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I Série - Número 9 Quarta-Feira, 27 de Novembro de 1985 273

DIÁRIO da Assembleia da República

IV LEGISLATURA

1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1985-1986)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 26 DE NOVEMBRO DE 1985

Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto Basto da Mota Torres
Rui de Sá e Cunha
José Manuel Maia Nunes de Almeida

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente e da apresentação de requerimentos.
Em declaração política, o Sr. Deputado Marques Júnior (PRD) prestou homenagem aos capitães de Abril e criticou o Governo a propósito dos recentes aumentos dos bens essenciais de consumo, tendo respondido no fim a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Lopes Cardoso (Indep. - UEDS). António Capucho e Cardoso Ferreira (PSD).
também em declaração política, o Sr. Deputado João Amaral (PCP), a propósito dos aumentos dos produtos essenciais recentemente verificados, exortou a Camará a exercer as suas funções de órgão fiscalizador da actuação do Governo, tendo proposto a realização de uma sessão de perguntas ao Governo.
Ainda em declaração política, a Sr. ª Deputada Helena Torres Marques (PS) abordou diversos aspecto; da evolução da economia e da política do actual Governo, respondendo no fim a pedidos de esclarecimento e a um protesto do Sr. Deputado Mendes Bota (PSD).
O Sr. Deputado António José Fernandes (PRD), a propósito da Cimeira de Genebra, focou alguns aspectos da política internacional.
O Sr. Deputado Carlos Carvalhas (PCP) referiu-se às graves carências da região da Grande Lisboa, salientando a necessidade urgente da implementação de legislação adequada.
O Sr. Deputado Machado Lourenço (PSD) apontou os graves problemas com que se defrontam os agricultores da tona da Lezíria Grande e Vila Franca de Xira. Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimentos dos Srs. Deputados Álvaro Brasileiro (PCP) e Correia Afonso (PSD).
Finalmente, a Câmara aprovou um voto apresentado pela Mesa da Assembleia da República sobre a recente Cimeira de Genebra.

Ordem do dia. - Foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre substituição de deputados.

niciou-se, depois, a discussão conjunta do projecto de resolução n.º 4/IV, apresentado pelo PSD, PS e CDS, sobre o regime de eleição dos deputados ao Parlamento Europeu, e dos projectos de lei n.º 47/IV apresentado pelo PSD, PS e CDS, sobre o estatuto dos deputados ao Parlamento Europeu, e n.º 46/IV, apresentado pelo PRD, sobre a eleição e estatuto dos deputados portugueses ao Parlamento Europeu.
Intervieram a diverso titulo, os Srs. Deputados António Vitorino (PS), João Amaral (PCP), Raul Castro (MDP/CDE), Magalhães Mota (PRD), Pedro Pinto (PSD), Cruz Vilaça (CDS), Pegado Liz l PRD). Lopes Cardoso (Indep. UEDS), Rui Almeida Mendes (PSD) e Joaquim Miranda (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Afonso de Sousa F. de Moura Guedes.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amélia Cavaleiro Monteiro de A. Azevedo.
António Branco Malveiro.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Barbosa de Azevedo.
António d'Orey Capucho.
António Machado Lourenço.

ntónio Joaquim Bastos Marques Mendes.
António José Baptista Cardoso Cunha.
António Roleira Marinho.
António Manuel Lopes Tavares.
Arlindo Moreira.
Arménio Jerónimo Martins Matias.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.

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Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Russo R. Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando T. Matos Vasconcelos.
Fernando Reis Condesso.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco José P. Pinto de Balsemão.
Francisco Mendes Costa.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Fernandes de A. Salgado.
João Luís Malato Correia.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Filipe de Atayde Carvalhosa.
José Francisco Amaral.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Mendes Bota.
José Pereira Lopes.
José da Silva Domingos.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luis Costa Geraldes.
Luís Jorge Cabral Tavares Lima.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel C. Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Rui Alberto Salvada.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Vasco Silva Garcia.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alfredo José Somera Simões Barroso.
António Almeida Santos.
António Antero Coimbra Martins.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Frederico Vieira de Moura.
António Gonçalves Janeiro.
António Manuel de Carvalho F. Vitorino.
António Miguel de Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Manuel Maldonado Gonelha.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando António Martins Vara.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Montez Melancia.
Helena Torres Marques.
Eduardo Ribeiro Pereira.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Jorge Lacão Costa.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto B. da Mota Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Torres Couto.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel da Mata de Cáceres.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raúl Manuel Gouveia B. Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rui do Nascimento Rabaça e Vieira.
Walter Ruivo Pinto Gomes Rosa.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Agostinho Correia de Sousa.
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça. C. Gonçalves C. Antunes.
Aníbal José da Costa Campos.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo A. de Sousa Pereira.
António Fernando Rodrigues Costa.
António José Fernandes.
António José Marques Mendes.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
Arménio Ramos de Carvalho.
Carlos Alberto da S. Narciso Martins.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Bártolo de Paiva Campos.
Eurico Lemos Pires.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Ivo Jorge de Almeida dos S. Pinho.
João Barros Madeira.
João Teixeira Leão de Meireles.
Joaquim Carmelo Lobo.
Joaquim Jorge de Magalhães S. Mota.
Jorge Pegado Liz
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José, Carlos Torres Matos de Vasconcelos.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Manuel de Medeiros Ferreira.

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José Maria Vieira Dias de Carvalho.
José Rodrigo C. da Costa Carvalho.
Maria Cristina G. da S. C. Albuquerque.
Maria da Glória M. C. Padrão e C. Carvalho.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Rui de Sá e Cunha.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço da Silva.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Margarida C. Tengarrinha C. Costa.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
António José Tomás Gomes de Pinho.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Henrique Manuel Soares Cruz.

Hernâni Torres Moutinho.
João Gomes de Abreu Lima.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Augusto Gama.
José Luís Cruz Vilaça.
José Maria Andrade Pereira.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Manuel Eugénio P. Cavaleiro Brandão.
Narana Sinai Coissoró
Pedro José Del Negro Feist.
Ruy Manuel Correia de Seabra.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

José Manuel do Carmo M. Tengarrinha.
Raul Fernandes de Morais e Castro.

Deputados independentes:

António Poppe Lopes Cardoso (UEDS).
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles (PPM).
Maria Amélia do C. Mota Santos (Os Verdes).

Antes da ordem do dia

Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte:

Expediente Cartas

Dos trabalhadores deficientes na empresa MESSA, remetendo uma proposta no sentido de lhes ser facultado o acesso ao seguro de desemprego, uma relação com a identificação desses mesmos trabalhadores e seus agregados familiares, e solicitando a concessão de uma audiência a S. Ex.ª o Presidente desta Assembleia.
Do conselho executivo da Associação Livre dos Objectores e Objectoras de Consciência, com sede em Odivelas, solicitando que sejam tomadas medidas tendentes à prorrogação dos prazos previstos na Lei n.º 6/85, de 4 de Maio, e fundamentando tal solicitação.
De Maria Madalena Forbes Leal Machado, residente em Penafiel, dando conta da sua indignação e do grupo de pessoas que diz representar, pela exibição do filme Je vous salue Marie.
Contendo abaixo-assinado dos trabalhadores da Santa Casa da Misericórdia de Oeiras, solicitando que seja revisto o Decreto-Lei n.º 9/85, de 9 de Janeiro, pois a sua aplicação determinou a perda de direitos anteriormente adquiridos, em matéria de isenção do imposto profissional.

Ofícios

Do Sindicato dos Professores do Norte, com sede no Porto, dando conta de reuniões efectuadas em Braga, Tadim, Guimarães e Caldas das Taipas, exigindo a revogação da Lei n.º 56/78 e do Decreto-Lei n.º 74/78, que regulamenta a contagem do tempo de serviço para efeitos de fases.
Do Sr. Presidente da Câmara Municipal de Mértola, remetendo exemplar de uma moção aprovada em reunião daquela autarquia no passado dia 15 do corrente, sobre a UCP - Freguesia Sem Medo.
Da Câmara Municipal de Palmela, remetendo o texto de uma moção aprovada em reunião efectuada naquela autarquia no dia 8 do corrente mês, na qual é exigida a revogação do Decreto-Lei n. º 381-F/85, de 28 de Setembro, sobre o pessoal auxiliar nas escolas do ensino primário e jardins-de-infância.
Da direcção da Associação dos Monitores da Telescola, em Vila Nova de Gaia, remetendo um exemplar do seu quadro reivindicativo e solicitando a concessão de audiências.
Do Sr. Conselheiro Presidente do Tribunal de Contas, datado de 12 do corrente mês, anexando fotocópia do acórdão deste Tribunal, que julgou a conta de gerência da Caixa Geral de Depósitos, referente ao ano de 1984.

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Telegrama

Do Senado Italiano, subscrito por Amiritóre Fanfani, datado de 14 do corrente mês, comunicando a ratificação por unanimidade do Tratado de Adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia.

«Telex»

Das direcções das UCP/cooperativas e estruturas de apoio do distrito de Setúbal, reunidas em Alcácer do Sal no passado dia 13 do corrente, exigindo que seja reposta a legalidade democrática no sector da Reforma Agrária.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Nas últimas reuniões plenárias foram apresentados os seguintes requerimentos: no dia 14 de Novembro de 1985, aos Ministérios da Saúde e da Educação e Cultura, formular, dos pelo Sr. Deputado Barbosa Costa; à Secretaria de Estado para os Assuntos da Comunicação Social, formulado pelo Sr. Deputado Sousa Pereira; à Secretaria de Estado do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Armando Fernandes; a diversos ministérios (5), formulados pelo Sr. Deputado António José Marques Mendes; ao Ministério das Obras Públicas (2), formulados pelo Sr. Deputado Dias de Carvalho.
No dia 15 de Novembro de 1985, ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado António Joaquim Marques, Mendes; ao Ministério da Educação e Cultura, formulado pelos Srs. Deputados Rogério Moreira e Jorge Lemos; ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Brasileiro.
No dia 19 de Novembro de 1985, ao Governo è ao, Ministério das Obras Públicas (3), formulados pelo Sr. Deputado Álvaro Brasileiro, ao Ministério da Educação e Cultura (2), formulados pelos Srs. Deputados Rogério Moreira, Jorge Lemos e António Feu; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Adriano Moreira; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelos Srs. Deputados António Mota e Maia Nunes de Almeida; ao Ministério do Plano e da Administração do Território, formulado pelo Sr.Deputado Rodrigues Costa; ao Ministério da Educação e Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Pereira Lilaia; ad Ministério da Educação e Cultura e à Comissão para a Integração Europeia, formulados pelo Sr. Deputado José Tengarrinha; à Comissão para a Integração Europeia, formulado pelo Sr. Deputado Raúl Castro.
No dia 20 de Novembro de 1985, ao Ministério da Indústria e Comércio, formulado pelos Sr. Deputado Manuel Silvestre e outros; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Vidigal Amaro; ao Governo (4), formulados pelo Sr. Deputado Sousa Pereira; ao Ministério da Educação e Cultura, formulado pelos Srs. Deputados António Mota e Vidigal Amaro; ao Ministério do Plano e da Administração do Território, formulado pelos Srs. Deputados Anselmo Aníbal e Rodrigues Costa; ao Governo e ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulados pela Sr.ª Deputada Zita Seabra; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado: João Meireles; ao Ministério da Educação e Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Armando Fernandes; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado António José Fernandes; ao Sr. Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado Pegado. Liz; ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, formulado pelos Srs. Deputados. António Feu e Carlos Ganopa.
No dia 21 de Novembro de 1985, ao Governo, formulado pelos Srs. Deputados Alexandre Manuel e Álvaro Brasileiro; à Direcção-Geral de Energia, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Dias de Carvalho; aos Ministérios da Justiça e da Indústria e Comércio, formulados pelos Sr.ª Deputada Maria Odete Santos e outros; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Anselmo Aníbal e Jerónimo de Sousa; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelos Srs. Deputados Coimbra Martins e Alísio Fonseca; ao Governo, formulado pelos Srs. Deputados Carlos Brito e Margarida Tengarrinha; aos Ministérios do Trabalho e Segurança Social e das, Finanças, formulados pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 45/IV* apresentado pelo Sr. Deputado Jorge Correia, do PS, relativo à elevação de Seia à categoria de cidade, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; projecto de lei n.º 48/IV, apresentado pelos Sr. Deputado Octávio Teixeira e outros, do PCP, revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado (Lei n.º 40/83, de 13 de Setembro); que foi admitido e baixou à 5.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam-me que, no momento em que pela primeira vez tomo a palavra nesta Casa, recorde todos os democratas que na luta pela liberdade tornaram possível que em Portugal se viva em democracia.

Aplausos do PRD, do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos.

Perdoe-se-me que refira, de entre todos, os militares de Abril, em especial aqueles de quem ninguém sabe o nome e que, indiferentes às luzes da ribalta política, discreta e humildemente, são ainda hoje um dos garantes da democracia em Portugal.

Aplausos do PRD e do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos.

Esses homens, militares de profissão e de vocação que nada mais desejam do que servir com dignidade a sua Pátria e que hoje tantas dificuldades sentem em preservar um simples local onde seja possível manter viva a mensagem cívica e cultural do 25 de Abril.
Permitam-me ainda uma nota pessoal para exprimir a minha grande satisfação e emoção, para não dizer orgulho, por me encontrar no meio de vós, coroando, no fundo, aquilo que para mim representa a essência da minha intervenção .em 25 de Abril de 1974.
Nesse dia foi a revolução necessária pela qual o povo português tanto ansiava. Agora, em democracia, é para mim o culminar daquilo que foi um bonito sonho e pode ser hoje uma realidade: usar da palavra livremente no local que representa em si a essência da democracia, perante os eleitos do povo português, e, sendo um de entre eles, poder falar em seu nome.
No uso desse direito, e julgando interpretar o sentimento profundo de muitos portugueses que em 6 de

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Outubro, passados quase 12 anos do 25 de Abril, mostraram que continuam a ter esperança e exigem que os seus problemas mais prementes sejam resolvidos, gostaria de recordar o que foi afirmado pelo presidente do Partido Renovador Democrático na sessão de encerramento da discussão do Programa do Governo: «procuraremos, enquanto grupo parlamentar, desenvolver uma acção profunda e positivamente crítica da acção do Governo» e as «nossas posições serão sempre ditadas pela nossa própria consciência e pelo desejo de bem servir o País».
O PRD acrescentou ainda considerar indispensável que o Governo fosse corrigindo constantemente a sua actuação e buscando consensos alargados, políticos e sociais. «O PRD terminou por acrescentar que manteria nesta Assembleia uma acção fiscalizadora da actividade governativa nos seus múltiplos aspectos e com iodos os meios que a Constituição lhe fornece», paulando «a sua posição perante o Governo pelo que for a sua acção concreta e pelo que em nossa consciência entendermos serem o interesse de Portugal e dos Portugueses».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na qualidade de membro da comissão directiva nacional do Partido Renovador Democrático, quero deixar expressa a surpresa com que o meu partido tomou conhecimento, através da RTP, dos aumentos dos preços decretados pelo Governo, aumentos que incidiram principalmente sobre os bens de primeira necessidade - precisamente aqueles que mais afectam a quase sobrevivência de muitas famílias portuguesas, tanto mais que na hierarquia das prioridades deste Governo devia estar, como constava do seu própria programa eleitoral, algumas medidas, como a resolução dos salários em atraso, que por esta forma ainda são mais gravemente verificadas.

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Orador: - O «secretismo» de que se revestiram as medidas anunciadas pelo Governo, privilegiando, inclusive, para a sua divulgação, o único órgão de comunicação social (talvez o mais controverso e por certo mais criticado), parece contradizer a ideia de transparência com que o Governo se quis apresentar perante esta Assembleia.
De facto, decretados os aumentos, passados que foram só 2 dias sobre a discussão do Programa do Governo, em que as questões económicas estiveram particularmente em foco, não se compreende que não tivessem sido referidas, concretamente, as medidas que pensava tomar a tão curto prazo, justificando-as no que parecia ser o local apropriado e o momento oportuno.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Além disso, o Governo não contactou nem os partidos políticos, nem os parceiros sociais, nem as próprias regiões autónomas, assim parecendo contrariar de uma forma explícita os propósitos que diz defender.
Fez mal. Ou, se me permitem, de uma certa forma pode ter feito bem, porque, se esta for a sua forma de actuar, não é conveniente que as pessoas se enganem por muito tempo. Veremos agora se o Governo vai seguir a via que anunciou durante o debate do seu Programa ou aquela que agora levou à prática.
A repetida afirmação de transparência invocada pelo Governo, referente a todos os actos de administração e o seu relacionamento com todos os agentes activos da vida pública, fica, por este processo, grandemente ofuscada, se não mesmo comprometida.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Renovador Democrático quer deixar claro que este tipo de actuação não perspectiva nada de bom e repudia de forma enérgica não só os aumentos de preços verificados como a oportunidade e a forma que eles revestiram.
O Governo aumentou as pensões nas vésperas da apresentação do Programa do Governo e da sua discussão, aumentou os preços dos bens essenciais 2 dias depois do encerramento do debate. Não é isto já uma prova de uma relação enviesada que o Governo quer imprimir na sua relação com os eleitos dos Portugueses?
Por outro lado, e isto é a essência da questão, como justificar os aumentos do pão e do leite num país em que alguns estratos da população passam fome?
Como justificar, também, os aumentos dos combustíveis num contexto internacional favorável (descida do dólar e dos preços dos produtos petrolíferos)?
Será que o Governo justifica este aumento por razões orçamentais?
Mas se é o défice do Fundo de Abastecimento que está em causa, por que fugiu o Governo à discussão do assunto com os partidos e os parceiros sociais? Será assim que o Governo logrará superar os «buracos ocultos» do Orçamento e praticar uma política orçamental de «verdade»?
Mas, independentemente da lógica fria dos números e das explicações muito tecnocráticas, a verdade é que são as camadas mais desfavorecidas da população (os pensionistas, os idosos, os desempregados, os trabalhadores com salários em atraso e até os jovens) que mais sofrem com estes aumentos.
Saberão de facto os governantes deste País que há pessoas com fome em Portugal? Não falo, neste momento, na fome de justiça, na fome de dignidade, na fome de verdade, falo simplesmente na fome-fome, aquela que se mata com o pão e o leite ... o mesmo pão e leite que aumentou!...
Conhecem, por acaso, os governantes que há crianças neste País que procuram nos caixotes do lixo e nas lixeiras alimentos, para matar a fome?
Como deputado eleito por Setúbal, distrito onde se fazem sentir de uma forma extrema situações deste género, direi que estas são, verdadeiramente, a justificação da nossa empenhada luta na defesa dos mais desfavorecidos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Renovador Democrático ao não inviabilizar o Governo assumiu uma atitude responsável, mas ficou claro que este não tinha a sua confiança.
Os indícios de uma acção menos justa do Governo que, mais que indícios, são já duras realidades, que começaram já a pesar sobre o Portugueses, com especial incidência sobre aqueles a favor de quem devem ser orientados os nossos esforços.
Não começou, pois, este Governo da melhor maneira.
Esqueceu o nosso aviso. Ignorou as promessas eleitorais. Frustrou as esperanças de muitos portugueses.
Para quem pretende governar no diálogo, o Governo escolheu o monólogo. Para quem pretende governar na

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transparência, o Governo escolheu a penumbra. Para quem pretende governar em paz social, o Governo escolheu o conflito. Numa palavra, o Governo optou...
e optou mal.
Parece ter esquecido que o povo português não perdoa a quem o ignora ou dele só se lembra nos períodos eleitorais. A recente lição; eleitoral não pode nem deve ser esquecida pelos políticos responsáveis.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por tudo quanto foi dito, o PRD não pode deixar de considerar que a actuação do Governo neste caso foi francamente condenável. Nas primeiras medidas que tomou, o Governo votou os partidos ao ostracismo, o que é ainda mais significativo se for tido em conta que o Governo dispôs de condições altamente propícias para o diálogo, no quadro da discussão do seu Programa nesta Assembleia.
O Governo não cumpriu, portanto, as suas promessas de abertura, transparência e, diálogo.,
Pela sua parte, o Partido Renovador Democrático, de acordo com o que tem afirmado, vai fiscalizar a acção governativa de uma forma clara e inequívoca. E gostaria de perguntar, neste momento, qual é, realmente, o caminho que o Governo pretende seguir.

Aplausos do PRD, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.-UEDS): - Sr. Deputado Marques Júnior, antes de mais, permita-me que me associe à homenagem que prestou aos capitães de Abril.
Dito isto, a questão que gostaria de colocar tem a ver um pouco com a perplexidade com que escutei a intervenção que V. Ex.ª produziu. Oito dias depois de ter viabilizado o governo PSD, o PRD vem aqui tentar separar-se, descomprometer-se, da atitude que assumiu e manifestar-se espantado com o comportamento do Governo, que - para usar as palavras do Sr. Deputado - «frustrou as esperanças do povo português, que traiu as promessas eleitorais, que foi francamente condenável na atitude que assumiu».
Ora, não compreendo esta atitude do PRD, que há 8 dias atrás depositava todas as esperanças neste Governo, a ponto de o viabilizar, e que agora vem aqui criticá-lo desta maneira. A mim, este Governo não me causou nenhuma desilusão porque, ao contrário dos senhores, nunca tive ilusões quanto a ele e sempre votei contra ele.
Porém, a questão concreta que gostaria de colocar é a seguinte: perante esta frustração dos anseios do povo português, esta traição às promessas eleitorais e a forma condenável como o Governo está a actuar, vai o PRD - para esclarecer de uma vez por todas a sua própria posição e ao abrigo dos direitos regimentais que lhe cabem - interpelar o Governo para que este explique aqui essas tomadas de posição e os aumentos de preços a fim de saber qual é realmente a sua política económica? Ou, quando não lhe convém, vai, continuar a fingir que não sabe e a assobiar para as árvores, por um lado, e, por outro, vai condenar a política do Governo quando eleitoralmente isso lhe pode convir?
Ao fim e ao cabo, Sr. Deputado, a intervenção que V. Ex.ª produziu e a actuação do Governo levam-me a concluir que tinha razão: o PSD, ao promover agora esta política de aumento de preços imediata para eventualmente durante ò próximo ano não mexer nos preços, com vista às eleições antecipadas,: está a revelar o seu. verdadeiro programa, que é o de governar para as próximas eleições; e o PRD, procurando fazer esquecer que é o responsável número um pela existência do Governo, vem agora aqui tentar demarcar-se das posições do Governo, pensando ele também nas eleições antecipadas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Marques Júnior, há mais Srs. Deputados inscritos para formular pedidos de esclarecimento. V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Prefiro responder no fim,: Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Deputado Marques Júnior, ouvi com muita atenção a exposição de V. Ex.ª e, como gosto de ser frontal, começarei por dizer que no que toca à questão dos preços, a sua intervenção raiou a demagogia.
Gostaria de parafrasear as oposições no último debate que aqui travamos sobre o Programa do Governo para lhe dizer que, a propósito daquilo que se disse ser a expressão numérica do apoio parlamentar ao Governo, esta revisão de preços significou o menor aumento percentual de sempre.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ë certo que estes aumentos incidem sobre produtos essenciais, mas também é certo - e isto p Sr. Deputado esqueceu-se de referir T- que, segundo o. compromisso do Governo, estes não voltarão a ser aumentados durante o próximo ano de 1986. Daí que o Sr. Deputado, mesmo que seja muito pessimista, terá de admitir que esta expressão dos. aumentos verificados não só é completamente compatível com a estratégia económica do Governo no sentido de suster a inflação nos 14.%.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... - compromisso aqui explicitado pelo Governo - como também esta expressão da subida dos preços será certamente inferior ao aumento dos salários e das pensões.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, a revisão da contratação colectiva está, e vai continuar a proporcionar ajustamentos salariais que traduzem melhorias, embora não espectaculares, do poder aquisitivo das classes trabalhadoras e dos pensionistas. Nessa linha, o Sr. Deputado não considera, por exemplo, que o aumento das pensões já decretado pelo Governo se traduz e se continuará a traduzir pela melhoria do poder aquisitivo dos beneficiários e. ainda por cima de forma mais acentuada para aqueles que têm as pensões mais degradadas? Isto por-

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que, tal como sabe, estes aumentos estão limitados a 8000$ e aqueles beneficiários que têm pensões na ordem dos 40 000$ ou superiores terão uma percentagem de aumento regressiva.
Por outro lado, o Sr. Deputado não considera que a questão do secretismo de que acusa o Governo é a forma mais adequada de actuar, neste caso concreto, nas revisões pontuais de preços de bens, já que é a única maneira de evitar o açambarcamento que o anúncio público dos aumentos de preços sempre provoca na opinião pública?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por outras palavras, o Sr. Deputado não considera que a estratégia fundamental deste Governo é repor - e isto pela primeira vez depois do governo Sá Carneiro - e mesmo melhorar o poder de compra das classes trabalhadoras e dos pensionistas?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Está-se a ver!

