Página 1347
I Série - Número 40
Sexta-feira, 28 de Janeiro de 1983
DIÁRIO da Assembleia da República
II LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1982-1983)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 27 DE JANEIRO DE 1983
Presidente: Exmo. Sr. Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida
ecretários: Exmos. Srs.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Vítor Manuel Brás
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos
José Manuel Maia Nunes de Almeida
SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 29 a 31 do Diário.
Deu-se conta do expediente e da apresentação de requerimentos.
Em declaração política, o Sr. Deputado Martins Canaverde (CDS) manifestou a posição do seu partido face à decisão do Sr. Presidente da República de dissolver a Assembleia, respondendo no fim a pedidos de esclarecimentos ou protestos dos Srs. Deputados Carlos Brito (PCP), Mário Tomé (UDP), Magalhães Mota (ASDI), Sousa Tavares (PSD), António Vitorino (UEDS) e Rocha de Almeida (PSD).
O Sr. Deputado Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) respondeu a um pedido de esclarecimento e a um protesto do Sr. Deputado Mário Tomé (UDP) relativo à declaração política que produziu na sessão do passado dia 21.
Ordem do dia. - Os Srs. Deputados Pinto da Silva (PS), Mário Tomé (UDP), Jerónimo de Sousa (PCP) e Braga Barroso (ASDI) produziram declarações de voto relativas à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 390/II, do PCP, sobre actualização do salário mínimo nacional.
Procedeu-se à discussão e votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 171/II, da ASDI, sobre o controle público da riqueza dos titulares de cargos políticos, que foi aprovado, tendo baixado à Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias.
Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Vilhena de Carvalho (ASDI), Borges de Carvalho (PPM), Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Natália Correia (Indep.), Mário Raposo (PSD), Carlos Lage (PS), Cardoso Ferreira (PSD), Lino Lima (PCP) e António Vitorino (UEDS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 20 horas e 5 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 35 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano Silva Pinto.
Afonso de Sousa Freire Moura Guedes.
Álvaro Barros Marques Figueiredo.
Álvaro Roque Bissaia Barreto.
Anacleto Silva Baptista.
António Duarte e Duarte Chagas.
António Manuel Lemos de Menezes.
António Maria de O. Ourique Mendes.
António Roleira Marinho.
António Vilar Ribeiro.
Armando Correia Costa.
Arménio dos Santos.
Carlos Dias Ribas.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Daniel Cunha Dias.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando Alfredo Moutinho Garcez.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Manuel Cardote B. Mesquita.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Mendes da Costa.
Francisco de Sousa Tavares.
Henrique F. Nascimento Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Afonso Gonçalves.
João Evangelista Rocha Almeida.
Página 1348
1348 I SÉRIE-NÚMERO 40
Joaquim Pinto.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Luís Figueiredo Lopes.
José Manuel Pinheiro Barradas.
José Mário de Lemos Damião.
Leonardo Eugênio R. Ribeiro de Almeida.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Ribeiro Arruda.
Maria Adelaide S. de Almeida e Paiva.
Maria da Glória Rodrigues Duarte.
Maria Manuel Aguiar Dias Moreira.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Mário Dias Lopes.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Nicolau Gregório de Freitas.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Octávio Pereira Machado.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Partido Socialista (PS):
Adelino Teixeira de Carvalho.
Alberto Marques Antunes.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alfredo José Somera Simões Barroso.
Alfredo Pinto da Silva.
António Duarte Arnaut.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Fernando Marques R. Reis.
António Francisco B. Sousa Gomes.
António Gonçalves Janeiro.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
António Manuel Azevedo Gomes.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando dos Santos Lopes.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Cardoso Lage.
Edmundo Pedro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fausto Sacramento Marques.
Fernando Torres Marinho.
Fernando Verdasca Vieira.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Hermínio Martins Oliveira.
Jaime José Matos da Gama.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Francisco Ludovico da Costa.
Joaquim José Catanho de Menezes.
José Gomes Fernandes.
José Luís Amaral Nunes.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Júlio Filipe de Almeida Carrapato.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonel de Sousa Fadigas.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel César Nunes de Almeida.
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel da Mata de Caçares.
Manuel Rodrigues Masseno.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul D'Assunção Pimenta Rego
Teófilo Carvalho dos Santos.
Vergílio Fernandes M. Rodrigues.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
Alberto Henriques Coimbra.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
Álvaro Manuel M. Brandão Estevão.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Jacinto Martins Canaverde.
Armando Domingos L. Ribeiro Oliveira.
Carlos Alberto Rosa.
Camilo Guerreiro Ferreira.
Carlos Martins Robalo.
Emílio Leitão Paulo.
Francisco G. Cavaleiro de Ferreira.
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Augusto Rocha Ferreira.
Henrique José Pereira de Moraes.
João José M. Pulido de Almeida.
João da Silva Mendes Morgado.
Joaquim Miguel Rodrigues S. Ferreira.
José Alberto Faria Xerez.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Luís Aníbal Azevedo Coutinho.
Luís Carlos Calheiros V. Sampaio.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Luisa Maria Freire Vaz Raposo.
Manuel António de Almeida A. Vasconcelos.
Mário Gaioso Henriques.
Paulo Oliveira Ascenção.
Rui António Pacheco Mendes.
Rogério Ferreira Monção Leão.
Ruy Garcia de Oliveira.
Victor Afonso Pinto da Cruz.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço.
António José M. Vidigal Amaro.
António José de Almeida Silva Graça.
Artur Mendonça Rodrigues.
Carlos Alberto do Carmo Espadinha.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim António Miranda da Silva.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Página 1349
28 DE JANEIRO DE 1983 1349
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Josefina Maria Andrade.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Manuel dos Santos e Matos.
Manuel da Silva Ribeiro de Almeida.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete dos Santos.
Mariana Grou Lanita da Silva.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Popular Monárquico (PPM):
António Cardoso Moniz.
António José Borges de Carvalho.
António de Sousa Lara.
Augusto Ferreira do Amaral.
Henrique Barrilaro Ruas.
Acção Social-Democrata Independente (ASDI):
Francisco Braga Barroso.
Joaquim Jorge de Magalhães S. Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Manuel Tílman.
União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.
Dorilo Jaime Seruca Inácio.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE)
Helena Cidade Moura.
João Corregedor da Fonseca.
União Democrática Popular (UDP):
Mário António Baptista Tomé.
Independentes:
José Eduardo Sanches Osório.
Natália de Oliveira Correia.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.ºs 29, 30 e 31 do Diário.
Pausa.
Como não há objecções, consideram-se aprovados.
Sr. Deputado Magalhães Mota, após a aprovação do Diário n.º 29, que é, salvo erro, o que contém a intervenção de V. Ex.ª do dia 4, e por efeito desta aprovação, fica em plenas condições de ser remetido ao destino que V. Ex.ª requereu e, portanto, sê-lo-á.
Vai proceder-se à leitura do expediente.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Circulares
Da União de Sindicatos do Distrito de Beja, enviando exemplar de uma moção aprovada em 17 do passado mês de Dezembro, manifestando apreensão pelo possível estacionamento ou trânsito de tropas estrangeiras em território nacional, nomeadamente na Base Aérea n.º 11, em Beja.
Ofícios
O Sr. Conselheiro presidente do Tribunal de Contas, enviando fotocópias com os textos de despachos que proferiu acerca da verificação das contas dos municípios.
Telegramas
Em nome de vários candidatos à habitação social em Caminha, protestando pelo critério que terá sido usado e solicitando que sejam realizados novos inquéritos.
O presidente da Câmara Municipal de Loulé, José Mendes Bota, considerando inconcebível a aprovação do projecto de lei n.º 435/82, sobre aldeamentos turísticos, sem prévia consulta das autarquias.
Petições
N.º 63/II, de Adelino Caiado Martins e outros, dos lugares de Carapinheira, Boavista e Igreja Nova, do concelho de Mafra, sobre problemas de construção clandestina e saneamento básico.
N.º 64/II, do Dr. José Augusto Seabra e outros, do Porto, solicitando aprovação de um novo diploma que venha aperfeiçoar o regime de doutoramento nas universidades portuguesas.
N.º 65/II, do Dr. António Ga Teles de Sousa, do Porto, solicitando a declaração da inconstitucionalidade do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 392/82. de 18 de Setembro.
N.º 66/II, de Maria Alice Ferreira Batista Figueira e outros, de Évora, expondo a sua situação de equiparadas a bacharel em Educação Física e contestando a publicação de um despacho normativo que anula parte do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 675/75, de 3 de Dezembro.
«Telexes»
Da direcção de associações de empresas de construção e obras públicas do Sul, referindo a possibilidade de colapso iminente do sector face à não aprovação do OGE/83.
Dos Sindicatos Químicos, Construção Civil, Têxteis e Indústrias Eléctricas, transcrevendo o texto de uma moção aprovada pelos trabalhadores da CIFA, concentrados no passado dia 18 do corrente em frente da delegação do Ministério do Trabalho, no Porto, exigindo a pronta intervenção do Governo para que sejam tomadas as medidas de fundo e salvaguardados os postos de trabalho.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Foram apresentados na Mesa na última reunião plenária os seguintes requerimentos: aos Ministérios da Qualidade de Vida e da Indústria, Energia e Exportação, no total de 4, formulados pelo Sr. Deputado António Vitorino; ao Ministério da Habitação, Obras Públicas e Transportes,
Página 1350
1350 I SÉRIE-NÚMERO 40
formulados pelos Srs. Deputados Jorge Lemos, Silva Graça e Manuel Matos; ao Ministério da Agricultura, Comércio e Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Vilhena de Carvalho; ao Ministério da Indústria, Energia, e Exportação, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Brasileiro; à Secretaria de Estado das Pescas, formulado pelos Srs. Deputados Gomes Fernandes, Vilhena de Carvalho e António Vitorino.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como devem estar recordados, vêm da última sessão, em período de antes da ordem do dia, algumas inscrições para pedir esclarecimentos relativamente às declarações políticas feitas pelos Srs. Deputados Fernando Condesso e Carlos Brito. Em todo o caso, como é uso habitual da Mesa, havendo uma inscrição para uma declaração política, dou de imediato a palavra ao Sr. Deputado Martins Canaverde para esse efeito.
O Sr. Martins Canaverde (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Continuamos hoje os nossos trabalhos parlamentares com a «espada de Dâmocles» sobre nós. Com efeito, no uso de poderes constitucionais que formalmente não contestamos, o Sr. Presidente da República entendeu anunciar, após intensa e demorada reflexão, a dissolução desta Assembleia com argumentos cuja originalidade aqui denunciámos.
Não ê este o momento para fazermos a leitura das atitudes e de alguns erros políticos cometidos pela Aliança Democrática. Importa, contudo, valorizar devidamente o papel fundamental que assumiu no sistema político português, ao dotar o País - e o Presidente da República - de uma maioria sólida que, decididamente, contribuiu para a normalização de um sistema democrático com a aprovação da primeira lei de revisão e da principal legislação complementar, no meio de dificuldades crescentes, quer a nível nacional, quer a nível internacional.
Tais dificuldades, primacialmente ao nível económico - e que em economias mais ou menos abertas ninguém nega -, não foram, elas próprias, antes pelo contrário, minimamente consideradas pelo Sr. Presidente da República, a não ser como determinantes da denominada «dissolução a prazo», ou seja, até «o Governo e o Parlamento dotarem o País das medidas que considerem indispensáveis para a resolução de questões urgentes».
O Sr. Presidente ignorou, por um lado, as questões económico-financeiras para a decisão dissolutória, mas, por outro, quase determinou a aprovação de medidas que todos consideram urgentes para a economia portuguesa e para uma mínima credibilidade externa do Estado.
Esqueceu-se, porém, o Sr. Presidente, na sua elaborada exposição sobre a problemática económica, que a alteração da política económica prometida ao eleitorado pela Aliança Democrática dependia em grande parte de uma nova lei de delimitação de sectores que o extinto Conselho da Revolução inviabilizou e que só seria possível após a lei de revisão.
Mas, paralelamente, não se esqueceu o Sr. Presidente de enunciar novas regras para a vigência do sistema português, ao acrescentar ao conceito de «maioria sólida» a figura híbrida, inexistente em qualquer regime, de poder político «socialmente aceite». Todos acreditávamos que em democracia alguns dos princípios determinantes do poder político eram, apenas e tão-só, o da separação de poderes, o da periodicidade eleitoral e o da renovação orgânica, e que não competiria, a quem quer que seja, o poder subjectivo de «qualificar» o apoio social. Caso contrário, cairemos numa conceptualização de «rua» - de triste memória - do poder político. Mas o que devia ser, não é, neste original Portugal político!
Concomitantemente, o Sr. Presidente aproveitou a oportunidade para deteriorar a imagem dos partidos políticos da Aliança Democrática, não se dando conta de que os partidos políticos, em regimes abertos - e não em regimes militares, paramilitares ou napoleónicos -, são instituições fundamentais à subsistência e reprodução do sistema e não poderão estar, de forma alguma, e a nível superior, dependentes de atitudes individuais - que sempre teremos que aceitar - dos circunstanciais dirigentes. Não há, na verdade, democracia sem partidos concretos!
Só desta forma é possível a subsistência de um ideal democrático arreigado na opinião pública, o que significa que só assim é possível garantir a democracia, o sistema pluripartidário e economicamente aberto.
E uma das características de um sistema pluripartidário polarizado, é a presença de partidos e grupos «anti-sistema» que podem criar in-puts atractivos, mas cuja relevância política não pode ser valorizada, a não ser como tributo «oculto».
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - O CDS não pode, neste condicionalismo, deixar de manifestar o seu desacordo pela decisão presidencial, principalmente pelo não acatamento da legitimidade maioritária parlamentar que é, acentue-se, tão democrática como a que elegeu o general Ramalho Eanes. Salvo se considerarmos que um órgão individual é mais legítimo que um órgão colegial!
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Simultaneamente, o CDS interroga-se sobre o sentido e alcance da dissolução a prazo, definindo, desde já, a necessária co-responsabilização presidencial e dos partidos da oposição parlamentar na tomada das medidas económico-financeiras urgentes para o País.
Estamos abertos, porém, a participar, com os demais partidos democráticos, na elaboração e aprovação do que for nesta matéria necessário a minimizar o vazio e a ambiguidade criados.
O CDS reafirma a sua fé no projecto da AD, desde que fortalecida e revitalizada, acreditando que a actual estrutura constitucional permite a existência de um poder político forte e estável, com projecto económico, social e cultural eficaz que faça retomar a crença dos portugueses na democracia participativa.
O meu partido mantém, assim, total disponibilidade para no seio da AD encontrar as soluções mais adequadas para a manutenção do projecto maioritariamente sufragado em 1979 e 1980. Isto, porém, não significa que temamos as anunciadas eleições legislativas antecipadas, certo, como é, que o bom senso e o equilíbrio do povo português saberão dar a sua preferência a uma ideologia e doutrina que em épocas de grave crise económico-financeira reconstruíram países mergulhados em crises ainda mais profundas do que a que atravessamos.
Por outro lado, somos o único partido, no conjunto dos partidos democráticos portugueses, que nunca teve
Página 1351
28 DE JANEIRO DE 1983 1351
participação maioritária nos governos de que fizemos parte, ...
Risos do PCP
... ao contrário do Partido Socialista e do Partido Social-Democrata; nem necessitamos, como outros já estão a fazer apressadamente, de modificar a nossa doutrina, a nossa ideologia e a nossa face de partido coerente, dinâmico e capaz de enfrentar com coragem os desafios do futuro da nossa Pátria.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Desafios que exigem, de uma vez por todas, um Estado com autoridade para clarificar as estruturas económicas, por forma a produzir mais riqueza, mais bem-estar e, consequentemente, distribuir mais equitativamente o rendimento produzido pelo trabalho de todos os portugueses, em paz e no diálogo, com todos os parceiros interessados na regeneração de Portugal.
Aplausos do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Estão inscritos, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Carlos Brito, Mário Tomé, Veiga de Oliveira, Magalhães Mota, Sousa Tavares, António Vitorino e Rocha de Almeida.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Martins Canaverde, tinha conhecimento de que o Sr. Deputado estava já inscrito na passada reunião plenária desta Assembleia, tendo decidido adiar a sua declaração política para hoje. Ao ouvi-lo agora, porém, creio que esta Assembleia não ganhou muito com esse adiamento. A sua falta de convicção nos momentos mais importantes da declaração política foi certamente uma nota que a ninguém passou despercebida nesta Assembleia.
Gostaria, em todo o caso, de acentuar o seguinte: vejo que o Sr. Deputado reconhece a total legitimidade institucional na decisão do Sr. Presidente da República, uma vez que reconhece ter ele toda a competência constitucional para tomar a decisão que anunciou, sendo isso já um passo bastante importante da sua parte.
Porém, a sua declaração política insiste repetidamente em aspectos formais, o que parece uma incoerência. De facto, o Sr. Deputado, por um lado, diz que institucionalmente está tudo certo, que não há nada a dizer, sendo a competência constitucional do Presidente da República efectiva, mas, por outro, argumenta com aspectos meramente formais.
