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I Série-Número 36
Sexta-Feira, 6 de Março de 1981
DIÁRIO da Assembleia da República
II LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1980-1981)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 5 DE MARÇO DE 1981
Presidente: Exmo. Sr. Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida
Secretários: Exmos. Srs.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Alfredo Pinto da Silva
Maria José Paulo Sampaio
José Manuel Maia Nunes de Almeida
SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 24 e 28 do Diário, tendo o Sr. Deputado Jorge Miranda (ASDI) feito um reparo de ordem formal em relação aos sumários da 2.ª série.
Deu-se conta do expediente, da apreciação de vários requerimentos e o recebimento de respostas a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado José Vitorino (PSD) referiu-se à necessidade da definição e execução de uma política que compatibilize a satisfação das necessidades básicas das populações mais carecidas e a implantação e fortalecimento dos suportes que garantam o aumento da produção nacional e da construção do País a médio e longo prazos.
Em declaração política, o Sr. Deputado Silva Graca (PCP) debruçou-se sobre a crise habitacional que aflige o Pais, criticando a actuação do Governo nesta matéria.
Foi lido um voto de congratulação pela eleição do Prof. Freitas do Amaral para o cargo de presidente da União Europeia das Democracias Cristãs, que será discutido e votado na próxima sessão.
O Sr. Deputado Custódio Gingão (PCP) fez uma intervenção em que se referiu às difíceis condições em que se realizou o encontro das culturas de Primavera, na sequência dos que anualmente as UCPs/Cooperativas agrícolas da Reforma Agrária vêm realizando, criticando a política desenvolvida formulada pelo Sr. Deputado Mário Lopes (PSD).
A Sr.ª Deputada Zita Seabra (PCP) fez uma intervenção sobre a situação em que o Conservatório Nacional se encontra.
Respondeu por fim a pedidos de esclarecimento e a um protesto, formulados, respectivamente, pelas Sr.ªs Deputadas Helena Cidade Moura (MDP/CDE) e Maria Amélia de Azevedo (PSD).
Ordem do dia. - Na primeira parte da ordem do dia, o Sr. Deputado Magalhães Mota (ASDI) fez a apresentação do projecto de lei n.º 137/II, relativo ao combate à imoralidade administrativa, fraude e corrupção.
Respondeu no fim a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Rui Pena (CDS) e Veiga de Oliveira (PCP).
Na segunda parte da ordem do dia, os Srs. Deputados Lemos Damião (PSD), Jorge Patrício (PCP), Adriano Rodrigues (CDS) e Portugal da Silveira (PPM) produziram declarações de voto sobre a votação na generalidade da ratificação n.º66 /II, relativa ao Decreto-Lei n.º 339/80, de 30 de Agosto, que estabelece um conjunto de medidas tendentes a conter, a curto prazo, a violência em recintos desportivos.
Depois de lido pelo Sr. Deputado Alexandre Reigoto (CDS) foi aprovado um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de vários deputados.
Foi discutido e aprovado o projecto de lei n.º 129/II, sobre o reforço das condições de independência da actividade dos jornalistas.
Intervieram no debate, a diverso título (intervenções e pedidos de esclarecimento), os Srs. Deputados Arons de Carvalho (PS), Helena Cidade Moura (MDP/CDE), Gomes de Pinho (CDS), Magalhães Mota (ASDI), Adelaide Paiva (PSD), Raul Rego (PS), Jorge Lemos (PCP), Mário Tomé (UDP) e Maria Odete Santos (PCP).
Procedeu-se à discussão do pedido de sujeição a ratificação n.º 28/II (Decreto-Lei n.º 488/80, que reestrutura a Comissão Regional de Turismo do Algarve), apresentada pelo PS. Intervieram no debate, a diverso título (intervenções e pedidos de esclarecimento, os Srs. Deputados Luis Filipe Madeira (PS) Carlos Brito (PCP), Almeida Carrapato (PS), Luis Coimbra (PPM), Cabrita Neto (PSD), Roleira Marinho (PSD) e José Vitorino (PSD).
O Sr. Presidente, depois de ter dado conhecimento de vários diplomas entrados na Mesa, encerrou a reunião às 24 horas.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD)
Adérito Manuel Soares Campos.
Afonso de Sousa F. de Moura Guedes.
Alberto Augusto Faria dos Santos.
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Álvaro Barros Marques Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amadeu Afonso Rodrigues dos Santos.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade Azevedo.
António Abreu Dias.
António Augusto Lacerda de Queirós.
António Augusto Ramos.
António Mana de O. Ourique Mendes.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António Vilar Ribeiro.
Armando Costa.
Arménio Jerónimo Martins Matias.
Arménio dos Santos.
Cipriano Rodrigues Martins.
Fernando José F. Fleming d'Oliveira.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Manuel Cardote Barbosa Mesquita.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Aurélio Dias Mendes.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Manuel Coutinho Sá Fernandes.
Joaquim Pinto.
José Adriano Gago Vitorino.
José Augusto de Oliveira Baptista.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Manuel Pinheiro Barradas.
José Mário de Lemos Damião.
Júlio de Lemos Castro Caldas.
Leonardo Eugénio R. Ribeiro de Almeida.
Leonel Santa Rita Pires.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Ribeiro Arruda.
Manuel Vaz Freixo.
Maria Adelaide S. de Almeida Paiva.
Maria da Glória Rodrigues Duarte.
Maria Helena do Rego C. Salema Roseta.
Maria Margarida do R. da C. S. M. Ribeiro.
Marília Dulce Coelho Pires M. Raimundo.
Mário Dias Lopes.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Marques Ferreira Maduro.
Natália de Oliveira Correia.
Nicolau Gregório de Freitas.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio António Pinto Nunes.
Partido Socialista (PS)
Alberto Marques Antunes.
Alfredo Barroso
António Duarte Arnaut
António Magalhães da Silva.
António José Vieira de Freitas.
António Teixeira Lopes.
Armando dos Santos Lopes.
Beatriz Cal Brandão.
Carlos Cardoso Lage.
Fausto Sacramento Marques.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Guilherme Gomes dos Santos.
João Francisco Ludovico da Costa.
José Gomes Fernandes.
José Luís Ferreira Araújo.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Júlio Almeida Carrapato.
Luís Nunes de Almeida.
Luís Patrão.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel José Bragança Tender.
Manuel dos Santos.
Manuel Trindade Reis.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Virgílio Fernando Marques Rodrigues.
Centro Democrático Social (CDS)
Adriano José Alves Moreira.
Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
António Jacinto Martins Canaverde.
António José Tomás Gomes de Pinho.
Emílio Leilão Paulo.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
João Gomes de Abreu de Lima.
João José M. Ferreira Pulido de Almeida.
João Lopes Porto.
José Eduardo F. de Sanches Osório.
Manuel Eugénio P. Cavaleiro Brandão.
Maria José Paulo Sampaio.
Mário Gaioso Henriques.
Rogério F. Monção Leão.
Partido Comunista Português (PCP)
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António José de Almeida Silva Graça.
António da Silva Mota.
Carlos Alberto do Carmo da C. Espadinha.
Carlos Alfredo Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Francisco Miguel Duarte
Georgete Ferreira de Oliveira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Patrício.
José Fernando V. Cabral Pinto.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel da Costa Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Josefina Maria Andrade.
Lino Carvalho Lima.
Manuel Rogério Brito.
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Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita da Silva.
Octávio Augusto Teixeira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Partido Popular Monárquico (PPM)
António Borges de Carvalho.
Jorge Victor M. Portugal da Silveira.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.
Acção Social-Democrata Independente (ASDI)
Joaquim Jorge de Magalhães S. da Mota.
Jorge Manuel M. Loureiro de Miranda.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS)
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.
César Oliveira.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE)
Helena Tâmega Cidade Moura.
União Democrática Popular (UDP)
Mário António Baptista Tomé.
O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 148 Srs. Deputados.
Temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 25 horas e 40 minutos.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.ºs 24 a 28 do Diário.
O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito?
O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É para me referir ao Diário n.º 28, 2.ª série.
O Sr. Presidente: - Se V. Ex.ª nos desse licença, iríamos por ordem.
O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Com certeza, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Em relação aos n.ºs 24 a 27 do Diário, algum dos Srs. Deputados tem alguma reclamação a fazer?
Pausa.
O Sr. Presidente: - Se nenhum dos Srs. Deputados tem qualquer reclamação a apresentar, considero-os aprovados,
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.
O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É relativamente ao do Diário, n.º 28, 2.ª série, em que vem publicado o projecto de lei que eu apresentei acerca de recursos de contencioso respeitante a actos legislativos. O problema que quero levantar é talvez de somenos importância, mas, mesmo assim, não queira deixar de o suscitar: no sumário da 2.ª série do Diário, ao serem indicados os projectos de lei, diz-se projecto de lei tal, apresentado pelo partido tal. Por exemplo, no respeitante àquele que apresentei, diz-se projecto de lei apresentado pela ASDI. Ora, a ASDI, e qualquer grupo parlamentar, não tem o poder de apresentar projectos de lei, pois quem tem o poder constitucional de apresentar projectos de lei são os deputados.
Por isso, pedia a V. Ex.ª que tomasse providências no sentido de, para no futuro, quando nos sumários da 2.º série do Diário aparecerem indicados os diferentes projectos de lei, ser dito que esses projectos são apresentados por deputados, embora pertencentes a determinados grupos parlamentares ou partidos, e não pelos partidos.
De acordo com o artigo 159.º da Constituição, o poder de apresentação de projectos de lei é um poder individual dos deputados, e não é um poder dos partidos ou dos grupos parlamentares.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa agradece a recomendação que acaba de fazer, mas, como V. Ex.ª sabe, o que está em aprovação é só a 1.ª série do Diário, visto ser só ela que contém intervenções dos deputados, que podem, em relação a elas, fazer as correcções que bem entenderem. No caso concreto, a Mesa anota a (recomendação e providenciará junto dos serviços de apoio para que efectivamente, passe a ter-se em conta a observação perfeitamente oportuna que V. Ex.ª acaba de fazer.
Não há mais nenhuma observação em relação ao n.º 28 do Diário, 1.ª série?
Como não há, considera-se aprovado.
O Sr. Secretário Reinaldo Gomes vai proceder à leitura do expediente.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Exposições
De um grupo de trabalhadores da empresa Raiontex - Empresa Têxtil de Raione, Lda., com sede no Porto, solicitando intervenção que possa impedir um previsto despedimento colectivo, por encerramento da citada Empresa.
De professores da Escola Preparatória de Terras de Bouro deduzindo oposição aos Decretos n.ºs 580/80 e 581/80 e solicitando uma reanálise dos citados diplomas.
Cartas
Dos Srs. Armindo Gomes Pereira Gonçalves e António A. Pereira, residentes, respectivamente, em Carcavelos e Hamburgo, regozijando-se pela proposta de lei apresentada paio Sr. Deputado Ângelo Correia relativamente à amnistia pelos delitos cometidos por desalojados e emigrantes com a importação de veículos.
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Da comissão Intersindical da empresa Audio Maggnética, das Caldas da Rainha, remetendo moção aprovada, em plenário realizado mo passado dia 16 de Fevereiro, no sentado de incentivar a conclusão da inspecção ao sector económico-financeiro actualmente em curso naquela empresa.
De Manuel Marques Ribeiro, residente em Bordéus, França, manifestando o desejo de os emigrantes poderem exercer o seu direito de voto para a Presidência da República e que o número de deputados pela emigração seja estabelecido segundo os mesmos critérios adoptados para a definição dos restantes.
Ofícios
Da Junta de Freguesia de S. Bartolomeu, do concelho de Coimbra, transcrevendo moção em que se exige, da parte do Governo, o cumprimento da Lei das Finanças Locais e a aprovação da lei de delimitação de competências.
Da Câmara Municipal e da Assembleia Municipal de Matosinhos regozijando-se pela criação de um canal de televisão no Porto e transcrevendo moção onde se exige da Assembleia da República que, ao apreciar o Orçamento Geral do Estado para 1981, assegure o cumprimento integral da Lei das Finanças Locais, bem como o reexame da lei de delimitação de responsabilidades da Administração Central e Local,
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Na última sessão foram apresentados os seguintes requerimentos: ao Governo Regional dos Açores, ao Ministério dos Transportes e Comunicações e à Secretaria de Estado da Comunicação Social, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado José Gago Vitorino; aos Ministérios da Educação e Ciência, da Habitação e Obras Públicas e da Justiça, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Miranda; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Mário Tomé; aos Ministérios da Agricultura e Pescas e do Comércio e Turismo, formulados pelo Sr. Deputado António Poppe Lopes Cardoso; ao Ministério do Trabalho, formulado pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo; ao Ministério das Finanças e do Plano, formulado pelo Sr. Deputado Nandim de Carvalho; ao Ministério da Justiça, formulado pelos Srs. Deputados Maria Odete Santos e Victor de Sá; aos Ministérios da Reforma Administrativa e da Educação e Ciência, formulado pelos Srs. Deputados Cabral Pinto e Ercília Talhadas; ao Governo, formulado pelas Sr.ªs Deputadas Maria Odete Santos e Georgete Ferreira.
Foram recebidas as seguintes respostas a requerimentos: do Congresso aos requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados Victor de Sá, Ilda Figueiredo, Magalhães Mota e Jaime Ramos nas sessões de 11 de Dezembro, 6 e 16 de Janeiro, respectivamente.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente» Srs. Deputados: É por todos sabido e reconhecido que não é tarefa fácil apegar» num país sujeito durante cinquenta anos às consequências de um feroz regime centralizador, e em que alguns muito grandes interesses económicos tudo foram subjugando e impondo à sua perspectiva sectorial, sectária e pessoal, e fazer dele uma obra nova, invertendo repentinamente na prática a situação.
Contudo, há-de ter-se a humildade de concluir que, passados sete anos sobre o fim do anterior regime, embora muito se tenha afirmado, discursado e até nalguns casos legislado, é evidente que muito mais podia e devia ter sido feito em múltiplos aspectos da vida económica, social e cultural.
Não é objectivo desta declaração política analisai as causas de tal facto, mas é dever afirmar-se que se falou e prometeu muito, mas as populações, na sua maioria, hoje sentem que, embora dados passos fundamentais na consolidação da democracia, muito do que é essencial no seu dia-a-dia ainda lhes falta.
Daí a necessidade da definição e execução de uma política que compatibilize a satisfação das necessidades básicas das populações mais carecidas e a implantação e fortalecimento dos suportes que garantam o aumento da produção nacional e da construção do País a médio e longo prazos.
Só assim se poderá dar aos portugueses da actual geração o melhor possível, mas, sobretudo garantir que os vindouros encontrarão um país florescente e produtivo, em vez de um país caduco e esgotado. E saliente-se aqui que as habituais vozes da demagogia, que muito falam no futuro, por vezes mais não fazem na prática do que lutar para que todas as energias sejam consumidas no presente, e numa perspectiva de curto prazo, procurando criar o deserto do futuro, onde sonham poder cultivar o seu projecto.
Em breve será apresentado nesta Assembleia o Orçamento e Plano para 1981 e ainda o Plano a Médio Prazo. Finalmente, e para além de alguns passos positivos dados pelo governo anterior, teremos a possibilidade de estabelecei metas e prioridades para que façamos um país novo e deixemos de, como diz o adágio popular, «só nos lembrarmos de Santa Bárbara quando faz trovões». É que, em termos políticos, tal prática conduziria inevitavelmente, e conduziu de facto nos últimos anos, a uma acção de «apagar fogos onde aparecem», em vez de se planearem, prevenirem, decidirem quais as metas, os meios e as prioridades para o progresso e transformação do País. E para qualquer país, como para qualquer empresa, tal política é fatal!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dentro daquilo que é indispensável à vida, a água assume um papel de primeiro plano. Muito em especial nos casos em que ela se transforma num bem raro.
A actual seca excepcional, por um lado, veio criar gravíssimos problemas aos agricultores e ainda em termos de consumo final, através da carência ás produtos e até do aumento de preço de alguns deles.
Mas, por outro lado, esta situação veio pôr mais a nu as carências de certas regiões do País, como, por exemplo, o Algarve, onde já se atingiu o limiar do alarme, e em que, mesmo verificando-se a queda pluviométrica normal nos últimos anos, a evolução previsível, caso nada se faça com a urgência devida, conduzirá à catástrofe.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já por várias vezes falámos no assunto, já por várias vezes o PSD o
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debateu, mas para que se assuma a gravidade plena, três vectores principais devem ser referidos:
1) Regime Hidrológico muito irregular, precipitação anual média da ordem dos 600 mm, humidade relativa rondando os 80%, temperatura média de 17º C e cerca de 3000 horas de sol por ano;
2) Dificuldade «m satisfazer as necessidades actuais, sendo frequentes as situações de ruptura;
3) Forte aumento das necessidades a curto, médio e longo prazos, quer na perspectiva agrícola, quer turística, quer urbana e industrial.
Mas mais detalhadamente, em termos climatéricos e de recursos, tem-se que apenas o rio Guadiana tem carácter permanente, tendo os restantes cursos de água, quer do Barlavento quer do Sotavento, regime torrencial. Associando isto à pouca chuva, à forte evaporação e ainda ao facto de a agricultura ser muito exigente, a situação tende, cada vez mais, a agravar-se.
O problema conheceu, nas duas últimas décadas, um agravamento extremamente rápido, devido, nomeadamente, à diminuição progressiva do grau pluviométrico, à reconversão da agricultura de sequeiro em regadio e ainda à «explosão» urbano-turística. O Algarve tem apenas 340 000 habitantes, mas por ano mais de 1 milhão passam por lá, em lazer ou em actividades diversas, coincidindo este agravamento sazonal de três ou quatro meses com as exigências das culturas estivais.
Deste modo, é com uma dificuldade crescente que se vai dando resposta às necessidades, e tanto assim que, enquanto há alguns anos, nos poços, a água era captada a 10, 20 ou 30 metros de profundidade, agora tem de se «descer» até profundidades da ordem dos 100 m. E aqui começa a surgir o fenómeno da salinização, provocado pela «invasão» da água salgada, rompido o equilíbrio até então existente.
Em consequência, os cortes e dificuldades no abastecimento, em especial nos principais centro urbano-turísticos, são evidentes, destacando-se, pela sua gravidade, os casos de Albufeira, Lagoa e zona do Sotavento, mas ainda em zonas fortemente urbanizadas, como Faro e Portimão.
Está assim em risco a satisfação das necessidades das populações e ainda dos turistas, e bem assim a boa imagem turística, que é indispensável salvaguardar com toda a determinação.
Por outro lado, é permanente a tormenta, preocupação e aflição dos agricultores algarvios, vivendo, ano após ano, com a perspectiva cada vez mais sombria de não disporem dos níveis mínimos de água para manterem a vida e produção das suas plantações e sementeiras, em que muitas vezes investiram as poupanças de uma vida de trabalho e sacrifícios. Desesperados, recorrem aos «furos» e necessárias bombas, descendo cada vez mais fundo, substituindo as tradicionais «noras» ou «engenhos», o que põe em causa as suas escassas disponibilidades. E, mesmo assim, acontece que muitas vezes não encontram a água que procuram e, noutros casos, não sabem por quanto tempo vão ficar com o problema resolvido.
É esta a epopeia actual dos estóicos agricultores algarvios: querer trabalhar, querer investir, querer produzir, ter necessidade de garantir o rendimento para o agregado familiar e sentir cada vez mais próximo o cutelo infalível e ameaçador da falta de água.
Mas as necessidades não ficam por aqui. A agricultura é muito exigente. Temos no Algarve cerca de 60 000 ha de terrenos das classes A e B em que, presentemente, apenas 16 000 ha estão destinados ao regadio.
E surge aqui o dilema, que tem de ser posto claramente: ou se pretende, numa perspectiva de adesão à CEE e de aumentos de produção e produtividade, tirar a máxima rentabilidade no domínio da agricultura forçada e semiforçada, citrinos e outras fruteiras, e então há que garantir a água necessária, ou então não resta outra solução que não seja pôr um travão ao crescimento e desenvolvimento, recorrendo a culturas e plantações menos exigentes, não havendo, mesmo assim, a garantia de que as actuais tenham a água necessária.
Ainda no campo turístico, também não temos dúvidas para afirmar que ou se criam condições para uma normal e planeada evolução ou então limitamo-nos a garantir os abastecimentos actuais, «travando», em termos definitivos, as acções e projectos que possam implicar aumento nos consumos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No que acabo de dizer não há qualquer dramatização ou empolamento. Todos no Algarve sentem e sabem que este problema existe.
E também convirá referir que para os próximos trinta anos se estimam necessidades anuais da ordem dos 200 a 400 milhões de metros cúbicos de água por ano, e que as mesmas poderão eventualmente ser satisfeitas com os recursos próprios da região apenas nos próximos dez anos. Ora isso quer dizer que, se tudo ficar como está, os problemas serão gravíssimos já durante a década de 80.
Tal quadro implica que se avance com urgência no sentido do adequado aproveitamento hidráulico das bacias hidrográficas do Algarve e com o reforço do sistema a partir do rio Guadiana. Caso contrário, os dados apontam para se concluir com toda * dureza que a desertificação aumentará ao mesmo tempo que o futuro ficará comprometido. Pode dizer-se que a esperança de vida regional tenderá a reduzir-se cada vez mais.
E já que se falou no Guadiana, parece também muito oportuno perguntar como estão, ou se eventualmente não se pensam fazer, as negociações dos actuais convénios existentes entre Portugal e Espanha sobre os rios Minho, Lima, Douro, Tejo e Guadiana, que têm as suas bacias hidrográficas em Espanha, com vista a garantir a quantidade e a qualidade da água.
O sistema para o Algarve está equacionado, constituído por um subsistema no Barlavento, com base nas albufeiras de Odelouca e Arade, para irrigar 9 garantir os consumos de Silves, Lagoa, Portimão, Lagos, Vila do Bispo, Albufeira e Loulé, e um outro subsistema no Sotavento, com base nas albufeiras da Odeleite e Beliche, para garantir a água e a irriga> cão a Castro Marim, Vila Real, Tavira, Olhão e Faro.
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Mas outros sistemas, sobretudo na serra, são impor tantes para garantir a retenção de água e a agricultura possível.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É verdade que alguma coisa se tem feito, e tanto assim que as obras da barragem do Funcho (Barlavento) se iniciaram, enquanto as de Beliche (Sotavento) se deverão iniciar dentro de algum tempo segundo se crê.
No entanto, entendemos que não basta que uns poucos conheçam o problema em toda a sua dimensão e vão fazendo «alguma coisa». É preciso avançar-se depressa, antes que seja tarde, e isso passa por uma consciencialização mais profunda da realidade.
Como se conclui do que foi dito, não faz sentido pensar nas boas condições agrícolas e turísticas do Algarve e fazer planos para as desenvolver se o pró blema de água, hoje em dia o principal estrangulamento da região, não for resolvido. Isto é, pensar no Algarve do ano 2000, já para não dizer uma data mais próxima, sem garantir um aumento substancial na recolha e abastecimento de água é quase utopia. Em termos de garantia da vida e da rentabilidade social e económica, o projecto tem perfeita justificação e, por isso, acreditamos que os governantes, dentro de todas as limitações, atribuam a esta questão a prioridade que merece, porque não é quando as torneiras se recusarem a deitar água, quando a água for salobra, quando as culturas secarem e quando o turismo for fortemente afectado, não vindo os turistas nem as divisas, que se irá à pressa encontrar a solução e gritar que mais uma fatalidade nos atingiu ...
E a esperança de que se atribua ao problema a prioridade que merece é fundamentada no facto de estar já constituída uma comissão interministerial para o Algarve, com vista a apreciar os problemas decorrentes da seca excepcional do corrente ano, a quem serão facultados os meios possíveis para resolver os problemas mais urgentes.
Em termos gerais, parece assim que, depois de alguns anos de paralisia, a vontade política existe, e essa é a melhor garantia de que a solução será encontrada com a brevidade possível. Os Algarvios e os Portugueses esperam e confiam!
Aplausos do PSD e do PPM.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Graça.
O Sr. Silva Graça (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquando da discussão do Programa do Governo afirmei, desta mesma tribuna, que «a intenção de serem produzidos 50 000 fogos/ano significa, face às carências habitacionais, que o Governo se propõe degradar ainda mais as condições de habitação dos Portugueses». Carências que, como todos sabem, se cifram em números que dispensam qualquer adjectivação: 800 000 fogos a menos, para um parque de cerca de 2,5 milhões; cerca de 1 milhão sem abastecimento de água, sem casa de banho, sem rede de esgotos, sem. rede eléctrica. Isto nas zonas rurais. Nos centros urbanos, são os bairro de lata -mais de três dezenas na capital do País -, as casas degradadas, a sobreocupação, com todo o conjunto de consequência dramáticas para aqueles que assim vivem.
As intimidades agredidas, os focos de doença, potencialmente geradores de endemias e surtos epidémicos, o subdesenvolvimento cultural, são consequências deste quadro. O novo censo poderá dar-nos números mais precisos, se porventura não se malograr por inépcia governamental.
Debrucemo-nos sobre esta situação. Procuremos desbravar um pouco as causas que conduziram à situação dramática por todos bem conhecida e por muitos sentida na própria carne. A análise fria da história também aqui nos pode ajudar. O ponto de referência situa-se há cerca de sete anos.
A iniciativa privada, nervo motor do regime fascista derrubado a 25 de Abril de 1974, legou-nos o essencial desta situação. A tentativa de reeditar processos já condenados pela prática e pela grande maioria dos portugueses agravaria ainda muito mais a crise habitacional que aflige o nosso país.
Logo a seguir ao 25 de Abril, enormes esperanças tocaram os Portugueses em geral. E, como é natural, a luta pelo direito a uma habitação condigna foi das mais agudas e naturalmente das mais complexas. Pesem alguns erros cometidos, que sempre procurámos combater e corrigir, é indiscutível que muito da iniciativa popular acabou por provocar medidas positivas por parte do Poder Central de então e de muitas autarquias.
Podemos dizer que as linhas gerais apontadas, com as correcções que a prática ia revelando necessárias, e tivessem sido desenvolvidas, nomeadamente a gradual e sistemática municipalização e nacionalização do solo urbano, o apoio às cooperativas de habitação, o forte incremento à habitação social, a efectiva dinamização dos contratos de desenvolvimento que passava necessariamente pelo apoio às empresas de construção civil e sua reestruturação, a forte dinamização do Plano de Recuperação dos Imóveis Degradados (PRID) e dos programas de renovação urbana, não estaríamos hoje na situação dramática em que nos encontramos, o défice apontado seria bem menor, as condições de habitabilidade bem melhores e as perspectivas para uma resolução do problema a médio e longo prazo bem mais luminosas. Mas não foi isso que aconteceu.
Após um período de inversão desta orientação e de cedências às pressões dos grandes especuladores, e da direita, entrámos abertamente, particularmente após o Governo Mota Pinto, numa política em que novamente se regressou à estafada tese de que compete à iniciativa privada o fundamental da resolução deste problema.
Esta incrível opção, contrária à Constituição da República e até ao que se passa em muitos países da Europa da CEE, tem sido pretexto para a semiparalisação a que se chegou. Os orçamentos gerais do Estado cada vez são mais restritivos em relação ao sector A não aplicação integral da Lei das Finanças Locais, acompanhada pela não existência de comparticipações e subsídios pela existência da mesma lei- que não é aplicada- dificulta ao máximo o lançamento de programas municipais de habitação social. A falta de apoio às cooperativas, manifestada pela não cedência de terrenos infra-estruturados e de subsídios a fundo perdido ou com juros altamente bonificados, paralisa praticamente o movimento. O não cumprimento do programa PRID conduz a uma cada vez
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mais grave degradação do parque habitacional, particularmente do urbano. A lei dos solos vai sucessivamente sendo amputada das soluções positivas para que apontava, chegando-se ao ponto de se alterar o seu artigo 5.º que proibia a alienação em propriedade plena do solo urbano às grandes sociedades imobiliárias. Quer dizer, à fase de não cumprimento de uma Lei Constitucional e disciplinadora da utilização não especulativa do solo urbano passou-se à fase ilegal, de transformar a lei num aborto jurídico e inconstitucional, conducente à maior permissividade no tocante à especulação desenfreada. Os programas SAAL ainda existentes não gozam, de uma maneira geral, de qualquer tipo de apoio, tendo-se chegado a um impasse, com as populações envolvidas à espera das casas que já estariam prontas há já alguns anos, não fosse o boicote sistemático que lhes tem sido movido.
Os contratos de desenvolvimento estão semiparalisados e os poucos fogos que ainda são concluídos ao seu abrigo são alienados ou arrendados com base em critérios que ninguém conhece, ao arrepio da opinião das estruturas de governos municipais onde se inserem. Concomitantemente e começando pelo fim, tenta-se alterar a Lei do Arrendamento Urbano, publicando-se mesmo o celerado Decreto-Lei n.º 389/79, com a marca inconfundível do Governo Mota Pinto, que, embora por razões diversas -eleitorais por banda da AD, por defesa intransigente de uma política séria e de classe por parte do PCP -, foi revogado por unanimidade por esta Assembleia, faz agora um ano. Aliás, tal como o prevíamos, o Programa do VII Governo adianta novas promessas e ameaças neste domínio. Perguntámos aqui, aquando da discussão do Programa do Governo, se isso significava a tentativa de repor a famigerada lei das rendas. A resposta que obtivemos foi um profundo silêncio por parte da bancada AD e do seu governo. A resposta, contudo, talvez não seja difícil, se observarmos o que está a acontecer às rendas das casas geridas pelo Fundo de Fomento da Habitação (FFH), cuja subida em flecha põe em risco o direito à habitação de milhares de famílias.
O Estado em vez de estar ao serviço das populações comporta-se como um grande senhorio movido pela única óptica do lucro máximo! O tiro de partida para a subida das rendas de casa partiu assim do único sítio donde nunca deveria partir - do sector público. No caso concreto do FFH. Assim funciona a AD uma vez instalada no aparelho do Estado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que se passa nesta estrutura central - FFH - que deveria estar ao serviço do nosso povo e da melhoria das suas condições de habitabilidade merece alguma análise.
Até Junho de 1980, números já tornados públicos provam a inoperância desta estrutura e dos seus responsáveis, em última instância o governo AD, através do Ministério da tutela. Previsto pelo PIDDAC o início de 20270 novos fogos, em Junho o realizado ficava-se pelos 5800. No tocante à conclusão de casas o mesmo plano previa 17 854 e em Junho a taxa de execução ficava-se pelos 16,8 %, ou seja, 3000 fogos. Após a publicação destes números, foram escamoteados os relatórios de execução mensais do FFH. No entanto, valores apurados referentes a Setembro comprovam as conclusões anteriormente aduzidas - 9000 fogos em vez de 20270 para fogos a iniciar e 4600 concluídos em vez dos 17 854 previstos. O grau de realização alcançado em Setembro comprova que os objectivos propostos pelo Governo não foi atingido, a despeito das afirmações propagandísticas do Ministro e Secretário de Estado em vésperas de eleições.
No tocante ao corrente ano os valores previstos para o FFH parecem apontar para uma verba do Orçamento Geral do Estado da ordem dos 4 a 5 milhões de contos. No entanto, desse montante, cerca de 2 milhões estão já cativos para o serviço de dívidas do FFH junto das instituições de crédito, não se considerando nesta parcela os juros a pagar por eventuais empréstimos a contrair em 1981. Esta situação irá condicionar ainda mais a prossecução de obras de promoção directa de habitação pelo FFH que se encontram em curso e levar, consequentemente, a uma transformação dos objectivos do organismo - sob a justificação da necessidade de «rentabilizar» os seus investimentos - que deverão evidentemente continuar a ser a promoção de habitação para as camadas mais carenciadas e desprotegidas da população. Esta política, em conjugação com a não aprovação da Lei de Delimitação de Competências em matéria de investimentos entre o aparelho central do Estado e as autarquias, e a aplicação cuidada da Lei de Finanças Locais, ou seja a sua não aplicação integral, conduzirá a uma diminuição substancial da promoção da habitação social, no corrente ano e nos seguintes. Duvidamos mesmo que, a prosseguir esta política, se atinja sequer o número altamente insuficiente de 10 000 fogos/ano.
