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I Série - Número 59 Sexta-feira, 30 de Maio de 1980

DIÁRIO da Assembleia da República

I LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1979-1980)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 29 DE MAIO DE 1980

Presidente: Exmo. Sr. José Rodrigues Vitoriano
Secretários: Exmos. Srs. Manuel Henrique Pires Fontoura
Bento Elísio de Azevedo
José Manuel Maia Nunes de Almeida
João Daniel Marques Mendes

SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberto a reunião às 10 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, da apresentação de vários requerimentos e do recebimento de respostas a alguns outros e da entrada das petições n.ºs 285/I e 286/I.
Em declaração política, o Sr. Deputado João Mateus (PPM) falou sobre as infra-estruturas do desporto na região de Viseu.
O Sr. Deputado Azevedo Soares (CDS), também em declaração política, criticou a acusação dos partidos da oposição. Respondeu no fim a protestos dos Srs. Deputados Helena Cidade Moura (MDP/CDE), Almeida Santos (PS), Jorge Sampaio (PS) e Veiga de Oliveira (PCP) e a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Igrejas Caeiro (PS).
Foi votado e aprovado um voto apresentado pelo PSD, CDS e PPM sobre acções terroristas levadas a cabo no nosso país nos últimos tempos. Intervieram no debate, a diverso título (incluindo declaração de voto), os Srs. Deputados Sanches Osório (CDS), Almeida Santos (PS), Meneres Pimentel (PSD), Angelo Correia (PSD), Lino Lima (PCP), Ferreira do Amaral (PPM) e Herberto Goulart (MDP/CDE).
Foi lido um voto de saudação do PCP relacionado com a defesa e promoção dos direitos da criança.
Ordem do dia. - Foi apreciada e aprovada por unanimidade uma proposta de resolução do PCP relativa à criação da Faculdade de Direito na Universidade do Porto, tendo o Sr. Deputado Lino Lima (PCP) procedido à sua apresentação. Em declaração de voto, usaram da palavra os Srs. Deputados Oliveira Dias (CDS), Helena Cidade Moura (MDP/CDE), Carlos Alberto de Sousa (PS) e Manuel Moreira (PSD).
Depois de lido pelo Sr. Deputado Alexandre Reigoto (CDS), foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de um Deputado do PSD.
Continuou a discussão conjunta na generalidade das propostas de lei n.ºs 284/I, 285/I, 303/I e 304/I e dos projectos de lei n.ºs 447/I e 448/I tendo intervindo, a diverso título, os Srs. Deputado Lucas Pires (CDS), António Vieira de Freitas (PS), Almeida Santos (PS), Medeiros Ferreira (DR), Vital Moreira (PCP), Amândio de Azevedo (PSD), Ferreira do Amaral (PPM), José Maria da Silva (PSD), Herberto Goulart (MDP/CDE), Francisco Oliveira (PS), Ourique Mendes (PSD), Armando Bacelar (PS), Jaime Gama (PS), Helena Roseta (PSD), João Vasco Paiva (PSD), Jorge Leite (PCP), Veiga de Oliveira (PCP), Alcino Barreto (PSD) e Jorge Sampaio (PS).
Seguidamente foram aprovadas as propostas de lei n.ºs 295/I, 300/I, 284/I, 285/I, 303/I, 304/I e 296/I, sendo rejeitados os projectos de lei n.ºs 447/I e 448/I.
Em votação final global, foi aprovada a proposta de lei n.º 290/I, fazendo declaração de voto os Srs. Deputados Ilda Figueiredo (PCP), Nicolau Gregório de Freitas (que manifestou também o seu pesar pela morte do artista madeirense Max, ao que se associou o Sr. Deputado do PS António Viera de Freitas), Germano Domingues (PSD) e Herberto Goulart (MDP/CDE).
A requerimento do PS, que foi aprovado, baixaram as propostas de lei n.ºs 284/I, 285/I, 296/I, 303/I e 304/I à Comissão de Assuntos Constitucionais para discussão e votação na especialidade.
A Mesa anunciou a entrada de um pedido de interpelação ao Governo, do PCP, para abertura de um debate de política geral sobre os problemas relacionados com o bem-estar dos portugueses, dos projectos de lei n.ºs 491/I e 492/I e do pedido de ratificação n.º 328/I, também do PCP.

O Sr. Presidente encerrou a reunião às 21 horas e 23 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada. Eram 10 horas e 25 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

Alcino Cabral Barreto.
Álvaro Sarros Marques de Figueiredo.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.

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António Alberto Correia Cabecinha.
Amónio Augusto Lacerda de Queiroz.
António José Ribeiro Carneiro,
António José dos S. Moreira da Silva.
António Maria de O. Ourique Mendes.
Amónio Monteiro às Freitas.
Carlos Manuel Pereira de Pinho.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel da Cunha Dias.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Fernando Monteiro do Amaral.
João António Sousa Domingues.
João Baptista Machado.
João Vasco da Luz Botelho de Paiva.
Joaquim Manuel Gaspar Mendes.
José Baptista Pires Nunes.
José Henrique Cardoso.
José Luís Figueiredo Lopes.
José Maria da Silva.
Luís António. Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel Antunes da Lomba.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Henriques Pires Fontoura.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Mário Dias Lopes.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Miguel Camolas Pacheco.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Valdemar Cardoso Alves.

Partido Socialista (PS)

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António José Vieira de Freitas.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Alberto Costa de Sousa.
Carlos Cardoso Lage.
Edmundo Pedro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Francisco Cardoso P. de Oliveira.
Francisco Igrejas Caeiro.
Frederico A. F. Handel de Oliveira.
Herculano Rocha.
Joaquim José Catanho de Meneses.
José Gomes Fernandes.
José Maria Parente Mendes Cadinho.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Manuel Joaquim de M. Pires dos Santos.
Manuel José Bragança Tender.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Rodolfo Alexandrino Susano Crespo.

Partido Comunista Português (PCP)

Adalberto António de V. Casais Ribeiro.
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Dias Lourenço da Silva.
Carlos Alberto do C. da Costa Espadinha.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Fernando Freitas Rodrigues.
Francisco Miguel Duarte.
Hélder Simão Pinheiro.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Victor Baptista G. de Sá.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Casimiro Sousa Correia.
José Ernesto I. Leão de Oliveira.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Josefina Maria Andrade.
Maria lida da Costa Figueiredo.
Marina Grou Lanita.
Victor Henrique Louro de Sá.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS)

Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alfredo Albano de C. de Azevedo Soares.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
António Ferreira Pereira de Melo.
António Mendes Caravalho.
Artur Fernandes.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Isilda Silva Barata.
João Daniel Marques Mendes.
João José Magalhães F. Pulido de Almeida.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Eduardo Fernandes Sanches Osório.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís António Matos Lima.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Manuel Baeta Neves.
Manuel Cunha Mota.
Manuel Eugênio P. Cavaleiro Brandão.
Marcelino Boaventura da S. Chaves.
Rogério Ferreira Monção Leão.
Partido Popular Monárquico (PPM)
Augusto Martins Ferreira do Amaral.
Henrique José Barrilaro Ruas.
João Carlos Osório Almeida Mateus.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores

Armando Adão e Silva.

Movimento Democrático Português

Herberto de Castro Goulart da Silva.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 107 Srs. Deputados. Temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 40 minutos.

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ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Moção

Dos trabalhadores da Equimetal - Divisão Metalsines, em que exigem a demissão da administração como solução para que sejam resolvidos os problemas existentes.

Carta

De Manuel Joaquim Leonardo, residente no Canadá, tecendo considerações acerca da proposta de aliteração à Lei do Recenseamento Eleitoral.

Ofícios

Do Sindicato Têxtil do Distrito do Porto, expondo a situação existente na firma Silva e Corte Real, Lda. - Fábrica de Malhas Jomar, solicitando que seja procurada uma solução para os problemas existentes.
Do Movimento das Mulheres Socialistas a enviar um comunicado referente à engenheira Maria de Lurdes Pintasilgo.
Do Sindicato dos Trabalhadores Têxteis dos Distritos do Porto e Aveiro - Secção de Santo Tirso, a enviar uma moção de reformados de Rebordões, na qual solicitam que sejam tomadas varias medidas de carácter económico e social.
Da União dos Sindicatos de Coimbra - CGTP/IN, a enviar uma moção na qual manifestam o apoio e solidariedade aos trabalhadores em luta pela negociação dos contratos colectivos de trabalho.
Dez ofícios de outros tantos órgãos autárquicos a enviar moções em que exigem a aplicação integral da Lei das Finanças Locais.

O Sr. Secretário (Pires Fontoura): - Vou agora proceder à leitura dos requerimentos que foram apresentados na penúltima reunião: ao Ministério da Agricultura e Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Angelo Correia; à Secretaria de Estado da Comunicação Social, formulado pelos Srs. Deputados Zita Seabra, Jorge Lemos, Veiga de Oliveira, Alda Nogueira e Carlos Brito; ao Ministério da Justiça e à Secretaria de Estado da Cultura, formulados pelos Srs. Deputados Armando Bacelar, Carlos Sousa, Agostinho Domingues. Bragança Tender e Handel de Oliveira; ao Ministério do Trabalho e á Secretaria de Estado da População e Emprego, formulado pelos Srs. Deputados Jerónimo de Sousa e Herberto Goulart; ao Ministério da Indústria e Iconologia, formulado pelos Srs. Deputados Sousa Marques e Carlos Espadinha; ao Governo, formulado pelos Srs. Deputados Herberto Goulart e Luís Catarino, ao Ministério dos Assuntos Sociais, formulado pelo Sr. Deputado Mendes Godinho; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e do Trabalho, formulado pelos Srs. Deputados Jerónimo de Sousa e Custódio Gingão; ao Ministério do Trabalho, formulado pêlos Srs. Deputados José Leitão e Marcelo Curto.
Foram recebidas as seguintes respostas e requerimentos: do Ministério da República da Região Autónoma dos Açores, ao requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Jorge Lemos, na sessão de 28 de Março último; do Ministério dos Negócios Estrangeiros, aos requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados Alda Nogueira, Carlos Carvalhas, Custódio Gingão, Francisco Oliveira e Jaime Gama, nas sessões de 18 e 27 de Março, respectivamente; do Ministério da Justiça, ao requerimento apresentado pelos Srs. Deputados Herculano Pires, Almeida Santos, Carlos Lage e José Nisa, na sessão de 27 de Abril próximo passado; das Secretarias de Estado da População e Emprego e da Indústria Transformadora, aos requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados Hélder Pinheiro, Ilda Figueiredo, Alberto Jorge e João Amaral, nas sessões de 7 de Fevereiro, 11 e 13 de Março, respectivamente; da Secretaria de Estado do Trabalho, ao requerimento apresentado pelos Srs. Deputados Vital Moreira, Alberto Jorge, Jerónimo de Sousa e António Mota, na sessão de 11 de Abril último; da Secretaria de Estado da Reforma Administrativa, ao requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Rui Pena, na sessão de 23 de Janeiro, passado; da Secretaria de Estado do Fomento Agrário, ao requerimento apresentado pelo Sr. Deputado António Chagas, na sessão de 28 de Março último; do Ministério do Comércio e Turismo, aos requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados Vítor Sá José Casimiro, Pires Fontoura, Amândio de Azevedo e Daniel Bastos, nas sessões de 22 de Fevereiro e 3 de Março, respectivamente. Deram entrada na Mesa as seguintes petições: N.° 285/I, apresentada por Maria Luísa Matos Duarte Cruz Gama Barreto e outros (Comissão Unitária de Mulheres do Lumiar - Lisboa), que baixou à 6.ª Comissão.
N.° 286/I, apresentada por João Velho Madeira, Viseu, que baixou à 2.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Comunicaram à Mesa que desejavam produzir declarações políticas o PPM e o CDS. Tem a palavra o Sr. Deputado João Mateus.

O Sr. João Mateus (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Recente entrevista do Sr. Secretário de Estado da Juventude e Desportos a um trissemanário desportivo, focando o problema do fomento do desporto, e um não menos recente despacho proferido pelo mesmo governante em processo de impugnação de uma candidatura a alto cargo federativo do futebol justificam que a esta Assembleia venham dois ou três casos da maior acuidade relacionados com a matéria desportiva.
Na verdade, e em primeiro lugar, dos casos se nos apresentam de ofensa frontal à Constituição da República, que no seu artigo 46.° veio consagrar em toda a sua amplitude a liberdade de associação, expressamente determinando que qualquer associação, legalmente constituída, prossegue livremente os seus fins sem interferência das autoridades públicas; o que obrigou a alterar ou mesmo eliminar vários dispositivos do Código Civil, designadamente fazendo desaparecer a figura do reconhecimento individual pelo Governo ou pelos seus representantes nos distritos, a necessidade de autorização para quaisquer alterações estatutárias e o poder que o Governo detinha de determinar a extinção das pessoas colec-

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tivas e de fixar o destino dos seus bens, como consequência disso resultando que apenas aos tribunais cabe agora o poder de, nos casos previstos na lei, dissolver ou suspender as actividades de uma qualquer associação.
as, se assim é na Constituição e no Código Civil, normas continuam a existir que, ao arrepio da lei constitucional, impõem uma aberrante tutela do Governo às associações desportivas.
É o caso do artigo 3.° do Decreto n.° 46 476, de 9 de Agosto de 1965, confirmado pelo Decreto n.° 48 887, de 1 de Março de 1969, que fixa em um ano o mandato dos corpos gerentes das federações e associações desportivas, apenas para as primeiras permitindo que, por despacho superior, seja esse prazo alargado até três anos (e não há muitos meses ainda, no caso concreto da Federação Portuguesa de Futebol, se fez, por parte do Ministério da Educação, uso desta norma), e é, mais gritante ainda, o caso também do Decreto n.° 32 946, de 3 de Agosto de 1943, mantido em vigor pelo Decreto-Lei n.° 553/77, de 31 de Dezembro, na redacção da Lei n,° 63/78, de 29 de Setembro, que impõe a necessidade de sanção ministerial na eleição dos corpos gerentes das associações desportivas. Mas esta ofensa à lei constitucional é, assim o cremos, fruto da pretensão, por parte de certos Governos posteriores ao 25 de Abril, de manterem, por herança do Estado Novo, um poder tutelar que agora o Sr. Secretário de Estado deu mostras de querer rejeitar no caso da eleição para a presidência da FPF.
E quem deixará de verificar que o desporto, e muito particularmente o futebol, vêm, ao fim e ao cabo, servindo para dar ao Estado receitas vultosas com que este vai satisfazer encargos que a ele, sim, competia cobrir? E que tudo isto se faz em prejuízo daqueles muitos que ao desporto se devotam com suas vidas e seus bens?
Veja-se o caso do Totobola, em que ao futebol, que o justifica, apenas couberam em 1978 menos de 86 000 contos num lucro líquido total de mais de 739 milhões de escudos, o que dá, em percentagem, 11,6%, beneficiando-se, em contrapartida, varadas instituições, como o Inatel, Misericórdias, Ministérios vários, etc., e veja-se o caso, a roçar o escândalo, do policiamento em que, não poucas vezes, a receita dos jogos não chega para pagar os gratificados aos agentes da PSP e da GNR que, em número discricionariamente fixado pelos respectivos comandos, para ali são enviados, chegando-se, após a publicação do Decreto-Lei n.° 94/79, de 20 de Abril, ao cúmulo de se impor (policiamento pago em jogos em que as entradas são gratuitas.
Mas como se isto não bastasse para se ver cometem sido posto em execução o que declara o artigo 79.º da Constituição da República e como se promove e estimula a prática e difusão do desporto, finalidade, para a qual, da mencionada receita do Totobola em 1978, foram retirados mais de 189 000 contos, vejamos o que vem o Estado fazendo no campo das infra-estruturas desportivas e do apoio aos clubes, em especial àqueles mais modestos e em exclusivo dedicados ao amadorismo e ao desporto juvenil.
Porque de Viseu sou, de Viseu falarei: 24 concelhos, 335 freguesias, mais de 400 000 habitantes, cerca de 70 clubes em actividade no que concerne ao futebol, com atletas inscritos, nesse desporto a caminho dos 3 milhares. E de infra-estruturas? Uma pista de atletismo em Viseu, um pavilhão gimnodesportivo na mesma cidade, duas piscinas ambas municipais, uma ainda nessa cidade e outra em Tarouca, campos de futebol que servem para vários clubes ao mesmo tempo, e citarei Viseu, em que o Estádio de Fontelo, com o campo exterior, aberto, serve ao Académico, ao Viseu e Benfica, ao Repenses, ao Ranhados, ao Abraveses, ao BUB e ao Travassos, só não servindo ao Vildemoinhós que, graças ao esforço ingente desenvolvido pelos seus dirigentes e associados, conseguiu ter um campo próprio, aliás com acesso verdadeiramente incrível e Lamego, onde o campo dos Remédios, que a certa altura se chegou a oferecer ao Inatel, teria de servir para quatro clubes se não se houvesse recorrido recreio do liceu "promovido" a campo de futebol...
E que apoio se dá a clubes como o cracks de Lamego, nascido depois do 25 de Abril, e que já conquistou uma taça nacional de juvenis, ou o Repesenses, que lhe procura seguir o exemplo, para não falar de tantos outros que não podem dedicar-se aos jovens das suas terras por absoluta penúria de meios. Pobres directores os seus a que não sei o que faltará para merecerem todas as medalhas e louvores que outros recebem.
E que apoios teve a própria Associação de Futebol quando, na última época, ultrapassando a sua actividade normal, se abalançou a organizar um torneio infantil?
Será que a todos estes anónimos cabouqueiros se vai responder com um projecto, elaborado há largos meses pelo gabinete de juristas da Secretaria de Estado para o combate à violência no desporto, que se proibia ou preconizava a proibição de novos campos que não fossem desde o início vedados com rede de arame e dotados de túneis de acesso para as equipas intervenientes? Será que neste pais existem clubes como o Benfica, o Sporting ou Porto, ou será que o Estado vai pagar essas obras? Será que em Lisboa se ignora como numa qualquer aldeia desta nossa terra se vai edificando um campo ao longo de anos de esforços sem conta? E será também que se lhes vai responder com medidas complicativas e emperrantes, como a de se criar um centro de medicina desportiva em Lamego para o subordinar ao do Porto, quando as sedes das respectivas associações dos desportos e do futebol são em Viseu?
Sinceramente, para o meu partido, nada disto dá para entender...
Vem o Sr. Secretário de Estado revelando sinais além de homem que foi, e é, do desporto, ser pessoa de bom senso. Que auscultados os interesses em confronto em cada caso, decida e faça pelo melhor é o que se lhe pode e deve exige.
Revogue quem de direito as leis que atentam contra a Constituição, para que não haja tentações de as utilizar, cumprindo-se o disposto no artigo do citado Decreto-Lei n.° 553/77, e tomem-se, na medida do possível, medidas razoáveis de aproveitamento e extensão do que ainda há de bom nesta terra, ajudem-se os que por carolice vêm fazendo alguma coisa de válido e haja a coragem de recusar projectos de fachada. A nossa juventude o reclama e a decência o exige.

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Se cesteiro que faz um cesto faz um cento, a terra que, sem apoios, de um Carlos Lopes pode, com eles dar um cento e, como ela, muitas outras e, quando mesmo os não dessem, a simples garantia do direito ao desporto é já um premo que por si só justificara a conjugação de esforços de todos os homens de boa vontade. Assam haja a modéstia suficiente para trabalhar em conjunto e recusar tendências hegemónicas.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, também para uma declaração política, o Sr. Deputado Azevedo Soares.

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A referência indiferenciada a «oposição» e «oposições», quer peja maioria, quer pela oposição, não é algo que lenha a ver com imanas incorrecções terminologias, antes traduz, ora uma análise serena dos factos, ora uma atitude voluntariosa perante a história. E se neste plano também nós gostaríamos de falar em ao posições», quando confrontados com os factos que temos que falar em «oposição».
Na verdade, se. observados do exterior, o PC, o PS e o MDP apresentam-se como uma e a mesma realidade, pose embora as piedosas manifestações de autonomia.
E é precisamente na presença e no comportamento do MDP nesta Assembleia que essa realidade se toma mais nítida. Entrando nesta Câmara pelas portas da APU, o MDP é, como há tempos aqui referi, uma estafada, e caduca forma de mistificação política e capa do disfarce eleitoral do PC. Mas o seu comportamento, cordato, civilizado, balanceando-se entre o PC e o PS, é o instrumento que aquele utiliza para eliminar o fosso que entre ambos existe, O MDP é assim, a serpente: que tenta ou a sereia que encanta, e pena é que o PS não tenha sabido resistir à tentação ou ao encantamento.

Protestos do PS.

O MDP é, na realidade das coisas, uma extensão do PC e, na aparência dos factos, um limite do PS. Funciona como válvula num sistema de vasos comunicantes. Confere realidade colectivista ao PS e aparência democrática ao PC.

Aplausos do CDS. do PSD e do PPM.

A unidade na oposição é evidente; o reflexo da sua imagem é o MDP.
Mas, porque a história desenvolve não na aparência dos factos, mas na substância das coisas, o PS perdeu já a sua autonomia ideológica e, estratégica e, simultaneamente, perdeu a sua própria identidade

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Não me diga! ...

O Sr. Carlos Candal (PS): - Põe-se um anúncio a ver se aparece!...

O Orador: - Não são os homens de Paris, de Argel ou da Suíça que dirigem o partido, mas sim os tecnocratas de Lisboa e aqueles que encontraram no PS o meio de realizar o seu projecto, tão claramente expresso o tão ardorosamente defendido até à sua. recente, e em bloco, entrada no partido. De um partido maior ou menor, com ou sem afianças, resta-nos uma coligação de ex-GIS, ex-MES e ex-ministros.

Aplausos do CDS.

Protestos do PS.

E como se tal não bastasse, propõe-se formar uma frente eleitoral com ex-PSDs e ex-PSs.

A Sr.ª Maria Emitia de Melo (PS): - E o que é que o senhor tem a ver com isso?!...

O Orador: - De ex-maior partido, de ex-partido do Governo, o Parlado Socialista prepara-se para ser o ex-Partido Socialista.

Aplausos do CDS.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Só diz parvoíces!

O Orador: - Compreende-se, assim, que enquanto os seus fundadores e1 os seus dirigentes históricos pró feriam a candidatura presidencial de Mário Soares, ou seja, uma candidatura PS, os novos senhores defendam a. candidatura Eanes, ou seja, uma candidatura, pelo menos, não PS.

A Sr.ª Maria Emília de Melo (PS): - O PS não defende é a candidatura de fascistas!...

O Orador: - Igualmente se compreende que a engenheira Maria de Lurdes Pintassilgo mereça a protecção incondicional do Partido Socialista e seja vista, aos olhos de todos, como potencial candidata a lugar de primeiro-ministro, posem embora os assomos de amor-próprio com que se pretende rodear o apoio à candidatura do general Ramalho Eanes.
De :um Mário Soares incensado, secretário-geral adulado, primeiro-ministro indiscutível, candidato potencial a Presidente: da República, releia-nos um vice-presidente da Internacional Socialista e um apelante a um primeiro-ministro que não é do partido e ia um Presidente da República que já uma vez lhe abriu a ponta da gaiola.

A Sr.ª Maria Emília de Melo (PS): - Não diga asneiras!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não foram os reflexos da situação descrita ao nível das instituições e só teríamos que nos regozijar com ela. Mas no momento em que o PS se prepara para apoiar a candidatura do general Eanes é legítimo e oportuno que sobre tal foi nos pronunciemos, sem que com isso ponhamos em causa o respeito que S. Ex.ª, como Presidente da República, nos merece.
No horizonte das eleições presidenciais, e a, partir do momento em que a Aliança Democrática manifesta publicamente o seu apoio a um candidato, perfila-se algo de semelhante ao que ocorreu em Agosto de 1975. Então, e na lógica do processo revolucionário, constituiu-se o célebre ... Otelo e Vasco Gonçalves caíram no 25 de Novembro. Ficou Costa Gomes. Também agora Otelo é candidato da extre-

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ma-esquerda e Vasco Gonçalves sara provavelmente candidato do PC. E neste novo triunvirato, também o general Eanes não será candidato daquelas forças, mas servirá, sem dúvida aos seus interesses. Otelo e Vasco Gonçalves, antes das eleições ou na primeira volta, cairão. Ficará apenas o general Eanes. Em 1976, este foi o candidato da maioria democrática contra a escalada comunista de 1975. Em 1980, se se candidatar, será o candidato da mino rui totalitária mais o PS contra a maioria democrática desta Assembleia.

Risos do PS e do PCP.

De candidato contra o PC passa a candidato do PC, pois, sem os votos do PSD e do CDS, só com os votos, todos os votos do PC e da extrema-esquerda pode pensar ser reeleito. Esta é uma análise objectiva dos factos que em nada afecta a convicção que temos de que o general Ramalho Eanes saberá esquivar-se a ser intérprete do Partido Comunista.

Risos do PS e do PCP.

E quando a oposição tanto fala em manipulação eleitoral é oportuno lembrar nesta Câmara as declarações do Dr. Mário Soares ao jornal Expresso na última semana.
Diz o Dr. Mário Soares que os discursos do Sr. Presidente da República, incluindo o que pronunciou nas vésperas das eleições de 2 de Dezembro, bem como o recente discurso da FIL, são ilustração clara das convergências objectivas e evidentes que nos últimos tempos têm vindo a criar-se entre o general Eanes e o 'PS. A acusação de parcialidade não é nossa; limitamo-nos a ser assistente no processo.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Fernandes da Fonseca (PS): - É um facto?

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é com alegria, mas antes, pelo contrário, com preocupação que procedemos a esta análise.

Risos do PS e do PCP.

Preocupação que mais se agrava perante declarações recentes do Sr. Comandante Almeida Costa. Quando um membro de um órgão de soberania, que declarada e intencionalmente hostiliza a acção do Governo e da maioria, afirma que o Estatuto da Região Autónoma dos Açores não levantará problemas na Assembleia da República e que está convicto de que o Presidente da República não terá hesitações em promulgar o Estatuto, quando tal acontece, ao mesmo tempo que reafirma o seu apoio à recandidatura do general Eanes, é ficho concluir que o Conselho da Revolução aprecia a constitucionalidade das leis, não pelo seu conteúdo, mas em função da conveniência política do seu presidente.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - E só a consideração pessoal que mantenho perto Sr. Comandante Almeida Costa me impede que, pela análise destes factos, vá mais longe na análise do comportamento do Conselho da Revolução.
A nossa preocupação é porém, limitada, pois não esquecemos o papel relevante que o Partido Socialista desempenhou em 1975.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Não tem nada que agradecer!

O Orador: - Estamos certos que o PS, cujo espírito e comportamento democrático não queremos pôr em dúvida, saberá quebrar o encanto ou fugir à tentação e que saberá colaborar na reconstrução do Estado e na harmonia das instituições.
Só assim evitará transformar-se num minipartido à italiana e só assim ajudará a evitar que a bipolarização existente na sociedade se transforme em radicalização ao nível político.

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Isto foi tão fraco que nem A RUA o aceitava!

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura pediu a palavra para um pedido de esclarecimento ou para um protesto?

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, penso que estou suficientemente esclarecida, queria era protestar.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - O Sr. Deputado Azevedo Soares inaugurou a sessão de hoje de uma forma que temos de lhe agradecer: foi extremamente claro, dizendo exactamente aquilo que pensa. Agradeço-lhe pessoalmente e em nome do meu partido.
É evidente que a nossa aliança com o Partido Comunista é muito antiga e as nossa ligações com o PS são do tempo da luta antifascista, que provavelmente o Sr. Deputado conhece ...

Risos do PS e do PCP.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Boa piada!

A Oradora: - Pelo menos historicamente é natural que conheça, pois nem todos tivemos oportunidade de lutar da mesma forma... Isto vai-me ciar oportunidade, por um lado, de prestar homenagem ao Partido Comunista, que consideramos um partido democrático, que tem batalhado pela libertarão do País, pela força das instituições, e que tem sido, de facto, um grande baluarte da democracia portuguesa.

Risos do PSD.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Não há dúvida!...

A Oradora: - Continuando na nossa missão de oposição civilizada, gostaria também de prestar as nossas homenagens aos colegas do Partido Socialista que nesta Assembleia têm mostrado uma competência altamente evidenciada, sobretudo se a pusermos em

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contraponto com a indigência intelectual e técnica demonstrada pelos partidos da AD.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - É evidente que a aliança da APU é uma aliança para construir e não uma aliança para destruir.

Vozes do CDS: - Nota-se! ...

A Oradora: - São alianças fundamentais, são alianças de escolha de objectivos e não alianças temporárias que desejam apenas circunstancialmente destruir qualquer coisa. É sempre fácil a aliança para destruir, mas muito mais difícil e muito mais séria é uma aliança para construir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Agradeço-lhe, pois, Sr. Deputado, a oportunidade que me deu para esclarecer as nossas posições nesta Assembleia. Nós temos pouco tempo e muito trabalho e nem sempre o podemos fazer. As nossas oportunidades de fazer declarações políticas são propositadamente poucas, pois somos um partido que trabalha na organização das populações numa militância de base e não temos realmente muito tempo a perder, como o Sr. Deputado acaba de fazer.
Quanto à parte da sua intervenção, se assim o podemos chamar, que é do foro da astrologia, agradeço-lhe os cenários possíveis que apresentou, pois são elementos para pensarmos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos, certamente também para um protesto.

O Sr. Almeida Santos (PS): -Ê, sim, Sr. Presidente.

O Sr. Deputado Azevedo Soares fez aqui uma bem estranha intervenção, pois penso que ela poderia ser repasto para uma análise psicanalítica. O Sr. Deputado Azevedo Soares tem vocação para dirigente do Partido Socialista, não tem consciência disso, quer mandar na nossa casa e eu convidava-o a mandar na sua.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: -Começou por dizer que somos a mesma coisa que o Partido Comunista -é uma frase que estamos habituados a ouvir quase todos os dias vinda dessa bancada- ...

O Sr. Carlos Candal (PS): - Já no tempo do fascismo «rã assim!

O Orador: -.... já a conhecíamos do tempo do antigamente, todos nós éramos comunistas quando nos limitávamos a ser apenas antifascistas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas, ao mesmo tempo, comete a contradição de dizer que sendo nós a mesma coisa, o MDP/CDE tem por função tapar o fosso que existe entre nós. Então existe um fosso ou somos a mesma coisa? Depois diz que somos um sistema de vasos comunicantes e retoma o tema que anteriormente tinha contraditado.
Está, também, muito preocupado porque estamos a perder u nossa autonomia e a nossa identidade. Devia felicitar-se por isso, uma vez que o seu partido tem feito tudo para bipolarizar este país e quanto maus nós perdêssemos a nossa identidade para nos fundirmos com o PCP mais êxito teria tido a política da bipolarização lançada pelo seu partido. Felizmente que não e assim, o País não vai bipolarizar tanto quanto desejam. Nós temos a nossa identidade, continuaremos a tê-la, somo nós e o País que julga sobre isso, não é, felizmente, o Sr. Deputado.

Vozes do PS: -Muito bem!

O Orador: - Diz ainda, mais uma voz em contradição, que o nosso partido está a ser controlado pelos tecnocratas de Lisboa. Não tenho ideia de que a tecnocracia despose o comunismo.
Fala também em ex-Partido Socialista, mnipartido à italiana, com preocupações que deveriam ser nossas e não do Sr. Deputado. Isso só lhe deveria dar alegra e não tristeza, mas, pelo que vejo, preocupa-se, uma vez mais. É curioso que essa afirmação seja seria num momento em que, ao que parece, ainda somos o partido mais votado.
Preocupa-se depois que venhamos a apoiar o Sr. General Ramalho Eanes. Vejo que já escolheu por nós. Ainda não fizemos essa escolha, o Sr. Deputado antecipou-se e fica mudo preocupado por virmos a apoiar um candidato que não é PS. Mais uma vez quer mandar na nossa casa, mas devo-lhe dizer que escolheremos em liberdade, escolheremos em consciência, escolheremos em patriotismo. No entanto, uma vez mais lhe digo que candidato PS ou não PS não escolheremos com certeza um antidemocrata.

Aplausos do PS e do PCP.

Terminou o Sr. Deputado dizendo que fez uma análise objectiva dos factos. Foi o aspecto mais curioso de todas as afirmações que fez.

Risos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de continuarmos queria comunicar-lhes que se encontram na Sala do Conselho de Ministros os representantes do Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, cuja audiência estava marcada para as 11 horas. Eles chegaram, de facto, a essa hora e pedia aos Srs. Deputados que têm a incumbência de os receber o favor de se dirigirem para aquela sala.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Igrejas Caeiro.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - É para nós importante saber a valorização dos Srs. Deputados quanto ao seu ponto de vista de actuação. Já sabíamos que o Sr. Deputado Azevedo Soares é um generalista, pois de uma forma geral está em todas, conhece todos os

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assuntos e trata-os com abundância de argumentos, mas não o sabíamos analista a fazer concorrência ao Sr. Marcelo Rebelo de Sousa ou ao Sr. Miguel José Júdice. A sua análise - o Sr. Deputado deve candidatar-se talvez a ser um futuro colaborador de A Rua ou de O Diabo - dá-nos realmente a sua preocupação mais por analisar as suas próprias forças do que as nossas.
Gostaria de perguntar-lhe, já que se meteu tanto na nossa vida, se o Sr. Deputado que integra a AO pertence, em relação ao CDS, à tendência do MIRN ou à da Fuerza Nueva.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Veiga de Oliveira pediu a palavra também para um protesto?

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Era, Sr. Presidente.
Em face da indigência das provocações e das tentativas de manipulação, afectando adias não só os partidos que aqui estão, mas inclusivamente pessoas que desempenham altas funções na hierarquia do Estado, bem vistas as coisas o Sr. Deputado e o seu discurso não merecem um protesto.

Aplausos do PCP e ao PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Há momentos em que. de facto, o Regimento, por mais figuras que tenha, não consegue albergar as figuras necessárias para as respostas que se impõem. Já não falaria daquilo que tem sido hábito por parte de alguns partido» e, nomeadamente, por parte do partido a que o Sr. Deputado Azevedo Soares pertence, quanto ao que se pode chamar de desqualificação dos órgãos de soberania e de uma Constituição a que todos devemos respeito, concordemos ou não com ela. Isso fará parte, efectivamente, do anedotário provocatório da nossa vida democrática.
Mas do ponto de vista do Partido Socialista, Sr. Presidente e Srs. Deputados, independentemente do que tivermos sido e do que somos, e que não mudámos a esse respeito, peço licença para pessoalizar e para dizer que de facto de nada me arrependo do ponto de vista político. E não me importo nada de ter sido ex-várias coisas para ser hoje um militante honrado e esforçado do meu partido.

Aplausos do PS.