Sr. Deputado Martins Canaverde, não é verdade que, se é certo que há aqui uma maioria parlamentar numérica, já não há uma só vontade política nessa mesma maioria?
E eu não lhe vou citar exemplos recuados - que, aliás, tenho referido nos últimos dias, inclusive nesta Assembleia da República -, basta referir as posições do vosso colega, actualmente ministro do Governo demitido e presidente da Comissão Directiva do CDS, Basílio Horta, e de tantos outros que poderia citar, como a própria posição do ex-presidente do seu partido, Diogo Freitas do Amaral. Mais concretamente, estou aqui a ter em conta uma entrevista de um seu colega de bancada que muito recentemente fez afirmações como estas:
No fundo, não foi o Presidente da República quem abriu a crise, mas sim a maioria. No espaço de um ano e meio, esta foi a segunda crise política, o que de certo modo veio demonstrar que para haver estabilidade governativa não basta que haja maioria parlamentar.
O mesmo Sr. Deputado afirma, num outro passo:
A AD não conseguiu encontrar em si as forças para um terceiro fôlego.
E mais, e mais, e mais afirmações, todas elas no mesmo sentido.
E, Sr. Deputado Martins Canaverde, são também conhecidas as posições dos mais destacados dirigentes do PSD.
Ora o Sr. Deputado omitiu na sua declaração uma condição que o Presidente da República certamente adiantou e que é muito importante: é a questão da solidez. De facto, o Presidente da República e o nosso regime institucional não podem ser indiferentes à circunstância de, em pouco mais de 1 ano, o Primeiro-Ministro ter pedido a demissão por duas vezes!
Isto não acontece noutros países, Sr. Deputado! Isto não acontece mesmo na nossa história política!
Então esta questão da solidez política não lhe parece, Sr. Deputado Martins Canaverde, uma questão fundamental, já que os Portugueses não podem continuar a ser governados desta maneira?!
É esta a questão de fundo que gostaria de lhe deixar e que contesta todas as razões formais que o Sr. Deputado adiantou quando da sua intervenção. De facto, a AD desapareceu como vontade política e como coligação, pelo que esta decisão do Sr. Presidente da República é a única justa e que corresponde ao interesse nacional.
Aplausos do PCP.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Américo de Sá.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Martins Canaverde, pretende responder já ou no fim?
O Sr. Martins Canaverde (CDS): - No final, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Deputado Martins Canaverde, a sua vontade manifesta - mal manifestada, aliás - de preservar aquilo que está podre e corroído por mal inevitável e imparável não esconde, no entanto, uma questão que para nós é fundamental: é que o Sr. Deputado pretende no seu esforço de conservação e preservação da AD, aquilo que o general Eanes definiu como a existência de um governo sólido.
Quero eu dizer com isto que V. Ex.ª, ao querer preservar a AD para continuar um trabalho que não deixe os créditos no nosso país por mãos alheias e que leve a cabo uma determinada política forte, decidida e coerente - aquilo que, com a AD, os senhores têm feito, uma política antipopopular -, vai ao encontro do que o general Eanes pretendia quando, com a AD já em dissolução e ainda antes da dissolução da Assembleia, referia a criação de um governo sólido.
Página 1352
1352 I SÉRIE-NÚMERO 39
À desagregação da AD, o presidente Eanes dizia: «arranjem um governo sólido que eu permitirei que vocês continuem»!
Ao contrário do que os trabalhadores do nosso país exigiam - a dissolução, o mais cedo possível, da Assembleia e o fim da AD e da sua política antipopular -, o general Eanes tentou dar a mão à AD para que a AD pudesse criar um «governo sólido», isto é, um governo com a capacidade repressiva para levar a cabo toda a política antipopular que hoje está por detrás do desmantelamento da CTM, da SETENAVE, da LISNAVE e de toda a política de despedimentos e de aumento de preços. E os senhores nem isso souberam aproveitar!...
É por isso, Sr. Deputado, que a sua lamúria e o seu queixume não têm qualquer razão de ser.
É que o general Eanes fez tudo - foi mesmo o homem que neste país mais fez - para que a AD sobrevivesse e se sustentasse. O general Eanes foi o maior suporte da AD; o general Eanes foi o homem que, com a AD a estrebuchar em total dissolução, ainda vos disse: arranjem um governo sólido, têm elementos para isso; o Ângelo Correia até já arranjou um grupo de operações especiais, vestido a preceito,...
O Sr. Mário Lopes (PSD): - O Ângelo Correia, não! O Sr. Ministro Ângelo Correia!
O Orador: - ... e vocês têm todas as possibilidades de levar por diante a salvação do País, não deixando os créditos por mãos alheias, ou seja, fazendo a vontade da CIP do Sr. Ferraz da Costa, da CCP e da CAP!
Foi isso o que os senhores nem sequer foram capazes de fazer, o presidente viu-o!
O Dr. Freitas do Amaral, afastando-se da total irresponsabilidade da vossa política, afastou-se da bacanal política para ficar como reserva, a reserva que ele pensa que poderá assumir-se em defesa dos interesses da direita mais reaccionária que os senhores quiseram assumir, mas que não foram capazes.
Os trabalhadores, no entanto, lá estarão; eles têm lutado e estão dispostos a continuar a lutar, não só para impedir que o próximo governo de gestão seja formado pela AD, mas também para impedir qualquer solução de compromisso com os interesses reaccionários da CIP, da CAP e da CCP e para impedir que o Prof. Freitas do Amaral possa aparecer alguma vez - ou ele ou alguém como ele - com o intuito de impor aqui um regime ainda mais reaccionário do que aquele que os senhores quiseram implantar.
O Sr. Mário Lopes (PSD): - Mas afinal, quais eram as perguntas que queria fazer?!
O Sr. Presidente: - Também para um pedido de esclarecimento...
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, apenas queria acrescentar uma coisa, para terminar.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado já excedeu o seu tempo. Aliás, ia já sentar-se, pelo que suponho que terminou a sua exposição.
Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Prescindo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Deputado Martins Canaverde, referiu-se o Sr. Deputado à problemática económica que não foi considerada aquando da decisão da dissolução da Assembleia da República.
O meu primeiro pedido de esclarecimento é exactamente no sentido de saber se a problemática económica se agravou muito ou se se modificou substancialmente desde o pedido de demissão do Primeiro-Ministro até à data da dissolução da Assembleia da República e quais foram os vectores que influenciaram essa deterioração da situação económica.
Em segundo lugar, quando o Sr. Deputado Martins Canaverde fala nos circunstanciais dirigentes dos partidos políticos -e, na realidade, os partidos ultrapassam esses circunstanciais dirigentes -, creio que não estava a pensar no ex-presidente do seu próprio partido.
Em todo o caso, gostaria de lhe pedir que confrontasse a sua própria opinião, tal como ela resultou da sua exposição, com a posição que sobre a AD e o seu futuro foi expressa pelo Dr. Freitas do Amaral.
Em terceiro lugar, o Sr. Deputado Martins Canaverde criticou a hipótese que chamou de dissolução a prazo da Assembleia da República. Gostaria de lhe pedir que recordasse à Câmara a posição tomada pelo seu partido aquando da dissolução da Assembleia da República efectivada em 1979 nas mesmas e precisas circunstâncias.
Por último, uma vez que se tratou de uma declaração política feita em nome do CDS e tendo nós ouvido aqui na terça-feira passada uma declaração política feita em nome do PSD em que concepções diferentes sobre o futuro da Aliança Democrática pareceram ter vindo ao de cima, gostaria que o Sr. Deputado esclarecesse a Assembleia sobre o pensamento do CDS em relação a essa posição do PSD, recentemente reforçada pelas questões postas ao seu próprio partido pelo presidente do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.
O Sr. Sonsa Tavares (PSD): - Sr. Deputado Martins Canaverde, gostava que me esclarecesse quanto ao sentido de uma frase que, de certa maneira, pode ser equívoca; trata-se da sua afirmação de que certos partidos estarão a rever as suas ideologias.
Gostaria de saber se o Sr. Deputado, ao considerar que o seu partido teve uma aliança eleitoral e de governo com um outro partido, entende que comprometeu esse partido eternamente, ou se, pelo contrário, esse partido conservou a sua liberdade de rever os seus gestos e atitudes políticas e, provavelmente, de reencontrar a sua verdadeira ideologia.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Sr. Deputado Martins Canaverde, embora a sua intervenção tivesse um interlocutor pressuposto, que até esteve ausente - o Sr. Deputado Fernando Condesso -, ela, no fundo, resume-se, pela sua falta de convicção e pelo tom fúnebre
Página 1353
28 DE JANEIRO DE 1983 1353
que lhe transmitiu, a um discurso de despedida do CDS da área do poder.
Diz assim o Sr. Deputado Martins Canaverde: «lá voltamos nós alegremente à oposição porque não abdicamos da filosofia e da ideologia próprias do CDS». Até parece que em Portugal, para exercer o poder isoladamente ou em coligação, é preciso inevitavelmente abdicar de filosofias e de ideologias próprias... Se não as souberam manter quando estiveram no poder, o problema é vosso, o problema não é um anátema geral da sociedade.
Admitamos que o CDS volta à oposição como o Sr. Deputado referiu, ou seja, sem abdicar da sua ideologia e da sua filosofia própria, no entanto, o País pergunta - e nós temos o direito de saber - quem é que, de facto, sufocou o projecto da AD, quem é que, de facto, matou o projecto da Aliança Democrática de que o Sr. Deputado Martins Canaverde fé? um curto elogio fúnebre. Foi o general Eanes quem matou a AD? Foi o Prof. Freitas do Amaral que, com a sua demissão, matou a Aliança Democrática? Foi o PSD e a desastrosa liderança de Pinto Balsemão que deu cabo da Aliança Democrática? Foi a crise interna do CDS que pôs pelas «ruas da amargura» o projecto da Aliança Democrática?
Era bom que, ao menos neste ultimato público, a Aliança Democrática ainda conseguisse chegar a acordo entre si própria para se saber quem é que deu cabo dela. É que, se não foi nenhuma destas entidades, se a morte da Aliança Democrática não foi às mãos sanguinolentas do PSD, se a morte da Aliança Democrática não foi às mãos sanguinolentas do CDS, só resta uma conclusão: quem deu cabo da Aliança Democrática foi o PPM!
Risos gerais.
O Sr. Presidente: - Igualmente para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rocha de Almeida.
O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Sr. Deputado Martins Canaverde. independentemente de tudo o que ouvimos e foi dito pela oposição, queria, neste momento, porque dúvidas me ficaram, perguntar-lhe se da sua parte não há uma preocupação em tentar fazer a defesa das meias palavras de cada um dos responsáveis políticos deste país onde, em relação à Aliança Democrática, um diz que morreu, outro que não morreu, um diz que está viva e outro que está morta.
Se hoje lermos os jornais, não é preciso ir ao dia de ontem nem esperar pelo dia de amanhã, vimos que um senhor deputado da bancada do CDS diz que «a AD já morreu e não cumpriu» - refiro-me concretamente a afirmações do Sr. Deputado Luís Beiroco - e se entrarmos por este processo nunca chegamos a lado nenhum porque acabamos por nos insultar uns aos outros ao tentar justificar aquilo que cada um diz, que não diz, acabou de dizer ou não quis dizer.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Ou não sabe fazer!
O Orador: - Entretanto, na sua intervenção, o Sr. Deputado afirmou, e foi isso que me motivou a inscrever-me, que «o CDS, para as futuras eleições, vai trazer uma proposta nova, dado que nunca foi responsável maioritário numa política sectorial governamental», deixando de barato áreas como a segurança social, a saúde ou a agricultura deste governo AD.
Assim, queria perguntar-lhe se o CDS é uma proposta nova para futuras eleições porque nunca foi parte inteira em qualquer governo nem se reconhece aquilo que de útil foi feito neste período, cito concretamente a revisão da Constituição, ou seja, se não se reconhece na sua intervenção neste governo da Aliança Democrática, ou se tinha outras propostas quanto à revisão constitucional.
O Sr. Presidente: - Visto que não há mais inscrições, tem a palavra o Sr. Deputado Martins Canaverde, para responder, se assim o entender.
O Sr. Martins Canaverde (CDS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Afinal parece que, no que respeita à dissolução, não houve apenas originalidade da parte do Sr. Presidente da República, visto que da parte do Sr. Deputado Carlos Brito, salvo melhor opinião, também ela se manifestou.
Com efeito, até aqui pugnava-se, e bem, pela existência no Parlamento de uma maioria, porém, agora não basta uma maioria, visto que, na opinião do Sr. Presidente da República, é necessário uma «maioria com apoio social» e para o Sr. Deputado Carlos Brito - o Sr. Presidente da República se calhar esqueceu isso - não basta uma maioria numérica, é necessário uma «maioria com vontade política».
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Depois disto, Sr. Deputado, deixe-me dizer-lhe o seguinte: é evidente que as maiorias que se formam em cada momento num Parlamento são necessariamente maiorias com vontade política; talvez não tenham a vontade política que o senhor desejaria que elas tivessem, mas são inequivocamente maiorias com vontade política.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Não parece!
O Orador: - Tudo o mais que o Sr. Deputado disse quanto a queixumes ou não queixumes merece o seguinte comentário: é evidente que nós não tivemos a preocupação, antes pelo contrário, de fazer aqui nenhum queixume, mas sim, tanto quanto possível, anunciar uma circunstância nova na recente história democrática portuguesa. Neste momento mantemos, e continuaremos a manter, uma maioria parlamentar e o facto de o Sr. Presidente da República, no seu pleno direito constitucional, não ter aceite um governo encabeçado pelo Sr. Prof. Vítor Crespo não impedia que voltasse a colocar à Aliança Democrática a hipótese de apresentar outro candidato a Primeiro-Ministro. Creio que isto não era nenhum entorse constitucional, que era perfeitamente factível, visto que o Sr. Presidente tem o pleno direito de aceitar politicamente ou não um primeiro-ministro.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Neste momento existe uma maioria nesta Assembleia que, se voltar a concorrer como Aliança Democrática, se arrisca - para vosso desgosto - a voltar a ter a maioria nesta Câmara.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Nessa altura voltamos à fase em que estamos agora, com uma situação económica e social
Página 1354
1354 I SÉRIE-NÚMERO 40
muito mais (desnecessariamente) agravada, e, nessa óptica, a culpa não pode ser imputada à maioria parlamentar que aqui tem continuado a dar provas de que está realmente a funcionar como maioria.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado, era só para acentuar o seguinte: V. Ex.ª afirmou que a coligação que existiu, se concorrer conjuntamente, se «arrisca». Será por isso que uma parte da coligação - pelo menos, uma parte do PSD, segundo ouvimos aqui na anterior reunião plenária - já prenuncia que não haverá um concurso conjunto? É para não correrem o risco?
O Orador: - O Sr. Deputado há-de concordar consigo mesmo, que fez a pergunta e deu a resposta. Quando eu disse «se arrisca» é uma expressão como outra qualquer, mas o que vai ou não vai acontecer à Aliança Democrática é um assunto que internamente os partidos que a integram hão-de discutir e oportunamente o País saberá se a Aliança Democrática vai ou não vai subsistir.
O facto de o Sr. Deputado e alguns outros senhores deputados terem invocado aqui o depoimento isolado de um colega meu de bancada, isso não significa que, primeiro, tenha de ser eu a responder por ele, e que, segundo, tenha de ser eu a responder, em nome do partido, por afirmações que qualquer deputado, que faz parte de um partido democrático, exprima livremente, por opiniões que muito bem entenda fazer sobre a conjuntura.
O Sr. Armando de Oliveira (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Relativamente à questão que o Sr. Deputado Magalhães Mota me colocou, devo dizer-lhe o seguinte: é evidente que as condições para enfrentarem as dificuldades económicas, designadamente em termos de crédito externo, são, natural e decisivamente, influenciadas pelo simples anúncio da dissolução da Assembleia. Certamente que concordará com isto!
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - A pergunta é outra!
O Orador: - Quando eu falo em circuntanciais dirigentes, falo em todos os dirigentes políticos sem estar a pensar em ninguém em concreto. Se nós considerarmos os partidos como instituições - os tais partidos concretos, reais, efectivos-, qualquer dirigente, por muito incontestado que seja, por muito carismático que seja, é sempre, em qualquer órgão de soberania ou nos partidos que integram, por exemplo, este Parlamento, circunstancial. Acerca disso não tenho dúvidas e suponho que também nesta óptica esclareci completamente V. Ex.»
Se o Partido Social-Democrata tem ou não tem, acerca da subsistência da Aliança Democrática, concepções diferentes das nossas, isso é um direito que igualmente lhe assiste, porquanto os senhores integraram inicialmente uma coligação e tiveram nela e acerca dela as
ideias e as opiniões que muito bem acharam ter em cada momento. O mesmo se passará naturalmente em relação anos.
