O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 3807

l Série - Número 102

Sexta-feira, 5 de Julho de 1985

DIÁRIO Da Assembleia da República

II LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 4 DE JULHO DE 1985

Presidente: Ex.mo Sr. Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca

Secretários: Ex.mos Srs.
Luís Abílio da Conceição Cacito
Daniel Abílio Ferreira Bastos
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 11 horas e 50 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Em intervenção, o Sr. Deputado Silva Marques (PSD) teceu críticas relativamente à escolha do local para implantação de uma central térmica a carvão, da EDP. No final, respondeu a pedidos de relacionamento dos Srs. Deputados Manuel Martins (PSD), Ferraz de Abreu (PS), António Gonzalez (Indep.) e Meneses Falcão (CDS).
Também em intervenção, o Sr. Deputado João Abrantes (PCP) referiu vários problemas do concelho de Coimbra. No final respondeu pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Cunha e Sá (PS) e Costa Andrade (PSD) - que deu explicações na sequência do direito de defesa exercido pelo Sr. Deputado Cunha e Sá (PS) e exerceu e direito de defesa em resultado das respostas a pedidos de esclarecimento dados pelo Sr. Deputado João Abrantes (PCP).
Igualmente em intervenção, o Sr. Deputado Joel Ferro (PS) referiu vários problemas do concelho de Barcelos.
Também em intervenção, a Sr.ª Deputada Odeie Santos (PCP) teceu considerações acerca da Década da Mulher decretada pela ONU as conclusões saídas do seminário organizado pelas organizações não governamentais que funcionam junto da Comissão da Condição Feminina.
Ainda em intervenção, o Sr. Deputado Neiva Correia (CDS) abordos questões relativas à adaptação da nossa vinicultura à CEE.
Ordem do dia. - Prosseguiu a apreciação das propostas de resolução n.º 21/III (aprova para ratificação o acordo técnico para execução do acordo de defesa entre Portugal e os Estados Unidos da América, de 6 de Setembro de 1951, feito em Lisboa a 18 de maio de 1984), 22/III (aprova para ratificação o acordo entre o Ministério da Defesa Nacional de Portugal e o Departamento de Dentados Unidos da América, respeitante ao emprego de cidadãos portugueses pelas Forças dos Estados Unidos da América nos Açores, feito em Lisboa a 9 de Outubro de 1984) e 23/III (aprova para raficação o acordo entrte a República Portuguesa e a República Francesa, respeitante à utilização pela República Francesa de [...] facilidades na Região Autónoma dos Açores, assinado em Lisboa a 9 de Outubro de 1984) e do projecto de lei n. ° 502/III (PCP), que determina a renegociação de todos os acordos de defesa ou de e incidência militar entre Portugal e os Estados Unidos da América.
Usaram da palavra a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Cooperação (Eduardo Âmbar), os Srs. Deputados Adriano Moreira (CDS), João Amaral e José Magalhães (PCP), Angelo Correia (PSD) e Acácio Barreiros (PS).
A Assembleia aprovou pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos relativos a pedidos de autorização para apresentação em juízo de vários Srs. Deputados.
Concluiu-se a votação da ratificação n. ° 95/III, relativa ao Decreto-Lei n.º 116/84, de 6 de Abril, que revê o regime de organização e funcionamento dos serviços técnico-administrativos das autarquias locais. Produziram declarações de voto, relativamente às propostas votadas, os Srs. Deputados Anselmo Aníbal, João Amaral e João Abrantes (PCP) e Raul Castro (MDP/CDE).
Concluiu-se a votação das propostas de alteração à proposta de lei n. ° 77/III - estabelece os regimes de renda livre, condicionada e apurada nos contratos de arrendamento para habitação - que ficaram tendentes da sessão anterior, tendo-se de seguida procedido à votação final global da proposta de lei. Produziram declarações de voto os Srs. Deputados Zita Seabra (PCP), Raul Castro (MDP/CDE), João Porto (CDS) e Leonel Fadigas (PS).
Procedeu-se depois à votação final global do projecto de lei n.º 105/III - Balanço Social -, tendo produzido declarações de voto os Srs. Deputados Ruben Raposo (ASDI), António Rebelo de Sousa (PS), Manuel Lopes (PCP), Raul Castro (MDP/CDE), Manuel António dos Santos (PSD) e Nogueira de Brito (CDS).
Após dar conta da entrada na Mesa de um requerimento do PSD pedindo a avocação pelo Plenário de alguns artigos das propostas de lei n.ºs 35/III e 36/III - direito de antena nas regiões autónomas -, o Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 11 horas e 50 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.

Página 3808

3808 I SÉRIE - NÚMERO 102

Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António José Santos Meira.
António do Manuel do Carmo Saleiro.
Armando António Martins Vara.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Luís Filipe Gracias.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Frederico Augusto Handel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Joaquim Gomes.
João do Nascimento Gama Guerra.
João Rosado Correia.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José António Borja dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José da Cunha e Sá.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Manuel Torres Couto.
José Martins Pires.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Fontes Orvalho.
Maria Angela Duarte Correia.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Nelson Pereira Ramos.
Paulo Manuel Barros Barrai.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Agostinho Correia Branquinho.
Amândio Domingues Basto Oliveira.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Pedro de Barros.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José Angelo Ferreira Correia.
José António Valério do Couto.
José Augusto Seabra.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
José Silva Domingos.
Leonel Santa Rita Pires.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Guilherme Branco Gonzalez.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
José António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Santos Magalhães.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria José Silva Ribeiro.

Página 3809

5 JULHO DE 1985 3809

Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Filipe Neiva Correia.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
[...] Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
[...] Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
João Gomes de Abreu Lima.
José Luís Nogueira de Brito.
Manul Tomás Rodrigues Queiró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Corregedor da Fonseca.
Helena Cidade Moura.
Raul Morais e Castro.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António Poppe Lopes Cardoso.
Francisco Alexandre Pessegueiro.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Rubén José de Almeida Raposo.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, quer interpelar a Mesa?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, é conhecido que com a revisão do Regimento foram profundamente alteradas as regras de funcionamento da Assembleia da República, designadamente em matéria de quórum. De qualquer modo, há um limite mínimo para que a Assembleia possa funcionar, que são 50 deputados.
Solicitava à Mesa que fosse verificado se estão prestes esses 50 deputados para que se possam iniciar os trabalhos.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Fui informado de que havia quórum e por isso abri a sessão. De qualquer maneira, vamos proceder à contagem.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Valente Rosa.

A Sr.ª Helena Valente Rosa (PS): - Sr. Presidente, ïue há comissões a funcionar e pedia-lhe 5 minutos para se poderem chamar as pessoas.

O Sr. Presidente: - Com certeza Sr.ª Deputada.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Penso que o Sr. Deputado que faltava para termos quorum acaba de entrar, e consequentemente, temos agora quorum de funcionamento.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai referir a entrada na Mesa de requerimentos e de respostas a requerimentos.

O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, nas últimas sessões deram entrada na Mesa os seguintes requerimentos: dia 2 de Julho de 1985 - a diversos ministérios, no total de 4, formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; dia 3 de Julho de 1985 - ao Ministério da Administração Interna, formulados pêlos Srs. Deputados Álvaro Brasileiro e Francisco Pessegueiro, respectivamente; ao Governo e ao Ministério da Cultura, no total de 2, formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; aos Ministérios da Agricultura e da Qualidade de Vida, formulados pelos Srs. Deputados Maia Nunes de Almeida e Rogério Brito.
Por sua vez, o Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Magalhães Mota, nas sessões de 20 de Junho, 16 de Setembro, 5 de Janeiro, 2 e 16 de Fevereiro, 3 de Abril, 3, 16 e 29 de Maio e na reunião da Comissão Permanente de 19 de Setembro; José Tengarrinha e outros, na sessão de 22 de Setembro; Carlos Carvalhas, na sessão de 30 de Março; Reis Borges, na sessão de 2 de Maio; Costa Fernandes e Anselmo Aníbal, na sessão de l de Maio; Nogueira de Brito, na sessão de 8 de Maio; Mota Torres, na sessão de 15 de Maio; lida Figueiredo e José Manuel Mendes, na sessão de 23 e 24 de Maio; Hasse Ferreira e Manuel Lopes, na sessão de 31 de Maio, respectivamente; José Magalhães, na reunião da Comissão Permanente de 19 de Setembro: Gaspar Martins e outros, na sessão de 11 de Outubro; Gomes de Pinho, na sessão de 4 de Janeiro; Marques Mendes, na sessão de 10 de Janeiro; Jorge Lemos, na sessão de l de Março; Maia Nunes de Almeida, na sessão de 12 de Abril.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

Uma voz do PS: - Isto vai ser uma intervenção pacífica!

O Sr. Silva Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A futura central termoeléctrica a carvão da EDP está a dar saltos de cabra montanhesa no litoral do País para encontrar poiso.
Esteve prevista para a Amorosa, em Viana do Castelo, deu um salto repentino para Lavos, na Figueira da Foz, e quando menos se esperava deu outro salto. Neste momento pretende sediar-se no distrito de Leiria, no concelho de Pombal, junto à Guia.
O caso da localização desta futura central térmica a carvão é mais um exemplo paradigmático de como o futuro do nosso país, o futoro de todos nós e de cada uma das nossas regiões, é posto em causa em nome do progresso. Sob a capa das soluções técnicas, ocultam-se a cobardia e o oportunismo políticos. Para não dizer, também, a ignorância, a preguiça ou até talvez a

Página 3810

3810 I SÉRIE - NÚMERO 102

própria falta de idoneidade profissional de certos técnicos destacados para justificar as soluções políticas em vez de fornecer os dados técnicos que ofereçam o leque das opções políticas claramente assumidas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas eu não quero discutir as soluções técnicas propostas no passado ou no presente. Admito que sejam todas defensáveis. Não sou técnico. Cabe-me, enquanto eleito pela população do meu distrito e do meu país, velar sobre as soluções políticas, as opções feitas, a sua seriedade, o seu grau de solidez e a sua inserção numa política global que se proponha, dentro da sua complexidade, variedade e até contradição, assegurar e prosseguir os interesses da Nação e dos Portugueses.
Ora, o mínimo que se pode dizer é que quando se tenta justificar com argumentos técnicos a implantação da futura central térmica a carvão na zona da Guia, no litoral do distrito de Leiria, tal justificação não tem qualquer credibilidade.
O relatório da Comissão Interministerial para a Selecção de Sítios de Centrais Térmicas a Carvão, de Abril de 1983, que apreciou as próprias propostas da EDP, comparou duas localizações - Amorosa, em Viana do Castelo, e Lavos, na Figueira da Foz -, concluindo do seguinte modo:

Os resultados a que se chegou revelam que o sítio de Amorosa é mais favorável do que o de Lavos do ponto de vista do somatório dos custos económicos associados aos factores de caracterização utilizados. [...] Contrariamente, o sítio de Lavos apresenta-se como mais favorável do que o de Amorosa em termos globais de impacte ambiental (P- 3).

Da Guia, no concelho de Pombal, nem cheiro.
Repentinamente (menos de 2 anos nestas coisas não é tempo), temos a localização ideal num sítio que nem sequer era encarado como recurso em Abril de 1983! Ou a técnica estava sornamente a dormir ou a política tem andado de rastos, arrastada como tem vindo a ser a solução de Norte para Sul: primeiro, do sítio considerado globalmente mais conveniente para o outro também estudado e proposto como escolha alternativa - de Amorosa para Lavos; repentinamente, já nem dentro das hipóteses técnicas - de Lavos para a Guia.
Ao sabor dos protestos das populações. Mas só dos protestos? É contudente a minha interrogação. Porém, legítima, quando é mais do que flagrante a falta de consistência do processo justificativo de uma tão importante decisão.
Afinal, o que é que está a ditar a opção pela localização na Guia? Uma linha geral de acção, em nome dos interesses globais e futuros do País, seriamente fundamentada no plano técnico e claramente assumida no plano político? Ou antes meros simulacros de justificação técnica para cobrir a cobardia e o oportunismo políticos?
Se a central deve ir para a Guia porque os outros não querem o lixo produzido pelo progresso, então, lambem nós, os do distrito de Leiria, não o queremos!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E os técnicos que justificaram [...] sítio tão rapidamente, apesar de menos de 2 [...] antes nem sequer o considerarem como alternativa [...] efeitos de opção final e imediata, que arranjem [...] ou outros e «justifiquem-nos» com igual velocidade.
Nós, também, dizemos NÃO à central a [...] vão no distrito de Leiria. E com maioria de razão [...] não serviu para os outros, que a «técnica» - a [...] não é dos deputados neste caso - tinha com [...] tranquilidade e liberta de pressões e jogos de [...] escolhido, então ainda menos servirá para nós a ...] de quem a «técnica» ainda ontem nem sequer se [...] brava.
Querem dar-nos empregos e rendimentos. Mas [...] contabilizam aqueles que nos vão tirar, afectando [...] região agrícola, florestal e turística tão importante. [...] não invocar prioritariamente os demais efeitos [...], que não serão decerto de menor monta.
O despacho de 5 de Fevereiro de 1982 que criou [...] já referida Comissão Interministerial para a Selecção de Sítios de Centrais Térmicas a Carvão pronunciava-se nos seguintes termos:

De acordo com as mais recentes previsões de expansão do sector eléctrico, o País terá de [...] nos próximos 30 anos, 5 a 6 centrais térmicas os nucleares. Nestes termos é constituída uma comissão encarregada de preparar uma carteira de sítios para a localização de centrais térmicas a carvão, que corresponda ao resultado de uma análise a [...] de todo o território.

Pois bem, a Comissão ou a EDP, mais de 3 anos, depois, já não têm uma carteira de sítios seleccionados, mesmo que só como pré-selecção? Pode-se saber qual é? São capazes de a divulgar?
Mas se o argumento é o da urgência, então pressa por pressa, para não dizer precipitação por precipitação, não será mais aceitável, à cautela, localizar a futura central num dos sítios, aquele que melhor suporte os efeitos acrescentados, em que já exista uma, em vez de se sacrificar uma nova zona? E se o argumento é o da distância, que força poderá ele ter por parte de quem já se deslocou da Amorosa até à Guia?!
De toda a evidência as opções energéticas que assegurem o futuro do País continuam a carecer de uma preparação e decisão global, publicamente feita e claramente assumida. Continua-se no improviso desconhecendo-se deliberadamente que o País é vez mais pequeno para suportar cada vez mais atropelos aos interesses das populações e, desse modo, interesses da Nação no seu conjunto. A preguiça, incapacidade ou insensibilidade da «técnica» [...] com a cobardia ou o oportunismo políticos têm feito grandes barbaridades. Na democracia, e na ditadura (o fenómeno o vício estão muito enraizados).
Por isso, o projecto de lei n.° 446/III que, em certo momento, apresentámos nesta legislatura, visando instituir a comunicação prévia obrigatória por parte dos serviços do Estado, institutos públicos e empresas publicas à Assembleia da República para conhecimento das comissões parlamentares competentes e da Comissão de Administração Interna e Poder Local assim como dos municípios a que digam respeito, dos programas ou projectos de extinção ou criação de unidades de produção ou de serviços, assim como de desenvolvimento ou de alteração dos existentes.

Página 3811

5 DE JULHO DE 1985 3811

Ao menos aproveitemos as vantagens da democracia não nos calemos e metamos na ordem os dinossauros da tecnocracia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Merecem-nos total apoio as posições [...] das instituições representativas das populações da região da Guia, sobremaneira da Câmara e da Assembleia Municipal de Leiria. Já nos deixa [...] o colaboracionismo com a EDP, nas circunstâncias descritas, do presidente socialista da Câmara Mucipal de Pombal no litoral de cujo concelho se situa a Guia.

Vozes do PSD: - Bom presidente!

O Orador: - Seria lastimável e catastrófico que o futuro do nosso país fosse (ou continuasse a ser) decidido aos baldões. A EDP e, sobretudo, o Governo têm de ser convincentes, claros e coerentes, em vez de [...] da forma inversa, suscitando a legítima indignação das populações quando estão em causa valores e interesses importantes como os da saúde e das condições de vida.
De qualquer modo, e enquanto o sistema de decisão for o dos empurrões, em Leiria empurraremos tanto como os outros.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Par interpelar o Sr. Deputado Silva Marques inscreveram-se os Srs. Deputados Manuel Martins, Ferraz de Abreu, António Gonzalez e Meneses Falcão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Martins, embora o PSD tenha apenas 2 minutos.

O Sr. Manuel Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lamento mais uma vez ter tão pouco tempo - apenas 2 minutos - para poder intervir. Já da semana passada, quando o Sr. Deputado Meneses Falcão aqui trouxe este mesmo problema, gostaria de ter intervindo, mas isso não me foi possível, pois o meu grupo. parlamentar já não linha tempo disponível, o que mais uma vez quero lamentar. E quero-o lamentar até porque sou uma das pessoas - talvez das primeiras - que há cerca de 30 anos sou atingido pelos efeitos de uma central a carvão (a primeira instalada no País) e portanto posso transmitir aqui a esta Câmara algumas das preocupações dessas mesmas populações.
Queria começar por felicitar o meu companheiro Silva Marques, assim como o Sr. Deputado Meneses Falcão por terem trazido aqui a esta Câmara tal problema, o que não foi feito antes do 25 de Abril pelos deputados que aqui estavam. Pelo contrário, eles aldrabaram as populações, dizendo que as centrais a carvão seriam um benefício para elas, seriam postos de trabalho que iriam ser criados.
Passado pouco tempo, o que se verificou foi que poucos postos de trabalho foram criados e as populações apenas tiveram a fome, apenas tiveram - posso dizer e tenho-o transmitido à EDP - talvez a morte.
O futuro das populações de Gondomar é negro; durante anos têm lutado, apesar de umas esmolas que lhes têm sido dadas por esta empresa, pois a EDP todos os anos distribui alguns milhares de contos pelos proprietários. Mas isso não basta porque não são só as culturas mas a saúde dessa gente que está em causa e, lamentavelmente, a comunicação social nada tem feito por estas populações.
Gostaria de focar esse problema hoje, mas, como vejo ali a bancada da imprensa vazia, com certeza que estas lamentações não irão ser transmitidas como deviam a quem de direito. Espero que com a intervenção que hoje aqui foi feita pelo meu companheiro de bancada as populações de Pombal sejam alertadas para o facto e que lutem. Ter-me-ão sempre a seu lado para lutar contra a instalação da central em Pombal, em Viana do Castelo ou na Figueira da Foz, pois uma central a carvão só traz a morte e a destruição às populações.

O Sr. Meneses Falcão (CDS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Martins, permita-me chamar a atenção de V. Ex.ª no sentido de lhe dizer que a bancada da comunicação social, embora não estando cheia, também não está vazia.

Aplausos DO PCP, do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Embora compreendendo as razões do Sr. Deputado Silva Marques, o que é verdade é que o País tem necessidades energéticas e, na realidade, tem de produzir energia se quiser desenvolver-se e trazer conforto e riqueza à sua população.
Portanto, temos de encarar o problema das centrais como males necessários e é indispensável que as populações sejam esclarecidas e não sejam confundidas nesta matéria porque se continuamos a fazer guerras um pouco obscuras a este problema somos capazes de levar o País a uma situação catastrófica, até porque uma central, seja ela convencional ou nuclear, leva uma dezena de anos ou mais a implementar e a construir.
É portanto necessário não retardar decisões nesta matéria, que são extremamente importantes, embora reconhecendo os inconvenientes que há na implementação de uma central. Porém, tenho a impressão de que qualquer debate nesta matéria deve, efectivamente, dirigir-se aos técnicos ou às técnicas que seleccionaram os sítios e que vão determinar, de facto, onde as centrais vão ser implementadas e não estar a excitar as populações com uma informação que muitas vezes nem sequer é certa e exacta.
A minha pergunta ao Sr. Deputado Silva Marques é se, perante isto, ele considera que intervenções como a que acaba de fazer - que não considero de maneira nenhuma de oportunismo político nem demagógico - ajudam a resolver o problema energético deste país.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Gonzalez.

O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Sr. Deputado Silva Marques, quero realmente dar-lhe os parabéns por ter trazido aqui à Assembleia esta questão que devia ter sido trazida já muitas outras vezes, porque este problema da central a carvão, como o de outras centrais, insere-se realmente num projecto de sociedade.

Página 3812

3312 I SÉRIE - NÚMERO 102

Em relação a esta central a carvão, como em relação às outras, há um problema muito grave que não é propriamente técnico. Esse problema é o que diz respeito a dessulfurização do carvão - isto não discutindo agora a necessidade de mais centrais a carvão ou nucleares ou o que quer que seja.
Falando só do ponto de vista técnico, se o carvão a utilizar na central for dessulfurizado, consegue-se travar um dos problemas mais graves que é o do anidrido sulfuroso. Isto conseguindo a montante evitar as poeiras do carvão ou conseguindo, na central - como, aliás, nós vimos em Sines -, a captação das poeiras por sistemas electroestáticos, tendo ainda em atenção o sítio onde as cinzas vão estar, de forma que tanto as chuvas, como as águas lexiviantes, como ainda as poeiras arrastadas pêlos ventos, sejam travados e não sejam lançados nas linhas de água e no ar.
Se se conseguir travar tudo isso fica ainda um grande problema que é a questão do anidrido sulfuroso. Ora, existe realmente uma resposta técnica para isso que é a dessulfurização do carvão. Esta dessulfurização é possível, é rentável - sabemos que o enxofre é necessário para o ácido sulfúrico, etc. -, daí que uma instalação de dessulfurização do carvão permitiria poupar dinheiro, evitanto ao mesmo tempo o lançar no ar do anidrido sulfuroso que, não indo afectar apenas directamente o nosso país com as chuvas ácidas, vai perturbar iodo o ecossistema mundial.
Sabemos que o problema da central aqui, ali ou acolá, será sempre o mesmo; será um jogo de empurra enquanto não se tomar a tal decisão que é a de dessulfurizar o carvão. Ora. sabemos que essa é uma decisão política e económica - porque sai caro não se pensar em termos de reciclagem do enxofre -, e é essa a decisão política que é preciso tomar. Os técnicos sabem que isso se pode fazer, mas em Sines já nos disseram que, realmente, saía caro, etc., e não havia hipótese de o fazer.
Portanto, quando as outras unidades de queima começarem a funcioar em Sines - quando forem construídas - vão-se somando todos esses lançamentos que referi a toneladas de anidrido sulfuroso. Isto sem falar aqui propriamente na política energética, pois os poucos minutos de que disponho não dão para isso.
Perguntava-lhe, portanto, Sr. Deputado, se perfilha ou não esta ideia da dessulfurização.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Meneses Falcão.

O Sr. Meneses Falcão (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Duas palavras apenas para me congratular com a forma como o Sr. Deputado Silva Marques trouxe aqui este problema. Efectivamente, estou inteiramente solidário com a posição assumida e nem outra coisa poderia acontecer depois da intervenção que aqui fiz sobre o mesmo assunto.
Em todo o caso tem oportunidade um pedido de esclarecimento, na medida em que o Sr. Deputado Silva Marques invocou a figura do presidente da Câmara Municipal de Pombal em todo este processo. O esclarecimento que lhe peço - e que se justifica, no meu entender - é precisamente este: quando o Sr. Deputado traz a esta Câmara o comportamento do presidente da Câmara Municipal de Pombal tem presente a acção da câmara em si - o órgão colegial que é a Câmara Municipal de Pombal - ou pretendeu, efectivamente, isolar o comportamento do presidente da Camara, dissociando-o da acção da administração [...] do concelho de Pombal?
Pedia ao Sr. Deputado que fizesse o favor de esclarecer a sua posição neste particular.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques tem 3 minutos para responder, por concessão da Mesa.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais foi clara a intenção da referência do meu colega Manuel Martins à bancada da imprensa. Trata-se do facto de ela estar pouco cheia porque, relativamente aos presentes nessa bancada, sabemos, por provas dadas, que eles são os que mais contribuem para a presença da imprensa no Parlamento e, através dela [...] Parlamento junto da população portuguesa. Por [...] eu diria que a bancada da imprensa está preenchida de forma inversa à importância que ela tem dado ao Parlamento. Por isso, também, presto a minha homenagem aos jornalistas que estão presentes, sem excluir alguns - e até vários - dos ausentes.
Quanto àquilo que o Sr. Deputado Ferraz de Abreu disse, pois é evidente que o País precisa de energia e não neguei isso.
Sr. Deputado, a minha intervenção foi sobretudo centrada na apreciação do processo técnico-politico de decisões tão importantes e tão drásticas para o presente e o futuro. A minha intervenção foi sobretudo dirigida àquilo que designei por barbaridades - não tenho a menor dúvida que são barbaridades - e àquilo que também designei por dinossauros da tecnocracia, ou seja, àqueles que com ar muito sério e pretensamente com o poder absoluto e infalível da técnica - sabendo nós que a técnica está dependente da subjectividade e fragilidade do próprio ser humano - dizem: isto [...] de ser aqui! E às vezes fazem-no pela calada, tentando fazer passar as decisões sem o contributo da opinião das populações e fazem normalmente asneira!...
Têm-no feito e inclusivamente isto não é uma questão de regime - digo isto para aqueles que julgam que na ditadura não era assim. Estas barbaridades foram praticadas na ditadura e sê-lo-ão, também, na democracia, mas com esta vantagem, que é precisamente o abismo que há entre a democracia e a ditadura: [...] na democracia, podemos protestar, podemos levantar a nossa voz e até podemos, se amanhã tivermos oportunidade e se a Câmara o quiser, aprovar projectos de lei - como aquele que é da minha autoria e a que a referência - no sentido de meter na ordem precisamente os dinossauros da tecnocracia, obrigado-os a tomar decisões sem ser pela calada, denunciando-os dizendo ao País e às populações aquilo que andam a maquinar.
Esta é que é a questão fundamental, não é o [...] precisar ou não de energia, porque precisa.
Quanto ao Sr. Deputado António Gonzalez [...] não ter a mínima ideia relativamente ao que [...] melhor, se a solução de dessulfurização ou não.
Sou suficientemente realista para não me [...] num tipo de discussão tão técnica, para o qual não [...] preparação. Mas isso não implica que [...] discussão para a qual tenho preparação e, mais - [...]dever político e moral, que é o dar expressão preocupações da população que me elegeu e querer [...], precisamente, os dinossauros da tecnocracia.

Página 3813

5 DE JULHO DE 1985 3813

Voz do PSD: - Muito bem!

O Orador - Quanto à pergunta do Sr. Deputado Meneses Falcão, sem dúvida que fiz referência à Câmara Municipal de Leiria no sentido global; mas não deixo de aproveitar a oportunidade para uma referência em especial ao Sr. Presidente da Câmara Municipal de Leiria.
Relativamente à Câmara Municipal de Pombal, referi-me ao seu presidente socialista...

Vozes do PS: - O senhor tem é inveja; é um bom presidente!
O Orador: - .... exactamente para o isolar, porque ele tido uma atitude de tal colaboracionismo passivo com a EDP que merece ser isolado.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.

