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I Série - Número 9 - Sexta-feira, 2 de Novembro de 1984

DIÁRIO da Assembleia da República

III LEGISLATURA - 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 31 DE OUTUBRO DE 1984

Presidente: Ex.mo Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Ex.mos Srs. Leonel de Sousa Fadigas
José Mário de Lemos Damião
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

Sumário. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 35 minutos.
Depois de apresentado pelo Sr. Deputado Frederico de Moura (PS), a Assembleia aprovou um voto de pesar pelo assassínio perpetrado contra a primeiro-ministro da União Indiana, Sr.ª Indira Gandhi. Produziram declaração de voto os Srs. Deputados Margarida Tengarrinha (MDP/CDE), Carlos Lage (PS), Octávio Cunha (UEDS), Amélia de Azevedo (PSD), Raul de Castro (MDP/CDE) e Horácio Marçal (CDS).
Concluiu-se a apreciação do pedido de urgência solicitado pelo PCP para o Projecto de Lei n. ° 27/III - Idade de reforma dos pescadores e anos de actividade, que não foi concedido. Intervieram a diverso titulo, incluindo declarações de voto, os Srs. Deputados Raul de Castro (MDP/CDE), Ruben Raposo (ASDI), Luís Saias (PS), Carlos Espadinha (PCP) e Horácio Marçal (CDS).
A terminar o primeiro ponto da ordem do dia, continuou a discussão das alterações ao Regimento (artigos 180. °, 148. °, 64. °-A, 174.°, 175.°, 176.° e 177.°), tendo intervindo os Srs. Deputados Luís Saias (PS), Jorge Lemos, José Manuel Mendes e João Amaral (PCP) e Silva Marques e Margarida Salema (PSD).
No segundo ponto da ordem do dia, e após a leitura do relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano, procedeu-se à discussão e votação na especialidade e votação final global da Proposta de Lei n. ° 57/III - Aprova alterações ao Orçamento do Estado para 1984, aprovado pela Lei n. ° 42/ 83, de 31 de Dezembro. Intervieram no debate, a diverso titulo, além do Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias), os Srs. Deputados Jaime Ramos (PSD), José Magalhães (PCP), Vilhena de Carvalho (ASDI), Soares Cruz (CDS), Correia de Jesus (PSD), Lopes Cardoso (UEDS), Jorge Lacão (PS), Magalhães Mota (ASDI), José Luís Nunes (PS), Basílio Horta (CDS), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Almerindo Marques e Mota Torres (PS), António Capucho (PSD), Octávio Teixeira e Joaquim Miranda (PCP), Carlos Lage (PS), José Vitorino (PSD), César Oliveira (UEDS), Bagão Félix (CDS) e António Gonzalez (Indep.).

O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que está aberta a sessão.

Eram 10 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Abílio Aleixo Curto.
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António José Santos Meira.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Eurico José Palheiros Carvalho Figueiredo.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco José Fernandes Leal.
Francisco Lima Monteiro.
Frederico Augusto Hãndel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.

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Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Luís Duarte Fernandes.
João do Nascimento Gama Guerra.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Manuel Ribeiro Arenga.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José de Almeida Valente.
José António Borja dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto Basto Torres.
José da Cunha e Sá.
José Ferreira Pires Gestosa.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
Juvenal Baptista Ribeiro.
José Martins Pires.
José Maximiano Almeida Leitão.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria Angela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Ovídio Augusto Cordeiro.
Nelson Pereira Ramos.
Nuno Álvaro Freitas Alpoim.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Paulo Manuel Barros Barrai.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel Caio Roque.
Zulmira Helena Alves da Silva.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Amândio S. Domingos Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
Anacleto Silva Baptista.
António d'Orey Capucho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando Monteiro Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José António Valério do Couto.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.
José Silva Domingos.
Leonel Santa Rita Pires.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Costa Andrade.
Manuel Pereira Martins.
Manuel Teixeira Pinheiro.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.
Serafim Jesus Silva.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Guilherme Branco Gonzalez.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Alberto Ribeiro Rodrigues.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria lida Costa Figueiredo.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Alexandre Carvalho Reigoto.
António Filipe Neiva Correia.

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António Gomes de Pinho.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Eugênio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João Gomes de Abreu Lima.
João Lopes Porto.
José Augusto Gama.
Manuel António Almeida Vasconcelos.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Octávio Luís Ribeiro da Cunha.

Agrupamento Parlamentar da Acção social-democrata Independente (ASDI):

Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Ruben José de Almeida Raposo.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

Raul Morais e Castro.

José Manuel Tengarrinha.
João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, porque vamos ter a preocupação de um momento muito sério, agradecia aos Srs. Deputados o favor de se sentarem e de aguardarem o que pretendo dizer-vos.

Pausa.

Quero dizer-vos, Srs. Deputados, que foi com muita mágoa e profundo pesar que tivemos agora conhecimento do inqualificável assassínio da Primeiro--Ministro da União Indiana, Sr.a Indira Gandhi.
Para dar pública manifestação da tristeza sentida, peco-vos que, em solidariedade com o povo indiano, guardemos, neste Parlamento, l minuto de silêncio.
A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

O Sr. Presidente: - Sei que os Srs. Deputados estão a pretender subscrever um voto de pesar. Logo que esteja concluído, agradeço que o entreguem na Mesa para ser apreciado por esta Câmara.
Como o voto terá de ser suficientemente meditado e para que a Câmara não esteja parada, irei dar a palavra ao Sr. Deputado Raul de Castro, que tinha ficado com a palavra reservada desde ontem para intervir sobre o pedido de urgência para o Projecto de Lei n.° 27/111, relativo à idade de reforma dos pescadores e anos de actividade.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raul de Castro.

O Sr. Raul de Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste debate parece-nos que cumpre, em primeiro lugar, ter presente que está apenas em causa o pedido de urgência requerido pelo PCP para a discussão e votação do Projecto de Lei n.° 21/111. Não está ainda em discussão, portanto, o conteúdo das diferentes propostas que constam deste projecto.
No que diz respeito à urgência e, naturalmente, embora a urgência se enlace com a matéria a que diz respeito o diploma, na verdade, as considerações aqui produzidas, quer inicialmente pelo Sr. Deputado Carlos Espadinha, que apresentou o projecto de lei, quer depois, pelo Sr. Deputado Rocha Almeida, são de molde a convencer-nos que, efectivamente, existe a urgência pedida pelo PCP.
Na realidade, a posição, em especial a de oposição à urgência manifestada pelo Sr. Deputado Rocha Almeida, baseou-se, no essencial, na ideia de que o Governo teria já uma portaria para publicar sobre a mesma matéria.
Parece, portanto, legítimo concluir que, mesmo a juízo da intervenção do Sr. Deputado Rocha Almeida, o próprio Governo tanto reconhece a urgência desta matéria que até teria já uma portaria sobre a mesma.
Naturalmente que não foi sem alguma surpresa que aqui ouvimos a afirmação de que o Governo tinha uma portaria sobre a matéria, porque estamos habituados a tomar conhecimento, pêlos órgãos de comunicação social, de forma exaustiva, de todas as decisões do conselho de ministros e, na realidade, nunca vimos em nenhuma decisão em que, de forma exaustiva, o Governo comunique ao País quais as matérias que foram discutidas e aprovadas no Conselho de Ministros, que esta portaria tivesse sido discutida e aprovada em conselho de ministros. Daí, portanto, a legítima surpresa, perante a afirmação do Sr. Deputado.
De qualquer forma, e porque efectivamente o que está em causa é a urgência, a natureza das disposições, que são disposições de imperativa justiça quanto à idade de reforma dos pescadores e ao tempo da sua actividade, em função da natureza muito especial da profissão que exercem, da dureza da sua profissão, tudo isso leva-nos a concordar com a urgência e parece-nos que não há mesmo na intervenção - repetimos - do Sr. Deputado Rocha Almeida razões para pôr de lado; antes pelo contrário, parece estar reconhecida por toda a Câmara que deve ser concedida a urgência.
Assim nos pronunciamos e assim votaremos favoravelmente.
Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - Não há mais inscrições sobre esta matéria?

Pausa.

Para ler o voto a que tínhamos feito referência, tem a palavra o Sr. Deputado Frederico de Moura.

O Sr. Frederico de Moura (PS): - Em nome de todas as bancadas, para um voto de pesar pelo assassínio de que foi vítima a primeiro-ministro da União Indiana, Sr.a Indira Gandhi, vou ler o referido voto de pesar.
Mais uma vez a barbárie que estigmatiza este nosso tempo fez cair uma personalidade que, ocupando a chefia do Governo de um grande país e de um grande agregado humano, era uma figura de grande prestígio internacional.
A manhã de hoje foi ensombrada com a notícia de que Indira Gandhi caiu morta à mão de

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sicários, para quem a luta política se processa e traduz por estes actos de terrorismo que nada respeitam, nem mesmo a própria vida humana.
Não pode esta Assembleia - expressão viva do poder democrático - deixar de, indignadamente, verberar um acto tão repulsivo como este, que fez cair pela morte uma figura de tal prestígio que, por vontade expressa do povo do seu país, ascendera à chefia do Governo da União Indiana.
Por isso, manifestando a sua repulsa por este inqualificável acto de violência, a Assembleia da República exprime o seu pesar e lavra o seu verdadeiro protesto contra o repulsivo acto que fez cair Indira Gandhi.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, acabámos de ouvir o voto em relação ao inqualificável assassínio de Indira Gandhi.
Vamos proceder à votação deste voto.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Queria sugerir ao Sr. Presidente que seja enviado à Embaixada da União Indiana e também às autoridades indianas o texto da moção que acaba de ser aprovada.

O Sr. Presidente: - Assim se fará, Sr. Deputado. Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, é no sentido de saber o entendimento da Mesa quanto ao voto que acabámos de votar.
Da nossa parte não fizemos menção de produzir qualquer intervenção, mas gostaríamos de, em nome da nossa bancada, poder produzir uma curta declaração de voto relativa a este doloroso momento que foi manifestado no voto que acabámos de votar.
Gostaríamos de ouvir a opinião de V. Ex.a sobre se essa hipótese foi encarada e manifestar, desde já, o nosso interesse para que a pudéssemos realizar.

O Sr. Presidente: - Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que essa hipótese não foi efectivamente encarada, mas, dada a situação em que nos encontramos, sobretudo por causa das relações que temos com o povo indiano, e tomando em consideração que se tratava de uma figura de nível internacional por todos nós conhecida, não vejo qualquer inconveniente - antes pelo contrário, até aplaudo - que os Srs. Deputados de cada bancada possam dispor de 3 minutos para fazer as declarações que julgarem pertinentes.
Por outro lado, quero ainda dizer aos Srs. Deputados que «encostamos» no processo da ordem do dia este voto e, porventura, as declarações que virão a ser produzidas, interrompendo a sequência dos trabalhos que estávamos a ter. Por certo se compreenderá e não haverá objecção a que se tenha procedido deste modo.
Tem então a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos para esse efeito.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, não serei eu a usar da palavra em representação da minha bancada, será a minha camarada Margarida Tengarrinha.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado. Tem a palavra a Sr.a Deputada Margarida Tengarrinha.

A Sr.a Margarida Tengarrinha (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O nosso voto de pesar significa toda a nossa condenação ao violento assassínio de Indira Gandhi.
Profundamente chocados pelo hediondo crime que vitimou esta insigne estadista, primeiro-ministro da índia e presidente do Movimento dos não Alinhados, sublinhamos o seu empenhamento em defesa da paz mundial e do progresso dos povos, tanto na luta contra o colonialismo britânico como na luta pelo desenvolvimento da índia e, muito particularmente, pela paz.
Indira Gandhi, pela sua vida, defrontou corajosamente o imperialismo. Condenamos, pois, energicamente, o violento crime de que foi vítima.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós não estávamos inclinados a fazer uma declaração de voto, na medida em que julgávamos que o voto exprimia totalmente a posição desta Câmara. No entanto, como foi feita uma declaração de voto pela Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha, sentimo-nos também, de alguma maneira, obrigados a fazer uma.
A nossa declaração de voto é muito simples: Indira Gandhi era uma grande personalidade; era primeiro-ministro de um grande povo, com uma cultura admirável; dirigia uma comunidade política de 600 milhões - se não estou em erro - de pessoas e, além disso, ligava-se espiritualmente a algo que sempre me impressionou e que sempre cativou a humanidade: à espiritualidade e à luta pela independência da índia, dirigidas pelo Mahatma Gandhi.
Indira Gandhi faz parte dessa grande dinastia espiritual, ligada às lutas pela independência na União Indiana, às teorias do não alinhamento e a uma certa concepção espiritual da humanidade.
Evidentemente que nem sempre os actos políticos de Indira Gandhi se pautaram por esta atitude espiritual e foram controversos. As lutas políticas na índia têm assumido, por vezes, formas muito virulentas, muito violentas e não podemos, naturalmente, resolver todos os actos do Governo Indiano e, em particular, de Indira Gandhi. Mas não é por esse terreno que queremos entrar.
No momento em que ela é assassinada, não podemos deixar de nos curvar respeitosamente perante a sua memória e perante uma grande corrente política e espiritual que ela representou na índia.
De entre todas as formas de fanatismo, provavelmente, o fanatismo religioso é o mais repugnante.
Reprovamos todo o fanatismo: o fanatismo político, o fanatismo moral, o fanatismo filosófico e o fanatismo religioso. Mas sempre o fanatismo religioso tem proporcionado crimes intermináveis e intoleráveis.

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E é o fanatismo religioso que, mais uma vez, provoca um crime hediondo, um crime inaceitável.
É também esta a última reflexão que queremos fazer na nossa declaração de voto: que a tolerância e a compreensão mútua são sempre melhores do que o sentimento de que se possui inteiramente a verdade, seja essa verdade uma verdade política, uma verdade moral ou religiosa.
A humanidade está sujeita ainda a muita intolerância: intolerância religiosa e intolerância política. Esperemos que o crime perpetrado sobre Indira Gandhi seja um desencorajamento para todos os assassinos, para todos os fanáticos e que constitua para a humanidade um rebate de consciência.
15to não pode continuar, a humanidade não pode continuar - como dizia o voto que acaba de ser aprovado - a prosseguir no caminho da barbárie.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Cunha.

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para além de morrer uma estadista, morreu uma mulher capaz de ultrapassar com a sua capacidade e a sua inteligência o monopólio da política detido pelos homens. Lutadora pela paz no mundo, é última representante significativa do Movimento dos não Alinhados, perde assim o mundo alguém dificilmente substituível.

Vozes da UEDS e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo.

A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de dizer quão revoltado se sente o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata pela perpetração deste crime hediondo contra a primeiro ministro indiana.
Indira Gandhi é uma figura notável de mulher e de estadista, presidente do Movimento dos não Alinhados, uma mulher com profundo conhecimento da política, quer a nível nacional, quer a nível internacional. Numa índia onde os contrastes são flagrantes, onde se procura fazer um desenvolvimento económico e social, onde há milhões de pessoas em situações de carência e de fome, onde se agiganta a figura de uma irmã Teresa de Calcutá...

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - ... onde as lutas são terríveis, suponho que este crime é contra toda a humanidade.
Mais uma vez chamamos a atenção para aquilo que o terrorismo significa, venha de que sector venha, seja ele - como se crê - de uma seita extremamente conservadora, seja ele de uma facção de qualquer outro tipo de ideologia de sinal oposto. Para nós, o que é necessário fazer acima de tudo é salvaguardar o direito à tolerância, às opções, o direito a que qualquer ser humano prossiga livremente a sua actividade, seja ela política ou de qualquer outra índole
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Acima de tudo há que pensar no problema de educação da juventude. Seria bom que todos nós tivéssemos em mente que deve ser ministrada nas escolas uma verdadeira educação cívica, que sejam ministrados conhecimentos acerca da Convenção dos Direitos do Homem, que estejamos todos nós, democratas, apostados na salva guarda desses mesmos direitos. Aqueles que pregam a violência revolucionária, mais tarde ou mais cedo também acabam por ser vítimas dessa violência revolucionária, seja ela de que sinal for.
Por isso, o que é preciso é que tenhamos consciência de que a salvaguarda dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos têm de vir de uma consciência nacional, de que é preciso lutar contra todas as formas de terrorismo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Indira Gandhi morreu, mas o movimento pacifista de que ela foi um famoso símbolo aliás, como o foi seu pai e todos os outros antepassados em cuja linha ela se inscreveu há de ter os seus frutos.
Trabalhamos em prol da paz entre os povos e somos contra todos os actos de violência.

Aplausos do PSD, do PS, do CDS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul de Castro

O Sr. Raul de Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Movimento Democrático Português condena frontalmente este acto brutal que roubou a vida a Indira Gandhi. Sem legitimamente se desejar pronunciar sobre a condução da política interna na índia, o MDP/CDE quer antes realçar que o mundo perde, com a morte de Indira Gandhi, uma das maiores figuras mundiais na luta pela independência dos povos, pela paz mundial, pelo desanuviamento e pela estabilidade das condições de paz no mundo.
A figura de Indira Gandhi, pelo seu esforço, pela sua capacidade e pela sua abertura fica ligada aos grandes passos que a Europa e o mundo deram ultimamente em defesa da paz, do desanuviamento e da independência dos povos. É, pois, essa grande lição que aqui desejamos recolher, prestando homenagem à memória de Indira Gandhi.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.

O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao aprovar o voto de pesar que foi votado, o CDS já expressou a sua posição. No entanto, já que todos os grupos parlamentares produziram declarações de voto, o CDS quer associar-se a eles para dizer que condena totalmente esses actos de terrorismo, principalmente em situações como estas, em que há razões de ordem religiosa e sectária.
Lamentamos e manifestamos a nossa dor pela perda de Indira Gandhi, um chefe de Estado altamente considerado em todo o mundo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora passar à votação do pedido de urgência requerido pelo PCP em relação ao Projecto de Lei nº 27/III.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS e da ASDI e votos a favor do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez.

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O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Ruben Raposo.

O Sr. Ruben Raposo (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A ASDI não votou favoravelmente o processo de urgência requerido pelo PCP em relação ao Projecto de Lei nº 27/III.
Este projecto de lei apresenta algumas inovações ao que está estabelecido na nossa ordem jurídica sobre a idade de reforma dos pescadores, ordem jurídica que já acertou o passo com a Europa ao prever a me ta preconizada pela Organização Internacional do Trabalho, na Convenção n.º 71 de 1946, ou seja a fixação da idade de reforma dos pescadores aos 55 anos.
Também se reconhece o direito à pensão, por desgaste físico, concedido a requerimento dos interessa dos, desde que tenham, pelo menos, 40 anos de serviço
Estabelece-se, ainda, que será contado como 1 ano efectivo de serviço do pescador que faça parte de campanhas, cada grupo de 150 dias seguidos ou interpolados.
Como dizíamos, o projecto de lei e as propostas nele incluídas, apresentadas pelo PCP, visam alterar o disposto na Portaria n.º 98/83, de 29 de Janeiro.
Não são alterações profundas. São alterações que se inscrevem na filosofia da portarias Simples melhorias do regime de reforma em vigor.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Consideramos que a democracia no nosso país só estará completa se for também democracia social.
Democracia social que é uma questão da ordem do dia, nos tempos de crise que vivemos.
Exige-se que o Estado, a todos e em particular aos que se encontram em condições mais desfavorecidas, preste serviços mobilize apoios e ajudas, a fim de poderem vencer as dificuldades do quotidiano.
É neste tempo que o Estado mais tem que velar pelos grupos sociais, com mais débil capacidade reivindicativa.
São eles, os desempregados e os pensionistas, que têm direito ao trabalho e o direito a um rendimento condigno, que são a base de uma política que defenda os valores da democracia e da justiça social.
O presente debate insere-se no respeito que todos temos de ter por aqueles que se encontram no Outono da vida, que já deram o seu contributo para a sociedade.
Sabemo-lo bem.
Não esquecemos também que o presente debate processual tem por fundo um grupo profissional sujeito pelas condições de trabalho a permanente desgaste, correndo riscos, registando um envelhecimento precoce.
Só que as principais reivindicações deste grupo profissional já foram acolhidas e vazadas em lei.
Por tudo isto, somos de opinião que importa introduzir melhorias, mas sobretudo trabalhar na definição de uma política social global a adoptar relativamente às várias profissões desgastantes.
Daí o nosso voto.

Vozes da ASDI, do PS e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Saias.

O Sr. Leis Saias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Reconhecemos a importância do assunto suscitado pelo PCP.
A reforma dos pescadores é um problema social e político importante.
Dadas as condições de vida dos pescadores, exercidas quase sempre em condições extremamente difíceis, por vezes em situações de verdadeiro heroísmo, a vida deles merece uma protecção muito especial.
No entanto, os argumentos adiantados pelo PCP para fazer triunfar a tese da urgência do projecto de lei não se nos afiguram convincentes. Pelo contrário, pensamos que, dada a importância e o melindre deste problema, ele deve ser discutido com a devida ponderação e com o necessário vagar para que as soluções a que se chega sejam socialmente justas e se enquadrem no contexto geral dos esquemas de previdência.
Por outro lado, como já aqui foi referido, o essencial da questão já foi oportunamente contemplado na Portaria nº 98/83, de 29 de Janeiro. Acresce ainda que, como foi referido pelo Sr. Deputado Rocha de Almeida - e não temos razão nenhuma para duvidar das suas informações, pois pensamos que as informações que veiculou são exactas -, o Governo tem pronta uma nova portaria que contempla o essencial dos aspectos focados no projecto de lei do PCP.
Nesta conformidade, pensamos que o assunto merece ponderação. O PS está disposto a discuti-lo com toda a profundidade, mas não pensamos que neste momento exista a urgência que estaria na base do requerimento do PCP.

A Sr.ª Margarida Tengarrinha (PCP): - Para os pescadores existe!

O Sr.ª Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr.ª Deputado Carlos Espadinha.

0 Sr. Carlos Espadinha (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos a favor do nosso pedido de urgência porque, como declarei ontem na intervenção que produzi, é urgente que este assunto seja resolvido.
Mais uma vez aqui foi provada a demagogia dos partidos do Governo e é de realçar neste caso a posição do PS, pois quando há 3 anos foi discutido na Assembleia o projecto de lei, ele votou a favor. Porém, agora votou contra o pedido de urgência! Assim, está mais uma vez demonstrada a demagogia que é andarem pelos portos dizendo que os pescadores têm razão, pois recebem reformas de miséria e é necessário trabalhar para resolver os seus problemas, e agora rejeitarem a urgência desse problema, que é um dos que mais afecta neste momento a classe piscatória, designadamente os mais idosos, aqueles que ao fim de 50 anos ou mais de trabalho no mar vêem chegar o fim dos seus anos de trabalho e receberem miseráveis reformas de 6000$ ou 7000$.
Como referi ontem na minha intervenção, neste momento estão a pedir a reforma os pescadores que auferem salários acima de 30 000$ mensais mas, porque todo o seu tempo de desconto não é contado para este benefício, as suas reformas são de autêntica miséria, pois fazem os pescadores ficarem pelos cantos, por cima das muralhas ou terem que andar às «tecas» de peixe de uns e de outros para assim sobreviverem.

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É esta demagogia que mais uma vez fica demonstrada na Assembleia da República.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Finalmente, para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.

O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Embora se concorde que a questão da reforma dos pescadores deve merecer a atenção do Governo e desta Câmara, o CDS é de opinião que se deve estudar globalmente o problema das reformas em todas as profissões e não apenas, especificamente, na de pescador, por muita consideração que estes trabalhadores nos mereçam. Daí o nosso voto contra o pedido de urgência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar no segundo ponto da ordem do dia que diz respeito à continuação do debate sobre as alterações ao Regimento da Assembleia da República.
Há várias disposições que tinham ficado pendentes e penso que esta é a altura oportuna de promovermos as respectivas votações. A primeira disposição pendente respeita ao n.º 1 do artigo 148.º, pelo que vai ser lido o respectivo texto, seguindo-se se a sua votação.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, gostaria que V. Ex.ª procedesse à verificação do quórum antes de se iniciar a votação.

O Sr. Presidente: - Assim será feito, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente. É também para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, quero apenas solicitar a V. Ex.ª que avise os membros da Comissão de Economia, Finanças e Plano, uma vez que esta se encontra reunida neste momento.

0 Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Será considerado esse facto.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, a última reunião plenária terminou quando estava a decorrer a discussão sobre o artigo 180.º. Nesse sentido, penso que deveríamos acabar primeiro a discussão sobre esse artigo e só depois passarmos às votações adiadas.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, efectivamente, parece me ser mais lógico que se proceda desse modo.
Entretanto, informam-me aqui na Mesa que não há qualquer inscrição para a discussão sobre este artigo 180.º

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente. É para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação é no seguinte sentido: no último dia de debate sobre a alínea c) do artigo 180.º informámos a Mesa de que considerávamos que a discussão não estava completamente acabada e que só teríamos a ganhar com a consideração desta proposta em sede de comissão. Nesse sentido, anunciámos que iríamos entregar um requerimento na Mesa e apenas não o fizemos, porque, entretanto, os trabalhos parlamentares encerraram.
Portanto, quero apenas comunicar a V. Ex.ª que, não havendo mais inscrições, vamos entregar na Mesa um requerimento de baixa à Comissão.

O Sr. Presidente: - A Mesa aguarda que lhe seja entregue esse requerimento para ser imediatamente submetido à votação.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, dá me licença que interpele a Mesa?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, queria apenas solicitar a V. Ex.ª que nos informe sobre os tempos disponíveis neste momento por cada grupo e agrupamento parlamentar.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Vou passar a referir os tempos disponíveis pelos grupos e agrupamentos parlamentares: o PS tem 63 minutos; o PSD tem 19 minutos; o PCP tem 14 minutos; o CDS tem 48 minutos; o MDP/CDE tem 6 minutos; a UEDS tem 5 minutos; a ASDI tem 43 minutos; e o Sr. Deputado Independente do Partido Os Verdes tem 2 minutos.
Entretanto, devo informar que há quórum para votação.
Vai ser lido um requerimento apresentado pelo PCP, de que é primeiro subscritor o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

Foi lido. É o seguinte:

Os deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, requerem, ao abrigo do artigo 6.º do Processo Especial de Revisão do Regimento, a baixa à comissão das votações da proposta relativa ao artigo 180.º alínea c).

O Sr. Presidente: - Vamos votar, Srs. Deputados.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS e da ASDI, votos a favor do PCP, do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da UEDS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos

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282 I SÉRIE - NÚMERO 9

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tentámos, ao longo de todo o debate, chamar a atenção para os inconvenientes e para a falta de transparência que pode decorrer da proposta apresentada pelo PS/PSD.
Chamámos a atenção para o facto de essa proposta não ter sido discutida em comissão e ter aparecido de supetão à última da hora. Tentámos, por todas as formas, que pudéssemos reconsiderar, em comissão, as soluções ora propostas.
Porém, a atitude da maioria de não se defender, de se calar, de se remeter apenas à votação maioritária, é bem significativa dos objectivos que estão por detrás da apresentação desta proposta.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sem dúvida!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lida uma proposta de substituição da alínea c) do artigo 180.º, de que são subscritores os Srs. Deputados Silva Marques e Luís Saias, respectivamente do PSD e do PS.

Foi lida. É a seguinte:

Proposta de substituição da alínea c) do artigo 180.º:

c) A votação na especialidade pode ter lugar em comissão se o Plenário assim o decidir.

