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DIÁRIO da Assembleia da República

I Série - Número 91

Quarta-feira, 12 de Junho de 1985

III LEGISLATURA
2.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 11 DE JUNHO DE 1985

Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Exmos. Srs. Leonel de Sousa Fadigas

José Mário de Lemos Damião
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberra a sessão às 15 horas e 25 minutos.

Antes de ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, do apresentação de requerimentos e respostas o requerimentos e da entrada na Mesa de várias propostas e projectos de lei.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo (PCP), a propósito da assinatura do Tratado de Adesão de Portugal à CEE, criticou o Governo por não ter facultado à Assembleia não só os dossiers completos da adesão como o próprio texto do Tratado. Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Carlos Lage (PS) e Hasse Ferreira (UEDS).
Em declaração política, o Sr. Deputado Lopes Cardoso (UEDS) falou sobre a actual situação política, tendo respondido, no fim, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Beiroco (CDS) e Carlos Brito (PCP).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado José Luís Nunes (PS) referiu-se igualmente à questão da assinatura do Tratado de Adesão de Portugal à CEE, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Capucho (PSD) - que fez também um protesto - e Luís Beiroco (CDS).
O Sr. Deputado Guerreiro Norte (PSD) chamou a atenção da Câmara para as condições em que o Conservatório Regional do Algarve vem desenvolvendo a sua acção.
Depois de lido pela Mesa, foi discutido e aprovado um voto de congratulação, apresentado pelo CDS, pela assinatura do Tratado de Adesão de Portugal à CEE. Intervieram no debate, incluindo declarações de voto, os Srs. Depurados Luís Beiroco (CDS), Carlos Lage (PS), Carlos Brito (PCP), Lopes Cardoso (UEDS) e José Vitorino (PSD).
Ordem do dia. - Na primeira parte, foi aprovado o pedido de prorrogação do prazo cometido à Comissão Eventual de Inquérito à Radiotelevisão Portuguesa, E. P. para conclusão dos seus trabalhos.
Foi igualmente aprovado um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos concedendo autorização a um deputado para depor como testemunha.

Na segunda parte, deu-se início à apreciação da ratificação n.º 133/III (CDS), respeitante ao Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, que aprova o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA). Intervieram no debate, a diverso titulo, além do Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias), os Srs. Deputados Nogueira de Brito (CDS), Hasse Ferreira (UEDS), Carlos Lage e Domingues Azevedo (PS), Octávio Teixeira e Ilda Figueiredo (PCP).
0 Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Gonçalves Janeiro.
António José Santos Meira.
António Manuel Azevedo Gomes.
António do Manuel do Carmo Saleiro.
Armando António Martins Vara.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Händel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeira Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.

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I SÉRIE - NÚMERO 91

Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Luís Duarte Fernandes.
João do Nascimento Gama Guerra.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José António Borja dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto Basto Mota Torres.
José da Cunha e Sá.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Leonel de Sousa Fadigas.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.
Walter Ruivo Pinto Gomes Rosa.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Agostinho Correia Branquinho.
Anacleto Silva Baptista.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Pedro de Barros.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José António Valério do Couto.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Augusto Seabra.
José Bento Gonçalves.
José Mário de Lemos Damião.
José Silva Domingos.
Leonel Santa Rita Pires.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Luísa Mesquita Cachado.
Maria Margarida Tengarrinha.
Octávio Augusto Teixeira.
Zita Maria Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Alexandre Carvalho Reigoto.
António Filipe Neiva Correia.
António José de Castro Bagão Félix.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
João Gomes de Abreu Lima.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Luís Nogueira de Brito.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António Almeida Vasconcelos.

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12 DE JUNHO DE 1985

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António Poppe Lopes Cardoso.
Francisco Alexandre Pessegueiro.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Carta

De Alexandre Guimarães, residente em Aveiro, a remeter cópia de uma exposição dirigida ao Sr. Provedor de Justiça, na qual se manifesta contra o que considera como uma discriminação, a forma como foi concedida a sua pensão de aposentação.

Ofícios

Da Junta de Freguesia de Tadim, Braga, a remeter fotocópia da exposição enviada ao Sr. Secretário de Estado e outras entidades ligadas à educação, relativamente à escola secundária daquela localidade e ao seu aproveitamento.
Da Câmara Municipal de Odemira a remeter cópia de parte da acta da reunião realizada em 15 de Maio, de onde consta a deliberação respeitante à escola secundária daquela localidade, cuja construção exigem seja levada a cabo urgentemente.
Da Câmara Municipal de Valença a remeter fotocópia autêntica da minuta da acta da reunião efectuada em 20 de Maio naquela autarquia, a qual, a partir daquela data, dá cumprimento integral às disposições contidas no Decreto-Lei n.º 390/82, de 17 de Setembro.

Telegramas

De Carlos Cordeiro, antigo presidente da Junta de Freguesia de Águas Santas, concelho da Maia, manifestando-se contra a pretensa divisão administrativa da mesma freguesia.
De trabalhadores do Hospital Distrital de Portalegre, exigindo o pagamento imediato das horas suplementares cortadas a partir de Março, assim como a rápida resolução da situação financeira daquele estabelecimento hospitalar.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Foram apresentados nas últimas reuniões plenárias os seguintes requerimentos:
A diversos ministérios, num total de 8, formulados pelo Sr. Deputado António Gonzalez; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Carlos Brito e Margarida Tengarrinha; ao Ministério da Saúde, formulado pela Sr.ª Deputada Rosa Albernaz; à Secretaria de Estado das Pescas, num total de 2, formulados pelo Sr. Deputado Carlos Espadinha; ao Ministério do Equipamento Social, formulado pelos Srs. Deputados Jerónimo de Sousa e Anselmo Aníbal; ao Ministério da Educação e Secretaria de Estado do Orçamento, num total de 2, formulados pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

Por seu lado, o Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: José Magalhães e outros, nas sessões de 23 de Novembro, 13 de Março e 9 de Abril; Reis Borges, na sessão de 23 de Maio; Zita Seabra, na Comissão Permanente do dia 19 de Setembro; José Manuel Mendes e outros, na sessão de 14 de Dezembro e 12 de Abril; Raul Castro, na sessão de 15 de Janeiro; Magalhães Mota, na sessão de 24 de Janeiro e 10 de Maio; João Teixeira e outros, na sessão de 1 de Março; Maia Nunes de Almeida e Jorge Lemos, na sessão de 5 de Março; António Gonzalez, nas sessões de 12, 13 e 19 de Março; José Vitorino, na sessão de 22 de Março; Jorge Lemos, na sessão de 9 de Abril e 14 de Maio; lida Figueiredo, na sessão de 26 de Abril.

Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: proposta de lei n.º 106/III, que institui tribunais judiciais de 1.ª instância, e sua competência especializada, denominados tribunais marítimos; proposta de lei n.º 107/III, que autoriza o Governo através do Ministério das Finanças e do Plano a contrair junto do Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento um empréstimo externo até ao montante global equivalente a 66 milhões de dólares dos Estados Unidos da América; o projecto de lei n.º 517/III, da iniciativa da Sr.ª Deputada Mariana Perdigão e outros, do PSD, sobre a região demarcada de vinhos do Alentejo; projecto de lei nº 518/III, da iniciativa do Sr. Deputado Jorge Alberto Santos Correia (PS), sobre a elevação de Seia à categoria de cidade; projecto de lei n.º 519/III, da iniciativa do Sr. Deputado Rui Picciochi e outros, do PS, sobre o estatuto dos eleitos locais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um voto de congratulação, emitido pelo Partido do Centro Democrático Social, respeitante à nossa adesão à CEE e que, não havendo objecções, vai ser lido pela Mesa.

Foi lido. É o seguinte:

Considerando que a adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia constitui um importante factor de consolidação da democracia pluralista no nosso país e uma acrescida garantia de salvaguarda das liberdades e dos direitos dos Portugueses;

Considerando que a conclusão de um processo negocial que se arrastou ao longo dos anos constitui uma clara vitória dos partidos democráticos que se empenharam nesse combate, resistindo àqueles que, à esquerda como à direita, sempre se opuseram à integração europeia em nome de preconceitos ideológicos;

Considerando que a adesão assume um eminente carácter nacional e que, por isso mesmo, está para além das crises políticas, consubstanciando um projecto

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nacional que será prosseguido por todos os partidos democráticos, quer se encontrem no governo, quer na oposição;
Considerando que a integração no espaço comunitário constitui o quadro mais favorável de um relançamento sustentado da economia portuguesa, susceptível de criar maior riqueza e melhores condições de vida para todos;
Considerando finalmente que a adesão de Portugal e de Espanha à CEE significa necessariamente um novo equilíbrio entre a Europa do Norte e a Europa do Sul, com claras repercussões no desenvolvimento futuro das políticas comunitárias e na repartição dos recursos próprios da Comunidade;
Os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Centro Democrático Social CDS - propõem, na véspera da assinatura solene, em Lisboa, do Tratado de Adesão, que a Assembleia da República aprove o seguinte voto:

A Assembleia da República, legítima representante do povo português, congratula-se com a adesão de Portugal, como membro de pleno direito, à Comunidade Económica Europeia e exprime a sua fundada esperança de que o histórico desafio que a integração europeia representa para o nosso país receba a resposta vitoriosa que é a única condigna com as tradições culturais e a vontade nacional de um povo que mais do que qualquer outro contribuiu no passado para a formação do espírito europeu e para a sua expansão no mundo.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, desejo dizer que da nossa parte não haverá oposição a que esse texto seja votado hoje, como é desejo dos subscritores.
Em todo o caso, o meu grupo parlamentar tem uma declaração política sobre a matéria e admito que outros grupos parlamentares também tenham.
Assim sendo, proponho que em primeiro lugar sejam feitas as declarações políticas, como é regimental e da praxe, e na conclusão seja então apresentado e votado o voto de congratulação, pois nessa altura, a posição de cada partido já estará definida de uma maneira muito mais substancial do que aquela que aplicaria na discussão do voto.
Nós, pela nossa parte, como temos uma declaração política depois diremos muito pouco para definir a nossa posição em relação ao voto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, entendo isso como uma proposta e julgo que seria de aceitar. Se não houver oposição da parte dos outros grupos e agrupamentos parlamentares, darei como aceite esta proposta.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desejo dizer que, pela nossa parte, não faremos oposição a que o voto apresentado seja objecto de votação nesta Assembleia.
Mas queremos acrescentar desde já que não o fazemos por uma questão de princípio embora aí tivéssemos talvez de reflectir se, então, não se deveriam discutir muitos outros votos que estão em carteira... Mas, enfim, não queremos, de maneira nenhuma, ser, pela nossa parte, obstáculo a que esta questão se discuta.

No entanto, quero acrescentar desde já o sentido do nosso voto. Nós abster-nos-emos porque consideramos que se trata - não queria usar o termo inadmissível, pois se o usasse teria de ser coerente com ele e teria que me opor - pelo menos, de uma bizarra e estranha antecipação do debate que no momento oportuno se terá de travar aqui nesta Assembleia em torno da ratificação do Tratado de Adesão à Comunidade Económica Europeia.

Trata-se de uma precipitada e incompreensível tentativa de «pôr o carro à frente dos bois». Pela nossa parte, como disse, não nos oporemos, mas por esta exacta razão abster-nos-emos de participar quer na discussão, quer na votação desta proposta de voto apresentada pelo CDS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, segundo entendi V. Ex.ª não se opõe à metodologia que foi proposta pelo Sr. Deputado Carlos Brito. Assim sendo, vamos adoptá-la.

Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está anunciado para amanhã com toda a pompa e circunstância a cerimónia indecorosa da assinatura do Tratado de Adesão à CEE por um Governo que já não é governo.

Um Governo com as horas contadas apoiado por uma coligação que não existe não tem autoridade nem legitimidade para assinar os acordos de adesão à CEE em termos que não são sequer conhecidos desta Assembleia da República.

Na véspera da data anunciada os deputados desconhecem por completo os termos em que tais documentos se encontram redigidos e não dispõem de quaisquer elementos sobre o exacto conteúdo e os resultados da fase final das negociações levadas a cabo pelo Governo.

Quem sabe o que vai ser assinado?

Foi divulgado pela comunicação social que vários membros do Governo se deslocaram de urgência a Bruxelas face à iminência de abertura de certos dossiers formalmente encerrados. Desconhece-se, porém, quais as suas exactas causas e os resultados alcançados, nomeadamente no domínio de alteração de dossiers tão importantes como os relativos à agricultura e pescas e a questões como o destino dos montantes compensatórios da adesão e a contribuição que Portugal terá de pagar à CEE para o reembolso da Grã-Bretanha.

Há seguros indícios de que os anunciados «problemas técnicos de última hora» poderão ter significado profundas alterações em aspectos fundamentais dos acordos tornando-os ainda muito mais gravosos para Portugal. São particularmente preocupantes certas notícias relativas às cedências em toda a linha nos últimos momentos relatados pela imprensa e que subvertem todo o sentido do período de transição que era apontado como fundamental para preservar o País do impacte da adesão.

É inadmissível que neste momento, a poucas horas da assinatura do Tratado de Adesão, a Assembleia da

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República não conheça o texto definitivo e desconheça igualmente o texto integral dos acordos celebrados com a Espanha para o período transitório apesar de terem vindo a público inquietantes informações sobre graves cedências em relação a aspectos fulcrais na óptica do interesse nacional, como nas pescas.
Mesmo os Srs. Deputados que insistem na defesa da importância da adesão de Portugal à CEE acham que a Assembleia da República está informada do que vai ser assinado? Conhecem os problemas que foram surgindo na maratona final da redacção do Tratado de Adesão? Sabem quais as formas de resolução adoptadas? Conhecem os problemas adiados para data posterior à assinatura do Tratado? Quando um dos responsáveis governamentais pela condução das negociações recorreu à mentira para lançar responsabilidades aleivosas á Assembleia da República quanto ao pretenso alheamento dos deputados sobre o conteúdo negociado, como fez através da RTP o Dr. António Marta, impõe-se que ainda hoje o Sr. Presidente da Assembleia da República providencie todas as diligências necessárias para que seja minorado o vexame a que foi sujeita esta Assembleia, mantida até ao momento no completo desconhecimento do texto integral do acordo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do PS: - Não apoiado!

A Oradora: - Para cumprir calendários e objectivos pessoais que nada têm a ver com os interesses do povo português e do País, o Governo persiste em manter como seu último acto público uma operação política que pode hipotecar o futuro de Portugal.
Quando é afirmado que algumas páginas do Tratado de Adesão poderão ser simples fotocópias feitas nos últimos minutos e que os Dez poderão ainda reservar-se o direito de confirmar os compromissos que a Presidência entenda assumir em relação aos países aderentes não podem deixar de ser postas as seguintes questões:
Com um Governo a cair quem vai responder pelos pontos em aberto? Quem é o responsável amanhã pelos compromissos assumidos?
Do que foi divulgado pela comunicação social pode dizer-se que de todas as benesses inicialmente propagandeadas após as cedências dos últimos momentos resta a verdade nua e crua que se começa a impor: Portugal ainda vai pagar para aderir à CEE.
O Governo cuidou da pompa do acto de assinatura, mas não cuidou da defesa do interesse nacional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - A ilegitimidade de um Governo praticamente demissionário para alterar e encerrar os principais dossiers em questões fulcrais sem qualquer contacto ou conhecimento quer dos deputados da Assembleia da República, quer das associações e organizações representativas das actividades económicas e dos trabalhadores não pode deixar de ser aqui vivamente denunciada tal ilegitimidade do Governo dando voz ao amplo movimento de rejeição da ruinosa operação da adesão. Novos sectores reclamam hoje a suspensão imediata do processo de adesão que um Governo com as horas contadas não tem autoridade nem legitimidade para assinar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - São posições, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a Assembleia da República não pode ignorar e deve ponderar em todas as suas implicações, não assumindo a conivência na assinatura de um Tratado que desconhece e pelo qual não se sabe quem irá responder.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - As condições e os termos em que vai ser assinado o acordo da adesão à CEE confirmam a análise feita pelo PCP: é urgente a demissão do Primeiro-Ministro e do que resta do Governo, a dissolução da Assembleia da República e a convocação de eleições antecipadas nos termos da Constituição.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não podíamos deixar passar em claro a intervenção da Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, tão negativa e tão contestária, da integração de Portugal na CEE que amanhã se fará mediante a assinatura do Tratado de Adesão.
Os argumentos da Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo carecem inteiramente de sentido de profundidade e de autenticidade.
O primeiro argumento que V. Ex.ª esgrimiu contra a assinatura do Tratado de Adesão, que amanhã se fará, é o de ausência de autoridade e de legitimidade do Governo para assinar esse Tratado.
Ora, Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, o Governo está em plenitude do exercício das suas funções e tem toda a autoridade e toda a legitimidade, enquanto o Sr. Primeiro-Ministro continuar a ser Primeiro-Ministro, para fazer a assinatura do Tratado de Adesão.
Além disso, até o interesse nacional e a dignidade nacional exigem que amanhã essa assinatura se faça porque corresponde inteiramente aos interesses do País e à preservação da sua própria dignidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto às questões que levantou, às suspeitas, às dúvidas sobre a utilidade da adesão, as objecções, as contestações, tudo isso é muito subjectivo porque a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo desta vez nem se atreveu a avançar com dados estatísticos de que o seu partido costuma servir-se nestas circunstâncias, dados esses muitas vezes inautênticos, parciais. Desta vez nem isso fez. Limitou-se a dizer que vai ser uma ruína para o País, que vai colocar o País em dificuldades, más isso é a opinião do Partido Comunista ...

Uma Voz do PCP: - Não só!

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O Orador: - ... que sobre a questão da integração de Portugal na CEE tem uma atitude ideológica contrária a essa integração.
Para o Partido Comunista qualquer argumento de natureza objectiva ou positiva não vale nada face às suas convicções anti-europeias.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Esse é um argumento estafado!

O Orador: - De maneira que os argumentos que apresentou no sentido de querer insinuar que a adesão é negativa para Portugal não têm nenhum valor probatório e de nada servem. É a continuação de uma campanha do Partido Comunista para denegrir a entrada na CEE e, afinal de contas, para manter uma posição que, por dogmática, pouco vale.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, compreendo algumas das reservas que V. Ex.ª apresentou, só que fiquei um bocado surpreendido com o que aqui disse e com a forma como pôs as questões.
A primeira pergunta que lhe quero fazer é a seguinte: está V. Ex.ª convencida, com os dados de que dispõe, que, no período de 7 a 10 anos a seguir à prevista adesão, Portugal será globalmente um contribuinte líquido para os cofres da Comunidade?
Segunda questão: está V. Ex.ª convencida de que eleições, eventualmente a realizar, se traduziriam numa alteração significativa nesta Câmara no que respeita às posições a favor e contra a integração na Europa das comunidades?
Em terceiro lugar, penso que V. Ex.ª conhece certamente os mecanismos que, no quadro do mercado livre de 300 milhões de consumidores, poderão aumentar as desigualdades e, eventualmente, piorar alguns aspectos da economia portuguesa, mas não desconhece também que nessa mesma Europa das comunidades há mecanismos de solidariedade interna que possibilitam a correcção dessas desigualdades.
Será que V. Ex.ª põe em dúvida a eficácia dos organismos portugueses para utilizar esses mecanismos ou pensa que eventualmente um governo em que participasse o Partido Comunista teria mais capacidade para gerir esses fundos e esses apoios da Europa das comunidades?
Para terminar, devo dizer que o que não ressalta claro, para mim, é o seguinte: o que é que V. Ex.ª, que além de política é economista, defende?
Defende que o País caminhe num regime de autarquia económica?
Defende eventualmente - e penso que não considerará isto provocatório - a adesão ao Conselho de Ajuda Mútua Económica? Ou defende antes, o que será a hipótese mais provável caso não avancemos no processo de integração europeia, a subordinação aos Estados Unidos? Ou defende que nós assinemos a Convenção de Lomé?

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - E a Suíça e a Suécia também a pediram?

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nas respostas às questões que me foram levantadas irei começar exactamente pelo Sr. Deputado Hasse Ferreira, se o Sr. Deputado Carlos Lage não se importar, para também lhe colocar uma questão.
Julgo que em tempos a UEDS foi contra a adesão ou, pelo menos, tinha sérias dúvidas relativamente à adesão de Portugal à CEE, mas neste momento a UEDS mudou de posição.
Qual é a posição da UEDS, relativamente à adesão de Portugal à CEE?
Quanto às outras questões que me colocou, e relativamente à questão de saber se Portugal será ou não contribuinte líquido nos próximos 7 a 10 anos após a adesão, gostaria de recordar ao Sr. Deputado Hasse que mesmo sem conhecer as alterações ...

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr.ª Deputada, permite-me que a interrompa?

A Oradora: - Faça favor.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - É que, Sr.ª Deputada, se quiser que eu lhe responda tem de autorizar a interrupção, porque senão, suponho, pelo novo Regimento depois não lhe posso responder a não ser numa ulterior sessão. Mas é como preferir.