Digo-lhe apenas que no curso da história, e pelo menos da história política que vivi nos últimos vinte anos, eu e muitos outros que estão nesta bancada fizemos muito para que o Sr. Deputado Azevedo Soares pudesse estar aqui a dizer os impropérios que acabámos de ouvir. E foi pena que o não tivéssemos visto nestes últimos vinte anos pelo menos do mesmo lado da barricada.

Aplausos ao PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Azevedo Soares, se desejar responder.

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: As intervenções havidas e os protestos da oposição são, de facto, a prova de que vivem aqui em clima de nostalgia.

Risos do PS.

A Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura com o seu protesto extremamente cordato e civilizado - volto a repeti-lo -, veio dar inteiramente razão â minha análise. Todo o seu discurso foi no fundo decalcado da minha intervenção. E pergunto à Sr.ª Deputada se a aliança do CDS contra a CEUD se mantém, ou se de facto, o MDP/CDE já não é o CDE contra a CEUD de 1969 e é agora a CEUD de 1980 contra o CDE de 1980.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Carlos Candal (PS): - Que tolice!

O Orador: - O Sr. Deputado Almeida Santos proeurou, com a habilidade do foro que iodos lhe reconhecemos, descobrir contradições na minha declaração. Elas não existem, reconheço a existência de um fosso entre o Partido Socialista e o Partido Comunista, sempre o disse, afirmo-o neste momento e continuares sempre a afirmá-lo enquanto o Partido Socialista mantiver a sua convicção democrática. Enquanto isso for assim não deixarei de o fazer, mas não posso deixar de reconhecer é que o Partido Socialista está, neste momento, de facto, esquecendo essa sua obrigação democrática, tendo a reboque das teses do Partido Comunista.

O Sr. Gomes Fernandes (PS): - Olha que professor! ...

O Orador: - Mais: a minha análise sobre o Partido Socialista ...

O Sr. Almeida Santos (PS): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador - Faça favor.

O Sr. Almeida Santos (PS):- Sr. Deputado, a última coisa que esperava de si era que se armasse em juiz da nossa capacidade e da nossa obrigação, como lhe chamou, de mantermos, como disse, a nossa convicção democrática. Era a última coisa que esperava ouvir nesta bancada.

O Orador: - Não estou a ser juiz, Sr. Deputado. Estou apenas a atestar um facto, a manifestar a minha opinião e essa mantenho-a. Não catou a fazer de juiz, estou apenas a emitir um juízo pessoal que julgo ter todo o direito de fazer.

O Sr. Fernandes da Fonseca (PS): - Está a ser ridículo!

O Orador: - Mas, de qualquer forma, a minha análise sobre o Partido Socialista tem toda a razão de ser, dado que deu origem a três intervenções do Partido Socialista, o que terá necessariamente algum significado. Julgo que desta forma terei respondido já ao Sr. Deputado Jorge Sampaio.

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O Sr. Deputado Igrejas Caeiro não fez nenhum pedido de esclarecimento, mas procurou apenas referir-se ao meu partido em termos profundamente incorrectos, que sabe não corresponderem minimamente à realidade e que da minha parte nunca houve nem há qualquer referência ao Partido Socialista nesses termos. Posso ser duro, posso ser rigoroso, mas não me refiro nunca ao Partido Socialista nos termos em que o Sr. Deputado Igrejas Caeiro se referiu ao CDS.
Em relação ao Sr. Deputado Veiga de Oliveira, só lhe quero agradecer que se tenha levantado para desmerecer da minha intervenção.

Aplausos do CDS.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Peço a palavra Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

A Sr. Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Queria responder ao abrigo do direito de resposta, pois o Sr. Deputado Azevedo Soares fez-me uma pergunta.

O Sr. Presidente: - Bom, o Sr. Deputado Azevedo Soares não pode regimentalmente fazer-lhe perguntas ou fazendo-as não pode a Sr.ª Deputada responder-lhe. Assim não posso conceder-lhe a palavra.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Ficará então para outra altura, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora iniciar a discussão do voto apresentado há dias pelo PSD, CDS e PPM sobre acções terroristas levadas a cabo no nosso país nos últimos tempos. O voto já foi lido e está em discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Sanches Osório.

O Sr Sanches Osório (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou ser muito breve na justificação deste voto.
Aparentemente pouco mais haveria a dizer ao veto que foi proposto há dias sobre este mesmo ajunto.
Todavia, considerando a situação internacional, considerando as ultimas intervenções a que todos a temos assistido por parte da bancada do Partido Comunista, parece-me que se nos impõe a todos, mais uma vez, e repito o que afirmei na última oportunidade, uma meditação.
Atentemos no facto de ainda ha pouco aqui temos estado todos em debate político, a falar de juízos e de analises políticas, em debate franco e aberto. Isso significa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que houve uma revolução em Portugal e que o ambiente em Portugal mudou. Iodos estamos aqui de pleno [...], mas também se nos impõe, por essa mesma razão, o dever de defesa das instituisões democráticas e o dever da independência nacional. Ao faze-lo, ao contribuir para a defesa da independência nacional, não fazemos mais do que a nossa obrigação, não fazemos mais do que respeitar a Constituição da República. De facto, nela se fala sete vezes em independência nacional de várias formas, mas com um único sentido: propiciar liberdade de acção, quer do Governo, quer a esta Câmara.
O terrorismo na ordem interna ou na ordem internacional é uma ameaça séria a essa mesma liberdade de acção. Este voto agora proposto fala em segurança interna e fala em sentido próprio e rigoroso do termo. Nele se afirma que esta segurança interna é indispensável para a defesa das instituições democráticas que nós aqui representamos e que nós aqui queremos que continuem a vigorar em Portugal.
É esse o apelo que volto a fazer a esta Câmara, para que não descuide as defesas que são imprescindíveis paira a democracia portuguesa.

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Breves palavras para dizer qual é a nossa posição acerca deste voto.
Parece-nos muito estranho nalguns aspectos, parece-nos aceitável noutros e, por isso, desde já requeria que a votação se fizesse em separado em relação aos três últimos números.
Desejamos votar a favor do n.º 1, pois é óbvio que na medida em que se traz aqui com pertinência ou sem pertinência - não quero discutir isso - um voto de profundo pesar pela morte de cidadãos portugueses nós necessariamente votaremos a favor dessa proposta.
Mas não poderemos nunca votar a favor de propostas em que esta Assembleia «requer ao a publicação de legislação necessária à detecção prevenção e combate ao terrorismo», isto é, de legislação que é da competência desta Assembleia. Que esta Assembleia requeira ao Governo que este faça aquilo que a esta Assembleia compete em exclusivo fazer, ultrapassa o nosso entendimento.
Por outro lado, que esta Assembleia também declare que «considera de máxima urgência a publicação de legislação necessária à operacionalidade plena do grupo de operações especiais, criado Decreto-Lei n.º 506/79, de 24 de Dezembro», bem não compreendemos. Se acha que é pois bem, ou fazemos a legislação que considera-mos urgente - somos a principal Câmara legislativa - ou então a AD, os proponentes deste voto, muito mais facilmente pegam no telefone e dizem ao seu Governo que faça aquilo que eles que se deve fazer. Esta é a nossa posição.
Diria, no entanto, mais alguma coisa. A AD mostra-se, neste momento, muito preocupada com a actividade terrorista. Lembro, no entanto, que estando os partidos que hoje formam a coligação governamental na oposição se fez aqui uma interpelação ao I Governo Constitucional, no momento que eu era Ministro da Justiça, acusando esse governo de não ser capaz de resolver o aumento da criminalidade. A criminalidade pôde, nessa altura, nos seus aspectos mais dramáticos, que eram exactamente aqueles que estão aqui em causa a propósito do terrorismo, ou seja, os assaltos e bancos e a bombas, Ter sido controlada e até extirpada. Felizmente pudemos reduzir a quase zero os assaltos a bancos.

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Não obstante, os assaltos a bancos recomeçaram, a criminalidade volta a ser maior do que nunca e pergunto à maioria de hoje e oposição de então se já está em condições de reconhecer não só que o I Governo Constitucional fez o que eles não são capazes de fazer, mas que o problema da criminalidade é algo de mais grave, não se resolve com simples discursos, com simples ataques de circunstância, mas que ultrapassa, por vezes, a capacidade dos bons Governos, quanto mais dos maus.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Angelo Correia.

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Apenas queria...

O Sr. Presidente: - Desculpe Sr. Deputado, mas o Sr. Deputado Meneres Pimentel também pediu a palavra, e como sabem não podem dois Deputados do mesmo partido intervir sobre um voto.

O Sr. Meneres Pimentel (PSD): - Faz favor, Sr. Deputado Ângelo Correia.

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Apenas queria. Sr. Presidente, dar dois breves esclarecimentos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe mas não pode dar esclarecimentos. Certamente que conhece bem a metodologia da discussão de votos e, por isso, não pode fazê-lo.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Então desejava lazer um pedido de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Não pode também fazer isso.
O Sr. Deputado Meneres Pimentel deseja intervir, dado o Sr. Deputado Ângelo Correia ter discutido?

O Sr. Meneres Pimentel (PSD): - Se me é permitido, queria antes interpelar a primeira fila da minha bancada, pois não sei se se reserva para uma declaração de voto a possível intervenção do meu grupo parlamentar.

Vozes do PS: - Resolvam lá isso!

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Faça favor de intervir, Sr. Deputado.

O Sr. Meneres Pimentel (PSD): - Bom, já que me é permitido, devo dizer que o voto em si parece-me suficientemente claro e aproveito esta oportunidade para responder ao Sr. Deputado Almeida Santos o meu querido amigo, dizendo que fez aqui afirmações complemente erradas.
Fui um dos portagonistas dessa interpelação sobre a criminalidade e recordo que na altura a comunicação social estatizada, sob o domínio do Partido Socializa, chegou ao ponto de, a propósito dessa interpelação, num programa de televisão que jamais esquecerei, caricaturar es intervenientes da oposição. Isto creio que não tem qualquer paralelo no regime democrático, sobretudo no regime democrático, sobretudo na fase constitucional a partir de 1976.
Por outro lado, o Sr. Deputado Almeida referiu que o Governo Constitucional socialista sei se ambos se só o primeiro - conseguiu a zero os assaltos a bancos e conseguiu conter a criminalidade. Recordo que na altura da interpelação apontei números que não foram desmentidos aqui pele Governo de então; recordo que nessa altura, pela primeira vez numa interpelação, apresentou PSD projectos de lei concretos para servirem de alternativa ao mal que procurávamos combater; recordo ainda que nessa altura insisti junto do Ministro da Justiça de então, agora Deputado Almeida Santos para a publicação de diplomas que já estavam concluídos na vigência do VI Governo Provisório e o Partido Socialista deixou os dois governos constitucionais sem sequer dar início de execução a essas medidas legislativas que foram aqui prometidas aquando dessa interpelação; recordo, finalmente, que aquando da publicação de um livro sobre um ano de actividade do I Governo Socialista se fazia a afirmação que esse Governo tinha conseguido conter um aumento da criminalidade, tendo eu, a propósito dessa publicação, dirigido um requerimento ao Governo Socialista de então pedindo que me concretizasse com números essa afirmação que aparecia desprovida de qualquer fundamentação numérica, e ate hoje aguardado tal resposta. Pelo contrário, agora, segundo números divulgados pela Policia Judiciária, prova-se que pelo menos no 1.° trimestre deste ano a criminalidade diminuiu.
A interpelação foi perfeitamente conseguida e só os órgãos de comunicação social estatizados, nessa altura controlados pelo Partido Socialista, e de uma maneira muito intensa, tentaram ridicularizá-la. Foi uma interpelação séria, repito, acompanhada de projectos legislativos, acompanhada de fundamentação concreta e que só essa comunicação social impede, tendo chegado ao ponto, insisto, de ridicularizar de uma forma soez essa mesma interpelação na televisão.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, depois de eu ter negado o uso da palavra ao Sr. Deputado Ângelo Correia para pedir esclarecimento ao Sr. Deputado Almeida Santos, surgiram dúvidas aqui na Mesa sobre a liquidez dessa decisão. A minha convicção e a de que, na verdade, procedi de acordo com o Regimento mas os restantes membros da Mesa tem dúvidas, pelo que, sendo assim, dou a palavra ao Sr. Deputado Angelo Correia para pedir os esclarecimentos que tender e depois o Sr. Deputado Almeida Santos aproveitará para também usar da palavra e responder.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Eu desejaria formular três perguntas ao Sr. Deputado Almeida Santos. Concordando o Partido Socialista com a posição que no voto formulámos de manifestar o profundo pesar pela morte de cidadãos portugueses, sobretudo de agentes da polícia de Segurança Pública e GNR, vitimas de acções terroristas o Partido Socialista coloca apenas em análise três dos quatro pontos do voto e é sobre este aspecto que queria fazer duas perguntas. A primeira é a de saber se

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o Sr. Deputado Almeida Santos mio articula devidamente o ponto 2 com o ponto 4, já que no ponto 2 nós dizemos «requer ao Governo a publicação de legislação necessária à detecção, prevenção e combate ao terrorismo e no ponto 4 afirmamos que consideramos indispensável à defesa da independência nacional e à manutenção do regime democrático instaurado em 25 de Abril a aprovação urgente de legislação que, respeitando as liberdades fundamentais e os direitos do homem consagrados na Convenção Europeia, garanta a segurança interna. Portanto, não &e diz claramente qual o Órgão de Soberania responsável por essa mesma legislação. Ou seja, segundo o nosso ponto de vista, consideramos que em termos de segurança interna existem duas vias para abordar o problema - e o Sr. Deputado Almeida Santos sabe que a própria Constituição no seu artigo 26.º, n.º 1, lembra a necessidade da segurança dois cidadãos como uma necessidade constitucional a estabelecer e a preservar.
O que acontece, portanto, é que neste domínio existem duas vias para abordar o problema, uma das quais é a da celebração, definição e dignificação) dos afeitos, liberdades e garantias e a sua preservação no que respeita a matéria de segurança interna, mas isto já numa segunda fase que é a chamada fase da reestruturação geral das policias - e não vou falar se é uma superintendência ou não.
O facto é que existem nove polícias dispersas, descoordenadas e sem meios internos de coordenação. Lembro, aliás, que foi iniciada uma acção nesse sentido, até pelo Ministro de um Governo socialista de que V. Ex.ª fazia parte, como acção do próprio Governo. Ou seja, foi em pleno II Governo Constitucional que se iniciaram as tarefas de tentar melhorar a segurança interna do País, por uma via dupla e, portanto, por uma via governamental na parte que atinge a questão da reorganização das polícias e, por outro lado, uma via parlamentar, via legislativa da Assembleia, que é uma via que atende directamente o qualificativo de segurança interna. Nesse sentido a proposta como é formulada da parte dos partidos que integram a Aliança Democrática...

O Sr. Presidente: - Desculpe interrompê-lo, Sr. Deputado, mas tenho de o informar que já esgotou o seu tempo, pelo que lhe peço o favor de terminar.

O Orador: - Portanto, o que eu queria dizer, Sr. Deputado Almeida Santos, é que no fundo a proposta, como é formulada, pretende atingir duas vias diferentes, uma de competência da Assembleia e outra que é uma parte mais limitada e relativa ao terrorismo, que, esse sim, depende de um meio de prevenção decorrente de uma acção governamental típica, já que a acção de coordenação de polícias é uma acção eminentemente governamental.
A segunda questão que lhe queria colocar...

O Sr. Presidente: - Desculpe, Sr. Deputado, mas pedia-lhe o favor de concluir.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Era apenas uma breve análise!

O Orador - A segunda questão que lhe queria colocar e já não tenho tempo de lhe pôr a terceira- é a seguinte: quando nós consideramos de máxima urgência a publicação de legislação necessária à operacionalidade do grupo de operações especiais da Polida de Segurança Pública, devo dizer que o que catamos a fazer é a pedir à Presidência da República que promulgue um diploma oriundo do VI Governo Constitucional que está desde o dia 27 de Março na Presidência da República e que é uma decorrência de um decreto-lei do V Governo Constitucional...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Angelo Correia, se continua a tecer considerações, vejo-me forçado a cortar-lhe a palavra. Peço-lhe, por essa razão, que conclua rapidamente.

O Orador- Eu termino já, Sr. Presidente. O pedido de esclarecimento que pretendo fazer ao Sr. Deputado Almeida Santos, é pois o seguinte: V. Ex.ª não pode, a meu ver, questionar a Aliança Democrática em termos de apoio parlamentar para este efeito; deve, sim, questionar a Presidência da República porque a legislação já existe e já foi enviada para lá pelo Governo e de lá é que não sai a resposta.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos, para responder, se assim o entender.

O Sr. Almeida Santos (PS): - O Sr. Deputado Ângelo Correia tem razão num ponto: é que eu esqueci-me' que existia, aqui no verso da folha mais um ponto 4 que não tinha ainda lido mas agora que o li devo dizer-lhe que se lhe aplicam as considerações que teci há pouco. Continuamos a votar favoravelmente o n. 1 e a votar contra os restantes números, incluindo o n.º 4 porque nele se diz: «Considera indispensável â defesa da independência nacional e à manutenção do regime democrático a publicação urgente da legislação respeitante à segurança interna.»
E a verdade é esta: se emendemos que efectivamente é necessária legislação .urgente, devo dizer-lhe que nós também temos capacidade para a fazer. Se me dissesse que se tratava de medidas de carácter regulamentar ou administrativo, enfim, talvez pudéssemos nesse caso enveredar pela figura da recomendação ao Governo de que eu tenho muitas dúvidas dada a independência dos órgãos de Soberania. Agora, se nós consideramos necessária legislação urgente, então façamo-lo e desde já lhe digo que estamos dispostos a colaborar com a maioria no se nítido de que essa legislação se faça depressa porque também estamos convictos de que é preciso, fazer tudo para evitar que, efectivamente, o terrorismo grasse e a criminalidade aumente.
E já agora aproveito a oportunidade para repetir que nós conseguimos conter a criminalidade. Não quero dizer que a tenhamos resolvido ou eliminado mas conseguimos, isso sim -e repito - eliminar o bombismo e conseguimos deter os assaltos a bancos que só mais tarde recomeçaram e que só agora continuam a grassar com a mesma violência com que grassavam então. Portanto, o aumento da criminalidade foi travado, mas, infelizmente, não é possível irradiar, a criminalidade e não é tão fácil como isso

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reduzida paro além de um certo ponto num mundo como o de hoje.
Para além disso, queria dizer o seguinte: eu não sabia que o n.º 3 do voto em «apreço se tratava do uma pirraça ou de um ponto de contencioso entre a maioria e o Sr. Presidente da, República. Afinal do contas isto engrena numa notícia que li nos jornal, em que se dizia que o Sr. Presidente da República era o responsável peto grassar do terrorismo, na medida em que não promulgava um diploma que tinha em seu poder para esse efeito.
Eu entendo que não temos nada que fazer recomendações a um Órgão de Soberania como a Presidência da República. Se o Precedente da República ainda não publicou esse diploma ele saberá porquê, é lá com ele, já que assume a responsabilidade dos seus actos. Agora não penso é que este voto seja o melhor caminho para a AD alimentar a sua luta com o Presidente da República.

Aplausos do PS.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente:- Srs. Deputados, como não há mais nenhum Sr. Deputado inscrito, vamos votar o voto que temos estado a discutir. Vamos, portanto, de acordo com o pedido formulado pelo PS, votar ponto por ponto, pelo que passamos à votação do ponto n.º 1.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o ponto n.º 2.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS e do PPM e votos contra do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o ponto n.º 3.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS e do PPM e votos contra do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o ponto n.º 4.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS e do PPM e votos contra do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino Uma para uma declaração de voto.

O Sr. Lino Lima (PCP):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República exprimiu muito bem, há pouco menos de quinze dias - e a proposta do PCP- o seu repúdio pelos actos de terrorismo que ultimamente têm alarmado o País e reclamou do Governo as medidas que são da sua competência, Assim, o voto que agora nos foi apresentado pelo PSD, CDS e PPM é estranho a vários títulos e, por isso, só votámos favoravelmente o n.º 1 reiterando às famílias das vítimas do terrorismo os nossos sentimentos de pesar. Para além desse número todo o voto se consubstancia em pedidos ao Governo para que publique legislação destinada a combater o terrorismo. Simplesmente os proponentes esqueceram-se - ou fizeram-se esquecidos... - de que a legislação que requerem é da competência exclusiva desta Assembleia e de que, portanto, apelando para o Governo a publicar, estão expressamente a promover a demissão da Assembleia (Já República do exercício dos seus; direitos e competências.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Muito bem!

O Orador - O que se pretende com isto? Desvalorizar a Assembleia, o Órgão de Soberania mais eminente da representação nacional? Uma coisa nos pa-icce certa: é que os grupos parlamentares subscritores do voto mostraram com ele que os seus propósitos políticos são os de conceder ao Governo cada vez maiores poderes; são os de tentar concentrar nas mãos do Governo poderes autoritários, poderes que o subtraia ao controle desta Assembleia.
Não poderíamos, assim, dar o nosso acordo aos n.ºs 2, 3, e 4 do voto apresentado. O ataque e a prevenção do terrorismo não podem ser alcançados pela via que a história demonstra acabar por pôr em perigo as liberdades e direitos legítimos dos cidadãos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador - Quanto ao terrorismo, pois somos contra ele, fomos os primeiros a denunciá-lo, temo sido bastas vezes vítimas dele e uma vez, mais chamamos a atenção do País para que os actos recentes de terrorismo servem objectivamente a política da direita, a política da AD, a política do Governo Sá Carneiro, que os actos recentes de terrorismo são contra a democracia e são contra o 25 de Abril.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Peço a palavra, para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Almeida Santos (PS): - É que o Sr. Deputado Angelo Correia chamou-me a atenção para o facto de que o n.º 4 teria outra formulação diferente da que nos foi distribuída e portanto queria clarificar que votámos a seguinte redacção. «Considera indispensável à defesa da independência nacional e à manutenção do regime! democrático a publicação urgente da legislação respeitante à segurança interna.» Se há outra formulação gostaríamos de a conhecer.

O Sr. Presidente: - Há efectivamente uma outra versão, do ponto n.º 4.

O Orador. - Como não nos foi distribuída temos dela conhecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Eu supunha que ela estava em poder de todos os Srs. Deputados.

O Orador - Não, Sr. Presidente, ela não foi distribuída ao nosso grupo parlamentar.

O Sr. Presidente: - Então, vou proceder à sua leitura. A nova redacção do ponto n.º 4 do presente voto é a seguinte: «Considera indispensável à defesa da independência nacional e à manutenção do regime democrático instaurado em 25 de Abril a aprovação urgente da legislação que é respeitando as liberdades

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fundamentais e os direitos do homem consagrados na Convenção Europeia, garanta a segurança interna.»
Pergunto se isso altera o sentido de voto do PS.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Não altera, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então não será necessário proceder a uma nova votação.
Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito rapidamente, queria dizer que perfilhamos vários dos considerandos que acabarem de ser expendidos pelo Sr. Deputado Lino Lima. Somos também contra o terrorismo e por isso promovemos este voto. Simplesmente entendemos que o combate ao terrorismo não se faz apenas por votos piedosos e de pesar pelas mortes das vítimas, mas que é necessário tomar todas as acções necessárias para os prevenir e sobretudo para evitar que as situações sejam demasiado propicias para que esses actos de terrorismo se desencadeiem. É por isso que entendemos necessário que no plano executivo, e para obviar a essa situação, sejam tomadas, as medidas necessárias. Aliás, como disse, o Sr. Deputado Ângelo Correia, há muito que fazer no plano do Executivo, no sentido de prevenir esses actos de terrorismo.
Por outro lado, entendemos que devem ser rapidamente promulgados e publicados diplomas do maior interesse para a coordenação das entidades responsáveis pela segurança e sobretudo também medidas que evitem, pelo menos, o desenvolvimento desse terrorismo. E como não é a Assembleia da República que pode resolver directamente esta situação, tanto no plano do Executivo, das acções administrativas e mesmo legais como na promulgação e publicação dos diplomas que já foram aprovados pelos órgãos competentes, entendemos que a Assembleia tem perfeitamente o direito e o dever de, fazer um veto por que essas acções sejam empreendidas.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Afirmámos recentemente, aquando da discussão de um voto sobre esta matéria, a nossa clara, posição de condenação dos actos de terrorismo. Ao votar o n.° 1 do voto proposto pelo PSD, CDS e PPM reafirmámos novamente a nossa condenação dos actos de terrorismo posto que não nos limpámos a votar - e podia-se até pensar que hipocritamente - a manifestação de pesar pela morte de cidadãos. E reafirmámos que a esta manifestação de solidariedade está naturalmente associada a posição de condenação dos actos que deram origem à necessidade de se fazer um voto de pesar e um voto de solidariedade.
Em relação aos pontos seguintes, do n.° 2 ao n.° 4, o nosso voto contra não significa que não consideremos igualmente a necessidade de serem tomadas medidas efectivas contra o terrorismo, o que afirmámos, aliás, também aquando da discussão sobre um outro voto em relação à mesma matéria. Este nosso voto significa que, por um lado, não nos associamos a uma posição que, em nosso entender, consubstancia uma posição de demissão deste Órgão de Soberania perante outro, o Governo, pois que a legislação sobre detecção, prevenção e combate ao terrorismo e portanto sobre segurança interna, até pelas suas ligações com matéria de direitos, liberdades e garantias, tem de ser da alçada da Assembleia da republicas.
Em segundo lugar, votámos contra esses pontos porque o MDP/CDE não concede aval a este Governo para legislar em tal matéria, peia sua prática autoritária e por vezes repressiva, pelas suas frequentei violações de aspectos legais e por falta de condições de democraticidade para legislar numa matéria tão melindrosa que, em nosso entender, pode abrir um risco não apenas de procurar medidas efectivas de combate, ao terrorismo mas, com base neste pretexto, criar electivas medidas que possam na prática significar novas afrontas aos direitos e às liberdades individuais.

O Sr. Presidente: - Creio que não há mais nenhuma declaração de voto, pelo que vou proceder à leitura do voto apresentado hoje pelo PCP e cuja discussão ficará para a próxima sessão.

1 - A Assembleia da República saúda todos os esforços provenientes das mais diversas organizações e sectores da opinião pública tendentes a defender as crianças de todo o mundo e em particular as crianças portuguesas, e em especial aquelas que ainda hoje sofrem a fome, a miséria, a repressão e a injustiça.
2 - Manifesta-se pelo cumprimento da Declaração Universal dos Direitos da Criança e pela promoção de uma política de maior justiça social, para todas, as crianças sem excepção, bem como pela aplicação de leis aprovadas nesta Assembleia, designadamente as que criam o sistema público de educação pré-escolar e as escolas normais de educadores de infância, e a respeitante ao ensino da língua e da cultura portuguesas no estrangeiro.
3 - Apoia os esforços tendentes à proclamação e celebração da Década da Criança no contexto de uma política de paz e desanuviamento correspondendo aos interesses profundos dos povos, e das crianças portuguesas e de todo o mundo.
Assembleia da República, 29 de Maio de 1980. - Os Deputados: Ercília Talhadas - Maria Alda Nogueira - Veiga de Oliveira - Vital Moreira - Lino Lima - Maria Ilda Figueiredo - Jerónimo de Sousa - Francisco Miguel Duarte - Victor de Sá - Josefina Maria Andrade.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia e vamos entrar na primeira parte do período da ordem do dia da qual consta a apreciação e votação de uma proposta de resolução do PCP.

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Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino Lima.

O Sr. Lino Uma (PCP): - Sr. Presidente, Srs Deputados: Durante o debate sobre o projecto de lei n: 439/I, apresentado pelo partido Comunista Português visando criara Faculdade de Direito da Universidade do Porto, os deputados que constituem a maioria desta Câmara invocaram razoes diferentes para o rejeitar e, consequentemente, para impedir que as gentes do Porto e do Norte vissem satisfeita uma velha aspiração. Em resumo, e fundamentalmente, o CDS invocou a autonomia da Universidade para votar contra. No seu entender só à Universidade do Porto compeliria propor a criação de mais uma Faculdade dentro dos seus muros. Isto para além de julgar que seria desnecessário criar uma terceira Faculdade de Direito numa cidade onde já existem duas de índole privada. Os Deputados reformadores invocaram razão idêntica a esta última considerando mesmo que a Faculdade existente na Universidade Católica podia suprir a criação de uma nova escola pública desde que o Estudo com aquela fizesse um acordo. O PPM votou contra porque decisões como a que se discutia deviam integrar-se numa planificação efectuada pelo departamento competente do Executivo.
Pensava, no entanto, que o Governo, sensibilizado pelo objectivo do projecto de lei, estará em condições para o realizar com a brevidade possível. O PSD afirmou-se partidário da criação da Faculdade de Direito proposta, entendendo, porém, que a competência para o acto pertence exclusivamente ao Governo. Assim, e embora por razões diferentes, todos estes grupos e agrupamentos parlamentares rejeitaram o projecto de lei do Partido Comunica Português.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: como a nós, comunistas, o que primacialmente interessa nesta matéria é garantir e facilitar o acesso ao ensino superior a todos quantos o queiram obter, nomeadamente os trabalhadores, regionalizar o ensino, diversificar a Universidade portuguesa; como a nós, comunistas, o que primacialmente interessa no caso, para concretizar aqueles objectivos, é que se crie na Universidade do Porto uma Faculdade de Direito, dando assim também satisfação a velhas aspirações do povo do Norte apresentámos a esta Câmara (logo após a rejeição do nosso projecto de lei) uma proposta de resolução recomendando ao Governo a adopção de providências legislativas e técnicas tendentes à criação, no mais curto prazo, ma Universidade do Porto, das escolas que permitam a licenciatura em direito.
Dadas as posições tomadas durante o debate do projecto de lei referido, estamos certas de que se irá formar uma maioria que aprovará a resolução proposta pelo Partido Comunista Português e que, por conseguinte, o Governo vai ficar moral e politicamente comprometido a dotar a Universidade do Porto, em breve prazo, com o ensino do direito. Isto muito embora venha a suceder, se a coerência e a vergonha não forem palavras vãs, que a maioria estabelecida nesta Assembleia desde as últimas eleições se venha a romper nesta circunstância. O objectivo último do Partido Comunista Português vai com certeza alcançar-se. E isso é o que importa. O resto vai ser só espectáculo...

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Continua o debate. Não havendo mais intervenções sobre esta matéria, passamos à votação.

Pausa.

Como não há mais intervenções, vamos a proposta de resolução apresentada pelo PCP.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Dias.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Presidente Srs. Deputados: Queria muito simplesmente dizer que votámos a favor da proposta de resolução PCP não porque nos preocupassem especialmente as preocupações relativas à maioria expressas pelo Sr. Deputado Lino Lima mas porque o texto desta resolução está de acordo com a posição que toma-mos durante o debate do projecto de lei do sobre a mesma, matéria.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Ai se o Sr. Deputado Narana Coissoró o ouve, Sr. Deputado!...

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós queríamos dizer apenas que, como era normal, votámos a favor do requerimento porque essa é a forma de fazer avançar um projecto que nos parece importante que seja realizado. Em todo o caso lamentamos que para estabelecer uma maioria nesta Assembleia seja preciso governamentalizar uma proposta do PCP que nos parecia, de base, justa e baseada nas necessidades das populações.

O Sr Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Alberto de Sousa.

O Sr. Carlos Alberto de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Acaba esta Assembleia da República de apreciar uma proposta de resolução do PCP, datada de 13 do corrente onde se recomenda ao actual Governo a criação, no âmbito Universidade do Porto, de uma escola que a licenciatura em Direito. Tal proposta de resolução que aliás vem na sequência da não aprovação pela maioria AD desta Câmara do projecto de n.° 439/I, onde se pretendia a criação, por lei da Faculdade de Direito no Porto, vem, assim como então sustentámos, dar cumprimento ao preceituado constitucional e contribuir para que os estudantes, pais e encarregados de educação vejam a sua situacão melhorada já que, não obstante existirem no Porto duas escolas privadas a ministrar o referido

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curso, estão inscritos 96 na Faculdade de Direito de Coimbra cerca de oitocentos alunos oriundos dos distritos do Norte do País.
Com a revisão da posição da Aliança Democrática, vai, de facto, permitir-se que esta situação se transforme. E, pela parte que toca ao Partido Socialista, nós muito nos congratulamos de os Deputados da maioria AD terem rectificado a anterior posição c permitido assim que, através desta proposta de resolução, o Governo possibilita a criação da Faculdade de Direito do Porto.

O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos a favor desta recomendação pelos argumentos que aduzimos durante a discussão do projecto de lei sobre a criação da Faculdade de Direito do Porto, ao Partido Comunista Português. Dissemos durante essa discussão que éramos realmente a favor da criação da Faculdade de Direito do Porto, uma vez que isso era um velho e justo anseio das populações não só do Porto como da zona Norte do País, mas dissemos ainda que isso não competia a este Órgão de Soberania, à Assembleia da República, mas sim ao Executivo. E é dentro dessa linha que nós agora pensamos que esta recomendação é realmente positiva, pois que compete efectivamente ao Executivo criar a Faculdade de Direito do Porto.
Além disso penso que isso deve ocorrer depois da aprovação por esta Assembleia da República da Lei de Bases do Sistema Educativo que, essa sim, é a trave mestra do ensino em Portugal. E a partir daí creio que estão criadas todas as condições para que, de uma vez por codas, a Universidade Civil do Porto possa realmente ter um ensino completo, incluindo a sua Faculdade de Direito.

Aplausos do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: - Há mais algum Sr. Deputado que deseje usar da palavra para declaração de voto?

Pausa.

Como não há mais declarações de voto, dou por encerrada esta matéria e, ainda antes de entrarmos na continuação do debate que ontem ficou suspenso, dou a palavra ao Sr. Deputado Alexandre Reigoto, para proceder à leitura de um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS):

Comissão de Regimento e Mandatos

Relatório e parecer

Em reunião realizada no dia 29 de Maio de 1980, pelas 10 horas, foi apreciada a seguinte substituição de Deputados:

1 - Solicitada pelo Partido Social-Democrata:

Júlio Lemos de Castro Caldas (círculo eleitoral de Viana do Castelo) por Manuel Bento Sousa Silva. Esta substituição é pedida por um período não superior a um mês.
2 - Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é real e actualmente o primeiro candidato não eleito ainda não solicitado na ordem de precedência da lista eleitoral de entre os apresentados a sufrágio pelo referido partido no respectivo círculo eleitoral.
3 - Foram observados todos os preceitos regimentais e legais.
4 - Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

5 - O presente relatório foi aprovado por maioria, com os votos favoráveis do PSD, PCP, CDS, PPM, MDP/CDE e do Agrupamento Parlamentar dos Reformadores, votos contrários do PS e abstenção da UDP.

