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I Série-Número 35

DIÁRIO da Assembleia da República

Sábado 5 de Janeiro de 1985

III LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 4 DE JANEIRO DE 1985

Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral
Secretários: Exmos. Srs. Leonel de Sousa Fadigas
José Mário de Lemos Damião
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 45 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta dos requerimentos entrados na Mesa, bem como das respostas a alguns outros.
A Sr.ª Deputada Margarida Marques (PS), a propósito de 1985 ser o Ano Internacional da Juventude, teceu algumas considerações sobre os problemas que afectam a juventude portuguesa, nomeadamente o acesso à Universidade e a abstenção de emprego. Respondeu no fim a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Jorge Patrício (PCP).

O Sr. Deputado Vidigal Amaro (PCP) teceu críticas à actuação do Governo relativa aos serviços públicos de saúde, acusando-o de deixar degradar os serviços e de não regulamentar a Lei do Serviço Nacional de Saúde.
O Sr. Deputado José Vitorino (PSD) considerando a regionalização um meio indispensável ao desenvolvimento do País e a uma maior participação dos cidadãos na vida democrática, tendo defendido que a regionalização deve ter ínsita, na sua própria filosofia, o planeamento de cada região, exemplificando com a abertura do concurso para as obras de ampliação e melhoramento dos aeroportos de Faro e de Pedras Rubras- Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Carlos Brito (PCP).
O Sr. Deputado Reis Borges (PS) chamou a atenção da Câmara para alguns aspectos relevantes que emergem e ou se conexionam com o programa de reestruturação da nossa marinha mercante e com a abertura de concurso para a construção de instalações terminais nas plataformas aeroportuárias do Porto e de Faro. Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Manuel Lopes (PCP).
O Sr. Deputado Abílio Guedes (PSD) teceu breves considerações sobre as expectativas que legitimamente se poderão manter em relação aos benefícios que do Ano Internacional da Juventude possam resultar puro a juventude portuguesa.

Ordem do dia. - Iniciou-se a discussão do inquérito parlamentar n. º 11/III, apresentado pelo PCP, sobre as actuações do Governo e outras entidades públicas que conduziram em 5 de Junho de 1984 à Resolução do Conselho de Ministros n.º 33/84, que determinou designadamente que fossem aceites por instituições de crédito, por 11,9 milhões de contos, terrenos cujo valor real é largamente inferior.

Após a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo (PCP) ter feito a apresentação do referido inquérito parlamentar e ter respondido a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Portugal da Fonseca (PSD), usaram da palavra, a diverso titulo, além do Sr. Secretário de Estado do Tesouro (António Almeida), os Srs. Deputados Carlos Brito (PCP). José Vitorino (PSD), José Magalhães (PCP) e Lopes Cardoso (UEDS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 45 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Abílio Nazaré Conceição.
Abílio Aleixo Curto.
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António José Santos Meira.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.

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Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto
Frederico Augusto Hãndel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Luís Duarte Fernandes.
João do Nascimento Gama Guerra.
Joaquim José Catanho de Menezes.
João Joaquim Gomes.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José de Almeida Valente.
José António Borja dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José da Cunha e Sá.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Manuel Torres Couto.
José Martins Pires.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Luís Gomes Vaz.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Nelson Pereira Ramos.
Nuno Álvaro Freitas Alpoim.
Paulo Manuel Barros Barral.
Raúl d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Social Democrata (PSD/PPD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Amândio Domingues Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Pedro de Barros.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José António Valério do Couto.
José Bento Gonçalves.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.
José Silva Domingos.
Leonel Santa Rita Pires.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Serafim de Jesus Silva.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
José António Gonçalves do Amaral.
João António Torrinhas Paulo.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda Costa Figueiredo.

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Octávio Augusto Teixeira.
Paulo Areosa Feio.
Zita Maria Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Alexandre Carvalho Reigoto'
António Filipe Neiva Correia.
António Gomes de Pinho.
António José de Castro Bagão Félix.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Basílio Adolfo Mendonça Horta Franca.
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Luís Nogueira de Brito.
José Miguel Anacoreta Correia.
Manuel Jorge Forte Goes.
Narana Sinai Coissoró.
Maria da Conceição Dias Neto.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Corregedor da Fonseca.
Raul Morais e Castro.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
António Poppe Lopes Cardoso.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vão ser lidos os requerimentos que deram entrada na Mesa, bem como respostas dadas pelo Governo.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Na última sessão deram entrada na Mesa os seguintes requerimentos: ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr' Deputado Marques Mendes; aos Ministérios das Finanças e do Plano e do Trabalho e Segurança Social (3), formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Luís António Martins e outros; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Hasse Ferreira e Duarte Lima.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Magalhães Mota, na sessão de 17 de Maio e na Comissão Permanente do dia 19 de Setembro; Jorge Lemos, nas sessões de 26 de Julho e 6 de Novembro; Ilda Figueiredo, na sessão de l0 de Outubro; Carlos Espadinha e Gaspar Martins, na sessão de 11 de Outubro; Joaquim Gomes, na sessão de 11 de Outubro; Licínio Moreira, na sessão de 26 de Outubro; José Manuel Mendes, na sessão de 8 de Novembro.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Marques.

A Sr.ª Margarida Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 1985 é o Ano Internacional da Juventude' Assim o proclamou a Assembleia Geral das Nações Unidas. «Participação, Desenvolvimento e Paz» são os temas centrais.
O carácter complexo e prolongado da crise que hoje vivemos parece constituir, mais do que uma situação transitória, o «modo de ser» das sociedades actuais.
A geração dos 15 aos 24 anos tem apresentado taxas de crescimento demográfico superiores às do conjunto da população portuguesa, o que origina uma situação de extrema dificuldade à juventude - o acesso à Universidade, onde o princípio de justiça social de igualdade de acesso ao ensino (constitucionalmente garantido) está completamente arredado, é interdito a quase metade dos candidatos; a juventude é o grupo social que mais obstáculos tem de transpor para obter emprego.
Olha se normalmente para os jovens de uma forma paternalista. Os jovens são «produto» da sociedade em que vivem. A sociedade canaliza para a juventude os seus próprios problemas. Rotula os jovens pela forma como aceitam ou rejeitam os valores comunitários tradicionais.
As circunstâncias sociais, culturais e históricas encontram se em permanente mudança pelo que os valores dominantes de uma geração podem não ser os de outra; mesmo dentro da mesma geração nem todos se identificam com os mesmos comportamentos.
Há valores que permanecem e que a juventude continua a assumir, ainda que por vezes reinterpretados; contudo, há novos valores os respeitantes à relação entre o homem e a natureza face às ameaças que pesam sobre a própria integridade planetária e os crescentes desequilíbrios ecológicos são disso exemplo.
A inserção social dos jovens não pode ser nunca, não será nunca, o ajustamento dos jovens aos valores tradicionais vigentes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para fazer face aos desafios que a difícil e complexa situação actual levanta, as políticas com incidência na juventude não devem ser perspectivadas com o simples enquadramento social; devem antes implicar o envolvimento actuante dos jovens, com recusa do paternalismo institucional, valorizando a participação dos jovens, tendo em conta que a sua experiência de vida, o seu quotidiano, deverão constituir lugares de aprendizagem da solidariedade, da responsabilidade e da crítica, da abertura aos problemas do mundo que os rodeia.
A mudança, no que diz respeito à juventude, não se cumpriu. Na organização do trabalho, por exemplo. Não é devolvendo aos jovens as formas esgotadas, tradicionais, de soluções que já não são adequadas às necessidades sociais que estamos a contribuir para a satisfação das aspirações dos jovens ou que estamos a criar condições para um empenhamento, participação, dos jovens no desenvolvimento.
Mas é de apoiar e incentivar acções que determinem um relacionamento diferente dos jovens com o trabalho e com a comunidade; que tenham presente um

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maior respeito pelas especificidades regionais e interesses individuais; que partam de uma análise das necessidades e dos recursos locais; actividades que não estão enquadradas na tipologia tradicional das profissões, mas que podem ter um papel determinante no desenvolvimento regional. As ILEs (Iniciativas Locais de Emprego) são disso exemplo.
A juventude é portadora de soluções que ainda não foram encontradas no quadro tradicional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A escola (que deve ser sobretudo lugar de preparação para a mudança), a empresa (que deve funcionar como espaço de inovação), a família, o serviço militar, as associações de jovens, os organismos estatais relacionados com questões juvenis, são níveis em que o jovem se move. Mas são instituições que no seu conjunto determinam o quotidiano dos jovens.
Por isso se exige uma abordagem integrada dos problemas da juventude, uma interacção em que o jovem seja o centro e não se verifique, como frequentemente acontece, o esquartejar do jovem entre esses 6 níveis de inserção social. Uma interacção multilateral e integrada destes níveis deve ser a preocupação fundamental da Assembleia da República neste Ano Internacional da Juventude.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não nos podemos ficar por festejar o Ano Internacional da Juventude. A festa fazem-na os jovens! Para além do que disse anteriormente, à Assembleia da República cabe ainda um papel de diálogo com as organizações juvenis. Também não lhe basta legislar embora seja de grande importância o consenso conseguido entre todos os partidos na Comissão de Juventude, que levou à apresentação de uma proposta de resolução que entre outras coisas determina a fixação de um período legislativo para projectos ou propostas de lei sobre questões de juventude.
Casos há em que o cumprimento integral da legislação em vigor, apesar das deficiências, seria suficiente para a criação de situações menos injustas.
Finalmente, as instituições, constituindo o suporte da sociedade, devem preocupar se em dar respostas adequadas à mudança e ao direito de ser diferente.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Patrício.

O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Sr. Presidente, antes de formular o meu pedido de esclarecimento, desejo interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Sr. Presidente, visto o meu partido ter uma declaração política para fazer, gostaria de saber se o meu pedido de esclarecimento a prejudica.

O Sr. Presidente: - Não prejudica, Sr. Deputado, na medida em que não foi esse o condicionalismo discutido na conferência de líderes. Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Sr.ª Deputada Margarida Marques, não assisti a toda a sua intervenção - com grande pena minha. Em toda o caso, V. Ex.ª fez uma afirmação que gostaria que me fosse devidamente esclarecida. Segundo penso, afirmou que a «mudança para a juventude não se concretizou». Será que à Sr.ª Deputada pode especificar, mais em pormenor, o que pretende dizer com esta afirmação? Entende que ela tem a ver com a orientação política que tem vindo a ser seguida nos últimos anos ou entende que não é possível que a mudança para a juventude se concretize de facto?

O Sr. Presidente: - Para responder tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Marques.

A Sr.ª Margarida Marques (PS): - A frase que proferi na minha intervenção foi a de que a «mudança, no que diz respeito à juventude, não se cumpriu». Quero clarificar, respondendo ao Sr. Deputado Jorge Patrício, esta afirmação. Efectivamente, ela tem no seu fundamento dois significados: primeiro, o de ter vindo a verificar-se, por parte do Governo, uma ausência de medidas legislativas que procurem dar respostas aos problemas dos jovens talvez o ano de 1985, pelo facto de ser o Ano Internacional da Juventude leve o Governo a estar mais atento à problemática juvenil; segundo, aquela afirmação não significa que os jovens apenas exigem do Governo medidas que levem a alterar o seu modo e condições de vida. O futuro dos jovens tem de ser, também, construído por eles próprios e têm de ser os jovens a proporcionar essa mudança' Têm de ser eles, também, a construir e a empenhar-se em encontrar respostas para as soluções às suas aspirações.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se no primeiro dia do ano de 1985 algum dos Srs. Deputados tivesse passado por um ser viço público de saúde, nada teria observado de melhoria em relação a anos anteriores.
Doentes, familiares, pessoal, gente, gemidos, choros, vozes, gritos, batas brancas, amarelas, azuis, verdes... sofrimento, medo, angústia, ansiedade, desilusão, o perder da esperança.
Os doentes amontoam-se. As macas nos corredores, com doentes, não deixam qualquer espaço. Um doente com enfarte do miocárdio tem de ficar no balcão por que o SO está superlotado. O aparelho de raio X tem de parar horas, porque aquece. O laboratório de análises clínicas não dá resposta aos exames pedidos. Uma simples contagem de glóbulos brancos demora 5 horas a realizar (a doente com suspeita de apendicite aguda, por sinal, uma canadiana, espera). O ruído é ensurdecedor. Os médicos mais uma vez pedem silêncio para poderem examinar os doentes.
À porta continuam a chegar as ambulâncias. Quantos quilómetros percorridos? Por quantos hospitais passaram? Em quantas portas o papel que assim reza: «Hoje não há serviço de urgência» ou a informação «15to não é para aqui!»
Uma pequena amostra da realidade vivida no primeiro dia de Janeiro no serviço de urgência do Hospital de São José de Lisboa.
O caos vivido dia a dia por quem trabalha nos ser viços públicos de saúde ou a quem a eles recorre, fruto do imobilismo de um Governo que com l8 meses de actuação continua a deixar degradar os serviços, con-

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tinua a não regulamentar a Lei do Serviço Nacional de Saúde, que o próprio partido maioritário deste Governo aprovou nesta Câmara.
Mas estas imagens não são um caso isolado. Elas são o espelho de imagens multiplicadas por esse País fora. São as «bichas» que se formam a partir das 5 horas da manhã, e às vezes mesmo antes, nos postos de saúde para se arranjar uma ficha para uma consulta. São as esperas de semanas e meses para a marcação de uma consulta de especialidade, de uma análise, de um exame radiográfico. São os dias perdidos e o dinheiro gasto em transportes para o tratamento de fisioterapia, quando conseguido. É o levantar de madrugada para apanhar a camioneta da carreira, levar uma «bucha» para o almoço, o regresso às tantas da tarde, perder um dia de trabalho, para ir à vila vacinar os filhos. É o chegar se à farmácia com as receitas e pedir ao farmacêutico para aviar as mais baratas, porque os medicamentos são caros e dinheiro não o há.
Estes, sim, são os casos comuns. E os Srs. Deputados bem os conhecem. Basta ler os requerimentos que de todas as bancadas são dirigidos ao Governo descrevendo situações em tudo similares a estas. Algum dos Srs. Deputados é capaz de afirmar que a situação da saúde se encontra bem ou que melhorou nestes l8 meses nas suas regiões? É um desafio que lhes deixo.
Mas para este estado de coisas não há qualquer justificação. Há unidades de saúde espalhadas por todo o País. Há médicos suficientes. Chegou até a afirmar-se que os havia a mais. Então porque não se põe a funcionar e não se rentabiliza o equipamento disponível, e os recursos humanos existentes? Porque não se colocam os médicos? É um escândalo, Srs. Deputados.
Todos os prazos prometidos pelo Sr. Ministro para a colocação quer dos médicos clínicos gerais, quer dos assistentes hospitalares se encontram esgotados. Prometia o Governo que os concursos e a respectiva colocação destes médicos na província estava terminada em Dezembro de 1984. Estamos em Janeiro de 1985 e tudo se encontra como há 18 meses atrás!
As datas para os concursos dos médicos policlínicos não foram cumpridas, como também não será realizado na primeira quinzena de Janeiro o concurso para assistentes hospitalares como foi prometido pelo Sr. Ministro, no passado mês, na Comissão Parlamentar de Segurança Social, Seguro e Família.
Cerca de 1000 médicos aguardam há já 18 meses a abertura do concurso para assistentes hospitalares e a sua colocação nos hospitais distritais. O concurso prometido com um júri nacional e para o qual já tinha sido publicado um regulamento, vê se agora de novo ameaçado. Prepara se nos bastidores a realização de um regulamento com júris regionais ou mesmo concursos institucionais com júris da casa.
O tempo passa, os profissionais desmobilizam se e os hospitais distritais continuam a funcionar com inúmeras carências e deficiências e vão drenando para os grandes centros os doentes.
É neste quadro e perante a firme e crescente rejeição, por parte dos trabalhadores da saúde, da política que tem levado à desorganização dos serviços e à degradação das condições de trabalho dos profissionais da saúde que o Sr. Ministro fez publicar este singular inconstitucional despacho:

Os funcionários deste Ministério e dos institutos públicos sob sua tutela, só poderão prestar declarações públicas que impliquem a divulgação de factos ou documentos relacionados com o funcionamento dos respectivos serviços, de que tenham conhecimento através do exercício das suas funções, bem como permitir reportagens gráficas sobre os mesmos, quando devidamente autorizado pelo director-geral ou órgão responsável pelo instituto público respectivo, conforme os casos os quais, por sua vez, ajuizarão, em cada caso, da necessidade de submeter o respectivo pedido à autorização do ministro da Saúde.