O Sr. João Abrantes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Coimbra, a cidade universitária do Mondego, é hoje o tema da nossa intervenção.
A exemplo de anteriores intervenções sobre o distrito é de todo o concelho de Coimbra que vamos falar.
Com uma população de 145 000 habitantes e uma densidade populacional de 464 habitantes por quilómetro quadrado, o concelho de Coimbra tem sido uma zona aberta às influências dos dois grandes centros - Lisboa e Porto - , resistindo a estas mercê do grande peso de alguns sectores da sua actividade (a Universidade, os hospitais, os serviços públicos, o comércio) e da sua posição de capital da região Centro.
A população do concelho cresceu acentuadamente, sobretudo nos anos setenta, devido a deslocações de concelhos vizinhos para Coimbra à procura de emprego, ao crescimento do poder de compra a seguir ao 25 de Abril e ao regresso de retornados.
A mancha urbana cresceu assim à volta do centro histórico da colina da Universidade, saltou para a outra margem do rio Mondego e representa hoje quase 70% da população total do concelho.
Refira-se ainda o enorme peso na população de Coimbra a sua componente flutuante - os estudantes - com importantes reflexos económicos na habitação e no comércio.
A população activa do concelho de Coimbra tem vindo a crescer (39 610 em 1971, 55 478 em 1981), bem como o seu peso na população total (35,8% em 1970, 40% em 1981) e reparte-se por três grandes sectores do seguinte modo: primário, 2159 - 3,89%, secundário, 18 220 - 32,84%, e terciário, 35 099 - 6,3%.
No sector primário (agricultura) trabalham 2159 pessoas - 3,89% da população activa total -, mas estes números oficiais não têm em conta nem os agricultores a tempo parcial (e este número tem vindo a aumentar como complemento de outras profissões), nem as centenas ou milhares de mulheres que nos censos figuram como domésticas.
De qualquer forma a situação neste sector é a quebra da população activa que se dedica à agricultura, do seu envelhecimento e da diminuição da produtividade.
Predomina a pequena exploração (a média é de 1,6 há) dispersa (6 parcelas por exploração, em média), existindo 2531 ha de terra inculta e 1900 ha na de área florestal destruída pelo fogo.
O concelho contribuiu em 1981 com mais de 108 COO contos para o produto agrícola bruto.
O sector secundário (indústria) ocupa 18 220 pessoas (32% da população activa total) em 352 empresas, contribui com cerca de 30% para o produto interno bruto total do concelho e está distribuído pelos sectores mais importantes da construção civil (5317 trabalhadores), têxteis (3356 trabalhadores), cerâmicas e cimentos (2750 trabalhadores), metalúrgicas (2578 trabalhadores) e alimentares (1715 trabalhadores).
A situação geral deste sector é de grave crise, com a maior parte das empresas a trabalhar a 50 % da sua capacidade.
A construção civil e obras públicas, que emprega quase 10% da população activa do concelho, viu reduzidos em 23% (só de 1980 para 1983) o número de fogos construídos e essa crise reflectiu-se em sectores a jusante como o da indústria cerâmica.
O sector terciário (comércio e serviços em geral) ocupam 35 099 trabalhadores (63 % da população activa), distribuídos da seguinte forma: educação e saúde - 11 987 trabalhadores; comércio e turismo - 8649 trabalhadores; administração pública, bancos, seguros e defesa - 6740 trabalhadores; transportes terrestres e comunicações - 2577 trabalhadores.
Estes números traduzem, por um lado, a concentração em Coimbra de serviços que são prestados a toda uma região (casos da saúde e da Universidade) e por outro lado à fixação em Coimbra de profissionais do ensino a prestar serviço em concelhos por vezes distantes.
Caracterizado o concelho, é altura de analisar as consequências da política nacional nas condições de vida das suas gentes.
Os dados disponíveis, quer nacionais, quer locais, permitem-nos concluir que as condições de vida no concelho de Coimbra têm piorado de forma acelerada nos últimos anos.
Os exemplos que apontamos são significativos: mais de 40 000 desempregados em todo o distrito - e o seu número aumenta assustadoramente; alguns milhares de trabalhadores com salários em atraso; mais de 80% dos trabalhadores da indústria e comércio auferindo rendimentos inferiores a 200 contos/ano; a quebra de vendas no comércio no primeiro trimestre de 1984 foi da ordem dos 20%; diminuiu em 23% entre 1981 e 1983, o número de fogos construídos - e este número é acompanhado de perto pela quebra na aquisição de casa própria; aumentam a prostituição, a mendicidade e o consumo da droga.
No sector da habitação, 45 % dos edifícios da cidade de Coimbra são anteriores a 1945 e 18% anteriores a 1919; 835 edifícios do concelho são de madeira e 140 são barracas, ao mesmo tempo que há 1817 alojamentos vagos e 1506 com ocupante ausente; 7694 famílias não têm retrete no alojamento; 6358 famílias não têm água canalizada e 13 849 famílias não têm banho nas suas casas.
No sector dos transportes e vias de comunicação as carências e o mau estado de muitas estradas e caminhos, bem como os problemas de trânsito e do estacionamento na cidade de Coimbra influem negativamente na qualidade de vida das populações.
E direi apenas que a total ausência de transportes colectivos camarários em toda a margem direita do Mondego, as dificuldades de acesso ao açude - ponte e a falta de construção das circulares são outros tantos

Página 3814

3814 I SÉRIE - NÚMERO 102

problemas a agravar os grandes engarrafamentos de trânsito na cidade. Os efeitos da auto-estrada no descongelamento de trânsito na cidade revelam-se inferiores aos pretendidos e o estado calamitoso das estradas de concelhos, da rua de acesso à Escola Secundária D. Duarte, da estrada Adémia-Cidreira, Conraria e Castelo de Viegas, entre outras tantas, contribuem para o agravamento daquilo que vimos descrevendo.
O património cultural e ambiental da cidade de Coimbra é rico e deve ser preservado. Os grandes estragos, na zona histórica da alta, praticados pelo fascismo não podem nem devem repetir-se.
É urgente a criação do museu António Nobre na Torre de Amo, a abertura da Torre de Almedina com a exposição permanente de fotografias da cidade antiga e a recuperação do Convento de Santa Clara-a-Velha e do Convento de São Francisco. Estas são apenas algumas das medidas mais urgentes neste campo.
Seguida, pêlos sucessivos governos de direita, uma política orientada para a reconstituição dos monopólios, das grandes fortunas e privilégios, também, no concelho de Coimbra os seus reflexos são a estagnação e a retracção das actividades produtivas e têm conduzido ao alastrar do desemprego e à degradação das condições de vida e de trabalho.
O sector não capitalista da economia tem sido alvo preferencial desta ofensiva contra as empresas nacionalizadas e do sector público de âmbito nacional, designadamente na banca, nos seguros, na EDP, na EPAC, na Gelmar, na Centralcer, na Rodoviária Nacional, na Cimpor e nos CTT.
A desintervenção de empresas recuperadas pêlos sacrifícios dos trabalhadores e com forte aplicação de fundos públicos como é o caso da Mondorel que foi entregue em 1977 à administração capitaneada por Iládio Alvarez.
O sector industrial tem sido alvo de desorganização e desarticulação crescente aumentando enormemente as dificuldades da pequena e média indústria privada em resultado da política de afrontamento do sector público e da retracção do mercado interno.
Os trabalhadores têm defrontado o drama dos salários em atraso em empresas como a Termec, a Gomes Porto, a Lumel, a Aerobus, a Amadeu M. Pereira e as fábricas Caravanas Mondego, a Olemar, a Barbosa e Ribeiro, a Argos, a Ideal, a Lakifa, a Ladricer, etc.
A Argos, a Ideal, os Supermercados Colmeia e os Móveis Olaio receberam subsídios sob a capa da manutenção dos postos de trabalho sem conhecimento nem controle dos trabalhadores quanto à sua efectiva utilização, apesar de esse controle ser uma das condições sempre constante dos despachos de concessão.
A Agfa - a empresa multinacional que nos últimos anos do fascismo beneficiou de facilidades várias -, nomeadamente no tocante à cedência de terrenos em troca de garantia de postos de trabalho, procedeu ao primeiro grande despedimento no primeiro governo de Mário Soares e agora a Reflecta (sua herdeira) colocou com contratos a prazo os 170 trabalhadores que conserva e outra empresa multinacional - a Centralfarma da Bayer - fez há poucos meses o despedimento colectivo de todos os trabalhadores que mantinha em Coimbra.
A agricultura é votada à ruína e ao abandono com prejuízo para a região e a produção agrícola nacional. Acentua-se a quebra de produção motivada pelo aumento constante dos preços dos factores de produção e preços não compensadores dos produtos agrícolas.
É ainda um outro sintoma de agravamemto a [...] de terrenos com grande aptidão agrícola, [...}] com a construção indiscriminada de habilitações [...] industriais - como no caso da [...] quer com florestação inadequada, quer ainda [...] extracções de areia às portas de Coimbra.
Todos estes anos de política de recuperação [...] lista conduziram, forçosamente, a um reforço da [...] dos trabalhadores.
A esta política que há mais de 9 anos se abate [...] os trabalhadores tem sido dada uma resposta [...] inequívoca de luta. A luta dos trabalhadores de Coimbra em várias empresas, designadamente: pelo [...] de salários e subsídios em atraso como as [...], na Ideal, nos lanifícios Montes Claros, na [...] e na Atlantida Editora e contra os despedimentos e encerramentos de empresas como os casos da Agfa, da Gelmar, da Livraria Bertrand, Bayer, da EPAC.
A luta dos trabalhadores do comércio no ano de 1984, dos trabalhadores dos serviços sociais da Universidade de Coimbra e a luta dos carteiros de Coimbra ilustram bem aquilo que vimos dizendo.
Esta luta dos trabalhadores do distrito de Coimbra produziu os seus frutos: abrem-se hoje novas perspectivas para a democracia. Por isso os trabalhadores de Coimbra estão orgulhosos da sua contribuição para a alteração do quadro que conduziu ao agravamento das suas condições de vida e estão confiantes de que a alternativa democrática existe e será conseguida!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para interpelar o Sr. Deputado João Abrantes, estão inscritos os Srs. Deputados Cunha e Sá e Costa Andrade.
Tem a palavra o Sr. Deputado Cunha e Sá.

O Sr. Cunha e Sá (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou ser extremamente rápido porque há um camarada meu que vai fazer uma intervenção e não lhe quero tomar tempo.
Não poderia deixar, entretanto, de referir aqui muito concretamente dois ou três aspectos.
Vou dar de barato determinados aspectos, abordando apenas aspectos específicos e concretos.
Referiu o Sr. Deputado que a habitação em Coimbra não tem tido crescimento. Como é que o Sr. Deputado pode referir isso se é a única cidade do País onde a componente percentual da habitação é superior à das obras públicas? É a única cidade do País onde isso acontece.
Quero referir, por outro lado, que Coimbra tem custos indirectos provenientes de ser um nó rodoviário, o que lhe provoca dificuldades nos aspectos das comunicações, bem como relativos à sua componente de transportes colectivos, possuindo estes 88 unidades que, pela baixa quilometragem a que são obrigados a circular, têm de estar permanentemente ao serviço. Bastava que a velocidade de circulação aumentasse para o dobro para essas unidades poderem ser reduzidas a metade.
Por outro lado, quero referir ainda e por último que o seu partido referiu na Câmara Municipal de Coimbra perfeitamente o contrário daquilo que o Sr. Deputado disse no respeitante aos aspectos do planeamento urbanístico, da habitação, e designadamente das vias de acesso.

Página 3815

5 JULHO DE 1985 3815

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Abrantes, [...] responder imediatamente ou não?

O Sr. João Abrantes (PCP): - Sr. Presidente, [...] evitar a intervenção do Sr. Deputado Cunha e Sá, [...] que efectivamente tenha muita consideração por [...] que gostaria de lhe responder, mas não posso [...] uma intervenção da minha camarada Odete [...] e como tal não posso usar do direito de [...] relativamente às questões que me foram colocadas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se V. Ex.ª não [...] responder isso é consigo, mas por falta de tempo [...] não seja, porque a Mesa lhe dá 3 minutos para [...] sem prejudicar a sua camarada Odete Santos.

O Sr. João Abrantes (PCP): - Então, Sr. Presidente, com certeza que responderei.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Deputado João [...], a sua intervenção caracterizou-se por uma [...] rigorosa e objectiva - admitamos - de [...] das carências mais significativas e dos problemas mais angustiantes com que se debate o concelho de Coimbra, que por vezes também são extensíveis a todo o distrito, algumas vezes mesmo a toda a Zona Centro do País.
Não podemos naturalmente deixar de concordar com a descrição que fez, temos de a admitir como segura, pois dados são dados e não podemos obviamente deixar de comungar as suas preocupações e angústias como deputado do distrito.
Porém, não podemos igualmente deixar de assinalar um dado importante, que é o de que algumas das carências se devem a um inequívoco falhanço da actual administração municipal.
O actual executivo municipal ganhou as eleições na sequência de uma campanha verdadeiramente [...] que estava longe de poder ser concretizada e a prova, está à vista, pelo que não vale a pena enunciar um a um todos os grandes objectivos que foram propostos à cidade e ao concelho de Coimbra e que ficaram letra morta.
No entanto, para além de tudo isto não posso deixar de censurar na sua intervenção o carácter verdadeiramente negro, escuro, de que ela se revestiu. É verdade, que o concelho e a zona de Coimbra têm carências, todas essas que o Sr. Deputado enunciou e muitas mais ainda, mas penso que não seria justo para o povo de Coimbra, para as pessoas que em lugar de responsabilidade trabalham denodadamente ao serviço do concelho e da zona. Por exemplo, está-se a realizar em Coimbra nesta semana uma das manifestações mais expressivas da cidade e da zona - refiro-me concretamente à CIC - e não é justo que o Sr. Deputado não tenha feito uma referência que valesse, pelo menos, como um apoio moral aos empresários da Zona Centro, que ano após ano vêm realizando essa manifestação verdadeiramente grandiosa das actividades do distrito e da região.
Penso que isso não devia ser esquecido, pelo menos, com uma palavra de estímulo, e igualmente julgo que Comunista não devia ter pruridos ideológicos, dado que a CIC longe de ser a feira do grande capitalismo monopolista é, pelo contrário, uma manifestação da capacidade de realização do empresário médio português, mesmo do pequeno empresário. Ora, isso não pode deixar de ser referido.
Penso que obras fundamentais não podem deixar de ser referidas - repito, que mais não seja como um estímulo moral às pessoas que têm essa possibilidade.
Julgo que o trabalho que está a ser realizado, designadamente pela Comissão de Planeamento da Zona Centro, em colaboração com os municípios, é um trabalho verdadeiramente notável.
Penso ainda que a resposta que as câmaras do distrito de Coimbra têm vindo a dar aos seus problemas é verdadeiramente ímpar no contexto em que se vive, quanto aos projectos que estão a ser apresentados e isto deve ser referido.
Penso igualmente, neste momento em que esperamos para breve prazo a inauguração do novo hospital distrital, que tal não devia ser silenciado.
Era fundamentalmente por isto, Sr. Deputado, que a sua intervenção peca.
Penso que, neste momento, no fim da legislatura se trata sobretudo de fazer um balanço e que, de certa maneira, atribuir culpas a alguém seria injusto da sua e da nossa parte, como deputados e como representantes e sindicantes últimos, em nome da vontade do povo, daquilo que a administração vai fazendo, não ter, também, uma palavra de estímulo para os autarcas, para a administração regional e para os empresários da zona que tanto vêm fazendo, apesar de tudo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem 3 minutos para responder, Sr. Deputado João Abrantes.

O Sr. João Abrantes (PCP): - Sr. Presidente, procurarei aproveitar o tempo que a Mesa generosamente me ofereceu.
Começarei por responder ao Sr. Deputado Cunha e Sá dizendo-lhe o seguinte: aquilo que referiu relativamente à habitação, à construção civil e obras públicas não tem nada que ver com aquilo que eu disse. Não referi a componente «construção civil e obras públicas» no desenvolvimento da cidade de Coimbra, apontei apenas a redução de 23 %, entre 1981 e 1983, no número de fogos construídos e oferecidos como habitação e que esta percentagem corresponde exactamente à quebra na aquisição de casa própria. Por conseguinte, estas são coisas diferentes daquilo que o Sr. Deputado referiu.
Em relação às questões do planeamento, não toquei nelas. Falei nas questões do trânsito mas, efectivamente, Sr. Deputado Cunha e Sá, numa intervenção deste tipo não poderia abordar todos os problemas. Aqueles que não abordei teve o Sr. Deputado Costa Andrade a ocasião de o fazer, o que fica registado, como certamente era seu interesse.
Em relação às questões do trânsito, o Sr. Deputado sabe perfeitamente que tal não foi resolvido em Coimbra e que grande parte da culpa é imputável ao poder central, designadamente a falta de um sistema tarifário que permitisse, através da auto-estrada - por exemplo, pelo embaratecimento das portagens -, um maior escoamento e evitar o atravessamento da cidade de Coimbra por carros pesados.

Página 3816

3816 I SÉRIE — NÚMERO 102

Por outro lado, a falta de construção de circulares e ainda os maus acessos feitos ao açude-ponte recentemente aberto à circulação contribuem para engarrafamentos monumentais.
Quanto ao Sr. Deputado Costa Andrade registo que V. Ex.ª queria, de facto, deixar aqui especificadas algumas das questões que não referi e desejava falar no inequívoco falhanço da política municipal — digamos que é uma dor que ficou ao PSD, pelo facto de ter «perdido» a Câmara Municipal de Coimbra. Mas pareceu que, ao querer afastar-se um pouco das responsabilidades que lhe cabem, procurou esquecer que o atraso de Coimbra não é apenas relativo as questões do poder local, nem às questões municipais.
O PSD tem responsabilidades no poder central e isso tem-se reflectido efectivamente no atraso de Coimbra.
O tom negro com que o Sr. Deputado nos acusa de termos «pintado» na nossa intervenção termina —e talvez V. Ex.ª não tenha ouvido— com uma palavra de esperança, porque efectivamente os trabalhadores têm esperança, acreditam que se abriram novas perspectivas na democracia portuguesa e certamente iremos conseguir para Coimbra que essas perspectivas não saiam defraudadas.
Por último, queria dizer que, efectivamente, não poderia falar em todas as questões. O Sr. Deputado falou na CIC e compreenderá que não temos quaisquer pruridos ideológicos em relação a esta importante manifestação económica. De facto, ela merece uma palavra de apoio, mas não havia tempo para o fazer, pelo que ela fica aqui.
V. Ex.ª falou na questão do hospital, creio que, também, para referir mais uma questão que eu tinha es-quecidp. Ora, isso não é verdade, pois na verdade, o que aconteceu foi que não tive tempo para a abordar. Falou na sua inauguração, mas cremos que, também, aí errou um pouco porque as responsabilidades do atraso da inauguração do Hospital Central de Coimbra cabem em grande parte ao PSD e, como sabe, ainda se desconhece qual é a data da sua. inauguração.

O Sr. Cunha e Sá (PS): Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Cunha e Sá (PS): — Para exercer o direito de defesa, em relação à intervenção do Sr. Deputado Costa Andrade, pois pertenço ao executivo da Câmara Municipal de Coimbra.
Sr. Deputado Costa Andrade, muito rapidamente, é o seguinte: apesar da estima que tenho por V. Ex.ª, tenho de referir três coisas: em primeiro lugar, quando este executivo foi presidir à Câmara Municipal de Coimbra não existia qualquer projecto de urbanização. Em segundo lugar, a primeira medida a tomar pelo executivo foi no sentido da moralização, pois ainda agora estamos a pagar contas do executivo anterior, por falta da sua contabilização. Em terceiro lugar, quero dizer que 99 % das decisões da câmara são tomadas por unanimidade.

O Sr. Presidente: — Para dar explicações, tem a pa-lavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): — Sr. Deputado do Partido Comunista, em primeiro lugar não fugi às responsabilidades que tinha. Pelo contrário, penso que a postura da minha intervenção Foi no sentido de dar alguma luz ao seu «quadro escuro» assumindo ...

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Costa Andrade, V. Ex.ª não pode dar respostas ao Partido Comunista, pois V. Ex.ª está a dar explicações ao Sr. Deputado Cunha e Sá.

O Orador: — Sr. Presidente, mas também estou no exercício de uma certa legítima defesa, pois o Sr. Deputado chamou-me irresponsável, na medida em que estava a fugir às responsabilidades. Penso que isto ...

O Sr. Presidente: — V. Ex.ª é um ilustre jurista, pelo que fará a melhor interpretação dentro do espírito e da letra do Regimento.

O Orador: — ... dá direito a legítima defesa, que pressupõe uma certa agressão, enfim, com alguma violência. Considero que tem alguma violência chamar irresponsável a alguém. Irresponsável é aquela pessoa que foge ás suas responsabilidades.
Portanto, Sr. Deputado, não fugi às minhas responsabilidades, pelo contrário, se avoquei alguma coisa de mérito foi porque me coloquei «de dentro» do processo. O que fiz foi censurar —embora concordando com a sua intervenção— o carácter manifestamente maniqueísta da sua intervenção.
O Sr. Deputado acaba de dizer que se esqueceu de alguns aspectos. Ora, esqueceu-se de todos aqueles com carácter positivo.
Também não é verdade, Sr. Deputado, que o Partido Social-Democrata como partido tenha qualquer responsabilidade no atraso da inauguração do hospital. As responsabilidades que temos, assumimo-las, mas penso que até agora havia um executivo com Primeiro--Ministro que era de certa maneira —segundo penso e até prova em contrário— constitucional e organicamente responsável pela política geral do País.
Quanto ao Sr. Deputado Cunha e Sá, quero dizer que em relação ao executivo de Coimbra —que me merece, também, todo o respeito, devo dizê-lo— não posso deixar de censurar a campanha eleitoral do Partido Socialista, que foi feita acima de todas as possibilidades realistas e o Sr. Deputado acaba por o reconhecer.
Refere V. Ex.ª que encontrou uma câmara catastrófica — o que não é inteiramente correcto. No entanto, encontrando-se essa câmara num estado de catástrofe, recomendava o realismo, a boa fé e o bom senso que fizessem outro tipo de campanha. V. Ex.ª não tenha dúvidas, a campanha que o Partido Socialista produziu, embora bem feita, foi uma fraude ...

O Sr. Cunha e Sá (PS): — Foi uma fraude, não foi?!

O Orador: — ... porque o tipo de programa que apresentou —e se o trouxermos aqui veremos isso— não era realizável dada a situação da própria câmara.
Não culpo a gestão camarária, mas sim a fraude da campanha eleitoral, que foi claramente megalómana. Foi assim que lhe chamei e mantenho, porque a câmara está a fazer o que é possível —nisso rendo-lhe a minha homenagem—, só que não posso deixar de trazer à colação esta questão e passados 3 anos sobre a campanha podemos constatar isso.

Página 3817

5 JULHO DE 1985 3817

Em nome de uma fraude, de um balão que [...] de ilusões, que o Partido Socialista ganhou a camara.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Ferro.

O Sr. Joel Ferro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com os seus 110 000 habitantes, e 292 km2 de [...] Barcelos tem 89 freguesias, o que lhe dá o 1.° lugar entre os maiores concelhos do País.
delimitado por 8 concelhos, sendo 2 do distrito de do Castelo, 5 do distrito de Braga e l do distrito do Porto, este concelho está situado bem no coração do Minho e é atravessado pelos rios Cávado e [...].
Barcelos tem 39,6 % da sua população activa, vivendo do sector primário, 39,4 % do sector secundário sendo 21 % do sector terciário.
Começando pelo primeiro dos sectores referidos, este concelho é «só» o maior produtor de vinho da Região Demarcada de Vinhos Verdes e o maior produtor de leite do País. Apesar disso a população que trabalha no campo está envelhecida (basta referir, a título de exemplo, que só 30 % dos podadores agrícolas têm menos de 45 anos), a propriedade está demasiado dividida (51,6 % das explorações agrícolas têm entre 0,5 há a 2 há).
As soluções que apresentamos para este sector, importantíssimo para o desenvolvimento de Barcelos, são os seguintes:
Uma maior e melhor informação e formação dos agricultores, apoiadas no ramo agrícola do ensino técnico-profissional, cuja urgente criação se torna necessária. Só assim poderemos ter no futuro jovens empresários agrícolas que possam dar o incremento necessário ao arranque do emparcelamento no concelho, baseado no cooperativismo.
Mas para isso é necessário que os técnicos agrícolas deixem de vez os gabinetes e venham para o campo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Precisamos, além disso, de crédito agrícola desburocratizado e da implementação de indústrias transformadoras baseadas nos recursos naturais do
concelho.

PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao sector secundário, que ocupa 15 725 pessoas, e responde por cerca de 80 % do valor acrescentado bruto de Barcelos, engloba dentro dele o maior centro malheiro do País!
Este sector, com a entrada de Portugal na CEE, tem de passar por uma fase urgente de modernização e pela implementação de indústrias alternativas.
Mas para a verificação dos pressupostos referidos é necessário o arranque do loteamento industrial, infra-estrutura para a qual já existe terreno.
Não devemos esquecer, porém, que a actual bolsa industrial coexiste, em Barcelos, com o atrofiamento do sector terciário. Sector que tem de registar um grande incremento, principalmente na comercialização dos produtos de artesanato.
Barcelos é, não o esqueçamos Srs. Deputados, o centro de artesanato da Europa. Os produtos de olaria e outros objectos de barro, com os seus artesãos, têm percorrido o mundo, como grandes embaixadores deste País.
Quem não conhece o «Galo de Barcelos» e «O Cristo» da Rosa Ramalho?
Precisamos no entanto de preservar estes e outros valores e por isso se torna urgente, no concelho, a criação do museu de olaria.
Na área do turismo necessitamos de um parque de campismo junto ao rio Cávado, rio algo poluído, com a sua fauna em desaparecimento e com a existência de poços nas zonas antigas e actuais de extracção de areia, descaradas agressões que tem merecido da parte do governador civil de Braga um combate de extraordinário vigor, com uma compreensão e receptividade a estes problemas, dignas dos maiores encómios.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com este «peso» nacional, nos sectores que acabei de referir, Barcelos apresenta uma ponte caduca, que ameaça ruína, onde se tem verificado elevado índice de acidentes, ponte que é essencial para o escoamento dos produtos do concelho.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Felizmente para o povo trabalhador de Barcelos este problema vai ficar finalmente ultrapassado, graças ao empenhamento decisivo do ex-Ministro do Equipamento Social, arquitecto Rosado Correia, que incluiu as verbas necessárias em plano.
No referente a vias de comunicação é necessário que o traçado natural da auto-estrada Porto-Famalicão-Braga, tenha o seu nó terminal na estrada nacional n.° 103, entre as freguesias de Encourados e Martim, pois, só assim, se justifica a alternativa que representa o porto de Viana do Castelo, ao escoamento dos produtos do supercongestionado porto de Leixões.
Necessitamos, por último, de beneficiação da estrada nacional n.° 204 entre Barcelos e Vila Nova de Famalicão, e do lançamento da central de camionagem de Barcelos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Trouxe a esta Assembleia alguns dos problemas que mais afligem os habitantes de um dos mais importantes concelhos do distrito de Braga. Concelho que dado o seu potencial agrícola e industrial, deve merecer o apoio e carinho dos responsáveis do governo central, pois com a resolução destes assuntos, estamos a resolver os problemas de um Portugal que viu abrirem-se-lhe novas perspectivas com a sua recente entrada na CEE.
Não desiludamos, pois, as esperanças das gentes de Barcelos.

