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DIÁRIO da Assembleia da República
I Série - Número 27
Quarta-feira, 12 de Dezembro do 1984
III LEGISLATURA 2ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 11 DE DEZEMBRO DE 1984
Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral
Secretários Exmos. Srs. Leonel de Sousa Fadigas
José Mário de Lemos Damião
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos
SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado José Magalhães (PCP), referiu-se à existência de um protocolo secreto, subscrito pelo presidente do Governo Regional da Madeira e pelo ministro dos Finanças em nome do Conselho de Ministros da República, revelado por diversos órgãos de comunicação social. Respondeu, o fim , a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Correia de Jesus (PSD).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Domingues Azevedo (PS) criticou o sistema fiscal em vigor. Respondeu, na fim, a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Nogueira de Brito (CDS).
Ordem do dia. - Iniciou-se a apreciação das Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional, sobre o que intervieram, a diverso título, além do Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional (Mota Pinto), os Srs. Deputados César Oliveira (UEDS), Carlos Brito e João Amaral (PCP), António Gonzalez (Indep.), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Nogueira de Brito (CDS), José Luís Nunes (PS), Adriano Moreira (CDS), Raul de Castro (MDP/CDE) e Cunha e Sá (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 55 minutos.
O Sr. Presidente (Carlos Lage): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 25 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António José Santos Meira.
Avelino Feliciano Martins Rodrigues.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Edmundo Pedro.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Hàndel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeira Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Luís Duarte Fernandes.
João do Nascimento Gama Guerra.
Joaquim José Gatanho de Menezes.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José de Almeida Valente.
José António Borja dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
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José Carlos Pinto Basto Torres.
José da Cunha e Sá.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Nuno Álvaro Freitas Alpoim.
Ovídio Augusto Cordeiro.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel Caio Roque.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
Abílio Gaspar Rodrigues.
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Agostinho Correia Branquinho.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António d'Orey Capucho.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maurício Fernando Salgueiro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José Angelo Ferreira Correia.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Bento Gonçalves.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
José Silva Domingos.
Leonel Santa Rita Pires.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Guilherme Branco Gonzalez.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Alberto Ribeiro Rodrigues.
José António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira.
Centro Democrático Social (CDS):
Abel Augusto Gomes Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Alexandre Carvalho Reigoto.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Filipe Neiva Correia.
António Gomes de Pinho.
António José de Castro Bagão Félix.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Basílio Adolfo Mendonça Horta Franca.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
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João Gomes de Abreu Lima.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Luís Nogueira de Brito.
José Miguel Anacoreta Correia.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António Almeida Vasconcelos.
Manuel Jorge Forte Goes.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
João Corregedor da Fonseca.
José Manuel Tengarrinha.
Raul Morais e Castro.
Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):
António César Gouveia de Oliveira.
António Poppe Lopes Cardoso.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Octávio Luís Ribeiro da Cunha.
Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):
Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Ruben José de Almeida Raposo.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.
Deu-se conta do seguinte.
Expediente
Ofícios
Da Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores das Indústrias Eléctricas a remeter as conclusões aprovadas no Plenário Nacional de Delegados Sindicais e Membros Representativos dos Trabalhadores da EDP, E. P., e para as quais chamam a atenção por as mesmas espelharem de uma forma sintética os problemas mais graves vividos na empresa.
Da Federação Nacional das Caixas de Crédito Agrícola Mútuo a remeter o plano de actividades e o seu orçamento para o ano de 1985, assim como um documento onde se aborda a situação económica nacional em geral e da agricultura em especial. Protesta também contra a intenção do Governo de extinguir o IFADAP.
Da Câmara Municipal do concelho da Feira a remeter moções aprovadas pela Assembleia Municipal da Feira e referentes a verbas para as autarquias do OE/85 e verbas para os transportes escolares.
"Telexes"
Da direcção do Sindicato dos Metalúrgicos do Porto protestando contra a situação vivida pelos trabalhadores das minas da Borralha e exigindo o apuramento das responsabilidades pelos acontecimentos ali ocorridos.
Da direcção da Associação Portuguesa de Editores e Livreiros contestando a nota do Ministério das Finanças sobre a aplicação do IVA ao livro.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Nas últimas sessões deram entrada na Mesa os seguintes requerimentos: dia 6 de Dezembro de 1984 - à Secretaria de Estado do Orçamento, formulado pelo Sr. Deputado Carvalho Silva; ao Ministério das Finanças e do Plano, formulado pelo Sr. Deputado Agostinho Domingues; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Morais Barbosa; aos Ministérios da Administração Interna e do Equipamento Social (4), formulados pelos Srs. Deputados José Vitorino e Guerreiro Norte; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelos Srs. Deputados Luís Monteiro e Araújo Guedes; aos Ministérios das Finanças e do Plano e da Administração Interna (2), formulados pelo Sr. Deputado Torres Moutinho; aos Ministérios das Finanças e do Plano e da Administração Interna (2), formulados pelos Srs. Deputados José Moniz e Manuel Vasconcelos; a diversos Ministérios (3), formulados pelo Sr. Deputado Nunes da Silva; ao Ministério da Educação (5), formulados por vários Srs. Deputados do PCP; ao Governo, formulado pelos Srs. Deputados Gaspar Pacheco e Vasco Miguel.
Dia 7 de Dezembro de 1984 - aos Ministérios da Qualidade de Vida e da Agricultura, Florestas e Alimentação e à Direcção-Geral de Planeamento Urbanístico (3), formulados pelo Sr. Deputado Roleira Marinho.
Por outro lado, o Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: José Magalhães e Helena Cidade Moura, na reunião da Comissão Permanente do dia 19 de Setembro; José Manuel Mendes e outros, na sessão de 2 de Outubro; Paulo Areosa e Jorge Patrício, na sessão de 3 de Outubro; Carlos Espadinha e Margarida Tengarrinha, na sessão de 3 de Outubro; Guerreiro Norte, na sessão de 11 de Outubro; José Manuel Mendes e José Magalhães, nas sessões de 16 e 18 de Outubro, respectivamente; Lopes Cardoso, na sessão de 25 de Outubro; Jaime Ramos e outros, na sessão de 26 de Outubro; José Vitorino, na sessão de 30 de Outubro; Magalhães Mota, nas sessões de 30 de Outubro, 6 e 8 de Novembro.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, creio que estamos colocados numa situação deveras caricata.
Em primeiro lugar, penso que, neste momento, não há quórum para se dar início aos nossos trabalhos.
Em segundo lugar, o PS e o PSD estão a colocar a Assembleia da República numa posição deveras caricata - é o mínimo que se pode dizer. É uma situação bizarra porque não temos aqui deputados em número suficiente para iniciarmos os nossos trabalhos, enquanto que, simultaneamente, ao nosso lado, numa das salas desta Assembleia, usando as instalações e os meios da Assembleia da República, está a decorrer, tanto quanto se sabe - segundo consta para aí -, uma cerimónia particular a que a Assembleia é alheia, mas que, no entanto, utiliza os seus meios.
Sr. Presidente, creio que, nesta situação, é escandaloso que se dê início aos nossos trabalhos enquanto não estiverem reunidas as condições mínimas ne-
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cessárias para um funcionamento digno, desta Câmara, com o quórum exigido pelo Regimento.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, tenho muito gosto em responder-lhe que há quórum de funcionamento e, por conseguinte, há condições para a Assembleia iniciar e prosseguir a sua actividade.
Em segundo lugar, estivemos a ler o expediente, que é uma das funções da Assembleia que se exerce no período de antes da ordem do dia. Há inscrições para intervenções neste período (que dura 60 minutos); logo penso que as ilações que a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo tirou - sem me querer pronunciar acerca delas -, não são de molde a inviabilizar esta sessão.
Para uma nova interpelação à Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, no início da minha interpelação tinha verificado a presença dos Srs. Deputados e, por esse meio, certifiquei-me de que não havia quórum.
Não sei se foi também usando esse meio que o Sr. Presidente verificou que há quórum, ou se o fez reportando-se às assinaturas.
De qualquer modo, pretendia que V. Ex.ª esclarecesse se, neste momento, há mesmo quórum de funcionamento e qual é o número de deputados presentes no Plenário.
O Sr. (Presidente: - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, não temos capacidade telepática para consultar o número de assinaturas nos livros, mas, lembro-lhe que o quórum de funcionamento para o período de antes da ordem do dia é de 63 deputados.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, V. Ex.ª, em resposta à Sr.ª Deputada lida Figueiredo, acaba de considerar que há condições para reunir o Plenário da Assembleia e que esta reunião deve prosseguir.
Com essa decisão tomada pela Mesa - que V. Ex.ª comunicou em resposta que deu -, acaba de confirmar que a cerimónia que se está a realizar no Salão Nobre é uma cerimónia de cunho meramente partidário e constitui, nesse sentido, uma utilização abusiva desta Casa. Assim, pergunto a V. Ex.ª qual é o precedente que encontra no funcionamento e nas regras da actividade desta Assembleia que justifiquem um tal procedimento.
Quem é que autorizou a reunião? Ao abrigo de que disposição e - volto a repeti-lo - de que tradição é que essa cerimónia está a ter lugar? Acha V. Ex.ª natural que essa cerimónia tenha lugar e que, simultaneamente, prossiga, deste modo, o Plenário da Assembleia da República?
O Sr. Handel de Oliveira (PS): - O que vocês queriam é que não houvesse cerimónia!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, estão reunidas condições de natureza formal para a Assembleia iniciar e prosseguir os seus trabalhos.
Não tenho de me pronunciar sobre as considerações que o Sr. Deputado acaba de fazer relativamente ao sentido de uma cerimónia que está neste momento a realizar-se dentro da Assembleia da República.
Para uma nova interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, se a Mesa não tem de se pronunciar sobre esta cerimónia, a quem é que devemos dirigir as nossas perguntas? Ao Sr. Primeiro-Ministro, que é quem dirige agora os trabalhos e o modo de funcionamento desta Casa? Ao Sr. Presidente da República?
Só a Mesa desta Assembleia, através do seu Presidente, é que tem de nos dar, neste domínio, uma resposta, Sr. Presidente. Mais ninguém. Recusamo-nos a dirigir essa pergunta a outrem que não seja a Mesa desta Assembleia.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, naturalmente que não se está a realizar nenhuma cerimónia clandestina dentro da Assembleia da República. É evidente!
Quanto à realização de cerimónias deste tipo ou às inúmeras reuniões de Srs. Deputados com membros do Governo nesta Assembleia, que se têm feito em todos os tempos, creio que as suas considerações vão para além do que é normal e exorbitam, com certeza, a capacidade de fiscalização que a Assembleia da República tem sobre estas questões.
Aplausos do PS e do PSD.
Sr. Deputado José Vitorino, pretende usar da palavra para que efeito?
O Sr. José Vitorino (PSD): - É para um protesto em relação às intervenções que aqui foram feitas, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não lhe posso dar a palavra para um protesto.
O Sr. Deputado poderá, também, interpelar a Mesa e nessa interpelação naturalmente terá oportunidade de fazer considerações, tal como outros Srs. Deputados fizeram anteriormente.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, nesse caso usarei a figura do direito de defesa do meu grupo parlamentar face às afirmações feitas pelo PCP e pelo CDS.
O Sr. Presidente: = Sr. Deputado José Vitorino, creio que estamos na mesma situação. Embora estas figuras sejam um pouco indefinidas - visto a figura da interpelação à Mesa ser utilizada, por vezes, para fazer apreciações de outra natureza que não o comportamento da Mesa ou as suas deliberações -, pode ter reflexos na vida da própria Assembleia os Srs. Deputados, noutras questões, quererem usar da palavra utilizando outras figuras regimentais.
No entanto, sugeria ao Sr. Deputado José Vitorino, que, através da interpelação à Mesa e mantendo uma atitude idêntica à dos restantes Srs. Deputados, faça as considerações que queira fazer e não utilize uma figura que não é a adequada neste momento.
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O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, julgo que o caminho que me indica não é o melhor, no entanto optarei por ele, visto ser o único que me deixa liberdade para falar ...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se quiser, contudo, optar pelo direito de defesa, faça favor.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, prefiro usar o direito de defesa porque, de facto, tanto o PCP como o CDS - sobretudo o representante do Partido Comunista - fizeram questão de salientar que da parte dos partidos da maioria, e no que se refere concretamente ao Partido Social-Democrata, haveria um menor empenho no funcionamento desta sessão por causa da cerimónia que está a decorrer numa das salas deste Parlamento.
O PSD, naturalmente, protesta e defende-se desta acusação, sem fundamento, e entende que não há razão para se estar aqui a perder tempo. Ou há quórum ou não há! Se há quórum, os trabalhos devem prosseguir imediatamente com as intervenções marcadas.
Quanto à questão de a cerimónia dever ou não ser feita nos termos em que se está a realizar, esse é, obviamente, um problema para a reunião de líderes e não para se discutir aqui, no Plenário da Assembleia.
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Vitorino, já tínhamos tomado essa decisão de prosseguir com esta reunião.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, em relação a este problema queria pôr-lhe uma questão.
Creio ser a primeira vez que 2 partidos utilizam as instalações da Assembleia da República ...
Protestos do PS e do PSD.
... para a assinatura de um mero acordo partidário. Creio, Sr. Presidente, que está aberto um precedente pergunto-lhe se, aberto este precedente, caso 2 ou
3 outros partidos quaisquer decidirem elaborar um acordo partidário, a Mesa da Assembleia autorizará a utilização do Salão Nobre da Assembleia da República para a assinatura desse acordo partidário.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, se não estou em erro, creio não ser a primeira vez que tal acontece, mas, naturalmente, recuso-me a entrar nessa futurologia.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, além das considerações que V. Ex.ª
fez sobre esta questão, creio que o debate a que estamos a assistir não dignifica em nada este Parlamento.
O Sr. José Magalhães (PCP): - O que não dignifica é a reunião que se está a fazer lá dentro.
Não dignifica em nada, Srs. Deputados, em absolutamente nada! 0 que se está a passar no Salão Nobre da Assembleia da República é um problema de interesse nacional.
Protestos do PCP e do CDS.
É um problema de interesse nacional, Srs. Deputados, e é lamentável que a mesquinhez domine os espíritos de tal modo que VV. Ex.as tragam aqui uma discussão sem sentido, sem significado e sem dignidade.
Aplausos do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, considero este assunto encerrado, pelo que só darei a palavra aos Srs. Deputados que queiram fazer intervenções no âmbito do período de antes da ordem do dia.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito pede a palavra para que efeito?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, suponho que agora é perfeitamente adequado o uso da figura do direito de defesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - O Sr. Deputado Ferraz de Abreu classificou as intervenções feitas nesta Câmara, por um lado, como susceptíveis de contribuir para a menor dignidade do Parlamento ou para a sua indignificação e, por outro lado, como mesquinhas. Diria que o que não contribui para a dignídade do Parlamento é a cerimónia que se está a passar no Salão Nobre ...
O Sr. Soares Cruz (CDS): - Muito bem!
O Orador: - ..., simultaneamente com o decurso dos trabalhos no Plenário.
O que teria contribuído para a dignidade do Parlamento - e sempre o afirmámos nas nossas intervenções - era que as discussões e as questões que conduziram a este acto tivessem decorrido aqui no Plenário da Assembleia, em discussão aberta e franca perante todo o País.
Risos do PS e do PSD.
O que não contribui para a dignidade do Parlamento é a cerimónia que está a decorrer aqui ao lado. Portanto, defendo o meu grupo parlamentar, repudiando as acusações de mesquinhez e de contributo dado para a indignificação do Parlamento que o Sr. Deputado Ferraz de Abreu acaba de fazer.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, quero dizer-lhe que não considero que esteja ferida a dignidade do Parlamento, se não a Mesa, e a minha pessoa em particular, teria tomado qualquer decisão ou atitude.
Não está em causa a dignidade do Parlamento e o Sr. Deputado dispõe de instrumentos para realizar o que sugeriu na sua interpelação à Mesa ou para fazer com que se discutam, aqui dentro, essas questões.
Para um protesto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, queria protestar em relação à intervenção do
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Sr. Deputado Ferraz de Abreu ou, se pretender, exercer o direito de defesa face às acusações que esse Sr. Deputado fez de que a minha intervenção teria sido mesquinha.
Sr. Presidente, temos, de facto, a ver com tudo o que se passa nesta Casa. Os deputados desta Assembleia têm a ver com todas as questões que se passam na Assembleia da República - por isso são deputados - e têm todo o direito de exercer esses direitos.
Nesse sentido, protesto contra as afirmações feitas pelo Sr. Deputado Ferraz de Abreu, e queria ainda dizer-lhe que, pela nossa parte, duvidamos que dignifique os trabalhos da Assembleia da República a realização simultânea da reunião que está a decorrer noutra sala.
Cremos, no entanto, que o facto de usarmos os nossos direitos, isso sim, dignifica a Assembleia da República.
O Sr. Presidente: - Para exercer o direito de defesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado Ferraz de Abreu, tenho-me habituado a ver em V. Ex.ª um deputado respeitador e que se dá ao respeito nesta Câmara.
Creio que foi apenas um lapso de V. Ex.ª a utilização de determinadas palavras que, de facto, utilizou. Pela minha parte tenho de as repudiar porque fazer uma pergunta à Mesa, perante um episódio que se está a passar nesta Casa, não merece os epítetos de V. Ex.ª.
Lamento, pois, as afirmações que proferiu porque elas vêm de um deputado que aparenta ser respeitador e educado. Por isso, Sr. Deputado Ferraz de Abreu, não poderei deixar de protestar, embora entenda que foi apenas por mero lapso que V. Ex.ª utilizou esses adjectivos.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Rocha de Almeida.
O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, utilizo esta figura regimental apesar de este assunto não ter nada a ver com a questão que aqui tem estado a ser debatida.
Na leitura do expediente, feita pela Mesa, foi referido um relatório da Federação Nacional das Caixas de Crédito Agrícola Mútuo em que, para além de diversos problemas que levantaram e que devem estar atinentes ao próprio relatório, referiam também a extinção do IFADAP.
A minha interpelação era no sentido de saber quais as possibilidades de a Mesa remeter esse relatório à Comissão Parlamentar de Agricultura e Mar porque entendo, e o meu grupo parlamentar também, que o assunto é delicado e que deve ser debatido. Portanto, deve-lhe ser dada uma "nobreza" - digamos assim - de acolhimento dentro da Assembleia porque há assuntos candentes, pendentes e gravosos para a agricultura e esse relatório devia ser remetido, para trato conveniente, à Comissão parlamentar respectiva.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.
O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, é uma interpelação muito rápida, exactamente no mesmo sentido do que o Sr. Deputado Rocha de Almeida acaba de dizer, ou seja, que o assunto tem suficiente importância para ser analisado na Comissão de Agricultura e Mar.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputado, enviaremos este relatório à Comissão de Agricultura e Mar porque as sugestões dos Srs. Deputados são, sem dúvida nenhuma, correctas.
Vamos passar às intervenções. O Partido Comunista está inscrito para uma declaração política mas ainda não nos indicou quem é o orador.
Pausa.
A Mesa foi entretanto informada de que os 10 minutos serão divididos em duas partes iguais e de que falarão os Srs. Deputados José Magalhães e Custódio Gingão.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do PCP venho fazer a seguinte declaração à Câmara: Diversos órgãos de comunicação social acabam de revelar a existência de um protocolo secreto, subscrito pelo presidente do Governo Regional da Madeira e pelo Ministro das Finanças em nome do Conselho de Ministros da República. O documento define segundo informações trazidas agora a público as grandes linhas que devem presidir à elaboração e execução do orçamento regional, fixa o limite do respectivo défice, sujeita a visto prévio do ministro das Finanças da República os programas de investimento da região e " autoriza" o congelamento das transferências do Orçamento do Estado para a Madeira por mera decisão ministerial.
A confirmarem-se estes termos, não tem fim a estupefacção. E foi por isso que trouxemos a questão a esta Câmara. A Assembleia da República sabe que 0 orçamento regional tem um buraco de mais de 5 milhões de contos, acrescendo aos 9 milhões inicialmente previstos. Sabemos que a dívida pública regional excede em muito 20 milhões de contos (e mais ainda se incluídas as dívidas autárquicas e do sector empresarial regional). É um facto: a política irresponsável, desastrosa, dos governos PSD conduziu a região à beira da bancarrota ...
É, porém, um colossal escândalo, Srs. Deputados, que os autores dessa política não tenham hesitado agora em aceitar a suspensão da autonomia regional, rasgando a Constituição numa parte fulcral que assegura os direitos das regiões em matéria financeira.
Causa estupefacção a notícia e o silêncio da coligação sobre ela. 15to é verdade? Chegou-se a este ponto? Os Srs. Deputados eleitos pela região autónoma confirmam que as coisas se passaram assim, com completa ultrapassagem das competências dos órgãos de governo próprio da região autónoma e dos seus direitos?!
