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I Série-Número 122 Terça-feira, 20 do Julho de 1982 5081
Diário da Assembleia da República
II LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1981-1982)
SESSÃO SUPLEMENTAR
REUNIÃO PLENÁRIA DE 19 DE JULHO DE 1982
Presidente: Exmo. Sr. Francisco Manuel Lopes Vieira de Oliveira Dias
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Vítor Manuel Brás
António Mendes de Carvalho
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão as 15 horas e 25 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente de apresentação de requerimentos e de respostas a alguns pontos
Em declararão política o Sr Deputado Lino Lima (PCP) exigiu que fosse tornado publico o resultado do inquérito aos acontecimentos do 1.º de Maio no Porto e a demissão do governador civil daquela mesma cidade
O Sr. Deputado Bento de Azevedo (PS) também em declararão política referiu-se a diversas situações de contrabando.
O Sr. Deputado Carlos Espadinha (PCP) igualmente em declaração política aludiu a problemas verificados no sector das pescas e a necessidade de tomada de determinadas medidas
O Sr. Deputado Anacleto Baptista (PSD) fez uma intervenção em que se referiu a comemoração do 75.º aniversário do Corpo Nacional de Escutas.
O Sr Deputado Custódio Ferreira (PCP) proferiu uma intervenção focando a situação dos reformados e pensionistas da Caixa dos Ferroviários no tocante a pensões
O Sr Deputado Sousa Marques (PCP) em intervenção criticou a Radiotelevisão Portuguesa pelo facto de anunciar uma 3.ª Guerra Mundial e a inevitabilidade uma guerra nuclear
Foi lido e votado tendo sido aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre o pedido de autorização formulado pela Universidade Nova a fim de que o Sr Deputado Arons de Canalha (PS) ai preste a sua colaboração como assistente convidado
O Sr. Deputado Bento de Azevedo (PS) leu um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de deputados do PSD PS e CDS que mereceu aprovação por parte da Câmara
Ordem do dia. - Procedeu-se a continuação da discussão e votação na generalidade e na especialidade da proposta de lei n.º 100/II que autoriza o Governo a legislar em matéria de definição de crimes penas e medidas de segurança com vista a aprovação de um novo Código Penal e a revogação do Código Penal vigente bem como a adoptar as necessárias disposições transitórias de direito criminal e de processo criminal autorizando ainda o Governo a legislar em matéria de contravenções a alterar a legislação respeitante as contra-ordenações e a legislar sobre o regime penal especial aplicável a jovens delinquentes dos 16 aos 25 anos Intervieram a diverso titulo (incluindo declarações de voto) alem do Sr Ministro da Justiça (Meneres Pimentel) os Srs Deputados Costa Andrade (PSD) Lino Lima e Zita Seabra (PCP) Teresa Santa Clara Gomes (UEDS) Carlos Robalo (CDS) Teresa Ambrósio (PS). João Morgado (CDS) Zita Seabra (PCP) Barrilaro Ruas (PPM) Amadeu Ferreira (UDP) António Vitorino (UEDS) Armando Lopes (PS) Sousa Lara (PPM) e António Taborda (MDP/CDE)
Procedeu-se ainda a discussão e votação, na generalidade e na especialidade da proposta de lei n º 103/II que concede autorização ao Governo para legislar em matéria de organização e competência dos tribunais bem como sobre o processo criminal e isenção de selo.
Intervieram a diverso titulo alem do Sr Ministro da Justiça os Srs Deputados António Taborda e Armando Lopes
Após ter anunciado a entrada na Mesa de diversos diplomas o Sr Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 5 minutos.
O Sr Presidente: - Srs Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 25 minutos
Estavam presentes os seguintes Srs Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Afonso de Sousa F. de Moura Guedes
Alberto Monteiro Araújo
Álvaro Barros Marques Figueiredo
Amândio Anes de Azevedo
Amadeu Afonso Rodrigues dos Santos.
Amélia Cavaleiro M Andrade Azevedo
Anacleto Silva Baptista
António Augusto Lacerda de Queiroz
António Mana de O Ourique Mendes
António Roleira Marinho
Armando Lopes Correia Costa
Arménio Jerónimo Martins Matias
Arménio dos Santos
Carlos Dias Ribas
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Cecília Pita Catarino
Daniel Abílio Ferreira Bastos
Fernando Alfredo Moutinho Garcez
Fernando José Sequeira Roriz
Fernando Manuel Cardote B Mesquita
Fernando Manuel Cardoso Ferreira
Fernando dos Reis Condesso
Francisco Mendes Costa
Francisco de Sousa Tavares
João Abreu Salgado
João Afonso Gonçalves
João Evangelista Rocha Almeida
João Vasco da Luz Botelho Paiva
Joaquim Pinto
José Augusto Ferreira de Campos
José Luis Figueiredo Lopes
José Manuel Pinheiro Barradas
José Mano de Lemos Damião
José de Vargas Bulcão
Júlio Lemos Castro Caldas
Leonel Santa Rita Pires
Luis António Martins
Luis Sousa Palha
Manuel António Araújo dos Santos
Manuel António Lopes Ribeiro
Manuel da Costa Andrade
Manuel Ferreira Martins
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel João Vaz Freixo
Manuel Mana Moreira
Manuel Pereira
Manuel Ribeiro Arruda
Maria da Gloria Rodrigues Duarte
Maria Manuela Dias Moreira
Marília Dulce Coelho Pires D Raimundo
Mário Marques Ferreira Maduro
Nuno Aires Rodrigues dos Santos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel Santana Lopes
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Rui Alberto Barradas do Amaral
Valdemar Cardoso Alves
Vasco Francisco Aguiar Miguel
Vítor Pereira Crespo
Virgílio António Pinto Nunes
Partido Socialista (PS)
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Marques Antunes
António de Almeida Santos
António Chaves Medeiros
António Carlos Ribeiro Campos
António Fernando Marques R Reis
António Francisco B Sousa Gomes
António Gonçalves Janeiro
Aquilino Ribeiro Machado
Armando dos Santos Lopes
Avelino Ferreira Loureiro Zenha
Beatriz Cal Brandão Bento
Elísio de Azevedo
Eduardo Ribeiro Pereira
Fausto Sacramento Marques
Fernando Torres Marinho
Francisco de Almeida Salgado Zenha
Francisco Manuel Marcelo Curto
Jaime José Matos da Gama
João Alfredo Félix Vieira Lima
João Cardona Gomes Cravinho
João Francisco Ludovico da Costa
Joaquim José Catanho de Menezes
Jorge Fernando Branco Sampaio
José Manuel Niza Antunes Mendes
Júlio Filipe de Almeida Carrapato
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonel de Sousa Fadigas
Luis Manuel César Nunes de Almeida
Luis Manuel dos Santos Silva Patrão
Manuel Francisco da Costa
Manuel Tavares
Manuel da Mata de Cáceres
Maria Teresa V Bastos Ramos Ambrósio
Mano Manuel Cal Brandão
Raul d'Assunção Pimenta Rego
Rui Fernando Pereira Mateus
Teófilo Carvalho dos Santos
Vítor Manuel Brás
Centro Democrático Social (CDS)
Adriano José Alves Moreira
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto
Américo Mana Coelho Gomes de Sá
António Jacinto Martins Canaverde
António Mendes Carvalho
António Paulo Rolo
António Pedro Silva Lourenço
Armando Domingos L. Ribeiro Oliveira
Carlos Martins Robalo
Daniel Fernandes Domingues
Duarte Nuno Correia Vasconcelos
Francisco G Cavaleiro de Ferreira
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias
Henrique Augusto Rocha Ferreira
Henrique José C. M. Pereira de Moraes
João Gomes de Abreu de Lima
João José M. Pulido de Almeida
João Maria Abrunhosa de Sousa
João da Silva Mendes Morgado
Joaquim Rosa da Costa
José Manuel Rodrigues Casqueiro
Luis Carlos Calheiras V. Sampaio
Luis Filipe Paes Beiroco
Luisa Maria Freire Vaz Raposo
Manuel António de Almeida Vasconcelos
Manuel Ferreira Castelhano
Maria José Paulo Sampaio
Paulo Oliveira Ascenção
Pedro Eduardo Freitas Sampaio
Rogério Ferreira Monção Leão
Rui António Pacheco Mendes
Victor Afonso Pinto da Cruz
Partido Comunista Português (PCP)
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira
Álvaro Favas Brasileiro
António Anselmo Aníbal
António José de Almeida Silva Graça
António José M Vidigal Amaro
Artur Manuel Mendonça Rodrigues
Carlos Alberto do Carmo C Espadinha
Carlos Alfredo de Brito
Custodio Jacinto Gingão
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Custódio Silva Ferreira.
Ercília Carreira Talhadas.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Sérgio Ferreira Pinto.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel da C. Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Manuel Silva Ribeiro de Almeida.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria d'Aires Sande Silva.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Mariana Grou Lanita da Silva.
Octávio Augusto Teixeira.
Osvaldo Sarmento de Castro.
Partido Popular Monárquico (PPM)
António José Borges G. de Carvalho.
António de Sousa Lara.
Augusto Ferreira do Amaral.
Henrique Barrilaro Ruas.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.
Acção Social-Democrata Independente (ASDI)
Fernando Dias de Carvalho.
Joaquim Jorge de Magalhães S. Mota.
Jorge Manuel M. Loureiro de Miranda.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS)
António César Gouveia de Oliveira.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE)
Herberto de Castro Goulart da Silva.
União Democrática Popular (UDP)
Amadeu José Ferreira.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura do expediente.
Expediente
Ofícios
Da Junta de Freguesia de Barcarena, remetendo fotocópia da moção aprovada em reunião do passado dia 25 de Junho, sobre uma moção de censura apresentada pelo
Grupo da Aliança Democrática à Mesa da Assembleia de Freguesia.
Da Junta de Freguesia do Castelo, em Sesimbra, capeando fotocópia da moção aprovada em reunião realizada no dia 25 de Maio findo, sobre a criação da freguesia da Quinta do Conde.
Do Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias de Celulose, Fabricação e Transformação do Papel, Gráfica e Imprensa do Sul e Ilhas, remetendo um dossier do processo ANOP, a fim de poder ser verificado.
Do Sindicato dos Trabalhadores do Comércio e Serviços do Distrito de Lisboa, remetendo o texto de uma resolução que foi aprovada em plenário de trabalhadores no passado dia l do corrente, acerca da situação na Bertrand.
Da União dos Sindicatos do Arquipélago da Madeira, enviando, em anexo, várias moções que foram aprovadas durante o II Encontro Regional da Mulher Trabalhadora realizado no Funchal no dia 27 do passado mês de Junho.
Da Assembleia Municipal de Azambuja, remetendo o texto de uma proposta aprovada naquela autarquia, por unanimidade, na sessão ordinária do passado dia 25 de Junho, sobre a elevação a freguesia do lugar de Maçussa, naquele concelho.
Da Câmara Municipal de Coruche, transcrevendo o teor de uma deliberação tomada na reunião efectuada no passado dia 18 de Junho, acerca da inauguração do Lar do Monte da Barca, em Coruche, com a presença do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais.
Da Câmara Municipal de Vila Real de Santo António, remetendo fotocópia do caderno reivindicativo dos reformados, pensionistas e idosos, designado por Maio/82, face à política do Governo.
Da Assembleia Municipal de Castro Verde, enviando fotocópia dos textos de moções aprovadas na reunião efectuada no passado dia 30 de Junho, sobre o projecto de lei da amnistia e da escola preparatória.
Da Assembleia de Freguesia de Vila Franca de Xira, capeando moções aprovadas na sessão ordinária de 18 de Junho transacto, sobre o pacote legislativo autárquico e elevação de Vila Franca de Xira a cidade.
Cartas
Da Comissão de Proprietários dos Terrenos para o Parque da Cidade de Espinho, remetendo fotocópia de uma exposição entregue pelos signatários na Câmara Municipal e Assembleia Municipal de Espinho, acerca de uma prevista expropriação de terrenos, para construção de um parque desportivo naquela cidade.
De Silvestre Rodrigues dos Santos e outros, professores na Escola Preparatória de Sobreda da Caparica, Carlos Alberto Campos Amaro e outros, professores na Escola Preparatória de Abrantes e Rui Joaquim Gomes Inácio e outros, professores na Escola Preparatória de Santo António, na Parede, remetendo fotocópias dos requerimentos apresentados no Ministério da Educação e das Universidades, sobre a situação dos professores de Música e Trabalhos Manuais.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Nas últimas reuniões plenárias, foram apresentados na mesa os seguintes requerimentos:
Na reunião do dia 15 de Julho de 1982:
Aos Ministérios das Finanças e do Plano e da Indústria, Energia e Exportação, formulado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira: ao Governo, no total de
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5, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos: ao Governo e aos Ministérios da Justiça e dos Negócios Estrangeiros, formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota: aos Ministérios do Trabalho e da Indústria. Energia e Exportação, formulado, pelos Srs Deputados Osvaldo Castro e Octávio Teixeira: ao Ministério da Cultura e Coordenação Científica, formulados pelos Srs. Deputados José Manuel Mendes Vital Moreira e João Abrantes: ao Governo e à Câmara Municipal de Gondomar, formulado pelos Srs. Deputados Manuel Ribeiro de Almeida e, Ilda Figueiredo:, ao Instituto de Participações do , Estado, formulado pelos Srs. Deputados Octávio Teixeira e Jorge Patrício.
Na reunião do dia 16 de Julho de J982:
Ao Ministério da Educação e das Universidades, formulado pelo Sr. Deputado Luís Patrão: ao Ministério da Agricultura, Comércio e Pescas, apresentado pelos Srs. Deputados Álvaro Brasileiro e Custódio da Silva Ferreira: aos Ministérios da Administração Interna é da Agricultura. Comercio e Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Osvaldo Castro.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados:
Álvaro Brasileiro, na sessão de 2 de Fevereiro; Ilda Figueiredo, nas sessões de. 9 de Fevereiro, 18 de Março e 29 de Maio Jaime Ramos, na sessão, de 10 do corrente: Magalhães Mota. Nas sessões de 26 e 29 de Novembro de 19,81 e de 25 de Fevereiro. 2 10 16 e 26 de Março 13 de Abril 4, 18 e 20 de Maio; Luís Filipe Madeira, na sessão ;de 15 de Abril: Manuel Tílman, na sessão de 20 de Abril: João Carlos Abrantes, na sessão de 22 e 30 de , Abril: Octávio Teixeira e Jerónimo de Sousa, na sessão de 30 de Maio:- Ilda Figueiredo, Ercília Talhadas e Manuel. Correia Lopes, na sessão de 9 de Março: Gaspar Martins e outros, na sessão de 15 de Abril: Jorge Miranda. Guilherme de Oliveira Martins e Vilhena de Carvalho, na sessão de 7 de Maio Manuel dos Santos e Torres Marinho, na sessão de 11 de Maio: Vilhena de Carvalho, nas sessões de 9 de Dezembro de 1981 e 18 de Maio; Adelino Teixeira de Carvalho, na sessão de 20 de Maio: Dias de Carvalho, na sessão de 20 de Maio; Anselmo Aníbal e Sousa Marques, na sessão de 25 de Maio: Dinah Alhandra, na sessão de 27 de Maio: António Vilar, na sessão de 22 de Junho.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Lino Lima.
O Sr. Lino Lima (PCP): - Sr. Presidente, Srs, Deputados: Estamos a mais de 2 meses e meio dos acontecimentos sangrentos que se verificaram no Porto na noite de 30 de Abril para l de Maio, dos quais resultaram 2 mortos e cerca de uma centena de feridos, alguns deles de muita gravidade.
O país em geral, e os cidadãos daquela cidade, em particular, continuam a lembrar-se do que foram essas horas durante as quais b Corpo de Intervenção e outras forças da Polícia de Segurança, Pública lançaram uma operação terrorista na baixa portuense, que depois estenderam a outras zonas da, cidade, perseguindo, ferindo e matando gente pacífica e indefesa. Foi uma actuação feroz.
Perante o alarme e a inquietação, que esses gravíssimos acontecimentos causaram na opinião pública, o Governo ordenou um inquérito e a Procuradoria-Geral da República designou um magistrado para o levar a cabo, tendo-se fixado o prazo de 30 dias para o seu termo.
Estão os senhores deputados lembrados de que - com o fundamento em tal inquérito e em tal prazo-a maioria, nesta Assembleia, recusou um outro inquérito, esse parlamentar, à actuação policial proposto pela UEDS e recusou também uma recomendação ao Governo, proposta pelo PS. no sentido de serem suspensos provisoriamente os Comandos da Polícia de Segurança Pública e do Corpo de Intervenção directamente ligados aos acontecimentos do Porto até à averiguação dos factos.
Nessa altura ouvimos aqui sucessivas justificações dos grupos parlamentares da AD no sentido de que nesse curto prazo, em 30 dias. tudo estaria apurado por um magistrado e as conclusões seriam imediatamente publicadas, como garantiu o Ministro da Administração. Interna perante esta Câmara.
Nessas condições, diziam, nenhuma daquelas medidas se justificava, votaram contra elas, e a Assembleia da República ficou ;tolhida de usar das suas competências e prerrogativas, nomeadamente para fiscalizar a actuação do Governo e dos órgãos da administração política e materialmente envolvidos nos acontecimentos do l.º de Maio.
Estão passados agora mais de 2 meses e meio sobre essas horas de tragédia. Nada se sabe do inquérito. Ou melhor, sabe-se, pela voz do Sr. Ângelo Correia, que ainda não está pronto, segundo disse por causa de uma peritagem de balas. E segundo disse ontem, depois de tanto tempo calado, porque nestes últimos dias se tem levantado um grande clamor exigindo a publicação dele. Não fora esse clamor e o Governo continuaria mudo e quedo.
Ora as falas tardias e tartamudeadas do Ministro da Administração Interna tornam legítimo que nos interroguemos - ca opinião pública interroga-se - sobre se não estamos diante de um novo inquérito que se quer abafado, tal como tem acontecido a tantos outros, tal como sucedeu com o inquérito acerca dos 2 trabalhadores da Reforma Agrária mortos em Montemor por agentes da Guarda Nacional Republicana:
Digamos, porém, que este silêncio prolongado não nos surpreende. O Governo, o Ministro da Administração Interna e o governador civil do Porto, Rocha Pinto - que desde logo apareceram aos. olhos da generalidade dos portugueses como os grandes responsáveis políticos, como os autores morais do que sucedeu naquela cidade nas comemorações do Dia Mundial do Trabalhador - estavam e estão interessados em fazer baixar uma cortina de silêncio sobre essa noite de terror.
A Sr.ª Alda Nogueira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Não permitiremos que isso suceda, até porque, para além de todas as razões - da violência policial das mortes, dos feridos, como motor delas, estava a tentativa de domesticar, primeiro, e acabar depois com o livre exercício do direito de reunião e manifestação, expresso no famigerado despacho do governador civil Rocha Pinto sobre as manifestações do l.º de Maio na baixa portuense, que aqui mesmo denunciámos ainda antes desses acontecimentos dolorosos.
Ora sucede que esse governador civil não cessa de proferir decisões frontalmente contrárias ao que se dispõe
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no artigo 45.º da Constituição,, invocando para tanto os seus despachos tolos, inconstitucionais e ilegais, proferidos, partindo sempre da ideia peregrina de que ainda vigora na nossa ordem jurídica democrática o princípio fascista de que o exercício do direito de reunião está condicionado à sua autorização prévia, por autoridades administrativas.
Recentemente, por exemplo, o governador civil do Porto recusou-se a requisitar uma escola para uma reunião requerida pela comissão concelhia da APU de Penafiel com o seguinte fundamento textual:
Como a finalidade da reunião tem fins eleitoralistas e não estamos em período da campanha eleitoral, não reúne os requisitos fixados no meu despacho genérico, pelo que não requisito a escola.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É uma vergonha!
O Orador: - Este despacho vem aliás, no seguimento de outros idênticos, desde aquele a que pomposamente chamou "normativo", de Março de 1980, onde impõe toda uma série de restrições ao exercício do direito de reunião, até ao que se recusa a requisitar uma sala que lhe fora pedida pela Juventude Comunista Portuguesa com o fundamento de que só o fará "quando se trate de reuniões dos respectivos órgãos ou filiados com vista à sua operacionalidade nos momentos e para os fins legalmente determinados.
salas que lhe são pedidas pelo PCP "em virtude de não indicar o objectivo da reunião" e ainda em Março deste ano também não requisitou uma sala para uma reunião do MARN com este pretexto, que também refiro também textualmente:
Tratando-se de uma reunião de interesse sectorial, não requisito a escola.
É evidente Srs. Deputados, que os ofenderia se me detivesse a demonstrar-lhes como esses escritos governadorescos brigam frontalmente com o livre exercício do direito de reunião.
O governador civil Rocha Pinto pensa e actua como se estivéssemos ainda antes do 25 de Abril. Simplesmente - já não estamos aí.
A Sr.ª Alda Nogueira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O povo a partir dessa data conquistou direitos que a Constituição consagra.
A Sr.ª Alda Nogueira.(PCP): - Muito bem!
O Orador: - E por isso mesmo surgiram também como um verdadeiro escândalo as declarações do presidente da Câmara Municipal de Marco de Canavezes quando, acusado de desvio de dinheiros públicos, diz textualmente o seguinte, que consta da acta desse órgão autárquico:
Aquilo que eu entendi que o Sr. Governador Civil me disse, quando lá fui. no fim de uma reunião do concelho distrital foi: recebi umas massas de Lisboa com que. não contava. Estão aqui 4 ou 5 presidentes de câmara que fazem parte do concelho distrital, arranjem-me uns recibos e distribuam a massa lá em cima conforme entenderem, mas que seja por gente da nossa cor.
Vozes do PCP: - Que vergonha!
O Orador: - Insistindo nisto, o presidente da câmara obteve do Grupo Desportivo de Tabuado um recibo de 100 contos, mas só lhe entregou 50, partindo-se daqui para um grande embróglio com dinheiros municipais, como tudo consta da referida acta que os Srs. Deputados podem obter e que é um documento exemplar de uma política.
Já não bastavam, portanto, os despachos de teor fascista do governador civil do Porto. Agora constata-se também que, em questões de "massas", o Sr. Rocha Pinto igualmente actua como nos tempos anteriores ao 25 de Abril: recebe-as de Lisboa à sucapa - até quando não constava - e faz distribuição delas por gente da sua cor. A questão é que lhe arranjem uns recibos, que até podem ser falsos, como sucedeu neste caso acabado do Marco de Canavezes ...
Eis como vamos, Srs. Deputados, na distribuição dos dinheiros públicos! Eis como vamos quanto ao governador civil do Porto, que se mantém em funções, que continua a merecer a confiança do governo AD, do Ministro da Administração Interna, apesar destes e de outros escândalos públicos que ofendem os cidadãos daquela cidade e daquele distrito.
Tal governo - tal governador civil. Tal Sr. Ângelo Correia - tal Sr. Rocha Pinto. Estão todos no mesmo complot, querem todos a mesma coisa: voltar ao passado, dar cabo do 25 de Abril e da democracia, regressar ao tempo em que o exercício dos direitos dos cidadãos dependia de vontades soberanas e os dinheiros dos cidadãos andavam em sacos azuis para serem distribuídos pelos da sua cor.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - É uma pouca vergonha!
O Orador: - É isto que eles querem e os democratas não querem. Por isso exigimos a demissão do governador civil do Porto, que uma mera questão de higiene política impõe que vá para casa sem demora.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Por isso mesmo também exigimos que o inquérito aos acontecimentos do l.º de Maio seja urgentemente tornado público! Tudo o impõe, até a tranquilidade dos cidadãos!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Bento de Azevedo.
O Sr. Bento de Azevedo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O contrabando, a especulação e a corrupção campeiam no nosso pais sob o manto da impunidade e, segundo se afirma, com a conivência ou a displicência de agentes do Estado alguns escandalosos negócios, com a cobertura legal dada por entidades com responsabilidades na área do Governo.