Tal medida inconstitucional, já conhecido pelo «despacho da rolha», é uma tentativa que não fará calar os trabalhadores da saúde que seguramente continuarão a denunciar os casos de incompetência e inoperância do Ministério da Saúde.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A má gestão dos recursos financeiros é, aliás, uma constante no campo da saúde. Apenas 2 exemplos:

Gastaram se, já há anos, 20 000 contos num edifício para a central de incineração do Hospital de Santa Maria. Gastou se o dinheiro mas a central não funciona;
Nas obras do serviço de urgência do mesmo hospital, por falta de programação, já se pagaram aos empreiteiros a título de indemnização mais de 6000 contos!

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - É um escândalo!

O Orador: - E o TAC dos hospitais civis quando vai funcionar? Chegará mesmo a funcionar? Quantos milhares de contos já gastos?
Pode dizer se que em Portugal a saúde só vai bem, para aqueles que fazem da doença dos Portugueses o seu comércio, para esses vão os chorudos lucros. Que o digam os chamados laboratórios de análises clínicas que proliferam por esse País.
Sem pessoal especializado, sem o mínimo de equipamento, transportando sem qualquer garantia de segurança os produtos a analisar recolhidos quantas vezes a dezenas de quilómetros, sem qualquer controle de qualidade, sem o mínimo de avaliação por parte dos serviços oficiais, tais comerciantes são pagos com as verbas do orçamento do Serviço Nacional de Saúde, enquanto os laboratórios dos serviços públicos se encontram a trabalhar em part-time, sem o mínimo de rentabilidade.

O Sr. António Mota (PCP): - É um escândalo!

O Orador: - O mesmo se passa com alguns serviços particulares de raios X, electrocardiografia, electroencefalograma e fisioterapia.
Mas o grande escândalo é o que se passa com a política dos medicamentos. Só no ano passado, foram gastos pelo orçamento do Serviço Nacional de Saúde em medicamentos 18,5 milhões de contos! Os preços subiram de Dezembro de 1983 a Julho de 1984 (em 6 meses apenas) 37,8 % nos medicamentos, 45,6 % no material para pensos, e 5l % nos desinfectantes. As

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multinacionais da indústria farmacêutica continuam a levar assim do País, milhões de contos de lucro.
Que espera o Governo para intervir? Que justificação para estes aumentos? Porque não se faz vigorar o Formulário Nacional? Porque se espera para uniformizar as embalagens, disciplinar a comercialização, intervir na propaganda médica? Mas intervir nesse campo é bulir com os interesses das multinacionais. Em vez disso o Governo prefere pôr os doentes a pagar mais e assim diminui a comparticipação na aquisição dos medicamentos. Medida de uma injustiça social sem qualificação!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes os principais vectores que levam o nosso país a mostrar os indica dores de saúde que nos aproximam dos países do Terceiro Mundo.
A morbilidade por tuberculose aumenta. As doenças infecto-contagiosas continuam com grande peso na estatística da morbilidade e da mortalidade. As taxas de mortalidade materna, mortalidade infantil e neonatal, a esperança média de vida não têm tendência a aproximar se dos indicadores verificados nos países da Europa em que nos situamos, mas antes nos aproximam dos países da América Latina.
É esta e não outra a situação a que a política de saúde do Governo PS/PSD gerida pelo ministro Gonelha conduziu o País.
Este Governo já demonstrou que não é capaz nem está interessado em tomar medidas integradas de política de saúde. Também neste campo já é tempo de mudar de política e de Governo. Só assim os Portugueses poderão usufruir do direito à saúde, constitucionalmente consagrado.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde o 25 de Abril tem sido praticamente uma constante a invocação da regionalização como meio indispensável ao desenvolvimento do País e a uma maior participação dos cidadãos na vida democrática. E, para o PSD, tal argumentação sempre se apresentou absolutamente inquestionável. Daí que sempre tenhamos enfileirado na primeira linha dos que têm lutado contra a excessiva concentração de meios humanos e de poderes no Terreiro do Paço, bem como na quase exclusividade de grandes investimentos de carácter público nas zonas e regiões mais cosmopolitas, industrial e comercialmente mais avançadas, em detrimento da maior parte do País, a debater se com terríveis problemas de desertificação humana e vegetal.
É que tal situação implica ou implicará na prática a redução progressiva da área económica e social de um país já de si geograficamente pequeno como é o nosso, além de poder pôr muitas vezes em causa o próprio crescimento e desenvolvimento das zonas mais desenvolvidas. E aqui entram, naturalmente, factores de ordem ambientai.
Mas, infelizmente, no aspecto da regionalização tem-se falado muito e avançado pouco ou, pelo menos, a um ritmo mais lento do que se podia e devia.
Tenho para mim, também, que falar da regionalização é falar do planeamento regional. 15to é, falar de regionalização sem que isso implique um efectivo planeamento regional é uma falsa, uma meia verdade ou até um absurdo. Quero com isto significar nesta minha intervenção de hoje, essencialmente, que não se pode confundir o lançamento de algumas grandes obras em várias regiões do País, o que se aplaude, com uma efectiva e sã política de regionalização planeada, de modo a que esses investimentos tenham em si efectiva rentabilidade e não sejam causadores de novos estrangulamentos e desajustamentos que, nalguns casos, podem ser mais graves do que os até aí existentes. E acrescentarei, também, que não se pode confundir, ainda, desenvolvimento regional com muitos e bons investimentos, designadamente de infra-estruturas diversas, que se desejam e aplaudem, a nível de pequenas unidades geográfico administrativas.
Naturalmente que há sempre uma parte essencial do desenvolvimento que numa economia de iniciativa privada como a nossa, funciona por si, aparecendo os investimentos logo que criadas algumas estruturas essenciais a nível de vias de comunicação e outras.
O que pretendo concluir é que o desenvolvimento do País exige a regionalização e que esta tem ínsito na sua própria filosofia o planeamento de cada região, enquadrada nos grandes objectivos nacionais, que não se confundem nem com o mero lançamento de grandes obras, nem com a realização de muitas obras em pequenas fracções do território.
Largas horas do debate se poderiam travar sobre a matéria, abordando a sobre os mais diversos ângulos e implicações. Mas no fundamental, é de referir que uma adequada gestão dos meios e recursos financeiros, bem como a salvaguarda do futuro, obrigam a que ao lançarem se grandes obras, isso seja feito face a necessidades sentidas e evolução previsível, mas ao mesmo tempo se integram num conjunto de outras grandes obras que a dinâmica social e económica irão tornar indispensáveis. Dou um exemplo: foi anunciada recentemente a abertura do concurso para as obras de ampliação e melhoramento dos aeroportos de Faro e Pedras Rubras, na sequência de decisões tomadas em 1982, através da abertura de negociações com o Banco Europeu de Investimentos. Eram e são necessárias e o PSD regozija se e congratula se vivamente com isso.
Mas quanto ao Algarve, quais os problemas que estão associados a esta questão? As obras do aeroporto vão realizar se no pressuposto seguro de que nos próximos 5 a 10 anos mais alguns milhões de turistas poderão procurar o Algarve como destino, além de outros movimentos de carácter económico e financeiro. Entretanto, por outro lado, conforme já foi anunciado e é necessário, em breve arrancarão as obras da ponte sobre o rio Guadiana, o que trará também a Portugal e ao Algarve largos milhares de indivíduos.
Ora, sabendo se as actuais limitações de ordem estrutural básica, com que o Algarve se confronta, com as conhecidas rupturas da falta de água, tratamento de esgotos, terríveis estrangulamentos de tráfego na Estrada Nacional n" 125, que percorre longitudinalmente o Algarve, mau ordenamento por inexistência do mesmo, etc., para o PSD, para os Algarvios e para o País toda esta problemática deverá constituir motivo de serena, mas avisada, preocupação face ao futuro.
De facto, à medida que nos aproximamos do século xx1 e se prevê tão forte afluxo de população flutuante, bem como um aumento significativo da população residente no Algarve, pergunta se: a actividade económica e o tecido social distribuem-se onde e como?

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Os indivíduos circulam onde? Que água vão beber e com que água se fará a agricultura? Os esgotos tratam se como?
Sobre estas questões muito se tem falado, e há ideias sobre os assuntos, mas agora e de forma definitiva além de se saber o que é preciso fazer, é preciso integrar e coordenar as ideias e os conceitos e passá-los à prática, porque já se atingiram, ou até ultrapassaram, to dos os limites de tempo. Torna se assim urgente e inadiável para o Algarve como forma de desenvolver o litoral, interior e serra de forma equilibrada e de aproveitar o seu enorme potencial turístico, agrícola e piscatório, e essencial ao próprio progresso do País que com urgência se planeie e prepare o futuro e se faça um calendário integrado da realização das seguintes iniciativas: plano de ordenamento; a exploração integrada dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos; plano global de tratamento de esgotos numa perspectiva de médio e longo prazos; via rápida entre o Barlavento e o Sotavento.
Muitos outros aspectos terão de ser considerados, mas estes são alguns dos que reputamos essenciais.
E caso o essencial não seja acautelado, poderemos estar a caminhar para situações de colapso e ruptura económica e social que não servem o Algarve nem o País e em que obviamente ninguém está interessado.
A reflexão e alerta do PSD aqui ficam, bem como a nossa disponibilidade para colaborar pelas formas que o Executivo achar conveniente, num são e alargado de bate sobre esta complexidade problemática!
E, no Algarve como no resto do País, é indispensável que as grandes linhas mestras do desenvolvimento sejam definidas e se avance harmonicamente com decisão, mas com segurança e clara perspectiva de futuro seguro.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Ouvi com toda a atenção a intervenção do Sr. Deputado José Vitorino, tanto mais que se tratava de problemas do círculo por que estou eleito e de algumas prioridades relativamente às obras de progresso que importa levar a cabo no Algarve.
0 Sr. Deputado começou por fazer algumas referências à regionalização. A este propósito, queria lembrar-lhe que aquando da revisão da Constituição,
em 1982, o PSD - e o Sr. Deputado também votou contra uma proposta apresentada por deputados algarvios do PS no sentido de ser introduzida uma norma transitória que teria tornado possível a criação da região piloto do Algarve.
Passados estes anos, pergunto se já se arrependeu do modo como votou nessa altura. Pensa que foi adequada e correcta a posição que o PSD tomou nessa altura? Não pensa que a aprovação daquela norma transitória poderia ter, na verdade, desbloqueado 0 processo de regionalização?
A segunda pergunta é relativa às questões de prioridade. Parece me que o Sr. Deputado vem defender - aliás, ouvi-o na rádio naquela grande cobertura que é dada às iniciativas do PSD no Algarve - , a propósito do aeroporto de Faro, que essa não é uma prioridade no Algarve. Em todo o caso, eu queria sublinhar com muita força que nós entendemos haver duas prioridades fundamentais, ou seja, as barragens, todo o problema dos recursos hídricos, e a questão do saneamento básico. Para nós essas duas prioridades são fundamentais. Aliás, o Sr. Deputado sabe que nós fizemos a nossa companha com o slogan «Água e Regionalização» e pensamos que esses dois problemas são fundamentais para o Algarve e gostaria de saber se para o Sr. Deputado também assim é.
Entre as prioridades que o Sr. Deputado citou não referiu as questões dos portos, drenagem das barras e das obras portuárias nos pequenos portos pesqueiros e gostaria de ouvir a sua opinião sobre isso. A minha opinião, bem como a dos meus camaradas do Algarve, é de que esta é a via real de desenvolvi mento para o Algarve e um incentivo para a pesca artesanal.
Finalmente, o Sr. Deputado falou da ponte do Guadiana. Bom, eu já tenho 51 anos e desde que me lembro sempre se falou nessa ponte. Gostaria de lhe perguntar se o Sr. Deputado tem alguns elementos concretos sobre a construção da ponte do Guadiana. Há da parte das autoridades espanholas alguma manifestação de vontade nesse sentido ou tudo continua a ser uma nebulosa e uma promessa que se mantém como miragem inalcançável? Pergunto ao Sr. Deputado se entende independentemente de isso ser possível ou não - que essa questão, da ponte sobre o Guadiana, é uma grande prioridade para o Algarve e se está ao nível das que nós abordámos-
Pena é, Sr. Deputado José Vitorino, que este dia logo que temos aqui na Assembleia da República não o possamos ter na comunicação social, porque, como sabe, tanto a televisão como a rádio dão grande relevo às iniciativas do PSD no Algarve e muito pouco relevo às iniciativas do PCP no Algarve.

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - As questões que o Sr. Deputado Carlos Brito levantou são pertinentes e possibilitam dar alguns esclarecimentos adicionais.
Em relação à questão do debate sobre regionalização, ou seja, à proposta feita no sentido da alteração constitucional para que o Algarve fosse considerado uma região piloto, em matéria de regionalização, quero dizer ao Sr. Deputado que não votei, pura e simplesmente, porque nessa altura não estava aqui na Assembleia - se não me engano era governador civil nessa altura.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - De qualquer forma, o Sr. Deputado sabe qual é a filosofia do Partido Social Democrata nessa matéria: em primeiro lugar, deverão ser criadas as condições estruturais efectivas para se dar o passo em frente da regionalização e, em segundo lugar e sobretudo, que esta problemática se deverá abordar numa perspectiva geral. Essa é a posição que o meu partido tem assumido até hoje. Obviamente, posso dizer lhe que o Algarve é de todos os distritos o que dispõe de melhores condições para, com mais prioridade, avançar num projecto desses, até por natureza de ordem geográfica, histórica, cultural, etc.

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Quanto ao problema das prioridades para o Algarve, acho que as obras do aeroporto de Faro são necessárias e, diria mesmo, indispensáveis. Não ponho reservas nenhumas, e eu e o meu partido regozijamo-nos com isso. Mas o que é indispensável é que essas obras sejam associadas a outro conjunto de iniciativas, porque neste momento já se revelam situações de ruptura ou, pelo menos, no limite do razoável. É esta a posição do meu partido.
Quanto à questão dos portos, nós temos apresentado requerimentos sobre essa matéria. Ainda. recentemente falámos sobre o porto de Quarteira e, portanto, estamos de acordo com isso. No entanto, o espaço da intervenção feita hoje não dava para abordar aqui tudo.
Pergunta-me se tenho elementos concretos sobre a ponte do Guadiana. Bom, confio no Governo, que diz que ela finalmente vai avançar e que já se chegou a
acordo com as autoridades espanholas. Está anunciado que as obras poderão iniciar-se em l985 e, enfim, eu tenho como boa e fundamentada a minha afirmação. Confesso crer que hoje estamos mais avançados do que há cinquenta e tal anos, isto fazendo referência à sua afirmação. Como sabe não foi fácil encontrar um acordo com as autoridades espanholas nesta matéria.
No que se refere aos debates mais alargados, quero lembrar-lhe que não há muito tempo houve um debate alargado entre o PS, o PSD e o PCP, no Emissor Regional do Sul, sobre a vasta problemática dos problemas do Algarve. Foi uma tarde inteira de debate, quase 3 horas, sobre esta matéria. Quanto ao resto, outros aspectos que invocou, não me compete a mim fazer considerações, sobretudo, de carácter subjectivo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Reis Borges.