O Grupo Parlamentar do PCP entende que a Assembleia da República tem o direito de se constituir na expectativa de sobre a matéria receber os esclarecimentos necessários tanto da parte do Governo da República como da parte dos órgãos de governo pró-
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prio da Região Autónoma da Madeira, e que mais não devem tardar.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Correia de Jesus para interpelar o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. Correia de Jesus (PSD): - O Sr. Deputado José Magalhães acaba de fazer uma comunicação a esta Câmara, baseado em notícias que terão sido publicadas nos jornais.
Penso que esta não será a melhor forma de trabalharmos nesta Câmara porque nos devemos basear em documentos oficiais, em fontes que possam fundar, com credibilidade, qualquer juízo, quer de encómio, quer de crítica.
Não conheço as notícias, pelo que não estou em condições de as contrariar ou de as confirmar, mas penso que o Sr. Deputado José Magalhães levanta seriamente esta questão e, como tal, associo-me a ele na preocupação de esclarecer tudo o que respeita ao Estado português que deva ser esclarecido.
Entretanto, Sr. Deputado José Magalhães, creio que não há razão nenhuma para isolarmos a situação financeira da Região Autónoma da Madeira face a outros problemas com que o Estado português está confrontado.
Daí que pense que a sua preocupação é pertinente, mas ela só é legitima se porventura acompanhada da preocupação de se esclarecer também tudo o que se passa em relação a outros importantes sectores da actividade do Estado, nomeadamente o sector empresarial do Estado e a sua situação financeira, o problema da reforma agrária e a sua situação financeira e tantos outros com que o nosso Estado e o Governo da República estão confrontados.
O Sr. Rocha Almeida (PSD): - Muito bem!
O Orador: - É, pois, neste contexto que o assunto deve ser tratado, e não tirando partido duma notícia de jornal, exagerando as considerações e a análise duma situação parcial, que é a da Região Autónoma da Madeira.
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães para responder.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Correia de Jesus, a questão que aqui está suscitada é da máxima gravidade, a todos os títulos. E o desconhecimento que o Sr. Deputado alega parece-nos pelo menos estranho.
Não é preciso ter estado na Região Autónoma da Madeira - e estivemos lá directamente e através de outros membros deste grupo parlamentar - para se saber que, por exemplo, a nível dos empreiteiros da região há, neste momento, um verdadeiro pânico quanto ao pagamento das obras em dívida e, mais ainda, que isso até é alegado pelos empreiteiros para não pagarem os salários, que estão em atraso, aos seus trabalhadores, que acabam assim por financiar a política que o governo regional teve e que conduziu a região à beira da bancacarrota, situação em que se encontra neste momento. É, pois, um facto público e notório que a Região Autónoma da Madeira tem 20 milhões de contos de dívida. Nem isso escapará ao Sr. Deputado Correia de Jesus!
O próprio pagamento aos funcionários públicos e às farmácias da região está em risco. O sistema de saúde está à beira da ruptura, também, por falta de meios financeiros. E não podem ser escamoteadas as responsabilidades do governo regional nisto!
Todos sabemos - debatemos isso aqui durante o período em que se discutiu a alteração ao Orçamento em vigor - por elementos oficiais que nos foram transmitidos, que a região autónoma está a procurar renegociar a sua dívida, e que para isso é necessária uma intervenção do Governo da República, porventura do Ministro das Finanças e do Plano e do seu Ministério. Tudo isto sabemos!
No passado fim-de-semana, um jornal veio revelar os termos de um protocolo. Esse protocolo vem replicar à questão do endividamento, mas em termos tais que são puramente arrepiantes quanto ao funcionamento do sistema de autonomia regional.
A primeira coisa espantosa é que o Sr. Deputado Correia de Jesus tenha vindo alegar desconhecimento em relação a um texto que já provocou um comunicado do PSD regional com acusações enormes, brutais, ao Governo da República, ao PS directamente, de centralismo de intervenção, ao mesmo tempo que esse protocolo é assinado pelo presidente do Governo Regional da Madeira.
Está, pois, constituída uma situação a que mesmo um cidadão mediano, que leia os jornais, não pode estar alheio. E o Sr. Deputado Correia de Jesus, deputado da República e ainda por cima com conexão específica à região autónoma, revela desconhecer, o que é pelo menos embaraçoso para mim, que o estou a ouvir, e creio que bastante mais para si que é o autor das palavras.
Considero útil e pertinente que se tenha associado ao pedido que este grupo parlamentar fez, mas devo dizer-lhe que teria considerado ainda mais útil e pertinente ter ouvido a sua voz logo no início desta reunião plenária a colocar esta questão e a exigir que, por quem de direito, sejam produzidos os esclarecimentos que venham a lançar luz sobre isto que, a confirmar-se, é um descomunal escândalo, não só do ponto de vista do Governo da República como também, e porventura sobretudo, do ponto de vista daqueles que, nos órgãos do governo próprio da região, em vez de defenderem a autonomia financeira não hesitam em pô-la no prego. É, isto o "nome" daquilo que acaba de ser feito.
Nesse sentido, consideramos que a Assembleia da República - e este debate pode ser um contributo para isso - deveria formalmente reclamar que, por parte de quem de direito, tanto a nível do Governo da República, como ao nível dos órgãos de governo próprio da região, sejam produzidos os esclarecimentos rigorosos que permitam, entre outras coisas, detectar se este protocolo escandaloso e inconstitucional existe realmente e o que é que se passa de verdade porque tanto o povo português como os deputados da Assembleia da República têm absoluto direito e dever de conhecer os termos exactos em que este golpe contra a autonomia regional foi perpetrado, por quem e porquê.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
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O Sr. Presidente: - Ainda dentro dos 10 minutos atribuídos ao Partido Comunista, tem a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado Custódio Gingão.
O Sr. Custódio Gingão (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar de tão mau quanto o Governo, o ex-ministro Soares da Costa não deixou de ser a primeira vítima das contradições de uma coligação onde é evidente a total incapacidade para a definição e implementação de uma política agrícola que sirva os interesses reais do País e o desenvolvimento tecnológico e socioeconómico da nossa agricultura e dos nossos agricultores.
Durante mais de ano e meio de governação, da responsabilidade de Mário Soares e Mota Pinto, todos os indicadores técnico-económicos não deixaram de se agravar, mesmo tendo havido o benefício de um ano agrícola favorável à produção.
Só que, imputar esta ocorrência favorável à acção do Governo apenas teria cabimento se o São Pedro fizesse parte do seu elenco ministerial.
Com efeito, os já extremamente baixos níveis de incorporação tecnológica regrediram, em consequência de uma política de preços que tem provocado a retracção na utilização de factores e meios de produção.
Alargou-se a já injustificável margem dos preços entre o produtor e o consumidor.
A incapacidade para implementar uma cobertura sanitária eficaz aos efectivos pecuários do País tem conduzido ao agravamento dos surtos de peripneumonia, da febre aftosa e da tuberculose, com a consequente degradação e redução dos efectivos pecuários.
Em lugar de uma política de incentivo à produção, assente e consolidada num adequado apoio técnico, num trabalho de experimentação e divulgação de novos cultivares de alta produtividade e de uma correcta gestão dos preços dos factores de produção, assistiu-se à adopção de uma política de preços artificiais para certos produtos (caso dos cereais), que apesar de ter tido alguns efeitos imediatos, se tornava evidente que não podia manter-se. Os preços estabelecidos para a actual campanha demonstram-no à evidência.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que faltou em vontade política, em competência, em capacidade de gestão dos meios disponíveis, para executar uma política de desenvolvimento do sector agrícola, foi ultrapassado em arbítrio, ilegalidades e imoralidades, no que respeita à reforma agrária.
Ou seja, na política agrícola deste Governo apenas existem respostas às pressões e interesses dos grandes intermediários e armazenistas, do grande comércio e indústria, e dos grandes agrários.
Tudo aquilo que o Partido Socialista dizia defender enquanto partido da oposição, e de que foram porta-vozes neste Parlamento vários deputados, caso do engenheiro António Campos, hoje membro do Governo, foi subjugado e espezinhado nesta coligação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tornou-se já um hábito nacional ouvir os governos afirmar que vão cumprir as leis, respeitar direitos, acatar decisões judiciais. Não foi este governo que nos desabituou, ainda, de ouvir tal cantiga.
Para este governo, tal como para os anteriores da AD, cumprir a Lei da Reforma Agrária (a lei Barreto, de inspiração e responsabilidade directas dos dois
partidos da coligação) tem sido violá-la artigo por artigo, regulamentá-la ilegalmente, estender as reservas
até ao limite do fisicamente possível - para não entrar por Espanha dentro - com o único objectivo de restituir as terras e antigos privilégios aos grandes latifundiários e suas famílias.
Respeitar direitos tem sido espoliar e fragmentar explorações agrícolas, produtivas e viáveis, entregando-as na sua maior parte, a falsos agricultores, com o único e cego critério de desapossar as UCPs/cooperativas de áreas legalmente detidas na sua posse útil; tem sido o esbulho de frutos pendentes, de gados e de um valioso património de exploração; tem sido o escândalo da cobrança coerciva de créditos, sem o pagamento das dívidas por parte do Estado.
Quanto a acatar as decisões judiciais perante 208 acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo que anularam concessões de reservas e distribuições de terras, este governo tem recorrido ao expediente de uma falsa reinstrução dos processos que leva, e levaria, seguramente, a nova vaga de despachos ilegais, mantendo entretanto centenas de milhares de hectares na posse de reservatários sem qualquer título de posse.
O despacho de 18 de Outubro de 1984, assinado por Soares da Costa, estendendo o prazo de requerimento de majorações, é um bom ponto de referência quanto às intenções do governo neste campo.
Trata-se de um despacho manifestamente ilegal à face da lei Barreto - que se antecipa, por receio, à projectada nova lei da reforma agrária, na forja governamental.
Este quadro teria, inevitavelmente, de se confrontar com o novo ministro da Agricultura.
Solicitado pela Comissão Parlamentar de Agricultura a vir prestar esclarecimentos sobre a política do seu ministério, o novo ministro Barreto escusou-se, alegando não ter tido ainda tempo suficiente para se inteirar e estudar os dossiers agrícolas. Esta atitude do Sr. Ministro poderia ser entendida como um acto ponderado e digno de quem pretenderia alicerçar a sua acção no equilíbrio e correcção da prática política.
Infelizmente, os actos já assumidos pelo Sr. Ministro retiraram todas e quaisquer ilusões, a quem as tivesse.
O que lhe faltou de conhecimento e de capacidade para responder de imediato aos graves problemas da nossa agricultura e para se apresentar perante a Comissão Parlamentar de Agricultura sobrou-lhe, desde logo, no empenhamento em prosseguir a política de destruição da reforma agrária.
Senão vejamos, e a título de exemplo, alguns dos muitos malefícios já desenvolvidos neste curto espaço de tempo do seu mandato:
No distrito de Portalegre, desde que o actual ministro tomou posse e até ao dia 22 de Novembro, já tinham sido entregues 3 reservas e estão para ser leiloados 7848 ha. O que, a concretizar-se, destruiria de uma assentada 6 UCPs/cooperativas perfeitamente viáveis.
No distrito de Setúbal, na Cooperativa Monte Novo de Palma, um ex-feitor recebe uma segunda reserva após a primeira ter sido entregue ao agrário. Alguém nesta Assembleia pode testemunhar legalmente que os feitores têm direito a reservas?
No distrito de Évora já foram entregues 3 reservas sem que as UCPs/cooperativas fossem previamente notificadas, como aliás a lei o exige, e sem que pu-
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dessem consequentemente exercer o seu direito legal e imperativo de contestação.
No distrito de Beja, e após o agrário José Joaquim Tareco ter recebido a sua reserva e o gado inventariado na altura da ocupação das terras (85 vacas e 64 porcos), a sua filha veio agora a ser contemplada, sem qualquer direito, ao efectivo pecuário correspondente ao que o pai já recebera. O mais espantoso em tudo isto é que quer o pai, quer o irmão deste reconheceram verbalmente e por escrito, perante os próprios serviços do MAFA, que já tinham recebido todo o gado a que tinham direito. O insólito deste caso vai ao ponto de o funcionário do MAFA, de nome Xavier, encarregado do processo, se ter limitado a concluir desta forma: "a entrega tem de ser feita".
No distrito de Santarém, de 56 agricultores a quem foram entregues terras de cooperativas, 51 foram já obrigados a devolvê-las aos agrários.
Exemplos como este, que se repetem por todo o lado, permitem compreender por que razão o ex-ministro Soares da Costa alterou para o dobro a pontuação das terras, passível de ser atribuída a agricultores individuais. E um processo para, ao fim e ao cabo, poderem entregar, mais rapidamente e a curto prazo, as terras aos grandes agrários.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes meros, mas significativos exemplos da política deste governo, mais que caracterizarem esta política, como profundamente reaccionária, são testemunho de um governo permissivo e participante nas ilegalidades, na corrupção e manifestamente atentório dos direitos humanos de milhares de homens, mulheres e crianças, para quem a reforma agrária e as suas UCPs/cooperativas, mais que simples instrumentos do direito ao trabalho e ao pão, constituem a certeza de um futuro de justiça e desenvolvimento nas terras do latifúndio.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Para bem do nosso povo e por vontade dele, este Governo tem de ser derrubado.
E não serão acções como a que está a ser levada a cabo pela Câmara Municipal de Lisboa, destruindo pela calada da noite anúncios relativos à grande manifestação do próximo dia 15 em Lisboa, que o irão evitar.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Tal como as acções do Governo, estes actos da Câmara Municipal de Lisboa, de presidência CDS, violam a Constituição e as leis, assentam numa filosofia que visa pôr em causa os direitos dos cidadãos, designadamente a liberdade de expressão e reunião, mas estarão condenadas ao fracasso.
A luta dos trabalhadores sairá vitoriosa.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gaspar Pacheco para pedir esclarecimentos.
O Sr. Gaspar Pacheco (PSD): - O Sr. Deputado Custódio Gingão referiu que o Sr. Ministro da Agricultura se tinha negado a vir aqui à Assembleia.
Queria lembrar ao Sr. Deputado Custódio Gingão que não foi isso que se passou. Ele foi convidado para vir à Assembleia dar esclarecimentos sobre as suas
viagens a Entre Douro e Trás-os-Montes e a Comissão de Agricultura entendeu fazer-me mais perguntas. E o Sr. Ministro achou que devia estudar os dossiers para poder responder a todas as perguntas, o que é absolutamente lógico dado que ele está no Ministério há mês e meio. Acho, pois, conveniente que tenha tempo suficiente para estudar as perguntas.
Por outro lado, também os dados que o Sr. Deputado Custódio Gingão referiu, sobre a entrega de reservas em Portalegre, acho-os muito estranhos pois não tenho qualquer conhecimento sobre entrega de reservas feita nesta altura.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder o Sr. Deputado Custódio Gingão.
O Sr. Custódio Gingão (PCP): - Sr. Deputado Gaspar Pacheco, se ouvisse com um pouco mais de atenção a minha intervenção, teria ouvido que fiz referência a isso. E disse mais: o Sr. Ministro não aceitou vir à Comissão de Agricultura e Mar por alegar que não conhecia os dossiers, o que achei natural. Até faço referência, na minha intervenção, que era normal que, em tão pouco tempo, não tivesse conhecimento de todos os dossiers porque eles são complexos e numerosos.
O que estranhamos e contestamos é que se o Sr. Ministro não tinha conhecimento de uns casos, mas tão-somente de outros, vá entregar reservas, como aconteceu em Portalegre, Setúbal, Évora e Santarém.
Então o Ministro não conhece os problemas de Trás-os-Montes, do Minho e das Beiras e conhece outros de forma a entregar no Alentejo? 15so é que é estranho e que contestamos!
Entretanto, o Sr. Deputado diz que não tem conhecimento de entrega de reservas, quer em Portalegre, quer em outros distritos. Posso dizer-lhe que já foram entregues reservas em todos os distritos desde que este ministro tomou posse, e o mais grave é que na vigência de outros governos e de outros ministros - mesmo do PSD - quase sempre as UCPs/Cooperativas eram notificadas, às vezes por telegrama, com 5 ou 6 horas de antecedência, que esse acto se ia consumar.
Este ministro manda consumar estes actos sem avisar as cooperativas. Mesmo que elas queiram recorrer destes actos não podem! Mais uma vez - ainda com uma maior agravante - este Governo viola as leis que por si foram criadas. Esta é que é a questão! Aliás, perece-me que o Sr. Deputado também deverá ir contestar esta questão junto do Sr. Ministro porque da vossa bancada, durante vários anos, sempre ouvimos dizer que eram pela legalidade ...
Estou aqui a denunciar um facto que é real. O Governo não cumpre as leis, no caso concreto o Sr. Ministro da Agricultura, e o Sr. Deputado e a sua bancada certamente não podem estar de acordo com um Governo e com um ministro que não cumprem as leis.
O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Gaspar Pacheco.
O Sr. Gaspar Pacheco (PSD): - Sr. Deputado Custódio Gingão, compreendo que quando um novo ministro entra para um gabinete não vai parar o ministério até estudar todos os dossiers. Logicamente que
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se havia instruções do antigo ministro para cumprir determinadas ordens ele as vai deixar correr para a frente.
O Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Na dúvida, deixa-as correr contra os trabalhadores!
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Custódio Gingão.
O Sr. Custódio Gingão (PCP): - O protesto do Sr. Deputado Gaspar Pacheco mostra bem, à evidência, as dificuldades em que a vossa bancada se encontra. Quer dizer, o ministro para não parar o seu ministério vai para a frente, ou vê um precipício e cai lá dentro. E o que este Ministro fez, é o que este Governo está a fazer, e as provas são claras.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vem sendo ponto de discussão constante o sistema fiscal em vigor. Sistema que muitos se recusam pacificamente aceitar, dado a fiscalidade portuguesa não surgir como um conjunto de medias interligadas entre si, mas antes um conjunto de normas, sem uma conexão e objectivo de levar os portugueses consciente e de boa vontade a colaborarem através dos seus impostos para a manutenção das despesas inerentes à vida da Nação.
Se é verdade que a fiscalidade portuguesa não se encontra organizada no sentido de dar resposta aos prementes problemas que nesta área se levantam, também é verdade que, salvo nestes últimos tempos, o País adormeceu em termos de modernidade fiscal, após a reforma levada a efeito entre 1958 e 1975.
Desta reforma, conduzida por um mestre na fiscalidade portuguesa, Prof. Teixeira Ribeiro, surgiram um conjunto de códigos e normas nas quais se dava preferencialmente luz verde à tributação das fontes de rendimento.
Se é certo que para o quadro fiscal de 1958 esta era indiscutivelmente a fonte certa de tributação, dado o peso que os meios de produção industriais começavam a ter na sociedade portuguesa, certo é também que com a referida reforma fiscal não foram acautelados princípios que a luz do desenvolvimento industrial, mais tarde viria a comprovar a necessidade da sua salvaguarda, sob pena de a própria reforma fiscal surgir ela mesma como geradora de injustiças sociais, que hoje urge remediar.
Qualquer reforma social que se pretenda levar a efeito em qualquer sociedade, tem de ter presente que a mesma só se consumará, na medida em que contar com o esforço do cidadão na sua implementação. Tal não aconteceu na aludida reforma fiscal e no meu entender não aconteceu porque não houve um esforço da Administração Pública no sentido de levar o cidadão a compreender a necessidade de cumprir as suas obrigações perante o Estado.
Tal situação era previsível pelos reformadores, se atendermos particularmente ao facto de todos os novos instrumentos fiscais terem incluídos na sua estrutura um mecanismo de presunção que permitia à Fazenda Nacional, através dos seus agentes, alterarem as declarações de rendimentos dos contribuintes.
Se é verdade que devem ser dados meios à Administração Pública, no sentido de salvaguarda dos interesses do próprio Estado, também é verdade que esse mecanismo deve ser accionado apenas em pormenores acidentais e não fazer dele um princípio dos agentes fiscais. Mais grave se me afigura é que por efeito da aplicação do processo de presunção o contribuinte fraudulento apenas seja penalizado com uma prestação pecuniária, e nunca privado da sua própria liberdade.
Tal situação leva a que se crie uma relação de mútua desconfiança entre o contribuinte e a administração fiscal - o contribuinte não fala verdade à administração -, pois sabe que a mesma não acredita nas suas declarações e aquela não acredita no contribuinte, pois sabe que na maioria dos casos ele não fala verdade.
É neste dilema, neste ambiente de mútua desconfiança em que se movimenta a maior fonte de receitas do Estado.
