O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 2607

I Série - Número 62

Quarta-feira, 10 de Março de 1982

Diário da Assembleia da República

II LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1981-1982)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 9 DE MARÇO DE 1982

Presidente: Exmo. Sr. Francisco Manuel Lopes Vieira de Oliveira Dias

Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Vítor Manuel Brás
António Mendes de Carvalho
José Manuel Maia Nunes de Almeida

SUMÁRI0.- O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Luísa Raposo (CDS) teceu considerações sobre o Dia Internacional da Mulher, tendo, no fim, respondido a pedidos de esclarecimento da Sr.ª Deputada Natália Correia (PSD).
Também em declaração política, o Sr. Deputado António Moniz (PPM) referiu problemas que afectam o bom funcionamento dos transportes ferroviários.
Ainda em declaração política, a Sr.ª Deputada Alda Nogueira (PCP), a propósito do Dia Internacional da Mulher, enalteceu a figura e a obra de Maria Lamas, no que foi secundada pelos Srs. Deputados Manuel Alegre (PS), Natália Correia (PSD), Barrilaro Ruas (PPM), Mário Tomé (UDP) e Sanches Osório (CDS).
Também em declarações políticas, os Srs. Deputados Beatriz Cal Brandão (PS) e Mário Tomé (UDP) aludiram ao significado do Dia Internacional da Mulher, tendo este último respondido ainda a um protesto do Sr. Deputado Sousa Tavares (PSD).
Entretanto, foi aprovado um voto de saudação a Maria Lamas, apresentado pela UDP, tendo usado da palavra, incluindo declaração de voto, os Srs. Deputados Carlos Robalo (CDS), Vilhena de Carvalho (ASDI), Helena Cidade Moura (MDP/CDE) e Teresa Santa Clara Gomes (UEDS).
O Sr. Deputado Sousa Tavares (PSD) fez uma intervenção, na qual homenageia igualmente a vida e obra de Maria Lamas.
O Sr. Deputado Rogério de Brito (PCP), abordando todo o processo que levou à falência a União das Adegas Cooperativas da Província da Estremadura, acusou a AD de servir os interesses dos grandes empresários capitalistas e dos grandes intermediários e armazenistas.
O Sr. Deputado Raúl Rêgo lembrou da figura do engenheiro Carlos Ernesto de Sá Cardoso, recentemente falecido, tendo terminado por propor um voto de pesar.
O Sr. Deputado Mário Tomé (UDP) chamou a atenção da Assembleia para a Associação de Moradores da Zona de Francos, no Porto, sobre cujas instalações foi intentada uma acção de despejo.
O Sr. Deputado Magalhães Mota (ASDI) referiu-se à greve decretada pelo Sindicato dos Feroaviários, manifestando perplexidade por ser o seu grupo parlamentar o primeiro a referir-se ao facto.
Ordem do dia. - Concluiu-se a votação na generalidade dos projectos de lei n.º 177/II, da ASDI, 185/II, do CDS, e 287/II, do MDP/CDE, e a proposta de lei n.º 58/II, relativos à autonomia universitária, tendo sido aprovados os projectos de lei n.ºs 177/II e 185/II e a proposta de lei n.º 58/II tendo estes diplomas baixado à respectiva Comissão para discussão e votação na especialidade.
Intervieram no debate, a diverso titulo - incluindo declarações de voto -, além do Sr. Ministro da Educação e Universidades (Victor Crespo), os Srs. Deputados Manuel Moreira (PSD), Jorge Lemos (PCP), Helena Cidade Moura (MDP/CDE), Teresa Santa Clara Gomes (UEDS), Silva Marques (PSD), Oliveira e Sousa (CDS), Mário Tomé (UDP), Adriano Rodrigues (CDS), Adérito Campos (PSD), Luis Patrão (PS), Narana Coissoró (CDS), Sousa Lara (PPM), Marília Raimundo (PSD) e Jorge Miranda (ASDI).
Entretanto, foi lido um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de um deputado da UEDS, o que foi aprovado.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 22 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum.

Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

Adérito Manuel Soares Campos.
Afonso de Sousa F. de Moura Guedes.
Alberto Augusto Faria dos Santos.

Página 2608

2608 I SÉRIE - NÚMERO 62

Álvaro Barros Marques Figueiredo.
Álvaro Roque Bissaia Barreto.
Amândio Anes de Azevedo
Anacleto Silva Baptista.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Duarte e Duarte Chagas
António Maria de O. Ourique Mendes.
António Roleira Marinho.
António Vilar Ribeiro.
Armando Lopes Correia Costa.
Arménio Jerónimo Martins Matias.
Carlos Manuel Pereira Pinho.
Carlos Mattos Chaves de Macedo.
Carlos Morais Alão.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Daniel Cunha Dias.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando Alfredo Moutinho Garcez.
Fernando José da Costa.
Fernando José F. Fleming de Oliveira.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Manuel Cardote B. Mesquita.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco de Sousa Tavares.
Jaime Adalberto Simões Rumos.
João Afonso Gonçalves.
João Evangelista Rocha Almeida.
Joaquim Pinto.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Luís Figueiredo Lopes.
José Manuel Pinheiro Barradas.
José Mário de Lemos Damião.
Júlio Lemos Castro Caldas.
Leonardo Eugénio R. Ribeiro Almeida.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Manuel Ribeiro Arruda.
Maria da Glória Rodrigues Duarte.
Mário Dias Lopes.
Mário Marques Ferreira Maduro.
Natália de Oliveira Correia.
Nicolau Gregório de Freitas.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio António Pinto Nunes.

Partido Socialista (PS)

Adelino Teixeira de Carvalho.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Marques Antunes.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alfredo Pinto da Silva.
António de Almeida Santos.
António Chaves Medeiros.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Fernando Marques R. Reis.
António José Sanches Esteves.
António José Vieira de Freitas.
António Magalhães da Silva.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando dos Santos Lopes.
Beatriz Cal Brandão.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fausto Sacramento Marques.
Fernando Torres Marinho.
Fernando Verdasca Vieira.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Jaime José Matos da Gama.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Francisco Ludovico da Costa.
José Luís Amaral Nunes.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonel Sousa Fadigas.
Luis Abílio Cacito.
Luís Manuel César Nunes de Almeida.
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel da Mata de Cáceres.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Vergílio Fernando M. Rodrigues.
Vítor Manuel Brás.
Victor Manuel Ribeiro Constâncio.

Centro Democrático Social (CDS)

Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Jacinto Martins Canaverde.
António Mendes de Carvalho.
Armando Domingos L. Ribeiro Oliveira.
Carlos Eduardo de Oliveira e Sousa.
Carlos Martins Robalo.
Daniel Fernandes Domingues.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Emílio Leitão Paulo.
Francisco G. Cavaleiro de Ferreira.
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
João José M. Pulido de Almeida.
João da Silva Mendes Morgado.
José Alberto de Faria Xerez.
José Eduardo F. de Sanches Osório.
Luís, Aníbal Azevedo Coutinho.
Luis Carlos Calheiros V. Sampaio.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Luísa Maria Freire Vaz Raposo.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.

Página 2609

10 DE MARÇO DE 19822609

Paulo Oliveira Ascensão.
Rogério Ferreira Monção Leão.
Rui António Pacheco Mendes.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António José de Almeida Silva Graça.
António José M. Vidigal Amaro.
Carlos Alberto do Carmo C. Espadinha.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Ercília Carreira Talhadas.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitorino.
Josefina Maria Andrade.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Manuel Silva Ribeiro de Almeida.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete dos Santos.
Marina Grou Lanita da Silva.
Octávio Augusto Teixeira.
Vital Martins Moreira.

Partido Popular Monárquico (PPM)

António Cardoso Moniz.
António José Borges G. de Carvalho.
António de Sousa Lara.
Jorge Victor Portugal da Silveira.
Henrique Barrilaro Ruas.

Acção Social-Democrata Independente (ASDI)

Joaquim Jorge de Magalhães S. Mota.
Jorge Manuel M. Loureiro de Miranda.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Manuel Tílman.

União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS)

António César Gouveia de Oliveira.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE)

Herberto de Castro Goulart da Silva.

União Democrática Popular(UDP)

Mário António Baptista Tomé.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura do expediente.

Expediente Ofícios

Da Federação dos Sindicatos do Sector da Pesca, com sede em Lisboa, dando conhecimento de situações a vários níveis no sector que representa, nomeadamente no que diz respeito à SNAPA.
Da União de Freguesias do Concelho do Porto remetendo documento;, resultantes de uma reunião efectuada em 13 de Janeiro transacto, na Câmara Municipal do Porto.
Do Conselho Municipal de Vila Nova de Famalicão remetendo o texto de uma moção aprovada por maioria na sua sessão de 28 de Dezembro do ano findo.
Do Conselho de Informação para a Agência Noticiosa Portuguesa, E.P. - ANOP, enviando os relatórios trimestral e anual das suas actividades referentes ao ano de 1981 e também o teor do parecer emitido pelo mesmo Conselho relativamente à nomeação do jornalista Fernando Lima para director de Informação da ANOP, E.P., acompanhado de algumas declarações de voto.
Do Conselho de Informação para a RTP -Radiotelevisão Portuguesa, E.P., remetendo para apreciação os relatórios trimestral e anual das suas respectivas actividades referentes ao ano de 1981.
Do Conselho de Informação para a Imprensa remetendo igualmente, para apreciação dessa Assembleia, o relatório anual das suas actividades relativamente ao ano findo.
Do Sr. Conselheiro Presidente do Tribunal de Contas remetendo a fotocopia do acórdão daquele Tribunal que julgou a conta do Banco de Portugal, relativamente à gerência de 1919.

Telegrama

Da Comissão de Unidade dos Trabalhadores da Mague enviando moção com vários considerandos e apelando para a demissão do actual Governo.

Diversos

Telex dos delegados sindicais e Comissão de Trabalhadores da Grundig protestando pela tentativa de despedimento de uma delegada sindical.

Telex do Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Químicas do Sul transcrevendo a proposta que foi aprovada no plenário realizado pelos trabalhadores do Parque do Rosairinho da Petrogal, no passado dia l do corrente mês.

Telex da direcção do Sindicato dos Trabalhadores da Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Sul protestando pelo facto de terem sido retirados cinco panos que aquele Sindicato havia mandado colocar no Martim Moniz, referente à manifestação do dia 6 de Março.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Foram apresentados na Mesa, nas reuniões plenárias a seguir designadas, vários requerimentos. Na reunião do dia 2 de Março de 1982: ao Governo, a diversos Minis-

Página 2610

2610 I SÉRIE - NÚMERO 62

térios e à Radiotelevisão Portuguesa, no total de 11, formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; aos Ministérios da Habitação, Obras Públicas e Transportes, dos Assuntos Sociais e à Secretaria de Estado e Turismo, no total de 3, formulados pelo Sr. Deputado Fleming de Oliveira; ao Ministério da Indústria, Energia e Exportação, formulado pelo Sr. Deputado Luís Coimbra; ao Governo e ao Ministério da Habitação, Obras Públicas e Transportes, formulados pelo Sr. Deputado Jaime Ramos; a diversos Ministérios, no total de 4, formulados pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso; à Secretaria de Estado da Segurança Social, formulado pelos Srs. Deputados Ludovico da Costa, Ribeiro Pereira, Nunes de Almeida e Mata de Cáceres.
Na reunião do dia 3 de Março de 1982: ao Ministério da Habitação, Obras Públicas e Transportes, no total de 5, formulados pelo Sr. Deputado Cantinho de Andrade; ao Ministério da Educação e das Universidades, formulado pelo Sr. Deputado Rui Pacheco Mendes; ao Ministério da Agricultura, Comércio e Pescas, formulado pelos Srs. Deputados Álvaro Brasileiro e Rogério de Brito; à Secretaria de Estado da Reforma Administrativa, formulado pelo Sr. Deputado Paulo Ascensão; ao Ministério da Agricultura, Comércio e Pescas e à Secretaria de Estado dos Transportes Internos, no total de 3, formulados pelo Sr. Deputado Roleira Marinho; ao Ministério dos Assuntos Sociais, formulado pelo Sr. Deputado Adriano Vasco Rodrigues; ao Ministério da Qualidade de Vida, formulado pelos Srs. Deputados Leonel Fadigas, Gomes Fernandes e Sacramento Marques; ao Ministério das Finanças e do Plano e à Secretaria de Estado da Integração Europeia, formulados pelo Sr. Deputado Leonel Fadigas.
Na reunião do dia 4 de Março de 1982: ao Governo formulados pelos Srs. Deputados Jorge Miranda e Magalhães Mota; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado José Niza; ao Ministério da Educação e 'das Universidades e às Capitanias dos Portos de Olhão e Tavira, no total de 3, formulados pelo Sr. Deputado Daniel da Cunha Dias; ao Ministério da Habitação, Obras Públicas e Transportes, formulado pelo Sr. Deputado João Carlos Abrantes.
Deram também entrada na Mesa respostas do Governo a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: António Lopes Cardoso, na sessão de 26 de. Fevereiro; António Mota, nas sessões de 10 de Março, 13 de Novembro, 17 de Dezembro e 7 de Janeiro; Magalhães Mota, nas sessões de 17 de Março, 28 de Maio, 12, 15, 20, 22, 27 e 29 de Outubro, 3 e 5 de Novembro e 9 de Dezembro; Ercília Talhadas, na sessão de 12 de Maio; Jaime Ramos e Cipriano Martins, na sessão de 21 de Maio; Zita Seabra, Jorge Lemos e José Manuel Mendes, nas sessões de 7 e 9 de Outubro; Fleming de Oliveira, na sessão de 2 de Junho; Joaquim Miranda, na sessão de 9 de Junho; Anselmo Aníbal e Ercília Talhadas, na sessão, de 18 de Setembro; Octávio Teixeira, na sessão de 20 de Outubro; Jorge Lemos e outros, nas sessões de 29 de Outubro, 5, 10, 20 e 24 de Novembro e 3 de Dezembro; Vital Moreira e Jorge Lemos, na sessão de 29 de Outubro; Silva Graça, na sessão de 22 de Novembro; Alberto Antunes, nas sessões, de 24 e 27 de Novembro; Verdasca Vieira e António Chaves Medeiros, na sessão de 3 de Novembro; Vergílio Rodrigues, na sessão de 5 de Novembro; António Arnaut, nas sessões de 6 e 20 de Novembro e 2 de Dezembro: Álvaro Brasileiro, nas sessões de 13 e 19 de Novembro; Vilhena de Carvalho, na sessão de 15 de Outubro; Dias de Carvalho, nas sessões de 19 de Novembro e 5 de Janeiro; Avelino Zenha, na sessão de 19 de Novembro; Miranda Calha, na sessão de 19 de Novembro; Manuel dos Santos, na sessão de 24 de Novembro: Ilda Figueiredo, nas sessões de 26 de Novembro e 8 de Janeiro; Vidigal Amaro e António Mota, na sessão de 26 de Novembro; Cantinho de Andrade, na sessão de 26 de Novembro; César Oliveira, na sessão de 26 de Novembro, António Teixeira Lopes, na sessão de 27 de Novembro; Vítor Brás, na sessão de 27 de Novembro; Manuel Moreira, na sessão de 27 de Novembro; Luís Saias, na sessão de 3 de Dezembro; Sousa Gomes, na sessão de 10 de Dezembro; Pinto da Silva e Manuel Lopes, na sessão de 15 de Dezembro, respectivamente; Joaquim Gomes, na sessão de 17 de Dezembro; Guilherme de Oliveira Martins, na sessão de 8 de Janeiro; Marcelo Curto e Adelino de Carvalho, na sessão de 19 de Janeiro; Luis Patrão, na sessão de 20 de Janeiro.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente:- Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, eu desejaria interpelar a Mesa justamente em razão da leitura do expediente e por isso pareceu-me ser esta a altura mais oportuna.
Na leitura do expediente do dia 2 d; Março de 1982, à mistura com muitas outras questões de que habitualmente é dada nota pelo Sr. Secretário da Mesa, foram lidos diversos telegramas em relação ao projecto de lei sobre o aborto. E de entre esses telegramas de pessoas e instituições tão responsáveis como o Sr. Arcebispo de Lamego, o Secretariado Diocesano de Lamego e párocos do conselho de Cinfães, etc., de pessoas responsáveis e devidamente identificadas, foi lido um telegrama oriundo de uma senhora que assina simplesmente Maria Helena, do Porto - certamente que no Porto há muitas Marias Helenas -, que não está identificada e, portanto, até prova em contrário, este telegrama é anónimo.
Aliás, este telegrama nem sequer tem uma leitura inteligível e a sensação que nos fica ao lê-lo, no mínimo, é de que eles é oriundo de uma pessoa com insuficiente informação e, porventura, até com insuficiente capacidade de compreensão.
Realmente, deste telegrama fica-nos a sensação de que se misturaram coisas de muito diverso valor e teor, o que até se prejudica aquilo que eventualmente tem algum significado.
Supomos que é norma da Mesa não dar notícia de nada que não esteja devidamente identificado. Temos essa norma como certa, mas este telegrama não lhe obedece e, se o Sr. Presidente me permite, vou lê-lo para que se verifique que ele é perfeitamente ininteligível, além de ser anónimo, até prova em contrário.

Página 2611

10 DE MARÇO DE 1982 2611

O telegrama dirigido à Assembleia da República, Largo das Cortes, Lisboa, diz o seguinte:

Sobre a lei do aborto, os bispos portugueses pedem esquecer que a Bíblia foi escrita da criação do mundo até à vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo à terra e partiu para o Pai. Portanto, não há lei nenhuma na terra. Maria Helena.
Isto, misturado com telegramas de apoio ou de desapoio de pessoas responsáveis e até de- instituições, como já referi, é qualquer coisa de estranho.
Deixo esta nota na acta e peço que nas próximas leituras do expediente haja a preocupação de não se repetirem incidentes destes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, confesso que não tinha conhecimento directo do teor do telegrama. Vamos verificar e desde já fica registada a sua observação que, aliás, me parece pertinente.
De qualquer maneara, oportunamente informá-lo-ei, ou ao seu grupo parlamentar, do que houver eventualmente a acrescentar.
Temos 5 oradores inscritos para produzirem declarações políticas. Vou, portanto, dar a palavra ao primeiro orador inscrito para o efeito, a Sr.ª Deputada Luísa Raposo.
Tem V. Ex.ª a palavra, Sr.ª Deputada Luísa Raposo.

A Sr.ª Luísa Raposo (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos os anos no dia 8 d: Março se fala da mulher, lembrando alguns dos seus problemas e algumas etapas da sua caminhada para uma plena emancipação.
Abordando este assunto queria que ficasse bem claro que para nós, centristas, a liberdade e a responsabilidade são duas faces inseparáveis de uma mesma realidade pessoal e social.
Consideramos que uma sociedade justa deve proporcionar à mulher as oportunidades necessárias para que esta se realize como tal. Isto é, iguais ao homem pela sua dignidade, mas diferentes pela sua natureza.
Consideramos que as mulheres têm uma forma de ser e estar na vida diferente. A sua actuação e abordagem dos problemas, de ordem geral ou particular, da vida de todos os dias, é-lhe específica.
Só em colaboração estreita e participação efectiva, homens e mulheres poderão ter uma visão clara de iodos os problemas de ordem humana e social.
Por isso defendemos que as qualidades e potencialidades das mulheres têm de ser devidamente reconhecidas e valorizadas, como padrões insubstituíveis na construção de uma sociedade humana e equilibrada.
Não podemos pôr a tónica exclusivamente sobre a conquista dos direitos, temos que lembrar e cumprir os deveres, pois corremos o grave risco de esquecer a responsabilidade dos nossos actos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como mulher, sou defensora da igualdade de oportunidades, direitos e deveres iguais para todos.
Mas, para que as mulheres e homens possam procurar o contínuo aperfeiçoamento e encontrar soluções para as mais prementes necessidades da humanidade, terão que necessariamente caminhar juntos e em complementaridade.
Embora as mulheres ainda encontrem grandes dificuldades para a sua plena realização pessoal muita coisa se fez. Temos que aprofundar novas soluções.
Cabe às mulheres da nossa geração, conscientes da sua potencialidade, participarem activamente em todos os sectores da vida nacional.
Para que a mulher consiga coordenar a sua vida profissional com a vida de família é necessário encarar nova forma de organização do tempo - tempo de trabalho, tempo de família. Há soluções modernas não totalmente aproveitadas como, por exemplo, a diversificação de horários de trabalho, horários flexíveis e trabalho a meio tempo, que tantos benefícios trariam para todos.
Parece que há medo de abordar o assunto. Tudo o que pode vir a alterar hábitos é encarado com desconfiança!
Também a valorização económica do trabalho da mulher no lar causa certa surpresa a muita gente, pois habituaram-se a não considerar essa tarefa como possível de valorizar qualquer pessoa.
Para muitos, os que se dedicaram durante uns anos exclusivamente ao bem-estar da família são considerados senão preguiçosos pelo menos originais.
Há que encarar o factor tempo-vida - hoje em dia, felizmente, muito mais prolongado-, que se pede planear de forma a que haja tempo para a família e tempo para a profissão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Posso parecer demasiadamente optimista mas é com uma palavra de esperança que gostava de acabar.
Penso que a longa caminhada da mulher pela conquista da igualdade de oportunidades, direitos e deveres acabará nesta geração.
Aos jovens já não se põe o problema da mesma forma, pois, através das leis, do direito ao voto e da plena participação, o caminho está traçado e aplanado.
Sabemos que o nosso esforço não foi em vão e assumiremos as nossas responsabilidades para ajudar a construir o futuro que todos desejamos melhor para os nossos filhos e filhas.

Aplausos do CDS, do PPM e de alguns deputados do PSD.

A Sr.ª Natália Correia (PSD):- Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Natália Correia (PSD):- Sr. Presidente, a minha bancada gostaria de fazer, pela minha boca, uma curta intervenção sobre este tema.
Enfim, uma intervenção a que o Sr. Presidente dará o nome que entender, ajustado ao Regimento.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, como disse há pouco, há vários oradores inscritos para produzirem declarações políticas, que têm prioridade, e V. Ex.ª só pode fazer uma intervenção depois das declarações políticas. Vamos ver se ainda temos tempo para V. Ex.ª fazer a sua intervenção.

Página 2612

2612 I SÉRIE - NÚMERO 62

A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Então, qual é a oportunidade que o Sr. Presidente me dá para eu me associar ao Dia Internacional da Mulher?

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, penso que ao dizer isso V. Ex.ª já se associou, embora cie uma forma muito sucinta.

A Sr.ª Natália Correia (PSD):- E muito económica, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Mas, se V. Ex.ª se pretende inscrever para produzir uma declaração política, devo dizer que há já quatro oradores inscritos para esse fim e o PSD ficou inscrito para quinta-feira.

A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Sr. Presidente, e se eu pedir a palavra para fazer um pedido de esclarecimento?

O Sr. Presidente: - Com certeza que pode usar da palavra para pedir esclarecimentos.

A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Quanto tempo tenho para pedir esclarecimentos, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Dispõe de 3 minutos, Sr.ª Deputada. Tem V. Ex.ª a palavra.

A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se há país onde a mulher não aguardou a emancipação que o nosso século lhe trouxe para se impor como criadora de valores intelectuais, esse país é Portugal.
Lembro que mesmo no período histórico marcado pela contra-reforma, a literatura se magnificou em nomes femininos como os de Violante do Céu, Maria do Céu e Mariana Glória. Nem mesmo as grades do convento calaram vozes que como diamantes da mais pura poesia, faiscaram na constelação barroca.
Há que recordar este património cultural da criação feminina no Dia internacional da Mulher porque é no campo da cultura que u mulher, com mais brilho e persuasão, manifesta os dons intelectuais que lhe dão plena autoridade para dispor de um estatuto que contemple os apelos da sua subjectividade, o valor do seu intelecto, da sua criatividade e da sua dignidade social, ainda desconsiderada no mundo do trabalho numa situação salarial qualificativa de desigualdade.
Como esquecer, porém, que a nossa sociedade é residualmente misógina. nomeadamente a nível de administração da ré publica, onde a omissão da presença feminina contrasta aberrantemente com o grande impulso que as mulheres dão às letras e às artes do nosso país.
Com um eleitorado maioritariamente feminino, são os homens que têm o comando da vida política, económica e social.
A prevalência do conceito da mulher como animal de luxo dá-lhe lugar decorativo, mitigado no Parlamento e em subalternas acessórias. E, contudo, quanto não lucraríamos em fazer ouvir, em escalões decisórios, a voz cia mulher, portadora - por seu vinculo psicofisiológico à natureza - de uma visão que sacraliza essa natureza. Isto quando a congestão urbanística exige que a ruralização seja o antídoto do mito antológico da cidade, dito quando o ambiente está ameaçado pelos pestíferos produtos de uma civilização industrial de inspiração eminentemente masculina.
Tais são as reflexões que nos parecem oportunas no âmbito do Dia Internacional da Mulher.
E, internacionalizar comemorativamente a importância e as reivindicações femininas, não passará de mais uma flor no calendário cias celebrações se o homem, cujos decretos ainda imperam avassaladoramente na gestão dos destinos do mundo, não adquirir a convicção, subjectiva e objectiva, de que as aportações da mundividência feminina são indispensáveis à reformulação de sistemas e processos exigida pela crise energética, política e institucional e pela ameaça nuclear, pelo espectro do desastre ecológico que a androcracia dominante está longe de resolver.

Aplausos do PSD, do PS, do CDS, do PPM, da ASDI e alguns deputados do PCP.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António Moniz.

O Sr. António Moniz (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os ferroviários são uma classe profissional que, independentemente dos seus diferentes componentes ideológicos, sabe dar resposta, como um corpo, solicitando a atenção das administrações para os problemas que afectam a comunidade portuguesa.
Não poderia eu deixar de tentar interpretar essa vontade, levantando nesta Assembleia problemas que afectam o bom funcionamento dos transportes ferroviários.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A constante queda de árvores nas catenárias do caminho de ferro provoca permanentes faltas de tensão, danifica o material e prejudica as circulações, originando incómodos irreparáveis a passageiros e enormes prejuízos nas mercadorias.
Com o intuito de proteger a catenária, ferroviários de diversos graus da linha hierárquica vêm fazendo, desde há muito, estudos cuidadosos, preparatórios cie uma nova regulamentação nesta matéria, sugerindo alterações à legislação em vigor, cujo conteúdo tem o apoio do paralelismo das legislações estrangeiras mais progressivas.
Neste momento, foi já submetido ao Ministério da tutela respectivo um projecto de diploma destinado a substituir parte do velho Regulamento para a Exploração e Polícia dos Caminhos de Ferro, cuja aprovação dará satisfação às preocupações de segurança da circulação e dos seus utentes, bem como evitará milhares de contos de prejuízos anuais à CP.
Esta a razão por que solicito ao Governo a rápida publicação desse diploma, cujo normativo vem beneficiar significativamente o exercício de funções cios trabalhadores dos caminhos de ferro.
Por outro lado, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não posso deixar de aqui trazer mais uma vez um problema que de qualquer modo, também diz respeito aos caminhos de ferro e aos seus trabalhadores.
A guerra das pontes do Douro, facto político com as tonalidades e o ridículo da «guerra do alecrim e da mangerona», foi o pretexto para certo tipo de imprensa

Página 2613

10 DE MARÇO DE 1982 2613

atirar autarca contra autarca, interior contra litoral, Governo contra província. E afirmo, e repito, «ridícula guerra» porque, na realidade, ela apenas, existiu na cabeça de alguns frustrados autores dessa montagem e nas suas infelizes penas, ávidas de escândalos políticos e alheadas do dever ético de levar ao grande público os elementos essenciais que permitissem formar conscientemente um juízo de valor sobre a oportunidade da construção da nova ponte ferroviária.
Só a ânsia de desencadear divisões dentro da AD explica o facto de se ter omitido gravemente a circunstância de a nova ponte ferroviária ser condição essencial do desenvolvimento de todo o interior nortenho e, por consequência, condição do cumprimento do próprio projecto da Aliança Democrática.
Perguntar-me-ão agora qual o motivo por que novamente trago a es:a casa tal assunto. Muito simples. Neste momento, ainda não tomaram posse os elementos du respectivo gabinete e, inexplicavelmente, os que tentaram protelar o início da construção, invocando a defesa de interesses locais, estão agora quedos e mudos, revelando à saciedade a mesquinhez do seu egoísmo político e a falia de visão para a realização dos projectos nacionais que o governo AD pretende levar a cabo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A ponte ferroviária de D. Maria Pia, inaugurada em 1877, ultrapassou há muito os limites temporais de bons e eficientes serviços normalmente admitidos para este tipo de estruturas.
Apesar do carinho que os ferroviários lhe devotam na sua cuidada conservação, a Ponte de D. Maria Pia caminha, naturalmente, para a ruína, atendendo ao que dela se exige.
A necessidade de se garantir o mínimo de segurança para as circulações vai tornando cada vez mais cara e complexa essa conservação, aumentando, por sua vez, o risco de avarias, com consequências desastrosas na qualidade do tráfego.
Estes factos desde há muito impunham, logicamente, a sua substituição, mais que não fosse pelas anti-económicas limitações de cargas e velocidades exigidas para garantir um mínimo de segurança.
Apesar do conhecimento destes factos, o projecto da nova ponte ferroviária foi sendo empurrado de Administração para Administração, no desfiar burocrático do centralismo do anterior regime e da falta de vontade política dos governos que antecederam o da AD.
Finalmente, em 1981, o VII Governo veio dar satisfação às aspirações do homem do interior nortenho, nomeando uma comissão que num breve espaço de tempo apresentaria uma proposta de implantação do traçado da nova ponte ferroviária, de via dupla, que ligará as estações das Devezas e de Campanhã.
Parecia que as populações esquecidas do Douro, do Minho e de- Trás-os-Montes iriam passar a ter, a breve trecho, circulações ferroviárias em número suficiente e em condições que constituíssem motivo de progresso e de desenvolvimento das suas regiões, acabando u estrangulamento causado pelo garrote injusto da alquebrada Ponte de D. Maria Pia.
Mas assim não aconteceu. Todos os que por desinteresse, por incompetência, por falta de participação, entravaram ao longo de dezenas de anos o projecto da nova ponte acordaram do sono letárgico em que se encontravam, dando alimento a questiúnculas políticas, logo aproveitadas para o brandir de interesses locais vesgos e de bairrismos tolos que apenas prejudicam o interesse do todo nacional.
E, para completar este quadro, omitiram-se tomadas de posição dos próprios autarcas, para que aos olhos do público aparecesse um irremediável conflito entre o Governo e o poder local AD que adiasse mais uma vez a construção da nova ponte do Douro e satisfizesse os apetites saloios da baixa política.
Convém recordar que a Assembleia Municipal do Porto, em reunião realizada em Março de 1981, aprovou uma proposta do Partido Popular Monárquico, com votos da maioria AD e de parte dos deputados municipais socialistas, que propunha ao Governo a construção de uma nova ponte ferroviária sobre o Douro, cujo início devia ter lugar no mais curto espaço de tempo, sem contudo ser inviabilizada a construção de uma nova travessia rodoviária de cota alta, nem devendo ser suspensos os estudos necessários a este último projecto.
Os responsáveis autárquicos de um órgão com u importância da Assembleia Municipal do Porto viam com natural apreensão a saturação a curto prazo das pontes rodoviárias existentes, mas sabiam, realisticamente, que os estudos sobre a colocação de um novo atravessamento e os estudos sobre a própria circulação rodoviária dentro da cidade do Porto estavam ainda muito longe de ser ultimados, não sendo possível, por consequência, que a construção da nova ponte ferroviária adormecesse, mais uma década, à espera de uma ideal ponte mista.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas essa proposta do PPM, bem como a ulterior decisão da Assembleia Municipal, eram certamente elementos incómodos para os fins que ÁS propunham as «sócias» e os «peraltas» desta nova versão da guerra do «Judeu», razão por que foram esquecidas ao canto da gaveta e substituídas, com um descaramento sem limites, por uma ridícula comparação do número de passageiros que diariamente faz a travessia do rio Douro por meios ferroviários com o que através dele viaja por outros meios, tirando-se daí a bizarra fundamentação para a não construção da ponte ferroviária.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O governo AD prometeu ao eleitorado rasgar rapidamente o acesso do interior ao litoral, removendo obstáculos, o burocratismo e a teimosia de gerações.
A sua actuação fez renascer a esperança ao homem da província. Ora, é em nome dessa esperança que venho protestar contra o inexplicável silêncio que recaiu sobre a construção da ponte ferroviária do Porto. Assim, exijo saber a data em que toma posse o gabinete da ponte, a data em que se inicia a sua construção e, igualmente, pretendo saber quando são postos à discussão pública os estudos que viabilizem a construção do terceiro atravessamento rodoviário sobre o rio Douro.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A cidade do Porto, através da história, tem sido o sujeito colectivo e a legítima representante das regiões mais esquecidas do País na luta contra o centralismo e contra as assimetrias existentes.