O Orador: - Ora, se isso for concebido, não haverá grande problema em pequenos ajustamentos, pois estes serão os menores ajustamentos de sempre em alguns bens e serviços.
Sem prejuízo dos esclarecimentos que o Sr. Deputado Marques Júnior tiver a bondade de dar, na altura considerada oportuna - e depois do conjunto destas medidas ser explicitado pelo Governo, outras se seguirão e presumivelmente ainda hoje, como foi anunciado no Conselho de Ministros, algumas medidas que têm a ver com esta matéria serão tornadas públicas -, a minha bancada fará uma declaração política sobre o assunto.

Aplausos do PSD.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Ainda ficamos a dever dinheiro ao Cavaco!

O Sr. Presidente: - Finalmente, para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Deputado Marques Júnior, numa passagem da sua intervenção, V. Ex.ª referiu um tema já largamente abordado, o da fome em Setúbal e as dificuldades da população do distrito. É verdade - e nunca o meu partido nem nenhum dos deputados eleitos por aquele distrito o recusou - que há sérias dificuldades para a população de Setúbal. Porém, gostaríamos de ter ouvido V. Ex.ª dar uma explicação para essas dificuldades.
O País sente uma crise, mas o que é facto é que ela e muito mais acentuada no distrito de Setúbal.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Isso é mentira!

O Orador: - Gostaríamos, pois, dê o ter ouvido dizer que essa razão se filia no facto de haver uma força política dominante, nomeadamente a nível das autarquias, que é contrária ao progresso, ao desenvolvimento e à criação de postos de trabalho, porque só gerindo um descontentamento e uma razão de queixa permanente das populações é que é possível manter níveis de implantação até agora mantidos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Gostaríamos de ter ouvido tudo isso da boca do Sr. Deputado, mas, porventura, a origem de uma parte dos votos que o seu partido obteve no distrito não o terão permitido. Lamentamos esse facto e aguardamos os esclarecimentos que V. Ex.ª terá para nos proporcionar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, devo confessar que fiquei um pouco perplexo com as perguntas que o Sr. Deputado Lopes Cardoso fez. Certamente que não terá sido por falta de atenção que o Sr. Deputado não acompanhou a declaração de encerramento do debate sobre o Programa do Governo que foi feita pelo presidente do meu partido, onde se encontram as posições do meu partido relativamente a este Governo e ao Programa em discussão.
Nessa altura foi claramente dito que este Governo não detinha a confiança do Partido Renovador Democrático, que este não depositava no Governo todas as suas esperanças - tal como o Sr. Deputado disse - e entendemos que a nossa atitude foi politicamente correcta e responsável. Aliás, devo dizer que 8 dias depois de ter viabilizado o governo PSD, o PRD não está arrependido da posição que tomou.
Ora, isso não significa que o PRD não vai seguir, de uma forma muito atenta, a acção deste Governo. A cada momento e a cada passo, de acordo com as missões que constitucionalmente lhe competem, o PRD vai, como partido da oposição, seguir muito de perto a actuação deste Governo. A nossa posição face às últimas medidas tomadas pelo Governo é a prova cabal da nossa constante preocupação e da nossa permanente vigilância sobre a atitude deste Governo.
Pensamos que assim poderemos contribuir de forma decisiva e determinante para a clarificação política do nosso país e ajudar a que um governo em Portugal possa governar melhor.
Portanto, até podemos conceder a este Governo um certo benefício da dúvida, quer dizer, acreditamos que seja possível um governo minoritário governar razoavelmente bem Portugal. O que é necessário é a oposição - e assumimos essa responsabilidade - exercer a sua acção. Nesse sentido, vamos procurar assumir a nossa acção de oposição de uma forma perfeitamente determinada e em todas as circunstâncias. Portanto, quanto a invocarem-se disposições regimentais para, no momento oportuno, interpelar o Governo, pois naturalmente que o PRD não exclui essa hipótese. Deve é reservar-se o momento que se considere oportuno para tomar essa e, eventualmente, outras atitudes em relação a este Governo.
O Sr. Deputado António Capucho diz que a minha intervenção raiou a demagogia e referiu-se concretamente ao problema da inflação e do aumento dos preços.
Embora não seja um expert na matéria, creio que desta vez o nível da inflação foi o menor desde 1976. De qualquer modo, todos estes aumentos têm como objectivo claro o de viabilizar os 14% da inflação, que o Governo se comprometeu a não ultrapassar no próximo ano.

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Mas aquilo que eu e o PRD quisemos deixar claramente expresso - e, provavelmente, não terei sido tão claro como pretendia - foi a falta de transparência que o Governo teve face à Assembleia da República. Porque o Sr. Primeiro-Ministro disse aqui, no decurso, da apresentação do Programa do Governo, que iria privilegiar o diálogo, que iria privilegiar o contacto com todas as forças políticas e parceiros sociais e fazer do diálogo a sua prática. Enfim, toda a sua prática política seria de uma transparência inequívoca!
Efectivamente, pensamos que isso não aconteceu no local adequado: quando o Programa do Governo foi aqui discutido, essa seria; no entendimento do PRD, a altura ideal para estes assuntos serem explicitados no Parlamento, nomeadamente o Governo deveria, ter dito quais as medidas que tencionava implementar a curto prazo. De facto, o Governo aumentou as pensões sor ciais, mas seria correcto, para que essa transparência não pudesse ser posta em dúvida, que dissesse quais as medidas que a curto prazo, iria adoptar.
E, relativamente ao poder de compra dos trabalhar dores, por que é que não aumentou primeiro os salários e depois não fez os aumentos?
Sobre a declaração política que o Sr. Deputado António Capucho diz que o PSD irá fazer a curto prazo na Assembleia da República, quero dizer que o PRD a aguarda com muita ansiedade embora pensemos que essa declaração já deveria ter sido feita.
Relativamente à intervenção do Sr. Deputado Cardoso Ferreira e do problema que se vive em Setúbal, a única coisa que poderei dizer é que os deputados (e particularizando o caso do distrito de Setúbal) eleitos pelo distrito de Setúbal estão na disposição de trocar impressões, de dialogar com todos os deputados desta Assembleia para que se possam encontrar as formas adequadas para ajudar a resolver alguns dos muitos graves problemas que se vivem em Setúbal. E, nesse aspecto, os deputados eleitos pelo PRD, no distrito de Setúbal, estão à disposição do Sr. Deputado è fazem, desde já, um convite a todos os deputados eleitos pelo círculo eleitoral de Setúbal para que, em conjunto, possamos estudar as melhores formas» de ajudaria resolver muitos dos graves problemas que se vivem em Setúbal.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João. Amaral (PCP): - Sr. Presidente Srs. Deputados, dando um- expressivo exemplo da forma como entende e trata, a comunicação social, o Governo utilizou no passado sábado o Telejornal das 20 horas da RTP para dele fazer o, canal oficioso do anúncio de um pacote de gravosos aumentos de preços.
Atingidos são os mais essenciais dos essenciais produtos: o pão, o leite, os transportes, à electricidade, a água, os adubos, os combustíveis (incluindo o gasóleo, o gás e a gasolina).
Três notas fundamentais se impõem, antes de mais, salientar:

1.º Os aumentos foram decididos pelo Governo depois de deliberadamente ter escamoteado à1 Assembleia da República, durante o debate do seu Programa, que era seu propósito prioritário realizá-los - o que é, no mínimo, sinal dos processos pouco sérios com que o Governo encara o seu relacionamento com a Assembleia.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - 2.ª Os aumentos são decididos quando o facto é que o preço do barril de petróleo diminuiu (desde o último aumento) de cerca de 4900S (Janeiro do corrente ano) pára 4300$ (neste momento), isto é, diminuiu sensivelmente 12 %, quando os cereais conhecem uma baixa no mercado internacional e quando se continua a assistir à quebra do dólar - tudo demonstrando que nas circunstâncias actuais (e com vista desde logo à dinamização económica) o que havia era condições para conter ou mesmo diminuir os preços de alguns dos produtos agora aumentados, designadamente os combustíveis e outros produtos de elevada componente importada.
3.º O Governo, decidindo estes aumentos no corrente ano de 1985, e continuando a anunciar a contenção da inflação em 1986 para o nível de 14 %, demonstra querer concretizar em 1985 a inflação de 1986, ou seja, quer cumprir a meta de 1986, agravando a taxa de 1985, o que, glosando a fraseologia governamental, é uma espécie de inflação antecipada...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, tomando como primeira medida o anunciado, e gravoso aumento dos preços dos produtos essenciais, o Governo deu público testemunho das suas reais opções.
O País e os Portugueses foram inteiramente colhidos de surpresa, e para aqueles quê entendessem legítimo o benefício da dúvida, o desmoronar das promessas e o ruir das esperanças trouxe-os à realidade da política governamental.
Hoje, o Governo anuncia medidas várias, entre elas medidas sobre a taxa de juro. Mas a primeira medida foi a que foi - o aumento dos preços, a recair sobre tudo e todos.
Indiscriminada, recai sobre os trabalhadores com salários em atraso, sobre os desempregados, sobre os reformados, que assim vão devolver com juros os aumentos anunciados.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Para todos - primeiro, os aumentos dos preços, primeiro o aumento da taxa de inflação. Explicada está assim a razão que levava, o Governo a falar dos aumentos salariais condicionados à inflação projectada. É que a inflação projectada será a que for, mas para já, antes de projectada para o futuro, é antecipada - isto é, antes de ser projectada, é acrescentada para data anterior à dos aumentos salariais. Um escândalo!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Afectados também os agricultores - com os aumentos inesperados do gasóleo (e não se esqueça que é o mesmo Barreto, que de forma descaradamente eleitoralista andou a pagar o subsídio de gasóleo em atraso, que agora anuncia o novo e

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desnecessário aumento do gasóleo), como afectados são, com as crescentes dificuldades do povo, os pequenos e médios comerciantes e industriais.
Perspectiva diferente é a dos representantes do grande capital, da CIP, que, publicamente, aplaudem.
Não espanta: é-lhes dada a garantia de uma política de continuidade, de que foi co-responsável o PSD nos últimos e consecutivos 6 anos!
É a explícita frustração, Srs. Deputados, da mudança para que os trabalhadores e a população laboriosa apontaram no seu voto em 6 de Outubro e pela qual, não haja dúvidas, continuarão a lutar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do PCP quer aqui afirmar a sua inteira disponibilidade para considerar todas as iniciativas vindas dos grupos parlamentares, excepto do apoiante do Governo, tendentes a questionar, condenar e fazer inflectir a deliberação do Governo de tornar prioritários os desnecessários e gravosos aumentos de preços que deliberou anunciar. E isto seja qual for a forma regimental utilizada.
Da nossa parte, entendemos que o Governo deve ser chamado desde já a perguntas nesta Assembleia, deve explicar-se aqui, no órgão fiscalizador da sua acção, confrontando-se com as perguntas e críticas que os deputados e grupos parlamentares entendam e devam fazer-lhe.
Por isso, apresentamos, hoje mesmo e neste momento, uma proposta com vista à realização na próxima reunião plenária (quinta-feira, dia 28) de uma sessão de perguntas ao Governo, com o objectivo único de debater a matéria dos aumentos de preços agora decretados, no quadro da política económica e social necessária ao País e reclamada pelos Portugueses.
Não se trata de um desafio ao Governo, a menos que o Governo, apanhado em falta, o tome como tal.
Trata-se de uma exigência democrática - a de que o Governo submeta as suas opções à fiscalização e à crítica da Assembleia da República.
O Governo, sem desculpa, omitiu perante a Assembleia da República o seu propósito de proceder a estes aumentos de preços - e frequentemente foi questionado sobre a matéria durante o debate do seu Programa.
Se não quer fugir às responsabilidades, o Governo não pode fugir a uma das suas máximas responsabilidades institucionais: a de vir explicar à Assembleia os aspectos da sua política que proeurou, durante o debate do Programa do Governo, não só sonegar à Assembleia como, e fundamentalmente, esconder do País e dos Portugueses, afinal, as primeiras vítimas das medidas tomadas!

Aplausos do PCP, do PRD e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, não quero formular um pedido de esclarecimento, mas fazer uma interpelação à Mesa.
Tinha vários comentários a fazer à intervenção do Sr. Deputado João Amaral, mas, porque dispomos de pouco tempo e como não quero prejudicar uma intervenção que um dos meus colegas irá fazer, farei uma declaração política no próximo período de antes da ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Tomamos nota, Sr. Deputado. Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.

A Sr. ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cedo se desfez o mito!
Toda a campanha eleitoral do novo líder do PSD foi feita no sentido de afirmar, ou no mínimo de insinuar, a incompetência do anterior governo - de que, por artes de prestidigitação, pôs de fora o seu partido - e, em contraponto, a sua própria competência.
Ao organizar a actual equipa governativa havia de repetir o argumento: tratava-se -disse- de um governo de competências.
Ser competente o que era? Fundamentalmente, fazer o contrário do que o anterior governo havia feito! Havia, por exemplo, o governo de Mário Soares subido os preços dos bens essenciais? Arranjaria ele maneira de os não subir, se não mesmo de os descer!
Só assim, de resto, fariam sentido os engodos com que captou o voto popular: o povo havia sofrido demais; a austeridade fora excessiva; era, pois, possível devolver ao povo o que o anterior governo lhe sacrificara - o poder de compra dos salários reais.
Curiosamente, o novo líder do PSD tinha em parte razão. A política restritiva do anterior governo - necessária para evitar a tal ruptura financeira, que o Dr. Cavaco Silva reconheceu ser um risco iminente em 1983 - havia produzido, até Dezembro de 1984, resultados surpreendentes. A contracção do défice da balança de transacções correntes havia mesmo ido além do programado. Era, pois, possível começar a dar folga ao cinto. Daí a programação de um crescimento prudente para 1985 ( + 3 %) e de uma redução da taxa de inflação para o nível médio anual, confortável, dos 21% a 22%. Esta estimativa viria, ela também, a revelar-se pessimista. Com o andar do ano, a meta anual média dos 19%, com 16% em Dezembro, começou a revelar-se atingível.
Como é óbvio, este significativo êxito, num dos nossos mais renitentes constrangimentos, traduzia-se em duas vantagens apreciáveis: a retoma em alguns pontos do poder de compra dos salários reais e a possibilidade, que viria a concretizar-se, com alguma folga, no termo do mandato do anterior governo, da redução da taxa de juros.
Na verdade, tendo os salários e ordenados sido convencionados ou negociados acima da taxa de inflação - entre 2 e 7 pontos - era esta a medida da recuperação efectiva do aumento do poder de compra dos Portugueses.
Ao avizinhar-se o termo do anterior governo, era clara, e nada aventura, a possibilidade das seguintes medidas governativas: uma nova redução da taxa de juro; o aumento antecipado das pensões sociais; a redução do preço de alguns combustíveis, designadamente a gasolina, o gasóleo e o fuel; não estava sequer fora de causa uma possível redução do preço dos cereais, logo do pão.
Isto porquê?
Porque foi razoável a produção agrícola de 1984; porque o preço do petróleo baixou e porque a cotação do dólar, moeda principal das nossas importações, havia baixado e continuava a baixar significativamente. Se a isto juntarmos o esforço feito pelo anterior governo no sentido da redução do subsídio ao preço dos bens essenciais, e não menos a sua preocupação finan-

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ceira de encontrar cobertura - através de um empréstimo público de longo prazo - para o défice abissal do Fundo de Abastecimento, que no ano corrente se aproxima do equilíbrio, teremos, completo, o quadro que tornava possível as referidas medidas de inegáveis, impacte político e significado social.
A tal ponto assim era que o PS, na sua campanha eleitoral, anunciou para o primeiro mês de governo, precisamente: uma nova redução da taxa de juros; o aumento antecipado e significativo das pensões sociais; a redução do preço da gasolina e outros combustíveis importados; a eventual redução do preço dos. cereais.
Era, reconheça-se, uma forma,, com iniludível significado social, de corrigir o referido e reconhecido, excesso de austeridade.
Com impecável lógica eleitoralista, o PSD opôs-se a que essas medidas fossem tomadas.
Sempre, porém, o PS teve por certo que o novo Governo tomaria, e tomaria com prioridade, aquelas medidas. O PS perdia a vantagem eleitoral mas o País ganharia a reparação social.
Quem ouviu o novo líder do PSD, na sua campanha eleitoral, criticar o anterior governo, e" creditar-se da capacidade de governar o País a contento dos Portugueses, deu-lhe o voto porque acreditou - ingenuamente acreditou - que ele era capaz de cumprir o que prometeu.
O PS havia reduzido o poder de compra dos Portugueses? Ele o subiria!
O PS havia aumentado o preço dos bens essenciais?
Ele o baixaria ou, no mínimo, o manteria tal qual!
O PS havia consentido num ligeiro aumento do desemprego? Ele o faria recuar através do desenvolvi; mento da economia!
O PS havia levado a crise ao seio das empresas? Ele às libertaria do espartilho do défice!
É claro que, onde ele dizia p PS, devia ouvir-se: primeiro o PSD, depois o PS mais o PSD. As dificuldades mais graves vinham do tempo em que o PSD provocou o endividamento vertiginoso. O PS mais o PSD haviam-se limitado a travar essa vertigem, reduzido o ritmo do crescimento da dívida externa de 25 % para 3 % ao ano!
Fosse como fosse, era uma cara nova que ao povo prometia a bem aventurança. É, como acreditamos facilmente no que desejamos, o povo português acreditou uma vez mais na palavra messiânica:
Fora com o PS, pois. que governe o novo messias!
Eis, senão, quando o novo messias dá o dito por não dito.
Quanto às pensões sociais, tudo bem. Não perdeu tempo em anunciar o, seu aumento, recordado, do excelente efeito eleitoral com isso conseguido em 1980.
Quanto à taxa de juros, já anunciou a sua nova, redução. É, de facto, e apenas, uma questão de contas;
E quando toda a gente, esquecida de que foi o governo anterior que lhe legou, de bandeja, essas bem-aventuranças, e lhe creditava, apenas à saída da posse, esses efeitos positivos da sua política, eis que tudo ruiu - crédito, bazófias e esperanças- com o, anúncio insuspeitado de que o custo de vida ia de novo subir, desde o pão para a boca aos combustíveis e à energia.
O pão mais que tudo! Oh! que genuína social-democracia!
A energia logo a seguir, e com ela o preço de tudo o que e produzido ou transportado.
Seguem no cortejo o leite, a água, os adubos. Tudo coisas sem as quais o povo português pode passar perfeitamente. Realmente, que estúpidos hábitos esses de os pobres comerem pão, as crianças beberem leite, os sedentos beberem água e os campos, carecerem de adubos!
E, como se isso não bastasse, vêm aí, reforçativos da nossa miséria, novos aumentos dos transportes e, ao que consta, novos aumentos nas telecomunicações e nos correios estão em preparação.
- Será que o Primeiro-Ministro não cora? Será que, lembrado, como tem de estar, dos milagres que prometeu ao povo, o Primeiro-Ministro se não penitencia? E o Presidente da República que, contra o seu hábito, tanto elogiou o empossado - a sua seriedade e a sua competência- não sente o desejo de recolher os elogios e de formular, junto da opinião publica, o seu arrependimento?

O Sr. António Capucho (PSD): - Esta é boa!

A Oradora: - E porquê a pressa, já que qualquer macro-economista confirmará que não era tanto o aperto que não fosse, possível conceder aos consumidores alguma folga?
Pelas seguintes razões, aparentemente:
1.ª Subindo, agora os preços, o aumento reflectir-se-á ainda na inflação de 1985, atribuível, como é de uso, à gestão, do anterior governo. Os dois ou três pontos de expansão inflacionista que os aumentos vão provocar acrescerão à taxa média de 1985, impedirão que se atinja a média anual de 20 % ou menos e mensal em Dezembro, de cerca de 16 % e permitirão a alegação de que o anterior governo estimou mal as suas metas.
Permitirão ainda que os preços cresçam menos em 1986 e que, por isso, se atinja a meta anunciada pelo actual Governo de 14% estimada para Dezembro deste ano. Será este o objectivo?
Simples manobra fria; tecnocrática, desumana.
2.ª Subindo agora, os preços sobem enquanto dura o estado de graça do recém-empossado governo. É a velha regra dos regimes autoritários: o mal deve fazer
se no princípio e por grosso; depois esquece.
3.ª Subindo agora os preços, o actual Governo poderá insinuar, se não afirmar -fenómeno de que já há indícios de que se trata de medidas que «já estavam ria calha», que o anterior governo as diferiu e que o actual Governo as herdou sem poder resistir-lhes.
É claro quê isto é mentira! Verdade é antes que estavam na calha; as medidas positivas já tomadas ou anunciadas-(aumento das pensões e redução das taxas de juros) e outras ao invés das que o actual Governo agora tomou (redução do preço de gasolina e dos cereais).
Estas reduções, aliás, teriam toda a lógica: se o preço dos produtos importados subia, porque subia o dólar, era lógico que descessem agora com a substancial descida, do dólar!
4.ª Um tecnocrata é sempre igual a si mesmo. As metas valem mais do que os homens: Um bom indicador económico vale bem uma mentira!
5.ª Fazendo agora aumentos que só no pão atingem 18 %, com a promessa de que não haverá novos aumentos em 1986, o Governo pretende convencer os sindicatos a tomarem as percentagens de agora como base da contratação colectiva que aí vem.