Aparentemente parece estarmos perante um problema sem solução; no meu entender ela existe e passa pela moralização do próprio sistema fiscal, pelos métodos da sua cobrança e liquidação e pela punição exemplar daqueles que fraudulentamente lesam o Estado e através dele a própria sociedade.
Sempre que haja razão para que a administração fixe rendimentos pelo processo presuntivo, ele deve ser consequência de conhecimentos de facto que conduzam a essa situação, e apuradas as responsabilidades, obrigue-se os seus autores às consequências dos actos de fraude que praticaram.
Para isso urge repensar a definição profunda entre infracções e transgressões fiscais, privando da liberdade os dolosos e mal intencionados e penalizando pecuniariamente os que por desleixo deixem de cumprir as suas obrigações.
O que não é mais possível, para bem da administração fiscal, do País e do próprio contribuinte é juntar no mesmo saco contribuintes cumpridores e contribuintes fraudulentos para quem na presente situação o crime é compensador.
No meu entender a Administração Pública deve irradiar para o cidadão uma imagem de eficiência, perfeição e moralidade.
No que à administração fiscal diz respeito não lhe é possível encarnar nenhum destes adjectivos, não que os seus agentes não se entreguem ao máximo das suas capacidades e com a melhor das boas vontades, mas não têm o mínimo de condições para serem eficientes, perfeitos e imporem ao seu trabalho, moralidade.
Tomemos conhecimento Sr. Presidente e Srs. Deputados, de alguns factos que nos ajudarão por certo a entender a situação actual:
A mais insignificante repartição de finanças deste país tem minimamente um número de 20 000 contribuintes sob a sua jurisdição; se atendermos aos impostos que produzem maior rendimento são sensivelmente um número de 10, verificamos que a repartição de finanças tem a seu cargo 200 000 contribuintes; se atendermos a que o quadro de pessoal das repartições anda sensivelmente por volta dos 20 funcionários constatamos que cada funcionário fica a seu cargo com 10 000 contribuintes; tomando em consideração que durante o ano os dias úteis de trabalho são sensivelmente 200, verificamos que cada funcionário terá de analisar 50 contribuintes por dia, o que
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dá para análise de cada contribuinte um tempo de 9 minutos.
Por muito pouca que seja a nossa sensibilidade para estas questões, não nos é difícil concluir pela impossibilidade de levar a cabo qualquer trabalho que reúna os predicados enunciados, não obstante existir na administração fiscal funcionários que dão o seu melhor, mas que não lhes é possível em termos humanos cumprirem minimamente.
Urge assim acordarmos para esta dura realidade com que se debatem os meios que dão expressão à fiscalidade portuguesa e unir esforços no sentido de dotar a administração fiscal de meios de informática capazes de possibilitarem uma mudança neste estado actual de coisas.
É que esta situação não se reflecte apenas nos processos de trabalho e fiscalização da administração fiscal; ela tem sido quanto a mim a responsável das distorções verificadas particularmente nestes últimos 10 anos na fiscalidade portuguesa.
O Estado vê diariamente acrescidas as suas responsabilidades perante o cidadão, responsabilidades traduzidas num aumento das despesas do próprio Estado, com a saúde, habitação, ensino, transportes, assistência social, terceira idade, etc. Tal facto gera a necessidade de aumentos de receitas, como essas receitas a serem implementadas, recolhidas e fiscalizadas pelo próprio Estado, por si era gerador de novas despesas e encargos para o próprio Estado.
Perante este dilema, o Estado tem optado pelo aumento das suas receitas sem que tal facto seja gerador de novos encargos, qual seja o aumento da tributação dos impostos retidos na fonte, como o imposto profissional, o imposto de capitais, o imposto de transacções e as quotizações para a Segurança Social e para o Fundo de Desemprego.
Como é evidente, o uso a este processo tem como consequência o agravamento dos rendimentos do trabalho, quer através do aumento das taxas ad valorem, quer por uma estagnação dos escalões de rendimento nas taxas progressivas.
E o mais grave é que esta situação continua a degradar-se em preterição de outras fontes de rendimento, capazes de produzirem as receitas necessárias mas que as não produzem, porque a sua liquidação exige um acompanhamento cuidado por parte da administração fiscal, no sentido de detectarem a verdade, como sejam a contribuição predial, o imposto sucessório, a contribuição industrial, o imposto complementar.
Estes impostos, e particularmente no que respeita à contribuição predial e ao imposto sucessório, há situações que de forma alguma podemos calar por mais tempo.
Na contribuição predial há situações verdadeiramente aberrantes, que se prendem com os rendimentos colectáveis das matrizes, havendo algumas destas que ainda são tributadas por rendimentos fixados há 15 anos.
Este é um imposto, que entronca com muitos outros e, para além de não produzir o seu rendimento próprio, cria distorções nas liquidações do imposto sucessório, imposto de sisa, imposto complementar e imposto de mais-valias.
Mas, para além do escândalo dos rendimentos matriciais, outros factos existem em sede da contribuição predial que demonstram a necessidade de se proceder a uma mudança profunda neste sector e que respeita à forma como os prédios urbanos são inscritos na matriz.
A administração fiscal não detém em seu poder quaisquer elementos de informação quanto aos prédios construídos na sua área de jurisdição, no entanto, na sua grande maioria os mesmos são construídos sob licenças passadas pelas câmaras municipais respectivas, e estas, por sua vez, nos termos da lei são obrigadas a comunicar ao Instituto Nacional de Estatística os seus titulares.
Estamos assim perante um dos mais graves erros do nosso sistema fiscal, qual seja a descoordenação dos diversos sectores intervenientes e o não aproveitamento dos organismos exteriores, mas que podem permitir in loco à administração fiscal a iniciação de um trabalho de fiscalização, por dentro, no sentido de identificação dos faltosos.
É este, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o quadro da fiscalidade portuguesa que implementado com um espírito de justiça e redistribuição perdeu pela prática do dia-a-dia as características fundamentais da sua filosofia existencial, ou seja, porque os contribuintes não se sentem minimamente sensibilizados para o cumprimento das suas obrigações.
Porque na sociedade portuguesa a carga fiscal não é distribuída de acordo com a capacidade de pagamento do cidadão, o sistema não é redistributivo e, finalmente, porque a diminuição constante de receitas, para além da falta de uma definição no que concerne aos sectores prioritários da nossa economia, tem-se assistido nos últimos tempos ao nascimento das mais variadas isenções, retirando ao sistema a sua função económica.
Nos últimos tempos, têm surgido pessoas que com o seu espírito crítico, têm dissecado, discutido e aprofundado a situação fiscal portuguesa, e temos que reconhecer que se outro mérito não existisse no seu trabalho, pelo menos o despertar da sociedade para a realidade actual premeia o esforço que empreenderam.
No meu entender, a Assembleia da República não pode ficar por mais tempo indiferente a esta situação e pela competência que lhe é atribuída, na Constituição da República Portuguesa, é nossa obrigação, Sr. Presidente, Srs. Deputados, unirmos as mãos, conjugarmos esforços no sentido de encontrarmos uma solução para este problema nacional.
E a solução, quanto a mim, passa necessariamente, pela reforma do sistema fiscal vigente, e uma nova concepção de tributação em que as fontes de rendimento são meios e não fins para determinar qual deve ser o quantitativo que cada cidadão deve contribuir para a vida da Nação.
Para tanto urge criar condições para que o imposto único sobre o património não surja ele mesmo já ferido de morte e gerador de novas injustiças.
Parta-se de elementos concretos e reais da vida portuguesa e atente-se o mais possível na inserção social em que o contribuinte tem a sua vida. Atribuam-se custos de vida os mais próximos da realidade e não se caia na tentação de que se o contribuinte mente à administração também lhe vai mentir, atribuindo-lhe valores de dedução que nada têm a ver com a realidade.
Se assim proceder, fica a administração fiscal com o direito e o dever de punir os fraudulentos, mas se
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o não fizer, com que moralidade os pode ela punir, se ela mesma, na sua concepção, é já imoral?
Criem-se condições para que o sistema seja infalível, isto é, crie-se um centro coordenador de rendimentos onde são condensados todos os dados fiscais dos contribuintes e onde seja possível a imediata detecção dos faltosos.
Repensem-se as isenções nos diversos impostos actualmente em vigor e muitos há certamente que noutros tempos se justificaram, mas hoje perderam razão de ser porque não correspondem às situações que pretenderam colmatar e porque a Pátria doente precisa do auxílio de todos os seus filhos.
Unamos as mãos, Sr. Presidente, Srs. Deputados, conjuguemos esforços, porque todos seremos muitos, juntos seremos fortes e Portugal precisa de nós.
Aplausos do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Domingues Azevedo, ouvi com a atenção possível a sua intervenção e, em certo momento, fiquei com a ideia de que V. Ex.ª fazia recair todos os elementos de injustiça e incorrecção do nosso sistema fiscal em sede de liquidação e cobrança. Não estou, porém, bem certo de que assim seja, porque na parte final da sua intervenção pareceu-me haver uma inflexão no sentido de uma maior correcção.
Pergunto-lhe: é isso que se passa, Sr. Deputado? Ou V. Ex.ª considera que o sistema fiscal português é injusto, eu diria do princípio ao fim, e que o problema não é de cobrança ou de liquidação, por muito que haja a dizer nesse domínio e nessa matéria, mas sim um problema de reformulação do próprio conceito de tributação, do que seja a matéria colectável, de caminhar, em suma, no sentido daquilo que nos tem sido prometido repetidamente e que, repetidamente, não tem sido realizado?
Agradecia o seu comentário, pedindo-lhe desde já desculpa se ele originar a repetição do que disse na sua intervenção. Mas, mesmo que repita, Sr. Deputado, penso que valerá a pena deixarmos bem claro nesta Câmara qual é a nossa posição perante este hediondo, repito, hediondo sistema fiscal que oprime os Portugueses.
O Sr. Presidente: - Para responder, se desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, quero antes de mais agradecer-lhe a oportunidade que me concede para poder explanar mais profundamente o meu pensamento nesta matéria.
As perguntas feitas pelo Sr. Deputado podem sintetizar-se em 3 questões fundamentais: a primeira residente em saber se os males do sistema fiscal se prendem ou não com a administração fiscal e os seus agentes, concretamente nas áreas da liquidação e cobrança; a segunda relaciona-se com o problema de saber se os sistema fiscal em si, como sistema, é bom ou é mau; a terceira consiste em saber qual deve ser a posição desta Câmara perante este problema.
O Sr. Deputado sabe, como jurista que é - e, como tal, teve Direito Fiscal no seu curso -, que todos os códigos fiscais portugueses em vigor - códigos que resultaram da reforma fiscal conduzida pelo Prof. Teixeira Ribeiro, como referi na minha intervenção - deixam ã administração fiscal um mecanismo de correcção das declarações do contribuinte. E é curioso que neste domínio não há sequer uma excepção.
Ora, a questão que se me coloca não é a de saber se a Administração tem ou não, se deve ter ou não o direito de corrigir as declarações dos contribuintes, mas sim o de saber qual deve ser a consequência da correcção efectuada pela administração fiscal.
De facto, o contribuinte faz a declaração e a Administração faz uma correcção em termos pecuniários. Mas não deverá o contribuinte sofrer uma penalização? E, a sofrê-la, será só de natureza pecuniária? O contribuinte defraudou a sociedade, lesou o Estado, na medida em que a administração fiscal teve de fazer uma correcção - ele disse que eram 50, mas a Administração diz que não são 50, mas sim 200. Neste caso, qual deve ser a sua penalização? Deve apenas pagar o diferencial? A única penalização que o contribuinte deve ter - e cinjo-me apenas à questão da correcção efectuada pela Administração - é apenas pecuniária? Neste país os ladrões não são penalizados? Neste país os fraudulentos não são penalizados?
O meu conceito da função social do sistema fiscal é diferente, tal como consta da parte final da minha intervenção.
O que defendo, Sr. Deputado, é que a administração fiscal deve continuar a ter ao seu alcance um mecanismo de presunção, mas esse mecanismo de presunção tem de ser executado em termos de direito de fundo e não apenas porque a administração fiscal entendeu que o indivíduo ganhou mais. Quando esse mecanismo for aplicado deve sê-lo em termos de conhecimento profundo e concreto para que o contribuinte fraudulento seja penalizado.
Atribuo, portanto, uma consequência mais profunda e fundamento este mecanismo da administração fiscal no sentido de que o contribuinte fraudulento seja penalizado. Mais: não tenho problemas em dizer que se a administração fiscal se aperceber, em termos de factos concretos, que o contribuinte foi dolosamente fraudulento e mal-intencionado, seja privado da sua liberdade, porque indesejável à sociedade.
A segunda questão consiste em saber se os sistema fiscal ...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, concluiu o seu tempo.
O Orador: -- Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, penso que nenhum deputado desta Câmara duvida que o sistema fiscal português deixou de corresponder à missão para que foi estruturado em 1958, desde logo porque as condições não são as mesmas. Há economia subterrânea, há economia paralela, há toda uma fuga a que os sistema fiscal deixou de corresponder.
Todos nós estamos perfeitamente conscientes de que, neste momento, é necessário haver uma nova concepção de tributação do cidadão. Já não podem ser as fontes de rendimento, porque sabemos todos os subterfúgios, todas as ramificações possíveis que na sociedade portuguesa existem em termos de fuga ao imposto.
A posição da Câmara ...
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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa, mas já não tem mais tempo, pelo que terá de dar por concluída a sua resposta.
O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Nogueira de Brito pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, gostaria de voltar a este assunto, sob a forma de protesto, evidentemente.
O Sr. Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado.
Embora já tivéssemos ultrapassado o tempo destinado ao período de antes da ordem do dia, tem a palavra o Sr. Deputado Pereira Lopes para produzir uma declaração política.
O Sr. Pereira Lopes (PSD): - Sr. Presidente, dado que irei atrasar o período da ordem do dia, e correspondendo a um apelo de V. Ex.ª, prescindo de efectuar hoje a intervenção, tanto mais que não a considero de tal modo urgente que justifique ter de ser feita hoje.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos então passar ao período da ordem do dia.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Da agenda consta a discussão das Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional, que iniciaremos logo que cheguem os membros do Governo, para o que já se estão a fazer as necessárias diligências.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, considero que foi útil a informação contida na última parte das palavras que acaba de dirigir à Câmara, isto é, que estão a ser feitas diligências que permitam levar ao conhecimento do Governo que a Assembleia da República vai entrar na apreciação das propostas do Governo relativas a estas matérias. Em todo o caso, isso não chega sequer para que o espectro do Governo paire sobre a Assembleia e menos ainda para que ele se sente na sua bancada, condição fundamental para que o debate possa começar, como V. Ex.ª sabe.
O Sr. Presidente: - Como o Sr. Deputado José Magalhães não ignora, o período de antes da ordem do dia tem uma duração um pouco variável, razão pela qual só agora, quando chegámos ao seu termo, se foram chamar os membros do Governo.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, queria perguntar se a Mesa já se terá apercebido dos inconvenientes que há pouco apontámos, designadamente para o funcionamento da Câmara, ou se continuará a não se aperceber deles.
O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado, não se trata de miopia da Mesa, mas sim de uma perspectiva diferente: a de fazer funcionar a Assembleia. A sua perspectiva é, ao invés, a de levantar questões relacionadas com a sua bancada.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não, Sr. Presidente, não é essa a minha perspectiva. A minha perspectiva é a de contribuir, juntamente com a Mesa, para que a Assembleia funcione.
O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, dado que já estão presentes os membros do Governo, vamos dar início ao debate das Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional, para o que estão abertas as inscrições.
Pausa.
Inscreveram-se os Srs. Deputados Magalhães Mota e César Oliveira, mas creio bem que haveria toda a conveniência em que fosse o Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional a abrir o debate.
Assim, se não houver oposição dos Srs. Deputados inscritos, dou a palavra ao Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional.
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional (Mota Pinto): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No momento em que, no cumprimento dos dispositivos legais vigentes, o Governo submete ao debate na Assembleia da República as Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional, parece oportuno começar por reflectir sobre o sentido deste debate.
O que está aqui em questão não é o conceito estratégico de defesa nacional, mas sim as grandes opções no desenvolvimento das quais o Governo elaborará um projecto - que está praticamente concluído, mas também aberto a receber as aportações que naturalmente este debate lhe proporcionará. O que aqui está em debate são, pois, as Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional, que, por simetria como que acontece entre as Grandes Opções do Plano e o Plano, são uma síntese e uma formulação concisa desenvolvida no conceito estratégico de defesa nacional, por aplicação do qual noutra sede será elaborado o conceito estratégico militar e no desenvolvimento do qual, noutras sedes, terá lugar a definição de missões, de sistemas e dos dispositivos a eles correspondentes.
Qual é o sentido deste debate sobre as Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional?
Numa nação multissecular, quando se procuram formular as grandes opções de um conceito estratégico de defesa nacional, não se trata de escolher, dentro de um universo ilimitado, objectivos de defesa através de uma definição de identidade nacional e do rastreio das ameaças que se lhe podem deparar. Numa nação multissecular, a consciência nacional gera o instinto de defesa e o reconhecimento natural da amea-
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ça que permitem alinhar os conjuntos das grandes medidas que poderão, a todos os níveis, diminuindo as vulnerabilidades, aumentar as potencialidades e, em suma, garantir a segurança.
Ainda que tenhamos vivido nos últimos anos profundas alterações do ser do Estado, que representam, indiscutivelmente, um factor de perturbação da corrente histórica natural, não podemos, ao debater um documento deste género, abordá-lo com a perspectiva de um Estado recém-criado. Não somos um Estado recém-criado.
Não se trata, assim, de fixar, como quem escreve numa folha de papel em branco, as grandes opções de um conceito estratégico de defesa nacional, mas antes de reconhecer as que correspondem já à natureza do Estado Português. Devemos entender que não há aqui conceitos imutáveis ou de validade inalterável e que se têm de considerar os grandes períodos históricos, mas também não podemos deixar de ter bem presente que um conceito estratégico de defesa nacional é algo de mais permanente e de mais consensual do que uma simples política de defesa, a qual tem um conteúdo muito mais conjuntural e poderá ter a marca de um governo determinado.
Num conceito estratégico de defesa nacional há, portanto, um sinal de estabilidade, de permanência e de identificação com os grandes imperativos que advêm da história, da geografia, da demografia e de todas as características de ser do Estado Português, ao invés do que acontece com uma política de defesa, naturalmente mais conjuntural e mais debruçada sobre os problemas do momento.
Ora, apesar de podermos identificar ao longo da história portuguesa alguns momentos em que se põe em dúvida não a sua. existência ou a sua razão profunda, mas a sua missão ou os seus objectivos, podemos também reconhecer factores permanentes de identidade que lhe permitiram enfrentar com sucesso os desafios lançados contra a sua independência nacional.
Portugal é um país de geração europeia, herdeiro de valores culturais hebraico-cristãos e greco-romanos, profundamente entrecruzados com contribuições de culturas extra-europeias.
Com efeito, a sua posição na periferia da Europa permitiu-lhe desempenhar um papel de relevo no cruzamento da Europa do Norte com os vastos espaços do hemisfério sul, ao mesmo tempo que assegurava uma posição única no quadro político existente no momento da formação da Nacionalidade.
Desde muito cedo que o território nacional se tornou arquipelágico, com a consequência natural de integrar o mar na lógica nacional de defesa e de viabilizar a manutenção da sua independência numa península com uma marcada tendência para a integração em torno do Estado de características mais acentuadamente territoriais.
De tudo isto se depreende a lógica e a utilidade da inserção de Portugal tanto nas comunidades europeias como na NATO, inserção esta que deve ser complementar e nunca disjunta. Mas à fidelidade de Portugal a ambas as organizações deve corresponder o reconhecimento pelo valor geo-estratégico da nossa posição atlântica e da nossa natureza arquipelágica.
O debate deste documento na Assembleia da República deverá ter o mérito de relembrar que, seja qual for a posição geo-estratégica de um Estado, seja
qual for a sua situação política, económica, cultural ou militar, a sua independência corre perigo se não lhe assistir um factor humano de coesão intrinsecamente distintivo e profundamente marcado pelo gosto da independência e pela vontade de defesa.
A Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas entende por conceito estratégico de defesa nacional - cujas grandes opções, ou seja, cuja formulação sucinta é do conhecimento dos Sr. Deputado - a definição dos aspectos fundamentais da estratégia global do Estado adoptada para a consecução dos objectivos da política de defesa nacional, indicando também alguns dos objectivos permanentes: garantir a independência nacional; assegurar a integridade do território; salvaguardar a liberdade e a segurança das populações, bem como a protecção dos seus bens e do património nacional; garantir a liberdade de acção dos órgãos de soberania, o regular funcionamento das instituições democráticas e a possibilidade de realização das tarefas fundamentais do Estado; contribuir para o desenvolvimento das capacidades morais e materiais da comunidade nacional, de modo que possa prevenir ou reagir, pelos meios adequados, a qualquer agressão ou ameaça externa; assegurar a manutenção ou o restabelecimento da paz em condições que correspondam aos interesses nacionais.
