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I Série -Número 60
Sexta-feira, 22 de Março de 1985
DIÁRIO da Assembleia da República
III LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 21 DE MARÇO DE 1985
Presidente: Ex.mo Sr. Fernando Monteiro do Amaral
Secretários: Ex.mos Srs. Leonel de Sousa Fadigas
José Mário de Lemos Damião
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos
SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 48 a 55 do Diário.
Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos e de respostas a alguns outros.
O Sr. Deputado João Eliseu (PS), a propósito da celebração do Dia Mundial da Árvore, abordou alguns dos problemas que se referem ao sector florestal, em especial o pinhal de Leiria e a mata de Marrazes, terminando por considerar prioritário o aumento da nossa área e defender as superfícies já florestadas. No fim, respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado António Gonzalez (Indep.).
O Sr. Deputado Jorge Gois (CDS) referiu-se à situação que se vem vivendo no seio da Universidade Livre, nomeadamente no que se refere ao Departamento de Direito da Secção de Lisboa e à suspensão do seu corpo docente, considerando que importa resolver rapidamente a situação presente, num quadro de legalidade que permita repor as condições pedagógicas.
O Sr. Deputado Luís Vaz (PS) abordou diversas questões relativas à problemática do desenvolvimento de Trás-os-Montes, considerando que o Estado promova o urgente desbloqueamento do sector das vias de comunicação e proporcione as transferências financeiras necessárias ao desenvolvimento da região. Respondeu no fim a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Alexandre Reigoto (CDS).
O Sr. Deputado João Abrantes (PCP), a propósito do Dia Mundial da Árvore, considerou que a Assembleia não pode ficar por tentativas de abordagem do problema de defesa da árvore, sem discutir e propor medidas legislativas adequadas à sua protecção, conservação e expansão.
O Sr. Deputado Agostinho Branquinha (PSD), apelidando a comunicação social como um «quarto poder», considerou que ela não conseguiu libertar-se das influências partidárias, seja através da nomeação de gestores para a comunicação social estatizada, seja através da atribuição de subsídios para a comunicação social privada. Respondeu no fim a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Beiroco (CDS) e Igrejas Caeiro (PS).
Foi votado, tendo sido aprovado, um voto de saudação pela comemoração do Dia Internacional da Floresta e do Dia Nacional da Árvore, que hoje se comemora. Produziram declarações de voto os Sr. Deputados Vilhena de Carvalho (ASDI), Dorilo Seruca (UEDS), Meneses Falcão (CDS), Vasco Miguel (PSD) e Raul e Castro (MDP/CDE).
Ordem do dia. - Concluiu-se a discussão na generalidade da proposta de lei n.° 78/111 - Autoriza o Governo a legislar em matéria de estatuto do pessoal dirigente da Administração Pública, central e local -, que foi aprovada. Intervieram no debate, a diverso titulo, além do Sr. Secretário de Estado da Administração Pública (San--Bento Menezes), os Srs. Deputados Anselmo Aníbal (PCP), Cunha e Sá (PS), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Narana Coissoró (CDS), Jorge Lemos (PCP), Luís Beiroco (CDS) e Carlos Lage (PS).
A requerimento do PS e do PSD, a referida proposta de lei baixou à Comissão de Administração Interna e Poder Local para apreciação e votação na especialidade.
Após leitura do relatório respectivo, apreciou-se e votou-se na generalidade o projecto de lei n. ° 105/III (ASDI) - Balanço social -, que foi aprovado e baixou à Comissão de Trabalho para apreciação e votação na especialidade. Intervieram no debate, a diverso titulo, os Srs. Deputados Ruben Raposo (ASDI), Manuel Lopes (PCP), Vítor Hugo Sequeira (PS), Raul e Castro (MDP/CDE), Hasse Ferreira (UEDS), Oliveira e Costa (PSD), Nogueira de Brito (CDS) e Jerónimo de Sousa (PCP).
Procedeu-se ainda à votação final global do projecto de lei n. ° 55/777 (CDS) - Património cultural português -, tendo produzido declaração de voto os Srs. Deputados José Manuel Mendes (PCP), Amélia de Azevedo (PSD), Raul e Castro (MDP/CDE), Coelho Pires (PS) e Vilhena de Carvalho (ASDI).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 40 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 30 minutos. Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Abílio Aleixo Curto.
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
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António da Costa. António Domingues Azevedo. António Frederico Vieira de Moura. António José Santos Meira. Avelino Feleciano Martins Rodrigues. Bento Gonçalves da Cruz. Carlos Augusto Coelho Pires. Carlos Cardoso Lage. Edmundo Pedro. Fernando Fradinho Lopes. Francisco Lima Monteiro. Francisco Manuel Marcelo Curto. Gaspar Miranda Teixeira. Gil da Conceição Palmeiro Romão. Henrique Aureliano Vieira Gomes. Hermínio Martins de Oliveira. João de Almeida Eliseu. João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu. João Luís Duarte Fernandes. João do Nascimento Gama Guerra. João Rosado Correia. Joel Maria da Silva Ferro. Jorge Alberto Santos Correia. Jorge Lacão Costa. Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda. José António Borja dos Reis Borges. José Augusto Fillol Guimarães. José Barbosa Mota. José da Cunha e Sá. José Luís Diogo Preza. José Manuel Nunes Ambrósio. José Martins Pires. Juvenal Baptista Ribeiro. Litério da Cruz Monteiro. Luís Silvério Gonçalves Saias. Manuel Fontes Orvalho. Manuel Laranjeira Vaz. Manuel Luís Gomes Vaz.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Nelson Pereira Ramos.
Nuno Álvaro Freitas Alpoim.
Paulo Manuel Barros Barral.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel Caio Roque.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
Abílio de Mesquita Araújo Guedes. Agostinho Correia Branquinho. Amadeu Vasconcelos Matias. Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo. Anacleto Silva Baptista. António Augusto Lacerda de Queiroz. António Joaquim Bastos Marques Mendes. António Nascimento Machado Lourenço. António Roleira Marinho. Daniel Abílio Ferreira Bastos. Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves. Fernando José Roque Correia Afonso. Fernando Monteiro Amaral. Fernando dos Reis Condesso. Gaspar de Castro Pacheco. João Evangelista Rocha de Almeida. João Luís Malato Correia. João Maria Ferreira Teixeira. João Maurício Fernando Salgueiro. José Adriano Gago Vitorino. José de Almeida Cesário. José Augusto Santos Silva Marques. José Mário de Lemos Damião. José Silva Domingos. Leonel Santa Rita Pires. Licínio Moreira da Silva. Luís António Martins. Manuel António Araújo dos Santos. Manuel Filipe Correia de Jesus. Manuel Maria Portugal da Fonseca. Manuel Pereira. Mário Júlio Montalvão Machado. Mário de Oliveira Mendes dos Santos. Vasco Francisco Aguiar Miguel. Virgílio Higino Gonçalves Pereira. Victor Manuel Ascensão Mota.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro. António Anselmo Aníbal. António Guilherme Branco Gonzalez. António José Monteiro Vidigal Amaro. António da Silva Mota. Belchior Alves Pereira. Carlos Alfredo de Brito. Custódio Jacinto Gingão. Francisco Manuel Costa Fernandes. Francisco Miguel Duarte. Jerónimo Carvalho de Sousa. João António Gonçalves do Amaral. João Carlos Abrantes. Jorge Manuel Abreu de Lemos. José Manuel Lampreia Patrício. José Manuel Antunes Mendes. José Manuel Maia Nunes de Almeida. José Manuel Santos Magalhães. José Rodrigues Vitoriano. Manuel Gaspar Cardoso Martins. Maria Alda Barbosa Nogueira. Maria Margarida Tengarrinha. . Maria Ilda Costa Figueiredo. Maria Odete Santos. Mariana Grou Lanita. Octávio Augusto Teixeira.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira. Alexandre Carvalho Reigoto. Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira. Francisco Manuel de Menezes Falcão. Hernâni Torres Moutinho. Horácio Alves Marçal. João Carlos Dias Coutinho Lencastre. João Gomes de Abreu Lima. Manuel António Almeida Vasconcelos. Manuel Jorge Forte Goes.
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Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
João Corregedor da Fonseca.
Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):
Dorilo Jaime Seruca Inácio. Francisco Alexandre Monteiro.
Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.ºs 48 a 55 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias de 14, 21, 26 e 28 de Fevereiro findo e 1, 5, 7 e 8 de Março.
Há alguma oposição?
Pausa.
Visto não haver, consideram-se aprovados.
Vai proceder-se à leitura do expediente.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Certas
De Manuel José da Costa solicitando que os «cortes» de electricidade, água, gás, telefones, etc., e de outras empresas do Estado ou particulares, não se processem sem conhecimento prévio dos utentes ou só por ordem judicial.
De Custódia de Jesus Azevedo, residente em Torres Vedras, chamando a atenção para o facto de cerca de 2000 viúvas estarem aguardando há anos que saia nova legislação que lhes permita virem a receber a sua justa pensão de sobrevivência através da Caixa Geral de Depósitos, porque na sua maioria não lêem o Diário da República.
Ofícios
Da Junta de Freguesia de Bencatel reafirmando o seu profundo descontentamento pela eventual desactivação do posto da GNR daquela localidade, reiterando a solicitação para que seja reconsiderada tal decisão.
Da Associação Cultural e Social de Saint-Maur protestando vigorosamente contra as medidas tomadas pelo Ministério da Educação no que se refere ao exames ad hoc, por considerarem que as mesmas não parecem ter em conta os interesses dos emigrantes, em particular o problema de reintegração dos jovens em Portugal.
«Telexes»
De várias empresas da região de Vizela pedindo o imediato agendamento da lei quadro de municípios, pois o atraso pode extinguir o tempo que ainda resta antes das eleições autárquicas, para a criação do município de Vizela.
O Sr. Secretário (Roleira Marinho): - Na sessão do dia 14 de Março de 1985 foram apresentados os seguin-
tes requerimentos: a diversos ministérios (3), formulados pelos Srs. Deputados Fillol Guimarães e Coelho Pires; ao Ministério das Finanças e do Plano, formulado pelo Sr. Deputado Fernando de Sousa e outros; aos Ministérios da Indústria e Energia e do Trabalho e Segurança Social (3), formulados pela Sr.ª Deputada lida Figueiredo; a diversos ministérios (3), formulados pelo Sr. Deputado Manuel Lopes; a diversos ministérios (2), formulados pelo Sr. Deputado António Gonzalez; ao Ministério do Equipamento Social, formulado pelo Sr. Deputado Alves Marçal; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca; à Procuradoria-Geral da República, formulado pelos Srs. Deputados José Magalhães e José Manuel Mendes; aos Ministérios da Agricultura e do Equipamento Social (2), formulados pelo Sr. Deputado Álvaro Brasileiro; a diversos ministérios (3), formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos e outros; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado Lima Monteiro; aos Ministérios da Educação e do Equipamento Social, formulados pelos Srs. Deputados Zita Seabra e Jorge Lemos; à Secretaria de Estado das Obras Públicas, formulado pelo Sr. Deputado Antunes da Silva; ao Ministério da Agricultura, formulado pelo Sr. Deputado Roleira Marinho; aos Ministérios da Indústria e Energia e do Trabalho e Segurança Social, formulados pelo Sr. Deputado João Paulo e outros.
Na sessão do dia 19 de Março de 1985: a diversos ministérios (8), formulados pelo Sr. Deputado António Gonzalez; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Morais Barbosa; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Paulo Barral; a Investimentos e Participações do Estado, S. A. R. L., formulado pela Sr.ª Deputada lida Figueiredo e outros; à Câmara Municipal de Sintra e ao Ministério do Equipamento Social (2), formulados pelos Srs. Deputados Jorge Lemos e José Magalhães; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Lemos; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
Foram ainda recebidas as seguintes respostas do Governo a diversos requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados: José Manuel Mendes e José Magalhães, na sessão de 14 de Junho; Magalhães Mota, na reunião da Comissão Permanente do dia 6 de Setembro e nas sessões dos dias 9 e 15 de Novembro; Seiça Neves, na sessão de 24 de Outubro e 19 de Dezembro; Cunha e Sá, na sessão de 30 de Novembro; Nunes da Silva, na sessão de 5 de Dezembro; Maia Nunes de Almeida e Jorge Lemos, na sessão de 6 de Dezembro; Jorge Góis, na sessão de 11 de Dezembro; António Mota, na sessão de 13 de Dezembro; Anselmo Aníbal e Manuel Fernandes, na sessão de 20 de Dezembro; Marques Mendes, na sessão de 3 de Janeiro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, devo informar que neste momento uma funcionária dos serviços encontra-se junto dos representantes dos grupos e agrupamentos parlamentares para subscreverem o voto que ontem foi combinado ser subscrito conjuntamente na conferência de líderes parlamentares.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Eliseu.
O Sr. João Eliseu (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando em Outubro de 1971 se rea-
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lizou em Santa Cruz de Tenerife a 23.ª Assembleia Geral da Conferência Europeia de Agricultura, foi proposta a criação do Dia Mundial da Floresta. E, quando um mês depois se realizou em Roma a Conferência Geral da FAO, ao ser solicitado apoio para aquela iniciativa, logo o pedido mereceu melhor acolhimento. Por isso, já em 21 de Março de 1972 um conjunto de países - entre os quais Portugal - comemorou o primeiro dia mundial dedicado à floresta, na data em que no hemisfério norte começa a Primavera.
Anteriormente àquele ano, e não só em Portugal, em muitas escolas se procedia à plantação de árvores e se ouviam palavras alusivas ao Dia da Árvore.
Não queremos, porém, deixar de acentuar que a alteração aprovada em 1971 representou um substancial salto qualitativo. Com efeito, um homem pode admirar, respeitar, defender e glorificar uma árvore ao reconhecer os benefícios que da mesma pode usufruir, em termos de produção de lenha, de madeira, de frutos ou de enquadramento e de sombra junto à sua habitação. Porém, certos benefícios, alguns aparentemente imperceptíveis, só se manifestam quando as árvores se encontram associadas, natural ou artificialmente, constituindo cortinas, matas, bosques ou florestas. Referimo-nos, por exemplo, à conservação do solo, à produção de água ou à influência sobre as condições climatéricas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No sector florestal, como em muitos outros, existe um mundo de problemas cuja resolução reclama o empenhamento dos responsáveis.
Em defesa ou melhoramento da nossa área florestal, em apoio da actividade do sector, em benefício das condições de escoamento das nossas linhas de água, ou na obtenção de melhores condições para práticas desportivas e para turismo, quantos problemas aguardam solução e, alguns deles, apenas boas vontades.
Vou referir apenas dois que, de tão dissemelhantes, somente têm em comum a sua proximidade geográfica: o pinhal de Leiria e a mata de Marrazes - esta localizada dentro do perímetro urbano da cidade de Leiria.
Do pinhal de Leiria - mata com cerca de 11 300 hectares, por cuja administração passaram alguns dos mais categorizados silvicultores portugueses - sai madeira de pinho que, pelas suas características excepcionais, é considerada como a melhor do nosso país. Não é de estranhar, por isso, que a sua venda em pranchas esteja a atingir, à saída da mata, valores que ultrapassam os 50 000$ por metro cúbico.
O facto referido é uma consequência da técnica aplicada na exploração do pinhal de Leiria, o que explica que o seu nome há muito tenha ultrapassado as fronteiras do País.
Os cerca de 8000 ha de área de exploração - dado que a restante superfície abrange a zona improdutiva das dunas e da área social - teriam canalizado para os cofres do Estado, durante o ano de 1984, mais de 143 000 contos. E, como todas as despesas com a exploração desta mata, incluindo a parte que lhe corresponde com o pessoal dirigente, não teriam atingido os 57 000 contos, ou seja, cerca de 40% da receita, não se compreende que o pinhal de Leiria não beneficie do apoio que, no mínimo, a sua projecção internacional impunha. Com efeito, como há mais de 12 anos não são abertos concursos para a admissão de guardas florestais, o número de guardas e mestres ali em serviço já baixou de 57 para 25, por os restantes terem atingido a idade da reforma. E como alguns que estão em actividade, irão em breve usufruir de idêntica recompensa pelo trabalho desenvolvido ao longo de muitos anos, cada vez são maiores as dificuldades encontradas para se assegurar uma correcta orientação das sementeiras, condução e exploração dos povoamentos.
Se num futuro que se deseja próximo é possível preparar novos guardas florestais através de cursos de formação profissional, não devemos esquecer que muitos conhecimentos só podem ser transmitidos por aqueles que os foram adquirindo, pela prática, ao longo de muitos anos.
Formulamos votos de que se consiga evitar que venha a ser comprometida a exploração do pinhal de Leiria, por não serem atempadamente abertos concursos para guardas florestais.
O segundo problema a que vamos fazer referência relaciona-se com a carreira de tiro instalada na mata de Marrazes.
Com o passar dos anos a povoação de Marrazes desenvolveu-se, ligou-se à cidade de Leiria e hoje está integrada na sua área urbana. A mata resultante de uma arborização feita pêlos Serviços Florestais, além de ser frequentemente utilizada para práticas desportivas, está rodeada de habitações e instalações. Basta referir que um bairro de 280 fogos, recentemente inaugurado, dista menos de 100 m da linha de tiro e as escolas primárias, a escola preparatória e o campo de jogos do Sporto Club Leiria e Marrazes distam apenas mais alguns metros. E ninguém esquece que dois irmãos que em 1979 frequentavam a escola preparatória foram gravemente atingidos pelo rebentamento de uma granada que haviam encontrado.
Apesar dos pedidos formulados ao Ministério da Defesa, a carreira de tiro continua funcional, com perigo para os que frequentam a mata ou habitam e trabalham nas proximidades.
Novo voto formulamos: o de que a carreira de tiro da guarnição militar da cidade de Leiria possa, em breve, ser transferida para um local mais isolado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao finalizarmos a nossa intervenção, não queremos deixar de afirmar que consideramos prioritário o aumento da nossa área arborizada, mas entendemos que é igualmente importante apoiar e defender as superfícies já florestadas. Por isso, aguardamos com ansiedade a aprovação, em Conselho de Ministros, dos diplomas do sector florestal o que, se acontecesse hoje, seria a melhor forma de o Governo se associar às comemorações do Dia Mundial da Floresta.
Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Gonzalez.
O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Sr. Deputado João Eliseu, para além da questão que gostaria de formular quero, em primeiro lugar, solidarizar-me com a preocupação manifestada por V. Ex.ª em relação ao estado não só do pinhal de Leiria, como da maior parte das nossas florestas, sobretudo relativamente a um ponto crucial que o Sr. Deputado abordou na sua intervenção e que se refere à falta de guardas florestais. Aliás, este aspecto faz-se sentir não só a nível dos guardas florestais, como - e isto, saindo um pouco da área das florestas - a nível dos guardas rios, da venatória,
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etc. Portanto, verifica-se por todo o País uma falta de quadros de fiscalização que torna impossível a vigilância do que se passa em relação às nossas zonas que apresentam ainda algo de natural.
Quero também deixar aqui manifesta a minha condenação em relação aos fogos reais que se realizam por várias zonas do País, sem a mínima preocupação de carácter ecológico, sendo certo que alguns desses fogos se realizam em zonas de floresta.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Eliseu.
O Sr. João Eliseu (PS): - Sr. Deputado António Gonzalez, creio que o que V. Ex.º formulou não foi uma pergunta, mas sim um apoio às palavras que proferi na minha intervenção. Nesse sentido, não me resta mais nada do que lhe agradecer.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Góis.
O Sr. Jorge Góis (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação anómala que se vem vivendo no seio da Universidade Livre não pode deixar de merecer a atenção desta Câmara.
Com efeito, a admissão para o 1.º ano do Departamento de Direito da Secção de Lisboa de mais de 650 alunos, muito acima, portanto, do limite máximo de 450 novos alunos definido pelo respectivo Conselho Escolar, veio despoletar uma nova crise no seio da instituição, com desenvolvimentos que têm sido do domínio público.
Tendo o conselho escolar manifestado a sua oposição à decisão referida, foi o professor catedrático director do Departamento de Direito suspenso pelo Reitor de todas as suas funções.
E face à solidariedade para com o director do Departamento demonstrada pelos docentes do Departamento de Direito, que, aliás, mantiveram a posição antes assumida quanto ao limite máximo de novos alunos a admitir, e à suspensão de actividades decorrente das aludidas circunstâncias, começaram a ser suspensos das suas funções os professores do Departamento de Direito, entre os quais praticamente todos os catedráticos em exercício e a maioria dos regentes.
Os alunos, entretanto, manifestaram nomeadamente em assembleia geral reunida a 26 de Fevereiro, «a sua total solidariedade para com os docentes do Departamento de Direito», o seu apoio à «decisão de suspender completamente as actividades universitárias até à completa reposição da legalidade», para além de exigirem «a reintegração imediata de todos os docentes suspensos».
Têm vindo, entretanto, a ser recrutados novos docentes para assumir as funções dos professores suspensos, situação que os alunos não aceitam, pelo que na sua generalidade não têm vindo a assistir às aulas nem a prestar as provas marcadas, conforme pude pessoalmente constatar quando a 5 do corrente mês de Março, juntamente com outro deputado, e a convite dos delegados dos alunos do Departamento de Direito da Secção de Lisboa da Universidade Livre visitei detalhadamente as instalações da escola.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos últimos dias dois factos salientes ocorreram neste domínio.
Por um lado, gorou-se a tentativa de promover uma reunião no Ministério da Educação, que juntando os diversos intervenientes permitisse o apontar de soluções, e isso face à não participação do Reitor da Universidade Livre, conforme, aliás, a imprensa noticiou.
Por outro, o Ministro da Educação determinou a instauração de um inquérito.
Temos por correcta tal decisão, esperando apenas que as conclusões do inquérito sejam rapidamente conhecidas, de molde a poderem contribuir para a rápida resolução dos problemas existentes no seio da instituição.
O quadro de factos descrito põe em causa a própria dignidade do ensino superior, não podendo o Estado deixar de ser extremamente sensível a tal valor. E se as Universidades, nos termos do artigo 76.º, n.º 2, da Constituição, gozam de autonomia científica, pedagógica, administrativa e financeira, o certo é que o artigo 75.º determina expressamente que «o Estado fiscaliza o ensino particular e cooperativo».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É em nome da liberdade e da dignidade do ensino que entendemos que o Estado se não pode demitir de exercer os poderes tutelares que lhe incumbem, nomeadamente face a uma situação com a gravidade daquela que se vem vivendo no seio da Universidade Livre.
É em nome, igualmente, de um conceito de Universidade como centro de cultura e saber, e não como instrumento de natureza lucrativa, o que neste domínio se afigura inaceitável.
E é ainda à luz da necessidade de salvaguardar as legítimas expectativas e os direitos dos alunos que frequentam a Universidade Livre, e das respectivas famílias, que importa resolver rapidamente a situação presente, num quadro de legalidade, que permita repor as condições pedagógicas.
E até por um princípio de paralelismo com as outras instituições universitárias, quer estatais quer particulares.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é este o momento, nem para isso dispomos de tempo em face das limitações regimentais, para ir mais longe na questão da Universidade Livre.
Não estão aqui em causa os problemas estruturais da instituição, desde a situação no seio da cooperativa até às relações entre esta e a Universidade, sem esquecer a sociedade comercial entretanto criada e para a qual foram transferidas a gestão administrativa e financeira da Universidade Livre.
Ocupámo-nos apenas da situação de crise que nas últimas semanas estalou no seio da Universidade Livre, das causas próximas de tal situação, e da necessidade imperiosa em ultrapassar urgentemente tal estado de coisas.
E é por isso que o inquérito se nos afigura positivo. Desde que concluído rapidamente, de molde a habilitar o Ministério da Educação a uma tomada de posição de fundo sobre a matéria.
Para terminar salientaríamos apenas que o projecto de lei n.º 447/III, apresentado pelo Grupo Parlamentar do CDS, ao definir uma autoridade académica no ensino privado e cooperativo, responsável, autonomamente, independentemente da forma jurídica do proprietário do estabelecimento, pela gestão escolar, pedagógica e científica, e pela emissão dos diplomas que certifiquem os graus académicos concedidos, introduz nesta matéria uma perspectiva inovadora que, a vir a
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ser consagrada, salvaguarda cabalmente os valores da liberdade, da exigência pedagógica e da própria Universidade.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Laranjeira Vaz.
O Sr. Laranjeira Vaz (PS): - Sr. Deputado Jorge Góis, congratulo-me pelo facto de V. Ex.ª ter trazido a esta Assembleia um tema polémico, um tema grave, que careceria de mais tempo para o debate.
O meu grupo parlamentar também não dispõe hoje de tempo suficiente para abordar esta questão, mas, amanhã, no período de antes da ordem do dia, apresentaremos aqui a nossa posição em face da situação grave que se vive na Universidade Livre.
O Sr. Presidente: - para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís. Vaz, que dispõe de 9 minutos.
O Sr. Luís Vaz (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome de um povo a que orgulhosamente pertenço e alguém classificou como «símbolo de algumas das melhores qualidades de que o homem português mais justamente se orgulha» cumpre-me chamar a atenção de VV. Ex.ºs para questões importantes relativas à problemática do desenvolvimento da sua região.
As suas potencialidades humanas, que tantos e tão elevados valores deu ao País, aliados às suas riquezas naturais, poderiam tê-la transformado numa terra de progresso e bem-estar.
Mas não. A sangria humana foi constante para cá do Marão e para lá da fronteira, acabando por produzir riqueza noutras paragens, no País e no estrangeiro, deixando a região empobrecida.
Contudo, após o 25 de Abril, conquistado o poder pelas populações através das autarquias, e apesar. de alguma má gestão, a região conheceu um surto de progresso e vitalidade.
Na última década a face de Trás-os-Montes mudou, graças ao dinamismo do sector da construção civil e do comércio, e muito especialmente, ao investimento feito ao nível das infra-estruturas básicas, como sejam as estradas municipais, electrificação, saneamento básico, arruamentos, abastecimento de água e ensino.
A ideia de subdesenvolvimento atroz, ainda existente acerca da realidade transmontana, é profundamente errada.
Trás-os-Montes tem hoje, a par de uma qualidade de vida invejável com que a natureza o brindou, muito do que está ao dispor das populações dos grandes centros.
As nossas aldeias e vilas têm vindo a transformar-se em locais onde se vive com o mínimo dê condições e dignidade.
Mas, o poder central não soube ou não quis acompanhar o esforço dos Transmontanos, continuando difícil a fixação de quadros e de investimento, em face do isolamento em que a região se encontra.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!
O Orador: - É que Trás-os-Montes, e o distrito de Bragança em particular, fica muito longe de Lisboa.
Longe nas horas que se gastam por estradas onde a curva e o mau piso dominam e muito, muito longe e penoso também, através de um caminho-de-ferro que em cada viagem nos brinda com um tormento, mesmo na linha do Douro.
A região está também perto do mar, mas a inadmissíveis 4 ou 5 horas por um arremedo de estrada nacional que penosamente atravessa o Marão. E a questão mantém-se: quem quer investir ou fixar-se nestas condições?
Num momento em que o cidadão comum já se refere com frequência aos «benefícios da insularidade», os Transmontanos esperam que o País os ajude a custear o preço da interioridade.
É, pois, moral e politicamente exigível que o Estado, por um lado,' promova o urgente desbloqueamento do sector das vias de comunicação é, por outro, proporcione as transferências financeiras necessárias ao desenvolvimento da região.
Assim, é fundamental a concretização da via rápida Porto-Bragança e a sua ligação à estrada da Beira e linha do Douro, transpondo o martírio de Moncorvo e Pocinho.
E os Transmontanos fazem votos para que os esforços desenvolvidos nesse sentido pelo ex-Ministro Rosado Correia tenham a necessária continuidade.
Mas o caminho-de-ferro, para além da linha do Douro, é indispensável na actual situação e os Bragançanos não permitirão o encerramento da linha do Tua, embora venham já assistindo ao espectáculo trágico-cómico de ver parar o comboio antes e depois de cada passagem de nível, para que o próprio revisor vá fechar e abrir as cancelas, ou apenas abrandar a marcha adivinhando-se a todo o momento o acidente.
Na perspectiva da optimização das infra-estruturas já existentes, impõe-se uma substancial melhoria dos serviços prestados pela CP na linha do Douro, impulsionando-se a necessária complementaridade entre a rede viária projectada e o caminho-de-ferro.
O Sr. Carlos Lage- (PS): - Muito bem!
O Orador: - Mas a complementaridade das vias de comunicação não deve esquecer a plena utilização da navegabilidade do rio Douro (onde muito já foi investido) de grande interesse para o transporte turístico e de mercadorias.
E não será de mais, pensamos, referir ainda a importância do transporte aéreo que se deverá desenvolver, o que implica a concretização da velha aspiração de um aeródromo regional no centro do distrito de Bragança, mais concretamente no Monte de Morais, no concelho de Macedo de Cavaleiros.
Com estes pressupostos tornados realidade estaria Trás-os-Montes com as portas definitivamente abertas ao progresso e à plena utilização local das suas gentes na fruição e valorização das suas riquezas naturais, desde que haja também a necessária coragem que leve à concretização de uma política de regionalização que confira, de facto, poder à região.
Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.
Criadas as condições básicas. referidas, a estratégia de desenvolvimento deverá assentar fundamentalmente no aproveitamento das potencialidades. regionais, com
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especial incidência na agricultura, sem esquecer as indústrias agro-alimentares e extractivas.
O integral aproveitamento dos perímetros de rega existentes e em conclusão, proporcionaria produções que ultrapassariam, a curto prazo, a capacidade do Complexo Agro-Industrial do Cachão, cuja crise é necessário ultrapassar ao nível da gestão e saneamento económico-financeiro, sendo inevitável o apoio à instalação futura de novas unidades junto à produção.
No que se refere às indústrias extractivas, assiste-se à incapacidade de o poder central pôr em prática os projectos mineiros, com especial destaque para os ferros de Moncorvo, sem esquecer os mármores de Vimioso.
Têm surgido, entretanto, algumas pequenas unidades industriais ligadas à construção civil, madeiras e mobiliário. No entanto, urge ultrapassar o bairrismo doentio de alguns autarcas e estudar a instalação de loteamentos industriais intermunicipais por forma a que se concentrem energias e capitais nos locais certos, segundo uma distribuição conveniente e geradora de desenvolvimento.
Sendo na agricultura que assenta basicamente a economia da região, é aí que serão necessárias as mudanças mais significativas, pois o extremo fraccionamento e dispersão das explorações, acrescidas da falta de formação e elevado nível etário dos agricultores, conduzem, em última análise, a uma muito baixa produtividade a que urge pôr termo.
E num país em crise é inadmissível o espectáculo de subaproveitamento dos regadios da Vilariça e a impune apatia dos Serviços Regionais da Agricultura ao longo dos últimos 7 anos, relativamente às transformações estruturais necessárias ao Perímetro de Rega de Macedo de Cavaleiros.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!
O Orador: - Tão grave é também a constatação da quase total incapacidade na utilização das verbas do Plano de Desenvolvimento Rural Integrado de Trás-os-Montes, cujas razões teria muito interesse averiguar, devendo ser reexaminada a exequibilidade prática de «projectos-modelo» da componente agrícola.
Por outro lado, verifica-se que alguns dos fruidores de financiamentos, de agricultores apenas têm o privilégio de ter herdado grandes casais, pelo que nos assiste o direito de afirmar: oxalá o Plano de Desenvolvimento Rural Integrado de Trás-os-Montes não passe e fiquem apenas as carcaças dos automóveis!
O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!
