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17 DE ABRIL DE 1984 4027

É o escandaloso caso dos foreiros da Várzea Fresca e Califórnia, Foros de Salvaterra de Magos, em que nada se vislumbra para a solução.
É o vergonhoso caso do emparcelamento de Cabanelas, no distrito de Braga, onde os agricultores se juntaram e os serviços oficiais os abandonam. Ali, cerca de 300 ha de terra fértil não estão a ser aproveitados como regadio só porque não é feito um pequeno arranjo no canal.
Outro escândalo e o aumento brutal do preço da água de rega na zona de Alvalade-Sado, que teve uma subida de 850 %, sem que os agricultores fossem consultados.
Um exemplo: 22 435$ é quanto a Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos quer que um agricultor pague pela água de rega que este gastou em meio hectare de terra de tomate no ano de 1983.
Escandalosa é também a afirmação do Governo que diz que a verba atribuída a alguns créditos não foi gasta porque os agricultores não se inscreveram.
É preciso ter lata para tamanhas afirmações, quando se sabe que os agricultores reclamam crédito acessível e em boas condições, quando há muitos processos pendentes e que não foram despachados.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O assoreamento e a poluição dos nossos rios são outra preocupação dos nossos agricultores. Quantas vezes, para minimizarem os perigos da poluição, têm de fazer poços junto aos rios para filtragem das águas que servem para regas.
De várias zonas do País surgem reclamações dos agricultores e das populações pelo plantio indiscriminado de eucaliptais em boas terras agrícolas, pelas celuloses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A gravidade destas situações que acabei de descrever, e que não são mais do que uma parcela do que se passa na agricultura deste País, tem levado nos últimos tempos a uma multiplicação de acções, movimentações e concentrações, algumas das quais chegaram a paralisar o trânsito, como aconteceu em Paredes de Coura, Braga, Caldas da Rainha, Canas de Senhorim, Covilhã, Vila Franca de Xira, Rio Maior, São João da Pesqueira, Baixo Mondego, etc., etc.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Este crescer de lutas do campesinato exprime por um lado a gravidade dos problemas e, por outro, o aumento da consciência entre os agricultores de que este governo e esta política não servem.
O desenvolvimento das lutas do campesinato prova que sectores sociais cada vez mais vastos, alguns dos quais há pouco tempo ainda incluídos nas áreas do PS e do PSD, se levantam contra o Governo e exigem outra alternativa política.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Cunha.

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta é a primeira sessão da Assembleia da República depois da comemoração, no dia 7 de Abril, do Dia Mundial da Saúde.
A Organização Mundial de Saúde entendeu que este ano deveria ser dedicado à «Saúde da criança - riqueza do futuro». E na sua introdução diz que:
O nascimento de uma criança representa um investimento considerável de amor, de energia e de esperança para os pais e para a sociedade no seu conjunto.
Hoje, apesar dos conhecimentos científicos e da tecnologia imensa de que a humanidade dispõe, 17 milhões de crianças com menos de 5 anos morreram em 1983. 14 milhões destas mortes foram provocadas pela fome ou por doença evitáveis.
1200 milhões de crianças vivem hoje em condições sub-humanas, com fome, sem ensino, sem habitação digna, cronicamente infectadas e parasitadas, suspensas num tempo, numa outra dimensão, onde a ternura não tem tempo de por lá passar e o pão não existe.
Hoje 400 milhões de crianças sofrem de bócio (facilmente tratável), 300 milhões de anemia (facilmente tratável) e 100 milhões de cegueira por carência em vitamina A (facilmente tratável).
A maioria destas crianças quase não teve tempo de nascer e já morreu na África, na Ásia e na América Latina, no que se convencionou chamar o Terceiro Mundo. Na semana passada responsáveis políticos aqui reunidos chamaram a atenção para este problema.
Na semana passada, enquanto aqui se discutia sobre a estratégia para acabar com os desequilíbrios que se criam nos Terceiro e Quarto Mundos, peguei em mim, comprei um bilhete de autocarro e fui até ao Terceiro Mundo.
O Terceiro Mundo fica ali mesmo ao lado da minha casa no Porto. Pelas muralhas da Sé, da Vitória, de Miragaia, pelas ilhas do Porto, autênticos ghettos, escorrega lentamente de dentro dos corpos sujos e magros das crianças a vida que se lhes deu e que a sociedade lhes retira em vida.

O Sr. Presidente: - Desculpe interrompê-lo, Sr. Deputado, mas quero pedir à Câmara o favor de ouvir a intervenção do Sr. Deputado Octávio Cunha com o silêncio que ela merece.
Faça favor de continuar.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente. Espécie de subproletariado sem identidade, desconfiado, escondido, vivendo dos restos que a sociedade rica rejeita, aprendendo a revolta e a violência.
Tinha razão o Sr. Primeiro-Ministro, quando aqui afirmou que a fome é hoje um escândalo.
Hoje, dia 16 de Abril de 1984, em Portugal 2,5 milhões de pessoas não comeram o suficiente. Vamos ter de acabar com este escândalo!
Hoje é altura para lembrar de novo que a saúde é um direito fundamental, que existem graves desequilíbrios no que se refere à saúde das populações entre os países desenvolvidos e os não desenvolvidos e que mesmo no interior de um mesmo país, como o nosso, essas desigualdades são enormes.
Lembrar que os governos tem a obrigação de agir com urgência, implementando em particular os cuidados primários de saúde a fornecer particularmente à mulher grávida, à criança e ao velho. Afirmar que é possível atingir o objectivo «Saúde para todos no ano 2000»