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É, evidentemente, uma habilidade condenada à mais segura suspeição e ao mais certo fracasso.
6.ª Uma última razão psicológica é talvez conjecturável. O Primeiro-Ministro foi com razão acusado de gestão demagógica e eleitoralista em 1980. Terá agora cedido à tentação de corrigir esse pendor?
Eis-nos, pois, mais pobres. Menos pão, menos água, menos leite, menos adubos, menos combustíveis, menos energia pelo mesmo dinheiro. A produção mais custosa. As empresas mais entaladas. A economia mais gemebunda. O Governo - que já não era fiável - menos de fiar.
Que dizem a isto os que, com a sua conivência, o viabilizaram?
Sem já falar nos pensionistas que, ainda sem consciência do logro, intimamente agradeceram ao Governo a antecipação, por l mês, do magro aumento das suas pensões! Na verdade, que sentido faz aumentar hoje as pensões e amanhã o preço dos bens em que se gastam?
Pelos quatro cantos do País ouve-se, neste momento, um monumental «ora bolas!»...

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Mendes Bota pediu a palavra?

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sim, Sr. Presidente, pois queria formular duas perguntas e um protesto.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques veio aqui repetir aquilo que alguns dos oradores antecedentes já disseram, ou seja, que o Governo pretende antecipar o eleitoralismo de 1986, que estamos muito preocupados com umas pretensas eleições antecipadas em 1986 e até que pretendemos afectar a inflação já em 1985.
Perguntaria à Sr.ª Deputada Helena Torres Marques se acha que a uma semana das eleições autárquicas, nas quais o partido do Governo está altamente empenhado - até porque detém uma posição cimeira, em termos de autarquias -, isto é ou não uma medida de um governo que pretende actuar com transparência e com verdade? Eleitoralismo seria transferir os aumentos dos preços para depois das autárquicas ou das presidenciais!

Aplausos do PSD.

A segunda pergunta que queria formular à Sr.ª Deputada Helena Torres Marques é se acha que o que é mais importante é discutirmos agora (talvez até desfasadamente!) apenas alguns aumentos dos preços essenciais sem os englobarmos numa análise conjunta sobre a subida dos salários. Porque o que interessa, creio eu, é se, de facto, os salários reais subiram.
E a pergunta que lhe deixo é a seguinte: é ou não verdade que os salários reais desceram 3% em 1983 e 9% em 1984? Nessa altura, a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques teria também a coragem de vir aqui proferir o discurso que proferiu?
Para terminar, queria-lhe dizer o seguinte: a Sr.ª Deputada pretendeu demonstrar aqui que o Governo é incompetente. Venho de uma terra onde viveu o poeta
António Aleixo, pelo que, permita-me, sem desprimor, que contraponha com o verso «incompetência do Governo, impertinência do seu discurso». Só que há uma pequena diferença: é que, de facto, a incompetência do Governo é ilusória e aparente, ao contrário da impertinência que vem dessa bancada e que parece ser já definitiva e permanente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, deseja responder já?

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Há mais pedidos de esclarecimento, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Não, não há e, apesar de, na sua declaração política, ter excedido os 10 minutos regimentais, a Sr.ª Deputada tem ainda o tempo disponível no caso das intervenções, que são normais.

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Obrigada, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Guido Rodrigues, a posição que o Governo agora tomou significa, pelos vistos, falta de respeito por todos os portugueses, pelos autarcas e pelos portugueses em geral.

Vozes do PSD: - Não apoiado!

A Oradora: - Em relação ao poder de compra, como disse há pouco o Sr. Deputado António Capucho, em 1980 conseguiu-se um aumento do poder de compra, mas de 1981 para cá, ou seja, com o PSD sempre no governo, não foi possível realizar este aumento do poder de compra, que, pelos vistos, também não vai continuar a verificar-se.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu agora entrada na Mesa um requerimento, pedindo, nos termos do artigo 74.º do Regimento, o prolongamento do período de antes da ordem do dia.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação.

O Sr. António Capucho (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Para que efeito deseja a palavra, Sr. Deputado?

O Sr. António Capucho (PSD): - Queria interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, presumo que não será necessário votar o requerimento, pois acordou-se na conferência de líderes que sempre que haja declarações políticas e caso haja solicitação nesse sentido seja automaticamente prorrogado o período de antes da ordem do dia - a não ser que lenha interpretado mal tal decisão.

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado. Nessa conferência fez-se apenas uma interpretação do artigo 74.º, mas sempre que se apresenta um requerimento cie tem de ser votado.
Vamos, então, proceder à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António José Fernandes.

O Sr. António José Fernandes (PRD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: O mundo em que vivemos é cada vez mais interdependente. A prodigiosa revolução científica e tecnológica a que vimos assistindo sofisticou os meios de comunicação e de transporte, encurtou as distâncias temporais, aproximou os povos e fez do género humano uma grande família cujos membros se vêem envolvidos, directa ou indirectamente, por todos os acontecimentos de repercussão internacional, seja qual for o local onde se produzam.
Os reflexos da explosão demográfica, da perturbar cão da paz, da exploração nuclear e da fome tornaram-se indivisíveis e dizem respeito a todos os habitantes da Terra.
Caminhou-se, pois, para uma complexa interdependência internacional que deu lugar a diferenciadas relações entre os Estados, nas quais se incluem e das quais se destacam as relações diplomáticas ad hoc comummente designadas por diplomacias paralelas.
É no contexto destas relações que se inscreve a recente Cimeira de Genebra entre o Presidente Reagan e o Secretário-Geral Gorbatchev.
A Cimeira de Genebra reveste-se dê particular importância, não tanto pelas decisões ali adoptadas mas, sobretudo, pelo simbolismo das aparências que a rodearam.
São louváveis todas as iniciativas destinadas a aproximar os principais responsáveis políticos das duas superpotências, particularmente se elas visam a preservação da paz e da segurança internacionais. E a Cimeira de Genebra, a fazer fé nos meios de informação, teria por objectivo o entendimento sobre a redução dos armamentos e destinar-se-ia a uma troca de pontos de vista sobre os conflitos regionais e as consequências de uma eventual guerra nuclear.
Mas o acontecimento do ano, como se convencionou chamar à Cimeira de Genebra, suscita algumas observações e merece uma reflexão.
Em primeiro lugar, parece um paradoxo desenrolar-se uma reunião com vista a encontrar soluções para a manutenção da paz e os seus intervenientes encontrarem-se rodeados de fortes dispositivos de segurança.
Em segundo lugar, a declaração final da reunião não é muito pródiga em soluções encontradas.
Em terceiro lugar, não deixa de ser curioso verificar como os países da Europa Ocidental, que constituem a primeira grande potência económica do Mundo, mais uma vez se deixaram arredar de uma participação activa na tomada de decisões que directamente lhes dizem respeito.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: A paz mundial não depende só e apenas da vontade dos dirigentes das superpotências. Nem a sua manutenção resulta dos encontros entre Reagan e Gorbatchev. A paz é indivisível e diz respeito a todos nós.
Enquanto se gastarem dois milhões de dólares pôr minuto na corrida aos armamentos - como afirmou a semana passada o secretário-geral da Federação dos Antigos Combatentes - e morrerem diariamente à fome cerca de 137 000 seres humanos, não é possível uma verdadeira paz mundial. E não acreditamos "que os dirigentes dos Estados Unidos da América e da União Soviética estejam dispostos a abandonar o apoio aos intervenientes directos nos conflitos regionais e a transformar as suas fábricas de armamentos em fábricas de preservação dos produtos alimentares com vista a oferecer alimentos gratuitos aos povos mais carecidos do Globo.
A solução dos graves problemas que põem em risco a paz mundial passa mais pelo verdadeiro e efectivo dialogo Norte-Sul do que pelos remendos introduzidos no diferendo leste-oeste. Por isso a Europa Ocidental não pode continuar a eximir-se de participar activamente no diálogo internacional. De resto, não faz sentido que a Europa Comunitária, que contribui com cerca de 35% para a produção industrial mundial, contra 25% dos Estados Unidos da América e 23% dos países de economia de direcção central e que realiza mais de 40% do comércio mundial, contra 14,5% dos Estados Unidos da América e 4,5% da União Soviética, continue a demitir-se das responsabilidades políticas internacionais que a própria história lhe atribui e o seu peso económico lhe impõe.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Geograficamente, de reduzidas dimensões, economicamente dependente do exterior e politicamente transformado em «estado cliente», segundo uma nova figura jurídica ainda não consagrada nos textos de Direito Internacional, Portugal pouco poderia fazer para alterar a bipolarização das relações internacionais. Mas a nossa integração na Comunidade Europeia permite-nos juntar a nossa voz aos 11 parceiros comunitários e, ao mesmo tempo, fazer-lhes sentir que uma Europa espartilhada pelo egoísmo dos nacionalismos estará sempre dependente das cimeiras entre os dirigentes soviéticos e norte-americanos e das decisões que estes se lembrem de adoptar.
É, pois, necessário que os representantes dos povos europeus se entendam e construam uma Europa política e economicamente capaz de dialogar de igual para igual com os mais poderosos interlocutores internacionais e de funcionar como exemplo promissor dos anseios e aspirações dos povos que lutam contra a fome, a miséria e a ignorância.
É urgente e imprescindível que as» «cimeiras de Genebra» deixem de ter razão de se realizar e que sejam substituídas por encontros fraternais dos representantes de todos os povos do mundo, nos quais se possa festejar, o fim das guerras, do analfabetismo e da fome:
É isto que os deputados do PRD e, estou certo, todos os membros desta Casa preconizam e desejam.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se entre nós, nas galerias, turmas da Escola Secundária D. Pedro V constituídas por professores e alunos do 10.º e 11.º anos da disciplina de Direito.
- Agradeço o favor de assinalarem a sua presença.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: É conhecido o atraso económico e social do País, os seus desequilíbrios externos, a grave situação financeira das empresas do Estado e do País, que prosseguem com a política deste Governo.

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São conhecidas também as assimetrias regionais e a sua problemática a que alguns deputados das bancadas da oposição aqui deram conta ainda recentemente na discussão do Programa do Governo. Ora, a verdade é que, a situação se vem agravando.
A Lei de Finanças Locais, aprovada por unanimidade em 10 de Outubro de 1978, não foi cumprida uma só vez. E o seu cumprimento era um factor importante no fortalecimento do poder local e na atenuação ou correcção dos desequilíbrios regionais. No entanto, o que se verificou foi a diminuição da percentagem de participação do poder local nas receitas do Estado.
Assim, em termos reais, as receitas das autarquias diminuíram 3,7% em 1981, 5,4% em 1982, 8,1% em 1983, 14,8% em 1984. Depois de ter prometido cumprir integralmente a lei, o governo PS/PSD revogou-a pura e simplesmente, através do Decreto-Lei n.º 98/84. Hoje, estamos colocados na situação de nem um só município do País fazer ideia das verbas de que irá dispor em 1986. Com efeito, uma das lamentáveis inovações da lei foi não consagrar a obrigatoriedade de qualquer percentagem mínima de participação do poder local nas receitas globais do Estado. Por outro lado, em vez de distribuição de verbas com critérios objectivos, introduziu-se o arbítrio, o subjectivismo e o caos, quando não o favoritismo.
Lisboa foi um dos distritos mais afectados. Apesar de introduzida a altitude como critério de distribuição, o governo PS/PSD conseguiu «acabar» com a serra de Sintra, tal como «acabou» com a serra da Arrábida e conseguiu atribuir maior índice de altitude a municípios algarvios do que a municípios da serra da Estrela.
Por outro lado, em domínios como a habitação, o património cultural, os equipamentos para a infância e a terceira idade, apesar da publicação de uma chamada lei de delimitação de responsabilidades em matéria de investimentos, nada ficou claramente delimitado.
Estamos assim na fase da preparação dos orçamentos e dos planos de actividade com um quadro legal manifestamente desadequado ao exercício do poder local, e com os problemas e assimetrias a agudizarem-se.
Também na região de Lisboa a cidade foi-se constituindo progressivamente numa grande cabeça de um corpo mal organizado que dele depende em grande parte. Este corpo deformado tem-se agravado com a actual gestão do município de Lisboa. Ê que não se pode pensar e gerir a cidade de costas voltadas para a região.
Os grandes problemas urbanísticos e de transportes de Lisboa resultam, fundamentalmente, a nosso ver, da concentração crescente e desordenada de actividades terciárias na cidade, expulsão massiça da habitação e da população residente para os concelhos periféricos e da densificação especulativa do tecido urbano, apoiado, cada vez mais, em demolições devastadoras e desnecessárias.
Os desequilíbrios que daqui resultam entre a cidade e a região, por um lado, e dentro da própria cidade, por outro, no que se refere à localização da habitação e do emprego, às diferenças de qualidade urbana das diversas áreas da cidade e da região, com a consequente segregação social, são ainda acentuados pelo subequipamento da generalidade das áreas periféricas e por um sistema de transportes anárquico, incompleto e mal gerido.
A desertificação noctuma da Baixa, os ritmos de vida espasmódicos, a sub e a sobre-utilização de equipamentos e transportes fazem parte do quotidiano de centenas de milhares de cidadãos.
Assim, enquanto a cidade de Lisboa não viu a sua população crescer, os restantes concelhos da Grande Lisboa aumentaram de 600000 habitantes entre 1970 e 1980. E como a cidade concentra cerca de 60% do emprego de serviços existentes na região e apenas 25 % da população residente, entre a região e Lisboa estima-se que se realizem diariamente 800 000 deslocações diárias. Estas fazem-se por 5 eixos radiais com um reduzido número de entradas na cidade com os inevitáveis congestionamentos.
A situação é semelhante no interior de Lisboa, pois só a zona da Baixa e avenidas novas concentra cerca de 75% do emprego de serviços.
Acentuam-se as assimetrias entre a cidade e a região e o espaço urbano vai-se degradando sobre a «pressão» da urbanização descontrolada, ditada pelos grandes empreiteiros e especuladores imobiliários.
E o que se tem feito perante esta situação?
Continuam-se a demolir prédios de habitação e a ocupar espaços livres com novos e maiores edifícios para escritórios, serviços ou habitações de luxo. Ao mesmo tempo executam-se obras apressadas e pontuais para a alteração da rede viária, mas não se planeia a circulação da cidade nem se realizam obras fundamentais de complemento dos eixos viários que ligam transversalmente a cidade, como, por exemplo, a viabilização do rebatimento do tráfego da linha de Sintra sobre a linha de cintura com a ligação do metropolitano em Sete Rios, Entrecampos e Areeiro.
A nosso ver toda esta situação só se alterará com a progressiva modificação da estrutura da região da Grande Lisboa, organizando-a com base em diversos centros urbanos que concentrem empregos, equipamentos e habitação na região, isto é, com a criação de uma área metropolitana polinucleada.
Isto passa pela desconcentração do terciário, pela alteração da estrutura viária radial, construindo, por exemplo, uma circular regional que ligue as vias radiais de Vila Franca de Xira, Loures, Sintra e Cascais; pela ocupação do território de acordo com a sua aptidão e com as capacidades disponíveis, e passa também pelo aumento e valorização dos espaços verdes, articulando-os entre si com o grande espaço que constitui o estuário do Tejo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: São graves os problemas da habitação, transportes, equipamentos urbanos, cultura e recreio, saneamento básico, etc. Mas alguns dos problemas e até dos mais urgentes com que se debate a Região da Grande Lisboa não podem ser resolvidos só com os limitados recursos de que dispõem os municípios, como sejam os problemas dos transportes, habitação ou o do grande interceptor dos esgotos da cidade. Assim, é absolutamente imperioso que o Orçamento do Estado, e para além da normal afectação de recursos através do Fundo de Equilíbrio Financeiro, que aliás deve ser revisto, assegure o financiamento de algumas das carências com que a Grande Lisboa se debate.
Pela nossa parte, e quando da próxima discussão do Orçamento do Estado para 1986, retomaremos as propostas já feitas no ano passado para a inscrição de dotações orçamentais visando a resolução destes e outros problemas que, localizando-se embora alguns em Lis-

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boa, apresentam uma dimensão nacional e exigem recursos financeiros que em muito ultrapassam as capacidades municipais.
Também neste sentido o Grupo Parlamentar do PCP apresentou nesta legislatura, entre o primeiro núcleo de projectos de lei, o do regime de finanças locais e de delimitação e coordenação dás actuações da administração central e municipal, relativamente aos respectivos investimentos.
Apelamos pois à discussão urgente deste projecto de lei e à aprovação de medidas urgentes que reforcem o poder local.
É tempo de se passar das belas palavras sobre o poder local aos actos concretos.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Machado Lourenço.

O Sr. Machado Lourenço (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os problemas do Vale do Tejo têm sido pouco tratados nesta Câmara, quando esta região tem talvez em qualidade, e quantidade os solos mais ricos do nosso país e nem sempre tratados com a acuidade necessária.
O agricultor ou criador de gado ribatejano é diferente. É homem agarrado à terra, gosta do seu trabalho, cria riqueza, luta por vezes desesperadamente contra as intempéries, que através dos tempos tem sido muitas. É conhecida a história, infelizmente, sempre renovada e sempre recente.
Estas terras e estes; lavradores merecem melhor sorte. Algumas obras de hidráulica, ajudas técnicas e sobretudo a definição política para toda a problemática da agricultura modificariam completamente este Vale do Tejo e, devo dizer, o País.
Hoje, quero falar-vos de uma obra, entre outras, no Vale do Tejo. Esta é a que está em estado mais adiantado, porque tem projecto: a Lezíria Grande de Vila Franca de Xira, uma ilha com 14000 ha de solo do melhor que existe no País, mas cuja degradação tem sido consentida.
Por volta de 1956 a 1960 foi feita a obra de defesa e enxugo da Lezíria Grande, onde se gastaram 50 000 contos, e para a completar era necessário gastar 80 000 contos para executar a rega de toda a lezíria. Este trabalho foi adiado e nunca se fez.
Tinha sido criada a Associação de Defesa da Lezíria Grande de Vila Franca de Xira, uma associação entre todos os proprietários da mesma para que, ao beneficiarem destes trabalhos, pudessem contribuir para o pagamento dos mesmos e também para conservação da obra: Esta foi conservada até 1974, mas, daí para: cá, quando o Estado tomou directamente conta da conservação, tudo se deteriorou: os diques de defesa deixaram de ser conservados, as valas de enxugo foram votadas ao abandono e eis que a lezíria está em perigo. Entraram as cheias em 1979 e em 1983 o valado das Galinheiras caiu, parte mesmo sem cheias, a rede de caminhos está deteriorada, a salinidade sobe à superfície do solo por falta de água doce, etc...
É preciso ter muito amor à terra, muita coragem para, mesmo nestas condições, ainda haver lavradores que produzam na lezíria, sempre com o «coração nas mãos e o credo na boca», sem saber se às colheitas chegam ate ao fim ou se tudo irá por água abaixo.
O Governo Holandês, conhecendo a lezíria e tendo esta as características parecidas com a Holanda -a terra está abaixo do nível médio das águas do mar - interessou-se por este bocado de terra e fez um acordo de colaboração com o Governo Português. Não sei o que receberam em troca ou se algo receberam, mas os Holandeses entregaram o trabalho de anos na lezíria, um projecto completo, pormenorizado, da Lezíria de Vila Franca de Xira. Este projecto tem andado de gaveta em gaveta há coisa de 4 anos e, segundo consta, ninguém vai aproveitá-lo. O valor da execução desta obra, há 3 anos, seria de 2,5 milhões de contos para defesa, enxugo, rega e rede de caminhos. Ficaria uma pequena Holanda, um paraíso agro-pecuário que teria reflexos bastante positivos em todo o País, mas os técnicos portugueses consideraram que a taxa de rendibilidade desta obra era muito baixa e que o projecto não era de executar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos sabemos quantos milhões de contos saem do País todos os anos para importação de produtos alimentares. Portugal vai entrar lia CEE em Janeiro. É por todos sabido o esforço que o País tem de fazer para melhorar e aumentar a produtividade agrícola. O pequeno, médio ou grande empresário agrícola não pode pagar todo o atraso em que nos encontramos. O Estado tem de suportar, talvez, a maior parte destes custos. Quero dizer que, numa obra da envergadura da Lezíria Grande, o Estado tem de suportar custos sociais. Esta tem de ser uma decisão política e não de números. Assim, nunca lá chegaremos.
Procurei indagar a posição actual deste projecto, em que gaveta se encontrava, pensando eu que este seria um dos que tinha seguido para Bruxelas. Enganei-me. Para meu espanto, os nossos técnicos arrumaram numa prateleira o projecto holandês e depois, bem à portuguesa, começaram os interesses a funcionar.
A Direcção-Geral de Hidráulica e Engenharia Agrícola chama a si a parte que diz respeito à rega e enxugo e a Direcção-Geral de Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos fica com a parte dos diques. A Direcção-Geral de Hidráulica e Engenharia Agrícola chegou à conclusão, através de estudos vários, que o melhor seria fazer outro estudo. Fez um concurso e lá vão 45 000 contos para um gabinete de estudos fazer um projecto de rega e enxugo de 3500 ha na parte norte. Todo o resto fica como está, ou seja, pior, porque dia a dia se vai deteriorando.
Os diques estão em estado péssimo e ficaram à responsabilidade da Direcção-Geral de Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos, mas esta nem os rombos conseguiu tapar durante o Verão, estando a lezíria em perigo de ser inundada. Será que também vai ser pedido um novo estudo a outro gabinete? Este Governo em quem depositamos bastantes esperanças tem de ter uma atitude firme e tomar uma decisão política em relação a estas coisas. O povo não come taxas de rendibilidade, o povo come o que se produzir enquanto menos se importar melhor. Será possível que haja dinheiro para se construir em Portugal um edifício para a Caixa Geral de Depósitos, falando-se, à partida, em 8 milhões de contos, mas dizendo-se que quando acabar ficará em 50 milhões, e não haja 2,5 milhões de contos para fazer esta obra? Será que o povo quando tiver fome come este futuro edifício aos bocadinhos?