Porque se trata de gravoso problema que atinge já proporções alarmantes e de gravíssimas consequências, porque se escoam divisas substanciais para fora do país: porque a saúde pública corre graves riscos; porque se abalam os alicerces de um regime que se pretende democrático, pelo clima de descrença e de frustração que se cria na população portuguesa, não podemos deixar de trazer
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este assunto perante esta Assembleia da Republica, abordando-o com alguma minúcia
Em 26 de Março passado apresentei um requerimento ao Sr Ministro da Agricultura. Comercio e Pescas, solicitando-lhe alguns esclarecimentos sobre um determinado arroz que apareceu em Dezembro de 1980 no mercado nacional, fabricado por uma firma que aí se referia
Este arroz não obedecia a qualquer padronização estabelecida por lei e apareceu a venda por preço exorbitante, numa altura em que, sem causa aparente, se registava falta de abastecimento no mercado de arroz carolino A agravar as circunstâncias estranhas em que este arroz é lançado no mercado, comprovou-se, um pouco mais tarde, através de analises, a existência de bolores potencialmente toxinogéneos que poderiam pôr em risco a saúde dos consumidores
Um parecer da EPAC classificaria este arroz como sendo "arroz carolino estufado que não se enquadrava em qualquer dos tipos definidos por lei"
O referido arroz era então vendido ao público a 50$/kg quando o preço do arroz carolino era de 36$/kg
Nestas circunstâncias - perante um facto que nos parecia de extrema gravidade - perguntamos ao Ministério da Agricultura, Comércio e Pescas
a) Como e defendida a saúde pública?
b) Quais as penalizações aplicadas aos infractores e aos responsáveis que estavam por detrás de todo este embróglio.
Na esperança que a resposta viesse rápida e concisa, a verdade e que tive que requerer novamente em 2 de Abril de 1982. acrescentando mais alguns elementos e, entre eles, a referência critica a estranha e inoportuna Portaria n º 311/82, datada de 22 de Março, pela qual a Direcção-Geral do Comercio Alimentar dava cobertura legal à comercialização de tal arroz, classificando-o então de fabrico Parboilleid (estufado)
Ora, a indicação referida não e definidora de um tipo comercial Pelo contrario, constitui uma forma de tratamento que o arroz sobre no processo tecnológico tendente a gelatinizar o amido Ora, este tipo de tratamento não estava previsto nas normas uniformes para a classificação do arroz anexas a Portaria n º 21 431, de 30 de Julho de 1965
Trata-se, sem duvida, de uma forma de ladear a lei para se especular com os preços de venda e usufruir-se de lucros ilícitos e com a agravante de se permitir deficientes condições higiénicas, por apresentar este arroz um teor de humidade elevado (cerca de 16 %), e de se ter ainda detectado, através de analises efectuadas, colónias de aspergilius flavius, bolor potencialmente toxinogénico que pode vir a produzir aflatoxinas, pondo em risco a saúde do consumidor
Só no período de 17 de Dezembro de 1980 a 2 de Abril de 1981, a firma produtora deste arroz, vendeu mais de l 100 000 kg, arrecadando um sobretudo de mais de 10 000 contos
E refiro estes números e estes factos. Sr Presidente e Srs Deputados, porque a resposta que veio recentemente do Ministério da Agricultura, Comercio e Pescas, é, pelo menos, ambígua e parece dai deduzir-se a cobertura legal à firma infractora Pela sua extensão dispenso-me de agora a ler No entanto, fica à disposição dos Srs Deputados para qualquer eventual consulta
A resposta daquele Ministério termina como displicência, para não dizer despudor "Penso que o que acima fica exposto satisfaz os esclarecimentos pedidos"
Que pensar de tudo isto. Sr Presidente e Srs Deputados ?
Nem uma palavra sobre a salubridade do produto um lamentável desconhecimento das analises efectuadas, nem uma palavra sobre as medidas tomadas para impedir a pratica das infracções indiciadas, nem uma palavra sobre os ensaios oficiais que deram cobertura legal ao lançamento no mercado de tal tipo de arroz, nem uma referência à sanidade do produto e à mocuidade da embalagem, nem uma palavra sobre as providências tomadas ou a tomar pelo Ministério da Agricultura, Comercio e Pescas para prevenir uma eventual posição monopolista da empresa titular da marca comercial no que concerne a preparação e comercio de arroz tipo carolino para o abastecimento publico, dada a sua posição preferencial na área produtiva que a confortável margem acrescida de lucro lhe proporciona, nem uma palavra sobre as medidas tomadas ou a tomar contra os infractores e sem acólitos, nem uma palavra em defesa dos pobres consumidores portugueses, que têm sido tão mal tratados!
Na verdade, ou a irresponsabilidade e muito grande ou é-nos permitido admitir que a conivência com a ilegalidade ou a corrupção - que atinge já foros de escândalo - é um facto.
Objectivar-se-á um clima psicológico para o descrédito continuado do próprio Governo, e das instituições democráticas?
Será que, mais uma vez. os Ministros do CDS estão no Governo para o melhor o combater
Sr. Presidente, Srs Deputados Diz-se por ai, a boa cheia, que este pais esta a saque Num ditado popular afirma-se "Tão ladrão e o que rouba a horta, como o que fica à porta.
De tacto, perante tantos casos gravosos, quase diariamente referidos pelos órgãos de comunicação social, perante inúmeros processos levantados cujo epílogo jamais se conhece, perante provas concretas, como e o caso que referi, como se pode justificar o aparecimento posterior de portarias dando cobertura legal a ilegalidade? Como explicar que, tendo sido aprovado um projecto-lei que visa precisamente pôr a coberto o consumidor português de abusos intoleráveis como este. se continue a permitir atentados à saúde publica e a autênticos assaltos a bolsa, já tão minguada, em proveito de alguns?
Como é possível determinar-se dispositivos constitucionais na defesa dó consumidor e contrariar-se, diariamente, esses princípios, recentemente 'aqui tão elogiados pelos partidos da maioria AD'7 Como e possível que no programa do VII e VIII Governos Constitucionais se afirme, como preocupação dominante, "uma actuação pronta e eficaz da fiscalização económica" e "a melhoria da qualidade de vida da população portuguesa" e, ainda, a promessa - mais uma - de "a execução de um conjunto de acções normativas, preventivas e fiscalizadoras visando as situações ou comportamentos mais lesivos dos direitos e interesses dos consumidores" 7
Sr. Presidente, Srs Deputados Constituíram e constituem autênticos escândalos públicos, perante a passividade deste Governo, o contrabando de gado tuberculoso e com febre aftosa de gado espanhol, ao qual já nos referimos em requerimentos dirigidos a este Ministério em 20 de Outubro e em 26 de Março passadas e demos, inclusivamente, algumas pistas para contrariar e combater tal praga Po-
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rem, continuamos sem resposta às nossas observações e o contrabando continua livremente a fazer-se.
Constituiu objecto também de um requerimento nosso, a abordagem das escandalosas importações de peixe e moluscos pelo sistema de "trapiche" ou outros que, para alem. de especulação sem limites, acarreta grandes prejuízos e até inactividade da nossa frota pesqueira e índices preocupantes de desemprego dos nossos pescadores, os quais se vão, pouco a pouco, afastando da sua fama
Sabemos, por exemplo, que terminaram a sua actividade, ha pouco mais de l ano, 10 barcos, colocando inactivos cerca de 100 pescadores e que cerca de 7 barcos aparelhados para a pesca do carapau, apenas 3 se encontram ainda em serviço
Constituiu escândalo público o aumento do preço do açúcar com a publicação da Portaria n º 1133/81, de 31 de Dezembro, mas somente publicada em 18 de Janeiro de 1982, sem que, entretanto, se tomassem medidas para evitar as especulações pela venda das existências ao novo preço e sem que o pagamento dos diferenciais ao Fundo de Abastecimento se processasse
Constitui escândalo publico a inexistência de vigilância à exportação de divisas, quando e afirmado, que as importações atrás referidas são normalmente pagas em pesetas ou em dólares e também constituem escândalos públicos o desenfreado contrabando da banana e da maçã
E o que dizer dos escândalos que houve com a batata importada e dos preços que foram então praticados? E da actual e grave falsificação do azeite com óleos duvidosos, que originaram casos mortais em Espanha! E das transferências irregulares de divisas para o estrangeiro praticadas por uma empresa comercial a coberto de despachos do Secretario de Estado do Comercio, conforme noticiava na semana passada um conhecido semanário da área política da AD?
Sr. Presidente, Srs. Deputados No que se refere ao contrabando, afirma-se a conivência e a responsabilidade de alguns agentes da Guarda Fiscal Pelo menos, um conhecido diário da cidade do Porto, em excelentes reportagens publicadas nos passados dias 12, 13 e 14 do corrente, indiciava essa colaboração em localidades da arraia fronteiriça do norte, que denominava de "paraísos do contrabando"
Entretanto, a especulação desenvolve-se de forma assustadora e incontrolável
A actual Direcção-Geral da Fiscalização Económica aguarda, ha muito tempo, uma reestruturação Sem ela, não poderá actuar com a eficácia E apesar das múltiplas promessas e de aparentes boas intenções, a verdade é que continua a não haver vontade política para tal
Com quadros depauperados, desmotivados e desiludidos, ganhando mal, não tendo meios materiais e técnicos nem uma direcção conhecedora dos factos económicos que se desenrolam à sua volta, a Direcção-Geral de Fiscalização Económica não pode desempenhar-se da árdua missão que lhe competiria num saneamento autêntico e eficaz dos circuitos de distribuição e no combate à especulação e delitos contra a saúde publica e outras fraudes da área económica
Assim, vai actuando de vez em quando e de forma mais ou menos passiva, como parece ser desejo deste Governo
Quanto a corrupção, temos dito Como todas as pragas, alastra e tudo parece indicar que o exemplo vem de alguns daqueles que tinham a obrigação de a combater sem tréguas.
"Quem não quer ser lobo, não lhe veste a pele. "
O Governo não pode continuar a ignorar ou fingir ignorar problemas graves ou anunciar "rigorosos inquéritos" dos quais não mais se conhecem os resultados
Ou governa, ou demite-se.
Como desgoverna, já deveria ter sido demitido E nisso, se não estamos todos de acordo, esta, com certeza a maioria do povo português
Aplausos do PS da UEDS e do Sr. Deputado Jorge Lemos, do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Deputado Carlos Espadinha
O Sr. Carlos Espadinha (PCP) - Sr. Presidente, Srs Deputados: O anteprojecto do chamado Plano Nacional das Pescas apresentado pelo governo AD. não passa de um conjunto de documentos sem ligação entre si e não resolve, de facto, de forma adequada os problemas que se põem ao sector e, em alguns casos, aponta mesmo para o seu agravamento
Como já tem sido dito por varias pessoas conhecedoras dos problemas da pesca, o chamado Plano não passa de uma manta de retalhos, composta por textos dispersos, contraditórios com o próprio programa do Governo e com as Grandes Opções do Plano para 1981-1982 e, por isso, de forma alguma pode ser designado como um Plano
Podemos ver algumas questões e dar alguns exemplos como estes" a anunciada adesão de Portugal à CEE conduziria à quase destruição do sector, já que seriamos forçados a permitir o acesso às nossas águas de importantes frotas estrangeiras com particular incidência da frota espanhola; assistiríamos à intensificação da concorrência dessas mesmas frotas e de produtos de pesca com origem na CEE, sem que tivéssemos qualquer contrapartida visível. Outra das questões que também se nota e a do desemprego, designadamente na pesca da sardinha, e pensamos que o Plano de maneira nenhuma o pode resolver. E ainda mais grave do que isto, e o desaparecimento da grande maioria da pesca artesanal costeira, pesca esta que emprega a esmagadora maioria dos pescadores portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados Este projecto, se viesse a ser posto em prática, mais não trazia que desemprego e miséria para a grande maioria dos pescadores portugueses
"Nós pescadores, não queremos de maneira nenhuma ser desempregados dos 'Senhores da CEE e darmo-lhes os nossos mares 'de mão beijada' Não podemos deixar que isso aconteça"
Pensamos, Sr Presidente e Srs Deputados, que e necessário que sejam ouvidas as propostas que os trabalhadores apresentaram em relação a este chamado Plano Quais são estas propostas?
Criar uma administração verticalizada e funcionai que permita uma correcta aplicação da política da pesca nacional; elaborar nova regulamentação para o sector, com vista à clarificação das regras e condições onde se exerce a actividade e com vista à defesa dos recursos, desenvolver a investigação científica operacional criando inclusivamente programas integrados - uma vez que a gestão nacional dos recursos pesqueiros tem que se basear em estudos da relação dos stocks com o meio ambiente, com o esforço e tipo de pesca, etc - com vista ao conhecimento, tanto quando possível profundo, das reais potencialidades dos nossos recursos e em que medida devem ser explorados; criar um sistema estatístico apropriado de colheita de dados, não só de desembarques de pescado como de capturas e apoios a desenvolver para progresso de amostra-
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gem nacional, quer nos portos, quer a bordo das embarcações, com vista ao conhecimento correcto das quantidades de pescado capturados e desembarcados, organizar no INIP um programa de táctica de pescas, que preste a assistência que a frota necessita, não só quanto a equipamentos, como a informações sobre pesqueiros, dar prioridade à investigação cientifica no domínio da aquacultura - relativa a produção de proteínas de origem aquática - através da cultura de espécies de forragens ao mais baixo nível da cadeia alimentar, que não exijam tecnologias sofisticadas, e que sejam eventualmente produtoras de divisas, e susceptíveis de ser aceites na dieta alimentar dos portugueses, apetrechar com meios adequados e suficientes, as entidades responsáveis pela fiscalização, promover a ocupação das ZEE pela trota nacional, estabelecer regimes de cooperação com outros países designadamente os de expressão portuguesa, renovar a nossa frota pesqueira com vista a um melhor aproveitamento das possibilidades no que respeita a stocks, e inaproveitados ou insuficientemente aproveitados
E preciso também Sr Presidente. Srs Deputados Apoiar as iniciativas que tenham em vista o lançamento da nossa ZEE de novas pescarias, nomeadamente, o aproveitamento da possibilidade de captura de crustáceos, trombeteiros verdinhos, bivales. etc apoiar a indústria trans-formuladora do pescado, tanto a nível de conservas, como congelados e secagem, com vista a manutenção de importantes mercados de consumo, e ainda, como no caso da industria conserveira, a manutenção e desenvolvimento dos mercados exteriores promovendo assim a entrada de divisas, modificar o sistema de comercialização permitindo, a produção a possibilidade de retirar da venda pescado, a partir de determinado preço mínimo, o qual deveria ser garantido, aproveitar as estruturas existentes, desenvolvendo-as, no que concerne a comercialização, no mentido de garantir uma intervenção actualmente e permanente na formação de preços, nomeadamente garantindo a produção um preço mínimo de venda, de acordo com os interesses e intervenção dos pescadores, alterar o sistema de lotas, transformando o actual serviço de lotas e vantagem, numa empresa publica que garanta a prestação eficaz dos serviços de descarga e primeira venda do pescado, impedir ate níveis razoáveis e extremamente necessários ai. importação do pescado, e impedir definitivamente a importação ilegal do verdadeiro contrabando que se faz através do Decreto-Lei n º 1/81, desenvolver as empresas nacionalizadas do sector procedendo ao necessário saneamento económico e financeiro das mesmas, de modo a permitir a intervenção do Estado na disciplina de preços e abastecimentos, promover e apoiar a formação de Cooperativas de pesca que tenham em vista o relançamento da actividade; desenvolver a rede de no - apesar de tudo existente - e pô-la ao serviço da produção para um regular abastecimento publico de pescado, para alem, também de regular o abastecimento das indústrias conserveiras e da transformação em farinha e óleos de pescado, desenvolver estudos no sentido de se encontrar projectos de navios que utilizem uma ou mais artes de pesca, cooperar com o MEU nos programas de profissionalização ligados ao sector, a nível dos cursos complementares e de grau, de modo a que o ensino ligado a pesca possa ser extensivo aos principais centros piscatórios e, que assim, permitam a formação de técnicos de pesca, e de pescadores navegadores, através de uma cooperação entre escolas de pesca. Escola Náutica e Direcção-Geral do Ensino Secundário, estudar, desenvolver, e pôr em pratica medidas que conduzam a uma maior dignificação e condições de trabalho dos trabalhadores da
pesca, durante e apôs a actividade, nomeadamente criando condições de segurança no mar e apoio em caso de perigo, e possibilitando o abandono da actividade aos 55 anos, através de uma reforma justa e digna, elaborar um regime jurídico de contrato individual de trabalho para os trabalhadores do mar, de acordo com o projecto apresentado pelas federações dos sindicatos representativos
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Impõem-se, decidida e firmemente, transformar as estruturas, adequá-las à nova realidade, avançar com medidas que visem o futuro da nossa frota e o aproveitamento de novos recursos.
O anteprojecto do plano apresentado pelo governo AD, nada disto contempla ou quando muito apenas aflora.
Os vários documentos que constituem o plano não têm ligação entre si logo, na verdade, não se trata de um Plano Baralhado, incoerente, contraditório e repressivo mesmo que contendo algumas propostas interessantes, não consegue ser uma proposta minimamente seria de planificação logo, na verdade, não se trata de um plano
Estamos em presença de um documento constituído por varias tolhas que se limita a falar - muitas vezes bem mal - de alguns problemas da pesca
E por isso. Sr Presidente e Srs Deputados, que não concordamos com este pretenso Plano Nacional das Pescas
Os trabalhadores do sector não podem aceitar tal e tão desastrosa política governamental para o sector da pesca
Exigimos as nossas medidas Não deixemos que façam dos pescadores portugueses desempregados dos "senhores da CEE do PCP e do MDP/CDE
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Deputado Anacleto Baptista
O Sr. Anacleto Baptista (PSD): - Sr Presidente. Srs Deputados No ano de 1907, em Guillwell, Inglaterra, Baden Povvel lançava o Movimento do Escutismo, hoje mundialmente conhecido e vivido
Entre nos designado por Corpo Nacional de Escutas, Associação de Escuteiros de Portugal e Associação de Guias de Portugal, vive-se, agora, a comemoração do 75.º aniversário deste Movimento
Porque este Movimento tem em Portugal quase 60 anos de vida, porque tem sido congregador de milhares e milhares de jovens ao longo de todos estes anos - alguns' hoje já só possuem a juventude do espirito e porque e, neste momento, escola de formação que largos milhares de jovens frequentam, entendemos ser oportuno proferir nesta Casa. algumas palavras acerca do Movimento, concretamente quanto ao Corpo Nacional de Escutas - porque foi neste movimento que nos inserimos desde há alguns anos. Com efeito, se hoje se lamenta que a juventude se sente desmotivada, e sem ideal, teremos que ser leais e dizer que o CNE - e as outras associações similares - continuam na senda do caminho traçado pelo seu fundador, ha 75 anos
Cultivando a pratica da saúde física através do contacto quase constante com a natureza, não deixa de procurar o aperfeiçoamento da formação cultural e moral do jovem
Apoiados pelos seus chefes - homens e mulheres que fazem das suas horas de descanso a dedicação ao apoio dos jovens - estas jovens dedicam também os seus tempos livres à pratica das actividades escutas, fieis ao lema de "Sempre alerta para Servir"
Sr. Presidente, Srs. Deputados Neste mundo conturbado, em que se faz da desordem quase "o pão nosso de cada
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dia", em que os jovens se vêem tantas vezes incompreendidos; em que outras tantas vezes eles mesmos se sentem em dificuldade para encontrar o caminho que lhes permita prepararem-se para o futuro, cremos ser oportuno como já referimos, falar aqui dos 75 anos do Movimento fundado por Baden Powel.
O testemunho de tantos antigos escuteiros - alguns com assento nesta Casa - ca prova mais real da validade e utilidade do Movimento.
Por isso e porque apesar de nos não encontrarmos em efectividade de funções - continuamos fiéis ao mesmo lema: "Escuta uma vez, sempre Escuta", quisemos aqui deixar o nosso testemunho que é, ao mesmo tempo, uma homenagem pública ao fundador do escutismo - Baden Powel.
Sem que nos possamos esquecer também, com saudade de D. José de Lencastre e tantos outros que ao escutismo deram muito de si mesmos, quer em dedicação e amor, quer até no aspecto material.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É na convicção de ter interpretado o sentimento de todos os antigos e actuais escuteiros, na esperança de um mundo melhor, que aqui deixamos estas simples mas muito sentidas palavras.
Aplausos do PSD. ASDI e alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Custódio Ferreira.
O Sr. Custódio Ferreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os reformados e pensionistas das Caixas de Regimes Especiais dos Ferroviários tem sido vítimas, ao longo dos anos. de graves atropelos aos seus direitos mais elementares, visto não receberem a actualização das suas pensões em tempo útil.
Assim, quando da actualização em 1980, aguardaram pacientemente 13 meses.
Em 1981 quando se entregou ao conselho de gerência da CP e ao Governo a nova proposta salarial, foi apresentado ao Governo um requerimento em 25 de Novembro de 1981 pedindo as seguintes informações:
a) Quais as causas dos atrasos de processamento verificados em anos anteriores, atrasos que tantos prejuízos têm causado a estes reformados e pensionistas?
b) Tem o Governo a intenção de resolver de imediato este problema? Por que meios?
c) Se as dificuldades são de natureza orçamental, vão ser previstas, como é justo que sejam, as verbas necessárias para dar cobertura aos previsíveis aumentos resultantes da revisão do ACT, que se avizinha?
Em resposta, ao ofício n.º 566-T, de 9 de Fevereiro de 1982. do Gabinete do Secretário de Estado dos Transportes diz:
Cumpre-me informar que se encontra inscrita no Orçamento Global de Segurança Social de 1982 a transferência do Ministério da Habitação, Obras Públicas e Transportes a verba de 2 350 000 contos conforme proposta apresentada pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, o que certamente permitirá que o pagamento actualizado das pensões durante 1982 se efective logo que o processo burocrático esteja concluído. Só nesta data é dada resposta ao requerimento por se ter aguardado a publicação do OGE para 1982. Atente-se que o valor inscrito no OGE do corrente ano é superior em 26,34 % ao valor constante no OGE de 1981, que era de l 860000 contos.
Apesar das promessas e até decisões deste Governo não lhes mereceram confiança, aguardaram, os reformados e pensionistas, a publicação do acordo de empresa que teve lugar em 22 de Maio de 1982 pelo Boletim de Trabalho e Emprego, n.º 19.
Após a sua publicação e de posse das informações atrás referidas, dirigiram-se os interessados à Comissão Nacional dos Reformados e Pensionistas da CP e ao responsável do Instituto de Gestão Financeira, onde foram informados que não poderiam ser feitos os respectivos aumentos por falta de verbas.
Dirigiram-se, igualmente, ao Secretário de Estado dos Transportes Interiores onde foram informados, que em 25 de Maio de 1982 tinha sido decidido no Ministério da Habitação, Obras Públicas e Transportes, uma transferência de verba na ordem dos 400 000 contos em fracções de 100 000 contos/mês, a partir de Setembro próximo, e que isso tinha sido comunicado ao chefe do Gabinete do Secretário de Estado da Segurança Social, à Secretaria de Estado do Orçamento e ao presidente do conselho directivo do Instituto de Gestão Financeira de Segurança Social,
Passado um mês tudo continua sem resposta e resolução, facto que põe em causa a sobrevivência dos reformados e pensionistas da CP. Que credibilidade nos pode merecer o expediente deste Governo quando disse que se procedeu à transferência de 2 350 000 contos - conforme proposta apresentada pio Instituto de Gestão Financeira de Segurança Social e portanto estando garantido o pagamento actualizado das pensões, logo que concluído o processo burocrático - para depois a verba desaparecer sem deixar rasto. Pelo menos nós não sabemos para onde terá ido. Depois volta a haver uma outra transferência, agora de 400 000 contos, para pagamento das mesmas pensões, mas mesmo assim parece que esta verba não chega ao seu destino.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Governo que tanto apregoa o seu apoio à terceira idade, afinal nega a cerca de 22 000 pessoas o direito a receberem a actualização das suas pensões de reforma em tempo útil.
Lembro que esta actualização é devida desde Janeiro de 1982, portanto já são passados 7 meses. Mesmo que, neste momento, fosse dada a verba necessária para que os serviços da Caixa possam ultimar o processo, seriam ainda precisos alguns meses. O que quer dizer que, na melhor das hipóteses, este processo será resolvido em Outubro ou Novembro, com os graves prejuízos para os interessados que, na sua esmagadora maioria, tem reformas de 5000$ e pensões de 2500S.
É bom que esta Assembleia tenha conhecimento que desde Janeiro até hoje, já faleceram 8 % daqueles que esperaram por esse dinheiro que é seu!
Ocorre perguntar, estará o Governo propositadamente a atrasar d processo da actualização das pensões com o fito de as regularizar em vésperas de eleições? Com tal política e tal Governo, tudo é possível!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Marques.
