ter a satisfação pessoal de que cumpri e que contribuí para minorar as dificuldades das pessoas que em mim têm acreditado.
Ser-me-ia mais fácil aceitar e ouvir, em género de atitude cómoda de laissez faire, laissez passer. Mas se na minha vida particular e profissional não optei por este caminho, não irei agora aqui escolhê-lo. Só assim, a meu ver, poderemos contribuir para o desenvolvimento do nosso país.
Sr. Presidente: Conforme orientação técnica estabelecida, a Estação Agrária das Caldas da Rainha foi dos primeiros organismos do nosso país a trabalhar voluntariamente em formação profissional junto dos agricultores do Oeste desde 1967, e assim tem continuado, numa acção permanente. A infra-estrutura associativa para a utilização em comum do equipamento mecânico e de comercialização de frutas, a agricultura de grupo e a expansão da pecuária e de novas culturas teve no Oeste a sua origem, nesta intensa acção de formação profissional. As jornadas de divulgação agrícola têm merecido o apoio e compreensão dos vários serviços técnicos e têm feito sentir aos pequenos, médios e, até, grandes empresários a necessidade da técnica como um factor de produção e estão na base da entreajuda, que tem dado os seus frutos.
Criou-se, assim, por um lado, uma élite de agricultores, hoje devidamente evoluídos, e que são os leaderes de uma moderna agricultura que começa a viver-se, por outro lado, deu-se experiência a um corpo técnico com autodomínio, à vontade e projecção, consequência da acção desencadeada.
Foi com imensa satisfação que vimos, mais tarde, o Prof. Eugénio Castro Caldas, presidente do Gabinete de Planeamento da Secretaria de Estado da Agricultura, estabelecer as bases dos cursos de empresários, hoje a cargo da Junta de Colonização Interna. Realizaram-se programas tipo e aproveitou-se a totalidade dos técnicos que haviam ganho experiência.
Igualmente há que referir a colaboração dos organismos de acção católica, encaminhando as populações agrícolas e no estabelecimento e elaboração dos programas mais adaptados às realidades.