Página 2614

2614 I SÉRIE - NÚMERO 62

E ninguém melhor personaliza essa luta do que a figura inesquecível do Dr. Francisco Sá Carneiro. É por essa razão que sugiro que à nova ponte ferroviária do Porto seja dado o nome desse grande estadista portuense.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esta é uma exigência dos democratas nortenhos em particular e dos portugueses que amam a liberdade em geral.

Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.

Durante a intervenção, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Américo de Sá.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr." Deputada Alda Nogueira.

A Sr.ª Alda Nogueira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Daqui, e a propósito do Dia Internacional da Mulher, saudamos hoje, em especial, Maria Lamas, resistente antifascista e grande defensora dos direitos da mulher em Portugal.

Aplausos do PCP, do PS, da UEDS e da UDP.

A escritora e jornalista, cuja obra é toda ela um acto de defesa dos direitos e valores das mulheres portuguesas trabalhadoras, domésticas, jovens e outras. Maria Lamas que ontem foi, muito justamente, homenageada publicamente na cidade de Lisboa.
Muitos dos direitos das mulheres, sobretudo das trabalhadoras, por que Maria Lamas e tantas outras mulheres democratas, que daqui também saudamos, lutaram abnegadamente, foram conquistados com o 25 de Abril.
Mas a luta continua, porque há quem queira pôr tais direitos em causa, há quem não os respeite.
Maria Lamas tem nas mulheres democratas que hoje continuam a luta contra as tentativas para privar as mulheres dos direitos conquistados com Abril, as suas verdadeiras companheiras de luta, de ontem e de hoje.
Problemas fundamentais da mulher portuguesa subsistem e agravam-se. Mais de 70 % dos desempregados do nosso país, cujo número aumenta sem cessar, são mulheres e destas a maioria são raparigas, jovens à procura do primeiro emprego.
Continuam, apesar das conquistas alcançadas, a existir problemas graves: não está assegurado o direito da mulher ao trabalho.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Isto, apesar da visível e indesmentível vontade da mulher de ingressar no trabalho produtivo, como o demonstra a crescente taxa de actividade feminina que, de um pouco mais de 20 % nos anos setenta, subiu para 37,1 % em 1981.
A valente luta das operárias da Camboumac há meses, sem desfalecimentos, pela defesa da garantia do seu direito ao trabalho, apesar de 16 meses de salários em atraso, merece o nosso melhor respeito. E daqui as saudamos também.
A luta das operárias da Algot e da Cintindeal e tantas outras, igualmente pela garantia do mesmo direito da mulher ao trabalho, não podem deixar de ser aqui por nós referidas.
Também no campo do apoio, protecção e defesa da maternidade, muito >há ainda a fazer para tornar a maternidade um acto responsável e consciente, para permitir à mãe e à trabalhadora uma actividade profissional, social e política, a que constitucionalmente tem direito.
Neste campo, a apresentação aqui há dias pela minha camarada Zita Seabra, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, de 3 projectos de lei sobre «defesa da maternidade», «planeamento familiar, educação sexual» e «interrupção voluntária da gravidez», representam um passo importante na vida das mulheres portuguesas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: E que dizer das discriminações das mulheres desde o campo profissional, onde normalmente ocupam os menos qualificados postos de trabalho, até à sua discriminação no campo social e político?
Que dizer da imagem falsa da mulher que, desde os manuais escolares aos meios de comunicação social, continua a ser veiculada em Portugal?
Vê-se, pois, que no seguimento e na continuação da luta travada há longos anos por Maria Lamas, ainda hoje a mulher portuguesa tem motivos importantes e justificados para a luta pela defesa dos seus interesses e direitos pela solução dos seus problemas de mãe, trabalhadora e cidadã.
Ameaçada, perseguida, privada do seu lugar de directora da revista Modas e Bordados, por se recusar a abandonar a direcção do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas de que era presidente, Maria Lamas é um exemplo de como o fascismo actuou contra os que se opunham aos seus desígnios de relegar a mulher para a condição de cidadã de segunda classe.
O assassinato da Catarina Eufémia, quando em luta pela defesa dos seus direitos de trabalhadora, é bem um exemplo extremo de tal actuação repressiva.
Mulheres como Maria Lamas, Maria Machado, Helena Magro, Luísa Paulo, Isabel Aboim Inglês, Maria Luísa Costa Dias e jovens trabalhadoras e estudantes, mulher ou jovem que se tenha oposto de uma forma ou de outra, à política de fome, exploração, guerra e discriminação do regime fascista nenhuma escapou à perseguição à repressão.
Maria Lamas, já com mais de 50 anos, sofreu várias prisões: em 1949, em 1950, em 1951. E em 1953 é de novo presa no Aeroporto de Lisboa com mais 100 democratas que ali a aguardavam quando regressava de uma reunião do Conselho Mundial da Paz, e que se recusaram, uma vez presos, a ser libertados sem que Maria Lamas o fosse também. É que Maria Lamas foi e é, também, uma destacada defensora da causa da paz em Portugal e no Mundo. Foi e é membro dos corpos dirigentes dos organismos nacionais e internacionais da paz.
E defender a paz, em plena guerra fria, em Portugal, implicava, no mínimo, aquilo que se passou em 1953 no Aeroporto de Lisboa,
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desejaríamos terminar estas palavras a propósito do Dia Internacional da Mulher, sublinhando a necessidade de um debate amplo em torno das questões da mulher e dos problemas desta na sociedade.

Página 2615

10 DE MARÇO DE 1982 2615

Lançada está a primeira pedra com os 3 projectos do lei do PCP já referidos.
Avançar para tal debate é necessário e urgente para a defesa dos direitos, para a solução dos problemas que existem ainda entre as mulheres trabalhadoras, mães e cidadãs deste pais de Abril.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - E essa é certamente a melhor forma, que afinal temos ao nosso alcance, para homenagear Maria Lamas.

Aplausos do PCP, do PS, da UEDS e da UDP.

Entretanto, assumiu a Presidência o Sr. Vice-Presidente Américo de Sá.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. É para me associar, muito brevemente, às palavras de homenagem à escritora Maria Lamas.
Maria Lamas foi precursora e é um símbolo da luta pelos direitos da mulher em Portugal.
Tive o privilégio de a conhecer em Paris já no seu último exílio. No seu quarto do hotel da Rue Cujas juntavam-se os exilados de vários quadrantes políticos e ideológicos. E nas horas amargas e difíceis foi para muitos de nós a mãe, a irmã mais velha, a companheira de uma luta comum.
Tive também ocasião de a receber em Argel, onde ela passou uma temporada, e posso testemunhar da sua fidelidade à causa da liberdade, a causa comum da resistência e do seu combate sempre pelos direitos da mulher e pela igualdade da mulher no combate por uma sociedade mais justa.
Assim, queria deixar aqui o tributo do meu respeito, a minha homenagem a essa grande mulher portuguesa, que é também um símbolo da resistência portuguesa e através dela, homenageando Maria Lamas, homenagear todas as mulheres que souberam lutar contra a ditadura e que lutam hoje, em novas condições, .pelos direitos da mulher, pela igualdade e por uma sociedade mais justa em Portugal

Aplausos do PS, do PSD, do PCP, do PPM, da ASDI, da UEDS e da UDP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.

A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vejo melhor enquadramento para homenagear Maria Lamas do que o Dia Internacional da Mulher, como muito bem fez a Sr.ª Deputada Alda Nogueira.

Aplausos do PSD, do PS, do PCP, do PPM, da ASDI e da UEDS.

A sua obra literária e social dedicada à mulher, a sua altíssima dignidade moral, o seu enorme valor cívico, o seu comportamento exemplar na luta pela liberdade, que a condenou a prisão e ao exílio, são motivos que nos vergam ao respeito que essa grande figura de mulher portuguesa nos merece.
Símbolos como Maria Lamas, na luta pela emancipação feminina e feita resistência à intolerância que se abateu sobre o nosso país ao longo de muitos anos, são raros e são de venerar para sempre.

Aplausos do PSD. do PS, do PCP, do PPM, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barrilaro Ruas.

O Sr. Barrilaro Ruas (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria, em nome do PPM, associar-me, em palavras muito singelas, à homenagem prestada à grande escritora e portuguesa que é Maria Lamas.
Recordo com uma certa saudade o tempo em que, sendo eu menino e moço, Maria Lamas sob o pseudónimo de Rosa Silvestre soube ilustrar, singularmente, a página infantil de um grande jornal de que era directora, um jornal independente, de orientação católica e monárquica, que era A Época, do Conselheiro Fernando de Sousa - não se deve confundir com a outra Época, que infelizmente deslustrou esse título nos últimos anos do Estado Novo, Maria Lamas acompanhou depois os tempos nas suas circunstâncias e soube adaptar-se, de modo extremamente digno, a essas circunstâncias, lutando sempre pelos ideais mais nobres da criança, da juventude, da mulher, da comunidade política em geral, tanto no âmbito nacional, como no âmbito internacional. Tornou-se, de facto, um grande nome das letras e um grande nome da luta pela liberdade, pelos direitos humanos fundamentais, pela paz e pela grandeza dos ideais humanos.
Maria Lamas, felizmente viva, não tem de esperar aquela hora que em geral as escritoras e os grandes nomes esperam -para concitar à sua volta as homenagens de todos.

A Sr.ª Natália Correia (PSD):- Muito bem!

O Orador: - Neste momento, em que Maria Lamas é um grande nome entre os vivos, tenho muito gosto e muita honra em associar a minha voz humilde a este coro de louvores que ela merece como poucos.
Recordo, também, como ela, ainda há muito pouco tempo, assinando uma tradução exemplar de um livro extraordinário, como são As Memórias de Adriano, de Marguerite Yourcenar, veio afinal introduzir nessa obra uma nota extremamente feminina e pessoal, através de um estilo e de um português magnífico, que é o seu, numa grande temática universal, que é a temática política, a temática do humanismo, a temática dos grandes temas, que a Humanidade tem de tratar em todas as épocas.
Mais por isto, também gosto de associar o meu nome à homenagem a Maria Lamas.

Aplausos ao PPM, do PSD, do PS, do CDS, do PCP, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

Página 2616

2616 I SÉRIE - NÚMERO 62

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Naturalmente que a UDP se associa a esta homenagem.
A UDP apresentou na Mesa da Assembleia um singelo voto de saudação a Maria Lamas. Assim, solicitava ao Sr. Presidente que, dada a circunstância e a oportunidade, esse voto não caísse na «gaveta dos votos» que está para aí e que pudesse ser hoje votado, dado que praticamente todos os partidos já se pronunciaram e dada a simplicidade do próprio voto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o voto vai ser lido.
No entanto, penso que há regras para isto, há vários votos pendentes e terá de ser discutido e votado oportunamente.

O Sr. Secretário Reinaldo Gomes vai ler o voto.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - O Voto de saudação é do seguinte teor:

A Assembleia da República, ao comemorar o Dia Internacional da Mulher, saúda a cidadã Maria Lamas, exemplo vivo de uma luta de vida inteira pela dignificação da mulher e pela defesa das liberdades no nosso país.

O Deputado da UDP, Mário Tomé.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado Lopes Cardoso

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): -Sr Presidente, é evidente que há uma certa namitação para os votos. Mas penso que se houver unanimidade neste Plenário nada poderá obstar a que o voto apresentado pela UDP seja votado imediatamente.
Era para isto que queria chamar a atenção do Sr. Presidente, dizendo desde já que da nossa parte daremos o nosso acordo para que se proceda á imediata votação do voto proposto pela UDP.

O Sr. Presidente: - Vamos já ver se existe esse consenso, sem prejuízo da palavra do Sr. Deputado Sanches Osório, que tem agora a palavra.

O Sr. Sanches Osório (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois de tudo o que já foi aqui afirmado, sobre a figura impar de Maria Lamas, mais nada tenho a acrescentar, a não ser no sentido de deixar o meu testemunho de muito apreço pela lutadora corajosa e exemplar que foi e é Maria Lamas.
Posso dizer que alguns desses factos políticos senti-os na minha juventude, marcaram-me profundamente e estiveram na origem da minha formação e de muitos camaradas meus, que foram, porventura, contributo valioso e de sacrifício indivisível para o 25 de Abril.
É pois uma palavra de saudação, em meu nome pessoal, que aqui quero deixar à grande escritora e grande portuguesa que é Maria Lamas.

Aplausos do CDS, do PSD, do PS, do PCP, do PPM, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Atendendo à sugestão do Sr. Deputado Mário Tomé desejava saber se algum partido se opõe a que o voto seja votado imediatamente?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Alberto Xerez.

O Sr. José Alberto Xerez(CDS): - Sr. Presidente, o CDS pede uma interrupção da sessão por 15 minutos, ao abrigo do Regimento.

O Sr. Presidente: - É regimental, está concedida Está, pois, interrompida a sessão.

Eram 16 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 16 horas e 40 minutos

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr. Presidente, eu estava fora do Plenário a tratar de outros assuntos e não assisti a toda a reunião. Mas suponho que há 5 declarações políticas, das quais só 2 foram proferidas.

O Sr. Presidente: - 3, Sr. Deputado.

O Orador:- Nesse caso, faltam 2 intervenções. O que eu queria perguntar era o seguinte este voto e enxertado no meio das declarações políticas ou vai ser votado no fim delas?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o único problema que esta pendente e sabei se o voto vai ser votado hoje ou se, pelo contrário, vai entrar no esquema dos votos que estão pendentes na Mesa.

O Orador: - Sr. Presidente, não gostaria de me pronunciar neste momento, pois queria saber até que horas vão as declarações políticas, e isto por uma simples razão nos temos hoje na ordem do dia a questão da autonomia universitária que foi adiada mais de meia dúzia de vezes, o que quer dizer que se não houver tempo para essa discussão nós nos oporemos à votação do voto, o qual, por sua vez, se juntara aos outros votos em suspenso para votação. Se, pelo contrário, a ordem do dia de hoje não ror prejudicada, não nos oporemos a que se proceda hoje a votação.
Tudo fica assim, condicionado ao desenvolver dos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tinha sido aqui dito que, se não houvesse oposição, se votava já - o tempo da votação e de 10 segundos Agora, se se pretende que o voto seja adiado, isso e um problema completamente diferente. O meu grupo parlamentar está apto a votar, já fez mesmo uma declaração de sentido de

Página 2617

10 DE MARÇO DE 1982 2617

votou em relação a este assunto e, como já se perdeu muito tempo com isso, o que me parece é que se deve dizer, claramente, se se pretende ou não que o voto seja votado, pois o tempo da votação 6 mínimo - 10 segundos- e não é isso que irá atrasar a discussão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o único pedido do Sr. Deputado Mário Tomé é no sentido de que o voto nau entre no esquema habitual, não vá para a Mesa para ser marcado dia para a sua votação, mas sim de que se proceda hoje a essa mesma votação.
Ora, penso que a posição que o CDS acabou de tomar não tem nada a ver com isto. Vamos ouvir as declarações políticas que faltam e no fim o CDS pronunciar-se-á sobre se dá ou não o seu consenso para essa votação.

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Carlos Robalo (CDS):- Sr. Presidente, eu peço imensa desculpa por gastar mais alguns segundos, mas gostaria de dizer ao Sr. Deputado Sousa Tavares que a minha posição foi clara; se, de facto, u Sr Deputado a não entendeu, posso explicá-la novamente.
Também queria dizer-lhe o seguinte: E que a votação de um voto não é de 10 segundos, até porque emendo que ou há intervenções sobre o voto, ou declarações de voto, o que normalmente faz alongar o tempo para 10 minutos. Nunca, portanto, 10 segundos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Salgado Zenha.

O Sr. Salgado Zenha (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria só de dar a minha anuência à sugestão do Sr. Deputado Sousa Tavares, porque se me afigura que se podia votar de imediato. Como, porém, o Sr. Presidente já resolveu, nada tenho a opor a essa resolução.

O Sr. Presidente: - É que, Sr, Deputado, no entendimento da Mesa, o pedido do Sr. Deputado Mário Tomé e no sentido de o voto ser votado hoje, não necessariamente agora.

O Orador: - Se eu bem entendi, Sr. Presidente, o Sr. Deputado Sousa Tavares sugeriu que se votasse imediatamente. Como todos os partidos já exprimiram a sua adesão à homenagem à escritora Maria Lamas, parece-me que apenas aqueles partidos que ainda se não tenham pronunciado terão o direito de fazer uma declaração de voto. Creio que foi este, genericamente, o sentido da sugestão do Sr, Deputado Sousa Tavares, pelo que nós daríamos o nosso acordo. Contudo, qualquer deliberação que a Mesa tome será por nós acatada sem qualquer reserva.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Beatriz Cal Brandão.

A Sr.ª Beatriz Cal Brandão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste Dia Universal da Mulher, que, ontem, 8 de Março, se comemorou, não podiam as mulheres socialistas deixar de recordar não só aquelas que em 8 de Março de 1857 -numa das primeiras greves de mulheres de todo o mundo - foram sacrificadas à brutal violência da polícia de Nova Iorque, como todas as outras que, através dos tempos, tem lutado pelos seus direitos, quer isoladas quer em conjunto com todos aqueles que se têm empenhado na defesa comum da igualdade de direitos ou da liberdade dos povos.
E, sendo mais um Dia Universal da Mulher a celebrar-se durante a Década das Nações Unidas para a Mulher, de 1976 a 1985 -que teve por fim constituir (princípio de citação) «um período propício à adopção de medidas eficazes e decididas, aos níveis nacional, regional e internacional, que obedecesse a três grandes temas - igualdade, desenvolvimento e paz» (fim de citação)-, não deixará de ser oportuno fazer uma breve reflexão a esse respeito, como melhor maneira de o comemorar.
É que, durante esta Década, Portugal, e graças ao 25 de Abril, com a promulgação da Constituição de 1976, deu um passo decisivo em relação ao primeiro tema, ao declarar no seu artigo 13.º que «ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social».
Em razão de tal preceito constitucional, a mulher passou a ter acesso ao exercício de todas as funções públicas; a depender só de si - e não do consentimento do marido - a escolha da sua profissão; a ter igualdade de direitos na família e o mesmo direito que o pai quanto aos filhos.
Enfim, passou a ser igual em todos os direitos em relação ao homem e a mãe solteira obteve para os seus filhos a mesma dignidade e os mesmos direitos que a mulher casada.
Quer dizer, aqueles objectivos mínimos que o plano de acção mundial, adoptado na Conferência Mundial do Ano Internacional da Mulher, realizada no México em 1975, propôs para os 5 primeiros anos da Década foram quase todos realizados em Portugal e disso nos temos de orgulhar.
Porém, isso não basta, e a mulher portuguesa tem de continuar a sua luta. de modo a que, ainda antes de findos os últimos anos da Década, se concretizem melhor os seus direitos e se consigam realizar mais alguns dos objectivos mínimos indicados para os 5 primeiros anos e que não foram atingidos, como, entre outros, «o de intensificar a alfabetização cívica das mulheres, em particular nas zonas rurais, aumentar as possibilidades de emprego para as mulheres e encorajar uma maior participação destas na vida política a nível local, nacional e internacional».
Além disso, e como um dos problemas mais candentes do nosso país e o da habitação, as mulheres tem também que se empenhar na concessão de uma casa para quem a não tem e. como a maioria delas passa ainda mais tempo em casa do que os homens, pela melhoria das habitações existentes, já que é elevadíssimo o estado de degradação das mesmas, reivin-

Página 2618

2618 I SÉRIE - NÚMERO 62

ilicações que bem se podem integrar no segundo grande tema da Década das Nações Unidas.
O terceiro grande tema, o da paz, é sem dúvida o mais .preocupante e o que mais aflige as mulheres que vêem na guerra além de tudo o mais, uma constante ameaça aos seus sentimentos mais afectivos de mulher e mãe.
Mas como é possível falar de paz se ante? não se falar da harmonia entre os povos e do respeito que todos devem ter pela observância da Declaração Universal dos Direitos do Homem, não só nu interior dos seus próprios países como nas relações com os seus vizinhos?
Assim, é necessário, antes de mais, lutar para que se ponha termo em todos os países à falta de respeito pelos direitos mais elementares dos cidadãos, que conduzem sempre a paixões exacerbadas e a actos de maior violência.
Portanto, queremos que não seja mais possível ter de fazer uma greve da fome para conseguir que uma mulher se possa juntar ao seu legítimo marido, como aconteceu na União Soviética; que não mais elementos da política raptem e assassinem, como voltou a acontecer, agora, na Argentina, com o rapto da jovem socialista revolucionária Ana Maria Martinez; que não mais se prendam e torturem mulheres que fizeram, na prisão, uma greve de fome em protesto contra os maus tratos infligidos aos seus familiares, como aconteceu na Turquia; que não mais se decapitem 51 pessoas, entre as quais 14 crianças, como aconteceu recentemente na Guatemala; que não se continuem a cometer todos os dias as mais horrorosas carnificinas de homens e mulheres, como está a acontecer em El Salvador; que não mais se prendam aos milhares por reclamarem a liberdade sindical, como está acontecer na Polónia; enfim, que se deixem de cometer as maiores violências, crueldades, assassínios, como acontece na Irlanda, no Irão, no Líbano, no Vietname, no Kampuchea e em tantas e tantas outras partes do mundo.
Trabalho difícil e, sem dúvida, demorado, no qual às mulheres cabe um grande lugar, empenhando-se nessa luta com determinação e coragem, participando em todas as actividades que tenham por fim consciencializar os povos de que os únicos caminhos que podem levar à paz é esse respeito mútuo pelos direitos inalienáveis dos cidadãos e pela liberdade dos povos de disporem livremente dos seus destinos.
Mas, ao celebrar-se hoje aqui nesta Assembleia o Dia Internacional da Mulher, não podem as mulheres socialistas, desde que se encontra posto sobre a mesa o problema do aborto, deixar de dizer a esse propósito, e por agora, duas breves palavras, já que é um problema que, acima de tudo, diz respeito às mulheres, pois serão sempre estas que mais sofrerão as suas consequências, quer abortando quer deixando de abortar.
Permito-me recordar que foi um governo socialista - o I Governo Constitucional - o que primeiro trouxe a esta Assembleia o problema do aborto, propondo a despenalização do aborto terapêutico e do aborto eugénico.
Com razão dissemos, pois, aqui, que não temos complexos deste domínio.
No seu I Congresso Nacional, depois de constituídas em organismo autónomo do Partido Socialista, manifestaram-se desde logo a favor da despenalização do aborto por entenderem que não é por meios coercivos, mas por uma acção pedagógica constante e esclarecedora, que se conseguirá evitá-lo.
E, se é justo que, ao apreciar o problema, se pense no direito á vida, também é igualmente justo pensar no direito, que a mulher tem, a uma vida decente, sem miséria.
Torna-se necessário, portanto, lutar pela consciencialização das mulheres a respeito dos direitos constitucionais ao planeamento familiar e, sobretudo, pela criação de iguais condições sociais para todas elas.
E, isto até porque, com condições sociais diferentes, qualquer penalização do aborto só viria a atingir aquelas mulheres que, devido a carências económicas, não tivessem podido servir-se das imunidades que hoje se encontram estabelecidas nas legislações da grande maioria dos países civilizados, deslocando-se a qualquer deles.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As mulheres portuguesas, conscientes dos seus direitos, não desistirão de os defender, e estão certas de que Portugal continuará no caminho que foi traçado, em relação aos seus direitos, pela Constituição de 1976.

Aplausos do PS, do PSD, do PPM e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao passar mais um ano cobre o dia 8 de Março, mais um ano sobre o 25 de Abril e mais um longo ano de governação AD, podemos dizer que, relativamente à situação da mulher no nosso país, na prática, tudo se encontra na mesma ou até que está tudo pior. E não será de estranhar que assim seja, visto que a liberdade escancarada do 25 cie Abril se está cerrando aos poucos, enquanto, naturalmente, a mulher vê os seus problemas irem-se agravando, os direitos conquistados continuarem a ser-lhe negados, o seu estatuto de igualdade ser adulterado, as nuvens negras do episcopado, da Secretaria de Estado da Família e da AD, de uma forma geral, juntarem-se, encastelarem-se e tudo escurecerem de novo.
A liberdade da mulher tem a ver com a sua condição de trabalhadora e com o seu estatuto social. Por isso que, naturalmente, cresça o movimento e a luta de libertação da mulher, como consequência da contradição objectiva existente entre a sua situação de oprimida e marginalizada, de duplamente explorada e a sua participação cada vez maior na produção e, portanto, na luta social.
Mergulhando com vigor e coragem na luta social, as mulheres dão o exemplo colectivo e contribuem de forma decisiva para as transformações da sociedade. Ao lado dos homens, por vezes contra a vontade dos próprios homens. Conquistando duramente, palmo a palmo, o reconhecimento por parte do companheiro, do pai ou do amigo, do seu direito a não serem discriminadas, a poderem decidir por si como, o quando, o quanto fazer, dar ou receber.
Se com o 25 de Abril a mulher conquistou o reconhecimento legal e constitucional dos direitos por

Página 2619

10 DE MARÇO DE 1982 2619

que tanto se bateu, temos de reconhecer que hoje, na prática, a sua situação se mantém: de duplamente explorada, de marginalizada, de sujeita à cupidez e despotismo.
Por isso também a sua luta continua, quotidiana, silenciosa, explodindo aqui e ali, mas sem resposta efectiva.
E no nosso país as próprias condições de atraso do capitalismo tomam a vida da mulher mais difícil, suscitando um reforço do arcaísmo na ideologia dominante. A AD encara o aborto de uma perspectiva vitoriana, como encara a contracepção e a própria informação e educação. Como encara a mulher.
Ao lado da Igreja, que define os arquétipos repressivos de acordo com os interesses da classe dominante, a Secretária de Estado da Família colabora activamente na menorização da mulher, que, contrariando a própria situação objectiva da sua participação na produção, se vê classificada como «ser familiar», e não como ser humano e produtivo, ser social.
Mantendo e preservando o estatuto familiar da mulher como privilegiado, garante-se assim a manutenção daquela num limbo em que é por vezes o seu próprio companheiro quem inconscientemente colabora com o patronato na imposição do desemprego ou na desclassificação como entidade autónoma na relação de trabalho.
A legislação aceite no mundo capitalista, dando passos em frente no reconhecimento da mulher como ser autónomo e livre, imposto pela sua luta secular, não é posta em prática e não passa de mero reconhecimento jurídico que as condições da produção capitalista põem sistematicamente em cama.
A Conferência de Copenhaga, realizada pela ONU em 1980 para balancear os resultados da aplicação das normas referentes à década da mulher, foi obrigada a reconhecer como altamente negativos os resultados dos 5 anos anteriores.
As causas desse balanço negativo, antes de se procurarem na má vontade de governos e governantes, encontram-se na incapacidade do sistema capitalista para satisfazer as reivindicações de igualdade por parte da mulher.
A propriedade privada da terra, das fábricas e empresas, o poder do capital, em que os trabalhadores estão reduzidos à escravidão assalariada, mantêm a mulher na situação de dupla escravidão, mantendo o homem como detentor de privilégios.
E onde existe a igualdade na lei, ela não se mantém na própria vida.
Só a organização colectiva do trabalho permitirá à mulher obter o estatuto de igualdade a que tem direito.
É por isso que são as operárias quem ocupa o lugar da vanguarda na luta pela liberdade e igualdade dos operários e camponeses, dos trabalhadores, na luta contra o capitalismo, na luta pelo socialismo.
Louise Michelle, Alexandra Kollontai, Maria Lamas, Josina Machel, 4 mulheres que assumiram e encabeçaram a luta pela liberdade dos oprimidos e pela liberdade da mulher. A luta dos povos pela emancipação, do proletariado pelo fim da propriedade privada, pela paz.
É o fim da propriedade privada que permitirá à generalidade da mulher trabalhadora superar as limitações que lhe são impostas e participar activamente na vida colectiva, política, social e cultural.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Falar hoje, no nosso país, da situação da mulher, nomeadamente da mulher trabalhadora, da sua luta pela liberdade e igualdade, é falar contra a AD, é juntar forças para tirar a AD do Governo e repor os caminhos do 25 de Abril.
É falar da exploração capitalista, da repressão patronal, do desemprego, da exploração e chantagem sexual, da violência.
É falar da falta de creches e jardins de infância, da falta de habitação, do aumento do custo de vida, dos aumentos dos serviços médico-sociais e dos medicamentos, da falta de planeamento familiar, da proibição reaccionária e obscurantista do acesso dos jovens às consultas de planeamento familiar.
É falar também do bispo de Braga, da penalização do aborto, da visita do Papa, das emissões da RTP do Proença.
Porque, sendo males que, uns mais do que outros, se abatem sobre todo o povo trabalhador, eles atingem sobremaneira as mulheres como consequência da sua condição objectiva.
É sobre elas que se abate mais brutalmente o desemprego - 73 % do total dos desempregados no nosso pais; são elas que são despedidas pelo simples facto de engravidarem, ou pela mesma razão perdem os prémios de produtividade. São elas que ainda recebem menores salários, são elas que tradicionalmente, familiarmente, têm de fazer crescer o dinheiro para dar de comer aos filhos; são elas que os acompanham na doença; são elas que mais atrasadas são obrigadas a manter-se; são elas que mais contribuem para os assustadores índices de analfabetismo; são elas que suportam o dia inteiro dentro da barraca ou da casa degradada a cair-lhe em cima; são elas que, trabalhando ou não fora de casa, se «estuiporizam» na lida doméstica e na alienação da telenovela; são elas que sofrem a angústia, a solidão, o medo, a violência do aborto clandestino. São elas o alvo predilecto de bispos untuosos e de curas concupiscentes, de santos perversos e de deuses castigadores.
É prioritariamente para elas que a Secretaria de Estado da Família existe, com todo o seu sinistro significado.
Como em 1977, em que o Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas é encerrado pelo governador civil de Lisboa sob a alegação de que o Estado assistia às mulheres através da Obra das Mães, hoje, a Comissão da Condição Feminina é lançada ao ostracismo, dependurada, sem apoio nem financiamento, e tudo passa a ficar, na prática, dependente da Secretaria de Estado da Família.
Outros tempos, outros métodos, o mesmo fim: reduzir a mulher à sua condição de mãe, definir a mulher exclusivamente em relação à família; retirar-lhe sumariamente o estatuto de trabalhadora, de ser independente e livre.
Dependente do homem ou do Estado -com o subsídio para as donas de casa-, garantia de perpetuação da relação de dominação e de propriedade privada.

Página 2620

2620 I SÉRIE - NÚMERO 62

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A mulher portuguesa desde sempre tem lutado, sem desfalecimento, contra a sua situarão de desigualdade, contra a exploração e a miséria pelo socialismo e pela paz.
Catarina Eufémia e Maria Lamas: Uma, a proletária indómita, mostrando o caminho aos da sua classe e a todos os outros que queiram derrotar a reacção, a exploração capitalista e a arbitrariedade fascista.
Outra, a mulher burguesa que da sua classe apenas ficou com o menosprezo mais ou menos declarado, quando não o ódio, que lhe votaram, ao tornar-se irmã de Catarina.
Mana Lamas é bem o símbolo de uma luta consequente na defesa das liberdades e pela dignificarão da mulher. A UDP não quer deixai de se associar as homenagens publicas que lhe têm sido muito justamente prestadas.
O caminho da luta foi escolhido pelas trabalhadoras do nosso pais, que desde sempre e depois do 25 de Abril se caracterizam pela sua coragem e radicalismo, adquirindo nessa luta a consciência de que a sua situação de desigualdade não poderá ser superada dentro dos limites) de uma sociedade estruturada e consolidada na iniquidade adquirindo a consciência de que as reformas e determinadas melhorias só serão alcançadas como consequência de uma luta heróica que ponha sistematicamente em causa os aljubes corrompidos desta sociedade.
As lutas das operárias da Plessey, da Algot, da Audio da Simões da Standard, da Messa, da Camboumac e tantas outras foram e são pontos altos da luta operaria e popular. Lutas que marcaram, por um lado, o caracter brutal do capitalismo, do seu Estado e do imperialismo e, por outro lado, a coragem e a determinação das operarias do nosso país para imporem os seus direitos, as suas reivindicações, na perspectiva de um mundo novo.
Também na conquista do direito a habitação, nas ocupações de casas vazias, as mulheres estanciam à frente assim como desafiaram e resistiram à brutalidade da GNR e da policia de choque.
Lutando contra a desigualdade no trabalho e na sociedade, contra a exploração e a repressão patronas, contra a chantagem sexual de patrões abjectos e seus lacaios, pela garantia dos postos de trabalho, pelo direito ao seu próprio corpo, à sua própria vida, pela vida dos seus filhos, arrostando com a lei criminosa que as obriga a abortar na clandestinidade, arrostando com a brutalidade e as sevícias das forças depressivas, as operarias, as camponesas, as trabalhadoras, mulheres portuguesas, são um exemplo, são uma força decisiva na transformação da sociedade, um potencial revolucionário inesgotável, factor determinante para a construção de um futuro de paz e liberdade para todos

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria apenas dizer duas palavras sob a forma de protesto ou de esclarecimento. É a citação de uma frase de uma mulher portuguesa bastante ilustre, publicada há 15 dias num jornal portuguesa.
A dignificação da mulher não reside em negai a sua diferença com o homem, mas em evitar que essa diferença constitua uma forma de exploração, não só económica, mas também verbal.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr Deputado Mário Tomé.