A Oradora: - Só se o Sr. Presidente o permitir sem descontar no meu tempo, pois de contrário fico sem poder responder.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, só a título excepcional é que o poderei fazer. Mas porque presumo que certamente a intervenção do Sr. Deputado Hasse Ferreira terá interesse para o Plenário, concedo-lhe a palavra.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr.ª Deputada, muito rapidamente devo dizer que em 1979 a UEDS defendeu, e apresentou um estudo que fundamentava essa posição, que Portugal negociasse com a Europa das comunidades um tratado de associação autónoma com possibilidades evolutivas.
Defendemos e fundamentámos essa posição 5 anos antes do ex-Primeiro-Ministro Pinto Balsemão vir defender uma posição semelhante, ele que, na altura, era um defensor acérrimo da integração.
Pensamos que essa solução era muito melhor - tinha permitido um desenvolvimento da nossa capacidade produtiva e uma adequação das nossas capacidades competitivas no mercado internacional - do que aquilo que se fez durante estes 5 anos, que foi, em geral, falar da CEE e não preparar em nada ou preparar em muito pouco o País para a integração europeia.
Portanto, neste momento a nossa posição face à votação do Tratado de Adesão - e somos nós aqui que o vamos ratificar - será definida em função dos últimos elementos e do que for concretamente o Tratado de Adesão.
Posso garantir-lhe que, em princípio, eu não tenho uma posição desfavorável face à assinatura do Tratado

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de Adesão, isto porque é, totalmente diferente na altura em que se discute uma integração completa vir defender que o que deveríamos era ter negociado uma associação autónoma.
Penso que sim, penso que a partir de uma associação autónoma era possível negociar outro tipo de posições. 15so não se fez e penso que é criticável.

No entanto, a situação neste momento, é outra e por isso é que lhe perguntei qual era a sua posição.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço-lhes que não tomem isto como um precedente porque certamente não seria aceitável.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP):
Sr. Presidente.

Creio que o Sr. Deputado Hasse Ferreira ao responder deu uma explicação que permite concluir que também não conhece bem os termos do Tratado que vai ser negociado já que disse: «do que for esse Tratado», «depois irá ser analisado».

De qualquer forma, vou responder, pela minha parte, às questões que colocou e dizer qual a opinião que tenho relativamente aos problemas que levantou.

Sr. Deputado Hasse Ferreira, quanto à questão de Portugal vir a ser ou não um contribuinte líquido nos próximos 7 a 10 anos, devo dizer que mesmo nos elementos que inicialmente tinham sido fornecidos à Assembleia já era possível prever que Portugal seria um contribuinte líquido antes dos 10 anos.

Mas de acordo com as informações que vieram nos órgãos de comunicação social, e de que não conhecemos a total veracidade, a situação será ainda muito mais grave e Portugal poderá ser contribuinte líquido nos próximos anos se se confirmarem informações que foram divulgadas na imprensa.
Mas há mais. Foi também divulgado que Portugal irá, já em Janeiro de 1986, contribuir para os montantes do reembolso da Grã-Bretanha. 15to, a confirmar-se, é altamente grave.

Neste momento, estamos colocados numa situação deveras caricata e vexatória para esta Assembleia e que se traduz no facto de não sabermos os termos exactos das negociações que foram realizadas, das cedências em toda a linha que alguns órgãos da comunicação social referem que o Governo Português terá feito nos últimos minutos das negociações com Bruxelas.

O Sr. Victor Hugo Sequeira (PS): - São suspeitas!

A Oradora: - Sr. Deputado, não são apenas suspeitas. É a falta de elementos que esta Assembleia tem e considero que todos os Srs. Deputados, qualquer que seja o seu partido, deveriam ter exigido, como princípio, do Governo uma informação sobre aquilo que vai ser assinado amanhã e que pode, de facto, hipotecar o futuro do País.

Quando se vem aqui dizer que nós não referimos hoje elementos ou dados estatísticos ou o que quer que seja, gostaria de lembrar, Srs. Deputados, que foram fornecidos à Assembleia da República elementos com base nos quais elaborámos estudos e demos aqui, num debate que se realizou recentemente embora não profundo, a nossa opinião sobre isso. E já na altura concluímos que a situação era grave.
Mas do que hoje é conhecido publicamente, e não oficialmente, a situação é ainda muito mais grave e se assim não é, Srs. Deputados, digam então - já que conhecem e porque eu não conheço - o que é que foi negociado em Bruxelas.
Quanto à questão de haver ou não alterações resultantes de futuras eleições, devo dizer que naturalmente isso pode acontecer se o povo português for devidamente esclarecido sobre aquilo que foi negociado. 15to porque quando não se esclarece é porque há razões para tal, é porque se tem medo da informação e tem-se medo que as pessoas, conhecendo o significado exacto do que foi negociado, tome uma posição de oposição relativamente àquilo que foi negociado.
Srs. Deputados, como bem sabem estão a crescer por todo o País as oposições àquilo que o Governo negociou, a rejeição dos acordos de negociação com a CEE, tendo em conta o que vem sendo publicado e não ainda aquilo que foi, de facto, negociado.

Mas quando isso for conhecido em toda a sua extensão, certamente que a oposição será ainda maior e certamente que com o esclarecimento que se impõe as eleições poderão alterar os resultados e só depois então se poderá dizer se a maioria dos deputados desta Assembleia está ou não de acordo com a ratificação do Tratado de Adesão.
Relativamente aos fundos da CEE seria importante aqui referir - e essa é a questão que já há pouco referi - se Portugal vai ou não ser um contribuinte líquido, se Portugal vai receber algo da CEE e se não vai ter de pagar muito mais do que aquilo que recebe. Tudo isto para além, naturalmente, das implicações que a adesão de Portugal terá na economia portuguesa, nomeadamente, na alteração da estrutura produtiva, na agricultura, nas pescas, na indústria, na situação dos trabalhadores, no aumento do desemprego, e na destruição, falência, encerramento de centenas ou milhares de unidades produtivas.
Mas para além dessas gravíssimas consequências, começa a ficar claro que nos próximos anos Portugal poderá ser mesmo um contribuinte líquido, poderá mesmo ter de pagar mais do que aquilo que vai receber da CEE e isto é um escândalo, Srs. Deputados, um escândalo que o povo português condenará quando conhecer o assunto em toda a sua profundidade.
É assim que estão em causa a defesa do interesse nacional, a defesa da preservação do interesse do País, da economia do País e do povo português. E por isso mesmo é que se exige o esclarecimento cabal daquilo que vai ser negociado, isto é, que acordo a que se chegou, o documento final que foi, de facto, negociado pelo Governo seja do conhecimento prévio desta Assembleia da República e que isso seja fornecido ainda hoje, pelo menos, para que os Srs. Deputados antes da assinatura tenham um conhecimento mínimo daquilo que se vai passar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Lage pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, era para exercer o direito de defesa.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não me dei conta da necessidade dessa figura, mas V. Ex.ª é que é o portador desse direito. Tem, portanto, a palavra.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquilo que eu tinha afirmado, ou seja, que a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo e o PCP se situavam no terreno da suspeita, sem provas e sem dados factuais comprovativos da inoportunidade da adesão de Portugal à CEE, ficou comprovado na resposta que a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo nos deu. De facto, insistiu nesses temas e invocou uma nova forma de combate à integração na CEE que consiste em dizer que cresce cada vez mais no País a oposição sem demonstrar e tipificar o crescer dessa oposição no País.

Estará a referir-se a alguns grupos, de carácter minoritário, que têm vindo a público defendendo alguns interesses, que se podem até considerar um pouco ultrapassados ou então com uma carga de receios e de medos perfeitamente intoleráveis? Serão esses grupos que evidenciam a contestação?

Em qualquer dos casos. Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, a quem compete aprovar o Tratado de Adesão à CEE, já que não temos condições para fazer um referendo, é a esta Assembleia da República. É a ela que compete aprovar o Tratado de Adesão.

A Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo invoca a falta de informação. Na verdade nestas questões há sempre todo o interesse em informar o melhor possível e estou convencido de que se alguma informação falta isso se deve à rapidez com que estas coisas se têm passado e é necessário que se passem. Tanto a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo como o PCP irão ter, com toda a certeza, as informações pertinentes para poderem avaliar das vantagens da adesão e quando fizermos aqui o debate sobre a aprovação do Tratado de Adesão, que o Governo vai amanhã assinar, então o PCP e todos os deputados nesta Câmara poderão conhecer os dados, analisá-los, apreciá-los, equacionar as vantagens e desvantagens e votar em consciência. Penso que é essa a metodologia normal e não invocar oposições, algo metafísicas imaginárias, que não correspondem à realidade.

A data de amanhã é uma grande data e não queiramos, com pequenas objecções, enxovalhá-la e querer passar lama sobre ela. É uma grande data para o País, o povo português sabe que é assim e o PCP está completamente equivocado. É mais um equívoco histórico e o PCP está naturalmente isolado nesta matéria.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, vou conceder-lhe a palavra, embora entenda que o Sr. Deputado Carlos Lage se aproveitou de uma figura, porque não estava em causa nem a sua honra nem a sua dignidade.

Mas se V. Ex.ª quiser dar explicações, tem a palavra.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que a única razão que terá levado o Sr. Deputado Carlos Lage a usar o direito de defesa terá sido o facto de eu ter invocado a falta de informação e certamente também o seu desconhecimento do conteúdo do Tratado de Adesão que amanhã vai ser assinado. Naturalmente que o Sr. Deputado considera que não desconhece esses documentos, mas é interessante sublinhar que o Sr. Deputado reconhece que existe falta de informação e que houve uma rapidez excessiva na forma como tudo isto foi tratado.

Vozes do PS: - Necessária!

A Oradora: - O que estava em causa era o cumprimento do calendário, mas, mais do que isso, tratava-se de uma operação política, que nada tem a ver com a defesa dos interesses do País e dos interesses nacionais, mas muito mais com interesses partidários e pessoais contra os interesses do País, pondo em causa e hipotecando o futuro de Portugal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma curta intervenção, porque julgo que há momentos em que cada um deve assumir as suas responsabilidades e pela nossa parte, UEDS, não queríamos permanecer silenciosos nesta Assembleia perante a situação política que o País atravessa.

Julgo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não terá constituído surpresa para ninguém a ruptura da coligação. Mas se assim foi diria desde já que, para nós se alguma. surpresa houve foi o facto de essa coligação ter durado tanto tempo. 15to porque não basta, para que uma coligação possa subsistir, a existência de uma maioria aritmética nesta Assembleia. Para que um governo possa ter um apoio minimamente estável é fundamental que, para além da maioria aritmética, haja um mínimo de coerência ideológica e programática entre aqueles que constituem essa coligação. Quando assim não é, o espectáculo é aquele a que assistimos, em que a coligação sobreviveu ao longo de 2 anos, mas se limitou a sobreviver com todas as peripécias, que não vale a pena neste momento rememorar. O que importa agora é olhar sobre aquilo que se irá passar e que cada um assuma as suas responsabilidades tornando claro aquilo que, no seu entendimento, seria útil que se viesse a passar para o nosso país.

Não pode deixar de se estranhar, para não usar um termo porventura mais violento, que o partido que é o responsável directo pela situação que se vive, isto é, o PSD que abre a crise, conduz e assume a responsabilidade da ruptura da coligação se mantenha silencioso sobre as soluções possíveis para a situação que criou. Será que o PSD, ao assumir a posição que assumiu, não fazia ideia nenhuma de quais as soluções possíveis e viáveis para o País, perante a situação que ele próprio criou ou que hesita em tornar claro quais são as soluções que propõe?

Tudo isto serão questões que nós poderemos colocar, mas há um dado objectivo, concreto e indesmentível: até hoje o PSD denunciou a coligação, assumiu a ruptura, mas não disse ainda, sem ambiguidades e sem equívocos, quais as soluções que propõe para a actual situação política portuguesa. Talvez porque, ao fim e ao cabo, o PSD, que ao longo destes 2 anos acusava o PS e o Dr. Mário Soares de condicionarem toda a sua estratégia às eleições presidenciais - e não vamos agora curar de saber se o fazia com razão ou sem

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razão -, tenha acabado por determinar as suas posições fundamentalmente por questões que tinham a ver com as próximas eleições presidenciais.

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Pela nossa parte, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não pensamos que haja muitas soluções possíveis. Não será difícil imaginar que, ao fim e ao cabo, elas se reduzem a duas: ou a dissolução imediata da Assembleia da República ou a designação de um novo governo.

Pela nossa parte - dissemo-lo já e quero aqui reafirmá-lo - somos contrários à dissolução imediata da Assembleia da República, por duas razões fundamentais, embora outras possam ser invocadas. Primeiro, porque não temos nenhumas razões para admitir - e admitimos perfeitamente que outra possa ser a opinião de outros partidos e de outros Srs. Deputados, dado que não há aqui métodos para uma medida concreta do que será a realidade futura - que eleições antecipadas conduziriam a um quadro parlamentar fundamentalmente diferente do actual. Mas para além desse facto e talvez mais importante do que ele, as eleições antecipadas afiguram-se-nos como uma grave hipoteca sobre o mandato do futuro Presidente da República. Dir-se-á que nada o impede, se for essa a sua vontade, de no início do próximo ano dissolver de novo a Assembleia da República, respeitados apenas os comandos constitucionais que impedem a dissolução nos primeiros 6 meses de funções de uma nova Assembleia. Formalmente é assim, mas ninguém ousará negar que a dissolução representará, neste momento, uma importante condicionante à liberdade de acção do futuro Presidente da República.

Daí, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que em nosso entender a primeira tentativa de procura de uma solução deverá ser buscada no actual quadro parlamentar. De acordo com os comandos constitucionais, deveria o Sr. Presidente da República propiciar a apresentação a esta Assembleia de um novo governo e, no respeito pelos comandos constitucionais e pelo actual quadro parlamentar, deveria em nosso entender sondar com esse objectivo o partido que tem nesta Assembleia a maioria absoluta. Esse governo deveria apresentar-se a esta Assembleia tão rapidamente quanto possível para que ela pudesse julgar o seu programa naquele período em que o Presidente da República estará ainda na plena posse dos seus poderes, e esta Assembleia, consequentemente, no pleno exercício das suas responsabilidades. 15to é: um tal governo deveria ser submetido, em nosso entender, a esta Assembleia no período em que o Presidente da República a poderá ainda dissolver para que cada um de nós e cada partido possa, na plenitude do seu mandato, assumir as responsabilidades de viabilizar ou inviabilizar esse governo, não se escudando numa situação que, determinada por comandos constitucionais, transcenderia a vontade de cada um de nós e a própria vontade do Presidente da República.

Falar-se neste momento, como já ouvimos falar, em governos de gestão até às eleições presidenciais parece-nos ser de todas a solução pior e a mais irresponsável, porque a não se dissolver a Assembleia da República, a não ser empossado um governo no quadro parlamentar actual significaria um governo de gestão não por 3 meses nem por 6 meses mas, pelo menos, por 1 ano, porque na melhor das hipóteses só daqui por 1 ano haveria um novo governo. O País não está em condições de suportar a existência de um executivo em condições precárias durante cerca de 1 ano.
Não sendo possível viabilizar no actual quadro parlamentar um novo governo, assumindo cada um de nós e cada um dos partidos a responsabilidade de o inviabilizar, então não teríamos, pela nossa parte, nenhuma objecção em dizer que a solução possível seria a dissolução da Assembleia da República. Não estamos por isso contrários, em quaisquer circunstâncias, à dissolução da Assembleia. O que dizemos é que ela só deverá ter lugar quando esgotadas as hipóteses de solução no actual quadro parlamentar.
Pela nossa parte, Sr. Presidente e Srs. Deputados, com perfeita consciência do que significa quantitativamente o voto dos deputados da UEDS, mas tendo também perfeita consciência de que o voto de cada deputado não tem apenas um significado quantitativo, tem também um significado qualitativo sem o que seria esvaziar de sentido o mandato de cada um de nós, estamos dispostos a viabilizar um governo de iniciativa do PS sob reserva, como é óbvio, de conhecer esse governo e o seu programa.

Aplausos da UEDS e do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Beiroco pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, é para fazer pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Presidente: - Só que o Sr. Deputado Lopes Cardoso não dispõe já de tempo para responder.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, eu conceder-lhe-ei, do tempo do meu partido, o tempo necessário para que ele me possa responder.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, ouvi a sua exposição, compreendo as suas preocupações e a sua posição, mas há no entanto uma questão concreta que gostaria de lhe colocar.
Entende o Sr. Deputado Lopes Cardoso que o Presidente da República deve indigitar um primeiro-ministro, mesmo que não tenha indicações concretas da viabilidade de um governo passar nesta Câmara? 15to é: entende o Sr. Deputado Lopes Cardoso quê antes de uma hipótese de dissolução o Presidente da República deve sempre tentar verificar, aqui no Parlamento, se há quaisquer condições para que um governo possa passar? Ou, se das consultas que o Presidente da República nos termos constitucionais faz aos partidos político resultar claramente que não há condições parlamentares para que um governo do tipo do que o Sr. Deputado referiu possa passar na Câmara, o Presidente da República, nesse caso, não deve poupar mais esse adiamento ao País e tomar, portanto, as decisões que são da sua competência, mas sem passar por essa tentativa? 15to tanto mais que sabemos o tempo que normalmente demoram a formar os governos, os prazos parlamentares para a discussão do programa e sabemos

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também que o poder de dissolução caduca numa data fixa, o que será mais um elemento a ter em conta pelo Sr. Presidente da República.
Era sobre esta questão que gostava de ouvir o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Brito pediu também a palavra mas o seu partido já não dispõe de tempo. Acontece, porém, que o MDP/CDE cede parte do seu tempo ao Sr. Deputado Carlos Brito, que com certeza também o concederá ao Sr. Deputado Lopes Cardoso para que ele lhe possa responder.
O Sr. Deputado Lopes Cardoso deseja responder já ao Sr. Deputado Luís Beiroco ou prefere aguardar?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, eu preferia talvez responder de imediato ao Sr. Deputado Luís Beiroco apenas por uma questão de gestão de tempo, já que vou usar do tempo do CDS para lhe responder e usarei do tempo do MDP/CDE para responder eventualmente ao Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra, Sr. Deputado, mas dispõe apenas de 2 minutos.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Deputado Luís Beiroco, compreendo a questão que me levantou, mas dir-lhe-ei que na situação que o País atravessa e dadas as repercussões que quaisquer atitudes que se venham a assumir tenham e o significado que têm, prefiro que a recusa de um governo desse tipo seja assumida claramente pelos diferentes partidos nesta Assembleia do que seja assumido nos gabinetes de Belém, deixando-se o ónus de uma interpretação do comportamento desses partidos ao Sr. Presidente da República.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - A recusa desse governo com base nas consultas aos partidos seria, no limite, assumida pelo Sr. Presidente da República. É importante que a matriz da democracia portuguesa, que é este Parlamento e os partidos políticos que existem no nosso país, seja assumida aqui e não nos gabinetes de Belém, Sr. Deputado!

Aplausos da UEDS e do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, ouvi com atenção as questões que levantou e as respostas que do seu lado adiantou e queria formular-lhe algumas questões.
A crise política que estamos a viver tem múltiplos aspectos, mas o fundamental é a crise do Governo. Não é nenhum outro órgão que está em crise mas, sim, fundamentalmente o Governo e aquilo que lhe dá base, isto é, a Assembleia da República. Esta Assembleia nasceu com uma maioria e ela desfez-se. E não se vê, Sr. Deputado Lopes Cardoso, lendo os jornais, que seja fácil constituir-se uma outra maioria. O Sr. Deputado Lopes Cardoso talvez não tivesse entrado em linha de conta com alguns factos. Por exemplo, parece nem sequer haver maioria para um governo minoritário, que o Sr. Deputado defendeu com tanto calor.

O partido, que antigamente estava associado ao PS, já declarou pela boca do seu líder que não viabilizará um governo minoritário do PS, em declarações que constam do Diário de Notícias de ontem e que não vou repetir para não demorar mais tempo.
Não sei se o CDS está na disposição de viabilizar um governo minoritário do PS, mas as perguntas do Sr. Deputado Luís Beiroco parece não inculcarem essa ideia. Por outro lado, é conhecida a nossa posição. Não sei assim se o Sr. Deputado não estará a adiantar uma solução que pode ter sido mas que já não é. E não sei se os argumentos que usa em relação à dissolução da Assembleia da República são válidos. Se é um problema de Governo que há que resolver, a solução não terá de passar por aquele órgão que dá origem e base aos governos, ou seja, a Assembleia da República? Não é da dissolução dela que pode nascer a possibilidade de uma nova maioria que seja capaz de resolver os problemas nacionais? Dê-se a palavra ao povo português e depois se verá em que sentido é que ele se pronunciará.
Creio que isto é que é real. O contrário parece-me que são ilusões, que já não cabem nos dias de hoje. Basta ler os jornais!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Deputado Carlos Brito, começarei por manifestar o meu acordo com uma das suas afirmações, quando me perguntou se não havia que começar por este órgão, Assembleia da República, que dá sentido aos governos. Há que começar por este órgão e é isso exactamente que nós propomos. Antes da dissolução, coloque-se este órgão perante as suas responsabilidades e escutemos a sua resposta que é mais importante para mim do que a leitura do Diário de Notícias ou de O Diário! Comecemos por este órgão e pela sua resposta.