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Assim, de modo espontâneo e com base em amizades pessoais, tem-se vindo a manter um movimento de formação profissional agrícola não oficializado com características diferentes mas próximas, que, através das jornadas de divulgação agrícola, já ultrapassa 4500 agricultores.
Face à experiência, aos resultados alcançados e à forte motivação que se consegue junto dos agricultores, e, vamos lá, pelo que verificámos pelo estrangeiro, tem-se feito enérgica divulgação da necessidade de se incrementar a formação profissional. Nos colóquios, seminários, palestras, em jornais e revistas, insiste-se na necessidade de se incrementar a formação profissional agrícola para, de modo rápido e conforme a agricultura regional, arrancarmos, com independência e dignidade, com a nossa agricultura.
Verificamos, pois, com imensa satisfação que valeu a pena a experiência alcançada e a criação do respectivo corpo técnico. Os vários apelos foram atendidos e o Governo, demonstrando uma atitude de compreensão e apreensão em relação à nossa agricultura, foi muito mais longe do que se esperava, anunciando a criação de um instituto especializado para este fim. Outros departamentos governamentais pretenderam fazer formação profissional agrícola, compreendendo a tempo que, para se conseguir algum rendimento, esta deve assentar em quatro aspectos fundamentais existência de agricultores, o que nem sempre é fácil; existência de técnicos profundamente conhecedores dos aspectos que estão tratando; num local próprio com o equipamento, o ambiente e os requisitos indispensáveis e fundamentalmente uma empresa agrícola onde se realizem e concretizem já os ensinamentos e as orientações aconselhados.
Os empresários agrícolas constituem uma categoria profissional sujeita a uma sociologia particular. Fazer formação profissional não é dar aulas, é transmitir a homens, por vezes analfabetos, a experiência e o conhecimento técnico, conseguido-se simultâneamente animá-los no caminho da realização. Para dar aulas é relativamente fácil, pois, partindo-se de uma formação de base, basta prepará-las e ter alunos. Para a formação profissional é necessário dar imediatamente ao agricultor, com o entusiasmo necessário e o realismo conveniente, uma informação que consiga arrancá-lo da dúvida e desconfiança que lhe são peculiares.
Os departamentos referidos compreenderam que não estavam apetrechados em meios, e, por tal, têm-se limitado a pequenas e pouco significativas iniciativas, segundo é do meu conhecimento. Ficaram assim os vários serviços da Secretaria de Estado da Agricultura, que, aproveitando do entusiasmo e dinamismo de alguns dos seus técnicos, têm continuado, por vezes com incompreensões de vária ordem, a fazer formação profissional.
Sr. Presidente no nosso país existem 813 640 explorações agrícolas, das quais mereceram acção técnica com a introdução de inovações 26%, continuando ainda no abandono 74%. Com áreas compreendidas entre 0,5 ha e 20 há, onde se incluem 598 920 explorações das de mais interesse económico e social, 73% da sua totalidade continuam ainda em situação de deserto técnico.
Os serviços agrícolas têm-na praticado há longos anos, adentro do velho e ultrapassado conceito de assistência técnica, com cursos de podadores, lagareiros, fruticultores e viticultores, pois reconhecia-se ser uma atitude específica das suas atribuições. Não poderei esquecer que assim se arrancou com a fruticultura, com um exemplo de persistência, de amor de trabalho, dedicação à causa pública e formação técnica do investigador Prof. Vieira Natividade, que compreendia ser muito pouco esta actividade técnica. Dizia-nos então «Escrevi há tempos que um dos graves erros dos serviços agrícolas tem sido preocuparem-se apenas em levar a técnica aos campos e muito pouco em preparar os campos para receberem a técnica. Creio que isto corresponde ainda a uma pesada verdade.
O baixo nível de instrução do pequeno agricultor, numa mentalidade de todo desajustada ao progresso técnico, económico e social dos nossos dias, favorece a subsistência de um individualismo que terá, no campo agrário, funestas consequências. Por outro lado, a falta de uma assistência técnica especializada, dinâmica, eficiente e um fundo desinteresse nacional pelas questões agrícolas conduziram, em muitos casos, à descrença e à desconfiança nos técnicos e nas técnicas e mais levaram o agricultor a isolar-se no seu pequeno mundo.
Tarefa ingrata é, pois, criar uma nova mentalidade no nosso ambiente agrário! Apesar disso, tudo quanto se faça para esclarecer a lavoura constitui obra meritória, pois só a perseverança na batalha consentirá que se realize o milagre que a água mole opera na pedra dura [. ]
Estas ideias, escritas em 1966, reveladoras de um conhecimento profundo da situação da nossa agricultura, estão ainda actualizadas para a quase totalidade do espaço português.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: As sugestões de Vieira de Natividade e de tantos outros que sentiram do mesmo modo as mesmas dificuldades vão começar a deixar de existir, pois a acção de promoção social a realizar pelo Serviço de Formação Profissional Agrícola colocará o agricultor português no lugar de há muito ambicionado. O sector agrícola, igual a qualquer outro, tem sido visto como o filho bastardo na grande família da comunidade nacional. Se bem pensarmos, e sem que tenhamos de recorrer a tratados de sociologia ou grandes esforços de inteligência, ainda compreendemos que a agricultura, actividade primária de todo o processo produtivo, é ainda a base de uma economia em progresso. É a agricultura a fornecedora de matérias-primas para a alimentação humana e animal em natureza ou para a indústria alimentar; fornecedora igualmente de mão-de-obra em excesso para o desenvolvimento industrial; consumidora exclusiva de muitos produtos manufacturados da actividade industrial, tem injustamente sido o suporte do desenvolvimento industrial da grande maioria dos países que se lançaram na senda do progresso. O nosso país, na medida em que ainda não esteve sujeito à acção desgastante do desenvolvimento materialista, é, podemos dizer, honesta e francamente, o «relicário» das virtudes do nosso povo.
Sr Presidente: Vai criar-se um sector especializado de formação profissional agrícola, o que chegou ao nosso conhecimento através do estudo do projecto do IV Plano de Fomento e da proposta de lei de autorização de receitas e despesas para 1974 .Ficamos assim com a garantia de que no ano em curso terá vida, e certamente entrará em funcionamento.