O Sr. Presidente: - Vamos votar, Srs. Deputados.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI, votos contra do PCP, do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da UEDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes para uma declaração de voto.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A disposição que acaba de ser aprovada permite todo o curso de soluções nada transparentes e nada convenientes aos trabalhos do Plenário e da Assembleia no seu conjunto, pelo que as consideramos, de todo em todo, inaceitáveis, pelas razões adiantadas durante o debate, e é bom que se diga que só por nós adiantadas, uma vez que a maioria não nos contrapôs qualquer argumento.
Por isso, votámos em conformidade com o nosso pensamento, que não sofreu aqui qualquer contestação.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar às votações respeitantes às disposições que ficaram pendentes.
Vai ser lido o n.º 1 do artigo 148.º, segundo o texto da Comissão.

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 148.º

1 - Para a discussão de cada projecto de lei, proposta de lei, proposta de resolução, ratificação de decretos-leis ou recurso é fixado, na conferência dos representantes dos grupos parlamentares, um tempo global, tendo em conta a sua natureza e importância.

0 Sr. Presidente: - Vamos proceder à votação, Srs. Deputados.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI, votos contra do PCP, do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da UEDS.

0 Sr. Presidente: - Vai ser lido o n.º 2 do mesmo artigo, também segundo o texto da Comissão

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 148.º

2 - Este tempo é distribuído entre os grupos e agrupamentos parlamentares proporcionalmente em função do respectivo número de deputados.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI, votos contra do PCP, do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da UEDS.

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, a proposta original do PS/PSD quanto ao n.º 3 deste artigo 148.º dizia que «a cada grupo ou agrupamento é garantido um tempo mínimo de intervenção em face da natureza e importância do assunto a discutir».
Entretanto, em sede de Comissão, relativamente a esta proposta original, surgiu uma proposta no sentido de ser aditado «que nunca poderá ser inferior a 10 minutos».
Há, neste momento, uma proposta, também relativa a este n.º 3, apresentada pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso, que retoma o texto original do PS/PSD.
A minha interpelação à Mesa é, portanto, no sentido de saber se vamos votar em primeiro lugar o n.º 3 tal como consta da proposta original ou se a Mesa entende utilizar outra metodologia relativamente a estas votações.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, vamos proceder à votação deste número com a rectificação introduzida por essa proposta de aditamento, que, segundo penso, foi acordada entre todas as bancadas.

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado, faça favor.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, a questão que se levanta é precisamente essa. É que esse aditamento não foi acordado entre todas as bancadas.

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O Sr. Presidente: - Nesse caso, vamos votar em primeiro lugar o texto da Comissão e depois a proposta de aditamento.
Vai, então, ser lido o texto da Comissão relativo ao n.º 3 do artigo 148.º

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 148.º

3 - A cada grupo ou agrupamento é garantido um tempo mínimo de intervenção em face da natureza e importância do assunto a discutir

O Sr. Presidente: - Vai ser lida uma proposta, apresentada pela UEDS, que deu entrada na Mesa no passado dia 24 e que substituiu uma anterior redacção do n.º 3, que deu entrada na Mesa no dia 31 de Maio.

Foi lida. É a seguinte:

A cada grupo ou agrupamento parlamentar é garantido um tempo mínimo de intervenção em face da natureza e importância do assunto a discutir.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o texto da Comissão que foi lido em primeiro lugar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI e votos contra do PCP, do MDP/CDE, e da UEDS e do deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra esta disposição porque o único sentido útil que ela tem está articulado com o número que fixa o tempo global e, como é sabido, estamos frontalmente contra o permitir aos partidos da maioria imporem tempos aos partidos da oposição. Estamos frontalmente contra que se entregue aos partidos da maioria a definição do que é e do que não é importante.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados não vamos submeter à votação a propostas apresentada pela UEDS porque, como VV. Ex.ªs ouviram há pouco, o seu texto é precisamente idêntico ao que acabou de ser votado.
Vai ser lida uma proposta de aditamento ao n.º 3 do artigo 148.º

Foi lida. É a seguinte:

Proposta de aditamento ao n.º 3 do artigo 148.º

ARTIGO 148.º

1 - .....................................
2 - .....................................
3 - ... que nunca poderá ser inferior a 10 minutos.

0 Sr. Presidente: - Vamos votar.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI e votos contra do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez.

0 Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra a proposta de aditamento, em primeiro lugar, porque ela se enquadra dentro do espírito que tem presidido à revisão do Regimento ou seja, no sentido de pôr a maioria a definir, sem regras, o funcionamento da Assembleia da República; em segundo lugar, porque achamos inadmissível que se preveja qualquer tipo de intervenção inferior a 10 minutos Desde já deixamos bem registado no Diário que consideramos que o tempo de 10 minutos não é suficiente para um debate com um mínimo de seriedade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Saias.

O Sr. Luís Saias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos a favor deste preceito e do aditamento porque eles representam, efectivamente, uma garantia para os pequenos partidos. Assim, os grupos e agrupamentos parlamentares sabem que, seja qual for o tempo global fixado, têm sempre 10 minutos, pelo menos, para intervir.

O Sr. João Amaral (PCP): - Parece que os pequenos partidos estão muito agradecidos!

O Sr. Presidente: - Vai ser lida a proposta vinda da Comissão e respeitante ao n.º 4 do artigo 148.º, para depois ser submetida à correspondente votação.

Foi lida. É a seguinte:

ARTIGO 148.º

1 - .....................
2 - .....................
3 - .....................
4 - O governo tem um tempo de intervenção igual ao do maior grupo parlamentar.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, não seria preferível deixar acabar a leitura das propostas e depois dar-lhe-ia a palavra?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: Muito obrigado, Sr. Deputado.

Pausa.

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284 I SÉRIE - NÚMERO 9

Como há aqui uma confusão, vamos ouvir o Sr. Deputado Jorge Lemos que é natural que nos retire a dificuldade com que estamos deparados.

O Sr. Jorge lemos (PCP): - De facto, Sr. Presidente, a minha interpelação vai no sentido de facilitar - creio - até os trabalhos da Mesa. É que eu tenho em meu poder a proposta original do PS/PSD, que já foi lida; uma proposta subscrita pela UEDS relativa ao n.º 4, que, ao que sei, foi retirada; e ainda uma proposta, subscrita pelo Sr. Deputado Silva Marques, do seguinte teor: «O governo assim como o autor da iniciativa em debate têm um tempo de intervenção igual ao do maior grupo parlamentar.»
A minha interpelação vai no sentido de perguntar às bancadas da maioria se se deve entender que a proposta subscrita pelo Sr. Deputado Silva Marques substitui o texto que consta da proposta apresentada pelo PS e pelo PSD e, no caso de assim não ser, como é que iríamos votar. Votaríamos primeiro o texto da proposta original com o inciso que consta da proposta subscrita pelo Sr. Deputado Silva Marques?

O Sr. Luís Saias (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Saias (PS): - Sr. Presidente, quanto ao facto de a proposta subscrita pelo Sr. Deputado Silva Marques substituir a proposta originária, parece me uma evidência uma vez que apresenta uma nova proposta. Resta ao PS dizer que retira a proposta originária e que dá a sua adesão à proposta subscrita pelo Sr. Deputado Silva Marques.
Assim, parece-nos que seria um procedimento correcto votarmos apenas a proposta do Sr. Deputado Silva Marques.

0 Sr. Presidente: - Em presença dos esclarecimentos prestados pelo Sr. Deputado Luís Saias, é retirada a proposta vinda da Comissão, assim como a proposta apresentada pela UEDS, visto tratar-se de um aditamento a um número novo, pelo que iríamos proceder apenas à votação da proposta subscrita pelo Sr. Deputado Silva Marques. É este o entendimento?

O Sr. Silva Marques (PSD): - É sim, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Vai então ser lida a proposta subscrita pelo Sr. Deputado Silva Marques.

Foi lidas. É a seguinte:

ARTIGO 148.º

1 - ......
2 - ......
3 - .......
4 - O governo, assim como o autor da iniciativa em debate, tem um tempo de intervenção igual ao do maior grupo parlamentar.

O Sr. Presidente: - Vamos votar.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI, votos contra do PCP, do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez e abstenção da UEDS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O nosso voto vem no sentido do conjunto dos votos que temos manifestado em relação a todo o artigo 148.º, pelo que é um voto coerente. O que está em causa é a filosofia que preside ao artigo e não tanto este preceito no concreto.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Vai ser lida uma proposta de aditamento que, no caso de ser aprovada, terá o n.º 5, subscrita pelo PSD.

Foi lida. É a seguinte:

ARTIGO 148.º

1 - ..............
2 - ..............
3 - ..............
4 - ..............
5 - 0 uso da palavra para invocação do Regimento, perguntas à Mesa, requerimentos, recursos e reacções contra ofensas à honra não é considerada nos tempos atribuídos a cada grupo ou agrupamento parlamentar.

O Sr. Presidente: - Vamos votar.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS, da UEDS e da ASDI e votos contra do PCP, do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez.

0 Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

0 Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O nosso voto não exprime um desacordo radical com o texto que acabou de ser sujeito à apreciação da Câmara, mas expressa, isso sim, e com todo o vigor, a mesma posição de filosofia de fundo que temos mantido ao longo do debate do presente artigo.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Vocês estão a rejeitar tudo!

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - E vocês têm o ónus de aprovar tudo!

O Sr. Presidente: - Vai ser lida uma proposta de aditamento de um n.º 6 ao artigo 148.º

Foi lida. É a seguinte:

ARTIGO 148.º

1 - ....................
2 - ....................
3 - ....................
4 - ....................
5 - ....................
6 - Na falta de fixação do tempo global referido no n.º 1, observa-se o disposto no artigo 103.º e demais disposições reguladoras do uso da palavra na discussão e votação.

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O Sr. Presidente: - Vamos votar.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI, votos contra do PCP, do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez e abstenção da UEDS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra o presente artigo porque ele encerra toda a nova filosofia que a maioria PS/PSD, com o apoio do CDS e da ASDI, estão a tentar introduzir no funcionamento democrático da Assembleia da República Pretende se acabar com regras objectivas de funcionamento e transferir para uma sala restrita, para o mero critério das maiorias, a definição e as normas de funcionamento essenciais num Parlamento.
Por tudo isto, votámos contra todos os preceitos do presente artigo.

0 Sr. Presidente: - Vai ser lida uma proposta de aditamento de um novo artigo, o artigo 64.º-A.

Foi lida. É a seguinte:

ARTIGO 64.º-A

(Organização dos debates)

1 - A conferência dos presidentes dos grupos e agrupamentos parlamentares delibera nos termos do artigo 148.º sobre o tempo global de cada debate, bem como sobre a sua distribuição.
2 - Na falta de deliberação da conferência, aplica-se supletivamente o artigo 103.º e demais disposições relativas ao uso da palavra.

0 Sr. Presidente: - Vamos votar.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI, votos contra do PCP, do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez e abstenção da UEDS.

0 Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a votação deste artigo 64.º-A, pode dizer-se que a coligação e os seus apêndices completaram a capela. Neste momento o que deveria ser regra objectiva passou a vontade unilateral de uma maioria, e o que deveriam ser garantias dos partidos da oposição passaram a ser meras figuras de retórica que, em qualquer altura, essa maioria, por simples vontade, sem qualquer critério, pode ultrapassar
Toda a filosofia desta revisão do Regimento, que se encerra com este artigo 64.º-A, visa, no nosso entender, como lembrámos no passado - e continuaremos a lembrá-lo no futuro -, que não está garantido o funcionamento democrático do Parlamento e isso é extremamente grave.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Luís Saias (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - É para fazer uma declaração de voto?

O Sr. Luís Saias (PS): - Não, Sr. Presidente. É para fazer um protesto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Luís Saias (PS): - Como a Câmara acabou de ouvir, o Sr. Deputado Jorge Lemos falou em ...

O Sr. Presidente: - Vai desculpar me a interrupção, Sr. Deputado, mas se quer fazer um protesto em relação à declaração de voto do Sr. Deputado Jorge Lemos não é possível, porque regimentalmente não tem cabimento.

0 Sr. João Amaral (PCP): - O Sr. Deputado Luís Saias conhece mal o Regimento!

O Sr. Presidente: - A não ser que V. Ex.ª queira fazer uma interpelação à Mesa sobre qualquer assunto referindo, porventura, aquilo que pretende.

0 Sr. Luís Saias (PS): - Era no que eu estava a pensar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Pois sim, Sr. Deputado. Queira ter a bondade de usar da palavra para fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Luís Saias (PS): - O Sr. Deputado Jorge Lemos, na declaração de voto há pouco emitida, falou em «maioria e seus apêndices».

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Exacto. Gravemente ofensivo!

O Orador: - Com toda a vivacidade e com todo o vigor, quero protestar quanto a esta expressão e pedir, por um lado, ao Sr. Deputado que diga quem são os apêndices a que se referiu e, por outro, que explique quais são os apêndices, nesta Câmara, do seu próprio partido.

0 Sr. Presidente: - Eu não vou dar a palavra ao Sr. Deputado Jorge Lemos sobre esta matéria, por que aquilo que o Sr. Deputado Luís Saias fez não foi um protesto mas uma interpelação à Mesa. Presumo que às perguntas que estariam inseridas naquilo que o Sr. Deputado Luís Saias referiu não será necessário dar resposta e todos compreendemos as conclusões que daí poderíamos tirar. Se me dessem licença, e se não levassem a mal, ultrapassávamos esta questão.
Quero levar ao conhecimento dos Srs. Deputados o seguinte: o n.º 2 do artigo 64.º que acabámos de votar, segundo me refere o Sr. Deputado Secretário, é idêntico ao aditamento que havíamos votado no nº 6 do artigo 148.º. Faço apenas esta observação para que a Comissão de Redacção tome isto em consideração.
Agradecia aos Srs. Deputados que lideram este processo o favor de me dizerem se em relação ao artigo 64.º-A. há mais alguma votação.

Pausa.

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286 I SÉRIE - NÚMERO 9

Não havendo, está encerrado o processo respeitante a esta disposição.
Vamos, pois, proceder à votação do artigo 174.º

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, se não houvesse objecção da parte de V. Ex.ª, gostaria de solicitar a dispensa da leitura. Os grupos parlamentares estão munidos dos textos e não há a menor dúvida acerca do que está em votação.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso não é possível. Para efeito de registo e precisamente para que o Diário possa dar expressão não só dos textos mas daquilo que se está a votar - se não não é possível a identificação do respectivo texto -, a sua leitura é essencial.
Ao que julgo, para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Saias.

O Sr. Luís Saias (PS): - Sr. Presidente, votámos há pouco o artigo 64.º-A e pelas notas que eu aqui tenho foi adiada a votação para depois do artigo 148.º, o que está correcto. O artigo 64.º-A, tem dois números e penso que a votação que se fez abrangeu os n.ºs 1 e 2.

O Sr. Presidente: - Foi sim, Sr. Deputado.

O Orador: - Muito obrigado.

0 Sr. Presidente: - Vai proceder se à leitura do artigo 174.º

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 174.º

(Reunião da Assembleia)

1 - Tendo o Presidente da República solicitado autorização à Assembleia da República para a declaração do estado de sítio ou de estado de emergência, nos termos do artigo 19.º, da alínea c) do artigo 137.º e do artigo 141.º da Constituição, o Presidente da Assembleia da República promove a sua imediata apreciação pelo Plenário ou pela Comissão Permanente, no caso de a Assembleia não estar reunida nem ser possível a sua imediata convocação extraordinária.
2 - A inscrição na ordem do dia da apreciação do pedido de autorização para a declaração do estado de sítio ou do estado de emergência, bem como a marcação da reunião do Plenário ou a convocação da Comissão Permanente, tem lugar independentemente de qualquer prazo ou outra formalidade prevista no Regimento.

O Sr. Presidente: - Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, queria referir que quando se trata de introduzir benfeitorias no Regimento e a adaptá-lo à revisão constitucional, o voto do PCP é manifestamente a favor.

0 Sr. Presidente: - Vão ser lidos os textos da proposta do PS e PSD relativa ao artigo 175.º e da proposta do PCP relativa ao nº 1 do mesmo artigo, pela ordem que acabei de referir.

Foram lidas. São as seguintes:

ARTIGO 175.º

(Debate)

1 - 0 debate tem por base a mensagem do Presidente da República que fundamente o pedido de autorização da declaração do estado de sítio ou do estado de emergência.

ARTIGO 175.º

1 - 0 debate tem por base a mensagem do Presidente da República, que nos termos do artigo 19.º da Constituição constitui o pedido de autorização da declaração do estado de sítio ou do estado de emergência.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente? É para interpelar a Mesa.

0 Sr. Presidente: - Faça favor.

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, no sentido de facilitar os trabalhos, quero dizer que a única diferença que existe na nossa proposta em relação à proposta que vem da Comissão, e subscrita pelo Sr. Deputado Luís Beiroco, é o aditamento de um inciso, referindo o artigo 19.º da Constituição, para que fique claro, em termos regimentais, o que se pretende dizer no presente artigo. Creio, portanto, que poderíamos votar em primeiro lugar o texto que vem da Comissão e depois votar como aditamento o inciso que nós propomos.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Salema.

A Sr.ª Margarida Salema (PSD): - Sr. Presidente, pela nossa parte aceitamos a votação da proposta do PCP em detrimento da proposta da Comissão.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Saias.

0 Sr. Luís Saias (PS): - Quero pronunciar-me no mesmo sentido em que a Sr.ª Deputada Margarida Salema acaba de se pronunciar.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, assim se fará.
Foi, pois, retirada a proposta apresentada pela Comissão e vamos votar a proposta apresentada pelo PCP.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

0 Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 nosso voto a favor exprime, como é natural, a concordância com o texto que aca-

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I DE NOVEMBRO DE 1984 287

bámos de apreciar, porque este está de inteiro acordo com o regime constitucional e porque, a nosso ver, dá inteiro cabimento a uma posição, segundo a qual a mensagem do Presidente da República não é um pedido em branco mas um pedido devidamente instruído com elementos para que a Assembleia possa aquilatar da dimensão do que é proposto e com toda a convicção e toda a profundidade decidir conformemente.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Vai ler-se o nº 2 do artigo 175.º que tem uma proposta alternativa subscrita pelo PCP.
O Sr. Deputado Luís Saias pede a palavra para que efeito?

O Sr. Luís Saias (PS): - Sr. Presidente, queria declarar que pela nossa parte retiramos a proposta do nº 2 e aderimos à proposta do PCP.

0 Sr. Presidente: - Fica retirada a proposta da Comissão e vamos submeter apenas à votação a proposta do PCP.

Foi lida. É a seguinte:

ARTIGO 175.º

2 - O debate não pode exceder um dia e nele têm o direito a intervir, prioritariamente, o primeiro ministro, por uma hora, e um deputado de cada grupo ou agrupamento parlamentar, por 30 minutos cada um.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vai ser lido o texto da Comissão com o nº 3 respeitante ao artigo 175.º

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 175.º

3 - A requerimento do Governo ou de um grupo ou agrupamento parlamentar, o debate pode ser encerrado logo que um deputado de cada partido tenha intervindo

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

0 Sr. Presidente: - Vamos submeter à vossa votação o artigo 176.º que vai ser lido.
0 Sr. Deputado Luís Saias pede a palavra para que efeito?

O Sr. Luís Saias (PS): - Sr. Presidente, vejo que há ainda uma proposta de aditamento de um nº 4 subscrita pelo PCP. Não sei se retira ...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, ia também interpelar a Mesa no sentido de lembrar que consta da nossa proposta um nº 4 que mantemos. A Mesa deve tê-lo, pois foi entregue

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, era entendimento da Mesa que esta proposta tinha sido retirada, na medida em que a proposta que fora manuscrita havia substituído esta, que se encontra dactilografada no seu nº 2.

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, quanto ao nº 2, a proposta manuscrita substitui o texto originário. Só que essa proposta manuscrita não se refere ao nº 4, uma vez que ela não sofreu qualquer alteração. Mantém-se, portanto, a proposta que originariamente havíamos apresentado.

0 Sr. Presidente: - 0 Sr. Deputado Secretário vai ler o aditamento de um nº 4 ao artigo 175.º, proposto pelo Partido Comunista Português.

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 175.º

4 - Ao debate na Comissão Permanente aplicam se com as devidas adaptações as disposições constantes dos números anteriores.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

0 Sr. Presidente: - Agora, sim, passamos ao artigo 176.º que vai ser lido.

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 176.º

(Votação)

A votação incide sobre a concessão de autorização.

0 Sr. Presidente: - Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Passemos ao artigo 177.º, que vai ser lido.

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 177.º

A autorização toma a forma de lei, quando concedida pelo Plenário, e de resolução, quando concedida pela Comissão Permanente.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos interromper os nossos trabalhos tal como estava previsto, mas queria pedir-lhes o seguinte favor:
Da parte da tarde vamos entrar na discussão das alterações ao Orçamento e agradecia que estivessem às 14 horas, com a máxima pontualidade possível, para que os Srs. Deputados cerca das 18 horas ou 18 horas e 30 minutos tenham os trabalhos concluídos e possam depois retirar-se em boa paz para gozo de férias, ainda que curtas. Mas isto só é possível se efec-

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tivamente os Srs. Deputados forem capazes do sacrifício de estarem aqui todos às 14 horas.
Está suspensa a sessão.

Eram 12 horas.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 14 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já chegou à Mesa o relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano, que era uma peça fundamental e que, infelizmente, obrigava a demorar o início dos trabalhos, o qual vai ser lido para ser introduzida a discussão da Proposta de Lei nº 87/III.

O Sr. Secretário (Lemos Damião):

1 - A Comissão de Economia, Finanças e Plano reuniu nos dias 19, 22, 23, 24, 25, 26 e 30 de Outubro do ano em curso, para discussão e votação na especialidade da Proposta de Lei nº 87/III de alterações ao Orçamento do Esta do para 1984.
2 - A discussão e as votações realizadas foram integralmente registadas para efeitos de publicação no Diário da Assembleia da República.
3 - Procedeu-se à discussão e votação da Proposta de Lei nº 87/III e dos respectivos mapas anexos, bem como de propostas de alteração apresentadas na Comissão.
Os mapas I a V apresentados na Proposta de Lei nº 87/III foram aprovados na globalidade com as alterações que decorrem de propostas aprovadas pela Comissão.
4 - Foram ainda votadas e aprovadas por unanimidade:

a) Uma proposta de aditamento de um artigo 3.º à Proposta de Lei nº 87/III, cujo texto se anexa;
b) Uma recomendação ao Plenário da Assembleia da República no sentido de que seja aprovada a Resolução cujo texto igualmente se anexa.

5 - Assim, e com vista à conclusão da apreciação da Proposta de Lei nº 87/III, carecem ainda de discussão e votação pelo Plenário:

a) A proposta de resolução em anexo;
b) Outras propostas que tenham sido ou venham a ser apresentadas no Plenário;
c) O artigo 2.º da proposta de lei, relativo a empréstimos;
d) O artigo 1.º da proposta de lei;
e) Votação final global da Proposta de Lei nº 87/III.

Palácio de São Bento, 3l de Outubro de 1984. - Pelo Presidente da Comissão, João Maurício Fernandes Salgueiro - O Secretário da Comissão, Octávio Augusto Teixeira

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está posta em apreciação, para posterior votação na especialidade, a Proposta de Lei nº 87/III, que aprova alterações ao Orçamento do Estado para 1984, aprovado pela Lei nº 42/83, de 31 de Dezembro.
Está aberta a discussão.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Dá me licença, Sr. Presidente?

0 Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, era para requerer a V. Ex.ª o favor de mandar proceder à distribuição do relatório que acabou de ser lido.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado vai proceder se à distribuição não só deste relatório como de uma proposta de aditamento e outra de resolução.
Vai ser lido um requerimento que deu entrada na Mesa, apresentado por vários Srs. Deputados do PSD e em que é primeiro subscritor o Sr. Deputado Correia de Jesus.

Foi lido. É o seguinte:

Os deputados abaixo assinados requerem a V. Ex.ª, nos termos do disposto no artigo 156.º do Regimento, a avocação pelo Plenário da proposta apresentada pelos deputados sociais democratas eleitos pelo círculo da Madeira sobre custos de insularidade, referente à Proposta de Lei nº 87/III Alterações ao Orçamento do Estado para 1984.

O Sr. Presidente: - Dou ainda conhecimento à Câmara de que há uma proposta de aditamento, de um artigo novo, à Proposta de Lei nº 87/III, em que o primeiro subscritor é o Sr. Deputado Jaime Ramos, que refere o seguinte:

1 - O ministro, cujo Ministério excede, em 10%, a verba que lhe houver sido consignada no Orçamento do Estado, será automaticamente demitido.
2 - O titular do cargo de ministro que incorra na situação prevista no número anterior ficará impedido de exercer as funções de membro do governo pelo período de três anos.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - É para solicitar ao Sr. Presidente que sejam distribuídos pelas bancadas os dois documentos que foram lidos.

0 Sr. Presidente: - Assim se fará, Sr.ª Deputada.

O Sr. Jaime Ramos (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

0 Sr. Jaime Remos (PSD): - Sr. Presidente, na qualidade de primeiro subscritor, quero anunciar à Câmara que retiro a proposta de aditamento que o

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Sr. Presidente acaba de ler e que ainda hoje farei chegar à Mesa uma justificação desta tomada de posição.

0 Sr. Presidente: - Vai ser retirada, Sr. Deputado.

0 Sr. José Magalhães (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente? É para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, na sequência da intervenção feita pelo Sr. Deputado Jaime Ramos, quero anunciar ao Sr. Presidente e à Assembleia que o Grupo Parlamentar do PCP, tendo ponderado as implicações da proposta que o Sr. Deputado Jaime Ramos acaba de retirar e com vista a obviar a alguns dos inconvenientes que por ventura poderiam ser suscitados, do ponto de vista constitucional, quanto ao seu teor, vai formalizar a apresentação, na Mesa da Assembleia da República, de uma proposta cujo desiderato e objectivo final se nos afigura exactamente idêntica ao documento apresentado pelo PSD, mas que não tem nenhum escolho constitucional no tocante à sua redacção. Essa proposta, que a Mesa oportunamente lerá, vai ser depositada na Mesa neste preciso momento.

0 Sr. Presidente: - Aguardemos, portanto, a entrega desse documento, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, vamos então votar o requerimento, que já foi lido, apresentado por Srs. Deputados do PSD.

Submetido à votação, foi aprovado, com 72 votos a favor (do PSD, do PCP, do MDP/CDE, do deputado independente António Gonzalez e de 2 deputados do PS), 62 votos contra (do PS e do CDS) e 3 abstenções (da UEDS e da ASDI).

0 Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

0 Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Abstive-me nesta votação, porque não obstante achar desnecessária a avocação requerida também não quis, com o meu voto, inviabilizar o direito que assiste regimentalmente aos Srs. Deputados que não participam em trabalhos da comissão de fazerem a avocação ao Plenário da discussão e votação de propostas ali porventura aprovadas ou rejeitadas.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Fica registado.

0 Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

0 Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na sequência e em coerência com a posição ontem assumida na Comissão de Economia, Finanças e Plano, votámos contra este requerimentos Entendemos não dever embarcar em atitudes que consideramos ser de chantagem política.
A nosso ver, o assunto foi ontem suficientemente debatido, analisado e resolvido, e não entendemos que tenha sido novamente trazido a Plenário para uma discussão meramente estéril, quanto a nós.

Aplausos de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Correia de Jesus.