O Orador: - Apesar de tudo isto poderiam os agricultores transmontanos encarar o futuro com esperança se houvesse vontade e capacidade para pôr em prática acções necessárias à alteração do sfatus vigente de que destacamos:
Intervenção gradual ao nível da estrutura fundiária, incentivando o emparcelamento;
Aproveitamento cabal das potencialidades florestais, apícolas e cinegéticas;
Fomento da pecuária, em especial da ovinicultura;
Aproveitamento dos recursos hídricos ao nível da piscicultura e, sobretudo, dos regadios, com fomento de novas culturas (horto-industriais, frutícolas e tabaco);
Apoio ao associativismo e cooperativismo, incentivando a ultrapassagem das dificuldades na rede de frio, armazenagem, transformação e comercialização dos produtos da terra;
Formação profissional agrícola, sobretudo para os mais jovens, através de uma estreita colaboração entre os Serviços Regionais dos Ministérios do Trabalho e da Agricultura;
Protecção e valorização de culturas tradicionais, como o castanheiro, a vinha e a oliveira - e a oliveira é uma cultura importante que o Plano de Desenvolvimento Rural Integrado nem sequer refere;
Fruição do manancial financeiro que o Plano de Desenvolvimento Rural representa.
A zonagem regional em função das aptidões edáfo-climáticas e a planificação cultural são igualmente instrumentos imprescindíveis.
É, no entanto, evidente que a concretização de qualquer projecto global para a agricultura implica uma prévia intervenção ao nível da Direcção Regional de Agricultura de Trás-os-Montes que se transformou num feudo de alguns, onde o compadrio, o oportunismo e a falta de decoro fizeram lei. E, 7 anos após a sua criação, apesar do seu gigantismo, a agricultura continua sem um eficaz apoio e técnicos de reconhecida...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo que V. Ex.ª dispunha para produzir a intervenção já terminou. Portanto, peço-lhe que a conclua brevemente.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, sei que estamos com problemas de tempo, mas o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho faz-nos o favor de transferir os 5 minutos que pertencem à ASDI para que o Sr. Deputado Luís Vaz possa terminar a sua intervenção, caso no voto sobre as florestas cada grupo ou agrupamento parlamentar disponha de 3 minutos.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, todos os tempos gastos pelos grupos e agrupamentos parlamentares contam no tempo global de que dispõem no período de antes da ordem do dia.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Inclusivamente para se pronunciarem quanto ao voto sobre as florestas?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lage, não levantemos problemas!
Faça favor de continuar a produzir a sua intervenção, Sr. Deputado Luís Vaz.
O Orador: - ... capacidade e credibilidade junto da lavoura, foram marginalizados, enquanto a hierarquia imposta, envereda, em muitos casos, pela protecção à mediocridade e, sobretudo, à subserviência.
Mas o problema da Direcção Regional de Agricultura não se resolve pela simples nomeação de um director regional. Há que encontrar uma equipa directiva equilibrada, técnica e politicamente credível - repito, técnica e politicamente credível -, capaz de
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detectar e responsabilizar os obreiros da inoperância e que aproveite a capacidade dos técnicos sem as peias de um pensamento retrógrado e elitista.
A alteração da situação da agricultura deverá também assentar na colaboração coordenada de várias entidades ligadas ao sector - direcção regional, Complexo Agro-Industrial do Cachão e cooperativas -, por forma a encaminhar a produção de acordo com as necessidades das indústrias agro-alimentares existentes e dos mercados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito mais haveria a dizer acerca do que há de bom em Trás-os-Montes e sobretudo das suas carências a vários níveis, como é o caso da saúde. No entanto, termino afirmando: Trás-os-Montes quer desenvolver-se e deixar de ser a mais deprimida região do País. Por isso, urge que o poder político entenda, de uma vez por todas, que é imperioso, moralmente inevitável e politicamente necessário quebrar o seu isolamento, para que haja um só Portugal.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Reigoto.
O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): - Sr. Deputado Luís Vaz, ouvi com muita atenção a intervenção que V. Ex.ª produziu e em relação à qual quero manifestar o meu apoio.
V. Ex.ª referiu o caso das oliveiras. Como o meu grupo parlamentar não dispõe de muito tempo, apenas gostaria de perguntar se o caso da Vilariça, onde se arrancaram milhares e milhares de oliveiras, não constituiu um prejuízo tremendo para a região de Trás-os-Montes, em especial para o distrito de Bragança.
Não estará hoje Trás-os-Montes mais escravizado do que nunca, Sr. Deputado?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Vaz.
O Sr. Luís Vaz (PS): - Sr. Deputado Alexandre Reigoto, quanto às oliveiras da Vilariça há duas questões a colocar: a primeira delas é que há olivais que não têm outra alternativa que não o seu arranque e a sua deslocação para zonas marginais da Vilariça; no entanto, há olivais de primeira qualidade que foram arrancados e isso, sim, é condenável.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.
O Sr. João Abrantes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pelo menos uma vez por ano a Assembleia da República lembra-se da árvore e das nossas florestas. Ë o que irá suceder com a aprovação do voto que, por nossa iniciativa, acabará por ser votado por unanimidade nesta Câmara.
Mas importa referir que esta Assembleia não pode ficar por tímidas tentativas de abordagem superficial do problema da defesa da árvore, sem pôr o dedo na ferida, sem discutir e propor as medidas legislativas adequadas à sua protecção, conservação e expansão.
O Grupo Parlamentar do PCP sempre tem questionado a ausência de uma política florestal que sirva os interesses das populações e não esteja ao serviço de interesses alheios, uma política florestal que concretamente aprecie e tenha em conta os aspectos sociais e económicos que o problema envolve.
Tem-se assistido a uma crescente tendência para que a floresta industrial substitua a floresta tradicional de uso múltiplo em que a política de florestação seguida conduz à inversão do valor real da floresta, passando a constituir um factor de degradação do meio físico em lugar de um elemento de valorização, incompatibilizando-se com as formas tradicionais de exploração.
Em defesa desta adulteração desenfreada afirma-se que temos uma imensidade de solos pobres de que, pela sua utilização para a monocultura florestal, acabaria por resultar um benefício apreciável.
Mas tal não é verdade porque na procura de maiores rendimentos no mais curto espaço de tempo se têm preterido áreas serranas em manifesta desertificação humana e física para inclusivamente se ocuparem solos de reconhecida aptidão agrícola.
Ninguém, Sr. Presidente e Srs. Deputados, pode daqui concluir que o PCP está contra a florestação industrial: o que sempre temos afirmado é que, até pelo seu valoramento económico, esta tem de ser condicionada a um correcto ordenamento florestal que não pode sobrepor-se e aniquilar a florestação de uso múltiplo.
Por outro lado, são já visíveis as consequências desta desastrosa falta de orientação:
Subverte-se o papel da floresta na conservação e protecção do solo e da água, designadamente na regularização da erosão e do regime hídrico, e o facto é que a florestação para as multinacionais de celulose tem em muitos casos destruído esses recursos. Todos nós conhecemos os casos do desaparecimento dos aquíferos da serra de Ossa ou o assoreamento dos leitos do Tejo e do Mondego em resultado da erosão dos terrenos a montante;
Modificam-se irremediavelmente os equilíbrios ambientais, alterando e destruindo as espécies cinegéticas e a vida selvagem em geral;
Arrisca-se a existência de águas interiores com reflexos negativos na pesca, no turismo, no desporto, e estes malefícios ainda não estão quantificados no impacte ambiental que provoca;
Inviabilizam-se as indústrias a juzante do sector florestal, em particular a indústria de transformação de resinas, com gravosos reflexos na nossa indústria química;
Arruinam-se as indústrias de serração, que o mesmo é dizer a economia nacional, dado o peso substancial deste sector na exportação.
Tudo resumido, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é o empobrecimento do País, o esgotamento do solo e da água, o desaparecimento de pequenas e médias indústrias que obtinham da floresta tradicional a matéria-prima necessária à sua actividade e o desemprego subsequente, a redução da área de exploração agrícola, o aumento da nossa dependência externa. Instalam-se no nosso país as indústrias poluentes ao serviço da CEE, que não nos ajuda a desenvolver a agricultura, mas está na disposição de incrementar a florestação que mais lhe interessa.
Desbaratam-se os nossos recursos naturais, invocando-se benefícios que nem sequer são reais: em
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1977 com uma tonelada de pasta para papel comprávamos 2,5 t de trigo; em 1982 a mesma quantidade de pasta não chegava para pagar 2 t de trigo.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Ora aí está!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está, pois, feito o diagnóstico da situação da nossa floresta. Os males de que padece são muitos, mas estamos a tempo (por enquanto) de salvar o doente.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Desde logo, introduzir no binómio árvore-homem um conceito de que aquele é vital para a existência deste, e alterar o rumo da política florestal que tem sido seguida.
Apesar da inexistência da política florestal que urge, não podemos deixar de dirigir no dia de hoje, no Dia Mundial da Floresta e Dia Nacional da Árvore, uma especial saudação às iniciativas das populações, das autarquias, das colectividades, da juventude, das crianças, dos professores, das escolas e de tantas e tantas outras organizações e estruturas que, com diversas realizações, dão um cunho real e alertam a opinião para as medidas de defesa da árvore que a situação reclama.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O papel que neste campo pode e deve desempenhar a comunicação social deve também ser salientado no dia de hoje.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Repensar o papel social e económico da floresta, por quem tem sido aproveitada, atendendo aos interesses da comunidade em geral e não ao de interesses estranhos que visam o lucro rápido; actuar nas novas arborizações com especiais cuidados na escolha das espécies e na forma de exploração; ordenar com uma cuidada intervenção técnica a floresta que temos é um importante contributo para o aumento da rentabilidade da exploração agrícola e uma forma de travar o passo à introdução de espécies estranhas e ao desenvolvimento das situações que referimos na primeira parte da nossa intervenção.
E inevitavelmente haveria que falar-se no eucalipto, não por qualquer animosidade especial, mas sim porque é ele o agente de uma expansão indiscriminada e desordenada.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O mesmo aconteceria com outra qualquer espécie desde que a sua proliferação servisse para os mesmos interesses e conduzisse à monocultura. A avidez dos interesses em jogo fazem com que a floresta seja hoje odiada e considerada como inimiga da agricultura. E para não ir mais longe, convido os Srs. Deputados a debruçarem-se sobre a leitura das conclusões do Plenário dos Pequenos e Médios Agricultores e Industriais, que no fim de semana passado se realizou em Abrantes.
É esta situação que é necessário inverter, fazendo da floresta um bem social estimado e protegido por todos.
Cabe ao Estado a promoção de uma correcta política florestal que conduza a esses objectivos; cabe-lhe ainda a dotação dos meios necessários às autarquias e aos agentes locais de protecção, defesa e preservação
da floresta, designadamente aos bombeiros, para que se torne efectiva a sua participação em todo o processo; cabe à Assembleia da República dotar o País da legislação conveniente à execução de todas estas acções que se querem conjugadas.
Continua, porém, a assistir-se à destruição da floresta pelo fogo e não se actua, sabendo-se que é tão importante a sua prevenção quanto a eficácia no seu combate.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E não poderíamos, nesta intervenção, deixar de dirigir uma palavra muito especial aos principais defensores da árvore - aos bombeiros, na sua maioria voluntários - e chamar mais uma vez a atenção para os bloqueamentos que se continuam a verificar, quer nas comparticipações para o combustível, quer na escassez de meios de prevenção de incêndios.
Aplausos do PCP.
Nas zonas urbanas e nas grandes concentrações industriais continuam a não ser projectados espaços verdes para a renovação ambiental, e é triste verificar que em alguns países esta preocupação vai ao ponto de, ao longo dos trajectos de caminho-de-ferro, se implantarem grandes manchas verdes com esta finalidade.
Nada disto tem sido feito, e não é pensando uma vez por ano na árvore que se protege a floresta. E não basta, igualmente, criar no papel ministérios de chamada «qualidade de vida» a quem não são dadas as mínimas condições financeiras para a prossecução de uma política de defesa do ambiente, como ficou demonstrado com a aprovação do actual Orçamento do Estado. O mesmo se pode dizer da escassez de verbas atribuídas ao Serviço Nacional de Bombeiros e ao Serviço Nacional de Protecção Civil.
Com o panorama descrito a conclusão a tirar é sempre a mesma, qualquer que seja o sector analisado: até para a floresta precisamos de um novo governo, que implemente uma nova política florestal.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Sr. Presidente, peço a palavra para um pedido de esclarecimento.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já há pouco lhe concedi a palavra e vou fazê-lo de novo. No entanto, será a título excepcional e é uma generosidade da Mesa.
Tem, pois, a palavra, Sr. Deputado!
O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Desculpe, Sr. Presidente. É uma generosidade da Mesa porque ultrapassa o tempo de que eu dispunha? É que não reparei se tinha chegado ao final do tempo de intervenção.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Abrantes tem tempo para lhe responder depois.
Queira V. Ex.ª formular a pergunta.
O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Queria aproveitar este pedido de esclarecimento para deixar aqui a minha posição sobre este dia que tinha consubstanciado num voto pequeno que ...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradecia que entendesse a complacência da Mesa, no sentido de que
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V. Ex.ª formule um pedido de esclarecimento e que não aproveitasse a figura regimental para fazer uma intervenção! Isso não é possível! V. Exa. terá de ter paciência, mas a sua atitude terá de estar em função com a figura regimental que invocou!
O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Sr. Presidente, foi por isso que perguntei se o tempo da pergunta me era concedido regimentalmente ou se era uma benesse!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, regimentalmente V. Exa. não dispõe de tempo. É uma benesse da Mesa!
O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Por isso é que fiz a pergunta! Era só para ficar esclarecido sobre se havia tempo para a formulação de perguntas após a intervenção do Sr. Deputado e se era regimental eu formular uma pergunta!
O Sr. Presidente: - Não é regimental V. Exa. fazer uma pergunta, porque não dispõe de tempo para tanto! É uma concessão da Mesa!
Agradecia que formulase então a pergunta, Sr. Deputado!
O Sr. António Gonzalez (Indep): - Sobre esse assunto, e uma vez que estou de acordo com o Sr. Deputado, não tenho perguntas a formular!
Queria só deixar a minha posição, dado que irão provavelmente surgir sombras negras aquando do momento da votação.
O Sr. Presidente: - Entretanto, convido desde já V. Exa. a comparecer no meu gabinete, a fim de trocarmos impressões acerca dos direitos de que V. Exa. dispõe dentro do novo Regimento e da invocação das figuras que porventura pretenda depois utilizar.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Branquinho.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Qualquer sociedade que viver em regime democrático tem, necessariamente, um «quarto poder», e este será tanto mais forte quanto a democracia estiver nela mais profundamente enraizada.
De facto, a comunicação social tem corporizado, ao longo deste século, o poder da opinião pública. Através da sua acção têm sido alcançadas grandes vitórias para as populações, nomeadamente no combate contra a corrupção económica, na defesa do consumidor, na moralização do exercício do poder político, etc. Vários governos, maiorias parlamentares e mesmo Presidentes da República, já sentiram o peso que a comunicação social tem, nomeadamente na denúncia de irregularidades, arbitrariedades e outros desvios na prática da democracia, no quotidiano. Isto, evidentemente, em regimes democráticos. Aliás, muitos titulares de órgãos de soberania que cometeram o erro de se afastarem de uma actividade sustentada por uma ética política correcta e assumida tiveram de se demitir por causa da acção positiva do «quarto poder».
Mas qual tem sido o papel que a comunicação social tem tido, no nosso país, na implantação e consolidação do regime democrático? Será que ela se tem assumido como um «quarto poder», isento, implacável, na denúncia das irregularidades?
De facto, passados que são mais de 10 anos após a mudança de regime, a comunicação social portuguesa, de um modo geral, apesar de ter tido um papel positivo na consolidação da democracia, não foi tão longe, como, eventualmente, seria capaz de se esperar.
De meros órgãos oficiosos no Estado Novo, os meios de comunicação social após o 25 de Abril não se conseguiram libertar das influências nefastas das elites partidárias e, desse modo, assumirem-se, em plenitude, como um «quarto poder», forte, veículo privilegiado das vontades da opinião pública nacional.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E esta afirmação tanto é válida para a comunicação social estatizada como para a privada, com algumas, raras, excepções, como é óbvio.
Se o controle das elites partidárias nos meios de comunicação social, cuja propriedade é pertença do Estado, se faz, nomeadamente, através da nomeação de gestores, nos privados esse controle é feito, talvez mais perfidamente, através dos subsídios estatais.
E esta gula pelo controle da comunicação social agrava-se conforme nos vamos aproximando, na análise, dos meios áudio-visuais, especialmente da televisão.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Poder-se-á perguntar como é que se chegou a esta situação?
Porque é que a opinião pública portuguesa não se vê retradada na comunicação social que temos? Porque é que a existência de um «quarto poder» forte, influente, não se verifica no nosso país, a exemplo do que acontece noutros países democráticos?
Não é tarefa fácil encontrar-se respostas que, globalmente, sejam capazes de justificarem aquelas interrogações.
Há, no entanto, algumas razões que, no nosso entender, são capazes de estarem na base desse grave problema nacional. Sem dúvida, que o atraso cultural em que o nosso país se encontra mergulhado, resultante da política do Estado Novo, é talvez o aspecto fundamental. Mas também não nos podemos esquecer do ataque desenfreado que o PCP, após o 25 de Abril, desferiu em largos sectores da vida nacional, incluindo a comunicação social. A sua presença em alguns órgãos, nomeadamente na televisão, foi, no nosso entender, outros dos aspectos negativos que mais contribuiu para a actual situação.
Após o afastamento, ainda que não de um modo pleno, dos comunistas das esferas de decisão, a democratização e, por consequência, a independência da comunicação social, não foi totalmente alcançada. Os partidos democráticos não foram capazes, em muitas situações, de se libertarem da «tentação totalitária» e permitirem que um «quarto poder» se desenvolvesse.
A partidarização da comunicação social, em Portugal, é hoje um facto indesmentível, o que é nefasto para a consolidação do regime democrático. E triste tem sido o espectáculo público que tem sido dado com a nomeação de gestores e as notícias sobre a partilha das áreas, em cada órgão de comunicação social estatizado, em função de critérios político-partidários.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como é que a opinião pública, a população portuguesa, pode acreditar que a comunicação social é um «quarto poder», fisca-
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lizador da acção dos outros poderes, com actuações deste tipo, ridículas e até desprestigiantes para os profissionais do sector?
Como é que, num ano de eleições presidenciais e autárquicas, tão importantes para a consolidação do regime democrático, a população portuguesa pode acreditar na isenção dos meios de comunicação social do Estado, com particular destaque para a rádio e a televisão, com o constante conhecimento de situações em que as élites partidárias se imiscuem, na orientação seguida pelos órgãos próprios daquelas empresas?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Factos públicos como, por exemplo, a metodologia seguida com a nomeação do actual conselho de gerência da RTP, na nomeação dos responsáveis pelos diversos departamentos desta empresa, a demissão do director-geral da Comunicação Social, são um sinal claro de que algo vai mal. Ou, como aconteceu, ainda mais recentemente, há poucos dias, a substituição do subdirector de Informação do Centro de Produção do Porto, da RTP, por uma pessoa que até há poucas semanas foi chefe de Gabinete do ex-ministro do Equipamento Social, arquitecto Rosado Correia - agora frequentemente apontado, por estruturas do Partido Socialista, como candidato à Câmara do Porto -, é uma situação, do ponto de vista objectivo, claramente indiciadora de um controle da comunicação social, exercido pelo poder político. Situação que é ainda mais grave, num ano de eleições, pois estes elementos poderão mesmo vir a pôr em causa a realização destes actos, num clima perfeitamente democrático.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Impõe-se que se procurem soluções para a grave situação em que se encontra a comunicação social em Portugal. A consolidação do próprio regime democrático impõe a existência de um «quarto poder» forte. As inovações tecnológicas obrigam-nos hoje a olhar para muitos dos problemas que temos tido, pragmaticamente e sem qualquer tipo de complexos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A aprovação de novos estatutos para a RTP, de uma lei da rádio, a revisão da Constituição, no que concerne às limitações quanto à propriedade e à exploração de alguns meios da comunicação social, e a venda, por concurso público, dos jornais estatizados poderão ser algumas pistas que conduzam à solução deste problema.
O que é preciso é ter vontade política para as implementar rapidamente.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Deputado Agostinho Branquinho, ouvi atentamente a sua intervenção e verifiquei a preocupação que o seu partido tem quanto aos meios de comunicação social no sentido de que eles não sejam partidarizantes e, portanto, directamente controlados pelo poder político.
Mas uma dúvida me ficou: o PSD não é, neste momento, poder político em Portugal? O PSD não é responsável pela política do Governo e, consequentemente, pela política deste em relação à comunicação social estatizada?
Era quanto a isto que desejava ser esclarecido!
Vozes do PS e do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Agostinho Branquinho, há mais oradores inscritos para formular pedidos de esclarecimento. V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): - Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Igrejas Caeiro.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - É evidente que apreciei a intervenção do Sr. Deputado Agostinho Branquinho que me parece, realmente, na posição correcta, mas que, por outro lado, me deixa de algum modo perplexo. 15to porque há 5 anos que o PSD está no Governo e tem exercido essa partidarização dos meios de comunicação social.
Parece-me que a intervenção de V. Ex.ª como deputado não coincide com a orientação do próprio partido a que pertence, uma vez que, corri frequência, se sentem pressões para que haja determinado equilíbrio partidário. E essas pressões vão sendo naturalmente resolvidas ao nível da coligação, respeitando em todo o caso - como aliás se deve fazer -, a independência da comunicação social. Daí a minha perplexidade por este rigoroso e corajoso ponto de vista do Sr. Deputado, ao longo da sua intervenção, com o qual estou de acordo. O que me parece é que não tem força dentro do seu próprio grupo parlamentar e dentro da acção política do seu partido para que coisas destas possam ocorrer.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Branquinho.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A primeira constatação que faço é que a minha intervenção colheu o apoio da bancada do Partido Socialista e da bancada do CDS. Essa é uma questão que me orgulha e que me deixa, de facto, lisonjeado!
Ainda bem que estamos todos de acordo nesta matéria, uma vez que, julgo, ela é de fundamental importância para a consolidação do regime democrático em Portugal!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A segunda questão, à qual passo a responder, diz respeito à responsabilidade do PSD na execução da política no nosso país - da sua responsabilização ou co-responsabilização na política.
Como o Sr. Deputado Luís Beiroco bem sabe, o Partido Social-Democrata está no poder, está em coligação, desde 1980. Portanto, a responsabilidade que o PSD tem tido na condução da política portuguesa é uma responsabilidade que tem sido dividida pelos outros partidos com que tem estado em coligação.
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Certamente que nem sempre aquilo que o PSD defende e as posições públicas que tem assumido nalgumas áreas - nomeadamente nesta comunicação social - têm sido seguidas. Devo dizer-lhe que, por exemplo, quando foi da constituição do Conselho da Comunicação Social e da discussão aqui, nesta Assembleia da República, do Estatuto do Conselho da Comunicação Social, a posição que vários deputados do Partido Social-Democrata aqui afirmaram, publicamente, foi a de que esse Conselho devia ter um voto vinculativo na designação dos directores dos órgãos da comunicação social!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E esse facto não veio a ser incluído por pressões, mas pelo facto de a negociação que terá de ter lugar com os outros partidos que estão envolvidos nessa direcção da política...
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faça o favor, Sr. Deputado!
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sobre essa questão do voto vinculativo na designação dos directores dos órgãos da comunicação social, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que essa questão não podia ser resolvida na lei do Conselho da Comunicação Social.
Vozes do PS e do CDS: - Muito bem!
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Ela teria de ser resolvida aquando da revisão constitucional. Foi discutida nessa altura e a Aliança Democrática - com o apoio do PSD - nunca pretendeu defender essa posição! Apesar de nessa altura o PS querer defender isso, a Aliança Democrática opôs-se.
Portanto, Sr. Deputado, é bom que assumamos as nossas posições coerentemente, em todos os momentos!
Aplausos do PS e do CDS.
O Orador: - Sr. Deputado, não quero entrar em polémica, mas é fácil, se pegarmos nos Diários da Assembleia da República, constatarmos qual a posição que o Partido Social-Democrata defendeu aqui em Plenário e qual a posição que deputados do Partido Social-Democrata também aqui defenderam, no sentido de que esse poder fosse um poder vinculativo. É uma questão de pegarmos nos Diários e aí verificarmos quem é que está a falar verdade!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É falso! Leia o que disse o Sr. Deputado Sousa Tavares...
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Leia o Sr. Deputado o que disse o Sr. Deputado Silva Marques!
O Orador: - Quanto à questão que o Sr. Deputado Igrejas Caeiro aflorou, sobre se a minha intervenção não se enquadra na linha do meu partido, devo dizer que é evidente que ela se enquadra na orientação e na linha política que o meu partido define e defende para a comunicação social. Faz parte dos estatutos programáticos do meu partido. Aliás, se hoje aqui fiz esta intervenção foi porque a direcção do meu grupo parlamentar assim o permitiu! Não há, portanto, qualquer dissonância entre aquilo que o meu partido defende e a sua prática!
Se por vezes há situações em que militantes do meu partido têm ido contra aqueles princípios que acabei de enunciar, isso não significa que nós ou eu próprio não os critique também nas esferas próprias!
Continuo, portanto, a defender a minha posição quanto à necessidade de existir uma comunicação social independente, isenta e que se afirme como um «quarto poder»!
Mas, aquilo que o Sr. Deputado aqui não conseguiu desmentir foram as afirmações que fiz e os factos públicos que denunciei! Essa é a questão que o Sr. Deputado não conseguiu contestar. Na verdade, aqueles indícios que apontei poderão levar-nos a pensar que a isenção da comunicação social, num ano de eleições, poderá estar em perigo se, em tempo devido, não atalharmos caminho!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Igrejas Caeiro pede a palavra, mas, lamentavelmente, não lha posso conceder.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Se me permite, Sr. Presidente, queria fazer um protesto!
O Sr. Presidente: - Não é possível, Sr. Deputado, porque não há protestos a pedidos de esclarecimentos.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Para exercer o direito de defesa, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, prefiro que seja a Mesa a conceder a V. Ex.ª o privilégio de formular as objecções que entender, do que V. Ex.ª invocar do direito de defesa quando ele não tem, efectivamente, lugar!
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Antes de mais nada, não tive que desmentir, aliás, apoiei a sua intervenção, Sr. Deputado! O que me parece um pouco estranho é que o Sr. Deputado tenha feito uma intervenção como se o seu partido tivesse tido um banho astral e esteja liberto de todas as implicações daquilo que, justamente, condenou! É que até de um ponto de vista ético, fiquei perplexo porque V. Ex.ª falou das coligações como se o PSD fosse sempre um partido menor nas coligações, quando afinal foi o partido maioritário numa coligação e na actual se serve dos seus meios de pressão até ao nível, não digo do partido ou geral, mas ao nível de certos deputados, que ameaçam de ruptura se não se lhe concedem todas as vontades que tem. Logo, admira-me que queira, com um ar angélico, mostrar que o seu partido está exactamente isento de tudo aquilo que justamente condena! Estou consigo na condenação! Já não estou consigo é na forma tranquila e clara como vem aqui expor uma exposição! Como se não pertencesse aos partidos do Governo que mais tempo têm estado a exercer o poder
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e que realmente têm usado aquilo que o Sr. Deputado condena e eu também...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa deu, por concessão especial, ao Sr. Deputado Igrejas Caeiro o tempo para fazer este comentário. Agradeço, no entanto, aos Srs Deputados o favor de não invocarem porventura posteriormente este precedente, que foi um caso excepcionalíssimo!
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Oh!, Sr. Presidente...
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Agostinho Branquinho tem ainda tempo para responder se o desejar fazer.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Deputado Igrejas Caeiro, volto a registar o meu agrado pelo facto de o Sr. Deputado estar de acordo com a tónica da minha intervenção. É bom - o Sr. Deputado já tem dado provas disso -, que ao defender uma política para a comunicação social se diga também que esta tem a capacidade de se afirmar na isenção e no pluralismo!
No que diz respeito à ameaça de ruptura, Sr. Deputado, devo dizer que é falso que deputados do meu partido façam ameaças veladas ou públicas de ruptura da coligação. Aquilo que deputados do meu partido e eu próprio, com parte na responsabilidade, temos dito é o seguinte: existe um acordo entre o Partido Social-Democrata e o Partido Socialista para a governação deste país, consubstanciado ao nível do Governo e da coincidência parlamentar. Se os termos desse acordo não forem cumpridos, então a coligação não tem razão de existir! Aquilo que os deputados e os órgãos próprios do meu partido querem é que os termos do acordo sejam cumpridos! Essa é que é a questão fundamental!
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - O Sr. Deputado dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado!
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - É que exactamente quando o PSD exige que o acordo seja cumprido está a exigi-lo ao Governo de coligação e não ao Partido Socialista!
O Orador: - É óbvio, Sr. Deputado, que é ao Governo e à própria maioria parlamentar que estamos a exigir o cumprimento do acordo! Mas o que o Sr. Deputado disse foi que havia deputados do meu partido que ameaçavam de ruptura, ou seja, que a coligação poderá deixar de ter sentido se os termos ou o objecto para que ela foi criada deixarem de existir e se se deixar de cumprir o que foi dito! Se tal acontecer, então, ela não terá razão de existir. Enquanto o protocolo de acordo entre os dois partidos for cumprido, é óbvio que defenderemos esse acordo, essa coligação!
Quanto à questão do PSD ser responsável, ele é-o, Sr. Deputado, numa quota-parte e sempre assumiu isso perante o próprio partido e os eleitores. E estes souberam, aliás, ver qual foi a quota-parte de responsabilidade que o Partido Social-Democrata teve. No último acto eleitoral a nível nacional e naqueles que se vão realizando a nível local, o povo português tem sabido responsabilizar o PSD, de tal modo que nas últimas eleições obtivemos o melhor posicionamento em termos de votos e, no que respeita às eleições autárquicas, temo-nos mantido e temos mesmo conquistado posições que anteriormente não eram nossas!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um voto subscrito pêlos Srs. Deputados de todas as bancadas e que vai ser lido.
Foi lido. É o seguinte:
21 de Março, Dia Internacional da Floresta, Dia Nacional da Árvore.
Data propícia para revelar e prestar justa homenagem a todos aqueles que abnegadamente dedicam grande parte das suas vidas à defesa e protecção da floresta e fomento da árvore e realçar o papel desempenhado pelas corporações de bombeiros e pêlos trabalhadores dos Serviços de Administração Florestal.
Importa relembrar ainda o empenhamento das autarquias locais quer no apoio financeiro às entidades directamente empenhadas nestas acções, quer no efectivo aumento do património florestal nos seus parques, ruas e jardins.
Mas é igualmente a altura própria para o balanço do que entre um ano e outro foi feito quando continuam os incêndios que devastam as nossas florestas.
Na justa homenagem e na reflexão das dificuldades, a Assembleia da República, ao assinalar este dia 21 de Março de 1985, Dia Internacional da Floresta, Dia Nacional da Árvore, associa-se às dezenas e dezenas de iniciativas das autarquias, da juventude, das escolas, dos bombeiros e de outros órgãos locais, saúda de forma particular aqueles que dão um sentido real a esta data e manifesta--se pela implementação de uma política que promova a floresta como parte de protecção e renovação dos recursos naturais.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação o voto agora lido.
O Sr. João Abrantes (PCP): Sr. Presidente.
Peço a palavra,
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Abrantes pede a palavra para que efeito?
O Sr. João Abrantes (PCP): - Sr. Presidente, desejo apenas fazer uma correcção ao voto que acabou de ser lido. Assim no seu segundo parágrafo, primeira linha, onde se lê «revelar», deve ler-se «relevar».
O Sr. Presidente: - Tem toda a razão, Sr. Deputado, caso contrário não faria sentido. Muito obrigado pela correcção.