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Serão possíveis grandiosidades destas quando se diz que não há dinheiro, mesmo com a ajuda da CEE, para construir obras de produção imediata que ajudam a criar riqueza?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para terminar, faço daqui um alerta ao novo Governo, em quem tenho toda a confiança, para que analise sem preconceitos e com toda a justeza este delicado projecto, que, caso vá para a frente, não só ajudará alguns agricultores mas contribuirá para a melhoria de vida dos Portugueses, através de uma maior produção agrícola, sendo mesmo possível tirar destes solos duas produções por ano.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Brasileiro, efeito para o qual dispõe de 2 minutos.

O Sr. Álvaro Brasileiro (PCP): - Sr. Deputado Machado Lourenço, ouvi com atenção a sua intervenção. Certamente se lembrará que também por várias vezes aqui levantei o problema do Vale do Tejo, pois conheço bem e tenho vivido bastante os problemas da Lezíria de Vila Franca.
O Sr. Deputado sabe que existe desde 1950 um plano de regularização do Vale do Tejo, mas até agora nada tem sido feito. Falou também nas cheias de 1979 e deve certamente ter conhecimento dos milhares de cabeças de gado perdidas e dos milhares de contos de prejuízo que nessa altura tiveram os agricultores dessa lezíria.
O Sr. Deputado mencionou também os diques da Lezíria Grande e os das Galinheiras, onde se verificou o rebentamento com a consequente inundação das terras. Pela minha parte, acrescentarei que os outros diques de terra batida se encontram na mesma situação.
O Sr. Deputado vem, de facto, levantar aqui um problema importante, mas duvido que o actual Governo faça alguma coisa de positivo. Penso, isso sim, que irá seguir as pisadas dos anteriores, continuando a fazer o mesmo que eles fizeram.
Estava agora mesmo a elaborar um requerimento no qual levantava não só o problema dos diques da Lezíria Grande mas também dos da Maia, da Lambuja, do Arrepiado, de São João, do Rebentão, da Junceira, de Gagos, da Torrinha, da Tapada, de Ómnias, de Vaiada do Ribatejo, de Caminho de Meias, da Meia-Postinha, da Tapadinha e da Senhora das Dores.
É que, Sr. Deputado, o Inverno começa a fustigar as zonas ribeirinhas do Vale do Tejo e os tapadões de alguns desses diques que citou e de outros que também citei estão em péssimas condições. O Sr. Deputado apelou para que o seu Governo faça alguma coisa, mas, pela nossa parte, temos a certeza de que o Governo não irá fazer nada, pelo contrário, irá apenas dar continuidade ao que os outros têm feito. É, no entanto, urgente que se levantem estes problemas aqui, na Assembleia da República, coisa que também já fiz na altura em que o Sr. Deputado José Niza levantou uma questão sobre o mesmo assunto.
Para terminar apenas queria dizer que seria bom que os deputados do distrito de Santarém fizessem um esforço conjunto no sentido de desencadearem as démarches necessárias para que fosse possível o arranjo dos diques, cujo actual estado constitui um grande perigo não só para as populações como também para a agricultura portuguesa. No entanto, Sr. Deputado, não acredito que o governo de V. Ex.ª vá, quanto a isto, tomar posições.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso. V. Ex.ª só dispõe de l minuto.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Chega perfeitamente, Sr. Presidente.
V. Ex.ª, Sr. Deputado Machado Lourenço, na intervenção que proferiu, referiu a situação actual da Lezíria Grande de Vila Franca de Xira e, nomeadamente, o que respeita à sua construção, em termos de diques de enxugo e de rega. A propósito, o Sr. Deputado Machado Lourenço disse, textualmente, que, a respeito de projectos - cito -, «[...] começaram os interesses a funcionar».
As palavras do Sr. Deputado sugerem que alguma coisa de menos transparente começou a passar-se. Por isso peco-lhe um esclarecimento no sentido de explicar melhor o que se passa ou o que é que quis dizer a respeito da reconstrução da Lezíria Grande de Vila Franca de Xira e dos seus projectos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Machado Lourenço, V. Ex.ª não tem tempo, mas a Mesa, considerando as perguntas feitas e entrando no espaço de generosidade que lhe é habitual, concede-lhe 5 minutos para responder.

O Sr. Machado Lourenço (PSD): - Sr. Deputado Álvaro Brasileiro, devo dizer que concordo inteiramente consigo. Sei que conhece perfeitamente a Lezíria Grande de Vila Franca de Xira - fez lá a sua vida - e sei que conhece perfeitamente toda esta situação.
O problema da regularização ou reforço dos diques não é partidário. É um problema de toda a região, é um problema que tem de preocupar todos e não qualquer partido em particular. Daí o meu interesse nesta questão. Sou da zona, conheço-a, também estive na lezíria durante 5 anos, precisamente durante a defesa e o enxugo, na obra de execução, e por isso conheço bem esta situação.
É verdade que todo o Vale do Tejo precisa de uma grande obra, na medida em que tem um potencial agrícola de que este pais precisa. Que o Governo olhe para ali com olhos de quem quer fazer alguma coisa, porque não há dúvida que terras daquelas, com tanta qualidade, se encontram numa situação de desperdício, o que é uma pena. Todo o desenvolvimento agrícola e toda a produção deste país - no que toca ao Vale do Tejo - pode contribuir muito, não há dúvida, para a riqueza do nosso país.
Queria, contudo, informá-lo, em relação aos diques, que o Governo acabou de nomear uma comissão para resolver esta situação o mais rapidamente possível, porque está preocupado com o problema das cheias. Por isto, estou absolutamente convencido de que este Governo vai ser diferente, para melhor, e não gostaria que V. Ex.ª tivesse essa habilidade de bruxo e começasse já a querer adivinhar aquilo que se vai passar.

O Sr. Álvaro Brasileiro (PCP): - É mais uma demissão!

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O Orador: - Vamos esperar para ver!
Sr. Deputado Correia Afonso, V. Ex.ª reparou, e reparou muito bem, naquilo que eu disse. É evidente que está feito um projecto, que ficou grátis ao País, pois, segundo me parece, os Holandeses ofereceram-nos o projecto. Daí que a minha preocupação seja a de ver que se começam a fazer pequenos projectos, estragando o outro, que se começa a puxar os vários projectos para vários gabinetes e que nunca mais chegamos ao fim.
Isto leva a que nunca mais se faça a obra da Lezíria Grande de Vila Franca de Xira, para além da variante no custo da obra, que agora é de 2,5 ou 3 milhões de contos, e que, se algum dia vier a ser feita, irá custar 5, 10 ou 20 milhões de contos. Não me esqueço que em 1960 a obra de rega custava 80 000 contos e que hoje é capaz de custar 2 milhões de contos. É por isso que digo que alguns interesses se movem à volta disto.
O Governo tem de olhar para isto, tem de pegar no projecto, se ele existe, se é capaz e se é útil, e eu creio que sim, pois ninguém diz mal do projecto tecnicamente e só se invoca que a rendibilidade não é grande. O Governo tem de assumir parte dos custos, porque o País precisa da produtividade desta terra e de outras como ela.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa, com a aquiescência dos Srs. Líderes dos Grupos Parlamentares, vai apresentar um voto cujo texto é o seguinte:

Voto de congratulação

Há poucos dias teve lugar em Genebra a reunião de dois representantes de dois grandes povos. O Mundo esteve suspenso dos 'resultados de tão importante cimeira. Estava em causa a paz que interessa a todos os povos do Mundo. Ela suscitou o esperançado desanuviamento e uma diminuição das tensões que têm constrangido o Mundo. Congratulando-nos com tais resultados, a Mesa propõe um voto expresso nos seguinte termos:

Foi com natural satisfação que acolhemos os resultados da Cimeira de Genebra, e esperamos que a ambiência criada passe a ter real concretização na atitude dos Povos para garantir e preservar a Paz.

Está em discussão o voto que acabei de ler.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se ninguém pretende usar da palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e do deputado independente Lopes Cardoso e a abstenção do deputado António José Fernandes, do PRD.

O Sr. António José Fernandes (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António José Fernandes (PRD): - Quero dizer, em duas palavras apenas, que o texto que apresentei na minha intervenção obrigou a que me abstivesse em relação a esta matéria.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, da primeira parte do período da ordem do dia consta a apreciação do relatório e. parecer apresentado pela Comissão de Regimento e Mandatos, sobre substituição de deputados, que vai ser lido.

Foi lido. É o seguinte:

Relatório e Parecer da Comissão de Regimento e Mandatos

Em reunião realizada no dia 26 de Novembro de 1985, pelas 15 horas, foram observadas as seguintes substituições de Deputados:

Solicitada pelo Partido Social-Democrata:

Alípio Barrosa Pereira Dias (círculo eleitoral do Porto), por Domingos Silva e Sousa. Esta substituição é determinada nos termos da alínea e), n.º l, do artigo 4.º dó Estatuto dos Deputados, a partir do dia 22 de Novembro corrente, inclusive.

Solicitadas pelo Partido Renovador Democrático:

Manuel dos Santos Messias Silvestre (círculo eleitoral de Lisboa), por Tiago Gameiro Rodrigues Bastos. Esta substituição é pedida ao abrigo da alínea b), n.º 2, do artigo 5.º. do Estatuto dos Deputados, a partir do dia 22 de Novembro corrente, inclusive.
Carlos Jorge Mendes Correia Gago (círculo eleitoral de Lisboa), por Daniel Pacheco Amaral. Esta substituição é determinada nos termos da alínea e), n.º1, do artigo 4.º do Estatuto dos Deputados, a partir do próximo dia 23 de Novembro corrente, inclusive.

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - António Augusto Lacerda de Queiroz (PSD) - António Roleira Marinho (PSD) - António Machado Lourenço (PSD) - João Domingos Fernandes de Abreu Salgado (PSD) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Mário Manuel Cal Brandão (PS) - Joaquim Carmelo Lobo (PRD) - José Costa Carvalho (PRD) - Vasco da

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Gama Fernandes (PRD) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) - José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Raul Castro (MDP/CDE).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vamos entrar agora na apreciação do projecto de resolução n.º 4/IV, do PSD, do PS e do CDS, sobre o regime de eleição dos deputados ao Parlamento Europeu.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, além de me inscrever, gostaria de colocar duas outras questões.
A primeira é relativa a uma correcção, por lapso de dactilografia, ao projecto de resolução que foi entregue na Mesa.
A segunda é uma proposta no sentido de se proceder à discussão conjunta do projecto de resolução e dos dois projectos de lei, na medida em que o projecto de lei do PRD tem uma parte que coincide com o conteúdo do nosso projecto de resolução.

O Sr. Presidente: - Penso, Sr. Deputado, que para facilitar a discussão era realmente conveniente que os três diplomas fossem apreciados conjuntamente, mas vou pôr essa questão à apreciação do Plenário.
Srs. Deputados, vamos votar este requerimento verbal para que a discussão dos três diplomas seja conjunta.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do PCP, do CDS e do deputado independente Lopes Cardoso e votos contra do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A partir do próximo dia l de Janeiro, Portugal fará parte integrante das Comunidades Europeias nos termos consignados pelo Tratado de Adesão que esta Assembleia aprovou em Julho último.
As duas iniciativas de que sou subscritor, juntamente com deputados do PSD e do CDS, visam dar cumprimento ao disposto nos artigos 10.º e 28.º do Tratado de Adesão. Por um lado trata-se de regulamentar o regime de eleição dos 24 deputados portugueses ao Parlamento Europeu em termos que o próprio Tratado de Adesão no n.º 2 do seu artigo 28.º prevê como transitório, ao dispor:
A partir da adesão e para o período que decorre até à realização de cada uma das eleições previstas no n.º l, os representantes dos povos espanhol e português à Assembleia serão designados pelos Parlamentos dos novos Estados membros de entre os seus membros, de acordo com o procedimento fixado por cada um destes Estados.
Por outro lado, pretende-se definir as incidências no domínio do ordenamento estadual português da existência de deputados europeus, visando conferir-lhes um estatuto jurídico que, tendo em linha de conta as disposições comunitárias directamente aplicáveis, as complemente na medida do estritamente indispensável ao cabal desempenho da sua função de representantes do povo português na mais vasta instância parlamentar das Comunidades Europeias.
O projecto de resolução que apresentamos visa, pois, garantir a designação por esta Assembleia da República dos representantes portugueses ao Parlamento Europeu até à realização de eleições por sufrágio directo e universal no período máximo de 2 anos após a adesão, isto é, até finais de 1987. Para essa eleição directa terá o Parlamento Português de adoptar, em momento ulterior, normativo específico, que tenha em atenção o debate em curso no seio da própria Comunidade, tendente à adopção de um processo eleitoral uniforme, comum aos diferentes Estados membros, que designam hoje em dia os seus representantes de acordo com os sistemas eleitorais vigentes em cada um deles e que diferem muito entre si.
O regime de designação por nós ora proposto tem, pois, mera vocação provisória e intercalar, destinando-se a ser aplicado apenas a esta primeira designação, por via indirecta, da representação portuguesa. Por isso foi nossa preocupação não inovar, quer face à experiência parlamentar de designação de representantes do Parlamento Português em instâncias internacionais, quer face às regras gerais do direito eleitoral vigentes no nosso país. E o que de novo nesta resolução se contém corresponde apenas ao entendimento do que se nos afigura mais conforme à natureza supranacional do órgão de que dentro em breve os nossos representantes farão parte.
Se quisermos sumariar as principais linhas de força do projecto de resolução que apresentamos poderemos dizer que ele assenta nos seguintes esteios fundamentais:

1.º Consagra um princípio de certa flexibilidade na definição do universo dos eleitores e dos elegíveis, ao impor o requisito de estarem presentes em exercício de funções na data da apresentação das listas uns e outros (e consequentemente na data da própria eleição, que ocorre 3 dias depois daquela);
2.º Opta pela existência de uma lista única submetida a sufrágio resultante da justaposição dos candidatos indicados por cada grupo parlamentar na proporção da sua representatividade na Assembleia da República, aplicando o método da média mais alta de Hondt, permitindo desta maneira a formação de uma vontade unitária, globalmente imputável à Assembleia no seu conjunto, susceptível de ser entendida como a vontade representativa do próprio povo português;
3.º institui um sistema de indicação de efectivos e de suplentes sufragados, em conjunto, no mesmo acto de eleição, o que facilita a substituição imediata daquele ou daqueles deputados europeus que, por qualquer razão, deixem de exercer o seu mandato.

Este sistema, definido em termos muito sucintos, distancia-se do que consta do projecto de lei do PRD. Vejamos em que pontos fundamentais.

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o Desde logo, quanto ao sistema de eleição: onde nós optamos por uma lista bloqueada, o PRD preconiza um sistema de lista relativamente aberta, ordenável pelo eleitor em termos diversos dos pretendidos pelos deputados subscritores da lista. E cumulativamente, visa conciliar o princípio da lista aberta com a representação proporcional, apurando os resultados desta em função da aplicação do método de Hondt ao número de votos obtidos por cada lista, a que acresceria a atribuição dos mandatos dentro de cada lista em função do posicionamento que os eleitores tivessem conferido aos diversos candidatos dentro da lista.
Estes dois aspectos aparentemente, contemplariam duas vantagens:

Por um lado, fariam depender o número de mandatos de cada lista da aplicação do método de Hondt aos resultados apurados nas umas;
Por outro, deixariam ao eleitor uma liberdade de escolha personalizada.

São, contudo, vantagens meramente aparentes, pois em termos práticos o resultado aponta em sentido diverso das intenções preconizadas.
A primeira vantagem constitui na prática um convite aberto ao defraudar da fidedignidade do espectro parlamentar através da fusão de listas que propiciem um acrescido benefício resultante da aplicação do método de Hondt, senão mesmo através de transferências de votos calculadas, de que poderia resultar um desiderato final diferente daquele que resulta normalmente do universo parlamentar, tal como ele foi determinado pelo sufrágio popular em 6 de Outubro último.
A segunda é apenas uma ilusão de liberdade de escolha. O ordenamento previsto só será feito pelo eleitor da lista que ele próprio eleja e não pelo conjunto do universo de eleitores e mesmo assim ficará restrito a uma mera opção de reordenamento do posicionamento mútuo dos candidatos efectivos e dos candidatos suplentes, em termos de reduzidíssimo impacte já que apenas se exige a apresentação de um mínimo de dois suplentes por lista. Na, prática, ainda aqui estamos, perante uma lista bloqueada, menos bloqueada que a nossa proposta, mas muito longe de uma escolha personalizada na verdadeira acepção do termo.
É que escolha verdadeiramente personalizada podemos encontrá-la de facto na nossa vida parlamentar na designação dos juízes do Tribunal. Constitucional, onde cada eleitor emite um juízo sobre cada um dos candidatos e não apenas sobre os da sua lista favorita. Aqui sim há uma indicação aferida ao mérito dos candidatos e não apenas uma mera comparação de entendimento dos deputados eleitores da lista? X e dos deputados dessa mesma lista X.
E uma escolha personalizada relacionada com as realidades da representação proporcional podemos encontrar ainda nas designações que esta Assembleia faz dos seus representantes no Conselho da Europa, onde, existindo quotas de, lugares- previamente definidas por grupo parlamentar em função da sua representatividade, tal como preconizamos no nosso projecto de resolução, cada candidato é submetido à votação individualizada do conjunto dos, deputados; só se considerando eleito aquele que desfrutar de uma maioria absoluta dos votos expressos, o que pressupõe, tal como defendemos no nosso texto, uma certa forma dê acordo interpartidário quanto aos nomes a eleger.
As soluções do projecto do PRD referidas, pelo que afirmei, não merecem a nossa concordância. Pensamos que as nossas soluções, embora aparentemente mais rígidas, garantem uma reprodução mais fiel do universo parlamentar, que se nos afigura ser o fim último prosseguido pelos normativos do Tratado de Adesão.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A segunda iniciativa que apresentamos na Mesa é um projecto de lei que visa definir o estatuto jurídico dos parlamentares europeus a designar, pela Assembleia da República. Dissociamos estas disposições das referentes ao regime de eleição, porquanto este, como vimos, tem vocação meramente transitória enquanto aquele pretende aplicar-se com força de lei e para todas as situações de exercício das funções de deputado ao Parlamento Europeu para futuro, independentemente do método de eleição. E porque se trata de norma que se pretende vigore com forçai obrigatória geral e até altere alguns normativos legais em vigor, optamos neste caso pela forma de projecto, de lei.
No essencial, o estatuto que propomos parte dos seguintes princípios:

1.º Aplicação das normas comunitárias em vigor em termos directos e imediatos;
2.º Aplicação das normas constantes das Leis n.ºs 3/85. (Estatuto dos Deputados) e 4/85 (Estatuto Remuneratório) referentes aos deputados à Assembleia da República, com as adaptações que se, tornem necessárias;
3.º Sujeição dos deputados ao Parlamento Europeu ao regime da Lei n.º 4/83 (Declaração de rendimentos dos titulares de cargos políticos);
4.º Aplicação da suspensão automática do mandato, ao Parlamento, nacional em virtude do exercício de mandato europeu;
5.º Garantia da cobertura financeira do ornamento da, Assembleia da República referente a normas nacionais aplicáveis aos parlamentares europeus.

Face ao projecto do PRD, separam-nos duas diferenças substanciais:

Por um lado, o regime nacional aplicável cumulativamente às regras comunitárias: a nossa, opção foi a de contemplar as disposições das Leis n.ºs 3/85 e 4/85 enquanto p PRD afasta esta, última e não acolhe, quanto àquela, as incompatibilidades previstas no artigo 19.º, que se presume aplicável pela manutenção do mandato no Parlamento, nacional, mas que não é opção
Isenta de dúvidas. Independentemente do que se pense quanto, à Bondade ou, maldade da Lei n.º 4/85, (Estatuto Remuneratório), ela existe, e um juízo de equanimidade não pode deixar de nos levar ía aplicá-la aos parlamentares europeus.
Se o que se pretende é a sua alteração ou até a sua revogação, esta não é o momento azado nem é o meio idóneo. Silenciá-la é, em última análise, um acto discriminatório, tanto mais que há normas comunitárias que só serão aplicáveis
aos parlamentares portugueses se a elas corresponder um regime substantivo de direito interno como o que a Lei n.º 4/85 consagra em Portugal;
Por outro lado, a tese do duplo mandato que o PRD. perfilha onde nós defendemos o regime da

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suspensão automática. Com efeito, a amputação dos deputados europeus, em nosso entender, não deve dar origem ao vazio da representação no Parlamento nacional. Em termos práticos, o duplo mandato é inconciliável, atenta a natureza das funções de parlamentar europeu. Por isso a substituição automática [tal como nos demais casos da alínea e) do artigo 5.º, da Lei n.º 3/85] se nos afigura ser a solução que garante a estabilidade do universo parlamentar nacional e a eficiência do exercício do mandato de deputado ao Parlamento Europeu.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com estas iniciativas legislativas o Parlamento Português dá mais um passo no sentido de completar o que iniciou em Julho último, ao aprovar o Tratado de Adesão. É ao Parlamento Português que cabe definir as regras e condições da presença e participação de parlamentares portugueses nesse areópago das Comunidades Europeias, que é o Parlamento Europeu.
A adopção dos regimes jurídicos que preconizamos corresponde, por isso, a um imperativo pela adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia e pela plena participação de Portugal, como membro de integral direito e em igualdade de circunstâncias com os demais países, nas instâncias e instituições que regulam a vida da Comunidade Europeia.
Teremos cumprido assim mais um ditame do processo de democratização e de europeização do nosso país.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado António Vitorino, em relação a algumas das questões que levantou e que são a nota justificativa ausente do projecto de resolução e do projecto de lei apresentados pelo seu partido, pelo PSD e pelo CDS, terei, noutra altura, ocasião de me pronunciar.
Entretanto, o Sr. Deputado adiantou alguma coisa que, no quadro de um debate que penso dever visar fundamentalmente, mais do que a polémica, encontrar uma solução adequada, entendo dever ser esclarecida.
Tenho ideia de que estará na mente dos proponentes que o Estado Português cumpra o compromisso de integrar com 24 deputados o Parlamento Europeu e, portanto, que o sistema conduzirá necessariamente a que isso suceda.
Assim sendo, interpreto o projecto de resolução no sentido de que a lista é uma lista bloqueada sob todos os aspectos. É uma lista única em que não é votável qualquer dos nomes. Isto porque, sendo os nomes votáveis e admitindo-se a hipótese de rejeição, então o Estado Português poderia ficar em circunstâncias de não lhe ser possível cumprir a obrigação que assumiu no quadro do Tratado de Adesão.
De outra forma, no sistema proposto pelo PS, pelo PSD e pelo CDS, só votando em conjunto a lista, sem possibilidade de qualquer espécie de abertura, é que o Estado Português estaria em condições de integrar com 24 deputados o Parlamento Europeu.
Ora, na sua intervenção, o Sr. Deputado assimilou este processo ao do Conselho da Europa e, nessas circunstâncias, põe-se a seguinte questão: será que, naquela lista, à frente de cada nome existem três quadradinhos, um para o sim, outro para o não e outro para a abstenção? E sendo assim, como é que o Estado Português poderá, então, inexoravelmente, cumprir a sua obrigação?
É claro que esta explicação tem a ver com a própria filosofia do projecto de resolução, sobre o qual direi mais alguma coisa adiante.
Mas, esclarecendo este ponto desde já, talvez o Sr. Deputado me tire outras dúvidas que tenho acerca do seu projecto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Deputado João Amaral, em primeiro lugar, quero dar a mão à palmatória (como convém), pois, por lapso não foi incluída no projecto de diploma a exposição de motivos. Tenho-a aqui e enviá-la-ei imediatamente para a Mesa.
Peço desculpa pelo lapso, mas, como compreenderão, há 2 anos que estou ausente das lides parlamentares deste lado - que é, aliás, o lado mais agradável das coisas - e, às vezes, esses lapsos sucedem.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O Governo esquecia-se sempre!

O Sr. Presidente: - A responsabilidade também foi da Mesa, Sr. Deputado, pelo que a sua fica diluída.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Quero dizer ao Sr. Deputado João Amaral que a referência que fiz à forma de designação dos deputados portugueses ao Conselho da Europa, tal como à eleição dos juizes do Tribunal Constitucional, constituiu uma mera indicação de dois exemplos onde, de facto, existem escolhas personalizadas, para contrapor ao sistema proposto pelo PRD que, reclamando-se da escolha personalizada, não se traduz numa verdadeira e autêntica escolha personalizada, na medida em que só permite emitir opinião individualizada sobre os candidatos dentro da lista que cada deputado eleitor escolher.
O ponto comum que encontramos entre o nosso projecto e o processo de designação dos deputados portugueses ao Conselho da Europa é apenas o respeitante ao critério de atribuição de quotas aos grupos parlamentares. E a similitude acaba aí.
Na lógica da nossa proposta, a lista única é, se quiser, uma lista duplamente bloqueada: bloqueada quanto à determinação pelo método de Hondt das quotas de representatividade de cada grupo parlamentar na Assembleia, e bloqueada quanto aos nomes indicados por cada conjunto de subscritores para fazerem parte dessa lista. Não há, pois, qualquer «ingerência» sobre os nomes constantes da mesma lista, sendo, de facto, um sistema diferente do preconizado pelo PRD.
Foi, portanto, apenas nesse sentido que falei em similitude com a eleição para o Conselho da Europa.

O Sr. Pegado Liz (PRD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

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O Sr. Pegado Liz (PRD): - Para apresentar um requerimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Pegado Liz (PRD): - É do seguinte teor o referido requerimento:
Nos termos do artigo 86.º do Regimento, considerando que o projecto de resolução n.º 4/IV trata inequivocamente de matéria eleitoral, apesar da sua natureza intercalar; considerando que, apenas por razões circunstanciais, a eleição dos deputados ao Parlamento Europeu se processa, pela primeira vez em Portugal, por forma indirecta, o que, por qualquer modo, não lhe retira o carácter e a dignidade de uma verdadeira e própria eleição, como, aliás, é expressamente reconhecido em qualquer dos projectos em apreço; considerando que, assim sendo, não pode tal matéria ser objecto de resolução mas antes de projecto de lei, por a tal se opor expressamente o disposto no artigo 169.º, n.º 2, da Constituição, por referência aos artigos 164.º, alínea d), e 167.º, alínea f), requeiro que o projecto de resolução em causa seja admitido e discutido como projecto de lei e não como projecto de resolução.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pegado Liz, V. Ex.ª vai fazer o favor de apresentar esse requerimento por escrito à Mesa, na medida em que ele implica matéria de ponderação e tenho de o mandar distribuir por todas as bancadas para que os Srs. Deputados possam sobre ele reflectir.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Presidente, gostaria que a Mesa me esclarecesse uma dúvida que, porventura, resulta do facto de eu não ser especialista na matéria.
A questão que ponho é no sentido de saber se este requerimento terá sido tempestivamente apresentado, visto que o projecto de resolução foi admitido pela Mesa e foi, inclusivamente, votado que tudo se discutisse em conjunto, tendo-se dado já início à discussão.
Então, agora é que surge um requerimento deste tipo?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradecia o favor de não se pronunciarem sobre esta matéria. Vou, primeiro, mandar distribuir o requerimento, após o que o submeterei à votação.
Entretanto, parece-me que o Sr. Deputado José Luís Nunes havia igualmente pedido a palavra.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, de facto, eu tinha pedido a palavra mas como V. Ex.ª ainda não tomou nenhuma decisão sobre o requerimento, penso que a intervenção que ia fazer está prejudicada.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Precisamente porque o projecto de resolução apresentado pelo PS, pelo PSD e pelo CDS não tinha uma exposição de motivos é que nos pronunciámos contra a discussão em conjunto dos três diplomas, visto que aquele mereceria, quanto a nós, uma. consideração à parte, pois o próprio Regimento estabelece um prazo de 5 dias para o suprimento.
Depois da intervenção do Sr. Deputado António Vitorino, esta questão ficou, de certo modo, ultrapassada.
Contudo, não queríamos deixar de afirmar aqui um outro ponto, que é o facto de estarmos a pôr em prática entre nós, embora transitoriamente, um regime de eleição, o que é totalmente diferente daquilo que se passou em Espanha em que o que houve foi um acordo dos partidos e não uma eleição nem, naturalmente, a necessidade de uma lei regulamentar para a escolha dos deputados ao Parlamento Europeu.
É, pois, um processo diverso do de um outro país também integrado na CEE.
Parece-nos que a primeira questão que decorre, em especial do projecto de resolução apresentado pelos três partidos que referi, é a que resulta do n.º 1 do artigo 2.º, onde se estabelece uma lista única e não uma lista completa dos candidatos a deputados.
Embora já corrigido com um acrescento apresentado no início desta sessão, no sentido da referência ao método de Hondt, a verdade é que continua a ser não uma lista completa mas sim uma lista única, o que contraria não só o disposto no artigo 280.º do Regimento como o disposto na própria Constituição, nomeadamente no seu artigo 116.º, n.º 3, alínea b).
Parece ser de entendimento claro que, havendo uma lista única, se altera profundamente o regime de eleição, na medida em que não é possível a apresentação de várias listas, mas apenas de uma só.
É certo que estamos de acordo com as observações feitas pelo Sr. Deputado António Vitorino relativamente às soluções propostas pelo PRD no seu projecto e quanto à classificação contida na votação dos artigos 4.º e 5.º e do n.º 1 do artigo 7.º - creio que ele também se referiu a estes aspectos. Na realidade, estas disposições não deveriam ser postas em prática porque se trata de uma inovação a que nada obriga e que iria alterar o próprio sentido do sufrágio.
Relativamente ao artigo 8.º, também nos parece que aquilo que consta do projecto do PRD não se adapta à nossa própria realidade política, sendo, quanto a nós, a solução apresentada pelos três partidos no artigo 4.º do respectivo projecto, em que se reporta ao «mesmo grupo parlamentar», mais consentânea com as nossas disposições constitucionais e regimentais.
Finalmente, no que diz respeito ao duplo mandato, mais própria do que a disposição que consta do artigo 9.º, n.º 2, do projecto apresentado pelo PRD, parece-nos ser aquela que consta do artigo 2.c do projecto de lei relativo ao Estatuto dos Deputados ao Parlamento Europeu apresentado pelos três partidos, na medida em que nada pode justificar que se mantenha o duplo mandato. Pelo contrário, deve o deputado eleito passar a ser deputado ao Parlamento Europeu e ser substituído como tal nesta Assembleia de República.

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Concluindo, pensamos que os três diplomas têm disposições aceitáveis, embora algumas outras não mereçam a nossa concordância. Mas, na realidade, sobreleva em todos eles o problema da lista única ou da lista completa e, quanto a esse, julgamos por bem que, tal como por pane do Partido Socialista já aqui foram feitas algumas correcções em relação às suas propostas iniciais, também quanto a esta questão venha a reconhecer-se que, efectivamente, é o regime da lista completa aquele que consta do Regimento e da Constituição, devendo, por isso, ser esse o regime a adoptar.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por colocar duas questões processuais no sentido de as eliminar tão rapidamente quanto possível.
Em primeiro lugar, foi apresentado na Mesa, por um deputado da minha bancada, um requerimento cuja apreciação está suspensa e segundo o qual o tratamento a dar ao projecto de resolução n.º 4/IV deveria ser não como tal, mas como projecto de lei.
Permitia-me adiantar que, se existisse algum consenso nessa matéria, pudéssemos prosseguir a discussão, independentemente da apreciação desse ponto e o deixássemos para objecto de debate no âmbito da comissão especializada que vier a debruçar-se sobre os projectos de lei e de resolução, cabendo a esta a classificação final da iniciativa legislativa como lei ou como resolução.
Penso que esta será a solução mais expedita e aquela que melhor permitirá uma apreciação das questões subjacentes a esta problemática, que não é, de maneira nenhuma, uma problemática de somenos.
Em segundo lugar, também para adiantar a nossa discussão, gostaria de esclarecer que, pela nossa parte, face à exposição de motivos feita oralmente pelo Sr. Deputado António Vitorino, achamos desnecessário o prazo de 5 dias para correcção do projecto de lei apresentado pelo PS, pelo PSD e pelo CDS, o qual, por não ter exposição de motivos, deveria, por força da alínea d) do artigo 132.º do Regimento, aguardar por um período de 5 dias para que essa anomalia fosse corrigida. Prescindimos desse prazo, pois parece-nos que a exposição de motivos que foi feita verbalmente permite colmatar essa lacuna e, como tal, aceitaremos que a discussão se faça desde já no sentido de aceleráramos os nossos trabalhos.
Postas estas duas questões processuais, gostaria de entrar directamente naquilo que tem a ver com o projecto de lei subscrito pelos deputados do PRD.
Pedindo antecipadas desculpas à Câmara pelo facto de esse projecto apresentar «gralhas», existindo, para além de erros dactilográficos, também erros de sentido, que se explicam por se tratar de uma primeira versão de um projecto que ainda estava em discussão interna no seio do Grupo Parlamentar do PRD e que, apenas pela necessidade de agendamento desta matéria, deu de imediato entrada na Mesa, sem que tivesse sido possível um debate aprofundado de todas as questões e o próprio aperfeiçoamento da redacção - o que, em sede de especialidade, poderá ser corrigido -, gostaria de me deter sobre os dois pontos fundamentais em que esse projecto difere dos restantes projectos, que, quanto a nós, merecerão alguma atenção por parte desta Câmara.
Refiro-me ao princípio da escolha dos deputados que farão parte do Parlamento Europeu e do método segundo o qual essa escolha será feita por esta Assembleia e à questão do duplo mandato versas mandato único.
Quanto ao problema da escolha dos deputados, parece-nos essencial que a mesma seja assumida por todo o Parlamento, ou seja, que o Parlamento não se limite a consagrar uma indicação fornecida pelos vários partidos políticos aqui presentes, mas que tenha ele próprio uma palavra a dizer sobre essa questão.
Trata-se - não o podemos esquecer - não apenas de uma representação desta Assembleia, mas de uma representação dos Portugueses que, por modo indirecto, é feita através desta Assembleia. Como tal, julgamos que não se trata, pura e simplesmente, de consagrar as opções que os vários partidos têm a fazer sobre quem eles próprios pensam que melhor os representará no Parlamento Europeu, mas de uma escolha em que os Portugueses, através dos seus representantes, devem escolher quem melhor os representará no Parlamento Europeu.
Esse é o sentido que futuramente terão as eleições directas para o Parlamento Europeu; esse é o sentido que entendemos dever-lhe ser desde já introduzido.
Trata-se - não o esqueçamos - de uma representação de Portugal no Parlamento Europeu, em que, por condicionalismos conhecidos, essa eleição se faz no Parlamento por via indirecta de entre os seus deputados.
Se assim é, uma segunda razão existe ainda que justifica este tipo de procedimento: é que, ao longo do tempo, já todos tivemos ocasião de verificar que as condições em que no Parlamento se votam as listas que correspondem à consagração parlamentar de designações se traduzem muitas vezes em situações de voto bloqueado. Nem sempre o Parlamento tem concordado com os critérios de escolha dos vários partidos que indicam os seus representantes para organizações, as mais variadas, exteriores à Assembleia da República e o que tem acontecido são variadas situações que nos colocam a todos um problema sério. Por várias vezes, eleições dessa natureza tiveram de ser repetidas, uma e mais vezes, até que se verificasse uma de duas situações: ou o Parlamento cedia em relação à consideração de resolver um problema e acabava por eleger um deputado à segunda, terceira ou quarta vez em que o partido o apresentava ou, pelo contrário, era o partido quem tinha de ceder perante a vontade do Parlamento e retirava essa escolha.
Penso que nenhuma das situações é prestigiante e, no caso concreto, ela poderia traduzir-se no facto de a representação de Portugal no Parlamento Europeu, em Janeiro, não ser de 24 mas, por exemplo, de 23 ou 22 deputados. Creio que uma situação dessa natureza seria de todo inconveniente.
Por assim ser, penso que é indispensável não só que os deputados da Assembleia da República tenham liberdade de escolha em relação às várias listas que lhes são propostas, mas também que devem ter alguma coisa mais a fazer - por isso elegem - do que limitarem-se a reconhecer notoriamente, através do seu voto, uma indigitação partidária. Não é isso que está em causa, mas sim, pelo contrário, a própria escolha deste Parlamento, escolha essa que deverá ser tão livre quanto possível.
Por isso mesmo, a solução encontrada procura compatibilizar interesses: respeita a indigitação dos vários

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partidos, mas permite aos deputados agruparem-se no sentido de elaborarem candidaturas e ainda, através dê diferente ordenação daquela que constasse da proposta inicial, corrigirem erros óbvios de que essa proposta se pudesse revestir.
Esta liberdade de actuação permite ainda corrigir uma evidente anomalia. Suponham VV. Ex.as que, pelo critério de lista única, um deputado apresentado como efectivo pelo seu partido tem menos votos: do que um candidato apresentado como suplente por esse mesmo partido. Neste caso; a Assembleia da República cai na. situação aberrante perante o povo português de escolher o deputado menos votado em desfavor do deputado mais votado, ainda que isso corresponda a «uma votação do próprio Parlamento.
Nestas f condições, o Parlamento ficaria a subordinar a sua própria; votação e deliberação, que deverá ser soberana ao interesse e entendimento dê um grupo parlamentar, qualquer que ele fosse. Creio que ninguém perceberia uma situação desta natureza, pelo que todos teremos de estar atentos a ela.
Mas há ainda outra consequência profunda desta situação de se tratar de uma escolha parlamentar feita em nome dos Portugueses, que tem a ver com ò grau de responsabilização dos deputados que forem escolhidos para o Parlamento Europeu e com a questão do duplo mandato.
Se os deputados que vierem a tomar assento no Parlamento Europeu suspenderem obrigatoriamente o seu mandato perante a Assembleia da República, a sua actuação no Parlamento Europeu hão os responsabiliza perante ninguém. Isto porque não tem eleitorado directo à quem prestem contas da sua actuação como deputados do Parlamento Europeu e, já que deixaram de desempenhar às suas funções na Assembleia da República, também perante esta, que os escolheu é designou, não assumem qualquer espécie de responsabilidade pela representação que assumiram. Ou seja, os deputados eleitos para o Parlamento Europeu por esta Assembleia perderiam automaticamente, por força da negação do princípio do duplo mandato, qualquer sentido de responsabilidade perante o eleitorado, quer este seja considerado directamente - o povo português- quer indirectamente - esta Assembleia da República.
Isso chegaria, provavelmente, para justificar que, neste período em que de eleições indirectas estamos à tratar, o princípio do duplo mandato fosse assegurado. Se entrarmos em linha de conta com aquilo que é a experiência alheia, podemos verificar que no Parlamento Europeu, até 1979, ou seja, até às primeiras eleições directas para o Parlamento Europeu, era o princípio do duplo mandato que vigorava. Isso tem este significado profundo, mas tem ainda um outro. É que, sem o princípio do duplo mandato, os deputados enviados para o Parlamento Europeu - aqui reside, provavelmente, a lógica da sua designação no projecto que nos está subjacente- ficam exclusivamente dependentes do partido ou grupo parlamentar: que os designou. Eles não têm eleitorado próprio, e, portanto, não têm hipótese de virem explicar perante o seu eleitorado qual foi a acção desenvolvida no Parlamento Europeu em favor dos interesses desses eleitores e dos portugueses em geral. Por outro lado, também não têm possibilidade de contacto com a própria Assembleia da República, ou seja, deixam de ter qualquer hipótese de, através de uma tribuna pública ao nível nacional, justificarem a sua acção, darem contas do seu mandato, dizerem do modo como o estão a exercer.
A própria Assembleia da República fica diminuída na sua actuação: ou encontra formas enviesadas de contactar com esses deputados ou, então, também ela ficou sem qualquer, espécie de contacto institucional com os deputados que escolheu para tomarem assento no Parlamento Europeu.
Isto é suficientemente importante para justificar que, nos países onde a maioria ;dos deputados ao Parlamento Europeu não têm estatuto de duplo mandato, se tenha tentado formular regimes como, por exemplo, o da existência de comissões mistas - como existe na Câmara Baixa da República Federal da Alemanha - ,em que tomam assento, em pé de igualdade, deputados ao Parlamento Alemão; Europeu. Só que essa comissão tem como único, poder o de, fazer relatórios: reúne pouco, os deputados ao Parlamento Europeu não têm sequer qualquer, obrigação de: comparecer às suas sessões e, os relatórios são feitos quando muito bem ,se quer e entende. Por isso, o Parlamento da República Federal da Alemanha queixa-se de ter perdido completamente o contacto com os seus deputados eleitos para o Parlamento Europeu e o, mesmo se passa em relação a vários outros países.
É por isso que o princípio do duplo mandato se mantém e que os inconvenientes de facto que são reconhecidos em relação à sua existência devem ser deixados ao julgamento do próprio deputado. Ninguém melhor do que ele próprio e os seus eleitores poderá julgar da sua capacidade de assegurar uma dupla representação ou de falhar neste ou naquela aspecto, e, então, de se fazer Substituir.
Daí que a nossa proposta seja bastante mais simples: mantém o princípio do duplo mandato e determina que o deputado no exercício de funções no Parlamento Europeu se pode, fazer substituir sem os limites temporais do Estatuto dos Deputados, ou seja, por períodos inferiores a 15 dias. É o deputado que julga do interesse em voltar a estar presente no Parlamento que o elegeu por forma indirecta, é ele que nesse Parlamento deverá estar presente sempre que o julgue necessário ou que o próprio Parlamento, pela natureza dos seus debates, aconselhe a que esse deputado aí tome o seu lugar.
Estas são as razões fundamentais que, do nosso ponto de vista, justificam que o processo de escolha dos deputados que nos representarão no Parlamento Europeu deva ser diferente da do processo adoptado para outras designações:.
Dos inconvenientes do sistema proposto, já de algum modo falámos.
Porém, também este princípio justifica que se mantenha a situação de duplo mandato, pelo menos, até à realização das primeiras eleições directas e então, com a ponderação que necessariamente a experiência nos fará ter, Portugal opte por consagrar o regime do duplo mandato ou o do mandato único.
Nesta matéria, pensamos que não temos nenhuma razão para nos apressarmos. Há no Parlamento Europeu vários deputados que mantêm o duplo mandato e, como é do conhecimento de vários dos Srs. Deputados, até há dúvidas sobre a possibilidade de uma legislação nacional impedir o princípio do duplo mandato, visto quê apenas duas legislações nacionais o proíbem. Inclusivamente, essa questão é objecto de controvérsia tão

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deria oscilar em função de as pessoas optarem pela manutenção dos dois mandatos ou pela manutenção de um só?
Por último, quero deixar a seguinte nota: há sempre duplo mandato na titularidade, mas não no exercício. O duplo mandato existe, não havendo renúncia do mandato ao Parlamento nacional. O que há é suspensão automática do mandato ao Parlamento nacional e exercício do mandato ao Parlamento Europeu. Há sempre duplo mandato, que é reassumível a qualquer momento. Quando alguém se cansar dos restaurantes de Bruxelas ou das viagens cansativas entre Lisboa e Estrasburgo, será com o maior prazer que o voltaremos a receber no nosso seio.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Magalhães Mota, terei ocasião de analisar os dois projectos (assim lhes chamo) em confronto.
Entretanto, há um aspecto da sua intervenção que, não se referindo sequer ao projecto do PRD, mas à sua análise do projecto do PSD, PS e CDS, me intrigou.
Questionei o Sr. Deputado António Vitorino acerca do significado da lista e de qual o nível de bloqueamento que ele entendia haver em relação ao sistema proposto. A resposta que o Sr. Deputado António Vitorino me deu foi a de que a lista era duplamente bloqueada no número e na composição, ou seja, de que, tanto quanto entendi, haveria uma votação da lista única sem possibilidade de escolha interna, o que significa que não haveria três quadradinhos à frente de cada nome. Foi assim que entendi a resposta do Sr. Deputado António Vitorino.
Entretanto, a intervenção que o Sr. Deputado Magalhães Mota produziu veio retomar a questão no seu ponto inicial.
O que perguntaria ao Sr. Deputado Magalhães Mota - pedindo-lhe desculpa por não colocar a pergunta ao Sr. Deputado António Vitorino, mas frisando que esta é a única forma que tenho para a colocar neste momento - é se não entende que a resposta do Sr. Deputado António Vitorino não foi suficiente, que ela significou coisa diferente da que entendi ou que contém mecanismos que não foram ainda explicitados.

O Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Pinto.

O Sr. Pedro Pinto (PSD): - Sr. Deputado Magalhães Mota, tendo-se referido à possibilidade que é, aberta aos deputados de desenvolver um trabalho efectivo no Parlamento Português e no Parlamento Europeu, através da faculdade de em cada momento se pedir a suspensão do mandato de deputado ao Parlamento Português, de forma a permitir a sua presença no Parlamento Europeu, perguntar-lhe-ia, até porque não estou bem certo, se, em termos de Parlamento Europeu, existe a figura da suspensão do mandato. Isto porque, tanto quanto penso, essa figura não existe.
Portanto, creio que, pelo menos, em termos de Parlamento Europeu, haverá momentos de trabalho em que, se forem coincidentes com os momentos de trabalho do Parlamento Português, alguns dos deputados não poderão lá estar presentes. Não sei ao certo se o Sr. Deputado Magalhães Mota tem conhecimento disso. De qualquer forma, gostaria que me esclarecesse acerca desta matéria.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Começando por responder ao Sr. Deputado António Vitorino, devo dizer que, em relação à primeira questão, é evidente que a proposta que consta do projecto de lei de autoria dos deputados do PRD não corresponde a um princípio total de personalização. Em relação a esse aspecto, diria que se trata necessariamente de uma escolha mais aberta do que a formulada pelo projecto de lei alternativo da autoria dos Srs. Deputados do PSD, do PS e do CDS e penso que, obviamente, teremos sido comedidos pensando precisamente nos interesses que estarão na base desse mesmo projecto alternativo.
Portanto, tentámos encontrar uma solução equilibrada e não encaminharmo-nos, desde já, pela assunção da personalização total, visto que, como a existência dos dois projectos tão opostos o demonstra, o projecto de personalização seria muito mais divergente da proposta que foi apresentada. Pensámos que este meio caminho poderia, talvez, ser um ponto de encontro.
Quanto à questão do duplo mandato, é evidente que, para futuro, os problemas permanecem e que esta matéria justifica uma reflexão aprofundada. Por assim ser, julgo que talvez se justificasse que aproveitássemos precisamente esta experiência inicial de eleições indirectas, para ponderarmos, em termos de legislação eleitoral que viermos a aprovar para o Parlamento Europeu, se nessa altura e de acordo com uma prática que estabelecermos se justifica ou não - mas só nessa altura - fazer terminar o princípio do duplo mandato. Pode ser que o regime dos factos e as condições do facto nos levem a essa conclusão, mas pode ser que, pelo contrário, concluamos que para o Parlamento Português é bastante mais útil a fórmula da manutenção do duplo mandato.
Ao Sr. Deputado João Amaral, devo dizer que não sou capaz de lhe explicar o sentido e alcance da resposta do Sr. Deputado António Vitorino. O que pretendi demonstrar quando usei da palavra foi que deve haver por parte do Parlamento um mínimo de possibilidades de escolha e que, se não nos é posta à frente de cada nome a possibilidade de se votar «sim», «não», ou «abstenção», há, pelo menos, a possibilidade de riscar nomes e julgo que a consequência desse risco só pode ser um voto negativo para esse nome e não que a anulação recaia sobre toda a lista. Esse foi o meu entendimento e é um aditamento à interpretação que foi dada pelo Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. Deputado Pedro Pinto perguntou-me se não havia suspensão do mandato. Creio que o problema é um pouco mais vasto do que este, porque se tem argumentado aqui com base nas 3 semanas de funcionamento do Parlamento Europeu. Bom, essas 3 semanas de funcionamento do Parlamento Europeu é l semana de plenário, l semana de comissões e l semana de reunião dos grupos parlamentares. Vamos, portanto, entender-nos quanto a esse funcionamento!

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grande que se pensa que será necessário uma própria decisão do Tribunal das Comunidades para ajuizar sobre ela e sobre a capacidade dessa proibição - ainda ontem, os deputados que fazem parte do comité misto Assembleia da República/Parlamento Europeu puderam escutar esta mesma informação.
Portanto, creio que a Assembleia da República está confrontada com duas questões cuja importância é relevante para a escolha da primeira representação de parlamentares portugueses no Parlamento Europeu, pelo que, quanto a nós, deve debater e aprofundar esta questão, que não é de. modo nenhum tão simples riem tão geradora de certezas que possa transformar-se numa simples reposição dos critérios para designação de outras representações ou deputações parlamentares.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, na parte inicial da sua intervenção, V. Ex.ª levantou duas questões de natureza processual uma diz respeito à falta da justificação de motivos que se deveu a mero lapso, o qual foi já suprido, tendo-se já procedido à distribuição dessa justificação de motivos; a outra respeita a um requerimento que foi apresentado pelo Sr. Deputado Pegado Liz. Pretendo saber de V. Ex.ª se, segundo aquilo que sugeriu, esse requerimento deve ou não ficar em suspenso.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - A indicação que tenho - suponho que com a concordância do meu colega Pegado Liz - é a de que o requerimento fique suspenso e a comissão, especializada que debate esta matéria, aprecie a questão e decida se deve assumir a forma de resolução ou a forma de lei a designação do processo eleitoral dos deputados que vão tomar parte ,no Parlamento Europeu.
Penso que assim adiantaríamos; não faríamos agora nem a votação nem a discussão deste assunto, cuja relevância me parece importante, e ele poderia ser. melhor tratado em comissão.

O Sr. Presidente: - Também penso que sim.
Portanto, seguindo a sugestão de V. Ex.ª, certamente com a concordância do Sr. Deputado Pegado Liz; fica suspenso o requerimento.
Houve Srs. Deputados que pediram a palavra para formularem pedidos de esclarecimento! Como já passámos a hora do intervalo, vamos tomar nota dos Srs. Deputados quê se inscreveram, para que, logo que recomecemos os trabalhos, tenham oportunidade dê formular os seus pedidos de esclarecimento. Pediram á palavra os Srs. Deputados António Vitorino, João Amaral e Pedro Pinto, que ficam, pois, com a palavra reservada para depois do intervalo.
Está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 45 minutos.

Após o intervalo, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Marques Mendes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Deputado Magalhães Mota começo com uma nota quanto à questão da forma.
Penso que a comissão poderá debater essa questão com mais cuidado. Os argumentos do Sr. Deputado Pegado Liz não me convenceram, mas pode ser que ele ainda tenha outros que não tenha expendido aqui no Plenário. Reservo-me, portanto, para essa ocasião. Escusamos de estar aqui a abrir um incidente processual e a perder tempo.
Quero fazer apenas dois apontamentos em relação à sua intervenção.
O primeiro diz respeito ao sistema da escolha. Na verdade, o método que o propõe é um método que aponta para uma solução híbrida, porque se não é verdadeiramente uma escolha personalizada também não é verdadeiramente, uma lista bloqueada. O que há é liberdade de escolha do eleitor dentro da lista que ele próprio escolheu e "de parâmetros muito rescritos.
Se a opção fosse pela personalização, com as virtudes que o Sr. Deputado Magalhães Mota lhe incutiu, o método teria de ser outro completamente diferente. O1 que gostaria dê saber é se o PRD, fazendo a apologia da personalização, está a pensar em reapreciar o método que propôs, no sentido de o tornar mais radicalmente personalizado e mais suavemente partidarizado, se é que estas expressões não têm um conteúdo muito forte neste debate.
A segunda questão e a do duplo mandato. Aqui, confesso que o Sr. Deputado Magalhães Mota marcou alguns pontos a seu favor - não vou esconder-lhe este facto. Mas quando dialoga com alguém teimoso como eu, mesmo que se marquem alguns pontos, ainda faltam, depois, alguns outros.
Tudo o que o Sr. Deputado Magalhães Mota disse é verdadeiro. Simplesmente, os problemas que o Sr. Deputado colocou são problemas que também se colocam para o futuro, onde não haverá condições para os resolver por uma norma, como neste momento o Sr. Deputado Magalhães Mota propõe.
Provavelmente, teremos mesmo de ter um grupo misto na Assembleia da República/Parlamento Europeu para manter o contacto entre os deputados e teremos, de admitir que haja duplo mandato, mas que, dentro da liberdade de escolha, as pessoas exerçam entremeando, digamos assim, e nunca os dois cumulativamente. Porém, o que também é verdade é que a prática do Parlamento Europeu demonstra que constituem, um número reduzidíssimo os parlamentares europeus que hoje têm duplo mandato. Embora as legislações nacionais o admitam, é, na prática, um número reduzidíssimo (salvo erro, são 50 ou 52).
Portanto, a prática também nos deve ajudar a compreender. Não me repugna a ideia de que a lei seja flexível e, depois, a prática se encarregue de fazer a triagem. Mas entendemos que seria mais claro e transparente, até à luz dos princípios da estabilidade e da manutenção integral de composição parlamentar.
No caso, por exemplo, de um deputado ser chamado a depor em julgamento, toda a jurisprudência da nossa Comissão de Regimento e Mandatos aponta no sentido de não aceitar a sua suspensão do mandato, para evitar uma amputação, ainda que transitória, de um só membro que seja desta Câmara, a fim de responder em juízo. Não será mais oneroso estarmos agora a admitir que este universo parlamentar que aqui está pó-

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Ora bem, esta é uma margem suficiente de manobra para permitir ao deputado a possibilidade de, a cada momento, escolher o que é que considera mais importante. Ë evidente que muitas vezes o conflito pode existir e terá de ser resolvido, mas há uma margem de manobra suficiente, até porque o regime de faltas e a consequência das faltas não são os mesmos no Parlamento Europeu e na Assembleia da República para permitir ao deputado uma opção e uma escolha em relação aos debates que ela considere mais importantes.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cruz Vilaça.

O Sr. Cruz Vilaça (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS subscreveu e apresentou os projectos de resolução e de lei em discussão por várias razões.
Com efeito, entende ser o sistema aqui consagrado o que melhor se coaduna com a natureza de uma eleição que, sendo transitoriamente uma eleição interna feita nesta Câmara, pretende escolher os representantes nacionais à Assembleia que, em Estrasburgo, representa os povos da Europa.
Esta Assembleia da República foi já eleita com este poder a exercer em aplicação do disposto no artigo 8.º do Acto de Adesão.
Os eleitores votaram, portanto, já em 6 de Outubro, sabendo, ou podendo saber, que o faziam com este efeito e com esta eficácia externa. Isto sem que, pelo facto de alguns dos escolhidos deverem ocupar um lugar no Parlamento Europeu, como deputados de pleno direito, deixarem de estar representados, pois os seus substitutos assegurarão essa representação.
Se assim é, o sistema de escolha deve, em nosso entender, ser o que exprima, com a maior fidelidade possível, as opções dos eleitores, isto é, o retrato do universo eleitoral.
Não o podendo fazer directamente nesta fase, dada a natureza indirecta da eleição, impõe-se que se criem entre o eleitorado e os seus representantes ao Parlamento Europeu o mínimo de distorções.
É isso que, em nosso entender, é assegurado pelo sistema que propomos: primeiro, porque é um sistema simples, claro e transparente; segundo, porque através da aplicação do método proporcional de Hondt - bem ou mal é o que está constitucionalmente consagrado como sistema eleitoral em geral - pretende exprimir o retrato do nosso universo eleitoral através da sua expressão na Assembleia da República; terceiro, porque evita justamente a intromissão de elementos de distorção entre o universo eleitoral original e os seus representantes escolhidos indirectamente, elementos de distorção que estão presentes em termos que parecem francamente desmesurados no projecto de lei do PRD.
Ao contrário do que pretendeu afirmar o Sr. Deputado Magalhães Mota, este é que desvia a eleição da sua raiz, isto é, da expressão original da vontade do eleitorado, e lhe desvaloriza, portanto, o seu sentido de uma escolha nacional, porque todas as combinações e arranjos se tornam então possíveis, aleatórios e não controláveis pelo eleitorado. Já que, de certa maneira, estamos a «expropriar» - temporariamente, é certo! - ao eleitorado a escolha dos seus representantes ao Parlamento Europeu, «expropriemo-la» o menos possível.
De resto, o sistema de ordenação dos deputados em cada lista, proposto pelo PRD, parece-nos inconveniente, porque, por um lado, é contraditório com o espírito do nosso sistema eleitoral constitucionalmente consagrado - poderá ser mau, mas é o que existe e é o que está em prática - e, por outro lado, não parece ser este um bom pretexto nem a forma correcta para o alterar. Aproveitar o sistema de eleição indirecta ao Parlamento Europeu para, de certa maneira, introduzir uma alteração no sistema eleitoral significa, mais uma vez, andarmos a reboque da integração na CEE para alterar o nosso quadro legislativo.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Muito bem!

O Orador: - A reforma do sistema eleitoral, que o CDS tem preconizado, deve ser um processo global, deve ser inscrito numa reflexão de conjunto sobre o sistema e não ditado por razões de simples oportunidade.
Finalmente, quanto à questão do duplo mandato, a nossa posição é a de que este se torna, sobretudo no caso dos deputados portugueses, fisicamente impossível. E digo «sobretudo no caso dos deputados portugueses» porque se ele já é difícil de assegurar para os deputados que estão geograficamente situados próximo da sede do Parlamento Europeu, torna-se muito mais difícil de assegurar para deputados cujo território de origem está na periferia da Europa. Estrasburgo não fica já aqui ao lado e, por isso, se é fisicamente impossível assegurar o duplo mandato, também isso se torna eticamente condenável de consagrar. Tanto mais que, com 24 deputados no Parlamento Europeu e sobretudo na fase inicial em que o Parlamento vai funcionar, para exercer cabalmente o seu mandato, estes terão de o fazer em regime de plena dedicação, em full-time, e com um desdobramento de esforços que não é compatível com o exercício do mandato também na Assembleia da República.
Apesar das dúvidas suscitadas a esse propósito, pelo Sr. Deputado Magalhães Mota, creio que a possibilidade de se criarem instituições, mecanismos ou comissões mistas que assegurem a coordenação e um contacto permanente entre a Assembleia da República, designadamente através da Comissão de Integração Europeia, e os deputados portugueses ao Parlamento Europeu pode evitar que se crie entre estes e o Parlamento de que emanam um fosso, um afastamento, que seria, de facto, indesejável.
De todo o modo, como salientou o Sr. Deputado António Vitorino, a experiência mostrou que é muito difícil o exercício do duplo mandato e que é possível adoptar mecanismos que não são os óptimos, mas que são, pelo menos, bons ou podem revelar-se bons. Se este sistema não é óptimo, não obstante e nas circunstâncias actuais, parece ser o melhor. A fazer-se uma experiência, penso que ela deve ser feita nestes termos, evitando o duplo mandato e criando mecanismos de coordenação e de contacto permanente, entre a Assembleia da República e os deputados ao Parlamento Europeu.

Aplausos do CDS, de alguns deputados do PSD e do deputado do PS António Vitorino.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, estão inscritos os Srs. Deputados Magalhães Mota, Pegado Liz e Lopes Cardoso.
Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

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O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Deputado Cruz Vilaça, ouvi com alguma perplexidade uma afirmação que fez a propósito das obrigações do Parlamento Português em relação à reprodução exacta do voto dos eleitores. Significa isso que V. Ex.ª adere a um sistema de mandato imperativo? Ou, pelo; contrário, entende que os deputados tem, como sempre se entende a na tradição parlamentar, uma liberdade de actuação que não os condiciona às decisões dos eleitorados, especialmente às decisões tomadas no momento; eleitoral próprio?
Em segundo lugar, o CDS, como quase todos os partidos desta Casa, tomou posição ao considerar desejável uma reforma do sistema eleitoral. O Sr. Deputado diz-me agora que essa reforma deve; ser global, que é uma forma perfeitamente bloqueante. Digo isto porque, se a reforma deve ser global e se não, se começa por nenhuma ponta, nunca a faremos, porque ela tem de ser global. Em que ficamos, Sr. Deputado? Podemos começar por algum lado ou não «podemos começar e, então, temos o argumento de, que nas ,eleições para o Parlamento, Europeu não seguimos, esse critério, para depois evitar reformas globais em relação, a outro sistema ou ao conjunto, do sistema, eleitoral?
Em terceiro lugar, quando fala dos sistemas de contacto que realizaram, melhores condições do que o Sistema do duplo mandato, pedia-lhe que me indicasse das várias experiências concretas que são conhecidas de comissões mistas ou de outras fórmulas, porque, outras fórmulas também já foram tentadas, quais as que os respectivos parlamentos, consideram Ter atingido o mínimo de objectivos de ligação com os parlamentar rés europeus e qual a experiência ou experiências concretas em que essa pratica produziu resultados junto dos respectivos eleitorados. Certamente não me vai referir os deputados do centro da Europa, que são aqueles que, precisamente pelas condições que há pouco invocou, isto é, que Estrasburgo não e aqui ao lado, têm melhor acesso, através dos seus meios dê comunicação, às intervenções dós seus deputados no Parlamento Europeu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pegado Liz.

O Sr. Pegado Liz (PRD): - Sr. Deputado Cruz Vir laça, gostaria de lhe perguntar se do ponto de vista jurídico, vê algum inconveniente, quer na nossa legislação, quer na legislação comunitária, no sentido de se opor ao duplo mandato. Isto é, no caso de ser estabelecida a mera faculdade do duplo mandato que objecções de princípio é que vê quanto a esse estabelecimento?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep UEDS): - Sr. Deputado Cruz Vilaça, embora não esteja totalmente convencido que o método proposto pelo Partido Socialista, pelo Partido Social-Democrata é pelo Centro Democrático Social seja o aceitável nas circunstâncias actuais, admito-o.
No entanto, na sua intervenção foi dado um argumento que me faz pedir-lhe um esclarecimento, quando disse que, no fundo, este método era o que melhor traduzia a vontade do eleitorado. Penso que é um argumento perigoso, Sr.. Deputado. Pensar que este sistema de lista bloqueada, definida pelos partidos aqui representados, é o sistema que melhor traduz a vontade do eleitorado, conduzir-nos-ia, no limite, a admitir que o eleitorado elege não deputados mas partidos políticos e ia, por coerência, estabelecer um sistema de escrutínio na Assembleia da República que conduziria, sistematicamente, a que a decisão viesse por via de decisões bloqueadas ao nível dos grupos parlamentares com um total, esvaziamento do mandato do deputado.
Como julgo que, por via da nossa lei eleitoral e por via do Regimento aqui adoptado, cada vez se tem caminhado mais no sentido de esvaziar o mandato do deputado entendido como tal, pretender que a fórmula adoptada dê lista única bloqueada através da representação, proporcional dos grupos, parlamentares é aquela que melhor traduz a vontade do eleitorado, creio que é um argumento que tem de ser usado com muita ponderação. Isto porque senão eu podia retrucar, analisando da mesma forma e dando- às coisas o valor absoluto, dizendo-lhe que. talvez tenham razão aqueles que dizem que, nunca é democrático um escrutínio que é baseado numa lista única, e que a lista única é sempre contraditória com a democraticidade do escrutínio.
Creio que estes argumentos têm de ser usados com um pouco de contenção e, do meu ponto de vista, não é seguramente o facto de ser o sistema que melhor traduz a vontade do eleitorado que pode justificar a adopção do sistema .proposto para a eleição dos deputados europeus.
Quanto à, ligação Parlamento Português/Parlamento Europeu, Sr. Deputado, penso que os deputados portugueses no Parlamento Europeu não representam a Assembleia da República. Não acha, até, que eles são deputados portugueses e até, numa perspectiva -que é minha- de construção da Europa, deviam ser encarados como deputados europeus eleitos por um círculo que se chama Portugal e que as ligações entre o Parlamento Europeu e a Assembleia da República se devem, fazer, ,não pelo exercício de um duplo mandato, mas por outras vias? Não acha que contínua a ter tanto sentido amanhã, como tinha ontem, a existência, de uma comissão, nesta Assembleia da República encarregada de abordar os problemas europeus, que são coisas, diferentes?
Temos de caminhar para a ideia de que quem está em Estrasburgo são deputados europeus eleitos por um círculo que se chama, Portugal, Itália ou França.
Só assim podemos caminhar no sentido da construção da Europa.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Cruz Vilaça

O Sr. Cruz Vilaça (CDS): - Quanto à primeira objecção posta pelo Sn. Deputado Magalhães Mota, devo dizer quê não está em causa o mandato imperativo, mas sim o fazer uma nova eleição em nome dos eleitores que nos escolheram para esta Casa. Na resposta que, de seguida; darei ao Sr: Deputado Lopes Cardoso completarei a resposta quanto à pergunta do Sr. Deputado Magalhães Mota.
Quanto à reforma do sistema eleitoral, é certo que há necessidade de se começar por uma ponta. Mas a ponta por onde entendemos que se deve começar é a da revisão da Constituição.

Vozes do CDS:- Muito bem!

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O Orador: - Sem a revisão da Constituição, não podemos fazer uma revisão do sistema eleitoral capaz, coerente, consistente e global. É essa a ponta por onde devemos começar, sob pena de se estar a «tapar a cabeça» e «destapar os pés». E isso não queremos fazer.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à experiência do trabalho em comissões, devo dizer que aquela que até agora existe não é uma experiência que nos possa dar ensinamentos perfeitos ou precisos sobre o que se vai passar da criação de organismos de coordenação entre esta Assembleia da República e os deputados portugueses ao Parlamento Europeu. Esta é uma experiência nova. Até agora, tem havido comissões mistas, constituídas, por um lado, por deputados ao Parlamento Europeu, que são deputados de outros Estados membros, e, por outro lado, por deputados a esta Assembleia da República. Esta é uma experiência nova e é essa a experiência que gostaríamos de fazer.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Deputado Cruz Vilaça, agradeço-lhe por me ter permitido a interrupção.
Devo dizer-lhe que não me referi à experiência portuguesa, mas à de outros países, para lhe perguntar se conhecia experiências concretas dessa articulação que tenham resultado, em termos de comités mistos ou de outras experiências que foram tentadas.

O Orador: - Sr. Deputado, não conheço a experiência de outros países -lamento imenso-, mas talvez o Sr. Deputado Magalhães Mota me possa esclarecer sobre os resultados que apurou.
Ao Sr. Deputado Pegado Liz devo dizer que não afirmei nenhuma objecção do princípio ao sistema do duplo mandato. O sistema é praticado por outros parlamentos e não há objecção do princípio. Há, sim, uma objecção no plano da operacionalidade, da praticabilidade, da possibilidade de por essa via se exercerem cabalmente os dois mandatos, com o risco de não se exercer nenhum por impossibilidade de isso acontecer, sobretudo nesta fase inicial, em que se exige dos deputados ao Parlamento Europeu uma tarefa particularmente pesada e particularmente desdobrante.
Ao Sr. Deputado Lopes Cardoso devo dizer que penso que na segunda parte da sua intervenção me deu razão, ao entender que os deputados ao Parlamento Europeu representam o povo português e não propriamente a Assembleia da República. Ora, estamos a escolhê-los porque esse foi o mecanismo adoptado nesta fase de transição e parece-me útil que, tanto quanto possível, avancemos no sentido de um mecanismo de representação e representatividade directa e, portanto, de «tirar um retrato» tanto quanto possível fiel do eleitorado através da sua expressão na Assembleia da República.
Foi este o sentido da minha intervenção.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Pegado Liz (PRD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Pegado Liz (PRD): - Sr. Presidente, desejava inscrever-me para intervir posteriormente.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado. Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cumpriria fazer algumas reflexões sobre a matéria em debate.
A primeira nota a salientar é que nos termos do n.º 2, do artigo 28.º, do Tratado de Adesão os deputados ao Parlamento Europeu, mesmo no período transitório, são representantes do povo português e, assim, não são qualificados como representantes da Assembleia da República, embora por ela sejam designados. E esta nota é suficientemente relevante para condicionar a forma como a Assembleia deve regulamentar esta matéria.
A segunda nota que decorre do n.º 2, do artigo 28.º, do referido Tratado, é a de que o procedimento na designação dos deputados ao Parlamento Europeu pela Assembleia da República deve ser fixado pelo Estado Português, visto tal não estar regulamentado por esse mesmo Tratado.
Na base destes pressupostos, e tratando-se assim de um sistema de eleição indirecta, o sistema eleitoral tem obviamente de adequar-se ao direito eleitoral nacional, àquele que está definido constitucionalmente, nomeadamente ao disposto nos artigos 116.º, n.º 5, 155.º, n.º l e 290.º, alínea h), em tais termos que não pode deixar de ser configurado como o sistema de representação proporcional e segundo o método da média mais alta de Hondt. Aliás, é neste sentido precisamente que apontava o documento assinado pelos Srs. Deputados Magalhães Mota e Luís Beiroco, hoje subscritores dos 2 sistemas em debate. Direi ainda que é este o sistema que decorre e para que de alguma forma aponta o disposto nos artigos 4.º, n.º l e 5.º, n.º l, do projecto de primeiro acto relativo à introdução de um processo eleitoral uniforme para a eleição dos representantes do Parlamento Europeu.
Neste quadro, a grande questão que se coloca é efectivamente a de saber se à Assembleia cumpre fazer uma eleição ou ficcioná-la. Esta é que é a questão que ao fim e ao cabo está contida no - passe a expressão, sem nenhuma ofensa - bizarro sistema encontrado com a lista duplamente bloqueada, propostas pelo PS, PSD e CDS.
De facto, o sistema de lista única duplamente bloqueada corresponde a uma negação da própria essência de qualquer sistema eleitoral na sua própria definição: não há eleição quando há lista única e não há eleição dentro da lista, porque não há possibilidade de «abrir» a lista, pois esta está também bloqueada no seu conteúdo.
Claro que isto sempre teria de ser assim, pois tive oportunidade de perguntar ao Sr. Deputado António Vitorino, e ele concordou comigo, porque o Estado Português, tendo de cumprir a sua obrigação de preencher 24 lugares do Parlamento Europeu, e a partir do momento em que é proposto o sistema subscrito pelo

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PS, PSD e CDS, não havia qualquer possibilidade de haver eleição. O que havia a fazer era carimbar à lista anteriormente definida. E definida como? Num sistema que tem um duplo controle prévio em primeiro lugar, um controle prévio na definição do número de candidatos; em segundo lugar, um contrôle prévio dos nomes dos candidatos a, partir da subscrição ou, não da lista de candidatos. Este não é um aspecto menor da questão. Aliás, definir esse sistema como o que corresponde ao universo eleitoral português e à diferente representação que o eleitorado entendeu, exprimir face às candidaturas para a Assembleia da República é, de alguma forma, viciar os próprios dados dos. resultados eleitorais. Porque se fosse essa a questão, então tratar-se-ia de aplicar a este sistema o resultado das eleições tal como eles foram definidos, ou seja, o número de votos de cada lista e, então, teríamos o resultado surpreendente de ao PSD caberem 8 deputados, 5 ao PS; 5 ao PRD, 4 à APU e 2 ao CDS. Naturalmente, este é um sistema que, provavelmente, não esteve na mente dos autores do projecto de lei apresentado pelo PS PSD e CDS.
A questão está colocada e agora trata-se de definir o sistema eleitoral. E é bom que se diga - em aparte - que a Assembleia sempre definiu no sistema eleitoral, quando se trata de eleger representantes seus a cargos exteriores à Assembleia, por via de lei. Fê-lo em relação ao Tribunal Constitucional, ao Conselho de Comunicação Social, ao Conselho de Liberdade e. Ensino, à Comissão Nacional de Eleições, ao Conselho Nacional de Alfabetização e Educação Básica de Adultos, etc., ou, então, o sistema eleitoral resultava directamente da Constituição .e foi o que sucedeu com o Conselho de Estado. Aliás, no caso do, Conselho de Estado é importante referir que ele vai servir para tentar exactamente explicar qual diferença entre a definição do sistema eleitoral e do processo da eleição a realizar dentro da Assembleia da República.
A necessidade de lei é óbvia, pois resulta, desde logo; da necessidade de impor a terceiros a forma de designação e ou o sistema eleitoral definido, acrescendo no caso que tratando-se de matéria, eleitoral, ele é da reserva de competência legislativa da Assembleia, por força da alínea f) do artigo 167.º da Constituição, tal como foi citado no documento conjunto subscrito pelos Srs. Deputados Magalhães Mota e Luís Beiroco, documento esse presente à Comissão de Integração Europeia, se não estou em erro.
Questão conexa com esta é a do processo. Deverá ser definido o processo? E em que termos?
O processo eleitoral ou é definido na própria lei ou, então, não o sendo, devem reger as normas do Regimento. Sucede que o Regimento é extremamente claro nesta matéria. Assim, os artigos 277.º a 281.º regulam o processo eleitoral pára cargos exteriores à Assembleia da República. O artigo 268.º regula o regime de apresentação de candidaturas; o artigo 269.º, n.º l regula o sufrágio e os artigos 269.º n.º 2, e 281.º o regime de repetição.
Importa sublinhar que o artigo 280.º define claramente o processo quando se tenha de fazer eleições segundo o sistema de representação proporcional. O artigo 280.º foi introduzido, precisamente; por causa das primeiras eleições que a Assembleia teve de fazer segundo o sistema de representação proporcional; ou seja, por causa dó Conselho de Estado. As alterações introduzidas, na altura, com uma numeração diferente, deveram-se ao Conselho de Estado e definiu-se o sistema de lista é, nomeadamente o sistema de representação proporcional pelo método de Hondt.
Estas são as normas regimentais que vigoram e que por imposição, do Regimento devem ser cumpridas.

O Sr. Jorge Lemos (PCP.): - Muito bem!

O Orador: - Para alterar este processo ou se faz por lei ou, naturalmente, se faria pelo processo adequado que era o da revisão do Regimento, o que não é o caso do projecto de lei apresentada pelo PS, PSD e CDS.
Vou tratar muito lateralmente uma questão conexa que é a de saber, se deve ou não ser adoptado o sistema de voto preferencial. Talvez seja uma, designação adequada do sistema proposto pelo PRD, ou seja, a possibilidade de ordenação dos nomes dentro de cada lista.
Consideramos que o sistema é inovatório no ordenamento eleitoral português e, em tais termos, consideramos com alguma apreensão o tempo diminuto: que há para reflectir sobre uma matéria de tão graves implicações.
Srs. Deputados, uma questão diferente, e que tem sido aqui qualificada como duplo mandato, é a da possibilidade de - chamar-lhe-ia assim -_ acumulação do exercício do mandato. De facto, nem o projecto de lei apresentado pelo. PS, PSD, e CDS nem o do PRD Jazem cessar, o mandato o primeiro diploma suspende automaticamente o mandato mas não o faz cessar. Não sei a designação de duplo mandato» será correcta. Apesar de tudo sei que, o que se procura saber é se é possível exercer cumulativamente os 2 mandatos.
Em nossa opinião a questão não pode ser colocada em sede de incompatibilidade porque como Bem sublinha o PRD na nota justificativa, o que está em causa nas incompatibilidades é a independência do deputado é ela não está em questão na acumulação do exercício do mandato de deputado na Assembleia da República e no de deputado ao Parlamento Europeu.
Não estando em causa tal, não há técnica ou materialmente uma incompatibilidade. Portanto, não podemos materialmente aproximar esta solução, proposta pelo PS, PSD e CDS, aos fundamentos das soluções contidas nas alíneas c), d) e e) do artigo 4.º do Estatuto dos Deputados, que se referem ao caso dos gestores públicos.
Assim, hão sendo materialmente uma incompatibilidade, o que talvez seja, e que tem aqui sido dito que é fundamento da solução, é a garantia da disponibilidade do deputado para um Ou outro dos mandatos que está a exercer.
No entanto, são apesar de tudo relevantes alguns argumentos que têm sido aqui trazidos.
Em primeiro lugar, o facto é que neste período transitório o que é pressuposto para o exercício do mandato ao Parlamento Europeu è precisamente o mandato à Assembleia da República, o que significa que será um contra-senso de alguma forma, ou que poderia ser classificado como tal, não permitir o exercício desse mandato.
Em segundo lugar, tal «incompatibilidade» era ou aparece como inesperada, limitativa dos direitos dos deputados eleitos à Assembleia e que de alguma forma se deverá encarar com apreensão: Assim, talvez sejam pertinentes razões já aqui aduzidas que levam, através do sistema da suspensão automática, a considerar que

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nesse quadro o deputado ao Parlamento Europeu seria mais um diplomata do Estado Português do que propriamente um deputado no exercício pleno do seu mandato. São reservas adequadas e que merecem adequada ponderação.
Claro que decorrem destas diferenças de concepção as dissemelhanças estatutárias entre o projecto de lei apresentado pelo PRD e o projecto de lei subscrito pelo PS, PSD e CDS. Não vou alongar-me sobre elas, pois são óbvias e evidentes. No entanto, para terminar importa assinalar um ponto: o debate decorreu de forma simultaneamente esclarecedora das posições dos diferentes partidos, mas também de molde a permitir aos diversos partidos conhecer as razões dos outros.
Nestes termos, parece-nos que mau seria que este debate não fosse aprofundado em sede própria. Mau seria que o conjunto de soluções que aqui estão não pudessem transitar para a sede de especialidade em termos de poderem ser aprofundadas, devidamente encaradas. Esse será, ao fim e ao cabo, o sentido do nosso voto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Almeida Mendes.

O Sr. Rui Almeida Mendes (PSD): - Sr. Deputado João Amaral, desejava formular algumas questões a V. Ex.ª
Julgo que os termos do Tratado são perfeitamente concretos: neste momento, trata-se não de uma eleição mas sim de uma designação, de maneira que a Assembleia da República poderia aprovar o método que quisesse para designar os deputados.
Assim, por um lado, perguntava a V. Ex.ª se poderia considerar válida uma situação em que tivesse sido uma reunião de líderes de grupos parlamentares que indicasse ao Parlamento Europeu quais seriam os deputados da Assembleia da República a esse mesmo órgão, a fim de se cumprir o disposto no artigo 28.º do Tratado de Adesão.
Por outro lado, V. Ex.ª indicou também diversas formas de eleição e disse que eram todas por via legal, por via legislativa. Mas trata-se de órgãos ou de representações exteriores à Assembleia da República em todas aquelas que indicou. Neste caso, não se trata de uma representação exterior, mas sim da representação da própria Assembleia, da sua própria forma. É esta própria Assembleia que aí se representa, pelo que os artigos 277.º e seguintes do Regimento não têm cabimento nesta sede.
Referiu, ainda, o caso das incompatibilidades, ou seja, do duplo mandato. Devo dizer que temos em Portugal um outro problema semelhante. Tal não se coloca só entre os deputados da Assembleia da República e os deputados ao Parlamento Europeu, pois coloca-se já, neste momento, entre os deputados à Assembleia Regional dos Açores ou da Madeira e os deputados a esta própria Assembleia da República.
Pois bem, o sistema que aí é aplicado é efectivamente o da suspensão imediata e automática do mandato, na medida em que, por exemplo, o deputado à Assembleia Regional dos Açores, que é simultaneamente deputado a esta Assembleia da República, quando exerce aqui funções suspende automaticamente as suas funções na Assembleia Regional dos Açores.
Temos assim que, para uma situação de certo modo semelhante, em que se colocam os mesmos problemas de tempo, de lugar ou de deslocações, ou até mesmo de interesses que estão em causa, o sistema consagrado é aquele que o PSD, PS e CDS pretendem ver aqui aplicado.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Rui Almeida Mendes, agradeço as suas perguntas, porque de alguma forma trouxeram também questões novas que no fundo reforçam a ideia geral, pelo menos é o que colho deste debate, de que vale a pena aprofundá-lo em sede de especialidade.
Quanto à questão da expressão «designação» contida no Tratado, obviamente que este último deixa ao Estado Português a possibilidade de definir o sistema. Pela nossa parte entendemos que o sistema deve ser definido pelos meios constitucionalmente previstos para a representação, de forma analógica, em órgãos de soberania ou de poder local ou regional e, nesse quadro, mal compreenderíamos que um acordo de bastidores pudesse resolver aquilo que no sistema constitucional português está reservado a esse procedimento ou a essa forma de execução.
Não me pergunte se aceito ou não esse acordo. O que me deve questionar é se ele é viável ou não.

O Sr. Rui Almeida Mendes (PSD): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Almeida Mendes (PSD): - Sr. Deputado, achava lícito que esta Assembleia por via do voto maioritário elegesse, por exemplo, deputados só de uma ou duas forças políticas?

O Orador: - De facto, não só acho ilegítimo como inconstitucional que isso sucedesse. Por isso é que entendo que o normativo da eleição tem de ser legalmente definido com respeito das regras constitucionais, nomeadamente o princípio da representação proporcional e, por aplicação analógica, o método da média mais alta de Hondt.
Quanto à não aplicação das normas do Regimento, suponho que o Sr. Deputado aí - vou-lhe falar com mais franqueza - não tem razão.
O Regimento não distingue entre a eleição para cargos exteriores de deputados ou não deputados. E no caso trata-se de aplicar uma forma de processo regimentalmente prevista para a eleição, quer seja de deputados, quer não. Ou seja, os processos eleitorais que ocorrem na Assembleia para a designação de titulares de cargos exteriores a este mesmo órgão.
Finalmente, a questão do duplo mandato. Esta tem a ver naturalmente com o princípio, como referi, da independência. Suponho que é no quadro da independência do deputado que podia considerar que existia uma incompatibilidade em sentido material, se o exercício simultâneo ou cumulativo do mandato ao Parlamento Europeu e à Assembleia da República pusesse em risco a independência do deputado. Ora, isso não sucede, e foi nesse quadro que eu disse não ser por esse lado que se poderia justificar a suspensão automática.

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Aliás, não foi nesse quadro que ela foi justificada pelas bancadas do PSD, do PS e do CDS, mas sim no sentido de garantir a disponibilidade do deputado.
O que lhe digo, Sr. Deputado, é que o exemplo quê traz é o exemplo clássico do- caso em que a independência não é garantida. E porquê? Por uma razão simples, que é a da existência de laços de dependência funcional, ou melhor, de dependência de competências entre a Assembleia da República e as assembleias regionais, na medida em que à Assembleia cabem, por princípio, por imposição constítucional, reservas de competência que impedem, ou podem impedir, de alguma forma, que o exercício do mandato regional seja exercido com completa independência.
Obviamente que não pode colocar em pé de igualdade o exercício simultâneo do cargo e de deputado à Assembleia da República e do cargo de deputado a uma assembleia regional com o exercício simultâneo do cargo de deputado à Assembleia da República e do cargo de deputado ao Parlamento Europeu.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem á palavra o Sr. Deputado António José Fernandes.

O Sr. António José Fernandes (PRD): - Sr. Presidente, peço a V. Ex.ª que seja alterada a ordem no uso da palavra, por forma a que o meu colega de bancada, Jorge Pegado Liz, possa proferir primeiro a sua intervenção.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Nesse caso, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pegado Liz.

O Sr. Pegado Liz (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Daquilo que até agora aqui, foi dito parece resultar claro que nenhuma questão, de princípio, do ponto de vista técnico e jurídico, faz infirmar, a possibilidade do duplo mandato. - Aliás, essa situação de exercício de duplo mandato era a situação normal que decorria para o parlamentares europeus até ao momento em que foi adoptado um acto segundo o qual as eleições passaram a ser directas.
A designação dos parlamentares europeus nos seios dos parlamentares nacionais obrigava-os, até então, a cumprir um duplo mandato. Isso consta, designadamente, de um relatório que, foi produzido pela Direcção-Geral de Informação e Relações Publicassem França, em Outubro de 1978.
Actualmente, resulta claro, também, do artigo 5.º do acto relativo à eleição de representantes à Assembleia por sufrágio universal directo, que a qualidade de representante à Assembleia é compatível com a de membro do Parlamento de um Estado membro. Não existe, de facto, incompatibilidade de princípio no exercício, de duplo mandato.
Conforme ainda ontem, nos foi referido em reunião do Comité Misto, o mesmo não se pode dizer quanta à legalidade duvidosa da obrigatoriedade de assim ser aliás, segundo creio, imposta apenas em dois casos de legislações nacionais de países membros da Comunidade.
No nosso caso, nesta fase intercalar, seremos necessariamente deputados ao Parlamento Europeu apenas e exclusivamente porque somos deputados à Assembleia da República.
Quanto à eleição dos deputados nacionais ao Parlamento Europeu se processar por sufrágio universal directo, podemos de alguma forma discutir a exclusividade dos mandatos. Neste momento, afigura-se-nos que o estabelecimento desta obrigatoriedade é necessariamente prematuro.
Portanto, da discussão que aqui foi travada apenas subsistem razões práticas para que assim não seja. Se dê razões práticas apenas se trata, não se afigura que deva ter consagração legal alguma coisa que deve estar exclusivamente na dependência e na faculdade de os partidos ajuizarem se os seus deputados ao Parlamento. Europeu ou de eles próprios ajuizarem por si mesmos devem e podem manter o exercício simultâneo- de dois cargos.
Ao contrário, diria que há também razões práticas fundamentais para que esse exercício se mantenha em simultâneo, designadamente pela necessidade de informações recíprocas. Já aqui foi visto que as experiências havidas em outras, formas de relacionamento não são as mais consentâneas com o bom funcionamento desta colaboração e desta reciprocidade de informações.
Aliás, sobre esta matéria, relativamente a casos de interesse nacional, pergunto que informação ou que controle terá esta Câmara. Recordo, por exemplo, neste momento, o caso da aprovação do orçamento da Comunidade: que posições é que os parlamentares europeus irão tomar nessa instância? Que conhecimento poderá haver dessas posições? Que informação recíproca poderá haver? Ou será que se pretende que essa informação esse relacionamento ou esse controle passem exclusivamente pela sede partidária, sendo os parlamentares europeus apenas considerados como funcionários dos partidos políticos?.
Acresce a isto que a situação dos parlamentares europeus no Parlamento não será, em futuro próximo, absolutamente igual para todos os que aí se deslocam. Alguns terão já os seus lugares perfeitamente definidos dentro de grupos parlamentares e, nessa altura, terão por certo o seu tempo extraordinariamente preenchido.. Outros haverá que não se irão inscrever de imediato em grupos parlamentares, não terão acesso nem, assento em algumas das instâncias de funcionamento e de trabalho, do Parlamento Europeu, participando quase exclusivamente nas reuniões plenárias que os ocuparão durante uma semana e pouco mais.
Pergunta-se, pois: por que razão poderiam esses deputados ficar impedidos de voltar a ter assento nesta Assembleia a que pertencem por direito próprio e de onde saem apenas por, serem deputados desta Assembleia?
Não pretendemos que o projecto que apresentámos seja um projecto perfeito. Entendemos que pode ser melhorado, com a inclusão de alterações e de aditamentos que, em sede, de comissão especializada, não deixarão, com certeza de ser considerados.
No entanto, gostaríamos, de não deixar passar esta oportunidade sem referir que, em contrapartida, o projecto apresentado pelo PSD, pelo PS e pelo CDS reflecte algumas, imperfeições que não são de mera forma.. .Muitas delas já aqui foram denunciadas.
A lista única é bloqueante; a lista única retira a possibilidade de grupos de deputados, inclusivamente dentro dos próprios grupos parlamentares, apresentarem mais do que uma lista e impede, designadamente, a possibilidade de participação de deputados independentes desses grupos parlamentares. Por outro lado, im-

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Não vou deter-me agora nas questões jurídicas que já foram expendidas, mas entrarei, de pleno, na questão do duplo mandato. Efectivamente, tem aqui sido muito discutida a questão sobre se é ou não possível o duplo mandato.
Julgo que há razões de ordem prática, haverá razões de ordem jurídica e, principalmente, razões de ordem moral que impedirão na prática o exercício do duplo mandato.
Foi aqui referida a questão do funcionamento do Parlamento Europeu. O Parlamento Europeu funciona 11 meses no ano - talvez menos uma semana - e funciona 4 semanas por mês: uma em sessão plenária, 2 semanas em sessão de comissões e uma semana em reunião dos grupos políticos, sessão que se destina, é claro, a preparar o próprio trabalho dos grupos políticos tanto em sede de comissão como em sede de Plenário.
Infelizmente, não sou dotado do dom da ubiquidade e já tenho uma experiência do exercício do duplo mandato como parlamentar da Assembleia do Conselho da Europa. Julgo até que não terei podido ir a um terço das reuniões do Conselho da Europa em que era suposto estar, em virtude de trabalhos imperativos nesta Assembleia da República.
Por outro lado, também aqui já foi referido que, no Parlamento Europeu, não existe a figura da suspensão do mandato.
Devo dizer que, para o meu partido, o que se vai passar no Parlamento Europeu é muito importante para Portugal, é muito importante para os Portugueses, na medida em que - alguns estão muito assustados e, sem dúvida, com razão com as próprias consequências da adesão - houve transferência de competências, nalguns domínios, desta Assembleia para o Parlamento Europeu e é aí que vão ser discutidas as questões que interessam a Portugal.
Sendo assim, quando o deputado português não estivesse presente em Estrasburgo seriam os interesses de Portugal que ficariam pior defendidos. Srs. Deputados, o meu grupo parlamentar não pretende isso para o povo português.
Por outro lado, fala-se aqui muito na possibilidade de alguns deputados poderem estar aqui e em Estrasburgo. Mas os Srs. Deputados esquecem-se que quando um deputado suspende o seu mandato é substituído por outro, que está na lista, e que terá de interromper a sua vida particular para entrar em funções por um período curto.
Srs. Deputados, aqui perguntaria: consideram que é desta forma que se obtém dignificação da Assembleia da República? Dignificar-se-á a Assembleia da República, tendo-se aqui deputados que ficam sem qualquer possibilidade de estabilidade, que estão sujeitos a não poderem acompanhar regularmente as matérias, isto quando esta Assembleia ainda há pouco tempo - aquando da revisão do seu Regimento - pretendeu e conseguiu limitar não só os casos de suspensão do mandato como também definir um regime mais rigoroso de incompatibilidades?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por todos estes motivos julgo que a questão do duplo mandato não poderá só ser analisada do ponto de vista dos deputados que neste momento integram esta Assembleia. Tem também de ser analisada do ponto de vista daqueles que ficarão privados dos seus direitos, direitos que lhes deveriam ser reconhecidos quando vierem aqui ocupar um lugar que ficará vago porque o Sr. Deputado que é titular do lugar se encontra nesse momento em Bruxelas, em Estrasburgo ou noutra qualquer missão do Parlamento Europeu.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para que possamos exercer convenientemente os nossos mandatos, tanto nesta Assembleia como no Parlamento Europeu, é perante o povo português que o meu grupo parlamentar não aceita, de modo nenhum, que possa haver uma acumulação de funções de deputados.

Aplausos do PSD, PS e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram-se para formularem pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados Magalhães Mota, Joaquim Miranda e Coimbra Martins.
Tem a palavra o Sr. Deputados Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na sua exposição o Sr. Deputado Rui Almeida Mendes referiu que o PSD tinha apresentado ao eleitorado os seus candidatos ao Parlamento Europeu.
Penso que esta informação deve ser entendida em termos hábeis, visto que, resultando a representação portuguesa dos resultados eleitorais pela aplicação da proporcionalidade, seria impossível a qualquer partido apresentar todos os seus candidatos, a menos que apresentasse 24 candidatos no pressuposto de que poderia ter o pleno dos resultados eleitorais - teria sempre de ter fórmulas mais comedidas.
Mas, abstraindo desta interpretação, que terá naturalmente de ser feita sobre o significado desta posição e que de qualquer modo, como é evidente, não compromete as outras bancadas, gostaria de lhe colocar algumas questões.
Em primeiro lugar, colocar-lhe-ia a questão, que já há pouco foi focada na intervenção do Sr. Deputado Pegado Liz, sobre o funcionamento do Parlamento Europeu. É evidente que o funcionamento do Parlamento Europeu não é o mesmo para todos os deputados e, portanto, há deputados que não têm as tais 4 semanas por mês de ocupação.
Julgo que deveremos ser de algum modo comedidos na nossa apreciação dos trabalhos do Parlamento Europeu, para que não venhamos a comover demasiado o Plenário quanto à situação, de algum modo, de trabalhos forçados a que estamos a condenar alguns dos nossos colegas. Também essa interpretação merece ser tratada com algum comedimento.
Srs. Deputados, estamos a encarar uma matéria que é o funcionamento do Parlamento Europeu. Ora, os deputados não integrados em grupos e não integrados em comissões - e as comissões dependem dos grupos - têm uma sessão por semana e, portanto, têm uma semana ocupada em cada mês que é a semana dos trabalhos plenários. Bom, não me parece que, então, a incompatibilidade seja tão grande como isso, mas gostaria de o interrogar sobre esse ponto.
Em segundo lugar, nos projectos apresentados e, concretamente, no projecto do PRD não está previsto que fiquem lugares em aberto na Assembleia da República. O que se prevê é um sistema de substituição mais flexível que o do actual Regimento e que, portanto, não tenha o limite temporal de obrigar a 15 dias de suspensão. Sr. Deputado, é ou não assim?

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Deputado Rui Almeida Mendes, a primeira questão tem a ver precisamente com a primeira questão que V. Ex.ª colocou e penso que é, no mínimo, relativamente estranho que coloque um tipo de argumento que não me parece plausível, que e o de dizer que o próprio PSD, quando elaborou as suas próprias listas, já teve em conta a eleição de deputados para o Parlamento Europeu e que, portanto, agora estamos fechados nesta matéria.
Ora, como deve compreender, trata-se de um argumento que não podemos aceitar, porque o PSD não pode, por questões de natureza interna, estar a condicionar a própria Assembleia da República e, portanto, penso que este argumento não colhe. Aliás, quanto a essa questão, poderíamos fazer-lhe certas perguntas como, por exemplo: quantos deputados pensou o PSD, nessa altura, que iria eleger para o Parlamento Europeu?
É evidente que o PSD não o pode dizer, porque não sabia qual era o número de votos e, consequentemente, de deputados que iria ter. Além disso, nem sequer estavam definidas as regras', é isso mesmo que estamos a fazer agora, e não é o PSD, internamente, que decide as regras por que se vai reger a Assembleia da República.
Gostaria ainda de fazer uma correcção, pois, talvez com o intuito de encontrar argumentos para aquilo que referiu, V. Ex.ª disse - (o Sr. Deputado Magalhães Mota também já refutou essa afirmação - que os deputados no Parlamento Europeu funcionam, ao fim e ao cabo, 4 semanas por mês. Não é assim. É evidente que não é assim. Há uma semana de plenário, há uma semana de comissões e uma semana dê reuniões de grupos. Esta é que é a realidade, portanto, há que corrigir, exactamente, a situação.
Gostaria também de dizer que também temos algumas dúvidas em relação a esta questão do duplo mandato e de tal maneira temos dúvidas que já dissemos aqui que pensamos que esta questão merece ser discutida e aprofundada em sede própria que, em nosso entendimento, deve ser sede de comissão, o que não prejudica naturalmente aquilo que estamos agora a fazer.
No entanto, a questão também não se pode resumir, como o Sr. Deputado fez, à disponibilidade ou funcionalidade porque, como referiu, o argumento que aqui trouxe em relação à questão do duplo mandato foi o de saber se, em termos de tempo e de disponibilidade, o exercício da função de deputado no Parlamento Europeu era ou não compatível com o exercício de deputado nesta Assembleia.
Já aqui surgiam argumentos de outra natureza que também têm de ser ponderados e se estes terão de ser ponderados; há outros que também o terão de ser e é esta questão que, em concreto, se coloca.
De tudo isto, ressalta uma questão fundamental - e esta é a pergunta que lhe quero fazer- que é a de saber se, de acordo até com o que aqui foi dito, o PSD entende ou não que todas as questões que foram aqui levantadas merecem um tratamento mais aprofundado.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Coimbra Martins.

O Sr. Coimbra Martins (PS): - Sr. Presidente, pedi a palavra para fazer uma intervenção e não para. formular pedidos de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, então V. Ex. fica, desde já, inscrito.
Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Almeida Mendes.

O Sr. Rui Almeida Mendes (PSD):- - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto às questões de funcionalidade do duplo mandato, começaria por afirmar que os jornais noticiam que eu estou hoje em Madrid numa reunião do Parlamento Europeu, mas não pude estar, estou aqui por causa desta discussão.

Risos.

Uma voz do PCP: - Tem pena de não estar!

O Orador: - Já têm a primeira resposta quanto a esses problemas.
Quanto às questões que o Sr. Deputado Magalhães Mota me colocou, devo dizer que, efectivamente; a lista do PSD é uma lista que foi votada segundo os mesmos moldes pelo qual foram votadas as listas para deputados pelos diversos círculos eleitorais e segundo o processo que os estatutos do partido estipulam para a designação de candidatos a deputados nas eleições à Assembleia da República.
Quanto às questões que o Sr. Deputado Magalhães Mota colocou sobre se o funcionamento do Parlamento Europeu é de 3 ou 4 semanas e se existem ou não comissões, devo dizer que os deputados não inscritos também têm comissões. Para além disso, há uma semana destinada às reuniões de grupos, que têm como objectivo a preparação do trabalho desenvolvido no Parlamento Europeu, de maneira que, haja ou não reuniões de grupo, deverá, pelo menos, haver sempre trabalho.
Quanto à flexibilidade do sistema, gostaria de dizer que o que em teoria é mais flexível, depois, com as limitações de tempo, acaba por ser mais inflexível, o que levará a que as pessoas não possam exercer as funções com a seriedade e a competência que lhes é exigida.
Por outro lado, o próprio facto de não se estar em comissões ou de não se desempenhar bem o trabalho que é suposto ser feito no Parlamento Europeu significa também que a representação dos deputados portugueses, não estando integrada no grupo político, sofre de certa maneira uma diminuição.
Em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado Joaquim Miranda, devo dizer que a lista é pública, foi apresentada aos órgãos de informação e era composta por 13 deputados, dois dos quais já não constam da lista por estarem a ocupar cargos governamentais.
Sr. Deputado Joaquim Miranda, o PSD não pretende, com certeza, corrigir as regras, mas era natural, era previsível temos de jogar no previsível que não iríamos para uma solução nesta Assembleia em que só viessem a ser designados para o Parlamento Europeu deputados de um único partido. Aliás, já havia exemplos no que toca ao Conselho da Europa em relação a outras representações parlamentares..
Assim, os deputados a eleger constariam de uma lista, o PSD apresentaria a sua, e não iríamos para uma solução em que fosse o partido maioritário a indicar a totalidade dos nomes.

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pede que grupos de deputados votem individualmente cada deputado ao Parlamento Europeu e que estabeleçam a sua própria ordem de precedência.
Em síntese, quase se diria que este projecto não prevê uma eleição mas uma simples designação pelos partidos, o que, em nosso entender, constitui uma forma manifestamente errada de propor um regime eleitoral na Assembleia da República para o Parlamento Europeu.
Por outro lado, esta fórmula apresentada gera alguns impasses, e alguns deles foram aqui já também analisados.
Não se prevê qualquer disposição para o caso de certos nomes serem cortados na lista única. O voto é nulo. Que solução encontrar para esse caso? Como seriam eleitos os deputados?
É por outro lado susceptível de criar dificuldades que aqui também já foram apontadas. É o caso de não ser reunido o número suficiente de votos, aliás, em similitude com o que tem sucedido para algumas eleições que já se realizaram nesta Assembleia para o Conselho Nacional do Plano, para o Conselho Europeu e para o Conselho Superior de Defesa.
Pressupõe e não resolve a prévia definição do número de deputados ao Parlamento Europeu a atribuir a cada partido, e não creio que neste momento esta matéria seja ilíquida.
Por outro lado, não prevê imunidade desses deputados. Supondo que à face da lei portuguesa certas posições assumidas pelos parlamentares europeus poderiam ser eventualmente consideradas ofensivas relativamente ao Governo ou aos seus membros, pergunto se não está previsto que os parlamentares europeus fiquem em Portugal imunes ou não sujeitos a procedimento criminal. Neste projecto não lhes foi estendido o previsto nos artigos 10.º e 11.º do Estatuto dos Deputados. No projecto apresentado pelo PRD, obviamente que os deputados estão protegidos, na medida em não perdem nem suspendem a sua qualidade.
Relativamente aos cargos políticos - aplicação da Lei n.º 4/83 -, direi apenas que me parece que este preceito não tem qualquer alcance prático, na medida em que os deputados saem desta Assembleia, acabam de fazer as suas declarações e a obrigatoriedade da suspensão do mandato não faz cessar nem tem qualquer efeito relativamente a essa obrigatoriedade. Portanto, não há nenhuma razão para a manutenção deste preceito ou para a aplicação destas disposições legais, que só para o caso de os deputados serem eleitos directamente e não passarem por esta Câmara teria razão de ser.
Por todas estas razões, parece-nos que este projecto não deve merecer o acolhimento desta Assembleia, sem embargo de ele poder ser analisado, em conjunto, em sede de comissão especializada.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Rui Almeida Mendes e António Vitorino.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Almeida Mendes.

O Sr. Rui Almeida Mendes (PSD): - Sr. Deputado Pegado Liz, em primeiro lugar, gostaria de lhe perguntar se não reconhece que no projecto apresentado pelo PSD, pelo PS e pelo CDS se configura o duplo mandato mas apenas se rejeita a acumulação de funções, de maneira que julgo não haver lugar para a aplicação de quaisquer critérios impeditivos do duplo mandato.
Por outro lado, V. Ex.ª referiu-se muito às informações recíprocas entre a Assembleia da República e o Parlamento Europeu. Devo dizer-lhe que talvez esteja muito mais preocupado relativamente às informações entre os deputados ao Parlamento Europeu e o eleitorado português. Essas, sim, é que me afligem muito.
Por último, pergunto-lhe qual o seu conceito quanto ao controle do orçamento da Comunidade Económica Europeia. O Sr. Deputado quererá dizer que esta Assembleia se vai arrogar, no futuro, a possibilidade de julgar a forma como os deputados ao Parlamento Europeu votaram o orçamento da Comunidade?
Relativamente a isso, Sr. Deputado, peço que esclareça o seu pensamento, porque, de facto, não vejo a Assembleia da República como uma segunda Câmara do Parlamento Europeu.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Deputado Pegado Liz, a sua exposição, fazendo a apologia da opção individual dos deputados por contraponto a um sistema amordaçante de tirania partidocrática, levar-me-á a perguntar-lhe porque é que V. Ex.ª não retira as conclusões últimas da sua proposta e altera o projecto do PRD no sentido de propor uma solução deste tipo: uma lista única com 24 nomes propostos individualmente por cada grupo parlamentar aqui presente, na proporção da sua representatividade, e votação de cada deputado individualmente em cada um dos nomes indicados, fazendo depender a indicação para o Parlamento Europeu da obtenção, por cada candidato, da maioria absoluta dos sufrágios expressos.
Esse é que seria o sistema coerente com as suas indicações de princípios.
O sistema híbrido por que optaram é uma tentativa de contemplar objectivos de consciência e de servir objectivos de oportunidade política que V. Ex.ª sabe muito bem quais são.
Há, portanto, uma contradição insanável entre as suas posições de princípios e a solução que adoptou.
Uma segunda questão é a de que, de facto, o projecto do PSD, do PS e do CDS não inclui referências ao regime das imunidades, porque não nos costumamos dedicar à prática de actos inúteis. Como é sabido, as regras de direito comunitário, a partir do momento da adesão, são regras directamente aplicáveis e imediatamente aplicáveis no ordenamento jurídico interno. Vigora para o regime de imunidades dos parlamentares europeus o disposto no artigo 10.º do Protocolo sobre Privilégios e Imunidades das Comunidades Europeias que diz que os deputados ao Parlamento Europeu beneficiam no território nacional respectivo das imunidades reconhecidas aos membros do Parlamento do seu país, e no território de qualquer outro Estado membro da extensão da medida de excepção de detenção ou de toda e qualquer perseguição judiciária que lhes seja movida.
Não é curial, face ao direito europeu, que haja normas do ordenamento interno que reproduzam normas

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comunitárias porque, a partir do momento em que aderimos às Comunidades, o acquis communautaire passa a vigorar directamente no ordenamento jurídico interno sem necessidade de recepção expressa, porque a recepção é global, integral e é feita pelo próprio acto de adesão.
O que já não será explicável- é a ausência de referência ao artigo 19;º da Lei n.º 3/85 no vosso projecto, onde, na realidade excluem um regime de incompatibilidades do exercício das funções, o que me pareceria de todo em todo justificável, sobretudo quando fazem referências a outros artigos dessa mesma lei, que, por identidade de razões e na vossa lógica, não teriam de ser citados. Se citam uns e não citam outros é porque querem excluir aqueles que não citam. Aí é que existe, em meu entender, e salvo melhor opinião, incongruência da técnica legislativa adoptada.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pegado Liz.

O Sr. Pegado Liz (PRD): - Começarei por dizer o seguinte: é evidente que, do ponto de vista puramente teórico, admito que para um duplo mandato puramente teórico o projecto do PSD, do PS e do CDS não o exclui em sede de puro princípio. Na prática, obrigando à suspensão, exclui-o, não admite a possibilidade do exercício simultâneo dos dois mandatos, e é isso que está em causa.
Quanto às informações ao eleitorado; é evidente que é fundamentalmente essa a preocupação que temos Creio que a melhor forma de se proceder a essa informação ao eleitorado, na medida em que os deputados ao Parlamento Europeu não são eleitos directamente é através e em sede desta Assembleia, que é o local adequado para proceder a essa informação.
No que respeita ao último aspecto, gostaria de o descansar, pois, em nosso entender não se propõe o controle da actividade dos parlamentares europeus por esta instância, nem no caso do orçamento nem no de noutras matérias. Propunha-se, sim, à possibilidade de esta Assembleia acompanhar e saber, de facto as posições aqui assumidas e do conhecimento preciso disso transmitido pelas pessoas que tem essas funções e que no local próprio vão ter oportunidade de defender essas posições.
Manter este contacto íntimo parece-nos extremamente conveniente, de inteira utilidade. A melhor forma de assegurar esta troca de informação não é através das comissões eventuais, dos comités, que reúnem esporadicamente, em situação de pouca operacionalidade, como revela a experiência noutros países.

O Sr. Rui Almeida Mendes (PSD): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Almeida Mendes (PSD):- Sr. Deputado Pegado Liz, acha também curial que o futuro comissário português venha igualmente sentar-se no Conselho de Ministros aqui em Lisboa?

O Orador: - Sr. Deputado, neste momento estava apenas a analisar o que se passa relativamente ao Parlamento, que não terá outra forma operacional de estabelecer este diálogo e é fundamentalmente isso que está em causa.
Sr . Deputado, também gostaria de lhe dizer que admito que há algumas imperfeições e comecei por dizer quê o nosso projecto também as contém. Houve preceitos que não foram considerados e que poderão vir á sê-lo.
Quanto à questão do nosso projecto levar às conclusões últimas, creio que o que estava em causa era encontrar uma fórmula expedita, rápida e que desse satisfação, de uma maneira suficientemente coerente; a uma necessidade imediata que era a de, a breve trecho, podermos fazer uma verdadeira eleição e não uma pura designação.
O nosso projecto, dentro do condicionalismo em que se move, dá alguma garantia de não se fazer aqui uma pura designação e de permitir que os deputados aqui presentes possam, independentemente de uma posição exclusivamente partidária, ter uma palavra a dizer na eleição dos deputados ao Parlamento Europeu.

O Sr. Presidente:- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Almeida Mendes.

O Sr. Rui Almeida Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito já aqui foi dito quanto a está matéria. Pelo tempo que já vai decorrido sobre algo que poderia parecer pacífico, afigura-se-me que o cumprimento de obrigações relativas a estas matérias, que estão contidas no Tratado de Adesão; se revela bastante mais difícil. Noutras matérias sabia bem que o cumprimento era muito difícil, nestas nunca esperei que isso assim fosse.
No entanto, verificámos que, em certos casos, estão mais em causa problemas pessoais do que problemas funcionais.
Neste caso, está em causa o cumprimento do artigo 28.º do Tratado de Adesão Poderia ter sido possível e chegou-se a encarar essa possibilidade fazerem-se, conjuntamente com as eleições legislativas, eleições directas pára o Parlamento Europeu, pelo que os deputados já aí sufragados pelo voto popular poderiam ir ocupar o seu lugar na Assembleia de Estrasburgo até ao termo do mandato dos outros deputados do Parlamento Europeu, ou seja, até 1989. A dissolução ia anterior Assembleia da República impediu que esta aprovasse unia lei eleitoral em que se consagrasse o sufrágio directo.
Em todo o caso, devo esclarecer esta Câmara que o meu partido entendeu que deveria, desde logo, apresentar ao povo português o nome dos deputados que iriam integrar o Parlamento Europeu. Assim, embora figurassem nas listas dos diversos círculos, os deputados propostos para o Parlamento Europeu já estavam numerados e classificados, digamos assim, por lista e a sua passagem por está Assembleia seria apenas uma passagem, digamos, funcional. Apresentámos a lista de deputados ao Parlamento Europeu como apresentámos a dos outros deputados.
De maneira que sentimos que esses deputados foram quase tão sufragados pelo voto popular como os outros que aqui ficam: As listas eram públicas é notórias; embora, pelas, razões que já indiquei, não pudessem, efectivamente, recolher o voto popular.

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De maneira que o facto de termos uma lista foi, sem dúvida, uma medida boa, até em termos daquilo que iam ser as futuras eleições para o Parlamento Europeu.
Quanto às questões de aprofundamento desta matéria, penso que, sem dúvida, se torna necessário aprofundá-las. Mas, Sr. Deputado, se vamos para dar cumprimento a qualquer uma das milhares de posições que a adesão nos acarreta e aprofundar tudo, então, eu já teria muitas dúvidas sobre se valeu a pena a adesão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, faltam 2 minutos para as 20 horas. Encontram-se inscritos, para fazerem intervenções, os Srs. Deputados António José Fernandes e Coimbra Martins, mas creio que 2 minutos não serão suficientes para as intervenções.
Tem a palavra o Sr. Deputado Coimbra Martins.

O Sr. Coimbra Martins (PS): - Sr. Presidente, para mim serão suficientes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Coimbra Martins, o Sr. Deputado António José Fernandes diz-me que não terá tempo para fazer hoje a sua intervenção.
Sendo assim, antes de encerrar a sessão, convoco, para amanhã, às 11 horas, a fim de tomarem posse, os Srs. Deputados que irão integrar as comissões permanentes. Convoco, ainda, os líderes dos grupos parlamentares para uma reunião amanhã, às 15 horas, no gabinete do Sr. Presidente.
Solicito à direcção do Centro Democrático Social, tal como foi combinado na reunião dos representantes dos grupos parlamentares, que apresente os nomes dos seus representantes nas comissões permanentes a fim de amanhã poderem ser empossados.
A próxima reunião plenária terá lugar na quinta-feira pelas 15 horas com a mesma ordem de trabalhos, sem prejuízo de outra que venha a ser agendada amanhã na conferência dos líderes dos grupos parlamentares.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Amândio Basto Oliveira.
Arnaldo Ângelo Brito Lhamas.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
José Mendes Melo Alves.
José Vargas Bulcão.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.

Partido Socialista (PS):

Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
Carlos Manuel N. da Costa Candal.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.

Partido Comunista Português (PCP):

José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel dos Santos Magalhães.

Centro Democrático Social (CDS):

José Luís Nogueira de Brito.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Manuel Costa Andrade.
Mário Júlio Montalvão Machado.

Partido Socialista (PS):

Abílio Aleixo Curto.
António Magalhães Silva.
Armando dos Santos Lopes.
Fernando Manuel dos Santos Gomes.
Jaime José Matos Gama.
João Rosado Correia.
Joaquim Jorge de Pinho Campinos.
Jorge Alberto dos Santos Correia.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Teófilo Carvalho dos Santos.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Daniel Pacheco Amaral.
Jaime Manuel Coutinho G. da Silva Ramos.
José da Silva Lopes.

Partido Comunista Português (PCP):

Ângelo Matos Mendes Veloso.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Centro Democrático Social (CDS):

Eugénio Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Horácio Alves Marçal.
João da Silva Mendes Morgado.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.

Os REDACTORES: Cacilda Nordeste - José Diogo.

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