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O Sr. Sousa Marques (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hesitei um pouco antes, de trazer à Assembleia da República algumas reflexões que, apesar de tudo. me parecem importantes. Mas o peso. que o debate, no período de antes da ordem do dia, está a tomar, não só dentro desta Assembleia, mas também fora dela, leva-me a tecer esta simples consideração: Será que algumas das nossas palavras, algumas daquelas razões que pensamos serem razões, valerão alguma coisa? Será que mais tarde os meios de comunicação social darão algum peso àquilo que aqui foi dito. àquilo que não foi discutido por causa do silêncio cúmplice ou comprometido daqueles que vão responder às acusações, dos que fogem a debater as nossas ideias?
Isto vem a propósito Sr. Presidente Srs. Deputados - e julgo que 2 ou 3 minutos chegarão para vos trazer esta preocupação - de uma 3.ª Guerra Mundial que tem vindo a ser anunciada e propagandeada pela Radiotelevisão Portuguesa.
Sei de pessoas que já desligaram o televisor. Sei de pessoas que sentem uma repugnância enorme e se sentem enojadas perante o espectáculo que esta televisão oferece com tanto orgulho e provavelmente, com tanta alegria ao povo português.
Sabemos que para certos espíritos existem, de um lado, os bons e do outro lado os maus.
Uma voz imperceptível do PSD.
Não ouvi este aparte que o Sr. Deputado disse mas se o quiser dizer de uma forma audível, teria muito prazer em discutir consigo esta matéria, Mas provavelmente não estará sequer interessado nisso. Estará apenas interessado em fazer um ruído de fundo pára que, pelo menos, uma parte da sua consciência fique tranquila.
Como estava a dizer, para alguns espíritos existem, de um lado, os bons e. do outro, os maus. Os maus são aqueles tipos terríveis que põem uma estrelinha na" testa, que matam velhos e crianças, que invadem os países estrangeiros, que estão preparados para dominar os Estados Unidos, que. enfim, para além de serem russos, ainda são comunistas. Os bons são os outros. São aqueles que estão em casa pacificamente, aqueles que querem construir um mundo de paz mas que são forçados a também tomar nas mãos as armas para defenderem a sua própria terra, para defenderem a paz no Mundo.
Nós já sabemos que, para alguns espíritos mais ou menos desiluminados é isto que se passa no Mundo.
A questão que se coloca - e que eu queria colocar - é bem outra. E a de saber como é possível, hoje, em Portugal, fazer-se a propaganda da guerra, defender-se a inevitabilidade da guerra, defender-se, perante ò povo português, de uma forma totalmente alienada e desinformativa, a inevitabilidade de uma 3.ª Guerra Mundial, a inevitabilidade de um holocausto' nuclear.
É esta para mim, a questão fundamental que está por detrás daqueles episódios que a televisão portuguesa rápida e pressurosamente foi encomendar não se sabe bem onde.
E esta parece-me que deve ser uma questão que deve preocupar a todos nós. É a de saber se temos alternativa, como homens que estamos vivos neste Mundo, como homens que, independentemente das nossas ideias, queremos que os nossos filhos e os nossos netos estejam vivos neste Mundo.
A questão que aqui coloco é a de saber se é inevitável um holocausto nuclear.
Já não coloco aqui a questão de saber se este holocausto nuclear vai começar pela invasão dos Estados Unidos da América por uns malandros, por uns criminosos, uns quaisquer homens que têm mais de animais, que são, capazes de matar criancinhas e velhinhos na sua passagem impiedosa. Já não coloco aqui essa questão, coloco sim outra. A questão da propaganda da guerra, a questão da inevitabilidade da guerra e, neste caso concreto, da inevitabilidade de um holocausto nuclear, porque é disto que se trata.
Nós já outro dia ficámos espantados - eu não fiquei espantado porque já perdi a possibilidade de me espantar com coisas destas, mas tive outros sentimentos que,, provavelmente, são comungados por pessoas de outras ideias bem diferentes das minhas - quando, na televisão portuguesa foi dito que a bomba que caiu em. Hiroshima foi a bomba da paz. E que foram contabilizadas as consequências da bomba atómica de Hiroshima e que dessa experiência resultou a salvação da humanidade e ainda, que salvou da morte muitos e muitos milhares de, seres humanos.
Agora é a 3.ª Guerra Mundial que nos entra pela porta dentro. Agora é a inevitabilidade do holocausto nuclear que nos entra pela mão da RTP de Proença de Carvalho. Já tenho conversado, acerca desta matéria com amigos, com familiares, com camaradas e com pessoas que não são meus camaradas ou minhas camaradas e, que provavelmente não o virão a ser nos tempos mais próximos. E, curiosamente, tem-se conseguido em todos estes diálogos um enorme consenso. Consenso em por um lado considerar isto que a televisão portuguesa nos apresenta como monstruoso e, por outro, considerar que isto que a televisão portuguesa está a fazer não pode ser impedido. E não pode ser porque certamente não basta um requerimento de qualquer deputado, não basta levantar isto na Assembleia da República, não bastará fazer marchas de protesto à frente dá televisão, não bastará que deputados da própria AD continuem a "engolir elefantes vivos- e a bater-se para que o Sr. Proença de Carvalho e a sua camarilha saiam da televisão portuguesa. Nada disso basta porque tudo aquilo que tem sido feito perante as monstruosidades, os arbítrios e as ilegalidades que se têm realizado na RTP não tem sido suficiente para alterar o estatuto, a prática política e dês i n formal vá da televisão "proencisia".
Poderá ser um acto "quixotesco" de aproveitar o período de antes da ordem do dia para aqui falar com a alma é o coração nas mãos. Poderá ser mais um acto "quixotesco" desta bancada. Poderá, certamente, ser mais um conjunto de palavras que vão cair- no poço da indiferença e do silêncio, até daqueles que não estão de acordo connosco, mas que, em coerência com as suas atitudes, deviam levantar a sua voz para oporem às nossas razões, às nossas ideias, as suas razões ou as suas ideias.
De qualquer modo. Sr. Presidente, Srs. Deputados, aproveitámos estes breves minutos e, perante aqueles deputados que. porventura, estão muito incomodados e até agoniados, peço as minhas humildes desculpas.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE
Neste momento, tomaram lugar na bancada do Governo, o Sr. Ministro da Justiça (Meneres Pimentel) e a Sr.ª Subsecretária de Estado Adjunto do Ministro para os Assuntos Parlamentares (Luisa Antas).
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para o limite do período de antes da ordem do dia faltam 3 minutos, pelo que suponho não ser compatível com qualquer intervenção.
Passamos, portanto, à ordem do dia.
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ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Na primeira parte do período da ordem do dia, temos um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre um ofício da Universidade Nova no qual se solicita autorização para que o Sr. Deputado Alberto Arons Braga de Carvalho exerça funções de assistente convidado na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da mesma Universidade.
Vai ser lido.
Foi lido. É o seguinte:
O Sr. Director da Universidade Nova de Lisboa solicitou a esta Assembleia que seja autorizado a exercer as funções de assistente convidado da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas daquela Universidade o Sr. Deputado Alberto Arons Braga dê Carvalho.
Nos termos do artigo 7.º do Estatuto dos Deputados, os deputados que sejam funcionários do Estado ou de outras pessoas colectivas públicas não podem exercer as respectivas funções durante o período de funcionamento efectivo da Assembleia.
Acresce, no entanto, que não se considera exercício de função pública o exercício gratuito de funções docentes no ensino superior.
A Universidade Nova de Lisboa é uma escola de ensino superior.
A simples aplicação do referido artigo 7.º obriga a concluir necessariamente que o exercício gratuito de funções docentes naquela escola não se considera exercício de função pública, podendo pois aquele Sr. Deputado, nas condições referidas de gratuitidade exercer as respectivas funções sem qualquer incompatibilidade com o exercício das funções de deputado.
Palácio de São Bento. 16 de Julho de 1982. - O Relator, Alfredo Pinto da Silva.
O Sr. Presidente: - Vamos proceder à respectiva votação.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, não estando presente a UDP.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Arons de Carvalho está. portanto, autorizado a exercer as funções de assistente convidado na Universidade Nova.
Há um outro relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, relativo à substituição de deputados. Vai ser lido pelo respectivo relator. Sr. Deputado Bento de Azevedo.
O Sr. Bento de Azevedo (PS): - O relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos é do seguinte teor: -
Em reunião realizada no dia 19 de Julho de 1982, pela 14 horas e 30 minutos, foram apreciadas as seguintes substituições:
l - Solicitada pelo Partido Social-Democrata:
Marília Morgado Raimundo (círculo eleitoral da Guarda), por José Assunção Marques. Esta substituição é pedida para os próximos dias 20 a 29 de Julho corrente, inclusive.
2- Solicitadas pelo Partido Socialista:
Manuel Trindade Reis (círculo eleitoral de Beja), por Luís Conceição Cacito. Esta substituição é pedida por um período não superior a 3 meses, a partir do próximo dia 20 de Julho, corrente, inclusive.
3 - Solicitadas pelo Partido do Centro Democrático Social:
José Manuel Rodrigues Casqueiro (círculo eleitoral de Portalegre), por Hélio Castro Pereira. Esta substituição é pedida para os próximos dias 20 a 22 de Julho corrente, inclusive.
4 - Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
5 - Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
6 - Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
7 - O presente relatório foi aprovado por maioria, com a abstenção do deputado da União Democrática Popular.
O Sr. Presidente: - Vamos proceder à votação.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, não estando presente u UDP.
O Sr. Presidente: - Passamos à ordem do dia, constando da continuação do debate da proposta de lei n.º 100/II.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente. Srs. Deputados. Sr. Ministro da Justiça: A Reforma Penal é sempre um momento particularmente alto na vida de uma colectividade politicamente organizada c. por isso. também na vida do Parlamento, expressão maior da sua representatividade democrática. É na hora da reforma penal que, de forma mais explícita, a comunidade assume a dialéctica da alteridade, da conformidade repressiva - mas legitimamente imposta - e das margens da tolerância. Se é certo, como sublinha um ilustre penalista alemão, que a reforma penal se realiza continuamente na experiência dos povos, não é menos exacto que a História regista período em que ela assume uma tensão particular. E o que vivemos é, claramente, um desses períodos: quer pela densidade do clima espiritual envolvente, quer pela amplitude e ousadia das transformações reclamadas, quer ainda pela dimensão do movimento de reforma, de escala praticamente universal. Bem pode. em síntese, afirmar-se que o período que a nossa geração protagoniza só terá tido paralelo naqueloutro. distante já cerca de dois séculos, quando, espreitando por sobre as ameias da velha monarquia repressiva com o lastro da barbárie das suas instituições penais, pensadores como Beccaria, Feuerbach e entre nós Pascoal de Mello Freire, tentaram levar ao problema criminal a luz e a racionalidade do humanismo iluminista.
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Sena monótono Sr Presidente. Srs Deputados, proceder a um elenco esgotante dos mais significativos eventos do movimento de reforma penal no plano comparistico Uma rápida e despretensiosa mirada será suficiente para se ganhar a perspectiva sobre a torça e o sentido do vento da reforma que nas ultimas 2 décadas, vem varrendo tanto o velho continente europeu como os novos continentes, tanto os sistemas jurídicos de índole continental como os de obediência ao modelo da common law e tanto os Estados de democracia do tipo ocidental como os países socialistas
Voz do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Assim, na Europa Ocidental a Alemanha e a Aústria lograram ao cabo de mais de 2 décadas de estudo e debate por em vigor desde I de Janeiro de 1975, novos códigos penais Entretanto a Espanha, a França, a Itália a Suíça e a Bélgica enquanto procuram dar forma definitiva aos projectos de Código Penal, vão, através de reformas parcelares dos capítulos mais importantes antecipando na pratica o sendo da reforma almejada De modo análogo se passam as coisas na Inglaterra, com destaque para os l sucessivos Criminal Justice Acts de 1961, 1967 e 1972 enquanto prosseguem as tentativas de codificação Nos Estados Unidos da America dispõem de códigos novos entre outros os seguintes estados federados Illinois (1961) Novo México (1961) Nova Iorque (1965) Connecticut e Kansas (1969) e Florida (1974) Em todos estes diplomas e visível a influenciado Model Penal Code apresentado em 1972 pelo American Law Institute Também nos Estados Unidos se desenvolvem esforços no sentido duma codificação unitária encontrando-se hoje em discussão na Camará dos Representantes um projecto do Código Federal Digna de menção nos parece ainda nesta sede a rica experiência desenvolvida pela generalidade dos países da America Latina em torno de um Código Penal Tipo, elaborado em 1971 com influencia marcante na legislação dos singulares países '
Nos países do bloco leste o movimento de reforma acelerou-se visivelmente a partir de 1958, data da publicação na União Soviética dos "Novos Principios Penais" Assim, em 1961 adoptaram novos Códigos Penais a União Soviética a Checoslováquia e a Hungria em 1968 a Republica Democrática Alemã a Bulgária e a Roménia, em 1969 a Polónia.
Não será difícil identificar um conjunto de linhas de fundo que - sem prejuízo das refracções particularizantes ditadas pelas idiossincracias historias e culturais de cada pais - são apesar de tudo comuns as experiências de todos eles Em primeiro lugar a procura de sistemas dogmáticos extremamente elaborados, todos alias, mais ou menos directamente tributários da conhecida doutrina alemã e do recorte quase filigrâmico dos seus conceitos tanto nos domínios da culpa como da ilicitude Isto, de resto em estreita conexão com a preocupação igualmente comum da maximização da tutela dos valores da liberdade e dignidade do homem eventualmente criminoso, valores de que os holocaustos dos meados do século nos deram uma consciência extremamente aguda.
Em segundo lugar estão as lições da criminologia e da política criminal modernas por que todas as legislações procuram alinhar Resumidamente, devem-se as mais recentes investigações criminológicas, por um lado, a convicção do profundo desfasamento entre o direito abstractamente legislado e o direito concretamente plasmado na realidade por obra das sucessivas instancias de controle social policia, Ministério Publico tribunais, administrações penitenciarias etc O que significa que o pretenso caracter geral e ideologicamente igualitário das leis criminais não garante sem mais. contra as eventuais injustiças e desigualdades efectivas da law in action a constatação das cifras negras da criminalidade e também, a constatação da desigualdade na aplicação da lei Deve-se ainda a nova criminologia a revelação dos custos humanos da experiência penal institucional designadamente da experiência penitenciaria Na verdade os estigmas resultantes da vivência intramuros acrescida da aprendizagem ai recebida podem frustrar irremediavelmente a ressocialização dos delinquentes E por isso se procla una voce a vantagem da limitação da pena de prisão ao mínimo imposto pelas necessidades da prevenção criminal
Por seu turno, a política criminal - por influencia já da própria criminologia, )a da chamada teoria critica da sociedade (Adorno Habermas ..) já das recentes correntes da psicanálise abertas ao político e ao sociológico (From, Plack Reiwald )- tem vindo sistematicamente a por em crise a legitimidade de extensas zonas da área tradicionalmente criminalizada Por isso se sustenta que o direito criminal deve na medida do possível sobrepor-se as linhas que marginam os núcleos de consenso próprios de toda a sociedade democraticamente institucionalizada O que implica que só pode recorrer-se ao direito criminal para a salvaguarda de valores ou interesses comunitários fundamentais - bens jurídicos - e nunca de particulares concepções moralistas ou construções ideológicas de vocação mais ou menos, confessadamente unicitana Como implica ainda o imperativo ético-politico de fazer( recuar o direito criminal para a ultima linha de defesa e promoção daqueles valores Com justeza se tala, por isso, do caracter necessariamente fragmentário do direito criminal como ultima ratio da política criminal
Não se poderá dizer, sem mais, que o projecto em analise se alimenta deste espirito Tal seria incorrecto por incompleto Pois a verdade e que também o projecto português, com as concepções doutrinarias e axiologico-politicas que lhe subjazem, tem contribuído activamente para o desenvolvimento daquele espirito universal Com efeito, se e certamente motivo de justificado orgulho, e seguramente imperativo de evidencia histórica reconhecer que. em matéria de doutrina penal e de política criminal, os cultores portugueses estiveram permanentemente na companhia dos pioneiros internacionais num dialogo em que não se limitaram a aprender Foi assim com o iluminismo de Mello Freire, o correccionalismo de Levy Mana Jordão, o cientismo-positivista de um Ferreira Deus-dado ou de um Júlio de Matos e o socialismo de um Afonso Costa E e assim já nos nossos dias com a obra de Beleza dos Santos Cavaleiro Ferreira, Eduardo Correia e Figueiredo Dias de cujos pensamentos não será difícil encontrar assomos inequívocos em muitas das soluções perfilhadas no projecto Isto sem esquecer o papel impar de Eduardo Correia obreiro da reforma a que, durante as 2 ultimas décadas, vem dedicando o melhor das suas energias e do seu reconhecido talento E sem esquecer outrossim que a reforma, a concretizar-se, não será apenas obra da Universidade Ela ficara igualmente a dever-se aos advogados magistrados e políticos portugueses
Destes últimos permito-me destacar Almeida Santos, Ministro da Justiça do I Governo Constítucional, Eduardo Correia, Ministro da Justiça do IV Governo Constítucional, e Meneres Pimentel Ministro da Justiça dos VII e VIII Governos Constitucionais, remetendo para os critérios
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salomónicas da história a tarefa sempre ingrata da repartição dos louros.
Isto posto, seria a hora de passar em revista as singulares disposições do projecto para sindicar a medida da sua conformidade com os ensinamentos das ciências penais e os valores de um Estado de Direito e de uma sociedade aberta. Tal tarefa, por certo a mais gratificante do ponto de vista espiritual, escapa contudo aos apertados limites desta intervenção. Ela já foi sumariamente realizada, quanto à parte geral, pelo Sr. Ministro da Justiça.
Impossibilitados de fazer mais, limitar-nos-emos, no que à parte especial concerne, a expressar o sentido francamente positivo das nossas conclusões. Permitimo-nos, a propósito, sublinhar o sentido saudavelmente inovador da nova sistematização adoptada, conferindo o primado emblemático aos valores fundamentais do homem: a vida, a liberdade, a integridade física e moral, a reserva da vida privada, etc.
O projecto mostra-se, por outro lado, atento aos perigos da moderna sociedade técnica que eleva assustadoramente as cotas de risco da convivência humana e propicia, por exemplo, meios particularmente agressivos de devassa da priviticidade humana. Daí o privilégio concedido aos crimes de perigo comum (artigos 253.º e seguintes) e a incriminação das condutas mais intoleravelmente devassadoras da reserva da vida privada (artigos 176.º e seguintes).
Inovador e de apoiar é também todo o título III, "Dós crimes contra a paz e a humanidade", bem como a secção III do capítulo l do título III, "Da violação de dever de solidariedade social". Recorde-se quanto, a esta última, a punição da omissão de auxílio que ela significa, no plano técnico-dogmático a equiparação da omissão à acção, e, no plano material, a conversão em dever - ser jurídico, do imperativo ético da solidariedade existencial ou, como outros preferirão, do mandamento da caridade. Sublinhamos, por último, a índole saudavelmente inovadora da secção dedicada aos crimes sexuais (artigos 201.º e seguintes). Do que aí se trata é apenas - e bem, a nosso modo de ver- da tutela jurídico-penal da liberdade e autenticidade da expressão humana em matéria sexual, e não de quaisquer cartilhas moralistas. Daí o privilégio concedido ao crime de violação, significativamente punido com pena igual à do direito vigente - prisão de 2 a 8 anos -, não obstante o recuo intencional de todas as penas de prisão e de todas as penas em geral.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Duas observações finais para antecipar a resposta a outras tantas objecções possíveis, e um apelo.
Falar-se-á e com razão, no excessivo optimismo que perpassa lodo o projecto. Só que, não se trata de um defeito mas de uma virtude que se assume. Na verdade, o projecto declina a inarredável necessidade de acreditar na bondade e na capacidade de recuperação do homem. Sob pena de nos condenarmos - como afirmava já a propósito de discussão idêntica, um ilustre antecessor nosso, o deputado Almeida Garrett - a fugir, não sabemos bem para onde ...
Em segundo lugar, ninguém nos poderá acusar, a justo título, do pecado anti-histórico do narcisismo. Temos consciência da relatividade das coisas, e sabemos que, no dia em que se acreditar ter atingido soluções definitivas, terá chegado, aqui como em todos os outros domínios, p último estertor, como para Fausto.
Um apelo, por último, aos colegas deputados. Oxalá eles saibam como políticos, à semelhança do que fizeram os estudiosos, pôr entre parêntesis as suas divergências ideológicas e dar o seu apoio a um projecto que - ousamos acreditar - merece o seu aval tanto no aspecto técnico como no substancial.
Aplausos do PSD do CDS e do PPM.
Sr. Presidente, esta era a declaração com que o Partido Social-Democrata se propunha contribuir para a matéria em debate.
Entretanto o debate já tomou o seu curso, já foram feitas algumas intervenções, e mal seria que da nossa parte nos furtássemos a ele.
Por isso não resistimos, neste momento, à oportunidade de dar a nossa resposta a algumas das intervenções já aqui feitas.
Já que na última sessão dissemos alguma coisa sobre a intervenção do Sr. Deputado Armando Lopes do Partido Socialista, cumpre-nos dar agora algumas respostas às intervenções entretanto feitas começando, privilegiando-a, pela do Sr. Deputado António Taborda, do MDP/CDE.
Lamentamos, naturalmente, a sua ausência. Não é nossa intenção trair pelas costas, mas o debate das ideias não pode estar sujeito às contingências de estarmos ou não presentes. De resto, tivemos oportunidade de dizer na altura, que admirámos a intervenção do Sr. Deputado tanto pelo seu nível, como pela seriedade das criticas - seriedade que estimula a nossa própria resposta.
De resto, da longa intervenção do Sr. Deputado, 7 das 10 páginas dactilografadas são dedicadas às vantagens e elogio do projecto do diploma e as outras 3 são de crítica.
E em relação a estas 3 que gostaríamos de nos pronunciar agora.
Designadamente, começa o Sr. Deputado por falar do chamado abrandamento da punição da homossexualidade - isto ainda numa fase de transição da intervenção, onde, a meias com o elogio, começa a crítica.
De resto, esta crítica é incorrecta e não inteiramente pertinente.
Na verdade, o projecto não estabelece um abrandamento em matéria de homossexualidade, pelo contrário, elimina completamente a sua punição.
Não é por acaso que, nos projectos apresentados pelo Prof. Eduardo Correia, a rubrica do artigo que tipificava essa matéria era "homossexualidade".
Agora, a homossexualidade como tal - portanto, as práticas homossexuais praticadas livremente por adultos e em privado - não é objecto de incriminação.
Apenas se incrimina, e bem segundo o nosso modo de ver, a homossexualidade praticada entre adultos e menores, e apenas em relação aos primeiros, o que é coisa corripletamente diferente.
É de resto nesta matéria, dos chamados crimes sexuais, que o projecto é, segundo nós, mais aberto e mais progressivo, levando muito mais longe as propostas avançadas pelo projecto do Prof. Eduardo Correia.
Recordo, a propósito, o que se passa com o crime de violação: segundo o projecto do Prof. Eduardo Correia, este crime tinha ainda o recorte tradicional que era - e vou ler - "quem tiver cópula fora do casamento com mulher [...]": agora eliminou-se, e bem a nosso modo de ver, o inciso "[...] fora do casamento [...]". por razões que. penso eu. todos considerarão óbvias.
O Sr. Deputado António Taborda também criticou o facto de o Código não conter os delitos antieconómicos, além de afirmar que o legislador actual, da maioria, se prepara para remeter os crimes contra a economia para essa zona cinzenta dos chamados delitos de mera ordenação social.
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Não é verdade.
Pelo contrário aquelas condutas, cuja danosidade social e manifestamente reconhecida, cujo recorte, concretização e tipificação e, a luz dos conhecimentos técnico-jurídicos, já possível, e cuja ressonância na consciência geral da colectividade portuguesa e já hoje evidente, continuam a constituir crimes contra a economia
Penso pelo contrario - e a luz das propostas de lei também já apresentadas nesta Câmara -, que o Governo, através do Sr. Ministro da Agricultura, Comercio e Pescas, tem uma proposta de lei sobre os crimes contra a economia onde naturalmente se mantém a criminalização do açambarcamento da especulação, etc agravando as penas e introduzindo de harmonia com as exigências postas pela evolução da economia em Portugal, novos tipos de crimes como, por exemplo o grande problema das fraudes em matéria de subvenções ou subsídios
Os Srs. Deputados sabem, tão bem como eu, que a moderna economia não prescinde de subsídios em muitos sectores e conhecem as possibilidades que esses subsídios abrem para intervenções menos escrupulosas E não só para obtenção indevida desses subsídios, como também para a utilização indevida dos fundos obtidos por esses meios.
Essa matéria deve naturalmente, ser criminalizada porque se trata de um evidente abuso dos dinheiros públicos.