O Sr. Deputado Sousa Tavares pergunta-me se o facto de nós termos estado com outro partido no Governo não permite que agora possamos reassumir - se bem percebi - a nossa ideologia original. Com certeza que sim, Sr. Deputado, mas o que eu quis dizer na minha intervenção foi que, como é público e notório em várias entrevistas vindas a lume acerca do que será socialismo democrático e social-democracia (que, segundo percebi, parecem coincidir na opinião de um ilustre dirigente de um outro partido onde se nega o colectivismo e o estatismo), em vésperas de eleições, embora isso seja um pleno direito, alguns partidos estão a reformular a sua doutrina e a sua ideologia e nós, pelo contrário, mantemos a nossa ideologia e a nossa doutrina sem precisar de a «retocar» para o próximo acto eleitoral, quer tenhamos que ir sozinhos, quer tenhamos de ir em coligação.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Quem sufocou a Aliança Democrática foi o brilho exuberante do Sr. Deputado António Vitorino.
Risos.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Não apoiado!
O Orador: - Não é disso, Sr. Deputado, que se trata. A Aliança Democrática, embora haja quem diga que morreu, ainda está viva, existe, neste momento está aqui.
Risos e protestos do PS.
Se é aquela que estava aqui inicialmente... bem, se nós a compararmos com a FRS creio que estamos mais vivos que os senhores.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Isso é verdade!
Aplausos do CDS, do PPM e de alguns deputados do PSD.
O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para protestar.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado. Inscreveram-se, pelo mesmo motivo, os Srs. Deputados António Vitorino e Mário Tomé.
O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Sr. Deputado Martins Canaverde, agradeço a gentileza da sua resposta e a forma como foi dada, mas, simplesmente, não respondeu a nada.
O Sr. Deputado insinuou na sua intervenção que um partido está a rever a sua ideologia. Ora um partido pode estar a rever a sua táctica, pode, inclusivamente, estar a rever a sua estratégia, sem rever a sua ideologia.
A ideologia do Partido Social-Democrata é sempre social-democrata e, portanto, ele pode neste momento buscar uma estratégia e uma táctica mais adequadas à sua própria ideologia, não sendo, por isso, de uma revisão de ideologia que se trata, mas sim de uma revisão de táctica, de uma revisão de direcção, de uma revisão de estratégia. Nunca será uma revisão de ideologia!
Página 1355
28 DE JANEIRO DE 1983 1355
Foi isto que eu quis dizer nas minhas perguntas e que o Sr. Deputado não respondeu.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Martins Canaverde deseja contraprotestar?
O Sr. Martins Canaverde (CDS): - Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Martins Canaverde (CDS): - Sr. Deputado Sousa Tavares, há aqui um equívoco, eu não me estava a referir ao Partido Social-Democrata.
Risos.
O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Então, era ao PS!
O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra, para formular um protesto, o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Sr. Deputado Martins Canaverde, a comparação que V. Ex.ª entendeu dever fazer com a defunta FRS revela verdadeiramente o espírito mórbido que perpassa por essas bancadas.
Risos.
A FRS está morta, não vale a pena ressuscitá-la, o que estamos aqui a constatar é apenas o óbito da Aliança Democrática, por muito lhe custe reconhecer isso.
Sempre esperei, apesar de tudo, Sr. Deputado Martins Canaverde, que a resposta que me fosse dar fosse a resposta que o Sr. Prof. Freitas do Amaral deu, na sua carta de demissão, à mesmíssima pergunta que eu lhe fiz: o que é que sufocou a Aliança Democrática?
O Sr. Prof. Freitas do Amaral explicou ao País que o que sufocou a Aliança Democrática foi a liderança desastrosa do Dr. Pinto Balsemão, foi a proposta inábil e inaceitável do «governo Vítor Crespo», foi o próprio atoleiro governativo que caracterizou toda a prática da Aliança Democrática nestes 2 últimos anos. O mínimo que se podia exigir, Sr. Deputado Martins Canaverde, era que fosse coerente com o ex-presidente do seu partido. Mudam-se os tempos, mudam-se os homens, e parece que, pelos vistos, por aí também se mudam das vontades!
Vozes da UEDS e do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, se assim o desejar, o Sr. Deputado Martins Canaverde, para contraprotestar.
O Sr. Martins Canaverde (CDS): - O Sr. Deputado António Vitorino, cujo brilho muito aprecio, começou por ser paradoxal. Afinal de contas, se o senhor diz que está aí para passar a certidão de óbito à AD, tem mais vocação para cangalheiro do que eu,...
Risos.
...que não passei nenhuma certidão de óbito à Frente Republicana e Socialista. Palavra que pensava que o Sr. Deputado, sempre com boa disposição, não tinha nada a ver com ar normalmente carrancudo dos cangalheiros e não o identificava, de maneira nenhuma, com
Uma voz do CDS: - Embrulha!
O Orador: - Quanto à opinião do Prof. Freitas do Amaral, devo dizer-lhe o seguinte: nós, no CDS, respeitamos a opinião dos nossos líderes, simplesmente não somos ecos que passamos a vida a repetir o que os nossos dirigentes, ou ex-dirigentes, dizem. Ele disse o que disse acerca da Aliança Democrática; nós temos cabeça para pensar e livre e democraticamente exprimimos aquilo que pensamos. O Sr. Deputado não tem nada que ficar surpreendido pelo facto de não me ter limitado a dizer o que o Prof. Freitas do Amaral já disse, até porque isso seria uma repetição do que V. Ex.ª tão bem conhece e seria, do seu ponto de vista, desnecessária. Ora nós não estamos aqui para praticar actos inúteis!
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Igualmente para protestar, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, o meu protesto não terá regimentalmente muita razão de ser...
Risos.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Então, não o faça!
O Sr. Presidente: - Então, não lhe posso dar a palavra!
O Orador: - Nenhum deputado é obrigado a responder e, por isso, o Sr. Deputado Martins Canaverde não tinha de responder às questões que lhe coloquei de uma fornia um pouco genérica. De qualquer forma, compreendo isso porque o Sr. Deputado e o CDS - aliás, como os outros partidos da AD -, não querem passar por mal agradecidos e para responder às questões que lhe coloquei teria de reconhecer que estão a ser mal agradecidos em relação ao tempo que vos foi concedido pelo general Eanes para tentarem reconstituir a AD. Tudo isto apesar de os trabalhadores exigirem a vossa saída do poder, na medida em que a degradação das condições da vida social e económica começou no primeiro dia da vossa governação!
Finalmente, aproveito para lhe perguntar o seguinte: aquilo que o Sr. Deputado Martins Canaverde considerou ser o grande papel dos partidos irmãos do CDS, da democracia-cristã, por esse mundo fora na recomposição, reconstrução e fortificação dos países tem a ver (é evidente que não me vai responder) com o papel da democracia-cristã no Chile, de Salvador Allende, e em no El Salvador, de Napoleon Duarte?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Martins Canaverde, se assim o entender, para contraprotestar.
O Sr. Martins Canaverde (CDS): - Sr. Deputado Mário Tomé, por lapso não respondi às suas perguntas, no entanto, na sua primeira intervenção atacou mais, isto na minha óptica, o Sr. Presidente da República do que eu próprio e não era disso que se tratava na minha declaração política.
Nós estamos interessados, já que o Sr. Presidente anunciou a dissolução, que ela se faça rapidamente para
Página 1356
1356 I SÉRIE-NÚMERO 40
vermos a UDP crescer maioritariamente nesta Assembleia.
Risos do CDS.
Se a Câmara não vê nenhum inconveniente, eu aproveitava para responder às perguntas do Sr. Deputado Rocha de Almeida devido a não o ter feito há pouco, por lapso.
Sr. Deputado, nós não enjeitamos as responsabilidades que assumimos enquanto estivemos e estamos no Governo. Não foi o contrário que eu disse, mas sim que pertencemos a governos em posição minoritária - de acordo com os resultados eleitorais -, e não teci, a respeito desta matéria, nenhum juízo de valor, fiz apenas uma constatação e não a tentativa - longe de mim tal ideia...
O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Sr. Deputado, sei que da parte de V. Ex.ª só por um descuido é que não tinha respondido às minhas perguntas, embora tivesse no pleno direito não o fazer.
A minha intervenção só teve uma única finalidade: assisti, aquando da intervenção última do meu companheiro de bancada deputado Fernando Condesso, a um desassossego muito grande por ele ter emitido aqui uma opinião pessoal.
Vozes do PCP e da UDP: - Pessoal?!
O Orador: - V. Ex.ª vem agora defender essa posição ao dizer que todo e qualquer deputado tem o direito a intervir aqui como quer, porque de outra forma entrávamos num processo de intenções onde tínhamos de fazer o juízo de cada afirmação, de cada pessoa, de cada política deste país. Ainda bem que é assim, ainda bem que cada um se responsabiliza pelas suas afirmações.
Risos.
Não há direito que as bancadas reajam de uma forma extemporânea, muitas vezes sem perceberem ou terem a preocupação de saber o que se quer dizer, sem terem a preocupação de saber qual a intenção que preside às afirmações de cada um.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Essa é boa!
O Orador: - Sr. Deputado, como vê estamos calmos, agradeço-lhe o seu esclarecimento, não estamos aqui para contrariar posições assumidas em declarações políticas que, em todo o caso, são sempre diferentes de opiniões pessoais que não sejam feitas sob a forma dessa figura...
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Deputado, dá-me licença?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - O Sr. Deputado disse que eu ataquei mais um do que o outro, mas a verdade é que ataquei os dois ao mesmo tempo e pelas mesmas
razões, ou seja, pela circunstância de existir um governo AD durante tanto tempo, de se manter, de persistir, contra os interesses e a vontade do povo expressa das mais variadas maneiras, e que vão desde a vontade eleitoral até à luta na rua.
Ambos contribuíram para esta situação de degradação total das condições de vida do nosso povo.
O Orador: - Tem toda a razão, Sr. Deputado. Não há dúvida que V. Ex.ª, como fala aqui em nome do povo, vai fazer falta na futura Assembleia da República se, por acaso, o seu partido não conseguir eleger ao menos 1 deputado.
Risos.
O Sr. Deputado consegue representar, ser o instrumento e o porta-voz dos interesses do povo português! Já o sabíamos há muito tempo!
Risos.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Pela primeira vez estou de acordo com V. Ex.ª!
Risos.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Vai ser substituído, cometeu muitos erros!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em relação à sessão de 25 de Janeiro e relativamente à declaração política do Sr. Deputado Fernando Condesso, que não está presente, havia um pedido de palavra - e não estou esclarecido para que efeito era esse pedido - do Sr. Deputado Sanches Osório relativa à intervenção do Sr. Deputado Borges de Carvalho. Havia também um pedido de palavra do Sr. Deputado Santa Rita Pires, que me parece estar igualmente ausente.
Sr. Deputado Sanches Osório, continua a pretender usar da palavra?
O Sr. Sanches Osório (Indep.): - Prescindo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Em relação à declaração política do Sr. Deputado Carlos Brito, havia pedidos de palavra dos Srs. Deputados Borges de Carvalho e Silva Marques. Os Srs. Deputados mantêm os pedidos de palavra?
O Sr. Silva Marques (PSD): - Prescindo, Sr. Presidente.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Prescindo também, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, relativamente à sessão do dia 21 e acerca da declaração do Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, ficaram pendentes pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Carlos Lage e Mário Tomé e ainda um pedido de exercício do direito de defesa da Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.
Os Srs. Deputados presentes - já que a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura não está presente - desejam ainda usar da palavra?
O Sr. Carlos Lage (PS): - Prescindo, Sr. Presidente.
Página 1357
28 DE JANEIRO DE 1983 1357
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Não prescindo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Não prescindo, mas vou ser muito rápido na minha intervenção.
Fundamentalmente - e dado que já passou uma semana sobre a declaração política do Sr. Deputado Corregedor da Fonseca -, vou apenas aproveitar este pedido de esclarecimento para perguntar muito sucintamente ao Sr. Deputado o seguinte: a Radiotelevisão Portuguesa é um órgão de comunicação social estatizado com determinado tipo de obrigações constitucionais, nomeadamente em questões de pluralismo democrático e de garantia de que ao povo português cheguem, da melhor forma, as opiniões dos partidos -principalmente, mas não só - com representação parlamentar.
Assim, quero perguntar ao Sr. Deputado se no caso concreto, de programas que se realizam na RTP e, nomeadamente, no caso do programa 1.ª Página, de hoje, em que se vai falar da actual situação política que preocupa todo o povo português e em que vão estar representados alguns partidos políticos - o PCP, o PS, o PSD e o CDS, partidos que concorreram às eleições legislativas integrados em coligações partidárias, a APU, a FRS e a AD...
Risos do PSD.
O Sr. Silva Marques (PSD): - A UDP também é uma coligação!
O Orador: - Como eu estava a dizer, pergunto se, neste caso, tão claro e tão evidente, a UDP - que é o único partido aqui representado que se apresentou ao eleitorado como aquilo que é, sem coligações, sem qualquer outro artifício ou de forma disfarçada,...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Não é exacto!
O Orador: - ...não quer dizer que seja disfarçada, mas de forma não evidente, com o seu símbolo, etc., - não tem toda a razão de protestar veementemente, como está a fazer, e insistir em estar presente nesse debate que hoje se vai realizar na RTP, bem como em todos os outros debates do mesmo tipo? Se assim não for, o povo português ficará privado de ouvir uma voz da Assembleia da República que não pode, de forma alguma, ser representada nem delegar representatividade, e nem o quereria fazer, em qualquer outro deputado ou em qualquer outra força política partidária.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, se deseja responder tem a palavra.
O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Mário Tomé, devo lembrar-lhe que o MDP/CDE nunca foi convidado para participar em programas de natureza política na Radiotelevisão Portuguesa. E o problema não se põe em termos de coligações. Com efeito, existe uma coligação APU para as eleições legislativas, mas, a partir desse momento, existem dois grupos parlamentares com independência dentro da Assembleia da República. O MDP/CDE nunca foi convidado para tais programas e sobre esse facto fizemos vários protestos nesta Assembleia.
É evidente, Sr. Deputado, que não me agrada nem satisfaz que também as outras forças políticas não sejam chamadas a participar em programas desta natureza; daí que considere que a UDP tem todo o direito de participar em programas deste tipo.
Contudo, gostaria de referir, e ainda bem que me dá essa possibilidade, alguns dados referentes a um determinado mês (creio que há 2 meses atrás) e procedentes directamente da Radiotelevisão Portuguesa, que estão depositados nesta Assembleia, segundo os quais o Governo teve 202 minutos de tempo de antena, a APU teve 4 minutos, a AD teve 23 minutos, além dos 202 minutos, o MDP/CDE não teve 1 único minuto!
O Sr. Mário Tomé (UDP): - E a UDP?
O Orador: - A UDP também não teve 1 único minuto, aliás, como a UEDS! E para os Açores houve 24 segundos e 1 minuto e 21 segundos para a Madeira!
Portanto, Sr. Deputado, o que se passa com a Radiotelevisão Portuguesa é uma pecha velha e há cerca de 8 dias, quando foi aqui levantada por mim a questão da comunicação social - como, aliás, já em tempos o foi pelo Sr. Deputado César Oliveira a propósito do caso da ANOP -, devíamos ter lavrado um vivo protesto à forma inconcebível como o relato da Assembleia da República está a ser feito diariamente pela Radiotelevisão Portuguesa. É que os telespectadores ficam sem saber rigorosamente nada do que aqui se passa, a não ser a filmagem constante dos deputados que constituem a AD.
Vozes do PSD e do PPM: - Isso não é verdade! É mentira!
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Mário Tomé, pede a palavra para que efeito?
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Para um pequeno protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estou integralmente de acordo com o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca. Acho que todos os partidos deviam ter o direito de se pronunciarem sobre aquilo que se passa e muito especialmente em situações políticas da gravidade da desta mesma.
Quero esclarecer que quando referi que a UDP não tinha aparecido em nenhuma coligação, fi-lo porque, na realidade, não considero que haja qualquer outro partido em relação ao qual, digamos assim, a política da UDP possa convergir para levar a bom cabo aquilo que considera as promessas dadas aos seus próprios eleitores. Daí, uma reivindicação mais forçada ainda do aparecimento da UDP!
No caso concreto de hoje, eu próprio vou estar presente na RTP exigindo a participação da UDP no debate que hoje se vai realizar.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Não entra!
Página 1358
1358 I SÉRIE-NÚMERO 40
O Orador: - Os outros partidos que se sentirem lesados em relação a esta mesma situação deveriam e poderiam fazer exactamente a mesma coisa.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Fica à porta. Vai apanhar frio!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, deseja contraprotestar?
O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Apenas uma palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.
O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado Mário Tomé, eu queria só recordar o que se passou na última campanha eleitoral para as eleições autárquicas, em que a APU foi positivamente afastada do debate que a Radiotelevisão Portuguesa organizou com outras forças políticas. Nada mais, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, esgotámos o período de antes da ordem do dia e vamos entrar no período da ordem do dia.
O Sr. Presidente: - Porém, antes de entrarmos na discussão e votação do projecto de lei n.º 171/II, apresentado pela ASDI, sobre o controle público da riqueza dos titulares de cargos políticos, há inscrições para declarações de voto relativas ao projecto de lei n.º 390/II, do PCP, salário mínimo nacional, que foi discutido e votado na sessão de 25 de Janeiro.