Srs. Deputados, visto não se registarem quaisquer inscrições sob o voto em apreciação, vai ser o mesmo submetido, de imediato, à votação.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
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O Sr. Presidente: - Para declarações de voto estão inscritos os Srs. Deputados Vilhena de Carvalho, Dorilo Seruca, Menezes Falcão, Miguel Vasco e Raul e Castro.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos favoravelmente o voto apresentado e que subscrevemos, pelas sucintas razões que passarei a expor.
Em primeiro lugar, fizemo-lo porque estamos solidários com todos aqueles que vêem na floresta e na árvore elementos fundamentais à existência de um ambiente propício a uma vida de melhor qualidade e uma condição de progresso do povo português e de toda a humanidade.
Em segundo lugar, porque entendemos dever saudar todos os que têm contribuído, seja de que modo for, para a conservação, renovação e expansão da floresta e da árvore, e exortar a todos que reforcem o seu amor à natureza, à floresta e à árvore, com a certeza de que a construção de um futuro melhor passa por um empenhamento colectivo em acções que as defendam e expandam.
Em terceiro lugar, fizemo-lo porque entendemos que uma política florestal consequente terá sempre de assentar numa generalizada consciencialização da importância natural, económica e social da floresta e da árvore. Para esta generalizada consciencialização têm contribuído as mais diversas entidades e instâncias, com destaque para as autarquias e escolas, o que a Assembleia da República não pode deixar de reconhecer e exaltar.
Como exemplo histórico do reconhecimento da importância da árvore a nível municipal, permita-se-me que cite uma velha postura do concelho de Pinhel, de 1810, onde, no seu artigo 10.º, se diz o seguinte:
Todo o habitante chefe de família será obrigado a plantar e dar prezas a três árvores silvestres ou de fruto, em terras suas ou baldios.
Finalmente, neste Dia Mundial da Floresta incluímos também nesta nossa breve reflexão uma palavra de saudação a todas as corporações de bombeiros que abnegadamente lutam, no dia-a-dia, contra os incêndios, quantas vezes postos por mãos criminosas, que devastam largas áreas do nosso património florestal.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Dorilo Seruca.
O Sr. Dorilo Seruca (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A UEDS associa-se ao voto aqui apresentado por ocasião do Dia Mundial da Floresta, hoje comemorado praticamente em todo o Mundo. Voto que, embora revelando o apoio unânime de todos os deputados presentes, não deixa de traduzir algumas divergências sobre ó modo e, sobretudo, o grau de empenhamento na implementação do projecto de desenvolvimento florestal de que o País tanto carece.
Não basta afirmar que urge incrementar a arborização nos cerca de dois milhões de hectares que se encontram inventariados como sendo áreas incultas e marginais para a agricultura; que o País não pode prescindir de tirar o máximo proveito dos seus recursos, o que no âmbito do sector florestal implica a valorização dos três milhões de hectares que constituem
o seu actual património; que é imperioso suster a catástrofe incendiária que anualmente vem dizimando o nosso património silvícola; que é necessário tomar medidas que visem o fomento, a protecção e o ordenamento da vida silvestre, nomeadamente da fauna cinegética, aqrícola e apícola.
Importa encontrar soluções organizativas que, no tocante aos indispensáveis recursos humanos e financeiros, permitam a execução de uma tarefa, unanimemente reconhecida como prioritária.
O voto da UEDS traduz o desejo que este Dia Mundial da Floresta possa ser um passo no caminho de uma vontade política capaz de criar as condições que permitam viabilizar um grande projecto de transformação dos espaços silvestres no nosso agros.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Meneses Falcão.
O Sr. Meneses Falcão (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A floresta das minhas preocupações a pensar na defesa da árvore não cabe numa declaração de voto. De qualquer modo, desejo inscrever-me para uma intervenção a proferir no período de antes da ordem do dia da sessão de amanhã, dado que pretendo dar um pouco mais de explicitude a esta minha preocupação.
Entretanto, declaramo-nos inteiramente solidários com este voto, na medida em que ele representa uma preocupação de lutar contra os males que afligem este país, nas agressões que estão a ser praticadas à floresta. Solidarizamo-nos com todas as formas de luta dos bombeiros da frente e dos bombeiros da retaguarda, que pretendam acudir a este Portugal que está a arder no Verão e que está a ser degradado por outras formas de agressão em qualquer época do ano.
A floresta é uma riqueza nacional. É por esta riqueza, por estes valores, que nos debatemos, porque para nós são válidos, imperiosos, necessariamente defensáveis todos os valores nacionais.
Ao reservarmos a nossa palavra para uma intervenção mais aprofundada declaramos muito sinceramente, e desde já, que não negamos o nosso incondicional apoio a esta manifestação de sensibilidade, que é também a nossa, porque somos portugueses e queremos defender os valores nacionais.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.
O Sr. Vasco Miguel (PSD): - O PSD solidariza-se com o voto apresentado, por isso o subscreveu e votou favoravelmente. É realmente de louvar a protecção e a defesa da floresta feita pelas corporações de bombeiros, pelos Serviços da Administração Florestal e pelas autarquias locais e ainda as iniciativas sensibilizadoras feitas pelas escolas no sentido da preservação da floresta.
Todos nós sabemos quantos fogos criminosos têm devastado a floresta no nosso país. A florestação dessas áreas queimadas tem sido difícil e nem sempre encaminhada no melhor sentido, pois as nossas florestas têm sido essencialmente criadas com fins industriais, marginalizando um outro aspecto que me parece tanto ou mais importante que o primeiro e que consiste na criação de áreas verdes, de maneira a compensar a explosão urbanística, que avança sem freios por entre as zonas verdes.
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A floresta que temos não é suficiente para a resposta que temos de dar em termos económicos, tem de haver mais, mas mais diversificada, de maneira que não sirva somente de matéria-prima às celuloses, mas que com as inúmeras potencialidades como por exemplo a resina e a cortiça, etc., sirvam para impulsionar um sem-número de empresas. Sem esquecermos contudo as virtualidades da floresta como palco de uma vida saudável e recreativa. Quem não gosta de dar um passeio por entre as árvores ou de correr pela floresta atrás de uma peça de caça. Vamos pois defender as árvores. A sua existência é a garantia da nossa continuidade.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul e Castro.
O Sr. Raul e Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O MDP/CDE subscreveu e apoia este voto, porquanto tem a clara noção de que iniciada uma política do culto da árvore na I República, passou-se, durante o longo período conhecido como de existência do regime fascista, para uma política de ignorância e desprezo pela árvore e pela floresta.
Presentemente e após o 25 de Abril, o poder democrático, livre e descentralizado - as autarquias locais -, bem como diversas organizações de juventude, começaram a pôr em prática iniciativas que se integram na defesa da árvore e da floresta.
O sentido do nosso voto é, por um lado, de apoio a uma política de defesa da árvore e da floresta, a qual se vai afirmando através de iniciativas pontuais - sobretudo das autarquias locais - e, por outro lado, pela necessidade em que se estabeleça uma política de implementação da defesa da floresta e da árvore.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, é terminado o período de antes da ordem do dia, pelo que vamos entrar no período da ordem do dia.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, da primeira parte do período da ordem do dia constam as eleições do Sr. Provedor de Justiça e de dois vice-secretários da Mesa da Assembleia da República.
Para facilitar todo este processo de eleição, entende a Mesa que deve abrir desde já os processos eleitorais e correspondentes umas para que VV. Ex.ªs possam promover o exercício de voto. Os referidos processos eleitorais serão encerrados às 17 horas.
Devo lembrar a VV. Ex.ªs que a eleição do Sr. Provedor de Justiça, nos termos da alínea h) do artigo 176.º da Constituição, só poderá ser proclamada se obtiver dois terços dos votos. A eleição dos dois vice-secretários da Mesa da Assembleia da República é feita por maioria simples.
Para que estas eleições não suscitem quaisquer dúvidas, referirei ainda que a eleição dos dois vice-secretários para a Mesa se fará em conjunto, pelo que os Srs. Deputados poderão, ou não, votar nos dois elementos propostos no referido boletim. O mesmo não sucederá na eleição para o Sr. Provedor de Justiça, na
qual a votação será em alternativa entre os dois elementos propostos.
Agradeço aos serviços de apoio o favor de providenciarem no sentido de que as umas eleitorais fiquem à disposição dos Srs. Deputados e aos Srs. Vice-Secretários se assumam na qualidade de escrutinadores.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Lage pede a palavra para que efeito?
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, agradecemos as explicações que V. Ex.1 deu relativamente ao modo como os processos eleitorais se vão processar. Gostaríamos que as umas pudessem estar abertas até um pouco mais tarde. No entanto, deixamos esse assunto à consideração do Sr. Presidente.
Ao abrigo do direito regimental, pedimos 10 minutos de interrupção dos trabalhos.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, serão concedidos, de imediato, os 10 minutos de interrupção solicitados por V. Ex.a
O Sr. José Vitorino (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Vitorino pede a palavra para que efeito?
O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, sugeríamos que as referidas eleições se prolongassem até às 18 horas, se V. Ex.ª não visse inconveniente nisso, aproveitando designadamente o intervalo regimental que tem lugar da parte da tarde.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu referi as 17 horas para o encerramento das umas precisamente para que durante o intervalo da tarde os Srs. Escrutinadores pudessem fazer o apuramento dos votos. Se as bancadas não levantarem qualquer objecção a isso, poderei porventura adiar o encerramento das umas para as 17 horas e 30 minutos.
Pausa.
Visto nenhum dos Srs. Deputados se desejar pronunciar sobre o assunto, devo entender não existir qualquer objecção, pelo que faço a respectiva rectificação, encontrando-se as umas abertas até às 17 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados, está suspensa a sessão por 10 minutos.
Eram 11 horas e SS minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 12 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos continuar com a discussão na generalidade da proposta de lei n.º 78/III.
Para formular um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Cunha e Sá, tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.
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O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Deputado Cunha e Sá, a sua intervenção de terça-feira passada não joga com o discurso do Sr. Secretário de. Estado da Administração Pública.
Sublinhou algumas situações que nada indicam que venham a ser contempladas nas preocupações desta autorização legislativa. Sublinhou, designadamente, existirem carreiras completamente bloqueadas, que os processos de classificação de serviços são processos altamente descredenciados - e apesar de esta ser sempre uma matéria extremamente polémica. Desejo colocar-lhe três questões.
Em primeiro lugar, pergunto-lhe se concorda com pedidos de autorização legislativa com este perfil, designadamente no respeitante às funções de chefia, aos quadros dirigentes. Ou seja, concorda com a substância daquilo que está na proposta de autorização legislativa, designadamente no que se refere aos lugares de chefia?
Em segundo lugar, as suas considerações não se coadunam com as referências voluntaristas e de promessa que estão referenciadas nas várias alíneas da proposta de lei de autorização legislativa. Ainda em relação aos lugares de chefia, encontra no clausulado e no articulado razões para votar a favor? Ou considera que o pedido de autorização legislativa não vem municiado com a informação mínima para um voto de equilíbrio sabendo o que se está a votar?
Por último, no projecto de diploma em questão, e na parte que diz respeito às carreiras, nomeadamente às carreiras completamente bloqueadas - e suponho que se refere a algumas, como é o caso da carreira administrativa e a carreira técnica média -, pergunto-lhe se essas carreiras estão contempladas no projecto que foi apresentado a esta Assembleia„tarde e a más horas, pela. Secretaria de Estado da Administração Pública.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Cunha e Sá.
O Sr. Cunha e Sá (PS): - Sr. Deputado Anselmo Aníbal, em relação à questão do que deveria ou não ter dito em relação ao Sr. Secretário de Estado, V. Ex.ª está a ser relativamente injusto porquanto a minha intervenção não foi um apoio de travesti em relação à posição que o Sr. Secretário de Estado, apresentou. Aliás, não sou travesti.
Por outro lado, e no que respeita à carreira administrativa, há efectivamente um bloqueamento que só por uma análise mais profunda das situações da Administração Pública poderá ser alterada., Tem a ver, também, com leis orgânicas e com outros processos, que serão objecto de uma segunda intervenção que proferirei.
Quanto aos aspectos que referiu da carreira técnica, refiro-lhe que foi a mesma substancialmente desbloqueada em termos de progressão na carreira, progressão essa que culmina com a intercomunicabilidade à própria carreira superior.
Quando me pergunta se concordo ou não com o problema das chefias, portanto, com o estatuto do pessoal dirigente, devo-lhe dizer que tenho as minhas opiniões próprias. São cerca de 4000 os funcionários da função pública que são abrangidos pelo estatuto de pessoal dirigente. Suponho existirem, pelo menos, três
ideias-força que me satisfazem. Uma delas respeita à possível estabilidade nos lugares. Efectivamente, constatava-se que o factor estabilidade não dava horizonte de gestão, de administração, ao dirigente.
Por outro lado, há uma responsabilização, um feed-back pelas suas actividades, o que não havia até agora. Avançarei - aliás, em termos pessoais - que a Administração Pública passa por uma exiguidade a nível dos directores-gerais e não a nível dos trabalhadores da função pública. Há muita dificuldade pela falta de coordenação, pela hiperdepartamentalização, pelo exagero das direcção-gerais. E o «alfobre» onde se irá recolher o número de dirigentes é escasso, em termos de qualidade. Portanto, há esta decalage entre o número de dirigentes capazes e o número de departamentos em que são possíveis de consignar.
O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faça o favor, Sr. Deputado.
O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - É certamente curioso que os critérios de nomeação em muitos ministérios passem, não por qualquer espécie de competência, mas claramente por nepotismo, por partidarite aguda e pelo sectarismo primário.
O Orador:- Sr. Deputado, vou dizer-lhe que ninguém, nestas bancadas, está isento nesses aspectos. Nenhuma das cinco bancadas está isenta dessa situação, se fizermos um balanço completo.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Nós estamos!
O Orador: - Não estão não, Sr. Deputado! Nenhuma das bancadas está isenta nessa situação e até - falo em termos pessoais - possuo a indexação do número dos dirigentes e a sua conotação partidária.
Numa reunião recente de directores de serviço constatámos que esta bancada é aquela que possui menos dirigentes a nível da função pública.
Vozes do CDS: - Ai isso é!
Vozes do PCP: - São incompetentes!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Desde há muito que os trabalhadores da Administração Pública anseiam e os seus sindicatos reclamam uma reestruturação nas carreiras da função pública. Na verdade, constatou-se que o Decreto-Lei n.º 191-C/79, de 25 de Junho, ao fim de alguns anos de vigência, pese embora o mérito de ter introduzido no âmbito da Administração Pública uma estruturação de carreiras e de ter procedido à revalorização de muitas categorias de amplos grupos profissionais, revelou-se um diploma imperfeito, parcelar e limitado nos seus objectivos carecendo de revisão e de aperfeiçoamento.
Sabe-se que as organizações sindicais, designadamente a Federação dos Sindicatos da Função Pública, têm elaborado, desde há , vários anos, propostas concretas, sucessivamente renovadas, tendentes à concretização daquele objectivo.
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Por seu lado os governos, nomeadamente o governo da ex-AD e o actual Governo, reconhecendo embora a justeza daquela pretensão, protelaram sempre a adoptação das medidas necessárias para aquele efeito.
Em 5 de Novembro passado, o actual Governo, cedendo às pressões sindicais, fez a entrega formal às organizações representativas dos trabalhadores de uma proposta de projecto de lei sobre esta matéria.
Temos conhecimento, Srs. Deputados, que esta proposta foi profusamente distribuída pelos serviços públicos através de uma edição da Federação dos Sindicatos da Função Pública, e tem sido objecto de fortes críticas por parte dos trabalhadores.
Sabemos que a referida organização e, porventura, outras estruturas sindicais emitiram parecer sobre o referido projecto, de que fizeram entrega na Secretaria de Estado da Administração Pública, fazendo-o acompanhar das contrapropostas.
15to é, a proposta do Governo é duramente criticada pelos trabalhadores, e é por estes rejeitada, na medida em que não satisfaz as suas reivindicações; ou seja, não só não lhes traz qualquer beneficio imediato, como se aplica apenas a uma pequena minoria de trabalhadores. De igual modo, não dá qualquer contributo para a melhoria e eficácia da Administração Pública.
Por outro lado, o Governo tem-se recusado a negociar com as organizações sindicais a sua proposta de diploma, bem como as contrapropostas sindicais. Até
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ras, que contemple as dotações orçamentais e lugares nos quadros que permitam a aplicação imediata das alterações introduzidas.
Aplausos do MDP/CDE e do PCP.
O Sr. Carlos Laje (PS): - Sr. Presidente, peço a pa. lavra para fazer uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Laje (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação é a propósito do método de votação.
Peço desculpa por interromper o debate, mas, na verdade, muitos dos Srs. Deputados estão a manifestar a sua perplexidade quanto ao preenchimento do boletim de voto para a eleição do titular do cargo de Provedor de Justiça, na medida em que à frente de cada um dos candidatos existem as expressões «sim», «não» e «abstenção».
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faça favor, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Eu respondo já a essa questão.
No inicio, referi que esta votação se faz em alternativa e, portanto, os Srs. Deputados ou votam no pri-
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a votos contraditórios que os deputados assumam em perfeita consciência e que, depois, levem à anulação do voto.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, quer ter a bondade de dar um exemplo de voto contraditório?
O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente. Um deputado que vote, por exemplo «sim» quanto ao primeiro candidato - e eu não vou citar nomes para não dizerem que estou a fazer propaganda eleitoral - e que se abstém quanto ao segundo.
O Sr. Presidente: - Está certo, Sr. Deputado, aí não há nenhuma contradição.
O Orador: - Não, Sr. Presidente, não está certo. Este voto, na boa lógica, tem de ser considerado um voto nulo, mas o modo como está feito o boletim propicia esta interpretação pelos Srs. Deputados e eles não serão, pois, responsáveis.
A única solução correcta, em meu entender, para evitar que venham a surgir complicações durante o escrutínio - temos tempo para isso -, é a de dar por anulados os votos que já entraram para a eleição do Provedor de Justiça, fazer novos boletins de voto com apenas um quadrado em frente de cada um dos candidatos e repetir a votação.
Caso não se proceda desse modo, vão-se gerar extremas confusões. Pode gerar, ainda, uma outra confusão, que é a de vir a criar-se polémica em torno de saber se a abstenção é ou não um voto expresso, o que obviamente não é. Ora, isto tem resultados no apuramento final do escrutínio.
Este boletim de voto, tal como está concebido, vai gerar inevitavelmente controvérsias, polémica e confusão. Estamos a tempo ainda de emendar correctamente a mão dando por nulos estes votos e repetindo a votação para a eleição do Provedor de Justiça, com boletins correctamente elaborados.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, vou entender que a sua intervenção envolve um requerimento oral, pelo que vou verificar se estamos em condições de proceder à respectiva votação, no sentido de se anular está votação por causa da objecção que V. Ex.ª levantou.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, creio que o Sr. Deputado Lopes Cardoso tem inteira razão e que o que o Sr. Deputado disse vem na sequência daquilo que afirmei.
Creio bem que estamos a proceder a um escrutínio em que o modo de votar não é claro, vai induzir em confusão, e que seria melhor anular esta votação e iniciar nova votação:
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu já referi que entendi que o que o Sr. Deputado Lopes Cardoso fez foi um requerimento oral e, por isso, peço a VV. Ex.ª que tenham a bondade de se não pronunciarem mais sobre este assunto até o Plenário se decidir, em função do requerimento oral que foi apresentado pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, não queria, de modo algum, que ficasse entendido que da parte da nossa bancada pudesse haver a ideia de que se uma bancada pensa que podem suscitar-se confusões quanto ao modo de voto não se ponderasse algum critério quanto à votação.
No nosso entender, os boletins não causam qualquer problema aos deputados quanto a exercerem o seu direito. de voto, a não ser no caso de votos contraditórios, mas o Sr. Deputado que assim o fizer é porque o deseja fazer, é uma maneira de se manifestar.
O que nos parece grave é que, tendo-se iniciado uma votação há mais de meia hora, com colegas nossos que certamente já terão cumprido o seu direito a voto e provavelmente até já terão abandonado a Assembleia da República, se vá interromper um processo que está em curso. 15so é que não nos parece aceitável, Sr. Presidente.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma impugnação.
O Sr. (Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, quero impugnar a admissão do requerimento oral, visto que só por um consenso muito especial é que se pode estar a intervir numa votação quando ela está a decorrer.
Suponho, Sr. Presidente, que o que se devia fazer, em termos regimentais, era interromper o Plenário, votar e, terminada a votação, apurar os votos e, em caso de reclamação, ser anulada a votação.
Nas circunstâncias que estão a ser criadas com este requerimento, suponho que não estamos em condições de ponderar devidamente os seus efeitos e isto significa pura e simplesmente que, como estamos a meia hora do intervalo,, a votação poderá continuar a decorrer e em conversa de líderes parlamentares se tomará a atitude mais adequada.
É a sugestão que eu faço a V. Ex.ª e ao Sr. Deputado Lopes Cardoso, que foi quem formulou o que o Sr. Presidente entendeu como um requerimento oral, mas que não é para mim, líquido se o foi.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos tomar em consideração a impugnação feita pelo Sr. Deputado João Amaral como sendo uma reclamação de deliberação da Mesa quanto à admissão do requerimento do Sr: Deputado Lopes Cardoso e a Mesa entende que esta reclamação é procedente.
Efectivamente, enquanto estiver a decorrer um acto de votação não é possível interrompê-lo através de requerimentos dessa natureza. Podem, sim, no final, impugnar-se os resultados da eleição se ela não estiver correcta.
Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró, para uma intervenção.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A autorização, que o Governo solicita ao Parlamento, para legislar em matéria de estatuto do pessoal dirigente, regime e estrutura das carreiras dos trabalhadores da Administração Pública, central e lo-
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cal, constitui mais um sinal, a juntar a tantos outros, que nos últimos tempos este vem multiplicando, do total desfasamento entre a actuação do Executivo e as reais necessidades do País.
Numa matéria tão importante, tão delicada e sensível - e ao mesmo tempo tão necessária para a adaptação do Estado saído da revolução do 25 de Abril às «incumbências prioritárias» que a Constituição de 1976 lhe comete e muito especialmente para defesa dos Direitos, Liberdades e Garantias consagrados no título II -, o articulado que o Governo nos apresenta é de uma pobreza desconsoladora. Não só pela visão estática que patenteia, mas sobretudo pela ausência de uma estratégia global para lançar a Administração Pública, central e local através do seu corpo de funcionários como um dos pilares fundamentais do nosso progresso, no sentido mais amplo desta expressão. E não será por acaso que na exposição de motivos não há uma única referência, directa ou reflexa, mesmo implícita, às disposições que tão laboriosa e entusiasticamente os constituintes consagravam nos artigos 266. º a 272. º do nosso texto fundamental. Dir-se-á que o articulado governamental nenhum esforço demonstra para alcançar, como aliás lhe compete, as grandes metas do Estado democrático, do modo como ele se encontra concretamente estruturado entre nós.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Administração antes da Revolução do 25 de Abril consistiu fundamentalmente em garantir o statu quo, manter ou restabelecer a chamada «paz pública», vital para a sobrevivência do próprio regime deposto. A função primordial do aparelho de Estado era promover a aparência da concórdia em volta dos princípios informadores do Estado Novo, que pouco deferia aliás, na sua estrutura e organização, do sistema clássico da administração legalista liberal. Importava, antes do mais, garantir o desenvolvimento espontâneo do jogo social, recorrendo a um quadro de pequeno número de regras normativas, sendo as funções da Administração fundamentalmente da autoridade e de enquadramento, que se traduziam numa regulamentação concebida de um forma assaz restritiva, o mais das vezes com regras proibitivas do que permissivas ou positivas.
Os direitos subjectivos dos cidadãos, largamente condicionados e sem defesa conferiam ao Executivo e aos agentes superiores do Estado uma enorme margem de discricionariedade, e na matéria económica a actuação falhada da doutrina corporativa era largamente supletiva para os agentes económicos.
A Constituição que nos rege destruiu o sistema administrativo cujos traços mais evidentes ficaram sublinhados. O poder administrativo é hoje concebido como o instrumento activo da mudança social, uma técnica de gestão que visa promover o desenvolvimento económico e social do País e, por essa via, dirigir praticamente o conjunto das actividades dos cidadãos. As normas proibitivas clássicas cederam lugar às regras imperativas, capazes de acelerarem o progresso, o atributo de autoridade eclipsa-se perante a prestação de serviço e a mão visível do estado-providência alcança as zonas que outrora eram autênticos santuários da iniciativa privada.
O próprio recurso à planificação económica e social para, cito o texto constitucional «garantir o desenvolvimento harmonioso dos sectores e regiões, a eficiente utilização das forças produtivas, a justa repartição individual e regional do produto nacional, a coordena-
ção da política económica com a política social, educacional e cultural, a preservação do equilíbrio ecológico, a defesa do ambiente e a qualidade de vida do povo» obrigam a um papel activo dos agentes administrativos e a uma concertação entre os poderes públicos de um lado e o sector empresarial e as principais organizações económicas e sociais de outro.
Os contratos-programa, os contratos de promoção tecnológica, agora tão propagandeados, a reconversão dos serviços obsoletos em novos aparelhos, requeridos pela modernização do País nos mais diversos sectores, as novas formas de desconcertação, descentralização e a regionalização que tardam a chegar, todo este arsenal para garantir a eficácia das funções novas de direcção e promoção, pelo Estado, das suas incumbências prioritárias e outros objectivos consagrados na constituição, obrigam a uma transformação radical dos sistemas, até aqui ensaiados, da Administração Pública, central e local, nos moldes apontados no artigo 267.º da Constituição.
A Administração Pública será estruturada de modo a evitar a burocratização, a aproximação dos serviços das populações e a assegurar a participação dos interessados na sua gestão efectiva, designadamente por intermédio de associações públicas, organizações populares de base ou de outras formas de reprodução democrática, no dizer da lei.
Por outro lado, os novos direitos e deveres económicos, sociais e culturais, constituem o que a doutrina designa por direitos funções, em contraposição aos tradicionais direitos egoístas, na terminologia sugestiva de Babbio na sua conhecida obra La funzione promozzionale del Diritto, obrigam a uma produção administrativa que alguém chamou de verdadeira inflação regulamentar, isto é, a multiplicação quantitativa de regulamentos, portarias, despachos, circulares, instruções, directrizes, confidenciais, que substituem as tradicionais leis e decretos, provocando a depreciação valorativa destes.
Acrescem a tudo isto, as novas formas da administração corporativa - os contratos colectivos, a arbitragem dos conflitos mercantis, que são formas concorrentes da administração tradicional, reduzindo o seu carácter legalista e ampliando o domínio do intervencionismo técnico ou tecnocrático.
Finalmente, neste breve aperçu sobre o novo conceito de actividade administrativa não se pode ignorar o frequente conflito entre funções jurisdicionais e administrativas. De um lado, algumas jurisdições, como de família e de menores, aproximam-se de autênticas funções administrativas, ao passo que as inúmeras «comissões» instituídas no seio da Administração Pública exercem funções contenciosas originadas pela filosofia social proteccionista e intervencionista do Estado moderno.
Como promotor e garante de transformações profundas e estruturais de sociedade a Administração Pública, central e local que se deseja, pouco tem a ver com o aparelho obsoleto e antiquado que é incapaz de acompanhar as grandes justaposições que hoje são frequentes entre o chamado público e o chamado privado. E pergunto: estarão os nossos agentes administrativos, dirigentes e subordinados, prontos para trabalharem com organismos privados, para executar tarefas de interesse público? Estarão os nossos funcionários, superiores e subalternos, aptos para intervirem e executarem com competência e eficácia, as grandes estratégias macro-económicas fixadas pelos governos em exercício?
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Estarão eles mentalizados para saberem que actualmente, como ensina Flammine, que uma lei pode ser negociada e aplicada como um contrato e que um contrato pode desempenhar funções regulamentares e de administração geral? Saberão eles que hoje o «interesse social» não é necessariamente o interesse da maioria da colectividade?
As interrogações que acabo de fazer têm importância decisiva para a estruturação das carreiras da função pública e, muito especialmente para o artigo 6.º do articulado que trata da classificação de funções, são as de concepção, aplicação e execução, esgotando-se na sua mera definição, sem delas o legislador extrair todas as consequências, no âmbito das carreiras.
Trata-se de uma lacuna' fundamental do articulado, que denota a falta de uma visão global e de profundas interligações entre o papel da Administração Pública na própria dinamização do Estado e na organização da função pública.
Na verdade, esta classificação deveria, naturalmente, informar os quadros, o modo do seu ingresso, a divisão das carreiras e as formas da sua mobilidades horizontal e vertical.
O diploma que o Governo traz à nossa apreciação é um corpo estático, inerte, sem o dinamismo próprio exigido pela Constituição e pela via nacional, sem as preocupações de garantir a eficácia e a eficiência das decisões governamentais.
Não se pode deixar de lamentar, que tendo o actual Governo tantos meios materiais e humanos ao seu dispor, não tenha podido elaborar, com o tempo de que dispôs, um estatuto digno dos constituintes, que tanto empenho puseram na reforma de fundo da função pública.
Apenas e só porque é melhor ter alguma coisa, mesmo que insuficiente e larvar, mesmo que denote a incompetência e a ineficiência deste Governo, do que manter a absoluta estrutura existente, não votaremos contra esta autorização legislativa, mau grado o nosso desejo, pois desejaríamos votar contra.
Ela própria é incompleta, pois nada nos adianta quanto às opções sobre o pessoal dirigente. O actual Governo nada faz, nada deixa fazer, e assim, o verdadeiro estatuto da função pública ficará para nós, CDS, quando formos o governo que aí vem.
Aplausos do CDS.
O Sr. (Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Cunha e Sá.
O Sr. Cunha e Sá (PS): - Sr. Deputado Narana Coissoró, V. Ex.ª disse que o aparelho de Estado é obsoleto e antiquado. Sr. Deputado, nós não temos dúvidas disso.
As perguntas muito concretas que lhe faço são as de saber se haverá condições, sem custos sociais muito elevados e sem guilhotinas para, a curto prazo, resolver este problema da Administração Pública. Não tem este diploma algo de inovador que se aproxima bastante do estatuto dos funcionários públicos franceses?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, está inscrito mais um orador para lhe pedir esclarecimentos. Pergunto-lhe se deseja responder já ou no fim.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Respondo no fim,
Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.
O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Deputado Narana Coissoró, responder-lhe-ia, em primeiro lugar, que os senhores tiveram responsabilidades no II Governo Constitucional exactamente na área da reforma administrativa, tendo como Ministro o Dr. Rui Pena e como Secretário de Estado o aqui presente San-Bento Menezes, governo esse que surgiu da ligação, do acasalamento, entre o PS e o CDS.
Gostava de lhe perguntar se tem presente o programa do II Governo Constitucional e se é esse o tipo de melhoria que os senhores dizem querer em relação à função pública e à Administração Pública em geral. Faço-lhe esta pergunta porque água benta ..., presunção ... , etc, podê-la-á ter, mas em relação à realidade, lembramo-nos dos meses de Fevereiro a Julho de 1978! ...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Os senhores anunciaram um tipo de voto, isto depois de terem salientado a indefinição, a falta de substância da proposta de lei em discussão. Este é um tipo de oposição que os senhores usam e abusam e que faz com que os senhores tenham um pé dentro.
Gostaria de lhe perguntar se considera que o tipo de posição que anunciou tem alguma coisa a ver com a critica global que fez à política dos quadros dirigentes seguida pela proposta de lei. É que o Sr. Deputado pôs tudo na negativa e depois anunciou o tipo de voto que não coincide, e não é coerente, dir-se-á, com esse tipo de apreciação.
Gostava, pois, de saber se se fica nas suas apreciações judicativas e o que é que vale o voto do CDS.