Portanto quando se tala da criação do direito de mera ordenação social e da eventual necessidade de remeter para ai muitas condutas - naturalmente próprias da vida económica - não tem nada que ver com a dignidade ou não dignidade penal
Tudo esta sem saber em que medida o legislador é capaz de recortar em cada matéria designadamente na matéria económica - que e aquela a que as bancadas da oposição são mais sensíveis - tipos de crime com verdadeira dignidade penal e depois defini-los
Não basta definir em abstracto, crimes contra a economia.
Toda a gente sabe - e não ha nisto qualquer lastro ideológico - que os governos de Vasco Gonçalves foram os que mais recorreram a criminalização das actividades económicas Só que o fizeram com total insucesso porque toda a gente sabe que o domínio da actividade económica, dos operadores económicos - o domínio do White collar cume - e também o domínio dos mais possidentes E são também os mais possidentes os que conseguem manipular os melhores consultores jurídicos
Ora numa legislação criminal deficientemente elaborada - sobretudo com a Constituição que temos, com os rigorosos princípios da proporcionalidade, de rigor e de tipicidade - e extremamente difícil definir os crimes contra a economia Não e por acaso que ao longo de vários anos de governo não da AD não foram os governos socialistas, nem os provisórios, capazes de progressos sensíveis nesta matéria
Se exceptuamos o Decreto-Lei n.º 129-A, de 10 de Julho de 1974 e o Decreto-Lei n. º 75-Q/75 - do governo do Ministro António Barreto, todas as tentativas feitas para uma legislação de fundo para uma substituição do Decreto-Lei n º 41 204 - sobre o regime geral dos crimes contra a economia não conseguiram ainda uma tipificação clara
E não basta, para satisfazermos a nossa boa consciência, para termos um guarda-nocturno a nossa cabeceira, dizer que temos as actividades ilícitas contra a economia, criminalizadas
Era vulgar no tempo do governo de Vasco Gonçalves fazer um diploma, um conjunto de disposições em matéria de economia, e depois dizer no fim que - era sempre um artigo sacramental - quem desobedecesse aos dispositivos destes preceitos são punidos com pena de prisão de tal a tal
Escusado será dizer que nunca ninguém foi punido por aqueles diplomas, não obstante o período em que se vivia.
O Sr Presidente: - Sr Deputado, dá-me licença que o interrompa!
Era só para o prevenir de que do tempo do seu partido restam 2 minutos
O Orador: - Bom, Sr Presidente, Srs Deputados, limitações obvias levam-me a abreviar estas considerações
Outro ponto que nos merecia alguma observação, era o que o Sr Deputado António Taborda referiu sobre o inadimplemento da obrigação duma entidade patronal de pagar o salário ao seu trabalhador dever ser incriminado como um roubo puro e simples
É evidente que isto não resiste a mínima observação com rigor nesta matéria
Por outro lado o Sr Deputado disse - e também aqui se trata de pura opção ideológica - a propósito daquilo que ele pretendeu ver na conversão dos chamados crimes contra a propriedade que agora o Governo, eufemisticamente, lhe chama apenas crimes contra o património
Não e verdade uma simples leitura do projecto mostraria a improcedência desta observação
Na verdade o titulo IV do projecto, diz o seguinte "Dos crimes contra o património" capitulo l, Dos crimes contra a propriedade.
Tinha que ser assim. Sr Presidente e Srs. Deputados.
E que os crimes contra o património podem ser crimes contra a propriedade, mas também podem não ser
Há crimes contra o património em geral, que não lesam a propriedade, mas lesam a posse, o usufruto, o destino natural de determinados bens (e o caso da infidelidade).
Não se trata de uma opção ideológica, como o Sr Deputado pretendeu ver, mas apenas de uma correcção de rigor mínimo
De entre os crimes contra o património ha crimes contra a propriedade Não se fugiu a rubrica "crimes contra a propriedade apenas se arrumou".
Não podíamos, naturalmente Sr Presidente, Srs Deputados, furtar-nos a uma ultima questão que e aquela em que o debate, nos meios de comunicação social e mesmo na opinião publica, mais se tem desenvolvido e que e a questão do aborto
Isto merece-me algumas observações E evidente que, dada a natureza das coisas e com a actual maioria, não e possível uma lei de liberalização do aborto
Independentemente das nossas opções pessoais - e eu já assumi varias vezes a minha - não e possível, neste momento, uma lei geral de descriminalização, de legalização do aborto As coisas são o que são
Tudo esta em saber se, a pretexto desta pequena reserva, se deve fazer naufragar uma inovação legislativa tão importante como essa
E nossa convicção que sim Convicção tanto mais justificada como e certo que um dia, a haver outra maioria, facilmente poderá, com uma simples reforma, mexer em 2 ou 3 artigos do Código Penal e pô-lo em plena sintoma com as suas opções ideológicas
De resto, ficaria mal com a minha consciência, se deixasse de dizer isto - a terminar -, para satisfazer um
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bocado, para contribuir um pouco para a alegria dos deputados do Partido Comunista
O problema do aborto agita-se em Portugal desde sempre, mas com particular acuidade desde 1974
Nesta Assembleia o problema de descriminalização, da despenalização, de legalização do aborto - conceitos que para o leigo, aparentemente são idênticos -, agita-se aqui desde 1974
Lembro-me de Diversissímas intervenções do Sr Deputado da UDP e de apelos a maioria de esquerda que na altura existia, para que se fizesse uma lei de despenalização do aborto, que se fana rapidíssimamente
A maioria que estava a favor do abono, ou dizia que estava, tinha todas as possibilidades
Apesar disso, a verdade e que essa maioria nunca deu ouvidos a urgência desse tipo de reforma
Nunca vi antes do acesso ao governo da actual maioria, e quanto o Partido Comunista e o Partido Socialista tinham a maioria nesta Câmara uma mínima motivação para tratar o tema do aborto
Isto permite desculpem-me mas factos são factos, pôr um pouco em causa a autenticidade desta situação, não obstante a seriedade de trabalho que esta por trás do projecto de lei do Partido Comunista que, do ponto de vista técnico nos merece todo o respeito e em que se nota um grande trabalho e uma grande seriedade
Isto não pode deixar de nos fazer dizer o seguinte por que e que, afinal, quando o Partido Comunista podia facilmente fazer passar a lei não a activou, e e agora, que sabe que a não pode fazer, que tanto se mobiliza a favor disto
Intenção seria de modificar aquilo que lhes parece errado, ou o propósito político naturalmente legitimo - mas menos louvável -, de criar dificuldades no terreno do adversário.
Aplausos do PSD do CDS e do PPM
O Sr Presidente: - O Sr Deputado excedeu em 4 minutos o tempo global Desconta 3 minutos, mas e certo, também que a Mesa ficou atribuída uma certa flexibilidade para atribuição dos tempos e não me parece nada escandaloso ter excedido l minuto
De qualquer maneira agora inscreveram-se para pedir esclarecimentos o Sr Deputado Lino Lima e a Sr.ª Deputada Zita Seabra Isto complica as coisas, pois o Partido Comunista já excedeu em 2 minutos o seu tempo global.
É evidente que a disposição da Mesa e de uma certa flexibilidade, mas, em todo o caso, não me sinto habilitado a abrir assim indiscriminadamente, o tempo de debate que foi acordado.
Tem a palavra o Sr Deputado Lino Lima-
O Sr Lino Lima (PCP) - Sr Presidente, Srs Deputados Aquilo que o Sr Presidente acaba de referir, quanto a exceder tempos, põe mais uma vez em evidência as criticas que fizemos ao processo seguido pelo Governo para publicar estes diplomas
Parece incrível que, para diplomas de tal natureza de tal importância para o ordenamento jurídico português, estejamos aqui a olhar para o relógio, a ter que fazer intervenções rápidas - evidentemente que não e por culpa do Sr. Presidente.
O Sr Presidente: - Oh Sr Deputado isso foi acordado entre todos
O Orador: - Sei o que foi deliberado. Sr Presidente Não estou a pôr em causa nada daquilo que o Sr Presidente esta a dizer
Estou a tirar as consequências políticas daquilo que o Sr Presidente disse muito verdadeiramente
Encontramo-nos, portanto, na situação de eu desejar fazer perguntas ao Sr Deputado Costa Andrade havendo grande interesse em que respondesse, e ele ía não ter tempo para o fazer, a não ser por um favor de outros partidos ou da Mesa
Eu próprio, diz o Sr Presidente já esgotei o tempo e ainda esta inscrita a minha camarada Zita Seabra para fazer uma intervenção
Isto serve para eu fazer o seguinte apelo aos presidentes dos grupos parlamentares alterem o acordo a que chegaram, de forma a que a gente possa, pelo menos fazer um arremedo de debate digno
O Sr. Presidente: - Sr Deputado, isso pode ser decidido em Conferência dos Presidentes de Grupos Parlamentares E se o Sr Deputado insiste no seu ponto de vista eu não tenho objecção de a convocar
Em todo o caso, peço licença para observar que não me parece aqui no Plenário, e em termos de indefinição a partida, seja um método pratico de alterar posições duma conferência que ainda esta manhã reuniu
O Orador: - Sr Presidente, eu ate sou capa? de estar de acordo com o Sr Presidente, mas o que penso e que a razão política que invoquei e suficiente para nos por perante a crueza desta situação
Nós não estamos aqui a debater uma lei qualquer
Até infelizmente, nem estamos a debater o Código Penal.
Estamos a debater uma simples autorização legislativa quando devíamos estar a debater o projecto de alteração do Código Penal
Mas pelo menos façamos um esforço - e parece que o Sr Ministro da Justiça esta aberto a fazê-lo - para que isto não seja assim como uma corrida porque na verdade trata-se de um diploma de extraordinária importância para o povo português
O Sr. César de Oliveira (UEDS) - Muito bem!
O Orador: - Bem Sr Deputado Costa Andrade eu não sei se lhe deva fazer perguntas se não nem se o senhor me pode responder ou não
E se o Sr Deputado não me pode responder para que e que lhe hei-de fazer perguntas.
O Sr. Costa Andrade (PSD) - Tentaria num minuto responder.
O Orador: - Não sei e efectivamente encontro-me numa situação bastante desagradável e atrapalhada porque eu tinha efectivamente interesse, não em fazer uma pretensa figura a fazer perguntas ao Sr Deputado Costa Andrade, mas a ouvi-lo, a ele. a responder, que e um técnico e um penalista e, portanto tem grande importância a opinião que ele transmita a esta Câmara e através dela a opinião publica
O Sr. Presidente: - Mas oh! Sr. Deputado Lino Lima quanto tempo e que o Sr Deputado entende que precisaria para fazer essas perguntas.
Naturalmente poderia fazer perguntas durante meia hora Não tenho duvida nenhuma
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E o Sr. Deputado Costa Andrade poderia utilizar 2 horas ou 3 a responder, e. certamente, com interesse para o Sr Deputado Lino Lima e para todos nos
Não sei qual e a dimensão do problema que o Sr Deputado Lino Lima me esta a pôr
O Orador: - Oh Sr Presidente eu creio merecer-lhe a ideia de que nunca fui exagerado.
O Sr. Presidente: - E que eu considero que esta perfeitamente ao alcance do Sr Deputado Lino Lima da sua competência, e da do Sr Deputado Costa Andrade, um debate de horas
O Orador: - Eu vou fazer perguntas muito sintéticas, que alias tenho aqui deduzidas, em 2 ou 3 minutos.
O Sr. Presidente: - Bom então em 2 ou 3 minutos já podia tê-las feito!
3 minutos já lá vão.
Faça o favor.
O Sr Manuel Pereira (PSD) - Dá-me licença. Sr Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça o favor Sr Deputado
O Sr. Manuel Pereira (PSD): -Sr. Presidente só com uma condição que e a de que o Sr Deputado Costa Andrade goze dos mesmos benefícios que o Sr' Deputado Lino Lima
O Sr. Presidente: - Sim claro.
Bom claro então 3 minutos para cada um e depois reapreciamos a questão se for caso disso.
Tem a palavra o Sr Deputado Lino Lima para pedir esclarecimentos.
O Sr. Lino Lima (PCP): - Sr. Deputado Costa Andrade ou compreendo perfeitamente a sua alegria a alegria que transparece do seu discurso porque efectivamente, na pane geral o projecto do Código Penal traz novidades.
Mas eu gostaria muito concretamente que me dissesse o seguinte o que e que o Sr Deputado pensa relativamente a tipicidade vaga dos crimes chamados contra a segurança das comunicações e contra a ordem e tranquilidade publica - que aliás já foi motivo de largo debate aqui ao tempo da discussão da chamada lei antiterrorista.
Outra questão o que e que pensa o Sr Deputado das contradições que eu referi na minha intervenção da parte especial - e pondo já de parte o problema do aborto - como por exemplo a proclamação da defesa penal da mulher gravida mas a discriminação do sancionamento da omissão de assistência material pelo progenitor, consoante seja casada ou solteira (caso dos artigos 197 º e 198 º), ou ainda quando se tala em defesa de garantia mas não se incrimina a dissipação do património para frustar o direito a alimentos, a meação e aos direitos legitimados.
Uma terceira pergunta, e para mim fundamental que tratei com especial relevo na minha intenção como justifica o Sr Deputado que se tenha esvaziado o Código Penal de normas de protecção aos valores de direito de trabalho?
Pensa que não se justifica Pensa que esta tora das tradições do novo Código Penal, da nova legislação penal O que pensa disto.
E finalmente Sr Deputado nenhum de nos desconhece e todos estamos de acordo com o que pode significar uma lei como actividade propulsora para a transformação de uma determinada sociedade
Mas leis deste género executam-se com estruturas.
Não o preocupa. Sr. Deputado, a pobreza das nossas estruturas - apropriadas para dar execução ao Código, a pane geral do Código ao novo sistema jurídico -, a falta de meios financeiros de que dispomos e toda a panóplia de funcionários de diferentes graus de competência e categorias que vão assegurar a reinserção social do criminoso.
Não o preocupa esta situação.
E Se, como o anunciou o Sr Ministro da Justiça, este Código entrar em vigor no dia l de Janeiro de 1983, haverá efectivamente tempo para renovar as estruturas para preparar pessoal.
Isso não cria em si ansiedade e angustia!
Que consequências podem advir da circunstância de entrar em vigor a pane geral do Código com um novo sistema punitivo tão variado e tão diferente do actual e sem estruturas que sejam capazes de lhe dar execução'
O que pode Suceder ai?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr Presidente: - Sr Deputado falou efectivamente durante 3 minutos Dou agora a palavra a Sr a Deputada Zita Seabra sabendo de antemão, que vai referir os mesmos argumentos do Sr Deputado Lino Lima.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP) - Sr Presidente, vou usar da palavra apenas durante 30 segundos.
O Sr Presidente: - De acordo Sr.ª Deputada, tem a palavra A seguir terá a palavra o Sr Deputado Costa Andrade para responder aos Srs Deputados e por igual tempo.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP) - Sr Presidente Sr Deputado Costa Andrade Perguntou o Sr Deputado porque razão só agora quando ha uma maioria AD na Assembleia da Republica vem o PCP levantar a questão da legalização do aborto
A resposta Sr Deputado tenho-a dado em numerosos locais e numerosas vezes
Desde sempre desde o 25 de Abril e mesmo antes, estava previsto que o projecto do Código Penal que viesse alterar o velho Código Penal legalizaria ou pelo menos, despenalizava o aborto terapêutico alterando o artigo 358.º do Código Penal Desde sempre houve esse consenso e quanto a nos essa era a solução ideal - não politizamos não partidarizámos e quando o pais desse por isso a questão estava resolvida.
Era assim que estava previsto no projecto do Prol Eduardo Correia a antes do 25 de Abril estava assim no projecto do mesmo professor apôs o 25 de Abril ha afirmações proferidas pelo Dr. Almeida Santos quando foi Ministro da Justiça no mesmo sentido Havia pois, esse largo consenso de que seria assim
Em Outubro deste ano o Sr Ministro Meneres Pimentel anunciou que iria entregar o projecto do Código Penal e que o artigo 358 º não seria alterado Então, aceleramos os nossos trabalhos e em Fevereiro fizémos entrega do projecto-lei de legalização da interrupção voluntária da gravidez E no fundo tudo tão simples e tão claro, Sr Deputado que não deve neste caso, imputar-nos intenções políticas porque em boa verdade as não temos
Vozes do PCP: - Muito bem!
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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade. Como sabe. Sr. Deputado, tem 3 minutos para responder ao Sr. Deputado Lino Lima e mais 2 minutos para responder à Sr.ª Deputada Zita Seabra.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino Lima: Começo por lhe agradecer as qualificações que teve a amabilidade de fazer em relação à minha pessoa. É evidente que, sendo eu um estudioso destas matérias, procurarei também, na medida do possível, fazer uma intervenção diferente daquelas que habitualmente são feitas e, a que eu próprio não me furto quando se trata, apenas, de matéria política e não de matéria técnica.
Sr. Deputado Lino lima, ao abordar a reforma penal em geral, desde os países de sistema capitalista aos países de sistema socialista procurei abordá-la no plano mais objectivo e mais neutro possível. Foi esta a base de que parti. Sr. Deputado e que tentei cumprir na medida do possível - eu não sou daqueles que acreditam na neutralidade absoluta das ciências e, sobretudo, das ciências humanas. Na verdade, por mais que nos esforcemos por despir as nossas motivações ideológicas, elas, dizem os entendidos, estão aí e, portanto, mais correcto do que tentar alijá-los será, pelo menos, partir do pressuposto que nos influenciam.
Sr. Deputado, começaria pela última das suas perguntas e que é, talvez, a que mais nos preocupa. É evidentemente. Sr. Deputado, e usando as suas palavras "preocupa-nos a adequação das estruturas à implementação do novo Código". É verdade que isto me angustia. E penso que deve angustiar todos os portugueses. Permito-me fazer apenas duas observações quanto a este facto: em primeiro lugar penso que. apesar de tudo é necessária uma certa dose de optimismo para se fazer alguma coisa. Em segundo lugar - e esta observação é, naturalmente, já mais política - se o Sr. Deputado reparar bem, é nesse domínio das estruturas que os verdadeiros problemas se põem. Mas, é nesse domínio que todos, afinal, estamos de acordo, é exactamente em relação à parte geral! Afinal critica-se um projecto do Código Penal do Governo porque na parte especial inovou um pouco em relação ao seu autor - o que até e verdade, e em meu entender, bem nalguns aspectos -. porque na parte geral não tem mérito e quanto a essa todos estamos de acordo. Aliás, essa parte geral já foi aqui apresentada na proposta de lei n.º 117/77, pelo então Ministro Almeida Santos. É, Sr. Deputado, a parte geral que suscita esses problemas. Mas, ou todos estamos de acordo em que essa pane geral é boa e todos estamos de acordo em correr esse risco, ou, então temos de fazer clivagens nos nossos estilos de argumentação.
E Sr. Deputado devo dizer-lhe ainda mais uma coisa: por mais que a realidade se venha a afastar do projecto de Código a que nos propomos dar corpo, de certeza que o abismo entre a realidade a criar e aquilo que o legislador intencionará, há-de, por certo, ser menor que o desfasamento entre o Código vigente e a realidade prática. Não é suficiente ...
O Sr. Lino Lima (PCP): - Dá-me licença, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça o favor. Sr. Deputado.
O Sr. Lino Lima (PCP): - Sr. Deputado, queria apenas perguntar-lhe se não admite que havia a possibilidade de diminuir os riscos se, por exemplo, se estabelecesse um período de vacatio que permitisse a implantação de um mínimo de estruturas capazes?
O Sr. Orador: - Sr. Deputado, com certeza que sim!
Mas quanto à entrada em vigor ou não entrada em vigor, o Sr. Deputado concordará comigo que é um problema em que confiamos no critério e no juízo de oportunidade do Governo, que responsavelmente, decidirá; e, se entender, no momento de publicação do diploma que não há condições para a entrada em vigor - l de Janeiro - fará diferir o prazo por mais alguns meses, mais meio ano; mas. Sr. Deputado, esse e o risco que o Ministro, como político e como governante, assume perante a colectividade. Calcular mal os riscos ou dar má resposta e um problema de governação. Mas. estou de acordo com o Sr. Deputado.
Eu próprio, se fosse governante, com um problema deste, também teria as minhas noites sem sono. Essas são as dores do Sr. Ministro da Justiça e. não serei eu a tomá-las!
Sr. Deputado, como estava a dizer-lhe, por mais que a realidade venha a afastar-se da lei, de certeza absoluta não se afasta mais do que a realidade que hoje se pratica nos tribunais se afasta do Código vigente. Ou, o Sr. Deputado, como bom jurista que é. advogado cheio de êxito que foi. não se apercebeu pela sua experiência do abismo que há entre o actual Código e aquilo que se pratica? Não se apercebeu do tipo de molduras penais que o Código prevê e daquelas que se praticam? Não se apercebeu do tipo de argumentos e racionalizações a que o próprio juiz recorre para fazer justiça por suas mãos, praeter legem, em detrimento do antigo Código? Há milhentos expedientes e quando outros não existem, basta ir para um expediente que dá sempre - a situação da prova. É extremamente fácil, encontrando primeiro a solução que, em si, é teoricamente justa; depois, dado que o Código não o permite, é através da prova que se alcança a solução. E. tudo isto é demonstrado por estudos sociológicos feitos sobre a prática dos nossos tribunais. Esse risco existe. Sr. Deputado, mas não devemos exagerá-lo!
Foi este um dos aspectos que foquei na minha intervenção - a existência de um certo desfasamento entre a realidade legislada e a realidade que conseguimos pôr em marcha. E. Sr. Deputado, um risco que vale a pena correr.
Apesar de já ter acendido o sinal vermelho queria apenas responder, rapidamente, à Sr.ª Deputada Zita Seabra. A sua resposta. Sr.ª Deputada, é uma resposta. E, evidentemente, cada um a assumirá com o mérito que ela própria contém e algum tem, mas não deixa, apesar de tudo. de legitimar uma cena reinversão da pergunta - porque é que estando o Partido Comunista tão empenhado na defesa da liberalização, legalização, ou despenalização do aborto, e sabendo que isso constava do projecto deste Código Penal, nunca (e isto é verdade) se mobilizou seriamente ou fez qualquer exigência quanto à necessidade de inovar em matéria penal?
Durante a intervenção, assumiu u Presidência o Sr. Vice-Presidente Américo de Sá.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma intervenção a Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes.
A Sr.ª Teresa Santa Clara Gomes (UEDS): - Sr. Presidente Srs. Deputados, Sr. Ministro da Justiça:
Todos temos presente que foi, há poucas semanas, votada nesta Câmara uma alteração ao artigo 68.º da Constituição que passou a ser redigido nos seguintes termos: "A ma-
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ternidade e a fraternidade constituem valores sociais eminentes.
Julgamos compreender que esta nova formulação do preceito constitucional (até agora a Lei Fundamental consagrava apenas, como sabemos, o valor social da maternidade) não é uma simples flor de retórica, mas um novo referencial objectivo a que nenhuma lei ordinária poderá fugir.
E pois à luz desse novo preceito constitucional que me proponho, em nome do Grupo Parlamentar da UEDS. formular ao Sr. Ministro da Justiça algumas questões relativas ao capítulo do projecto do Código Penal intitulado "Dos crimes contra a vida uterina".
Que conteúdo tem para o Sr. Ministro da Justiça o valor social da paternidade?
Refere-se esse valor, apenas, aos filhos já' nascidos ou admite o Sr. Ministro que o pai é socialmente responsável desde o acto da concepção de um filho?
No caso de não admitir a responsabilidade dó pai durante o período de vida intra-uterina, como justifica ó Sr. Ministro essa posição? Que limites tem, para o Sr. Ministro o conceito de responsabilidade paterna?
No caso de admitir que o casal - pai e mãe - é igualmente responsável pela vida de um filho desde a sua concepção, como justifica o Sr. Ministro que só a mulher seja penalizada pela prática do aborto? Considera o Sr. Ministro que os artigos 139.º, 140.º e 141.º do projecto do Código Penal estão de acordo com o espírito e com a letra do novo artigo da Constituição?
Ao formular estas questões não pretendo, como é óbvio, pugnar aqui por que a pena de 3 anos de cadeia por crime de aborto passe a ser aplicada aos Homens nos mesmos termos em que é aplicada às mulheres. Pretendo apenas apontar, unia vez mais. o carácter caduco da legislação tradicional nesta matéria.