O Sr Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Sousa Tavares é lógico que estou de acordo com essa frase. O que é preciso que hoje claro e que as minhas palavras são agressivas em relação ao capitalismo, em relação a exploração da mulher, em relação a exploração de uma forma geral e, portanto, agressivas em relação a AD.
É por isso que, sempre que eu caracterizo a AD como o poder político que cristaliza a exploração do capitalismo no nosso país, há um deputado da AD que tema desviar o sentido das minhas palavras, como neste caso, o Sr Deputado Sousa Tavares.
A minha intervenção não foi exploração verbal da mulher foi a caracterização da sua situação no mundo e no nosso pais em particular.
E é contra essa situação que se batem tantas mulheres, como a própria autora dessa frase, Sofia de Mello Breyner.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do CDS, se bem se interpretou o pensamento dos Srs. Deputados Sousa Tavares e Salgado Zenha, a votação deste voto que está na Mesa passaria pela circunstância de se entender que os grupos parlamentares que já usaram da palavra sobre esse assunto o não fariam outra vez, como e o caso do PSD do PS, do PCP, da UDP e do PPM. Usariam, assim, da palavra unicamente o CDS, a ASDI e a UEDS.
Nestas circunstâncias, o Grupo Parlamentar do CDS da a sua adesão ao consenso estabelecido.

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr. Presidente, damos a nossa adesão e inscrevemo-nos para uma intervenção.

O Sr. Salgado Zenha (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Salgado Zenha (PS): - Sr. Presidente, eu ousava pedir aos outros grupos parlamentares que, se não houvesse oposição, a seguir a votação deste voto de homenagem a escritora Mana Lamas, fosse igualmente votado um voto de pesar pelo falecimento do engenheiro Sá Cardoso, ocorrido há dias. Creio que a oportunidade do voto de pesar se perdera se for votado daqui a muito tempo.
O engenheiro Sá Cai doso foi companheiro de lutas democráticas de muitos dos deputados aqui presentes e creio que a votação deste voto não oferecia dificuldades de maior aos grupos parlamentares, pelo

Página 2621

10 DE MARÇO DE 1932 2629

que eu me atrevia a fazer esse pedido, sem prejuízo, naturalmente, da votação do voto de homenagem à escritora Maria Lamas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, nos termos regimentais, a Mesa não poderá consentir nisso, a menos que haja consenso nesse sentido.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Robalo.

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: queremos manifestar o nosso desacordo pela enxertia de votos, tendo em conta que o nosso entendimento é o seguinte: qualquer voto, quando é apresentado, é-o porque tem oportunidade e deve ser votado na altura da apresentação. Se não estou em erro, neste momento, nós temos «em carteira» 10 votos, alguns dos quais perderam já totalmente a sua oportunidade. E eu aqui queria fazer justiça aos grupo;, parlamentares que apresentam votos, que um dos indicadores que usam e exactamente a oportunidade desses mesmos votos. Daí o termos consentido, contrariados, que este voto seja votado. A nossa discordância provém, porém, do facto de para nós não existirem votos de primeira nem de segunda. Contudo, lamentamos o comportamento maioritário desta Câmara, o qual não quisemos contrariar. E, se foi este o nosso procedimento, nau foi por recearmos tomar posições sobre este voto.
Nós associamo-nos a comemoração do Dia Internacional da Mulher e essa associação advém da própria declaração política apresentada neste Parlamento por uma deputada do Partido Socialista. Mas queremos dizer o seguinte: entendemos que há muitas mulheres em Portugal que se dignificaram como escritoras, numa luta inteira pela dignificação da mulher e pela defesa da liberdade no nosso país. Diria mesmo que nós nem precisávamos de sair desta Assembleia para podermos prestar homenagem neste dia à mulher portuguesa, escolhendo até, como símbolo desta homenagem, uma deputada. Não seria difícil para nós. Intervenções houve que poderiam eventualmente ser o indicador.
Quer dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que temos grande admiração pela escritora e cidadã Maria Lamas Sabemos que cia e um exemplo vivo de uma luta inteira pela dignificação da mulher e uma defensora das liberdades no nosso país. Mas também sabemos que ela não é símbolo da mulher portuguesa; também sabemos que não é em Maria Lamas que nós vamos encontrar a mulher portuguesa. Se a víssemos que escolher, escolheríamos outras e tínhamos muitas mais para escolher!...
O que significa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, ainda com todo o respeito que a escritora e mulher Maria Lamas nos mereça, não terá o nosso voto favorável, porque não queremos confundir uma comemoração do Dia Internacional da Mulher nem as mulheres deste país só com o símbolo Maria Lamas. As mulheres portuguesas tem outros símbolos. Daí que a abstenção do nosso voto significa, de facto, admiração pela escritora, admiração pela mulher, mas não a possibilidade de a transformar em símbolo da mulher portuguesa A mulher portuguesa que seja transformada em símbolo das mulheres portuguesas tem que ter uma dimensão bem maior que a da escritora Mana Lamas, ainda que a dimensão de Maria Lamas, como escritora, como cidadã, como lutadora pedir liberdades, seja grande. Está longe, em nosso entender, de ser a maior.

Aplausos do CDS.

O Sr Presidente: - Srs. Deputados, não há mais pedidos de palavra Vamos, por isso, passar à votação do voto apresentado pela UDP.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PCP, do PPM, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE, da UDP e do deputado Sanches Osório (CDS) e com a abstenção do CDS e do deputado Santana Lopes (PSD).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma declaração de voto o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao associarmo-nos ao voto de saudação a Maria Lamas, queremos significar que apiedámos o seu exemplo de civismo, espalhado numa vida inteira de luta pela liberdade dos seus concidadãos, muito especialmente pela libertação da mulher portuguesa de todas as opressões de que foi vítima e das desigualdades de que tem também sido sofredora.
Apreciamos o seu valor como lídima escritora da língua portuguesa e consideramos que lembrá-la no Dia Internacional da Mulher é um acto de justiça que se lhe presta.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma interpelação à Mesa o Sr. Deputado Carlos Robalo.

O Sr. Carlos Robalo (CDS):- Sr. Presidente, V Ex.ª disse, antes de se pôr esta proposta à votação, que todas as bancadas haviam feito uma intervenção, com excepção das bancadas do CDS e da ASDI.
Em termos de votos, se há intervenção, não há declaração de voto; se há declaração de voto, não há intervenção No caso de ser dada a palavra para declarações de voto a outras bancadas gostaria também de inscrever para os mesmos efeitos, ainda que entenda, Sr. Presidente, que tal não é regimental.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma interpelação à Mesa o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Carlos Robalo não assistiu ao desenrolar do período de antes da ordem do dia. Talvez por isso mesmo, fez na sua intervenção de há pouco afirmações que, estou seguro, não teria feito se tivesse assistido ao que se passou.
O que aconteceu foi que o meu grupo parlamentar fez uma declaração política a propósito do Dia Internacional da Mulher em que prestou homenagem à escritora e cidadã Maria Lamas. Outros grupos parlamentares se associaram a nossa declaração política. Entretanto, o Sr. Deputado Mário Tomé, ao associar-se à nossa declaração política, anunciou que tinha apresentado na Mesa um voto de homenagem à escritora e cidadã Maria Lamas. Nestas circunstâncias, o Sr. Deputado Mário Tomé perguntou se seu voto, uma vez que todas as bancadas pare-

Página 2622

2622 I SÉRIE - NÚMERO 62

ciam estar de acordo, poderia ser imediatamente votado, o que seria muito rápido, visto todos se terem já pronunciado.
É neste momento que a bancada do CDS pede 15 minutos de interrupção, vindo depois com a posição que o Sr. Deputado Carlos Robalo anunciou.

O Sr. Presidente: - Com licença, Sr. Deputado.
Gostaria de dizer que para esclarecer o Sr. Deputado Carlos Robalo sobre o que se passou está aqui a Mesa. Não é preciso V. Ex.ª esclarecer.
Se V. Ex.ª quer interpelar a Mesa, faça o favor de a interpelar.

O Sr. Carlos Brito (PCP):- Sr. Presidente, é só para dizer que não sentiríamos nenhuma necessidade de dizer mais uma palavra sobre o assunto se não lessem as declarações de há pouco do Sr. Deputado Carlos Robalo. É nesse sentido que queria fazer uma muita curta declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o Regimento, como sabe, diz que só podem fazer declarações de voto os grupos parlamentares que não se tenham pronunciado na discussão do voto.
Neste sentido, penso que o Sr. Deputado Carlos Brito tem alguma razão, na medida em que não houve declaração do Partido Comunista relativamente à proposta de voto da UDP. O que houve, sim, foi uma declaração política do PCP.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, não pediria para fazer esta declaração, que será, aliás, muitíssimo curta, se não fossem as alegações do Sr. Deputado Carlos Robalo. É só por isso que queria fazer esta declaração, além de que direi apenas três ou quatro palavras.
Todavia, se o Sr. Presidente entende que estou a fazer, mesmo assim, perder tempo à Câmara, não insistirei no meu pedido.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, do que se trata é de que, na sequência lógica do seu pensamento, o PS, que também não se pronunciou, poderá fazer uma declaração, e por aí adiante.
Penso que poderíamos dar por encerrado este assunto.
Tem a palavra para fazer uma interpelação à Mesa o Sr. Deputado Carlos Robalo.

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr. Presidente, gostaria de dizer ao Sr. Deputado Carlos Brito que não pus nada em causa. Comecei por dizer que estava, efectivamente, a tratar de outros assuntos lá fora.
No entanto, o problema que coloco é que dá claramente a ideia de que era quando foi definida pela Mesa a orientação da discussão que se devia ter levantado o problema, o que quer dizer que me parece carecer de oportunidade o estar a retomar uma discussão agora neste momento.

O Sr. Presidente: - Está esclarecido, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Presidente, gostaria apenas de pedir à Mesa que esclareça melhor o seu critério.
O meu grupo parlamentar já usou da palavra nesta sessão a propósito da intervenção da Sr.ª Deputada Alda Nogueira, do PCP, cuja intervenção se situou dentro do mesmo assunto do voto proposto pelo Sr. Deputado Mário Tomé. Isso, no entanto, aconteceu antes do voto.
Consideramos, portanto, que essa nossa participação no debate não tem nada a ver com tal voto e desde já solicitamos ao Sr. Presidente para tomar nota da nossa inscrição para uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, no entendimento da Mesa, bom ou mau, os únicos grupos parlamentares que podem usar da palavra neste momento são a UEDS e o MDP/CDE.
Não vou usar para o PPM, naturalmente, um critério diferente daquele que usei para o PCP.
Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD):- Sr. Presidente, gostaria de dizer que tenho uma posição igual à do Sr. Deputado Borges de Carvalho.
Com efeito, o meu grupo parlamentar não se pronunciou sobre o voto. Houve apenas um pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Natália Correia. Não abdicamos, portanto, do direito de fazer uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM):- Sr. Presidente, é só para dizer que estou de acordo com o que disse o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma declaração de voto a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O espírito de tolerância de Maria Lamas, a sua grande capacidade de sentir o colectivo e a sua inteligência abriram no coração de todos os homens e de todas as mulheres que a conheceram um campo amplo, como ontem se verificou na homenagem que lhe foi prestada no São Luís. Não havia, de facto, distinções políticas. Havia apenas distinções humanas. Lamento que o CDS se tenha excluído deste voto, já que isso representa, de facto, um empobrecimento grande para esta Assembleia.
Maria Lamas era daquelas mulheres indiscutíveis, que nunca pôs o ódio na política, antes sim, pôs sempre a compreensão, na medida em que estava ao serviço dos trabalhadores, da honestidade e da inteligência.

Aplausos do MDP/CDE, do PS, do PCP, da ASDI; da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.

Uma voz do PS: - Não estava ao serviço do CDS!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes.

Página 2623

10 DE MARÇO DE 1982 2623

A Sr.ª Teresa Santa Oura Gomes (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar da UEDS não pode também deixar de se associar, com o mais vivo sentimento, a este voto apresentado aqui na Assembleia em honra de Maria Lamas.
Maria Lamas ê, de facto, uma figura ímpar de mulher da nossa geração. Todas as mulheres portuguesas dos últimos 50 anos terão, com certeza, uma consciência viva daquilo que Maria Lamas representou - e representa ainda - na nossa sociedade.
Não tive ocasião de estar presente durante a discussão do voto que aqui foi feita. Em qualquer caso, quero associar-me, assim como o meu grupo parlamentar, à homenagem que aqui, publicamente, em nome do povo português, prestamos à grande mulher que foi Maria Lamas.

Aplausos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI, do MDP/CDE € da UDP.

O Sr. Presidente: - Sn,. Deputados, relativamente ao que aqui foi dito pelos Srs. Deputados Sousa Tavares e Borges de Carvalho, consultei a Mesa, sendo que a decisão tomada por este é no sentido de que mais nenhum grupo parlamentar poderá usar da palavra.
Isto por duas razões: em primeiro lugar, porque foi esse o critério adoptado em relação ao pedido de palavra do Sr. Deputado Carlos Brito, do PCP, e, em segundo lugar, porque penso que fui muito claro quando esclareci o Sr. Deputado Carlos Robalo no sentido de que foi nessa perspectiva. Cito o CDS deu o seu consenso para se votar esta proposta de voto. Esclareci então que só poderiam usar da palavra o CDS, a ASDI, a UEDS e o MDP/CDE, únicos grupos parlamentares que não haviam ainda usado da palavra.
Assim sendo, a decisão da Mesa vai no sentido de que está encerrada a discussão deste voto, apresentado pela UDP, prosseguido os nossos trabalhos.
Tem a palavra para uma interpelação à Mesa o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Sr. Presidente, assim sendo, recorro para o Plenário da decisão da Mesa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está pendente o recurso do Grupo Parlamentar do PSD, cuja proposta vai no sentido de que os outros partidos que não fizeram declarações de voto as possam fazer.
Vamos passar à sua votação.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, face à votação, o recurso apresentado pelo Grupo Parlamentar do PSD foi rejeitado. Todavia, por falta de quórum, a votação é inválida.
Tem a palavra para uma interpelação à Mesa o Sr. Deputado Carlos Robalo.

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados; Vou, em termos de interpelação a Mesa. fazer um certo desvio a essa mesma interpelação, já que ela, naturalmente, se dirige aos grupos parlamentares que aceitaram, efectivamente, as normas da discussão que a. Mesa comunicou a esta Assembleia. Com efeito, nenhum partido contestou essa mesma decisão.
Ouvi, inclusivamente, referir, para forçar a decisão do Grupo Parlamentar do CDS, levando a que este voto passasse à frente de todos os votos que estão em carteira, que não gastaríamos mais de 10 segundos a votar este voto.
Lamento, efectivamente, que esses 10 segundos se tenha transformado em vários minutos e que se quisesse alargá-los ainda em mais minutos, quando se tinha considerado ser, de facto, um assunto tão pacífico. É neste sentido que interpelo a Mesa, interpelando, naturalmente, os grupos parlamentares.

O Sr. Presidente:- Srs. Deputados, em resposta ò interpelação do Sr. Deputado Carlos Robalo, diria que a Mesa, por unanimidade, manteve a sua posição, já que entendeu que era a única correcta.
Tem a palavra, também para uma interpelação à Mesa, o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM):- Sr. Presidente, gostaria apenas de solicitar a V. Ex.ª permissão para entregarmos a nossa declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado Salgado Zenha.

O Sr. Salgado Zenha (PS):- Sr. Presidente, gostaria de fazer uma declaração de voto sobre este incidente e também de fazer um apelo aos restantes senhores deputados.
Somos os mais liberais possíveis em matéria de votação e de debate dos vários pontos que aqui são apresentados. No entanto, creio, realmente, que a Mesa foi inteiramente clara ao enunciar os termos em que se iria votar o voto de saudação apresentado pela UDP. Creio que o PSD, através do Sr. Deputado Sousa Tavares, quis reagir contra certas afirmações que posteriormente se fizeram. Gostaria de esclarecer o que aqui se passou.
Nós, socialistas, não nos associamos à declaração política do PCP, conforme, erradamente, disse o Sr. Deputado Carlos Brito, nem nos associamos à intervenção do Sr. Deputado Mário Tomé, em fundamentação do voto que apresentou.
Nós, socialistas, através do Sr. Deputado Manuel Alegre, associámo-nos, única e exclusivamente, à homenagem prestada à escritora Maria Lamas, por a considerarmos inteiramente justificada. Consideramos que a sua vida foi um exemplo de...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, está a fazer uma declaração de voto, o que já entendemos não ser possível. Não consenti que o PSD e o PPM a fizessem ...

O Sr. Salgado Zenha (PS): - Sr. Presidente, trata-se de uma declaração de voto, sim, mas sobre o recurso aqui apresentado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o recurso não foi votado.
Dei-lhe a palavra só porque o Sr. Deputado Carlos Robalo fez uma declaração em relação à qual V. Ex.ª poderia eventualmente assumir uma posição.

Página 2624

2624 I SÉRIE - NÚMERO 62

O Sr. Salgado Zenha (PS): - Sr. Presidente, peço desculpa, mas parece haver um grande equívoco.
Pedi a palavra para fazer uma declaração de voto acerca do recurso interposto pelo Sr. Deputado Sousa Tavares sobre uma decisão que a Mesa tomou.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, lembro-lhe que a votação não foi válida por falta de quórum.

O Sr. Salgado Zenha (PS): - Sr. Presidente, não sou da mesma opinião.
Se o Sr. Presidente não deixa concluir, muito bem. Caso contrário, sentar-me-ei.

O Sr. Presidente: - Se V Ex.ª for breve, faça favor de concluir.

O Sr. Salgado Zenha (PS): - Serei breve, Sr. Presidente.
Penso que não temos de, tomar posição sobre as declarações de fundamentação dessa homenagem. Temos apenas de tomar posição sobre ela uma vez que não há quórum e a decisão da Mesa está fume.
Creio que dignificariam o trabalho da Assembleia da Republica e considerássemos lindo este incidente e se pagássemos a restante ordem de trabalhos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso é o que a Mesa queria há uma porção de tempo.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Sr Deputado Carlos Brito, vou-lhe conceder a palavra, ate porque o Sr. Deputado usou de uma grande parcimónia na sua posição anterior, mas agradecia-lhe o favor de não prolongar, desnecessariamente, esta discussão
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de fazer uma declaração de voto, dado que o Sr. Deputado Salgado Zenha a fez também.
A votação e inválida por falta de quórum, mas é um facto que houve uma votação. Há lugar, portanto, para uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, vou-lhe dar a palavra. No entanto, queria concluir que aqui na Mesa não se pode ser bom.
Faz favor de continuar, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, queria apenas dizei que a nossa abstenção assenta na lógica de que já tínhamos aceite a decisão da Mesa. Não vamos insistir, naturalmente, através de uma votação, num critério contrário ao que foi anunciado pela Mesa e que, pela nossa pane, aceitámos.
Se me permite, gostaria ainda de fazer uma correcção. isto é, que se das minhas palavras anteriores vê inferiu que o PS ou o PSD, pela voz da Sr.ª Deputada Natália Correia, se assinaram à declaração política feita pelo meu grupo para lamentar relativamente á escritora e cidadã Maria Lamas, corrijo no sentido
de que queria dizer - se é que não foi isso que disse, o Diário da Assembleia da República o registará -, terem-se assumido à homenagem a escritora e cidadã Maria Lamas, e não qualquer coisa que não estava na minha intenção, ao prestar aquelas explicações ao Sr. Deputado Carlos Robalo.

O Sr. Presidente:- Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares(PSD):- Parece que o Sr. Presidente usa o critério de julgar a parcimónia. Tenho sido o mais parcimonioso possível nesta discussão, junto mais que o meu grupo parlamentar é a vítima.
Disse que entendia não ter havido intervenção do PSD neste assunto Parece-me que, de fado, não liou vê O que houve foi um pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Natália Correia, o que não pode, de foi ma nenhuma, ser convidei ado- como uma associação ou como uma manifestação sobre a proposta de voto do Sr. Deputado Mário Tomé.
Queria dizer que, por isso, o meu grupo parlamentar votou a favor do recurso, já que entendia que, foi ante tantas questões levantadas à ioda deste voto, havia necessidade de um esclarecimento sobre o porquê de termos votado a homenagem à escritora Maria Lamas. Quer dizer, foram, inclusivamente, incidentes suscitados depois, dessa deliberação da Mesa e depois de eu ter dito que o voto de homenagem à escritora Maria Lamas não oferecia qualquer dificuldade e que me parecia poder ser votado em 10 segundos. Como depois se suscitaram muitos incidentes, vi-me perante uma situação inteiramente nova, assim como a minha bancada Por isso, entendi que tinha direito a um esclarecimento sobre esse assunto Se o Sr. Presidente entende que não.
De qualquer maneira, queria dizer que estou perante uma situação que é regimentalmente imprevista, qual e a de me ser coitada a palavra por uma votação que não é válida, porque não há quórum para lazer tal votação.
Perante tudo isto, não sei agora qual a minha situação ou a situação do meu grupo parlamentar.

O Sr Presidente: - A Mesa tomou uma deliberação. V Ex.ª recorreu dela e o recurso não pode ser votado, visto não haver quórum. Portanto, considero o incidente encerrado.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Não é bem assim, Sr. Presidente: É preciso que haja quórum. O recurso que interpus continua de pé.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa considera que o incidente está encerrado.
Entretanto, informo que deu entrada na Mesa um requerimento de prorrogação do período de antes da ordem do dia, que vai ser lido.

Foi lido É o seguinte.

Ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, os deputados do Grupo Parlamentar do PCP abaixo assinados requerem que seja prolongado o período de antes da ordem do dia na sessão de 9 de Março de 1982.

Página 2625

10 DE MARÇO DE 1982 2625

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar este requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PCP, do PPM, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP e as abstenções do PS e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Robalo.

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr. Presidente, Srs Deputados: Pedi a palavra para fazer uma declaração de voto uma vez que me parece ser esta a primeira vez, que o Grupo Parlamentar do CDS se abstém relativamente a um requerimento com este sentido.
De facto, o CDS absteve-se pelas razões expostas aquando da introdução de um voto [ora do Regimento, portanto sem o respeito pelas regras regimentais, porque desde o início se pensou sempre numa redução de tempo a utilizar na apreciação do voto.
Efectivamente, os acontecimentos vieram dar-nos razão e com o trabalho que temos marcado para a ordem do dia, o que acontecerá e que mais uma vez se vai postergar para segundo plano a apreciação dos diplomas sobre a autonomia universitária.
Assim, porque esta ordem do dia tem sido adiada tantas vezes, entendemos que ela merecia, pelo menos, que se pensassem não prolongar o período de antes da ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, poderá informar a Mesa das razões por que pediu a palavra?

O Sr. Lopes Cardoso(UEDS): - Sr. Presidente, para voltar um pouco atrás nesta discussão toda, mas a culpa efectivamente não é minha, será da Mesa. É que eu pedi a palavra imediatamente após a intervenção do Sr. Deputado Carlos Robalo e o Sr. Presidente não ma concedeu.
Nessa altura, o Sr. Deputado Carlos Robalo interpelou a Mesa e introduziu uma figura nova interpelando os outros grupos parlamentares. Ao abrigo dessa figura eu queria responder muito rapidamente, para não tolher mais tempo, dizendo que votámos a favor do recurso interposto pelo Grupo Parlamentar do PSD exactamente pelas razões que foram aduzidas pelo Sr. Deputado Sousa Tavares e que em nosso entender, levam a reconhecer o direito que o Grupo Parlamentar do PSD tinha de se pronunciar sobre a matéria então em causa.
Era apenas isto que eu queria dizer, para que ficasse registado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, peco-lhe desculpa, pois, de facto, a Mesa não se tinha apercebido do seu pedido de palavra.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Está desculpado, Sr. Presidente.

Risos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, para o correcto ordenamento dos nossos trabalhos peço-lhe que me informe de quanto tempo prevê ser u intervenção que, nesta fase do prolongamento do período de antes da ordem do dia, o seu grupo parlamentar irá produzir.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, em nome do Grupo Parlamentar do PCP explicarei que este prolongamento do período de antes da ordem do dia tem um funcionamento rígido estabelecido regimentalmente.
De facto, cada grupo parlamentar só tem direito a produzir uma intervenção por 5 minutos. Assim, o meu grupo parlamentar só irá produzir uma intervenção e pelo período de 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso.

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra apenas para dizer que o meu grupo parlamentar votou a favor da prorrogação, porque sempre o tem feito, por uma questão de princípio, quando efectivamente ele é regimental, isto é, uma vez por semana. Adicionalmente, porque consideramos que em relação ao voto proposto pela UDP, sobre o qual ainda não nos tínhamos pronunciado, a votação de há pouco, a ter sido válida, com certeza nos iria permitir fazer uma declaração de voto.
Assim, esta prorrogação, se neste momento existir quórum, permitirá que V. Ex.ª, o Sr. Presidente, repita essa votação, que nos permitirá fazer a declaração de voto em que efectivamente pretendemos tomar posição.
Depois, seguir-se-á então a segunda volta de declarações por parte de todos os partidos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o problema do voto penso que está ultrapassado.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Peço a palavra para fazer uma declaração de voto sobre a última votação a que procedemos.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Tem a palavra.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Abstivemo-nos na votação do requerimento em que se pedia o prolongamento do período de antes da ordem do dia por entendermos que esse requerimento não devia ser sujeito a votação.
A maneira como interpretamos o Regimento é de que o prolongamento do período de antes da ordem do dia apenas pode ter lugar uma vez por semana, desde que seja requerido pelo número de deputados que o Regimento exige; concretamente não havia que pô-lo a votação.

Foi essa, pois, a razão pela qual nos

O Sr. Presidente: - Mas é uma

Sr. Deputado, porque o artigo 84.º... diz que a Assembleia terá que dei monto de um deputado, apoiado prolongar o período de antes da ordem do dia

Página 2626

2626 I SÉRIE - NÚMERO 62

Portanto, o requerimento não é automaticamente aprovado. A Assembleia e que tem de deliberar no sentido do prolongamento do período de antes da ordem do dia.

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado,

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, pretendo interpelar a Mesa porque entendemos que a questão da declaração de voto não está ultrapassada.
Continuamos no período de antes da ordem do dia, e se há pouco a possibilidade de fazermos a nossa declaração de voto não existiu, porque não havia quorum necessário, para validar uma certa votação, neste momento já há, quorum e, como tal, nós requeremos que a votação se repita.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo prolongamento do período de antes da ordem do dia, VV. Ex.ªs têm 5 minutos para usar da palavra e, portanto, não vejo porque é que havemos de estar a repetir votações. Julgo não haver necessidade disso.

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, processualmente não consideramos correcto esse entendimento, mas aceitamo-lo.
Em todo o caso. agradecemos a possibilidade de sermos nós a primeira bancada a usar da palavra, isto se os outros grupos parlamentares não se opuserem. É que o tema dessa intervenção conecta-se com aquele que acabou de ser discutido.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso depende do PCP, que pediu primeiro a palavra. Entretanto, V. Ex.ª fica inscrito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, o meu grupo parlamentar aceita que seja o Grupo Parlamentar do PSD o primeiro a intervir. Nós seremos os segundos.

O Sr. Presidente: - Assim faremos.
Vamos proceder agora ao intervalo regimental.
Está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - No prolongamento do período de antes da ordem do dia, e tal como ficou acordado antes do intervalo, concedo a palavra, para uma intervenção, ao Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD, quando presta homenagem a alguém que se notabilizou na vida portuguesa ou mesmo - sem ser na vida portuguesa - em qualquer aspecto da vida em geral, não o faz por tomar essa pessoa como paradigma em todos os sentidos, quer ideologicamente quer por virtudes pessoais. Fá-lo simplesmente porque essa pessoa prestou um contributo útil para a comunidade, porque foi uma pessoa notável e porque, de qualquer maneira, é um exemplo de cidadania.
É esse exactamente o caso de Maria Lamas.
Maria Lamas é uma mulher da resistência. Não me posso esquecer pessoalmente, nos anos 60, em que sempre que podia ia a Paris, do abrigo que era a Rue Cujas, onde normalmente se encontravam todos os emigrados portugueses, os refugiados da política então concentracionária do Estado Novo e das perseguições da PIDE.
Foi aí que conheci Fernand Echevarry, José Augusto Seabra e, inclusivamente, Palma Inácio, que acabava deser absolvido da Cour d'Assise, que lhe tinha recusado a extradição para Portugal por considerar o roubo da Figueira da Foz como um crime político e não como um crime de delito comum.
Nós associamos a ideia de Maria Lamas não só a uma mulher que durante 20 anos se bateu galhardamente numa coisa chamada Modas e Bordados, até fazer dessa coisa, que inicialmente não era nada, um jornal dignificador da condição da mulher em Portugal, mas também a uma pessoa que foi sempre resistente, que sempre soube opor-se ao fascismo com uma virilidade pouco vulgar nas mulheres portuguesas e que, portanto, merece o nosso respeito e a nossa homenagem.
E nós, independentemente de quaisquer divergências políticas que nos separem, sentimo-nos inteiramente abertos a prestar uma homenagem digna, aqui e em qualquer parte, a Maria Lamas. Era isto que eu queria dizer, Sr. Presidente.

Aplausos do PSD, do PS, do PCP, do PPM, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É do domínio público a falência da União das Adegas Cooperativas da Província da Estremadura. Dela resultam prejuízos incalculáveis para os viticultores e para o próprio movimento cooperativo, envolvido que é num processo não apenas de má gestão mas, sobretudo, de irregularidades, de ilegalidades e de corrupção.
Este é mais um caso que comprova exemplarmente o que sempre temos afirmado: para a AD, o cooperativismo agrícola limita-se a uma mera actividade de serviços e concentração da produção, mais não visando que servir os interesses dos grandes empresários capitalistas e dos grandes intermediários e armazenistas.
Neste jogo de interesses aposta igualmente a CAP, ou não seja ela uma organização de grandes agrários, industriais e comerciantes, que a coberto da demagogia, da manipulação e da ambiguidade tenta arrastar - com êxito cada vez menor, diga-se em abono da verdade- os pequenos e médios agricultores.
Para atingir os seus objectivos, que subvertem o papel e a actividade das cooperativas, a AD e a CAP instalam-se na direcção das cooperativas, tomam decisões estatutariamente ilegais, manipulam assem-

Página 2627

10 DE MARÇO DE 1982 2627

bleias gerais Tudo isto que afirmamos está ((exemplarmente» comprovado neste caso.
As vicissitudes por que passou a União das Adegas Cooperativas da Estremadura comprometem muita gente, nomeadamente figuras gradas da AD e dos seus governos, como é o caso do actual secretário de Estado da Produção, bem como o presidente da CAP e também presidente da Junta Nacional do Vinho (JNV).
Porque o tempo o não permite, referiremos apenas e resumidamente alguns dos aspectos deste processo, que agora termina em falência, deixando atrás de si dezenas de milhares de contos de dívidas às adegas cooperativas e aos seus associados: descontos e comissões de revenda, no mínimo irregulares; dívidas acumuladas que ultrapassam largamente a centena de milhares de contos, por parte de intermediários e armazenistas à União, só possíveis pela permissividade e compadrio, com a agravante de se tratar de empresas reconhecidamente falidas: reintegrações do imobilizado, no mínimo, tecnicamente incorrectas; valorização artificial, ilegal e falsa das existências de vinho, não tendo a direcção da União o mínimo pejo em valorizar a 11$50 por litro 266 938 l de vinho branco já vendidos por 6$30, cuja existência - inexistente por já vendida - fizeram passar para o ano seguinte, para valorizar stoks.
Autêntica bagunça de compras e vendas de vinhos, por valores ora sobrevalorizados - quando comprados - ora subvalorizados - quando vendidos -, sempre em benefício dos armazenistas e intermediários.
Processo mais que nebuloso na tentativa de obtenção de um financiamento de 55 000 contos para a compra de 65 % das acções da falida Sociedade de Vinhos Barardo, envolvendo o presidente da direcção da União, que também é presidente da CAP e que também é presidente da JNV, bem como o então ministro da Agricultura António Barreto, que autorizou o financiamento contra o parecer dos técnicos da Secretaria de Estado do Fomento Agrário, Departamento de Cooperativas do IGEF, do SECIA e do então Secretário de Estado António Campos.
Neste processo de financiamento a tudo se recorreu, inclusive a declaração de concordância por pane de direcções das adegas cooperativas afectas a AD, que emitiram o seu aval sem poderes estatutários, bem como à manipulação descarada e vergonhosa de assembleias gerais.
Poderemos dar como exemplo os casos da direcção da Adega Cooperativa da Merceana, que, sem poderes, omitiu declaração favorável à operação, mas que, mais, tarde, ela mesmo pediu a demissão, tendo, por seu lado, a posterior assembleia geral de associados deliberado por unanimidade a saída da adega da União.
A direcção da Adega de Cooperativas de Sobral de Monte Agraço emitiu declaração favorável à formação de empresa mista, apesar de há mais de 10 anos não entregar quaisquer vinhos, como era exigido pelo regulamento interno e pelo estatuto da União.
Poderíamos indicar o caso da Adega Cooperativa de Cordes, etc., tal como a manipulação de sessões do assembleias gerais. De facto, tal sucedeu com a
assembleia geral da Adega Cooperativa do Cadaval, que foi suspensa quando se encontrava na mesa uma proposta, subscrita por um produtor, para votação da saída imediata da adega da União, proposta essa aclamada com uma salva de palmas, etc., etc.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O tempo não permite que aprofundemos esta questão, mas por tudo o que aqui denunciámos não restarão dúvidas de que a falência da União das Adegas Cooperativas da Estremadura é mais um triste exemplo de uma política que bem se pode sintetizar nesta equação:
Os agricultores cada vez mais pobres;
Os grandes industriais a comerciantes cada vez mais ricos:
O povo português a pagar uma factura cada vez mais pesada;
A nossa democracia cada vez mais comprometida.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Rego, para uma intervenção.