O Sr. Deputado começou por dizer que esta Assembleia nasceu com uma maioria. 15so não é verdade! Esta Assembleia não nasceu com nenhuma maioria, ela até comporta, em termos teóricos, diversas maiorias. Já não falando daquela que é proposta pelo MDP/CDE, de todos os partidos, que é a táctica do «Estebes»: «Todos ao molho e fé no governo!». Mas tem uma maioria PS/CDS, PS/PSD, PS/PCP, PSD/PCP/CDS, etc. Umas das razões, por que nos confrontamos com esta situação é que esta Assembleia não nasceu com uma maioria predeterminada.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Quanto a saber se o outro governo, de iniciativa PS, que do nosso ponto de vista não significa que seja exclusivamente um governo PS, mas um governo, cuja iniciativa no quadro constitucional deveria ser suscitada pelo Presidente da República ao PS, Sr. Deputado, não estou a prever o que se vai passar.
O que eu digo é que se experimente, que se coloque a Assembleia perante as suas responsabilidades e que, em função das responsabilidades assumidas pela Assembleia, o Sr. Presidente da República decida acerca do destino desta mesma Assembleia.

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Não se perde muito tempo, Sr. Deputado, pois esta proposta que fazemos só tem sentido se tudo o que é possível se desenrolar com a celeridade necessária de modo a que seja encontrada uma solução até ao dia 14 de Julho.

Assim, perde-se seguramente muito menos tempo do que acontecerá se se acolherem propostas que tenho visto serem acenadas - sei que não são do PCP, mas são de outros partidos...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - O Sr. Deputado dá-me licença que o interrompa?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Queria apenas colocar-lhe a seguinte questão: daqui até 14 de Julho medeia 1 mês. Ora, o Sr. Deputado sabe que formar um governo, ainda que se trate de um governo minoritário, não será coisa rápida, a avaliar pelas experiências que conhecemos.

Assim, como é que o Sr. Deputado justifica que numa situação como esta, se enverede por uma solução que, à partida, tudo indica - não só os artigos dos jornais mas também as declarações dos dirigentes e das direcções dos partidos e nem todos mudam de opinião todos os dias, pelo que há que fazer fé naquilo que afirmei! ...

Sendo assim, como é que o Sr. Deputado entende que se vá fazer uma experiência que, à partida e pelo que se conhece, está condenada.

É que ninguém defende essa solução para além dos interessados, dos defensores dessa solução, ou seja, dos membros do partido unitário.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Deputado, evidentemente que há aqui uma divergência irredutível. Para o Sr. Deputado tudo é claro pois já sabe tudo o que se vai passar e portanto é fácil.

Mas eu não sei, não tenho essa posição e portanto coloco a interrogação.

E mais do que colocar essa interrogação, quero ver aqui os partidos perante um governo concreto e perante um programa de governo assumirem a responsabilidade de impedir esse governo e de conduzirem à dissolução da Assembleia.

Aplausos da UEDS, do PS e da ASDI

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Amanhã, dia 12 de Junho de 1985, o Sr. Primeiro-Ministro, em nome do Governo Português, assinará, no Mosteiro dos Jerónimos, o Tratado de Adesão à CEE.
Trata-se de uma data histórica no processo de viragem iniciado em 25 de Abril de 1974, que nos abriu as portas da liberdade e da democracia.

A adesão à CEE abre-nos, hoje, as portas do progresso e da modernidade, da expansão económica e da revolução tecnológica.

Não se julgue, porém, que foi fácil atingir este ponto.
Em 20 de Junho de 1983 e no seu discurso de abertura do debate sobre o Programa do IX Governo Constitucional. o Dr. Mário Soares sublinhava que o Programa de Modernização da Economia Portuguesa (de 4 anos)

Terá obviamente em conta a adesão de Portugal à CEE, como elemento prioritário e presente em todos os aspectos sectoriais relevantes.

A situação encontrada pelo Governo não era, porém, encorajadora.
Importaria pois recordar as palavras serenas de Mário Soares que, no seu discurso de tomada de posse do IX Governo Constitucional, em 9 de Junho de 1983, declarava:

O País encontra-se - todos o sabem - paralizado há largos meses. A economica está desregulada. Empresas públicas e privadas da maior importância que empregam milhares e milhares de trabalhadores estão à beira da falência, asfixiadas, com prejuízos que se cifram em milhões de contos, a viver artificialmente de subsídios que o Estado não está mais em condições de continuar a conceder-lhes, como até aqui. A fuga de capitais nunca foi tão preocupante como agora, quando se assiste ao paradoxo das exportações aumentarem em volume e valor e a entrada de divisas correspondentes diminuir.
Entre as vozes angustiadas que se erguem, um pouco por todo o lado, advertindo ou protestando, entre as reivindicações que facilmente explodem e cuja razão de ser não se contesta importa ter em conta, realmente, o estado das finanças públicas, o grau a que chegou o endividamento externo de Portugal.
Na crueza dos números direi que a dívida externa portuguesa passou de sete biliões de dólares, em 1979, para treze biliões de dólares, em fins de 1982 (quase o dobro, ou seja, 60% do produto nacional), embora até 1981 tal crescimento fosse de certo modo controlado. Os juros da dívida externa elevam-se, este ano, a 1 bilião e 200 milhões de dólares. O défice da balança de transacções correntes foi, em 1982, de 3,2 biliões de dólares (14,5 % do produto nacional) quando em 1979 era apenas de 52 milhões.
Esta é a situação verdadeira que os Portugueses têm direito de conhecer, até porque os círculos financeiros internacionais a não ignoram. É uma situação dramática que explica muita coisa - hesitações, desânimos, silêncios - e que torna perfeitamente descabida, mesmo intolerável, a desestabilização irresponsável ou intencional que se procura instalar entre nós, e que visa tão-só provocar ao caos, sem nada dar em troca aos trabalhadores, tanto mais que a situação, sendo muito difícil, é ainda recuperável.

Decorridos escassos 2 anos, importará verificar-se em que medida se conseguiu transformar a situação descrita na base de uma análise serena da política prosseguida pelo IX Governo Constitucional.

Uma Voz do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Começando pela situação financeira, não pode deixar de se sublinhar que o défice de transacções correntes que em 1983 atingia ainda 1640 milhões de dólares, situou-se em 1984 em apenas 520 milhões de dólares (6 % do PIB) para o final do último ano.
Esta evolução foi determinada por um aumento das exportações (crescimento de cerca de 14 %) e acompanhada, deve dizer-se por uma quebra da produção e do investimento com a correspondente diminuição do consumo privado, resultante também do desemprego e do aumento do número de trabalhadores com salários em atraso.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - O desemprego aumentou!

O Orador: - Contudo, esta política de recuperação financeira só tinha sentido se fosse acompanhada por reformas estruturais equilibradas que permitissem uma melhor gestão dos recursos nacionais.
A abertura da banca e dos seguros ao sector privado são certamente, as alterações estruturais com maior peso no campo económico.
Não obstante o esforço reformador, não esteve ausente de outros sectores da governação.
Assim, importa salientar os Estatutos dos Advogados e dos Magistrados Judiciais e a criação do Serviço de Informações, tudo integrado numa política orientada para aquilo que constituirá a reforma das reformas: a adesão à CEE.
Decorridos 2 anos, encontramos um país diferente em que estão criadas as condições básicas para o esforço renovador que se impõe.
Foi o IX Governo Constitucional e a coligação que lhe deu suporte na Assembleia da República que executaram esta política de recuperação nacional na base da qual é, agora, possível um desenvolvimento económico prudente para ser realista, sustentado para ser efectivo.
O Partido Socialista reivindica, orgulhosamente, a parte que lhe cabe no esforço que, por imperativo patriótico, desempenhou nesta difícil conjuntura.
Não engeitando os erros cometidos, que são próprios de toda a obra humana, assume orgulhosamente estes 2 anos de governação que permitiram pôr à prova a tenacidade, a devoção ao interesse nacional e a paciência, até, de um partido que no Governo soube, sobretudo, pautar a sua acção pelos interesses do Estado.

Aplausos do PS.

Dois parâmetros orientaram a acção do PS na governação:

a) A convicção da impossibilidade de um qualquer programa a médio ou a longo prazo sem uma efectiva estabilidade política pois, coma notava ainda Mário Soares no profético e já citado discurso:

O País precisa de estabilidade sem o que não haverá confiança e nenhum problema poderá ser susceptível de resolução. A permanente incerteza e indefinição e a agitação inconsequente, instalados como temos estado, desde 1974, no provisório, não servem os interesses nacionais. Nenhum governo com um horizonte de meses pode resolver seriamente o que quer que seja. Tudo se adia e se vai insensivelmente degradando. É assim que tem vindo a acontecer com enormes prejuízos para a Nação.

b) A certeza de que não é possível proceder a quaisquer reformas no País sem agir com a moderação que só uma política de centro-esquerda pode garantir.

De um certo passado próximo perdura uma lição que importa não esquecer: do extremismo não pode resultar qualquer política reformista, seja ele de esquerda ou de direita.

Aplausos do PS.

O IX Governo Constitucional compreendeu que só era possível efectivar uma política de reforma usando de uma lúcida moderação de todo em todo contrária a um certo verbalismo gesticulante que se esgota na sua, mimética, repetição.
Tínhamos um programa para 4 anos mas, finda a experiência governamental, decorridos 2 anos, urge sublinhar a importância das reformas efectivadas e o equilíbrio na sua elaboração, aliados a uma vontade férrea de fazer prevalecer o bom senso na sociedade portuguesa.
O Partido Socialista é um partido novo há mais de 100 anos em que o tempo decorrido e a experiência grangeada serviram para melhor sedimentar as convicções fundamentais.
Nestes 11 anos compreendemos que Portugal necessita de ser governado ao centro e com, inteligente, moderação.
Hoje, no começo da nossa adesão à Europa, não temos, felizmente, nada a renegar.
A crise política aberta pela nova direcção do PSD torna, para nós, ainda mais clara a necessidade da formação de um «bloco central»...

Uma Voz do PCP: - Outro?

O Orador: - ... onde caibam todos aqueles que querem um país renovado em que os direitos dos cidadãos - empresários e trabalhadores - sejam, reciprocamente, respeitados nos seus campos específicos de actuação dentro de uma democracia pluralista que a todos pertence.

Aplausos do PS.

A entrada de Portugal na CEE põe, talvez, ao País o maior desafio da sua história.
Amanhã, no Mosteiro dos Jerónimos, e sob a sombra tutelar de Luís de Camões, depois de uma longa viagem que nos levou a longes terras, reatamos o caminho interrompido em Alfarrobeira.
É à luz de todo este próximo passado que, com a serenidade daqueles cuja consciência está tranquila, podemos dizer ao País: continuamos, como sempre, prontos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado José Luís Nunes inscreveram-se os Srs. Deputados António Capucho e Luís Beiroco.

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12 DE JUNHO DE 1985

Acontece que o PS já não dispõe de tempo para responder só o podendo fazer se cada um dos Srs. Deputados lhe conceder o tempo necessário para a correspondente resposta.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, quero apenas informar que a ASDI nos cede o seu tempo.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Deputado José Luís Nunes, ouvi atentamente a sua declaração política que considero formalmente correcta mas, se me permite a expressão, substancialmente coxa, deficiente.
Poderia resumir a sua intervenção à seguinte máxima: «depois do dilúvio, o centro-esquerda ou o bloco central».
O Sr. Deputado enunciou uma série de objectivos alcançados pelo governo de centro-esquerda, PS/PSD, mas esqueceu-se de alguns, que, quanto a mim, são o essencial.
Pergunto-lhe se não me dá razão no seguinte: por exemplo, quando fala na contenção do défice - quanto a nós, não pode ser um fim em si mesmo o Sr. Deputado omitiu a questão do investimento que deve ser uma das grandes preocupações de quem governa este País.
Ora, o investimento caiu praticamente a zero; ninguém pede dinheiro emprestado aos bancos. O que é certo é que os bancos, há 1 ou 2 anos atrás, se queixavam de que tinham plafonds insuficientes e neste momento esses plafonds mantêm-se quase intactos.
Ninguém quer investir, ninguém tem confiança. 15to trouxe consequências gravíssimas na produção, na produtividade, na criação de postos de trabalho e, por tabela, reflexos no desemprego.
Sr. Deputado José Luís Nunes, a questão de fundo é que, analisada a situação, o PSD entendeu que era absolutamente indispensável relançar a confiança neste Governo, isto é, relançar a confiança dos Portugueses em geral - as sondagens mostravam, de facto, a fraca adesão do eleitorado ao governo PS/PSD - e relançar a confiança dos agentes económicos em particular - e os índices relacionados com o investimento mostravam bem a falta de confiança dos agentes económicos.
Ora bem, aquilo que fizemos, perante o incumprimento de inúmeras medidas estruturais que foram acordadas e calendarizadas - inúmeras, não nos falem apenas da legislação laboral, da legislação agrícola e dos indivisos pois muitas mais medidas foram contempladas nos acordos PS-PSD, foram calendarizadas e não foram cumpridas - foi apresentar uma série de medidas que considerávamos absolutamente essenciais para relançar essa confiança.
Era preciso dar sinais ao eleitorado, era preciso dar sinais ao povo português de que restabelecíamos a confiança para redinamizar a adesão ao governo de centro-esquerda, que, na sua opinião, se sucedeu ao dilúvio.
A questão é que estes sinais foram recusados pelo PS.

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Perante essa recusa, Sr. Deputado, pode ser lindo o seu discurso, pode relatar inúmeras metas atingidas, mas o essencial não foi, de facto, atingido.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Deputado António Capucho, dir-lhe-ei que não penso que o PSD tenha causado uma grande dilúvio - não serei tão severo.

Em segundo lugar, devo dizer-lhe que tive a preocupação de ser objectivo. Assim, a propósito do investimento e dessas coisas que o Sr. Deputado diz que me faltaram, recordo-lhe que disse «[...] esta evolução foi determinada, entre outras coisas, por um aumento das exportações e acompanhada, deve dizer-se, por uma quebra da produção e do investimento com a correspondente diminuição de consumo privado, resultante também do desemprego e do aumento do número de trabalhadores com salários em atraso».
Creio que estamos entendidos de que quanto a essa parte, não faltou aqui.

Quanto ao mito, à questão do investimento, «ninguém quer investir porque ninguém tem confiança», há uma história que há muito desejo contar.

Um belo dia, o embaixador inglês disse ao Czar Nicolau da Rússia, com quem tinha algumas relações de amizade: «É bom que o povo comece a granjear confiança na monarquia».

O Czar da Rússia, que era amigo do embaixador inglês, terá cortado relações com ele, dizendo-lhe: «Não é o povo que tem de ter confiança na monarquia; é a monarquia que tem de ter confiança no povo».
Por isso, caiu - lamentavelmente, dadas as evoluções posteriores -, veio abaixo como não podia deixar de ser.
Ora, quando se fala em confiança do investimento, há uma questão que é necessário acentuar e que é o facto de o Governo, os sucessivos governos e as instituições já terem dado provas suficientes de que os empresários têm condições para investir - se é o que refere quanto aos agentes económicos.

Portanto, agora não são os empresários que têm de confiar nas instituições democráticas; são as instituições democráticas que têm de ter confiança nos empresários.
Penso que, em relação a alguns deles, esta minha asserção é exacta e, relativamente a outros, não o será.
É tudo o que posso dizer acerca deste assunto.

Quanto à análise do problema dos agentes económicos, gostava de dizer que há dois agentes económicos, ou seja, as empresas e os trabalhadores. Ora, é preciso ter a confiança dos dois e não a confiança de um só, sobretudo quando essa parte não é aquela que está disposta a arriscar o seu dinheiro para obter o necessário lucro mas está disposta a arriscar até ao último centavo da banca portuguesa. Não! Deve ter-se é a confiança daqueles que estão dispostos a arriscar o seu dinheiro para obterem o lucro. É isto o espírito empresarial tal como o definiu, por exemplo, em 1947 um ministro chamado Ferreira Dias na sua obra Para um Mundo Novo.

0 Sr. Luís Beiroco (CDS): - E era fascista!...

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O Orador: - Para terminar, quero dizer que quis fugir a este: «Dize tu, direi eu» porque o que está claro já foi expresso.
Se este discurso fosse feito antes do Congresso da Figueira da Foz seria aplaudido ou, pelo menos, não mereceria a censura do Sr. Deputado.
O que é necessário sublinhar é que nós tínhamos um programa para 4 anos e não nos parece que aqueles pontos, a que, entre nós, chamamos pretextos, e que a recusa ou a chegada da situação actual a que V. Ex.ª chama dilúvio tenham algumas potencialidades para aumentar ou para contribuir para aumentar o investimento ou a estabilização...

O Sr. Reinaldo Gomes (PSD): - Se o Soares desistisse, não havia Figueira da Foz!

O Orador: - «Se o Soares desistisse, não havia Figueira da Foz»... isto fica com quem o disse.
É um comentário sobre o qual me escuso de tecer qualquer outro comentário até porque provavelmente no espírito de algumas pessoas ele é verdadeiro.
Se o Soares desistisse, não havia Figueira da Foz; se o PS desistisse, não havia cisão e se o 25 de Abril não tivesse acontecido, não haveria certamente democracia.

O Sr. António Capucho (PSD): - O Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Capucho (PSD): - Para dar explicações, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Não lhe foram pedidas, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Deputado José Luís Nunes, V. Ex.ª veio aqui fazer um discurso de «inventário e balanço» que bem se compreende para quem está em fim de exercício.
Mas, quando proeurou elencar as componentes do activo desse balanço, todos tivemos ocasião de ver as dificuldades que teve.
Falou, é certo, na estabilização, mas todos sabemos que a estabilização resultou, não de uma política cara ao PS, mas das políticas que merecem a aprovação do FMI.
A política de estabilização foi a receita habitual do Fundo e aquilo que resta saber é se a terapêutica não foi em dose excessiva, o que se verá nos próximos meses.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Dissemos isso!

O Orador: - Quanto a reformas, falou na reforma de alguns estatutos profissionais, na abertura da banca e dos seguros à iniciativa privada e na lei da segurança interna.
A questão da reforma dos estatutos profissionais, por importante que seja, não é certamente, por si só, uma medida capaz de resolver os graves problemas que o País enfrenta.

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A questão da banca e dos seguros - essa, sim, é uma medida importante! -, se foi tomada por este Governo - todos sabemos - foi apenas porque os governos anteriores não a puderam tomar. Tentaram-no várias vezes mas o Conselho da Revolução não deixava.
Portanto, o mérito dessa medida vem da revisão constitucional e não vem deste Governo.
Quanto à lei da segurança interna, ela foi aprovada na generalidade neste hemiciclo, os trabalhos na Comissão têm decorrido como se sabe, embora não se saiba bem porquê, e, neste momento, seria um excessivo optimismo pensar que esta Assembleia ainda viria a aprovar definitivamente a lei da segurança interna.
Por outro lado, estranhamente, o Sr. Deputado José Luís Nunes omitiu aquilo que aparentemente seria a única grande reforma deste Governo, isto é, a lei das rendas. Esta, sim, está aprovada na especialidade e pronta para aprovação final global, o que me leva a crer que provavelmente o PS, depois da Figueira da Foz, também já não está interessado na lei das rendas.

Uma voz do PS: - Está enganado!

O Orador: - Mas o que foi mais significativo no seu discurso foi ter dito que as exportações crescem em valor e crescem em volume mas que a entrada de divisas diminui, o que quer dizer que o clima de confiança é cada vez mais negativo neste país.
A questão, Sr. Deputado, é a de saber se com este quadro económico, com o quadro institucional da nossa economia, é possível restaurar a confiança em Portugal.
E é preciso saber se este Governo fez alguma coisa para isso.
Efectivamente, nós pensamos que nada fez para o conseguir e, realmente, não o podia fazer.
Porém, há uma coisa em que o Sr. Deputado José Luís Nunes tem razão, segundo o nosso ponto de vista. É que o País precisa de ser governado ao centro. É por isso que o País precisa que o PS passe para a oposição.

Aplausos do CDS.

Vozes do PS: - Continua enganado!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Deputado Luís Beiroco, são conhecidas as relações pessoais, de admiração e de amizade, que tenho por V. Ex.ª
Nesse sentido, respondo-lhe dizendo que V. Ex.ª fez uma interpelação, não ao discurso que eu fiz, mas ao discurso que v. Ex.ª gostaria que eu tivesse feito.
Comecemos pelo princípio.
Eu não falei da lei de segurança interna. Para que fique bem claro, aquilo que de que eu falei foi do Estatuto dos Advogados e dos Magistrados Judiciais e da criação do Serviço de Informações, tudo isso sendo uma política orientada para etc.
A lei de segurança interna nunca aqui aparece referida pelas razões que V. Ex.ª referiu.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Deputado, se dá licença, quero pedir-lhe desculpa pelo meu lapso. Foi decerto um acto falhado pois o que eu queria era falar na lei de segurança interna juntamente com a lei das rendas.

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Era, de facto, outra grande reforma que afinal se perdeu pelo caminho.

Risos do CDS.