Vozes do PCIIP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder; se assim entender, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Vou responder, em primeiro lugar, à segunda pergunta feita pelo Sr. Deputado Cunha e Sá, ou seja, aquela que tem a ver com o estatuto dos funcionários públicos franceses..
Naturalmente que a Constituição francesa não é igual à Constituição portuguesa, nem a tradição da função pública francesa é igual à tradição da função pública portuguesa.
Como deve saber, a nossa tradição de Administração Pública não se pauta pela tradição da Administração Pública gaulesa. O que sucedeu, depois da vitória dos socialistas foi que a Administração Pública francesa, na prática, se aproximou demasiado bem da gestão privada. Hoje, os grandes directores-gerais não são negociados entre as duas comissões; as pessoas pertencentes aos dois maiores partidos não se sentam, cada uma de um e outro lados da mesa, para, independentemente da competência e da eficiência, tirarem do bolso nomes de pessoas para as colocarem aqui ou acolá.
De nada serve ir buscar conceitos à legislação francesa e trazê-los para aqui, quando todas as tardes os jornais vespertinos nos dizem que os gestores, o pessoal dirigente são colocados de acordo com a sua fi-
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cha partidária, só têm que ver com o amigo ou o inimigo de determinado indivíduo nomeado pelo partido para escolher os gestores, os directores públicos, os técnicos, o pessoal dirigente ou profissionalizante, e mandar para as ortigas os estatutos que aqui se fazem.
Ao Sr. Deputado Cunha e Sá que se encontra sentado na bancada do Partido Socialista e é porta-voz do mesmo partido, pergunto-lhe se há alguma coerência entre a prática socialista de nomear o pessoal dirigente e aquilo que a proposta de lei de autorização legislativa pede.
O Sr. Cunha e Sá (PS): - Dá-me licença, Sr. Deputado?
O Orador: - Depois V. Ex.ª poderá usar da palavra.
O Sr. Deputado diz que nada se pode fazer na função pública porque há custos sociais, há guilhotinas.
O Sr. Cunha e Sá (PS): - Não foi isso o que eu disse!
O Orador: - De duas, uma: ou arcamos com os custos sociais e adaptamos o aparelho administrativo às reais necessidades do Estado moderno, às reais necessidades do Estado saído da revolução do 25 de Abril, ou então enchemos o aparelho obsoleto e antiquado do Estado - como V. Ex. e sabe, pois há pouco concordou logo comigo - de militantes e filiados do PS e do PSD e dizemos: nada podemos fazer porque o aparelho de Estado está inflacionado».
É a VV. Ex.ªs que cabe dizer quem devem guilhotinar. São VV. Ex.ºs que devem dizer se devem guilhotinar primeiro as comissões que se sentam para negociar os funcionários; se devem guilhotinar os próprios técnicos que enchem, incompetentemente, os quadros do Estado; se devem guilhotinar as próprias pessoas que aqui dizem uma coisa e depois vão às repartições dizer outras. É por aí que deve começar a grande guilhotina. Aliás, devemos, em primeiro lugar, guilhotinar esta coligação.
O Sr. Cunha e Sá (PS): - Olhe que não! Olhe que não!
O Orador: - Ao Sr. Deputado Anselmo Aníbal, direi que tivemos um ministro do nosso partido com a pasta da Reforma Administrativa. No entanto, não tivemos um primeiro-ministro que pertencesse ao nosso partido. V. Ex. º sabe muitíssimo bem que uma coisa é uma pessoa ter um Ministério a seu cargo e outra é uma pessoa definir a política global de um Executivo.
V. Ex.º sabe que o li Governo Constitucional não era um governo do CDS, mas era um governo do PS e tinha como primeiro-ministro uma pessoa do PS. Este governo tinha debaixo da mesa, e o seu partido é responsável por isso - mesa essa onde, entre outros, se sentava o Sr. Ministro Rui Pena - representantes vossos que, à surdina, negociavam com o Sr. Primeiro-Ministro e os ministros socialistas, de forma a ter uma mão no Partido Comunista e outra no CDS.
Foi isso que levou ao fim da coligação; foi isso que abriu o caminho para os governos presidenciais que depois se seguiram. O Partido Comunista foi o primeiro responsável para que nenhuma política fosse feita porque, volta e meia, obrigava o Partido Socialista a fa
zer cedências constantes nas chamadas reivindicações sociais, no chamado estatuto social.
Por isso mesmo este casamento não era, como V. Ex.ª disse, um acasalamento, mas uma poligamia de conúbio com o Partido Comunista e casamento legal com o CDS.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - V. Ex.ª é, portanto, como o Sr. Deputado Anselmo Aníbal, um dos principais responsáveis para que a política do II Governo Cosntitucional não tivesse ido avante. O Partido Socialista estava mais preocupado em dialogar, por intermédio do Ministro da Agricultura, com a Reforma Agrária e, por intermédio do Ministro da Saúde, com os serviços sociais que nada diziam, do que propriamente erigir o sistema e adaptar o aparelho administrativo às verdadeiras funções do Estado.
Como sempre dissemos, até hoje, não tivemos nenhuma responsabilidade global do governo e, tal como eu disse, a reforma da função pública só pode ser feita dentro de uma estratégia global, e não parcelar, da actuação do governo.
A função pública poderá melhorar com uma meta sectorial, porque é a coluna vertebral da estruturação do próprio Estado democrático. É isso que um governo pode fazer quando. tem a responsabilidade global. Um ministro do CDS, quando tem acima de si um primeiro-ministro do PSD, ou do PS ou de outro qualquer partido, não pode levar a cabo nenhuma obra sobre a Administração Pública ou sobre a função pública. 15so é impossível para definir uma política global. Só com as responsabilidades globais é que poderemos fazer uma reforma global do Estado e da Administração Pública.
Relativamente ao nosso voto, quero dizer que não vamos votar contra, mas - aliás, já o dissemos - vamos votar a favor. A única coisa que dissemos foi que é pouco, muitíssimo pouco, aquilo que se faz. No entanto, é alguma coisa em relação à sucata que actualmente temos. Portanto, quem limpa a sucata merece, pelo menos, a nossa aproximação valorativa e positiva. VV. Ex.ªs, votando contra, querem manter a sucata que temos.
Aplausos do CDS.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, é mesmo caso para dizer que peço a palavra para defesa da honra do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
O Sr. Presidente: - Nos termos regimentais, V. Ex.ª não pode invocar essa figura regimental porque ela não existe. O artigo 89.º do Regimento apenas concede que os Srs. Deputados possam invocar a figura regimental da legítima defesa quando se trata de defesa da honra própria.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Com certeza, Sr. Presidente. Nesse caso, peço a palavra para defesa da minha honra.
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O Sr. Presidente: - V. Ex.ª julgará.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da minha honra que, neste caso, simboliza a honra colectiva.
O Sr. Cunha e Sá (PS): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Assistimos aqui a um pedaço do debate parlamentar com uma linguagem algo promíscua.
O Sr. Deputado Anselmo Aníbal começou por falar do acasalamento entre o PS e o CDS, simplesmente o Partido Socialista fez um contrato com um partido adulto. O que parece é que o PCP quer acasalar-se com qualquer coisa que ainda está a nascer.
Risos de alguns deputados do PSD.
O Sr. Deputado Narana Coissoró falou numa linguagem de tal maneira promíscua que deu a sensação de que nós, socialistas, tínhamos relações do tipo - e já agora podia-lhe emprestar essa linguagem que não gosto de usar - amancebamento, relações marginais em relação aos contratos lícitos estabelecidos.
Quero dizer-lhe, Sr. Deputado Narana Coissoró, que o Partido Socialista fez contratos oficiais que são publicamente conhecidos. Tal como diz o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Dr. Rui Machete, o Partido Socialista fez contratos publicamente conhecidos, contratos esses que apenas não foram celebrados na Igreja.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Narana Coissoró pretende dar explicações?
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, simplesmente para dizer que ainda não alcancei por que razão é que a honra do Sr. Deputado Carlos Lage foi violada. Falou em adultério, amancebamento; isso são palavras técnicas, são palavras jurídicas, são palavras sociais. Agora, é que se compreende que o PS tenha um certo pudor em falar de aborto e, como tal, diz interrupção voluntária da gravidez.
Agora já percebo de onde é que vem esse pudor do Partido Socialista em utilizar as palavras comummente aceites pela nossa colectividade.
Risos do PSD e do CDS.
O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para usar a figura regimental do direito de defesa, nos termos do artigo 89.º do Regimento.
O Sr. Presidente: - Não dei conta de que tivesse sido ofendido. No entanto V. Ex. ª é que é portador desses valores.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para salientar ao Sr. Deputado Narana Coissoró que a sua intervenção - aliás, como outras que já se ouviram hoje - mostra bem que, quando as comadres se zangam, se sabem as verdades.
É curioso notar, mais uma vez, que 7 anos depois da situação que se viveu entre o CDS e o PS - e não refiro terminologias- para. não ofender conteúdos jurídicos de contrato -, a vossa situação esteve longe de
correr bem, como aliás, já o sabíamos. Contudo, a interpretação que agora é feita está longe dos preitos, das homenagens mútuas, dos dizeres que entre um e outro se travaram há 7 anos.
Já se passaram 7 anos, mas as palavras do Sr. Deputado Narana Coissoró mostram que os seus fantasmas históricos estão também acantonados nessa época de 78.
Quanto à sucata, -permitimo-nos- pensar que o aparelho de Estado terá, designadamente nos quadros dirigentes, muitos quadros de extracção nepotista oriundos de situações onde a sua emergência apenas vale o que vale, a sua adesão ou a sua filiação partidária.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado, chamar ao Sr. Secretário de Estado limpador primário de sucata..., eu não diria tanto! Julgo que o CDS, que esteve no governo com o Sr. Secretário de Estado, San-Bento Menezes, saberá quantas faz e o facto é que poderá, dentro do seu próprio partido e das suas diversas linhas, conferenciar com o Dr. Rui Pena sobre essa situação e sobre essa limpeza de sucata.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Narana CoissoTó pretende dar explicações?
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não, Sr. Presidente. As respostas já estão dadas na minha intervenção, assim como naquilo que eu disse ao Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Presidente: - Com certeza.
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, o sentido da minha interpelação é o de saber se a interpretação da Mesa quanto ao uso do artigo 89.º do Regimento é tão ampla que, na Assembleia da República, vamos criar a praxe de que a figura do protesto, que eliminámos aquando da revisão do Regimento, vai permanentemente ser agora substituída pela figura da defesa da honra.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a interpretação da Mesa é restritiva.Só que, infelizmente, não posso comandar o sentimento e a sensibilidade de cada um dos Srs, Deputados. Por isso, costumamos dizer que cada um é portador do respectivo valor, quando se sente ofendido.
Mau será que os Srs. Deputados usem e abusem desta figura regimental porque, daqui a pouco, ela degrada-se de tal ordem que, quando se falar em ofensas à honra, verificamos que não há ofensas nenhumas. O conceito que possamos ter do carácter das pessoas, certamente fica diminuído e degradado.
Aplausos do PS,do PSD e do CDS.
Agradeço que os Srs. Deputados passem a dar uma interpretação mais correcta acerca do sentido da sensi-
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bilidade das ofensas à honra para que não estejamos a degradar Lima figura regimental, que é muito nobre e justa, porque respeita aquilo que há de mais íntimo em cada um dos Srs. Deputados.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, é para dizer que concordamos que se faça uma interpretação autêntica e comedida deste preceito. No entanto, verifico que hoje o Sr. Deputado Luís Beiroco não está com muito bom humor.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Se me permite, Sr. Presidente, gostaria de chamar a atenção da Mesa para o facto de que o uso e o abuso que possa fazer-se da figura regimental do direito de defesa não será uso e abuso por parte dos deputados, mas reflexo do uso e abuso com que a maioria alterou o Regimento. Os resultados práticos estamos nós a vê-los aqui no dia-a-dia. Se uso e abuso houve foi nessa altura, e não agora.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Certamente que isso daria lugar a muitos protestos.
Srs. Deputados, chegámos à hora regimental para o intervalo. Interrompemos agora a votação e os Srs. Escrutinadores retomarão o trabalho às 15 horas, bem como esta sessão.
Está suspensa a sessão.
Eram 13 horas e 5 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 20 minutos.
O Sr. Presidente:- Para interpelar a Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP):- Sr. Presidente, creio que não há, neste momento, condições para iniciarmos os trabalhos.
Assim, solicito à Mesa que tome as providências necessárias para que tal se torne possível.
O Sr. Presidente:- Sr.ª Deputada, acontece que já temos as condições regimentais. No entanto, por uma questão de delicadeza, que, aliás, é habitual, gostaria que o CDS se fizesse representar.
Acabo de verificar que tal já acontece.
Tratou-se, portanto, de uma delicadeza por parte da Mesa, aliás, muito justamente devida a todas as bancadas.
Quanto ao resto, estão verificados os pressupostos necessários ao funcionamento da Assembleia.
Assim, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.
O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Manifestamente, em matéria de função pública, este Governo, este Ministro de Estado, este Secretário de Estado da Administração Pública optam pelos pedidos de autorização legislativa, em detrimento da apresentação atempada e fundamentada de propostas de lei.
É verificável e constatável que, no início da acção desastrada do ainda Governo, este veio aqui, sumária e quase displicentemente, dizer à sua maioria que queria produzir textos legislativos de que traçava mal o perfil, de que não definia a extensão. A maioria aprovou nessa altura e deu assentimento. O Governo legiferante produziu, como todos sabem - lembramo-lo aqui - um novo Estatuto Disciplinar, em vários aspectos balizado pelo autoritarismo e pela unilateridade decisória e por algum tom salazarento...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - ... produziu um conjunto de 5 diplomas que institucionalizaram a possibilidade de uma gestão de recursos humanos, assente na instabilidade e na precariedade dos vínculos de emprego, na dependência unilateral dos administrados face à administração e no potencial recurso ao despedimento sumário; produziu ainda, para OIT ver e para as CE certamente se congratularem formalmente, um diploma da chamada «negociação», instrumento definidor de uma parquíssima participação, de uma unilateridade decisória (por parte do Governo) e de um regime de fixação de condições laborais imposto e não negociado.
Este Governo, como sublinhámos, opta pelos pedidos de autorização legislativa em detrimento de proposta de lei certamente por razões, umas do foro confessável, outras menos confessáveis...
Mas essas razões não se confinam com o Estatuto desta Assembleia que não é propriamente uma instituição para passar autorizações legislativas - muito embora alguns gostassem que assim fosse - mas onde a plenitude da sua função legislativa deve ser exercida. Acresce que, no caso presente da proposta de lei n.º 78/III, este pedido de autorizações legislativas vem datado de Junho de 1984, esteve agendado em Julho, e, entretanto, em Novembro foi enviado às estruturas sindicais um projecto de decreto-lei que aborda esta matéria e que não é sequer citado nem referido em qualquer acrescentamento actualizador da proposta de lei. Sublinhe-se, ainda, que também não são referidos na proposta de lei quaisquer dados referentes aos textos que também sobre a problemática das carreiras, o Governo assinou em 22 de Janeiro de 1985. Só tarde e a más horas nos foi enviado um texto do articulado. Acresce que, nos considerandos, o Governo leviana e apressadamente diz que « não lhe é possível pormenorizar, desde já, os aspectos que, concretamente, serão objecto de produção normativa» porque há o direito de participação estabelecido no Decreto-Lei n.º 45-A/84, de 3 de Fevereiro. É de todo em todo inovatoriamente escandalosa a teoria subjacente à apresentação de uma proposta de autorização legislativa que o Sr. Secretário de Estado aqui defendeu, em detrimento de uma proposta de lei substantiva. 15to prova, apenas e mais uma vez, que este Governo prefere assumir os problemas, tentando silenciar os seus adversários, o que traduz um claro intento anticonstitucio-
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nal, de igualha paralela a outras iniciativas que estão É um autêntico maná de dispensas, fazendo lei o que
nesta Assembleia. deveria ser excepção, verdadeiramente excepcional e
sendo um escândalo!
Vozes do IPCP: - Muito bem!
O Orador: - A autorização solicitada é para legislar em matéria de estatuto do pessoal dirigente, por um lado, e para legislar em matéria de estrutura das car
reiras, por outro lado.
Invocam-se, globalmente, «razões de experiência» em relação aos Decretos-Leis n.ºs 191-C/79 e 191-F/79.
Pretende-se - peço a atenção dos Srs. Deputados - «tornar mais rigorosa a selecção do pessoal dirigente».
Como e de que forma? Estabelecer-se-á ainda uma maior e mais cuidada divisão de lugares dirigentes, tendo em conta as condições partidárias no seio da
ainda maioria e no percentual respectivo das suas diversas tendências? Enquadrar-se-ão as competências dos
adversários políticos em prateleiras de ocasião? Era necessário que a proposta dissesse alguma coisa sobre isto.
É que, para estes efeitos, a chamada «maior maioria» alarga-se tripartidariamente ao CDS, como no caso já notoriamente público do Instituto do Emprego e Formação Profissional tutelado pelo Secretário de Estado do Emprego, entregue ao viajado Dr. Rui Amaral, e no caso do INA, agora entregue a um ex
-secretário de Estado da AD, de extracção CDS.
O Sr. João Amaral (PCP): - É tudo em família!
O Orador: - Visa-se também na proposta de lei «definir claramente os direitos e deveres do pessoal dirigente». Como e de que forma? Na vacuidade e na ino
cuidade de umas frases de ocasião? Na outorga de novos poderes disciplinadores de carácter arbitrário? Ou os senhores estão a ver isto relacionado com ditames
da famigerada Lei de Segurança Interna?
Visa-se também conferir ao pessoal dirigente « estabilidade profissional e criar estímulos compensatórios graduados em função da experiência e do grau de res
ponsabilidade e de complexidade dos respectivos cargos». É curioso que o Governo fale de estabilidade profissional para dirigentes. O que pretendem? Pretendem
que o dirigente nomeado fique para sempre? Pretendem acabar com o instituto da comissão de serviço?
Em variados casos, estamos perante dirigentes - já o dissemos - que só o são por se terem predisposto à sujeição nepotista. Por outro lado, e em relação a ou
tra alínea da proposta, lembramos que, aceitando globalmente a necessidade de os salários serem em função da função e de se perspectivar um leque salarial
de enquadramento negociado que diferencie o que deve
ser diferenciado, não aceitamos a discriminação privilegiatória do pessoal dirigente, que o diferencie de modo ostentatório e que diminua ou impeça possibilidades de trabalho conjunto entre dirigentes e não diri
gentes.
Outra alínea diz curiosamente que é de «exigir formação técnica e científica adequada à natureza e complexidade das funções». Aproveitámos a sua presença
aqui, Sr. Secretário de Estado da Administração Pública, para lhe pedir uma indicação sobre o que acha, eticamente e a nível de gestão, do volume de despa
chos de variadas proveniências (cerca de 140 portarias), dispensando os requisitos legais exigíveis para a nomeação em cargos dirigentes.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Dever-se-ia, contrariamente a esta proposta de lei, e em texto substantivo, apresentar à Assembleia da República proposta em que fossem definidas as competências genéricas do pessoal dirigente, a definição dos níveis de chefia e funções de parâmetros concretos, adequados à heterogeneidade da realidade organizacional da Administração Pública e o disciplinar dás regras de recrutamento de pessoal dirigente.
Esta proposta de lei visa também alterar o quadro de carreiras.
Sublinhe-se, em primeiro lugar, que, em todas estas carreiras, o problema fundamental da Administração Pública é o da indispensabilidade da revisão dos quadros orgânicos, no sentido de as dotações orgânicas corresponderem aos recursos humanos existentes, o que a proposta de lei nem refere. Em relação ao pessoal técnico e ao pessoal técnico superior anuncia-se a identificação e autonomização das áreas funcionais e específicas, o que é manifestamente um anúncio sem sequência.
` O Sr. José Magalhães (PCP): - Bem observado!
O Orador: - Naturalmente que se pretenderá criar novas perspectivas de acesso a alguns quadros técnicos, e isso será positivo, mas dever-se-á também atender às alterações das dotações dos quadros orgânicos. É o problema das alterações orgânicas, problema nodal da estrutura de carreiras. As alíneas são a evasiva. Nos documentos que conhecemos, salienta-se o problema do retorno dos quadros dirigentes às letras cimeiras da função pública e daí o poder pensar-se que as novas letras, designadamente as letras D e A, para os assessores se destinam fundamentalmente, mais do que a promover novos horizontes para a generalidade desses técnicos, a serem uma área de reserva para os assessores, resultante do retorno de chefia. Aliás, nas carreiras técnico-superiores, técnicas e técnico-profissionais, não se introduzem quaisquer elementos com vista à sua revalorização, limitando-se os textos conhecidos a potenciar a criação de novas categorias, o que vem contrariar expectativas e atropelar situações.
A classificação de serviço é mantida em regime que favorece a subjectividade - que é naturalmente uma inerência da classificação e da apreciação de outrem porque não alarga o conjunto dos apreciadores notadores, nega e substancia a aleatoriedade dos resultados obtidos e é promovida a requisito de acesso a classificação de Muito Bom, o que vai permitir naturalmente a justificação da permissibilidade dos Muito Bons, o que contraria naturalmente qualquer princípio mínimo de docimológico ou até de apreciação em termos de carreira nas empresas. Noutras carreiras a situação é semelhante, resumindo-se na criação de categorias - voltamos a salientar - que não garantem quaisquer obrigações de adequação de quadros, nos termos do artigo 44.º do texto, o que representa, no fundo, uma promessa eleiçoeira para contentar, naturalmente, expectativas mas não para criar situações.
0 Sr. José Magalhães (PCP): - Bem observado!
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O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por último, a indicação global de que esta proposta de lei vem a esta Assembleia num quadro de funcionamento da função pública, que tem como característica de fundo a aplicação dos pacotes de 1984 e da penúria orçamental para a função pública. É significativo, e não esquecemos, que na proposta de lei do Orçamento do Estado foi significativa a imposição pela maioria de algumas acções contra os trabalhadores através da criação de condições para a criação de milhares de excedentes. Continua a manter-se a situação: perspectivam-se inúmeras acções - aparentemente pontuais contra milhares de trabalhadores, abusivamente apelidados de tarefeiros, a quem são negados os direitos Laborais fundamentais.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sublinhamos aqui que estamos perante uma política de redução das despesas públicas, no intento de esvaziar o Estado das suas funções sociais e de reduzir os custos do consumo público em áreas insubstituíveis para serviço das populações. Se ligarmos tudo isto, isto é, a redução dos serviços públicos, a diminuição dos empregos na administração central, o desmuniciamento da administração local, a sobrecarga de atribuições às autarquias sem transferência de recursos, verificamos com clareza que os intentos do Governo na área da Administração Pública não prosseguem os fins constitucionalmente expressos.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O Governo, nesta como noutras áreas, atenta contra a Constituição, atenta contra o direito dos trabalhadores da função pública ao trabalho e à estabilidade do emprego, atenta contra a dignificação das suas funções, pretendendo, até, impor-lhes um estatuto de delatores no exercício de um chamado dever de colaboração.
Feita na presunção de menorizar a Assembleia, tida aqui como mera aprovadora de autorizações, quem sai daqui menorizado, mais uma vez, é este Governo, que apresenta em Março de 1985, sem qualquer actualização, um texto de Junho de 1984, infundamentado e incorrecto.
Daí a nossa conclusão: esta proposta de lei traduz uma política incorrecta em termos de Administração Pública, procurando entretanto, em ano eleitoral, dourar algumas expectativas que são apenas expectativas e que não serão, naturalmente, realidade.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Cunha e Sá.
O Sr. Cunha e Sá (PS): - Sr. Deputado Anselmo Aníbal, eu não tive oportunidade de ouvir a primeira parte da sua intervenção e por isso vou ater-me apenas à sua segunda parte.
O Sr. Deputado referiu, a propósito do acesso e promoção na carreira, designadamente quanto aos assessores, que os assessores do 1.º grau se destinavam à retoma de dirigentes.
Aqui há que ter em conta um aspecto legal mais ou menos recente, isto é, a ida à categoria de assessor proveniente da categoria dirigente, como também o dis-
posto no n.º 19 do projecto de decreto-lei sobre o regime de carreiras.
Ora, parece-me exagerada a expressão que o Sr. Deputado utilizou, isto é, que diga que é a «retoma de pessoal dirigente» até porque está perfeitamente determinada a forma como essa promoção se irá realizar.
A outra pergunta que lhe faço tem a ver com a classificação de serviço. Devo dizer-lhe que, nesta matéria, não tenho muitas reservas relativamente ao que V. Ex.ª disse. De qualquer modo, gostaria de ficar esclarecido sobre qual seria o âmbito da própria classificação e quais seriam as propostas que eventualmente viriam melhorar este aspecto.
Quero dizer que este diploma ainda vai ser objecto de apreciação por parte das associações sindicais e era importante que V. Ex. e aqui pudesse manifestar a sua posição neste caso concreto.
O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.
O . Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Deputado Cunha e Sá, agradeço-lhe as questões que me colocou.
Vou responder, em primeiro lugar, à que se refere à classificação de serviço, acentuando que o artigo 45.º do projecto do decreto-lei que, tarde e a más horas, o ainda Governo fez chegar à Assembleia, permite concluir que não estamos apenas perante uma autorização legislativa mas, sim, perante diversas autorizações legislativas.
O Sr. Deputado certamente tem presente que, em relação ao artigo 45.º, se identifica que, sem prejuízo de se manter em vigor o actual sistema de classificação de serviço, a Secretaria de Estado ponderará a conveniência da sua revisão, tendo em conta a sua adequação às finalidades que visa e à forma como vem sendo aplicado.
Dir-se-á, portanto, que é uma autorização legislativa que nunca mais acaba. Aliás, logo na análise introdutória ao diploma, o Sr. Secretário de Estado pôs o problema de saber os limites constitucionais da sua acção e se este tipo de diploma teria que vir à Assembleia da República.
Nós respondemos-lhe que sim, mas, pelos vistos, há aqui formas degenerativas de aplicar a classificação de serviço com mais uma autorização legislativa.
Em relação ao retorno de chefias devo dizer-lhe que é fundamentalmente um problema das dotações dos quadros, ministério a ministério e que em relação à situação dos assessores, independentemente da sua disciplina legal geral, há, de facto, quadros que serão criados fundamentalmente para retorno de chefias. É que o conjunto das promoções a chefias muitas vezes, como nós sublinhamos e sublinhámos, sendo apenas escolhas demasiado discriminatórias e pouco assentes, têm depois o ónus da recolocação da pessoa.
O Sr. Cunha e Sá (PS): - Podem não ter!
O Orador: - Terão, terão. Nós sublinhamos que o retorno das chefias é que vai tapar muitos dos quadros dos assessores, assim como sublinhamos que não é a carreira técnica que vai ter o horizonte mais largo.
São exactamente chefes feitos made in AD ou made in governo PS/PSD que retornarão às carreiras, retirando lugares aos técnicos que preferiram a sua carreira normal.
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O Sr. Deputado Cunha e Sá naturalmente conhecerá casos destes, designadamente no Ministério da Agricultura.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Algum tempo utilizado pelo Sr. Deputado Anselmo Aníbal foi-lhe cedido pela UEDS.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cunha e Sá.
O Sr. Cunha e Sá (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Começamos por adiantar uma questão prévia:
Com vista à discussão da proposta de autorização legislativa n.º 78/III, havíamos preparado duas intervenções distintas: uma, perspectivada em reflexões de âmbito e natureza mais estrutural da Administração Pública, em estreita correlação com a temática em apreço; a outra, balizada em aspectos sublinhadamente concretos e aplicados, mais de acordo com a temática do regime e estruturas das carreiras do estatuto do pessoal dirigente.
Hesitámos, ainda, em fundir ambas numa só. Como o não fizemos, e em função da opção que tivemos, a presente intervenção prende-se com aspectos mais conjunturais e numa perspectiva das estruturas da Administração Pública.
Pareceu-nos pertinente começar esta segunda intervenção reproduzindo a posição muito recentemente assumida pelos professores de «Ciência Administrativa» da Universidade de Amiens; respectivamente Jacques Chevallier e Danièle Loschak quanto à especificidade da Administração Pública como aparelho do Estado. Vamos citar:
Enquanto que os homens políticos eleitos são investidos das responsabilidades de impulso e de controlo, os funcionários nomeados, inseridos em estruturas burocráticas, são confinados a tarefas de execução. Se combinarmos estes dois critérios, a administração pública pode ser definida como a instituição encarregada, sob a autoridade dos eleitos políticos - directa ou indirectamente, avançamos nós - de defender e promover o interesse geral da sociedade.
Podemos, contudo, encarar a Administração Pública num conceito mais descritivo qual seja o sistema ou estrutura organizacional de administração especializada,
profissionalizada, departamentarízada e hierarquizada com o objectivo de preparar e depois aplicar as decisões tomadas pelo poder político.
E chamamos-lhe «sistema organizacional» por inserir duas conotações básicas e essenciais: a primeira, por se constituir num conjunto de «órgãos hierarquizados» - entenda-se, grupo coerente de pessoas reunidas para exercer funções afins ou complementares entre si -; a segunda, por dispor de procedimentos e normas de funcionamento preestabelecidas:
Igualmente designámos a Administração Pública de «estrutura organizacional», por, no nosso entender, representar a articularão num todo, de diversos órgãos e funções, isto é, uma composição harmónica -. ou que se pretende harmónica - de funções a serem exercidas por um número determinado de «agentes» que se articulam em órgãos e interagem entre si.
É com base nestas considerações conceptuais que entendemos carecer a Administração Pública de uma adequada racionalização de estruturas e de meios - que reconheço tem vindo ultimamente a ser encarada -, ainda, da subsequente aplicação de medidas programáticas, inovadoras e pragmáticas que «desencalhem» esta «máquina» tão pesada, tão onerosa, tão emperrada, tão burocrática e, o que é mais grave, tão pouco credível quanto. eficiente, quando encarada no seu todo. E tais maleitas vêm já de muito longe. Mas, não se cometa o erro de confundir «problemas estruturais e de gestão da Administração Pública com a dedicação, a capacidade, o interesse e a competência», da maioria dos trabalhadores da função pública, como aliás tivemos a oportunidade de destacar na intervenção que produzimos nesta Câmara em 13 de Julho de 1983.
Em resumo: não estão postas em causa as potencialidades e a auto-realização, através do trabalho, dos trabalhadores da função pública.
A abordagem da questão e, em especial, a identificação das atitudes a tomar, como método de reflexão e reapreciação, reflectir-se-ia, no nosso entender, no encarar dos seguintes aspectos metodológicos: em primeiro lugar, a identificação e indexação dos grandes tipos - distintos - de actividade, ou seja, a determinação dos módulos autónomos de «operações inter-relacionáveis», respeitando, sempre, como é óbvio, a componente e os objectivos políticos programáticos, a partir do mais alto nível.
Estamos em teoria (note-se), perante. a questão: quantos ministérios? que secretarias de Estado?
Um segundo estádio de aproximação de identificação de estruturas contemplaria a avaliação e posterior agrupamento lógico das actividades, ou seja, a departamentalização, seus sistemas e subsistemas, criando-se a correspondente estrutura das unidades organizacionais, com funções, competências e clientelas afins (ou seja, o «destinatário»).
Estamos perante a definição de quais e quantas as direcções gerais ou serviços equiparados e sua implantação geográfica.
Por último, uma vez vencidos os conceitos metodológico-estruturais anteriormente referidos, e para cobertura das estruturas entretanto definidas, seriam encarados os aspectos remanescentes, quais sejam a quantificação dos meios humanos, patrimoniais e financeiros. (neste último caso com a aplicação da metodologia já anunciada de orçamentos de «base zero»).