O Sr. Raúl Rego (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O engenheiro Carlos Ernesto de Sá Cardoso, que na sexta-feira foi a enterrar, pode bem ser tomado como um dos representantes da geração silenciada. Tinha 24 anos quando se trancaram as liberdades em Portugal; tinha 72 quando foram restabelecidas essas mesmas liberdades e os cidadãos puderam participar na vida pública.
Filha de um dos militares civilistas da República, presidente do Parlamento que declarou o País em guerra com os impérios centrais, em Março de 1916, e que logo abandonavam a vida política para seguir para a frente de combate, ainda estudante também o engenheiro Sá Cardoso participaria no. Batalhão Académico de Defesa da República, em 1919.
Formado em Engenharia Civil, devem-se-lhe estudos como o do anteprojecto da estrada marginal Lisboa-Cascais, que ele previra com mais 3 m de largura, o que foi considerado um exagero, e o dos acessos rodoviários à ponte de Vila Franca.
Na política, Sá Cardoso pertenceu à falange dos inconformados. Sempre na oposição, nem por isso deixavam de reclamar os direitos que lhes eram devidos. Teria sitio a geração que daria seguimento à obra eminentemente cívica do governo da República, mas cujos anseios foram estrangulados pela ditadura de base militar e clerical.
Sá Cardoso participou em todos os movimentos democráticos e experimentou uma vez e outra os processos policiais do regime. Em livros e em artigos de jornal, principalmente no República, esteve sempre na primeira fila dos que nunca descreram. A sua mentalidade conservadora estava bem longo de se confundir com a reacção. Ao começar a guerra colonial, que havia de liquidar o regime e o chamado «Império Colonial», desfazendo até a comunidade, os democratas manifestavam-se no «Programa para a democratização da República», logo abafado e os seus signatários presos.
Morre o engenheiro Sá Cardoso quando ia fazer 80 anos. Sobre ele e a sua geração fará silêncio a história: foram os que, na clandestinidade, continua-

Página 2628

2628 I SÉRIE - NÚMERO 62

ram a esperança democrática. Podemos dizer que foram eles os mais legitimos representantes da Nação contra os usurpadores.
O engenheiro Sá Cardoso, republicano e democrata, filho de um dos homens do 5 de Outubro, parlamentar, ministro e presidente do ministério, deixou um legado para o Museu de República e da Resistência. Por que não anda esse Museu? Que forças o emperram? Na sua sala de visitas, onde algumas reuniões da oposição se fizeram, encontrava-se uma das peças básicas desse museu: a planta da cidade de Lisboa, sobre a qual o capitão Sá Cardoso, o tenente Hélder Ribeiro e o comandante Aragão e Melo fizeram o plano da revolução de Outubro.
Por que não anda esse museu da República e da Resistência? O Aljube, Caxias, Peniche, aí estão se servir de memória daqueles que silenciaram duas gerações e destruíram a comunidade portuguesa.
Pedindo à Assembleia da República a votação de uma moção de pesar pelo falecimento do engenheiro Carlos Ernesto de Sã Cardoso, eu lembro a necessidade de não esquecer as vítimas da tirania quando se procuram já recuperar muitos dês algozes.

Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e de alguns deputados do PSD.

Que o esquecimento não caia sobre a geração silenciada, mas sempre inconformada e resistente.

Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e de algum deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero-me associar às palavras do Sr. Deputado Raul Rego. no sentido de que sejam implementadas com a maior lapidez possível todas as condições para que no nosso país exista de facto um museu da resistência democrática e antifascista.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Trago aqui um problema que diz respeito à Associação de Moradores da Zona de Francos, no Porto, que desde 1975 - aliás com prévia auscultação e autorização das entidades locais dessa altura - ocupa um edifício onde tem instalado o seu centro. Ora, esse centro desenvolve, ao nível educativo e desportivo, uma actividade muito grande, mobilizando cerca de setenta rapazes da zona independentemente de os pais pertencerem ou não à Associação de Moradores, impedindo assim que os seus tempos livres sejam dedicados aquilo a que muitas vezes, infelizmente, os jovens pobres do nosso país dedicam os seus tempos.
Portanto, é de grande utilidade a actuação desta Associação. Para além disso, tem um posto medico permanente, com consultas todos os dias por um médico que dá assistência gratuita ao posto médico, e toda a gente da freguesia é unânime em reconhecer a utilidade da Associação de Moradores da Zona de Francos e desta sua actividade.
No entanto, o que se passa é que a Associação tem uma ordem de despejo posta em tribunal. Á Junta de Freguesia de Ramalde já constatou a utilidade da Associação de Moradores. Inclusivamente, já oficiou a Associação, reconhecendo essa utilidade e prestando-se a tudo o que fosse necessário para o desenvolvimento da actividade e a melhoria das condições da Associação de Moradores. Da mesma forma, a Assembleia Municipal do Porto também já o reconheceu oficiosamente, pondo-se à disposição da Associação de Moradores para apoiar a sua actividade e melhorar as instalações.
Contudo, a situação é que ou o edifício - aliás velho - é adquirido pela quantia de 2000 contos ou consumar-se-á o despejo por ordem do tribunal.
Ora, a Câmara do Porto não está disposta a adquirir o imóvel, e a Associação de Moradores da Zona de Francos, com toda a utilidade que representa, reconhecida publicamente na freguesia e pela própria Assembleia Municipal, está em riscos de ver terminar assim a sua actividade de utilidade pública.
Portanto, daqui se lança um apelo à Câmara para que ou adquira esse prédio ou o exproprie. Aliás, a Associação de Moradores põe uma alternativa, que é justa, e que é a utilização pela Associação do prédio até à construção ou alargamento previsto, já em fase inicial, da própria Associação de Moradores, com a respectiva construção do imóvel necessário para a continuação do funcionamento da Associação de Moradores. Depois, o imóvel que eles agora ocupam - aliás como é vontade expressa pela Junta de Freguesia - ficaria adstrito à Junta de Freguesia, servindo de apoio para um lar para a terceira idade, de que a própria Junta de Freguesia sente necessidade.
Esta minha intervenção é no sentido de apelar para que esta situação seja resolvida, como é de toda a justiça que assim se faça.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por diversas vezes temos aqui feito referência de que consideramos a Assembleia da República, e em particular este período de antes da ordem do dia, destinada a intervenções políticas de actualidade.
Assim, não podemos deixar de exprimir alguma perplexidade pelo facto de ser nossa a primeira voz que se eleva a falar de um tema que está na preocupação de muitos portugueses. Refiro-me à greve decretada pelo Sindicato dos Ferroviários.
Trata-se dos maquinistas da CP, trata-se de um sindicato não integrado em nenhuma central sindical. Ora, a conotação desse sindicato, a importância das verbas que estão em equação e os prejuízos causados à economia do País seriam certamente, se não fosse este sindicato e se fosse outra a sua conotação, motivo de muitas outras intervenções e de muitas outras tomadas de posição.
Na verdade, em relação a uma greve de transportes com a duração de um dia noutros sectores, apressa-se o Governo em tomar posições, mobiliza-se uma larga escalada de transportes alternativos, procura-se demonstrar uma eficácia em larga escala, na demonstração de que os grevistas não têm razão. Ora, há um dia de greve nacional e ela e confundida como plano de subversão, mas nada disto é agora sequer posto em equação, ao menos como interrogação a propósito desta greve.

Página 2629

10 DE MARÇO DE 1982 2629

Este facto é estranho. Dai que eu não possa deixar cie perguntar se o comportamento cio Governo mudou: se o Governo já entende melhor ou mais compreensivamente este tipo de actuações por parte de alguns sectores laborais: se, pelo contrário, o seu procedimento é excepcional e de favor em relação aos maquinistas da CP, e então pretendo saber porquê; se esta greve não causa prejuízos á CP: se essa empresa pública não dá prejuízos; se os prejuízos; nacionais não são acumulados pelo facto de esta greve privar as pessoas e os bens de serem transportados, etc. Enfim, é todo um mundo de interrogação que gostaria de ver equacionado, formulado e respondido.
Ainda há pouco, quando o Sr. Deputado António Moniz, do PPM, usou da palavra invocando uma solidariedade ferroviária, confesso que pensei que desejava falar da greve e não da Ponte de D. Maria - no entanto, ou da Ponte que nos falou.
Portanto, aqui fica esta intervenção, que é o eco no pensar de muita gente fora deste hemiciclo, que se interroga no seu dia-a-dia pelos prejuízos que sofre e pretende saber qual a posição das forças políticas em relação a este problema. É este também um eco dessas vozes que carece de resposta neste lugar, que e o lugar próprio para que estas discussões não deixem de se efectivar e não haja silêncios que parecem ser, neste caso e por via excepcional, demasiado complacentes e acolhedores.

Aplausos da ASDI, do PS, da UEDS e do MDP/CDE.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições para este período de antes da ordem do dia, vamos agora entrar no período da ordem do dia com a continuação da apreciação na generalidade dos projectos de lei n.ºs 177/II (ASDI), 185/II (CDS) e 287/II (MDP/CDE e da proposta de lei n.º 58/II, relativos à autonomia universitária.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, encontram-se em debate vários projectos de lei e uma proposta de lei. Portanto, pretendia saber se a Mesa tinha alguma informação sobre a presença do Governo neste debate.

O Sr. Presidente:- Sr. Deputado, já providenciámos no sentido de informar o Sr. Ministro da Educação e das Universidades de que iríamos iniciar 05 nossos trabalhos e temos a informação de que ele chegara muito brevemente.

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS):- Sr. Presidente, está ali o Sr. Secretário de Estado da Educação e Juventude, que, creio, vem em representação do Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): ~~ Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Social-Democrata e a Juventude Social-Democrata tem uma filosofia política reformista. Nós, sociais-democratas, somos a favor de reformas estruturais e profundas da sociedade portuguesa. Por isso, desde sempre defendemos a reforma do ensino em Portugal e lutamos pela implementação de um moderno e coerente sistema educativo do nosso país.
A lei da autonomia universitária é a reforma estrutural do ensino universitário - é a reforma da instituição universitária.
Estamos hoje aqui na Assembleia da República, Sr. Presidente, Srs. Deputados, a reformar a nossa universidade, procurando transformá-la e adequá-la a um país diferente, a um país, novo e democrático que estamos construindo e queremos concluir.
E, para atingirmos a plena democracia em Portugal, que como sociais-democratas propugnamos, isso também passa por concebermos e traduzirmos, no plano da lei ordinária, a universidade em termos abertos e democráticos.
A lei da autonomia universitária e a consagração, a nível orgânico e da participação universitária, da verdadeira democracia institucional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Com a discussão e aprovação na Assembleia da República da lei da autonomia universitária, está-se a dar um passo na reforma da legislação vigente sobre o ensino em Portugal, mas diga-se também, em abono da verdade, que este passo é já por si um importante passo em frente na reforma do ensino no nosso país.
A autonomia universitária é bandeira de gerações antigas de estudantes, direi mais que constitui aspiração tradicional da universidade em Portugal.
A universidade é uma comunidade viva composta por professores, estudantes e funcionários. E a lei da autonomia universitária deve procurar dar resposta aos anseios da comunidade universitária.
O Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata defende uma autonomia universitária verdadeira, flexível, eficaz e inovadora.
A autonomia universitária deverá ter conteúdo real, e para que isso aconteça terá de ser consagrada e autonomia cultural e científica, pedagógica, administrativa e financeira.
A autonomia universitária deve representar a consagração e a institucionalização de uma nova concepção de universidade, mais livre, mais autónoma, com capacidade de autogovernarão, dentro de um espólio de diálogo entre todos os estratos que a compõem.
As universidades, são centros de criação, transmissão e difusão da cultura e da ciência.
Nós, sociais-democratas, somos a favor de uma universidade moderna e, por isso, aberta ao futuro.
Conforme se afirma no preâmbulo da proposta de lei do Governo, e com o qual estamos perfeitamente de acordo, «a universidade medicina deve ser uma instituição dinâmica e flexível, susceptível de acompanhar a evolução e responder aos problemas do meio em que se insere e com o qual deve manter um diálogo permanente. Tal concepção pressupõe condições de liberdade e responsabilidade, ou seja, de autonomia.

Página 2630

2630 I SÉRIE - NÚMERO 62

A universidade portuguesa deve formar técnicos para serem úteis, e ajudarem a desenvolver o País, para que ele venha a ser um país moderno e europeu.
Deve também ainda a universidade ter a sua participação com vista a dar o st u contributo na definição da política de ensino superior e, dentro de uma perspectiva mais lata, na definição da política educacional e cultural de Portugal.
A autonomia universitária é ainda uma forma de descentralizar - numa palavra, e a regionalização do ensino universitário. Trata-se de atribuir ás universidades poderes e competências próprias, que tem sido até este momento do Governo e particularmente do Ministério da Educação e das Universidades.

Sr. Presidente:- Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: São estas, genericamente, as concepções que temos sobre o papel da universidade e sobre a autonomia universitária.
Em relação á proposta de lei e aos projectos de lei ora em discussão, como e do conhecimento publico, a organização juvenil do meu partido, a JSD, logo que tomou conhecimento dos mesmos, manifestou as suas reservas - reservas pontuais em relação a uns e globais em relação a outros. Designadamente em relação a proposta de lei do Governo, manifestou á JSD as suas reservas pontuais, face a algumas disposições que, de acordo com o espírito de abertura manifestado pelo Governo do Sr. Ministro da Educação e das Universidades, na apresentação da referida proposta de lei, queremos ver ultrapassadas em sede de especialidade e para isso desde já anunciamos que apresentámos na Mesa um conjunto de propostas de especialidade cem o objectivo de conseguirmos atingir uma lei da autonomia mais perfeita, favorecendo a participação equilibrada de docentes, estudantes e funcionários.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Passarei agora a explicitar rapidamente algumas das propostas de alteração na especialidade a proposta de lei do Governo que apresentámos na Mesa, e outros meus colegas de bancada que não igualmente intervir sobre esta matéria explicitarão as restantes.
Apresentámos propostas de alteração à composição dos órgãos colegiais da universidade. Nesse sentido, propõe-se que a redacção do n.º 3 do artigo 14 º, que se refere à composição da assembleia de universidade, passe a ser a seguinte:

A Assembleia da universidade será constituída por:

Reitor, que preside;
Vice-reitores,
Secretário-geral;
Representantes do pessoal docente e investigador, na proposição de 50 % da totalidade dos seus membros,
Representantes dos alunos, na proporção de 40 % da totalidade dos seus membros,
Representantes dos funcionários, na proporção de 10 % da totalidade dos seus membros;

Propõe-se, consequentemente, a eliminação dos n º 4 e 5 do artigo 14 º

No que diz respeito a composição do senado ou conselho universitário, propõe-se que a redacção do n º 4 do artigo 16.º passe a ser a seguinte:

Os representantes dos professores, dos investigadores, dos assistentes e assistentes estagiários de carreira docente e dos assistentes e assistentes estagiários de careira de investigação membros do senado ou conselho universitário serão na proporção de 50% do número total dos membros do referido orgão.
E propõe-se ainda a criação de 2 novos números no artigo 16º, com a seguinte formulação, respectivamente:
Os representantes dos estudantes membros do senado ou conselho universitário serão na proporção de 40 % do número total de membros do referido orgão.
Os representantes dos funcionários membros do senado ou conselho universitário serão na proporção de 10% do número de membros do referido orgão.
Pensamos que com a aprovação em sede de especialidade destas propostas de alteração, a composição de órgãos colegiais da universidade fica mais democrática e mais equilibrada na representação de todos os estratos da universidade.
No que concerne ao reitor, aceita-se que o reitor seja nomeado pelo Ministro da Educação e das Universidades de entre os professores que integram a lista escolhida pela universidade. No entanto, propõe-se que seja criado um novo n.º 2 do artigo 18.º, com a seguinte redacção:

A lista conterá os três candidatos mais votados, por ordem de votos recebidos, e será enviada ao Ministério da Educação e das Universidades.
Sr Presidente, Srs Deputados, Sr Secretário de Estado O Grupo Parlamentai do PSD, dentro do objectivo que o norteia, de conseguir uma boa lei da autonomia universitária, vai na generalidade votar favoravelmente a proposta de lei do Governo e o projecto de lei do CDS e abster-se-á em relação ao projecto de lei da ASDI, para assim permitir que a Comissão de Educação, aquando da discussão na especialidade, se consiga uma síntese dos referidos projectos de diploma.
Termino dizendo que o Grupo Parlamentar do PSD deseja e espera, acima de tudo, que em sede de especialidade, com base na proposta de lei e nos projectos de lei que forem aprovados na generalidade, todos os partidos façam um esforço de consenso que leve a encontrar uma lei da autonomia universitária o mais positiva possível, capaz de servir a universidade e corresponder aos interesses do País.

Aplausos do PSD do CDS e do PPM.

Durante esta intervenção tomou lugar na bancada do Governo o Sr. Secretário de Estado da Educação e Juventude (António Hortêncio Pina).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Jorge Lemos para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Se-

Página 2631

10 DE MARÇO DE 1982 2631

cretário da Mesa para proceder à leitura de um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (Mendes de Carvalho):

Comissão de Regimento e Relatório o parecer

Em reunião realizada no dia 9 de Março de 1982, pelas 14 horas e 30 minutos, foi apreciada a seguinte substituição de deputados, solicitada pelo Partido da União de Esquerda para a Democracia Socialista:

António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino (círculo eleitoral do Porto) por Octávio Ribeiro da Cunha (esta substituição é pedida para os próximos dias 10 e 11 de Março corrente, inclusive).

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções. considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo aludido partido no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O presente relatório foi aprovado por maioria, com a abstenção do deputado da União Democrática Popular.

A Comissão: Secretário, Alexandre Correia de Carvalho Reigoto (CDS) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - António Duarte e Duarte Chagas (PSD.) - Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - Nicolau Gregório de Freitas (PSD) - Valdemar Cardoso Alves (PSD) - Armando dos Santos Lopes (PS) - Alfredo Pinto da Silva (PS) - Armando de Oliveira (CDS) - Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Lino Carvalho de Lima (PCP) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI) - António Manuel de Carvalho F. Vitorino (UEDS) - Mário António Baptista Tomé (UDP).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o relatório da Comissão de Regimento e Mandatos que acaba de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência da UDP.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Manuel Moreira: Ouvi com muito interesse a sua intervenção e creio que é de sublinhar a parte final, em que apela ao consenso sobre esta matéria. Nós próprios temos advogado essa filosofia, não só na matéria de autonomia universitária, como na generalidade das matérias que dizem respeito ao sistema educativo.
Ignorei por que razão o Sr. Deputado não referiu qual a posição de voto do PSD sobre o projecto do MDP/CDE. Referiu todos os outros menos o do MDP/CDE, e gostava de saber até onde é que vai o consenso que o PSD pretende sobre a matéria.
No entanto, as perguntas que lhe queria colocar advêm de um documento que foi distribuído pelos diferentes partidos e subscrito por várias associações de estudantes de Lisboa e que tem como sigla «por um associativismo reformula», que certamente não associará posições perto das organizações de juventude quer do Partido Comunista Português, quer de outros partidos com assento na Assembleia da República, e no qual é feita uma série de sugestões e de razões pelas quais é considerado que não deve ser tido em conta e aprovado o projecto de lei apresentado pelo Governo.
Constatei com regozijo que algumas delas foram contempladas pela intervenção do Sr. Deputado. No entanto, houve outras a que não deu qualquer resposta. É precisamente sobre estas que gostaria de lhe colocar algumas questões.
Em relação à gestão democrática, que e ignorada neste projecto de autonomia, qual é a posição da JSD e do PSD? Em relação às associações de estudantes, qual é a posição da JSD? Em relação à questão da eleição do reitor, aposição da JSD é aquela que o Sr. Deputado aqui trouxe ou é a que consta do documento elaborado pelas associações estudantes da JSD que se opõem à eleição do reitor a partir da lista tríplice?
Finalmente, gostaria de perguntar se o Sr. Deputado está de acordo com o parágrafo que consta deste documento que foi distribuído e que diz o seguinte:
Em todo o texto se nota uma completa ausência de sensibilidade em relação aos problemas da universidade portuguesa.
Considera que, de facto o Sr. Ministro não está sensível aos problemas da universidade portuguesa?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Nós estamos, como é costume sempre que se trata de matéria educativa, em situações anómalas: temos um Ministro que apresentou e assina uma proposta de lei, em relação a qual foram apresentadas várias tentativas para a modificar, mas não frutuosas. Neste momento - sem que isto seja considerado desprestígio- aparece aqui uma pessoa, o Secretário de Estado da Juventude e dos Desportos - penso que se chama assim -, ...

Vozes do PSD: - Não, não! Da Educação!

A Oradora:- ...que, de facto, não está ligado a estes problemas, havendo um Secretário de Estado do Ensino Superior, que é um homem respeitado pelas pessoas ligadas à educação.

Página 2632

2632 I SÉRIE - NÚMERO 62

Por outro lado, congratulo-me que tenha sido um representante da JSD, pelo menos dos jovens do PSD, que tenha tomado a posição neste debate. Penso que isso já e um beneficio, que poderemos esperar traga frutos para o futuro.
Penso que este debate continua a ser muito deficiente Coisa que logo me espantou foi uma certa confusão entre regionalização e autonomia da universidade. De lacto, isso só pode ser confundido numa proposta de lei que define a autonomia científica da universidade com uma tal pobreza que não se chega a perceber o que é.
O nosso colega Jorge Lemos já fez algumas observações e, como não dispomos das propostas de alteração, não há processo de saber se somos exactos nas nossas afirmações Mas pergunto, por exemplo, se o artigo 9.º -que dá ao Governo um poder discricionário para retirar a autonomia sempre que situações graves se justifiquem- também recebe o acordo do PSD
Também pergunto se o facto de os estatutos das associações de estudantes estarem submetidos ao senado universitário também merece a vossa aprovação o se o número de membros de cada assembleia deve depender do número de escolas nela representado. Nesse caso, por exemplo. 50 membros podem ser muito para a Universidade do Minho, bem como 150 para a Universidade de Lisboa Imprecisões deste teor também não foram explicitadas.
Depois, a diminuição de 60 % para 50 %. Parece-me, de facto, que continua a remar o mesmo espírito, embora tenha melhorado.
Deixar ao Ministério da Educação a escolha do reitor, para além de ser contestado por todos os estudantes e todos os professores que conheço, de vários quadrantes políticos- e conheço alguns-, parece, de facto, que é continuar a rejeitar uma verdadeira autonomia da Universidade.
Devo dizer que isso não me espanta Só me espanta é que o CDS tenha apresentado um projecto de lei diferente do diploma do Governo.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - O Sr. Deputado Jorge Lemos afirmou que esteve com muita atenção à minha intervenção, mas depois das perguntas que me faz fico na dúvida se esteve ou não.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Se calhar não percebi bem!

O Orador: - Tive oportunidade de dizer que outros meus colegas de bancada iriam fazer intervenções e que teriam oportunidade de explicitar outras questões, em relação ao diploma do Governo aqui em discussão, que mereciam as nossas reservas E mais, disse que eles teriam oportunidade de explicitar quais eram as propostas de alteração que apresentámos; agora na Mesa.
Em relação à pergunta que me fez sobre a nossa posição em relação ao projecto de lei apresentado pelo MDP/CDE, refiro que a nossa posição será de rejeição.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O tal consenso!

O Orador: - Consideramos que a filosofia que lhe está subjacente é totalmente díspar dos restantes diplomas. Consideramos que, com base na proposta de lei do governo e nos projectos de lei apresentados pelo CDS e pela ASDI, é possível, efectivamente, conseguir-se um amplo consenso, com vista a obter-se uma lei de autonomia universitária que venha a servir a universidade e os estudantes, acima de tudo.
Em relação às outras questões que colocou, sobre gestão democrática, associações de estudantes e o problema do reitor, posso dizer que em relação a este último problema aceitamos que o reitor seja escolhido pela universidade, com a tal lista tríplice, ou seja a escolha de três candidatos, e que depois o Ministro possa nomeá-lo com base nessa lista.
No entanto, também disse na minha intervenção que fazemos uma adenda ao artigo que refere a escolha do reitor, no sentido de que a lista a enviar pela universidade contenha o numero de votos obtidos por cada candidato, para que o Ministro saiba qual foi o 1.º, o 2.º e o 3.º classificados e possa fazer em consciência a sua escolha.
Queria ainda dizer-lhe, em relação às outras questões que colocou, a gestão democrática e associação de estudantes, que os meus colegas que irão intervir, Adérito Campos e Marília Raimundo, focarão esses aspectos Assim, terá oportunidade de saber qual é a resposta do Partido Social-Democrata acerca destas questões.
Quanto à pergunta que me fez, se acho ou não que este Ministro é sensível aos problemas da universidade, respondo que sim. Penso, até, que é mais sensível que os outros ministros da Educação, designadamente dos governos provisórios, socialistas- e presidenciais, na medida que este Ministro tem dado passos importantes na reforma progresso a do ensino em Portugal com a apresentação da Lei de Base, do Sistema Educativo e agora com esta proposta de lei sobre autonomia universitária Penso que tem sido o Ministro da Educação dos governos da AD que tem dado esses passos Como tal, está sensível aos problemas da universidade portuguesa.

Aplausos do PSD.

Queria ainda responder a uma consideração que fez quando leu passagens do manifesto das associações reformistas Nós, JSD e Partido Social-Democrata, preservamos a autonomia do movimento associativo e estamos certos, também, de que o movimento associativo preserva a autonomia política da JSD Além disso, aqui está o Grupo Parlamentar do PSD e não as associações de estudantes, nem sequer u JSD Está o Grupo Parlamentar do PSD, que defendi porções que procuram reflectir, tanto quanto possível, a posição da nossa base social de apoio.
Penso que nas nossas propostas de alteração na especialidade estamos a contemplar, ao máximo, as preocupações das academias universitárias e das associações de estudantes, no que concerne a esta proposta de lei da autonomia universitária.
Quanto às questões apresentadas pela Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, devo dizer que os meus colegas lhe irão responder nas suas intervenções.
Só quero, no entanto, referir que em relação ao artigo 9.º vamos fazer um aditamento ao n.º 2, que diz o seguinte: «A suspensão temporária será pelo

Página 2633

10 DE MARÇO DE 1982 2633

período máximo de 90 dias, ouvidos os órgãos da universidade, sempre que possível.»
Isto responde, suponho, à questão que pôs sobre o artigo 9.º da proposta de lei do Governo.

Entretanto, reassumiu a presidência n Sr. Presidente Oliveira Dias.

O Sr. Presidente: - Para protestar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, por barulho na Sala não consegui ouvir a parte que se referia à adenda.
Mas é muito difícil trabalhar nestas condições. Pedia ao Sr. Presidente o favor de mandar distribuir as alterações que o PSD propõe à proposta de lei. Assim nau podemos trabalhar com rigor.

O Sr. Presidente: - Assim que entrarem na Mesa, Sr.ª Deputada.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Já as entreguei, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Peço desculpa à Assembleia. Já entraram na Mesa e estão neste momento a fotocopiar.
Para protestar, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Um brevíssimo protesto.
Não vou comentar os desbotas do Sr. Deputado Manuel Moreira sobre a sensibilidade do Ministro. O dia-a-dia tem demonstrado que, de facto, a população portuguesa não o considera muito sensível para os problemas da educação. Aliás isso é a sua maneira de ver.
Fico particularmente sensibilizado- pela desautorização, chamemos-lhe assim, que o Sr. Deputado acaba de fazer dos seus colegas das associações que defendem um associativismo reformista.

O Sr. Manuel Moreira (PSD) : - Não, não! O senhor não entendeu nada!

O Orador: - Afinal, Sr. Deputado, queria dizer-lhe que o tal consenso com que terminou a sua intervenção não existe. Porque, de facto, um dos projectos é posto de lado, só porque pertence a um sector que não vos agrada e com o qual não podem trabalhar.
Já se esperava.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Referi na minha intervenção e nas respostas aos pedidos de esclarecimento que nas nossas propostas de alteração na especialidade contemplámos, tanto quanto possível, as questões que a JSD C js associações de estudantes que nos são afectas puseram acerca do problema da autonomia universitária.
No entanto, é bom que o Sr. Deputado note aquilo que eu lhe disse, ou seja, que nós aqui estamos como Grupo Parlamentar do PSD, e por isso temos que ter uma visão, acima de tudo, de Estado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - De estado caótico!

O Orador: - E é dentro dessa perspectiva que aqui nos pronunciámos e apresentámos as nossas propostas, no sentido de procurar, acima de tudo, uma boa lei de autonomia universitária.

Vozes do PSD: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes.

A Sr.ª Teresa Santa Clara Gomes (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vamos demorar-nos a insistir em pontos já suficientemente denunciados por outros deputados que intervieram no debate no passado dia 7 de Janeiro. Em poucas palavras, diremos que consideramos a proposta de lei do Governo inaceitável, porque consagra uma autonomia que, na realidade, o não é.
Na realidade, uma autonomia tutelada por um reitor nomeado pelo MEU e cuja primeira competência e «representar o Governo junto da universidade e mantê-lo informado acerca das suas realizações e problemas» não é, em nosso entender, verdadeira autonomia.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Muito bem!

A Oradora: - Uma autonomia que à partida coloca quase dois terços do poder de decisão nas mãos dos doutorados e que submete à aprovação do senado universitário os estatutos das associações de estudantes da respectiva universidade também não é, em nosso entender, verdadeira autonomia.

O Sr. Luís Patrão (PS): -Muito bem!

A Oradora: - Uma autonomia que regulamenta serviços, estabelece normas de contratação de pessoal, defini condições de acesso, fixa regimes de estudo, condições de atribuição de graus e diplomas, situações de incompatibilidade e suspeições não é, nunca poderia ser, para nós, verdadeira autonomia.
Dito isso, e porque é frequente ouvirmos da boca de membros do Governo e de deputados da maioria a afirmação de que a oposição critica mas não tem alternativas, gostaria de enunciar aqui, embora com a brevidade que as limitações de tempo impõem algumas das bases em que, para o Grupo Parlamentar da UEDS, deveria assentar o entendimento de uma lei sobre autonomia universitária.
Em primeiro lugar: de que autonomia falamos? No diploma governamental é óbvio que a expressão «autonomia universitária» é entendida num sentido extremamente restrito. O próprio Sr. Ministro da Educação e Universidades o reconheceu, numa das suas intervenções, no debate de 7 de Janeiro, quando disse: «Considero que nenhuma das propostas de lei de autonomia é efectivamente uma proposta de lei de autonomia, mas sim um sector dessa proposta de lei.» E o Sr. Ministro continua: «Esse sector é relativamente restrito, ou melhor, poderia dizer-se que é uma

Página 2634

2634 I SÉRIE - NÚMERO 62

proposta de lei de eleição do reitor e do órgão colectivo da universidade.»
Louvamos a sua sinceridade, Sr Ministro, mas perguntamo-nos por que razão vem o Governo, conscientemente servir-nos «gato por lebre», tomando a parte pelo todo e restringindo uma lei sobre autonomia universitária e aspectos parcelares, como é este da eleição do reitor (que, aliás, para o Sr Ministro não e eleição, mas simples nomeação).
Sabemos, e de justiça dizê-lo, que o mal não é só deste governo O conceito de autonomia universitária de há muito que vem sendo maltratado entre nós. O Sr. Ministro vai buscar a» razões históricas das limitações que aponta a «um estudo feito pelo conselho de reitores», onde todos os autores da presente legislação teriam, em sua opinião, ido beber. Eu iria mais longe, aos períodos de forte repressão durante o regime fascista, em que a expressão autonomia universitária e viu esvaziada de conteúdo, circunscrita a aspectos meramente formais, de carácter administrativo.
Quaisquer que sejam as razões, o facto permanece o conceito de autonomia subjacente à legislação que hoje aqui apreciamos, e um conceito estreito e pobre Estreito e pobre, porque trata a autonomia unicamente como sistema de relação de cúpula e não, também, de base. Estreito e pobre, porque cobre unicamente uma corrupção vertical de relações. Estreito e pobre, porque apenas refere a autonomia universitária ao Governo, e não ao conjunto da sociedade, como numa perspectiva verdadeiramente democrática seria devido.
Com efeito, e como já outros deputados tiveram ocasião de apontar, a proposta de lei do Governo não trata a autonomia da universidade na sua estrutura interna, no seu modo de funcionamento, na gestão democrática de cada um dos seus órgãos Trata, sim, das relações superstruturais entre a universidade e o seu ministério de tutela o MEU. O que interessa ao Governo não e a estruturação orgânica do exercício da liberdade democrática aos vários níveis em que essa estruturação se processa Interessa-lhe, apenas, delimitar competências, estabelecer fronteiras burocráticas ate onde vai a Direcção-Geral do Ensino Superior e ate onde vão as minidirecções gerais em que, como já alguém aqui referiu, se condenarão necessariamente as reitorias.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Muito bem!