Tudo isto conduz, como é natural, a uma situação interna do FFH, de degradação global, com desmobilização e desinteresse da maioria dos trabalhadores, no cumprimento das suas tarefas e, consequentemente, à criação de condições para o aparecimento de situações de corrupção verdadeiramente lamentáveis e intoleráveis.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Intencionalmente degradada a imagem do Estado aos olhos da opinião pública, esvaziados os municípios de competência e de meios técnicos e financeiros para avançarem com os seus programas próprios, criado está o meio de cultura ideal para a iniciativa privada - leia-se grandes promotoras imobiliárias - aparecer como a grande salvadora de uma situação por ela própria criada ou directamente ou através dos seus agentes colocados no aparelho de Estado. Maior farisaísmo é difícil de encontrar. E através dos grandes meios de comunicação social, integralmente controlados pela «AD», surgem as grandes operações propagandísticas levadas ao conhecimento público através de políticos megalómanos, cujos projectos deixam o cidadão comum perplexo. É o que se passa, por exemplo, em Lisboa, aonde, a pretexto do realojamento integral das populações que vivem em zonas degradadas, se anuncia, em concurso de pré-qualificação, a construção de 80000 no vos. fogos na capital do País. Esta grande operação propagandística pré-eleitoral e uma das causas próximas da alteração do artigo 5.º da lei dos solos já referida mais acima, transforma-se na grande panaceia para o realojamento de cerca de 18 000 famílias que vivem nos bairros de lata da nossa cidade. Só 30 000 fogos serão construídos no
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Casal Ventoso, anuncia leviana e demagogicamente o presidente CDS da edilidade lisboeta. 30000 fogos na zona do Casal Ventoso daria uma densidade superior a SOO fogos por hectare! Gostaria de lembrar aos Srs. Deputados que, para a respectiva zona, o plano director do município não autoriza que se ultrapassem os 60 fogos por hectare. Que se pretende com esta operação?
Um dos objectivos já foi atingido. As grandes empresas de construção civil passaram a dispor, em propriedade plena, de solo urbano para as suas operações lucrativas e especulativas. E que mais se irá obter? O realojamento das populações pobres e insolventes? Alguma vez, em algum país do mundo, a iniciativa privada resolveu o problema habitacional destas camadas da população? Sabemos bem que não. Srs. Deputados. Mas esta operação é propagandeada pelos jornais estatizados (lidos em todo o País), pela rádio e pela TV (ouvida e vista por milhões de portugueses). Que se pretende com isto? A «Krusificação» do País, para benefício de alguns à custa do sacrifício da grande maioria?
Face a esta situação degradada que solução resta, não já para os habitantes dos bairros de barracas, não já para os trabalhadores e para a classe operária cuja situação global se agrava cada vez mais por força da política antipatriótica e antipopular da «AD» e do seu governo, não já para todos aqueles: sem capacidade económica para alugarem uma casa em condições minimamente aceitáveis, mas para as camadas intermédias, com alguma capacidade de aforro, para os quadros não superiores do Estado e das empresas, para os jovens casais que iniciam uma vida de trabalho e com um rendimento mensal capaz, em princípio, de fazer frente ao aumento galopante do custo de vida e à inflação que tudo devora e que recusam optar pela construção clandestina? A aquisição de casa própria. Mas, ao contrário do que se poderia pensar, e por força do Decreto-Lei n.º 435/80 e da Portaria regulamentador n.º 969/80, diplomas da responsabilidade do Governo AD, acabam também por serem vítimas, ao hipotecarem-se durante dezenas de anos na aquisição daquilo que pensavam ser a tranquilidade e o bem-estar, pelo menos no tocante ao problema da habitação. Seria interessante simular a evolução da prestação mensal que um casal jovem, sem filhos, teria de suportar para adquirir uma casa avaliada, por exemplo, em 1600 contos. O tempo que já me escasseia não me permite contudo fazê-lo. Mas não é difícil imaginá-lo se pensarmos que ao abrigo da nova legislação as famílias com acesso ao crédito mais bonificado pagam à instituição emprestadora mais de 5000 contos por cada mil emprestados. E as condições mais bonificadas só abrangem os fogos cuja avaliação não ultrapasse os 14 contos/m2. Onde existe essa casa, ideal, para o nosso jovem casal? É previsível - e desejável - que tenha filhos e portanto não poderá contentar-se com duas assoalhadas. Mesmo dando de barato que o fogo existe realmente, ao preço referido, estarão de acordo comigo que se localizará num qualquer dormitório longínquo, sem equipamentos, que irá tornar a vida deste casal um quotidiano pouco agradável, deslocando-se entre o local de trabalho, o local de residência e os equipamentos em transportes subdimensionados e pouco eficientes. Havemos de concordar, Srs. Deputados, que esta política, cujos traços essenciais acabei de aflorar, não tem nada que ver com a melhoria da qualidade de vida do nosso povo.
Aplausos do PCP, Do MDP/CDE, da UEDS e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, nos termos da agenda para hoje cumpria a seguir discutir-se o voto de protesto apresentado pelos Srs. Deputados do Partido Socialista, da ASDI e da UEDS. Em todo o caso, por informação chegada à Mesa, os Srs. Deputados dos partidos proponentes, com o consenso dos restantes partidos, concordaram em que a discussão e votação desse voto ficasse para a próxima sessão. Consequentemente, não será discutido nem votado na sessão de hoje.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, é só para fazer um acréscimo às palavras que V. Ex.ª acaba de dizer.
Os autores do voto não tinham qualquer dificuldade, muito ao contrário, em que ele fosse discutido hoje, apenas estiveram de acordo com o pedido do PSD para que fosse feita essa transferência para amanhã.
O Sr. Presidente: - De qualquer maneira, esse consenso está formado e a transferência assente. Em todo o caso, está na Mesa um voto de congratulação apresentado pelos Srs. Deputados da bancada do CDS, que vai ser lido e que portanto entrará em discussão e votação imediatamente a seguir.
É do seguinte teor:
Voto de congratulação
Ontem ocorreu, em Bruxelas, um acontecimento político de inegável importância e significado.
Importante, porque relacionado com a União Europeia das Democracias Cristãs, a força política que nas últimas eleições para o Parlamento Europeu obteve o maior número de votos e fez eleger a mais numerosa representação parlamentar.
Importante ainda, porque nele esteve em causa a eleição para a presidência daquela grande força democrática, cargo de alta responsabilidade e de indiscutível relevo político a nível europeu e mesmo mundial.
Importante, finalmente, porque a escolha recaiu, por unanimidade, num português, presidente de um dos maiores partidos nacionais e deputado em exercício - o Prof. Diogo Freitas do Amaral.
Assim, se essa eleição traduz o reconhecimento do mérito do eleito, representa uma honra, não apenas para ele, para o seu partido e para o próprio País, mas também para esta Assembleia,
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Face ao exposto:
A Assembleia da República congratula-se com a eleição do deputado Diogo Freitas do Amaral para a presidência da UEDC e felicita-o vivamente por tão honroso mandato que recebeu.
Lisboa, 5 de Março de 1981.-(Assinaturas ilegíveis).
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, este voto de congratulação que acabou de ser lido está em discussão.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): -Sr. Presidente, dá-me licença?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP):-Sr. Presidente, nós não temos o voto distribuído - como, alias, é da praxe -, e, por outro lado, ao abrigo do Regimento, nós pediríamos que esse voto fosse votado amanhã. O Regimento assim o permite: quando um voto é apresentado num dia, basta que um dos grupos parlamentares o peça para que a votação seja adiada para a sessão subsequente. Neste caso é forçoso que nós façamos o pedido, uma vez que nem sequei conhecemos o voto por escrito.
O pedido está feito e, ao abrigo do Regimento, esse voto será transferido para amanhã.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Veiga de Oliveira, parece que efectivamente há um precedente que se tem seguido e realmente é o que acaba de ser invocado por V. Ex.ª
Há alguma objecção?
Pausa.
Visto não haver, este voto de congratulação será transferido na sua discussão e votação para a sessão de amanhã.
Tem a palavra o Sr. Deputado Custódio Gingão para uma intervenção.
O Sr. Custódio Gingão (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Realizou-se no passado dia 21 de Fevereiro mais um encontro das culturas de Primavera, na sequência dos que anualmente as UCPs/Cooperativas agrícolas da Reforma Agrária vêm realizando, com o objectivo de planificar e desenvolver a produção.
Como em nenhum outro ano, este encontro realizou-se em condições particularmente difíceis, não só pela crise derivada pela seca, cujos efeitos e consequências ainda não são de todo previsíveis, mas também, e sobretudo, em consequência da política desenvolvida pelos governos da AD.
O exaustivo inquérito efectuado às explorações (inquérito que, tal como em anteriores conferências da Reforma Agrária, não tem similar em estudos oficiais) deu os seguintes resultados em relação às culturas de Primavera:
No que se refere às oleaginosas, a produção foi de 52001, correspondendo a cerca de 32 % da produção nacional para o ano de 1979;
No que respeita ao arroz, a produção de cerca de 48 0001 contribui com cerca de 36 % para a produção nacional;
No que se refere ao tomate, as 134 0001 produzidas constituíram uma comparticipação da ordem dos 20 % para a produção nacional;
As 5001 de tabaco produzido traduziram-se em quase 100 % da produção total do País.
Este breve resumo das produções obtidas em algumas das principais culturas de Primavera constitui uma clara afirmação da vitalidade das UCPs/Cooperativas da Reforma Agrária e do seu contributo para o desenvolvimento da agricultura.
Durante o ano de 1980 a brutal acção desenvolvida pelo governo da AD não só roubou as UCPs/cooperativas centenas de milhares de hectares das melhores terras, como comprometeu seriamente, com muitos casos destruiu, a estrutura produtiva.
Os resultados desta acção reflectem-se não só era termos sociais, mas também em termos económicos de difícil e cada vez mais dolorosa recuperação.
Os dados que a seguir apresentamos falam por si e dispensam comentários.
Eles constituem a contrapartida da AD e dos latifundiários ao constante esforço e investimento produtivo efectuados pelas UCPs/cooperativas.
Nos distritos de Beja, Évora e Portalegre mais de 250 herdades tiradas às UCPs/cooperativas e entregues aos agrários encontram-se abandonadas ou sub-aproveitadas.
Nos mesmos distritos em mais de 200 herdades de azeitona ficou por apanhar, tendo grande parte dela já sido enterrada.
No Alentejo, e dentro das herdades devolvidas aos latifundiários, cerca de 75 barragens e albufeiras e mais de 60 charcos roubados aos trabalhadores da Reforma Agrária, que dariam para regar alguns milhares de hectares, encontram-se desaproveitados e em muitos casos voluntária e criminosamente despejados.
Ainda nos mesmos distritos há a registar mais de duas dezenas de pomares abandonados e em risco de se perderem definitivamente.
Milhares de cabeças de gado (de que se conhecem casos de pelo menos cerca de 1000 bovinos, 6000 ovinos e 250 porcas reprodutoras) foram autenticamente dizimadas pelos agrários.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não deixa de ser curioso e de constituir uma autêntica agressão à inteligência e aos interesses nacionais que o Governo se apresente tão preocupado com a seca e as suas consequências, nomeadamente quanto à produção agrícola, e que, simultaneamente, ele próprio. Governo, contribua para o agudizar da crise. Mais importante que a seca, mais importante que o desenvolvimento da nossa agricultura, mais importante que os interesses nacionais, são para a AD os interesses dos grandes agrários e a reconstituição dos latifúndios, mesmo que à custa da exploração e da ruína de milhares de trabalhadores e pequenos agricultores.
E a este propósito cabe referir o que ainda ontem se verificou em Seda, na Cooperativa Liberdade, pese embora a denúncia por nós aqui feita, há alguns dias, das ilegalidades e prepotências já anteriormente verificadas na mesma cooperativa. Alguns funciona-
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nos do MAP, acompanhados por cerca de duas centenas de guardas da GNR, pura e simplesmente roubaram todo o efectivo pecuário da cooperativa, cerca de 1700 cabeças de gado, mais de 20000 contos.
Nem uma notificação à cooperativa; nem sequer uma justificação. Os serviços do MAP em Portalegre afirmam ser «coisas da GNR»; esta, por sua vez, afirma ter sido requisitada pelo MAP.
E, assim, sem mais, a cooperativa vê-se privada da sua principal base de actividade. A favor de quem não se sabe, mas presume-se. Com que pretexto? O mesmo de sempre: destruição das Cooperativas, reconstituição dos latifúndios, abalar a já débil economia nacional.
Serve esta intervenção para denunciar a esta Assembleia e à opinião pública a demagogia do Governo no que à agricultura diz respeito. Ao mesmo tempo que diz que vai tomar medidas para os agricultores e para a agricultura, o Governo permite que a água armazenada nas pequenas barragens corra o risco de não ser aproveitada, permite ainda que haja barragens abertas não aproveitando a água que vai nascendo, permite ainda que muitos milhares de hectares de alqueives feitos pelas cooperativas e entregues aos agrários continuem por semear. Um governo que permite todos estes crimes contra a economia nacional não tem moral para falar em medidas de protecção à agricultura e aos agricultores.
Perante isto tudo, Srs. Deputados, bem se pode dizer que se o rei não vai nu, já só lhe resta a parra.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e da UEDS.
O Sr. Mário Lopes (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Mário Lopes (PSD): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Ouvi a exposição feita pelo Sr. Deputado Custódio Gingão e queria fazer-lhe, desta vez, não um protesto mas um pedido de esclarecimento.
Pergunto-lhe se é o governo da Aliança Democrática o culpado da seca e da geada que tem existido neste pais e se o Sr. Deputado será capaz de me dar as áreas que neste momento as unidades colectivas de produção e as cooperativas agrícolas abrangem no Sul do País, assim como a área da capacidade de solos, das classes A e B.
Gostaria de saber ainda - e em relação ao vosso contributo para o produto nacional bruto, em termos de agricultura - qual a produção por hectare em girassol, em tomate e nas restantes culturas que indicou.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Custódio Gingão para responder.
O Sr. Custódio Gingão (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou responder muito rapidamente, mas antes disso quero dizer que a minha intervenção de há uns dias atrás produziu alguns efeitos. Afinal o Sr. Deputado já não protesta, faz perguntas. Ainda bem que aprendeu a lição.
Aplausos do PCP.
O Sr. Deputado pergunta-me se é o governo da AD que é o culpado de haver seca. Evidentemente que não, mas este governo já estava a querer valer-se da seca para se desculpar por não ter tomado medidas.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Muito bem!
O Orador - A verdade é que está a chover e o Governo já não tem essa desculpa e no fim da época agrícola nós estamos aqui para denunciar tudo aquilo que o Governo deveria ter feito e não fez.
Mas, mais, a denúncia que eu aqui fiz não foi no sentido das medidas que o Governo tomou, mas sim das que deveria tomar. Uma das coisas que disse aqui - e que é importante - é que há dezenas de barragens que estão abertas, quando deveriam estar fechadas. Para segurar a pouca água que havia. O Governo não tomou essas medidas.
Que medidas é que o Governo tomou para dizer aos proprietários que segurem a água porque ela faz falta? Não fez nada disso!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O que o Governo tem feito é ir à televisão fazer demagogia e desculpar-se com a seca para encobrir a sua incapacidade de governar. Esta é que é a verdade.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Quanto às outras perguntas, o Sr. Deputado deve fazê-las ao Governo, pois é ele que deve fazer um inquérito e deve saber disso. O Sr. Deputado quer valer-se do Plenário para obter essas informações. Contudo, não é este grupo parlamentar que tem de responder, mas sim o Governo. Se o Governo não é competente para isso, não sou eu que vou responder-lhe.
O Sr. Presidente: - O Grupo Parlamentar da UEDS, que tinha inscrito o Sr. Deputado António Vitorino, cedeu a sua posição para uma intervenção de cinco minutos à Sr.ª Deputada Zita Seabra.
Portanto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Trazemos hoje aqui uma situação escandalosa a que a Assembleia da República e, particularmente, a sua Comissão de Cultura não podem continuar alheias.
Trata-se da situação em que se encontra o Conservatório Nacional, que é, como sabem, constituído por cinco escolas de arte: música, teatro, dança, educação pela arte e cinema.
O Conservatório Nacional é das poucas instituições existentes no País onde se ensinam diversas artes. Escolas de teatro, por exemplo, só existe mais uma em Évora, a de cinema e a de educação pela arte são únicas no nosso triste panorama.
Mas, quando seria de esperar que esta escola, por ser quase única num país tão necessitado de desenvolvimento das potencialidades culturais do seu
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povo, fosse acarinhada, apoiada e desenvolvida e que novas escolas surgissem, o Governo está a matá-la!
Um estranho e recente despacho da Anop noticiava que «um trabalho de reestrutura cã o do Conservatório Nacional está a ser elaborado» pelo licenciado José Luís de Oliveira Nunes no Ministério de Educação e Ciência. O estranho telex terminava: «Segundo instruções que recebi outras achegas poderão ser dadas por forma a que no próximo ano lectivo o Conservatório Nacional seja fechado...»
Mas quem é o Sr. José Luís de Oliveira Nunes? E como é que chegou à autoria de tão estranho telex?
Nomeado gestor da Escola a. 24 de Junho de 1980 pelo Despacho n.º 281/80, do Ministro Vítor Crespo, para dar execução ao Despacho n.º 252/80. do mesmo Ministro e do mesmo dia, que suspendeu as matrículas no Conservatório Nacional até ao dia 31 de Outubro.
O dito senhor, nomeado gestor, imediatamente entra no Conservatório, proíbe as 2.ªs chamadas e os exames de 2.ª época e de admissão, proíbe o acesso dos professores às salas die aulas, manda desmantelar os gabinetes de trabalho das escolas, gasta verbas avultadíssimas a redecorar luxuosamente a sala da direcção, enquanto as salas de aula e os estúdios continuam quase a cair, insulta professores, alunos e funcionários, promove o afastamento da bibliotecária e de uma funcionária da secretaria, ambas consideradas altamente competentes por toda a gente e com elevados serviços prestados ao Conservatório, dá cobertura e fomenta a especulação, difamações e montagens fotográficas nalguns órgãos de comunicação social.
É este senhor que com este desastroso curriculum veio a ser exonerado pelo Despacho n.º 384/80, do mesmo Ministro Vítor Crespo, em resultado da luta unanimemente, travada pelos professores e alunos, é este senhor que anuncia que está encarregado nalgum gabinete da 5 de Outubro de preparar a liquidação do Conservatório Nacional.
A curta intervenção que fazemos não permite trazer todo o grave panorama em que se encontra o Conservatório Nacional e todas as complicadas situações por onde vem passando desde há anos e que só o esforço de professores e alunos tem permitido que a escola se mantenha de pé. Mas a situação actual é insustentável, pois, além do telex da Anop que traz a ameaça de morte alguns traços, poderemos dar da situação do Conservatório Nacional:
O Conservatório vive à margem de qualquer legislação, pois à experiência pedagógica iniciada em 1971 sucedeu o vácuo; as escolas de cinema e educação pela arte continuam impedidas de abrir o 1.º ano, o quadro de professores é ridiculamente exíguo e dos 120 professores, 102 são contratados além do quadro; as Escolas de Cinema e de Educação pela Arte não têm um único professor do quadro, a Escola de Dança tem 1, a Escola de Teatro 2. Isto depois das gritantes injustiças resultantes do concurso de recrutamento de professores. A maior parte dos professores estão a ser pagos pela letra G e as escolas debatem-se com carências de professores, pessoal administrativo, técnico e auxiliar, as instalações são degradantes e há urgente necessitado de obras nas salas de aula...
Se hoje o Conservatório Nacional tem as portas abertas, «isso deve-se ao facto de com a sua firmeza e pela sua presença professores e alunos terem obrigado o Secretário de Estado a recuar na ordem que tinha dado de as portas serem fechadas.
A Assembleia da República não pode de forma alguma assistir passivamente à acção de lesa-cultura, à morte do Conservatório Nacional. Por isso, o PCP irá propor à Comissão de Cultura que se desloque ao Conservatório, que ouça professores e alunos, que veja as instalações e as carências, e que, no exercício das suas funções, encontre solução para o Conservatório.
Estamos certos de que, independentemente das divergências políticas que separam os deputados, será possível encontrar os pontos de entendimento para salvar o Conservatório Nacional.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Para formular - pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.
A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Eu queria referir-me à intervenção da Sr.ª Deputada Zita Seabra sobre o Conservatório Nacional e lembrar que não deve ser só a Comissão de Cultura a estudar o problema do Conservatório mas eu diria até, sobretudo, a Comissão de Educação.
É muito difícil dissociar a Escola de Teatro do sistema de ensino e quanto à Escola de Professores de Formação pelas Artes eles são hoje uma carência enorme tanto no ensino pré-primário, como no primário, como o básico. A meia dúzia de professores que estão formados estão a fazer, em todo o Pais, trabalho extremamente útil para a coordenação das disciplinas no sentido da pedagogia activa que facilita o desenvolvimento sensorial e portanto a capacidade intelectual das crianças. Fazem parte, mesmo em termos económicos, do rendimento do ensino.
Portanto, eu teria de acrescentar àquilo que a Sr.ª Deputada Zita Seabra disse a necessidade de a Comissão de Educação - no quadro do sistema educativo - tomar conto das escolas do Conservatório que estão estritamente ligadas a esse sistema.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra para responder.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Agradeço a intervenção da Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura. Contudo, gostaria de dizer que quando nos inclinámos para a proposta à Comissão de Cultura no sentido de esta se deslocar ao Conservatório Nacional para impedir que esta escola feche e para impedir a liquidação - no fundo- destas cinco escolas que compõem o Conservatório Nacional foi um pouco, talvez, a pensar que a questão tem a ver com a Comissão de Educação, mas também tem a ver com a Comis-
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são de Cultura. É uma realidade e talvez seja difícil diferenciá-la, mas para nós o importante é que na verdade uma das comissões -a de Cultura ou de Educação- pegue neste problema e não deixe liquidar o Conservatório Nacional, que é das poucas escolas que no nosso país ensinam Arte. Escola de Teatro só há outra mas escola de Cinema e Educação pela Arte são únicas no nosso país.
Portanto, é preciso que não deixem liquidar estas escolas, que não deixem que o telex que o Ministério divulgou através da Anop - ou que alguém do Ministério divulgou através da Anop - seja uma realidade e que não deixem que no próximo mês de Outubro o Conservatório Nacional seja fechado. Para isso penso ser necessário que ou a Comissão de Educação ou a Comissão de Cultura - uma delas, é indiferente- deitem mão ao assunto, estudem o problema e impeçam este atentado, este facto de lesa-cultura, que tornaria mais pobre o nosso já tão pobre panorama cultural português.
Vozes ao PCP: - Muito bem!
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente eu penso que poderia dar um esclarecimento na sequência da intervenção da Sr.ª Deputada Zita Seabra.
O Sr. Presidente: - Mas a Sr.ª Deputada não se inscreveu na altura própria para fazer pedidos de esclarecimento. Poderá quando muito, se quiser, fazer a sua intervenção sobre a forma de protesto, pois a Mesa aceitará essa solução.
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Se o Sr. Presidente vê que regimentalmente será mais razoável, não me repugna nada fazê-lo sob essa forma.
Portanto, queria dizer o seguinte: É que a Sr.ª Deputada Zita Seabra tira uma série de ilações de um suposto telex que vem publicado através da Anop, atribuindo afirmações a um Sr. José Luís de Oliveira Nunes que, efectivamente, punha em risco a própria vida dessa instituição que é o Conservatório Nacional.
Ora bem, primeiro que tudo suponho que não há uma declaração oficial acerca desse problema, mas admito que a Sr.ª Deputada Zita Seabra ponha questões e dúvidas acerca dele e se interrogue mesmo sobre se isso efectivamente é verdadeiro. Assim sendo, afigura-se-me que o processo regimental adequado para se saber ao certo qual a posição do Ministério sobre este problema seria talvez o requerimento ao Ministério. A Sr.ª Deputada tem a possibilidade de através de um requerimento ao Ministério saber da veracidade dessa mesma afirmação. Eu admito que esse problema tenha a ver com a Comissão de Educação e com a Comissão de Cultura, pois não podem ser alheias a esse mesmo problema, mas isso tem de ser visto num âmbito mais vasto que é o problema do Conservatório Nacional e do seu funcionamento.
É evidente que isso mesmo interessa à própria Assembleia da República, mas suponho que antes de mais há que averiguar da veracidade dessa mesma afirmação e saber se esse tal senhor foi ou não incumbido de pôr fim e, por assim dizer, passar certidão de óbito a essa mesma instituição. Só depois disso é que a Assembleia da República se deverá pronunciar.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra para responder.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Para que efeito é que o Sr. Deputado pede a palavra?
O Sr. Magalhães Mota (ASDI):-Sr. Presidente, se a forma regimental é a de protesto eu teria de protestar em relação às afirmações da Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo.
O Sr. Presidente: - Evidentemente que vou conceder-lhe a palavra, mas o Sr. Deputado pretende protestar em relação à intervenção da Sr.ª Deputada Zita Seabra ou à da Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo?
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Em relação à da Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se eu abrir um precedente terei de o levar até ao fim...
Por outro lado, a Sr.ª Deputada Zita Seabra pretende usar da palavra para responder ao protesto?
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então a Sr.ª Deputada Zita Seabra responderá ao protesto que lhe foi feito. Contudo, como já excedemos em três minutos este período de antes da ordem do dia, o Sr. Deputado Magalhães Mota intervirá no início do próximo período de antes da ordem do dia.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Nesse caso, Sr. Presidente, farei o meu contraprotesto e consentirei que durante ele o Sr. Deputado Magalhães Mota me interrompa para prestar o esclarecimento que pretende, pois certamente será útil a esta questão.
Vozes do PCP: - Muito bem!
Risos.
O Sr. Pressente: - A Sr.ª Deputada fará, se desejar, o seu contraprotesto em relação à Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo. Quanto ao Sr. Deputado Magalhães Mota a Mesa decidirá a seguir.
V. Ex.ª usará agora da palavra, se o julgar convergente e útil, para responder à Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo e só para isso.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, por mim não queria de maneira nenhuma retirar-lhe esse direito de dar a palavra aos deputados...
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, como sabe, se há coisa de que eu possa ser acusado é de concedei
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a palavra a mais aos Srs. Deputados e não de lhes retirar a palavra.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, eu apenas consenti que o Sr. Deputado Magalhães Mota me respondesse.
Em relação ao chamado protesto da Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo o que acontece é que este despacho da Anop que foi lido em todos os órgãos de comunicação social e na Radiodifusão Portuguesa - inclusive tenho aqui a hora e o noticiário em que foi lido -, sem nenhum desmentido da parte do Ministério, não é um facto isolado nem é um despacho caído do céu, de repente, que a Anop inventou em qualquer lado. Isto vem no seguimento de uma situação gravíssima que se vive no Conservatório Nacional desde há dois anos a esta parte, desde que exactamente o Sr. José Luís de Oliveira Nunes foi nomeado gestor do Conservatório pelo actual Ministro da Educação Vítor Crespo.
O despacho de encerramento das portas do Conservatório Nacional assinado pelo mesmo Sr. Ministro, esse mesmo despacho já foi feito, já foi publicado, sucedendo, porém, que os professores e estudantes da escola, que são bastantes e que têm amor à escola e têm a noção de que ela é única, no País, lutaram, uniram esforços e até lhe digo mais, Sr.ª Deputada, ultrapassaram as divergências políticas que os separam e vimos gente, da direita à esquerda, unida no sentido de abrir a escola. Os portões foram abertos, a escola começou a funcionar em condições extremamente graves, designadamente o 1.º ano da escola de Cinema foi cancelado, os alunos que se queriam inscrever no curso de Educação pela Arte foram impedidos de o fazer e não têm 1.º ano. Esta notícia veiculada pela Anop é mais uma gota de água numa questão que já estava quase a deitar para fora desde há muito tempo.
Ora a nossa proposta, a razão de ser da intervenção que hoje fizemos, reside no facto de entendermos que a Comissão Parlamentar da Cultura ou a da Educação se devem interessar pelo problema e não podemos consentir que o Conservatório Nacional seja fechado até porque, por exemplo, quanto a escolas de teatro só há mais uma no País, em Évora; de Cinema é a única; e a de Educação pela Arte - como a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura dizia aqui, e muito bem - tem permitido, com bolsas de estudo fornecidas pelo próprio Ministério da Educação, que professores primários tenham a sua educação pela arte para depois poderem desenvolver melhor o seu trabalho na escola.
Nós temos que salvar esta situação. Assim, fazemos este apelo a todos os deputados e, particularmente àquela comissão, que nós nos desloquemos àquela escola, vejamos com os nossos próprios olhos a situação grave que lá se passa e encontremos soluções. De resto, uma solução para um caso destes não aparece em virtude de um qualquer gestor ou o Ministério da Educação fazer um despacho dizendo que se fecha a escola e que só daqui a uns anos se deve reestruturar e pensar o que deve ser o Conservatório.
Os seus professores ev estudantes sabem o que querem e é nesse sentido que trazemos aqui esta questão e fazemos este apelo aos deputados da Assembleia da República.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota. uma vez que o período de antes da ordem do dia já foi excedido, V. Ex.ª ficará com a palavra reservada para a sessão de amanhã sobre este assunto.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, por lapso da Mesa não foram anunciados no encerramento da última sessão. Os diplomas que deram entrada na Mesa durante a respectiva sessão.
Passarei de imediato a anunciar esses diplomas, até porque a Mesa recebeu propostas de lei, das quais duas delas com pedidos de prioridade e urgência.
Assim, deram entrada na Mesa durante a sessão plenária de 27 de Fevereiro os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 153/II, apresentado pelos Srs. Deputados Magalhães Mota, Vilhena de Carvalho e outros, sobre a transmissão pela rádio e pela televisão de produções dramáticas portuguesas; projecto de lei n.º 154/II, apresentado pelo Sr. Deputado José Vitoriano, sobre a criação da freguesia da Quinta do Conde, no concelho de Sesimbra; proposta de lei n.º 11/II, que aprova o acordo celebrado entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federal da Alemanha sobre cooperação técnica, que vem acompanhada de um pedido de prioridade e urgência; proposta de lei n.º 12/II, que aprova para adesão a Convenção Relativa à Emissão de Determinadas Certidões de Registo do Estado Civil Destinadas ao Estrangeiro, assinada em Paris em 27 de Setembro de 1956; proposta de lei n.º 13/II, que aprova para ratificação o acordo entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Popular do Congo, relativo a transportes aéreos; proposta de lei n.º 14/11, que aprova para ratificação o acordo para transporte aéreo entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Popular de Angola; proposta de lei n.º 15/II, sobre a Convenção Relativa à Emissão Gratuita e Dispensa de Legalização de Certidões do Registo do Estado Civil, assinada no Luxemburgo em 26 de Setembro de 1957; proposta de lei n.º 16/II - que vem acompanhada de um pedido de prioridade e urgência -, sobre o acordo relativo ao programa internacional de energia; finalmente, proposta de lei n.º 17/II, sobre a Convenção Relativa à Constatação de Certos Óbitos, assinada em Atenas em 14 de Setembro de 1966. Srs. Deputados, passamos à apresentação do projecto de lei n.º 137/II, sobre o combate à imoralidade administrativa, fraude e corrupção, subscrito por deputados do Grupo Parlamentar da ASDI.
Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresentaremos hoje. com toda a simplicidade, o projecto de lei n.º 137/II, sobre o combate à imoralidade administrativa, fraude e corrupção.
Temos consciência das limitações do nosso próprio projecto de lei. Como tal, desde já anunciámos o nosso propósito de estarmos abertos a todas as iniciativas que visem melhorá-lo ou, de algum modo, enriquecê-lo. Pensámos que os problemas que este diploma pretende abordar são de tal forma importantes para a sociedade portuguesa que merecem o contri-
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bulo interessado de todos os parlamentares desta Câmara.
Com efeito, não há democracia possível quando ela se tenta estabelecer num tecido social corrompido, sujeito a toda a espécie de fraudes e em que a imoralidade possa ter campo livre. Do mesmo modo, nem há a possibilidade de as instituições funcionarem quando elas são subvertidas na sua prática diária pela corrupção e pela fraude.
Por isso, e porque um projecto desta natureza põe necessariamente em causa muitos interesses - e alguns poderosos -, porque certamente contra ele serão usadas todas as vias - e algumas sinuosas - para que ele não vá em frente, desde já solicitamos a colaboração interessada de todos os deputados desta Câmara. Cremos que poderá unir-nos como objectivo o pretendermos que na nossa terra e para o nosso povo os projectos tenham a clareza e a transparência que são essenciais à democracia, sem que nenhuma forma aviltada ou abastardada de actuação os possa mistificar ou os possa misturar e, de algum modo, roubar aquela qualidade que é essencial também à vida democrática: tornar iguais todos os cidadãos.