O Orador: - O que V. Ex.ª queria, e muito bem pois nós somos parlamentares, era contrapor o aparente ilogismo de eu me referir a uma lei que não tinha sido aprovada na Assembleia e deixar no tinteiro outra que já está na Comissão.
Ora, nós somos fiéis aos compromissos que assumimos. Só me referi a leis que tivessem sido aprovadas pela Assembleia.
Portanto, todo o elaborar do seu raciocínio cai pela base.
Quero agradecer-lhe uma afirmação que fez, ou seja, a de que esta política de estabilização não era a política que nós gostaríamos de fazer. Era a política que tínhamos de fazer em nome dos superiores interesses nacionais. Foi por isso que a fizemos.
Louvo-me no testemunho insuspeito de um partido da oposição que diz: «O PS, numa conjuntura difícil, foi capaz de fazer uma política que não lhe é cara em nome dos interesses nacionais».
Quanto ao problema de que falou, isto é, do inventário e balanço em fim de exercício, gostava de dizer ao Sr. Deputado que não imagina como apreciei essa nota e por dois motivos.
Em primeiro lugar, porque o Sr. Deputado também já teve uma experiência não muito longínqua de «inventário e balanço em fim de exercício» e, em segundo lugar, porque, utilizando uma terminologia comercialista que nos é comum, como advogados e como juristas que somos, eu diria que este é um dos casos em que uma sociedade se interrompe por mudança de gerência.

Risos.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Foi a fuga de um sócio!
É a sociedade unipessoal!

O Orador: - Há também aqui uma questão que é importante.
De facto, eu disse que as exportações crescem em valor e diminuem as entradas de divisas. Mas, Sr. Deputado, eu gostava de pedir a sua esclarecida atenção para o momento em que eu ó disse.
Disse isto citando o discurso de tomada de posse do Dr. Mário Soares, em 9 de Junho de 1983. E, em 9 de Junho de 1983, em nome de todo o Governo o Dr. Mário Soares fez este diagnóstico...

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Deputado José Luís Nunes, entende que a situação se alterou, entretanto? Entende que a fuga de divisas diminuiu neste país ou que aumentou nos últimos meses?

O Orador: - O Sr. Deputado sabe que, no que respeita a fuga de divisas, eu e V. Ex.ª não temos nenhum conhecimento acerca dessa matéria, a não ser aquilo que é dado a conhecer indirectamente, através da consulta de análises estatísticas.
Penso que a fuga de divisas diminuiu, penso que diminuiu porque se criou um clima de maior confiança e que não foi através da criação de medidas repressivas sistemáticas que isso aconteceu.
Mas não temos aqui índices para estarmos a discutir sobre essa matéria.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - As divisas estão a entrar todas!

O Orador: - Portanto, o que sugeri há pouco foi o diagnóstico feito em 9 de Julho de 1983.E esse diagnóstico, feito em 9 de Julho de 1983, não foi contestado por ninguém: VV. Ex.as não o contestam, mais ninguém o contestou e é natural que ninguém o tenha aqui contestado porque ele correspondia à exacta verdade dos factos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que tenho outros serviços relacionados com a actividade parlamentar, solicito ao Sr. Vice-Presidente Basílio Horta, o favor de me vir substituir.
Entretanto, convoco os Srs. Deputados líderes dos grupos e agrupamentos parlamentares para estarem presentes numa reunião que se realizará no meu gabinete, às 17 horas e 45 minutos.
Entretanto, assumiu a presidência, o Sr. Vice-Presidente Basílio Horta.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção é, no fundo, para dar as explicações que, há pouco, o Sr. Presidente, interpretando correctamente o Regimento, não consentiu - e bem - que eu desse.
As explicações que eu pretendo dar referem-se à insinuação do Sr. Deputado José Luís Nunes, de que eu não teria feito o discurso que fiz se não tivesse ocorrido o Congresso da Figueira da Foz. Não é verdade, Sr. Deputado. O Sr. Deputado deve conhecer os comunicados finais dos Conselhos Nacionais do PSD e, em Abril, o PSD, reunido em Conselho Nacional, concluiu de uma forma muito clara, constatando o não cumprimento das medidas acordadas pelos dois partidos, devidamente calendarizadas; elencou. várias medidas cuja aprovação considerava absolutamente indispensável e, entre elas, estão a lei eleitoral, a legislação laboral, a legislação agrícola e concluiu da seguinte maneira: o não cumprimento atempado de uma destas medidas, consideradas essenciais, era motivo bastante para o PSD rescindir o acordo com o PS. Portanto, no essencial, não se trata de matéria nova, já que o Conselho Nacional, reunido antes do Congresso - como o Sr. Deputado referiu e como eu referi - tinha deliberado cessar o acordo convosco se uma dessas medidas não fosse cumprida nos prazos acordados.
'De facto, essas medidas não foram cumpridas e basta dar o exemplo da lei eleitoral, cujo prazo terminou em 31 de Março.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Luís Nunes, ainda tem 1 minuto do tempo que a ASDI lhe concedeu. Portanto, se desejar responder ao Sr. Deputado António Capucho, tem a palavra.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Diria, como Ricardo III, «não o meu reino por um cavalo» mas o meu reino por 2 minutos. Não tenho reino, portanto...

Risos.

Sr. Deputado António Capucho, percebemos todos o que eu quis dizer e percebi perfeitamente o que o Sr. Deputado quis dizer: estamos entendidos. Mas se, por acaso, uma só das medidas não fosse cumprida, implicava o fim da coligação, então não entendo, concretamente, por que é que estivemos reunidos - para além do prazer que há sempre em trocar impressões com VV. Ex.as!

Risos.

Quanto à leitura dos comunicados do Conselho Nacional do PSD, devo dizer-lhe que os leio. Mas, vou dizer-lhe, com franqueza e com verdade, o seguinte: leio-os em diagonal, isto é, no princípio e no fim.

A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - O mal foi esse!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guerreiro Norte.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Conservatório Regional do Algarve, associação particular, com sede em Faro, fundada em 1972, é hoje credor da maior admiração e respeito pelos relevantes serviços prestados à cultura algarvia, com especial incidência no domínio da música.
Esta instituição tem catalizado as gentes do Algarve pelo enorme esforço desenvolvido no sentido de varrer a tradicional letargia do cidadão comum e suscitar-lhe o interesse pelo ensino e cultura das artes.
E esta realidade é evidenciada de forma insofismável pelo substancial e ininterrupto aumento de alunos que o frequentam ou que aguardam a longa lista (cerca de 500) à espera de uma vaga para nele ingressarem.
Ao seu início, que ocorreu em 1972, com uma frequência de 160 alunos, contrapõe-se presentemente uma escola onde mais de 700 alunos aprendem desde o piano e violino, a flauta de bisel e transversal e cerca de 20 professores ministram quase tudo o que a ciência das artes elevou à dignidade escolar e conferiu o estatuto de matéria docente como a guitarra, clássica, violino, composição, acústica, história da música, ballet, ginástica rítmica, canto coral, etc.
Pode afirmar-se sem receio que a actividade do Conservatório do Algarve se situa a par daquela que os Conservatórios de Lisboa e Porto têm desenvolvido no País.
Neste curto espaço de tempo de 13 anos, ex-alunos seus exercem o professorado por toda a província e fora dela, para além daqueles que, pelas qualidades demonstradas, vão singrando na tão difícil arte dos sons, e ocupam lugares de destaque na capital do País.
Acrescente-se ainda que o Conservatório é frequentado por rapazes e raparigas oriundos de toda a província que vêm demonstrando por ele um carinho especial.

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Apesar de isso representar um incentivo para nós algarvios, é confrangedor saber que por falta de estruturas não é possível conservar estes jovens que bem podiam trabalhar no Algarve, preenchendo uma lacuna nas actividades a oferecer ao turismo.
É que não podemos esquecer que embora o Algarve constitua o maior cartaz turístico de Portugal, mercê das suas praias e do seu sol incomparável é indispensável criar outros pólos de atracção aos turistas nacionais e estrangeiros, designadamente na arte, na cultura, no teatro e na música, que os motivem de molde a interessarem-se mais de perto pelos valores culturais e manifestações espirituais do povo que os recebe e acolhe.
Torna-se por isso urgente e inadiável acautelarmos com o maior empenho possível, tudo o que ainda resta da cultura tradicional do povo algarvio.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos seus diferentes e multifacetados aspectos, essa cultura que vem de séculos e cuja continuidade parece estar seriamente comprometida, se não forem tomadas as devidas precauções para a preservar, tem encontrado no Conservatório Regional do Algarve um símbolo e uma bandeira na defesa desse precioso património, fundamentalmente no que respeita à música e em tudo o que gira à sua volta.
Trata-se, pois, de uma instituição decisiva no quadro da actividade musical da província que tem participado em quase todas as manifestações culturais, através de centenas de concertos que se têm realizado por todo o País e estrangeiro. Sublinhe-se que tem havido anos de apresentar em público mais de 5 dezenas de espectáculos de todas as actividades artísticas, colocando-se assim em plano de igualdade ou superior ao que qualquer escola de arte do País.
O próprio Festival Internacional do Algarve, um cartaz de renome nacional e internacional considerado dos melhores da Europa é fruto e consequência da actividade desenvolvida pelo Conservatório Regional do Algarve.
Ainda no pretérito dia 2 terminou um concurso nacional de piano em homenagem à fundadora e primeira directora, D. Maria Campina, em que concorreram alunos idos de todas as regiões do País, saldando-se por um êxito assinalável, concurso esse que se institucionalizará como prémio nacional a realizar anualmente no intuito de prosseguir os objectivos que presidiram à sua realização, ou seja, a oportunidade e a conveniência de um contacto mais efectivo entre a juventude, tentando aperfeiçoar os seus conhecimentos musicais e sensibilizá-la para a sublime nobreza da sua profissão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É de lamentar que uma escola tão importante não tenha merecido das entidades superiores o correspondente acompanhamento e interesse.
É incompreensível que uma instituição com esta amplitude e dimensão continue a subsistir à custa do sacrifício dos seus professores, os quais retiram parte dos seus ordenados e entregam ao Conservatório, da quotização dos seus sócios e de alguns subsídios que constituem autênticas esmolas.
Mas esta situação só tem sido possível graças à boa vontade do corpo directivo, que sem olhar a esforços e vencendo todos os obstáculos, tem conseguido equilibrar os magros orçamentos através de uma ginástica financeira permanente.
Não se compreende também a razão pela qual os últimos anos dos cursos superiores não são ainda ministrados

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naquela instituição, obrigando os alunos a deslocarem-se a Lisboa e Porto para concluirem os seus cursos?
Queremos e temos o direito que o Algarve não continue a ser uma região esquecida no que se refere ao ensino superior como foi durante décadas consecutivas, não obstante o espólio histórico-cultural e patriótico, tão eloquentemente demonstrado ao longo dos séculos por muitos dos seus filhos mais ilustres.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Conservatório Regional do Algarve não possui edifício próprio, funcionando em precárias instalações cedidas pela Cruz Vermelha, que desde há muito se revelam inadequadas e tacanhas, espera dentro do espaço de 3 anos ter uma casa moderna e adequada com capacidade para mais de 2000 alunos que irá satisfazer as necessidades que enumerámos.
Mas é evidente que se torna indispensável oficializá-lo, convertendo-o num estabelecimento estadual, a única forma que se nos afigura capaz de cativar professores competentes e fixá-los no Algarve e ainda pôr cobro aos problemas financeiros inerentes a um estabelecimento desta natureza e com este estatuto.
Essa medida corresponderá a um profundo anseio dos Algarvios e actuará como uma espécie de reparação moral para com uma província que tão mal olhada tem sido pelos poderes públicos.

Aplausos do PSD e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a convite da Assembleia da República e em visita oficial ao nosso país, encontra-se no hemiciclo, a assistir aos nossos trabalhos, uma delegação do Soviete Supremo da URSS.
A Mesa da Assembleia da República saúda cordialmente esta delegação e deseja-lhe uma óptima estadia em Portugal.

Aplausos gerais.

Srs. Deputados, encontra-se na Mesa um voto de congratulação, apresentado pelo Grupo Parlamentar do CDS. Segundo me informaram os Srs. Deputados-Secretários, o voto já foi lido, tendo ficando acordado que seria posto à discussão e votação ainda na sessão de hoje..
Queria pois informar a Assembleia de que o tempo disponível no período de antes da ordem do dia é bastante reduzido: o CDS dispõe de 3 minutos, o MDP/CDE de 1 minuto, o PSD de 2 minutos e a ASDI de 1 minuto, enquanto o PCP já ultrapassou em 1 minuto o seu tempo e o PS e a UEDS não dispõem de tempo.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, não sei se me antecipei ao raciocínio que V. Ex.ª ia fazer mas como creio que todos os partidos terão necessidade de produzir declarações de voto, sugeria que fossem igualizados os tempos por forma a que todos os partidos tivessem 2 ou 3 minutos para proferirem uma declaração de voto.
Naturalmente que sou parte interessada mas também há partidos que não dispõem de tempo e mal pareceria que não pudessem fazer uma declaração para indicarem qual o sentido do seu voto.

O Sr. Presidente: - Se todos os Srs. Deputados estiverem de acordo, é óbvio que a Mesa acolherá favoravelmente a sugestão do Sr. Deputado Carlos Lage.

Pausa.

Não havendo objecções por parte dos Srs. Deputados, cada grupo e agrupamento parlamentar disporá de 3 minutos para as declarações que entenderem produzir acerca do voto de congratulação.
Srs. Deputados, está em discussão o voto de congratulação apresentado pelo CDS, que já foi lido.
Para apresentar o voto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que os considerandos que antecedem a proposta de voto apresentada pelo Grupo Parlamentar do CDS são suficientes para fundamentar esse mesmo voto.
Por isso, neste momento, limitar-me-ia a sublinhar dois aspectos.
Em primeiro lugar, sublinho que a adesão à Comunidade Económica Europeia é uma tarefa nacional, que tem sido assumida por todos os partidos democráticos, quer no governo, quer na oposição. Portanto, é uma questão que não pode ser posta em causa a prestexto de crises políticas que existam em Portugal.
Quaisquer que sejam os resultados de uma futura eleição parlamentar - se a ela houver lugar nos tempos mais próximos -, não temos dúvidas que continuará a haver uma maioria democrática na Assembleia da República. Por isso mesmo, o projecto de integração de Portugal na Comunidade Económica Europeia será prosseguido como tem sido até aqui.
Em segundo lugar, desejo sublinhar - respondendo a uma questão pertinentemente colocada pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso - que penso que, neste voto, não se trata de uma antecipação do debate que a Assembleia da República terá de travar, com maior profundidade, aquando da aprovação para ratificação do Tratado de Adesão.

É evidente que neste momento se trata de a Assembleia da República tomar posição política face ao fim de um processo negocial que se arrastou por largos anos e que comprometeu sucessivos governos e sucessivas maiorias parlamentares.
Os poderes da Assembleia não ficam esgotados pela emissão deste voto. E, como é óbvio, é desejável que a Assembleia debata com a maior profundidade o conteúdo do Tratado de Adesão, o que certamente será feito oportunamente.
É evidente que a Assembleia da República terá, até ao fim, até ao momento em que emitir o seu voto de aprovação para ratificação, todos os poderes que constitucionalmente lhe cabem. Mas é evidente que seria uma pura estultícia pensar-se que os sucessivos governos que negociarem o Tratado não o negociarão com toda a legitimidade e com o apoio desta Câmara. Todos os governos tiveram esse apoio e o CDS, apesar de ser um partido de oposição, nunca deixou de apoiar este Governo em matéria de negociações do Tratado de Adesão.
Neste momento, o que importa é que a Assembleia da República se pronuncie politicamente sobre um facto que é, certamente, um facto histórico, que é certamente um facto que irá alterar profundamente a sociedade

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portuguesa e que irá alterá-la num sentido da sua maior modernização e com inteira salvaguarda dos valores democráticos e das liberdades e garantias dos Portugueses.

Aplausos do CDS, de alguns deputados do PS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, queremos congratular-nos com a iniciativa do CDS porque, sendo o CDS um partido de oposição, esta iniciativa, agora tomada, reforça o sentido nacional da cerimónia que se vai realizar amanhã e evidencia - como o Sr. Deputado Luís Beiroco já teve oportunidade de sublinhar - um largo consenso em matéria tão importante e tão decisiva para o futuro do País.
Cremos, assim, que este voto não antecipa o debate que se travará nesta Assembleia e o aprofundamento das razões pelas quais se faz a adesão à CEE. Mas, desde já, este voto é um sinal, é um sentido de qual é a vontade nacional em matéria de integração na CEE.
Quase é supérfluo estar a indicar as razões pelas quais apoiamos, decidida e entusiasticamente, a adesão de Portugal à CEE. De facto, são razões políticas, económicas e culturais que nos levam a apoiar, sem hesitações, esse grande projecto.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - São razões políticas, visto que a integração na CEE não só contribuirá para consolidar a democracia em Portugal mas também nos permite contribuir para a construção de uma unidade europeia que cada vez é mais necessária para a Europa retomar a palavra, a decisão e a intervenção à escala mundial.
A nossa - ainda que modesta - contribuição é também muito importante para a construção da unidade europeia.
A adesão é importante também por razões económicas: Estamos convencidos de que a participação num espaço económico tão vasto será motivador para os nossos empresários e para as suas exportações, será motivador para a modernização da economia portuguesa e também criará novas condições para os trabalhadores portugueses.
São razões económicas e de interesse para a economia do País mas também - e finalmente - razões de natureza cultural e psicológica.
Somos parte da Europa, somos herdeiros e participantes de uma velha cultura e sentimos toda a honra em nos reunirmos a outros países que querem contribuir para a valorização do papel da Europa e para a afirmação da sua velha cultura. Nós aderimos à ideia e à imagem da Europa e achamos que essa ideia e essa imagem são dignas de afecto, de empenhamento e de fidelidade.

Aplausos do PS, de alguns deputados do PSD e de alguns deputados do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Numa situação em que ninguém sabe exactamente qual o texto do Tratado que vai ser assinado amanhã, nem se sabe também exactamente quem é responsável pela assinatura, isto é, a quem é que, no futuro, o País e a Assembleia da República vão pedir contas - não se sabe, por exemplo, se o PSD é inteiramente solidário com a assinatura que amanhã vai ter lugar nem se, mais tarde, quando se pedirem contas sobre o texto do Tratado, o PSD se considera responsabilizado pela assinatura que se vai realizar amanhã -, este voto apresentado pelo CDS parece querer indicar um sim da parte desse partido. Ou seja, o CDS sabe tudo, o CDS é inteiramente solidário com os termos do Tratado que amanhã vai ser assinado e, no futuro, aquando da ratificação e depois, na política da vida portuguesa, nós poderemos responsabilizar o CDS pelos termos do Tratado que vai ser assinado amanhã.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É assim a leitura que nós fazemos desta proposta do texto apresentado pelo CDS.
É essa responsabilidade que amanhã e no futuro nós exigiremos ao CDS.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Prometo!

O Orador: - Pela nossa parte, votaremos contra porque, a nosso ver, o processo de adesão à CEE é, desde o início, um processo político dos partidos - não dos partidos democráticos, como dizia o Sr. Deputado Luís Beiroco - que têm ocupado o Governo desde 1977 e que têm servido os objectivos político-partidários desses partidos e não têm levado na devida conta os interesses da economia nacional e os próprios interesses da independência do País.
Como temos demonstrado e como demonstraremos quando aqui se fizer o acto próprio e dignificador da Assembleia da República, que é a ratificação do Tratado, voltaremos a expender com fundamentação apropriada a nossa oposição a este Tratado, a nossa oposição à adesão à CEE que, a nosso ver, é ruinosa para a indústria, para as pescas, para a agricultura e, de uma maneira geral, é ruinosa para a economia nacional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Acresce que as negociações e o processo de adesão têm sido marcados, na última fase, por uma série de peripécias caricatas, verdadeiramente de opereta, não se sabendo verdadeiramente aquilo que vai ser assinado, se vai ser assinado um texto que tem partes fundamentais ainda em branco, em que as altas autoridades portuguesas como, por exemplo, os deputados da Assembleia da República, não conhecem, na véspera da assinatura, uma parte substancial do seu texto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Acresce ainda que esse texto vai ser assinado por um Governo que, devido à situação em que se encontra, não deveria assumir a responsabilidade da sua assinatura.
Finalmente, pensamos que este voto do CDS é uma tentativa para
co-responsabilizar a Assembleia da República num acto que ela não teve condições de apreciar

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devidamente, não teve condições de julgar. Portanto, seria pôr, mais uma vez, a Assembleia da República a reboque do Governo. Embora constituindo apenas uma parcela da Assembleia da República, não alinharemos nesses reboques. Não será connosco que o CDS porá a Assembleia da República a reboque deste Governo moribundo.
Por isso, votaremos contra.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito rapidamente, reafirmo aquilo que já tive ocasião de dizer, ou seja, o nosso voto será de abstenção porque consideramos - teimamos em considerar - que o voto apresentado pelo CDS é uma despropositada antecipação do debate sobre a ratificação do Tratado de Adesão às Comunidades. Despropositada, embora compreensível: colocado, pelos azares ou pelas sortes da vida política nacional, na segunda
fila, o CDS põe-se hoje em bicos de pés para ver se, apesar de tudo, dão por ele, pela sua existência e se o vêem na cerimónia de amanhã.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não faz falta!