A Oradora:- Ora, para nós, Grupo Parlamentar da UEDS, o entendimento da expressão «autonomia universitária» e outro. Para nós, falar de gestão autónoma e falar de «autogestão». E falar de autogestão e falar de um principio de organização democrática em que a autonomia e pilar, não apenas ao nível formal e superstrutural, mas ao nível de cada uma das pequenas unidades que constituem o todo. Porque parte das necessidades e interesses reais dos cidadãos e porque procura que a todos os níveis, eles tenham uma intervenção directa nas decisões que lhes dizem respeito, a autogestão nunca pode ser definida de cima para baixo, do vértice para a base da pirâmide. O seu terreno privilegiado não são as relações do topo, são as relações e as trocas entre as múltiplas células de base que constituem qualquer corpo social.
Por isso, para nós, a autonomia universitária ou começa na base, ou não começa. O seu lugar primeiro não são os órgãos colectivos gerais da universidade são os órgãos das escolas e departamentos que a integram. Como muito bem diz um depoimento da PSD publicado em 22 de Fevereiro no Diário de Lisboa a opção cem que nos confrontamos e clara queremos uma estrutura centralizada em universidades, dirigidas por catedráticos, onde as faculdades são apenas estruturas retalhadas pelos departamentos, ou uma estrutura flexível de escolas e faculdades, agrupada em universidades, que as coordenam e interligam, mas dotadas de amplos podei es de gestão e decisão, com órgãos em que todos os corpos da escola intervenham e participem.»
As palavras poderiam ter sido nossas Só que para nos o conceito de intervenção e participação na gestão democrática das escolas tem certamente um conteúdo mais amplo do que aquele que lhe e atribuído pela JSD. Para nós, intervir e participar é mais do que eleger órgãos representativos.
Não olhamos os estudantes, os professores ou quaisquer outros membros da comunidade universitária como entidades abstractas, que alguém possa representar em bloco. Olhamo-los como cidadãos vivos, com interesses e necessidades diversificados, interesses e necessidades que só através de patamares sucessivos de confronto e de conciliação poderão caminhar para uma convergência representativa do consenso possível Dai que, como referi no inicio, o nosso conceito de autonomia não seja apenas vertical.

O Sr César de Olheira (UEDS): - Muito bem!

A Oradora: - Acreditamos na auto-regulação dos interesses sociais através do diálogo democrático. E esse tanto é vertical como horizontal. Mas há mais na perspectiva em que nos situamos, a gestão autónoma (autogestão) é uma dinâmica que anima não só o interior de cada orgão social, mas o conjunto das relações que se estabelecem entre os vários órgãos. Também aí está em causa a conciliação de interesses plurais, que só um sistema de trocas vivas, aos vários níveis de tomada de decisão, poderá fazer convergir no quadro dos interesses mais amplos que são os da sociedade no seu conjunto.
Por isso, esperaríamos que qualquer legislação sobre autonomia universitária contemplasse adequadamente o sistema de trocas e de interpelações com outros organismos e instituições afins Quem é autónomo é-o em relação a alguém. Quem é esse alguém para o Governo e para o CDS. Única é exclusivamente o próprio Governo. (Que longe vão os tempos do tão famoso slogan do «fortalecimento da sociedade civil»!)
Só os projectos de lei da ASDI e do MDP/CDE introduzem, neste aspecto, uma abertura significativa. O primeiro, integrando na assembleia da universidade «representantes da instituições sem fins lucrativos, cuja contribuição pau a vida da universidade seja considerada relevante». O segundo, admitindo no senado indivíduos com representação de sectores da sociedade relacionado, com a universidade». Aqui sim. Aqui está o principio já inter-relação entre corpos sociais, que, a no o ver, e intrínseco a toda a definição de autonomia

Página 2635

10 DE MARÇO DE 1982 2635

Resta-nos, Srs. Deputados e Sr. Secretário de Estado, descer ao concreto das preocupações regulamentares que anima o diploma do Governo e deixar aqui uma questão que, quanto a nós, está ainda por esclarecer: quem elabora os primeiros estatutos das universidades?
No artigo 15.º diz-se que a assembleia da universidade «aprova os estatutos da universidade». E no artigo 14.º estabelece-se que a composição da mesma assembleia será fixada nos estatutos da respectiva universidade. Pergunta-se: quem nasce primeiro, os estatutos ou a assembleia? No caso de serem os estatutos, elaborados por quem? No caso de ser a assembleia, com que composição?
Agradecemos, Sr. Secretário de Estado, uma resposta tanto quanto possível directa a esta questão. Sobre os outros pontos que levantámos, não esperamos, como é, óbvio, respostas directas. Essas viriam pôr em questão, de forma radical, a proposta de lei do Governo. E a capacidade de se deixar pôr em questão é virtude de que este governo, infelizmente, ainda não deu provas.

Aplausos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Silva Marques, Oliveira e Sousa e Adriano Rodrigues. Acontece, porém, que a UEDS esgotou praticamente o seu tempo e a Sr.ª Deputada não disporá, assim, de tempo suficiente para lhes dar os esclarecimentos que pretendam.
Pondo este facto, à consideração dos Srs. Deputados inscritos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, a direcção da minha bancada informou-me que tenho um minuto. Utilizarei meio minuto e cedo o outro meio minuto à Sr.ª Deputada, para que me possa responder.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Rodrigues.

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - Sr. Presidente, prescindo da interpelação à Sr.» Deputada, mas o meu colega não, e nós daremos meio minuto para que a Sr.ª Deputada responda.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - A Sr.ª Deputada anunciou -ao referir; «para não dizerem que não temos alternativa» - que ia apresentar a sua alternativa.
Estando atento -para ver se conseguia colher alguma sugestão concreta da alternativa anunciada-, anotei duas, que, aliás, V. Ex.ª colheu em projectos alheios.
E quanto à sua alternativa, limitou-se a generalidades. Isto é, dentro da generalidade, limitou-se a generalidades como: «a autogestão é uma dinâmica», «a autonomia não é só vertical» e «participar não é só eleger».
Sem dúvida nenhuma que sim mas se queremos colocar as coisas em termos de intervir, para criar essa tal dinâmica temos de ter um pouco mais de esforço de concretização.
A Sr.ª Deputada, ao referir-se a afirmação séria - V. Ex.ª assim mesmo reconheceu - de parte do Ministro, não conseguiu conter-se na necessidade de atacar gratuitamente o Ministro. Logo que reconheceu a sua seriedade, classificou a sua proposta de lei como tratando-se de apresentar gato por lebre.
V. Ex.ª diz que a autonomia universitária não é algo de superficial. Sem dúvida nenhuma. A autonomia universitária é um combate que vem de antes, de muito antes, do 25 de Abril. Não tanto por essa razão histórica, mas pela forma como se repartiu a intervenção de V. Ex.ª, dá-me a impressão de que V. Ex.ª está repartida entre talvez aquilo a que posso chamar o conservantismo, mas a boa consciência do discurso radical, e entre o radicalismo, a inoperância e a incapacidade de intervir. Não sei se será essa a lebre de V. Ex.ª!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira e Sousa.

O Sr. Oliveira e Sousa (CDS): - A Sr.ª Deputada, na sua intervenção, preocupou-se em analisar a proposta de lei do Governo e quase se não referiu ao projecto de lei que nós apresentámos, como nossa contribuição democrática para um problema que interessa a todos.
Na sua intervenção, a Sr.ª Deputada referiu que apenas os projectos da lei da ASDI e do MDP/CDE previam uma integração na sociedade, onde estava inserida a universidade, através da participação de pessoas externas à universidade nos seus órgãos.
Quero referir à Sr.ª Deputada que também no conselho universitário, constante do nosso projecto de lei, no artigo 13.º, está prevista a integração de individualidades representativas de sectores da sociedade.
A Sr.ª Deputada disse também que os projectos não previam o arranque, ou seja, como seriam elaborados os primeiros estatutos.
Quanto a isto, queria também dizer-lhe que no nosso projecto de lei, no artigo 16.º, se prevê exactamente esse arranque: uma assembleia cuja composição é definida e cujo fim, expresso e único, é elaborar o primeiro estatuto da universidade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes, para responder.

A Sr.ª Teresa Santa Clara Gomes (UEDS): - Sr. Deputado Oliveira e Sousa, começo pelas suas questões, que foram as últimas, para lhe dizer que tenho consciência de que o projecto de lei do CDS se referiu também à possibilidade de presença no conselho universitário de individualidades representativas da sociedade relacionadas com a vida da universidade.
Tem razão nesse ponto, Eu deveria ter também mencionado o projecto de lei do CDS e não o fiz. Mas não o fiz - e digo-o agora globalmente - porque, no conjunto, considero o projecto de lei do CDS

Página 2636

2636 I SÉRIE - NÚMERO 62

mais incaracterístico do que a proposta de lei do Governo.
Portanto, a minha análise incidiu sobretudo sobre a proposta de lei do Governo e foi sobre essa que me debrucei com mais cuidado. Reconheço que no projecto de lei do CDS há vários aspectos positivos em relação à proposta de lei do Governo, embora, globalmente, considere que os vícios de pobreza e estreiteza de concepção do que é a autonomia da universidade são vícios de que enferma também o projecto de lei do CDS.
O outro exemplo que deu è também justo, é a questão dos arranques dos primeiros estatutos. Isso já está previsto no projecto de lei do CDS, na proposta de lei do Governo não está.
É, pois, mais uma indicação de uma área em que o projecto de lei do CDS vai mais longe do que a proposta de lei do Governo. Em qualquer caso -e agora passo a responder ao Sr. Deputado Silva Marques -, interessa-me mais a perspectiva global que inspira os documentos do que a análise pontual.
Como devem ter ocasião de constatar já, não tenho por hábito referir nesta Assembleia afirmações que já tenham sido feitas por outros deputados Tendo estado presente no debate que aqui se travou no dia 7 de Janeiro, tive ocasião de constatar que muitas das críticas aos diplomas tinham sido já expressas por deputados que me precederam no uso da palavra.
Portanto, no início da minha intervenção tentei apresentar uma síntese dessas críticas. Lamento que o Sr. Deputado Silva Marques não tenha tomado nota, porque elas eram bem concretas e precisas.
Referi-me, nomeadamente, ao facto de o reitor ser um representante do Governo junto da universidade e ter como primeira função manter o Governo informado acerca das universidades. Portanto, a acusação que aqui já foi feita de que o reitor é concebido quase como um governador civil.
Referi-me também à composição do senado universitário e dos órgãos da universidade, referi-me à questão dos aspectos regulamentares ou regimentais excessivos, que o próprio Sr. Ministro da Educação referiu que eram desajustados num diploma desta natureza. E citei o Sr. Ministro, com seriedade, porque reconheço que foi honesto ao dizer que se tratava, não de uma lei de autonomia da universidade, mas apenas de uma lei para a eleição do reitor Agora lamento é que uma lei que se destina apenas a regulamentar a eleição do reitor se chame nesta Câmara «lei sobre a autonomia da universidade».
Foi nesse sentido que utilizei a expressão «o Governo está a dar-nos, conscientemente, gato por lebre».
Se, de facto, o Ministro tem consciência de que se não trata de unia lei sobre autonomia da universidade, mas apenas sobre a regulamentação de um aspecto parcelar dessa autonomia, mais valia dizê-lo e fazer um decreto regulamentar sobre a eleição do reitor.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Posso interrompê-la, Sr.ª Deputada?

A Oradora: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD: - Sr.ª Deputada, eu intervim porque V. Ex.ª anunciou a sua alternativa.
Mas posso dizer-lhe que, atendendo ao que acaba de dizer, e preferível então chamar-se «sobre» a «de» Aí poderia contestar.

A Oradora: - Desculpe. Sr. Deputado, mas não percebi.

O Sr. Silva Marques (PSD): -V. Ex.ª contesta que se chame «sobre», mas até tem uma lógica! Contestável seria se fosse «de» ou «da», mas «sobre» até é aceitável!

A Oradora:- Sr. Deputado, cito-lhe dt novo o Sr. Ministro da Educação. Quando me referi a esse ponto, foi com palavras do Sr, Ministro, que disse: «Poderia dizer-se que é uma proposta de lei de eleição do reitor e do orgão colectivo da universidade e nada mais!». Portanto, é a isso que me estou a referir.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma intervenção o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr Secretário de Estado da Educação: A autonomia universitária foi sempre um objectivo da luta persistente que opôs os estudantes e a generalidade dos docentes universitários ao regime fascista, que se viu obrigado a fazer algumas concessões, devido à força e determinação reveladas, fundamentalmente, pelo movimento estudantil de então.
No entanto, foi preciso decorrerem mais de sete anos após o 25 de Abril para o surgimento da primeira tentam a de reconhecimento legal do princípio da autonomia universitária.
Todavia, à medida que fomos tomando conhecimento do conteúdo da proposta de lei do Governo, vamo-nos sentindo ludibriados pela contradição flagrante entre o articulado e o falacioso preâmbulo, que deixaria antever a consagração de uma efectiva autonomia unhei suaria.
Em primeiro lugar, o MEU não deixa de ser papel decisivo em variadas matérias que deveriam ser cometidas à universidade.
O bizarro processo de eleição e exoneração do reitor demonstra cabalmente a recusa em reconhecer maturidade à população universitária e o terror de uma verdadeira e completa democratização.
A UDP defende claramente a eleição, por lista, do reitor e dos vice-reitores. por sufrágio secreto, directo e universal, com maioria absoluta, revestindo-se de carácter definitivo. A sua exoneração competirá definitivamente ao senado universitário, cuja composição deve ser equilibrada, rejeitando-se assim o privilégio concedido aos doutorados, aliás na sequência de legislação vária, em particular do Decreto n.º 781-A/76, de 28 de Outubro, que continua a merecer a discordância da UDP.
Torna-se, assim, coerente a acepção essencial (a velha concepção do fascismo, e relembre-se a propósito a crise de 1969 em Coimbra e o discurso da tomada de pose do então reitor) que o diploma tem do reitor: é o representante do Governo junto da universidade.
Na verdade, uma concepção exemplaríssima de autonomia! ...

Página 2637

10 DE MARÇO DE 1982 2637

A desconfiança na responsabilidade e liberdade universitária materializa-se ainda na exigência de aprovação ministerial dos estatutos universitários e regulamentares das componentes institucionais das universidades, ainda por cima quando a própria lei que pretende regulamentar a autonomia universitária é de tal forma inibidora pela sua extensão, detalhe e conteúdo.
A exigência de homologação pelo MEU de orçamentos privativos revela, só por si, qual a autonomia financeira cometida às universidades.
A insistência no controle sobre as universidades chega ao ponto de ser necessária a submissão à aprovação ministerial dos modelos dos diplomas comprovativos de obtenção dos graus académicos.
Em segundo lugar, esta proposta ignora completamente (rejeitando-a, apesar de tudo) a autonomia das escolas dentro da universidade. Ou seja, nas partes em que o diploma concede autonomia esta é atribuída à reitoria, impedindo assim uma descentralização sucessiva de funções pelas escolas e departamentos, situação, aliás, que já corresponde a uma certa realidade (como o atesta, por exemplo, o funcionamento descentralizado da Universidade Técnica de Lisboa).
Para quê concentrar na reitoria e não nas escolas, por exemplo, a requisição de fundos à contabilidade pública? A autorização da abertura de concurso para docentes e investigadores e de nomeação dos respectivos júris? A homologação dos mapas de distribuição de serviço docente?
Desta forma, a aplicação deste projecto não poderia deixar de revogar linearmente a reduzida autonomia das várias escolas, consagrada, aliás, na legislação em vigor e que certamente têm sabido exercer de forma responsável.
O desplante anti-autonomia atinge o clímax ainda na atribuição ao senado universitário da competência para aprovar os estatutos das associações de estudantes, cujas tradições de independência seriam, quanto a nós, mais do' que suficientes para o MEU não ter o arrojo de seguir as pisadas das suas antecessoras de antes do 25 de Abril, no que concerne á imposição de tutelas sobre o movimento associativo dos estudantes universitários.
Parece-nos que a análise desenvolvida é suficiente para concluir, sem margem para qualquer dúvida, que este projecto é uma clara negação do conceito de autonomia universitária. Ele pode perfeitamente consubstanciar-se na ideia de que os direitos concedidos às universidades só o serão após assentimento do MEU.
A sua implementação provocaria, em certos casos, uma regressão da realidade actual.
Assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, melhor seria que este projecto de lei fosse intitulado de «moldagem das universidades pelo MEU» e de «submissão das escolas às reitorias», pela que a UDP o recusa frontalmente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Rodrigues.

O Sr. Adriano Rodrigues {CDS): - Queria perguntar ao Sr. Deputado Mário Tomé a que diploma se refere, pois não foi suficientemente claro quando falou em projectos.
Pergunto se não terá havido qualquer confusão de linguagem ou se percebi mal.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP):- Eu referi-me, fundamentalmente, ao projecto de lei do Governo.

Vozes do CDS: - Não é projecto de lei, é proposta de lei!

O Orador: - À proposta de lei do Governo, sim, peço desculpa.

O Sr. Presidente: - Pronto, está esclarecido o equívoco.
Está inscrito para uma intervenção o Sr. Deputado Adérito Campos.
Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Adérito Campos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Educação e das Universidades, Sr. Secretário de Estado: Cremos ser escusado salientar insistentemente a importância que reveste o tema da autonomia universitária, quer para nós, sociais-democratas, quer no quadro mais global da consolidação do Estado democrático; velha aspiração da universidade portuguesa, só agora, quase oito anos depois da reimplantação da democracia e na vigência do VIII Governo Constitucional, da AD, a Câmara dos Deputados se debruça sobre matéria de tal relevância.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Gostaríamos, por outro lado, de relevar aqui a nossa opinião, aliás idêntica à expendida pelo próprio Sr. Ministro na sua intervenção inicial, de que a proposta e os projectos de lei que agora debatemos não cobrem senão uma parte, porventura até não das mais importantes, de quantas constituem o quadro muito mais complexo de uma autêntica autonomia universitária. Sempre defendemos que a autonomia das universidades não é um conceito estático, mas dinâmico, gradual e progressivo, feito com a responsabilidade que nos dita a realidade, objectivando-se numa perfeição que não pode ser conseguida sem os ditames da experiência ou o divórcio da situação existente e herdada do passado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se antes do 25 de Abril era impensável alguma vez falar-se de autonomia universitária, se após a data histórica tudo ou quase tudo ficou na mesma, não se registando qualquer vontade política, ainda que mínima, dos sucessivos ministérios em dar um passo que fosse no sentido da progressiva construção da autonomia das universidades, são agora de realçar, e fazemo-lo à vontade, os contributos dados pelo actual Ministério na arrancada para a autonomia da instituição universitária que assente numa autonomia pedagógica, cultural, administrativa e orgânica.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Página 2638

2638 I SÉRIE - NÚMERO 62

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Sr. Secretário de Estado: Falar-se em autonomia universitária implica e compreende, para além de muitos outros vectores, alguns deles já referidos, a participação dos diversos estratos universitários na formação da vontade da universidade em posição do necessário equilíbrio para o indispensável diálogo que na escola deve existir. De facto, só o equilíbrio participativo entre os diversos corpos académicos é positivo para uma maior responsabilização e um mais profundo dinamismo nus destinos da universidade portuguesa.
Hoje em dia, nas nossas universidades, como em outros níveis do ensino e da vida nacional, a participação estudantil atingiu papel da mais profunda das importâncias. Assim, no âmbito dos órgãos da gestão democrática das escolas e faculdades, que vieram pôr termo à instabilidade académica vivida logo a seguir ao 25 de Abril, cuja rica experiência se deve manter e reforçar, com todas as suas virtualidades, introduzindo-se aquelas melhorias que a prática aconselhe; assim mesmo no quadro do seu movimento associativo, no qual os estudantes tem demonstrado uma consciente e coerente responsabilidade nos objectivos de estabilidade, de elevação pedagógica, cultura! e científica da academia portuguesa, as associações de estudantes e os seus estatutos são obra e mataria dos estudantes, e só deles, e, ao criarem as associações, os estudantes organizam-se por forma a manterem a sua independência, representatividade e responsabilidade, não podendo, em caso algum, aceitar qualquer tipo de regime administrativo e exterior à sua essência, como corpo, que possa condicionar a sua vontade soberana, posto que respeitadora da lei geral.

Aplausos do PSD.

Por outro lado, ao entrar na universidade, o estudante irão aliena os seus direitos de participação interna ou externa enquanto aluno ou cidadão, isto é, não adquire um estatuto redutor das suas funções, à mera função do estudo.
Das anteriores considerações genéricas resulta, nestas áreas circunscritas, a apresentação pela bancada do Punido Social-Democrata de 2 propostas de eliminação, umbus relativas à proposta de lei do Governo; uma. que incide sobre a alínea/)) do n.º 1 do artigo 17.a, e a outra, sobre o artigo 53.º Apenas um pequeno acrescento sobre o referido artigo 17.c, n.º 1, alínea i. Entendemos que este artigo se encontra em franca contradição com o artigo 58.º da proposta de lei, que reconhece, como não podia deixar de ser, a liberdade de constituição das associações de estudantes. Todavia, entendemos também, e para isso chamo a atenção, que esta disposição do artigo 58.º nos apresenta um alcance muito mais vasto do que uma mera repetição de outras disposições constitucionais ou legais; um dispositivo idêntico ao do artigo 58.º significará, a nosso ver, uma vontade clara do legislador no sentido do reconhecimento pleno das associações estudantis como verdadeiros «.parceiros académicos» e como instrumento privilegiado e indispensável à .participação dos estudantes nos destinos da academia e na formação da sua vontade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, Sr. Ministro: Duas breves palavras a terminar. A primeira, para chamar a atenção de que sempre defendemos, como continuaremos, convictamente, a sustentar, que os verdadeiros centros da vida universitária são as escolas e as faculdades e que são estas as autênticas estruturas base do ensino superior, sem prejuízo da existência de órgãos supra-escolares de coordenação, desde que não impeditivos da sua organização interna e do seu direito de se autogovernarem: é o reforço qualitativo dos órgãos da gestão democrática que propugnamos e no qual os estudantes têm e terão um papel de primordial importância. A segunda, para salientar que estes pontos de vista e estas como outras propostas transmitem algumas dai posições da Juventude Social-Democrata na defesa intransigente, firme e coerente dos interesses e posições dos estudantes na academia portuguesa e da independência e eficácia do movimento associativo estudantil.
Por tudo o que foi dito, Sr. Presidente e Srs. Deputados, manifestam os deputados sociais-democratas o seu total empenho para que em Plenário ou em sede de comissão seja possível desenvolver um trabalho eficaz e consciente na busca das soluções que se impõem para a construção da autonomia universitária, certos, todavia, do atraso que registamos, do melindre e importância da matéria e do muito que aqui sempre haverá a fazer!

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos tem a palavra o Sr. Deputado Luís Patrão.

O Sr. Luis Patrão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho muito pouco tempo disponível, visto ainda ter de produzir uma intervenção, onde darei conta à Câmara da posição do meu grupo parlamentar. Por esse motivo, a minha pergunta terá de ser feita em estilo quase telegráfico.
Gostaria de lhe perguntar o seguinte: qual é a posição da JSD em relação à matéria de fundo que está agora em discussão e que está consignada na proposta de lei do Governo? Ou seja, está a JSD de acordo com a destruição por parte do Governo de todo um sistema de gestão democrática das escolas, de lodo um princípio teórico que foi implantado - não o podemos esquecer- em Portugal por um governo socialista, com bons frutos dados ate esta data?
O Ministério da Educação e das Universidades, o ministério da AD, tem sido pródigo em contestar, prejudicar e atacar a gestão democrática das escolas. Pergunto-lhe, uma vez que o Grupo Parlamentar do PSD e os deputados da JSD nele integrados fizeram algumas propostas de alteração a proposta de lei que aparentemente servem para preservar o espírito fundamental da gestão democrática das escolas, mas, na prática, reduzem algo que era essencial nessa mesma gestão, ou seja, acabam com a paridade entre estudantes e professores nos estabelecimentos de ensino e, mais genericamente, nas universidades, é essa a posição da JSD nessa matéria? Se não é, gostaria de saber se essa posição resulta de alguma conciliação em relação às posições do Governo e se é essa a vossa última posição em matéria de gestão democrática?

Página 2639

10 DE MARÇO DE 1982 2639

Faço estas perguntas porque ouvimos dizer ao PSD uma coisa lá fora e outra coisa aqui dentro e é por isso que ficámos confusos acerca da vossa posição.

O Sr. Presidente:- Tem a palavra para responder o Sr. Deputado Adérito Campos.

O Sr. Adérito Campos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma breve resposta a uma não muito breve pergunta do Sr. Deputado Luís Patrão.
Devo dizer duas coisas fundamentais: a primeira é que o que está aqui em causa é o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, facto que não impede que pessoas integradas neste grupo parlamentar exponham pontos de vista de uma organização política que fez parte do Partido Social-Democrata; a segunda e minha convicção e convicção do próprio Ministro da Educação e das Universidades que não está em causa, como acabei de dizer na minha intervenção, a gestão democrática do ensino superior. Lembraria, por outro lado, ao Sr. Deputado -que, aliás, fez muito bem em lembrar isso à Assembleia - que a gestão democrática do ensino superior foi introduzida nas escolas pelo ministro Sottomayor Cardia. Só que na altura a Juventude Socialista recusou-a frontalmente.

Aplausos do PSD e do PPM.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - A JS teve mais coragem, vocês não têm coragem nenhuma!

O Sr. Presidente: - Para formular um protesto tem a palavra o Sr. Deputado Luís Patrão.

O Sr. Luís Patrão. (PS):- Sr. Presidente, um brevíssimo protesto só para dizer que as informações do Sr. Deputado não são fidedignas. A JS não recusou frontalmente a gestão democrática, nem o PS o fez. E não a recusou porque ela foi sugerida ao ministro Sottomayor Cardia pela JS. No entanto, o que consideramos hoje - como considerávamos naquela altura - é que essa proposta de lei, que deu origem ao diploma que está em vigor, precisava de ser aperfeiçoada, o que é contrário à necessidade de a destruir, conforme pretende fazer o ministro da AD.

Vozes do PS: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para um contraprotesto tem ã palavra o Sr. Deputado Adérito Campos.

O Sr. Adérito Campos (PSD): - Sr. Deputado, tenho muito pouco tempo, mas mesmo assim dir-lhe-ia que reafirmo todas as palavras que disse em relação à nossa convicção de que não está em causa a gestão democrática das escolas do ensino superior - nisso e na necessidade de a manter e reforçar parece que estamos de acordo. Se eu tivesse mais tempo, até lhe glosaria o tema de como a JS naufragou e a JSD é a maior organização política da juventude.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para solicitar um esclarecimento ao Sr. Deputado Adérito Campos tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, queria perguntar ao Sr. Deputado como é possível apoiar um ministro que apresenta um projecto de decreto-lei contendo o texto que vem referido na alínea O do artigo 17.º, que depois apresenta uma proposta de lei do mesmo teor e que depois defende uma proposta de alteração aqui apresentada pelo PSD. Como é que é possível manter a confiança num ministro que por duas vezes coloca as associações de estudantes dependentes da aprovação do senado universitário? Como é que a Juventude Social-Democrata -que é tão maioritária- é capaz de continuar a manter a confiança num ministro que comete estas barbaridades?

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

Como é que os senhores admitem que não seja o Sr. Ministro a vir aqui defender essas posições e a dizer a razão pela qual as pretende ver incluídas no decreto-lei?
Nós não andamos a brincar. Sr. Deputado, nós andamos a trabalhar exaustivamente neste país em matéria de educação e o que verificamos è que o País está a ficar completamente degradado com a vossa complacência e com as vossas reservas e conversas de bastidores.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Queria ainda lembrar que os órgãos de gestão democrática do ensino superior foram consagrados no decreto-lei n.º 806/74, de 31 de Dezembro. São conquista do 25 de Abril, e não conquista da AD.

Aplausos do MDP/CDE, do PS, do PCP e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Adérito Campos.

O Sr. Adérito Campos (PSD): - Sr. Presidente, dando uma resposta muito breve à Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura aproveito para lhe dizer que concordo que a gestão democrática do ensino superior é uma conquista do 25 de Abril - não vou ser eu a negá-lo. No entanto, o caminho para a autonomia universitária é uma conquista da AD - isso parece--me inequívoco -, visto ter sido a AD que primeiro apresentou uma proposta nesse sentido.
Dir-lhe-ia ainda, com o máximo de brevidade possível, que não confunda -isto é muito importante em democracia - a solidariedade política que deve existir, nomeadamente entre a JSD e o Governo - Governo onde está integrado o partido a que a JSD pertence - e o direito à crítica democrática e construtiva. Dessa crítica nós não abdicaremos!

Aplausos do PSD e do PPM.

O Sr. Luis Patrão (PS): - A ver vamos, a ver vamos!

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

Página 2640

2640 I SÉRIE - NÚMERO 62

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Peço desculpa, Sr. Presidente, mas não se pode confundir solidariedade política com falia de consciência individual, conforme está a acontecer nesta Assembleia.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Ramos.

O Sr. Jaime Ramos (PSD):- Sr. Presidente, pedi a palavra para solicitar, em nome da minha bancada, o prolongamento da sessão até à votação dos diplomas em apreço. Pessoalmente auscultei a opinião de todas as bancadas que me deram o consenso para esse prolongamento.

O Sr. Presidente: - Muito bem, em todo o caso pergunto à Câmara se há consenso, não duvidando da afirmação do Sr. Deputado. Desejo advertir a Assembleia que os tempos disponíveis, segundo as previsões da Mesa, quer dos partidos, quer do Governo, são de cerca de 1 hora e 45 minutos.

Pausa.

Como ninguém se manifestou em contrário, vamos continuar a apreciação dos diplomas relativos à autonomia das universidades.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Prossegue hoje o debate de um conjunto de iniciativas legislativas à autonomia das universidades. Não e um tema novo para os professores, estudantes e trabalhadores das universidade, já que ele foi sempre a sua bandeira de luta, quer durante a ditadura fascista, quer no novo Portugal democrático nascido da Revolução de Abril.
Falar de autonomia é falar de alguns exemplos daquilo que tem representado para o Governo esse mesmo conceito de autonomia. Perguntaria: quem não recorda a intervenção abusiva do Ministro na organização das comemorações do cinquentenário da Universidade Técnica de Lisboa, ao tentar opor-se, por meios muito pouco dignos - mesmo pela chantagem-, à presença do Presidente da República na sessão solene comemorativa?
Quem já esqueceu a tentativa de intervenção abusiva do Ministro da Educação e Universidade? na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, de que, por acaso, até é docente?
E que dizer sobre o que se tem vindo a passar na Universidade do Porto com a dança de nomeações e exonerações do reitor e vice-reitores, situação denunciada em significativo documento pelos próprios vice-reitores, que acusam o Ministro de os submeter a «marginalização», a «tratamento grosseiro)», de originar «demoras e prejuízos», e de a Universidade ter sido «seriamente ofendida»?
Mas seria de esperar outra coisa de um Ministro, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que ora se demite, ora volta ao Governo, que foge desta Assembleia como o diabo da cruz - como, aliás, hoje aconteceu -, que, apesar de expressamente convocado não comparece à comissão especializada para explicar os cortei de verbas do OGE para a educação, que não tem uma palavra neste Plenário para explicitar o programa do seu Ministério ou do orçamento para cie proposto e que faz aplicar de maneira prepotente as suas decisões, ferindo todas as crianças e jovens portugueses com as suas medidas e com os cortes de verbas para a educação.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Que esperar de um ministro que se tem pautado, e isso é reconhecido pela própria Aliança Democrática, pela mais pedestre incompetência nos seus actos e. que actua de maneira discriminatória, que actua de maneira a marginalizar as pessoas que não se enquadram ideologicamente nas fileiras da AD?