A Comissão: Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Secretário, Alexandre Correia de Carvalho Reigoto (CDS) - João Baptista Machado (PSD) - Bento Elísio de Azevedo (PS) - Herculano Ramos Rocha (PS) - Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP) - João António Gonçalves do Amral (PCP) - Lino Carvalho de Lima (PCP) - Francisco Gonçalves Cavaleiro de Ferreira (CDS) - Augusto Martins Ferreira do Amaral (PPM) - Luís Manuel Alves de Campos Catarina (MDP/CDE).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos o favor do PSD, do PCP, do CDS, e do MDP/CDE e votos contra do PS.

Srs. Deputados, vamos agora entrar na continuação da discussão conjunta dos diplomas que iniciámos ontem e que são os seguintes:

Proposta de lei n.° 284/I - entrada em vigor nas regiões autónomas dos diplomas emanados dos Órgãos de Soberania -, da Assembleia Regional da Madeira;
Proposta de lei n.° 285/I -Suspensão da aplicação nas regiões autónomas dos diplomas dos Órgãos de Soberania impugnados perante o Conselho da Revolução pelas respectivas Assembleias -, da Assembleia Regional da Madeira;
Proposta de lei n.° 303/I - entrada em vigor nas regiões autónomas dos diplomas emanados dos Órgãos de Soberania e dos publicados no Diário da República -, da Assembleia Regional dos Açores;
Proposta de lei n.° 304/I - suspende, nas regiões autónomas, a aplicação de diplomas cuja constitucionalidade seja impugnada pelas respectivas Assembleias -, da Assembleia Regional dos Açores;
Projectos de lei n.º 447/I e 448/I - sobre o regime de eleição das Assembleias Regionais dos Açores e da Madeira -, do PCP.

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Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lucas Pires.

O Sr. Lucas Pires (CDS): - Eu gostaria de usar da palavra mas, se o Sr. Presidente permitisse, aguardaria apenas um minuto porque me falta a última parte do meu discurso que está ainda a ser dactilografado.

O Sr. Presidente: - Certamente, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Gostosamente esperamos!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se o Sr. Deputado Lucas Pires necessita de muito tempo, talvez fosse melhor suspender a sessão por alguns minutos.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Eu penso que efectivamente é um pouco desagradável estarmos nesta situação, de maneira que pedia, nos termos regimentais, a suspensão da sessão por cinco minutos.

O Sr. Presidente: - Então, a sessão está suspensa por cinco minutos.

Eram 12 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, declaro reaberta a sessão.

Eram 12 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lucas Pires, faça o favor de intervir.

O Sr. Lucas Pires (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Numa apreciação na generalidade dos estatutos dos Açores e Madeira mais do que uma análise amiudada do articulado proposto justificar-se-á um debate sobre o próprio processo de autonomia no seu conjunto, assim como sobre as perspectivas gerais de cada partido a respeito do respectivo enquadramento e desenvolvimento.
O juridismo imediato e fácil que tem feito desta Câmara mais um areópago do que um cenáculo - mera antecâmara da Comissão Constitucional ou 1.ª instância do Conselho da Revolução -, deixa de lado aspectos essenciais e visões de conjunto, perdendo o domínio de questões tão complexas como a da autonomia regional.
Pelo meu lado, acho que a seguir à Assembleia Constituinte que escreveu a Constituição a Assembleia Legislativa não tem de passar o tempo a deslindar ou contemplar adortivamente o que a primeira Câmara escreveu. De resto, há suficientes poderes outorgados a outros órgãos para que esteja garantido que a leitura constitucional se fará à lupa e infelizmente até quase mais policial que judicial e judiciosamente.
É, pois, noutra perspectiva que eu colocarei a minha intervenção, remontando àquilo que tem sido, inclusivamente na sua versão, a certa altura dramática, a questão da autonomia regional.
Tal questão tornou-se de facto, uma questão nacional vital e constitucional no sentido mais profundo dessas expressões que os termos da Constituição ou sequer os termos jurídicos em geral não abarcavam facilmente. Evidentemente, houve para isso razões permanentes de carácter histórico e geográfico, subitamente, despoletadas, como na abertura de uma panela de pressão pelo estalar de toda a artificial ou antiquada constituição ultramarina portuguesa e pelo clima de generalizada abertura mesmo de explosão social que então se viveu em toda a alçada da soberania portuguesa.
Porém, tal dramatização, pela intensidade que assumiu, tem também, razões políticas e económicas de carácter conjuntural, as quais diziam respeito quer à situação política e económica vigente no continente quer à evolução da situação política internacional, sendo no primeiro destes planos que particularmente nos incumbe tomar consciência e tomar providências. Para além das exigências de uma autonomia orgânica de carácter histórico houve as exigências de uma autonomia mecânica que era o reflexo ou a resposta a situações e ideologias de centralismo patológico que se verificaram, e aliás se continuam a verificar, no continente.
É mesmo possível alinhar cinco razões principais de tal dramatização. Em primeiro lugar, a concentração política, económica e cultural a que um Estado ideológico e de extracção marxista como aquele se tornou oficial no continente é inevitavelmente atreito. A concentração económica, do tipo do que se produziu no 11 de Março com as nacionalizações, sempre gerou mais concentração política, perante a qual a resposta de autonomia não se podia fazer esperar e não podia deixar de tender a ser proporcional. O marxismo prefere sempre o centralismo e concentração mesmo nos Estados burgueses. Onde se verifique tal concentração, a sua luta pode mais intensa, mais fácil, mais directa mais global, centralismo social-marxista no continente era uma agressão directa à autonomia cultural de forte e maciça raiz cristã, à autonomia económica, radicada por um lado numa emigração liberal, na identificação com a terra, por outro lado, e na liberdade comércio, por último, que são o apanágio das do Atlântico.
Não admira, assim, que os Governos social-marxistas do continente tenham sido os mais desestabilizadores nas ilhas e tornou-se assim também claro que só um Governo com outro horizonte, um Governo da Aliança Democrática, poderia contribui para a desdramatização da justa autonomia e condições como as que hoje existem para a aprovação aqui nesta Câmara de um estatuto definitivo dos Açores e da Madeira.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Uma segunda razão da reivindicação, violenta da autonomia nas ilhas foi a falta de uma política de Estado, e a abundância de políticas de revolução e de políticas de partido ao nível do poder em Lisboa. Mais centralismo que o centralismo de Estado é sempre o centralismo de partido ou o centralismo da revolução, situação critica que histórica-

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mente é sempre vocacionada para a liquidação de todas as autonomias.
É mesmo contraditório que um Conselho da Revolução possa alguma vez ser pensado como garante constitucional da autonomia. Garantir a Revolução é sempre garantir, ou o jacobinismo ou o directório. Assim quando as ilhas reivindicavam mais autonomia não era só ou principalmente para pôr em causa uma parte da soberania portuguesa e ganhar aí mais espaço. Era sobretudo para pôr em causa os agentes os modos e as ideologias concretas desta mesma soberania, nessa altura em forma de acção revolucionária.
Mais do que de autonomia perante o Estado Português, aliás nessa altura inexistente ou em construção, tratava-se, sobretudo, de reivindicação de autonomia perante uma certa revolução e perante certos revolucionários.
Neste contexto se pode dizer, inclusivamente, que a luta pela autonomia tem sido, também, feita pelo Estado ou a luta por outro Estado português no seu conjunto. O que aliás, prova ainda à sua maneira, que não bastará outra autonomia para resolver o problema da autonomia. São também essenciais outra concepção e outra organização do Estado Português no seu conjunto.
Uma terceira razão que excitou desavenças e dramatizou, relações foi o modo como a descolonização se processou. O fim da expansão gera um inevitável fenómeno de contracção sobre si mesmo, tal e qual como no movimento de um fole. Sabe-se como sístole e diástole são movimentos recíprocos. Os Açores e a Madeira, que eram caminhos de África até então, vêem-se subitamente amputadas dessa sua dimensão histórica. De Atlântico intermédio ou até interior vêem-se postos nas condições de Atlântico-fronteira ou Atlântico-limite. Não são mais etapa ou entreposto do torna-viagem, mas limite da própria capacidade descobridora, e a própria sujeita ao risco de ser sacrificado no meio da violência ou voragem entreguista. O poder de Lisboa ao demonstrar-se incapaz de dominar 3 dirigir um processo como a descolonização tornou-se ele mais uma ilha, senão até uma espécie de boat-people, perdido no conjunto de um enorme despejo colectivo e sumário.
Um Estado nestas condições não era protector e a sua força autodestrutiva era mesmo bem maior do que a sua capacidade de protecção. A autonomia podia inclusivamente assumir o carácter de um resguardo perante tais riscos. Quando chega a parecer que a descolonização se prolongou até à transferência da própria soberania para outrem, para outros, a que já reconhecíamos mais soberania que a nós próprios mesmo daquela soberania que era a originária e própria sobre si mesmo - então a exigência de autonomia quase se: assemelha à recuperação da verdadeira soberania nacional no seu conjunto.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: -Em quarto lugar, é preciso compreender como a autonomia das ilhas foi sempre uma arma contra formas de ocupação do continente, riscos de iberismo ou ameaças, à liberdade dos Portugueses. Basta dizer que Angra do Heroísmo foi por duas vezes capital de Portugal e, como dizem orgulhosamente os habitantes da Terra, ali foi Portugal quando já nada mais o era. A autonomia item sido, pois, uma dupla parente e garante da liberdade e da nacionalidade de todos os portugueses no seu conjunto e continuou a sê-lo decisivamente depois do 25 de Abril. Enquanto a liberdade e a independência nacional correrem riscos, a autonomia das ilhas tem de ser também uma arma e não apenas uma função, para além da sua condição permanente e autêntica.
Houve manifestações de resistência muito importantes nas ilhas que precederam o 25 de. Novembro e são datas significativas na escalada da resistência. Os partidos- da Aliança Democrática sempre tiveram a maioria nas ilhas e lá se percebeu também muito cedo que o 25 de Novembro, afinal, não chegava para o ,que era preciso enquanto não encontrasse ele próprio uma perspectiva consolidada de Estado capaz de se concretizar e institucionalizar. A autonomia funcionou, pois, também, e continuará a funcionar como forma derivada do direito constitucional de resistência.
A luta pela autonomia das ilhas era, afinal, solidária da luta aqui conduzida em Portugal, pela autonomia da sociedade civil, pela Aliança Democrática contra o usurpador que era o Estado socialista.
Em quinto e último lugar, a integração das ilhas foi prejudicada pela falta, não apenas de uma arquitectura de Estado, como pela falta de uma política externa coerente e pelas inflexões neutralistas e terceiro-mundistas da nossa política externa. O neutralismo no meio do Atlântico é a insegurança. Os Açores, por exemplo, podem ser concebidos tanto como a fronteira da Europa no Atlântico ou como a fronteira avançada da América no Atlântico ou como a ponte entre a América e a Europa - condição que, aliás, se reflecte na amplitude cultural, ora pró-americana ora pró-europeia dos, Açorianos mas que, em qualquer caso, reflecte o seu profundo enraizamento ocidental. O que as- ilhas não têm a ver é com o terceiro-mundismo. Este correspondia a deitar as ilhas pela borda-fora e passar ao seu largo. Mas é isso que tem acontecido. De resto, neste domínio muitos Governos anteriores demonstraram tanto mais avareza com a autonomia das ilhas quanto mais subserviência demonstravam com as grandes potências, por exemplo, ou algumas das antigas colónias. O que parece ser uma injustiça paga da fidelidade e traduz, também, de uma dupla maneira, a falta de confiança do próprio Estado Português em sim mesmo.
É, pois, urgente repensar o problema de autonomia e assumir as nossas responsabilidades, nesta matéria, do lado de cá.
A aprovação destes estatutos definitivos será uma etapa importante na assunção dessas responsabilidades. Talvez os Açorianos & os Madeirenses aniles de mais, o povo da Madeira e dos Açores apenas não queiram é ser «nacionalizados» ou «socializados», no mesmo sentido que essas expressões adquiriram no 11 de Março.
A uns e a outros cabe enquadrar a sua parte da vida nacional encerrando o ciclo da desconfiança mútua para assim conseguir ao mesmo tempo mais autonomia, regional e mais unidade nacional. É um esforço que passa, sem dúvida, por uma autonomia que não seja só resistência, mas seja, sobretudo, participação - participação de que a iniciativa autonó-

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mica desde estatuto é uni primeiro aval. É preciso repercutir a autonomia no espaço metropolitano e não apenas as decisões metropolitanas no espaço regional.
Autonomia tem de funcionar tanto de lá para cá como de cá para lá. As regiões autónomas não podem, pois, ser o mais pequeno; círculo interno de uma série de círculos concêntricos e é indispensável que toda a política externa e de defesa nacional portuguesa sejam integrados e perspectivados em função do triângulo constituído pelo continente os Açores e a Madeira.
Isto é, também, o mesmo que dizer que a autonomia deve ser tratada, naturalmente como um princípio e não patologicamente como uma excepção. Donde deveria resultar um controle meramente constitucional, legal e jurisdicional do seu exercício, mas nunca um controle político ou administrativo do seu funcionamento. Na sua esfera própria, a região deve exercer os seus poderes com a mesma independência e com mesma autoridade que o Estado Português na respectiva esfera. Não deve haver ou devem ser reduzidos ao mínimo os controles de oportunidade politica embora devam ser reforçados os controles de legalidade e da constitucionalidade. O controle a exercer deve ser mais sobre funções do que sobre órgãos e deve ter mais carácter sucessivo do que preventivo.
É por tudo feto que se é verdade que é necessário aperfeiçoar na especialidade um ou outro aspecto avulso dos Estatutos ora propostos, cuja apreciação nos incumbe, é, também, verdade que não é menos necessário melhorar alguns aspectos avulsos da própria Constituição Política em matéria de regiões autónomas. Há que institucionalizar a própria noção de Estado, sem complexos antiautonomistas. Valha-nos neste aspecto, a superioridade de dois dirigentes que muito têm ajudado a resolver em termos de equilíbrio e de Estado o problema da relação entre autonomia regional e soberania nacional. Refiro-me ao Dr. Mota Amaral e ao Dr. Alberto João Jardim. Trata-se de dois verdadeiros estadistas e houve até uma altura em que, paradoxalmente, parecia só haver estadistas, não no Estado mas nas regiões.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É-lhes neste momento devida uma homenagem por todos os portugueses.
Vamos agora a ver como reagem os «estadistas» de cá, a estes Estatutos e à sua possível aprovação na Assembleia da República. Os Açores e a Madeira estão longe e o Conselho de Revolução é capaz, de ter dúvidas sobre se a sua soberania chega até lá. Vamos a ver. As decisões políticas medem-se às vezes também por quilómetros e com as decisões do Conselho da Revolução não são senão decisões políticas é natural quão Comandante Almeida e Costa passa agora ganhar a dianteira sobre a major Melo Antunes dir-se-ia até porque a marinha pode ter mais a noção das questões atlânticas e das distâncias, marítimas)...
Sr. Presidente, Sr». Deputados: A aprovação dos Estatutos da Madeira e dos Açores é uma etapa importante na estabilização e no desenvolvimento democrático em Portugal. Felicitamo-nos e felicitamos as populações, os órgãos, e os dirigentes das regiões assim como os «ossos colegas Deputados, de todos os partidos, representantes das Regiões Autónomas dos Açores e Madeira.

Aplausos da AD.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado António de Freitas.

O Sr. António Vieira de Freitas (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Lucas Pires fez aqui uma afirmação a respeito da personalidade dos presidentes dos governos regionais, ou seja, do Dr. Mota Amaral e do Dr. Alberto João Jardim.
Acontece que a opinião do CDS na Madeira é precisamente o contrário daquela que aqui foi definida pelo Sr. Deputado Lucas Pires, porque o Dr. Alberto João Jardim é, na verdade, um homem de um partido e é um homem cujas opiniões, truculentas não revelam a dignidade e a personalidade de um verdadeiro homem de Estado...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - É falso!

O Orador:- ..., tal como acontece com o Dr. Mota Amaral.

Vozes do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - Por conseguinte, essa opinião de que nós socialistas, na Madeira, estamos plenamente de acordo com a opinião do CDS local vem precisamente contraditar a opinião aqui formulada pelo Dr. Lucas Pires.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Lucas Pires: Na sua referencia a um juridismo fácil julguei ver uma referência à minha intervenção, o que muito lhe agradeço. No entanto, sinto-me no dever de lhe retribuir a referência dizendo que o Sr. Deputado recorreu a um filosofismo ainda mais fácil.
A intervenção do Sr. Deputado não me deixou a certeza se o Sr. Deputado leu ou não os projectos da Madeira e dos Açores, tão nenhuma foi a referência ao conteúdo desses mesmos projectos. Admito que sim, mas, die qualquer modo, esta minha referência só tem o conteúdo de que podia ter feito a intervenção que fez sem ter lido nenhum desses projectos. Reconheça que, de facto, é assim.
Não temos que contemplar adorativamente o que a Constituição escreveu. Temos de o contemplar juridicamente, e aí a necessidade de recorrermos a conceitos jurídicos e de denunciarmos as dúzias de inconstitucionalidades que chamou a si o homem de Estado, o qual o Sr. Deputado aqui felicitou pela sua conduta política.
Estamos de acordo em que quanto aos Açores isso não se verifica no mesmo nível embora haja pontos de pormenor em relação aos quais também teremos de discordar.
Devo dizer-lhe que não vi à lupa -como me pareceu estar implícito na sua referência - os dois projectos, pois para isso seriam necessárias horas por-

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que os defeitos, sobretudo da Madeira - mas em parle também dos Açores - vistos à lupa são muito mais, embora nem todos da mesma gravidade que eu referi.
Na intervenção do Sr. Deputado havia dois pontos sobre os quais gostaria que me esclarecesse. O Sr. Deputado disse que -e creio ter reproduzido fielmente - «as regiões devem usufruir da mesma autoridade do Estado na respectiva esfera». Agradecia, pois, que me esclarecesse qual é o conteúdo exacto desta sua referência.
Por outro lado, o Sr. Deputado disse também que devemos melhorar aspectos avulsos da Constituição Política sobre a autonomia. Neste aspecto estamos de acordo, pois acho que os conceitos autonômicos da Constituição podem ser melhorados. Conteúdo, gostaria de saber se em todo o caso o Sr. Deputado não acha que é cedo para os fazermos e impróprio o caminho de rever a Constituição através de simples leis ordinárias, mesmo quando essas leis ordinárias são os Estatutos das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.
O Sr. Deputado Lucas Pires referiu .ainda que tudo se resume numa palavra: centralismo! E, ao que parece, nós seríamos responsáveis por esse centralismo e o Sr. Deputado e o seu partido seriam defensores de uma descentralização. Gostaria, pois, de perguntar desde quando, porque não me parece que isso corresponda ao passado dos nossos dois partidos.
Como ontem aqui referi, a autonomia deu os primeiros passos pela nossa mão, deu-os bem e firmemente, e não nos parece que, depois de nós, alguém tenha podido levar mais longe o conceito de autonomia « a sua prática do que a levou o Partido Socialista.
Portanto, Sr. Deputado Lucas Pires, pedia-lhe o favor de me clarificar estes pontos e desde já lhe agradeço.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lucas Pires para responder, se- assim o desejar.

O Sr. Lucas Pires (CDS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: É com muito gosto que respondo às questões que me foram expostas.
Quanto às observações feitas pelo Sr. Deputado António Vieira de Freitas que entende haver uma. contradição entre a minha opinião sobre o Sr. Dr. Alberto João Jardim e os membros do meu partido da ilha da Madeira, poderia responder aquilo que ontem foi aqui dito pelo Dr. Almeida Santos em resposta a uma. observação do Partido Social-Democrata que é a seguinte: entre nós há também autonomia e, no fundo, as questões são decididas por votos e, finalmente, chega-se a uma posição comum.
Contudo, vou responder-lhe de outra maneira e não apenas por esse argumento. Gostaria, pois, de lhe dizer que falei de estadistas e não de chefes partidários nem de relações partidárias. Como membro do CDS posso ter uma opinião em relação às opções partidárias do Dr. Alberto João Jardim e outra opinião ao nível da análise pessoal e da capacidade de elevação a nível de estadista. Por outras palavras, posso ter uma opinião favorável a respeito do Chanceler Helmut Schmidt como estadista e, no entanto, ninguém suspeita de que eu tenha qualquer ligação
com o Partido Social-Democrata alemão ou muito menos com a Internacional Socialista.
Portanto, foi a esse nível que exprimi uma opinião sobre o Dr. Alberto João Jardim, além de que, naturalmente, o CDS é um partido que sempre assegurou às suas estruturas regionais tanta ou mais autonomia do que aquela que defende no plano do Estado e no da Constituição para as Regiões dos Açores e da Madeira. Inclusive, nos próprios estatutos partidários, o CDS da Madeira diz-se CDS-Madeira. Acrescenta esse tópico e, portanto, tem uma bastante grande autonomia em termos partidários.
Quanto às observações do Sr. Deputado Almeida Santos, devo dizer-lhe que quando pensei em juridismo fácil não me estava a referir ao Sr. Deputado Almeida Santos, até porque julgo que, o juridismo do Sr. Deputado não é fácil, acho que é bastante rebuscado. Portanto, creio que está juntamente nas antípodas do juridismo elementar e até às vezes correspondente ao bom senso comum ou à primeira aproximação e à primeira visão das coisas. Aliás, devo dizer que quando digo que é rebuscado não quero dizer que não seja juridicamente e até tecnicamente muito perfeito ou muito capaz - juízo esse que, aliás, não quero exprimir porque acho que esses juízos não são para ser feitos entre pessoas da mesma condição profissional.
Em todo o caso, quando o Sr. Deputado diz que eu poderia ter feito o discurso que fiz sem ter lido os Estatutos, acho que essa observação é verdadeira mas também num outro sentido: no sentido que, por exemplo, o discurso do Sr. Deputado foi de tal modo uma leitura crítica dos Estatutos que eu me podia ter dispensado dessa leitura pois bastava ter ouvido o discurso do Sr. Deputado para ter fitado a saber o que é que dizia o Estatuto da Madeira e o Estatuto dos Açores.

Risos do CDS.

Nesse sentido é, de facto, verdade que eu me podia ter dispensado de ler os Estatutos. Mas só nesse sentido porque nesta Assembleia suponho ter alguma tradição de intervenção em vários debates e creio que nunca fui apanhado em falso em relação as questões sobre as quais falo, embora durante alguns anos o teor típico da minha intervenção fosse ligeiramente diferente daquele que neste momento faço por razões de colocação política e partidária.
Por outro lado, acontece também que o Sr. Deputado Almeida Santos me pergunta o que é que eu quero dizer quando digo que as regiões devem dispor da mesma independência e autoridade na respectiva esfera de que o Estado dispõe.
Talvez porque o hábito parlamentar estimula ou excreta uma certa violência, estava quase tentado a responder que é lamentável que as pessoas que lêem muno as leis, as propostas e os códigos foram pouco os textos e as doutrinas. É porque essa fórmula que utilizei é justamente uma das mais faleónicas da doutrina constitucional sobre a matéria de autonomia. E daquelas que: respondem ao tal juridismo fácil ou elementar em matéria de autonomia regional e que; muito simplesmente e muito chamejo, quer dizer que ao nível daquilo que o Sr. Deputado

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Almeida Santos no seu discurso chamou a Constituição de 2.º grau, que é o Estatuto das Regiões, Autónomas, ao nível desse 2.º grau essa competência exerce-se na sua total plenitude e independência, e que a autonomia! é verdadeira se for controlada por tribunais com independência contenciosamente e, se não for, controlada por superiores hierárquicos como, por exemplo, ora o Ministro do Ultramar em relação à chamada autonomia das ex-colónias.
Portanto, no fundo, o que eu quis dizer foi que só há verdadeira autonomia quando não há um Ministro do Ultramar ainda que camuflado, com outros nomes, e agora não em relação a ex-colónias mas sim em relação às regiões autónomas.
Quanto ao problema do centralismo e de se saber se o Partido Socialista é descentralizador, quero dizer que sobre este assunto há a possibilidade de uma discussão bastante longa. Eu sempre fui partidário de que à liberdade económica corresponde liberdade política e vice-versa; que ao centralismo económico corresponde centralismo político e vice-versa.
Portanto, o que eu quis dizer é que tanto o centralismo económico que o Partido Socialista subscreve e não nega, como, inclusive, o centralismo político e até do ponto de vista da avaliação constitucional que o Partido Socialista subscreve, tudo isso está inteiramente ligado. É evidente que isto pode ser discutível, mas o Partido Socialista não renegou até hoje nem a ditadura do proletariado, nem o centralismo democrático, nem as conquistas irreversíveis, a nacionalização da banca e dos seguros.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Deputado Lucas Pires, para vencer a minha perplexidade gostaria que me dissesse onde é que o Partido Socialista afirmou a defesa da ditadura do proletariado, para depois ver se teríamos ou não tido a obrigação ou a necessidade de a desmentir.

O Orador: - Ó Sr. Deputado, neste caso eu estava a referir-me ao Partido Comunista.

Vozes do PS: - Estava a referir-se ao Partido Socialista.

O Orador; - Então peço desculpa! Queria dizer Partido Comunista.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Até já confunde os dois!

O Orador: -Acho que, de facto, nós defendemos perspectivas descentralizadoras e liberais em todas as matérias da vida portuguesa, embora estranhamente as pessoas vejam por trás disto preocupações e projectos autoritários. Toda a gente está no direito de ver os fantasmas que entende por trás dos projectos dos outros - isso é um fenómeno psicológico e psiquiátrico conhecido que às vezes se chama transferência.
A verdade, porém, é que, de facto, não temos nenhum fantasma por trás desta realidade que é a defesa pura e simples da descentralização de um projecto de liberdade e de pluralismo em todos os domínios, quer económico, político, etc.
Foi, pois, isto que eu quis dizer e suponho que estão respondidas todas as perguntas que o Sr. Deputado Almeida Santos me colocou.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira para uma intervenção.

O Sr. Medeiros Ferreira (OR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A discussão na generalidade a que estamos a assistir sobre diplomas referentes à autonomia do Açores e da Madeira, nomeadamente os estatutos das regiões, obriga-nos a uma reflexão sobre a experiência autonômica encetada com o 25 de Abril de 1974. Mas para melhor se compreender o fenómeno autonômico, haverá que fazer um breve bosquejo histórico e ver o que há de original nesta fase contemporânea da autonomia.
Por diferentes razões, sobretudo por razões de sistemática, irei referir-me apenas à autonomia da Região dos Açores.
O que há de verdadeiramente original no processo autonômico desencadeado após o 25 de Abril de 1974 é, em síntese, a regionalização e os órgãos de poder democraticamente eleitos.
De facto, historicamente, a primeira vez que os Açores são olhados no seu conjunto como envidada administrativa é com a criação, pelo Marques de Pombal, em 1776, de uma só província no arquipélago, cujo Governo com sede em Angra estava a cargo de um general que acumulava as funções administrativas, militares, policiais e judiciais. Como corolário desse sistema altamente centralizador, os capitães-generais tinham em todas as ilhas delegados seus, autênticos governadores locais, embora meros executores das suas ordens.
Dir-se-á assim que pela primeira vez que o arquipélago dos Açores é visto como entidade administrativa é para se criar um sub-sistema altamente centralizado com sede na própria Região.
Este Governo dos capitães-generais durou sessenta e cinco anos.
Só pela reforma administrativa decretada a 16 de Maio de 1823 pelos liberais os Açores ficam ainda a constituir uma só província com capital em Angra, mas a partir desta data e aproveitando as sequelas das lutas entre absolutistas e liberais como entre cartistas e reformistas, Ponta Delgada vai encetar uma luta vitoriosa para se libertar de Angra, luta bem simbolizada na proclamação da Junta Governativa de S. Miguel no seguimento da Maria da Fonte. Esta Junta, embora de duração efémera, marcou o fim do centralismo interno açoriano.
O processo autonômico da segunda metade do século XIX vai encetar-se assim dentro de uma perspectiva distrital, já que a entidade administrativa «arquipélago dos Açores» havia sido criada mediante um duplo centralismo: o centralismo de Lisboa e o centralismo do capitão-general.
A autonomia consagrada em 1895 baseou-se, pelo seu lado, no aprofundamento da divisão administrativa «distrito» com a criação de três distritos. Essa divisão foi, aliás, acentuada pela disposição legal que obrigava a que cada distrito solicitasse a autonomia por si própria -portanto, independente dos outros - e por dois terços dos seus cidadãos eleitores.

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A vitória eleitoral arrancada pêlos autonomistas açorianos, nessa altura Aristides da Mota e [...] Sequeira, ao partido do poder em Lisboa - nessa altura o partido regenerador -, através de um movimento grupando os autonomistas açorianos para além dos seus créditos políticos nacionais desde os regeneradores aos progressistas, desde os monárquicos aos republicanos, teve na realidade tal força que nem o ladeamento das câmaras impediu a publicação do célebre Decreto-Lei de 2 de Março de 1895.
No entanto, pode dizer-se que esse decreto-lei limitou ainda em muito as aspirações autonômicas e, na realidade, só vamos encontrar alguns passos positivos em relação à autonomia em disposições dai Lei n.° 88, de 1913.
No entanto, essa lei iria ser limitada no seu alcance por um Decreto de Julho de 1928 que suprimia a eleição das juntas gerais, instituía os procuradores natos que eram funcionários do Estado, e revogava a disposição do artigo 87.°, § 5.° da Lei n.° 88, de 1913 que proibia a criação de novas despesas sem imediata contrapartida nas receitas.
A partir de 1928 inaugurou-se a filosofia dos subsídios.
Finalmente, o Decreto-Lei n.º 31 095 fez entrar em vigor o Estatuto dos Distritos Autónomos das Ilhas Adjacentes em 1940, o qual, com algumas, modificações introduzidas em 1947, foi o diploma legal que regeu a vida do arquipélago até ao 25 de Abril de 1974, e consagrava a tal autonomia que num projecto da Junta Regional dos Açores em 1975 se chamava «mais nominal que efectiva».
Por outro lado, as grandes discussões sobre a autonomia que precederam a aprovação da Lei n.° 3/71, ou seja, a revisão constitucional de Marcelo Caetano, não se referem aos arquipélagos, dos Açores e da Madeira. Ao que resulta da leitura dos debates então travados, em realidade não há nenhuma referência à autonomia, dos Arquipélagos dos Açores e da Madeira nessa revisão constitucional datada de 1971. E, como se diz no já citado preâmbulo do projecto de estatuto político-administrativo da Região dos Açores, os tempos, com efeito, não propiciavam as reformas.
Estamos, pois, aptos a considerar como um dos elementos originais próprios do actual processo autonômico a regionalização. De facto, a autonomia democrática consagrada em 1976 destina-se a operai num espaço radicalmente novo em termos de Açores que é a região.
O conceito da região aparece, em geral, nos nossos dias, como uma entidade favorável ao desenvolvimento endógeno equilibrado, encarado este na sua globalidade económica e social. A regionalização é assim um fenómeno geral enquadrado na problemática de uma participação democrática das populações na realização das suas aspirações económicas e sociais e que, no cso concreto dos Açores, tem vindo a tomar uma expressão política e cultural, e onde, a meu ver, as potencialidades da autonomia jogam a sua capacidade de resposta. Gostaria de acrescentar que, dentro dessa perspectiva, estão os Açores em plena experiência--piloto no qual se entrelaçam forças inovadoras ligadas às necessidades contemporâneas de autonomia, regionalização e desenvolvimento, vistas estas como factores de atenuação dos desequilíbrios entre regiões ricas e regiões pobres e isso quer em termos nacionais, quer em termos mundiais.
Essa frente interna em que tem de operar a autonomia constitui, como vê, o verdadeiro desafio a colocar aos açoreanos. Não é necessária a criação de qualquer inimigo externo.
A autonomia que lhe foi consagrada em 1976 é para tojos os efeitos uma autonomia constitucional, daí que os órgãos, da Recito sejam órgãos regionais e não de soberania. A autonomia constitucional é assim como o fermento na massa da soberania comum.
No preâmbulo do projecto de Estatuto da então Junta Regional dos Açores em 1975 afirma-se: «Uma autonomia destas só Os açorianos podem dizer como a querem e só eles podem avaliar até em que medida a suportam. Daí que o presente Estatuto tenha muito de gradual, de provisório, e susceptível de modificações que só à experiência, vivida dos interessados terá a legitimidade para delinear e impor.»
Vejamos então como a Assembleia Regional dos Açores concebeu o seu projecto de estatuto que, como sabemos, foi votado por unanimidade.
Assim, no titulo I dos princípios gerais, muitas das disposições consagradas neste título são praticamente aguais às dos estatutos provisórios.
Saliente-se, no entanto, que além das ilhas, são incluídas na Região Autónoma «o mar circundante e seus fundos definidos como águas territoriais e zona económica exclusiva». Não está dito no Estatuto mas presume-se que é nos termos da Lei n.° 37/77, promulgada por esta Assembleia da República.
Um dos pontos que parece levantar maiores dúvidas é o artigo 8.°, que prevê a possibilidade de uma organização judiciária própria para os Açores, opção que, logo à partida, levanta muitas dificuldades, já que parece ser o tapo de matéria com a mesma regulação em todo o território nacional. É certo, no entanto, que em defesa da proposta apresentada se pode argumentar com a circunstancia de a organização judiciária do País não levar em conta a especificidade derivada da insularidade, bem como as dificuldades reais que se têm deparado no funcionamento dos tribunais, na Região.
O artigo 9.° prevê que a Região tenha uni sistema fiscal adequado à realidade económica e às necessidades do seu desenvolvimento e que possa ser adequado ao sistema fiscal nacional. Este ponto levanta várias questões: do ponto de vista teórico entendeu-se durante muito tempo que só o Estado Central detinha poderes tributários com essa amplitude, mas é certo que a tendência moderna vem a reconhecer a possibilidade da formação de outros espaços fiscais quer a nível substatuais como será o caso da Região, quer a nível transnacional, como é o caso da fiscalidade derivada da comunidade económica europeia.
Do ponto de vista prático a pretendida autonomia financeira consagrada na Constituição, bem como a existência de um poder de aprovar anualmente um orçamento próprio e ainda um plano regional específico parecem reforçar a convicção de que deve ser possível ás regiões autónomas poder alterar essa componente fundamental de qualquer política económica e que são os instrumentos tributários.
Do ponto de vista. constitucional, algumas dificuldades podem resultar desse facto, e talvez fosse conveniente que na próxima revisão constitucional

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se pudesse atribuir aos governos regionais a faculdade de pedir a esta Assembleia da República autorização legislativa para estas matérias, o que talvez daria uma base legal e constitucional mais rigorosa e mais segura.
Sobre o título II é uma matéria referente as assembleias regionais e aos Deputados e não traz grandes inovações em relação aos estatutos provisórios ou àquilo que está previsto em matéria de eleições para a Assembleia da República e aqui o Agrupamento Reformador não poderá deixar de tecer a mesma critica que tece à Lei Eleitoral geral, que é o tecto de também aí não estar prevista a inclusão de candidaturas independentes.
A criação feita pelo n.º 3 do artigo 11.º de dois círculos, um correspondente aos açorianos residentes noutras parcelas do território nacional e outro para residentes no estrangeiro é, de facto, uma inovação de relevo.
Em relação às competências do Governo não se prevê alterações significativas, havendo mais uma vez a registar sobretudo aperfeiçoamentos técnicos na redacção dos preceitos.
Sobre, o título III a alteração mais significativa parece ser a de se passar a exigir que seja ouvida a Assembleia Regional antes da nomeação do Ministro da República e que o Primeiro-Ministro ouça o Governo Regional antes de formular a proposta.
Esta é já uma prática corrente c, de facto, não creio que venha alterar substantivelmente o que já acontece.
O título IV é sobre as relações entre os Órgãos de Soberania e os órgãos regionais.
Ê uma matéria completamente nova nos estatutos e que parecem útil porque vem precisar uma série de questões que ate agora se apresentavam como conflituais entre os governos regionais e o Governo da República, prevendo até a celebração de protocolos de colaboração que não é inovação dado que já existem alguns precedentes.
O titulo V sobre administração regional é inovação mais significativa e quanto a nós louvável. É a criação de um conselho consultivo em cada ilha designado por conselho da ilha com poderes em larga medida ainda a definir por decreto regional.
O título VI sobre o regime económico e financeiro prevê a comparticipação do Estado Central nas despegas com investimentos, o que evidentemente é de apoiar dado o atraso de desenvolvimento económico devido à insularidade, e consagra a nível de Estatuto a prática já introduzida por anterior legislação de recurso à dívida junto do Banco de Portugal.
No entanto, há uma lacuna em todo esse Estatuto que não gostaria deixar de realçar. Todo o Estatuto está orientado numa filosofia de autocentração dos poderes da Região e existe uma lacuna que creio que com a próxima revisão constitucional se poderá colmatar: é que não está previsto nenhum enlace institucional entre a Região Autónoma e os órgãos nacionais. Digamos que a falta de alguns laços de consertação entre as regiões e os órgãos de Soberania creio que terá de ser colmatado na próxima revisão constitucional.
Desde já se poderiam fazer algumas sugestões, como as regiões autónomas estarem representadas enquanto tais ao nível máximo do Conselho Nacional do Plano. E se a próxima revisão constitucional vier a consagrar órgãos do tipo do Concelho Estado ou do Conselho Nacional de Segurança, creio que as regiões autónomas devem estar representadas enquanto tais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, numa visão evolucionista das instituições em Portugal no sentido de uma democracia estável, temos todos interesse que a experiência da autonomia vingue com serenidade. Como dizemos no Manifesto Reformador «a dimensão atlântica de Portugal é lhe dada também pelas suas imas dos Açores e da Madeira;, quais, constituídas em regiões autónomas depois da Revolução de Abril, vêm impondo a sua personalidade e concorrendo para aumentar as virtualidades do poder nacional no mundo.
Para já, as atribuições, as competências e o contexto contemporâneo da autonomia dão à experiência autonômica um relevo, um valor e uma esperança jamais igualadas. Trata-se, de facto, de fazer da autonomia um meio de dignificação do homem insular e um factor de aperfeiçoamento da democracia portuguesa».