O Orador: - Mas é totalmente despropositado.
É evidente - e já aqui foi dito pelo Sr. Deputado Luís Beiroco - que este voto não limita os poderes da Assembleia da República. Melhor fora que limitasse,
Sr. Deputado! Mas também já foi dito aqui que isso não impede que as razões que cada um tenha para tomar uma posição em relação ao Tratado venham a ser
aprofundadas. Com certeza que não impede, mas significa que, neste momento, as pessoas necessitam ainda desse aprofundamento ou então que tomam posição de
forma irresponsável.
É claro e evidente que, a meses ou semanas da ratificação do Tratado, é totalmente despropositado estar-se a debater este voto. Daí a razão da nossa abstenção.
Para terminar, gostaria apenas de sublinhar e de frisar bem que da nossa abstenção não se pode inferir qualquer elemento quanto à nossa posição relativa
mente à ratificação do Tratado de Adesão à Comunidade Económica Europeia.
De facto, a nossa abstenção refere-se ao voto apresentado pelo CDS; a nossa posição em relação ao Tratado será assumida aqui no momento oportuno,
quando tiver lugar o debate sobre esta matéria.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É só porque é do CDS!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições ...

O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, dado que esta votação é muito significativa, peço a V. Ex.ª que suspenda a sessão por 5 minutos para permitir que os Srs. Deputados, nomeadamente os que estão a trabalhar nas Comissões, possam participar na votação.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado.
Está suspensa a sessão por 5 minutos.

Eram 17 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 17 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto de congratulação apresentado pelo CDS e já lido.

Submetido a votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI, o voto contra do PCP e a abstenção da UEDS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD votou favoravelmente este voto porque o processo de adesão ao Mercado Comum sempre foi uma das prioridades e uma das grandes opções de política que os sociais-democratas estabeleceram.

Obviamente que isso não implica que desconheçamos as dificuldades e os grandes desafios que se nos deparam, bem como a necessidade de um grande esclarecimento e de consciencialização de todos os Portugueses. Mas importa, sobretudo, que os poderes públicos assumam em profundidade toda a dimensão deste desafio e que tenham a capacidade de procurar acelerar o processo de recuperação e de preparação das estruturas portuguesas para que este embate tenha um saldo positivo e não se salde por maiores dificuldades para os Portugueses e para a nossa sociedade.

Entendemos, em suma, que se trata de um desafio nobre que vale a pena correr e que todos, em consciência, devem assumir em plenitude.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais pedidos de palavra, queria sugerir que, ainda antes do intervalo, se desse início ao período de antes da ordem do dia para tratar dos dois pontos da 1. a parte daquele período. Os Srs. Deputados estão de acordo?

Pausa.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Entrando, pois, no período da ordem do dia, peço ao Sr. Deputado Secretário que proceda à leitura do pedido de prorrogação do prazo à Comissão Eventual de Inquérito à Radiotelevisão Portuguesa, E. P.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: o ofício é do seguinte teor:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:

A Comissão Eventual de Inquérito à RTP, constituída pela Resolução n.º 19/84, chegou à conclusão de que não lhe é possível dar por terminados os seus trabalhos dentro do prazo que lhe foi

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prorrogado até 30 de Maio de 1985, por dificuldade de elaboração do relatório.
Nestes termos, a Comissão deliberou solicitar a V.ª Ex.ª a prorrogação do prazo até ao dia 15 do próximo mês de Junho.

Palácio de São Bento, 30 de Maio de 1985. O Presidente da Comissão Eventual de Inquérito, António Marques Mendes.

O Sr. Presidente: - Está em discussão, Srs. Deputados.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Não havendo inscrições, vamos votar este pedido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Passamos agora à leitura do parecer da Comissão de Regimento e Mandatos acerca do pedido solicitado pelo 2.º Juízo Correccional de Lisboa para que o Sr. Deputado Leonel Santa Rita Pires deponha como testemunha.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O ofício é do seguinte teor:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:

De acordo com o solicitado no ofício n.º 600, Processo n.º 401, 1.ª Secção, do 2.º Juízo Correccional da Comarca de Lisboa, datado de 11 de Abril último, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado Leonel Santa Rita Pires, comunico a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a depor como testemunha no processo referenciado.

Com os melhores cumprimentos.

Palácio de São Bento, em 30 de Maio de 1985. - O Vice-Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, Mário Júlio Montalvão Machado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão, Srs. Deputados.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Não havendo inscrições, vamos proceder à votação deste parecer, Srs. Deputados.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, finda a 1.ª parte do período da ordem do dia, vamos fazer então o intervalo, recomeçando a Sessão às 18 horas.
Está suspensa a Sessão.

Eram 17 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a Sessão.

Eram 18 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início à 2.ª parte do período da ordem do dia, que consiste na apreciação das ratificações n.ºs 133/III, do CDS, 129/III, do PCP - Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, que aprova o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA).

Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se na semana passada a Câmara não tivesse sido confrontada com o anúncio público da ruptura, a prazo curto, da coligação de apoio ao Governo haveria talvez quem intentasse atribuir a esta iniciativa do CDS propósitos que, na verdade, nada têm a ver com os objectivos que moveram o meu grupo parlamentar ao longo de todo o processo.

De qualquer modo, entendemos que se justifica começar esta intervenção respondendo a algumas questões, o que não significa também qualquer espécie de indisponibilidade para o fazer na altura dos pedidos de esclarecimento.

A primeira será a que respeita à razão de ser do próprio pedido de apreciação do Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, que, como é sabido, aprovou o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA).

Podendo o pedido de apreciação, após a revisão constitucional de 1982, ter apenas um de dois objectivos - a introdução de alterações no diploma a apreciar, ou a recusa da sua ratificação -, a intenção do CDS ao requerê-la tempestivamente, como o fez, em relação a este diploma concreto, foi apenas e tão-só a de tentar alterar algumas das disposições do código que, como ele, acabava de ser aprovado, para entrar em vigor menos de 6 meses depois.
Nada tem, com efeito, o CDS em especial contra um imposto como o IVA, que dentro do género da tributação indirecta, se apresenta como susceptível de realizar com menor imperfeição o princípio da justiça fiscal, pelo grau de neutralidade que pode alcançar, pelo considerável alargamento da base de tributação que implica e pela circunstância de evitar, como nenhum outro, as situações de abuso e fuga, responsáveis sempre por distorsões graves da concorrência.

Acresce o facto que não pode considerar-se despiciendo para aqueles que, como nós, sempre têm assumido numa atitude de apoio à integração do País na CEE, de a aplicação do IVA constituir, em si, uma das consequências da celebração do respectivo tratado.

Simplesmente a atitude de princípio favorável, designadamente os princípios consagrados na autorização legislativa concedida no artigo 22.º da Lei n.º 42/83, de 31 de Dezembro, não nos impediu, como é óbvio, de encarar com objectividade o conjunto de soluções que o Governo acabou por consagrar com a publicação do já citado Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, bem como a própria oportunidade da iniciativa.
Ora, em relação ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado propriamente dito, consideramos que não poderiam passar sem correcção, ao menos do nosso ponto de vista, alguns aspectos importantes.

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Desde logo, a forma de cobrança estabelecida, preterindo os serviços do Tesouro representados pelas várias tesourarias da Fazenda Pública, em favor da própria Direcção-Geral das Contribuições e Impostos.

Depois, a extensão e natureza das listas de bens e serviços isentos (lista I referida n.º 34, artigo 9.º) e de bens e serviços sujeitos à taxa reduzida de 8 % [lista II referida na alínea a)no n.º 1 do artigo 18.º].

Depois ainda, a aplicação de regimes diferentes em estádios sucessivos de alguns processos produtivos, criando distorsões eliminadoras do próprio efeito da neutralidade.
Finalmente, o regime estabelecido para devolução do imposto pago, nos casos em que a mesma tenha lugar.

Quanto à oportunidade da publicação e da escolha do dia 1 de Julho, a meio do ano, portanto, para a entrada em vigor, do novo imposto, sempre nos interrogamos sobre se as vantagens invocadas seriam, em si, suficientes para se sobrepor aos inconvenientes manifestos de tal opção.

É certo que nunca nos foi dada resposta satisfatória, do mesmo modo que nunca se conseguiu explicar as razões que terão levado os nossos negociadores a conseguir um período de 3 anos após a adesão para introduzir o IVA, para depois o legislador interno desperdiçar todo esse prazo e decidir avançar com o novo imposto mesmo antes da adesão.

Métodos, como diria o Sr. Secretário de Estado Dr. António Vitorino.

De tudo isso demos devida conta no decurso do processo de discussão do Orçamento do Estado para 1985, altura em que foi possível fazer uma primeira apreciação das soluções consagradas no código publicado pelo Governo. A Assembleia acabou, de resto, por partilhar, ao menos em parte, os pontos de vista do CDS, apesar de as razões tecidas pela coligação constituírem então um obstáculo a que muitas vezes a verdadeira razão das coisas subsistisse.

Daí o ter sido incluído no artigo 32.º da Lei n.º 2-B/85, de 28 de Fevereiro, uma disposição a conceder autorização ao Governo para proceder a eventuais alterações nas listas I e II anexas ao Código aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/84, de «de modo a contemplar situações de melhor ajustamento ao regime fiscal que o imposto sobre o valor acrescentado visa substituir».
Mas sendo assim, aguardamos que a autorização fosse utilizada e por isso não usamos o direito de fixação da ordem do dia para avançar com a discussão do pedido de apreciação do Código.

Entretanto, na reunião plenária de 1 de Abril de 1983, aproveitando uma sessão de perguntas ao Governo, colocámos a questão de saber se se mantinha ou não a data da entrada em vigor do IVA para 1 de Julho, referindo certas notícias da imprensa que davam já como certo tal não ser possível.

Do mesmo passo, interrogamos o Governo sobre o momento em que pensava utilizar a autorização legislativa que lhe fora conferida para alterar as listas I e II.

Respondeu o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, confirmando peremptoriamente a data de 1 de Julho, e indicando que a autorização seria utilizada em Abril ou Maio.
Voltámos ao assunto, em 27 de Abril, também numa sessão de perguntas, tendo, então o Sr. Secretário de Estado mantido a afirmativa no tocante à data de 1 de Julho, adiando porém para Maio a data provável de apresentação a Conselho de Ministros dos diplomas destinados a utilizar a autorização legislativa.
No tocante à regulamentação necessária à implementação do imposto, designadamente respeitante à transição do actual imposto de transacção para o novo IVA, afirmou o Sr. Secretário de Estado que seria apresentada a Conselho de Ministros na primeira quinzena de Maio, uma vez que o projecto se encontrava já concluído.
Afinal, passou-se Abril, passou-se Maio e quando este se aproximava do fim requeremos a inclusão na ordem do dia da apreciação que haveríamos requerido tempestivamente.
E estamos agora, no dia 11 de Junho, a escassas 3 semanas do dia 1 de Julho - previsto para a entrada em vigor do novo imposto -, sem que tenha sido publicada a autorizada alteração das listas I e II, com a agravante de na sessão de 27 de Abril, o Governo ter adiantado algumas indicações concretas sobre o sentido que viria a ter tal alteração.
E, também, a escassas 3 semanas da entrada em vigor do Código, não está regulamentada a aplicação do imposto às transacções efectuadas pelas agências de viagens, conforme previsto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 394-B/84, e não se conhecem as medidas destinadas a evitar casos de dupla tributação em IT e IVA, como poderá acontecer com as mercadorias em stock, nas empresas, em relação às quais foi já pago o primeiro imposto.
Quer tudo isto dizer que às razões iniciais do CDS acresce agora mais uma: a que reside na impreparação dos destinatários, sujeitos passivos de imposto, tanto mais grave quanto é certo que o IVA exige uma cooperação particularmente intensa da sua parte, sem quaisquer precedentes entre nós.
E à impreparação juntam-se as enormes dúvidas sobre a data da entrada em vigor, em boa parte inerentes ao clima de incerteza e falta de segurança, ultimamente instalado na vida política portuguesa.
Por tudo isso, fixamos a ordem do dia com a apreciação do Código do IVA, vamos propor as alterações que sempre tivemos em mente e vamos ainda submeter à votação um projecto de resolução com vista à suspensão do Decreto-Lei n.º 394-B/84, nos termos do disposto no artigo 172.º, n.º 2, da Constituição da República.
Supomos, aliás, ao fazê-lo, que outra atitude não poderá ser adoptada se apesar de tudo o que a vida política nos tem oferecido nas últimas semanas, se mantiver a capacidade de raciocinar e actuar com um mínimo de realismo.
Como poderá entrar em vigor em 1 de Julho um imposto que implica uma mudança tão radical nos procedimentos da maior parte dos agentes económicos, se subsistem em relação ao mesmo tantas dúvidas e incertezas?
Por outro lado, estamos certos de que ao propor a suspensão não iremos contribuir para a diminuição da receita. Antes pelo contrário, iremos evitar essa redução.
Quando aqui se discutiu o assunto em sede de aprovação do Orçamento de Estado para 1985, o argumento que o Governo avançava era o de que a soma da cobrança prevista do 1T em 1985 e do IVA - 163 900 000 contos - era superior à que resultava da actualização, mediante a aplicação da taxa de inflação em 1985, dos valores de IT cobrados em 1984.

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Estamos certos, porém, que a falta de esclarecimento, principalmente das empresas do comércio retalhista, e a falta de preparação destas empresas, levará a uma omissão de tal forma grande no pagamento do imposto que a aplicação do IVA se virá a traduzir numa diminuição autêntica da receita do Estado prevista para 1985.
Aguardaremos que o Governo nos demonstre o contrário, designadamente com base em elementos que por certo terá colhido nos registos das empresas feitos com base no Decreto-Lei n.º 384-A/84.

Por último é nossa convicção de que ao proceder como procedemos não estamos a infringir o disposto no n.º 2 do artigo 170.º da Constituição da República Portuguesa.

Com efeito, as únicas propostas que apresentaremos e que poderia entender-se implicarem diminuição das receitas orçamentais são as que se encontram já compreendidas na autorização legislativa do n.º 1 do artigo 32.º da Lei n.º 2-B/85 e que foram, por isso mesmo, necessariamente tidas em consideração no Orçamento já aprovado por esta Assembleia.

As demais alterações que propomos nada têm a ver com a diminuição de receitas ou aumento de despesas.

O que estamos, isso sim, é a usar do direito que nos assiste - na media em que requeremos atempadamente a apreciação de um decreto-lei publicado pelo Governo - de propor à Câmara a suspensão da vigência de tal diploma.

Até quando?

Precisamente até serem aprovadas as nossas propostas de alteração ou até serem definitivamente rejeitadas pela Assembleia, como manda a Constituição e o Regimento.

Mas que alterações propomos e o que é que justifica a suspensão com elas requerida?

Sem o detalhe que só a discussão na especialidade justificará, diremos que essas alterações se destinam antes de mais a tornar possível a adaptação das listas I e II às verdadeiras necessidades de consumo dos Portugueses, tendo em conta uma transição coerente do sistema de IT para o novo sistema do IVA, e evitando sobressaltos em matéria de inflação para além dos que fatalmente se irão produzir.

O mais correcto neste domínio é prever que a entrada em vigor do imposto irá produzir um impacte no índice de preços equivalente ao valor das próprias taxas sem saber como deduzir o IT já pago, os comerciantes de retalho terão tendência para remarcar todos os seus stocks com o agravamento do IVA e só depois, conhecidas as regras e colhida experiência, poderá então alcançar-se um impacte aproximado do previsto pelos serviços.

Por isso propomos alterações que abrangerão entre outros os medicamentos e os livros que não poderão deixar de figurar entre os bens isentos. Por outro lado, a modificação das listas terá como objectivo evitar que sejam sujeitos a diferentes regimes, com taxas diferentes, as diferentes fases de um mesmo processo produtivo, anulando-se, por essa via, a vantagem da neutralidade, um dos mais positivos efeitos do novo imposto.

Outra das alterações é a que se refere ao processo de cobrança com o qual se alterou o sistema tradicionalmente consagrado entre nós de distinguir entre os serviços encarregados de dirigir os processos tributário gracioso e de praticar os actos tributários - dependentes da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos - e os serviços que têm por missão arrecadar as receitas já liquidadas - dependentes da Direcção-Geral do Tesouro.
Trata-se, sem dúvida, de uma distinção que desempenha um papel de relevo no conjunto (já tão reduzido) das garantias do cidadão contribuinte e que por isso não poderá ver-se eliminada sem que isso seja acompanhado de uma reforma global dos serviços da administração fiscal.
Finalmente, outra alteração que propomos visa eliminar uma verdadeira imoralidade do diploma, qual seja a que resulta de permitir ao fisco demorar as devoluções de imposto, ficando sujeito a uma taxa de juro de mora inferior à que cai sobre os cidadãos que demoram o pagamento do mesmo imposto.

É para estas alterações que pedimos a atenção da Câmara e é atento ao seu significado que vamos propor a suspensão do Código.
Esperamos que identificada com os interesses do povo português que representa, a Câmara acolha favoravelmente as nossas propostas.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Hasse Ferreira e Carlos Lage.
Tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, como é habitual, apreciei muito a forma da sua intervenção, mas desta vez também o seu conteúdo.
De facto, partilho uma boa parte das preocupações aqui apresentadas pelo Sr. Deputado.
Aliás, nas sessões que aqui se realizaram relativas à discussão do Orçamento, em Fevereiro, fui um dos deputados que levantou aqui o problema da aplicação do IVA a medicamentos e a livros, bem como o problema da suspensão da data da aplicação do IVA e, portanto, a possibilidade de o IVA só entrar em vigor em 1 de Janeiro de 1986.
Na realidade, sempre me pareceu um pouco abstruso e não me convenceram as explicações do Sr. Secretário de Estado do Orçamento e de um ou de outro colega que interveio para defender a posição que o Governo tinha na altura - e espero ser esclarecido hoje sobre se não terá havido evolução do Sr. Secretário de Estado, uma vez que estamos em 11 de Junho e não em Fevereiro ... Mas, como dizia, sempre me pareceu um pouco abstrusa a necessidade de aplicar o IVA a meio de um ano fiscal, sem ter nada a ver com a data prevista para a adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia.

Devo salientar, aliás, as posições divergentes que, a respeito da data de entrada em vigor do IVA, se manifestaram no seio do próprio Governo: o Sr. Ministro da Saúde teve a hombridade de declarar, na Comissão de Economia e Finanças e na televisão, que não era favorável à aplicação do IVA aos medicamentos.

Por seu turno, o Sr. Deputado Manuel Alegre manifestou aqui as maiores reservas quanto à aplicação do IVA aos livros.
15to quanto à incidência. Quanto ao processo, os problemas que levantou revestem-se, de facto, de uma certa complexidade para as empresas.