Vozes do PCP:- Muito bem!

O Orador: - Trouxemos já aqui várias perguntas e o Sr. Ministro não respondeu às questões concretas que lhe foram colocadas «pela oposição.

O Sr. Silva Marques (PSD): - E a matéria?

Vozes do PSD: - E o projecto? O projecto?

O Orador: - Já lá vamos!
É este mesmo ministro que pretende ver aprovada por esta Assembleia uma proposta de lei chamada de «autonomia das universidades». Mas vamos ver por que é que, de facto, não é uma proposta de autonomia das universidades. O traço anti-autonómico está patente ao longo de toda a proposta de lei.
Desde logo no artigo 9.º se diz que, a todo o momento, u ministro pode suspender a chamada autonomia sempre que situações graves o justifiquem, por exemplo «quando não existirem as condições necessárias mínimas ao normal funcionamento e gestão universitária» Mas quem vai ajuizar dessas condições? O próprio Ministro!
A JSD diz que só por um prazo de 90 dias. Mas, Srs. Deputados, o Ministro saberá melhor que a universidade se as coisas vão bem ou mal?
Da proposta governamental está totalmente ausente qualquer ideia de representação proporcional.
Os Srs. Deputados da JSD e do PSD apresentaram uma proposta de alteração que nos parece positiva. Por isso, certamente concordam connosco quando dizemos não á proposta original do Ministro, mas vamos ver se a vossa proposta é aceite.

O Sr. Adérito Campos (PSD): - É aceite!

O Orador: - Já assistimos a tanta coisa deste Ministro que mais uma cambalhota não seria de estranhar.
Mas o Sr. Ministro disse que a sua proposta decorria da recolha de experiências do que se passava no estrangeiro. Só que, certamente, o Ministro não quer enganar os deputados desta Assembleia com exemplos do que se passa no estrangeiro, como tentou fazer. O Ministro sabe muito bem que na maior parte das universidades estrangeiras a esmagadora

Página 2641

10 DE MARÇO DE 1982 2641

maioria dos docentes são doutorados, Basta citar o caso francês ou inglês. Mas o que se passa na proposta de lei do Ministro; da Educação e que se pretende marginalizar, para além dos estudantes, cerca de 80 % dos docentes da universidade portuguesa - os assistentes.

O Sr. Gomes Carneiro (PS):- Muito bem!

O Orador:- Por outro lado, o Sr. Ministro não pode assacar a esses Assistentes o facto de eles não prosseguirem os seus estudos, de não conseguirem o grau de doutoramento. Os Srs. Deputados sabem perfeitamente que o Governo não tem facilitado a vida aos assistentes universitários, nem tem dado resposta às reivindicações por eles apresentadas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: De acordo com a proposta o reitor é designado pelo ministro a partir de 3 nomes escolhidos pela assembleia da universidade - com a composição atras descrita-, o que dá sempre a possibilidade ao MEU de escolher arbitrariamente o nome que mais lhe agradar, ou seja o Ministro poderá- sempre escolher, de entre esses 3 nomes, aquele candidato - ainda que tenha sido o menos votado - que represente melhor os interesses da AD ou do PSD.

Vozes- do PCP: - É claro!

O Orador: - Logo, o que se pretende é, de facto, assegurar uma pessoa de confiança, que certamente estará entre os 3 escolhidos para estar à frente da universidade.

Vozes do PCP: - É óbvio!

O Orador: - Mas as questões não se ficam por aqui: a proposta do Governo denota uma concepção presidencialista de poder exercido pelo delegado do Ministério na universidade - o senhor reitor que, ainda por cima, é por este imposto à universidade. A proposta de lei encarna um verdadeiro projecto de poder pessoal a ser exercido pelo ainda Ministro Vítor Crespo. Mais: o Ministro pode nomear ou exonerar o reitor contra a vontade da universidade e esta não pode nomear ou demitir o reitor contra a vontade do Ministro. A eleição surge como clara fantochada. Falar de eleições com estas características é, de facto, brincar com os estudantes, com os professores e com os funcionários das universidades.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Aliás, é uma fantochada que não é diferente daquelas que estão a ser preparadas com o «pacote eleitoral da AD», tão brilhantemente elaborado pelo «Sr. Ministro da insurreição» deste governo.

Vozes do PCP:- Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei é totalmente omissa de qualquer referência, na definição dos objectivos a prosseguir pela universidade, à participação de quaisquer representantes das actividades sociais com ela relacionadas. Há uma total falta de democraticidade na definição dos estatutos profissionais dos docentes e outros funcionários, que não são sequer ouvidos, nem mesmo através dos seus representantes sindicais. Prevê-se a possibilidade de aumento ilimitado das propinas, a definir pelos órgãos universitários, ou seja pretende-se que não seja o Orçamento Geral do Estado a suportar os custos com a educação, mas sim - partindo da máxima do Sr. Ministro Barbosa dos Assuntos Sociais - as próprias universidades. Mas o que está na vossa proposta, na proposta do governo da AD, podia originar o seguinte: escolas baratas e escolas caras, cursos baratos e cursos caros, cadeiras baratas e cadeiras caras, enfim, dependia casa a caso de cada universidade decidir ou não aumentar as propinas. Nós pensamos que não é assim que se encara a educação neste país!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas há mais: o projecto governamental define os «institutos de estudos graduados» como «responsáveis pelos cursos de mestrado e doutoramento», entidades cuja existência não passou ainda do papel e que têm merecido o repúdio generalizado dos professores das universidades, quer pela facto de não estar prevista a gestão democrática, quer pelo total compadrio na escolha de quem os pode frequentar e de quem os deve orientar.

Vozes do PCP:- Muito bem!

O Orador: - Mas as malfeitorias do projecto Vítor Crespo não se ficam por aí. O Ministro pretende aproveitar-se desta proposta de lei para se meter em assuntos que nada têm a ver com a autonomia das universidades. É assim que, num total desrespeito pela Constituição e pela lei, o Sr. Ministro Vítor Crespo pretende impor que sejam os doutores a aprovar os estatutos das associações de estudantes.
Espero bem que a proposta da JSD possa ser aprovada, No entanto, ainda estou à espera de uma última cambalhota do Ministro, visto ser pródigo nesse virar de face!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): ~- Esteja descansado, somos nós que a vamos aprovar, não é o Sr. Ministro.

O Orador: - Trata-se de uma disposição totalmente antidemocrática. Na altura veremos se a JSD manda alguma coisa ou se é este Ministro que manda.
Mas há mais, Srs. Deputados: pretende-se nesta proposta de autonomia universitária estabelecer os numerus clausus nas universidades. Ora, isto não tem nada a ver com a questão que estamos aqui a tratar, é uma matéria totalmente diferente que poderá eventualmente ser discutida em sede de Lei de Bases do Sistema Educativo, mas nunca numa proposta com as características da que hoje estamos a discutir.
Com esta proposta o Governo pretende assegurar o controle de toda a vida universitária -ainda que fazendo algumas concessões à autonomia da cátedra-, permitir o encarecimento ilimitado do ensino e facultá-lo apenas a uma elite de privilegiados, desresponsabilizando-se da concessão de verbas e de dar resposta às carências das escolas, ignorar o direito à negociação na definição de carreiras, intrometer-se na vida das associações de estudantes, ou seja subver-

Página 2642

2642 I SÉRIE - NÚMERO 62

ter por completo todos os objectivos e funcionamento das universidades. É, pois, um projecto inaceitável no quadro do regime democrático constitucional e que deve merecer o repúdio veemente desta Câmara.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a proposta de lei do Governo não surge isolada, ela surge como uma peça chave - é pena que não esteja aqui o Sr. Ministro ou o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, visto que poderiam dar resposta a esta questão - para, em conjunto com a Lei da Direcção-Geral do Ensino Superior (cujo anteprojecto foi posto a circular e que ainda não foi desmentido), assegurar ao Ministro o comando e o controle de todas as alavancas sobre o sistema universitário português. Era bom que o Sr. Ministro - que não está presente - pudesse esclarecer as suas ideias face ao projecto de lei orgânica que veio a conhecimento do público e em que a Direcção-Geral do Ensino Superior é transformada em superstrutura de definição, coordenação e controle de tudo o que diz respeito ao ensino superior. A autonomia universitária por esta via não passaria, de facto, de algo consagrado no papel sem qualquer tipo de valor.
Vou agora ao encontro de uma frase usada por um senhor deputado do PSD: o consenso. Srs. Deputados, como é que se pode falar de consenso em relação a uma proposta de lei unanimemente rejeitada pelos partidos da oposição?

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Está a delirar!

O Orador: - Qual é o vosso consenso? É o consenso da maioria?
A vossa proposta de lei é atacada, desmontada pelos partidos da oposição, como algo de inaceitável no Portugal democrático. Será que essa proposta pode ser base de qualquer consenso?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Como se pode falar de consenso quando um dos próprios partidos da coligação da AD -o CDS- apresentou um projecto autónomo, não o retirou, insiste nele, não morrendo de amores pela proposta do Sr. Ministro Vítor Crespo?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Como se pode falar no consenso em torno de um texto que é considerado e criticado severamente pela própria JSD, designadamente pelos seus eleitos nas associações de estudantes que, aliás, não estão a ser acompanhados neste debate pelos seus correligionários de partido?

O Sr. Manuel Moreira (PSD):- Não apoiado!

O Orador:- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto ao projecto do CDS importa, em primeiro lugar, referir que ele surge como um projecto que omite - e bem, em nosso entender- propositadamente aspectos melindrosos em que abertamente penetra
- e mal-, em clara derrapagem totalitária, a proposta de lei do Governo. Mas não são apenas as omissões que caracterizam esse projecto. Tratando-se, como se trata, de um projecto de autonomia universitária da cátedra, ele cai contudo em gritantes contradições com a proposta governamental, das quais, entre muitas, se podem salientar.
Era bom que os Srs. Deputados do CDS nos dessem resposta para que deste debate saísse luz de modo a percebermos o que pretendem em termos de autonomia universitária. No vosso projecto de lei a concepção do reitor surge como representante da universidade e não como mandatário do Governo - aspecto que consta da proposta governamental; há uma completa diferença de concepção dos poderes ministeriais face à nomeação do reitor eleito, que só poderá ser recusada com base em fundamento legal. Como sabem a proposta de lei do Governo dá uma total discricionariedade ao Ministro para nomear e exonerar o reitor; há uma diferente concepção da composição da assembleia responsável pela eleição do reitor, cuja constituição e remetida para estatuto interno de universidade a elaborar pela própria universidade. Como os senhores sabem na proposta de lei é o Ministro que aprova o estatuto da universidade; há uma total ausência de referências ao acesso, aos numeras clausus, à liberdade de associação, etc., etc., em que o «projecto Vítor Crespo» é prolixo; mas as contradições assumem um ponto fulcral quando no projecto do CDS as associações de estudantes participam na defesa do estatuto da universidade - e bem - ao passo que no «projecto Crespo» cabe ao doutoral senado aprovar - ou não - os estatutos das associações de estudantes. O Ministro Crespo ultrapassa em conservadorismo pela direita o próprio CDS!
Queríamos respostas para saber como é que o CDS vai descalçar esta bota!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para a elaboração de uma verdadeira lei de autonomia universitária que englobe todos os aspectos imprescindíveis para a ver assegurada e não abrange outras questões que em outras sedes devem ser resolvidas, existe nesta Assembleia base de trabalho bastante: 2 projectos de lei, da ASDI e do MDP, a que haverá que juntar as propostas concretas que resultam do trabalho concreto que vimos desenvolvendo, que passou pela realização de uma conferência nacional da juventude do meu partido e por intensos estudos com a colaboração de professores comunistas e outros democratas que connosco têm analisado estes problemas.
Quanto ao projecto da ASDI, pese embora as reticências que o projecto nos levanta em matéria de eleição do reitor e na excessiva tendência de deixar para governamentação aspectos fundamentais do diploma, ele não pode deixar de ser encarado como um contributo sério e positivo para a definição, não só de um esquema de verdadeira autonomia universitária, como para a definição do papel que a universidade deverá desempenhar no âmbito de toda a vida social, política e económica do País. Consideramos que este projecto é uma boa base de trabalho, por isso o votaremos favoravelmente.
No que se refere ao projecto de lei do MDP ele corresponde bem à declaração preambular de que seria errado, passo a citar, «substituir uma orientação centralizadora e em comando burocrático, asfixiante e despótico exercido pelo Estado pelo comando exer-

Página 2643

10 DE MARÇO DE 1982 2643

eido pelos professores catedráticos». Daí que se tenha optado - e bem - pela definição de que o poder de orientar as acções da universidade deve residir no conjunto dos seus membros a quem cabe fixar o estatuto, eleger e destituir o reitor. Para além da consagração da existência de vários tipos de universidades públicas, privadas e cooperativas, assegura-se a autonomia científica e cultural, pedagógica e orçamental da universidade -com definição de regras próprias- e consagre-se o direito da universidade de participar na elaboração dos quadros legais que a regem e na orientação geral da política de ensino, da ciência e da Universidade, bem como a representação no Conselho de Educação, no INIC e outros órgãos que intervenham na orientação do ensino superior e na política da ciência. São princípios que merecem o nosso apoio, pelo que o projecto de lei do MDP irá contar com o nosso voto favorável.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Colocadas estas questões resta dizer que pelo nosso lado entendemos como particularmente necessário dotar o país de uma lei sobre a autonomia das universidades que corresponda efectivamente aos anseios, ao sentir, à vivência de todos quantos trabalham e estudam nas universidades portuguesas e não de um diploma que pretenda institucionalizar o controle governamental de toda a actividade universitária.
Em primeiro lugar somos apologistas de uma concepção da universidade não como instituição central situada acima das escolas, mas sim como a totalidade englobante destas e resultante das suas próprias experiências. Daqui se conclui que um projecto de autonomia não deve nem pode cingir-se na sua orgânica à estrutura central da universidade, antes devendo contemplar também a composição, competências e atribuições dos órgãos gerais da gestão das escolas.
Em segundo lugar entendemos que qualquer nova lei de autonomia não pode deixar de consagrar a eleição democrática e participada de todos os principais órgãos de gestão universitária pelos que nela trabalham ou estudam, assim como não pode deixar de conter normativos que assegurem o funcionamento democrático e colegial de toda a instituição universitária. Daqui resulta claro que somos apologistas da participação de todos os elementos da universidade na sua organização e funcionamento.
Em terceiro lugar, e finalmente, pensamos ser imprescindível que a futura lei consagre uma grande margem de competências científicas, pedagógicas e administrativas para a universidade, aliada à gestão por esta dos seus recursos financeiros, na certeza de que a sua principal fonte de financiamento deve ser o OGE.
São princípios cuja consagração consideramos fundamental para que se possa falar de uma verdadeira autonomia universitária. A serem consagrados em diploma legal, estamos certos que a AD terá dado um importante e decisivo contributo para o reforço da gestão democrática das escolas e para a verdadeira autonomia das universidades do nosso país.

Aplausos do PCP, do PS, da UEDS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Suponho que para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente Srs. Deputados: Não vou pedir esclarecimentos, mas sim dar um esclarecimento, isto é, vou responder a uma ou duas questões que o Sr. Deputado Jorge Lemos dirigiu à nossa bancada.
Não há dúvida de que há uma diferença profunda entre o projecto de lei do CDS e a proposta de lei do Governo. É esta a razão por que não retiramos o nosso projecto quando o Governo apresentou a sua proposta. E isso levou também a que o Governo, apesar de já haver um projecto de lei do CDS, apresentasse também a sua proposta.
Mas isto não quer dizer que se trate de duas filosofias diferentes. A única coisa que se pode dizer é que se vê a universidade sob duas vertentes diferentes.
É que o projecto de lei do CDS contempla a universidade como uma instituição e naturalmente que liga a esta ideia institucional todo o problema da autonomia.
A proposta do Governo não olha para a universidade como uma instituição, mas sim coma um serviço público e esta é a primeira diferença. Enquanto que a proposta de lei do Governo parece ser uma outorga da autonomia dada pelo Estado à universidade, o projecto de lei do CDS defende a autonomia originária de universidade em face do- Estado.
Trata-se de uma questão de qual o prisma por que se vê este problema, é uma questão de olhar para a universidade em face do Estado. É, portanto, o problema do relacionamento do Estado para com a instituição universidade que já é tradicional entre nós.
E porque a nossa visão de universidade é institucionalista, é personalista e não é uma visão de mero serviço público - não se trata de uma carta constitucional, mas da constituição da universidade -, o nosso projecto de lei aparece como uma lei quadro da universidade, como a própria lei orgânica da universidade, aparece como a constituição da universidade, feita por cia própria.
Daí que nós deixemos à própria universidade a feitura do seu estatuto, a maleabilidade, a flexibilidade, a adaptação da universidade às necessidades regionais, às necessidades dos seus próprios currículos e do seu próprio pessoal docente.
O Sr. Deputado Jorge Lemos apontou aqui um problema fundamental: o de que não basta falar dos doutores. É preciso ver quantos doutores há em cada escola, em cada universidade, em cada departamento e o modo como eles são recrutados e promovidos para que a universidade se auto-afirme como uma instituição de doutores e não dos docentes.
E enquanto isso não for assim, no nosso projecto de lei, é deixado aos estatutos a sua adaptação e a sua própria constituição dentro das necessidades educacionais do País.
Por outro lado, no nosso projecto de lei há uma espécie de subordinação à política legislativa, que vê as universidades em três campos diferentes.
Em primeiro lugar, o problema da criação das universidades que, infelizmente, se tem transformado em problema político, o que não deveria acontecer.
Em segundo lugar, o problema da própria estruturação da universidade. Isto é, quais são as finalidades da universidade, o que é que a universidade ensina, o que é a independência pedagógica, o que é a independência da docência, o que é a indepen-

Página 2644

2644 I SÉRIE - NUMERO 62

ciência da formação dos alunos que lhe são entregues. Nós entendemos, e parece que o PCP também, que estas questões devem ser as bases do sistema nacional de educação e não o decreto-lei e a lei que trata apenas do problema da autonomia da gestão das universidades.
Estes projectos de lei não são verdadeiramente projectos sobre a autonomia universitária, mas referem-se, sim, a autonomias universitárias. Como diz o Sr. Prof. Ferrer Correia, não há autonomia universitária: há, sim, autonomias universitárias: há autonomia pedagógica, autonomia científica, autonomia financeira e há também autonomia da gestão ou do governo da universidade.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Ora, a autonomia que, neste momento, estamos a discutir nesta Câmara é a autonomia administrativa, isto é, a autonomia de autogoverno das universidades e não mais do que isso.
Infelizmente este problema da autonomia e do autogoverno das universidades foi confundido com a eleição do reitor. Toda a gente fala da eleição do reitor come- se o problema da autonomia, mesmo o desta autonomia, se confundisse com a eleição do reitor quando a eleição é um modo processual, é um modo secundário, é um modo que integra a autonomia da administração e não esgota todo o problema.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Parece que toda a gente está «bêbeda» da eleição do reitor, quando esta eleição é apenas um modo processual e não o problema de fundo da autonomia da universidade.
Ora, o que o nosso projecto de lei diz é que quem elege o reitor é a universidade e que só se houver impedimentos legais é que o Governo poderá inter vir. Não haverá assim poderes discricionários e dá-se a César o que é de César e à universidade o que é da universidade.

Vozes do CDS: - Muito bem!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Gomes Carneiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, o nosso projecto de lei tem realmente omissões, mas são omissões deliberadas e não são lacunas da autonomia universitária. Porque, como já disse e repilo, a autonomia universitária que aqui se discute não é a autonomia total, mas uma parte da autonomia da universidade: é a lei do autogoverno da universidade.
Devemos olhar para esses projectos de lei apenas como a lei de autogoverno das universidades e não como a lei de toda a autonomia das universidades. Porque é conjuntamente com as restantes partes da autonomia das universidades que se constituirão as bases do sistema nacional de educação, essas autonomias farão parte de leis sobre a criação das universidades.
Tenho ainda a esperança de que um dia este deixará de ser um problema político para ser um problema próprio das universidades, do conselho dos reitores, para ser um dos problemas da comunidade universitária, da universidade portuguesa e não da Direcção-Geral do Ensino Superior ou da Assembleia da República.
Ora, nós não nos intrometemos neste problema porque - e digo-o mais uma vez- o projecto de lei do CDS não é o estatuto universitário, não é a lei democrática global da universidade, mas. sim, meramente uma parte que diz respeito ao governo interno da universidade - talvez fosse melhor dizer que todos os nossos projectos são leis orgânicas do governo interno da universidade e nada mais do que isso.
Dizendo que se trata de uma lei sobre a autonomia das universidades nós estamos a iludir-nos a nós próprios. Como disse a Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes, não se trata da autonomia pedagógica, da autonomia científica ou da autonomia do recrutamento, não se trata destas autonomias, mas apenas da autonomia do governo da universidade.
E vendo o problema desta forma já desaparecem as tais contradições de que o Sr. Deputado Jorge Lemos falou entre a proposta de lei do Governo e o projecto de lei do CDS. O que há é modos diferentes de ver o problema, mas que se podem conjugar em ordem a um consenso.
Do meu ponto de vista pessoal e do meu partido julgamos que há uma grande contribuição da pane da ASDI, que é uma contribuição positiva, para o problema do autogoverno da universidade, embora o mesmo já não se verifique para o problema da autonomia das universidades.
Por exemplo, o discurso do Dr. Sousa Franco, aquando da apresentação do projecto de lei da ASDI, referia-se à autonomia global da universidade e o que se verifica é que o projecto de lei não corresponde ao discurso.
Por outro lado, também o artigo no Jornal da Educação, em conjunção com o Sr. Deputado Oliveira Martins, diz respeito à independência científica e trata a autonomia da universidade, mas não se refere à questão central que estamos agora aqui a debater.
Portanto, o problema está distorcido, está ampliado, quando não deveria estar.
Entendemos, no entanto, que o projecto de lei da ASDI merece a aprovação desta Câmara, na generalidade, e tem que baixar à Comissão respectiva para dar o seu contributo.

O Sr. Comes Carneiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em relação ao projecto de lei do MDP/CDE, nós entendemos também que alguns dos aspectos nele apontados merecem uma séria reflexão e naturalmente que esses pontos serão tomados em consideração na Comissão de Educação, Ciência e Investigação. Porque pelo facto de u projecto de lei não passar aqui na generalidade não quer dizer que se fechem os olhos aos seus aspectos positivos. E, estando presentes na Comissão respectiva os deputados, principalmente a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, estou absolutamente certo de que muitos dos pontos que, sob o nosso ponto de vista, merecem o tal consenso também serão aproveitados para a lei de autogoverno das universidades.

Página 2645

10 DE MARÇO DE 1982 2645

Simplesmente, não poderemos dar o nosso voto na generalidade ao projecto de lei da MDP/CDE porque este ultrapassa a nossa visão da universidade. O MDP/CDE tem uma visão de poder local, uma visão de poder não institucional tradicional da universidade e por isso não o podemos aceitar. É só por esta razão que iremos votar contra. Não é que muitas das soluções pontuais que se encontram no articulado do MDP/CDE não mereçam o nosso aplauso e a nossa aprovação, mas porque a filosofia que está na base da estruturação da universidade não é a de universidade como instituição tradicional portuguesa, mas a de uma universidade integrada nos outros poderes, principalmente no poder local.
Ora, não podemos aceitar esta visão e é esta a razão que nos leva a não votar o projecto de lei do MDP/CDE.
Finalmente, quero ainda salientar que quem deve discutir a universidade são os universitários, porque este e um problema que lhes diz respeito. E só faço votos para que na Comissão de Educação, Ciência e Investigação o problema em questão não venha a ser partidarizado, que o autogoverno da universidade não seja visto como um problema da AD ou um problema da oposição, um problema do PCP ou um problema do PS. Faço votos para que seja visto como uma lei autêntica da Universidade, porque não há autonomia AD da universidade, não há autonomia PS da universidade, não há autonomia PCP da universidade, mas sim a autonomia da universidade que está acima de todos os partidos políticos.
Nós queremos que a universidade continue para além da alternância do Poder, para além dos governos que sucedem no tempo, porque não podemos fazer uma lei de autogoverno para 4 ou 5 anos. As universidades têm que programar a sua vida e quando o fazem não é para períodos curtos nem para períodos médios.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI):- Muito bem!

O Orador - Porque nós sabemos que a unidade do tempo na Universidade é de l ano, a unidade do curso são 5 anos, a unidade do doutoramento são, pelo menos, 10 anos e quando a universidade tem de planear tem de o fazer para vinténios e não apenas para decénios.
Esperamos que esta não seja uma lei AD da universidade, não seja uma lei PCP da universidade, não seja uma lei Vítor Crespo da universidade, não seja uma lei política da universidade, mas sim uma lei universitária da universidade.
É este o voto do CDS.

Aplausos do CDS, do PSD, de PS, do PPM, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, confesso que neste momento me encontro um pouco embaraçado porque há uma inscrição de um outro deputado do CDS, que é o Sr. Deputado Adriano Rodrigues, e o Sr. Deputado Narana Coissoró produziu uma intervenção que quase consumiu o tempo do CDS.
Pedia, pois, aos deputados do CDS que considerassem a situação uma vez que neste momento dispõem apenas de 2 minutos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP):- Dá-me licença, Sr. Presidente?
É que, tendo feito uma intervenção ao longo da qual, em tom discursivo, coloquei algumas questões, o CDS, pela voz do Sr. Deputado Narana Coissoró, entendeu dar resposta a algumas das questões colocadas.
Neste sentido eu pretendia comentar brevemente as palavras do Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Presidente: - Com certeza. Sr. Deputado. Faça favor.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Narana Coissoró, as suas palavras vieram confirmar o que nós aqui dissemos. De facto, há duas concepções presentes que diferenciam -c muito- quer o projecto de lei do CDS, quer a proposta de lei do Governo.
Mas enquanto o Sr. Deputado Narana Coissoró, em relação à proposta de lei do Governo, usando o termo visão, que repetiu, diz que a visão diferente do CDS e do Governo não o impede de votar favoravelmente a proposta de lei do Governo -e isto apesar de o próprio Sr. Deputado Narana Coissoró ter demonstrado que as contradições em matéria de fundo são, de facto, tão grandes. Em face disto o que eu tenho é medo de que da Comissão possa sair um saco de GATs em vez de um diploma de autonomia.
Mas V. Ex.ª vem falar também de visão diferente para justificar um voto contra o projecto de lei do MDP/CDE, apesar de até dizer que ele tem aspectos positivos.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador:- Com certeza, desde que desconte no tempo do seu partido.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): -Eu pedi a palavra apenas para dizer que quando falei medi as palavras. Em relação ao projecto de lei do MDP/CDE eu disse «filosofias» diferentes.

O Orador: - Sr. Deputado, depois o registo confirmara que tenho razão.
O objectivo do Partido Comunista ao partido neste debate não é politizar a questão da autonomia universitária. Se alguém quis politizar esta questão foi precisamente o Sr. Ministro da Educação e Universidades ao trazer a esta Câmara uma proposta de lei que vai impossibilitar não só em termos de autonomia de governo da universidade, mas em todos os outros campos que o SP Deputado refere -e bem-, que se concretizem as verdadeiras autonomias da universidade.
É contra isso que aqui estamos e é contra isso que o próprio Sr. Deputado Narana Coissoró se bateu há pouco na intervenção que fez -e não me vai negar certamente. Porque o Sr. Deputado sabe tão bem como eu que a proposta do Ministro Vítor Crespo é tudo menos uma proposta a favor da autonomia das universidades.
O mínimo que se poderia exigir depois do que disse era que se abstivesse na votação da proposta

Página 2646

2646 I SÉRIE - NÚMERO 62

de lei apresentada pelo Ministro da Educação e Universidades. Porque certamente como disse, e bem, quem tem um peso fundamental no julgamento cias propostas sobre a autonomia das universidades são os próprios universitários e não desconhecerá - porque é um homem que vive dia a dia na Universidade - os protestos que pelas universidades surgem contra esta proposta de lei anti-autonómica que nos foi apresentada pelo Ministro Vítor Crespo.
É um dever de consciência, mais até do que um dever de partido -sendo um aniversário como é - , votar contra ou. pelo menos, abster-se numa proposta tão aberrante como aquela que o Governo aqui nos quer fazer engolir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Adriano Rodrigues pretende ainda fazer a intervenção para que estava inscrito?

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como temos o tempo muito limitado, eu queria apenas dar um esclarecimento ..

O Sr. Presidente: - Vamos chamar as coisas pelos nomes, o Sr. Deputado quer fazer uma breve intervenção.

O Orador:- Perdão, Sr. Presidente. Eu tinha uma intervenção para fazer, mas hão a quero realizar.
Gostaria apenas de dizer que subscrevo as palavras do meu colega e de fazer o seguinte esclarecimento relativamente à minha renúncia.
Esta intervenção prestava fundamentalmente uma homenagem a alguém que dentro do nosso partido sempre se bateu pela autonomia universitária, que foi o engenheiro Adelino Amaro da Costa. Eu transcrevia pontos de vista do engenheiro' Amaro da Costa que foram há pouco aqui expressos e defendidos pelo Sr. Deputado Narana Coissoró e que todos nós subscrevemos.
Portanto, quero apenas dizer que apresentarei por escrito, como declaração de voto, esta minha intervenção, prescindindo assim do tempo que me era reservado e que de bom grado cedi totalmente ao meu colega. Manifesto apenas a minha congratulação pelas suas palavras e o apoio integral de todo o meu grupo parlamentar.

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Patrão.

O Sr. Luís Patrão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Tema de colóquios, debates e artigos, assunto de conversa para estudantes e professores, foco de novas e agudizadas tensões no seio da maioria governamental, para tudo um pouco tem servido, nos últimos tempos, a autonomia universitária.
E, no entanto, tal conceito é tão antigo quanto a própria universidade, que nasceu livre e autónoma e só pouco a pouco foi perdendo essa independência que fazia jus à sua dignidade de instituição superior.
Autonomia universitária é, tradicionalmente, medida legislativa de honra de regimes nascidos ou renascidos para a democracia; eloquente é o caso da nossa I República, que logo em 1911 aprovou um decreto consagrando o princípio de que cabe às universidades. O seu próprio governo, tanto no domínio económico como no científico.
A negação dessa autonomia é, por outro lado, timbre dos regimes antidemocráticos, cuja paradigma o povo português tão longa e duramente conheceu e que nesta matéria e revelou através do Estatuto da Instrução Universitária de 1930, virgem de qualquer referência à ideia da autonomia e cerceador dos princípios da democracia representativa do regime legal da I República.
Pela ordem natural das coisas, ao 25 de Abril caberia, pois, voltar a afirmar a essência democrática do princípio da autonomia das universidades em relação ao Poder, estender a liberdade reconquistada até ao ensino superior, devolver aos universitários a responsabilidade de traçar o seu próprio futuro.
Por razões diversas, só decorridos quase 8 anos nos aprestamos para levar a cabo essa tarefa essencial da democracia, analisando três projectos e uma proposta de lei sobre autonomia universitária.
Não pretendo, com esta intervenção, dissecar todos os pontos controversos dos textos em presença.
Não posso, todavia, calar o meu protesto face a um desses textos, que considero frontalmente atentatório de direitos democráticos adquiridos, burocraticamente centralizador nos objectivos e nos métodos, pessoais inconfessáveis.
Esse, o mais conservador e reaccionário, é o do Governo.
Proposta de lei nascida de parto difícil, criança repudiada como bastarda por parte, da família política a que pertence, não se sabe ainda hoje, dia da votação, de fonte segura, com que apoios contará neste hemiciclo.
O CDS adoptou a proposta do conselho de reitores e apresentou-a como projecto de lei; tantas são as diferenças entre o seu texto e o do Governo que se não vislumbram as razões de um seu hipotético apoio à proposta de lei, a menos que o aforismo AD «maioria a quanto obrigas!» faça valer a sua força!
Quanto ao PSD, a confusão e grande. De um lado, o seu ministro da Educação -trave carcomida do edifício do poder AD - a exigir apoio, quando não, demite-se. Do outro, a JSD na aflição da impossibilidade de justificar aos estudantes mais esta tirada do seu correligionário ministro, a pretender negar o seu apoio, mas a dar trémulos passos no sentido de inflectir essa sua posição.
Ao que consta - e ficámos esclarecidos nessa matéria pelas intervenções que foram sendo feitas esta tarde -, porém, o Sr. Ministro terá ganho este primeiro round ao assegurar o apoio da sua maioria à sua proposta, à custa de cedências que não alteram o fundo da questão e que, sobretudo, não fazem o ministério inflectir a sua perspectiva política nesta matéria.
O que é certo, ao fim e ao cabo, é não ser sem razão o generalizado desgosto pela proposta de lei do Governo. Senão vejamos: a proposta é de tal

Página 2647

10 DE MARÇO DE 1982 2647

forma centralizadora que, só a título indicativo, se pedem apontar 36 normativos atribuindo ou reservando competências e poderes para o Governo em geral ou para o MEU em particular. Para um diploma sobre autonomia, não está mal!
A tudo chama o Sr. Ministro seu: desde a aprovação- dos estatutos das universidades até à aprovação dos regulamentos das unidades orgânicas componentes das universidades: desde a nomeação do reitor até à sua exoneração, a qual é praticamente discricionária; desde a homologação dos orçamentos privativos das universidades, até á fixação dos numerus clausus, aqui confessando o ministro que o principal critério para a respectiva fixação é, «a capacidade de acolhimento das estruturas universitárias».
O cúmulo é a equiparação, assumida pelo diploma, do reitor a director-geral e dos vice-reitores a subdirectores-gerais, como se as universidades fossem meras estruturas orgânicas do MEU, e o reitor um simples mandatário do ministro todo-poderoso.

