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11 DE ABRIL DE 1986 2075

Penal, que só poderia eventualmente decorrer de uma profunda análise da natureza e alcance da mesma reforma.
Não se quis, não se podia - nem se deveria, nas precisas circunstâncias do arranque da iniciativa - prover, directa, principal ou especificamente, aos problemas e aos objectivos de uma «amnistia técnica».
Reconhece-se indiscutivelmente a necessidade de preparar as condições funcionais à aplicação desbloqueada do novo Código de Processo Penal; comunga-se da preocupação de acorrer aos problemas dramáticos do excesso de população prisional; alinha-se com os que propõem um combate de emergência ao congestionamento do serviço dos tribunais, designadamente do penal.
Como é óbvio, o contributo acessório ou adicional para a menorização da crise e atenuação dos rigores nessas áreas e as vantagens que decorrem por simples arrastamento não deixaram de influir no avanço da iniciativa, mas em limites restritos. Todas as achegas que ajudem à correcção dessas distorções merecerão o nosso acolhimento.
Não estava no ânimo dos promotores e subscritores da iniciativa, porém, outro tipo de amnistia que não o projectado, nem tão-pouco dispunham de elementos considerados unanimemente indispensáveis para proceder ao alargamento do seu âmbito, criteriosa e responsavelmente.
Dir-se-á, em síntese, que se desconhecia o teor e alcance da reforma do Código de Processo Penal e, em consequência, a natureza rigorosa dos bloqueios à sua aplicação, situação prejudicial para uma avaliação correcta das medidas a adoptar.
Não se dispunha de um levantamento preciso e prévio do número e tipo de processos pendentes e em atraso, da fase em que se encontram, das razões da acumulação por áreas, da fase do cumprimento das penas dos detidos, dos crimes geradores das sanções, o que impedia saber-se, com exactidão ou aproximadamente, a projecção real das medidas exigidas para um correcto «saneamento» da situação. Por outro lado, a pressão das circunstâncias não viabilizaria a recolha ampla, esclarecida e atempada desses elementos.
Não subscrevemos, portanto, coerentemente, a generosidade das sugestões do Governo, que, a consumarem-se, dariam à amnistia uma extensão que exorbitaria dos limites pensados e que ocorreria a «expensas exclusivas» da Assembleia da República, sem a merecida consciência crítica, por escassez de dados.
Mas o Governo dispõe, entretanto, de dados bastantes para a consideração da oportunidade e justificação de uma iniciativa mais ampla.
Adoptou-se, por isso mesmo, uma atitude de comedimento realista e de prudência, na conformidade das causas e fins da iniciativa, rejeitando a hipótese de um excesso eventual da sua dimensão em termos de gravidade dos crimes.
Com crescente preocupação e um doloroso sentimento de angústia, assiste-se, é certo, à agudização da crise da justiça.
Permitam-me, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que aproveite o ensejo para fazer um «parêntesis-alerta». Ninguém consegue permanecer indiferente ao que ocorre. A justiça atrasa-se e, em consequência, denega-se; os processos acumulam-se e, em consequência, a qualidade do tratamento das soluções degrada-se; o crime multiplica-se e as prisões estão a abarrotar, pelo que não virá longe o dia em que os condenados aguardarão em liberdade a vez para cumprirem as penas (o que, segundo informações que foram feitas na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, já não é caso inédito no mundo).

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não podemos permanecer insensíveis aos dramas prisionais crescentes. Como alguém disse, as cadeias transformaram-se em espaços de violentação de direitos humanos elementares, onde os «lobos já uivam» e gente cumpre penas a «dobrar» em termos de carências e de sofrimento.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Muito bem!

O Orador: - Não será descabido republicar alguns dados para uma reflexão reiterada e atenta.
Em 1985 os serviços de justiça conseguiram terminar apenas 37,37% do total dos processos penais em fase de julgamento que, entrados de novo ou já pendentes, lhes foram distribuídos; em menos de três anos a população prisional aumentou em mais de 80%, abeirando-se agora dos 10 000 reclusos, dos quais mais de um terço são preventivos; a capacidade global de alojamento do nosso sistema prisional oscila apenas entre os 5 000 e 6 000 lugares, o que significa que a população de detidos excede no dobro aquela capacidade. Cada um que imagine as consequências.
De 1974 a 1985 a percentagem de presos aumentou 400% e o número de detidos cresce mensalmente, salvo erro, a um ritmo de 120.
Entretanto, nos últimos 10 anos creio que não se construiu qualquer novo estabelecimento prisional, mas está em perspectiva a construção de três, cujas demoras serão necessariamente prolongadas.
O Instituto de Reinserção Social não funciona. Os males acumulam-se. O esforço para nos situarmos na «actualidade», Sr. Presidente, Srs. Deputados, passa, necessariamente, por vias estruturais. Não serão a descriminalização legislativa, os agraciamentos comemorativos, as eleições periódicas o caminho para o êxito.
Fechado este parêntesis alarmante, retomo as questões centrais do projecto. Há um aspecto que pode naturalmente suscitar dúvidas. Refiro-me à relativa particularização de certas partes da amnistia, de certo modo não compatíveis com a natureza genérica e as finalidades que presidem à sua outorga.
Houve, todavia, a preocupação, quiçá não perfeitamente conseguida, de obediência a uma aplicação igualitária e equitativa, até onde possível, e aconselhável da lei.
Este objectivo de equidade encontra também resistências assinaláveis, de ordem técnica, noutras áreas que mereciam tratamento mais ajustado - e a que se pretenderá obviar na especialidade na medida do possível.
Seremos, finalmente, os derradeiros comentários a um aspecto que consideramos importante nesta questão das amnistias. Refiro-me à repercussão pública do projecto.
A decretação de uma amnistia reveste-se habitualmente de grande delicadeza.
Não vale a pena escamotearmos os obstáculos reais e ampararmo-nos em vírgulas, parágrafos, metáforas.