Sabemos que a Constituição da República prevê, no seu artigo 81.º alínea g), o «reprimir os abusos do poder económico e todas as práticas lesivas do interesse geral». É neste fundamento constitucional que o projecto de lei que hoje apresentamos encontra o seu fundamento e a sua razão de ser.
Não esquecemos - e isso o dissemos - as preocupações que desde o II Governo Constitucional ficaram patentes em relação à luta contra a corrupção. Mas também temos consciência de que os passos dados até à data não foram decisivos.
Por isso, entendemos que a Assembleia da República - a quem cumpre vigiar pelo cumprimento da Constituição e das leis e apreciar os actos do Governo e da Administração- deve chamar a si o essencial da competência, no sentido de fiscalizar estes aspectos da vida portuguesa.
Não está em causa o concorrer-se com as funções inspectivas do Provedor de Justiça, nem está em causa o criar-se mais uma comissão eventual deste Parlamento que, possivelmente, pudesse ter o destino das acções de outras comissões eventuais. Procura-se que a comissão instituída - Comissão para o Combate à Fraude e à Corrupção - tenha efectivos poderes, e tão efectivos que ela possa, sem nenhuma forma de entrave, averiguar e detectar as fraudes e as formas de corrupção relativamente a concessões, a contratos, designadamente a adjudicação de empreitadas ou de fornecimento de materiais, precedida ou não de concursos, públicos ou limitados, a aquisição, alienação ou oneração de quaisquer bens por serviços ou entidades públicas, a atribuição e majoração de reservas nos termos da Lei de Bases da Reforma Agrária, a importação ou exportação de bens ou serviços, as actividades de fiscalização económica e aduaneira, a concessão de licenças e autorizações, as matérias respeitantes a inquéritos parlamentares, ainda que eles não tenham sido aprovados, e, inclusivamente, os índices exteriores de riqueza de cidadãos referidos pelas suas posições no aparelho de Estado ou no sector público e que possam exceder em muito os resultados da sua actividade profissional.
Estabelece-se, também, que a Comissão seria constituída por quatro cidadãos, de reconhecido mérito, sendo um deles jurista de comprovada competência, eleitos pela Assembleia da República em lista completa e votada pela maioria de dois terços dos deputados em efectividade de funções, e por três juízes, sendo um designado pelo Supremo Tribunal de Justiça e dois pelo Conselho Superior da Magistratura, um dos quais juiz dos tribunais da Relação.
Estabelece-se ainda que a esta comissão cabem as garantias que normalmente são atribuídas aos magistrados, como sejam a garantia da independência, da inamovibilidade, da imparcialidade e da irresponsabilidade. Por outro lado, estabelece-se ainda que os membros da Comissão sejam considerados, designadamente para efeitos penais, como autoridade pública, que possam beneficiar de garantias semelhantes às dos deputados em relação a procedimentos criminais que contra eles possam ser movidos, que estejam sujeitos às mesmas incompatibilidades que os juízes na efectividade de serviço e que não possam ser prejudicados na estabilidade do seus empregos, da sua carreira e do regime de segurança social de que beneficiem.
Assim, procura-se, por um lado, dar todas as garantias de independência aos membros da comissão e, por outro lado, procura-se também atribuir-lhes funções que lhes permitam exigir dos titulares e agentes da Administração todos os esclarecimentos e informações que lhes sejam solicitados, exigir das autoridades públicas ou dos órgãos de qualquer entidade pública toda a colaboração que lhes for solicitada, inclusivamente obrigando-se esses serviços a efectuarem sindicâncias e inspecções e facultando, para exame, à Comissão quaisquer documentos.
Por último, estabelece-se neste diploma que o Governo, se entender invocar o interesse superior do Estado para fazer cessar uma investigação da Comissão, terá de fazê-lo fundamentando a sua posição, e só poderá invocar como fundamentos motivos respeitantes à segurança, à defesa ou às relações internacionais. No entanto, a Assembleia da República poderá ser chamada a deliberar e a entender que, apesar da oposição do Governo, o inquérito à corrupção ou à fraude iniciado deve prosseguir.
A Comissão poderá ainda solicitar de qualquer cidadão o depoimento ou a informação sempre que os julgue necessários para o apuramento dos factos A recusa deste depoimento constituirá crime de desobediência sempre que não seja justificada.
Estas são, Sr. Presidente e Srs. Deputados, sucintamente expostas, as normas regulamentadoras do órgão que pretendemos criar e do qual esperamos que, quando se fizer a discussão deste projecto de lei nesta Assembleia, venha ele a merecer o assentimento deste Parlamento, como problema que necessariamente preocupa todos os democratas e todos os homens de bem deste país.
Aplausos da ASDI, do PS e da UEDS.
Durante esta intervenção assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Martins Canaverde.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Veiga de Oliveira pediu a palavra.
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O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Pedi a palavra, Sr. Presidente, mas penso que não fui o primeiro.
Contudo, se V. Ex.ª ma conceder neste momento, não a recusarei.
O Sr. Presidente: - Há uma inscrição anterior.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Pena.
O Sr. Rui Pena (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra para, além de solicitar alguns pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Magalhães Mota, me congratular pelo facto da própria apresentação deste diploma.
Concordo com as palavras do Sr. Deputado proponente, na medida em que se torna urgente que esta Assembleia e todos os deputados tomem consciência da situação que, não só na Administração Pública, mas em toda a nossa própria vida social, existe do ponto de vista da imoralidade, imoralidade no sentido para que este projecto dei lei aponta, ou seja, corrupção, fraude e má fé.
É realmente uma atitude corajosa, a que se tem de responder com igual coragem e idêntica frontalidade. Estou certo que o grupo parlamentar onde me integro cooperará com o partido apresentante na apresentação de sugestões positivas que visem o objectivo pretendido por esta iniciativa legislativa.
Em todo o caso, creio - aliás como o próprio proponente reconheceu - que os objectivos meritórios do diploma não são servidos devidamente pelo seu conteúdo. Na verdade, para combater a imoralidade administrativa, a fraude e a corrupção, não basta constituir como que uma comissão parlamentai de inquérito. Não basta, para esse efeito, criar na nossa sociedade - já por vezes constituída por sujeitos com tantas desigualdades - mais uns tantos privilegiados, embora eu reconheça que a esta Comissão deve ser dado todo o poder e toda a autoridade para que, quer junto da Administração, quer junto dos particulares, possa levar a bom termo a missão espinhosa de que é incumbida.
Em todo o caso - e passo às questões que queria submeter ao Sr. Deputado proponente -, parece-me que a fórmula utilizada é bastante modesta. É bastante modesta na medida em que aparece, pura e simplesmente, como a tal comissão parlamentar de inquérito permanente, sem ter mais poderes ou outras fórmulas de actuação do que aquelas que são próprias de uma comissão parlamentar de inquérito.
A verdade é que o combate à fraude administrativa e à corrupção tem de ser um combate em amplas frentes, e que passa por uma total reforma administrativa que, em primeiro lugar, procure e vise a dignificação dos próprios funcionários públicos. Eles têm de ser não apenas consciencializados da sua missão, mas também tem de lhes ser atribuída a dignidade a que têm jus. Para isso há muito a fazer.
Além disso, torna-se absolutamente indispensável uma reestruturação da própria estrutura do Estado. Esta reestruturação passa pelo esforço das inspecções. Os serviços de inspecção, que foram tão criticados durante o período revolucionário, têm de ser repostos no seu devido lugar, têm de ser recriados. Muito haverá a esperar do reforço das próprias inspecções internas dentro de cada serviço.
Aquela reestruturação passa ainda por uma modificação total em determinados serviços, designadamente por uma maior racionalização - e talvez até por uma centralização - dos próprios serviços logísticos de Estado, para assim acabarmos com a dispersão dos vários serviços que compram e dos vários serviços que vendem, de forma a que tudo seja concentrado em determinados serviços presididos por comissões com todas as garantias de imparcialidade, de isenção e de honestidade.
Aquela reestruturação passa ainda por outros mecanismos de mais fácil solução, como seja a fixação de prazos para a prática de actos definitivos e executórios e por um alargamento do próprio princípio do regime dos chamados actos tácitos.
Em suma, creio que este projecto de lei é uma pedra lançada no charco. Esta pedra tem de ser lançada, mas há que fazer um esforço - que tem de ser colectivo - no sentido de melhorar as condições para que a lei que eventualmente esta Assembleia venha a aprovar sobre esta matéria não seja mais uma lei para não ser cumprida, para que não seja mais uma lei sem eficácia, mas que seja uma lei que reponha a moralidade administrativa, que combata a fraude e a corrupção, em suma, que dignifique a nossa Administração Pública.
Aplausos do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Verga de Oliveira para formular pedidos de esclarecimento.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Magalhães Mota: Ouvi com atenção a sua intervenção e, naturalmente, já tinha lido o vosso projecto de lei.
Nesta matéria todos nós conhecemos várias iniciativas e certamente todos estarão de acordo -pelo menos em palavras- quando se fala em combater à imoralidade administrativa, a fraude e a corrupção. Haverá até quem, uma vez proposta uma questão desta, se lance numa corrida, por vezes exagerada, de elogios à iniciativa. Mas, com mais ou menos aprovação, com mais ou menos boas vontades, continuamos num inferno, como o Sr. Deputado reconhece, em matéria de moralidade administrativa, de fraude e de corrupção.
E isto não se deve simplesmente à ausência de uma comissão ou à ausência de um organismo próprio, especial, para combater a fraude, a corrupção e a imoralidade administrativa. O Sr. Deputado Magalhães Mota, que conhece inclusivamente o poder por dentro, sabe que não se deve só a isso, que só com isso nada se resolve e que provavelmente - e esta é já uma pergunta - nem é esse o aspecto mais importante para a correcção de tais situações. Provavelmente esta é uma questão de estilo do poder - de estilo que vem de cima, por ser estilo - e não só de fiscalização a posteriori de uns tantos actos dos cidadãos que estão encarregados de funções públicas ou que desempenham funções em empresas públicas.
O Sr. Deputado Magalhães Mota citou na sua intervenção a alínea g) do artigo 81.º da Constituição, que diz que incumbe prioritariamente ao Estado «eliminar e impedir a formação de monopólios privados, através de nacionalizações ou de outras formas, bem como reprimir os abusos do poder económico e todas
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as práticas lesivas do interesse geral». Ora a questão que se nos põe é esta: pensa o Sr. Deputado que estes abusos que aqui estão referidos na Constituição e estas práticas são principalmente e sobretudo as práticas de corrupção, de fraude e imoralidade administrativa? Ou serão, pelo contrário, outras? Outras que não são nem fraude, nem imoralidade administrativa e que estão contempladas nestes abusos económicos e outras práticas lesivas do interesse geral.
Outra questão se suscita quando o Sr. Deputado fala - e digamos que em palavras todos estaremos de acordo - na necessidade de garantir uma comissão que tenha como principal função ou como função fundamental estar, digamos, permanentemente disposta à sindicância ou ao inquérito, se quiser. E esta questão coloca-se da seguinte maneira: sabendo nós aquilo que sabemos a respeito da natureza das coisas que estão em causa, não se suscitará a questão de saber se esta comissão não poderá, em vez de passar a fraude e as imoralidades administrativas, passar a caçar as bruxas. Isto é, que pensa o Sr. Deputado das cautelas necessárias a tomar neste terreno. Mais: fala também o Sr. Deputado - e quanto a nós muito bem, pelo menos de princípio podemos estar de acordo - da necessidade de garantir os membros deste organismo, e fala também de inamovibilidade, de independência e de irresponsabilidade. Mas a pergunta que cabe é esta: isto é assim por quatro anos, uma vez que no máximo é por uma legislatura - e todas as questões em geral se põem, por exemplo, em relação aos juízes, mas estes não estão propriamente dependentes de uma legislatura? E suponho que aqui também se poderão pôr questões a respeito da eficácia destas defesas.
Bom, muitas outras questões se no põem porque nós gostaríamos, efectivamente, de contribuir eficazmente para a resolução deste problema. Mas temos dúvidas a respeito de algumas das medidas que aqui estão colocadas.
Portanto, a dúvida que nós pomos é uma dúvida construtiva e não destrutiva, e acrescentaríamos ainda que uma comissão deste tipo. como o Sr. Deputado Magalhães Mota sabe pode servir para cobrir, em vez de ser para combater, a imoralidade administrativa e a fraude. E nós conhecemos exemplos por esse mundo fora, para não falar em exemplos nacionais.
Quer dizer: tudo isto são questões que colocamos no sentido de mais tarde e na altura devida podermos contribuir com o melhor dos nossos esforços para obtermos o resultado que seja mais conveniente do ponto de vista da legislação, sem contudo deixarmos de insistir que a questão não pode ser só resolvida com legislação nem só com um organismo destes. Enquanto não houver uma orientação superior da administração pública que seja ela própria moralizante, naturalmente que nenhum organismo deste tipo pode fazer um combate eficaz à fraude, à corrupção e lutar pela moralidade da administração pública.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota para responder.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Começaria por agradecer as referências feitas que são de concordância em relação aos princípios genérico; do projecto - patentes nas duas intervenções que foram feitas.
E referindo-me concretamente às questões sucitadas pelo Sr. Deputado Rui Pena, gostaria de dizer que os poderes atribuídos a esta comissão não são os poderes de uma comissão parlamentar, são bastante mais amplos, aliás, como resulta do articulado do projecto de lei. E esse alargamento de funções é uma das justificações, aliás, para que se tenha adoptado a fórmula de um organismo permanente e não de uma comissão parlamentar, com um conjunto de pessoas exclusivamente com esta tarefa e com estas finalidades.
Entrando agora nas questões que o Sr. Deputado mais directamente me pôs, creio que todas elas são importantes, mas gostaria de dizer que nenhuma delas, quanto a mim, retira a dimensão e a importância deste projecto. E gostaríamos mesmo que as questões não fossem confundidas & que o gosto pela perfeição não nos levasse a impedir que iniciativas mais modestas talvez, mas mais viáveis e eficazes a curto prazo, não tivessem seguimento.
Creio que na nossa terra - posso invocar isto visto que somos conterrâneos - as gentes do campo não gostam de ver florescer demasiado cedo, pois têm sempre medo de que venha uma geada ou uma nortada e que a frutificação não seja plena. Penso que também em matéria legislativa talvez não devamos ser tão ambiciosos e não pensar que a tão celebrada reforma administrativa é coisa para amanhã, porque ela vem sendo anunciada há muitos anos e não vem sendo efectivada. Estamos todos de acordo quanto à dignificação dos funcionários, quanto à reestruturação do Estado, quanto à modificação e à racionalização de procedimentos e quanto à fixação de prazos para a prática dos actos. Creio que tudo isto são boas fórmulas, que muitas delas devem ser contempladas em várias iniciativas legislativas e poderíamos acrescentar até muitas outras como, por exemplo, a diminuição drástica das decisões casuísticas por parte da administração, porque é no casuísmo, na resolução caso a caso que se gera muitas vezes o favoritismo. Se houver actos genéricos e disposições a todos aplicáveis, todos conhecemos a lei em que se vive e então mais fácil será evitar estas situações.
É fácil também utilizar mecanismos, alguns deles já existentes, como, por exemplo, o controle através dos boletins de registo de importação, que são obrigatoriamente arquivados durante cinco anos, e que poderiam permitir um tratamento que seria naturalmente bastante sugestivo sobre os critérios utilizados em relação a várias importações consentidas. Há, por exemplo, a verificação das situações em que organismos público e autarquias locais dispensam os concursos públicos ou sequer os concursos limitados para fazerem determinados projectos ou a realização de determinadas obras.
Há enfim, toda uma série de iniciativas legislativas que podemos e devemos lançar e se o Grupo Parlamentar do CDS tomar essa iniciativa, nós certamente apoiá-la-emos, como pela nossa parte também estamos dispostos a tomar algumas delas.
Mas creio que todo esse clima de fundo não prejudica, pelo menos em nosso entender, a necessidade de averiguação de actuações que são de imoralidade, de fraude e de corrupção, e que não podem ficar,
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cada vez mais, diluídas no tempo e na esponja fácil do nosso esquecimento.
Quanto ao Sr. Deputado Veiga de Oliveira, dir-lhe-ia estar de acordo com a ideia genérica de que evidentemente, as fiscalizações não são a panaceia que tudo resolve e que a averiguação a posteriori não é também essa solução milagrosa. Mas creia que, em todo o caso, é importante e que a impunidade, porque de impunidade se trata, tem sido muitas vezes o aliciante para novas práticas ainda mais lesivas do interesse da comunidade nacional.
Dir-lhe-ia também que a minha leitura do artigo 81.º da Constituição e da sua alínea g) é também, naturalmente, diferente da do Sr. Deputado Veiga de Oliveira. Mas diria que na minha leitura não é independente de uma certa actuação dos poderes económicos que se verifiquem fraudes e corrupções. Direi que estas envolvem dinheiro e envolvem uma certa mentalidade da vida económica e da vida colectiva e que isso tem a ver com o poder económico e não é, de maneira nenhuma, um sector dela arredado. Creio que não há, pelo menos que eu saiba, nenhum caso de fraude ou de corrupção em que tenha sido alguém de fracos recursos ou rendimentos a aliciar outrem para uma fraude ou para uma corrupção.
Julgo que, certamente, há que tomar cautelas em relação à actuação de um organismo deste tipo. Por isso mesmo se estabelece a sua dependência da Assembleia da República, por isso mesmo se estabeleceram na sua composição duas espécies de cautelas: integrar parte da comissão com elementos tirados da magistratura e submetendo a esta, que já tem essas características de independência, os componentes da comissão e designar os componentes escolhidos por esta Assembleia por um critério de maioria agravada de dois terços, isto é, sujeitando necessariamente a um consenso amplo a escolha das pessoas que hão-de integrar esta comissão. Pensamos que também aqui se encontra necessariamente uma garantia para as suas qualidades de isenção e de eficácia na actuação que delas se pretende.
Direi, portanto, que precisamente por estas condições não creio que uma comissão deste tipo se pudesse transformar num organismo encobridor de fraudes. Muito pelo contrário. E se, por acaso infeliz, alguma vez isso acontecesse aí estava a controle parlamentar a exercer-se, visto que a comissão é dependente do Parlamento e, portanto, também essa garantia me parece ter sido consignada.
Por último, quanto à eficácia das defesas para além dos quatro anos, direi que estaremos, naturalmente, abertos a uma melhoria nesse sentido, mas pareceu-nos que, se a comissão trabalhar com eficácia, os quatro anos poderão ser talvez protecção suficiente. Em todo o caso é uma matéria que uma melhor discussão permitirá esclarecer.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos agora à segunda parte da ordem do dia e que trata das declarações de voto sobre a votação na generalidade da ratificação n.º 66/II, relativa ao Decreto-Lei n.º 339/80, de 30 de Agosto, que estabelece um conjunto de medidas tendentes a conter a curto prazo a violência nos recintos desportivos.
Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr Deputado Lemos Damião.
O Sr Lemos Damião (PSD): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Terminada a discussão na generalidade do Decreto-Lei n.º 339/80, de 30 de Agosto, temos de reconhecer que do debate franco, competitivo e pedagógico saiu reforçado o desporto, dado o empenho manifestado pelos diversos intervenientes em apontar formas clarificadoras conducentes a definir as normas e regras necessárias a desenvolver as virtualidades de relacionamento saudável entre as pessoas, eliminando tudo o que de algum modo possa ofuscar a mensagem que o desporto encerra.
Foi, em nosso entender, um debate pedagógico realizado em clima saudável, onde os interlocutores se preocuparam em dar o seu contributo válido à resolução da preocupante realidade com que o desporto e a sociedade se debatem, condenando a violência nos recintos desportivos.
Apercebemo-nos quão defraudados ficaram todos quantos de uma forma explícita ou encoberta esperavam que deste debate resultasse uma violência porventura maior do que aquela que aqui se pretendia prevenir e combater.
Podemos dizer sem rebuço que não houve violência nesta Câmara, saindo reforçado o desporto por ter sido respeitado o seu ideal, por se ter falado a sua linguagem universal, por se ter chegado ao fim com um sorriso desportivo em todos os rostos e por salutar exemplo dado a quantos, não servindo o desporto, dele se servem para curtir as suas frustrações, dar largas aos seus recalcamentos ou despejar toda a sua má formação.
Sendo, no seu programa, defensor da concórdia e da fraternidade, o PSD, como força política de concepção personalista e humanista, pautou a sua actuação de uma forma inequivocamente clara, onde, sem tibiezas, demonstrou que os jogos devem definir-se e caracterizar-se na lealdade mais transparente, no repúdio pela mentira e pela violência.
No Parlamento, como nos recintos desportivos, as relações e habitas, quando salutarmente desenvolvidos como no desporto, devem ser o melhor treino para o cumprimento das obrigações respeitantes à vida social. Sendo a linguagem desportiva, de carácter universal, não entendemos que os exaltados na sua cegueira de amor clubista se deixem arrebatar por paixões incontroladas, ao ponto de contribuir para que a mensagem que o desporto possui seja transformada numa batalha, numa guerra ou em autêntico terrorismo. Dizia Claparède que «só é suficientemente homem quem sabe actuar como homem»; mas como e surpreendente ver quem no seu quotidiano é digno de tal designação e, nos recintos, se transforma radicalmente, pondo termo à sua normal moderação humilhando, ofendendo e agredindo o seu semelhante, só porque o árbitro errou, o seu ídolo falhou ou a sua equipa perdeu.
Porém, quando se perde não acontece nenhum cataclismo; a não ser pana quem, sendo responsável, se esquece dos seus deveres sociais, das suas responsabilidades morais e educativas. Para nós foi positivo repensar este problema e, nessa perspectiva à medida que ganha mais acuidade, torna-se cada vez mais necessário encontrar soluções práticas, pesquisando a descoberta da terapêutica necessária para evitar, ao máximo, a violência.
Nesta perspectiva, ao baixar à Comissão respectiva o Decreto-Lei n.º 339/80, entendemos que urge fazer
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um grande esforço no sentido de o dotar de fórmulas adequadas, aceitando todas as achegas e alterações que se ache por bem introduzir, ouvindo e aceitando as sugestões e contributos dos intervenientes no desporto: federações, associações, árbitros, atletas, técnicos, dirigentes, jornalistas, público, etc.
O Sr. Moura Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Porém, para além da vontade e de esforço desenvolvido por todos para arranjar soluções eficazes e justas urge procurar a cooperação e solidariedade internacionais; sendo desejável a participação de todos para uma organização colectiva é fundamental que haja uma inter-relação onde a autoridade legalmente imposta seja compreendida, aceite é desejada. A par de uma Lei satisfatória é imperioso desenvolver acções profilácticas ou preventivas, a começar pelas escolas, pelos escalões etários mais baixos, fomentando e desenvolvendo hábitos de são relacionamento, de amizade sincera, de modo que se faça compreender que no desporto, como no trabalho, deve reinar a paz e a concórdia, e não a violência e o ódio.
Temos de criar espaços cada Vez mais amplos de humanização através do desporto. Para isso, devem esses órgãos competentes: apresentar exemplos elucidativos na TV, na imprensa escrita e falada; promover colóquios nas escolas e agremiações; cursos de formação dos árbitros, atletas, dirigentes e autoridades; distribuição de panfletos; colocação de frases de conteúdo pedagógico nos recintos; palavras de ordem nas instalações sonoras antes e nos intervalos dos jogos; exaltação das boas maneiras e actos praticados; prémios aos atletas e clubes bem comportados, etc.
A aprendizagem escolar deve ser ministrada de modo a que, ao entrarem na sociedade, os alunos sejam, como no desporto, não espectadores mas esclarecidos praticantes, conhecedores das regras de jogo, homens preparados nas relações de convivência, de competência, de emulação, de esforço pessoal, respeitando os seus iguais e as regras estabelecidas.
Porém, a aprendizagem não termina quando termina a escola; impõe-se uma formação extra-escolar ao nível de educação permanente, de aperfeiçoamento em exercício com o auxílio de professores, psicólogos, dirigentes, treinadores e dos próprios intervenientes. Fomentar os slogans «joga hoje, assiste amanhã», «respeita para te respeitarem», etc.
Se considerarmos o desporto um barómetro social, poderemos verificar que a violência nele manifestada é a consequência de instabilidade social, das injustiças, dos traumatismos acumulados, das dificuldades familiares existentes, etc. Em suma, a violência é o fruto de toda uma violentação que desejamos cada vez mais afastada, o modus vivendas de cada um, para que haja mais cidadãos a servirem e a viverem o desporto em vez de o procurarem, bem como às instalações desportivas, para aí abrirem a válvula de escape despejando os seus recalcamentos.
O PSD e o governo da AD envidarão todos os seus esforços no sentido de contribuir para melhorar e reduzir ao máximo as causas profundas que originam tal violência. Entendemos que a resolução dos problemas da violência nos recintos desportivos deve ser norteada por objectivos de interesse essencialmente social, cultural, educativo e pedagógico.
Convictos da necessidade do contributo de todos os Portugueses e, em especial, dos seus representantes na Assembleia da República, o PSD votou favoravelmente o Decreto-Lei n.º 339/80, de 30 de Agosto, na generalidade, pondo o seu total empenhamento e disponibilidade no contributo que possa dar no sentido de que se façam as correcções e emendas precisas para dotar o desporto de uma lei justa que o sirva, o dignifique e o respeite, para bem de todos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Patrício.
O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais uma vez ouvimos da bancada do PSD uma intervenção com o sentido de melhorar o Decreto-Lei n.º 339/80. Só que não percebemos, e continuamos a não perceber, por que razão as propostas de alteração do PSD ao referido decreto não tratam sobre as medidas que o Sr. Deputado Lemos Damião aqui agora focou.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP votou contra o Decreto-Lei n.º 339/80 (aplicação de medidas tendentes a conter a curto prazo a violência em recintos desportivos), por considerar que o Governo, apoiando-se numa realidade existente nos nossos recintos desportivos, visa como objectivo a ingerência e controle de Estado dos organismos desportivos não governamentais, visa o desmoronamento e o acabar com dezenas de grupos e associações desportivas.
Votámos contra este decreto por considerarmos que atenta frontalmente contra leis aprovadas nesta Assembleia da República, por se furtar ao debate de uma matéria que diz respeito a esta Assembleia e por ser inconstitucional. Consideramos que o Decreto-Lei n.º 339/80 deixa transparecer o não cumprimento dos preceitos constitucionais sobre a cultura física e o desporto, mas uma tentativa de repor o controle corporativo-fascista da actividade dos organismos desportivos não governamentais. Porque consideramos que com a aplicação deste decreto dezenas de grupos desportivos ou associações onde forem registados actos de violência estão sujeitos ao seu aniquilamento, resultante das suas enormes dificuldades, quer económicas quer materiais, para fazer face ao que o decreto exige em termos de multas, de obras, etc.
Esta Câmara, ao votar unanimemente a ratificação do Decreto-Lei n.º 553/77 pela Lei n.º 63/78, impediu a tutela governamental sobre o associativismo desportivo, tendo ficado o Governo, vinculado a esta Assembleia, de apresentar uma proposta de lei que regulamentasse as relações do Estado com as estruturas do associativismo desportivo não governamental. Não o fez, optando não pelo cumprimento do estipulado mas pela produção de decretos, de portarias, de despachos, de decretos-leis que lhe permitissem legislar sobre matéria da competência da Assembleia da República, como é exemplo o decreto-lei agora chamado a ratificação.
Não é com medidas deste tipo, claramente ilegais e anticonstitucionais, de carácter repressivo, que se combate e atenua a violência nos recintos desportivos.
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Só com uma política e uma orientação que respeitem as liberdades e os direitos dos cidadãos e que vá ao encontro dos preceitos constitucionais sobre a cultura física e o desporto, só com uma política e uma orientação que assentem no diálogo e não na violência inconstitucional se enfrenta e atenua a violência nos recintos desportivos.
Mas o certo é que não encontramos da parte do Governo qualquer medida que assente nesta base e dê solução a este problema.
Esperemos que a intenção do Governo de lançar nos órgãos de comunicação social uma campanha no sentido de sensibilizar a população portuguesa sobre esta situação não se fique pelo mero anúncio, mas que venha a concretizar-se.
Por fim, votámos contra porque pensamos que a violência no desporto não se combate com medidas administrativo-repressivas, mas com uma política que crie as condições para um aumento gradual e seguro do número de praticantes, que apoie efectivamente o desporto escolar e popular e crie condições para o desenvolvimento do desporto para trabalhadores, que incremente o plano de desenvolvimento das diversas modalidades, que apoie criteriosamente a média e alta competição, que fomente a autoconstrução de instalações desportivas por forma a cobrir cada vez mais todo o território nacional, que incremente o intercâmbio desportivo a nível internacional, privilegiando as relações com os países de nível desportivo mais elevado, que, numa só palavra, se aplique uma política desportiva e cultural virada para o harmonioso desenvolvimento das capacidades físicas e intelectuais do nosso povo.
Pelo nosso lado pensamos ter já dado um contributo positivo para tal objectivo através das propostas de alteração que fizemos chegar à Mesa. Ao longo de todas elas perpassa o encarar o desporto e a prática desportiva num sentido pedagógico e formativo e não nessa perspectiva de aplicação pura e simples de medidas administrativas de carácter repressivo.
Na nossa óptica há que criar condições e estímulos para que as próprias colectividades e associações se empenhem, elas próprias, na defesa da sã convivência, do espírito cívico, na concretização do desporto como direito do povo.
Face às declarações das bancadas da AD de vontade de transformar profundamente o decreto, esperamos que elas se concretizem no debate em comissão e não se quedem por umas declarações de intenção.
As associações desportivas, os desportistas, as massas associativas e todo o povo português não deixarão certamente de nos julgar pelas opções tomadas. Pelo nosso lado, estamos certos de ter contribuído para que o desporto e a violência nos recintos desportivos, possam ser encarados concretamente, isto é, como questão eminentemente social, cultural, lúdica e pedagógica.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Rodrigues.
O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 339/80, que foi discutido nesta Assembleia da República, procura resolver um problema da maior importância para o mundo do desporto evidenciado no preâmbulo do mesmo diploma, em que se preconiza «um conjunto de medidas tendentes a conter a curto prazo a violência em recintos desportivos».
A prática desportiva é das mais nobilitantes e salutares para ocupação dos tempos livres, devendo revestir uma função essencialmente formativa e educativa.
O desporto insere-se na sociedade moderna como uma necessidade primária, característica da nossa civilização e cultura, indispensável à saúde social quando prática equilibrada.
O CDS ao ratificar na generalidade o Decreto-Lei n.º 339/80, embora com alterações que julgamos necessárias e úteis, fê-lo considerando a vantagem do estabelecimento de regras gerais e uniformes, visando o bom funcionamento desta actividade e procurando retirar-lhe o carácter violento que se verifica nos recintos desportivos.
O problema é essencialmente de natureza educativa. Nesse sentido apelamos para a colaboração dos órgãos de comunicação social, para as escolas e para as famílias, responsáveis no campo formativo cívico, de modo a evitar o espectáculo degradante da agressão física e moral dos campos de jogos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Naturalmente, mais importante que o poder coactivo deste decreto será a boa vontade de o cumprir, o que certamente só se poderá alcançar com um eficiente processo de educação de massas - feito com a colaboração das escolas, das famílias e da comunicação social - de modo que a emotividade clubista ceda ao respeito cívico sem que para tal se tenha de recorrer a formas de repressão, que reprovamos.
O CDS confia nas alterações que foram propostas de modo a tornar o decreto mais realista, esperando que o desporto, arte e técnica educativa por excelência, se transforme numa verdadeira escola de civismo e de salutar convívio.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Finalmente para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Silveira.
O Sr. Portugal da Silveira (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Popular Monárquico ratificou o decreto-lei que estava em apreciação porque pensa que, não obstante não ser ainda preocupante no nosso país a violência nos recintos desportivos, a verdade é que o que se passa por essa Europa nos faz recear, legitimamente, que possamos vir a ser afectados pelo mesmo mal. Por isso entendemos que mais vale prevenir do que remediar, competindo ao Estado tomar medidas que possam obviar a essas situações.