O Sr. Reis Borges (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos últimos dias de 1984 alguns factos, de significativa expressão, marcaram a actividade governativa no domínio dos transportes e da sua infra estrutura. Nomeadamente: a regulamentação dos transportes rodoviários de tipo expresso e de alta qualidade; a apresentação de propostas com vista à execução, no Norte, de lanços de vias rápidas e auto estradas; o programa da reestruturação da nossa marinha do comércio; a abertura de concurso para a construção de instalações terminais nas plataformas - aeroportuárias do Porto e de Faro.
Nesta intervenção iremos, todavia, e muito sucintamente, chamar a atenção para alguns aspectos relevantes que emergem e ou se conexionam com os dois últimos factos elencados e relativos aos transportes marítimo e aéreo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr Presidente, Srs. Deputados: A situação de crise e de completa degradação a que se deixou chegar a marinha mercante nacional é escândalo sem perdão. De facto, o nosso país, cujo comércio exterior utiliza a via marítima para 90 % das suas importações e exportações (e designadamente no acesso
a matérias-primas energéticas e alimentares de primeira necessidade), só consegue encaminhar pouco mais de l0 % desse tráfego em armamento nacional. Acresce que dispomos de estaleiros de construção e reparação naval em situação de flagrante subutilização por escassez de encomendas.
Ora o certo é que, após anos e anos de impotentes lamentações numa litania sem fim, aparece um programa de reestruturação, ao que se crê suficientemente fundamentado. Não iremos, por isso, questionar a solução. Queremos sim recordar ao Governo que deverão ser adequadamente ponderadas todas as consequências de tal solução e que se repercutam nos trabalhadores (e suas famílias) eventualmente atingidos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esperamos, pois, que sejam minimizados todos os efeitos susceptíveis de criarem situações socialmente injustas. É para nós um dever indeclinável chamar a atenção para tais aspectos: por coerência, por respeito a valores que são nossos pontos de referência. Como também esperamos que não sejam postas em causa normas básicas da contratação colectiva, que seja estabelecida uma rigorosa disciplina na actividade de armador que não pode ser um mero afretador, que seja conseguida uma reformulação da gestão portuária recusando qualquer compromisso ou partilha por zonas de influência partidária ou de grupo: em suma, esperamos uma política para o sector que seja global, coerente e eficaz, indo ao fundo das causas e não se ficando, superficialmente, pelos seus efeitos.
A construção de novas instalações terminais nos aeroportos do Porto e de Faro, é o corolário final de uma velha disputa de fins da década de 60: ou concentração de tráfego no aeroporto de Lisboa ou desenvolvimento de plataformas regionais nas zonas, por excelência, industrial (Porto) e turística (Faro). A escolha política do Governo incidiu e bem -, sobre esta última alternativa. Acabou deste modo por fazer vencimento a posição assumida já pelos técnicos de então, os quais muito lutaram para o estabelecimento de tal política no domínio aeronáutico nacional. Deixa se lhes, aqui, este singelo reconhecimento.
Pena é que, ao longo de todos estes anos, não tenha sido adequadamente preparada a indústria nacional para poder responder agora, em termos de equipa mentos aeroportuários e para além da construção civil, às exigências que os programados melhoramentos impõem. De qualquer forma, é questão que, estamos certos, o Governo não deixará de dedicar a atenção requerida.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Lopes.

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - 0 Sr. Deputado Reis Borges referiu a questão da extinção da CTM e da CNN. No entanto, parece me que assim ignorou uma situação que não se pode pôr de parte nos planos social e político deste país, quando temos cerca de 600 000 desempregados.

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O Sr. Deputado entende que a extinção destas duas companhias de navegação, através da resolução que o Governo tomou, acautelam os postos de trabalho e dos direitos adquiridos dos trabalhadores que há muitos anos laboraram e que, no fundo, fizeram aquelas empresas? Ou, pelo contrário, acha que se trata de tomar agora medidas que há muito deviam ter sido tomadas não no sentido da extinção daquelas duas empresas públicas mas mo sentido de se encontrar uma solução para um país, como disse e muito bem, que depende em muito da marinha mercante e que faz uma parte substancial dos seus transportes por via marítima? Não acha o Sr. Deputado que estas medidas deviam ter sido tomadas, atempadamente, e mesmo agora, no sentido de viabilizarem as próprias empresas e, por outro lado, acautelarem os interesses sociais e, naturalmente, os direitos dos trabalhadores, bem como o seu emprego?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Reis Borges.

O Sr. Reis Borges (PS): - Sr. Deputado Manuel Lopes, creio que fui perfeitamente claro na minha intervenção. Entendo que há uma solução que está em marcha e chamo a atenção do Governo para a necessidade de serem, digamos, acauteladas todas as questões de carácter social. Portanto, espero que o Governo tenha isso em conta e possa, efectivamente, minimizar efeitos que possam ser inevitáveis. O Governo deve e tem que minimizar esses efeitos.
Foi isto o que eu disse, Sr. Deputado, e creio que respondo exactamente à pergunta que me fez.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abílio Guedes.

0 Sr. Abílio Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 1985 é por deliberação da Assembleia Geral das Nações Unidas o Ano Internacional da Juventude subordinada aos temas da «Paz, Participação e Desenvolvimento».
Parece-nos, pois, importante que no abrir de l985 nos pronunciemos nesta Câmara sobre as expectativas que legitimamente mantemos em relação aos benefícios que dele possam resultar para o conjunto da juventude portuguesa.
É importante, antes de mais, referir e salientar que este Ano Internacional da Juventude não pode constituir uma mais qualquer comemoração com carácter mais ou menos oficial. Antes deve proporcionar uma oportunidade a não perder para com coragem e seriedade se fazer o diagnóstico do que representa hoje ser jovem em Portugal.
15to pressupõe, é certo, que já se deviam ter iniciado os processos tendentes a fazer deste Ano Internacional um espaço participado e consequente. Lamentavelmente ainda nada se fez excepto a constituição de mais uma comissão governamental para coordenar as acções oficiais e que, saibamos, ainda nada fez ao contrário da política seguida noutros países da Europa onde as verbas e o apoio logístico foram postas à disposição dos organismos representativos da juventude.
É certo que em Portugal ainda não existe um conselho nacional de juventude mas não se pode ignorar a plataforma de diálogo que constitui a comissão pró
conselho nacional de juventude que não devia ter sido marginalizada, como o foi até agora.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - E mesta linha de acções consequentes queremos expressar o nosso agrado não só pela proposta de deliberação elaborada pela Comissão Parlamentar de Juventude e a submeter ao Plenário da Assembleia da República como e principalmente pela proposta que existe, desta Câmara reservar durante o ano em curso alguns dias da sua agenda para contemplar a discussão e votação das iniciativas legislativas que mais directamente digam respeito à juventude.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Será sem dúvida uma das formas mais nobres de comemorarmos o Ano Internacional da Juventude.
Animados da convicção de que, com a nossa contribuição empenhada poderemos dar passos positivos na resolução dos problemas dos jovens, suscitando a sua participação, fazemos votos para que em Dezembro de l985 não digamos com um encolher de ombros resignado «foi mais um ano» mas possamos dizer: «Valeu a pena o Ano Internacional da Juventude.»

Aplausos do PSD e do PS.

ORDEM DO DIA

0 Sr. Presidente: Srs. Deputados, a primeira parte do período da ordem do dia diz respeito ao inquérito parlamentar n.º 11/III, requerido pelo PCP, sobre as actuações do Governo e outras entidades públicas que conduziram em 5 de Junho de 1984 à Resolução do Conselho de Ministros n.º 33/84, que determinou designadamente que fossem aceites por instituições de crédito, por ll,9 milhões de contos, terrenos cujo valor real é largamente inferior (caso Torralta).
Para a apresentação do referido inquérito parlamentar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No Programa do Governo apresentado à Assembleia da República em Junho de 1983, afirmando-se que «a corrupção, o nepotismo e a fraude minam os alicerces da República» era anunciado que o Governo chamaria a si «um combate arrojado, imaginativo e em todos os azimutes da fraude, contra o comércio das consciências».
O Governo vinha assim reconhecer a existência de casos de corrupção que envolviam a política do anterior governo PSD/CDS e prometer um combate eficaz tanto nos casos já existentes como a futuros actos de que tivesse conhecimento.
0 ministro dos Assuntos Parlamentares aceitou mesmo vir à Assembleia da República para fazer um balanço das medidas tomadas e das punições correspondentes.
Foi sol de pouca dura. Os meses passaram se e a Assembleia da República não teve da parte do Governo a informação necessária quanto à sua política nesta área.
E poderemos mesmo adiantar que o governo PS/PSD não só não deu combate aos anteriores escân-

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dalos que objectivamente estão abafados, como com a sua conduta mantém a imunidade e encoraja novas situações a exigir inquérito. Finalmente sobre actuações de membros do Governo tem recaído a suspeita pública quanto à sua conformidade com a lei e a ética que deve presidir aos actos do Estado. São alguns desses casos que aqui temos trazido. Foi na sequência dessas iniciativas que o Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares afirmou que o Governo e que a maioria parlamentar «votariam a favor de todos os inquéritos» que o PCP propusesse no sentido de serem esclarecidos os pontos suscitados.
O PCP entregou os referidos inquéritos que foram publicados no Diário da Assembleia da República, de 22 de Junho de 1984' Porém, contra as regras regimentais e por impedimento da coligação governamental esses inquéritos aguardaram 6 meses o agendamento.
Temos hoje, finalmente, o debate e votação do primeiro dos pedidos de inquérito pendentes. Está em apreciação o inquérito parlamentar sobre as actuações do Governo e outras entidades públicas que conduziram em 5 de Junho de 1984 à Resolução do Conselho de Ministros n.º 33/84, que determinou, designada mente, que fossem aceites por instituições de crédito, 11,9 milhões de contos de terrenos cujo valor real é largamente inferior.
A resolução do Conselho de Ministros respeita à Torralta, que esteve intervencionada pelo Estado de 10 de Dezembro de 1974 a 22 de Março de 1978. Importa, antes de mais, conhecer um pouco melhor esse processo para clarificar o quadro em que se situa a actuação do actual Governo e de outras entidades públicas que conduziram à resolução de 5 de Junho de 1984. A história recente da empresa torna mais clara a enorme indignação provocada pelas medidas governamentais.
É que a intervenção do Estado na empresa tornou se imperiosa depois de um exame que a Inspecção-Geral de Finanças fez à situação da Torralta, que confirmou o comportamento anómalo e irregular da administração daquela sociedade confirmando designadamente a impossibilidade de solver compromissos cor rentes, como sejam os dó regular pagamento de salários a pessoal, a fornecedores e a empreiteiros e, por outro lado, o atraso no reembolso de títulos de férias da ordem dos 130 000 contos e do pagamento de rendimentos (direitos de ocupação) em quantitativo superior a 100 000 contos. Comprovou-se igualmente:

O recebimento de terceiros da ordem dos 800 000 contos a título de adiantamentos para novo aumento de capital, operação esta não autorizada oficialmente e nem tão pouco requerida;
A entrada no País de fundos provenientes do estrangeiro sem autorização do Banco de Portugal e saídas de fundos do País com destino ao estrangeiro, igualmente não autorizadas por aquele banco;
E interligações anómalas entre associadas e outras empresas, fundamentalmente no domínio financeiro e no da transacção e gestão de patrimónios.

Tudo isto assumia gravidade acrescida - sublinhava a resolução que intervencionou a empresa por:

Estarem comprometidos milhares de empregos e cerca de 5 milhões de contos de poupanças confiadas a esta empresa, sabendo se até que muitas delas foram recrutadas junto de emigrantes nossos.

Estas mesmas razões viriam a ser confirmadas, por exemplo, em 1976 quando o então secretário de Estado Luís Madeira na tomada de posse de uma nova comissão administrativa da Torralta afirmou: -

A estrutura financeira da Torralta - empresa que em 25 de Abril de 1974 manifestava graves dificuldades de tesouraria - caracterizava-se por um activo largamente representado por valores imobilizados e por participações financeiras, face a um passivo na sua quase totalidade exigível a curto prazo no montante de 5 milhões de contos, correspondente aos valores aplicados pelos «denominados investidores».

Ainda segundo Luís Madeira:

A intervenção do Estado e a série de medidas a que ao mesmo tempo se recorreu visaram impedir a respectiva declaração de falência.
Cumpre agora ao Governo Constitucional - disse o então secretário de Estado do Turismo - chegar à solução de fundo que permita à empresa sobreviver normalmente, salvaguardando os legítimos direitos dos seus trabalhadores, assegurando o pagamento aos credores, garantindo o reembolso e ou o rendimento possível aos investidores, que têm sido até agora os grandes sacrificados no processo. Não podemos esquecer que até ao momento o Estado prestou garantias a empréstimos bancários contraídos pela Torralta, no montante aproximado de 1 milhão de contos.

No entanto, a Torralta acabaria por ser desintervencionada (em 22 de Março de 1978) pelo governo PS/CDS após grande campanha de um certo jornal de então e dirigida em especial pelo seu director, Proença de Carvalho, que acabaria por ocupar o cargo de presidente do conselho de administração da Torralta, de certo a título de prémio.
O Estado prestou então aval a um financiamento transitório até ao montante de 500 000 contos e atribuiu um financiamento inicial de 250 000 contos.
Mas a Torralta não é desconhecida desta Assembleia da República.
Em 1979, o Governo chefiado por Mota Pinto, através do Decreto Lei n" 33/79, de 28 de Fevereiro, criou a zona de jogo de Tróia, cuja exploração pretendia conceder à Torralta. Sujeito a fiscalização parlamentar, o diploma viria a ver recusada a ratificação, tendo os debates clarificado o papel desempenhado no processo pelo então ministro Proença de Carvalho, que transitara directamente do conselho de administração da Torralta para o Governo!
Em 1979, o governo chefiado por Mota Pinto, atra de 30 de Agosto, o I Governo da AD veio impor o que em 1980 fora recusado pela Assembleia da República. Em Janeiro de 1981 o Decreto Lei n.º 340/80 obteve confirmação parlamentar com os votos a favor do PSD e do CDS, votos contra do PCP, PS, MDP/CDE, UEDS e UDP, não estando presentes os Grupos Parlamentares do PPM e da ASDI.
Acresce ainda que as condições e obrigações inerentes a esta concessão não foram cumprida pela administração da Torralta, nos termos acordados.