Estes objectivos são subsumíveis e podem reconduzir-se a um único - a garantia da soberania e da independência nacional - princípio este orientador da estratégia global do Estado.
A defesa tem, assim, um carácter intrínseco de unidade, cobrindo e obrigando imperiosamente, de modo uniforme, todo o território e toda a população nacional.
A Nação, o facto nacional português, é, portanto, o valor estratégico fundamental que determina para a estratégia global do Estado em matéria de defesa nacional algumas direcções essenciais.
Primeira direcção essencial: reforço da coesão e unidade interna, através do fortalecimento da consciência nacional e do desenvolvimento dos valores éticos, morais e culturais que historicamente a formam e lhe dão razão de ser.
Nesta direcção, a defesa nacional deve, num país plurissecular, orientar-se pelo princípio da unidade do Estado enquanto comunidade política, cuja relevância se manifestará em particular e de forma exemplar na solidariedade entre os portugueses residentes no todo nacional geograficamente disperso ou no estrangeiro.
Segunda direcção essencial: a afirmação do primado do interesse nacional nas relações externas, fundado numa vontade nacional firme e no conhecimento e assunção da importância estratégica dos factores geográfico e cultural portugueses no plano internacional.
Esta afirmação do primado do interesse nacional nas relações externas é rica de consequências quando no próprio conceito estratégico de defesa nacional nós aceitamos a necessidade de aderir a um quadro correcto de alianças. Desde logo significa que nós não colocamos em primeiro lugar outro valor que não seja o dos objectivos nacionais, os objectivos ligados à independência nacional. E os objectivos que prosseguimos no quadro de alianças em que participamos por comunhão de valores civilizacionais, culturais, éticos ou de interesses, são objectivos instrumentais em relação à afirmação dos grandes objectivos nacionais, dos objectivos que definem a independência nacional.
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15to tem importância nos seus corolários e no seu desenvolvimento e é uma opção clara: primado do interesse nacional nas relações internacionais externas de defesa ou outras. Designadamente no campo da defesa, isto pode conduzir, no seu desenvolvimento, a consequências muito diversas, não sendo a mesma a opção feita por muitos Estados. Há Estados que definem como objectivo prioritário a consecução dos objectivos das alianças em que estão integrados.
Chamo a atenção para o significado do primado do interesse nacional, porque, designadamente, no seu desenvolvimento ele terá de conduzir a determinadas opções na definição do conceito estratégico militar, conceito cuja definição não terá lugar aqui mas noutras instâncias, embora naturalmente as suas consequências estejam sujeitas ao controle parlamentar, através da programação militar, através do Orçamento e através de todos os outros mecanismos de que o Parlamento dispõe para poder controlar o conjunto da vida pública.
A afirmação do primado do interesse nacional significa que os objectivos nacionais próprios são aqueles que consideramos prioritários, embora não sejam necessariamente aqueles que são vistos como prioritários, se fosse perspectivado o interesse de Portugal para a defesa a partir de Bruxelas, por exemplo. É que, se se perspectivasse o interesse de Portugal, em matéria de defesa, a partir de um ponto exterior, ou a partir da Aliança Atlântica em que estamos integrados, daí poderia decorrer que fossem prioritários aspectos que, por exemplo, não acentuassem tanto a necessidade de atender ao elemento territorial no seu aspecto de quadrícula do território ou no seu aspecto de defesa territorial por outros meios adequados a essa defesa. E poderiam, naturalmente, ganhar apenas relevância outros aspectos, pondo de parte ou dando um interesse muito secundário ao aspecto territorial.
A afirmação do primado do interesse nacional, mesmo no quadro de um país que opta por permanecer não neutralista, não isolado, mas integrado em alianças tem corolários e tem consequências que são diversas daquelas que resultariam de uma afirmação de que os nossos objectivos nacionais de defesa eram apenas os objectivos da aliança em que nos integramos.
Os nossos objectivos de defesa são, em primeiro lugar, os objectivos nacionais, e os objectivos da aliança em que nos integramos são instrumentais destes objectivos que configuram e dão corpo à ideia de independência nacional. Neste sentido, portanto, a defesa nacional orientar-se-á pelo princípio da independência política que postula a necessidade de afirmação de interesses próprios e a salvaguarda de uma capacidade de decisão autónoma no quadro actual de independências económicas e militares.
Uma terceira direcção essencial da ideia de nação como valor estratégico fundamental é a garantia de um quadro de alianças adequado, isto é, de um quadro de alianças que possibilite suprir ou reduzir ao mínimo as vulnerabilidades salvaguardando e promovendo ao máximo as potencialidades nacionais. Nesta direcção, a defesa nacional, sem deixar de ter em conta que o desarmamento equilibrado e que a dissolução segura dos blocos politico-militares são condições de uma paz mundial efectiva, deve orientar-se pelo princípio do alinhamento ocidental, princípio esse que reúne o consenso da opinião pública e é a expressão de um compromisso internacional realista, capaz de garantir a autonomia política, a estabilidade das instituições democráticas e a identidade cultural portuguesa no espaço euro-atlântico que lhe é próprio.
Existem no mundo blocos políticos - é um facto - de forte componente militar e essa existência traduz uma opção fundamental de grupos de nações com vista à sua melhor defesa, mas há diferenças! Para algumas nações, a opção por um determinado alinhamento é uma opção feita com base em factores históricos, sociais, culturais, morais, todos eles livre e democraticamente assumidos, enquanto para outras a integração em blocos é uma escolha imposta, uma escolha que resulta de um sentido expansionista e hegemónico de uma superpotência.
Defendemos, portanto, o princípio do alinhamento ocidental e, dentro dele, somos favoráveis à existência de um forte pilar europeu, de um pilar europeu sólido dentro da aliança ocidental, sem que, todavia, esta aceitação de um pilar europeu sólido e robusto dentro da aliança ocidental possa significar a opção pelo isolamento europeu, por uma Europa, digamos, europeísta, integralmente cortada das suas ligações naturais e sem que isto signifique que estejamos de costas viradas para a América do Norte. Pelo contrário, somos defensores da complementariedade da afirmação europeia com o diálogo e com a cooperação transatlântica, ou seja, entre os EUA e o Canadá e os países da Europa Ocidental.
Estes princípios de unidade do Estado, de independência política e de alinhamento ocidental devem somar-se e combinar-se com o princípio geral de eficácia que impõe, dentro de parâmetros definidos, a procura de soluções de melhor relação, custo/eficácia.
A garantia da independência nacional deve ser conseguida não apenas através de mecanismos puramente político-militares mas também pela intervenção na ordem económica, social e cultural do Estado, devendo ainda ser ponderada a partir da posição relativa do Estado no seio da comunidade internacional.
A estratégia da defesa nacional deverá desenvolver-se de forma coerente em obediência aos princípios e objectivos enunciados.
Assim, destacam-se as seguintes grandes áreas de intervenção: no plano político geral, deve privilegiar-se a existência de uma vontade e de uma determinação políticas fortes, decorrentes de uma sólida vontade nacional de defesa. Assim, devem ser desenvolvidas e fortalecidas a consciência da identidade nacional e a consciência cívica de toda a população, e em especial da juventude, bem como a de uma opinião pública nacional esclarecida e motivada em matéria de segurança e de defesa. Cabe aqui um papel muito importante ao sistema educacional, ao conteúdo dos programas, à prática da vida educacional dentro do pluralismo democrático. Cabe também aqui um papel muito importante a todos os aparelhos de ordem ideal que podem contribuir para a formação de uma sólida consciência nacional e democrática de defesa. A educação e também a acção dos meios de comunicação social, votando-se ao esclarecimento isento e sistemático das várias questões de segurança e de defesa nacional.
Deve existir - e é desejável que exista - um confronto sério, intelectualmente bem apoiado, entre pontos de vista diferenciados sobre tais matérias, e sempre com a consciência do melindre deste tipo de questões
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e de manifesta actuação permanente que poderes, interesses e forças adversárias dos objectivos nacionais portugueses têm numa contra-informação confusa e sofismada e numa manipulação da informação. Dentro deste prisma de política geral, devem ser desenvolvidas e fortalecidas a autoridade do Estado democrático e a solidariedade entre os órgãos de soberania em torno dos interesses nacionais, no respeito das instituições democráticas e das formas constitucionais de exercício do poder político. Igualmente a participação equilibrada de todo o espaço português nos grandes objectivos nacionais, designadamente nos da defesa através da cooperação inter-regional. Há que salvaguardar, como valor fundamental, nas Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional e no seu desenvolvimento no conceito estratégico o prestígio das forças armadas como instituição nacional ao serviço do povo português e não ao serviço de qualquer grupo, o que é indispensável à afirmação nacional no seio das nações. Naturalmente, a defesa e a garantia, que corresponde a uma efectiva realidade nos tempos actuais, da disciplina das forças armadas e da sua inserção harmónica no corpo do Estado, através da subordinação ao poder político democraticamente fundado. O prestígio e a disciplina das forças armadas, que são realidades patentes, evidentes e indiscutíveis na hora actual, são fundamentais, pois sem forças armadas prestigiadas e disciplinadas não há militares, há, sim, soldados desgarrados.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Ainda no plano político geral, é importante e deve ser desenvolvido e fortalecido o planeamento civil de emergência, o que, aliás, foi já feito pelo Governo através da institucionalização dos órgãos adequados articulando a gestão dos recursos disponíveis por forma a fortalecer a capacidade da Nação para enfrentar e para responder satisfatoriamente a situações de crise ou de emergência grave.
O fortalecimento dos Poderes Públicos deverá assegurar as necessidades nacionais de segurança pelo respeito e através das instituições democráticas com salvaguarda das liberdades individuais, do pluralismo de expressão social e das regras e formas constitucionais de exercício de poder político.
Outra área de intervenção tem a ver com o plano económico, social e cultural. Aí, o conceito de defesa nacional não pode deixar de afirmar a imperatividade de se criarem e de se incrementarem as condições sociais de independência, através do desenvolvimento das forças produtivas e criadoras, nomeadamente do desenvolvimento industrial, científico e tecnológico nos sectores mais carecidos e mais relevantes em termos estratégicos, em ordem a diminuir, na medida do possível, a dependência em relação ao exterior. Sob este aspecto, o do desenvolvimento tecnológico, é necessário assinalar a necessidade da permanente defesa pelo Estado Português de uma posição adversa da Constituição, mesmo no quadro dos países com os quais temos relações mais próximas, de agrupamentos reduzidos ou de clubes tecnológicos de países que, por possuírem um património tecnológico e industrial mais desenvolvido, promovam a sua cooperação, em termos de se verificar a maximização das vantagens que já têm, com a consequência de se aprofundar o fosso, a diferenciação com outros países aliados que têm, apesar de tudo, capacidades tecnológicas evoluídas. 15to é, nós entendemos que a nossa capacidade tecnológica deve ser colocada em comum com os países aliados e, em geral, as nossas potencialidades em matéria de indústria de defesa ou de indústria em geral para recebermos aquilo que corresponde a um estádio de desenvolvimento mais avançado ou alcançado mas que, no patamar que possuímos, temos possibilidade de gerir, em termos de uma contribuição útil, num esforço comum. Este tipo de cooperação tecnológica, portanto, é o contrário da aceitação de um clube tecnológico de países mais desenvolvidos à margem dos países de menor dimensão ou tecnologicamente menos desenvolvidos. O reconhecimento da existência de potencialidades e de realidades no domínio tecnológico e industrial português permite uma cooperação efectiva, em termos reciprocamente vantajosos e em termos de contribuirmos para um resultado comum positivo.
Ainda neste plano económico, social e cultural, devem ser inscritas no conceito estratégico de defesa nacional as condições que se referem igualmente à necessidade do desenvolvimento económico, em termos de justiça social e de qualidade de vida, através de uma distribuição mais equitativa e equilibrada da riqueza, do progresso entre pessoas e entre regiões, diminuindo os custos da pobreza, da insularidade e da interioridade e a extensões internas daí resultantes.
Preconizamos também o desenvolvimento da educação e do ensino de forma a contribuir para a conscencialização colectiva da importância e do significado dos valores históricos e culturais da Nação, do significado e da importância dos símbolos que retratam a unidade nacional, bem como incentivar o florescimento livre da cultura portuguesa enquanto traço de união e de sinal de identidade nacional.
Impõe-se ainda o desenvolvimento das comunicações e transportes internos, elemento essencial de união e fortalecimento da identidade nacional num território geograficamente disperso, isto é, composto por parcelas descontínuas em termos territoriais.
E, finalmente, defendemos nesta área a constituição de reservas estratégicas em áreas vitais, em especial nas da alimentação, combustíveis e matérias-primas essenciais, a fim de garantir a sobrevivência e aumentar a capacidade de resistência em caso de conflito.
No plano da política externa geral, as relações internacionais deverão ter em conta a realidade geo-estratégica do País como espaço euro-atlântico e privilegiar as suas áreas tradicionais de influência. Neste sentido, a posição de Portugal, depois da adesão às comunidades europeias, deverá tomar em consideração os elementos internos e externos da política de defesa nacional, nomeadamente no que toca ao desenvolvimento económico, científico e tecnológico.
Em segundo lugar, a integração em organizações ou em espaços supranacionais e, em geral, a colocação internacional será determinada; para além de razões económicas e técnicas, pela necessidade concreta de preservar a soberania nacional contra todas as ameaças.
Finalmente, ainda neste plano de política externa geral, a cooperação económica, científica, cultural, diplomática e militar com os países de expressão portuguesa, com os países em que existam comunidades
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portuguesas e, em geral, com todos os países de espaço euro-atlântico e africano deve ser intensificada com o objectivo de estabelecer uma área de influência em que Portugal possa desempenhar um papel de relevo.
No plano político-militar externo procurar-se-á garantir que a participação portuguesa na OTAN reforce a capacidade de defesa autónoma e seja compatível com esta. Já há pouco referi este ponto, quando afirmei o primado do interesse nacional quando posto em paralelo com o princípio do alinhamento ocidental. Assim, a participação militar portuguesa na defesa colectiva da OTAN deve ser articulada com as necessidades de defesa autónoma, em termos que permitam, tanto quanto possível, a utilização dos mesmos meios e capacidades para a realização desse duplo objectivo.
Em segundo lugar, a participação militar portuguesa na defesa colectiva deve ser desenvolvida em todas as circunstâncias e, em particular, no quadro actual da Aliança, de forma a não pôr em perigo a unidade nem enfraquecer a soberania nacional. Portugal deve assumir responsabilidades especiais de comando nas tarefas em que estejam em causa interesses vitais próprios, seja no que toca à defesa territorial, seja no que toca aos espaços interterritoriais e deve ser orientado essencialmente em relação com a sua caracterização geo-estratégica ou, quando conveniente, com a defesa à distância adequada ao interesse nacional.
Em terceiro lugar, a cedência de facilidades ou de utilização de infra-estruturas em território nacional por outros países da Aliança, sendo origem de riscos acrescidos, deve ser compensada por ajuda de defesa e de outras naturezas que contribuam para o desenvolvimento das capacidades militares nacionais ou para o fortalecimento da comunidade nacional, designadamente no aspecto tecnológico.
Em quarto lugar, a política militar externa de defesa deverá ter sempre em consideração especial o carácter descontínuo do território e a importância estratégica essencial das fronteiras e áreas marítimas e do espaço interterritorial, quer para a defesa do Ocidente, quer para a garantia da sobrevivência e da viabilidade da Nação Portuguesa como Estado independente.
Finalmente, no plano político-militar interno, deverá ser acentuada a componente de defesa autónoma eficaz da capacidade de sobrevivência e dissuasão das ameaças à integridade nacional, ameaças cuja efectíva identificação não é aqui, naturalmente, o lugar próprio para sublinhar, para além daquela que está implícita no princípio do alinhamento ocidental que é uma direcção fundamental da nossa estratégia nacional de defesa. Deve também ter-se em vista assegurar uma capacidade militar própria que desencoraje a agressão e facilite, em caso de conflito, o restabelecimento da paz em condições que correspondam aos interesses nacionais. Em segundo lugar, organizar a indispensável capacidade dissuasora de modo a permitir a defesa conjugada do território nacional, procurando, em face da sua dispersão geográfica e falta de profundidade do território continental, exercer presença e vigilância aérea e marítima no espaço interterritorial e assegurar capacidade de reforço e de intervenção rápida em qualquer área do território nacional.
Em terceiro lugar, estruturar o serviço militar obrigatório enquanto modo de participação directa dos cidadãos na actividade de defesa, bem como organizar a resistência dos cidadãos em caso de conflito.
Em quarto lugar, incentivar uma indústria de defesa vista como departamento ou como aspecto logístico das próprias forças armadas, sem embargo da sua inserção nas potencialidades industriais globais do País, mas incentivar a indústria de defesa como factor essencial à capacidade de defesa autónoma, ao desenvolvimento económico e ao progresso tecnológico.
Em suma, a estratégia global do Estado pode resumir-se à definição de duas missões históricas: o fortalecimento da ordem interna do Estado que o torna capaz, em meios e vontades, de reconhecer e de reagir à ameaça e o fortalecimento do Estado na ordem externa na comunidade internacional pela reafirmação da sua capacidade negocial, pela definição inequívoca dos seus interesses e pela maximização das suas potencialidades políticas, histórico-culturais, e geo-estratégicas.
Estas são, Srs. Deputados, as considerações que queria tecer em apresentação do texto das Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional.
Aplausos do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados César Oliveira, Carlos Brito, João Amaral, António Gonzalez, João Corregedor da Fonseca, José Luís Nunes e Nogueira de Brito.
Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Vice-Primeiro-Ministro, gostaria de colocar algumas questões iniciais em relação à intervenção que V. Ex.ª produziu, visto que, felizmente, este debate ir-nos-á ocupar algumas horas, e ainda bem que assim é.
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro disse que não estamos a discutir o conceito estratégico de defesa nacional, mas sim alguma coisa de prévio a esse conceito, ou seja, as grandes opções que irão enformar e informar o Conceito Estratégico de Defesa Nacional. Sendo assim, concorda V. Ex.ª que estas grandes opções condicionam ou não as sucessivas definições que irão ser tomadas neste domínio?
No início da sua intervenção, V. Ex.ª referiu que "há um reconhecimento natural da ameaça". Ora, gostaria que trocasse esta frase em miúdos, ou seja, que explicasse que reconhecimento natural existe, que ameaça é reconhecida pelos cidadãos e pelo Estado como sendo natural. Creio que a resposta a esta questão vai condicionar muito o conceito estratégico de defesa nacional, o conceito estratégico militar, etc.
Julgo que V. Ex.ª se enganou ao referir-se a aparelhos de ordem ideal, pois penso que queria dizer aparelhos de ordem ideológica e não ideal ...
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional: - Aparelhos de ordem ideal!
O Orador: - Então, o que é que V. Ex.ª entende por aparelhos de ordem ideal? Devo confessar que não sei o que é que isso quer dizer.
Por outro lado, falou várias vezes acerca do primado dos interesses nacionais. Essa é uma verdade que La Palisse não enjeitaria, mas, no entanto, não sabemos quais são esses interesses nacionais. Esta é que é a questão fulcral que V. Ex.ª apenas enunciou,
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mas nunca disse quais eram esses interesses nacionais. Creio que este debate se deve centrar fundamentalmente na definição e na elucidação de quais sejam os interesses nacionais que devem presidir à formulação e à definição das Grandes Opções do Conceito Estratégico Nacional e a tudo o mais que por arrastamento daqui decorre.
Também foi dito que uma das tarefas prioritárias é a constituição de reservas estratégicas essenciais no tocante à alimentação, combustível, etc. Ninguém estará em desacordo com isso, pois, na verdade, o Estado tem essa obrigação. No entanto, gostaria de lhe colocar uma questão que tem que ver com isto e que é a de saber se esse seu desiderato, essa sua tarefa ignora ou não as condicionantes económico-financeiras que têm a ver com a constituição dessas reservas estratégicas. V. Ex.ª poderá dizer que é fundamental constituir reservas estratégicas no domínio cerealífero, dos combustíveis, dos minerais, etc., isso não passa - perdoe-me a expressão - de uma boutade porque depois não há condições económico-financeiras que assegurem a constituição dessas reservas estratégicas. Portanto, trata-se apenas de um mero exercício de aquecimento em termos de estratégia militar e não passa rigorosamente disso. Não é mais do que um exercício de aquecimento, uma figura de estilo, porque depois a condicionante económico-financeira vai impedir que se constituam essas reservas estratégicas.