Aliás, as medidas preconizadas no decreto-lei em apreciação já estavam, de algum modo, em vigor através das estruturas independentes do Estado que, afinal, foram aquelas que ao longo de dezenas de anos implantaram e montaram em Portugal esta estrutura extraordinária que é a organização do desporto, de que ainda ontem tivemos uma amostra pela televisão, e que só foi possível pela abnegação.
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pela dedicação, peio esforço de milhares de ignorados dirigentes que, ao longo de dezenas de anos, conseguiram montá-la e propiciar os espectáculos que podemos agora apreciar.
Neste sentido, pensamos que a ratificação deste decreto-lei deve consistir e deve consubstanciar-se, acima de tudo, na homenagem das estruturas do Estado a essas autênticas organizações populares de base que são os clubes desportivos, as associações e as federações.
Assim, nós aprovámos a ratificação deste decreto-lei e pedimos a sua baixa à comissão competente para que o Estado possa dizer a essa estrutura que ele não se sobrepõe a ela mas que, acima de tudo, procura dar-lhe toda a sua força e toda a sua autoridade para que ela, por si própria, possa, de facto, dominar os acontecimentos. E foi também neste sentido que o meu partido propôs que a comissão encarregada de apreciar este decreto-lei na especialidade chame e oiça, com toda a atenção e seguindo as sugestões que vierem a ser feitas, as federações, as associações, as comissões de árbitros, enfim, toda esta enorme estrutura que, de facto, montou o desporto no nosso país.
O Sr. Presidente: - Para proceder à leitura de um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Reigoto.
O Sr. Alexandre Reigoto (CDS):
Comissão de Regimento e Mandatos
Relatório e parecer
Em reunião realizada no dia 5 de Março de 1981, pelas 14 horas e 30 minutos, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:
Solicitadas pelo Partido do Centro Democrático Social:
Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (círculo eleitoral de Braga) por José Carlos Barbosa Macedo (esta substituição é pedida por um período não superior a trinta dias).
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro (círculo eleitoral de Lisboa) por Paulo de Oliveira Ascensão [esta substituição é pedida por dois dias (5 e 6 de Março corrente, inclusive)].
Narana Sinai Coissoró (círculo eleitoral de Lisboa) por Carlos Alberto Rosa (esta substituição é pedida por um período não superior a trinta dias).
2. Solicitadas pelo Partido Popular Monárquico:
Henrique Barrilaro Ruas (círculo eleitoral de Braga) por Amadeu Domingos Ribeiro de Sá Menezes (esta substituição é pedida pelo período de 1 a 31 de Março corrente, inclusive).
António Cardoso Moniz (círculo eleitoral do Porto) por Eurico de Campos Godim (esta substituição é pedida paio período de 3 a 31 de Março corrente, inclusive).
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O presente relatório foi aprovado por maior com a abstenção do deputado da União Democrática Popular.
A Comissão: Alexandre Correia de Carvalho Reigoto (CDS), secretário - José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP), secretário - Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - Maria Adelaide S. de Almeida e Paiva (PSD) - Nicolau Gregório de Freitas (PSD) - Valdemar Cardoso Alves (PSD) - Armando dos Santos Lopes (PS) - António Jacinto Martins Canaverde (CDS) - Rui Eduardo Ferreira Rodrigues Pena (CDS) - Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP) - Fernando de Almeida Sousa Marques (PCP) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI) - António Manuel de Carvalho F. Vitorino (UEDS) - Helena Tâmega Cidade Moura (MDP/CDE) - Mário António Baptista Tomé (UDP).
O Sr. Presidente: - Não há qualquer oposição ao relatório que acabou de ser lido?
Pausa.
Considera-se aprovado.
Srs. Deputados, como sabem, os trabalhos desta reunião terminam quando se tiver esgotado a ordem do dia agendada para hoje, tendo a sua discussão como limite máximo até à meia-noite. Vamos fazer agora o intervalo regimental acrescido de quinze minutos solicitados pelo Partido Socialista, pelo que agradecemos que sejam pontuais para que a reunião não se estenda muito pela noite fora.
O intervalo vai ser de quarenta e cinco minutos - por o Partido Socialista ter pedido quinze minutos, como já anunciei -, durante o qual convoco uma reunião dos líderes dos grupos parlamentares.
Está suspensa a reunião.
Eram 17 horas e 40 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a reunião.
Eram 18 horas e 40 minutos.
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O Sr. Presidente: - Vamos agora entrar na discussão na generalidade do projecto de lei n.º 129/II, sobre o reforço das condições de independência da actividade dos jornalistas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Arons de Carvalho para uma intervenção.
O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 129/I, da iniciativa do Sr. Deputado Magalhães Mota, que agora discutimos, toca na realidade a informação que temos. Impedir a contratação a prazo de jornalistas, vedar a possibilidade de admissão de candidatos ao jornalismo nos períodos que decorrem desde a marcação de eleições até à sua realização e limitar aos jornalistas estagiários a aplicação do chamado período experimental, que se prevê tenha cento e oitenta dias, são medidas que atingem directamente a situação actual e a modificam. O projecto de lei em causa não configura, pois, meramente situações hipotéticas. Combate factos gravosos para a liberdade dos jornalistas e logicamente da informação e da opinião pública portuguesas.
A existência de numerosos jornalistas contratados a prazo em diversos órgãos de informação constitui sem dúvida o aspecto mais grave de quantos se procuram agora corrigir.
Tomemos o caso da Radiodifusão Portuguesa. Alguns meses antes das eleições legislativas de Outubro do ano passado, a comissão administrativa recrutou, na sua quase totalidade nos quadros de diversos jornais apoiantes da coligação governamental, mais de 40 jornalistas, impondo-lhes meros contratos a prazo de três meses, que até hoje tem vindo a ser renovados por idêntico período. Na altura, a Comissão administrativa da RDP argumentou com a necessidade de suprir a falta de jornalistas motivada pelas férias de Verão. Depressa se verificou, porém, que as férias dos jornalistas não passavam de um mero álibi para disfarçar os reais objectivos da RDP: substituir nesse período eleitoral - e depois dele...- os profissionais não afectos à AD por esses novos recrutas, tentar conquistar o cada vez mais incómodo conselho de redacção, arranjar quem se prestasse para fazer -como foi feita- a escandalosa manipulação da campanha presidencial a favor do general Soares Carneiro, preencher os lugares deixados vagos por alguns profissionais de prestígio - que por mera discriminação política tenham sido afastados -, dificultar, finalmente, eventuais movimentos grevistas dos jornalistas, na altura, como se recordam, na luta por melhores condições e por um novo enquadramento profissional.
Como é sabido, a operação só resultou em parte, mas foi motivo de enorme desprestígio para quem a promoveu. No conselho de informação para a RDP todas as forças políticas referiam a existência de jornalistas contratados a prazo como um dos factores graves que justificavam a demissão da comissão administrativa. E houve mesmo quem, de entre os próprios jornalistas contratados a prazo, não hesitasse em reagir perante esta situação enfileirando com o combate travado pela classe. A consequência desse facto veio afinal a reforçar todos os argumentos de quem considera esta situação intolerável.
O jornalista em causa viu o seu contrato a prazo não renovado, sendo assim, ao que parece, o único dessas cerca de quatro ou cinco dezenas que não fazia falta no Verão ou na campanha do general Soares Carneiro...
O diploma do deputado Magalhães Mota tem ainda outro mérito: chama a atenção para formas mais subtis e menos conhecidas de controle da informação.
Quando se fala em liberdade da imprensa ou da informação, ou quando se avalia o grau de liberdade existente num qualquer regime político, todo o debate é normalmente cingido a aspectos directa ou indirectamente decorrentes das leis de imprensa, da rádio ou da televisão. Saber se há ou não censura prévia, liberdade de publicação ou difusão, liberdade de acesso às fontes oficiais de informação, direitos de resposta, esclarecimento ou rectificação, legislação antimonopolista que impeça a concentração de títulos, formas que garantam a independência da informação perante o poder económico e o poder político, competência meramente judicial para aplicar penas por crimes contra a liberdade de informação ou para apreender publicações, constituem normalmente o quadro aferidor do grau de liberdade existente.
Muito poucas vezes se analisam outros aspectos, não menos importantes, e que constituem crescentemente nos dias de hoje as formas mais utilizadas para limitar a liberdade da informação: limitar a liberdade do próprio jornalista, diminuindo a sua independência económica ou, como é o caso dos contratos a prazo e das situações agora aqui em discussão, fazendo perigar a própria estabilidade do seu emprego.
Portugal tem tido, depois do 25 de Abril, ressalvados períodos conhecidos de evidente dependência perante o poder político, um quadro geral embora instável, de relativa liberdade de informação.
É também por isso que os jornalistas, que antes do 25 de Abril viam os seus escritos dependentes da benesse de um coronel da censura e que ao longo dos últimos anos tiveram por vezes de trabalhar às ordens de comissários políticos, não podem ter agora já não os seus escritos nem as suas funções, mas o seu próprio emprego nas mãos de comissões administravas com o perfil da que temos, por exemplo, na RDP.
Há tempos, durante a greve dos jornalistas, um comunicado do seu sindicato referia acertadamente que após controlar os órgãos de informação se pretendia controlar agora os próprios jornalistas.
De facto, não pode haver liberdade de informação sem liberdade dos jornalistas. Faz relativamente pouco sentido discutirmos as formas de independência dos órgãos de informação perante os grupos económicos ou o Governo, a existência de um sector público da informação, a continuação ou não dos actuais conselhos de informação com esta ou outra composição, competência ou atribuições, ou ainda poderes próprios dos conselhos de redacção, se entretanto todos e cada um dos jornalistas não tiverem condições de independência económica e política, o mesmo é dizer de total liberdade.
Ao acabar com os contratos a prazo ao excluir jornalistas não estagiários do chamado período experimental e ao impedir admissão de candidatos ao jornalismo durante os períodos pré-eleitorais, o projecto de lei do deputado Magalhães Mota presta bom ser-
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viço à causa da luta pela liberdade de informação, tanto mais que complementa da melhor forma um despacho de 4 de Fevereiro do Secretário de Estado da Comunicação Social que limita o recurso da contratação a prazo apenas nas empresas públicas tuteladas por aquele departamento governamental.
O PS votará pois a favor do projecto lei n.º 129/I, sobre o reforço das condições de independência da actividade dos jornalistas e espera que esta Assembleia da República, a quem crescentemente se entende dever atribuir a responsabilidade de garantir o pluralismo e a liberdade de informação, proceda coerentemente com essa exigência.
A opinião pública e sobretudo os próprios jornalistas terão aqui uma boa ocasião para avaliar se às palavras dos políticos correspondem sempre os seus actos.
Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.
A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O não cumprimento do espírito e da própria letra da Constituição da República Portuguesa tem levado na comunicação social, como noutros sectores, ao esvaziamento das leis parcelares, que procuravam regulamentar e tornar possível a vivência da democracia.
Desacompanhadas de um poder político verdadeiramente democrático, as leis mostram-se, por vezes, insuficientes para salvaguardar as liberdades e garantias essenciais.
O querer forçadamente criar um ambiente sócia! que possibilite as alterações na sociedade portuguesa que o seu projecto político impõe tem levado a AD a uma tentativa de manipulação da opinião pública e ao consequente desrespeito pela informação.
Este desrespeito obriga a uma informação culturalmente alienante ou negativa, dispersa e alheada do povo português, que cabe o vazio e o isolamento e predisponha à circulação da mentira e à passividade do público.
Tais objectivos são mais facilmente atingidos através de servidores da comunicação social não profissionalizados e da neutralização dos profissionais autênticos.
Essa neutralização tem vários graus de intensidade, desde o aliciamento, o saneamento puro e simples, à prateleira da rejeição, à coacção pelo medo do desemprego.
E embora o Estatuto do Jornalista diga que o jornalista «não pode ser constrangido a exprimir opinião ou a cometer actos profissionais contrários à sua consciência» (artigo 9.º), afirmação esta dentro das normas do direito ao trabalho e das liberdades e garantias individuais e colectivas que a Revolução de Abril consagrou, a verdade é que, como refere a ASDI, a alternativa que se põe é «submeter-se, ou ficar sem emprego».
Assim, demos desde logo, o nosso apoio ao projecto de lei que sugestivamente se intitula: «Reforço das condições de independência da actividade dos jornalistas.»
Entregamos na Mesa alterações a quatro pontos e uma proposta de aditamento de mais um ponto, somos optimistas, Srs. Deputados!
As alterações propostas visam uma maior exactidão do que se pretende e o aditamento representa mais um elemento de salvaguarda da independência do jornalista.
Alguns directores, nomeados pelas empresas, merecem, de facto, o nosso respeito, porque são aceites pelos conselhos de redacção. Porém, a verdade é que, estabelecendo o Estatuto do Jornalista que ao lugar de director se tem acesso através da carteira, parece--nos que na nomeação de um director, para maior coerência da profissão, para além do parecer do conselho de redacção, logicamente deverá ser emitido parecer pela comissão técnica do Sindicato. Estes pareceres, quanto a nós, deveriam ser vinculativos e o seu não cumprimento punido por sanções legais.
Apesar de se resumir a alterações de um único artigo do Estatuto do Jornalista, este projecto de lei, que se espera baixe à comissão, mexe nas bases profissionais dos jornalistas. Daí que entendamos que a classe deveria ser amplamente ouvida durante a discussão na comissão e que este projecto só deverá ser submetido a Plenário da Assembleia da República depois de provocada a necessária dinamização social em torno dos problemas vários que ela suscita.
Lutar pela independência da comunicação social, Si. Presidente e Srs. Deputados, é hoje tarefa base dos cidadãos. De facto, se a liberdade de expressão poderá, numa interpretaçâo restritiva, ser reivindicação de profissionais, o direito à livre informação é um direito que assiste a todos os portugueses.
Aplausos do PS, do PCP, da ASDI e da UEDS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei apresentado pela ASDI - como já aqui havíamos referido e que, aliás, foi reconhecido pelos apresentantes - resultou fundamentalmente de uma preocupação relativa a uma situação conjuntural que, na visão daqueles deputados, se tornava preocupante, porque condicionava a independência profissional dos jornalistas e, consequentemente, a liberdade de imprensa em Portugal, nomeadamente nos órgãos de comunicação social estatizados.
Na altura não nos parecia que a situação real justificasse a terapêutica proposta e agora ainda menos, sobretudo depois da nota divulgada pela Secretaria de Estado da Comunicação Social, que dá conta de dois despachos de 4 de Fevereiro, em que se determina: no primeiro, que o recurso à contratação a prazo do pessoal para as empresas públicas tuteladas por esta Secretaria de Estado apenas seja permitido para satisfação de necessidades temporárias de mão-de-obra de carácter eventual e substituição temporária de trabalhadores impedidos de prestar o seu concurso à empresa no segundo, a prioridade absoluta nas novas admissões nos quadros de pessoal dos trabalhadores do sector em situação de desemprego. Estão, assim, afastados alguns dos pressupostos fundamentais que estiveram na base da intenção legislativa subjacente ao projecto apresentado.
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Por outro lado, e para além das orientações agora definidas ao nível da imprensa e dos órgãos de Comunicação Social estatizados em geral, outras condições poderão e deverão, a nosso ver, ser introduzidas - mas em sede mais adequada -, como por exemplo, através da modificação do regime dos contratos a prazo. Aliás, a nosso entender, isto deve ser feito no quadro de uma revisão mais ampla da legislação do trabalho, que impeça que se aproveite um regime, porventura excessivamente liberal, para, abusando dele, introduzir distorções nos seus objectivos.
E, aliás, estando em curso, por iniciativa de alguns partidos políticos representados nesta Assembleia, a revisão desse regime, mais se justifica, quanto a nós, que não se venha, por uma via espúria, estabelecer eventuais precedentes e, sobretudo, estabelecer regimes especiais, que podem não ser compatíveis com o regime geral, que, de facto, urge modificar.
Todavia, parece-nos que algumas das matérias contempladas neste projecto de lei terão a sua sede própria no regime de contratação colectiva, contratação essa onde melhor se poderão ponderar não apenas os interesses das partes directamente interferentes - ou seja, a entidade patronal e jornalistas -, como também o interesse público, que nos recusamos a admitir que esteja ausente na celebração de um contrato colectivo de trabalho. E isto sobretudo porque pensamos que é nesta sede que melhor poderão ser ponderadas as realidades empresariais, que, quer queiramos quer não, condicionam obviamente questões como o período experimental, cuja duração deve ter em conta acima de tudo a especificidade da profissão, e que, não sendo uma questão política nem como tal devendo ser encarada, não deve ser objecto de uma regulamentação como a pretendida.
É evidente que estas considerações não implicam que o nosso partido não entenda que a situação dos jornalistas - designadamente no que respeita ao seu estatuto profissional - não deva ser objecto de uma análise cuidadosa e global, tendo em vista a importância social da sua actividade, a carência de meios de informação profissional-designadamente no campo do aperfeiçoamento e da reciclagem -, a necessidade de um adequado enquadramento profissional, etc.
Garantir a independência dos jornalistas não pode ser, do nosso ponto de vista, contribuir para criar um estatuto de privilégio entre trabalhadores - que a classe seria a primeira a repudiar -, mas sim criar condições de trabalho que permitam exercer a profissão com independência, liberdade e rigor. Por isso estamos dispostos a tomar iniciativas no quadro legislativo com vista à revisão geral da legislação, a breve prazo.
Na defesa destes objectivos estamos e estaremos ao lado dos jornalistas portugueses. Porém, não nos parece que o projecto em causa crie condições efectivas para a sua realização e, assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não lhe poderemos dar o nosso apoio.
Aplausos do CDS.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Peço a palavra para pedir esclarecimentos, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Deputado Gomes de Pinho, desejava pedir-lhe alguns esclarecimentos.
Creio que os jornalistas portugueses agradecerão devidamente a solidariedade demonstrada, mas talvez apreciassem mais que da, em vez de ser só palavras, se traduzisse nos actos.
Vozes do PS e da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - Alguns estarão lembrados dos casos de 10 de Junho e de A Nação!
Em relação às questões concretas que o Sr. Deputado levantou, eu gostaria de dizer que a nota divulgada pela Secretaria de Estado da Comunicação Social diz respeito aos Despachos Normativos, n.ºs 78/81 e 79/81, publicados em 4 de Março no Diário da República, e a despachos de 16 de Fevereiro, ou seja, alguns dias depois da apresentação deste projecto no Parlamento.
De qualquer modo, esses despachos suscitam um problema sobre o qual gostaria de conhecer a opinião do Sr. Deputado. A Constituição estabelece que não pode haver regimes discriminatórios entre a imprensa privada e a pública, portanto entre os vários órgãos de comunicação social.
Ora bem, quando os despachos normativos em causa estabelecem um regime especial para os órgãos de comunicação social públicos, parece que a não extensão desse regime aos órgãos de comunicação social privados coloca estes, ainda que indirectamente, numa situação que, essa, sim, seria de privilégio. Portanto em relação a este ponto, em relação à constitucionalidade destes despachos, gostaria de conhecer a posição do Sr. Deputado.
Em segundo Lugar, gostaria de saber se a consideraçâo dessa igualdade de circunstâncias não levará naturalmente a ter que reconhecer que a doutrina dos despachos necessitará, pelo menos, de ser alargada a todos os órgãos de comunicação social.
Em terceiro lugar, devo dizer que nós estaremos de acordo com uma alteração ao regime dos contratos a prazo, mas pensamos que as situações não se compadecem comparativos, e no caso concreto da comunicação social, está em causa uma situação que não só é um problema de uma classe social determinada, não é só um problema dos jornalistas, mas sim um problema da sociedade portuguesa em geral, que tem direito a ser informada e que, criando formas de dependência dos jornalistas, nunca poderá ter condições de ser informada com verdade. Já temos alguma experiência disso, e também sobre este aspecto gostaria de conhecer a posição do Sr. Deputado. Gostaria de saber se está disposto, e já - porque isso seria um começo para quem prevê a eliminação em geral dos contratos a prazo -, a aceitar a eliminação dos contratos a prazo para os jornalistas. Este ponto era só um começo para generalizar, o que, certamente, não deixará de fazer.
Quanto ao facto de a contratação colectiva ser ou não a sede própria para estas matérias, já tivemos ocasião de trocar impressões sobre isto aquando da apresentação do projecto de lei. Contudo, perguntaria ao Sr. Deputado se não pensa, de acordo com os
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mais clássicos dos autores, como, por exemplo, Lacordaire, que entre o forte e o fraco, entre o rico e o pobre, é na lei que reside a defesa.
Aplausos da ASDI, do PS, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Gomes de Pinho, se desejar, pode responder.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de dar dois breves esclarecimentos ao Sr. Deputado Magalhães Mota. O primeiro é que, embora eu não seja um constitucionalista, não me parece que haja qualquer hipótese de vício de constitucionalidade nestes despachos.
Estes despachos constituem apenas meras normas orientadoras dos conselhos da administração das empresas públicas e, como tal, resultam do exercício do poder de tutela da Secretaria de Estado da Comunicação Social. Não penso que ponham efectivamente em causa a igualdade de tratamento dos jornalistas e das empresas de comunicação social, porque todas as empresas estão obrigadas - mesmo as empresas privadas - à observância das regras gerais do direito, designadamente às regras que regulamentam neste momento os contratos a prazo, que, como sabe, implicam a observância de determinadas restrições.
Por outro lado, eu não disse - e peço-lhe que não atribua às minhas palavras as suas intenções - que nós estávamos a favor da eliminação pura e simples dos contratos a prazo. Julgo mesmo que essa medida se traduziria em prejuízos «videntes para os trabalhadores portugueses pois todos sabemos que os contratos a prazo correspondem nalguns casos a necessidades técnicas evidentes, que resultam da especificidade das relações de trabalho, designadamente do seu carácter eventual ou temporário, e, noutros casos, procuram contemplar uma situação de desemprego, que é real, ou procuram ser, talvez, um antídoto eficaz para essa situação.
Contudo, nós estamos contra os abusos que, com base numa legislação que pode ser excessivamente liberal, se possam cometer e, sobretudo, estamos contra a ineficácia dos órgãos jurisdicionais a quem competiria corrigir essas anomalias em tempo oportuno.
No entanto, parece-nos que, neste momento, em Portugal, será profundamente irrealista - para não dizer demagógico - pensar na eliminação imediata dos contratos a prazo.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, creio que estamos inteiramente de acordo quanto à necessidade de uma informação objectiva e correcta. Simplesmente, não estamos de acordo quanto aos factores ou quanto à valorização relativa dos factores que conduzem a esse objectivo.
Para nós há um conjunto de factores extremamente importantes, que passam pela existência de condições de trabalho, pela formação profissional adequada de jornalistas, pela existência de regimes legais que impeçam o exercício de pressões, o exercício de interferências, da administração e de outras entidades, e cremos que a legislação que existe em Portugal neste momento é suficiente para que se garanta essa liberdade, o que, aliás, é reconhecido internacionalmente.
E muito me espanta que sejam as pessoas e agrupamentos políticos quo contribuíram para a formulação dessa legislação que, por razões puramente conjunturais, puramente tácticas - quanto a mim, neste momento vazias de conteúdo -, estejam agora a pôr em causa essa legislação. Parece-me, pois, que com isso não se pretende, de facto, ir ao fundo do problema, e nós estaríamos e estamos de acordo - aliás eu referi isso - em melhorar globalmente a legislação e não em fazer pequenos enxertos, que têm um carácter puramente conjuntural.
Estamos, portanto, de acordo em defender e melhorar globalmente a legislação. Mas o que não cremos é que por esta via se chegue realmente a resultados concretos que conduzam aos objectivos que o Sr. Deputado acabou aqui de enunciar. Era apenas isto que eu queria dizer.
Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Adelaide Paiva.
A Sr.ª Adelaide Paiva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O preâmbulo do projecto de lei apresentado pelo Sr. Deputado Magalhães Mota revela preocupações que à partida perfilhamos, com perfilharemos todas as preocupações concernentes à criação de condições conducentes à independência dos jornalistas face aos poderes político e económico instituídos.
Contudo, o teor do projecto não responde a tais preocupações, ficando aquém dos interesses em causa, mormente os dos próprios profissionais da informação.
Na realidade o referido projecto visa apenas o artigo 4.º do Estatuto do Jornalista, onde ou não inova ou no que procura inovar é para nós inaceitável.
Vejamos: não inova no que se refere aos n.ºs 1, 2 e 3, que são a transcrição do que se encontra actualmente contemplado. Não chega propriamente a inovar no que se refere ao n.º 4, porquanto se procura limitar a cento e oitenta dias o período experimental de candidatura, matéria até à data reservada ao CCT e onde importa referir que no momento actual esse período experimental é de sessenta dias.
Não sei se o Sr. Deputado Magalhães Mota ouviu os jornalistas sobre a vantagem de ampliar o período experimenta] de sessenta para cento e oitenta dias.
O projecto de lei inova efectivamente no tocante aos n.ºs 5 e 6, de forma contudo para nós inaceitável. Na verdade, o n.º 5, ao vedar a contratação a prazo de jornalistas é passível de três tipos de críticas.
Num primeiro passo, não pode deixar de constatarão que esta disposição - a ser aprovada - criaria um regime de excepção para os jornalistas, que ficariam, pois, constituindo uma elite dos trabalhadores portugueses.
Num segundo passo, a proposta do Sr. Deputado Magalhães Mota parece ignorar totalmente as implicações que tal medida teria no sector laboral. Os contratos a prazo surgiram em Portugal num determinado contexto sócio-laboral, que teve a sua razão mais próxima nas alterações então introduzidas nas leis de trabalho, designadamente com a determinação de proibição do despedimento sem justa causa, que veio a provocar, na altura uma certa restrição na
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admissão de trabalhadores, com o consequente aumento do número de desempregados. Foi para obviar esta situação que se vinha apresentando gradativamente catastrófica, particularmente tendo presente o estado difícil que em grande parte das empresas vinha sendo vivido - empresas essas saídas de uma revolução e ainda sem as infra-estruturas ditadas para um redimensionamento e um reapetrechamento imposto pelas circunstâncias - que foi criado então o contrato a prazo. Admitimos que se tenha verificado em alguns casos o seu uso abusivo. Há portanto que fazer funcionar os dispositivos legais de controle. Esses dispositivos existem, portanto há que fazê-los funcionar no tocante a todos e quaisquer usos indevidos. A nossa visão da sociedade é uma visão dinâmica e entendo que os contraltos a prazo deverão ser objecto de reapreciação de forma a corresponderem aos objectivos ditados pelas actuais condições da vida económica portuguesa. Estamos receptivos a tal reapreciação, contudo entendemos que essa reapreciação terá de ser global e não sectorial, como seria o caso manifestado neste projecto de lei.
Num terceiro passo, é nossa opinião que a proibição da contratação a prazo, tal como pretende o Sr. Deputado Magalhães Mota, traduzir-se-ia em prejuízo do trabalhador da informação. Se não vejamos: é sabido que existe presentemente, pluriemprego praticado pelos profissionais da informação. Ao fazer esta afirmação não pretendo fazer juízos de valor sobre tal facto, que conduziria a discussões bastante mais amplas e que se prenderiam a questões relacionadas com os vencimentos dos jornalistas, o nível de vida e a dignificação da classe. Mas o pluriemprego é unia realidade na vida portuguesa no tocante aos jornalistas, tecida através da contratação a prazo que a consubstancia. Vedando o contrato a prazo, seriam os jornalistas os primeiros e os principais prejudicados, o que está completamente oposto aos considerandos que tece na apresentação do seu projecto de lei.
Quanto ao n.º 6, permitam-me que o diga com toda a frontal idade que traduz uma politização marcada da actividade dos jornalistas, aos quais o Sr. Deputado Magalhães Mota nem chega a conceder o benefício da dúvida do exercício da sua actividade de forma objectiva e isenta em lermos políticos. Nós, sociais-democratas, partimos de uma premissa diferente. Entendemos que à partida os candidatos a jornalistas são trabalhadores que exercerão a sua actividade de forma consentânea com os princípios ético-deontológicos que pautam a mesma. Se existir violação, os mecanismos existentes deverão funcionar de forma a evitar quaisquer atitudes abusivas. O próprio estatuto dos jornalistas, no seu artigo 9.º, contempla esse problema e a forma de o cercear. Aliás, entendo também que a crescente politização que certas forças políticas procuram imprimir à actuação dos jornalistas é nefasta por traduzir uma hipertrofia da função social cometida ao jornalista. Compreendo que num país como Portugal, que viveu décadas sem liberdade de expressão, se tenha seguido um movimento explosivo após a Revolução, com particular pendor para as questões políticas que durante os últimos anos nos absorveram. Entendo, contudo, que presentemente uma sociedade em que a democracia se encontra praticamente consolidada, numa sociedade que viveu apenas uma revolução virada para as questões económico-financeiras, numa sociedade em que até à data não se viveu um projecto de dinamização cultural, a actuação dos jornalistas tem de ser despolitizada num movimento em crescendo de forma a possibilitar aos profissionais da informação assumirem uma atitude participativa na veiculação de um movimento cultural que se impõe. Movimento cultural esse tido numa visão bastante lata e que implica, inclusive, todo um trabalho de consciencialização cívica dos Portugueses, levado de Norte a Sul do País.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Aí, os profissionais da informação terão certamente uma palavra muito importante a dizer e é possível que nestes próximos anos o seu trabalho não seja facilmente mensurável. Mas estou completamente consciente que daqui a dez anos estaremos a ver os frutos de conseguirmos uma sociedade portuguesa a nível europeu. Sem essa «revolução» para já deste movimento cultural apoiado efectivamente pelos profissionais da informação, suponho que daqui a alguns anos estaremos com uma sociedade, tal com temos presentemente, carenciada a todos os níveis e em que consciência cívica é algo que está bastante afastado dos centros europeus.
Entendo que no Estatuto do Jornalista - que foi o primeiro a aparecer em Portugal e que já tem um ano e qualquer coisa de existência, surgiu em 1979 - há certos aspectos que convém serem ponderados, particularmente o caso das incompatibilidades, que grandes problemas tem provocado no sector.
Efectivamente, há todo um trabalho a ser feito com auscultação da classe através de um contacto a nível do Sindicato dos Jornalistas.
Assim, o Partido Social-Democrata manifesta para já a sua disponibilidade para apresentar um projecto de lei global, que não seja uni enxerto movido não por atitudes ditadas de facto para a protecção e inserção dos jornalistas numa sociedade livre, tal como a pretendemos, mas para tirar dividendos políticos fáceis que não estão nada conformes com a nossa posição na vida.
Portanto apresentaremos um projecto de lei de revisão global do Estatuto do Jornalista.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr.ª Deputada Adelaide Paiva, creio que por falta de atenção sua - perdoe-me que lho diga -, visto que o texto do nosso projecto de lei já foi publicado, a Sr.ª Deputada esqueceu que na minha intervenção eu tinha citado os contactos com o Sindicato dos Jornalistas e que esses contactos tinham determinado inclusivamente a apresentação de uma proposta de alteração. Se alguém não consultou a classe, não fomos certamente nós. E o que não fazemos é apropriarmo-nos de nenhuma classe profissional e dizermos aqui que estamos a representá-la ou a defender os seus interesses sem a ter ouvido.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Em relação às questões concretas que pôs, gostaria de lhe dizer, pois falou de problemas
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no sector laboral que os contratos a prazo pretendiam resolver, quais são as situações sazonais que a Sr.ª Deputada confie em termos de comunicação social e quais são as situações de desemprego que a contratação a prazo permitiu resolver. E se pelo contrário o que se pretende ocultar é que os contratos a prazo, em especial nas empresas de comunicação social, são colocados numa situação de dupla dependência que leva a que no caso concreto que ainda há pouco foi invocado de na RDP, quando um profissional contratado a prazo toma posições que não agradam à administração, a necessidade sazonal da sua contratação termina automaticamente.
Vozes do PS - Muito bem!
O Orador: - Gostaria ainda de lhe dizer que não há, da nossa parte, uma hipertrofia da acção política dos jornalistas. O que há é uma tentativa de fazer cessar a hipertrofia da acção política que se pretende desenvolver através dos jornalistas.
E em termos de manipulação muita coisa poderíamos certamente contar do que se tem passado em termos de comunicação social.
Por último, Sr.ª Deputada, poderia dizer que aguardava com entusiasmo a sua declaração no sentido de que apresentaria um projecto de lei. Mas lembrado do que aconteceu com os inquéritos sobre a comunicação social, julgo que a FRS teria de apresentar primeiro um projecto de lei para que horas depois surgisse o seu.
Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Adelaide Paiva, há mais um Sr. Deputado inscrito para lhe pedir esclarecimentos. Deseja responder já ou no fim?
A Sr.ª Adelaide Paiva (PSD): - Respondo no fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Rego.
O Sr. Raúl Rego (PS): - Sr.ª Deputada Adelaide, Paiva, queria perguntar-lhe o que entende por «despolitizar o jornalismo». Será realmente torná-lo apenas servo de um partido único?
Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Adelaide Paiva
A Sr.ª Adelaide Paiva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente ao Sr. Deputado Magalhães Mota devo esclarecer que, efectivamente, antes de fazer a minha intervenção auscultei a classe dos jornalistas, isto é, auscultei membros da direcção do Sindicato dos Jornalistas e alguns jornalistas. Possivelmente auscultámos elementos diversos, o que mostra que existem jornalistas com várias opiniões, o que e óptimo. Isso será um trabalho construtivo quando apresentarmos um projecto de lei global e não um projecto do artigo 4.º com dois pontos inovatórios.
No tocante à questão da manipulação e das dependências que o Sr. Deputado Magalhães Mota foca, não digo que o contrato a prazo - aliás na minha intervenção foquei isso - por vezes não tenha sido indevidamente utilizado não só no tocante ao sector dos jornalistas como no tocante a outras áreas dos trabalhadores portugueses. O que digo e mantenho é que não vejo que de facto seja criado um regime de excepção para uma qualquer classe de trabalhadores, seja dos jornalistas ou de quaisquer outras classes.
Entendo, sim, que se o contrato a prazo tem defeitos, se os mecanismos existentes actualmente para o seu controle se mostram ineficazes então há que reestruturá-los mas numa visão global, ou estaremos a criar élites dentro de élites, que francamente, Sr. Deputado, não acredito que à partida considere positivo para uma disciplina laboral portuguesa. Nem acredito que consiga constituir uma sociedade sadia dentro desse campo.
Agora vou responder ao Sr. Deputado Raúl Rego, que me perguntou o que entendo por «despolitizar o jornalismo» e se isso «será o servo de um partido único».
Ó Sr. Deputado, francamente, jamais. Entendo que a função do jornalista é uma função crítica que efectivamente deve ir ao âmago dos problemas. Deve levar ao conhecimento de todos os portugueses os problemas reais da vida portuguesa, sejam eles agradáveis ou desagradáveis. E até mais os desagradáveis na medida em que os Portugueses se possam consciencializar da sociedade em que se inserem e possam ter uma atitude participativa no sentido de a modificar e de a melhorar. Queremos uma sociedade virada para o futuro. Não queremos uma sociedade parada.
Quando falo em despolitizar não é tirar o sentido crítico e a criatividade dos jornalistas. É abrir-lhes o leque das suas aptidões e não torná-los veículo de uma força política qualquer que ela seja. O que entendo é que devem estar ao serviço dos Portugueses e portanto apenas fiz um apelo ao que se me afigura fundamental para a sociedade portuguesa no futuro, que é uma coordenação da comunicação social com os objectivos de dinamismo cultural, que não foi feito até à data e que se impõe que seja feito em Portugal.
Se não pensarmos nesse problema já, suponho que estaremos a pensá-lo daqui a dez ou vinte anos e que esses anos foram perdidos para as gerações futuras. É um trabalho de base, é um trabalho de fundo que importa seja feito já. E acredito que o Sr. Deputado será um dos primeiros a participar nesse trabalho. Conto pelo menos com a sua colaboração.
O Sr. Raul Rego (PS): Posso interromper a Sr.ª Deputada?
A Oradora: - Faça favor.
O Sr. Raul Rego (PS): - Se acha que é uma actividade crítica, então tem de ser crítica mesmo na política. Não percebo realmente por que é que se vai despolitizar. Peco-lhe desculpa por o sentido das minhas palavras poder parecer ofensivo, que não é, mas falava-se muito da despolitização quando apenas era permitida uma politização. Será no sentido em que os bispos agora também falam em tirar a força ideológica à Constituição...
Risos.
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... como se (houvesse alguma constituição sem força ideológica?
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Sr. Raul Rego (PS): - Queremos despolitizar também o jornalismo como se fosse possível despolitizar o jornalismo político?
Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.
A Oradora: - Sr. Deputado Raul Rego, quando falei em despolitizar a classe dos jornalistas isso tem de ser entendido no contexto geral. E falei precisamente do que se refere ao ponto 6 do projecto de alteração ao Estatuto do Jornalista, em que se vem a proibir que durante o período da marcação de eleições até à sua realização não se possa efectuar, nas empresas jornalísticas, a admissão de candidatos ao jornalismo.
Portanto, neste ponto, à partida, está-se a passar um atestado de falta de isenção aos candidatos a jornalistas. É nesse sentido que digo «isto tem uma carga política que à partida nem sequer o benefício da dúvida concede». Parto da premissa que candidatos a jornalistas, que passam por uma apreciação a nível de sindicato, certamente terão de dar provas de ética, de isenção, de pluralismo e de critérios deontológicos para poderem exercer construtivamente a sua actividade.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Sousa Marques (PCP): - Não politize a intervenção!
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputados: A Assembleia da República é chamada hoje pela segunda vez a pronunciar-se sobre matéria referente à definição e enquadramento da actividade dos profissionais da informação.
Em 28 de Julho de 1979, aquando da aprovação do Estatuto do Jornalista, tive oportunidade de em nome desta bancada justificar o voto favorável do PCP por considerar que, sendo o Estatuto do Jornalista uma velha reivindicação da classe, a sua consagração a nível legal representava não só uma vitória destes profissionais como também uma vitória da própria democracia. De facto, no diploma então aprovado ficou claramente expresso o reconhecimento da actividade profissional do jornalista como sendo a principal forma de exercício do direito de informar, integrando, entre outras, ía liberdade de expressão e informação e criação, a liberdade de acesso às fontes de informação, a garantia do sigilo profissional, a garantia da independência do Jornalista e o reconhecimento do direito de participação dos jornalistas no respectivo órgão de comunicação social. A consagração de tais princípios demonstrou bem o reconhecimento pela Assembleia da República do importante papel que cabe aos jornalistas na defesa do Estado democrático, no exercício do direito de informar e ser informado como elemento essencial à prática da democracia, à defesa da paz e do progresso político, social e económico do nosso país.
E se pelo nosso lado votámos sem reservas tal lei, desde logo ficou claro que os partidos da direita, o PPD e o CDS,...
Vozes do PSD: - PSD! ...
O Orador: - ... que hoje formam a maioria parlamentar, não encaram de igual modo a aprovação de tal diploma. A abstenção do PSD.
Vozes do PSD: - Ah! ...
O Orador: -... os senhores chamavam-se PPD/PSD. Na altura ainda eram PPD, agora são PSD, por isso é que eu disse PPD. Como ia dizendo, a abstenção do PSD e a votação provável, mas com muitas reservas, do CDS de imediato deixavam antever que a consagração dos direitos e deveres reivindicada pela classe dos jornalistas não lhes agradava. Da facto, vivendo-se na altura o feroz ataque ao sector público de comunicação social promovido pelo Governo Mota Pinto, não poderia ser encarada de forma diferente pelos partidos seus apoiantes a aprovação de uma lei que tinha precisamente como objectivo consagrar direitos dos profissionais da informação, impedindo os abusos e ilegalidades praticadas pelo então Ministro da Propaganda, Sr. Proença de Carvalho.
E a prática veio demonstrar que as dúvidas então levantadas pelos partidos que hoje integram a AD, designadamente o PSD, correspondiam efectivamente a uma completa falta de vontade política de consagrarem na lei direitos e garantias dos profissionais da informação. Um ano de governação «AD» aí está para o comprovar!
Quem poderá esquecer o que foram as mexidas na Direcção de Informação e nos quadros jornalísticos das empresas de comunicação social do sector público, particularmente na rádio e na TV, nos períodos que antecederam as eleições de 5 de Outubro e de 7 de Dezembro?
Quem poderá ignorar as admissões massivas de jornalistas de direita, com contratos a prazo pelo exacto período de duração das campanha eleitorais, ao mesmo tempo que se marginalizavam, os profissionais da rádio e da TV e se colocavam na prateleira ou na bolsa de trabalho os jornalistas mais competentes?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O objectivo era claro - havia que a todo o custo, mesmo violando as leis; fazer dos órgãos de comunicação social do sector público cadeias de ressonância dos projectos governamentais para assegurar a vitória nas eleições.
Tais atitudes demonstraram que para a «AD» e seu governo o jornalista não é encarado como um profissional sujeito a um código deontológico e com a missão de concretizar o direito à informação do nosso povo. Para a «AD» o jornalista é encarado como mera peça do canal de comando governamental, que parte do Governo, passa pelas administrações e direcções e acaba frente às câmaras de -televisão ou frente aos microfones da rádio. Para a «AD» é fundamental o abastardamento da profissão jornalística, a transformação dos profissionais em peças desqualificadas de uma máquina, admitidos para fins específicos ao serviço do Governo e dos seus objectivos.
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Por outro lado, não pode deixar de referir-se o que foi o ataque aos órgãos dos jornalistas, designadamente aos conselhos de redacção, quer tentando impedir a sua actividade, quer avançando com medidas repressivas, quer mesmo ameaçando de prisão os seus membros, como sucedeu na RDP. Todos estes factos foram objecto de denúncia clara e objectiva no colóquio recentemente realizado pelo Sindicato dos Jornalistas em diversas intervenções então proferidas.
Tal como a ASDI, cujo projecto de lei consideramos uma iniciativa positiva, também nós estamos preocupados com esta situação, e por isso mesmo apresentámos um projecto de lei que visa consagrar direitos aos membros dos conselhos de redacção, designadamente aplicando-lhes o regime de protecção legal de que gozam os membros das comissões de trabalhadores e os delegados sindicais. Projecto de lei que teremos oportunidade de discutir amanhã nesta Assembleia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei ora em análise permite, quanto a nós, uma clarificação das situações e vem, sem dúvida, enriquecer de maneira positiva o Estatuto do Jornalista. É definido um período experimental de candidatura que em nosso entender deveria ser mais curto, como, aliás, opinião do próprio Sindicato dos Jornalistas. Impede-se a contratação dos jornalistas a prazo, o que pode vir pôr fim à dança do vai e vem que se tem verificado nas empresas de comunicação social. Pôr outro lado, é dado um mínimo de garantia de estabilidade de emprego aos profissionais de informação. É vedada a admissão dos jornalistas nos períodos eleitorais, o que visa objectivamente evitar a repetição dos casos escandalosos e arbitrariedade e abuso do poder verificados na altura das eleições legislativas e presidenciais.
Quem pode, Srs. Deputados, em boa verdade, deixar de considerar como positivas tais disposições?
O debate preliminar já aqui travado sobre esta matéria de maneira cabal revela a dificuldade insanável de encontrar argumentação contrária justificativa da rejeição das medidas ora propostas. E a discussão que já teve lugar neste plenário continua a demonstrar que de facto a argumentação dos partidos da maioria não justifica de uma maneira realista, porque a rejeição do actual projecto de lei. E vejamos porquê: que sentido faz alegar que o que é preciso é mais formação profissional, sem cláusulas de garantia contra factos que comprometem a independência e dignidade profissional dos jornalistas? Nem as duas coisas são incompatíveis nem uma pode servir de pretexto para recusar a outra, sendo como são complementares e indissociáveis.
Que sentido faz, Srs. Deputados da maioria, exaltar farizaicamente a dignidade profissional dos jornalistas no preciso momento em que com o voto se pretende recusar-lhes um precioso instrumento de garantia dessa mesma dignidade com a alegação de que se trataria de um privilégio?
Qual a consistência, Srs. Deputados da maioria, do vosso argumento de que esta matéria não teria dignidade legal, devendo ter puro assento contratual, quando tanto como defender a independência de cidadãos se trata de garantir as bases da própria liberdade de informação? E como se pode qualificar de prematuro um aperfeiçoamento legal de utilidade e oportunidade evidentes?
Que mais espera a «AD» ou que mais tem programado, para gerar uma situação tal em que estas medidas deixassem de ser prematuras?
A fragilidade argumentativa das bancadas da maioria é tal que em desespero de causa se recua até ao século XIX, como fez o vosso colega Gomes de Pinho, para fazer o mais serôdio liberalismo, condenando a restrição contratual agora proposta em nome de uma pseudo liberdade contratual que se traduz na perpetração de situações de sujeição a que os jornalistas se têm visto forçados nas condições mais degradantes.
E não venha dizer-se finalmente que a matéria hoje em debate perdeu actualidade, como disse o vosso colega Gomes de Pinho, pelo facto de o Secretário de Estado da Comunicação Social ter publicado, por despacho, instruções genéricas para as empresas públicas ou intervencionadas do sector em matéria de contratação. A própria existência deste despacho contraria toda a vossa argumentação e demonstra que o problema existe, é grave e carece de regulamentação específica.
Mas, em primeiro lugar, e é importante que se diga, o âmbito do projecto de lei em análise não se confunde com o despacho ministerial. É muito mais vasto.
De facto, pelo Despacho n.º 78/81 apenas se congelam as admissões de pessoal nas empresas públicas e intervencionadas (não sujeitas a ASEFs), enquanto não forem aprovados pela SECS os seus quadros de pessoal, para o envio dos quais se dá o prazo de um mês. Por outro lado, não há da parte da SECS a intenção de acabar com a contratação a prazo, já que se remete para a legislação em vigor tal matéria. Bem ao contrário, o projecto de lei em análise surge como uma medida de fundo que se aplica a todos os jornalistas e a todas as empresas de todos os sectores e pela qual é, de facto, vedada a contratação a prazo.
É nosso entendimento que na situação actual é importante que fique assegurado no próprio Estatuto do Jornalista tal tipo de disposições, que estão na área de reserva de competência da AR, não deixando para uma qualquer instrução genérica de um qualquer responsável governamental (expeditamente revogável a qualquer prazo) a sua regulamentação (e ainda por cima com as limitações já referidas).
Perante isto, é bom que se diga que se a maioria governamental tivesse intuitos de moralização da actividade neste sector esta seria a boa altura para o demonstrar. Actuar de maneira diversa, inviabilizar a aprovação do diploma em discussão, argumentar que o projecto de lei em causa é dispiciendo é, como atrás deixei demonstrado, tentar lançar areia para os olhos dos restantes partidos, dos jornalistas e do próprio povo português.
E não se fala em projecto global, de novo. De facto, a colega Adelaide Paiva sempre que não tem argumentos para rebater qualquer projecto, afirma que ele está incompleto, que não é global, que não diz tudo, etc., etc. Fala de projectos globais, fala sei lá de quê, fala de revolução cultural, fala do que ainda falta fazer, mas foge, de facto, à responsabilidade de tomar a opção concreta no momento concreto, ou melhor, toma a opção votando contra o que
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não provém do seu Governo, ou das bancadas da maioria que apoia.
Pelo nosso lado, é certo, e já tive oportunidade de aqui o dizer, que o projecto de lei em análise carece de melhorias, carece de clarificação em vários pontos, mas é também certo que ele não deixa de ser, por isso, uma medida positiva, marcadamente moralizadora e dignificante dos profissionais da informação e da sua actividade.
Certamente, em sede de discussão na especialidade em comissão, se tal for consentido pela votação da maioria «AD», haverá oportunidade de alterar, de melhorar, de modificar o diploma em causa.
Srs. Deputados, o resto está feito. Está nas vossas mãos a decisão.
Pelo nosso lado já optámos - votaremos a favor do projecto de lei n.º 129/II, porque defendemos a liberdade de informação e os direitos dos jornalistas e porque não aceitamos a sua utilização como meros joguetes de circunstância.
Esta a razão fundamental do nosso voto favorável.
Aplausos do PCP, da UEDS, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A União Democrática Popular votará favoravelmente o projecto de lei n.º 129/II, da ASDI, que introduz alterações à Lei n.º 62/79 e em cuja inicial e aprovação a UDP se empenhou de forma decidida, na medida em que considera que o mesmo procura dar maior conteúdo prático às garantias já enunciadas na referida lei.
Na verdade, pese embora as repetidas afirmações do reconhecimento pelo trabalho e independência dos jornalistas, ao que assistimos, na prática, é ao total esvaziamento desses direitos dos profissionais da informação pela não existência de garantias que permitem o livre exercício desses mesmos direitos.
Julgamos, pois, que, mais importante do que enaltecer as virtudes e os sacrifícios da profissão, importa mais garantir que a mesma possa ser exercida em efectivas condições de independência.
Mais importante que apelar ao esforço dos jornalistas na procura da isenção e da objectividade, é necessário, primeiro que tudo, que o seu trabalho seja respeitado e garantir as condições materiais, humanas e profissionais que permitam essa mesma isenção e objectividade.
Nesse sentido, o projecto de lei n.º 129/II, apresentado pela ASDI, dá um sério contributo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A função dos jornalistas na sociedade .portuguesa, sobretudo após o 25 de Abri, não pode ser encarada apenas na perspectiva exclusiva dos salários que auferem, mas sobretudo na da actividade eminentemente social que a mesma desempenha, com toda a sua complexidade e responsabilidade.
Acontece, porém, que no nosso país o salário da grande maioria dos jornalistas, mesmo daqueles com dezenas de anos de profissão, que optaram pelo exercício exclusivo dessa mesma .profissão, é manifestamente insuficiente. E da exiguidade do salário, confrontado com o crescente aumento de custo de vida.
E da ameaça dos contratos a prazo à tentação ou necessidade de um segundo emprego vai um pequeno passo, que, a ser dado, acarreta um inevitável agravamento das condições de trabalho e prejudica, necessariamente, um maior empenhamento dos jornalistas em áreas para as quais estavam verdadeiramente vocacionados.
É necessário hoje - sempre o foi, aliás - permitir aos profissionais da comunicação social um sério esforço de formação e aperfeiçoamento profissional e de reciclagem, mas a adesão dos jornalistas a tais propostas não pode ser uma imposição vinda do exterior da classe, mas tão-somente a derivada de um ajustado enquadramento profissional, orientado pela classe dos profissionais da informação e pelo Sindicato dos Jornalistas.
Quanto às garantias de independência de que devem gozar os jornalistas, e também aqui sempre exigidas por todos os deputados, importa lembrar mais uma vez os factos mais do que julgar das intenções.
Recorde-se, a propósito, as agressões de que foram alvo inúmeros jornalistas que faziam a cobertura das campanhas eleitorais, e em especial aquela de que foi alvo o jornalista Humberto Marcos, do Diário de Lisboa, perante a complacência de dirigentes da «AD».
Recorde-se, igualmente, as constantes medidas de intimidação e de desrespeito pelo exercício da profissão de jornalista por parte das autoridades policiais, que, mesmo depois de identificados, viram os seus instrumentos de trabalho destruídos e impedidos de prosseguir no seu trabalho, e muitas vezes mesmo presos, sem que os responsáveis por tais actos, mesmo claramente identificados, tenham sido até agora responsabilizados pelas suas acções criminosas.
A independência da actividade dos jornalistas só pode ser alcançada se lhes forem garantidas a segurança no trabalho, a estabilidade do emprego e uma remuneração compatível com a importância, a responsabilidade e os riscos da sua profissão, se forem eles próprios a definir a orientação e o funcionamento do órgão de comunicação social, nomeadamente na escolha democrática do director.
E isto para a imprensa, rádio e TV, privadas e nacionalizadas. Se para as empresas privadas se torna, hoje, mais difícil obter as garantias acima expressas, no caso das estatizadas nada obsta, a não ser a vontade política dos governantes, que se tem revelado totalmente contrária.
Como pode ser defensável que um director nomeado pelo Governo, parte das vezes com a oposição do conselho de redacção - o que legalmente devia equivaler a um veto -, possa dar garantias de melhor servir o público do que um director escolhido pelos próprios jornalistas e de entre os seus pares? Quem tem capacidade para apreciar das qualidades profissionais e de direcção de um jornalista: o Governo, através das suas antenas administrativas, ou os próprios jornalistas?
O Estado deve funcionar, nos órgãos estatizados, como suporte material da actividade dos jornalistas, e estes defendidos de qualquer prepotência ou arbitrariedades por parte daquele. Se não for a grande maioria dos jornalistas, organizados como classe e por local de trabalho ou sector, a definir os critérios deontológicos, de qualificação e capacidade, as normas e processos de formação profissional, as formas de
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actuação e abordagem dos assuntos, dos factos, da vida, se não forem eles próprios a garantir - o direito à iniciativa e à criatividade e a impor o justo respeito pelo rigor da informação, quem o poderá fazer? Um qualquer senhor «nomeado»? Um fiscal? E por que não a polícia ou a comissão de censura?
A importância da informação e da comunicação social impõe que nelas se adoptem desde já critérios de independência, liberdade, democracia e responsabilidade que desejaríamos ver de facto consagrados para todas as profissões.
É por eles que todos os trabalhadores lutam e foi nesse sentido que o 25 de Abril apontou.
No entanto, o recuo do movimento popular leva-nos a constatar que grandes dificuldades foram levantadas, quando não desferidos ataques -criminosos e violentos, ao desenvolvimento de estruturas que correspondam à vontade e interesse dos trabalhadores. Por isso, eles lutam. Neste campo, o projecto de lei em apreciação tem méritos incontestáveis.
Os jornalistas, funcionando a um nível mais sensível e também mais sensibilizador da opinião pública, podem e devem lutar por que, no exercício da sua profissão, sejam desde já reconhecidos, sem hesitação, todos os direitos que a Constituição e o seu próprio Estatuto lhes conferem.
A sensibilidade do sector dificulta, até certo ponto, ao Governo e aos seus apoiantes a afirmação inequívoca daquilo que efectivamente pretendem, sendo obrigados a actuar pela sorrelfa, demagogicamente e de forma golpista para impor a orientação política com a censura e a rolha.
Deve ficar bem claro que não é por se ser governo que se detêm os critérios da objectividade. O Poder, e só por isso o é, detém a máquina, o dinheiro, a repressão, para a sua própria preservação. Quando muito, são estes os vectores que definem a sua objectividade.
O mesmo facto é sempre visto de, pelo menos, dois pontos de vista. Proença de Carvalho fará dizer ou mostrar ou insinuar que, por exemplo, Krus Abecassis é um novo Péricles e criará dificuldades a quem não esteja disposto a fazê-lo. Pelo contrário eu diria que a sua (política e um acervo de crimes contra a cidade viva de Lisboa, um absurdo, uma negociata pegada para os especuladores e uma violenta agressão contra os interesses do povo de Lisboa. Os factos, os mesmos. As torres de Alcântara, o luna-parque no Jardim Zoológico, as Amoreiras, a venda do Martim Moniz, o jardim da Gulbenkian, a feira de Belém, etc.
Onde a verdade?
Certamente nos factos. Nos factos, que, no entanto, têm uma incidência e um efeito para os todo-poderosos e outro, totalmente contrário, em relação ao cidadão comum.
São, pois, os jornalistas, trabalhando com todas as garantias de liberdade e independência, responsáveis perante a classe, perante o público e perante os instrumentos democráticos constitucionalmente consagrados, formados em escolas por eles próprios controladas enquanto alunos e enquanto classe de trabalhadores, que darão a garantia da objectividade democrática, a objectividade científica, a objectividade assente no sentir e no compreender o pulsar da sociedade e a sua dinâmica para a frente, para o progresso e para o futuro.
Contra isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, estão as forças mais reaccionárias da sociedade: o capital, o Governo, a «AD».
Por isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, está a esmagadora maioria dos jornalistas, os trabalhadores em geral, as forças democráticas e progressistas.
Aplausos do Sr. Deputado António Arnaut (PS) e da Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura (MDP/CDE).
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que poderei já neste momento fazer um breve balanço do debate e com a minha intervenção terminar a série de intervenções.
Creio que logo no momento da apresentação do projecto de lei ficou patente o essencial do debate: discutiu-se se se trataria ou não da concessão de um privilégio a uma classe profissional, discutiu-se se não seria melhor que a situação fosse resolvida a nível contratual, falou-se da formação profissional e de outras coisas. Creio que tudo isto é importante e que é especialmente importante na medida em que revela o que claramente se encontra em discussão.
Direi, Sr. Presidente, e Srs. Deputados, que a concepção conservadora-liberal do Estado e da sociedade assenta em que a solução dos problemas se há-de encontrar sempre pelo equilíbrio, pela harmonia natural resultante do encontro entre as partes. Se aos trabalhadores se confere qualquer regime especial, rompe-se o equilíbrio. A lei do mercado deve funcionar tanto no que diz respeito aos salários como quanto às condições de trabalho. Haverá luta, o Estado é um simples espectador, quando muito um árbitro preocupado com uma única regra: a liberdade presumida de todos os protagonistas, ou, numa imagem sugestiva de um constitucionalista: o Estado garante o policiamento exterior, prepara a arena e, se for preciso, retira os cadáveres.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que é isto que está em causa na discussão do diploma. São, no fundo, duas concepções de sociedade e de Estado que aqui se debatem. A nossa é a de que o Estado tem não só o direito como o dever de intervir em todas as situações em que os abusos da liberdade podem prejudicar a própria liberdade.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Podemos ir bastante longe e bastante classicamente, podemos ir tão longe e tão classicamente como citar Leão XIII e a Rerun Novarum quando defendia que o pobre sem riqueza seja posto a coberto das injustiças e conte sobretudo com a protecção do Estado. O Estado deve, pois, rodear de cuidados e de uma solicitude muito especial os trabalhadores que pertencem à multidão dos deserdados.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a intervenção do Estado se justifica tanto mais amplamente quando neste caso são os próprios direitos, liberdades e garantias que estão em causa, porque não está em causa, como se disse logo de entrada, a situação de uma classe profissional, mas o direito de uma socie-
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dade, o direito da sociedade, a ser informada, o seu direito à informação, que faz parte dos direitos, liberdades e garantias, e, como tal, é matéria que, pela alínea c) do artigo 167.º da Constituição, está reservada à competência desta Assembleia da República.
Diria, Sr. Presidente, que todas as outras afirmações que foram feitas não têm senão a importância e o interesse de procurarem ser portas falsas descobertas para evitar confrontalidade, enfrentar os problemas causados por um projecto de lei tão simples e tão pouco inovador como o que está em discussão.
É que, na verdade, formação profissional, pois com certeza. Mas que sentido tem, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a formação profissional de um jornalista que dedicasse também o tempo do seu trabalho a essa formação profissional para no fim ser sujeito a um qualquer contrato a prazo que o despedisse a si e mais à sua formação profissional sempre que ele não obedecesse às directrizes do poder político ou da administração da sua empresa de comunicação social?
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Ou querer-se-á também um regime de formação profissional a prazo, que seria o mais consentâneo com a contratação a prazo?
Fala-se da dignidade da profissão. Eu preferiria falar do respeito pela profissão. O respeito pela profissão implica que não a manipulemos, que não a usemos e que sejamos capazes de, muito pelo contrário, pôr cobro às manipulações e aos usos e abusos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os despachos do Sr. Secretário de Estado, que foram aqui citados, são naturalmente importantes, mas são naturalmente também limitados. Como tive ocasião de apontar, e isso ficou sem resposta, se esses despachos ficarem isolados, creio bem que se criará uma situação, essa, sim, de privilégio, visto que haverá dois regimes e duas medidas: uma para a imprensa e para os meios de comunicação social estatizados, sujeitos uma vez mais a mais obrigações do que o conjunto da informação social, e outra para os restantes meios de comunicação social, e esses nem despachos normativos poderão ter e continuarão a contar com toda a liberdade de actuação e com toda a sua possibilidade de contratação a prazo.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, chegou-se ao ponto de se sugerir que no projecto de lei que tão simplesmente apresentámos haveria uma desconfiança em relação à capacidade profissional dos jornalistas. O que há, e muito clara, é uma desconfiança em relação à capacidade de manipulação das empresas, e por isso é que se lhe proíbe que nos períodos eleitorais e pré-eleitorais admitam candidatos ao exercício da profissão, porque, ao contrário do que foi dito, a candidatura à profissão não está sujeita a nenhum controle sindical ou profissional.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Creio que se tentou aí mistificar esta Assembleia e creio que uma afirmação dessas não pode passar em claro, porque ela é nitidamente desmentida pela realidade e pelos factos.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, creio que também foi dito, e muito claramente, que o projecto de lei tão pouco inovador era apenas a resolução de alguns casos particulares, que era apenas a resolução de um pequeno problema. E é verdade que sim.
Lembro-me de que António Sérgio, que muitas vezes gostamos de citar, dizia que «é precisamente cuidando de casos particulares, remediando males particulares, que se aperfeiçoa uma sociedade. O democrata distingue-se do não democrata, entre outras coisas, porque o primeiro não entende fazer do mal de cada um a bondade geral».
Para terminar, gostaria de dizer que a reprovação de um diploma da natureza daquele que estamos a discutir não seria de facto um benefício para os jornalistas. A eles, melhor do que eu, caberá responder. A não ser esses tais jornalistas a martelo, de que noutro dia se falava e de que hoje - e ainda bem - se evitou falar; só esses poderão estar interessados na derrota de um diploma como o que está em discussão.
O que eu não quereria era deixar de dizer que o que não é sequer tolerável é que se procure justificar uma tomada de posição que tem intuitos claros de conseguir a manutenção de formas de dependência dos profissionais da informação, porque essas formas de dependência convêm aos poderes estabelecidos, que se procure mascarar isso sob a forma de interesses dos trabalhadores.
É a mesma coisa que, quando nos tais tempos do liberalismo, se dizer que ao magro lucro que o pobre espera do seu sacrifício serve de álibi para o enriquecimento que o rico retira da colocação do seu supérfluo».
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não vale a pena - e não vale no sentido de que é pura mistificação - confundir os reais interesses de qualquer classe profissional, pôs essa, sim, quererá sempre velar pela sua independência, porque ninguém gosta de estar subjugado. É confundir os interesses de qualquer classe profissional, como é confundir os interesses de uma sociedade que tem direito a ser informada com verdade e com objectividade e, para que o seja, precisa da independência dos profissionais da informação, dizer que isso é de alguma maneira limitar essa independência. Sejamos sinceramente pela dignidade, pela dignificação, de uma profissão. Respeitemos essa profissão, e para isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é preciso que terminem todas as formas de dependência, para isso é preciso que os contratos a prazo nos meios de comunicação social terminem, e desde já.
Aplausos da ASDI, do PS, do PCP, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais intervenções, passamos à votação na generalidade do projecto de lei n.º 129/11, sobre o reforço das condições de independência da actividade dos jornalistas, apresentado pela ASDI.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos a favor do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP e com votos contra do PSD, do CDS e do PPM.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, interrompemos os trabalhos durante uma hora e trinta minutos para o jantar e recomeçamos a sessão às 21 horas e 30 minutos.
Está suspensa a reunião.
Eram 20 horas.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 22 horas.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Odete Santos.
A Sr.ª Maria Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao votar favoravelmente o projecto de lei n.º 129/II, o PCP defendeu, na verdade, algumas das; condições basicamente necessárias para a existência de jornalistas livres, de uma informação livre.
Ao votar favoravelmente o projecto de lei discutido, o PCP reafirmou, mais uma vez, a necessidade de os jornalistas da informação não serem a voz do dono, a necessidade de legislativamente se instituírem alguns dos meios essenciais para que se realize um dos princípios básicos da democracia.
Votar a favor da extinção de contratos a prazo foi o mesmo que defender a dignidade do jornalista, defendê-lo da sua manipulação pelos órgãos do Poder.
O voto favorável a um projecto de lei que proíbe a admissão de candidatos em períodos eleitorais e pré-eleitorais significa a defesa da legalidade democrática.
A aprovação do projecto de lei seria uma garantia de que os órgãos de comunicação social, em períodos em que deles especialmente se exige informação livre, seria a garantia, dizíamos, de que não sucumbiriam às ameaças do Poder.
O voto favorável do Grupo Parlamentar do PCP, não obstante a necessidade de se aperfeiçoar e clarificar o projecto, foi o reconhecimento da importância dos jornalistas, da informação, na defesa do futuro da democracia.
Votar contra o projecto de lei, como o fez a AD, não foi mais do que defender, com unhas e dentes, a todo o custo e sem qualquer fundamentação, os atropelos praticados pelos órgãos do Poder na comunicação social.