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Aliás, em 1982, o governo de Pinto Balsemão, através do Decreto Regulamentar n.º 15/82, de 25 de Março, veio rever as obrigações assumidas pela Torralta com o pretexto de que a viabilidade da empresa necessitava «de uma enorme concentração de investimentos», mantendo, no entanto, um certo conjunto.
Mas apesar disso, nem mesmo estas foram cumpridas. É neste quadro que importa que esta Assembleia analise e avalie a Resolução do Conselho de Ministros n.º 34/84, publicada no Diário da República, 1.ª série, n.º 130, de 5 de Junho de 1984.
Através dela o Governo vincula instituições de crédito (entre as quais a União de Bancos de cujo conselho de gestão foi presente o actual Secretário de Estado do Tesouro, António de Almeida), a aceitar um vasto conjunto de condições. É para o carácter anómalo e espantoso dessas condições que importa alertar a Câmara.
Nos termos da resolução, as instituições de crédito:

Foram obrigadas a aceitar os terrenos objecto de avaliação pela comissão arbitral pelo valor de 11,9 milhões de contos, distribuídos por vários terrenos;
Foram encarregadas de constituir, sempre que julgado conveniente e dentro do princípio da livre negociação entre as partes, sociedades com o objectivo de promoverem o património recebido como dação em pagamento, as quais terão como sócios não mais de 3 bancos e, quando for considerado de interesse para as instituições de crédito, empresas especializadas no sector imobiliário turístico, em número não superior a dois;
Foram informadas de que deverá cessar a contagem de juros, a partir de 1 de Janeiro de 1984, relativamente ao passivo bancário que for liquidado por força da dação em cumprimento;
Foram obrigadas a acordar com a Torralta a forma de liquidação do eventual passivo sobrante em termos adequados ao esquema global de recuperação da empresa, competindo às instituições de crédito escolher os créditos a incluir nesta alínea;
Foram vinculadas a analisar pedidos de financiamento decorrentes do programa referido, dando conhecimento ao Ministério das Finanças e do Plano, no prazo de 30 dias após a recepção do pedido, da decisão sobre o mesmo, devidamente fundamentada.

Que a operação é benéfica para a Torralta, não sobram dúvidas. Que a sua repetição em relação a outras empresas lhes traria alívio substancial, é igualmente indubitável.
Sucede, porém, que não só os benefícios foram excepcionalmente atribuídos à Torralta sem que se conheçam os critérios da concessão, como é reconhecido por diversos avalistas, que a operação é altamente lesiva da banca nacionalizada e logo do erário público (desde logo porque os terrenos objecto de dação em cumpri mento têm valor real bastante inferior a 11,9 milhões de contos).
Como se tal não fosse suficientemente grave a resolução autoriza ainda a Secretaria de Estado do Em prego e Formação Profissional, as instituições de previdência, o Fundo de Desemprego, o Fundo de Turismo e a Direcção Geral do Tesouro e Fazenda Pública a negociar com a Torralta específicos protocolos de acordo para liquidação dos respectivos despachos.
À regularização das responsabilidades da Torralta para com os seus investidores e credores privados não dedica a resolução sequer uma dúzia de linhas, aludindo vagamente à apresentação pela própria empresa de uni «esquema de regularização», no quadro de um «programa de recuperação» que entre as obrigações previstas inclui a de provocar uma onda de despedi mentos.
Igualmente não ficam devidamente garantidas as poupanças de milhares de pequenos aforradores que continuam sem receber o rendimento das poupanças in vestidas, nem tão pouco os valores que subscreveram.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, tal resolução tem ainda de ser encarada no âmbito da situação actual do sistema bancário.
É sabido que as condições de rentabilidade em que o sistema bancário vem exercendo a sua actividade se têm degradado aceleradamente, em razão, fundamentalmente, das políticas económica e monetária globais. Mas para essa degradação têm igualmente contribuído os créditos mal concedidos e sem garantias adequadas, que vêm engrossando de forma gravosa os créditos mal parados. 0 caso dos volumosos créditos concedidos à Torralta, na forma em que o foram, é um exemplo dessa prática que nos últimos anos vem sendo prosseguida por alguns gestores bancários. E a resolução a que agora o Governo procedeu não vem melhorar essa situação mas agravá-la. Quando muito pode vir a ser vir em termos meramente contabilísticos, para esconder, tal como os actuais retoques nos balanços, a matéria ruinosa de algumas gestões bancárias.
Mas não serve a defesa dos interesses do sistema bancário, nem do interesse da colectividade.
É assim que numa situação de grave crise financeira, que o secretário de Estado do Tesouro por coincidência ex-responsável da União de Bancos não desconhecia que foi tomada tal resolução bem demonstrativa da dualidade de situações, de uma política de dois pesos e duas medidas na pseudo viabilização, racionalização ou encerramento das empresas: para as empresas públicas, como aconteceu com a CTM e a CNN, é o agravamento da situação, a sua extinção, a falência. Para certas empresas privadas ligadas ao grande capital (como são escandalosamente os exemplos da Torralta, do jornal O Dia e da sociedade financeira do Sr. Santos Silva) vão todas as escandalosas facilidades para garantir a viabilização à custa do erário público e da banca nacionalizada.
Srs. Deputados, se a Assembleia da República quer ter uma intervenção real e eficaz, no combate à corrupção que tem o dever de levar a cabo, então tem de
o fazer através de acções concretas, através da realização de inquéritos e da divulgação dos seus resultados.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É isso que plenamente se justifica em relação ao acordo que beneficiou a Torralta com as consequências que ficaram descritas! Como foi possível que tivesse sido celebrado tal acordo?! A Assembleia deve apurar rigorosamente que negociações e contactos precederam a Resolução n.º 34/84 do Conselho de Ministros, qual a posição e intervenção dos diversos ministérios, das instituições de crédito e segurança social em todo o processo e em cada uma das suas fases.

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A realização do inquérito agora proposto é, pois, necessária e revestir-se-á de grande importância pelo que ficou exposto e também porque, 6 meses decorridos sobre a resolução do Conselho de Ministros, á Torralta mantém em relação aos seus pequenos accionistas e em relação aos trabalhadores a mesma política de insegurança, denegação de direitos e incumprimento de obrigações legais.
Com a aprovação deste inquérito, de vastas implicações, dar-se-á, pois, um contributo positivo para a normalização da vida da empresa e para a reposição da própria legalidade democrática. É isso que se espera e exige da Assembleia da República!

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Fonseca.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, ouvi com bastante atenção a exposição que V. Ex.ª produziu sobre a situação na Torralta e os comentários que fez à Resolução do Conselho de Ministros n.º 33/84 relativamente à mesma empresa.
Ora, se em determinadas situações o PCP luta acerrimamente pela viabilização de determinadas empresas, não entendo muito bem que no caso da Torralta - considerada uma empresa de estrutura para o turismo nacional, que já o era antes do 25 de Abril e que dentro de uma política que a própria empresa fez de cativação das pequenas poupanças desenvolveu em determinado sentido a oferta de turismo nacional para a captação de divisas de que tanto necessitamos haja uma crítica tão forte e tão fundamentada.
Devo dizer que fico um pouco perplexo quando a Sr.ª Deputada refere o facto de não ter conhecimento de que tenha havido negociações entre a própria empresa, o Governo e os bancos credores. Acaso a Sr.ª Deputada não tem conhecimento de que os presidentes dos conselhos de gestão dos bancos credores da Torralta estiveram diversas vezes reunidos no Ministério das Finanças e do Plano a fim de acordarem as próprias condições de reembolso dos créditos e de solvência da própria empresa? Não tem a Sr.ª Deputada conhecimento de que as avaliações foram feitas em diversas etapas precisamente para conciliar os interesses e os valores reais dos terrenos dados em dação em pagamento pelas dívidas em causa? Porventura não concorda a Sr.ª Deputada que as pequenas economias investidas na Torralta estarão mais garantidas e unicamente garantidas pela viabilização racional da própria empresa em condições de, num futuro não muito longínquo, essas mesmas pequenas economias verem respeitados os seus direitos e serem reembolsados os seus débitos?
Sr.ª Deputada, são estes esclarecimentos que gostaria de obter. A avaliação não é tão grave como a Sr.ª Deputada referiu: houve avaliações superiores e inferiores! Talvez o termo médio encontrado fosse o mais justo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É o que vamos ver!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado Portugal da Fonseca, creio que as perguntas e as considerações que V. Ex.ª acabou de fazer vêm, no fundamental, dar razão ao inquérito que acabamos de apresentar. O que o Sr. Deputado acabou de referir foi uma série de quesitos que justificam as dúvidas, as apreensões que grande parte do povo português levantou, que vários órgãos da comunicação social suscitaram, que muitos empresários referiram, que milhares de pequenos accionistas interrogam diariamente perante o destino das suas poupanças e perante qual o momento em que serão satisfeitos os direitos que têm.
De alguma forma trata-se de um conjunto de questões que legitima todas as apreensões que existem por parte da minha bancada, mas certamente também por parte da bancada a que o Sr. Deputado pertence, tal como o pedido de esclarecimento que produziu deixou transparecer.
' O Sr. Deputado referiu que a avaliação não é tão grave como apontámos. Mas, pelos vistos, sempre é grave! De qualquer forma, é através do inquérito parlamentar que poderá vir a confirmar-se se ela é tão, mais ou menos grave. Só a realização deste inquérito parlamentar permitirá clarificar toda esta situação.
São assim toda uma série de dúvidas que persistem, são assim interesses de milhares de pequenos accionistas, de milhares de trabalhadores, do erário público, da banca nacionalizada e, nomeadamente, de um banco que o Sr. Secretário de Estado do Tesouro conhece bem. Como todos sabemos, há certas dificuldades que esta operação não veio facilitar.
Seria, pois, importante que por parte do Governo fossem dados alguns esclarecimentos, fossem colocadas algumas questões que envolveram toda esta negociação e fosse tornado mais claro todo o processo que envolveu a operação que está na base desta resolução.
Porém, o inquérito que permita uma avaliação concreta dos terrenos e das outras operações que estão subjacentes a esta resolução permitirá então clarificar definitivamente o que se passou, que é grave e sobre o qual existem muitas dúvidas e muitas suspeições.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Fonseca.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, vou usar a figura do protesto com o fim de proporcionar mais um esclarecimento sobre este assunto, já que se trata de uma matéria suficientemente séria e difícil para que se peça um inquérito baseado apenas em suspeições.
Pela minha parte, acredito plenamente na política que o Ministério das Finanças adoptou relativamente a este caso, acredito na sua seriedade e tenho a certeza, até por motivos profissionais, da plena lisura com que se resolveu este caso. E porque tenho essa certeza, Sr.ª Deputada, penso repito que não se levantam inquéritos por meras suspeições.
Nós não somos contra o inquérito, mais: desejamos que este inquérito se faça para clarificar, de uma vez por todas, tudo o que se passou na Torralta. Porém, não concordamos, de maneira nenhuma, que V. Ex.ª diga que o secretário de Estado do Tesouro, o Ministério das Finanças, os gestores da banca e os próprios gestores da Torralta fossem tão incompetentes que le-

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vassem ao prejuízo da banca, que levassem ao prejuízo do erário público. Em sua opinião, talvez fosse mais fácil destruir a Torralta e destruir precisamente as pequenas economias dos investidores privados que nela colocaram o seu dinheiro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado Portugal da Fonseca, a questão que aqui está em causa não é a sobrevivência ou a viabilização da Torralta.
Aliás, nós defendemos a viabilização da Torralta, só que temos opiniões diferentes das do Sr. Deputado e das deste Governo quanto aos processos a seguir para a sua viabilização.
Nós pretendemos já aqui o referi a defesa dos interesses dos pequenos accionistas, dos trabalhadores da Torralta e a defesa dos interesses da economia do País. E é isso que está aqui em causa, ou seja, saber se estão ou não a ser defendidos os interesses dos trabalhadores e dos pequenos accionistas da Torralta e sobretudo, os interesses da economia do País e da banca nacionalizada.
Será desta forma, isto é, dando cerca de l2 milhões de contos de mão beijada à Torralta que se defendem esses interesses? Será desta forma, considerando o valor dos terrenos em 12 milhões de contos que muita gente, diversos órgãos da comunicação social e inúmeros avalistas consideram de valor muitíssimo inferior, Sr. Deputado - que se defendem esses interesses? É que estamos a falar de milhões de contos e não de milhares!
É, pois, no momento grave e complicado que atravessa a situação financeira e bancária de Portugal, no momento difícil que atravessa a gestão financeira do País, que importa averiguar se a melhor forma de defender os interesses do País é dar l2 milhões de contos à administração da Torralta, sem que esteja devidamente assegurada a gestão dessa empresa, destes 12 milhões de contos e a defesa dos interesses dos pequenos accionistas, dos trabalhadores e da economia do País.
É isso, Sr. Deputado, que está em causa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Secretário de Estado do Tesouro.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro (António Almeida): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 processo que deu origem à aprovação da Resolução do Conselho de Ministros n.º 33/84 foi conduzido, em todas as suas fases, de forma directa e pessoal pelo Sr. Ministro das Finanças e do Plano, que proeurou, em estreito diálogo com os presidentes dos bancos maiores credores, abordar este problema com a maior isenção e tecnicismo.
A presença do Secretário de Estado do Tesouro, neste debate, resulta de o facto do Sr. Ministro das Finanças e do Plano não poder estar presente, de ter acompanhado aquele membro do Governo o referido processo em todas as suas fases e de lhe estar delegada competência relativamente ao sistema bancário e viabilização das empresas privadas.

O inquérito parlamentar pedido pelo PCP relativamente à Torralta, nomeadamente à Resolução do Conselho de Ministros n.º 33/84, é encarado com a maior serenidade pelo Governo, ao mesmo tempo que se lhe reconhece grande utilidade, pelo que o desejamos.

A serenidade resulta da isenção da actuação do Governo, como, estou certo, ficará inequivocamente demonstrado durante o inquérito. Aliás, competirá ao PCP demonstrar o erro das decisões tomadas através da apresentação de alternativas que, no conjunto, se mostrem mais válidas para a viabilização da empresa e defesa dos postos de trabalho, alternativas que, gostaria de o referir, nunca foram equacionadas durante o longo período em que este assunto foi largamente discutido, em várias reuniões, com as entidades interessadas na viabilização da empresa.

Este inquérito é, igualmente, útil, uma vez que a empresa em causa é privada, com cerca de 37 000 accionistas, não sendo dominada por qualquer grupo; insere-se num sector de grande importância; tem apreciável dimensão, pelo que a sua viabilização tem particular significado no sector imobiliário-turístico; esteve intervencionada desde finais de l974 até 22 de Março de l978; o passivo total ultrapassava os 23 milhões de contos em finais de l983, sendo de cerca de l2 milhões o passivo bancário; o Estado encontra-se envolvido, através de avales a operações de crédito, na maioria concedidos durante o período da intervenção, em cerca de 5,3 milhões de contos.
Assim, este inquérito irá certamente permitir, em primeiro lugar, definir, de forma inequívoca, uma posição sobre a actuação dos governos quanto aos processos de viabilização das empresas privadas, devendo assumir se, se esse vier a ser o entendimento político desta Assembleia, sem rodeios, a falência das empresas mesmo que detenham património para reduzir o seu passivo e os credores aceitarem a dação em cumpri mento, com as inerentes consequências quanto aos postos de trabalho.
O que parece ser pouco aceitável, por contraditório, é não permitir clarificar as regras de jogo, e exigir se aos governos actuação pontual para a viabilização de determinadas empresas, nomeadamente em áreas de influência do Partido Comunista e, simultaneamente, acusar se o Executivo de interferir na autonomia de gestão quando, em casos considerados especiais, e refiro a título de mero exemplo a Torralta, a Setenave, a Lis nave e a Mesa, procura contribuir para essa viabiliza ção, sempre em estreita articulação com as partes intervenientes.
A primeira utilidade deste inquérito, e que a sociedade portuguesa agradecerá, é a clarificação das posições das várias forças políticas quanto à intervenção do Executivo na viabilização de empresas privadas; e quanto à utilização e dinamização do instituto da falência.
0 inquérito permitirá, igualmente, julgar as consequências de algumas intervenções feitas durante o período gonçalvista e definir, também sem rodeios, os responsáveis pelos prejuízos já ocasionados ao Estado, aos empresários e até aos trabalhadores, bem como os que ainda ocorrerão no futuro, nomeadamente quando 0 Estado tiver de honrar os avultados compromissos as sumidos nessa altura, através de avales prestados, e a banca nacionalizada tiver de anular créditos que mantém relativamente a certas empresas. Será que alguém minimamente informado será capaz de sustentar, com

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verdade, que empresas que foram intervencionadas e outras com elevadíssimos passivos e explorações negativas terão possibilidade de liquidar a totalidade dos seus compromissos?
Não citarei exemplos, por demasiado evidentes e conhecidos, nomeadamente pelo Partido Comunista, que não pode deixar de chamar a si a responsabilidade pela degradação a que algumas empresas privadas chegaram.