A mesma interrogação pode. aliás, ser formulada noutros termos:
Tem o Sr. Ministro consciência de que á consagração na lei de uma pena que unicamente se aplica às mulheres relativamente a um acto de que já (ou devia ser) moralmente responsável o casal e não apenas a mulher - é um preceito profundamente discriminatórios logo, também por essa via contrário ao princípio da igualdade entre os cidadãos consagrado na Constituição?
Tem o Sr. Ministro consciência de que essa discriminação é fruto de uma mentalidade ultrapassada, diria mesmo arcaica, segundo a qual a mulher era olhada como mero objecto de reprodução e prazer é não como um ser com plena dignidade e responsabilidade cívica e social?
Como compatibiliza ó Sr. Ministro este preceito discriminatório com a moderna legislação europeia - e internacional - sobre a igualdade de direitos das mulheres? Como explica que a nossa legislação defenda u igualdade de direitos e deveres entre os sexos em tantos outros domínios (a nossa legislação é francamente progressista em matéria de defesa dos direitos das mulheres) e manter nesta área um princípio que entra em contradição flagrante ,com essa mesma noção de igualdade?
A segunda série de questões que pretendo colocar-lhe. Sr. Ministro, refere-se ao princípio do direito à vida, que o Sr. Ministro aqui e noutros lugares tem evocado como subjacente à questão da penalização do aborto.
Penso que é desnecessário dizer que também eu defendo intransigente esse dito. A questão está na melhor maneira de o defender. Se se tratasse de uma mera afirmação teórica de princípios, seria certamente mais fácil chegarmos a um acordo. Em nome desse direito (direito à vida) como encara o Sr. Ministro a situação "pragmática- que é a existência de mais de 100000 abortos clandestinos anualmente praticados entre nós em condições que são, na maioria dos casos, atentatórios não só da dignidade moral das mulheres mas da própria integridade física dessas mulheres?
Considera o Sr: Ministro que o novo Código Penal vem, de algum modo contribuir, para atenuar os efeitos desta situação? Se sim. de que maneira? Se não. como justifica o Sr. Ministro que a aplicação da lei venha, na prática, favorecer situações que são obviamente contrárias aos fins que a própria lei se propõe salvaguardar?
Uma última questão, Sr. Ministro ainda em nome da defesa do direito à vida: como explica o Sr. Ministro que tenha sido retirado dó projecto do Código Penal a referência ao aborto terapêutico que constava de versão do projecto Eduardo Correia, de 1979 e que tenha sido mantida a atenuante relativa à "desonradas mulheres"?
Considera o Sr. Ministro que a vida da mulher é um bem menor do que aquilo a que no Código se chama a "desonra da mulher"?
A que artigo do capítulo v (intitulado "Dos crimes contra a honra") se refere no conceito de desonra inserto na alínea 3) do artigo 140.º?
Quem "desonra" quem? Admite o Sr. Ministro, para efeitos do Código Penal, em qualquer situação, o conceito de "bem desonrado"?
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Estas. Sr Presidente e Srs. Deputados; algumas das questões que aqui deixo ao Sr. Ministro da Justiça. Poderão não ter resposta imediata (o tempo de que o Governo dispõe e apenas de 4 minutos, infelizmente). Espero, no entanto, que possam vir a ser objecto de ponderação e de reflexão por parte dos autores do projecto. Se o não forem, o nosso Código Penal poderá apresentar--se como moderno, e mesmo pioneiro, em outros aspectos, conforme foi aqui justamente apontado não só pelo Sr. Deputado Costa Andrade, como até pelos deputados da oposição. Neste aspecto!, o Código permanecerá obsoleto, contraditório, aviltante para as mulheres portugueses. É pena! Sr. Ministro e Srs. Deputados!
Aplausos da UEDS do PS do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Muito obrigada, Sr.ª Deputada, Sr. Ministro, quererá responder, no fim?
O Sr. Ministro da Justiça (Meneres Pimentel): - Sim, Sr. Presidente. Preferia responder no final das intervenções.
O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Ministro. Srs. Deputados, estão inscritos e, por esta ordem, os seguintes Srs. Deputados: Castro Caldas, Zita Seabra, Teresa Ambrósio e João Morgado.
Os Srs. Deputados Castro Caldas e Zita Seabra, bem como os respectivos grupos parlamentares, já não tem tempo: tal não exclui que o Plenário decida conceder-lhes tempo. Todavia, parece-me mais razoável dar, agora, a palavra aos Srs. Deputados cujos grupos parlamentares ainda tem tempo e, a seguir, debruçar-nos-íamos sobre a
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questão da concessão da palavra ao Sr. Deputado Castro Caldas e à Sr.ª Deputada Zita Seabra.
A Sr.ª Deputada Zita Seabra pediu a palavra para que tipo de intervenção?
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, pretendo comunicar-lhe que hoje mesmo, quando foi posta esta questão pelo meu grupo parlamentar, na reunião dos líderes dos grupos parlamentares, foi acordado que nos seria concedido tempo para mais uma intervenção. Portanto. Sr. Presidente, foi colocada hoje. expressamente, na reunião dos líderes esta questão e, expressamente, nos foi concedido esse tempo.
O Sr. Presidente: - Como a Sr.ª Deputada sabe, eu não estive presente na reunião. Todavia, e segundo a informação que me dá a Sr.ª Deputada Secretária, o Grupo Parlamentar do PCP já tem 10 minutos para além do tempo concedido.
Parece-me, pois. Sr.ª Deputada que é mais razoável dar a palavra, neste momento, aos Srs. Deputados cujos grupos parlamentares ainda têm tempo, sem prejuízo de ainda poder vir a dar-lhe a palavra, mais tarde.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Robalo.
O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr. Presidente, creio que importa esclarecer esta questão. Na verdade, foi concedido esse tempo - foram concedidos 10 minutos para a intervenção da Sr.ª Deputada Zita Seabra - e, até, com o bom senso de só serem gastos 10 minutos. Acontece que o acordado na reunião de líderes dos grupos parlamentares não foi cumprido e. designadamente, pelo PCP. Mas. em qualquer circunstância, ficou claramente expresso o tempo - 10 minutos - para a intervenção da Sr.ª Deputada Zita Seabra: por outro lado, ficou também claramente expressa a boa vontade e bom entendimento dos grupos de se limitarem ao tempo que lhes era concedido.
O Sr. Presidente: - Dentro do critério que referi, dou a palavra à Sr.ª Deputada Teresa Ambrósio.
A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: Não posso deixar passar esta ocasião sem sublinhar também o grave atentado aos direitos das mulheres e à vida no seu sentido mais amplo, que representam algumas disposições contidas na proposta de revisão do Código Penal e, já ressaltadas aqui, nomeadamente pelo meu camarada Armando Lopes.
Quero apenas hoje, mais uma vez, enquanto deputada e enquanto mulher fazer-me porta-voz de todos os homens e mulheres, que lutam por aquela mudança cultural, civilizacional e política que permita o pleno exercício da liberdade e das responsabilidades humanamente assumidas e não impostas.
Homens e mulheres que lutam pelo progresso da humanidade que se alicerçam no desenvolvimento de consciência de cada homem e no respeito da liberdade dessa consciência.
Sr. Ministro, não faço perguntas porque já sei as respostas! Ao consagrar de novo a penalização de todo e qualquer tipo de aborto no seu Código Penal, patenteando um retrocesso escandaloso no que jurisdicionalmente era já um facto adquirido entre nós e uma abertura das mentalidades após 25 de Abril - refiro-me às propostas de alteração ao disposto vigente do Prof. Eduardo Correia - recusando a legalização de casos de interrupção da gravidez. V. Ex.ª. representa o mais puro reacionarismo, a faceta mais machista do poder, o esmagamento da liberdade das liberdades que é o poder escolher dar vida. Que é poder viver e cumprir uma maternidade em plenitude humana e em responsabilidade assumida. V. Ex.ª demonstra a intolerância hipócrita e farisaica dos que se julgam possuidores dos princípios morais absolutos e os impõem, sem consideração pela liberdade de consciência, às mulheres, aos médicos, aos familiares.
V. Ex.ª não defende a vida. V. Ex.ª em nome dos seus princípios, que são porventura seus e de uma percentagem minoritária de cidadãos que serve, renega a vida para quem a quer plena, assumida, livre e realizada em sentido colectivo e responsável.
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - O seu Código Penal, Sr. Ministro, não fossem outros aspectos, ficaria, assim, na história jurídica deste país como a hipocrisia moral institucionalizada.
As mulheres e homens deste país que lutam pela liberdade e pela tolerância já o julgaram. Já percebemos que para os intolerantes e portanto inseguros (democrática, político e moralmente falando) não são os argumentos que contam. Aqui e lá fora. em instituições jurídicas, médicas, populares tem sido por demais apresentados argumentos demonstrando a ineficácia na luta contra o abono clandestino, que representa a penalização jurídica de toda e qualquer forma de aborto, nomeadamente o ter em consideração a vida da mãe ou as malconformações do feto. Aquele que tem por objectivo o salvar a vida a quem dá vida e a defesa do direito a viver com dignidade e em pleno de qualquer nascituro. Mas V. Ex.ª e quem V. Ex.ª representa não ouvem esses argumentos nem os discutem.
E não bastará vir da bancada do PSD, o Sr. Deputado Costa Andrade, a quem presto a minha homenagem pela hombridade que teve ao explicar aqui. aquilo que defende lá fora e de reconhecer que a AD não está disposta a considerar no novo Código Penal, o que defende lá fora, não bastará vir o Sr. Deputado demonstrar aquilo que é por demais evidente!
E não bastará, repito, vir da bancada do PSD, o Sr. Deputado Costa Andrade tomar os seus desejos por realidades e querer atirar com areia aos nossos olhos.
Se o aborto terapêutico, é permitido legalmente, então porque retirar o artigo da proposta do Prof. Eduardo Correia que a ele se refere? Bastará por outro lado tolerá-lo, fechar os olhos quando ele é por decisão médica considerado para que estejam criadas condições legais e materiais a fim de que a ele recorram livremente e, como medida responsável, todas as mulheres de que dele necessitam? Por que não se fala então abertamente das condições permitidas e não permitidas desse tipo de aborto? Ou será que se pretende com o desconhecimento legal que o seu Código patenteia, abrir apenas a prática do aborto terapêutico às élites iluminadas e que têm possibilidades de recorrer a cuidados médicos especiais, relegando todas as outras mulheres para a vida do aborto clandestino penalizado? Ou vai o Sr. Ministro tomar outras medidas para acautelar estas condições evitando que elas aconteçam? Se a AD não o apoia, é com o apoio do CDS que o vai fazer?
Não é assim Sr. Ministro, que se encaram e resolvem os problemas graves e dolorosos da realidade social. A história julgará o governo AD por isto. Por não ter sabido aproveitar a abertura e esclarecimento da opinião pública para ir criando os quadros legais e institucionais que permitam o acesso de todas as mulheres a uma maternida-
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de consciente E por, pelo contrario, sublinharem o obscurantismo e a ignorância nesta matéria e manterem quadros mentais que impedem essa realização com todos, os dramas que se conhecem
A historia o julgara mas nos PS. não desistimos porque não e um favor ao poder que pedimos mas, sim o reconhecimento de um direito que exigimos
Aplausos da UEDS do PS do PCP e do M DP/CDE.
O Sr Presidente: - Muito obrigado Sr.ª Deputada Eu daria agora a palavra ao Sr Deputado João Morgado No entanto estamos a 2 minutos da hora do intervalo regimental pelo que e melhor interrompermos agora a sessão Recomeçaremos as 18 horas.
Eram 17 horas e 28 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 10 minutos.
O Sr Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr Deputado João Morgado.
O Sr. João Morgado (CDS) - Sr Presidente Sr Ministro da Justiça Srs. Deputados Remonta a 1837 a publicação em Portugal pelo governo de Passos Manuel do primeiro Código Penal
Este diploma porem não foi aprovado pelo Parlamento de então e só em 1852 o pais teve o seu Código Penal Código que substituiu a legislação contida no livro contida no livro v das Ordenações e em variada legislação extravagante
Mormente quanto ao sistema de penas, todavia o Código apresenta-se particularmente desactualizado, mantendo sanções penais que o pensamento jurídico do século XIX já considerava desumanas Por isso, duas leis de 1867 e a Reforma Penal de 1884 baseadas nos trabalhos de preparação de um novo Código fundamentalmente a cargo de Levi Maria Jordão e cujo projecto ficou conhecido por projecto do Código Penal de D Pedro V modificaram em cerca de um terço disposições essenciais do Código de 1852
A lei de 1884 permitia que tossem compiladas num só diploma as disposições do Código de 1852 e as constantes das Leis de 1867 e 1884 que as completavam ou alteravam
Essa compilação oficial e designada como Código de 1886 sem que no entanto possa ser considerado um diploma legislativo autónomo.
Além de que não recolheu todas as disposições penais então em vigor.
A partir de 1937 o governo do Di Sala/ar, pretendendo a remodelação do Código Penal encarregou primeiramente da elaboração de um projecto o Prof. Beleza dos Santos e, apôs a renuncia deste o Prof. Eduardo Correia.
Em 1954 foram alteradas algumas' disposições do Código Penal de 1886 mediante a introdução de um novo sistema de penas bem como pela inserção num corpo da legislação extravagante relativa a sua parte penal
Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Srs Deputados iniciei a minha intervenção com uma sucinta resenha histórica sobre a nossa legislação penal, para evidenciar a complexa teia que representa, nos nossos dias, o conjunto das normas jurídico-penais em vigor.
Código de 1852 Compilação de 1886, Lei de 1867 e múltipla legislação penal avulsa.
Em meados de 1977 o I Governo Constítucional apresentou no Parlamento uma proposta de lei relativa a revisão da pane geral do Código Penal, iniciativa que foi retomada em Fevereiro de 1979 pelo IV Governo Constítucional
Nenhuma dessas iniciativas obteve êxito, por isso o governo da Aliança Democrática se lançou nesta empresa legislativa que e a elaboração de um novo Código Penal.
Diga-se desde já que não e tarefa fácil legislar em matéria penal Definir, de forma precisa, os comportamentos violadores do sentimento ético da sociedade, determinar quais desses comportamentos merecem a tutela da Lei Penal e dosear a sanção que a cada um há-de corresponder, e obra delicada e dificilmente será obra perfeita
Muito menos o parecera quando observada de ópticas partidárias distintas, cada uma delas a propugnar por um tipo de sociedade própria, a valorar os fenómenos da vida a luz dos princípios que informam os seus programas político-partidários, e a requerer tratamentos penais que abram caminho a realização acelerada desses mesmos programas
Naturalmente que não foi essa a óptica do governo da Aliança Democrática, as soluções encontradas, para alem de consagrarem princípios que radicam na tradição jurídico-penal portuguesa reflectem uma preocupação fundamental
Assegurar a protecção da sociedade mediante a criminalização dos actos por ela reclamada, e através da penalização dos delinquentes, em termos de garantir a sua recuperação sem prejuízo do caracter repressivo intimidativo e dissuasor da sanção
Afigura-se que o projecto de ler privilegia o primeiro aspecto.
Esta e, aliás, a tendência dominante, da moderna orientação do direito penal, que progressivamente tem vindo a fazer realçar o valor da prevenção especial
Da crueldade das penas que se mantinha ainda nos finais do século XVIII, e do domínio da arbitrariedade na sua aplicação, passou-se com o iluminismo a uma preocupação seria com a delimitação dos direitos recíprocos da sociedade e dos cidadãos, a legalidade das penas a abolição das penas de tortura e a pessoalidade da pena
A vontade criminosa, para alem do mau exemplo e do dano material do alarme social causados, passou a constituir um prisma através do qual também o delinquente e observado
A escola positiva dominada pela filosofia materialista e agnóstica perante a metafísica pretendeu substituir o conceito de responsabilidade subjectiva e moral do delinquente ao conceito de responsabilidade social em obediência a um principio de utilidade social, já que o delinquente não era um ser racionai e livre
Mas o esquecimento a que a vida psíquica do delinquente foi votado, não impediu que triunfasse a ideia de que o motivo só determina as acções humanas enquanto elaborado pelo próprio indivíduo e pela sua personalidade
A preocupação de utilizar a pena como meio repressivo, e simultaneamente preventivo, e apanágio do direito penal moderno e encontra-se vertido no projecto do Código Penal em apreço
Só que para obter este desiderato no que toca a prevenção especial se impõe que tal preocupação extravase dos tribunais para os órgãos da administração penitenciaria e de assistência social dos delinquentes Sem isso de nada valera uma adequação da pena, feita pelos juízes, a personalidade do delinquente e ao seu grau de culpabilidade
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É indispensável que durante o cumprimento das penas, sejam elas de trabalho, sejam privativas da liberdade, a administração dispunha de meios ao serviço da correcção do estado pessoal de fraca resistência à criminalidade, de forma a conseguir uma de duas coisas:
Ou o indivíduo adquira a capacidade ordinária de sentir, para obedecer ao imperativo da norma; ou procure subtrair o indivíduo a situações objectivas que constituem para ele uma ocasião de delinquência.
De pouco valerá à sociedade um Código Penal que permita ao julgador a aplicação de penas ajustadas ao juízo de reprovação desencadeado na sociedade pelos actos praticados, e à personalidade dos delinquentes, se o cumprimento da sanção não constituir o desenvolvimento correcto da actuação do legislador que criminalizou a conduta e do juiz que aplicou a condenação.
Defraudada ficará a sociedade e o delinquente; e desvirtuado ficará o fim da pena e o travejamento das normas penais incriminatórias.
Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Srs. Deputados: O projecto de decreto-lei que o Governo apresentou nesta assembleia não é. nem pretende ser, trabalho isento de lacunas e de crítica, nem pode ser obra acabada em matéria de legislação criminal.
Em todo o caso, e como é evidente, não poderão ter acolhimento, do nosso ponto de vista, críticas ou sugestões que ponham em crise a sua constitucionalidade; que visem criminalizar deveres de raiz exclusivamente cível, ou que levem à descriminalização de actos cuja penalização é exigida ao Estado pela esmagadora maioria dos cidadãos.
A ilicitude criminal de um acto não pode ser consagrada senão com base num forte juízo de reprovação social da sua prática, violadora de valores ético-jurídicos que a sociedade consagra como merecedores de protecção penal.
E a descriminalização de qualquer conduta só deve ter lugar quando esse juízo de reprovação cessa ou se atenua, ao ponto de se extinguir a exigência social da penalização.
Pela nossa parte apontamos 3 aspectos em que nos parece dever ser melhorado o diploma.
Em primeiro lugar entendemos que deveria ser obrigatória a substituição, por multa, de qualquer pena de prisão de duração não superior a 6 meses.
Se mediante a aplicação de uma pena privativa de liberdade se visa, no essencial, a reeducação do delinquente, não se afigura possível qualquer reeducação em período inferior a 180 dias; e, mesmo assim, só através do funcionamento eficiente da assistência prisional.
São sempre pesados os custos sociais do cumprimento de penas de prisão, sejam curtas ou de longa duração.
São muito profundas as marcas psíquicas que o delinquente transporta após o encarceramento.
E por isso não deve ser deixado ao arbítrio do julgador a conversão em multa de pena de prisão por período não superior a 6 meses; essa conversão deve constituir um imperativo legal.
Em segundo lugar pensamos que deve ser alargada a conversão da pena de multa de prisão em trabalhos, em obras ou oficinas do Estado ou de outras pessoas colectivas de direito público.
O limite de 3 meses referido no artigo 60.º do projecto deveria ser aumentado pelo menos para 6 meses.
As potencial idades de regeneração pelo trabalho são indiscutivelmente maiores do que as de recuperação pela simples privação de liberdade. E conhecidas como são as indímicas carências de possibilidades de trabalho nos estabelecimentos prisionais, mormente nos de pequena capacidade, afigura-se desejável que as pequenas penas de privação de liberdade possam ser substituídas por trabalho.
Isto sem prejuízo de julgarmos indispensável o esforço da administração no sentido de abrir possibilidades de trabalho a todos os reclusos, nos estabelecimentos prisionais.
Das visitas que fizemos a alguns estabelecimentos prisionais do continente e dos Açores ficou-nos a convicção de que seria possível desenvolver, sem grandes custos financeiros, a oferta de trabalho aos condenados. E ficou--nos a certeza de que a esmagadora maioria dos presos estavam sinceramente interessados em trabalhar.
Afigura-se-nos, no entanto, que se está a sacrificar à segurança a ocupação dos reclusos; que a primeira preocupação da administração prisional é criar condições que impeçam a evasão, ainda que para tanto seja sacrificado o desejo louvável dos delinquentes em realizar trabalho útil em favor da comunidade.
O projecto de decreto-lei não abre grandes perspectivas neste campo, nem isso seria de esperar por se tratar de um Código Penal e não de um diploma regulador da execução das penas. Mas seria desejável que a administração prisional visse contempladas em legislação actualizada um regime de trabalho prisional; que permitisse aos presos aprender uma profissão, exercer um mister, enfim, serem úteis à sociedade mesmo em reclusão.
Por último parece-nos de que deveria ser dada diferente formulação ao n.º 3 do artigo 219.º
A redacção usada permite inferir que a omissão de auxílio é sempre crime, embora em certas circunstâncias isento de pena.
Consideramos um louvável avanço a criminalização do dever de solidariedade social, nos termos em que a consagram os n.ºs l e 2 do artigo 219.º; todavia entendemos que as circunstâncias enunciadas no n.º 3 do mesmo artigo devem afastar da omissão de auxílio a qualificação do crime, em vez de tão-só isentarem de pena o seu autor.
Sr. Presidente. Sr. Ministro da Justiça, Srs. Deputados: É evidente a necessidade sentida pela sociedade portuguesa, pelos tribunais e pelos profissionais do foro na aprovação de um novo Código Penal.
O governo da Aliança Democrática meteu ombros a esse empreendimento, e enquadrou essa aprovação no movimento de renovação legislativa em que se empenhou.
O CDS congratula-se por isso e vai dar o seu voto favorável ao pedido de autorização legislativa deduzido pelo Governo.
Oxalá da aplicação do novo Código Penal resulte, para a sociedade portuguesa em geral, a realização do seu ideal de justiça, e para os delinquentes a porta por onde passe o tratamento adequado à sua rápida, segura e integral regeneração.
Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos agora perante o problema da inscrição dos Srs. Deputados Castro Caldas e Zita Seabra. Ambos os partidos, quer o PSD quer o PCP, esgotaram já os tempos de que dispunham e parece até que esgotaram também aquele tempo de 10 minutos mais que. na reunião dos presidentes dos grupos parlamentares, tinha sido concedido ao PCP para uma intervenção da Sr.ª Deputada Zita Seabra.
A Mesa julga que não pode ultrapassar os tempos limitados pela Conferência dos Presidentes dos Grupos Parlamentares de maneira que, a não ser que haja consenso, não poderei conceder a palavra a nenhum dos Srs. Deputados.
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O Sr. Castro Caldas (PSD) - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça o favor. Sr Deputado
O Sr. Castro Caldas (PSD) - Sr Presidente, eu farei enviar a Mesa a minha declaração de voto que substitui a intervenção que desejava fazer
O Sr. Presidente: - Portanto, o Sr Deputado Castro Caldas prescinde da palavra para produzir a intervenção e fará uma declaração de voto E a Sr.ª Deputada Zita Seabra?
A Sr.ª Zita Seabra (PCP) - Sr Presidente, eu não prescindo e pedia d Câmara se tinha um gesto de boa vontade e me permitia que fizesse a intervenção
O Sr. Presidente: - Sr a Deputada, desculpe mas não estou a ouvi-la Pedia aos Srs Deputados o favor de fazerem silêncio, pois de outra forma não posso ouvir a Sr.ª Deputada Faz favor.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP) - Sr Presidente, estava a dizer que não prescindia da palavra e solicitava a Câmara o consenso para que pudesse produzir essa intervenção
O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado Armando Lopes
O Sr. Armando Lopes (PS) - Sr Presidente, não pomos qualquer dificuldade a que a Sr.ª Deputada Zita Seabra use da palavra, pelo tempo que tinha sido, aliás, combinado na reunião dos lideres dos grupos parlamentares Isto serve também para o Sr Deputado Castro Caldas
Somos perfeitamente abertos as duas intervenções:
O Sr Presidente: - Sr. Deputado Manuel Pereira, faz favor.
O Sr. Manuel Pereira (PSD) - Sr Presidente, julgo que nos devíamos circunscrever aquilo que ficou deliberado na reunião dos lideres parlamentares
Não estive presente nessa reunião, mas solicitava a Mesa que nos informasse sobre qual foi o consenso ai obtido
O Sr. Presidente: - Segundo a informação que há bocado deu o Sr Deputado Carlos Robalo, e efectivamente certo que foram concedidos ao PCP mais 10 minutos para uma intervenção da Sr.ª Deputada Zita Seabra Simplesmente, esses 10 minutos já foram utilizados pelo PCP
Tem a palavra o Sr Deputado Carlos Robalo
O Sr Carlos Robalo (CDS): - Sr Presidente, gostaria que ficasse claro que não houve nenhuma benesse especial concedida ao PCP, ate porque o PCP não merece benesses especiais
Risos.