Uma voz do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, começa por se contestar o carácter burocraticamente centralizador da proposta em apreço, a que mais correctamente se deveria chamar da «dependência universitária».
Mas outros defeitos existem. Por exemplo: em matéria de respeito por direitos democráticos, veja-se o tratamento conferido pelo Sr. Ministro às associações de estudantes.
No artigo 17.º, alínea h), dispõe-se que compete ao conselho ou senado, universitário «aprovar os estatutos das associações de estudantes que se constituam no âmbito da respectiva universidade».
Como é possível, 8 anos depois da libertação do 25 de Abril, termos um ministro que tais coisas escreve, é caso para todos nos interrogarmos vivamente.
Para além do inadmissível desrespeito pela legislação em vigor sobre direito e liberdade de associação e da indizível contradita do espírito e da letra da nossa Constituição, para além disso, é de sublinhar a fraca conta em que o Sr. Ministro tem o associativismo estudantil, tão rico de tradições de luta.
E nem o facto de algumas associações terem na direcção correligionários seus o fez recuar! Ou tratar-se-á, maquiavelicamente, de alguma prova de força interna no PSD que nós, cá fora, não estamos em condições de perceber? E não serão as propostas de alteração da JSD, nesta matéria como noutras, uma tentativa de contra-ataque, apenas para salvar a face?

Vozes do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - Seja como for, os estudantes já enfrentaram coisas piores, ministérios mais fortes que o MEU, situações políticas de restrição de liberdades bem mais adversas que a actual. Não irão vergar agora!
Aliás, as sucessivas tomadas de posição de associações de estudantes repudiando o teor da proposta governamental, bem como as formas de luta que têm sido escolhidas em diversas escolas da academia de Lisboa, como de outros pontos do País, prenunciam o renascimento da capacidade de luta estudantil. Alguma virtude havia de ter a proposta de lei do Governo!
Mas a falta de espírito democrático da proposta não se fica por essa norma,
Outra, bem grave, é a que impõe que os órgãos colegiais das universidades, ou seja, o senado ou conselho universitário e a assembleia de universidade, não poderão ter um número de doutorados inferior a 60 % do total dos seus membros.
Que o corpo de catedráticos possa e deva ter uma representatividade proporcional ao seu peso específico, enquanto elemento chave da instituição universitária, não se contesta, antes se aplaude como justo e bom princípio.
Agora, que se fixe uma percentagem despropositada de 60 % já nos surge como uma atitude desvirtuadora dos princípios da democracia e do justo equilíbrio na repartição dos poderes, que nada pode justificar, nem sequer a desmesurada ânsia de controle de um ministro que se faz chamar das universidades.
A participação estudantil condigna na gestão dos estabelecimentos de ensino é, mais que uma questão meramente formal, uma necessidade imperiosa, um acto do mais puro realismo democrático. Pô-la em causa, como faz o Sr. Ministro AD, é pôr em causa o próprio conceito de gestão democrática, é tratar com desprezo os jovens que tão empenhadamente nela tem participado e isso não podemos aceitar.

Uma voz do PS: -Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Falar em autonomia é, deve ser, falar em participação, em compartilhar de responsabilidades, em dar a cada cidadão a sua quota de poder.
Falar de autonomia universitária é, deve ser, falar de autogoverno, falar das capacidades da instituição universitária para se renovar e melhorar continuamente, para melhor servir o País e o povo.
Falar de autonomia universitária é, enfim, confiar em universidades renovadas e modernas, independentes e autónomas, das quais se não possa nunca mais ouvir dizer, com justiça, aquilo que António José de Almeida aqui disse em 1907: «a universidade ama as trevas como as aves noctumas.»
Por nós, socialistas, confiamos que o 25 de Abril tenha trazido à universidade o gosto pela luz, por muitos pios lamentosos que isso mereça aos descontentes.

Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.

O Sr. Jorge Lemos (PCP):- Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:- Sr. Deputado, para que efeito deseja usar da palavra?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença? É para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Jorge Lemos (PCP):- Sr. Presidente, há pouco, vendo a lista das inscrições, verifiquei que o Governo não estava ainda inscrito. Ora, pretendia saber se o Sr. Secretário de Estado se tenciona ins-

Página 2648

2648 I SÉRIE - NÚMERO 62

crever, porquanto nós temos ainda outro orador e queríamos saber se o Governo pretende ou não falar e, em caso afirmativo, quando o fará.
É que foram levantadas aqui várias questões e certamente que o Governo não estará à espera que os partidos esgotem todo o seu tempo para depois poder falar sem contradita.
Assim, creio que seria de boa tónica o Governo falar agora. Note-se que já falaram representantes de praticamente todas as bancadas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, trata-se de uma interpelação à Mesa, a qual não pode responder. A Mesa apenas tem conhecimento de que neste momento não há qualquer inscrição por parte do Governo, se bem que lhe tenha sido comunicada a intenção de o Governo intervir.
Como compreende, Sr. Deputado, não faz parte das atribuições da Mesa inscrever alguém compulsivamente.

Risos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Lara.

O Sr. Sousa Lara (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meu partido tem ideias perfeitamente claras no domínio das autonomias das universidades do Estado.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Palavra de honra?

O Orador: - Destacaria, pela sua oportunidade nesta discussão, as seguintes posições: desejamos um reitor eleito pela universidade e respeitado pelo Estado, como símbolo da autonomia da universidade, como representante máximo da sua complexa e rica estrutura e, a ser assim, como órgão de topo do seu governo.
Desejamos um senado universitário que congregue em salutar proporção os representantes dos professores e dos alunos e que, em articulação com o reitor já caracterizado, seja uma assembleia representativa da universidade a quem caiba definir as grandes linhas gerais orientadoras da sua vida, quer nos aspectos escolares propriamente ditos, quer nos domínios que se prendam com a sua vida económico-financeira, administrativa e social.
Desejamos uma relativa autonomia financeira que, para além da eventual consignação das receitas de cada uma das universidades do Estado ao cumprimento dos fins que a justificam, acolha o financiamento estatal em função dos serviços objectivos que prestam à comunidade.
Desejamos a consagração de uma autonomia científica que se traduza na livre elaboração dos planos de acção científica e de investigação, subordinando-os às grandes linhas gerais de política de educação e de investigação científica que enformem os programas dos governos democraticamente sancionados.
Desejamos a defesa de uma ampla autonomia pedagógica, concretizada na consagração de autêntica, ampla e franca liberdade na escolha de programas, métodos de ensino e de avaliação de conhecimentos, garantindo aos docentes o direito de, dentro de um quadro mínimo legalmente definido, gozar de liberdade de exposição e de opinião escrita ou verbal.
Desejamos o maior respeito pelas associações académicas livremente constituídas, democraticamente representativas dos estudos que a cada escola pertençam.
Os projectos de lei apresentados contemplam, diríamos que de forma complementar, soluções que satisfazem os nossos anseios sobre este domínio.
Assim, e não obstante as posições que venham a ser assumidas na votação na generalidade sobre as diversas soluções apresentadas, para regular a autonomia das universidades do Estado, estamos certos que muitas das suas válidas pistas transitarão, com o bom senso que a apreciação de um assunto desta importância e solenidade merece, para sede de especialidade, onde enriquecerão e corrigirão seguramente as fórmulas neste momento preferencialmente seleccionadas,

O PPM saberá, com certeza, ser fiel à filosofia que sempre o norteou.

Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Luís Patrão e Jorge Lemos.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Luís Patrão.

O Sr. Luis Patrão (PS): - Queria meramente fazer-lhe uma pergunta muito breve Sr. Deputado Sousa Lara.
Este processo tem sido marcado por confusões sucessivas e, para evitar ainda mais confusões, queria apenas perguntar-lhe o que o Sr. Deputado queria significar quando, no seu discurso, se referiu a «salutar proporção de professores e alunos nos órgãos de gestão». Ë que o termo «salutar» deixou-nos um pouco confusos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP):- Sr. Deputado Sousa Lara, uma curtíssima pergunta: posso depreender do seu discurso que vai votar contra a proposta de lei apresentada pelo Governo?

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - É um mistério.

O Sr. Presidente:- Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Lara.

O Sr. Sousa Lara (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação à pergunta do Sr. Deputado Luís Patrão, «salutar proporção» significa uma tendência para uma equivalência, ou seja uma aproximação, tanto quanto possível, da paridade. Se esta não for possível, nós lutaremos para que essa proporção se aproxime dessa paridade.

O Sr. Luís Patrão (PSN):- Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor.

Página 2649

10 DE MARÇO DE 1982 2649

O Sr. Luís Patrão (PS): - Só gostava de saber o que entende por «não ser possível a paridade». É questão que está nas nossas mãos, já que a Assembleia é soberana nesta matéria!

O Orador: - A universidade também é soberana, ou pelo menos esperemos que seja, Sr. Deputado. Já conhece, pois, a minha posição que traduz o nosso princípio.
Quanto a votar contra, o Sr. Deputado Jorge Lemos pode depreender o que quiser. Contudo, nós vamos votar a favor do projecto do Governo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura,

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: O MDP/CDE apresentou aqui, nesta Assembleia, o seu projecto de lei de autonomia da universidade em 7 de Janeiro.
No espaço de mês e meio, decorrido entre a apresentação e esta sessão de agora, tivemos possibilidade de fazer uma larga distribuição do nosso projecto e de recolhermos pareceres. Nas Jornadas Democráticas de Educação, Cultura e Comunicação Social, realizadas em 13 e 14 de Fevereiro, uma sessão foi especial mente destinada ao estudo da autonomia universitária. Professores das mais significativas escolas que compõem as universidades de Lisboa e outros das universidades regionais debruçaram-se sobre este tema e com eles reflectimos.
A imprensa diária trouxe variados testemunhos: a juventude universitária manifestou-se ou através das suas associações, ou através das suas organizações partidárias.
O MDP/CDE tem hoje uma muito maior certeza sobre u valor do seu projecto de lei e a certeza também de que só um grande, «um cego sectarismo político pode impedir que se baixe à Comissão de Educação e dê aí o seu valioso contributo para a elaboração de uma lei equilibrada que garanta um quadro, onde a autonomia da universidade seja possível.
A autonomia da universidade que nós preconizamos í aquela que visa, não a mera estrutura formal da independência, mas aquela que toma a forma de uma atitude de espirito.
Essa atitude de espírito, de que o PSD já disse gostar -o PSD aqui em funções, pois muitos dos professores do PSD apoiam o nosso projecto -, é a essência mesmo da autonomia pedagógica e científica e determinante da sua autonomia administrativa e das suas relações com o Governo.
A autonomia da universidade objectiva-se numa auto-responsabilização e tende a gerar uma dinâmica de criatividade.
A universidade assenta na prática de uma educação fundada na «rejeição de hábitos das certezas ilusórias». É a liberdade de ensinar; é a capacidade de aprender em liberdade.
Esta função pedagógica da universidade exige um grande grau de segurança interior; e essa segurança de cada um dos seus membros só poderá ser assegurada institucionalmente através da representatividade e da responsabilização.
São estes os pressupostos do nosso projecto de lei.
Nós sabemos que a forma de eleger o reitor não é em si certeza da autonomia, mas é ponto importante e o único em que nos encontramos praticamente desacompanhados dos outros projectos de lei. Por isso nos explicamos.
Para o MDP/CDE, o reitor é eleito entre os professores pela assembleia da universidade, por maioria simples, e o nome mais votado entregue ao Ministro para nomeação. A recusa do Ministro da Educação só poderá ser fundada em pressupostos legais e obriga a retomar de novo o processo.
Embora a ASDI dificulte a escolha do Ministro entre os 3 nomes eleitos, a verdade e que também ela sujeita à escolha do Ministro a eleição feita pela assembleia da universidade. O que nos parece a nós pouco lógico na economia do seu projecto de lei.
Vejamos o testemunho insuspeito, citado pelo deputado Narana Coissoró, do Prof. Ferrer Correia sobre este assunto:

Dois sistemas, portanto: o da eleição directa e o da lista tríplice. Aquele, mais próximo da prática hoje seguida nos países da Europa Ocidental; este, coincidente com a solução que foi adoptada entre nós durante a I República.
Foi por este último que se pronunciou, maioritariamente, o conselho de reitores (a minoria votou pela primeira das soluções acima referidas), enquanto os órgãos consultivos desta Reitoria se manifestaram claramente pelo sistema da eleição.
Quer dizer, o Prof. Ferrer Correia distingue a Academia de Coimbra e diz que aquilo que os conselhos de reitores escolheram não é o que se encontra como prática na Europa Ocidental. Eu espero Sr, Ministro, que isto não impeça a nossa entrada na CEE, e que seria um grande desgosto para si.

Risos.

Será que ficamos assim eternamente vinculados ao parecer do conselho dos reitores, que preferiu tradicionalmente o estatuto da l República?
Ora este estatuto, elaborado alguns meses depois da proclamação da República, em 19 de Abril de 1911, embora abra generosamente as portas da universidade, cerradas pelo espírito pombalino, traduz necessariamente as precauções de um governo emanado de uma revolução que a si própria se acautela, guardando o direito de escolha do reitor para camuflar os efeitos da eleição.
Passados quase 8 anos da Revolução de Abril, em 1982, na Europa, vamos nós entregar ao Governo essa medida preventiva?
Então a tal libertação da sociedade civil há pouco referida pela deputada Teresa Santa Clara Gomes?
Uma medida tomada por um governo por precaução e medo, em 1911, torna-se agora um preito de vassalagem da própria universidade ao Sr. Ministro da Educação.
O MDP/CDE não entende a lógica de tal atitude. E não a aceita de forma alguma.
De resto, e entramos no segundo problema, a figura do reitor que o MDP/CDE preconiza não pode ser designado por votação de derrota, como eventualmente acontecerá se o Ministro optar pelo terceiro nome da lista, o menos votado.

Página 2650

2650 I SÉRIE - NÚMERO 62

E a verdade é que o Sr. Ministro Vítor Crespo, neste momento no Governo - esperamos que não seja por muito tempo -, tem critérios subjectivos para a escolha das pessoas que entram em concursos, como acontece com os coordenadores de alfabetização de Faro e da Guarda. Já mostrou que não é objectivo.

Aplausos do MDP/CDE, do PCP e da UDP.

O reitor no nosso projecto-lei é uma figura altamente responsável perante a assembleia da universidade que o elegeu, que tem poderes para o demitir e a quem o reitor terá de prestar contas anualmente.
Não se trata de privilegiar o papel do reitor; trata-se de dar dignidade e eficácia a uma função de grande responsabilidade e de profunda representatividade democrática.
Sr. Presidente, estou a abreviar e a cortar a intervenção por falta de tempo.

O Sr. Presidente: - Faz favor de continuar, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Quem define e orienta a política da universidade é o senado universitário, órgão também de grande representatividade e altamente prestigiado na universidade. O projecto do MDP/CDE confere a este orgão grande importância e nele se sentam, por isso mesmo, as individualidades locais que devem trazer à universidade o concurso da dinâmica da região e devem levar à região a capacidade produtiva da universidade.
Esta dimensão, indispensável a uma verdadeira autonomia, sem alterar a política de cultura e de valores da universidade, confere-lhe uma dinamização alargada e projectiva, própria dos seres vivos.
É largo o consenso entre aqueles que servem o ensino e acreditam na educação. Nós sentimos esse consenso e dele estamos rodeados.
O projecto-lei do MDP/CDE, Sr. Ministro, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é um contributo positivo, para uma verdadeira autonomia da universidade - o próprio Sr. Deputado Narana Coissoró, que em todo este processo tem usado de uma enorme lealdade, já o confirmou; por isso tal projecto de lei é verdadeiramente incompatível com a proposta de lei do Governo.

Aplausos do MDP/CDE, do PS, do PCP, da UEDS e da UDP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Marília Raimundo.

A Sr.ª Marília Raimundo (PSD):- Sr Presidente, pelo facto de a Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo, minha colega de bancada, não poder estar presente, embora tenha sido ela quem preparou esta intervenção, serei eu a fazê-la.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: As universidades portuguesas desempenham um importante papel como centros de transmissão de saber e de preparação de profissionais. É, porém, no campo da investigação fundamental e aplicada que a universidade se afirma e se assume como sede do conhecimento de nível verdadeiramente superior. Daí, a sua vocação cultural, que vem projectando-se para um intercâmbio nacional e internacional; daí, também, a sua vocação para a criação, apoio e estímulo às inovações científicas e tecnológicas, que condicionara o progresso da sociedade em que as universidades estão inseridas.
Não é, pois, despiciendo discutirmos na Assembleia da República a questão da autonomia das universidades, dando forma jurídica a essa velha aspiração, adormecida em séculos de centralismo napoleónico e burocrático.
O caminho para uma verdadeira autonomia já começou, de resto, a ser rasgado com determinação pelos governos da AD, através de várias medidas, ainda que de forma prudentemente progressiva. Assim, o Decreto-Lei n.º 132/80, de 17 de Maio, começou por definir os princípios gerais delimitadores da estrutura dos serviços sociais do ensino superior, come pessoas colectivas do direito público dotadas de autonomia administrativa e financeira e funcionando junto de cada universidade; o Decreto-Lei n.º 200-1/80, de 24 de Junho, atribuiu competência aos reitores para autorizar, prorrogar, renovar e rescindir, nos lermos legais, os contratos de várias categorias de assistentes e monitores; o Decreto-Lei n.º 320/81, de 27 de Novembro, Alargou a competência aos reitores, permitindo-lhes conceder equiparação a bolseiro no País e fora do País, e. a sua prorrogação, aos docentes, investigadores e técnicos superiores das respectivas instituições por períodos até 3 meses; e, por último, o Decreto-Lei n.º 173/80 atribui competência aos estabelecimentos de ensino superior para organizar os cursos neles ministrados, segundo o sistema de unidade de crédito.
A proposta de lei n.º 58/II, que o Governo apresentou à Assembleia, em 12 de Outubro de 1981, e que agora está em apreciação constitui o coroamento deste processo de autonomia.
Em geral, o que importa reter na proposta de lei do Governo é que se assume a vontade política de atribuir à universidade o poder jurídico de decidir e de ela própria se regular,
O Estado limita-se a enunciar os princípios gerais definidores dessa mesma autonomia pedagógica, científica, administrativa, financeira e patrimonial, cabendo a cada uma das universidades, através do órgão competente, a elaboração do respectivo estatuto, segundo moldes e caracteres próprios, como livro expressão de individualidade.
É que autonomia é, antes de mais, a forma como se assume a universidade face ao Estado.
Universidades clássicas e seculares, a par de universidades novas ou recém-criadas, terão, pois, a enquadrá-las uma lei geral ou lei quadro, devendo guardar cada uma delas a sua feição específica, feição essa que não poderá deixar de reflectir os moldes da organização democrática da sociedade e do pais em que essas mesmas universidades estão implantadas. Por isso, todas elas reclamam processos democráticos de designação dos seus órgãos de governo, através do processo de eleição; todas elas reclamam a participação dos seus corpos integrantes - docentes, discentes e funcionários - na própria gestão.
Discutir a autonomia em Portugal, neste momento histórico, é, todavia e sobretudo, dirigir o modo de designação do reitor e a composição do colégio eleitoral.

Página 2651

10 DE MARÇO DE 1982 2651

Apraz-me registar que todos os projectos em discussão, bem como a proposta do Governo, optaram pelo sistema de eleição directa do reitor ou por lista tríplice, também obtida por eleição em colégio eleitoral.
Este é, pois, um ponto adquirido nesta fase do processo de autonomia.
Diga-se, no entanto, em abono da verdade, que nos últimos tempos (sobretudo após as vitórias eleitorais cia maioria da Aliança Democrática) se polemizou a questão em termos tais, por parte de alguns sectores da opinião pública e académicos, que se pode dizer que assumiu uma forma de contestação ao Governo ou, mais precisamente, ao Ministro da Educação.
Todavia, a despeito das suas lacunas ou de carácter excessivamente regulamentar de certo articulado da proposta de lei do Governo, o certo £ que foi o Ministro da Educação de um governo da AD, ou seja, do VIII Governo Constitucional que teve o mérito de apresentar para discussão na AR um vasto conjunto de normas limitativas da sua própria competência.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Este é um aspecto político da maior relevância, porquanto alguns dos que agora apregoam autonomia revelaram um grande apego às soluções autoritárias, aquando da sua passagem pelo Governo.

Aplausos do PSD.

Esta incongruência ressalta, com uma crua evidência, se nos propusemos fazer «ma curta visão retrospectiva acerca do exercício desse poder discricionário de nomeação dos reitores.
Antes dos governos da AD, quer nos governos provisórios, quer nos governos constitucionais, os reitores foram de livre escolha e nomeação dos ministros. Pois bem, os governos da AD não só mantiveram nos seus cargos os reitores nomeados pelos ministros dos governos anteriores, como, inclusive, não usaram do seu poder de livre nomeação para os cargos que entretanto vagaram.
Isto é, o Decreto-Lei n.º 781-A/76, de 28 de Outubro, determina, no seu artigo 60.º, que. enquanto não entrar em vigor novo diploma legal sobre organização e funcionamento das universidades, o processo de designação dos reitores se continuará a reger pelo Decreto-Lei n.º 266/I, de 19 de Maio de 1936, ou seja, será de livre escolha do ministro.
Quer dizer, foi ao abrigo do decreto de 1976, por remissão para o decreto-lei de 1936 -note-se bem! - que os ministros, que não da AD, escolheram e nomearam os leitores!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora:- O Ministro da Educação e das Universidades resolveu não aguardar a alteração do decreto-lei, usando os poderes discricionários que actualmente lhe são concedidos, fazendo intervir no processo de nomeação dos reitores as próprias universidades, nos moldes que estas consideram mais aconselháveis.
Assim, surgiu o Despacho n.º 279/81, em que se determina que a nomeação dos reitores será feita pelo Ministro da Educação e das Universidades do entre 3 nomes, a indicar pela respectiva universidade, através de um processo de eleição.
Deste modo se processou a designação do reitor da Universidade do Minho e da Universidade do Porto, sendo de salientar que, num caso e no outro, foi nomeado o candidato mais votado.
A proposta de lei do Governo mantém este sistema de designação do reitor na base de uma lista tríplice, essencialmente por ter verificado, após consultas, ser o sistema (preferido pelas próprias universidades, nomeadamente o conselho dos reitores.
Apresentamos, agora, várias propostas que, estou certa, não deixarão de merecer a concordância do Governo, tendo em conta a posição definida pelo Ministro da Educação e das Universidades na intervenção que aqui proferiu aquando da apresentação da sua proposta de lei no início do debate na generalidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, Sr. Ministro: Entendemos que a lei de autonomia das universidades há-de, acima de tudo, ser a expressão de um largo consenso nacional, que, no âmbito da Assembleia da República, se obterá pela aproximação dos textos aqui apresentados que entre si recolhem soluções não contraditórias, isto é, a proposta de lei do Governo e os projectos de lei do CDS e da ASDI.
Supomos que, deste modo, interpretaremos essa velha aspiração das universidades, na linha de uma verdadeira autonomia pedagógica e científica, no carácter democrático de designação dos titulares dos órgãos de governo das universidades, com a participação de professores, alunos e funcionários.
Assim, dignificaremos todos aqueles que. com diferentes graus de responsabilidades e em diferentes tarefas, corporizam a universidade, em ordem à formação humana dos estudantes. Assim, se dará curso à regionalização do ensino universitário, que, enquadrado numa política nacional, corresponderá às necessidades das comunidades. Assim se assegurará a liberdade de investigação. Assim, se prestigiará Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Educação e das Universidades.

O Sr. Ministro da Educação e das Universidades (Vítor Crespo): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se me permitem, desejaria fazer uma breve intervenção, mas antes disso quero dar uma explicação à Câmara das razões por que não estive aqui desde o início do debate.
Tinha já, há longo tempo, organizado uma reunião de trabalho na Universidade de Lisboa com os reitores, vice-reitores, presidentes dos conselhos científicos e directivos e essa reunião realizou-se hoje, mas prolongou-se um pouco mais, e isso me impediu de estar aqui presente no princípio do debate. Mas quero prestar as minhas homenagens à Câmara e não queria que se entendesse que esse meu atraso não significava um grande apreço pela Câmara.

Vozes do PS: - Muito bem!

Página 2652

2652 I SÉRIE - NÚMERO 62

O Orador:- Quero referir agora um ponto que aqui já foi focado e que é o da posição da lista tríplice. Aliás, não tenho por ela um apego extraordinário, já tive ocasião de o dizer; o único desejo que tenho é que saia da Assembleia da República uma lei da autonomia que seja a mais desejável e consentânea com os interesses das universidades. Ela foi-me proposta, como aqui já foi dito, pelo conselho de reitores e corresponde à posição maioritária das universidades. Não é um regressar ao estatuto da República, mas é uma aspiração das universidades.
Também queria dizer que não é exacto que os reitores das universidades da Europa sejam eleitos pelas próprias universidades. Há situações dessa natureza, mas também há situações de natureza muito diferente, e permito-me recordar o que se passa num pais como a Franca, mesmo sob a direcção de um governo afecto ao Partido Socialista.
Quero fazer ainda só mais uma referência. Tenho seguido, muito de perto, todos os debates sobre a lei da autonomia. Tem sido polemizado o problema do reitor, do senado, das percentagens e de certas lacunas.
Quanto a estas lacunas, já referi que nenhum dos diplomas sobre autonomia, que aqui estão em debate, trata de autonomia total, porque há variadíssimos aspectos que têm que ser encontrados na autonomia das universidades e que não são cobertos em qualquer desses diplomas. Há um ponto que gostava de referir, porque, curiosamente, nunca vi mencionado: é que a proposta de lei do Governo tem uma disposição que corresponde, efectivamente, a um afastamento muito significativo do que se passa hoje nas universidades, é que a proposta de lei do Governo prevê autonomia administrativa e financeira para as universidades e é a única a fazê-lo.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Luís Patrão e Jorge Lemos.

O Sr. Luis Patrão (PS): - Sr. Ministro, muito obrigado pelas palavras que nos acabou de dirigir. Elas não correspondem, como compreenderá, à grande parte das interrogações que tivemos ocasião de colocar, nas diversas intervenções que fizemos, e penso que, de uma forma sumária, delas lhe terá sido dada conta.
Esta questão da autonomia universitária tem-nos preocupado - particularmente em relação à actuação do Ministério que V. Ex.ª dirige -, seja ela a intenção do Ministério em relação à gestão democrática das escolas, aos sistemas em vigor para dirigir democraticamente as escolas, ao sistema em vigor para adaptar as liberdades do 25 de Abril às escolas.
No ensino superior, o Sr. Ministro tem lido ocasião de emitir diversa legislação sobre esta matéria, e eu faria referência directa, para lhe pedir também uma resposta directa, à Portaria n.º 1137/81, da Universidade Nova, a qual o Sr. Ministro diz emitir respeitando os princípios da proposta de autonomia que submeteu a esta Assembleia da República Devo dizer-lhe, com muita franqueza, que é a primeira vez que vejo aplicada, anteriormente à aprovação, uma proposta de lei submetida à apreciação da Assembleia da República. Seja como for, queria fazer-lhe uma pergunta, uma vez que circula também outro documento do Ministério pelas escolas do ensino secundário propondo a alteração radical do sistema de gestão democrática nas escolas. Qual é a sua opinião sobre esta candente matéria? Planeia o Ministério da Educação manter em vigor um sistema de gestão democrática das escolas? O actual, ou pretende modificá-lo? Se pretende modificá-lo, em que medida e qual o papel dos estudantes em relação a esta matéria?
Quais as razões que levaram o Sr. Ministro a submeter os estatutos das associações de estudantes das universidades á aprovação de um órgão universitário que eles nem minimamente controlam e qual a razão que o levou a fixar em 60 % a percentagem de doutorados na assembleia de universidades, isto já para não falar naqueles outros órgãos de que os estudantes e outros membros do corpo universitário deveriam fazer parte, com a dignidade que lhes é reconhecida unanimemente por todos os que por lá andam e por aqueles que cá de fora, como nós, assistem ao que se lá passa.
Quero perguntar-lhe ainda, Sr. Ministro, o que pensa das seguintes afirmações: «Vemos, contudo, com preocupação as, tentativas que estão a ser feitas no sentido da criação de órgãos e estruturas universitárias em que os estudantes não têm o mínimo controle. Tais factos apontam perigosamente para uma mentalidade centralizadora, da qual discordamos.»

Estas são palavras da JSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Ministro, sei que o seu tempo e curto, como o nosso, mas esperava que nos dissesse mais alguma coisa. Fizemos intervenções, levantámos problemas, e o Sr. Ministro limitou-se a falar-nos na lista tríplice e no que se passa em França. Temos de confessar que, como intervenção do Ministro no debate da autonomia, é curto.
Volto a lembrar-lhe as questões postas, pois pode ser que agora responda.
Como se justifica o que consta do artigo 9.º da proposta de lei, de que depende totalmente de V. Ex.ª a manutenção, ou não, em vigor da autonomia para as universidades? Dado que e V. Ex.ª que decide, quando é que não existem as condições mínimas necessárias ao normal funcionamento e gestão democrática?
Há algum critério que defina quais são estas condições mínimas necessárias para além do seu arbítrio, Sr. Ministro?
Uma outra questão, relativamente à composição dos órgãos universitários. Foi apresentada uma proposta pela JSD, ou melhor, pelo Grupo Parlamentar do PSD, e gostava de saber se conta com o apoio do Sr. Ministro, já que a filosofia inerente a uma e a outra é totalmente diversa. E ou estamos perante partidos diferentes, ou então algo vai mal dentro do PSD.
Ainda uma outra quentão. Tive oportunidade de demonstrar, na minha intervenção, que se não pode comparar, em termos de representantes dos doutorados nos órgãos das universidades, o que se passa em Portugal com o que se passa nas outras universidades

Página 2653

10 DE MARÇO DE 1982 2653

estrangeiras. O Sr. Ministro certamente saberá, melhor do que eu, que a percentagem de doutorados em Portugal e muito inferior à de qualquer universidade no estrangeiro. Assim sendo, creio que o exemplo que deu, na sua intervenção, não foi feliz, não colheu.
Volto a colocar-lhe ainda a questão da lista tríplice. O Sr. Ministro considera ou não -independentemente de ter sido uma solução defendida na I República, muitas outras foram - que e uma maneira de lhe assegurar, e volto a repetir o que foi duo pela minha colega Helena Cidade Moura, que terá sempre na universidade um homem que certamente não lhe dirá «não».
E lembro-lhe, como ela já lhe lembrou -não sei se o Sr Ministro ouviu -, o que se passou com o coordenador de alfabetização na Guarda e em Faro.
E mais, Sr. Ministro, aproveitava o facto de o problema já aqui ter sido referido pelo Sr. Deputado Luis Patrão, do PS, para lhe pôr a seguinte questão: o Sr. Ministro fez publicar em 31 de Dezembro a Portaria n. º 1137. Esta portaria define um conselho da faculdade, que elege um director. Há estudantes, funcionários -,não vamos discutir em que proporções-, mas limita-se, tão-só, a eleger esse director Não tem mais qualquer função.
Mas, curiosamente, vamos verificar depois que o órgão que gere a Universidade Nova C um conselho directivo, que e constituído pelo director, que preside, pelo subdirector, pelo presidente do conselho pedagógico, pelo vogal, eleito pelo conselho cientifico, de entre os seus membros, e pelo secretario da faculdade Nem um só representante dos estudantes, nem um só representante dos corpos administrativos ou auxiliares da Universidade Nova.
É isto, Sr. Ministro, que pretende, através de despacho regulamentar ou portaria posterior, vir a fazer da autonomia das Universidades.
É o que consta do Diário da República, n.º 300, de 31 de Dezembro de 1981.
Sr. Ministro, era a estas questões concretas que gostaríamos de ter resposta.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura está inscrita, mas não dispõe de tempo. Não sei se algum dos outros partidos lhe quererá ceder algum.
O PCP está a dizer que pode ceder 2 minutos.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): -Muito obrigada. Em todo o caso, e se não me fosse contado o tempo, gostaria de dizer á Mesa que foi minha convicção, na conferência dos líderes parlamentares, que estes tempos eram limites que os partidos impunham a si próprios, e não tempos fixados. No entanto, parece-me que não vale a pena perder tempo com isso. Os 2 minutos chegam-me e agradeço ao Partido Comunista o ter-mos cedido.