Seria de grande utilidade averiguar se o que levou a Torralta, durante o período da intervenção a agravar o seu passivo, de 3,9 para 10,6 milhões de contos, tendo a banca sido convidada nessa altura, para não utilizar expressão mais forte, a aumentar o seu envolvimento na Torralta de 115 000 contos (em 1973) para 2,2 milhões de contos (em 1977), verba que se refere exclusivamente ao capital envolvido.
Seria igualmente útil conhecer se a que racionalidade de gestão obedeceu o aumento dos quadros de pessoal da Torralta durante o período da intervenção de 2378 unidades em 1973 para 3608 em 1977 quando as vendas subiram de 433 000 para apenas 549 000 contos no mesmo período'
A segunda utilidade do presente inquérito será permitir um debate, que há muito se impunha, sobre o fenómeno das intervenções efectuadas em 1974 e 1975.
O inquérito permitirá, do mesmo _modo, que se apresentem modalidades de recuperação de empresas com viabilidade económica, mas desequilibradas financeiramente, sem que tal conduza a agravamentos de encargos para a sociedade portuguesa.
A terceira grande utilidade deste inquérito será a demonstração da capacidade criadora através da apresentação de soluções concretas, que os trabalhadores portugueses agradecerão, uma vez que não é apenas com um apurado sentido crítico que se lhes assegurarão os postos de trabalho.
Estou certo que o PCP não deixará de perder esta oportunidade para apresentar, com objectividade e pragmatismo, soluções nesta área.
Quanto à questão fulcral da resolução do Conselho de Ministros, ou seja, o valor atribuído aos terrenos que irão ser entregues para pagamento das dívidas da Torralta às instituições de crédito desejo, sem prejuízo de um maior aprofundamento do assunto, que terei o maior gosto em fazer, referir os seguintes aspectos:
Em primeiro lugar, a dação em pagamento foi aceite livremente pelas instituições de crédito, em negociações efectuadas com a Torralta e sem qualquer intervenção nem do anterior nem do actual Executivo, conforme carta de 5 de Julho de 1983 que a União de Bancos Portugueses, na qualidade de banco líder, enviou à Torralta.
Em segundo lugar, as instituições de crédito não fizeram qualquer objecção à constituição da comissão arbitral.
Em terceiro lugar, na constituição dessa comissão não houve qualquer interferência do Governo, tendo a referida comissão sido constituída por um representante da banca, um representante da empresa e um presidente que foi indicado pela banca.
A comissão arbitral apresentou ao Sr. Ministro das Finanças e do Plano dois valores para os terrenos: um de 8,7 milhões de contos e outro de 16,8 milhões de contos. O Governo, após variadíssimas reuniões com os presidentes das instituições de crédito, reuniões a que eu estive presente, fixou um valor que é ligeiramente inferior à média aritmética dos valores indica dos pela comissão arbitral, na sequência aliás das regras fixadas aquando da reunião da mesma comissão, em que ambas as partes aceitaram a decisão que viesse a ser tomada pelo Governo. Gostaria aqui de referir - uma vez que se tem dito que foram dados 12 milhões de contos à Torralta - que a banca, por escrito, comunicou que estava na disposição de aceitar os terrenos por um valor que era de 8,7 milhões de contos e mais uma margem de erro de 15 %, ou seja, estava disposta a aceitar os terrenos por um valor de 10,1 milhões de contos.
Fico, tanto eu como o Sr. Secretário de Estado do Turismo, à disposição de VV' Ex.as para responder às questões que acharem por bem formular.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram se para pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados Anacoreta Correia, Carlos Brito e Ilda Figueiredo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Anacoreta Correia.

O Sr. Anacoreta Correia (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado do Tesouro: A bancada do CDS, por razões que já foram aqui expostas por outros Srs. Deputados, acha útil a realização deste inquérito, no sentido de tornar cristalina a vida pública do nosso país.
No entanto, gostaria de pôr uma questão ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro relativamente aos termos da Resolução n.º 34/84. Nessa resolução, segundo parece, havia prazos segundo os quais se deveria fazer a dação dos terrenos às respectivas instituições bancárias. Pretende-se, pois, saber se essa dação já foi efectuada, se os prazos foram cumpridos, e no caso de o não terem sido a razão por que é que o não foram com certeza uma razão técnica.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ouvimos com interesse a exposição que o Sr- Secretário de Estado acabou de fazer. O Governo já poderia ter dado à Assembleia da República alguma das explicações que agora deu, já que essa seria a boa prática da vida democrática, que este Governo assim não entende, pois este Governo só aqui vem e só fala quando é forçado a fazê-lo.
Também compreenderá que, do nosso ponto de vista, não seja agora o momento de lhe fazer muitos pedi dos de esclarecimento. Entendemos que o inquérito é absolutamente necessário, criou se em torno dessa questão uma grande suspeição na opinião pública portuguesa e foram trazidos a pública factos e elementos que tornam respeitável essa suspeição.
Há questões a que o Sr. Secretário de Estado não respondeu, como a questão da avaliação - e essa era uma questão relativamente à qual se poderia ter adiantado alguma coisa. Mas a dúvida que se coloca é a de saber como é que as partes se concertaram para chegarem a esse acordo' Esta que é a grande questão, a que o Sr. Secretário de Estado não respondeu, não podia responder e só em sede de inquérito certamente se fará luz sobre ela.

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Há, contudo, uma postura do Sr. Secretário de Estado que é bastante divertida. O Sr. Secretário diz que é bem vindo o inquérito parlamentar proposto pelo
PCP e, depois, manifesta se magoado, fazendo uma série de remoques ao PCP: por isto e por aquilo, agora é que se vão ver quais as responsabilidades do PCP,
Etc. Naturalmente que não temos nenhuma dificuldade em discutir toda a questão de intervenção, mas ela é introdução a este inquérito. O inquérito vai incidir sobre uma outra questão. Ao fim e ao cabo, aquilo para que o Sr. Secretário de Estado quer arrastar a Assembleia da República é para a ideia de que o que está
em causa não é o acordo, não é a resolução do Conselho de Ministros que levou a esta operação de 12 milhões de contos, mas, sim, o passado. Não nos desviemos. A questão que está em causa são os 12 milhões de contos e é isso que o inquérito tem de averiguar.
Não venha o Sr. Secretário de Estado apontar outras pistas. Nós discutiremos todas as questões, discutiremos também a introdução histórica, mas para chegar
a este objectivo que são os 12 milhões de contos.
Era esta a questão que lhe queria colocar: saber se não entende que tal inquérito é bem vindo para a questão dos 12 milhões de contos. Não acha que é essa a questão que o inquérito coloca?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado do Tesouro: De facto, na intervenção que o Sr. Secretário de Estado agora fez, em relação à questão que é objecto fundamental do inquérito que temos aqui, hoje, em apreciação e que é a questão da avaliação e a resolução do Conselho de Ministros, de 5 de Junho de 1984 limitou se a pô-la do seguinte modo: foram feitas duas avaliações, uma de 8,7 milhões de contos e outra de 16,8 milhões de contos, e o Governo optou por uma média aritmética desses dois valores.
Senhor secretário de Estado, sem prejuízo, natural mente, de todas as averiguações que através da comissão de inquérito certamente irão ser feitas, importaria já hoje que o Sr. Secretário de Estado pudesse adiantar o seguinte: porque é que o Governo optou pela média aritmética? Porque é que o Governo não optou pela avaliação mais baixa? Considerou que os avalistas que fizeram a avaliação mais baixa se tinham enganado, tinham errado, e então o Governo deveria optar por considerar mais cerca de 3 300 000 contos do que o valor que eles consideraram?
Importava, de facto, que já hoje, neste esclarecimento, que, aliás, o Governo podia ter dado há 6 meses, fossem adiantadas algumas pistas sobre esses critérios do Governo. 15to porque, mesmo aqui, está já em causa a avaliação feita por certas pessoas, avaliação essa que o Governo não considerou válida, e está em causa um critério de sobreavaliar uma avaliação no valor de 8,7 milhões de contos e de, à partida, a considerar em 12 milhões de contos. Porquê, Sr. Secretário de Estado? Quais, ainda, as finalidades que as instituições de crédito têm previstas para a utilização destes terrenos? Essa poderia ser outra pista a avançar desde já.

Mas, Sr. Secretário de Estado, naturalmente que poderíamos avançar hoje com muitas outras questões. Creio, no entanto, que o melhor é constituir a comissão de inquérito. 0 processo é demasiado complexo - como foi dito pelo Sr. Deputado Portugal da Fonseca , é demasiado sério, para que através das respostas do Sr. Secretário de Estado se façam processos de intenções quanto às posições do PCP, e não se cuide, antes, de tornar claro e objectivo todo o processo que envolve esta resolução do Conselho de Ministros, todo o processo que envolve mais de 12 milhões de contos. 15to, porque o que está em causa até nem são apenas os 12 milhões de contos dos terrenos avaliados, como já vimos, por um valor muito superior ao seu valor real , mas todo o conjunto de outras medidas que também vêm pôr em causa o erário público nalguns milhões de contos, pelo que importa averiguar se foram ou não cumpridas pela administração da Torralta, em que condições, e se, de facto, estão a ser salvaguardados todos os interesses em causa: dos pequenos accionistas, dos trabalhadores, da banca nacionalizada, os interesses do País e não apenas os interesses da administração da Torralta.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.

0 Sr. Secretário de Estado do Tesouro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente à pergunta que me foi feita pelo Sr. Deputado Anacoreta Correia, gostaria de informar que depois da publicação da Resolução do Conselho de Ministros, os bancos em negociação com a Torralta e aí o Governo não teve, como é óbvio, qualquer tipo de intervenção chegaram a um acordo quanto ao texto do protocolo, que seria assinado para a dação em cumprimento. Esse texto foi remetido à Torralta pelo banco líder em 14 de Agosto de 1984.
Tanto o sistema bancário como a Torralta deram o acordo a este projecto de protocolo. O facto de ele não ter sido assinado deve se à circunstância de as instituições de crédito terem posto como condição - e quanto a mim bem que só aceitarão os terrenos se não forem obrigados a pagar a sisa. Foi esta a única razão por que o protocolo não foi assinado entre as partes.
Em relação às questões que me foram levantadas pelo Sr. Deputado Carlos Brito, gostaria de começar por lhe dizer que pensamos que o inquérito é útil e que se deve fazer.
Quanto à avaliação, há uma repetição da mesma pergunta, pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo pelo que, se me permitisse, responderia depois à Sr.ª Deputada.
Em relação às responsabilidades que poderão ser atribuídas ao PCP, queria começar por dizer que não considero que elas sejam todas do PCP. Não é possível analisar este problema em concreto, considerando apenas a razão pela qual os terrenos foram avaliados e por que é que se vai eliminar um passivo. É preciso saber por que é que se constituiu esse passivo, conhecer as suas causas.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Vamos a elas!

O Orador: Temos de ir às causas com origem não só nos anos de 1974 e 1975, mas também nos anos que

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se lhe seguiram. A verdade é que a grande maioria do passivo resultou das operações de crédito que foram concedidas à Torralta no período de 1974 e 1975, através do adicionamento de juros durante um período de quase 10 anos. Estes juros, adicionados aos 2,2 milhões de contos, que foi o passivo bancário que foi agravado à Torralta no final de 1975, fizeram com que o passivo se cifrasse aproximadamente em l2 milhões de contos. Houve outras operações de crédito que foram concedidas à Torralta e que contribuíram e contribuem, obviamente, para o aumento do passivo. Estas as razões por que temos de fazer a história, a fim de que se possa conhecer as causas que geraram esta situação.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Posso interrompê-lo, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Secretário de Estado, até dá a impressão, por aquilo que está a dizer, que foi o Governo que tomou a iniciativa de fazer a história! Ora, quer pelo texto que entregámos a requerer o inquérito, quer pela intervenção de hoje da minha camarada Ilda Figueiredo, fomos nós que tomámos a iniciativa de fazer a história. Nesse aspecto o mérito é, portanto, nosso e não do Governo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, os governos nos regimes democráticos não fazem história, fazem parte dela. Não temos ainda esse poder.
Referir-me-ia agora às questões levantadas pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo. A Sr.ª Deputada começa por fazer uma afirmação que tem de demonstrar e que é a de que o valor real dos terrenos é de 8,7 milhões de contos. Se esse facto fosse tão evidente e se todas as partes estivessem de acordo, era óbvio que não fazia sentido nem uma arbitragem nem que a própria comissão arbitral, que era constituída, como eu disse, por um representante da banca, por um representante da empresa e por um presidente que foi indicado pelo sistema bancário, tivesse tido dúvidas.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Posso interrompê-lo, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Secretário de Estado, eu não disse que o valor real dos terrenos era de 8,7 milhões de contos. Essa é uma das questões que faz parte de um lote de problemas que queremos que sejam inquiridos e avaliados.
O que eu disse foi que uma comissão de avaliação, nomeada nos termos que o Sr. Secretário de Estado aqui referiu há pouco, considerou que o valor dos terrenos era de 8,7 milhões de contos. O que perguntei ao Sr. Secretário de Estado foi a razão por que é que o Governo não considerou esse valor, que foi referido por essa comissão de avaliação, e foi optar por um valor superior em cerca de 3 300 000 contos.

O Orador: - Não sei se a Sr.ª Deputada teve acesso ao relatório da comissão de avaliação...

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Não, não tive!

0 Orador: - Mas vai ter oportunidade de o poder fazer e só é pena que esteja a fazer afirmações sem ter lido o relatório!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Era apenas uma pergunta!

0 Orador: - Então se é apenas uma pergunta, tenho muito gosto em lhe responder.
De facto a comissão de avaliação não diz que os terrenos valem 8,7 milhões de contos. Ela refere, na parte final do relatório a que VV. Ex.as vão ter acesso, que se os terrenos forem analisados segundo uma perspectiva de um promotor valem 16,8 milhões de contos; se forem analisados numa perspectiva de compra e venda valem 8,7 milhões de contos.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Esta é que é a verdade!

O Orador: - 15to é que é de facto a verdade.
O relatório diz depois o seguinte:

Com esta explicação pensamos que fica claro que a dupla avaliação feita cobre as necessidades de uma base negocial perante alternativas a estudar perante as partes interessadas, face às opções que o Governo entenda em última análise tomar.