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Desculpem-me, Srs. Deputados, o entusiasmo que me assiste, mas um tema que já ocupou alguns anos da minha vida e me permitiu estabelecer das mais intensas relações humanas não poderá ser tratado de ânimo leve.
No concerto das acções de desenvolvimento global, com base na noção do ser e ter mais, e em relação à formação profissional, há que ter em conta iniciativas a montante e consequências e exigências a jusante. De outro modo, surge um serviço igual a qualquer outro, com uma elevada frota de viaturas, funcionários e funcionários mais ou menos enquadrados e que vive e sobrevive à custa da condescendência de outros serviços mais antigos e com técnicos mais conhecedores e mais dinâmicos. Em suma, será mais uma iniciativa falhada, cara ao Estado!
A montante, devemos ter a preocupação de compreender o agricultor isolado ou já em associação, dentro da sua comunidade, numa tentativa de inventário de relações, de auscultação de necessidades e, fundamentalmente, de prospecção de leaders. Aqui, a colaboração com as Casas do Povo e os grémios da lavoura é fundamental.
Os agentes de serviço social terão aqui um campo de actividade novo, enquadrados numa óptica sociológica, para se poder atender a todas as perspectivas que surjam, na procura de uma acção continuada e de modo a cobrir o espaço, não autorizando tecnicamente o aparecimento de desertos por incapacidade de actuação.
Para além destas razões e outras compreensíveis, há a considerar ainda a preocupação que poderá resultar do impacte frontal de jovens licenciados, sem maturidade política e experiência da vida, com um ambiente ainda são, de certo modo conservador, e ainda voltado para a inovação pelo peso da ancestralidade. A desconfiança, característica do agricultor, que lhe advém de temperamento próprio e da ausência de uma política realista poderá, por um lado ser uma defesa natural ao impacte referido, mas poderá também ser porta aberta às ideias fáceis.
Os regimes políticos estáveis sempre contaram com a grande força eleitoral do meio agrário, razão por que alguns países têm na sua política económica agrícola auxílios excessivos!
Por mim, sou um homem dado ao progresso, tendo-me como um agente fiel do desenvolvimento, mas, pela minha formação profissional, vivo com os pés assentes na terra. Neste trabalho, mais do que em qualquer outro, só conseguirão algum êxito pessoas experimentadas, esclarecidas e, se possível, aceites no meio local.
De outro modo, e numa antevisão precipitada, assistiremos ao desequilíbrio de conceitos que advirão de novas mentalidades, consequência das perspectivas políticas em que os assuntos e temas poderão ser apresentados.
Exige-se, pois, muita prudência, dado que o género humano evolui progressivamente, e não de modo brusco e rápido, em linhas de descontinuidade, como alguns desejariam. Tem o Governo um plano de fomento com uma base política por nós aqui aprovada e apoiada nas coordenadas da nossa história. Esta a realidade que interessou preservar, através de um ideário igualmente aceite em plenário nacional.
A jusante, depois de os agricultores terem frequentado os cursos sujeitos a metodologia própria, teremos de ter em linha de conta todo o acompanhamento exigido, não só sob o ponto de vista técnico, mas também financeiro, e fundamentalmente social. De outro modo, caímos nas frustrações que redundam sempre no êxodo agrícola ou na emigração. Verificamos fàcilmente e da maneira que é possível dar a compreender em limitado espaço de tempo e numa comunicação desta índole que, à partida e no fim, o enquadramento social é considerado indispensável. Estamos num Estado dito e tido como social, tenhamos, pois, estes aspectos em linha de conta.
Sr Presidente: Face ao exposto, verificamos que a criação do Instituto de Formação Profissional Agrícola, além de um acto de mera atitude técnica com vista à satisfação de uma necessidade premente e imediata, reveste aspectos da competência do foro político do domínio desta Assembleia para os definir e do Governo para os executar. A coordenação, com finalidades de complementaridade, englobará vários departamentos ministeriais e exigirá uma reforma global para que os organismos e instituições várias da Secretaria de Estado da Agricultura possam, além das missões próprias, poder atender à cobertura técnica, financeira e social referida.
Sr. Presidente: Congratulo-me com esta iniciativa, pois sou das pessoas que pensam que em serviços velhos, sujeitos à rotina que daí advém, a criação de instituições novas, quando administradas por pessoas dinâmicas e conhecedoras, constitui uma lufada de juventude, de que só se beneficia. Vivemos numa época caracterizada pela exigência de um dinamismo que consiga adaptar as instituições a situações constantemente novas.
A nossa agricultura vai ficar enriquecida! Creio que todos vamos ficar contentes. Um instituto novo vai nascer para nos dar aquilo que nunca tivemos, pois nunca foi feita a revolução técnica. Apelo para todos os serviços, técnicos e agricultores, que dêem as mãos para que ele possa cumprir e satisfazer os nossos anseios.
Foi partindo destes juízos e preocupações que realizei o presente aviso prévio, que deixo à Assembleia Nacional, para, à luz dos superiores interesses nacionais, facultar à nossa agricultura a promoção económica, social e humana que necessita.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Alberto de Alarcão: - Peço a palavra, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: - V. Exa. pediu a palavra para...

