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220 I SÉRIE - NÚMERO 7

estruturais é demorada e passa pela tomada de grandes decisões em vectores qualitativos fundamentais.
Estas decisões têm de ser tomadas no quadro de uma política de desenvolvimento, que integre um vasto conjunto de processos de ajustamento estrutural, que não podem ser adiados por mais tempo nem deixados ao livre arbítrio das forças de mercado.
O Programa do Governo não define sequer os contornos genéricos dessa política. O Governo exprime, basicamente, desejos, mas é bom não confundir desejos com realidades.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Torres Couto, que, considerando todos os tempos que lhe foram cedidos, dispõe de 13 minutos.

O Sr. Torres Couto (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O ênfase dado pelo Sr. Prof. Cavaco Silva, durante a última campanha eleitoral, quanto às insuficiências e graves questões de âmbito sócio-laboral, com as quais, em muitos aspectos, estava de acordo, fez-me aguardar com enorme expectativa a apresentação do Programa do Governo, certo de que o mesmo consubstanciaria as medidas concretas que ressarcissem os trabalhadores portugueses da dramática situação em que se encontravam e encontram.
Li e reli com sofreguidão o referido Programa, nomeadamente os capítulos referentes à política de rendimentos, trabalho, emprego e formação profissional, tendo hoje de afirmar, com mágoa, ser grande a minha frustração e maior a minha preocupação pelas razões que passo a enunciar.
Umas das linhas de força da campanha eleitoral do actual Primeiro-Ministro foi, e bem, a denúncia veemente da quebra brutal do poder de compra dos salários reais nos últimos anos; e a imediata necessidade de corrigir essa situação. Constatamos, no entanto, que o Governo se propõe seguir exactamente a mesma política seguida pelo governo cessante no último ano, isto é, aponta para «uma evolução moderada dos salários, conjugada com um incremento razoável da produtividade».
Tudo vai ficar na mesma quanto à distribuição funcional do rendimento. Por incrível que pareça, os rendimentos do trabalho continuarão abaixo dos 50% nessa redistribuição, quando se esperava, no mínimo, que o Governo criasse condições para que fossem retomados, pelo menos, os níveis de 1979. Nada mais se esperava, nada mais se exigia.
Reconhece o Governo que «tudo vai ficar abaixo daquilo que o próprio Governo entendia razoável». O Governo começa aqui a reconhecer que se enganou. Fê-lo contra os trabalhadores, o que é de lamentar.
Nada refere o Governo quanto à negociação tripartida de uma norma salarial que possibilite a recuperação do poder de compra dos salários. E, contrariamente, já se começa a ouvir falar em famigerados tectos salariais, que contrariam a visão governamentalista do «mais mercado e menos Estado», que, pelos vistos, mostra que o Governo só pretende ser liberal no que concerne ao benefício dos mais fortes, sendo intervencionista quanto à penalização dos mais fracos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao capítulo do trabalho, emprego e formação profissional, estamos em presença de um texto genérico e abstracto que se limita a seriar um somatório de declarações de intenção que, em muitos casos, são louváveis, mas que não estão traduzidas em objectivos, medidas concretas, nem qualquer calendarização.
Se algumas dessas declarações de intenção têm a nossa plena concordância, é enorme a discordância em relação a outras e fundamentalmente em relação a omissões que consideramos graves.
Fica-se, em suma, com a sensação de que, uma vez mais, apesar de promessas em contrário, os custos para os trabalhadores virão já e os benefícios, esses, virão lá muito mais para diante, se vierem.
Insiste o Governo em velhos chavões como o da revisão da lei de cessação do contrato de trabalho, para uma «fetichizada» adequação à legislação dos outros países da CEE e com vista à «reformulação do conceito de justa causa». Verifica-se, assim, uma insistência numa visão jurisdicista dos problemas, face ao que se reafirma não ser admissível a diminuição das garantias dos trabalhadores, no caso de despedimentos individuais fundados em razões disciplinares, perguntando-se se com isto pretende o Governo um instrumento de gestão, ou pelo contrário, um instrumento de repressão e intimidação.
Seguidamente, com alguns anos de atraso em relação a idênticos ensaios em alguns países da OCDE, aparece o Governo retomando teorias liberais de flexibilização e de desregulamentação, de resultados funestos em todos os países onde foram ensaiadas.
Fala o Governo, primeiro, em «flexibilidade controlada na área laboral», sem especificar o que pretende alcançar com tão vago conceito, para mais adiante falar em «flexibilizar a partilha do volume de emprego existente».
Em democracia, numa sociedade com as carências e assimetrias da nossa, onde a justiça social muitas vezes não passa de um slogan, rejeitamos tudo o que de aleatório e discricionário contém esse conceito de flexibilização e só reconhecemos e aceitamos o conceito de participação total e de negociação permanente.
Com pragmatismo e sentido de responsabilidade, tudo é para nós susceptível de adaptação e até de alteração, desde que seja negociado com todas as partes envolvidas e, nomeadamente, com os sindicatos.
Quanto à flexibilização da partilha do volume de emprego existente, somos de opinião de que tal hão será conseguido através do trabalho parcial ou temporário, mas somente através da redução da idade de reforma e também redução gradual e cautelosa da duração do trabalho.
Sendo os salários em atraso uma das mais graves chagas sociais da vida portuguesa, as medidas consignadas no Programa do Governo são insuficientes e desajustadas. O Governo demonstra uma falsa generosidade ao não assegurar aos trabalhadores a recuperação do total de salários em falta, atitude contraditória com a vertente humanista que o Governo diz privilegiar, visto que, no que diz respeito à cobrança das dívidas à Segurança Social, o Governo, para além de assegurar a sua posição creditícia, diz que as taxas de juro de mora da Segurança Social serão ajustadas e ligadas à evolução das taxas de juro do sistema monetário e financeiro, situação que, lamentavelmente, não sabemos se, por lapso, não é considerada para-as dívidas aos trabalhadores.

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