O Sr. Presidente: - Sr. Vice-Primeiro-Ministro, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim de todos os pedidos de esclarecimento?
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional: - Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Vice-Primeiro-Ministro, no decorrer deste debate o meu partido fará uma intervenção de fundo onde definiremos as nossas posições globais quanto a esta matéria. No entanto, desde já gostaria de colocar algumas questões no sentido de obter alguns esclarecimentos.
Sabemos que estamos a discutir as Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional, e que não estamos a discutir o próprio conceito estratégico de defesa nacional, tal como o Sr. Vice-Primeiro-Ministro teve ocasião de referir. Em todo caso, nota-se, da parte de V. Ex.ª e do Governo - a avaliar pelo documento que nos foi apresentado e pelo discurso que foi feito -, uma desvalorização excessiva do que é discutir estas Grandes Opções e pouca preocupação em cingir o objecto da nossa discussão. Creio que há, talvez, da sua parte, excessiva abrangência na maneira como esta questão é abordada pois, desde a política agrícola do País, à situação das empresas nacionalizadas, às medidas estruturais, tudo poderia caber neste debate a avaliar pelo modo como ele foi lançado pelo Governo através deste documento e como foi apresentado pelo Sr. Vice-Primeiro-Ministro. Admitimos que esta matéria se relacione com questões de alta classificação de segurança. Porém, dai a não discutirmos nada, ou muito pouco em concreto vai uma grande distância!
Na intervenção que produziu, o Sr. Vice-Primeiro-Ministro insistiu na questão do primado do interesse nacional. Se há alguma originalidade no documento que foi apresentado pelo Governo, ela aparece logo na 4.ª linha, onde se diz: "I. Nos termos da Constituição e da lei, a defesa nacional consiste na actividade desenvolvida pela comunidade, Estado e cidadãos no sentido de garantir, no respeito pelas instituições democráticas e (...)", sublinho, "(...) no quadro dos compromissos internacionais assumidos." Ora, o texto, em geral, baseia-se na Constituição mas isto não consta nem da Constituição nem sequer da Lei de Defesa Nacional. Portanto, o sublinhado não está no primado do interesse nacional nem do da defesa nacional concebida nacionalmente. Talvez seja por isso que V. Ex.ª teve agora necessidade de insistir na questão do primado nacional!
Um especialista nesta matéria, e citando um outro ainda de muito maior nomeada, dizia que "a independência e a integridade territorial se preservam principalmente de amigos e aliados e apenas da segurança de inimigos". O que é que o Sr. Vice-Primeiro-ministro pensa desta afirmação?
O que é que pensa também da situação em que, do ponto de vista da NATO, se encontra o território nacional? Uma parte - o território continental e a Madeira - depende de um comando, o IBERLANT, mas uma outra parte - os Açores - depende de outro comando da NATO. Ora, isso não terá implicações relativamente a esse conceito do primado nacional, em relação à própria estratégia de defesa do território nacional?
Na intervenção que produziu, o Sr. Vice-Primeiro-Ministro não abordou as questões da economia como alguma coisa que torna frágil a defesa nacional. Ora, gostaria de o ver abordar essas questões que, aliás, têm sido abordadas por alguns colaboradores seus, pois são assuntos de grande relevância quando o Governo se prepara para fazer um novo acordo com o Fundo Monetário Internacional e na medida em que a dependência económica do nosso pais se vai agravando.
Quanto às relações internacionais, V. Ex.ª falou de desarmamento mas não de segurança colectiva. Que medidas têm sido tomadas pelo seu governo no sentido da consecução destes objectivos?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Vice-Primeiro-Ministro, a primeira questão que gostaria de colocar é relativa à filosofia do debate que aqui se trava. V. Ex.ª comparou o debate das Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional ao debate das Grandes Opções do Plano. Grosso modo, a proposta Grandes Opções do Plano que o Governo aqui apresentou tinha mais do que 16 páginas e a das Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional tem menos de duas páginas. A proposta das Grandes Opções do Plano tinha, nomeadamente, o enquadramento internacional em que se movimentava a economia portuguesa, a evolução recente da economia portuguesa, a definição qualitativa dos objectivos, a quantificação dos objectivos e a explicitação da área dos objectivos que decorriam do quadro geral da economia portuguesa.
Sr. Vice-Primeiro-Ministro, em sua opinião, o documento que V. Ex.ª aqui trouxe tem alguma pare-
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cença com o que foram as Grandes Opções do Plano e com o que deveria ser o documento em apreciação?
V. Ex.ª referiu-se ao prestígio das forças armadas como um dos traços que, de alguma forma, devia condicionar o Conceito Estratégico de Defesa Nacional, ou seja, que deveria também constituir um objectivo. Entende V. Ex.ª que prestigia as forças armadas o seu envolvimento em acções de segurança interna? Entende que o que aqui foi subscrito por V. Ex.ª como proposta de lei de Segurança Interna pode valorizar o papel das forças armadas de representação de todo o povo português na defesa militar da República e no exercício das missões que nesse quadro lhe competem?
O Sr. Primeiro-Ministro tem publicado bastante legislação sobre a condição militar - aliás, devo dizer que se trata de legislação que não tem cobertura, visto que não há estatuto da condição militar -, mas, tirando esta, tem publicado legislação sobre questões como o acordo entre o Governo de Portugal e o supremo comandante aliado do Atlântico sobre o estatuto e as condições especiais aplicáveis ao Quartel-General do comandante-chefe Ibero-Atlântico onde se diz que: "Considerando que o Conselho do Atlântico Norte aprovou a instalação do comandante-chefe Ibero-Atlântico, com o seu quartel-general em Portugal, etc ... " Publicou também um decreto-lei relativo ao Conselho Nacional de Planeamento de Emergência, onde se diz o seguinte:
A nível da NATO, integrando a delegação nacional portuguesa ao Senior Civil Emergency Committee/NATO (SCEPC/NATO), já criada por Resolução do Conselho de Ministros n.º 39/83, de 31 de Agosto, a promoção da representação eficaz e sistemática naquele Alto Comité e a coordenação das actividades das comissões sectoriais, entretanto em fase de implementação ou de reestruturação, nas suas funções de representantes de Portugal nos subcomités do SCPEC.
Publicou um outro relativo à autoridade nacional de segurança que tem dois considerandos, sendo um deles relativo à Lei de Defesa Nacional e um outro que diz o seguinte:
Considerando o disposto no documento C-M (55) 15 (definitivo) da Organização do Tratado do Atlântico Norte:
Ora, nesta produção legislativa que envolve o País em compromissos externos, o Sr. Vice-Primeiro-Ministro considera que pode pôr à frente da definição do Conselho Estratégico de Defesa Nacional os compromissos que aqui assume através desta legislação?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Gonzalez.
O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Sr. Vice-Primeiro-Ministro, V. Ex.ª falou na total ameaça. Por quem é que V. Ex.ª se sente ameaçado? Pelos Espanhóis que ocupam Olivença, pelos estrangeiros que aos milhões nos invadem nas férias com toalha e fato de banho, ou pelos largos milhares de portugueses que vivem cada vez pior e acumulam doenças, forem e frustação?
Vozes do PCP e do MDP/CDE: - Muito bem!
O Orador: - Quais são os interesses que estão ameaçados em Portugal?
Em relação à nossa fidelidade à NATO, queria abordar uma questão que normalmente é pouco referida. A grande maioria dos portugueses com quem tenho falado "está-se nas tintas" para a NATO, não sabe o que isso é apenas reconhece que tem despesas e isto não sé em relação à NATO, como aos nossos equipamentos militares - e que tem de apertar o cinto. Portanto, as reservas que possuímos são gastas com uma defesa nacional que é mal compreendida.
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro não julga que o nosso envolvimento na NATO é uma opção em relação à qual não somos livres de discutir e que sofreríamos represálias económicas se saíssemos desta Aliança? Ora, se não somos livres de sair da NATO - e todos sabemos que tal facto é real -, porque é que temos de nos estar a enganar e dizer que todo o nosso povo pretende continuar a investir na compra de armamentos com vista a uma modernização desnecessária, se é a indústria, o trabalho autárquico, a educação, as florestas, as pessoas, etc., que precisam dessas verbas? Essa é, pois, a defesa nacional que pretendemos.
Se hoje é difícil o abastecimento normal, como é que podemos estar a falar em reservas estratégicas? A partida a ideia não é má, mas o que importa saber é como é que ela é possível.
Se a vigilância na costa portuguesa é praticamente impossível em relação ao contrabando, à pesca proibida e ecologicamente destruidora, não o será mais em relação a toda a zona económica exclusiva?
A indústria de defesa é muito falada como fonte de receitas. Já referi que, em termos de indústria de defesa, estamos praticamente a prostituirmo-nos, porque vendemos a morte a quem a pagar melhor - no caso dos países que estão em combate vendemo-la aos dois e, portanto, trata-se unicamente de uma questão económica.
Ora, para um povo pacífico como é o nosso e que se assume como tal, não seria melhor que os projectos de reconversão de indústrias como, por exemplo, a da Fábrica Militar de Braço de Prata, apresentados pelos trabalhadores tivessem sido aprovados há uns anos atrás e que em vez de se fabricarem armas se fabricassem equipamentos e maquinaria que hoje importamos? Não seria preferível que esses planos tivessem ido avante?
Apesar de achar positivas as propostas que constam da página 4 do texto da proposta de lei, elas parecem-me um programa do Governo e devo dizer que não vejo como é possível, dentro deste âmbito, reflectirmos sobre isso.
Já sabemos que é esta a defesa nacional que pretendemos, ou seja, a resolução destes problemas concretos.
Bom, são estas, para além de muitas outras, as perguntas que lhe queria colocar agora.
O Sr. Presidente: - Igualmente para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
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O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional, ouvi-o com particular atenção e tenho duas questões que lhe gostaria de pôr.
V. Ex.ª referiu a presença de Portugal na NATO e focou, com ênfase, o nosso compromisso com a Europa, com os EUA e com o Canadá, ao mesmo tempo que aludia aos compromissos internacionais assumidos.
Queria fazer-lhe a seguinte pergunta: o facto de Portugal estar na NATO impõe qualquer condicionante à autonomia estratégica do nosso país? Ou a nossa estratégia obedecerá apenas à estratégia- ditada pela NATO? Enfim, considera V. Ex.ª que a nossa capacidade de decisão é realmente autónoma?
Uma segunda questão que lhe queria deixar, liga-se com o facto de a certa altura se dizer no texto do Governo que uno plano político-militar interno serão garantidas as condições que permitam uma capacidade de defesa autónoma, com capacidade de sobrevivência e de dissuasão das ameaças à integridade nacional".
Gostava que fosse um pouco mais esclarecida esta última frase sobre "as ameaças à integridade nacional", no sentido de apurar o que realmente se pretende dizer com isto, ou seja, se há qualquer ameaça, de onde parte e porquê.
Na mesma ordem de ideias diz-se a certo passo: "Para tanto torna-se necessário assegurar uma capacidade militar própria ... " - estamos de acordo! - " e organizar a indispensável capacidade dissuasora".
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa sabe que esta frase "capacidade dissuasora" tem corrido o mundo, nomeadamente nos últimos anos. Ora, eu gostava de saber o que é que falta às nossas forças armadas.
Faltam novos aviões, falta um novo tipo de armamento, falta armamento convencional ou outro tipo de armamento, nomeadamente nuclear?
É que quando se fala em "capacidade dissuasora", os telegramas e as tomadas de posição da NATO são constantes e isso está imediatamente ligado a mísseis nucleares colocados na Europa, assim como à questão do armamento nuclear.
Gostaria que o Sr. Ministro esclarecesse o que quer dizer "organizar a indispensável capacidade dissuasora". Será que nós não temos a capacidade das nossas forças armadas devidamente organizada? É que, se ela não está organizada, a responsabilidade será seguramente do ministro da Defesa!
Portanto, gostava que V. Ex.ª dissesse, claramente, o que é que falta às nossas forças armadas em termos de "capacidade dissuasora".
O Sr. Presidente: - No uso da palavra, segue-se o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: Antes de iniciar o meu pedido de' esclarecimento, devo dizer que me refiro a V. Ex.ª na qualidade de vice-primeiro-ministro, porque V. Ex.ª está aqui hoje mais nessa qualidade do que como ministro da Defesa Nacional. E só por isso é que acabaremos por aceitar que V. Ex.ª tenha tido a necessidade de fazer preceder esta intervenção na Câmara, da cerimónia que teve lugar há poucos momentos no Salão Nobre!
Risos do CDS.
Uma voz do PS: - Outra vez!?
O Orador: - Nem todas as vezes são demais, Sr. Deputado!
Sr. Vice-Primeiro-Ministro, V. Ex.ª salientou, e bem, no seu documento e na sua oração que, na formulação das grandes opções que iam ser determinantes para a definição do conceito de estratégia, a Nação é o valor estratégico fundamental e que ela determinará a estratégia global do Estado e as grandes opções a tomar neste domínio.
Na sequência desta reflexão, V. Ex.ª salientou ainda a circunstância de o Estado Português ser de base nacional multissecular, tendo acrescentado que nos tempos mais recentes o usem do Estado Português tinha sofrido, neste domínio, algumas alterações, as quais não tinham deixado de ter repercussão nesta matéria, isto é, na matéria que se reconduz à base multissecular do Estado Português.
Gostaria que V. Ex.ª explicitasse perante a Câmara quais as alterações do "ser" do Estado Português sofridas mais recentemente com influência na sua base nacional multissecular e aproveitava para lhe perguntar se entende ou não que a identificação dessas alterações têm importância e alguma coisa a ver com o reforço da consciência da unidade nacional que V. Ex.ª aponta como opção fundamental a ter em conta na definição do conceito estratégico.
Por outro lado, o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, ainda na sequência desta afirmação - que é realmente uma autêntica "afirmação matricial", digamos assim -, salienta o primado do interesse nacional e também a necessidade de, nessa perspectiva, salvaguardar uma capacidade de decisão autónoma, no quadro actual da interdependência económica.
Ponho-lhe esta questão, Sr. Vice-Primeiro-Ministro: entende V. Ex.ª que neste momento essa capacidade de decisão autónoma do Estado Português está salvaguardada? E, no caso de a resposta ser negativa ou no caso de dúvida - como em consciência entendo que deverá ser -, o que é que V. Ex.ª pensa que deve ser feito para garantir essa salvaguarda?
Eram estas as duas questões fundamentais que lhe queria colocar, Sr. Vice-Primeiro-Ministro.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa, ouvi a sua intervenção e tive ocasião de ler o documento que lhe deu causa.
Creio que após os debates que se travaram sobre esta matéria, tanto ao nível dos órgãos do Estado como ao nível nacional, muitas das críticas referidas foram consagradas, procurando-se estabelecer ou definir uma síntese unificadora.
De qualquer forma, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, este debate não é inútil. É importante que ele seja considerado e que se introduzam algumas modificações no documento final.
Assim, na alínea a) do n.º II da proposta, dá-se como objectivo que deve ser desenvolvido e fortalecido o "prestígio das foras armadas".
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Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional, certamente que, tanto eu como V. Ex.a, partilhamos da ideia absolutamente essencial de que o
prestígio das forças armadas deve ser defendido. Mas cela va de soi, ou seja, isso vai de per si!
Não se pode colocar como objectivo, num documento desta ordem, a "defesa do prestígio das forças armadas", porque ao Governo não compete defender ou criar o prestígio das forças armadas! Ao Governo o que compete é dar condições às forças armadas para que elas possam exercer a sua missão e o prestígio é algo profundamente subjectivo que - embora saiba que tal ideia não está no espírito do Governo - se pode confundir com duas ideias negativas: uma, a ideia de propaganda; outra, a ideia da ideologia ou do discurso ideológico sobre as forças armadas.
Portanto, penso que, em nome do prestígio das forças armadas, esta referência ao seu prestígio deveria ser retirada deste documento.
Para além deste ponto, outras notas, reservas e pontos de vista gostaria de exprimir sobre esta matéria, mas deixo-os para a minha intervenção de fundo, congratulando-me pela possibilidade que tive já de dialogar com V. Ex.ª sobre este assunto e tendo como certo que, da sua parte, eu próprio como deputado, o meu grupo parlamentar e toda a Assembleia, terão um interlocutor atento a tudo aquilo que aqui for dito.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos na hora do intervalo regimental. No entanto, e para não quebrar o encadeamento do debate - se não houver objecções-, dou de seguida a palavra ao Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa, para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram dirigidos.
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional: - Muito obrigado, Sr. Presidente. Vou ser breve e procurarei focar todos os pontos que foram levantados, pois todos podem ter interesse para o debate subsequente. Se, porventura, não referir algum por omissão, ele será certamente focado na intervenção que venha a fazer ou no debate que seguidamente tiver lugar.
O Sr. César Oliveira colocou-me uma primeira questão sobre a distinção entre grandes opções e conceito estratégico, manifestou a sua concordância e pôs-me
uma questão que, segundo entendi, tinha a ver com a utilidade do debate. Respondo-lhe afirmativamente, pois aquilo que aqui se debater condiciona a versão definitiva do conceito estratégico de defesa nacional.
Naturalmente que os órgãos próprios para o fazer são o Governo e o Conselho Superior de Defesa Nacional - que se pronunciará posteriormente sobre
ele -, mas tudo aquilo que aqui for dito será registado e considerado de acordo com o seu valor e possibilidade de contribuir para o aperfeiçoamento do
projecto existente.
Quanto à questão das ameaças que o Sr. Deputado César Oliveira também pôs, gostaria de dizer que, para além da ameaça que está identificada quando digo
que nós optamos pelo princípio do alinhamento ocidental e, portanto, pela inserção na NATO, há uma variabilidade, uma fluidez e uma mutabilidade quanto às ameaças que, podendo embora discernir-se de constantes históricas, não deve naturalmente ser expressa de uma forma que faça tábua-rasa do que podem ser as variações da política internacional.
Ameaças ou agressões externas a enfrentar são aquelas que possam ser apercebidas em consequência de interesses de outros estados pela utilização da nossa posição estratégica, da nossa zona económica exclusiva ou de outros recursos do nosso país.
Quanto à referência correctiva que me fez, devo dizer que foi intencionalmente que não falei em aparelho ideológico e fi-lo justamente para não empregar a sua cassette. Falei em "aparelhos de ordem ideal" e não em aparelhos ideológicos, exactamente para considerar todas as formas organizadas que não sejam infra-estruturas materiais, ou seja, a educação, a comunicação social, a cultura, enfim, tudo o que possa contribuir para o reforço e para a intensificação da consciência nacional.
Opus, portanto, a palavra "ideal" a "material" e desculpe se não repito o seu vocabulário, mas tenho o direito de ter alguma originalidade ...
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Cada qual tem a sua cassette!
O Orador: - Obviamente, cada qual tem a sua cassette'
Risos.
Esta não sei se é cassette, Sr. Deputado!
Quanto à questão dos interesses nacionais, o Sr. Deputado César Oliveira disse-me quais eram para si esses interesses e eu respondo-lhe que a identificação dos interesses nacionais tem de ser articulada, nesta sede, com os próprios propósitos da defesa nacional; isto é, a defesa nacional destina-se a preservar determinados objectivos que são esses interesses nacionais e fá-lo contra as agressões externas.
Ora, esses interesses estão consagrados na própria Lei de Defesa Nacional! Eu li-os e, portanto, dispenso-me de os reler agora: são, normalmente, garantir a independência nacional; assegurar a integridade do território; salvaguardar a liberdade e a segurança das populações, bem como a protecção dos seus bens e do património nacional; garantir a liberdade de acção dos órgãos de soberania e o regular funcionamento das instituições democráticas e a possibilidade de realização das tarefas gerais do Estado; contribuir para o desenvolvimento das capacidades morais e materiais da comunidade nacional de modo que se possa prevenir ou reagir por meios adequados a qualquer agressão ou ameaça externa; assegurar a manutenção ou o restabelecimento da paz. Estes são interesses nacionais, Sr. Deputado!
Finalmente, quanto à questão das reservas estratégicas, o Sr. Deputado pareceu-me incorrer num entendimento - apesar de não ser minha intenção estar a fazer eventualmente um erro de diagnóstico segundo o qual reservas estratégicas eram uns "amontados de bens" ou serviços disponíveis para uso dos militares.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Não é nada disso!
O Orador: - Bom, mas o que é certo é que quando me pergunta " se nós devíamos estar a investir ou a constituir tais reservas ... ", V. Ex.ª referia-se a isso!
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Naturalmente que as reservas estratégicas são reservas nacionais, são reservas que têm a ver com a vida e com o consumo da comunidade nacional no seu conjunto! As que conseguirmos manter serão justamente aquelas que a nossa capacidade de gerir o melhor possível o nosso País, nos permita ir mantendo.