Sob pena de grandes e graves injustiças e elevados custos sociais, a metodologia preconizada deverá ser definida num horizonte temporal tal, que evite-os inconvenientes mencionados.
Entretanto, com base nos pressupostos descritos e numa perspectiva de relações formais de autoridade - ou seja, a capacidade formal de agir -, haveria que distinguir os seguintes níveis, no nosso entender, perfeitamente diferenciados numa óptica hierárquico-funcional e então já numa fase de aplicação 'em concreto.
Um primeiro nível, o do Governo e diferentes ministérios, a quem cabe definir, no respectivo programa e nos termos da Constituição, seu artigo 191.º «[...] as principais orientações políticas e medidas a adoptar ou a propor nos diferentes domínios da actividade governamental» e a submeter à apreciação, para assentimento (ou não) da Assembleia da República (artigo, 195.º da Constituição).
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Poder-se-á dizer que este primeiro nível é essencialmente político - e substantivo - (razão, consequência e emanação dos actos eleitorais em democracia), conforme, aliás, se infere das leis orgânicas dos diferentes ministérios, cujos objectivos, sempre com base no programa de Governo, se materializam no estabelecer, concretizar e coordenar as respectivas finalidades adentro da esfera específica em que se insere cada ministério.
No mesmo âmbito (das estruturas), este primeiro nível é assessorado por serviços de concepção e coordenação sectorial, apoiados ainda em «serviços instrumentais de apoio» (vulgarmente designados de «administrativos»).
A um segundo nível, funcionarão serviços e organismos centrais de cada ministério com funções - adjectivas - de assessoria especializada, cujas actividades de promoção, coordenação e orientação respeitam os diferentes ramos de especialidade.
Inserem-se neste nível as direcções gerais centrais ou organismos equiparados.
Articulam-se a montante com o nível ministerial e a jusante com os serviços ditos «operativos» ou «de linha», sejam eles sedeados em Lisboa, se for caso disso, ou regionais.
Não devem dispor de uma dinâmica executiva e ou operativa.
Os seus quadros deverão ser formados por técnicos altamente especializados nos diferentes ramos adentro do seu próprio âmbito de responsabilidade funcional.
Para a prossecução das suas atribuições e competências, não necessitam de elevados meios humanos, financeiros ou patrimoniais posto que as actividades de promoção, coordenação e orientação se desenvolvem numa perspectiva de ideação e concepção e não de execução (operativas). Acresce que o suporte de apoio instrumental deve ser de reduzida dimensão.
Anómala e, até, irresponsavelmente, nos últimos 15 a 20 anos temos vindo a assistir a um empolamento dos referidos meios, e em especial, das correspondentes estruturas departamentais, quando se trata de serviços cujas estruturas já há muito deveriam considerar-se estabilizadas em termos de efectivos e de estruturas departamentais.
Um terceiro nível abrange exclusivamente os serviços operativos com funções de exclusiva execução.
Tais departamentos devem ser inequivocamente dotados de meios humanos, financeiros e patrimoniais que permitam a concretização das suas competências de índole, vocação e atribuição operativa.
Os seus quadros não deverão ser constituídos por técnicos especialistas tout court, mas sim por agentes especializados, por grandes sectores e generalistas, capazes de abranger um leque diversificado de actividades, apoiados por técnico-profissionais em número e qualidade que permitam cobrir com eficiência a sua área de influência e espaço geográfico de responsabilidade.
Os meios patrimoniais e financeiros deverão poder suportar as necessidades do seu normal funcionamento, sem empolamentos.
Um quarto nível - o da investigação - terá o âmbito próprio das actividades relacionadas com a investigação quer no campo da concepção e coordenação quer no da própria execução, como o são os da «ideação/experimentação», sendo relevante destacar que deverão operar sempre não deslocados dos contextos próprios, isto é, actuando próximo das realidades concretas envolventes.
Independentemente dos níveis mencionados e para que o sistema funcione de forma articulada e uma melhor prossecução dos objectivos de cada uma das partes do sistema - isto é, da Administração Pública no seu todo - seria irrealista não prever a existência de um órgão que garantisse a fidelidade funcional, no fundo, o indispensável feed back.
Estaríamos vocacionados para o desempenho de funções desta natureza, aquilo que vulgarmente se designa por «inspecção», mas, é imprescindível referi-lo, com métodos de trabalho, dinâmica e actuação ajustados a uma nova ordem e a uma nova realidade.
Eis, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, tão-só e de forma sucinta e nos 10 minutos regimentalmente estabelecidos os grandes princípios que, em nosso entender, deverão presidir a uma reestruturação, redefinição e inovação de estruturas da Administração Pública, num horizonte temporal mais ou menos alargado.
Eis, igualmente, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, as razões que .nos levam a considerar inoportuna a criação de uma «lei de bases» da Administração Pública.
Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
V. Ex.ª vai continuar a utilizar o tempo que a UEDS cedeu ao PCP.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, sem querer abusar da bondade da UEDS, vou utilizar o tempo que nos cedeu para fazer uma pergunta muito simples.
Sr. Deputado Cunha e Sá, tivemos muito gosto em ouvir a sua intervenção e podemos dizer que, no essencial, estamos de acordo com ela. Digamos mesmo que se tratou de uma intervenção que aplaudiríamos se se tratasse de um seminário promovido em torno do que deve ser a gestão da Administração Pública em Portugal. Mas, Sr. Deputado Cunha e Sá, como compreenderá, estamos a tratar de um assunto muito concreto. Trata-se da proposta de lei n.º 78/III, proposta de lei que visa autorizar o Governo a legislar em dois sentidos: o primeiro, o estatuto do pessoal dirigente, sobre o qual não sabemos o que o Governo quer fazer e o segundo, as carreiras da função pública, de que conhecemos, pelo menos, um mínimo de intenções. E, conjugando os materiais que já conhecemos, estão longe de corresponder às intervenções feitas pelo Sr. Deputado aqui na. Assembleia da República sobre esta matéria.
Aliás, deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado Cunha e Sá, que estamos ainda muito longe - o Sr. Deputado terminou desta maneira - de a Assembleia da República ser chamada a deliberar sobre as bases, o regime e o âmbito da função pública.
Não é isso que estamos a tratar. Estamos a tratar de coisas bastante mais simples e, portanto, Sr. Deputado Cunha e Sá, vamos saber se as suas posições estão ou não de acordo com o texto que nos é trazido aqui pelo Governo, se as suas preocupações estão contempladas nesse texto e nas intenções do texto que não existe.
E uma última interrogação: tudo o que o Sr. Deputado disse tem alguma coisa a ver com a actual Lei Orgânica do Governo? Julga o Sr. Deputado que é pos-
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sível com a actual Lei Orgânica do Governo avançarmos no sentido que V. Ex.ª deixou expresso na intervenção que acabou de fazer?
O Sr. Presidente: - Se desejar responder, tem a palavra o Sr. Deputado Cunha e Sá.
O Sr. Cunha e Sá (PS): - Sr. Deputado Jorge Lemos, logo no início, tinha dito que era intenção de ambos e que tinha correlação com o processo que estávamos a discutir. E tem porque, sem estruturas departamentais definidas - e acabei a minha intervenção dizendo-o -, não é oportuno ter uma lei de bases, porque, efectivamente, esta constelação, que é o problema da Administração Pública, é mais pesado do que muita gente pensa, uma vez que se traduz numa despesa de 500 milhões de contos com pessoal, 57 milhões de contos em despesas correntes, etc., e muito pouco se discute aqui na Assembleia. Aliás, nem os seus problemas aqui têm audiência - quero referi-lo concretamente.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - E de quem tem sido a culpa?
O Orador: - A culpa é de todos nós, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Só não discutimos aqui o problema da função pública porque a maioria o não tem permitido.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, só poderá interromper o Sr. Deputado Cunha e Sá se ele o permitir.
O Orador: - Sr. Presidente, parece-me saudável esta troca de impressões.
O Sr. Presidente: - Ainda bem que o Sr. Deputado assim o entende.
O Orador: - Devo dizer ainda que as considerações que fiz são doutrina que considero dever fazer parte da constelação a que me referi. Trata-se, assim, de uma posição que, na sua globalidade, não desvirtua o texto da proposta de autorização legislativa, aproximando-se, efectivamente, de uma das estrelas dessa constelação.
O Sr. Jorge (Lemos (PCP): - É muito pequenina!
O Orador: - Não é pequenina, não, Sr. Deputado. Penso, mesmo, que ela é bastante grande.
Aliás, tenho que referir aqui o esforço que um jovem secretário de Estado - que, por sinal, é meu camarada - tem feito, ' com base nesse pacote legislativo do ano passado, para aumentar as estrelas desta constelação, para a completar de modo a podermos, depois, caminhar para uma lei de bases da função pública.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O Sr. Deputado dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Cunha e Sá, já percebi que se trata apenas de uma estrela de
uma grande constelação. Mas, ainda assim, se o Sr. Deputado Cunha e Sá nos conseguisse dar a ideia de a quantos anos-luz está essa estrela, em termos do que o Sr. Deputado aqui defendeu e que nos parece tratar-se de princípios objectivos e, de alguma maneira, correctos, seria muito positivo.
O Orador: - Eu não sou famoso em astronomia mas devo dizer-lhe que, em termos de luz, estamos bastante mais perto do que o Sr. Deputado pensa.
Mas repare que quando digo que é uma estrela da constelação que é a lei de bases, o é de facto porque, como sabe, há estruturas, há os aspectos patrimoniais, financeiros, relativos a criações departamentais e por aí fora.
Portanto, penso que temos que começar por uma. Começámos por onde pudemos. E penso que é correcto começar pelo pessoal. E até lhe digo mais: se esta proposta fosse apresentada pela vossa bancada teria certamente a aceitação de todas as bancadas.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Há-de convir que nunca apresentaríamos uma proposta destas.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço aos senhores representantes dos grupos e agrupamentos parlamentares o favor de se dirigirem ao meu gabinete a fim de efectuarmos a conferência de líderes que foi combinada e a que deram o respectivo acordo.
Para me substituir, peço a presença do Sr. Vice-Presidente José Vitoriano, a fim de prosseguirmos com os trabalhos.
Pausa.
Entretanto, assumiu a Presidência o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições na Mesa. Se mais nenhum Sr. Deputado deseja intervir, daria a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Administração Pública.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública (San-Bento Menezes): - Sr. Presidente, agradecia que me dissesse de quanto tempo disponho a fim de o poder administrar criteriosamente.
O Sr. Presidente: - Dispõe de 11 minutos, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação ao presente pedido de autorização legislativa farei uma intervenção muito breve, mas creio que se impõe.
Começaria por responder à bancada do CDS, que falou através do Sr. Deputado Narana Coissoró. Registaria que o Sr. Deputado atrás citado fez a defesa dos princípios constitucionais em matéria de Administração Pública, os quais, aliás, subscrevo, bem como o Governo, e que estão subjacentes à proposta apresentada por este último.
Relativamente ao Sr. Deputado Anselmo Aníbal, respondi já a uma das questões por ele colocada, ou seja, a respeitante à opção pelos pedidos de autorização legislativa em detrimento de propostas de lei.
No que concerne à questão das críticas feitas pelo Sr. Deputado ao chamado «pacote» de 3 de Fevereiro,
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dir-lhe-ia que quanto à objecção apontada no respeitante à precariedade do emprego não consta que este Governo tenha feito despedimentos na função pública. É uma evidência que não o fez.
Quanto ao qualificativo de «salazarentos», devolvê-lo-ia ao Sr. Deputado e ao seu grupo parlamentar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em relação às chamadas portarias de alargamento das áreas de recrutamento, que são solicitadas por todos os ministérios, registo que o Sr. Deputado faz a defesa do elitismo no que respeita à nomeação de lugares de chefia e, por outro lado, sublinho que se trata de pedidos que vêm de todos os ministérios, o que significa que a lei não corresponde às necessidades concretas.
Finalmente, quanto à crítica respeitante ao pessoal dirigente e ao clientelismo no que toca a esse mesmo pessoal, lembraria ao Sr. Deputado - o que não gostaria de fazer, mas vejo-me obrigado a isso - que o seu partido liderou, o que tem ainda sequelas na Administração, o processo de saneamentos sem precedentes na Administração Pública portuguesa. Mas para deixar clarificadas algumas questões, em relação às quais convém de facto dar transparência, sublinho que quanto às carreiras do pessoal da função pública a proposta de lei do Governo cria condições para, fazendo apelo ao esforço individual, premiar os mais aptos, contrariando, ao mesmo tempo, a massificação inerente e a apologia da mediocridade que vinha sendo praticada, dar o devido relevo à qualificação profissional, não desvalorizando, obviamente, as habilitações académicas, e ainda dar o devido relevo às funções exercidas, à classificação, à mobilidade, o que também não vinha a acontecer como devia.
Quanto ao estatuto do pessoal dirigente, dá-se ou vai dar-se a esse pessoal maiores garantias de estabilidade e um regime mais favorável para o exercício das suas funções. Trata-se ainda de dotar a Administração de condições que hão-de permitir, ao nível desse pessoal, melhorar a qualidade da gestão pública em geral.
No que concerne à questão da participação das organizações sindicais dos trabalhadores da Administração Pública, no iter legislativo referente aos projectos das carreiras, alguns Srs. Deputados do PCP e do MDP/CDE intervenientes no debate abordaram essa questão em termos que têm de ser esclarecidos. E abordaram-na de uma forma que é firmemente rejeitada pelo Governo.
Relativamente a esclarecimentos que, todavia, são devidos nessa matéria, o Governo sublinha que, no respeito pela lei da negociação, foram constituídas comissões técnicas com representantes da Administração e das organizações sindicais em presença, para efeitos de tornar mais profícua a participação destas organizações na preparação do futuro texto legal das carreiras.
Sublinho ainda que não foram acolhidas as sugestões dessas organizações, que se traduziam em reclassificações automáticas de funcionários, por isso não ser financeiramente comportável e também por não contribuir para a lógica de selecção dos mais aptos, sendo esta a da proposta do Governo.
Sublinho, por último, que foi acolhida a intercomunicabilidade reivindicada por todas as organizações sindicais e também múltiplas sugestões sindicais, quanto à criação de novas categorias de progressão nas diver-
sas carreiras. Faço notar, a título de curiosidade, que, globalmente, neste aspecto, se foi mais longe do que a chamada comissão negociadora sindical pretendia.
Rejeitam-se as críticas e os processos de intenção formulados pelos Srs. Deputados do MDP/CDE e do PCP. E, a fim de que conste, para além da intervenção destes Srs. Deputados, o Governo quer deixar muito claro, para que não fique qualquer dúvida a pairar, que, sendo o autor da primeira lei portuguesa relativa à negociação colectiva dos trabalhadores da Administração Pública - lei que lhes reconheceu, no plano da jurisdicidade, esse direito de há muito reivindicado - e que sendo parte do primeiro e do segundo acordo firmados em Portugal entre a Administração e organizações sindicais da função pública, não recebe lições, não aceita conselhos impertinentes e dispensa o paternalismo e a demagogia dos Srs. Deputados intervenientes do PCP e do MDP/CDE.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que tem de reconhecer-se que o Governo tem defendido, de facto, apesar das limitações conjunturais de natureza financeira que são conhecidas, os interesses dos trabalhadores da Administração Pública, servindo o objectivo fundamental do processo de modernização administrativa e da melhoria dos serviços prestados aos cidadãos.
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
V. Ex.ª dispõe de 1 minuto para intervir.
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, 1 minuto é suficiente.
Intervinha apenas para informar a Câmara, e muito particularmente o Sr. Secretário de Estado, que o meu colega de bancada Narana Coissoró teria muito gosto em estar aqui a ouvir os esclarecimentos finais do Sr. Secretário de Estado e se não está é porque, em virtude das suas responsabilidade partidárias, tinha uma actividade fora de Lisboa que estava marcada antes de se poder prever o término deste debate.
O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Mas o Sr. Deputado já não tem tempo.
O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Presidente, o MDP/CDE concedeu-me algum.
O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública não nos surpreende, mas queremos reiterar aqui, mais uma vez, o tom enfastiado, pavónico, de alguma insolência para a Assembleia da República...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - .. . que V. Ex.ª Dr. San-Bento Menezes utilizou, designadamente para com a minha ban-
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cada. Não é, propriamente, por enfatuar o discurso que consegue diminuir o «vazio».
O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O que o deve envergonhar é a propositura de uma proposta de lei de autorização legislativa que não honra quem a apresenta.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!
O Orador: - Na verdade, se o Sr. Secretário de Estado estivesse ali sentado como esteve ou a escrever artigos como em 1979, durante o consulado «motapintista», em que sublinhou aspectos negativos do «motapintismo» dessa altura, embora tenha feito parte de um governo co-dirigido pelo Dr. Mota Pinto, assistindo ou verificando o texto de uma proposta de autorização legislativa tão vazia, certamente consideraria que o Governo minorava ou tentava minorar a Assembleia da República. Daí que o enfatuar o discurso, como o fez, e até o tom - volto a reiterar - de alguma insolência que utilizou, não nos amedronta, Sr. Secretário de Estado, como aliás deve saber.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!
O Orador: - E gostaríamos de dizer que um «vazio» corresponde a isto: além das autorizações legislativas mal pedidas, mal solicitadas à Assembleia da República, bem como preferenciar as autorizações legislativas vazias, o Sr. Secretário de Estado tem, designadamente no artigo 45.° do projecto de decreto-lei que, a tarde e a más horas, fez aparecer na Assembleia, outros projectos de autorização legislativa, nomeadamente em relação à regulamentação do preenchimento dos lugares e à classificação de serviço.
Solicitava-lhe, pois, alguma informação complementar sobre essa situação da classificação de serviço, bem como queria sublinhar-lhe que tudo o que tem feito nesta área da Administração Pública continua a ser o «pacote» de 3 de Fevereiro e que tem uma grave responsabilidade no diploma regulamentar da função pública, designadamente no código disciplinar que é, de facto, de tom salazarento.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Secretário de Estado referiu também o elitismo nos lugares de chefia. Quero sublinhar - e talvez V. Ex.ª não tenha entendido completamente o sentido das nossas expressões - que desejamos diferenciar o que deve ser diferenciado, pois acentuámo-lo na nossa intervenção. Assim, consideramos que os estatutos remuneratórios devem, naturalmente, diferenciar responsabilidades diversas dentro das funções, isto é, não vamos pela igualização.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Simplesmente, potenciamos, isso sim, uma possibilidade de diálogo entre dirigentes e não dirigentes e que não haja da parte do estatuto remuneratório dos primeiros algo que o diferencie ostensivamente do estatuto dos segundos. É evidente que isso tem a ver com os leques de situação, com aspectos de carreira e, naturalmente, com os lugares de acesso e provimento.
Quanto a nepotismo, falámos já. Se V. Ex.ª é Secretário de Estado da Administração Pública de um governo que se tem caracterizado, em muitos casos, por discriminatórias nomeações por um conjunto de excepções à regra dos provimentos, isso é consigo! Tal não o honra e não lhe vale, Sr. Secretário de Estado da Administração Pública.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na verdade, o meu pedido de esclarecimento não tem como objectivo clarificar esta reforma da Administração Pública, que se pretende fazer ou contribuir com esta proposta de lei, para que ela se faça.
O meu camarada Cunha e Sá explanou, e bem, uma doutrina completa nesta matéria. Por sua vez, o Sr. Secretário de Estado deu-nos bastantes explicações e, ao contrário do que afirmaram alguns dos Srs. Deputados, designadamente do PCP, esteve atento a este debate, deu respostas, esteve sempre presente. Ora, deve sempre respeitar-se o estilo pessoal, a voz das pessoas, pois é desagradável que isso seja considerado como algo a levar a desconto das pessoas ou sirva de motivo de crítica. Penso que o que interessa é o conteúdo das palavras...
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Se as palavras tiverem conteúdo!...
O Orador: - ... e não propriamente a maneira como as palavras se dizem ou o tom com que se dizem.
A questão que lhe queria colocar é a seguinte: em 1979, o Sr. Ministro - segundo creio - Meneres Pimentel fez alguns decretos de reestruturação da função pública. Não ponho em causa a sua utilidade, nem o seu interesse para os funcionários públicos e para a reforma da Administração Pública. Simplesmente, verifiquei que em 1980 isso teve repercussões financeiras de grande magnitude: as despesas com o pessoal, se não estou em erro, tiveram um grande incremento e essa dimensão financeira das reformas que se pretende fazer na Administração Pública não pode ser descurada. Ora, é essa a questão que lhe coloco.
Com estas modificações na estrutura das carreiras, quais são as consequências financeiras que o Sr. Secretário de Estado prevê? Qual a dimensão em custos das despesas de pessoal que é legítimo prever, visto que estas reformas não podem ser observadas apenas de forma endógena na Administração Pública, sem ter em conta as repercussões que têm inevitavelmente no Orçamento do Estado, no capítulo das despesas de pessoal?
Creio que o Sr. Secretário de Estado e o Governo avaliaram este aspecto e terá com certeza alguma palavra a dizer-nos sobre isso. Assim, não ponho em causa a necessidade de haver reforma e creio que o Sr. Secretário de Estado está no bom caminho, mas não posso, como deputado e também como uma pessoa interessada no bom andamento das despesas públicas, descurar este aspecto essencial do problema.
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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública. V. Ex.ª dispõe de 5 minutos.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: - Começando pelo Sr. Deputado Carlos Lage, devo dizer que já informei ontem a Câmara de que o custo anual de execução directo previsto para o projecto de carreiras é da ordem dos 500 000 contos. Este ano, estando nós já em Março, este custo vai descer substancialmente.
Ao Sr. Deputado Anselmo Aníbal, quero dizer que não tratei, obviamente, de utilizar um tom que pudesse ofendê-lo a si ou à sua bancada, nem muito menos de minorar a Assembleia da República.
Quanto às questões concretas que ultimamente colocou na sua intervenção, como seja o problema do preenchimento dos lugares e da alteração dos quadros é, de facto, um problema técnico complexo para o qual a Direcção-Geral da Contabilidade Pública não está tecnicamente dotada para um regime de revisão automática. Isso vai-nos obrigar, como já referi ontem, a uma revisão do tipo administrativo, mas em que se irão procurar construir espaços mais amplos de gestão de pessoal, sendo este com melhores características, ou seja, quadros departamentais ou até, eventualmente, interdepartamentais. Contudo, o problema é complicado.
Quanto à classificação de serviço estou de acordo consigo em que ela tem de ser aperfeiçoada, que há que lhe retirar, na medida do possível, a dose de subjectivismo que ela tem, e está a trabalhar-se nesse sentido. Acontece somente que não é possível alterar a classificação de serviço num mês ou nos meses seguintes à sua revisão.
Portanto, é necessário que, na base da experiência colhida no concreto, se possa alterar da forma mais correcta, embora toda a classificação seja, de facto, criticável e sujeita a críticas e correcções.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa no seguinte sentido: suponho que V. Ex.ª vai anunciar a votação, mas não gostaríamos que esse acto se processasse sem a verificação das condições regimentais.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, segundo o Regimento em vigor, a votação só terá lugar a partir das 18 horas, isto é, depois do intervalo: Do mesmo modo, a votação final global do projecto de lei n.° 85/111, do CDS, acerca do património cultural português, ficará também para essa hora, a seguir à votação que acabei de anunciar antes.
Portanto, está encerrado o debate.
Entramos agora no debate do projecto de lei n.° 105/III, da ASDI, relativo ao balanço social.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero perguntar se há relatório da Comissão sobre este projecto de lei e, em segundo lugar, no caso de ele existir, peço que se proceda à respectiva leitura.
O Sr. Presidente: - Assim se fará, Sr. Deputado. Vai, pois, proceder-se à leitura do Relatório da Comissão de Trabalho.
Foi lido. É o seguinte:
Relatório da Comissão de Trabalho
Projecto de lei n.° 105/111
A Comissão de Trabalho reunida em 20 de Março de 1985, na sala da Biblioteca do Palácio de São Bento, para apreciar o projecto de lei n.° 105/III sobre o balanço social, deliberou considerar que o referido documento não enferma de nenhum vício formal que impeça a sua apreciação em Plenário da Assembleia, pelo que pode subir para debate na generalidade.
Os representantes dos diferentes grupos parlamentares reservaram a apreciação e posição sobre os seus princípios e articulado para momento posterior.
Palácio de São Bento, 20 de Março de 1985. - O Presidente da Comissão de Trabalho, Fernando dos Reis Condesso.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, deveria constar em anexo ao relatório, devido às disposições legais, nomeadamente a Lei n.° 16579, o resultado da consulta às organizações representativas dos trabalhadores que em princípio deveria também ser lido.
O Sr. Presidente: - Assim se fará, Sr. Deputado.
Vai ser lido o rol de organizações que se pronunciaram sobre o projecto de lei n.° 105/III, cujo parecer é favorável.
Foi lido. É o seguinte:
Rol de organizações que se pronunciaram sobre o projecto de lei n.° 105/III:
União dos Sindicatos do Distrito de Braga;
Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses - Intersindical Nacional;
Federação Portuguesa dos Sindicatos das Indústrias de Celulose, Papel, Gráfica e Imprensa;
Federação dos Sindicatos da Indústria de Hotelaria e Turismo de Portugal;
Manuel Bidarra;
SNTCT - Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Correios e Telecomunicações;
União dos Sindicatos do Distrito de Castelo Branco;
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Sindicato dos Trabalhadores do Sector Têxtil da Beira Baixa;
Sindicato dos Trabalhadores da Indústria e Comércio Farmacêutico;
Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores das Indústrias Químicas e Farmacêutica de Portugal - CGTP-IN;
ssociação Portuguesa dos Gestores e Técnicos dos Recursos Humanos;
Federação dos Sindicatos das Indústrias de Alimentação, Bebidas e Tabacos;
Associação dos Reparadores de Automóveis do Sul;
Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Químicas do Norte;
União dos Sindicatos de Aveiro;
Federação dos Sindicatos das Indústrias de Cerâmica, Cimento e Vidro de Portugal - CGTP-IN;
UGT - União Geral dos Trabalhadores;
STIMM - Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Metalúrgica e Metalomecânica do Distrito do Porto;
Comissão da Condição Feminina;
Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias de Celulose, Fabricação e Transformação de Papel, Gráfica e Imprensa Norte;
FESTRU - Federação dos Sindicatos de Transportes Rodoviários e Urbanos;
PETROGAL - Comissão Central de Trabalhadores;
ARAS - Associação dos Reparadores de Automóveis do Sul;
Projecto de lei n.° 105/III - «Balanço Social»; e
Comissão Central de Trabalhadores da PETROGAL, EP.
O Sr. Presidente: - Para fazer a apresentação do projecto, tem a palavra o Sr. Deputado Ruben Raposo.
O Sr. Ruben Raposo (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Usando um direito regimentalmente consagrado, solicitou o meu agrupamento parlamentar o agendamento na ordem do dia do projecto de lei n.° 105/III. Projecto de lei que visa introduzir uma reforma nas empresas portuguesas, que é a de passarem a elaborar um instrumento de gestão, o balanço social.
Hoje, as empresas portuguesas elaboram o seu balanço económico e financeiro. Aquilatam assim, no fim do exercício, do excedente criado, do défice gerado, da riqueza produzida. Estimam a rentabilidade económica.
De futuro, a ser aprovada a nossa iniciativa legislativa, as empresas passarão a determinar a sua responsabilidade social.
Para isso, dotar-se-ão do balanço social. Texto onde, no princípio do ano, se valora o esforço produzido pela empresa, em matéria social, e se aquilata do cumprimento ou não dos objectivos anteriormente fixados.
Esta nova metodologia de pensar a gestão dos recursos humanos permitirá racionalizar a esfera social da empresa, alargar a informação, introduzir maior certeza e rigor na negociação colectiva.
A ideia do balanço social é uma ideia antiga, tem mais de 20 anos. A sua origem remonta aos Estados Unidos da América, datado de meados da década de 60. O seu aparecimento é o resultado da contestação dos sindicatos americanos à empresa. Eles descobrem que a empresa tem uma responsabilidade social, uma responsabilidade para com os trabalhadores e para com os vários grupos sociais que entram em contacto com ela.
O balanço social surge, quantificando os aspectos sociais internos em termos idênticos à contabilidade financeira e estudando as relações entre a empresa e a comunidade local.
Na década de 70, a Europa descobre este importante instrumento.
Na República Federal da Alemanha, as empresas passam a elaborar relatórios anuais focando os problemas sociais e ecológicos e as condições de trabalho.
Na Holanda, surgem relatórios orientados no sentido das condições de trabalho e de emprego.
Na Escandinávia, estas informações passam a ter uma forma sistematizada em lugar de aparecerem dispersas ao longo do ano.
Em França, a Assembleia Nacional aprovou uma lei implementando o balanço social nas empresas e nos seus vários estabelecimentos, abrangendo os sectores industriais, agrícolas, comércio e serviços, bem como a Administração Pública e transportes.
Em Espanha, são várias as empresas que vêm elaborando balanços sociais, interessadas na problemática social e no aproveitamento dos elementos recolhidos para uma adequada gestão de recursos humanos.
Em Portugal, são muitas também as empresas, públicas e privadas, industriais, comerciais e de serviços, que elaboram o balanço social.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: uma sociedade que se pretenda construir pêlos valores da social-democracia e do socialismo democrático, o lucro não pode ser o único critério de eficiência das empresas.
As unidades produtivas têm uma responsabilidade social indeclinável, que poderá não ser plenamente assegurada, mesmo por empresas lucrativas. Com efeito, importa encontrar fórmulas que quantifiquem, que avaliem o grau de cumprimento da responsabilidade social.
Consideremos uma das tais empresas lucrativas, mas onde existe uma percentagem excessiva de trabalhadores contratados a prazo, onde a sinistralidade é elevada, apresentado valores elevados aos considerados razoáveis pela Organização Mundial de Saúde, onde há um recurso indevido à prestação de trabalho extraordinário, onde as despesas com formação são reduzidas em relação à massa salarial.
É claro que unidades produtivas deste tipo podem gerar resultados positivos de exploração, mas não geram um bom clima de trabalho e a prazo estarão a comprometer a 'sua própria viabilidade económico-financeira.
É preciso, pois, criar condições para que as empresas deste tipo reformulem a sua orientação e comecem a cumprir a sua responsabilidade social.
Para que, este objectivo possa ser atingido e é esse o desiderato do nosso projecto, é preciso publicitar as variáveis da gestão social.
A transparência da informação permitirá melhorar as relações laborais, aumentar a coesão social, compatibilizar os objectivos da empresa com os dos trabalhadores ao seu serviço.
Por isso se prevê no projecto de lei n.° 105/III que as empresas publiquem anualmente no respectivo balanço social dados que sejam referentes, pelo menos, ao emprego, às despesas com pessoal, às condições de
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higiene e segurança, à formação, às relações laborais e à acção social.
Esta informação constituirá um instrumento para uma melhor intervenção das comissões de trabalhadores na gestão a nível das empresas, melhorando o conteúdo do direito à informação previsto nos artigos 23.°, 24.° e 25.° da Lei n.° 46/79, de 12 de Setembro.
Esta informação melhorará a própria gestão de recursos humanos. Efectivamente, como se refere na exposição de motivos do projecto:
Uma correcta gestão financeira e económica da empresa assenta num conjunto de informações tratadas, quantificadas e por isso precisas. Para que a gestão do pessoal - entendida também como gestão social - ganhe foros de maior objectividade e eficácia, importa que se abandone, na medida do possível, o subjectivo e o relativo, assumindo-se plenamente uma nova dimensão - a quantitativa.
Igualmente a elaboração do balanço social fornecerá à Inspecção do Trabalho elementos que lhe permitirão, se for caso disso, averiguar eventuais ilegalidades. Permitirá também a elaboração de medidas e propostas mais adequadas no âmbito da política legislativa e da administração do trabalho. Com efeito, fornecerá elementos ao serviço de estatística do Ministério do Trabalho.