A situação do PCP e a mesma que a do Sr Deputado Castro Caldas O que se admitiu e que haveria uma certa tolerância da Mesa, inclusivamente o meu grupo parlamentar disse que não ma gastar todo o tempo para que fosse possível votar hoje as autorizações legislativas
A Sr.ª Deputada Zita Seabra pode usar da palavra como ficou acordado, como também, naturalmente, pode falar o Sr Deputado Castro Caldas A Sr a Deputada Zita Seabra não ficou com nenhum estatuto especial, mas em igualdade de situação
A Sr.ª Zita Seabra (PCP) - Muito obrigado. Sr Deputado
O Orador: - Não teve, ate porque nos não consentíamos
Aqui, Sr.ª Deputada, irmãos, irmãos todos!...
Risos.
O Sr Presidente: - Se bem entendo. Sr Deputado da parte do CDS não ha oposição a que a Sr.ª Deputada faça a sua intervenção
O Orador: - De forma nenhuma. Sr Presidente Da mesma maneira que não ha qualquer oposição, bem pelo contrário, a que o Sr Deputado Castro Caldas faça a sua intervenção
O Sr. Presidente: - Sr Deputado Manuel Pereira, em face desta posição o seu grupo parlamentar não tem oposição a fazer'
O Sr. Manuel Pereira (PSD) - Sr Presidente, suponho que o Sr Deputado Castro Caldas já indicou o caminho a seguir prescindiu
Não estamos com 2 problemas iguais nem sequer semelhantes, porque nos não usaremos mais da palavra, visto que o Sr Deputado Castro Caldas prescindiu
Suponho que dentro desse caminho se o PCP já esgotou o tempo, considera-se esgotado
O Sr. Presidente: - Bom, em face da oposição do PSD, a Mesa não poderá conceder a palavra a Sr a Deputada Zita Seabra
Tem a palavra, Sr Deputado Armando Lopes
O Sr. Armando Lopes (PS) - Se houver necessidade, estamos dispostos a ceder tempo que nos sobra para que os 2 Srs Deputados usem da palavra
O Sr. Presidente: - Mas para isso era preciso tê-lo. Sr Deputado
Tem a palavra, Sr Deputado Carlos Robalo
O Sr. Carlos Robalo (CDS) - Sr Presidente acabamos por gastar mais tempo nestas questões do que nas intervenções
Gostaria de referir que ate o Sr Deputado Borges de Carvalho - esta na Comissão Eventual para a Revisão Constítucional - disse que cederia 5 minutos ao PCP para a intervenção.
Portanto, penso que estamos a gastar tempo de mais com isto Ha esta facilidade do PPM em ceder tempo ao PCP, da mesma maneira que havia a nossa boa vontade em ceder tempo ao Sr Ministro
O Sr. Presidente: - Nestes termos. Sr.ª Deputada Zita Seabra, V. Ex.ª pode usar da palavra por 9 minutos, 4 cedidos pelo PS e 5 minutos pelo PPM
Tem pois a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Zita Seabra
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A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando há 5 meses o Grupo Parlamentar do PCP entregou na Assembleia da República 3 projectos de lei de defesa da maternidade como acto livre, consciente e responsável, o último dos quais visa a legalização do aborto, fê-lo tendo como objectivo consagrar legalmente direitos fundamentais dos casais e particularmente da mulher. Procurámos também que em torno de questões tão importantes para a vida das pessoas, se travasse um debate sério profundo e esclarecedor, tanto em termos de opinião pública do país, como dos deputados que compõem a Assembleia da República, para que, chamados a votar, o fizessem em plena consciência, com o seu querer e o seu pensar e não estritamente em termos político-partidários.
Nada justificava que assuntos tão importantes para a vida das pessoas (e nomeadamente o direito de decidir o número de filhos que deseja e quando devem nascer) e que dramas que tão duramente atingem muito particularmente as mulheres - o aborto clandestino - não fossem discutidos e encarados no Portugal democrático e se mantivessem tabus.
Assim foi. Em poucos dias o tabu quebrou-se, a discussão iniciou-se e os dramas, as misérias e as mortes por que passam milhares de mulheres portuguesas vieram à superfície os jornais falaram e continuam falando, realizam-se debates, conversa-se no café, ou no intervalo do trabalho. O primeiro passo estava e está dado: conseguimos, e muito especialmente nós, mulheres, discutir direitos fundamentais que se relacionam especificamente com a nossa condição. Uns concordaram, outros, poucos, discordaram. Isolados, os ultramontanos escandalizaram-se e sobretudo escandalizaram o país e entraram no anedotário nacional.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - O Governo porém alinhou por esses! Os partidos de oposição tomaram posição inequívoca; em termos de opinião pública respiraram os portugueses de alívio (particularmente as mulheres) e puseram os olhos na Assembleia da República; as sondagens em que a AD acredita são claras, e até no próprio Grupo Parlamentar do PSD a maioria dos deputados exigiu um debate público sobre o aborto ... Agora aparece o Governo, por detrás de um pedido de autorização legislativa, sem tempo para debate e para discutir o que quer que seja, com uma proposta de alteração ao artigo 358.º do Código Penal que é uma vergonha! É uma vergonha, Srs. Deputados, que em 1982 a Assembleia da República vá alterar um artigo velho de 100 anos que condena a interrupção voluntária da gravidez, como se de crime se tratasse, com prisão de 2 a 8 anos de cadeia, mantendo-o praticamente igual, reduzindo simplesmente a pena a 3 anos de prisão! Certamente que o Sr. Ministro da Justiça pensa que neste momento as mulheres portuguesas respiram de alívio perante tão "comiserada" proposta.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - É uma vergonha!
A Oradora: - Daqui para o futuro durante uma gravidez indesejada, perante uma gravidez que não podem levar a termo, às mulheres já não as esperam 2 a 8 anos de cadeia, mas, graças ao Código Penal do Dr. Meneres Pimentel, "só" 3 anos! É um alívio Sr. Ministro!
Aquela mulher que com mais de 40 anos, com os filhos criados, um dia descobre que está grávida e que têm todas as probabilidades de dar à luz um filho deficiente, hoje respira de alívio Sr. Ministro da Justiça, pois já não a esperam 2 a 8 anos de cadeia, mas sim 3!
Aquela outra mulher a quem o planeamento familiar acidentalmente falhou, ou aquele jovem casal que não tem casa nem emprego, ou a menor solteira que engravidou, hoje, respiram todas de alívio. Sr. Ministro da Justiça, pois já só as espera, se forem condenadas, 3 anos de cadeia!
E todas estas mulheres portuguesas, as 100 000 ou mais que por ano vivem esse drama terrível que é o aborto clandestino (um aborto é sempre um drama para quem o pratica) e todas aquelas que entram diariamente a morrer, ou gravemente mutiladas e doentes, vindas do mundo subterrâneo do aborto clandestino, podem ficar descansadas: se saírem com vida e forem presas, graças ao projecto do Ministro da Justiça da AD, a pena máxima de prisão em que incorrem é de 3 anos! E talvez lhes permitam cumprir a pena ao fim de semana ou nas férias, beneficiando da inovação que é a prisão por dias livres.
Se por detrás disto não estivesse o flagelo social do aborto clandestino - mortes, doenças, danos sem conta - o ridículo desta proposta faria rir o país. Mas não faz! Porque tudo isto é demasiado sério e dramático e sobretudo demasiado injusto e hipócrita! Injusto, porque quem sofre as consequências fundamentais são as mulheres trabalhadoras, camponesas, operárias, empregadas, todas essas que não têm dinheiro para irem à Suíça e Inglaterra ou a boas clínicas que há para aí (e que praticam o aborto em curiosas ou parteiras, com ou sem anestesia, e ficam infectadas, ou estéreis). Essas é que o fazem em condições tanto piores quanto menos possam pagar. Essas é que entram a morrer nos hospitais, e às vezes morrem mesmo. Mas essas é que também correm o risco de serem presas e as estatísticas revelam que são elas as vítimas da repressão penal, nos casos em que esta é accionada.
Hipócrita ainda esta proposta do Código Penal porque este artigo não vai ser cumprido! Sabe-o o Sr. Ministro, os deputados que o vão votar, sabem-no os juízes, sabe-o toda a gente. Ou será que o Governo vai mandá-lo aplicar lançando a perseguição policial sobre milhares de mulheres? Fizemos esta pergunta há dias e o Sr. Ministro esquivou-se a responder! Mas trata-se de uma questão que não pode ficar sem resposta neste debate. Se o que se pretende é uma ofensiva policial tendente a levar ao banco dos réus, nem que seja 5 % das mulheres que por ano praticam o aborto em Portugal, é bom que fique claro que isso significaria que não haveria cadeias que chegassem para albergar tantos milhares de pseudocriminosas. Nem tribunais capazes de as julgar em tempo, nem bancos onde sentar tantos réus!
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Proposta hipócrita, pois o Governo sabe tão bem como nós que a lei não é cumprida, que o máximo de condenações por ano, nos últimos 10 anos. foram 7 pessoas.
Mas a existência e agora a manutenção no Código Penal deste artigo tem uma consequência extremamente grave. Não impede nem previne o aborto, mas remete-o para a clandestinidade, remete-o para condições que põem em perigo a vida a saúde, e a dignidade da mulher.
Ao recusar-se a legalizar o aborto e ao apresentar uma proposta destas, o Governo sabe que a sua última consequência é a manutenção do aborto clandestino, e que perante uma gravidez indesejada ou que ponha em risco a saúde e a vida da mulher, ela em vez de se encaminhar
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para um hospital, ou um serviço de saúde onde proceda em condições de segurança a interrupção da gravidez, continuara a ter de se encaminhar para uma parteira, uma curiosa de vão de escada, ou a tentar em supremo desespero o auto-aborto
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP) - E uma hipocrisia'
A Oradora: - Sr. Presidente, Srs Deputados Importa não deixar de acentuar que esta proposta do Governo e um escandaloso recuo em relação a todas as propostas anteriores do Código Penal nomeadamente a do Prof. Eduardo Correia Esta ultima despenalizava expressamente o abono terapêutico incluindo o aborto por razões de ordem psicológica
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Que razões levaram então o Governo a retirar essa referencia expressa do projecto do Código Penal. Por que o aborto terapêutico cabe já no quadro jurídico português como disse o deputado Costa Andrade Então por que não explicita-lo no Código Penal tanto mais que essa explicitação fazia justamente parte do projecto do Prof. Eduardo Correia Ha na verdade diversos juristas que consideraram que o aborto terapêutico tem já cobertura legal como por exemplo o Prof. Boaventura Sousa Santos num celebre artigo que permitiu desbloquear situações mais escandalosamente justas Mas e o caso também do Prof. Figueiredo Dias e ficamos a saber que do Dr. Costa Andrade Mas a verdade e que tal orientação maioritária da doutrina não tem encontrado eco na jurisprudência dos nossos tribunais, sendo urgente uma clarificação legal, como alias tem sido sustentado publicamente por numerosos penalistas dos quais destacamos o próprio Prof. Figueiredo Dias que expressamente considera necessária uma clarificação legal desta questão no Código Penal
O Governo não o fez e a solução que apresenta agrava ainda as dificuldades e as indefinições existentes
Conceptualmente e uma solução inepta mistura tudo' Confunde propositadamente a interrupção voluntária da gravide? (a que chama aborto consentido) com o aborto criminosamente praticado contra a vontade da mulher
Reconhece a diferença absurdamente penaliza ambas as situações Ora no nosso entendimento, assim como no de quase todos os penalistas que sobre a matéria" se tem pronunciado, a proposta do Código Penal devia exclusivamente contemplar o crime de aborto contravontade cabendo j uma lei autónoma (não penal) regulamentar a interrupção da gravidez
Presta o Governo, assim um tributo as concepções mais retrogradas daqueles que preconizam a penalização da interrupção voluntária da gravidez em nome da defesa da vida Mas também ai a contradição e flagrante! O Ministro da Justiça teve que reconhecer que afinal ha vida e vida Teve que distinguir entre a vida intra-uterina e a extra-uterina. penalizando incomparavelmente mais a ofensa a uma do que a outra homicídio simples - 8 a 16 anos de cadeia, aborto-pensão até 3 anos.
Vai o CDS ter a hipocrisia de votar tal proposta, quando salazarenta proposta de "lei da família" apresentada pela Secretaría de Estado da Família. Dr. Costa Macedo, equipara a vida antes e depois do nascimento para efeitos de protecção legal e quando tem dito tantos dislates sobre a matéria. Ou será que pretendem aprovar simultaneamente 2 conceitos contraditórios.
Vozes do PCP: - Muito bem'
A Oradora: - Mas a proposta do Governo não se fica por aqui Tal como ha 100 anos não legaliza o aborto para salvar a vida da mulher, mas concede uma atenuante se o aborto for praticado para lhe salvar aquilo a que chama honra Que conceito de mulher esta aqui inerente em que expressamente a vida conta tão-pouco
Temos, Srs Deputados, serias e fundadas duvidas sobre a constitucionalidade desta proposta que se recusa a legalizar ou sequer salvaguardar expressamente o aborto terapêutico
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Isto e, uma proposta que se recusa a proteger a nossa vida. a vida da mulher Se esta monstruosa solução for aprovada certamente que se vira a colocar a questão de fazer operar por via da declaração de inconstitucionalidade uma clarificação que salvaguarde os direitos das mulheres
Vozes do PCP: - Muito bem'
A Oradora: - E bom recordar ao Sr Ministro da Justiça o que se passou em Itália nesta matéria'
Há dias, questionado, o Dr. Meneres Pimentel considerou duvidosa a constitucionalidade do projecto de lei do PCP sobre a interrupção voluntária da gravidez Ainda estão por inventar os argumentos que lhe permitam fundamentar tais duvidas Solicitamos-lhe porem, na altura o parecer que o Sr Ministro em tempos pedira a Procuradoria-Geral da Republica e respondeu-nos que esse parecer e (espantem-se) secreto ate a homologação ministerial' Francamente Dr Meneres Pimentel, homologar um parecer que (com algum abuso) solicitou a Procuradoria para verificar ou não a constitucionalidade de um projecto de lei pendente para votação e um espanto'
Vozes do PCP: - Muito bem'
A Oradora: - Mas perguntamos-lhe se a Procuradoria agora e no seu entender a estrutura que verifica a constitucionalidade dos projectos de lei pendentes na Assembleia da Republica E será que o Sr Ministro se arroga o poder de homologar simples informações jurídicas solicitadas a Procuradoria (que não e um serviço de assessoria jurídica do Governo e menos ainda uma instância de filtragem dos projectos de lei da oposição).
Aplausos do PCP
Mas pior ainda o Sr Ministro chama a si o privilegio de divulgar ou não o conteúdo dessas informações, consoante favoreçam os intentos políticos do Governo ou não
Neste caso o silêncio embaraçado do Sr Ministro e em si mesmo uma confissão Mas isso não nos leva a deixar de exigir que o Sr Ministro faculte aos deputados e a opinião publica esse parecer, uma vez que o solicitou
Em qualquer caso não se engane o Sr Ministro da Justiça, que o debate vai prosseguir e esta escandalosa proposta que só por si macula este projecto de Código Penal não será aplicada e terá o destino que merece a revogação e a sua substituição por uma lei que salvaguarde os direitos da mulher de acordo com a nova dignidade que lhe e constitucionalmente reconhecida
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Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Em breve a Assembleia da República será chamada a votar os projectos de lei do PCP sobre a defesa da maternidade, o planeamento familiar e a educação sexual, e a interrupção voluntária da gravidez. Esse debate e essa votação são tanto mais necessários, quanto hoje, à revelia de tudo. escondendo-se por trás de uma autorização legislativa o Governo vai alterar o velho de 100 anos artigo 358.º do Código Penal, substituindo-o por outro artigo em tudo igual e de consequências igualmente dramáticas para as mulheres.
Mas mostra também Srs. Deputados, esta proposta, a mentalidade ultramontana e conservadora de quem está à frente dos destinos governamentais do país. Esta proposta só está realmente à altura deste Ministro da Justiça. Esta é a injusta justiça da AD!
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Informo a Câmara de que a Sr.ª Deputada pôde terminar a sua intervenção dado o tempo que lhe foi concedido pela UEDS.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Barrilaro Ruas.
O Sr. Barrilaro Ruas (PPM): - Sr. Presidente. Sr. Ministro da Justiça, Srs. Deputados: Apenas uma palavra muito breve para que fique claro que o PPM não intervém em sede de discussão da proposta de lei n.º 100/II para discutir o problema do aborto ...
O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Muito bem!
O Orador: - .... visto que, por um lado. a posição do PPM foi já tanto quanto possível, creio eu, claramente expendida, aqui nesta Câmara, pela minha voz, e, por outro lado, a Assembleia da República vai ser decerto solicitada a oportunamente discutir, com a profundidade e a amplitude que o tema merece, o problema momentoso, o problema muito grave, em termos sociológicos, filosóficos e morais, que é o aborto, na sociedade portuguesa de hoje.
O problema do abono será, portanto, discutido por nós em sede própria, e não queremos neste momento antecipar um debate que tem todas as razões para ser feito em termos de grande dignidade na altura própria.
Isto não significa, naturalmente, que entendamos que dentro da tessitura ou da economia do Código Penal agora proposto pelo Governo, este problema não tenha a sua importância e a sua altura própria.
No entanto, como esse problema é. filosófica, sociológica e também politicamente, um problema humano de grande profundidade, entendemos que ele exige um tratamento adequado, digamos unificado ou unitário, global, e seria prejudicá-lo trazer para aqui as nossas posições nesta matéria no momento em que ele é apenas um dos muitíssimos problemas dentro do Código Penal Português.
Aplausos do PPM do PSD e do CDS.
Entretanto, reassumiu a Presidência o Sr. Presidente Oliveira Dias.
O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Amadeu Ferreira.
O Sr. Amadeu Ferreira (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A União Democrática Popular votará contra a proposta de lei n.º 100/II, que autoriza o Governo a legislar em matéria de crimes, penas e medidas de segurança com vista à aprovação de um novo Código Penal e à revogação do vigente e em matéria de contravenções e sobre o regime penal especial aplicável a jovens delinquentes dos 16 aos 25 anos, na medida em que entende que a matéria penal, com todos os riscos que implicam, com a liberdade e a segurança dos portugueses, deveria ser discutida em sede própria, isto é, na Assembleia da República.
Não importa neste momento abrir uma discussão aprofundada sobre o novo Código Penal que. só por si, justificaria um amplo e aprofundado debate na opinião pública e nesta Assembleia, na medida em que alguns dos institutos do mesmo, por insuficientemente conhecidos, se tornarão de morosa aplicação.
Da mesma forma não pensamos ser possível, nas condições em que esta discussão se processa, analisar o atavismo de muitas das disposições do novo Código. Referimo-nos por exemplo, à disposições relativas ao abono.
Sr. Presidente. Srs. Deputados: - A UDP tem uma concepção de combate à criminalidade oposta à do governo AD. Porque pensamos que esta sociedade é, em si, geradora do crime a melhor forma de o combater é combatendo esta sociedade, é lutando pela sua transformação.
Temos para nós que o crime não é uma entidade abstracta, mas tem causas muito concretas geradoras duma marginalidade onde o crime tem todo o terreno para florescer.
A repressão do mais diverso tipo que se abate sobre os cidadãos e em particular sobre os trabalhadores, o desemprego, a falta de um projecto de esperança e de futura são algumas das causas estruturais da criminalidade. Importa, antes de mais, combater estas causas e não só nem essencialmente os seus efeitos ou consequências. Não o fazer é. de facto, instituir o primado da repressão sobre o da transformação, prática que leva, inevitavelmente, ao aumento da criminalidade e, consequentemente. encontra permanentes argumentos para o aumento da repressão ora mais aberta, ora mais sofisticada.
No quadro de uma crise nacional e internacional que permanentemente se agrava e atinge todos os domínios, desde o económico ao político, do cultural ao moral, as soluções de cunho vincadamente repressivo ganham novas justificações, a ponto de o próprio crime ser progressivamente institucionalizado. É a isso que assistimos progressivamente com a aplicação da política do governo AD.
É assim que entendemos todas as medidas que levam ao empobrecimento dos trabalhadores, em todos os domínios da sua vida e actividade: da mesma forma entendemos a vontade de liberalização dos despedimentos, a imposição progressiva de um projecto de cultura contrário aos valores da liberdade e da independência nacional, enfim uma política de doença, mais que de saúde, de embrutecimento mais que de ensino.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pela nossa parte não daremos ao Governo qualquer aval para legislar nesta matéria.
Isto porque fazemos um juízo claro sobre a sua política e temos presente o seu projecto repressivo, fonte de crime e não de combate ao mesmo.
Quero concluir dizendo que hoje o melhor serviço que pode ser prestado à luta contra a criminalidade, é combater este Governo por fornia a abrir caminho a um projecto de
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sociedade onde as causas do crime sejam de facto eliminadas
O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça
O Sr. Ministro da Justiça (Meneres Pimentel) - Sr Presidente, Srs Deputados Aproxima-se do fim o debate sobre a proposta de lei que autorizara o Governo a publicar um novo Código Penal e a subsequente legislação complementar e indispensável para que este mesmo novo Código Penal não constitua letra morta mas sim que possa ser aplicado
Com a única excepção da União Democrática Popular, todos os grupos parlamentares estiveram fundamentalmente de acordo com as coordenadas fundamentais da pane geral deste Código, isto e, com a filosofia básica deste projecto do Código Penal Divergiram como seria natural, nalguns pontos da parte especial
Fundamentalmente, as criticas acentuaram-se na forma do debate isto e o de ser uma proposta de lei de autorização ou de dever ser uma proposta de lei com maior participação desta Camará no debate.
Já referi inicialmente em resposta a varias perguntas das diversas bancadas das oposições, as razões que levaram Governo a tomar esta atitude Não vou, pois, repeti-las, mas julgo ser fundamental que uma proposta de lei de autorização legislativa que contem minuciosamente o respectivo articulado que vem mesmo instruída com os projectos de lei de toda a legislação complementar, oferece muito maiores garantias de debate do que uma proposta de lei de autorização legislativa propriamente dita - isto por um lado por outro lado o direito inalienável de qualquer grupo parlamentar pedir a ratificação dos respectivos diplomas logo que publicados
A outra questão fundamenta suscitada foi a da possível ou difícil aplicabilidade desta resolução legislativa, conforme e muito bem lhe chamou o Sr Deputado Vilhena de Carvalho inexequibilidade ou dificuldade de aplicação que resultaria fundamentalmente de dois factores o primeiro seria o de não existirem estruturas suficientes e capazes de fazerem aplicar esta lei para evitar que toda esta legislação se torne letra mona, e o segundo seriam as dificuldades financeiras que o pais atravessa e que também tornariam inaplicável ou inexequível esta legislação
Começando pela ultima devo referir que, segundo estudos de todos os criminalistas, mesmo segundo conclusões de colóquios e congressos realizados no âmbito da Organização das Nações Unidas, e ponto assente que um sistema penal deste tipo - o que agora esta em discussão - custa menos ao Estado do que um sistema punitivo como e ainda o vigente
O Sr Costa Andrade (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Isto, porque e menos oneroso acompanhar e auxiliar as pessoas em regimes como estes mais abertos do que encerrar e custear as despesas inerentes aos funcionamentos de grandiosos e custosos estabelecimentos prisionais
Julgava eu ser isto um ponto assente, mas pelos vistos não o foi por pane das oposições e por isso o recordo aqui
Em relação a questão das estruturas, ainda hoje, no estabelecimento prisional de Alcoentre, tive oportunidade de fazer um balanço que suponho verídico, da mudança qualitativa operada neste ultimo ano no domínio dos serviços prisionais e ai se contêm exemplificações quantificadas do salto qualitativo que neste ano e meio se conseguiu operar
Seria mesmo conveniente que grupos parlamentares que no inicio do ano passado tomaram a iniciativa louvável de visitar os estabelecimentos prisionais os contactassem novamente para aquilatarem das diferenças qualitativas
O Sr António Vitorino (UEDS) - Boa ideia!
O Orador: - Como vê Sr Deputado também dou boas ideias!
O Sr. António Vitorino (UEDS) - Nunca o neguei!