A este respeito, não impende sobre nós uma obrigação de assegurar um resultado, mas apenas uma obrigação de diligência, isto é, de fazermos todos os nosso melhor para que existam em matéria alimentar, de combustíveis e de todos os outros elementos necessários à vida nacional, reservas estratégicas que permitam, numa situação de conflito, a sobrevivência nacional, a resistência nacional e a própria fundamentação da eventual resposta militar.
15to são coisas que não creio que sejam de menosprezar e nós não devemos dispensar-nos de as dizer por elas parecerem ociosas.
O Sr. Deputado Carlos Brito, por seu lado, fez uma benévola censura à minha intervenção, salientando que eu tinha falado de tudo e que tudo era defesa.
Bom, efectivamente, a defesa nacional - tal como se encontra consagrado na própria Lei de Defesa Nacional - não se confunde com a instituição militar, tem um carácter global e é um dever não só da instituição militar como de todos os órgãos do poder político, de todos os titulares de órgãos de soberania e de todos os cidadãos. Ora, a capacidade de exercer essa defesa de uma forma mais ou menos intensa tem a ver com a vida nacional em todos os seus domínios: no domínio físico, psicológico, económico, etc., e é por isso que falei de "tudo" num conceito estratégico de defesa nacional.
O Sr. Deputado pediu-me também para comentar uma frase, que era a seguinte: "A independência e a integridade territorial preservam-se principalmente de amigos e de aliados e apenas a segurança de inimigos."
Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que não sei por quem esta frase foi proferida, nem o Sr. Deputado mo indica. Em todo o caso, temos de afirmar a todo o momento uma capacidade de defesa nacional contra todos e quaisquer potenciais agressores.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Vice-Primeiro-Ministro?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Essa frase que está a comentar e que lhe fizeram chegar é uma "patifaria" muito grande. É que ela refere-se a tempo de paz e quando se tira a expressão "em tempo de paz" em relação à primeira premissa, estraga-se tudo!
O Orador: - Bom, eu ...
O Sr. Carlos Brito (PCP):- Mas o que é isto?
O Sr. Presidente: - Só um momento, Sr. Vice-Primeiro-Ministro.
Realmente a intervenção do Sr. Deputado José Luís Nunes foi de tal maneira fulgurante que a Mesa não teve sequer possibilidade de controlar a palavra.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Brito não quer aguardar pelo final da intervenção do Sr. Vice-Primeiro-Ministro? ...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Só uma observação muito rápida, Sr. Presidente, para dizer que se há " patifaria" é o Sr. Deputado José Luís Nunes que acaba de a fazer! Eu posso citar a frase que pedi para o Sr. Vice-Primeiro-Ministro comentar, ela é tirada da revista Nação e Defesa. Trata-se de uma concepção, de uma ideia!
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Dá-me licença?
O Sr. Presidente: - Não, não, Sr. Deputado!
Vai fazer o favor de aguardar o final dos esclarecimentos do Sr. Vice-Primeiro-Ministro para suscitar essa interessante polémica.
Desculpe, mas não posso dar-lhe a palavra.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Mas a quem cabe autorizar-me é ao Sr. Vice-Primeiro-Ministro, pois é ele que está no uso da palavra, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - Não lhe dou a palavra, Sr. Deputado.
Faça favor de continuar, Sr. Vice-Primeiro-Ministro.
O Orador: - Sr. Deputado Carlos Brito, estou inteiramente de acordo quando aqui se diz que a segurança se defende contra inimigos - segurança contra as agressões externas, entenda-se, visto que a defesa contra as agressões externas visa garantir a própria segurança.
Mas creio que, num certo sentido desta frase, há muito cidadão polaco ou checoslovaco que acha que a independência e a integridade territorial se preserva principalmente de "amigos" e de "aliados"!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O deputado Carlos Brito falou também acerca do problema da orgânica da NATO. 15so em nada afecta a questão do primado dos interesses nacionais -circunstância que pode ser efémera porque pode ser mutável - pelo facto de na estratégia dos subcomandos da NATO haver uma inserção dentro do mesmo grande comando desta organização. Essa é a razão por que se verifica esta subdivisão entre os Açores e o território nacional.
Finalmente, colocou a questão de saber o que é que o Governo tem feito no sentido de uma redução equitativa dos armamentos, sem prejuízo do esforço para um desarmamento seguro.
O Governo tem sempre tornado claro que é esta a filosofia que o inspira em matéria de defesa e, designadamente, deu uma importante contribuição para a paz e para que se possam verificar reduções equilibradas de armamento ao apoiar a dupla decisão da NATO, em 1979, e a sua implementação, visto que foi a firmeza e a determinação do mundo ocidental em não ceder a chantagens e a ameaças que levou a que a União Soviética abandonasse a política de cadeira vazia e regressasse às conversações de Genebra e de Viena.
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
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O Orador: - Portanto, o nosso apoio a uma posição de firmeza - visando um desarmamento equilibrado, recíproco e bilateral, que não se consegue com capitulações - conduziu a que a política de cadeira vazia fosse abandonada.
Foi uma contribuição que demos, na modesta medida da nossa voz, nos aerópagos onde realmente podemos intervir.
O Sr. Deputado João Amaral pôs uma questão de metodologia acerca do funcionamento do debate e eu gostaria de esclarecer o meu pensamento em relação a este ponto.
Eu disse que ia falar das Grandes Opções e, na medida em que o meu conceito estratégico é um pouco mais amplo, no desenvolvimento da minha exposição fui, de certo modo, explicitando ideias que constarão do projecto desse conceito.
Não quis fazer uma equiparação quantitativa ou de volume, apenas pretendi dizer que a relação que há entre as Grandes Opções e estratégia é a mesma que existe entre os objectivos do Plano e o Plano. É uma questão de posicionamento relativo. 15to porque temos estes conceitos na Lei de Defesa Nacional e não temos muito onde nos apoiar para determinar exactamente o seu sentido e alcance pois nem os trabalhos preparatórios desta Câmara esclarecem muito a esse respeito.
Penso, no entanto, que estamos todos de acordo em que as Grandes Opções são uma matriz concisa e sintética e que o conceito é o de desenvolvimento, tal como acontece nas Grandes Opções do Plano e no Plano. Ora, foi apenas neste sentido metodológico ou interpretativo da Lei de Defesa Nacional que me quis referir.
Quanto à questão do prestígio das forças armadas e à relação que fez com a sua intervenção em matéria interna, direi que as forças armadas têm o prestígio que lhes advém das missões que lhes são confiadas e que são justamente aquelas que estão na Constituição e nenhumas outras!
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Muito bem!
O Orador: - Quanto à legislação que tenho produzido, queria dizer o seguinte: o estatuto da condição militar não está ainda publicado, é certo, mas neste ponto não é ao Governo que cabe a principal omissão, visto que a respectiva proposta já foi elaborada há muito tempo, como sabe. Quanto à legislação subsequente, ela tem fundamento suficiente.
O Sr. Deputado considerou que é contra a ideia do primado dos objectivos nacionais o facto de haver legislação sobre a instalação de um Conselho Nacional do Planeamento Civil de Emergência, porque nos considerandos do respectivo diploma também se faz referência a que este conselho nacional é, ao mesmo tempo, uma delegação portuguesa a um organismo da NATO com esta função. Mas é justamente por uma questão de economia de meios e de eficácia que é o mesmo organismo que desempenha esta função!
O Conselho Nacional de Planeamento Civil de Emergência ocupa-se, precisamente, do conhecimento das reservas existentes em cada momento e da ligação com os vários ministérios para, em cada altura e em caso de hostilidades, poder ter um ponto da situação. Este organismo tem uma missão nacional e mesmo que não pertencêssemos à NATO, se quiséssemos ter defesa nacional, tínhamos de ter um Conselho Nacional de Planeamento Civil de Emergência. Só que o organismo que tem essa função em termos de objectivos nacionais é o mesmo que a desempenha em termos de objectivos da NATO.
A este respeito queria dizer-lhe também que legislamos, naturalmente, como autoridade nacional de segurança. Tem de haver uma autoridade que credencie as pessoas para poderem ter acesso a determinados documentos da NATO. Trata-se de uma regra da organização. Mas o que está na base de tudo isto não é nenhuma submissão. Aderimos voluntariamente à NATO e nela cada membro tem um voto, verificando-se, a cada momento, a existência de pontos de vista diversos sobre algumas questões. Os objectivos das forças, definidos muitas vezes pelos comandos, não são sempre aceites por parte dos países.
Todos sabemos que a prática da NATO em matéria de liberdade e capacidade de manobra é muito diferente da do Pacto de Varsóvia, onde efectivamente não há nenhuma liberdade, havendo uma direcção que se impõe de uma maneira que não consente reticências, liberdade de discussão, de desvio ou de definição de caminhos próprios ao conjunto de países reunidos nessa dita "aliança", que é muito mais um aglomerado dirigido e ao serviço de objectivos hegemonistas e expansionistas!
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A vida quotidiana mostra que a NATO tem aquilo que, em termos militares, é talvez uma vulnerabilidade, que é justamente essa possibilidade de os países discutirem entre si, não estarem muitas vezes de acordo e de alguns se recusarem mesmo a fazer aquilo que os outros querem.
Agora compare isto com o Pacto de Varsóvia!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Deputado António Gonzalez colocou também uma questão sobre a NATO, à qual penso que já dei resposta.
A NATO é uma organização que existe no mundo dos blocos e que tem a característica de ser composta por nações livres, comprovando a conduta delas a existência de um efectivo espaço de liberdade num quadro de interdependências.
Em relação à indústria de defesa, queria dizer que a sua existência é uma condição sine qua non da ideia de defesa nacional.
Compreendo que o Sr. Deputado fira a corda sensível dos objectivos a que se destinam os armamentos ou as munições que produzimos e que são de uma dimensão e de uma importância que, aliás, em parte nenhuma do mundo contribuem para desequilíbrios estratégicos, visto que a nossa indústria de defesa produz armamento que em nenhuma circunstância e em nenhum lugar pode levar a provocar desequilíbrios estratégicos, mesmo quando fornecido a a ou fornecido a b.
Mas o Sr. Deputado tem de concordar que se queremos ter defesa nacional é essencial termos um mínimo de auto-suficiência, ou seja, tem de haver um mínimo de capacidade industrial própria, porque, doutra maneira, deixaríamos de ter o mínimo de defesa autónoma.
A indústria de defesa não está concebida para ser um ramo seleccionado da indústria nacional, embora
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os seus excedentes e muitas das suas actividades possam servir, simultaneamente, para fins militares e civis. Poderei referir, a título de exemplo, o caso das oficinas de reparação aeronáutica e os estaleiros navais, entre outros, que poderão ter uma aplicação múltipla e plural.
Mas a indústria de defesa está concebida como estrutura logística das forças armadas e não como opção da nossa matriz de desenvolvimento industrial. É, no fundo, repito, um departamento logístico das nossas forças armadas.
O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca falou também da NATO e queria saber se isso condicionava a nossa autonomia estratégica.
Já respondi a esta questão, tendo referido que é prática comum da NATO, conhecida de todos e verificando-se em relação a todos os países incluindo Portugal, o facto de existir liberdade de opinião entre os seus membros. Nas reuniões surgem propostas, muitas vezes objectivos, que levantam reservas ou até rejeições por parte de alguns países. O quotidiano demonstra-o.
Quanto à dissuasão, quero esclarecer que se trata de um conceito fundamental porque é o que demonstra que a nossa perspectiva de defesa não é agressiva ou ofensiva, mas que se destina, no limite das nossas possibilidades, a retrair potenciais agressores. Portanto, a capacidade dissuasora a que me refiro é, evidentemente, relativa a armamento convencional.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito fez referência à questão de saber se tínhamos ou não uma capacidade de decisão autónoma em matéria económica e noutras.
Digo-lhe que no quadro das interdependências que caracterizam o mundo, sempre tivemos um certo grau de dependência. Neste momento, entendo que temos um grau de decisão autónoma relativo, como todos os países. Pode medir-se mais ou menos o grau de autonomia das decisões, mas estamos ligados, como é óbvio, pela interdependência das economias actuais, a instituições internacionais, que criam naturalmente essas interdependências. Mas, no quadro destas, temos uma relativa autonomia, como aliás sempre tivemos. Nunca usufruímos de uma total autonomia em relação ao relacionamento económico internacional.
Por fim, o Sr. Deputado José Luís Nunes fala-me da questão do prestígio das forças armadas.
Registo a sua sugestão, mas quero dizer-lhe que isto está aqui referido porque a Constituição consagra as forças armadas como instrumento de defesa militar da República. Naturalmente que não podemos ter uma instituição prevista na Constituição, com a missão nobre de defesa nacional e de defesa militar, sem pretendermos que ela seja uma instituição prestigiada, não só para que a sua carreira seja aliciante e possa haver, efectivamente, uma motivação dos candidatos para nela participarem, como ainda para que a importância da missão dissuasora - e que queremos que seja apenas essa - tenha efectivamente o reconhecimento da comunidade internacional.
Aplausos do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para protestos, os Srs. Deputados César Oliveira, António Gonzalez, Carlos Brito e Nogueira de Brito.
Porém, antes de lhes dar a palavra, pergunto ao Sr. Deputado José Luís Nunes se quer utilizar a palavra para replicar às considerações feitas pelo Sr. Deputado Carlos Brito, na medida em que tinha feito sinal à Mesa nesse sentido.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, estou um pouco confuso quanto a esta matéria. Geralmente, quando um orador está a falar e um Sr. Deputado lhe pede autorização para interromper, a relação é entre o deputado e o orador que fala.
Pedi na altura autorização para interromper o Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa, ele autorizou-me e introduzi um elemento no debate.
Em seguida, tentei fazer novo pedido de intervenção e esse não foi autorizado pelo Sr. Vice-Primeiro-Ministro, pelo que deixei para melhor oportunidade o tratamento deste assunto.
Penso, deste modo, que não tenho nada a comentar agora em relação àquilo que o Sr. Deputado Carlos Brito disse.
De qualquer forma, gostaria de comentar algumas das coisas que foram agora ditas pelo Sr. Vice-Primeiro-Ministro.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Luís Nunes tem de reconhecer que, no momento em que pediu a palavra, estávamos numa situação crítica, na medida em que se corria o risco de iniciar um debate entre o Sr. Deputado José Luís Nunes e o Sr. Deputado Carlos Brito quando se estava a proceder a um debate com o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, estando este a responder a pedidos de esclarecimento.
Foi essa a razão por que não lhe dei a palavra.
O Sr. Deputado José Luís Nunes fica inscrito.
Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Vice-Primeiro-Ministro: Efectivamente, posso ter cassettes!
Vozes do CDS: - Piratas!
O Orador: - Mas o que proeuro evitar é pronunciar repetidamente generalidades, lugares-comuns, frases sem sentido e inconvenientes como aquelas que o Sr. Vice-Primeiro-Ministro veio aqui debitar perante a Assembleia da República. Vou demonstrar-lhe que assim é.
Quando lhe coloquei o problema do reconhecimento natural da ameaça, V. Ex.ª refugiou-se no facto - e é um expediante que não quero deixar passar em claro - de Portugal optar pelo alinhamento ocidental e, portanto, pela ameaça que afectava globalmente os países da NATO e depois falou na capacidade dissuasora autónoma de Portugal!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro já viu como é ridícula a sua afirmação? Então, vamos ter uma capacidade dissuasora em relação a quê? Em relação à ameaça externa imediata? É para isso que ela serve. Mas como é que o senhor define uma ameaça como aquela que envolve o Pacto do Atlântico?! Veja lá a embrulhada em que se meteu!
Sr. Vice-Primeiro-Ministro, a cassette não está na palavra "ideológica", mas sim no uso da expressão "aparelho"! Fugiu-lhe a boca para a verdade! V. Ex.ª disse "aparelho de ordem ideal" e ia a dizer "ideoló-
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gico", quando podia ter dito "de ordem espiritual ou cultural", referindo do mesmo modo aquilo que queria evitar, que era de facto o uso da palavra "aparelho". Aí é que está a cassette! Se V. Ex.ª reparar, ela não está na diferença entre "ideal" e "ideológico", mas sim, repito, no uso da palavra "aparelho". Foi esta a cassette que V. Ex.ª me quis imputar a mim, mas que não tenho.
Compreendo o seu embaraço, porque V. Ex.ª estava a falar para o seu partido - que entretanto se procura redefinir de uma nova forma - e tinha medo que eles pensassem que o Sr. Prof. Mota Pinto tinha uns laivos de marxismo. Não se preocupe, porque ninguém pensa isso, Sr. Vice-Primeiro-Ministro!
Risos do PSD.
Uma voz do PSD: - 15so é a brincar, não é?
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Vice-Primeiro-Ministro.
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional: - Queria contraprotestar e creio que ficarei mesmo dentro do âmbito da figura do contraprotesto.
Fiz referência à ameaça que resulta da direcção do Conselho Estratégico de Defesa Nacional que é o alinhamento ocidental. Mas como o registo da sessão não deixará de o demonstrar, disse também que há outras ameaças. No entanto, não disse que elas vêm do país a, b, e ou d, nem devo dizê-lo! Nem o senhor deve pretender que lho diga!
É que a situação internacional é sempre de tal maneira mutável que poderão sempre surgir ameaças por parte de países que poderão ter interesses, de acordo com aspectos circunstanciais, na nossa posição geo-estratégica, na nossa zona económica exclusiva, nos nossos recursos ou até que tenham a ver com áreas vitais onde tenhamos, por exemplo, necessidade de nos abastecer. Não devo ir além disto.
De qualquer modo, recordo que falei deste ponto e de alguma coisa mais do que aliança ocidental.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado António Gonzalez.
O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Era apenas para dar um pequeno toque em relação à indústria nuclear. Perdão, este era um assunto mais vasto e não o quero trazer, agora, para aqui. Fica para quinta-feira!
Risos do PSD.
Quando falei na indústria nacional de armamentos, referia-me a situações como, por exemplo, à venda de armamentos explosivos para o Irão, que está a cometer todas as atrocidades a que assistimos. No gabinete está precisamente uma delegação de iranianos que estão a contar as situações graves que se verificam devido às armas e explosivos que vendemos.
Queria dizer também que, como Verde, fiquei um bocado em branco relativamente à maior parte das perguntas que fiz.
Risos do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Luís Nunes, se quiser intervir, terá de usar a fórmula de protesto.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, desejava protestar contra o facto regimental - que, portanto, vai para além da nossa vontade - de ter de usar a fórmula do protesto para referir ao Sr. Vice-Primeiro-Ministro da Defesa algumas notas, estando de acordo com o que ele acaba de dizer.
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro, nas suas respostas, acaba de dar a solução para o problema que lhe pus, ao ter referido que o prestígio das forças armadas ressalta das missões que lhe são constitucionalmente conferidas, sendo portanto algo que lhes é inerente.
Assim, é absolutamente necessário que na redacção final desta matéria, se dê a ideia de que o prestígio das forças armadas ressalta das missões que constitucionalmente são referidas.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - E daí a necessidade de as prestigiar!
O Orador: - O Sr. Deputado que quer também entrar no debate, não prestigia forças armadas nenhumas.. Aliás, nem eu nem ninguém!
Não nos compete a nós fazer política de prestígio em relação às forças armadas. E não querendo ser demasiado duro com o Sr. Deputado - porque acho que V. Ex.ª não merece que o seja - direi apenas que houve três ou quatro países que fizeram políticas de prestígio em relação às forças armadas: a Alemanha nazi, a Rússia comunista de Estaline, o Portugal de Salazar, a Argentina e talvez a Espanha. Mas não vamos entrar nessas coisas! ...
O debate que aqui se está a travar é construtivo e deve ser encarado como tal. Aquilo que tiver ocasião de observar em relação àquele documento, são pontos de vista de ordem construtiva, que tiveram imediatamente resposta no discurso do Sr. Vice-Primeiro-Ministro e, portanto, é necessário que fiquem expressos de uma forma diferente. Este documento é para durar e deve ser uma base, um ponto de referência, que tem que ser visto com um espírito de abertura.
Sr. Vice-Primeiro-Ministro, já tivemos ocasião de trocar impressões sobre este assunto no Conselho Superior de Defesa Nacional e, em certa altura, tínhamos chegado mais ou menos a uma conclusão que eu vi com muito gosto expressa no seu discurso. Porém, ela não está expressa no texto e era sobre isso que queria chamar a atenção de V. Ex.ª De qualquer modo, agradeço-lhe ter vindo ao debate que se acabou de travar.
O Sr. Presidente: - O Sr. Vice-Primeiro-Ministro deseja responder desde já ou no final?