Será assim possível ao poder político conhecer as várias variáveis sociais, suficientemente determinadas e quantificadas. Será assim possível a uniformização de conceitos, de métodos de cálculo.
Será possível definir e aplicar, a nível nacional, políticas consequentes de combate ao absentismo e sinistralidade, por exemplo porque as realidades de base estão devidamente quantificadas.
Finalmente, importa referir que o projecto prevê dois momentos, dois tempos de entrada em vigor. Numa primeira fase, as empresas com mais de 500 trabalhadores elaborarão o balanço social.
Num segundo momento, ou seja no segundo ano da vigência da lei, a obrigatoriedade estender-se-á às empresas com mais de 200 trabalhadores.
Valores que serão fixados em definitivo, em sede de Comissão Parlamentar de Trabalho.
Duas palavras de explicação.
Porquê a entrada faseada em vigor? Porque não queremos que o nosso projecto vá penalizar as empresas. Porque acreditamos que será uma boa lei e queremos que seja factor de mudança, de inovação, que traga melhorias à gestão do pessoal e por isso importa que se dê tempo às empresas mais pequenas para fazerem os ajustamentos necessários.
Porquê o universo de 200 trabalhadores? Como referimos, este número é proposto e estamos naturalmente sensíveis a corrigi-lo. Contudo, a justificação radica no facto de sermos um país de pequenas e médias empresas, mais pequenas que médias. 10% do nosso tecido industrial é constituído por pequenas e médias empresas, responsáveis pela criação de riqueza e de elevado volume de emprego.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como é norma desta Casa, o projecto de lei foi publicado em separata do Diário da República, para que pudesse recolher o parecer dos parceiros sociais e mesmo de outras organizações e entidades interessadas.
Dos pareceres recolhidos, saliente-se que, quer a UGT quer a CGTP, se manifestaram na generalidade, favoráveis.
O mesmo aconteceu com o parecer emitido pela Associação Portuguesa dos Gestores e Técnicos de Recursos Humanos.
Uma nota final importa também sublinhar. Há quem pense que a intervenção das comissões de trabalhadores e a informação aos sindicatos irá constituir um factor de perturbação e de indesejável intromissão na gestão da empresa. Esta crítica é infundada. De facto, não se percebe qual a desvantagem para a empresa em facultar aos organismos representativos de trabalhadores, informação em matérias de absentismo, trabalho extraordinário, acidentes de trabalho, etc.
As empresas ao cumprirem a Lei n.° 46/79, que define os direitos de informação das comissões de trabalhadores, já fornecem estes elementos, desagregados quando solicitados.
Pelo contrário, o facto desta informação condensada ser divulgada, será factor de transformação, de melhoria da gestão das empresas, do clima social e da própria rentabilidade da empresa.
Os empresários verdadeiramente interessados na modernização das suas unidades produtivas, bem como os sindicatos e as comissões de trabalhadores terão a ganhar com esta proposta.
A sociedade que desejamos construir é uma sociedade democrática. Democracia que começa nos locais de trabalho e de residência. Democracia que tem a ver com o direito à informação e à participação.
O projecto que apresentamos visa introduzir reformas estruturais nas empresas. Visa dar conteúdo à noção de responsabilidade social. Visa melhorar a gestão de recursos humanos e a gestão das unidades produtivas. Com ele, ganham as empresas, ganham os empresários e os trabalhadores, ganha todo o País.
O texto que propomos não é um texto acabado, fechado. Estamos naturalmente abertos a alterações em sede de especialidade. A palavra cabe agora à Assembleia da República, que decidirá do bem fundado do nosso projecto.
Aplausos de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Lopes.
O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desejava fazer uma pergunta muito rápida ao Sr. Deputado Ruben Raposo.
O balanço social vem complementarizar aquilo que entendo ser a participação dos trabalhadores na vida económico-social do nosso país. O que pergunto é se o Sr. Deputado pensa ou não que há da parte das entidades patronais e do Governo uma tentativa descabelada e descarada de reduzir as possibilidades de intervenção e de participação dos trabalhadores na vida social. Falo concretamente da forma como a proposta de lei aborda a discussão sobre o direito à greve, que, como actualmente foi posta, restringe os direitos e as liberdades sindicais, da lei de despedimentos e de tudo aquilo que são projectos do Governo, designadamente a precarização do trabalho.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ruben Cardoso.
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O Sr. Ruben Cardoso (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão que o Sr. Deputado Manuel Lopes coloca é marginal a este debate. Ela tem a ver com a posição que o meu agrupamento parlamentar tem acerca das propostas de lei enunciadas em matéria de revisão da legislação do trabalho. Consideramos que estas propostas terão de ser ponderadas em relação ao estado do País e à situação económica que o País vive e que é prematuro emitir qualquer opinião acerca delas neste momento, em sede da Assembleia da República, uma vez que ainda não conhecemos o debate que se vai travar em termos de discussão pública. Conhecemos apenas alguns textos que indiciam determinados comportamentos e determinadas vontades políticas por parte do Governo.
O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Sr. Deputado, quando invoquei legislação, que se diz para aí que está em discussão pública, o que eu pretendia não era discutir o arbusto, mas sim a árvore. A questão concreta que lhe coloquei era se o Sr. Deputado e o seu agrupamento parlamentar consideram ou não que neste momento na sociedade portuguesa se coloca a questão da marginalização da participação dos trabalhadores, nomeadamente o controle da gestão, a questão da participação dos gestores eleitos na gestão das empresas e tudo aquilo que é, efectivamente, poderes e direitos dos trabalhadores conquistados após o 25 de Abril.
O Orador: - Sr. Deputado Manuel Lopes, não é de facto chamada para aqui a questão do debate da legislação do trabalho. O Sr. Deputado aflora dificuldades na tomada de posse por parte dos gestores eleitos pêlos trabalhadores nas empresas públicas e participadas. Nós conhecemos essa questão e formulámos aqui o desejo de que houvesse a tomada de posse por parte dos gestores, em tempo rápido, de forma a dar-se conteúdo à lei das comissões de trabalhadores.
De qualquer forma, a questão que o Sr. Deputado coloca tem a ver também com o chamado balanço social, ou seja, quando diz que há neste momento uma radicalização em termos de lutas sociais por parte dos meios empresariais em relação à sociedade portuguesa e às empresas, dir-lhe-ei que somos da opinião que a sociedade portuguesa se defronta hoje em dia com bastantes confrontos sociais, com um elevado nível de conflitualidade social. Pensamos, no entanto, que o nosso projecto de balanço social poderá ser uma forma de viabilizar que essas tensões sociais se apaziguem nos locais de trabalho, sendo possível melhorar o nível das relações laborais das empresas. Cremos que o nosso projecto poderá permitir uma maior participação, concertação e planificação em matéria de relações de trabalho.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Com a nova lei de despedimentos?
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Hugo Sequeira.
O Sr. Vítor Hugo Sequeira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A iniciativa do Agrupamento Parlamentar da ASDI, que se traduz no projecto de lei n.° 105/III - Balanço social das empresas -, merece a inteira concordância do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, pelo que o votaremos afirmativamente no terminum do seu debate, na generalidade.
O balanço social das empresas teve a sua origem nos finais da década de 60, nos Estados Unidos da América, tornando-se progressivamente extensivo a outros países da Europa, nomeadamente membros da Comunidade Económica Europeia, como é o caso da Bélgica, República Federal da Alemanha e da França, conhecendo actualmente uma fase de grande implementação nomeadamente na vizinha Espanha.
Poderá questionar-se o que de comum existe entre a estrutura e o grau de desenvolvimento industrial da realidade portuguesa e os países por nós aqui citados, questão que não deixará de ter a sua pertinência mas que, contudo, não é por si só suficiente para invalidar as vantagens que a institucionalização do balanço social das empresas consubstancia, quer no plano económico quer no plano social.
A história está recheada de factos que demonstram à saciedade que a resistência dos homens às inovações foi uma constante, mas o presente século XX também demonstra que os países se desenvolvem e as sociedades progridem consoante as capacidades que demonstram no assimilar das novas tecnologias, mas também nas novas concepções de gestão e dos fins que prioritariamente terão de ter em vista.
Pese o facto de serem notórias algumas resistências à implementação em Portugal do balanço social das empresas, como bem o atestam alguns pareceres recolhidos das confederações patronais aquando do período de discussão pública a que foi submetido o projecto de lei, o mesmo vem sendo já elaborado por algumas empresas portuguesas, quer do sector público quer do sector privado.
A simplicidade - em claro prejuízo face a um conceito de balanço social, que poderia consubstanciar mais do que um mero balanço contabilístico social - caracteriza essencialmente o projecto de lei, pelo que o devassar ou onerar as empresas portuguesas pela institucionalização do balanço social não constitui fundamento legítimo para a sua contestação.
O balanço social não pode nem deve ser visto numa perspectiva de reclamar da classe empresarial uma prestação de contas, antes, o balanço social deve constituir a emissão de informação que permita avaliar em que medida a sua actuação modifica os interesses económicos dos indivíduos, a qualidade de vida, os valores culturais e os anseios da sociedade.
É claramente neste sentido que, na revista Negócios, no seu número de Setembro de 1982, o Dr. Eduardo Carvalho, no seu artigo «Balanço social: Novo instrumento de gestão da Empresa», abordava a questão da forma que passamos a transcrever:
Mas a empresa, não obstante dever respeitar o princípio da rendabilidade económica - quer como garantia de sobrevivência quer como disciplina de gestão - constitui em si mesma uma manifestação de responsabilidade social num duplo sentido.
Por outro lado, os cidadãos que inicialmente a instituem e os que depois a desenvolvem, contribuem efectivamente para a sua configuração social interna. Por outro lado, a empresa é também sujeito de responsabilidade social assumida como
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pessoa jurídica; com efeito, a sua finalidade última não reveste exclusivamente para os indivíduos que a compõem - proprietários, dirigentes e trabalhadores - mas também se projecta na totalidade do corpo social, sempre que se entenda este como organismo vivo e não como massa inerte e anónima.
A empresa é, assim, muito mais que uma simples exploração económica, porquanto tem como substrato de toda a sua actividade e dos seus resultados uma colectividade que a ela dedica o seu labor profissional, um mundo de relações com outras pessoas e entidades - colaboradores, clientes, consumidores, concorrentes, poderes públicos, fornecedores, investidores, etc. - e, em definitivo, um dinamismo indiscutível dentro da sociedade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma correcta gestão financeira e económica é vital para a consolidação e desenvolvimento de qualquer empresa mas pode não ser suficiente se a estes factores não lhe adicionarmos a necessidade também de uma correcta gestão dos recursos humanos, factor indispensável à estabilidade social.
Sendo o balanço social um documento a publicar anualmente pelas empresas, as vantagens da informação que por esta via se apresentam aos trabalhadores, permite e facilita a concertação interna entre os parceiros, não apenas no domínio da reivindicação economicista ou de outro carácter mas, e sobretudo, no domínio da planificação da própria empresa através de um melhor aproveitamento do desenvolvimento do potencial humano, porque assente em novas condições de trabalho e de maior estabilidade de emprego.
A gradual implementação do balanço social das empresas permitirá, por último, o estabelecimento de comparações interempresas, intersectores e inter-regiões permitindo desta forma a correcção de graves e injustas assimetrias que hoje todos reconhecemos existirem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O alcance desta iniciativa legislativa vai permitir, em alguns casos reajustamento na gestão dos recursos humanos com vantagens de produtividade e de estabilidade social. Na maioria das empresas, a sua aplicação vai permitir a superação de conflitos que tendiam a enraizar-se com todos os inconvenientes que desta situação advêm.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista, ponderados devidamente os efeitos e os objectivos do projecto de lei n.° 105/III sobre o balanço social das empresas, dá-lhes o seu apoio na generalidade e reserva-se para, na especialidade, em sede de comissão, suscitar o debate, num espírito de abertura a propostas de alteração que contribuam para o seu aperfeiçoamento.
Aplausos do PS, da ASDI e de alguns deputados do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Raul e Castro.
O Sr. Raul e Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Anoto que na intervenção do Sr. Deputado Vítor Hugo Sequeira foi afirmado que o Grupo Parlamentar do PS dará a sua aprovação a este diploma, posição que é, também, naturalmente, a do MDP/CDE embora com algumas restrições, que serão oportunamente explicadas. Fiquei, no entanto, com certas dúvidas em relação a algumas afirmações do
Sr. Deputado, relativamente às quais vinha pedir esclarecimento.
Em primeiro lugar, a afirmação de que não se pode considerar o balanço social como uma prestação de contas por parte da classe empresarial deixou-me a ideia de que o Sr. Deputado pensa que não se deve tocar na classe empresarial nem com uma flor! Na realidade, a classe empresarial está já obrigada a prestar contas no plano económico, como é sabido, visto que o Código Comercial obriga as empresas a apresentar um balanço anualmente. Trata-se de um balanço económico e financeiro e não se vê o que é que possa constituir para o PS ou para o Sr. Deputado, que aqui interveio, algo que ponha em causa a classe empresarial, que o balanço seja apresentado como uma prestação de contas no plano social e humano.
Por outro lado, o Sr. Deputado aludiu à concertação social. Tenho alguma dificuldade em entender esta expressão porque a impressão com que fico é que se trata de uma expressão nova que exprime uma ideia antiga, que era a da harmonia de classes do corporativismo, ou seja, do próprio fascismo português. A concertação social pretende desmentir que há uma oposição de interesses entre as classes, tal como se afirma na Constituição, isto é, entre exploradores e explorados? E que é possível fazer desaparecer essa oposição intrínseca entre interesses opostos, que são os dessas classes? É isso que o Sr. Deputado entende como expressão nova para a ideia antiga de concertação social?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vítor Hugo Sequeira, visto que há mais pedidos de esclarecimento, V. Ex.ª responde já ou apenas no final?
O Sr. Vítor Hugo Sequeira (PS): - Sr. Presidente, responderei só no final.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Deputado Vítor Hugo Sequeira, já aquando da apresentação deste projecto de lei, pelo Grupo Parlamentar da ASDI, tive a oportunidade de dizer que a posição do meu grupo parlamentar era, em princípio, favorável à sua aprovação, e na altura tive até ocasião de solicitar alguns esclarecimentos ao Sr. Deputado Furtado Fernandes, se não estou em erro.
Nesta altura é, portanto, ao Sr. Deputado que eu queria formular um ou outro pedido de esclarecimento muito breve. E deixando aqui claro que penso que este é o tipo de elementos que, constituindo uma base concreta de análise, servem ou podem servir, efectivamente, para negociações interempresas ou dentro até de diversos sectores, e permitem comparações entre as empresas.
Tudo o que seja avançarmos no sentido da clarificação do que é a nossa vida económica e social é, portanto, positivo.
As duas perguntas que formularia são as que passo a enunciar.
O Sr. Deputado referiu, ou falou um pouco ao de leve - e estaria certo o contexto da sua intervenção e eu pedia-lhe que aprofundasse -, sobre a eventual existência de resistências à introdução do balanço social nas empresas.
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Porque pensa V. Ex.ª que existirão de facto - se ouvi bem - ou em que se fundarão resistências desse tipo à introdução de um elemento como o balanço social?
A segunda questão, embora possa ser considerada de detalhe e de especialidade, talvez o não seja tanto, tem a ver com o seguinte: este projecto de lei prevê que o seu âmbito de aplicação seja para as empresas que tenham, pelo menos, 200 trabalhadores.
Na sua óptica, Sr. Deputado, considera que este limite de 200 trabalhadores deveria ser um limite que deveríamos considerar, digamos, em si um limite fixo ou considera esse número de 200 mais como um limite, digamos, para uma aplicação experimental por um tempo e que mais tarde se poderia vir a estudar a sua extensão progressiva a empresas com um menor número de trabalhadores?
O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra
o Sr. Deputado Vítor Hugo Sequeira.
O Sr. Vítor Hugo Sequeira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começarei por responder ao Sr. Deputado Raul e Castro, que teve a amabilidade de me colocar algumas questões. Todavia, penso que a primeira das questões que me colocou não tem efectivamente razão de ser porque a sua perspectiva parte de uma premissa que, de facto, não é a minha nem é a que resultou da minha intervenção, na medida em que, provavelmente por um problema de comunicação, o Sr. Deputado não apreendeu na totalidade o que eu havia referido.
O Sr. Raul e Castro (MDP/CDE): - Sr. Deputado, permite-me que o interrompa?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Raul e Castro (MDP/CDE): - Sr. Deputado, eu permiti-me até anotar a seguinte afirmação que fez:
O balanço social não pode ser visto, como o reclamar da classe empresarial, uma prestação de contas.
O Sr. Bento Gonçalves (PSD): - E não é!
O Sr. Raul e Castro (MDP/CDE): - Era esta a expressão que, creio, o Sr. Deputado usou na sua intervenção e a que eu me referia.
O Orador: - E efectivamente não o é, Sr. Deputado. Mas a frase que a meu ver clarifica o meu entendimento em relação a esta matéria está contida na passagem da intervenção em que eu digo que a simplicidade do projecto de lei n.° 105/III, em claro prejuízo face a um conceito de balanço social, poderia consubstanciar mais do que um mero balanço contabilístico social.
Portanto, logo à partida, face ao projecto da ASDI, no que concerne ao balanço social das empresas nós admitimos que o balanço social das empresas pode ser uma substância que vai muito para além da mera contabilidade social das empresas, nomeadamente face aos custos de mão-de-obra, de condições de higiene e segurança no trabalho, de algumas regalias sociais. O balanço social, no nosso conceito, pode e deve ser algo bastante mais do que isso.
Esta era, portanto, a primeira explicação que queria dar ao Sr. Deputado, remetendo-o depois para um total aclaramento, para a leitura mais atenta da minha intervenção.
Sr. Deputado, a determinada altura considero que a institucionalização do balanço social pode ser, efectivamente, um factor de paz social no seio das empresas.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sim!
O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Nem que seja com a GNR.
O Orador: - Nós sabemos que, hoje em dia, em muitas das empresas, algumas das situações conflituais têm por base a falta de informação que, em muitos dos casos, até é devida às organizações dos trabalhadores.
Quando falo, nomeadamente, em concertação e o Sr. Deputado invoca o corporativismo queria-lhe dizer que, de facto, já não estamos nesse estado. Estamos num Estado de direito democrático, e na nossa concepção socialista, em democracia, a via privilegiada deve ser a do protagonismo, pela capacidade negociai, pela capacidade de diálogo. E não se pode estar a privilegiar, com os resultados, que nomeadamente, estão à vista, as vias permanentes do antagonismo.
No nosso entender, em democracia as situações não se confundem, pelo que a concertação, também da forma como a entendemos, não é sinónimo de capitulacionismo.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - E as intervenções da GNR?
O Orador: - Quanto ao Sr. Deputado Hasse Ferreira, a par das questões onde, nomeadamente, também reconhece as vantagens do balanço social pela fonte informativa e pelo quadro de leitura que permite comparar interempresas, sectores e regiões no sentido de se planificarem políticas e corrigirem algumas assimetrias existentes, dir-lhe-ia que as resistências a que me refiro resultam nomeadamente de, em sede de Comissão, eu ter sido o relator deste projecto de lei e, por consequência, como esteve à discussão pública, obviamente que nos foram remetidos os pareceres, quer das organizações sindicais, quer das confederações patronais. Em relação à maioria das confederações patronais, constatei que não estão neste momento na disponibilidade de aceitar a implementação de um diploma tão importante como pelo menos nós o reportarmos. Argumentam, nomeadamente, que ele vem onerar as empresas, vem representar um novo imposto para as empresas face às infra-estruturas que deveriam, portanto, ser consignadas para poderem, digamos, dar vazão à matéria obrigatoriamente decorrente do projecto de lei relativo ao balanço social.
Obviamente que esse não é o nosso conceito. Tivemos a preocupação de dizer, na nossa intervenção, que não só não há onerações como não há devassidão das empresas nomeadamente no capítulo das informações a prestar e a conter neste balanço social.
De facto, só podemos entender esta situação como um problema da mentalidade que ainda caracteriza a esmagadora maioria da nossa classe empresarial em
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que, em muitos casos, se constata uma dificuldade de adaptação à nova ordem económica e democrática estabelecida com o 25 de Abril.
Portanto, trata-se também de um problema de conceitos que, em democracia, no nosso entender, já deviam estar ultrapassados mas que em vastos sectores empresariais, lamentavelmente, ainda subsistem e com prejuízo não só para o desenvolvimento das próprias empresas, mas daí também os reflexos, no plano social, que advêem desses comportamentos.
Quanto à questão do limite dos 200 trabalhadores significar, digamos, um travão para uma mais generalizada implementação do projecto do balanço social nós remeteríamos essa resposta e essa questão, tal como já o dissemos, para a discussão na especialidade onde estaremos abertos ao diálogo e, portanto, a discutir todas as propostas no sentido de aperfeiçoar este instrumento e não no sentido de, pura e simplesmente, o tornar num instrumento inócuo.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Lopes.
O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Num momento em que o mundo laboral português mais uma vez se confronta com um conjunto de projectos de revisão pela negativa da legislação de trabalho vigente, surge nesta Assembleia em discussão o projecto de lei n.º 105/III da ASDI sobre o balanço social.
É assim que, independentemente dos critérios e reparos que oportunamente teceremos ao seu articulado, não poderemos deixar de ressaltar o carácter positivo, embora tímido, deste projecto que se enquadra no quadro jurídico-laboral vigente, demonstrando assim que é possível tomar medidas de política social sem no entanto pôr em causa as conquistas democráticas que o 25 de Abril permitiu aos trabalhadores portugueses.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Há um evidente contraste entre esta iniciativa e o carácter antidemocrático e restauracionista das iniciativas da coligação governamental PS/PSD.
Tivesse sido outro o comportamento do Governo na condução dos destinos nacionais, e o fosso hoje existente entre o actual Governo e os Portugueses não seria tão grande.
A verdade, no entanto, é bem diferente. O governo PS/PSD não só não privilegiou o diálogo, não tentou o entendimento, não optou por uma postura democrática e constitucional como em todos os seus actos apostou no confronto e prosseguiu objectivos verdadeiramente autoritários.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!
O Orador: - Legislar para este Governo não tem sido um objectivo de equilíbrio, de respeito e de justiça, mas antes um projecto que sirva e cubra as suas claras opções classistas e os seus intentos de recuperação monopolista e latifundista.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Ora aí está!
O Orador: - Só assim se entende que o Governo insista em restringir o direito de greve aos trabalhadores
enquanto pretende criar inconstitucionalmente facilidades ao exercício do lock-out.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Que vergonhaça!
O Orador: - Só assim se entende que o Governo insista e venha pela quarta ou quinta vez nos últimos anos tentar liberalizar a Lei dos Despedimentos e precarizar mais o trabalho, do que é bom exemplo a proposta do trabalho temporário.
Só assim se entende que o Governo não tenha assumido qualquer iniciativa para repor a legalidade nesse estranho e único fenómeno que são os salários em atraso, e que venha agora descaradamente propor que aos sem salários sucedam os desempregados.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Só assim se entende que em lugar de procurar o empenhamento de todos os portugueses para vencer a crise e perspectivar o futuro opte por trazer à Assembleia propostas como a das rendas de casa e a Lei de Segurança Interna.
Não foi, não é e não será com propostas deste tipo que mais não visam do que alterar as regras sobre a distribuição do poder nas empresas e na sociedade, retornar a um modelo autoritário de direcção das empresas, limitar directamente as formas de acção operária e sindical, com o objectivo de tentar enfraquecer o movimento unitário e sindical que algum dia na sociedade portuguesa se encontrarão as soluções necessárias para os grandes e graves problemas nacionais.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - A jornada de luta do passado dia 16, organizada pela CGTP-IN, foi bem a expressão do sentir e pulsar de um povo que, farto da exploração e da repressão que sobre ele se abate, exige legitima e 'urgentemente a demissão deste Governo e a implementação de uma nova política que defenda os interesses nacionais, acabe com a fome e com a miséria e reponha a esperança no futuro aos Portugueses.
A implementação do balanço social foi, de um modo geral nos casos que conhecemos, concebida como uma forma e como um instrumento de integração e principalmente de corresponsabilização dos trabalhadores na empresa e na sua gestão.
No entanto, as experiências conhecidas desses mesmos países mostram-nos que a despeito de uma ideologia dominante de «conciliação» de classes a corresponsabilização não resiste à prova dos factos e à realidade objectiva, quer económica, quer social, nem tão-pouco quando os interesses dos trabalhadores são postos em causa.
Somos no entanto de opinião que este diploma pode constituir um instrumento útil quer para a estratégia da empresa, enquanto detentora dos meios de produção, quer para os trabalhadores que, passando a dispor de mais elementos e de mais dados, podem em cada momento procurar influenciar essa mesma gestão de pessoal num sentido favorável aos seus interesses.
Num momento em que o patronato retrógrado com a conivência do governo PS/PSD viola impunemente a lei e a Constituição, nomeadamente no que se refere aos direitos de participação de controle de gestão e de informação e sem dispensa de se encontrarem os meios que façam aplicar a legislação vigente, nomeadamente
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a Lei n.º 46/79, assume assim este projecto uma importância adicional como forma sistematizada de colocar à disposição dos trabalhadores e das suas organizações informações capazes de potenciar o exercício de intervenção democrática dos trabalhadores na empresa, nomeadamente no controle de gestão. Claro que em nosso entender tal facto só poderá ser integralmente cumprido se previamente as organizações dós trabalhadores dispuserem do acesso à informação, quer económica, quer técnica, quer de recursos humanos, que lhes sirva de suporte. E, a este propósito, não pode deixar de ser referido o facto de o Governo e dos seus homens de mão nos conselhos de gerência teimarem em não dar posse aos trabalhadores eleitos para esses conselhos, em evidente confronto com a legalidade e a própria Constituição. É um escândalo, Srs. Deputados.
De realçar ainda será o facto de este diploma poder constituir uma boa fonte de recolha de dados, quer para os serviços estatísticos, quer para a administração, quer para a própria Inspecção do Trabalho.
É porque as parte em presença compreenderam o alcance deste diploma, que, independentemente das críticas pontuais que lhe tecem todas as associações sindicais que sobre ele se pronunciaram, lhe são favoráveis, enquanto em contrapartida as associações patronais, ainda saudosistas do passado, nada motivadas para o funcionamento democrático da sociedade, e muito menos para a participação dos trabalhadores na vida dessa mesma sociedade, todas elas reprovam tal projecto.
No entanto, a realidade social dos nossos dias mostra-nos que uma empresa, sendo uma organização actuante no plano social, deve subordinar os seus fins lucrativos por regra e as suas formas de actuação ao interesse geral.
É perante esta importante responsabilidade da empresa, .perante a restante comunidade a quem pensamos não bastar a uma administração, ou a um conselho de gerência, a lisura dos seus métodos e das suas contas, que a comunidade em que a empresa se insere deve poder dispor dos meios de informação necessários para um julgamento crítico das responsabilidade sociais dessa mesma empresa perante a respectiva comunidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É assim que julgamos que o articulado do projecto de lei é no mínimo, e numa forma medrosa, decepcionante pelas expectativas e pelo sentido que o seu próprio preâmbulo nos sugerem.
O seu artigo 2.º não só é incompleto, mas vago e genérico, e, ao remeter para o Governo a sua regulamentação, quase que nele vemos «o desdigo aquilo que disse», porque trata-se de dilatar no tempo, de permitir em determinado momento o esvaziamento total deste diploma, que assim mais não servirá do que para um diploma de «fachada» muito «europeu», mas que nada viria a modificar no plano dos direitos dos trabalhadores à informação. Em nosso entender este artigo deve ser profundamente alterado, de modo a definir qualitativa e quantitativamente quais os dados que obrigatoriamente este projecto deve conter.
Também em relação ao artigo 3.º não se poderá ignorar o direito de parecer prévio das organizações de trabalhadores, que exige o respeito e o reforço de direitos já hoje existentes no plano global, e .que a não serem cumpridos limitariam imenso qualquer participação real das referidas estruturas.
Parece-nos por fim que, quer o artigo 1.º, onde o limite de 200 trabalhadores, quer o artigo 7.º, que transitoriamente aponta para 500 trabalhadores, números a partir dos quais se faria o balanço social, se encontram desencontrados com a realidade que é a estrutura média das empresas nacionais. Em nosso entender não só se justifica que este número seja reduzido, como se deverá igualmente ter em linha de conta, com outros factores, designadamente os valores das vendas.
É por isso que ver neste projecto mais do que isto é como ver na aspirina a cura para o cancro.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Definido que foi o contexto em que o Grupo Parlamentar do PCP enquadra a propositura à Assembleia da República deste projecto da ASDI, balizado o nosso entendimento sobre o balanço social, apontadas algumas críticas e feitas na generalidade algumas propostas, iremos votar favoravelmente este diploma...
Risos do PSD.
... e preparar a nossa intervenção na especialidade, de modo a de uma forma positiva, que sempre nos tem caracterizado, contribuirmos para uma revisão séria, do que seriamente entendemos que poderia ser este diploma. .
Nesta situação, em que o Governo permite que a ilegalidade se transforme em legalidade instituída, promove o desemprego, recorre à repressão, e não toma qualquer medida para combater a situação dramática dos trabalhadores com salários em atraso, o que se pode dizer do futuro no balanço social é que ele, com este Governo, corre o risco de nunca ser aplicado.
De facto, uma futura lei do balanço social só poderá servir parcialmente os trabalhadores com uma política que, em vez de atentar contra os seus direitos e interesses, prossiga os caminhos previstos na Constituição da República e de Abril. E isso é impossível com este Governo! É por isso também que mais urgente se torna a sua demissão!
Aplausos do PCP.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Tinha de acabar assim. Já estava admirado que não dissesse isso.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira e Costa.
O Sr. Oliveira e Costa (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar queria referir que vou tecer a minha intervenção sobre o projecto de lei n.º 105/III, que a ASDI aqui apresentou, e por respeito para com a Câmara não entrarei noutros assuntos que, obviamente, têm o seu tempo e portanto não vou desrespeitá-los falando de algo que não está em discussão neste momento.
Vozes do PSD:- Muito bem!
O Orador: - Apresenta-nos a ASDI um projecto de lei sobre o balanço social e nós, como sociais-democratas, temos da sociedade e da empresa, obviamente, uma visão não marxista e, portanto, temos claramente uma visão contrária a que a empresa seja um palco contínuo de luta de classes. Também como
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sociais-democratas temos da empresa uma visão de que ela não pode visar, exclusivamente, o lucro pelo lucro, de que o trabalhador não pode ser uma mera peça de uma máquina e, portanto, a empresa, para além de uma função de gestão de pessoal, terá também de ter uma função de gestão social do próprio pessoal.
É, portanto, dentro desta perspectiva social-democrata, em que recusamos claramente a luta de classe marxizante e também o liberalismo selvagem e o capitalismo puro...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - .... que entendemos que o balanço social se aplica e se deve aplicar nas empresas portuguesas.
Entendemos que um projecto deste tipo pode claramente possibilitar uma melhor realização pessoal dos trabalhadores e uma melhoria da sua qualidade de vida, de emprego e de trabalho.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Obviamente!
O Orador: - Por isto o PSD votará favoravelmente, na generalidade, este projecto da ASDI sobre balanço social.
No entanto, temos algumas dúvidas que se prendem com questões das mais diversas, desde o número de trabalhadores a partir do qual o balanço social deve ser obrigatório nas empresas; dúvidas que se prendem com os prazos a partir dos quais as empresas devem, obrigatoriamente, publicar o seu balanço social, etc. Temos contributos e sugestões que na comissão - à qual, conjuntamente com outros deputados, iremos solicitar a baixa deste projecto de lei - iremos apresentar.