O Orador: - Por outro lado como referi, existem já preparadas algumas estruturas para aplicação de o que e profundamente inovador neste projecto, isto e a assistência social socializada
Referi-me de inicio a aprovação recente em Conselho de Ministros, de um instituto de reinserção social que terá, na execução de toda esta legislação um papel fundamental e que, apesar de ainda não estar legalizado, já tem sede, já tem projectos muito concretos para a sua regionalização, uma vez que a assistência prisional e pós-pensional deve ser desconcentrada de forma a preparar o regresso dos reclusos as terras de onde provieram
No funcionamento desse novo instituto, que recorrera aos actuais assistentes sociais da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e também a outras admissões novas que se tornarão possíveis, tendo em conta o despacho a que também já me referi, deposito na acção desse instituto as maiores esperanças
E porque a razão fundamental da criação desse Instituto Porque a retirada progressiva dessa fundação a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais Porque, também como hoje modernamente e aceite, a assistência prisional e pós-prisional não deve encerrar-se em estabelecimentos fechados deve constituir uma corrente de ar fresco e livre que partira de fora para dentro dessas mesmas prisões
Acusou-se a parte especial de uma indeterminação nas penas, de conferir aos magistrados uma grande latitude de poderes, mas foi esse, exactamente, o objectivo de toda esta legislação
E impossível fazer uma correcta individualização da pena em quadros rígidos como os que actualmente vigoram neste pais E mais - conforme ainda ha pouco acentuou, e muito bem o Sr Deputado Costa Andrade-, o sistema punitivo vigente em Portugal não e hoje aplicado neste mesmo pais Perante a rigidez desse sistema punitivo, os juízes por vezes acham por bem absolver contra a prova produzida e a usar faculdades extraordinárias de uma forma normal
E, pois, incorrecta essa acusação Tratou-se, apenas, de transpor para a realidade legal aquilo que hoje já se pratica, alias, na esteira das modernas teorias do direito criminal
Acusou-se, igualmente o projecto do Código Penal de certas omissões, como tosse a de não tratar de legislação dos crimes contra a economia
Já tinha sido informado por mim e foi ha pouco explicitado pelo deputado Costa Andrade que o Governo aprovou uma proposta de lei no sentido de reformular o anterior Decreto-Lei n º 41 204 no qual alem da criminalização de certos tipos indiscutíveis se introduzem alguns afloramentos dos direitos de mera ordenação social
Acusou-se igualmente o projecto do Código Penal de omitir a regulamentação da emissão de cheques sem
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cobertura. Também já respondi a essa observação. Dado o seu carácter de mutabilidade, não julgo aconselhável essa introdução. Por outro lado, ainda no domínio de emissão de cheques sem cobertura, acusou-se o projecto de ter alterado uma lei aprovada aqui o ano passado, sob proposta do Governo, ainda que com algumas introduções e alterações propostas, salvo o erro, pelo Partido Socialista. Não foi assim. A uma leitura atenta do projecto de lei preambular deste projecto do Código Penal, verifica-se que houve, apenas, a necessidade de adaptar parte dessa legislação, e só parte, uma vez que a restante manter-se-á em vigor, ao crime mais similar, isto é, ao crime de burla. Não se atacou a tipificação da burla, que esteve na origem desta adaptação; preferiu-se atacar o resultado. Foi a meu ver, um processo francamente ilógico sem qualquer fundamentação rigorosa, portanto, científica.
Também se acusou, por parte do Partido Comunista Português, a não criminalização no projecto do Código Penal das relações do direito do trabalho. Responderei ao Partido Comunista Português que não existe qualquer código penal no Mundo que faça a criminalização, por exemplo, do não pagamento de salários.
Ficarei à espera que o Partido Comunista Português me apresente um único exemplo em todo o mundo, mesmo nos países de regime comunista, onde isso se processe.
Finalmente, a questão que se quis empolar sobre a criminalização do aborto.
Começo por responder a duas perguntas da Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes.
Não quis fazer qualquer discriminação entre o homem e a mulher na tipificação deste crime. Recorrendo à parte geral e através dos princípios gerais da comparticipação, é possível encontrar aí a resposta. Por outro lado, se houve a necessidade de inserir o conceito de desonra e não o valor do direito à vida, foi porque este já se continha na parte especial, e aquele não se continha.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - É fraco, não é resposta.
O Orador: - Mas eu ainda não acabei, Sr. Deputado. O Sr. António Vitorino (UEDS): - É só suspense ...
O Orador: - Sobre o ponto da descriminalização, despenalização ou legalização do aborto - três expressões que. como sabem, não são coincidentes - travou-se aqui uma grande discussão, agora culminada com a intervenção da Sr.ª Deputada Zita Seabra. Em primeiro lugar, não vejo que haja qualquer ilegalidade da minha parte em solicitar uma informação - parecer à Procuradoria-Geral da República.
Em segundo lugar, devo informar a Sr.ª Deputada que acabei de homologar essa informação-parecer. Assim, ele deixará de ser secreto e será enviado a quem o pedir. Aliás, creio que o Partido Comunista já o pediu.
Posso adiantar que esse parecer não conclui pela inconstitucionalidade do projecto de lei do Partido Comunista Português, embora ponha algumas reservas a essa inconstitucionalidade.
Esse parecer conclui, sim. pela perfeita constitucionalidade da criminalização do aborto. A dúvida jurídico-constitucional posta pela Sr.ª Deputada não tem, assim, qualquer razão de ser.
Já disse no início que a manutenção deste tipo legal de crime assenta numa certa concepção do mundo e da vida.
Admito perfeitamente que essa concepção varie sociologicamente em cada país, e que evolua, mas não encontro neste momento condições em Portugal para se ir mais longe.
A solução não será a do Partido Comunista Português, que tem erros gravíssimos, um dos quais é o de descriminalizar sempre a mulher e criminalizar sempre o médico, o que levaria, precisamente, à proliferação dos abortos clandestinos - o que se quer evitar, através desse projecto. Após o período de 3 meses, a intervenção de qualquer médico passa a ser punida, e aí a actuação da mulher é despenalizada.
Destas duas circunstâncias a conclusão e fácil de tirar. Não será essa a solução. Certamente que esta ou outra qualquer Assembleia virá a aprovar o projecto. Apesar de bem elaborado, bem investigado, o projecto de lei do Partido Comunista contém soluções manifestamente incorrectas, o que acontece em qualquer obra humana. Com certeza que o Partido Comunista não deve querer para si um poder divinatório.
Suponho que não será nunca um projecto de lei do tipo que o Partido Comunista Português apresentou que virá a ser aprovado.
Como já referi, entendeu-se, que não existiam condições, que a filosofia prevalecente na sociedade portuguesa é a de proteger criminalmente a vida, mesmo a vida intra-uterina. e que será esta a melhor, ou a menos má, forma de combater o aborto clandestino. E está provado que naqueles países que legalizaram o aborto, o aborto clandestino aumentou.
Vozes do PS e do PCP: - É falso!
O Orador: - Isso consta de estatísticas e de estudos que a Sr.ª Deputada Zita Seabra bem conhece.
Em resumo, creio que todo este esforço legislativo do Governo mereceu um debate aprofundado, que poderá e deverá ser acentuado, quer a nível da Assembleia até à publicação da lei de autorização legislativa, quer através de outros meios de comunicação social com a participação, como é evidente e se nisso consentirem, de todas as forças políticas.
Como disse no início, a aprovação desta proposta de lei constitui uma verdadeira e real viragem de página nas instituições penais e penitenciárias portuguesas.
O voto favorável a esta proposta de lei é um voto a favor do progresso, é um voto a favor da recuperação social dos delinquentes, é um voto a favor da liberdade das liberdades.
Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação ...
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Dá-me licença. Sr. Presidente? É para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça o favor.
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, durante esta discussão não se disse uma palavra sobre a proposta de lei n.º 103/II. Ela traz alguns problemas importantes, varre de uma assentada os assentos do Supremo Tribunal de Justiça, possibilita que as acções ordinárias e determinados processos sejam julgados só pelo juiz singular. Isso são coisas importantes processualmente.
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Por outro lado a maior parte dos partidos têm o seu tempo esgotado Punha o problema a Mesa de saber se se vai votar uma proposta sem se dizer uma palavra sobre todos esses problemas importantes Não haverá outra hipótese de resolver o assunto.
O Sr. Presidente: - Sr Deputado em primeiro lugar queria dizer lhe que estava a por a votarão a proposta de lei n º 100/II e não a proposta de lei n º 103/II E essa a minha intenção.
Quanto a essa ultima proposta de lei a n º 103/II, e certo que alguns Srs. Deputados lhe fizeram referência.
Parece-me ate que a sua bancada interpelou a Mesa no sentido de saber se se poderia fazer simultaneamente referencia as duas propostas E isso ficou ao arbítrio dos Srs Deputados intervenientes
De qualquer maneira não vejo qualquer espécie de problema em relação a proposta de lei n º 100/II Em relação a proposta de lei n º 103/11 penso que, depois da votação na generalidade e na especialidade da proposta de lei n º 100/II os grupos parlamentares poderão acertar numa distribuição equitativa dos tempos dentro dos limites que nos restam na sessão de hoje sendo certo que temos também agendada a discussão na especialidade, da proposta de lei n º 82/II
O único Sr Deputado inscrito para usar da palavra sobre a proposta de lei n º 103/II e o Sr Deputado António Arnaut que alias não me parece estar presente Mas admito que outros Srs Deputados se queiram pronunciar
Em todo o caso penso que seria preferível chegarem rapidamente a um acordo quanto a uma distribuição equitativa do tempo que nos resta da sessão de hoje
Srs Deputados vamos agora votar na generalidade a proposta de lei n º 100/11 qua autoriza o Governo a legislar em matéria de detimção de crimes, penas e medidas de segurança com vista a aprovação de um novo Código Penal e a revogação do Código Penal vigente, bem como a adoptar as necessárias disposições transitórias de direito criminal e de processo criminal, autorizando ainda o Governo a legislar em matéria de contravenções, a alterar a legislação respeitante as contra-ordenações e a legislar sobre o regime penal especial aplicável d jovens delinquentes dos 16 aos 25 anos
Submetida à votação foi aprovada com 90 votos a favor (do PSD do CDS do PPM e da ASDI) e votos contra ido PCP e da UDP) e 24 abstenções (do PS da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr Presidente: - Srs Deputados vamos agora votar na especialidade a proposta de lei n º 100/II
Deram entrada na Mesa apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PSD propostas de substituição relativas aos artigos l º e 2 º Vai ser lida e votada a proposta de substituição respeitante ao artigo l º
Foi lida. É a seguinte:
ARTIGO 1.º
E concedida ao Governo autorização para legislar em matéria de definição de crimes penas e medidas de segurança com vista a aprovação de um novo Código Penal e a revogação do Código Penal vigente, bem como adoptar as disposições adequadas de direito criminal de processo criminal e de organização judiciaria.
Submetida a votação foi aprovada tem 90 votos a favor Ido PSD do CDS do PPM e da ASDI) 33 votos contra (do PCP e da UDP) e 24 abstenções (do PS da UEDS e do MDP/CDE)
O Sr Presidente: - Srs Deputados, vai ser lida e votada a proposta de substituição respeitante ao artigo 2 º
Foi lida. É a seguinte
ARTIGO 2.º
Fica igualmente autorizado o Governo a legislar em matéria de contravenções a alterar a legislação respeitante as contra-ordenações e a legislar sobre o regime penal especial aplicável a jovens adultos dos 16 aos 21 anos
Submetida a cotação foi aprovada com 90 votos a favor (do PSD do CDS do PPM e da ASDI) 31 votos outra (do PCP e da UDP) e 24 abstenções (do PS da UEDS e do MDP/CDE)
O Sr Presidente: - Srs Deputados vai agora ser lido c' votado o artigo 3.º da proposta de lei
Foi lido. É o seguinte
ARTIGO 3.º
autorização legislativa concedida pela presente lei caduca decorridos 3 meses sobre a data da sua entrada em vigor.
Submetido a votarão foi aprovado com 90 votos (do PSD do CDS do PPM e da ASDI) votos contra (do PCP e da UDP) e 24 abstenções (do PS da UEDS e do MDP/CDE)
O Sr Presidente: - Para uma declaração de voto tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (UEDS) - Sr Presidente, Srs Deputados O Grupo Parlamentar da UEDS absteve se na votação da proposta de lei n º 100/II por 3 razões fundamentais em primeiro lugar porque constam deste projecto do Código Penal inovações manifestamente positivas, sob o ponto de vista pontual de actualização imprescíndivel da legislação penal vigente que data de 1852 e porque por mais retrogradas e conservadoras que sejam algumas das soluções consagradas sempre são apesar de tudo, mais aggiornate que as do velho Código, em segundo lugar porque o projecto do Código se mova no domínio de múltiplas concepções criminalistas - como e o caso do regime da prisão preventiva - mantém no entanto, uma marca filosófica e moral passadista por exemplo na questão do aborto que rejeitamos Em matéria de aborto este Código não consegue sequer ocultar a desonra do Governo! Finalmente e porque a abstenção e, em nosso entender uma mera moratória a ratificação fica prometida
Cá esperaremos o Código para ser ratificado e mais o Sr Ministro e o seu Código se entretanto não for chamado a desempenhar outras honrosas e mais altas funções que o despenalizem no bom sentido claro está!
Vozes e risos da UEDS, do PS e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr Deputado João Morgado inscreveu-se para fazer uma declaração de voto no entanto o seu grupo parlamentar já esgotou o seu tempo
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O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr Presidente, dá-me licença'
O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr Deputado.
O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr Presidente, peço imensa desculpa mas se ha grupo parlamentar, que não usou mais tempo do que aquele que foi programado, foi o do CDS, Nessa circunstancia, nos termos acordados na reunião dos lideres; desta manhã, entendo que o Grupo Parlamentar do CDS tem o direito de usar da palavra São só l minutos
O Sr. Presidente: - Pronto Sr Deputado, taça o favor de não gastar 5 minutos a explicar aquilo que, porventura se resolve em 2.
Risos.
O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr Presidente, penso que não demorei mais tempo do que a Mesa em qualquer das circunstâncias.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma declaração de voto o Sr Deputado João Morgado.
O Sr. João Morgado (CDS): - Sr Presidente, Srs Membros do Governo. Srs Deputados O Governo, através da proposta de lei n.º 100/II pediu a esta Assembleia autorização para legislar sobre matéria de definição de crimes, penas e medias de segurança com vista a aprovação de um Código Penal e a revogação do Código Penal vigente O meu partido votou favoravelmente a concessão dessa autorização por entender que de ha muito se faz sentir a premência na alteração do Código Penal em vigor Sublinhe-se que os estudos preparatórios remontam a década de 60 e que o actual Código Penal conta já cerca de 130 anos de idade No debate da proposta de lei não se ouviu no hemiciclo nenhum argumento solido que contrariasse a concessão da autorização legislativa E certo ter sido retendo que a dignidade da matéria não se compadece com a aprovação, pelo Executivo, de um novo Código Penal Mas sobre este remoque deve dizer-se que ele e normal e regulamentarmente repartido pelas bancadas da oposição, sempre que o Governo pede autorizações legislativas Também ouvimos aqui que o Governo pretende retirar a este Parlamento a possibilidade da discussão seria e a fundo das matérias tratadas no Código penal, e mais que algumas das opções em matéria de penalização consubstanciam posições hipócritas, aberrantes e injustas Naturalmente que não podemos estar de acordo O Parlamento tem e mantém ao seu alcance mesmo concedendo a autorização pedida mecanismos que lhe permitem discutir, em sede de Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, o Código Penal que vier a ser aprovado pelo Governo Ponto e que a maioria assim o decida
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Mas a oposição tem de convencer-se de unia vez por todas que em democracia não pode obter no Parlamento o que o povo negou nas eleições, e por isso, não lhe será licito impor soluções que a esmagadora maioria do povo rejeita, mesmo que coloridas demagogicamente com argumentos falaciosos e inconsistentes
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - O poder de legislar sobre a matéria em causa cabe, nos termos constitucionais, a este Parlamento Mas a disposição que fixa a competência exclusiva da Assembleia tem a mesma dignidade da norma que prevê a concessão ao Governo de autorizações legislativas sobre matéria da competência reservada
O Sr. Armando Lopes (PS): - Quem disse!
O Orador: - De um modo geral o meu partido concorda com o teor do projecto governamental do novo Código Penal e esta certo de que a justiça portuguesa saíra dignificada com a sua entrada em vigor E não pode deixar de congratular-se pela iniciativa legislativa do Governo em matéria de tão grande alcance e de tão profundo impacto na ordem jurídica da sociedade portuguesa
Aplausos, do CDS e do Sr. Deputado Manuel Pereira do PSD
Entretanto reassumiu a Presidência o Sr. Vice-Presidente Américo de Sá.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr Deputado Armando Lopes
O Sr. Armando Lopes (PS): - Sr Presidente Srs Deputados Poderiamos ter votado contra o pedido de autorização legislativa n º 100/II Porque se trata de uma autorização para legislar em matéria penal e esse foi sempre o comportamento do PSD enquanto tomos Governo e o PSD oposição Por exemplo a p 2975 da l.ª serie do Diário da Assembleia da Republica de 1978 consta
Nós votamos contra esta autorização legislativa pelas seguintes razões numa Assembleia em que o Governo detém a maioria não se justificam a nosso ver. pedidos de autorização legislativa
Trata-se de uma declaração de voto do PSD a respeito do pedido de autorização do Governo em matéria de processo penal produzida pelo então ilustre deputado Meneres Pimentel.
Aquela declaração foi feita pelo mesmo Sr Deputado em relação ao pedido de autorização do Governo para definir crimes e penas não superiores a 2 anos de prisão
Vozes do PS: - O Sr. Ministro não esta a ouvir! Ouça! Ouça!
O Orador: - Não quisemos, porem, usar do mesmo processo de criar oposição só por sermos oposição Entendemos que o Código Penal e uma peça legislativa tão importante que não nos deveríamos opor contra ele Abstivemo-nos apenas Na certeza porem de que pediremos a ratificação dos diplomas em causa, logo que forem publicados, porque entendemos que esta Câmara tem uma palavra a dizer sobre tais matérias e não podem estas ser-lhe escamoteadas
Aplausos do PS e da UEDS
O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto tem a palavra o Sr Deputado Sousa Lara
O Sr. Sousa Lara (PPM): - Sr Presidente, Srs Ministros. Srs Deputados O Grupo Parlamentar do PPM votou favoravelmente este pedido de autorização legislatu-
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va no convencimento de que o Governo vai ter possibilidade de introduzir alguns ajustamentos no texto que nos foi apresentado, nomeadamente na sua parte especial Para esse efeito apresentara o PPM um conjunto de sugestões que abrangem as alterações que entendemos mais convenientes
O regime profundamente liberal e flexível que o novo Código quer introduzir em Portugal, tendo aspectos humanitários. sociais e científicos louváveis, envolve, contudo. no nosso entender, potenciais riscos, entre os quais não será se esquecer mesmo o da desadequação cultural, o que a verificar-se poderia abrir caminho a desvios de justiça popular ou de justiça privada
Entendemos possível uma ultima reflexão que sem pôr em causa globalmente as vantagens da reforma agora autorizada conduza aos melhoramentos e a prudente ponderação de diversos problemas suscitados pelo texto anexo a proposta
Daí que tivéssemos aprovado a autorização legislativa, a qual a oposição não tem razão em verberar, pois, legiferando o Governo por decreto-lei ao abrigo dela, sempre haverá possibilidade de esta Assembleia o chamar a ratificação
O Sr. António Vitorino (UEDS): - E um Código da monarquia!
O Sr. Presidente: - Igualmente para uma declaração de voto. tem a palavra o Sr Deputado António Taborda
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr Presidente. Srs Deputados Abstivemo-nos da votação respeitante a proposta de autorização n º 100/II por entendermos que, apesar de o projecto do Código Penal anexo na sua parte geral ser um significativo avanço em relação ao actual Código e ate extremamente inovador em muitos sentidos, a verdade e que desde logo não poderiamos votar a favor de tal proposta por entenderemos que esta matéria, pela sua importância e dignidade deveria caber senão em exclusivo a esta Camará e nunca ser tramitada através de uma autorização legislativa.
Por outro lado, a parte especial deste projecto de Código Penal e omissa quanto a penalização e codificação de condutas do maior relevo, como sejam os crimes antieconómicos os relativos as relações de trabalho, as relações comerciais aos cheques sem cobertura, a droga, etc , e no outro extremo penaliza condutas aceites hoje pela maioria da sociedade como por exemplo, o aborto
Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente Oliveira Dias.
O Sr. Presidente: - Srs Deputados, vamos agora passar a proposta de lei n º 103/II Na rápida consulta que tive ocasião de fazer aos vários grupos parlamentares e partidos, parece-me que estamos em condições de votar, pretendendo alguns Srs Deputados ou grupos parlamentares produzir oportunamente declarações de voto a este respeito
O Sr. Manuel Pereira (PSD): - Sr Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação a Mesa
O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr Deputado.
O Sr. Manuel Pereira (PSD): - Sr Presidente, segundo as suas palavras, não compreendi bem se haverá um período suplementar para o Sr Deputado António Taborda fazer uma declaração de voto ou para fazer uma intervenção inicial
O Sr Presidente: - Para declaração de voto, Sr Deputado Alias, não e só para o Sr Deputado António Taborda. mas sim para outros Srs Deputados que a queiram fazer, pelo menos ha um outro grupo parlamentar que me disse que também pretendia fazê-la
O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, dá-me licença.
O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr Ministro.
O Sr. Ministro da Justiça: - Sr Presidente, como eu não posso fazer declaração de voto. creio que pode transformar-se as declarações de voto em curtas intervenções
O Sr. Presidente: - Sr Ministro, peco-lhe desculpa, mas realmente esqueci-me de consultar V. Ex.ª quando procurei informar-me dos sentimentos da Câmara a esse respeito No entanto, penso que a Câmara, da mesma maneira que acordamos em que os grupos parlamentares que assim o desejarem, farão declarações de voto, não terá reservas de maior a que o Sr Ministro faça uma breve apresentação da sua proposta de autorização legislativa
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr Presidente, peço a palavra
O Sr. Presidente: - Faça o favor. Sr Deputado
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr Presidente, desde que o Sr Ministro se propõe fazer a apresentação da proposta de autorização legislativa, talvez pudesse haver pedidos de esclarecimento a essa intervenção e assim pudesse fazer-se um mínimo de debate sobre a proposta
O Sr. Presidente: - Sr Deputado, por mim estou disponível.
O Sr. Manuel Pereira (PSD): - Sr Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça o lavor. Sr Deputado.
O Sr. Manuel Pereira (PSD): - Sr Presidente, receamos que com este processo não venhamos a fazer a votação hoje ate as 20 horas, tal como estava previsto Alias, ainda temos uma outra matéria a iniciar
Portanto, parece-me que esse processo não será o mais indicado Aceito perfeitamente o que o Sr. Ministro faça uma intervenção inicial porque não pode fazer declarações de voto, portanto em igualdade de condições com o Governo, no entanto, penso que os deputados só podem fazer declarações de voto
O Sr. Presidente: - Então tem a palavra o Sr Ministro da Justiça.
O Sr. Ministro da Justiça: - Sr Presidente. Srs Deputados Desculpem esta minha insistência mas não e meu timbre deixar passar questões que são importantes Por isso, referirei muito sinteticamente que, ao tomar posse do cargo de Ministro da Justiça, senti a necessidade urgente de fazer a recuperação do sistema judiciário da admnis-
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tração judiciária Ora, nesse programa que então estabeleci - bom ou mau, não importa - para a recuperação da administração judiciária, inseria-se a reforma do Código de Processo Civil
É conhecido de todos um decreto-lei já publicado que se norteia por 2 princípios fundamentais o primeiro, a celeridade na administração da justiça e o segundo, a desburocratização dessa mesma administração Poderá acontecer, como e inerente a qualquer obra humana, que uma ou outra disposição não tenha sido, felizmente ou com felicidade, redigida, e é por isso que foi aqui suscitado o processo de ratificação
Como essa proposta de lei se insere em dois domínios da competência reservada da Assembleia, teve que vir aqui Mas começarei por dizer que não me surpreendem as reacções dos meios forenses ou de certa classe dos meios forenses, mais claramente dos advogados, sem qualquer reforma da Lei Processual Isso tem-se verificado não só neste pais como em países estrangeiros, na medida em que o direito processual e de aplicação diária e constante, as novas soluções implicam sempre uma não desejada mudança de hábitos e dai que, por exemplo, na Aústria, no fim do século passado, quase se tenha feito uma revolução quando se iniciou a Reforma do Processo Civil
Uma outra questão que também gostaria de referir e a do processo Ha quem entenda que teria sido melhor fazer um Código de Processo Civil novo A experiência estrangeira e nacional mostra-nos que esse processo leva a que os Códigos de Processo Civil quando completados já perderam a actualidade ou demoraram tanto tempo que já não trazem qualquer novidade e, entretanto, perderam-se oportunidades manifestas de fazer caminhar gradual e progressivamente à administração judiciária.