Aplausos do PS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, faltam 6 minutos para o termo dos nossos trabalhos regimentais e temos ainda inscritos, para produzirem intervenções a Sr.ª Deputada Odete Santos c o Sr. Deputado Neiva Correia.
Sugeria que tentássemos fazer um esforço para acabar este período de antes da ordem do dia ainda antes da hora de almoço. Assim, se não houver inconveniente, prolongaremos os nossos trabalhos por 5, 10 minutos. Espero que VV. Exas. o compreendam e aceitem.

Página 3818

3818 I SÉRIE - NÚMERO 102.

O tempo que a Sr.ª Deputada Odete Santos vai agora gastar na sua intervenção foi cedido pelo MDP/CDE (3 minutos) e pela UEDS (2 minutos). Deste modo, para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Terminados que estão os 10 anos da Década da Mulher, decretada pela ONU, vai realizar-se dentro de poucos dias em Nairobi a conferência da Organização das Nações Unidas para fazer o balanço da Década da Mulher.
As organizações não governamentais que funcionam junto da Comissão da Condição Feminina tiveram ocasião, no sábado passado, em seminário, de apontarem os traços positivos que nos vêm praticamente todos do 25 de Abril e o balanço negativo que resultou, principalmente a partir de meados desta década, da política dos governos que, sendo uma política contra o desenvolvimento, necessariamente teria de ser uma política contra os direitos das mulheres. Isto se nos lembrarmos que precisamente um dos lemas desta década é desenvolvimento.
Ora, as organizações não governamentais constataram aquilo que consideraram um autêntico escândalo. É que existindo um organismo governamental chamado Comissão da Condição Feminina, verificámos que neste momento não está ainda assegurado a qualquer dos elementos dessa Comissão a ida a essa conferência para apresentarem as conclusões desse seminário, ou seja, aquilo que as mulheres em conjunto reflectiram.
Sabemos que, na verdade e há sinais disso, alguma coisa tem este Governo contra essa Comissão e contra a Comissão de Igualdade para o Trabalho e Emprego. E é só atentarmos nas pessoas que se encontram demissionárias, nomeadamente a presidente da Comissão da Condição Feminina, Dra. Joana de Barros.
De facto, toda a actividade destas duas Comissões se tem orientado na defesa efectiva dos direitos das mulheres e é só lermos o abundante material que a Comissão da Condição Feminina tem produzido sobre temas vários como a publicidade no que toca às mulheres - que é uma autêntica vergonha neste País - , como a violência sobre as mulheres, como o que se passa em relação aos níveis de emprego relativamente às mulheres. É só atentarmos naquilo que a Comissão de Igualdade para o Trabalho e Emprego tem realizado até agora, emitindo alguns pareceres e denunciado algumas das discriminações a nível de emprego e a não aplicação do Decreto-Lei n.° 392/79.
Uma interrogação que se coloca é: porque é que este Governo procede assim? Por que é que não assegura as verbas necessárias para a ida de representantes dessa comissão a Nairobi? Porque é que esta Assembleia não aprovou uma proposta que tinha sido aprovada por unanimidade na Comissão Parlamentar da Condição Feminina no sentido de se reforçar no Orçamento do Estado a verba destinada à Comissão da Condição Feminina governamental?
Creio que estas interrogações são de fácil resposta. Realmente este Governo, estando apenas ele representado em Nairobi, com exclusão dessa comissão, com certeza irá levar na mala as reformas legislativas que radicam no 25 de Abril e então a sua imagem poderá ser positiva.
Na verdade, este Governo não quer que se saiba lá fora que a nível de emprego de mulheres, elas constituem neste momento 62,4 % dos desempregados, o nível de salário médio das mulheres neste País inferior em cerca de 30 % ao salário dos homens.
Este Governo não quer que se saiba que frontalmente violou a directiva da ONU constante do programa.
Década da Mulher que referia que «os governos» viam implementar reformas agrárias para [...] trabalho das mulheres rurais».
No nosso País o que se passa é o que vemos que ficou bem patente na manifestação que 1200 metros da área da Reforma Agrária fizeram em Lisboa ciando o desemprego e a repressão de que foram vítimas.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE e do independente António Gonzalez.

A Oradora: - É por tudo isto que consideramos maior utilidade a ida a Nairobi de elementos da comissão da Condição Feminina, é por toda esta discriminação que juntamos aqui o nosso protesto, isso o protesto do Grupo Parlamentar do Partido Comunista e em especial das mulheres comunistas, do que juntamos, também, o protesto contra toda a política de direita que se tem desenvolvido desde 1976 e que se tem cifrado em ataques aos direitos das mulheres. É isto que não pode ser escamoteado, é isto que a nível internacional se tem de ouvir.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

A Sr.ª Helena Valente Rosa (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Helena Valente Rosa, o PS não tem tempo e o PCP não só já não tem tempo como já lhe foram concedidos alguns minutos mais. Consequentemente há uma impossibilidade material para V. Exa. usar da palavra.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Neiva Correia.

O Sr. Neiva Correia (CDS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Desejava hoje trazer aqui algumas questões relacionadas com a adaptação da nossa vinicultura à CEE.
Queria, desde já, deixar claro que assumo a decisão de adesão à CEE com realismo e pragmatismo no curto prazo, com muito idealismo no longo prazo.
Mas, efectivamente, no curto prazo temos de ser pragmáticos e realistas, sobretudo no que diz respeita à vinicultura que é uma área crítica. A sua adaptação carece de especiais cuidados.
De facto, entre os produtos agrícolas, a vinicultura tem uma situação excepcional, porque lhe corresponde, simultaneamente, um excesso de produção cíclico em Portugal e um excesso de produção crónica na CEE.
Por outro lado, por razões de clima, relevo e solos a vinicultura tem um grande peso na nossa agricultura quer ao nível do País, quer ao nível do distrito de Lisboa, que me compete aqui defender.
Na realidade, a área rural do distrito de Lisboa tem verdadeiras alternativas nas zonas de encosta, mas tem, como disse, por razões de clima, relevo e solo uma clara vocação vinícola.
Esta situação é claramente contemplada pelos regulamentos vitivinícolas da CEE e pelo Tratado de Ade-

Página 3819

5 DE JULHO DE 1985 3819

contemplam os conceitos de zonas de [...] agrícola e de zonas de encosta, sobretudo no [...] a novas plantações e transferências.
Mas é necessário realismo e pragmatismo. É necessário que o Governo e os serviços oficiais tomem as [...] e pratiquem os actos que lhes cabem e que [...]
adequados à correcta adaptação deste sector à [...] para a CEE.
Vejamos, no entanto, o que se passa. Em primeiro lugar quanto a demarcações. Em Espanha, dois terços da sua produção está coberta pelo conceito de «vinhos com denominação de origem», que pelo Tratado de Adesão foram equiparados aos V.Q.P.R.D., ou seja aos vinhos de qualidade produzidos em regiões determinadas.
Em Portugal, necessitamos de ter um entendimento político e realista sobre a questão e não uma posição crítica. Contudo, em reunião realizada, em 27 de Maio em Santarém, com os elementos da comissão nomeada pelo Ministro da Agricultura, para a qual o convite aos deputados proponentes da criação de regiões demarcadas foi feito por ofício chegado à Comissão de Agricultura, na própria segunda-feira em que se realizava, em Santarém, essa reunião, na qual estive presente por ter tido conhecimento através de um dos produtores convidados, dizia eu, os elementos da comissão encarregada de promover a criação de regiões demarcadas mostraram uma atitude muito ambígua, muito restritiva, sobretudo enunciando exigências técnicas imediatas para a criação de novas regiões demarcadas, quando encontram razão ilógica para uma adaptação progressiva nas regiões demarcadas já existentes. Isto levou-me a emitir o meu protesto formal a que se considere que regiões demarcadas, criadas agora, tenham de nascer «qual Minerva» já completamente armada de elmo, escudo e lança, mas que às regiões demarcadas já existentes seja dado um período gradual para se adaptarem às condições técnicas que todos consideramos que devem ser atingidas como meta, mas não como barreira inicial.
A outra questão que implica um grave perigo, se não for corrigida, é a situação da incidência do imposto sobre o valor acrescentado.
O CDS, como é sabido, propôs por um lado, a suspensão da entrada em vigor do referido imposto e, por outro lado, propôs alterações nas listas, nomeadamente que o vinho constasse na lista I, ou seja, nos produtos com taxa zero.
Isso justifica-se, plenamente, porque é um produto agrícola com uma situação extremamente crítica, como disse atrás, de excessos cíclicos de produção em Portugal e excessos crónicos de produção na CEE.
Se o IVA for aplicado ao vinho com a taxa de 8%, como consta neste momento, na lista II serão os agricultores, porque dentro de todo o seu circuito, aqueles que terão de suportar, não por imposição legal, mas Por efeitos da lei da oferta e da procura, a taxa de 8 % e não sobre o seu valor de venda mas sobre o valor que o produto tem quando chega ao consumidor, ou seja, terão de deprimir os seus preços para se poder escoar a mesma quantidade de uma importância equivalente praticamente à imposição do IVA em todos os níveis da comercialização desse produto, da garrafa, da rolha, do rótulo, das despesas de engarrafamento e das margens comerciais.
É isso que a nossa agricultura não pode suportar. A vinicultura portuguesa não pode suportar que sobre ela recaia uma redução dessas por efeito da necessidade de escoar a sua produção, visto que todos os intervenientes comprarão só aquilo que podem vender, mas os produtores têm de vender aquilo que produziram.
Portanto, a sua posição é extremamente rígida e inelástica e serão eles que terão, em última análise, de suportar um abaixamento do preço do seu produto, que corresponde na prática à totalidade do IVA, não sobre o preço à saída da sua adega, mas sobre o preço com todas as transformações até chegar ao consumidor.
Isso representa, na prática, muito mais do que 8% sobre o preço de venda do agricultor. Será qualquer coisa próxima de 20% a 25% desse preço.
É por isso que aqui deixamos mais uma vez a nossa exigência de que esse ponto seja revisto e seja cumprido aquilo que vem sendo prometido mas que os factos até agora desmentiram.

Aplausos do CDS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - V. Exa. pediu a palavra, mas informo-o de que não dispõe de tempo. O seu partido não tem qualquer tempo disponível.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Presidente, tinha realmente conhecimento de que não tinha tempo. Desejava, contudo, ficar inscrito para o próximo período de antes da ordem do dia a fim de pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Neiva Correia.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Fica já para Novembro!
O Orador: - Contudo, poderia adiantar a interpelação, se o Sr. Presidente me permitisse...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não faça isso.

Srs. Deputados, vamos fazer agora o intervalo para almoço e recomeçaremos os nossos trabalhos às 15 horas e 15 minutos.

Está suspensa a sessão.

Eram 13 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem do dia diz respeito à votação de várias propostas da Comissão de Regimento e Mandatos relativos à suspensão de mandato de alguns Srs. Deputados para efeitos de apresentação em juízo.
Todos os pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos foram aprovados por unanimidade em Comissão e todos eles entendem que o mandato dos Srs. Deputados não deve ser suspenso. Ora se VV. Exas. assim o entenderem, poderemos dispensar a leitura dos pareceres, uma vez que todos eles concluem da mesma forma, ou seja, pela não suspensão dos mandatos dos Srs. Deputados.
Como é óbvio, os Srs. Deputados que concordam com estas conclusões votarão «sim» no boletim de

Página 3820

3820 I SÉRIE - NÚMERO 102

voto; quem não concordar votará «não» ou «abstenção». Portanto, o voto é sobre o parecer da Comissão, cuja síntese me permiti fazer.
Um pouco ao contrário do que é hábito, sugiro que procedamos de imediato à votação para depois continuarmos com a ordem de trabalhos, estipulada para hoje, porque me parece extremamente desagradável estar um Sr. Deputado no uso da palavra e outros Srs. Deputados a votarem ao mesmo tempo. Creio que isso não dignifica a Câmara nem a importância dos temas que estão em debate nesta Casa.
Nesse sentido, peço aos Srs. Deputados Jorge Patrício e Armando Vara que sejam escrutinadores e declaro abertas as urnas para proceder à votação, de acordo com o que já indiquei. Como lhe compete, a Mesa irá votar em primeiro lugar.
Deu-se inicio à votação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a urna continuará aberta até às 17 horas e 30 minutos para que os Srs. Deputados que ainda não tenham exercido o seu dever de voto o possam fazer.
Vamos continuar com a discussão das propostas de resolução n.ºs 21/III, 22/III e 23/III e do projecto de lei n.° 502/III, apresentados pelo PCP.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desejaríamos, por brevidade, começar por enumerar alguns pontos que nos parecem salientes no que respeita aos textos em discussão.
Primeiro, que o aviso publicado no Diário do Governo, 1.ª série, de 20 de Junho de 1952, sobre o Acordo de Defesa entre Portugal e os Estados Unidos da América, claramente afirma que este decorre da doutrina e deveres emergentes dos artigos 3.° e 5.° do Tratado do Atlântico Norte. Depois, que a estratégia da NATO evolui de acordo com as alterações detectadas na conjuntura grave, que temos vivido, e que hoje admite a responsabilidade por questões fora da Zona, pelo que os riscos não podem ser avaliados em relação aos factos de 1949, e constantemente mudam em vista, entre outras razões, da evolução técnica. Ainda, que a maior parte dos Estados, que não são agressivos, como ê o nosso caso, estão constragidos por um sistema mundial de poderes, que os obriga a participar em riscos que outros causam.
Já nos aconteceu algumas vezes, como nas invasões francesas aqui citadas na Assembleia, como na última guerra mundial, em que a nossa neutralidade não foi respeitada pêlos próprios aliados em Timor, e a cedência de facilidades nos Açores foi uma construção hábil da neutralidade, chamada colaborante, e só possível pelo consentimento interessado de ambas as partes em conflito. À medida em que a situação estratégica alarga mundialmente, o seu teatro possível de operações, a capacidade de Portugal diminuiu drasticamente, não apenas segundo o critério da relação das forças materiais, mas receio que também da credibilidade e decisão, em vista da cultivada instabilidade governativa, que nesta data nos coloca a discutir tratados fundamentais com o país politicamente adiado.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - A presença de forças aliadas nos territórios dos outros aliados, como acontece nos Açores implica a negociação de um estatuto que tem as suas premissas no Direito Internacional, tal como está previsto no artigo 8.°, n.° 1, da Constituição e trata de actos de poder público que a doutrina encara sem algumas dúvidas. A apreciação do estatuto negocial foi prejudicada nas comissões pelo segredo de Estado em que estava o acordo anterior, e isto levanta uma questão geral e importante, que é a do regime de segredo de Estado, num Estado que, no sistema em que vivemos, constantemente muda de direcção ou está sem ela.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, é da defesa da paz que nos ocupamos, e a debilitação dos nossos recursos estando colocados pela geografia num lugar por onde passam as ameaças e necessidades de defesa que não provocamos, torna mítica a sustentação da possibilidade de [...] orgulhosamente sós a organizar a defesa da integridade e da utilização do que temos. Qualquer política, com tal premissa, não nos conduz a estarmos, sós, conduz-nos a mudar de companhia, e isso não queremos.

Vozes do CDS e de alguns deputados do PS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não teríamos, certamente, de estar hoje a discutir os acordos celebrados pelo Governo com os Estados Unidos da América se correspondesse, a alguma realidade o propósito da 6.ª Comissão da Assembleia Geral da ONU, de estabelecer um «Direito Internacional das Relações Pacíficas», depois de uma organização não ter resistido a incluir na sua volumosa agenda o tema da «coexistência pacífica», que á AKademiia Nauk (1951) e Tunkin (1963) reduzem a estas cinco permissas:

1) Renúncia à guerra como instrumento de solução dos conflitos entre os Estados;
2) Igualdade, compreensão e confiança entre os Estados, mostrando completo respeito interesses recíprocos;
3) Não intervenção na jurisdição interna;
4) Respeito pela soberania e integridade territorial dos países;
5) Desenvolvimento de cooperação económica cultural em pé de igualdade dos Estados.

Acontece que os autores desta proposta para pedir às relações internacionais, também são os autores da doutrina da «soberania limitada» muito claramente exposta por Malik no Conselho de Segurança, em [...] de Agosto de 1968 (Checoslováquia) e severamente condenada pela China no Boletim de Informação» de 31 de Março de 1969, atacando o social-imperialismo revisionista soviético. É esta situação, e não a proclamação de apoio à estratégia indirecta soviética, determina a existência do Tratado de Aliança do Atlântico Norte e do seu braço armado que é a NATO, no qual Portugal está obrigado. Enquanto os factos políticos e legislativos forem estes, enquanto o poder político português não for tomado por uma formação política que decida que a ameaça não existe, ou que mesmo admitindo que existe, considere conveniente

Página 3821

5 DE JULHO DE 1985 3821

[...] de campo e estatuto, nenhuma proclamação chamada pacifista tem base constitucional para colocar entre parêntesis as obrigações internacionais assumidas, nas quais decorrem os acordos em discussão e os anteriores.

Aplausos do CDS e de alguns deputados do PS e do PSD.

Não é aceitável construir uma crítica que toda decorre da doutrina da soberania limitada, dando-a como o facto vigente num espaço ocidental que a recusa, do nome do conceito de uma soberania patrioticamente limitada que não é admitida no campo soviético, de onde vem a ameaça que o Tratado do Atlântico procura conter.

Vozes do CDS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não somos satélites, esta categoria de independência internacional não vigora no Ocidente em que encontramos, não apenas pela geografia, mas sobretudo pela concepção de vida ainda vigente.
Existem porém, duas questões que nos parecem importantes no que respeita aos acordos firmados em execução das obrigações decorrentes do Tratado do Atlântico e não apenas em relação a esse Tratado.
A primeira, que comecei por enunciar, diz respeito ao segredo de Estado que a nossa vasta Constituição não parece ajudar a definir e até parece ter contrariado quando no n.° 2 do artigo 48.° declara que «todos os cidadãos têm o direito de ser esclarecidos objectivamente sobre actos do Estado e demais entidades públicas e de ser informados pelo Governo e outras autoridades acerca da gestão dos assuntos públicos».
É contra a natureza das coisas que não haja um domínio de segredo de Estado, é em relação com essa necessidade que os Estados multiplicam, no domínio da defesa e até da ciência e da economia, os serviços de informações e segurança.
Acontece simplesmente que, como a Constituição não diz quando e como é que o Governo deve cumprir, por iniciativa própria, o dever de informar, nem existem parâmetros legais que permitam responsavelmente obrigá-lo a terminar com o segredo, não é a forma que devem revestir os acordos que permitirá clarificar este domínio, e as questões da qualificação da matéria, de que depende a divisão das competências entre os órgãos de soberania, sempre causará dificuldades de monta. O cumprimento do Estatuto da Oposição poderia remediar esta situação difícil, mas o costume não mostra que sirva para grande coisa. Ainda não há muitos dias aqui vimos que algumas disposições constitucionais, referentes a Macau, se baseiam em acordos que a Assembleia Constituinte e as seguintes, não conheceram e até agora continuamos a desconhecer.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Estamos remetidos para a circunstância de apenas poder pedir responsabilidades ao Governo quando este tiver considerado que o segredo de Estado se impunha, logo que eventualmente tenhamos conhecimento da matéria, ou porque o Governo resolveu a desqualificação, ou porque a indiscrição colmatou as lacunas legais.
Em suma, não é possível governar sem um domínio que fica temporalmente no segredo do Estado. Isto é particularmente exacto e continuado nos domínios da defesa, e por isso não podemos aceitar orientações ou de projectos de leis que parecem afloramentos de um sistema de governo de Assembleia: aquilo de que necessitamos é de ter uma maneira legal, que julgo que não possuímos, de impedir que o segredo transborde para domínios abusivos, ou que dure para além da conveniência pública.
Tornados públicos, como agora, os acordos e os seus antecedentes, que faltaram ao conhecimento da Comissão de Defesa Nacional, podem fazer-se funcionar os mecanismos da responsabilidade política do Governo perante a Assembleia, mas não se pode apagar o passado mesmo reprovado por algumas formações políticas, nem isso serve para afastar a obrigação de aprovar ou reprovar os acordos na forma proposta.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - E quanto a esta é que uma segunda questão se levanta, a qual tem de ser encarada com realismo, sem dispensar a amargura. Não me refiro ao Estatuto das Forças Armadas Americanas, nem a questões de jurisdição, que outros abordarão, c que encontram matrizes no Direito Internacional, designadamente na Convenção NATO-SOFA, de 19 de Junho de 1951, embora haja uma crise doutrinal no que respeita aos actos de gestão, que não podem ter o tratamento dos actos públicos clássicos, quando o Estado aparece a exercer actividades secularmente privadas, na área internacional, como acontece com os Soviéticos.
Refiro-me apenas às funções militares a cargo das forças americanas nos Açores, dentro dos planos estratégicos da NATO, porque a isso exclusivamente se referem as chamadas facilidades, e que alguns intervenientes na discussão de hoje desejariam a cargo exclusivo das forças portuguesas.
Infelizmente trata-se aqui menos do conceito de soberania, que é respeitado pelo consentimento, do que do poder efectivo do Estado. E nesta matéria mais temos de nos fiar do Estado-Maior, responsável pela defesa contra a agressão externa, do que das anotações inspiradas por um neutralismo que repudiamos, ou por uma sonhada neutralidade que os factos não consentem a nenhum Estado que esteja no caminho da agressão presumida.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - A avaliação das capacidades para assumir responsabilidades directas pertence, no domínio dos factos, e, em primeiro lugar, às Forças Armadas, que raciocinam dentro do quadro das nossas obrigações internacionais e equacionam aquilo que se lhes exige com os meios que lhe são colocados à disposição.
Estes acordos têm, segundo nos informam da parte do Governo, o parecer favorável dessas instâncias. Não devemos admitir que se pense que os militares portugueses preferem que outros assumam encargos que estariam ao seu alcance. Também não é da sua função encaminharmo-nos para riscos dispensáveis. O certo é que, no domínio do poder efectivo, resvalamos para Estado exíguo, como uma vez mais se documenta, sendo inteiramente despegado da realidade proclamar que temos o dever e o poder de uma auto-suficiência defensiva.

Página 3822

3822 I SÉRIE - NÚMERO 102

Trata-se de salvaguardar a soberania com a exiguidade dos meios que ainda temos, que foram substancialmente degradados, e continuam a ser degradados por muitos que se proclamam inquietos com o Estatuto internacional do País.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Sem verdadeiramente ter Governo nesta data, quando uma Câmara em vésperas de ser dissolvida é chamada a aprovar tratados fundamentais para o futuro do País, é no parecer do Estado-Maior que fundamentalmente apoiamos a nossa concordância, porque tal é a situação do regime, à espera de que finalmente consigamos ter planos com um Governo que responda por eles.

Aplausos do CDS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Adriano Moreira, inscreveram-se os Srs. Deputados João Amaral e José Magalhães.
Tem. pois, a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, antes de formular os pedidos de esclarecimento, gostaria de ser informado sobre qual o tempo que o meu grupo parlamentar dispõe para usar da palavra durante este debate.

O Sr. Presidente: - Certamente, Sr. Deputado. Aliás, vamos aproveitar esta ocasião para informar todos os grupos e agrupamentos parlamentares sobre qual o tempo de que cada um deles dispõe.
Tem a palavra o Sr. Secretário para informar a Câmara acerca desta questão.

O Sr. Secretário (Armando de Oliveira): - O Governo dispõe de 29 minutos: o PS de 49 minutos; o PSD de 42 minutos; o PCP de 13 minutos; o CDS de 35 minutos: o MDP/CDE de 20 minutos; a UEDS de 20 minutos e a ASDI de 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral, para formular pedidos de esclarecimento.

O Sr. Soão Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Visto dispormos de escasso tempo para usar da palavra, vou ser muito breve.
Sr. Deputado Adriano Moreira, sublinho a importância que atribuiu à questão do segredo como uma forma de não ser possível uma discussão sobre esta matéria.
A questão da rejeição do neutralismo pode, na concepção do Sr. Deputado, implicar a rejeição de uma autonomia? A questão está aqui colocada francamente: autonomia e neutraiismo, neutralismo e autonomia são conceitos incompatíveis. O problema não está em afirmar que se rejeita o neutralismo mas, sim, em defender a autonomia e uma capacidade autónoma.
Sr. Deputado Adriano Moreira, não será uma posição maniqueista dizer-se: ou sós ou mudar de companhia? Ou será que, também, entra aqui em questão um outro factor que é o de que não valerá mais estarmos sós do que mal acompanhados?
No mundo de hoje, e pese alguma dificuldade ou algum parti pris que se possa ter em relação a esta matéria, não será possível estar-se suficientemente acompanhado não estando empenhado e comprometido com conceitos estratégicos que são apriorísticos e que nada têm a ver com as necessidades do País?.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Adriano Moreira, V. Exa. deseja responder já ou no fim?