A comissão de avaliação não indicou, portanto, um valor. Ela indicou ao Sr. Ministro das Finanças dois valores, tendo referido que os terrenos valiam, segundo uma perspectiva, 8,7 milhões de contos e, segundo outra, l6,8 milhões de contos.
Desta maneira, o Sr. Ministro das Finanças, ao ter de arbitrar, fê-lo por um valor que é inferior à média aritmética. Esta foi feita, aliás, partindo do pressuposto de que se a alternativa fosse a falência da empresa e se, portanto, o património desta tivesse de ser executado, o resultado, na ponta final, seria o mesmo. Os bancos acabariam por ficar na mesma com os terrenos, só que ficariam com eles em condições muito mais gravosas porque só teoricamente é que poderíamos considerar que num processo de falência eles conseguiriam recuperar a totalidade do crédito do capital. Portanto, o diferencial entre os 10 e os 12 milhões de contos foi aquilo que nós estimámos, numa avaliação que fizemos, que seria um prejuízo normal do sistema bancário, num processo filamentar. Foi daí que resultou esta diferença. Pode estar certa ou errada e podem existir opiniões diferentes, o que não contestamos. Mas a base de cálculo foi uma base técnica, que tem pressupostos que foram perfeitamente rigorosos.
A Sr.ª Deputada referiu ainda que foram entregues 12 milhões de contos à administração da Torralta. Permita me que lhe diga, Sr.ª Deputada, que esta forma de encarar os problemas não é correcta. Não houve nenhuma entrega de 12 milhões de contos. 0 que se fez foi regularizar um passivo que se acumulou desde 1974, que já estava em mora, através da entrega de um determinado património e isso fez-se porque a banca aceitou, de facto, essa dação em pagamento. Não houve, portanto, entrega de novos montantes à Torralta.

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Penso que há aqui também uma confusão que convinha clarificar. Quando se procura viabilizar uma em presa que tem 37 000 accionistas e em que o maior de todos, tanto quanto é do nosso conhecimento, tem 2,5 % do capital, procura se viabilizar a administração, ou a própria empresa, tentando defender os interesses dos accionistas, dos trabalhadores, dos credores e da própria economia nacional? Ora, é óbvio que o Governo não proeurou minimamente e seria erradíssimo que o fizesse preocupar se com os eventuais interesses da administração. O que procurámos foi viabilizar uma empresa que representa 10 % das camas no nosso país que são oferecidas ao turismo e que considerámos ser uma empresa de utilidade, devendo consequentemente ser recuperada

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: A questão que está aqui em causa, em relação ao problema da avaliação dos terrenos, é de alguma forma - e foi a que pus ao Sr. Secretário de Estado conhecer os critérios do Governo em relação a esta avaliação.
De facto, não conheço o relatório, uma vez que ele não foi enviado a esta Assembleia, mas por aquilo que o Sr. Secretário de Estado disse são dados dois valo res: um deles, dizendo que seria a óptica do promotor, a do valor mais elevado, e, um outro, a óptica da compra e venda, a do valor mais baixo. O que interessava saber era porque é que o Governo optou pelo valor que optou, não considerando nem um valor nem outro. Qual a razão que levou o Governo a decidir por esse valor?
Sr. Secretário de Estado, o valor que está aqui em causa é, como sabe, superior a 3 milhões de contos, o que corresponde às verbas orçamentais de alguns ministérios deste Governo, como, por exemplo, a do Ministério da Cultura, que de certeza não é muito superior a ela, e a do Ministério da Qualidade de Vida, que é até inferior! Portanto, não estamos aqui a falar de valores insignificantes, mas sim de verbas muito elevadas.
Naturalmente que não houve entrega directa do dinheiro à administração da Torralta. Não é isso que está em causa e nós sabemo-lo. A questão reside no facto de a Torralta ir usufruir de um tal benefício, quando temos ministérios cuja acção poderia ser importante e benéfica para este país e que não podem dispor de verbas sequer parecidas com aquela que vai ser atribuída à Torralta. Temos, além disso, empresas públicas que precisam de verbas deste tipo para serem viabilizadas e o Governo não as concede. Há, também, empresas privadas que solicitam ao Governo acordos idênticos, ou acordos cujo valor é bastante menor do que este, e o Governo não aceita. O sector cooperativo tem também gravíssimos problemas e sabemos, por exemplo, que as verbas que são atribuídas às cooperativas não passam das centenas de contos ou até menos.
É, portanto, numa situação destas, a que acresce ainda a gravidade da situação do sistema bancário, que o Sr. Secretário de Estado bem conhece e de que é particular exemplo a União de Bancos Portugueses, que esta questão tem de ser enquadrada. A posição do Governo, bem como estes valores, tem de ser avaliada face a este quadro. É isso que importa esclarecer e é essa a questão a que o Sr. Secretário de Estado não deu até agora resposta. É isso que é preciso ser averiguado no inquérito, sem prejuízo de outras averiguações. Mas essa é que é, repito, a questão fundamental que importa averiguar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: O facto de se apreciar hoje o primeiro de uma série de pedidos de inquérito apresentados pelo PCP leva o Grupo Parlamentar do PSD afazer uma reflexão sobre esta problemática.
Conforme referi em intervenção recentemente pro ferida nesta Assembleia, a solidez do regime e das instituições que lhe servem de suporte obriga os cidadãos, em geral, e em particular aqueles que mais e maiores responsabilidades detêm a nível dos órgãos do Poder, que actuem e fiscalizem os actos das estruturas públicas com vista a que tudo seja transparente e à opinião pública não restem dúvidas sobre a justeza e honorabilidade dos que desempenhem funções de cujas decisões depende em grande parte o nosso futuro colectivo.
E nesta linha de comportamento, sempre o PSD nesta Assembleia, tanto no Governo como na oposição, tem solicitado e participado activamente na realização de inquéritos do tipo mais diverso.
Naturalmente que não se podem definir limites ou conceitos precisos para definir com precisão o que deve ou não constituir motivo de inquérito.
Mas o que não é difícil concluir é que na parte que respeita ao PCP, que actua de uma forma sistemática e demagógica contra as instituições e as pessoas que as representam, a sua conduta, mais do que orientada num real e sério sentido de apuramento da verdade e aprofundamento das questões - que até pode interessar esclarecer -, é orientada no sentido de procurar derrubar o Governo, lançando para isso permanentes ofensivas quanto à imagem e honra de quem ocupa esses lugares do poder.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Confrontando com a sua incapacidade política de gerar alternativas a este ou a qualquer outro governo democrático, e muito menos de vir a as sumir o poder porque pela sua própria conduta e raízes históricas anquilosadas, das quais nunca se quis desligar, o PCP lança se e mantém se freneticamente numa linha de acusações e insinuações generalizadas a tudo e a todos. E para isso recorre às figuras constitucionais e regimentais que se lhe deparam, usando-as até à exaustão, ou interpretando as como melhor lhe convêm aos desígnios que permitam emperrar o funciona mento dos mecanismos e órgãos democráticos.
Naturalmente que os direitos são para se aplicar e usar, mas as normas gerais do bom senso e a profunda razão popular, que estão acima e devem ser a origem das próprias leis e normas, têm plena consciência de que uma coisa é usar os direitos outra coisa é abusar deles.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - E o que o PCP normalmente faz é usar e abusar das faculdades que o regime democrático e as leis lhe põem à disposição para pôr tudo e todos permanentemente em causa.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, no que respeita aos pedidos de inquérito, põe-se agora a questão de reflectir sobre a melhor posição a tomar quando estes aqui são apresentados em «catadupas» pelo PCP, a tal ponto que, obviamente, a serem todos aprovados, irão levar a uma banalização da importância desta importantíssima figura regimental e, eventualmente, porão em causa a própria imagem da Assembleia perante a demora no apuramento das conclusões face à impossibilidade de lhe dar resposta prática rápida.
Temos normalmente votado a favor dos pedidos de inquérito apresentados porque não temos querido que nos acusem de estarmos a encobrir seja o que for e, acima de tudo, porque sempre quisemos apurar toda a verdade dos actos públicos, no sentido claro e inequívoco de que se há anomalias, então que se averigúem e penalizem judicialmente e politicamente os seus responsáveis.
Mas parece evidente que perante esta série de inquéritos teremos de rever os nossos critérios, porque a questão essencial é decidir se há ou não fundamentos para inquirir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Votando contra, poderemos vir a ser acusada de impedir o uso de um direito constitucional por parte do PCP? Tal acusação não nos poderá ser feita com propriedade, pois o direito de propor à Assembleia da República a realização de um inquérito é igual ao direito de votar nesta Assembleia contra ele.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Daí que o legislador constitucional não o tenha considerado como um direito absoluto no sentido de ser suficiente, para que qualquer inquérito tenha lugar, que um deputado ou grupo de deputados o solicite. O direito é assim e apenas uma faculdade sujeita a apreciação e votação por parte da Assembleia da República.
Daí que se tenham de exigir fundamentos sólidos e fortes para que se deva e possa continuar a dar luz verde aos pedidos de inquérito apresentados.

A estratégia do PCP é muito simples e cristalina. Faz a sua campanha de intoxicação; faz as acusações durante meses e meses, procurando a seguir criar perante a opinião pública a ideia de que houve por parte dos responsáveis má-fé, incapacidade, corrupção, nepotismo, fraude ou abuso de poder em relação a determinados actos. Criado este ambiente ou «lastro» político-social, o PCP solicita inquéritos ou então basta-lhe a dúvida que já lançou perante a opinião pública e que visa, no mais fundo real das coisas, pôr em causa o próprio sistema.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Na generalidade dos casos - e como se tem provado -, as suas acusações não têm fundamento, mas ainda assim, perante os seus militantes, eleitores e a nível geral fará a acusação política de que a maioria nesta Assembleia da República ou noutros órgãos e instituições a quem compete pronunciar-se, es tão a ser coniventes e são meros joguetes do Governo.

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Se calhar é mentira! ...

O Orador: - Pode acontecer, obviamente, que alguma vez se averigúem elementos que dêem fundamentos a algumas das suas acusações.

Vozes do PCP: - Ah! Ah!

O orador: E aí, o PCP dirá que sempre teve razão e que a maioria ou o poder perante tantas «razões», que não quis reconhecer noutras oportunidades foi «obrigada» finalmente a dar a mão à palmatória.

Uma voz do PCP: - Problemas de consciência!

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Quem fala assim tem culpas!

O Orador: - Para o PCP, aparentemente, este investimento e procedimento apresenta-se como seguro. Só que, em primeiro lugar, a opinião pública já se apercebeu dos processos e estratégias do PCP. Quanto àqueles que nesta Assembleia da República têm a responsabilidade de dizer sim ou não para que os pedi dos de inquérito avancem - pela maioria de que aqui dispõem -, perante as autênticas avalanches de pedi dos de inquérito, terão de decidir quanto ao procedimento que melhor preserva a imagem da Assembleia, em primeiro lugar e das instituições democráticas em geral.
Terá, assim, esta ou outra maioria, em qualquer outro momento, de avaliar dos sérios e objectivos fundamentos para dizer sim ou não, sem complexos. Porque em democracia é tão importante saber dizer sim como saber dizer não. E no caso dos inquéritos, um não nunca poderá ser tomado como obstruir ou pactuar seja com quem for ou seja com o que for, mas tão-somente, na óptica de um direito legítimo, perante eventuais meras «insinuações» e «provocações» que mereçam a concordância generalizada dos parlamentares' 1sto é, ao fim e ao cabo, o que o PCP pretende desde logo dizer quando aqui é votado um pedido de inquérito é dizer que a Assembleia, no fundo, reconheceu haver algum fundamento para as suspeições que o PCP aqui levantou.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No caso concreto em apreço, pelas razões pormenorizadamente constantes da Resolução n.º 33/84 do Conselho de Ministros, em que o Governo se decidiu por uma determinada solução para viabilizar a Torralta, o Governo fê-lo no seu legítimo e pleno direito. E fê-lo depois do período em que as loucuras revolucionárias iniciadas em Dezembro de 1974, quando a Torralta foi intervencionada, degradaram de forma decisiva o seu património e a sua rentabilidade.
Desde o início do processo da desintervenção, em 1978, que os governos têm invocado para a Torralta um tratamento particularmente estudado e considerado o facto de o sector do turismo ser essencial para ao País, tanto na perspectiva económica como financeira, a nível de empregos, divisas entradas e empregos e relançamento de actividades económicas indirectas diver-

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sas, bem como a realidade que a Torralta representa nesse sector, com cerca de 10 % da oferta das camas turísticas classificadas, além dos quase 30 000 aforradores que aí investiram e dos milhares de trabalhadores ligadas à empresa. Sem dúvida que ela constitui uma realidade indiscutível e a preservar no contexto da actividade económico turística nacional. Daí, que o Governo tenha tomado medidas de carácter excepcional. São essas medidas excepcionais que o PCP hoje aqui vem questionar. Mas o Governo tomou as, considera dos todos os factores em jogo, com vista a viabilizar a empresa e usou um poder excepcional, não tipificado em leis e que não tem sido de prática corrente.
Não nos cabe agora aqui, aliás, respeitando a própria figura processual do inquérito parlamentar, abordar em pormenor os diversos aspectos. Mas, pela parte que respeita ao PSD, acrescentaremos desde já que, pelos elementos disponíveis, o Governo, e em particular o Sr. Ministro das Finanças, actuaram seguindo o que consideraram ser a melhor forma de salvaguardar os interesses do País, assumindo claramente a responsabilidade de tomar medidas de carácter excepcional, como expressamente se refere na resolução. E o que o PCP não aceita é que o Governo tenha decidido e tenha usado um critério que o Sr. Secretário de Estado já aqui hoje deixou suficientemente clarificado.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 PSD e por certo a maioria que apoia o Governo não estão dispostos a continuar a aceitar este jogo do PCP e, muito menos, a ser joguete de propósitos tão claros e evidentes, como atrás demonstrei, no sentido de emperrar o funcionamento de instituições e denegrir a imagem dos responsáveis.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Votaremos a favor do presente pedido de inquérito, mas a dignidade das instituições, e designadamente desta Assembleia da República, exigem também que os mecanismos constitucionais sejam accionados apenas com base em causas profundas e nunca apenas por mero manobrismo político.
No futuro e face à avalanche de inquéritos que aí estão, iremos procurar ser o garante da dignidade dos órgãos e responsáveis também pelo bom nome das pessoas.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Decidiremos face a critérios adequados e não nos coibiremos de votar contra sempre que entendamos que esses pedidos de inquérito não têm mais do que propósitos sem fundamento para corroer por dentro as instituições e as estruturas.
O Partido Social Democrata e a maioria que apoia o Governo assumirão as suas responsabilidades e assumi-las-emos com coragem e esclarecimento.
Aplausos do PSD e do PS.