Assim, estão inscritos para declarações de voto os Srs. Deputados António Vitorino, da UEDS, Alfredo Pinto da Silva, do PS, Mário Tomé, da UDP, Corregedor da Fonseca, do MDP/CDE, Jorge Patrício, do PCP, e Magalhães Mota, da ASDI.
Sr. Deputado António Vitorino, tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Prescindo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - E o Sr. Deputado Alfredo Pinto da Silva?
O Sr. Alfredo Pinto da Silva (PS): - Eu não prescindo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pinto da Silva.
O Sr. Alfredo Pinto da Silva (PS): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não prescinde da declaração de voto porque entende que ela deveria ter sido feita logo a seguir à votação realizada anteontem e, por excesso de zelo regimental, isso não foi possível. Portanto, não prescindo da leitura da nossa declaração de voto.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª vai usar da palavra, mas não posso consentir que V. Ex.ª diga que não usou da palavra na última sessão por excesso de zelo regimental. Foi uma decisão da Mesa que o Sr. Deputado tem que acatar e não pode nem deve comentá-la da forma como o fez.
Tem agora a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Alfredo Pinto da Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Anunciámos no passado dia 14 do corrente, pela voz do meu camarada Carlos Lage, estarmos de acordo com a necessidade e a urgência da actualização do salário mínimo nacional, encarando favoravelmente a iniciativa do PCP por superar uma censurável falha da acção do Governo.
Na conferência de líderes parlamentares realizada naquele dia e pela carta lida anteontem pela Mesa da Assembleia, teve-se conhecimento que o Governo havia já legislado sobre esta matéria, tendo o diploma sido já promulgado pelo Sr. Presidente da República, encontrando-se o mesmo para publicação.
Entendíamos, por razões de ordem moral e de justiça social, que esta era uma das matérias que esta Assembleia deveria atender face ao aumento do custo de vida e à diminuição do poder de compra dos trabalhadores abrangidos - que são centenas de milhares -, caso o Governo não legislasse sobre a matéria em questão, como lhe competia.
Lamentamos que o Governo não tenha tornado pública a decisão que nos anunciou, mantendo-se em silêncio, sabendo que, desde o início de Janeiro, estava pendente nesta Assembleia o projecto de lei do PCP e já após de, no passado dia 15 do corrente, se ter aberto o processo legislativo de tal projecto. A não ser que este sigilo do Governo, que nós muito estranhamos, tenha sido a procura de esconder que se havia esquecido de actualizar o salário mínimo nacional, como constitucional e legalmente lhe competia, vindo à pressa e sob a capa desse sigilo fazê-lo, demonstrando mais uma vez uma total incapacidade e irresponsabilidade em problema tão importante; no entanto, a competência de legislar nesta matéria é do Governo e, bem ou mal, exerceu-a, não estando, portanto, em discussão o decreto-lei do governo então anunciado.
O nosso apoio, na generalidade, ao projecto de lei do PCP justificava-se e baseava-se no facto de o Governo não ter legislado nesta matéria, tendo como fim esse nosso apoio obviar minimamente ao desgaste do poder de compra dos trabalhadores abrangidos, face ao aumento constante dos produtos, bens e serviços essenciais e à inflação galopante que se vai acentuando. Entendíamos que essa medida, a ser tomada por esta Assembleia, teria de ter sempre um carácter de excepcionalidade, face ao tempo que irá decorrer até à existência de um governo responsável e em funções plenas.
Uma vez que está para publicação um diploma do Governo que irá legislar sobre a matéria em discussão, entendemos dever abster-nos. Queremos que fique bem claro que apenas, e só, nos abstemos por a competência em legislar nesta matéria pertencer ao Governo, o qual, como já dissemos, bem ou mal, a exerceu.
Compreendemos as razões de ordem política, moral e de justiça social que moveram a iniciativa do PCP, deixando nós em aberto a possibilidade da chamada à ratificação do diploma anunciado, se entendermos que os valores do salário mínimo nacional ali referidos não são aqueles que entendemos ser razoáveis e justos, e se o principio da anualidade expresso na lei não for respeitado, ou garantindo que um futuro governo o reexamine no sentido mais justo.
Não nos pronunciamos, assim, sobre se os aumentos propostos pelo PCP são suficientes ou insuficientes, não é isso que, para nós, está em causa. De igual modo, não nos pronunciamos sobre se os valores decretados pelo Governo serão ou não suficientes, pois na altura própria
Página 1359
28 DE JANEIRO DE 1983 1359
e após conhecimento oficial dos mesmos tomaremos as iniciativas que entendermos mais adequadas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé, também para uma declaração de voto.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos favoravelmente o projecto de lei do PCP, apesar de o Governo, de uma forma que ainda não está clara, ter decretado no mesmo sentido, mas com retroactivos apenas a partir de 1 de Janeiro e numa percentagem de subida do salário mínimo bastante inferior.
Por estas razões, votámos favoravelmente o projecto apresentado pelo PCP, considerando que não é admissível aceitar a desculpa que aqui foi dada pelo Sr. Deputado Cipriano Martins de que o Governo não apresentou em devida altura a actualização do salário mínimo nacional para não correr o risco de ser acusado de demagógico em altura eleitoral. Isto é absolutamente ridículo. Estes argumentos fazem-me lembrar os de um outro deputado, por coincidência também do PSD, que dizia - e parece-me que foi o Sr. Deputado Chagas... não foi, foi outro - que os locatários e os pequenos e médios industriais estavam ansiosos por verem aumentadas as rendas de casa. De facto, não se pode admitir nem compreender, muito menos por razões deste tipo, que não se tenha actualizado e aumentado o salário mínimo nacional em Outubro.
Nós somos de opinião que os salários mínimos nacionais não devem ser repartidos em 3 categorias, achamos que deve haver apenas um salário mínimo nacional, ao nível superior das 3 categorias, seja qual for o tipo de trabalhadores.
Consideramos que a actualização deve reportar-se, de uma vez por todas, ao dia i de Janeiro. A actualização - neste caso não, obviamente, porque há retroactivos a ter em conta a partir de Outubro- deve, a partir de agora, ser feita em l de Janeiro e a percentagem para a actualização do salário mínimo nacional tem de ser muito bem calculada porque a degradação de poder de compra e das condições de vida dos trabalhadores, nomeadamente daqueles que auferem salário mínimo, como as mulheres e os jovens, são de tal ordem que estes ficam, normalmente, marginalizados em relação ao desenvolvimento - que é muito baixo - da indexação mínima dos salários que seria necessária. É, pois, necessária uma atenção muito especial neste aspecto.
E não devemos esquecer-nos da necessidade de aumentar os trabalhadores da função pública, que já no ano passado viram o seu aumento remetido para um tecto salarial arbitrário e intolerável de 17%. Aliás, esse tecto salarial não foi atingido, ficando apenas pelos dez vírgula pouco por cento.
Estas são situações que não podem continuar e acho que um dos últimos actos desta Assembleia poderia e deveria ser uma resolução que impusesse o aumento imediato dos trabalhadores da função pública.
O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra, também para uma declaração de voto, o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca.
O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, eu farei chegar à Mesa a minha declaração de voto.
O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, também para uma declaração de voto.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD, o CDS e o PPM, e refiro os três porque estou na dúvida se ainda os devo considerar como AD, recusaram na passada terça-feira a aprovação do projecto de lei n.º 390/II, do Grupo Parlamentar do PCP, que visava a actualização do salário mínimo nacional. Ao fazê-lo inviabilizaram a possibilidade de repor, minimamente, o poder de compra de milhares e milhares de trabalhadores, que não vendo os seus salários actualizados não conseguirão fazer frente ao brutal aumento do custo de vida, fruto da política ruinosa e destruidora do demitido governo AD. Ao recusá-lo impossibilitou o cumprimento da Constituição e das leis, que consagram a sua actualização anual.
Desta forma ficou demonstrado, por mais uma vez, que a AD não entende os interesses e direitos dos trabalhadores, das classes mais desfavorecidas, não serve o País, não serve a democracia. Refugiaram-se no facto de o seu Governo ter aprovado o decreto que actualiza o salário mínimo nacional.
Uma voz do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Mas a verdade é que a AD não falou em valores, não garantiu a salvaguarda do imperativo constitucional da anualidade e foi necessário a apresentação do projecto de lei do PCP para que a AD viesse emendar, mal e insatisfatoriamente, à mão, quanto à questão do salário mínimo nacional.
Uma voz do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E vejamos porquê: segundo informações de um senhor deputado do CDS que nem sequer estava seguro do papel que tinha nas mãos, o Governo rouba 4 meses de actualização e fica aquém dos valores propostos com realismo no projecto do PCP, tendo em conta que a inflação atingiu os 30%, para já não referir os 34% atingidos na alimentação e bebidas, com influência determinante nos orçamentos familiares de menores recursos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República teve oportunidade de corrigir mais uma das muitas ilegalidades feitas pelo governo AD. A sua maioria em dissolução não o permitiu. O PS, mantendo as suas dúvidas e hesitações, absteve-se: a sua argumentação produzida durante a declaração de voto não colhe. Insistimos e provamos a indiscutível constitucionalidade do projecto n.º 390/II.
A fixação dos valores do salário mínimo nacional está dentro dos limites da competência legislativa desta Assembleia da República. Em primeiro lugar, não há obviamente ofensa do artigo 170.º, n.º 2, da Constituição, visto o acto não implicar por si aumento da despesa prevista no Orçamento Geral do Estado. De resto, se se entendesse que os valores do salário mínimo nacional tinham alguma coisa a ver directamente com a despesa orçamental, então o Governo não poderia fazer a sua elevação sem incluir na lei orçamental a previsão desse aumento!
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
Página 1360
1360 I SÉRIE-NÚMERO 40
O Orador: - Em segundo lugar, o aumento do salário mínimo nacional, na inexistência de uma lei quadro do salário mínimo, tem de revestir forma legislativa, pois só assim as entidades empregadoras ficarão obrigadas ao seu cumprimento. Em terceiro lugar, tratando-se materialmente de norma geral e abstracta (que obriga todos os empregadores e de que beneficiam todos os trabalhadores que se encontram nas circunstâncias previstas), nenhuma dúvida pode legitimamente arredar a plena competência legislativa da Assembleia, ou, se for esse o caso, a competência para, por via de processo de ratificação, mudar os valores que o Governo tenha eventualmente fixado. Em quarto lugar, e só como reforço de argumentação, importa dizer que tratar uma matéria como esta como um acto da exclusiva competência do Governo, alegando qualquer coisa como a sua «natureza administrativa», seria abrir caminho a pôr em questão iniciativas legislativas como a das promoções de alguns oficiais do 25 de Abril, a idade da reforma dos pescadores, a da criação do Centro Histórico do Porto, as de criação de regiões demarcadas vitivinícolas, etc., etc.
O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Muito bem!
O Orador: - E é óbvio que nunca aqui ninguém questionou o pleno cabimento constitucional de tais iniciativas.
As razões para os diferentes sentidos de voto não têm, assim, raiz em possíveis «dificuldades» constitucionais. São razões políticas. Da nossa parte o que propusemos foi a clara opção política de elevar o salário mínimo nacional de acordo com a taxa de inflação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os jovens, as mulheres, os desempregados, os trabalhadores com salários mais baixos e com maiores dificuldades, vão sentir os efeitos desta decisão injusta e ilegal da AD. Esta é mais uma razão que dá justeza à medida tomada, de dissolução da Assembleia da República e da convocação de novas eleições legislativas. Uma nova Assembleia da República e um governo democrático saberão corrigir os erros e ilegalidades cometidas.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, em nome da ASDI, tem a palavra o Sr. Deputado Braga Barroso.
O Sr. Braga Barroso (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A discussão do projecto de lei n.º 360/II, da iniciativa de deputados comunistas, processou-se em circunstâncias anómalas que não podemos deixar sem reparo.
Com efeito, no próprio dia em que a Assembleia agendara aquele debate foi recebido, com a indicação de muito urgente, do chefe do Gabinete de Sua Ex.» o Ministro dos Assuntos Parlamentares um ofício, que foi lido na sessão e no qual o Governo comunica ter aprovado «oportunamente um diploma sobre aquela matéria».
Ainda, segundo os termos do ofício referido -e que não será demasiado voltar a citar-, «de facto, na reunião do Conselho de Ministros de 6 de Janeiro próximo passado foi aprovado o projecto de decreto-lei que actualiza o salário mínimo nacional, o qual foi promulgado em 22 do corrente por Sua Ex.ª o Presidente da
República, aguardando publicação no Diário da República».
O Grupo Parlamentar da ASDI não pretende, como é evidente, especular com a coincidência de datas, que, como simples coincidência, prefere entender entre as duas iniciativas: a do Governo, que teria aprovado em 6 de Janeiro um decreto-lei, e a do PCP, apresentando em 7 o seu projecto. Mas o que lhe cumpre e não pode deixar de assinalar é que, apesar da celeridade do Gabinete de Sua Ex.ª O Presidente da Assembleia da República que à Mesa fez chegar no dia 25 o ofício do Governo da mesma data, o menos que poderá dizer-se é que o comportamento do Governo é desrespeitador da Assembleia.
Dispõe o Governo de dois elementos a que atribui funções de ligação com o Parlamento e que são, no exercício dessa função, coadjuvados pelos seus gabinetes. Mas o Governo não teve oportunidade de comunicar ao Presidente da Assembleia da República que já legislara sobre o mesmo assunto quando os deputados exerceram a sua iniciativa. Nem o facto de, como afirma, ter legislado na véspera, lhe chamou a atenção para a circunstância. Mais ainda: o projecto foi objecto de uma apresentação, efectivada nos termos regimentais e como tal agendada.
O Governo continuou a nada dizer à Assembleia, sequer aos deputados da AD, que não suscitaram a questão por, naturalmente, a desconhecerem, já que o Governo também - apesar de antes a questão ter sido largamente difundida pelos órgãos de comunicação social - não tornou pública a sua decisão de alterar o salário mínimo nacional, que não consta de qualquer comunicado do Conselho de Ministros ou foi, por qualquer forma, dada a conhecer. Também a fixação da ordem do dia para agendamento do projecto se processou com o mínimo de 15 dias de antecedência regimentalmente fixado, prazo que, também, decorreu no silêncio indiferente do Governo. Deixar, assim, que todos estes trâmites regimentais se tivessem processado sem uma palavra é comportamento grosseiramente incorrecto para com a Assembleia da República que não pode deixar passar-se em claro.
O Governo confunde a subserviência dos deputados que o apoiaram com o prestígio e o respeito que deve à Assembleia de que depende. No momento em que a dissolução da Assembleia da República é facto assente, sirva a lição aos deputados que, sem independência nem juízo próprio, contribuíram para o desprestígio da instituição política essencial à democracia que é o Parlamento.
A fundamentação do protesto que entendemos dever exprimir não pesou, entretanto, no sentido do nosso voto.
Tivemos dúvidas quanto à própria admissibilidade do projecto de lei n.º 390/II e, não apenas, face ao disposto no n.º 2 do artigo 170.º da Constituição. Com efeito, não é para nós líquido que o projecto não envolva aumento de despesas e, como tal, caia sob a alçada da «lei travão».
Não será apenas o caso de o próprio Estado ter, muito provavelmente, trabalhadores a quem paga o salário mínimo, mas, e essencialmente, o facto de o salário mínimo nacional constituir medida padrão para muitas outras despesas públicas, tais como, por exemplo, a subvenção aos partidos políticos - n.º 2 do artigo 16.º da Lei n.º 32/77, de 25 de Maio, o subsídio de desemprego, etc. Do mesmo passo, não se nos afigura claro poder o direito regimental de um partido à fixação da
Página 1361
28 DE JANEIRO DE 1983 1361
ordem do dia ultrapassar direitos constitucionalmente garantidos às estruturas representativas dos trabalhadores, a que também o regimento dá cobertura. Tal é o caso dos direitos constitucionalmente conferidos às comissões de trabalhadores - Constituição, artigo 55.º, alínea d) - e às associações sindicais Constituição, artigo 57.º alínea a) do n.º 2 - de participarem na elaboração da legislação do trabalho que, além do mais, são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas, nos termos do artigo 18.º da Constituição, aplicável por força do artigo 17.º
A ASDI não viu estas questões esclarecidas ao longo do debate. E porque não teve ocasião de, por si só, as aprofundar ou esclarecer, limita-se a enunciá-las, sem sobre elas tomar posição definitiva.
Acrescendo às dificuldades derivadas das questões sucintamente enunciadas, o Grupo Parlamentar da ASDI ponderou, com particular cuidado, o enquadramento constitucional do problema do salário mínimo. Com efeito, nos precisos termos do n.º 2 do artigo 60.º da Constituição da República, «incumbe ao Estado assegurar as condições de trabalho, retribuição e repouso a que os trabalhadores têm direito, nomeadamente o estabelecimento e a actualização do salário mínimo nacional, tendo em conta, entre outros factores, as necessidades dos trabalhadores, o aumento do custo de vida, o nível de desenvolvimento das forças produtivas, as exigências da estabilidade económica e financeira e a acumulação para o desenvolvimento». Esta nova redacção, resultante da Lei de Revisão no que ao salário mínimo se refere, reproduz exactamente o texto inicial da Constituição de 1976.