Na verdade, não pode ser fundamentação dizer-se que os contratos a prazo surgem por serem proibidos os despedimentos sem justa causa; não pode ser fundamentação dizer-se que os contratos a prazo surgem para obviar ao desemprego - já ouvimos isso a outras pessoas, noutros locais ...
O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Se calhar foi em Kabul!
A Oradora: - ... que eram grandes empresas; não há fundamentação quando se deixa sem resposta o ponto fundamental que é responder à pergunta: quais são as actividades em relação às quais se justifica, na imprensa, a existência de contratos a prazo?
Votar contra, como fez a AD, não foi mais do que a reafirmação do propósito de manipular a informação, constantemente, g (c)m especial em períodos eleitorais e pré-eleitorais, não foi mais do que evidenciar o desespero sentido quando a verdade chega ao povo.
Votar contra, como fez a AD, não foi mais do que a reafirmação, por parte da maioria, da sua inabalável vontade de manter na informação um clima repressivo e um clima de mediocridade.
Nesta votação, o voto contra da maioria surge sem qualquer fundamentação válida, não conseguindo disfarçar os verdadeiros propósitos que por detrás deste se escondem.
Com os votos expressos ficou bem demonstrado quem pretende a asfixia da verdade, quem pretende parar o curso irreversível da história.
Quanto a nós, votámos pelo futuro, pela liberdade, votámos por quem sempre nos acompanhou na luta - a democracia.
Aplausos do PCP, da UEDS e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Não havendo mais declarações, de voto, passamos ao ponto seguinte da ordem de trabalhos, do qual consta a ratificação n.º 28/II - Decreto-Lei n.º 488/80, de 17 de Outubro, que reestrutura a Comissão Regional de Turismo do Algarve, apresentada pelo PS.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.
Neste momento toma lugar na bancada do Governo o Sr. Secretário de Estado do Turismo (Alcino Cardoso).
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedimos a sujeição a ratificação deste diploma por entendermos que é passível de variadas críticas, devendo merecer, por parte desta Câmara, uma reprovação bem clara.
O Algarve e os Algarvios são, desde sempre, uma região e uma população com características bem vincadas, das quais deve destacar-se um acrisolado amor à liberdade, uma grande coerência de princípios e um grande sentimento de independência em relação aos poderes centrais.
A Comissão Regional de Turismo do Algarve foi um órgão que causou muita polémica quando foi criado, tendo na altura provocado graves divergências, mesmo no seio do governo de então. Essa Comissão aparece no início do diploma que a constitui como um órgão de desconcentração administrativa, embora sob férreo controle do Governo Central. Com o 25 de Abril, a Comissão Regional de Turismo do Algarve não escapou às vicissitudes que a Revolução trouxe à nossa Administração Pública e desde logo se preparou uma revisão exaustiva do seu estatuto.
Este estatuto, desde os primeiros tempos, foi pensado como devendo ser reformulado no âmbito do processo de descentralização que a democracia trouxe a Portugal.
Em 1979, a Lei das Finanças Locais atribuiu aos municípios o produto integral das receitas derivadas da cobrança do imposto de turismo, que era uma das principais receitas da Comissão Regional de Turismo do Algarve. Essa lei e essa norma vieram pôr em causa as principais receitas dessa Comissão. Acontece que logo em 1979 o Governo Central levantou sérios
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problemas à questão do financiamento da Comissão Regional de Turismo do Algarve e, alegando dificuldades orçamentais, o Governo negociou com os municípios do Algarve uma fórmula que permitisse às autarquias serem elas a financiar, em larga medida ainda, a Comissão Regional de Turismo, cobrindo o Governo o restante que porventura viesse a ser necessário.
É evidente que se as autarquias financiavam com receitas próprias a Comissão Regional de Turismo do Algarve, assista-lhes - que mais não fosse, pelo menos a esse título - o direito de controlarem, de terem uma vigilância, um poder de intervenção, pelo menos indirecto, sobre a forma como essas receitas iam ser utilizadas na região.
E o governo de então - o V Governo Constitucional - achou uma fórmula que nos parece correcta: tratava-se de uma fórmula que equilibrava a necessária descentralização com a também necessária capacidade de intervenção do Governo Central. Por essa fórmula, o Governo Central nomearia o presidente da Comissão Regional de Turismo do Algarve de entre os nomes que lhe tossem propostos peia assembleia distrital. Nessa medida, as câmaras municipais aceitavam comparticipar em pelo menos 50 % do imposto de turismo para financiar a Comissão Regional de Turismo do Algarve. E as coisas corriam aparentemente bem...
Porém, veio o VI Governo Constitucional e as coisas passaram a correr mal. Esse governo pôs cá fora um diploma - o diploma que está agora sob discussão - que, de tacto, é um diploma profundamente centralizador e que, além disso, transforma um acordo temporário - que era a participação das câmaras municipais nas receitas da Comissão Regional de Turismo do Algarve - numa obrigação ordinária, para a qual não assinala nenhum prazo visível nem qualquer intenção de lhe pôr fim. Portanto, revoga, nesse aspecto, a Lei das Finanças Locais, chama a si todos os poderes, altera profundamente a composição dos órgãos da Comissão Regional de Turismo do Algarve e introduz, a título de compensação, uma norma segundo a qual o presidente da Comissão Regional seria nomeado pelo Secretário de Estado do Turismo, pelo Governo, ouvido o Conselho Regional, no qual o Governo, com muita falta de pudor, se assegurou previamente daquilo que pensava ser uma maioria certa e segura. O Governo calculou, a régua e esquadro, com uma larga margem de disponibilidade - segundo o Governo -, a composição desse Conselho Regional, de modo a retirar às câmaras municipais o seu poder de decisão, e põe, nesse Conselho, uma lista infinita de pessoas representando Ministérios, Secretarias de Estado, direcções-gerais, alfândegas, associações patronais e sindicatos, que à partida lhe asseguraria sempre o voto concordante com as suas posições, uma vez que, como é evidente, os representantes dos Ministérios e Secretarias de Estado não são procuradores; são verdadeiros núncios que levam lá uma ordem que lhes é dada, não votam em liberdade, não são pessoas que vão a uma reunião desse órgão para discutir e votar, vão sim «levar a carta a Garcia» - neste caso vão «levar a carta aos Algarvios».
Mas o Governo, apesar de todas estas cautelas, enganou-se. E foi ouvido o Conselho Regional, aliás com uma falta de delicadeza, de diplomacia e de correcção democrática que urge reprovar e denunciar, porque o decreto-lei do Governo diz que o Ministro nomeará, ouvido o Conselho Regional - o que pressupõe, se o português não me escapa, que o Governo primeiro ouve e depois nomeia. A verdade é que, relativamente à Comissão Regional de Turismo do Algarve, o Governo, de facto, não nomeou primeiro, mas disse à comunicação social que já tinha escolhido o seu presidente - disse o nome, disse tudo, e depois dignou-se ouvir, dignou-se cumprir, aquilo que lhe parecia ser um mero pró-forma.
Reunido o Conselho Regional, cujo presidente em vez de ser eleito pelo Conselho foi designado, por telex, pelo Sr. Secretário de Estado, que designou de Lisboa quem devia presidir ao Conselho - o que é outra norma democrática curiosa e inovadora neste nosso já conturbado a PREC» da direita -, ...
O Sr. José Vitorino (PSD): - Só cá faltava essa!
O Orador: - ...a verdade é que, com surpresa geral, o Conselho Regional «chumbou os olhos e os ouvidos do imperador». E o Governo ficou um pouco atrapalhado. Mas compromissos são compromissos - compromissos entre cavalheiros -, tanto mais que, tendo cabido ao CDS a partilha do turismo do Algarve, a AD, sob pena de pôr em causa outros lugares - quem sabe se o de Presidente da Assembleia da República, quem sabe se o de Provedor de Justiça, quem sabe se ainda mais pastas -, teve de manter para o CDS o lugar de presidente da Comissão Regional de Turismo do Algarve.
Risos do PSD.
Deve dizer-se, em abono da justiça, que o presidente nomeado, contra a vontade do Conselho Regional, tem a seu favor muitas coisas: uma delas é que ninguém sabe nada dele e, portanto, ninguém lhe aponta nada - é um perfeito desconhecido.
Risos do PS, do PSD e do CDS.
Em segundo lugar, é um homem que no sector de turismo tem um curriculum positivo: o único acto que fez até aqui foi tomar posse.
Risos do PS, do PSD e do CDS.
Em terceiro lugar, é um homem correcto, simpático e, como pessoa, é de bom trato. Portanto, está perfeitamente recomendado para o lugar de presidente da Comissão Regional de Turismo do Algarve.
É por estas razões, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que nós nos atrevemos mais uma vez, não tanto para bradar ao País - que tem as costas largas -, mas para bradar a estes nossos colegas, que estão tão desassossegados e que lhes pesa tanto a consciência, que talvez seja bom pensar-se nas campanhas eleitorais que se fazem falando a torto e a direito de descentralização, dizendo respeitar sobretudo a vontade das populações locais quando um partido que esteve aqui na oposição há uns anos - poucos, infelizmente -...
Risos do PSD e do CDS.
...e que aqui gritou sistematicamente que era pelo Poder Local que votou por unanimidade, com esta
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Assembleia, a Lei das Finanças Locais um partido que faz questão de dizer que é um partido democrático - embora às vezes custe a acreditar -. ...
Vozes do PSD: - Não apoiado!
O Orador - ..., esse partido não terá em qualquer parte menos visível um sino que toque a rebate e que lhes diga: Srs. Deputados, vamos a ter consciência, vamos a respeitar a palavra que demos, vamos a não quebrar compromissos políticos, vamos emendar aquilo que está mal!?
Esta lei, Srs. Deputados, 6 um aborto que ou os senhores a emendam, ou vos rebenta na cara.
Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agendado para ter lugar nos princípios de Janeiro, este debate sobre o Decreto-Lei n.º 488/80, que reestrutura a Comissão Regional de Turismo do Algarve (CRTA) só hoje, passados dois meses, finalmente se inicia.
Durante esta tão longa espera, que fica a dever-se, fundamentalmente, primeiro, à interrupção provocada pela discussão do Programa do Governo e, depois, a um adiamento pedido pela bancada do PSD, não se pouparam as entidades governamentais em dar todo o gás à execução do Decreto-Lei n.º 488/80, procurando assim produzir efeitos que tornassem mais difícil a sua revogação ou até a introdução de alterações que o modificassem substancialmente.
O que sucedeu, entretanto, é que o debate que não se fez na Assembleia da República tem estado a fazer-se lá fora, tem estado a fazer-se no Algarve, com a participação das autarquias, dos sindicatos mais interessados e da imprensa algarvia, e dele resulta vivamente demonstrado que o diploma em apreço não serve o turismo, não serve o Algarve e não serve o País.
Os factos ocorridos nestes dois meses, incluindo os resultantes de iniciativas governamentais, longe de favorecerem, mais comprometem o Decreto-Lei n.º 488/80 e a postura da AD nesta questão.
Neste sentido é particularmente esclarecedor o que se passou até agora com a nomeação do novo director da CRTA, o Dr. Baptista Coelho, coordenador geral do CDS no Algarve e administrador da Lusotur, Vila Moura.
Uma voz do CDS: - Coordenador geral?
O Orador: - Sr. Deputado, se não é coordenador geral é presidente da comissão distrital. Mas V. Ex.ª depois esclarece.
Vozes do CDS: - Afinal, vê como sabia...
Risos.
O Orador: - O Conselho Regional de Turismo, já constituído segundo o figurino centralizador do Decreto-Lei n.º 488/80, rejeitou mesmo assim, por 15 votos contra 14, em 21 de Janeiro passado, o nome do Dr. Baptista Coelho, proposto pelo Ministério do Comércio e Turismo, para presidente da CRTA.
A propósito desta rejeição, que exprime o ponto de vista prevalecente no Conselho, de que o presidente da CRTA deve ser um técnico de turismo e apartidário, que não é o caso do Dr. Baptista Coelho, uma declaração de voto subscrita por autarquias assinalava ainda: ao resultado devesse à falta de critério utilizado na designação da personalidade que iria presidir à Comissão Regional de Turismo do Algarve e à não auscultação prévia das autarquias como legais representantes do povo algarvio».
Perante tão clara e fundamentada rejeição por parte dos representantes dos mais genuínos e legítimos interesses algarvios, e feita nos próprios termos do Decreto-Lei n.º 488/80, o Governo fez-se surdo e desentendido, manteve escandalosamente a nomeação de Baptista Coelho e deu-lhe posse na -passada sexta-feira, dia 20 de Fevereiro.
Ficou assim demonstrado de uma penada que, para o Governo, quem tudo decide no novo regime da CRTA é o Poder Central, e foi posto a claro ao mesmo tempo que o quo a AD pretende com o novo diploma e o novo presidente não é servir o País, o Algarve ou o turismo, mas tão-somente fazer o serviço de mesquinhos interesses partidários e de grupos económicos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É esta a terceira vez que a questão da Comissão Regional de Turismo do Algarve vem ao Plenário da Assembleia da República no curto período de dois anos.
O relevo parlamentar que as circunstâncias têm conferido à CRTA não acontece, evidentemente, por ser esta a questão chave da situação algarvia, que não é, tão-pouco, a questão chave do turismo algarvio, apesar do papel muito importante que em relação a este pode e deve desempenhar.
A atenção que a Assembleia tem feito incidir sobre a CRTA também não resulta de se estar num processo de concretização de boas soluções que exigisse novo acompanhamento parlamentar e novas disposições legislativas, como seria para desejar, tanto mais que a Assembleia da República definiu há dois anos as suas posições nesta matéria, no desaparecido Decreto da Assembleia da República n.º 262/I.
De nada disto se trata.
E, no entanto, o debate que hoje nos ocupa é de uma grande importância para o turismo algarvio e para o Algarve, para o turismo em Portugal e para os interesses nacionais.
A chamada a ratificação do Decreto-Lei n.º 488/80, de 17 de Outubro, requerida pelo Grupo Parlamentar do PS, faz parte, como se confirma pelas alegações que acabamos de ouvir ao Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, da mesma batalha que aqui travámos em 1979 em torno da chamada a ratificação ao Decreto-Lei n.º 14/79, então requerida pelo Grupo Parlamentar do PCP.
Os propósitos do governo Sá Carneiro/Freitas do Amaral ao legislar em 1980 em matéria da CRTA foram exactamente iguais aos propósitos do governo Mota Pinto quando sobre ela legislou em 1979, só que mais descarados.
Para o executivo Sá Carneiro/Freitas do Amaral, como antes mais veladamente para o executivo Mota Pinto, o objectivo foi repor abertamente as estruturas, as concepções, os critérios, os métodos, pelo que se vai vendo, também os homens, que vigoravam durante
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o regime fascista para o turismo algarvio, e colocai tudo isso ao serviço dos mesmos grandes interesses hoteleiros e outros, dotando-os dos mesmos magestáticos antigos privilégios e assegurando-lhes os mesmos gigantescos negócios.
ozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Tal é o sentido político essencial do Decreto-Lei n.º 488/80, de 17 de Outubro.
O diploma do I Governo da «AD» sobre a CRTA é manifestamente, sob a capa da alegada regionalização do turismo, uma lei de recuperação centralizadora:
Não toma minimamente em conta os imperativos constitucionais em matéria de descentralização e regionalização;
É um produto da ordem constítucional de 1933, do Código Administrativo de Marcelo Caetano, da famigerada Lei de Bases n.º 2082, de todo o espírito e de quase toda a letra do Decreto-Lei n.º 114/70;
Subalterniza as autarquias colocando-as em minoria em todos os órgãos e negando-lhes qualquer verdadeira capacidade de intervenção que não seja o pagamento do serviço;
Viola a Lei das Finanças Locais.
A CRTA configurada pelo Decreto-Lei n.º 488/80 é um mero organismo desconcentrado da Administração Central, uma emanação pura a simples do Poder Central concebida à margem de qualquer ideia de participação democrática das autarquias.
Neste sentido, o diploma da «AD» sobre a CRTA vai ao ponto de agravar as soluções do Decreto-Lei n.º 14/79 relativamente aos órgãos (dignação do presidente, por exemplo) e manifesta o mais soberano desprezo pelo debate parlamentar sobre a ratificação desse decreto do governo Mota Pinto, bem como pelas soluções encontradas pela Assembleia da República em 1979 sobre a composição dos órgãos e sua designação, as garantias de cumprimento da Lei das Finanças Locais e o financiamento da CRTA.
Voltemos a pegar, pela importância que já se viu ter em tudo isto, no processo de designação do presidente da CRTA. O Decreto-Lei n.º 14/79 estabelecia que as câmaras municipais eram ouvidas antes da sua nomeação pelo Secretário de Estado do Turismo. A Assembleia da República entendeu, porém, que era insuficiente a -possibilidade de condicionamento assim reconhecida às autarquias e por isso o decreto que aprovou em 1979 determinava que o presidente da CRTA seria nomeado peto Secretário de Estado de entre três nomes propostos pela Assembleia Distrital de Faro.
Nos antípodas das preocupações descentralizadoras evidenciadas no decreto da Assembleia da República e do relevante papel que este atribuía ao Poder Local, a AD, no seu Decreto-Lei n.º 488/80, procura reduzir a zero qualquer possibilidade de condicionamento por parte das autarquias da nomeação do presidente do CRTA, entregando a audição a um órgão - o Conselho Regional - onde as autarquias são colocadas em minoria e onde a maioria está nas mãos dos representantes da Administração Central e das entidades patronais.
Apesar de todas estas cautelas do legislador, o escolhido presidente da CRTA e, não o esqueçamos, destacada figura do CDS e da grande hotelaria, foi chumbado pelo Conselho Regional, o que força o governo Pinto Balsemão a revelar esta coisa espantosa - que é a que não pode escolher outro que não seja o Dr. Baptista Coelho.
Quem o impõe? É caso para perguntar.
Só por um estranho impedimento é que se pode admitir que o Governo reduza a menos que nada a consulta prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 488/80 e afronte de maneira tão insultuosa os votos e os argumentos dos representantes do Algarve no Conselho Regional.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Tudo indica que o Decreto-Lei n.º 488/80, além de tudo que dele já dissemos, é também um fato feito por medida. Oito de outra maneira: estamos perante um caso em que, primeiro, por acordos e compromissos interpartidários e outros, foi encontrado o homem e feita, depois, a lei para consagrar os interesses e as actuações que ele representa. E assim que uma das principais inovações deste diploma da «AD» é a atribuição da categoria de órgão, com latos poderes, ao presidente do Conselho Regional de Turismo.
Escrevendo há tempo sobre o presidente da CRTA, como ele era no estatuto do antigo regime, quando ainda não tinha a categoria de orgão, já o nosso colega e ilustre algarvio Almeida Carrapato lhe chamava «omnisciente e omnipotente». Com o estatuto actual e o presidente actual o menos que se pode dizer é que a AD quer fazer um vice-rei para o turismo no Algarve.
Vozes do PS: - Muito bem!
Risos do PCP.
O Orador: - No seu conjunto, o Decreto-Lei n.º 488/80 consagra uma política de turismo que do regionalização só tem o nome. E o regresso, no essencial, à filosofia da base da Lei de Salazar n.º 2082. que se transcreve:
1. Incumbe ao Estado, por intermédio dos órgãos centrais competentes e em colaboração com os órgãos locais, promover [...]
2. Para tanto, compete-lhe orientar, disciplinar e coordenar os serviços [...]
Estamos afinal perante a tentativa da consolidação (através da norma remissiva do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 488/80) do domínio pleno das soluções prevalecentes no regime fascista.
O Estado irá «auxiliar a iniciativa privada» (base I da Lei n.º 2082), irá até participar em sociedades turísticas (artigo 3.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 488/80), garantirá o exclusivo das operações de licenciamento, acompanhamento e fiscalização das actividades e empresas turísticas [artigo 4.º, alínea e), do Decreto-Lei n.º 488/80].
O Poder Local é subtilmente metido em baias. E no mais verá o produto do imposto de turismo financiar a operação.
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O Decreto-Lei n.º 488/80 não visa a promoção da região do Algarve e a defesa dos seus interesses. Visa garantir a rentabilidade dos investimentos da iniciativa privada através de mecanismos adequados à «colaboração» da Administração Central e com o afastamento do Poder Local das decisões que lhe cabem, para evitar complicações.
O diploma da AD sobre a CRTA não é o instrumento necessário à concretização de uma verdadeira política de turismo; é, pelo contrário, uma ferramenta de promoção e cobertura da especulação turística, isto é, do turismo visto como negócio de pequenos encargos, de nenhuns riscos e de lucros fáceis, rápidos e grandes.
É uma lei que faz o jogo daqueles que há dois anos clamavam que o turismo só à margem do Estado se pode desenvolver, mas que agora, após a liquidação pela AD dos interesses estatais do sector, reclamam freneticamente a tutela do Estado para o crédito, as bonificações, as isenções, as infra-estruturas para as suas negociatas. Os mesmos ainda que reivindicam não estradas que conduzam ao Algarve mas estradas que conduzam aos seus hotéis; que reclamam saneamento básico não para as mais carecidas povoações algarvias mas para as imediações dos seus aldeamentos; que exigem modernos serviços de saúde não para as populações mais necessitadas mas para serem colocados às ordens dos seus turistas. No fundo, uma lei ao serviço daqueles que no Algarve e no turismo querem o regresso ao passado, que um meu correspondente de Vila Real de Santo António descrevia de forma sugestiva a propósito da barra do Guadiana.
Dizia ele desse tempo:
Enquanto na Assembleia Nacional fascista se apelava ao investimento no turismo, actividade de lucros fáceis e rentabilidade garantida, na barra do Guadiana as trameiras esperavam a maré com peixe a apodrecer, os pescadores perdiam horas de sono e arriscavam a vida, os armadores viam o peixe perder valor e as fábricas laboravam uma matéria-prima de baixa qualidade. Era o País que perdia.
Se até agora não se conseguiu modificar substancialmente este quadro desastroso, o Decreto-Lei n.º 488/80 e a política em que se inscreve, a vingarem, significam que dele não sairemos nos tempos mais próximos.
O turismo é, à margem de qualquer dúvida, uma grande riqueza do Algarve e uma grande riqueza do País que urge desenvolver com energia, determinação e inteligência. Para todos aqueles que se determinam pelo interesse nacional é flagrantemente dado que no Algarve como em qualquer parte o verdadeiro incremento do turismo só pode ser realizado no quadro de uma política de desenvolvimento regional integrado.
O desenvolvimento do turismo algarvio é solidário de uma política de combate às assimetrias entre o litoral e a serra e, dentro do próprio litoral, de uma enérgica política de defesa e aproveitamento dos recursos hídricos e de protecção das reservas naturais, do desenvolvimento da agricultura, das pescas e das conservas, da resposta enérgica às gravíssimas carências habitacionais, do incremento rápido da electrificação, do saneamento básico, dos transportes e da elevação da qualidade de vida das populações, da Tesa global dos interesses dos trabalhadores.
Uma política de turismo virada em cheio para a garantia dos interesses nacionais e o verdadeiro benefício das populações pressupõe descentralização e democratização, o que nas presentes condições do nosso país só é realizável com a crescente participação do Poder Local nas estruturas públicas do turismo e com a sua activa intervenção na definição e concretização das orientações oficiais em matéria turística.
O Decreto-Lei n.º 488/80 é o oposto desta política em todas as questões fundamentais, por isso lhe dizemos não e vamos votar contra a sua ratificação. Fazendo-o, porém, apresentamos muitas propostas de alteração, algumas coincidentes com o que a Assembleia da República aprovou em 1979, que representam no seu conjunto uma alternativa à CRTA que a AD quer colocar ao serviço dos grandes especuladores e da especulação - turística e que configuram uma outra CRTA, muito diferente, capaz de servir uma política de turismo a favor do nosso povo e do nosso país.
Aplausos do PCP, do PS, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira apresentou na Mesa um requerimento baseado no facto de o Sr. Deputado Cabrita Neto ter tomado posse, no passado dia 2 de Março, do lugar de vogal da Comissão Executiva da Comissão Regional de Turismo do Algarve, situação que, segundo o requerente, é incompatível com o exercício do mandato de deputado, pelo que o mesmo requer que se submeta a parecer da Comissão de Regimento e Mandatos. Aliás não haverá outro caminho a tomar, nos termos do artigo 45.º do Regimento.
O requerimento foi admitido e baixa à Comissão referida para obtenção de parecer.
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, se me permite gostaria apenas de fazer a seguinte correcção: e que, de facto, não é pelas razões que V. Ex.ª aduziu que considero a situação incompatível. Na verdade, é porque o Sr. Deputado Cabrita Neto é vogal designado e em representação dói Governo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem razão, Sr. Deputado. Posto isto, continua o debate.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Carrapato.
O Sr. Almeida Carrapato (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi pedida a sujeição a ratificação pela Assembleia da República, nos termos do artigo 172.º da Constituição, do Decreto-Lei n.º 488/80, de 17 de Outubro, que «estruturou a Comissão Regional de Turismo do Algarve - CRTA.
Cumpre apreciar o diploma publicado pelo Governo.
Embora enquadrada numa moldura de interesse nacional, a região turística do Algarve, criada pelo Decreto-Lei n.º 114/70, de 18 de Março, contém
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certa especificidade regional. Dai que a sua administração, agora reestruturada, devesse apontar para um certo grau de descentralização. Demais, tal solução seria a que maior paralelismo encontraria no texto constitucional. Efectivamente, o princípio de descentralização na Comissão Regional de Turismo do Algarve acertaria o passo pelo princípio, no plano mais amplo da Administração Autárquica, de descentralização administrativa, para que aponta o artigo 239.º da Constituição da República.
Seria de esperar que o articulado do decreto-lei em apreço se coadunasse mais com o princípio descentralizador. Mas não. Dir-se-ia que o diploma sujeito a ratificação só se preocupou com o poder local na medida em que lhe impôs encargos financeiros, na esteira do que já dispunha o Decreto-Lei n.º 502-D/79, de 22 de Dezembro, que cerceava o campo de aplicação do artigo 5.º, alínea a) n.º 4, da Lei n.º 1/79, de 2 de Janeiro (Lei das Finanças Locais).
A orientação centralista começa na enumeração que se fez dos órgãos da CRTA:
a) O presidente da Comissão Regional;
b) O conselho regional;
c) A comissão executiva.
Pela primeira vez na história da região turística do Algarve e da CRTA, o presidente da Comissão Regional é alcandorado ao nível de um órgão autónomo. Órgão singular que, pela sua competência, sobrepuja os demais órgãos da Comissão Regional, esses colegiais. Como não podia deixar de ser numa óptica centralista, o presidente, como órgão autónomo da Administração, é nomeado pelo Poder Central, mais concretamente pelo Ministro do Comércio e Turismo.
No Decreto-Lei n.º 114/70, de 18 de Março, os órgãos da Comissão Regional eram apenas dois, ambos de natureza colegial: o conselho regional e a comissão executiva.
O mesmo regime se manteve no Decreto-Lei n.º 14/79, de 6 de Fevereiro, apesar das anomalias nele contidas, por exemplo, a ofensa frontal à Lei das Finanças Locais, artigo 5.º, alínea a), n.º 4.º, consentida no aditamento que seria o artigo 21.º-A do Decreto-Lei n.º 114/70, sem revogar nem derrogar o artigo 21.º deste decreto-lei.
Só o Decreto-Lei n.º 488/80, de 17 de Outubro, em apreço, se atreveu a inovar no plano administrativo, elevando à categoria de órgão autónomo o presidente. Esta orientação presidencialista, contida no artigo 2.º, insere-se num propósito de ressequimento dos órgãos do Poder Local. É inspirada por uma política centralista.
Nota curiosa: enquanto o Decreto-Lei n.º 14/79, de 6 de Fevereiro, do IV Governo Constitucional, mandava o Ministro ouvir as câmaras municipais antes de nomear o presidente (que em si mesmo não era um órgão) do conselho regional - vide artigo 1.º daquele diploma -, o decreto-lei sub Júdice manda ouvir o conselho regional. Porquê a alteração? Porque o propósito é secar os órgãos do Poder Local, cuja filosofia política dominante no Algarve é conhecida. Ao Poder Central, avesso a descentralizar, é mais vantajoso substituir o parecer dos executivos municipais por um órgão em que detém posição maioritária, através dos representantes dos Ministérios, Secretarias de Estado e direcções-gerais que enxameiam o Conselho.
O que é preciso é pôr o Poder Local em minoria, mesmo num sector que directamente lhe respeita. Para tanto, é-se mais extensivo do que no decreto-lei do governo do Dr. Mota Pinto.
Somos, portanto, abertamente contrários aos artigos 2.º, n.º 1, alínea c), e 5.º, n.º 1 e 3, do Decreto-Lei n.º 488/80. Entendemos que onde se escreveu «conselho regional» se deveria ter escrito «câmaras municipais». Seria mais lógico, mais coerente e mais justo, tendo em atenção que são as câmaras municipais o órgão de poder que mais alimenta financeiramente as receitas da Comissão Regional de Turismo.
Mas devemos ainda avançar na emenda que propomos para o n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 488/80. A redacção, tal como foi dada, mostra-se demasiado platónica. O Governo, a manter-se o texto, ouve o Conselho Regional e pode nomear quem lhe apetecer. E mesmo que no texto legal se substituam as Câmaras Municipais ao Conselho Regional, o Ministro pode ouvi-las, mas depois pode nomear o Presidente como lhe aprouver. É de elementar prudência evitar as normas em branco, meramente académicas. Daí que entendemos que, embora o Presidente seja nomeado pelo Governo, deverá a nomeação recair em pessoa física incluída em lista de «nomeáveis» a fornecer-lhe pelas câmaras. Assim se alcançará uma nomeação de pessoa de confiança dos poderes local e central. Demais, é justo prestar aos municípios este tributo, atento que deles, isto é, do imposto de turismo, que lhes cabe pela Lei das Finanças Locais, advém para a CRTA a sua principal receita.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A composição do conselho regional também merece a nossa discordância.
Não se compreende por que foi excluído um representante do Governo Civil do Distrito de Faro. Este membro tinha assento no conselho regional pelo Decreto-Lei n.º 14/79. O governador civil, além de mandatário imediato do Governo no distrito, integra-se também no Poder Regional, na medida em que preside ao órgão deliberativo do distrito, a Assembleia Distrital, e é o executivo singular das deliberações da Assembleia. Esta posição permite-lhe um contacto permanente com os órgãos das autarquias e as populações, facilitando uma articulação administrativa, ao nível dos municípios e do distrito, que, no Algarve, tudo indica venha a coincidir com a região instituenda. Além de que se situa em posição de privilégio para actuar segundo um plano de conjunto, exercendo, nos casos concretos que se suscitam, uma acção moderadora e mesmo conciliatória. Nó governo civil se entrelaçam os dois poderes: o central e o local. O que facilita a acção unitária dos órgãos da administração.
É, pois, de salientar esta injustificável omissão, que deverá ser suprida.
Se o conselho já é integrado do presidente, nomeado pelo Ministro do Comércio e Turismo, não vemos motivo para trazer ao conselho um representante da Secretaria de Estado do Turismo. Integrando-se a Secretaria de Estado no Ministério, parece-nos alcançar-se uma duplicação. Ou o presidente do conselho
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regional é nomeado pelo Secretário de Estado do Turismo e, nesse caso, não há que haver outro representante no conselho da Secretaria de Estado, ou é nomeado pelo Ministro, e então uma representação específica e acrescida da Secretaria de Estado outra finalidade não tem senão a de duplicar o peso do Ministério.
Assinala-se a eliminação do conselho do representante da Guarda Fiscal, que ali nenhum cabimento tinha. No decreto-lei de 1970 nem faltavam os representantes da GNR e da PSP, que nada tinham a ver com a administração da região turística. A menos que se quisesse um turismo de repressão ou policiado. De inferência em inferência, poderia bem ter-se chegado ao representante da Direcção-Geral das Alfândegas que, pela sua afectação natural, não se mostra vocacionado para o turismo.
Não deve ter assento no conselho um representante da Associação dos Industriais de Construção de Edifícios. O Ministério da Habitação e Obras Públicas já está representado, assim como, e bem, a Secretaria de Estado do Ordenamento e Ambiente. A construção de edifícios deverá preservar o ambiente, salvando a beleza estética e paisagística, não degradando a natureza, defendendo a qualidade de vida, obedecendo a um plano de equilibrado ordenamento físico.