0 Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado José Vitorino, surpreendente intervenção a sua. Creio que começa o ano com um discurso invertido: foi um discurso de acusação descabeladíssima ao PCP, em vez de ser aquilo que se esperava, isto é, um discurso de acusação dura à corrupção, que é aquilo que está em foco e que deve ser o objecto do combate desta Câmara.
Em vez de falar das chagas, o Sr. Deputado José Vitorino veio falar do PCP, que aponta para as chagas e que propõe que a Assembleia da República apure o que há que apurar; em vez de protestar contra a corrupção, o Sr. Deputado veio protestar contra o PCP, revelando uma obsessão verdadeiramente demoníaca.
«0 PCP abusa dos mecanismos, o PCP não sei o quê, o PCP quer intoxicar», ouvi dizer. 15to é, realmente, um vezo persecutório bastante bizarro.
Sr. Deputado, o PCP quer esclarecer-se...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - ... tem o direito e o dever de se esclarecer. E suscitada a questão que foi suscitada, neste e noutros casos, o que é verdadeiramente surpreendente é que a sua bancada, que fumega em requerimentos incendiários, indagando de ilegalidades várias em vá rios domínios, fique perfeitamente muda como se língua não tivera, em vez de apresentar aquilo que pode apresentar: um inquérito que apure completamente e ilibe quem deva ser ilibado e revele as responsabilidades de quem deva ser responsabilizado.
É verdadeiramente de estranhar que o Sr. Deputado José Vitorino tenha dito, no fim do discurso, que vai aprovar o inquérito parlamentar. Eu quase estava à espera que dissesse que não o ia aprovar porque carreia uma série de razões que são, no fundo, ameaças em relação a futuros inquéritos, e que não têm o mínimo fundamento.
O que lhe pergunto é isto, Sr. Deputado José Vitorino: há ou não há, reconhecidamente, indícios de casos de corrupção, que são graves e aos quais a Assembleia da República não pode ficar imune?
Quais são os meios, através dos quais podemos e de vemos actuar, para que essas suspeições não pairem indefinidamente e sejam indagadas as responsabilidades de quem as tenha tido. Não de outros que estejam inocentes.
E como é que explica o espantoso silêncio de quase 6 meses entre a apresentação deste texto que, aliás, teve a adesão, o acordo e a promessa de aprovação por parte do Governo, através do Ministro de Estado, e a sua discussão agora? Não considera que esse atraso, esse silêncio e essa passividade até lesam, isso sim não nós, PCP, mas os senhores -, a imagem da Assembleia da República?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É isso, esse atraso, essa tibieza, esse gaguejar, esse «sim, mas», essas figuras tristes feitas ali do alto da tribuna que desprestigiam a Assembleia da República, porque em vez de uma acção decidida, não tíbia, clara e sem medo os senhores exibem silêncios, dúvidas, reticências, acusações aos acusadores.
Fazem isso em vez de agarrarem os problemas reais, que é o que o povo português quer: que esclareçamos em vez de fazer ataques descabelados - aliás, comple

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tamente infantis -, ao PCP numa matéria que não concede nenhuma infantilidade e que é muito séria, Sr. Deputado José Vitorino.
Que medidas é que a sua bancada vai tomar no futuro, não para chumbar inquéritos do PCP, mas para combater a corrupção? Essa é que é a questão e é isso que lhe deixo aqui perguntado.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Vitorino, deseja responder já ou só no fim, depois dos outros pedidos de esclarecimento?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Respondo no final, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado José Vitorino, é pena, de facto, que o Sr. Deputado tenha dito tão pouco sobre o caso Torralta e se tenha preocupado muito mais com outras questões.
Sobre o caso Torralta era importante que o Sr. Deputado dissesse qual a opinião do PSD - já que falou como representante do PSD - sobre a questão
da avaliação do terreno. Esse é um dos pontos que já hoje serviu de interrogação ao Sr. Secretário de Estado que, por sua vez, respondeu ter havido dois valores na avaliação e que o Governo não optou por nenhum de les mas por um terceiro valor, sem que, até ao momento, esteja clarificada a razão dessa opção. Opção
que é - volto a repetir - superior em mais de 3 milhões de contos ao valor mais baixo que era proposto.
Ora, Sr. Deputado José Vitorino, era importante que o PSD se pronunciasse sobre esta questão, dissesse qual a sua opinião sobre isto, sobre as consequências e implicações que esta Resolução do Governo tem para o sistema bancário e, nomeadamente, para a União de Bancos Portugueses.
Também era importante que se referisse ao que se passa quanto às garantias dadas aos tais cerca de 37 000 pequenos accionistas de que hoje aqui se falou.
Era importante que fosse referido, por exemplo, se todos os direitos dos trabalhadores da Torralta estão devidamente assegurados, nomeadamente o pagamento atempado dos salários e de todos os outros direitos dos trabalhadores. Pode crer que, neste momento, os trabalhadores da Torralta esperam uma resposta a esta questão, porque têm sérias dúvidas sobre isso.
Era importante também, Sr. Deputado, que se tornasse aqui clara qual a posição do PSD em relação às dúvidas e suspeições que vários órgãos de comunicação social levantaram, e de que se tornaram eco junto da opinião pública, quanto a toda a envolvente deste processo.
Era também importante que se referisse, sobretudo, às consequências de tudo isto.
Creio que só assim é que poderá dar um contributo importante para a clarificação deste processo e só assim é que podemos estar a tratar seriamente um assunto que merece ser tratado seriamente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos chegados à hora regimental do termo dos nossos trabalhos.

Entretanto, constato que falta ainda uma intervenção do Sr. Deputados Leonel Fadigas e dois pedidos de esclarecimento a formular pelos Srs. Deputados Carlos Brito e Lopes Cardoso a que se seguirão, naturalmente, as respectivas respostas.

Assim, e se não houver objecções por parte dos vários grupos e agrupamentos parlamentares, proponho que se prolonguem os nossos trabalhos até às 13 horas e 30 minutos a fim de terminarmos esta ordem de inscrições que acabei de enunciar.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos prosseguir os nossos trabalhos até às 13 horas e 30 minutos.
Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado José Vitorino, a sua intervenção é um desacerto completo e, tal como já foi assinalado, V. Ex.ª acabou por enunciar um sentido de voto que é completamente contraditório com tudo aquilo que argumentou ao longo do seu discurso.
0 Sr. Deputado quis fugir às questões concretas e, por isso mesmo, começo por lhe colocar exactamente duas questões concretas que, aliás, são da sua especialidade.
O Sr. Deputado sabe que uma parte dos terrenos que referiu se situam no Algarve e já deve ter ouvido falar os algarvios da região sobre os critérios de avaliação. Pergunto-lhe o que é que tem a dizer sobre isso.
Depois, gostaria de assinalar que, como o Sr. Deputado saberá - e isso, de resto, foi aqui há pouco invocado -, um dos critérios de avaliação reside na «óptica dos promotores imobiliários». Perguntar-lhe ia, Sr. Deputado José Vitorino, e peço-lhe que não se distraia, se isso não será afinal uma abstracção, exactamente para justificar um montante que é inteiramente inadmissível, pois não tem nenhuma correspondência com o valor dos terrenos em concreto e que o Sr. Deputado provavelmente conhece, como eu próprio também conheço.
Era bom que o Sr. Deputado respondesse a estas duas perguntas em concreto. No mais, não será que a sua argumentação permite supor que da parte do seu partido haverá uma tentativa de começar a justificar hoje as posições que poderá vir a tomar amanhã em relação aos inquéritos que envolvem os militantes do vosso partido, Rui Amaral e engenheiro Eugénio Nobre, designadamente respeitantes à Secretaria de Estado do Emprego e à Secretaria de Estado das Obras Públicas?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não estará já o Sr. Deputado a «sangrar-se em saúde» em relação a esses próximos inquéritos que aqui vão ser debatidos?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, Sr. Deputado José Vitorino, as suas acusações ao PCP não tem nenhum sentido, porque, inclusivamente, V. Ex.ª não foi capaz de trazer aqui a verdadeira história da génese destes inquéritos. Na verdade, eles nasceram porque nós colocámos algumas perguntas ao Governo e porque o Governo res-

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pondeu indignado dizendo: «Então se quiserem fazer um inquérito, façam um inquérito!» Foi realmente a partir daí que resolvemos, com a frontalidade que caracteriza o nosso partido e o nosso grupo parlamentar, ir para diante com esses inquéritos e discutir nessa base.
A questão colocou-se, portanto, em resposta a perguntas nossas e a pedidos de esclarecimento nossos, respostas que o Governo não nos deu, de onde a responsabilidade é também neste caso do Governo, pois a isso temos de chegar para esclarecer alguma coisa na Assembleia da República. Mas, quanto a nós e relativamente aos casos vertentes, é correcto, é adequado e temos de chegar a isto.
O resto, Sr. Deputado José Vitorino, é a política do abafarete que os senhores na generalidade praticam. E até o Sr. Deputado o faz, ao produzir aqui grandes intervenções, assumindo uma postura moral de combate à corrupção em geral para depois, quando se entra nas questões concretas, tomar a posição que hoje ouvimos.
É tal e qual como acontece em relação a outras normas moralizadoras e até relativamente ao estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, em que os senhores votam aqui na Assembleia da República uma coisa mas fazem publicar no vosso jornal Povo Livre outra completamente diferente.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem observado! É um escândalo!

O Orador: - É essa a postura moral e ética que assumem em geral, para depois na prática desenvolverem a política do abafarete.
Sr. Deputado José Vitorino, de facto, esta política é que vai enganando cada vez menos e os seus argumentos para justificar a vossa oposição a futuros inquéritos parlamentares - porque relativamente a este não conseguem dizer que não - traduzem-se numa política que, essa sim, compromete a democracia portuguesa, pois é a política que denigre o prestígio da Assembleia da República.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Igualmente para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Deputado José Vitorino, V. Ex.ª começou por afirmar que o comportamento do Governo...
Sr. Presidente, se me permite, aguardaria que o Sr. Deputado José Vitorino acabasse de consultar os seus papéis.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Estou a ouvir, Sr. Deputado! Não é desconsideração por si, estou a ouvi-lo!

O Orador: - Bom, o Sr. Deputado começou por afirmar que o comportamento do Governo era, no caso vertente, acima de toda a suspeita. Trata-se de um comportamento impecável que se pauta apenas pêlos interesses nacionais.
Disse, depois, que os propósitos que moviam o Partido Comunista Português eram, no mínimo, inqualificáveis.
Ora, com base nestes dois pressupostos, o Sr. Deputado chegou a esta conclusão espantosa: o PSD vai votar favoravelmente o pedido de inquérito. Gostava que o Sr. Deputado me explicasse como é possível que o PSD acabe, no fundo, por ceder àquilo que considera manobras inqualificáveis por parte do PCP.
Mas o Sr. Deputado vai mais longe porque diz que «desta vez cede, mas para as outras a ver vamos»! Bom, também não se percebe muito bem porque é que desta vez cede e nos outros pedidos que se seguirão «veremos caso a caso». É que, se o Sr. Deputado não esclarecer esta posição com um mínimo de fundamento, seremos levados a concluir, quer queiramos, quer não, que o Sr. Deputado Carlos Brito talvez tenha avançado a única explicação possível para esta atitude: no fundo, o caso a caso tem a ver, não com a natureza dos casos, mas com a natureza dos membros do Governo eventualmente nele envolvidos.

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram formulados, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foram-me formuladas uma série de questões, foram feitas algumas acusações - umas pessoais, outras ao grupo parlamentar e ao próprio PSD - e vou procurar dar os esclarecimentos que as perguntas suscitadas justificam.
A primeira questão é a do chamado «discurso invertido», segundo a terminologia que o Sr. Deputado do Partido Comunista tanto gosta de utilizar.
Diria que as inversões decorreram das considerações que o Sr. Deputado fez, porque ao dizer que o PCP apenas pretende saber a verdade e por isso solicita o pedido de inquérito - e mais nada faz -, coloca-se numa perspectiva «angelical» - sem ofensa, mas no sentido de pretensa pureza - que é absolutamente contraditória com o próprio comportamento do PCP.
Temos de tratar as coisas como devem ser, Sr. Deputado. O Partido Comunista monta campanhas através do Avante e do Diário, através dos órgãos de comunicação social onde consegue penetrar e fazer valer os seus discursos, campanhas muitas vezes com manifestações de rua, prosseguindo pêlos mais diversos mecanismos, uma campanha persecutória...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado José Vitorino, V. Ex.ª sabe que, em relação aos inquéritos vertentes, uma parte das interrogações mais contundentes foram feitas em requerimentos assinados por deputados da sua bancada.
Portanto, essa argumentação que está a usar não tem sentido, Sr. Deputado.

O Orador: - Realmente, pondo agora de lado as posições do meu grupo parlamentar - e podemos falar sobre isso quando quiser -, o PCP assumiu-se aí com uma total coerência, dizendo que eu tinha feito um discurso invertido. Do que se trata é demonstrar que o discurso do PCP, designadamente nas perguntas que me formulou, sofre do vício profundo da inversão, do absurdo completo.

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15to é, criticam e vêm aqui dizer: «Só queremos dizer a verdade e nunca dissemos que os dirigentes ou os membros do Governo eram corruptos ou que cometiam acções fraudulentas, nunca dissemos nada disso, nunca acusámos o Sr. Dr. Sá Carneiro de ter roubado não sei quantos mil contos ao Banco Espírito Santo, nunca acusámos nada disso. Só dissemos isso depois de o tribunal ter dito que realmente já não tinha razão nenhuma.»

Vozes do PCP: - Acusámos!

O Orador: - Vamos ver se nos entendemos. O PCP acusa conforme lhe dá na «real gana» tudo o que lhe vem à cabeça e toda a gente.
Portanto, aqui, estamos à vontade e ficamos esclarecidos.
Quanto à clareza da minha intervenção, disse o Sr. Deputado que lhe «parecia que ia desembocar no voto contra, mas que afinal votaríamos a favor, e que lhe parecia que era contra a corrupção, mas, afinal, talvez lhe estejamos a estender a mão ou a facilitar a passagem, abrindo uma fresta de uma porta ou de uma janela».
Também aqui, rigorosamente, foi invertido o discurso do PCP. O que se disse - e está escrito - foi que queremos e somos claramente pelo apuramento de responsabilidades e pela penalização jurídica e política de todos os responsáveis.
Agora, o que somos é contra o uso e o abuso do recurso aos inquéritos parlamentares, como somos contra o uso e abuso - sempre fomos - de determinada utilização que o PCP aqui fazia de determinadas figuras regimentais. Por isso, lutámos pelas alterações ao Regimento.
Não somos contra a existência das liberdades nem contra a faculdade de se usarem as liberdades. Achamos que devem ser utilizadas, mas também achamos que as instituições sairão tanto mais enobrecidas quando essa utilização for feita com a devida fundamentação.
E aqui reside a questão. Votaremos a favor de todos os inquéritos parlamentares sobre os quais nos apresentem dados efectivos da existência de razões fortes e ponderosas que justifiquem realmente esse tipo de inquéritos. Mas não confundimos a existência de razões fortes e ponderosas com o facto de o PCP dizer que há razões fortes e ponderosas. É preciso provar, à partida, alguma coisa.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Falei pouco sobre o caso da Torralta, mas julgo que falei o suficiente.
Penso que, quando estamos no dealbar de uma catadupa de doze pedidos de inquérito do PCP...

O Sr. César Oliveira (UEDS): - 15to é uma «diabrite»!

O Orador: - Parece que sim, Sr. Deputado.
Quando estamos no dealbar desta catadupa de inquéritos, justificava-se esta reflexão, sobretudo virada para a bancada do PCP, porque foi o PCP que apresentou os pedidos de inquérito.
Esta é que é a questão. Não faria sentido virar-me para a bancada do CDS, que apresentou um, dois ou três pedidos de inquérito. Obviamente que não faria sentido.

Não somos contra os pedidos de inquérito. Somos é contra determinadas circunstâncias em que eles se verificam. E já falei disso, a propósito da pergunta que o Sr. Deputado Lopes Cardoso me formulou.
Quanto à questão da avaliação, já no diálogo que a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo travou com o Sr. Secretário de Estado se focou este problema. E pareceu-me depreender daquilo que a Sr.ª Deputada referiu, que o PCP através da Sr.ª Deputada, acusava o Governo de não ter optado por um dos dois valores.
Afirmou o PCP qualquer coisa deste género: «Vejam lá este Governo malévolo e sinistro!»

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - «Aquela comissão propôs-lhe dois valores - um à volta de 8 e outro à volta de 16 milhões -, mas este Governo, em vez de ter optado por um ou por outro valor, foi escolher um terceiro valor.»
E a lógica de raciocínio leva ao seguinte: se se acusa o Governo de não ter aceite nem 8 nem 16 milhões, que foram os dois valores que a comissão de avaliação propôs, deduz-se então que o Governo propôs um valor ainda superior ao valor mais alto que lhe foi apresentado.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Não disse isso!