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Adriano Moreira, ouvi V. Exa. defender uma certa política do cumprimento das obrigações internacionais com Portugal, mas não o ouvi defender a via seguida pelo Governo para, supostamente, realizar esse fim - creio que ainda bem.
Em todo o caso, gostava de obter respostas concretas em relação a estas perguntas: considera o Sr. Deputado que a extensão de facilidades e a fixação do [...] dessas facilidades poderão ser feitas por acto do Governo, ou essa função caberá exclusivamente à Assembleia da República?
O processo de revisão dessas facilidades poderá ser fixado por troca de notas ou deverá sê-lo pela Assembleia da República e apenas por ela?
Quais os instrumentos jurídicos bilaterais em vigor neste momento em matéria de defesa entre Portugal e os Estados Unidos? Considera em vigor o acordo técnico de 1957? No caso de o Sr. Deputado entender que está em vigor, ele está a ser cumprido? Se entender que nada disto se regista, a que título é que neste momento se encontram forças estrangeiras norte-americanas em território nacional?
O que é que o Sr. Deputado pensa da tomada de posição da Assembleia Regional dos Açores sobre o chamado «acordo laboral das Lajes»? Qual a posição do CDS quanto a esta matéria?
Como é que o CDS - seguida que foi pelo Governo esta via, que é inconstitucional - pensa que é possível sair-se desta situação?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou tentar responder às questões que considero que são do meu foro. Digo isto porque o Sr. Deputado José Magalhães colocou-me algumas questões que deveriam ser dirigidas ao Governo, na medida em que é este que pode e deve informar muitas das questões que suscitou. Admito a dificuldade que há em fazer perguntas à instância competente mas a verdade é que não a posso substituir. É, pois, por essa razão que não vou responder a todas as questões que o Sr. Deputado colocou.
Esta é uma assembleia política e não propriamente um foro de discussão de Direito Internacional. Porém o Sr. Deputado sabe perfeitamente que é extremamente discutível a divisão de matérias em relação à forma [...] ^ que as obrigações se devem revestir nas relações entre os Estados e que essas dúvidas são resolvidas pela atitude concreta que cada Estado toma. E quando o Estado assume que por troca de notas se pode obrigar

Página 3823

5 DE JULHO DE 1985 3823

[...] interpretou o Direito Internacional nesse sentido; quando o Estado assume que apenas por um tratado formal solene se pode obrigar, ele interpretou o tratado nesse sentido.
A experiência portuguesa revela que nesta matéria temos assumido obrigações por troca de notas, por acordos entre os executivos e por avisos publicados no Diário do Governo - creio que no Diário da República ainda não vi nenhum. Por consequência, é na nossa experiência governativa que o Sr. Deputado pode encontrar resposta para essas questões e, neste domínio concreto, a experiência do Estado é que assume as obrigações sem intervenção da Assembleia da República. Sendo a resposta que decorre da prática do Estado, muitas das questões que o Sr. Deputado levantou decorrem desta resposta e, por consequência, não vale a pena fazer perder tempo nem à Câmara nem a V. Exa. com mais comentários sobre esse ponto.
Não tenho dúvidas em, rapidamente, dizer aquilo que penso, sobretudo em relação ao problema laboral, que creio ser o mais importante dos que o Sr. Deputado levantou no que respeita à posição que foi tomada na Assembleia Regional dos Açores. Acontece aqui, também que o Direito Internacional tem regras que dizem respeito ao estatuto das forças de um país que estacionou noutro e ao serviço que os nacionais desse país ou estrangeiros que venham a colaborar com essas forças devem utilizar.
Para não presumir de delongas fundamentações e tentando resumir de uma maneira breve o que me parece decorrer desse Direito Internacional, devo dizer que o estatuto dos que trabalham para forças estrangeiras estacionadas num país que não tenha um estatuto de dependência internacional reconhecido por tratados que, também, existem, mas não na nossa zona, é como se se, tratasse de uma emigração - talvez de uma maneira sintética isto exprima o que penso que é a situação do Direito Internacional nesse domínio.
É uma espécie de emigração, porque se trata de uma Organização que está a exercer uma função pública e resulta da maior ou menor capacidade de negociação dos governos, da sua maior ou menor habilidade e capacidade de pressuasão, que esse estatuto, que decorre de princípios gerais do Direito Internacional, possa ser limitado por obrigações que remetam para a jurisdição interna, para as leis internas, para as garantias internas.
Creio que foi isso que o Governo fez neste acordo: limitou o regime decorrente do Direito Internacional com melhorias de situação dos trabalhadores portugueses e houve na Assembleia Regional dos Açores quem reconhecesse isso.
Embora na Assembleia Regional dos Açores o CDS tenha apoiado as reivindicações que não encontraram satisfação nas cláusulas que foram aprovadas, não encontrou aí motivo suficiente para reprovar o acordo na sua globalidade. Por isso, tal como declarei, o CDS vai votar a favor.
Quanto ao Sr. Deputado João Amaral, devo dizer que este problema do segredo de Estado não é nenhuma novidade e eu próprio tive ocasião de o levantar na Comissão de Defesa Nacional.
Creio que V. Exa. concordará comigo no sentido de que juridicamente estamos numa situação pouco clara - pelo menos, pareceu-me poder deduzir isso dos comentários que V. Exa. produziu em relação a esta matéria - e até admito que existam obrigações que o povo português não conheça. Não creio nisso, mas até o admito! E por que é que tenho de admitir isso com coerência? Porque continuo a não saber que obrigações temos em relação a Macau.
Se há um exemplo insofismável que me revela uma situação de Estado em que tenho disposições constitucionais dotadas pela Constituinte sem saber quais eram as obrigações em relação às quais estava a definir um regime constitucional, quando alguém suspeita que talvez haja obrigações que não são conhecidas, tenho de admitir que elas existam.
No entanto, pessoalmente, estou convencido de que não existem e que este Governo não tem obrigações para além das que tornou públicas e da que traz aqui à Assembleia. Este é, pois, o meu convencimento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Salvo o devido respeito, devo dizer que a questão do neutralismo, da autonomia e da respectiva compatibilidade, está mal colocada, porque o Sr. Deputado está a misturar conceitos e definições de estatutos internacionais que, de maneira alguma, são aproximáveis.
Os países que professam o neutralismo têm um claro comportamento de dupla medida na vida internacional - porque isto diz respeito ao comportamento internacional e não à doutrina social - que é sempre mais favorável para o bloco soviético do que o é para o bloco ocidental. Isto é um facto que tem várias explicações e é nessa medida que a conduta neutralista tem importância para as obrigações de um país que está situado na área ocidental com os constrangimentos sistemáticos a que me referi.
Por consequência, quando refiro a sustenção do neutralismo, que por vezes me parece encontrar nas intervenções do Sr. Deputado João Amaral, ou de uma impossível neutralidade no mundo contemporâneo, julgo - e faço esta observação com toda a objectividade, a mesma que tenho reconhecido a V. Exa. nas discussões na Comissão de Defesa Nacional - que esta defesa auxilia objectivamente a estratégia indirecta do bloco soviético e enfraquece a segurança ocidental. Faço com isto um julgamento de facto e não um julgamento moral.
Como referi na minha intervenção, a defesa depende não apenas da definição das ameaças presumidas, mas da capacidade para as enfrentar. Julgo, pois - e mais de uma vez tenho insistido neste ponto na Câmara - que o Estado Português, ao continuar com esta verdadeira anarquia política em que vivemos, em que não há governo que aguente uma legislatura, em que o regime democrático não consegue produzir a coincidência entre um plano a médio prazo e a responsabilidade pela execução do Plano, em que um governo acaba de ser nomeado e logo se demonstra que é mau, para a seguir vir outro que se considera pior, está a conduzir o País para a situação de estado exíguo. Pela dignidade própria, poderemos salvar o respeito da soberania pelo consentimento dos outros, porque o consentimento salva a nossa dignidade, mas o que não podemos é ter meios próprios para instituir, reproduzir e auto-sustentar o tal aparelho de defesa autónomo, independentemente, talvez orgulhosamente só, que parece decorrer das palavras do Sr. Deputado.

Aplausos do CDS.

Página 3824

3824 I SÉRIE - NÚMERO 102

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Angelo Correia.

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Duas notas prévias à abordagem do problema que hoje nos traz à Assembleia.
A primeira é a relação Governo-Assembleia. Estão presentes alguns instrumentos fundamentais do Estado Português que atingem a soberania ao mais alto nível: a política externa e a política de defesa nacional.
Subscritos, em termos de resolução do Conselho de Ministros, o Primeiro-Ministro, o Vice-Primeiro-Ministro e vários membros do Governo com a dignidade e a hierarquia constitucionais de ministros, no momento em que a Assembleia da República, por propositura do próprio Governo, aborda esta questão, o Governo faz-se representar por dois secretários de Estado, um dos quais, naturalmente, o da Cooperação, que tem mais a ver com assuntos de relação com outros Estados e não propriamente com os Estados Unidos da América e com a Aliança Atlântica.

Uma Voz do PS: - Isso foi o que disse o PCP!

O Orador: - Não está em causa o mérito, a competência e o respeito que nos devem os Srs. Secretários de Estado, mas, sim, o problema da relação política democrática entre Governo e Assembleia da República; está em causa a questão de saber qual a natureza de relação de poder, qual a responsabilidade política. Esta é a primeira nota.
Daqui decorre um segundo ponto prévio que se articula com o primeiro. O Governo da República apresentou a esta Assembleia - julgo que há cerca de l ano - duas propostas de autorização legislativa que consubstanciavam aquilo que o Governo pensava ser o domínio específico, essencial e exclusivo do poder parlamentar.
Eram matérias que, nos acordos em questão, referenciavam situações de natureza fiscal e de direitos, liberdades e garantias. Vários acontecimentos levaram a que o Governo retirasse as autorizações legislativas relativas a essas duas áreas.
Mas, simultaneamente, o Governo, por acordo de troca de notas, isto é, por um acordo meramente de natureza de relação inter-administração americana e Governo Português, dá uma extensão temporal aos acordos estabelecidos em 1957 e revistos em 1984.
Isto é, o Governo, em 1984, dizia e concebia que a Assembleia da República era o local essencial para se poder discutir e aprovar só algumas - diria um décimo daquilo que respeita a este acordo -, reservando para si, assumindo ele próprio como potência capaz, as outras áreas, mormente a extensão das facilidades no tempo, que passam a ser do domínio do Governo. Era uma propositura lógica e coerente. Alguns podê-la-iam discutir, mas era lógica e coerente.
A partir do momento em que o Governo coloca todo o acordo, todos os anexos, na Assembleia da República, o Governo não tem, com essa medida, um acto de benignidade ou condescendência política para com a Assembleia; o que o Governo diz é que, afinal, não é apenas da exclusiva competência do Parlamento o problema de natureza fiscal e o dos direitos, liberdades e garantias, mas, pelo contrário, é da competência do Parlamento todo o acordo técnico.
Ora, se assim é, como é que, politicamente é possível considerar que algumas minudências técnica esta Assembleia e o aspecto essencial, que resulta mesmo acordo, que é a extensão temporal das facilidades, é eximido ao próprio Parlamento?
A atitude política que o Governo tomou na transformação de duas autorizações legislativas, sem dar-lhe de domínios específicos do Parlamento, trazendo o acordo técnico ao mesmo Parlamento, introduz a circunstância política nova, que é a do reconhecimento de uma capacidade e de uma necessidade do Parlamento num domínio, eximindo-lhe, todavia, o aspecto essencial do mesmo acordo, que é o problema do prorrogamento no tempo das facilidades de utilização.
Há, pois, aqui um problema político fundamental, que já resultou de intervenções anteriores - Sr. Deputado Adriano Moreira colocou-o lateralmente de uma maneira elegante, mas não deixou também de o colocar - que careceria de um esclarecimento político, que só os próprios subscritores da proposta, [...] caso os ministros em questão, o deveriam prestar. É a lógica da presença, hoje e aqui, dos membros Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vamos abordar apenas a questão dos acordos.
Só é possível fazer a análise do problema destes acordos se tivermos em conta um enquadramento político de três âmbitos: primeiro, aquilo que resulta do nosso papel e da nossa opinião sobre a participação de Portugal na NATO; segundo, a importância primordial específica da Região Autónoma dos Açores; terceiro, na abordagem daquilo que foi discutido nesta Assembleia e já aprovado, que são as bases do Conceito Estratégico de Defesa Nacional.
Primeira questão: Portugal deve felicitar-se pela existência da Aliança Atlântica e do Pacto de Varsóvia, em que a existência destes dois blocos político-militar trouxe à Europa, desde 1945, uma paz real: uma pode dizer-se, sedimentada num conceito de ameaças e de dissuasão acrescidas, mas a verdade é que a Europa teve paz durante 40 anos..., e pode tê-la por mais tempo.
Isto por uma razão essencial: é que, no âmbito de relação bilateral entre dois Estados, não são possíveis, no âmbito europeu, conflitos bilaterais. Conflitos que envolvam a ameaça do instrumento militar de um Estado não são possíveis, porque, automaticamente, se passe no limiar de intervenção acrescida, que é exercida através da solidariedade global, que é acrescida a esses Estados. Donde a passagem da bilateralidade à multilateralidade, por efeito da existência do Pacto de Varsóvia e da NATO são dissuasores credíveis que deram paz à Europa. Portugal felicita-se, pois, por estar na NATO, como naturalmente outros países se felicitarão por estarem em pactos que trouxeram paz à Europa!,
Mas ser membro da NATO implica consequências políticas. Portugal, por isso, adere globalmente a qualquer reserva ao acordo da própria NATO.
Isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, põe a questão da importância dos Açores, que, sendo grande [...] 1945, hoje em dia é essencial. Isto por uma razão única de natureza militar: no caso de desencadeamento de hostilidade no Centro ou no Norte da Europa a Aliança Atlântica dispõe de meios convencionais suficientes para assegurar, entre a primeira semana e metade da segunda semana de agressão, forças defensivas suficientes que garantam uma resposta [...] avançada.

Página 3825

5 DE JULHO DE 1985 3825

A partir de meados da segunda semana de hostilidades, e no caso de não serem desencadeadas utilizações de armas nucleares ou químicas em elevado grau intensidade, a Europa carece, sobretudo na zona central, de reforços que vêm, primordialmente, dos Estados Unidos da América. Entre a segunda e a quarta semanas de desencadeamento de conflitos, de hostilidade abertas sobretudo no Centro da Europa, põe-se a questão da necessidade de meios rápidos de transporte entre os Estados Unidos e a Europa.
É por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que os Açores são importantes. Os Açores funcionam como um meio de fiscalização e de prevenção de qualquer dá luta anti-submarina, que é necessariamente realizável para que a Europa possa responder a uma ofensiva eventual que lhe seja desencadeada pelo Pacto de
Varsóvia.
A terceira questão tem a ver com o Conceito Estratégico de Defesa Nacional, discutido nesta Assembleia e aprovado pelo Governo e pelo Conselho Superior de Defesa Nacional.
Aí prevêem-se duas circunstâncias que, liminarmente, apoiamos: primeiro, Portugal deve ter meios de autonomia suficientes para responder, num primeiro momento, a uma eventual agressão; segundo, se os meios portugueses não forem suficientes para colmatar a resposta Portugal pode, ao abrigo de alianças defensivas político-militares onde estão inseridas, solicitar o apoio, que é automático, ao abrigo do artigo 5.° do Tratado da NATO, no caso de essas hostilidades se verificarem.
Como tal, o presente acordo entre o Governo Português e o Governo dos Estados Unidos da América corresponde ao desiderato mínimo que está prescrito d'sse mesmo Conceito Estratégico de Defesa Nacional.
O Partido Comunista atacou o acordo em várias linhas. Tentarei, resumidamente, dar a minha opinião sobre algumas críticas que o PCP fez e que, do meu ponto de vista, são infundadas. Vamos às mais importantes, visto que o tempo não permite ir a todas. Vamos àquelas que considero mais importantes, reservando para outro companheiro de bancada alguns pormenores, algumas especificações e, até mesmo, alguma intervenção mais marcada em relação a domínios mais específicos que respeitem à própria região autónoma.
A primeira crítica que o Partido Comunista faz prende-se com aquilo que é considerado «Portugal éster envolvido em planos estratégicos contrários ao interesse nacional» e que, ao fim e ao cabo, euferísticamente, o próprio acordo técnico com os Estados Unidos da América significa uma diminuição da opacidade portuguesa e uma subordinação portuguesa
Este argumento não parece pertinente porque, Srs. Deputados do Partido Comunista, o que se passa no Centro, no Norte ou no Flanco Sul da Europa respeita aos países que têm fronteira com a eventual hostilidade como respeitam a Portugal. Isso faz da lógica de um tratado, faz parte da lógica da de global, política e militar, à qual estamos vinculados. Se para nós é importante o que se passa na Noruega ou na Alemanha, para esses países é tão importante o que se passa nos Açores.
Donde a nossa lógica ser global e não haver um interesse específico americano nisto; há o interesse global português, também americano, naturalmente!, mas, acima de tudo, há o interesse português.
Portugal não está envolvido em planos alheios; Portugal participa em planos que aprovou e consubstância e nos quais envolvida também uma componente militar e, sobretudo, uma componente política.
E, se o acordo de 1984 prevê cláusulas novas - no meu ponto de vista, bem mais explícitas do que o acordo de 1957 -, chamo a sua atenção pata três cláusulas fundamentais: o acordo de 1957 previa, por exemplo, que apenas era apensa a Portugal, à responsabilidade portuguesa, a defesa imediata em termos de meios terrestres e aéreos da Região Autónoma dos Açores. Como sabe, em termos militares, há a chamada «defesa imediata e a defesa à distância», o que significa que, no acordo de 1984, por se retirar a defesa imediata, apenas da responsabilidade portuguesa, houve uma amplitude da missão portuguesa para além da própria defesa imediata.
Enquanto no acordo de 1957 havia, claramente, uma diminuição da capacidade operativa de intervenção e de responsabilidade portuguesa, neste acordo de 1984 não há.
Enquanto no acordo de 1957 estava previsto, por exemplo, que apenas competia a Portugal, nesse âmbito, uma intervenção em Maios terrestres e aéreos, estando cometida aos Estados Unidos da América a intervenção em meios navais, o acordo de 1984 retira aos Estados Unidos a intervenção em meios navais; circunscreve apenas aos meios aéreos inclusive a aviação naval, mas não a meios operativos de superfície ou submarinos navais.
A terceira questão que interessa precisar tem a ver com a noção de soberania que, no acordo de 1957, era quase limitada. Penso que, no acordo de 1984, a questão está colocada em termos mais próprios, mais «secos» mas mais precisos.
Penso que há vantagens nisso, assim como há vantagens na própria classificação que decorre, aliás, do artigo 1.° do acordo, sabe qual o grau de intervenção das Forças dos Estados Unidos.
Srs. Deputados, enquanto no acordo de 1957 se declarava, explicitamente, que a condução de operações de guerra era permitida às Forças dos Estados Unidos em território da Região Autónoma dos Açores, no acordo de 1984 foi completamente eliminada essa perspectiva, recolocando-se outra mais de acordo com a nossa própria postura do domínio da relação internacional. É que apenas se permite que o território da Região Autónoma dos Açores, o caso concreto das Lajes, possa ser utilizado para a condição de condução de operações e apenas no desencadeamento de hostilidades ao abrigo do acordo da NATO, ou seja, ao abrigo do artigo 5.° do Tratado. Isso reduz a margem ou de ambiguidade ou de excessiva operacionalidade que, eventualmente, podia estar implícita no acordo de 1957.
Quer parecer-me por isso, Srs. Deputados, que o acordo de 1984 salvaguarda mais clara e objectivamente o comando português, a autonomia portuguesa, a soberania portuguesa.
Dirão os Srs. Deputados: «Mas mesmo assim as Forças Armadas americanas podem exercer, em termos de treino para a acção ou condução de operações, no caso de se desencadearem hostilidades - artigo 1.°, n.° 1 -, por exemplo, o patrulhamento marítimo». Os Srs. Deputados têm razão em qualificar essa situação como sendo uma situação relativamente desvantajosa.

Página 3826

3826 I SERIE — NUMERO 102

Mas vejamos qual é a alternativa: a alternativa é a de Portugal ter, pelo menos, 6 aviões de vigilância aérea. E é curioso que eu ontem tenha ouvido aqui uma crítica pela aquisição pelas Forças Armadas portuguesas dos chamados P3 Orion que, afinal, são os meios que a própria Força Aérea vai utilizar para, eventualmente, ela própria poder desempenhar essa missão, sem recurso a outrem!

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Srs. Deputados do Partido Comunista, a alternativa para que essas missões, mesmo em termos de paz e meramente no campo de treino, fossem possibilitadas exclusivamente a Portugal implicariam, nos meus cálculos e rapidamente, face ao que hoje se gasta, uma decuplicação imediata do esforço financeiro de equipamento das Forças Armadas portuguesas.
Se esta Assembleia, se o País, aceitar, politicamente, uma decuplicação dos valores de equipamento nas Forças Armadas portuguesas para os anos seguintes, naturalmente que seremos favoráveis a uma perspectiva destas. Só que perguntamo-nos a nós próprios se a opinião pública aceita, se o País aceita, se nessa altura a crítica não «choverá» sobre todos nós.
Por isso a alternativa é a existência, em tempo de paz e no sentido de manobra, de uma adequação entre meios que, ao abrigo do Tratado do Atlântico Norte, podem ser uma missão favorável a Portugal. Portanto, a crítica do Partido Comunista não me parece sólida e justa.
O segundo tipo de críticas que o Partido Comunista faz decorre das obrigações do Governo, ou seja, da Administração e do Senado americanos...

O Sr. João Amaral (PCP): — Só do Governo!

O Orador: — ... relativamente a Portugal face a estes problemas.
Srs. Deputados, penso que aí a questão é relativamente importante mas que tem dois argumentos de peso. Li com toda a atenção o acordo que, há 2 anos, os Estados Unidos fizeram com a Turquia e com a Espanha e, o ano passado, com a Grécia e, comparando as cláusulas do acordo português, cheguei à conclusão de que o commitment americano em relação a Portugal é mais sólido e determinado do que o commitment que o Governo dos Estados Unidos da América, a Administração Americana, tomou com esses outros três países. Todavia, isso decorre de duas circunstâncias, sendo a primeira o mecanismo constitucional americano.
Como sabe, todos os anos, através dos chamados «créditos FMS» da chamada Comissão de Apropriação de Fundos, que precisam de ir à Comissão Senatorial e à Comissão da Casa dos Representantes, obriga, em cada ano fiscal americano, a que haja a necessidade de o Senado e a Casa dos Representantes terem uma aprovação específica do montante global e das áreas das subcategorias. A Administração Americana comprometeu-se, perante o Governo Português, a empenhar os seus esforços junto dessas instâncias legislativas.
Mas suponhamos, Srs. Deputados, que não são obtidas garantias e práticas suficientes e razoáveis por parte do Senado e da Casa dos Representantes americanos. A resposta é simples, e, no meu ponto de vista,
vem no próprio acordo numa cláusula de salvaguarda. Na troca de notas está contida uma cláusula, dizendo que, no caso de dificuldades, os governos podem suspender a relação e declara um período interino que obriga a uma renegociação. Nessa altura, temos a possibilidade de a Administração Portuguesa e o próprio Parlamento português poderem colocar uma cláusula que limite e coloque o stand by nesse mesmo acordo.
Não há aquilo que eu gostaria, ou seja, um commit-ment mais específico, mais claro e mais plurianual da Administração Americana face ao Governo Português, com isso estou de acordo, mas reconheço que da parte dos negociadores portugueses a cláusula de salvaguarda imposta pode limitar substancialmente os eventuais danos que daí decorreriam.
A terceira circunstância que o Partido Comunista ataca é o problema da possibilidade de armazenagem e de trânsito de armas nucleares.
Queria chamar a atenção do Partido Comunista para dois factos: o primeiro, que é simples, é o que decorre do artigo 6.°, bem como o que decorre do artigo 4.°, n.° 6. Ou seja, enquanto no acordo de 1957 eram qualificadas armas e munições indiscriminadamente, no acordo de 1984 não é assim, neste está restrita a armazenagem de armas e munições apenas às armas e munições convencionais. Isso está explicitamente escrito, ou seja, há, portanto, uma melhoria clara e nítida do acordo desde 1957 a 1984, restringindo a eventual área de manuseamento e de stockagem.
Dir-me-á o Partido Comunista: «Mas está em claro a questão do trânsito. As Forças Armadas americanas, através deste acordo, não têm qualquer cláusula de proibição de trânsito de armas nucleares.»
Com o devido respeito, o Partido Comunista escamoteou uma realidade elementar: é que, para além do acordo técnico em questão, está em vigor o Decreto-
-Lei n.° 267/72, que é o decreto-lei fundamental que limita a aplicação e o trânsito, quer de meios de superfície, quer aéreos, quer de munições de natureza nuclear. Ora, não é necessário que esse acordo esteja implícito no acordo técnico, pois faz parte do travejamento jurídico português e, por isso mesmo, limita a capacidade de trânsito de meios nucleares. Dir-me-á que...

O Sr. João Amaral (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): — É como a Constituição em relação ao acordo laboral. Existem a Constituição e as leis laborais, que, como estão em vigor, devem limitar o acordo laboral.

O Orador: — Sr. Deputado João Amaral, percebo que V. Ex.ª tenha de mudar o tipo de discurso nesta fase da minha intervenção... É porque, Sr. Deputado, o que estava em causa na exposição de motivos presentes no projecto de lei do PCP era que poderia existir o trânsito de armas nucleares e eu estou a responder-lhe no campo jurídico e não no campo accionalista político do Governo e, no campo jurídico da lei portuguesa, vigora o Decreto-Lei n.° 267/72 que inibe circunstâncias normais de trânsito de meios, aviões ou armas nucleares. Como tal, o argumento do Partido Comunista não é sólido neste domínio.

Página 3827

5 DE JULHO DE 1985 3827

Um outro ponto de crítica do Partido Comunista é o problema da extensão e o alargamento, que o Partido Comunista qualifica de uma maneira bastante dilatada, das facilidades cedidas por Portugal.
Queria chamar a atenção dos Srs. Deputados do Partido Comunista para a incongruência do vosso raciocínio. Chamo a atenção, por exemplo, que nas Lajes não houve nenhuma área adicional estabelecida; há apenas, dentro da área acordada em 1957, um aumento da capacidade de armazenagem e de utilização de pessoal na área estabelecida. Não houve novo aumento de área.
Os Srs. Deputados reafirmam na vossa exposição de motivos o problema da Praia da Vitória, da Graciosa, do Faial. O Srs. Deputados, com o devido respeito, se olharem para o suplemento n.° 2 do acordo de 1957 e para os n.ºs 6 e 5, desse mesmo acordo, verificarão que todos esses pontos estavam previstos em 1957 e que pelo contrário, em 1984, há até duas reduções sensíveis: a primeira é a utilização de 20 acres para armazenagem de combustível e de munições junto do aeroporto da ilha de S. Miguel, que agora não existem pois são retirados do acordo; e a segunda é a não utilização de um conjunto de meios previstos em 1957 para o porto de Santa Maria, que agora caducam.
Penso que, na prática, tecnicamente não pode falar--se em nenhum aumento de facilidades. Poder-se-á falar em utilização intensiva, em dois casos, de aumento de facilidades dentro da ilha Terceira na parte das facilidades comuns das Lajes; fora disso o argumento do Partido Comunista não é pertinente.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Tem, por acaso, cópia dos originais do acordo de 1957?

O Orador: - Tenho!