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Devo dizer, no entanto, que, neste momento, não há nenhuma solução boa. Deliberar-se agora, em 11 de Junho, que já não se aplica a partir de 1 de Julho, também é uma solução coxa. A boa solução tinha sido estabelecer, em Fevereiro, a não aplicação do IVA durante 1985.
Daí que a minha pergunta a V. Ex.ª seja a seguinte: qual a razão da oportunidade da apresentação, nesta data, deste pedido de suspensão? V. Ex.ª não tem de justificar, mas agradecia-lhe essa amabilidade. É certo que me poderá dizer que poderia ser mais tarde. Teoricamente, poderiam apresentá-lo no dia 25 ou 26 de Junho para que se procedesse à suspensão no dia 1.
A minha ideia é a seguinte: já se introduziu uma tal perturbação no que respeita à aplicação ou não aplicação deste tipo de imposto que, neste momento, qualquer solução é má, embora pense e continue a defender que ela deve ser adiada.
Uma outra questão é a seguinte: como é que o Sr. Deputado, do seu alto critério, aprecia a proposta feita pelo Partido Socialista - e parece-me que bem ao PSD quanto ao adiamento da aplicação do IVA? Será que o Sr. Deputado estará, do meu ponto de vista, do bom lado da barricada?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, lamento muito não ter chegado a tempo de ouvir toda a sua intervenção, até porque muita informação útil colheria nela, uma vez que V. Ex.ª é um especialista e eu não.
De qualquer modo, a dado passo da sua intervenção, já na parte final, o Sr. Deputado Nogueira de Brito disse que a intenção do CDS (não sei se estou a reproduzir fielmente as suas palavras) é a de adiar a entrada em vigor deste decreto-lei até que as propostas feitas pelo seu partido para a modificação na especialidade venham a ser aprovadas.
Queria avançar desde já com a minha opinião e com a do Grupo Parlamentar do Partido Socialista. Nós não estamos contra a suspensão da entrada em vigor do diploma e até votaremos favoravelmente um projecto de resolução que o Grupo Parlamentar do CDS venha a apresentar nesse sentido. Já estamos em desacordo é quanto à incerteza das datas da entrada em vigor do diploma.
De facto, se bem depreendi das palavras do Sr. Deputado Nogueira de Brito, o diploma fica sem uma data predeterminada, fixa para entrar em vigor, visto que isso está condicionado às vicissitudes das modificações que, na especialidade, o Sr. Deputado Nogueira de Brito e outros grupos parlamentares vão apresentar.
É aqui que se levantam as minhas dúvidas e que não estou de acordo. Creio que a suspensão da entrada em vigor do diploma deve ser feita com uma data fixa para que os agentes económicos possam ter as expectativas correctas.
Ora, pensamos que a data mais correcta para a entrada em vigor do diploma - e, portanto, para o fim da suspensão - será a de 1 de Janeiro do próximo ano.
Chamo a atenção do Sr. Deputado Nogueira de Brito para os inconvenientes que resultam do facto de não ficar desde já fixada uma data para a entrada em vigor. Depreendo que o Sr. Deputado Nogueira de Brito deixaria para o próprio diploma, resultante da discussão na especialidade, a fixação da entrada em vigor. Mas, depois de se ter anunciado que entrava em vigor em 1 de Junho, e havendo inconvenientes que não importa estar agora a sublinhar, creio ser de bom senso e correcto fixarmos desde essa data.
Pela nossa parte, entendemos que deve ser a de 1 de Janeiro de 1986. Pergunto, pois, ao Sr. Deputado Nogueira de Brito se já está de acordo com isto. Cremos que até lá há tempo para se introduzirem as modificações que, na especialidade, os diversos grupos parlamentares queiram apresentar.
Aqui fica a minha opinião e a pergunta a V. Ex.ª

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, V. Ex.ª tinha pedido a palavra há momentos para dar ou pedir esclarecimentos?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias): - Para fazer uma intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, na altura oportuna dar-lhe-ei a palavra.
Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, teve esta Câmara a oportunidade de ouvir da parte de V. Ex.ª uma intervenção que se relacionou com o imposto sobre o valor acrescentado (IVA) e o rol de malefícios que esse imposto é capaz de trazer à sociedade portuguesa e ao sistema fiscal.
Aquilo que não ouvi ser referido em toda a sua intervenção foi qual a situação actual da tributação sobre o consumo no nosso sistema fiscal, isto é, V. Ex.ª limitou-se a relacionar o que, no seu entender, são as deficiências do IVA, mas não estabeleceu, em paralelo, aquilo que é actualmente o imposto de transacções e os impostos sobre o consumo em comparação com esta nova forma de tributação.
Neste sentido, gostaria de lhe formular algumas perguntas, V. Ex.ª abordou o facto de, nos termos do acordo de adesão, Portugal ter 3 anos para poder implementar o Código do IVA.
Sr. Deputado, acho que em termos práticos, no que se refere à tributação sobre o consumo, não suporta por mais tempo a desorganização que existe em sede de imposto de transacções e a porta aberta à evasão e à fraude fiscal, que o próprio sistema jurídico-fiscal, que suporta o imposto de transacções possibilita.
É impossível, tendo um mínimo de respeito pela justiça fiscal, a manutenção desse estado de coisas. Não estou de acordo com o adiar por 3 anos a coragem de implementar reformas num sistema que se tem mostrado injusto para com os Portugueses e gostaria que V. Ex.ª, Sr. Deputado, se explicitasse nesta matéria.
Gostaria ainda de lhe referir um outro pormenor relacionado com o facto de V. Ex.ª ter perguntado como é que poderá entrar em vigor um código que, pela sua estrutura, vai criar tantas incertezas no sistema português. É que, Sr. Deputado, qualquer reforma fiscal que se queira introduzir e levar a fundo - e ela é necessária não só no âmbito dos impostos indirectos e de tributação sobre o consumo mas também noutros âmbitos, nomeadamente na tributação sobre o cidadão -, desde que seja uma reforma de fundo, tem de provocar

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incertezas porque é algo de novo. Gostaria que V. Ex.ª me explicasse, se lhe fosse possível, como é que se implementa uma reforma fiscal de fundo sem que, efectivamente, essas incertezas atinjam a própria sociedade.
Um outro ponto que V. Ex.ª frisou dizia respeito à incidência técnico-administrativa que a aplicação do IVA pode trazer, particularmente em relação às pequenas e médias empresas. É um problema que não é despiciendo, mas o que está mal dentro do sistema fiscal português, no meu ponto de vista, não é o IVA exigir organização mas, sim, nunca se ter exigido nenhuma em muitos casos, às pequenas e médias empresas.
É isso que está mal e se nós recordarmos todo o historial do sistema fiscal português no que concerne às pequenas e médias empresas constatamos que, infelizmente, só a partir do Decreto-Lei n.º 535, de 31 de Dezembro de 1980, lhes é exigido um borrão, um papel que não tem qualquer credibilidade em termos de contabilidade. E hoje, é isso, única e simplesmente, que é exigido às pequenas e médias empresas, nomeadamente às do grupo C.
Sr. Deputado, gostaria que V. Ex.ª frisasse como é interpretada a organização actualmente existente nas pequenas e médias empresas do País e se, efectivamente, está ou não contra o mínimo de organização que lhes é exigida pelo Código do IVA.

Uma outra pergunta que lhe queria ainda fazer foi já formulada pelo meu camarada Carlos Lage e dizia respeito ao «sem limite» de tempo que o CDS preconizava para a aplicação do IVA.

Eram estas as perguntas a que gostaria que o Sr. Deputado respondesse.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Domingues Azevedo, começaria por lhe responder salientando o seguinte: porventura, o Sr. Deputado não disse que chegou tarde - foi só o Sr. Deputado Carlos Lage que o disse -, mas o Sr. Deputado também deve ter chegado tarde. E digo que deve ter chegado tarde porque o Sr. Deputado começa por dizer que na minha intervenção eu só fiz críticas ao IVA. É falso, Sr. Deputado, não é verdade! Antes pelo contrário, teci encómios ao IVA, disse que significava uma mudança positiva na tributação indirecta portuguesa e disse porquê.

Algumas das razões que me levam a mim e ao meu partido a sermos favoráveis ao IVA - e já manifestámos aqui essa posição de favorabilidade, não vamos mudar agora - identificam-se com aquelas que o Sr. Deputados acaba de enunciar. Não temos nenhum problema nessa matéria e tive o cuidado de voltar a salientá-lo na minha intervenção de hoje.

Resta-me fazer esta interrogação: suponho que, do ponto de vista do Governo, só o Sr. Secretário de Estado do Orçamento é que é a favor do IVA?! ...

Nós somos a favor do IVA; simplesmente, entendemos que o Código, tal como foi publicado, carecia de algumas correcções que se situavam em relação a alguns dos normativos desse Código. Por exemplo, uma delas era importante porque dizia respeito à própria lista das isenções. Ora, toda a Câmara se mostrou favorável à introdução dessas correcções e lembro-me do papel que o Sr. Deputado Domingues Azevedo desempenhou na discussão do Orçamento para 1985, concretamente na formulação do n.º 1 do artigo n.º 32 da Lei n.º 2085.

Depois de autorizado o Governo a alterar o diploma nesse sentido, o CDS, que tinha pedido a sua apreciação, aguardou que o Governo publicasse aquilo a que estava autorizado e procedesse à regulamentação indispensável do diploma.

Agora, só ponho a questão da impreparação - que se prende, aliás, com a oportunidade de que fala o Sr. Deputado Hasse Ferreira. Fomos aguardando, questionámos o Sr. Secretário de Estado, chegámos à data do dia 11 de Junho, o imposto vai entrar em vigor no dia 1 de Julho, fez-se um programa na televisão afirmando que vai entrar, há membros do Governo que dizem, mais ou menos às escondidas, que não vai entrar. Ora, a dúvida é total por parte dos agentes económicos e há agentes económicos que estão convencidos de que não vai entrar coisa nenhuma. É desta impreparação que falo, Sr. Deputado Domingues Azevedo.

15to não é inquestionável, é inegável e a regulamentação não saiu. Por isso pergunto: o Sr. Deputado pode garantir-me que o IVA não vai onerar mercadorias já oneradas com o imposto de transacções? Tem algum critério para isso? Conhece a regulamentação? Eu não a conheço!

O Sr. Secretário de Estado conhece-a porque - disse-nos aqui - tencionava publicá-la na primeira quinzena de Maio. Não conseguiu! Ora assim o imposto não pode entrar em vigor.

E como é que se vai aplicar o imposto em relação, por exemplo, aos serviços prestados por agências de viagens que, por sua vez, compram outros serviços já onerados com imposto e os compram muitas vezes no estrangeiro?

Continuamos a não saber como é que vamos fazer e como é que se vai aplicar o imposto.

O Sr. Deputado Carlos Lage e o Sr. Deputado Hasse Ferreira dizem-me: mas qual é a oportunidade? A oportunidade foi essa: a Assembleia da República está a terminar o seu período normal de funcionamento e nós aguardámos uma atitude do Governo para a podermos apreciar. Como não houve qualquer atitude do Governo, entendemos que teríamos de avançar porque, de contrário, seria enorme a confusão.

O que é que ia acontecer no dia 1 de Julho? Iria aplicar-se o imposto sem a regulamentação publicada. 15so era impossível. Depois de se ter prometido a certos agentes económicos que determinados bens estavam isentos, ele iriam passar a ser onerados com o imposto? Depois de se ter prometido que certos bens iriam passar para a lista II - como aqui confirmou o Sr. Secretário de Estado na sessão de 27 de Abril -, afinal isso não se verificaria?

Srs. Deputados, estas considerações justificam a nossa oportunidade. E essa oportunidade é aquela que permite suspender a aplicação do diploma sem que este tenha entrado em vigor e, portanto, não se verifica o inconveniente que a Sr.ª Deputada Margarida Salema, a propósito do Código do Direito de Autor, no outro dia nos apontava, dizendo: com a vossa proposta, vocês vão fazer com que uma mesma matéria seja regulamentada, no período de 1 ano, por 3 diplomas diferentes. Aqui vai ser o mesmo imposto de transacções

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e os outros impostos que são necessariamente repristinados pela suspensão e que, portanto, continuarão em vigor.
O Sr. Deputado Carlos Lage perguntou porque é que não fixámos uma data para a aplicação do diploma. Sr. Deputado, nós estamos de acordo com a data do dia 1 de Janeiro, mas não fizemos essa proposta porque o que estamos a propor aqui é a apreciação deste diploma com propostas de alteração. Não estamos aqui para recusar a ratificação - Sr. Deputado Domingues Azevedo, esteja descansado! -, mas para alterar, em alguns aspectos, o diploma que foi publicado e, acompanhando essa proposta de alteração, propomos a suspensão da sua aplicação.
Supomos que assim ficamos fora da aplicação do disposto no n.º 2 do artigo n.º 170 - a chamada «lei travão» -, pois de contrário não alcançávamos nenhum efeito útil. Daí que tenhamos feito a proposta nestes termos.
Supúnhamos que era mais correcto ser o próprio Governo a ter tomado a iniciativa de suspender a aplicação do imposto. Não o faz e por isso temos nós que proceder na Câmara, com os instrumentos que nos são concedidos e nos são conferidos para actuar.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra V. Ex.ª o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: Sr. Presidente, gostaria realmente de começar por afirmar que, do ponto de vista do Governo, os elementos essenciais para a aplicação do IVA em 1 de Julho estão prontos.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito referiu concretamente dois ou três diplomas e queria dizer-lhe que foi apresentado no mês de Maio e aprovado em Conselho de Ministros, quer o diploma de transição, quer o diploma das agências de viagens.
Relativamente às alterações da lista, no uso da autorização concedida pela Assembleia da República ao Governo, posso dizer-lhe que o diploma está na mesa do Conselho de Ministros e que já obteve consenso. É um diploma que contempla, julgo eu, a generalidade das situações que foram objecto de alguma crítica ao longo deste período de longo vacatio legis, que se proeurou que fosse relativamente longo exactamente para que todos os agentes económicos e todos os operadores pudessem dar conta do novo mecanismo e da nova legislação do IVA.
Posso dizer que os restaurantes passam de 16 para 8, que os livros ficam isentos, que na lista dos medicamentos que são comparticipáveis estes ficam também isentos, que as matérias-primas para a parte têxtil, calçados, etc., ficam com uma taxa de 8 % e que se está realmente a conceber um período de 30 dias - que eventualmente poderá ser de 60 - entre o desembaraço aduaneiro e o pagamento do IVA pois pode haver realmente uma falta de sincronização e isso é realmente fundamental para não sobrecarregar o fundo de maneio das empresas.
Gostaria de salientar portanto que, do ponto de vista do Governo, e concretamente do Ministério da Finanças, o que é fundamental para que o IVA possa entrar em vigor no dia 1 de Julho está rigorosamente preparado.

Quanto às vantagens do IVA, julgo que não vale a pena referi-las.
Gostaria de salientar, numa terceira nota - e todos os especialistas na matéria que foram consultados, quer nacionais, quer estrangeiros, apontam para isso - que, de facto, a cobrança deve ser centralizada.
Cada contribuinte tem de ter uma conta corrente e não tem necessidade absolutamente nenhuma de passar o seu tempo a correr para as repartições de finanças e para as tesourarias da Fazenda Pública pois isso é nitidamente do século passado. Tem, portanto, uma conta corrente e se, efectivamente, não remete o cheque, ao fim de 1 ou 2 dias é contactado no sentido de saber porque é que não cumpriu a sua obrigação tributária, havendo uma lista dos contribuintes que estão em falta nas direcções de finanças e nas repartições de finanças.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito, na sua intervenção, quer realmente fazer recuar isto para o século passado, o que é francamente lamentável.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Secretário de Estado, queria em primeiro lugar - se bem ouvi - saudar a evolução do ponto de vista do Governo, e suponho que do Sr. Secretário de Estado, face a dois pontos não tão despiciendos como isso.
Na sua rápida, sintética e esclarecedora intervenção pareceu-me que referiu que havia um consenso quanto aos livros e os medicamentos ficarem isentos. Eram dois pontos cruciais que aqui tinham sido levantados e ainda bem que tanto aqui se batalhou nesta Assembleia porque admito que a deliberação tomada não terá deixado de sofrer, minimamente que seja, a influência dos debates parlamentares.
Não tenho qualquer dúvida que o Governo tem toda a capacidade, ainda que diminuído pela crise que o partido de V. Ex.ª no seio dele criou, para fazer entrar em vigor o IVA. O problema aqui é outro e penso que se trata de preocupações largamente partilhadas como vimos pelo CDS, pelo Sr. Deputado Carlos Lage, da direcção do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que já clarificou a posição da sua bancada, para não falarmos no Partido Comunista, que é contra o IVA - não percebi ainda até quando mas isso será certamente esclarecido muito em breve...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É de compreensão lenta!

O Orador: - O Sr. Deputado Carlos Brito diz que sou de compreensão lenta, mas houve algumas coisas que já compreendi, ele ainda não, mas lá chegará!

Sr. Carlos Brito (PCP): - Então é mais célere!

O Orador: - É mais célere, é! Lá chegará, Sr. Deputado.
Portanto, a questão que queria pôr era a seguinte: do ponto de vista do Governo parece haver toda a capacidade para a aplicação do IVA. Mas do ponto de vista dos agentes económicos, considera o Sr. Secretário de Estado que existe a mesma capacidade e que eles estão suficientemente preparados para o IVA poder entrar, efectivamente, em vigor em 1 de Julho?

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Qual será, de facto, a vantagem visível da entrada em vigor do IVA em 1 de Julho e não na data tão celebrada e várias vezes falada de 1 de Janeiro de 1986?
Sou também dos que pensam que é errado deixar em aberto o problema da data porque há efectivamente compromissos internacionais, inclusivamente quanto à restituição do montante que está calculado em função de percentagens do IVA. Penso, portanto, que devem ser fixadas datas limite e aí partilho a preocupação do Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, há mais oradores inscritos para formular pedidos de esclarecimento. V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado, V. Ex.ª referiu que o Governo já teria em carteira uma série de diplomas regulamentares que até já teriam sido aprovados em Maio. A ser assim, por que é que esses diplomas regulamentares aprovados já em Maio ainda não foram publicados?
O Sr. Secretário de Estado referiu-se àqueles diplomas que já tinha em carteira aprovados, mas não referiu, por exemplo, a legislação especial para a aplicação do imposto às transmissões de bens e prestações de serviços cujos preços eram fixados pelas autoridades públicas. O que é que se passa em relação a isso?
O que é que se passa em relação à legislação necessária à regulamentação da cobrança e dos reembolsos do imposto sobre o valor acrescentado?
O que é que se passa em relação aos modelos de impressos que terão de ser elaborados, emitidos e publicados para conhecimento dos agentes económicos, designadamente a declaração a que todos os agentes passíveis de imposto estão sujeitos?
Para além destas questões relacionadas com a problemática da legislação complementar prevista no próprio Código e que até agora não foi publicada - e gostaria de chamar a atenção para o facto de que é do domínio público que todo este processo de introdução do imposto sobre o valor acrescentado trará para as empresas alterações profundas não só nos regimes contabilísticos mas também nos administrativos, e chamaria ainda a atenção para o facto de que mesmo que esses diplomas viessem todos a ser publicados até ao dia 30 de Junho iria encontrar as empresas num período em que o seu pessoal estará reduzido a metade, pois Julho e Agosto são períodos de férias e por atrasos clamorosos do Governo não se vai agora pretender que os trabalhadores dessas empresas deixem de gozar as suas férias -, gostaria de perguntar como é que estamos em termos materiais, por exemplo, no que se refere ao computador, às obras no edifício previsto para funcionarem os serviços do IVA e ao próprio equipamento de escritório para os trabalhadores da função pública que irão trabalhar no processamento deste imposto. Ou será que o Governo pretende lançar o IVA e pôr os trabalhadores a escrever em pé, sem computador nem material adequado para o seu processamento?

Creio, que estas são algumas questões que valeria a pena serem esclarecidas por parte do Sr. Secretário de Estado antes de continuarmos este debate, pois outras matérias haverá que, a seu devido tempo, terão de ser colocadas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Também para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Secretário de Estado, quando aqui foi realizado o debate sobre o Orçamento de Estado tivemos ocasião de, em várias propostas e intervenções produzidas por elementos do meu grupo parlamentar, chamar a atenção para muitos dos vários problemas que envolvem toda a problemática do IVA. Já nessa altura dissemos que todo o processo burocrático-administrativo que envolvia o pôr em prática o IVA em 1 de Julho de 1985 iria significar que ou o Governo revia muito rapidamente tudo aquilo que tinha legislado, ou então não havia outra alternativa que não fosse a da suspensão da aplicação do IVA durante o ano de 1985.
Apresentámos essa proposta na Assembleia da República, mas, lamentavelmente, ela foi rejeitada. Contudo, é com bastante agrado que registamos que deputados que nessa altura votaram contra essa proposta, hoje já pensam de maneira diferente. Também verificamos que outras propostas que fizemos e pelas quais nos batemos, assim como largos estratos da população portuguesa, começam finalmente a ter algum atendimento por parte do Governo.
Porém, além das questões colocadas pelo meu camarada Octávio Teixeira relativamente ao curto período de tempo que medeia entre l de Junho - data em que estamos a discutir o IVA e em que o Sr. Secretário de Estado afirma que foram aprovados alguns diplomas em Conselho de Ministros...

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Já foram aprovados anteriormente!

A Oradora: - Mas se foram aprovados anteriormente eles não estão publicados e, portanto, em termos práticos, a situação é idêntica.
Ora, se não estão publicados, se não são do conhecimento da população nem dos agentes económicos, como é que num tão curto espaço de tempo o Sr. Secretário de Estado considera possível ter-se todo o conhecimento deste processo e continuar a recolher as receitas que neste momento estão a ser recolhidas pelos actuais impostos que o IVA visa substituir, nomeadamente o imposto de transacções.
Gostaria ainda de saber se o Sr. Secretário de Estado não considera que a manter-se o dia 1 de Julho deste ano como data da entrada em vigor do IVA, tal facto vai implicar uma diminuição abrupta de receitas relativamente aos impostos actuais por estes já não estarem em vigor a partir dessa altura e por não terem sido criadas as condições necessárias para a aplicação do IVA.
Se o Sr. Secretário de Estado já fez alguma estimativa, gostaria que se referisse ao quantitativo de redução de receitas , do Estado ao levar-se por diante tal questão.

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O Sr. Presidente: - Finalmente, para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, ouvi atentamente a curta intervenção que V. Ex.ª produziu e que, de certo modo, foi esclarecedora.
O Sr. Secretário de Estado voltou a afirmar que tudo está preparado para a entrada em vigor do imposto. Simplesmente, isso vai-se fazendo com intervalos de tempo cada vez menores em relação à data prevista para esse efeito, o que desde logo é grave porque se em 1 de Abril se dizia (e não é que tenha qualquer conotação, pois apesar de ser o dia das mentiras não foi mentira nenhuma) que em Abril ou Maio os diplomas seriam publicados e depois, em 27 de Abril, já se dizia que na primeira quinzena de Maio eles seriam apresentados ao Conselho de Ministros - e devo dizer que acredito que tenham sido, pois não estou a fazer um processo ad hominem, mas apenas um processo contra o Governo -, isto é, se eles foram aprovados, quando é que são publicados? '

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Já foram aprovados!