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desejo simplesmente afirmar que estou de acordo com o Sr. Deputado José Luís Nunes. A referência que fiz na minha intervenção ao prestígio das forças armadas como instituição nacional e do povo português, indispensável à afirmação nacional no seio das nações, não tinha, obviamente, em vista nenhum aspecto subjectivo de privilegiar uma instituição especial da sociedade portuguesa, mas, sim, salientar a necessidade de, através
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da formação técnica e profissional, da capacidade tecnológica, do equipamento adequado, esta instituição estar em condições de desempenhar a sua função. Em suma, estamos de acordo.
O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa: Em primeiro lugar, quero protestar pelo facto de o Sr. Vice-Primeiro-Ministro não ter feito qualquer alusão à questão que levantei relativamente ao ponto n.º 1 do texto governamental, designadamente à introdução da frase um quadro dos compromissos internacionais assumidos", o que manifestamente vai contra o ênfase que o Sr. Vice-Primeiro-Ministro aqui colocou na questão do primado nacional e é também uma distorção do texto constitucional, bem como do próprio texto da Lei da Defesa Nacional.
Bem, V. Ex.ª também não referiu outras questões concretas. Mas, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, gostaria de voltar à questão da frase que lhe coloquei há pouco, que é do comandante Virgílio de Carvalho.
Naturalmente que compreenderá que os grupos parlamentares, na perspectiva deste debate, tenham procurado informar-se, ler os especialistas sobre esta matéria e foi assim que tomámos conhecimento de algumas posições e de alguma doutrina que esses mesmos especialistas têm vindo a fazer nas revistas da especialidade.
Mas eu aprofundava a questão, e se o Sr. Vice-Primeiro-Ministro me permitisse lia-lhe a frase, isto é, narrava um desenvolvimento daquela ideia que referi e que é a seguinte: "Há dois países amigos com os olhos em Portugal, sendo o primeiro naturalmente a Espanha, que não desdenharia assumir a direcção da gestão militar de todo o espaço ibero-atlântico a pretexto da segurança própria e do Ocidente, o que contribuiria para o reforço do seu poder negocial à custa do apagamento do de Portugal; o segundo é os Estados Unidos, onde se tende abertamente a ver os Açores não apenas como um elemento da sua própria defesa militar em profundidade mas ainda uma peça-chave do socorro militar à Europa (...)."
Bem, foi no desenvolvimento destas ideias e destas preocupações que, por exemplo, no Canadá se desenvolveu a doutrina contra a "ajuda".
Esta é uma questão concreta, que certamente tem perfeito cabimento neste debate. Estávamos à espera que o Sr. Vice-Primeiro-Ministro dissesse muitas generalidades, como efectivamente disse, mas gostaríamos de o ouvir pronunciar-se sobre questões muito concretas e relevantes que são adiantadas pelos especialistas.
Espero que desta vez o Sr. Vice-Primeiro-Ministro não me responda com a cassette habitual.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Vice-Primeiro-Ministro, tem V. Ex.ª a palavra, se pretender contraprotestar.
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional: - Sr. Presidente, pretendo fazê-lo para dar uma explicação.
Efectivamente, não dei resposta a essa pergunta que o Sr. Deputado acabou de me fazer, mas quero dizer-lhe o seguinte: há aí uma tentativa completamente inconsistente de considerar o primado do interesse nacional como uma pedra fundamental da nossa estratégia da defesa nacional; porém, nem todos os países o consideram do mesmo modo, pois há aqueles que aceitam o seu conceito de estratégia na base do cumprimento das missões decorrentes das alianças em que estão integrados.
O Sr. Deputado afirma que o primado do interesse nacional, isto é, a defesa da independência nacional está posta em causa por se dizer que esta última é uma actividade exercida no quadro de compromissos internacionais assumidos. A própria Lei de Defesa Nacional, é que o estabelece: "A defesa nacional é igualmente exercida no quadro de compromissos internacionais assumidos pelo País." E, se calhar, também a própria Constituição o refere!
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Di-lo de maneira diferente!
O Orador: - Não, não! Refere-o expressamente: "A defesa nacional é igualmente exercida no quadro dos compromissos internacionais assumidos."
Risos do PCP.
O Orador: - Pois, obviamente, é o que está também aqui no meu texto! De qualquer maneira, estes compromissos são livremente assumidos, pois têm por base uma atitude livre. Portanto, não posso deixar de contraprotestar contra a tentativa de o Sr. Deputado se arvorar - o que seria o cúmulo da ironia - em supremo defensor da independência nacional!
Vozes do PSD: - Muito bem!
Enfim, a via que escolheu foi aquela que lhe pareceu mais à mão e que lhe possibilitasse tentar encontrar a incompatibilidade entre "primado do interesse nacional" e "compromissos internacionais livremente aceites".
Evidentemente, tudo isto é compatível e a sua tentativa de se afirmar como o máximo defensor da independência nacional foi uma tentativa feita por mau caminho, pois tal não logra credibilidade junto da população portuguesa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Vice-Primeiro-Ministro, verifico que a referência que V. Ex.ª fez às alterações do "ser" do Estado Português com repercussões no carácter nacional desse mesmo Estado foi uma referência acidental. Quer dizer, tal não teve importância no seu discurso, porque V. Ex.ª entendeu por bem não pormenorizar essas alterações do "ser".
Quanto ao facto de V. Ex.ª considerar natural a posição do País no quadro internacional de interdependências económicas, tenho a dizer que vou um pouco mais ao cerne da questão. Assim, perguntar-lhe-ia se um país como o nosso, com 15 biliões de
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dólares de dívida externa e com o que esta última representa em percentagem do produto interno bruto, está realmente em condições consideradas normais no quadro internacional das interdepêncidas? Ou será que quando se refere às interdepências económicas estará a falar no quadro dos grandes espaços económicos? 15to é realmente uma coisa completamente diferente.
Era este o sentido do meu protesto.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Vice-Primeiro-Ministro.
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa: - Os meus esclarecimentos quanto a esta questão constam já da minha intervenção e das respostas que dei há pouco ao Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Vamos proceder à interrupção da sessão para o intervalo. A sessão recomeçará às 18 horas e 50 minutos.
Convoco os líderes dos grupos parlamentares para uma breve conferência.
Eram 18 horas e 20 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 19 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.
O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Professor Mota Pinto: O ponto sorteado foi o das grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional, não foi o da política da defesa, nem a condição militar, e assim por diante, pelo que a ele tentarei exclusivamente referir-me. Também não abordarei pontos em que uma evidente concordância sobre o sentido nacional dispensa comentários. Conviria, todavia, evidenciar que a discussão do conceito estratégico, como todas que a conceitos se referem, pode facilmente ser entendida com alcance menos do que académico, no caso de não se fazer compreender ao País que nele está envolvida a própria concepção da viabilidade independente de Portugal no mundo de hoje. Na história portuguesa, tendo sempre como objectivo a integridade nacional, encontram-se posições extremas que não podem deixar de ser relacionadas com o próprio grau de desenvolvimento em que nos encontramos, independentemente dos regimes políticos, porque as variáveis exógenas pesaram sempre no ambiente das decisões, obrigando a atender à hierarquica mutável dos poderes mundiais.
Hoje, parece evidente que a questão do poder, da hierarquia efectiva das potências, da tentativa do condomínio mundial pelos donos do fogo nuclear, e do projecto de império mundial que indiscutivelmente anima um dos concorrentes, é um facto que necessariamente entra na prudência governativa das escolhas, e esta não será a mesma para os que desejam manter a identidade e viabilidade independente, ou para os que consideram que existem valores mais altos, de natureza ideológica, a servir. Também não é de esperar que, para defesa da identidade e da viabilidade independente, as respostas sejam continuadamente as mesmas ao longo da história, porque as conjunturas mudam com novos desafios alheios a qualquer experiência passada, e porque as perspectivas também variam conforme a formação dos governantes e seus apoios. Lembremos pois duas concepções diferentes de organizar essa defesa, referidas a épocas próximas uma da outra. A primeira será a que consta do depoimento do 2.º marquês de Fronteira (1655-1729) feita ao naturalista Merveilleux, e que a publicou nas suas Mémoires, editadas em Amesterdão no ano de 1738.
Admirado o cronista do desleixo em que encontrava a indústria dos teares da Covilhã, que diz: que "não trabalham deixando-os parados e inúteis, por mais vantajoso que isso fosse para o Reino", obteve do ministro esta explicação: "Os estrangeiros que vêm em massa apresentar memórias ao rei para tornar este país fértil e aqui estabelecer manufacturas de toda a espécie, ignoram que as instituições que propõem não convêm de nenhuma maneira ao bem da nação nem à tranquilidade dos seus habitantes. Deus tornou-nos senhores do ouro, que encontramos sem dificuldades no Brasil, e quase sem cavar a terra. Se este ouro estivesse aqui em Portugal, teríamos todas as manufacturas que existem em França e Inglaterra, porque as nossas riquezas nos dariam possibilidades, como a qualquer outra nação, de construir fortalezas e manter numerosas tropas para as guardar. Mas como o nosso ouro está no Brasil, a mais de 200 léguas, no interior, se nos tomarem uma das praças marítimas, põem-nos em situação de não podermos gozar os nossos tesouros. Nada disso teremos a temer enquanto os ingleses nos venderem os produtos das suas terras e das indústrias dos habitantes dos seus reinos. Serão capazes de nos proteger e verter a última gota do seu sangue para nos defenderem contra os inimigos que ousem atacar-nos. Sem nós, os ingleses não saberiam viver, pois damos-lhes mais lucros que todas as outras nações. São os únicos que dão valor aos nossos vinhos e aos outros produtos de Portugal.
Para além da ideia de comprar a paz com o subdesenvolvimento, à qual a crítica não pode já dar qualquer remédio, a percepção do pouco poder e a imaginação de a partir dele manter, ainda assim, a viabilidade independente, são variáveis que estão presentes na conjuntura que vivemos.
Bem diferentes são já os preceitos do marquês de Pombal, quer ao responder às 24 queixas que o Governo Inglês faz ao de Portugal quer no discurso político sobre as vantagens que o Reino de Portugal pode tirar da sua desgraça por ocasião do terramoto do 1.º de Novembro de 1755: "resultam - dizia o marquês - tão grandes perigos ao nosso povo, que tira toda a sua subsistência primeira de outras nações, que por mais inconvenientes que resultar possam do oposto sistema, não há coisa que possa fazer dúvida de preferência." Estas palavras, por muitas e conhecidas razões da nossa circunstância de hoje, ganham actualidade porque é grave o terramoto que atingiu os nossos recursos e capacidades e o rigor e a austeridade não podem ser dispensados, mas acompanhados de uma clara definição de objectivos, o principal dos quais é a viabilidade independente. É, porém, necessária uma atenção maior, do que no passado, à hierarquia real das potências, uma análise mais fria dos constrangimentos que resultam de um teatro de operações mundializado, uma ponderação realista do que nos cabe ainda representar numa definição de ri-
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validades das superpotências, cujo quadro dificilmente está ao nosso alcance modificar.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - De tudo resulta a necessidade constante de identificar os interesses próprios, avaliar o poder disponível, averiguar o serviço que pode ser oferecido como contrapartida das solidariedades que não sejam dispensáveis, em função dos parceiros cujas conveniências melhor se ajustem com as nossas. Ora, o processo da nossa debilidade é um incidente do processo da debilitação europeia e ocidental, e fere-nos mais porque é nosso, mas apenas varia em grau no contexto geral. Parece que toda a evolução dos esquemas destinados a organizar esse espaço europeu ocidental, militar, política e economicamente, mostra estas constantes: a definição do espaço envolvido, a identificação do catalisador e a selecção de um ponto exterior de apoio em vista da debilidade regional europeia. Os últimos anos deixaram ver de quando em vez assomos no sentido de dispensar o apoio exterior, construindo uma autonomia de decisão europeia nesse domínio, sobretudo porque a solidariedade incondicional não encontra muitos devotos e praticantes, mas os factos obrigam a que tudo esteja em anteprojecto, sem estudo críveis de viabilidade. o esquema que permanece é, portanto, o indicado, e não é fácil que encontremos uma criatividade local mais frutuosa, ou pelo menos não se tem manifestado.
Comecemos, portanto, pela definição do espaço que se organizou em vista, antes de mais, dos receios de uma agressão, primeiro alemã, e depois soviética, com um ensaio na falhada Comunidade Europeia de Defesa e com débil expressão final na União Europeia Ocidental. Não interessa recordar as razões pelas quais a União tem ainda um significado reduzido, que pode aumentar se as relações com os EUA se modificarem, mas não pode deixar de notar-se a evidência de que Portugal não foi considerado em nenhum momento para integrar esse espaço. A distinção histórica entre a Europa continental e a Europa da frente marítima, parece que continuou a desempenhar aqui um papel. O mesmo se verificou durante o desenrolar das fases da descolonização europeia, em que primeiro as grandes democracias retiraram as soberanias deixando ficar os poderes económico, financeiro, técnico e cultural em toda a medida do possível, e Portugal, que não tinha estes últimos em relação ao constrangimento sistémico mundial, invocava um serviço de defesa dos interesses ocidentais, com a falta de esclarecimento permanente sobre se esses ocidentais sabiam isso, concordavam com isso, ou queriam isso.
A organização económica do espaço europeu, também ela começou por ser determinada por necessidade de defesa. A declaração de Robert Schumann, de 9 de Maio de 1950, sobre a criação da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, tinha em vista permitir a recuperação económica da Alemanha que fizesse dela um aliado válido, sem lhe consentir a reconstituição de um poderio industrial e militar que acordasse os antigos receios. As posteriores comunidades europeias, isto é, a Comunidade da Energia Atómica (Euratom) e, finalmente, a Comunidade Económica Europeia (CEE), não perderam esta preocupação originária, e Portugal não entrou na definição do espaço que nunca dispensou a chamada "estaca americana".
Pelo contrário, nenhuma das tentativas de organização do atlantismo, a partir da Resolução Vandenberg de Maio de 1948, aprovada pelo Senado em 11 de Junho, e que colocou um ponto final oficial na tradicional política isolacionista americana, deixou de procurar incluir Portugal. Em 4 de Abril de 1949 figurou entre os signatários fundadores da NATO, o que mostra bem que na definição das solidariedades de interesses não são os regimes que contam, e que a nossa vocação atlântica e a capacidade de retribuir a solidariedade com serviço não precisa de ser demonstrada nem discutida.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - utilizando o esquema antes referido, e que parece a moldura da evolução europeia, o espaço que nos pertence é antes de mais o que depende da nossa soberania, mas também o caminho aberto para a redefinição de um convívio novo com toda a área cultural de matriz portuguesa, sem esquecer nunca o Brasil. O único poder que aparentemente está ainda nas nossas mãos, em relação com o sistema de competição mundial, é o que temos chamado "poder funcional", que tem expressão principal na posição geográfica das regiões autónomas e que interessando ao sistema geral actual da defesa ocidental, é atlântico pela geografia, pelos interesses económicos dos territórios, pela longa mão das migrações tradicionais.
A admissão feita pela NATO, depois de tantos anos em que a evidência não conseguiu ser vista, de que existem questões fora da zona do tratado que envolvem o interesse de todos os aliados, revaloriza esse poder funcional e revigora a vocação atlântica.
Vozes do CDS, do Sr. José Lello (PS) e do Sr. Carlos Ferreira (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Por isso, se por exemplo o iberismo político apenas poderia ser uma solução de alienação da identidade nacional, que os governos até hoje repudiam com firmeza que deve merecer o apoio geral, para que as necessárias boas relações assentem no respeito e no proveito mútuos, coerentemente o europeísmo político português não pode, na mesma linha, aceitar um diálogo ibero-europeu, como não o aceitou com a EFTA, como não o aceitou nem pode vir a aceitá-lo com a NATO.
Não se trata de proximidades geográficas, cada vez de resto menos determinantes na definição das solidariedades, trata-se de Estados em busca de uma definição de fronteiras militares, económicas e políticas onde cada interesse apenas tem a alternativa de escolher entre ter voz própria ou funcionar como satélite. Também, porque o europeísmo em causa é nosso, não sendo apodítico que as comunidades europeias se mantenham ou que se mantenham com a definição actual, ou que o vector da defesa que as inspirou não mude de formulação mais rapidamente do que podemos pensar, parece de meditar sobre que o mais duradouro é o poder funcional que temos e que é atlântico; que o ponto de apoio exterior, que a Europa não dispensou até hoje, continua para nós a ser atlântico, seja qual for a evolução das comunidades e o destino das relações entre os EUA e a Europa; que o nosso legítimo espaço, para além da definição da soberania, é atlântico; que a solidariedade atlânti-
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ca não deve ser diminuída pela procurada solidariedade da Europa; que a solidariedade com a Europa da frente marítima precede qualquer solidariedade com a Europa continental; que a nossa responsabilidade de matriz de uma área cultural é atlântica, e que os nossos interesses devem procurar nessa direcção uma alternativa que não exclui o europeísmo complementar, mas que não dê à Europa dos ricos a convicção de que estaremos condenados a permanecer à porta, lamuriando com resignação os versos tristes de Guerra Junqueiro sobre os pobrezinhos. Se algum dia estes substituíssem o Hino Nacional, também seria altura de lavrar o epitáfio da Nação portuguesa, deixando o campo livre às soluções que passam pela dispensa da viabilidade independente.
É por isso que, reconhecendo que a conjuntura europeia submete todos os Estados ocidentais aos mesmos riscos, ameaças e carências, é uma pretensão legítima portuguesa ter a contrapartida das seguranças colectivas que as organizações comunitárias europeias pretenderam construir, porque não é aceitável participar nos riscos que não ajudámos a criar, e suporem os agentes desse ,processo de debilitação europeia que corresponde a uma benevolência sua alargar o número dos seus membros. Se o nosso poder efectivo é pequeno, a dignidade não se mede pelo mesmo padrão.
Aplausos do CDS, do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para interpelar o Sr. Deputado Adriano Moreira, os seguintes Srs. Deputados: Raul de Castro, José Luís Nunes, Acácio Barreiros e Cunha e Sá.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raul de Castro.
O Sr. Raul de Castro (MDP/CDE): - Sr. Deputado Adriano Moreira, queria pedir-lhe esclarecimentos em relação à exposição que V. Ex.ª acaba de fazer na sua intervenção em que se referiu e fez a defesa de um espaço europeu atlântico e ocidental, naturalmente integrado no bloco da NATO.
Por outro lado, fez também referências críticas à descolonização. O que eu queria perguntar ao Sr. Deputado prende-se com a ideia do conhecimento que V. Ex.ª tem, naturalmente, dos princípios constitucionais em matéria de colonialismo, isto é, a Constituição preconiza a abolição de todas as formas de colonialismo e ainda dissolução de todos os blocos militares. Deste modo, como é que o Sr. Deputado concilia as suas referências a estes dois temas com esses princípios constitucionais?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Adriano Moreira, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?
O Sr. Adriano Moreira (CDS): - No final, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Adriano Moreira: Embora não estando de acordo com toda a sua intervenção, como é natural, ouvi-a e aplaudi-a pelos aspectos de extrema riqueza de ideias que ela encerra.
O debate que estamos a ter neste momento, está centrado quanto a mim, em termos demasiado excessivos - no atlantismo e no europeísmo. O Sr. Deputado sublinhou, e bem, a importância da dimensão atlântica portuguesa, por exemplo, no piano das relações com a Península Ibérica. Aí, o atlantismo é, de certa maneira, garante da nossa independência nacional.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado sublinhou - e creio que também bem - a importância que tem para a Europa a ligação com a outra margem do Atlântico e, está subjacente nas suas palavras, que as duas guerras mundiais permitiram a vitória sobre os impérios totalitários graças à aliança entre a Europa, os Estado Unidos e o Canadá.
Simplesmente, há uma questão que eu gostaria que o Sr. Deputado desenvolvesse e que é a seguinte: é impossível continuar a defender-se princípios de aliança comum na Europa quando, através da política económica, os estados europeus e os estados das outras margens do Atlântico são submetidos a uma pressão terrível, de tal forma que, neste caso, nós somos aliados no plano militar mas somos adversários, para não dizer inimigos, no plano económico.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Era neste sentido, Sr. Deputado Adriano Moreira, que eu gostaria de sublinhar a necessidade da construção da entidade europeia, ou melhor, do pilar europeu da Aliança Atlântica, que pode ser a União da Europa Ocidental ou qualquer outra estrutura jurídica que se venha a criar ou alguma que já esteja criada, como o Eurogrupo, não como uma forma de constituir ou de basear uma política não comunista - que seria contra os interesses do Ocidente e só facilitaria o jogo de uma União Soviética -, mas como a forma de estabelecer um diálogo com os nossos aliados da outra margem do Atlântico. Mas isto de forma que eles ouçam estas palavras: "Nós não podemos ser aliados no plano militar e ser inimigos no plano económico."
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.
O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Deputado Adriano Moreira, em primeiro lugar, queria felicitá-lo pela sua intervenção com a qual, em linhas gerais, estou de acordo, sobretudo com a forma como focou - e fê-lo muito bem - a dimensão atlântica da nossa política de defesa e os exemplos históricos que inclusivamente citou, que demonstram como um pequeno País - para usar a expressão, suponho que do comandante Virgílio de Carvalho, "cercado de Espanha por todos os lados menos por um" conseguiu, de facto, seguir uma política autónoma e dimensionar-se no mundo de forma a merecer o respeito internacional.
Contudo, V. Ex.ª é também um especialista em assuntos de educação e, pedindo desculpa por me desviar um pouco da sua intervenção, penso que efectivamente um dos aspectos mais preocupantes da defesa nacional é o problema de não existirem praticamente quaisquer ideias sobre o estudo defesa nacio
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nal no sistema educativo. Como sabe, existem apenas o Instituto da Defesa Nacional e alguns institutos particulares, o que é uma situação que não tem paralelo com outros países democráticos, onde a preocupação com os assuntos de defesa no ensino, a nível universitário e a nível do ensino médio, é muito grande, onde existem numerosos institutos e onde há uma preocupação - quer da classe política propriamente dita, quer de empresários, de dirigentes sindicais, etc. - no conhecimento dos fundamentos da defesa nacional. Ora, eu gostaria que V. Ex.ª se dignasse comentar o assunto e dissesse o que seria necessário fazer nesta matéria em Portugal.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cunha e Sá.
O Sr. Cunha e Sá (PS): - Sr. Deputado Adriano Moreira, acompanhei, com a atenção possível, a sua intervenção e referir-me-ei aqui a determinados aspectos que tive oportunidade de tratar com V. Ex.a, na qualidade de professor.
Contudo, queria fazer algumas considerações prévias, que aqui redigi à pressa.
Com o advento da era gâmica o conceito de privaticidade das comunidades autónomas, isoladas, identificadas num determinado território, perdeu o seu significado. Encontrámo-nos, então, perante uma fraca socialização do nosso mundo; não havia a noção de estratégia geopolítica para além das cautelas a ter com os vizinhos. 15to, portanto, à data da era gâmica. A partir desta era, o conhecimento, a informação e a comunicação marcaram definitivamente o próprio conceito de identidade territorial.
De uma manta de retalhos, que eram as comunidades autónomas, estanques, assistiu-se à passagem a uma progressiva interdependência, que se multiplicou qualitativa e quantitativamente. Deu-se o aparecimento da tal lei da complexidade crescente dos fenómenos internacionais.
Entretanto, mantivemo-nos numa posição de neutralidade, uma neutralidade colaborante, durante 50 anos. Nos últimos 50 anos, houve pois, uma certa neutralidade - era essa a política seguida pelo governo de então -, estávamos orgulhosamente sós. Apercebi-me pela intervenção de V. Ex.ª de que Portugal se encontrava excluído do espaço da comunidade europeia ocidental e atlântica, de que Portugal tinha ficado à porta. Não sei se entendi correctamente o que V. Ex.ª queria dizer.
O que eu pergunto é o seguinte: deve-se ou não esta situação à falsa neutralidade em que vivemos durante esses tais 50 anos?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.
O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, responderei ao Sr. Deputado Raul de Castro e dir-lhe-ei que não fiz nenhuma referência crítica à descolonização - o que não quer dizer que anteriormente as não tenha feito e escrito, porque até o fiz e essas afirmações são conhecidas.
Deve ser das condições de audição da sala, pois nesta intervenção limitei-me a tentar definir a situação política objectiva que se verificou durante 14 anos, no que tocava à invocação de objectivos políticos de Portugal e à compatibilidade com os objectivos invocados pelos restantes países europeus. É uma avaliação absolutamente objectiva e quase permitiria dizer - se tal não parecesse um abuso nesta Casa - que era uma observação estritamente científica. Não teve nenhuma conotação valorativa em relação ao facto da descolonização.
Não quero dizer com isto, como, aliás, já o frisei, que não tenha sobre isso opinião, que não a tenha escrito e, até, suponho que com alguma audiência dos portugueses nesse aspecto. Pelo que toca à compatibilização dos princípios da Constituição que invocou com o facto de Portugal pertencer à NATO - creio que é esta a essência da pergunta de V. Ex.ª -, suponho que não consegui que ficasse claro que no mundo em que vivemos hoje, onde o teatro estratégico se mundializou e onde já não há teatros estratégicos regionais, as violências sistémicas sobre os países constituem elemento do ambiente das decisões a que não podem fugir e são obrigados a optar.
É por isso que me tem parecido que países com a situação geográfica de Portugal, sendo a definição estratégica mundial a que é, não têm hoje possibilidade de adoptar um estatuto de neutralidade que possam manter, porque hoje não é neutral quem quer, só é neutral quem pode e só o pode quem não ficar na trajectória da agressão que outros desencadeiam.
Vozes do CDS: -- Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar - e começando por agradecer as palavras do Sr. Deputado José Luís Nunes que é, certamente, um dos nossos deputados mais devotados a estes problemas, com uma assiduidade exemplar em todas as reuniões em que eles são debatidos -, queria dizer o seguinte a respeito dessa relação entre os Estados Unidos e a Europa: não vou enunciar aqui nenhuma ideia nova ou circunstancial respondendo à pergunta fundamental que acabou de fazer, porque tive a ocasião de a escrever num livro, em 1971, salvo erro, que incidia sobre a Europa em formação.
O exame frio da situação leva-me às seguintes conclusões: esta violência sistemática que se instalou no mundo fez com que os estados directores das grandes organizações da defesa tenham uma consciência muito nítida, primeiro, do seu interesse nacional - como aqui foi pregado, como matriz principal do conceito estratégico nacional -; segundo, de que não podem confundir as suas responsabilidades mundiais com as suas responsabilidades regionais; terceiro, de que não podem hesitar em pagar os acomodamentos dos interesses mundiais com interesses regionais que sejam dos outros.
Por isso, como não tenho de ter as mesmas cautelas que o Sr. Ministro da Defesa - porque não estou obrigado a nenhum segredo de Estado e as coisas em que me posso basear são públicas - sempre imaginei e concluí que era necessário ter presente que o destino da Europa poderia ser, na evolução destes dois sistemas de defesa, uma moeda de troca, ou um campo de batalha. E o europeu consciente tem de ter isto nas suas perspectivas.
Assim, são realmente graves as distorções ou os não paralelismos entre a política de defesa que o estado director da Aliança - porque não devemos ter medo
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das palavras - pratica no domínio da defesa e aquela que pratica no domínio económico. Realmente, as duas coisas têm de ser tornadas coerentes!
Quando os Estados Unidos começaram a organizar a defesa ocidental, um dos slogans que lançaram foi o de que, tendo o então director da Academia Militar de Moscovo feito um discurso em que dizia que a árvore europeia estava cheia de frutos já maduros, pelo que bastaria abaná-la para que eles caíssem, o Governo Americano apressar-se-ia a pôr uma estaca perto da árvore.
Simplesmente, as estacas não têm a vida das árvores, elas vão envelhecendo, apodrecem, e algum empodrecimento há nestas relações dentro da Aliança. E por isso considero que estão de acordo com o interesse europeu, atlântico e ocidental, os esforços que começaram a ser desenvolvidos no sentido de reanimar uma autonomia europeia de decisão.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Deputado Adriano Moreira, mais uma vez queria congratular-me com o conteúdo da sua intervenção, é de uma importância fundamental.
É que um país como o nosso, se não tiver consciência da sua dimensão europeia e da solidariedade europeia, pouco poderá fazer dentro da Aliança. E esse é o ponto fundamental, é um contributo importante para os princípios estratégicos de defesa nacional que aqui vão ser considerados. Aliás, espero que ,este princípio também seja considerado.
O Orador: - Espero que com os comentários que fiz à pergunta, tão oportuna e importante do Sr. Deputado, tenha respondido satisfatoriamente à sua curiosidade.
Quanto àquilo que afirmou o Sr. Deputado Acácio Barreiros, devo dizer-lhe que nós somos um país inesperado em muitos aspectos, nomeadamente em poetas, o que é uma riqueza - porque os poetas escutam vozes que os outros não escutam -, o que de vez em quando nos faz encontrar soluções dentro da própria vida do País que são difíceis de conduzir a qualquer racionalidade.
Por exemplo, a primeira escola onde sistematicamente se estudou e ensinou a política internacional foi o Instituto Superior Naval de Guerra e não foi em nenhuma das universidades portuguesas.
Acontece, por outro lado, que sucessivas reformas do ensino acabaram com uma articulação, que se tinha mostrado sempre extremamente frutuosa, entre o ensino militar e o ensino civil, através daquelas cadeiras que hoje temos de chamar "de propedêuticas" - para que estejamos actualizados ...
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Preparatórias.
O Orador: - ... com a terminologia - e que os estudantes que pretendiam seguir a carreira militar, tinham que fazer nas escolas civis.
Ora, nós hoje estamos todos mais ou menos conscientes - espero que a generalidade o esteja - de que se pode dizer que a defesa é fundamentalmente um problema civil e não militar. Por consequência, é absolutamente necessário que no ensino civil esteja presente o ensino dos problemas da defesa. Aliás, já temos um leve anúncio disso, a propósito das novas licenciaturas em Relações Internacionais, onde já se começa a estudar estratégia. Mas é evidente que o problema precisa de ser revisto, tem de ser encontrada uma solução mais consistente e a articulação entre os dois ramos do ensino tem de ser maior, desde que a conclusão operacional - que já está feita - seja a de que a defesa é fundamentalmente civil e não militar.
Queria ainda dizer que é uma homenagem que é devida ao Instituto da Defesa Nacional ...
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Muito bem!
Aplausos do PS.
O Orador: - ... a circunstância de, tendo provavelmente nascido com objectivos bem diferentes, ter conseguido implantar este conceito e estar a desenvolver um trabalho extremamente meritório nesta articulação interdisciplinar, interprofissional, que faz convergir portugueses de várias profissões e diversíssimas formações ideológicas para a meditação em comum de um problema que é de todos, o problema da Defesa Nacional.
Finalmente, Sr. Deputado Cunha e Sá, creio que fui eu que tive a debilidade de enunciar essa lei da complexidade crescente da vida internacional. Quanto a esta, não penso que tenha deixado de ser comprovada e é absolutamente certo que nós hoje vivemos num mundo interdependente, solidário, socializado, onde, sobretudo em virtude & um fenómeno importantíssimo, que é a simultaneidade da informação, todas as inquietações do mundo caem no nosso espírito em cada manhã. O mundo é só um.
Todavia, não foi sempre assim e o problema a que se referiu, da neutralidade colaborante de Portugal, é um problema - que ainda hoje inquieta os juristas, os internacionalistas - que talvez só tenha recebido nome novo durante o conflito de 1939 a 1945. E isto porque realmente é uma prática que nós encontramos na história portuguesa, quando os teatros de operações não eram comunicantes, pois Portugal pode em muitas ocasiões, até com o mesmo adversário, estar em guerra numa parte do mundo, em paz noutra e estar em tréguas numa terceira parte. É que o que acontecia num lugar não tinha repercussões num outro lugar.
Essa atitude multifacetada de responder ao desafio de cada teatro, para defender um interesse só - que é o interesse nacional, como na época o entendiam -, foi aplicada pela última vez (não será possível nunca mais) na guerra de 1939-1945 com custos elevadíssimos. Custos elevadíssimos, repito, porque - já não sei qual foi o Sr. Deputado que teve a boa lembrança de falar nisso - na guerra de 1939-1945, nós, em primeiro lugar, de quem precisámos de nos defender, foi dos amigos. Basta lembrar a invasão de Timor, que foi, aliás, a primeira tragédia de Timor e que não deixava adivinhar a tragédia que hoje aí se vive.
Quanto a essa atitude da neutralidade colaborante enunciada na guerra de 1939-1945, não considero demonstrado que a mesma tenha tido qualquer peso na pertença posterior do País aos espaços que se formaram. E, facilmente podemos verificar isto na história recente pois, relativamente à nossa intervenção em
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grandes conflitos mundiais, como foi o de 1914-1918 e o de 1939-1945, os próprios aliados achavam melhor que não participássemos. Assim, a neutralidade colaborante só foi possível porque os adversários estavam de acordo, na medida em que Portugal não tinha força para a impor e para a tornar viável.
Em suma, foi porque os adversários estavam de acordo que, pela última vez na história de Portugal, esse conceito pôde ser posto em vigor. Suponho que mais nenhum governo o poderá experimentar para o futuro.
Aplausos do CDS, do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está inscrito para uma intervenção o Sr. Deputado César Oliveira. Contudo, lembro que a sessão encerrará às 20 horas e faltam 10 minutos para o fecho da mesma. Por isso mesmo, pergunto ao Sr. Deputado quanto tempo prevê que irá durar a sua intervenção?
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Provavelmente 20 minutos, Sr. Presidente. Digo provavelmente, porque não tenho tudo escrito, daí que presuma demorar um tempo aproximado aos 20 minutos.
Sugiro, assim, Sr. Presidente, que use da palavra outro Sr. Deputado, cuja intervenção seja mais breve, passando a minha para quinta-feira e evitando-se, deste modo, o condicionamento das 20 horas, momento que não quero ultrapassar.
O Sr. Presidente: - Alguns dos Srs. Deputados inscritos pertence fazer uma intervenção cuja duração máxima seja de mais ou menos 10 minutos?
Srs. Deputados, devido às circunstâncias referidas, e na medida em que nenhum Sr. Deputado pretende fazer uma intervenção curta, creio que devemos terminar a sessão. Contudo, antes de o fazer, a Mesa vai anunciar a ordem de trabalhos da próxima sessão, que se iniciará às 10 horas da próxima quinta-feira.
A ordem de trabalhos consiste na continuação do debate das Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional, o qual se prevê - segundo informação vinda da conferência dos líderes parlamentares - que termine no intervalo da tarde de quinta-feira. Seguir-se-á a discussão e votação da proposta de lei n.º 62/III, que define o regime das leis de programação militar.
Quanto à proposta sobre o Estatuto da Condição Militar que vinha inserta, condicionalmente, na ordem de trabalhos distribuída, informo que a mesma foi retirada.
Também na próxima sessão de quinta-feira se fará a eleição de um juiz do Tribunal Constitucional, que terá lugar simultaneamente com o debate das Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional. A votação em causa será iniciada às 15 horas e prosseguirá até à hora que oportunamente se definir.
Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, peço antecipadamente desculpa se porventura a observação que vou fazer não tiver sentido, mas com o ruído que existe neste momento no Plenário não me apercebi daquilo que o Sr. Presidente disse.
A questão que colocava é a seguinte: ficou combinado na conferência dos líderes parlamentares que o tempo da referida votação teria lugar no momento do intervalo; é uma decisão de princípio, condicionada à situação real do debate nesse momento e ao facto de até lá terem podido intervir pelo menos todos os partidos.
Provavelmente foi esta a informação que o Sr. Presidente deu, mas eu confesso que não a ouvi, devido ao referido ruído na Câmara.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, não fiz uma precisão idêntica à que acaba de fazer, porque recebi uma informação bastante sintética. Contudo, segundo me informam na Mesa, é essa a interpretação correcta.
Srs. Deputados, há ainda a fazer o anúncio dos diplomas que deram entrada na Mesa, pelo que vão os mesmos ser anunciados pelo Sr. Secretário.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 412/III, da iniciativa dos Srs. Deputados Raul Rego, João Salgueiro e outro, do PS e do PSD, sobre a elevação de Vila Nova de Famalicão a cidade; o referido projecto baixa à 10.ª Comissão; Pedido de ratificação n.º 124/III, da iniciativa do Sr. Deputado João Amaral e outros, do PCP, do Decreto-Lei n.º 372/84, de 22 de Novembro, que aprova a nova orgânica da Autoridade Nacional de Segurança, responsável pela segurança de informação classificada relativa à OTAN em Portugal e às representações do País no estrangeiro; pedido de ratificação n.º 125/III, da iniciativa do Sr. Deputado João Amaral e outros, do PCP, ao Decreto-Lei n.º 361/84, de 19 de Novembro, que institui o regime de cooperação facultativo entre o estado e os municípios relativamente a edificações e conservação de edifícios necessários à instalação das forças de segurança e estabelece o regime da sua utilização e o destino dos edifícios constituídos ao abrigo do regime de cooperação; pedido de ratificação n.º 126/III, da iniciativa ... , do Decreto-Lei n.º 374/84, de 29 de Novembro, que estabelece disposições complementares e regulamenta o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de Abril; pedido de' ratificação n.º 127/III, apresentado pelo PCP, do Decreto-Lei n.º 386/84, de 5 de Dezembro, que acrescenta um n.º 4 ao artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 449/83, de 26 de Dezembro, que autoriza a Caixa Geral de Depósitos, o Crédito Predial Português, o Montepio Geral, a Caixa Económica de Lisboa e o Fundo de Apoio ao Investimento para a Habitação a conceder financiamentos a longo prazo às câmaras municipais para relançamento do programa para a recuperação de imóveis em degradação, afectos a fins habitacionais.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, resta-me acrescentar que a sessão de quinta-feira se inicia com um período de antes da ordem do dia.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 55 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Abílio Aleixo Curto.
António Gonçalves Janeiro.
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Dinis Manuel Pedro Alves.
Joaquim Manuel Ribeiro Arenga.
Jorge Alberto Santos Correia.
José Barbosa Mota.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Torres Couto.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Fontes Orvalho.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Victor Hugo Sequeira.
Zulmira Helena Alves da Silva.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
Amândio Domingues Basto Oliveira.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José da Costa.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
José Vargas Bulcão.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Partido Comunista Português (PCP):
João António Torrinhas Paulo.
José Manuel Santos Magalhães.
Maria lida Costa Figueiredo.
Centro Democrático Social (CDS):
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
João Lopes Porto.
Jorge Manuel Barbosa.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Almerindo da Silva Marques.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António Manuel Azevedo Gomes.
Bento Elísio de Azevedo.
Eurico Faustino Correia.
José Maximiano Almeida Leitão.
Nelson Pereira Ramos.
Paulo Manuel Barros Barral.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
João Pedro de Barros.
José António Valério do Couto.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Raul Gomes dos Santos.
Partido Comunista Português (PCP):
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Gomes dos Santos.
Lino Carvalho de Lima.
Maria Luísa Cachado.
Maria Margarida Tengarrinha.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Paulo Areosa Feio.
Zita Maria Seabra Roseiro.
Centro Democrático Social (CDS):
Horácio Alves Marçal.
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
João da Silva Mendes Morgado.
José Vieira de Carvalho.
Narana Sinai Coissoró.
Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos enviados è Mesa para publicação
Em reunião realizada no dia 11 de Dezembro de 1984, pelas 18 horas e 30 minutos, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:
Solicitadas pelo Partido Social-Democrata:
Guido Orlando de Freitas Rodrigues (círculo eleitoral do Porto) por Serafim de Jesus Silva. Esta substituição é pedida por um dia (10 de Dezembro corrente).
Agostinho Correia Branquinho (círculo eleitoral do Porto) por Serafim de Jesus Silva. Esta substituição é pedida por um período não superior a 60 dias, a partir do dia 13 de Dezembro corrente, inclusive.
Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social:
José António de Morais Sarmento Moniz (círculo eleitoral de Viseu) por João da Silva Mendes Morgado. Esta substituição é pedida para os dias 11 a 14 de Dezembro corrente, inclusive.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.
A Comissão: Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - Secretário, José Manuel Maia Nunes
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de Almeida (PCP) - Secretário, Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (CDS) - António da Costa (PS) - Luís Silvério Gonçalves Saias (PS) - Adérito Manuel Soares Campos (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - Fernando José da Costa (PSD) - Maria Margarida Salema Moura Ribeiro (PSD) - José Manuel Mendes (PCP) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Joaquim Rocha dos Santos (CDS) - Francisco Menezes Falcão (CDS) - António Poppe Lopes Cardoso (UEDS) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).
Declaração de voto enviada à Mesa para publicação
As razões de ordem política, económica e ética que me levaram a votar contra a proposta de lei n.º 88/III aplicar-se-iam, quase por inteiro, ao projecto de lei n.º 400/III, em relação ao qual, todavia, me abstive, apenas em função da autoria partidária do mesmo.
O Deputado do CDS, Manuel Jorge Goes.
AS REDACTORAS: Ana Maria Marques da Cruz - Maria Amélia Martins.
PREÇO DESTE NÚMERO 85$00
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.