Outra crítica que o Partido Comunista levantou, sem razoabilidade, foi o problema do policiamento.
Acerca disto, lembro que no acordo de 1957 estava previsto que o policiamento, no interior e no exterior, fosse feito por patrulhas mistas. Quero lembrar ao Partido Comunista que essa hipótese foi reduzida no acordo de 1984, isto é, só é necessária a existência de patrulhas mistas no interior das facilidades comuns, enquanto no exterior só é possível por requisição e comum acordo das autoridades portuguesas. Aquilo que em 1957 era genericamente aceite, dentro e fora, em 1984 só acontece por solicitação.
Srs. Deputados, não pode nenhum cidadão português ou de outros países ser preso pelas autoridades, pela patrulha mista. Se lerem bem o articulado - e podemos lê-lo - está dito que só dentro das facilidades comuns e só em circunstância de flagrante delito pode ser detido um cidadão exterior aos EUA e entregue às autoridades portuguesas.
Mais: se fora de zona comum, a patrulha mista encontrar algum cidadão português ou de terceiro país, e quiser prendê-lo, tal não será possível se houver desacordo com a autoridade portuguesa que acompanha a autoridade norte-americana, donde esse argumento do Partido Comunista também não ser verdadeiro.
Por último, para não me alongar mais e falar de algumas debilidades da exposição de motivos que o Partido Comunista colocou nesta sede, queria talvez justificar porque é que o Partido Comunista se equivocou em alguns desses domínios. É que talvez o Partido
Comunista não tenha tido acesso - e essa responsabilidade não é dele - ao acordo de 1957, e presumiu talvez algumas realidades que, quando comparando os acordos de 1957 e 1984, se verifica não serem razoáveis.
Não queria imputar responsabilidades a ninguém mas, naturalmente, o Partido Comunista deveria ter alguma precaução e alguma prudência ao expor um motivo, de modo a estar mais fundamentado e mais baseado em dados objectivos e não em meras conjecturas políticas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Perguntar-se-á se o acordo técnico entre os Governos dos EUA e de Portugal é satisfatório. Penso, com toda a sinceridade - e é uma opinião pessoal -, que tem pontos de que não gosto, tem pontos que não são os melhores mas, na sua generalidade, tem duas vantagens muito significativas.
Em primeiro lugar, significa um passo político de 1957 para 1984, que resolve mais claramente três realidades: a soberania portuguesa, o exercício da autoridade das Forças Armadas portuguesas e o comando português. Estas três realidades significam uma melhoria essencial, substancial e merecem a nossa aprovação e louvor.
Em segundo lugar, significa, como segunda realidade política, que Portugal celebra hoje um acordo, em circunstâncias diferentes das de 1957. De facto, em 1957 Portugal não tinha capacidade democrática para o seu exercício, isto é, tínhamos condições materiais mas não tínhamos condições democráticas para o exercício do acordo.
Hoje em dia, este acordo, celebrado à vista, às claras, perante o País, é uma vitória do regime, é uma vitória que dignifica o Parlamento, que dignifica o Governo e as instituições democráticas porque significa um empenho mais claro, mais transparente e, por isso, mais sólido, porque não precisa de ser secreto um acordo celebrado entre Portugal e um país com quem temos relações de amizade e de cooperação, no âmbito de uma aliança político-militar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O futuro dirá das melhorias a introduzir. Dirá da aplicação do tratado, mas uma realidade é evidente: Portugal é hoje uma democracia.
Portugal tem responsabilidades democráticas que se circunscrevem não só ao nosso território e à nossa zona de jurisdição, ao nosso santuário, mas a tudo aquilo que se passa na correlação das relações externas portuguesas.
O que se passa na Europa, o que se passa no Atlântico diz respeito, muito e também, a Portugal. Se Portugal não celebrasse um acordo, não o mantivesse, podendo ser melhorado, nalgumas condições, teríamos claramente uma situação de maior debilidade.
Ë em nome de uma capacidade do Estado Português, minimamente exercida nas condições da democracia, que aprovamos este acordo, reconhecendo-lhe algumas debilidades, reconhecendo até aquilo que ontem o Sr. Deputado João Amaral, sibilinamente, dizia: "pelo facto de celebrar um acordo técnico, Portugal tem hoje mais vulnerabilidade, mais ameaças do que tinha".
É um risco mas é um risco que tem a contrapartida da solidariedade daqueles outros países que connosco acreditam e lutam pela paz e pela democracia.

Aplausos do PSD.

Página 3828

3828 I SERIE — NÚMERO 102

O Sr. Presidente: — Para formularem pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Ângelo Correia, pediram a palavra os Srs. Deputados Acácio Barreiros, João Amaral e José Magalhães.
Tem pois a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): — Sr. Deputado Ângelo Correia, V. Ex.ª explicitou vários aspectos importantes deste acordo e a perspectiva política em que ele se insere.
Tendo em conta a sua qualidade de presidente da Comissão de Defesa, gostaria de lhe colocar algumas questões.
A primeira refere-se às relações entre o Governo e a Assembleia e o Sr. Deputado abordou o assunto de uma maneira que me pareceu algo confusa.
Penso que há, de facto, muita coisa a melhorar nesta matéria, nomeadamente, na negociação de acordos internacionais. Há muita coisa a aprender com a forma de funcionamento de outros parlamentos, até porque, em minha opinião, a falta de informação e de interligação entre o Governo e as comissões especializadas, nesta área, reduz a capacidade negociai do Governo e, inclusivamente, poderá criar suspeições que podem vir a diminuir os efeitos dos acordos.
Penso, pois, que é preciso melhorar as relações entre o Governo e o Parlamento, sobretudo nesta área que, até aqui, tem tido um certo secretismo — que não se justifica —, que tem a sua maior expressão no facto, já referido pelo Sr. Deputado Adriano Moreira, de até ao princípio deste mês ter sido considerado secreto o acordo anterior, mesmo para os membros da Comissão de Defesa Nacional.
Gostava de saber se o Sr. Deputado Ângelo Correia considera ou não que foi largamente prejudicado o debate à volta desta questão por a Comissão de Defesa Nacional se ter visto confrontada, tal como o Parlamento e o País, com a próxima dissolução da Assembleia da República. Portanto, é um custo acrescido, daqueles que pediram a dissolução da Assembleia da República, o facto de estarmos a discutir nas condições em que estamos, com os tempos extremamente limitados.
É que não se pode, por um lado, reclamar a dissolução e, por outro, vir-se queixar dos custos que ela implica.
Ainda na sua qualidade de presidente da Comissão de Defesa Nacional, queria colocar-lhe outra questão.
Trata-se de um aspecto também focado pelo Sr. Deputado Adriano Moreira e que me parece extremamente importante. De acordo com a nossa Lei de Defesa Nacional, com a qual, aliás, estamos em perfeita sintonia, a subordinação das Forças Armadas ao poder político parece-nos extremamente importante: é ou não verdade, o Sr. Deputado Ângelo Correia considera ou não que também é um custo acrescido da situação geral de pré-ruptura da coligação e da consequente dissolução da Assembleia da República, o facto de a implementação deste acordo e as vantagens que poderiam ser retiradas pelas Forças Armadas Portuguesas, sobretudo num aspecto extremamente importante, de que temos de ser nós a cuidar dos nossos próprios problemas e nós próprios a ter de definir — e é uma coisa que se deve discutir pouco e que exige estabilidade política — qual a política de rearmamento das Forças Armadas, que tem de ser discutida, por exemplo, no âmbito deste acordo?
Sr. Deputado Ângelo Correia, como presidente da Comissão de Defesa Nacional, considera ou não que é um custo acrescido a ruptura da coligação e extremamente grave do ponto de vista do reequipamento das Forças Armadas passarmos por um período mais ou menos alargado até à formação de outro governo e talvez vir a acontecer que na formação de outro governo apareça, uma vez mais, um outro ministro das Finanças a fazer o discurso da necessidade de medidas de emergência devido à situação que, entretanto, foi gerada e, uma vez mais, se atrase o reequipamento das Forças Armadas e se prejudiquem as muitas vantagens que, apesar de tudo, era possível retirar deste acordo político?

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Ângelo Correia, deseja responder já ao Sr. Deputado Acácio Barreiros ou só no final?

O Sr. Ângelo Correia (PSD): — Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Nesse caso, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Deputado Ângelo Correia, tenho de ser muito breve, pois tenho muito pouco tempo.
A primeira questão é a da aquisição dos P3. Sobre isto, devo dizer que critico e criticarei que alguém anuncie a aquisição de aviões quando está aprovada a lei-
-quadro das leis de programação militar e quando a aprovação da aquisição de equipamento militar compete à Assembleia da República.
Lamento que o Sr. Deputado Ângelo Correia não tenha sublinhado esse sentido crítico.
Segunda questão: Sr. Deputado, ah, evidentemente, esteve a brincar connosco!...
Agravamentos no conteúdo dos acordos técnicos: está dito, está dito por toda a gente que existem esses agravamentos.
Só lhe quero relembrar, por exemplo, que o Sr. Deputado pela Região Autónoma dos Açores (Reis Leite), do PSD, seu camarada de partido, dizia claramente o seguinte: «A leitura do acordo secreto de 1957 provoca o riso.» Com isto queria dizer que as limitações que lá estavam não existiam e que foram agora consagradas no conteúdo do acordo que aqui está votado. E basta recordar também o que foi escrito e dito pêlos senhores negociadores, nomeadamente, em relação às condições do agravamento.
Finalmente, a terceira questão diz respeito às armas nucleares.
Sr. Deputado, ontem explicitei claramente o que disse o Secretário de Estado da Defesa americano, George Schultz, quando respondeu a perguntas acerca da existência de armas nucleares, e foi o seguinte: «Sobre isso, não digo nem sim nem não porque isso é secreto e não se pode dizer ao inimigo.»
Sr. Deputado Ângelo Correia, obviamente que não pode haver — com toda a franqueza, não vou fazer-lhe a injustiça de o considerar ingénuo — qualquer ilusão acerca dessa matéria. Se aquilo não está ali escrito, é propositadamente, é porque os Americanos não querem que esteja nem a proibição nem a permissão.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): — Muito bem!

Página 3829

5 DE JULHO DE 1985 3829

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Deputado Ângelo Correia, não estamos a fazer um exame em abstracto das relações Portugal/Estados Unidos, estamos a apreciar acordos internacionais, instrumentos jurídicos. Portanto, há regras.
Gostava de lhe perguntar, concretamente, o seguinte: o Governo considera que celebrou validamente por troca de notas um acordo para estender até 1994 facilidades aos EUA? O Governo não tem, de acordo com a nossa Constituição, poderes para isso.
Qual é a sua opinião sobre isto: tem ou não? Ë que isso é fundamental e este debate não tem sentido tal qual...
Segundo aspecto: o Governo considera que lhe cabe, a ele, aprovar as linhas mestras do acordo, por troca de notas, e à Assembleia cabe agarrar nos aspectos técnicos?
Então, o Governo escolhe o fato e a Assembleia cose os botões!?

Risos.

Isto não faz qualquer sentido.
Gostava de lhe perguntar o que pensa sobre isto.
Um outro aspecto é o de que as coisasjêm de ser feitas pela forma própria: o Sr. Deputado Ângelo Correia não se casa no barbeiro nem compra uma casa por telefone! Há regras para isso.
Como é que este contrato com os EUA pode ser celebrado no Direito Constitucional Português? Diga-nos como, criado o berbicacho que está criado pela conduta atrabiliária do Governo, que, como o Sr. Deputado citou, mudou de agulha várias vezes, isto é, começou por nos apresentar umas «autorizaçõesecas» legislativas e depois nos apresentou os chamados acordos técnicos.
Quarto aspecto: o que pensa da actual situação?
O acordo de 1957 expirou, ou não, em 4 de Fevereiro de 1984? Estes acordos não estão em vigor porque estamos aqui a discuti-los.
O que é que está em vigor? E a que título é que aquelas coisas andam lá pêlos Açores? A que título pousam, saem, aterram?
Último aspecto: acha que isto que aqui está é uma mera explicitação do acordo de 1951? Acha que é uma mera explicitação ou revê o acordo de 1951? Então acha que a revisão do acordo de 1951, em todos os seus aspectos, pode ser feita assim, bocadinho aqui, bocadinho ali, toma íá agora um acordo técnico, toma lá depois o acordo laborai? E o todo? E a medição global das vantagens e contrapartidas, a medição das obrigações que assumimos e daquilo qe não somos obrigados a cumprir? Quem é que a faz e como é que a faz? Fazemos aos bochechos? Mandam-nos aqui dois secretários de Estado daqui a um bocadinho — daqui a um bocadinho não, porque estão demitidos?!...
Como é isto, Sr. Deputado Ângelo Correia?
Finalmente, o que é que pensa da posição da Assembleia Regional dos Açores — que omitiu — em relação ao acordo laborai? Acha que aquelas «clausula-zinhas» são compatíveis com a ordem constitucional portuguesa? Não têm de ser renegociadas? Qual é a posição do PSD? Em que é que fica? Diz uma coisa aqui, outra ali e outra acolá?
Era sobre isto que também gostávamos de o ouvir.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram fomulados, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): — Disponho de muito pouco tempo para responder, mas começarei pelo Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Deputado José Magalhães disse — e bem — que não estava em causa a discussão em abstracto das relações EUA/Portugal. Curiosamente, não foi esse o sentido político da intervenção que o seu camarada de partido proferiu ontem nesta Assembleia.
Na parte sequente da sua intervenção, o Sr. Deputado José Magalhães — perdoe-se-me a expressão — quis arrombar uma porta aberta. Eu próprio coloquei essa questão inicialmente: eu próprio tenho algumas dúvidas.

O Sr. José Magalhães (PCP): — E como é que sai delas?

O Orador: — Sr. Deputado, eu não vou sair. A questão é: como é que saímos? Como é que globalmente, o Governo e a Assembleia resolvem este problema? É que a questão que eu coloquei é muito simples: o Governo reconhecia ou não, perante si próprio, uma capacidade de acordar a extensão de facilidades no tempo e reconhecia, para si próprio, a capacidade jurídica de negociar esses elementos de natureza técnica do acordo geral, reservando para a Assembleia da República apenas aquilo que são matérias que ele considerava específicas da Assembleia, ou seja, o regime fiscal e direitos, liberdades e garantias. Era essa, no ano passado, a orientação do Governo enquanto este ano a Assembleia da República está confrontada com uma outra opção. E está confrontada com uma opção que é equívoca.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sem dúvida, e pior do que isso: é inconstitucional!

O Orador: — No início da minha intervenção levantei essa questão, que é a de dar a capacidade à Assembleia da República de resolver e de aprovar, por resolução, todo o acordo, ou seja, não só os aspectos que o Governo inicialmente considerou como específicos da Assembleia, mas também outros que ele se tinha arrogado, a si próprio, no ano passado. Agora, ao devolvê-los, coloca à Assembleia e ao País um problema político...

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sem dúvida!

O Orador: — ... que é o seguinte: se o Governo nos dá e reconhece que a capacidade de discussão de todo o acordo técnico é da Assembleia da República, sobretudo aquilo que ele não considerava como competência específica da Assembleia, no ano passado, é que o Governo se autopropõe e fez estender, por trocas de notas, o prazo de utilização, ou seja, há uma dificuldade política a ultrapassar.
Eu não tenho capacidade jurídica para resolver e responder a esta questão. Perdoar-me-á a imodéstia de dizer que não sei. Penso que o Governo deverá fazê-lo

Página 3830

3830 I SÉRIE — NUMERO 102

nesta sede, com clareza e de uma maneira precisa. Não vale é a pena o Sr. Deputado estar a arrombar uma porta que eu já tinha aberto!

O Sr, José Magalhães (PCP): — Não é uma porta aberta, é um buraco!

O Orador: — Sr. Deputado João Amaral, V. Ex.ª disse que o Sr. Deputado Reis Leite proferiu uma afirmação relativa ao acordo de 1957. Mas, citando apenas essas palavras que reproduziu aqui, nesta Câmara, não se pode, minimamente, extrapolar que ele tenha dito que o «acordo de 1984 é francamente pior e mais extensivo que o de 1957».
Se o deputado Reis Leite o disse, o deputado terá com certeza usado outra expressão que o Sr. Deputado não citou.

O Sr. João Amaral (PCP): — Então, é melhor citar-lha, Sr. Deputado.

O Orador: — Faça o obséquio, pois eu até acredito que ele tenha dito isso.

O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. DeputadoÂngelo Correia, naturalmente serei breve. O Sr. Deputado Reis Leite dizia «aumentam-se os combustíveis, evidentemente que se aumentam as instalações, se permite o acesso a outros aeroportos da região — é um facto — etc.». Portanto, está tudo dito, Sr. Deputado Ângelo Correia.

O Orador: — Bem, o Sr. Deputado Reis Leite disse isso e eu quero dizer-lhe urna coisa muito simples: o Sr. Deputado Reis Leite e o outro Sr. Deputado da Região Autónoma dos Açores acompanharam, com as autoridades portuguesas, todo o processo de negociação. Se eles têm essa opinião técnica em relação ao acordo — eu duvido — e não a aceito, excepto num ponto: é verdade que há mais facilidade de instalação de armazenagem de combustíveis e é verdade que há mais facilidade de instalação de pessoal, mas não há novas facilidades aeroportuárias nem há novas facilidades de postos de telecomunicações. O acordo é claro; podemos compará-lo texto a texto e concluiremos que isso não é verdade. O que citou não é a minha opinião, é a opinião do deputado Reis Leite. Aceito-a mas do ponto de vista técnico, não concordo com essa opinião.
Queria ainda focar a questão que o Sr. Deputado colocou sobre as leis de programação militar em relação aos Orion.
Reconheço — dou a mão à palmatória — que não percebi essa parte da sua intervenção de ontem e concordo com ela, ou seja, desde que seja um contrato plurianual, naturalmente que devem ser cumpridas as leis que a própria Assembleia aprovou e que as próprias autoridades militares reclamaram.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Acácio Barreiros, quero dizer duas coisas muito simples.
A primeira é esta: como sabe, a Assembleia da República recebeu estes diplomas em meados do mês de Maio, Entretanto, meteram-se as férias — quase 15 dias de interrupção — e a própria situação actual prejudica, indiscutivelmente, uma discussão mais clara.
Mas queria lembrar-lhe uma outra coisa: a própria Comissão de Defesa Nacional da Assembleia da República solicitou já por várias vezes e por unanimidade, em Novembro ou Dezembro do ano passado, que todos os elementos sobre a Base das Lajes pudessem ser explicitadas à Assembleia da República. Logo, a própria Comissão de Defesa solicitou em Novembro do ano passado, por várias vezes e por consenso geral, que esses elementos nos fossem presentes.
Sr, Deputado, isso talvez seja um problema da relação Governo-Assembleia. Mas isso entronca na questão política básica, que o Sr. Deputado Adriano Moreira e o Sr. Deputado chamaram à colação, ou seja, o problema da estabilidade política.
E atenção, Srs. Deputados, porque a estabilidade política é essencial e quero chamar a vossa atenção para duas questões: é que só há estabilidade política quando há maiorias claras e simples. E foram VV. Ex.ªs, Partido Socialista, quem, muitas vezes, renegou a possibilidade de revisão da Constituição num ponto, que, quanto a nós, não só melhoraria a qualidade e a função parlamentar como também daria mais possibilidades da existência de governos homogéneos e estáveis. Ora, isso passava pela revisão do método proporcional de eleição, ou seja, pela revisão da Constituição.
Acho bem que hoje o Sr. Deputado recorde a estabilidade. Mas seja consequente, Sr. Deputado Acácio Barreiros, no plano político, com todas as implicações que isso tem no plano de acção política do seu próprio partido.
A minha segunda chamada de atenção é sobre se isto prejudica o problema e o plano de reequipamento das Forças Armadas. Quero dizer-lhe uma coisa muito simples, que é chocante para a democracia portuguesa mas que é verdadeira e que por ser verdadeira é chocante: os governos passam mas as instâncias militares vão fazendo a programação e vão decidindo, às vezes em nome do poder político.
Tenho pena que em Portugal a democracia tenha conduzido a isto. Não o quereria, nem o quero porque penso que é o poder político que deve ser responsável e dar a cara claramente pelo bem e pelo mal que fizer e não pode estar em situação de sub-rogação permanente em questões de fundo. Mas essa é mais uma das questões sobre a qual vale a pena meditarmos para que, ao fim e ao cabo, a questão da estabilidade seja atingida.
Por último, um pequeno pormenor: Sr. Deputado, o fundamento não está na celebração nem no desenvolvimento do acordo das Lajes. O problema está, fundamentalmente, naquilo que o Governo ainda não fez, que é a tradução do conceito estratégico militar que decorre do conceito estratégico de defesa nacional.

O Sr. César Oliveira (UEDS): — Muito bem! Há quanto tempo eu ando a clamar por isso!

O Orador: — E isso é o vazio organizativo que Portugal tem, porque é daí que decorre, em primeiro lugar, o plano das missões e, em segundo lugar, o plano dos sistemas de forças. E isso pode ser feito, independentemente do desenvolvimento.
Estabilidade política, matriz fundamental, todos nós a desejamos: então, sejamos consequentes e vamos rever a Constituição da República.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chamo a vossa atenção para o facto de o prazo para a votação em curso expirar dentro de 10 minutos, pelo que os Srs. Deputados que ainda não votaram devem fazê-lo.

Página 3831

5 DE JULHO DE 1985 3831

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cooperação.

O Sr. Secretário de Estado da Cooperação (Eduardo Âmbar): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O denominado «Acordo entre a República Portuguesa e a República Francesa respeitante à utilização pela República Francesa de certas facilidades na Região Autónoma dos Açores», geralmente conhecido pela forma mais abreviada de «Acordo das Flores», cujos textos o Ministro dos Negócios Estrangeiros assinou, em nome do Estado Português, em 13 de Abril de 1984, em Lisboa, juntamente com o Embaixador de França que subscreveu o documento pela parte francesa, representou o culminar de um laborioso processo de negociações que tinham sido formalmente abertas em 13 de Janeiro desse ano e que constituíam uma das prioridades da poítica do programa do Governo.
O articulado do acordo em causa traduz a preocupação que não deixou de estar sempre presente ao longo dessas negociações no espírito da nossa delegação, integrada por representantes do Ministério dos Negócios Estrangeiros bem como dos Ministérios da Defesa Nacional, das Finanças e do Plano e do Governo da Região Autónoma dos Açores, de, ao assegurar a defesa dos interesses nacionais, em modo particular dos Açores, dar continuidade ao acordo geral celebrado entre os dois países em 24 de Fevereiro de 1977. Tínhamos solicitado oportunamente a renegociação deste acordo perante a óbvia necessidade que existia em se adaptarem as disposições e os mecanismos do acordo à evolução dos condicionalismos económico-financeiros verificada nos últimos anos da vigência do convénio.
Quer isto dizer que o objectivo primordial da nossa parte era o de procurar as fórmulas que melhor adequassem o valor e a natureza das contrapartidas a conceder pela França à especificidade e duração indispensável das facilidades que nos eram pedidas, ou seja, a concessão por um certo período de um determinado número de meios e serviços em algumas ilhas do arquipélago dos Açores destinados a facilitar-lhe a observação e medição das trajectórias de engenhos balísticos franceses sem ogiva nuclear que são lançados no oceano Atlântico a partir de costas ou de águas francesas.
Há já cerca de 20 anos que o nosso país tem vindo a conceder à França as facilidades referidas, precisamente desde Junho de 1965, início da vigência do primeiro acordo entre os dois países sobre a matéria, que foi concluído por um período de 6 anos. Nesse documento não ficaram contudo previstas quaisquer contrapartidas financeiras, mas apenas supostas contrapartidas de apoio à política colonial de que o anterior regime tanto carecia. Após o 25 de Abril, esse acordo revelou-se por isso apenas favorável à França, factor que motivou a sua renegociação e que originou a assinatura do já referido texto de 1977. Este documento, válido por 6 anos e renovável por um segundo igual período de 6 anos, teve já em conta a fixação de contrapartidas financeiras pelas facilidades concedidas, mas que se destinavam apenas ao auxílio da Região Autónoma dos Açores. O montante desse auxílio, estipulado de modo assaz confuso e complexo nos últimos parágrafos do seu artigo 9.° e no seu anexo 4.°, limitava--se à quantia de 144 milhões de escudos e o seu financiamento era realizado por fracções de 12 milhões de
escudos anuais, referidos às condições económicas de l de Julho de 1966, orientando-se de acordo com projectos apresentados em determinados sectores.
As alterações dos condicionalismos económico--financeiros entretanto verificadas desde 1977, a que já tive oportunidade de me referir e que são por todos nós conhecidas, provocaram um desequilíbrio manifesto entre as facilidades concedidas e as obrigações assumidas, factor que impunha que se renegociasse de novo o acordo. Tendo em conta que o texto do acordo de 1977 o permitia, e em cumprimento do programa do Governo que referia expressamente que a revisão do acordo das Flores constituía uma das prioridades da sua política externa, solicitámos as necessárias renegociações que deram origem ao novo texto em causa, devidamente actualizado, e que nos parece sem dúvida mais digno de corresponder aos nossos interesses, e cuja redacção resultou bem mais clara e racional do que a do texto anterior.
Os resultados obtidos reflectem, quanto a nós, a convergência objectiva entre o interesse que para a França reveste a continuação da sua presença nos Açores e o interesse que essa presença igualmente reveste para Portugal, tanto no plano da Região Autónoma como no plano nacional.
Como contrapartida dessas facilidades a França prestará anualmente a Portugal um auxílio financeiro no montante global de 500 000 contos, com referência às condições económicas vigentes em 31 de Dezembro de 1983 e indexadas pelo índice nacional da construção em Portugal, o que representa um acréscimo de cerca de 10 vezes mais em relação ao estipulado no anterior acordo. 300 000 contos são destinados ao desenvolvimento económico da Região Autónoma dos Açores (6 vezes mais do que no anterior acordo). Para além desse auxílio, o acordo prevê a possibilidade das duas partes poderem cooperar em projectos a nível regional nos domínios que forem reconhecidos de interesse comum. Os restantes 200 000 contos são destinados ao financiamento da aquisição de material francês pelas Forças Armadas portuguesas, o que constitui o aspecto inovador e de particular significado. O acordo prevê também que, à parte da concessão desta verba, os dois países promoverão o estabelecimento de uma cooperação estreita em matéria de indústrias de defesa nos domínios que forem reconhecidos de interesse comum, o que poderá culminar na celebração de um acordo com tal finalidade específica.
Foram modificadas de forma bastante positiva algumas disposições e introduzidas alterações tendo em consideração os interesses específicos da Região Autónoma e a perspectivação desses interesses a nível nacional. Mencionarei a propósito a disposição que estabelece que, doravante, as contribuições financeiras francesas serão directamente afectadas ao plano de investimento da Região Autónoma dos Açores; a que prevê a possibilidade de entabular a qualquer momento no decurso dos 12 anos da vigência do acordo conversações entre as duas partes com a finalidade de nele introduzir ou nos seus anexos qualquer mofica-ção de forma ou de fundo que se afigure desejada; e a que atribui aos Ministros da Defesa dos dois países a responsabilidade pela aplicação do acordo e institui a Comissão Luso-Francesa incumbida da respectiva execução.
A referência expressa no preâmbulo do acordo aos tradicionais laços de amizade entre os dois países tes-

Página 3832

3832 I SÉRIE — NUMERO 102

temunha, para além da sua expressão formal, a existência de uma realidade velha de séculos, que contribuiu sumamente para os bons resultados atingidos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: este acordo, ao revelar mais uma vez as virtualidades da nossa posição estratégica e o seu reconhecimento pêlos nossos aliados, assume um papel importante no esforço de defesa francês que consideramos factor indispensável à segurança europeia e ocidental.
Não escapará também por certo a VV. Ex.ªs o alcance e o significado de que este acordo se reveste no contexto global das relações luso-francesas, ao abrir horizontes novos na cooperação bilateral que se deseja cada vez mais diversificada e que atinge já importância crescente, nomeadamente em sectores como o das relações culturais, das trocas comerciais, dos investimentos franceses em Portugal e da cooperação industrial e tecnológica, na cooperação política, na cooperação tripartida com os países africanos de língua oficial portuguesa. Ë um relacionamento solidamente cimentado pela rica e vasta realidade humana e sociológica que constitui a actual presença em França de perto de l milhão de portugueses emigrados. A cooperação em matéria de armamento e defesa, para a qual se abrem novas perspectivas, vem enriquecer sobremaneira o leque diversificado das relações luso--francesas que ambos os governos desejam mais dinâmicos e frutuosos, no limiar de um futuro europeu já tão próximo, e certamente mais próspero e solidário, em cuja construção nos orgulhámos de participar.