Para tanto, lá está o representante da Secretaria de Estado do Ordenamento e Ambiente. Não é a Associação dos Industriais da Construção de Edifícios que perseguira no conselho aqueles fins. No fundo, curou-se apenas de dar representação a uma Associação do patronato, para superar a representação dos sindicatos dos trabalhadores do turismo, nos sectores hoteleiros, das viagens e da informação, colocando-os em minoria. Até parece que a inserção no conselho regional da Associação dos Industriais da Construção de Edifícios, feita a martelo, teve apenas em vista colocar os trabalhadores do turismo e os seus organismos de classe em desequilíbrio numérico, relativamente às associações patronais 3 contra 5. Leiam-se só as alíneas o), p), q,) r), s) e l) ao n.º 1 do artigo 7.º
Assim, entendemos que deverá ser eliminada a alínea r), aditando-se à alínea s) uma referência a um representante do Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes Rodoviários, que não se compreende tenha sido excluído. Inserindo-se o representante do Sindicato no conselho, ter-se-ia alcançado um equilíbrio social, 4 contra 4, entre as associações patronais e os sindicatos dos trabalhadores conexos com a actividade turística.
E retomando o tema da defesa do ambiente, não vemos razão para excluir do conselho os capitães dos portos do Algarve, que, mais do que os presidentes das juntas, esforçam-se por preservar a beleza natural da nossa costa.
Ainda quanto ao conselho regional, o número de reuniões ordinárias previstas afigura-se assaz modesto, minimizando as tarefas do conselho. Até parece ser esse o propósito!...
O número de reuniões ordinárias deverá subir de 2 para 4 em cada ano. É o sistema mais conforme ao funcionamento dos órgãos deliberativos no campo da Administração Local.
Os poderes de orientação da comissão e de coordenação com a acção das câmaras municipais não devem ser do presidente, mas sim da comissão executiva. O mesmo deverá acontecer com a competência para coordenar e incentivar a acção dos serviços da CRTA. Menos presidencialismo e mais colegialidade.
Relativamente à fiscalização, contemplada no artigo 17.º, é óbvio que o direito que nesse preceito é cometido ao pessoal do quadro da Comissão Regional de Turismo se deverá entender sem prejuízo de igual direito que outros diplomas legais cometem ao pessoal de fiscalização dos quadros da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos e das câmaras municipais. Mas para obstar a possíveis obstáculos a colocar pelas pessoas, singulares ou colectivas, fiscalizadas, deverá redigir-se o artigo 17.º, n.º 1, em termos semelhantes aos adoptados no artigo 13.º, alínea m). Onde há as mesmas razões devem existir as mesmas disposições.
Estas objecções levam-nos a opor-nos à ratificação do Decreto-Lei n.º 488/80, sem emendas - o que se propõe, acompanhado de requerimento de baixa do decreto-lei revidendo e da proposta de alterações à Comissão de Comércio e Turismo.
Note-se que as objecções formuladas são as que mais se ajustam no momento presente, enquanto não for instituída a região administrativa do Algarve, pois, atingida que seja essa última fase da democracia local, todo o sistema será de reformular, em termos de integrar a CRTA na região, articulando-a, administrativa e financeiramente, com os órgãos próprios da Administração Regional.
Não tem, pois, a nossa crítica carácter definitivo e radical. Não pode ter!
Aplausos do PS. do PCP, da ASDI. da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Coimbra.
O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas um pedido de esclarecimento à bancada do Partido Socialista porque de facto não fiquei a saber se o Partido Socialista vai ou não votar a ratificação deste decreto-lei. Pela voz do Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, pareceu-me que o PS irá votar contra a ratificação. Pela voz do Sr. Deputado Almeida Carrapato, parece-me que vai introduzir alterações, pressupondo portanto que a posição da maioria ou dos partidos, aqui representados nesta Assembleia, será a de conceder a ratificação do decreto-lei com a respectiva baixa à comissão. Isto é um ponto que me parece importante, até porque estou de acordo com alguns dos comentários que o Sr. Deputado Almeida Carrapato fez em relação a algumas eventuais alterações a este decreto-lei.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Carrapato.
O Sr. Almeida Carrapato (PS): - Sim, é muito claro! Aliás, eu agradeço a oportunidade de esclarecer este ponto.
Evidentemente, ressalta de toda a economia da exposição que fiz, que o nosso propósito é não votar a ratificação, é votar contra a ratificação. Mas isso não nos impede de apresentar propostas de alteração
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e propostas de emenda, que é o caso concreto, porque vamos apresentá-la na (Mesa.
Uma voz do PS - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Não há mais nenhum Sr. Deputado que queira usar da palavra sobre esta matéria? Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Isto é um pouco contra as regras, contra as praxes parlamentares, mas Santo António soube falar aos peixes eu posso também falar aos deputados da maioria.
Risos.
Uma voz do PPM: - Coitadinho do Santo António!
O Sr. João Figueiras Cantinho (CDS): - Sempre teve muito jeito para contar anedotas!
O Orador: - É que às vezes, as pessoas quando são compaginadas com a sua própria consciência acabam por ter alguns rebates. Eu gostava de ouvir, de facto, a AD dizer alguma coisa sobre isto.
Este decreto-lei não tem defesa?! Nem a AD nem o Governo dizem uma palavra em defesa deste decreto-lei?
Vou dizer mais alguma coisa porque fiz uma introdução quanto aos motivos fundamentais do pedido de ratificação, mas é evidente que há mais coisas para dizer.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Vai defender o decreto?
O Orador: - Há mais coisas para dizer contra este decreto-lei, desmontar esta máquina perfeitamente diabólica que pretende controlar, esmagar a democracia neste país.
Risos.
Democracia não é monólogo, democracia é diálogo.
Risos.
E eu não estou a ver diálogo nem na Assembleia nem por parte do Governo deste país.
Uma voz do PS: - É uma conversa em família!
O Orador: - E para melhor demonstrar a má fé que presidiu a este decreto-lei eu vou compará-lo a outro decreto-lei anterior a este, que instituiu a região de turismo do Alto Minho, onde por acaso a AD tem a esmagadora maioria dos municípios, para vermos as pequenas diferenças que existem.
Em relação ao Algarve, já vimos que o presidente é nomeado pelo Governo, ouvido o Conselho Regional. Em relação ao Alto Minho, o presidente da Comissão Regional de Turismo é nomeado pelo Secretário de Estado do Turismo, de entre pelo menos três individualidades residentes na região, sob proposta do Conselho Regional.
O Conselho Regional dessa região está feito à medida de uma região que a AD domina.
Em relação ao Conselho Regional do Algarve, dele passam a fazer parte só mais estas entidades: um representante do Ministério da Habitação e Obras Públicas, que não se viu necessidade para o Alto Minho; um representante da Secretaria de Estado da Comunicação Social - pelos vistos no Alto Minho não há necessidade de comunicação social...
Uma voz do PSD: - Não é por acaso!
O Orador: - ... um representante da Direcção-Geral da Aviação Civil - no Alto Minho, de facto, os aeroportos não terão grande interesse, mas também lá têm aeroportos, pelo menos, para pequenos aviões; um representante de cada uma das Juntas Autónomas dos Portos do Algarve - no Alto Minho não deve haver portos nenhuns, com certeza; delegado distrital de saúde - também não deve haver delegados de saúde no Alto Minho;...
Risos.
... um representante da Associação dos Industriais de Aluguer de Automóveis sen» Condutor - também não deve haver automóveis sem condutor no Alto Minho; ...
Risos.
... um representante da Associação dos Industriais de Construção de Edifícios - também não deve haver esta Associação no Alto Minho, não deve haver li ninguém que construa edifícios, nem associações - e ainda um representante da Empresa Concessionária do Jogo no Algarve, mas aqui temos que ser justos: ainda não há jogo no Alto Minho, mas para lá caminhamos.
O Sr. João Figueiras Cantinho (CDS): - Só há bisca!
O Orador: - Isto porquê? Quem são todos estes senhores que aparecem a mais no Conselho Regional do Algarve? São todos, à excepção dos representantes da concessionária dos edifícios e dos automóveis, pessoas subordinadas à orientação do Governo.
O Governo, de facto, quis acautelar-se no Algarve, para garantir a sua hegemonia sobre a Comissão Regional de Turismo.
Isso compreende-se à luz do preâmbulo deste decreto-lei, porque o Governo, sem pudor nenhum, diz carrément - perdõem-me o galicismo - que este decreto-lei visa adequar a Comissão Regional de Turismo com os conceitos do Governo em matéria de regionalização turística.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!
O Orador: - Ficamos conversados quanto a estes conceitos do Governo sobre regionalização turística. É de facto uma grande regionalização!
E tal era a confiança do Governo depois de todas as cautelas que tomou neste decreto-lei que um deputado desta Câmara, num recente congresso de turismo realizado em Montechoro, interpelado sobre se o Conselho Regional não aprovaria o indigitado presidente, o tal deputado, aliás, nosso ilustre colega, não teve dúvidas nenhumas e, certamente, com a maior das
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boas fés - eu diria antes uma aposta pesada que perdeu - disse: é evidente que o Governo acatará a deliberação do Conselho Regional. Como se viu, acatou a deliberação do Conselho Regional! Isto foi dito em público, está gravado.
Uma voz do PS: - Foi azar!
O Orador: - Mas mais! O Governo é de facto da AD e a AD também existe no Algarve - o Sr. Deputado Ângelo Correia, que acaba de entrar na Sala, certamente vai falar porque ele não resiste a estes debates sobre o turismo no Algarve - ...
Risos.
... e é evidente que o CDS não tem no Algarve uma implantação excessiva, digamos mesmo que está muito aquém das suas legítimas ambições. Creio que ainda não chegou aos 10%, mas lá irá ...
Uma voz do CDS: - Ainda vamos fazer essas contas!
O Orador: - ... com a ajuda da AD, evidentemente. Naturalmente que o PSD - que é um grande partido no Algarve, valha a verdade - não deixava que fosse o CDS, aliás, seu lealíssimo companheiro de coligação, a dominar um órgão cujo presidente vai tantas vezes à televisão, que se diz, faz deputados... Não podia deixar isso sozinho. Tinha que partilhar o poder. Mas, partilhar o poder, como? E com a maior das simplicidades, a dificuldade se resolveu. Não houve nenhum embaraço de ordem jurídica, nem de ordem constitucional. Não houve nenhum problema de praxe parlamentar: um deputado desta Assembleia é delegado do Governo na Comissão Regional. Tudo resolvido... Assim, o presidente é do CDS, nomeado pelo Governo, mas o vogal por parte do Governo é do PSD. As partilhas estão feitas e é exactamente ao contrário do que mandam as regras democráticas.
Eu tenho muito gosto em lembrar que quando o PS foi Governo, sozinho, no I Governo Constitucional, procedeu em todas as circunstâncias do turismo - e desafio quem quer que seja a desmentir-me - exactamente ao contrário do que está a proceder a AD desde que está no Governo.
O PS no governo nunca nomeou, para órgãos locais de turismo, ninguém que não tivesse a concordância da autarquia local respectiva.
Uma voz do CDS: - Esqueceu-se!
O Orador - Posso citar-vos bastantes juntas de turismo, em várias zonas, em que nomeadamente o PSD é maioritário! O PS nomeou para presidente interino da Comissão Regional de Turismo o homem ligado ao turismo que estava, já na altura, publicamente comprometido com o PSD.
O Sr. Deputado José Vitorino fez parte, como independente, de uma lista para a Câmara Municipal de Silves e foi eleito como vereador. Lista do PPD!
Vozes do PS: - É verdade!
O Orador: - Estava publicamente comprometido com o PPD e não cora outro partido. Não foi por acaso que escolheu aquela lista e não outra! Se isto não é publicamente comprometido, então, não sei o que será comprometer-se publicamente.
Sr. Presidente. Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado do Turismo: Estas coisas todas têm um limite. Nós, no Algarve, é evidente que prezamos muito a ordem pública e a autoridade legítima, mas também prezamos muito que não abusem da nossa paciência.
Os algarvios não estão habituados a ser excessivamente colonizados. Os governos fascistas colonizaram o Algarve através de Évora. Mas colonizá-lo agora através de Faro, com o tal vice-rei que já hoje foi aqui referido, é excessivo.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - O vice-rei é o José Vitorino!
O Orador: - As câmaras municipais. do Algarve pertencem aos leques dos principais partidos aqui representados nesta Assembleia, incluindo o CDS através da coligação com o PSD. Assim, há câmaras municipais da APU, há câmaras municipais da AD, há câmaras municipais do PSD e há câmaras municipais do PS. Ora, creio que todas as câmaras estão contra este decreto-lei, uma vez que ele põe em causa o poder dos Algarvios, põe em causa o direito de os Algarvios terem uma palavra autónoma, influente e decisiva numa questão que a todos eles diz respeito.
Com efeito, Sr. Secretário de Estado do Turismo, o Algarve não é apenas um balcão de divisas. O Algarve também paga os custos sociais, culturais e ambientais gravíssimos que o turismo acarreta. Os Algarvios sentem na pele as contrapartidas que o turismo tem para o Estado e para alguns outros. Mas, a maioria esmagadora da população do Algarve não participa directamente nos benefícios do turismo. Os Algarvios têm muito gosto em que o Algarve seja um grande balcão do turismo português, mas não querem que, por isso, sejam discriminados e tratados de um modo diferente da população do Alto Minho, por exemplo.
Na verdade, se os Minhotos - e muito bem - têm o direito de influir decisivamente na sua região turística, por que razão hão-de os Algarvios ter menos direitos? Será porque os Algarvios votaram mais no PS do que no PSD e no CDS? Será que se pretende assim punir os eleitores pela escolha que fizeram? Onde estão os princípios da descentralização? Onde está o respeito pelo voto popular? Onde está a defesa do interesse de uma região? É que isto chama-se discriminar uma região e é enxovalhar todos os Algarvios, que não admitem, Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados, esta discriminação.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Aliás, sei que na bancada da AD há algarvios que, tal como eu, também prezam o direito de os Algarvios disporem de si próprios. Nós não queremos ser senhores absolutos no Algarve, nem da sua Comissão Regional de Turismo. Nós queremos apenas participar, de uma forma decisiva e influente, nas decisões que lá se tomam.
Desmontei aqui - e posso esclarecer ainda mais se a minha intervenção não bastou - toda esta situação. Se os Srs. Deputados quiserem participar neste
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debate eu poderei dar-lhes mais elementos, desmontando, assim, toda esta maquinação legal contra o direito de os Algarvios disporem de si próprios e contra o direito de os Algarvios fazerem sentir a sua influência nas decisões de um órgão importante como é a Comissão Regional de Turismo do Algarve.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós apresentamos aqui no ano passado e repetimos este ano a apresentação de um projecto de lei relativo à região administrativa do Algarve. É que o Algarve é, talvez, a única região - à excepção das regiões autónomas - que não tem discussões de carácter geográfico ou étnico a respeito de uma delimitação. O Algarve é uma região natural e que, mais do que nenhuma outra, merece ser tratada como região natural. Os Algarvios, são um povo ordeiro e disciplinado, trabalhador e amante da paz e da liberdade.
Sendo assim, os Srs. Deputados não têm o direito de fazer este insulto aos Algarvios e aos municípios do Algarve.
Aplausos do PS, do PCP, do ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem, a palavra o Sr. Deputado Cabrita Neto.
O Sr. Cabrita Neto (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho estado a ouvir com toda a atenção esta polémica em relação à Comissão Regional de Turismo do Algarve.
Simplesmente, por detrás de todo este problema encontram-se pessoas. Ora, penso que um problema com a importância que este da Comissão Regional de Turismo do Algarve item não pode ser tratado em termos de pessoas.
O Sr. Deputado Luis Filipe Madeira, quando foi Secretário de Estado do Turismo, nomeou-me presidente da comissão administrativa da Comissão Regional de Turismo do Algarve.
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Interinamente!
Risos do PS.
O Orador: - Interinamente, é verdade, mas porque, na altura - e, modéstia à paute, isto tem de ser dito -, a situação da Comissão Regional de Turismo do Algarve era de tal modo caótica que não havia um socialista para colocar nesse lugar.
Risos do PSD.
Vozes do PS: - Isso não é verdade!
O Orador. - É necessário que isto se diga, porque a Comissão Regional de Turismo do Algarve - e eu tive oportunidade de constatar esse facto ao longo dos anos que lá estive - foi considerada como sendo, entre os organismos regionais do turismo, um exemplo. Esta Comissão funcionou em equipa, havia uma colaboração razoável, bastante boa mesmo, entre os outros membros da comissão administrativa, onde estavam dói» representantes das autarquias, e as câmaras municipais.
Isto foi assim até que a Comissão começou a ter a nível nacional uma certa importância, a que fazia jus e que o turismo do Algarve justificava.
Nesse momento, as coisas começaram a complicar-se. Na verdade, ouvi o Sr. Deputado Carlos Brito dizer que esta era a terceira vez que este problema da Comissão Regional de Turismo do Algarve vem à Assembleia da República. Simplesmente, o turismo do Algarve é um sector bastante importante para este país. Na verdade, o Algarve tem mais de metade das camas turísticas do País, realizando-se e gerando-se no Algarve cerca de metade das divisas deste país. Além disso, mais de metade dos trabalhadores da indústria hoteleira -não incluindo os restaurantes- encontra-se no Algarve, facto que toma o turismo desta região um problema muito importante.
Assim, considero que o facto de este problema vir à Assembleia da República resulta de ele ser importante.
O Sr. Deputado Luís Filipe Madeira falou no decreto-lei relativo ao Alto Minho, mas esqueceu-se de dizer que no mesmo Diário da República está publicado o Decreto-Lei n.º 489/80, relativo à Comissão Regional de Turismo do Douro Sul, e que tem precisamente a mesma base legislativa do Decreto-Lei n.º 488/80, de 17 de Outubro, que alterou o funcionamento da Comissão Regional de Turismo do Algarve.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador. - É pena que o Sr. Deputado não tenha também apresentado esse exemplo, porque ele seguiu a orientação que foi dada ao Governo na altura. Ora, é estranho que o PS não tenha pedido a ratificação do Decreto-Lei n.º 489/80, que, em traços gerais, em pouco altera aquilo que está institucionalizado e decretado para a Comissão Regional de Turismo do Algarve.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Se o Sr. Deputado me perguntar se eu considero que esta é a última forma legislativa para a Comissão Regional de Turismo do Algarve ou para qualquer região, pois eu digo-lhe que não ó. O problema que se coloca e que se verificou neste último ano e meio é que a Comissão Regional de Turismo do Algarve tem tido dificuldades de funcionamento. Considero, e sempre considerei, que as câmaras municipais têm e devem ter uma força importante dentro da Comissão Regional de Turismo do Algarve. Mas considero, por outro lado, que os sindicatos, as associações patronais do sector turístico e o Governo também devem ter uma posição importante no funcionamento da Comissão Regional de Turismo do Algarve. Aliás, posso dizer-lhes que as câmaras municipais têm 16 representantes em 34 dos seus membros e na comissão executiva as câmaras municipais tem 2 representantes, os sindicatos têm 1 representante, as associações patronais têm 1 representante e o Governo tem 1 representante e o presidente. São seis elementos que constituem esta comissão.
Ora, saliento precisamente este aspecto, em que as câmaras municipais têm também aí uma representatividade capaz num órgão colegial que tem funcionado.
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O Sr. Deputado falou ainda no Dr. Baptista Coelho, que não vou defender, dizendo que ninguém o conhece. Ora, o Dr. Baptista Coelho é militante do CDS, é economista, é gestor de uma empresa turística ...
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Turística?
O Orador - É gestor da Lusotur, onde se encontra a representar um banco.. Além disso, o Dr. Baptista Coelho é residente no Algarve, facto que considero bastante importante e que não acontecia com o presidente da comissão administrativa que esteve lá neste último ano e meio, que foi aceite pelas câmaras municipais socialistas do Algarve e que era presidente apenas aos fins-de-semana, pois apenas lá se encontrava às sextas-feiras, aos sábados, domingos e, por vezes, à segunda-feira.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Na verdade, o PS e as autarquias no Algarve aceitaram esta situação, sabem que a Comissão Regional de Turismo do Algarve, durante o último ano e meio, teve dificuldades de funcionamento, embora tenha tido o apoio das câmaras municipais. Mas é interessante verificar que apoio foi este que as câmaras municipais deram à Comissão Regional de Turismo do Algarve quando lhe deviam muitas dezenas de milhares de contos e não lhe entregavam o imposto de turismo. Talvez fosse apenas um apoio platónico.
Penso que o turismo do Algarve e a região que todos defendemos não podem ser vistos apenas considerando as regiões da beira-mar, pois as populações do interior têm algo a receber - e vão recebendo - do turismo, embora tenham de receber ainda mais.
Por outro lado, considero que a Comissão Regional de Turismo do Algarve, para ultrapassar os impasses - e todos cá estaremos, se Deus quiser, para o constatar- necessita do equilíbrio entre associações sindicais, patronais, Governo e autarquias locais, para pôr a funcionar um organismo importantíssimo para o desenvolvimento turístico da região do Algarve e, além disso, para o desenvolvimento turístico do País, pois é importante que ela funcione e que seja um porta-voz junto do Governo.
Posso também dizer-lhe, Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, que durante os últimos dois anos em que esteve na Comissão Regional de Turismo do Algarve nunca me foram impostas por qualquer governo quaisquer obrigações a cumprir que não fosse a defesa dos interesses da região do Algarve.
Se algumas ordens me foram dadas e peremptórias, foram-no pelo Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, embora eu entenda que na altura a situação era difícil e tínhamos problemas de ordem social para resolver no Algarve.
Isto para dizer que, na verdade, apesar de as pessoas estarem a representar o Governo ou serem nómadas pelo Governo, defenderão, certamente, e acima de tudo, os interesses do Algarve e lutarão por eles num ambiente de solidariedade, num ambiente em que, apesar de haver problemas partidários, eles devem ser ultrapassados quando os interesses do turismo e da região estão em causa. Isso certamente irá acontecer, estou disso convencido, seja quem for que vá para a Comissão Regional de Turismo do Algarve.
Penso que este esforço de regionalização não será o último, o Governo tem de, na verdade, ultrapassar muitas das dificuldades e complexidades da regionalização do País e certamente que, quando se criarem as regiões, teremos de alterar, ou até antes disso, o funcionamento da Comissão Regional de Turismo do Algarve. Ma isso não inibe que se faça e que se vote a ratificação deste decreto-lei, no sentido de que a Comissão Regional de Turismo, com a colaboração de todas as câmaras, dos sindicatos, das associações patronais e do Governo, seja um órgão ao serviço do Algarve, ao serviço do turismo e ao serviço de Portugal.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, houve - aqui um equívoco por parte da Mesa. Eu estava convencido de que o Sr. Deputado Cabrita Neto queria pedir esclarecimentos, mas ele fez afinal uma intervenção, e o Sr. Deputado Roleira Marinho tinha-se inscrito para fazer pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.
Portanto, se a Câmara não vê inconveniente, dou a palavra ao Sr. Deputado Roleira Marinho.
O Sr. Roleira Marinho (PSD): - O Sr. Deputado Luís Filipe Madeira referiu-se à Comissão Regional de Turismo do Alto Minho; eu queria pedir-lhe alguns esclarecimentos, mas antes queria fazer um comentário.
A luta dos homens do Alto Minho pela sua Comissão Regional de Turismo dependeu quase inteiramente das pessoas das autarquias do Alto Minho. Foram elas que, com a boa vontade que encontraram da parte do Governo, fizeram o diploma que têm. Não pode o Sr. Deputado dizer que não existem representantes de todos os organismos ligados, ao turismo no Alto Minho.
Quando o Sr. Deputado refere, por exemplo, que não há nenhum representante dos aeroportos do Alto Minho, pois, realmente, não há, mas nós lutámos realmente pela existência de um pequeno aeroporto que fosse incluído na região turística do Alto Minho.
A institucionalização do turismo nesta região partiu do zero e foi com a boa vontade do Governo e de todas as suas câmaras municipais que foi possível chegar ao diploma que temos, que pode não ser bom, mas representa aquilo que foi possível, representa aquilo por que se bateram os homens quando partiram para a criação da região turística do Alto Minho. Um turismo que os homens do Alto Minho estão convencidos de que concorrerá sadiamente e capazmente com a zona turística do Algarve e com todas as outras zonas turísticas do País, porque é num turismo feito à base de um trabalho sério e honesto e que se pretende que vá ao encontro dos interesses de Portugal e dos Portugueses.
Por isso, Sr. Deputado, não tem nenhuma razão ao dizer que o diploma agora em apreço é um diploma que não serve. É natural que haja que corrigir alguma coisa. Pois vamos corrigi-lo, e isso não se faz votando contra, como o seu partido defende, mas sim propondo as alterações necessárias e possíveis. Se assim for, com certeza que terá os deputados do PSD a seu lado e do seu partido, mas não nos terá, a seu
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lado fazendo como o Sr. Deputado faz, demagogia barata e derrotando aquilo que se pretende melhorar. Se não for assim, com certeza que nunca chegaremos a lado nenhum. Vamos construir, vamos fazer, vamos trabalhar por melhor.
Vozes do PS: - Não percebe nada disto!
O Sr. Presidente: - Não sei se o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira quer responder?
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, não ouvi que me tenha sido feito algum pedido de esclarecimento, pois o Sr. Deputado fez um comentário, e isso merece-me um outro comentário.
O Sr. Presidente: - Então, faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Luis Filipe Madeira (PS): - De facto, não gosto de deixar ninguém sem conhecimentos suficientes para falar nestas coisas.
O Sr. Deputado deve, julgo eu, ter-me ouvido mal. É que eu não falei em representantes dos aeroportos. Eu falei em representantes da Direcção-Geral da Aeronáutica Civil, que é uma instituição que tem funções sobre o todo do território nacional.
É certo que disse que no Alto Minho não haveria aeroportos de carreiras regulares ou internacionais, mas há lá aeródromos que estão sujeitos à tutela da Direcção-Geral da Aeronáutica Civil, como o Sr. Deputado sabe melhor do que eu.
Por outro lado, fiquei um pouco aterrorizado quando julguei que o Sr. Deputado ia dizer que no Alto Minho as pessoas mereciam e no Algarve não.
E já agora deixe-me dizer-lhe que, quando dizemos que votamos contra, é óbvio que votamos contra o que se prevê neste decreto-lei. Se a maioria da AD nos disser que vai introduzir aqui alterações que ponham este decreto-lei em função daquilo que afirmámos que estava mal, mostrar-nos-emos, evidentemente, dispostos a estar de acordo com isso, e que é exactamente uma situação paralela com a da sua região.
Quero agradecer-lhe também por ter sido o Sr. Deputado, que é do Alto Minho, a solidarizar-se com as minhas palavras sobre o Algarve.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Cabrita Neto.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Cabrita Neto, ouvi com toda a atenção a sua exposição; aliás, costumo acompanhar os seus, escritos sobre a matéria.
Quero dizer-lhe que, quando referi que a questão da Comissão Regional de Turismo do Algarve subia pela terceira vez no Plenário da Assembleia da República, não foi lamentando que isso acontecesse. A primeira vez que aqui veio foi por iniciativa do meu partido, e quero dizer-lhe ainda que, se estamos a discutir esta questão esta noite, foi também por iniciativa do meu partido - não fomos nós, é certo, que chamámos o decreto-lei a ratificação, foi o Partido Socialista -, pois insistimos, na conferência dos representantes dos grupos parlamentares, para que esta questão fosse debatida no Plenário e não se protelasse mais uma discussão que era de todo urgente.
Relativamente às suas considerações, e para não polemizarmos excessivamente, queria apenas reputar-me à parte, final, quando como que apelou para a colaboração e para o estreitamento de esforços das autarquias, dos sindicatos, do Governo, dos empresários, para o desenvolvimento do turismo no Algarve.
E eu pergunto ao Sr. Deputado, como algarvio que e, como político ligado ao Poder Local - forma como iniciou os seus passos na vida política portuguesa depois do 25 de Abril -, como pessoa ligada profundamente ao turismo, se pensa que é um bom princípio para essa tal colaboração a que apela aquilo que o Governo acaba de fazer, que é reduzir a zero a consulta prevista no próprio diploma que estamos a debater, que é reagir com o mais soberano desprezo, de maneira que temos de considerar insultuosa, em relação à opinião dos representantes do Algarve, porque foram estes que se pronunciaram e chumbaram o proposto presidente da Comissão Regional de Turismo, que o Governo acabou por nomear.
Parece-lhe que isso é um bom princípio para um trabalho promissor em defesa do turismo do Algarve e para transformar esta CRTA, que é muito má, num instrumento para o incremento do turismo algarvio.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Cabrita Neto, se desejar poderá responder.
O Sr. Cabrita Neto (PSD): - Na verdade, eu fiz um apelo, que continuo a manter, pois penso que tem de haver um grande empenhamento de todos.
Há pouco, na minha intervenção, esqueci-me de referir uma afirmação do Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, que vem um pouco em resposta àquilo que o Sr. Deputado Carlos Brito acabou de dizer, sobre um deputado desta Assembleia -eu próprio- que teria afirmado, num congresso de turismo no Algarve, que o Governo não nomearia qualquer individualidade desde que este não tivesse o parecer favorável do Conselho Regional. O que eu afirmei, efectivamente, foi que o Governo não nomearia qualquer individualidade desde que fossem apresentadas razões válidas para não aceitar esse nome. Esta é uma das questões que se põe porque não sabemos quais seriam as razões válidas para que não fosse aceite o nome.
Quando se fala num independente, num apartidário para presidente da Comissão Regional de Turismo do Algarve, eu pergunto, considerando a força política que foi levada para a Comissão Regional de Turismo do Algarve e considerando que as câmaras municipais têm, neste caso, actuado - e não quer dizer que actuem no futuro - mais por questões político-partidárias do que por outras questões, se seria possível, ou mesmo pensável, que o presidente fosse um independente apartidário - como uma camaleão que se reveste de várias cores - para poder ter a força suficiente para que o organismo funcionasse e conseguisse o equilíbrio entre todos os membros do Conselho Regional.
Naturalmente que não me parece que haja razões, válidas contra a pessoa indigitada e nomeada pelo Governo, e se as há, desconheço-as. Aqui não estão questões partidárias...
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O Sr. Carlos Brito (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado, não está em causa a sua opinião em relação à posição adoptada pela maioria do Conselho Regional de Turismo. A pergunta que eu fiz foi esta: considera ou não o Sr. Deputado que o ponto de partida para o incremento do turismo no Algarve é o respeito pela posição maioritária do Conselho Regional de Turismo?
Não se trata de interpretar porque eu pergunto apenas se o Sr. Deputado acha que sim ou não o Governo devia ter respeitado o ponto de vista maioritário do Conselho Regional do Turismo.
O Orador: - Acho que o Governo devia ter respeitado essa posição se, na verdade, houvesse razões válidas da parte do Conselho Regional, e que não foram apresentadas.
Uma voz do PS: - E o que é que afere essa validade?
O Orador: - Portanto, não me parece que o Conselho Regional tenha sido de qualquer modo menosprezado, antes pelo contrário, pois foi ouvido, houve uma votação de 15 para 14, como sabe, e não apareceu uma única razão válida para que o nome indigitado pelo Governo na altura fosse considerado como não aceitável -por incompetência ou por quaisquer outras razões de que neste momento não me lembro -, pois se assim fosse o Governo teria em consideraçâo esses factos e certamente não o iria nomear. Agora, não nomear a pessoa só porque ele é do partido A ou só porque tem uma cara bonita ou feia, ou por esta ou aquela razão que não foi visível no Conselho Regional, não seria correcto. Esta a razão que eu vejo para dizer que o Governo não foi contra o Conselho Regional porque não foram apresentadas, até hoje, razões válidas para que a individualidade indigitada não fosse nomeada pelo Governo, e eu espero que ela desempenhe, ao serviço do Algarve e do turismo, um bom cargo nos próximos três anos.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Coimbra.
O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas uma curta intervenção para dizer que o PPM votará favoravelmente...
O Sr. Gomes Fernandes (PS): - Já está sossegada a consciência do PPM!
O Orador - ... a ratificação do projecto em discussão.