Ora, se nenhumas dúvidas nos assistem quanto à necessidade de actualização do salário mínimo que o aumento do custo de vida torna imperativo de justiça e a atenção, que é dever de solidariedade, às necessidades dos trabalhadores igualmente impõe, outras questões permanecem.
Os partidos sociais-democratas defenderam, ao longo das décadas de 50 e 60, o crescimento do salário mínimo a um ritmo mais rápido que o do salário médio nacional, de forma a que progressivamente se estreitasse o leque salarial.
Na redução das desigualdades, na repartição mais equitativa dos recursos, mantêm-se objectivos que a social-democracia, confrontada com a crise generalizada das economias, pretende alcançar.
Mas a chamada de atenção contida, por exemplo, no Plano Intercalar 1982-1983 para a França (p. 65 da edição Flammarion) parece particularmente esclarecedora:
A prazo, a revalorização dos baixos salários deverá resultar de uma melhoria da qualificação dos trabalhadores que, ao mesmo tempo, deverá responder às aspirações dos operários e contribuir para promover a adaptação tecnológica das empresas.
No decurso do plano de 2 anos o movimento de revalorização do salário mínimo será prosseguido por fases. A repercussão da revalorização, em cada fase, terá tendência a tocar uma proporção mais importante de assalariados e deverá, portanto, conter-se em limites cada vez mais estreitos. Sem isso faria relançar a inflação e reduziria, assim, a dimensão do esforço da solidariedade.
Dados recentemente vindos a público revelam como o
salário mínimo nacional se encontra muito próximo do salário médio. As consequências da sua elevação terão, assim, que ser pesadas na sua repercussão, no conjunto de economia, face «às exigências de estabilidade económica e financeira e a acumulação para o desenvolvimento». Ora, ao longo do debate -aliás curto - não foram sequer apresentados elementos que nos convencessem da bondade da solução preconizada e, em particular, não foi demonstrado que, no estado actual da economia nacional, ficassem afastados efeitos perversos, tais como a incapacidade de resposta de alguns sectores, gerando não só a não criação de novos postos de trabalho, como arriscando a manutenção dos existentes, os efeitos inflacionistas da medida, etc.
Foi, assim, a insuficiência de elementos - que a ausência de discussão participada com as estruturas dos trabalhadores mais agravou - que nos impediu de votar favoravelmente um projecto que, à partida, merecia a nossa simpatia. Por isso nos abstivemos.
Não ignoramos que, derrotando a AD a iniciativa, seria mais fácil colher a «popularidade» imediata do voto que apoia as medidas «simpáticas» sem a responsabilidade de as ver executadas. Mas por outros critérios nos pautamos e temos procurado exercer a nossa actividade parlamentar.
Como escreveu Michel Rocard no Nouvel Observateur, a propósito da herança de Mendes France, também nós pensamos e acreditamos que «a ideia de que todo o discurso político não está necessariamente votado a tornar-se mentiroso, de que as promessas não serão forçosamente traídas, de que a esperança não é vã, numa palavra, de que o compromisso político deverá poder ser assumido por qualquer cidadão, mantém-se uma ideia profundamente nova e moderna.
Aplausos da ASDI.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos agora à discussão e votação do projecto de lei n.º 171/II, da ASDI, sobre o controle público da riqueza dos titulares de cargos políticos.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Dá-me licença, Sr. Presidente? É para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Presidente, levanta-se-me aqui uma dúvida regimental que a Mesa ou o Plenário talvez possam suprir. É que o texto que nos é apresentado para discutir hoje é capeado com o n.º 171/II - iniciativa do Sr. Deputado António Luciano Pacheco de Sousa Franco. Vem, pois, assinado por um ex-senhor deputado.
Ora, uma vez que as iniciativas legislativas são dos deputados e não dos grupos parlamentares e que o autor do presente projecto de lei há muito que não é deputado, pergunto a V. Ex.ª, Sr. Presidente, se será regimental a discussão do diploma que consta da ordem do dia de hoje. Assim, gostaria que V. Ex.ª desse a sua opinião ou que a Câmara se pronunciasse sobre o assunto.
Por outro lado, este é ainda um projecto claramente inconstitucional, mas creio que não valerá a pena arguir nesse sentido, uma vez que o vício de que falei chegará para infirmar esta discussão.
O Sr. Presidente: - Antes de conceder a palavra ao Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, que a pediu natural-
Página 1362
1362 I SÉRIE-NÚMERO 40
mente para responder à objecção do Sr. Deputado Borges de Carvalho, ...
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Não, Sr. Presidente. Pedi a palavra para intervir no debate.
O Sr. Presidente: - ... devo dizer que no pensamento da Mesa as iniciativas são efectivamente dos deputados, mas depois de apresentadas e admitidas na Mesa da Assembleia da República passam a ser dos grupos parlamentares.
Neste sentido, a Mesa não vê qualquer objecção na discussão e votação deste projecto, mas naturalmente que o Plenário será soberano se V. Ex.ª quiser recorrer desta decisão da Mesa.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Presidente, qual é a disposição regimental em que V. Ex.ª se baseia para dizer que esta iniciativa, apesar de tomada por um deputado, é assumida pelo grupo parlamentar, que, aliás, não teve sequer o cuidado de o fazer, ou seja, de assumir, com a assinatura de outros proponentes, a iniciativa do presente projecto de lei?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Borges de Carvalho, o pedido de marcação desta ordem do dia veio subscrito pelo Sr. Deputado Magalhães Mota, em ofício emitido pelo Grupo Parlamentar da ASDI. A nós, isso parece-nos bastante como assunção do projecto.
Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.
Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Para intervir no debate, naturalmente?...
O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, peco-lhe o favor de aguardar um momento. Faça favor, Sr. Deputado Borges de Carvalho.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - V. Ex.ª tinha dito que ia dar a palavra ao Sr. Deputado Vilhena de Carvalho para me responder. Mas como não é para esse efeito, quero apenas que fique registado que esta Câmara vai discutir um projecto de lei de um deputado que não existe. Pretendo que isto fique efectivamente registado, bem como que o grupo parlamentar que pediu o seu agendamento não teve sequer o cuidado de subscrever o diploma.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Borges de Carvalho, fica registado na acta que essa é a opinião de V. Ex.ª.
A opinião da Mesa, que também já foi registada em acta, é a de que, embora se trate de uma iniciativa de um deputado que neste momento já não o é, ela foi subscrita e assumida pelo Grupo Parlamentar da ÁSDI de forma tal que a Mesa julga suficiente. Portanto não vamos discutir e votar uma iniciativa legislativa de um deputado que já não existe, mas sim uma iniciativa do Grupo Parlamentar da ASDI.
Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, para intervir no debate.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de fazer a apresentação do nosso projecto de lei naturalmente que não me dispenso de dar uma resposta à questão posta pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho.
No momento em que o Sr. Presidente me deu a palavra para intervir sobre o tema introduzido, o Sr. Deputado mostrou-se, desde logo, com um certo nervosismo no sentido de que não era uma resposta da minha boca que queria ouvir, mas da Mesa.
Ora a Mesa deu-lhe a resposta adequada e eu, neste momento, não teria mais que me louvar na decisão da Mesa, que passou em julgado na medida em que o Sr. Deputado Borges de Carvalho dela não interpôs recurso, sinal de que o Sr. Deputado se conformou com tal decisão.
De qualquer maneira, não me dispenso de patentear que o Sr. Deputado Borges de Carvalho só hoje, e no momento em que tem lugar a discussão deste projecto de lei, se deu conta de que este diploma se encontrava subscrito pelo então deputado, no momento da apresentação, Sr. Dr. Luciano Sousa Franco.
O Sr. Deputado Borges de Carvalho esqueceu um ponto importante, que é o seguinte: o que dá legitimidade à apresentação de qualquer projecto de lei é o momento da sua apresentação. Se o Sr. Deputado Sousa Franco no momento em que o projecto foi apresentado não fosse deputado nesta Casa poderia, sim, pôr-se o problema da subsistência ou não subsistência deste diploma.
Mas a verdade é que este projecto de lei foi apresentado sendo deputado desta Casa o Sr. Dr. Sousa Franco. E a prova de que ele foi assumido não só por esta Câmara, mas em especial pelos deputados da ASDI, deriva do facto, já salientado pela Mesa, de ter sido pedida a sua marcação para a ordem do dia de hoje.
Em segundo lugar, verifica-se que as propostas de alteração ao mesmo projecto de lei são subscritas pelos deputados da ASDI, como o Sr. Deputado Borges de Carvalho e os demais grupos parlamentares tiveram já ocasião de ver, e que, pelo menos, elas traduzem a assunção do diploma.
Não me dispenso ainda de, quanto ao segundo ponto suscitado, qual seja o da inconstitucionalidade deste projecto, dizer que o Sr. Deputado Borges de Carvalho mais uma vez foi impertinente e está absolutamente carecido de razão
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Está carecido de razão desde logo porque - e mais uma vez mostra não estar a par daquilo que se passa nesta Assembleia - devia ter reparado que não era ocasião para suscitar a questão da inconstitucionalidade por forma a impedir a discussão do presente diploma.
É que para suscitar a questão da inconstitucionalidade deste projecto de lei por forma a impedir a sua discussão teria de o fazer nos termos regimentais e o Sr. Deputado Borges de Carvalho não o fez em tempo útil.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Passando agora à apresentação do projecto de lei n.º 171/II, dir-lhes-ei, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o seguinte: É do conhecimento geral que nenhum Estado de direito democrático se constrói,
Página 1363
28 DE JANEIRO DE 1983 1363
se preserva e perdura sem que a vida política desenvolvida no seu seio traduza uma realidade ética e moralmente forte e respeitada.
Mas é também do nosso conhecimento que os homens - por eles próprios e pelas suas circunstâncias - nem sempre se comportam na sociedade política em que pontificam com pleno respeito pelos princípios éticos e morais que deles seria legítimo esperar.
A violação ou mesmo o simples receio de violação dos princípios enunciados, embora genericamente, faz logo surgir a ideia e a necessidade da tomada de medidas de índole diversa: umas, meramente políticas, e outras, de carácter legislativo; algumas, só preventivas, e outras, mesmo repressivas, mas todas, afinal, orientadas numa única direcção: a moralização da vida política, como condição de credibilidade e solidez da organização do Estado de direito democrático.
Se nos fosse pedido para, numa curta fase, exprimirmos os fundamentos e a finalidade do projecto de lei n.º 171/II, sobre o controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos, nós diríamos, na sequência do que vimos afirmando, que ele assenta e se dirige à prossecução do que temos por essencial em democracia: a moralização da vida política.
Quanto a nós, a transparência da situação financeira dos titulares dos cargos políticos muito poderia contribuir para essa moralização.
Aqueles que dispõem de poder, não se eximindo à obrigação de prestar contas à comunidade, arredariam desta a tentação das suspeitas, dos juízos pejorativos, da invenção de escândalos financeiros, tudo porventura infundado, mas de frequente uso e abuso, seja em privado, seja em público, quando não menos com tratamento e especulação a nível de órgãos da comunicação social.
Como observa o nosso ilustre colega Dr. Raul Rego, no seu livro Os Políticos e o Poder Económico:
Caluniados foram sempre os nossos homens públicos, e o século XIX e o primeiro quartel do século XX deram-nos bastos exemplos de boatos de riquezas atirados sobre quem, às vezes, apertava bem apertado o cinto na sua economia caseira. E homens ricos houve que entraram na política e lá deixaram os bens herdados.
A observação que citámos continua a ser verdadeira em relação à nossa realidade actual.
De facto, de quanta maledicência não são ainda hoje vítimas muitos dos titulares dos cargos políticos. Alguns se têm mesmo justificado publicamente sobre* a origem dos seus bens ou até os quantificam, como o fez bem recentemente na televisão um político muito conhecido, que foi confidenciando a milhões de telespectadores que só tinha de seu a casa e o automóvel.
Se quisermos extrair a lição dos apontados comportamentos, diríamos que existe a consciência de que é útil, necessária e honrosa a revelação pública da situação financeira daqueles que exercem cargos políticos e que essa revelação é estimada pela comunidade.
Diríamos também que a aprovação de medidas legislativas que vão nesse sentido, longe de confirmar um acto generalizado de desconfiança em relação à chamada classe política, traduziria, pelo contrário, um reforço da sua imagem pública e da sua salvaguarda contra falsas arremetidas de adversários, de gente sem escrúpulos e dos inimigos da democracia.
Diz o povo, com a sua sabedoria, que quem não deve não teme e a verdade é que não basta que os titulares de cargos políticos sejam honestos; têm de, como a mulher de César, ao menos, parecê-lo, apresentando-se em público como tal.
São preocupações como as que vimos sucintamente expressando que explicam a razão de ser do projecto de lei em debate.
Projecto que se inscreve na mesma linha de orientação com que os deputados da ASDI apresentaram nesta Assembleia diversas iniciativas, seja o projecto de lei n.º 137/II, sobre o combate à imoralidade administrativa, fraude e corrupção, sejam os inúmeros requerimentos formulados com idênticos fins, seja a constituição por nós suscitada de algumas comissões parlamentares de inquérito, ou a invocação da lei n.º 266, de 27 de Julho de 1914, a aplicar no chamado caso «Alfaia versus ANOP» ou «Alfaia pró NP».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pensamos que a tradução prática da filosofia subjacente ao projecto de lei em debate, consistirá na obrigatoriedade da apresentação de declarações do património e rendimentos no início e no termo do exercício das funções de Presidente da República, deputado, membro do Governo e outras funções julgadas de carácter político, tanto da República como das regiões autónomas, independentemente do facto de os respectivos cargos terem sido assumidos por eleição, por nomeação ou por cooptação política.
A apresentação de uma tal declaração haverá de ser feita com alguns detalhes, sem o que não seria susceptível de produzir os efeitos úteis que com ela se pretendem alcançar e, por isso, se propõe que da mesma conste uma descrição, por grandes rubricas, dos vários elementos que compõem o património pessoal, tanto activo como passivo, a indicação dos cargos sociais ou outros exercidos em empresas de qualquer natureza, no País ou no estrangeiro, e, bem assim, a indicação do rendimento colectável bruto para efeitos de imposto complementar e demais rendimentos isentos, ou não sujeitos a este imposto.
Para que esta obrigação adquira o quantum satis de jurisdicidade, estabelece-se como sanção ao seu incumprimento a inibição, para o exercício de cargos públicos, até 5 anos e demissão automática dos cargos e funções públicas que se exerçam, a declarar judicialmente, a pedido do Ministério Público.
A tanto se resume, no essencial, a economia do projecto de lei em debate.
O tempo decorrido desde a sua apresentação nesta Assembleia, a qual teve lugar em Março de 1981, e certas alterações institucionais resultantes da revisão da Constituição impõem que sejam introduzidas modificações no articulado, se bem que ligeiras, e que vamos apresentar de imediato na Mesa desta Assembleia.
Dizem respeito, concretamente à atribuição ao Tribunal Constitucional da competência para o arquivo das declarações prestadas, à eliminação dos ex-membros do Conselho da Revolução do elenco dos titulares de cargos políticos e à actualização do preceito relativo à vacatio legis estabelecida.
Poder-se-á sustentar que os princípios defendidos neste projecto de lei deveriam conduzir ao alargamento da obrigatoriedade da apresentação das declarações de riqueza pessoal a outros titulares de cargos públicos, nomeadamente àqueles que desempenham funções autárquicas. Também estes são muitas vezes alvo de injustificadas
Página 1364
1364 I SÉRIE-NÚMERO 40
suspeitas ou acusações e também, quanto a eles, poderá reconhecer-se, às respectivas comunidades locais, o direito de controle do seu comportamento em relação ao poder económico durante o exercício das suas funções.
Cedendo facilmente à bondade de uma tal argumentação, não quisemos, todavia, ir tão longe.
Pensamos que ao inovar nesta matéria se deverá aguardar os resultados da experiência desta iniciativa, com o âmbito proposto, para só depois se proceder em conformidade com esses resultados.
Um outro ponto que desejaríamos explicitar é a resposta a uma possível objecção quanto à constitucionalidade do nosso projecto, na medida em que ele acarretará uma certa intromissão na vida privada dos cidadãos que se encontrem a desempenhar cargos políticos.
Uma tal objecção carece de fundamento legal e moral.
Antes de mais, convém ter presente que as declarações a prestar ficarão arquivadas no Tribunal Constitucional e que a elas só poderão ter acesso os cidadãos ou os órgãos de comunicação social que justifiquem, junto do mesmo Tribunal, a legitimidade do seu interesse em conhecer-lhes o conteúdo e em termos a regular pelo Governo, por decreto-lei, o que significa que se prevêem as necessárias cautelas quanto à publicação das declarações apresentadas, devendo ser suficientemente sopesados todos os interesses em jogo, quer privados, quer públicos.