O Sr. Correia de Jesus (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Congratulamo-nos com a aprovação do nosso requerimento. Ele é regimental, foi votado validamente por esta Assembleia e esta votação foi uma afirmação dos poderes deste Plenário. Portanto, congratulamo-nos com isso e consideramos impertinentes outras considerações que saiam do quadro institucional em que nos movimentamos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Abstivemo-nos em face do requerimento apresentado pelos Srs. Deputados do PSD por duas razões: primeiro, porque, do nosso ponto de vista, não se justifica a discussão em Plenário; e, por outro lado, porque entendemos que o direito à avocação pelo Plenário é um direito fundamental dos deputados cujo exercício, só em circunstâncias muito excepcionais, lhes pode ser recusado. Por isso, nunca daríamos o nosso voto contrário ao princípio da avocação pelo Plenário.
Não vemos como a avocação ao Plenário possa, em que circunstâncias for, ser entendida como qualquer espécie de chantagem política, porque não admitimos que qualquer deputado tenha receio de assumir no Plenário posições iguais ou diferentes daquela que porventura assumiu nas Comissões.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

0 Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista votou contra o requerimento apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata por duas ordens de razões, a primeira das quais é de natureza regimental.
Tem este grupo parlamentar o entendimento de que as avocações - que, nos termos do artigo 156.º do Regimento, são faculdade do Plenário, relativamente às deliberações no âmbito das comissões devem poder fazer-se antes que as comissões tomem, elas próprias, posições de voto.
Sucede que a Comissão de Economia, Finanças e Plano já tinha tomado uma posição de voto e, do nosso ponto de vista, essa posição deveria ser entendida como definitiva, interpretação, aliás, que entendemos ser reforçada pela própria Lei do Enquadramento Orçamental, a qual diz, no seu artigo 14.º, quais as matérias que são votadas na Comissão de Economia, Finanças e Plano.

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Justamente, sucede que esta é uma matéria da competência da votação da Comissão de Economia Finanças e Plano Nesse sentido, entendemos que não haveria lugar para esta avocação, a qual pode representar o principio de subversão de todo o trabalho decorrido na Comissão de Economia, Finanças e Plano.
A segunda ordem de razões tem uma natureza substancial e, naturalmente, releva da circunstância de as posições do Grupo Parlamentar do Partido Socialista terem sido claramente definidas no âmbito da Comissão de Economia, Finanças e Plano, de termos continuado fiéis aos pontos de vista aí estabelecidos e, portanto, de entendermos ser completa mente desnecessária a reprodução de um debate que já tinha tido lugar na sua sede própria.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, para uma declaração de voto.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP votou favoravelmente o requerimento apresentado pelo Grupo Parlamentar do PSD, de acordo com aquilo que é uma posição de princípio que temos mantido inalteravelmente na Assembleia da República.
O direito de avocação, tal como se encontra gizado no Regimento, permite ao Plenário a todo o tempo chamar a si votações que estejam ou tenham decorrido em qualquer comissão parlamentar especializada. É uma forma através da qual se exprime a plenitude de poderes do Plenário, principio incontestável na nossa organização democrático parlamentar e a experiência da Assembleia da República tem ido nesse sentido.
O direito de avocação é um direito fundamental, que pode ter um papel importante no sentido de clarificar e garantir uma transparência plena aos trabalhos da Assembleia da República decorridos em Comissão.
No caso corrente, é inteiramente dislatado afirmar que a Lei de Enquadramento impeça esta avocação. Nada disso: é uma questão de lê-lo e não gastaria sequer um minuto com isso. As observações feitas em sentido contrário são inteiramente descabidas e, do ponto de vista político, cremos que se justifica plenamente esta avocação, pela razão simples de que não deve haver o mínimo receio de trazer ao Plenário, nesta sede, todo o debate que ontem travamos na Comissão Parlamentar de Economia, Finanças e Plano assumindo cada partido, à luz do dia, perante os portugueses e Regiões Autónomas, todas as responsabilidades decorrentes das suas posições de voto.
Vamos a isso e, nesse sentido, votámos favoravelmente o instrumento que permite esse debate necessário.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para conhecimento da Câmara, vai ser lida a proposta de aditamento de um artigo novo à Proposta de Lei nº 87/III, apresentada pelo Partido Comunista Português.

Foi lida. É a seguinte:

Proposta de aditamento à proposta de lei nº 87/III

De acordo com o disposto no artigo 22.º da Lei nº 40/83, de 13 de Dezembro (Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado), «os titulares de cargos políticos respondem política, civil e criminalmente pelos actos e omissões que pratiquem no âmbito do exercício das suas funções de execução orçamental, nos temos da legislação aplicável».
Ora ao contrário do que sucede quanto à possibilidade constitucional de a Assembleia da República determinar a «demissão automática» de ministros e subsequente inibição de exercício de funções governamentais (como propõe o PSD em aditamento à Proposta de Lei nº 87/III formulado em 26 de Outubro), nenhuma dúvida existe quanto à plena competência constitucional da Assembleia da República para adoptar providências úteis com vista à efectivação das responsabilidades que a lei prevê para os que violem as leis orçamentais.
Nestes termos, apresenta-se a seguinte proposta de aditamento de um

ARTIGO NOVO

O Ministro das Finanças e do Plano tomará as providências necessárias para que até 31 de Novembro seja remetida à Assembleia da República e à Procuradoria Geral da República, designadamente para os efeitos da Lei n.º 266, de 27 de Julho de 1914, informação circunstanciada e devidamente documentada sobre os Ministérios e demais departamentos e organismos do Estado em que a execução orçamental tenha excedido o limite máximo das dotações legalmente autorizadas.

Assembleia da República, 31 de Outubro de 1984 - Os Deputados do PCP: José Magalhães - Octávio Teixeira - José Manuel Mendes - Ilda Figueiredo.

Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, para fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, é uma interpelação à Mesa meramente para corrigir um lapso que consta do texto que foi distribuído e, que V. Ex.ª leu.
Onde se lê que o Governo ou o Ministro das Finanças deverá enviar a relação que referiu, para os devidos efeitos, «à Procuradoria-Geral da República e à Assembleia da República até 31 de Novembro», deve ler-se «até 30 de Novembro», isto por razões óbvias do calendário ...
Por este efeito e através desta forma corrijo, esse lapso que consta da nossa proposta.

0 Sr. Presidente: - Vou proceder à correcção e ficará, então, 30 de Novembro.

Pausa.

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Aquela proposta, cuja avocação fora pedida, diz o seguinte:

Proposta de lei nº 87/III

Proposta

0 Governo transferirá para o Orçamento da Região Autónoma da Madeira a verba de
1 milhão de contos para suporte dos custos das desigualdades derivadas da insularidade relativos ao ano em curso, de acordo com o que dispõe o artigo 51.º do Decreto-Lei nº 318-D/76, de 30 de Abril.
Palácio de S. Bento, 25 de Outubro de 1984. - Os Deputados do PSD eleitos pelo
Circulo da Madeira: Correia de Jesus - Virgílio Pereira - Cecília Pita Catarino - Francisco Jardim Ramos.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

0 Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, nos termos regimentais, requeiro a V. Ex.ª a interrupção dos trabalhos por 30 minutos.

0 Sr. Presidente: - 0 requerimento é regimental, pelo que suspendo a sessão por 30 minutos.

Eram 15 horas.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 40 minutos.

0 Sr. Presidente: - Para criarmos a metodologia conveniente ao desenvolvimento dos trabalhos, pergunto aos Srs. Presidentes dos grupos e agrupamentos
parlamentares se estão de acordo com a metodologia que vou indicar: primeiro, discutir-se-ia a proposta de resolução, em seguida as propostas que foram apresentadas na Mesa, depois o artigo 2.º da proposta de lei, relativo a empréstimos, e, posteriormente, o artigo 1.º da proposta de lei. Por fim, procederíamos à votação final global da Proposta de Lei nº 87/III.
Se não houver objecções, vamos proceder à discussão da proposta de resolução, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

Tendo em consideração o disposto no artigo 24.º da Lei nº 40/83, Lei do Enquadra
mento Orçamental, em que se dispõe o dever de integração gradual dos diversos fundos e serviços autónomos no Orçamento do Estado, a Comissão de Economia, Finanças e Plano recomenda ao Plenário da Assembleia da República a aprovação da seguinte resolução:
Deve o Orçamento do Estado para 1985 integrar no seu âmbito e estrutura todos os fundos e serviços autónomos cuja receita sejam essencialmente de natureza fiscal e parafiscal, nomeadamente Fundo de Desemprego, Instituto de Emprego e Formação Profissional, Fundo Especial dos Transportes Terrestres.

0 Sr. Presidente: - Como ninguém deseja intervir, vamos proceder à sua votação.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

0 Sr. Presidente: - Está, pois, em discussão a proposta apresentada pelo PSD, cujo primeiro subscritor é o Sr. Deputado Correia de Jesus.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota para uma interpelação à Mesa.

0 Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Salvo erro, esta proposta corresponde exactamente à proposta derrotada em Comissão de Economia, Finanças e Plano, cuja avocação também foi recusada há pouco pelo Plenário.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Não foi recusada!

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, presumo que há um equívoco da sua parte.

0 Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Muito obrigado, Sr. Presidente!

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

0 Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, eu iria pedir a interrupção dos trabalhos mas, se a Mesa fosse condescendente e esperasse 1 minuto, eu tentaria que os deputados da Madeira regressassem ao Plenário.

0 Sr. Presidente: - Sem dúvida que sim, Sr. Deputado António Capucho. Vamos aguardar 1 minuto, que é bem preferível do que interromper os trabalhos, na medida em que quebramos o ritmo. Temos necessidade de acabar esta discussão com uma certa brevidade, de modo que todos os Srs. Deputados possam ir gozar as férias prometidas.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Correia de Jesus para uma intervenção.

0 Sr. Correia de Jesus (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Consideramos de uma importância fundamental que esta matéria tenha sido avocada pelo Plenário, na sequência de um requerimento subscrito por deputados da minha bancada.
É que ontem, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, desenrolou-se um processo de discriminação das regiões autónomas entre si cujas consequências têm de ser publicamente assumidas perante o povo português e, em especial, perante o povo da Região Autónoma da Madeira.
Não negamos o direito de cada partido e de cada Sr. Deputado votar no sentido que entender, mas o que não podemos permitir é que os partidos e os deputados não assumam, ou não queiram assumir, as consequências políticas e sociais dos seus actos.
Srs. Deputados, o incrível aconteceu ontem na Comissão de Economia, Finanças e Plano. Duas propostas iguais, vindas, uma da Madeira, outra dos Açores, receberam tratamento diverso.

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A proposta apresentada pelos deputados sociais democratas eleitos pelo círculo dos Açores, no sentido de ser inscrita neste Orçamento suplementar uma verba de 1 500 000 contos para suporte dos custos de insularidade foi aprovada, contando com os votos favoráveis e decisivos do Partido Socialista.
A proposta apresentada pelos deputados sociais democratas eleitos pelo círculo da Madeira, no sentido de ser destinada a esta região, para o mesmo fim, uma verba de 1 milhão de contos, foi recusada, com os votos contra, também aqui decisivos, do Partido Socialista.
Temos assim que, para as regiões autónomas, foram usados dois pesos, duas medidas. Foram discriminadas entre si, isto é, para os Açores, 1 500 000 contos, para a Madeira, zero.
Quais as razões invocadas pelos partidos que votaram contra a proposta da Madeira? Inoportunidade quanto ao momento de apresentação da mesma, falta de fundamentação e a situação financeira da Região Autónoma da Madeira.
Como se vê, Srs. Deputados, meras desculpas. Nada de consistente, nada de determinante, nada de procedente.
A proposta foi apresentada atempadamente nos termos regimentais, foi discutida, e se os Srs. Membros da Comissão não levaram mais longe a sua análise foi porque não quiseram. Em termos de fundamentação, era a mesma que a proposta dos Açores, com a única diferença do preceito legal invocado, já que cada uma das regiões tem estatuto próprio.
Quanto à situação financeira da Região Autónoma da Madeira, trata se de mera confusão, já que o dever de comparticipação financeira do Estado naqueles custos existe, independentemente do que for em cada momento aquela situação financeira.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mas se as razões invocadas nada justificam, como explicar então que a situações idênticas tenha sido dado tratamento diverso? Esta é uma pergunta pertinente.
A explicação cabe, naturalmente, aos partidos que votaram contra. Mas à evidência da fraqueza dos argumentos avançados - à laia de desculpas por terem votado contra - tem de procurar-se a explicação política do que se está a passar. E se as explicações não forem convincentes, então temos de perguntar ao CDS se, com este voto, não terá querido vingar o seu desaire eleitoral nas últimas eleições regionais na Região Autónoma da Madeira.

O Sr. Anacoreta Correia (CDS): - Não é nada disso!

Aplausos do PSD.

O Orador: - E temos de perguntar ao Partido Socialista se ao votar desta maneira não estará mais preocupado com a estratégia presidencial do seu partido do que com as necessidade financeiras, imperiosas e urgentes da Região Autónoma da Madeira.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Os Srs. Deputados são livres de se expressarem, e eu sou livre de me exprimir.
É que, Sr. Presidente, Srs. Deputados, num e noutro caso os partidos que votaram contra terão escolhido uma vítima inocente, que é o povo da Região Autónoma da Madeira.
Nunca, depois do 25 de Abril, tinha sido praticado em Portugal, e neste caso com a agravante de o ter sido por um órgão de soberania, um atentado tão grave contra a unidade do Estado. A discriminação entre as duas regiões autónomas, sobretudo em matéria tão essencial, tem de considerar-se uma provo cação separatista. Mas a votação ocorrida na comissão são denuncia ainda uma escandalosa e inadmissível discriminação entre os povos dos Açores e da Madeira, que não pode deixar de considerar se violadora do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição Finalmente, ao recusar a proposta por nós apresentada, a Lei de Alterações ao Orçamento de 1984 viola também o princípio da cooperação entre os órgãos de soberania e os órgãos de governo próprio.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não cremos que, depois desta reflexão, os partidos que votaram contra a nossa proposta persistam no seu voto. Não cremos que persistam no separatismo, na discriminação, na falta de solidariedade para com o povo da Madeira Temos a certeza de que as razões de Estado, em especial a preservação da unidade do Estado, prevalecerão sobre quaisquer outras razões.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota para um protesto.

O Sr. Magalhães lota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que, para além de um protesto, cumpre também à Assembleia da República lamentar a intervenção que acaba de ouvir.

Vozes do CDS: - Muito bem!

Aplausos da ASDI, do PS, do CDS e da UEDS.

O Sr.ª Magalhães Mota (ASDI): - E lamentá-la duplamente porque a Assembleia da República não pode consentir que um dos seus membros ponha em dúvida que qualquer deputado seja capaz de assumir, aqui ou em qualquer lugar, as votações que uma comissão fez, porque a Assembleia da República não pode tolerar a acusação de discriminação entre as regiões autónomas ...

O Sr.ª Luís Saias (PS): - Muito bem!

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - ..., porque a Assembleia da República não pode tolerar a acusação de incentivar o separatismo ...

O Sr. Luís Saias (PS): - Muito bem!

O Sr.ª Magalhães Mota (ASDI): - ..., porque a Assembleia da República não pode tolerar, finalmente, que a verdade dos factos, o ocorrido no debate de uma comissão, seja deturpado grosseiramente.

Vozes do PS: - Muito bem!

Aplausos da ASDI, do PS e da UEDS.

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O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - As afirmações do Sr. Deputado Correia de Jesus não resistem minimamente ao confronto com o registo da acta das várias sessões em que a Comissão de Economia, Finanças e Plano abordou este problema.
O Sr. Deputado Correia de Jesus se quiser rever essas actas chegará rapidamente à conclusão de que nenhum dos argumentos que invocou é autêntico. Na Comissão, bem pelo contrário, se verificou - e essas razões determinaram o voto da Comissão - que a proposta apresentada pela Região Autónoma da Madeira foi apresentada fora de tempo e sem fundamentação. No debate nenhuma fundamentação lhe foi introduzida e, pelo contrário, tentaram se invocar artifícios, no sentido de conseguir uma igualdade de propostas entre duas regiões, que a própria geografia tornou diferentes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, quando se procura, ainda por cima, escamotear que estamos perante uma proposta de alteração do Orçamento do Estado e que a proposta inicial alterada, essa sim, introduziu uma manifestação de injustiça para com a Região Autónoma dos Açores, que apenas essa foi corrigida pela votação da Comissão de Economia, Finanças e Plano, creio que estamos perante algo que não pode deixar de merecer um protesto indignado.

Aplausos da ASDI, do PS, do CDS e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes

0 Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Correia de Jesus fez uma intervenção sobre um facto passado nesta Assembleia, na Comissão de Economia, Finanças e Plano Nada haveria a objectar, na medida em que corresponde ao seu ponto de vista, se nessa intervenção não se dissesse que uma posição tomada aqui na Assembleia da República, relativamente a um pedido de verba para a Região Autónoma da Madeira significa uma provocação separatista e uma ofensa à unidade do Estado. É, pois, em relação a estes 2 pontos que se dirige o meu protesto.
Na Comissão de Economia, Finanças e Plano esta matéria foi tratada na base de critérios exclusivamente te económicos. Não houve, nem poderia haver, a preocupação de estabelecer discriminações ou de recusar o que quer que fosse por razões que não fossem de ordem exclusivamente económica.
Desejaria lembrar que o Orçamento do Estado tem, de uma forma compreensiva, suportado os défices brutais das gestões, o que é mau, e os custos das insularidades, o que é correcto.
Desejaria ainda lembrar que não existe na Madeira um estatuto autonómico, mas desejaria lembrar também - e é esta a razão fundamental do meu protesto - que os deputados à Assembleia da República se movem por razões - desculpem o pleonasmo - racionais e não por apelos emocionais e deixariam de ser deputados se, pior do que por apelos emocionais, se movessem por ameaças de extorsão ou de chantagem.

Aplausos do PS, da UEDS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Também para formular um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS protesta vivamente contra o teor da intervenção do Sr. Deputado Correia de Jesus.

O Sr. César oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Com efeito, penso que o Sr. Deputado podia ter trazido a esta Assembleia, ou podiam estar no seu espírito, várias intenções, mas certamente não esteve a de defender a Madeira e os interesses da sua população
Se foi o início de uma campanha presidencial, que mau início V. Ex.ª escolheu ...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... , quer no tema, quer no momento!
Se outras razões V. Ex.ª aqui pode aduzir, essas não têm qualquer princípio nem qualquer justificação.
Por outro lado, não podemos deixar de sublinhar o tom de ameaça com que V. Ex.ª iniciou as suas palavras. Esperamos, sinceramente, que não seja um afloramento subconsciente da mudança de sistema que alguns seus correligionários andam a apregoar.

Aplausos do CDS, do PS e da UEDS.

0 Orador: - Quanto ao que está em causa - e a isso nos reportamos - V. Ex.ª sabe muito bem - e bastava consultar os seus colegas de bancada, deputados do PSD dos Açores, para o saber - que a situação dos Açores e da Madeira era completa e radicalmente diferente.
Em relação aos Açores - e isso foi dito com muita clareza -, tratava-se de remediar uma injustiça. Em relação à Madeira, esse problema não se colocava.
Não está em causa a questão dos custos de insularidade, e isso foi dito e repetido, e mau era que, se essa matéria estivesse em causa, V. Ex.ª só tivesse apresentado esta proposta depois de a proposta dos Açores ter sido aprovada.
Não quero qualificar esta sua atitude de oportunista, porque certamente o não foi, mas não há dúvida de que o que esteve na sua base não foi qualquer justificação minimamente plausível.
Finalmente, Sr. Deputado, a posição do CDS relativamente ao Orçamento pautou-se por uma linear coerência Votámos contra aquilo que entendemos ser um desregular das finanças públicas, um derrapar do seu controle - dissemo-lo repetidamente.
Em relação à Madeira, neste caso concreto, nenhumas razões poderiam inflectir o nosso voto, que foi um voto contra por razões de Estado, e bom é que V. Ex.ª as comece a perceber melhor e, numa altura tão difícil para o País, as sobreponha a interesses mesquinhos, cuja qualificação me abstenho aqui de avançar mais.

Aplausos do CDS, do PS, da UEDS e da ASDI.

0 Sr. Presidente: - Para formular um contra protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Correia de Jesus.

O Sr. Correia de Jesus (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, queria esclarecer a Câ-

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mara de que se porventura algum calor, algum entusiasmo, pus na minha intervenção, isso, suponho, não poderá ser entendido como ameaça nem como qualquer forma de pressão sobre os colegas, mas deve-se apenas ao facto de este assunto, para nós, deputados pela Região Autónoma da Madeira, ser deveras importante e relativamente ao qual nós, efectivamente, sentimos que, em consciência e por dever de mandato, não podemos cruzar os braços. Portanto, se, das minhas palavras, houve a hipótese de se pensar outra coisa, peço que considerem que não houve outra intenção senão a de defender o interesse da Região Autónoma da Madeira.
Relativamente aos pedidos de esclarecimento e protestos que foram feitos, queria, muito rapidamente, dizer o seguinte: nós admitimos as diferenças entre as duas regiões autónomas aliás, elas têm estatuto próprio diferente , mas o que não podemos aceitar é que à Região Autónoma dos Açores seja atribuída determinada verba achamos bem que tenha sido atribuída, nunca discutimos isso e congratulamo-nos com o facto e que à Região Autónoma da Madeira não seja atribuída verba nenhuma.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - 15so não é verdade!

O Orador: - 15to é que é de facto uma posição verdadeiramente insustentável e relativamente à qual, por muito que os Srs. Deputados raciocinem, não
conseguem encontrar uma explicação, a não ser que queiram defender, como pareceu estar implícito no pensamento do Sr. Deputado Magalhães Mota, que, em relação à Região Autónoma da Madeira, não há custos de insularidade. Mas penso que essa tese os levaria, de facto, para domínios verdadeiramente insustentáveis.
Quanto ao Sr. Deputado José Luís Nunes, dir-lhe-ei que não é verdade que na Comissão os deputados nossos colegas se tenham guiado apenas por critérios exclusivamente económicos Fizeram se considerações da mais variada ordem nos debates em que eu tive oportunidade de participar e, portanto, a consideração política desta temática não me parece, de maneira nenhuma, impertinente.
O Sr. Deputado Basílio Horta fez uma série de considerações. Pois eu serei um mau advogado dos interesses da Madeira ...
Fala de início de campanha. Ora, eu não sou candidato a coisa nenhuma, portanto não percebo, efectivamente, o que é que V. Ex.ª quererá insinuar com este tipo de intervenções.
Além do mais, fala em ameaças e mudança de sistemas. Não vejo nada de antidemocrático nem de censurável na minha conduta como deputado e como político, de qualquer maneira estou à espera que me atirem a primeira pedra.
Finalmente, o Sr. Deputado faz também uma confusão - que eu pretendi eliminar através da minha intervenção - entre a temática dos custos da insularidade e a situação financeira de cada uma das regiões autónomas.
Gostaria que estes dois aspectos ficassem bem claros porque qualquer confusão a este respeito pode jogar - e no caso da Comissão efectivamente jogou - contra a Região Autónoma da Madeira.
São duas coisas completamente distintas. As obrigações do Estado em matéria de cobertura dos custos de insularidade existem em relação às duas regiões autónomas. 0 Estado tem essas obrigações, e se se tem que estabelecer proporções, que tal se faça, mas não se admita essa obrigação em relação a uma região e não se negue em relação à outra.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

0 Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado Correia de Jesus, V. Ex.ª habituou-nos sempre, nesta Câmara e também em comissões, a um tipo de linguagem bastante diferente daquela que adoptou neste momento.
V. Ex.ªfalou em separatismo. É exagerado. Julguei que essa palavra, Sr. Deputado, já estava afastada desta Câmara desde há muito. Tem reflexos extremamente negativos a V. Ex.ª sabe bem isso.
V. Ex.ª referiu também que o artigo 13.º da Constituição, que contempla o princípio da igualdade, foi violado. Pode ter razões para se mostrar profunda mente descontente, mas convém, Sr. Deputado, não exagerar. V. Ex.ª sabe que não é verdade. Todos somos iguais perante a lei e todos temos a mesma dignidade social.
0 Sr. Deputado Correia de Jesus poderá fazer o favor de nos responder a várias questões? A primeira é no sentido de saber por que razão os deputados da Madeira não apresentaram esta questão, como fizeram os deputados dos Açores, atempadamente, logo nas primeiras reuniões da Comissão de Economia, mesmo antes do debate na generalidade aqui ocorrido.
Por que razão, Sr. Deputado, não fundamentaram, VV. Ex.ªs, convenientemente, esta vossa proposta?
Como V. Ex.ª sabe, isto não é bem um jogo de futebol, ou seja, lá porque os Açores levam, a Madeira também tem de levar, e vice versa! A questão é muito mais séria.
Já agora, Sr. Deputado, não acha que os problemas da Madeira e dos Açores são bem diferentes, neste caso?
Os Açores, como sabe - e o Sr. Deputado Basílio Horta referiu-o -, receberam, em 1982 e 1983, verbas creio que de 1 500 000 contos, integrados nos chamados custos de insularidade. Em 1984 viram essas verbas diminuídas para cerca de 600 000 contos Fez-se, de certo modo, uma justiça aos Açores.
Aliás, Sr. Deputado, não acha que a diferença entre os Açores e a Madeira é realmente substancial, mesmo nos níveis de endividamento desta última, fortemente preocupantes, como ficou perfeitamente demonstrado durante a audiência do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e que não têm nada a ver com os custos de insularidade?
Já agora, Sr. Deputado, mais uma última pergunta: qual o critério adoptado por VV. Ex.ªs para pedirem 1 milhão de contos? Porque não 2 milhões? Porque não 500 000 contos? Qual o critério adoptado? Terá de haver uma fundamentação para este pedido!
Perguntava ainda, Sr. Deputado, se VV. Ex.ªs têm na Madeira um bom estudo, um bom levantamento dos custos da insularidade Seria útil saber-se esse estudo para bom esclarecimento da Câmara.

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0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Correia de Jesus.

0 Sr. Correia de Jesus (PSD): - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, muito obrigado pela sua intervenção. Infelizmente a minha bancada luta com falta de tempo, portanto terei de ser telegráfico.
Nós apresentámos a proposta quando achámos oportuno fazê-lo. Apresentámo-la atempadamente, nos termos do Regimento, portanto, por aí, penso que não merecemos censura.
Além disso, o argumento que desenvolveu há pouco joga a favor da Região Autónoma da Madeira. Se os Açores já receberam 4 500 000 contos em custos de insularidade e se a Madeira, até este momento, ainda não recebeu um tostão, como é que o Sr. Deputado vem dizer que isso joga a favor dos Açores e contra a Madeira? É isto que eu não percebo.
Finalmente, quanto ao critério segundo o qual apresentamos 1 milhão de contos, a pergunta é também pertinente em relação aos Açores: porque é que apresentaram l,5 milhões de contos? E será sempre pertinente enquanto esta Assembleia, apesar de já ter tido aqui uma proposta de lei no sentido de definir os critérios de determinação dos custos de insularidade, não aprovar a respectiva lei. 15so está nas nossas mãos e não nos estudos do Governo Regional ou de qualquer outra entidade.