O Sr. Alberto de Alarcão: - Para um requerimento, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: - Nesta altura não me parece oportuno. Talvez seja melhor ouvirmos primeiro o relatório das Comissões convocadas para o estudo do aviso prévio.
Vai ser lido.

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Foi lido. É o seguinte.

Relatório da Comissão de Educação, Cultura e Interesses Espirituais e Morais e da Comissão de Economia acerca do aviso prévio sobre formação profissional agrícola.

A Comissão de Educação, Cultura e Interesses Espirituais e Morais e a Comissão de Economia, ouvidas, nos termos do artigo 67.º do Regimento da Assembleia Nacional, sobre o aviso prévio referente à formação profissional agrícola, tendo estudado os problemas relativos a assunto de tanta relevância cultural e económica e tomado em consideração, quer os fundamentos e proposições formulados pelo Sr. Deputado avisante, quer a exposição feita às Comissões pelo Sr. Secretário de Estado da Agricultura, apresentam o relatório em que, de modo sucinto, se contêm as conclusões a que chegaram.
A Assembleia Nacional debateu largamente, na última sessão legislativa, os importantes problemas suscitados pela proposta de lei respeitante à Reforma do Sistema Educativo, de que resultou a Lei n º 5/73, de 14 de Julho.
Foram então apreciadas as questões que mais directamente se relacionam com a formação profissional, a todos os níveis e na multiplicidade dos seus aspectos.
Este diploma deu o merecido relevo à formação profissional, ao definir as bases gerais dos regimes jurídicos que passaram a constituir a Reforma do Sistema Educativo Nacional. Na verdade, na sua base IV, essa lei estabelece que a educação escolar, incluída no sistema educativo conjuntamente com a educação pré-escolar e a educação permanente e a realizar através do sistema escolar, abrange, além dos ensinos básico, secundário e superior, a formação profissional.
No n.º 4 dessa base prevê-se ainda que «a formação profissional destina-se aos que possuam a habilitação do ensino básico ou do curso geral ou complementar do ensino secundário e optem por esta modalidade de ensino», ao mesmo tempo que o n.º 5 considera «a formação, a actualização e o aperfeiçoamento cultural, científico e profissional» finalidades implícitas da própria educação permanente.
A Assembleia Nacional, para além do que se continha na proposta de lei e no douto parecer da Câmara Corporativa, entendeu que não poderia deixar de incluir-se a formação profissional na educação escolar, e por isso no sistema escolar que a promove, mas admitiu também que essa formação fosse integrada no sistema de educação permanente, ou assegurada mediante a conjugação de esforços dos sectores público e privado, em obediência a normas e programas a estabelecer pelo Governo ou por ele homologados.
Com efeito, para além das responsabilidades directas que ficaram consignadas ao Ministério da Educação Nacional através de cursos de formação profissional integrados no âmbito da educação escolar, ou de outros, nomeadamente no vasto domínio da educação permanente, a reforma do sistema educativo estabelece que outras entidades públicas e privadas possam organizar, coordenadamente, cursos com finalidades idênticas.
O presente aviso prévio visa precisamente um tipo de formação profissional previsto no n.º 4 da base XII da referida lei. E não pode deixar de se considerar oportuno o problema, que tão louvavelmente foi apresentado à Assembleia pelo Sr. Deputado avisante.
Ninguém porá em dúvida, por certo, o alto interesse de que se reveste, para o desenvolvimento económico e social do País, a promoção do mundo rural e a modernização da agricultura pela valorização técnica e cultural da população agrícola.
Aliás, o IV Plano de Fomento é bem expressivo ao considerar prioritárias as acções de formação profissional agrária. A mesma preocupação ressalta do relatório da lei de autorização das receitas e despesas para 1974.
Nesta linha de rumo, definida em textos legais e programas do Governo, compreende-se que os departamentos públicos com responsabilidades no sector da agricultura dêem activa cooperação à política educativa nacional no campo da formação profissional agrícola extra-escolar.
A este propósito, é justo referir os esforços que o Governo, pela Secretaria de Estado da Agricultura, tem envidado para dar à formação profissional o lugar que lhe cabe no contexto da política da educação e da política agrária.
Importa, contudo, reconhecer que a acção que neste campo vem sendo desenvolvida não tem estado sujeita a uma coordenação racional eficaz. Com efeito, afigura-se indispensável evitar a dispersão e sobreposição de esforços, para o que se impõe sejam confiadas a um único serviço, convenientemente especializado e com a necessária autonomia, as difíceis e complexas tarefas ligadas à formação profissional agrícola extra-escolar. Por outro lado, convirá que esta actividade seja realizada de modo especial, em plena cooperação com o Ministério da Educação Nacional, que, como se compreenderá, está em condições de poder proporcionar efectivo apoio pedagógico.
Idêntica orientação há-de seguir-se no entendimento a estabelecer não só com o Ministério das Corporações e Segurança Social e outros departamentos do Estado, mas também com os organismos corporativos e quaisquer outras instituições que, pelas suas finalidades e meios de acção, possam dar colaboração útil à política de formação profissional.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Abril de 1974 - Pelas Comissões: Henrique Veiga de Macedo, presidente da Comissão de Educação, Cultura e Interesses Espirituais e Morais - José João Gonçalves de Proença, presidente da Comissão de Economia - Júlio Dias das Neves, relator.