Em segundo lugar, dir-se-á que o mecanismo instituído das declarações e da sua divulgação pode e deve funcionar, as mais das vezes, no interesse particular dos próprios declarantes.
Em terceiro lugar, deverá ter-se presente que o interesse público que pode estar em causa, ou seja, o respeito pela moralidade e ética políticas como valores indispensáveis à preservação da democracia, não poderá ceder quando em confronto com um interesse meramente privado.
Finalmente, ninguém ignora que quando alguém aceita candidatar-se a cargos políticos, ou aceita a nomeação ou cooptação para eles, aceita, implicitamente, uma certa e necessária limitação ao direito à imagem e à reserva da intimidade da vida privada.
De facto, não há exemplo, em tempo ou lugar algum, de um político que reclame da utilização pública da sua imagem. E se é em geral aceite a limitação que respeita à imagem física, por maioria de razão se há-de ter por aceite uma certa limitação ao direito à sua imagem moral e política.
Tudo isto porque, e em resumo, é a opinião pública o principal juiz da actuação dos titulares de cargos políticos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O regime que se pretende instituir com o projecto de lei hoje submetido à apreciação desta Assembleia não é ignorado, mas antes praticado e com bons resultados em diversos países, como os Estados Unidos, com legislação a nível federal, a Alemanha Federal, no âmbito de diversos Estados, e na Suécia e Dinamarca, entre outros.
Recordaremos também que na última campanha para as eleições presidenciais, em França, o partido mais próximo do então Presidente Giscard, a UDF, incluía entre as suas promessas ao eleitorado a adopção de medidas de moralização da vida política, entre as quais se contavam o controle judicial do património pessoal dos ministros, deputados, maires de grandes cidades, etc.
Dentro em breve também nos acharemos em período eleitoral. A discussão deste projecto de lei, digamos mesmo que constitui um teste às posições que cada um dos partidos assumirá quanto aos problemas que se prendem com a moralização da nossa vida política. E os resultados da sua votação não deixarão, por certo, de ser ponderados por todos os que apostam, em definitivo, em viver em democracia autêntica em Portugal.
Aplausos da ASDI, do PS, do PCP, da UEDS, do MDP/CDE, dos Srs. Deputados do PSD Mário Raposo e Sousa Tavares e da Sr.ª Deputada Independente Natália Correia.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Borges de Carvalho, Corregedor da Fonseca, Natália Correia e Mário Raposo.
Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado Borges de Carvalho.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, a parte introdutória da sua intervenção merece obviamente que lhe contraponha alguma coisa.
Como V. Ex.ª muito bem disse, conformei-me com a decisão da Mesa e se o fiz foi porque não era minha intenção inviabilizar a discussão que hoje aqui vamos travar. Simplesmente, digamos que a minha objecção foi colocada muito particularmente ao partido de V. Ex.ª porque ele é, sem sombra de dúvida, aquele que com mais frequência invoca pruridos de carácter regimental e procura, de uma forma quase burocrática, fazer valer determinados pontos de vista.
Por isso não pude deixar de salientar que nessa altura, a meu ver, a ASDI teve, pelo menos, uma pequena falta de cuidado, para que se demonstre que, afinal, também os superdeputados se enganam.
Na parte final da sua intervenção falou V. Ex.ª na questão da constitucionalidade. Sem lhe pôr as objecções que penso existirem, pois também agora não argumentarei pela inconstitucionalidade - e que, afinal, também não invoquei na minha interpelação à Mesa exactamente porque sabia que não era altura de o fazer e, portanto, apenas me referi a elas-, pedirei, contudo, um favor. Peço-lhe que mais pormenorizadamente me diga, e à Câmara, como é que V. Ex.ª compatibiliza o seu projecto de lei, ou o projecto de lei do Sr. Deputado Sousa Franco, com os artigos 13.º e 26.º da Constituição. Agradecia-lhe algum pormenor neste esclarecimento, caso V. Ex.ª queira e possa fazê-lo.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, pretende responder imediatamente ao Sr. Deputado Borges de Carvalho ou no final de todos os pedidos de esclarecimento?
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - No final, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então, tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado Corregedor da Fonseca.
O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, ouvi atentamente a sua intervenção e, na minha opinião, o conteúdo do projecto de lei apresentado por V. Ex.ª é altamente moralizador das instituições democráticas, é eticamente defensável e merece o total apoio do MDP/CDE.
Página 1365
28 DE JANEIRO DE 1983 1365
Não há dúvida de que há muito se impõe no nosso pais a aprovação de uma lei clara que tome finalmente possível a transparência sobre a situação financeira quer do Presidente da República, como de ministros, deputados e de outras entidades previstas no vosso projecto de lei.
O prestígio do regime democrático necessita de iniciativas legislativas como esta. O povo português tem de possuir garantias de que os seus eleitos e outros altos funcionários e titulares de cargos públicos procedem em todos os seus actos com toda a limpidez. O povo português tem o direito de ser informado sobre a vida financeira dos que exercem cargos políticos e pela nossa parte nada receamos.
Contudo, Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, julgo que a lei poderia talvez ser melhorada e neste sentido pedia-lhe dois esclarecimentos.
Não julga V. Ex.ª que seria de integrar no artigo 5.º, na lista das personalidades abrangidas no projecto, os presidentes das Câmaras de todo o País e o presidente do Supremo Tribunal Administrativo?
Finalmente, na proposta de alteração que agora me chegou à mão VV. Ex.ªs dizem:
Estas declarações serão arquivadas no Tribunal Constitucional e a elas terão acesso quaisquer cidadãos que devidamente justifiquem o seu interesse.
Ora eu gostava de saber como é que os cidadãos podem justificar esse seu interesse. Basta lá chegar e dizer: «eu quero ver o que é que o deputado do MDP/CDE, fulano de tal, tem», ou tem de apresentar um outro formulário qualquer? É tudo, Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia, também para pedir esclarecimentos.
A Sr.ª Natália Correia (Indep.): - Sr. Deputado, fala-se muito em corrupção, com ou sem fundamento, mas fala-se.
A transparência da situação financeira dos titulares dos cargos políticos tem uma função moral numa sociedade em que a desconfiança se instalou, agravando a crise moral que, em meu entender, é bem mais perigosa do que a crise económica.
Dou, pois, o meu apoio ao projecto de lei em causa. Mas, no seu preâmbulo, leio que a opinião pública tem o direito de saber o mínimo imprescindível sobre a vida privada dos que exercem cargos políticos.
Sendo isto aceitável no aspecto da posse de bens materiais, não acha o Sr. Deputado que semelhante redacção pode dar lugar a que por vida privada se entenda a vida íntima dos titulares dos cargos políticos, que deve ser indevassável como tudo o que sagradamente diz respeito à intimidade dos indivíduos, mesmo quando personalidades políticas?
Aceita o Sr. Deputado a minha sugestão em especificar que esse conhecimento mínimo da vida privada dos que exercem cargos políticos se refira exclusivamente à situação financeira?
O Sr. Presidente: - Finalmente, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Raposo.
O Sr. Mário Raposo (PSD): - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, devo dizer que esta sua intervenção foi uma lufada de ar fresco, da qual, aliás, só ouvi a parte final, e
contém um princípio que considero imprescindível numa sociedade normalizada, que queira viver sob as regras e sob a égide dos princípios democráticos.
Os titulares dos cargos públicos, sejam eles quais forem, não podem ter uma noção, que seria indevida, de possidência institucional ou patrimonial em relação aos cargos e ao poder que ocupam. Este é necessariamente transitório.
Consequentemente, uma lei determinada por estas razões e com esta intencionalidade é uma premência para a vida nacional, não em razão da conjuntura imediata e próxima, mas por imperativos de princípios e objectivos que são indeclináveis na nossa vivência e nos nossos objectivos essenciais.
Colocaria apenas uma ligeira dúvida quanto à necessária demarcação das fronteiras entre a privacidade que é devassável, enquanto se refira ao espaço patrimonial, e aquilo que realmente deva ter de resguardo personalizado e, portanto, necessariamente restringido em função da dignidade que toda a pessoa, seja qual for o cargo que ocupe, deve ter.
Neste aspecto não poria a restrição que o Sr. Deputado e meu querido amigo Borges de Carvalho aqui pôs. Considero que esta problemática não tem nada a ver com aquela que poderão propor o artigos 13.º e 26.º da Constituição. Trata-se, na verdade, de um princípio fundamental que nem teria de estar consignado na Constituição, já que a defesa da incolumidade da vida privada é um núcleo essencial da cidadania.
Colocaria, pois, este pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Vilhena de Carvalho e diria, em remate, que quanto ao que o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca aqui disse - com o que, fundamentalmente, estou de acordo - apenas manifesto o meu protesto, sem prejuízo de uma concordância quanto ao demais, no que se refere à inclusão, no elenco, do presidente do Supremo Tribunal Administrativo.
Trata-se de um órgão judicial; tem de estar isento de qualquer controle deste tipo.
Os controles são feitos por outra via, por outros canais. Os juizes não são titulares de cargos políticos. Nem todos os titulares de órgãos de soberania exercem funções políticas.
Tem sido um defeito que tem viciado determinadas atitudes desta Assembleia a confusão entre os cargos políticos com natureza pública e os cargos públicos que têm natureza política.
Os tribunais judiciais ou equiparados não são órgãos políticos. Assim, terão de estar isentos de uma possível devassa; esta, nos termos expostos, tem de ser restringida aos cargos políticos.
Em substância, manifesto, pois, uma total conformidade, uma total concordância, com o espírito do projecto de lei, mas faço-lhe os reparos que brevemente aqui elenquei.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Deputado Borges de Carvalho, permitir-me-ia lembrar-lhe uma passagem duma ode horaciana que V. Ex.ª certamente bem conhece e de onde extraí a lição de que «até Homero dormita».
Pois se «até Homero dormita», como não hão-de dormitar os superdeputados por V. Ex.ª designados?
Só que, neste caso - e felizmente para os modestos
Página 1366
1366 I SÉRIE-NÚMERO 40
deputados que nós somos -, os «super» e os «Homeros» dormitam, mas os «modestos deputados» estão atentos. E estão tão atentos que não cometeram nenhuma irregularidade processual. Mas o Sr. Deputado Borges de Carvalho não podia deixar de, praticamente no final da nossa actuação conjunta, ao menos nas posições em que nos encontramos, mais uma vez, atirar os seus dardos e as suas setas - que às vezes têm um humor aceitável - em relação ao trabalho da ASDI, chamando à colação o facto de a ÁSDI nem sempre deixar passar um certo número de coisas que entende merecer reparo, de não deixar de interpor recursos de coisas que entenda, coisa que, afinal de contas, revelou que o Sr. Deputado, sim, deixa passar as coisas, não interpõe recursos e diz que fala nelas porque a ASDI também o costuma fazer.
Isto é lateral em relação àquilo que efectivamente é importante neste debate e responderei à parte da sua intervenção que de facto tem alguma importância para o debate, onde perguntava, se bem me lembro, como ê que eu entendia que o nosso projecto se conciliava com o disposto nos artigos 13.º e 26.º da Constituição.
Penso ter explicado isso na minha intervenção. Não considero, pois, o projecto de lei - e responderei também, desde já, à Sr.ª Deputada Natália Correia e ao Sr. Deputado Mário Raposo - inconstitucional.
Aquilo que apenas se pretende controlar, e por declaração do próprio titular de um cargo, é a sua situação financeira.
Dir-se-á que a situação financeira de uma pessoa porventura entra naquele quadro de vida íntima que tanto preocupa a Sr.ª Deputada Natália Correia! Penso que não. Penso que em relação à situação financeira de um titular de um cargo político a nível de Presidente da República, de membro do Governo, de deputado, tem de haver um certo interesse do próprio titular desse cargo de forma a que não sejam postos em causa os seus bens de fortuna que tinha antes, que não seja posta em causa a sua honorabilidade no desempenho do cargo e as suspeitas de que se serve desse cargo para alcançar resultados financeiros.
Isto porque, contrariamente ao que se pudesse pensar, o intuito deste projecto de lei não visa denegrir os políticos; é até do reconhecimento do facto de muitos políticos serem denegridos injustamente que há que criar condições para que isso não aconteça.
Mas quando algum político tem «pedras no telhado» naturalmente que tem que sofrer as consequências porque a comunidade tem o direito de ser governada por titulares isentos, do ponto de vista financeiro, no desempenho dos seus cargos.
Não vejo, portanto, que isto colida com a disposição constitucional que defende a privaticidade e a intimidade da vida das pessoas.
Mas ainda em relação a isto, Sr.» Deputada Natália Correia, arriscaria uma opinião pessoal quanto ao seguinte: por vezes são as próprias pessoas que põem a privaticidade da sua vida em público. E quando isso acontece pergunto se o público não poderá fazer as apreciações que entenda acerca da privaticidade dessas pessoas.
A Sr.ª Natália Correia (Indep.): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faz favor.
A Sr.ª Natália Correia (Indep.): - Sr. Deputado, se isso acontece a culpa será dessas pessoas, condenando-se assim ao juízo público.
Mas o que eu penso é que se abrirmos um precedente no sentido de expor a vida íntima ao julgamento da opinião pública podemos cair numa espécie de ficção política em que a intimidade desapareceu.
Quanto ao resto, devo dizer que só pedi que especificasse que se tratava da situação financeira para preservar o projecto de lei de interpretações perigosas. Mais nada, Sr. Deputado.
Penso que o próprio conceito de moralização da vida política não se compadece com a lavagem pública das roupas íntimas. É só isso Sr. Deputado.
O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Não apoiado!
O Orador: - Estamos inteiramente de acordo, Sr.ª Deputada. Apenas queria fazer uma apreciação a latere, porque, como sabe, a economia do projecto é exclusivamente dirigida aos aspectos financeiros dos titulares dos cargos políticos.
O Sr. Mário Raposo (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faz favor.
O Sr. Mário Raposo (PSD): - Interrompo-o apenas para dizer que por vezes a distinção entre a vida íntima e a vida financeira é muito difícil de se fazer, até porque para muitas pessoas a vida «mais íntima» é a financeira. Portanto curemos de evitar que se escudem na capa da vida íntima aquilo que é de mais sensível à moralidade e à dignidade das instituições, que são os contágios ou distorsões do poder financeiro.
Não sob revalorizemos, portanto, a vida íntima e o espaço íntimo nesta medida.
E, como é sabido, há muitos anos que defendo o que de legítimo tenha a ver com a privacidade da vida privada.
O Orador: - Sr. Deputado, estamos de algum modo e em certa medida de acordo. Mas volto a insistir que os aspectos financeiros são os principais e a circunstância de eles também terem, por vezes, alguma coisa de íntimo.
Também não podemos esquecer um facto importante, e esse argumento eu queria aduzir: reconheço, reconhece-se em geral, que a comunidade tem o direito de conhecer certos contornos da vida dos titulares de cargos políticos. E o titular do cargo político sabe de antemão, ao aceitá-lo, ao propor-se a uma eleição, ao aceitar uma nomeação, que a sua vida privada tem de ser necessariamente sujeita a um mínimo de limitação porque isso lhe é imposto pela comunidade em que está inserido.
E se se trata de uma imposição que se reconhece existir na comunidade, quem não esteja de acordo com essa devassa ou possível devassa só tem uma coisa a fazer: não se candidatar, não aceitar nomeações. Porque a verdade é esta - e insisto com uma imagem que constava da minha intervenção: algum titular de um cargo político foge de que lhe explorem a sua imagem física? Existe ou não aqui também uma limitação ao direito constitucional à imagem?
O político já sabe que tem de aparecer nos magazines deformado fisicamente, não pode impedir que o retratem. E por que é que há-de impedir que outros aspectos
Página 1367
28 DE JANEIRO DE 1983 1367
da sua vida que interessam à comunidade não tenham, pelo menos, o tratamento cauteloso que consta deste projecto?
Em resposta ao Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, começarei por agradecer o apoio que disse dar à nossa iniciativa ou ao nosso projecto assumido, para satisfação do Sr. Deputado Borges de Carvalho.
Em relação aos presidentes das câmaras municipais, tive ocasião de, na minha exposição, dizer que achava bondosa a argumentação que levaria a admiti-los como incluídos entre os titulares de cargos sujeitos a estas declarações.
Todavia, estamos a dar os primeiros passos nesta matéria no nosso país. E penso que em função dos resultados que se obtenham, como providências desta natureza com um âmbito limitado, como está no nosso projecto, ter-se-ia dado um passo para fazer uma experiência que permitiria, posteriormente, face aos resultados, alargar - se assim for entendido - aos presidentes das câmaras ou, quiçá, a outros autarcas.
Em relação ao presidente do Supremo Tribunal Administrativo, estou mais de acordo com o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca do que com o Sr. Deputado Mário Raposo, porque houve uma omissão da nossa parte.
Repare, Sr. Deputado, que está incluído o presidente do Tribunal Constitucional, o presidente do Supremo Tribunal de Justiça e houve a preocupação de incluir os titulares dos mais altos cargos dos Órgãos de Soberania, até por uma questão de equilíbrio e de justiça distributiva quanto à economia do processo.