O Orador: - Já foram aprovados na semana passara, mas acontece que essa notícia ainda não nos tinha sido dada pelos jornais! Mas, Sr. Secretário de Estado, V. Ex.ª acha tempestiva essa aprovação agora a pouco tempo da entrada em vigor da imposto?
Tal como o Sr. Deputado Octávio Teixeira perguntou, será que o suporte e a infra-estrutura humana e material estão em condições de controlar e fiscalizar este imposto? Quando é que ele poderá começar a ser controlado e fiscalizado? Que nível de fuga é que, numa primeira aproximação, ele vai permitir?
Sendo certo que as alterações ao Plano Oficial de Contabilidade para incorporarem as necessárias transformações impostas pelo IVA só foram publicadas em 28 de Março de 1985 e sendo também certo que todas as empresas de informática nos dizem que não há programação feita para esta adaptação da contabilidade das empresas, será que estas estarão minimamente preparadas? 15to, porque, por exemplo, no comércio retalhista a federação dos comerciantes retalhistas já pediu ao Governo que lhe abrisse uma linha de crédito para se dotar com meios mecânicos de contabilidade que lhes permitissem fazer uma contabilidade que até aqui não faziam.
Sr. Secretário de Estado, tudo leva a crer que neste momento há uma impreparação total. Ora, foi precisamente isso que determinou a oportunidade da iniciativa do CDS. Quer dizer, vimos que a preparação da entrada em vigor do IVA estava a ser de tal maneira atrasada que avançamos com esta iniciativa que visa a suspensão do imposto.
No que diz respeito à Direcção-Geral do Tesouro e à Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, devo dizer ao Sr. Secretário de Estado que nessa questão não sou do século XIX. Do século XIX é quem no Governo, em 1978, por exemplo, legislou, definindo as competências da Direcção-Geral do Tesouro precisamente nesse sentido.
Na realidade, o que não acho correcto, do ponto de vista da defesa dos interesses dos contribuintes, é

proceder-se a uma alteração tão radical de um esquema próprio da nossa administração fiscal sem inserir essa transformação numa reforma de fundo e, sub-repticiamente - inserida no n.º 1 do artigo 26.º do Código -, vir determinar uma alteração tão profunda da administração fiscal, confundido os serviços encarregados da liquidação e do contencioso tributário com os serviços que vão arrecadar a receita. É, pois, isso que me parece negativo e carecido de uma transformação.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto às duas questões que foram colocadas pelo Sr. Deputado Hasse Ferreira, devo precisar que aquilo que foi afirmado relativamente aos livros e aos medicamentos é correcto. No decreto-lei aprovado pelo Governo, os livros passarão a estar isentos de IVA e os medicamentos que constam da lista dos medicamentos comparticipáveis pelos serviços de saúde também beneficiarão de isenção.

Uma outra questão que o Sr. Deputado levantou foi a da preparação dos agentes económicos. Em relação a este ponto, o que posso dizer é que de Norte a Sul do País já se contam por dezenas - e eu diria mesmo por centenas - os custos de divulgação do IVA que foram efectuados. Por outro lado, a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos tem em curso todas as semanas, à quinta-feira, das 19 horas e 30 minutos às 20 horas, um programa na televisão em que, de forma muito correcta, se explica o que é o IVA, como é que ele se calcula, se aplica, etc.
Devo ainda referir que as alterações ao Plano Nacional de Contas para a aplicação do IVA foram publicadas em Março deste ano. Portanto, creio que estão reunidas as condições mais do que necessárias para que os operadores e agentes económicos tenham consciência do que é o IVA.
Gostaria ainda de recordar que foi aquando da apresentação da proposta de lei do Orçamento de 1984 que, pela primeira vez, se falou no IVA e se publicou o Código. Suponho que em Portugal nunca houve um decreto-lei que com tanta antecedência fosse dado a conhecer aos agentes económicos e que tivesse uma vacatio legis de cerca de 6 meses, como é o caso do IVA. Portanto, creio que em matéria de divulgação só não está informado quem não quer estar. Devo ainda acrescentar que estão previstos regimes simplificados para os pequenos retalhistas e para toda uma .série de actuações.
Portanto, julgo que não é muito justa a razão de que haverá falta de esclarecimento às pessoas. Poderá haver falta de esclarecimento em Janeiro, ou numa outra data qualquer, se nos quisermos fechar à realidade e se não quisermos partir do princípio que tem de haver mudanças. Se não quisermos mudar, então diremos que não estamos informados e di-lo-emos daqui a 6 meses ou a 1 ano.
Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, devo dizer que os diplomas que citei estão remetidos para publicação.
O Sr. Deputado referiu-se ainda aos modelos de impressos que estão na Imprensa Nacional para publicação e à questão do suporte material para a entrada em vigor do IVA. Ora, se é verdade que houve alguns

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atrasos na escolha e na aquisição do equipamento, também posso dizer que é verdade que se conseguiram encontrar as alterações necessárias para que, do ponto de vista do Ministério das Finanças e do Plano, o IVA possa entrar em vigor no dia 1 de Julho.

A Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo levantou o problema do esclarecimento dos agentes económicos, mas creio que essa questão já estará esclarecida.

Perguntou também se o Ministério das Finanças e do Plano já tinha feito uma estimativa do que poderia resultar da não introdução do IVA em 1 de Julho. Creio, pois, que 10 ou 12 milhões de contos será aquilo que o Estado deixará de arrecadar se isso se vier a verificar.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito levantou a questão dos documentos aprovados. A este propósito devo dizer que os documentos foram aprovados em Conselho de Ministros e, portanto, estão para publicação.

Quanto a uma outra questão que levantou devo dizer que a verdade é que o IVA é uma reforma de fundo da administração fiscal. 15so significa que na reforma fiscal que estamos a antevisionar pretendemos fundamentalmente ter três impostos: um imposto indirecto, que é o IVA, um imposto directo sobre as pessoas singulares e um imposto directo sobre as pessoas colectas. Portanto, o IVA é uma reforma fiscal profunda em matéria de tributação indirecta.
Julgamos, pois, que este será o momento correcto de dar um passo em frente no que respeita a evitar que se demore 2 ou 3 meses a constatar que um contribuinte está em falta. Quando um contribuinte deixa de cumprir a sua obrigação tributária é fundamental que 8 ou 15 dias depois ele esteja a ser contactado pelos serviços de fiscalização e se procure saber por que é que não a cumpriu. Esta é realmente a grande vantagem que o método de cobrança previsto no Código do IVA vai permitir, pois, ao fim de 10 ou 15 dias, o contribuinte faltoso está automaticamente a saber o que é que se está a passar e está a ser contactado pelos serviços de fiscalização.

Creio, pois, que este é um avanço muito importante em matéria de controle de evasões e fraudes fiscais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, que aprova o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), e cuja ratificação hoje se discute, é bem um exemplo da forma autoritária, irresponsável e perniciosa como este Governo - que finalmente chega ao seu fim - legislou e actuou nos seus demasiado longos 2 anos de existência.
O governo PS/PSD legislou com base numa autorização legislativa que cega e servilmente lhe foi concedida pela sua maioria parlamentar, furtando-se ao debate em matéria por excelência da competência desta Assembleia. 15to é, ao debate democrático sobre matéria de tal relevância, o Governo e a sua maioria opuseram o autoritarismo, contra a força da razão jogaram com a razão da força numérica.

À ponderação exigida por uma alteração profunda do sistema da fiscalidade indirecta contrapôs a coligação PS/PSD a mais acabada irresponsabilidade, mostrando desconhecer a realidade da estrutura económica

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nacional, o País real de que tantas vezes farisaicamente falam, limitando-se a copiar, com mais ou menos erros, o que por alguma estranja encontraram.
Vendo na substituição de um conjunto de impostos indirectos pelo IVA apenas uma forma de obter maior receita fiscal e escamoteando os efeitos que tal substituição produz ao nível de variáveis macro-económicas e da repartição da carga fiscal pelos diversos grupos sócio-económicos, naturalmente que o governo PS/PSD legislou, uma vez mais, de forma perniciosa para o País.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um dos aspectos que com maior acuidade se colocaria no processo de ratificação do decreto-lei que aprova o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, qual seja o da suspensão da sua entrada em vigor, e que o PCP propôs há 4 meses em sede da discussão do Orçamento de Estado para 1985, por força das circunstâncias e da própria inépcia do Governo, bem se pode dizer que está no momento presente e pela realidade dos factos simplificado. Na verdade, a suspensão do IVA apenas carece de um acto formal, já que a sua entrada em vigor no próximo dia 1 de Julho, nos termos do n.º 1 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 394-B/84, é já materialmente impossível.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Aliás, um mínimo de seriedade por parte do Governo perante esta Câmara e o País teria exigido já a iniciativa da sua suspensão ou, no mínimo, o seu anúncio pelo Governo no início deste debate.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A apenas 15 dias da data legalmente prevista para a entrada em vigor daquele imposto, a situação pode caracterizar-se do seguinte modo: nada ainda foi regulamentado sobre as medidas necessárias à compensação, nas entregas do imposto sobre o valor acrescentado, do montante do imposto de transacções liquidado; não foi publicada a legislação especial para a aplicação do imposto às transmissões de bens e prestações de serviços cujos preços sejam fixados pelas autoridades públicas; não é ainda conhecida a legislação especial para a aplicação do imposto às prestações de serviços das agências de viagens; não é ainda conhecida a legislação necessária à regulamentação da cobrança e dos reembolsos do IVA; não são ainda conhecidos os modelos de livros e impressos que se tornam necessários à execução das obrigações decorrentes do Código do IVA, nomeadamente o modelo de declaração periódica a que são obrigados os sujeitos passivos do imposto; dos 400 000 sujeitos passíveis do imposto previstos pelo Governo, pouco mais de 50% se encontram até ao momento inscritos; não foi ainda assinado o contrato entre o Estado e a empresa fornecedora do computador para processamento do IVA, encontrando-se atrasada a instalação do mesmo computador; não estão ainda concluídas as obras no edifício em que deveriam ficar instalados os serviços relacionados com o IVA, nem existem ainda todos os equipamentos necessários; enfim, o próprio Conselho

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de Ministros reconheceu publicamente a inadmissibilidade da entrada em vigor do IVA em 1 de Julho próximo, já que na sua reunião do passado dia 23 de Maio decidiu que se reunisse < o mais brevemente possível o grupo de trabalho criado para avaliar os efeitos da aplicação do IVA».
15to é, a suspensão da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 394-B/84, cuja proposta do PCP apresentada em Fevereiro foi rejeitada pelos votos do PS, PSD, CDS e ASDI, é hoje urgente e inevitável, é exigida pela generalidade dos sectores económicos, sociais e culturais do Pai, e parece ter agora o apoio da maioria dos partidos com assento nesta Assembleia. É caso para se dizer, mais vale tarde que nunca!

Reafirmamos, por isso: o Código deve ser suspenso. O novo imposto, que de facto não pode ser cobrado a partir de 1 de Julho, deve claramente ser suspenso de direito, evitando uma situação absurda em que o Estado Português ficaria impossibilitado, juridicamente de cobrar o imposto de transacções e impossibilitado, na prática, de cobrar o imposto sobre o valor acrescentado. Nem IT nem IVA! É um disparate que é preciso evitar.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A suspensão legal do IVA é uma necessidade indiscutível.

O Governo já o deveria ter feito e pode fazê-lo a todo o momento.
Afirmarão alguns que o não pode fazer a Assembleia da República ao abrigo do artigo 172.º, n.º 2, da Constituição. Poderá haver, no entanto, boas razões para sustentar o contrário.

Não há suporte literal no artigo 170.º, n.º 2, para a interpretação restritiva dos poderes da Assembleia da República no quadro dos processos de ratificação, que são constitucional e politicamente distintos dos processos legislativos literalmente referidos no artigo 170. º da Constituição. Por outro lado, não se afigura sustentável que a Assembleia da República fique tão inteiramente despojada de poderes em matéria financeira após o acto orçamental a ponto de ficar tolhida por completo de influir na vigência de diplomas que autorizou.
A Assembleia da República não deve ir contra si mesma e não pode assistir impotente ao desabar do sistema fiscal.
É, pois, nosso entendimento que deve ser ponderada neste debate a forma de rápida e inquestionavelmente fazer intervir a Assembleia da República no processo tendente à inadiável suspensão do imposto sobre o valor acrescentado!
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a questão do imposto sobre o valor acrescentado não fica resolvida com a sua suspensão temporária. A eventual introdução do IVA exige ser profunda e cuidadosamente analisada e ponderada pela Assembleia da República. De facto, e como muito bem acentua a Comissão do IVA, «uma tal alteração do sistema fiscal português envolve a quase totalidade do aparelho produtivo - por incidir sobre uma parte substancial da procura final, com destaque para o consumo privado - e, portanto, deverá processar-se com os cuidados necessários, tendo em vista melhorar a equidade do sistema fiscal e, se possível, aumentar a eficiência da economia». A introdução do IVA influencia, ou pode influenciar, «os

níveis global e sectoriais de preços no produtor e no consumidor, os preços relativos, o nível de procura, produção e emprego, bem como a repartição da carga fiscal pelos diversos grupos sócio-económicos ».
«Levar a cabo esta reforma fiscal sem avaliar as variáveis macro-económicas - como se a introdução do IVA não afectasse senão a componente administrativa equivaleria a tomar um conjunto de decisões de política económica sem debate sobre os objectivos ou os instrumentos nela implícitos, aceitando uma limitação deveras restritiva dos poderes públicos», e designadamente dos poderes e deveres desta Assembleia da República.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Ora, a verdade é que os estudos sobre os efeitos decorrentes da aplicação do actual Código do IVA não estão feitos, como é do conhecimento público e como expressamente o reconheceu o Governo na reunião do Conselho de Ministros do passado dia 23 de Maio.
Existem, é certo, estudos preliminares elaborados pela Comissão do IVA. E embora tais estudos se encontrem ultrapassados pelo facto, por um lado, de assentarem na matriz das relações interindustriais e no inquérito às despesas familiares de 1974, e, por outro lado, por terem simulado estruturas de listas de produtos e de taxas diversas das acolhidas no Decreto-Lei n.º 394-B/84, a verdade é que os resultados obtidos são de molde a causar sérias apreensões e a exigirem, por si só, a mais cuidada ponderação.
Não sendo este o momento asado para a sua análise exaustiva, que em meu entender deverá processar-se em comissão especializada, interessa, porém, chamar a atenção para dois aspectos significativos.
Assim, a hipótese estudada que, embora por defeito, mais se aproxima das opções contidas no decreto governamental, aponta para um aumento do índice de preços no consumidor da ordem dos 4% a 5%. E repare-se que este resultado assenta na hipótese teórica de nenhum agente económico aproveitar a introdução do IVA para aumentar as suas margens o que, face ao aumento do nível geral de preços, significa que todos eles, todos os agentes económicos, aceitariam passivamente a redução das suas remunerações reais. Caso contrário, o que é, aliás, mais provável, o aumento geral de preços atingiria não os 4% ou os 5% mas os 8%, com todos os reflexos negativos na própria competitividade da produção nacional e na degradação acentuada do nível de vida dos Portugueses. Recorde-se ainda que, em qualquer das hipóteses ensaiadas, as camadas sociais de mais baixos rendimentos seriam sempre penalizadas pela introdução do IVA, verificando-se uma transferência do peso da tributação das classes de rendimentos mais elevados para os de menores recursos. E isto numa situação de já enorme injustiça fiscal e de elevadas taxas de inflação.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Mais um escândalo!

O Orador: - Por outro lado, os mesmos estudos apontam para uma quebra do consumo privado da ordem dos 7%, com importantes distorções sectoriais e com efeitos claros e imediatos sobre a diminuição da produção, a partir de uma situação de gravosa recessão económica como aquela em que o ainda governo PS/PSD lançou o País.

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O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dando corpo às análises já realizadas pelo PCP e às muitas dezenas de protestos e propostas que dos mais variados sectores nos chegaram, o Grupo Parlamentar do PCP apresentará a esta Câmara um conjunto de propostas de alteração ao Código do IVA, visando alterar as situações mais gravosas contidas no Decreto-Lei n.º 394-B/84. Na altura própria, faremos a apresentação de tais propostas, que incidirão não só sobre á. sujeição a taxa zero de bens e serviços essenciais, desde os medicamentos e os livros à electricidade, mas ainda sobre o tratamento mais favorável das associações de cultura e recreio, das cooperativas e dos corpos de bombeiros, bem como sobre a melhoria dos regimes especiais de isenção e dos pequenos retalhistas que, de modo algum podem, suportar a carga burocrática-administrativa imposta pelo regime geral do IVA e que, não a podendo suportar, são fortemente penalizados, pela via financeira, pelo Código do governo PS/PSD.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, tais propostas não invalidam a necessidade reafirmada de uma profunda e cuidadosa análise de todos os aspectos decorrentes da eventual introdução do IVA no nosso país, que deverá decorrer em Comissão e com tempo. Com o tempo que a actual maioria parlamentar já não tem. Uma discussão que, por isso, necessariamente se processará com uma outra composição desta Assembleia da República.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse (Ferreira (UEDS): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, eu não diria que «água mote em pedra dura tanto dá até que fura» porque a água dos votos que aqui foram postos não foi nada mole. Pelo contrário, pode até ter corroído algo que não estaria bem, qual seria a persistência na aplicação inoportuna de um determinado imposto.
Ora bem, devo dizer que partilho com V. Ex.ª algumas das preocupações que manifestou quanto à impreparação para a aplicação do Código do IVA. V. Ex.ª focou, designadamente, o ponto de vista do próprio aparelho de Estado - sendo aí a sua intervenção claramente dissonante das afirmações do Sr. Secretário de Estado, mas aí o problema é vosso e espero que quanto a esse aspecto a Câmara fique esclarecida.
Há um conjunto de argumentos que têm a ver com a não aplicação imediata, ou seja, daqui a 20 dias, do Código do IVA, com os quais estou de acordo, mas há um outro tipo de argumentos, que têm a ver com a possibilidade de uma subida de preços sobre um conjunto de bens que gostava que precisasse. Sr. Deputado, essa é uma das bases pela qual o Sr. Deputado assenta a vossa oposição ao Código do IVA,- ou que outro tipo de razões é que existe? Ou seja, é o problema dos níveis das taxas que estão previstos para a aplicação do Código do IVA que o preocupa? O que é que, na filosofia geral da aplicação do Código do IVA, o faz estar contra?
O Sr. Deputado fala na impreparação das nossas estruturas económicas, e isso é verdade. Contrariamente

ao que o Sr. Secretário de Estado diz, penso que um ano e tal, pois há um ano e tal que o Código do Imposto começou a ser preparado, não é muito tempo, até pode ser pouco tempo. Isto porque o Código do IVA corresponde a uma reforma, de certo modo radical, num ponto nevrálgico do nosso sistema de impostos.
Ora bem, partilhando das suas preocupações quanto à celeridade na aplicação do Código do IVA, isto é, quanto à data em que o Código do Imposto deve entrar em vigor, pergunto qual a razão desta sua animosidade contra um imposto com a filosofia do IVA?
Considera que o IVA, ainda que com outras taxas e ainda com a isenção do imposto sobre os livros e os medicamentos - que, neste momento, o Sr. Secretário de Estado garante estar adquirida e, na altura, votámos a favor da vossa proposta -, vem piorar o nosso sistema de impostos? Considera que nesta área os mecanismos actuais são mais positivos do que serão quando o Código do IVA for aplicado, ainda que alterássemos as suas taxas? Ou seja, há uma posição radical quanto à filosofia do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado? Era em relação a isso que eu há pouco me referia quando disse que não percebia a Vossa posição tão radical, tão sistemática, relativamente a este tipo de imposto.
É que se a vossa recusa se refere à data da aplicação do imposto, estamos de acordo com vocês, se a vossa recusa é sobre algumas das taxas, também estamos de acordo com vocês; se a vossa recusa é quanto à isenção que deve operar-se sobre alguns produtos, também estamos de acordo com vocês. Por isso gostava de saber o que é que há na filosofia da aplicação do Código deste Imposto que motiva a animosidade radical por parte de todos vós contra este imposto.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Domingos Azevedo.

O Sr. Domingos Azevedo (PS): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, compartilhando de algumas preocupações que expendeu na sua intervenção, nomeadamente no que respeita ao desconhecimento de alguns formulários que são exigidos pela aplicação do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, designadamente no que respeita aos livros, consegui retirar uma dúvida, aliás o Sr. Deputado Hasse Ferreira a esse respeito já lhe formulou uma pergunta e por isso não a vou repetir.

No entanto, gostava que me respondesse se o Partido Comunista duvida do timing da aplicação do Código do Imposto ou da própria filosofia do imposto.
Por outro lado, não compartilho de algumas preocupações, nomeadamente no que respeita ao timing de o Governo regulamentar em sede de tributação das actuais existências das empresas. Sr. Deputado, gostava que me dissesse se não acha que dar-se um conhecimento muito dilatado do processo de actuação nesta matéria é, por vezes, propiciar aos contribuintes uma forma de fuga.
O Sr. Deputado diz que o Código de Imposto deve ser suspenso. Pergunto: até quando, Sr. Deputado?
Por outro lado, Sr. Deputado defende determinadas considerações no que respeita à função redistributiva do sistema fiscal e particularmente fez uma incidência relevante na função redistributiva no Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado.