O Sr. Presidente: - Estou agora preparado para ouvir o requerimento do Sr. Deputado Alberto de Alarcão.

O Sr. Alberto de Alarcão: - Sr. Presidente: Requeiro a generalização do debate.

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O Sr. Presidente: - Concedo a generalização do debate. Os Srs. Deputados que desejarem usar da palavra nesta generalização tenham a bondade de se inscrever, pois espero que possamos dedicar parte da ordem do dia de amanhã a esta matéria.
Antes de encerrar a sessão, peço a atenção de VV. Exas. prevejo que na próxima quinta-feira se possa iniciar a discussão na generalidade da proposta de lei relativa à promoção e defesa do consumidor.
Peço aos Srs. Deputados que desejam intervir nesta discussão o favor de se prepararem para esta agenda.
Amanhã haverá sessão à hora regimental, tendo como ordem do dia, na primeira parte, a continuação da discussão das contas públicas do ano de 1972, na segunda parte, o debate sobre o aviso prévio relativo à formação profissional agrícola.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 40 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Augusto Domingues Correia.
Fernando Guilherme Aguiar Branco da Silva Neves.
Francisco Domingos dos Santos Xavier.
João António Teixeira Canedo.
João Paulo Dupuich Pinto de Castelo Branco.
José Fernando Nunes Barata.
José João Gonçalves de Proença.
José de Mira Nunes Mexia.
José de Vargas dos Santos Pecegueiro.
José Vieira de Carvalho.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Manuel Valente Sanches.
Ricardo Horta Júnior.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Álvaro José Rodrigues de Carvalho.
Álvaro de Mendonça Machado de Araújo Gomes de Moura.
Álvaro Pereira da Silva Leal Monjardino.
Aníbal de Oliveira.
António Calapez Gomes Garcia.
Armindo Octávio Serra Rocheteau.
Camilo Lopes de Freitas
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Fernando António Monteiro da Câmara Pereira.
Francisco José Correia de Almeida.
Francisco José Roseta Fino.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Manuel Alves.
José da Silva.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís António de Oliveira Ramos.
Manuel Fernando Pereira de Oliveira.
Manuel Ferreira da Silva.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Oscar Antoninho Ismael do Socorro Monteiro.
Rómulo Raul Ribeiro
Sebastião Alves.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA PREÇO DESTE NÚMERO 8$80

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