Entendemos também que os parceiros sociais, que de um modo geral responderam por escrito e se pronunciaram sobre este projecto de lei devem ser ouvidos oral e individualmente pela Comissão de Trabalho para que numa troca de impressões mais clara se possa melhorar - e julgamos que isso é perfeitamente possível - este projecto de lei.
Estamos, pois, em condições de votar este projecto favoravelmente, na generalidade, e estamos também em condições não só de apresentarmos os nossos contributos e as nossas sugestões como também estamos abertos a contributos e a sugestões que, vindos de outros grupos parlamentares ou de parceiros sociais, surjam posteriormente na comissão.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Raul e Castro.
O Sr. Raul e Castro (MDP/CDE): - Sr. Deputado, referiu-se à sua concepção de que entende a empresa no sentido de que esta não pode ser palco contínuo de luta de classes.
Gostaria de ser esclarecido sobre se esta sua afirmação é idêntica a uma outra, que diz o seguinte: «o capital e o trabalho têm uma importante função a desempenhar».
Pode-se deduzir, portanto, ao escolher qualquer destas expressões, como sintetizando o seu pensamento?
Necessariamente, dispenso-me de lhe dizer quem é que usava a segunda expressão.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Como a lei dos despedimentos.
O Sr. José Magalhães (PCP): - E o lock-out.
Uma voz do PCP: - É tudo social-democracia!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira e Costa.
O Sr. Oliveira e Costa (PSD): - Sr. Deputado Raul e Castro, agradeço a sua pergunta.
É evidente que não me parece que vamos ter uma discussão quase que filosófica sobre balanço social. De qualquer forma, gostaria de deixar bem claro qual é o meu pensamento pois, isso sim, parece-me importante.
O que eu pretendi dizer - e julgo que fui claro - foi o seguinte: enquanto social-democrata - e não sou marxista - não entendo a empresa como se esta devesse ser um palco de luta de classes. Este é o primeiro ponto.
Também disse - e o Sr. Deputado Raul e Castro ouviu com certeza - que, como social-democrata, não entendo que a empresa possa ser algo que vise o lucro pelo lucro em que o trabalhador seja uma simples peça de uma máquina.
Portanto, julgo que tenho uma visão que corresponde ao sentimento generalizado do povo português, de que a empresa deve ser algo onde o trabalhador se realize, onde a melhoria da sua condição de vida possa ocorrer diariamente. Foi esta posição tão simples e tão social-democrata, que eu transmiti.
Se tem outras dúvidas, devo dizer-lhe que lamento não poder esclarecê-lo mas julgo que o Sr. Deputado não ficará na ignorância.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul e Castro.
O Sr. Raul e Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Contrasta singularmente com as iniciativas legislativas do Governo, em matéria laborai - de todos conhecidas porque estão publicadas -, este projecto apresentado pela ASDI.
Contrasta porque tem, efectivamente, um sinal contrário, e essa é a primeira razão para o saudarmos, na sua apresentação para discussão nesta Assembleia da República.
Contudo, o Sr. Deputado Rúben Raposo, ao apresentar este projecto de lei, afirmou que ele visa introduzir uma reforma nas empresas portuguesas.
Ora, relativamente a este objectivo há, naturalmente, algumas observações a fazer ao projecto de lei agora apresentado. Não parece que, efectivamente, este projecto de lei possa introduzir uma reforma nas empresas portuguesas nomeadamente se se mantivesse a sua aplicação às empresas com um mínimo de 200 trabalhadores.
O Sr. Deputado Rúben Raposo sabe perfeitamente que no nosso país, as empresas com 200 ou mais trabalhadores representam uma minoria. Portanto, a ser assim, o projecto viria a ser aplicado a uma minoria de empresas e esse não será, com certeza, o objectivo da ASDI ao apresentá-lo.
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Por outro lado, relegar para regulamentação do Governo os desmembramentos dos capítulos que devem abranger o balanço social, não nos parece a melhor forma, visto nos parecer que, não só há aqui uma demissão - digamos - por parte do partido apresentante do projecto de lei como, afinal, se confia a um Governo que - nesta e noutras matérias, de resto - não merece confiança para o desmembramento dos capítulos do balanço social.
Por outro lado, ainda, para que o balanço social possa, efectivamente, representar uma reforma das empresas portuguesas, ele teria, necessariamente, de abranger muitas mais matérias para além daquelas que se referem no texto do projecto.
A este propósito, dou alguns exemplos: teria de se referir à cessação dos contratos de trabalho, aos acidentes de trabalho e doenças profissionais, ao absentismo, ao leque salarial, aos regulamentos internos das empresas, à acção disciplinar nas empresas, etc. Só assim, efectivamente, o balanço social poderia desempenhar um papel importante e um papel harmónico, como é o próprio objectivo com que foi apresentado na Assembleia da República pelo Sr. Deputado da ASDI.
Finalmente, desejaria chamar a atenção para uma mera gralha existente no artigo 6.°, no que se refere às multas, porque é evidente que se trata de uma gralha: fala-se em multas de 50 contos e 200 contos quando, naturalmente, a expressão é «de 50 a 200 contos». Como esta é a expressão que figura no texto, seria bom corrigi-la para que não restem dúvidas.
Portanto, e em conclusão, diríamos que, à parte estas considerações e as restrições que pomos ao projecto de lei quanto à sua eficácia, o MDP/CDE votará favoravelmente o projecto de lei n.° 105/III, agora apresentado, porque consideramos que introduz, efectivamente, uma melhoria significativa na regulamentação destes problemas.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos dito por várias vezes que as grandes dificuldades que entre nós são encontradas pelo estabelecimento de um são clima de concentração social, se devem em boa parte, ao maximalismo da legislação social, maxime da legislação do trabalho.
Com todas as questões abordadas e minuciosamente tratadas na legislação publicada no decurso dos últimos 10 anos, os parceiros sociais perderam margem de manobra e por isso têm reais dificuldades em estabelecer plataformas correctas de entendimento e se refugiam numa contratação meramente quantitativa e sem imaginação.
E esse problema põe-se, também, em sede de contrato individual, com a inflação de disposições imperativas - absolutamente imperativas ou relativamente imperativas -, a tolher a capacidade de contratação das partes e a impor a publicização crescente de um contrato que só in nomine pertence ainda ao direito privado.
Vai de certo modo nesse sentido o presente diploma, a impor mais uma carga burocrática às empresas, a acrescentar aos milhares delas que lhes são, desde já, impostas: é a apresentação dos mapas de horários de
trabalho, dos quadros de pessoal e de tantas outras obrigações, a imporem, cada vez mais e só para isso, a constituição de quadros cada vez mais nutridos de pessoal.
O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Coitadinhos.
O Orador: - É verdade, é verdade!
E quem perde, no fundo, são os trabalhadores, como o Sr. Deputado Correia Lopes sabe.
Por isso, entendemos que, ao menos na sua formulação actual, atento o limiar mínimo de aplicação e o princípio da obrigatoriedade cega, sem quaisquer considerações, o diploma se nos afigura não inteiramente positivo.
A ideia nasceu nos Estados Unidos da América - vejam lá os Srs. Deputados do PCP! sob a bandeira da aplicação voluntária e aí proliferou, sendo certo que apenas em França tem carácter obrigatório e em termos diferentes dos que vêm estabelecidos no presente projecto.
Entendemos, porém, não inviabilizar com o nosso voto a iniciativa que - repetimo-lo -, devidamente corrigida durante a discussão na especialidade, poderá representar realmente, um factor de desenvolvimento social.
Nesse sentido, votaremos a favor na generalidade.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Hugo Sequeira.
O Sr. Vítor Hugo Sequeira (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, ouvimos atentamente a sua intervenção.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Como era sua obrigação!
O Orador: - Antes de o Sr. Deputado entrar, concretamente, na discussão do projecto agendado para hoje, teceu algumas considerações e pareceu-me inferir que - em conclusão - tudo o que de anormal se passa na nossa vida económica, nomeadamente, com grandes reflexos no tecido social, se deve àquilo que o Sr. Deputado apelidou de maximalização da legislação laboral.
Gostaria que o Sr. Deputado Nogueira de Brito, em relação à maximalização da legislação laborai, pudesse esclarecer convenientemente se, em seu entender, esta maximalização existe e em que sentido é, efectivamente, mais penalizadora: se dos empresários, se dos trabalhadores.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Pergunte ao Sr. Ministro!
O Orador: - Porque, objectivamente, se o que está em causa é a possibilidade de se despedir, devo dizer-lhe que, hoje em dia, a legislação vigente no nosso país permite-o através de determinados instrumentos, que podem ir desde o despedimento à suspensão. Por consequência, tenho para mim que é exactamente no outro plano da legislação laborai, naquele que regulamenta actualmente os contratos a prazo, que regulamenta toda a outra matéria relacionada com as condições de vida e de emprego dos trabalhadores
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portugueses, que essa maximalização pode ser localizada.
Mas porque, provavelmente, partimos de pontos de vista e preconceitos em relação a esta matéria, perfeita e compreensivelmente divergentes, gostaria que o Sr. Deputado Nogueira de Brito explicitasse melhor aquilo que, no seu conceito, lhe permitiu afirmar que a maximalização da actual legislação laborai vigente em Portugal é, de facto, a causa de todos os males.
O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Não sabe!
O Sr. Presidente: - Como certamente o Sr. Deputado Nogueira de Brito vai responder no final a todos os Srs. Deputados inscritos para pedirem esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira e Costa.
O Sr. Oliveira e Costa (PSD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, no início da sua intervenção, o Sr. Deputado disse - se percebi correctamente - que entendia que, em termos de concertação social, se deveria ir mais longe em Portugal do que a mera contratação colectiva, que visa aspectos, quantas vezes meramente economicistas.
Se entendi correctamente a sua intervenção - e julgo que sim - queria colocar-lhe uma questão.
O Sr. Deputado sabe, com certeza, como observador atento da realidade portuguesa e interessado por aspectos sociais e do trabalho que o Conselho Permanente de Concertação Social tem tido um trabalho que, obviamente, poderia - todos concordamos - ir mais além. De qualquer modo, tem produzido de um modo que me parece positivo, tratando-se - como se trata - de um órgão recente na vida política portuguesa.
Gostaria de saber qual é a posição do Sr. Deputado Nogueira de Brito e do Grupo Parlamentar do CDS sobre o papel do Conselho de Concertação Social, em termos de se possibilitar uma concertação para além dos aspectos da contratação colectiva, como referiu.
O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Espanta-me a pergunta do Sr. Deputado Vítor Hugo Sequeira, que quer ser esclarecido sobre o que deva ser a forma de legislação do trabalho ou sobre aquilo que eu posso entender como maximalização da legislação do trabalho, quando é certo que foi o seu governo...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O seu governo!
O Orador: - ..., no programa que submetem a esta Assembleia, que falou em flexibilização da legislação do trabalho e foi o seu governo que, concretamente, apresentou ao Conselho da Concertação Social diplomas muito concretos sobre várias matérias, em relação às quais o seu governo entende também que se torna necessário flexibilizar a legislação do trabalho.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Sr. Manuel Lopes (PCP): - E o seu partido está de acordo!
O Orador: - Pêlos vistos, o Sr. Deputado Vítor Hugo Sequeira não está de acordo com essa flexibilização; porventura, também não está de acordo com o Sr. Deputado que falou a seguir, Rui Oliveira e Costa e que, consigo, pertence também a um órgão de representação dos trabalhadores.
Isso é um problema vosso, não é um problema meu. Só me espanta é que, neste momento, 2 anos depois de o Sr. Deputado pertencer a uma coligação que sustenta e apoia este Governo, e de este Governo nos ter falado aqui, várias vezes, nessa flexibilização, o Sr. Deputado ainda hoje não saiba em que sentido é que deve fazer essa flexibilização.
Queria dizer-lhe o seguinte, Sr. Deputado Vítor Hugo Sequeira: falei nesta matéria, a propósito, não de todos os males da nossa economia e da sociedade portuguesa - é evidente - mas de grande parte desses males. Disso não tenha dúvida nenhuma.
Realmente, a legislação é maximalista, e é maximalista exactamente na medida em que excede o normal ou até excede qualquer outra legislação de países que, como nós, vivem centrados numa economia de mercado. E excede-o na realidade, como acontece, por exemplo, nessa matéria dos despedimentos: ao impor, necessária e absolutamente, a reintegração do trabalhador como consequência da nulidade do despedimento, não existe nenhum paralelo com isto na Europa do Mercado Comum, a não ser, em termos, aliás, diferentes do nosso, o caso do regime italiano. De resto, não temos nenhum paralelo.
Se o Sr. Deputado me fala em maximalização, eu digo-lhe: cá está um aspecto concreto de maximalização, Sr. Deputado, que é este que referi. Ou o Sr. Deputado entende que não é e que o despedimento colectivo é a forma suficiente para resolver os problemas de flexibilização de que necessitam as nossas empresas?
Se o Sr. Deputado entende que é assim, digo-lhe uma coisa: dentro de algum tempo vamos assistir aqui, na nossa Assembleia, a uma discussão curiosa, na qual espero ver participar o Sr. Deputado, o Sr. Deputado Oliveira e Costa, o Sr. Deputado Manuel Lopes e o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa. E nós cá estaremos com a posição que é sabido ser a nossa e que não deixa de ser a nossa.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - De flexibilizar.
O Orador: - Exactamente, a posição de flexibilizar.
Uma voz do PCP: - Mais desemprego!
O Orador: - Bem, isso é outra questão sobre a qual os Srs. Deputados sabem, obviamente, mais do que eu.
Risos.
Quanto ao mais, o Sr. Deputado Oliveira e Costa diz que o Conselho de Concertação Social tem sido um exemplo de real concertação. Para já, o Conselho não conseguiu ter lá todos os seus parceiros sociais!
Em segundo lugar, Sr. Deputado, tem tratado - como dizia o chefe da coligação, o Primeiro-Ministro deste país, em tempos - de matéria vaga.
Risos do CDS.
Foi o célebre plano de recuperação económica e financeira que andou por lá e depois andou por muitos outros sítios e parece ter sido, finalmente, aprovado agora - ainda não o sabemos, ainda não o vimos!
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Quanto ao mais, não anda nada por lá, Sr. Deputado. Nada anda pelo Conselho de Concertação Social.
Portanto, não nos parece que o clima de concertação seja um clima positivo, mas dizemos que é por causa disto.
Eu pergunto: que cedência hão-de fazer as organizações representativas dos trabalhadores em Portugal? Que cedências podem fazer? Que matéria podem tratar que não seja matéria puramente quantitativa? Não podem, pois ela está tratada, está resolvida. Enquanto as organizações de trabalhadores de muitos países tratam, por exemplo, dos direitos das comissões de trabalhadores ou dos organismos representativos dos trabalhadores na empresa, os senhores não podem tratar, pois isso está minuciosamente resolvido, não apenas na Constituição, como também numa lei ordinária - o que é, aliás, hábito entre nós: está tudo na Constituição, e também está numa lei ordinária, e numa portaria, e num regulamento, e num despacho, e em várias outras coisas ...
Risos.
E os senhores e os representantes dos patrões já não têm de fazer nessa matéria; tudo está feito ao pormenor; nada há a fazer!
É evidente que, assim sendo, não há concertação social possível.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Foi esse o sentido da minha intervenção e é esse sentido que eu suponho que resulta concludentemente demonstrado pelo que tem sido a realidade da concertação.
Aliás, digo-lhe, Sr. Deputado Oliveira e Costa: não é apenas do Conselho que eu falo quando me refiro à concertação social mas da própria contratação colectiva. A própria contratação colectiva está - como o Sr. Deputado muito bem sabe - acantonada a aspectos puramente quantitativos, e isso, é negativo entre nós. Isso mina um são clima de concertação social; mina a partir daí, e com resultados no próprio Conselho de Concertação Social.
O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Dá-me licença, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, só quero levantar-lhe uma pequena questão. É que, pelo que estou a ouvir, o senhor e o seu grupo parlamentar entendem que aquilo que é preciso em Portugal é arrasar toda a legislação laboral, para que depois haja concertação social.
Ora bolas! Então voltamos a uma situação idêntica ou pior do que a situação paternalista do próprio corporativismo.
Então onde estariam, efectivamente, as alterações substanciais introduzidas - não foi meramente uma votação da Assembleia da República, foi também uma conquista dos trabalhadores?! Essas alterações foram uma conquista no plano social, que têm mais que lógica em todas as sociedades actuais, sejam capitalistas, sejam socialistas, pois trata-se de direitos agarrados, de facto, pelas pessoas.
Qual é a sua opinião sobre isto, Sr. Deputado Nogueira de Brito?
O Orador: - É muito clara e digo-lha já, Sr. Deputado.
Não tenho a opinião de arrasar nem de deixar de arrasar.
O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Parece que sim!
O Orador: - Não quero arrasar coisíssima nenhuma; o que eu quero é rever a legislação do trabalho. Quero que os direitos efectivamente conquistados pêlos trabalhadores sejam conquistados numa base de concertação, que eu não confundo, no actual regime, com concertação corporativa.
Quando o Sr. Deputado se senta a negociar um contrato colectivo com parceiros sociais representativos da outra parte na relação do trabalho, sente que está a praticar um acto corporativo? Se sente, é lá consigo!
O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Até essa legislação querem alterar!
O Orador: - Mas olhe, meu caro amigo, que o que eu lhe queria dizer era isto: o que eu queria era que, realmente, a legislação aprovada na Assembleia da República, ou aprovada pelo Governo, não tivesse um sentido completamente distorcido como tem, por exemplo, quando se aprova na Assembleia da República um diploma sobre despedimentos, nos termos em que eles estão regulamentados hoje em dia, no dia seguinte se diz - para sossego da economia em geral - que «não há perigo, pois há uma lei dos contratos a prazo que serve para compensar este sistema».
Tudo isto é um sistema de falsas compensações; é um sistema de distorções. É este sistema de distorções que tem de acabar, e as verdadeiras conquistas serão as conquistadas através do diálogo.
Sr. Deputado, foi isso que eu quis significar na minha intervenção.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Vítor Hugo Sequeira pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Vítor Hugo Sequeira (PS): - Para fazer um protesto em nome do meu grupo parlamentar, Sr. Presidente.
Vozes do PCP e do CDS: - Não pode!
O Sr. Presidente: - Não pode, Sr. Deputado.
O Sr. Vítor Hugo Sequeira (PS): - Em nome do meu grupo parlamentar, posso. O que não posso é em nome individual.
O Sr. Presidente: - Qual o artigo do Regimento que lhe permite fazer um protesto em nome do seu grupo parlamentar, Sr. Deputado?
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Fizeram o Regimento sem o ler!
O Sr. Vítor Hugo Sequeira (PS): - Sr. Presidente, lamento...
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O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Lamentamos todos!
O Orador: - ..., mas tinha em mente que em nome do meu grupo parlamentar poderia fazer esse protesto. Não o posso fazer, mas lamento porque a resposta que o Sr. Deputado Nogueira de Brito forneceu merecia esse protesto.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Oliveira e Costa, a sua posição é a mesma, suponho?
O Sr. Oliveira e Costa (PSD): - É, sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a sessão está suspensa até às 18 horas e 15 minutos.
Eram 17 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vão ser lidos pelo Sr. Secretário da Mesa os resultados das eleições para o cargo de Provedor da Justiça e para o de dois vice-secretários da Mesa da Assembleia da República.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a acta da eleição para o cargo de Provedor da Justiça é do seguinte teor:
Na reunião da Assembleia da República de 21 de Março de 1985, realizou-se o escrutínio para a eleição do Provedor de Justiça, a que se apresentaram os seguintes candidatos:
Angelo Vidal de Almeida Ribeiro e Eudoro Martins Pamplona Moniz de Sá Corte-Real.
Verificou-se que entraram nas urnas 208 votos, assim distribuídos:
Angelo Vidal de Almeida Ribeiro - votos «sim», 132
Eudoro Martins Pamplona Moniz de Sá Corte-Real - votos «sim», 41.
Votos «não», 26; votos nulos, 7; abstenções, 1; votos brancos, 1.
Verifica-se assim que nenhum dos candidatos obteve o número de votos necessários à respectiva investidura.
Os Secretários escrutinadores: Roleira Marinho - Luís Cacito.
A acta da eleição de dois vice-secretários para a Mesa da Assembleia da República é do seguinte teor:
Na reunião da Assembleia da República de 21 de Março de 1985, realizou-se o escrutínio para a eleição de dois vice-secretários para a Mesa da Assembleia da República, tendo-se apresentado os seguintes candidatos:
Armando Domingos Leiria Ribeiro Oliveira e Jorge Manuel Lampreia Patrício.
Verificou-se que entraram nas urnas 208 votos, assim distribuídos:
Armando Domingos Leiria Ribeiro Oliveira - votos «sim», 169; votos nulos, 20; abstenções, 14; votos brancos, 5.
Jorge Manuel Lampreia Patrício - votos «sim», 121; votos nulos, 57; abstenções, 20, votos brancos, 10.
Verifica-se assim que ambos os candidatos foram eleitos.
Os Secretários Escrutinadores: Roleira Marinho - Luís Cacito.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.° 78/111.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e da ASDI, votos contra do PC P, do MDP/CDE e da UEDS, e a abstenção do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora votar um requerimento de baixa à Comissão desta proposta de lei.
Vozes do PS e do PSD: - Sr. Presidente, o requerimento que entregámos na Mesa não diz respeito a esta proposta de lei.
O Sr. Presidente: - Têm razão, Srs. Deputados. Foi um lapso meu.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, queria tentar obter algumas informações da Mesa, ou eventualmente dos partidos da maioria, para que possamos ter algum entendimento quanto ao prosseguimento dos nossos trabalhos.
Quando foi agendada esta proposta de lei de autorização legislativa, foi dado a entender pêlos partidos da maioria que não haveria intenção de gastar muito tempo no debate na generalidade, uma vez que os partidos da maioria pretenderiam apresentar um requerimento para que a proposta de lei baixasse à Comissão e que nesta se travasse o debate e a discussão na especialidade.
Ora, como é lógico, iríamos votar favoravelmente o requerimento anunciado pela Mesa.
Se algum lapso houve, não foi certamente da nossa parte. Estamos na disponibilidade de passar à discussão na especialidade em Plenário, mas então, como é lógico, todo o sistema de tempos terá de ser revisto.
O Sr. Presidente: - Antes de clarificar esta questão, devo informar que há ainda uma votação final global que teremos de fazer.
Sr. Deputado Jorge Lemos, não havendo qualquer requerimento para a baixa à Comissão...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, para facilitar o trabalho da Mesa - e uma vez que a maioria não toma a iniciativa, apesar de a ter anunciado -
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nós iremos formalizar um requerimento no sentido de que a proposta de lei baixe à Comissão.
O Sr. Presidente: - Vamos então aguardar o requerimento, Sr. Deputado.
Pausa.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, houve uma troca de impressões entre as bancadas dos grupos parlamentares e chegou-se à conclusão de que, numa conferência de líderes, teria havido o compromisso no sentido de este diploma baixar à Comissão para aí ser apreciado na especialidade.
Na medida em que se estabeleceu esse compromisso, nós não temos senão que respeitá-lo, pelo que imediatamente farei chegar à Mesa um requerimento nesse sentido.
O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado. Vamos aguardar.
Pausa.
Srs. Deputados, o requerimento, cujo primeiro subscritor é o Sr. Deputado Carlos Lage, é do seguinte teor:
Os deputados abaixo assinados requerem a baixa à Comissão de Administração Interna e Poder Local da proposta de lei n.° 78/111 para que esta proceda à sua votação na especialidade, com o prazo de 10 dias.
Vamos votar, Srs. Deputados.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS, da UEDS e da ASDI e votos contra do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Lemos pede a palavra para que efeito?
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Apenas para anunciar o seguinte, Sr. Presidente: uma vez que em face do novo Regimento não é possível formular declarações de voto orais, iremos apresentar na Mesa uma declaração de voto escrita em que justificaremos a nossa abstenção, designadamente quanto ao prazo.
O Sr. Presidente: Srs. Deputados, antes de passar à votação final global do projecto de lei n.° 85/III, queria prestar uma informação à Câmara.
O Sr. Presidente da Assembleia da República comunicou-me que, em virtude de ser neste momento impossível verificar quais os grupos parlamentares que intervieram ou não intervieram na discussão na especialidade, a Mesa decidiu atribuir 3 minutos para a produção de declaração de voto aos grupos e agrupamentos que assim o desejarem.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, confesso que não entendemos muito bem a razão pela qual são concedidos 3 minutos para uma declaração.
Na verdade, vamos fazer uma votação final global e o Regimento parece ser omisso nesta matéria ou então apontar a impossibilidade de fazer qualquer declaração de voto numa votação global.
E aqui peço também a reflexão dos Srs. Deputados - e em particular dos Srs. Deputados António Capucho e Luís Beiroco (refiro-me em particular a este Sr. Deputado, uma vez que ele se tornou numa espécie de guardião da ortodoxia regimental!) - para o seguinte: na votação final global os grupos parlamentares, ao votarem, estão, de alguma maneira, a confirmar
- ou não - as votações que se fizeram na especialidade, pois que o Plenário chama a si uma decisão final sobre competências que atribuiu às comissões parlamentares. E pode haver, como é evidente, mudança de voto, atendendo à natureza e às consequências da discussão na especialidade.
Ora, parecia-me estranho que não se pudesse dizer nada, que não se pudesse dar uma explicação sobre essa mesma natureza da mudança de voto, se eventualmente ela se verificasse. Por isso, parece-me que, neste caso, deverá haver a possibilidade de uma declaração de voto para dar uma explicação sobre o sentido das votações a especialidade.
É uma opinião, mas não sei se os Srs. Deputados comungarão dela.
Já agora, gostaria que este assunto fosse rapidamente apreciado, mas não como o Sr. Presidente o colocou, porque pela maneira como pôs a questão não percebi bem a razão da atribuição dos 3 minutos.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lage, vou repetir o que disse há pouco.
O Sr. Presidente da Assembleia da República transmitiu-me que a Mesa tinha decidido atribuir a cada grupo e agrupamento parlamentar o tempo de 3 minutos para uma eventual declaração de voto que quisessem fazer no fim da votação. E isto porque, neste momento, não tem a Mesa qualquer possibilidade de averiguar quais tinham sido os grupos e agrupamentos que, na discussão na especialidade, tinham efectuado intervenções.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Carlos Lage pôs uma questão e sobre ela gostaria de dizer que, pela nossa parte, estamos totalmente de acordo com o ponto de vista subscrito por aquele Sr. Deputado e com os argumentos que teve oportunidade de expor na sua intervenção.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, fica então assente que, querendo, os grupos e agrupamentos parlamentares poderão produzir declarações de voto de 3 minutos.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global do projecto de lei n.° 85/III, sobre o património cultural português.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do deputado independente António Gonzalez.
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O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português acaba de renovar o voto que produziu no termo do debate na generalidade, porque, findos os trabalhos da subcomissão, pode afirmar que a iniciativa legislativa em apreço melhorou, de forma substancial, relativamente à matriz originária.
Com efeito, a lei que aprovámos desenvolve as disposições constitucionais nesta matéria, designadamente as constantes da alínea e) do artigo 9.°, quanto às tarefas fundamentais do Estado, e as da alínea c) do n.°2 e do n.°3 do artigo 78.°, de forma a promover a salvaguarda e a vivificação do nosso património histórico-cultural.
Consagra-se o papel relevante das Associações de Defesa do Património (ADP) bem como, ainda que insatisfatóriamente, o direito de acção popular.
Estabelecem-se regras de classificação e seu processo, com destaque para o elenco das normas específicas sobre a delimitação da área dos conjuntos e sítios.
Definem-se as competências da administração central, das autarquias locais e das regiões autónomas, mesmo que de modo não perfeito, mas, apesar de tudo, positivamente, tendo-se determinado os poderes e as obrigações de cada uma destas entidades.
Apuram-se os regimes do património arqueológico, do intercâmbio internacional, dos bens imateriais, das garantias e sanções face a actividades depredatórias, quaisquer que sejam os graus de ilicitude, e fomenta-se, embora de maneira não muito ousada, a fruição colectiva, a sensibilização popular para a intervenção nestes domínios concretos e a conservação e valorização do património cultural.
Pena foi que não tivesse sido possível, nesta sede, ir mais longe: à formação de conteúdos inovadores nas esferas do direito de acção popular, do acervo etnológico ou da participação das Associações de Defesa do Património.
Afigura-se-nos, por outro lado, vantajoso, que se tenha conseguido diminuir, conquanto em termos relativos, o peso excessivo do aparelho burocrático, do Ministério da Cultura enquanto instância decisória, em todos os terrenos sectoriais que temos presentes.
Fica vasto leque de assuntos para tratar em sede regulamentar, tais como a compra, venda e comércio de antiguidades e outros bens culturais móveis, o sistema peculiar de arrendamento de bens classificados, a transacção de bens com o estrangeiro e, sobretudo, como já pude afirmar, no que concerne a formas de intervenção das estruturas associativas ligadas ao tratamento qualificado da questão patrimonial e ao regular adequado, necessário e urgente das prescrições constitucionais do artigo 52.°, nomeadamente do seu n.° 2, no tocante ao direito de acção popular.
Outras medidas importariam, sobretudo no sentido de dar eficácia e limpidez à acção do IPPC e no domínio da criação de nova legislação material.
Não obstante, a aprovação do projecto de lei n.° 85/111 constitui, sem dúvida, um contributo extremamente valioso para, pondo cobro a alguma anomia vigente, dotar a ordem jurídica portuguesa de um diploma flexível para a defesa e para a vitalização do nosso património cultural.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo.
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD votou favoravelmente o texto final do projecto de lei n.° 85/III - Património cultural português, porquanto as alterações introduzidas na especialidade correspondem a tomadas de posição e a pontos de vista defendidos pelo nosso partido.
A presente lei de bases do património cultural passa a ser a referência, o quadro de toda uma política de defesa do património cultural do povo português.
Como foi acentuado na discussão na generalidade, o projecto de lei n.° 85/III, do CDS, retoma, nos seus aspectos essenciais, a anterior proposta de lei n.° 106/II, baseada nos estudos efectuados no Instituto Português do Património Cultural.
É bastante significativo o consenso obtido em relação a vários aspectos desta lei de bases do património cultural português. Cumpre ainda realçar que ela é o resultado ou epílogo de vários anos de aturado trabalho e até da apresentação de projectos de lei de outros grupos parlamentares em legislaturas passadas.
Congratulamo-nos, portanto, com a sua aprovação, porquanto vem preencher uma lacuna, articulando de uma forma bastante equilibrada a intervenção dos próprios particulares, das associações, das instituições, das autarquias e do próprio Estado. Poder-se-á mesmo afirmar que em muitas das suas disposições se vai bem longe na esteira de recomendações da UNESCO e do Conselho da Europa, no seu conceito integrado de património cultural.
Tendo presente o relatório da Subcomissão de Cultur da Comissão da Educação, Ciência e Cultura da Assembleia da República - que, aliás, não foi aqui lido -, verifica-se que a grande maioria das propostas apresentadas na especialidade mereceram o consenso dos deputados representantes dos diversos partidos.
Em plenário da referida Comissão, foi igualmente aprovada por todos os partidos, com excepção da ASDI, uma proposta do PCP, que, depois, de reformulada, passa a constituir o n.° 3 do artigo 6.° Aí se atribui às Associações de Defesa do Património (ADP) assentes no Conselho Consultivo do Instituto Português do Património Cultural, através de um representante seu, o que, atento o seu escopo, vai, seguramente, contribuir para que promovam directamente a defesa do património de uma maneira participada e viva. Tal representatividade assim atribuída irá, por outro lado, ser um estímulo a que se constitua, a nível nacional, uma estrutura representativa das referidas associações.