O Orador: - Mas, obviamente, não foi isso que aconteceu. O Governo optou pelo valor de 11,9 milhões, o que está situado mais ou menos a meio dos dois valores propostos.
O que também pergunto ao PCP é se preferia que, em vez de 11,9 milhões, o Governo tivesse aceitado, na sua proposta de resolução, a proposta mais alta, que era de 16 milhões.
Pergunta-se como é que o Governo chegou a este valor. Obviamente que, pelo carácter excepcional, expressamente referido na resolução, que imprimiu a este processo, o Governo chegou a este valor depois de ter ponderado todos os factores e de ter negociado com a banca. Certamente que teve em consideração os pontos de vista dos conselhos de gestão da banca e, mais, os critérios que a excepcionalidade que o Governo atribuiu ao processo justificou. É tão simples como isto.
Pergunta se se o Governo não se preocupou com as consequências para os aforradores e para os trabalhadores. Penso que a melhor maneira de garantir o futuro e a segurança dos aforradores e dos trabalhadores é viabilizar a empresa. Julgo que este é o melhor caminho, melhor do que qualquer discurso que se possa fazer.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - De facto!

O Orador: - Quanto à valorização dos terrenos, já se falou nos valores. Sabemos que o Algarve tem 60% do património da Torralta e que a zona de Setúbal tem cerca de 40% e que, portanto, o valor funcionou nessa base.
Para concluir - e julgo que a nossa posição já está suficientemente esclarecida -, diria apenas ao Sr. Deputado Lopes Cardoso que, obviamente, o discurso não foi dirigido a si nem ao seu partido.
Claro que tem todo o direito de colocar as questões que colocou. Não há aqui discursos dirigidos a pessoas

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ou a grupos: a Assembleia está aberta e, portanto, estamos aqui para dialogar nessa base.
Diria que, pela minha parte e pela do meu grupo parlamentar, nunca decidiremos em função das pessoas que estão ou não envolvidas nos processos. Não será esse o móbil da nossa decisão.
Perante a catadupa de inquéritos que aqui estão - e sabemos como os inquéritos se prolongam por 2, 3, 4 e 5 meses o que pretendemos, e vamos ser nisso rigorosos, é saber se há ou não um mínimo de fundamentos que justifiquem a abertura desses inquéritos. 15to porque, como disse na minha intervenção, se o legislador constitucional tivesse querido aceitar todos e quaisquer inquéritos, diria apenas que qualquer deputado tem o direito de apresentar um pedido de inquérito à Assembleia da República e pronto: apresentava na Mesa, accionavam se os mecanismos constitucionais, as comissões, e o inquérito fazia-se. Não é esse o caso.
Claro que, como disse também na minha intervenção e repito, não se podem definir limites ou conceitos precisos para saber se se deve ou não constituir, num determinado caso, um pedido de inquérito. Não é possível; há sempre um carácter de subjectividade.
O que dizemos é que passaremos a ser tão rigorosos quanto possível, a não ser que haja casos de evidente exploração política que, para salvaguardar, eventual mente, do próprio nome das pessoas, se entenda então dever realizar o inquérito achamos que não é fundamental, mas faça-se.
É uma ponderação política que reservamos para nós próprios e decidiremos em conformidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso pretende a palavra para que efeito?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, é para um protesto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Deputado José Vitorino, peço lhe o favor de entender o protesto como uma figura regimental que utilizo para lhe agradecer a sua resposta, dizendo-lhe que estou esclarecido e que folgo com ela.
Desta vez, o Sr. Deputado foi claro: o PSD apenas votará favoravelmente os pedidos de inquérito, quando haja um mínimo de fundamento para esses pedidos de inquérito - penso que é a posição correcta, se me permite a presunção de emitir um juízo de valor sobre a posição assumida pelo PSD. Assim, já que o PSD só votará favoravelmente quando haja um mínimo de fundamento e dado que o PSD vai votar favoravelmente este pedido de inquérito, o PSD reconhece que há no pedido de inquérito um mínimo de fundamento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 PSD, na sequência desta réplica do Sr. Deputado José Vitorino, parece, realmente, acomodar-se mal a esta realidade, que é o facto de haver no País artigos de jornal que suscitam a questão da corrupção; de haver manifestações, legítima e incontestavelmente feitas pelos cidadãos, em que a questão da corrupção é suscitada; de haver conversas, de haver críticas, em relação à questão da corrupção. E o Sr. Deputado José Vitorino certamente admitirá que há pessoas que dizem, inclusivamente de alguns membros do Governo, coisas que haviam certamente de ferir certos ouvidos virginais. Dizem e dizem mesmo, não tenha dúvida.
A questão é esta: é estranho, desde logo, que o Governo não accione todos os mecanismos que tem e que deveria usar, para impedir que isto aconteça, usando de seguida, naturalmente, os mecanismos adequados e não a manipulação e intoxicação da comunicação social e o impedimento e o atrofiamento de informações vitais.
O Governo não faz isso; curiosamente, faz o contrário. E isso tem um poderoso e lastimável papel estimulador do campear da corrupção. Este é o primeiro aspecto.
O segundo aspecto é o seguinte: as próprias banca das governamentais, em vez de acatarem o dever de inquirir, lamentam-se da catadupa de inquéritos.
Sr. Deputado José Vitorino, nós temos é que lamentar a catadupa da corrupção e temos de encontrar as formas adequadas de aqui, na Assembleia da República, adoptarmos os meios para inquirirmos o que tenhamos que inquirir. Se tivéssemos de fazer 30 inquéritos, 30 inquéritos deviam ser feitos, devendo organizarmo-nos para isso.
Creio que a Alta Autoridade contra a Corrupção tem instruídos 500 processos gostaríamos de ter informação adequada sobre isso. Bom, e daí? São 500. E se fossem 1000, Sr. Deputado José Vitorino, o dever da Câmara seria, sempre e ainda assim, não encolher os ombros e dizer: não podemos, porque isto são inquéritos a mais; pelo amor de Deus, não inquiram tanto.
- Sr. Deputado José Vitorino, sobretudo e por favor, não alastre de tal forma a corrupção. E se alastrar como alastra, tornemos medidas.
O que é surpreendente e chocante na posição do PSD é que, em vez deste posicionamento claro e concreto, o Sr. Deputado venha exibir a incapacidade do PSD de articular a acção política geral e a acção parlamentar, uma vez que é capaz de anunciar nas colunas do Povo Livre, como ficou claro, aquilo que não ousa propor aqui dentro. E isso sim, é que é duplicidade política, isso sim, é inversão.
Trazer aqui aquilo que são os justos protestos, reclamações e exigências de qualificação, é coerência, é eficácia, é um procedimento democrático. É esse o procedimento que é timbre deste grupo parlamentar, indeclinavelmente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda de Figueiredo.

A Sr.ª Ilda de Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nas questões que o Sr. Deputado José Vitorino pôs aqui, como se o PCP estivesse a ser inquirido sobre este inquérito, queria dizer lhe que o problema da avaliação é, sem dúvida, um problema central deste inquérito. Não é, naturalmente, o único problema, como já tivemos ocasião de referir e como,

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1346 I SÉRIE - NÚMERO 35

aliás, consta também do pedido de inquérito que entregámos, mas é, sem dúvida, um problema central. E é de tal modo central que - volto a repetir - a questão que pus ao Sr. Secretário de Estado foi o pedido de informações sobre os critérios que presidiram à decisão do Governo, quanto à opção pelo valor de cerca de 12 milhões de contos, em prejuízo do valor de 8,7 milhões de contos.
O Sr. Deputado José Vitorino não pode, abusivamente, concluir que o PCP está a defender o valor de 8,7 milhões de contos, como valor ideal da avaliação dos terrenos referidos. 15so é abusivo, Sr. Deputado. Eu nunca defendi tal coisa e o senhor sabe o muito bem.
Agora, o que gostaria que aqui ficasse claro - certamente que, depois, através dos trabalhos da comissão de inquérito, essa possibilidade vai ser dada - é a clarificação dos critérios do Governo e do valor real dos terrenos.
Para o PCP, o valor dos terrenos não é 16 milhões de contos nem, naturalmente, 8,7 milhões de contos. Mas a questão que aqui está em causa é que houve avalistas que propuseram 8,7 milhões de contos. O Governo não considerou esse valor, mas sim 12 milhões, dando, logo à partida, de barato, 3,4 milhões de contos. 15so é grave, Sr. Deputado, se não for positivamente clarificada a razão de ser desta opção governamental.
Por outro lado, Sr. Deputado, naturalmente que a comissão de inquérito se irá debruçar sobre o valor efectivo dos terrenos nesta situação de crise económica e financeira que se vive no País. É que isso também interessa para a análise do valor correcto dos terrenos e, portanto, também é necessário ter isso em conta-
Mas, enfim, são questões que ficam, são questões que, certamente, irão ser esclarecidas - e nós queremos que sejam esclarecidas - e a votação do nosso pedido de inquérito poderá tornar claro se todos os partidos estão ou não interessados nesse esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, infelizmente, não tivemos capacidade de síntese, nem de concisão durante esta meia hora. Na verdade, todos os Srs. Deputados com excepção do Sr. Deputado Lopes Cardoso, não foram capazes de fazer as suas perguntas e de dar as correspondentes respostas no tempo que lhes estava consignado regimentalmente.
Acontece que somos chegados às 13 horas e 30 minutos. Tenho profunda pena que não possamos hoje acabar a discussão deste tema mas, na realidade, não fomos capazes disso. Portanto, tenho que dar por encerrados os trabalhos de hoje, para prosseguirmos na próxima terça-feira.
Quero, ainda, informar os Srs. Deputados e, de modo especial, os Srs. Presidentes dos grupos e agrupamentos parlamentares, de que a programação que estava estabelecida para a próxima semana, no que respeita à apreciação, por parte das comissões, do Orçamento do Estado e das grandes opções do Plano para 1985, tem de ser profundamente alterada.
Daí a necessidade de termos uma reunião de líderes, pelo que, desde já, convido os Srs. Presidentes dos grupos e agrupamentos parlamentares para uma reunião que terá lugar no meu gabinete às 10 horas de terça-feira.
Há alguma objecção?

Pausa.

Não havendo objecções, agradecia aos representantes dos grupos e agrupamentos parlamentares que compareçam no meu gabinete, às 10 horas, de terça-feira, para tratarmos deste problema.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, há pouco eu tinha pedido a palavra para responder às perguntas que me foram feitas mas, dado que agora já passou a oportunidade...

O Sr. Presidente: - Claro que não é possível, Sr. Deputado!

O Orador: - Exactamente, Sr. Presidente, passou a oportunidade e, portanto, não vou maçá-lo com isso.
Contudo, penso que importa saber o que é que da ordem de trabalhos de hoje transita para a sessão da próxima terça feira. Gostaria, pois, de saber se o Sr. Presidente tenciona dar essa informação no final da sessão.

0 Sr. Presidente: - Certamente que tenho de dizer qual será a ordem do dia da próxima sessão, Sr. Deputado.
O Sr. Secretário da Mesa vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Luís Cacito): - Deram entrada na Mesa o projecto de lei n.º 423/III, subscrito pelo Sr. Deputado Raul Brito, do Partido Socialista, sobre a criação da freguesia de Baguim do Monte no concelho de Gondomar, e o projecto de lei n.º 424/III, subscrito pelo Sr. Deputado José Manuel Mendes e outros, do PCP, sobre a elevação de Darque à categoria de vila.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a próxima reunião plenária terá lugar na terça-feira, às 15 horas, sendo a ordem de trabalhos a continuação da de hoje.
Está encerrada a sessão, Srs. Deputados.

Eram 13 horas e 30 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

José Carlos Pinto Basto Torres.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Zulmira Helena Alves da Silva-

Partido Social Democrata (PSD/PPD):

António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Domingos Duarte Lima.
Fernando José da Costa.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.

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João Maurício Fernando Salgueiro.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Pereira Lopes.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Pedro Miguel Santana Lopes.

Partido Comunista Português (PCP):

José Manuel Santos Magalhães.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.

Centro Democrático Social (CDS):

Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
José Augusto Gama.
José Luís Cruz Vilaça.
José Henrique Meireles Barros.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António Almeida Vasconcelos.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social Democrata Independente (ASDI):

Ruben José de Almeida Raposo.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.

Almerindo da Silva Marques.
António Gonçalves Janeiro.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
Avelino Feleciano Martins Rodrigues.
Carlos Filipe Gracias.
Eurico Faustino Correia.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
José Luís do Amaral Nunes.
José Maria Roque Lino.
José Maximiano Almeida Leitão.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria de Jesus Barroso.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rui Fernando Pereira Mateus.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Vargas Bulcão.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Mário Martins Adegas.
Octaviano Geraldo Cabral Mota.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

António Dias Lourenço.
António Guilherme Branco Gonzalez.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Domingos Abrantes Ferreira.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
Lino Carvalho de Lima.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Luísa Cachado.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Centro Democrático Social (CDS):

Francisco António Lucas Pires.
João Gomes de Abreu Lima.
João Lopes Porto.
José António Morais Sarmento Moniz.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

José Manuel Tengarrinha.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

Octávio Luís Ribeiro da Cunha.

Relatório e Parecer da Comissão de Regimento e Mandatos

Em reunião realizada no dia 4 de Janeiro de 1985, pelas 10 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:

Solicitadas pelo Partido Socialista:

António Manuel Chambica de Azevedo Gomes (círculo eleitoral de Lisboa) por José Maximiano Albuquerque de Almeida Leitão. Esta substituição é pedida por um período não superior a 3 meses, a partir do dia 4 de Janeiro corrente, inclusive.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo (círculo eleitoral do Porto) por Abílio Henrique Nazaré da Conceição. Esta substituição é pedida por um período não superior a 2 meses, a partir do dia 5 de Janeiro corrente, inclusive.

Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social:

José Vieira de Carvalho (círculo eleitoral do Porto) por José Henrique Ribeiro Meireles de Barros. Esta substituição é pedida por um dia (4 de Janeiro corrente).

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais.

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Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.

A Comissão: Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - Vice-Presidente, Mário Júlio Montal vão Machado (PSD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Secretário, Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (CDS) - António Costa (PS) - Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves (PS) - Rui Monteiro Picciochi (PS) - Teófilo Carvalho dos Santos (PS) - António Nascimento Machado Lourenço (PSD) - Leonel Santa Rita Pires (PSD) Manuel Portugal da Fonseca (PSD) Maria Margarida Salema Moura Ribeiro (PSD) - José Manuel Mendes (PCP) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) - Francisco Menezes Falcão (CDS) - António Poppe Lopes Cardoso (UEDS) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

Os REDACTORES: Carlos Pinto da Cruz - José Diogo.

Rectificação ao n.º 24, 1.ª série do «Diário»

Na p. 854, col. 2.ª, 1.38, onde se lê «Em segundo lugar, queria dizer que a minha intervenção não constitui nenhuma desautorização, ou sequer em sentido contrário ( ... )» deve ler-se «Em segundo lugar, queria deixar bem claro que a minha intervenção não constitui nenhuma desautorização ou sequer revela um sentido contrário (...)»;
Na p. 885, col. 2.ª, 1.59, onde se lê «( ... ) é um facto que existem disparidades natas no ensino secundário ( ... )» deve ler-se «( ... ) é um facto que existem disparidades nas notas no ensino secundário ( ... )»;
Na p. 883, col. 2.ª, 1.32, onde se lê «O Sr. Secretário (Boleira Marinho)» deve ler-se «O Sr. Secretário (Roleira Marinho).

PREÇO DESTE NÚMERO 78$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

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