Portanto, nesse aspecto estou inteiramente de acordo e votarei uma proposta apresentada nesse sentido.
Entretanto, não quero deixar de agradecer aos Srs. Deputados Corregedor da Fonseca, Natália Correia e Mário Raposo o apoio que ofereceram ao projecto, nomeadamente a expressão do meu querido amigo Mário Raposo, que teve a gentileza de considerar o projecto uma lufada de ar fresco na vida política nacional.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos de seguida fazer o nosso intervalo habitual. Retomaremos os nossos trabalhos às 18 horas e 20 minutos.
Eram 17 horas e 50 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 40 minutos.
O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, em nome do meu grupo parlamentar e ao abrigo das disposições regimentais peço a interrupção da sessão por 30 minutos.
O Sr. Presidente: - É regimental. Está concedida. Retomaremos os trabalhos às 19 horas e 10 minutos.
A sessão foi interrompida.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão. Eram 19 horas e 20 minutos.
O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, peço a palavra para um protesto relativamente às declarações do Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, ouvi atentamente as respostas aos meus pedidos de esclarecimento. Apenas ficou por responder uma questão relacionada com a justificação que as pessoas devem apontar para poderem ser esclarecidas quanto à situação financeira dos titulares de cargos políticos. Contudo, como considero que uma futura regulamentação para resolver este problema, não faço muita questão em obter um esclarecimento por parte de V. Ex.ª
Em todo o caso, Sr. Deputado, volto a falar na questão dos presidentes das câmaras. Eles estão na mira das populações e pode, em alguns casos, como alguns são de localidades pequenas, haver certas injustiças sobre o bom nome dos presidentes das câmaras. Talvez fosse razoável - como há bocado eu dizia - integrar os presidentes das câmaras na lista das personalidades que deverão prestar contas da sua situação financeira.
Finalmente, noto também que o projecto de lei podia ser beneficiado no tocante aos governadores civis. Reparo que no artigo 5.º do projecto de lei fala-se em Presidente da República, em deputados, em ministros, em ministros da República, mas não estão incluídos os governadores civis.
Gostava, se pudesse, que me desse um esclarecimento sobre isto.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, relativamente à primeira questão que colocou, V. Ex.ª deu a resposta.
O projecto de lei prevê ser regulamentado pelo Governo e penso que o lugar mais adequado quanto ao processo de acesso às declarações depositadas no Tribunal Constitucional - até por ser matéria de processo - seria no decreto regulamentar desta lei.
Quanto aos presidentes das câmaras, sou sensível à argumentação expendida relativamente a eles, mas - e repito mais uma vez - quisemos dar um primeiro passo, passo esse que não significa, por si só, que estejamos fechados; bem pelo contrário, aprovaríamos uma proposta que nesse aspecto enriquecesse o nosso projecto de lei.
Já quanto aos governadores civis, dizer-se que a sua inclusão se justificaria com muito mais acuidade do que a dos próprios presidentes das câmaras, devo dizer que a sua não inclusão foi um acto pensado. Não porque entendamos que eles não exerçam cargos políticos que os devem sujeitar a idêntico controle, mas porque nós, ingenuamente, acreditámos em algumas promessas da AD, como fosse o completar da regionalização e a extinção do distrito. Daí o desaparecimento dos governadores civis.
Naturalmente que só cometemos essa ingenuidade durante o momento da feitura do projecto de lei. Neste momento temos que nos penitenciar, porque devíamos ter logo obtido a certeza de que os governadores civis, iriam, com o governo da AD, manter-se ainda por muito tempo, tal como aconteceu.
Página 1368
1368 I SÉRIE-NÚMERO 40
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A moralização da Administração Pública deve começar pelos mais altos responsáveis políticos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Á transparência da situação financeira dos titulares de cargos públicos é uma questão de ética política e de dignificação da vida democrática.
Contribui para comprovar a honorabilidade dos titulares de cargos públicos e a inexistência de actos de corrupção, desencorajando-os ou prevenindo-os.
Nada há mais deletério para a democracia do que a suspeita de que os governantes se «governam» a si mesmos, aproveitando-se do poder que adquirem, não para servir a comunidade, mas para fins egoístas e imorais.
E neste momento, em que a chamada «classe política» é objecto de críticas indiscriminadas, algumas delas centradas em questões de índole financeira, é mais do que oportuno e justo que se faça luz sobre as diversas situações individuais e que cada qual possa ser julgado e apreciado com verdade e rigor.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - As medidas propostas pela ÁSDI inserem-se nas nossas preocupações.
Nesse sentido, propusemos até medidas mais vastas, em 21 de Março de 1981, que foram, aliás, rejeitadas pela AD.
Com efeito, o projecto de lei do PS, com o título de «Divulgação pela Administração do rendimento colectável global e sua tributação», por nós apresentado, determinava que nos 3 primeiros meses de cada ano, as repartições de finanças de cada concelho ou bairro afixassem, nos locais reservados ao público, uma relação nominativa dos contribuintes colectados em imposto complementar, secção A, incluindo para cada contribuinte o rendimento colectável, determinado nos termos da lei, e o imposto complementar liquidado.
Esta divulgação visava quebrar definitivamente tabus arcaicos quanto ao segredo de rendimentos, permitindo que os cidadãos possam apreciar e julgar do que cada um ganha e fiscalmente paga.
Medida moralizadora que atingia a todos e tornaria transparente, inevitavelmente, os comportamentos económicos dos titulares de cargos políticos.
O nosso projecto renasce agora em forma reduzida. Quem apoia o mais, apoia o menos. É um bom começo, começo.
Em concreto, a proposta encontra-se desactualizada. Ainda prevê o Conselho da Revolução e não prevê outros órgãos do Estado criados pela Constituição revista.
Devem incluir-se, pelo menos, os membros do Conselho de Estado, os membros do Conselho Superior de Defesa Nacional, os membros das vereações camarárias, os membros do Tribunal Constitucional e do Conselho Superior de Comunicação Social.
Por outro lado, o artigo 6.º do projecto de lei em discussão, em que se define o acesso às declarações, não parece primar pela clareza. Não se percebe bem o que significa o acesso de «quaisquer cidadãos que devidamente justifiquem o seu interesse junto do respectivo tribunal e designadamente junto dos órgãos de comunicação social», como está consagrado nesse artigo.
Entendemos que seria mais claro e correcto consagrar que os órgãos de comunicação social têm acesso às declarações sem justificação de interesse, em obediência ao princípio do acesso dos jornalistas às fontes de informação.
Finalmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, quando na vida política e económica do nosso país se registam tantos sinais alarmantes de corrupção, a aprovação deste projecto de lei terá, sem dúvida, efeitos moralizadores e constituirá um exemplo que daria os seus frutos.
Nesta hora crepuscular da Assembleia da República, a aprovação deste projecto de lei da ASDI não deixaria de ser um acto positivo que, sem redimir os Srs. Deputados da maioria, constituiria, no entanto, uma atenuante e uma nota agradável.
Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
Dito isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se é certo que há rendimentos dos titulares de cargos políticos que não são conhecidos e que, através do projecto de lei da ASDI, passarão, se o projecto de lei for aprovado, a ser conhecidos, há, no entanto, muitos rendimentos de antigos titulares de cargos políticos que são conhecidos e não são justificados.
Estou a pensar, como com certeza todos os Srs. Deputados, na transferência de alguns ministros, secretários de Estado e governadores civis para as altas administrações de muitas das empresas deste país onde vão receber chorudos vencimentos e razoáveis subsídios. Esses são conhecidos e é um sinal negativo da nossa vida que tende a generalizar-se.
A esse propósito, permitam-me que cite, analogia que, espero, não seja arbitrária, um parágrafo de um texto célebre do Sr. Deputado Raul Rego, chamado Os Políticos e o Poder Económico, que, como é evidente, foi apreendido pela Polícia. Diz a determinada altura o Sr. Deputado Raul Rego:
Sem exagero, podemos dizer que o que na República era excepção foi tornado pelo Estado Novo em regra. Indicam-se até companhias transformadas em verdadeiras colmeias de antigos ministros, subsecretários de Estado, directores-gerais, governadores coloniais.
É certo que o projecto de lei da ASDI não resolve estes casos, mas contribui para formar o espírito que venha a impedir semelhantes casos, e assim as palavras do Sr. Deputado Raul Rego não serão palavras proféticas, mas palavras avisadas.
Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, para um pedido de esclarecimento.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Deputado Carlos Lage, apreciei muito a sua intervenção, não só naquela parte em que tece os elogios que entendeu merecer a iniciativa da ASDI, mas ainda agradecer-lhe os reparos feitos e a sua preocupação de melhorar o projecto de lei. É para isso mesmo que servem os debates dos projectos de lei, é para eles serem enriquecidos com quem tem elementos válidos que permitam a sua
Página 1369
28 DE JANEIRO DE 1983 1369
melhoria. Salve-se, ao menos, a ideia que presidiu à iniciativa e melhor contribua V. Ex.ª para ser enriquecido o nosso projecto.
Todavia, não deixarei de lhe lembrar que nós próprios tivemos a preocupação de fazer uma actualização do projecto, na medida em que apresentamos propostas de alteração ao nosso próprio articulado. Certamente vai debruçar-se sobre elas e espero que o seu juízo seja favorável.
O Sr. Deputado citou o livro Os Políticos e o Poder Económico, do nosso colega Raul Rego - que também tive o prazer de citar na minha intervenção -, e põe um problema relativo aos titulares dos cargos políticos, ao menos a nível do Governo, porque acredito que ao nível desta Assembleia se isso se verificar acontecerá em reduzida proporção. Mas dada a experiência do passado e a previsão do que possa acontecer a curto prazo, perguntaria ao Sr. Deputado Carlos Lage se considera ou não ainda em vigor a Lei n.º 2105, que estabelece as providências a adoptar em relação às acumulações de cargos e em relação à assunção de cargos, onde se percebam rendimentos e vencimentos superiores aqueles que são percebidos pelos ministros da República.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto às perguntas que o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho me dirigiu, lamento não conhecer em pormenor as propostas de alteração que fizeram ao texto original do projecto, pois isso provavelmente ter-me-ia dispensado de fazer algumas críticas injustificadas.
Se as propostas que a ASDI já fez ao seu próprio projecto contemplam todas as objecções que formulei na minha intervenção, tanto melhor, mais perfeito ele estará neste momento e mais fácil ê para nós votar favoravelmente o projecto.
Quanto ao problema que levantou sobre se não está em vigor a lei que proíbe a acumulação de cargos, ela está em vigor, mas não é aplicada. Ora, um dos males do nosso país é que muitas leis são letra morta, sobretudo aquelas leis que se transformam num incómodo para quem pretende, de alguma forma, acumular rendimentos e acumular vantagens.
Evidentemente que a minha intervenção, na parte complementar, em que citei o famoso opúsculo do Sr. Deputado Raul Rego, visou chamar a atenção para uma realidade que este projecto de lei não contempla e que são os rendimentos percebidos e que resultam, muitas vezes, não do talento, do mérito ou da capacidade técnica das pessoas, mas da influência política e do compadrio.
Esse tem sido um dos males do nosso país, que há que afastar. Julgo que nesse aspecto estamos inteiramente de acordo.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, muito brevemente, para dizer qual é a posição do meu partido em relação a esta iniciativa da ASDI.
Estamos basicamente de acordo com a intenção que presidiu a esta iniciativa legislativa. A avaliar já pelas propostas de alteração que o próprio partido autor da iniciativa apresentou, pelas objecções que o Sr. Deputado Carlos Lage colocou, e como tudo parece indicar que as coisas se encaminham no sentido que vamos propor, votaremos favoravelmente este projecto de lei.
No entanto, vamos fazer o pedido de baixa à Comissão, pois temos algumas dúvidas e desejamos introduzir-lhe algumas alterações.
O Sr. Presidente: - Está inscrito a seguir o Sr. Deputado Américo de Sá.
No entanto, pedia licença ao Sr. Deputado para prestar à Câmara a informação de que entrou na Mesa um requerimento subscrito pelos senhores deputados do partido proponente deste projecto de lei, e que marcou por isso mesmo a ordem do dia de hoje no uso de um direito regimental, no qual se requer que se proceda à votação do projecto de lei até ao termo da reunião, quer na generalidade, quer na especialidade. Mas desde que há um pedido de baixa à Comissão, parece que a última parte do requerimento não poderá ser votada.
Tem a palavra, o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, pode não ser mais correcto o meu entendimento, mas penso que, não distinguindo o Regimento sobre qual o tipo de pedido de votação que é permitido ao partido que fixou a ordem do dia, visto que não se fala no artigo 71.º do Regimento em direito de pedir a votação, na generalidade, antes do fim da reunião, no meu entender há o direito de pedir a votação, quer na generalidade, quer na especialidade.
A respeito do requerimento por V. Ex.ª referido de baixa à Comissão, queria dizer que lhe daríamos o nosso acordo, depois de votado o projecto na generalidade, se o prazo concedido para a discussão e votação na especialidade, fosse de molde a possibilitar a votação final global dentro da duração previsível dos trabalhos da Assembleia.
O Sr. Presidente: - Suponho que também sobre esta questão está a pedir a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.
Tem a palavra.
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, é para dizer que estamos já a tentar encontrar um acordo para o prazo de discussão em Comissão.
Julgo que já o encontrámos, pois parece-me que há acordo com a sugestão de 5 dias.
O Sr. Presidente: - Tem então agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Américo de Sá.
O Sr. Américo de Sá (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Liminarmente importa dizer à Câmara, como se porventura isso fosse necessário, que o CDS estará sempre na mesma linha das preocupações de moralidade da vida pública que o projecto de lei da ASDI hoje provocou em todas as bancadas parlamentares.
Também nós, como o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho e os seus companheiros de bancada, estamos preocupados em que haja uma grande transparência na vida pública, em que não haja suspeitas, tantas e tantas vezes absolutamente infundadas, sobre a honestidade e sobre o procedimento dos titulares dos cargos políticos.
Página 1370
1370 I SÉRIE-NÚMERO 40
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, vamos votar favoravelmente, na generalidade, este projecto da ASDI.
Mas não vamos votar favoravelmente para nos redimirmos, como o Sr. Deputado Carlos Lage há bocadinho sugeria, do voto desfavorável que oportunamente demos a um projecto de lei do PS, se em erro não estou, subscrito em primeiro lugar pelo Sr. Deputado Salgado Zenha, sobre matéria muito semelhante.
O nosso pensamento continua a ser, e sempre, o mesmo e não mudou porque votámos contra o projecto de lei do PS e vamos votar a favor, na generalidade, o projecto de lei da ASDI.
Não mudou porque esses projectos de lei são completamente diferentes. Só aceitamos que a intimidade da vida privada das pessoas, mesmo dos titulares dos cargos políticos, ceda à transparência da vida democrática na medida em que isso for absolutamente indispensável. Continuamos a pensar serem absolutamente inaceitáveis muitas das exigências que no projecto de lei do PS se faziam, nomeadamente essa devassa pública das fortunas, dos rendimentos das pessoas, com a fixação das declarações dos impostos profissional e complementar. Contra isso votaríamos, naturalmente, contra.
Quanto ao projecto de lei da ASDI, aceitamo-lo, porque só faz ceder a intimidade da vida privada das pessoas na medida em que isso é absolutamente indispensável para a clareza da vida pública.
Assim, aceitamos o projecto de lei da ASDI apenas na generalidade e em função do princípio que lhe subjaz, porque, como é óbvio, consideramos perfeitamente inaceitáveis muitas das disposições que nele vêm referidas.
Não entendemos, de nenhuma forma, que se considere para este efeito o presidente do Supremo Tribunal de Justiça - estamos aí inteiramente com o Sr. Deputado Mário Raposo - , pois aquele é efectivamente um membro de um Órgão de Soberania, mas é sobretudo um magistrado cujo controle da honestidade se faz por outras formas. Não podemos também aceitar que o presidente do Supremo Tribunal Administrativo, pelas mesmas razões, esteja incluído neste diploma.
É matéria para profunda discussão, é matéria para a qual estamos claramente disponíveis. Esperamos encontrar da parte dos outros grupos parlamentares a mesma disponibilidade, para discutirmos na Comissão os pormenores com os quais discordamos.
Mas o princípio, e isso é o que nos importa - e é só esse o sentido que tem o nosso voto favorável -, é o da transparência da vida pública, é o da ASDI, mas não é menos do CDS e, por isso, votaremos a favor.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Lino Lima.
O Sr. Lino Lima (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Obrigar os responsáveis por cargos políticos a apresentar, no início do exercício dos respectivos cargos e após a cessação das suas funções, declarações do património e rendimentos surge aos olhos de qualquer cidadão comum como uma medida mínima de moralidade política e cívica, que se impõe por si própria e que quase não necessita de justificação.
Difícil será justificar a sua reprovação. É que, como se diz no intróito do projecto de lei n.º 171/II, «não basta que os titulares de cargos políticos sejam honestos, mas que apareçam publicamente como tal».