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O Sr. Deputado Octávio Teixeira considera que uma das funções fundamentais de qualquer sistema fiscal é a sua função redistributiva, isto é, o Governo, o poder central, distribuir, proporcionalmente, a todos os cidadãos o seu grau de comparticipação nas despesas do Estado. Entende V. Ex.ª que este processo de redistribuição é possível através de uma tributação indirecta?
Quando o Sr. Deputado vai ao supermercado é-lhe possível identificar qual é a condição económica do português que lá vai buscar o azeite, a batata, o arroz ou vinho? Ou será que só os Portugueses de baixos rendimentos é que consomem esses bens?
Gostava de saber o que é que entende sobre esta função redistributiva, se é possível ela ser implementada através de um imposto como o IVA.
Finalmente, gostava de lhe formular algumas questões no que respeita aos encargos administrativos que o imposto sobre o valor acrescentado vem trazer aos contribuintes, particularmente aos de pequena dimensão, e saber se concorda com a indefinição total, com a concorrência desleal, que neste momento se verifica. 15to é, V. Ex.ª verifica que o contribuinte do grupo C, só em excepcionais circunstâncias, está sujeito ao pagamento de imposto de transacções. Esse contribuinte, que produz um produto qualquer, está isento de imposto de transacções enquanto um contribuinte de uma outra dimensão, que produz os mesmos produtos, mas porque tem uma dimensão diferente - e muitas vezes nem a tem - está sujeito ao pagamento de imposto de transacções.
Pergunto: o imposto sobre o valor acrescentado vem ou não equilibrar esta concorrência desleal que com a aplicação do imposto de transacções se verifica?

O Sr. (Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, em primeiro lugar, quero registar que as ideias de coerência da sua bancada e mesmo as suas são bastante peculiares.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira teve o cuidado de registar que, em Fevereiro, o CDS votou contra a vossa proposta quando aqui discutíamos a proposta de lei do Orçamento tendente à suspensão - no fundo o efeito prático seria esse - da aplicação do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e que agora, em Junho, se apressa a propor a suspensão. Exactamente, Sr. Deputado, é isso, rigorosamente. Foi isso o que aqui dissemos e justificámos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - O CDS está atrasadíssimo. É que VV. Ex.ªs não prevêem!

O Orador: - É que nesta matéria a nossa diferença em relação à vossa bancada é, pura e simplesmente, esta: nós não estamos, em princípio, contra o imposto, apesar do que o Sr. Deputado Domingues Azevedo o cavaleiro andante do imposto sobre o valor acrescentado - pensa; pelo contrário, nós estamos a favor da introdução do imposto. Agora, as condições em que ele vai entrar em vigor, tal como resulta do processo que se desenvolveu até agora, leva-nos a tomar esta iniciativa e agora é que ele não pode entrar em vigor.

Em Fevereiro, se tudo fosse rigorosamente cumprido, havia, porventura, hipótese de o fazer entrar em vigor; neste momento, em Junho, sem conhecermos a legislação - e o Governo vem aqui dizer que já a aprovou mas não a publicou e não sabemos quando é que a vai publicar - isso é que já não é possível. Essa é a nossa posição.
Por outro lado, Sr. Deputado Octávio Teixeira gostava que expusesse, de uma forma mais desenvolvida, a sua tese respeitante ao artigo 170.º, n.º 2, da Constituição, sendo certo que eu e a minha bancada, em princípio, somos favoráveis a essa vossa interpretação não restritiva da «lei travão».

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Algumas das questões terão resposta global, e começarei por uma para evitar mais confusões.
Nenhum Sr. Deputado nesta Câmara pode afirmar, como alguns pretenderam fazer, que o Partido Comunista Português tem um posição radical de oposição quanto a filosofia do imposto sobre o valor acrescentado. E nenhum Sr. Deputado pode dizer isso porque nunca o Partido Comunista Português ou um qualquer deputado do Grupo Parlamentar do PCP o afirmou. Por conseguinte, toda e qualquer ilação que queiram tirar nesse sentido é, como mais do que uma vez tive oportunidade de dizer, abusiva, no mínimo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, o problema do imposto sobre o valor acrescentado é uma questão, no entanto, o problema do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado publicado por este Governo é uma questão completamente diferente.
O problema da filosofia do IVA existe em termos gerais, existe em termos genéricos, e o Código concreto que foi apresentado faz má ou boa utilização dessa filosofia. É isso que está em discussão.
Para nós, o problema não se põe tão-só em termos de período de entrada em vigor, não se põe tão-só em termos de inoportunidade. Para nós, em Fevereiro já era inoportuno e, por isso, apresentámos uma proposta tendo em vista a sua suspensão até 1 de Janeiro de 1986.
O problema vai mais fundo, vai mais .além do que a inoportunidade. Por exemplo, sobre o problema da inflação os aspectos que referi põem-se não só em termos de inoportunidade - porque parece completamente descabido avançar com o impacte da inflação da ordem dos 8 pontos percentuais numa altura em que a inflação está a 25 % ou a 26 % - como, para além do mais, é ilógico, do nosso ponto de vista, quando esse peso vai recair fundamentalmente, tal como está repetidamente escrito nos estudos da Comissão do IVA, sobre as camadas de menores recursos.
Os Srs. Deputados Hasse Ferreira e Domingues Azevedo põem a questão de saber se vamos fazer uma redistribuição apenas através dos impostos indirectos, e o Sr. Deputado Domingues Azevedo perguntou mesmo se é possível pensar-se num regime fiscal que faça uma redistribuição da riqueza.

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Sr. Deputado, desde já lhe afirmo que o sistema fiscal deve procurar isso. E para além do mais, chamaria a sua atenção para o seguinte: talvez fosse conveniente que o Sr. Deputado, uma vez por outra abrisse a Constituição da República, que é aquela que nos rege, e lesse concretamente o n.º 1 do artigo 106, que refere expressamente:

O sistema fiscal será estruturado por lei, com vista à repartição igualitária da riqueza e dos rendimentos e à satisfação das necessidades financeiras do Estado.

Ora, deve-se prosseguir esse objectivo. E, mais do que isso, talvez essa possa a vir a ser - e nós propomos sempre a análise cuidada em termos de comissão e de especialidade - uma razão para não se atingir completamente esse desiderato, apenas através da fiscalidade indirecta. Talvez possa vir a ser, repito, uma razão para levar a que a introdução do IVA, com as alterações profundas que merece no caso concreto do código que temos em presença, só venha a efectuar-se num período mais avançado para ser conjugado com a reformulação de tributação directa.
E chamo mais uma vez a atenção para a análise dos estudos elaborados pela Comissão do IVA. Variadas vezes ela apela para a necessidade de se poder compensar os estratos de menores rendimentos através de outras prestações, eventualmente prestações indirectas, ou através, por exemplo, da tributação directa.
Esclarecidos alguns destes pontos que me parecem importantes, vou responder agora a mais uma ou duas questões: ao Sr. Deputado Hasse Ferreira devo dizer que, em nosso entender, o problema do IVA - e restringindo-me agora apenas às listas - não se põe apenas em relação aos bens que foram referidos, ou seja, em relação aos medicamentos e os livros, relativamente aos quais devo dizer que somos favoráveis à sua inclusão na lista de taxa zero. Os problemas colocam-se igualmente com outros produtos. Há um para que chamo a atenção e que poucas vezes tem sido referido, que é o problema da electricidade, não só pelo peso que a electricidade tem já nos consumos domésticos, mas fundamentalmente pelas repercussões que a tributação da electricidade vai ter em todo o aparelho produtivo nacional. Parece-nos, por exemplo, que é absolutamente ilógico (para não chamar outra coisa) que, perante o défice energético que o nosso país tem, se tributem com o IVA todas as tentativas de minorar esse défice energético, nomeadamente através de energias renováveis. Mas o facto é que elas são tributadas com o IVA. Porquê? 15to é ilógico na situação económica do nosso país!
Em relação ao Sr. Deputado Domingues Azevedo, dir-lhe-ia ainda o seguinte relacionado com a questão da função distributiva, sobre a questão de não podermos ir ao supermercado e fazer a distinção entre aquele que compra um quilo de batatas e ganha 20 e aquele
que compra o mesmo aquilo de batatas e ganha 100. que isso, sinceramente, Sr. Deputado, dá-me vontade de rir porque me recordo do que nesta Câmara, em anos passados, foi dito: nessa altura foi defendida a eliminação dos cabazes de compra com o argumento de que «com os cabazes de compras estamos a beneficiar os turistas»! É evidente que quem utiliza argumentos destes não pode estar a falar a sério! É evidente que os produtos que se pretende isentar, os produtos que se pretende tenham taxa zero são aqueles que mais

pesam no cabaz de compras das famílias de menores rendimentos! Porque se uma família que ganha 200 contos por mês compra x quilogramas de batatas por mês, uma família com a mesma dimensão mas que ganhe apenas 20 ou 30 contos por mês, vai comprar uma percentagem muito maior de batatas, em termos de peso no seu rendimento, é claro!
Por conseguinte, é um argumento que, sinceramente, não colhe e que, portanto, não devia ser utilizado.
Em relação ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, devo lembrar-lhe que - e, aliás, tive o cuidado de que isto não fosse esquecido -, quando o Partido Comunista Português, em Fevereiro, atempada e avisadamente, propôs a suspensão do IVA até ao final do ano, essa proposta foi rejeitada pelos votos de diversas bancas, entre as quais a do CDS. Ora, Sr. Deputado, depois disto parece-me que tirou uma ilação errada! Ao contrário do que V. Ex. a pensa, nós congratulámo-nos porque, como eu disse, «mais vale tarde que nunca». Congratulámo-nos com o facto de ao fim de 4 meses, o CDS, no caso concreto, já defender uma posição idêntica àquela que nós defendíamos, em Fevereiro, ou seja, a suspensão do IVA, de o PS já estar disponível para também alterar o seu voto em relação ao de Fevereiro e não sei ainda se o mesmo se passa com outros partidos.
Mas, em relação ao CDS, diria que o problema é, ou pelo menos foi-o neste caso concreto, um problema de falta de capacidade de previsão e, talvez mais do que isso, um problema de confiança, diria quase que ilimitada, no Governo. O CDS confiou que o Governo, depois da discussão havida em sede de Orçamento, tivesse apreendido todas as propostas de alteração que o CDS propôs e que ele próprio, Governo, tomasse a iniciativa de as introduzir no Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado. Como nós não tínhamos, não teremos, nem nunca tivemos, essa confiança no Governo propusemos, desde logo, a suspensão do diploma para que fosse discutido em especialidade por esta Assembleia e para que nós próprios pudéssemos apresentar as nossas propostas de alteração.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para usar do direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Utilizo o direito de defesa relativamente à intervenção do Sr. Deputado Octávio Teixeira particularmente pela expressão que o Sr. Deputado utilizou quando, acerca do meu entendimento de que a função redistributiva do sistema fiscal não é possível ser alcançada com uma tributação indirecta, nomeadamente com o imposto sobre o valor acrescentado, ter dito que não estamos a falar a sério nesta matéria. Estou a falar a sério, Sr. Deputado. Aliás, esta é uma matéria que me preocupa e nesta Câmara tenho já feito diversas intervenções sobre o sistema fiscal e tenho produzido as minhas críticas em relação à falta de capacidade da função redistributiva do actual sistema fiscal. E não acredito, Sr. Deputado, que se devam iludir as

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questões, quando pretendemos actuar através de uma tributação indirecta levantar essa bandeira a dizer que estamos a proteger as classes de menores rendimentos.
Já o disse na discussão do Orçamento e reafirmo-o uma vez mais: o Governo, com a aplicação do imposto sobre o valor acrescentado fica com muito mais capacidades económicas para poder efectivamente beneficiar as classes de mais baixos rendimentos no País, nomeadamente através da tributação indirecta, do imposto profissional, do imposto complementar e da contribuição predial quando isso for entendido como importante para as classes de menores rendimentos. Aí sim, aí estaremos a fazer funcionar a função redistributiva do sistema fiscal.
Mas não procurem enganar esta Assembleia! Não procurem dizer que quando se vai a um supermercado, ao isentar-se determinados bens de tributação indirecta, se está afazer funcionar o sistema redistributivo de qualquer sistema fiscal. 15so não é possível, Sr. Deputado! Não há um mínimo de garantia nessa matéria! Não estamos enganados, eu não estou enganado e se há alguém que não está aqui a falar a sério, Sr. Deputado, penso que é V. Ex.ª.

A Sr.ª Ilda (Figueiredo (PCP): - Não apoiado!

Vozes do PCP: - Não apoiado! 15so não são maneiras!

O Sr. Presidente: - Par dar algumas explicação, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado Domingues Azevedo, é evidente que tenho estado e continuo a falar a sério. O que disse há pouco é que não me parece que fosse uma argumentação séria, defender o IVA e as listas que estão concretamente no seu Código, tendo por base apenas o argumento de que se alterarmos essas listas e se aumentarmos a lista de taxa zero estaremos a beneficiar as camadas de mais altos rendimentos. 15so é que para mim não é sério, isso é que é para mim brincar, na medida em que não estamos a ir ao fundo das questões!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O problema não é dar 10$ ou 20$ a quem tem altos rendimentos! Senão, porque é que não se aplicou o IVA na batata, quando, o Sr. Deputado, com essa medida estaria realmente e aí sim, a beneficiar - termos relativos -, muito mais as famílias de mais baixos recursos? Esse problema tem de ser encarado!
Mas dir-lhe-ei ainda, em relação à sua intervenção, o seguinte: O Sr. Deputado continua a ver o IVA apenas como uma forma de aumentar a receita e isso não pode ser! 15so faz enviesar todo e qualquer raciocínio sobre o Código do IVA. O Código do IVA tem implicações muito mais profundas que estão para além do aumento de receita. E a propósito pergunto se o aumento de receita previsto com a introdução do IVA é para constar do orçamento português ou é para fazer parte do orçamento da CEE?

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Nesse caso - e porque é essa a questão - não diga que o vai utilizar, como diz, para o redistribuir depois através dos impostos directos, porque não o pode fazer!
E já agora punha à sua consideração este aspecto: já que falamos em receitas, porque será que a Grécia entrada na CEE há 4 anos e meio, e tendo-lhe sido dado um prazo de 3 anos para aplicar o IVA, ainda não o fez e nem sequer pensa fazê-lo?

Dozes do PS: - Se calhar porque não têm batatas!...

O Orador: - Dir-lhe-ei que é por duas razões básicas e fundamentais: primeiro, porque a sua estrutura económica com uma imensidade de pequenas e médias empresas, tal como em Portugal, torna extremamente difícil, complicada e burocratizante a aplicação do imposto que poderá ser ultrapassado com o tempo, não tenho dúvidas nenhumas, mas também por razões financeiras. É que pagando a sua contribuição para a CEE através do produto nacional bruto a Grécia paga muito menos para o orçamento da CEE do que pagaria se tivesse aplicado o IVA.

A Sr.º lida Figueiredo (PCP): - Toma e embrulha!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a próxima sessão terá lugar amanhã às 15 horas e terá como período de ordem do dia, na primeira parte, a proposta ou propostas de deliberação sobre o prolongamento do período normal de funcionamento da Assembleia, depois a continuação da ordem do dia de hoje, na segunda parte, e ainda a discussão do diploma sobre a amnistia das infracções da comunicação social.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, não percebi bem a parte final da comunicação da mesa, porque o Sr. Presidente disse «continuação da ordem do dia de hoje» e depois disse ainda «amnistia». 15so quer dizer que o que está acertado é que seja a conclusão do IVA, depois a amnistia e depois a continuação?

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado. O que eu disse foi que da ordem do dia constaria na primeira parte da ordem do dia, na discussão da proposta ou propostas de prolongamento da sessão normal da Assembleia da República, na segunda parte seria a continuação da ordem do dia de hoje e ainda, se houver tempo, é claro, a discussão do diploma sobre a amnistia das infracções da comunicação social.
Nada mais havendo a esclarecer, declaro encerrada a sessão.

Eram 20 horas.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Abílio Aleixo Curto. António Jorge Duarte Rebelo de Sousa. Carlos Augusto Coelho Pires.

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Dinis Manuel Pedro Alves.
João Rosado Correia.
Jorge Alberto Santos Correia.
José Luís Diogo Preza.
José Maximiano Almeida Leitão.
Litério da Cruz Monteiro.
Manuel Filipe Santos Loureiro.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Nelson Pereira Ramos.
Paulo Manuel Barros Barral.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio Domingues Basto Oliveira.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José da Costa.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Vargas Bulcão.
Manuel Ferreira Martins.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Paulo Manuel Pacheco Silveira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.

Partido Comunista Português (PCP):

António Guilherme Branco Gonzalez.
João António Torrinhas Paulo.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
Manuel Correia Lopes.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.

Centro Democrático Social (CDS):

Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
João Lopes Porto.
José Augusto Gama.
José Miguel Anacoreta Correia.
José Vieira de Carvalho.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Manuel Jorge Forte Góes.
Narana Sinai Coissoró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

Raul Morais e Castro.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Ruben José de Almeida Raposo.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.
Almerindo da Silva Marques.
Avelino Feleciano Martins Rodrigues.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Edmundo Pedro.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Joaquim Manuel Ribeiro Arenga.
José de Almeida Valente.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Maria Luísa Modas Daniel.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui Monteiro Picciochi.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Augusto Faria dos Santos.
João Maurício Fernando Salgueiro.
José Pereira Lopes.
Manuel Pereira.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Rogério da Conceição Serafim Martins.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
João Carlos Abrantes.
Joaquim Gomes dos Santos.
Lino Carvalho de Lima.
Luís Francisco Rebelo.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Octávio Rodrigues Pato.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Gomes de Pinho.
Francisco António Lucas Pires.
Horácio Alves Marçal.
José António Morais Sarmento Moniz.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Corregedor da Fonseca.
Helena Cidade Moura.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.

Voto sobre o Dia Mundial do Ambiente enviado à Mesa para publicação

Comemora-se hoje em todo o País o Dia Mundial do Ambiente. Assumem particular significado às iniciativas, que irão envolver milhares de pessoas e que se dirigem especialmente às crianças, que neste dia são levadas a cabo pelas autarquias locais, pelas escolas, por organizações populares e por ligas e associações ecológicas e de protecção da natureza.

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Saliente-se a proclamação das Nações Unidas que considera o decénio de 1981-1990 como «Década Internacional das Águas de Abastecimento e Saneamento» e o papel que vêm desempenhando nesta área as câmaras municipais que juntamente com o trabalho voluntário das populações têm assegurado e alargado o abastecimento de água a milhares de casas e isto apesar dos meios financeiros insuficientes de que dispõem.
Importa lembrar a falta de verbas e meios com que se debatem todas as entidades vocacionadas para a defesa e protecção do ambiente e a necessidade urgente de medidas que impeçam a contínua degradação das nossas riquezas naturais.
Nestes termos, os deputados abaixo assinados apresentam o seguinte voto:
A Assembleia da República manifesta o seu apoio às iniciativas levadas a cabo por centenas de organizações populares, autarquias locais e escolas e pronuncia-se pela urgente tomada de medidas para a defesa do ambiente e das riquezas naturais do País.

Assembleia da República, 5 de Junho de 1985. Os Deputados: Carlos Lage (PS) - António Capucho (PSD) - Anselmo Aníbal (PCP) - Ilda Figueiredo (PCP) - Luís Beiroco (CDS) - Lopes Cardoso (UEDS) - António Gonzalez (Indep.).

Relatório e Parecer da Comissão de Regimento
e Mandatos enviado à Mesa para publicação

Em reunião realizada no dia 5 de Junho de 1985, pelas 10 horas e 30 minutos, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:

Solicitada pelo Partido Socialista:

Joaquim José Catanho de Meneses (círculo eleitoral de Lisboa) por ter falecido em 3 de Junho corrente, preenche essa vaga com carácter definitivo a Sr.ª Deputada Maria Helena Nazareth Santos Valente Rosa. Nestes termos, o Sr. Deputado João Joaquim Gomes passa a ser substituído, a partir da data acima referida, por José Maximiano Albuquerque de Almeida Leitão.

Solicitada pelo Partido Social-Democrata:
Arménio dos Santos (círculo eleitoral de Lisboa) por Amadeu Vasconcelos Matias. Esta substituição é pedida para os dias 3 a 30 de Junho corrente, inclusive.

Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social:
João António de Morais Leitão (círculo eleitoral de Lisboa) por António Filipe Vieira

Neiva Correia. Esta substituição é pedida por um período não superior a 4 meses, a partir do dia 2 de Junho corrente, inclusive.

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais.
Foram' observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.

A Comissão: Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - Vice-Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) Secretário, Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (CDS) Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves (PS) - José Maria Rogue Lino (PS) - Luís Silvério Gonçalves Saias (PS) - Rui Monteiro Picciochi (PS) - Teófilo Carvalho dos Santos (PS) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) -Manuel Portugal da Fonseca (PSD) Maria Margarida Salema Moura Ribeiro (PSD) - José Manuel Mendes (PCP) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - João Gomes d'Abreu de Lima (CDS) Francisco Menezes Falcão (CDS) - João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) - António Poppe Lopes Cardoso (UEDS) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

As REDACTORAS: Leonor Ferreira - Cacilda Nordeste.

Rectificações ao n. º 87, de 31 de Maio de 1985:
Na p. 3249, no sumário, col. 2.ª, 1. 14, onde se lê «Conclui-se» deve ler-se «Concluiu-se».
Na p. 3289, col. 2.ª, l. 38, onde se lê « quod abundam non nocet » deve ler-se « quod abundat non nocet».
Na p. 3290, col. l.ª, l. 54, onde se lê «dos irmãos Karamazov» deve ler-se «de Os Irmãos Karamazov».
Nas mesmas p. e col., l. 59, onde se lê «não tu» deve ler-se «não Tu».
Na mesma p. col. 2.ª, l. 10, onde se lê «avião que ele antes tinha servido» deve ler-se «avião de que ele antes se tinha servido».

Página 3402

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IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

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