Aplausos do PSD

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

0 Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Consideramos importante, útil e necessário este debate, por isso mesmo, aliás, votámos favoravelmente o pedido de avocação da votação deste artigo.
Na verdade, a situação suscitada merece a atenção da Câmara. A República tem, sem dúvida, deveres para com as regiões autónomas; as regiões autónomas têm direitos que não são contestáveis; os custos da insularidade devem ser suportados nos termos constitucionais e legais. 15to não é iludível.
É péssimo - em nosso entender não é apenas mau, é péssimo - que não se encontrem rigorosamente estabelecidos os contornos de autonomia financeira, os direitos e os deveres nesta matéria, aquilo com que, antecipadamente e de forma certa, as regiões autónomas podem contar, aquilo que a República obrigatoriamente deve desembolsar de acordo com regras de todos conhecidas, que a todos permitam saber, de antemão, o que deverão fazer com os recursos que são disponíveis e escassos são, todos o sabemos.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Tem faltado vontade política no sentido da definição desse regime. Não é possível encontrar outra explicação para o facto de estarmos hoje aqui, a debater, nestes termos, o que a debater estamos.
Em todo o caso, este debate terá porventura, a utilidade de impulsionar agora, finalmente, aquilo que tem faltado, isto é, essa definição legal clara que supõe um esforço, quer da parte das regiões autónomas, quer dos órgãos de soberania.
Falta fazer esse esforço. Sem ele, os problemas como o que hoje aqui debatemos subsistirão.
Consideramos este episódio lamentável, fruto dessa situação de indefinição.
Também consideramos, num segundo plano, que não deve haver lugar à instrumentalização da bandeira autonómica, que é constitucional e respeitável, para quaisquer estratégias partidárias ou mesmo de poder pessoal das quais obviamente, nos dissociamos e que condenamos firmemente, como não cabe, por outro lado, o apelo exaltado à soberania nacional, face àquilo que é, em nosso entender, apenas um conflito normal entre os órgãos de Governo próprios das regiões autónomas e os órgãos de soberania que preparados devem estar para os assumir e os debater com a serenidade necessária, uma vez que o quadro constitucional nos faculta a todos as respostas que não deixaremos certamente de dar.
No caso concreto - e nisso se filia a nossa posição -, a proposta que nos apareceu da Região Autónoma da Madeira é súbita, e ninguém o pode negar. Dir-se-á que aquilo que se descobre a tempo, a tempo deve ser solucionado, e que tal terá acontecido. Permitimo-nos pôr dúvidas que tal tenha sucedido neste caso concreto e, de qualquer forma, não aconteceu o que devia ter acontecido, o que é injustificável.
Deveria ter acontecido, Srs. Deputados, a fundamentação em termos cabais.
Também não ouvimos, lamentavelmente, da parte do Governo, uma resposta rigorosa a que a Câmara tinha direito nesta matéria, e não perdemos a esperança de a ouvir ainda. Quando se diz que a situação da Região Autónoma da Madeira é totalmente diferente daquela que se verifica na Região Autónoma dos Açores, que há disparidades - e ouvimos isto em termos até um pouco estranhos da boca de um deputado da Região Autónoma da Madeira -, é preciso, seria útil e desejável que isto fosse concretizado, se possível com dados quantitativos. Seria bom que a Câmara soubesse quais os montantes exactos das transferências, já não digo nos outros anos mas neste, para as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, nas várias rubricas e aos vários títulos em que estas podem ter lugar: as transferências para cobertura do défice, para custos de insularidade, os encargos com os serviços da região directamente a cargo da Administração Central e já regionalizados, as transferências de receitas fiscais, as transferências para os municípios insulares, as transferências de Segurança Social, as indemnizações compensatórias, as transferências a título de um fundo de abastecimento e tal vez ainda não menos importantes, certas operações de tesouraria cujos contornos são muito mal conhecidos e, naturalmente, o regime e as movimentações em matéria de empréstimos concedidos às duas regiões.
Este quadro rigoroso, detalhado, completo, permitiria evitar discussões um pouco apaixonadas mas inteiramente atabalhoadas e infundamentadas como aquela a que, de certo modo, temos vindo a assistir, com algum constrangimento.
Creio que é dever do Governo traçar perante a Assembleia da República - e neste momento, creio - esse quadro rigoroso, afastando alguns equívocos. Discutamos os custos da insularidade, mas sem equívocos e sabendo exactamente que recursos é que as regiões autónomas receberam, como é seu direito, e qual

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a situação que enfrentam neste momento. É problema delas e nosso. É problema de todos. Há aí uma questão de solidariedade nacional a resolver.
O Grupo Parlamentar do PCP manterá, na votação em Plenário, exactamente o mesmo sentido de voto que adoptou na Comissão. Nem poderia ser de outra forma. Mas ao votarmos exactamente no mesmo sentido com que o fizemos na Comissão, não podemos deixar de repetir aqui o voto que lá formulámos. Esse voto é o de que se chegue - porque entendemos que é chegado o momento -, finalmente, a um exame aprofundado da situação financeira das regiões autónomas e se defina finalmente um regime legal que, de forma clara, rigorosa, equânime, permita que não se repitam mais, no Plenário ou em qualquer comissão da Assembleia da República, episódios lamentáveis como aqueles que, constrangidamente, hoje fomos forçados a viver.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Vamos, pois, votar a proposta de resolução.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do CDS, da UEDS e da ASDI, votos a favor do PSD e do Sr. Deputado Mota Torres (PS) e as abstenções do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.

O Sr. Almerindo Marques (PS): - O PS votou contra a proposta nos mesmos termos e pelas mesmas razões por que tinha votado contra uma proposta idêntica na Comissão de Economia, Finanças e Plano.
O PS partilha de algumas considerações que aqui foram feitas hoje. Poderia aduzir outras, mas este não me parece o momento azado e, assim, apenas pedia ao Sr. Deputado que reintroduziu esta proposta que levasse em linha de conta o meu protesto pessoal.
Eu julgava que o Sr. Deputado, na resposta aos protestos feitos por outros Srs. Deputados, iria aclarar um pouco mais o comportamento dos deputados da sua bancada na Comissão de Economia, Finanças e Plano, pois o Sr. Deputado conhecia a fundamentação que aduzi antes e depois da votação na Comissão e sabia também que os deputados que aí votaram contra esta proposta naturalmente que votariam nos mesmos termos aqui no Plenário.

Aplausos de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Correia de Jesus, também para uma declaração de voto.

O Sr. Correia de Jesus (PSD): - Em primeiro lugar, depois do resultado desta votação, penso que a Câmara compreenderá que os deputados eleitos pela Região Autónoma da Madeira votem contra as alterações ao Orçamento do Estado para 1984 na votação final global.
Em segundo lugar, quero referir que a discriminação que esta lei faz entre as duas regiões autónomas e a denegação de comparticipação financeira para cobrir os custos de insularidade da Região Autónoma da Madeira, bem como a afectação do princípio da unidade do Estado, permite lançar sobre ele um juízo de inconstitucionalidade que os deputados eleitos pela Região Autónoma da Madeira, de acordo com os mecanismos que a lei põe ao seu alcance, não deixarão de desencadear, se assim o entenderem.
Finalmente, quero declarar que os deputados sociais democratas eleitos pelo círculo da Madeira se consideram desvinculados desta maioria, pois não podemos continuar solidários com um partido que, sem qual quer razão plausível, recusou recursos financeiros essenciais ao povo da Região Autónoma da Madeira, povo a que nos orgulhamos de pertencer e que, sem perda de razão de Estado e dos interesses nacionais, aqui continuaremos a defender.

Aplausos de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - O CDS votou contra esta proposta apresentada pelo PSD por duas ordens de razões: em primeiro lugar, por uma razão de ordem genérica, que tem enformado a nossa posição em todo este debate parlamentar, ou seja, como já foi afirmado por várias vezes, votamos contra tudo aquilo que revele um aumento da despesa pública e, consequentemente, um resvalar da nossa situação económico financeira; em segundo lugar, e no que se refere a este caso concreto, votámos contra porque não foi dada nenhuma explicação minimamente convincente em relação a esta proposta.
Portanto, o CDS votou contra esta proposta em plena consciência, no exercício do que a Constituição lhe confere, e pensa que é muito mau presságio levantarem se problemas como o da unidade do Estado. Não há qualquer razão para se levantar aqui esse problema, não há nenhuma razão para isso, pois os problemas são equacionados, discutidos e votados nos termos constitucionais e o nosso voto responde à forma bastante incompleta - para não dizer inexistente - como a proposta foi apresentada no seio da Comissão.
No fundo, o nosso voto significa repudiar certos processos políticos que não dignificam este debate.

Aplausos de alguns deputados do CDS.

0 Sr. Presidente: - Igualmente para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na sequência desta votação, os habitantes da Região Autónoma da Madeira vão sofrer as consequências da maneira inadequada, imprópria, como foi conduzido todo o processo que culminou com a apresentação do texto que acaba de ser rejeitado.
Esse processo é em si mesmo lamentável e é expressão de uma forma de gestão que tem conduzido à dramática situação financeira que esta região autónoma vive e que é da responsabilidade daqueles que têm ocupados os seus órgãos de governo próprio, a começar, e sobretudo, pelo PSD.
Essa responsabilidade é grave e deve ser aqui pontuada, sublinhada e assumida, uma vez que a proposta, apresentada tardiamente como o foi, pode por isso mesmo propiciar equívocos como aqueles que aqui se geraram.

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O destino desta proposta foi a que foi, a nossa posição encontra-se suficientemente fundamentada e resta nos lamentar o adensar de equívocos sobre a autonomia regional, que nos parecem decorrer de algumas intervenções - designadamente da declaração de voto do Sr. Deputado Correia de Jesus -, o ressuscitar de algumas querelas que se julgavam ultrapassadas. E se nos é legítimo formular algum voto, ele é o de que se aprecie severamente e em profundidade a situação financeira das regiões autónomas e se definam com urgência os mecanismos legais necessários para enfrentar as dificuldades que existem, para clarificar o que deve ser clarificado.
A autonomia financeira não pode prestar se a operações de pressão política ou a apaixonadas declarações, como algumas que aqui ouvimos, ela é um imperativo constitucional e, como tal, deve ser acatado.
E se alguma lição se deve tirar deste debate, é a de que o Governo da República, ao silenciar os dados que lhe foram pedidos, contribuiu para o avolumar dos equívocos, contribuiu muito negativamente para que algumas questões que aqui foram colocadas indevidamente o pudessem ter sido e se prolonguem ainda neste momento.
Consideramos que apesar de o Governo não ter fornecido os dados pedidos, este fornecimento de elementos à Assembleia da República é imprescindível e inadiável e é com essa exigência que terminamos esta declaração de voto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Mota Torres (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Mota Torres (PS): - Sr. Presidente, francamente, hesito sobre qual a figura regimental que devo usar - talvez a de interpelação à Mesa - para manifestar a minha discordância em relação ao modo como foi apresentada a declaração de voto do Sr. Deputado Correia de Jesus.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, para esse efeito não tem razão de ser uma interpelação à Mesa.

0 Sr. Mota Torres (PS): - Então, Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª é portador desse direito, e com certeza que só V. Ex.ª poderá julgar se o seu uso neste momento é ou não legítimo ou se está a fazer dele um aproveitamento. 15so fica à consciência do Sr. Deputado
Tem V. Ex.ª a palavra.

0 Sr. Mota Torres (PS): - Sr. Presidente, talvez inadvertida e involuntariamente fui incluído pelo Sr. Deputado Correia de Jesus no grupo dos deputados da Madeira a que fez referência várias vezes na sua declaração de voto, na medida em que referiu várias vezes os deputados da Madeira sem especificar que falava apenas em nome dos deputados do PSD.
De facto, em consciência, não posso subscrever inteiramente a declaração de voto do Sr. Deputado Correia de Jesus, e, portanto, devo afirmá-lo perante esta Câmara. O facto de ter votado favoravelmente a proposta apresentada pelos Srs. Deputados do PSD eleitos pela Região Autónoma da Madeira tem a ver unicamente com aquilo que entendo ser uma forma de dignificar os regimes autonómicos, ou seja, proporcionando-lhes meios financeiros capazes para eles poderem exercer o seu mandato de corpo inteiro.

O Sr. Magalhães Mote (ASDI): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito deseja V. Ex.ª usar da palavra, Sr. Deputado?

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - É ainda para uma declaração de voto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Votámos contra a proposta apresentada nos precisos termos em que ontem votámos contra uma proposta de idêntico teor apresentada na Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Em primeiro lugar, votámos contra porque as questões colocadas nada têm a ver com a constitucionalidade, nada têm a ver com a unidade do Estado, e pena é que as questões de unidade e de solidariedade do Estado pareçam ser entendidas exclusivamente como forma de pressão sobre a Assembleia ou que se julgue que a solidariedade de Estado tem um único sentido e não um sentido conforme com essa mesma unidade, que é o da solidariedade se exercer nas dificuldades que recaem sobre todos e cada um dos portugueses.

Vozes da ASDI e do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que a proposta apresentada foi derrotada porque foi apresentada sem justificação, foi apresentada inopinadamente e dando pelo menos a aparência de pretender apenas um equilíbrio e uma pressão política face a outra região autónoma.
Mas, em meu entender, a proposta foi ainda derrotada porque nenhuma justificação nos foi apresentada para as despesas a realizar com este reforço orçamental e, face ao modo como a gestão financeira vem sendo exercida na Região Autónoma da Madeira, face à dimensão da dívida daquela região autónoma, temos fundadas e sérias dúvidas de que qualquer novo contributo viesse a ser utilizado com eficácia e no interesse autêntico das populações.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Sr. Correia de Jesus (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

0 Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Correia de Jesus (PSD): - Para exercer o direito de defesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª é portador desse direito e julgará em consciência do seu valor e do seu interesse.
Tem a palavra, Sr. Deputado Correia de Jesus.

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O Sr. Correia de Jesus (PSD): Sr. Presidente, penso que toda a Câmara ouviu o que o Sr.ª, Deputado Magalhães Mota acabou de afirmar e, de facto, as suas palavras contêm uma insinuação que considero a todos os títulos inadmissível e não posso deixar de protestar contra ela.
Apresentámos uma proposta para que a Região Autónoma da Madeira fosse dotada de determinada verba para ser utilizada no interesse do seu povo e de mais ninguém. As considerações do Sr. Deputado Magalhães Mota ficarão com ele, mas esta é a verdade e a transparência dos intuitos que presidiram à apresentação da nossa proposta e não admitem que alguém ponha em causa a lisura dos processos que utilizámos no exercício do nosso mandato!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais pedidos de palavra para declarações de voto, vamos passar à discussão da proposta de aditamento de um artigo novo, apresentada pelo PCP, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

ARTIGO NOVO

0 Ministro das Finanças e do Plano tomará as providências necessárias para que até 30 de Novembro seja remetida à Assembleia da República e à Procuradoria-Geral da República, designadamente para os efeitos da Lei n.º 266, de 27 de Julho de 1914, informação circunstanciada e devidamente documentada sobre os ministérios e demais departamentos e organismos do Estado em que a execução orçamental tenha excedido o limite máximo das dotações legalmente autorizadas.

0 Sr. Presidente: Está em discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso para uma intervenção.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): A minha intervenção tem como objectivo interpelar os proponentes da proposta agora em discussão no sentido de saber se estariam na disposição de mudar a data aqui fixada até 30 de Novembro para 30 de Janeiro de 1985.
As razões que me levam a fazer esta sugestão de alteração são simples. 0 orçamento refere-se ao ano de 1984, terminando portanto em 3l de Dezembro deste ano, e até lá poderão eventualmente ser excedidas as dotações nele consignadas; por outro lado, importa dar ao Sr. Ministro das Finanças e do Plano o tempo necessário para poder corresponder àquilo que dele é requerido nesta proposta de alteração à Lei do Orçamento.

O Sr. José Magalhães (PCP): Peço a palavra, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PCP): Sr. Presidente, oportunamente farei uma intervenção, mas neste mo mento gostaria de interpelar a Mesa a fim de obter a seguinte informação: há momentos o PSD retirou
a proposta que tinha apresentado em 26 de Outubro sobre esta matéria e percebi que oportunamente a substituiria por uma outra.

0 Sr. Presidente: Não foi com essa reserva, Sr. Deputado.

O Orador: - A proposta foi retirada em absoluto e não forneceram fundamentação?

0 Sr. Presidente: Assim foi, Sr. Deputado.

0 Orador: - Então, Sr. Presidente, peço a palavra para uma curta intervenção,

0 Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

0 Sr. José Magalhães (PCP): Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta do PCP visa uma resposta constitucional para um problema que o PSD suscitou, apontando para a sua resolução uma via que levantava objecções de constitucionalidade.
Como todos se lembram, o PSD propôs a demissão automática dos ministros cuja execução orçamental revelasse um excesso de 10 % em relação ao orçamentado e, por outro lado, previa uma inibição do exercício do cargo, por um período de 3 anos, para esses ministros.
Bom, a questão é que as objecções de constitucionalidade de que essa via proposta pelo PSD porventura suscitava não existem em relação a uma outra solução, que é a normal.
Como sabem, são responsáveis civil e penalmente os membros do Governo que não cumprirem a lei orçamental. 15so constitui um crime de responsabilidade, que pode ser efectivado através dos tribunais nos termos de legislação que é geralmente considerada em vigor e que, aliás, já foi invocada contra titulares de cargos políticos em circunstâncias diversas.
Creio que é esse o mecanismo que pode ser utilizado nesta circunstância e se alguém tem genuinamente o desiderato que se dizia subjacente à proposta do PSD, então, a solução é esta, sob pena de se duvidar seriamente e com todas as razões de que esse desiderato alguma vez tivesse existido.
Quando se aponta para um muro em que não há porta nenhuma, havendo ao lado uma porta verdadeira, quem se recusar a penetrar na porta verdadeira é dúbio que alguma vez tenha tido a intenção de se mexer do seu sítio e o seu desejo era porventura fumaça.
Não gostaríamos que esse equívoco se perpetuasse em torno desta proposta e por isso apresentamos uma proposta que é clarificadora e constitucional.

O Sr. Presidente: Não havendo mais pedidos de palavra...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, por lapso não respondi à questão que o Sr. Deputado Lopes Cardoso suscitou há pouco, e se V. Ex.ª me permitir gostaria de o fazer.

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O Sr. Presidente: Com certeza, Sr. Deputado. Faça favor.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não temos qualquer objecção a que a proposta seja alterada no sentido que foi apontado pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso, pois a nossa preocupação é que as violações da lei orçamental sejam sancionadas como a lei prevê e não fiquem no ar.

O Sr. Presidente: - Assim sendo, em função da referência feita pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso e em razão do que o Sr. Deputado José Magalhães acabou de referir, vou alterar a proposta em debate no sentido de que onde está «30 de Novembro» se passe a ler «3l de Janeiro de l985».

O Sr. Basílio Horta (CDS): Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Basílio Horta (CDS): Sr. Presidente, é apenas para solicitar uma interrupção dos nossos trabalhos por 10 minutos.

O Sr. Presidente: Sr. Deputado, o CDS já pediu uma interrupção dos trabalhos por meia hora, pelo que uma nova interrupção pedida pelo CDS não é possível.
De qualquer modo, vou consultar a Mesa.

Pausa.

Sr. Deputado Basílio Horta, se for absolutamente essencial essa interrupção, concedê-la-ei. Mas a Mesa entende que o prazo que temos para concluirmos os trabalhos é de tal modo imperativo que gostaríamos de apelar para a boa vontade do Sr. Deputado para não nos colocar na situação de ter de lhe conceder a interrupção por 10 minutos, que depois se podem arrastar.

O Sr. Basílio Horta (CDS): Sr. Presidente, o nosso pedido é absolutamente essencial, mas mais essencial ainda é o interesse que V. Ex.ª neste momento personifica e, portanto, retiramos o nosso pedido.

0 Sr. Presidente: Muito lhe agradeço Sr. Deputado.
Continua em discussão a proposta de aditamento de um artigo novo, apresentada pelo PCP.
Não havendo mais pedidos de palavra, vamos votar.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e da ASDI, votos a favor do PCP, do MDP/CDE e da UEDS e a abstenção do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Votámos contra esta proposta pelas seguintes razões: o PSD compreende as preocupações subjacentes à proposta agora rejeitada, aliás também presentes numa proposta apresentada por deputados da minha bancada e que posteriormente foi retirada face a dúvidas suscitadas quanto à sua constitucionalidade.

Contudo, não pensamos que a forma correcta de abordar estas questões seja através de iniciativas avulsas, mas antes mediante a revisão global da legislação que trata da matéria, designadamente da Lei de Enquadramento Orçamental.
Assim, se é certo que votámos contra a proposta do PCP, não deixaremos de tomar as iniciativas convenientes naquele sentido, em sede da Comissão de Economia, Finanças e Plano.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - O Grupo Parlamentar do Partido Socialista votou contra a proposta apresentada pelo PCP porque nesta discussão metafórica suscitada pelo Sr. Deputado José Magalhães entre as portas falsas e as portas verdadeiras entendemos que também esta instância seria uma porta falsa e que a porta verdadeira é uma revisão consistente, coerente e devidamente pensada da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado.
Com efeito, é nessa sede que questões desta natureza devem ser pensadas e sistematizadas e é nesse sentido que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista assume politicamente o compromisso de tomar, no âmbito da Comissão de Economia, Finanças e Plano, a iniciativa de um processo de revisão daquela lei Aí sim, e para os devidos efeitos, devem ser matura das as propostas mais adequadas, e não pela forma atrabiliária como se estava pretendendo que fosse feito através da proposta apresentada pelo PCP.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Olhe que não, olhe que foi na sequência da proposta do PSD.

O Sr. Presidente: igualmente para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta

O Sr. Basílio Horta (CDS): Sr. Presidente, Srs. Deputados, o nosso voto de abstenção justifica-se por uma simples razão: o CDS não quer camuflar o seu juízo condenatório do Governo no aspecto político, evidentemente sob formas mais ou menos inóquas e despidas de um significado prático evidente.
Consequentemente, entendemos que não é este o momento para discutir esta matéria, embora com preendamos as razões que lhe estão subjacentes E vamos mais longe: supomos mesmo que nem é a Lei do Enquadramento do Orçamento a sede própria para esta discussão A sede própria para a discussão destas matérias deverá ser aquela onde se discutem as responsabilidades políticas, civis e criminais dos titulares dos órgãos de soberania.
Logo, fazer esta discussão aqui é deslocado Daí a nossa abstenção

O Sr. Presidente: Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lamentamos que esta proposta tenha sido rejeitada e sublinhamos a espantosa celeridade com que o PSD passa da reclamação berrante da de-

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missão automática e da interdição profissional dos ministros relapsos e violadores da lei orçamental para a recusa de accionar o mais elementar dos mecanismos sancionadores de quem viole a lei orçamental, mecanismo que está previsto, basta tocar lhe, mas que não quiseram.
Sublinhamos também que, à confusão constitucio nal que grassa no seio do PSD e, pelos vistos, no seio do PS, se soma a confusão jurídica quanto a coisas
elementares. A Lei de Enquadramento já tem uma norma sobre o sancionamento dos membros do Governo que prevariquem, e a regulamentação dessa norma tem a sua sede própria ou no Código Penal, ou em outra legislação penal avulsa, ou na lei dos crimes de responsabilidade, mas é dúbio que a possa Ter na Lei de Enquadramento.
No entanto, tomamos nota do compromisso assumido pelo PSD e pelo PS, fazendo apenas votos para que ele não desapareça com a mesma rapidez com que desapareceu há 10 minutos a proposta que, firme e garbosamente, tinha sido apresentada pelo PSD

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: A proposta do PCP não era atrabiliária: visava accionar os mecanismos que repusessem a justiça, aí onde o Governo foi atrabiliário, onde o Governo violou a Lei do Orçamento, saindo daqui sem a justa punição ou, pelo menos, o caminho para a punição que era bem necessária e que esperamos ainda venha a ter lugar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): Sr. Presidente, Srs. Deputados: O nosso ponto de vista negativo em relação a esta proposta resultou do facto de considerarmos que a matéria está já contemplada na Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado a Lei n.º 40/83, de 13 de Dezembro - a qual dispõe, no seu artigo 18º, que as votações orçamentais constituem o limite máximo a utilizar na realização das despesas e que nenhuma despesa pode ser efectuada sem que, além de ser legal, se encontre suficientemente discriminada no Orçamento do Estado No artigo 22.º
estabelece ainda que os titulares dos cargos políticos respondem política, civil e criminalmente pelos actos e omissões que pratiquem no âmbito do exercício das
suas funções de execução orçamental.
Creio, portanto, que todas estas matérias estão contempladas o sentido do nosso voto contra tem, pois, o significado de expressar que, existindo disposições legais, cumpre accioná-las, em vez de encontrar formas de elas serem transferidas para outra sede, pois neste momento podem ser já activadas.

0 Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Não havendo mais declarações de voto, vamos entrar na discussão e votação do artigo nº 2 desta proposta de lei.
Entretanto, peço ao Sr. Ministro das Finanças ou ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento que nos esclareçam sobre se o montante que está fixado no artigo 2º
respeitante a «empréstimos» é de 220 milhões de contos ou de 269 milhões de contos.

O Sr. secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias): - Sr. Presidente, o montante correcto é de 269 milhões de contos.

O Sr. Presidente: Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.
Está então em discussão o artigo 2" da proposta de lei, que é do seguinte teor:

ARTIGO 2º

(Empréstimos)

Na sequência das alterações introduzidas pela presente lei, é fixado o limite de 269 milhões de contos para o montante de empréstimos, a prazo superior a 1 ano, referido no nº 1 do artigo 3º da Lei n.º 42/83, de 31 de Dezembro.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, gostaria de colocar à Câmara a seguinte questão: refere-se o limite de 269 milhões de contos, mas não se refere quem será o tomador do reforço que agora se propõe em matéria de empréstimos.
Julgo que será necessário fazer se uma referência a este ponto.
Por outro lado, gostaria de chamar a atenção para o facto de o limite de 269 milhões de contos, relacionado com os outros empréstimos possíveis que constam da Lei do Orçamento, não dar para cobrir o défice que neste momento existe, de acordo com os mapas que nos foram presentes Haverá alguma alteração a fazer e essa terá que ser feita pelo Governo ou pelos partidos da maioria.

O Sr. Presidente: - Não há mais inscrições?

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Então o Governo não responde?!

O Sr. Presidente: Não havendo mais pedidos de palavra, vamos votar.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado

O Sr. Basílio Horta (CDS ): - Sr. Presidente, gostaria de perguntar a V. Ex.ª se o Governo não tenciona responder a esta pergunta. É que nós gostaríamos de obter uma resposta...

O Sr. presidente: - Sr. Deputado, é evidente que não poderei responder pelo Governo

O Sr. João Amara (PCP): - Se o Governo precisa de tempo, nós podemos pedir, meia hora de interrupção!

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): Sr. Presidente, se há dúvidas por parte do Governo, posso fornecer uma fotocópia dos cálculos por mim feitos sobre este assunto. E mais: se for necessário, nós podemos pedir uma suspensão para que o Governo tenha tempo para se debruçar sobre esta questão.

O Sr.ª Lopes Cardoso (UEDS): Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. topes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, V. Ex.ª não se pode dar conta, mas eu daqui fiquei com a sensação, pela reacção dos membros do Governo, que se pretende responder.
Portanto, julgo que não devemos passar à votação antes de o Governo responder.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, como sabe, é preciso que o Governo peça ao Presidente desta Assembleia o tempo que julgar oportuno e conveniente para o estudo e análise que entender pertinente Nós é que não podemos tomar a iniciativa.
O Sr. Secretário de Estado necessita de tempo para estudar a questão?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: Sim, Sr. Presidente Julgo que 5 minutos serão suficientes.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Secretário de Estado.
Srs. Deputados, a sessão está suspensa por 5 minutos.

Eram 16 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: Srs. Deputados está reaberta a sessão.

Eram 17 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão o artigo 2.º, na redacção que já foi lida.
Tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): Sr. Presidente, de pois deste insólito intróito, gostaria de saber se o Governo já acabou de fazer as contas!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não serei eu quem lhe poderá responder, mas se o Sr. Secretário de Estado do Orçamento o quiser fazer, tem a palavra.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: Sr. Presidente, Srs. Deputados: O artigo 2.º está correcto: são os 269 milhões de contos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria apenas dizer à Câmara que o artigo 2", estava errado e continua errado.
No entanto, para que a questão possa ser ultrapassada, posso adiantar que o Governo vai apresentar um outro artigo para «meter» mais uma verba.

Vozes do PCP: - Esta é que é a verdade!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, a afirmação que acaba de ser feita pelo Governo, se não for contestada, é gravíssima, pois constitui a prova de como este Orçamento Suplementar está a ser elaborado e discutido Esta é, portanto, uma questão prévia que necessita de ser clarificada, até em benefício da consciência dos deputados que têm que votar este Orçamento.