Portanto, optei pelo regime da reforma gradual e parcial e anunciei essa reforma e a metodologia para a mesma numa sessão realizada no Supremo Tribunal de Justiça, para o qual foram convidadas todas as entidades às quais poderia interessar a revisão do Código de Processo Civil, sem esquecer - como me pareceu evidente - os lideres dos grupos parlamentares desta Assembleia Então, tive oportunidade de esclarecer que os anteprojectos iriam ser - tal como foram - amplamente distribuídos por todos os profissionais do foro do país e que. além disso, apenas acabariam por ser adoptadas as soluções que tivessem o aplauso da maioria
Várias centenas de exemplares foram distribuídos individualmente a advogados, a respectiva Ordem, aos magistrados, as respectivas associações sindicais dos magistrados, aos professores de Direito e aos funcionários e respectivas associações de classe, do mesmo modo que se facultaram exemplares a quem os pediu, para alem destes destinatários mais directos
Apesar de todo o empenho na larga divulgação destes documentos, houve quem se surpreendesse com a publicação de um recente decreto-lei, talvez por não ter mandado previamente esse mesmo projecto de decreto-lei aqui para a Assembleia, circunstância de que muito me penitencio, mas que está reparada através de um prolongamento do inicio da vigência
Quero aqui salientar a preciosa colaboração que em todo este processo tem prestado a Associação Portuguesa dos Jovens Advogados, a qual tem dado todo o aplauso às soluções preconizadas pelo Ministério da Justiça
No caso concreto, acontece que nos termos do artigo 51 º da Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais, o tribunal colectivo tem de intervir necessariamente no julgamento da questão de tacto nas acções ordinárias, ao contrário do que
acontece nas acções sumárias, em que as partes, se quiserem, podem prescindir do colectivo.
Pretende-se alargar esta faculdade - mera faculdade e não obrigatoriedade Isto é- desde que o tribunal colectivo só possa ser substituído pelo juiz singular mediante acordo das partes representadas no processo, tudo aconselha que os litigantes possam contentar-se com a intervenção do tribunal singular
Trata-se de uma providência de larguíssimo alcance, sobretudo numa época em que escasseiam as vocações para a magistratura judicial e em que ainda não estão completamente recuperados os atrasos na administração judiciária.
Além disso, suponho que a medida proporciona às partes inegáveis vantagens, visto permitir que o julgamento tenha lugar mais cedo, desonerando-as simultaneamente dos encargos decorrentes da intervenção de 3 juízes
A missão do segundo ponto desta proposta é a de uniformizar a jurisprudência atribuída ao Supremo Tribunal de Justiça que tem sido desempenhada, quer pela intervenção de todos os juízes em reunião conjura de secções, quer mediante o emprego do recurso para o Tribunal Pleno
É, porém, geralmente reconhecido não serem (arnosos os resultados conseguidos
A reunião conjunta de secções não tem logrado o êxito esperado, e, por outro lado, a emissão de assentos através do plenário do Supremo Tribunal de Justiça tem demorado excessivamente
Procurando remediar todos estes inales, num segundo diploma já pronto, integrado na reforma do Código de Processo Civil, suprime-se o recurso para o Tribunal Pleno e a disciplina vigente das secções reunidas, firmando-se um único regime, mais expedito e capaz de originar maior abundância de assentos, em que o Supremo Tribunal exerce o papel de uniformizar a jurisprudência dentro dos quadros de um simples recurso de revista ou de agravo interposto na 2.ª instância
Atenta, porém, a reserva de competência desta Assembleia, o disposto na alínea f) do artigo 27 º da Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais insere-se nessa competência reservada e dai a necessidade desta autorização legislativa.
Segundo o entendimento da pessoa que em Portugal mais se tem dedicado ao instituto dos assentos, o Prof. Castanheira Neves, os assentos não deveriam ter força obrigatória, visto ser inconstitucional o artigo 2.º do Código Civil, ao atribuir aos tribunais competência para proferir decisões com força obrigatória geral
Nestes termos, para que aos tribunais seja reconhecido, sem sombra de dúvida, o poder de legislar por meio de assentes, não basta declarar-se no artigo 122 º da Constituição que devem ser incluídas no jornal oficial as decisões dos tribunais com força obrigatória geral Julgo imperioso acrescentar ao artigo 206 º um numero em que se atribua expressamente aos tribunais competência para proferir decisões com força obrigatória geral - como. de resto, chegou a constar de uma das versões estabelecidas por consenso aqui nesta Assembleia
A supressão do recurso para o Tribunal Pleno e a criação de um outro sistema de uniformização da jurisprudência devem, porem, ser estendidas ao processo criminal, e dai outra razão para este conjunto de normas vir a esta Assembleia
Por outro lado, nos termos dos artigos 688 º e 689 u do Código de Processo Civil, os despachos que não recebam um recurso ou os retenham só podem ser impugnados em
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reclamação hierárquica dirigida ao presidente do tribunal superior
Tratando-se, como se trata de uma função jurisdicional, e verdadeiramente anómalo - e isto e criticado pela generalidade dos juristas - que tais decisões não estejam sujeitas a regra geral da impugnação através de um agravo, embora de tramitação mais expedita
Esta uma outra alteração que se pretende introduzir, quer no Código de Processo Civil, para o que hão seria necessária a intervenção desta Assembleia, quer no Código de Processo Penal onde essa intervenção e já necessária
Também se procura a isenção de selo para certos documentos que se devem juntar aos articulares e a outros requerimentos de maneira a facilitar a acção dos advogados evitando-lhes a consulta sistemática aos processos
E este um conjunto de medidas saudáveis para uma celeridade processual A Assembleia, contudo dirá a sua ultima palavra
O Sr. Presidente: - Para formularem pedidos de esclarecimento estão inscritos os Srs Deputados António Taborda e Armando Lopes.
Tem a palavra o Sr Deputado António Taborda.
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente Srs Deputados, Sr Ministro Fundamentalmente são 4 as questões que aqui são postas neste pedido de autorização governamental Isto e a possibilidade do julgamento de matéria de tacto nas acções ordinárias ser efectuado por juiz singular a substituição do actual regime de assento, a abolição da reclamação hierárquica do despacho de não recebimento ou de retenção do recurso a apresentação em duplicado de todos os requerimentos, alegações ou quaisquer outros documentos juntos aos processos
Estas duas ultimas medidas são positivas Quanto as primeiras porem, queria muito sucintamente pôr algumas questões
Como o Sr. Ministro sabe, isto imbrica com o novo Código de Processo Civil que esta na situação que V. Ex.ª sabe Assim o primeiro problema que eu ponho e o de saber qual a utilidade de aprovar agora normas que vão imbricar directamente com o Código de Processo Civil, estando ele numa situação híbrida - foi pedida a ratificação tendo-se entretanto suspendido por também ter sido prorrogada a vacatio legis até l de Dezembro Não seria preferível. Sr Ministro, pelo menos quanto a estas duas primeiras questões, manter também todo o problema em suspenso ate uma decisão final desta Câmara quanto a ratificação ou não ratificação do Código de Processo Civil.
Mas para alem disto punha o problema de fundo quanto a primeira questão, ou seja a possibilidade do julgamento da matéria de facto pelo juiz singular.
Como o Sr Ministro sabe melhor do que eu, o que hoje se passa quanto a matéria de tacto e a possibilidade de recurso para a Relação e que esta, na realidade, funciona como um tribunal não de instancia mas sim de revista Na realidade, e impossível recorrer-se da matéria de facto - a que eu chamo a ditadura do colectivo
Transformar esta ditadura do colectivo na ditadura do juiz singular, quanto a matéria de facto não será agravar ainda mais as coisas.
Quando e que o Governo entende fazer o que me parece ser norma na generalidade dos países, isto e fazer o registo das audiências de l a instancia, para que haja, de tacto, a possibilidade pratica do recurso da matéria de facto'
Quanto aos assentos, disse o Sr Ministro que a aprovação já feita por esta Camará - e suponho que por unanimidade - da alínea g) do novo artigo 122 º da Constituição da Republica não representa, só por si, a constitucionalização dos assentos A ser assim, qual a vantagem pratica e o conteúdo útil da aprovação desta alínea que refere as decisões do Tribunal Constítucional, bem como as dos outros tribunais a que a lei confira força obrigatória geral.
Se isto não representa propriamente a constitucionalização, apertis verbis da figura do assento e, parece-me a constitucionalizarão remetendo par a lei geral, dos próprios assentos
Por outro lado Sr. Ministro, o mecanismo proposto nos novos artigos 668.º a 670.º do novo Código de Processo Civil não será uma duplicação de instancias E os critérios de oportunidade, ai quase erigidos em dogma para se chegar ou não a uniformização da jurisprudência, não brigarão com a segurança do direito nestes casos, e com as legitimas expectativas das partes.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Armando Lopes.
O Sr. Armando Lopes: (PS) - Sr Ministro, gostaria de colocar apenas duas questões.
A primeira respeita às alterações ao artigo 728 º do Código de Processo Civil No sentido de se conseguir a unificação da jurisprudência altera-se o preceito e permite-se que se façam reuniões das secções do Supremo para decidir a matéria que porventura seja duvidosa Ao mesmo tempo, vai diminuir-se a possibilidade de recurso para o Tribunal Pleno
Assim, ponho a seguinte duvida por um lado, faz-se recuar, parece que para um plano secundário, o recurso para o Tribunal Pleno, pondo a funcionar, numa grande inflação, as secções cíveis reunidas no decorrer da própria apreciação do recurso - e nesta medida pretende simplificar-se os processos por outro lado substitui-se a reclamação hierárquica dos despachos que não admitem recurso ou que o retenham por um recurso de agravo, fazendo, assim intervir numa questão simples e que nunca levantou protestos dignos de nota. o próprio tribunal de recurso, em vez apenas do seu presidente Isto vai, parece-me complicar tudo
Esta a minha primeira duvida.
A outra questão e referente a alteração do n.º 3 do artigo 91.º do Código de Processo Penal, em que se dispõe agora que toda a pessoa devidamente notificada ou avisada que não compareça no dia hora e local designados e não justifique a falta. incorrera em multa, podendo o juiz ordenar a sua comparência sob custodia ao acto para que tivesse sido notificada ou avisada.
Entendia-se, em interpretaçâo da Procuradoria-Geral da Republica, que essa falta de comparência poderia determinar o levantamento de auto por crime de desobediência Com a nova redacção, estabelece-se que, na hipótese de falta de comparência o juiz pode ordenar a detenção do faltoso para assim assegurar a sua comparência perante a autoridade judicial o que e a mesma coisa de o fazer comparecer sob custodia
Acrescenta-se ainda que a detenção também pode ser ordenada em virtude de desobediência a decisão tomada
Esta solução parece-me esquisita, pois em lugar do levantamento de um auto por crime de desobediência - a apreciar e julgar em tempo oportuno, depois de devidamente instruído o processo e ouvido o interessado na
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justificação da sua falta -, o juiz manda deter imediatamente o faltoso por ter cometido o crime de desobediência. (Suponho que é assim que tem que se interpretar o texto). Com a agravante de o arguido do crime de desobediência não poder ser julgado de imediato em processo sumário, pois não vemos como haja flagrante delito que autorize tal processo.
Possivelmente quereria consagrar-se em termos legais a interpretação da Procuradoria-Geral da República, só que, a ser essa a intenção, ela ter-se-ia conseguido se se dissesse que a detenção visava assegurar a comparência do faltoso ao acto para que tinha sido notificado ou avisado, sem embargo de contra ele se instaurar procedimento criminal por crime de desobediência.
Não sei se interpreto bem o que ora nos e proposto, mas, se assim é levantam-se-me bastantes dúvidas de entendimento.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro da Justiça.
O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Sr. Deputado António Taborda: Quanto à primeira questão, isto é, de se estar na tal situação indefinida - que não é indefinida, pois embora a ratificação esteja pedida, não está suspensa a vigência - o problema resolver-se-á atribuindo aos diplomas que forem publicados no uso desta autorização legislativa o mesmo início de vigência que está proposto para o anterior decreto-lei.
Quanto ao problema dos assentos terem ou não força obrigatória geral, pois aqui apenas se faz uma alteração de tramitação, fazendo intervir as secções cíveis e não o Plenário do Supremo Tribunal. A utilidade ou inutilidade desses assentos será ditada por VV. Ex.as, aquando da conclusão do processo de revisão constitucional. Limitei--me apenas a chamar a atenção de que não seria suficiente a alteração que. segundo tenho conhecimento, já foi feita.
A questão da obrigatoriedade ou não dos assentos fica. pois, para os constitucionalistas, ou seja. para VV. Ex.as. que estão a rever a Constituição. Esta fórmula não briga nem com a actual versão da Constituição, nem com qualquer outra versão que venha a ser utilizada. É apenas uma fórmula processual de intervenção.
Quanto à possibilidade de intervenção de um juiz singular, isto em primeiro lugar, como o Sr. Deputado referiu, depende da vontade das partes. Tem a vantagem da celeridade e também tem a vantagem da economia de custos.
Julgo que o problema mais fundamental foi aquele que pôs. o chamado problema da ditadura do colectivo. Estou inteiramente de acordo que o Tribunal da Relação é um tribunal de revista. Apenas o posso informar de que estão em curso estudos no Ministério da Justiça para que, de alguma forma - talvez não a mais generalizada -, se introduza o registo magnético dos depoimentos em 1.ª instância ou outro qualquer sistema que obvie a esse tal problema, que o Sr. Deputado muito bem colocou.
Quanto às reclamações hierárquicas, respondendo ao Sr. Deputado Armando Lopes, direi que também poderei adoptar aqui a expressão do Sr. Deputado António Taborda, isto é, verifica-se uma ditadura dos presidentes dos tribunais superiores.
Julgo que a transformação disto num recurso em termos muito simples, que estão aqui explanados, conferirá muito maior segurança em caso de não se julgar irrecorrível determinada decisão.
Quanto ao outro problema que o Sr. Deputado Armando Lopes me colocou, tal como não diz respeito a esta proposta de lei mas sim à anterior. Salvo erro, era nessa altura que me devia ter posto a questão. No entanto, julgo que a sua interpretação - que não pude captar bem - será a correcta. Poderá acontecer que a redacção não responda concretamente à sua interpretação ou à interpretação que julga desejável, mas julgo ter surpreendido nas suas palavras uma identidade de pontos de vista. A formulação poderá estar mal feita. Terei isso em consideração.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dou por encerrada a discussão. Vamos votar a proposta de lei n.º 103/II.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença?
O Sr. Presidente: - Faça o favor. Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, agradecíamos que fosse verificado o quórum.
O Sr. Presidente: - Vamos verificar.
Pausa.
Neste momento, há 111 deputados na Sala. Agradecia à direcção dos grupos parlamentares que procurassem chamar os Srs. Deputados que estejam noutras salas. Penso que poderemos reunir rapidamente o quórum necessário.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença?
O Sr. Presidente: - Faça o favor. Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, parecer-nos-ia melhor que encerrássemos agora a sessão - uma vez que se trata apenas da votação, iniciando por ela os nossos trabalhos na sexta-feira - do que estarmos aqui à espera dos Srs. Deputados.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, ainda não estamos na hora regimental e tem estado a entrar na Sala vários deputados. Por isso é que ainda não encerrei os trabalhos.
O Sr. Manuel Pereira (PSD): - Sr. Presidente, dá-me licença?
O Sr. Presidente: - Faça o favor. Sr. Deputado.
O Sr. Manuel Pereira (PSD): - Sr. Presidente, salvo erro, há duas comissões a funcionar. Já foram chamar os Srs. Deputados. Com certeza que estarão a chegar. Era só mais l minuto. -
Pausa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já há quórum. Passamos, portanto, à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 103/II.
Submetida à votação, foi aprovada com votos a favor do PSD, do CDS. do PPM e da ASDI. votos contra do PCP, do MDP/CDE e da UDP e as abstenções do PS e da UEDS.
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5114 I SÉRIE - NÚMERO 122
O Sr Presidente: - Srs Deputados passamos agora a votação, na especialidade Pergunto se ha algum algum inconveniente em votar simultaneamente os dois artigos da proposta de lei n.º 103/II.
Pausa.
Como não ha qualquer objecção, vão ser votados em simultâneo os referidos dois artigos.
Submetidos a votação foram aprovados com votos a favor do PSD do CDS do PPM e da ASDI votos contra cio PCP do MDP/CDE e da UDP e dai, abstenções do PS e da UEDS
São os seguintes:
ARTIGO 1.º
E concedida autorização ao Governo para legislar em matéria de organização e competência dos tribunais bem como sobre o processo criminal e isenção do selo
ARTIGO 2 º
A autorização legislativa caduca se não for utilizada no prazo de 6 meses, a contar da data da entrada em vigor desta lei.
O Sr. Presidente: - Srs Deputados não ha agora tempo para produzir as declarações de voto Sugeria aos Srs Deputados que as enviassem por escrito
A nossa próxima reunião esta marcada para amanhã, as 10 horas para se continuar a debater os projectos da revisão constítucional.
Devo ainda informar a Camará de que deram entrada na Mesa as seguinte ratificações n.º 182/II, da iniciativa dos Srs Deputados Rogério de Brito e outros do Grupo Parlamentar do PCP sobre o Decreto-Lei n º 269/82, de 10 de Julho n º 183/II, de iniciativa dos Srs Deputados Vilhena de Carvalho e outros, do PS, da ASDI e da UEDS sobre o Decreto-Lei n º 274/82. de 14 de Julho n º 184/II, da iniciativa dos Srs Deputados Magalhães Mota e outros, da ASDI e da UEDS. sobre o Decreto-Lei n º 277/82, de 16 de Julho
Srs. Deputados, esta encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 5 minutos
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD)
António Vilar Ribeiro
Cristóvão Guerreiro Norte
Daniel Cunha Dias
Dinah Serrão Alhandra
Eleutério Manuel Alves
João Aurélio Dias Mendes
João Manuel Coutinho de Sá Fernandes
Leonardo Eugénio R Ribeiro de Almeida
Maria Margarida do R da C S M Ribeiro
Nicolau Gregório de Freitas
Partido Socialista (PS)
António Manuel de Oliveira Guterres Guilherme Gomes dos Santos
Centro Democrático Social (CDS)
Henrique Manuel Soares Cruz
José Alberto de Faria Xerez
Partido Comunista Português (PCP)
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
Maria Odete dos Santos.
Vital Martins Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
António Monteiro Taborda
Faltaram a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Adérito Manual Soares campos
Adriano Silva Pinto
António Duarte e Duarte Chagas
Artur Morais Araújo
Carlos Manuel Pereira de Pinho
Carlos Mattos Chaves de Macedo
Fernando José da Costa
Jaime Adalberto Simões Ramos
Joaquim Manuel Cabrita Neto
José Augusto Santos Silva Marques
Manuel Mana Portugal da Fonseca
Mário Dias Lopes
Mário Ferreira Bastos Raposo
Partido Socialista (PS):
Adelmo Teixeira de Carvalho.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alfredo José Somera Simões Barroso.
Alfredo Pinto da Silva.
António Duarte Arnaut.
António Cândido Miranda Macedo.
António Emílio Teixeira Lopes.
António Fernandes da Fonseca.
António José Sanches Esteves.
António José Vieira de Freitas.
António Magalhães da Silva.
Carlos Cardoso Lage Carlos.
Manuel N Costa Candal Edmundo.
Pedro Fernando Verdasca Vieira.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
José Luis Amaral Nunes.
Luis Filipe Nascimento Madeira.
Luis Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Trindade Reis.
Mário Alberto Lopes Soares.
Vergílio Fernando M Rodrigues.
Victor Manuel Ribeiro Constâncio.
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20 DE [ULHO DE 1982
§115
Centro Democrático Social (CDS)
Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues
Alberto Henriques Coimbra
Álvaro Manuel M Brandão Estêvão
Carlos Eduardo de Oliveira e Sousa
Eugénio Mana Anacoreta Correia
José Augusto Gama
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luis Aníbal de Azevedo Coutinho
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão
Narana Sinai Coissoró
Ruy Garcia de Oliveira
Partido Comunista Português (PCP) Manuel Correia Lopes
Partido Popular Monárquico (PPM) António Cardoso Moniz
Os REDACTORES Noemut Malheiro — habel Barrai
Declarações de voto publicadas nos termos do artigo 134º, n.º 3, do Regimento
Declaração de voto sobre a proposta de lei n " 100/11, apresentada pelo Sr. Deputado Castro Caldas
Votei tavoravelmente a proposta de lei n º 100/11 unicamente em virtude de disciplina de voto do meu partido
Faço esta declaração de voto porquanto o meu partido esgotou o seu tempo de debate, vedando-me a possibilidade de uma intervenção adequada
Não posso deixar assim de frisar que considero inadequado, em matéria penal da grandeza e complexidade da que vem contemplada na proposta de lei n º 100/11, alienar a reserva de competência legislativa da Assembleia
O nosso Código Penal carecia de uma votação concludente e o mais consensual possível, que evidenciasse o seu poder coercivo e punitivo
A metodologia legislativa do Governo e precipitada e imponderada, e )ulgo poder antever as graves consequências que advirão para a comunidade de tal precipitação
O Deputado do PSD, Castro Calda*
Declaração de voto, sobre a proposta de lei n. 103/11, apresentada pela ASDI
O Grupo Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI), votou favoravelmente a proposta de lei n º 103/11. que autoriza o Governo a legislar em matena de organização e competência dos tribunais, bem como sobre o processo criminal e isenção de selo, pelas razões seguintes
l — As alterações a toda a legislação criminal em vigor que o Governo pretende levar a cabo, através de um novo
Código Penal e demais legislação complementar, acham-se autorizadas, desde a aprovação da proposta de lei n º 100/11
Com as reservas e criticas feitas em intervenção no Plenário, a ASDI votou favoravelmente essa proposta de lei n º 100/11
O direito substantivo a criar de novo em matena criminal, exige a sua complementação adjectiva, o que implica alterações a lei processual vigente
O Governo deu a conhecer os textos que. em principio, pretende va?ar nos decretos-leis a publicar
Apesar das criticas possíveis a algumas das disposições, julgamo-las consequentes as exigências da matéria substantiva que aprovamos
Não renunciamos porem, a uma ulterior reapreciação, através do instituto da ratificação
2 — As normas de Processo Civil que também se pretendem alterar através da proposta de lei n º 103/11, na medida em que visam a celeridade processual e, com ela, a possibilidade de uma mais pronta justiça, acham-se, por esse facto, justificadas
Não nos parece todavia, de boa técnica legislativa, misturar disposições do Código de Processo Civil com disposições do Código de Processo Penal, como se fez no texto que acompanha a proposta de lei n º 130/11
Como ainda nos encontramos no «caminho da lei >. fácil será remediar a talha apontada
Muito em síntese se deixam expressas as razões do nosso voto
Os Deputados do Partido da Acção Social-Democrata Independente M Vilhena de Carvalho — Magalhães Mota — Dias de C emalho
Declaração de voto, sobre a proposta de lei n. 103/11, apresentada pelo Sr. Deputado Castro Caldas
Votei tavoravelmente a proposta de lei n º 103/11 unicamente em virtude de disciplina de voto do meu partido
A matéria contemplada pela proposta de lei n " 103/11, merece-me censura no que se reporta as projectadas alterações no Código de Processo Civil, porquanto não posso aceitar a metodologia seguida pelo Governo, ao efectuar uma denominada «reforma gradual > do Processo Civil, que originara manifesta anarquia processual, dificultara a interpretaçâo e a aplicação da lei pelos tnbunais e redundara enfim, em prejuízo na administração da justiça
Por outro lado, não posso igualmente aceitar a projectada redacção proposta para o artigo 273 º do Código de Processo Penal
Se e evidente que desde ha muito tempo se devia ter legislado no sentido de introduzir limites aos prazos de prisão preventiva, esse limite deve ser um limite absoluto, e não dar-se ao preceito legal uma redacção que permite as policias retardar a formação da culpa, em diversas incriminações como instrumento persecutono e de prorrogação de tempo de cárcere, a réus detidos a ordem de um tribunal, com sentença não transitada em julgado
O Deputado do PSD Castro Caldas
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