Aplausos do PS e do PSD,

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não há qualquer inscrição para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado da Cooperação.
Assim sendo, vamos fazer, de imediato, o intervalo regimental, pelo que retomaremos os nossos trabalhos pelas 18 horas.

Srs. Deputados, está suspensa a sessão.
Eram 17 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados, vai proceder-se à leitura do resultado da votação sobre o Parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (Daniel Bastos): — É o seguinte:
Acta da votação por voto secreto dos pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos para apresentação em juízo dos Srs. Deputados a seguir indicados.
Aos 4 dias de Julho de 1985 realizou-se a votação acima indicada, que forneceu os seguintes resultados constantes do boletim anexo (anexo l.) Face aos resultados, os pareceres da respectiva Comissão foram aprovados.
Os resultados foram os seguintes: votos entrados, 146; votos brancos, 1.
Sr. Deputado Marcelo Curto: sim, 157; não, 5; abstenção, 1;
Sr. Deputado José Manuel Torres Couto: sim, 156; não, 6; abstenção, 1.
Sr. Deputado Narana Coissoró: sim, 152; não, 9; abstenções, 2.
Sr. Deputado Rui Mendes de Oliveira e Costa: sim, 153; não, 8; abstenções 2.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, como se verifica da votação expressa, todos os pareceres foram considerados aprovados.
Srs. Deputados, uma vez que já passa das 18 horas, vamos proceder agora a várias votações.
Começarei por dizer-vos que, não tendo estado ontem a presidir à sessão plenária, peço antecipadamente desculpa por alguma falha na condução dos trabalhos de hoje.
Assim, começaremos por submeter à votação a ratificação n.° 95/III, relativa ao Decreto-Lei n.° 116/84, de 6 de Abril, que revê o regime de organização e funcionamento dos serviços técnico-administrativos das autarquias locais. Votar-se-á, primeiro, na especialidade, três propostas que ficaram pendentes e de seguida proceder-se-á à votação final global da referida ratificação. Vão, assim, ser lidas as propostas.
Foram lidas. São as seguintes:
Proposta de eliminação
Os deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, propõem a eliminação do n.° 1 do artigo 14.°
Proposta de substituição
Os deputados abaixo assinados, dos Grupos Parlamentares do Partido Socialista e do Partido Social-Democrata, propõem a alteração do artigo 17.°, com a seguinte redacção:
Artigo 17.°
O presente diploma aplica-se às Regiões Autónomas, sem prejuízo de, por decreto das respectivas assembleias regionais, ser objecto da adaptação justificada pelas especialidades regionais.
Proposta de aditamento
Os deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, propõem a alteração do n.° 2 do artigo 17.°
Propõe-se a seguinte redacção:
Na elaboração do decreto referido em l, participarão obrigatoriamente os municípios e os trabalhadores através das suas associações sindicais.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, se não houver qualquer objecção, passaremos de seguida às votações das propostas que acabam de ser lidas.
Vamos, então, votar a proposta de eliminação de n.° l do artigo 14.°, apresentada pelo Partido Comunista Português.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD, do CDS, da UEDS e da ASDI, votos a favor do PCP e do MDP/CDE.

Página 3833

5 DE JULHO DE 1985 3833

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresentámos a proposta de eliminação do n.° l do artigo 17.° do Decreto-Lei 116/84, porque pretende criar, nas autarquias, quadros de excedentes de pessoal. Exactamente como se fez para a administração central e para os variados ministérios, pretende-se que as autarquias sejam também elas viveiro de excedentes, sejam elas, portanto, potenciado-ras de desemprego. Esta asserção é contra os trabalhadores da administração local, como foi o pacote Almeida Santos contra os trabalhadores da administração central.
Daí, termos apresentado a presente proposta de eliminação.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vai ser submetida à votação a proposta de substituição do artigo 17.°, apresentada pelo Partido Social-Democrata.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS, da UEDS e da ASDI e votos contra do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A norma que acabou de ser votada altera o artigo 17.° do Decreto-Lei 116/84 no seguinte sentido: anteriormente o diploma não era aplicável às regiões autónomas porque dependia da regulamentação própria dessas regiões. Ou seja, garantia-se a especificidade própria das regiões autónomas e o diploma só servia na exacta medida em que as regiões o entendessem e nos termos em que essa regulamentação fosse feita. A proposta que foi votada corresponde a um recuo em relação às garantias próprias das regiões autónomas, nomeadamente por definir o princípio da aplicação, e a única coisa que admite é uma adaptação.
Isto significa que a aplicação é imediata e que nesta medida não são respeitados os direitos próprios das regiões autónomas, porque representa um recuo e uma forma de não respeitar a autonomia. E, sendo certo que nesta matéria a Constituição é clara, visto que concede às regiões autónomas, em sede do elenco de atribuições, competências próprias na matéria de regulamentação no que respeita aos órgãos do poder local das regiões, consideramos que este recuo é inaceitável, pelo que votámos contra.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, por último, vai ser submetida à votação a proposta de aditamento ao n.° 2 do artigo 17.°, apresentada pelo Partido Comunista Português.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD, do CDS, da UEDS e da ASDI e votos a favor do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.

O Sr. João Abrantes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Acabámos de votar na especialidade a ratificação n.° 95/III, pedida pelo PCP, relativa ao Decreto-Lei n.° 116/84. Tal como apresentámos uma proposta relativa ao n.° 2 do artigo 15.°, apresentámos esta proposta de igual teor em relação a um novo n.° 2 do artigo 17.°, que prevê a consulta aos municípios e aos trabalhadores através das suas associações sindicais.
Ficou claramente demonstrado, agora que acabou esta votação na especialidade, que o PS, o PSD e o CDS não estão interessados em ouvir as organizações sindicais dos trabalhadores. E as preocupações que aqui pretenderam, timidamente, invocar como defesa dos direitos dos trabalhadores caem por terra perante as votações a que acabámos de proceder.
Quer em relação ao artigo 15.°, n.° 2, quer em relação a esta proposta sobre o n.° 2 do artigo 17.°, ficou claramente demonstrado o respeito que merecem ao PS, ao PSD e ao CDS as organizações sindicais dos trabalhadores.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, de seguida vai ser submetida à votação final global a ratificação n.° 95/III.

O Sr. João Amaral (PCP): — Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado João Amaral pede a palavra para que efeito?

O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, suponho ter ouvido que se ia votar a ratificação, mas a ratificação não se vota neste momento. Votou-se na altura adequada a recusa de ratificação, pelo que agora o que se vota é a lei de alterações.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o sentido das minhas palavras era exactamente esse: trata-se de uma votação final global sobre os artigos que foram alterados, não sobre os que o não foram.
Srs. Deputados, vai então submeter-se à votação final global de todos os artigos que foram alterados em relação à lei original.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI, votos contra do PCP e do MDP/CDE, e a abstenção da UEDS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Cordeiro.

O Sr. Carlos Cordeiro (PS): — Sr. Presidente, desejo apenas informar que entregaremos na Mesa, por escrito, a nossa declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: o MDP/CDE votou no sentido contrário ao Decreto-Lei n.° 116/84, porquanto contendo alguns aspectos positivos, estes apenas servem para tornar menos pesado o conteúdo negativo do diploma.
Este decreto-lei revela uma clara intromissão do poder central na administração local e, portanto, é atentatório da autonomia do poder local.
Porque contraria provavelmente a autonomia do poder local, não podia contar com a nossa aprovação.

Página 3834

3834 I SERIE — NUMERO 102

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, quero anunciar que apresentaremos na Mesa, por escrito, a nossa declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.

O Sr. Horácio Marcai (CDS): — Sr. Presidente, entregaremos na Mesa a nossa declaração de voto, por escrito.

O Sr. Presidente: — Tembém para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.

O Sr. João Abrantes (PCP): — Sr. Presidente, quero também informar a Mesa de que a nossa declaração de voto relativa a esta matéria será entregue, por escrito, na Mesa.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, encerrado este primeiro ponto de votações, vamos entrar no segundo ponto, ou seja, na proposta de lei n.° 77/III — Lei das Rendas.
Vamos começar por votar na especialidade três propostas de alteração ao artigo 53.° desta lei. Como sabem, ficaram adiadas desde ontem pelo que serão, na sessão de hoje, objecto de leitura e de votação.
O Sr. Secretário vai proceder à leitura da proposta de substituição do n.° 2 do artigo 53.°, apresentada pelo PCP.
Foi lida. É a seguinte:
Proposta de substituição do n.º 2 do artigo 53.°
A actualização de rendas resultante da aplicação da presente lei só terá lugar após a efectivação dos mecanismos relativos ao subsídio previsto no artigo 22.° e à aplicação, após revisão, da legislação relativa ao acesso à habitação, designadamente a referente ao plano nacional de habitações e regime de acesso ao crédito habitacional.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta que acabou de ser lida.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD, do CDS e da ASDÏ, e votos a favor do PCP, do MDP/CDE e da UEDS.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
Só um momento, Sr. Deputado José Magalhães, é que o Sr. Deputado João Porto pretende interpelar a Mesa.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado João Porto.

O Sr. João Porto (CDS): — Sr. Presidente, uma vez que estas propostas foram objecto de discussão, julgo que não haverá lugar a declarações de voto feitas oralmente.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado José Magalhães, não quer prescindir do uso da palavra?

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, a sua pergunta suscita-me alguma perplexidade.
Creio que seria adequado — aliás, isso tem sido feito em diversas circunstâncias aqui na Assembleia e não tem colisão regimental — a produção de declarações de voto nestas circunstâncias.
Suponho, portanto, que a Mesa poderia utilizar o mesmo critério que temos adoptado em circunstâncias similares.
Se a Mesa tiver entendimento diferente, o meu grupo parlamentar considerará e, em momento ulterior, encontrará formas de intervenção.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, de facto, as declarações de voto, nos termos em que foram pedidas por V. Ex.ª, são anti-regimentais.
Sendo anti-regimental, não lhe poderei, portanto, dar a palavra para produzir a declaração de voto, salvo se for outra a decisão do Plenário.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Porto.

O Sr. João Porto (CDS): — Sr. Presidente, queria concretizar um pouco melhor o que disse há pouco.
É que apenas os partidos que não tenham intervindo no debate terão possibilidade de fazer declarações de voto.
Por outro lado, às votações dos artigos seguir-se-á a votação final global, finda a qual, como não é objecto de debate, poderá haver declarações de voto orais.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, suponho que neste momento se deve introduzir um pouco de tranquilidade e de serenidade neste debate.
Ora, acontece que no debate anterior sobre matérias que tinham o seu objecto de discussão, o Sr. Presidente acabou por dar a palavra a quem a requereu para fazer declarações de voto.
Acabámos de votar as matérias referentes à alteração do Decreto-Lei n.° 116/84 exactamente nas mesmas circunstâncias em que votamos esta matéria e sobre aquelas foram produzidas declarações de voto.
Posso compreender que existam razões que levem a tentar que não seja registado publicamente a razão dos sentidos dos votos. São, naturalmente, más razões porque não permitem explicitar qual é a fundamentação de cada um dos grupos parlamentares relativamente às suas propostas — exclusivamente a duas propostas — que estão neste, momento em questão.
Mas, Sr. Presidente, devo dizer que isso contraria o que tem sido prática nesta Assembleia, pese embora o Regimento — e insisto, peso o Regimento —, porque é extremamente difícil definir um sentido de voto, ou seja, exercer o direito de voto sem o explicar.
Aliás, devo dizer que, em relação à matéria das votações finais globais, também não há declarações de voto. Ora, foi já entendido por unanimidade na Comissão de Regimento e Mandatos que esta norma tem de ser interpretada num sentido restritivo, ou seja, no fundo, deve consagrar-se o direito à declaração de voto que é a forma de os partidos poderem explicar porque é que votaram em determinado sentido.

Página 3835

5 DE JULHO DE 1985 3835

O direito de declaração de voto é extremamente reduzido, é apenas de 3 minutos e, Sr. Presidente e Srs. Deputados, existem inúmeras formas de conseguir o uso da palavra por vias inviesadas.
A forma mais simples de a Assembleia assumir o problema que aqui está levantado é a de permitir que as declarações de voto sejam feitas, uma vez que os requerimentos ou qualquer outras das possibilidades que existem e que permitem exprimir o sentido da votação tornariam este debate muito mais pesado do que havendo concessão pela Mesa do direito de produzir uma declaração de voto pois, pelo que se viu, nem sequer houve mais alguma inscrição.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado João Amaral, a Mesa tem de se limitar a cumprir o Regimento quando ele não oferece dúvidas na sua interpelação.
V. Ex.ª invocou, há pouco, num precedente da Mesa relativamente ao caso imediatamente anterior.
Devo dizer-lhe que, em minha opinião, V. Ex.ª não tem razão ao invocar esse precedente.
Quando foi feito o primeiro pedido de palavra para uma declaração de voto, informei-me imediatamente sobre se o debate estava, ou não, sujeito a tempos.
Ora, quando o debate está sujeito a tempos e os partidos dispõem de tempo para gastar, temos entendido que a declaração de voto é puramente formal e consequentemente temos consentido que ela se faça.
Pelo contrário, quando o debate não está sujeito a tempos, temos de aplicar estritamente o Regimento. Sempre assim tenho feito enquanto tenho presidido aos trabalhos.
Logo, pela minha parte, não há qualquer precedente e a decisão tomada pela Mesa neste domínio é de, neste caso, não consentir na produção da declaração de voto, a não ser —repito— que outro seja o entendimento do Plenário.

Vozes do PS c do CDS: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, penso que em relação aos casos em que há limitação de tempo a solução encontrada é razoável.
Mas o que se espera, Sr. Presidente, é que a aplicação do Regimento seja, toda ela, razoável, sejam quais forem as circunstâncias.
Será também razoável, no caso que aqui temos pendente neste momento, termos requerido o exercício do direito a uma declaração de voto, pesem as limitações que a alteração do Regimento introduziu.
O Sr. Presidente compreenderá que, com bom senso, a Mesa teria autorizado que tivéssemos feito essa declaração de voto.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a Mesa, por consenso, entende que não pode violar o Regimento.
Srs. Deputados, vamos agora votar a proposta de aditamento do n.° 2 do artigo 53.°, passando o n.° 2 para n.° 3, subscrita pelo MDP/CDE que vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
Proposta de aditamento ao n.° 2 do artigo 53.°, passando o n.° 2 para n.° 3
O disposto nas alíneas a), c), d) e e) do n.° l do artigo 29.º só entra em vigor no prazo de 5 anos, a partir da regulamentação desta lei.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar a proposta que acaba de ser lida.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD, do CDS e da ASDI e votos a favor do PCP, do MDP/CDE e da UEDS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vai agora ser lida uma proposta de aditamento de um novo n.° 2 ao artigo 53.°, subscrita pelo PS, pela UEDS e pela ASDI.
Foi lida. É a seguinte:
Proposta de aditamento de um novo n." 2 ao artigo 53.°, passando o actual n.° 2 a n.° 3
A actualização das rendas resultante da aplicação, nos termos da presente lei, dos artigos 11,° e 12.°, só poderá ter lugar após a regulamentação do subsídio previsto no artigo 22.°
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos pois votar a proposta que acabou de ser lida.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e da ASDI e votos contra do PSD e do CDS.

Uma voz do CDS: — Participam na burla!

O Sr. Carlos Brito (PCP): — Deixem-nos fazer uma declaração de voto que nós explicamos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação final global da proposta de lei n.° 77/III — Estabelece os regimes de renda livre, condicionada e apoiada nos contratos de arrendamento para habitação.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI e votos contra do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do Sr. Deputado Magalhães Mota (ASDI).

Uma voz do PCP: — Afinal, sempre é boa!

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República acaba de votar uma das mais graves leis do ponto de vista social que jamais votou após o 25 de Abril.
Esta votação é ilegítima, pois esta Assembleia e esta maioria PS/PSD não têm legitimidade política para fazerem votar, nas vésperas da dissolução da Assembleia da República, e com o Governo demissionário, uma lei de fundo, que vai empenhar o futuro de milhares de portugueses.

Página 3836

3836 I SERIE — NUMERO 102

No entanto, a pressa do seu agendamento só mostra que não confiam na futura maioria que vai haver nesta Casa.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Oradora: — Mas esta votação é também um espelho, um exemplo mais, dos resultados da aliança do PS com o PSD e da política de direita, uma política contra o povo, contra os trabalhadores, contra as classes e camadas mais pobres da população.
Mas esta votação é também uma profunda injustiça, pois acaba de ser aprovada pelo PS, PSD e CDS, uma lei que visa pôr a pagar mais quem menos tem, e que não é uma lei qualquer de um ligeiro aumento das rendas de casa. E uma lei brutal, incomportável socialmente, que, se vier a ser aplicada, criará problemas gravíssimos e dramáticos a juntar mais questões às famílias, às centenas de milhares que já hoje não têm um tecto.
Pois este Governo e esta maioria, todos em dissolução, a única medida que deixam como obra sua, a somar à lista das carências habitacionais, é o aumento brutal das rendas de casa.
Dissemos já, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que esta lei não provoca uma qualquer actualização! É uma inaudita violência contra os cidadãos mais carencia-dos — os inquilinos, a favor dos senhorios.
Na verdade, se a proposta do Governo era, já de si, grave, na votação na especialidade, com os votos do PS, PSD e quase sempre do CDS, foi agravada ainda mais e a lei é hoje ainda pior.
Mas a proposta que há pouco acabámos de votar, apresentada pelo PS visa apenas, na véspera de um acto eleitoral, enganar mais uma vez as pessoas.
Trata-se, apenas, de congelar a aplicação de um dos aspectos mais brutais desta íei, a correcção extraordinária, para depois do acto eleitoral.
Isto é, se a lei fosse votada tal e qual como veio da Comissão da especialidade, na véspera das eleições, os inquilinos receberiam uma carta do senhorio, contendo o valor da correcção extraordinária das rendas de casa. Assim, fica o cutelo pendente para, logo a seguir às eleições, o PS pôr em vigor a lei, se tiver força para isso.
É uma tentativa de enganar mais uma vez os cidadãos.
Mas nós estamos conscientes que os Portugueses não se deixarão enganar por mais esta manobra, esta al-drabice, do Partido Socialista.
Votámos a favor dessa proposta e votaríamos sempre, nem que fosse uma vírgula, desde que melhorasse esta proposta de lei.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Oradora: — Votaríamos favoravelmente sempre qualquer proposta que visasse adiar, nem que fosse por 8 dias, esse brutal aumento sobre os inquilinos, que é a correcção extraordinária.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

A Oradora: — Mas esta lei, se entrar em vigor logo a seguir às eleições, não vai libertar casas, vai, sim, provocar despejos.
Vejamos alguns dos aspectos do conteúdo real daquilo que o PS, o PSD e o CDS acabaram de votar.
Esta lei faz aumentar anualmente todas as rendas. Rendas «livres», rendas condicionadas, rendas sociais, todas, todos os anos aumentarão em valor entre três quartos e a totalidade do índice de preços no consumidor.
Isto é, mais do que os valores que tem havido para as rendas já descongeladas, e mais que a proposta inicial do Governo que cifrava esta taxa em dois terços. Mas outra malfeitoria introduzida na especialidade foi estabelecer-se que todos os arrendamentos mesmo os antigos podem ser feitos em regime de renda livre. Como o PCP desde sempre afirmou a renda condicionada existe apenas como o ponto de partida mínimo dos senhorios.
Mas na especialidade o PS, o PSD, e o CDS, ainda introduziram os contratos de arrendamento a prazo. É uma vergonha, pois o PS já tinha no seu «currículo» os contratos de trabalho a prazo, agora acrescenta-lhe os arrendamentos a prazo. Felizmente para o País, quem está a prazo, neste momento, é o Governo e a Assembleia da Republica.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

A Oradora: — Mas esta norma quer dizer que se esta lei entrar em vigor as pessoas que alugaram uma casa, não sabem que ao fim de 5 anos o senhorio lhes exige o dobro ou o triplo da renda, ou lhes diz simplesmente rua... E no entanto o princípio da renovação obrigatória do contrato vem da I República como um elemento decisivo para a segurança do tecto dos cidadãos. E na proposta do Governo vinha inicialmente que o contrato era de 7 anos e a Comissão da Assembleia da República, com os votos do PS, PSD e CDS estabeleceu que ao fim de 5 anos o inquilino pode ser posto na rua sem qualquer indemnização, sem qualquer recurso.

O Sr. Carlos Brito (PCP): — Ë um escândalo!

A Oradora: — É esta violência, esta brutalidade, tão distante da realidade de um país cheio de problemas, de portugueses vivendo em condições sub-humanas, que não pode deixar de provocar no Grupo Parlamentar do PCP, um profundo e sentido sentimento de revolta e de indignação.
Mas esta lei não se fica por aqui. A chamada correcção extraordinária, nos moldes em que é feita. — e os Srs. Deputados do Partido Socialista têm consciência disso e por isso apresentaram esta porposta para ela só entrar em vigor depois das eleições — visa a mais brutal transferência de rendimentos dos inquilinos para os senhorios. Na Comissão o PS e o PSD alargaram o âmbito da sua aplicação de 1977 para 1980.
Esta correcção extraordinária significa que há rendas de casa que sobem no primeiro ano valores da ordem dos 300% — e é isto que aconteceria aos inquilinos nas vésperas das eleições se esta proposta não tem agora entrado, mas isto vai-lhes acontecer logo a seguir — e que, por exemplo, todos os arrendamentos de 1974, em todo o País aumentam no primeiro ano 50%. E nos anos seguintes as rendas continuarão a aumentar em valores que oscilam entre 33% e 45%, se se mantiver o índice de preços nos consumidores, ou seja vez e meia o valor do chamado «coeficiente de actualização», valor que, repetimo-lo, é da inteira responsabilidade do Governo.

Página 3837

5 DE JULHO DE 1985 3837

O subsídio de renda aparece desde o início desta proposta como um rebuçado para enganar ingénuos. A votação na especialidade confirma plenamente o que o PCP sempre afirmou. Se os aumentos das rendas, esses, sim, são bem claros, e basta fazer as contas, os subsísios são desconhecidos tanto no seu valor como no que respeita a quem tem efectivamente direito a eles.
Mas também é claro que foram recusadas todas as propostas do PCP no que respeita a serem contemplados arrendatários desempregados, com salários em atraso, reformados e pensionistas.
Por último, e a terminar vale a pena ainda colocar a questão das obras tanto mais que este foi um dos argumentos do PS/PSD para justificar a razão de ser desta lei, jogando com o facto do parque habitacional se encontrar em condições precárias.
Mas é falso tudo o que disseram. O diploma não estabelece nenhum mecanismo que obriga de facto os senhorios a fazerem obras. Pelo contrário, a preocupação foi remeter essa responsabilidade para os inquilinos e para as câmaras municipais, restringindo-se mesmo em relação a estes a possibilidade de cobrança coerciva. As câmaras municipais ficam assim com o papel de entidades financiadoras dos proprietários locadores!
Não se ficaram por aqui. Como o diploma estabelece um aumento extraordinário por razão das obras de beneficiação como durante o debate dissemos, na especialidade o PS/PSD alargaram o conceito de órgãos de beneficiação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes são apenas alguns exemplos do conteúdo deste diploma. As consequências sociais da sua aplicação são visivelmente graves.
E é na verdade inaceitável do ponto de vista político que uma coligação que já não existe, uma maioria que já não há e um Governo demissionário aproveitem os últimos dias que hes restam para ainda tentar fazer mais mal aos trabalhadores, aos reformados, aos pobres, do que já fizeram durante estes 2 últimos anos. E esta pressa só demonstra que não estão confiantes de voltar a ter maioria.
Nós, comunistas, votámos contra e solidarizamo-nos activamente com todos aqueles que irão ser atingidos por tal lei se ela entrasse em vigor. Mas não desistiremos.
Na futura Assembleia da República, com uma nova maioria, lutaremos para revogar esta lei e para contribuir para uma verdadeira lei do arrendamento realmente justa e para definir uma política de habitação em que o direito à casa seja um direito efectivo dos Portugueses.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O MDP/CDE, na votação final global, votou contra esta proposta de lei n.° 77/III pelas razões que passo a enunciar.
Esta lei não contribuirá minimamente para a resolução dos problemas habitacionais portugueses e nem sequer contribuirá para travar a degradação do parque habitacional, pois os aumentos de renda não ficam dependentes da realização de obras de conservação.
Por outro lado, vai desencadear uma onda de problemas sociais de dimensão e efeitos imprevisíveis.
Sucede ainda que o Governo elaborou esta proposta sem que tenha realizado os estudos mínimos para avaliar o quadro em que ela se inseriria e o impacte da sua aplicação.
Apesar das promessas da maioria aquando da discussão da proposta de lei no Plenário, a Comissão agravou-a substancialmente, tanto no acréscimo de poder que é concedido aos senhorios, como no agravamento mais rápido das rendas.
É interessante, aliás, notar que o CDS apresentou algumas propostas de alteração, que eram ainda piores do que o texto do Governo, votando geralmente com o PS e o PSD a favor deste texto.
Esta lei concede aos senhorios um poder discricionário, que é agravado pela situação de deficiente oferta de habitação para arrendamento.
E esta situação não se alterará a curto ou a médio prazos, pois a iniciativa privada não está interessada em aumentar essa oferta; por um lado, para poder especular com os fogos que vão ficando vagos, por outro lado, não está interessada em investir num sector de carácter social, tão inseguro, pois a uma lei favorável pode seguir-se uma desfavorável, ou mesmo novo congelamento das rendas; para que o investimento seja rentável é necessário que as rendas sejam muito elevadas, o que só é suportável por um sector muito restrito da população portuguesa, o qual prefere e tem possibilidades de possuir casa própria.
Num outro plano, esta lei irá dar origem a frequentes e agravados conflitos, não só devidoà sua própria filosofia, mas também devido à dificuldade e ambiguidade de interpretação de alguns artigos e à imperiosa definição de algumas figuras, como, por exemplo, o de obras de conservação e de obras de beneficiação ou o valor actualizado do fogo para cálculo da renda condicionada.
Também quanto à importante questão dos subsídios revelam-se algumas imprecisões e o seu montante não é definido com um mínimo de precisão, podendo dar lugar a grandes injustiças e a corrupção.
É de salientar alguns dos aspectos em que se revela o agravamento que a proposta de lei sofreu no decorrer da discussão na especialidade. Vão ser referidos os mais significativos.
A actualização das rendas realiza-se de forma mais rápida que anteriormente, pois os coeficientes anuais são multiplicados vez e meia em vez de uma vez como estava anteriormente previsto.
O valor actualizado dos fogos para cálculo da renda condicionada é realizado pelo Governo...