Vozes do CDS e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: Sr. Presidente, Srs. Deputados Suponho que há aqui alguma confusão que importa, de facto, clarificar.
Quando o Governo pede autorização à Câmara para contrair empréstimos junto do Banco de Portugal, está a pedir dois tipos de empréstimos: um, para cobertura do défice orçamental - é o que consta do artigo 2º ; outro, para a realização de operações activas, de resto autorizadas já pela Assembleia através da Lei nº 42/83 que fixou, para tanto, um limite de 80 milhões de contos é que deve constar de um artigo 3º.
Insisto, portanto, que o montante indicado no artigo 2º está correcto e que nada há a alterar nesse particular.

Risos do PCP.

Vozes PS e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Não havendo mais inscrições, vamos votar este artigo 2.º , Srs. Deputados.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e do PSD, votos contra do PCP, do CDS e do MDP/CDE e a abstenção da UEDS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão e votação do artigo 1.º da proposta de lei, o qual vai ser lido.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, como tem sido norma desde logo na Comissão de Economia, Finanças e Plano, o último artigo a ser votado é o artigo 1.º

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Ora, não obstante o Sr. Presidente ter já anuncia do que estava em discussão o artigo 1º. queria saber se não teria chegado à Mesa uma proposta de um novo artigo no qual a Câmara autoriza o Governo a contrair novos empréstimos.

O Sr. Presidente: Sr. Deputado Octávio Teixeira, a Mesa não tem conhecimento de uma tal proposta, mas parece que, pelos gestos que estou a ver, ela vai ser apresentada. Ficamos, portanto, à espera.

Srs. Deputados, chegou agora à Mesa uma proposta de aditamento de um artigo 3º. subscrita pelos Srs. Deputados Almerindo Marques e Bento Gonçalves, do seguinte teor:

ARTIGO 3.º

Fica o Governo autorizado a contrair empréstimos internos, a prazo superior a um ano, a colocar junto do Banco de Portugal, até ao montante de 37 milhões de contos para a realização de operações de crédito activas de prazo superior a um ano.

Srs. Deputados, entretanto, encontrava-se também na Mesa, junto ao processo, uma proposta de aditamento de um artigo 3.º subscrita por deputados do PS e do PSD, a qual vai ser lida.

0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): Sr.ª Presidente, julgando eu que se trata da mesma proposta uma que se inicia desta forma: «1- 0 Estado, bem como os organismos ... » , devo esclarecer que essa proposta já está votada no seio da Comissão, pelo que apenas deverá ser votada no âmbito da votação final global.

0 Sr. Presidente: - Se bem entendi, Sr. Deputado, não há que pôr à votação esta proposta que acabei de referir, porque ela faz parte da votação final global, não é verdade?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): Exactamente, Sr. Presidente. Em termos de especialidade, já foi votada na Comissão, razão pela qual não há que fazê-lo agora, mas sim na votação final global.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.
O Sr. Deputado Basílio Horta pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Basílio Horta (CDS): Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Queria interpelar a Mesa em dois sentidos.
O primeiro era para referir aquilo que acabou de ser dito pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, ou seja, que esta proposta de aditamento de um artigo 3.º a que o Sr. Presidente se referiu já tinha sido votada em Comissão, pelo que só necessita de ser votada em sede de votação final global.
Em relação à outra proposta de aditamento de um artigo 3.º gostava de fazer a seguinte pergunta a um dos seus subscritores, concretamente ao Sr. Deputado Almerindo Marques: por que é que V. Ex.ª apresenta a proposta de aditamento de um artigo novo e não corrige o artigo 2º. Por que é que não soma 37 milhões de contos ao montante previsto no artigo 2.º?

O Sr. Presidente: Sr. Deputado Almerindo Marques, se deseja responder, tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Almerindo Marques (PS): Sr. Deputado, é muito simples a resposta: é que às vezes a lógica tem que ser sacrificada a outros valores.

Risos do PCP e do CDS.

0 Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que se a lógica pode ser sacrificada a outros valores, há um valor que não pode ser sacrificado à lógica nem a qualquer outra espécie de valores: o respeito que se deve a esta Câmara e aos deputados que a compõem.
Ora, uma proposta com a importância que tem a que foi subscrita pelo Sr. Deputado Almerindo Marques permite nos exigir que nos sejam dados os esclarecimentos mínimos sobre quais os motivos que fundamentam esta proposta É intolerável que se procure escamotear esses fundamentos, recorrendo se àquilo que assume a dimensão de um puro e simples trocadilho.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.

O Sr. Almerindo Marques (PS): Sr. Deputado Lopes Cardoso, começo por lhe dizer que não há da minha parte qualquer preocupação ou intenção de escamotear o que quer que seja a esta Câmara
O que havia, sim, era o entendimento, óbvio e lógico, de que esta matéria tinha já sido discutida em sede de especialidade e dai, ao apresentarmos agora esta proposta, pretendemos apenas ultrapassar uma questão de forma que tinha surgido na discussão que houve entre o Sr. Deputado do PCP e o Sr. Secretário de Estado do Orçamento. Mas, nada estava escamoteado! Basta que o Sr. Deputado Lopes Cardoso veja a votação que se realizou na Comissão, que discutiu e aprovou a proposta na especialidade, e basta que atente porque é que se justifica esta proposta Assim, a única coisa que me pode dizer é que estou a fazer uma redundância, mas nunca que estou a escamotear o que quer que seja a esta Câmara

Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso pede a palavra para que efeito?

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O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): Era para protestar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: Tem a palavra, Sr.Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): No fundo, era para protestar agradecendo ao Sr. Deputado Almerindo Marques o esclarecimento que acabou por dar a esta Câmara.
Trata se de uma pura e simples correcção de ordem formal, porque o artigo 2.º, tal como estava redigido, estava efectivamente mal.
0 Sr. Deputado, porém, acabou por o reconhecer e era isso que era importante.

O Sr. Presidente: Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, vamos proceder à votação desta proposta de aditamento de um artigo 3.º.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e do PSD, com votos contra do PCP, do CDS, e do MDP/CDE e com as abstenções da UEDS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): Sr. Presidente, Srs. Deputados: A apresentação e a votação deste artigo 3º vem mostrar que não foi atendida a sugestão que fiz há pouco de alteração do artigo 2.º no sentido de se indicar onde se iriam buscar esses 269 milhões de contos para os 37 milhões vão ao Banco de Portugal, mas quanto aos 269 milhões não sabemos onde é que os vão buscar. Mas, mais do que isso, este artigo 3.º demonstra bem a forma como esta revisão orçamental foi apresentada à Assembleia e a forma como ela tem sido tratada por parte do Governo, como tem sido feita em cima do joelho, tanto mais que por diversas oportunidades chamámos à atenção para esta diferença.
É para nós uma grande surpresa o silêncio que sobre a matéria manteve o Sr. Ministro das Finanças e do Plano, já que esta matéria é, indiscutível mente, de grande importâncias.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Carlos Brito (PCP): E é ele o responsável perante a Assembleia!

O Orador: - Exacto, além de ser o responsável político do seu Ministério perante a Assembleia da República.
Terminaria dizendo que há pouco chamei a atenção para uma diferença que existia e que existe - de 12,6 milhões de contos Agora solicitaram a autorização para mais 37 milhões de contos de mo do que o Governo fica com uma «almofada» de 25 milhões de contos.
É este o rigor deste governo!

Vozes do PCP: - É um escândalo!

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.

O Sr. Almerindo Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs., Deputados: 0 Grupo Parlamentar do PS não pode deixar de colher o ensinamento devido deste pequeno incidente, mas também não pode permitir que se diga que «se faz contas em cima do joelho».

Vozes do PCP: - E não houve?

0 Orador: 0 que acontece, de facto, é que há diferenças de critérios no apuramento final do número e essa é, apenas e tão só, a explicação razoável do ligeiro incidente ocorrido.

O Sr. Presidente: Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

0 Sr. Basílio Horta (CDS): Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: 0 Grupo Parlamentar do CDS votou contra esta proposta «redentora» ou pseudo-salvadora apresentada pelo Sr. Deputado Almerindo Marques, sem deixar de frisar que ela é bem demonstrativa da forma como este Orçamento foi elaborado.
Ou seja, num orçamento suplementar apresentado e discutido quase às portas de Novembro, as contas não vêm minimamente seguras, as reflexões feitas em conjunto pelo Partido Comunista e pelo secretário de Estado do Orçamento acabam por não dar resultado nenhum como ainda agora se viu e acaba-se por dizer que o artigo e o número que nele figuravam estava correcto, quando não estavam
Pergunto a V. Ex.ª, Sr. Presidente, e à Câmara, se não seria muito mais lógico, coerente e transparente que o Governo dissesse «o número não é este, é outro», e desse assim, ao menos, já que não sabe fazer contas, um exemplo de que sabe pelo menos fazer política.

Vozes do CDS: Muito bem!

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Queria começar por protestar contra a afirmação que acaba de ser feita de que « o Governo não sabe fazer contas».
As contas estão rigorosamente exactas e chamo à atenção do Sr. Deputado Basílio Horta para o facto de estarmos em presença de duas realidades diferentes: uma, a do défice orçamental, e o número proposto no artigo 2.º está correctamente indicado para a sua cobertura; mas, paralelamente, como o Sr. Deputado pode ler na proposta de revisão orçamental, há um pedido de autorização para fazer operações activas por parte do Governo e é para estas que se refere o artigo 3º
Salvo melhor opinião embora não o possa garantir, pois não tenho aqui o respectivo original , creio que na proposta inicialmente apresentada a esta Câmara estava lá o artigo 3.º com os 37 milhões de contos.
Infelizmente, porém, não a tenho aqui, mas julgo que foi por força da sequência dos trabalhos que a Câmara teve somente conhecimento das alterações re-

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lativas ao artigo 2.º , olvidando, em consequência, o referido artigo 3.º
Não o afirmo aqui seguramente, porque não tenho a proposta inicial, ...

O Sr. José Magalhães (PCP): Mas ela está aqui!

O Orador: -... mas muito provavelmente foi isso que terá acontecido.

O Sr. Presidente: Para contra protestar, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta, embora a figura regimental invocada não tenha a oportunidade devida
No entanto, uma vez que foi aberto o precedente, tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Formalmente pode não ser esta afigura regimental adequada, mas pretendia apenas perguntar o seguinte ao Sr. Secretário de Estado: se é assim como diz, porque é que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, logo de início, não apresentou um artigo 3º à Assembleia?

O Sr. Presidente: O Sr. Deputado Octávio Teixeira pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, pretendia fazer um protesto em relação às declarações do Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Presidente: Uma vez que foi aberto o precedente, tem V. Ex.ª palavra para protestar.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Gostaria de protestar porque, de facto, fica um excedente, em ter mos de capacidade de recurso e financiamento por parte do Governo de 25 milhões de contos números redondos, em relação àquilo que é previsto gastar pelo mesmo Governo e, designadamente, tendo em linha de conta o défice orçamental e a intenção de contrair empréstimos em operações activas no valor de 37 milhões de contos.
Por outro lado, queria chamar à atenção do Sr. Secretário de Estado e, nesse sentido, também protesto de que não existe na proposta de revisão do Orçamento nenhuma proposta relativa aos 37 milhões de contos O que existe é uma proposta no Orçamento inicial que permite ao Governo contrair empréstimos até ao montante de 80 milhões de contos.
Ora, do que se trata agora é apenas de arranjar a cobertura para a parte dos 80 milhões de contos de empréstimos que o Governo pretende contrair.

O Sr. Presidente: - Antes de prosseguirmos, gostaria que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento me prestasse um esclarecimento relativamente ao texto do artigo 1º da proposta.
Quando se lê, na parte final desse artigo, «constantes dos mapas I a IV» pretende-se dizer «I a IV» ou «I a V»?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Deve ser lido «I a V», Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.

Srs. Deputados, não havendo mais inscrições passo a colocar à apreciação e discussão o artigo 1.º da proposta sob a epígrafe «Aprovação das alterações ao Orçamento», cujo texto é o seguinte:

São aprovadas pela presente lei as alterações ao Orçamento do Estado para 1984, aprovado pela Lei nº 42/83, de 31 de Dezembro, constantes dos mapas I a V.

Está em discussão, Srs. Deputados.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda

O Sr. Joaquim Mirando (PCP): Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: As alterações ao Orçamento de Estado para l984 agora em fase de votações finais constituem mais uma prova e uma prova significativa da falência da política económica e financeira deste Governo, para além de serem uma demonstração indisfarçável da falta de rigor e de competência que o caracterizam, agora mais uma vez demonstrada com a determinação do montante dos empréstimos.
Como se não bastassem já os mais diversos indicadores que, de forma insofismável, retratam a degradação contínua e acelerada da situação económica, financeira e social em que o País está a ser mergulha do, temos agora também este conjunto de «buracos» orçamentais. Os quais, de resto, eram previsíveis, já que ninguém poderia esperar uma situação de normalidade no que respeita ao Orçamento, quando tudo o que o determina é anormal e extremamente gravoso.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A taxa média anual da inflação sobe para os 30 % - e não 24 %, como o Governo fixou; a quebra dos salários reais atinge 12,5 %; mais de 1 milhão de trabalhadores ou estão no desemprego, ou têm os salários em atraso ou laboram num regime de contratos a prazo. O consumo diminui aceleradamente te, os investimentos retraem se e a produção sofre mesmo uma quebra da ordem dos 2 %, contrariamente às previsões do Governo que apontavam para uma quebra de 1,4 %'
Ou seja: à degradação social, soma se a rotura económica e financeira.
Os fortes défices orçamentais surgem, assim, como inevitáveis.
Os membros do Governo que intervieram durante os debates, nomeadamente na discussão na generalidade, e à falta de argumentos, tentaram conduzi-los para o seguinte falso dilema: ou défice orçamental agravado ou venda de ouro
Desta forma, pretenderam escamotear a razão de fundo do agravamento do défice, ou seja, a degradação da situação económica, financeira e social do País; quiseram esconder o agravamento do défice, inicialmente previsto, de 28 milhões de contos; tentaram escamotear o défice real do Orçamento de Estado para 1984 que, como afirmámos logo no debate na generalidade, é bem superior aos 250 milhões de contos que constavam da nota justificativa da proposta do Governo e ascenderia aos 300 milhões de contos se o critério seguido fosse o do rigor e o da transparência orçamentais.

Aplausos do PCP.

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O Orador: É agora evidente a inconsistência da pretensa argumentação do Governo, quer quando tentou justificar o agravamento do défice pelo facto de «não ter sido necessário vender ouro», como afirmou, quer quando invocou o seu tardio conhecimento dessa desnecessidade.
Mesmo admitindo a hipótese de que tivesse sido vendido mais ouro durante o presente ano, a mais valia dessa venda nunca cobriria os 77 milhões de contos de agravamento do défice formalmente aprovados, nem sequer os 45 milhões do segundo agravamento proposto pelo Governo.
Quanto ao invocado conhecimento tardio da desnecessidade da venda de ouro, em face ao que tem vindo a público nos últimos dias segundo o que o FMI já estaria informado do facto, desde há algum tempo, ao Governo resta escolher entre estas duas hipóteses: ou mentiu a esta Assembleia e ao País; ou, então, é já o FMI a instituição que tutela o Banco de Portugal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: Mas, Srs. Deputados, para além desta manobra pouco clara o que ressalta, fundamental mente, é a situação grave em que o Governo tem vindo a colocar o sistema financeiro nacional. Esta é uma questão da responsabilidade do Governo, cuja resolução não se compadece com mais demoras!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Afirmámos durante o debate na generalidade, confirmámos e compro vamos durante o debate na especialidade e reafirma mos de novo, agora ainda com maior segurança, que o «buraco», já grande nas suas sucessivas versões, é na realidade bem maior.
O aumento do défice votado em Comissão, confirmou, embora parcialmente, a razão que sempre nos assistiu. E dizemos parcialmente porque nas alterações finais ao Orçamento foi confirmado o aumento do défice em mais 4,2 milhões de contos, quando, na verdade, as alterações reais são bem superiores às formalmente aprovadas. De facto, o défice orçamental para 1984 não se restringe aos formais 265,1 milhões de contos, mas atinge mais de 300 milhões de contos.
Não é difícil comprovar esta afirmação: o Estado deverá à Banca, no final de 1984, 68,3 milhões de contos, respeitantes a bonificações de juros. Esta dívida, segundo informações do próprio Governo, ascenderá a 100 milhões de contos no final de 1985. No entanto, após as alterações ao Orçamento, feitas em comissão, continua a não existir qualquer cobertura orçamental sequer para as dívidas respeitantes ao ano de 1984 e que são da ordem dos 27,7 milhões de contos, ainda segundo dados fornecidos pelo Governo.
Por seu lado, as verbas orçamentadas para fazer face aos juros com a dívida externa são insuficientes, não havendo dotação orçamental consignada para 482 900 contos. Como também seria necessário um reforço de 5 milhões de contos para fazer face ao reembolso da dívida externa.
Relativamente a alguns ministérios, as despesas inscritas provou se serem igualmente insuficientes: apesar do reforço de 7,5 milhões de contos para o Ministério da Saúde que embora seja conhecida a degradação dos serviços dependentes deste Ministério, foi o próprio Ministro Maldonado Gonelha quem confirmou que transitarão para 1985 - por não terem sido tidas agora em conta - 10,8 milhões de contos de dívidas, particularmente para com as farmácias e resultantes, nomeadamente da falta de controle sobre os preços de medicamentos e outros produtos, cuja subida é verdadeiramente escandalosa.

Vozes do PCP: - É um escândalo!

O Orador: Quanto ao Ministério da Educação existe igualmente uma diferença entre as dotações orçamentais previstas incluindo uma transferência futura da dotação provisional para o Ministério diferença essa que se cifra em 800 000 contos que o ministro afirmou serem indispensáveis. E não entra mos em linha de conta, por exemplo, com as dívidas que o Ministério do Equipamento Social terá para com os empreiteiros e que, no entendimento destes, serão bastante avultadas.
Ou seja: ao défice final aprovado mandava o rigor e a transparência que se somassem mais cerca de 40 milhões de contos. E daí que, ao défice formal de 265,1 milhões de contos, nós contrapomos um défice real agora mesmo comprovado com a votação do montante aos empreiteiros a contrair e superior a 300 milhões de contos.
Esta é a realidade dramática resultante da política desastrosa deste Governo
Realidade tanto mais grave quanto continua a ser escamoteada a situação financeira de muitos fundos e serviços Situação que esta Câmara não pode permitir que continue a verificar se no processo de discussão do Orçamento para 1985.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: Fizemos todos os esforços, nomeadamente com a apresentação de propostas, no sentido de adequar as alterações do Orçamento à realidade O Governo e a maioria, porém e sintomaticamente, impediram-no.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A gravidade das presentes alterações ao Orçamento não se resume, porém, ao forte aumento do défice e à forma atribulada que o determinou. Outras questões se colocam e merecem ser sublinhadas.
Desde logo, o facto de os aumentos de verbas orçamentadas se destinarem, em muitos casos, para despesas já comprometidas, o que limita o significado que estes debates deveriam assumir na Assembleia da República O reforço concedido ao Ministério do Equipamento Social é disso uma prova evidente, como o foi também a intervenção aqui feita pelo seu titular. Intervenção, aliás, que destoou da realidade que vimos analisando e que foi claramente indiciadora de campanhas eleitoralistas que se avizinham.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: De resto, se se quiser encontrar um destinatário certo para a proposta votada sobre a questão dos concursos públicos ele é, sem dúvida, o Ministério do Equipamento Social e os seus principais responsáveis.

Vozes do PCP: Muito bem!

O Orador: Também as, intervenções do Ministro da Educação, na Comissão ou ainda uma passagem

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do documento enviado à mesma Comissão e relacionado com o orçamento da Segurança Social, são igualmente elucidativas quanto a este aspecto.
Por outro lado, existem ministérios pasme-se, Srs. Deputados que têm o «seu» próprio orçamento distinto do aprovado por esta Câmara

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - É um escândalo!

0 Orador: Não conformado com aquilo que rotulam de imposição do Ministério das Finanças e do Plano, funcionam e despendem verbas como se nenhuma alteração tivesse ocorrido relativamente às propostas que formularam para o seu departamento governamental

Vozes do PCP: Muito bem!

O Orador: O caso já do domínio público do Ministério da Educação é, também neste campo, exemplar e escandaloso; chegando ao ponto de, perante a Comissão de Economia, e como fundamento do reforço de verba que lhe é destinado, invocar um «défice inicial»' Mais concretamente, pode ler-se no texto distribuído pelo Secretário de Estado do Ensino Básico o seguinte: « 2 Défice inicial face às exigências de plafond imposto pelo Ministério das Finanças e do Plano, 3 l50 000 contos.»
A impunidade, a ilegalidade e a falta de pudor é, no mínimo, o que se pode dizer deste tipo de comportamento.

Vozes do PCP: Muito bem!

O Orador: Mas, Srs. Deputados, estas alterações ao Orçamento, são ainda a prova da falta de rigor, da incompetência e da fuga à transparência por parte do Governo.
Os constantes aumentos do défice a que assistimos bem o demonstra. Como o demonstra igualmente o enorme fosse que separa o défice formal do défice real do Orçamento para l984.
Mas outras situações existem igualmente comprovativas das acusações que fazemos Um exemplo significativo: o da cobrança de impostos.
São indesmentíveis as profundas alterações, quer quantitativas quer qualitativas, que no decurso deste ano se verificaram nas receitas dos vários impostos Embora o montante global seja sensivelmente idêntico ao previsto, a verdade é que enquanto as receitas provenientes do imposto profissional aumentam cerca de 8 milhões de contos, o imposto de transacções diminui 6 milhões e o imposto de capitais reduz-se em 2 milhões de contos. Apresentámos uma proposta para corrigir o Orçamento e introduzir estas alterações relevantes. Porém, o Governo e a maioria impediram que tal se verificasse, tentando assim ocultar o profundo alcance político e social de tais alterações.
Aliás, as incidências negativas introduzidas no Orçamento, e com reflexos na vida dos trabalhadores e de outras camadas dependentes de rendimentos fixos, multiplicaram-se. Numa altura em que o desemprego alastra e os salários em atraso se multiplicam, este Governo impõe a redução da verba para subsídio de desemprego em mais de 2 milhões de contos.
E também no orçamento da Segurança Social, apesar do reforço de 16,5 milhões de contos transferidos do OE para fazer face à quebra de receitas provenientes das entidades patronais, as despesas orçamentadas para abonos e outros subsídios sofrem uma redução de mais de 1 milhão de contos; o que claramente se liga com o atraso na actualização de certos subsídios, como o abono de família
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Face a este panorama desastroso o voto do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português só pode ser, contra.
Ao votarmos contra estas alterações ao Orçamento dizemos não, antes de mais, à política económica, financeira e social que está na base deste descalabro orçamental.

Vozes do PCP: Muito bem!

O Orador: E é também por isso que continuamente afirmámos que a responsabilidade desta situação não pode ser individualizada neste ou naquele ministério, não pode ser personalizada neste ou naquele membro do Governo. Se é verdade que alguns ministérios e alguns ministros são merecedores de acusações específicas e graves, o certo é que é o Governo no seu conjunto e o primeiro-ministro e o vice-primeiro-ministro como seus principais responsáveis que devem ser responsabilizados pela deterioração da situação económica e financeira e pela degradação da situação social.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

0 Orador: Mais uma vez ficou provado que o Governo ao rigor opõe o descontrole total; à travagem de preços, a inflação crescente; ao desenvolvimento, a recessão; ao reequilíbrio, o descalabro financeiro.
Por isso, também mais uma vez afirmamos a necessidade urgente de ser demitido este Governo e ser banida esta política.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: Entretanto, inscreveram-se para intervir os Srs. Deputados Carlos Lage, José Vitorino e Bagão Félix
Assim, e segundo a ordem indicada, passo a dar a palavra ao Sr. Deputado Carlos Lage

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta revisão orçamental não se revestiu de carácter invulgar ou excepcional entre nós, embora tivesse mais colorido e mais alguns lances inesperados do que habitualmente.

Risos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Lá isso é verdade!

O Orador: - Infelizmente, todos os anos nos vemos na contingência de rever o Orçamento do Estado. Todos concordaremos na desejabilidade de abolir tal prática que, baldados todos os esforços em sentido contrário, tem vindo a banalizar-se.
Nestas circunstâncias, parece me evidente que não vale a pena exacerbar posições, aumentar o tom de voz das acusações e atirar pedras, visto que, de uma maneira ou de outra, ninguém está isento no funcionamento bastante irregular do sistema financeiro público.

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O Sr. José Magalhães (PCP): Ora essa!

O Orador: Mas esperamos também que estas situações se não repitam, visto que a disponibilidade e a receptividade do Grupo Parlamentar do Partido Socialista tem limites e pode esgotar-se.
Confesso também a minha decepção por esta revisão orçamental ter surgido mais ou menos no momento em que deveria ter entrado nesta Casa o Orçamento para l985.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - 15so é verdade.

O Orador: No entanto, as coisas são o que são. As dificuldades são grandes, os problemas enormes, derivados do funcionamento pouco racional de toda a nossa máquina financeira e de situações económicas, internas e externas, bem conhecidas que se reflectem automaticamente sobre as despesas e receitas públicas.

De facto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a redução dos impostos com a consequente diminuição de receitas, o aumentar das despesas públicas e o contrair do défice orçamental é, como todos sabem, uma equação impossível. Para se conseguir duas destas variáveis é preciso sacrificar uma terceira e a isto não há maneira de fugir como todos sabem nesta Casa.
Relativamente ao inesperado agravamento do défice, entre outras causas, permito-me assinalar o modo de funcionamento do aparelho burocrático do Estado, a sua pouca eficácia e a relativa indisciplina nos seus gastos.

O Sr. José Magalhães (PCP): Pois; o Governo é que é bom!

O Orador: É imprescindível, para combater as raízes do mal e convém insistir sempre nisto , uma urgente reforma de todo o aparelho do Estado que configure uma verdadeira reforma estruturar da vida portuguesa.

Vozes do PS: Muito bem!

O Orador: É essencial poupar nas despesas públicas, adoptando-se medidas, tais como: austeridade, moralização, supressão de gastos supérfluos, controle eficaz sobre admissões e reclassificações de funcionários públicos.
Não podem reproduzir-se e perpetuar se privilégios ou desigualdades de tratamento, nem verificar se discriminações entre os diversos departamentos do Estado, os quais nem sempre correspondem às prioridades nacionais; nem tão pouco admitir se privilégios excessivos em certas parcelas do território nacional.
No entanto, relativamente às despesas de capital as coisas são bem diferentes, Sr. Presidente e Srs. Deputados Parece me justo e necessário incrementá-las, a fim de garantir as bases de uma economia próspera e evitar o envelhecimento do aparelho produtivo nacional. Estas deveriam ser, porventura, mais significativas, para estimular a prostrada economia portuguesa, desde que seja determinado, com rigor, quais os sectores onde este tipo de despesas têm mais expressão e onde o efeito multiplicador é maior.

Como se sabe, a política económica do actual Governo - e convêm aqui sublinhá-lo mais uma vez por
que parece que anda esquecido de muitos Srs. Deputados, inclusive dos mais ardentes adversários do Governo - tem-se desenrolado sob o imperativo de combater o défice da balança de transacções. correntes que tinha atingido níveis insustentáveis. Parece que todos esquecem esta realidade, como se ela não contasse ma análise da vida política nacional e na análise da política económica e financeira do Governo.
Não se tem aqui sublinhado devidamente nem o Governo o tem feito, talvez por modéstia, o que lhe fica muito bem...

Risos.