O Sr. Presidente: - Só me permitia observar a Sr.ª Deputada que, para mim, os limites acenes pelos próprios partidos correspondem, de uma maneira muito mais consentânea, a aceitação dos mesmos do que se, eventualmente, tivessem sido fixados por outra entidade qualquer.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - É evidente. Os limites são sempre fixados por nós próprios. Simplesmente, o que quero dizer é que foram limites que nos comprometemos a colocar, na medida do possível, e não tempo fixo, como é distribuído nas outras vezes.
De qualquer maneira, penso que não vale a pena perder tempo com isso e se o Sr Presidente me desse licença eu avançava.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Queria dizer ao Sr Ministro da Educação e das Universidades que a minha referência à Europa foi simplesmente para lhe ser agradável, porque paia mim isso não é significativo E depois, também, sendo agradável, citei o Prof. Ferrer Correia A informação não e minha, e dele. E é evidente que quando o Prof. Ferrer Correia diz isto dos reitores eleitos não refere aqueles que não são eleitos.
É evidente que noutros países em que os reitores são nomeados, não vale a pena falar em eleições.
Quanto à França, desejaria que estivéssemos a esse nível, mesmo em democracia - neste momento não estamos, mas já estivemos mais adiantados.
Gostava ainda de saber - se o Sr. Ministro quisesse ter a amabilidade de responder de forma que eu fosse capaz de entender, porque já fiz vários esforços e não consegui -, exactamente, o que é que o Sr Ministro entende por exonerar o reitor, ouvida a assembleia. Se a assembleia disser «não, senhor, o Sr. Ministro não exonera o reitor», gostaria de saber se o Sr. Ministro acata essa indicação. Não são assim as suas relações com os órgãos contestatários do seu partido. Pode ser que sejam com a Assembleia.
Gostaria também que o Sr Ministro explicasse o que quer dizer com retirar autonomia. O Sr. Deputado Jorge Lemos já fez esta pergunta, mas eu gostava de a formular desta maneira, porque não percebo o que é retirar a autonomia à universidade, Gostava que me explicasse.
De qualquer maneira, subscrevo as perguntas do Partido Socialista e do Partido Comunista e estava igualmente interessada em ouvir as respostas.

O Sr. Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira e Sousa. Dispõe de 2 minutos.

O Sr. Oliveira e Sousa (CDS): - Apenas uma brevíssima rectificação às palavras do Sr. Ministro, que disse que apenas a proposta de lei do Governo previa a autonomia administrativa e financeira para as universidades.
Queria só chamar a atenção do Sr Ministro e da Câmara para o facto de o nosso projecto de lei -que, aliás, e vários meses anterior na sua apresentação - conter, no seu artigo 2. º, o seguinte. «As universidades são pessoas colectivas de direito publico. E gozam de autonomia pedagógica e cientifica, administrativa e financeira.» Mais adiante tem alguns artigos onde são explanadas essas autonomias administrativa e financeira. Talvez não sejam, efectivamente, tão regulamentares como a proposta de lei, mas consagram o direito.

Página 2654

2654 I SÉRIE - NÚMERO 62

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Educação e das Universidades.

O Sr. Ministro da Educação e das Universidades (Vítor Crespo):- Se me permitissem, respondia desde já ao Sr. Deputado Oliveira e Sousa. Efectivamente, tem razão. Simplesmente, a proposta de lei do CDS faz uma declaração de princípio e a proposta de lei do Governo vai um pouco mais longe. Mas fui impreciso na minha afirmação.
Quanto ao problema da gestão democrática das escolas, não fiz nada para alterar o sistema que hoje existe, que foi proposto pelo então ministro Sottomayor Cardia. Já tive ocasião de dizer em várias situações que é particularmente ao nível da escola que reconheço como altamente importantes, benéficas e necessárias as participações de estudantes, designadamente nos conselhos pedagógicos e directivos.
O que se prevê na proposta de lei apresentada pelo Governo é uma superstrutura administrativa para a universidade, que é um pouco diferente da gestão das escolas.
Isto poderia levantar o problema que aqui foi focado, pelo menos pelos Srs. Deputados Luís Patrão e Jorge Lemos, da Universidade Nova de Lisboa e da Portaria n.º 1137/81.
Poderei dizer que há uma outra portaria, que ainda não tem número, que se refere à Universidade de Aveiro, que também, porventura, fará correr alguma tinta.
Mas vejamos o que se passa. Há universidades que, para simplificar, lhes chamarei universidades antigas, às quais se aplica o decreto da gestão das faculdades do ministro Cardia e - há universidades -que, em designação abreviada, chamarei de universidades novas - que viveram em regime de instalação até 31 de Dezembro passado.
Essas universidades, porque viveram em regime de instalação, tinham uma estrutura 100 % determinada pelo Ministro da Educação, que podia escolher todos os órgãos da faculdade. Eram comissões de instalação. As escolas novas solicitaram ao Ministro - e assim está dito no decreto-lei, que, por acaso, sai uns dias mais tarde, em data, que não tenho presente, de Janeiro -...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Uns meses!

O Orador: - ...que houvesse um período de transição entre a situação de regime de instalação e o regime normal que se prevê para todas as universidades novas. Esse regime de transição è de um ano, dividido em 2 períodos de 6 meses, e para o primeiro período terão de se fazer um certo número de coisas e para o outro período terão de se fazer outras coisas.
Dessa maneira, e transitoriamente, estabeleci um estatuto para a Universidade Nova, integralmente proposto por essa mesma Universidade, assim como estabeleci um estatuto para a Universidade de Aveiro, também integralmente proposto por ela própria, como também irei estabelecer um estatuto para a Universidade de Évora e para a Universidade do Minho quando elas mo propuserem.
É uma situação intermediária e híbrida que não é ainda a situação das universidades antigas. As universidades entenderam que não podia ser e deixei que elas fizessem o melhor juízo para essa situação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em todo o caso, e apesar disso, já nessa forma de transição há - e isso não pode deixar de se reconhecer- uma atitude muito mais participativa do que aquela que a lei ainda hoje me concede para a designação de reitores das universidades antigas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao problema da gestão nas escolas de ensino secundário, o que o Ministro fez foi um conjunto de perguntas -que podem ser provocatórias, no bom sentido da palavra -, espera receber as respostas e, em face dessas respostas prepara um diploma para discutir sobre a gestão das escolas do ensino secundário.
Não se pode concluir das perguntas feitas que haja uma intenção, até porque, se nós queremos descortinar qual é o real sentido, devíamos fazer perguntas tão mais «agressivas» quanto possível para que as respostas sejam tão concludentes quanto possível. Nada está fixado sobre isso: há apenas um conjunto de perguntas que foi enviado aos sindicatos e às escolas, estão neste momento a ser recolhidos os dados, e depois então meditarei sobre as respostas que vierem.
Sobre o lema das associações de estudantes, já tive ocasião de me pronunciar aquando da abertura. Portanto, não vou estar aqui a repetir-me, pois basta ler os proceedings da Assembleia da República, e, embora não se considere como propaganda, tive também ocasião de me pronunciar sobre este mesmo assunto num órgão do meu partido, onde está claramente expressa a minha posição.
Houve uma lógica não para a aprovação dos estatutos para o senado, mas uma lógica de aceitação do corpo de associação de estudantes pelo senado, lógica essa em que estou e sempre estive de acordo, pois escrevi-o e disse-o sempre que falei com os estudantes de quaisquer matizes. Portanto, foi uma solução que me pareceu ser razoável, mas pela qual não me ligam nenhuns laços demasiadamente profundos.
Ora, o que eu não gostava era de ver adulterada a lógica que presidiu a essa solução. Tive ocasião de dizer aqui e em todos os locais que a lógica não era do estabelecimento dos estatutos ou imposição dos estatutos às associações de estudantes, mas, pelo contrário, a absorção pelo senado desses estatutos e, portanto, a integração das associações de estudantes no corpo universitário. No entanto, se outras soluções vierem, não me causam grandes perturbações.
É evidente que não utilizei todo o meu tempo na minha intervenção final. Julgo que, infelizmente, o problema da autonomia universitária tem sido bastante debatido. Não faço a desconsideração à Assembleia de não saber que ela já conhece as minhas posições e tem uma ideia clara não só sobre o projecto de lei do Governo, como dos projectos de lei dos partidos que estão na Assembleia.
Espero que a Assembleia, na sua Comissão de Educação, produza uma lei de autonomia, e desde já me

Página 2655

10 DE MARÇO DE 1982 2655

ponho à disposição dessa Comissão de Educação para melhorar e para clarificar u meu pensamento.
Como já tive ocasião de dizer, gostava que isso também fosse feito relativamente aos reitores e a outros sectores da universidade. É verdade que o Prof. Ferrer Correia tem uma opinião, mas também é verdade que outros reitores, com igualíssima legitimidade, tem outra opinião sobre a autonomia.
Portanto, não é legítimo que se fale apenas na posição do reitor Ferrer Correia - que eu respeito -, o qual foi nomeado discricionariamente pelo ministro Sottomayor Cardia, e bem, e que eu mantive na Universidade de Coimbra, apesar de - como não é do desconhecimento público - ter algumas, dificuldades com o reitor Ferrer Correia, o que demonstra que apesar de tudo em todo este processo tive uma extraordinária isenção na manutenção ou na substituição dos reitores das universidades Portanto, não e a única opinião, e gostaria que, para que a lei saísse o melhor possível, fossem ouvidas outras entidades.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Faz-se aqui uma certa consideraçâo sobre os poderes discricionários do Ministro Mas permito-me dizer, com todo o à vontade, que nem os meus sucessores, nem eu próprio, nem os que me antecederam serão suficientemente insensatos para criarem lutas inúteis.
É óbvio que um ministro da Educação não pode e não deve entrar em choque inútil com a universidade - não o fez e não o fará. Eu próprio tive o cuidado de dos reitores que nomeei ter escolhido primeiro da lista tríplice - a menos que houvessem razões muito profundas, procederia de maneira diferente.
Como já referi, a solução da lista tríplice foi-me recomendada maioritariamente por reitores das universidades, por muitos sectores das universidades, existe em vários países, é a proposta de lei da autonomia espanhola, existe no Brasil, onde, na realidade, houve uma vez um conflito. No entanto, não é uma solução tão estranho como possa parecer á primeira vista, como não seria, e a menos que o Ministro fosse extremamente insensato -e faço a justiça de que os passados e futuros não serão -, não iria suspender ao reitor a autonomia da universidade, a não ser em condições absolutamente extremas, tanto mais que a suspensão do reitor tem de ser precedida da audição da assembleia, e, alem do mais, logo a seguir há um processo eleitoral onde a universidade podia propor o mesmo nome, o que, naturalmente, embaraçava profundamente o Ministro, se o acto que ele praticou não fosse legítimo e sensato.
Efectivamente, há aqui uma válvula de escape, no sentido de amadurecimento da autonomia, que é recomendada pelas próprias instituições, e gostava que isso ficasse bastante claro.
Também gostava de lhe dizer que não é tão diferente a posição do Ministro da Educação e a da JSD quanto à composição, porque, no fundo, o que está em causa não é um princípio de rateamento da composição, mas sim uma percentagem Podem dizer que, num caso, se aproxima mais dos 50 % e que esta percentagem tem algum valor para além de um aspecto mítico, o que e verdade. Mas também aí não tenho uma posição fechada, apesar de ter dito - e continuo a dizer- que julgo que a posição do Ministério da Educação e do Governo é a mais conecta. E julgo que é a mais correcta porque estava a pensar numa universidade do futuro.
É verdade que hoje as universidades, pelo menos em certas faculdades, ainda têm uma percentagem enorme de assistentes. Não é que eu tenha menor consideraçâo pelos assistentes, mas toda a arquitectura legislativa do Ministério da Educação vem no sentido de que os assistentes se doutorem rapidamente, vem no sentido de que, dentro em pouco, as universidades sejam constituídas por professores auxiliares associados e professores catedráticos.
Posso dizer que há faculdades em que, felizmente, já nos aproximamos dessa situação.
Julgo que basicamente respondi e já não terei muito mais tempo para me referir ao problema da lista tríplice. No entanto, só quero afirmar que nomeei e laço tenção de nomear o primeiro votado, sem embargo de ter aceite o princípio da lista tríplice.
Julgo que a resposta à Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura estará mais ou menos implícita nas respostas anteriores

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria rectificar uma informação que aqui foi dada pelo Sr Ministro.
O Sr. Ministro referiu o caso da Universidade Nova de Lisboa a propósito da portaria, salientando que a posição encontrada tinha o apoio e que até ia no sentido das solicitações da escola. Gostava de ler aqui um documento aprovado pelo conselho directivo da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, na sua reunião de 3 de Março:

A constituição do conselho directivo imposto pela portaria citada não assegura a paridade dos diversos corpos da Faculdade e o pluralismo dos seus interesses. Os princípios orientadores que lhe estão subjacentes, para alem de não se enquadrarem numa política coerente e inovadora para a universidade portuguesa, ignoram os aspectos positivos da experiência dos últimos anos daquela instituição, poder-se-á, até, considerar a portaria ilegal na medida em que, tendo sido atribuídos efeitos retroactivos ao Decreto-Lei n.º 35/82, por força do seu artigo 7. º, a partir do dia 31 de Janeiro de 1982, estes não abrangem a portaria datada de Dezembro de 1981.
Como vê, Sr. Ministro, a Universidade Nova de Lisboa não concordou com a sua portaria nem com as medidas que tomou

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro, se quiser responder, tem meio minuto.

O Sr. Ministro da Educação e das Universidades: - Sr. Presidente, o PPM cede-me alguns minutos do seu tempo. Em todo o caso, eu serei breve.

Página 2656

2656 I SÉRIE - NÚMERO 62

A primeira questão é esta: a portaria, de facto, antecede o Decreto-Lei n.º 35/82, mas é perfeitamente legítima, visto ter sido produzida na situação de regime de instalação, u que originou uma muito maior liberdade.
Segundo: como o Sr. Deputado Jorge Lemos referiu - e bem - a data do documento da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas é posterior à portaria. Quem eu ouvi e com quem me relaciono é com o reitor da Universidade Nova de Lisboa e há documentos que provam que a proposta foi feita e elaborada pelo reitor da Universidade Nova de Lisboa.

O Sr. Luís Patrão (PS): - Só ouviu o reitor?

Vozes do PCP: - Só o reitor?

O Orador: - É o órgão com quem o Ministro da Educação se relaciona nas universidades, ele relacionou no passado e se deve relacionar no futuro, visto ser o primeiro membro da prevista hierarquia universitária.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Ministro, das duas uma: ou o reitor, de facto, não corresponde â vontade unanimemente manifestada pelo conselho directivo de uma faculdade ou o reitor não serve para a Universidade Nova de Lisboa.

Vozes do PSD:- Oh! ...

O Orador: - Gostava só de esclarecer que, para além da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, existem outras faculdades, designadamente a Faculdade de Economia, a Faculdade de Ciências e Tecnologia, a Faculdade de Medicina.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Tomaram idênticas posições!

O Orador: - O consenso que o reitor arranjou da Universidade Nova de Lisboa é por mim desconhecido, mas o reitor tem - sempre o teve - a minha confiança. O reitor fez-me uma proposta e eu aceitei-a como boa. De resto, o processo que se desenvolveu na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas é um processo extremamente curioso, que seria interessante analisar, mas, uma vez que eu sei que foi pedida a ratificação do decreto, talvez nessa altura haja oportunidade de discutir claramente essa situação.

Aplausos do PSD, do CDS e PPM.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais inscrições, vamos votar os diferentes projectos de lei e a proposta de lei, pela ordem da sua entrada na Mesa da Assembleia da República.

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr. Presidente, penso que existe aqui uma questão regimental e formal que é preciso ter em conta. Embora o CDS não tenha marcado a ordem de trabalhos, esta sessão foi a continuação desse dia e representa essa marcação.
Nesse sentido, entendo que o primeiro projecto a ser votado deve ser o projecto de lei apresentado pelo CDS, tendo em conta que quem marcou uma ordem de dia para discutir esta matéria foi o CDS, votando-se depois os outros projectos de lei segundo a sua ordem de entrada na Mesa.

O Sr. Presidente: - Penso que a observação feita pelo Sr. Deputado Carlos Robalo é pertinente. Eu não tinha tido em conta a marcação da ordem do dia, pelo que peço desculpa.
Penso que não haverá qualquer objecção e, portanto, vamos votar o projecto de lei n.º 185/II, apresentado pelo CDS.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS e do PPM, votos contra do PCP e da UDP e o abstenção do PS, do ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Vamos agora votar o projecto de lei n.º 177/II, apresentado pela ASDI.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE e a abstenção do PSD, do CDS, do PPM e da UDP.

O Sr. Presidente: - Vamos votar a proposta de lei n.º 58/II.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do CDS e da PPM, votos contra do PS, do PCP, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP e a abstenção da ASDI.

O Sr. Presidente: - Vamos, finalmente, votar o projecto de lei n.º 287/II, apresentado pelo MDP/CDE.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS e do PPM, votos a favor do PS, do PCP, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP e a abstenção da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda. V. Ex.ª dispõe de apenas um minuto.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos a favor do nosso projecto de lei sobre autonomia universitária e abstivemo-nos em relação aos outros 2 projectos, bem como em relação à proposta de lei.
Votámos a favor do nosso projecto de lei porque o consideramos o único texto que satisfaz plenamente os requisitos fundamentais de uma verdadeira autonomia, tal como os defini na minha intervenção de 26 de Fevereiro último.
Abstivemo-nos em relação aos projectos de lei apresentados pelo CDS e pelo MDP/CDE e em relação à proposta de lei do Governo porque nenhum desses

Página 2657

10 DE MARÇO DE 1982 2657

textos vai satisfatória e equilibradamente ao encontro daquelas exigências, mas também nenhum deles se afasta de maneira irreparável.
Abstivemo-nos mesmo perante a proposta de lei porque ela encerra disposições manifestamente inaceitáveis e abrange outras que nada têm que ver com a autonomia; sem embargo, as propostas de alteração hoje apresentadas por deputados do PSD e a esperança que temos em que mais profundas alterações venham a surgir, durante a apreciação na especialidade, levaram-nos a não votar contra.
Em domínio tão complexo como este, torna-se essencial avançar simultaneamente com realismo e prudência. Realismo para tomar em conta a pluralidade de interesses e factores em presença, a necessidade de rigor científico e cultural e as grandes carências de um país como Portugal, que não pode esbanjar recursos. Coerência com os nossos princípios de democracia descentralizada e participativa e com a nossa vontade política de procurar, sempre que possível, soluções consensuais.
Para nós, a autonomia universitária não se reduz a uma questão de poder na universidade. Ela releva, antes de mais, da comunidade universitária e da sua permanente inserção na comunidade nacional.
Os nossos votos foram votos pela democracia cultural e pela consolidação do regime democrático. Os nossos votos foram votos pela reconstrução da universidade e do País, em espírito, também aqui de liberdade efectiva e de responsabilização solidária.

O Sr. Presidente: - Vários grupos parlamentares já fizeram chegar à Mesa, ou anunciaram que vão entregar, declarações de voto por escrito...

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu grupo parlamentar já não tem tempo.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, eu preferia fazer oralmente a nossa declaração de voto e preciso de apenas um minuto.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Srs. Presidente, Srs. Deputados: Nós queremos apenas dizer que nos congratulamos por este processo ter chegado ao fim e pela forma como ele decorreu.
Penso que as posições foram clarificadas, o que em democracia é muito importante. As pessoas assumiram, de facto, aquilo que pensam e isso é também importante na convivência entre nós.
É evidente que lamentamos profundamente que a proposta de lei do Governo tenha sido aprovada e estamos convencidos de que ela irá dificultar, amesquinhar e empobrecer o trabalho na Comissão de Educação, Ciência e Investigação.
De qualquer maneira, o MDP/CDE trabalhará o melhor que puder, como é seu hábito, e sempre com espírito de tolerância e de diálogo, não regateando o seu máximo esforço.
Em todo o caso, estamos convencidos de que a autonomia da universidade é dependente do sistema educativo. O nosso sistema educativo é coerente com a autonomia da universidade que acaba de ser votada e, portanto, se e que alguma lei vai sair da Comissão de Educação, Ciência e Investigação, essa lei não vai servir a realidade do povo português. Para servir essa realidade do povo português ficará o projecto de lei do MDP/CDE, que nós continuaremos a melhorar na medida das nossas possibilidades.

O Sr. Presidente:- Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um requerimento solicitando a baixa à Comissão de Educação, Ciência e Investigação, da proposta de lei n.º 58/II e dos projectos de lei n.ºs 177/II e 185/II, suponho que para discussão e votação na especialidade - o que não está expresso, creio que por lapso'-, com o prazo de 30 dias.
Vamos votar o requerimento que acabo de anunciar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade registando-se a ausência da ASDI e da UDP.

O Sr. Presidente: - Cumpre-me ainda anunciar que deu entrada na Mesa um voto de pesar subscrito pelos Srs. Deputados Raúl Rêgo e outros, do PS, relativo ao falecimento do Sr. Engenheiro Sá Cardoso. Vai ser publicado e irá à Conferência dos Presidentes dos Grupos Parlamentares para ser agendado.
Deram também entrada na Mesa o projecto de lei n.º 315/11, subscrito pelo Sr. Deputado Luís Cacito, do PS, sobre a criação da freguesia dos Fernandes, concelho de Almodôvar -que foi admitido e baixa à 16.ª Comissão-, o projecto de lei n.º 316/II, também da autoria do Sr. Deputado Luís Cacito, do PS, sobre a criação da freguesia de Zambujeira do Mar, concelho de Odemira, -que foi igualmente admitido e baixa à 16.ª Comissão-, o projecto de lei n.º 317/II, subscrito pelo Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, que institui a obrigatoriedade de afixação de preços nas embalagens dos adubos, rações e outros produtos para a agricultura, que foi admitido e baixa à 9.ª Comissão.
A próxima sessão terá lugar amanhã, às 10 horas t a ordem do dia 6 a interpelação ao Governo, de iniciativa da UEDS, sobre a actuação do Ministério da Administração Interna, com particular incidência no que se refere à manutenção da ordem pública e segurança dos cidadãos.

Está encerrada a sessão.

Eram 22 horas.

Declaração de voto do PPM, publicada nos termos do artigo 124.º, n.º 3, do Regimento.

O Grupo Parlamentar do PPM pronunciou-se a favor do voto de saudação que a UDP propôs que a Assembleia dirigisse à escritora Maria Lamas, e fê-lo obedecendo ao que já tinha sido expresso por mim próprio sob forma de «pedido de esclarecimento» à Sr.ª Deputada Alda Nogueira.
Julga, efectivamente, o PPM que Maria Lamas, como escritora, como mulher, como cidadã, merece a homenagem dos representantes do povo português.
Quis o Sr. Deputado da UDP (de acordo, aliás, com o espírito da intervenção política do PCP) vincular esta homenagem à celebração do Dia Interna-

Página 2658

2658 I SÉRIE - NÚMERO 62

cional -ou mundial- da Mulher. No nosso entender, o essencial do voto a Maria Lamas não se prende a essa circunstância e a essa intenção. Mas também não consideramos dever alterar a nossa posição pelo facto de a UDP ter promovido aquela associação.
Assim, o PPM reitera a sua homenagem a Maria Lamas, ao mesmo tempo que vê nela um dos símbolos actuais da mulher portuguesa (não, evidentemente, o único). E entende que não há, no Dia Internacional da Mulher, qualquer carácter mítico ou sagrado que obrigue esta Câmara a escolher com religioso cuidado um nome de mulher para um voto de louvor nesta oportunidade.

Lisboa, 9 de Março de 1982. - O Deputado do PPM, Henrique Barrilaro Ruas.

Declaração de voto enviada para a Mesa pelo deputado Virgílio Rodrigues (PS).

Votámos contra a proposta de lei de autonomia universitária porque entendemos que se trata de uma forma grave cie ofender os valores da participação efectivamente democrática na vida da escola. Na verdade, na proposta de lei do Governo quase nada se muda ou, pelo contrário, abrem-se perspectivas para um retrocesso escandaloso, mantendo o Governo e o Ministério da Educação e das Universidades o essencial dos poderes, através do seu representante - o reitor. Falar de autonomia num caso destes não tem sentido. Tem sentido, pelo contrário, manter por delegação o poder centrai que hoje possui e se fortalecerá.
Entendemos que os valores que o 25 de Abril em si contém têm de ser aprofundados nas escolas, bem como tem de ser estimulada a gestão democrática da educação. A proposta de lei do Governo não responde a estas exigências.
Pensamos, por outro lado, que dos projectos de lei da ASDI e do MDP/CDE será possível extrair um texto final que consagre o respeito pelas regras democráticas, favoreça a participação de todos na gestão da escola e dê realmente expressão a uma verdadeira autonomia universitária. Daí a razão dos nossos votos. Abstivemo-nos no projecto de lei do CDS por ele ser, como dissemos, a proposta, ipsis verbis, dos reitores. Por isso deixámos que baixe à Comissão.

Declaração de voto enviada para a Mesa pelo deputado Adriano Rodrigues (CDS).

A universidade portuguesa, de longa história, mantém inalienável responsabilidade na vida cultural, científica, económica e técnica do País. No decorrer do processo histórico a que nos referimos, a universidade portuguesa foi interveniente nas crises e nos triunfos nacionais, nas glórias e decadências, nos entusiasmos e desunimos. E os desanimes agravaram-se sempre que a universidade foi instrumentalizada e abdicou do seu poder de decisão e intervenção.
Em nossos dias, a universidade reflecte uma multiplicidade de problemas e contradições resultantes da falta de renovação e adaptação à realidade nacional.
Estas contradições opõem ao controle do Estado à autonomia, o livre acesso ao numerus clausus e à universidade de elite, a neutralidade política ao compromisso ideológico, a escola fechada à escola aberta e participante no desenvolvimento regional e no progresso social.
Este aspecto fundamental da intervenção da Universidade no desafio da regionalização foi expresso na intervenção do meu colega de bancada deputado Carlos Oliveira e Sousa, razão por que não vamos retomar agora este problema.
Pela sua implicação em todos os sectores ligados à melhoria das condições da comunidade nacional, não pode recusar-se à universidade a autonomia, que a defende de pressões e a ajuda a reconstituir dos vícios graves que ao longo dos decénios a afectaram.
Por isso mesmo, autonomia universitária não é uma questão partidária, mas um problema nacional, que a todos afecta.
Neste momento, em que discutimos nesta Assembleia documentos importantes que irão determinar a dignidade institucional, evocamos aqui o grande parlamentar que foi Adelino Amaro da Costa, um lutador para quem a reforma da universidade seria impraticável sem a autonomia. São dele as palavras que passamos a transcrever, numa homenagem sentida, nesta hora em que é viabilizado o seu desejo:
Um dos graves defeitos que marcam as universidades de recorte napoleónico do nosso tempo é a rigidez da estrutura.
A capacidade de adaptar, todos os sabemos, é o elemento fundamental das instituições, pois a universidade ou vive e se adapta ao evoluir das condições ambientais ou fenece no torpor do seu anquilosamente. Não há outra via: parar é voltar para trás.
Para tanto as universidades precisam de ser elásticas, dinâmicas. Necessitam de estar capacitadas para a todo o momento introduzir as correcções que os negócios do ensino vão impondo: quer na gestão, quer na docência e nos planos de estudos, quer ainda na investigação e, em geral, nos vários capítulos da sua actividade. Como órgãos vivos, hão-de saber mostrar-se dotadas de flexibilidade: só assim poderão ser instrumento de progresso. Porque mudam as exigências da sociedade, porque se revelam as insuficiências da máquina do ensino, a universidade haverá de poder corrigir-se com elasticidade e rapidez. A ausência de autonomia é um impedimento a essa autocorrecção permanente. [Amaro da Costa, «Crise e autonomia da universidade», in Democracia e Liberdade, p. 41.J.
Este extracto de um texto de Amaro da Costa justifica cabalmente a razão de ser de posição do CDS perante esta votação.

Declaração de voto enviada para a Mesa pelo deputado Anselmo Aníbal (PCP).

Como já referimos, a proposta da lei n.º 58/II avança um arrazoado em que se procura apropriar de uma terminologia que, como já referimos, faz parte integrante da vida da universidade em Portugal, mas em que, de facto, o que vale explicita um desígnio de tutela ministerial directa e grosseira.

Página 2659

10 DE MARÇO DE 1982 2659

A autonomia, como foi frisado, é entendida pelo ainda Ministro cia Educação e das Universidades como concessão, e não como reconhecimento. Os artigos 8.º e 9.º explicitam a possibilidade de um intervencionismo tutelar do Governo, por quaisquer razões, não se esclarecendo, em qualquer caso, qual a entidade que irá julgar da existência das denominadas condições mínimas necessárias ao «normal funcionamento e à regular gestão universitária».
Sublinhámos a possibilidade de arbítrio da opção ministerial, com base na lista tríplice, restando sempre o poder de o Ministro escolher o candidato que lhe seja mais conveniente, entre aqueles apontados pela universidade.
Sublinhámos também, e reiteramo-lo, que a proposta de lei n.º 58/II é totalmente omissa de qualquer referência à participação de quaisquer representantes das actividades sociais com ela relacionadas. Há falta de democraticidade na definição dos estatutos profissionais, há uma referência permissiva ao aumento das propinas.
Referimo-nos, e reiteramo-lo, à imposição, arbitrária e anti-autonómica da necessidade de aprovação dos estatutos das associações de estudantes pelos doutorados das universidades, parecendo o Ministro, propositadamente, esquecer-se da existência, no nosso país, de liberdade da associação.
Votámos também contra o projecto de lei do CDS, que omite aspectos de melindre da gestão universitária, sublinhando-se, contudo, a contradição clara com a proposta de lei do Governo, numa operação de distanciamento que a ninguém deixou dúvidas.
Votámos favoravelmente os projectos de lei da ASDI e do MDP porque nos parecem ser bases para um trabalho que dignifique esta Assembleia e as universidades portuguesas, institucionalizando uma verdadeira autonomia, bandeira de luta dos estudantes portugueses durante os anos difíceis do fascismo e expressão a assumir na realidade quotidiana das estruturas do ensino universitário no nosso país.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

António José B. Cardoso e Cunha.
Arménio dos Santos.
João Manuel Coutinho Sá Fernandes.
José de Vargas Bulcão.
Maria Margarida do R. da C. S. M. Ribeiro.
Marília Dulce Coelho Pires D. Raimundo.
Mário Ferreira Bastos Raposo.

Partido Socialista (PS)

António Francisco B. Sousa Gomes.
António Gonçalves Janeiro.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Manuel António dos Santos.

Centro Democrático Social (CDS)

Álvaro Manuel M. Brandão Estêvão.
Carlos Alberto Rosa.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Narana Sinai Coissoró.
Victor Afonso Pinto da Cruz.

Partido Comunista Português (PCP)

Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Manuel Correia Lopes.
Zita Maria Seabra Roseiro.

União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS)

Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE)

Helena Cidade Moura.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

Amadeu Afonso Rodrigues dos Santos.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade Azevedo.
Américo Abreu Dias.
Henrique Alberto Nascimento Rodrigues.
João Vasco da Luz Botelho Paiva.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel da Costa Andrade.
Maria Adelaide S. de Almeida e Paiva.
Maria Helena do Rego Salema Roseta.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Mário Júlio Montalvão Machado.

Partido Socialista (PS)

Alfredo José Somera Simões Barroso.
António Duarte Arnaut.
António Cândido Miranda Macedo.
António Emílio Teixeira Lopes.
António Fernandes da Fonseca.
Bento Elísio de Azevedo.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Gomes Fernandes.
Júlio Filipe de Almeida Carrapato.
Mário Alberto Lopes Soares,
Rui Fernando Pereira Mateus.

Centro Democrático Social (CDS)

Adalberto Neiva de Oliveira.
Adriano José Alves Moreira.
Alberto Henriques Coimbra.
Eugénio Maria Anacoreta Correia.
Henrique José C. M. Pereira de Moraes.
João António de Morais Leitão.
João Gomes de Abreu de Lima.
João Lopes Porto.
José Augusto Gama.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.

Página 2660

2660 I SÉRIE - NÚMERO 62

José Miguel N. Anacoreta Correia.
Maria José Paulo Sampaio.
Mário Gaioso Henriques.
Rui Eduardo Rodrigues Pena.
Ruy Garcia de Oliveira.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Barreirinhas Cunhal.
António Dias Lourenço da Silva.
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Gomes dos Santos.
José Manuel da C. Carreira Marques.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Partido Popular Monárquico (PPM)

Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.

OS REDACTORES DE 1.ª CLASSE: Ana Maria Marques da Cruz - Carlos Pinto da Cruz.

PREÇO DESTE NÚMERO 108$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

Páginas Relacionadas

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×