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, terminou o seu tempo, tenha a bondade de terminar.

O Orador: — Sr. Presidente, então vou terminar a minha intervenção.
Já no preâmbulo do Decreto-Lei n.° 330/81, de 4 de Dezembro, se dizia que as actualizações anuais de rendas comerciais tinham em vista «incentivar o investimento imobiliário».
O Governo e a sua ex-maioria repetem o mesmo em relação a esta Lei das Rendas. Porém, é evidente que o Decreto-Lei n.° 33/81 — e 4 anos vão decorridos — não trouxe qualquer aumento do investimento imobiliário. E o mesmo, como é evidente, se tem de dizer desta Lei das Rendas agora aprovada.

Página 3838

3838 I SERIE — NUMERO 102

Ela não irá incentivar a construção, mas a especulação imobiliária, agravando profundamente a já bem difícil situação económica da grande maioria da população. E isto porque o Governo e a sua maioria em vez de tratarem a habitação como um direito social, como por exemplo o direito à saúde, consideram a habitação um mero bem de consumo.
As duas porpostas de alteração apresentadas à última hora pelo PS, UEDS e ASDI têm um âmbito claramente restrito, só uma destas representando uma alteração positiva das muitas que eram indispensáveis, pois a outra limita-se a contemplar um eventual adiamento da actualização de rendas.
De resto, o PS teve ocasião de afirmar que tais propostas não excluem a sua concordância com a chamada «Lei das Rendas», de que partilhou a autoria juntamente com o PSD, não obstante aquilo que a Lei das Rendas representa.
Ficam, assim, claramente assumidas nesta votação final global, as responsabilidades dos partidos que votaram favoravelmente esta lei.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado João Porto.

O Sr. João Porto (CDS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A posição favorável do CDS na votação final global da proposta de lei n.° 77/III, sobre o regime das rendas para fins habitacionais, fundamenta-se mais no absurdo da situação que presentemente se vive em tal domínio, do que nas virtudes do diploma acabado de aprovar.
Na verdade, é tão insustentável, quer do ponto de vista lógico, quer do ponto de vista social, o regime de rendas habitacionais actualmente em vigor, que seria difícil ao CDS não votar favoravelmente a sua substituição, desde que o novo regime contivesse um mínimo de realismo e de flexibilidade, reconhecendo a natureza simultaneamente social e económica do arrendamento habitacional, bem como o arrastamento de uma conjuntura inflacionária cujos parâmetros têm flutuado ao longo dos últimos anos de forma muito sensível.
Quando participámos na discussão na generalidade desta proposta de lei, esperávamos que a ulterior discussão e votação na especialidade permitisse melhorá-
-la nos muitos aspectos de pormenor em que ela se apresentava defeituosa, não obstante a apreciação geral positiva então formulada. E não nos furtámos a participar nesse trabalho de aperfeiçoamento, através da proposição de numerosas alterações, apesar de não ter sido nossa a iniciativa em causa.
Infelizmente, a votação na especialidade em Comissão, se concretizou algumas melhorias, que reconhecemos, agravou por outro lado um vasto número de disposições e rejeitou muitas beneficiações propostas ao texto inicial.
Parece-nos muito grave, por exemplo, que por força do artigo 36.° do diploma, que resulta do artigo 27.° da proposta governamental, um grande número de autarquias, sobretudo do interior, estejam ameaçadas — para não dizer condenadas — de ver diminuir os seus rendimentos provenientes da contribuição predial. Ë que, o facto de no conjunto do País, a matéria colectável aumentar nos primeiros anos mais que os 20% a subtrair às autarquias — visto ser ainda da ordem dos 40% a incidência do parque arrendado no total do parque habitacional — daí não resulta que em todos e cada um dos municípios isso também se verifique. E garantidamente se não verificará naqueles em que o parque arrendado é proporcionalmente menor; recordemos, por exemplo, que no distrito de Bragança a incidência do parque arrendado é apenas de 14%, valor que é afinal a média ponderada dos valores municipais, pelo que alguns destes serão ainda menores.
Um outro aspecto que, também, condenamos vivamente é o de não ter ficado estipulado um prazo para se completar a cobertura do País com o pagamento do subsídio de renda, conforme tivemos ocasião de propor em Comissão; tanto mais que o artigo 50.° salvaguarda, e bem, a posição de inquilinos com direito ao subsídio enquanto ele não for efectivamente processado. Ora, nestas circunstâncias, se a incapacidade do Governo ou a ineficácia dos serviços do Estado conduzirem a um arrastamento de tal processo, não só se tran-ferirão para terceiros — os senhorios atingidos — as consequências de tal incapacidade, como se poderá gerar o bloqueamento do funcionamento da própria lei, já que, para usufruir da referida salvaguarda, bastará demonstrar que se requereu o subsídio de renda, independentemente de ter ou não direito a ele. Tudo isto no pressuposto de que a lei será regulamentada nos termos nela previstos.
Também nos parece grave que o artigo 38.°, que resulta do artigo 32.° da proposta inicial, não preveja um prazo, após a cessação do arrendamento anterior, para que o locador possa encontrar um novo inquilino sem estar sujeito, de imediato, à penalização da contribuição predial na ausência de rendimento. O funcionamento do mercado exige tempo; e se dentre os ob-jetivos deste diploma se inclui o do restabelecimento do mercado do arrendamento habitacional, uma tal lacuna surge como um contra-senso. Argumentar-se-á que tal penalização só ocorrerá quando o prédio se mantiver devoluto por facto imputável ao locador; o que, segundo a lógica, atribuiria à adminstração fiscal o ónus da prova. Mas todos bem sabemos que, em Portugal, todos os ónus das questões com as Finanças recaem sobre o contribuinte.
Para além de tudo o mais, o presente diploma ficou polvilhado de normativos absurdos, que o deslustram mesmo quando não parecem ter consequências de grande relevo.
É o caso, por exemplo, do artigo 44.°, proveniente do n.° l do artigo 29.° da proposta, cujo conteúdo nada tem a ver com arrendamento habitacional, pelo que é injustificável a sua manutenção.
Igualmente absurda é a conjugação do disposto nos artigo 8.° e 11.° Pois, como julgamos ser evidente para todos, das próprias designações se infere que o âmbito de aplicação da correcção extraordinária deveria ser menor que o da actualização anual, já que decorrendo esta da inflação presente, que a todos toca, aquela só se justificará nos casos em que a degradação da renda, no passado, exija agora um complemento de actualização. Ora, isso não se verificará com os arrendamentos de renda livre existentes à data da entrada em vigor deste diploma, visto que um contrato de 1979 não se achará neste ano ainda nas condições de actualização anual, mas já terá direito à correcção extraordinária.
Os exemplos das imperfeições do diploma, incluindo as tabelas anexas, poderiam multiplicar-se; mas o Regimento impede-nos de completar o rol.

Página 3839

5 DE JULHO DE 1985 3839

Sr. Presidente, Srs. Deputados: De todo o modo, julgamos ter deixado evidente que o CDS, ao votar favoravelmente esta lei, pretende sobretudo participar activamente na revogação do regime, estático e irracional, que de há longos anos vigora no arrendamento habitacional; mas que no seu entender, e infelizmente, o novo diploma legislativo deixa muito a desejar. Por outras palavras: esta não é a lei do CDS.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Domingues.

O Sr. Silva Domingues (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar das alterações propostas pelo Partido Socialista e aprovadas por uma nova maioria de circunstância — maioria, aliás, compreensível em tempos pré-eleitorais e que terá constituído nesta Assembleia mais uma afloramento de demagogia eleiçoeira —

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — .... alterações essas que violam compromissos assumidos e penalizam a eficácia da lei, o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata votou favoravelmente a proposta de lei n.° 77/III, sobre o regime das rendas para fins habitacionais. Votou-a, pelas razões que invocámos no debate na generalidade e ainda porque, na discussão na especialidade, foi possível melhorar, política e tecnicamente, a proposta de lei, tornando-a num instrumento equilibrado que, esperamos, venha a revelar-se eficaz para se atingirem os objectivos que nos propomos e que são a recuperação da confiança dos investidores e a atracção de poupanaças destinadas à habitação, a recriação do mercado de arrendamentos urbanos e a expansão da oferta de fogos para arrendar, a preços acessíveis, a recuperação do parque habitacional degradado e a reabilitação do nosso património cultural.
Mas a grande aposta desta lei está, também, no relançamento da construção civil, com o aproveitamento da sua capacidade produtiva disponível e a das indústrias a montante e a jusante, contribuindo-se decididamente para a recuperação da produção nacional e para a criação de postos de trabalho.
A nova lei estabelece os regimes de renda livre, condicionada e apoiada, altera para 8% a taxa aplicável ao valor actualizado do fogo no ano de celebração do contrato, para fixação do limite do valor inicial da renda condicionada, prevê o princípio da liberadade de escolha do regime de renda, a actualização anual de todas as rendas, variando o respectivo coeficiente entre três quartos e a totalidade do IPC sem habitçaão e a correcção extraordinária das rendas actuais com base na sua última fixação. Estabelece um novo regime para execução de obras, sendo as de conservação a cargo do senhorio, sem direito a repercussão nas rendas.
Cria o subsídio de renda de que são beneficiários os inquilinos mais carenciados, cujas rendas tenham sido ajustadas nos termos dos Decretos-Leis n.ºs 294/82 e 449/83 ou fiquem sujeitos a correcção extraordinária, havendo ainda casos especiais de atribuição de subsídio, entre os quais a deficientes com grau de incapacidade igual ou superior a 60%.
Mas tendo em atenção as especiais condições em que se encontra a indústria de construção civil, no que respeita ao escoamento dos fogos novos diponíveis e à sobrevivência das empresas construtoras, que exige a resolução dos seus passivos, inclusivamente na banca nacionalizada, que não poderiam ter outra forma de satisfação, prevê-se, a título excepcional e temporário, um regime especial de arrendamento para habitação, aplicável a prédios nunca arrendados e que prevê a denúncia do contrato para o termo do respectivo prazo, quando a duração convencionada do mesmo for igual ou superior a 5 anos.
A nova lei procede à reafectação das receitas de contribuição predial, penaliza em contribuição predial os prédios devolutos e altera preceitos do Código Civil, das Leis n.ºs 55/79 e 2088. Prevê ainda a criação de modalidades especiais de crédito para recuperação de habitações arrendadas e o direito de representação das associações de inquilinos.
Assim se fará termo ao irracional regime de congelamento das rendas, que vigorou, a título muito precário, desde a l.a Guerra Mundial nos concelhos de Lisboa e Porto, e fora destes concelhos desde 1974, não tendo havido antes a coragem e a clarividência política de o alterar, procedendo-se a uma reforma estrutural essencial ao nosso desenvolvimento económico, objectivo primordial que o PSD vem prosseguindo e dando-se mais um passo na aproximação às regras de jogo europeias, na esperança de que, a médio prazo, o nosso mercado de habitação apresente um perfil que tenda para o prevalecente na Europa.
Compete agora ao Governo regulamentar esta lei , no prazo de 60 dias, no que respeita ao subsídio de renda — o que não acontecendo constituiria uma hipocrisia e mistificação grosseira, na qual preferimos não acreditar —, mas que não impede todavia que os aumentos entrem desde já em vigor.
Compete ainda ao Governo criar as condições necessárias e suficientes para que, a médio e longo prazo, o investimento na habitação para arrendamento seja viável e significativamente procurado, resolvendo simultaneamente as necessidades de investimentos seguros a longo prazo, limitados hoje, quase só, aos depóstios a prazo, e ainda satisfazendo a procura crescente de nvoas habitações com rendas acessíveis.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Leonel Fadigas.

O Sr. Leonel Fadigas (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS assume aqui o seu papel essencial numa iniciativa como esta, que vai quebrar o imobilismo que tem caracterizado a legislação sobre rendas habitacionais, imobilismo que é considerado responsável pelo estado calamitoso a que chegou o nosso parque habitacional.
Muitos têm o credo das reformas na boca. Mas a sua acção nTao tem correspondido às palavras, como a experiência dos últimos anos demonstrou.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — A votação aqui feita da proposta de lei n.° 77/III foi feita pelo PS com a consciência plena da sua importância e dos seus reflexos sociais e políticos.

Página 3840

3840 I SÉRIE — NÚMERO 102

Por eleitoralismo ou por demagogia, era fácil deixar cair uma iniciativa como esta.
No entanto, não são esses os objectivos que nos movem. Votámos uma lei discutida e aprovada num quadro que tornou possível o texto a que chegámos; texto que reputamos equilibrado e necessário à vida do País.
E votámos favoravelmente porque ele responde aos objectivos que apontamos como essenciais para a resolução dos problemas de habitação, que, recorde-se não se restringem a esta questão. Têm a ver com a dinamização da oferta, o apoio à habitação social e cooperativa, à recuperação de imóveis degradados e centros urbanos, à política do crédito e à redução das taxas de juro e ao lançamento de apoios específicos aos jovens que procuram casa pela primeira vez.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — O PS empenhou-se no lançamento e prossecução desta política; prometeu medidas e cumpriu-as. Com serenidade apresentou propostas, fez alterações ao texto inicial, e, naturalmente, demonstrou que não tem sido ele a causa do atraso de aplicação das medidas desejadas pelo Governo.
Esta lei inova, no plano da política de arrendamento, ao prever a atribuição de um subsídio de renda para os agregados familiares de menores recursos ou para casos especiais, onde pode abranger a totalidade dos aumentos agora previstos.
A criação do subsídio de renda tem um carácter mar-cadamente socialista e sempre foi por nós defendida como peça fundamental da revisão do regime das rendas.
Garantimos a protecção aos inquilinos idosos, aos deficientes, e garantimos às situações de união de facto, inovando outra vez, a protecção prevista para os cônjuges na transmissão do arrendamento, penalizámos significativamente a manutenção de casas devolutas, mantivemos a inalterabilidade das rendas fixadas a partir de l de Janeiro de 1980 pelo prazo de 7 anos — e para os contratos celebrados até à data será a da entrada em vigor da presente lei —, mantivemos para a correcção extraordinária os valores de actualização financeira calculados para 1983, sem os actualizar para o ano de início de aplicação.
Tivemos em toda a discussão e votação da lei a ideia de que, se, por um lado, o descongelamento das rendas vem atrasado, por outro ele comporta questões e preocupações sociais que não ignoramos e tivemos em conta.
Julgamos ser esta uma reforma fecunda que a médio prazo vai alterar substancialmente o dramático problema habitacional.
Aqueles que, dominados por preocupações imedia-tistas, quiseram, porventura, fazer-nos críticas demagógicas, nunca se atreverão a dizer que a manutenção do status quo devia ser norma de conduta, porque não ignoram que num clima de inflação generalizada a manutenção das rendas de casa congeladas era uma impossibilidade.
O PS teve a coragem e a lucidez de defender os interesses globais da sociedade, compatibilizando os interesses legítimos em confonto e iniciando a resposta urgente à crise habitacional.
Para tal votou esta lei, não hesitando em pedir a avo-cação de duas disposições que se lhe afigurava justo modificar.
Não obstante as qualificações desbocadas feitas pelo PCP, não deixaram estas propostas de obter vencimento com os votos do próprio PCP que, esquecendo tudo o que tinha dito, veio pelo seu voto afirmar o que já se sabia: — na sua boca, qualificativos como «burla» ou «vigarice» nada significam para quem os pronuncia.
Daí o sentido e o significado do voto que fez sobre as propostas que injuriou.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Importa agora sublinhar que a nossa política habitacional se não circunscreve a esta lei, mas a um conjunto ordenado e coerente de medidas; umas já tomadas, outras em preparação.
Só se lamenta que não possamos dar continuidade a uma política de recuperação económica que estava em curso e que era o enquadramento natural a uma tão importante medida de fundo.
Outros, que não nós, carregam sobre os ombros esta grave responsabilidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Rúben Raposo.

O Sr. Rúben Raposo (ASDI): — Sr. Presidente, é para anunciar que o meu agrupamento irá fazer chegar à Mesa uma declaração de voto por escrito.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, encerrado este ponto da nossa ordem de trabalhos, devíamos proceder à votação final global do Código de Direito de Autor e Direitos Conexos e das Ratificações n.ºs 144/III, 145/III, 146/III e 147/III. Só que, neste momento, não dispomos ainda do relatório da comissão respectiva, pelo que somos forçados a ultrapassar este ponto e entrar na matéria do balanço social, portanto, no projecto de lei n.° 105/III, e proceder à sua votação final global.
O Sr. Secretário vai ler o relatório da comissão.

O Sr. Secretário (Armando de Oliveira): — O relatório da comissão tem o seguinte teor:
Relatório e parecer
Reunida em 28 de Junho de 1985, no Palácio de São Bento, com a presença dos deputados constantes no livro de presenças, a Comissão de Trabalho emitiu um parecer sobre o projecto de lei resultante da Subcomissão. Por maioria, foi aprovado o relatório da Subcomissão, que se anexa.
Na votação na especialidade da redacção do projecto de lei proveniente da Subcomissão todos os artigos foram aprovados por maioria.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, há o relatório da Subcomissão, que ainda é bastante longo. Entendem VV. Ex.ªs que se podia dispensar a leitura desse relatório ou não?
Não havendo nenhuma oposição, dispensar-se-á a sua leitura.

Pausa.

Página 3841

5 DE JULHO DE 1985 3841

Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global do projecto de lei n.° 105/III.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: — Para fazerem declarações de voto, inscreveram-se os Srs. Deputados Rúben Raposo, Manuel Rebelo de Sousa, Manuel Lopes, Raul Castro e Manuel António dos Santos.
Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Rúben Raposo.

O Sr. Rúben Raposo (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Comissão Parlamentar de Trabalho e a Assembleia da República estão de parabéns.
Estão de parabéns, porque a Comissão elaborou e esta Casa aprovou uma boa lei. A Lei do Balanço Social.
Uma lei que significa o virar de página em muitas empresas.
Uma lei que se inscreve na construção de uma sociedade democrática em Portugal.
Democracia que começa nos locais de trabalho e de residência.
Democracia que tem a ver com o direito à informação e à participação.
Esta lei visa dar conteúdo à noção de responsabilidade social. Visa melhorar a gestão de recursos humanos e a gestão das unidades produtivas.
Com a lei, ganham as empresas, ganham os empresários e os trabalhadores, ganha todo o País.
Com a lei que acabámos de votar, Portugal acerta o passo pela Europa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, nos trabalhos em sede de especialidade, na Comissão Parlamentar de Trabalho, definiu-se com maior precisão o conceito de responsabilidade social.
Definiram-se as fórmulas que quantificam, que avaliam o grau de cumprimento da responsabilidade social.
Do que vimos afirmando são exemplo os quadros do anexo A e do anexo B, que estão apensos à presente lei.
Nos referidos quadros passará a ser inscrita a informação referente ao emprego, às despesas com o pessoal, às condições de higiene e segurança, à formação profissional e cultural, às relações de trabalho e à acção social.
Informação que permitirá o conhecimento e tratamento das variáveis sociais, suficientemente determinados e quantificados. Passará a ser possível uniformizar conceitos e métodos de cálculo. Permitirá também a elaboração de medidas mais adequadas no âmbito da política legislativa e da administração do trabalho. Daí a lei ter previsto a remessa do Balanço Social ã Inspecção de Trabalho e Serviço de Estatística do Ministério do Trabalho.
A Comissão Parlamentar fixou dois modelos de Balanço Social. Um modelo mais exigente. Outro menos exigente.
O Balanço Social mais exigente, onde se obriga a que maior informação seja publicitada, será elaborado pelas empresas públicas, pelas empresas com 33,5 % ou mais de capital participado pelo Estado e pelas empresas com mais de 500 trabalhadores. O outro modelo de Balanço Social menos exigente será elaborado pelas empresas com mais de 100 e menos de 500 trabalhadores. Fixou-se, também, o número mínimo de 100 trabalhadores para que uma empresa seja obrigada à feitura do Balanço.
Assim, a Comissão decidiu baixar o número de trabalhadores de 200 para 100. Conseguiu-se, assim, um maior número de empresas que irão ser avaliadas em termos de responsabilidade social. Tal resulta do facto de sermos um país de pequenas e médias empresas, mais pequenas que médias. Com efeito, 70 % do novo tecido industrial é constituído por pequenas e médias empresas, responsáveis pela criação de riqueza e de elevado volume de emprego.
Estabeleceram-se, por último, três momentos diferidos para entrada em vigor da lei. Para as grandes empresas, o ano de 1986. Para as empresas com 200 a 500 trabalhadores, o ano de 1987. Para as empresas com mais de 100 trabalhadores e menos de 200 trabalhadores, o ano de 1988.
Tal encontra a sua justificação porque somos de opinião que se trata de uma boa lei e que se deseja que seja factor de mudança, de inovação, que traga melhorias à gestão das empresas e por isso importa que se dê tempo às empresas mais pequenas para fazerem os ajustamentos necessários.
Por tudo aquilo que vimos afirmando, votamos favoravelmente a Lei do Balanço Social.

Aplausos da ASDI e do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

O Sr. Soares Cruz (CDS): — Sr. Presidente, as condições em que votámos não eram as melhores e, portanto, tivemos algumas dificuldades em definir a nossa posição de voto. Nesse sentido, rectificava a nossa posição, dizendo que o Grupo Parlamentar do CDS se( absteve na votação do projecto de lei 105/III.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Soares Cruz, para efeitos de registo, V. Ex.ª já fez a declaração. Mas é apenas para efeitos de registo, uma vez que a votação já foi realizada.

O Sr. Soares Cruz (CDS): — Sr. Presidente, para evitar novamente estas situações, agradecia a V. Ex.ª que apenas pusesse em votação quando na sala estivessem, de facto, reunidas as condições necessárias para o efeito.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Soares Cruz, antes de pôr à votação este projecto de lei fiz quatro ou cinco apelos para que isso acontecesse.

O Sr. Carlos Lage (PS): — É verdade!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rebelo de Sousa.

O Sr. Manuel Rebelo de Sousa (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista votou favoravelmente o projecto de lei n.° 105/III, apresentado pela ASDI à Assembleia da República, pelas seguintes razões fundamentais:
Em primeiro lugar, porque o estipulado no sobredito projecto poderá contribuir para uma adequada informação acerca da afectação dos recursos humanos disponíveis à esfera produtiva da economia nacional;
Em segundo lugar, porque a iniciativa legislativa em causa permitirá uma maior transparência ao nível dos

Página 3842

3842 I SÉRIE — NUMERO 102

mecanismos de funcionamento do mercado de trabalho se, entretanto, vier a ser articulada com uma adequada política de informação;
Em terceiro lugar, porque o projecto de lei n.° 105/III possibilita o conhecimento das zonas de estrangulamento existentes, designadamente no que se refere aos índices de produtividade do factor produtivo de trabalho e às flutuações da oferta e da procura, inclusive a nível sectorial e regional;
Em quarto lugar, porque o sobredito projecto permitirá a ulterior implementação de políticas de desenvolvimento sectoriais e regionais adequadas à análise da dotação de factores existentes e, bem assim, a concretização de uma nova política de emprego, em articulação com uma nova política de formação profissional.
Convirá, finalmente, salientar que o projecto de lei n.° 105/III se apresenta, simultaneamente, inovador e realista, quer no que se refere ao seu âmbito quer no que concerne ao faseamento da sua aplicação.
O PS, como partido democrático que é, não se bate, apenas, pelas suas iniciativas legislativas, mas também por todas aquelas que se apresentam válidas, como é o caso da que foi agora submetida à aprovação da Assembleia da República.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Lopes.

O Sr. Manuel Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos favoravelmente a lei resultante do projecto n.° 105/III, porque ao contrário das antidemocráticas iniciativas legislativas governamentais em matéria laborai, a Lei do Balanço Social, embora tímida nalguns aspectos, não deixa de ter um carácter inovador e criador, respeita o quadro jurídico-laboral vigente, e por isso, em nosso entender, enquadra-se nas aquisições democráticas que o 25 de Abril permitiu aos Portugueses conquistar e consagrar no nosso texto fundamental.
No essencial, a lei que agora acabamos de votar pode ser tida como uma lei consensual. Isto porque, se, por um lado, pode servir uma estratégia empresarial no domínio da «gestão de pessoal», obriga, no entanto, a que esta mesma gestão seja melhorada, num sentido de maior objectividade e rigor. Por outro lado, esta lei, para ser aplicada correctamente, tem de criar condições que potenciem o exercício do direito de intervenção democrática dos trabalhadores na empresa, nomeadamente o controle de gestão.
E isto é tanto mais importante quanto vivemos um momento em que o patronato viola impunemente as leis e a Constituição. Não só em muitas empresas não se pagam os salários intencionalmente, como se recorre cada vez mais a medidas repressivas, e não se cumprem as obrigações decorrentes da Lei n.° 46/79, quanto ao direito à informação por parte dos trabalhadores.
Por último, importa destacar o interesse desta lei para o sistema estatístico, para a Administração e para a Inspecção do Trabalho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dissemos que apesar de positiva esta nova lei era, nalguns dos seus aspectos, tímida e insuficiente.
Podia bem ter-se ido mais longe, nomeadamente dotando-a de mecanismos que permitissem uma mais rápida aplicação tanto às empresas com 100 ou mais
trabalhadores como aplicá-la até às empresas com 50 ou mais trabalhadores. Poderiam ainda ter sido introduzidos factores como o volume de facturação anual das empresas, a funcionar como indicadores para o Balanço Social. Também no que se refere aos anexos previstos no artigo 2.°, embora consideremos o avanço conseguido em comissão positivo, nem tudo o que é importante ficou a constar do Balanço Social.
A terminar esta declaração de voto mais dois apontamentos.
O primeiro é para dizer que, evidentemente, o Balanço Social não substitui, nem esgota, nem reduz o direito à informação que a Lei n.° 46/79 consagra às comissões de trabalhadores; pelo contrário, antes o completa e confirma. Ao introduzir no artigo 3.° o dever de as empresas fundamentarem o balanço social, mais não se visa do que reforçar aquilo que hoje a lei já obriga às entidades patronais e que constitui um direito das comissões de trabalhadores.
O segundo apontamento é de reserva, porque pela prática constante de muitas empresas, existe uma fuga ao cumprimento mínimo das suas obrigações legais, sem que a Inspecção do Trabalho tenha intervenção capaz, quer no papel da dissuasão quer pela penalização dos infractores. Tão-pouco os tribunais são céleres na sua acção.
Tal como se afirma no Relatório PIAC, que o governo PS/PSD teima em esconder ao País, é necessário fazer funcionar a Inspecção do Trabalho e dar mior celeridade e eficácia aos Tribunais do Trabalho.
Queremos por fim expressar nesta Assembleia, a caminho da dissolução que, em lugar de se apadrinhar, quer por acção quer por omissão, como o faz o governo PS/PSD, a subversão da legislação laborai, bom será que num futuro próximo, na nova Assembleia a eleger pelo povo português, se accionem os mecanismos que façam cumprir e aplicar a legalidade constitucional e se aprofundem as condições que possam conduzir a uma maior democratização da sociedade portuguesa, desde os locais de trabalho ao aparelho de Estado e às instituições.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já quando da discussão do projecto de lei sobre o balanço social, apresentado pela ASDI, tivemos ocasião de salientar que na generalidade dos diplomas trazidos a esta Assembleia pela ex-maioria — diplomas com carácter nefasto — era de assinalar o carácter positivo da iniciativa da ASDI, ao trazer aqui este diploma.
Considerado no seu âmbito próprio, sem haver ilusões quanto àquilo que ele possa representar, trata-se, mesmo assim, de uma iniciativa positiva (como, aliás, assinalámos na altura da discussão) e, por isso, na votação final, o MDP/CDE votou favoravelmente.

Aplausos do PCP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presi-dente, José Vitoriano.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel António dos Santos.

Página 3843

5 DE JULHO DE 1985 3843

O Sr. Manuel António dos Santos (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD congratula-se com a aprovação do projecto de lei n.° 105/III, da iniciativa da ASDI, sobre o balanço social. E fá-lo, porque são os seus princípios programáticos, que aí estão colocados. Daí que o PSD tenha participado gostosamente em todas as etapas que conduziram a esta aprovação. De facto, a aprovação deste projecto significa a defesa e a participação dos trabalhadores na vida das empresas e a possibilidade de empresas cada vez mais fortes, onde impere, cada vez com maior profundidade, a justiça social.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meu partido solicitou, precisamente, que ficasse registada a alteração do seu voto, no sentido da abstenção, retomando o voto que aqui fez, quando este mesmo projecto foi discutido na generalidade. Entendemos, com efeito, que do projecto respeitante ao balanço social não resultam benefícios directos para os trabalhadores. Trata-se de um esforço de informação que é louvável, mas que implica uma só-brecarga burocrática para as empresas, o que nos levou precisamente a tomar a posição de abstenção.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, penso que podemos passar à votação final global...

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — Sr. Presidente, dá-me licença? É para solicitar à Mesa a verificação do quorum.

O Sr. Presidente: — Assim se fará, Sr. Deputado. Pausa.
Srs. Deputados, de momento não temos quorum. Estão presentes na sala 110 Deputados. Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): — Sr. Presidente, quando o Sr. Deputado Luís Beiroco requereu a contagem do quorum não percebi se era de funcionamento ou de votação.

O Sr. Presidente: — Era certamente quorum de votação.

O Sr. Carlos Lage (PS): — Então, se era quorum de votação, o Sr. Presidente deve fazer esforços para que os Srs. Deputados que estão em comissões possam vir ao Plenário e aqueles que estão a trabalhar nos seus gabinetes possam regressar.

O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr. Deputado.

Pausa.

Srs. Deputados, neste momento exacto já há quorum. No entanto, faltam 3 minutos para as 20 horas e creio que não temos tempo para prosseguir com os debates e a votação.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): — Sr. Presidente, V. Ex.ª tinha anunciado, se bem entendi, uma votação. O Sr. Deputado Luís Beiroco pediu a contagem de quorum e como há quorum tem de se votar, a não ser que algum Sr. Deputado peça, ao abrigo de qualquer figura regimental, outra coisa.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, penso que podemos passar à votação final global da proposta de lei n.° 35/III — direito de antena nas regiões autónomas.
Há um pedido de avocação pelo Plenário, que vai ser lido.
Foi lido. É o seguinte:
Ex.° Sr. Presidente da Assembleia da República:
Os deputados do Grupo Parlamentar do PSD vêm requerer, ao abrigo do artigo 154.° do Regimento, a avocação pelo Plenário da Assembleia da República dos artigos 3.° e 6.°-B da proposta de lei n.° 35/III — exercício do direito de amena na televisão na Região Autónoma dos Açores e dos artigos 3.° e 6.°-B da proposta de lei n.° 36/III — exercício do direito de antena na radiodifusão na Região Autónoma dos Açores.

O Sr. Presidente: — Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sr. Presidente, trata--se apenas de uma questão processual, mas creio que não podemos votar nestes termos o requerimento de avocação pelo Plenário. De facto, são dois diplomas distintos e o que teríamos de votar neste momento era apenas a avocação de duas disposições da proposta de lei n.° 35/III. Portanto, para não ter de obrigar os Srs. Deputados do PSD a terem de reformular o requerimento, entendê-lo-íamos apenas na primeira parte, ou seja, quando se refere à avocação dos artigos 3.° e 6.°-B da proposta de lei n.° 35/III — exercício do direito de antena na Região Autónoma dos Açores.
Quando chegássemos à proposta de lei n.° 36/III votaríamos idêntica avocação. Mas fazê-lo já é que não me parece correcto.

O Sr. Presidente: — Parece ser esse, também, o entendimento de todas as bancadas, pelo que assim se fará.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vai ser lido, pelo Sr. Secretário, o relatório da Comissão.

O Sr. Secretário. (Armando de Oliveira): — Ex.mo Sr. Presidente da Assembleia da República:
Para os devidos efeitos, tenho a honra de enviar a V. Ex.ª o relatório anexo sobre as propostas de lei n.05 35/III e 36/III, relativos ao direito de antena na radiotelevisão na Região Autónoma dos Açores.
Com os melhores cumprimentos.

O Sr. Presidente: — Sr. Secretário, desculpe interromper a leitura do relatório, mas queria avisar os Srs. Deputados de que ele é muito extenso.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

Página 3844

3844 I SERIE — NUMERO 102

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sr. Presidente, para seguirmos idêntico método quanto ao processo de avo-cação, sugeria que a Mesa lesse apenas, do relatório, o que se refere à proposta de lei n.° 35/III, ou seja, o ponto A do mesmo relatório.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, fica entendido que a sessão se prolonga para além das 20 horas, até terminarmos a leitura do relatório e procedermos à votação do requerimento de avocação ao Plenário em relação a esta proposta de lei n.° 35/III?

Vozes do CDS: — Não, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: — Nesse caso, vamos ficar por aqui, Srs. Deputados.
A sessão de amanhã, sexta-feira, tem início às 10 horas prolongando-se até às 18 horas, com interrupção às 13 horas e recomeço às 15 horas.
A primeira parte da ordem do dia é preenchida com os seguintes diplomas: o primeiro orçamento suplementar da Assembleia da República; o projecto de resolução n.° 55/III, que cria lugares no quadro de pessoal da Assembleia da República; o parecer da Comissão de Regimento e Mandatos não autorizando o deputado Costa Fernandes a depor como testemunha; e o processo de urgência para apreciação do projecto de lei n.° 514/III — enquadramento da concessão de subsídios,, subvenções e outros benefícios financeiros —, subscrito pelo PCP.
A segunda parte da ordem do dia é preenchida com a continuação da agenda anterior, composta pelas propostas de resolução n.ºs 21/III, 22/III e 23/III e o projecto de lei n.° 502/III — relativos aos acordos —, a votação na generalidade, especialidade e votação final global dos projectos de lei sobre a criação de novas cidades, vilas e freguesias e, ainda, as ratificações n.ºs 83/III, do PCP e 92/III do CDS — Decreto-Lei n.° 88/84, de 29 de Março, que aprova o novo Regime das Finanças Locais.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): — Sr. Presidente, talvez por causa do ruído, não entendi bem se o Sr. Presidente anunciou a votação para amanhã destes diplomas, que estávamos agora a votar e cuja votação foi interrompida pelo fim da sessão, bem como a respectiva hora.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, limitei-me a ler uma proposta da agenda para amanhã, que vem do Sr. Presidente da Assembleia da República e não estou informado de mais nada.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sr. Presidente, creio que há consenso, quer em termos de Comissão, quer da conferência de líderes, para que possamos continuar amanhã as votações finais globais que estavam previstas para hoje. A nossa sugestão, Sr. Presidente, iria portanto no sentido de logo que terminada a primeira parte iniciássemos a segunda com as votações finais globais dos diplomas relativos aos direitos de antena nas regiões autónomas e do Código do Direito de Autor, que, também, está pronto para ser votado.
Informou a Sr.ª Deputada Margarida Salema que temos de iniciar pela votação na especialidade, uma vez que se trata de um processo de ratificação e esgotaríamos a agenda que estava prevista para a sessão de hoje em termos de votações finais.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Catarino.

A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): — Sr. Presidente, permita-me fazer uma rectificação àquilo que o Sr. Deputado Jorge Lemos acabou de dizer. Há, efectivamente, uma votação final global para o diploma relativo aos direitos de antena na Região Autónoma dos Açores, mas não em relação à da Madeira. Tem de ser feita a votação na generalidade, na especialidade e, depois, a votação final global.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Mas é isso!

O Sr. Presidente: — Exacto, Sr.ª Deputada. Em relação à proposta de lei relativa ao direito de antena na Região Autónoma da Madeira será feita, portanto, a votação na generalidade, na especialidade e, finalmente, a votação final global.
Agora, estas votações costumam ser feitas às 18 horas e penso que, amanhã, talvez fosse conveniente antecedê-las, porque a sessão termina às 18 horas. Talvez às 16 horas.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): — Sr. Presidente, é apenas para dizer que se de facto foi esse o acordo na conferência de líderes, achamos bem. Quanto à hora da votação penso que é dispensável, na justa medida em que podia ser feita a seguir à primeira parte.

O Sr. Presidente: — Fica, então, assim entendido, Srs. Deputados. Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 30 minutos.

Entraram durante o sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Alberto Manuel Avelino.
Almerindo da Silva Marques.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António Manuel Azevedo Gomes.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
João Luís Duarte Fernandes.
Jorge Lacão Costa.
José de Almeida Valente.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto Basto Mota Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Maria Roque Lino.
Leonel de Sousa Fadigas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Walter Ruivo Pinto Gomes Rosa.

Página 3845

5 DE JULHO DE 1985 3845

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Alberto Augusto Faria dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Fernando José da Costa.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Maurício Fernando Salgueiro.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Bento Gonçalves.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Pereira.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Paulo Manuel Pacheco Silveira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

António Dias Lourenço.
António José Cardoso Silva.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Georgete de Oliveira Ferreira.
João António Torrinhas Paulo.
Joaquim Gomes dos Santos.
José Manuel Lampreia Patrício.
José Rodrigues Vitoriano.
Luís Francisco Rebelo.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Luísa Mesquita Cachado.
Maria Margarida Tengarrinha.
Octávio Rodrigues Pato.
Zita Maria Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Alexandre Carvalho Reigoto.
Eugênio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Henrique José Pereira de Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
João Lopes Porto.
José António Morais Sarmento Moniz.
José Miguel Anacoreta Correia.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António Almeida Vasconcelos.
Manuel Jorge Forte Góes.
Narana Sinai Coissoró.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Abílio Aleixo Curto.
António Gonçalves Janeiro.
Avelino Feliciano Martins Rodrigues.
Joaquim Manuel Ribeiro Arenga.
Manuel Filipe Santos Loureiro.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rui Fernando Pereira Mateus.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
José Vargas Bulcão.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui Manuel de Oliveira Costa.

Partido Comunista Português (PCP):

José Manuel Antunes Mendes.

Centro Democrático Social (CDS):

António José Bagão Félix.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Augusto Gama.
José Vieira de Carvalho.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Declarações de voto relativas à ratificação n.° 95/III —Decreto-Lei n.° 116/84, de 6 de Abril, enviadas à Mesa para publicação.
O Partido Social-Democrata votou favoravelmente a ratificação do Decreto-Lei n.° 116/84, introduzindo benfeitorias que apontam para uma mais alargada autonomia do poder municipal, conferindo-lhes a possibilidade da sua própria organização, em moldes que lhes permitam uma maior rentabilização de serviços, maior mobilidade de pessoal e também mais rigoroso e justo enquadramento do mesmo.
Destacamos particularmente:
1) O aclaramento da norma prevista no artigo 5.°, n.° 2;
2) O mais claro reforço da norma que prevê o recurso aos GAT para o necessário apoio técnico;
3) A maior responsabilização na percentagem das verbas afectas ao pessoal, que se reportam agora às receitas e não às despesas, conforme o previsto no Decreto-Lei n.° 116/84;
4) Introduziu-se a norma que assegura aos substitutos legais dos assessores autárquicos as regalias que àqueles cabem, enquanto exercerem tais funções e com a introdução de um novo n.° 4 no artigo 10.°, prevê-se o preenchimento do quadro de pessoal, a ser implementado por fases;

Página 3846

3846 I SÉRIE — NUMERO 102

6) Ainda se reconhece o direito aos funcionários do quadro geral administrativo que se encontrassem a desempenhar funções em regime não definitivo a serem providos, a título definitivo, para o lugar que viessem desempenhando, por simples deliberação dos órgãos do município.
Assembleia da República, 5 de Julho de 1985. — Os Deputados do PSD: António Roleira Marinho — Machado Lourenço — Marques Mendes.
Declaração de voto
O Grupo Parlamentar do PCP votou negativamente o conjunto de alterações ao Decreto-Lei n.° 116/84, pelo sentido globalmente negativo que tais alterações revelam. As pequenas precisões de carácter positivo e de melhoria do texto referem-se às perspectivas de carreira que se introduzem para os chefes de secretaria das assembleias distritais e no acesso a chefes de repartição e a alguns normativos referentes à extinção do quadro geral administrativo e ao regime de transição desses trabalhadores para os lugares dos quadros próprios dos municípios.
Mas, no essencial, manteve-se, pela rejeição feita, por parte do PS, PSD e CDS das propostas de substituição e eliminação apresentadas, nesse sentido, pelo Grupo Parlamentar do PCP, o nodal do Decreto-Lei n.° 116/84 e designadamente:
a) A «legislação» dita «especial» aplicável aos Municípios de Lisboa e Porto;
b) Uma terminologia falsamente imbuída de técnica de gestão, manifestamente pretensiosa e não definitória, como a utilizada no artigo 3.° com a epígrafe geral «Princípios de gestão de serviços»;
c) Não ficou assegurada a participação dos trabalhadores na definição das «regras de mobilidade entre os quadros» e é mantido o conceito, não definido nem consolidado, de zonas de média e extrema periferia, como se refere no artigo 5.°;
d) Manteve-se, também, o preceito —artigo 6.° — de as autarquias serem campo de aplicação dos decretos sobre excedentes na Administração Pública central;
e) Manteve-se no conjunto de disposições sobre pessoal dirigente (artigo 7.°) para além da possibilidade de permanência por tempo indeterminado do «director do projecto municipal», a preferência pêlos diplomados do CEFA, não tendo sido aceite a indicação de diplomados «por institutos oficiais de formação especializada, em condições a regulamentar», o que é discriminatório;
f) Manteve-se, ainda, no conjunto de disposições sobre os Gabinetes de Apoio Técnico (artigo 9.°) um dispositivo de intervenção da administração central, em formas menos correctas e de pendor intervencionista;
g) Manteve-se a opção fundamental sobre o limite das despesas efectuadas com o «pessoal do quadro» e com o «pessoal em qualquer outra situação», potencíando-se, assim, o recurso ao despedimento de trabalhadores;
/i) Manteve-se que o «desrespeito pelo disposto no artigo 10.°» se considera «ilegalidade grave, constituindo fundamento para a dissolução do órgão ou órgãos responsáveis por tal facto», o que sublinha o carácter de tutela administrativa que se pretende dar ao Ministério da Administração Interna;
/) Foi rejeitada, pelo PS, PSD e CDS, a proposta presente, pelo Grupo Parlamentar do PCP, de os projectos de regulamentação do decreto-lei, deverem ser objecto de prévia consulta aos municípios e aos trabalhadores através das suas associações sindicais;
j) Manteve-se o mapa l do Decreto-Lei n.° 116/84, não sendo alterados os valores que impedem a totalidade dos municípios de criar estruturas orgânicas adaptadas às necessidades desses municípios.
Assembleia da República, 5 de Julho de 1985. — Pelo Grupo Parlamentar do PCP, Anselmo Aníbal.
Declarações de voto relativas à votação final global da proposta de lei n.° 77/III enviadas ã Mesa para publicação.
A ASDI votou favoravelmente a Lei das Rendas.
A Lei das Rendas que esta Casa acaba de aprovar é uma atitude positiva.
Positiva porque será factor de racionalização do mercado. Trará confiança ao sector, pois permitirá a animação do sector da construção civil.
A prazo, conseguir-se-á mais racionalidade e justiça social na política de habitação.
Racionalidade no mercado, porque permitirá elevar as rendas antigas que estão abaixo da justa medida e pela oferta gerada, conseguir-se-á a redução das rendas que estão acima daquela justa medida.
Justiça social porque prevê a atribuição de subsídios de renda às famílias de fracos recursos económicos.
A Lei das Rendas permitirá corrigir a situação injusta que o País tem vivido. De facto, hoje são beneficiadas as famílias já instaladas, penalizando as famílias recém-formadas, os jovens casais, as famílias que chegam às grandes cidades.
Justiça social e também solidariedade. Porque a nova lei prevê a atribuição de subsídios especiais em particular aos deficientes. Uma das propostas que o meu agrupamento viu acolhida em sede de especialidade pela Comissão Parlamentar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meu agrupamento parlamentar votou favoravelmente a Lei das Rendas.
Ela, por si só, não resolverá o problema da habitação em Portugal, mas ajudará a solucioná-lo.
Problema de habitação que será resolvido se houver uma estratégia articulada para o seu combate. Onde o Estado, o poder local, a iniciativa privada e as cooperativas serão os elementos motores dessa transformação.
Ela passará pela dinamização de auto-construção na linha do diploma sobre a habitação evolutiva e de auto-acabamento, como modalidade de grandes potencialidades e baixos custos; por uma poli-

Página 3847

5 DE JULHO DE 1985 3847

tica de apoio às cooperativas de construção de habitação, pela recuperação da intervenção estatal na produção de habitação social. Passa também pelo reforço da intervenção autárquica na construção (nesta linha importa uma intervenção reguladora no mercado de terrenos, conseguindo-se a aquisição e infra-estruturação de terrenos destinados a reserva urbanística dos municípios). Conseguir-se-á, assim, o controle de preços dos terrenos, elemento essencial no controle do custo final da habitação.
Por último, importa sublinhar a necessidade de uma política de crédito ajustada à aquisição de casa própria.

O Deputado da ASDI, Rúben Raposo.

Declaração de voto relativa à proposta de lei n.° 77/III

1 — O sector de construção, assume, na economia portuguesa, algumas características específicas.
Sendo uma indústria cujo peso no produto nacional bruto tem vindo, ao longo do tempo, a manter-se a níveis relativamente baixos, não há dúvida da sua contribuição para o crescimento económico, quer como sector produtivo que é, quer pela sua aptidão para a satisfação de necessidades essenciais e ainda pelo forte efeito de arrastamento sobre os outros ramos industriais, a sua capacidade de absorção da mão-de-obra e o curto intervalo de resposta a estímulos.
São ainda dados de facto, indubitáveis, o ser a componente habitação a principal parcela do mercado de construção.
Ora, se nos anos sessenta, o reordenamento territorial da população portuguesa e a sua concentração nos grandes centros urbanos — praticamente com apenas Lisboa, Porto, Setúbal, Aveiro e Braga a crescerem de população — alterou substancialmente as necessidades habitacionais nesses centros, determinando um agravamento nas condições de alojamento, em especial da população de menores recursos, a década de 70 ainda mais deteriorou a situação.
Para além, da instabilidade política que caracterizou o período de 1974-1977 e das alterações estruturais que o 25 de Abril ocasionou, o regresso dos retornados e o quase encerramento do mercado de trabalho europeu aos emigrantes portugueses determinaram, e ao mesmo tempo, o avolumar súbito dos níveis de procura e das necessidade habitacionais e a ruptura do modelo económico em que assentava o sistema de construção e oferta de habitações.
Baixaram, nomeadamente, níveis de produtividade, aumentaram encargos financeiros das empresas (com salários e juros derivados do recurso ao crédito), diminuíram as remessas dos emigrantes canalizadas para o sector.
O cada vez mais alto custo do produto impede de facto, assim, a crescentes camadas da população o acesso a uma habitação condigna.
2 — As políticas seguidas para obviar a tal situação procuraram, essencialmente, basear-se na alteração do modelo financeiro de suporte ao sector de habitação, visando-se através da criação de sistemas de crédito, com juros bonificados, incentivar-se a aquisição de casa própria.
Só que o mercado habitacional, vocacionado para a casa própria, não se afigura suficiente para a reanimação do sector e os sinais de «esgotamento» do modelo de suporte financeiro são evidentes.
A revisão do regime do arrendamento urbano aparece, assim, como uma forma, digamos natural, de incremento da poupança e dos capitais com destino à habitação.
3 — Assim sendo como é, a proposta de lei tinha plena justificação e constituía ainda um primeiro passo para a introdução, no regime do arrendamento urbano, do conceito de renda justa, isto é, dos elementos definidores dos valores máximos das rendas em novos arrendamentos, como dos elementos de actualização periódica dos arrendamentos antigos, inserida ainda numa política de rendimentos, pressupondo a institucionalização de um subsídio familiar de renda.
O facto de, simultaneamente, não se posiciorïarem outras políticas constituía, naturalmente, uma limitação.
Com efeito, e sem preocupações exaustivas, uma política de solos, alterações dos regulamentos e padrões de construção, o estabelecimento de «contratos--programas», garantindo níveis mínimos de realização, a padronização de componentes e elementos destinados à construção, a formação de mão-de-obra do sector, a revisão da política de crédito, o apoio do cooperativismo, a regulamentação de hospedagem doméstica, retirando-a do mesmo passo do sector da economia paralela, constituem um conjunto do que poderia ser uma política de habitação digna desse nome.
O caso de hospedagem é, aliás, paradigmático, mal se concebendo como não foi considerado e como, por exemplo, se encarará a atribuição de subsídios de renda em tais casos.
A eficácia da alteração da lei das rendas para a recuperação dos imóveis degradados ou a animação do sector é, por assim ser, e considerada isoladamente, pelo menos duvidosa.
4 — Às razõs sucintamente expostas em favor da proposta de lei acresce uma outra, mal se percebe porquê deveriam ser os proprietários de prédios urbanos a suportar os custos de uma política social de habitação e a ver congelados — nalguns casos há 40 anos — os seus rendimentos.
Consequentemente, e mesmo numa visão naturalmente céptica quanto aos benefícios previsíveis da proposta de lei, os argumentos a favor desta justificam o voto favorável que na generalidade lhe concedemos.
Penso que tal situação de partida se agravou e inverteu durante o período de trabalho em Comissão e até à subida a Plenário da proposta entretanto votada na especialidade.
Na verdade, se o acto de repartição se refere essencialmente aos outros, e se afirmar a solidariedade de todos na utilização das riquezas da terra é proclamar que no uso concreto que delas faz o homem deve ter em conta os outros, se «quem possui, possui para todos» (na velha fórmula cristã de exprimir a função social da propriedade) não podem ser soluções de liberalismo económico as adoptadas em relação a algo, tão ligado à vida dos homens, como a sua própria habitação.
Em meu entendimento, a proposta de lei, tal como saiu da Comissão, é apenas a consagração de uma solução liberal diluída no tempo, deixando ao mercado, tornado inteiramente livre ao fim de algum prazo, a resolução dos problemas.
O mesmo é dizer que beneficiando os mais fortes e abandonando os mais débeis à sua sorte.

Página 3848

3848 I SÉRIE — NÚMERO 102

Evoluiu-se, a meu ver, da ideia da renda justa, para a ideia de que todas as rendas, sem excepção, devem anualmente aumentar.
Com os consequentes factores de insegurança que a crise económica tenderá a agravar, já que não parece possa esquecer-se que o desemprego atinge 11% da população e que só no ano de 1984 os salários reais diminuíram 10% e o custo da alimentação subiu 32%.
A lei irá atingir essencialmente os estratos da população que, sem possibilidades de comprovar a sua situação de carências, verão substancialmente agravada a sua economia.
Admito se resolva o problema das rendas baixas, mas não se cuidou, sequer, de enfrentar o das rendas altíssimas. E, como disse o meu companheiro Ruben Raposo, esta é «a pedra de toque de justiça social de uma política de habitação» ( Diário da Assembleia da República, l.a série, n.° 58, de 15 de Março de 1985, p. 2403).
Mudar de casa continuará a ser mudar de renda des-proporcionalmente, penalizando os jovens, gerando a subocupação e a sobreocupação.
Os contratos de arrendamento a prazo gerarão, necessariamente, insegurança.
E a tudo isto acresce a indefinição, que permanece, sobre os subsídios (donde virá o dinheiro, e quanto, e com que condições e a quem vai ser pago).
Dir-se-á que tal situação é resolvida ligando a aplicação da lei a tal regulamentação. Afigura-se que a ,. preocupação manifestada é, além do mais, sintomática da existência de tal indefinição.
5 — As críticas à versão submetida a votação final global poderiam, aliás, ampliar-se.
Não creio que valha a pena fazê-lo numa declaração de voto.
Mas importará ainda realçar dois aspectos que contribuíram para o meu voto negativo.
Em primeiro lugar, tenho dúvidas sobre a conformidade constitucional do texto aprovado, já que, sobre ele, não foram ouvidas as regiões autónomas e
penso que deveriam tê-lo sido nos termos do artigo 229.°, alínea a) da Constituição da República e até, também por força da alínea f) do mesmo preceito.
Ainda, porquanto a suspensão da eficácia de alguns preceitos, à última hora introduzidos, é uma forma, quanto a mim, menos transparente, de fazer permanecer as ambiguidades e de prosseguir num não assumir de responsabilidades que merecem, quanto mais não seja, uma atitude de protesto. No Nouvel Observateur escreveu Michel Rocard a propósito da morte de Mendes France:
A ideia de que todo o discurso político não está necessariamente votado a tornar-se mentiroso, de que as promessas não serão forçosamente traídas, de que a esperança não é vã; numa palavra, de que o compromisso público deveria poder ser assumido por qualquer cidadão, mantém-se uma ideia profundamente nova e moderna.
Não se adiam ou suspendem soluções de cuja bondade se está convencido, nem se evitam malefícios, diluindo-os no tempo.
«Dizer a verdade, anunciar o seu calendário e as suas opções, manter os seus compromissos, falar a mesma linguagem a correlegionários e a opositores, é desde logo manifestar pelo interlocutor um reconhecimento que é garantia não apenas de democracia mas também de eficácia», sublinhava, noutra passagem do texto citado, Rocard.
Creio que se tornava necessário sublinhar isto.
No período final de uma legislatura em que são maiores a tentação do conformismo e do seguidismo, entendi ainda necessário fazê-lo pelo voto.
Assembleia da República, 5 de Julho de 1985. — O Deputado da ASDI, Magalhães Mota.

As REDACTORAS: Maria Amélia Martins — Maria Leonor Ferreira — Cacilda Nordeste.

Depósito legal n. ° 8818/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

PREÇO DESTE NÚMERO 126$00

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×