... O êxito que representou a redução rápida do défice da balança de transacções correntes e a expansão bem significativa das nossas exportações, registando-se, como se sabe, uma substancial melhoria da cobertura das importações pelas exportações, tendo-se atingido já uma taxa de cobertura de 64%. 15to configura um êxito indiscutível não só do Governo, mas do País.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): Muito bem!

O Orador: Não ignoramos que aquele resultado foi acompanhado por uma recessão profunda, caracterizada por queda nos investimentos, aumento do desemprego e uma inflação pronunciada. Também aqui a reacção é superior à acção, verificando-se que o princípio do multiplicador funciona ao contrário.
Mas, atingida e até ultrapassada a prevista redução do défice externo, importa agora voltar à normalidade, isto é, ao empenho no desenvolvimento económico e no favorecer a justiça social, modernizando o tecido produtivo, fomentando a inovação tecnológica e a actualização cultural do País.

É, pois, urgente relançar a economia portuguesa com prudência e segurança, tomando-se, desde já, precauções para evitar o fatal stop and go. Parece me ser esse o consenso das bancadas da maioria e, mais do que isso, a vontade do País.
Para tal, é necessário incrementar o investimento produtivo, quer público, quer privado.
Com efeito, aquilo que deve absorver e dominar as nossas preocupações, deputados e governantes, não é obter equilíbrios económicos e financeiros numa economia estagnada, se é que aqueles seriam viáveis. A prioridade número um e verdadeiramente histórica da economia portuguesa é o desenvolvimento.
Desenvolvimento entendido num enquadramento internacional e, em particular, no quadro da irreversível e necessária integração na CEE. O desenvolvimento económico, o progresso social e cultural são as aspirações históricas da colectividade nacional, às quais ninguém pode renunciar e muito menos os partidos que apoiam este Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tendo baixado à Comissão de Economia, Finanças e Plano para debate e votação na especialidade, a proposta do Governo sofreu modificações, aperfeiçoamentos e precisões, que são já conhecidas.
Congratulamo-nos com o teor do debate na Comissão. As inovações introduzidas na mecânica do debate orçamental, não é demais realçá-lo, estão a revelar se fecundas, exigentes para com os executivos e com os próprios deputados que assim exercem melhor uma competência essencial do Parlamento a competên-

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cia para aprovar o Orçamento do Estado Os executivos devem ter em conta esta nova realidade - e este, naturalmente, também só tendo a lucrar com isso. Fica a advertência.
Porém, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não quero deixar de terminar esta intervenção sem ser voltado para o futuro, ultrapassada esta dificuldade do Governo que se traduziu no défice orçamental.
Julgo que a questão do défice orçamental não deve ser dramatizada. Insisto nesta questão: não me parece legítimo que se dramatize o défice do Orçamento do Estado, transformando a na questão maior da vida nacional ...

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Mas é uma das importantes, Sr. Deputado!

O Orador: ... enquistando-se à volta da mesma, quer os partidos, quer os analistas políticos e até a curiosidade pública com toda a irreverência e ironia que a caracteriza e que tem, naturalmente, encontra do nos «buracos orçamentais» um alimento interessante.

Seria lamentável que a política económica portuguesa, depois de ter girado em torno do défice da balança de transacções correntes o que era inevitável atendendo à sua enormidade passasse a ser gerida sob o signo da redução do défice orçamental, transformado em pura obsessão. Poderá originar duelos de inteligência, discussões académicas, mas o discurso será sempre vazio e por vezes assumirá, como por exemplo, no Sr. Deputado Bagão Félix um tom inimigo do Estado, até um tom anarquizante quando parece repudiar todos os impostos e, daí, todas as despesas públicas.

15so não significa que menospreze o défice orçamental. Muito ao contrário, exigimos rigor na execução orçamental e austeridade pública.

Vozes do PCP: - Viu-se, viu-se!

O Orador: Não pode deixar de se aplicar a norma de austeridade ao Estado, para se aplicar aos cidadãos. Quando não, teremos uma terrível dualidade moral e um Estado que será então objecto de todas as acusações e contestações.
O défice tem de ser controlado e há que evitar a sua derrapagem, como disse recentemente o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - É o que se vê!

O Orador: - No entanto, tenho para mim como norma de bom senso que o Orçamento do Estado deve ser subordinado aos objectivos da política económica fixados para o ano em que se aplica e não o contrário.
E é este chamamento que deixo ao Governo. Particularmente para com o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, visto que não está aqui o Sr. Ministro das Finanças e Plano. Insisto em que o Orçamento do Estado deve ser subordinado aos objectivos de política económica fixados para o ano em que se aplica e não o contrário.
A política orçamental não é um valor em si mesmo, muito embora tal política tenha que ter um tratamento próprio e autónomo.

O ano de 1985 tem que ser um ano de recuperação e relançamento económico, (Risos do PCP) não por voluntarismo e já agora para os que sorriem e também não por eleitoralismo.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Por eleitoralismo, sim!

O Orador: Não por eleitoralismo, Sr. Deputado Carlos Brito 15so seria um paradoxo Aliás, seria singular se agora que queremos desenvolver, passássemos a ser acusados de eleitoralistas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Não vão desenvolver nada! Parece um figura do Eça!

O Orador: O ano de 1985 terá, assim, que ser um ano de recuperação e relançamento da economia. Não por voluntarismo, mas porque o nível de vida da população portuguesa não pode continuar a ser sacrificado e brutalmente iludido, e o crescimento económico não pode continuar estrangulado. Estão cria das - como disse atrás condições para a fase de recuperação e modernização estrutural e do desenvolvimento regional do País, até porque o grande obstáculo, ou seja, o défice da balança de transacções correntes o permite neste momento.
As melhores perspectivas foram neste capítulo ultrapassadas. E sabe se que no primeiro semestre do ano em curso segundo dados do Banco de Portugal - o défice da balança de transacções correntes foi de 647 milhões de dólares, ou seja, menos de metade do registado em igual período do ano passado, que foi de 1 bilião e 413 milhões de contos.
Ora, isto significará que, a manter se a tendência, o défice da balança de transacções correntes embora possa acelerar se um pouco no final do ano com algum relançamento da economia poderá ser este ano pouco mais ou menos de metade em relação ao do ano passado, ou seja, à volta de 800 ou 900 milhões de dólares. E seria lamentável que, nestas condições, se não procedesse ao relançamento da economia portuguesa.
Lembro-me de que em 1979 quando já se sabia que tinha sido reduzido o défice da balança de transacções correntes - se erguera nesta Câmara protestos contra a política que alguns governos de iniciativa presidencial estavam a fazer continuando a austeridade sem fazer o relançamento Aliás, isso permitiu em 1980 um relançamento excessivo, com as consequências que todos sabem que daí advieram, ou seja, com a impossibilidade de travar uma certa marcha da economia portuguesa e do agravamento súbito do défice da balança de transacções correntes em 1981 e 1982.
O Orçamento do Estado não pode ser mera questão de contabilidade e aquilo que é mais lamentável é encontrar ministros a discutir verbas, se mais ou se menos, para os seus ministérios e não a discutir as grandes questões nacionais e os grandes objectivos da economia portuguesa Como diria o meu amigo e camarada José Luís Nunes, isso acaba por ser uma questão de intendência utilizando uma linguagem um pouco pejorativa.
O Orçamento do Estado não deve ser uma questão de contabilidade, mas deve traduzir os objectivos atrás referidos.

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A política orçamental é uma componente da política económica e na minha opinião subordinada.
Permito me assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, encorajar o Governo a empreender um novo curso e a fazer uma inflexão na política económica, porque ela é possível. Para bem dos portugueses, da democracia e de Portugal.

Aplausos do PS.

0 Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Peço a palavra, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Para um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Deputado Carlos Lage, V. Ex.ª disse que defende o rigor e que o défice deve ser controlado, assim como a sua derrapagem citou até a frase do Sr. Deputado Basílio Horta. Mas a verdade está em que a alteração que o orçamento consubstancia revela ter se falhado no objectivo que foi anteriormente considerado prioritário pelo Governo, isto é, a redução do défice, como V. Ex.ª sabe.
V. Ex.ª falou também na necessidade do desenvolvimento e no quadro da nossa participação na Comunidade Económica Europeia (CEE).
Decidi, então, colocar-lhe somente duas questões Sr. Deputado: entende V. Ex. que as despesas de investimento se destinam a viabilizar ou concretizar programas específicos que se tem decidido implementar no âmbito dum conjunto de acções tendentes a promover a modernização da economia portuguesa ou, pelo menos, a suster a preocupante degradação da economia e isto a propósito da sua frase de que pretende o desenvolvimento no quadro da CEE.
Por outro lado, Sr. Deputado, pergunto-lhe também se conclui que na base do novo Orçamento estarão ou não erros e omissões conscientemente assumidas e, também, a maior gravidade da crise económica em que o Governo mergulhou a nossa economia, o crescente descontentamento e a tensão claramente visíveis em camadas cada vez mais vastas da nossa população.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Lage pretende responder já ou a todos os pedidos de esclarecimento em conjunto?

O Sr. Carlos Lage (PS): Responderei no final dos pedidos de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, também para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de formular o pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Carlos Lage gostaria de dizer que este debate, não obstante o interesse que está a ter, está realmente a ser menorizado pelo Governo. Estamos aqui a discutir as alterações ao Orçamento deste ano. Se se compreende que não esteja presente neste debate o Sr. Primeiro Ministro, já se compreende menos que não esteja o Sr. Ministro de Estado. Mas, o facto de não estar presente neste debate o Sr. Ministro das Finanças é algo que tenho que sublinhar e achar da maior estranheza, para não dizer inconviniência.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: Mas, colocando agora as perguntas ao Sr. Deputado Carlos Lage, gostaria primeiramente tenho que reconhecer o tom optimista, falsamente optimista, que o Sr. Deputado empregou na sua intervenção de formular-lhe duas perguntas de natureza técnico económica e uma de natureza política.
0 Sr. Deputado reivindica como grande vitória deste Governo ou pelo menos o único aspecto positivo, a redução acelerada do défice externo. É escusado lembrar lhe que essa redução acelerada do défice ex terno recomeçou no 1.º semestre de l983. Mas é escusado esse pormenor. Começou por aí.

Uma voz do CDS: Muito bem!

O Orador: Sr. Deputado, o problema que se coloca prende-se com a questão que lhe vou pôr: acha que essa mudança de política, ou seja, a redução do défice externo é uma mudança estrutural da nossa economia ou, pelo contrário, é uma mudança conjuntural? V. Ex.ª acredita que esta mudança que se verifica nas nossas contas externas significa uma mudança de fundo no nosso edifício económico? Significa uma mudança de fundo no nosso sistema de produção? Significa uma mudança de fundo nas intenções de investimento? Significa uma mudança verdadeira, isto é, no sentido dum caminho económico claramente traçado e firmemente percorrido? É óbvio que não. 0 Sr. Deputado sabe bem que não.
Pergunto lhe ainda o seguinte: como é que o Sr. Deputado quer proceder ao relançamento? 0 Sr. Deputado sabe muito bem que se proceder ao relançamento da economia neste momento, perde se imediatamente essa fugaz vitória do défice orçamental. E nestas condições se se iniciar o relançamento, o Sr. Deputado fica com um défice bastante maior do que aquele que tinha Portanto, pergunto lhe se isso é mesmo convicção firme ou se, pelo contrário, é deficiência de informação.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente uma pergunta política e simples. 0 Sr. Deputado diz que a paciência do Par tido Socialista tem limites Sr. Deputado, qual é o limite da paciência do PS? Qual é esse limite? Sabendo nós que a paciência do Partido Social Democrata tem também limites, verificámos isso já aqui pela voz de 3 autorizadas tendências aquando do início da discussão, parecendo que esses limites foram atingidos ainda antes dos seus, perguntar-lhe-ia se os limites estão a ser atingidos, quem é que suporta afinal este Governo, Sr. Deputado?

Uma voz do CDS: Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder às questões formuladas, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

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O Sr. Carlos Lage (PS): Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, quanto à primeira parte da sua intervenção, confesso que tive um défice auditivo e, por isso, não consegui apanhar as suas questões. Mas quanto aos problemas que colocou sobre os investimentos, reconheci na minha intervenção que as despesas de investimento são porventura insuficientes, mesmo neste Orçamento Suplementar.
Quanto aos erros e omissões deste Orçamento, são de sobremaneira reconhecidos. Não vale a pena estar aqui a referi-los nem a repisá-los.
0 Sr. Deputado Basílio Horta diz que revelei um tom excessivamente optimista. Talvez eu tenha já caído nesse «pecado» de me revelar demasiado optimista, mas também não podemos cair todos num pessimismo atroz, num cepticismo total que é inimigo da acção. Se há na economia portuguesa e na vida portuguesa sinais negativos, também os há positivos. E nós temos de valorizar, em cada momento, os sinais positivos ou os sinais negativos. Eu valorizei os primeiros, relativamente à política económica, e permito me manter essa posição. Não adoptei uma posição panglossiana, ou seja, «tudo vai pelo melhor, no melhor dos mundos» originalmente esta última nem sequer é de Voltaire, mas sim de Leibniz , mas, em qualquer dos casos, parece-me que também a posição contrária «tudo vai pelo pior, no pior dos mundos», parece ser a posição de muitos dos Srs. Deputados e ainda é pior que a posição do Pangloss. Porque esse, pelo menos, ainda teria alguma alegria de viver. Aqueles que pensam que «tudo vai pelo pior e mo pior dos mundos» o Sr. Deputado Almerindo Marques não está nesse caso, porque está a sorrir-...

Risos.

... Com certeza que viverão mais felizes.
Quanto à redução do défice externo, de facto ele começou em 1983. 15to é exacto, Sr. Deputado Basílio Horta. Não atribuo apenas a este Governo o mérito da redução do défice da balança de transacções correntes. Há-de notar que quando eu disse num recuo rápido no tempo - que em 1981 e l982 se acelerou o défice da balança de transacções correntes, tal é um facto: em 1982 atingiu 3 biliões e 200 milhões de dólares, se a memória não me falha, e em 1983 começou a desacelerar.
Portanto, este mérito é extensivo também a executivos anteriores e eu nunca partilhei duma certa culpabilização que se fez e se tentou fazer - a algumas pessoas que considerou ilustres. Mas também não aceito que se retire a este Governo um grande mérito de ter aprofundado, de ter robustecido essa redução do défice da balança de transacções correntes e ter prosseguido firmemente uma política altamente impopular, que muitos não se atreveriam a fazer, sobre tudo tratando-se de um partido como o nosso, um Partido Socialista que tem uma determinada base social de apoio.
Quanto à questão de saber se a redução do défice configura uma mudança estrutural ou não, Sr. Deputado Basílio Horta, há aspectos da economia portuguesa que são susceptíveis de uma correcção a longo prazo, e nós sabemos que temos um défice estrutural da nossa balança comercial há já dezenas de anos. Agora há um sinal positivo nos dados estatísticos: é que a cobertura das importações pelas exportações melhorou significativamente. Sei que também caíram as importações drasticamente, mas as exportações, por seu lado, aumentaram significativamente. Abordei aqui os dados estatísticos que dão um aumento, em dólares, de 22 % das exportações nos primeiros 8 meses do ano corrente.
Portanto, há uma melhoria real. 0 nosso sector exportador está a responder e temos de mos congratular com isso e também que o apoiar.
Quanto às mudanças de fundo não estamos ainda a desenvolvê-los, pois elas implicam uma reestruturação do aparelho produtivo; implicam uma mudança fundamental do nossa agricultura, que está a gerar défices tremendos em matéria de cereais e produtos alimentares como o Sr. Deputado Basílio Horta sabe; exige muitas outras medidas que seria agora supérfluo estar a enunciar. Mas, Sr. Deputado Basílio Horta, reconheça que isto nos permite respirar.

O Sr. Basílio Horta (CDS): Já chega!

O Orador: A situação permite-nos respirar quanto ao défice da balança de transacções correntes.
E ao permitir-nos respirar podemos também ma minha opinião ter novo fôlego para os próximos anos em termos não de um desenvolvimento acelerado ninguém está a pensar nele , mas num desenvolvimento controlado da economia portuguesa, escolhidos os sectores que têm menos efeitos sobre eventuais importações e também aqueles mais ligados à renovação e modernização tecnológica que podem garantir o futuro da nossa economia.
Foi nesse capítulo que falei. A minha intervenção cheia de reticências sobre alguns aspectos da economia portuguesa e da situação financeira e do Orçamento do Estado vai nesse sentido. Estou até convencido de que o Sr. Deputado Basílio Horta concorda comigo neste relativo optimismo, embora naturalmente como deputado da oposição gostasse que o Governo tivesse tais fracassos que viesse a sofrer uma substituição, muito embora o seu partido, não crescendo eleitoralmente, também esteja um bocado receoso de eventuais situações de crise no Governo.
Quanto à paciência do PS, Sr. Deputado, a paciência é um estado qualitativo Não tem uma medição quantitativa. Não lhe sei, assim, dizer os graus de paciência

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a discussão do pedido de autorização pelo Governo deste empréstimo feito a esta Assembleia, está prestes a terminar o debate das alterações ao Orçamento do Estado para 1984.
Pode dizer-se que nas últimas semanas a propósito da discussão das alterações ao Orçamento de 1984 se deram aqui passos decisivos no sentido de um exercício real das funções de exigência e controle que a esse órgão se soberania competem constitucionalmente, na linha do que em sentido geral muito bem referiu há poucos dias S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República no seu discurso de tomada de posse.

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Além das considerações sobre a matéria concreta em discussão, alguns factos dignos de nota, de elevada nota, devem destacar-se se neste debate.
Os debates das alterações ao Orçamento de l984, na generalidade, e em particular na especialidade, atingiram uma grande profundidade, o que demonstra antes de mais que a maioria parlamentar nada quer camuflar nem pretende calar a voz de ninguém, como alguns profetas da desgraça e da demagogia por vezes têm pretendido divulgar. A posição do PSD é de que se deve gastar tempo com o que é de gastar, mas não se pode nem se deve perder tempo com manobras dilatórias que a todos desacreditam e não servem o País. Daí o empenho e urgência com que sempre lutámos pela introdução e aprovação de alterações ao Regimento.

Vozes do PSD: Muito bem!

0 Orador: - Deram se passos novos e fundamentais naquilo que comumente se designa por relacionamento entre maiorias parlamentares e os governos que estas sustentam.
Tem constituído alvo de debates e análises o saber qual o papel que, aos deputados em geral e aos deputados das maiorias em particular cabe no regime parlamentar como o português, como forma de dignificar a função do deputado e evitar a governamentalização do regime. Um principio de base é de equacionar desde já. É que se um Governo pode dignificar a sua maioria parlamentar, não é menos verdadeira a afirmação de que uma maioria responsavelmente assumida é condição essencial da credibilidade e manutenção do próprio Governo e, mais ainda, da estabilidade do regime.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: Daí a postura de certo modo comum que tanto o PSD como o PS assumiram neste debate.
Não está em causa, como é óbvio, o apoio da maioria ao seu Governo, mas sendo os deputados o espelho do Pais nos seus profundos anseios e na constatação das realidades diárias, natural é que de Ias façam aqui eco com serenidade e lealdade. E pensa o Grupo Parlamentar do PSD que esse é um bom caminho, o melhor caminho, o único caminho para o Governo ter uma mais ampla e real dimensão dos problemas, devendo aceitar, por isso, de boa fé recomendações e criticas que visam melhorar a sua eficácia. Foi esse o tipo de intervenção que os representantes do PSD adoptaram no debate na generalidade e na especialidade E pode dizer se também que foi com esse espírito positivo que o Governo encarou este debate e nele participou, o que é justo realçar
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os debates que acabaram de ter lugar a propósito de alterações introduzidas pelo Governo ao Orçamento de 1984, com um preocupante agravamento do défice, que atingiu os 77 milhões de contos, obriga ao Partido Social Democrata a fazer algumas considerações e reflexões e tirar conclusões.
E os debates situam se obviamente no que se podem considerar as 3 fases essenciais da vida orçamental: definição do Orçamento, sua execução e controle. E foi em torno destas realidades básicas que giraram grande parte dos debates. Elas envolvem aspectos tão importantes, como: saber qual o grau de responsabilidade orçamental do Governo co mo um todo, no que respeita ao Ministério das Finanças e dos demais ministérios, designadamente quanto ao rigor e realismo da previsão das receitas e despesas; a forma como é controlada e fiscalizada a sua execução, e quem o faz e deve ser responsabilizado por isso.
E o que os debates travados também demonstraram, em primeiro lugar, é que, perante alterações desta profundidade, em situações futuras é indispensável apresentá-las no Parlamento com muito maior antecedência, e também que se deram passos muito importantes no sentido de se encontrarem e até formalizarem no futuro formas cada vez mais aperfeiçoadas da Assembleia da República, através da Co missão de Economia, Finanças e Plano, exercer o efectivo controle político que lhe compete sobre a execução orçamental. Por outro lado, ficou demonstrado, como era lógico, que é possível prever, com rigor, as receitas a arrecadar e as despesas a afectar nas rubricas dos diversos ministérios propostas à última hora, não havendo assim sólido fundamento para a maioria das alterações propostas à última hora. Ficou também claro ser urgente definir e executar uma politica orçamental coordenada e com integração progressiva dos fundos e organismos autónomos no todo que é o Orçamento do Estado, conforme recomendação aprovada na comissão e apresentada a este Plenário.

Vozes do PSD: Muito bem!

O Orador: E este conjunto sintético de conclusões, bem como os aspectos concretos e pontuais, e nalguns casos preocupantes, analisados em comissão, valem por si, mas para o PSD valem sobretudo como recomendações que devem condicionar o orçamento a apresentar em 1985. Foi neste sentido que encarámos o debate e a definição da nossa posição, ainda que tivéssemos votado a favor de algumas alterações na especialidade que se afiguraram importantes, designadamente um reforço de verbas para os Açores, que foi aprovado, e para a Madeira, infelizmente rejeitado.
E na perspectiva do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, o orçamento para 1985 como instrumento essencial político-económico financeiro, deverá ser elaborado não apenas a 1ano de vista, mas na perspectiva da evolução para os próximos 3 a 5 anos de distância, pelo menos.
É que a situação é tão preocupante e dolorosa para tantas famílias, e a juventude sente tanto a falta de expectativas, como aqui foi salientado pelo representante da JSD, deputado Pedro Pinto, que por imperativo patriótico não se pode mais governar dentro de curtos horizontes temporais, e muito menos governar condicionado por outros factores políticos conjunturais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para o PSD não se trata naturalmente de reclamar para 1985 um orçamento de Estado equilibrado em termos de despesas e receitas, como defendiam e

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aplicavam os conceitos clássicos de finanças. 0 défice orçamental não é crime nem erro na perspectiva das finanças modernas, em que os problemas financeiros são avaliados no quadro de um equilíbrio geral da vida económica e social. Daí que temporariamente o desequilíbrio financeiro possa ser mesmo um meio positivo para assegurar o equilíbrio económico. Sobretudo em períodos de crise e em economias atrasadas ou em estagnação, como é o caso português.
Mas para ter efeitos positivos o défice terá de ser mantido a níveis razoáveis, combatendo os factores de agravamento que acabam por inviabilizar o aumento de crédito ao sector privado e têm provocado uma acentuada quebra do poder de compra dos estratos sociais mais desfavorecidos, designadamente pelas altas percentagens de inflação verificadas.
Daí que não se possa nem deva aceitar como objectivo, ou como dado de facto o défice situado em torno dos 8% do PIB, antes se devendo fazer esforços para que em 1985 seja inferior. Em quais quer circunstâncias, não se afigura, no entanto, realista tomar como base de cálculo um aumento previsível do PIB de 3% para 1985, quando em 1984 este estagnou ou decresceu.
Mas tão ou mais importante do que definir o montante do défice, é saber a estrutura das despesas orçamentais em termos de despesas não produtivas e investimento produtivo. Assim, a política de défice sistemático que tem vindo a constatar-se, agravada agora, apenas poderá conduzir a um equilíbrio financeiro orçamental num prazo aceitável desde que as principais causas do défice orçamental respeitem a despesas com investimentos produtivos. Caso contrário, será o descontrole total a nível de inflação, desemprego e queda do investimento.
Noutro âmbito, no que diz respeito à recuperação que se está a verificar no défice da Balança de Transacções Correntes, e suas consequências benéficas, o PSD congratula-se com isso, e tal constitui um êxito da política governativa, mas essa orientação deve prosseguir no mesmo nível sem «abrir mão» a quaisquer facilidades ou abrandamentos por razões que não sejam exclusivamente de ordem económico-financeira. Ao mesmo tempo deve ser alvo de particular atenção a desaceleração do crescimento das exportações que se fez sentir a partir da segunda metade de 1983.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está-se assim, pois, e cada vez mais, perante a encruzilhada das grandes opções, que justifica, em primeiro lugar, uma política de absoluta verdade, partindo da apresentação transparente das contas públicas, corrigindo todas as práticas que dificultem ou distorçam a análise de situação em toda a sua profundidade.
A nível estrutural, e do que representa o sector público no conjunto da economia, a solução para os problemas do País não é naturalmente aquela que o PCP propõe e pela qual luta, de manutenção e ampliação das estruturas, serviços e empresas públicas, passando o Estado a assumir ainda um maior controle e asfixia sobre os cidadãos, esmagando em concreto a sua liberdade e iniciativa em troca de um discurso de ideologia e uma prática de demagogia.

A Sr. Ilda Figueiredo (PCP): - Está a perceber muito mal as nossas propostas!

0 Orador: - É inequívoco que a solução, além de um vasto conjunto de alterações legislativas fundamentais pelas quais o PSD tem lutado, reside no desbloqueamento e libertação da sociedade e dos cidadãos através da diminuição da tutela asfixiante e burocratizante de um Estado tentacular que muito pretende controlar mas pouco controla; que muito pretende gerir, mas pouco gere; que existe e se diz justificar se para servir os cidadãos, mas pouco os serve e a prazo até os prejudica; que vai absorvendo os governantes com problemas que directamente os não deviam preocupar, como, por exemplo, os problemas e a gestão do fardo das empresas públicas, que vai consumindo meios financeiros avultados que poderiam servir para a recuperação do Pais e, mais grave do que tudo, vai a pouco e pouco desmotivando os cidadãos. O problema já não é tanto de as pessoas serem mais ou menos competentes, mas da teia cada vez mais apertada em que o actual sistema, como um garrote, nos vai focando a todos.
Daí que o PSD sempre tenha defendido que em especial se impõe que o Estado se liberte de parte substancial do sector empresarial - através de algumas desnacionalizações , por razões de projecto de sociedade que defendemos mas agora bem justificado por razões de pragmatismo, dando oportunidade a que a dinâmica e a criatividade da iniciativa privada possa recuperar o que é possível recuperar e muitos milhões de prejuízos já são irrecuperáveis -, com o mínimo de custos económicos e sociais. E tal solução é claramente preferível à tese de que, não tendo a máquina estatal, pesada como a nossa, capacidade para rentabilizar as empresas públicas, pura e simplesmente se devem fechar.
O que também não será possível continuar a aceitar é a situação que se tem vindo a arrastar com a actual estrutura e montantes dos gastos sociais e os enormes encargos do sector público. administrativo, quer com pessoal, quer de ordem administrativa, pois os funcionários aumentaram de 180 000 em 1973 para cerca de 520 000, e os serviços, departamentos, gabinetes e comissões em vez de diminuírem aumentam cada vez mais, e outros que foram já extintos por lei em 1982 e 1983 continuam a existir de facto. E muito menos aceitável se pode considerar a continuada admissão de pessoal, quando a formação, reciclagem e mobilidade deveriam constituir os elementos privilegiados.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. António Mota (PCP): - Aquilo é que é um tratado!