O movimento associativo ganhará com isso, assim como ganhará também a cultura portuguesa na sua expressão plural.
A Comissão aprovou por unanimidade uma proposta que passa a constituir o n.° l do artigo 15.°, segundo o qual os proprietários ou detentores dos bens classificados ou em vias de classificação devem:
a) Ter em consideração os problemas específicos da conservação do património, nas políticas de luta contra a poluição praticada a nível nacional ou internacional;
b) Apoiar a investigação científica no intuito de identificar e avaliar os efeitos prejudiciais da poluição, e definir os meios de reduzir ou eliminar as respectivas causas.
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O artigo 24.° da presente lei de bases resulta ainda de uma proposta, igualmente aprovada por unanimidade, nos termos da qual «nenhum monumento classificado ou em vias de classificação poderá ser removido total ou parcialmente, sem as necessárias garantias de preservação e salvaguarda material do mesmo».
Aliás, esta e outras preocupações estão, como já disse, na linha de orientações emanadas do Conselho da Europa.
Controversa foi ainda uma proposta apresentada pelo PCP que, visando a acção popular na defesa do património, acabou por ser retirada. Em sua substituição, foi aprovada, por unanimidade, uma outra, que constitui o artigo 59.°, proposta essa que consagra o direito à acção popular, na defesa do património cultural, a qualquer cidadão bem como a qualquer associação da defesa do património. Tal direito à acção popular terá de ser prosseguida «nos casos e nos termos definidos na lei».
Penso ser oportuno assinalar que o Conselho da Europa tem em apreciação uma convenção, no âmbito da sua Comissão de Cultura e Educação, tendente a preservar os bens culturais da criminalidade, com base no entendimento de que existe um património cultural europeu a defender, assenta numa ideia de solidariedade. Há, portanto, que adoptar normas internacionais com esse objectivo, completando-se, assim, aspectos que não estão contidos noutras convenções penais europeias.
Daí que, provavelmente nos próximos tempos, o Governo Português, na qualidade de Estado membro do Conselho da Europa, venha a ter oportunidade de vir a ratificar a Convenção Europeia sobre as Infracções que Visam os Bens Culturais. Ficará, pois, a constituir mais uma instrumento jurídico destinado a salvaguardar o património cultural português, como parte integrante do património cultural europeu, cuja protecção deve, portanto, ser assegurada por todos os Estados membros.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem agora a palavra o Sr. Deputado Raul e Castro.
O Sr. Raul e Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O MDP/CDE votou favoravelmente este projecto de lei por ele vir, apesar das suas insuficiências, colmatar uma grave lacuna.
Este projecto de lei, amplamente discutido na Comissão de Educação, que para essa discussão recorreu a muito material e pareceres de instituições, deve--se não ao interesse que os seus autores (CDS) puseram no projecto mas ao esforço, trabalho honesto e persistente do coordenador da Subcomissão, Sr. Deputado Coelho Pires.
Apesar de o trabalho da Comissão de Educação e Cultura se ter orientado pelo justo critério do interesse nacional que reveste uma lei do património cultural, esse esforço não substitui a justeza de uma discussão pública que não foi feita. Tal como uma lei base da educação, uma lei normativa do património cultural deveria ter sido discutida por todo o País, para aproveitar por completo o saber e a experiência dos grupos organizados e não institucionais e, por outro lado, para se aproveitar a oportunidade de possibilitar uma larga dinamização junto das populações, já que a sua colaboração empenhada é base de eficácia de qualquer lei do património cultural.
A aprovação desta lei implica uma revisão crítica dos cerca de 40 projectos de lei adormecidos nas comissões parlamentares ou rejeitados por motivos demasiado circunstanciais. Referimo-nos sobretudo a todos aqueles que dizem respeito às associações de defesa e dinamização do património cultural.
A ênfase dada pela revisão da Constituição ao património cultural não foi acto gratuito dos deputados, foi antes a força da realidade imposta pela mudança social a que foi sensível esta Assembleia, e realidade à qual os estados-maiores dos partidos responsáveis pela revisão da Constituição deram o seu assentimento.
Esta responsabilidade política obriga não só à regulamentação correcta desta lei, como a todas as leis consequentes desde as competências das autarquias até à acção nas escolas, nas associações recreativas, passando, é claro, pelas associações de defesa do património cultural.
Aplausos do PS e do PCP.
O Sr. Presidente: - Também para um declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Coelho Pires.
O Sr. Coelho Pires (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquando da discussão na generalidade do projecto de lei n.° 85/III, apresentado pelo CDS, deixámos bem claro que só obteria o nosso voto favorável com a condição de lhe serem introduzidas benfeitorias que considerávamos indispensáveis para o tornar numa lei que efectivamente contribuísse para a salvaguarda e valorização do património cultural português.
Comparando o texto original com o texto agora votado, reconhece-se facilmente que essa condição foi satisfeita. Daí o nosso voto favorável.
A origem deste projecto de lei é de todos conhecida. O CDS limitou-se a assumir a sua paternidade. Como não o concebeu, não lhe ganhou amor e cedo o enjeitou.
Não mostrou o mínimo interesse em participar na discussão na especialidade. Nunca se mostrou disponível para discutir uma única das muitas propostas de alteração que foram surgindo.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - É verdade!
O Orador: - Não fora a persistência e a vontade dos outros partidos e este projecto de lei ficaria no esquecimento e seriam mais uma vez frustradas as expectativas criadas nos diversos agentes culturais.
É da mais elementar justiça realçar aqui a colaboração preciosa prestada por numerosos técnicos que exercem a sua actividade no âmbito do património cultural, enviando sugestões e propostas à Subcomissão de Cultura, o que muito contribuiu para o enriquecimento desta lei.
Temos agora uma lei do património cultural português. É sem dúvida um instrumento legal importante, mas não podemos criar a ilusão de que todos os problemas do património cultural estão resolvidos.
Sem uma acção pedagógica junto das populações e até junto dos autarcas, sem meios e, sobretudo, sem vontade política, tudo poderá continuar como dantes.
É, pois, necessário criar estruturas regionais e revitalizar as já existentes, pois quem conhece o património cultural e o sente como seu está em melhores condições de o defender e valorizar.
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Os meios de que o Ministério da Cultura dispõe são, sem dúvida, exíguos para tão grande e importante tarefa, mas a competência e a perspectiva cultural do actual Ministro, a quem caberá regulamentar esta lei, deixa-nos a consciência tranquila.
Aplausos do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.° 85/III, como o havíamos salientado quando da sua discussão na generalidade, constituiu uma boa base de trabalho numa área que se achava carecida de uma clara definição de conceitos, atribuição de competências e previsão de medidas numa área tão importante como é aquela em que se inscreve o nosso «património cultural».
A discussão a que se procedeu na Comissão de Educação, Ciência e Cultura é merecedora de toda a saliência, pois não se poupou a um aprofundado estudo da matéria: alargou para além dos seus membros a recolha de dados importantes junto de instituições e entidades que à causa do património e sua defesa e preservação vêm prestando a melhor das atenções.
O texto final obtido, pode dizer-se, assim, contempla o essencial do que pode e deve exigir-se a um diploma que aspira a constituir como que uma lei quadro sobre o património cultural, cabendo agora ao Governo e às autarquias locais dar-lhe o necessário desenvolvimento e aplicação na prática, dentro do âmbito das respectivas competências.
A partir desta lei pode afoitamente dizer-se que se dota o País de um instrumento legislativo claramente perspectivado para a defesa e enriquecimento do nosso património cultural.
Este breve e simplificado juízo sobre o diploma é por si bastante para justificar o nosso voto positivo nesta votação final global.
Aplausos da ASDI, do PS e do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, é só para informar a Mesa e a Câmara de que entregaremos uma declaração de voto por escrito.
O Sr. Presidente: - Visto não haver mais declarações de voto, vamos, Srs. Deputados, retomar o debate do projecto de lei n.° 105/III, apresentado pela ASDI.
Tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira para interpelar a Mesa.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sob a forma de interpelação à Mesa, queria informar VV. Ex.as, meus distintos colegas...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, pêlos vistos, o que V. Ex.ª pretende é fazer uma declaração de voto, não? A Mesa concede-lhe a palavra.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Não, Sr. Presidente. É para uma interpelação à Mesa.
Hoje à tarde - tendo tido o cuidado de ontem mesmo efectuar uma comunicação para o Forte Militar de Caxias -, eu próprio e os meus colegas Margarida Marques e Nuno Alpoim fomos impedidos pelo comandante do respectivo Forte - cumprindo, segundo nos informou, instruções da hierarquia militar -, fomos impedidos, dizia, de visitar o Sr. Tenente-Coronel Ótelo Saraiva de Carvalho, detido no referido Forte a aguardar julgamento.
O Sr. Jorge Gois (CDS): - Se calhar foi por ser o «Dia do Pai»...
Risos do CDS.
O Orador: - Consequentemente, resolvemos efectuar as diligências necessárias para compreender as razões de tão insólita atitude, já que nos foi comunicado que a hierarquia militar - Serviços Prisionais e Estado-Maior-Geral das Forças Armadas - interditava a todos os que não fossem parentes em 1.° grau do Sr. Tenente-Coronel as visitas ao detido, englobando nessa exclusão os próprios deputados à Assembleia da República.
O Sr. Dorilo Seruca (UEDS): - É uma vergonha!
O Orador: - Penso que tenho o direito e o dever de dar conhecimento deste facto ao Plenário da Assembleia da República.
O Sr. Presidente: - Vamos, então, continuar o debate do projecto de lei n.° 105/III, pelo que concedo de imediato a palavra, para uma intervenção, ao Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na intervenção do meu camarada de bancada Manuel Lopes já foram avançadas algumas considerações que fundamentaram a nossa posição de voto, sujeita, obviamente, ao desenrolar dos trabalhos em comissão.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - No entanto, para um observador menos atento ou para um deputado que não tenha estado presente ao debate, poderia tomar-se como paradoxal o já anunciado voto unânime da Assembleia em relação ao projecto de lei n.° 105/III, da ASDI. Com o devido respeito pelo esforço construtivo de quem tem a paternidade desta iniciativa, que, em nossa opinião, contém um sentido positivo, embora tímido, poderia dizer-se que todos os grupos parlamentares, no momento de uma grave situação social, encaram o projecto de lei não tanto como um bom remédio para atender as maleitas sociais, mas como uma espécie de
- e salvo a publicidade- «melhorai», que não faz bem nem faz mal!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Mas, a partir de uma ideia positiva contida no projecto de lei da ASDI, foram tecidas considerações que encerram, no fundo, os conceitos que cada um tem das obrigações do patronato e do direito de intervenção e participação dos trabalhadores, tal como é definido da Constituição da República Portuguesa - e aqui bancadas houve que foram derrotadas durante o processo de revisão da Constituição, nomea-
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damente em termos do direito do controle de gestão ou na co-responsabilidade e da co-gestão. De facto, os deputados constituintes criaram este conceito que está contido no artigo 55.° da Constituição.
É que a Constituição, porque sabe que os trabalhadores não participam no Poder, um poder que não dominam, dá-lhes o direito de intervir através do controle de gestão e não na co-responsabilização desse mesmo Poder, um poder que, como já disse, não dominam!
Quanto ao CDS, um dos derrotados aquando da inclusão na Constituição do princípio do controle da gestão, não nos surpreende as suas teses de liquidação dos direitos fundamentais dos trabalhadores que a Constituição reconhece! Aliás, não é por acaso que, segundo nos informam, o CDS não reconhece, por exemplo, a Comissão de Trabalhadores da Assembleia da República com o argumento de que aqui, nesta Casa, não existiria a necessidade de os trabalhadores se organizarem em comissão de trabalhadores. Isto é elucidativo.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É um escândalo!
O Sr. José Magalhães (PCP): - É timbre!
O Orador: - Mas ver neste projecto a possibilidade de co-responsabilização, de conciliação e de concertação de classes não tem sentido à luz da lei fundamental.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É uma boa piada!
O Orador: - E dizer, como foi dito aqui, que é assim que caminhamos para a paz e para a justiça social, escamoteando que o Governo engatilhe leis que ilegalizaria precisamente esses direitos fundamentais dos trabalhadores, é um pouco como discutirmos e saudarmos a árvore enquanto o Governo se prepara para abater a floresta.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este passo tímido da ASDI, este projecto tão limitado, nomeadamente no âmbito das matérias a incluir no balanço social nas empresas onde se aplica, não pode servir para que alguns esqueçam as responsabilidades da política social que está a ser seguida pelo Governo, assim como na destruição dos direitos constitucionais dos trabalhadores. Cumpra-se a Lei n.° 46/79, nomeadamente o direito de controle de gestão, e não só...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!
O Orador: - ... nomeadamente a questão dos gestores eleitos pelos trabalhadores que há 5 anos aguardam entrar em funções, enquanto se repartem tachos, lugares e cargos nas empresas públicas e nacionalizadas em que os trabalhadores, com o seu voto directo e secreto, elegeram centenas de representantes.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!
O Orador: - E esta, a Lei n.° 46/79, uma lei da República aprovada aqui, na Assembleia, essa o Governo não a cumpre. Não se escamoteiem, portanto, as coisas porque o que é importante é, de facto, respeitar as leis existentes, tal como a Constituição da República aponta.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Por último, não se tome este projecto como uma cortina de fumo ou panaceia para esconder no discurso os problemas sociais, as intenções e as ilegalidades cometidas pelo Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projecto tem o valor que tem e com as nossas propostas procuraremos desenvolver as ideias positivas que os autores do projecto tiveram quando o apresentaram na Assembleia da República.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, já aqui manifestámos favoravelmente a aprovação deste projecto, aliás o mesmo acaba de fazer o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa e já o tinha feito, também, o Sr. Deputado Manuel Lopes em nome do mesmo grupo parlamentar. Queria, de qualquer forma, perguntar-lhe se, apesar de terem considerado este projecto como um projecto tímido, não pensam que este tipo de instrumentos, nomeadamente o balanço social eventualmente melhorado após o debate aprofundado na especialidade, não pode ser mais um elemento que contribua para a clarificação da situação nas empresas e que, portanto, ajude a detectar, de facto, em cada uma delas, a situação real e os problemas reais que dentro delas existem.
A segunda questão relaciona-se com esta: não será então, também, eventualmente melhorado este balanço social quando exista um instrumento que venha a facilitar o próprio controle de gestão em termos em que a legislação vigente o determina?
Independentemente destas questões, queria colocar uma questão paralela à que formulei há pouco ao Sr. Deputado Vítor Hugo Sequeira e sobre a qual gostava de ter a sua opinião, não só como deputado mas até como sindicalista que foi durante alguns anos. Considera que este limite dos 200 trabalhadores, aqui proposto, é um limite que se deve manter rígido durante um largo tempo ou pensa que o devemos tomar mais como uma indicação para aplicação experimental da lei durante um período que, depois, progressivamente, seria estendido a empresas de menor dimensão?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Deputado Hasse Ferreira, agradeço-lhe o seu pedido de esclarecimento que, de certa forma, me compensa face ao silêncio do Governo e do Sr. Ministro do Trabalho, que, com certeza, teria alguma questão a levantar em relação a esta matéria. Mas parece que o Sr. Ministro só fala em despedimentos e na alteração da lei da greve!...
De qualquer forma, agradecendo-lhe as perguntas que me colocou, devo dizer-lhe que nós entendemos que este tipo de instrumentos, de facto, pode contribuir para o desenvolvimento do próprio controle de gestão, mas que o balanço social, em sim, não se substitui ao controle de gestão.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!
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O Orador: - Quando a Constituição da República aponta que constituem direitos das comissões de trabalhadores: receber todas as informações necessárias ao exercício da sua actividade; exercer o controle de gestão nas empresas; participar na elaboração da legislação de trabalho; promover a eleição de representantes dos trabalhadores, etc.; quando a própria Lei n.º 46/79, no seu artigo 23.º, especifica matérias muito importantes em relação ao controle de gestão, obviamente nós dizemos que privilegie essa lei da República e vamos olhar seriamente, também, para o balanço social como uma boa achega e como um bom contributo, positivo, para que esse direito seja, de certa forma, potenciado.
Entendemos que o balanço social não pode servir para algumas argumentações que aqui se ouviram, no sentido de ser assim que caminhamos para a paz social, para a concertação, etc., quando, de facto, uma lei da República é escamoteada aos trabalhadores, nomeadamente às próprias comissões de trabalhadores.
Quanto à questão dos 200 trabalhadores a que o meu camarada de bancada Manuel Lopes se referiu, pensamos que pela estrutura actual das empresas portuguesas, onde existem milhares e milhares de empresas com menos de 100 trabalhadores - já não digo 200 -, valeria a pena não se considerar como rígido este número e que, na especialidade, a Comissão e a própria ASDI como proponente do projecto pudessem ter em conta uma maior flexibilidade de forma a que outras empresas de menor número de trabalhadores fossem, também, abrangidas pelo próprio balanço social.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Como não há mais inscrições considero encerrado o debate.
Srs. Deputados, esta matéria é uma marcação da ASDI, que ao abrigo do n.º 4 do artigo 61.º, tem o direito de requerer a votação no fim da reunião. Pergunto, portanto, à ASDI se requer a votação.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Naturalmente, Sr. Presidente. Eu entendi esse direito como sendo uma emergência. Quer dizer, o debate ainda não está terminado e antes de terminar a sessão deve haver esse direito. Uma vez que o debate terminou antes de terminar a sessão, naturalmente que à discussão e debate se seguirá a votação.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a pergunta resulta do facto de o Regimento em vigor marcar para as dezoito horas as votações.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, compreendo-o perfeitamente, portanto fica feito o requerimento para a votação.
O Sr. Presidente: - Nesse caso, Srs. Deputados, vamos votar o projecto de lei n.º 105/III.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do deputado independente António Gonzalez.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados vamos proceder à leitura do requerimento de baixa à Comissão.
Foi lido. É o seguinte:
Nos termos regimentais da Assembleia da República e tendo em vista uma discussão aprofundada na especialidade, visando a melhoria do projecto de lei n.º105/III, os deputados abaixo assinados solicitam que este baixe à Comissão de Trabalho.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do deputado independente António Gonzalez.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se ao anúncio da entrada e admissão de alguns diplomas.
O Sr. Secretário (Roleira Marinho): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, entraram na Mesa os seguintes documentos: recurso da admissibilidade da proposta de lei n.º 101/III, apresentado pelo PCP, que foi admitido e baixa à l.ª Comissão para efeitos do n.º 4 do artigo 134.º do Regimento; projecto de resolução n.º 44/III, apresentado pelo PS, PSD, PCP, CDS, MDP/CDE, UEDS e ASDI, sobre a constituição da Comissão especial que irá dar parecer sobre se S. Ex.ª o Ministro da Qualidade de Vida, Dr. Francisco José de Sousa Tavares, deverá ou não ser suspenso de acordo com o cargo que ocupa, que foi admitido; projecto de lei n.º 460/III, apresentado pelo Sr. Deputado António Capucho - Condiciona a afixação de publicidade ou de propaganda, bem como a realização de inscrições ou de pinturas murais -, que foi admitido e baixa às 1.ª e 10.ª Comissões; projecto de lei n.º 461/III, apresentado pelo Sr. Deputado Joaquim Gomes dos Santos e outros, do PCP Criação da freguesia de Memória, no concelho de Leiria -, que foi admitido e baixa à 10. º Comissão; projecto de lei n.º 462/III, apresentado pela Sr.ª Deputada Odete Santos e outros, do PCP Criação do município de Azeitão, no distrito de Setúbal; projecto de lei n.º 463/III, apresentado pelo Sr. Deputado Rocha de Almeida e outros, do PSD - Alteração ao Decreto n.º 48 297, de 28 de Março de 1968 -, que foi admitido e baixa à 10.ª Comissão; e projecto de lei n.º 464/III, apresentado igualmente pelo Sr. Deputado Rocha de Almeida e outros, do PSD - Criação da freguesia de Santa Catarina, no concelho de Vagos -, que foi admitido e baixa à 10. º Comissão.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, a nossa bancada está com algumas dúvidas. É que ouvimos referir um projecto de lei contra as pinturas murais...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Murais e imorais! ...
Risos do CDS.
O Orador: - ... e se é contra a arte impugnamo-lo já. Por isso gostávamos de saber qual era o título do projecto.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É para resolver alguns problemas do vosso partido!...
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O Sr. José Magalhães (PCP): - É aquela coisa do «Soares Rua!»
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o Sr. Secretário vai verificar e repetir.
O Sr. Secretário (Roleira Marinho): - Sr. Deputado, trata-se do projecto de lei n.º 460/III, subscrito pelo Sr. Deputado António Capucho, do PSD, que condiciona a afixação de publicidade ou de propaganda, bem como a realização de inscrições ou de pinturas murais. Foi admitido e baixa à 10. º Comissão.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Só com a autorização do governo civil!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 10 horas, com período de antes da ordem do dia e período da ordem do dia. Do período da ordem do dia consta a discussão do inquérito parlamentar n.º 9/III, subscrito pelo PCP, tendente a apurar em que obras ou empreendimentos da responsabilidade da Secretaria de Estado das Obras Públicas se verificaram desmoronamentos e outras anomalias, bem como as respectivas causas, implicações e responsabilidades, e a votação final global dos diplomas sobre o objector de consciência, que terá lugar às 12 horas.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 40 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Alberto Manuel Avelino. António Gonçalves Janeiro. António Jorge Duarte Rebelo de Sousa. António Manuel do Carmo Saleiro. Carlos Justino Luís Cordeiro. Dinis Manuel Pedro Alves. Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues. Francisco Igrejas Caeiro. Frederico Augusto Händel de Oliveira. João Joaquim Gomes. Joaquim José Catanho de Menezes. Joaquim Manuel Ribeiro Arenga. José de Almeida Valente. José Carlos Pinto Basto Mota Torres. José Luís do Amaral Nunes. José Manuel Lello Ribeiro de Almeida. José Manuel Niza Antunes Mendes. José Manuel Torres Couto. José Maria Roque Lino. Leonel de Sousa Fadigas. Luís Abílio da Conceição Cacito. Manuel Alegre de Melo Duarte. Maria do Céu Sousa Fernandes. Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia. Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo. Victor Hugo Sequeira.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
Adérito Manuel Soares Campos. Amândio Domingues Basto Oliveira.
António d'Orey Capucho. António Sérgio Barbosa de Azevedo. Arménio dos Santos. Carlos Miguel Almeida Coelho. Cecília Pita Catarino. Cristóvão Guerreiro Norte. Fernando José Alves Figueiredo. Fernando Manuel Cardoso Ferreira. Francisco Antunes da Silva. Francisco Jardim Ramos. Guido Orlando Freitas Rodrigues. João Pedro de Barros. Joaquim Eduardo Gomes. Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro. José Ângelo Ferreira Correia. José António Valério do Couto. José Augusto Seabra. José Bento Gonçalves. Manuel da Costa Andrade. Manuel Ferreira Martins. Manuel Maria Moreira. Maria Margarida Salema Moura Ribeiro. Mariana Santos Calhau Perdigão. Marília Dulce Coelho Pires Raimundo. Pedro Augusto Cunha Pinto. Pedro Miguel Santana Lopes. Pedro Paulo Carvalho Silva. Raul Gomes dos Santos. Rui Manuel de Oliveira Costa. Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Partido Comunista Português (PCP):
António Dias Lourenço. António José Almeida Silva Graça. Carlos Alberto da Costa Espadinha. Carlos Alberto Gomes Carvalhas. Georgete de Oliveira Ferreira. João António Torrinhas Paulo. Joaquim Gomes dos Santos. Lino Carvalho de Lima. Manuel Correia Lopes. Manuel Rogério de Sousa Brito. Paulo Areosa Feio. Zita Maria Seabra Roseiro.
Centro Democrático Social (CDS):
Abel Augusto Gomes Almeida. Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares. António Filipe Neiva Correia. António Gomes de Pinho. Basílio Adolfo Mendonça Horta Franca. Francisco António Lucas Pires. Henrique Manuel Soares Cruz. João Lopes Porto. João António Morais Sarmento Moniz. José Henriques Meíreles Barros. José Luís Nogueira de Brito. Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia. Luís Eduardo da Silva Barbosa. Luís Filipe Paes Beiroco. Narana Sinai Coissoró. Ruy Manuel Correia Seabra. Manuel Tomás Rodrigues Queiró. Manuel Leão Castro Tavares.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
Raul Morais e Castro.
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Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):
António Poppe Lopes Cardoso. Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):
Ruben José de Almeida Raposo.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Alberto Rodrigues Ferreira Camboa. Almerindo da Silva Marques. António Manuel Azevedo Gomes. Beatriz Almeida Cal Brandão. Eurico Faustino Correia. Fernando Alberto Pereira de Sousa. Maria de Jesus Simões Barroso. Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo. Rui Fernando Pereira Mateus.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
Alberto Augusto Faria dos Santos. Carlos Alberto da Mota Pinto. Fernando José da Costa. José Luís de Figueiredo Lopes. José Pereira Lopes. José Vargas Bulcão. Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Partido Comunista Português (PCP):
Domingos Abrantes Ferreira. Joaquim António Miranda da Silva. Maria Luísa Mesquita Cachado.
Centro Democrático Social (CDS):
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia. José Augusto Gama.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
José Manuel Tengarrinha.
Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):
Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Declaração de voto do Sr. Deputado Jorge Lemos (PCP) enviada à mesa para publicação ao abrigo do disposto no artigo 92.º do Regimento.
O Grupo Parlamentar do PCP absteve-se na votação do requerimento subscrito por deputados do PS e PSD, relativo à baixa à Comissão para votação na especialidade, da proposta de autorização legislativa n.º 78/III, por considerar que o prazo de 10 dias nele fixado para tal fim é manifestamente insuficiente para a correcta e completa apreciação na especialidade do referido diploma.
Assembleia da República, 21 de Março de 1985. Pelo Grupo do PCP, Jorge Lemos.
Declaração de voto do Sr. Deputado Gomes Pinho (CDS) enviada è Mesa para publicação, ao abrigo do disposto no
artigo 92.º do Regimento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A votação a que acabamos de proceder constitui um momento importante para o CDS e para esta Assembleia.
Para o CDS, porque se acabou de aprovar um projecto do nosso partido, o que demonstra que para nós ser oposição não é apenas criticar (embora o seja e tenha que ser) mas apontar alternativas, tomar a iniciativa, suprir as omissões do Governo e da sua maioria, enfim promover, no quadro parlamentar, a construção de soluções concretas para os problemas portugueses.
Mas é também importante porque esta iniciativa do CDS, o projecto de lei n.º 85/III (Património cultural português), foi aprovada por unanimidade, o que demonstra que o CDS não é apenas capaz de dialogar com todas as outras forças políticas como é um partido especialmente vocacionado para esse diálogo e para o qual o ser do centro representa não uma mera posição geométrica mas, sobretudo, uma atitude de realismo que nos leva a privilegiar a resolução de problemas concretas ao puro debate ideológico, nem que para tal tenhamos de abdicar do essencial da nossa doutrina.
E esta lei é o exemplo disso, porque, contendo o essencial de uma concepção de património cultural que rejeita a visão materialista e se funda na ideia de que a História é uma obra do Homem por ele determinada e a que só a sua dignidade pessoal dá sentido, conjuga, de forma equilibrada, os direitos individuais dos detentores dos bens materiais com a sua responsabilidade perante a colectividade.
E é por isso que acreditamos que será um mecanismo eficaz ao serviço da defesa dos nossos valores culturais.
Mas esta lei é ainda importante porque representa a conclusão de um longo e penoso processo. Várias vezes, em várias circunstâncias e por vários motivos esta lei foi proposta, discutida, mas nunca aprovada.
É, pois, ainda de lembrar e saudar sem discriminação todos os que, desde há vários anos, no Parlamento e em todas as bancadas, no Governo, e em particular no Ministério da Cultura, nos serviços, e em especial no Instituto Português do Património Cultural, nas autarquias, nas associações da defesa do património, lutaram por esta lei, nela trabalharam, para ela contribuíram e agora vêem finalmente coroados os seus esforços.
A lei do património cultural é, porém, importante, ainda, pela sua natureza e oportunidade. Defender o património cultural é, neste momento de crise profunda, defender a nossa própria identidade, preservar e potenciar a reserva moral que ele exprime e que é indispensável que, como país independente, possamos afrontar os desafios e pôr em comum, de forma mobilizadora, as energias acumuladas ao longo do percurso histórico em que o País foi sendo construído.
Não é, pois, o património, como uma realidade estática e morta, que se trata de preservar. É o património como memória colectiva, bem viva, capaz de enformar o presente, que se pretende trazer ao nosso convívio, religando os vários elos a esta cadeia que a vida de um povo constitui e de que nós constituímos apenas o presente.
E por isso o meu pensamento se dirige particularmente para os jovens, a que temos o dever de trans-
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mitir intacto e enriquecido o património cultural que nos foi legado, mas sobretudo a quem temos de dar condições para o usufruir e entender, como condição da sua própria identificação com a nação em que se integram e que hão-de continuar no futuro.
Esta lei vem, pois, abrir as portas para que se reforce a consciência nacional da nossa própria História, e essa consciência constituirá cada vez mais um dos suportes mais sólidos da forte motivação que nos é exigida para que possamos assumir as responsabilidades individuais e colectivas que a situação que vivemos nos atribui.
Dir-me-ão que esta é apenas uma lei. Mais uma lei. E até que infelizmente as leis em Portugal valem cada vez menos. Mas o facto de finalmente ela ser aprovada, e por unanimidade, é já um passo muito importante. O primeiro passo para uma mobilização de esforços, a nível nacional, para um combate sério e consequente à crescente degradação do património. O desencadear de uma campanha para a sua recuperação e a tomada de medidas ousadas para que o maior número possível de portugueses o possa fruir.
Mas acreditar na democracia é também ter a convicção de que a vontade política expressa neste Parlamento é a vontade nacional, e neste caso, como ficou demonstrado, é a vontade unânime dos Portugueses.
E, se assim é, este momento não é apenas de júbilo, é sobretudo um momento de esperança.
O Deputado do CDS, António Gomes de Pinho.
Relatórios e pareceres da Comissão de Regimento
e Mandatos enviados á Mesa para publicação
Em reunião realizada no dia 21 de Março de 1985, pelas 17 horas e 30 minutos, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:
Solicitada pelo Partido Socialista:
Maria de Jesus Simões Barroso Soares (círculo eleitoral de Faro) por Joaquim Manuel Leitão Ribeiro Arenga. Esta substituição é pedida por 6 meses, a partir do próximo dia 22 de Março corrente, inclusive.
Solicitadas pelo Partido do Centro Democrático Social:
Joaquim Rocha dos Santos (círculo eleitoral do Porto) por José Henrique Ribeiro Meireles Barros. Esta substituição é pedida por um período de 15 dias, a partir do dia 21 de Março corrente, inclusive.
José Víeira de Carvalho (círculo eleitoral do Porto) por Manuel Leão Rosas Castro Tavares. Esta substituição é pedida por um período de 15 dias, a partir do dia 21 de Março corrente, inclusive.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.
A Comissão: Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - Vice-Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretários, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves (PS) - José Maria Roque Lino (PS) - Luís Silvério Gonçalves Saias (PS) - Teófilo Carvalho dos Santos (PS) - Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - Daniel Aba7io Ferreira Bastos (PSD) - José Mário Lemos Damião (PSD) - Maria Margarida Salema Moura Ribeiro (PSD) - José Manuel Mendes (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) António Poppe Lopes Cardoso (UEDS) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).
OS REDACTORES, Carlos Pinto da Cruz - Ana Maria Marques da Cruz - Leonor Ferreira.
PREÇO DESTE NÚMERO 156$00
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.