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, os trabalhos estão suspensos até às 15 horas.

Eram 13 horas e 5 minutos.

No recomeço da sessão assumiu a presidência Sr. Vice-Presidente Martins Canaverde.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa lembra à Câmara que não há inscrições para intervir sobre este ponto da ordem de trabalhos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós estamos em condições de inscrever um Deputado para intervir, só que somos o partido que dispõe de menos tempo e somos o partido que ontem utilizou e ultrapassou o seu tempo para se pronunciar sobre as questões das regiões autónomas. Pensamos, por isso, que era correcto que outros partidos gastassem o seu tempo, interviessem e marcassem as suas posições. Se não houver ninguém para intervir inscreveremos um Deputado para que a sessão não esteja paralisada.

O Sr. Gualter Basílio (PS):-- É o respeito da maioria pela Câmara!

O Sr. Presidente:-Em primeiro lugar, quero recordar ao Sr. Deputado Carlos Lage que o PS tem tanto tempo como o CDS, cinquenta e um minutos.

O Sr. Carlos Lage (PS):-Se o Sr. Presidente me permitir, lembro que ontem partidos da maioria não chegaram a gastar o seu tempo e que o Partido Socialista o ultrapassou fazendo uma intervenção de fundo. No entanto, inscrevemos para já o Sr. Deputado António Vieira de Freitas para fazer uma intervenção.

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O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Deputado António Vieira de Freitas.

O Sr. António Vieira de Freitas (PS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: O estatuto político-administrativo da Região Autónoma da 'Madeira que hoje é submetido a votação no Plenário da Assembleia da República recolheu a aprovação na generalidade dos Deputados socialistas na Assembleia Regional. As propostas de alteração do nosso grupo parlamentar visavam substancialmente corrigir desvios que se nos afiguram atentatórios contra a Lei Fundamental do País. O nosso camarada Dr. Almeida Santos leve o ensejo de demonstrar com o rigor e precisão jurídicas que lhe reconhecemos as inconstitucionalidades mais flagrantes do referido documento; verifica-se, no entanto, ao contrário do que sucedia com o famigerado estatuto provisório, um esforço razoável do enquadramento nos moldes constitucionais, sem abdicar, contudo de forte autocratismo, subjacente em alguns artigos do estatuto; por mais paradoxal que pareça pretende-se descentralizar, concentrando no Governo Regional e mais concretamente no seu Presidente, um conjunto de poderes, perante os quais o Ministro da República não passa de figura decorativa.
Mas se o preâmbulo é positivo no enquadramento institucional das regiões autónomas e até nos objectivos fundamentais: «a meta programática do regime económico é a criação e distribuição de riquezas tendo em vista a igualdade de classes», o objecto da autonomia, tal como está definido, não deixa de ser aparentemente tranquilizador: «a autonomia da Região da Madeira visa a participação democrática e o desenvolvimento integral dos cidadãos, a promoção e a defesa dos valores regionais [...] atendendo em particular à satisfação das necessidades de classes mais desfavorecidas, bem como o reforço da unidade e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses.» (artigo 4.º); estamos plenamente de acordo com o «reforço da unidade nacional e da solidariedade entre os Portugueses», só que a prática do Governo Regional até à tomada de posse do VI Governo Constitucional tem-se caracterizado pela negação deste principio de solidariedade, ao fomentar de forma sistemática a guerrilha aberta contra os Governos Constitucionais, entrando ultimamente numa via de contemporização com o Governo AD, transigindo desta feita com as imposições do Governo Central, como recentemente sucedeu com a não cobertura do déficit regional de 5 milhões de contos.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador:- Aquando da discussão do Orçamento na Assembleia Regional, Alberto João Jardim acusou os partidos da oposição de serem contra a Madeira, por votarem desfavoravelmente e orçamento da Região; nessa lógica o Governo Sá Carneiro ao recusar a cobertura do déficit também votou obviamente contra a Madeira.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - O estatuto político-administrativo da Região Autónoma da Madeira é, pois, o instrumento estatutário, o esqueleto jurídico de uma autonomia que tem de ser pragmática, ajustada às realidades concretas e especificas do arquipélago; não é de modo algum um instrumento de centralização do poder regional - como alguns artigos deixam subentender-, centralismo acentuado que progressivamente vem caracterizando a política do Governo Regional da Madeira; centralizar a autonomia é esvaziá-la do seu verdadeiro conteúdo...

O Sr. Jaime Gama (PS): - Muito bem!

O Orador: - ... despojá-la dos objectivos generosos que representam as aspirações Legítimas dos Madeirenses; muito mais grave será fazer dela um instrumento partidário que se amolda às conveniências eleitorais do partido e não às preocupações fundamentais da Região.

Aplausos do PS.

Monopolizar a autonomia através de um partido é sufocar à partida as liberdades e os direitos democráticos próprios do regime saído do 25 de Abril.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Cabe, por isso, perguntar: a política autonômica, tal como vem sendo gerida pelo PSD ao longo destes quatro anos, corresponde de facto aos adjectivos consignados na Constituição? Se a Lei Fundamental é uma síntese programática das transformações político-sociais e dada a estabilidade tão proclamada na Região, onde está o resultado dessas transformações? A recusa do Governo Regional em homologar os conselhos directivos das escolas, eleitos democraticamente, quando nele figuram elementos não merecedores da sua confiança política, é uma das iniciativas «originais», entre tantas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista tem sido ao longo destes anos um fiel intérprete das motivações autonômicas, não só a nível local, como oposição responsável e crítica do Executivo madeirense, como a nível nacional, na Assembleia Constituinte ao lançar as traves mestras da autonomia e, no governo, ao propor a arrancada inicial para a sua concretização. Mas se a memória dos homens é outra, a cegueira partidária não permite destrinçar no seu devido contexto e valor a transcendência de certos actos que assumem na história a expressão do futuro. Não negamos o contributo aditamente meritório de outras forças políticas na implementação das autonomias regionais, mas o dinamizador do processo coube ao Partido Socialista que apesar dos erros cometidos e à luz dos princípios programáticos, item defendido a descentralização, o pluralismo e vivência democrática, que renasceram em Portugal com o 25 de Abril.

Aplausos do PS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos finalmente a discutir o estatuto definitivo para as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, mas é importante começar por uma pergunta: o que significa estarmos só agora a discutir os estatutos para as regiões autónomas, quando vão passados quatro anos desde a sua instituição, quando

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a Assembleia da República está rapidamente a caminho do fim da I Legislatura, quando durante estes anos não houve da parte das assembleias regionais, dominadas maioritariamente pelo PSD, o mínimo de interesse pela aprovação de tais estatutos -abstraio obviamente, a proposta vinda da Assembleia Regional da Madeira apresentada à Assembleia da República passada que acabou por ser retirada tal era a sua generalizada confrontação com a Constituição.
Poderá porventura dizer-se que sempre têm existido os estatutos provisórios e que a experiência entretanto adquirida permite agora - e só agora - pensar maduramente mo estatuto definitivo. Só que entretanto a autonomia regional se foi consolidando sem estatuto - ou à sombra das lassas disposições do estatuto provisório, o que vem ai dar no mesmo -, à revelia de qualquer; lei, de forma, ,por assim dizer, permitam a expressão, selvagem.
Transferiam-se serviços do Estado para as regiões sem qualquer pré-definição ou planificação legislativa - designadamente por leis da Assembleia da República - do âmbito dessas transferências. Noutros aspectos de organização das regiões autónomas o estatuto que faltava, e que não devia faltar, foi sendo preenchido ,por via, die decreto regional. A delimitação de autonomia foi variando ao sabor das circunstâncias, instrumento de pressões ou moeda de troca sem plano coerente, sem intervenção da Assembleia da Republicai que era, ao fim e ao cabo, a entidade competente pata se pronunciar sobre o estatuto regional. Este foi sondo, na prática, feito unais ou menos clandestinamente, ao sabor das disputas governamentais entre os governos das regiões autónomas e o Governo da República, fora das vias regulares sobre o ponto de vista constitucional. Os estatutos provisórios que, naturalmente, deveriam ter servido apenas para permitir a montagem inicial do aparelho dos órgãos regionais, viram-se abusados para cobrir um processo que foi tudo menos transparente.
Entretanto foram-se gastando energias em conflitos evitáveis e em disputas estéreis, em que não faltou sequer a chantagem separatista, e a aldvosia pedestre de alguns pretendentes a imperadores atlânticos, quem sofre com tudo isto tem sido afinal a autonomia regional, malbaratada em favor de projectos políticos, no mínimo pouco constitucionais.
É pois com alguma perplexidade que assistimos agora no final dos trabalhos desta Assembleia da República- e dos trabalhos das próprias assembleias regionais à pressa com que as forças políticas dominantes nos arquipélagos pretendem fazer em alguns dias aquilo que nem sequer tentaram fazer durante quatro anos. «Mais vale tarde do que nunca» - diria o observador ingénuo e benévolo. Só que não é difícil concluir que da parte dos súbitos promotores deste expedito processo haja tudo menos ingenuidade e muito porventura de malevolência.
Na verdade, compreende-se mal que, no seu ponto de vista, àquilo que esperou quatro anos não pudesse esperar mais quatro meses. Só que as forças políticas que agora carregam no acelerador de aprovação dos estatutos regionais começam a ter poucas dúvidas de que já não voltarão a ter a maioria após as próximas eleições: o que -julgam- dificultaria, mais uma vez, a consecução de alguns dos objectivos políticos que subjazem a e as propostas de estatuto vindas das regiões autónomas.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns Deputados do PS.

Pode, certamente, vislumbrar-se um segundo objectivo que será o de, forçando a aprovação de propostas de lei, inçadas de inconstitucionalidades -como é o caso especialmente da proposta da Madeira -, obter, assim mais um campo de conflito preferencial com a Comissão Constitucional, o Conselho da Revolução e o Presidente da República, então a apresentação desta proposta de lei -sobretudo, friso, a da Madeira -, e o seu forcing através da Assembleia da República neste preciso momento podia ser apenas mais uma peripécia na estratégia de confrontação política e institucional em que se encontram desesperadamente empenhados e interessados os partidos da AD.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Que significado atribuir ao facto de, por exemplo, o Presidente do Governo Regional da Madeira, Alberto João Jardim, que acha que a Constituição da República em matéria de autonomia regional é péssima, ter insistido em avançar com a proposta de estatuto regional que avançou, porque das duas uma, ou a Constituição é péssima em matéria de autonomia regional e um estatuto constitucional tem de ser péssimo, e não se compreende que o Sr. Alberto João Jardim nele insistisse, ou, então, o estatuto regional para não ser péssimo tem de ser inconstitucional, coisa que não podemos aceitar. Em todo o caso está criado um campo em que importa esclarecer estes problemas que têm sido colocados.
Pela nossa, parte, declaramos que nos encontramos seriamente disponíveis para participarmos na elaboração dos estatutos definitivos de que as regiões autónomas carecem e a Assembleia da República, e a República em geral, lhes deve. Mas também não conciliaremos com propostas que acabam por se revelar como simples expedientes de objectivos políticos em que as regiões autónomas apenas constituem a «carne para canhão» de uma política anticonstitucional e antidemocrática que nem sequer tem por palco as regiões autónomas mas as próximas eleições legislativas para a Assembleia da República.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um estatuto regional é, tecnicamente, uma lei organizatória de uma entidade jurídica colectiva territorial - a própria região autónoma. Deve, sobretudo, definir a natureza dessa entidade, descrever as suas atribuições, regular a composição, competência e funcionamento dos seus órgãos.
Ora, as propostas ficam, por um lado, e em alguns aspectos, aquém do que deveriam regular, e, por outro lado, noutros aspectos, vão além do ponto em que deveriam ficar. Compreendem-se, aliás, as razões políticas que conduzem a esse fenómeno de alargar para um lado e estreitar para outro. O estatuto régio-

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nal, dada a sua forma especial de aprovação, é uma lei dotada de certa rigidez, pois uma vez aprovado só poderá ser alterado mediante iniciativa das próprias assembleias regionais e carece, obviamente, de aprovação da Assembleia da República, não pode haver alterações por iniciativa da Assembleia da República, também não pode haver alterações que não tenham a aprovação da Assembleia da República. É pois fácil de entender que as regiões autónomas tendam, por um lado, a meter no estatuto o mínimo daquelas matérias em que, naturalmente, poderão legislar mediante decreto regional, e, por outro, a alargar no estatuto a regulamentação de tudo aquilo que, de outro modo, ficaria para lei comum, ou seja, não dependente de iniciativa exclusiva das próprias assembleias regionais. Tratava-se de manter a máxima liberdade de acção legislativa da Assembleia Regional e por outro lado precludir ao máximo a possibilidade de acção legislativa da Assembleia da República.
Assim, por exemplo, as propostas de estatuto são bastante sumárias em matéria de regras disciplinadoras do orçamento e do plano regionais - pois assim ficam com as mãos mais livres para alterar a disciplina das matérias-, mas já são bastante exuberantes em matéria de regime eleitoral-pois assim furtam tal matéria à possibilidade de,' ala ser alterada pela Assembleia da República independentemente da vontade regional.
Todavia, se os motivos são compreensíveis, temos já dificuldade, em admitir que são admissíveis. Não é facilmente admissível que o estatuto regional deixe de conter um conjunto normativo suficiente mente denso em relação ao regime económico e financeiro das regiões autónomas ou ao Estatuto dos Deputados, e que falhei nos estatutos regionais regras precisas sobre o enquadramento do orçamento regional e sobre a aprovação dos planos regionais, por exemplo. E muito menos se pode aceitar, do nosso ponto de vista, que os estatutos regionais pretendam ocupar ilegitimamente o espaço jurídico de leis comuns da Assembleia da República, como é o caso da legislação eleitoral. A Constituição é bem clara ao distinguir entre o estatuto regional e a lei eleitoral para as eleições regionais. A questão, aliás, não é de mera forma. Ao fazer introduções no estatuto de matéria eleitoral esta deixaria de poder ser alterada pela Assembleia da República nos termos gerais, de qualquer outra matéria da sua competência; só poderia ser alterada a partir da aprovação por vontade dia maioria das assembleias regionais de cada uma das regiões autónomas, isto é, neste caso concreto por iniciativa do PSD açoriano e madeirense.
Quer dizer: O alargamento dó âmbito objectivo do estatuto para além dos seus limites próprios traduz-se numa limitação inconstitucional ilegítima, da liberdade e da competência legislativa da Assembleia da República. Por isso mesmo não devem ser aceites essas normas como parte integrante do estatuto. De resto, há outras normas em idêntica situação como, por exemplo, aquela quei na proposta da Madeira, diz respeito à família e à educação -artigo 5.º-, que se saiba a autonomia regional ainda não inclui a existência de, concepções próprias nessa matéria, diferentes ou divergentes daquelas que constam dos artigos competentes da Constituição da República.
Sob outro ponto de vista, seria de esperar que os estatutos regionais viessem clarificar e solucionar os principais problemas com que a autonomia se tem deparado na sua concretização efectiva. Assim não é estulto esperar que o estatuto contenha uma delimitação rigorosa do âmbito da autonomia regional, especialmente quanto às atribuições legislativas e quanto às atribuições administrativas, como, por exemplo, transferência de serviços estaduais. Quando digo delimitação rigorosa não digo delimitação limitada porque neste campo estamos dispostos a ir muito longe, o problema está no estatuto garantir certeza, segurança e estabilidade e previsibilidade em matéria de delimitação das áreas das esferas de competência entre as regiões autónomas e o Estado. Pior que uma autonomia regional limitada é uma autonomia regional não delimitada!
Ora, neste aspecto, ambas as propostas desiludem porque, ou não procuram sequer resolver o problema, queo resolvem de, forma flagrantemente inconstitucional - sobretudo o da Madeira -, a aprovação dos estatutos não se traduziria portanto em benefício sensível neste campo. As expectativas ligadas ao estatuto definitivo, que se traduzem m pôr fim às disputas sobre a limitação e a delimitação da autonomia não acabariam com a aprovação dos estatutos. A delimitação das esferas de atribuições recíprocas do Estado e das regiões continuariam a ser objecto de disputa e de conflito. Dir-se-ia mesmo que no caso do projecto da Madeira constituiria apenas mais uma alavanca para uma nova fase de disputas, de maceração de conflito, com o Governo da República acerca da «concretização dia autonomia».
Toda esta questão é, aliás, complicada -,e isto em ambos os projectos- por eles não conterem, como seria de esperar numa correcta sistematização legislativa, um capítulo ou título específico, autónomo, sobre as atribuições da região como pessoa colectiva pública que seria o local próprio paira definir rigorosamente os contornos das esferas de autonomia regional. Ao enxertar a matéria dias atribuições regionais como entidade jurídica, em sede de competência dos órgãos regionais, isto é, do governo regional ou da assembleia regional, os projectos, não somente produziram verdadeiras «salsadas» quase ilegíveis -como acontece com o artigo 51.º do projecto da Madeira e convido os Srs. Deputados a leram-no-, como também, e sobretudo, ficaram impossibilitados de abordar em termos adequados sistemática e coerentemente a questão das atribuições regionais e deste modo propiciarem uma visão clara e sobretudo uma delimitação rigorosa, -independentemente da sua dimensão que não está agora em causa- da esfera de atribuições entre a República por um lado « as regiões autónomas por outro. Insisto que, nesta matéria, estamos dispostos a ir muito longe.
Sr. Presidente, Sr. Deputados: Os dois projectos são profundamente diferentes, sobretudo no modo como se relacionam cem a Constituição da República. Importa, portanto, tratá-los separadamente.
O projecto da Madeira é, no seu conteúdo, globalmente inaceitável à luz de qualquer visão constitucional ou de autonomia, regional, é um portento de inconstitucionalidade. O Sr. Deputado Almeida Santos não teve dificuldade, sem ter necessidade de apurar o olho constitucionalista, em topar com duas boas

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dezenas de grossas inconstitucionalidades. Não seria, aliás, difícil encalhar em mais uma boa dúzia delas. Vale a pena acrescentar a referência a duas que, se me afiguram importantes - e que são de resto comuns aos dois projectos. Por um lado, suponho não ser compaginável com o carácter não estadual das regiões autónomas, a inclusão, como território das regiões, do mar territorial e de plataforma continental que «ao geralmente entendidas como elementos do «domínio público necessário do Estado» e que, por outra lado, dada a sua relevância internacional, constituem atributo da soberania internacional dos Estados que, naturalmente, não pode caber às regiões autónomas, como não cabe a muitos Estados federados. Tenho também por insusceptível de ser incompatibilizado com a Constituição a figura dos Deputados eleitos em círculos exteriores à própria região independentemente da configuração concreta de tais círculos e independentemente, portanto, dos argumentos adiantados ontem pelo Sr. Deputado Almeida Santos. A admissão desses Deputados eleitos pelos madeirenses ou açorianos residentes fora da região autónoma e incompatível com a natureza estritamente territorial das regiões autónomas como pessoa colectiva pública: suporia a existência de uma figura político-jurídica nova - «povo madeirense» e «povo açoriano» - e a atribuição de direitos políticos: a certos cidadãos só por .terem nascido numa determinada região; implicaria organização de recenseamentos autónomos para esse efeito - já que o actual não discrimina, nem permite discriminar, os recenseados com o lugar do nascimento -e- em contradição com o princípio constitucional da unicidade do recenseamento eleitoral.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): -Não é nada disso!

O Orador: - Dois traços essenciais, para além da sistemática inconstitucionalidade, caracterizam o projecto de estatuto da Madeira: o reiterado propósito de eliminar a presença do Estado da República na região e a procura de, empolar a dimensão externa para a autonomia regional que, aliás, e em termos extremamente generosos, a Constituição reconhece às regiões autónomas. O primeiro traço decorre transparentemente, entre outros dos artigos referentes à regionalização dos serviços. No final, a região substituir-se-á integralmente à República no domínio da administração e das tarefas competentes; aos executivos; o Estado deixaria de, ter qualquer serviço e de exercer qualquer competência na região; ao contrário, seria a região a intervir, fora da .região nem tarefando o Estado em relação ao restante território nacional.
A segunda característica é igualmente exuberante em várias disposições não só quanto à existência de Deputados eleitos para a assembleia regional em territórios estrangeiros, mas também ao estabelecimento de relações directas entre a região e Estados estrangeiros quanto ao apoio a regiões autónomas. Estas duas características não estão, aliás, desligadas por quem faça uma- leitura atenta dos projectos, uma vez expulso totalmente o Estado da Região e adquirindo relevância externa, estariam adquiridos traços inequívocos de estadualidade que depois se imporiam como um facto consumado na almejada federalização da região autónoma da Madeira que parece ser objectivo obsessivo do respectivo Presidente do Governo Regional.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): -- Até é inconstitucional!

O Orador: - Já quanto ao projecto dos Açores não está isento de inconstitucionalidades -algumas delas graves, comuns às da Madeira- nem de lacunas importantes ou deficiências profundas, mas umas e outras não se afiguram de impossível correcção. O projecto tem, globalmente, considerado, «pés para andar», sobretudo quando contrastado com o que provém da Assembleia Regional da Madeira. O projecto da Assembleia Regional dos Açores apresenta-se como proposta dotada do mínimo de seriedade e de respeito pelo regime democrático constitucional que tanta ausência marca no outro.
Mas analisado em si mesmo o projecto dos Açores carece ainda assim de intenso esforço de reflexão, de correcção e de aperfeiçoamento. Talvez valha a pena chamar a atenção para um ponto: o sistema do governo. Como é notório, o projecto quase copia nesse plano o regime que a Constituição da República estabelece em matéria de relações, de responsabilidade, entre o Governo da República e a Assembleia da República. Simplesmente as soluções que são válidas num sistema de governo misto ou semipresidencialista como é o da República, não são necessariamente válidas e coerentes num sistema de governo em que o executivo é responsável apenas perante a Assembleia -como acontece nas regiões autónomas. Num sistema de governo parlamentar não se compreende que o governo possa ser formado e subsistir sem passar por um voto na Assembleia, como se admite na proposta; nem se compreende a urgência de duas moções de censura para fazer demitir o Governo. Não são soluções muito «típicas» em regimes parlamentares.
Por outro lado, o estatuto não encara sequer a possibilidade de exoneração do Governo a pedido do respectivo Presidente nem a 'hipótese de dissolução da assembleia regional pelo Ministro da República a pedido do Presidente do Governo Regional ou, em caso de derrube do Governo e na impossibilidade de o formar no quadro da assembleia existente. São hipóteses perfeitamente configuráveis, compagináveis com o sistema de governo parlamentar, e sobretudo realistas quando se abstraia da actual situação de avantajada maioria monapartidária do PSD nas assembleias regionais.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Não temos culpa de ser bons!

O Orador: - Obras como esta -a feitura de um estatuto regional- não perdem nada em serem previdentes!
Neste contexto importa referir outro assunto em que o projecto tem de ser emendado: é o que respeita às garantias dos direitos - ao menos os parlamentares- dos partidos não governamentais. Ao contrário do que acontece com a Constituição da República, a nível do Governo da República não se faz qualquer referência, por exemplo, ao direito de fazer interpelações, de fixar um determinado número de ordem do dia, etc., isto é, um conjunto de direitos que garan-

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iam o direito de intervenção, participação e fiscalização das forças políticas parlamentares de oposição. Nem sequer se fixa um período mínimo de sessão legislativa, tal como está, não está excluída a hipótese da maioria silenciar o plenário da Assembleia e, com ele, a voz parlamentar da oposição, aliás, como toda a gente sabe, é o que vem acontecendo de ano para ano: existe um progressivo silenciamento da assembleia, um progressivo silenciamento do Plenário da Assembleia, um progressivo silenciamento dos partidos da oposição, provocando uma concentração do poder político uma governamentalização intensa nas regiões autónomas a favor do governo regional e, dentro do governo regional, a favor do Presidente, a favor de um poder extremamente oligárquico e pessoal que tem vindo a ser construído paulatinamente nessas regiões, sobretudo na Madeira.
São perigos destes que importa prevenir corrigindo as deficiências e colmatando as lacunas. Depois disso, depois de expurgar o projecto das inconstitucionalidades, depois de retirado todo o regime eleitoral do texto do projecto, então o estatuto regional dos Açores, além de passar a respeitar a Constituição da República, constituirá um seguro instrumento de consolidação e desenvolvimento de autonomia regional, no quadro da unidade do Estado, do respeito pela soberania da República e capaz de dar realização às aspirações do povo dos Açores. Ao contrário do que outros pensam, a autonomia para ser autêntica e grande não precisa de ser inconstitucional, precisa apenas de respeitar a Constituição.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns Deputados do PS.

Pela nossa parte - se nos é permitido parafrasear o preâmbulo do projecto da Assembleia Regional dos Açores- estamos seriamente empenhados em colaborar nessa empresa com «inteligência e serenidade». A inteligência e serenidade que infelizmente não têm sempre pautado em declarações e atitudes no tratamento da questão regional, e, que inclusivamente, já apareceram neste debate.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A autonomia regional 6 uma ideia, um conceito e uma realidade adquirida no Portugal democrático do 25 de Abril. A autonomia regional é uma conquista do 25 de Abril, é uma realização da Constituição da República de 1976, é bom repetir isto e rememorizá-lo quando há vozes a tentar esquecer esta realidade. Não há em Portugal uma questão regional no sentido de conflito entre partidários de autonomia e hostilizadores da autonomia, o que subsiste -e salutarmente subsiste- é o debata sobre a sua delimitação e a sua utilização ou má utilização.
Por nossa parte diremos que se a autonomia regional é um valor em si mesma, que prevíamos e defendemos, somente, todavia, se realiza como elemento de democratização do poder de desenvolvimento económico, social e cultural. Por isso mesmo entendemos que ê extremamente nociva à autonomia a perspectiva «sediciosa»» - se me é permitida a expressão - que é compartilhada pelas oligarquias políticas reproduzindo oligarquias económico-sociais subsistentes que continuam dominantes nas ilhas, perspectiva que hoje foi filosofada pelo Sr. Deputado Lucas Pires do CDS ao referir a origem da crispação autonomista nos últimos anos.
Entendemos que não são testemunho de autonomia - mas antes da sua negação- os actos que se consubstanciaram na expulsão de cidadãos, nos atentados e destruições terroristas a casas, sedes de partidos e sindicatos, veículos de cidadãos e partidos, as agressões e as arruaças a Ministros do Governo da República, a incentivação artificial de forças separatistas. Compreende-se que compartilhe dessa visão quem não tem da autonomia local e regional mais do que o horizonte mesquinho da defesa de privilégios e interesses oligárquicos postos em causa pós-25 de Abril. Sempre que estes estão em causa é sempre de esperar um lan Smirh indígena emancipalista de última hora. Mas ninguém esperará que os tomemos senão como aquilo que são: oportunistas históricos. Por mais malabarismos que se tente fazer a verdade é que a direita nunca defendeu, nem jamais defenderá, em termos honestos e sérios, um sistema autonômico que possa merecer a caracterização de democrático.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns Deputados do PS.

Também aqui é a esquerda e as forças democráticas que são herdeiras das tradições e dos ideais de luta pelo municipalismo e pelas autonomias locais e e regionais. São essas forças que se podem reivindicar dessa mesma luta pela autonomia ao serviço da democracia e não de oligarquias; ao serviço da participação popular e não do poder de minorias privilegiadas; ao serviço do progresso e não do restauracionismo.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Vital Moreira mostrando, a meu ver, padecer gravemente de uma doença que tem grassado pelo nosso país, a aconstitucionalite aguda» ...

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

... descobriu não sei quantas inconstitucionalidades, das mais graves e das mais grosseiras. Gostaria que o Sr. Deputado Vital Moreira, a meu pedido, reflectisse um pouco acerca dos exemplos que apresentou para ver se estamos ou não perante inconstitucionalidades.
Diz o Sr. Deputado Vital Moreira que é uma inconstitucionalidade daquelas que bradam aos céus a região autónoma querer abranger, no n.º 2 do artigo 1.º do estatuto político-administrativo, o mar circundante, os seus fundos, etc. Será que o Sr. Deputado Vital Moreira considera ser mais fundamental, dentro do espaço nacional, os fundos marinhos e as águas territoriais do que o próprio território das ilhas que compõem o arquipélago da Madeira e dos Açores? Será que é constitucional sujeitar ao mesmo regime o território das ilhas e o mar circundante?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Vital Moreira diz que é uma inconstitucionalidade pretender que os madeirenses residentes no estrangeiro possam eleger Deputados

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para as assembleias regionais. Pergunto: fere mais o conceito de autonomia o facto de dar o direito aos madeirenses residentes no estrangeiro de votarem para as assembleias regionais do que aos próprios madeirenses que residem na Madeira?
Onde é que está aqui a inconstitucionalidade? Francamente não a vejo e só posso compreender tais afirmações em virtude da tal doença que está a atingir gravemente muitos dos Deputados desta Câmara, sobretudo os sentados à minha direita.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que está a grassar nesta Assembleia uma doença bastante grave de tipo óptica de ouvido, isto é, a surdez e outra bastante pior que é a incapacidade de ouvir os argumentos do adversário sobretudo quando não se está disposto a entendê-los, a ouvi-los, a compreendê-los e, sobretudo a analisá-los seriamente.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP):- .Muito bem!

O Orador - Pretender entender de forma ligeira e pouco sensata, como fez o Sr. Deputado Amândio de Azevedo, os argumentos expostos por esta bancada é uma prova de incapacidade de assumir a própria importância do debate que aqui estamos a tratar e a forma séria, digna e construtiva como procurei apresentar os meus argumentos e a minha intervenção nesta matéria.

Aplausos do PCP.

É óbvio que entre as dezenas de grossas, grossíssimas, inauditas, inconstitucionalidades propostas na proposta da Assembleia Regional da Madeira - duas boas dezenas delas foram indicadas ontem pelo Sr. Deputado: Almeida Santos-, não pretendi elencá-los, não fiz elenco nenhum, coloquei à consideração mais dois temas, os que citou, e aduzi argumentos que o Sr. Deputado não considerou e nem sequer tentou rebater. Apenas tentou utilizar o processo muito simples de terrorismo verbal baseado na pergunta «se é ou não legítimo os Madeirenses votarem paira a Assembleia Regional da Madeira». Mas, Sr. Deputado, o problema é que as regiões autónomas; não são realidades extraterritoriais, são pessoas colectivas territoriais, como sabe, ou devia saber, - não sei se o Sr. Deputado é particularmente qualificado para discutir estas matérias, mas uma vez que me colocou a questão vejo-me obrigado a dar-lhe uma pequena explicação que serve para leigo e que serve para aqueles que, invocando uma qualidade jurídica, fazem observações que nem sequer a leigos ficariam bem.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Dispenso as suas lições, que aliás não servem para nada! Já sei isso há muitos anos ainda quando o senhor ainda andava nos bancos da escola!

O Sr. Vítor Louro (PCP): -Não parece!

O Orador - O Sr. Deputado deve compreendei que as regiões autónomas são pessoas colectivas territoriais e que as pessoas colectivas territoriais têm o seu cerne de implantação...

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Malcriado é o que você é!

O Orador: - Sr. Deputado, não esteja tão nervoso, por que é que está tão irritadiço nestes últimos dias...?

Protestos do Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Orador - Por que é que eu terei de pagar os problemas internos que o Sr. Deputado tem no Grupo Parlamentar do PSD? Atire isso para esse lado, não se preocupe...

Risos gerais.

Aplausos do PCP.

Se o Sr. Deputado tem problemas dentro da AD invista para outro lado porque neste caso...

Risos do PCP.

... acabará por reconhecer que há pontos de contacto que uma consideração desapaixonada levará a encontrar sobretudo se as declarações, vindas da parte de pessoas que dentro do PSD afirmam estar disponíveis para a construção de um autêntico poder regional democrático, corresponderem à realidade. Eu quero dar o benefício da dúvida a alguns Deputados do PSD nesta matéria.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Não divague!

O Orador - Mas, dizia eu, não se compreende que uma região autónoma que não tem, nem pode ter, as características de um Estado possa ter competências que só a um Estado dizem respeito, nomeadamente a extraterritorialidade. A autonomia regional é dada para melhor resolver os problemas das populações residentes na Madeira e não para resolver os problemas de uma entidade a criar agora, que seria o «povo madeirense», independentemente dos sítios onde essa população resida,

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD):- Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Gostaria de o interromper para lhe perguntar se não pensa que os madeirenses residentes no estrangeiro nau estão interessados naturalmente na própria evolução económica da Madeira pelo simples facto de poderem para lá regressar tal como acontece aos emigrantes em geral que trabalham fora do nosso país. Estão interessados na forma como a Madeira se desenvolve para mão terem de emigrar ou para poderem regressar do estrangeiro.
É essa a justificação do voto dos madeirenses relativamente ao seus órgãos autónomos, que é perfeitamente idêntica àquela que existe para os portugueses

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que estão no estrangeiro relativamente ao Governo de Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É isso! O Sr. Deputado não entende a diferença que existe entre República de um Estado e uma região autónoma! O Sr. Deputado não tem essa sensibilidade para estas pequenas questões. Eu tenho, o Sr. Deputado, infelizmente, não tem!

Vozes do PCP: -Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: -Quanto à outra questão que me colocou, creio, e toda a gente entenderá, que o mar territorial é o ponto de confronto e de crispação com o estrangeiro de qualquer Estado e de qualquer República. Verá em qualquer manual de direito público que o mar territorial e a plataforma continental fazem parte do domínio público necessário do Estado e achará aí facilmente que mesmo Estados federados não têm esse domínio de mar territorial e da plataforma territorial que são características de estadualidade e, por isso, não devem ser dados a uma região autónoma. É óbvio que sobre o mar territorial e sobre a plataforma territorial incidem acções que afectam as relações externas de um Estado e a sua relevância para efeitos internacionais. O Sr. Deputado, ao atribuir essa competência e esse domínio a uma região autónoma tem de lhes dar poder para efeitos externos e para efeitos internacionais, isto é, tem de expropriar o Estado, tem de expropriar a República, dá competência em matéria de política externa e de defesa que, obviamente, não pode atribuir a regiões autónomas sem lhe alterar o modelo e a natureza.
Entendo que estas ideias possam ter alguma relevância sob o ponto de vista do projecto do Sr. Alberto João Jardim que é um projecto federalista mas que, ele mesmo o confessa, não tem cabimento constitucional. O que é de espantar é que Deputados do PSD pretendam fazer já a revisão constitucional através do estatuto regional da Madeira. Pela nossa parte a revisão constitucional deve fazer-se no momento próprio e não através da votação de estatutos regionais seja da Madeira, seja dos Açores.
Insisto nisto: para nós a autonomia regional para ser grande, para ser autêntica, para ir ao encontro de todas as aspirações de autonomia legítima do povo dos Açores e da Madeira, não precisa de ser inconstitucional. Só pretende e só procura que assim seja quem está interessado, não em salvaguardar a autonomia regional, mas em obter outros efeitos indirectos e ilegítimos em benefício de objectivos inconfessáveis, ou minimamente confessados, que não são dignos de serem tratados em termos de luta séria e honesta e em termos da utilização das regiões autónomas como «carne para canhão» e aríete para outros objectivos que, de forma alguma, são dignos da defesa dos interesses dos Açorianos e dos Madeirenses.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, quero só fazer um brevíssimo comentário que é o seguinte: quanto aos tais objectivos que pairam na cabeça do Sr. Deputado Vital Moreira, lembrava-lhe apenas que o estatuto foi aprovado por unanimidade. Quanto às águas territoriais, lembrava-lhe que nós não pretendemos outro estatuto que- não seja de autonomia,, idêntico ao que se reflecte no próprio território da Madeira e que não prejudica, de maneira nenhuma, os direitos soberanos do todo nacional relativamente, quer ao território da Madeira, quer às águas territoriais.
Todas as suas dúvidas e argumentos caem por terra com estas simples observações.

Risos do PCP.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Além de ignorante é sobranceiro!

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Claro que você é ignorante! Há mais pessoas que estudam Direito sabe, não é só você!
Não se arme em professor que ainda tem muito a aprender!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Sr. Presidente Srs. Deputados: a ordem do dia que estamos versando é indubitavelmente dos pontos mais altos da presente sessão legislativa. Está em causa, pela primeira vez na nossa história, a consagração de verdadeiros estatutos de autonomia das ilhas atlânticas que Portugal descobriu e fundamentalmente povoou e que, não só sob o ponto de vista natural mas também sob o da vivência sócio-cultural, são justo motivo de orgulho para que se enalteça o génio lusíada.
Aberta pelo 25 de Abril a possibilidade de desenvolvimento de uma autêntica autonomia, na justa linha da liberdade com a qual o País então se reencontrou, imperioso se torna que, no tocante às ilhas atlânticas, o regime se não contraia em simples intenções piedosas, em desconfianças e «servas mentais, em exegeses escolásticas de alguns preceitos constitucionais, cuja finalidade não pode ter sido a de restringir, mas foi decerto a de libertar.
Importa, pois, antes de mais, arredar do tratamento deste tema uma mentalidade mesquinha, de discussão do tostão, quando e que está nas nossas mãos para votar é um acervo de riquezas, é algo de belo e solene; que pode representar mais um marco no secular segredo lusitano de aproximar povos e distâncias geográficas sem necessidade de esgrimir com o jus imperis, na nossa habilidade do viver fraternalmente sem ter de pedir pareceres jurídicos.
Uma primeira palavra, pois, de confiança, de princípio, a estas iniciativas em boa hora tomadas pelos órgãos regionais, de objectivar uma tendência que não pode deixar de merecer, não apenas o nosso apoio, mas também o nosso entusiasmo. E uma palavra de confiança, porque sabemos bem que, ao fazê-lo, os legítimos representantes das regiões autónomas não visam cavar fossos entre as comunidades de lá e de cá, mas sim traduzir na prática o sumamente legítimo direito à autonomia, que a Constituição da República tinha de consagrar e consagrou mesma

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Mas, mais do que este crédito liminar que legitimamente lhes deve ser dado, que poderia esperar-se dos representantes das gentes açorianas e madeirenses?
Se a historia é a mestra da vida, nós os portugueses do continente não temos outra coisa a esperar dos Açores e da Madeira senão exemplos de lusitanidade e de liberdade.
Ao longo da nossa expansão pelos vários continentes, na epopeia de quinhentos, quantos milhares de açorianos e de madeirenses se contavam entre as intrépidas tripulações dos veleiros, entre os ousados guerreiros que vertiam seu sangue pelo que então se entendia como serviço da Pátria, longe da sua terra, entre os comerciantes e anónimos trabalhadores que levavam aos confins do globo um pouco da nossa maneira de estar no Mundo!
Quando, em dias difíceis, o País baqueava diante do exército espanhol que nos manietava á União Ibérica, foi a ilha Terceira o ultime baluarte da independência a resistir em volta do Prior do Crato, em combate desigual, três anos depois da submissão do continente.
E quando em 1640 os Portugueses puderam recuperar a sua liberdade nacional, foi a Madeira, fora do Reino, a primeira das terras a aclamar D. João IV como soberano de Portugal. E dizia o historiador lisboeta Gregório de Almeida: «bom era que ela levasse as lâmpadas, e ganhasse a palma a todas, pois de todas as conquistas descobertas até à China foi Primaz: a ela recorram como a Igreja Metropolitana sua.»
Mais tarde, quando Portugal provara já os primeiros frutos da Liberdade e dos sistemas sociais do mundo contemporâneo, e quando, parecia que perigava o seu irrecusável desenvolvimento, foram os Açores que acolheram os pioneiros do constitucionalismo e do liberalismo e lá se organizou a triunfante expedição do desembarque no Mindelo e de libertação: da invicta cidade do Porto, prenúncio da vitória da modernização do País e da sua abertura para a era da maioridade dos Portugueses. Dos Açores partiram os brilhantes chefes militares constitucionais, nele se preparam alguns dos mais significativos diplomas que vieram a traduzir as novas opções. Uma vez mais, na nossa história, das ilhas norte-atlânticas veio o exemplo.
E já neste século, que parte grande da nova epopeia lusíada que é a sementeira das nossas comunidades por mundos mais úberos e menos acanhados, que parte grande não é devida aos; Açorianos e aos Madeirenses que na Califórnia ou na África do Sul, na costa leste dos Estados Unidos, nas ilhas Hawai, ou oa Venezuela, marcam outros tantos padrões de presença da nossa língua, dos nossos costumes das nossas especialidades antropológicas!
Mais não é preciso para que entendamos que estes projectos, agora em debate vêm bem credenciados, dispensam reservas na generalidade e devem encontrar, por parte do nosso grupo parlamentar, uma calorosa saudação.
Que a análise de especialidade, em espírito de aberta fraternidade e de franca compreensão conduza a algumas modificações, com vista u facilitar uma rápida implementação dos estatutos e das relações autonômicas, é ponto que entendemos perfeitamente admissível e construtivo.
Mas com isso de forma alguma pretendemos ensombrar o quanto de notável e válido se contém nos projectos, o quanto de boas-vindas nos cabe significar-lhes.
Não será do nosso grupo parlamentar que reservas serão levantadas a estas iniciativas dos Açores e Já Madeira. Ficamos sim ao dispor, para contribuir, se
necessário for, para viabilizá-las com plena satisfação da vontade e dos interesses de todos os que, lá ou aqui, falamos a língua de Camões.
Saudamos pois os projectos e felicitamo-nos pela honra de que vamos desfrutar de lhes darmos o nosso voto favorável.

Aplausos do PPM, do PSD, do CDS e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente:- Tem a palavra o Sr. Deputado José Maria da Silva.

O Sr. José Maria da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: «Somos a colónia mais próxima da Europa» - assim se iniciava o cartaz- manifesto lançado nos primeiros dias de Maio de 1974, pelo grupo de intelectuais madeirenses, aparecido sob a designação de «MA I A» - Movimento de Autonomia das Ilhas Atlânticas.
Dizia-se então e no mesmo manifesto:

Cada povo tem o direito de governar a sua riqueza, de moldar a sua alma, de conduzir o seu futuro!
O nosso futuro é a democracia enraizada que quer dizer autonomia!
Autonomia não pode ser benefício para poucos, mas- uma libertação de todos.
Autonomia que terá de ser construída com a abolição de todas as formas de servidão.
Autonomia não é um disfarce de qualquer forma de colonialismo, mas a livre expressão do pensamento autóctone!
A aspiração da autonomia tem sido uma constante da história das ilhas atlânticas, depois que os povos tomaram consciência da sua existência como sociedades diferenciadas. É, sobretudo, uma reivindicação, do pós-liberalismo, quando a sociedade do ancien regime. seminobre e semiburguesa, autoritária e intolerante, rebentou ao horizonte do racionalismo e dos novos ideais de uma burguesia dinâmica saída da Revolução Francesa. Mas, o movimento autonomista das ilhas, fortalecido com a Revolução de 1820, só deu os seus frutos legais em 1895 com a publicação do Decreto de 2 de Março, aplicado ao Funchal por Decreto die 8 de Agosto de 1901.
Porém, a natureza dê Estado unitário de forte inspiração napoleónica, a condições económicas e sociais de periferia impostas pela metrópole impediram durante mais de meio século o livre desenvolvimento de uma autonomia crescente, nas regiões insulares.
Nas suas Lições de Direito Administrativo. Marcelo Caetano afirmava que à Madeira não lhe unha sido concedido o favor da criação de juntas de freguesia porque não possuía chefes de família capazes.
Afirmação que se poderá contrapor à famosa frase de Bernard Shaw de que «aos negros americanos só é lhes permitia engraxar botas, e que depois se quei-

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xavam que os negros americanos não sabiam fazer mais nada do que engraxar botas».

Vozes do PSD:- Muito bem!

O Orador: - As ilhas sempre foram governadas por governadores idos da metrópole, administradas por funcionários da metrópole, ensinadas por professores formados na e da metrópole.
A drenagem de cérebros insulares para o continente foi uma constante, desde a época da descoberta.
Cálculos efectuados pouco antes do 25 de Abril de 1974 dão coma de que cerca de 80% dos estudantes universitários da Madeira não regressavam à terra depois da formatura, e ficavam instalados sobretudo em Lisboa.
A Madeira, como região a que se lhe impôs o estatuto férreo da periferia, não conseguiu nunca criar uma verdadeira vida cultural própria e activa, e, embora, pelo menos, desde a plantação do açúcar, tenha balança de pagamentos favorável, as condições de vida impostas aos seus naturais obrigaram-nos a emigrar para os países da América e da África.
Somos uma ilha de emigrantes. Uma ilha que estende o esforço e trabalho de uma população, multiplicada três vezes no exterior, à Venezuela, ao Brasil, ao Curaçao o à União Sul-Africana.
Uma ilha cujas actividades económicas mais rentáveis são exploradas por grandes empresas do centro, cujas decisões mais importantes são ainda interferidas pelo Centro, cuja economia é drenada e afunilada pelo Centro.
Em fins de 1974, MAIA, o movimento dos intelectuais madeirenses estrutura um programa revolucionário para a autonomia das ilhas Atlânticas, programa social, político e cultural.
No programa político, o MAIA faz derivar a autonomia, tal como a maioria dos tratadistas, das próprias exigências da democracia moderna, A democracia hoje exige como integrantes o aumento dos centros de decisão, a multiplicação e repartição dos níveis do poder por diversos entre públicos autónomos.
A ideia de autonomia, por outro lado, cresce e concretiza-se nos vários estados, a partir das constituições surgidas depois da guerra de 1939-45, sobretudo nos países em que foi notória a pressão totalitária.
O programa político de MAIA supõe uma autonomia avançada, para uma sociedade avançada, e que ainda está longe de concretizar-se na nossa prática constitucional e legislativa, embora tenha já em parte inspirado tal prática.
Estrutura-se a autonomia a partir do que podemos chamar uma visão atomística das sociedades e não a partir de teorias gestaltistas, de totalidade e unidade.
Parte-se de uma forma factual, de que as comunidades têm existência própria, vida própria, interesses próprios.
As unidades comunidades autónomas agregam-se numa estrutura superior e para defesa de interesses comuns, estrutura essa que é o estado regional.

O Sr. Pedro Roleta (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A concepção de autonomia prevalecente na nossa Constituição e na prática parte, pelo contrário, de um estado unitário, a que artificialmente
lhe amputam duas regiões - Açores e Madeira - dando-lhes estatutos de autonomia, a partir do todo para as panes, numa visão totalizante, gestáltica da sociedade.
E de duas uma: ou as regiões têm individualidade, são-lhe reconhecidos «estereótipos regionais» próprios t: então devem ter estatuto de autonomia, ou não formam qualquer tipo de comunidade individualizada, e não merecem o estatuto autonômico, mas tão-só, e quando muito, o da descentralização ou desconcentração.
Esta concepção gestáltica leva insita um vírus altamente perigoso para a comunidade a que se pretendo autonomizar: que é a colonização desta pelo todo nacional, ou, melhor dito, pelo restante todo nacional.
Se o todo é homogéneo, não se devem destacar partes, e, neste caso, se as partes se destacam é para serem novamente tragadas pelo todo.
A ciência política já deu soluções para este tipo de relações políticas que se estabelecem entre os distintos grupos culturais, em três capítulos fundamentais:

a) A fórmula do dualismo político no interior do mesmo marco estatal (a que os autores anglo-saxónicos designam por duality concept);
b) A fórmula da atribuição de direitos colectivos concedidos aos membros de um grupo cultural particular (que também os autores anglo-saxónicos designam por corporate righis);
c) É a fórmula dos estados associados.

Efectivamente, se o voto é pessoal, se as votações são homogéneas a nível de superestrutura administrativa nacional, a pequena comunidade com menos população que o restante lodo nacional é colonizada por esse todo, que até nem possibilidades tem de conhecer os pequenos ressones dos interesses regionais próprios.
E o resultado prático na nossa Constituição é que os preceitos base para a Autonomia dos Açores e da Madeira não diferem muito de iguais preceitos da Constituição de 33 (revisão de 1971) com relação às ex-colónias.
Este problema sentido em todos os países com regiões autónomas está bem expresso no relatório preliminar da Comission royale d'enquète sur le bilinguisme. no Canadá, que diz:

Poucos canadianos de língua francesa admitem o processo democrático actual no Canadá consistente verdadeiramente em adaptar-se de um modo pragmático às circunstância?, a negociar os compromissos para resolver problemas particulares. A maior parte dos canadianos franceses desconfiam desse processo, que seria, segundo eles, determinado pela maioria, e julgam necessário que seja reconhecido o conceito da dualidade fundamental no Canadá: só depois, a nível de diálogo entre iguais, poderão efectuar-se negociações e transacções legitimas.
É evidente que se as maiorias e as; minorias concorrem homogeneamente em votações, as minorias são sempre vencidas pelas maiorias, que impõem a sua vontade, os seus interesses, a sua força. E isto, no fundo, é marcar previamente as cartas do parceiro no jogo da autonomia.
Uma certa contradição se divisa na nossa Constituição entre uma ideia de estado unitário puro, com incidências de práticas de estado regional. Isto é sobre-

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tudo visível nos n.ºs 1 e 2 do artigo 6.º, em termos de considerar-se a regra o estado unitário, e a excepção o estado regional.
Mais, a concepção unitária e a aparente e geral, de primeira ordem, permanente e estável; e a concepção regional é subterrânea, de segunda ordem, colocada a um nível inferior, descontínua e instável.
Quer dizer: as Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, são consideradas em dois planos: }, a nível de estado unitário, e aí são exactamente como outra qualquer parte do todo; 2.º a nível de estado regional e aí estão já separadas do todo nacional; porém, num plano inferior, as partes periféricas com relação ao núcleo central.
É bem verdade que no artigo 227.º se fundamenta o regime político-administrativo, próprio dos arquipélagos dos Açores e da Madeira, «nos condicionalismos geográficos, económicos e sociais, e nas históricas aspirações autonomistas das populações insulares».
A questão, porém, é de saber se esses condicionalismos geográficos, económicos e sociais são suficientemente marcantes para considerar-se tais arquipélagos como verdadeiras regiões do ponto de vista sócio-político.
Fernando Baia considera que, sob o ponto de vista sociológico, a ideia de região inclui os três elementos centrais, a toda a comunidade, ou sejam: a) o elemento espacial; b) a consciência regional, e c) a tendência a uma organização comunitária.
Para quem conheça a realidade insular, a verdade é que não pode escamotear-se individualidade própria às populações, açoriana e madeirense.
No livro colectivo La pousseé regionaliste de l' Europe Occidental, diz-se:
Por ioda a parte a contestação regionalista ultrapassa o simples quadro das estruturas administrativas. Trata-se agora de uma reivindicação à igualdade que se exprime em todos os sectores, político, económico, cultural, social, e desemboca por vezes numa contestação do papel, mesmo da existência do Estado-nação tradicional.
É este reconhecimento do estatuto de Região, o reconhecimento do estatuto de igualdade e de interlocutor, a consecução da. conjugação dos ideais da democracia e da autonomia, que as regiões autónomas dos Açores e da Madeira continuarão a procurar sem descanso.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Isto também é, de certa maneira, a posição da Comissão Constitucional no seu parecer 13/78, onde se diz:

O desenvolvimento e a consolidação da autonomia regional com o correlativo respeito de competência legislativa das regiões, nas matérias que são do seu interesse específico, exige que a competência genérica dos órgãos centrais se vá como que autolimitando nesses domínios até que os estatutos das regiões autónomas venham a demarcar, com maior precisão do que hoje acontece, face aos estatutos provisórios em vigor, as fronteiras da autonomia.
A futura revisão constitucional terá dê ter em conta estes; novos aspectos da problemática da autonomia. Dever-se-á estabelecer uma série de princípios a que os estatutos das regiões autónomas deverão obedecer, no género dos estatutos da Sicília, Sardenha, Trentino-Alto Ádige, por exemplo, ou soja. «o respeito» pelos princípios gerais do ordenamento jurídico do Estado «ou pelos princípios fundamentais das grandes reformas económico-sociais da República». Ou, então, no género da Constituição Suíça, «assegurar o exercício dos. direitos políticos segundo as formas republicanas, representativas ou democráticas».
E depois reconhecer o princípio da dualidade às comunidades insulares, de forma a suscitar a criatividade, a responsabilidade e a liberdade, pedras basilares da autonomia. Esta é a maneira, como diz Paolo Barae, de das populações se «libertarem da colonização do Estado» e se «defenderam dt proletarização» que os órgãos centrais lhes tentam impor.

Aplausos do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado de Freitas,

O Sr. António Vieira de Freitas (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi com muita atenção a dissertação do Sr. Deputado José Maria da Silva, no entanto gostaria de pôr-lhe algumas questões.
Eu creio que a autonomia representa um esforço progressivo e construtivo na descentralização não só no domínio político-administrativo mas também no domínio da educação e; da cultura. Ora, o Sr. Deputado invocou a marginalização e o isolamento a que estavam votados os jovens madeirenses no que respeita ao ensino superior. Quais os esforços que têm sido feitos pelo Governo Regional no sentido de tentar ou, pelo menos, criar o Instituto Universitário da Madeira? Eu somente conheço umas extensões de alguns cursos da Faculdade de Letras que não são suficientes para suprir uma lacuna importante como é a do ensino superior na Madeira.
Por outro lado, o Sr. Deputado falou do Estado unitário como regra eido Estado regional como excepção. Eu creio que a questão não se põe nestes termos de: excepção e de regra visto que a própria Constituição não fala de excepção nem de regra mas fala da regionalização e da autonomia regional no todo, de um Estudo soberano e por conseguinte na participação democrática dos cidadãos no todo nacional. Eu gostaria que o Sr. Deputado me explicitasse este conceito de diferença e de unidade no Estado soberano como é Portugal.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Maria da Silva.

O Sr. José Maria da Silva (PSD):- Terei muito prazer em responder às perguntas, do Sr. Deputado Vieira de Freitas. Em relação à primeira pergunta, o Sr. Deputado sabe tão bem como eu, quanto eu defendo - desde há muitos anos - a criação da Universidade na Madeira, uma Universidade de tipo experimental nesse sentido, como pessoa, e dentro das

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estruturas do partido B que estou ligado, tenho feito o maior dos esforços e estou convencido de que dentro de pouco tempo teremos uma Universidade na Madeira não do tipo que temos neste momento, que são extensões universitárias - que não garantem realmente uma qualidade de ensino - mas teremos uma Universidade que ou gostaria que fosse experimental, sem a qual não será possível uma verdadeira sociedade de ócio para formar ambiente cultural na Madeira. Quanto a isso o Governo Regional tem envidado já muitos esforços não só no sentido do ensino universitário mas também da expansão da cultura 8 do desenvolvimento cultural na Madeira. Posso dizer-lhe; que a Madeira tem neste momento o maior índice de frequência de cinema do País, dera, possivelmente no fim deste ano, o maior número de espectadores de teatro, e tem o maior número - a nível europeu - de frequentadores de cinema de idades compreendidas entre os 6 e 10 anos que se estabelecem em cerca de 1200 por cada 100 crianças na idade escolar. São os maiores índices europeus.
Quanto à segunda pergunta que o Sr. Deputado me fez, é uma questão de lermos o referido artigo 6.º da Constituição e compará-lo com outros artigos de constituições estrangeiras. Eu falo, por exemplo, da Constituição espanhola d* 1978 -artigo 2.º- e d» Constituição Italiana de 1974.
Na Constituição portuguesa, artigo 6.º, nós temo» o seguinte:

l - O Estado é unitário e respeita na sua organização os princípios da autonomia das autarquias locais e da descentralização democrática da administração pública.
Claro que aqui o termo «autonomia» está incorrectamente aplicado, com certeza, pois todos sabemos que as autarquias locais não têm autonomia. Aqui o sentido de- autonomia é o de descentralização. Mas depois no n.º 2, aparece como excepção os arquipélagos dos Açores e da Madeira.
Os arquipélagos dos Açores e da Madeira constituem regiões autónomas dotadas de estatutos político-administrativos próprios.
No n.º 1, que é a regra, estamos realmente num Estado unitário e no n.º 2, que é a excepção, estamos num Estado regional.
O artigo 1.º (artigo único) da Constituição espanhola de 1931 -que é típica de um Estado regional - diz o seguinte.: «a República constitui um Estado integral compatível com ia autonomia dos municípios e das regiões.»
A actual Constituição espanhola, no artigo 2.º, diz também mais ou menos o seguinte: «a Constituição fundamenta-se na indissolúvel unidade na nação espanhola pátria comum e indivisível de todos os espanhóis e reconhece e garante o direito à autonomia das nacionalidades e regiões que a integram e a solidariedade entre todas elas.»
Isto apesar de no regime político espanhol actual não se considerarem na Constituição regiões autónomas, elas irão aparecendo pouco a pouco.
Podia também referir a Constituição italiana de 1974 mas já não tenho mais tempo.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - De disparates já chega! O que lhe valeu foi o tempo.

O Sr. António Vieira de Freitas (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Vieira de Freitas (PS): - O Sr. Deputado considera a autonomia como uma excepção, embora aqui a Constituição, no seu artigo 6.º, não fale propriamente de excepção, diz que «os arquipélagos dos Açores e da Madeira constituem regiões autónomas dotadas de estatutos político-administrativos próprios». Mas parece-me um tanto arriscado considerar a autonomia regional como uma excepção, pois a prova de que estamos a debater o estatuto na Assembleia da República é precisamente uma contraprova de que a autonomia não é uma excepção mas, pelo contrário, está integrada no Estado unitário da República portuguesa, creio eu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Maria da Silva.

O Sr. José Maria da Silva (PSD) - É uma questão de diferença que teria muito gosto em discutir consigo em direito político comparado, mas não tenho mais tempo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Partido Comunista Português apresentou na Mesa uma interpelação ao Governo para abertura de um debate de política geral centrado sobre a política social e os problemas relacionados com o bem-estar dos Portugueses. Como sabem, vai ser publicada e comunicada ao Governo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart, para uma intervenção.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: colocados perante a discussão em conjunto das propostas de estatutos das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, a primeira conclusão que resulta é a de que nos encontramos perante projectos de diferente validade.
Em primeiro lugar, quanto ao seu enquadramento constitucional. Neste debate já foram feitas análises detalhadas, de que me permito agora prescindir, que apontaram para o número elevado de normas da proposta de estatuto da Região Autónoma da Madeira que ferem preceitos constitucionais, enquanto que na proposta de estatuto da Região Autónoma dos Açores se nota uma maior subordinação ao texto constitucional, sem prejuízo da existência também de matéria que se pode acusar de ferida de inconstitucionalidade.
Mas se o estatuto dos Açores tem relativa preocupação de correspondência, ao menos formal, com a Constituição de 1976 -com a Constituição da República que está em vigor- a proposta de diploma para a Região Autónoma da Madeira parece subordinar-se já não ao nosso texto constitucional, mas a

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uma futura Constituição da República que: estaria no espírito dos autores dia proposta de lei n.º 205/I. Esta ilação leva, naturalmente, o MDP/CDE a uma clara demarcação relativamente ao projecto de estatuto da Região Autónoma da Madeira apresentado a esta Câmara.
Qualquer dos projectos de estatuto evidencia o objectivo político de aprofundar a autonomia regional. Ê obviamente compreensível, já que se pode admitir corresponder à vontade das populações dos dois arquipélagos.
Mas para além de aspectos pontuais a rever, em nossa opinião, num e noutro dos diplomas, julgamos correcto afirmar que na sua globalidade este objectivo vai longe de mais na proposta de estatuto da Região Autónoma da Madeira, o que se expressa não só nalguns artigos -por exemplo 2.º, 6º e o 5.º - como no tom e estilo que caracterizam o documento.
Em termos formais, finalmente, os dois projectos de diploma afiguram-se-nos também de valor diferente. O projecto relativo aos Açores tem uma sistematização adequada (pese embora, por exemplo o último artigo, relativo à revisão do estatuto estar incluído no capítulo sobre bens da Região do titulo referente ao regime económico e financeiro) tem ainda uma redacção tecnicamente cuidada.
Já o mesmo se não passa, a nosso ver, com o projecto relativo à Madeira. Redacções pouco cuidadosas, por vezes mesmo confusas, propiciadoras de interpretações diferenciadas; inclusão de matérias que não nos parecem adequadas a um diploma de definição do estatuto político-administrativo da Região, como sejam partes dos artigos 26.º, 32.º ou 33.º mais propriamente a incluir no Regimento da Assembleia Regional ou todo o pormenor de tratamento do protocolo nas disposições finais; artigos de localização desajustada, como seja o artigo 5.º, que até nos parece ridículo como definição de princípios gerais, aã a clara repetição entre os artigos 10.º e 55.º Todos estes aspectos, a título exemplificativo, não abonam a valia formal da proposta de estatuto para a Região Autónoma da Madeira.
Por tudo isto, e arredando naturais divergências políticas, diríamos que nos encontramos, por um lado, perante um documento inaceitável -o da Madeira e. por outro lado, na expressão já utilizada pelo Sr. Deputado Almeida Santos, diríamos que nos encontramos, perante um documento que é boa base de trabalho, o dos Açores.
Pela nossa parte, entendemos ser de assumir coerentemente as consequências decorrentes do princípio do autonomia político-administrativa. Se esta pane da consideração de uma realidade geográfica especifica e por extensão de realidades económicas e sociais também particulares, na sua aplicação não pode deixar de ser influenciada pela realidade de política regional.
O facto é que a relação política de forças em qualquer das regiões reflecte uma realidade diferente da do continente. Tal tem a ver, entre outros aspectos, com as precárias condições democráticas existentes nas regiões e com a muito menor participação popular que aí se verifica.
Politicamente, as populações dos Açores e da Madeira têm-se expressado em determinado sentido, colocando o PSD como força majoritária em qualquer dos arquipélagos. Com realismo, mas também em coerência e por respeito aos princípios de autonomia que perfilhamos e a que constitucionalmente estamos obrigados, compreendemos e aceitamos que as propostas apresentadas contenham pontos de vista não coincidentes com os nossos.
Não será pois este motivo da nossa oposição frontal desde que os estatutos pretendidos pelas regiões autónomas por vontade política maioritária nelas existente, se conciliem com critérios gerais que lhes são prévios:
A saber: a) respeito pelos preceitos constitucionais directamente aplicáveis e pelo espírito do texto constitucional; a conciliação entre a mais larga autonomia político-administrativa das regiões e a preservação da unidade nacional; o) equilíbrio entre a competência própria dos órgãos de governo regional e as atribuições locais dos órgãos de soberania nacional.
Enquadrados neste espírito passemos à análise de alguns temas gerais das propostas de estatuto.
Preocupante é o investimento de qualquer dos estatutos relativamente ao projecto constitucional. Haja ou não vontade de identificação política com tal projecto, e ele que vigora como lei superior do País e não pode deixar de estranhar-se que os estatutos não contemplem as grandes transformações económico-sociais ocorridas em Portugal. Uma justa concepção de autonomia não pode estar desligada dos direitos de intervenção dos trabalhadores e do fomento da participação dos cidadãos na vida política, económica, social e cultural, aspectos que não ressaltam das propostas em discussão, nem ao menos ao nível da definição de princípios gerais.
A autonomia político-administrativa das regiões não conduz por si só a uma política íntima de descentralização. A este propósito cabe recordar o artigo 268.º da Constituição da República, cujo espírito se desejaria efectivamente transportado para as propostas de estatuto, mas mais, efectivamente aplicado. O estatuto dos Açores inova uma perspectiva de organização administrativa do arquipélago assente na realidade natural, económica e social que cada ilha representa. Esta inovação, que aplaudimos, tem de estar associada a uma real política de descentralização, que não apenas de declaração de intenções - a intenção encontra-se expressa no artigo 73.º - tanto mais necessária quanto se sabe que nas diferentes ilhas vão surgindo frequentes acusações de excessiva centralização em S. Miguel.
As forças políticas legalmente constituídas têm de ver os seus direitos políticos plenamente reconhecida. As assembleias regionais devem - e é até esse o sentido que decorre dos próprios estatutos em apreciação - ser consideradas como órgãos de expressão parlamentar e não como simples colectivos de cidadãos. Não nos parece assim que seja politicamente defensável condicionar certas iniciativas, que têm de corresponder a direitos normais de oposição, a um número mínimo de Deputados proponentes, como se verifica nos casos dos artigos 20.º e 40.º da proposta de estatutos para a Região Autónoma dos Açores ou no artigo 49.º, n.º 4, da proposta para a Região Autónoma da Madeira, embora neste de forma que nos parece algo confusa.
A matéria eleitoral constante de uma e outra proposta merece-nos firme contestação, não em termos de análise na especialidade, mas tendo em conta o interesse que releva desta matéria.
Em primeiro lugar a questão dos círculos eleitorais

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e do processo de transformação dos votos em número de Deputados.
Para o círculo da ilha do Corvo, com pouco mais de 300 eleitores, teríamos 2 Deputados, tantos como, para Flores e S. Jorge, com cerca de 4000 eleitores, ou como Santa Maria e Graciosa, com número de eleitores próximo de 5000. Outro exemplo, a Terceira com mais ou menos doze vezes mais eleitores do que as Flores, elegeria apenas quatro vezes mais Deputados do que esta última.
 situação é equivalente na Região Autónoma da Madeira. Um único exemplo: O concelho de S. Vicente, com menos de metade dos eleitores do Machico, elegeria 2 Deputados, enquanto este último apenas 3.
Isto é, o princípio constitucional da representação proporcional, aliás expressamente transcrito nas duas propostas de estatuto, é flagrantemente incumprido a nível de qualquer das Regiões.
Quando ambos os estatutos reconhecem que Deputados regionais são representantes de toda a região e não apenas dos círculos por que são eleitos -nem de outro modo seria pertinente - é de perguntar quais as razões que levam a propor a existência destes círculos eleitorais.
Por ingenuidade poderia pensar-se que se trataria de uma simples questão de analogia com o esquema nacional de eleições para a Assembleia da República.
Não se pode, no entanto, deixar de ter em conta a completa arbitrariedade da noção de concelho na Madeira, como círculo eleitoral, e a inconstância do critério na ilha nos Açores para o mesmo efeito de círculo eleitoral.
O que se trata é de fazer prevalecer a representação da força política majoritária e sacrificar antidemocraticamente a expressão parlamentar das forças políticas de menor implantação.
Na nossa opinião, um círculo único regional, tal como se verifica para as eleições da Assembleia da República é a única formulação efectivamente democrática para o processo eleitoral às assembleias regionais das regiões autónomas da Madeira e dos Açores.
Igualmente não se nos afigura aceitável a criação de círculos eleitorais fora das regiões e a concessão do direito de voto a naturais não residentes.
Sem prejuízo de não ignorarmos a existência de importantes colónias de açorianos e de madeirenses no estrangeiro, entendemos que o estatuto da autonomia reside essencialmente na consideração de uma realidade geográfica específica e é dessa realidade que têm de emergir os órgãos regionais e concomitantemente o direito de participar nos respectivos processos electivos.
Não é a circunstância de se ser açoriano ou madeirense que dá direito a participar na vida política local. É a circunstância de o cidadão residir nas ilhas, sujeito ao fenómeno da insularidade e condicionado pela realidade económica e social vigente localmente, que concede o direito de participar na vida própria da região e portanto de contribuir para a escolha dos órgãos do governo regional.
Finalmente, a limitação à elegibilidade dos cidadãos que consta do artigo 13." da proposta de estatuto da Região Autónoma dos Açores parece-nos um procedimento totalmente inaceitável - constitucional e democraticamente até por simples lógica das situações.
Num último apontamento, não queremos deixar de nos referir à proposta madeirense quanto aos meios de comunicação social estatizados e ao Conselho Regional de Informação.
E não deixaremos de o fazer, não pela clara inconstitucionalidade do artigo 63.º, por exemplo, mas pelo que reflecte de vontade política de dominar os órgãos de comunicação regional. É de facto a tentativa,, de institucionalizar condições propícias à travagem do processo de democratização da Região Autónoma da Madeira.
Fique-nos porém, como prémio de consolação, a evidência de que os responsáveis madeirenses do PSD vêem com apreensão a possibilidade de a AD continuar a governar após as próximas eleições legislativas, regionais, é compreensível que a Assembleia da Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sendo os projectos de estatutos político-administrativo das regiões autónomas iniciativa legislativa das respectivas assembleias regionais, é compreensível que a Assembleia da República se veja perante documentos com concepções, estrutura e articulados diferentes, a que acresce uma razão adicional, mas não menos importante, o resultarem de realidades regionais distintas.
Em qualquer dos casos, o produto final será porém uma lei da Assembleia da República.
Perfilhamos a opinião de que deveria haver uniformidade - a uniformidade possível - e coerência entre as duas leis emanadas desta Assembleia.
Na suposição de que os dois projectos de diploma venham a ser aprovados na generalidade, esperamos que o tratamento na especialidade tenha em conta muitas das válidas observações que aqui têm sido produzidas.
E esporamos que, dentro do moroso processo estabelecido pelo artigo 228.º da Constituição, esta Câmara, sem prejuízo da qualidade do seu trabalho e sem que seja de sua responsabilidade que só agora discuta estes diplomas possa desenvolver acções de emergência que permitam às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira vir a dispor finalmente dos seus estatutos político-administrativos no quadro das regras constitucionais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Oliveira.

O Sr. Francisco Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vive-se o dia de hoje com alguma emoção nos Açores, por nesta Câmara se discutir e ir votar o estatuto definitivo para aquela Região.
Na verdade, desde longa data que o povo açoriano luta pela sua autonomia, por ser essa a única forma que encontra para resolver os inúmeros problemas que o afligem.
Vetada ao ostracismo pelos Governos de antes do 25 de Abril, merecendo de Salazar a denominação de «poldras do Atlântico», as populações daquelas ilhas sentiram bem na carne a opressão exploradora do regime anterior em todos os seus aspectos: na saúde, na educação, nos transportes, na economia, no trabalho, na habitação, na segurança social, etc., etc., chegando mesmo a pagar o própria transporte dos produtos que importavam, tal como daqueles que exportavam. Isto diz bem do estado deplorável em que desde sempre se viveu nos Açores, sob um centralismo feroz que criava as condições apenas

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para que a fertilidade daquela terra e a riqueza daqueles mares servissem para engrossar os bolsos a uns poucos que à distância manobravam os cordelinhos da economia açoriana.
Perante isto, restava apenas àquela gente procurar outros horizontes que lhe oferecessem as condições que a sua própria terra lhes negava.
Uns, à procura de meios de subsistência, lá seguiram para os Estados Unidos e Canadá, principalmente; outros, verificando que ao ficar nos Açores seriam sempre tratados de forma inferior, sem que lhes fosse nunca dada a hipótese sequer de participarem no desenvolvimento da sua terra, viram-se obrigados a seguir para o continente: casos de escritores, multares, políticos, médicos, etc.
Desta forma se ia sistematicamente esvaziando os Açores de grande parle dos seus valores humanos, o que servia inteiramente os desígnios de quem governava este país.
Região situada a tão grande distância do continente, composta por nove ilhas, algumas delas bastante distantes entre si, os Açores .têm particularidades próprias que nunca no passado foram entendidas convenientemente, levando os Governos de então a não fazerem nada por aquela terra ou a fazerem-no mal, por má fé ou ignorância.
Por isso, cada vez foi tomando forma mais concreta em muitos espíritos a autonomia como única forma de solução: autonomia que nos consentisse ter um Governo e Assembleia Regional próprios, formados por açorianos, escolhidos pelos açorianos e que in loco pudessem ter respostas prontas a concretas para cada caso concreto que surgisse.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi por isso que o povo dos Açores rejubilou com o surgir do 25 de Abril; foi por isso que alguns açorianos tanto se empenharam para que o direito à autonomia ficasse consagrado na Constituição da República Portuguesa.
Mas importa aqui referir que no quarto de milhão de portugueses existentes nos Açores, também existiam conservadores e homens de esquerda democrática. Existiam e existem.
Por isso, o conceito de autonomia à partida não podia ter o mesmo significado para todos, tal como a palavra democracia o não tem...
Para uns, seria a forma de solucionar todos os problemas já aqui focados e outros mais, colocando essencialmente essa autonomia ao serviço de quem sempre foi mais sacrificado; para outros, seria a oportunidade de copiarem para a Região o mesmo centralismo existente em Lisboa, uma forma apenas de conseguirem o poder, que da capital se lhes escapava.
Assistiu-se por isso nos Açores a uma fase algo confusa, onde a palavra autonomia era repetida de boca em boca, muitas vezes de uma forma abstracta, armando-se alguns publicamente em únicos e exclusivos defensores daquilo que antes do 25 de Abril menos desejariam que acontecesse, chegando-se ao1 cúmulo de acusar o PS nos Açores de antiautonomista, só porque não andou de braço dado com os separatistas de então, só por ter cometido a ousadia de querer a autonomia, mas continuar português!

Aplausos do PS.

Aliás, toda essa tentativa de confundir a opinião pública dos Açores quanto à nossa posição sobre este assunto entrou na curva descendente, pois passado- o período em que diversas situações políticas para isso contribuíram, a população dos, Açores está-se apercebendo do papel fundamental que o PS desempenhou na construção da autonomia, bem como do papel que lhe está reservado para a consolidação da mesma em termos de futuro.
Seria até mesmo contrário a qualquer lógica política, que qualquer partido à nossa direita, e por isso mesmo conservador, o que implica centralismo, pudesse de alguma forma defender uma autonomia em termos mais eficazes, do que nós próprios o fazemos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ou não será a descentralização um dos princípios básicos de qualquer partido da esquerda democrática e por conseguinte do socialismo democrático?
É que a vontade de um povo é para nós soberana: este não é um lema para trazer na lapela, mas antes um princípio que há que ter sempre em mente para dessa forma nos sabermos entregar à vontade desse povo, seja ela qual for. A própria democracia passa por aqui, e sem democracia não haverá hipótese alguma de autonomia.

Vozes do PS- Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi por isso que os socialistas aprovaram na generalidade na Assembleia Regional este projecto de estatuto definitivo, tendo até sido o primeiro partido u apresentar naquela Assembleia o seu próprio projecto.
Não está para nós em causa quem governa anualmente os Açores. A autonomia tem de ser realizada e passar à sua fornia definitiva, como conquista de um povo e não de um partido político; e quanto mais depressa isso for feito mais cedo os Açorianos poderão julgar da sua aplicação prática e livremente escolherem quem lhes mereça confiança para a executar. É que, conjuntamente com a autonomia, os Açorianos desejam passar a ser tratados como adultos responsáveis, capazes de decidirem de seu destino conforme a sua própria vontade, sem qualquer espécie de tutelas.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador:- O Partido Socialista vem a esta Câmara com a mesma coerência de sempre, de antes e depois do 25 de Abril, defender a concretização deste anseio, defender a realização de autonomia.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador. - Isto na prática quer dizer que nos empenhamos acima de tudo para que as condições de vida dos Açorianos sejam as melhores possíveis.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ali, nos Açores, discutiremos palmo a palmo a melhor forma de servir as classes menos protegidas do arquipélago.

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Ali estaremos sempre alerta para que a autonomia conseguida não seja desvirtuada no seu conteúdo, não sirva de moderna forma de opressão, mas antes esteja ao serviço de todos os Açorianos.
Ali nos esforçaremos para que não mais existam portugueses de segunda, pela simples razão de não aceitarmos que exista um açoriano diferente de outro açoriano.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador: - Para nós, um melhor serviço de saúde, uma melhor assistência na velhice, uma maior segurança no trabalho, um melhor sistema de transportes, um melhor acesso à educação, um maior desenvolvimento económico, o acesso à habitação própria, uma melhor segurança social, são as razões básicas pelas quais lutamos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Estamos, contudo, conscientes de que isto não se conseguirá de lodo para os Açores, se problemas desta natureza não forem tratados e resolvidos no próprio local por pessoas que conheçam inteiramente a Região e por isso lá residentes), através, portanto, de órgãos de governo próprio o que concretamente significa com uma verdadeira autonomia.
Doutra forma, existirá sempre a constante dependência, o comando à distância, o favoritismo político, tal como do passado vínhamos habituados.
Os Açorianos são, na sua essência, gente pacata, ordeira, normalmente de poucas palavras, mas com uma vontade inquebrantável.
Já da história se conhecem os exemplos; no isolamento e nas calamidades cimentaram essa união que os fortalece e, por isso, as suas decisões, quando consciente e colectivamente assumidas, são irreversíveis.
Neste caso concreto, a decisão foi conquistar a autonomia para os Açores e só a partir daqui decidir-se da melhor forma da sua execução.
Quanto a este aspecto, o Partido Socialista tem o seu próprio conceito sobre como governar os Açores, e, por conseguinte, sobre a forma como pôr em prática essa mesma autonomia, de uma maneira que contemple todas as ilhas e toda a população em geral.
Importa por isso, antes de mais, que ela fique definida através da aprovação deste estatuto definitivo, não vá acontecer que por obra cruel do destino esta agora pequena bola de neve se despenhe pela encosta da direita e assim se perca a oportunidade histórica de o conseguir.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador:- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vive-se, pois, por tudo isto um ambiente de expectativa na Região Autónoma dos Açores. Os, Açorianos esperam a compreensão de todos os portugueses do continente aqui representados nesta Câmara e daqui afirmo solenemente que não tenhais receio se acaso considerardes esta autonomia algo ampla.
Os descendentes desse povo que soube ser sozinho Portugal durante a ocupação espanhola, saberão usá-la no bom sentido, para o seu próprio desenvolvimento económico e social, sabendo acima de tudo que quanto mais se sentirem realizados nas suas vidas tanto mais portugueses se sentirão!

Aplausos do PS do Deputado José Maria da Silva (PSD) e ao Deputado Barrilaro Ruas (PPM).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ourique Mendes.

O Sr. Ourique Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A aprovação do projecto de estatuto da Região Autónoma dos Açores, elaborada pela Assembleia Regional com base na proposta apresentada pelo Partido Social-Democrata, é para os Portugueses em geral e para os Açorianos em especial um dos momentos mais altos e mais dignos desta Câmara, imprimindo na memória de todos uma dignidade que vai timbrar esta 4.ª sessão legislativa. Ê de lamentar que nem todos se tenham apercebido deste momento. Aliás, tem sido notório o desinteresse de alguns ou as ausências verificadas por pane das diversas bancadas que compõem esta Câmara. É tempo de irem aprendendo alguma coisa sobre as regiões autónomas.
Para o País novo que é Portugal, a inequívoca consagração do regime político-administrativo dos Açores em termos de um poder autónomo organizado e responsável, é justíssimo motivo de orgulho, pois só assim se dá cumprimento cabal ao preceituado da Constituição e se constrói, de uma vez por todas, a verdadeira unidade nacional. Esta só tem sentido, força e coerência quando reconhecida -como agora se espera que aconteça - a diversidade geo-sócio-económica dos arquipélagos atlânticos de Portugal. É aqui e agora que a democracia que queremos defender e viver começa a alcançar a sua dimensão inteira, encaminhando-nos para um período novo que urge perseverar e fortalecer, ainda mesmo que contra a vontade de alguns.
Para o povo açoriano - tão e tanto português como os demais, mas certamente caracterizado por condicionalismos e estímulos particulares - a aprovação deste ser estatuto autonómico é encerramento de uma luta longa e sempre difícil, de uma luta tenazmente consciente, mas a maior pano das vezes incompreendida e combatida, é a conquista indiscutível que o 25 de Abril na sua expressão mais pura e mais bela veio permitir, é a solidificação de uma realidade irreversível e incoarctável.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se não fora a «tirania regimental» e o deslizar rápido das ampulhetas do tempo, conviria reflectir no que foi desde momentos bem recuados esta aspiração e este direito do povo dos Açores.
Já talvez aflorado mesmo no século XVIII (ainda que de uma maneira intelectualizada e ainda que adentro dos padrões políticos e mentais daquela época), o movimento autonômico dos Açores acabou por encontrar no século passado um caminho doutrinal organizado e uma filosofia fundamentada, com peso e razão suficientes para que um continental ilustre, Paula Nogueira, catedrático e membro da Sociedade de Geografia, pudesse reconhecer num opúsculo sobre as ilhas em 1895, o seguinte:

No continente tem sido desvirtuada esta ideia [a da Autonomia], fingindo-se temer que por

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SÉRIE - NUMERO 5V

detraz d'ella se occulte o phantasma da emancipação dos Açores.
E mais adiante:
A autonomia administrativa dos Açores não é n emancipação do arquipélago: é a aplicação do princípio descenralizador preconizado [...) a um grupo de ilhas que, pela comunidade de seus peculiares interesses e pela distância a que se acham da mãe pátria, não podem ser administradas pela metrópole, sem detrimento dos direitos que lhes assistem.
Muito raramente compreendidos, os. autonomistas do século passado, tal como os da nossa época, não lograram vingar em pleno as suas indiscutíveis aspirações, travadas pela constante histórica nacional: a centralização feroz e ciumenta.
Mas agora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, agora que rodaram 86 anos sobre as considerações que acabo de vos ler, mostremos a nossa capacidade de compreender e aceitar este fenómeno político e social que caracteriza o nosso tempo, que e o dos movimentos autonômicos. E não será despiciendo lembrar aqui aos mais renitentes incrédulos ou aos mais estrábicos «vigilantes» da Constituição (que segundo muito boas opiniões em nada é afrontada, diga-se de passagem), as recentes e significativas palavras pronunciadas nesta Casa pelo Presidente da República na reunião solene comemorativa do 25 de Abril: «A autonomia é, ainda, um valor essencial para a definição consistente do Estado Português.»
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É, pois, chegado o tempo (Te se acabar com as tensões que ainda passam existir entre as instituições do Poder Central e as do poder regional que em alguns governos nacionais pós-25 de Abril mais velada ou mais abertamente se verificaram.
Está demonstrada que elas não foram suficientes para impedir a marcha para o triunfo de um diploma «definitivo», tão definitivo quanto as leis o podem ser, num reconhecimento descomplexado da realidade nacional e na recíproca criação de direitos e deveres.
É altamente conveniente para aqueles que ora se dispuserem à aprovação deste texto - e ao que parece vão ser todos, até mesmo o PCP, o MDP e a UDP, pasme-se! - ter presente que ela representa, por um lado, o remate de uma experiência frutífera dos últimos quatro anos, em que vigorou o chamado «Estatuto Provisórios, por outro, o amadurecimento gradual e qualitativo que sobre ele se foi operando, sem pressas nem euforias, em ordem a um resultado prático muito mais próximo do real e que afastou as tentações enganosas do ideal. Tem, pois, em si esta proposta um carácter pragmático e está elaborada para funcionar e funcionar bem.
É um diploma construído a partir de elementos concretos já sobejamente experimentados e testados para que possam actuar no quadro constitucional que temos as instituições regionais, com proveito de todos, mesmo daqueles que sendo na Região durante muito tempo opositores do regime autonômico, não acreditavam nas suas virtudes, mas que agora (quero crer que por sinceridade e não por oportunidade política) já nele alicerçam também as bases da sua participação na vida colectiva açoriana, ultrapassando-se louvavelmente nas ambições estritamente partidárias.
Se me permitem abrir um parêntesis nesta declaração, a propósito do que aqui se passou na sessão de ontem e do que disse o Sr. Deputado Almeida Santos - creio que num diálogo estabelecido com uma Sr.ª Deputada da Madeira ou com o Sr. Deputado Meneres Pimentel-, conviria aqui fazer um esclarecimento.
Afirmou o Sr. Deputado Almeida Santos ter sido um grande paladino da autonomia e que o seu partido - o PS- igualmente o era e desde sempre.
Sem pôr em causa as convicções do Sr. Deputado Almeida Santos, naquilo que diz respeito à ordem estritamente pessoal, já o creio poder fazer enquanto ligado a um partido que tardiamente conseguiu trilhar a estrada da autonomia inegavelmente posta em marcha nos Açores pelo PSD.
Na realidade, nem o PS nem talvez o Dr. Almeida Santos foram sempre esses autonomistas doados e convictos como nos querem fazer crer.
Permito-me, pois, invocar aqui o testemunho do presidente da Assembleia Regional dos Açores, Dr. Álvaro Monjardino, lançado num livro da sua autoria e vindo recentemente a lume e que responde também, talvez, às questões iniciais postas há pouco pelo Sr. Deputado Vital Moreira a propósito de perguntar porque e que se tinham rodado quatro anos sobre um estatuto provisório que toda a gente dizia que era mau.
Reportando-se à altura em que foi elaborado o Estatuto Provisório que o Sr. Deputado Almeida Santos tanto enalteceu, porque nele participou, Dr. Álvaro Monjardino (e o testemunho, repito, reporta-se a umas conferências realizadas entre 7 de Março e 3 de Abril de 78) o seguinte:

Saída, pois, a Constituição, foi preciso adaptar a ela e aos seus limites o projecto do estatuto. Então constituiu-se uma comissão (outra!) que depois se chamou «Comissão de Análises» e que incluía representantes da Junta Regional, do Conselho da Revolução e ainda juristas e economistas nomeados pela Presidência da República.
Fiz parte dessa Comissão, com o Dr. Carlos de Bettencourt, que vive em Ponta Delgada, e com o Prof. Vitorino Nemésio, ao tempo bastante doente, mas que lhe deu um concurso, embora pequeno, do maior interesse.
Reunimo-nos em Lisboa, durante uma semana inteira, para adaptar o projecto do estatuto à Constituição. Desse trabalho resultou um texto muito bom, formalmente bastante melhor do que o do projecto. E esse texto foi mandado para o Governo Provisório.
O Governo, à última hora, pegou no texto e entregou-o a um número restrito de Ministros, entre os quais, exemplar e implacavelmente militante, estava o único comunista que dele fazia parte. Esse grupo restrito, numa só noite de trabalho, neutralizou o projecto, suprimindo-lhe a maior parte das concretizações e deixando apenas menos vagas as competências correspondente aos direitos e deveres constantes da Constituição. A Região agitou-se, houve protestos e, numa reunião de três horas, algumas das neutralizações voltaram à primeira forma. Nessa altura, a explicação que se deu foi que, prevendo a Constituição que a Assembleia Regional, a eleger, elaborasse

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um estatuto (artigo 228.º, como já vimos), o melhor era neste Estatuto Provisório (ao abrigo, como também já vimos, do artigo 302.º, n.º2) adiantar pouco, deixando as definições, em muitos campos, para esse novo estatuto, impropriamente chamado «definitivo».
A partir de certa altura entraram a sentir-se nos Açores certas pressões do Governo da República, insistindo por que fizesse, quanto antes, o projecto do estatuto «definitivo».
Parecia claro, agora, que afinal o Estatuto Provisório continha ainda muita coisa que passara àquele grupo restrito de Ministros: e os seus artigos, bem aproveitados, permitiam um funcionamento razoável das instituições, para incomodo daqueles que se receiam da autonomia regional e que, evidentemente, ignoram que ela é um dos mais seguros garantes da democracia nos Açores.

Vozes do PS; -Muito bem!

O Orador:

E é assim que, de há um ano para cá [e isto reporta-se a 78] em mensagens e até em tomadas de posição públicas, o Governo da República insiste no novo estatuto. A posição da Região tem sido esta: «Para quê? Nós agora é que começámos a funcionar; ainda nem temos o Governo bem estruturado; temos uma Assembleia que está a dar os seus primeiros passos e a, aprender por si o que sejam funções parlamentares; temos (pelo menos) quatro anos para fazer o novo estatuto; apresentá-lo-emos, quando muito, no fim do mandato da Assembleia, e até lá procuraremos colher os frutos desta experiência nova.»
E é o que se tem estado a fazer na Região: pôr em prática, e pôr á prova, o Estatuto Provisório. Porque ele já nos permite experimentar muitíssimas soluções, e nós queremos tirar o máximo de ensinamentos da sua aplicação, para os levarmos em conta no estatuto «definitivo».
Foi nesta altura que a Madeira nos passou à frente. A Madeira, impetuosamente, apressou-se a votar um estatuto «definitivo» e a apresentá-lo, como proposta de lei, à Assembleia da República. Esse estatuto retoma muita coisa do nosso projecto da Junta Regional, mas é mais desenvolvido - e mais atrevido também.
Nós ficámos a ver o que sucedia ao estatuto da Madeira. Pois até agora, que se saiba, e mais de um ano volvido, sucedeu o pior: quer dizer, não sucedeu nada. A Assembleia da República nunca lhe mexeu e a proposta jaz silenciosamente entregue a uma comissão parlamentar, provavelmente a dos Assuntos Constitucionais. Em vista disto, quando de Lisboa nos perguntam: «Então, e o estatuto?», nós respondemos: «Aprovem o da Madeira e conversamos depois,»

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador.- Sr Presidente, Srs. Deputados: É assim que, aprovado na Assembleia Regional em Março último, pelas formações políticas que a integram, o estatuto traz consigo a carga de uma vontade colectiva congraçada em torno das propostas apresentadas pelo Partido Social-Democrata, num reconhecimento indiscutivel das suas virtudes ou no afinamento construtivo das suas e imperfeições. Haja, pois, a lucidez de se ver nele, não a porta aberta para uma rebelião política, mas antes o correr de um processo histórico viável, praticado nas democracias mais perfeitas como forma única de assegurar o cumprimento da Constituição no reforço da unidade de Portugal e nos laços de solidariedade que unem o seu povo, garantindo como forma exclusiva a vivência democrática dos Açorianos.
O conferir-se aos Açorianos uma larga autonomia político-administrativa corresponderá, em lace de tudo isto, a um acto de rasgada visão política por parte do Estado Português.
Continua válida a afirmação de que: «Uma autonomia destas só os Açorianos podem dizer como a querem e só eles podem avaliar em que medida até a suportam.»
Visto sob este ângulo, o estatuto é, antes de mais, um desafio à própria comunidade açoriana. Desafio que ela saberá vencer!

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vital Moreira (PCP):-Sr. Presidente, utilizando a faculdade que tem sido consagrada pela prática parlamentar, o meu grupo parlamentar, que tem marcada uma conferência de imprensa para o intervalo, pede que, para além dos trinta minutos normais para o intervalo, sejam somados trinta minutos de suspensão dos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o nosso intervalo será então de uma hora. Está suspensa a reunião.

Eram 17 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a reunião.

Eram 19 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente : - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS). - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se bem retomo a discussão de há pouco, queria fazer não sei se um protesto, se uns pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Ourique Mendes.
Disse o Sr. Deputado que me arvorei em paladino de autonomia. Bem gostaria de o ter tido, Sr. Deputado, mas, na verdade, creio que o não consegui; de qualquer modo, também não sou tão pouco como isso.
Disse também o Sr. Deputado que o PS tardiamente trilhou a estrada da autonomia. Gostaria de ser esclarecido sobre quem é que a trilhou primeiro do que nós.
Disse ainda que o fazemos não convictos. Sena bom que ninguém se arvorasse em juiz das nossas convicções porque correria um risco que não deveria correr.

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Desejaria fazer algumas precisões quanto à citação que foi feita do Sr. Dr. Monjardino. Segundo ele, o texto que veio da Junta Distrital era muito bom e nós neutralizámos o projecto. Diria antes que o constitucionalizamos, porquanto
Apenas nos limitámos a pô-lo de acordo com a Constituição e isso implicou, com bastante pena minha tenho que o reconhecer a sua quase redacção integral de novo.
Disse, depois que no âmbito dessa reunião algemas neutralizações voltaram à primeira forma. Nisto, permito-me -e tenho que o fazer - corrigir a versão algo optimista do Sr. Pr, Monjardino porque aquilo que voltou à primeira forma foram três ou quatro pontos de uma extrema banalidade, e isto foi reconhecido pelo constitucionalista Sr. Dr. Miguel Galvão Teles que vinha a assessorar juridicamente a delegação que veio discutir connosco e que reconheceu a pertinência das nossas objecções fundadas no texto constitucional, não obstante estar numa posição contraria à nossa.
Disse depois o Sr. Deputado que os artigos do estatuto, bem aproveitados, podem levar-nos longe. Acho bem, desde que o aproveitamento não seja inconstitucional. Mas depois o Sr. Deputado cai em contradição, isto é, diz que o estatuto não prestou, que o texto era bom mas que nós o neutralizamos. E depois pergunta: estatuto definitivo para quê? Temos quatro anos para fazermos novo estatuto, vamos pôr à prova o Estatuto Provisório, primeiro o da Madeira e discutamos depois...
Há aqui uma contradição, Sr. Deputado. Então se o estatuto não prestava por que é que se não procurou corrigi-lo? Parece que se concordou com o estatuto; e que ele tinha valia para vigorar durante quatro anos.
De qualquer modo, parece-me também não muito correcta a insensibilidade perante o fenómeno de se aprovar primeiro um estatuto definitivo da Madeira e só mais tarde, com base nele, um estatuto definitivo dos Açores. A minha visão não é essa. A Madeira e os Açores não merecem discriminações desse género!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não participei no processo de elaboração dos estatutos regionais provisórios mas conheço o processo; e o meu camarada Veiga de Oliveira que era o Ministro comunista a que o Sr. Deputado Ourique Mendes se referiu na sua intervenção, embora não lhe citando o nome, teve na realidade intervenção na formulação do texto que veio a ter o Estatuto Provisório das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira,
Mas, como estava a dizer, conheço o processo e posso dizer que essa intervenção governamental visou, como aqui já foi mais uma vez acentuado, compatibilizar um projecto com aquilo que constava da Constituição da República, deixando para a Assembleia Regional, isto é, para o órgão representativo das regiões, a elaboração de um estatuto que cobrisse tojo o espaço que um estatuto devia cobrir. E por isso é que o estatuto regional se guardou de entrar, por exemplo, na definição dos limites da competência legislativa, na definição dos limites da competência administrativa em matéria de transferência de serviços estaduais para os serviços regionais, deixando naturalmente, e a meu ver bem e justamente, que essas matérias viessem a ser definidas pela Assembleia Regional, partindo do princípio de que. Logo que instalada na base do estatuto regional provisório, a Assembleia Regional tivesse, como uma das suas primeiras preocupações, a elaboração de um projecto de estatuto definitivo. Não foi isso o que aconteceu. O que aconteceu foi o seguinte: é que, tendo invocado que o Governo tinha estragado e estoirado o Estatuto Provisório, assistimos, durante quatro anos à invocação de que o Estatuto ao fim e ao cabo, não era tão mau como isso e bem utilizado, até podia prescindir-se, mais ou menos indefinidamente, do estatuto definitivo.
O que aconteceu, infelizmente, é que essa, utilização do Estatuto Provisório nem sempre, como se sabe, foi uma utilização regular, uma utilização constitucional, uma utilização estatutária. E daí número bastante grande de declarações de inconstitucionalidade, e teria sido bastante grande o número de declarações de ilegalidade, se o sistema de controle de legalidade tivesse entrado em funcionamento mesmo tempo que o sistema de controle de constitucionalidade.
Em todo o caso, o que me parece é esclarecimento era necessário para clarificar, mós, o processo que levou a que tivéssemos aguardar quatro anos para que a Assembleia República, que é o órgão competente para se pronunciar, em última análise, sobre o estatuto definitivo das regiões autónomas, enquanto durante esses quatro anos se foi construindo à margem da Assembleia da República e, atrevo-me a dizer, até ponto, à margem das Assembleias Regionais, como se se tratasse de uma questão privada catre Governos Regionais e os Governos da República como se se tratasse de uma questão de choque, reivindicação, a que viemos assistindo durante quatro anos.
Portanto, creio que, ao contrário daquilo Sr. Deputado Ourique Mendes tentou provar, carreando, é certo, alguns argumentos pertinentes, que, a meu ver, não são suficientes para por que é que se demorou quatro unos para apresentar uma proposta de estatuto para substituir provisório, de que, deliberadamente e, a meu justamente se tinha guardado e linha guardado para as Assembleias Regionais a proporia de matérias que qualquer estatuto deve, a meu ver regular em homenagem à certeza, à protecção expectativas e à segurança e de modo a evitar zonas conflituais entre a República e a região. E isso deve regular é nomeadamente, por exemplo, o mais rigorosamente possível, a delimitação da esfera da competência legislativa, a delimitação devi que devem ser transferidos para as regiões autónomas. Não se trata agora da quantidade, trata-se de, digamos, sacrificar ao valor da segurança e de saber com o que é que se pode contar. Infelizmente isso não existia no Estatuto Provisório e, a meu ver bem, mas continua a não existir nestas propostas de lei em discussão, salvo o Estatuto da Madeira que resolve a questão de um modo mais simples:

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passa para a região tudo, tudo o que existe na região que seja público. Portanto, soluciona a questão; expulsando o Estado da região, e acabou-se...
Mas, abstraindo-nos desta solução que, obviamente, para além de não ser constitucional, provavelmente é exagerada - isto para utilizar uma palavra que não choque- os ouvidos de alguns Srs. Deputados - há necessidade de o estatuto regional definir, estabelecer, uma linha de delimitação. Por isso, pergunto-lhe, Sr. Deputado: o facto de os estatutos virem agora aqui, no final do prazo de funcionamento das Assembleias Regionais, da I Legislatura da Assembleia da República, não terá, até certo ponto, um elemento: de estranheza? Porquê agora, necessariamente? Será que o PSD madeirense e açoriano temem que na próxima Assembleia Já República a maioria, que hoje supõe que pode aprovar determinadas coisas; já não existirá na próxima Assembleia?

Uma voz do PSD: - Não. Será maior!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ourique Mendes.

O Sr. Ourique Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho muito pouco tempo para responder, uma vez que ainda há por parte do meu grupo parlamentar mais duas intervenções. No estamos, em resposta conjunta quer ao Sr. Deputado Almeida Santos, quer ao; Sr. Deputado Vital Moreira, na parte em que invoco o testemunho do Sr. Dr. Álvaro Monjardino, abstenho-me de ir mais longe ou fazer quaisquer comentários porque, como muito bem entenderão e perceberão, invoquei aqui uma afirmação feita pelo Sr. Dr. Álvaro Monjardino e o mínimo que me podem conceder é eu considerá-la tanto como considero os contratestemunhos dos Srs. Deputados.
Na parte referente a qualquer ofensa - e teria sido posto em dúvida por parte do Sr. Deputado Almeida Santos se deveria fazer um protesto ou formular alguns esclarecimentos- evidentemente que não houve da minha parte qualquer intenção. Limitei-me a transmitir uma sensação e uma convicção generalizada nos Açores de que, de facto, o PS não se bateu inicialmente com esse denodo pela autonomia e, em determinados momentos e pode-se apontar concretamente aspectos de transferências de serviços em que foram muito difíceis as negociações - eu próprio participei em algumas delas em matéria relacionada com a Secretaria Regional de Educação e Cultura e disso dou testemunho-, em que houve que travar batalha; muito rijas e muito duras e o PS estava no Governo e dificilmente aceitava abrir a mão de determinados serviços, talvez porque não tivesse ainda regulamentado o campo concreto de acção e, nesse capítulo, o Deputado Vital Moreira avançou com um aspecto que me parece pertinente.
De qualquer maneira, não houve da minha parte qualquer intenção de menosprezar as suas convicções de ordem autonômica, Sr. Deputado Almeida Santos. Aceito que seja um imegérrimo defensor de ideias e de princípios autonômicos. Enquanto teve responsabilidades, creio que nem sempre, talvez por estar submetido a uma disciplina partidária, actuou como poderia ter actuado se fosse apenas condicionado pelas suas convicções de ordem estritamente pessoal.
Aceito isso e até compreendo um pouco as suas atitudes e as suas variantes de atitude.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador.- Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Deputado Ourique Mendes, agradecia que me esclarecesse se, depois que o PS deixou o Governo, foram encontradas maiores facilidades na transferência dos serviços periféricos e qual foi a diferença entre as facilidades encontradas antes e depois.

O Orador. - Creio que sim, Sr. Deputado. As maiores transferências foram feitas em governos não PS, nomeadamente no Governo Mota Pinto e até no Governo de Maria de Lurdes Pintasilgo. Houve nessa altura concretizações muito mais efectivas e muito mais reais.

O Sr. Armando Bacelar (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para prestar um esclarecimento muito breve acerca desta matéria.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Armando Bacelar (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Ourique Mendes referiu-se à dificuldade de transferência de serviços periféricos durante os Governos socialistas. Gostava de relembrar que, no que diz respeito ao Ministério dos Assuntos Sociais, se entabularam, por iniciativa do I Governo Constitucional e do próprio Ministério, as mais cordiais negociações nesse sentido com os Governos Regionais da Madeira e dos Açores.
Em relação à Região Autónoma da Madeira, essas conversações deram lugar a uma completa e cabal regionalização dos serviços de saúde e segurança social, feita por acordo num projecto em que houve uma negociação que chegou a um consenso unânime, que a própria imprensa da Madeira referiu na ocasião, com uma missão do Ministério que lá foi para esse efeito e que conduziu à publicação no Diário da República da lei de regionalização desses serviços.
Quanto ao Governo Regional dos Açores, as coisas passaram-se em termos completamente diversos: o Ministério dos Assuntos Sociais pretendeu fazer uma regionalização em termos se não iguais, pelo menos correspondentes àqueles que alcançou com a Madeira, e não o conseguiu porque as autoridades do Governo Regional dos Açores disseram que não lhes interessava essa regionalização e, por conseguinte, recusaram-se a levá-la por diante.

O Sr. Presidente: - Para uma .intervenção, tem a palavra o Sr Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS):- Sr. Presidente. Srs. Deputados: Seis anos após o 25 de Abril, a Assembleia da República encerra de forma serena com este debate um grande ciclo de reflexão democrática sobre a autonomia dos Açores. Desde as hesitações, a falta de rigor e o lirismo revelados sem excepção em diversos quadrantes, ao estado adulto da discussão de hoje, o caminho percorrido constitui indiscutivelmente uma

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vitória das regiões sobre o centralismo, da responsabilidade sobre a tutela e da democracia sobre o autoritarismo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador - Na verdade, só o 25 de Abril tornou possível a autonomia regional.
O constitucionalismo monárquico e a I República haviam resolvido a questão da descentralização insular sob a forma de autonomias distritais. Após os regimes das capitanias B da donatária, do governador-geral, da capitania-geral, da província açoriana, das duas províncias, da perfeitura e das subperfeituras, dos distritos administrativos, e em resultado da campanha autonomista liderada por Aristides da Mota e Mont'Alverne de Sequeira, em 1892, foram criadas nos Açores, no ano de 1895, com largos poderes de administração, as juntas gerais, cuja obra se desenvolveria no decurso da I República, para vir a ser asfixiada em termos de escolha não democrática dos seus dirigentes e de drenagem de recursos financeiros para o exterior do arquipélago pelo regime anterior, como oportunamente foi evidenciado por socialistas açorianos que militaram na oposição democrática ao salazarismo e ao marcelismo.
O restabelecimento da democracia no País naturalmente iria despertar a temática autonomista, não se alheando dela as correntes políticas de expressão insular. O Fartado Socialista, cuja versão histórica se caracterizou, nos Açores, por um profundo empenhamento na defesa da autonomia, e q>ue, nos finais do regime anterior, se batia pela descentralização democrática e pela eleição directa e livre das juntas gerais, não se podia eximir à riqueza de um tal debate. As posições assumidas pelo PS na Assembleia Constituinte, e que fizeram vencimento, entendidas na altura por alguns como restritivas, revelam-se hoje de grande validade, sendo a parte da Constituição referente às regiões autónomas um dos mais avançados sistemas de autogoverno para as regiões insulares dos países democráticos. Optando, com realismo, pela adopção de estatutos provisórios, o PS possibilitou assim a realização das primeiras eleições regionais nos Açores e na Madeira e a formação das respectivas Assembleias representativas. De resto, a participação do PS na Junta Regional dos Açores liga-se directamente à melhoria que viria a ser introduzida na primeira versão do Estatuto Provisório e ao abrandamento conseguido para muitas das tensões então verificadas, .fruto do evoluir da situação política nacional. Apesar das críticas, há que reconhecer objectivamente que foi com o PS no Governo que se deram os primeiros passos na concretização das experiências governativas regionais, cobrindo-se deficits, transferindo-se alguns serviços periféricos, assegurando a participação das regiões em negociações internacionais como o acordo das Flores e o acordo das Lajes. Resistências de parte a parte entre o Poder Central e os poderes regionais seriam ultrapassadas, ao mesmo tempo que, no plano interno da política açoriana, o PS, como principal partido da oposição, ajudava a edificar, na Assembleia Regional e nas autarquias, um conjunto de instituições democráticas que tem vindo a aperfeiçoar de dia para dia. Ao apresentar na Assembleia Regional dos Açores, em 9 de Março de 1979, o primeiro projecto de estatuto, o PS demonstrava que a sua opção autonomista e democrática estava feita e que não devia ser adiada por mais tempo a aprovação de um estatuto definitivo. Ao ser aprovado por unanimidade na Assembleia Regional, juntamente com o projecto do PSD e o texto da Comissão de Síntese, o conjunto das propostas socialistas passou a fazer parte do património institucional da Região Autónoma dos Açores, património que é plural na sua origem e do qual ninguém ou nenhuma força política se poderá reclamar detentor exclusivo.
Receando que a maioria - tal como fez em relação a outros diplomas oriundos das regiões autónomas - não estivesse interessada em acelerar a aprovação do Estatuto dos Açores, por várias vezes insisti junto do Sr. Presidente no sentido de serem tomadas as medidas necessárias à sua apreciação. Os trabalhos de hoje, que recompensam esse esforço, representam uma acertada, escolha descentralizadora por parte do Parlamento nacional, pois estou certo de que não poderá ser recusada a aprovação na generalidade ao projecto estatutário em boa hora remetido a esta Câmara pela Assembleia Regional dos Açores.
Demonstrando a perenidade da maioria dos princípios constitucionais que regulam a matéria, o novo estatuto aperfeiçoa o anterior e introduz-lhe as alterações que a experiência entretanto adquirida melhor aconselhou. Vislumbrada no plano político global, a autonomia carecia de uma formulação jurídico-administrativa rigorosa no momento do seu arranque. É, pois, à luz de uma prática entretanto conseguida que se delimitam competências com mais exactidão e que se procura dar um conteúdo concreto e moderno ao velho ideal do século passado de «livre administração dos Açores pelos Açorianos». Comparado com estatutos semelhantes em outros regimes democráticos, o texto elaborado pela Assembleia Regional dos Açores (e que aí mereceu consenso unânime) atesta bem o grau de maturidade que o pensamento autonomista atingiu nas forças políticas da Região. Vencendo aqueles preconceitos centralistas que formam grande parte do inconsciente colectivo dos nossos políticos, os Srs. Deputados podem estar certos de que ao aprovar o Estatuto dos Açores prestam um acto de justiça à população das ilhas e ajudam por medidas concretas e não por palavras a reforçar os laços de solidariedade nacional a que a Constituição alude.
A questão autonômica não é, porém, uma questão partidária. Ela é, em primeiro lugar, uma questão regional.

A partidarização desta temática tem-se revelado extremamente negativa. A indigência reinante no nosso direito administrativo e o empolamento sistemático de certas tensões por parte de sectores sensacionalistas da comunicação social fizeram da problemática insular um nem sempre bem sucedido exemplo de querela política. A autonomia dos Açores é um tema demasiado sério para ser ignorado nas universidades, sobretudo nas Faculdades de Direito, e para ser abordado com ligeireza por um certo turismo político e jornalístico, superficial na análise, mas contundente e peremptório nas afirmações irresponsáveis.
A exigência de uma consolidação séria da autonomia dos Açores, e do consequente aperfeiçoamento dos mecanismos democráticos regionais, leva-nos a ter de reclamar para as ilhas um desenvolvimento maior e uma capitação de despesas públicas capaz de vencer as enormes carências no campo das infra-

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-estruturas. Como oposição responsável e reivindicativa, é isso o que o PS está a fazer nos Açores, dadas as insuficiências do actual Executivo Regional, a sua descoordenação, a manifesta incompetência de muitos dos membros do Governo Açoriano, a lentidão com que actua em certos campos, como o da reconstrução das ilhas atingidas pelo sismo de l de Janeiro. Mas tal não significa que, no plano institucional, não lutemos também por uma clarificação e pela concessão dos meios adequados ao normal funcionamento dos órgãos de Governo próprio dos Açores. A nossa oposição ao actual Executivo Açoriano é, aliás, tomada em inteira consonância com a nossa opção constitucional autonomista e com a nossa fidelidade à democracia e ao socialismo democrático.
A geografia e a historia justificam a autonomia dos Açores. A descontinuidade territorial com o continente e entre as ilhas cria um rol de problemas próprios, designado por insularidade, que marca de maneira decisiva a forma de pensar e de sentir da gente açoriana e que acompanha o povo insular na emigração para os Estados Unidos, o Canadá, o Hawai e as Bermudas. A autonomia é a resposta adequada, no plano político-administrativo, às questões com que depara uma sociedade insular e constitui a única forma susceptível de viabilizar o desenvolvimento económico, social e cultural do povo de um arquipélago. De todos os modelos ensaiados nos Açores, nenhum como o actual se revelou tão apto, no plano institucional, para enfrentar o desafio das transformações e a vontade de progresso por parte dos cidadãos. A via descentralizadora aberta pela Constituição de 1976 e agora em véspera de minuciosa delimitação estatutária representa o fim de um longo período de marginalização dos ilhéus e uma viragem decisiva na história dos Açores, indissoluvelmente articulada com a democracia existente no Pais.
Mas a autonomia não é apenas uma questão regional. Por mais que ela apaixone e motive a gente das ilhas, ela é também uma questão nacional. De resto, é como tal que a Assembleia da República a deve encarar. Tem faltado ao nosso sistema democrático uma formulação adequada do fenómeno descentralizador e os vícios de uma democracia abstracta, praticada por um clube de profissionais desligados da movimentação electiva da sociedade, estão sempre prosemos nos hábitos e nos reflexos centralistas de muitos responsáveis. A existência de uma perspectiva regional, de uma óptica regional, de uma valorização económica, social, política e cultural da região, a prática de uma leitura regional da geografia, da história, da economia, da política, da cultura, são factores indispensáveis à consolidação e ao desenvolvimento da democracia. Ao assumirem a sua regionalidade, na diferença e não na ruptura, ao identificarem-se como ser regional autónomo, no quadro amplo de valores eminentemente portugueses, os Açores demonstram como é rica a temática regional e como ela deve interessar todo o Pais. A ignorância ou a má te sobre a questão das autonomias é grave prejuízo para o curso político da democracia portuguesa. A uniformização artificial das regiões e o seu Desconhecimento profundo, a criação de atritos despropositados entre regiões, o paternalismo sempre presente na demagógica apresentação das facturas financeiras, o sistemático recalcamento dos espaços regionais e da sua vitalidade na cultura oficial, na linguagem abstracta da imprensa, na retórica política e nos programas ultracentralizadores do nosso ensino são hoje rejeitados por quantos, como os socialistas democráticos, alinham com o pensamento regionalista moderno e sabem que está em marcha por toda u parte a vontade irreversível de afirmação das culturas regionais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador - É no diálogo respeitador dós diferenças regionais e não na uniformidade unilateralmente imposta que um país ergue o seu futuro em democracia. A Pátria é uma solidariedade de culturas e não um exército do espírito

A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Muito bem!

O Orador:-Mal vai uma democracia que não se transpõe a si própria para o plano de cada região e para o pulsar da sua vontade criadora. A experiência dos Açores, com as suas insuficiências, é certo, mas com os seus aspectos positivos deve constituir motivo de reflexão para quantos entendam necessária uma reforma descentralizadora do Estado, transferindo para as áreas deprimidas do nosso mundo rural os meios técnicos, financeiros e administrativos capazes de vencer o subdesenvolvimento, a tutela feudal das direcções-gerais comodamente instaladas nos Ministérios em Lisboa e a pulverização de municípios deficientemente apetrechados. Transmontanos e algarvios quanto não beneficiariam com a amplitude da opção regional? E o Alentejo, a Beira e o Minho? A hipocrisia descentralizadora da burocracia estatal, que descentraliza tudo para câmaras incapazes de exercerem as funções que lhes atribuem, na esperança de reaver mais tarde um poder reforçado, combate-se com a edificação de regiões, entendidas estas como corpos intermédios entre o poder estadual e o poder municipal. As implicações nacionais da temática autonomista são por de mais evidentes e não se limitam à área das regiões autónomas. Mas a temática autonomista é hoje também uma questão europeia de grande dimensão.
Os complexos problemas do alargamento das comunidades europeias aos países do Sul vieram igualmente colocar com extrema acuidade o fenómeno da articulação entre os grandes espaços económicos e as regiões periféricas insulares. Suportar os custos da insularidade, vencer o atraso económico, impedir a degradação e o abastardamento das culturas insulares pela industrialização selvagem e o turismo de massas é o grande desafio com que depara a Europa ao tentar estabelecer em moldes mais humanos e equitativos uma nova forma de relacionamento com as ilhas e os arquipélagos que a circundam no Atlântico, no Mediterrâneo e no Mar do Norte, Para essas ilhas donde se emigra ou onde se passa férias em hotéis incaracterísticos urge elaborar um programa de melhoria das comunicações e dos transportes, vencendo a barreira do abandono, e utilizando com mais energia os fundos comunitários de equilíbrio regional.

Vozes do PS-Muito bem!

O Orador: - Frequentemente cobiçadas como bases aéreas ou navais ou como ancoradouro de rea-

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bastecimento para frotas pesqueiras que praticam autênticas pilhagens em mares por vezes contaminados por detritos nucleares, as ilhas c os arquipélagos da pireferia europeia têm direito a ver assegurado um estatuto que salvaguarde de uma vez para sempre os seus valores culturais e proteja os interesses da sua economia perante fenómenos nem sempre bem conduzidos de integração e de uniformização.

O Sr. Angelo Correia (PSD) e o Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Muito bem?

O Orador:-Chegou a altura dos povos insulares tomarem consciência de si e fazerem ouvir a sua voz e também dos países que integram ilhas e arquipélagos estudarem com menos superficialidade e arrogância a problemática específica das suas regiões insulares. Nesta matéria, a democracia portuguesa pode orgulhar-se de ter elaborado parâmetros constitucionais de autonomia insular cuja consistência esta provada e de ir agora sancionar estatutos, oriundos dos próprios parlamentos regionais, que são porventura os mais avançados da Europa latina. A Assembleia da República faz sua, com inteiro merecimento, uma perspectiva actualizada e responsável sobre uma questão de grande relevância regional, nacional e europeia. Só tem razões para se orgulhar com isso.
Sr. Presidente, Srs. Deputados; Mais de cinco séculos após a sua descoberta e o seu povoamento, com uma população dispersa por nove ilhas e à qual se acrescentam os emigrantes das Américas e os residentes noutros pontos do território nacional, os Açores vêem finalmente consagrados num estatuto que os seus representantes elaboraram os princípios constitucionais de autonomia que só a democracia tornou possíveis e que justamente acertam o nosso relógio pela hora europeia. Faço votos para que o estatuto que esta Assembleia aprovar sirva realmente para a promoção e a defesa dos Açores como Região Autónoma no quadro constitucional português, .para o desenvolvimento e não para a estagnação, para o progresso humanizado e não para a descaracterização embrutecedora, para o avanço e não para o retrocesso, para a igualdade e não para o privilégio, para a democracia e não para a oligarquia.

O Sr. Carlos Sousa (PS): - Muito bem!

O Orador: - A terra que viu nascer Antero de Quental, Hintze Ribeiro, Manuel de Arriaga, Teófilo Braga, Roberto Ivens, Mário de Azevedo Gomes, D. José da Costa Nunes, Vitorino Nemésio e Mons. Humberto Medeiros, o arquipélago donde arrancou para o Mindelo a revolução liberal com D. Pedro IV, Almeida Garrett e Mouzinho da Silveira...

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - E Jaime Gama!

O Orador - ..., as ilhas onde melhor ficou simbolizada a resistência portuguesa à ocupação espanhola na época filipina - os Açores vivem hoje um marco decisivo da sua história política e administrativa. O futuro não há-de deixar de reconhecer que esse marco foi benéfico e que esta Assembleia soube prestar justiça às aspirações mais autênticas e mais genuinamente democráticas do povo dos Açores.

Aplausos do PS. de alguns Deputados do PSD, do PPM, dos Deputados Reformadores e do Sr. Deputado do CDS Sanches Osório.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (PSD): -Sr. Deputado Jaime Gama, uma vez que a nossa bancada está inteira mente de acordo com as afirmações que produziu acerca da importância das ilhas periféricas marítimas no contexto de um projecto europeu, por que é que, no ano passado, na Conferência dos Poderes Locais e Regionais do Conselho da Europa, quando João Bosco Mota Amaral apresentou ao plenário Conferência um relatório que terminava por propor exactamente a realização de uma conferência das ilhas atlânticas com o apoio do Conselho da Europa os seus camaradas socialistas se abstiveram na votação e alguns se ausentaram até da sala? Gostava de saber se o fizeram por a proposta ser apresentada por João Bosco Mota Amaral, se o fizeram porque têm uma posição diferente da do Sr. Deputado sobre esta matéria, ou se o fizeram por pura inconsciência.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a o Sr. Deputado Jaime Gama, se o entender. Em todo o caso, devo avisá-lo que o Partido Socialista dispõe de sete minutos e trinta segundos.

O Sr. Jaime Gama (PS)-Sra. Deputada Helena Roseta, muito rapidamente diria que a questão regiões autónomas tem sido objecto de uma abordagem extraordinariamente dramatizada e, por isso mesmo, extremamente negativa. Penso que tem ser exercida uma reflexão e uma pedagogia sobre o problema das regiões, sobre o regionalismo e, concretamente, sobre a questão das autonomias. E pense que não é de culpar ninguém. Essa situação acontece em todos os quadrantes da vida política nacional, exactamente por pensar que o problema tem de ser analisado e reflectido em toda a sua profundidade, que suponho que este debate teve uma grande relevância para que esses objectivos fossem atingidos. E tenho também a certeza de que, se essa reunião só tivesse realizado depois deste debate, o sentido de voto dos membros do Partido Socialista naturalmente não teria sido o mesmo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Vasco Paiva.

O Sr. João Vasco Paiva (PSD): - Sr Presidente, Srs. Deputados: Após um período razoável de experiência dos órgãos do Governo próprios das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, chegou a altura de, nesta Câmara, serem apreciadas as propostas de novos estatutos para aquelas Regiões.
Se três anos e tal atrás poderia dizer-se que a experiência das instituições regionais era inexistente, agora não passará por certo pela mente de ninguém, especialmente dos que naquelas longínquas terras habitam, labutam e criam um visível futuro promissor para os vindouros; agora não ocorrerá a ninguém, dizia, por em causa a credibilidade indesmentível de que as ins-

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tituições regionais desfrutam eleitas adentro das mais apertadas normas do respeito democrático.
Estamos agora na delicada posição de eleitos pelo povo, para apreciar uma proposta que nos é feita pelos eleitos do povo, do povo das regiões autónomas, que de perto têm vindo a viver em cada dia a construção da autonomia e que naturalmente estarão na posição privilegiada para se pronunciarem sobre as Grandes Opções, em matéria de autonomia que melhor correspondem aos seus anseios e às carências que querem ver satisfeitas por intermédio da lei que agora se aprecia.
Primeiro Deputado regional e desde fins de 1977 Deputado nesta Assembleia eleito pelo círculo dos Açores, sinto-me, como compreenderão, perfeitamente identificado com a proposta da Assembleia Regional dos Açores que abarca matéria estatutária que a Constituição permite nos seus parcos limites.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Açores com a luz que o 25 de Abril lhes proporcionou iniciaram uma caminhada nem sempre fácil, nem sempre facilitada, de se reencontrarem, de se unirem e de se harmonizarem como uma única comunidade espalhada por nove ilhas com as suas características muito próprias.
É bem certo que no arquipélago dos Açores temos ilhas com população que vai das 4 centenas de habitantes até à que tem cerca de 150 000 habitantes. Mas qualquer delas carece de uma representação que dê significado à sua própria identidade, como qualquer delas terá de ser representada de forma que se respeite um critério de proporcionalidade que responda afirmativamente ao consenso que os Açorianos atingiram logo em 1976 sobre a representação das ilhas e do eleitorado.
Nos últimos tempos nesta Câmara muito se tem falado dos Açores, infelizmente nem sempre com objectividade, com recta intenção e mesmo com verdade.
Coisas como a de afirmar que cerca de 3 000 marienses emigraram depois de 1975 e mais ...; que 3 toques de voo 5 regulares da TAP transferido de Santa Maria para as Lajes são uma espécie de «fim do Mundo» para os marienses e agravarão o tal fenómeno da emigração, são uma das muitas provas aqui dadas da inconcebível ignorância das realidades açorianas do passado e, ainda que é bem mais decepcionante, das realidades recentes.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Orador: - E quedo-me pela afirmação da ignorância porque assim julgo menos gravoso do que considerar a existência de manifesta má fé, posta em algumas das palavras aqui produzidas.
Ora a proposta do novo estatuto que dos Açores nos é aqui presente por quem conhece e vive a sua região resultam de um longo e árduo trabalho de levantamento e é fruto de um significativo empenhamento para a busca de novas soluções, mais adequadas ao avanço qualitativo que na Região Autónoma dos Açores se tem vindo a operar na consolidação da autonomia pela afirmação positiva, digna e operante dos órgãos do Governo próprio, Assembleia e Governo Regionais. Assim foi possível acabar uma proposta que veio a obter o voto favorável mesmo dos partidos políticos, que naquela Região são oposição do PSD, partido com a maioria absoluta na Assembleia e o grande responsável pelos bons resultados até aqui obtidos.

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas esse sinal do equilíbrio e justeza da proposta deverá nesta Assembleia apontar para a rápida adopção do proposto pelo mais amplo consenso possível para que ao menos em relação ao estatuto sejamos lestos e dotemos a Região Autónoma dos Açores daquela lei porque muitas forças já vinham clamando, mesmo quando ainda faltavam os testes, e que nesta oportunidade todos pensam já se terem efectivado.
O povo dos Açores espera o voto célere da Assembleia da República.

Aplausos do PSD do CDS do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não ha mais inscrições e presumo que não querem ainda votar... Se a falta de inscrições significa que querem votar, então vamos votar; senão, vamos jantar...

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Vamos votar, Sr. Presidente.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Peço a palavra. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Fava favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vital Moreira (PCP.:. - Sr. Presidente, o meu camarada Veiga de Oliveira gostaria de poder fazer uma intervenção, mas não está aqui neste momento.
Se alguém quisesse ainda intervir, pedia que o fizesse. Se ninguém quisesse intervir, pedia uma pequena suspensão dos trabalhos, de cinco minutos, para o chamar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradecia que a suspensão fosse por menos tempo, porque realmente não há mais, inscrições.

Pausa.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Leite.

O Sr. Jorge Leite (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quem tenha assistido atentamente a este debate e não tenha visto a ordem de trabalhos, poderia supor que em discussão estavam apenas as propostas de lei relativas aos estatutos das regiões autónomas. De facto, assim não acontece pois há mais um conjunto de propostas de lei, algumas delas da iniciativa das regiões autónomas, e é nosso entendimento que este debate não podia deixar em claro a análise e discussão dessas propostas de lei.
No conjunto de propostas de lei relativas às regiões autónomas em discussão na Assembleia da República, incluem-se duas, uma de cada região, sobre a entrada em vigor dos diplomas emanados dos Órgãos de Soberania e outras duas sobre a suspensão, nas regiões autónomas, da aplicação de

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diplomas cuja constitucionalidade seja impugnada pelas respectivas Assembleias.
A vulgarmente designada vacatio legis visa permitir o conhecimento das leis pelos destinatários dos comandos normativos, podendo sempre o legislador fixar, ele mesmo, o prazo da suspensão inicial dos respectivos diplomas, prazo que naturalmente variará em função da natureza das leis e da sua importância e complexidade.
Só que o legislador pode igualmente determinar a imediata entrada em vigor dos respectivos diplomas e pode, finalmente, nada dizer sobre a data da sua entrada em vigor. É para esta última hipótese que se pretende fazer valer o dispositivo das propostas de lei n.º s 284/I e 303/I. Trata-se, no fundo, de uma proposta de lei que revoga o artigo 2.º da Lei n.º 3/76 no que respeita às regiões autónomas, propondo o alargamento da vacatio legis de dez para quinze dias.
Simplesmente, os motivos invocados ligam-se mais às iniciativas legislativas das regiões autónomas sobre a suspensão dos diplomas objecto de impugnação constitucional, do que propriamente à razão de ser da vacatio legis.
Por outro lado, a «sanção» prevista no artigo 2.º da proposta de lei n.º 284/I da Região Autónoma da Madeira para os casos em que, fixando-se num diploma prazo mais curto, se não faça menção expressa à participação que na sua elaboração tenham tido os órgãos de Governo Regional, e irrazoável e constitucionalmente mais do que controversa. E ambas as razões são bastantes para não votarmos favorável mente as propostas de lei n.º s 284/I e 303/I.
Já as propostas de ler n.º s 285/I e 304/I das Assembleias Regionais da Madeira e dos Açores, respectivamente, ambas sobre o efeito suspensivo de diplomas emanados dos órgãos de Soberania e cuja constitucionalidade seja impugnada, merecem um pouco mais de atenção.
As diferenças entre as duas propostas são, neste caso, praticamente insignificantes.
As propostas de lei agora em discussão são a renovação de anteriores propostas de lei apresentadas na 2.º sessão legislativa sobre- as quais a Comissão de Assuntos! Constitucionais havia elaborado um parecer e que, por maioria, com apenas duas abstenções, ali tinha sido aprovado.
Vale a pena transcrever aqui a parte mais significativa desse parecer.
Diz-se nesse parecer: «Apreciadas perfunctoriamente as propostas de lei, a Comissão entendeu que elas careciam, desde logo, do necessário suporte constitucional. Não podendo, portanto, dar-lhes parecer favorável, a Comissão considerou todavia conveniente não dar parecer definitivo ao Plenário da Assembleia da República sem propiciar às assembleias regionais ocasião de se pronunciarem sobre o assunto à luz das razões invocadas por esta Comissão. Para o efeito, a Comissão elaborou um parecer sucinto, cujo envio às assembleias regionais foi solicitado ao Presidente da Assembleia da República por ofício de 21 de Abril de 1978, e cujo teor se transcreve»:
Apresentadas pelas Assembleias Regionais das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, as propostas de lei n.º s 143/I e 157/I versam ambas a mesma questão: a suspensão nas regiões autónomas dos diplomas emanados dos Órgãos de Soberania que hajam sido objecto de resolução das respectivas assembleias regionais no sentido de solicitar ao Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade.
A Constituição dispõe, de facto, que as assembleias regionais podem solicitar ao Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade das normas jurídicas emanadas dos Órgãos de Soberania por violação dos limites das regiões autónomas (artigo 229.º, n.º 2).
Este poder é idêntico, salvo no que respeita à parte final da citada norma, ao que Q artigo 281.º, n.º l, atribui ao Presidente da República, ao Presidente da Assembleia da República, ao Primeiro-Ministro, ao Provedor de Justiça e ao Procurador-Geral da República. Trata-se, no fundo, do poder de desencadear os mecanismos de controle a posteriori de quaisquer normas ou, para o caso previsto no n.º 2 do artigo 229.º, das normas emanadas dos Órgãos de Soberania. Embora de âmbito diferente, este poder é da mesma natureza e o seu exercício produz os mesmos efeitos, ou seja, produz o «feito de fazer desencadear os mecanismos de controle da constitucionalidade das normas previstas no artigo 281.º. O exercício deste poder não produz, porém, qualquer outro efeito.
Ora, é sabido que as normas existem e são aplicáveis enquanto não forem revogadas, não caducarem ou não forem declaradas inconstitucionais com força obrigatória geral. Nenhum outro meio pode evitar a aplicabilidade das leis vigentes.
De facto, a suspensão das normas como efeito do pedido de apreciação da constitucionalidade não está previsto na Constituição. Sendo certo que só ela o poderia prever, é vedado à lei ordinária a criação de qualquer outro mecanismo que implique a suspensão, total ou parcial, das normas vigentes.
Acabei de transcrever a parte mais significativa do parecer que havia sido votado por maioria, com, repito, apenas duas abstenções, na 2.ª sessão
legislativa da I Legislatura.
E nem mesmo se diga contra estes argumentos, como se faz no parecer da 1." Comissão - parecer é certo que recolheu tantos, votos favoráveis quantos os votos contrários, e por - isso não foi aprovado -, que, dando o - texto constitucional poderes à Assembleia da República para legislar, lhe dá implicitamente poderes, para revogar o legislado e, também, para o suspender na sequência e com invocação - leviana, diga-se desde já - de um princípio geral segundo o qual quem - pode fazer o mais, pode fazer o menos.
Na verdade, do que as propostas tiraram não é da competência ou (incompetência da Assembleia da República para suspender diplomas; do que tratam não é sequer de uma eventual delegação de poderes da Assembleia da República nas assembleia regionais; do que se trata, nos termos daí propostas de ler em análise', é de saber se pode uma lei ordinária ligar ao acto das assembleias regionais de impugnação da constitucionalidade dos diplomas emanados dos Ór-

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gãos de Soberania efeitos diferentes daqueles que a própria Constituição prevê.
É para nós evidente a inconstitucionalidade de uma liei que estabeleça, como efeito do acto de impugnação, a suspensão dos diplomas impugnados porque é para nós evidente que só a Constituição poderia prever tal efeito.

Aplausos do PCP.

Admitir, no domínio do direito político, no domínio do direito de conformação política de um Estado, que o que não é proibido c permitido, como já tanta vez aqui se invocou, é, ao fim e ao cabo, afirmar a subversão da Constituição ou, pior ainda, negar a própria ideia da Constituição.
Negar, por exemplo, o carácter de taxatividade às normas sobre as, formas por que o povo pode exercer a soberania que detém ou às normas sobre os Órgãos de Soberania é admitir, por exemplo, que podem sar feriados outros órgãos de Soberania paira adem aos previstos na Constituição, ou que o povo pode exercer a soberania num dado momento sob certas for-mas para deixar de a poder exercer sob essas meti-mas formas no momento seguinte.
Por outro lado, admitir, como se diz no parecer da 1.ª Comissão, que quem pode o mais pode o menos é, em direito político, outra rematada asneira. Não sei se quem votou favoravelmente um tal parecer defenderá, por exemplo, que, podendo o Presidente da República dissolver a Assembleia da República, a poderá suspender temporariamente ou que, podendo esta Assembleia da República demitir o Governo; também o poderá suspender.

O Sr. Vital Moreira (PCP):-Bem apanhado!

O Orador.- Para além do problema constitucional, as propostas de lei em análise suscitam problemas políticos e sociais extremamente melindrosos.
A ser publicada uma tal lei, poder-se-á assistir à suspensão, numa região, de leis regulamentadoras de direitos fundamentais por um acto de quem não tem competência para legislar sobre tal matéria. Poder-se-á assistir ainda a que certo facto seja considerado crime em todo o território, salvo na região cuja assembleia deliberou impugnar a lei incriminadora e vice-versa.
As propostas de lei n.ºs 285/I e 304/I não são nem constitucional, nem politicamente sustentáveis e por isso as não aprovaremos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ontem foi aqui recordada, pelo Sr. Deputado Almeida Santos, a nossa participação na elaboração dos actuais estatutos de autonomia das Regiões dos Açores e da Madeira.
Não valeria a pena recordá-lo se não fosse a insistência e a má fé com que alguns pretendem acusar a esquerda, em geral, e o Partido Comunista Português, em particular, de vícios centralistas que não temos ...

Risos do PSD e do CDS.

...e de posições antiautinómicas que nunca foram nem são as nossas.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Essa é boa!

O Orador - Para a direita e para a reacção, vale a pena sublinhar que, certamente com deficiências e insuficiências próprias de um regime jurídico que dá os primeiros passos, os actuais estatutos permitiram ir realizando e consolidando, pela primeira vez na nossa história, a existência de verdadeiras; regiões autónomas, com potencialidades (ainda que malbaratadas e desviadas) para servirem os interesses legítimos e justos das populações portuguesas dos Açores e da Madeira.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador - Chegados ao fim deste debate ...

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Ainda não acabou!

O Orador: - ... não será necessário repetir o que por nós foi já sobejamente demonstrado e, em particular, pelo meu camarada Vital Moreira.
Dispensar-nos-emos de reeditar, quer os argumentos de constitucional idade que não poderão ser arredados, quer a comprovação das manipulações anticonstitucionais golpistas e quase sediciosas que alguns internam, com objectivos que estão no pólo oposto ao real e justo anseio autonômico das, populações portuguesas dos Açores e da Madeira.

Vozes do PCP; - Muito bem!

Vozes do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - De facto, com um total desprezo pela resolução dos problemas económicos e sociais dos Portugueses e, em especial, dos Açorianos e Madeirenses, e, só e tão-só, para melhor cacicarem e encobrirem a defesa dos seus privilégios de classe ...

Vozes do PSD: - Não apoiado!

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Caciques são vocês!

O Orador. - ..., as suas actuações antidemocráticas e os seus propósitos revanchistas e resta restauracionistas, a directa e a reacção intentam, desde 1975, transformar a autonomia dos Açores e da Madeira num biombo para os seus ataques ao Estado democrático-constitucional e às conquistas do 25 de Abril.

O Sr. Cabrita Neto (PSD) : - Está-se a ver ao espelho!

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Lá se foi o eurocomunismo!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): -Já jantou? ...

O Orador: - Os Srs. Deputados estão muito agitados!

Vozes do PCP: - Estão nervosos, estão nervosos ...

Aplausos do PCP e protestos do PSD.

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O Orador. - Por tal forma as minhas acusações procedem que se torna indispensável lembrar que se autonomia há e haverá e se podemos hoje, por nosso lado, declarar da tribuna da Assembleia da República que a autonomia irá tão longe quanto for necessário para melhor salvaguardar os interesses do povo português e, em especial, das populações dos Açores e da Madeira, isto se deve à vitória das forças democráticas contra a direita e a reacção, à vitória do 25 de Abril contra aqueles mesmos que hoje enchem a boca com a autonomia, que a seu tempo negaram totalmente.

Vozes do PSD: - Não apoiado!

Aplausos do PCP.

O Orador: -Para nós, comunistas, a autonomia política e administrativa das regiões insulares portuguesas dos Açores e da Madeira constitui uma importante conquista de Abril, um traço marcante do Estado democrático-constitucional, uma poderosa contribuição para a unidade da Nação Portuguesa e uma base fundamental para o progresso económico e social das populações portuguesas dos Açores e da Madeira, em particular, e do povo português, em geral.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Fundamentada objectivamente na geografia e na história, a autonomia político-administrativa das regiões insulares portuguesas dos Açores e da Madeira representa também um justo e democrático anseio das populações contra o centralismo esterilizante, autocrático e reaccionário de cuja expressão mais recente e nefasta foi responsável a ditadura fascista de Salazar e Caetano, durante quarenta e oito longos anos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A autonomia é, pois, sinónimo de esquerda e de democracia e antónimo de direita e de reacção.

Aplausos do PCP e de alguns Deputados do PS.

É isto aliás que explica a crispação da direita quando se fala de autonomia e é também isto que explica que a direita e a reacção venham servindo-se sistematicamente da questão autonômica como aríete contra o Estado democrático, contra a Constituição, contra o 25 de Abril.

O Sr. António Lacerda (PSD): -- Contra o PCP!

O Orador: - E é bom lembrar que, se tivessem feito vingar o que para muitos de vós foi o ideal - a «evolução» caetanista, hoje as regiões autónomas estariam certamente na situação de submissão, abandono e exploração que caracterizavam as regiões insulares antes do 25 de Abril.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador - Não admira, pois, que os dois projectos de estatuto presentes a esta Assembleia da República, embora com diferenças profundas, deixem em muitos casos transparecer as marcas da manipulação.
É assim que vimos aqui alegar, falsamente e [...]...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

O Orador: - ..., em defesa de claros e gritantes atropelos à Constituição contidos nas duas propostas que não seriam estas que haveria que corrigir, sim antecipadamente, por via enviesada e golpista a própria Constituição.
Foi assim, também, que vimos aqui produzir exemplos livrescos, mal assimilados e claramente reveladores de um grande desconhecimento das realidades dos países citados, exemplos, como dizia, de [...] de autonomia às quais a nossa Constituição fica a dever.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas claro é, neste caso, como anterior, que o que se pretendeu foi mais uma vez introduzir, sob a capa da autonomia, ideias separatistas quando não a simples chantagem.
Em nenhum caso a argumentação que supostamente deveria ser produzida em defesa das propostas d estatuto, (sobretudo o da Madeira), tal qual foram presentes a esta Assembleia da República, procurou fundamentar-se em interesses objectivamente reconhecidos e manifestados pelo povo açoriano e madeirense.

Vozes do PCP: -- Muito bem!

O Orador: - O discurso da direita resumiu-se, um lado, a deixar cair a máscara quanto aos sei verdadeiros desígnios anticonstitucionais e antidemocráticos e a mostrar claramente o seu jogo político-partidário e manipulador das populações açorianas e madeirenses.
Há, como dissemos, diferenças profundas entre as duas propostas e se é verdade que o voto na generalidade representa um quase voto de admissibilidade (uma vez que a iniciativa em tal matéria é constitucionalmente das Assembleias Regionais), não e menos verdade que, assegurada a tramitação dos dois projectos, entendemos poder marcar bem a diferença qualitativa que os separa, votando favoravelmente a proposta de lei relativa aos Açores, e votando contra a proposta de lei relativa à Madeira.
Por nosso lado, estamos dispostos a tudo fazer para contribuir para que, corrigidas das inconstitucionalidades e também, e afinal, das insuficiências, quer quanto às garantias de organização democrática, quer quanto á eficácia e adequação à resolução dos justos anseios económicos, sociais e autonômicos das populações portuguesas dos Açores e da Madeira, como dizia, estamos dispostos a tudo fazer para que embreve seja possível substituir os estatutos provisórios
- aqueles que votámos em 1976, no Conselho Ministros- pelos estatutos definitivos, mais consentâneos com as necessidades do povo português, do povo da Madeira e do povo dos Açores, sem nenhuma diferença, e sem prejuízo para nenhum português isto é, para o povo português, e sem, sobretudo, permitir que, através da manobra dos novos estatutos se configure na prática a tentativa de alterar antecipadamente, inconstitucionalmente e de forma golpista

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a Constituição da República e portanto o Estado democrático que foi conquistado e que está consagrado nessa mesma Constituição.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por nosso lado estamos dispostos, se for necessário, a fazer novamente uma vigília para que os estatutos saiam daqui, como é necessário, para as populações dos Açores e da Madeira, mas que saiam daqui conformes com a Constituição da República Portuguesa.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais oradores inscritos, vamos proceder à votação dos diplomas em discussão.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade. Sr. Deputado.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, suponho que iremos votar as duas propostas de lei relativas aos estatutos das duas Regiões Autónomas e logo após estas duas votações teremos de solicitar a interrupção da sessão por um período de quinze minutos.
Por outro lado, se o Sr. Presidente me permite, gostaria de dizer que por enquanto não prescindimos dos sete minutos que ainda dispomos, pois não sei se viremos a precisar de os usar ainda neste debate.

O Sr. Presidente: - Penso que a Câmara esteja de acordo, até porque, em principio, a Mesa iria submeter estes diplomas à votação pela ordem que consta da ordem do dia. Simplesmente, em face do requerimento do Sr. Deputado Almeida Santos, votaremos em primeiro lugar as propostas de lei n.º s 295/I e 300/I, fazendo-se de seguida um intervalo de quinze minutos.
Sendo assim, vai proceder-se à votação na generalidade da proposta de lei n.º 295/I, relativa ao Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira e apresentada pela Assembleia Regional da Madeira.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores e votos contra do PCP e a abstenção do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação da proposta de lei n.º 300/I, relativa ao Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, apresentada pela Assembleia Regional dos Açores.

Submetida à votação, foi aprovado por unanimidade.

Aplausos gerais,

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo PS, está suspensa a reunião por um período de quinze minutos.

Eram 20 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a reunião.

Eram 20 Horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à votação na generalidade da proposta de lei n.º 284/I, relativa à entrada em vigor nas Regiões Autónomas dos diplomas emanados dos Órgãos de Soberania, apresentada pela Assembleia Regional da Madeira.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do CDS, do PP.M e dos Deputados reformadores e votos contra do PS e do MDP/CDE e as abstenção do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à votação na generalidade da proposta de lei n.º 285/I...

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, para se evitar toda a possibilidade de confusão nas votações que vamos fazer, seria conveniente que quando se colocasse à votação um diploma se indicasse em seguida qual o seu objecto.

O Sr. Presidente: - É o que temos vindo a fazer, Sr. Deputado, e é o que eu ia a fazer quando V. Ex.ª pediu a palavra.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Estava eu a dizer que se iria proceder à votação na generalidade da proposta de lei n.º 285/I, apresentada pela Assembleia Regional da Madeira, sobre a suspensão da aplicação nas regiões autónomas dos diplomas dos Órgãos de Soberania impugnadas perante o Conselho da Revolução pelas respectivas Assembleias.

Submetida à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS, do PPM e aos Deputados reformadores e votos contra do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à votação na generalidade da proposta de lei n.º 303/I, apresentada pela Assembleia Regional dos Açores, sobre a entrada em vigor nas Regiões Autónomas dos diplomas emanados dos Órgãos de Soberania e dos publicados no Diário da República.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS, do PPM e dos Deputados, reformadores e votos contra do MDP/CDE e a abstenção do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à votação na generalidade da proposta de lei n.º 304/I, apresentada pela Assembleia Regional dos Açores, que suspende, nas Regiões Autónomas, a aplicação de diplomas cuia constitucionalidade seja impugnada pelas respectivas Assembleias.

Submetida à votação, foi aprontada, com votos a favor do PSD, do CDS. do PPM e dos Deputados reformadores e votos contra do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação de dois projectos de lei, apresentados pelo PCP, sobre o regime de eleição das Assembleias Regionais dos Açores e da Madeira.

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O Sr. Vital Moreira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, eu não gostaria que estes dois diplomas fossem votados sem dizer algumas palavras que, pelo menos, enquadrassem as propostas que o meu partido apresentou.
Na realidade, o facto de este chamado «pacote regional» ter metido juntamente com os estatutos outros diplomas de importância em si mesma grande, mas que comparativamente é bastante menor, fez com que a discussão fosse justamente centralizada para a questão dos estatutos regionais.
Todavia, esta matéria sobre o regime de eleições regionais, bem como a matéria que acaba de ser votada, ficou em silêncio total. Uma vez que se trata de dois diplomas que, entre os três que nos falta votar, são apresentados pelo Grupo Parlamentar do PCP, gostaria de em dois breves minutos dizer de nossa justiça.
Com estes dois projectos de lei pretendemos obter duas coisas: por um lado, renovar as leis eleitorais para as Assembleias Regionais - que, como se sabe, caducaram - e adaptá-las eM alguns pontos à Constituição ou a leis posteriores, como a Lei do Recenseamento. É o que diz respeito, por exemplo, a algumas das competências que agora devem ser exercidas pelos presidentes das câmaras ou pelo Ministro da República, entidades que não existiam na altura em que os diplomas que regularam as últimas eleições, bem como as primeiras, não estavam em vigor. É também o que acontece em relação à questão da divisão das mesas eleitorais em assembleias de voto quando o, número de eleitores ultrapasse os 800 eleitores. Este foi um dos motivos que nos levam a apresentar esses projectos de lei.
Aproveitámos também para propor algumas alterações de fundo em relação ao regime eleitoral das Regiões Autónomas, que nos parecem ser exigidas por uma melhor adequação e funcionamento do princípio da proporcionalidade nas respectivas Regiões Autónomas. Com efeito, o actual regime prevê, na Madeira, por exemplo, a existência de círculos uninominais, que nos parecem de todo em todo incompatíveis com a aplicação do princípio da proporcionalidade e, mesmo no caso dos Açores, a existência de ilhas com apenas algumas centenas de eleitores provoca grandes disparidades pela aplicação da actual lei.
É óbvio que não temos estas alterações por indiscutíveis, nem as temos .por serem as únicas justas. Propusemo-las para discussão. É por isso que não podemos aceitar que, em relação à consulta que sobre os nossos projectos de lei foi feita, o Presidente de um dos Governos Regionais - que não preciso de dizer qual é, porque as pessoas ficarão logo a saber quem é, porque o outro seria incapaz disso, pois tem um sentido de dignidade da coisa pública que o sujeito que subscreve isto obviamente não tem - se tenha permitido verberar o facto de o PCP se «meter neste assunto», isto é, em matéria de eleições para a Assembleia Regional, na medida em que, não tendo representatividade na Assembleia •Rgional da Madeira, não tem legitimidade para interferir nos assuntos da região.
Ora que este senhor não tem estofo para Presidente de um Governo Regional é óbvio e já ficou aqui várias vezes demonstrado.

O Sr. Nicolau de Freitas (PSD): - Não apoiado!

O Sr. Nuno Lima (PCP): - Nem para carreteiro!

O Orador - Que não tem um mínimo de educação, em termos de respeitar os poderes que constitucionalmente os grupos parlamentares e os partidos políticos representam, é coisa que nós não podemos tolerar. Lamentável é que haja aparentemente Deputados nesta Assembleia da República que podem contestar atitudes destas. Julguei que elas deviam merecer unanimemente, pelo menos, reprovação, para não dizer repúdio!...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Juntamente com os nossos doas projectos de lei- existe uma proposta de lei regional da Madeira. Um dos seus objectivos é exactamente um dos motivos que nos moveu a apresentar algumas propostas, ou seja, adaptar o decreto-lei que caducou, renová-lo e adequar algumas das suas normas.
Infelizmente, a Assembleia Regional da Madeira não se ficou por aí. Ter-se-ia ficado bem, mas avançou também paxá instituir um regime especial em matéria de propaganda para a Região Autónoma da Madeira. Este facto implica, uma limitação bastante grande em relação ao regime geral da Lei Eleitoral nesta matéria e que, se fosse aprovado, iria provocar o seguinte: se houvesse eleições simultâneas para a Assembleia da República e para a Assembleia Regional da Madeira, os partidos políticos poderiam colar propaganda, nos termos da Lei Eleitoral, relativa às eleições para a Assembleia da República, em muros, salvaguardando as excepções previstas na Lei Eleitoral, mas já não o poderiam fazer no que se refere à propaganda respeitante à eleição para a Assembleia Regional, porque aí ficariam limitados aos placarás das câmaras municipais!
É uma solução que lemos por não justificada e não compreendemos porque é que se há-de restringir de tal modo a propaganda eleitoral, tratando-se de propaganda eleitoral e, sobretudo, estabelecendo-se um regime excepcional que de modo algum se justifica.
É por isso que não podemos dar o nosso apoio à proposta de lei da Região Autónoma da Madeira, embora, dado que a nossa discordância se limita a um dos artigos, também não tenhamos razão para votar contra.

Aplausos do PCP.

O Sr. Alcino Barreto (PSD): - Peço a palavra para formular um protesto, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

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O Sr. Alcino Barreto (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu estava longe de pensar que voltaria a usar hoje da palavra. Mas tenho a obrigação moral de o fazer, não só pelo respeito por esta bancada, mas também pelo respeito pelo povo madeirense que aqui nos pôs.
Creio que o Sr. Deputado Vital Moreira exagera quando confunde todos os Madeirenses com o Sr. Presidente do Governo Regional da Madeixa, com quem - toda a gente o sabe - o Sr. Deputado Vital Moreira tem um contencioso pendente que vem de longa data. É uma questão pessoal, pelo que me parece mal que o Sr. Deputado Vital Moreira, com a inteligência e experiência parlamentar de que tem dado mostras, venha pessoalizar e, ao mesmo tempo, institucionalizar uma querela pessoal dentro desta Assembleia.
Parece-me, sobretudo, um tanto ou quanto desleal, pois não se encontra presente a pessoa atingida, de forma a que se possa defender.
Em nome do povo da minha terra, não podia deixar passar estas referências que têm sucessivamente sido feitas, confundindo o individual com o todo, para denegrir um povo no qual também se contam - o Sr. Deputado sabe-o bem - correligionários seus, que também seriam abrangidos por essa infâmia e esse labéu que o Sr. Deputado lança indistintamente contra todo o povo da Madeira.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM,

O Sr. Lino Lima (PCP): - E não lhe encolhe o bigode...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Deputado Alcino Barreto, é óbvio que o seu esclarecimento não tem nada a ver com o que eu disse. Eu referi-me apenas ao Presidente do Governo Regional da Madeira, e não disse nada que pudesse injuriar os Madeirenses e pô-los ao mesmo nível do Presidente - do respectivo Governo Regional.
Vejo que estou acompanhado, e bem, pelo Sr. Deputado. Estamos de acordo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Não apoiado!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Iremos votar de seguida o chamado «pacote das leis eleitorais». O PS entende que haverá uma relação lógica entre aquilo que será o resultado final dos trabalhos no que respeita ao estatuto das Regiões Autónomas. Por isso, abster-nos-emos no que respeita a este pacote de leis eleitorais, na expectativa de ver qual será o resultado final no que respeita ao estatuto das Regiões Autónomas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à votação na generalidade da proposta de lei n.º 296/I, apresentada pela Assembleia Regional da Madeira, sobre a lei eleitoral paira a Assembleia Regional da Madeira,

Submetida â votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores e as abstenções do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação na generalidade do projecto de lei n.º 447/1, apresentado pelo PCP, sobre o regime de eleição da Assembleia Regional dos Açores.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores e votos a favor do PCP e do MDP/CDE e a abstenção do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à votação na generalidade do projecto de lei n.º 448/I, apresentado pelo PCP, sobre o regime de eleição da Assembleia Regional da Madeira.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores e votos a favor do PCP e do MDP/CDE e a abstenção do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à votação final global da proposta de lei n.º 290/I, que considera determinadas áreas da Região Autónoma dos Açores, afectadas pelo sismo de l de Janeiro de 1980, regiões rurais economicamente mais desfavorecidas para efeitos de benefícios fiscais estabelecidos na lei durante os anos de 1980-1984.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, por acordo entre os restantes grupos parlamentares faremos - uma declaração de voto amanhã sobre esta matéria. Não sabemos se os outros grupos parlamentares quererão usar do mesmo direito. O que é certo é que nós vamos fazê-lo.
Penso que será ainda necessário votar algum requerimento, se é que ainda não se encontra na Mesa, solicitando a baixa destes diplomas às respectivas comissões.

O Sr. Presidente: - Aguardamos esse requerimento. Quanto às declarações de voto, parece que há consenso para que elas se façam na sessão de amanhã.

A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Mas, Sr. Presidente, houve uma votação final global de um diploma que, assim, não tem de baixar a qualquer comissão, e o PCP pretende fazer hoje a respectiva declaração de voto referente ao mesmo.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr.4 Deputada. Antes, porém, tem a palavra o Sr. Deputado Meneres Pimentel.

O Sr. Meneres Pimentel (PSD): - Sr. Presidente, eu não vou fazer uma declaração de voto.

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É o seguinte: dispõe o Regimento, quanto aos projectos dos Estatutos Político-Administrativos das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, que eles devem ser discutidos e votados na especialidade no Plenário.
Todavia, depois de um contacto que fiz com todas as forças políticas aqui representadas, ficou acordado que a comissão especializada, à qual foram distribuídos estes diplomas, prepararia a votação na especialidade, que é obrigatório fazer-se no Plenário.
Para esse efeito, irá ser marcada, se ninguém se opuser, uma reunião da Comissão de Assuntos Constitucionais.
Era este ponto que queria pôr à consideração da Mesa para confirmarem ou infirmarem esta minha pretensão.

O Sr. Presidente: - Salvo melhor opinião e o devido respeito, terá de ser apresentado o requerimento ...

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, eu continuo a insistir em que nós pretendemos fazer hoje a declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, eu não lhe disse que não. Estava apenas a responder a um Sr. Deputado.
Não obstante, como estava dizendo, a Mesa entende que é necessário ser apresentado o requerimento que confirmará essa sua posição.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, pretendia dar o nosso acordo ao que foi dito pelo Sr. Deputado Meneres Pimentel. Parece-nos que posta a coisa como foi, não há necessidade de nenhum requerimento. A Comissão vai ser convocada para preparar a votação e isso parece-nos bastante.

O Sr. Presidente: - Não há oposição da Câmara?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, o PS está de acordo, mas pensamos que quanto aos restantes projectos e propostas de lei terá de haver votação de um requerimento solicitando a sua baixa à Comissão respectiva.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada lida Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos favoravelmente a proposta de lei n.º 290/I porque sempre considerámos serem necessárias medidas excepcionais tendentes a minorar os efeitos provocados pela catástrofe que atingiu duramente as populações da zona sinistrada dos Açores. A nossa .posição desde logo ficou clara quando propusemos a criação dei uma comissão de solidariedade e apoio às vítimas do terramoto dos Açores, o que não foi aceite pela escassa maioria governamental desta Assembleia.
Também aquando da discussão na generalidade da presente proposta de lei alertámos que a Situação que se vive nas ilhas atingidas pelo terramoto afectava não apenas as - pessoais singulares ou colectivas que detêm as empresas comerciais e industriais ou prédios urbanos. Outras camadas da população, nomeadamente os trabalhadores por conta de outrem, foram igualmente atingidos pelo sinistro.
Assim, apresentámos três propostas de aditamento e alteração com o objectivo de que fossem introduzidas disposições que a melhorassem, alongando os benefícios fiscais às pessoas, singulares que exerçam a sua actividade profissional nas áreas sinistradas, assentando-as do imposto profissional relativamente aos rendimentos de 1980, na parte que não ultrapasse os 200 contos e com os efeitos correspondentes no imposto complementar.
Outra proposta nossa referiu-se à possibilidade de também beneficiarem da redução da sisa as entidades individuais que adquirissem bens na área sinistrada e não apenas as sociedades, como acontece com a presente proposta de lei agora, aprovada.
A rejeição das nossas propostas de alteração e aditamento é uma prova inequívoca de que ao Governo não interessa minorar as dificuldades dos trabalhadores e camadas da população de menores rendimentos, nomeadamente os pequenos agricultores.
A posição do Governo apenas neve, pois, em conta os proprietários de empresas industriais e comerciais ou prédios urbanos.
De sublinhar, por outro lado, que os órgãos da Região Autónoma dos Açores levaram mais de dois meses a responder ao parecer solicitado por esta Assembleia da República sobre a presente proposta de lei, o que atrasou naturalmente a sua votação final global.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A posição de voto favorável que ora assumimos, bem como as propostas que apresentámos, nomeadamente de solidariedade, empenhamento e apoio dos órgãos de Soberania às populações das zonas atingidas pelo sismo, e que a maioria da AD rejeitou, demonstram de maneira clara que são os comunistas e os democratas em geral quem mais se tem esforçado pela rápida resolução dos problemas existentes.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Fica também demonstrado quê as posições dos partidos da, AD e a falta de resposta pronta dos organismos regionais (da responsabilidade PPD) às carências sentidas pelas populações afectadas são a prova cabal de que as suas propostas e propósitos eleitorais se quedam pela pura e simples demagogia.

O Sr. António Lacerda (PSD): - Não apoiado!

A Oradora: - Pelo nosso lado fica a certeza de tudo termos feito, quer dentro, quer fora da Assembleia da República, para que no mais curto prazo de tempo fossem adoptadas as medidas concretas necessárias à reconstrução e a minorar os sofrimentos das populações atingidas peia catástrofe.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Nicolau de Freitas.

O Sr. Nicolau de Freitas (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com viva satisfação que os sociais-democratas madeirenses e o povo madeirense vêem finalmente ser aprovados na Assembleia da República vários diplomas emanados da sua Assembleia Régio-

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nal, de entre os quais ressalta pela sua importância o Estatuto
político-administrativo da Região.
E dizemos finalmente porque só agora, com a maioria parlamentar liderada pelo Partido Social-Democrata, foi possível verem-se discutidos e aprovados diplomas apresentados péla Região, o que não aconteceu com outras eventuais efémeras maiorias existentes nesta Assembleia ida República.
Por aqui se vê quem são os verdadeiros defensores da Autonomia das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira. Com a aprovação do Estatuto político da Região Autónoma da Madeira passaremos a usufruir de uma autonomia, embora ainda mitigada, que nos permite satisfazer para já os mais urgentes interesses do povo madeirense.
As satisfações que sentimos neste momento é, porém, grandemente ensombrada por uma notícia bem dolorosa que chegou ao nosso conhecimento há pouco.
Max - o madeirense que levou aos quatro cantos do mundo o nome e a vivência madeirense, o homem que se afirmou sempre com grande dignidade e serenidade em todos os momentos da sua vida - faleceu. Deixou o mundo dos vivos esta tarde, quando tudo levava a crer que estava a recuperar da sua dolorosa doença.
Perdeu a Madeira um dos seus mais devotados e acarinhados filhos. Sentimos profundamente o seu desenlace e prestamos profundamente sentida homenagem.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Freitas.

O Sr. Vieira de Freitas (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Partido Socialista e em representação dos socialistas madeirenses, desejo interpretar o sentimento de dor pela morte desse artista extraordinário, intérprete do folclore madeirense, autêntico embaixador da Madeira no mundo.
Gostaria que toda esta Assembleia se solidarizasse com o voto de pesar proposto pelo meu colega Nicolau de Freitas e ao qual o PS se associa com verdadeiro pesar.

O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Germano Domingues.

O Sr. Germano Domingos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD votou favoravelmente os diplomas agora aprovados, em especial o Estatuto da Região Autónoma dos Açores, porque sempre defendeu uma autonomia progressiva e baseada na vontade; expressa pelo povo açoriano, através de eleições livres e democráticas.
Este Estatuto foi-nos presente, depois de discutido e aprovado na Assembleia Regional dos Açores, tendo como base o projecto do PSD e onde os Deputados eleitos por todas as ilhas conhecem e sentem as realidades e aspirações do nosso povo.
É de lamentar que o Partido Socialista, pela boca do Sr. Deputado Almeida Santos, tenha encontrado dificuldades em perceber este Estatuto, o que prova que não está em sintonia com os socialistas dos Açores, como hoje ficou aqui demonstrado - porque um Deputado eleito pelos Açores demonstrou mais uma
vez que a sensibilidade dos nossos problemas é apenas sentida por nós e não pelo Sr. Deputado Almeida Santos.
Preferimos nós que funcionasse nestes anos o Estatuto Provisório para o testar depois de entrarem em pleno funcionamento os inexperientes órgãos de governo próprio - Assembleia e Governo Regionais. Isto mesmo foi reconhecido por Deputados socialistas na Assembleia Regional dos Açores.
Não seria necessária a intervenção de ontem, do Sr. Deputado Almeida Santos, pois os Governos Socialistas de que fez parte tudo fizeram para entravar a autonomia, até mesmo dificultando simples transferências de serviços periféricos. No entanto, tenho que fazer justiça ao Sr. Deputado Almeida Santos que, após uma sua digressão pelos Açores participando de seguida numa reunião sentado a meu lado, tentou na altura pôr-se de acordo com as nossas posições e em desacordo com os seus colegas de Governo. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nós, sociais-democratas, sempre lutámos e continuaremos a lutar pela autonomia, pois em várias eleições sempre o povo açoriano nos deu o seu aval e só tardiamente muitos se aperceberam dessa vontade e querem agora acompanhar-nos, o que nos dá a força da razão.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vários Deputados, já ontem e hoje, aqui desenvolveram análises técnico-jurídicas, políticas e históricas sobrei este diploma em apreço.
Caberá, porém, aqui referir que o nosso voto favorável advém ainda de uma experiência no campo concreto levada a efeito pela Assembleia Regional e pelo Governo Regional, que aí sim tem tido uma actuação altamente meritória e dignificante e que vem contribuindo para o desenvolvimento da nossa terra e melhoria de condições de vida das nossas gentes. Bastará notar que estes dois órgãos de governo próprio formado por gente inexperiente, arrastando com dificuldades de várias ordens, tais como falta de pessoal qualificado, dificuldades de transportes agravadas com a paralisação da marinha mercante e da aviação civil, entraves dos Governos Centrais, atrasos nas aprovações dos vários OGE, onde o orçamento regional tem de se inserir e que, embora o nosso sempre aprovado em Outubro de cada ano tem esperado até Abril/Maio do ano seguinte para se poder executar, reduzindo para seis ou oito meses o que; se programou para doze meses do trabalho.
Apesar de tudo isto e porque o tempo é pouco, vou referir algumas realizações efectuadas nestes três anos e meio de governo próprio.
Enquanto que a governação central construiu em quinhentos anos dois portos dignos desse nome e dois aeroportos em Horta e Ponta Delgada, já que os da Terceira e Santa Maria e Flores foram construídos pôs estrangeiros, o Governo Regional está a construir três portos no Pico, um porto na Graciosa, adjudicou melhoramentos no de Ponta Delgada, abriu concurso para obras no da Horta, tem pronto o projecte para o das Flores, aprecia o projecto de viabilidade económica do porto oceânico da Praia

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da Vitória e mandou proceder ao levantamento para localização do porto de Santa Maria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador - Quanto ao aeroporto, estão em construção quatro nas ilhas Graciosa, S. Jorge, Pico e Corvo, este último pelos militares.
Estão já concluídos e alguns em funcionamento oito entrepostos frigoríficos de apoio às pescas e a agro-pecuária tem recebido- grande apoio quer para cooperativas, como ainda em equipamento agrícola, cujo custo ascendeu a 200000 contos e que está ao serviços dos agricultores de várias ilhas.
Estão em construção dezenas de escolas primárias e secundárias e o Instituto Universitário dos Açores tem recebido grande apoio. A rede hospitalar tem vindo a ser equipada e beneficiada, estando já a concurso mais uma grande unidade hospitalar.
As estradas, o abastecimento de água, saneamento básico, habitação social, apetrechamento da electrificação rural e urbana, com aquisição de mais de vinte novos geradores, lançamento do cabo submarino para transporte de energia através do canal Faial-Pico e o prosseguimento da exploração da energia geotérmica têm sido contemplados corá grandes investimentos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O investimento público total nestes três anos e meio foi de 9 milhões de contos para 260 000 habitantes, na sua grande maioria pescadores e trabalhadores rurais. Ora, são estes trabalhadores rurais que votam no PSD e. não os reaccionários como dizem dessa bancada.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Esta verba não contempla as despesas correntes de funcionamento e pagamentos a pessoal dos serviços e administração pública, os números falam por si.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está provado que a vontade e a capacidade do povo açoriano justificam a autonomia e com a aprovação deste Estatuto estou certo de que o desenvolvimento será acelerado. Deixem-nos trabalhar em paz, para que o progresso e a justiça social a que sempre aspiraram as populações açorianas se concretize rapidamente, já que a autonomia lhes veio proporcionar essa oportunidade de engrandecimento para os Açores, que o é também para Portugal.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Sr. Presidente, foi anunciado pelo PS que este partido apresentaria um requerimento. Pergunto à Mesa se esse requerimento já deu entrada na Mesa, e em caso afirmativo, requeiro que seja imediatamente posto à votação.

O Sr. Presidente: - O requerimento em causa acaba de chegar à Mesa neste momento. É do seguinte teor:
O Grupo Parlamentar do PS requer a baixa à Comissão competente, para discussão e votação na especialidade, das propostas de lei n.º s 296/I, 284/I, 285/I, 303/I e 304/I.

Há alguma oposição?

Pausa.

Com o silêncio da Câmara, considera-se aprovado por unanimidade. Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, uma vez que os representantes dos outros partidos fizeram imediatamente as declarações de voto - que, pensávamos, deveriam ter lugar apenas amanhã -, devo dizer que tanto eu como o meu camarada Jaime Gama estamos preparados para fazer a nossa imediatamente.
Desta forma, pouparíamos à Assembleia o tempo que demorariam amanhã.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Simplesmente, terá de esperar pela sua vez. Tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A calamidade de l de Janeiro de 1980 justificou amplamente a solidariedade nacional que se verificou em todo o País relativamente às populações sinistradas das ilhas Terceira, S. Jorge e Graciosa.
A proposta de lei acabada de aprovar foi também um passo nesse sentido e daí o nosso voto a favor.
Mas não podemos deixar passar o que significa, em cotejo com as propostas apresentadas, pelo PCP, os benefícios que foram concedidos, uma vez que é claro que se privilegiaram na concessão de benefícios os rendimentos provenientes do capital e que houve uma clara recusa em incluir no mesmo esquema de benefícios os rendimentos provenientes do trabalho e ainda com a consideração de que uma das propostas do PCP, relativamente ao imposto profissional, limitava a concessão de benefícios fiscais a rendimentos anuais até 200 contos.
O reparo que queremos fazer é que nesta proposta, que foi votada com a oposição dos partidos da AD relativamente às propostas apresentadas pelo PCP, ficou claro que as clientelas eleitorais destes partidos não se localizam nas áreas dos trabalhadores, nem nas áreas daqueles que trabalham por conta de outrem.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não obstante haver consenso para que se façam hoje as declarações, a Mesa verifica que não há quorum.

Pausa.

Srs. Deputados, a agenda da reunião de amanhã já foi distribuída, pelo que os Srs. Deputados já a conhecem.
Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 491/I, do PCP, sobre a lei-quadro do ordenamento do território e da prática urbanística, que baixa à comissão respectiva; projecto de lei n.º 492/I, também do PCP, sobre a explorarão dos perímetros de rega; ratificação n.º 328/I, apre-

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30 DE MAIO DE 1980 2643

sentada pelo PCP, relativamente ao Decreto-Lei n.º 110-A/80, de 10 de Maio,, que uniformiza as carreiras de informática. Está encerrada a reunião.

Eram 21 horas e 25 minutos.

Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social-Democrata (PSD)

Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade de Azevedo.
Américo Abreu Dias.
Armando António Correia.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Dinah Serrão Alhandra.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José da Costa.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Germano Lopes Cantinho.
Germano da Silva Domingos.
Henrique Alberto F. do Nascimento Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Aurélio Dias Mendes.
João Luís Malato Correia.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Jorge Rook de Lima.
José Angelo Ferreira Correia.
José da Assunção Marques.
José Bento Gonçalves.
José Manuel Cochofel Ferreira da Silva.
José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.
José Theodoro da Silva.
Manuel Bento Sousa e Silva.
Manuel Luís Fernandes Malaquias.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Pereira.
Maria Adelaide Santos de Almeida Paiva.
Maria Helena do Rego da C. S. Roseta.
Maria de Lurdes M. Simões da Silva.
Marília Dulce C. P. Morgado Raimundo.
Viário Marques Ferreira Maduro.
viário Martins Adegas.
Nicolau Gregório de Freitas.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.

Partido Socialista (PS)

Adelino Teixeira de Carvalho.
Albano Pereira da Cunha Pina.
Alberto Marques Antunes.
Amadeu da Silva Cruz.
António Chaves Medeiros.
António Duarte Arnaut.
António Fernandes da Fonseca.
António Fernando Marques R. Reis.
António Francisco Barroso Sousa Gomes.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando Filipe Cerejeira P. Bacelar.
Armando dos Santos Lopes.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Beatriz M. de Almeida Cal Brandão.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Fernando Alves de Almeida Miranda,
Fernando Luís de A. Torres Marinho.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Francisco Manuel Marcelo M. Curto.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
Guilherme Gomes dos Santos.
Jaime José Matos da Gama.
João Alfredo Félix Vieira Lima,
João Cardona Gomes Cravinho.
João Joaquim Gomes.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Maximiano de A. Almeida Leitão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Filipe Nascimento Madeira,
Luís Silvedo Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dia Costa.
Maria de Jesus Simões Barroso Soares.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Mário Alberto Nobre Lopes Soares.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Victor Manuel Gomes Vasques.
Victor Manuel Ribeiro Constâncio.
Victor Manuel R. Fernandes de Almeida.

Partido Comunista Português (PCP)

Alberto Jorge Fernandes.
António da Silva Moía.
Carlos Alberto do Vale G. Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
José António Veríssimo Silva.
José Manuel Aranha Figueiredo.
José Manuel do C. Carreira Marques.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria da Conceição Morais Matias.
Marino B. de Vasconcelos B. Vicente.
Octávio Augusto Teixeira.
Rosa Maria Reis A. Brandão Represas.
Vital Martins Moreira.

Centro Democrático Social (CDS)

Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Martins Canaverde.
Eduardo Leal Loureiro.
Eugénia Maria Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Gonçalves Cavaleiro Ferreira.
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
Henrique Augusto Rocha Ferreira.
Henrique José C. de Menezes P. Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
João da Silva Mendes Morgado.
José Manuel Macedo Pereira.

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Luís Carlos C. Veloso de Sampaio.
Luís Filipe Pais Beiroco.
Luís Gomes Moreno.
Manuel António de A. e Vasconcelos.
Maria José Paulo Sampaio.
Maria Salete Gomes Simões Salvado.
Maria Tabita L. F. Mendes Soares.
Narana Sinai Coissoró.
Rui Eduardo F. Rodrigues Pena.
Ruy Garcia de Oliveira.
Victor Afonso Pinto da Cruz.

Partido Popular Monárquico (PPM)

Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores

Francisco José de Sousa Tavares.
José Manuel Medeiros Ferreira.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.
Pelágio E. de Maios Lopes de Madureira.

Movimento Democrático Português

Helena Tâmega Cidade; Moura.
Manuel José Ramires Fernandes.

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social-Democrata (PSD)

António Duarte e Duarte Chagas.
Leonardo Eugênio R. Ribeiro de Almeida.

Partido Socialista (PS)

Alberto Arons Braga de Carvalho.
António Cândido de Miranda de Macedo.
António José Sanches Esteves.
António Manuel Maldonado Gonelha.
Herculano Rodrigues Pires.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Teófilo Carvalho dos Santos.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Ba freirinhas Cunhal.
Custódio Jacinto Gingão.

União Democrática Popular (UDP)

Mário António Baptista Tomé.

O REDACTOR DE 1.ª CLASSE, Ana Maria Santos. - O REDACTOR PRINCIPAL, Manuel Adolfo de Vasconcelos.

PREÇO DESTE NÚMERO 56$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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