O Orador: Por outro lado, é de absoluta necessidade que todas as decisões tomadas tomem em conta os respectivos custos, muito em especial quando têm um carácter plurianual.

O Sr. Presidente: Sr. Deputado, terminou o seu tempo. Queira ler apenas a conclusão, se fizer o favor.

O Orador: - Trata-se, em suma, como dizia o representante do PSD há pouco, de dizer não a um quadro em que ao País, aos cidadãos, é exigida uma tremenda austeridade enquanto o Estado exige

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muito pouco rigor de si próprio. Além de ser imoral, é injusto, distorce os mecanismos económicos e trava a recuperação económica do Pais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E apenas uma acção urgente e firme, nestes domínios, não cedendo a pressões, como foi necessário fazer nos últimos anos numa Europa muito mais evoluída que nós e sendo em Portugal ainda mais necessário reduzir as despesas públicas, porque não dispomos de infra-estruturas de base, poderá libertar as verbas para investimentos produtivos e que promovam o desenvolvimento, como, por exemplo: vias de comunicação, barragens, planos de irrigação, estruturas portuárias, centros de formação, de desenvolvimento tecnológico e de investigação, telecomunicações, escolas, habitação social (mas não promovida directamente pelo Estado), apoio a sectores vitais da nossa economia e acções diversas de desenvolvimento regional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Deste modo aumentará o nível da procura, diminuirá o desemprego, diminuir-se-ão os níveis de inflação, os cidadãos retomarão a confiança para poupar, investir e fazer os seus depósitos em Portugal, equilibraremos as nossas relações com o exterior e estaremos aptos a enfrentar o desafio europeu.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Do desemprego, da inflação?

O Orador: - Ao nível das receitas orçamentais, mais do que registar a sua escassez e ir sacrificando com sucessivos aumentos de carga fiscal (que fazem diminuir os rendimentos reais das famílias), os que não podem fugir ao fisco (trabalhadores) e os empresários cumpridores, a única base sólida é o relançamento referido, aumentando a matéria colectável, além do combate à fraude e evasão fiscais. Do mesmo modo, devem desonerar-se certos impostos ou escalões de impostos que afectam o investimento e quase «estimulam» ou «convidam» à evasão fiscal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta não é uma visão catastrófica. Esta é a realidade que o Português sente no seu dia-a-dia.
Entendemos que a maioria em que assenta o Governo tem potencialidades para inverter a situação e, por isso, aqui, com os demais deputados e em particular com os deputados da maioria, e o Governo, o PSD procura reflectir responsável e seriamente sobre a situação do Estado e o futuro da Nação.
A história de Portugal, como a história de todos os povos e nações, tem tido as suas grandezas e as suas misérias Hoje somos o que somos e estamos e estaremos cada vez mais integrados num mundo altamente competitivo e avançado, da revolução informática e das telecomunicações. E quando estamos às portas da adesão à CEE, maior deve ser a nossa preocupação para criarmos condições estruturais e de organização para aguentarmos o impacto Porque se não o fizermos e se tivermos toda a nossa estrutura desequilibrada, a adesão à CEE pode ter consequências que não serão benéficas como nós esperamos e em que acreditamos.
Daí que o necessário discurso da austeridade tenha de ter real correspondência na prática governativa. E também não se deverá fazer crer que a recuperação é fácil e está à vista para não se criarem situações de falsas expectativas e consequente desilusão e desespero.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Apenas uma política de verdade, coragem e renovação, assente numa sã política de mercado, com um Estado que deve coordenar e dinamizar e salvaguardar os interesses essenciais, mas deve abdicar de se pretender assumir como Estado providência. Tal actuação, porque dará mais bem-estar aos Portugueses, permitirá a prazo derrotar inexorável e definitivamente os demagogos, os desestabilizadores e que apostam na degradação das instituições democráticas, mobilizará a actual geração e fará com que os jovens acreditem no futuro, crescendo e formando-se em estabilidade moral e psíquica e dentro de um quadro de valores à altura da nossa história e cultura.
Garantiremos assim a perenidade dos valores da Nação Portuguesa.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, pediram a palavra o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado César de Oliveira para o mesmo fim, bem como o Sr. Deputado Lopes Cardoso. Vão formular esses pedidos, mas com a certeza de que ficarão «dependurados», já que o Sr. Deputado José Vitorino não terá tempo para responder.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, a Mesa pode me informar de quanto tempo ainda dispomos?

O Sr. Presidente: A União da Esquerda para a Democracia Socialista tem 10 minutos

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Penso que poderemos conceder o tempo necessário ao Sr. Deputado José Vitorino para responder às questões que lhe vamos colocar.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado. E o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca segue o mesmo princípio?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias): Peço a palavra, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: O Sr. Secretário de Estado do Orçamento pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: Sr. Presidente, pedi a palavra para dar uma informa-

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ção à Câmara. Acontece que o Sr. Ministro de Estado e o Sr. Ministro das Finanças não podem estar presentes neste momento na Câmara, porque estão numa reunião urgente convocada pelo Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Vitorino: Ouvi realmente o seu longo discurso e dir-se-ia que era um discurso sobre o estado da Nação.
Sr. Deputado José Vitorino, V. Ex. começou, desde logo, por afirmar que é preciso não perder tempo com manobras dilatórias. Pela minha parte, rejeito essa afirmação de V. Ex.ª e creio que todos nós não temos assistido aqui a nenhumas manobras dilatórias. V. Ex. está, efectivamente, obcecado com o Regimento e com as alterações a este último.
Finalmente, V. Ex.ª pretende tentar limitar debates sérios como este, e que estes debates decorram como «um gato sobre brasas». São debates incómodos? Para V. Ex. sê-lo-ão efectivamente.
Abordemos algumas questões sérias, Sr. Deputado José Vitorino. Fiquei sem perceber qual é a verdadeira posição de V. Ex.ª, isto é, se é ou não favorável a uma inflexão da nossa política económica. Acha ou não o mesmo depois da sua longa divagação fiquei sem perceber - que esta política se tem revelado positiva? Como e em quê? Gostava também de saber, Sr. Deputado, se entende na sequência das afirmações de V. Ex.ª que este orçamento suplementar constitui um instrumento financeiro indispensável para concretização de um programa de recuperação da economia?. V. Ex.ª disse também - com uma certa dose de humorismo, mas realmente sem se rir, pois não o vi rir - que devia fazer se um orçamento do Esta do não para 1985 mas para os próximos 5 anos.
Gostava que V. Ex.ª me explicasse o que é que pretende dizer com isso? Para já queria saber se isto é uma ameaça? Se é uma ameaça, tenho que me precaver Gostava de saber, Sr. Deputado, se V. Ex.ª acha que o Governo actual está em condições de poder apresentar à Nação um orçamento do Estado desse tipo? Realmente, gostava de saber todas estas questões.
Finalizando, acha que o Governo deu um bom exemplo com os sucessivos erros e com as sucessivas tentativas de correcção ao longo destes dias? Acha que este Governo é capaz de apresentar um orçamento do Estado ou um programa válido, no sentido que V' Ex.ª apresentou? Acha que estas propostas de V- Ex.ª são realmente o resultado da reflexão sobre o estado da Nação, reflexão essa que o Sr. Deputado disse que fez juntamente com os deputados da maioria?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Vitorino, tem oportunidade para responder, se o desejar. Terá de ser agora e não no final, porque é preciso contabilizar os tempos. No final, não é possível, porque o Sr. Deputado só poderá aproveitar da generosidade, nos tempos correspondentes, de cada um dos Srs. Deputados que lhe formulam perguntas. No final teriam de ser uns tempos globais que a Mesa não tem a possibilidade de controlar.

0 Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, nesta perspectiva de generosidade, queria perguntar qual é a generosidade do Sr. Deputado Corregedor da Fonseca em relação a mim neste momento.

O Sr. Presidente: O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca ainda dispõe de 9 minutos, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Como fiz 3 perguntas, dou ao Sr. Deputado José Vitorino 3 minutos.

O Sr. José Vitorino (PSD): Diria que é uma generosidade justa, Sr. Deputado.
Em relação à questão do estado do Estado e do futuro da Nação, não pus o problema em termos de maioria e do Governo, mas coloquei-a de uma forma mais alargada. É evidente que podemos pensar de uma maneira diferente, podemos ter opções diferentes, propostas e análises diferentes, mas todos temos a obrigação de pensar as coisas dessa forma. É que quanto mais cada um de nós, aqui e com seriedade independentemente de concordarmos ou discordarmos nos formos libertando de toda a do se de demagogia e é um esforço que cada um de nós deve fazer, embora tal não seja fácil, mas que cada um de nós poderá fazer , então tanto mais caminhamos nesse sentido, mais próximo estaremos de reflectir sobre o estado do Estado e o futuro da Nação, fugindo às pequenas tricas partidárias que, apesar de tudo, são também essenciais em termos do próprio regime democrático.
Quanto às manobras dilatórias, não falei em tal neste debate, Sr. Deputado Disse claramente que este debate tinha tido tempo, profundidade, e que, por tanto, não tínhamos posto quaisquer entraves ou problemas, como não queremos pôr em nenhuma questão verdadeiramente essencial.
Pergunta se sou ou não favorável à inflexão e que não percebeu a minha posição? Se sou ou não pela austeridade e pela redução do défice do Estado? Sr. Deputado, julgo que fui muito claro nesse aspecto. 0 que nós entendemos é que a austeridade é indispensável, que se deve manter o défice numa percentagem razoável do produto interno bruto (PIB), mas, obviamente, que este último deve ser calculado em termos objectivos e práticos, sem empolamentos. Penso também que, ao mesmo tempo, se devem reduzir os encargos com tudo o que representa, quer o sector empresarial do Estado, quer o sector público administrativo, para se libertarem verbas que permitam o relançamento económico e o investimento produtivo. Esta é a questão e a nossa filosofia muito simples e linear.
Falou nos orçamentos para 3 a 5 anos.
Obviamente que não pedi ao Governo um orçamento para tal período de duração, porque isso não é constitucionalmente possível, nem desejável. Aliás, como sabe, a própria evolução parlamentar europeia levou a que houvesse os controles anuais dos orçamentos, precisamente para que os parlamentos controlassem melhor os governos. O problema que se põe é o Governo fazer hoje a sua previsão para 1985, mas numa perspectiva de mais largo prazo e não apenas tendo em equação alguns dados económicos ou polí-

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ticos ou de outra ordem. Esta é realmente a nossa pretensão.
Pergunta se o Governo deu um bom exemplo e se será capaz de mo futuro apresentar coisa válida. Julgo que sim, Sr. Deputado. 0 Governo participou de uma forma séria neste debate, designadamente nas comissões. Tudo se aprofundou, tudo foi apresentado e julgo que ficámos enriquecidos com esse debate, independentemente das nossas posições críticas ou não. Mas julgo, também, que o Governo ganhou alguma coisa com essa experiência e estará em melhores condições de futuramente representar os anseios que ali foram reflectidos em geral e em particular da sua maioria.

O Sr. Presidente: - 0 Sr. Deputado Corregedor da Fonseca pretende protestar?

O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Era sim, Sr. Presidente.
Sr. Deputado José Vitorino, acontece que V. Ex.ª não me deu respostas. Perguntei-lhe se se deve ou não inflectir a política económica e V. Ex.ª não respondeu. Perguntei-lhe se esta política se tem revelado positiva, como e em que sentido, e V. Ex.ª não me respondeu. Perguntei-lhe se entende que este orçamento suplementar constitui um instrumento financeiro indispensável para a concretização de um programa de recuperação económica da nossa economia e V. Ex.ª não respondeu.
Respondeu, realmente, em relação ao Orçamento do Estado a propósito dos tais 5 anos, e acabou por dizer que tal não é desejável, nem sequer regimental nem constitucionalmente, nem coisa que o valha. Perguntei-lhe se entendia que o Governo também tinha dado um bom exemplo durante todo este debate do orçamento suplementar. Ora, V. Ex.ª, certamente que não esteve atento ao debate na generalidade nem ao debate na Comissão nem ao que se passou há 2 horas aqui nem, com certeza, deve ter lido os erros nem as tentativas de correcção sucessivas do Governo. V. Ex.ª é um desatento. Queira V. Ex.ª desculpar.

O Sr. Presidente: Sr. Deputado José Vitorino, não tem tempo. Presumo que o MDP/CDE continua a ser generoso, no sentido de lhe conceder o tempo para um contraprotesto.

O Sr. José Vitorino (PSD): - É um brevíssimo contraprotesto, apenas para lhe dizer, Sr. Deputado, que julgo que não se trata de falta de atenção. Não disse que o Governo tinha dado um bom exemplo nem que tinha dado um mau exemplo. Disse que o Governo tinha participado seriamente no debates Foi isso o que disse, independentemente das críticas que cada um quisesse formular lhe ou da maneira como cada um as encarava Foi isso que disse e repito-o.
Portanto, não se trata de desatenção. Trata-se, sim, de uma análise deturpada feita pelo Sr. Deputado à minha afirmação que admito que não tenha sido voluntária.

O Sr. Presidente: Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado César de Oliveira.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Vitorino: Tenho estado muito atento, ultimamente, às intervenções dos Deputados da sua bancada e proeuro lê-las politicamente. Julgo que todos temos a obrigação de fazer isso. É por isso que lhe coloco algumas questões.
0 Sr. Deputado disse que chegou a hora das grandes opções, que passam sempre pela transparência das contas públicas. No seguimento desta sua afirmação apenas lhe restam duas alternativas: ou o Sr. Deputado está a reivindicar a substituição da equipa económica, nomeadamente do Sr. Secretário de Estado do Orçamento e do Sr. Ministro das Finanças e do Plano ou, pelo contrário, acredita que é possível, em determinadas condições, uma regeneração desta equipa económica, relativamente à actividade económica portuguesa. Queria-lhe perguntar: nesta matéria por qual das alternativas V. Ex.ª opta? Se optar pela segunda, gostaria que me dissesse quais são as condições para que esta equipa económica regenere o trabalho que tem efectuado até aqui?
Segunda questão que é muito séria e muito grave e nisto o CDS e o PSD têm convergido, ou seja, na reivindicação da destruição daquilo que os Srs. Deputados chamam o Estado providência. Está toda a gente, levianamente e irresponsavelmente, a reivindicar a destruição do Estado providência, sem curar de saber o que é que fica para depois dessa destruição, para garantir uma série de coisas que este Estado providência ainda vai garantindo e que não há classes sociais nem empresários em Portugal capazes de garantir o que o Estado providência vai garantindo; ou seja, se os senhores vão destruir o Estado providência, o que é que fica depois disso? Que garantias tem o Sr. Deputado que haja instrumentos, classes sociais e empresários capazes de exercitarem supletivamente aquilo que o Estado deixa de poder fazer, enquanto Estado-providência?
Sr. Deputado, diga-me concretamente quais são as estruturas concretas existentes na sociedade portuguesa porque esta questão é fulcral no vosso discurso que ele leva a um capitalismo do mais selvagem que se possa imaginar - capazes de suprir a falta do Estado providência, depois da sua destruição em Portugal, como VV. Ex.ªs pretendem.
Sr. Deputado, o que é que existe realmente depois da destruição do Estado providência? De facto existe muito pouco ou quase nada! Pergunte aos sindicalistas que estão sentados atrás de si que eles dar-lhe-ão a resposta.

Aplausos da UEDS e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Deputado José Vitorino, muito rapidamente, para ainda poder dispensar-lhe algum tempo. Não acha que era altura de desligar a cassete do «cancro» do sector público, do sector público bode expiatório, que no fundo serve para disfarçar os reais problemas e serve de álibi à incapacidade dos sucessivos executivos neste país para conduzirem uma política económica diferente, susceptível de dar resposta aos problemas nacionais?
Sr. Deputado, estamos fartos de o ouvir apresentar o sector público como o sorvedor da riqueza do País, mas V. Ex.ª não fala da verba de mais de duas

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centenas de milhões de contos de incobráveis à banca que foram para o sector privado, das dezenas de milhões de contos que o sector privado deve à Previdência, dos vinte milhões de contos que o sector privado deve à EDP., e poderíamos continuar por aí fora...
Sorvedouro, Sr. Deputado, não é só o sector público! Ele é, com certeza, mal gerido e não corres ponde ás necessidades do País. Mas a responsabilidade decorre do Executivo e não do sector público, em si próprio. Não é a pura e simples destruição deste sector que iria resolver os problemas.
O que é lamentável, é que, de facto, os executivos não saibam orientar o sector público no sentido de que ele pudesse desempenhar o papel que lhe cabe, mas o tenham transformado numa espécie de couta da dos sucessivos aparelhos partidários que estão no poder para distribuírem entre si as benesses que encontram nesse mesmo sector público.

Vozes da UEDS, do PS e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, dos 6 minutos que ainda dispõe, quanto tempo cede a UEDS ao Sr. Deputado José Vitorino para que ele possa responder?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, concedemos quatro minutos ao Sr. Deputado José Vitorino, mas se o Sr. Deputado não conseguir responder nos quatro minutos pode gastar os seis minutos que a UEDS ainda tem. Como vê, Sr. Deputado, somos bastante mais liberais do que o seu partido na distribuição de tempos nesta Assembleia!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino

0 Sr. José Vitorino (PSD): - Certamente não irei responder de acordo com o que o Sr. Deputado quer ouvir, até porque as nossas opções políticas e sociais são bastante diferentes. Logo, não admira que não nos entendamos e que o senhor continue a fazer protestos e contraprotestos, se assim o entender.
Começando pelo Sr. Deputado César Oliveira, em relação às grandes opções que apontei aqui, V. Ex.ª pôs a questão de saber se, perante essas grandes opções, a questão se resolvia através de uma mudança de equipa ou através de uma mudança de política e se, eventualmente, o PSD considera que esta equipa é ou não capaz de mudar esta política.
Em primeiro lugar, Sr. Deputado, não pus o problema estritamente nos termos em que o referiu. Coloquei-o de uma forma mais lata e em termos de alguns factores que eram importantes O Sr. Deputado não referiu alguns deles, naturalmente por uma questão de poupar tempo.
Aquilo que também referi na minha intervenção, é que entendo que esta maioria e este Governo têm condições políticas para inverter o rumo dos acontecimentos.
Naturalmente que inverter o rumo dos acontecimentos implica mudar alguma coisa na política. Se me pergunta se acreditamos na equipa do Ministério das Finanças e do Plano para mudar a política, então remeto-o para a primeira parte da minha intervenção.

Uma das questões fundamentais, que aliás se pôs na Comissão de Economia, Finanças e Plano, é saber de quem é, no todo ou em parte, a responsabilidade de algumas «derrapagens» verificadas. De todo o Governo? Do Ministério das Finanças e do Plano? De alguns outros ministérios? É uma questão que, no futuro, é preciso clarificar, já que isso é importante para solidez do regime, defesa do Governo (e dos seus membros) e da própria maioria que o tem de sustentar.
Portanto, Sr. Deputado, o que lhe direi é que há condições e é possível inverter a política e que, de facto, a maioria acredita nisso. Só que isto passa por uma série de clarificações que todos esperamos e, por isso, também disse que a nossa perspectiva de debate para as alterações do Orçamento do Estado de l984, se situava, sobretudo, e desde já, em condicionar na medida do possível a elaboração e eventual aprovação do Orçamento do Estado para 1985.

0 Sr. César Oliveira (UEDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado.

0 Sr. José Vitoriano (PSD): Faça favor Sr. Deputado.

O Sr. César Oliveira (UEDS): Sr. Deputado, V. Ex.ª coloca aí o cerne da questão. É que o discurso que o PSD tem feito ultimamente aqui no Plenário é um discurso liberal, que do ponto de vista programático e ideológico é perfeitamente coincidente nas suas linhas de força com o discurso do CDS. Essa é que é a grande contradição que o PSD tem de resolver!
O PSD tem de resolver, de uma vez por todas, se advoga um projecto liberal em Portugal ou se mantêm apegado a uma falsa concepção social democrata que de facto não tem! Esta é que é a questão fundamental!

0 Orador: Julgo que o Sr. Deputado está a laborar num erro, porque não estamos, neste momento, a defender qualquer perspectiva liberal. Se o Sr. Deputado quiser chame-lhe, então, perspectiva liberalizante face ao estado tentacular que o País herdou em 1975, o que é diferente de um Estado liberal, ferozmente capitalista e eventualmente explorador dos trabalhadores, tirando lhes os seus direitos, como o Sr.ª Deputado referiu.

Aplausos do PSD.

Quanto à segunda questão - também referida pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso relativa ao problema da destruição do Estado providência, quero lhe dizer que o PSD não luta pela destruição da estrutura do Estado. O Partido Social-Democrata luta é para que não se mantenha e não se amplie este Estado providências Mas uma coisa é lutar para que ele não se mantenha como está e não se amplie, e outra coisa é lutar pela destruição de uma certa estrutura, de uma certa intervenção e de uma certa coordenação do Estado na vida do País. São coisas completamente diferentes.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - É exactamente com isso que estou em desacordo Sr. Deputado des-

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culpe esta nova interrupção, mas este diálogo é importante.
É que o Estado providência que temos, e que obviamente já vem de antes do 25 de Abril, e o papel do Estado na sociedade portuguesa, não é algo que se tivesse formado de um dia para o outro, pois tem raízes históricas muito profundas, de antes de 1820, se quisermos recuar até essa altura. Portanto, V. Ex.ª, quando destroi o tal Estado providência que quer destruir é o Estado providência e não o Estado, nunca acusei o PSD de querer destruir o Estado tem que ter mecanismos supletivos na sociedade portuguesa que preencham o vazio dessa destruição, e isso não acontece Sr. Deputado.

O Orador: Já lá vou Sr. Deputado, deixe me só chegar ao fim da resposta.
Já éramos contra o tipo de Estado corporativo e Estado-providência anterior ao 25 de Abril, e agora continuamos a ser contra os acrescentos que, sob uma outra capa, se colocaram sobre esse Estado providência que herdámos.
Queremos agora corrigir esses dois tipos de Estado. Um que foi criado com uma filosofia ferozmente capitalista e o outro que foi criado e ampliado numa perspectiva ferozmente estatizante, em 1975. 0 nosso problema é racionalizar, e existe aqui uma questão de fundo.
O Sr. Deputado pôs uma questão que é essencial e fundamental, porque o que o Partido Social Democrata quer precisamente evitar é que aos cidadãos não reste outra solução que não seja empregarem se à sombra do Estado, viverem à custa dos seus tentáculos ou subordinados a eles
O PSD não quer isso, e quando o Sr. Deputado pergunta o que é que se vai fazer, visto não haver empregos, não haver isto, não haver aquilo, se o Estado não garantir minimamente essa actividade e esses empregos, respondemos que pensamos exactamente o contrário, que o que há a fazer é redinamizar a actividade económica para que o Estado não se vá ampliando. É uma questão de filosofia, Sr. Deputado, que nos levaria longe e sobre a qual nunca chegaríamos a acordo, porque a nossa perspectiva é completamente diferente.
Por outro lado, quando falei do sector público, não se tratou de cassete. Obviamente que ninguém foi ainda capaz de digeri-lo eficazmente, ninguém foi ainda capaz de rentabilizá-lo eficazmente, se é que as pessoas duvidavam da nossa posição ideológica digamos assim.
Agora é já uma questão de pragmatismo, pois não se pode confundir o aliviar a carga e a responsabilidade do Estado para com o sector público com uma eventual situação em que de novo se voltasse aos monopólios e às grandes empresas que controlavam o próprio poder político. Não se pode confundir uma coisa com a outra, mas o que também não queremos é que esse poder público absorva o próprio poder político, em termos de não lhe dar tempo nem meios, para servir o Pais e a sociedade como deve e para arrancar a sociedade a esta situação que está longe de atingir os níveis da Europa a que nos propomos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix.

0 Sr. Bagão Félix (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Da do que o essencial sobre este orçamento suplementar já foi dito, vou realçar apenas alguns pontos que me parecem importantes.
O primeiro ponto vai no sentido de fazer uma anotação relativa a uma situação que de algum modo parece pouco ortodoxa e pouco adequada neste debate do orçamento suplementar, que é a ausência dos principais responsáveis do Governo na parte final deste debate.
É caso para dizer que a presença dos membros do Governo está na razão inversa do aumento do buraco orçamental. Quer dizer, à medida que o buraco orçamental foi aumentando, o número de membros do Governo na respectiva bancada foi diminuindo e, neste momento, está praticamente reduzido - com todo o respeito que me mereçam o Sr. Ministro da Saúde e a Sr. Secretária de Estado Adjunta do Sr. Ministro da Educação ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, como aliás, é hábito, que por isso mesmo merece toda a minha consideração e respeito pelo facto de aqui estar, perante todos nós, a abarcar praticamente na globalidade a crítica, clara e consistente, que temos feito a este orçamento suplementar.

Aplausos do CDS e de alguns Deputados do PSD.

A discussão no Plenário e depois na Comissão de Economia, Finanças e Plano, revelou claramente a to tal falência da política de rigor, austeridade e disciplina do Governo PS/PSD.
Em primeiro lugar, e volto à questão da ausência, aqui, do Sr. Primeiro-Ministro, do Sr. Vice Primeiro Ministro, do Sr. Ministro das Finanças e do Plano, ou até do Sr. Secretário do Estado do Tesouro, para uma discussão que parece não ter importância nenhuma e que se resume a isto: o défice aumentou qualquer coisa como 75 milhões de contos, ou seja 43%, e a criação de moeda passa de 155 milhões de contos, mais ou menos, para cerca de 306 milhões de contos. 1sto é, a criação de moeda com este Orçamento suplementar duplicou e isto parece não ter importância nenhuma para o Governo que, neste momento, temos.
Mas falharam também todos os argumentos de ordem técnica, de ordem política e até de ordem verbal com que aqui se proeurou defender este orçamento Aliás, o Sr. Ministro das Finanças e do Plano não veio aqui dar-nos explicações sobre as causas deste agravamento do défice, veio antes envergonhadamente e incoerentemente, procurar demonstrar como é que tentou esconder este défice orçamental.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: O que estava em causa não era tanto o problema técnico da cobertura do défice, mas sim o problema político da causa do défice orçamental.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: Enfim, e tudo isto para além daquilo a que o País assistiu perplexo, que foi o escândalo da relação entre o Governo e o Banco Central do nosso país. Sem comentários ficam apenas os factos

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para demonstrar aquilo que temos vindo a dizer no debate. Este orçamento suplementar representa, por um lado, a falta de credibilidade, a falta de coerência, a falta de crença na resolução dos problemas, a criação do pessimismo, de falta de confiança e, por outro lado, traduz-se - e isto em nosso entender é o aspecto mais grave numa acentuada deterioração ética, que não apenas política, das relações entre uma sociedade com mais dificuldades e mais austeridade imposta e um Estado mais perdulário e que não soube ter para consigo as regras que impôs militarmente a essa mesma sociedade.

Aplausos do CDS.

Verificámos, aliás, neste debate, também com perplexidade, que este Governo até em pormenores se revelou perfeitamente incoerente Basta citar um exemplo: o Sr. Ministro das Finanças e do Plano na apresentação deste orçamento suplementar veio nos dizer que a inflação andava pelos 26 - 27 %, quando na discussão na Comissão de Economia, Finanças e Plano tivemos vários exemplos que contrariavam esses da dos, como um documento do Ministério da Educação que nos foi entregue e que dizia que a inflação prevista era de 33,6% até outros documentos em que se dizia que a inflação ia atingir os 37% Afinal de contas o Governo tem ou não um único número para a inflação?
A Sr.ª Secretária de Estado abana a cabeça, mas deveria fazê-lo se estivessem em causa pequenas diferenças de 1% ou 2% O que está em causa, embora se possa discutir se as taxas são sectoriais ou não em relação a determinado tipo de bens de consumo, são diferenças de 37% para 27% e 26%.

Vozes do CDS: Muito bem!

O Orador: Outra questão que nos parece importante frisar aqui no encerramento desta discussão é a de um Governo que desde o primeiro dia fez o discurso do rigor e da austeridade e de discursos sobre austeridade já não precisamos mais, Sr. Deputado José Vitorino, mas sim de actos concretos capazes de resolver os problemas dos Portugueses que gere, neste momento, os interesses do Estado, não saiba responder, como patrão dos funcionários públicos, quantos funcionários públicos estão dependentes do Estado.

O Sr. Carlos Lage (PS): O senhor sabia o quando estava no Governo?

O Orador: Mais: o Governo não sabe o número efectivo de funcionários públicos que foi admitido em 1984
Fiz a pergunta, Sr. Deputado Carlos Lage, na Comissão de Economia, Finanças e Plano A resposta que me foi dada foi a de que o número rondava os 5 mil novos funcionários Mas perguntei se esse número era em termos líquidos ou ilíquidos e isto é muito importante porque entra ou não em conta com os aposentados da função pública - e até hoje a resposta ainda não me foi dada, apesar de prometida Para um Governo com todo este verbalismo de austeridade e disciplina, isto é pelo menos insólito.
Efectivamente, este orçamento suplementar revelou uma série de questões que resumiria do seguinte modo: está provado que para este Governo o orçamento é muito mais um documento para português ver e muito menos um documento para o Governo cumprir e fazer cumprir.
O Governo desprestigiou, também, o próprio instrumento orçamental com a invasão de valores, com a revelação de incompatibilidades e contradições e, mais do que isso, até com a invenção de novos conceitos orçamentais como, por exemplo, e passo a citar outro documento de um dos ministérios a de défices iniciais, com ou sem aspas, e a de orçamentos impostos, e friso a expressão «impostos», pelo Ministério das Finanças e do Plano. Que solidariedade é esta, a de um Governo com esta linguagem, perante a Câmara que aprovou o Orçamento? Fica também provado que este orçamento suplementar estava previsto desde o início do ano, como aliás dissemos na discussão inicial do Orçamento para l984.
Fica também provado que os portugueses vão pagar, e apesar de não haver nenhum imposto extraordinário directo, estes 150 milhões de contos de emissão pura de moeda sem contrapartida produtiva. E vão pagá-lo pelo «imposto inflação», pela onerarão das gerações presentes, no que se refere aos juros da dívida, e pelas gerações futuras, no que se refere aos juros e ao reembolso da dívida formada Não tenha mos dúvidas nenhumas sobre isto, que tem que ficar claro, pois é assim que em política se tem que falar aos portugueses É assim que efectivamente a situação deve ser descrita. Não se trata de nenhum malabarismo através do qual esse papel moeda apareça, pois ele aparece como um sacrifício acrescido aos Portugueses.

Vozes do CDS: Muito bem!

O Orador: - Enfim, podemos dizer que o Orçamento em rigor político se traduziu, em termos de execução, numa mentira para os Portugueses Neste Parlamento, onde ninguém explicitamente apoiou o Governo e onde os Srs. Deputados da maioria procuraram vestir se de uma camuflagem meramente técnica que, para além das críticas a este orçamento, obviamente, tinham implícitas críticas políticas fundamentais - , este orçamento vai ser aprovado. Tal vez valha a pena reflectir sobre esta questão e tirar dela a ilação positiva, que é a do papel fiscalizador da Assembleia da República: esta Assembleia é, neste momento, responsável pela Lei do Orçamento e não pode ser uma mera repartição que se limita apenas a pôr o carimbo depois da execução do aumento das despesas públicas. Esta Assembleia da República tem de ter acrescidas funções de fiscalização apriorística, face às despesas e aos consumos, pelo que não pode mos admitir aqui que uma semana antes de começar a ser discutido nesta Câmara este orçamento suplementar, um membro do Governo tenha adjudicado 39 novas escolas em função de verba que iria ser aprovada uma semana depois.

Aplausos do CDS

Este facto desprestigiou o Governo, o Parlamento, desprestigia o País.
Em conclusão deste debate, vale a pena pensar num acréscimo de funções fiscalizadoras apriorísticas por parte da Assembleia da República face aos Orçamentos do Estado. Nesse sentido, o Grupo Parlamentar

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do CDS irá apresentar dentro de pouco tempo uma revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento que permita que não sejamos sujeitos a situações de facto consumado e que aqui apenas se legitima formalmente, apesar de condenadas politicamente.
Os Portugueses terão o direito de perguntar: e o que é que vai acontecer em l985? Também já o perguntámos em 1984. Em 1985 iremos ter aqui, provavelmente, um orçamento nominalmente de maior contenção de despesas públicas. O comunicado de ontem do Conselho de Ministros é prova cabal disso. Mas quem nos vai garantir que em Setembro ou Outubro de 1985, como o foi em Setembro ou Outubro l984, como aconteceu com o Orçamento de l983, não estaremos aqui a discutir o verdadeiro Orçamento do Estado? É caso para dizer, e com isto termino, Deus queira que os Portugueses e a Assembleia da República, em particular, não sejam confrontados em Setembro ou Outubro do próximo ano com o espectro de uma questão como esta: «o aumento do défice segue dentro de momentos».

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): Sr. Deputado Bagão Félix, a sua intervenção reflectiu com um certo exacerbamento as posições que o CDS tem divulgado, com alguns aspectos positivos reconheço-o , e a sua crítica é nalguns aspectos aceitável, como seria aceitável para orçamentos em cuja elaboração o Sr. Deputado, como membro de um Governo, cooperou.
Desejava apenas dizer ao Sr. Deputado que há um ponto da sua intervenção com o qual não posso concordar e que é o de afirmar que este Parlamento se desprestigia quando é «caixa de ressonância» ou «repartição pública». Já lhe ouvi essa afirmação repetidamente sustentada. Creio que o nosso Parlamento não se desprestigiou com este debate sobre as alterações do Orçamento, mas que, pelo contrário, se prestigiou, pois o Parlamento exerceu integralmente as suas funções de fiscalização e controle. A Comissão de Economia, Finanças e Plano, como tive oportunidade de afirmar na minha intervenção, teve um papel altamente meritório na procura do rigor, do aperfeiçoamento e da fiscalização das verbas orçamentadas.
Creio, assim, que este debate, e outros que lhe haverão de suceder com o novo esquema de alterações ao Regimento da Assembleia da República e da Constituição, é um debate que prestigia o nosso Parlamento.
Quanto à maioria, e em particular ao PS, as críticas que fazemos resultam da nossa discordância, não obstante existir um vínculo de solidariedade fundamental com o Governo. E o Sr. Deputado mal compreenderia que os partidos que apoiam o Governo se colocassem numa posição meramente obstrucionista. Não haveria, então, estabilidade política, não haveria solidez governativa e também isso não seria positivo para o País.

O Sr. Presidente: Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Gonzalez.

O Sr. António Gonzalez (INDEP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: a dois meses do início de 1985, encontramo-nos aqui reunidos para votarmos a proposta de alterações ao Orçamento do Estado de 1984. Em abono da verdade deveríamos estar, isso sim, debruçados sobre a análise ao Orçamento para l985. Contudo, o Governo não o entende deste modo. Eis-nos perante uma prova do «dinamismo» que imprime à gestão do Estado. Durante o debate realizado anteriormente sobre esta proposta ficou, a meu entender, evidente que as alterações ora apresentadas destinam-se a cobrir despesas já realizadas a compromissos já assumidos sem prévia autorização parlamentar. É pois, assim, que o Executivo concebe o respeito pela legalidade democrática e pelas suas instituições.
Quando da apresentação do Orçamento do Estado de l984, o Sr. Ministro das Finanças apontou como grande objectivo da política orçamental do Governo a redução do défice orçamental para cerca de 6,l% do PIB. Este ano, ao defender a presente proposta de alteração, soma ao défice inicial mais 28 milhões de contos e, no embalo, passada uma semana, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento junta a esta cifra mais 45 milhões. E pronto! 0 défice sobe a cerca de 250 milhões de contos, ou seja, a 8,8% do PIB. Mais 0,8% que em l983, e bastante longe dos 6,1% previstos pelo Sr. Ministro. Aqui, faço também minhas as palavras do Sr. Deputado Bagão Félix a propósito da representação governamental. Mas há mais. 0 PIB, ao invés dos 1,4% de quebra previstos para l984, atingirá os 2% segundo as estimativas, insuspeitas, da OCDE. Eis como o Executivo nos revela a sua extraordinária competência em matéria tão fundamental como é o planeamento do Orçamento do Estado. Não precisamos de ser génios em finanças para entender que o Governo planeou o Orçamento como quem joga no totobola. Com uma única diferença: no totobola teria ainda oportunidade de acertar no l3. 0 mais grave Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, o mais grave é que tanto desacerto não é exclusivamente fruto da incompetência dos gestores que integram o Governo. Concedo que possam ser tecnicamente competentes: o mais grave, meus senhores, é que tanto desacato, tanto desacerto, é consciente e deliberadamente produzido. É uma das manifestações, ao nível de aparelho de Estado, da situação de ruína, de desarticulação, de desmoralização a que se chegou, e que se agravará, caso se persista numa política de ataque e sabotagem sistemáticas às esperanças e concretizações da revolução de Abril.

A política «entreguista», «tecnocrática», «liberalizante», modelo europeu, que vem sendo aplicada, reflecte na prática e no próprio discurso, o perfil da sua base social de apoio: uma burguesiazinha serôdia com pretensões cosmopolitas.
Mas o que pode o cidadão comum, o homem da rua, inferir deste debate, deste Orçamento e desta proposta de alteração?

Que a quebra de 2% no PIB se traduzirá na redução do rendimento per capita, ou seja, que os salários reais continuarão em queda livre enquanto, paralelamente, os preços subirão em flecha (a tal previsão de 30% para a média anual da inflação).
Que a nossa economia continuará a regredir- Mais fábricas serão encerradas e maior número de desempregados e de trabalhadores com salários em atraso.
Que as dotações orçamentais para sectores tão fundamentais como a saúde pública, a habitação, a

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educação, a cultura e a defesa do ambiente serão restringidas ainda mais.
Que os 350 milhões de contos de dívidas do Esta do ao sector público continuarão por pagar.
Que a nossa independência continuará a diluir se na razão directa do aumento da dívida externa.
Em suma, que a situação do País nos planos político, económico, social e cultural passará de muitíssimo má a totalmente péssima.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: a resolução dos graves problemas nacionais que hoje enfrentamos só será possível com o apoio dos trabalhadores e com o aproveitamento de toda a força de trabalho disponível Para tanto, urge galvanizar o nosso povo em torno de um projecto de recuperação nacional que respeite a nossa dignidade, a nossa independência e, sobretudo, que retome as esperanças depositadas pelos Portugueses nos espaços de sonho que Abril abriu
Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: nós «Os Verdes» estamos convictos que é possível e urgente retomar os caminhos na emoção vivida e partilhada na construção de um país nosso, de todos e de cada um Tal não é possível com esta política e com este Governo, e porque estamos fartos de «cinzento» votamos contra a proposta de alteração ao Orçamento do Estado. Já agora protestarei ainda contra o ambiente de fumo com que temos de trabalhar, como se pode notar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: Visto não se registarem mais inscrições, vai ser submetido à votação o artigo 1º

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, votos contra do PCP, do CDS, do MDP/CDE, do deputado independente António Gonzalez, de 3 depurados do PSD e as abstenções da UEDS e da ASDI.

Era o seguinte:

ARTIGO 1.º

(Aprovação das alterações do Orçamento)

São aprovadas pela presente lei as alterações ao Orçamento do Estado para 1984, aprovado pela Lei nº 42/83, de 31 de Dezembro, constantes dos mapas I a V.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Catarino

A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - Sr. Presidente, desejo apenas anunciar que entregaremos na Mesa uma declaração de voto por escrito, justificando o nosso sentido de voto

O Sr. Presidente: - Agradeço que seja feito para que possa fazer parte do correspondente registo
Srs. Deputados, vai ser submetida à votação final e global a Proposta de Lei n.º 87/III.

Submetida à votação ,foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, da ASDI, votos contra do PCP, do CDS, do MDP/CDE, do deputado independente António Gonzalez, de 4 deputados do PSD e as abstenções da UEDS e de 1 deputado do PS.

O Sr. Presidente: Srs. Presidentes dos Grupos e Agrupamentos Parlamentares, convido VV. Ex.ªs a comparecer no meu gabinete, uma vez terminados os trabalhos desta sessão, para realizarmos uma reunião de líderes que presumo ir demorar pouco tempo A essa reunião gostaria que estivessem também presentes os Srs. Deputados Rui Mateus e Rogério Martins.
Vai dar-se conta dos diplomas entrados na Mesa.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): Deu entrada na Mesa o pedido de Ratificação nº 122/III, de iniciativa do Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do Partido Comunista Português, relativo ao Decreto Lei nº 330/84, de 15 de Outubro, que permite a revisão da situação militar e a reconstituição da carreira dos militares que foram compulsivamente afastados do serviço.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a próxima sessão terá lugar no dia 6 de Novembro, às 15 horas, com período de antes da ordem do dia e com a continuação das alterações do Regimento.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 20 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
Almerindo da Silva Marques.
António Gonçalves Janeiro.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
Avelino Feliciano Martins Rodrigues.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
José Luís do Amaral Nunes.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Victor Hugo Jesus Sequeira.

Partido Social Democrata (PSD/PPD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
António Maria Ornelas Ourique Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Fernando José da Costas.
Fernando José Roque Correia Afonso.
João Maurício Fernando Salgueiro.
João Pedro de Barros.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Bento Gonçalves.
José Pereira Lopes.
José Vargas Bulcão.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Mário Martins Adegas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Rui Manuel de Oliveira Costas.

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Partido Comunista Português (PCP):

António Dias Lourenço.
António da Silva Mota.
Carlos Alfredo de Brito.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
João António Gonçalves do Amaral.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Santos Magalhães.
Lino Carvalho Lima.
Maria Odete Santos.
Paulo Areosa Feio.
Zita Maria Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António José de Castro Bagão Félix.
Francisco António Lucas Pires.
Henrique Manuel Soares Cruz.
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Miguel Anacoreta Correia .
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel Jorge Forte Goes.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António Poppe Lopes Cardoso.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social Democrata independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Manuel Azevedo Gomes.
Gil da Conceição Palmeira Romão.
José Manuel Torres Couto.

Partido Social Democrata (PSD/PPD):

António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Francisco Antunes da Silva.
Manuel Teixeira Pinheiro.
Pedro Paulo Carvalho Silva.

Partido Comunista Português (PCP):

Domingos Abrantes Ferreira.
João António Torrinhas Paulo.
Joaquim Gomes dos Santos.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Centro Democrático Social (CDS):

José António Morais Sarmento Moniz.
José Luís Nogueira de Brito.
José Vieira de Carvalho.
Narana Sinai Coissoró.

RELATÓRIOS E PARECERES DA COMISSÃO
DE REGIMENTO E MANDATOS
ENVIADOS A MESA PARA PUBLICAÇÃO

Em reunião realizada no dia 31 de Outubro de 1984, pelas 10 horas, foi apreciada a seguinte substituição de deputados:

1) Solicitada pelo partido Socialista:

Eurico Faustino Correia (círculo eleitoral de Faro) por Francisco José Fernandes Leal (esta substituição é pedida para os dias 31 de Outubro corrente a 9 de Novembro próximo, inclusive);

2) Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio no concernente círculo eleitoral;

3) Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis;

4) Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

5) O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.

A Comissão: Vice P residente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Secretário, Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (CDS) - António da Costa (PS) Carlos Cardoso Lage (PS) - Manuel Fontes Orvalho (PS) - Luís Silvério Gonçalves Saias (PS) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) José Mário Lemos Damião (PSD) - José Manuel Mendes (PCP) João António Gonçalves do Amaral (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) Francisco Menezes Falcão (CDS) - João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

Em reunião realizada no dia 31 de Outubro de 1984, pelas 15 horas, foi apreciada a seguinte substituição de deputados:

1) Solicitada pelo Partido Social-Democrata:

Guido Orlando de Freitas Rodrigues (círculo eleitoral do Porto) por Manuel Teixeira Pinheiro (esta substituição é pedida por 1 dia 31 de Outubro corrente);

2) Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio no concernente círculo eleitoral;

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3) Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis;
4) Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

5. O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos Deputados presentes.

A Comissão: Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS)- Vice Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD)- Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP)- António da Costa (PS)- Carlos Cardoso Lage (PS)- Luís Silvério Gonçalves Saias (PS)- José Luís Diogo de Azevedo Preza (PS)- Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD)- José Mário Lemos Damião (PSD) João António Gonçalves do Amaral (PCP)- Francisco Menezes Falcão (CDS)- João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE)- António Poppe Lopes Cardoso (UEDS) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

Declaração de voto

Há cerca de um ano, defendi nesta Câmara que, em matéria de natureza financeira e no que à Região Autónoma da Madeira diz respeito, havia que clarificar as regras do jogo e encetar vida nova...
Assim sendo, haveria que rever os critérios que presidem à cobertura pelo OE do défice do orçamento regional e definir em termos objectivos o que - e quais são se entende por custos da desigualdade resultantes da insularidade e quais as responsabilidades do Estado na sua cobertura. Nenhum destes significativos passos foi dado e o esquecimento a que foram votados em vez de, como seria de esperar, prestigiar a autonomia regional, contribuem, mais, propiciam o aparecimento mais ou menos oportuno, de propostas quiçá extemporâneas, mas compreensíveis face às circunstâncias.
Afirmei também nessa altura aquilo que é uma evidência, ou seja, que não há autonomia regional sem meios financeiros que a permitam assumir de corpo inteiro na perspectiva do seu aprofundamento e dignificação Ao afirma-lo não me passaria pela cabeça isentar de responsabilidades os que têm tido na Madeira a incumbência de governar, o PSD/PPD Pelo contrário, penso que é mesmo essa sólida maioria instalada, possuidora de enorme quota-parte de culpas, permitindo me salientar a falta de interesse e mesmo a oposição dessa maioria na aprovação do Estatuto Político Administrativo, instrumento indispensável à clarificação e reforço do prestígio da autonomia regional
Em síntese, penso que independentemente dos erros cometidos de parte a parte seria de toda a conveniência a discussão, ajustamento e aprovação da proposta apresentada, em sede de comissão de especialidade e posteriormente votada em plenário, pelos deputados eleitos do PSD pela Região Autónoma da Madeira, razão pela qual a votei favoravelmente.
Sem hesitação, votaria favoravelmente a proposta de alteração orçamental para 1984, não fosse a exclusão irremediável da proposta referida Assim sendo, a abstenção foi a única forma de manifestar o meu descontentamento pela forma irredutível com que a maioria da Câmara resolveu contemplar a proposta referida.
Palácio de São Bento, 31 de Outubro de l984. O Deputado eleito pelo PS e pela Madeira, Mota Torres.

Declaração do voto

(Proposta de Lei nº 87/III, que aprova alterações ao Orçamento do Estado para 1984)

Os deputados sociais democratas eleitos pelo círculo da Madeira votaram contra a Proposta de Lei nº 87/III porque, não tendo sido aprovada a proposta que apresentaram sobre as obrigações do Esta do em matéria de custos de insularidade, praticou se uma grave injustiça em relação ao povo da Região Autónoma da Madeira e comprometeu se irremediavelmente a constitucionalidade da lei em apreço.
Com efeito, atribuindo se à Região Autónoma dos Açores a verba de 1 500 000 contos para suporte dos custos da insularidade e denegando se à Madeira a concessão de qualquer verba para esse efeito, violaram se os princípios da unidade do Estado (artigo 6º da Constituição), da igualdade (artigo 13º) da solidariedade nacional (artigo 231.1, n.º1).
Acresce que, não tendo sido previamente ouvidos os órgãos de governo próprio, quedou também viola do o nº 2 do artigo 231º da Constituição.
Dada a gravidade da situação criada, quer em ter mos políticos, quer em termos jurídico-constitucionais, não poderia ser outro o sentido do nosso voto.

Palácio de São Bento, 3l de Outubro de 1984. Os deputados sociais-democratas eleitos pelo círculo da Madeira: Correia de Jesus Virgílio Pereira Cecília Catarino Jardim Ramos.

Declaração de voto dos Deputados do Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente enviada à Mesa para publicação sobro a Proposta do Lei n.º 87/III

1 - Os deputados da Acção Social Democrata Independente tiveram ocasião, quando do debate na generalidade e, em particular, por ocasião do debate na especialidade, de exprimir as suas críticas, dúvidas e perplexidades em relação às previsões e execução orçamental de 1984.
0 trabalho realizado pela Comissão de Economia, Finanças e Plano constitui, aliás, um primeiro e válido ensaio do exercício, pela Assembleia da República, do poder fiscalizador que tradicionalmente sempre coube aos Parlamentos, forçando a que a transparência democrática em matéria financeira seja uma realidade.
A ideia anteriormente expressa pela ASDI (intervenção do deputado Magalhães Mota no Diário da Assembleia da República, 1.ª série, n.º 37, de 22 de Outubro de 1983, p. 1607 e seguintes) de acordo com a qual «face ao novo processo constitucional de discussão do Orçamento do Estado, o Estado passará a só poder exercer a sua função se for organizado de acordo com missões a realizar As tarefas só podem ser levadas a cabo de acordo com as prioridades nacionais e para isso é necessário que os meios administrativos do Estado sejam redistribuídos de acordo

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com essas prioridades, ou seja, não é mais possível que a organização do Estado seja feita por motivos que têm a ver com hábitos do passado ou com relações de forças burocráticas» ganhou nova acuidade ao evidenciar se que o Orçamento de 1984 manteve estruturas duplicadas e foi, em muitos aspectos, mais um orçamento sequente, inclusive na reprodução de vícios, que um orçamento inovador, e autenticamente de rigor, tendo nomeadamente, determinado a cada serviço a justificação das despesas que se propunha.
O Orçamento para 1985 terá, e muito decididamente, que dar importantes passos no sentido de se ultrapassarem as regras do Conde de Villelle a que a nossa previsão orçamental permanece amarrada e condenada.
2 - É todavia no campo da execução orçamental que a proposta de lei veio evidenciar erros novos.
O episódio da venda ou não venda de reservas de ouro e do conhecimento atempado de tal situação pelo Ministério das Finanças e do Plano, para além doutros, revela um facto essencial: o Governo apresentou-se à Assembleia da República tendo realizado despesas ao abrigo de uma receita eventual e que considerava indesejável se acontecesse mas que, apesar disso, não acompanhou, continuando a despender como se a receita existisse, fosse útil e salutar.

É, no mínimo, bizarro e é o tanto mais quanto o primeiro ministro declarara aos Portugueses não vender mais ouro, ao mesmo tempo que o seu Governo considerava tal venda como hipótese de arrecadação de receitas.

O controle orçamental existente permitiu, assim, tal avolumar de défice, como igualmente o permitiu em diversos ministérios, designadamente nos sectores da educação, saúde, segurança social e equipamento social e nas empresas públicas.
As preocupações quanto ao Orçamento de 1985 não podem deixar de avolumar se sabendo se que, sem pôr em causa as despesas agora cobertas:

a) O Ministério da Educação não parece dispor de meios minimamente adequados ao planeamento e à previsão e controle orçamentais, parecendo ter feito com o Ministério das Finanças e do Plano um acordo orça mental à partida viciado, a que, como tal, nunca na realidade se terá subordinado;

b) Medidas de racionalidade e eficácia das despesas foram muito incompletamente introduzidas no campo da saúde, havendo distorções de despesas entre estabelecimentos e actos similares reveladores de tal situação;

c) A segurança social está em situação de pré ruptura, sem que se vislumbrem iniciativas capazes de modificar ou sequer melhorar a situação;

d) O Ministério da Administração Interna «resolveu» a questão dos transportes escolares, sem qualquer planeamento nem cuidar da cobertura financeira indispensável, ou seja, com ligeireza e irresponsabilidade;

e) No Ministério do Equipamento Social, são lançadas obras sem adequada cobertura financeira, o planeamento afigura-se inexistente ou a ele se sobrepõem discutíveis critérios de oportunidade, os custos previstos são largamente ultrapassados sem controle, a corrupção gera aumentos de custos sem que medidas adequadas e moralizadoras sejam esboçadas e penalizem os responsáveis, qual quer que seja o nível a que se encontrem;
f) Não é feito minimamente o controle das em presas públicas;
g) A evolução da situação do Tesouro levará, a breve prazo, a ter que considerar despesas do OE muitos créditos, sendo particular mente preocupante a situação de endividamento da Região Autónoma da Madeira.

3 - Tais situações, porém, não oferecem alternativa à Assembleia da República, pelo menos na nossa perspectiva, que não seja, por manutenção da credibilidade do Estado, assegurar a cobertura financeira de tais encargos que, em nome do Estado foram assumidos.
Algumas das despesas são, aliás, justificáveis.
Por esta razão, e apenas por ela, votámos favoravelmente na votação final global a proposta de lei.

Pelos Deputados da ASDI, Magalhães Mota.

Requerimento apresentado pelo PSD sobre a retirada
de uma proposta de aditamento de um artigo novo à Proposta de Lei n.º 87/III

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:

De acordo com o anunciado no plenário, solicitamos que seja retirada a proposta de aditamento de um novo artigo à Proposta de Lei n.º 87/111
Fundamentamos esta decisão no facto de a proposta parecer inconstitucional ou, no mínimo, de duvidosa constitucionalidade.
Como justificação, embora aparentemente extemporânea, da iniciativa, não podemos deixar de esclarecer que se enquadra numa perspectiva de haver necessidade de se mobilizarem todos os recursos para se disciplinar a gestão orçamental do Estado.
Durante a discussão na especialidade da Proposta de Lei n.º 87/III o Governo mostrou se sensibiliza do e disposto a promover as medidas necessárias a diminuir as despesas públicas e a impedir as habituais «derrapagens» orçamentais.
Teremos a oportunidade, em 1985, de avaliar a sua prática...
Em termos políticos e éticos, independentemente de ser ou não constitucional, a proposta era correcta e corresponde ao estado de espírito de vastas camadas da população portuguesas.
O Estado não pode adoptar critérios de «dupla moral».
Independentemente de não se questionar a responsabilidade pública dos gestores autárquicos e o facto de dependerem do juízo dos seus eleitores, há quem defenda que na ordem legal devem ser criados mecanismos que protejam a gestão autárquica de eventuais administrações demagógicas e financeiramente irresponsáveis.
Independentemente de não se desconhecer a ordem constitucional e a dependência política dos membros do Governo relativamente ao Primeiro-Ministro e de todo o executivo em relação ao Parlamento não vemos inconveniente num plano ético político em

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criar mecanismos legais cuja automatização faça, duma vez por todas, terminar com os chamados «buracos orçamentais».
Para além de todas estas razões a iniciativa teve o mérito de tornar público o sentimento que vai grassando de, perante erros sistemáticos de planeamento e gestão, independentemente da responsabilidade colegial do Executivo, há que responsabilizar individualmente os agentes políticos incapazes de se conterem e enquadrarem a sua actuação nas restrições financeiras que vêm a exigir se ao povo português.

A duvidosa constitucionalidade da proposta de aditamento obriga nos a retirá-la.
Fazemos votos para que a realidade futura não nos leve a ajuizar que, independentemente da ordem constitucional, cometemos um erro político.

Lisboa, 31 de Outubro de 1984 - Os Deputados do PSD: Jaime Ramos Rocha de Almeida Vasco Miguel - Luís Martins.

OS REDACTORES: Maria Leonor Ferreira - Ana Maria Marques da Cruz e José Diogo.

PREÇO DESTE NÚMERO 125$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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