Pensamos que, esta situação que aqui temos debatido tem de ser vista segundo três aspectos: o primeiro é que o turismo no Algarve, desde há longa data - pese embora os tais esforços da própria Comissão Regional de Turismo, pesei embora os esforços das câmaras municipais e restantes autoridades do Algarve -, tem sido uma autêntica vergonha, vergonha essa aqui apontada, de certo modo, pelo Sr. Deputado Carlos Brito, pois, de facto, só quem lá não vai é que não sabe o que tem sido esse desenvolvimento turístico; e eu diria mesmo que o Algarve está, neste momento, totalmente a saque, e tudo o que se faça para evitar essa situação será positivo ou não.
Penso que este decreto tem pés para andar, no sentido de que aqui estaremos para julgar da actuação da Comissão Regional de Turismo do Algarve e do seu presidente. Não por meras suposições ou declarações de intenção ou meros juízos políticos à partida, mas após o seu período de actividade, para podermos julgar a orgânica que aqui se aprova neste decreto-lei e a actividade do seu presidente e dos vários órgãos que compõem a Comissão Regional de Turismo do Algarve, que continuam a merecer a nossa confiança.
E relativamente a todas estas questões - incluindo a própria questão levantada aqui pelo Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, a quem até talvez dê um pouco de razão, porque julgo que esta é uma questão importante -, penso que, embora haja algumas diferenças de critérios entre a criação de uma Comissão de Turismo para o Alto Minho e outra para o Algarve, não se deve tentar uniformizar nem normalizar a criação de regiões de turismo por duas razões: a primeira é a de que estaríamos a negar a própria descentralização e a própria especificidade das regiões.
O Sr. Deputado Luís Filipe. Madeira sabe com certeza tão bem como eu que o Algarve precisa de maior protecção e, se possível, de maior intervenção estatal, porque os interesses exógenos que se exercem na província de que o Sr. Deputado é natural são muito superiores àqueles que se exercem no Alto Minho, e daí que nós, para defendermos os interesses naturais, tenhamos de ter, como País e como Assembleia, muito maiores preocupações em matéria de turismo em relação ao Algarve do que em relação ao Alto Minho.
O segundo aspecto, que - embora caracterizando estas especificidades - julgo que poderá integrar a problemática da criação de comissões regionais de turismo noutras regiões do País, terá de ser visto, como aqui já foi hoje falado, não só com a criação da Região Administrativa do Algarve - proposta que desejamos ardentemente que seja continuada -, mas com a criação das regiões Plano -que, aliás, é um preceito constitucional ainda não cumprido - e eventualmente, com a criação das próprias áreas metropolitanas.
Portanto, estamos aqui a ratificar favoravelmente uma situação que terá de ser vista integrada dentro de uma definição de critérios mais vasta do que o próprio desenvolvimento, quer turístico, quer assente no ordenamento do território. Alguma coisa está a ser feita, e mais se fará ainda, pois, salvo erro, existe uma proposta do Partido Socialista nesse sentido sobre a criação de regiões Plano, tendo o meu partido outra proposta, que apresentará brevemente, e com certeza que então se fará um pouco de luz sobre todas estas matérias.
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Peço a palavra para pedir esclarecimentos, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Luis Filipe Madeira (PS): - Sr. Deputado Luís Coimbra, tive muito gosto em ouvido, mas a sua intervenção deixou-me algumas dúvidas.
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Compreendo perfeitamente a dificuldade que é ser um pequeno partido no seio de uma grande coligação. Tem a sua dificuldade e tem o seu preço, é natural...
Mas, Sr. Deputado, como é que o Sr. Deputado justifica, em nome do seu grupo parlamentar, a sua posição que, aliás, é confirmada pelas propostas de alteração que teve a bondade de fazer chegar à nossa bancada- com a vossa consabida defesa de municipalismo?
Outra questão é a de que o Sr. Deputado parece inverter os valores, pois parece aceitar a diferenciação de tratamento jurídico-administrativo entre o Alto Minho e o Algarve.
Dá-me ideia que seria precisamente ao contrário porque, dada a maior tradição de órgãos de turismo no Algarve - órgão» regionais e locais - do que no Alto Minho, aparentemente, seria no Algarve que haveria pessoas com mais experiência e câmaras municipais mais aptas a autogerirem-se. E, pelo contrário, parece que é no Alto Minho, onde aparentemente também, por falta dessa tal tradição e dessa experiência administrativa, o Governo deveria, no período inicial, ter mais cautela e iniciar a descentralização com uma tutela mais próxima do órgão. Assim, seria precisamente no Algarve que o Governo poderia fazer uma maior descentralização.
Portanto, não percebi o seu raciocínio, que me parece subverter os valores não só do municipalismo como dos princípios gerais da política administrativa.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - É a reconquista cristal
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Coimbra para responder, se desejar.
O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Queria apenas repetir um pouco aquilo que disse.
A Sr.ª Ana Nogueira (PCP): - Não vale a pena!
O Sr. Sousa Marques (PCP): - Já se ouviu!
O Orador: - Pese embora o esforço de muitas das autoridades algarvias e pese embora o esforço da própria Comissão Regional de Turismo do Algarve que até à data existiu, a verdade é que, pessoalmente, devo dizer-lhe que em matéria de desenvolvimento turístico do Algarve nada me inspira confiança. E se o municipalismo no Algarve significa o Algarve ser entregue, a saque, aos estrangeiros que aí vão para a grande exploração capitalista...
Risos do PCP e do PS.
... ou para a grande exploração da situação miserável dos parques de campismo -que são feitos para o turismo de massas tão ao gosto do Partido Comunista, que está tão sorridente - que é feito em prejuízo dos interesses nacionais, porque quem vem fazer turismo de massas à conta do Orçamento Geral do Estado português e o turismo estrangeiro, pois nem sequer há hipóteses para o turismo de massas português enquanto persistir a política de parques de campismo que está a ser executada no Algarve.
É neste sentado que eu devolvo as aparências, porque os conceitos, quer em matéria de turismo, quer em matéria de defesa do património, têm de estar ligados. Nem 100 % de municipalismo, nem 100 % de centralismo!
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): -Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, eu queria fazer uma intervenção muito curta se fosse possível.
O Sr. Presidente: - Só pode fazer um protestozinho.
Risos.
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Não, Sr. Presidente, eu não quero protestar contra as palavras do Sr. Deputado Luís Coimbra, por quem tenho a maior consideração e que até é meu homónimo, não quero embaraçá-lo mau do que já embaracei. Ele já se defendeu o melhor que pôde, e é melhor não lavrar mais senão afunda-se.
O Sr. Presidente: - Penso que a Câmara aceita a explicação, não levantando obstáculos a que o Sr. Deputado dê a explicação que entende.
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Era uma explicação relativa à intervenção do Sr. Deputado Cabrita Neto.
O Sr. Deputado Cabrita Neto disse - e penso que falou como deputado, e não em nome do Governo que o nomeou para vogal da Comissão Regional de Turismo do Algarve- que estão em causa pessoas (e eu quero acreditar que sim), mas terão de ser pessoas de grande importância para justificar todo este maquiavelismo legislativo de que o Governo jogou mão para fugir às regras normais da democracia.
Depois, o Sr. Deputado falou na questão do Douro Sul. Bem, já há pouco referi que numa região onde se implanta inicialmente uma comissão regional de turismo com órgãos insipientes, com pessoas porventura pouco experientes, até compreendo que o Governo tome precauções de entrada. Agora numa região que já tem mais de uma dezena de anos de experiência, numa região onde há valores bastante importantes no turismo, quer a nível empresarial, quer de trabalhadores, quer até municipais, parece que o Governo podia ser mais generoso e respeitar mais as regras democráticas e do Poder Local.
O Sr. Deputado fez uma consideração que penso que terá sido um lapso. Disse que quando foi designado presidente interino da Comissão Regional de Turismo do Algarve fez mais do que qualquer socialista que o antecedeu. O Sr. Deputado não pensa que de facto o Algarve só gerou um sábio e um génio, que foi V. Ex.ª Haverá lá mais gente que, sem ter de facto as culminâncias da genialidade de V. Ex.ª, é capaz de fazer o seu pezinho nos cargos que desempenha.
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O PS, hoje, tem uma votação inferior no Algarve, é verdade. Mas tivemos 50 % dos votos em 1975, 40 e tal por cento em 1976, e nesta gente toda não haveria ninguém que pudesse, pelo menos, imitar palidamente a fulgurante figura de V. Ex.ª?
O Sr. Teodoro da Silva (PSD): - A quantidade era grande, mas a qualidade é que não!
O Orador: - Depois afirmou, como a vol d'oiseau (hoje estou um pouco para os galicismos é por causa do turismo, fala-se muito francês!), que recebeu algumas vezes ordens minhas. É natural, era uma comissão administrativa, estava sob tutela do Governo, e V. Ex.ª era um gerente impetuoso e metia-se em áreas que não eram da sua competência directa.
Risos do PS e do PCP.
A seguir acusou a gestão anterior da actual Comissão Regional de Turismo do Algarve de ter tido dificuldades de funcionamento. Teve, de facto, e uma delas foi que V. Ex.ª faltava sistematicamente a todas as reuniões.
Risos do PS e do PCP.
Uma voz do CDS: - Lá lhe levanta um processo disciplinar!
O Orador.-Depois disse que o actual presidente pertence a uma empresa de turismo. Bem, é de turismo porque se chama Lusotur, pois vive para vender terrenos ao turismo. É uma empresa, como V. Ex.ª sabe muito bem, imobiliária. Vende imobiliário, não vende serviços turísticos.
É verdade ou mentira?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Depois referiu-se às dívidas das câmaras municipais à CRTA. V. Ex.ª talvez devesse ter sido mais cauteloso porque, como sabe ou devia saber, dois terços das dívidas à CRTA provêm de câmaras da AD. E há até empresários que publicamente subsidiam a AD e fazem campanha pela AD e que há três ou quatro anos que não pagam um tostão de imposto de turismo.
Grandes empresários, os tais homens. Eu não digo que põem a saque, mas que sacam sobre o turismo.
Risos do PS.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Finalmente, quero agradecer-lhe, Sr. Deputado, a achega que nos deu quando disse que o Governo devia ter respeitado a deliberação do Conselho Regional de Turismo do Algarve.
Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.
O Sr. Cabrita Neto (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para um contra-esclarecimento.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, mas agradecia-lhe que fosse breve.
O Sr. Cabrita Neto (PSD): - Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, na verdade, sobre o imposto de turismo posso dizer-lhe a posição em que estava ontem, pois tenho aqui os dados, e que a câmara que mais deve é a Câmara Municipal de Portimão. Posso esclarecer que as câmaras municipais da AD devem 19000 contos e as outras devem cerca de 40000 contos.
Risos do PS, do PCP e da UEDS.
O Sr. Deputado sabe que quando, como Secretário de Estado do Turismo, me nomeou não aceitei facilmente o cargo.
Sei que os elementos que representavam os sindicatos e as câmaras municipais -as mesmas que posteriormente levantaram problemas -, em reunião com V. Ex.ª, aceitaram o meu nome para presidir interinamente. Também sabe muito bem que aceitei o cargo com a condição de a Comissão Regional de Turismo do Algarve ser reestruturada e que o Conselho Regional começasse a funcionar. E certamente porque a duração do seu Governo foi muito curta, não foi possível fazer essa reestruturação...
Quanto às ordens que me deu - e que o Sr. Deputado acaba de dizer que foi por me ter metido em áreas que não eram da minha competência -, tenho a consciência absolutamente tranquila de que nos problemas sociais do Algarve, que nem o governador civil nem o Ministério do Trabalho resolveram e que punham em causa o turismo da região, o Cabrita Neto, como presidente interino da Comissão Regional de Turismo, actuou - e actuou razoavelmente - de tal modo que resolveu muitos dos problemas sociais.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - É o maior!
O Orador: - E esses problemas foram resolvidos em diálogo aberto com os trabalhadores. Quando os membros do Governo não conseguiam esse diálogo com os trabalhadores da indústria turística, o Cabrita Neto lá estava, dentro das suas modestas possibilidades, a resolver essas situações.
Esta foi uma das questões que me pôs. Quanto às restantes considerações, prezo e respeito todos os Srs. Deputados e naturalmente não vou responder às insinuações, algumas malévolas, que o Sr. Deputado fez há pouco em relação à minha pessoa.
O Sr. Luis Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para um breve protesto.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, mas peço que faça um protesto curto.
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: o primeiro protesto que quero fazer é relativo à parte final da intervenção do Sr. Deputado Cabrita Neto.
O meu protesto é no sentido de lhe dizer que não houve na minha parte qualquer intenção malévola. Pode ter havido alguma vivacidade, como é meu hábito, mas sem intenções malévolas. Peço-lhe desculpa, se alguma das minhas considerações poder ter sido interpretada como malévola.
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Conheço o Sr. Deputado Cabrita Neto há quase quarenta anos...
Risos.
... e, apesar das divergências que temos tido, nunca lhe dirigi ofensas nem as recebi da sua parte. Permitir-me-á que ponha a vivacidade que julgue normal num debate parlamentar.
Quanto às suas contas da Comissão Regional de Turismo do Algarve, não as nego. Elas significam - e V. Ex.ª se quiser, poderá confirmar isso lá fora, pois é difícil ouvir tanta coisa desagradável - que as câmaras da AD esperavam que fosse nomeado um presidente da sua confiança para pagar as contas em atraso.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um observador menos atento e conhecedor menos profundo dos problemas e da realidade turística algarvia e ainda sobre a legislação ligada às questões da Comissão Regional de Turismo do Algarve ficaria convencido, se não conhecesse aqueles que fizeram as críticas e as insinuações, que no Algarve o Governo faz uma política de interesses particulares, centralizadora e de regresso ao passado. É evidente que nada disso se passa e tais acusações explicam-se pelo facto de o PS e de o PCP pretenderem controlar o processo turístico no Algarve, o que não conseguiram e o que não conseguirão. Dai o seu claro desespero.
O PS não tem a moral nem o direito de dizer o que afirmou porque, enquanto foi governo ou apoiou governos, além de palavras, pouco ou nada fez nesse sentido e, ainda por cima, porque defendia que a direcção da Comissão Regional de Turismo, até há pouco existente, continuasse em funções quando sabia que a mesma não funcionava.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, sobre a questão que está aqui hoje em discussão já tive oportunidade de me referir a ela por três vezes e estamos hoje confrontados novamente com a realidade turística no Algarve.
Entendo que o turismo é um dos sectores que terá de merecer da nossa parte a maior atenção, mas também penso que é oportuno salientar que o tempo gasto com esta discussão só não é tempo perdido porque constitui essencialmente uma oportunidade para fazer referência aos mais graves problemas com que desde sempre nos debatemos no Algarve.
Claro que ao Partido Socialista, como a qualquer outro partido, assiste o direito regimental de provocar a discussão dos decretos-leis do Governo, mas é indispensável que desde já se ponha a claro o que verdadeiramente está em causa para o Partido Socialista. Isto é, é preciso que esta Assembleia e a opinião pública possam concluir claramente as razões deste debate. Se o mesmo reside na preocupação em encontrar formas de gestão e representatividade que garantam a melhor prestação de serviços à causa turística ou se, pelo contrário, estaremos mais uma vez perante um simples jogo partidário do Partido Socialista que, procurando assegurar um certo controle da actividade turística do Algarve, vai levantando e criando um sem-número de questões enquanto não consegue tal objectivo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas, mais do que o jogo de palavras do «diz tu, direi eu», julgo que o mais importante é situarmo-nos no campo das realidades e o mais correcto é compararmos o decreto-lei agora sujeito a ratificação com as alterações ao Decreto-Lei n.º 14/79, aprovadas nesta Assembleia, em Julho de 1979, portanto com maioria PS/PCP. É certo que as mesmas não chegaram a sair no Diário da República, embora tenham sido enviadas à Presidência da República, em 24 de Agosto de 1979, e promulgadas em 30 de Agosto pelo Presidente da República. Tendo no entanto desaparecido, segundo informação do secretário-geral da Presidência do Conselho, e não havendo registo de que o Primeiro-Ministro o tenha referendado, ficaram sem existência jurídica. Esta foi a informação dada sem mais pormenores jurídicos e nem sequer outros elementos me transmitiram.
Mas o importante é considerar a vontade política manifestada pelo Partido Socialista nessa altura.
Como resulta do texto do decreto-lei, toda a questão gira, como aliás já aqui foi hoje confirmado em torno dos seguintes pontos: presidente da Comissão Regional de Turismo; comissão executiva e conselho regional.
Vejamos as diferenças:
1 - Presidente da Comissão Regional de Turismo.
a) Em relação à legislação anterior, este passa agora a constituir um órgão, mas sem que isso implique qualquer aumento dos seus poderes. Afigura-se assim que a alteração, pela maior força representativa que dá ao presidente, pode até trazer benefícios em contactos nacionais e internacionais e bem assim na motivação de agentes diversos para as medidas de política mais adequadas, sem que daí advenham quaisquer inconvenientes.
b) Por outro lado, põe-se a questão de se saber «quem nomeia o presidente e quem é ouvido para o efeito». Entendia nessa altura o PS que a nomeação devia ser feita pelo Ministro do Comércio e Turismo, ouvida a Assembleia Distrital.
Actualmente, o PS já entende outra coisa: entende que devem ser ouvidas as câmaras municipais que, como se sabe, num total de 16 elementos, o Partido Socialista tem 11, enquanto que na Assembleia Distrital num total de 48 elementos, tem 33 elementos.
O Governo limitou-se a alargar e diversificar o «colégio» a quem compete dar parecer sobre a personalidade indigitada para presidente. Assim, transferiu essa competência para o conselho regional onde têm assento, além das câmaras, representantes de associações, de sindicatos, entidades e organismos diversos com ligações directa ou indirecta à actividade turística.
Este é um dos pontos mais reclamados pelo Partido Socialista, pois quando se discutiu a ratificação do Decreto-Lei n.º 14/79 não aceitou soluções por nós propostas com idêntico espírito ao adoptado agora pelo Governo.
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E aqui está a verdadeira questão do problema. Aqui começa a levantar-se/o véu da verdadeira razão que leva o Partido Socialista a trazer para o Plenário esta discussão. É que na Assembleia Distrital de Faro de um total de 48 elementos, 33 são afectos ao Partido Socialista. É pois evidente na Assembleia Distrital a maioria afecta ao Partido Socialista Se em vez de ser a Assembleia Distrital a propor o nome para os seus elementos, for o conselho regional, naturalmente que a situação é outra.
Não está aqui em causa salientar o peso devido que o Partido Socialista dá às autarquias locais porque nesse aspecto nós também o demos, sobretudo com a experiência e o papel importante que as autarquias têm no Algarve. O problema do Partido Socialista não é o que acabo de referir A questão essencial que tem que ser dita e na qual terá que se focar - e o Partido Socialista tem que o reconhecer e tem que assumir essa responsabilidade perante todos os profissionais da indústria hoteleira, perante todos aqueles que estão ligados à indústria hoteleira -, é que o Partido Socialista, para manter o controle - da proposta de nomeação do presidente da Comissão Regional de Turismo no Algarve pretendia sacrificar e marginalizar aqueles que directa e indirectamente estão ligados à actividade turística
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É este o entendimento participativo do Partido Socialista? É assim que entende que o turismo é participado e feito por todos, sobretudo por aqueles mais directamente ligados a ele, por aqueles que trabalham nele e dele vivem e nele investem e donde ganham o seu pão?
O Sr. Sousa Marques (PCP): - Cuidado com o coração, Sr. Deputado!
O Orador: - É isso que o PS pretende? É preciso que o responda. O PS marginaliza desta forma verdadeiramente atroz as forças turísticas no processo de audição da nomeação do presidente da Comissão Regional de Turismo. Sobre este ponto saliente-se que o PS e também o PCP - claro está - parecem não querer perceber que o fenómeno turístico tem a ver com o Algarve «todo», e o direito à audição e participação deve ser garantido a múltiplas entidades, muito em especial aos que mais intimamente o conhecem e, claro está, incluindo os representantes autárquicos mas não dando a exclusividade a estes como não a concedendo apenas a outros. Podíamos por exemplo, defender que fosse ouvidos apenas os sindicatos ligados ao turismo ou a associação dos profissionais da hotelaria. Mas não, Srs. Deputados! Não se deve também defender tal posição. Penso que a posição mais equilibrada é aquela em que todos devem ser ouvidos.
2 - Comissão executiva.
a) No respeitante à sua composição, em relação aos demais cinco elementos, a indicar pelo Secretário de Estado do Turismo (1), câmaras municipais (2), associações empresárias (1) e associações sindicais (1), nenhuma alteração é introduzida no decreto-lei, a não ser a forma de nomeação do presidente.
b) Quanto às competências, as alterações são de pormenor.
3 - O tão falado conselho regional: o Alto Minho, o Douro, etc., etc.
Sobre este assunto já o Sr. Deputado Luís Coimbra se referiu às diferenças evidentes que existem entre uma realidade e outra.
Diz o Sr. Deputado Luis Filipe Madeira que as câmaras no Algarve têm mais experiência do que as de, por exemplo, Viana, Douro, Alto Minho. Penso, Sr. Deputado, que, em Portugal, o Poder Local democrático tem todo a mesma experiência porque foi instituído na mesma altura, com o mesmo poder e o mesmo direito democrático.
a) No que respeita à composição do conselho regional e ainda em relação ao diploma que o Partido Socialista aqui apresentou e aprovou o seu número passou de 36 paira 38, o que resultou da eliminação do representante do Governo Civil e dos; capitães dos portos do Algarve (estes por lapso segundo cremos e daí uma proposta por nós apresentada para que continuem a fazer parte do conselho regional, do acréscimo ide seis representantes de vários organismos, e da «concentração» num só elemento, da represem/tacão da TAP e do Aeroporto de Faro. Alterações que melhoram e completam a capacidade do orgão, dado que são representantes ligados à actividade turística.
b) No que respeita às competências, essas, mamtiveram-se.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como se concluí, pode dizer-se que dos discursos do PS e do PCP «a montanha pariu um rato» ...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador -... e que, sem prejuízo de um ou de outro aspecto de pormenor, as razões que levaram o PS a suscitar esta discussão tem muito pouco a ver com os interesses do turismo ou do alargamento da participação e audição de vários agentes e organismos, visando, pelo contrário, tão-somente tentar na prática, através da subversão do espírito e da letra da lei, ser ele a nomear de facto o presidente da Comissão Regional de Turismo do Algarve, «esquecendo» que não é governo e que existem também outras entidades que item o direito a ser ouvidas.
Mas já vai sendo tempo die se pôr fim a estas pequenas guerrilhas, para não lhe chamar outra coisa, já que de útil muito pouco resulta. E convirá recordar que as polémicas e conflitos suscitados em 1979, tal como prevíramos nesta mesma Assembleia, foram responsáveis, pelo menos em parte, pela falta de uma adequada promoção e da degradação internacional da nossa imagem, contribuindo assim para que o ano turístico há pouco findo não tivesse atingido a percentagem de ocupação que estava ao nosso alcance.
Penso que, tendo em conta as contingências, tendo em conta a responsabilidade e o progresso do turismo o que é verdadeiramente importante é que nos debatamos e nos batamos pela resolução dos problemas de esgotos de abastecimento de água, da rede viária, das ligações telefónicas das regras urbanísticas, da segurança e ordem pública.
Contrariamente ao que aqui disse o Sr. Deputado Almeida Carrapato, penso não se trata de se querer
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instituir um turismo repressivo. O Sr. Deputado sabe tão bem como eu que a droga, a prostituição, o crime, a desordem são neste momento, com maior ou menor intensidade, um facto real no Algarve.
O Sr. Deputado sabe com certeza que os efectivos da GNR, da PSP e da Polícia Judiciária são insuficientes. E digo insuficientes não para reprimirem, é evidente, mas para prevenirem, para garantirem a paz e a tranquilidade daqueles que vão passar férias no Algarve, para garantirem que,.aqueles que trabalham no Algarve o ano inteiro, tenham o direito a um descanso e não sejam acometidos por um qualquer excesso de imoralidade dos tempos modernos ou até por um qualquer prazenteiro que lhes roube as carteiras.
Risos do PS e do PCP.
É preciso tratar verdadeiramente destes problemas e é preciso também assegurar que o imposto cobrado pelas finança, chegue rapidamente às câmaras e à Comissão Regional de Turismo, o que não tem acontecido. Posso, no entanto, dizer-lhes, Srs. Deputados que já foram tomadas medidas e já foram dadas instruções às repartições de finanças a nível distrital para que, com rapidez, zelassem para que as verba? do imposto de turismo chegassem rapidamente as câmaras e, por sua vez, à Comissão Regional de Turismo.
Estes, de entre muitos outros, como por exemplo a descentralização, é que são os grandes problemas com que nos devemos apoquentar. Tudo o mais, nomeadamente as «guerras de alecrim e manjerona» a que nos últimos tempos vimos assistindo, só servem para fazer perder a confiança aos empresários, desmotivar os trabalhadores, afastar os turistas e prejudicar o Algarve e o País. Daí a serenidade e firmeza exigidas por parte de todas as forças para que, embora uns sejam governo e outros oposição, não se confunda o essencial em particular e não se ponham interesses partidários acima dos interesses gerais das populações.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegaram à Mesa e foram admitidos os projectos de lei n.º 156/II - Criação da freguesia de Vale de Amoreira no concelho da Guarda, apresentado pelo Sr. Deputado Alberto Antunes, do PS, que baixa à 16.ª Comissão, e 157/II - Criação da freguesia de Argomil no concelho de Pinhel, apresentado pelo Sr. Deputado Adriano Vasco Rodrigues e outros, do CDS, que baixa à 16.ª Comissão.
Foi apresentado pelo Partido Social-Democrata um voto que será lido amanhã porque hoje iremos cumprir o horário estabelecido que é o de encerrarmos os nossos trabalhos às 24 horas.
Para pedir, amanhã esclarecimentos ao Sr. Deputado José Vitorino, fica inscrito o Sr. Deputado Luis Filipe. Madeira.
A próxima reunião será amanhã, às 10 horas, tendo como ordem de trabalhos a continuação da discussão da ratificação n.º 28/II e a discussão do projecto de lei n.º 141/II, sobre o reforço das garantias do exercício dos direitos dos conselhos de redacção e dos seus membros, apresentado pelo PCP.
Está encerrada a reunião.
Eram 24 horas.
Declaração de voto sobra a ratificação n.º 66/II. relativa ao Decreto-Lei n.º 339/80, de 30 de Agosto, que estabelece um conjunto de medidas tendentes a conter a curto prazo a violência em recintos desportivos do Sr. Deputado António Magalhães (PS), publicada ao abrigo do artigo 100.º, do Regimento.
O Sr. António Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista votou contra a concessão da ratificação do Decreto-Lei n.º 339/80, de 30 de Agosto, essencialmente pelas seguintes razões:
O decreto-lei agora submetido a ratificação apresenta, no seu todo, um conjunto de medidas irrealistas, que em vez de conduzirem à contenção da violência nos recintos desportivos, a ser aplicado, trará um contínuo desaparecimento de modestas colectividades desportivas que se extinguirão pela impossibilidade de dar cumprimento às rígidas e pesadíssimas sanções previstas no decreto-lei em apreço.
Em face das dificuldades criadas, as pequenas agremiações desportivas podem finar-se, mas não acabará a violência, pois a prática desportiva no pequeno meio continuará agora à revelia de tudo e de todos, com os profundos inconvenientes que daí advirão. O alfobre de desportistas que sempre foram os pequenos clubes, o passatempo preferido dos fins-de-semana das comunidades de reduzida dimensão, o são convívio que, apesar de isolados incidentes de pormenor, brota da prática desportiva, desprovida de certos vícios, será pura e simplesmente banido com a aplicação deste decreto.
Se referimos especialmente as pequenas associações desportivas é porque são as principais vítimas dos princípios que informam o articulado deste diploma fazê-mo-lo por o diploma fazer tábua rasa da dimensão, das possibilidades da especificidade, em suma da variedade de agremiações a quem se dirige e às quais vai atingir com golpes de morte. O Governo não teve em conta nada disto. Conhece o problema da violência em recintos desportivos (que também nós gostaríamos de ver minorado, se não banido) e com uma penada, fazendo promulgar um decreto-lei contendo irrealistas medidas repressivas, trata da mesma forma um conjunto de modalidades diferentes e, portanto, a merecerem, caso a saco, ponderação especial. Engloba os empórios desportivos do País, concedendo-lhe tratamento idêntico ao previsto para as pequenas colectividade!) de bairro ou de aldeia. Finalmente, não tem em conta factores sociológicos dos mais diversos que são indispensáveis à análise da problemática que envolve situações de violência em recintos desportivos.
O Governo fez o mais fácil, o mais simples, mas simultaneamente o pior. O diploma legal que esteve hoje em discussão é utópico, não ponderou as realidades sociológicas inerentes ao fenómeno desportivo, apresenta apenas supostas soluções para sanar a violência no desporto e por isso, senão caiu hoje, cairá em breve, por impossibilidade da sua aplicação prática.
Por tudo isto, e ainda porque julgamos haver no diploma matéria reservada à competência desta As-
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embleia, o Partido Socialista votou contra a ratificação do Decreto-Lei n.º 339/80, certo de que, caso não tivesse sido obtida a sua concessão, seria prestado um óptimo contributo ao desporto e ao País, sem contudo deixarmos de pensar que medidas eficazes deverão ser tomadas para tentar acabar com a violência nos recintos desportivos.
Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Social-Democrata (PSD)
António Duarte e Duarte Chagas.
Bernardino da Costa Pereira.
Carlos Manuel Pereira Pinho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Dinah Serrão Alhandra.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José da Costa.
Fernando dos Reis Condesso.
João Afonso Gonçalves.
João Vasco da Luz Botelho Paiva.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Theodoro da Silva.
Luís Fernando C. Nandim de Carvalho.
Partido Socialista (PS)
Adelino Teixeira de Carvalho.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alfredo Pinto da Silva.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António José Sanches Esteves.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Janeiro.
António Marques Ribeiro Reis.
António de Sousa Gomes.
Aquilino Ribeiro Machado.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Fernando Torres Marinho.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Filipe Nascimento Madeira,
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel da Mata de Cáceres.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Mário Alberto Lopes Soares.
Victor Brás.
Victor Manuel Ribeiro Constâncio.
Centro Democrático Social (CDS)
Alberto Henriques Coimbra.
Alfredo Albano de C. Azevedo Soares.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Mendes de Carvalho.
Carlos Alberto Rosa.
Diogo Pinto Freitas do Amaral.
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Henrique José C. M. Pereira de Moraes.
Isilda da Silva Barata.
João Cantinho M. Figueiras de Andrade.
João da Silva Mendes Morgado.
José Carlos Barbosa Macedo.
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro.
José Girão Pereira.
José Vicente de J. Carvalho Cardoso.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís Carlos C. Veloso Sampaio.
Paulo de Oliveira Ascensão.
Rui Eduardo Ferreira Rodrigues Pena.
Partido Comunista Português (PCP)
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
Manuel Lopes.
Vital Martins Moreira.
Partido Popular Monárquico (PPM)
Amadeu Domingues Ribeiro de Sá Menezes.
Vérico de Campos Gondim
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE)
Herberto de Castro Goulart da Silva.
Deputados que faltaram à sessão:
Partido Social-Democrata (PSD)
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
José de Vargas Bulcão.
Luís António Martins.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Partido Socialista (PS)
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
António Azevedo Gomes.
António Cândido Miranda Macedo.
António Manuel Maldonado Gonelha.
Benito Elísio de Azevedo.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Eduardo Ribeiro Pereira.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
Joaquim José Catarino Menezes.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Luís Amaral Nunes.
Manuel Francisco da Costa.
Mário Manuel Cal Brandão.
Centro Democrático Social (CDS)
Adalberto Neiva de Oliveira.
Álvaro Manuel M. Brandão Estêvão.
Daniel Fernandes Domingues.
Francisco G. Cavaleiro de Ferreira.
Francisco Manuel L. V. de Oliveira Dias.
José Augusto Gama.
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Luís Filipe Paes Beiroco.
Luísa Maria Freire C. Vaz Raposo.
Manuel A. de Almeida de A. Vasconcelos.
Ruy Garcia de Oliveira.
Partido Comunista Português (PCP)
Álvaro Barreirinhas Cunhal.
António Dias Lourenço da Silva.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
Armando Teixeira da Silva.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Acção Social-Democrata Independente (ASDI)
António Luciano P. Sousa Franco.
União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS)
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
OS REDACTORES DE 1.ª CLASSE: Anita Paramez Paz, Noémia Malheiro.
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PREÇO DESTE NÚMERO 52$00
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA