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I Série - Número 49

Quarta-feira, 2 de Abril de 1986

DIÁRIO

da Assembleia da República

IV LEGISLATURA

1.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1985-1986)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 1 DE ABRIL DE 1986

Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto B. da Mota Torres
António Eduardo Sousa Pereira
José Manuel Maia Nunes de Almeida

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão eram 15 horas e 40 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa de diversos diplomas.
Foi aprovado um voto de pesar pelo falecimento do Sr. Deputado Teófilo Carvalho dos Santos, apresentado pela Mesa, após o que a Assembleia guardou um minuto de silêncio. Produziram declarações de voto os Srs. Deputados Tito de Morais (PS), José Carlos de Vasconcelos (PRD), António Capucho (PSD), Jorge Lemos (PCP), José Manuel Tengarrinha (MDP/CDE)e Adriano Moreira (CDS).
Foram aprovados os nrs. 40 e 41 do «Diário», respeitantes às sessões de 6 e 9 de Março.
Iniciou-se a discussão e votação na especialidade das propostas de lei nrs. 15/IV - Grandes opções do Plano para 1986 - e 16/IV - Orçamento do Estado para 1986. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro das Finanças (Miguel Codilhe) e dos Srs. Secretários de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro (Tavares Moreira) e para os Assuntos Fiscais (Oliveira Costa), os Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Carlos Brito (PCP), João Cravinho e Almeida Santos (PS), Borges de Carvalho (Indep.), Nogueira de Brito (CDS), Rui Machete (PSD), Magalhães Mota(PRD), Alípio Dias, Rui Machete e Silva Marques (PSD). Carlos Carvalhas (PCP), Próspero Luís (PSD), Octávio Teixeira (PCP), Victor Ávila (PRD), Helena Torres Marques(PS) e Lobo Xavier (CDS).
O Sr. Presidente declarou encerrada a sessão eram 21 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adérito Manuel Soares Campos. Alberto Monteiro Araújo. Alípio Pereira Dias. Álvaro Barros Marques de Figueiredo. Amândio Anes de Azevedo. Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo. António d'Orey Capucho. António Joaquim Bastos Marques Mendes. António Manuel Lopes Tavares. António Paulo Pereira Coelho. António Roleira Marinho. António Sérgio Barbosa de Azevedo. Arlindo da Silva André Moreira. Arménio Jerónimo Martins Matias. Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas. Belarmino Henriques Correia. Cândido Alberto Alencastre Pereira. Carlos Alberto Pinto. Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho. Cecília Pita Catarino. Cristóvão Guerreiro Norte. Daniel Abílio Ferreira Bastos. Dinah Serrão Alhandra. Domingos Duarte Lima. Domingos Silva e Sousa. Fernando Dias de Carvalho Conceição. Fernando José Alves Figueiredo. Fernando José Próspero Luís. Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Mendes Costa.
Francisco Rodrigues Porto.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
Henrique Rodrigues Mata.
João Manuel Alves do Valle.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.

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João Luís Malato Correia.
João José Pedreira de Matos.
João José Pimenta de Sousa.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Filipe Athayde Carvalho.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Bota.
José Mendes Melo Alves.
José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares de Lima.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel José Marques Montargil.
Manuel Maria Moreira.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
António de Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Frederico Vieira de Moura.
António Miguel de Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando António Martins Vara.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Carlos Manuel Pereira Pinto.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Helena Torres Marques.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
Jorge Lacão Costa.
José Apolinário Nunes Portada.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Ricardo Jorge de Sousa Roque.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
António M. Azevedo Gomes.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Agostinho Correia de Sousa.
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo de Sousa Pereira.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
João Barros Madeira.
Joaquim Carmelo Lobo.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Torres Matos de Vasconcelos.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Luís Correia de Azevedo.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo da Costa Carvalho.
José Torcato Dias Ferreira.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.
Victor Manuel Lopes Vieira.

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Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço da Silva.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel dos Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
António Bernardo Lobo Xavier.
Adriano José Alves Moreira.
António Filipe Neiva Correia.
António José Tomás Gomes de Pinho.
António Vasco Mello César Menezes.
Eugénio Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Henrique José Pereira de Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João Gomes de Abreu de Lima.
José Luís Nogueira de Brito.
José Maria Andrade Pereira.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
António José Borges de Carvalho (Indep.).

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Manuel do Carmo Tengarrinha.
Raul Fernando de Morais e Castro.

Deputados independentes:

António Poppe Lopes Cardoso (UEDS). Gonçalo Pereira Ribeiro Teles (PPM). Maria Amélia Mota Santos (Verdes).

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas entrados na Mesa.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): -- Deram entrada na Mesa os seguintes projectos de lei nrs. 170/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Henrique Bairrão e outros, do PSD, sobre a criação da freguesia de Santana, no concelho da Figueira da Foz, que foi admitido e baixa à 10.ª Comissão; 171/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Rogério Moreira, do PCP, sobre o dia do estudante, que foi admitido e baixa à 13.ª Comissão; 172/IV, da iniciativa do Sr. Deputado António Osório, do PCP, versando o subsídio de dedicação exclusiva dos docentes do ensino superior e dos investigadores, que foi admitido e baixa à 4.ª Comissão.

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, com a aquiescência da conferência de líderes parlamentares, a Mesa vai apresentar para vossa apreciação o seguinte voto de pesar:

Voto de pesar

Com a morte de Teófilo Carvalho dos Santos a Assembleia da República acaba de perder um dos seus deputados mais ilustres. A beleza da sua modéstia dava às coisas simples a grandeza dos seus méritos e às coisas grandes o testemunho da sua inexcedível humildade.
Figura respeitada e admirada por todos os seus pares, granjeou a amizade de todos quantos tiveram o privilégio do seu convívio.
O valor da liberdade e a força dos direitos que traduzem a garantia da dignidade humana tiveram em Carvalho dos Santos a expressão autêntica duma proclamada evidência.
Na política, na advocacia, no relacionamento social, foi sempre um ponto de referência de comportamento. Ouvido com respeito, seguido com naturalidade, Carvalho dos Santos marcou rumos e promoveu iniciativas que são marcos relevantes da vida política e social do nosso tempo.
Com a sua morte o Parlamento perdeu uma das suas figuras, das mais respeitadas e estimadas, e o País perdeu um dos raros homens que se fez grande na extrema discrição com que deu um largo e fecundo testemunho de coerência de vida.
Deputado às Constituintes e em todas as legislaturas, deu um contributo notável para o prestígio da Assembleia da República. Nela desempenhou as funções de seu Presidente com tal dignidade que é sempre lembrado como exemplo edificante.
Por todas estas e muitas outras razões a Assembleia da República manifesta o seu profundo pesar pela morte do Sr. Deputado Teófilo Carvalho dos Santos e apresenta à família as suas condolências.
Como primeira homenagem a tão respeitada memória guardar-se-á um minuto de silêncio.

Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Como não há inscrições, vamos passar à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, atendendo à aprovação do voto de pesar, vamos dar cumprimento à sua última parte, guardando um minuto de silêncio.

A Câmara guardou de pé um minuto de silêncio.

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Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Tito de Morais.
O Sr. Tito de Morais (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sofreu um rude golpe a democracia portuguesa com a perda de um dos seus mais valorosos combatentes, a cuja memória prestamos hoje a nossa sentida homenagem.
Com o desaparecimento de Teófilo Carvalho dos Santos perdemos, neste momento que todos reconhecemos difícil para a consolidação das instituições democráticas no nosso país, e vemo-nos privados do apoio e do conselho de um homem que desde a idade dos bancos da escola dedicou toda a sua inteligência, toda a sua coragem e toda a sua dedicação à defesa dos princípios de liberdade e de justiça.
É toda uma geração, precursora da grande revolução de Abril, que a pouco e pouco vai desaparecendo na marcha inexorável do tempo, que nos deixa como
que um vazio que os companheiros de Teófilo têm dificuldade em preencher.
O País e a democracia esperam que as gerações que lhe sucedem saibam seguir-lhe o exemplo, saibam como ele manter bem alto o estandarte da liberdade, lutando como ele lutou para que nunca mais nesta terra que tanto amamos apareçam «fichas» a que chamavam «biografia prisional». A de Teófilo começava assim:
«Preso por esta Directoria em 12 de Maio de 1947 para averiguações, tendo recolhido à Cadeia Penitenciária de Lisboa, transferido para o depósito de presos de Caxias, posto à disposição do Governo Militar de Lisboa, transferido para a Cadeia do Aljube», e assim por diante até 25 de Abril de 1974, 27 anos depois.
Mas a «biografia» começa em Janeiro de 1930, quando Teófilo tinha 25 anos, com o n.º 63 de inscrição na Liga da Mocidade Republicana.
Era dura a luta, Srs. Deputados, e Teófilo nunca a abandonou, participando em todos os movimentos antifascistas clandestinos e legais, e em 1973 é um dos fundadores do Partido Socialista.
Aqueles que tiveram o privilégio de o acompanhar guardam dele a memória de um lutador incansável pela liberdade e pelo socialismo, mas também dum homem generoso, profundamente humano, de qualidades pessoais invulgares.
Quase todos nós aqui presentes também com ele convivemos nesta Casa e soubemos apreciar-lhe aquelas qualidades, sobretudo quando exerceu as funções de
Presidente da Assembleia da República para que o elegemos.
Permita-me, Sr. Presidente, que agradeça, em nome do meu partido, a V. Ex.ª, à Mesa da Assembleia, a todos os grupos parlamentares não só a homenagem que agora prestamos à memória de Teófilo Carvalho dos Santos, mas também as manifestações de solidariedade que testemunharam aquandodo funeral do meu querido camarada para sempre desaparecido.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto,
tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos de Vasconcelos.

O Sr. José Carlos de Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Teófilo Carvalho dos Santos morreu no ano em que perfazia seis décadas de luta
constante pela liberdade e pelos direitos do homem, luta que para ele começou cedo -- ainda estudante -, com a própria ditadura, imposta aos Portugueses pelo golpe militar de 28 de Maio de 1926.
Desde esse ano longínquo até ao dia libertador da revolução de 1974, Teófilo Carvalho dos Santos participou em todos os movimentos de resistência ao fascismo, foi sempre uma voz -- ou talvez melhor, no seu caso, um silêncio erguido bem alto a favor da democracia e da justiça. Após o 25 de Abril, obviamente se manteve sempre fiel aos seus ideais, fosse nas tarefas mais apagadas ao nível da acção no seu partido de sempre (o PS) e na sua terra adoptiva (Alenquer), fosse nas tarefas mais destacadas ao nível da presidência desta Assembleia da República, como n.º 2 da hierarquia do Estado.
Aquando da sua eleição como presidente desta Câmara, tive oportunidade de escrever sobre a justiça da escolha e o exemplo da vida do Dr. Teófilo, que foi para mim um privilégio conhecer melhor, e por isso admirar mais, nos últimos nove anos, no âmbito do labor na Comissão do Livro Nego sobre o Regime Fascista, nomeada por Mário Soares enquanto chefe do I Governo Constitucional, e a que preside outra grande figura de democrata da sua geração, José Magalhães Godinho, seu camarada de todos os combates, que comovidamente o evocou junto à sua última morada; geração ainda que é a do nosso companheiro, e também camarada do Dr. Teófilo em todos esses combates, Vasco da Gama Fernandes, que apenas o peso da natural emoção impede de usar da palavra nesta oportunidade, como ele e nós todos desejaríamos.
Que Teófilo Carvalho dos Santos se tenha empenhado, até que a doença de tal o impediu, no trabalho da Comissão do Livro Negro e que o último acto público em que participou tenha sido aquele em que o então Presidente da República, general Ramalho Eanes, o agraciou com a Ordem da Liberdade são ainda dois aspectos e dois marcos cujo simbolismo quero salientar.
Por tudo isto, e muito mais, em consonância com toda esta Câmara, quer o PRD prestar aqui a sua homenagem e deixar consignado o seu pesar pelo desaparecimento deste homem naturalmente bom, tolerante e generoso, deste velho republicano, tão combativo quanto discreto, tão corajoso quanto humilde, tão firme nos seus ideais como respeitador dos ideais diferentes, deste cidadão digno e vertical, que sempre esteve ao lado dos perseguidos contra os opressores, dos desprotegidos contra os privilegiados, dos democratas contra os inimigos da democracia.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata associa-se inteiramente ao voto de pesar pela morte do Sr. Deputado Teófilo Carvalho dos Santos.
Foi um homem muito respeitado nesta Casa, não só pela forma como desempenhou as elevadas funções de Presidente da Assembleia da República e como exerceu os mandatos de deputado desde a Assembleia Constituinte, mas também pelas inegáveis qualidades políticas e humanas que todos lhe reconhecíamos. E entre

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estas, permitam-me que destaque, porque vão sendo raras no meio político em que nos inserimos, a sua modéstia, simplicidade e discrição, que nunca diminuíram a convicção e o empenho com que lutou pelos ideais que defendeu.
Mas a actividade política de Teófilo Carvalho dos Santos não vem apenas desde a libertação ocorrida em 25 de Abril de 1974. De facto, foi um lutador, de sempre, pelos ideais que então puderam livremente exprimir-se e consolidar-se no nosso país.
Ao Partido Socialista, de que Teófilo Carvalho dos Santos foi um distinto fundador, e à sua família o PSD apresenta sentidas condolências.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: -- Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos a favor e associamo-nos à homenagem que a Assembleia da República presta à memória de Teófilo Carvalho dos Santos, deputado à Assembleia da República e ex-Presidente desta Casa.
Participámos em todas as manifestações que marcaram a dor e a mágoa pela perda da vida deste resistente antifascista, deste democrata, deste homem que tinha o amor pela tolerância e que acreditava nos princípios.
Temos a oportunidade de apresentar ao Partido Socialista e à família de Teófilo Carvalho dos Santos a nossa solidariedade e as nossas condolências face à hora de luto que atravessam. É com profunda mágoa que nos associamos mais uma vez e dirigimos ao PS e à família de Teófilo Carvalho dos Santos a nossa sentida homenagem e solidariedade nesta hora difícil.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: -- Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Tengarrinha.

O Sr. José Manuel Tengarrinha (MDP/CDE): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lamento profundamento intervir aqui em memória de um homem que muito admirava, tal como todos os que tiverem o privilégio de com ele contactar.
O convívio durante muitos e muitos anos sempre veio reforçar o apreço pelo homem, bem como a admiração pelo democrata. Em primeiro lugar, na sua actuação política sempre lhe distinguimos a sua exemplar coerência de antifascista, de democrata e de lutador pelo ideal socialista. Nos tempos difíceis do fascismo, quando tão difícil era a expressão e a actuação por estes objectivos, ainda mais víamos nele o exemplo de firmeza com que, nunca claudicando, sempre lutou, dando o exemplo a todos os que com ele contactaram.
Era uma figura de grande prestígio local e aí sempre marcou presença de grande relevo, não apenas pela sua actividade política. E entre as suas actuações locais lembramos os célebres jantares do 5 de Outubro, de que foi organizador durante largos e largos anos, aos quais sempre nos associámos e que foram exemplares manifestações de luta antifascista, que sempre nos animaram a prosseguirmos com mais alento na difícil luta que desencadeámos. Nele encontrámos sempre o bondoso amigo e o acalentador apoiante da nossa luta.
Como político, as suas qualidades invulgares eram marcadas fundamentalmente pela sua profunda humanidade, pela sua transparência de comportamento, pela sua perfeita e exemplar lealdade e pela sua tão invulgar humildade. E por isso podemos dizer que, tendo marcado positivamente todos os que com ele conviveram, todos os que ao seu lado lutaram, o Dr. Carvalho dos Santos foi daqueles homens de quem se pode dizer verdadeiramente que lembraremos o seu exemplo e que foi muito fecunda a sua passagem pela terra.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: -- Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com uma mágoa muito particular que o CDS e eu pessoalmente nos associamos a esta manifestação da Câmara em memória de Teófilo Carvalho dos Santos.
Foi dos melhores e poucos amigos que tive na minha vida e creio que posso dar dele um testemunho pessoal que muitos dos seus camaradas de luta não poderão provavelmente dar. Ele foi um homem que, adoptando uma das mais nobres profissões deste país -- a advocacia --, em todos os momentos difíceis se guiava por aquele princípio fundamental que é da ética dos advogados: ir ao Tribunal, levar a verdade numa das mãos e a cabeça na outra para que o Tribunal disponha da segunda depois de ouvir a primeira. Fez isso nos tribunais comuns e nos tribunais políticos.
Teófilo Carvalho dos Santos foi um homem profundamente agarrado aos interesses do povo português e isso explica aquilo que é chamada a modéstia da sua vida: a circunstância de se ter retirado para Alenquer, onde sentia melhor as necessidade da população que queria servir.
Sofreu uma das maiores dores humanas que um homem pode sofrer, a morte repentina de um filho. E ninguém viu que a sua devoção e coragem cívica fossem alteradas enquanto ele escondia a mais profunda e dramática das dores.
Foi um homem leal aos seus amigos, independentemente das suas convicções políticas, porque supunha que o verbo é capaz de ser o instrumento da concórdia e, por isso mesmo, o usava, recusando a violência como instrumento de luta política. Foi um lutador constante, um amigo perfeito, um socialista convicto, um cidadão exemplar, um pai cheio de amor e dignidade pelos seus filhos e teve a modéstia constante que permite aos homens fortes não terem humildade nenhuma nas suas convicções.
Quando o acompanhei à sua última morada, sabia que acompanhava um homem de quem tinha sido amigo dezenas de anos, probo, não crente, mas sabia que ele esperava que eu rezasse, como fiz, pelo eterno descanso que merece.

Aplausos gerais.

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O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, estão em aprovação os nrs. 40 e 41 do Diário, respeitantes às sessões plenárias de 6 e 9 de Março findo.

Pausa.

Como não há oposição, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai ler um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida):

Relatório e parecer da Comissão
de Regimento e Mandatos

Em reunião realizada no dia 20 de Março de 1986, pelas 17 horas e 30 minutos, foi apreciada a seguinte substituição de deputado:

Solicitada pelo Partido Socialista:

Américo Albino da Silva Salteiro (círculo eleitoral de Setúbal) por Ricardo Jorge de Sousa Roque. Esta substituição é pedida por um período de 15 dias, a partir de 21 de Março corrente, inclusive.

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo aludido partido no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.

Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

A Comissão: Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) -- Vice-Presidente, Belarmino Henriques Correia (PSD) -- Secretário, António Sousa Pereira (PRD) -- Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) -- Adérito Manuel Soares Campos (PSD) -- Daniel Abílio Ferreira Bastos(PSD) -- João Domingos Fernandes Salgado (PSD) -- José Maria Peixoto Coutinho (PSD) -- António Marques Mendes (PSD) -- Henrique Rodrigues da Mata (PSD) -- Carlos Manuel Luís (PS)
-- Joaquim Carmelo Lobo (PRD) -- Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) -- António José Borges de Carvalho (CDS).

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, está em discussão o relatório e parecer que acabou de ser lido.

Pausa.

Como não há inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, foi distribuída pelas bancadas uma informação respeitante à metodologia dos debates que irão ter lugar no domínio da especialidade das propostas de lei nrs. 15/IV e 16/1V, que refere o seguinte:

O Sr. Deputado Ivo Pinho teve a amabilidade
de nos apresentar uma proposta quanto
à metodologia a seguir na orientação dos trabalhos de
iscussão na especialidade das propostas de lei
nrs. 15/IV e 16/IV. O respectivo processo teria a
seguinte ordenação:

1.º Proposta de lei n.º 16/IV:

a) Artigos 11.º e 12.º;
b) Artigos 16.º a 20.º;
c) Artigos 24.º a 46.º;
d) Artigos 49.º e 50.º;
e) Artigo 57.º;
f) Artigo 59.º;
g) Artigo 61.º;
h) Artigos 21.º a 23º e artigos 3º a
6.º;
Artigo 1.º e mapa I;
) Artigo 62.º;

.º Proposta de lei n.º 15/IV.
Nota. -- Todas as votações terão lugar às 18 horas de cada dia, salvo aquelas que se processarem para além daquela hora no último dia, as quais terão lugar na parte final do debate, imediatamente antes da votação final global.

Peço aos representantes dos grupos parlamentares que digam o que se lhes oferecer acerca desta proposta de metodologia.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -- Sr. Presidente, quanto à metodologia que foi sugerida pelo Sr. Deputado Ivo Pinho, por parte da nossa bancada não temos objecções.
Quanto à nota, no que se refere à hora das votações, pensamos que poderão surgir alguns problemas de eficácia quanto à possibilidade de todas as votações se efectuarem às 18 horas.
Pensamos, contudo, que a sessão de hoje pode servir de experiência para se ver se é possível ou não aplicar este método. Mas parece-nos que o número de votações que se vão seguir tornará difícil que elas sejam todas concentradas às 18 horas. De qualquer modo, poderíamos ver o que sucede durante a sessão de hoje e não firmarmos já uma doutrina para o dia de amanhã, dado que quinta-feira a questão não se coloca.

O Sr. Presidente: -- Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): -- O Grupo Parlamentar do PSD gostaria de manifestar a sua concordância com esta proposta no que diz respeito à proposta de lei n.º 16/IV, com excepção da alínea h), relativa aos
impostos.

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Efectivamente, compreende-se que as matérias dos empréstimos do mapa I anexo ao artigo 1.º e do artigo 62.º sejam votadas no fim, mas parece carecer de justificação que os artigos 21.º a 23.º sejam votados fora da sua ordem normal.
Queríamos, por outro lado, manifestar a nossa concordância com o Sr. Deputado Jorge Lemos no sentido de podermos fazer hoje a experiência no que diz respeito ao horário das votações. Se ela for positiva, poderemos mantê-la amanhã, se por acaso se revelar impeditiva da necessária eficácia teremos de mudar essa metodologia.

O Sr. Presidente: -- Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação à metodologia que suponho ser proposta pela Comissão de Economia, Finanças e Plano, da qual foi porta-voz o meu companheiro de bancada Ivo Pinho, temos duas questões a colocar.
Em primeiro lugar, em relação às votações, julgamos que mesmo hoje não se justificará que elas só sejam feitas às 18 horas. Julgamos que neste debate as votações devem efectuar-se imediatamente a seguir à discussão, a menos que seja requerido o adiamento da votação nos termos regimentais.
Consequentemente, achamos que durante o debate orçamental não devem realizar-se reuniões de comissões, de modo que todos os Deputados possam estar presentes no Plenário e possam participar nas votações imediatamente a seguir à discussão dos vários artigos em análise. Digo isto porque neste momento sabemos que há comissões que deveriam reunir durante este debate.
Concluindo, pensamos que as votações do debate orçamental se devem fazer artigo por artigo e a seguir à sua discussão, a menos que surja qualquer requerimento para adiamento da votação.
Em relação à seriação das matérias que foi proposta, julgamos que se trata da seriação mais lógica, na medida em que ela permite distinguir dois tipos de hipóteses: avançamos em relação à matéria de receitas por uma ordem que é naturalmente a ordem lógica e distinguimos duas matérias de votação que, pelo seu natural melindre, devem ser tratadas com alguma relevância e à parte de outras votações. Referimo-nos à discussão e votação que dizem respeito aos impostos sobre aplicação de capitais, ao imposto profissional e ao imposto complementar. Pensamos que estas matérias devem ser debatidas depois das matérias em relação às quais existem menos propostas susceptíveis de debates e pensamos também que antes da matéria dos empréstimos e das votações finais do artigo 1.º e do mapa I e da entrada em vigor da Lei Orçamental devem ser discutidos os artigos novos que não foram contemplados na proposta de seriação do debate.
Portanto, estamos de acordo com a proposta de um modo geral, pois pensamos que se justifica plenamente a distinção que foi proposta em relação à sequência do debate, distinguindo como segundo capítulo de discussão as matérais referentes ao imposto de capitais, imposto profissional e ao imposto complementar, que imediatamente depois devem ser discutidos os artigos novos propostos pelas várias bancadas e que só a seguir a esta discussão se deve fazer a discussão dos artigos referentes a empréstimos, ao artigo 1.º e ao mapa I. Estas são as nossas
observações em relação à proposta que foi feita pela Comissão.

O Sr. Presidente: -- Tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS dá, em princípio, o seu acordo à metodologia proposta pelo Sr. Deputado Ivo Pinho.
Consideramos, no entanto, que foram judiciosos alguns comentários feitos pelo Sr. Deputado Jorge Lemos. Se a experiência de hoje se mostrar conveniente, penso que poderia ser alterada a ordem indicada para as votações.
O Sr. Presidente: - Tomando em consideração as observações que foram feitas, a Mesa determinou que as votações fossem feitas logo em seguida à discussão de cada um dos artigos.
Em relação à alínea h), gostaria que os Srs. Deputados se pronunciassem sobre a objecção levantada pelo Sr. Deputado Rui Machete. O Sr. Deputado Rui Machete entende que os artigos 21.º a 23.º deveriam estar na sequência lógica dos respectivos números, e não na alínea h).

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): -- Sr. Presidente, o que o meu grupo parlamentar pretende é que tanto a proposta como a objecção feita pelo Sr. Deputado Rui Machete sejam devidamente fundamentadas -- o que não aconteceu --, para que as possamos apreciar e votar em conformidade.

O Sr. Presidente: -- Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -- Sr. Presidente, em relação à hora para as votações nós apenas manifestámos a nossa disponibilidade, face à sugestão que nos foi feita pela Mesa.

O Sr. Presidente: -- Agradeço que tenham aceite a sugestão, Sr. Deputado. Só que a Mesa entendeu que, para uma melhor ordenação dos trabalhos, as votações deviam fazer-se de imediato.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -- Sr. Presidente, não gostaríamos, porém, que ficasse a ideia de que teria sido nossa a sugestão, face a uma matéria com as características que tem a discussão na especialidade de um Orçamento. Pensamos que isso poderia provocar algumas complicações e foi isso que, inclusivamente, dissemos.
Quanto à metodologia proposta, já manifestámos a nossa opinião: pensamos que é uma boa proposta e, embora o PSD se tenha manifestado de forma diversa, era bom que pudéssemos ouvir mais opiniões sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: -- Sr. Deputado Rui Machete, mantém a sua objecção?

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O Sr. Rui Machete (PSD): -- Sr. Presidente, como foi solicitado, eu justificava muito brevemente a razão por que, concordando quanto ao resto com a proposta do Sr. Deputado Ivo Pinho -- que, aliás, não é uma proposta da Comissão de Economia, Finanças e Plano, já que ela foi feita a título individual --, preferíamos que os artigos 21.º a 23.º fossem votados pela sua ordem. Enquanto que no que diz respeito aos empréstimos e à aprovação global do artigo 1.º do mapa I anexo há uma justificação lógica, pois têm que ser votados no final de tudo -- e nesse aspecto o Sr. Deputado Magalhães Mota tem toda a razão em dizer que os novos artigos devem ser votados antes destes últimos --, já que só depois é que vamos saber qual o montante dos empréstimos e o artigo 1.º º e o mapa I, assim como o artigo 62.º. Quanto do capítulo dos impostos, há um capítulo IV, «Sistema fiscal», pelo que não vejo por que é que se deve autonomizar e retirar da ordem as matérias relativas ao imposto profissional, imposto complementar e imposto de capitais, na medida em que existem também alterações a outros impostos e o critério da importância das alterações é, obviamente, um critério subjectivo.

O Sr. Presldente: -- O Sr: Deputado Ivo Pinho não vê objecção em que a alínea h) passe a ser a alínea b-1)?

O Sr. Ivo Pinho (PRD): -- Sr. Presidente, não vejo qualquer objecção, mas já agora gostaria de explicar por que é que tomei a iniciativa de fazer essa proposta,
essa sugestão.
Em primeiro lugar,queria dizer que essa proposta foi
apresentada a título pessoal, já que não tive a oportuni-
dade de encontrar o Sr. Presidente na Comissão de Eco-
nomia, Finanças e Plano. Fiz isso porque me foi dito que
era habitual nos relatórios das comissões proceder-se a
essa indicação para facilitar os trabalhos. Foi nesse sen-
tido que o fiz: como não encontrei o Sr. Presidente, e
na minha qualidade de vice-presidente, entendi que devia
fazer esse trabalho para facilitar a nossa sessão de hoje.
Se me pedem para fundamentar a razão pela qual entendi que os artigos 21.º a 23.º deveriam ser discutidos depois direi que, no plano estritamente lógico, não há razão para isso, embora saiba que os artigos 21.º a 23.º, recaindo sobre os impostos profissional, complementar e de capitais, são matéria extremamente delicada, que vai fazer com que a Assembleia da República perca muito tempo coma sua discussão. Daí que, por uma questão de pragmatismo, celeridade e para dar tempo a que as propostas,que surjam nessas áreas pos-
sam ser devidamente fundamentadas, fosse proposta a alínea h), com esses artigos, para discussão quarta-feira ou quinta-feira.

O Sr. Presidente: -- Sr. Deputado Ivo Pinho, quero agradecer-lhe a iniciativa que teve ao apresentar-nos esta proposta. A Mesa pensa que devemos seguir a lógica da respectiva numeração -- tanto mais que V. Ex.ª não levantou grandes dificuldades a isso, a não ser pelo facto de ser uma matéria mais complexa. Assim, a alínea h) passará a ser a alínea b-1).
Tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): -- Sr. Presidente, em primeiro lugar quero pedir desculpa por voltar à questão da hora das votações. A Mesa decidiu, se bem
entendi, que seguiríamos o critério de votar os artigos imediatamente após a discussão. Não recorreremos dessa decisão, mas estão comissões reunidas -- neste momento, por exemplo, está reunida a 1.ª Comissão.
A minha interpelação vai, pois, no sentido de V. Ex.ª fazer chegar junto dos presidentes das comissões aqui presentes, e aos que estão ausentes a presidir às comissões, o facto de que terão que anular essas reuniões.

O Sr. Presidente: -- Sr. Deputado, o fundamento dessa deliberação situa-se, apenas e tão só, no facto de se ter entendido que para a Mesa era mais fácil anotar as votações logo a seguir ao termo de cada discussão. Assim, foi apenas para facilitar o trabalho da Mesa.

O Sr. António Capucho (PSD): -- Não contesto isso, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: -- Irei pedir, então, aos Srs. Presidentes das comissões o favor de aqui comparecerem, já que iremos proceder às respectivas votações.
Srs. Deputados, pergunto aos representantes dos diversos grupos parlamentares se dispensam ou não a leitura do Relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): -- Sr. Presidente, não queria pronunciar-me já sobre a questão da leitura do relatório, mas, ainda, sobre a questão do método a seguir nas nossas votações.
Creio que a justificação de que se vote por forma
sequencial -- tal como foi proposto pelo Sr. Deputado
Ivo Pinho -- o debate e a votação dos vários artigos
da proposta de lei orçamental tem uma razão evidente,
que não é apenas subjectiva. Todos nós sabemos que
a importância objectiva das propostas de alteração não
é exactamente a mesma daquelas matérias que estão em
discussão.
Creio que também todos nós sabemos que há formas regimentais de conseguir que os debates e as votações não sejam feitos pela sequência dos vários artigos e, portanto, sempre restaria à disponibilidade de qualquer grupo parlamentar propor à Assembleia da República -- e obter para isso maioria -- quer uma nova baixa à comissão da discussão de um artigo, quer o adiamento de uma votação.
Creio que é bastante mais transparente e correcto, considerando a importância relativa das várias propostas, que façamos a seriação do debate e das votações tendo em conta estes aspectos. Como todos sabemos que o debate vai ter uma importância fundamental, a propósito dos impostos sobre aplicação de capitais, profissional e complementar, faz naturalmente mais sentido que todos nós concedamos a nós próprios um pouco mais de tempo para esse debate, do que estarmos a provocar formas antecipadas, ou estarmos a provocar a utilização de mecanismos regimentais que conduziriam, precisamente, aos mesmos resultados.
Penso que poderemos, com facilidade, entender-nos sobre esse campo. Era, pois, neste sentido que pretendia clarificar e apoiar a proposta do meu companheiro de bancada Ivo Pinho.

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Quanto à discussão e leitura prévia do relatório, pela nossa parte, dispensamo-la.

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, vamos dar início desde já à discussão dos artigos que estão propostos nas alíneas a) e b). Entretanto, no intervalo, farei uma reunião de líderes para que possamos chegar a uma conclusão e a um consenso sobre esta matéria.
Pretendo saber se os Srs. Deputados dispensam ou não a leitura do relatório. Se entendem que ela deve ser feita agradeço que o digam, pois, caso contrário, passaremos desde já à sua discussão.

Pausa.

Como ninguém requer a leitura, vamos dar início à discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): -- Sr. Presidente, consideramos conveniente para a organização dos trabalhos que nos possamos organizar internamente sobre a nossa votação.
Se V. Ex.ª entender que, com prejuízo do intervalo, por exemplo, deve ser desde já convocada a reunião de líderes para assentarmos a sequência dos debates e das votações, o PRD entende que essa proposta é lógica e merece, naturalmente, a nossa concordância. Com isso ganharemos tempo na organização dos debates e no modo como eles decorrerão.
Se se entender de forma diversa, o meu grupo parlamentar decidirá em conformidade com a sequência da deliberação que a Mesa tomar.
Proponho que se reúna, antecipando o intervalo regimental, a conferência de líderes e que assentemos nela a sequência dos debates e a sua deliberação. É uma proposta que faço à Mesa e gostaria de ouvir a opinião dos outros grupos parlamentares.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): -- Sr. Presidente, em relação à proposta do Sr. Deputado Magalhães Mota e no sentido de facilitar e dar maior celeridade aos trabalhos, o PSD prescindirá da conferência de líderes e dará o seu acordo à sequência proposta pelo Sr. Deputado Ivo Pinho e à votação nos termos em que a Mesa acabou por deliberar.
Penso que a única objecção existente era a nossa e, portanto, iremos retirá-la para que possamos seguir em frente. Também pela nossa parte dispensamos a leitura do relatório.

O Sr. Presidente: -- Está, portanto, estabelecido o consenso.
Srs. Deputados, segundo a metodologia proposta, vamos entrar na apreciação da proposta de lei n.º 16/IV, relativa ao Orçamento do Estado para 1986, e na discussão dos seus artigos 11.º e 12.º
Estão em discussão, Srs. Deputados.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças (Miguel Cadilhe): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitirão VV. Exas. que teça algumas considerações sobre a apreciação na especialidade do Orçamento do Estado para 1986. Justifica-se que o faça, porque o Governo tem notícias da existência de intenções de alteração em alguns pontos substanciais da proposta.
O Governo apresentou em meados de Fevereiro passado a proposta do Orçamento do Estado para 1986. Trata-se de uma proposta a que são reconhecidos a consistência macroeconómica e um «grau de verdade» pouco usual.
Esse é o nosso Orçamento porque executa a nossa política económica. Aprovado o Programa em Novembro passado e investido o Governo em toda a sua plenitude e legitimidade, devem os restantes órgãos de soberania respeitar que a política económica seja concebida e conduzida pelo próprio Governo.
A nossa política económica está, toda ela, dirigida para realizar a «estratégia de progresso controlado». Queremos que aumente o nível de vida das famílias portuguesas, mas não permitiremos que isso se faça à custa dos equilíbrios macroeconómicos fundamentais que prometemos atingir, gradualmente em matéria de défice externo, défice do Estado, desemprego, inflação.
Queremos que o consumo privado cresça, mas não permitiremos que se substitua ao investimento, como locomotiva da procura interna e do crescimento económico.
Queremos que os salários reais cresçam, mas não consentiremos perdas de competitividade externa, nem nos deixaremos iludir com a tentação dos ganhos salariais excessivos e, por isso, efémeros e reversíveis. Queremos que a carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho e sobre o capital do risco diminua, mas não embarcaremos em soluções fáceis de fazer desagravamentos espectaculares num só ano, provocando o descontrolo e as derrapagens.
Esta é, Srs. Deputados, a nossa política económica. Se alguém quiser outra política, deverá ganhar eleições.
Não é no âmbito do debate do Orçamento do Estado que o Parlamento pode obrigar a uma mudança essencial da orientação da política económica, mas sim, e apenas, quando a Assembleia da República investe ou derruba governos. De resto, é em eleições que, por excelência, se assumem promessas e compromissos de uma ou outra orientação política. Quem ganha eleições, e constitui Governo, tem o direito e o dever de pôr em acção a política económica que tiver delineado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Entendemos que o Parlamento não deve modificar as traves-mestras dessa política - muito menos quando escassos meses estão decorridos sobre a aprovação do Programa do Governo.
Srs. Deputados: o País quer ter um Parlamento forte, ao lado de um Governo forte. A força de um não pode ser a fraqueza do outro. Não estamos aqui para isso!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Temos de respeitar a esfera de competência de cada órgão de soberania, para evitar que surjam fraquezas e fragilidades que só empobrecem o País e desacreditam a democracia.

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O Sr. Silva Marques (PSD): -- Muito bem!

O Orador: -- Que fique, pois, muito claro: o Governo tem o mais profundo desacordo por certas hipóteses de alteração à proposta de lei do Orçamento do Estado para 1986, hipóteses essas que têm sido ventiladas por órgãos da comunicação social ou que existem
mesmo materializadas em documentos de grupos parlamentares.
Entre os casos mais salientes, destacarei os respeitantes aos preços de combustíveis, aos impostos profissional e complementar e ao imposto de capitais.
Quanto aos preços dos combustíveis, há, desde logo, uma distinção primária que é ao mesmo tempo uma questão de princípio. Uma coisa é a fixação de componentes fiscais dos preços, outra coisa é a própria administração dos preços. A primeira cabe exclusivamente
à Assembleia da República. A segunda compete, indiscutivelmente, ao Governo, ou, se este assim o entender, às empresas e ao mercado.
O Governo não quer prolongar o erro de administrar matéria fiscal sem autorização da Assembleia da República - pecado que, aliás, foi cometido por todos os Governos anteriores e tacitamente consentido pelas composições parlamentares contemporâneas. Nem a Assembleia da República deve invadir uma área típica do Executivo, como o é a gestão dos preços.
Seria a primeira vez que isto acontecia; constituiria um precedente perigosíssimo (poderiam seguir-se os preços do leite, do pão, dos transportes, a taxa de juro, a taxa de câmbio!). Onde iríamos parar, Srs. Deputados? Uma tal atitude só poderia ter uma leitura: interferência e obstrução parlamentar à acção do Governo.
Se o Governo não serve, mude-se o Governo. Se o Governo serve, respeite-se o que compete ao Governo. Não aceitamos ser um governo anónimo de responsabilidade limitada. Só aceitamos ser um governo por inteiro, sem limites ocasionais, nem reduções arbitrárias.

O Sr. António Capucho (PSD): -- Muito bem!

O Orador: -- Para além desta questão de princípio, que sempre se poria mesmo que houvesse uma perfeita concordância do Governo relativamente à proposta ventilada de mexida dos preços de combustíveis, acontece, Srs. Deputados, que estamos perante uma hipótese que carece de triagem técnica e de avaliação rigorosa e
demorada das consequências. É matéria complexa, que se tem arrastado em Governos anteriores sem solução; o Governo está a estudar o assunto e há-de fazer à Assembleia da República uma proposta de lei, tecnicamente ponderada, sobre a componente fiscal dos preços dos combustíveis -- em articulação, aliás, com a extinção já decretada do Fundo de Abastecimento.
Não é possível, com segurança, fazer isto em poucas semanas, muito menos em poucos dias. Ninguém
pode garantir que, por este caminho, a Assembleia da República não estaria, além de invadir a esfera do Governo, a consagrar uma solução gravemente inadequada no domínio da pura técnica da fixação de preços. Os especialistas da matéria mostram-se perplexos e classificam uma tal atitude como sendo, de todo em todo, desaconselhável.
Mas, mesmo que não se pusesse a questão de princípio sobre as esferas de competência, nem houvesse riscos técnicos quanto à estrutura dos preços dos combustíveis, sempre restariam duas questões essenciais que têm a ver com o papel dos preços na orientação da política energética e com o peso da dívida que vem do passado. A primeira insere-se na problemática da afectação dos recursos, das poupanças energéticas e do estímulo ao consumo e dos custos de produção, e é uma problemática fundamental que me absteria de desenvolver. A segunda reclama algo tão simples como um juízo em que intervenha o bom senso e a sabedoria do povo português: o que deve fazer uma família endividada a quem sai o prémio da lotaria?
Comprar um carro, mudar o televisor e passear no estrangeiro, ou pagar dívidas e investir na educação dos filhos? É este segundo caminho o apontado pelo Sr. Primeiro-Ministro no discurso que fez perante VV. Exas.

Vozes do PSD: -- Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, permitam-me que passe aos outros dois casos citados de hipotéticas alterações à proposta do Orçamento do Estado do Governo.
Quanto ao imposto profissional, conjugado com o ex-Fundo de Desemprego, propôs o Governo uma redução das taxas em dois pontos percentuais. Não é uma redução sensacional, certamente que não é, mas é a redução possível tendo em devida conta as projecções macroeconómicas para 1986. Ao que parece, existe uma hipótese de a Assembleia da República ir mais longe em matéria do imposto profissional, acumulado com o imposto complementar, atingindo-se, assim, a maior explosão dos salários líquidos de que há memória. Que saibamos, nunca houve uma conjunção deste tipo, com os impostos drasticamente reduzidos e, ao mesmo tempo, os salários nominais a subir bastante acima da inflação (três a quatro pontos segundo a política de rendimentos do Governo). Teremos consciência plena do que isto poderá vir a representar em termos de consumo privado e de ilusões de nível de vida que não serão sustentáveis em anos seguintes?
Teremos consciência dos riscos que o País corre quanto à necessidade de em 1987 ou 1988 vir a submeter-se, mais uma vez, às severidades de uma política de estabilização tutelada pelo exterior? Quem vai, então, responder pelos excessos de agora? Quem vai, então, enfrentar o desprezo dos cidadãos desiludidos e o desdém sobranceiro dos parceiros europeus? Mas alguém duvida de que, se assim pudesse ser, não teria o Governo proposto, desde logo, ou depois, a qualquer momento, um maior e mais cativante desagravamento fiscal?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -- O Governo é que sabe!

O Orador: -- A solução que expus na Comissão de Economia, Finanças e Plano é a mais recomendável na presente situação do País, quando os salários nominais estão já a evoluir significativamente acima da inflação esperada: aguardar pelo Outono, fazer uma avaliação da conjuntura e das principais variáveis macro-económicas (salários, consumo, inflação, défice externo, competitividade) e decidir, então, se for caso disso, por um novo desagravamento fiscal por acordo responsável e altamente meritório entre os dois órgãos de soberania.

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Quanto ao imposto de capitais, existe, ao que parece, uma proposta de suspender a isenção que tem vigorado sobre os juros das obrigações. Tratar-se-ia, novamente, de impor um desvio substancial às traves-mestras da política económica do Governo, porque iria contra a dinamização do mercado de capitais, contra a diversificação da captação da poupança, contra o reforço financeiro das empresas com insuficiência de capitais permanentes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nunca, em doze anos de democracia, a Assembleia da República alterou a tabela do imposto profissional proposta pelo Governo, nem interferiu em matéria de preços. Porquê agora e nesta dimensão?

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): -- Está enganado!

O Orador: -- O Governo tem um programa e é responsável pela sua execução. Mas ninguém poderá, mais tarde, chamar-nos à responsabilidade pelo eventual incumprimento do programa se hoje a Assembleia da República introduzir alterações no Orçamento do Estado de tal monta que desvirtuem traves-mestras da política económica que decorre desse programa.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca, Carlos Brito e João Cravinho.
Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro das Finanças: Todos dizem que V. Ex.ª é um bom professor, um bom técnico e nós não temos razões nenhumas para duvidar disso. Uma coisa é certa, V. Ex.ª não parece ter grande habilidade para dirigir-se à Assembleia da República, não a teve no debate na generalidade, não a teve no debate na especialidade e continua a não tê-la.
O Sr. Ministro referiu que os restantes órgãos de soberania devem respeitar o Governo. Disse «não permitiremos desequilíbrios», «não permitiremos que os salários sejam alterados», «não permitiremos que os impostos diminuam num só ano», «se alguém quiser outra política deverá ganhar eleições», «o Parlamento não deve impedir as traves-mestras do Governo».
V. Ex.ª declarou que não está de acordo em que se imponham desvios ao Governo, que haja interferência e obstrução parlamentar à acção do Governo, que não aceita decisões arbitrárias. Finalmente, disse que nunca, em doze anos de democracia, a Assembleia da República interferiu na política de preços ou de impostos.
O Governo, por um lado, vai cumprindo com o Estatuto da Oposição e vai recebendo os partidos e, por outro lado, actua num total confronto com o Parlamento.
Perante estes ultimatos, V. Ex.ª acha que o Parlamento deve aceitar, submissamente, as declarações que acabou de produzir? Sr. Ministro, acha ou não que as declarações de V. Ex.ª são, pura e simplesmente provocatórias? Acha ou não, Sr. Ministro, que nós deveríamos aqui discutir, por exemplo, o preço dos combustíveis? V. Ex.ª diz que o Governo vai apresentar uma proposta. Não é esta a sede de discutir o assunto,
Sr. Ministro? Havendo uma proposta de alteração -- e V. Ex.ª teve dela conhecimento e não através da comunicação social --, não acha que é exactamente aqui que deveríamos discutir esse assunto, aberta e claramente, sem subterfúgios? Talvez V. Ex.ª, com os seus argumentos, conseguisse que a Assembleia da República o seguisse...! Contudo, parece-me que, com a sua falta de habilidade, não vai atingir essa sua finalidade.
Acha V. Ex.ª e que esta é a forma mais clara e mais correcta de iniciar um debate na especialidade sobre matérias tão importantes como esta? Acha, Sr. Ministro, que a sua intervenção serviu para esclarecer, de alguma maneira, esta Câmara? Não terá servido apenas para nos lançar um ultimato, tipo «se vocês fizerem aprovar algumas das propostas de alteração nós teremos uma crise política»? Será que o Governo pretende criar uma situação provocatória?
Sr. Ministro das Finanças, V. Ex.ª não nos trouxe nenhum esclarecimento sobre as matérias para as quais existem propostas de alteração.

O Sr. Presidente: -- Sr. Ministro das Finanças pretende responder agora ou no fim?

O Sr. Ministro das Finanças: -- No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: -- Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): -- Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: Falando o Sr. Ministro das Finanças de uma área que é da competência absoluta da Assembleia da República, como é a aprovação do Orçamento e do Plano, resulta particularmente deslocado o tom e o teor do seu discurso. Na verdade, Sr. Ministro, a quem compete votar e aprovar o Orçamento e as grandes opções do Plano é à Assembleia da República. Talvez o Sr. Ministro das Finanças nunca tenha reflectido sobre a circunstância de cada um de nós ir votar com o peso da sua consciência e da sua relação com o eleitorado.

Vozes do PCP: -- Muito bem!

O Orador: -- Não é um acto ligeiro e, por isso, Sr. Ministro das Finanças, ofende-nos quando vem aqui dizer que, numa matéria que é da competência da Assembleia, o Governo «não consentirá», «não permitirá», etc. Mais do que discutir isto, importa ajuizar politicamente sobre o sentido do seu discurso. O Sr. Ministro não veio ralhar à Assembleia da República por causa das alterações que o Parlamento introduziu na parte das despesas -- já votadas --, mas sim pelas alterações que, em seu entender, a Assembleia da República propõe introduzir na parte das receitas.
Significa isto que o Governo aceita e já digeriu as alterações que foram introduzidas nas despesas, em comissão? Já aceitou o Governo as dotações do capital estatutário para a EDP e para as empresas públicas de transportes? O Governo já aceitou os aumentos para as autarquias, para a construção de juntas de freguesias, para a Acção Social Escolar, para as pensões e reformas da função pública, para o Hospital de Évora, para o apoio à pesca, para o combate à polui-

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ção do Alviela, para a ANOP, para o acesso ao direito, para a recuperação de toxicómanos? Significa isto, então, que o Governo aceita todas estas alterações e só está, pois, preocupado com as receitas?
Em relação às receitas, importa dizer que o Governo minoritário vem aqui exaltado, intranquilo, ofensivo para com a Assembleia da República. Contudo, podemos admitir que «faz pela vida», o que resulta da sua própria natureza de Governo minoritário.
O que é que entende, Sr. Ministro, por acto de apreciar, discutir e votar o Orçamento e as grandes opções do Plano? Pensa o Sr. Ministro que a Assembleia da República não podia fazer mais nada senão pôr o «carimbo» nas brilhantes propostas que o Governo aqui trouxe? Não lhe parece inteiramente legítimo que o Parlamento considere excessivo o peso da carga fiscal? O Sr. Ministro pensa que a Assembleia da República não se deve preocupar com isso? Não pensa -- já que outras medidas não há -- que o Parlamento se deve preocupar com o aligeiramento da carga fiscal? É que é disso que se trata: aligeirar a carga fiscal em relação aos impostos que incidem sobre os rendimentos do trabalho.
O Sr. Ministro veio aqui dizer que a Assembleia não tem de intervir nos preços, mas sim nos impostos. A Assembleia da República deixaria de exercer as suas competências porque o Governo veio aqui fazer chantagem? E é disso que se trata, porque o Sr. Ministro não veio aqui discutir ideias, já que se assim fosse discutia o que se passou na Comissão em relação às despesas. O Sr. Ministro veio aqui fazer chantagem sobre a Assembleia da República!

Vozes do PCP: -- Muito bem!

O Orador: -- Creio que a melhor resposta que o Parlamento pode dar é, serenamente, prosseguir o seu trabalho e fazer votar as propostas que aqui tenham consenso maioritário. O Governo que cumpra a sua missão, que exerça as suas competências, como deve e está obrigado pela Constituição. Aquilo que se prova mais uma vez -- e é isto que importa dizer ao País -- é que quem desestabiliza, quem cria artificialmente situações de tensão e de crise é o Governo. A Assembleia da República trabalha para resolver o problema dos Portugueses.

O Sr. Presidente: -- Para pedir esclarecimentos, tem
a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): -- Sr. Ministro das Finanças, ouvimo-lo mais uma vez um bocado a destempo.
Quando se discutiu e votou na especialidade o Orçamento das Despesas na Comissão de Economia, Finanças e Plano, tive oportunidade de emitir a opinião de que o discurso de V. Ex.ª ali feito foi o discurso que faltou neste Plenário aquando da discussão na generalidade. O Governo furtou-se, a debater as observações e sugestões da Comissão de Economia, Finanças e Plano e a responder directamente aos partidos que o interpelaram sobre a política económica. E, fora de horas, quando sabia que regimentalmente já ninguém lhe poderia responder se de facto se seguisse o bom processo regimental, o Sr. Primeiro-Ministro veio fazer a introdução de elementos novos.
Como já tive ocasião de dizer, V. Ex.ª, Sr. Ministro das Finanças, fez o mesmo no debate na especialidade sobre matéria de generalidade. Essa matéria é extremamente importante e pena foi que V. Ex.ª a quisesse reservar para si na ocasião própria e a tivesse omitido perante este Plenário. Vem agora, perante o Plenário, expor a matéria que entendeu.
Gostaria de pedir esclarecimentos a V. Ex.ª sobre um -- e só um -- aspecto dessa matéria.
Estamos profundamente surpreendidos e chocados por ver que o Sr. Ministro das Finanças vem aqui censurar o Parlamento antecipadamente por este eventualmente vir a decidir matéria que é da sua exclusiva competência. Estamos aqui, por direito próprio e por obrigação constitucional, para votar matéria que é da exclusiva competência da Assembleia da República. Nestas circunstâncias, choca-nos muito que o Sr. Ministro das Finanças venha dizer que o Parlamento não deve exercer a sua competência porque, exerça-a bem ou mal, interfere em matéria governamental. Não percebemos este entendimento.
Não percebemos como o Sr. Ministro das Finanças pode dizer aqui que a Assembleia da República, ao considerar a matéria fiscal de novo exclusivamente da sua competência, está a interferir em área governamental. Que eu saiba, nenhum de nós propôs aqui alterações de preços, mas, sim, alterações da componente fiscal. 15to é da matéria reservada da Assembleia da República, pelo que não percebemos como é que o Sr. Ministro das Finanças insiste em dizer que há deputados que propõem aumentos ou diminuições de preços, quando o que os deputados propõem é a alteração da componente fiscal. Quanto aos preços, o Governo, nessa altura, não terá mais do que cumprir a lei.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): -- Muito bem!

O Sr. Presidente: -- Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: -- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou responder em conjunto, dado que os Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca, Carlos Brito e João Cravinho teceram considerações que convergem e que, portanto, me permitem esta resposta em conjunto.
A falta de habilidade invocável no meu discurso não preocupa o Governo. Só preocupará o Governo se o País vier a concluir que houve falta de habilidade na condução dos assuntos da economia e da sociedade portuguesa.

Vozes do PSD: -- Muito bem!

O Orador: -- É essa habilidade ou essa falta de habilidade que nos poderá preocupar. Não é uma eventual quebra de protocolo ou um discurso menos simpático ou menos diplomático que nos preocupa. Essa falta de habilidade, Srs. Deputados, não nos preocupa absolutamente nada.

Vozes do PSD: -- Muito bem!

O Orador: -- Quanto às citações que os Srs. Deputados fizeram de memória e que, de facto, se distanciam substancialmente daquilo que disse, agradeço que,

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se tiverem interesse, leiam a transcrição que os serviços venham a fazer do meu discurso, o qual, aliás, sendo do Ministro das Finanças, contém o pensamento e o sentimento do Governo.

Vozes do PCP: -- Pior ainda!

O Orador: -- Separei as traves-mestras da política económica do Governo de tudo o mais. E é por se desenharem algumas eventuais alterações a essas traves--mestras que o Governo diz: «Assim não pode ser».
Não podemos ser responsabilizados pelo cumprimento do Programa do Governo, quando nos destroem algumas das traves-mestras da política económica.

Vozes do PSD: -- Muito bem!

O Orador: -- Separei também as áreas da competência exclusiva da Assembleia da República, que o Governo respeita inteiramente, das áreas da competência do Governo.
Através do meu discurso, o Governo refere ser fundamental para o País e para os próprios órgãos de soberania que haja o respeito integral das duas esferas de competência: a que cabe à Assembeia da República, designadamente a da matéria fiscal, que o Governo respeita por inteiro, e a que cabe ao Governo, designadamente a da gestão de preços, de que o Governo de modo algum pode abdicar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, informo a Câmara que o Sr. Presidente da Comissão de Agricultura e Mar convoca os Srs. Deputados para uma reunião a realizar no dia 9 de Abril, às 10 horas, que o Sr. Coordenador da Subcomissão da Juventude convoca para reuniões nos dias 1 e 3 de Abril, respectivamente às 17 horas e às 17 horas e 30 minutos, e que o Sr. Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos convoca para uma reunião no dia 1 de Abril, às 18 horas.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A última intervenção parlamentar do Sr. Primeiro-Ministro e o folhetim que se lhe seguiu tiveram a virtude dos seus próprios defeitos: a virtude de terem agido como uma campainha de alarme nos que dormem sobre o que há de definitivo nas nossas conquistas democráticas.
Com a eleição do primeiro Presidente Civil, após um ror de tempo de presidências castrenses, e com o pé bem assente na Europa em que a democracia se não discute, muitos foram os que fecharam o dossier das suas preocupações quanto ao regime.
Alertados pelo alarme, perguntam-se agora se o Primeiro-Ministro e o seu Governo apenas tropeçaram no desábito das praxes ou denotaram predisposição de espírito para porem o essencial em causa.
É porventura cedo para uma resposta. Mas não para lamentar o que houve de insólito num discuso que conseguiu ser tão mau como isto: primeiro conter a demonstração de que é um erro crasso reduzir o preço dos combustíveis, ainda que só na sua componente fiscal, e ao mesmo tempo a garantia dessa redução; segundo admitir a possibilidade financeira e fiscal da
redução dos preços de alguns combustíveis e de, pelo menos, um bem essencial e, não obstante, não formalizar em proposta essa redução; terceiro, negar ao sobrepreço dos combustíveis - deduzidos os custos e as margens de comercialização - a natureza de imposto indirecto, quando, obviamente, é isso que ele é e que o próprio Governo lhe chama na sua proposta de Orçamento do Fundo de Abastecimentos; quarto, introduzir no final da discussão na generalidade da proposta de lei do Orçamento, já na iminência da votação, a figura ortorrômbica da proposta verbal de aumento das despesas sob condição de os deputados abdicarem de exercer a sua constitucionalíssima competência para alterarem a proposta de lei do Governo.
Permito-me aqui uma breve referência ao discurso do Sr. Ministro das Finanças, que acabámos de ouvir, tendo-me parecido que regressei aos meus tempos de escola primária. Pretendeu dar-nos lições e matricular-nos numa suposta escola de que seria professor, dizendo que «não permitiremos», «não consentiremos», «não embarcaremos em... ».
Mas não consente quem? Não permite quem? Não embarca quem? O Governo, a propósito do exercício normal pela Assembleia das suas competências? É isso, ou seja, que esta Assembleia exerça as suas normais e constitucionalíssimas competências, que o Governo não permite?
Ouvimo-lo também dizer que quem desejar outra política económica tem de ganhar as eleições. Será que isto significa que o Governo as ganhou por maioria suficientemente confortável para impedir que nesta Assembleia se formem maiorias contrárias ao seu desejo e à sua vontade?

Vozes do PS: -- Muito bem!

O Orador: -- Disse ainda que é este o nosso Orçamento. «Nosso» de quem? Do Governo? Mas nós temos de fazer um orçamento do Estado -- é esse que estamos a fazer -- e não um orçamento do Governo. Se este é só o orçamento do Governo, pode tratar-se de um orçamento inútil, porque do que o nosso país precisa é que o Estado disponha de um orçamento.
Disse ainda que o Governo não é nem «anónimo» nem de «responsabilidade limitada». Anónimo encarrega-se todos os dias de o não ser pelo recurso que faz a tudo quanto é meio de comunicação social.

Risos do PSD.

Acho estranho que os Srs. Deputados ainda continuem a rir-se desta afirmação, depois da afirmação extraordinária da maneira como este Governo povoa os órgãos de comunicação social em geral e o pequeno ecrã em especial.

Vozes do PSD: -- Olha quem o diz!

O Orador: -- Mas, Sr. Ministro das Finanças, de responsabilidade limitada este Governo tem de ser - limitada, naturalmente, pela Constituição e, desde logo, pelo princípio da separação de poderes que nela se consagra.
Mais uma vez realço o que já o meu camarada João Cravinho realçou: não se trata de se propor aqui a redução de preços de bens especiais, mas de exercer a competência para alterar a margem e a expressão fiscais desses preços. Não poderemos deixar que se con-

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tinue a argumentar como se não fosse assim e como
se o que estivesse em causa não fosse o exercício de
uma constitucionalíssima competência em matéria fis-
cal, mas a invenção da esfera administrativa do
Governo.
Por outro lado, lembro ao Sr. Ministro das Finanças que esta Assembleia exprime a sua vontade através de leis, as quais ou são constitucionais ou não são. Se são inconstitucionais, o Governo pode promover a declaração da sua inconstitucionalidade. Se são constitucionais, o Governo só pode fazer uma de duas coisas: respeitá-las enquanto não se demitir ou demitir-se por sentir que não é capaz de as respeitar.
Disse ainda que se tratou apenas de uma quebra de protocolo. Não se tratou, pois, só de uma quebra de protocolo, mas, no fundo -- e isso é que é grave --, de uma quebra de respeito pelas competências desta Assembleia, que ao que parece faz confusão ao Governo que sejam exercidas em liberdade e em plena independência daquilo que pensa o Governo.
Afirmou também, uma vez mais, que não consentiria nem aceitaria que destruíssemos as traves-mestras da política económica do Governo. O que é isso de destruirmos as traves-mestras da política económica do Governo? É de, em matéria fiscal, exercermos uma vez mais as nossas competências? É de fazermos aquilo que já foi feito pela generalidade dos governos da Europa, que porventura estarão a esta hora «destravejados» e com o tecto prestes a cair-lhes em cima?
Continuando o meu discurso, diria que, por outras palavras, o que o Governo nos diz é o seguinte: não propus a redução, mas, se vocês, deputados, se portarem bem e abdicarem de reduzir, eu próprio reduzirei.
Resposta natural dos partidos da oposição parlamentar:

Não abdicamos: demonstrado que existe a possibilidade financeira e fiscal de reduzir, demostrado fica o dever político de efectuar a redução e, já que o Governo a não propõe, exerceremos a nossa competência para nesse sentido alterar a sua proposta.

Que há de mais adequado, de mais legal e de mais lógico? Porventura nem o discurso do método!
A ameaça corre, aliás, o risco de se converter no expediente político predilecto do Sr. Primeiro-Ministro. Não acabámos de vê-lo,com efeito, a adejar com o papão das restrições de crédito e outras inclemências inominadas às empresas, sem excepção das privadas, que negociarem acordos colectivos acima de um dado tecto, assim limitando a sua liberdade contratual e assim espartilhando os seus critérios de justiça social?
Mas retomemos o fio da meada: ao sinal de que a maioria dos deputados não estava disposta a ceder a pressões e intimidações, o Sr. Primeiro-Ministro, imune à trégua pascal, convoca de emergência o seu governo e faz saber que está instalado na Páscoa de cada um o mafarrico de uma nova crise.
A palavra crise caiu de súbito no arroz-doce e tornou mais amargas as amêndoas. Pois como? Nem na Páscoa?!
Subitamente, o Primeiro-Ministro suspendeu a pena. Sempre na versão do Governo, o susto teria produzido nos deputados - ao menos em confortável número deles - a reacção de algum comedimento. Chegou mesmo a afirmar-se que a montanha parira um rato. Mas, como a montanha continua em trabalho de parto
e pode, de repente, parir um elefante - daí o discurso do Sr. Ministro das Finanças -, a pena foi a pena suspensa. Não houve amnistia! Se, após as aleluias da ressurreição, deputados em número que baste voltarem à teimosia de baixar o preço dos combustíveis, ainda que só na sua dimensão fiscal, sobretudo incorrendo na «demagogia» incompreensível de incluir na baixa o preço da burguesíssima gasolina, a cominação volta a ser reposta, o fantasma da crise volta a ter lençol.
O Orçamento oferece margem fiscal sobeja para que sejam mais baratos os combustíveis e o leite? Ficou demonstrado que sim. Deviam, nesse caso, os deputados tentar embaratecer esses bens? É óbvio que sim. O que se diz do leite e dos combustíveis devia dizer-se do pão, que também encareceu sempre que encareceu o petróleo, e de outros bens essenciais? Devia.
Se os deputados exercerem o direito de cumprir esse poder-dever, o Governo vai demitir-se? A minha resposta é a de que, em nome da estabilidade institucional, não desejo que o faça, como não acredito que venha a fazê-lo. Mas, se o fizer, exerce um direito tão digno de respeito como o de os deputados fazerem como melhor entendam o Orçamento que lhes cumpre fazer - a eles, não ao Executivo.
ma coisa não consegue o Governo, no que me diz respeito: tirar-me o sono. Se por absurdo se demitir, pois bem, não ficará órfã a democracia: Ficará mesmo aliviada de um governo que ou bem que a não compreende ou bem que a não respeita.
a verdade, uma de duas: ou o Governo sabe e aceita que é ao Parlamento que compete fazer o Orçamento do Estado ou não sabe.
e não sabe ou não aceita, não há nada a fazer: não podendo revogar-se a Constituição, resta o expediente de «revogar» o Governo.
e sabe e aceita, deve então bater com a mão no peito e pedir desculpa ao Parlamento e ao País: ao Parlamento, por ter tentado condicioná-lo no livre exercício das suas competências; ao País, por ter feito demagogia ao afirmar que existia o risco de o Parlamento desvirtuar o que lhe compete fazer ou se imiscuir na esfera de acção do Governo, quando do que se trata é precisamente de o Governo tentar imiscuir-se na esfera de acção do Parlamento. O risco não é, assim, o da governamentalização da Assembleia, mas o da parlamentarização do Governo!
ito isto, cumpre realçar a extrema prudência dos partidos da oposição parlamentar: primeiro, não se declarando ofendidos na sua honra por o Primeiro-Ministro ter tentado pressioná-los a deixarem passar sem retoque uma proposta de Orçamento com a qual não estão de acordo, ficando-se por uma mal contida gargalhada de surpresa; segundo, não se deixando susceptibilizar nem arrastar para atitudes de retaliação, como seria a de acentuarem a sua margem de discordância, sobretudo se traduzida em propostas realmente deformantes do necessário equilíbrio, ainda que relativo, entre as receitas e as despesas; terceiro, mostrando um tão alto sentido de responsabilidade e do primado do interesse nacional, traduzido no comedimento com que, após terem demonstrado a excepcional margem de manobra financeira de que goza este governo, alguma dela intencionalmente oculta, passaram a propor tão pouco significativas correcções nas despesas, de antemão compensadas pela expectativa segura de correcções
nas receitas.

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O Primeiro-Ministro parece recusar-se a compreender que se não trata de opor uma birra a outra birra, mas de opor uma política a outra política.
À política secamente financista do equilíbrio orçamental sobre todas as coisas opõem os partidos da oposição o tempero de alguma humanidade. O equilíbrio entre as receitas e as despesas é importante, mas a salvaguarda do equilíbrio entre as necessidades mínimas da população mais desprotegida e a sua satisfação possível, essa, é irrecusável. Como é irrecusável reduzir o peso da carga fiscal, quando se ganharam as eleições prometendo essa redução; ou aligeirar a cruz fiscal dos rendimentos do trabalho, quando se obteve o Poder para cumprir essa promessa; ou corrigir para menos os preços dos bens mais essenciais, porque desceram vertiginosamente o preço do petróleo e a cotação do dólar, quando se passaram anos a aumentá-los de cada vez que este preço e esta cotação subiam, ainda que pouco; ou negar a natureza de imposto àquilo que imposto é, na tentativa de evitar que a Assembleia faça, em vez do Governo, o que, constitucionalmente, só ela pode fazer.
E que fique bem claro -- para usar uma expressão tão cara ao Sr. Ministro das Finanças -- que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não aceita recados de ninguém, nomeadamente do Sr. Primeiro-Ministro, do Sr. Ministro das Finanças ou de todo o seu governo e do partido que o suporta, no tocante à assunção patriótica da política de austeridade necessária para evitar a derrapagem das finanças públicas. Precisamente porque travámos com coragem os demónios da dívida, soltos por quem agora pretende dar-nos lições, é que não podemos ficar insensíveis à maneira tecnocrática e fria como o Governo se propõe aproveitar o «maná» financeiro que lhe caiu do céu. Com o nosso voto, não será todo ele imolado ao betão armado e ao equilíbrio das contas, com total abstracção do sofrimento acumulado. Cada um assumirá, a esse respeito, as suas responsabilidades.
Que o Sr. Primeiro-Ministro chame a esta preocupação « frentismo de esquerda», ou se sirva dela para tentar relançar o papão comunista, é apenas outra revelação do seu pendor para sobrepor à realidade mais insofismável uma jurisprudência de falsos conceitos. Também a este respeito nos não dará lições.
Pelo contrário, fomos nós e o PRD quem lhas demos, votando na especialidade a favor de 99,4 % das despesas propostas pelo Governo, depois de o PSD e o CDS se terem antecipado a abster-se e vindo o PCP a votar contra elas.

O Sr. João Corregedor de Fonseca (MDP/CDE): - E o MDP/CDE!

O Orador: -- Se hoje temos aprovado um orçamento de despesas, fica isso a dever-se ao sentido de responsabilidade dos partidos que na especialidade o votaram. O resto é terrorismo verbal e, como não pratico a maledicência, não concluo que o PSD regressou já ao seu pendor para derrubar os seus próprios governos.

Risos do PS.

O Sr. António Capucho (PSD): -- Essa tem graça!

O Orador: -- Mas, como por vezes a demagogia consegue fazer caminho, termino com uma garantia: a de que o grupo parlamentar do meu partido, sem se
deixar pressionar e muito menos intimidar, continuará a contribuir para que o Orçamento do Estado saia daqui melhorado, não desvirtuado no seu necessário equilíbrio e, sobretudo, socialmente mais justo e mais humano.

Aplausos do PS, do PCP, do MDP/CDE e do Sr. Deputado Silva Lopes do PRD.

O Sr. Presidente: -- Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): -- Sr. Presidente, na última sessão plenária, V. Ex.ª ou quem presidia no momento - não me lembro de quem era - anunciou que hoje nos reuniríamos para discutir o Orçamento do Estado na especialidade.
Nessa conformidade, quero perguntar a V. Ex.ª se houve algum consenso dos grupos parlamentares ou alguma decisão da Mesa no sentido de se ultrapassar o artigo 213.º do Regimento e entrarmos hoje aqui numa espécie de segunda parte da discussão na generalidade.

Vozes do PSD: -- Muito bem!

O Orador: -- No caso de assim não ser, pergunto a que artigo da proposta de lei de Orçamento do Estado é que se refere esta discussão.

Vozes do PSD: -- Muito bem!

O Sr. Presidente: -- Informo o Sr. Deputado Borges de Carvalho que o que se está a processar é a discussão na especialidade dos artigos 11.º e 12.º O teor das intervenções, como V. Ex.ª compreenderá, é da responsabilidade dos Srs. Deputados.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): -- Sr. Deputado Almeida Santos, também ficarei muito grato pelo esclarecimento que V. Ex.ª possa dar ao meu colega de bancada Borges de Carvalho.

Vozes do PCP: -- E o discurso do Ministro? Pergunte ao Ministro!

O Orador: -- Bom, abrangerá também o discurso do Sr. Ministro...

Risos do PS e do PCP.

Agora, Srs. Deputados, do que não tenho dúvida é que o discurso do Sr. Ministro se referiu mais às matérias que aqui vamos tratar do que o do Sr. Deputado Almeida Santos.

Vozes do PCP: -- O Sr. Deputado é muito parcial!

O Orador: -- No entanto, o esclarecimento cobrirá também, obviamente, a intervenção do Sr. Ministro, a não ser que me queiram convencer de que o Sr. Deputado Almeida Santos fez esta intervenção porque o Sr. Ministro fez a dele.

Risos do CDS e do PSD.

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Realmente, isso seria curioso. Tenho louvado muito
a capacidade de improviso e de rapidez do Sr. Depu-
tado Almeida Santos, mas quero crer que ela não terá
ido tão longe.

Risos do CDS e do PSD.

Se o Sr. Presidente me permitisse, quero, em primeiro lugar, não dar mas prestar um esclarecimento ao Sr. Deputado Almeida Santos. É que o CDS não se antecipou a votar abstendo-se na votação dos mapas. O CDS votou depois de o PS e o PRD terem votado e votou como votou em consciência. E a questão releva de um pequeno diferendo que haverá entre V. Ex.ª e o Sr. Deputado Carlos Brito, que talvez convenha resolverem rapidamente, na perspectiva de bom relaciona-
mento em que estão agora.

Risos do CDS e do PSD.

É que, Sr. Deputado, nós entendemos na Comissão especializada, talvez um pouco de acordo com o Sr. Deputado Carlos Brito, que o que tinha sido votado no orçamento da despesa alterava significativamente a proposta de lei de Orçamento com que nos tínhamos confrontado e à qual demos o nosso voto na generalidade e que as alterações que pretendíamos introduzir-lhe não eram no sentido do aumento de despesa.
oje aqui, o Sr. Deputado Almeida Santos preocupou-se, deitando algum sumo de limão no arroz-doce, em demonstrar que não, que, antes pelo contrário, o Orçamento estava na mesma e não descaracterizado e que isso tinha sido coisa de somenos importância. Nós entendemos que não foi e por isso votámos como votámos. O voto dos outros nessa matéria, Sr. Deputado, não nos interessa.
O Sr. Deputado preocupou-se muito em distinguir leis constitucionais de leis inconstitucionais e em chamar a atenção do Governo, dos cidadãos e da Assembleia para a necessidade de dar cumprimento às leis constitucionais.
Se não me engano, enquanto durou o governo do bloco central, que aqui apresentou orçamentos e orçamentos suplementares, estava em vigor a Lei n.º 2/79, de 2 de Janeiro. Sei que a memória do Sr. Deputado Almeida Santos é estimável e surpreendente, mas gostaria de lhe recordar -- pois talvez já não se recorde -- que esta lei se refere ao problema da fixação de preços de bens, nos quais esteja incluída uma componente fiscal.
Durante o governo do bloco central, o preço das matérias-primas que entram na produção dos produtos petrolíferos sofreu, evidentemente, uma evolução, de princípio no sentido da subida e depois no da descida. 15to só a título de esclarecimento.
Pergunto o seguinte: V. Ex.ª considerou esta lei como constitucional ou como inconstitucional? Se a considerou como constitucional, que cumprimento lhe deu o governo a que o Sr. Deputado Almeida Santos pertenceu?

Vozes do CDS: -- Muito bem!

O Sr. Presidente: -- Para pedir esclarecimentos,tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): -- Sr. Deputado Almeida Santos, o Sr. Deputado -- aliás na sequência dos pedidos de esclarecimento que foram feitos ao Sr. Ministro das Finanças - teceu, para além de outras considerações sobre as quais não me vou alongar neste momento, uma crítica básica de tipo jurídico, dizendo que, em última análise, o governo não respeitava as competências da Assembleia da República.
Penso, pois, que aqui há um equilíbrio fundamental. O discurso do Sr. Ministro das Finanças foi um discurso político a uma câmara política.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: -- Não foi um discurso de um constitucionalista a um conjunto de professores de Direito. No fundo, ele colocou o problema com clareza, com simplicidade e com honestidade e penso que, nesse aspecto, o Governo deveria ser louvado e não criticado.
Afinal de contas, o que é que ele veio dizer? Veio dizer que um governo que tem um apoio minoritário não pode ter o mesmo tipo de flexibilidade e laxismo perante a Câmara porque não dispõe de maioria e, portanto, tem de colocar logo desde o princípio as coisas com muita clareza.
O Governo tem competência para propor um orçamento; o Governo não pode admitir, sem tirar consequências políticas, que o Orçamento seja completamente descaracterizado. Por isso, é importante que na discussão e na dialética que nesta Câmara se deve registar se venha, a pouco e pouco, a clarificar o que é que o Governo pode ou não aceitar do ponto de vista polí-
tico.
Ninguém está a discutir aquilo que um estudante de
ireito logo no primeiro ano saberia, ou seja, que é
Assembleia a quem cabe aprovar o Orçamento e, por-
tanto, fixar os impostos -- essa é uma matéria sobre
a qual não tem sentido estarmos a discutir. O que tem
sentido discutir são as condições em que o Governo
pode continuar a governar, porque do ponto de vista
da estabilidade política é óbvio que não se lhe pode
exigir que preste um serviço para além de determina-
dos limites.
Creio que foi nesses precisos termos que o problema foi colocado; acho que o foi com clareza e com coragem e que não há nenhuma razão para as críticas que são formuladas. A Assembleia tem de tomar isso em consideração e grave seria que o problema não tivesse sido atempadamente colocado, não em termos de nenhuma ameaça nem sequer em termos de dizer que se assim for feito a conclusão será esta ou aquela, mas sim no sentido de que há uma zona de incerteza que a pouco e pouco é preciso clarificar. Há zonas claras em que o Governo está de acordo e que correspondem ao seu programa; há questões que, sob pena de se negar a si próprio, o Governo não pode aceitar, e há toda uma zona que, a pouco e pouco, é preciso ir clarificando e o debate na Assembleia da República deve ter justamente essa missão.
Nesse sentido, penso que o Sr. Deputado Almeida Santos, cuja inteligência todos reconhecemos, não quis, neste momento, pestar atenção a este momento político fundamental. É nesta sede e não noutra que a questão se situa e não vale a pena iludirmo-la.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: -- Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): -- Sr. Deputado Nogueira de Brito, com a elegância e até com a graça que sempre coloca nas suas intervenções, pediu-me para responder ao pedido de esclarecimento formulado pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho. Ora, longe de mim intrometer-me numa tarefa que compete à Mesa, pois isso seria um atrevimento que não passaria sem uma reprimenda da quase totalidade dos Srs. Deputados. Solicitei o uso da palavra, concederam-mo, usei dele e creio que não cometi nenhum pecado. Parece que o CDS votou depois! Na verdade, esqueci de me espantar por ter admitido que tivesse votado antes -- faço essa correcção.

Risos.

Quanto ao bom relacionamento com o Sr. Deputado Carlos Brito, desculpar-me-á que não responda; essa é uma pequena brejeirice provocatória que cabe perfeitamente no debate parlamentar sem que me susceptibilize por causa disso.
Porém, já não concordo com a ideia de que as propostas em causa alteravam o Orçamento. O Sr. Deputado Nogueira de Brito menospreza a competência desta Assembleia e a margem que a Constituição lhe confere na feitura do Orçamento. Ainda estamos mal habituados, pois estamos muito próximos de 1982, altura em que esta Assembleia se limitava a fazer uma lei de meios, uma lei quase de enquadramento da matéria orçamental, competindo depois ao governo fazer o resto. 15so já faz parte do passado, Sr. Deputado, e temos mesmo que nos habituar às novidades da nossa Constituição, sobretudo quando elas são boas, como parece ser o caso.
Respondo-lhe com toda a clareza que todos nós fomos tendo consciência de que nos preços havia uma margem fiscal que era inconstitucional. Acontece que não compete aos governos levantar o problema da inconstitucionalidade das suas próprias medidas, mas nunca o Governo apareceu aqui a pretender que não eram inconstitucionais. Acontece que todos os deputados e outras entidades a que compete pôr ao Tribunal Constitucional o problema da inconstitucionalidade de uma lei entenderam que em época de «vacas magras» não era o momento de discutir esse problema. Acontece que em matéria fiscal as «vacas» engordaram um bocadinho e no primeiro momento em que elas engordam é aí que o problema se põe com toda a equidade e foi por isso que neste momento ele surgiu desta forma.
Sr. Deputado Rui Machete, estava a ouvi-lo falar e a lembrar-me da velha história do pingo de solda que todos conhecemos e que não posso contar com todo o rigor. Era uma vez um indivíduo que em casa de uma senhora muito educada andava a soldar uns canos. Ora, caiu-lhe um pingo de solda a ferver em cima das mãos, ele disse uns palavrões que não são muito curiais, a senhora zangou-se e queixou-se à entidade patronal. Então, esse indivíduo disse que apenas tinha dito: «Oh Joaquim, caíram-me uns pinguinhos de solda na mão; tem lá mais cautela!»
Ora, se o Sr. Ministro das Finanças tivesse usado esse tom cortez, simpático, meu Deus, qual de nós é que iria susceptibilizar-se com o Sr. Ministro das Finanças? Mas não foi isso! 0 Sr. Ministro veio para aqui de
dedo em riste -- aliás, é a terceira ou a quarta vez que o faz -- dizer que não consente, não permite, não embarca, não compreende, tem que ficar e aqueloutro.

O Sr. Silva Marques (PSD): -- Por isso é que ele é bom Ministro!

O Orador: -- Bom Ministro não é aquele que não respeita as competências da Assembleia da República. Para mim esse não é um bom Ministro, isto sem prejuízo de o Sr. Ministro das Finanças poder ter -- e tem certamente -- outras qualidades, mas essa falta-lhe.
O Sr. Deputado Rui Machete disse que o discurso que fiz foi de um político e não de um constitucionalista. Sr. Deputado Rui Machete, longe de mim insultar o Sr. Ministro das Finanças, supondo que ele não conhece as elementaridades da Constituição do seu próprio país. Não faço isso, mas o senhor, que é seu colega de partido, pode fazê-lo com todo o à-vontade; porém eu não!

Risos do PS.

O Sr. Deputado disse ainda que o Governo veio aqui dizer o que é que pode ou não aceitar. Ora, há uma coisa que ele tem de aceitar -- e aí é que está a nossa divergência: é que a Assembleia exerça as suas competências como melhor entende e faça o Orçamento que considere melhor para o nosso país. O Governo não tem de aceitar, mas sim de se demitir. Acredite que se assim for nenhum de nós irá pôr luto, nem ninguém irá propor aqui um minuto de silêncio.

Risos dos PS.

Sr. Deputado Rui Machete, creio que respondi às questões que me colocou com a afabilidade correspondente também com o apreço pela sua inteligência que é, seguramente, maior do que a minha.

Aplausos do PS e do deputado independente Lopes
Cardoso.

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um requerimento subscrito por dez Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do PRD, no sentido de baixar à Comissão de Defesa Nacional a proposta referente ao artigo 11.º -- suponho que essa proposta incluirá também uma proposta de aditamento com o n.º 11-A -- e que é do seguinte teor:

Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 148.º do Regimento da Assembleia da República, os deputados abaixo assinados, em número de dez, requerem a baixa à Comissão de Defesa Nacional, pelo prazo de 48 horas, das propostas referentes ao artigo 11.º e 11.º-A, a fim de ser preparado o seu debate em Plenário.

Srs. Deputados, vamos votar este requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, vamos passar à discussão do artigo 12.º
Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): -- Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.

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O Sr. Presidente: -- Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): -- Sr. Presidente,
creio que está na altura de fazermos o nosso intervalo
regimental.

O Sr. Presidente: -- Sr. Deputado, como a sessão tem início cerca das 16 horas, creio que seria preferível fazermos o intervalo às 18 horas, porque depois até às 21 horas iremos ter um período mais longo.
Portanto, faríamos o intervalo às 18 horas, a não ser que os Srs. Deputados já se encontrem cansados ou tenham razões para que se proceda de imediato ao
intervalo da sessão.

O Sr. Nogueira de Brito(CDS): -- Sr. Presidente, na realidade, não nos encontramos cansados, até porque até agora a sessão foi bastante agradável. Porém, temos uma reunião do grupo parlamentar que estava marcada para as 17 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: -- Com certeza, Sr. Deputado.
O Sr. Deputado Magalhães Mota fica então com a palavra reservada para mais tarde e vamos fazer de imediato o intervalo regimental.
Está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 25 minutos.

Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): -- Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Após a intervenção do Sr. Ministro das Finanças não pedi esclarecimentos porque me considerei esclarecido.
Posto isto, e exactamente nos mesmos termos de uma
introdução a um debate, vou também procurar fazê-la
e situar o debate que agora se vai iniciar nos termos
em que pela nossa parte entendemos dever ser colocado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seria um lugar-comum se começasse por relembrar que o Estado moderno nasce com o imposto permanente. E se o recordo é para, a traço largo e grosso, não deixar esquecer aqui e agora uma lição da História. Uma carga fiscal tida como excessiva terá estado ligada, na mesma década, à Revolução Inglesa, à França, à Revolução de Nápoles, mas não é, obviamente, destes movimentos que pretendo falar. O que quero lembrar é que foram diferentes as sequências destas movimentações sociais em França e na Inglaterra. Em França, os parlamentares que, com Luís XIV, tinham perdido a possibilidade de vetar os éditos fiscais, retomam-na quando Filipe de Orleães restaura o prestígio do Parlamento de Paris. Mas é o uso sistemático deste direito de veto que em boa parte determina a queda da monarquia. Na Inglaterra, o Parlamento adquire o direito de votar impostos, privilegia o debate orçamental, aumenta ou diminui a carga fiscal e controla o uso dos recursos obtidos.
Um historiador europeu contemporâneo conclui e explica esta evolução: se o Estado Francês sob Luís XIV era muito mais poderoso do que o inglês sob
os Stuarts, acontecia o inverso no século XVIII. É que o Ministério e o Parlamento punham-se de acordo na Inglaterra e opunham-se na França.
Não pretendo tirar qualquer moralidade da História. Contudo, gostaria de partir daqui para uma reflexão sobre este debate.
Em primeiro lugar, para recordar um princípio constitucional simples, mas que apesar de simples e elementar muitas vezes se afigura esquecido. Em Portugal, são os governos que dependem da Assembleia da República. Por vezes, maiorias, silenciosas ou silenciadas, geraram convicção inversa reduzindo os deputados à função de claque organizada, aplaudindo generosa e calorosamente como tentativa ritual de incitamento à obediência.
Mas talvez devêssemos, antes de mais, saudar o termo de tal situação.
O Parlamento é essencial à democracia e os próprios partidos políticos têm no Parlamento a sua razão de ser. Mas, se o melhor dos parlamentos fosse o que votasse sem discussão os créditos que lhe são pedidos ou as leis que lhe são propostas pelo Governo, o Parlamento não teria razão de existir. É opondo-se que se afirma. Tal e qual como os homens. E é porque, como neste debate se revelou, existe Parlamento que a democracia em Portugal se robusteceu - motivo sobejo para todos estarmos de parabéns!
No debate disse-se ser o Orçamento uma questão de confiança. Não o é. Direi mesmo que o princípio do controlo parlamentar pressupõe inversamente a ideia de que é necessário balizar a actividade dos governos, fiscalizar o modo como gerem os recursos nacionais, restringir os recursos que administrarão. Cada despesa pressupõe um sacrifício de gerações actuais ou das futuras. Numa fórmula sugestiva disse-o num debate de há pouco tempo Michel Roccard: «Quando não se fazem contas não se conta com os homens.» Nem com o futuro de um país.
Não pode um parlamento digno desse nome, nem podem os deputados a quem cabe representar o povo de que são parte, deixar de discutir verba a verba, o destino não apenas dos nossos dinheiros, mas das nossas expectativas num futuro melhor. E se há diferenças de concepção quanto ao futuro desejável, é o debate que as clarifica e a votação quem define as opções maioritárias.
É por tudo isto assim ser que não é sem alguma estranheza que estamos a acompanhar este debate. Falou-se no Orçamento como se ele fosse pertença de alguém ou de alguns e, ainda por cima, como se fosse uma coutada de entrada interdita. É no final, e só no final da votação, que haverá ou não um orçamento de Estado, que é votado livremente pela Assembleia da República e que ao Governo cumprirá executar. Não é o Governo que elabora o Orçamento, não é o Governo que o aprova.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -- Muito bem!

O Orador: - Um parlamento não é uma reunião de dadores de avisos, não é uma reunião de conselheiros chamados a opinar, mas não a decidir; não é uma câmara consultiva. Importa, pois, que isto fique claro no início do debate em que temos de aprovar as recei-
tas do Estado.

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Ao longo do debate na especialidade e das votações
em comissão foram introduzidas alterações na proposta
de lei do Orçamento. Mas talvez valha a pena recor-
dar aqui, e neste momento, que se este debate tem
lugar e se está a processar é porque dois partidos não
representados no Governo o viabilizaram e permitiram
que houvesse Orçamento do Estado. Se na sequência
da votação feita no final do debate da Comissão de
Economia, Finanças e Plano os partidos da oposição
ou, pelo menos, o PS e o PRD tivessem seguido a posi-
ção do PSD e se tivessem abstido, o Orçamento teria
sido derrotado pelos votos do PCP e do MDP/CDE
e não estaríamos neste momento nesta discussão.

Aplausos do PRD e do PS.

Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que quando
um debate se processa -- e estamos a falar de respon-
sabilidades --, então é necessário que cada um assuma
as suas e que digamos com toda a clareza que as coisas
são o que são e não o modo como pretendemos que
elas sejam. Repito que se este debate tem lugar foi por-
que dois partidos não representados neste Governo assu-
miram a necessidade de um orçamento do Estado e pen-
saram que isso é mais importante para os Portugueses
do que as suas posições próprias para que assumamos
com responsabilidade o dever de dotar Portugal e os
Portugueses de um orçamento do Estado para 1986.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao longo do debate
na especialidade foram introduzidas modificações na
proposta de lei do Orçamento e não tenhamos ilusões
nem escamoteemos questões, pois essas alterações, se
quantitativamente não são importantes -- quer dizer,
se em termos quantitativos não alteram as disponibili-
dades de que o Governo já dispunha para gerir as des-
pesas públicas e os recursos nacionais -- e não chegam
a pesar no conjunto orçamental mais do que 1 %, qua-
litativamente as alterações introduzidas são importan-
tes porque introduzem uma óptica diferente nas des-
pesas estaduais.
Em primeiro lugar, introduzem-na quando refor-
çando as dotações do capital das empresas do sector
público manifestam uma opinião maioritária na Assem-
bleia da República, de acordo com a qual o sector
público tem direito de existir em plenitude e não deve
ser artificialmente prejudicado, combatido ou abafado.

Vozes do PRD: -- Muito bem!

O Orador: -- Por isso mesmo esse reforço de dota-
ções tem esse valor simbólico e importante: representa
uma manifestação maioritária de acordo com a qual
e nos próprios termos constitucionais existem na eco-
nomia portuguesa três sectores, um sector cooperativo,
um sector privado, mas também um sector público que
não pode ser asfixiado nem abafado nem eliminado por
processos artificiais.
Em segundo lugar, reforçou-se de forma substancial
o contributo do Orçamento do Estado para as autar-
quias locais. Creio que essa proposta não merece lar-
gos considerandos justificativos: foi amplamente expla-
nada ao longo do debate e creio que por todo o País
se conhece exactamente quais são as possibilidades reais
de resposta em termos da imediata retoma da activi-
dade económica que têm as autarquias em compara-
ção com a administração central. Tanto os autarcas
de todos os partidos como os munícipes de todos os
partidos sabem tão bem como eu que assim é.
Também se reforçou substancialmente a verba dedicada ao Instituto de Acção Social Educativa. Esse reforço substancial traduziu-se num aumento de meio milhão de contos. Porém, Sr. Presidente e Srs. Deputados, até que ponto é que cada um de nós teria coragem de sustentar, sequer em termos de dizer que isso desfigura qualquer proposta, sequer em termos de dizer que isso desfigura uma proposta, que o acesso ao ensino fosse dificultado pelas carências, até ao nível alimentar, de que sofre parte da população portuguesa?

Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Disse-se que a discussão do preço dos combustíveis tem uma contrapartida em termos sociais porque lhe estaria associado o problema dos preços do leite. Talvez seja mais exacto, talvez seja necessariamente mais verdadeiro e é com certeza socialmente mais útil dizermos aqui e agora que o problema do leite passa também pelo reforço das verbas do Instituto de Acção Social Educativa.

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Orador: -- Creio que boa parte das carências alimentares de que sofrem muitas das crianças que frequentam as nossas escolas passa por esse reforço alimentar e se o problema se quer pôr nesses termos, então ponha-se aqui, que é o lugar certo.

Vozes do PRD: -- Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foram introduzidas alterações qualitativas importantes. E tão importantes que se traduziram ao mesmo tempo numa dificuldade de opção que esperamos ver clarificada ao longo deste debate: queremos saber se este Orçamento é o orçamento da Assembleia da República ou o orçamento de alguém; queremos saber se o Orçamento que estamos a votar significa realmente uma alteração importante e justificativa de uma crise ou de uma ameaça de crise ou se, pelo contrário, se trata de um qualquer «rato parido».

Vozes do PRD: -- Muito bem!

O Orador: -- Essa é uma escolha que a nós não nos compete, mas que é uma opção clarificadora que deve ser feita. E pensamos que vai longe o tempo em que algumas pessoas eram alvo de troça ou de gargalhada quando, com gritos mais ou menos histéricos, subiam para cima de uma cadeira porque tinham visto um rato.

Risos

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao longo desta discussão das receitas públicas vamos discutir fundamentalmente três matérias cruciais: os impostos sobre aplicação de capitais, os impostos profissional e complementar, o problema do preço dos combustíveis.
Comparando duas questões, direi que temos natural estranheza por ver invocar argumentos em relação a uma redução do imposto profissional que não vemos sustentados a propósito do imposto sobre aplicação de capitais.

Vozes do PRD, do PS e do PCP: -- Muito bem!

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O Orador: -- Vamos ver que uma isenção aplicada em relação ao imposto de capitais se prolonga ao longo dos anos, que portanto estão em causa não apenas os oito ou nove milhões de contos do imposto profissional, mas várias dezenas de milhões de contos. Para termos uma noção quantitativa do que está em causa, num défice de 580 milhões de contos, 8 milhões de contos talvez não sejam tal motivo de escândalo.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, também creio que está em causa saber até que ponto é que a Assembleia da República pode modificar um programa de Governo. Gostaria de relembrar aos mais distraídos que nesse ponto a Assembleia da República estará particularmente à vontade.
Se quiserem recordar a edição distribuida do Programa do Governo, poderão encontrar, a p. 17, que, para fomentar a poupança das famílias, haverá que sus- citar a imaginação, a iniciativa; haverá que encontrar uma série de ofertas que possam corresponder às possibilidades de consumo geradas.
Creio que está aí um desafio. Porém, aí ainda estamos no campo da imaginação e da vontade. Mais clara é a p. 19, quando, criticando, e bem, o sistema fiscal e salientando que a sua complexidade é incompatível com a eficácia e a transparência que deve presidir ao relacionamento entre o Estado e os cidadãos -- estamos de acordo com esta crítica --, se diz que um dos objectivos do Governo é a aplicação de taxas suaves aos rendimentos do trabalho.
Estamos de acordo e não estamos a fazer qualquer entorse ao Programa do Governo, pois estamos a aplicar taxas suaves aos rendimentos do trabalho -- não tão suaves como pensamos ser desejável, mas as taxas possíveis na actual conjuntura.

O Sr. Carlos Brito (PCP): -- Muito bem!

O Orador: -- E qual de nós resistirá também a dizer às pessoas que têm uma carga fiscal injusta e que neste momento estamos em condições de a aliviar?
Creio que a questão não é, inclusivamente, uma questão técnica, mas exclusivamente política. O que consta do Programa do Governo não é com certeza uma questão técnica, pois o Governo também pensou que teria meios técnicos para fazer o mesmo que a Assembleia ora se propõe fazer. Portanto, a questão é política: é que possivelmente o Governo gostaria de ser o único distribuidor de benesses neste país.

Aplausos do PRD do PS e do PCP.

Quanto ao problema dos combustíveis, teremos ocasião de dele tratar. Contudo, recordaria que, ao contrário do que foi dito, já a Lei n.º 2/79 -- e podemos recordar esse debate -- reivindicava para a Assembleia da República a componente fiscal de todos os preços e não apenas dos preços dos combustíveis. Tal quer dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que longe vai o tempo em que os governos podiam manipular preços à vontade; que longe vai o tempo em que os governos poderiam, por exemplo, através do Fundo de Abastecimento (agora extinto), promover importações a preços mais baixos para com isso praticar políticas que,com certeza, poderemos considerar sociais.
Não é possível, neste momento, praticar uma política de importações, porque, em termos dos tratados internacionais que celebrámos, mesmo que uma importação fosse feita a preços mais baixos que os da CEE,
teríamos de pagar o mesmo preço por ela. Todos sabemos isso e não vale a pena mistificar ou iludir
questões.
Assim sendo, não vale a pena pensar-se que são coisas diferentes os chamados preços políticos e a componente fiscal desses mesmos preços. Não há preços políticos sem essa componente fiscal e essa componente pode e deve, porque é de sua competência exclusiva, passar pela Assembleia da República.
Que a Assembleia da República diga, muito claramente, que isso é com ela, que a administração de preços é com o Governo, mas que a administração da componente fiscal de cada preço é da competência, e da competência exclusiva, da Assembleia da República, isso é apenas o desenvolvimento de um preceito constitucional largamente reivindicado pela Assembleia da República, com o antecedente claro que estou a citar, isto é, o da Lei n:º 2/79, cuja origem e debate que lhe esteve subsequente vários Srs. Deputados se lembrarão com certeza.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio ser tempo de terminar e fá-lo-ei dizendo, muito simplesmente, que num debate como o do Orçamento várias e muitas coisas ìmportantes estão necessariamente em causa.
Porque assim é, o problema não é o de gerar crises artificiais ou de provocar golpes de teatro. Não é isso o assumir de responsabilidades, o enfrentar dos problemas ou o responder às solicitações e aos desafios que nos coloca uma situação de um país que é o nosso e de um povo a que pertencemos. Pelo contrário, se a noção de estabilidade tem valor -- e esta noção só tem valor instrumental --, então é preciso que a estabilidade seja assumida responsavelmente por todos, sendo que assumir responsavelmente a estabilidade significa não aproveitar o primeiro pretexto para desencadear artificialmente crises.
Sr. Presidente, Srs.Deputados: Nunca numa discussão orçamental está em causa uma tomada de poder. Porém,, numa discussão orçamental está sempre em causa uma devolução do poder a um povo que é soberano e que por isso tem o direito e exige o dever de os seus deputados discutirem cada receita e cada despesa, pois elas representam o seu sacrifício e a sua contribuição para o progresso colectivo.

Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: -- Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Alípio Dias.

O Sr. Alípio Dias (PSD): -- Sr. Deputado Magalhães Mota, a propósito do tom dramático que perpassou na fase inicial da sua intervenção, gostaria de lhe colocar a seguinte questão: o que é que teria acontecido se, por hipótese, aquando da discussão e votação do orçamento das despesas, verificada na Comissão de Economia, Finanças e Plano, o Orçamento não tivesse sido aprovado?
Gostaria também de aproveitar este ensejo de formular a anterior questão para, em Plenário, esclarecer novamente o sentido de voto do PSD. Com efeito, o PSD absteve-se porque considerou, como na altura foi salientado, que o orçamento das despesas que tinha sido aprovado não era o orçamento que, de algum modo, satisfazia e dava resposta às despesas que o PSD gostaria de ver aprovadas na Comissão.

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Por outro lado, Sr. Deputado, à medida que se foi processando a sua intervenção, fomos ficando um pouco na dúvida se, efectivamente, já estávamos a discutir cada um dos artigos na especialidade. 15to porque o Sr. Deputado atacou em primeiro lugar o imposto de capitais, depois o problema dos combustíveis e assim sucessivamente.
Obviamente que gostaríamos também de tomar posição nessas matérias, mas, salvo melhor opinião e de harmonia com o programa de trabalhos que foi aprovado, falaremos disso depois, em tempo oportuno.

O Sr. Presidente: -- Visto que há mais Srs. Deputados inscritos para formularem pedidos de esclarecimento, presumo que o Sr. Deputado Magalhães Mota pretenderá responder no fim, não é verdade?

O Sr. Magalhães Mota (PRD): -- Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: -- Tem então a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): -- Efectivamente, como referiu o Sr. Deputado Alípío Dias, o Sr. Deputado Magalhães Mota, um pouco contraditoriamente com aquilo que tinha proposto em relação à ordem de trabalhos, referiu-se predominantemente à matéria dos impostos, a qual achava dever ficar para o fim. Porém, isso não tem grande importância.
Agora, há uma questão sobre a qual gostaria de saber qual é, exactamente, o seu pensamento. Trata-se do seguinte: o Sr. Deputado citou a Lei n.º 2/79, de 3 de Janeiro, referindo ser ela um exemplo da distinção entre aquilo que é imposto e aquilo que são as receitas não tributárias, Efectivamente, no seu n.º 3 diz-se que, para efeitos dessa distinção:

Entende-se por fiscal a componente do preço de um produto de que resulta receita para o Estado ou qualquer outra entidade pública, excluindo-se portanto os diferenciais que visem compatibilizar preços ou regularizar o abastecimento do mercado.

15to significa que, enquanto não alterarmos a lei -- é evidente que a Assembleia da República o pode fazer -- o problema dos combustíveis não tem nenhuma componente tributária. Portanto, é preciso alterar a lei para que os combustíveis passem a ter uma componente tributária, o que significa que o Governo está a agir legitimamente enquanto, considerando em vigor uma lei da Assembleia da República, entende que não há, neste caso, matéria tributária.
Quando a Assembleia modificar a lei -- tem plena legitimidade para o fazer agora --, então passará a haver matéria tributária. No entanto, quem está a cumprir o ordenamento jurídico e uma lei desta Assembleia é o Governo.

Vozes do PSD: -- Muito bem!

O Sr. Presidente: -- Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): -- Sr. Deputado Magalhães Mota, pretendia formular-lhe um pedido de esclarecimento, sobretudo relativo à lógica das instituições que o Sr. Deputado abordou
Não vou referir-me à coerência ou incoerência do voto do PSD, a propósito das despesas, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, pois um colega meu já acabou de explicar a nossa posição, que, aliás, nem poderia ter sido diferente.
Com efeito, o Sr. Deputado Magalhães Mota fez-nos uma observação, que, no seu rigor, traduz uma incoerência da sua parte, perguntando porque é que o PSD se tinha abstido. Na verdade, não tinha sentido o voto favorável do PSD, dando um juízo positivo a um documento que estava a ser alterado sem se ter ainda a ideia da alteração global. Só em sede de alteração global e final é que tem sentido a emissão de um juízo definitivo, sobretudo quando estão a decorrer propostas que não são as da nossa preferência. Assim, a incoerência seria votar de outro modo.
Pondo agora de lado esse problema, disse o Sr. Deputado, e a meu ver bem, que os parlamentares se afirmaram relativamente à questão fiscal pelo menos autorizando e até fixando impostos -- sem dúvida!
O Sr. Deputado referiu, inclusivamente, que na França o Parlamento e o Governo se opunham e que na Inglaterra conjugavam esforços. No entanto, isso já seria suficiente para nos colocar de pré-aviso, sendo certo que pertencemos também à Europa latina.
Mas pondo de lado esse problema, isto é, pondo de lado a eventualidade de ser bom seguirmos o exemplo anglo-saxónico, queria formular o seguinte pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Magalhães Mota: quando os parlamentares não abdicavam do seu direito conquistado (e com quantas lutas e sacrifícios) de se pronunciarem sobre os impostos, havia também o mecanismo da moção de confiança, Sr. Deputado? Havia o mecanismo da viabilização do Governo?
De facto, nessas circunstâncias, a questão do imposto era uma questão decisiva. Mas quando um sistema institucional contém o mecanismo da viabilização de um governo, terá sentido que o Parlamento, pela via do Orçamento, inviabilize aquilo que viabiliza numa outra sede?
É esta a questão que está em debate com as suas repercussões institucionais e é aí que é pertinente a acusação, ou pelo menos a eventual acusação, de o Parlamento se colocar numa posição de obstrução, isto é, de não fornecer uma proposta alternativa em termos de governo e de se colocar numa posição obstrucionista de não deixar fazer, pela via orçamental, aquilo que quis deixar fazer viabilizando o Governo.
Do ponto de vista institucional, é esta a questão e é aqui que é pertinente a eventual acusação de obstrução, ou seja, não deixar fazer aquilo que aparentemente se quis deixar fazer.

O Sr. Presidente: -- Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): -- Começaria por responder ao Sr. Deputado Alípio Dias e agradeço-lhe, desde já, a explicação que forneceu à Câmara sobre o sentido da abstenção do PSD. Agradeço-lhe necessariamente, porque eu próprio partilho da interrogação que o Sr. Deputado começou por formular e que alguns Srs. Deputados também formularam: o que teria acontecido se o PS e o PRD tivessem seguido o exemplo do PSD e tivessem pensado que a abstenção era o melhor caminho? De facto, esta discussão não teria tido lugar e aí estamos confrontados com o sentido útil dessa votação.

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No entanto, o Sr. Deputado Alípio Dias acrescentou um factor de perplexidade àqueles que eu já tinha: é que me explicou que o sentido da abstenção feita significava a importância das alterações introduzidas durante o debate.
Estou de acordo com a importância dessas alterações em termos qualitativos e já disse que não o estava em termos quantitativos, mas a minha dúvida crucial é esta: sete horas depois dessa deliberação, o Grupo Parlamentar do PSD estava na posição inversa.
Quer dizer, foi ao longo destas sete horas de reflexão noctura apurada que o Orçamento deixou de ser nosso,destas bancadas, para ser também vosso e desta Assembleia da República? Foi nessas sete horas que a abstenção deixou de ter sentido e que afinal o tal rato apareceu ou o que é que ocorreu durante essa vigilância noctuma que modificou o sentido dessa abstenção? Foi ela importante ou não; teve ela razão de ser ou não teve? Continuo na dúvida, Sr. Deputado Alípio
Dias.
Os Srs. Deputados Alípio Dias e Rui Machete interrogaram-se sobre a sistemática do meu discurso e eu, tive o cuidado de explicar que ia fazer esta intervenção porque tinha ficado esclarecido -- e por isso não tinha pedido esclarecimentos -- face ao discurso do Sr. Ministro das Finanças. Portanto, o meu enquadramento sistemático é exactamente o mesmo do do Sr. Ministro.
Quanto à questão da Lei n.º 2/79, levantada pelo
Sr. Deputado Rui Machete, gostaria de lhe relembrar,
exactamente, o sentido da referida lei, começando pelo
seu artigo 1.º
De facto, a Lei nº. 2/79, não 'foi cumprida. Como o Sr. Deputado Rui Machete se recordará, o nº. 1 do artigo 1.º da Lei nº. 2/79 dizia:

Os actos administrativos de fixação de preços de produtos, dos quais faça parte uma componente de natureza fiscal, praticados ao abrigo da legislação em vigor, devem ser fundamentados e conter uma precisa discriminação dos componentes dos novos preços [...]

Assim,, verificamos que o n.º.1 não foi cumprido.
Quanto ao nº. 3, este diz o seguinte:

Entende-se por fiscal a componente do preço de um produto de que resulte receita para o Estado ou qualquer outra entidade pública [...]

Então dos combustíveis não resulta uma receita para
o Fundo de Abastecimento? E não é ao Fundo de
Abastecimento que o próprio Orçamento do Estado vai
buscar uma importância significativa para aumentar as
suas receitas?
Então o Fundo de Abastecimento é uma instituição de caridade pública que cede dinheiro ao Orçamento do Estado ou uma instituição de solidariedade social? Qual é a qualificação do Fundo de Abastecimento?

O Sr. Rui Machete (PSD): -- Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: -- Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Machete (PSD): -- Sr. Deputado, as leis têm as suas regras de interpretação e uma delas é a de as ler até ao fim, não é verdade?

O Orador: -- Com certeza.

O Sr. Rui Machete (PSD): -- Ora, o que se diz na parte final do n.º 3 é o seguinte:

[...] excluindo-se portanto os diferenciais que visem compatibilizar preços ou regularizar o abastecimento do mercado.

E é para isso que servem actualmente os preços...

O Orador: -- Os preços dos combustíveis correspondem a compatibilizar preços com o mercado internacional, com o preço de aquisição das ramas?!

O Sr. Rui Machete (PSD): -- Ou regularizar o abastecimento do mercado.

O Orador: -- Com quem é que se compatibilizam esses preços, Sr. Deputado?
Creio que é esse, precisamente, um dos problemas que nos afecta e que afecta os Portugueses, isto é, não há compatibilização de preços com os mercados.
Diz ainda o Sr. Deputado que se trata de regularizar o abastecimento. Mas houve alguma crise de abastecimento nos últimos tempos? Há algum problema de aquisições? É isso que está em causa?

Aplausos do PRD e do PS.

De facto, não sou um consumidor de combustíveis, mas não tenho essa noção dos acontecimentos.
Quanto ao Sr. Deputado Silva Marques, creio que a sua intervenção tem realmente muito interesse, mas tem algumas particularidades, também especialmente relevantes, precisamente no capítulo da lógica das instituições. 15to porque o Sr. Deputado Silva Marques, em intervenção complementar à do Sr. Deputado Alípio Dias, me vem dizer que a vossa abstenção teve sentido porque ainda não sabiam o que ia acontecer; na lógica das instituições, o que ia acontecer, se o quadro das despesas não tem sido aprovado, era que não estávamos hoje nesta discussão, sendo isso consequência directa da abstenção do PSD, pois não compete aos partidos não representados no Governo apoiar a expressão orçamental. É essa a lógica das instituições.
Quando o Sr. Deputado me fala da inviabilização
pela via orçamental, creio que está a misturar questões
e talvez valha a pena dilucidar essa questão, a qual tem
alguma importância.
O Sr. Deputado confunde a discussão do Orçamento com a discussão de uma moção de confiança, quando não há uma moção de confiança, nem explícita nem implícita, na discussão orçamental. Pretende o Sr. Deputado sugerir ao Governo que a ponha? Eu não cairia nessa tentação, mas o Sr. Deputado lá sabe o que é que pretende fazer.

O Sr. Silva Marques (PSD): -- Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: -- Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): -- Sr. Deputado, se se parte do princípio que o Orçamento não é do Governo mas do Parlamento, tinha toda a coerência a nossa abstenção. 15to porque os senhores é que estavam a fazer

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o Orçamento -- primeiro ponto. E isto independentemente das extrapolações que daqui se podem tirar -- estou a procurar entrar no seu raciocínio.
Por outro lado, se o Parlamento não tivesse possibilidades, como aconteceu na história do parlamentarismo que o Sr. Deputado referiu, de fazer cair o Governo, tinha sentido que o Parlamento fizesse uma questão fechada do Orçamento, pois era uma questão de autodefesa -- era a única autodefesa. Porém, num sistema em que o Parlamento pode demitir o Governo, não tem sentido essa posição estrita relativamente à questão do Orçamento.

O Orador: -- Sr. Deputado, apreciei uma expressão que proferiu: «que estava a procurar». Aprecio as suas tentativas, mas creio que, de facto, não conseguiu encontrar.

Risos.

O que gostaria de lhe dizer era, exactamente, o seguinte: o que está em causa numa discussão orçamental é precisamente, e só, a discussão orçamental. Tal quer dizer que as consequências constitucionais, jurídico-legais, da não aprovação do Orçamento seriam que, pura e simplesmente, continuaríamos a viver num regime de duodécimos. Não há outras consequências a tirar em termos jurídico-formais puros. As consequências políticas serão outras, mas, em termos jurídico-formais, não se podem tirar outras consequências.
A discussão do Orçamento não tem acopulada qualquer questão de confiança. E é por isso que lhe digo que, na lógica própria dessa discussão, o Orçamento é um Orçamento votado pela Assembleia da República. Se, por acaso, o Governo entende que a sua proposta orçamental foi tão grandemente prejudicada, então incumbe ao Governo explicitar porquê, traduzir o seu pensamento, explicar rigorosamente onde é que, em termos quantitativos e qualitativos, essas diferenças se verificaram.
Creio que essa é uma obrigação que lhe corresponde, é uma obrigação de clarificação deste próprio debate. Com efeito, não pode limitar-se a dizer que a Assembleia está a ultrapassar a sua esfera de competência, que está a entrar no seu campo próprio...

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): -- Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: -- Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): -- Sr. Deputado Magalhães Mota, está V. Ex.ª a manifestar o seu aplauso ao discurso proferido há pouco pelo Sr. Ministro das Finanças, não é verdade?

Risos.

O Orador: -- Sr. Deputado, penso que isso é um excesso de boa vontade da sua parte no apoio ao Governo.

Risos.

O Sr. Carlos Brito (PCP): -- Que grande colagem! Eles bem precisam de ajuda!

O Orador: -- Continuando na interpretação tentada pelo Sr. Deputado Silva Marques, direi que não está em causa mais do que isso e, portanto, isso importa para a clarificação deste debate.
Não dramatizemos estas questões. Tratemos delas com seriedade e com eficácia, porque é isso que nos é exigido. Não vamos é dizer que a Assembleia da República invade competências quando ela está rigorosamente no campo das suas competências e ainda ninguém demonstrou o contrário.
Portanto, não digamos que estamos aqui a fazer qualquer ultrapassagem, nem confiramos à Assembleia da República o papel de simples visionadora de qualquer proposta de lei, mesmo que essa proposta de lei seja a proposta orçamental.
Se em qualquer discussão de uma proposta de lei a Assembleia da República tem o direito e o dever de a discutir, de a aprofundar e de chegar a conclusões -- e só há uma lei votada pelo Parlamento quando ela resulta do debate e da votação --, por maioria de razão, porque quando se discute um orçamento, em que estão em causa perspectivas futuras e contribuições que se pedem a cada um e a todos os portugueses -- ou pelo menos deveria ser assim em termos de justiça fiscal --, quando isso está em causa, mais se compreende o direito e o dever de um Parlamento de discutir cada uma dessas verbas e de as assumir como suas.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, vai ser lido um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

Foi lido. É o seguinte:

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos

Em reunião realizada no dia 1 de Abril de 1986, pelas 18 horas, foram observadas as seguintes substituições de deputados:

Solicitada pelo Partido Social-Democrata:

Rui Manuel Oliveira e Costa (círculo eleitoral de Lisboa) por João Manuel Alves Nunes do Valle. Esta substituição é pedida por um período de quinze dias, a partir do dia 1 de Abril corrente, inclusive.

Solicitada pelo Partido Socialista:

Teófilo Carvalho dos Santos (círculo eleitoral de Lisboa) por António Manuel Chambica de Azevedo Gomes. Esta substituição é motivada pelo falecimento do Sr. Deputado Teófilo Carvalho dos Santos, a partir de 24 de Março último, inclusive. Em consequência, passa a assumir funções de deputado com carácter definitivo o Sr. Deputado João Cardona Gomes Cravinho, que até àquela data exercia o mandato em regime de substituição.

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Solicitada pelo Partido Renovador Democrático:

Carlos Jorge Mendes Correia Gago (círculo eleitoral de Lisboa) por Rui José dos
Santos Silva. Esta substituição é determinada, nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), a partir do dia l de Abril corrente, inclusive.

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

A Comissão: Secretário, António Sousa Pereira (PRD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) -- João Domingos Fernandes Salgado (PSD) -- José Maria Peixoto Coutinho (PSD) -- Henrique Rodrigues da Mata (PSD) -- Manuel José Marques Montargil (PSD) - Carlos Manuel Luís (PS) -- Joaquim Carmelo Lobo (PRD) Carlos Alberto Correia Rodrigues Matias (PRD) -- Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) -- José Manuel Antunes Mendes (PCP) -- João Cerveira Corregedor da Fonseca (MDP/CDE).

O Sr. Presidente: Está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, trago ao conhecimento de VV. Exas. que o Sr. Presidente da Comissão de Equipamento Social e Ambiente convoca uma reunião da mesma para o dia 2 de Abril, pelas 16 horas.
De igual modo, o Sr. Presidente da Comissão Even-
tual para o Acompanhamento da Situação em Timor-
Leste, deputado Vítor Crespo, convida os seus mem-
bros para uma reunião a levar a efeito no dia 3 de
Abril, pelas l0 horas.
Também o Sr. Presidente da Comissão de Defesa
Nacional convoca os Srs. Deputados que a integram
para uma reunião no dia 9 de Abril, pelas 10 horas
e 30 minutos.
Para uma intervenção,tem a palavra o Sr. Deputado
Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas -- (PCP): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A atitude que o Governo tem vindo a assumir ao longo da dis-
cussão e votação do Orçamento do Estado e das grandes opções do Plano e a escandalosa instrumentalização que tem exercido sobre os órgãos de comunicação social ao serviço da sua propaganda tornam necessário que se ponham os pontos nos «is» e que se diga claramente: pretendendo a Assembleia da República dar resposta, no exercício das suas competências, a alguns graves problemas nacionais, o Governo recorre à chantagem e à intriga para paralisar os trabalhos parlamentares ou condicionar a livre decisão dos deputados. Mas afinal o que é que aconteceu na Assembleia da República no decurso da passada semana? Um facto positivo inteiramente constitucional: a Assembleia da República reforçou as dotações para o sector público; reforçou consideravelmente as verbas para as autarquias, para a Acção Social Escolar e para as universidades; corrigiu injustiças cometidas pelo Governo contra aposentados e reformados da função pública; concedeu verbas para o apoio à pesca e o combate à poluição; fez justiça à ANOP. Pela primeira vez votou verbas para garantir o acesso ao direito, preocupou-se com a recuperação de tóxicomanos e garantiu o prosseguimento das abras do Hospital do Patrocínio, de Évora, há muito paralisadas.
Trata-se, como se vê, de medidas absolutamente positivas e necessárias, como bem reconheceram as comissões parlamentares especializadas.

Vozes do PCP: -- Muito bem!

O Orador: -- Para preparar essas propostas
desenvolveu-se na Assembleia da República um traba-
lho responsável e intenso. E como é que o Governo
reagiu a este trabalho? Logo que teve notícia das pro-
postas desencadeou um Conselho de Ministros extraor-
dinário, proeurou obstruir a marcha dos trabalhos da
Comissão de Economia, Finanças e Plano, espalhou o
alarme na comunìcação social, simulou uma crise,
fazendo constar que o Primeiro-Ministro poderia demitir-se.
Numa palavra: uma grande operação de histeria e chantagem sobre a Assembleia da República.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): Para o PCP é chantagem o Primeiro-Ministro dizer que se demite?!

O Orador: -- Felizmente, os deputados não se deixaram intimidar. Aquelas justas medidas foram aprovadas e, insolitamente, o Governo, que tinha encenado o psicodrama da demissão, «mandou» os seus deputados absterem-se, retirou-se momentaneamente da cena e incumbiu o Grupo Parlamentar do PSD de dar uma incolor conferência de imprensa.
Hoje, ao ouvi-lo, dir-se-ia que o Sr. Ministro das Finanças esteve ausente durante a semana passada. Já não fala dos horrores das alterações orçamentais da despesa, parece que já as digeriu.
Mas, ao mesmo tempo que se mostra acomodado em relação às alterações de ontem, repete, em relação às possíveis alterações de hoje, a mesma grande encenação, com os mesmos amuos, as mesmas ameaças, a mesma inqualificável pressão e a chantagem já conhecida.
E tudo isto (repito) para impedir que sejam tomadas medidas de grande alcance social e de rigor e verdade orçamental.

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Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Está aqui em causa, como já foi sublinhado pela minha bancada, não só a competência constitucional, mas também a vontade política da maioria da Assembleia da República.
É com ela que o Governo não se conforma.
O Governo não se resigna a perder sacos azuis com que «secretamente» contava para levar a cabo operações demagógico-eleitoralistas.
Este Governo de classe não se resigna a ver diminuída a carga fiscal que pesa sobre os trabalhadores, nem aceita uma mais justa carga fiscal sobre o grande capital e os altos rendimentos, que se propunha diminuir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E não quer sobretudo, contra tudo e contra todos, que a Assembleia da República chame a si uma acção decisiva para a baixa dos preços dos combustíveis, necessária à dinamização da economia e ao alargamento do mercado interno.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Dói-lhe que seja a Assembleia da República a decidir que o remanescente seja destinado ao pagamento da dívida, de grande responsabilidade do PSD, e à diminuição do défice orçamental.
O Governo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não se resigna a ser só o que é: um Governo minoritário, que tem de buscar em cada dia condições para atingir o dia seguinte.
Mas está a fazê-lo, porém, por um caminho muito perigoso para o País. O caminho do afrontamento institucional, da multiplicação de crises artificiais, da contra-informação. Numa palavra: da desestabilização.
Este caminho não pode ser aceite. A Assembleia da República deve lançar mãos ao trabalho e não aceitar outras traves-mestras que não as que decorrem da Constituição e do interesse nacional.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É nesse sentido, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que continuaremos a empenhar os nossos esforços.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e da Deputada Independente Maria Santos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para pedir esclarecimento, o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Carlos Carvalhas, duas frases do seu discurso levam-me a fazer-lhe um pedido de esclarecimento.
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado classificou de chantagem a atitude do Governo. Mas chantagem porquê se o que o Governo fez foi falar claramente? Por que é que o Sr. Deputado classifica de chantagem aquilo que é frontalidade?

O Sr. José Magalhães (PCP): - São rosas...

O Orador: - Será um vício de interpretação da sua parte, em consequência também de um vício de racio-
cínio relativamente à interpretação do que se passa ao seu redor no mundo? Como é que é possível o Sr. Deputado classificar de chantagem aquilo que é frontalidade?
Depois, o Sr. Deputado, relacionando a posição do Governo com a questão dos preços dos combustíveis, disse que este Governo era um «Governo de classe». Bom, quando a União Soviética, apesar de hoje o barril de petróleo custar praticamente 10 dólares, continua a cobrar aos Países de Leste 28 dólares, qual é, então, a classe do Governo da União Soviética?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas, para responder.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Deputado Silva Marques, acabei de contar a história do que se passou, com alguma minúcia e lentidão, mas também com alguma brevidade, já que ela é conhecida de todos os Srs. Deputados.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem êxito! ...

O Orador: - Mas, pelos vistos, não tive êxito, como aqui estão a dizer. Ou o Sr. Deputado Silva Marques não conseguiu captar a história ou, então, quer esquecê-la...
Mas o Sr. Deputado votou e absteve-se. Fez uma acção de votação com abstenção.
Ora, o que é que veio aqui dizer o Sr. Ministro das Finanças, que entrou naquela Comissão com aquele ar solene... Veio dizer:

Tenham atenção, Srs. Deputados, porque o consumo interno pode disparar 0,2 % com o desagravamento dos impostos sobre os rendimentos do trabalho e, inclusivamente, pedimos que, em Setembro, a Assembleia da República, juntamente com o Governo, possa vir a dar resposta a estes anseios.

O que é que o Sr. Ministro das Finanças fez...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - ... senão dizer ao País que se enganou, que enganou o País ...

Protestos do PSD .

... e que as projecções macro-económicas das grandes opções do Plano estavam erradas?
E depois o que é que o Governo fez? Fez chantagem, isto é, desencadeou à pressa um Conselho de Ministros, fazendo constar na comunicação social que o Primeiro-Ministro se ia demitir.
Mas parece que, afinal, o que o Governo queria era diminuir os preços dos combustíveis. Só que a Assembleia da República, no exercício das suas competências próprias, antecipou-se e apresentou na Comissão um projecto para diminuir a carga fiscal, que terá como consequência a redução dos preços dos combustíveis.
Relativamente à segunda questão que me pôs, só lhe posso dizer que o Sr. Deputado fez a sua habitual chicana, mostrou a sua ignorância e o seu anticomunismo primário...

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O Sr. Silva Marques (PSD): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - ... e recebeu algumas palmas dos ultramontanos. Mas, ultramontanos por ultramontanos, está muito bem encostado. Portanto, fique com eles!...

Aplausos do PCP.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Silva Marques (PSD): - Para defesa da honra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Uso da palavra para exercer o direito de defesa, não porque o Sr. Deputado Carlos Carvalhas tenha liberdade de ofensa - não o consegue -, mas para defesa do próprio Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
Tenho aqui uma fotocópia de uma das páginas da revista News Week, de Março de 1986...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Bela fonte!...

O Orador: - Mesmo não vos servindo a fonte, neguem, de qualquer modo, a realidade destes factos: segundo o contrato entre os países da Europa de Leste e a União Soviética, para efeitos de fornecimento do petróleo soviético, o preço que esses países de Leste pagam - e quase era tentado a dizer «que esses pobres e infelizes países de Leste pagam»...

Risos do PSD.

... -, acorrentados a um contrato leonino, é a média do preço do petróleo nos últimos cinco anos.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faz favor. Concedo-lhe uma liberalidade que o Sr. Deputado não me concedeu há pouco.

Risos do PSD.

O Sr. Carlos Carvalhas (PSD): - Então prescindo, Sr. Deputado.

Risos do PSD.

O Orador: - Oh! Ficou zangado por esta simples brincadeira!...

Risos do PSD.

Não apreciou a liberalidade, mas espero que passe
a apreciar a liberdade.

Risos do PSD.

15to são factos, Sr. Deputado! O preço que os.pobres e infelizes Países de Leste ainda continuam a pagar hoje à União Soviética é de 28 dólares o barril, quando o preço do barril de petróleo neste momento é praticamente 10 dólares.

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Sr. Deputado, quando os senhores são incapazes de responder com factos e com uma argumentação clara a estas realidades, a vossa credibilidade é nenhuma, mesmo que se socorram do argumento de que isso não é assunto nacional, mas sim estrangeiro. Resta até saber se isso é rigoroso do vosso ponto de vista.
Mas mesmo que o fosse, tratando-se, ainda por cima, do petróleo, que não tem produção nacional, os senhores tinham a obrigação intelectual de discutir estas questões com factos e com argumentos claros e não refugiarem-se no puro insulto, que foi o que o Sr. Deputado tentou fazer relativamente ao meu pedido de esclarecimento.

Aplausos do PSD e do deputado independente Borges de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas, para dar explicações.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Deputado Silva Marques, estamos aqui num debate sério e viemos trazer questões sérias.
O Sr. Deputado, que veio aqui com a voz da News Week, parece mostrar que está a trabalhar para alguém, que o seu discurso foi encomendado, mas mostrou também uma grande ignorâcia e fez aquilo a que se chama anticomunismo primário.
E quando digo que mostrou ignorância não é por isso que está a dizer; é porque - e posso desmonstrar-lho com documentos e com informação séria, objectiva e científica...

Risos do PSD.

... - aquilo que está a dizer é,
pura e simplesmente, asneira, burrice.

Protestos do PSD.

E é pena que um deputado se sirva da imprensa não científica, como o é a revista News Week, para vir aqui fazer anticomunismo primário, recebendo as palmas dos ultramontanos. Mas torno a dizer-lhe: o senhor é ultramontano, portanto fique com os ultramontanos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontra-se na Mesa uma proposta de substituição relativa ao artigo 12.º, apresentada pelo PSD, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

Proposta de substituição

ARTIGO 12.º

(Saldos do capítulo 60.º do Orçamento do Estado para 1985)

Os saldos das dotações afectas às rubricas da classificação económica 39.00 «Transferências - Empresas públicas», 65.00 «Activos financeiros» e 71.00 «Outras operações financeiras», inscritas no Orçamento do Estado para 1985, no capítulo 60.º do Ministério das Finanças, poderão ser excepcionalmente depositados em conta especial de operações de tesouraria e utilizados na liquidação das respectivas despesas.

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O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

Tem a palavra, para intervir, o Sr. Deputado Próspero Luís.

O Sr. Próspero Luís (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção é apenas para dar uma curta explicação sobre a razão de ser da proposta de substituição que o Grupo Parlamentar do PSD apresentou.
A alteração proposta é no sentido de eliminar uma frase que existe no texto da proposta do Governo para este artigo, que propõe que esses saldos sejam contabilizados como receita do Estado.
Efectivamente, não se nos afigura absolutamente necessária essa contabilização, pois parece-nos que desta forma é mais fácil a utilização das verbas para acorrer ao reforço de certas rubricas para que estavam já destinadas no Orçamento do Estado para 1985.

O Sr. Presidente: - Também para intervir, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou referir-me à proposta de substituição que foi agora apresentada pelo Partido Social Democrata e, simultaneamente, ao texto apresentado pelo Governo na proposta de lei do Orçamento do Estado.
Julgamos que a proposta de substituição apresentada pelo PSD vem agravar ainda mais a situação com que estávamos confrontados e que já tinha sido colocada ao Governo em sede de Comissão.
O Governo pretendia, segundo o seu articulado, transferir verbas que não gastou em 1985 para o Orçamento de 1986. Mas, por obra do acaso ou de qualquer outra coisa que se não descortina, esqueceu-se de as meter no Orçamento. Talvez o esquecimento não tenha sido um esquecimento de facto, na medida em que, na sua proposta, o Governo dizia: «excepcionalmente». Portanto, era uma situação excepcional, em que o Governo transferia essas verbas para o Orçamento dó Estado de 1986, mas não as metia lá.
Já muitas vezes se tem falado nesta Assembleia em «sacos azuis». Ora, mais um «saco azul» ou menos um «saco azul», digamos que não adviria daí nenhuma novidade.
A proposta agora apresentada pelo PSD coloca o seguinte problema: há uma dotação que tinha sido atribuída no Orçamento de 1985 e que o Governo não utilizou até ao fecho das operações relativas ao Orçamento de 1985 - e recordo que este ano esse período, chamado período complementar, foi bastante prolongado, já que só terminou em 6 de Março. Agora o Governo pretende (e do nosso ponto de vista bem) utilizar estas verbas para a finalidade a que estavam destinadas. Só que o Governo esquece-se de cumprir a Constituição, pois não nos diz qual é o montante dessas verbas. Serão 100 000 contos? Será 1 milhão de contos? Serão 10 milhões de contos? Ninguém sabe. O Governo recusou-se a dar esta informação, tal como se recusa a informar para que sectores de actividade é que essas verbas estavam destinadas. Eram verbas que foram distribuídas em 1985 e o Governo diz agora, em meados de 1986, que ainda não sabe para que sectores de actividade é que elas se destinam. Não sabe se são para
empresas industriais, se para empresas do sector dos transportes ou do sector da comunicação social. Não sabe, afinal, para que quer o dinheiro.
15to é um problema puro e simples de cumprimento da Constituição, que nos parece não poder ser olvidado por esta Assembleia da República.
Nos moldes em que estas propostas, quer a do Governo, quer a de substituição apresentada pelo PSD, se encontram formuladas, não nos parece que a matéria possa ser votada por esta Assembleia da República. Primeiro temos de ser informados claramente, qualquer que seja a proposta que se queira votar, sobre quais são os valores e a que sectores de actividade se reportam. E isto por uma questão de classificação funcional. De resto, o Tribunal Constitucional já teve oportunidade de, em acórdão, referir que o Governo não tem competência para fazer modificações que acarretam alterações funcionais no Orçamento.
Por outro lado, há aqui um outro problema, que é o de o Governo pretender agora, pela voz do partido que o apoia nesta Assembleia, retirar isto do Orçamento do Estado de 1986 e deixá-lo confinado ao Orçamento de 1985, o que significa que as despesas não foram realizadas em 1985, mas vão recair sobre o Orçamento daquele ano, aparecendo na respectiva Conta Geral do Estado.
Também esta proposta não é inocente. Ela só serve para que o Governo possa fazer posteriormente comparações de défices orçamentais - aliás, como várias outras que aqui aparecem -, tentando demonstrar que o seu défice é inferior ou, pelo menos, pouco superior ao défice de anos passados. Assim, de facto, seria muito fácil que este Governo viesse a apresentar défices inferiores aos do ano passado. Se o Governo atira tudo para cima do ano anterior, se teve três meses a mais para fazer despesas sobre o ano anterior, etc., de facto, assim, é facílimo ...
Acho que a Assembleia da República deve pôr um travão nisto e, pela nossa parte, fá-lo-emos.

O Sr. Vítor Ávila (PRD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Vítor Ávila (PRD): - Sr. Presidente, o nosso grupo parlamentar não se encontra suficientemente esclarecido sobre o objectivo desta proposta de substi-
tuição apresentada pelo PSD, pelo que irá entregar Mesa na um requerimento no sentido de esta questão ser discutida em comissão, para melhor esclarecimento da situação.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esse requerimento terá de ser imediatamente formulado e subscrito por dez Srs. Deputados.
Tem a palavra, para intervir, o Sr. Deputado Alípio Dias.

O Sr. Alípio Dias (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou tentar, nesta breve intervenção, esclarecer o Sr. Deputado Vítor Ávila sobre o objectivo deste artigo e da alteração proposta.
Percebi a natureza de algumas das objecções que foram levantadas, mas julgo que o que sobretudo importa ter presente é o que se pretende satisfazer, que tipo de reforços se pretende dar com esta dotação.

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Essencialmente, estamos perante dotações que visam permitir aumentos de capital, subsídios e indemnizações compensatórias a empresas públicas. É natural que ao longo do período complementar de despesa que acabou em 9 de Março não se tenham, porventura, reunido as condições de que o Governo entende dever fazer depender a atribuição desses aumentos de capital ou dessas indemnizações compensatórias.
É essa, essencialmente, a razão de ser do artigo 12.º, e quando sugerimos a eliminação de uma frase do texto do articulado - concretamente onde se diz «e contabilizadas como receita do Estado no Orçamento para 1986» - é porque, de facto, essa frase está lá a mais, pois não se trata de uma despesa de 1986 e também não pode tratar-se de uma receita de 1986. Se esta dotação fosse havida como uma receita de 1986, naturalmente que a respectiva despesa também teria de ser incluída no Orçamento de 1986 e não é isso o que o Governo pretende.
Julgo que talvez este esclarecimento possa contribuir
para clarificar a posição do PRD.

O Sr. Vítor Ávila (PRD): - Dá-me licença que inter-
pele a Mesa, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Vítor Ávila (PRD): - Sr. Presidente, a intervenção que acabou de ser feita pelo Sr. Deputado Alípio Dias não me esclareceu sobre que empresas é que estão incluídas nestas dotações, pelo que continuamos a manter o nosso interesse em que seja votado o requerimento que anunciei há pouco no sentido de esta questão ser debatida em sede de comissão.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Peço a palavra,
Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito,,Sr. Deputado?

O Sr. Octávio.Teixeira (PCP): -Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Alípio. Dias, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado Alípio Dias, por que é que o Governo não faz o seguinte: a verba não foi gasta em 1985; logo, entra com um saldo que transita de 1985 para 1986 em receita e o Governo mete-o na despesa de 1986. 15to não aumenta o défice. O défice é o mesmo.
Por que é que o Governo não resolve a questão desta forma, que é clara e que não levanta problemas? Com certeza que a Câmara não terá dificuldades em aprovar isto, depois, obviamente, de ser resolvido aquele «pequeno» problema de constitucionalidade sobre a questão das classificações funcionais.

O Sr. Presidente: -Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Alípio Dias, se bem percebi, V. Ex.ª considera que a inscrição destas verbas sobrantes no Orçamento do Estado de 1986 como receita impede que elas sejam aplicadas naquilo a que aqui se designa por «liquidação das res-

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pectivas despesas». Não consigo, porém, entender o alcance dessa sua afirmação. Poderá o Sr. Deputado ir um pouco mais longe, aliás como lhe foi solicitado por outros partidos com assento nesta Câmara?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Alípio. Dias.

O Sr. Alípio Dias (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que a situação está relativamente clara mas, no entanto, poderei tentar clarificar melhor o meu pensamento - e talvez o Governo o possa complementar depois, se assim o entender.
Estamos perante dotações que foram inscritas em 1985 para, durante o período complementar, serem utilizadas, tanto quanto julgo saber, em aumentos de capital, em indemnizações compensatórias, no pagamento de bonificações, etc. Se, por razões que, com certeza, o Governo saberá explicar, não foi possível realizar este tipo de despesas, isto é, de atribuir os fundos aos seus beneficiários, obviamente que neste período poderão estar reunidas essas condições, as quais o Governo fará depender - admita o caso de um aumento de capital numa empresa pública - de uma política em matéria de investimentos ou de outra natureza. A verba em questão fica, então, à disposição do Governo, e ele poderá, realmente, realizar essa despesa em 1986. Mas não Se trata, em nenhum caso, nem de uma despesa nem de uma receita de 1986.
É evidente que a solução apresentada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, nesta matéria, poderá contribuir para clarìfìcar a situação, mas ela é indiferente porque não altera o défice do Orçamento.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e, do Tesouro pede a palàvra para .que efeito?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro (Tavares Moreirà): - Sr. Presidente, peço a palavra para prestar um esclarecimento.

O Sr.Presidente: - Não foi feito nenhum pedido nesse sentido, mas V. Ex.ª pode usar da palavra como se de uma intervenção se tratasse.
Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Impõe-se que se preste um esclarecimento quanto à apresentação, pelo Governo, deste artigo excepcional, aqui referido.
O Governo, com a introdução deste artigo, não pretendeu outra coisa senão clarificar um procedimento que vinha sendo adoptado por executivos anteriores e que, para maior transparência e para que não fugisse ao conhecimento e ao controle da Assembleia da República, foi incluído na proposta orçamental.
É um procedimento tradicional no Ministério das Finanças a utilização destas verbas e o Governo pretendeu, de facto, clarificar esta situação.
E esta clarificação tem em vista exactamente o seguinte: trata-se de verbas que estavam inscritas no Orçamento de 1985, basicamente para aumentos de capital de empresas públicas, aumentos esses ligados à realização de projectos de investimento que, por lentidão na sua execução, não chegaram a ser concluídos,

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não se tendo conseguido realizar a tempo aquilo que estava programado. A despesa não foi feita, a verba não foi utilizada.
Por uma questão de simplicidade e de transparência de procedimento, pretendia-se apresentar à Assembleia da República esta proposta governamental no sentido de, com vista a aproveitar essas verbas orçamentadas em 1985, permitir, oportunamente, a sua utilização ao longo do exercício de 1986 de maneira a que as empresas as pudessem efectivamente aproveitar.
A Assembleia julgará agora sobre a vantagem e as conveniências deste procedimento. Do nosso ponto de vista ele é claro e não tem nenhuns objectivos escondidos.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Secretário de Estado, acontece que me considero melhor esclarecido sobre o artigo 12.º tal como ele foi formulado do que com a proposta de alteração do PSD e é um comentário à proposta de alteração do PSD que agora lhe quero pedir.
O Governo prefere que estas importâncias não sejam orçamentadas este ano, mas apenas inscritas como operação de tesouraria em termos de receita e de despesa? Pelo menos é isto que resulta da proposta apresentada pelo PSD.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado, V. Ex.ª referiu qual era a intenção do Governo e qual era o procedimento que vinha sendo adoptado - e mal - em termos das regras orçamentais.
Contudo, a nossa proposta é a de que se vamos alterar a situação - e devemos alterá-la - a rectifiquemos de uma vez por todas, completa e correctamente, e não nos fiquemos por uma semi-rectificação. É este o problema que julgo que deve ser atendido.
Por outro lado, se a proposta do Governo ficava semi-rectificada, a proposta do PSD reporta-se mais a uma situação idêntica à anterior, isto é, reporta-se mais a um procedimento mau do que a uma semi-rectificação e, por isso, ainda está mais atrás do que a própria proposta governamental.
Quanto ao problema dos investimentos, o Sr. Secretário de Estado referiu qual era o seu objectivo e, se existem investimentos, eles devem estar definidos. Se a questão é apenas o atraso da entrega das referidas verbas por lentidão na sua concretização, podem-se usar as classificações funcionais, que o Governo conhece.
Mas, para além de tudo o mais, julgo que, depois desta breve troca de impressões - chamemos-lhe assim -, se justifica plenamente a proposta de baixa à comissão do referido artigo 12.º

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das
Finanças e do Tesouro: - Em primeiro lugar, para esclarecer o Sr. Deputado Nogueira de Brito quanto à
nterrogação que levantou, começo por lhe dizer que aquelas operações são de tesouraria no aspecto da receita mas não no da despesa. Elas referem-se a despesa orçamental e não a operações de tesouraria, no sentido vulgar da expressão.
A proposta de alteração apresentada pelo Grupo Parlamentar do PSD simplificaria este procedimento e dispensaria a inclusão desta receita no Orçamento do Estado para 1986. Seria, assim, uma simplificação processual, que tem uma vantagem evidente.
Relativamente à questão formulada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, o que lhe posso dizer é o seguinte: estas verbas estavam já imputadas e localizadas, inclusive pela resolução do Conselho de Ministros que definiu o plano de investimentos do sector empresarial do Estado para 1985 e pelos despachos subsequentes a essa resolução.
Portanto, estas verbas estão perfeitamente localizadas, destinam-se a determinadas empresas.
Por conseguinte, estar a alterar isso outra vez complica muito mais o processo do que a solução que o Governo propôs; isto é, como essas verbas já estão consignadas, a questão que se coloca agora é a de as utilizar dentro da afectação que tinham e não estar a voltar ao princípio outra vez, repondo tudo numa verba global, tendo que, de novo, reafectar esta verba.
Não vejo qualquer vantagem em estarmos a voltar ao princípio e daí a utilidade da proposta.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado, o problema é que nós estamos precisamente na posição contrária, ou seja, não queremos pôr tudo numa só verba, queremos que o Governo nos diga qual é a discriminação das verbas, qual o seu montante e, também, a que sectores de actividade se destinam. Nem sequer lhe pedimos a indicação das empresas, mas apenas os sectores de actividade a que se destinam, o que torna a questão mais fácil.

O Orador: - O Sr. Deputado está a pedir isso agora.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Já o pedi na Comissão, Sr. Secretário. Aliás, isso está registado, Sr. Secretário de Estado, porque as reuniões de Comissão são gravadas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos aguardar até que se faça a distribuição do requerimento pedindo a baixa à Comissão competente do artigo 12.º constante da proposta de lei n.º 16/IV, que vai, desde já, ser lido.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - O requerimento é do seguinte teor:
Os deputados abaixo assinados requerem a baixa à competente Comissão do artigo 12.º constante da proposta de lei n.º 16/IV, por um período de 24 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proce-
der à votação do requerimento que acaba de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, levo ao vosso conhecimento que o Sr. Deputado Coordenador da Subcomissão para a análise do projecto de lei n.º 90 convoca os Srs. Deputados desta comissão para uma reunião no dia 8 de Abril, às 15 horas e que o Sr. Deputado Coordenador da Subcomissão para a análise dos projectos de leis nrs. 76/IV, 100/IV, 116/IV, 156/IV e 159/IV, os convoca também para uma,reunião, também no dia 8 de Abril, às 22 horas.
O Sr. Deputado Rui Machete pediu a palavra para
que efeito?

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, era só
ara solicitar, aproveitando a sequência dessas comu-
icações, que V. Ex.ª anunciasse que a Comissão de
conomia, Finanças e Plano reúne amanhã, às 14 horas
45 minutos, para resolvermos este problema.

O Sr. Presidente: - Está feito o anúncio, Sr. Deputado, e certamente que os Srs. Deputados tomarão isso em consideração.
Vamos entrar na matéria correspondente aos arti-
gos 16.º a 20.º Estão, em discussão, Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, é para fazer uma interpelação à Mesa no seguinte sentido: julgo que V. Ex.ª, quando agora pôs à discussão os artigos 16.º a 20.º, terá partido talvez da proposta de discussão desses artigos apresentada pelo Sr. Deputado Ivo Pinho.
A minha dúvida é a seguinte: julgo que, independentemente da ordenação que foi proposta de discussão dos artigos, cada artigo devia ser discutido isoladamente, pois trata-se de matérias çompletamente diferentes.

O Sr. Presidente: - Se assim é, Sr. Deputado Octávio Teixeira. Rectifico, estando à discussão apenas o artigo 16.º da proposta de lei.
Srs. Deputados, agradeço o favor de estarem aten-
tos porque depois do artigo ser submetido à votação,
não posso admitir que se façam posteriormente pedi-
dos de palavra.
Não há inscrições quanto ao artigo 16.º, pelo que
vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É do seguinte teor:

RTIGO 16.º
(Cobrança de impostos)
Durante o ano de 1986, o Governo é autorizado a cobrar as contribuições e impostos constantes dos códigos e demais legislação tributária, com as sub- sequentes modificações e diplomas complementares em vigor e ainda de acordo com as alterações previstas nos artigos seguintes.

O Sr. Presidente: - Relativamente ao artigo 17.º há propostas de alteração, que vão ser lidas.

Foram lidas. São as seguintes:

Proposta de eliminação do artigo n.º 17.º, apre-
sentada pelo PRD:
É eliminado o artigo 17.º da proposta de
lei n.º 16/1V.

I SÉRIE - NÚMERO 49

Proposta de eliminação da alínea b) do artigo 17.º, apresentada pelo CDS:

1 - ............................................................................................................................................................................................................
a) ............................................................................................................................................................................................................
b) (Eliminado.)

2 - .........................................................................................................................................................................................................

roposta de eliminação do artigo 17.º, apresentada pelo PS:

Os Os deputados abaixo assinados propõem a
eliminação do artigo 17.º
O Sr.Presidente: - Estão em discussão as propos-
tas que acabam de ser lidas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Alípio Dias.
O Sr. Alípio Dias (PSD): - Como estão em discussão três propostas, gostaria de solicitar aos subscritores de cada uma delas que nos informassem de qual a quebra de receita fiscal que a eventual aprovação da sua proposta implicaria.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Victor Ávila.

O Sr. Victor Ávila (PRD): - O Sr. Deputado Alípio Dias perguntou-nos qual seria o impacte da eliminação do artigo 17.º, mas como a nossa proposta está correlacionada com uma outra que vamos apresentar sobre o imposto de capitais, pomos à vossa consideração,se quiserem, discutirmos em conjunto as duas propostas agora referidas e aí talvez se visse qual seria o impacte diminuto desta eliminação do artigo 17.º

O Sr: Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira:

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Era para fazer uma interpelação um pouco semelhante à do Sr. Deputado Alípio Dias, no sentido de saber o que estamos de facto a votar. Gostaria de perguntar aos subscritores das três propostas se o objectivo é eliminar os adicionais para incorporar o adicional na taxa base.
Convém clarificar se estas propostas são nesse sentido ou não porque, se assim não for, haverá o problema que o Sr. Deputado Alípio Dias levantou e, então,teremos de ver qual é o seu custo em termos de receita fiscal.
Julgo que o PSD não apresentou nenhuma proposta neste sentido e que só os outros partidos é que o fizeram.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Queria esclarecer o sentido da nossa proposta e suponho que ele se alcança com facilidade.
A proposta do CDS é no sentido de eliminar o adicional sobre o imposto sucessório, ou seja, imposto sobre as sucessões e doações.
Na realidade, este imposto tem hoje, em matéria de arrecadação, um significado muito reduzido. Ele representa, segundo cálculos feitos por especialistas na maté-

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ria, cerca de 0,53% do conjunto das receitas fiscais do sector público administrativo e, portanto, ele mesmo encontra já uma justificação muito reduzida, sendo certo que a sua estrutura o transforma num imposto grandemente injusto para os sujeitos passivos. Nessa perspectiva, não faz sentido que sobre ele estejamos a fazer incidir um adicional de 15%. Aliás, estes adicionais deviam-se considerar no seu conjunto como cargas tributárias extraordinárias a eliminar quanto mais depressa melhor e, se possível, através de uma reforma sistemática e coerente do sistema fiscal, senão eliminando aquilo que, não se revelando produtivo do ponto de vista das receitas do Estado, não encontra justificação nenhuma na sua manutenção na Lei Orçamental.
Quanto ao adicional sobre o imposto sobre a aplicação de capitais, temos contra ele a mesma posição de princípio que temos sempre aqui manifestado contra os adicionais em geral.
Simplesmente o volume de receita arrecadada é aqui muito diferente e por isso nos coibimos de propor a sua eliminação e nos coibimos também de propor uma alteração estrutural, que seria a sua integração na própria taxa desses impostos.
Este é o sentido da nossa proposta e é para ela que esperamos a votação e a aprovação da Câmara.

O Sr. Presidente: -- Tem a palavra o Sr. Deputado Victor Ávila.

O Sr. Victor Ávila (PRD): - Como não foi apontada por mais nenhum deputado a hipótese de discutirmos em conjunto as duas propostas de alteração que apresentámos, uma sobre os adicionais e a outra sobre o imposto de capitais, iria referir a justificação da nossa proposta de eliminação do artigo 17.º
Consideramos que os adicionais sobre o imposto de capitais, secção A, não têm qualquer expressão financeira significativa.
Em 1981, os rendimentos fiscais daquela secção correspondiam apenas a 2,73 % das receitas cobradas no imposto de capitais. Se em 1986 o peso relativo permanecesse, o que é improvável, devido à crescente perda de peso da secção A, o adicional de 15 % corresponderia apenas a 4 ‰ das receitas de imposto de, capitais, pelo que não tem relevância que justifique as complicações da política de adicionais e acresce a isto que a taxa de imposto de capitais, secção A, já é muito elevada, correspondendo neste momento a cerca de 30%.
Consideramos também que não se justifica manter-se a política de adicionais sobre o imposto sucessório, bem como a sua cobrança, porque não têm sido actualizados os escalões dos valores das heranças, que estão profundamente desactualizados, e por isso as taxas em vigor são altíssimas, podendo-se atingir em alguns casos e na hipótese mais desfavorável 86,25 % e ainda porque é muito pequeno o volume da arrecadação do imposto sucessório, ou seja, ele representa 0,16 % do produto interno bruto e o respectivo adicional equivaleria a 0,8 % das receitas desse imposto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - O Sr. Deputado não se referiu à secção B do imposto de capitais e dado que ela é mais vultosa, gostaríamos de conhecer a sua justificação sobre ela.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Victor Ávila.

O Sr. Victor Ávila (PRD): - Quanto à secção B, o imposto de capitais, ao analisar a proposta que temos nesse âmbito e que obviamente ainda não foi apresentada, poderemos chegar à conclusão que não há grande impacte porque propomos a inclusão desse adicional no valor da taxa de imposto de capitais que incide sobre os depósitos a prazo, sobre os juros das obrigações e sobre os suprimentos de sócios a empresas.
Portanto, nessa perspectiva, a taxa em questão corresponderia a 14,95 % se indexassem 15 % à taxa base e como propomos esta percentagem não há perda de receita na secção B.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Com o Sr. Deputado Victor Ávila falou um pouco desviado do microfone não consegui ouvir uma parte da sua intervenção, mas julgo ter percebido que a parte relativa à secção B do imposto de capitais é para integrar na respectiva taxa.
Em segundo lugar, gostaria de fazer uma pergunta ao CDS. Suponho que este partido vai complementar a sua proposta em discussão neste momento no sentido de o mapa I ser reduzido de 1 050 000 contos, na medida em que não tenciona integrar o adicional do imposto de sucessões e doações na respectiva taxa. Não é assim?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Mas não apresentamos só essa proposta e, para seu descanso, verá V. Ex.ª um conjunto de propostas que vamos apresentar em relação ao mapa da receita.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - E, se me permite, pergunto-lhe: isso vai contribuir para aumentar o défice?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não vai, Sr. Deputado Octávio Teixeira, não tencionamos aumentar o défice.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Oliveira Costa): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo decidiu propor a manutenção destes adicionais, não porque defenda o princípio dos adicionais a quaisquer impostos, mas porque se eles ocorreram foi para fazer face a determinadas necessidades.
Entendemos que um adicional é o que é e como tal deve ser considerado e não deve criar-se um adicional para depois o integrar num imposto.
Achamos que este é um mau princípio e por isso mesmo não procurámos fazer a sua integração no imposto de capitais e nos opomos a ela.
O adicional foi criado para fazer face a determinadas necessidades, logo que aquelas necessidades sejam ultrapassadas, e estamos nesse caminho, o referido adicional deve acabar pura e simplesmente - aliás, isto deve acontecer com este ou com qualquer outro adicional ou impostos extraordinários que foram criados com um fim claro.

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Essa é a razão de fundo por que propomos e mantemos a decisão da nossa proposta, no sentido da sua vigência no Orçamento de 1986.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr: Presidente, o
Sr. Deputado Victor Ávila tinha explicado no início da
sua intervenção que preferia votar este artigo sobre os
adicionais quando se discutisse o problema do imposto
de capitais.
As explicações que deu levam pensar que ganharíamos em clareza de discussão se acabássemos por votar este artigo 17.º aquando da votação do artigo sobre o imposto de capitais.
Portanto, a minha intervenção é no sentido de finos associarmos à sua proposta.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, supo-
nho que a explicação sobre esta matéria está dada; sim-
plesmente, como também propomos a supressão do
artigo 17.º, gostaríamos de dizer que a técnica dos adi-
cionais não é de facto a melhor. Faremos uma pro-
posta oportunamente sobre o imposto de capitais que
elevará a taxa, para o caso pertinente, de modo a eli-
minar o adicional sem se verificar o problema que aqui
se levantou.
Gostaria que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que veio aqui trazer à Câmara - e muito bem - a ideia que os adicionais devem ser suprimi- dos, reconhecesse que é chegada a altura, este ano e neste Orçamento, de o fazer.
É só uma questão de oportunidade que está aqui em causa, porque todos nós concordamos que técnica dos adicionais não é a melhor.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr.Presidente, faço um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado João Cravinho que, no fundo, se dirige ao Sr. Deputado Victor Ávila, e que é o seguinte: ficou claro que o PRD propôs a eliminação do artigo 17.º e propõe-se integrar na taxa do imposto sobre a aplicação de capitais o adicional que incide sobre esse imposto no respeitante à secção B.
Concluo, a contrário, que o PRD, assim como o Partido Socialista, propõe - e digo isto só para me esclarecer a mim próprio - a eliminação do imposto de capitais, secção A, e do adicional sobre o imposto sobre as sucessões e doações. Terei ou não percebido bem?

O Sr. João Cravinho (PS): - Exacto, Sr. Deputado.

O Orador: - Devo dizer que não estou confundid pela pergunta que o Sr. Deputado Octávio Teixeira me dirigiu; no entanto, a vossa intervenção não ficou com- pletamente esclarecida no meu espírito.

O Sr. Victor Ávila (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para confirmar que, de facto, o Sr. Deputado
Nogueira de Brito percebeu bem.

I SÉRIE - NÚMERO 49

O Sr. Presidente: - Não havendo mais inscrições, vamos proceder à votação das propostas de eliminação apresentadas pelo PRD e pelo PS, respectivamente.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rui Machete, enquanto procedemos a votações não é possível qualquer interrupção, a não ser que ela tenha a ver com
o processo de votação.

O Sr. Rui Machete -(PSD): - Sr. Presidente, peço
imensa desculpa, mas é que foi anunciado um requeri-
mento no sentido de as votações que V. Ex.ª acabou
de anunciar serem adiadas; no entanto, V. Ex.ª não
o considerou.

O Sr. Prsident: - Sr: Deputado, o requerimento a que se refere tem de ser formulado por escrito e subscrito por dez deputados, e ainda não foi entregue na Mesa.

O Sr. Rui Machete (PSD) - Mas, Sr. Presidente, se houver consenso, isso não é necessário.

O Sr. Presidente: - Sem dúvida.
Srs. Deputados, agradeço o favor de me apresentarem o requerimento subscrito por dez Srs. Deputados, a fim de se proceder à sua votaçâo.

Pausa.

Srs. Deputados, o requerimento, apresentado pelo PRD, é do seguinte teor:

Nos termos e para os efeitos do Regimento da
Assembleia da República, os dez deputados abaixo
assinados requerem o adiamento da discussão e
votação do artigo 17.º para o momento da discussão e votação do artigo 21.º
A discussão destes artigos será, consequentemente, feita conjuntamente.

Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Lopes Cardoso e Borges de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Entramos agora na discussão do artigo 18.º
Relativamente a este artigo, foram apresentadas quatro propostas de aditamento: uma da alínea b), subscrita por deputados do PSD; outra, de três alíneas - h), i) e j) -, subscrita por deputados do PS; outra, de duas alíneas - i) e f) -, subscrita por deputados do CDS, e ainda outra, de um n.º 2, subscrita por deputados do PCP.
Estão em discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, solicito aos Srs. Deputados do CDS o favor de me explicitarem aquilo que é na sua proposta de aditamento à alínea f). É que julgo que não se trata da alínea f). Deve haver engano. A seguìr à alínea i), normalmente, vem a alínea j), mas na vossa proposta vem referida-
a alínea f).

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Gostava, pois, que me explicitassem a vossa proposta, assim como gostava que o PSD me explicitasse a proposta que apresentou.

O Sr. Presidente: - Se o Sr. Deputado Nogueira de Brito pretende responder, tem a palavra.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, com muito gosto, vou esclarecer o Sr. Deputado Octávio Teixeira, dizendo-lhe que a alínea a que se refere não é nem a alínea i), nem a alínea j), nem a alínea f), mas sim a alínea h). 15to porque se trata de uma alínea nova. É, pois, uma alínea que se deve acrescentar ao artigo 18.º e que tem a ver com a Contribuição Industrial.
Portanto, propomos o aditamento de duas novas alíneas - as alíneas h) e i) - e não o aditamento das alíneas i) e f), tal como foi apresentado. Tratou-se de um lapso de escrita.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, vou providenciar no sentido de se fazer a correcção na respectiva proposta.
Algum Sr. Deputado do PSD pretende responder à questão formulada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Próspero Luís.

O Sr. Próspero Luís (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A razão que levou o Partido Social-Democrata a apresentar a proposta de aditamento da alínea b) do artigo 18.º baseia-se no facto de, neste momento, se entender que já não se justifica a manutenção de elevados montantes de títulos como reservas de fruição.
Ora bem, como há um montante significativo de rendimentos que não estão a ser tributados, a nossa proposta vai no sentido de passar a ser tributada uma parcela significativa de rendimentos das empresas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, continuam em discussão as diversas propostas que foram apresentadas e que há pouco referi.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A primeira sugestão por nós apresentada funda-se na manifesta e inútil escassez do prazo previsto no § 1.º do artigo 138.º do Código da Contribuição Industrial, que é de 8 dias, e que propomos ampliar para 30. 15to porque se trata de matérias complexas e de demorado exame.
A segunda sugestão, ou seja, a alínea i), destina-se a impedir os clamorosos abusos que vêm ocorrendo por parte de alguns agentes de fiscalização, que deslocam para o grupo B contribuintes do grupo A, fixando depois matérias colectáveis verdadeiramente escandalosas.
A terceira sugestão, ou seja, a alínea j), justifica-se por si própria.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa proposta da alínea h) tem a mesma explicação que foi dada pelo Partido Socialista

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relativamente a uma proposta paralela que apresentou. Trata-se de uma medida com graves consequências para a vida dos agentes económicos e não está certo que esteja subtraído ao controlo contencioso, como neste momento acontece.
A segunda medida que propomos tem em vista limitar os efeitos de uma medida que deve ser apenas restrita à forma de determinação da matéria colectável e não deve ter a ver com o estatuto do contribuinte.
É esse o sentido da nossa proposta.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As cooperativas que se encontram nas condições exigidas pelo n.º 2.º do Decreto-Lei n.º 456/80, de 9 de Outubro, estão isentas de Contribuição Industrial e de impostos, como, por exemplo, o imposto criado pelo Decreto-Lei n.º 119-A/83, de 28 de Fevereiro, e pelos Decretos Regulamentares nrs. 66/83 e 67/83, de 13 de Julho. Aliás, a própria Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, na circular n.º 699, de 27 de Fevereiro de 1984, entendeu este sentido e deu essas indicações às repartições de finanças. No entanto, várias repartições de finanças têm efectuado diligências no sentido de cobrar estes impostos. Devo dizer que temos, em nosso poder, algumas reclamações de cooperativas que foram alvo dessas diligências por parte das repartições de finanças.
Ora bem, apresentámos a proposta de aditamento ao artigo 18.º para que não restem dúvidas de que às cooperativas que se encontram nas condições exigidas pelo artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 456/80, de 9 de Outububro, não sejam exigidas quaisquer contribuições, quer a Contribuição Industrial, quer outro tipo de impostos.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão as propostas apresentadas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lobo Xavier.

O Sr. Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, presumo que neste período também nos podemos pronunciar sobre o artigo 18.º da proposta de lei do Governo, não é verdade?

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. Lobo Xavier (CDS): - Nesse sentido, aproveito a presença do Sr. Secretário de Estado para os Assuntos Fiscais para dizer que é talvez a terceira vez que nos regozijamos nesta Câmara pelo aparecimento de um pedido de autorização legislativa referente à Contribuição Industrial, sobretudo quando ela se propõe, como nas sucessivas propostas de orçamento os governos se têm proposto, a rever o regime das provisões, assim como o problema da valorimetria das existências, tal como está - e mal! - no artigo 38.º do Código da Contribuição Industrial.
Nesse sentido, congratulando-me, pela terceira vez, por haver a intenção de rever estas matérias que tantos problemas causam aos contribuintes e que enxameiam a Administração de reclamações e os tribunais de processos, gostaria de saber se desta vez existem já trabalhos em curso, em estado adiantado, sobre esta matéria, se realmente desta vez estas autorizações são para ser utilizadas. Refiro-me, concretamente, às alí-

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neas b) e c) do artigo 18.º Há estudos? Já há propostas concretas? É este ano, finalmente, que as empresas vão ver resolvido o problema da valorimetria das existências e o regime das provisões?

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaria de solicitar da parte do Governo uma explicação da razão que o levou a incluir a alínea e) nos exactos termos em que se encontra redigida. 15to é: quais foram as razões que levaram o Governo a reduzir a taxa de Contribuição Industrial apenas para os lucros superiores a 3000 contos?
Por que é que se mantém a taxa de Contribuição Industrial para os lucros inferiores a 3000 contos e apenas se baixa a taxa para os lucros superiores a esse valor?
Em segundo lugar, gostava que me fosse clarificada a questão da alínea f). Como não percebo bem o que aqui está, gostava de saber qual é a importância que vai ser deduzida ao lucro tributável em Contribuição Industrial pelos aumentos de capital que venham a ser efectuados. Não sei se isso vai ser feito com base na taxa do Banco de Portugal fixada anualmente, isto é, x por ano, ou se é apenas a aplicação da taxa sobre as entradas de capital que vai ser deduzida nos anos que aqui se referem.
Gostava que o Governo me respondesse a estas dúvidas.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado para os Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado para os Assuntos Fiscais: - Relativamente às questões que foram postas, podemos avançar que, no que toca às alíneas b) e c), existem trabalhos suficientemente avançados para podermos garantir que a nova disciplina será implementada no decurso deste ano. Aproveito para referir que tudo aquilo que o Governo está a propor neste Orçamento é para ser realizado no decurso deste ano, não somente em relação a este caso concreto, mas em relação a todas as situações que apresentámos. Se não tivéssemos essa intenção, não teríamos apresentado a proposta.
Quanto à dúvida suscitada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira no que toca à questão de saber por que é que se baixou a Contribuição Industrial só para os rendimentos superiores a 3000 contos e não para os rendimentos inferiores a 3000 contos, devo dizer que foi pela simples razão de que uma taxa é de 40% e a outra é de 30%. Haveria, consequentemente, que encontrar uma aproximação, tendo já em vista o que se perspectiva no futuro quanto ao problema do sistema fiscal em Portugal.
Quanto à alínea f) o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro dará a resposta.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro.

I SÉRIE - NÚMERO 49

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: - Para responder à dúvida do Sr. Deputado Octávio Teixeira, peço-lhe que, de novo, ponha a questão porque também eu fiquei com dúvidas.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado, quanto à questão de fundo, percebo-a, está clarificada. A questão que se põe é a de saber qual é o valor a considerar como custo para efeitos de Contribuição Industrial, tomando por base um aumento de capital - 100, por hipótese.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das
Finanças e do Tesouro: - Suponho que a resposta à questão que colocou está claramente contida na redacção da alínea f).
O montante a deduzir é o que resulta de uma importância calculada com base no valor dos aumentos de capital, realizados em dinheiro, e mediante aplicação de uma taxa igual à taxa básica de desconto do Banco de Portugal deduzida de 4 pontos percentuais. Por conseguinte, será aquela que vigorar durante um determinado exercício.
Portanto, há um capital, há um período de tempo, e há uma taxa. Consequentemente, temos os ingredientes necessários e suficientes para determinar o valor a deduzir à matéria colectável.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Para ver se consigo perceber qual é o esquema que está previsto pelo Governo, vamos admitir que a taxa de desconto do Banco de Portugal é de 15%, para facilitar os cálculos, e que há um aumento de capital 100, em dinheiro, em 1986. Pergunto: será deduzido 15% em 1986, 15% em 1987 e 15% em 1988?
É sobre isto que gostava de ser esclarecido.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, não será deduzido necessariamente 15% em 1986, de acordo com o exemplo que figurou, na medida em que entra já num momento avançado do ano de 1986. Por conseguinte, se o aumento de capital for realizado em 1986, o período de tempo já será necessariamente inferior a um ano. Se aplicar uma taxa de 15% a um capital de 100 por um período inferior a um ano, o produto não é 15%, mas é menos.
Em 1986 será deduzido o que resultar da aplicação da taxa em causa pelo período de tempo que contar até ao final do ano.
É evidente que em 1987 e 1988 já não será assim, na medida em que o período de tempo será o ano inteiro.
Suponho que quanto a este ponto ficou esclarecido.

O Sr. Presidente: - As propostas continuam em discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente à alínea f) do artigo 18.º da proposta de lei, a questão de fundo parece-nos incorrecta, parece-nos que não é uma forma de tratar a problemática da fiscalidade, no caso concreto a fiscalidade sobre os lucros, atribuir como custos de exercício uma percentagem dos aumentos de capital a título de remuneração convencional do capital social. 15to é uma coisa muito esquisita porque as empresas ou têm lucros ou não têm lucros.
Se o Governo considera que a tributação dos lucros é demasiada pesada, apresente as propostas que entender. Agora estar a deduzir como custo uma remuneração convencional do capital social, pouco terá a ver com uma perspectiva de clarificação da fiscalidade, de clarificação do sistema fiscal e de uma clareza na aplicação dos tributos que existem.
Se há que fazer alterações ao Código da Contribuição Industrial, proponham-se as alterações, mas não façamos coisas deste género.
Por outro lado, afinal, a minha dúvida parece que tinha razão de ser, na medida em que não estava explícito, nem sequer implícito, que se aplicava a taxa de desconto do Banco de Portugal proporcionalmente ao tempo da existência do aumento de capital. 15so não está aqui explícito. Ficou agora clarificado, embora continue a não estar expresso na lei.
Por outro lado, em relação à alínea e), de facto não nos parece que os argumentos apresentados pelo Governo sejam justificativos. Se o Governo entende que a taxa de contribuição industrial deve ser única, que faça essa proposta. Reduzir essa taxa apenas aos lucros mais elevados, também nos parece que é um exagero.
Finalmente, e para terminar, em relação à alínea g), gostaria de referir, desde já, que estamos totalmente de acordo com o objectivo, só que este é um dos casos concretos em que a autorização legislativa que o Governo pede é completamente «em branco». Não se refere qual o sentido, fala-se em rever, mas não se diz nada sobre o sentido em que se vai dar a alteração pretendida.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Ainda em matéria de esclarecimentos de propostas que temos presentes, coloco as minhas questões.
Refiro-me, nomeadamente, à proposta de uma nova alínea b) para o artigo 18.º - contribuição industrial -, apresentada pelo Grupo Parlamentar do PSD. Consubstancia-se essa proposta numa autorização legislativa que o Governo não solicitou.
Ora bem: se é duvidosa, em termos constitucionais, a concessão de autorizações legislativas não solicitadas pelo Governo - e é-o só para uma parte da doutrina, porque para outra é questão pacífica que não podem ser concedidas autorizações não solicitadas -, essa questão está hoje esclarecida pelo Regimento da Assembleia da República, que diz, expressamente, no artigo 191.º, alínea a), que em matéria de autorizações legislativas a iniciativa originária é sempre do Governo.
Não se verificou essa iniciativa no caso presente e, portanto, não parece que esta autorização legislativa possa ser concedida, pois o artigo 191.º, alínea a), do Regimento da Assembleia da República esclareceu a

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questão duvidosa em termos constitucionais e optou pela solução de que a Assembleia da República, em matéria de autorizações legislativas, só as possa conceder quando a iniciativa originária seja do Governo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Penso que o Sr. Deputado Magalhães Mota tem razão quanto ao modo da formulação da nossa proposta, e o que há é que formulá-la em termos de não ser uma autorização legislativa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Deputado Rui Machete, julgo que há uma proposta de reformulação que vai dar entrada na Mesa. Penso que podemos aguardar que a proposta dê entrada na Mesa para depois continuarmos os trabalhos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, quero fazer um breve pedido de esclarecimento ao PSD.
Quando os Srs. Deputados apresentam esta proposta com a alínea b), isso significa que querem eliminar a alínea b) da proposta do Governo?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Próspero Luís.

O Sr. Próspero Luís (PSD): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, se V. Ex.ª ler as restantes alíneas da nossa proposta, verá que elas estão alteradas sucessivamente, isto é, a alínea b) passa a alínea c) e assim até ao fim. A razão de ser da denominação da alínea ora proposta como alínea b) é a de respeitar a ordem dos artigos do Código da Contribuição Industrial.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rui Machete, devo entender que estão a reformular a proposta?

O Sr. Rui Machete (PSD): - Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, se V. Ex.ª me desse licença, enquanto se faz a reformulação e como é necessário recopiar o texto, gostaria de perguntar aos proponentes da proposta do PS e do CDS quais são as diferenças significativas - além do prazo previsto passar de 8 para 30 dias - entre as duas propostas, pois julgo que são praticamente idênticas e podem ser fundidas ou, quiçá, uma pode ser retirada em benefício da outra.
No fundo, penso que a única diferença significativa é, realmente, na primeira alínea, o prazo passar de 8 para 30 dias.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rui Machete, V. Ex.ª desculpar-me-á por eu não ter entendido bem o sentido da sua interpelação e, assim sendo, peço que me diga se entendi bem ao pensar que fez uma interpelação dirigida a um partido.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Exactamente, Sr. Presidente.
Como as duas propostas são muito similares - só variam naquela questão do prazo -, julgo que seria útil esclarecer se os dois partidos insistem numa formulação autónoma ou se podemos fundi-las.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª refere-se ao PS e ao CDS, Sr. Deputado?

O Orador: - Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, o CDS aceita a fusão das propostas.
A questão que as diferencia não é, contudo, só a questão do prazo previsto no artigo 38.º, mas também a questão da nova alínea i), que nós propomos. Mas já conversei com os Srs. Deputados do PS e o Partido Socialista aceita a fusão.
Portanto, nós aceitaríamos, da proposta do PS, o alargamento do prazo do artigo 38.º e o modo de determinação da passagem do grupo A ao grupo B e o PS aceitaria, da nossa parte, a fixação dos efeitos dessa passagem do grupo A ao grupo B.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lobo Xavier.

O Sr. Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste momento gostava que ficasse esclarecida uma questão que me parece ser necessário que fique, desde já, assente ou que, pelo menos, sejam adiantados alguns argumentos a favor ou contra. 15to prende-se, fundamentalmente, com a intervenção do Sr. Deputado Magalhães Mota sobre a não possibilidade de a Assembleia conceder autorizações legislativas que o Governo não pediu.
No nosso entender a redacção dos nrs. 2 e seguintes do artigo 168.º da Constituição dá a entender que o pedido de autorização legislativa deve provir do Governo. Foi aqui entendido, durante muito tempo, por aqueles que não acham que tudo aquilo que não está na Constituição e no Regimento não pode ser feito - e que constituíram uma larga maioria -, que esse era um processo salutar, para evitar que a Assembleia da República estivesse a incluir na proposta de lei do Orçamento do Estado leis acabadas ou meras recomendações sem qualquer sentido e que se optasse por uma solução intermédia, que seria a da concessão de autorizações legislativas ao Governo, mesmo quando ele não as pedisse, balizadas de acordo com os critérios exigidos pela Constituição.
O Grupo Parlamentar do CDS pensa que se mantêm as razões para distinguir as autorizações legislativas incluídas na Lei do Orçamento do Estado das outras autorizações legislativas.

I SÉRIE - NÚMERO 49

Nessa medida, somos a favor deste sistema salutar de a Assembleia da República propor simples autorizações legislativas. Se assim não for, há um inconveniente grave na não aceitação da nossa opinião. É que a Assembleia da República, nesta matéria do articulado da proposta de lei do Orçamento do Estado, só poderá fazer leis completas e acabadas - com o inconveniente de serem leis que só vigoram pelo período de um ano, que é o período durante o qual vigora um Orçamento - ou, então, simples recomendações destituídas de qualquer sentido jurídico.
É preciso esclarecer isto e eu gostaria de ouvir outra vez a exposição do Sr. Deputado Magalhães Mota, porque, segundo o que eu já vi aqui, há várias propostas de concessão de autorizações legislativas ao Governo balizadas que vão aparecer subsequentemente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que a matéria justificará, talvez, um alargamento do próprio sentido do debate em relação a esta proposta em concreto.
Em primeiro lugar, depara-se-me a questão das autorizações legislativas incluídas na lei orçamental. Tem-se discutido e há, nesse sentido, uma corrente doutrinária e uma jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo conhecidas. Penso que são uma má jurisprudência e uma má doutrina, pois fazem uma dístinção, que a Constituição não permite, entre as autorizações legislativas incluídas na Lei do Orçamento de Estado e as outras autorizações legislativas.
A Constituição não faz essa distinção, não a permite e não há qualquer forma de, com base nos nossos textos constitucionais, fazer tal distinção. A única coisa que é possível, em termos de autorizações legislativas incluídas na Lei do Orçamento de Estado, é pensar que elas têm uma duração equivalente à da própria vigência da lei orçamental, e não mais do que isso. Essa seria uma distinção, mas só nesse sentido. Em nosso entendimento, o comando do n.º 2, artigo 168.º da Constituição, se a memória me não atraiçoa, é exemplar para todas as autorizações legislativas e não permite que esta distinção possa ser efectivada.
Por outro lado, entendemos que as autorizações legíslativas, se não são solicitadas pelo Governo, transformam-se em algo que, rigorosamente, pouco mais é do que as tais recomendações referidas pelo Sr. Deputado Lobo Xavier, visto que se o Governo é livre de utilizar ou não a autorização legislativa que pediu, mais livre o será quando não a solicitou ele mesmo, não se sentindo, portanto, obrigado, por comando que lhe é transferido, a usar ou não essa faculdade, por um comando que não tem qualquer espécie de imperatividade, antes, pelo contrário, se torna um comando mitigado, visto que é o Governo o próprio a decidir utilizar ou não essa autorização legislativa.
A prática tem-nos demonstrado que mesmo quando os Governos pedem autorizações legisltaivas nem sempre as usam, quanto mais quando eles não as solicitam, e acontece que os governos ficariam, de algum modo, confrontados com a questão de serem autorizados a fazer uma coisa para a qual não pediram autorização, o que é uma situação constitucionalmente estranha.

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2 DE ABRIL DE 1986

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No caso presente, pensamos que a Assembleia tem formas de resolver esta questão, mesmo no enquadramento da lei orçamental. Gostaríamos de ter uma lei orçamental despojada de muita matéria que não tem que ver com o Orçamento e que é meramente programática, é uma mera declaração de intenções, quando, por exemplo, se transforma o comando constante de uma autorização num autêntico comando, obrigando o Governo a apresentar uma proposta de lei num prazo determinado. Aí já há uma manifestação de vontade por parte da Assembleia, que espelha completamente uma obrigação a que o Governo está submetido.
Claro que será fácil dizer que isto também não tem sanção. 15so é verdade, mas trata-se de uma atribuição de uma obrigação muito mais imperiosa para o Governo, com formas de redacção várias vezes utilizadas ao longo da elaboração das propostas e que permitem resolver a questão de não conceder formalmente uma autorização, mas de obter os mesmos efeitos práticos, traduzindo-se, para o Governo, na formulação de uma manifestação de intenção do Parlamento em relação àquilo que pretende que o Governo venha a formular e a apresentar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, penso que esta matéria é suficientemente importante para justificar um debate num outro momento que não este, em que estamos a votar, em especialidade, o Orçamento.
Queria apenas referir que julgo que a interpretação que é dada pelo Sr. Deputado Magalhães Mota, no que diz respeito a não poder haver propostas de autorização legislativa por parte da Assembleia, é óbvia, consta do Regimento. Já quanto à injunção que a Assembleia faça ao Governo, no sentido de legislar de uma determinada maneira, que obriga o Governo a uma proposta de autorização legislativa, penso que é uma forma de tornear o Regimento - nós usamo-la - e este terá de ser revisto nesse sentido porque não é correcto o modo como está expresso o artigo referente a essa matéria.
Mas, repito, julgo que não é este o momento para entrarmos num debate aprofundado da questão, será a propósito da Lei do Enquadramento do Orçamento que poderemos analisar o problema levantado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lobo Xavier.

O Sr. Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, sem querer maçar os Srs. Deputados, quero dizer mais o seguinte: julgo, ao contrário do que diz o Sr. Deputado Rui Machete, que este é o momento para ficar assente qual é a opinião dos Srs. Deputados e dos grupos parlamentares sobre esta questão, porque isso implica, pelo menos, a reformulação de uma série de propostas de alteração, de substituição ou de aditamento que estão já na Mesa.
Quero ainda dizer que nós não somos da opinião de que aquilo de que a Constituição não fala não pode ser feito. Essa é uma interpretação à qual nós não propendemos a aderir.
É preciso ver que o facto de o Governo não cumprir ou não executar as autorizações legislativas que lhe são fornecidas se vira contra aquilo que disse
O Sr. Deputado Magalhães Mota, porque o Governo também não dá cumprimento às autorizações que ele próprio pede e, portanto, as coisas ficam em pé de igualdade.
Além disso, essas autorizações, se forem correctamente redigidas e se respeitarem os requisitos do artigo 168.º da Constituição, colocam sérios entraves ao Governo, como já foi visto o ano passado a propósito da revisão do imposto complementar. Só por que um pedido de averiguação de inconstitucionalidade, feito pelo Sr. Presidente da República, não foi correctamente redigido é que o Tribunal Constitucional não se pronunciou no sentido da violação de certas medidas legislativas do Governo em matéria de imposto complementar e de violação de balizas que foram fixadas pela Assembleia sem que o Governo as tivesse pedido.
Portanto, a fixação dessas balizas em autorizações legislativas tem efeitos práticos, que são os de limitar a legislação do Governo nesses domínios. Por outro lado, temos imensas dúvidas sobre a admissibilidade de imposições de legislação ao Governo, temos as maiores dúvidas sobre a constitucionalidade dessas medidas que o Sr. Deputado Magalhães Mota propõe. A alternativa única à concessão dessas autorizações legislativas parece-me ser a da inclusão de verdadeiras normas na proposta de Orçamento do Estado, que têm um defeito fundamental - volto a lembrar -, que é o de serem normas que vão estar no sistema fiscal apenas por um ano, contribuindo para a confusão e para a falta de clareza do mesmo.
Portanto, achamos que o sistema não é violado, pois há que considerar que há algo de especial nessas autorizações legislativas e seria bom que esta Câmara as aceitasse. Há muita doutrina que já diz isso e, segundo penso, di-lo bem - excluindo este modesto autor que, com certeza, naquilo que já escreveu, não terá razão, como a têm outros.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos terminar os nossos trabalhos, pois está na hora regimental. Quero lembrar a VV. Exas. que amanhã o Plenário abrirá às 10 horas e 30 minutos.
S. Ex.ª o Sr. Presidente da República chegará às 11 horas e a parte da manhã da sessão será dedicada à comemoração dos 10 anos da Constituição. Os trabalhos hoje interrompidos terão continuidade a partir das 15 horas de amanhã.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 21 horas.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Arménio dos Santos.

Partido Socialista (PS):

António Gonçalves Janeiro. José Manuel Torres Couto.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Campos Rodrigues Costa. Zita Maria de Seabra Roseiro.

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I SÉRIE - NÚMERO 49

Centro Democrático Social (CDS):

João da Silva Mendes Morgado. José Augusto Gama. Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Aurora Margarida Borges de Carvalho. Manuel da Costa Andrade. Mário Júlio Montalvão Machado.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues. António Manuel Ferreira Vitorino. Carlos Montez Melancia. José Luís do Amaral Nunes. Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.

Mário Nunes da Silva. Raúl da Assunção Pimenta Rêgo.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Bártolo de Paiva Campos. José Maria Vieira Dias de Carvalho. Maria Cristina Albuquerque.

Partido Comunista Português (PCP):

Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Centro Democrático Social (CDS):

Joaquim Rocha dos Santos. Narana Sinai Coissoró. Pedro José del Negro Feist.

Os REDACTORES: Carlos Pinto da Cruz - Maria Amélia Martins.

PREÇO DESTE NÚMERO 133$00

Depósito legal n.º 8818/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

PORTE
PAGO

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