E quando tanto se fala em corrupção, em negócios escuros e em mercados paralelos que proporcionam fortunas, bom seria, para os próprios e para o regime democrático, que os titulares de cargos políticos praticassem o acto necessário de mostrar as mãos lavadas aos seus concidadãos quando os abandonam.
Assim, hoje e aqui, nesta Assembleia, a questão que muito comezinhamente se põe a cada um dos senhores deputados é a de decidir se querem que, no futuro, aqueles que desempenham cargos políticos saiam deles de mãos a abanar, num sinal público de que não levam nelas nem o pó das cadeiras do Estado, ou de mãos nos bolsos, a segurar aquilo de que indevidamente se apoderaram no exercício do poder.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Para gente honrada é, portanto, uma opção fácil e sem dramas. Trata-se de prestigiar as pessoas a quem o povo escolhe para o desempenho de missões políticas e de lhes proporcionar e facilitar a garantia e a defesa da sua honra e dignidade.
No entanto, trata-se também de, para além das pessoas, prestigiar o próprio Estado democrático, garantir a honra e dignidade do regime e assegurar a sua moralidade.
Facilitar o controle público da riqueza dos titulares de cargos políticos, permitir que a opinião pública seja, também nesta matéria, juiz documentado da actuação daqueles que personalizam o Estado e as instituições democráticas, será uma medida que transmitirá confiança aos cidadãos, que desmoralizará o boato, que promoverá a tranquilidade pública, tantas vezes afectada por notícias falsas que o segredo propicia e que meras aparências falseiam. Também quanto a este vector parece não se porem opções dramáticas aos Sr. Deputado.
Estas são razões genéricas e de senso comum que alicerçam as razões políticas que levam os deputados comunistas a votar favoravelmente, na generalidade, este projecto de lei, sem embargo de entendermos que ele necessita de alguns melhoramentos e precisões. Mas as nossas razões a favor de um projecto de lei que beneficia a transparência democrática reforçam-se com o espectáculo que a AD, mais uma vez, tem dado nas últimas semanas de falta dessa transparência, em termos tais que põem em causa a seriedade e a dignidade do regime e que desmoralizaram as instituições.
O povo português está farto de tais processos. É preciso bani-los da nossa vida política. E preciso substituí-los por outros. Este projecto de lei, agora em discussão, seria um passo positivo nesse sentido.
No entanto só o será se, efectivamente, este projecto de lei for aprovado não só na generalidade, mas também na especialidade, antes da dissolução da Assembleia da República.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Se assim não for, poder-se-á, porventura, acusar este Parlamento de, com o voto favorável na generalidade, não querer senão enganar o povo português, já que votaria este projecto de lei na generalidade com a certeza de que ele não entraria em vigor, por não haver tempo antes da dissolução da Assembleia de ele ser discutido e aprovado na especialidade e de sofrer aqui, em Plenário, um voto final global positivo.
Página 1371
28 DE JANEIRO DE 1983 1371
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Chamo a atenção dos Srs. Deputados para a responsabilidade que cada um de nós vai hoje aqui assumir, ao votar favoravelmente este projecto de lei. É preciso que o nosso voto corresponda a uma vontade autêntica da nossa parte e não seja, simplesmente, uma habilidade parlamentar ou «parlamentaróide».
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Está a falar para si?
O Sr. Américo de Sá (CDS): - Não se preocupe!
O Orador: - Não só é necessário mudar de governo e de política, mas também mudar de processos políticos, substituindo a indignidade dos jogos escuros pela normalidade democrática da limpidez, da transparência e da verdade.
É isto que esperamos do voto favorável na generalidade a este projecto de lei da ASDI e, repito, do voto na especialidade que torne esta lei apta a entrar em vigor antes da dissolução da Assembleia da República.
Aplausos do PCP e do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Borges de Carvalho.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Das intervenções que já tive neste debate pode inferir-se, com certeza, que temos as maiores dúvidas quanto à bondade deste projecto de lei.
Dúvidas que se filiam, antes de mais, no próprio princípio de onde advém. Julgamos que os titulares de cargos políticos, tal como quaisquer outros cidadãos, estão sujeitos a leis que são suficientes para os poder punir e apontar sempre que prevariquem na gestão dos seus bens ou na forma como utilizam os seus cargos.
Acresce que um país como o nosso, que não é um país anglo-saxónico e onde a frieza com que uma lei destas tem de ser aplicada necessariamente não existe, correm-se riscos muito graves quando se legisla neste sentido.
Tenho ainda, como expressei há pouco, algumas dúvidas quanto à constitucionalidade efectiva desta lei em termos de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos titulares de cargos políticos, tanto mais quanto o seu articulado me parece muito exagerado e muito necessitado de correcções.
Postas estas dúvidas e para não nos alongarmos no debate, devo dizer que, por outro lado e no outro prato da balança, temos de reconhecer que em Portugal muito se fala de corrupção.
Toda a gente sabe e fala de corrupção que existe aqui, ali e acolá. Sabemos de como, por exemplo, se emitem BRI's em Portugal, de como por vezes é mais fácil importar whisky do que matérias-primas para uma indústria qualquer, de como, por exemplo, se pretende monopolizar determinados mercados através de empresas como a CNP ou a Quimigal, com prejuízo de muitas outras que poderiam fazer importações directas e não o fazem por que os mercados tendem a ser monopolizados. Ora isso é também um processo de corrupção, não já de entidades privadas, mas mesmo de entidades públicas.
Sabemos também de como, por vezes, são obtidos determinados empréstimos bancários. Sabemos, perdoem-me os termos, das trafulhices que muitas vezes se fazem para ultrapassar burocracias.
Vozes do PPM: - Muito bem!
O Orador: - Reconhecendo embora defeitos que este projecto de lei possa ter (e tem na nossa opinião), seria neste momento da parte da Câmara, de todos nós, deputados, como que uma demissão da nossa própria qualidade de titulares de um Órgão de Soberania o não aceitarmos o princípio da transparência da nossa própria vida, quando todos somos capazes de exigir que outros tenham essa mesma transparência nos actos que praticam.
Seria incongruente, portanto, da parte de todos nós, não aceitarmos este princípio.
Vozes do PPM: - Muito bem!
O Orador: - Espero que a Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias desta Câmara saiba, com bom senso, fazer sair daqui um projecto de lei tanto mais conseguido quanto mais aplicável for.
Nessa medida, o meu grupo parlamentar votará favoravelmente o projecto de lei da ASDI e acompanha os grupos parlamentares que pedem a sua baixa à Comissão para que, numa discussão tão profunda quanto rápida, se possa chegar a uma solução final acerca deste problema.
Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O voto favorável do Grupo Parlamentar da UEDS explica-se em 2 minutos, já que a honestidade e a coerência não precisam de grandes rodeios nem de grandes discursos para serem expressas.
Na realidade, nesta fase final dos trabalhos do Parlamento, ao votar favoravelmente o projecto de lei da ASDI, queremos deixar claro que não se trata de um voto pio ou melífluo, mas trata-se, isso sim, de um voto de adesão convicta a um princípio basilar sem o qual não existe democracia, que é o princípio da transparência dos proventos dos titulares dos cargos políticos, o qual consta do projecto de lei da ASDI.
Tudo isto sem prejuízo de considerarmos que alguns aperfeiçoamentos, na especialidade, dos mecanismos propostos para a sua declaração e verificação poderem ainda ser introduzidos no trabalho em Comissão.
É profunda a identidade de preocupações e de objectivos do projecto de lei da ASDI com uma proposta que tivemos ocasião de apresentar a esta Câmara, quando do debate do estatuto dos deputados.
Nessa altura propusemos que, apenas para aplicação aos deputados, seria necessário proceder à declaração dos rendimentos no início e no fim do mandato. A maioria rejeitou, então, a nossa proposta, tendo vindo o referido estatuto a ser vetado pelo Presidente da República.
Não queríamos deixar hoje de chamar a atenção para essa proposta e para a identidade de objectivos que nos liga a este projecto, aliás, na senda de exemplos de grandes homens, como o caso do Presidente da República Francesa, François Mitterrand, o qual apresentou
Página 1372
1372 I SÉRIE-NÚMERO 40
a declaração dos seus bens no início do mandato sem que qualquer lei a isso o obrigasse.
A declaração quando é voluntária tem um valor ainda maior do que quando é obrigada por lei. No entanto, pensamos que a obrigação legal não é uma violentação da intimidade e da privacidade dos que exercem cargos políticos.
É por isso que pensamos que a adopção deste projecto de lei, que parece estar adquirido, deve ser levada às últimas consequências. O voto na generalidade não pode nem deve ser entendido como um tranquilizador de consciências.
Pelo contrário, tal voto tem que ser a assunção de responsabilidade de garantir a sua eficácia concreta num curto prazo de tempo, antes, portanto da dissolução da Assembleia da República.
Em nome da dignidade do Estado e em nome da dignificação dos titulares de cargos políticos, votar hoje na generalidade este projecto de lei é assumir concomitantemente a responsabilidade de o fazer aprovar, na especialidade e na votação final global, no máximo de 5 dias e antes da dissolução da Assembleia da República e de entender a sua adopção com uma atitude, um primeiro passo, de moralização da nossa vida pública, que uma nova maioria e um novo poder político tem que assegurar na plenitude de todas as instâncias do Estado democrático.
Aplausos da UEDS, do PS e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está na Mesa um requerimento de baixa à Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias e outras julgadas convenientes do projecto de lei n.º 171/II, pelo prazo de 5 dias.
Se não houver objecções, votaríamos conjuntamente este requerimento e, na generalidade, o projecto de lei em discussão.
Pausa.
Como não há qualquer objecção, vamos passar à votação.
Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, V. Ex.ª, na Conferência de presidentes dos grupos parlamentares ontem realizada, comunicou que estava a aguardar uma resposta do Governo para podermos definir o esquema dós nossos trabalhos quanto às questões urgentes que esta Assembleia teria que resolver e votar para, enfim, se poder proceder à anunciada dissolução da Assembleia da República.
Gostaria de saber se V. Ex.ª já obteve alguma resposta governamental no sentido de podermos, enfim, pensar nas próximas agendas da nossa Assembleia.
O Sr. Presidente: - Nada recebi ainda, Sr. Deputado.
No entanto, como o Sr. Deputado deve estar também, com toda a certeza, recordado, ficou convocada uma Conferência de presidentes dos grupos parlamentares que se realizará amanhã, tendo nós assente que ela se
realizaria mesmo durante o funcionamento do Plenário.
Nestas circunstâncias, solicitava às direcções dos grupos parlamentares a que pertencem os Srs. Vice-Presidentes, o favor de lhes solicitarem - como, aliás, é de presumir que acontecerá - a sua presença amanhã no Plenário, a fim de um deles poder substituir o Presidente, que terá de estar ocupado nessa conferência de presidentes dos grupos parlamentares.
Cumpre-me ainda anunciar que deu entrada na Mesa e foi admitido mais um projecto de lei, sob o n.º 397/II, sobre o combate à imoralidade administrativa, fraude e corrupção, subscrito pelos Srs. Deputados Magalhães Mota e outros, da ASDI.
A ordem de trabalhos de amanhã, que se iniciará às 10 horas, compreende um período de antes da ordem do dia e, depois, a lei formulário, que, como os Srs. Deputados sabem, já está instruída com o parecer da Assembleia Regional dos Açores.
Srs. Deputados, estão encerrados os trabalhos.
Eram 20 horas e 5 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social Democrata (PSD):
Arménio Jerónimo Martins Matias.
Bernardino da Costa Pereira.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
João Manuel Coutinho de Sá Fernandes.
José Vargas Bulcão.
Júlio Lemos Castro Caldas.
Manuel Pereira.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio António Pinto Nunes.
Partido Socialista (PS):
António de Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
João Cardona Gomes Cravinho.
José Jorge Gois Mendonça.
Vítor Manuel Brás.
Centro Democrático Social (CDS):
Carlos Eduardo de Oliveira e Sousa.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Henrique Manuel Soares Cruz.
José Augusto Gama.
José Luís Cruz Vilaça.
Manuel Eugênio Cavaleiro Brandão.
Narana Sinai Coissoró.
Partido Comunista Português (PCP):
Joaquim Gomes dos Santos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Rodrigues Vitoriano.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Partido Popular Monárquico (PPM):
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Página 1373
28 DE JANEIRO DE 1983 1373
Partido Social-Democrata (PSD):
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro M. Andrade Azevedo.
Américo Abreu Dias.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António José Cardoso e Cunha.
Carlos Mattos Chaves Macedo.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José da Costa.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Valdemar Cardoso Alves.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho.
António Emílio Teixeira Lopes.
António Fernandes da Fonseca.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Beatriz Cal Brandão.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
João Joaquim Gomes.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Manuel Alfredo Tito Morais.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Centro Democrático Social (CDS):
Adalberto Neiva de Oliveira.
Eugénio Maria Anacoreta Correia.
João Lopes Porto.
Maria José Paulo Sampaio.
Partido Comunista Português (PCP):
Domingos Abrantes Ferreira.
Ercília Carreira Talhadas.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
José Manuel da C. Carreira Marques.
Manuel Correia Lopes.
Octávio Rodrigues Pato.
Os REDACTORES: - Maria Amélia Martins - Noémia Malheiro.
Declaração de voto do MDP/CDE para a Mesa e relativa ao projecto de lei n.º 390/II.
O MDP/CDE votou favoravelmente o projecto de lei sobre a actualização do salário mínimo nacional por considerar que os trabalhadores de mais fracos recursos não podiam estar mais tempo à espera de que o Governo se decidisse pelo aumento, que tardou vários meses, para repor, embora ligeiramente, o poder de compra.
Centenas de milhares de pessoas sentem a dureza das condições de vida impostas pela implacável actuação dos governantes que só se lembraram dos assalariados com mais reduzidos vencimentos em épocas eleitorais, nas demagógicas promessas então formuladas e nunca cumpridas.
O MDP/CDE considera que evolução da economia portuguesa durante o último ano se caracterizou pelo aumento acelerado dos preços, pelo constante agravamento do ritmo inflacionário e pela existência de planos de investimento que proporcionasse desenvolvimento da nossa actividade económica e que se reflectisse no bem-estar e poder de compra de todos os portugueses em lugar da recessão e endividamento que se verifica.
A política posta em prática nos últimos 3 anos conduziu o País para um verdadeiro desastre económico provocando, ao mesmo tempo, consequências gravosas a nível social, nomeadamente nas camadas mais desfavorecidas da população, ou seja, dos trabalhadores, dos reformados e dos pensionistas.
Não existe dinamização da economia portuguesa, nem dinamização da vida social, pelo que a esmagadora maioria da classe trabalhadora não beneficia de um equilíbrio minimamente exigível que lhe garanta condições de vida dignas.
As reivindicações legítimas dos trabalhadores e dos reformados nunca foram aceites, observando-se, isso sim, uma cada vez mais rápida deterioração da situação sem que o governo tivesse considerado as alternativas realistas que as forças democráticas e o movimento sindical foram apresentando.
Entretanto, o desemprego acentuou-se e acentua-se. A repartição dos rendimentos só satisfaz as camadas mais favorecidas.
A propósito, convém relembrar as promessas que visavam, demagogicamente, a criação de 80 000 novos postos de trabalho, quando o que na realidade se registou foi o número de desempregados ter aumentado para muito próximo de meio milhão.
Por outro lado, foram criadas taxas que tornam cada vez mais difícil o direito constitucional da população à assistência clínica a medicamentosa; facilita-se o aumento arbitrário das rendas das casas comerciais, o que necessariamente se irá reflectir nos preços dos bens de consumo imediato; a habitação torna-se inacessível enquanto os jovens lutam contra as prepotências que os impede de terem livre acesso ao ensino.
Para se promover o desenvolvimento do País é necessária uma política económica que considere a adopção de medidas estruturais de fundo, que torne possível uma mudança radical do actual panorama.
Mas em lugar de se apresentar um plano que tenha em vista uma melhoria concreta de todos os sectores da vida portuguesa, cerceia-se a liberdade dos trabalhadores, promove-se o desemprego, não se actualiza o salário mínimo e tenta-se limitar a discussão dos contratos colectivos de trabalho a tectos salariais que não consideram o custo de vida e a degradação da situação económica.
Não obstante este negro quadro criado pela AD e seus governos, foi-se adiando a decisão de aumentar o salário mínimo para níveis minimamente compatíveis com as necessidades.
Finalmente, o MDP/CDE considera, a propósito deste problema, que até ao fim do seu funcionamento o governo da AD mantém um comportamento pouco claro.
Uma vez mais deu prova de falta de lisura de processos, de falta de lealdade democrática e de falta de respeito pela Assembleia da República, ao elaborar um decreto-lei sobre esta matéria sem informar a Assembleia da República, apesar de no seu elenco existir um Ministério para as Relações com o Parlamento e quando existia na AR um projecto de lei.
A exemplo do que aconteceu com o projecto de lei sobre o formulário de diplomas, o Governo desrespeitou novamente esta Câmara.
Esperemos que exemplos destes não se repitam para dignificação das instituições democráticas.
O Deputado: Corregedor da Fonseca.
Página 1374
PREÇO DESTE NUMERO 56$00
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA