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l Série - Número 69
Sexta-feira, 16 de Maio de 1986
DIÁRIO
da Assembleia da República
IV LEGISLATURA
1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1985-1986)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 15 DE MAIO DE 1986
Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto Bastos da Mota Torres
Rui Sá e Cunha
José Manuel Maia Nunes de Almeida
SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 35 minutos.
Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos, da resposta a alguns outros e da entrada de diplomas na Mesa.
O Sr. Deputado Agostinho de Sousa (PRD) criticou alguns dos aspectos relativos à conversão e obras de ampliação em curso do porto de Viana do Castelo. Respondeu, no fim, a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Roleira Marinho (PSD).
O Sr. Deputado Sottomayor Cardia (PS) abordou algumas questões quanto ao funcionamento da comissão criada para discussão da proposta de lei n." 5/1 V, sobre a atribuição de um canal de televisão à Igreja Católica. Respondeu, no final, a pedidos de esclarecimentos dos Srs. Deputados Alexandre Manuel e José Carlos Vasconcelos (PRD).
A Sr. º Deputada lida Figueiredo (PCP) contestou a manutenção do regime de situação económica difícil para a TA P e exigiu a revogação dessa medida.
O Sr. João Teixeira f PSD) elogiou a recente visita de diversos membros do Governo à cidade de Chaves para tratar de vários problemas daquela região.
O Sr. Carlos Matias (PRD) referiu-se à passagem dos 75 anos da criação do primeiro organismo de turismo em Portugal e do Congresso Internacional de Turismo realizado na mesma data no nosso pais.
O Sr. Deputado João Abrantes (PCP) criticou um projecto de decreto-lei que visa retirar à Biblioteca Municipal de Coimbra o depósito legal das publicações editadas. Respondeu, no final, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Sá Furtado (PSD), Santana Maia (PS), Joaquim Domingues (PSD) e Manuel Queiró (CDS).
O Sr. Deputado Sá Furtado (PRD) realçou a importância do Festival Internacional de Cinema da Figueira da Foz, tendo, depois, respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Santana Maia (PS), João Abrantes (PCP), Pereira Coelho (PSD) e Sá Furtado (PRD).
Após leitura do parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias - que foi aprovado -, relativo aos recursos apresentados pelo PCP e MDP/CDE, sobre a admissão da proposta de lei n." 21/l V, que concede autorização para o Governo legislar em matéria de processo penal, intervieram, a diverso titulo, além do Sr. Ministro da Justiça (Mário Raposo), os Srs. Deputados José Magalhães (PCP), António Taborda (MDP/CDE). Sottomayor Cardia (PS). Costa Andrade (PSD). José Manuel Mendes (PCP), José Carlos Vasconcelos (PRD). Andrade Pereira (CDS) e Amónio Vitorino (PS).
Lido o relatório e parecer da Comissão de Administração Interna e Poder Local, procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n. º 82/1V - Revogação do n." 4 do artigo 14. º da Lei Quadro dos Municípios, apresentado pelo PS, e 95/1V - Sobre a criação de municípios, apresentado pelo PCP, que foram rejeitados. Intervieram no debate, a diverso título, os Srs. Deputados Agostinho Domingues (PS), João Amaral (PCP), Manuel Moreira (PSD), Oliveira e Silva (PS), Antónia Feu (PRD), Eduardo Pereira (PS), Lopes Cardoso (Indep.), Abreu Lima (CDS), Roleira Marinho (PSD), Amónio Taborda (MDP/CDE), António Capucho (PSD), Horácio Marçal (CDS), Ribeiro Teles (Indep.). José Manuel Mendes (PCP) e Silva Marques (PSD).
Entretanto, depois de o Sr. Deputado Carlos Candal (PS) ter procedido à leitura de um relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, o projecto de lei n. º 173/1V - Lei da amnistia foi aprovado em votação final global.
Produziram declarações de voto os Srs. Deputados José Manuel Mendes (PCP), Agostinho de Sousa (PRD), Licinio Moreira (PSD), Andrade Pereira (CDS), António Taborda (MDP/CDE) e Carlos Candal (PS).
Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.º 81/IV (do deputado independente Lopes Cardoso), 83/IV (do deputado independente Ribeiro Teles) e 98/1V (do PCP), relativos à criação do concelho de Vizela, que, após votação nominal, foram rejeitados.
Intervieram, a diverso título, os Srs, Deputados Lopes Cardoso (Indep.), Silva Marques (PSD), Ribeiro Teles (Indep.), Horácio Marçal (CDS), José Manuel Mendes (PCP). Magalhães Silva (PS), Fernando Conceição (PSD), Oliveira e Silva (PS) e Antónia Taborda (MDP/CDE).
O Sr. Presidente encerrou a sessão era l hora e 10 minutos do dia seguinte.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 35 minutos. Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio Gaspar Rodrigues
Adérito Manuel Soares Campos
Adriano da Silva Pinto
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Alberto Monteiro Araújo.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Paulo Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio dos Santos.
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Próspero Luís.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Mendes Costa.
Francisco Rodrigues Porto.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
Henrique Rodrigues Mata.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João José Pimenta de Sousa.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Filipe Ataíde Carvalhosa.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Maria Peixoto Coutinho
José Mendes Bota
José Mendes Melo Alves.
José Pereira Lopes.
Licinio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luis Jorge Cabral Tavares Lima.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Maria Moreira.
Maria António Cardoso Moniz.
Mário Jorge Belo Maciel
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Agostinho de Jesus Domingues
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Manuel Ferreira Vitorino.
António Miguel de Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel Pereira Pinto.
Fernando Henriques Lopes.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
Jorge Lacão Costa.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Meirinhas Santana.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raúl da Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Partido Renovador Democrático (PRD):
gostinho Correia de Sousa.
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Eduardo de Sousa Pereira.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo Paiva Campos.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Eurico Lemos Pires.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
João Barros Madeira.
Joaquim Carmelo Lobo.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Carlos Torres Matos Vasconcelos
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Fernando Pinho da Silva.
José Luís Correia de Azevedo.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo da Costa Carvalho.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.
Victor Manuel Lopes Vieira.
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Partido Comunista Português (PCP):
António Anselmo Aníbal.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
José António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel dos Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Odete Santos.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
António Filipe Neiva Correia.
António José Tomás Gomes de Pinho.
António Vasco Mello César Menezes.
Henrique José Pereira de Moraes.
Hernâni Torres Moutinho.
João Gomes de Abreu Lima.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Maria Andrade Pereira.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
António Monteiro de Almeida Taborda.
Deputados independentes:
António Poppe Lopes Cardoso.
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura do expediente.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Abaixo-assinado
De professores da Escola Preparatória de Ílhavo, relativamente à problemática da lei de bases do ensino, dando o seu apoio a uma exposição apresentada por colegas da Escola Preparatória do Poeta Manuel da Silva Gaio, de Coimbra, e repudiando as tentativas de marginalização dos professores do ensino preparatório.
Cartas:
De António Joaquim Sousa, residente em Burgães, Vale de Cambra, dando conta da situação em que foi colocado, com a suspensão pela Segurança Social do complemento de cônjuge, e solicitando a intervenção desta Assembleia para que possa ser reposta a justiça a que diz ter direito.
Da Comissão Pró-Sindical da Polícia de Segurança Pública - Zona Norte, remetendo documento que se refere a diplomas existentes nesta Assembleia (Lei da Segurança Interna e Regulamento Disciplinar da PSP).
De Vasco Marques, residente no Bombarral, tecendo considerações sobre assuntos relacionados com problemas sociais, métodos da televisão e os serviços nos CTT, solicitando a sua divulgação por todos os grupos parlamentares.
De Diniz Nazaré, residente em Lisboa remetendo uma proposta para criação de um espaço de rádio na Antena l da RDP com a intenção de apoiar e complementar a projectada «Caravana Portugal/CEE», de que é co-autor.
Do Movimento para a Restauração do Concelho de Vizela, enviando fotocópias de documentos confirmativos da adesão das nove freguesias inseridas nos projectos de criação do concelho de Vizela, que reforçam a sua posição para a justiça que pretendem.
Da Federação das Juntas de Freguesias de Guimarães, dando conta da reunião que efectuaram no passado dia 12 do corrente para análise da situação que pode vir a ser originada pela revogação da Lei Quadro dos Municípios, para efeitos do caso Vizela, e apresentando várias propostas.
Ofícios
Do Agrupamento de Municípios do Vale de Lima, com sede em Viana do Castelo, remetendo exemplar de uma moção aprovada, por unanimidade, em reunião realizada no dia 28 de Abril transacto, relativamente às condições deficientes em que naquela zona são recebidas as transmissões da RTP.
Da Assembleia Municipal de Paredes, enviando o texto de uma moção aprovada em reunião realizada no passado dia 30 de Abril sobre a construção da escola preparatória naquele concelho.
Do Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Alimentares de Hidratos de Carbono do Sul e Ilhas, com sede em Lisboa, remetendo moções aprovadas por trabalhadores de várias empresas do sector da panificação, com vista à publicação de nova portaria de regulamentação de trabalho.
Da Associação Nacional das Farmácias, com sede em Lisboa, remetendo um exemplar das conclusões da assembleia geral de delegados que se realizou nos dias 11, 12 e 13 de Abril findo, no Vimeiro.
Da Assembleia Municipal de Montemor-o-Velho e da Assembleia Municipal do Concelho de Paredes de Coura e telegrama da Câmara Municipal da Guarda, todos no sentido de repudiarem a discriminação de que foram alvo no que se refere às verbas do FEDER.
Da Câmara Municipal de Guimarães, rementendo um exemplar do documento que serviu de base à conferência de imprensa que, conjuntamente com as Câmaras de Felgueiras e Lousada, promoveram na passada sexta-feira, dia 9 do corrente, acerca do «caso Vizela», solicitando a sua leitura.
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O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Na última sessão foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: a diversos ministérios (3), formulados pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo; ao Ministério da Educação e Cultura, formulados pelos Srs. Deputados Francisco Armando Fernandes e António Osório; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Adriano Moreira, Carlos Carvalhas e Carlos Brito, respectivamente; ao Ministério dá Educação e Cultura (3), formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos; ao Ministério das Finanças, formulado pelos Srs. Deputados Anselmo Aníbal e Jerónimo de Sousa; a diversos ministros (3), formulados pelos Srs. Deputados António Tavares e Miguel Relvas; à Secretaria de Estado dos Desportos, formulado pelo Sr. Deputado Raul Junqueiro; à EDP, formulado pelo Sr. Deputado José Francisco Amaral; ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Brasileiro; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado António Mota; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Mário Belo Maciel; à RTP, formulado, pelo Sr. Deputado Soares Campos.
Foram ainda recebidas do Governo respostas aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: António Barreto, na sessão de 10 de Dezembro; Rogério Moreira,' nas sessões de 19 de Dezembro e 6 de Fevereiro; Jorge Lemos, nas sessões de 21 e'28 de Janeiros 6 e 18 dê Fevereiro; Francisco Armando Fernandes, nas sessões de 30 de Janeiro e 11 de Março; Jerónimo de Sousa, 'na sessão de 20 de Fevereiro; Raul Junqueiro, na sessão de 25 de Fevereiro; António Sousa Pereira, nas sessões de 4 de Março e 3 de Abril; Carlos Martins, na sessão de 10 de Março; Ângelo Correia e Magalhães Mota, na sessão de 18 de Março, respectivamente; Eduardo Pereira e Custódio Gingão, na sessão de 19 de Março, respectivamente; Cláudio Percheiro, na sessão, de l de Abril; Corujo Lopes, na sessão de 8 de Abril.
O Sr. Presidente: -"Srs. "Deputados; o Sr. Secretário vai enunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.
O Sr.º Secretário (Reinaldo Gomes): - Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: projecto, de lei n.º 204/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Raul Junqueiro e outros, do PS sobre a lei da radiodifusão, que foi admitido e baixou à l.ª Comissão; projecto de lei n.º 203/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Manuel Vaz Freixo e outros, do PSD, propondo a alteração dos limites da freguesia de Lapa do Lobo 'no concelho de Nelas, que foi admitido e baixa à 10.º Comissão; proposta de lei n.º 24/IV, sobre o licenciamento de estações emissoras de rádio, que foi admitida e baixa à 1.ª Comissão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Ex.mº Sr. Presidente da Comissão Eventual de Timor Leste convoca os Srs. Deputados que fazem parte da referida Comissão. para a reunião que se realiza na sala 250-G, no próximo dia ,16 do corrente, pelas 11 horas. Este aviso é determinante para ficar sem efeito a reunião que estava marcada para hoje às 16 horas.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho de Sousa.
O Sr. Agostinho de Sousa (PRD): - Questiono pela primeira vez nesta Assembleia um importante problema do distrito pelo qual fui eleito.
O povo que nos elegeu, na sua maioria, não conhece, com rigor, as competências respectivas, a natureza das funções e a qualidade jurídico-político-constitucional do deputado, a quantidade, a urgência, as prioridades, a complexidade e o valor das questões políticas e legislativas com que se debate e que o absorvem contraditoriamente; porém, continuam a ser os problemas diários, as carências elementares para uma sobrevivência digna, as indiferenças do poder e as injustiças sociais não resolvidas, os erros e os divórcios dos seus eleitos que lhe marcam, preocupante e dolorosamente, a vida quotidiana.
Por isso, aguarda e exige que a nossa presença dê voz às suas queixas e às aspirações concretas e essenciais, seja um pouco o rosto e o sentimento das suas dificuldades e não traia o voto de confiança com que nos distinguiu. A ligação com o eleitorado assume aqui um papel decisivo, por vias travessas.
Sinto, confesso-o, uma vaga sensação de constrangimento perante tantas «distâncias» acumuladas e concluo pela necessidade, cada vez maior, de um ajustamento institucional, criador de uma estrutura de representação e poder regional alargada, para que as nossas tarefas em 'prol dos interesses locais sejam mínima e consequentemente eficazes.
Para que se não sinta a sensação, por vezes penosa, de que devemos ir «cantar para outra freguesia», como se diz na gíria da nossa terra...
Confronto o poder com um problema velho para o qual se reclamam soluções novas, que está em marcha,, mas precisa de ser acelerado, que respeita próxima e directamente a Viana, mas é nacional, que é uma história permanente de preocupações passadas, mas, agora, sobretudo, de interrogações e interesses futuros.
Refiro-me à reconversão do porto de Viana do Castelo, às obras de ampliação em curso.
Trata-se de uma infra-estrutura essencial para a dinamização do crescimento sócio-económico daquela e das regiões próximas.
Além de constituir um pólo real de "desenvolvimento económico do noroeste minhoto, virá complementar o porto de Leixões no apoio "a toda a região norte e permitir uma acção decisiva na luta para o reequilíbrio das graves assimetrias regionais, como sé ponderava num relatório do Ministério .da Habitação, Obras Públicas e Transportes distribuído aos órgãos da comunicação social em 28 de Outubro de 1982.
Está terminada a primeira fase das obras, há deficiências incompreensíveis quanto à implantação de algumas infra-estruturas necessárias ao regular e capaz funcionamento do porto no seu actual estado de desenvolvimento; desconhece-se a data da conclusão definitiva dos acessos rodoviários e ferroviários, o assoreamento afecta uma zona importante do porto, os trabalhos de dragagem para o aprofundamento do ante-porto, dos canais de acesso e das bacias de manobra fronteiras ao cais são insuficientes.
Estes aspectos, também essenciais, proponho-me abordá-los logo que obtidos os esclarecimentos que requeri ao Governo em 18 de Março de 1986.
As preocupações sobre o destino do porto de mar e a sua aptidão para> satisfazer os grandes objectivos que determinaram o empreendimento crescem, alheias a divergências de raiz ideológica em pessoas e entida-
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des dos mais diversos quadrantes, numa aproximação e identificação que assenta, exclusivamente, na defesa dos interesses colectivos.
Ainda recentemente, numa reunião do Rotary Club de Viana, o actual presidente da Câmara alertava os circunstantes e a cidade de que são agora as próprias esferas governativas a interrogarem-se se não terá sido um fracasso a construção de um novo porto de Viana do Castelo, acrescentando que não reúne as condições necessárias e suficientes para cumprir a sua missão... Aviso tardio e inadmissível, a confirmarem-se os receios.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na origem deste processo - e isto é fundamental - há aspectos políticos e de política económica cuja omissão não permitirá uma perspectiva aprofundada e correcta do problema, o que diz respeito não apenas a este investimento, mas aos investimentos em geral que se fazem neste país.
Porquê o desleixo perante a verdade, se não mesmo o temor à sua dureza?
Nessa altura, foram já investidos cerca de 3 milhões de contos, sendo certo que o investimento previsto uns anos antes não excederia os 400 000 contos.
Perante uma obra desta envergadura e dos riscos e incertezas que comporta, nenhum vianense, em particular, e nenhum cidadão ou político, em geral, poderá manter-se distraído ou indiferente.
Hoje cingir-me-ei a esses aspectos, porventura menos tratados, por conveniência ou mera ignorância, cuja ambiguidade e falta de transparência se mantêm perante a opinião pública.
Deixarei para outra ocasião as questões mais visíveis do icebergue, algumas eivadas de chocante e temível caricatura, como sejam a falta de um sistema de potabilização de água, fornecida à tarefa por motobombas de corporações de bombeiros locais, o grave assoreamento imprevisto mas previsível e já confirmado, a instalação de sistema de iluminação eléctrica instalado de emergência, com dispêndios condenados à inutilidade após a instalação definitiva e o mais que os et caetera agora necessários encobrem.
A estes aspectos, silenciados pela natureza e oportunidade deste trabalho, juntam-se outros sobre planificação, erros técnicos, violentação discutível e irremediável da paisagem, etc., que ficarão a aguardar a vez e a voz.
Questão histórica, económica, social e política tradicional e decisiva para os destinos da região, acabou por transformar-se, também, num verdadeiro caso passional de urgência e de exigência, pouco sensível à controvérsia pública, e que iludiu a necessidade de uma serena, sistemática, ampla e correcta análise global, cobrindo vantagens e desvantagens de curto, médio e longo prazos, inserção no novo regime económico-político, etc.
A necessidade, centenária e umbilical, tornou-se quase dogmática. E assim não se eurou de aprofundar, fria e inteligentemente, os limites, as conveniências e as restrições possíveis ao seu lançamento, concretização e desenvolvimento, naquela perspectiva complexa.
Esta convicção de obra imprescindível, que se arreigou no sentimento colectivo, ajudou a criar uma autêntica barreira emotiva a uma discussão pública, inteligente e realista, o que permitiu a instalação de alguns tabus quase intocáveis e consentiu a prática de erros evitáveis e graves que podem ser irremediáveis.
Daí que a aparente e generalizada adesão ao projecto, silenciosa ou falada, tenha sido uma atitude muito mais passiva que activa, muito mais sentimental que lúcida, mais imposta pela força das circunstâncias do que do consenso. Enfim, muito menos livre e esclarecidamente assumida do que pareceu, se desejava e se impunha.
Criou-se um vazio que levou a enfrentar o empreendimento sem o adequado pensamento e vigilância críticos.
Com um sentimento e num clima colectivo prévios que predispuseram à aceitação da impunidade de qualquer erro ou falha e solidificaram o alheamento perante algumas dúvidas e preocupações, que ainda esperam uma resposta, porventura nesta altura já platónica e inútil.
A aspiração de um porto capaz encontrava-se ligada à vocação colectiva, de sangue e raiz, de Viana para o mar. Porém, a decisão definitiva terá ocorrido no «consulado marcelista».
O projecto transita para o pós-25 de Abril sem modificações apreciáveis no que respeita aos princípios fundamentais da sua motivação e utilidade social.
A primeira dúvida, que nenhum dos governos provisórios ou constitucionais se empenhou, se dispôs, quis, pôde ou achou conveniente esclarecer, a primeira e inevitável grande perplexidade, surge, pois, com esta quase total, imprevista e curiosa coincidência do projecto em duas épocas de estruturas sócio-político-económicas diversas e irredutíveis.
Teme-se, muito naturalmente, que se trate de coincidências injustificadas, à revelia de regras democráticas relevantes.
O desafio renova-se nesta hora - que alguém responsável explique, quando, onde, como e por que meios esta questão essencial de projecto, de regime e de ética política influiu, determinou ou em que medida foi tomada em conta na recuperação do projecto inicial.
Certo que é possível invocar a urgência da obra contra o apelo dos princípios, a pressão dos interesses colectivos imediatos, a luta pelo desenvolvimento e contra o desemprego, a carência de uma via marítima renovada e ampliada para apoio e viabilização de novas indústrias, etc.
De qualquer modo, uma política de verdade, num país novo e em transformação, exige, em nome de princípios óbvios, a colaboração do poder num simples esclarecimento.
É que as opções regionalizam-se, também, e necessariamente, pela informação e discussão adequadas (ao menos...).
Bem sabemos que será o povo - sobretudo ele - que terá de descobrir, para além dos actos eleitorais, à custa de novos sacrifícios e frustrações, que a defesa principal dos seus interesses, que a criação de riqueza e a produção de bens subordinados à sua aptidão para lhe serem úteis, não é somente uma questão teórica de regime e de projecto político ou de programa, mas também uma de uma luta constante para o seu cumprimento efectivo e a sua consagração na prática diária.
Nunca houve, também, antes do 25 de Abril - o que se entende - nem depois - o que é inintelegível - um programa oficial, pensado e efectivamente desejado e realizado, de participação pública no debate que se impunha, encarado como um conjunto de acções organizadas, de iniciativa da administração central e
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local, com a colaboração das. várias forças políticas, de paisagistas, de urbanistas, de técnicos de transportes e de. obras públicas, de pescadores profissionais, de associações de classe, de empresas (especialmente de construção naval; e utentes ido Porto...), de ecologistas, etc., envolvendo pessoas e territórios de Viária e de outras regiões do País - do Minho, de Trás-os-Montes, do Douro, etc.
Seguiu-se tradicional política do facto consumado, soberano, para satisfazer desígnios menos claros, por vezes, à excepção de algumas iniciativas isoladas do poder, de âmbito reduzido ou específico.
Tão pouco se fez a elementar e imprescindível pedagogia democrática dos resultados, não se explicou, com elementos concretos e sérios, a utilidade social imediata e futura da obra, recenseamento também os visíveis e inevitáveis danos, sobretudo os pesqueiros e paisagísticos; não se previu, .sequer,,, a solução para os terraplenos roubados ao leito do rio mutilado.
Enfim, nunca houve a inteligência, a vontade e a capacidade administrativa e política para impor, pela disciplina do esclarecimento, a adesão, das populações à importância, à dimensão real da obra e aos seus custos.
Em termos de futuro e de democracia este divórcio pelas exigências de planificação, da utilidade social, por um projecto político que tenha efectivamente sem conta os interesses, das regiões e das pessoas tem um preço inevitável e pesado.
O futuro dirá, na circunstância, qual o seu exacto montante. O presente, Sr. Presidente, e Srs. Deputados, já começou a dizê-lo.
Aplausos do PRD, do PCP e do MDP/CDE
O Sr: Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Roleira Marinho.
O Sr. Roleira Marinho (PSD):- Sr. Deputado Agostinho de Sousa, eu, os deputados do PSD do distrito de Viana do Castelo, bem como toda a bancada
social-democrata, atentos aos problemas da nossa região, não podíamos deixar de ouvir, com a atenção devida a intervenção de V. Ex.ª.
Em certo ponto ficou-nos a impressão de que V. Ex.ª iria reinvidicar - como em parte fez - que é necessário continuar esta obra imprescindível para o desenvolvimento do nosso distrito. Mas, ao longo da sua intervenção, ficaram-nos dúvidas se na realidade é esta a perspectiva do Sr. Deputado e do seu grupo parlamentar. Porque mais do que reivindicar a melhoria daquilo que está mal, das condições técnicas do porto, que ficaram aquém do que seria desejável (talvez porque os estudos não tenham sido os mais felizes e em parte seja necessário revé-los e modificar ou ampliar o que está feito), ficou-nos a ideia que o Sr.Deputado contestou a obra, no seu conjunto, na sua globalidade. Em relação a isso, somos contra, porque não há desenvolvimento na nossa terra se não houver vias de comunicação e uma delas - como V. Ex.º referiu na sua intervenção - é o mar. Viana do Castelo nasceu com o mar, desenvolveu-se com o mar e tem muito a esperar da estrada que é o mar.
Foi por isso, Sr. Deputado, que levantei a minha voz e que, embora concordando com as críticas e com a reivindicação que fez de que o porto de Viana do Castelo tem de continuar e tem de ser melhorado, alerto para que existem verbas no Orçamento do Estado que duvido que as entidades locais ligadas à administração
do porto tenham capacidade de utilizar durante ó ano de 1986, porque se a tiverem estou convencido de que o porto andará para a frente, e se melhorará, substancialmente, aquilo que é necessário melhorar.
Temos de reivindicar todos juntos, os deputados do distrito e o Parlamento, no seu conjunto, para que a obra que é o porto de Viana do Castelo não fique parada porque, como disse, Viana deve tudo ao mar e tem a esperar tudo do mar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho de Sousa.
Ò Sr. Agostinho de Sousa (PRD): -Sr. Deputado, quero esclarecer que estarei afastado em razões da concepção crítica e política do Sr. Deputado. O facto de se tratar de uma obra, que diz respeito a um distrito não quer dizer que eu, deputado desse distrito, não faça a crítica que deve ser feita em termos nacionais quanto à gestão dos próprios recursos e do desenvolvimento da própria obra.. Mas é claro que, tanto como, o Sr. Deputado e ò seu partido, o PRD está interessado no desenvolvimento da própria cidade de Viana do Castelo, e do País em geral.
Ó que aqui quis trazer, foi unia afirmação critica quanto a erros gravíssimos de gestão dós nossos próprios meios e um alerta aos responsáveis para a essa situação. Por um lado, em termos de prevenção geral, a fim de que se consiga futuramente a nível nacional em todos os investimentos desta envergadura ó tipo de orientação de política económica que há que fazer, e, por outro lado, para que no caso concreto de Viana do Castelo se possa, neste momento, obviar ao agravamento, de erros quê são claríssimos, tentando emendá-los e, na medida do possível, evitar o seu agravamento, sem .prejuízo da continuação das próprias obras.
Mas repare, Sr. Deputado, que isso não se consegue através da continuação, de olhos fechados, das próprias obras só porque se trata de um investimento que interessa à cidade. Sr. Deputado, o que lhe estou a dizer envolve um princípio dê crítica àquilo que está a ser feito na cidade. Fizemos ao Governo cerca de 36 perguntas que ainda estão sem resposta e considerámos que elas serão fundamentais para poder responder cabalmente às suas perguntas.
O que lhe digo, em primeiro lugar, é que somos inevitavelmente pela continuação dessa obra; em segundo lugar, não abdicamos, num centímetro que seja, das críticas que fizemos, porque as nossas perguntas estão ainda sem resposta e V. Ex." hão fez sequer o menor comentário a este tipo critico de orientação política e de concretização da própria obra; em terceiro lugar, bater-nos-emos pela concretização é pelo desenvolva mento do próprio porto, mas com sérias reservas quanto à capacidade de desenvolvimento demonstrado, que, em vez de ser corrigido, poderá estar a confirmar-se.
É esse o nosso propósito, é esse o nosso objectivo e apesar de deputados do distrito não deixaremos de pensar, sobretudo, em termos nacionais e de futuro, sem prejuízo de, enquadrando qualquer, empreendimento regional nestes princípios, o defendermos de qualquer maneira e com maior ardor e interesse. Aplausos do PRD; do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.
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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sottomayor Cardia.
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma das virtudes do Parlamento como legislador é a garantia de transparência do processo legislativo.
Entre as questões que, a curto prazo, ameaçam apaixonar os meios políticos e alguns círculos próximos do poder, conta-se a que o Governo suscitou com a apresentação da proposta de lei n.º 5/IV, relativa à concessão de um canal de televisão à Igreja Católica.
O debate realizado neste Plenário no dia 27 de Fevereiro demonstrou a frontalidade do Governo nesse particular e deu ocasião a que todos os partidos explicassem, com maior ou menor nitidez, as respectivas posições.
O interesse partidário táctico do PRD no aditamento do voto da proposta de lei n.º 5/IV -e só esse interesse- conduziu à apresentação, em 27 de Fevereiro, de um requerimento no sentido de a proposta de lei baixar a uma comissão ad hoc «para efeito de nova apreciação no prazo de 30 dias». A maioria dos Srs. Deputados (PSD, PRD e CDS) entendeu dever votar favoravelmente tal requerimento. O PS, como é sabido, votou contra.
A Comissão reuniu pela primeira vez em 24 de Abril e prosseguiu os seus trabalhos em 30 de Abril e em 5 de Maio. Nesta reunião foi obtida uma decisão sobre a chamada «metodologia a seguir nos trabalhos da Comissão». Tal «metodologia» foi formulada nos termos seguintes:
A Comissão deve pronunciar-se sobre a proposta de lei em apreço, sem prejuízo de serem consideradas as seguintes possibilidades regimentais: apresentação de projectos de lei, nos termos regimentais, susceptíveis de serem apreciados por esta Comissão, caso se liguem à matéria da proposta do Governo; apresentação de propostas de substituição e uma proposta do Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos (PRD), que foi a seguinte:
Que dentro dos seus poderes regimentais a Comissão decida se deve ou não apresentar à Assembleia da República um texto alternativo à proposta do Governo que enquadre constitucional e legalmente a abertura da televisão à iniciativa privada; que cada partido explicite o que entende dever ser consagrado num texto alternativo à proposta do Governo como linhas de orientação fundamentais; que os partidos se pronunciem sobre o método de trabalho a seguir na elaboração daquele texto, referindo se deve ou não ser constituído, e em que moldes, um grupo de trabalho no seio da Comissão, para levar a cabo a tarefa de redigir o texto alternativo.
Formulada esta proposta, os deputados do PS, entre outros, pediram algum tempo para a estudar, pelo que ficou decidido que todos os partidos se pronunciariam na reunião seguinte, que ficou marcada para as 9 horas e 30 minutos do dia 9 de Maio.
Tal reunião não se realizou por motivo de ausência dos Srs. Deputados do PSD, do PRD e do CDS, com excepção da Sr." Deputada Glória Padrão e do Sr. Deputado Gomes de Almeida, presidente da Comissão.
A 13 de Maio realizou-se nova reunião. O PS iniciou imediatamente a prestação da resposta prometida. E iniciou essa resposta pelo princípio, ou seja, pela primeira das questões colocadas. A saber: a apreciação da proposta de lei n.º 5/IV. Em primeiro lugar, pela necessidade de ordenar os raciocínios, as questões e as decisões. Em segundo lugar, porque o debate na generalidade fora já efectuado nas reuniões anteriores, em que o PS. sem êxito, apresentara propostas de auscultação da vontade dos principais interessados.
A referida resposta dada pelo PS consistiu na proposta seguinte: «Sem prejuízo do prosseguimento dos seus trabalhos, a Comissão dá ao Plenário o parecer de que a proposta de lei n.º 5/IV deve ser recusada.» A reunião passou então a decorrer sob o impulso de duas dinâmicas: o encadeamento de questões e incidentes processuais, por um lado, e sucessivas contradições da representação do PRD, por outro. E terminou, inclusive, por se haver chegado às 20 horas.
Alguns meios de comunicação social - e designadamente a televisão - fizeram-se eco de tal reunião em termos gravemente parciais. Um senhor jornalista da televisão chegou mesmo a pronunciar-se em termos ofensivos da competência dos poderes públicos.
O PS reafirma a sua plena disponibilidade para participar em todas as comissões formadas por esta Assembleia, desde que regimentalmente constituídas e conduzidas.
O PS entende, todavia, que assunto de tão grande relevo deve ser publicamente discutido e não pode confinar-se ao ambiente reservado de uma comissão parlamentar e, por maioria de razões, de um grupo de trabalho.
Sobre as questões agendadas para os trabalhos da Comissão, o PS declara o seu ponto de vista:
1.º A Comissão deve dar a este Plenário parecer negativo sobre a proposta de lei n.º 5/IV;
2.º A Comissão deve manter-se em funções para apreciar os projectos de lei que surjam, embora se verifique que, passado mais de mês e meio sobre a constituição da Comissão, nenhum deu entrada na Mesa da Assembleia da República ou foi sujeito à Comissão Eventual;
3.º O PS não abdica do direito de apresentar, quando o entender oportuno, mas autonomamente, um projecto de lei sobre a matéria em apreço, parte dela ou outra que a inclua.
Na verdade, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o PS considera impróprio da dignidade desta Assembleia que uma iniciativa legislativa, referente quer a direitos, liberdades e garantias quer ao sector da comunicação social, seja tomada de forma diluída, sem que se saiba o que, à partida, cada um pensa ou quer.
Quem, nesta Assembleia, entender necessário e urgente rever a Lei da Radiotelevisão tem um caminho, e apenas um caminho, a seguir: tomar a iniciativa de apresentar um projecto de lei. Por conseguinte, à primeira proposta do PRD - «que a Comissão apresente à Assembleia da República um texto alternativo à proposta do Governo» - o PS responde, a partir deste momento, pela negativa. Por razões de princípio e por razões de eficácia. Razões de princípio: a iniciativa legislativa deve ser assumida por quem a quer tomar, e até agora ninguém quis. Razões de eficácia: um grupo de trabalho, composto pelo CDS, pelo PSD, pelo PRD,
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pelo PS, pelo MDP/CDE e pelo PCP, poderá contribuir para circunscrever o domínio sobre o qual deve incidir um debate ou vários debates. Poderá obviamente apreciar iniciativas legislativas existentes que lhe sejam distribuídas. Afigura-se, todavia, claro que jamais conseguirá elaborar uma iniciativa legislativa sobre a matéria em apreço.
Não queremos ser responsáveis por confusões desnecessárias. Quando queremos legislar, procedemos por escrito, apresentando um articulado e assinando. É essa a nossa maneira de entender a ética parlamentar.
Aplausos, do PS e de alguns deputados do PCP.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, pediram a palavra os Srs. Deputados Alexandre Manuel e José Carlos Vasconcelos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Manuel.
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Sr. Deputado Sottomayor Cardia, desconhecia que V. Ex.ª tivesse sido nomeado porta-voz da Comissão. Eu, pelo menos, não votei em V. Ex.ª .
Segundo ponto, é uma quebra de ética, que tenho de classificar de muito grave, o Sr. Deputado vir aqui referir o que se passou no interior da Comissão, até porque algumas decisões foram adiadas por culpa de V. Ex. e do seu partido.
Aplausos do PRD, do PSD e do CDS.
Terceiro ponto, e mais grave ainda: a mentira. É que, ao contrário do que o Sr. Deputado diz, o PRD esteve presente em todas as reuniões. Em relação à reunião de sexta-feira, foi por ausência de outro partido, que não o PRD, que ela se não efectuou.
Aplausos do PRD e do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Sottomayor Cardia. V. Ex.ª responde de imediato ou no fim dos outros pedidos de esclarecimento?
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Respondo de imediato, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Deputado, agradeço as questões que pôs e aproveito, em primeiro lugar, para esclarecer que as comissões parlamentares não são sigilosas; em segundo lugar, os deputados têm o direito de no Plenário ou em público exprimir os seus pontos de vista. Não há porta-vozes de comissões, ou, se há, que não se iniba o direito à expressão de pensamento e à reposição da verdade dos factos por quem os conhece, inclusivamente por- quem deles participou e tem, portanto, direito a defender-se a si próprio, a defender o Partido Socialista e a defender o Parlamento.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - V. Ex.ª disse que eu mentia. Diga, se faz favor, onde é que eu menti? Na reunião de sexta--feira esteve presente a Sr.ª Deputada Glória Padrão...
O Sr. Alexandre Manuel (PRD;: - Dá-me licença que o interrompa Sr. Deputado?
O Orador: - Faz favor Sr. Deputado.
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - É que por parte do PDR, não esteve apenas presente a Sr.ª Deputada Maria Glória Padrão, mas esteve também presente o deputado Alexandre Manuel. Em representação do Partido Socialista estiveram presentes dois deputados, o que significa que também o seu partido faltou, até porque tem mais elementos na Comissão, que o PRD.
O Orador: - A razão por que a reunião se não efectuou foi devido à ausência dos deputados do PSD, do CDS e do PRD (excepto a Sr." Deputada Glória Padrão e o Sr: Deputado Alexandre Manuel). Por isso peço-lhe desculpa a si pessoalmente - e não ao seu partido -, pelo facto de ter omitido o seu nome, mas fi-lo por esquecimento. Fiz uma afirmação insuficiente, V. Ex.ª tem todo o direito de protestar, já lhe pedi desculpa pessoalmente. V. Ex." sentiu-se lesado na sua honra e consideração, eu dou a mão à palmatória na parte que diz respeito à presença de V. Ex.a, mas apenas nessa parte.
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Dá-me licença que o interrompa Sr. Deputado?
O Orador: -- Faz favor Sr. Deputado.
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Acho realmente estranho que, tendo estado presentes apenas dois dos cinco membros do PS nessa Comissão o PS tenha estado representado, enquanto o PRD com quatro membros e duas presenças tenha estado ausente. Sr. Deputado, é capaz de me explicar isto, se faz favor?
Risos e aplausos do PRD, do PSD e do CDS.
O Orador: - Por uma razão extremamente simples: é que quem tem feito as intervenções em nome do PRD é o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos .. .
Protestos do PRD e do PSD.
...e o Sr. Deputado Alexandre Manuel não falou agora como porta-voz do PRD.
Mas deixemos a questão da reunião de sexta-feira de manhã, que tem o seu relevo, pois quem pôs insistência nessa reunião foi o PRD, o CDS e o PSD, e não o PCP, nem o MDP/CDE nem o PS. Puseram o máximo relevo nessa reunião e depois não apareceram, isto com as excepções dos Srs. Deputados Alexandre Manuel e Glória Padrão e do Sr. Deputado do CDS que referi. Penso que o que disse é suficiente e mais não tenho a esclarecer.
Julgo, no entanto, que é importante, e para concluir, que se não deixe que a imagem do Parlamento fique enredada em conversas inacessíveis à opinião pública e aos parlamentares, insusceptíveis mesmo de serem um dia reproduzidas. Isto talvez queira dizer que debates em comissões desta natureza devam ser gravados.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos.
O Sr. José Carlos de Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meu companheiro de bancada já se referiu à intervenção do Sr. Deputado
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Sottomayor Cardia, pela minha parte lamento não ter podido ouvir o início dela, dado que estava a receber umas pessoas, pelo que vou acrescentar pouco. Quero só dizer que eu próprio fui à reunião dessa Comissão, se bem que não à hora inicial (estive na sala, mas entretanto as pessoas já tinha descido).
Quero, no entanto, dizer que acho lamentável que venha trazer-se para Plenário discussões havidas no interior dessa Comissão e que a fazê-lo eu próprio teria muito a acrescentar, nomeadamente sobre os expedientes dilatórios que estão a ser utilizados para que esta Comissão não cumpra o mandato que, obviamente, resulta do que aqui foi aqui aprovado. Não tenho agora tempo para falar disso, mas se for necessário falaremos.
Aplausos do PRD, do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Sottomayor Cardia.
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Deputado, expediente dilatório deve ter havido ou negligência ou então desinteresse, porquanto a Comissão foi constituída no dia 27 de Fevereiro e reuniu pela primeira vez no dia 24 de Abril, quando, aliás, já tinha expirado o prazo de 30 dias dado por este Plenário para concluir os seus trabalhos. Quanto ao modo como decorreram os trabalhos, não foi um expediente dilatório, mas um método parlamentar de actuar, e aí o Sr. Deputado tem de respeitar as regras regimentais das comissões.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Deputado dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Capucho (PSD): - Queria perguntar-lhe se essa demora na constituição da Comissão terá tido alguma coisa a ver com o atraso com que o Partido Socialista indicou os seus membros para a Comissão?
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Ignoro isso. Se o meu colega de bancada Sr. Deputado António Vitorino o quiser esclarecer, eu pela minha parte não sei. Mas o que certamente não é por culpa do Partido Socialista é que os partidos que consideram necessário e urgente legislar sobre a matéria não tenham tomado a iniciativa de o fazer. Esse é que é o cerne da questão, porque o cerne da questão não é saber quem faltou na sexta-feira, nem é tanto o saber...
Protestos do PSD.
... Os Srs. Deputados não consideram isso importante? Pelos vistos consideram como importante o secundário e como principal aquilo que de facto é secundário. Para mim o que é importante é que cada um de nós assuma a responsabilidade por aquilo que pretende, este é para mim o cerne da questão.
O Sr. José Carlos de Vasconcelos (PRD): - Afinal, até parece que fomos nós que levantámos o problema das presenças!
O Orador: - Eu referi esse facto. Esse incidente está esclarecido.
O essencial é saber quem é que quer e quem é que não quer que haja iniciativas legislativas para a quais entende não contribuir com o articulado e com a sua assinatura.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Sottomayor Cardia, queria perguntar-lhe se autorizava que o Sr. Deputado António Vitorino o interrompesse?
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Autorizo sim, Sr. Presidente.
O Sr. António Vitorino (PS): - Não o farei como uma interrupção ao meu colega de bancada, mas sim como uma interpelação à Mesa.
Penso que o Sr. Deputado António Capucho levantou uma suspeita que não tem fundamento, pelo que agradeceria que a Mesa, no decurso da sessão, comunicasse à Câmara quando é que os diferentes grupos parlamentares fizeram a indicação dos nomes dos seus representantes nessa Comissão. O Partido Socialista não quer tornar este facto um facto de polémica, agradece apenas que sejam conhecidos os factos e reafirma, pelo seu lado, que entregou os nomes oito dias depois de a deliberação no Plenário ter sido tomada. O que sucede é que a Comissão levou algum tempo para reunir, em virtude de a conferência de líderes parlamentares não ter feito uma escala de distribuição das presidências e das vice-presidências das comissões eventuais.
Esta é que é a verdade dos factos, e naturalmente que essa verdade devia ter sido dita, em meu entender, na intervenção do Sr. Deputado António Capucho, e não foi. Levantou apenas a dúvida sobre uma atitude relapsa do Partido Socialista que não se verificou neste caso.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Vitorino, a Mesa vai providenciar para saber se é possível conhecer as datas em que foram entregues os nomes para preencher esta Comissão.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está a terminar o «regime sucedâneo» a que têm estado sujeitos os trabalhadores da TAP, regime regularmente actualizado desde que em 12 de Julho de 1980 a TAP foi declarada em situação económica difícil. Tem sido com base nesse estatuto «empresa em situação económica difícil» que os sucessivos governos têm procedido a uma permanente intervenção no plano das relações colectivas de trabalho na transportadora aérea nacional, pondo em causa durante mais de seis anos o princípio da livre celebração de convenções colectivas.
Os trabalhadores têm vindo a contestar esta situação injusta, que assenta em pressupostos incorrectos e hoje profundamente alterados, pelo que se impõe a sua imediata revogação.
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De facto, o diploma legal que, determina o quadro normativo na base do qual as empresas públicas podem ser declaradas em situação económica difícil é o Decreto-Lei n. º 353-1/77, .de 29 de Agosto, que refere nomeadamente o seguinte:
Podem ser declaradas em situação económica difícil as empresas cuja exploração se apresente fortemente deficitária, prevendo-se que a sua recuperação seja problemática ou demorada, constituindo indícios de tal situação à existência de responsabilidade da empresa por financiamentos concedidos por instituições de créditos nacionais cujo montante global atinja pêlo menos 60% do seu activo líquido de amortizações, ou o recurso a avales é subsídios do Estado não atribuíveis a compensação de custos sociais, mas sim para cobertura de saldos, negativos de exploração, ou ainda, o. incumprimento, sobretudo reiterado, de obrigações para com o Estado, a Segurança Social ou o sistema bancário.
Ora, na situação actual da TAP não se verifica qualquer dos pressupostos enunciados. Desde 1984 que O resultado líquido da empresa é positivo (146 000 000$ em 1984 e cerca dê 200 000 000$, em l 985). Por outro lado, as responsabilidades da empresa por financiamentos concedidos por instituições de crédito nacional situam-se nos 7% do seu activo líquido/muito longe, portanto, dos 60% previstos no diploma- legal quê tipifica os casos de declaração de empresas públicas; em situação económica difícil. Por último, a TAP tem cumprido as suas obrigações para com o Estado, a Segurança Social e o sistema bancário, tendo recebido insuficientes indemnizações compensatórias pelos serviços prestados abaixo do seu preço real para as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.
Não há, pois, nada que justifique a manutenção da declaração da TAP em situação económica difícil. Estando a terminar o «regime sucedâneo» a que os trabalhadores da TAP têm estado sujeitos, há mais uma razão para pôr fim a tão desprestigiante estigma empresarial.
A TAP é hoje uma empresa lucrativa, englobando um pequeno grupo económico de empresas complementares e subsidiárias, situando-se no grupo cimeiro, das empresas portuguesas cuja, gestão deve ser encarada com a maior atenção. Deputados de diferentes bancadas tem vindo aromar posição contra a manutenção da TAP em situação económica difícil. Parece haver, portanto, uma posição maioritária no sentido de repor a normalidade na empresa.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Por que espera o Governo? Porque não responde aos requerimentos formulados, às questões levantadas quanto às razões que determinam a persistência em manter a TAP numa tal situação, apesar de não haver razões económicas que o justifiquem?
Qual o sentido da revisão do contrato-programa e qual o conteúdo exacto do contrato de gestão entre o Governo e o conselho de gerência da TAP? São questões que têm vindo a ser formuladas, nomeadamente aquando do debate do Orçamento do Estado, e às quais o Governo, nomeadamente o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, continua a não responder.
Mas, como refere a comissão de trabalhadores da empresa, novas ameaças surgem. A recente, nomeação do actual conselho de gerênçia da TAP e as declarações de alguns dos seus membros são indícios de que pode estar em preparação um ataque governamental a esta importante empresa pública.
Não pode defender uma empresa pública quem, foi especialista em negociatas no IPE.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - e quem afirma no acto de posse, como fez o presidente do conselho de gerência da TAP, o seguinte: «é conhecida a minha preferência pessoal pela privatização do sector empresarial do Estado, nela incluindo a possibilidade de alienação de parte da propriedade das empresas».
O Sr. Carlos Brito (PCP) - É um escândalo.
A Oradora: - Outro elemento do conselho de gerência (o seu-vice-presidente) admitiu já a abertura da AIR ATLANTIS ao capital privado(nacional e estrangeiro), ao mesmo tempo que anunciava um endurecimento do conselho de gerência face à contratação colectiva de trabalho.
É, pois, neste contexto que urge um escrlarecimento cabal do Governo a todas as questões ligadas ao futuro da transportadora aérea nacional e à sua situação actual, o que, sem dúvida, passa no imediato pela revogação da declaração da empresa em situação económica difícil e pela não existência de mais regimes sucedâneos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira. Entretanto peço ao Ex.mº Sr. Vice-Presidente o favor de me substituir, na medida em que tenho de ir satisfazer outros compromissos.
Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José- Vitoriano.
O Sr. João Teixeira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos; estaremos de acordo que as decisões governamentais e consequente tomada de medidas que assentam, no correcto e actualizado conhecimento do país real, na sua diversidade e complexidade, se traduzem em resultados mais benéficos para as populações que se destinam e mais .ajustadas aos, problemas concretos que pretendem solucionar.
Pensamos ainda que, por mais sofisticados e eficazes que possam ser os canais de informação ascendente de que um governante ou todo o governo disponha, nada é comparável à vantagem do conhecimento presencial in loco, quer para avaliação das carências e do respectivo grau de prioridades no cômputo global quer ainda para ajuizar da justeza de reivindicações realistas e objectivas que, na maioria dos casos, mais não são do que a recusa de continuidade da insustentável situação de desigualdades e assimetrias regionais, mas que, vistas e apreciadas dos gabinetes de Lisboa, longe da realidade, surgem muitas vezes distorcidas pela informação burocratizada, desfocadas pela generalização ou, pura e simplesmente, ignoradas pela decisão, por outro lado, completamente, ou até talvez primordialmente, o diálogo, entre, os rcpre-
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sentantes do poder local e os detentores do poder central é diferente na forma, na extensão dos resultados, conforme se desenrole em Lisboa, nos gabinetes ministeriais, ou localmente, junto das populações e dos problemas concretos.
E, se na nossa perspectiva este tipo de actuação é importante no que respeita à decisão, não o é menos no aspecto do acompanhamento das acções que materializam no terreno tais decisões e permite a avaliação conjunta dos resultados ou das expectativas.
Porque assim o entendemos, e porque vem sendo essa a prática do actual governo, assim estamos a dar testemunho dessa realidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi neste quadro e nesta filosofia da actuação que no passado dia 12 de Maio tivemos em Trás-os-Montes, mais concretamente na cidade de Chaves, alguns membros do Governo, não em simples e formal ou tradicional visita protocolar, mas em reunião de trabalho com os autarcas da região, para tratar, em conjunto, de problemas concretos daquela zona, com a intervenção dos directamente interessados. Reunião de trabalho que contou com a presença de Ministros, Secretários de Estado, deputados pelo circulo, directores-gerais, presidentes das câmaras municipais de Trás-os-Montes e Alto Douro, nomeadamente as que integram áreas abrangidas pelo Projecto de Desenvolvimento Regional Integrado de Trás-os-Montes, além de técnicos e responsáveis de sectores da Administração Pública e de empresas privadas ligadas aos empreendimentos em execução.
Mais importantes, contudo, do que o número e a qualidade dos participantes, foram os temas, problemas debatidos e analisados, e que haviam motivado a deslocação governamental, bem como a análise e verificação directa das obras em curso naquela zona e relacionadas com o desenvolvimento regional em diferentes áreas.
Destas merece-nos especial atenção o projecto de investigação aplicada com vista à procura de soluções alternativas possíveis para a irrigação da zona cujas operações de pesquisa se estão a desenvolver no vale de Chaves e vales submontados próximos, bem como no planalto mirandês e outras localidades pré-seleccionadas para o estudo, projecto cujo custo se eleva a mais de 400 000 000$ e que já foi iniciado em finais de 1985.
Executado por um consórcio internacional, que inclui duas empresas portuguesas e uma israelita, dispondo de equipas técnicas permanentes, acompanhando localmente os trabalhos de campo, que incluem, entre outros, a pesquisa de águas subterrâneas, medição de caudais de cursos de água susceptíveis de alimentar pequenas barragens, estudo das possíveis localizações destas efeitos custo/benefício, é um projecto que poderá alterar profunda e radicalmente o desenvolvimento regional.
Tratando-se, assim, de um empreendimento de grande vulto no campo, da investigação aplicada, destinado a uma zona tradicionalmente esquecida, não poderíamos deixar de o referir aqui com entusiasmo e sobretudo com muita esperança.
Não para agradecer a decisão de o implementar, porque nem nós nem as populações destinatárias temos de agradecer aquilo que constitui um direito nosso e uma obrigação dos governantes, mas, isso sim, para reconhecer publicamente a importância do projecto para a região transmontana, e o verdadeiro empenho com que os actuais responsáveis governamentais estão a acompanhar a sua execução no terreno e as esperanças que iodos depositamos nos resultados como elemento fundamental e decisivo no arranque para o desenvolvimento e modernização, tão desejáveis como necessários para a melhoria de vida das populações transmontanas.
Como deputados sociais-democratas pelo círculo de Vila Real, tudo faremos para que a fase subsequente, ou seja, a implementação das soluções apontadas pelos estudos em curso se faça de imediato e produza os efeitos que todos esperamos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Carlos Matias.
O Sr. Carlos Matias (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Teófilo Braga, António José de Almeida, Afonso Costa, Bernardino Machado e Manuel Brito Camacho criaram, no Ministério do Fomento, em 16 de Maio de 1911 - fará amanhã 75 anos - a Repartição de Turismo, através de decreto com força de lei.
Há também 75 anos que se realizou em Portugal um congresso internacional de turismo que aprovou os estatutos da Federação Franco-Hispano-Portuguesa dos Sindicatos de Iniciativa e Propaganda, primeira organização turística internacional que está na origem da criação da actual Organização Mundial de Turismo, organismo integrado na ONU.
Resolveu o Governo considerar o período que medeia entre o dia de hoje e 15 de Maio de 1987 ano do jubileu do turismo português e assinalá-lo com uma série de realizações de vária índole.
O PRD não podia alhear-se da efeméride e vem no dia de hoje recordar os que há 75 anos, com rasgada visão e pioneirismo, lançaram os começos de uma organização que, carecida de remodelação ao nível central, se apoia ainda em órgãos que foram lançados tão longinquamente.
É o caso do Conselho de Turismo, que antecedeu o actual Conselho Nacional de Turismo.
O turismo é sector chave na nossa economia.
Contribui na percentagem de mais de 36 % para a cobertura do saldo negativo da balança de transacções correntes. Dá trabalho a mais de 150 000 portugueses.
Actividade com fortes implicações sociais e culturais, indústria virada ao intercâmbio entre os povos e a paz, ela assim era encarada já no citado decreto com força de lei. Talvez por ter tido tão bons princípios em matéria organizacional, o surto de progresso que atravessou a partir da década de 50 gerou dentro de si quadros competentes a nível estatal e privado, que com grande espírito de independência a têm sabido apoiar.
Quadros que a nível da administração central foram capazes de concretizar a única experiência de descentralização administrativa conseguida no País.
Aguarda o PRD que as comemorações do ano jubilar que hoje se inicia sejam dignas dos factos a comemorar.
Aplausos do PRD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Abrantes.
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O Sr. João Abrantes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos em nosso poder um projecto de decreto-lei da Presidência do Conselho de Ministros que, segundo o seu preâmbulo, pretende regulamentar o instituto do ciclo produtivo da publicação, fazendo recair a obrigação do depósito legal no editor. Acrescento que o regime legal em vigor nesta matéria impõe que esta obrigação de apresentar os exemplares destinados ao depósito legal é do impressor. Desde logo, é discutível a alteração que se pretende impor, tanto mais que sabemos que em todas as tipografias fica uma enorme quantidade de sobras, mesmo após a entrega dos exemplares do depósito legal.
No entanto, este mal é o menor, já que o articulado, com base nesta perspectiva, desenvolve a filosofia do Governo nesta matéria e, desde logo, o seu artigo 2.º refere «que se consideram objectivos do depósito legal a defesa e preservação dos valores da língua e cultura portuguesas». Mas, mais adiante, no artigo 8.º, verificamos que, em relação à esta mesma questão, vão ser retirados os depósitos legais a Angola e a Moçambique, verificando-se com isto, desde logo, que a preocupação da defesa e preservação da língua e cultura portuguesas são letra morta.
Ainda no artigo 2.º, na alínea e), refere como objectivos do depósito legal o enriquecimento de bibliotecas dos principais centros culturais do País, regulamentando depois o artigo 6.º que este depósito legal passa a ser constituído por oito exemplares, assim distribuídos, conforme o artigo 7.º: Biblioteca Nacional, Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, Biblioteca Municipal de Lisboa, Biblioteca Municipal do Porto, Biblioteca Pública e Distrital de Évora, Biblioteca do Real Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro, Região Autónoma dos Açores, Região Autónoma da Madeira.
E aqui começa a questão. Em relação à lei vigente é retirado com esta disposição o depósito legal à Biblioteca Municipal de Coimbra, ao Arquivo Distrital de Braga e à Biblioteca da Academia das Ciências.
Esta notícia, Srs. Deputados, caiu em Coimbra como uma bomba, como não poderia deixar de ser. De facto, o que é que se pretende? Ninguém sabe o que se pretende com esta. medida, ao retirar à Biblioteca Municipal de Coimbra o depósito legal que constitui, de facto, a sua forma de sobrevivência, já que, face às exíguas verbas, das finanças locais para o poder local e os compromissos assumidos pelas autarquias, não é de facto possível a nenhum município assumir encargos nesta matéria.
Portanto, o que aqui se pergunta é se de facto se pretende com esta medida a destruição, pura e simples, da Biblioteca Municipal de Coimbra. Sendo certo que se tala no artigo 2.º no enriquecimento das bibliotecas dos principais centros culturais do País, ninguém ignora que Coimbra é efectivamente um centro cultural, onde existe a maior percentagem estudantil de todo o País quanto ao total populacional. É certo que uma das bibliotecas contempladas é a da Universidade de Coimbra! mas esta e uma biblioteca privada da Universidade. ,
Ninguém compreende, efectivamente, como referi, por que. é que é excluída a Biblioteca Municipal de Coimbra, tanto mais que esta biblioteca tem implantado um serviço de empréstimo domiciliário, criado em 1932, e que é o único no País. Toda a cidade beneficia deste sistema de empréstimo domiciliário, e isto muito tem contribuído para a elevação do nível cultural da população de Coimbra.
Nós, muito claramente, em relação a esta questão, diremos que, se se persistir nesta aberração, se porventura este diploma legal vier a.ser publicado, usaremos todos os mecanismos legais ao nosso alcance para impedir que ele entre em vigor, para impedir que, de facto, a Biblioteca Municipal de Coimbra, o Arquivo Distrital de Braga e a Biblioteca da Academia das Ciências sejam prejudicadas com esta medida anticultural.
Por outro lado, gostaria ainda de aproveitar para afirmar que a importância da Biblioteca é de tal forma reconhecida que decorrem neste momento obras para a sua instalação num novo edifício e que estas obras foram comparticipadas - dado o reconhecido interesse de instalar condignamente este instituto cultural - pela Fundação Calouste Gulbenkian. Isto demonstra, efectivamente, o valor desta Biblioteca e não pode, de forma alguma, ser com uma medida destas, verdadeiramente atentatória dos valores culturais, que se pode destruir este valioso património.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para pedidos de esclarecimento, estão inscritos os Srs. Deputados Sá Furtado, Sottomayor Cardia, Joaquim Domingues e Manuel Queiró. O Sr. Deputado João Abrantes não dispõe de tempo, mas a Mesa concede-lhe dois ou três minutos para responder, caso não haja objecções da Câmara.
Tem a palavra o Sr. Deputado Sá Furtado.
O Sr. Sá Furtado (PRD): - Sr. Presidente, queria afirmar que desejo associar-me às palavras do Sr. Deputado João Abrantes. Pela falta de entendimento que tenho sobre as razões que levaram o Governo a interromper o depósito legal de que a Biblioteca Municipal de Coimbra desfrutava até à data, penso que, de facto, esta medida não se insere no aprofundamento da cultura, do conhecimento da literatura e dos valores mais elevados da arte e do espírito em Portugal.
Daí que pergunte ao Sr. Deputado João Abrantes quais a medidas que devemos tomar, todos nós, os deputados pelo círculo de Coimbra, para conseguirmos suster esta medida, que considero, de facto, lesiva para a cultura do povo português em geral.
O Sr. Presidente: - Também para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Santana Maia.
O Sr. Santana Maia (PS): - Sr. Deputado João Abrantes, queria manifestar a minha solidariedade à questão que trouxe a esta Câmara. A Biblioteca Municipal de Coimbra é uma biblioteca que não serve apenas a cidade de Coimbra, não serve apenas o seu distrito ou a sua região. É uma biblioteca com características próprias, extremamente dinâmica, que, como foi dito, tem novas instalações em construção e que deve continuar a desfrutar de um privilégio, que não é, efectivamente, um privilégio, mas sim um dever.
É absolutamente justificado que o depósito legal continue a ser desfrutado pela Biblioteca Municipal de Coimbra, e, por isso, aqui vinha trazer esta palavra de apoio à pretensão do Sr. Deputado João Abrantes. O Partido Socialista e os seus deputados pelo distrito de Coimbra estão abertos a tomar qualquer iniciativa no sentido de que tal medida governamental não vá por diante.
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O Sr. Presidente: - Igualmente para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Domingues.
O Sr. Joaquim Domingues (PSD): - Sr. Deputado João Abrantes, ouvi a sua intervenção, mas fiquei com a convicção de que ignora o fundamento desta decisão. Com efeito, foi já dado conhecimento de que a Secretaria de Estado da Cultura encomendou a uma comissão, composta por peritos de reconhecida competência na matéria, um parecer sobre uma política do livro e da leitura para o País, do qual consta uma série de propostas, entre as quais, precisamente, a da redução do número de obras a ser enviadas para depósito obrigatório. Como é evidente, idealmente todas as bibliotecas - e não apenas as que citou - deveriam ter fundos capazes de serem consultados por todos os leitores interessados, mas, como é evidente, esse processo não consegue atingir o seu objectivo e há apenas um número reduzido de bibliotecas que têm depósito obrigatório.
A proposta da comissão é no sentido de que seja reduzido o peso que impede sobre quem edita livros, no sentido de evitar o envio de um número bastante elevado de livros para depósito, para que, em contrapartida, através de uma estrutura apropriada, a ser destacada do IPPC, sejam feitas aquisições de livros para serem distribuídos por um número de bibliotecas superior àquele que beneficia do depósito obrigatório.
Neste sentido, o que se está a tentar traduzir nesse diploma que referiu não é mais do que uma recomendação que foi feita à Secretaria de Estado da Cultura por uma comissão composta por pessoas cuja competência certamente reconhecerá, caso conheça a composição dessa comissão.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Sr. Deputado João Abrantes, não sabemos se estamos em presença de mais um diploma do Ministério da Educação de que o Ministro não tinha conhecimento, mas que vai tratar imediatamente de abolir, como se passou aqui no outro dia com o caso do ensino ministrado por deficientes.
Quero dizer ao Sr. Deputado que também me encontro no desconhecimento das verdadeiras razões que estarão na base da preparação de um tal diploma.
Em todo o caso, a circunstância parece-me particularmente agravada pelo facto de que nem que a Câmara Municipal de Coimbra quisesse já não poderia obviar à situação, visto que já foi elaborado o respectivo orçamento. Nesta circunstância, a aplicação desta medida implicaria praticamente, senão o encerramento da biblioteca, pelo menos a sua inutilização no que diz respeito à actualização dessa mesma biblioteca.
Deste modo, quero manifestar ao Sr. Deputado a minha concordância com o teor geral da sua intervenção e dizer-lhe que se o Sr. Deputado entender requerer junto do Governo informações mais actualizadas e exactas sobre os reais motivos desta medida, me associarei a esse requerimento pela forma que entender mais conveniente.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.
O Sr. João Abrantes (PCP): - Quero manifestar os meus agradecimentos a todos os Srs. Deputados que me colocaram perguntas relativamente a esta questão e aos apoios manifestados.
De facto, esta é uma questão a que não podemos ficar indiferentes. Respondendo de uma forma global às perguntas colocadas, designadamente pelos Srs. Deputados Sá Furtado, quanto à justificação dos motivos, e Manuel Queiró, em relação ao facto de se ignorarem as razões por que esta medida foi tomada pelo Governo, diria que não há nenhum motivo que justifique uma atitude destas, não há nenhuma razão para que uma medida destas seja tomada.
E tal medida não pode ser justificada, como pretendeu o Sr. Deputado Joaquim Domingues, com um parecer de peritos altamente qualificados, tendo em vista o desenvolvimento de uma política do livro e da leitura. Isto, Sr. Deputado, é exactamente o contrário. Efectivamente, o que esta redução do depósito legal vai fazer é aumentar os lucros de alguns à custa de uma política de «incultura» do povo português. Não há razão nenhuma que justifique isto.
Não sei como é que se pode argumentar da forma como o Sr. Deputado argumentou, ainda por cima com as razões que aduziu relativamente ao facto de ser o próprio Instituto Português do Livro a fazer compras e a distribuí-las depois por todo o país, com as reduzidas verbas que estão no Orçamento do Estado afectas a esse Instituto. Qual é o papel de desenvolvimento que está cometido a esse Instituto, dadas as reduzidíssimas verbas que tem para fazer essa política?
Não há nada que justifique uma medida destas, e parece-me haver contradição entre aquilo que o Sr. Deputado afirmou e aquilo que se está a passar.
O Sr. Joaquim Domingues (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Joaquim Domingues (PSD): - Sr. Deputado João Abrantes, agradeço-lhe a possibilidade que me deu de o interromper.
É que, possivelmente, V. Ex." não compreende as razões desta medida, na medida em que, com toda a certeza, e pelo que vejo da sua intervenção, desconhece o teor do relatório que foi apresentado.
Nesse relatório, esta medida é uma de um conjunto de várias dezenas de outras medidas que são propostas e que, no seu conjunto, pretendem atingir esse objectivo. Como é evidente, o Governo não pode de uma assentada tomar essas dezenas de medidas, mas terá de as tomar passo a passo.
Nesse sentido, isto é, no de esclarecer os fundamentos da medida, além de outras diligências que queira fazer, sugeria que pedisse cópia do relatório que existe na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, no qual está explicado o fundamento da proposta.
O Orador: - Sr. Deputado Joaquim Domingues, interrogo-me sobre a validade deste relatório. Se esta é a primeira medida e aquela que o Governo considera mais prioritária para o desenvolvimento de uma política do livro e da leitura, então, em relação às outras, valha-nos Santo Ambrósio.
Risos do PCP.
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Mais vale que esse relatório fique esquecido!
De facto, esta amostra não augura nada de bom no que esse relatório contém e, por outro lado, nada nos diz que este já esteja aprovado - pelo menos a amostra que aqui vem é muito má.
Em relação às outras questões, nomeadamente a das medidas que esta Assembleia poderá tomar relativamente a esta questão, para já a denúncia política fica feita, com a associação por parte dos Srs. Deputados das restantes bancadas.
Da nossa parte, teremos ainda outros mecanismos, se porventura este diploma for publicado. Poderemos usar o mecanismo da iratificação para impedir que esta medida, atentatória da cultura da população portuguesa, vingue.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Informo os Srs. Deputados que se encontram nas galerias os alunos da Escola Secundária de D. Filipa de Lencastre e da Escola-Secundária de D. Maria 1, a quem manifestámos o nosso acolhimento.
Aplausos gerais
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado
Sá Furtado.
O Sr. Sá Furtado (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Qualquer realização de carácter(cultural que, entre nós, se afirme com qualidade, alcance nomeada e não feneça, mal desponte merece ser apoiada e louvada: É este o caso do Festival Internacional de Cinema da Figueira da. Foz, que tem em preparação á sua 15.ª edição, a realizar-se de 11 a 21 de Setembro próximo.
Ao longo da sua existência, que remonta ao já longínquo ano de 1972, adquiriu projecção internacional, promoveu o conhecimento de jovens realizadores, do chamado cinema de autor ou cinema independente, divulgou cinematografias sem acesso aos circuitos Comerciais de exibição, ajudou de modo decisivo o relançamento do cinema português no mercado interno e a sua inserção em programas de festivais estrangeiros, condição imprescindível para uma verdadeira divulgação extrafronteiras.
Muitos realizadores, grandes nomes de cinema, entre os quais cito Fassbinder, Carlos Saura, Herzog, Marguerit Duras e Kramer, tiveram antecipada consagração ria Figueira da Foz. Outro tanto aconteceu com a moderna e brilhante plêiade de realizadores portugueses, a quem presto a minha homenagem através desse fabuloso criador, o patriarca sempre jovem da cinematografia portuguesa, que é Manoel de Oliveira que, ao ser consagrado na Figueira da Foz, consagrou o próprio festival.
Integra-se ainda o Festival da Figueira da Foz numa perspectiva cultural de larga amplitude, com incidência nacional e internacional, pois tem encontrado formas de descentralização e sido ocasião e palco de reuniões internacionais de realizadores, críticos, jornalistas e artistas. Estas as razões que me levam a manifestar o apoio e simpatia e a realçar os méritos do Festival internacional de Cinema da Figueira da Foz, a que desejo vida prolongada, com afirmação continuada de seriedade e qualidade artísticas, a bem do nosso cinema e da nossa cultura.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs.º Deputados Santana Maia, João Abrantes e Pereira Coelho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Santana Maia.
O Sr. Santana Maia (PS): - Sr. Deputado Sá Furtado, prevaleço-me da figura regimental do pedido de esclarecimento para manifestar o meu total apoio às palavras que V. Ex. acaba de proferir sobre o Festival Internacional de Cinema da Figueira dá Foz.
Na realidade, esta iniciativa, que, como disse, deu os primeiros passos em Julho de 1972, sob a designação de Semana Internacional de Cinema, veio a afirmar-se de ano para ano como um momento, alto da vida cultural portuguesa e ponto de encontro de cineastas e realizadores, portugueses e estrangeiros.
De entre os primeiros, passaram já pelo Festival, entre outros, Manoel de Oliveira (citado por V. Ex.a), António Pedro Vasconcelos, Alfredo Tropa, Fernando Lopes, José da Fonseca e Costa, António da Cunha Teles, Artur Semedo, Eduardo Geada, António Macedo, Lauro António, Alberto Seixas Santos e João Botelho.
No que respeita a realizadores e cineastas estrangeiros, a Figueira da Foz tem tido a presença de representantes qualificados do Brasil, Estados Unidos, Espanha, França, Inglaterra, Bélgica, Holanda, Alemanha, Itália, Suíça, Jugoslávia, Grécia, Turquia, Dinamarca, Noruega, Polónia, Checoslováquia, Hungria, União Soviética, China, União. Indiana, Tunísia e Senegak.
Mas, para além de um tempo em que se vê e se discute cinema, sob todos os seus aspectos e em que a realização, de colóquios estimulam a realização de um filme público, o Festival tem sido também nas suas edições, antes e depois de 1974, um espaço de crítica criativa, de polémica cultural, artística, política e até civilizacional, em suma, um espaço de liberdade.
Por isso, tudo tem de ser feito para que o Festival prossiga a mesma senda para o futuro e para que não se deixe estiolar uma iniciativa que é marcante na vida nacional.
Por isso, também se alertam as entidades responsáveis para que tudo façam no sentido de que tal objectivo seja alcançado, isto é, dito de outra maneira, para que cumpram as suas obrigações.
Este é o meu ponto desvista, aliás, concretizado enquanto desempenhei as funções de governador civil do distrito de Coimbra, no apoio que dei e de que não estou arrependido, ao Festival Internacional de Cinema da Figueira da Foz.
Aplausos do PS e do PRD.
O Sr: Presidente: - Como o Sr. Deputado João Abrantes não dispõe de tempo para formular o pedido de esclarecimento requerido, a Mesa concede-lhe um minuto para esse efeito. "Tem a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.
O Sr. João Abrantes (PCP): -Sr. Deputado Sá Furtado, este meu pequeno pedido de esclarecimento não representa uma troca de galhardetes em relação à sua intervenção, mas serve para lhe manifestar o meu apoio a essa mesma intervenção.
No entanto, gostaria de lhe chamar a atenção para algumas questões que me parecem importantes.
Ninguém deverá estranhar que os deputados pelo círculo de Coimbra aproveitem esta ocasião para se manifestarem relativamente a esta questão. Isto tem a ver com algumas polémicas que surgem em torno deste festival.
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com as quais é necessário acabar de vez, dado que este é um festival consagrado e reconhecidamente implantado no espectro cultural português, e que não tem nada a ver com falsas polémicas.
Se efectivamente se vierem a desenvolver em Portugal outros festivais com o nível do Festival Internacional de Cinema da Figueira da Foz, ainda bem e estaremos todos de parabéns. Agora, é bom que não se criem falsas polémicas em torno desta questão, porque, de facto, elas não têm razão de existir.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pereira Coelho.
O Sr. Pereira Coelho (PSD): - Sr. Deputado Sá Furtado, sirvo-me também desta figura regimental para me associar às suas palavras - não me vou alongar muito sobre a matéria em questão - e, de algum modo, realçar a componente de voluntariado que está subjacente à organização deste festival e o carácter nacional e internacional que ele adquiriu ao longo dos anos da sua realização.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Sá Furtado, que dispõe de dois minutos para o efeito.
O Sr. Sá Furtado (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nada houve em dissonância com as palavras que previamente pronunciei.
Quero apenas reiterar o carácter nacional e internacional que o Festival Internacional de Cinema da Figueira da Foz possui. Acho que esse aspecto é extremamente importante para que todos nós, portugueses, lhe dêmos a maior importância e o maior apoio e não entremos em questões de secundária importância que desmereçam um festival que, na sua 15." edição, é prova evidente da sua vitalidade, da sua importância e do reconhecido mérito que alcançou além-fronteiras.
Aplausos gerais.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos agora ao período da ordem do dia, de cuja primeira parte consta a apreciação da impugnação da admissibilidade da proposta de lei n.º 21/IV - Código de Processo Penal -, da iniciativa do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Secretário vai proceder à leitura do parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à admissão da proposta de lei n.º 21/IV.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Srs. Deputados, é do seguinte teor o referido parecer:
Parecer relativo à admissão da proposta de lei n.º 21/IV (autorização para o Governo legislar em matéria de processo penal).
Reunida em 23 de Abril de 1986, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias apreciou e debateu as questões suscitadas pelos requerimentos, apresentados nos termos do artigo 134.º do Regimento pelos deputados do Partido Comunista Português e do MDP/CDE, relativos à proposta de lei n. º 21/IV, tendente à concessão ao Governo de autorização para! legislar em matéria do processo penal.
1 - Os normativos questionados dizem respeito ao regime de revista, buscas e apreensões, a certas medidas cautelares e de polícia, ao regime de algumas medidas privativas da liberdade, a certas competências a atribuir ao Ministério Público e aos órgãos de polícia criminal e às garantias de defesa dos arguidos.
A Comissão ponderou os problemas decorrentes da necessidade de compatibilização da eficácia das medidas especiais de processo penal com as garantias constitucionais aplicáveis, matérias que debateu com o Sr. Ministro da Justiça.
2 - Duas observações preliminares se suscitam:
1.º A proposta de lei n.º 21/IV visa a obtenção de uma autorização legislativa, com base em soluções jurídicas acolhidas no projecto de decreto-lei anexo, que constitui intenção do Governo vir a publicar no uso daquela autorização;
2.º As matérias questionadas, estando incluídas no projecto de decreto-lei, colocam-se em zonas de acesa controvérsia quanto à sua admissibilidade constitucional e já anteriormente foram no essencial objecto de extenso debate parlamentar aquando da apreciação da proposta de lei da segurança interna submetida pelo IX Governo Constitucional à Assembleia da República na III Legislatura.
A Comissão sublinha que:
a) Em termos meramente formais, a invocação de normas de um projecto de decreto-lei anexado a uma proposta de autorização legislativa só condicionadamente releva para efeitos de ajuizar da constitucionalidade do pedido de autorização legislativa, dado que o que vincula em termos jurídico-constitucionais o Governo é o teor da futura lei de autorização, e não o projecto de decreto-lei remetido em anexo a esta;
b) O próprio conteúdo da proposta de lei de autorização não constitui, por si só, elemento delimitador da capacidade legislativa do Parlamento; com efeito, assiste à Assembleia da República uma ampla capacidade conformador dos poderes legislativos a que o Governo vai aceder por força de lei de habilitação, desde logo na definição do objecto, do sentido e da extensão e na própria estatuição de limites adicionais, quer através de preceitos injuntivos positivos, quer através de normas proibitivas.
3 - A Comissão sublinha, por outro lado, que o juízo de inadmissibilidade de uma iniciativa legislativa com fundamento em inconstitucionalidade só deve dar origem a uma rejeição liminar em situações limite, onde o debate na generalidade e na especialidade não possa permitir a sanação de um vício originário de inconstitucionalidade (como
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é o caso de iniciativas legislativas de objecto r impossível, feridas de incompetência absoluta ou afectadas por outras formas de inconstitucionalidade grosseira); sempre que o vício originário possa ser suprido pelo exercício normal das competências legislativas do Parlamento, tudo aconselhará, em regra, o seu debate na generalidade para que a apreciação da questão de fundo de uma iniciativa não fique prejudicada pela eventual inconstitucionalidade de certas das suas normas, quando meramente acessórias ou adjectivas.
4 - Estando em causa o futuro Código de Processo Penal, cuja necessidade e urgência é unanimemente reconhecida pelos membros da Comissão! o esclarecimento da delimitação do que é constitucionalmente consentido e do que pode ferir a letra e o espírito dos normativos constitucionais depende fulcralmente do debate na generalidade da própria proposta de lei.
Na sequência desse debate qualquer texto legislativo a aprovar na especialidade, mesmo sob a forma de autorização legislativa, deverá assegurar o cumprimento das disposições constitucionais atinentes às garantias individuais de processo penal definidos na lei fundamental. A Comissão entende que nem todos os casos apreciados mereceram à partida igual juízo de censurabilidade. Mas em todos eles importará acautelar soluções que garantam a plena jurisdicionalidade do processo e a cabal salvaguarda dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos. Tal é para os efeitos regimentais o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Assembleia da República, 23 de Abril de 1986. - Pelo Presidente, António Vitorino.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está aberto o debate, que incidirá já na votação deste parecer da Comissão.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, creio que se deve adoptar o
critério usual nestas matérias: foram apresentados textos e requerimentos, pelo que se segue a apresentação, pela ordem de apresentação, dos ditos textos, e requerimentos.
O Sr. Presidente: - Tem razão, Sr. Deputado. Cabe, então, ao PCP iniciar o debate.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Ao requerer a apreciação preliminar da proposta de lei n.º 21/IV, através da qual o Governo solicitou à Assembleia da República autorização legislativa para aprovar o novo Código de Processo Penal, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português visou sobretudo manifestar a sua profunda preocupação pela forma e pelo conteúdo da reforma do processo penal tal qual nos foi apresentada e está a ser conduzida pelo Governo.
Quisemos alertar a Assembleia da República e o País para a necessidade de assegurar que o futuro diploma respeite integralmente os princípios constitucionais atinentes aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e assegure, simultaneamente, a plena realização das finalidades do Estado democrático que são inerentes ao próprio processo penal. Está inteiramente nas mãos da Assembleia da República assegurar que esses objectivos sejam plenamente realizados.
O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português quer congratular-se com o facto de ter sido possível, no âmbito da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, aprofundar o debate em torno de questões tão fulcrais como aquelas que quisemos suscitar através do nosso requerimento.
Nenhuma dessas questões afloradas nó parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que acabou de ser lido ao Plenário e que foi aprovado por unanimidade, é nova. Muitas dessas questões, como. as relativas às violações de correspondência e ao regime das revistas, das buscas, das apreensões, das escutas telefónicas, das identificações de cidadãos e dos poderes das polícias e do Ministério Público, foram ao longo de anos, entre nós, questões de fronteira. Em torno delas se estabeleceram linhas divisórias entre os partidários da democracia e os prosélitos do autoritarismo em processo penal - esses que achavam que um «pide» ao lado de outro «pide» era garantia suficiente do direito de defesa dos cidadãos. Esses tempos estão enterrados, acabaram, é estamos seguros de que não renascerão!
A Constituição; na sua redacção originária e na que decorreu da revisão de 1982, proeurou precisamente consagrar e aprofundar as destrinças democráticas fundamentais neste domínio essencial.
As fronteiras que a Constituição traçou suscitam, aqui e além, interrogações. Não são questões simples, nem questões que possam dirimir-se com «sins» e «nãos» sumários ou que não careçam de precisões: Essas precisões e aclarações devem ser feitas. Cabe-nos a nós, Assembleia da República, fazê-las e devemos fazê-las com o rigor que a Constituição nos impõe a todos e com o conhecimento das realidades, do terreno e das dificuldades da instrução e investigação criminal em Portugal, que todos conhecemos e temos o dever de aprofundar quanto, às suas dimensões exactas.
Assim tenhamos do Governo as informações e a colaboração que é obrigatória, desejável ,e necessária!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Pela nossa parte, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Justiça, temos, por certo que a resposta às interrogações, onde elas existam - e há áreas em que não existem -, deve resolver-se a favor das liberdades, e não certamente a, favor dos excessos policiais, da devassa da vida dos cidadãos, nunca decerto através da consagração legal dessa perversão profunda que conduz a fazer de cada cidadão um suspeito e de cada suspeito um condenado, sancionado sem intervenção judicial.
Precisamos - é esta a nossa opinião, e nesse sentido nos associamos inteiramente ao consenso pára a necessidade urgente de um novo Código de Processo Penal - de um processo penal célere, seguro, desburocratizado, eficaz e plenamente respeitador das garan-
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tias de defesa dos cidadãos. Precisamos de uma investigação criminal não indigente de meios, mas dotada pelo menos dos meios essenciais e delimitada quanto ao objecto e à competência. Precisamos de uma instrução criminal em que o juiz, qualificado e dotado de meios, seja fiel activo da verdade e guardião dos direitos fundamentais dos cidadãos. É disso que precisamos, e não da policialização da instrução criminal.
No parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias reflecte-se - e alerto especialmente a Câmara para este aspecto - a preocupação, que nos parece muito positiva, de levar a cabo num intenso trabalho preparatório (que deve ser feito com a participação de todas as instituições sindicais do sector, do Conselho Superior da Magistratura, do Sr. Procurador-Geral da República e de todos aqueles que possam dar um contributo positivo para o labor informado desta Câmara, porque só informado pode ser eficaz).
Essa preocupação, expressa pela Comissão, visa, no fundo, assegurar que o futuro articulado do Código de Processo Penal equilibre de forma harmoniosa e plenamente constitucional as exigências de perseguição criminal eficaz e os imperativos decorrentes da necessidade de salvaguarda plena das liberdades dos cidadãos. Nem outra coisa consentiria a nossa constituição processual penal, na sua matriz eminentemente democrática, fundada na dignidade do homem, nas suas precisas cláusulas proibitivas - que as contém muitas, felizmente e por razões históricas, de que é bom que todos nos lembremos com rigor.
Em nosso entender, não deve nem pode ser consagrada nesta reforma a possibilidade de revistas e buscas sem autorização judicial e mediante a mera alegação policial de que a demora representaria «grave perigo para bens jurídicos de grande valor constitucional». Entendemos que este tipo de vaguidade não é consentido pela malha constitucional que temos, além de ser (e precisamente porque é) perigoso. Ninguém pode responder em bom rigor pelos limites a que isto conduziria no terreno concreto da vida e da sociedade portuguesa, com as suas concretas instituições.
Não estamos a desenhar, em laboratório, um modelo abstracto, mas sim a desenhar um Código de Processo Penal para Portugal nas suas condições concretas - para este regime constitucional mas também para este mundo concreto, este direito em aplicação.
Este Código, Sr. Presidente, Srs. Deputados, também não deve liberalizar apreensões com regime similar de alegação de clausulas de carácter geral, como a que resumi. Isto é o que acontece, por exemplo, no artigo 178.º do articulado que se pretende ver autorizado.
Não devem ser estabelecidas as chamadas medidas cautelares e de polícia em termos que excedam os limites constitucionais. Não questionamos, naturalmente, que o Código de Processo Penal contenha e discipline medidas de polícia e de coacção. Se há sede própria para isso, ela é certamente o Código de Processo Penal, não outra qualquer sede e nunca a proliferação avulsa de medidas de polícia em toda a espécie de diplomas, sem arrimo, coerência e qualquer controle. Em todo o caso, devem ser acatados os limites constitucionais tal qual decorrem, designadamente, dos artigos específicos que os regulam e, naturalmente, do artigo 18.º da Constituição.
Acho espantoso que o Governo reconheça, na sua exposição de motivos, que as soluções que estão contidas no Código podem conduzir a «utilizações abusivas», quando sabemos que a função do Código é precisamente a de prevenir as utilizações abusivas, que já existem neste momento, e não a de legalizá-las ou de provocar uma espiral no seu abuso. Se o Governo pretender provocar uma espiral de abusos não poderemos, naturalmente, deixar de lhe dizer firmemente que não, por razões teóricas, constitucionais e também práticas (penso no recente «Relatório sobre as polícias», de que todos estamos lembrados ou nos devemos lembrar).
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, Sr. Presidente, Srs. Deputados, não devem, em nosso entender, ser institucionalizadas medidas privativas da liberdade e lesivas da segurança dos cidadãos contra o que dispõe a Constituição no seu artigo 27.º Todavia, isso é o que acontece no artigo 257.º, n.º 2, alínea c), do articulado projectado, quando autoriza a prisão fora de flagrante delito sem autorização judicial, «por razões de urgência e de perigo na demora». Estamos outra vez perante cláusulas vagas, gerais, que consentem uma margem de arbítrio que nos parece incompatível com os limites decorrentes do artigo 27.º
Também não devem ser autorizadas, fomentadas ou de alguma maneira viabilizadas por esta Câmara medidas que conduzam à policialização e administrativização da instrução criminal, deferindo ao Ministério Público e aos órgãos de polícia criminal a competência para efectuar actos fulcrais atinentes a direitos fundamentais dos arguidos. Isto é o que acontece, designadamente, nos artigos 143.º e 144.º do articulado projectado.
Por outro lado, não devem ser diminuídas as garantias de defesa dos arguidos no tocante ao direito à assistência de defensor em todos os actos de processo. Neste sentido, merecem-nos reservas a alínea e) do n.º 1 do artigo 61.º e o n.º 4 do artigo 143.º do articulado projectado.
Haverá também que reponderar muito cuidadosamente as fronteiras entre as competências das policias, do Ministério Público e dos JIC. Não caucionaremos, pela nossa parte, qualquer forma de regresso ao Decreto-Lei n.º 35 007, que significaria hoje, na prática, a concessão às polícias do domínio da instrução.
Policialização da instrução criminal, não, a qualquer título, por razões constitucionais e práticas!
Por outro lado, quero alertar a Câmara - e esta, Sr. Ministro, não é certamente a «arma secreta» que referimos no debate da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, mas, antes, um aspecto que não pudemos então debater mas que devemos debater agora - para o facto de sei inteiramente inconstitucional a norma da alínea d) do artigo 1.º do diploma que se pretende ver autorizado. Essa norma coloca nas mãos do Governo a possibilidade de definir como entender, alargando porventura sem limites, o elenco das autoridades de polícia criminal em cujas mãos seriam depositados os vastos poderes de excepção que criticamos.
Se aceitássemos a proposta do Governo, a Assembleia faria esta coisa inaceitável: por um lado, desenharia um vasto conjunto de poderes policiais de coacção dos cidadãos como sejam revistas, buscas, apreensões,
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intercepções de correspondência, etc., por outro lado, deixaria nas mãos do Governo o direito de preencher a lista dos polícias investidos nesses superpoderes, isto é, o Governo teria liberdade, de escolher que tipo de polícias, e polícias de que tipo nos poderiam restringir as liberdades, a nós, aos cidadãos em geral. Isto é manifestamente inconstitucional. Não pode ser!
Finalmente, Sr. Presidente, Srs. Deputados; não podemos deixar de colocar uma outra questão fulcral: é que o Governo articula este Código de Processo Penal conta chamada lei de segurança interna em gestação?
Este Código inclui algumas medidas de polícia, medidas especiais de processo penal, outrora contidas na famigerada proposta de lei de segurança interna e aqui severamente verberadas na legislatura anterior. Porquê? Ficam algumas na lei de segurança? Ficam todas no Código de Processo Penal?
O Governo não respondeu ainda a essa questão, embora tenha já anunciado; a aprovação em Conselho de Ministros da proposta de lei de segurança interna. Se essa proposta surge expurgada desses aspectos processuais e é - uma mera lei organizatória de polícias, então é inteiramente desnecessário que a Assembleia da Republicada aprove porque, o Governo pode organizar, já deveria. Ter organizado e estruturado as polícias. Outra hipótese é á de essa proposta incluir: medidas especiais de processo penal. Nesse caso; que medidas são essas, e porquê? Contém, designadamente normas que autorizem o Sr. Ministro da Administração Interna a ordenar escutas telefónicas administrativas, com mero conhecimento ulterior do juiz e medidas de identificação dos cidadãos, para além das que constam do Código de Processo Penal aqui apresentado?
Seria importante que o Governo esclarecesse hoje e aqui em que termos fazia articulação entre o Código e a lei de segurança e o fizesse de maneira frontal e aberta. Pela nossa parte discordamos absolutamente daquilo a que lá fora alguma imprensa tem chamado as «duas tácticas do Governo» em matéria de segurança interna. Essas «duas tácticas» consistem em, por um lado/procurar encher- o código do Processo Penal de medidas que trilham a fronteira do constitucionalmente permissível em matéria de liberdade dos cidadãos e, por outro lado acumular na chamada lei de segurança interna paralelamente, complementarmente, medidas que aprovem por via administrativa aquilo que não seja contido ao Código de Processo Penal.
E Sr. Ministro da Justiça uma vez, que o Governo nos vem falando crescentemente em «segurança», gostaríamos de saber o seguinte: que medidas é que o Governo tem em preparação, em articulação com este Código de Processo Penal para que pede autorização? Com vista a acabar com a situação verdadeiramente caótica, existente no sistema prisional? Que medidas tem em preparação, para garantir meios aos juízes, de instrução criminal e condições para reinserção social? Que medidas tem para garantir a regularização da situação anómala que neste momento existe quanto à investigação criminal e que considerámos particularmente preocupante?. Que posição adoptará quanto às conclusões do chamado «relatório das polícias»? É conhecido um despacho, do Sr. Ministro da Administração Interna sobre a matéria, mas, até agora, o Ministério da Justiça manteve silêncio circunspecto num processo que até foi originado por um despacho emanado pelo Sr. Ministro Mário Raposo, pelo que nem deixa de haver coincidência pessoal.
Em suma: cremos que foi positivo que a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias tenha emitido o parecer que emitiu. É um contributo útil, a ele nos associamos de pleno e procuraremos lutar para que a Assembleia da República aprove um Código de Processo Penal constitucional, eficaz e plenamente respeitador dos direitos dos cidadãos.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Sr. Secretário de Estado para os Assuntos Parlamentares: O MDP/CDE interpôs recurso do despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República que admitiu a proposta de lei n.º 21/IV, que concede ao Governo autorização para legislar em matéria de processo penal, por considerar que a mesma viola vários preceitos constitucionais, pelo que não deveria ser admitida, nós termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 127.º do Regimento desta Assembleia.
Para que não restem ^quaisquer dúvidas, quero começar por afirmar que o projecto de decreto-lei que acompanha a proposta de, autorização legislativa é, no seu conjunto e globalmente considerado, um notabilíssimo trabalho, que honra sobremodo os seus autores, todos eles juristas eméritos, permitindo-me, porém, destacar o presidente da Comissão encarregada .da sua feitura, á cuja alta estatura científica, cultural e hamana rendo, gostosa e publicamente, as minhas homenagens.
Más porque assim penso e sinto, maior é a minha decepção, e desgosto por verificar que haja caído na tentação de sobrepor pretensas frazões, de Estado à defesa intransigente aos direitos, liberdades, e garantias dos cidadãos, incluindo nesse projecto de Código de Processo Pena algumas normas, claramente inconstitucionais, ao arrepio, aliás, das suas lições e de todo o seu pensamento expresso, abundantemente, em revistas e publicações.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por lembrar, aqui, parte de uma intervenção por mim feita nesta, Câmara, a propósito de recurso idêntico, interposto pelo MDP/CDE, da admissibilidade da proposta de lei n.º 71/III, - lei de segurança interna, publicada no Diário da Assembleia da República, n.º 127, de 22 de Junho de 1984.
Recordava eu, nessa altura:
O primeiro e primacial, valor conquistado com a Revolução de Abril foi a liberdade, designadamente a liberdade do cidadão, face, ao Estado e mesmo contra o Estado.
Depois de 48 anos de imposição pela força, de um Estado totalitário que tudo sacrificava à sua imagem e aos seus «superiores interesses», esmagando, positivamente, a liberdade e a dignidade do homem enquanto tal, legítimo era que os cidadãos, deste, país tivessem saudado o 25 de Abril, antes de tudo como a sua libertação, enquanto homens, livres e responsáveis.
Daí que a Constituição de 1976 tenha privilegiado a liberdade dos cidadãos, dando-lhe o enquadramento jurídico no capítulo, dos direitos, liberdades e garantias, que quis fosse de aplicação directa e imediata.
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Sedimentada a Revolução, o legislador constituinte de 1982 reforçou e ampliou os direitos liberdades e garantias dos cidadãos, resolvendo, definitivamente, em favor destes a colisão entre os interesses dos cidadãos e do Estado.
As «razões de Estado», que tantas vítimas têm feito através dos tempos, e que agora se pretende ressuscitar, foram definitivamente arredadas da Constituição, que define a República Portuguesa como um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no respeito e na garantia dos direitos e liberdades fundamentais e no pluralismo de expressão e organização política democráticas - artigo 2.º Ora, como diz Figueiredo Dias:
O primeiro vector provém directamente do princípio axiológico que preside à ordem jurídica de um Estado de direito material: o princípio da dignidade do homem, da sua intocabilidade e da consequente obrigação, para todo o poder oficial, de a respeitar e a proteger.
E não se trata aqui, desejo sublinhá-lo, de simples princípio programático, ao qual não pertença conteúdo prático-normativo. Trata-se, bem pelo contrário, do fundamento axiológico - normativo de toda a ordenação jurídica comunitária que se queira justa e que se radique numa exigência de humanidade.
Por isso, quando, em qualquer ponto do sistema ou da regulamentação processual penal, esteja em causa a garantia da dignidade da pessoa... nenhuma transacção é possível. A uma tal garantia deve ser conferida predominância absoluta em qualquer conflito com o interesse - se bem que ele seja legítimo e relevante do ponto de vista do Estado de direito - no eficaz funcionamento do sistema da justiça penal (Para Uma Nova Justiça Penal, pp. 206 e 207).
Em nosso entender, a proposta de lei n. º 21/IV viola o preceito constitucional expresso no n.º 1 do artigo 18.º, bem como os seus n.ºs 2 e 3, ao restringir liberdades, direitos e garantias, em casos em que a Constituição não consente tal restrição, a qual, por outro lado, vem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial destes preceitos constitucionais, como é o caso da inviolabilidade do domicílio, da correspondência, das telecomunicações, do direito à liberdade e à defesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relembrei algumas passagens da minha intervenção, a propósito do incidente de inconstitucionalidade da proposta de lei sobre segurança interna apresentada a esta Câmara pelo IX Governo Constitucional, porque algumas das normas do projecto de decreto-lei anexo à proposta de lei n.º 21/IV, ora em apreciação, foram repescadas, embora de modo mais mitigado, naquela proposta de lei do IX Governo Constitucional, como é o caso, entre outros, dos artigos 143.º, n.ºs 1 e 4, 174.º, n.º 4, 177.º, n.º 2, 178.º, n.º 3, 187.º, n.º 2, 257.º, n.ºs 1 e 2, e 344.º, que violam claramente, a nosso ver, os artigos 18.º, n.º 2, 27.º, 32.º, n.º 4, e 34.º da Constituição da República Portuguesa.
Pasma-se, por exemplo, como é possível admitir que o consentimento do detido, no momento da detenção, possa suprir o mandato judicial de busca ou revista,
quando o n.º 1 do artigo 34.º da Constituição prescreve o princípio da inviolabilidade do domicílio sem autorização expressa do juiz, que só pode delegar tal competência em actos que se não prendam directamente com os direitos fundamentais, como é o caso.
Violando claramente o artigo 32.º, n.º 4, da Constituição, a possibilidade é admitida no projecto de decreto-lei anexo, de as buscas domiciliárias poderem ser ordenadas pelo Ministério Público ou órgão de polícia criminal.
É que a colisão de interesses entre o do Estado à segurança e o dos cidadãos aos seus direitos, liberdades e garantias fundamentais, há-de ser sempre, mas sempre e sem excepção, ser resolvido a favor destes. Tanto mais, num tempo histórico como é o nosso em que não só os jornais mas inquéritos reconhecidamente isentos e imparciais nos dão conta da violação sistemática e diária dos direitos fundamentais dos cidadãos por certas polícias.
Acontece, porém, que o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, emitido a propósito do recurso do MDP/CDE sobre a proposta de lei n.º 21/IV, ressalva, a nosso ver, toda a problemática de inconstitucionalidade ínsita no nosso recurso, embora discordemos, pontualmente, da doutrina restritiva enunciada no n.º 3 daquele parecer, por esvaziar substancialmente a alínea a) do artigo 165.º da Constituição da República.
Na verdade, o referido parecer remete para a discussão na especialidade da proposta de lei, isto é para quando tratarmos da definição do seu objecto, sentido, extensão e da estatuição de limites adicionais, toda a problemática da inconstitucionalidade.
Porque também entendemos que a dispersão, envelhecimento e inadequação da actual legislação processual penal, muita dela eivada de inconstitucionalidades patentes e de manifesta desadequação face ao Código Penal vigente, impõe a entrada em vigor, com a maior urgência, de um novo Código de Processo Penal não eivado daqueles vícios, votámos em comissão e votaremos agora favoravelmente aquele parecer.
Com a ressalva, porém, de que não pactuaremos, em sede de especialidade, com qualquer resquício de inconstitucionalidade, mesmo que alicerçado em poderosas razões de Estado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Estado não é o Governo, o Estado somos todos nós, cidadãos livres deste país de Abril.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.
O Sr. Ministro da Justiça (Mário Raposo): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Sob custódia do n.º 2 do artigo 134.º do Regimento da Assembleia da República, alguns dos senhores deputados do Partido Comunista Português e do MDP/CDE deduziram recurso contra a admissão da proposta de lei de autorização legislativa respeitante ao Código de Processo Penal.
Diz aquele n.º 2 que o requerimento deve ser fundamentado; ora, por maior que seja o meu afã de suprimento, não detecto, no que o MDP/CDE oferece, um vislumbre sequer de fundamentação. Faz-se uma referência a certos preceitos da Constituição. Só que
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não se diz porquê e em que medida eles são violados. Motivo haverá, pois, como que para uma rejeição liminar; não é possível conhecer do fundo da arguição. Quanto ao recurso do PCP já nela se configura uma fundamentação; só que ela é referenciada ao texto do anteprojecto do código que o Governo publicará no uso da autorização legislativa, e não ao texto da própria proposta de lei. Obtemperar-se-á que esta será uma argumentação especiosa, já que a utilidade da função do texto do anteprojecto é a de a Assembleia da República poder antecipadamente conhecer do sentido e da intencionalidade do Governo. Só que não terá razão quem assim, pense. O que prevalecerá será a própria proposta de lei de autorização legislativa, e por isso mesmo esta terá de definir o objecto, o sentido e a extensão da autorização...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!
O Orador: - Ainda bem que assim pensa, pois estamos de acordo.
Como ia dizendo, terá de definir o objecto, o sentido e a extensão, da autorização como agora avisadamente acautela o n.º-.2 do artigo 168.-º da Constituição. E porque as coisas se passam deste modo, a Assembleia será livre de parametrar a disponibilidade legiferante ulterior do Governo. No caso sujeito, não foi por acaso que o Governo cuidou de elencar em 75 pontos o sentido do pedido de autorização, fazendo anteceder o articulado com uma extensa exposição de motivos.
Nesta perspectiva não deixa, pelo menos, de ser estranhável que o Partido Comunista Português entenda que, com tal metodologia, se visou degradar o processo de apreciação e de controle parlamentar.
Sr. José Magalhães (PCP); - Nós é que não deixámos que isso acontecesse!
O Orador: - Devo explicitar que, ao invés do que directa ou reflexamente aduz ou induz o Partido Comunista, o decisivo objectivo do Governo foi e é o de construir um sistema processual penal que permita alcançar, tanto quanto possível, as finalidades da realização da justiça, preservando os direitos fundamentais das pessoas e restabelecendo, no mais curto prazo, a paz jurídica, dos arguidos. Será, sem beliscar nesses matriciais, escopos, que, paralelamente, se pretende promover, até onde seja possível, a máxima simplificação e aceleração da tramitação processual.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Com o afectivo - e efectivo - respeito que sempre, mantenho pela instituição parlamentar, não posso esquivar-me a observar que, em matéria de relações Governo/Assembleia, está a ocorrer uma situação bem caracterizada: a Assembleia da República não reluta, com frequência já sintomática, em invadir espaços que, embora sendo formalmente da sua competência se traduzem, de facto, numa incontida governamentalização parlamentar.
O Sr. José Magalhães: -(PCP): - Não apoiado!
O Sr. Jorge, Lemos (PCP): - É preciso ter lata!
O Orador: -..., forma branda de desequilibrara convencionada geografia dos poderes, do Estado; ao Governo quando, com a mais meridiana das transparências intenta fazer uso de um direito constitucional, é assacado o feio pecado de pretender degradar a soberania volitiva da Assembleia.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Má caricatura!
O Orador: - Parece, pois, haver dois pesos - e várias medidas.
Entretanto, enquanto lentamente transcorrem estas escaramuças formularias, a vida judicial portuguesa vai, ela própria, ingressando em fase de acrescidas dificuldades, como se para acudir a elas bastasse o expedito remédio de imputar ao Ministério da Justiça um compêndio de males e um rosário de culpas. Esquece-se, quem assim pensa ou quem assim diz, que, em matéria de administração da Justiça, o Ministério da Justiça está hoje quase que confinado a uma actuação relativa ao equipamento judiciário - quanto às estruturas físicas e humanas -, em nada podendo influir, a não ser através das leis, que possa ajudar a preparar, na vida dos tribunais.
Sempre fui adepto - adepto convicto e perseverante - da independência do poder judicial.. Mas a separação dos poderes não poderá significar a convolação das culpas, e a sua exclusiva concentração num dos pólos do sistema relacional - precisamente aquele cuja interferência se executada, valerá como uma intromissão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É evidente que a invocada, inconstitucionalidade não poderá ser resolvida como questão prévia em termos de recurso de admissibilidade da; proposta de lei de autorização legislativa.
Entretanto, e de qualquer fornia, há que sublinhar uma trivialidade aparentemente esquecida: um código de processo é um sistema encadeado e quase que incidível de actos, coerentemente aglutinados; as suas normas têm, todas elas, uma significação colectiva como na frase de Manuel de Andrade.
Ora, sendo assim, vejamos o que daqui decorre.
Em primeiro lugar, não se porá em crise que o Código - para cuja aprovação se solicita-a presente autorização, legislativa - marca, relativamente ao direito processual criminal vigente, um significativo progresso, que, aliás, foi já aqui referido, uma acentuada evolução no sentido, da acusatoriedade, e temperada embora pelo tradicional princípio da investigação.
Isto mesmo - esta potenciação do acusatório - desde logo mostra que de uma filosofia processual criminal nova se trata, de um novo modo, de compatibilizar os interesses conflituantes da autoridade e da liberdade, dos direitos dos arguidos e dos interesses das vítimas, de demarcar a linha fronteiriça entre o Estado (aqui protagonizado pelos juízes,- Ministério. Público e entidades de polícia) - e o cidadão (que no processo surge como o arguido, o ofendido ou o defensor).
Por isso, não é possível, no ajuizamento que deste Código se faça tomar, cada instituto processual de per si, sem esquecer o sistema global no qual ele se insere.
Preparava-se o Governo, para o dizer aquando da discussão parlamentar da lei de autorização legislativa. Di-lo-á agora, a propósito da questão prévia da constitucionalidade.
Vejamos, pois.
Num processo de estrutura ainda marcadamente inquisitória - ou só formalmente acusatória - como é o caso daquele que ainda, hoje rege, a vida das nossas instituições criminais, é conhecida a linha de equi-
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líbrio entre os interesses conflituantes que no processo penal se perfilam: aos excessos a que possa conduzir uma averiguação criminal eficaz, donde policial, contrapõe-se a aparição do juiz instrutor, gerador de uma menor celeridade mas garante de uma maior conformação jurídica dos actos que praticar; aos defeitos que possa ter uma instrução totalmente judicializada, necessariamente mais ritualizada e assim mais lenta, opõe-se a validade probatória de actos de delegação instrutória em entidades policiais, a admissibilidade do inquérito preliminar; às dificuldades inerentes ao trabalho diário de investigação policial - cerceado de meios técnicos à altura, donde candidato sério ao uso de meios mais expeditos - cruza-se a necessidade de fazer intervir o juiz instrutor, reduto último da não subalternização de certas regras.
O processo criminal de inspiração inquisitória é, face às necessidades da vida contemporânea, a quadratura do seu próprio círculo.
Pretende-se a celeridade processual, mas sabendo-se que esta só poderá ser alcançada à custa da policialização e administrativização instrutórias, e temendo-se os excessos que daí derivem, faz-se intervir por sistema o juiz de instrução, com o que se mata à nascença aquela procurada aceleração.
Pretende-se a defesa dos direitos constitucionais, mas assumindo que, nas actuais circunstâncias, só o juiz as poderá garantir, e não querendo que tal judicialização conduza a exageros incompatíveis com o normal fluir do processo, faz-se intervir o polícia e o Ministério Público, o que põe em crise o próprio princípio que se quis proteger.
Daí, as aporias do sistema e o ponto de ruptura institucional a que ele chegou.
Reputa-se que o brocardo «toda a instrução é da competência de um juiz» significa que toda e qualquer modalidade de investigação criminal tenha que ser efectuada pelo magistrado - mas, ao mesmo tempo, tem de se tolerar, por força da própria natureza das coisas, o inquérito preliminar, a investigação policial e o auto de notícia, os quais mais não são do que meios de desjurisdicionalizar aquela instrução, supostamente monopólio privativo do juiz.
É precisamente tudo isto que se quis encerrar com o novo Código.
O que nele está em causa é todo um novo jogo de equilíbrios, um novo modo de compatibilizar interesses respeitáveis: esse sistema é o acusatório, de que se quis fazer um acolhimento mais intenso, embora prudência).
Só que não se pretende transferir mecanicamente para este Código - novo e enformado por um sistema diverso - os critérios de aferição firmados durante a longa vigência do sistema processual penal que ele pretende substituir, sobretudo quanto à constitucionalidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Devo-lhes dizer que tenho de terminar. A minha intervenção estava preparada para ser mais longa e entrar no detalhe, ponto por ponto, indo além da barreira liminar, que me parece óbvia, da não admissibilidade dos recursos.
No entanto, se o Sr. Presidente me permitir que utilize mais dois minutos, não quereria deixar de, como que em nota de rodapé, ou après la lettre, esclarecer dois pontos suscitados agora pelo Sr. Deputado José Magalhães.
O primeiro desses pontos diz respeito à lei de segurança interna. Para acautelar os zelos de alguma comunicação social que me pensa revel em tal matéria, esclarecerei que já em 1984 e a pedido da Ordem dos Advogados - e como seu antigo bastonário - dei uma opinião sobre o texto de então, que a Ordem fez sua. Os meus reparos estão atendidos neste momento e estou em inteira sintonia com a proposta de lei já aprovada pelo Governo; que isto fique bem claro. É evidente que este debate não será o momento adequado para estar a discutir a lei de segurança interna.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Se o Sr. Ministro me permite a interrupção, quero informar que acabou de chegar à Mesa a informação de que há consenso para atribuir mais cinco minutos a cada partido e para o Governo o tempo que considere necessário para intervir.
Faça o favor de continuar a sua intervenção, Sr. Ministro.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
O segundo ponto diz respeito à minha não intervenção pública sobre os resultados do inquérito à actuação da Polícia de Segurança Pública, inquérito esse realizado como que por impulso do Sr. Provedor de Justiça. Devo esclarecer que, pura e simplesmente, tudo quanto se possa dizer sobre a minha omissão do dever de actuar, digamos, administrativamente, no sentido de produzir um despacho de fundo, é inteiramente descabido. Compreendo que em torno disso se possa estabelecer confusão no espírito de pessoas mal preparadas do ponto de vista jurídico. Mas o que já não concebo é que, com o muito respeito e a sincera admiração - devo dizê-lo publicamente - que tenho pelo Sr. Deputado José Magalhães, o Sr. Deputado possa, em recta consciência, pretender que o Ministério da Justiça interfira na actividade de uma polícia que nos termos legais e tradicionais está no âmbito do Ministério da Administração Interna.
Quer o Sr. Deputado José Magalhães que o Ministro da Justiça assuma ele próprio a actividade de investigação criminal? Se essa actividade fosse assumida pelo Ministro da Justiça, certamente que o Sr. Deputado José Magalhães viria aqui dizer que o Ministro da Justiça estava a arrogar-se em poderes que não possuía. No fundo, e já que estamos a falar em polícia, prisões, etc., é ser «preso por ter cão e por não o ter».
Aplausos do PSD.
O Sr. Deputado José Magalhães até se está a rir agora, e, portanto, a rir-se da sua própria argumentação.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não. Estou a rir-me do seu equívoco!
O Orador: - Na realidade, não acredito que o Sr. Deputado, em consciência, possa acreditar... Ainda posso aceitar que algum jornal menos informado possa assacar-me uma omissão quanto a um relatório em cujo momento inicial actuei, por uma óbvia razão de solidariedade de governo e por pensar que o Ministério da Justiça, em tudo o que diga respeito ao Estado de direito, deve ter uma intervenção. Actuei na fase genética, não na fase de apreciação do resultado. Com
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efeito, não sou uma autoridade policial, o Ministério Público ou alguma dessas altas autoridades que agora existem, por vezes, em termos de uma certa ortopedia do sistema. Sou apenas o Ministro da Justiça e, como disse há pouco, em matéria de actividade judicial estou - e, tal como eu, também o estiveram os meus antecessores - confinado a uma área de preparação de leis e de acolhimento às necessidades de infra-estruturas dos tribunais; e não poderei ir além disso. Portanto, Sr. Deputado, e salvo o devido respeito, considero que a sua dúvida não tem qualquer razão de ser. Dispenso-me de evidenciar essa falta de razão, porque em consciência o Sr. Deputado sabe que não existem nem razão de ser nem pertinência na sua observação.
Dada a possibilidade que me foi concedida para prosseguir, na leitura - o mais abreviada possível, pois não quero retardar excessivamente esta sessão - do texto da minha intervenção, insistirei em que está em causa um novo jogo de equilíbrios, um novo modo de compatibilizar interesses respeitáveis.
E, dizia eu, não se queira transferir mecanicamente para este Código - novo e enformado por um sistema diverso - os critérios de aferição firmados durante a longa vigência do sistema processual penal que ele pretende substituir, sobretudo quanto à constitucionalidade.
Em matéria de Constituição e de Processo Penal, haverá que tomar em linha de conta que o texto da lei fundamental fornece um quadro de referência normativo bem escasso relativamente àquilo que podem ser às multiformes manifestações dos concretos sistemas de processo penal e que valem na ordem interna e nos grandes textos internacionais a que Portugal está adstrito, maxime a Convenção Europeia sobremos Direitos do Homem.
Se o Sr. Presidente me permite, gostaria de saber se o Sr. Deputado José Magalhães pretende solicitar algum esclarecimento, pois, na realidade, à tarde há uma reunião de Conselho de Ministros, pelo que não poderei estar aqui presente e, assim sendo, se o Sr. Deputado José Magalhães desejar algum esclarecimento, terminarei desde já a minha intervenção.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, para formularem pedidos de esclarecimento estão inscritos três Srs. Deputados.
O Orador: - Nesse caso, Sr. Presidente, creio que será mais útil terminar a minha intervenção, descer à bancada do Governo e, de lá, enfrentar mais «operacionalmente» as questões que os Srs. Deputados me queiram colocar.
Aplausos do PSD.
O Sr: Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, estão inscritos os Srs. Deputados Sottomayor Cardia, José Manuel Mendes, José Magalhães e António Taborda.
Srs. Deputados, entretanto, quero reafirmar que está implícito o entendimento de que se prolongará esta parte da manhã dos nossos trabalhos, até que sejam formulados os pedidos de esclarecimento agora anunciados e respectivas respostas.
Tem a palavra, o Sr. Deputado Sottomayor Cardia.
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Ministro da Justiça, bem compreendo, as aporias ou algumas das aporias referidas por V.. Ex.ª Mas não é de aporias que aqui venho falar.
Vou começar por referir duas afirmações minhas, talvez erradas, pelo que se for esse o caso, V. Ex.ª corrigir-me-á, se tiver a bondade de o fazer.
A primeira dessas afirmações é a que no projecto governamental de Código de Processo Penal se introduz um significativo alargamento do conteúdo do conceito de investigação criminal. A segunda afirmação é a de que de tal alargamento resulta a inclusão no conceito de investigação criminal de competências actualmente inerentes à fase instrutória e, portanto, cometidas ao juiz.
Agora, as perguntas que lhe coloco.
Primeira: admite o projecto que um cidadão não detido possa ser interrogado, para efeitos de instrução criminal; por uma entidade policial?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Admite, admite!
O Orador: - Segunda questão: admite-se mesmo que tal cidadão possa ser sujeito a esse interrogatório sem assistência de advogado?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Admite, admite!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, quero apenas esclarecer que eu não havia pedido a palavra para formular um pedido, de esclarecimento, mas para sugerir à Mesa alguma tramitação, que acabou por se observar, no sentido de facilitar a palavra ao Sr. Ministro, da Justiça e de permitir, que aprofundemos o debate para além da hora prevista.
O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra, o Sr. Deputado José, Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Ministro da Justiça, compreendo o tom que utilizou hoje do alto da tribuna. Julgo é que há um certo desvio de destinatário, pois creio que V. Ex.ª não se estava a dirigir a mim, embora me tenha tomado como ponto de referência para o sinal. Segundo creio, estava a dirigir-se àqueles que vindos de outros sectores políticos é ideológicos, vêm desferindo contra o seu Ministério e a sua gestão alguns ataques que, aparentemente, lhe produzem profundos dissabores e que mal gostam com muitas coisas, inclusive, com o seu mister governamental.
Quero dizer que temos críticas em relação à acção governamental - elas são profundas e tive ocasião de aqui expressar algumas delas -, mas, em todo o caso, de maneira alguma consideramos adequado, correcto, justo e politicamente explicável que sejamos bodes expiatórios de quaisquer ajustes de contas que V. Ex.ª tenha como os jornais O Diabo, Semanário, e corri quaisquer desses sectores que belicosamente lhe vêm desferindo algumas zagaias, em circunstâncias sobre as quais não me pronuncio agora. Não é esse o tom que queremos adoptar neste debate parlamentar, nem é sobre isso que vou falar.
Quero, sim, colocar-lhe questões em duas áreas. Primeiro, ri-me, quando V. Ex.ª colocou a questão da sua posição face ao inquérito às polícias, pelo manifesto equívoco que estava subjacente às suas palavras. Com efeito, sendo também da autoria do Ministro da Justiça o despacho que conduziu à elaboração do rela-
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tório em questão e predendo-se este relatório com polícias que sei serem primacialmente da dependência do Ministério da Administração Interna - é público, é notório -, é muito estranho, reafirmo-o, que o Ministério da Justiça, que tem importantes funções numa das vertentes da segurança interna, da tranquilidade dos cidadãos, se mantenha inteiramente silencioso no momento em que o Sr. Provedor de Justiça traz os factos a público e se verifica que eles são de uma extrema gravidade e em que, na esfera do Ministério da Justiça, há que pensar que consequências e projecções é que isto tem.
O Sr. Ministro é chefe hierárquico da Polícia Judiciária e tem um conflito aberto com ela, designadamente com os seus investigadores, em relação ao qual muito gostaríamos de saber como é que o Governo se vai sair, a bem da investigação criminal e da regularidade e estabilidade da Polícia Judiciária.
Sr. Ministro, por favor não nos diga que estas são questões indiferentes ou que relevaria de má fé ou de qualquer outro sentimento esquisito a sua questionação. Colocámos, colocamos e colocaremos estas questões até que o Governo lhes dê resposta ou, no caso de entender não a dar, tiraremos as ilações óbvias e justas.
Um segundo aspecto prende-se com a questão da segurança interna e dos factores de segurança. Como é que podemos deixar de perguntar ao Ministro da Justiça, como hierarca de uma vertente fulcral da defesa da legalidade em Portugal, questões como as relativas aos factores de insegurança? Como é que podemos deixar de colocar a questão da ruptura do sistema prisional? Como é que podemos deixar de lhe colocar a questão da situação caótica dos tribunais de instrução criminal e das suas causas? O Ministro da Justiça é um simples gestor dos edifícios, dos portões, das portas, dos sistemas prisional e judicial? Sr. Ministro, se é assim, é um gestor péssimo. Péssimo, uma vez que o sistema está em explosão, uma vez que o sistema judicial cai aos pedaços e os juízes até já se queixam do pagamento em atraso de ajudas de custo - chegou-se mesmo a este ponto! -, e fazem-no com muita razão.
Pergunto-lhe, Sr. Ministro, se como gestor é a isto a que se circunscrevem as suas funções.
Por outro lado, como é que pode achar estranho que se questione o facto de ter sido assassinado um director-geral dos Serviços Prisionais e o Governo ainda não tenha uma informação cabal sobre estas matérias? Como pode achar estranho que, estando o sistema prisional em levitação, se questione o facto de a Assembleia da República ainda não ter um relatório circunstanciado da parte do Governo sobre tudo isto e, sobretudo, conhecimento das medidas que vai tomar?
Como é que o Sr. Ministro quer que não falemos disto quando V. Ex.ª propõe um Código de Processo Penal que vai alterar profundamente toda esta situação? Como é que podemos deixar de falar disto?
Quanto à Lei de Segurança Interna, não quero saber se V. Ex.ª está em sintonia com o Governo, nem concebo que o Ministro da Justiça, estando em dessintonia com o Governo numa matéria tão fulcral como o é esta, continuasse a ser Ministro da Justiça, membro do Governo.
Nós, Assembleia da República, não temos nada a ver com isso. O que precisamos de saber não é uma questão íntima do Conselho de Ministros, mas, sim, a de
como o Governo, pela boca do seu Ministro da Justiça, articula o Código de Processo Penal com a Lei de Segurança Interna.
O Sr. Ministro, sintomaticamente, não respondeu a esta pergunta que lhe coloquei e que volto a repetir: vai a Lei de Segurança Interna incluir medidas de processo penal especial, como escutas autorizadas administrativamente pelo Sr. Ministro da Administração Interna? É isso o que o Sr. Ministro da Justiça entende?
Se assim é, deve dizê-lo aqui e já, para que, quando estivermos a ponderar as medidas especiais que se encontram no Código de Processo Penal, saibamos que não estamos a discutir tudo e que o Sr. Ministro da Justiça tem dois tipos de posições, que só articula no azimute do infinito. Ora, não estamos de acordo com isso. É, pois, essa crítica que aqui lhe deixamos e é sobre isso que consideramos necessário e imprescindível que o Sr. Ministro se pronuncie com urgência perante esta Câmara.
Foi isto que presidiu à nossa interrogação e não houve nenhuma outra intenção. É isto que quero deixar bem esclarecido.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Ministro da Justiça, antes de mais, quero fazer uma rectificação, pois V. Ex.ª disse que o requerimento em interposição do recurso de admissibilidade da proposta de lei n.º 21/IV, apresentado pelo MDP/CDE, não estava fundamentado e, por tal, deveria ter sido liminarmente rejeitado.
Ao lermos o recurso apresentado, verificamos que ele está minimamente fundamentado e indica os artigos da Constituição que seriam violados - concedo que seja uma fundamentação demasiado sumária, mas, em nosso entender, o recurso está minimamente fundamentado. De resto, como o Sr. Ministro sabe, é prática desta Casa que o fundo da fundamentação se faça depois, na medida em que inicialmente se trata de um recurso para o Plenário e, portanto, a fundamentação deve ser feita perante o Plenário da Assembleia da República.
O Sr. Ministro apresentou aqui uma ideia demasiado restritiva e burocrática do que entende que deve ser a acção de um Ministro da Justiça, como sendo, praticamente, um gestor puro e simples dos tribunais e um colaborador da formação técnica das leis do Governo. Não acha V. Ex.ª que, acima de tudo, o Ministro da Justiça tem de ser uma consciência moral e ética do Governo, tem de ser fundamentalmente o garante, dentro do Governo, da legalidade democrática e da defesa das liberdades e garantias dos cidadãos? É ou não esse o seu principal escopo dentro de qualquer governo?
Neste projecto do Código de Processo Penal, gostaria que me explicasse porquê e para quê ultrapassar os limites constitucionais no momento em que, como todos sabemos, grassa uma certa insegurança dos cidadãos devido a actividades perfeitamente ilegais e inconstitucionais de alguns polícias. Porquê repescar estes elementos extremamente polémicos de uma tristemente defunta lei de segurança interna apresentada pelo anterior governo?
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Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Para quê fazer esta repescagem se ao contrário do que se julgava, foi anunciado pela imprensa que, afinal, o Governo sempre tem uma lei de segurança interna que aprovou na última reunião de Conselho de Ministros?
Para quê e porquê transferir para esta Assembleia da República as responsabilidades do actual caos legislativo em matéria de Código de Processo Penal?
Vozes do MDP/CDE e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.
O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Deputado Sottomayor Cardia, quanto ao problema da investigação, é evidente que há uma intervenção maior do Ministério Público. Mas, Sr. Deputado, temos, de uma vez para sempre, de ultrapassar o conceito da dicotomia abissal entre Ministério Público e juiz, magistrado do Ministério Público e magistrado judicial, embora o juiz continue a ser juiz e o magistrado do Ministério Público continue a ser magistrado do Ministério Público.
O grande perigo que anteriormente existia relativamente ao Ministério Público era ele sei como que um porta-voz, como que uma longa manus do Governo. Ora, hoje, todos nós sabemos que, nos termos da Constituição. - salvo erro, o artigo 224.º da Constituição -, o Ministério Público é o garante da legalidade democrática, quase que diria o grande preferencial da legalidade democrática; é, por assim dizer, o promotor, activo da legalidade democrática. E quero aqui reiterar, publicamente todo o apreço que, como jurista e pequeno cidadão, tenho pelo Ministério Público do meu país. Isto, por certo, tal como VV. Ex.ªs, embora por vezes até pareça que não o têm. Não quer isto dizer que tenha sido esse o objecto do pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Sottomayor Cardia, que fez uma pergunta perfeitamente pertinente.
Realmente esta dicotomia tem de ser ultrapassada...
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Ministro, não perguntei pela dicotomia entre o Ministério Público e o juiz, mas sim se continua a haver dicotomia entre polícia e juiz.
O Orador: - É evidente, Sr. Deputado, que não há qualquer intensificação da intervenção da autoridade policial enquanto tal. O que há é um reforçar do âmbito da investigação, depois sempre assegurada por uma instrução consequente..
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - E esse alargamento, não significa aumentar a competência da polícia em actos instrutórios, Sr. Ministro?
O Orador: - Não, de maneira nenhuma. Quanto a isso, respondo que não.
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Então estou esclarecido. V. Ex.ª respondeu pela negativa às minhas duas perguntas...
O Orador: - Exactamente, Sr. Deputado. Quanto ao segundo ponto que o Sr. Deputado há pouco referiu, dizia que a constituição de advogado pelo arguido está expressamente prevista no artigo 58.º, n.º 1, alínea a), do anteprojecto do Código de Processo Penal, junto com a proposta de lei: correndo inquérito contra pessoa determinada e esta prestar declarações perante qualquer autoridade judiciária ou órgão de polícia criminal, é obrigatória a constituição de arguido.
Quanto ao direito de intervenção do defensor, é um dos direitos processuais do arguido, nos termos das alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 61.º do anteprojecto: ser assistido por defensor em todos os actos processuais em que participar e, quando detido, comunicar mesmo em privado com ele a partir do primeiro interrogatório judicial. Suponho que também esclareci a segunda interrogação do Sr. Deputado.
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Às minhas perguntas concretas o Sr. Ministro respondeu pela negativa?
O Orador: - Sim, Sr. Deputado, a ambas.
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Fico tranquilizado. Quem me informou de que estes riscos tinham alguma base no texto, certamente informou-me mal...
O Orador: - Não, o que pode realmente haver, num caso singular que aliás referiria no texto que aqui leria, é um momento excepcional em que o defensor não intervém imediatamente.
Isto é um sistema que é comum a todos os países da Europa e só se aplica a situações de crise grave, a situações de ponta. Mas esse assunto será discutido aquando do debate do diploma. Não é agora o momento de o fazer, porque na realidade neste momento é difícil estar a explicitar ponto por ponto.
O que interessa é a regra e não as excepções, porque as excepções poderão ser corrigidas se for caso disso e o Governo está inteiramente aberto a essa possibilidade.
Srs. Deputados, a Assembleia tem possibilidade de ao conferir à autorização legislativa ao Governo definir determinadas regras e princípios que porventura prevaleçam. A Assembleia não está adstrita a aceitar como que impotestativamente qualquer ingerência ou qualquer coacção do Governo.
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Ministro, isso quer dizer que quanto à segunda das minhas perguntas, V. Ex.ª afinal responde pela positiva?
O Orador: - Respondo, Sr. Deputado, porque é um caso excepcional em que pode acontecer essa situação apenas numa primeira fase. Mas isso será objecto de uma apreciação aquando do debate do diploma.
Sr. Deputado José Magalhães, devo dizer que o meu tom não era em relação a nenhum orgão de comunicação, não era em relação a ninguém em concreto. Sinceramente, era em relação a ele próprio, se me permite, eu assumo os tons e os destinatários dos tons. Devo dizer ainda que não falei «do alto da tribuna».
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tribuna e penso que o fiz pela primeira vez nesta Assembleia, excepto quando fui deputado, em exercício, durante alguns anos. Fi-lo para não dar a sensação de um excesso de humildade, mantendo-me aqui, quando os Srs. Deputados lá foram. Portanto, e apenas por isso, não aceito que tenha falado «do alto». Não pretendi falar do alto de nada, mas também sinceramente lhe digo que não me sinto por baixo, sinto-me na posição em que sempre estive, podendo olhar para as pessoas a direito, com responsabilidade e com segurança.
Ora, o que também sinto Sr. Deputado é que na realidade há por vezes pontos que são postos (por exemplo todas estas perguntas que fez o Sr. Deputado Sottomayor Cardia e que o Sr. Deputado também fez) com perfeita pertinência. E não é por eu o considerar que o diálogo existe, mas sim porque é uma regra da própria democracia. Agora o ponto que levantou é que, salvo o devido respeito, não tem qualquer espécie de pertinência. E já agora aproveito para, ao Sr. Deputado e meu querido colega Dr. António Taborda, dizer que na realidade não devemos ir para esse tipo de complicados chavões, dizendo que o Ministro da Justiça é a consciência ética e moral do Governo. O que se passa é que o Ministro da Justiça é um membro do Governo como qualquer outro, que tem as atribuições e as competências que a lei lhe confere e a realidade lhe consente. Não queiramos hipertrofiar nem queiramos diminuir nem restringir, situemo-nos na realidade à qual eu já tentarei ir.
Devo dizer, rapidamente, quanto ao inquérito, que este foi suscitado, que avalisei inteiramente que fosse suscitado e que não tive qualquer relutância em ser signatário do despacho que o suscitou. Isto embora não tenha sido - ao invés do que costumo assinar - um despacho por mim redigido.
Mas estive em sintonia com ele. E mantenho essa concordância; o que me interessou foi que fosse desencadeada uma actuação. A actuação desencadeou-se, e dentro dos parâmetros da minha possível actuação dei-lhe toda a assistência, solicitando inclusivamente a designação de um procurador-geral-adjunto para presidir à Comissão. Explicitarei que não sou eu quem designa os magistrados do Ministério Público, por menos gestor que eu queira ser, por mais soberania que eu queira ter e por mais pompa e ritual de que eu quisesse dispor. É que não posso ir além das minhas competências. Pedi à Procuradoria-Geral da República, «gerindo...» O que sucede é que quando eu giro ainda a coisa vai bem, agora o que me custa por vezes é digerir coisas que dizem acerca do Ministério da Justiça. E não por via dos tais órgãos de comunicação social que apontou, mas sim das situações que o Sr. Deputado talvez por uma razão de mero rito parlamentar entendeu elencar e que, sempre com o devido respeito, são perfeitamente descabidas. Isto no sentido de não cabidas, já que todas as questões que vêm de si têm algum cabimento, pelo menos no seu ponto de vista. Devo, portanto, dizer que é isso que me custa a aceitar, ou seja que se possa dizer, no termo de um inquérito, que o Ministro da Justiça devesse fazer mais do que um despacho interno, que eu fiz, e que pode ser facultado. Enviei-o ao Sr. Ministro da Administração Interna e, ao fazê-lo, sublinhei que o caso era da sua competência. Mas, mais do que isso, mandei remeter o assunto à Procuradoria-Geral da República para os efeitos depois postos ou suscitados pelo Sr. Ministro da Administração Interna.
Não tenho os despachos aqui à vista, pois não vinha preparado para este tipo de interrogatório ou questionamento. No entanto, quando o Sr, Deputado quiser, estão à sua disposição nesta Assembleia da República, que é o lugar próprio para o cumprimento deste meu dever de informação; o lugar do cumprimento, no caso, não é «o do domicílio do devedor, mas sim o do credor».
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faça o favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Ministro, finalmente!
O Orador: - Finalmente, porquê? É a primeira vez que me fazem a pergunta Sr. Deputado, isto para além de algumas vagas notícias que li. Devo dizer que quando falei com alguma vivacidade - e desculpe agora estar eu a interrompê-lo -, mas é que na verdade isso foi dito em O Jornal, que é um órgão de comunicação que, desde o momento em que surgiu, teve sempre a minha admirativa adesão, até porque dele foi director o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos. Dizia-se, mais ou menos, que o Ministério da Justiça não actuou como devia. Ora o Ministro da Justiça fez exactamente o que devia fazer, só que o Ministro da Justiça entende que deve cumprir a sua obrigação, respeitar os deveres que tem perante os órgãos, perante os quais é responsável, e mesmo perante aqueles que na realidade possam interessar à opinião pública. Só que não pode andar a dizer tudo o que faz, não deve promover a sua imagem, nem a propagandear a sua acção, e será esse o feio pecado de omissão que posso ter cometido. Agora quanto àquilo que eu devo fazer na realidade, posso garantir que pelo menos tento fazê-lo ...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É que, Sr. Ministro, aquilo que nos acaba de dizer é importante porque, pelos vistos, sabem-se do Ministro da Justiça coisas que não faz e faz coisas que não se sabem. Ë a grande síntese.
O Sr. Ministro da Administração Interna mandou à Assembleia da República, através do ofício n.º 2776/86, de 7 de Maio, o relatório das conclusões do processo de inquérito e o despacho que exarou. V. Ex.ª atrasou-se, esqueceu-se, tem más public relations e abre o equívoco monumental de um silêncio, que agora nos diz que não tem mantido, pelo que é do mais alto interesse que a Câmara conheça o despacho que V. Ex.ª exarou, ainda que interno seja.
É isto que quero dizer.
O Orador: - Sr. Deputado José Magalhães, salvo erro, nesse despacho do Sr. Ministro da Administração Interna refere-se, a certa altura, no ponto 4 ou no ponto 5, o Ministro da Justiça para qualquer efeito. Evidentemente, o Ministro da Justiça imediatamente deu seguimento àquilo que aí se lhe pedia.
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Só que, na verdade, quem decidiu quanto ao fundo da questão foi o Sr. Ministro da Administração .Interna Consequentemente, eu não teria ,de andar a dizer nada pelo Sr. Ministro da Administração Interna, porque, da mesma maneira que não giro apenas os tribunais, também não sou porta-voz de outros ministérios por mais respeitáveis e cordiais que sejam as relações com eles.
Isso não teria cabimento Sr. Deputado. Seria um problema de cabimento, mas, Sr. Deputado, o problema deste país, às vezes, também é um problema de cabimento orçamental. Este "orçamento" ; já vai, longo e os senhores deputados até já me ouvirão com algum desagrado. Já estarei a incomodar a Câmara, mas será, talvez, um pouco por vingança. Os senhores deputados são os representantes do País e, como às vezes, o País é injusto comigo, estou agora, na vossa presença, a vingar-me dessa vertente do País que comigo tão injusta é.
Realmente, Sr. Deputado, posso ser, um .gestor, que serei, e creio que ,a gestão serve para muita coisa e ajuda a resolver muitos assuntos. Porém, me confino a uma função de gestão e, sobretudo, não me resigno a gerir uma "crise".
Devo dizer que não me sinto na obrigação de andar a dizer isto metódica e sensacionalisticamente a todos os órgãos de comunicação social. E estes são os que depois transmitiriam o que dissesse para, a opinião pública, da qual eu próprio também sou tributário, no que diz respeito a outros emitentes de qualquer mensagem (no caso os senhores deputados, em relação a mim próprio).
Precisarei que não há ruptura do sistema prisional; em relação ao qual se está, a tentar fazer tudo. o ;que é possível. Só que não é nalguns, meses, que se pode recuperar um atraso de uma série de anos; atraso que não se poderá imputar a nenhum ministro em concreto, mas antes se deve imputar a uma falta de estabilização ou de continuidade de uma política prisional e sobretudo - sejamos realistas- à falta de meios financeiros com que, no fundo, se tem debatido desde sempre, e não apenas agora, este país.
Portanto, não serei um gestor "das portas, dos tribunais ".
Agora, quando vêm dizer, que um processo está nas mãos de um senhor juiz há não sei quantos meses e me vêm pedir para intervir, é evidente que não posso intervir, porque, se o fizer, estou a ter uma, atitude objectivamente, inconstitucional, já que existe o princípio do artigo 114.º da Constituição que, embora apontando para a interligação entre os poderes, se firma no prudente princípio, oriundo de Montesquieu, da separação dos poderes: princípio que é uma vitória da nossa democracia.
Agora, o incómodo é bi-incómodo. Antigamente, o Ministro da Justiça poderia dar ordens aos , tribunais; ordenando, por exemplo, que se andasse com certo processo mais rapidamente. Neste momento, não pode fazer isso.
Quanto à lei de segurança interna, devo dizer que estou solidário com o Governo a que pertenço. Tal questão nem se colocará porque, se não estivesse solidário, não estaria nele.
Agora, posso é estar pontualmente em desacordo com alguma atitude .que se tome , numa área do Governo. Como, felizmente, continuo a ter a liberdade de pensar e de exprimir a minha discordância, até poderia eventualmente, nos órgãos e no espaço próprios, manifestar essa discordância, embora, por uma razão de solidariedade para com o Governo, enquanto nele me mantivesse, aqui não a (exprimisse publicamente. Só que se dá a feliz circunstância de estar em total sintonia com a actual formulação da lei de segurança interna, pelo que tenho muito gosto em publicitar essa concordância. Falo, pois, pela activa e não pela negativa. Tenho muito gosto em dizer que estou em total sintonia e, aliás, devo dizer que a actual lei de segurança interna, tal ,como foi, aprovada como proposta de lei do actual governo, é uma, proposta de lei perfeitamente certa, democrática perfeitamente asseguradora da segurança individual, dos cidadãos.
Recordo que sempre, sustentei, que qualquer política de segurança não pode ser geradora ou fautora da instabilidade e da insegurança. Acredito que esta lei de segurança interna, será um instrumento decisivo para que, na realidade, se concretize um Estado de direito, um Estado democrático de direito, que viabilize a liberdade de todos os Portugueses. É evidente que se agora o Sr. Deputado for perguntar, porquê, então já não terei possibilidade, por falta, de tempo; de explicitar.
Quanto, ao Sr.Deputado António, Taborda .
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Ministro, dá-me; licença que o interrompa?
Orador:- Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Amónio Taborda (MDP/CDE): - Então, devo concluir que se a, lei de segurança interna, que o Governo aprovou e que, neste momento, só o Governo conhece foi expurgada de todas; as questões polémicas da anterior, lei de segurança interna, essas mesmas questões polémicas foram metidas aqui neste projecto de decreto-lei do Código de Processo Penal?
O Orador:- Sr. Deputado, devo repetir que não posso estar a dizer que há uma interacção entre as duas propostas, de lei.
Já tive ocasião de o dizer na l.ª Comissão, aliás na ausência do Sr. Deputado, e creio que isso aí foi entendido - e continuo a olhar desgostosamente para o Sr.º Deputado José Carlos Vasconcelos fazendo um feed back ao nosso querido semanário O Jornal. Não desacompanhei a lei de segurança interna. Só que entendo que a proposta de lei do Código foi inteiramente assumida por uma comissão inteiramente responsável, em que não houve qualquer intromissão, qualquer interferência, por parte do Governo.
Hoje de manhã estive a pensar numa lei, sobre o contrato de transporte de mercadorias por mar.
Discordei... - Vou pedir à respectiva Comissão para repensar alguns pontos.
O Sr. Deputado Costa Andrade, está aqui e suponho que ainda tem a paciência de me ouvir, embora talvez já em pé de saída, e posso à frente dele certificar, que, no caso da sua comissão, não tive qualquer interferência real a não ser a de lhe assegurar todos os meios, até porque não sou, um processualista penal. Tenhamos a noção das nossas próprias limitações.
Consequentemente, esta lei foi feita, como, aliás o Sr.Deputado teve ocasião de dizer, com toda a liberdade de espírito, com toda a possibilidade de discordância em relação ao próprio Ministério da Justiça.
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Devo dizer que a assumo inteiramente, que com ela me rejubilo. E isto porque será dela que resultarão soluções para todos esses males que andamos a falar, como seja o de não houvesse suficientes juízes de instrução criminal, não haver isto, não haver aquilo. O novo Código terá a virtualidade de, em curto prazo, resolver todos esses problemas.
É evidente que se o Sr. Deputado me pergunta se houve um sistema de vasos comunicantes entre esta lei e a lei de segurança interna, respondo-lhe frontalmente que não houve. Foram duas leis que funcionaram em dois espaços de produção legislativa diversos; esta, na Comissão do Código de Processo Penal e, a outra, no Ministério da Administração Interna, embora com conhecimento de todos os membros do Governo e, necessariamente, de mim próprio.
Em 1984 e, aliás, curiosamente então em total sintonia com o Sr. Deputado Sottomayor Cardia, pois tivemos ocasião de falar uma vez, eu discordava com muitos pontos da lei de segurança interna de então. Desculpe que diga isto agora ...
O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Fico satisfeito que o diga!
O Orador: - E, com isto, termino. Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, os nossos trabalhos recomeçarão às 15 horas e 30 minutos e estão já inscritos para produzir intervenções os Srs. Deputados Costa Andrade, José Carlos Vasconcelos, Andrade Pereira e António Vitorino.
Srs. Deputados, está suspensa a sessão.
Eram 13 horas e 35 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 40 minutos.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sem presumir de alguma notoriedade no que toca à minha pessoa e aos meus actos, julgo, de todo o modo, que algumas das pessoas mais interessadas neste processo sabem que fui membro da comissão nomeada, já em 1983, pelo Sr. Ministro da Justiça para elaborar um anteprojecto do Código de Processo Penal. No entanto, não é na qualidade de membro dessa comissão que farei esta curta intervenção a propósito do requerimento de impugnação de admissibilidade desta proposta de lei, oriundo da bancada do Partido Comunista Português. Faço-o como deputado, no contexto de um debate que, sendo técnico-jurídico, é também, aqui e agora, predominantemente político.
Este é um debate político já pela natureza das matérias em debate. Não é por acaso que, há já algum tempo, um célebre penalista alemão dizia que o processo penal é por definição a esfera do Direito onde, com maior evidência, fazem crise as relações entre e cidadão e o poder, entre o indivíduo e o Estado, isto é, onde o problema jurídico do político se põe com maior acuidade. O debate é também político pelo ambiente que vivemos: são conhecidas as vicissitudes por que têm passado as relações entre o Governo e Assembleia da República nos últimos tempos, pelo que este debate releva também, de certa maneira, deste ambiente.
O debate é igualmente político pela própria postura com que o Partido Comunista Português o introduz. Na verdade, no requerimento de impugnação desta proposta de lei, por parte do Partido Comunista Português, é possível distinguir claramente dois aspectos completamente diferenciados.
Por um lado, e, em primeiro lugar, o plano dos problemas reais que esse requerimento coloca. São problemas reais - e aqui concordo inteiramente com a intervenção do Sr. Deputado José Magalhães quando diz que "certezas ninguém as tem" - que requerem de nós uma atitude de abertura e não dogmática, e para os discutir afirmamos também a nossa disponibilidade e a nossa abertura.
Mas o requerimento do Partido Comunista não releva só deste sentido. Releva também de uma outra atitude. E esta, já do nosso ponto de vista, deputados do Partido Social-Democrata, releva de uma certa e injustificada obstinação contra tudo o que vem do Governo. Este requerimento já é (nesta sua parte, repito) oposição pela oposição, necessidade, quase ritualizada, de protestar contra tudo o que vem do Governo. E se demonstrarmos que o Código de Processo Penal representa um passo significativo no sentido do progresso e da modernidade, teremos, obviamente, que concluir também que, nesta parte, o requerimento do Partido Comunista é, a seu modo, uma tentativa obstinada de pôr um travão a ambos.
Na verdade, o Partido Comunista Português começa por dizer que o Governo degrada duplamente o processo de apreciação parlamentar da necessária revisão do Código de Processo Penal. Primeiro - e estou a citar -, "[...] ao solicitar uma mera autorização legislativa limitadora do pleno exercício das competências legislativas da Assembleia da República [...]". É aqui que está, segundo o Partido Comunista, uma das razões da degradação que o Governo propõe. Mas degradação porquê, Srs. Deputados? Por ser uma autorização legislativa? Mas não é verdade que esta representa um instituto normal do nosso ordenamento jurídico-constitucional?
O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Não é perfeitamente correcto e adequado que o Governo, numa atitude intraconstitucional, recorra ao expediente da autorização legislativa? Ou será que o Partido Comunista tem a ousadia de considerar o contrário? Pelo menos nunca lhe vi expressa esta ideia de que haverá normas constitucionais que são também inconstitucionais! Talvez não chegue a tanto, mas parece dar a entender, implicitamente, que existem normas constitucionais bastardas, designadamente as que legitimam as autorizações legislativas. Ora, só pelo facto de ser autorização legislativa não degrada duplamente o processo de revisão. Mas degradá-lo-á só porque é um pedido de autorização legislativa sobre o Código de Processo Penal? Seria eu o último, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a tentar subestimar a importância das matérias do Código de Processo Penal.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando o legislador constituinte enumerou um elenco de matérias que constituem a reserva da Assembleia da República, fê-lo em nome da especial dignidade desta. Todas as matérias que constituem reserva da Assembleia da República relevam de uma certa dignidade. Ora, este argumento do Partido Comunista levar-nos-ia a que nunca houvesse lugar a pedidos de autorizações legislativas, porque tal degradaria o processo de elaboração legislativa em matérias de reconhecida dignidade e relevância jurídico-constitucional. E eu penso -ou, pelo menos, parto desse pressuposto - que todas as matérias incluídas no elenco da reserva da Assembleia da República são matérias de extraordinária dignidade. Portanto, também não é por ser um pedido de autorização legislativa sobre o Código de Processo Penal que o processo se degrada.
Degrada porquê? Pelo processo em si? Pelo modo como o Governo o conduziu?
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, haverá na história legiferante desta Assembleia processo mais límpido, mais transparente, mais. correcto, mais adequado do que o que foi seguido pelo .actual governo nesta matéria?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Governo apresenta uma proposta de lei de autorização legislativa documentada como nunca houve outra na história da actual República, apresentou um projecto acabado do Código de Processo Penal, oferendo-se para vir à Assembleia da República dar todos os esclarecimentos - e, também nisto, há uma grande inovação na história da actual República Portuguesa. Mais: o Governo -e nisto foi, para nós, inexplicavelmente criticado pelo Partido Comunista, que apodou esta atitude de espantosa - teve a hombridade e a abertura de assinalar que algumas das medidas contidas na própria proposta de lei implicam os seus perigos. Tudo o que lida com a liberdade das pessoas -e todo o Código de Processo Penal é matéria de liberdade das pessoas - tem, obviamente, os seus perigos. O Governo reconhece-o numa atitude de, para nós, meritória transparência, e o Partido Comunista apoda-o de "espantosa atitude". É, talvez, espantosa porque suscita o nosso espanto, porque não estamos habituados. Mas, também por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não me parece que o Governo degrada duplamente o processo de discussão do novo Código de Processo Penal.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não degradará, porque a Assembleia não deixará...
O Orador: - Sr. Deputado, a Assembleia não deixará porque o Governo não lhe dá motivos para tal.
O que estou a tentar demonstrar -e penso que é convincente, mas o Sr. Deputado terá oportunidade de o contestar- é que todos estes argumentos que tenho elencado não abonam a favor da sua tese, Sr. Deputado. E, permita-me uma certa ousadia intelectual, ouso acreditar que o Sr. Deputado concorda comigo neste aspecto.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Ouse, ouse ...
O Orador: - Por outro lado, o Partido Comunista - vejam agora da ousadia ou do desconcerto! - vai a ponto de criticar o Governo, implicitamente, pelos limites do processo de autorização legislativa. Isto é, considera que o processo de autorização legislativa limita a capacidade de reflexão e de discussão da Assembleia da República.
Mas, Sr. Deputado, que culpa tem o Governo do modo como foi feito o Regimento da Assembleia da República? Que culpa tem o Governo que a Assembleia da República, autonomamente, se tenha dotado deste preciso Regimento para regulamentar este preciso processo de produção legislativa? O Governo não tem a mínima culpa!
A concluir este primeiro ponto, dir-lhe-ei, Sr. Deputado, que tenho para mim que o Governo não degradou o processo de produção legislativa nesta matéria, antes o enobreceu. Sr. Deputado, se há matérias onde, pela sua complexidade, pela interdependência de todas as suas partes, se reclama um trabalho feito numa comissão é, manifestamente, o trabalho de produção legislativa de um Código de Processo Penal.
Sr. Deputado José Magalhães, sou deputado há vários anos - honro-me de o ser -, mas, permita-me que lhe diga, com alguma autenticidade, não estou a ver esta Assembleia da República a produzir, ela própria, sponte sua, originariamente, um Código de Processo Penal, como não estou a vê-la a produzir um Código de Processo Civil. Nas actuais condições penso que este processo é, manifestamente, o mais correcto.
De resto, repare, Sr. Deputado José Magalhães - já que me tem dado a honra de alguns apartes: em Itália, onde o Governo não tem capacidade legislativa, e quando se pretendeu fazer um Código de Processo Penal, foi o próprio Parlamento Italiano que elaborou uma legge delega para pedir ao Governo que, na base daquela lei de autorização, daquela lei de delegação, elaborasse um Código de Processo Penal. Portanto, Sr. Deputado, quanto a este ponto estamos esclarecidos.
Outro tópico importante, que também não pode passar sem uma referência nossa, é o que se refere ao sistema do Decreto-Lei n.º 35 007, que o Partido Comunista apoda de "má memória". Concordo, todos nós concordamos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o sistema previsto pelo Decreto-Lei n.º 35 007 é de má memória. Mas é-o devido ao sistema autocrático que tínhamos em vigor e não pelo decreto em si. Se tivermos a independência de espírito, enfim, a capacidade crítica para considerarmos os factos independentemente do ambiente político então vigente - o Decreto-Lei n.º 35 007 a funcionar no quadro de um Estado autocrático-, quanto, a mim é evidente que deste decreto em si não vinha grande mal ao mundo. O mal vinha do facto de o Decreto-Lei n.º 35 007 ser uma peça de um Estado totalitário ou, pelo menos, podia ser utilizado como instrumento de um Estado totalitário, tal como muitas outras coisas: por exemplo, o caso das espingardas nas mãos do povo já o Sr. Deputado e o Partido Comunista dirão que é bom. É evidente que as espingardas nas mãos do fascismo ou do Estado totalitário eram inconvenientes. Portanto, devemos encarar os factos não com um certo atavismo acrílico, mas com a capacidade de os olharmos pela sua essência, pelo que são e não pelo o que as circunstâncias permitiram que fossem.
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Vou agora passar ao fundo da questão. Aqui, permitam-me, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que assinale que a nossa atitude é manifestamente outra. Quando entramos na análise dos pontos focados pelo Partido Comunista, a nossa atitude é outra, já não podemos encarar as questões com leviandade. Eu próprio, como profissional do direito, seria o último dos últimos a apresentar-me aqui como detentor de certezas. De resto, não é próprio dos grandes períodos de criação legislativa ter certezas. Quem tem uma experiência de participação activa na criação do direito constitucional, do direito civil ou do direito processual tem interiorizada uma grande convicção da contingência das questões.
Não é por acaso que os sociólogos mais modernos fazem a afirmação, à primeira vista espantosa, de que foi o dogma da Criação do Mundo que constituiu um dos primeiros passos para a introdução de uma mentalidade sem Deus, dessacralizada, secularizada. É que o mito - ou, se se quiser, o dogma - da Criação retirou ao Universo o seu carácter de sacralidade, e de igual modo o fez a criação do direito. E nós estamos aqui a criar direito. A geração do meu tempo, que acordou para a vida depois do 25 de Abril, tem pelo menos esta grande experiência: a de ser mais que contemplador do direito a de ser criadora do direito. Quem cria direito tem um grande sentido do relativismo das coisas: elas são de uma maneira, mas poderiam ser de outra. Só quem herda o estado de coisas, quem olha para o direito como um dado do passado é que tem certezas. Não é essa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a nossa atitude.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Posto isto, farei uma referência a cada um dos argumentos invocados pelo Partido Comunista, na medida em que a paciência do Sr. Presidente e da Câmara mo permitirem. Estes argumentos suscitam-me, pessoalmente, a convicção - embora sem querer que ela seja dotada daquela força objectiva que a torne intersubjectivamente válida que, não obstante, é minha e do Partido Social-Democrata - de que o Partido Comunista não tem razão. Não são convincentes os argumentos que utiliza nestas matérias. Matérias - repito - todas elas situadas na zona da fronteira. Do nosso ponto de vista, as cautelas de que todas elas foram rodeadas, e sem prejuízo de se afinarem ainda mais - o que é possível -, mostram que o Partido Comunista não tem razão.
O caso seguramente mais patente é o que diz respeito às buscas. A Comissão reconhece que este é o caso limite em que a questão da constitucionalidade se pode pôr com maior premência, quanto a nós sem razão. E porquê? Porque se trata de uma medida rodeada de tais circunstancialismos e apelando para um tal condicionalismo concreto que não resta outra alternativa. Quando a polícia de investigação criminal se depara com a situação de que ou intervém ou são meios jurídicos fundamentais para o Estado, em vez de "meios jurídicos fundamentais para o Estado e para a sociedade" - podemos afinar melhor esta redacção escrevendo, designadamente, "fundamentais para a vida, para a liberdade e para a integridade física dos cidadãos", proposta que, julgo, será viável -, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não há alternativa. Se o
Estado não interviesse demitir-se-ia, irresponsavelmente, da defesa da vida, da liberdade e da integridade física dos cidadãos.
De resto, qual seria a alternativa pragmática para isto? Respondo-lhe, muito claramente, que existem duas: por exemplo, a alternativa seguida pela jurisprudência da República Federal da Alemanha que se tem debatido, como nós, com estas questões e que é esta: não precisamos de lei para isso. Já temos lei, a lei é o estado de necessidade, é a legítima defesa, etc. Está previsto no Código Penal, no Código Civil e a polícia intervém a coberto destes institutos. Esta é a atitude seguida pela jurisprudência alemã, pela sua doutrina legítima, mas é a solução. Nós não queremos esta solução. Nós queremos que fiquem clarinhos na lei os limites através dos quais é possível efectuar as buscas. Mas que fiquem definidos, porque, não tenhamos dúvidas, a alternativa ou é a apresentação de leis avulsas, leis apócrifas sobre esta matéria, ou é o recurso às medidas à margem de toda a legalidade.
Não acredito que um polícia de instrução criminal, no exercício das suas funções, não leve ao cume a defesa da vida e da integridade quando anda a seguir um determinado criminoso, sabendo que este, empunhando uma pistola, se meteu numa casa com a vítima.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, embora isto possa parecer chocante, vou dar um exemplo extremamente expressivo: em Portugal e no mundo, toda a gente sabe que a nossa Constituição assegura o direito à integridade da vida. A vida humana é o valor fundamental do cidadão sobre o qual assenta o Estado democrático. A pena de morte é proibida em Portugal, no entanto, como todos os juristas portugueses sabem, é perfeitamente legítimo e legal sacrificar o valor humano "vida" em legítima defesa, mesmo que seja em defesa de bens patrimoniais. Se um comerciante vê o seu estabelecimento atacado e não tem qualquer possibilidade de defender a integridade do seu património - e isto é aceite nemine discrepante -, pode, se necessário, recorrer a agressões à integridade física do agressor. Por maioria de razão deve ser possível sacrificar, em caso de necessidade, a inviolabilidade do domicílio em casos como este.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Em resposta a alguns pedidos de esclarecimento que eventualmente sejam solicitados, é natural que eu possa dar mais alguns contributos sobre outros aspectos que não esclareci.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Costa Andrade, os Srs. Deputados António Taborda e José Manuel Mendes.
O Sr. Deputado Costa Andrade já não dispõe de tempo, mas a Mesa, dentro do espírito de tolerância em que está a funcionar, e se não houver objecções, concede-lhe mais dois ou três minutos paia que o Sr. Deputado possa responder aos pedidos de esclarecimento que lhe forem feitos.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado António Taborda.
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Deputado Costa Andrade, peco-lhe desculpa por só ter ouvido a parte final da sua intervenção, mas, de manhã, o Plenário interrompeu os seus trabalhos muito tarde. Porém, queria colocar-lhe duas questões.
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Era primeiro lugar,' o Sr. Deputado Costa Andrade fez um grande panegírico da forma como o Governo apresentou este problema a esta Assembleia, com o projecto de decreto-lei do Código de Processo Penal em anexo, depois de, durante bastante tempo, ter sido elaborado por uma comissão de meritórios juristas - como teve ocasião de afirmar na intervenção -, da qual, suponho, V. Ex.ª fazia parte.
A questão que lhe coloco é a seguinte: não concordará comigo que tudo isso estaria certo se, em vez de uma autorização legislativa, tivesse sido feita uma proposta de, lei com articulado próprio, embora servindo-se do articulado dessa comissão? Não seria depois mais fácil, para esta Assembleia, trabalhar, nas tais zonas de perigo ou de fronteira -como o Sr. Deputado, também as qualificou -, para se conseguir que não se ultrapassassem, exactamente, fronteiras constitucionais, e não, como terá de acontecer, fatalmente, por causa desta autorização legislativa, através de princípios gerais enunciados a propósito do sentido e da extensão da própria autorização?
Sr. Deputado, em segundo lugar perguntava-lhe também - e V. Ex.ª é uma pessoa especialmente qualificada para o dizer, uma vez que fazia parte da própria Comissão que elaborou este projecto de Código de Processo Penal -, tendo a Comissão ou o Governo que a subscreveu- noção destes perigos e destas zonas de fronteira, se não seria preferível; dentro daquela colisão entre o interesse do Estado à segurança e o interesse dos cidadãos às suas liberdades e garantias fundamentais; optar por este último.
Isto porque não está só em causa a questão das buscas. Há, por exemplo; uma coisa que me choca - e a V.ª Ex.ª, como jurista e como advogado, com certeza também -, que se traduz na possibilidade de intercepção e de gravação de conversas entre o detido e o advogado.
Isto não afronta, frontalmente, o direito de defesa do arguido e o princípio da sua inocência até à sentença final.
Por último, V. Ex.ª disse que, mesmo nessas zonas de fronteira, estaria aberto a que essas zonas fossem disciplinadas e só fosse possível fazer essas buscas e, digamos assim, essas violações constitucionais quando estivessem em jogo interesses fundamentais, como o da vida, etc., etc.
No entanto, o problema que lho ponho é este: quem é que controla o momento em que estão ou não em jogo esses interesses fundamentais? Isto porque tal controle tem de ser anterior e não realizado a posteriori, porque senão já não terá depois interesse.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado
José Manuel Mendes.
Ó Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Deputado Costa Andrade, confesso-lhe que a sua intervenção me frustrou um pouco. E não se deve isto ao facto de pensar, que o Sr. Deputado não sabe daquilo que trata a matéria em apreço. Bem pelo contrário, tal deve-se à circunstância de não ter querido pronunciar-se sobre alguns dos problemas mais controversos - justamente aqueles que mais nos interessariam.
O Sr. Costa Andrade,(PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Deputado José Manuel Mendes, aceito a apreciação feita pelo Sr. Deputado à minha intervenção, no sentido de que ela o teria frustrado. Porém, devo dizer-lhe que não é verdade que me tenha querido furtar à apreciação dos problemas mais controversos. E a prova é esta, Sr. Deputado: dê-me tempo do seu partido e atacarei todos os problemas em concreto colocados pelo requerimento do PCP. Dê-me esse tempo e verá que não fugirei às questões.
O Orador: - Sr. Deputado Costa Andrade, com certeza teve oportunidade de verificar, durante a manhã, que, por iniciativa do Grupo Parlamentar do PCP, se ensejou uma mais. longa exposição do Sr. Ministro da Justiça.
Estamos agora disponíveis para que a Câmara considere, sem prejuízo da ordem de trabalhos que temos pela frente, a hipótese de um alargamento de tempo que lhe permita abordar os problemas que não pôde referir na sua intervenção de há pouco.
Vizela aguarda-nos, é respeitável, mas, desde que as coisas se compatibilizem, pela nossa parte não haverá obstáculo.
Passava agora ao que queria dizer.
Quando afiançava que houve algo de decepcionante na sua intervenção era justamente porque o não tinha visto aflorar questões centrais para este debate, nem, as que se prendem materialmente com 'as normas por, nós indicadas como feridas de inconstitucionalidade, nem o que se prende com o universo da lei da segurança interna e da articulação do Código de Processo Penal com essa mesma lei.
Ficámos por saber qual é o seu pensamento, designadamente no que se relaciona com a, inclusão ou não inclusão, na lei de segurança interna, de medidas de policialização dos direitos fundamentais dos cidadãos, bem como sobre, se essa lei deve conter matéria do Código de Processo Penal, passível de ser indebitamente utilizada por forças que não dão à mínima garantia de defesa da legalidade. E creio que, a este propósito, importará ter em .conta as lições .que decorrem do último relatório das polícias, o qual, obviamente, não é tranquilizador para quem tem de legislar.
Nós estamos de acordo com a defesa da vida à oulrance, mas, naturalmente, estamos em frontal desacordo com os excessos policiais - e era fundamental que se pronunciasse sobre isto.
O Sr. Deputado fez alusão ao direito comparado. Citou-nos a- Lei n.º 108/74, italiana; a qual não é, para nós, devo dizer-lhe, um ícone; não é uma estrela rutilando entre uns quantos balões de néon.
O Sr. José Magalhães .(PCP): - Muito bem!
O Orador: - É, entre outros, um ponto de referência que temos em consideração, será, como muita outra matéria, um elemento de reflexão, Mas não é um modelo.
Vem isto a talhe de: foice para lembrar que importara ser obstinado - e nós somo-lo - na defesa do quadro constitucional e de uma sã metodologia, que não deve admitir a não participação dos deputados ou remetê-la para caminhos, apesar de tudo, eseuros, ínvios e dificultosos, que terá de propiciar um debate, não degradado.
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Temos diante de nós o mau exemplo do Código Penal, do qual hoje todos se distanciam, que todos criticam, considerando inadequada a dosimetria das penas, reputando a moldura penal perfeitamente insufragável à luz das novas concepções do Direito Penal.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Isto não pode repetir-se. Impõe-se um trabalho em Comissão, e por parte desta Câmara, que leve, na circunstância presente e no mínimo, a uma autorização legislativa específica.
Nós iremos lutar pelo máximo de especificação e para que o Código de Processo Penal, que aqui nos chega com algumas soluções que se arrogam de inovatórias e que serão, seguramente, a muitíssimos níveis, relevantes, mas também com as graves entorses que não deixámos passar em claro, iremos lutar, afirmava, em defesa obstinada da legalidade, da constitucionalidade, do direito à vida, daqueles direitos que são elementares para quaisquer de nós, mas não compatíveis com laxismos que, ao cabo e ao resto, acabam por produzir efeitos nefastos.
Era esta a questão que lhe queria colocar, pedindo-lhe que, tanto quanto possível, se pronuncie sobre alguns dos eixos problemáticos que deixei enunciados.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Costa Andrade, a Mesa concede-lhe três minutos para responder aos pedidos de esclarecimento e pede-lhe que não exceda esse tempo, pois estamos já a ultrapassar bastante o tempo previsto.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Deputado José Manuel Mendes, pela minha parte aceito a proposta feita por V. Ex.º, de discutirmos mais alargadameme esse assunto. Porém, como o Sr. Deputado sabe muito bem, não tenho responsabilidades de direcção da minha bancada e, portanto, só a direcção da bancada poderá tomar uma posição nessa matéria.
Começou o Sr. Deputado José Manuel Mendes por dizer que a minha intervenção o decepcionou. Devo dizer-lhe que a sua intervenção não me decepcionou, nem me frustrou, confirmando aquilo que, aliás, já esperava. Com efeito, este é um mau debate, esta é uma má oportunidade para o PCP.
É evidente que peguei em algumas coisas. Mas peguei em algumas coisas porquê, Sr. Deputado? Porque o PCP desencadeou este processo, o qual está errado desde o princípio.
Na verdade, no rigor das coisas, como aliás bem o reconheceu a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, este tipo de impugnação não tinha sentido. O PCP é que colocou a questão nestes termos e era nesses termos que havia que pegar nos problemas. O que está em causa é a lei de autorização legislativa e não o projecto de Código de Processo Penal.
O PCP é que colocou erradamente as questões, é que não pegou bem com a cabeça nesta questão - deve ter pegado com outra parte do corpo menos nobre - e a suscitou nesta matéria.
Sr. Deputado, repito que não fujo às questões e que estou inteiramente disponível para as discutir uma a uma.
No entanto, e para clarificar este problema, quero dizer-lhe que o que está aqui em discussão é, tão-só, um novo projecto de Código de Processo Penai; isto é, um pedido de autorização legislativa para elaborar um Código de Processo Penal.
Ninguém aqui falou, nem nos documentos juntos, nem na intervenção do Sr. Ministro da Justiça, nem na Comissão, ninguém falou, repito - nem serei eu a falar - na lei de segurança interna. A lei de segurança interna não está aqui em discussão.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Está, está!
O Orador: - A seu tempo falaremos nesse assunto.
Não quero, Sr. Deputado, fugir ao que está em discussão. E o que está em discussão é o Código de Processo Penal, onde - permita-me outra vez a ousadia -, sem grande convicção - e digo isto porque acredito na inteligência dos deputados do PCP -, fizeram esta impugnação.
O sinal amarelo está a avisar-me e passaria, de imediato, a responder ao que foi perguntado pelo Sr. Deputado António Taborda.
Sr. Deputado, é verdade que fiz um panegírico ao modo como o Governo conduziu o processo. Porém, tinha antes um belo precedente, pois o Sr. Deputado fez-lhe não um belo, mas um belíssimo panegírico. Isto porque disse que este era um projecto de lei altissimamente bem articulado - foi mais ou menos isso.
Portanto, estou em boa companhia, Sr. Deputado, pois também faz parte do processo de produção legislativa a feitura de um bom projecto de lei.
O Sr. Deputado perguntou-me também se não seria melhor uma proposta de lei.
Já respondi a isso, Sr. Deputado. Com efeito, deixe-me que lhe diga, com toda a honestidade, com toda a sinceridade, com todo o respeito que tenho por esta Câmara e pelos seus deputados - eu sempre fui deputado e nunca fui membro de um governo -, que não acredito que uma Assembleia como esta pudesse levar a bom termo a feitura de um Código de Processo Penal - é a minha convicção pessoal e posso estar errado.
O Sr. Deputado também me perguntou - e foi uma pergunta extremamente pertinente e séria - como é que se controla se estão em causa bens jurídicos fundamentais, uma vez que a questão se põe depois a posteriori.
Com toda a honestidade e com toda a abertura, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que há, apesar de todas as cautelas, zonas de risco que não podemos deixar de considerar. A vida moderna é, em todos os campos, uma vida de risco.
Portanto, aqui também há uma zona escassa e incontrolável de risco. Porém, é um risco que se corre, voluntária e assumidamente, para proteger a vida, a liberdade e a integridade física, contra a detenção, por 48 horas, de alguns objectos. Isto porque, no prazo de 48 horas, são levados ao juiz, sendo certo que este decidirá sempre em última instância. Com efeito, caso se verifique que não havia pressupostos das buscas e das escutas telefónicas, o juiz porá a chancela de proibição de prova sobre essas matérias.
No entanto há um risco que se assume, sendo certo que este risco, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para um lado ou para outro, para a vida ou para a liberdade, é inescapável.
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É preciso optar com alguma moderação e com algum equilíbrio.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Presidente da Comissão de Integração Europeia convoca os senhores deputados que fazem parte da referida comissão para uma reunião a realizar na Sala n.º 250-H, no próximo dia 16 de Maio, pelas 10 horas e 30 minutos. Na reunião estará também presente um representante do Sr. Secretário de Estado da Integração Europeia.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos.
O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria, antes de mais,, sublinhar um aspecto importante, aliás já aflorado pelo Sr. Deputado José Magalhães, que se traduz na importância das normas do Código de Processo Penal como pedra de toque de um Estado de Direito. Nós, juristas, e, sobretudo, advogados, que durante ò fascismo nos batemos, designadamente no tribunal Plenário e contra a PIDE, para que fossem respeitadas essas normas essenciais, sabemos bem como é assim.
Por outro lado, queria sublinhar, em relação ao advogado e antigo bastonário da nossa Ordem, Dr. Mário Raposo, que nem sequer se figure a hipótese de esse ilustre advogado e bastonário dá Ordem ter na sua intenção pessoal a violação de qualquer norma dos Direitos do Homem. Digo-o pelo que conheço dó seu passado de advogado e de bastonário.
Vozes do PRD e dó PSD: - Muito bem!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD entende dever começar por sublinhar a sua inteira concordância com o, teor do parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, desde logo sobre a problemática do ponto de vista da apreciação da constitucionalidade, da relação entre, o pedido de autorização legislativa e o conteúdo da proposta de Código de Processo Penal a ele anexado, bem assim sobre o facto de o conteúdo da proposta de lei de autorização legislativa não constituir, por si só, elemento delimitador da. capacidade legislativa do. Parlamento.
Igualmente, entendemos, como já em outras oportunidades aqui expressámos, que só em casos perfeitamente nítidos, para não dizermos, inequívocos, a Assembleia deve recusar a apreciação, de fundo de um diploma com, base na sua inconstitucionalidade; e, muito mais, quando a sua apreciação e eventual subsequente modificação podem sanar os vícios de que os diplomas em análise, porventura, padeçam.
Seja como for, e para. lá destas considerações gerais, importa fazer uma muito breve referência às normas que o PCP, no seu recurso de admissão, considera fendas de inconstitucionalidade. Normas que, em si mesmas, são de muito diverso valor e gravidade, designadamente do ponto de visto constitucional. Várias delas, aliás, merecem a nossa inteira discordância. Mas uma coisa é esta discordância quanto ao fundo das soluções preconizadas e outra pode ser a de as considerar, desde já, inequivocamente inconstitucionais.
Concretizando, e seguindo a ordem do recurso do PCP, pensamos que, em primeiro lugar, os artigos 174.º, n.º 4, e 177.º, n.º 2, são os de mais duvidosa,
e de muito duvidosa, constitucionalidade, sobretudo o segundo, que propendemos mesmo a considerar inconstitucional, tal como se encontra, formulado.
Com efeito, o artigo 34.º, n.º 2, da Constituição, determina, expressamente, que "a entrada no domicílio dos cidadãos contra a sua vontade só pode ser ordenada pela autoridade judicial competente, nos casos e segundo as formas previstas na lei". E o artigo 177.º, n.º 2, a), do projecto do Governo permite as buscas domiciliárias "ordenadas pelo Ministério ,Público ou efectuadas por órgão de polícia criminal"; e, ainda por cima, permite-o em condições tão vagas tão imperfeitamente tipificadas, como são aquelas,-cito:
[...] em que houver razão para crer que a demora poderia representar grave perigo para bens jurídicos de grande valor constitucionalmente protegidos [...]
Eis, além do mais, algo de enigmático.
Eventualmente se podem conjecturar múltiplos casos ou numerosas hipóteses em que a salvaguarda de valores constítucional e juridicamente protegidos, mais importantes mesmo do que a inviolabilidade do domicílio - maxime o da vida e mesmo o da integridade física - podem levar a que o citado preceito -constitucional conheça excepções. Mas estas poder-se-ão, porventura, considerar cobertas pela teoria geral do "estado de necessidade"
Assim, repetimos, os artigos em apreço, e sobretudo o artigo 177:º,. n.º 2, a), afiguram-se-nos, tal como estão formulados, pelo menos, de duvidosa constitucionalidade.
Em segundo lugar, já quanto ao, artigo 178. V n.º 3, dado que se trata apenas de apreensões e por isso de eventuais violações do direito de posse (nem sequer de propriedade), parece-nos que .não viola nenhum dos direitos ,liberdades e, garantias consignados, nós artigos 24.º e seguintes da .Constituição, pelo* menos quando as revistas e buscas forem ordenadas ou autorizadas, pela autoridade judiciária competente.
Em terceiro lugar, no que concerne ao artigo 251: do projecto, não se julga terem tanto cabimento as dúvidas que levantamos quanta ao artigo 174 n.º 4, e a possibilidade de os órgãos de polícia criminal poderem proceder às identificações a que se, refere o artigo 250.º não padece, a nosso ver, de qualquer inconstitucionalidade;
Mais controverso seria -ou será- o artigo 257.º; no seu n.º 2. Se os requisitos aí previstos, para a prisão preventiva ,não forem ou não fossem exigidos cumulativamente; estar-se-ia perante um preceito manifestamente inconstitucional. Porém, a nossa leitura é que o espírito do, projecto -que, de qualquer modo, se tem de explicitar- é a de exigir, efectivamente, essa verificação cumulativa, pois, se assim não fosse, estar-se-ia, inclusive, a dar mais ;poderes à polícia do que ao Ministério Público.
O mesmo se diga quanto à necessidade de verificação cumulativa dos requisitos previstos nas várias alíneas do n.º l do artigo 181.º
No respeitante aos artigos 143.º, n.ºs l e'2, 144.º, n.º l, do projecto, também não se afigura haver inconstitucionalidade, na medida em que se distinga o inquérito da instrução e se entenda que o inquérito não prejudica a posterior instrução. Mas pensamos não haver razões de fundo para que seja diferente, nos dois casos, o regime quanto à presença de defensor.
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Enfim, quanto aos artigos 61.º, n.° 1. alínea e), e 143.°, n ° 4, não nos parece líquido haver inconstitucionaiidade desde que se entenda que, após a prisão, o primeiro acto do processo é, necessáriamente, o interrogatório do arguido — que nele será assistido, por defensor, só que poderá não ser autorizado a comunicar previamente com ele.
O que acontece, de novo mas essa é outra questão, que está fora do objecto da apreciação deste recurso e, por isso, só de passagem a assinalámos— é que a solução preconizada se mostra, em nosso ver, inaceitávei, de acordo, inclusive, com o que sempre defendeu o ilustre jurista e penalista que é o Prof. Jorge Figueiredo Dias, exactamente presidente da comissão que elaborou o projecto de Código em apreço.
De facto, no primeiro volume do seu Direito Processual Penal (1974. pp. 499-502). Figueiredo Dias. referindo-se ainda à doutrina do Decreto-Lei n.º 185/72, sublinha, muito bom, ser —cito— «absolutamente inadmissível» um regime semelhante. Assim escrete textualmente:
E absurdo que a lei se tenha preocupado seriamente em assegurar a assistência obrigatória do defensor a qualquer interrogatório de arguidos presos, durante a instrução preparatória, e ao mesmo tempo tenha tirado quase toda a eficácia real a tal assistência, decretando a incomunicabilidade total antes do primeiro interrogatório, e frustrando, assim o direito de comunicação prévia entre arguido e defensor.
Aliás, o prestigioso penalista, que foi presidente da comissão que elaborou o projecto, acentua mesmo que:
|... l a generalidade das legislações põe ainda maior cuidado no asseguramento desta comunicação (em reais condições de uberdade, segurança e segredo) do que propriamente na obrigatoriedade de assistência (física) do defensor aos interrogatórios.
Bem certo que se podem figurar casos em que, porventura, se possam abrir excepções a este principio — mas tais excepções, a existirem, têm de ser tipificadas e limitadas a detidos como os acusados de práticas terroristas, e nunca consagradas com a indeterminação e com a possibilidade de amplitude que resulta do projecto.
Aplausos do PRD, do PSD, do PS e do PC P.
O Sr. Presidenie: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Andrade Pereira.
O Sr. Andrade Pereira (CDS): — Sr. Presidente. Srs. Deputados: O que está neste momento em apreciação no Plenário são os recursos de admissão da proposta de lei n.º 21/1V, apresentados pelo PCP e pelo MDP/CDE. Creio que é uma norma salutar que nos habituemos á ideia que devemos confinar os debates e as discussões havidas neste Plenário exactamente á matéria em causa e não aproveitar os pretextos que eles, porventura, ensejam para. extravasando dos limites dos mesmos, deambularmos por outras questões mais alargadas.
Os recursos em análise têm. aliás, uma curiosa particularidade que, de algum modo, se complementam.
Efectivamente, enquanto o recurso do PCP diz quais são as normas do projecto cie decreto-iei em anexo à proposta dï lei do Governo que entende que colidem com normas constitucionais, sem referir quais as normas constitucionais que seriam objecto dessa colisão — com excepção "lê uma vaga referência ao artigo 27.º da Constituição, que poderia ter a ver corn os casos cie detenção ou prisão, mas sem referência, qualquer ouiro preceito constitucional —. o recurso interposto pelo MDF/CDE, pelo contrário, elenca exactamente os preceitos ciHisiitucionais que considera postergados, sem no entanto dizer quais as disposições cio projecto de decreto-!oi que violariam esses mesmos preceitos constitucionais. Dai a afirmação que fiz que eles, de algum modo, se complementariam.
No entanto, tendo em atenção as disposições do projecto que, segundo o recurso -do PCP, se constata serem violadoras da Constituição, verifica-se que elas têm a ver, exactamente, com as revistas, as buscas, as apreensões, as rneclidas cautelares e cie policia, as medidas privativas de liberdade e certas competência; que são atribuídas ao Ministério Público e à policia criminal, para aiém de certas garantias de defesa dos próprios arguidos.
O primeiro dos preceitos que. porventura, seria afectado, na visão do; recorrente; neste domínio, seria exactamente o n.° 2 do artigo 13.° da Constituição. Simplesmente, a leitura correcta desse preceito constitucional leva-nos s considerar que a própria Constituição admite como legítima a restrição aos direitos e liberdades dos cidadãos, desde que essa restrição seja expressamente admitida pela própria Constituição, desde que vise a salvaguarda de direitos ou interesses constitucionalmeme protegidos, desde que a restrição seja apta, isto é, seja necessária e suficiente para a salvaguarda daqueles outros valores, e ainda, e por último, desde que não aniquile por completo o direito em causa, isto se não atinja o seu conteúdo essencial.
Creio que iodas as disposições que são referidas no recurso e que se situam, como já aqui foi assinalado, exactamente, na zona de fronteira, isto é, na zona em que é precisa uma adequada, ponderada e equilibrada avaliação aos interesses em jogo, por forma a ver se se está ainda no limite mínimo da constitucionalidade ou se, pelo contrário, já se extravasa esse domínio, todos esses casos têm a ver com uma opção fundamental, que é necessário levar a cabo.
Em suma, trata-se de uma questão que não pode, como já aqui foi referido, colocar a democracia contra o autoritarismo, já que as duas coisas são compatíveis. Porventura, terá antes a ver com uma outra opção que qualquer Estado social de direito tem de fazer, que é escolher entre a permissividade. entre a criminalidade ou, pelo contrário, entre meios eficazes de investigação criminal que sejam susceptíveis de pôr cobro ou diminuir os índices -daquela permissividade ou daquela criminalidade.
É, portanto, uma ponderação de valores constitucionalmente protegidos; é, portanto, uma decisão entre o conflito, entre liberdade e segurança, entendida a segurança não apenas como a segurança do cidadão contra o Estado mas também a segurança do cidadão face aos eventuais criminosos, face aos ataques que possam ser feitos, quer contra a sua integridade física quer contra os seus valores e bens.
É que o regular funcionamento das instituições democráticas e o respeito pêlos direitos e liberdades das vítimas eminentes, relativamente a crimes especialmente
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graves, não podem nem devem compadecer-se com uma leitura formalista, descontinua. feita caso a caso, de determinados artigos da Constituição. Pelo contrário, o respeito efectivo por esses valores, que são valores fundamentais exige uma visão global do edifício cons-titucional como um conjunto harmónico, de modo a que todos os princípios e normas consignados na Cons-tituição para a salvaguarda da dignidade das pessoas e a tutela dos interesses gerais sejam considerados.
Em suma, importa que as limitações reduzam o âmbito do direito atingido apenas na exacta medida e na medida estritamente necessária á superação deste conflito.
De resto e por outro lado, todos os constituciona-listas aceitam que, em cenas circunstâncias excepcio-nais, o estado de necessidade pode legitimar a viola-ção de direitos fundamentais. No fundo é disso que se trata, saber se face a determinadas circunstancias extremas, não existe um verdadeiro estado de necessidade, imposto pela salvaguarda da harmonia do edifício social, que leve a pisar a fronteira dos limites consti-tucionalmente impostos em nome de uma eficácia de luta contra a criminalidade, de luta contra cenas formas de crimes mais graves de que o Estado, enquanto tutelar do direito de defesa da sociedade, cumpre levar a cabo.
Creio que a generalidade das disposições do projecto de decreto-lei que o Governo fez juntar à proposta de lei, cuja constitucionalidade é posta em causa pelos recursos apresentados, traduzem exactamente situações deste tipo, isto é, situações em que se impõe, para a defesa da sociedade, para uma eficaz luta contra a criminalidade, que se pise aquela fronteira que há pouco referi.
É claro que há outro tipo de reparos ínsitos no mesmo recurso, que têm antes a ver com o conceito de instrução face à aparição no projecto de decreto-lei, que está junto à proposta de lei, da figura do inquérito preliminar, isto é, de algum modo, da rea-parição dessa figura do inquérito preliminar, que em todo o caso, do meu ponto de vista, nos surge numa posição de equilíbrio entre o sistema inquisitório e o sistema acusatório. Isto é, creio que se encontrou um adequado equilíbrio entre, por um lado, a necessidade de se ser eficaz na detecção, quer dos agentes quer da prática dos crimes, através dos elementos policiais mais expeditos, mais capazes, mais eficientes nessa medida, e, por outro, a salvaguarda dos interesses dos arguidos, através da intervenção na fase posterior da instrução por parte da entidade judiciária, por parte do juiz de instrução, consideração que é sobretudo perti-nente se tivermos em conta a experiência levada a cabo nos últimos anos, que reputo altamente negativa, de juizes de instrução que não funcionam de arguidos detidos que estão à espera que o juiz tenha vagar, tenha oportunidade de se deslocar a respectiva comarca, para serem ouvidos. Creio que se prejudica muito mais a defesa dos interesses dos próprios arguidos insistindo na ideia que há-de ser sempre uma entidade judi-ciária, que há-de ser sempre o juíz de instrução, a con-duzir a fase de reunião de provas, a fase de inquérito, a fase inquisitória, que necessariamente, a busca das provas relativamente à prática de crimes, sobretudo dos mais graves, importa que seja celere e eficaz, sem que, em todo o caso se deixe de respeitar minimamente a dignidade humana e os princípios constitucionalmente salvaguardados.
Em suma a referência que o recurso do do Partido Comunista fez ao artigo 27.º da Constituição leva-me a pensar que se quis pôr uma especial ênfase na questão das medidas preventivas de liberdade e, portanto na possibilidade de a prisão preventiva ou a detenção ser ordenada, quer por autoridades policiais quer pelo Ministério Público, antes de haver uma qualquer decisão judicial sobre isso.
Em todo o caso, sobre este caso, permito-me recordar que já o actual Código de Processo Penal, exactamente no seu artigo 293.º permite que quaisquer autoridades policiais, em que se inclui o presidente da câmara podem ordenar esse tipo de prisão preventiva.
Em suma, em nome da minha bancada, quero crer que não estamos de modo algum, seguros de que algumas das disposições do projecto de decreto-lei anexo à proposta de lei não tenham de ser objecto de uma reponderação e até que num ou noutro caso se chegue à conclusão de que as soluções avançadas pelo Governo foram longe de mais. Recordo que já na Comissão de Assuntos Constitucionais, exactamente na troca de impressões que tivemos oportunidade de ter com o Sr. Ministro da Justiça.,adiantei a ideia de que ao que toca à possibilidade de buscas, durante a noite, se me afigura que a solução avança no projecto de decreto-lei é é largamente inconstitucional.
Só que me parece que todas estas questões - e no fundo mais não fiz do que enunciar pela rama — tem uma sede própria, que é exactamente a discussão (que se virá, com certeza a fazer) da proposta de lei do Governo e de todas as diligências que, entretanto, a Comissão irá levar a cabo, e que nos permitirão tomar uma consciência mais clara desta ponderação de interes-ses que referi no inicio da minha intervenção, que creio, deve ser fará com toda a serenidade, com toda a sensatez, com toda a ponderação, mas que não tem neste momento, pertinência, porquanto aqui se trata exclusivamente de saber se a iniciativa legislativa, que é, recordo de novo, uma proposta de lei com vista à concessão de uma autorização legislativa para o Governo legislar sobre esta matéria, é ou não admissível.
De resto, sobre esta matéria, e como muito bem salienta o parecer aprovado na Comissão, o que importa é que a autorização que esta Câmara venha a conceder ao Governo possa, ela própria, impor determinadas injuncões, determinadas balizas que o Governo tem de respeitar no desenvolvimento dessa autorização legisla-tiva, que podem perfeitamente acautelar quaisquer dúvidas que, depois da tal ponderada análise, entendam dever sanar-se, e pode até ir ao ponto de proibir que o diploma final venha a conter determinado tipo de disposições.
Exactamente porque é assim, exactamente porque todos — creio que todos, posso afirmar — estamos de acordo quanto á necessidade e urgência de se ter um novo Código de Processo Penal, porque todos, ou quase todos entendemos que o projecto de decreto-lei anexo à proposta de lei do Governo é o resultado de um trabalho serio feito por pessoas altamente competentes, a começar pelo presidente dessa Comissão, obviamente que seria estuito obviar que se avançasse neste processo legislativo ou sequer, que se retardasse, quando realmente é urgente, é importante, que tenhamos rapidamente um Código de Processo Penal novo.
Por isso entendemos que a iniciativa legislativa deve prosseguir os seus termos, e os recursos interpostos devem ser considerados improcedentes.
Aplausos do CDS e do PSD.
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Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Fernando Amaral.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: O mérito das intervenções que me antecederam contribuiu em muito para demonstrar que é impossível sintetizar, nos limites de um debate de impugnação de admissibilidade, todas as implicações que o projecto de Código de Processo Penal acarreta em sede de constitucionalidade dos seus preceitos.
Não é, aliás, um debate novo nesta Câmara: foi apreciado quando da impugnação da proposta de lei de segurança interna do anterior governo. No decurso do debate na generalidade dessa proposta de lei, as questões atinentes às revistas, às buscas, às escutas telefónicas, à violação da correspondência e à delimitação de competências no exercício da instrução criminal foram objecto de fundadas dúvidas de inconstitucionalidade. É um debate que não se esgotará, decerto, ao que tudo leva a crer, na apreciação ora em curso.
O parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias restringe o âmbito da discussão aos limites que nos parecem aqueles que devem ter assento neste debate. A ele aderimos, sem reservas, porque faz doutrina em que nos reconhecemos quanto à natureza das autorizações legislativas, aos seus limites, à relevância que os seus normativos têm para os decretos-leis que vierem a ser emitidos no uso das autorizações conferidas, e porque define, com clareza, quais os princípios que devem nortear a autorização legislativa em matéria de Código de Processo Penal: a jurisdicionalidade do processo e a cabal salvaguarda dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos constitucionalmente consagrados. Estes dois princípios norteadores foram objecto de unanimidade por parte da Comissão.
Quanto à questão da relevância das autorizações legislativas, o que importa sublinhar é o que o normativo da proposta de lei de autorização que o Governo apresentou contém, não propriamente o conteúdo do projecto de decreto-lei, por meritório que ele seja, não só quanto à qualidade técnica do articulado da proposta mas também quanto às qualidades dogmáticas do próprio projecto do Código de Processo Penal.
Só que o articulado da proposta de lei de autorização está na inteira disponibilidade desta Assembleia: ele será o que quisermos, quando quisermos e pelo que quisermos.
A rejeição liminar de uma proposta de lei de autorização só deve militar em circunstâncias limite, aquelas precisas que o parecer da Comissão assinala. Não é o caso da presente proposta de lei.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Quanto ao conteúdo dessa proposta, todos somos unânimes em reconhecer a urgência e a importância da aprovação de um novo Código de Processo Penal a fim de contribuir, ainda que de forma limitada - disso tenhamos consciência -, para obstaculizar à situação dramática que se vive no processo de administração da justiça penal em Portugal.
Outras medidas complementares se exigem, designadamente uma nova lei orgânica do Ministério Público e uma nova lei de organização judiciária. Só aí poderemos assentar a solução dos problemas da administração da justiça penal em Portugal.
Contudo, gostaria de chamar a atenção dos Srs. Deputados, designadamente daqueles que pensam que não é este o momento oportuno para ponderar sobre a constitucionalidade dos normativos do projecto de decreto-lei, que, quanto mais ingente é o esforço de dotar o País de um novo Código de Processo Penal, mais inútil será esse esforço se o resultado a que chegarmos for desconforme à Constituição. Isto porque acarretará a fiscalização da constitucionalidade da própria lei de autorização e porque pode, inclusivamente, acarretar a declaração de inconstitucionalidade do próprio Código de Processo Penal.
O que nos interessa é, com serenidade, delimitarmos o que é constitucionalmente consentido nesse terreno difícil onde se defronta a eficácia da protecção do Estado contra a criminalidade de alta violência (através de medidas especiais ou mesmo excepcionais de processo penal, cujo lugar correcto é, de facto, o Código de Processo Penal) e a garantia dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos.
A justa ponderação destes interesses, pontualmente conflituantes, que se encontram em presença, só pode ser feita cabalmente no decurso do debate na generalidade. As normas questionadas pelo Partido Comunista não mereceram por parte da Comissão igual juízo de censurabilidade. As revistas, as buscas, as escutas telefónicas podem encontrar justificação no apelo a um estado de necessidade, mas se esse estado de necessidade for indeterminado quanto aos condicionalismos que o justificam, facilmente se resvalará, em termos de campo de aplicação, para um estado de necessidade abrangente, que esvazia o conteúdo da própria garantia constitucional.
O que se pede à Assembleia da República é que proceda a uma cuidada ponderação de valores para saber em que casos concretos e até onde é que o estado de necessidade é legítima e constitucionalmente evocável e a partir de onde é que o estado de necessidade é autêntica fraude à Constituição.
O seu significado terá, pois, de ser achado através da ponderação cuidada da concatenação dos dispositivos das medidas excepcionais de processo penal com os demais incisos do Código de Processo Penal. Para essa concatenação de interesses reiteramos o compromisso que o PS assumiu em 1985, pela voz do presidente do seu grupo parlamentar, na declaração de voto sobre a então proposta de lei de segurança interna: a plena jurisdicionalidade do processo penal, a salvaguarda intransigente dos direitos, liberdades e garantias, constitucionalmente consagrados.
Mas estes dois princípios têm de ser antecedidos de uma reflexão prévia de natureza metodológica, que me permito fazer, para concluir.
O que se pede à Assembleia da República é uma ponderação de valores sociais, cuja violação é punível, e a dimensão e dosimetria da punição. Há normas do projecto de decreto-lei que estão numa zona de fronteira; algumas delas estão para cá da fronteira; outras estão para lá da fronteira; algumas situam-se numa terra-de-ninguém. O que queremos saber é quais são aquelas que constitucionalmente podem considerar-se para cá da fronteira.
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Não é uma mera questão de técnica jurídica, não é, ao contrário do que este debate poderia indiciar, um mero debate de juristas ou de processualistas penais; é, acima de tudo, uma questão cultural e até uma questão de ética social.
O PS é contra o equívoco que consiste em pensar que o policiamento das consciências e a ingerência dos meios repressivos do Estado na .esfera da autonomia privada sejam factores de tranquilidade social e de combate eficaz à. criminalidade de alta violência.
A policialização do processo penal, designadamente através do inquérito preliminar da responsabilidade exclusiva das autoridades policiais, e sem controle jurisdicional, é, indubitavelmente, fraude à Constituição.
Os governos têm a tentação de supor que a protecção paternal de um Big Brother não ultrapassa os limites razoáveis do temor reverencial devido pelos filhos--cidadãos aos progenitores-Estado. Mas, por essa via, facilmente se resvala do proteccionismo enlevado para uma repressão doce, e da repressão doce para versões mais azedas.
Cabe aos parlamentos erguer a bandeira da defesa das liberdades e, dentro dos limites da harmonia e da paz cívica na sociedade, salvaguardar os direitos dos cidadãos. Esse é e será sempre, ontem, como hoje e amanhã, o compromisso do Partido Socialista.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente. Serei extremamente breve.
Sr. Deputado António Vitorino, devo dizer-lhe que apreciei a sua intervenção, com a qual estou inteiramente de acordo.
De qualquer modo, há uma parte da sua intervenção que, talvez por má intelecção minha ou, porventura, devido às condições de som, não ficou para mim muito clara.
O Sr. Deputado disse, mais ou menos, que a plena policialização das consciências não seria factor de tranquilidade, designadamente que não veria com bons olhos a submissão do inquérito preliminar feito inteiramente sob o controle dos polícias. Percebi mais ou menos isto - vejo pelo seu sinal que percebi bem.
Mas Sr. Deputado, penso que essa é uma afirmação em geral e abstracta que não se reporta ao projecto do Código de Processo Penal em causa, onde não está, nem pouco mais ou menos, aberta a possibilidade de entregar o inquérito preliminar à polícia.
Pelo contrário, a proposta de lei diz, expressamente, de forma muito clara e inequívoca, que o inquérito preliminar é da competência do Ministério Público - uma magistratura autónoma e independente -, podendo delegar algumas diligências nas polícias criminais, que serão feitas sempre sob a sua. orientação como, aliás, já hoje acontece, Sr. Deputado. Já assim é no chamado inquérito preliminar, que não existe em todos os processos, mas existe numa quantidade significativa de processos. O que agora se faz nesta proposta é apenas generalizar.
Permito-me recordar só outro ponto, Sr. Deputado; No projecto do PS, o inquérito não está - penso que o Sr. Deputado não fez esta afirmação, mas é para que fique claro - sob a dependência da polícia criminal.
Pelo contrário, todos os actos realizados durante o inquérito preliminar que contendam com os direitos, liberdades e garantias, não só não são da competência da polícia criminal como nem sequer são da competência do Ministério Público, são da competência do juiz de instrução.
A minha pergunta vai no sentido de saber se a sua formulação era uma afirmação de princípio, com a qual estou de acordo, coisa, completamente diferente - e aí não posso deixar de estar em desacordo, pois os factos não são esses - de o Sr. Deputado «vestir» essa frase à matéria em discussão.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Deputado Costa Andrade, penso que a sua pergunta deve ser dividida em dois pontos.
O primeiro diz respeito à referência que fiz à policialização das consciências.
Estou convencido de que o que se pede a esta Assembleia é que definamos, claramente, quais são os tipos de situações onde se justifica que a prevenção criminal faça o apelo ao estado dê necessidade, dentro da lógica de que as medidas excepcionais de política não se aplicam a dez milhões de terroristas em potência, mas apenas a um conjunto delimitado de potenciais delinquentes contra os quais se justifica que o Estado utilize medidas excepcionais.
Feita esta clarificação prévia de ordem cultural - sé me permite chamar-lhe assim - quanto à segunda questão, Sr. Deputado Costa Andrade, não sei se estamos a vestir um corpo inteiro. Não sei. Tenho a sensação de que, em matéria de Código de Processo Penal, estamos a cobrir parte da nudez de um corpo que tem uma parcela que ainda não está aqui sob a nossa apreciação.
Como sabe, foi comunicado que o Governo aprovou, no Conselho de Ministros, uma lei de segurança interna. Ora, ninguém poderá negar, até pelo conteúdo deste Código de Processo Penal, que existe, ao que tudo leva a crer, uma ligação íntima entre este projecto de Código de Processo Penal e a lei de segurança interna que se encontra em trânsito.
O que disse quanto à policialização do inquérito preliminar é um princípio geral, vale para todas as leis, valerá para o nosso posicionamento em relação ao Código de Processo Penal e valerá, de igual forma, para o nosso posicionamento em relação à lei de segurança interna.
Foi apenas uma jurisprudência das cautelas.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Dá-me licença?
O Orador: - Faça o favor.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Deputado, permita-me que lhe diga que não posso suportar de ânimo leve a afirmação que faz.
Isso não é verdade, Sr. Deputado. Com efeito, não corresponde aos factos nem à verdade histórica das coisas que a elaboração deste projecto tenha alguma coisa a ver com os actuais trabalhos em matéria de segurança interna.
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Os trabalhos de elaboração deste projecto do Código de Processo Penal começaram em 1983 e ainda nesse ano foi dirigida ao Governo uma carta de intenções, isto é, de princípios fundamentais que regeriam a elaboração do futuro Código de Processo Penal. O Governo aprovou essa metodologia e desde então trabalhou-se sempre na base dessas premissas.
Sr. Deputado António Vitorino, repito que não é verdade que a elaboração deste projecto do Código de Processo Penal tenha alguma coisa a ver com a lei de segurança interna.
De resto, devo dizer-lhe, para que não haja dúvidas, que não estou a tirar «água do capote» quanto à lei de segurança interna, pois na altura em que aqui vier pronunciar-nos-emos sobre ela, na certeza de que, penso eu, será uma lei mais suave do que aquela que, noutro tempo, já aqui foi aprovada. Mas, sublinho, pois é importante que isto fique muito claro: não é verdade o que o Sr. Deputado afirma no sentido de que isto tem alguma coisa a ver com a lei de segurança interna. Só há coincidência temporal e proximidade espacial que não são relações nem de causa nem de interdependência nem qualquer outra relação mais íntima do que esta.
Este testemunho era importante, Sr. Deputado.
O Orador: - O Sr. Deputado Costa Andrade tem uma autoridade que eu não tenho, na medida em que foi membro da Comissão de Reforma do Código de Processo Penal que estamos agora a apreciar.
Mas o que, de certo, o Sr. Deputado Costa Andrade não poderá negar é que se estamos aqui a ter este debate, sobre o Código de Processo Penal, é porque algumas das posições que aqui foram incluídas aliviaram a lei de segurança interna. A coincidência substantiva das matérias é inegável.
Podemos cotejá-la artigo a artigo, mas a verdade é que há coincidência substantiva. Não quero entrar em discussões de causa-efeito, mas presumo, por exemplo, que alguns dos normativos que constam actualmente do projecto de decreto-lei do Código de Processo Penal não constavam do projecto do Código de Processo Penal quando esta Câmara debateu no ano passado a lei de segurança interna.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sem dúvida!
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Ó Sr. Deputado António Vitorino, nessa altura ainda não havia projecto!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições em relação a esta matéria, pelo que dou por encerrado o debate. Fui informado de que havia consenso para se proceder, de imediato, à votação deste parecer.
Penso que não há objecções. Vamos, pois, votar este parecer.
O parecer, ainda que não seja conclusivo de uma forma expressa, diz que depende fulcralmente do debate na generalidade da própria proposta de lei, o que nos leva a crer que o parecer da Comissão é no sentido de julgar improcedente a impugnação.
Vamos, então, votar o parecer com esta interpretação.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, o parecer da Comissão não é tão simples quanto aquilo que acaba de ser objecto de resumo do Sr. Presidente.
O parecer é o que é, conclui nos exactos termos em que conclui e é isso que vai ser submetido à votação nos termos regimentais.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, devo informá-lo que a votação tem de ser sempre, segundo penso, sobre assuntos suficientemente claros e explícitos. Mas o parecer levanta-nos essas dúvidas, na medida em que não é conclusivo de uma forma expressa. Tira-se dele a ilação, tal como acabei de ler - e não tem outra fórmula -, de que depende fulcralmente do debate na generalidade da própria proposta de lei, o que me leva a crer que o parecer é no sentido que referi, pois não vejo outra forma expressa.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Costa Andrade, pretende esclarecer este assunto?
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Não, Sr. Presidente, vou ser mais modesto, pois, mais precisamente, não queria esclarecer, queria ser esclarecido.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Não sei bem, mas penso que o que vamos votar é a interposição de um recuso de admissibilidade ...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não é, não!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Costa Andrade, o Regimento diz, no seu artigo 134,º, n.º 5, o seguinte: «o parecer é lido e votado [...]» Portanto, estava-me a referir ao parecer. O que vai ser votado é o parecer.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Vamos votar o parecer!
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Então, Sr. Presidente, se for aprovado o parecer, qual o resultado em termos de impugnação de inconstitucionalidade? É procedente ou improcedente a impugnação?
O Sr. Presidente: - Se o parecer for votado favoravelmente, no sentido que estou a referir, a impugnação é julgada improcedente.
É com este espírito que vamos fazer a votação.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, é apenas para clarificar este aspecto.
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Face ao Regimento, aquilo que a Assembleia, da República vota é o parecer tal como ele vem da Comissão, ou então manda reformulá-lo, manda-o baixar à Comissão de novo, o que creio que não é o caso.
A Comissão de Assuntos Constitucionais dedicou particular atenção à modelação deste parecer. É um caso em que a Câmara está de acordo em que há muitos aspectos relevantes suscitados, há outros que não o serão tanto e considero que, de todo o modo, é de aprofundar o debate.
É esta a substância do parecer que foi aprovado e foi nestes termos que o votámos, favoravelmente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, continuamos, então, num aspecto dúbio e cinzento, e interessam-nos situações claras, se não a Câmara não poderá votar.
Referi que, se a Câmara viesse a votar favoravelmente este parecer, deveria ser entendido que a impugnação era improcedente. Penso portanto, que está clarificada a situação: se este parecer não for votado favoravelmente, necessariamente que a impugnação é julgada procedente:
Só fiz este esclarecimento para evitar dúvidas é, assim sendo, penso que a Câmara está esclarecida.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães/PCP): - Se V. Ex.ª coloca a questão nesses termos, pedimos que o parecer seja votado às 6 horas.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, há pareceres que dizem «ou crês ou morres», o que não é bem o caso deste.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto!
O Orador: - Mas este parecer, no fundo, poderia ser sintetizado nestes termos: ponderando todas as questões que nele constam, a Comissão entende que deve ser aberto o debate na generalidade sobre a proposta de lei.
Vozes do PSD: - Não pode ser!
O Orador: - Desculpem, Srs. Deputados, o parecer e no sentido de abrir o debate na generalidade da proposta de lei, mas a votação, de um requerimento de impugnação impede o .debate na generalidade. Se o parecer é para que se abra o debate na generalidade é porque naturalmente ultrapassa o requerimento de impugnação.
O parecer deve ser votado nos precisos termos em que a Comissão o aprovou, ou seja, por unanimidade! Se os grupos parlamentares mudarem de opinião sobre o, que votaram na Comissão, votam contra o parecer, como é óbvio.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Parece impossível!
O Sr. Presidente: - Sr.- Deputado António Vitorino, a Mesa continua na dúvida. Peço-lhe, por isso, para ter a bondade de nos ajudar à compreensão dos termos deste parecer.
Se o parecer, for votado favoravelmente, vai para a generalidade a discussão. Este entendimento é no sentido de que o recurso não, é tomado em consideração?
O Sr. António Vitorino (PS): - É óbvio, Sr. Presidente, nos termos em que o parecer o faz.
O Sr. Presidente: - Espero que a Câmara entenda suficientemente a clareza do parecer tal como ele foi formulado.
Sr. Deputado Marques Mendes, pretende pronunciar-se sobre esta matéria?
O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, há aqui qualquer coisa que não consigo entender e que me parece que está a criar alguma, confusão.
Se o parecer se refere a um recurso de admissibilidade de uma proposta de lei, de duas uma: o parecer ou leva à procedência do recurso ou leva à improcedência. Abrir o debate na generalidade - e que me perdoe o Sr. Deputado; António Vitorino, que muito prezo - tem necessariamente de significar a abertura do processo e consequentemente a improcedência do recurso!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não joguemos com as palavras!
Temos de jogar com a realidade! A realidade só pode ser esta e, portanto, acho que o Sr. Presidente fez muito bem em colocar a questão tal como colocou: se o parecer for votado favoravelmente o recurso improcede, se for votado desfavoravelmente procede o recurso é morre o processo legislativo.
O Sr. Presidente: - Entretanto, Srs. Deputados - e para evitarmos discussões, não vamos mais longe -, parece-me que poderei dar- uma outra interpretação que, ao fim e ao cabo, é «levar a água ao mesmo moinho» mas por outro caminho: se o parecer for votado favoravelmente este diploma entrará no curso normal da sua apreciação e depois será apreciado na generalidade; se não for votado favoravelmente o diploma já não vai à generalidade para discussão.
O Sr. António Vitorino (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Vitorino (PS):- Sr. Presidente, gostaria de registar para a acta o seguinte: o que o Regimento diz - lastimo profundamente, Sr. Presidente, não gostaria que isto fosse posto com tanta crueza - é que se votam os pareceres das comissões e não os recursos de impugnação - e o Sr. Deputado Silva Marques devia saber isto de cor porque foi ele que fez essa norma. Votam-se os pareceres e não os requerimentos;
Portanto, o parecer diz: «proceda-se ao debate, na generalidade», e é isso que a Câmara tem de votar.
Sr. Presidente, gostaria de acrescentar que não percebo porque é que esta questão é colocada sobre este parecer pois ele e praticamente uma fotocópia do. pare-
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cer que a mesma Comissão emitiu sobre a proposta de lei do Governo quanto à concessão de um canal de televisão para a Igreja Católica. Nessa altura, ninguém colocou esta questão que agora está aqui a ser colocada.
Lastimo profundamente, Sr. Presidente, e reitero a minha posição: o que a Câmara votará é o parecer da Comissão nos precisos termos em que esta o fez, e daí decorrerão consequências para o prosseguimento do processo legislativo tal como o Regimento estipula.
Vozes do PCP e do MDP/CDE: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, penso que a Câmara está suficientemente esclarecida, pelo que vamos votar o parecer.
Sr. Deputado Silva Marques, pretende ainda usar da palavra?
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, se me permite, estava há algum tempo a pedir a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Silva Marques (PSD): - É apenas para dizer que V. Ex.ª usou, e bem, do seu direito de clarificação da matéria sobre a qual vai recair o nosso voto. Não houve qualquer recurso da decisão de V. Ex.ª e nesse sentido podemos passar à votação.
O Sr. Presidente: - Vamos, pois, passar à votação, do parecer.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e a abstenção do Sr. Deputado Vasco da Gama Fernandes (PRD).
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, na segunda parte da ordem do dia vamos proceder à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 82/IV (revogação do n.º 4 do artigo 14.º da Lei Quadro dos Municípios), apresentado pelo PS, e 95/IV (sobre a criação de municípios), apresentado pelo PCP.
O Sr. Secretário vai proceder à leitura do relatório e parecer relativo ao primeiro diploma referido.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes):
Relatório e parecer da Comissão de Administração Interna e Poder Local
A Lei n.º 142/85, de 18 de Novembro, que estabeleceu o regime para a criação de municípios, na sequência dos princípios gerais consignados na Lei n.º 11/82, de 2 de Junho, rematou o seu articulado com um preceito que paralisou de imediato a sua aplicação.
Dispõe, na verdade, o n.º 4 do seu artigo 14.º que a criação de novos municípios só poderá efectivar-se após a criação das regiões administrativas, nos termos dos artigos 250.º, 256.º e seguintes da Constituição.
Ora, no projecto de lei em apreço propõe-se que aquele n.º 4 seja pura e simplesmente revogado, considerando que não se prevê a curto prazo a
criação de regiões administrativas e que urge resolver situações que não se compadecem com essa demora.
A nosso ver, o projecto de lei está em condições de poder subir, sem mais delongas, a Plenário.
Palácio de São Bento, 29 de Janeiro de 1986. - O Relator, Alberto Marques de Oliveira e Silva.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Domingues.
O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como subscritor do projecto de lei n.º 82/IV, cabe-me fazer a sua apresentação e justificação.
Na anterior legislatura, o Partido Socialista defendeu, em várias intervenções produzidas nesta Câmara, o condicionamento da criação de novos municípios à existência de uma lei quadro da criação de municípios. Daí resultou por nossa parte a rejeição da criação do concelho de Vizela. Entretanto, assumindo os nossos compromissos anteriores, empenhávamo-nos, com os restantes grupos parlamentares, na elaboração da referida lei. Foi um trabalho árduo, quer do ponto de vista técnico-legislativo quer do ponto de vista estritamente político.
Tenho de prestar aqui pública homenagem a um meu camarada ausente do Parlamento na presente legislatura. Refiro-me ao então deputado arquitecto Paulo Barrai, que pôs todo o seu alto saber e competência ao serviço do projecto. A sua vontade política foi determinante na elaboração da Lei Quadro da Criação de Municípios.
A lei estava certa no momento da sua aprovação pela Assembleia da República. As leis podem não estar certas absolutamente, mas apenas de forma relativa às circunstâncias da sua produção. A conjuntura política era a do Governo PS/PSD. Coligação de poder com implicações difíceis também em matérias secundárias onde os dois partidos podiam ter posições antagónicas ou mesmo inconciliáveis. Era o caso quanto à criação do concelho de Vizela. Não era o caso da Lei Quadro da Criação de Municípios. Por isso, foi possível aos partidos do governo PS/PSD acordarem no texto da nova lei. As negociações, longas e penosas, haviam chegado ao fim. A luz surgia finalmente ao fundo do túnel ...
Seria mesmo luz? À última hora, o PSD descobria um travão, que veio a ficar consignado no n.º 4 do artigo 14.º da Lei n.º 142/85, e que reza assim:
A criação de novos municípios só poderá efectuar-se após a criação das regiões administrativas nos termos dos artigos 250.º,. 256.º e seguintes da Constituição.
O meu grupo parlamentar, confiante na vontade política do PSD em regionalizar rapidamente o País, e atendendo a razões maiores do Estado, terminou por se resignar.
A minha confiança pessoal no Partido Social-Democrata não chegava para tanto, embora às razões de Estado seja sempre muito sensível. Por isso solicitei liberdade de voto, que prontamente o meu grupo parlamentar, com generosidade, me concedeu.
Votei contra o travão. Usei entrementes da legitimidade advinda das novas circunstâncias políticas e, sobretudo, daquele meu sentido de voto para subscre-
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ver o presente projecto de lei que preconiza nada mais nada menos do que a supressão do acrescento espúrio, tendo tido a honra de apor a minha assinatura junto da do brilhante deputado, paladino das liberdades e cabeça de lista dos deputados do Partido Socialista pelo círculo eleitoral de Braga, Raúl Rêgo.
É este o sentido do projecto de lei que visa suprimir o malfadado travão à aplicação da Lei de Bases da Criação de Municípios.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aqui está, mais uma vez, na Assembleia da República, a questão da criação do município de Vizela.
Não há ilusões entre nós. Todos sabemos que este debate sobre a Lei Quadro de Criação de Municípios aparece hoje, como sempre sucedeu, só e tão-só, por causa de Vizela.
Foi para inviabilizar Vizela que em Maio de 1982 foi inventada a necessidade de uma lei quadro.
Foi com o mesmo objectivo que, em Outubro de 1983, o Governo apresentou a proposta de lei sobre a matéria à Assembleia da República. E foi ainda com esse objectivo que os grupos parlamentares então apoiantes do Governo propuseram e aprovaram própostas de alteração, particularmente a norma que diz que a criação de municípios depende da criação das regiões administrativas.
A questão é tão transparente que foi possível afirmar que, no caso, estávamos perante não uma lei, mas antes perante uma antilei, que tinha por característica fundamental estar destinada a nunca funcionar e por objectivo central inviabilizar aquilo que deveria permitir, isto é, precisamente a criação de municípios!
Entretanto, Srs. Deputados, o que de mais relevante pode ser dito acerca deste debate de alteração ou revogação da lei quadro é o mesmo que foi já dito acerca da própria lei.
É que á lei quadro é desde sempre uma lei desnecessária. Por três razões: porque a Assembleia da República já criou um município - o da Amadora - sem que tal lei quadro existisse; porque a Lei n.º 11/82 já contém as regras mínimas necessárias para a criação de municípios; finalmente, porque não existe no sistema constitucional português nenhuma hierarquia de leis, pelo que a Assembleia pode sempre, por outra lei de igual valor, criar municípios que não se enquadrem... na lei quadro!
Importará, nestes momento, responder a duas questões centrais: primeira - e esta é uma questão que por vezes é colocada - vive o País e esta Assembleia uma situação de crise em que se multiplicam de forma insensata os projectos de criação de novos municípios? Todos os senhores deputados sabem que isso não é verdade. Os projectos apresentados nesta legislatura e na anterior resumem-se a seis escassos casos.
A lei quadro vigora há menos de um ano e o facto é que nos nove anos em que a Assembleia funcionou e apreciou estes casos sem lei quadro foi um único
- um único, sublinho - o município criado: o da Amadora, que; suponho, ninguém questiona, ou seja, suponho que todos sabemos que a Assembleia deliberou bem. Aliás, este ponto leva-me directamente à segunda questão: será a criação dos novos municípios uma questão eminentemente técnica, em que sobreleve a régua e o esquadro, e a opinião da equipa de geógrafos, sociólogos e economistas? E é bom que se diga, Srs. Deputados, que isso não é assim. E tanto isso não é assim que a própria lei quadro, que aqui discutimos, não é um documento tecnicamente fundamentado, mas tão-só uma grelha inventada para dificultar certos e determinados processos, uma grelha de opções feitas à medida de interesses políticos e não de interesses ou razões técnicas.
Para os que fizerem o percurso de debate da lei quadro isso é particularmente evidente, desde logo, porque todos sabem que nenhuma razão técnica foi alguma vez invocada para fundamentar as soluções da lei.
Tudo afinal se resume em afirmar claramente que a grelha traçada nada tem a ver com a realidade humana e geográfica subjacente aos municípios existentes e a criar. Os disparates a que conduz uma tal lei são evidentes. Por um lado e desde logo, muitos dos municípios hoje existentes não obedecem aos requisitos! Por outro lado, não só inviabilizaria municípios de criação completamente justificada, como acabaria por potenciar - e isto é espantoso- o aparecimento de municípios que não correspondem a aspirações concretas e nada justifica que fossem criados! A grelha acabava por ser 'um incentivo ao disparate.
A autarquia município, Srs. Deputados, é antes de tudo o produto da sedimentação histórica e cultural de populações em concreto, no exacto desenho moldado pela tradição do passado, pela vontade afirmada no presente e pelo empenho na construção de um futuro melhor. E mais do que isso: a formação e reconhecimento legal de municípios que seja justo e democraticamente exigível criar é, no Estado democrático, a afirmação de uma vontade clara de valorização das formas participadas de exercício do poder, de reforço do poder local, de empenhamento no caminho da descentralização democrática.
A Assembleia pode e deve hoje assumir responsavelmente - a criação do município de Vizela. Com a confiança - e a certeza de que é um processo justo e irreversível no quadro da construção do Estado democrático.
A criação de municípios não depende da criação das regiões administrativas. Aliás - é bom recordá-lo -, a norma da lei quadro que a isso se refere não apareceu nunca no debate que ao longo de quase dois anos foi feita em torno da proposta de lei. Apareceu praticamente no último dia e só para inviabilizar a criação de municípios e, particularmente, do município de Vizela.
O processo de criação de regiões tem de avançar, mas não é nem pode ser impeditivo da criação de um município que é necessário, justo e imperioso criar. A descentralização nos seus diferentes níveis não é um exercício técnico -faseado em Lisboa ou no Terreiro do Paço - é e deve ser uma afirmação da vitalidade democrática do País, com sede e ponto de partida na vontade - e nos interesses legítimos das populações.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Srs. Deputados, por todas estas razões, entendemos que este seria o momento para proceder à revogação da lei quadro e, no quadro dos mecanismos da Lei n.º 11/82; apreciar caso a caso os poucos
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casos em que existem projectos sedimentados em razões históricas, culturais, sociais e económicas que justifiquem voto favorável.
A opinião do PCP é a de que este debate - sobre a lei quadro - é por si mesmo um debate desnecessário, já que a Assembleia poderá sempre, por lei, criar os municípios que entender justo criar.
Obviamente que esperamos um resultado positivo deste debate: a revogação da lei quadro ou uma profunda alteração que lhe introduza os mecanismos que a adeqúem à vida e às realidades.
Mas, seja qual for o resultado final deste debate sobre a lei quadro, o que importa é passar ao ponto seguinte da ordem de trabalhos: que se faça justiça, que se vote a criação do novo município, que se faça já aquilo que há-de ter de ser feito - criar o município de Vizela!
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República aprecia hoje o projecto de lei n.º 82/IV, do PS -, que propõe a revogação do n.º 4 do artigo 14.º da Lei n.º 142/85, mais conhecida por Lei Quadro de Criação de Municípios, e o projecto de lei n.º 95/IV, do PCP, que propõe a revogação pura e simples dessa lei, considerando que a criação de municípios se deve reger pela Lei n.º 11/82.
Em nome do Grupo Parlamentar do PSD vou abordar, de forma sucinta, frontal e objectiva, a existência da Lei Quadro de Criação de Municípios e os projectos de lei do PS e do PCP que propõem a sua revogação parcial e total.
Começo por recordar aqui algumas passagens da declaração de voto que fiz em 19 de Outubro de 1983, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, após a votação na generalidade da Lei Quadro de Criação de Municípios:
O Partido Social-Democrata sempre considerou como fundamental para dar cumprimento cabal ao preceituado na alínea y) do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa, na qual se consagra como reserva absoluta da competência legislativa da Assembleia da República o regime de criação, de extinção e modificação territorial das autarquias locais e para igualmente dar execução a uma verdadeira política de reordenamento do território e finalmente para dar satisfação aos anseios das populações, a existência de leis quadros reguladoras dos requisitos essenciais para o efeito.
Foi assim que ao fim de alguns anos de aturados estudos e debates se elaborou e aprovou na Assembleia da República a Lei n.º 11/82, que define o regime de criação e extinção das autarquias locais e de determinação da categoria das povoações, regulando de forma particularmente detalhada os pressupostos da criação de freguesias.
No entanto, o PSD considerava que também era importante, através de uma outra lei quadro, regular de forma igualmente detalhada a criação, extinção e modificação de municípios.
Foi esse o objectivo do Governo- PS/PSD ao apresentar a esta Assembleia da República uma proposta de lei com este objecto.
O Governo, desta forma, não mais faz do que procurar que o poder legislativo preencha uma lacuna importante no nosso ordenamento jurídico, para que depois assim a Assembleia da República esteja mais apetrechada a analisar e a votar todos os projectos de lei sobre a criação de novos municípios portugueses, já pendentes neste Parlamento, e outros projectos ou propostas de lei que possam no futuro aparecer com o mesmo objectivo.
O Partido Social-Democrata, com esta proposta de lei, com o seu debate e aprovação vê assim preenchido um dos seus objectivos políticos, pelo qual, desde há muito, se vem batendo.
O Grupo Parlamentar do PSD entende que a lei tem de ser o mais geral e abstracta possível, para servir o País e não ser dirigida a este ou aquele caso particular.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É também conhecida a filosofia do PSD, que coincide cada vez mais com as tendências modernas das reformas europeias, que vai no sentido de procurar espaços mais amplos para a administração municipal. E já hoje em dia e no nosso país a tendência é para a associação de municípios com o objectivo de aproveitarem todos os recursos humanos e materiais disponíveis e para se aplicarem economias de escala que levem mais rápida e eficazmente à resolução dos problemas locais, à satisfação dos anseios das populações e ao prestígio das instituições autárquicas.
Considera o PSD que se deve ter tudo isto em linha de conta na Lei Quadro dos Municípios, porque só se devem criar novos municípios quando haja razões de ordem histórica, factores geográficos, demográficos, económicos, sociais, culturais e administrativos que o justifiquem e quando for essa a vontade das populações.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Queremos o nosso país com uma administração local dimensionada, competente, dinâmica e eficaz para bem das populações.
Acabei de citar parte da declaração de voto que fiz aquando da discussão e votação na generalidade da Lei Quadro de Criação de Municípios, porque me pareceu útil fazê-lo para assim melhor perceberem a posição do PSD na discussão que hoje estamos a travar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entrando agora objectivamente na análise dos projectos de lei em apreço, comecemos pelo projecto de lei n.º 82/IV, do PS.
A Assembleia da República aprovou na anterior legislatura a Lei n.º 142/85, de 18 de Novembro, denominada «Lei Quadro de Criação de Municípios», que definiu o regime jurídico da criação de municípios, na sequência dos princípios constantes da Lei n.º 11/82,
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de 2 de Junho, que havia definido o regime de criação e extinção das autarquias locais e de determinação da categoria das populações.
Ora, atentando ao disposto no artigo 14.º daquele primeiro diploma, parece não poder deixar de reconhecer-se que a criação de novos municípios só poderá efectivar-se após a criação das regiões administrativas, a que se referem os artigos 250.º, 256.º e seguintes da Constituição da República.
Na verdade, estabelece-se textualmente no n.º 4 daquele normativo:
A criação de novos municípios só poderá efectivar-se após a criação das regiões administrativas, nos termos dos artigos 250.º, 256.º e seguintes da Constituição.
Como ainda não foram criadas as regiões administrativas, parece constituir uma quase impossibilidade jurídica a criação de novos municípios, em Portugal.
É evidente que o que fica referido deverá ser considerado como uma resposta um pouco simplista, mas, do ponto de vista estritamente jurídico, é a única possível, uma vez que ela traduz o resultado da operação que consiste em verificar se a situação fáctica contemplada nas iniciativas legislativas se, harmoniza com o direito objectivo existente.
É claro que também poderá dizer-se que as novas iniciativas legislativas que propõem a criação de municípios estão apresentadas perante o mesmo órgão de soberania que produziu a Lei n.º 142/85 e, por conseguinte, a Assembleia da República, detém a .faculdade de derrogar a lei anterior que ela própria produziu. Tudo será uma questão de conveniência e oportunidade políticas.
Sucede, no entanto, que estas questões não podem ser vistas casuisticamente, e tanto o ordenamento jurídico como a prática de política legislativa não consentem incoerências flagrantes ou inflexões inesperadas. Uma lei quadro como a Lei n.º 142/85 (Lei Quadro de Criação de Municípios) destina-se a definir os princípios fundamentais, e os sistemas reguladores, das modalidades de intervenção numa determinada área de actuação do Estado e surge, no mundo do direito com apetência a não ser alterada no dia seguinte ao da sua publicação, por dever representar, em condições normais, uma opção amadurecida do legislador e o resultado final e duradouro da ponderação de todas as soluções possíveis, fundado no mais amplo consenso possível relativamente a uma questão importante da organização do Estado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É profundamente lamentável que o PS, que aprovou a Lei Quadro de Criação de Municípios em todos os seus dispositivos, venha agora, passados seis meses da sua entrada em vigor, numa atitude de incongruência, propor que a mesma seja revista parcialmente revogando um dos seus importantes dispositivos: E acabámos de assistir agora à entrega, na nossa bancada de mais, algumas propostas de aditamento de artigos que propõem a revogação de toda uma série de outros artigos, acabando, na prática, com a lei quadro. Talvez fosse mais coerente para o PS apresentar um projecto de lei idêntico ao do PCP, para acabar, de uma vez por todas, com a lei quadro.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não entendemos ou, melhor, talvez possamos entender: este projecto de lei do PS reflecte bem a ambiguidade e a incongruência natural a que nos habituou o Partido Socialista Português.
Em relação ao projecto de lei n.º 95/IV, do PCP, que propõe a revogação total da Lei Quadro de Criação de Municípios, começo por, fazer justiça aos comunistas, porque são coerentes, porque sempre se opuseram à existência de uma lei quadro que regulasse com algum, rigor a criação de novos municípios, dizendo que para tal bastava a Lei n.º 11/82.
Como sabem, nunca foi esse o entendimento dos sociais-democratas e, por isso, não estranharão que votemos, contra o vosso projecto, de lei.
Seria desastroso para o País que a Assembleia da República apreciasse, de forma casuística os projectos de lei de criação de novos municípios, isso poderia levar e levaria com certeza absoluta - à pulverização de novas autarquias municipais, em Portugal, que em nada contribuiria para o progresso e desenvolvimento das comunidades locais, que o mesmo será dizer da própria Nação Portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vivemos felizmente num Estado de direito democrático e por isso as leis são , para se respeitar e cumprir.
A Assembleia da República, como órgão de soberania e legislador por excelência, deve por isso dar o exemplo perante o País de que estamos num Estado de direitos. A Assembleia da República deve por isso respeitar e cumprir, a Lei Quadro de Criação de Municípios, que aprovou, para assim se dignificar e prestigiar aos olhos, do País e do povo que somos.
Não existem, a nosso ver, razões objectivas suficientes para mudam a Lei nº 142/85, e por isso iremos votar contra os dois projectos de lei em discussão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não pomos nem está em causada legitíma aspiração, das populações pretenderem e reivindicarem a sua autonomia ou independência municipal.
Risos do PCP.
Que fique muito claro que nada move o PSD contra qualquer população local.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Como partido nacional e eminentemente popular e ainda como deputados da Nação que somos, respeitamos, profundamente todos os cidadãos e as populações locais.
Aplausos do PSD.
Os Portugueses são todos iguais perante lei e os deputados à Assembleia da República têm de lhes dar igual tratamento.
O legislador tem de pensar com toda a seriedade, ponderação, sensatez e ainda de acordo com as regras estabelecidas nas suas tomadas de decisão, para que estas sejam as mais certas e adequadas para o País e para as populações que serve.
Sr. Presidente, Sr. Deputados: Desejamos a paz e a cooperação entre as populações locais. Os sociais-democratas defendem que os actos de auto domínio das populações locais devem ser feitos respeitando as leis quadros existentes, de forma ponderada, oportuna e pacífica e com natural, satisfação, e alegria para todos.
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Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É assim, no nosso entendimento, que o legislador deve proceder.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A concluir, direi que os sociais-democratas portugueses desejam ardentemente o progresso e o desenvolvimento das populações locais, que lhes permitam uma boa qualidade de vida, porque só assim Portugal pode mudar e ser um país moderno e plenamente europeu.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, atingimos a hora regimental de suspendermos a sessão.
Informo os Srs. Deputados que no reinicio dos nossos trabalhos iremos passar à votação final global da lei da amnistia.
Está suspensa a sessão.
Eram 17 horas e 35 minutos,
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Para a leitura do relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo ao projecto de lei n.º 173/IV, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Candal.
O Sr. Carlos Candal (PS): - O relatório é do seguinte teor:
1 - Oportunamente aprovado na generalidade pelo Plenário da Assembleia da República, baixou o articulado do projecto de lei n.º 173/IV à 1.ª Comissão para apreciação e votação na especialidade.
2 - Ao longo de sucessivas reuniões, esta Comissão discutiu e votou aquele texto inicial e diversas propostas de aditamento, substituição ou eliminação de alguns preceitos - apresentadas pelos grupos parlamentares ou por membros da Comissão ou elaboradas colectiva e consensualmente no interior desta.
3 - De tal trabalho resultou o articulado final, ora remetido ao Plenário.
4 - Foram os seguintes os resultados e votações que os seus diversos normativos obtiveram:
a) Os números 4 a 7, 10, 11-fl), 12 e 16 a 26 do artigo 1.º, os artigos 3.º a 11.º e os artigos 13.º a 18." foram aprovados por unanimidade pelos membros da Comissão presentes;
b) Os demais preceitos foram aprovados por maioria pelos membros da Comissão presentes, com as seguintes especificações:
I - Os n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 1.º tiveram votos contra do PS, do PCP e do CDS;
II -O n.º 8 do artigo 1.º teve votos contra do PCP e a abstenção de um deputado do PSD;
III - O n.º 9 do artigo 1.º teve abstenção do CDS;
IV - As alíneas b) e c) do n.º 11 do artigo 1.º tiveram votos contra do PCP;
V - O n.º 13 do artigo 1.º teve abstenção de um deputado do PS;
VI - O n.º 14 do artigo 1.º teve votos contra de um deputado do PSD e de um deputado do PS e abstenção do CDS;
VII - O n.º 15 do artigo 1.º teve abstenção do PCP e a abstenção de dois deputados do PRD; VIII - O n.º 27 do artigo 1.º teve voto contra do CDS;
IX - O n.º 28 do artigo 1.º teve votos contra do PSD e do CDS;
X - O n.º 29 do artigo 1.º teve a abstenção do PCP;
XI - O artigo 2.º teve duas abstenções;
XII - O artigo 12.º teve abstenções do PCP e do CDS e a abstenção de um deputado do PS; XIII - O artigo 17.º teve voto contra do CDS e a abstenção de um deputado do PSD e de um deputado do PS.
5 - Por unanimidade dos membros da Comissão presentes, foi eliminado o preceito do articulado aprovado na generalidade pelo Plenário que fixava uma condição resolutiva ao perdão de penas ora concedido pelo artigo 10.º (cf. artigos 5.º e 6.º daquele primitivo articulado).
6 - Consigna-se, finalmente, que diversas propostas de especialidade foram retiradas e outras não obtiveram maioria e que diversos preceitos do articulado foram objecto de melhorias consensuais de redacção.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, há aqui uma referência ao n.º 29 do artigo 1.º que preciso de confirmar com um membro do CDS que pertença à Comissão e, se for caso disso, depois farei a rectificação no relatório.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso será impeditivo que se processe de imediato à votação?
O Sr. Carlos Candal (PS): - Creio que não, Sr. Presidente.
Já agora, gostaria de ser informado se não deu entrada na Mesa um requerimento subscrito por dez deputados do PS solicitando a avocação pelo Plenário da votação na especialidade do projecto de lei n.º 173/IV.
O Sr. Presidente: - Esse requerimento deu entrada na Mesa neste momento, Sr. Deputado.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
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O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, gostaria de informar V. Ex.ª de que o meu grupo parlamentar vai enviar para a Mesa um requerimento que condiciona esse processo.
O Sr. Presidente: - Porventura não será do mesmo teor do requerimento apresentado pelo PS? Aliás, este requerimento é do seguinte teor: «Ao abrigo do artigo 154.º do Regimento, requeremos a avocação pelo Plenário da votação na especialidade do projecto de lei n.º 173/IV (lei da amnistia).»
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, o requerimento que enviámos para a Mesa é de teor diferente.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, nos termos do artigo 154.º do Regimento, não é possível a avocação pelo Plenário de matéria já votada em comissão. A avocação é, a todo o tempo, possível antes de o diploma ser votado em comissão, mas, depois dessa votação, a avocação seria um absurdo. Assim, salvo consenso, a avocação pretendida não é possível.
Vozes do PS: - Isso é falso e é ridículo!
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr: Deputado.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que não valerá a pena estarmos a perder tempo com um assunto sobre o qual, seja. qual for a opinião que se tenha acerca da interpretação do Regimento, há já doutrina firme por parte desta Assembleia. Ora, se bem me lembro, a última vez que essa doutrina foi aplicada foi aquando da avocação de dois artigos respeitantes à lei das rendas.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Nessa altura houve consenso!
O Orador: - Não, Sr. Deputado, não houve, consenso.
Portanto, não vale-a pena estarmos a perder tempo a discutir um assunto sobre o qual há doutrina firme.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção vai no mesmo sentido da do Sr. Deputado José Luís Nunes, mas, para avivar a memória dos Srs. Deputados, gostaria de acrescer que o mesmo aconteceu - pouco tempo antes da avocação dos dois artigos da lei das rendas já votados na Comissão - em relação a um artigo do Estatuto dos Magistrados, que também já tinha sido votado na especialidade na Comissão e foi aqui avocado e votado na especialidade.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que será difícil considerar doutrina firme um, dois ou três casos. Mesmo que fossem mais casos, a verdadeira doutrina é estabelecida no Regimento. Aliás, se assim não é, para que é que se apregoa o Regimento? Se não estão de acordo com o Regimento, altere-se este, mas não se dêem todos os dias pontapés em normas que elaborámos com tanto esforço.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Deputado Silva Marques, creio que V. Ex.ª está a invocar uma interpretação do Regimento que não tem nenhum fundamento. O que o artigo 154.º do Regimento refere é que o Plenário pode deliberar, a todo o tempo, fazer a avocação. Ora, «todo o tempo» é, obviamente, um direito que estamos a exercer neste momento, tempestivamente.
O Sr. Silva Marques (PSD): - A avocação da votação, mas não a avocação para um segunda votação!
O Orador: - Utilizando a figura regimental de interpelação à Mesa, gostaria que o Sr. Presidente esclarecesse o que é que vamos fazer em seguida, na medida em que depois de ouvir o Sr. Deputado Silva Marques fiquei com bastantes dúvidas. Vamos ou não proceder à votação final global do projecto de lei n.º 173/IV, respeitante à lei da amnistia?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, em primeiro lugar, vou pôr à votação o requerimento e depois vamos proceder à votação final global do diploma em questão.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Estou esclarecido, Sr. Presidente. Muito obrigado.
O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Independentemente do problema jurídico que foi colocado, gostaria de esclarecer que a avocação que propomos visa exclusivamente os três primeiros números do artigo 1.ª do diploma. Não pretendemos discutir e votar todos os preceitos do diploma, mas sim os três primeiros números do artigo 1.ª.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Candal, V. Ex.ª é um dos subscritores do requerimento que o PS apresentou e que diz o seguinte: «Ao abrigo do artigo 154.º do Regimento, requeremos a avocação pelo Plenário da votação na especialidade do projecto de lei n.º 173/IV.» Referem-se a todo o projecto de lei?
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O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, quando redigi o requerimento não destrincei essa questão porque tive dúvidas sobre se a avocação poderia ser parcial...
O Sr. Presidente: - Penso que sim, Sr. Deputado, desde que V. Ex.ª restrinja a esse limite.
O Orador: - Foi feito o esclarecimento verbal no sentido de que só nos interessa a avocação dos três primeiros números do artigo 1.º do diploma.
O Sr. Presidente: - Então dá-me licença que acrescente isso ao requerimento?
O Sr. Carlos Candal (PS): - Peço-lhe esse favor e agradeço-lhe, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Gomes de Pinho, o requerimento que o CDS subscreveu também diz respeito aos três primeiros números do artigo 1.º - tal como o PS - e ainda aos artigos 17.º, 27.º e 28.º?
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Exactamente, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou pôr estes requerimentos à votação e se eles forem aprovados teremos, em primeiro lugar, que proceder à apreciação dos números respeitantes aos artigos cuja avocação aqui está a ser requerida e só depois passaremos à votação final global do diploma.
Vamos, pois, votar o requerimento apresentado pelo PS.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PRD e do MDP/CDE, votos a favor do PS, do PCP, do CDS e dos deputados independentes Lopes Cardoso, Ribeiro Teles e Borges de Carvalho e a abstenção do deputado Silva Lopes, do PRD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o segundo requerimento, apresentado pelo CDS, que, como sabem, é mais extenso do que o primeiro.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PRD e do MDP/CDE, votos a favor do PS, do PCP, do CDS e dos deputados independentes Lopes Cardoso, Ribeiro Teles e Borges de Carvalho e a abstenção do deputado Silva Lopes, do PRD.
O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, nos termos regimentais, o CDS requer a suspensão dos trabalhos por 15 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, sendo regimental o pedido feito pelo CDS, estão suspensos os trabalhos por 15 minutos.
Eram 18 horas e 50 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 19 horas e 20 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou submeter a votação final global o projecto de lei n.º 173/IV - lei da amnistia.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, está neste momento a ser-nos distribuído um relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre a lei da amnistia. O CDS pede apenas 30 segundos para poder ler o relatório.
Vozes do PCP: - Já foi lido, Sr. Deputado.
O Orador: - É que temos fundadas suspeitas de que este relatório seja inexacto e estamos a tentar comprovar isso.
O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Presidente, a minha interpelação é no sentido de que, se não estamos, neste momento, em condições de proceder à votação final global da lei da amnistia, que estava prevista para as 18 horas, a mesma seja adiada para amanhã às 13 horas. Não continuemos a perder tempo e a adiar o resto dos trabalhos em torno de uma votação que, pelos vistos, não está em condições de ser realizada.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Gomes de Pinho, o CDS já leu o relatório?
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, pela parte do CDS não há nenhuma objecção a que a votação seja feita agora. Queremos apenas pedir a V. Ex.ª que faça uma correcção no relatório que agora foi distribuído, indicando que o n.º 29 do artigo 1.º teve o voto contrário do CDS, facto que não consta do relatório.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Gomes de Pinho, no original do relatório já está feita a correcção. Queira desculpar o facto.
O Sr. Secretário vai ler a correcção, Sr. Deputado.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - A correcção foi feita posteriormente à distribuição do relatório e o seu texto é o seguinte: «O n.º 29 do artigo 1.º teve o voto contra do CDS e a abstenção do PCP.»
O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Candal.
O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, pretendo apenas dizer que quando li o relatório fiz uma reserva verbal, que foi esta, pois havia dúvidas quanto à posição do CDS nesta votação.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Gomes de Pinho, quando foi lido o relatório o Sr. Deputado Carlos Candal fez, efectivamente, essa reserva, precisamente por causa deste inciso, que consta já do original.
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Srs. Deputados, vamos, pois, proceder à votação final global do projecto de lei n.º -173/IV.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Lopes Cardoso, Ribeiro Teles e Maria Santos, votos contra do CDS e do deputado independente Borges de Carvalho e a obtenção dos deputados Carlos Candal e José Meirinhos (PS).
O Sr,. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A votação favorável do PCP às avocações a Plenário apresentadas tanto pelo PS como pelo CDS nada tem a ver com a substância das disposições a que se referiam, mas apenas, com o princípio do Grupo Parlamentar do PCP de viabilizar tudo o que contribua para o aprofundamento do debate e para o esclarecimento político das questões em apreço na Assembleia da República.
Com efeito, votaríamos diferentemente as normas avocadas pelo PS e pelo CDS, sendo que em caso algum deixaríamos de manifestar oposição frontal ao que este último partido pretendia.
Tudo ficou pois, como saiu da Comissão. O Grupo Parlamentar do PCP expressou, na votação final global do projecto de lei da amnistia, uma posição que releva, sobretudo a sua consonância com a estratégia cqnsensualizadora que modelou os trabalhos da especialidade e que, como se viu, não foi levada às últimas consequências por todos os partidos.
Certas teses normativas apontavam, certamente, para talhar de modo diverso o emaranhado de hipóteses normativas, orientando-se para uma visão muito mais restrita, pontual e selectiva, já que a questão de um diploma agraciante, dado o motivo que a ele preside, estava colocada com geral concordância.
Pudemos, em comissão, traduzir com votos contra e abstenções o firme desacordo que nos mereceram certos dispositivos, entre os quais os que decretam benefícios em matéria de crimes antieconómicos e particulares. Não obstante, afastada a possibilidade de serem abrangidas, com as medidas aprovadas, redes de contrabando como a de Setúbal e escândalos como o da DOPA ou o chamado «caso Nabeiro» - o que bem pode explicar a votação do CDS -, entendemos ter-se ido longe de mais ao incluir ilícitos dolosos e ao adoptar níveis quantitativos elevados como fronteira.
Por outro lado, pelo particular melindre de que sé revestem, gerando, em regra, apaixonados juízos de censurabilidade popular, ponderámos cuidadosamente a viabilidade de a lei acolher as ofensas corporais voluntárias, as injúrias e difamações, as ameaças e as coacções. Como afirmámos aquando da apreciação deste diploma na generalidade, haveria que ser cauteloso e prudente nas situações em que o Estado aparece a dirimir, anulando a instância judiciária, questões do foro íntimo dos cidadãos.
Nada justificava que um diploma de matriz política como o que a Câmara concluiu privilegiasse uma certa óptica só por ser tradicional, funcionando, porém, na conjuntura, como maximalista, e inconvenientemente fundamentado. Esta não era e não é a amnistia técnica desejada pelo Governo.
Obstou-se, entretanto, a que vingasse o propósito de amnistiar indiscriminadamente os reincidentes. Foi essa uma sensata decisão, já que, na esteira do artigo 126.º do Código Penal, se não alargou indevidamente o espectro dos agraciados a uma massa de detidos a quem a opinião pública não aceitaria, com pesadas razões, ver dirigidas normas de clemência similares às que recaem sobre os delinquentes primários. Afigura-se, lastimável que, ainda assim, atentas as malhas, consideravelmente. largas a que se chegou, a maioria dos deputados não houvesse admitido um preceito visando fazer justiça aos agentes da PSP atingidos por iníquas penas de transferência e demissão pelo facto de se baterem pelo livre exercício das actividades sindicais a que têm direito. A amnistia aplica-se à PSP, mas de forma limitada, e esperemos que não inteiramente ineficaz.
Por último, Sr. Presidente, Srs. Deputados, uma amnistia não é sequer, como sempre proclamámos, uma panaceia com efeitos sensíveis. Ficam por resolver, apesar desta, os graves problemas da justiça em Portugal, situem-se eles na esfera penitenciária ou judiciária, no campo das reformas que não há ou que espreitam por aí, com intoleráveis «aleijões» inconstitucionais, no terreno das infra-estruturas inadiáveis e no das acções tendentes a dar qualificada resposta legislativa às exigências da célere mutabilidade social. Malgrado as condicionantes e as contingências, o PCP, que pautou pela diligência a sua participação no labor da Comissão, não se eximiu a viabilizar o resultado consensual - assim deveria ser - que se ensejara.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, pára fazer declarações de voto, os Srs. Deputados Agostinho de Sousa, Licinio Moreira, Andrade Pereira, António Taborda e Carlos Candal.
O Sr. Agostinho de Sousa (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na discussão na generalidade, na declaração de voto então produzida e no decurso da discussão na especialidade, o PRD teve a oportunidade de defender com frontalidade, transparência e coerência a sua posição.
O PRD, sensibilizado pela natureza polémica e controversa da amnistia, reconheceu que esta não mereceria o «castigo» de uma neutralidade, de um acordo passivo ou de uma decisão sem dúvidas e previu, naturalmente, p desencadear de inevitáveis divergências, mas impôs à si próprio aquilo que, naturalmente, aguardava das restantes forças partidárias, a coerência da conduta, tendo orientado esta no sentido de um compromisso avisado e procurando, especialmente, conseguir o aperfeiçoamento do equilíbrio entre a área de crimes já abrangidos ria generalidade e outros, excluídos, merecedores, em nosso entender, de tratamento equivalente.
O espírito inicial e os objectivos do agraciamento limitavam, à partida, o seu âmbito. Uma extensão imprudente afectaria a sua natureza e crédito, mas não é menos certo que uma decisão susceptível de conduzir a um tratamento discriminatório, pela injustiça praticada, não o afectaria menos.
Tratou-se de um alargamento controlado do projecto consensual de arranque que não ultrapassou aquela área de tolerância tradicional em matéria de amnistias; evitou a consagração de uma opção final menos justa,
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permeável até a um juízo de possível ilegalidade por aplicação não igualitária da lei; cooperou numa solução mitigada e acidental do preocupante problema de congestionamento de serviço nos tribunais e impediu qualquer especulação de conduta discriminatória pouco explicável.
Não foi possível o encontro de uma solução global consensual que eventualmente evitaria alguns problemas adicionais.
Cada uma das forças partidárias proeurou a sua solução e apresentou as suas explicações e justificações. Cada uma assumirá as suas responsabilidades. Não enjeitaremos as nossas, mas rejeitamos as que nos não cabem ou nos sejam contraditória e injustificadamente atribuídas.
O projecto de lei na generalidade foi um ponto de partida e não o de chegada. Não admitimos que o alargamento da amnistia aos crimes referidos nos n.ºs 1, 2 e 3 haja, por qualquer modo, contribuído para a subversão do espírito da amnistia. Tais crimes não são rejeitados com maior veemência, com mais sensível melindre ou com mais acentuada discordância pela opinião pública do que outras infracções amnistiáveis por acordo global (ou quase global, outras), relativamente às quais são inegavelmente mais importantes os valores tutelados ofendidos, revestindo uma maior dignidade penal.
A lesão possível ou temida do crédito ou prestígio político dos subscritores ou, em particular, da Assembleia da República, não se originará nem se agravará com os acréscimos questionados, que não têm uma repercussão social mais delicada do que infracções amnistiadas, como a especulação e o açambarcamento com dolo (apesar da cautelosa barreira do lucro e do valor da mercadoria), ou do que a de certos crimes aduaneiros ou de outros contra a propriedade, nem do que as medidas decretadas como perdão...
Além das razões apresentadas para a operação (e a opção) de acréscimo, existem outras que não podem silenciar-se: pouca gravidade das penas aplicáveis; não indiciação de especial periculosidade (e até revelação oposta de atenuadas características de perigo); não afectação de valores sociais significativos; inexistência de uma perspectiva de perigo de serem postos em causa no futuro; a prática reduzida de algumas das infracções adicionalmente integradas; escasso número de condenações finais de outras; punição mais severa das amnistiáveis; tradição de agraciamento; interdependência e conexão da sua prática em conjunto.
Aceitamos que é uma opção controversa, mas não abdicamos da sua coerência e equidade. Bem mais grave seria a extensão, por exemplo, aos crimes negligentes, com ressalvas restritas, incluindo, todavia, o homicídio voluntário ou a reincidência, como pretendia o PS, à partida o grande defensor do rigor selectivo da amnistia.
Enfim, não propugnamos a liberalização da clemência em nome de objectivos técnicos, mas também não divinizamos a rigidez e a redução à força e em nome de conveniências de mero alcance circunstancial.
Daí o nosso voto favorável.
Aplausos do PRD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Licinio Moreira.
O Sr. Licinio Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquando da discussão na generalidade do projecto de lei em apreço, logo vincámos que as medidas agraciantes e de clemência contidas em tal iniciativa legislativa só tinham justificação quando apareçam inesperadamente e sobretudo quando ocorra um importante acontecimento nacional que concite à unidade, paz e concórdia entre todos os portugueses, de forma a que ao Estado e aos próprios cidadãos seja fácil esquecer infracções às regras de uma sã convivência ou oferecer a liberdade a muitos que expiam penas de prisão, ou ainda aligeirar, para uns tantos, anos, meses ou semanas que têm ainda de viver sem liberdade.
Se tais medidas forem moderadas, sensatas e equilibradas, isto é, não puserem em jogo os mais elementares princípios da prevenção criminal, não sendo excessivas na concessão do benefício do tempo de perdão de pena nem suficientemente vastas que abranjam um grande número de infracções criminais e disciplinares, transgressões e contra-ordenações, então criar-se-ão as condições necessárias para reintegrar, recuperar, e reinserir socialmente os beneficiados com tais providências, e ainda estimular-se-ão os funcionários e magistrados servidores da justiça no sentido de aumentarem a sua dedicação e entrega profissionais, evitando o espectáculo degradante de muitos tribunais e de muitos outros serviços de justiça, com pilhas e pilhas de processos a aguardar a oportunidade de serem movimentados ou o decurso do tempo da prescrição.
O texto base deste projecto de lei, obtido por consenso dos elementos dos grupos e agrupamentos parlamentares que fazem parte da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, ao ser aprovado na generalidade, no Plenário, no passado dia 15 de Abril, fixou as fasquias de infracções disciplinares e criminais, transgressões e contra-ordenações, até às quais, no nosso entender, tal diploma poderia vir a ser melhorado.
Foi animados dessa preocupação de beneficiação do texto que deputados do PSD apresentaram várias propostas para a discussão e votação na especialidade.
Entre outras, destacaremos as que se referem aos crimes semipúblicos de ofensas corporais simples ou com doença até dez dias e aos crimes particulares de difamação e injúria, considerados por muitos como bagatelas penais, por a mais das vezes não conduzirem a qualquer condenação efectiva dos arguidos, e, quando os mesmos são punidos, são-no, quase sempre, com pena suspensa ou, em reduzido número, em poucos dias ou meses de prisão.
Quem frequenta os tribunais sabe muito bem que os intervenientes neste crimes são, na sua grande maioria, pessoas das mais baixas condições sociais, económicas e culturais, que, as mais das vezes, só recorrem aos tribunais para se vingarem do seu ofensor e não por terem considerado grave a ofensa física corporal ou moral.
Não nos convenceu o argumento, várias vezes repetido, de que nestes crimes há um ofendido directo e que por isso seria abusivo que o Estado viesse apagar um crime contra a vontade da pessoa ofendida.
Esqueceu quem assim argumentou que o Estado é o titular do ius puniendi, que só a ele cabe classificar ou deixar de classificar certas condutas humanas como delituosas e que foi em homenagem a esse poder do Estado que há cerca de dois anos, com os votos contra do PSD e do CDS, esta Assembleia da República
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despenalizou, em três casos, o aborto, crime tanto mais abominável quanto o ser humano destruído - ofendido directo - não tem á menor hipótese de se defender.
Uma voz do PCP: - Não diga asneiras!
O Orador: - Por tudo quanto acaba de ser dito e por aquilo que dissemos na discussão na generalidade é que votámos favoravelmente a presente lei.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Andrade Pereira.
O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Efectivamente, se alguma declaração de voto se justifica, é a do CDS. É que, porventura, começará a sentir-se que é estranho que exactamente um partido democrata-cristão, que tem, portanto, um particular dever de clemência e que na votação na generalidade votou a favor da amnistia, tenha hoje votado contra essa mesma amnistia. E digo «mesma» porque a grande razão do nosso sentido dê voto é precisamente o facto de a amnistia que hoje foi submetida a votação final global no Plenário estar longe de ser aquela que foi votada na generalidade e que obteve o voto favorável do CDS.
Há desde logo dois pontos que importa assinalar e que se mostraram perfeitamente inatacados do ponto de vista do CDS. É que nesta mudança de sentido de voto não nos determinou minimamente o objectivo político que se tinha em vista com essa amnistia.
Na declaração de voto que aqui produzimos aquando da discussão na generalidade deste projecto de lei demos conta do quanto estávamos de acordo em que se fizesse uma amnistia para com isso se traduzir um reconhecimento de que a eleição do Presidente da República havia sido um acto de relevo na vida política nacional, tratando-se, como se tratou, da eleição do primeiro Presidente da República civil. Dissemos também que, com o nosso voto favorável à amnistia, com a aprovação desse acto de clemência, queríamos contribuir para a consolidação da democracia, para o prestígio das instituições e para a dignificação dos órgãos de soberania.
Simplesmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se qualquer destas motivações que nos fizeram votar favoravelmente este projecto de lei na generalidade não se alteraram e por isso continuavam a aconselhar â votação favorável ha especialidade, houve muito mais que se alterou e que justificou-a inversão do nosso sentido de voto. E não se tratou apenas de ter aumentado, de forma assaz considerável, o número de crimes amnistiáveis em relação àqueles que estavam previstos no projecto de lei inicial. É que havia nesse diploma inicial uma determinada filosofia, uma determinada explicação global da, amnistia, havia um certo número de requisitos que, no fundo, identificavam e caracterizavam a amnistia.
Uma das notas mais salientes dessa caracterização era, desde logo, a de não se prejudicar, em caso algum, a pessoa dos ofendidos. Não havia; na versão inicial, um só caso em que a amnistia não acautelasse devidamente e por força dela própria os interesses dos ofendidos.
Pois bem, no texto que agora acabou de ser submetido a votação no Plenário, em todos os casos de crimes de injúria, difamação, ameaça e ofensas corporais simples, a amnistia é concedida como um acto unilateral do poder, deixando, porventura, satisfeito o réu arguido, mas insatisfeito o ofendido.
Para além disso, e já sem querer referir a questão dos processos e das penas disciplinares aos funcionários públicos, que apresentam factos gravíssimos susceptíveis de serem punidos com pena de demissão, o que ainda queria salientar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que, vivendo-se, como se vive, neste momento, num clima de degradação social, que engloba desde as polícias às Forças Armadas e em que existe na sociedade um grande sentimento de insegurança, é lamentável que se tenha sido tão magnânimo e se tenha ido para uma amplitude tão grande.
Em suma, Sr. Presidente e Srs. Deputados, na discussão na generalidade tínhamos terminado a nossa intervenção dizendo que estávamos seguros de que tínhamos sido suficientemente clementes e avisadamente prudentes. O que aconteceu foi que, após a discussão na especialidade, deixou de ser suficientemente prudente e foi-se desavisadamente para além da medida em que se devia ter ido.
Esta a explicação da nossa mudança de sentido de voto.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda,
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por explicar por que votámos contra a avocação no Plenário deste projecto de lei, pedida quer pelo. PS quer pelo CDS.
Fizemo-lo, em primeiro lugar, porque, em nosso entender, a discussão havida em comissão foi franca e aberta e, segundo suponho, extremamente exaustiva. Com efeito, todos os argumentos foram ali postos, e parece-me que nenhuns outros poderiam vir a ser aqui novamente aduzidos.
Por outro lado, entendemos que, tendo o início deste processo começado por um consenso entre partidos; mal seria que se viesse para o Plenário fazer uma discussão cerrada de todos ou de alguns destes dispositivos legais. Não será esta a amnistia que. entendemos melhor, mas é a possível.
Foi dentro deste espírito de consenso que sempre pretendemos dar o nosso contributo para esta amnistia. Talvez alguns dos pontos mais sensíveis tenham sido exactamente os três primeiros números do artigo 1.º deste diploma. Já se fizeram aqui referências contraditórias a estes números, já foi, portanto, defendido
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o diploma relativamente às ofensas corporais, difamações e injúrias, e o CDS acabou já de justificar uma das razões do seu voto contra, que, no entender do MDP/CDE, não tem justificação, pois aquela que foi dada agora vem ao arrepio de todo o consenso da Câmara, com a excepção única do CDS, que votou contra. E a verdade é que desde sempre tem sido tradição na nossa vida pública contemplar em todas as amnistias os crimes de ofensas corporais, injúrias e difamação.
Como já aqui foi dito, são crimes que não têm uma grande dignidade penal, são quase bagatelas penais - e refiro-me, pelo menos, àqueles que se encontram nestes três primeiros números -, que até são normalmente cometidos mais por espírito menos esclarecido do que com intuitos criminais.
Poderá dizer-se, talvez, que esta é uma das mais amplas amnistias jamais existentes, do ponto de vista dos crimes que abrange. De qualquer modo, houve o cuidado de mitigar o mais possível o limite de cada um desses crimes. Por isso nos parece que esta é uma amnistia equilibrada, que, além do elemento de medida de clemência, tem ainda, a nosso ver, uma importantíssima missão em relação ao problema, que todos conhecemos, dos tribunais e também, de certo modo, ao da superpopulação das nossas prisões.
Em resumo, entendemos que, apesar de tudo, é uma amnistia quase consensual e harmoniosa e, nessa medida, demos o nosso voto favorável.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Candal.
O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra para justificar o voto favorável do Partido Socialista. Pensamos que esta amnistia, apesar de alguma reserva que decorre da inclusão dos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 1.º no acto de clemência, merece a votação favorável do nosso partido. E merece-a, desde logo, porque o referencial deste acto de clemência é a eleição para a Presidência da República do Dr. Mário Soares, não pela eleição da pessoa em si, mas pela efeméride e pela maneira cívica e democraticamente evoluída com o sufrágio decorreu.
De todo o modo, esta amnistia - que é selectiva e moderada, que não põe em causa a segurança dos cidadãos e é a primeira «fabricada» pelo Parlamento -, introduzindo dispositivos inovadores e contemplando reservas cautelosas, fica um pouco distorcida, pois tem uma pecha que importa sublinhar e que é a amnistia de crimes de ofensas corporais voluntárias (embora de medida curta), de injúrias e difamação.
Não se trata, contra o que aqui foi dito, de bagatelas penais, de valores menores - e nisso apoio o que foi dito pelo deputado do CDS, Dr. Andrade Pereira. Realmente, o Estado é titular do direito de punir e pode descriminalizar. Porém, não pode, avulsamente, sem ter sentido o senso jurídico da comunidade, libertar de responsabilidade penal os agressores e os caluniadores, sobretudo porque isso constitui subalternização dos mais pequenos e dos mais pobres, que são, em via de regra, os ofendidos.
O Estado pode conceder perdões de pena na medida em que entender razoável para a segurança social e pode dispor até certo limite do património dos cidadãos. Mas onde prevalecer um certo sentido personalista da sociedade, o Estado não tem o direito, não deve - embora possa, como se vê - menosprezar e subalternizar a integridade física dos cidadãos, não pode menosprezar o direito à honra e à dignidade dos cidadãos, e foi isso que acabou por acontecer.
Na nossa sociedade, onde pervalece o sentido individual, ser-se agredido ou ser-se injuriado não é nem pode ser considerado bagatela jurídica.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Apesar de tudo, e pelas razões invocadas, o Partido Socialista entendeu votar globalmente a favor desta lei da amnistia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Vai ser lido um requerimento que deu entrada na Mesa, subscrito por deputados do PCP e do MDP/CDE e pelos deputados independentes Lopes Cardoso e Gonçalo Ribeiro Teles.
Foi lido. É o seguinte:
Ao abrigo das disposições regimentais, os deputados abaixo assinados requerem o prolongamento da presente reunião até à votação das matérias inscritas na ordem do dia.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, queria pedir a V. Ex.ª se poderia obter, da parte dos subscritores do requerimento, esclarecimentos sobre se esse pedido se faz com ou sem prejuízo do intervalo para jantar. Isto é, se a intenção é prolongar a sessão sem intervalo ou se se pretende fazer esse intervalo nos termos regimentais e depois prolongar a sessão.
O Sr. Presidente: - O requerimento não fala em intervalo; porém, se o Sr. Deputado João Amaral pretender dar algum esclarecimento, tem a palavra.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, suponho que, neste momento, deve votar-se o requerimento e essa questão esclarecer-se-á a seguir.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar. Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira e Silva.
O Sr. Oliveira e Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Lei n.º 11/82, de 2 de Junho, que instituiu o regime da criação e extinção das autarquias locais e a designação e determinação da categoria das povoações, consagrou, como se sabe, critérios profundamente dissemelhantes, ou mesmo antagónicos, para as freguesias e para os municípios.
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Enquanto que para as primeiras precisou, e quantificou os requisitos indispensáveis à sua criação, já a dos segundos ficou apenas submetida à disciplina do artigo 3.º, que se contenta com a enunciação genérica de algumas directivas que só em muito escassa medida condicionavam para cada caso concreto a liberdade de apreciação e decisão desta Assembleia.
Às razões que ditaram essa assimetria puseram em evidência o entendimento unânime de que o País não pode ser retalhado em circunscrições que, por carência de dimensão adequada no plano geográfico, económico, social, cultural é populacional, se mostrem incapazes de exercer as atribuições e competências que as autarquias, freguesias ou municípios são chamados a cumprir.
Mas, se a instituição e quantificação de diversos requisitos se mostrou, quanto às freguesias, o instrumento mais apropriado para assegurar à partida a viabilidade da autarquia a criar, concluiu-se, por outro lado, que essa não era a melhor orientação quanto aos municípios.
Em relação, a estes considerou-se que, o número incomparavelmente, mais reduzido de candidaturas então conhecidas à autonomia municipal, a par da diversidade das circunstâncias, em que se fundava, melhor se quadraria com uma ponderação cuidada de cada caso concreto do que com a submissão, de todos eles a uma moldura ou figurino, baseado em quantificações que seria difícil consensualmente estabelecer.
Foi esse o entendimento que prevaleceu nesta Assembleia e que por isso, presidiu à votação por unanimidade da Lei n.º 11/82.
Tanto o PS, como o PSD e o CDS vieram, posteriormente, na III Legislatura, a rever à sua atitude nesta matéria, optando por uma lei quadro que, pondo termo ao casuísmo instituído, estabelecesse critérios objectivos e quantificados para a criação de novos municípios. Assim nasceu a Lei n.º 142/85.
Não vamos aqui expor ou, rebater os argumentos que podem ser aduzidos a favor de um ou outro regime, que não têm necessariamente como pressuposto qualquer diferenciação de natureza ideológica ou política.
Continua, porém, a entender-se, que um conjunto de referências que, ultrapassando a generalidade do artigo 3.º, da Lei n.º 11/82, prescreva, objectivamente, algumas condições mínimas a satisfazer para a criação de um novo município, orientando como, quadro normativo inspirador a actuação desta Assembleia, terá vantagens incontestáveis sobre o mero casuísmo, sempre sujeito, pela pressão de conjunturas diversas, a uma disparidade de critérios e soluções e, por isso, fonte eventual, de injustiças, que, a consumarem-se, arrastarão o desprestígio da própria instituição parlamentar.
A mais disto, poderá ainda dizer-se que a fixação daquelas condições, mínimas de acesso à autonomia municipal, estatuídas numa lei quadro segundo critérios de razoabilidade generalizadamente reconhecidos, pode constituir um salutar factor de desencorajamento, de iniciativas legislativas que por não se enquadrarem naquele diploma, estejam de antemão votadas a completo naufrágio.
O que não é, da nossa parte, uma posição nova, pois já ao anunciar o voto do PS. na generalidade da Lei n.º 11/82, declarávamos expressamente que não concitava o nosso entusiasmo a assimetria de que enfermava o projecto, ao precisar e quantificar os requisitos indispensáveis à criação de freguesias e à elevação das povoações a vilas e cidades, pôr um lado, e ao libertar por outro, de todos esses condicionamentos os municípios, que ficavam apenas submetidos à disciplina genérica do artigo 3.º
E acrescentamos mesmo que, a optar-se pela estatuição de regime diversos, como se fez, a formulação de maiores exigências deveria então recair sobre a criação de novos municípios, já que entorno desta se concentram os interesses mais vastos, complexos e melindrosos.
A verdade é que não pôde ainda ser colhida qualquer experiência sobre as virtudes ou deméritos da Lei n.º 142/85, já que o n.º 4 do seu artigo 14.º, condicionando a sua aplicabilidade à prévia criação das regiões administrativas, despojou-a, até hoje, da mínima eficácia.
Ora, reconhece-se lealmente, que urge pôr termo a esta situação e, para isso apresentou o PS o projecto, que se está a discutir de revogação pura e simples daquele preceito.
Nele se pondera que, não se prevê, a curto prazo a. criação de regiões administrativas e que há exigências em matéria de autonomia municipal, cuja satisfação atempada não se compadece com a morosidade do processo' dá 'efectiva- regionalização do País.
O indiscutível fundamento deste acerto dispensa-nos, manifestamente, de analisar aqui a relevância desse nexo, que se pretendeu estabelecer na Lei n.º 142/85, entre a regionalização e a criação de novos municípios. O que fica dito é o bastante para concluir que o PS não votará o projecto de Lei n.º 95/IV, do Partido Comunista, que pretende revogar a Lei n.º 142/85, mas, pelo contrário, ao propor a revogação do seu artigo n.º 14.º, n.º 4, nos termos do projecto de lei n.º82/IV que apresentou, pretende justamente dotá-la da eficácia de que a vigência daquele preceito a tem, privado.
Se a pretensão do Partido Comunista se gorar e o projecto de lei do PS merecer a aprovação desta Assembleia, como tudo confiadamente se espera, irá, assim, finalmente, entrar em vigor o regime instituído pela Lei n.º 142/85 e à sua aplicação as diferentes propostas de autonomia municipal permitirá aferir da sua adequação às realidades que vai ser chamado a regular.
Não é, seguramente, uma obra perfeita e a experiência acabará por impor-lhe, sem dúvida, alterações e ajustamentos que o PS será o primeiro a encarar, como já agora o faz ao subscrever uma proposta de aditamento ao seu projecto de lei n.º 82/IV.
Com efeito impõe-se reconhecer, desde já, que os requisitos contemplados na Lei, n.º 142/85, ou quaisquer outros que em substituição deles se venham a consagrar no futuro, não devem assumir um valor absoluto.
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Concebidos para regularem a generalidade dos casos, admite-se que a sua observância seja afastada por ponderosas razões de natureza histórica e cultural, que poderão também impor que se abrevie ou altere tramitação processual estatuída na mesma lei.
E, se é certo que para alcançar esses objectivos não se imporia sequer votar qualquer preceito, uma vez que, constituindo a lei quadro uma mera lei ordinária, esta Assembleia é sempre livre de a revogar, no todo ou em parte, expressa ou tacitamente, pensamos que se deve aqui adoptar procedimento paralelo ao que foi seguido na Lei n.º 11/82 e que se encontra consagrado no seu artigo 14.º
Julgamos também que o regime consagrado no artigo 11.º da Lei n.º 142/85, ao prescrever, em caso de criação de um novo concelho, a obrigatoriedade de eleições intercalares para os órgãos de todos os municípios envolvidos, não é, com essa extensão, o que melhor conjuga a estabilidade administrativa com o respeito da vontade popular.
Eleições intercalares nos municípios de origem só devem ocorrer se a dedução dos votos dos eleitores, que vão constituir o novo município, modificar a correlação de forças entre os partidos políticos que se confrontaram nas anteriores eleições gerais.
Porque, se ela se mantiver, se subsistir a proporção dos mandatos ou se a alteração deles não modificar a ordem por que os partidos ficaram alinhados segundo o seu peso eleitoral, ou a natureza da maioria obtida pelo partido mais votado, será de afastar a eleição intercalar, por ser manifestamente de presumir que a composição dos órgãos municipais continua a corresponder à vontade dos eleitores.
Subscreveremos assim uma proposta de aditamento ao projecto de lei n.º 82/IV, que contemple estes dois aspectos, defendendo, pois, quanto ao primeiro deles, que razões excepcionais de natureza histórica e cultural podem justificar a alteração, nomeadamente dos requisitos e do processo previsto na Lei n.º 142/85, deste que a Assembleia da República assim o delibere.
De que resulta que esta lei quadro não deverá ser aplicada como uma bitola rígida, antes comportará excepções ou desvios que as circunstâncias imponham segundo o avisado critério desta Assembleia.
E cremos que há todas as razões para recusar os funestos pressentimentos dos que vivem no temor de que se subverta a organização administrativa vigente sob a avalanche da criação incontrolada de novos municípios.
Se ponderarmos que, ao cabo de uma dezena de anos de funcionamento, se consentiu apenas em criar um novo concelho o da Amadora, finalizamos a nossa intervenção com a certeza antecipada de que esta Assembleia, consciente e adulta como sempre mostrou ser, continuará sem tibiezas a fazer no futuro um uso prudente e responsável dos seus poderes.
Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Feu.
O Sr. António Feu (PRD): - Sr. Presidente Srs. Deputados: É de público conhecimento que os deputados do Partido Renovador Democrático não têm disciplina de voto.
Aliás, sempre essa liberdade foi por nós usada.
E quando convergimos nas mesmas posições, tal ficou a dever-se a um debate livre e em inteira liberdade de consciência e de opinião.
Em matérias de interesse regional e local ainda menos se compreende, naturalmente, a disciplina partidária.
Os estatutos do PRD sublinham a liberdade de voto - que é coisa diversa da objecção de consciência - no que se refere a todas as matérias de interesse regional e local.
Melhor conhece os problemas quem deles está mais próximo. E se todos somos deputados nacionais, é porque acima do interesse local ou partidário é o interesse do todo nacional que temos obrigação de privilegiar.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Não temos, portanto, nem devemos ter, como grupo parlamentar, um sentido de voto apurado, no que aos debates de hoje se refere. Mas isso não significa que como partido e grupo parlamentar não tenhamos sentido a obrigação de tomar posição sobre este mesmo debate.
Em primeiro lugar, para destacar o nosso entendimento em relação a um processo onde nunca fomos parte, em que nunca nos envolvemos, processo esse que consideramos de uma forma extremamente crítica.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - A democracia não se confunde com arruaça. A democracia não permite, nem consente, que aos seus mecanismos de reflexão e decisão se substituam a violência, a confrontação e as provas de força.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Em democracia fazem-se eleições. Escolhem-se representantes. Não se impedem escolhas nem se violentam consciências.
Aplausos do PRD.
O Orador: - Por isso, não apoiamos, nem apoiaremos, as formas de actuação escolhidas por algumas pessoas de Vizela, ou de qualquer outro local.
Vozes do PRD e do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Elas diminuem mesmo o respeito que nos merecem as convicções afirmadas e a firmeza e coerência de qualquer debate político.
No entanto, de igual modo, a democracia não se confunde com o eleitoralismo, o expediente, a manipulação, o abuso de confiança dos cidadãos.
Vozes do PRD: - Muito bem!
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O Orador: - A democracia não suporta a sua negação quotidiana, através da impunidade de quem promete e não cumpre, de quem se não responsabiliza pelo que afirma, quem nega hoje o que disse ontem e tenta com habilidade fugir ao confronto com a realidade e a verdade.
Aplausos do PRD e de alguns deputados do PSD.
O Orador: - Quando um ministro faz promessas à população de uma autarquia e não as cumpre, duas hipóteses são de admitir: ou tais promessas forma feitas com seriedade, o que o levaria a honradamente se demitir, outras não fez seriamente, e nessa política co-responsabilizou todos os seus parceiros do Governo.
... Aplausos do PRD e de alguns deputados do PSD.
A quebra de palavra de um governante é a quebra do prestígio das instituições democráticas.
Tal como condenamos as formas de actuação de alguns vizelenses, condenamos - se possível mais, porque terão maiores responsabilidades - todos os que ao longo este processo usaram as pessoas ao sabor das suas conveniências particulares ou eleitorais, esqueceram e negaram os seus compromissos e tudo procuraram enredar ou adiar em expedientes e pequenas habilidades.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs.. Deputados: A Assembleia da República debateu, pela primeira vez, em 11 de Março de 1982, um projecto de criação do concelho de Vizela - projecto de lei n.º 209/11 do PPM, que integrava a Aliança Democrática, então maioritária.
O PSD requereu, entretanto, a baixa à Comissão do mesmo projecto, através de um requerimento em que se diz, textualmente: «Devendo ser agendado, logo que existia legislação, em que se possa enquadrar a criação de autarquias municipais, no prazo que não deve exceder 60 dias.»
O Partido Socialista foi o primeiro a denunciar que tal atitude era dilatória e desprestigiava a Assembleia.
O PSD exigiu que aquilo a que chamou «processos de intenções», ficassem guardados pelos tais 60 dias.
Em 30 de Abril de 1982, a maioria AD saiu do hemiciclo para provocar a falta de quórum e impedir os trabalhos parlamentares.
E foi isto, os expedientes dilatórios quê se repetiram, até sem imaginação, ao longo dos anos e dos debates.
A chamada lei quadro entra neste processo como mais uma manobra. Não tem constitucionalmente valor diferente de outras leis e, por isso, a Assembleia pode mante-la e soberanamente decidir para além dos limites querela estabelece.
Inverteram-se mesmo as questões. A lei quadro surgiu por causa de Vizela.
Recordar tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, mesmo para quem, talvez especialmente para quem nada teve a ver com este processo, e democraticamente doloroso.
Para introduzir uma dimensão nova no debate, este conjunto de omissões da verdade e de fuga à frontalidade torna impossível, neste momento, chegar a soluções boas.
Há demasiadas feridas abertas e conflitos provocados.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Neste processo, entendemos dever repetir que nenhuma, solução é boa.
Nestes termos, cada deputado do PRD votará em consciência, como menos mal lhe parecer.
Devemos ter em conta, as expectativas criadas e as necessidades do ordenamento do território, que se não compadecem com o eleitoralismo demagógico dos que pretendem colher dividendos fáceis à custa do País.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Seria demasiado fácil poder dizer a quem criou o problema que o resolva.
Mas não se trata neste caso, e aqui, de dores alheias.
É a credibilidade democrática, a nossa capacidade de ultrapassar bairrismos exacerbados, a atenção e as exigências inadiáveis da regionalização, que também passam pelo resultados da votação a que chegarmos.
Aplausos do PRD e de alguns deputados do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira, para formular um pedido de esclarecimento.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Deputado António Feu, não lhe poria nenhuma questão visto que estamos a discutir a Lei Quadro dos Municípios e o Sr. Deputado só falou sobre o problema dos projectos que debateremos depois. Também não lhe faria outra observação que não fosse a de lhe ter faltado indicar uma solução; como seria conveniente depois de todas as críticas que fez. É sempre bom, quando se critica, acrescentar-se como se faria se se estivesse no lugar dos outros.
Porém, o Sr. Deputado pôs apenas duas hipóteses para explicar a atitude que o Ministro da Administração Interna poderia ter tomado e eu pergunto-lhe porque é que não pôs uma terceira hipótese, que é a de que o Ministro, quando partiu para Vizela, estivesse a interpretar a vontade do Governo.
Vozes do PSD: - Essa não! Essa é muito forte!
O Sr. Presidente: - Tem à palavra o Sr. Deputado António Feu, para responder, se assim o desejar.
O Sr. António Feu (PRD): - Sr. Deputado Eduardo Pereira, digo-lhe, com franqueza, que não imaginava, nem nunca me passou pela cabeça, essa possibilidade.
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Penso que se o Ministro da Administração Interna vai a Vizela e toma um determinado compromisso, fá-lo em nome do Governo e a única obrigação deste Ministro é cumprir a sua promessa. Se não a cumpre ...
Vozes do PSD: - Demite-se!
O Orador: - Portanto, o Ministro só tem duas soluções: ou tomou esse compromisso em nome do Governo ou não o tomou e, nesse caso, chega a Lisboa, o Governo diz que esse compromisso não pode ser assumido e o ministro demite-se.
Aplausos do PRD.
Sr. Eduardo Pereira (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Queria só dizer-lhe que a promessa que fiz foi cumprida de lado a lado, até uma determinada situação.
A minha promessa foi a de que se o povo de Vizela - que foi, penso eu, exageradamente criticado pelo Sr. Deputado ...
Risos do PRD.
... restabelecesse a via do diálogo, procedesse a eleições e preenchesse uma terceira condição, nós aceleraríamos o processo de Vizela.
O Governo accionou o processo de Vizela e o resultado final será o que resultar da Assembleia da República.
O Orador: - Sr. Deputado Eduardo Pereira, em primeiro lugar, quero dizer-lhe que julgo que da minha intervenção ninguém entendeu que era minha preocupação atacar o povo de Vizela. Pelo contrário, a minha intenção foi atacar todo um processo que é, para nós, profundamente incorrecto.
A realidade é que existe um compromisso. O compromisso foi que Vizela seria um concelho e, neste momento, Vizela não é concelho. Essa é a realidade.
É isso que nós, deputados do PRD, entendemos e nós não estamos de modo nenhum comprometidos neste processo, conhecemo-lo apenas por tê-lo acompanhado através da comunicação social e por termos lido as actas das discussões havidas aqui.
O que não há dúvida nenhuma é que Vizela, neste momento, não é concelho e as promessas foram feitas.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - A promessa não foi no sentido de Vizela ser concelho, foi no sentido de trazer esse problema até à Assembleia da República.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abreu Lima.
O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Abreu Lima, queira desculpar, é só um momento.
Faça favor, Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Presidente, peço para fazer uma interpelação à Mesa - sem prejuízo da intervenção do Sr. Deputado Abreu Lima - porque creio que chegou o momento de definirmos o prosseguimento dos trabalhos. Permitia-me sugerir que ouvíssemos a intervenção do Sr. Deputado Abreu Lima e, em seguida, interrompêssemos para jantar e retomássemos os trabalhos às 22 horas. Creio que era altura de assentarmos numa solução quanto ao modo como os trabalhos vão prosseguir.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, não lhe posso dar resposta conveniente. Estou a pretender cumprir o que foi deliberado pelo Plenário, em função do requerimento entregue na Mesa e que foi aceite, que diz que «ao abrigo das disposições regimentais, os abaixo assinados requerem o prolongamento da presente reunião até à votação das matérias escritas na ordem do dia».
Não vejo como hei-de conceder a interrupção, a não ser que seja entregue na Mesa outro requerimento e que o Plenário, porventura, venha a decidir noutro sentido, esclarecendo a sua posição.
Recordo até que o Sr. Deputado Gomes de Pinho pré» tendeu um esclarecimento a determinada altura, certamente para dar outra feição ao requerimento votado, mas não foi atendido.
O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Compreendo a necessidade do formalismo do requerimento, que o Sr. Presidente invoca. Então, se me permite, diria que o Sr. Presidente continuará com os trabalhos e, enquanto o Sr. Deputado Abreu Lima fizer a sua intervenção, eu providenciarei no sentido de apresentar junto da Mesa um requerimento pedindo a interrupção para o jantar. A menos que haja consenso e, então, talvez o Sr. Presidente pudesse dispensar essa formalidade.
Se o Sr. Presidente quiser ter a gentileza de perguntar à Câmara se há consenso para se interromper a sessão nas condições que propus, dispensar-se-ia o requerimento, isto se o Sr. Presidente aceitasse esta solução. Caso contrário, eu farei o requerimento de acordo com o Regimento.
O Sr. Presidente: - Vou procurar saber das bancadas se existe consenso para que se estabeleça um intervalo até às 22 horas, recomeçando os trabalhos a essa hora. Portanto, interrompíamos desde já, ficando o Sr. Deputado Abreu Lima com a palavra reservada.
Entretanto, quero pedir autorização ao Sr. Deputado Abreu Lima, no sentido de saber se acha bem esta proposta que estou a fazer, visto que V. Ex.ª ia fazer uso da palavra.
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O Sr. Abreu Lima (CDS):- Sr. Presidente, nada tenho a opor e acho, correcto o estabelecimento de um intervalo para o jantar. Portanto, se for conveniente que eu, em vez de falar agora, seja o primeiro a falar após o intervalo, também não ponho qualquer obstáculo a isso.
O Sr. Presidente: - - Sendo assim, e se não houver qualquer objecção por .parte dos representantes dos grupos parlamentares, procederemos agora à interrupção dos trabalhos, que recomeçarão às 22 horas.
Pausa.
Visto não haver qualquer objecção, estão interrompidos os trabalhos.
Eram 20 horas e 20 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 22 horas e 25 minutos.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abreu Lima.
O Sr. Abreu Lima (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A propósito dos projectos de lei n.º 82/IV e 95/IV, respectivamente do PS e do PCP, aquele propondo a revogação do n. º 4 do seu artigo 14.º, este propondo a revogação total do diploma legal que agora estamos aqui a discutir.
O CDS mantém hoje exactamente à mesma orientação que perfilhou quando apresentou e defendeu há Assembleia da República o seu projecto de lei n.º 216/III, que tinha por objectivo a institucionalização de uma lei quadro onde se definiam os princípios e os condicionalismos conducentes à criação de novos municípios.
Aquele projecto de lei, que, em Outubro de 1983, não mereceu vencimento na Assembleia da República, reflectia à preocupação do CDS de ver surgir neste país um número desmedido de municípios, numa altura e em circunstâncias que não nos permitiam saber que dimensão e que objectivos reais e concretos há-de ter a administração regional.
O ordenamento do território está, praticamente, por fazer. A grande maioria das câmaras municipais não dispõe do ordenamento dos seus concelhos e muito menos- de um plano director municipal que lhes possibilite conhecer e avaliar com rigor as necessidades locais, que lhes aponte soluções harmónicas e conjunturais e que alerte para a forma- como se devem inserir e dimensionar em função do todo nacional, que defina, as prioridades, que meça e coordene as actuações de diferentes naturezas na resolução, dos problemas locais, mas sempre na preocupação e no respeito dos interesses e dos problemas de âmbito nacional. A instituição, do poder regional é essencial e com a nossa entrada na Europa das regiões; mais sentida será a sua falta, mais urgente é a sua criação.
Constitui, a nosso ver, um erro ter em vigor uma lei quadro para a criação de municípios que permita uma proliferação de novos, concelhos, dando satisfação a anseios locais, que podem até ser muito justificados sentimentalmente e muito correctos sob o ponto de vista histórico-cultural, mas que podem não se coadunar e vir a constituir um forte factor negativo quando enquadrados numa nova organização administrativa, fruto das realidades e dos objectivos actuais do País, a que não podemos fugir e que, mais do que nunca, se aproxima com a nossa entrada na CEE.
É, fundamentalmente, por esta razão que votámos a favor da introdução do n.º 4 do artigo 14.º da Lei n.º 142/85, onde se estabelece que a «criação de novos municípios só poderá efectivar-se após a criação das regiões administrativas, nos termos dos artigos 250.º, 265.º e seguintes da Constituição»
Quando agora surgem, na Assembleia da Republica, os projectos de lei em apreço, propondo a revogação do n.º 4 do artigo 14.º daquele diploma legal, ou a sua revogação total, sem que a organização administrativa do País tenha sido modificada, é, pelos mesmos princípios e pélas mesmas razões que continuamos a defender que não podemos dar-lhe de novo o nosso voto favorável.
Referindo o que o meu colega, Prof. Vieira de Carvalho, disse nesta Assembleia da República aquando da discussão do projecto de lei do CDS, a criação de novos municípios implica, em consonância com a institucionalização do poder regional, um processo de reforma que deve conhecer, antes de tudo, clara e suficientemente os objectivos para onde caminha e as metas a atingir, sendo indispensável fixar toda. a filosofia subjacente à administração de todo o conjunto, de medidas inerentes a esse processo de reforma.
Nada disto existe: nem uma filosofia, nem os objectivos, nem as condições mínimas indispensáveis que gerem uma orientação de interesse nacional, à luz de uma regionalização indispensável e que ainda não temos.
Todas e quaisquer opções neste domínio carecem de profundo e adequado estudo justificativo e objectivado, assente numa filosofia de base suficientemente construída e clara; carecem de verdadeiro sentido de Estado e carecem ainda de oportunidade e de bom-senso. Oportunidade e bom senso que, se são importantes a todo o propósito e em todos os contextos, neste âmbito não podem revelar as mínimas sequelas, geradoras sempre de graves traumatismos, com as mais gravosas consequências.
Há valores sagrados que; em esferas diversas, têm de estar presentes na acção do Estado e significativamente condicioná-la. Valores relativamente aos quais o Estado verdadeiramente democrático terá de ter séria consciência dos seus limites.
O município é, inquestionavelmente, um deles. E quando se esquecem tais valores, insensivelmente que seja, pode cair-se no erro e no absurdo, mesmo quando se apregoa intencionalidade diversa.
Sem que no decurso do último ano - a Lei n. º 142/85 foi votada nesta Assembleia em 29 de Maio do ano findo e publicada em Outubro do mesmo ano - tivessem sido modificados o condicionalismo e as razões que ditaram o n.º 4 do artigo 14.º, cuja revo-
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gação agora se propõe, antes pelo contrário, entramos na CEE e participamos nas suas organizações e beneficiamos dos seus fundos, nomeadamente do FEDER, razões aquelas que, em Outubro de 1983, mais ampla e substancialmente foram expostas e invocadas pelo meu partido na discussão do seu projecto de lei n.º 216/III, levam-nos a dar o nosso voto negativo à alteração da Lei n.º 142/85.
Aplausos do CDS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Roleira Marinho.
O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Teve a Lei Quadro de Criação de Municípios (Lei n.º 142/85) uma longa tramitação nesta Assembleia, e, durante esse tempo, foi possível confrontar as diversas opções que se colocavam, e, maduramente, reflectidamente, decidir pela melhor solução, tendo em conta os maiores interesses das populações e do País.
A maior parte das normas contidas na Lei Quadro foram aprovadas por uma alargada maioria desta Assembleia e, por isso, estranhamos agora tão despropositado projecto de lei, - projecto de lei n.º 82/IV - que procura retirar toda a filosofia que esteve na origem da feitura da Lei Quadro, já não estranhando, porém, a proposta da sua revogação, dado que do quadrante político donde emana sempre nos habituámos aos radicalismos, que entroncam numa perspectiva política de quanto maior divisionismo, maior campo de manobra para a agitação pretendida.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É, na realidade, estranho que se argumente agora, ao contrário do que se argumentava há um ano atrás, que o que então era bom, era justo, era racional, era desejável, hoje é mau, é injusto, é incompreensível, é abominável.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas, Sr. Presidente, Srs. Deputados, será que esta Assembleia não tem, em termos gerais, uma composição ideológica próxima da Assembleia anterior? Não foram os preceitos então apresentados e aprovados também por aqueles que agora se apresentam a querer revogá-los, mesmo antes da sua aplicação? Que coerência afinal, que comportamento político é este que obedece, diria exclusivamente, a situações conjunturais e não privilegia, como seria lógico, a estabilidade e o interesse geral?
Como entender, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, quando da discussão da Lei Quadro da Criação de Municípios, o deputado mais responsável da área do poder local, do Partido Socialista - hoje deputado da mesma bancada - começasse uma das suas intervenções com estas palavras:
Quero, naturalmente, dizer que o PS está de acordo com esta lei quadro, porque acha que é uma condição sine qua non para a criação de futuros municípios.
E ainda, um outro Sr. Deputado do Partido Socialista, dirigente da bancada - hoje também dirigente da bancada - em declaração de voto final, dizia:
Votamos favoravelmente esta lei porque ela vai acelerar o processo de regionalização, que consigo arrastará, naturalmente, a mais desejada descentralização do poder.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, lemos, num jornal diário de há dias, frases e conceitos como estes:
Caminhar para a construção da grande comunidade, já que dos pequenos não reza a história, ou reza cada vez menos, a economia, a cultura, as finanças, a saúde, todos os sectores da vida dos povos começam a ser medidos à escala nacional e continental, acabaram os senhores de pendão e caldeira no termo desta vila e daquela cidade?
Será o seu autor alguém que vive longe da problemática que hoje aqui debatemos? Alguém que nada tem a ver com os projectos de lei em apreço?
Respondo que não, Srs. Deputados. É alguém que apõe o seu nome, como autor, numa das iniciativas que contraria. frontalmente as teses defendidas.
Por aqui podemos concluir que a coerência do PS não é aquela que o Sr. Deputado Oliveira Silva nos pretendeu inculcar há pouco.
O Partido Social-Democrata mantém a sua posição anterior, porque continua a pensar que deve haver uma lógica, uma metodologia razoável entre o processo de regionalização e o recorte municipal do território, aliás pressuposto que sempre defendemos, na defesa da rentabilidade dos investimentos e na mais clara opção do planeamento em áreas de significativas afinidades geográficas ou culturais.
É certo que nunca deixarão de verificar-se conflitos, propósitos divergentes, em qualquer situação de ruptura com a realidade existente. Mas, devemos ter presente que, ao imediatismo do interesse particular e localizado, devemos contrapor o interesse da comunidade, e, sopesando sempre o rigor da análise e até levando em conta a justeza das pretensões de minorias, devemos ter o bom senso e a capacidade de discernir entre a demagógica mobilização política e a serena responsabilidade legislativa, sem arvorarmos em arautos de forças em contenda, que mais não pretendem do que a recolha dos favores do voto, independentemente do alinhamento sério daquilo que a consciência nos dita. Por isso, também a responsável tomada de posição do PSD, reafirmando que nada temos contra as populações, que nos preocupa o desenvolvimento harmonioso do todo nacional e porque o desenvolvimento é algo diferente e mais amplo que o crescimento, e este não pode ser entendido isolado ou descontrolado, mas como instrumento ao serviço do desenvolvimento, que, logicamente, abarca as comunidades próximas ou, pelo menos, aquelas que se encontram mais próximas. E serão talvez essas gentes - aquelas que hoje mais abertamente clamam por uma autonomia que interpretam como «carta de alforria» - aquelas que amanhã responsabilizarão o legislador de hoje por deixar-se embalar no grito do Ipiranga, que levaria ao legado de um património menos rico e perspectivas desenvolvimentistas ainda mais negras do que as que dispomos no presente, às gerações vindouras.
A divisão municipal, a região, as regiões, são interdependentes.
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- Cada uma aspira a mais e melhor e não está, na sua matriz actual, em condições de divisões anárquicas e ocasionais.
Temos de saber, com ponderação, com estudo sério, com humildade, com transigências, é certo, com diálogo, mas numa perspectiva nacional, do interesse dos Portugueses, de todos os portugueses ir ao encontro também dos que, num espírito bairrista, mas num espírito de construção colectiva de uma sociedade mais justa, aspiram à sua participação na via autonómica municipal e regional.
Estamos com eles, mas saibamos assumir tal projecto no abraço nacional, com realismo e na oportunidade que uma autêntica reforma da administração local e regional nos apontar.
Aplausos do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos; neste momento, confrontados: com dois projectos de lei - o projecto de lei do PS, para a revogação n.º 4 do artigo 14.º da lei quadro dos municípios, e o projecto de lei do PCP; que propõe a revogação da Lei n.º 142/85, de 18 de Novembro.
O MDP/CDE, coerentemente com as posições que sempre tem tomado nesta Assembleia acerca desta matéria; designadamente aquando da feitura extremamente difícil, diria mesmo rocambolesca, desta Lei n.º 142/85... Os senhores deputados que intervieram na feitura da lei, em sede da respectiva Comissão para lamentar, recordar-se-ão como mudavam constantemente as posições de alguns partidos, designadamente do PSD, que um dia trazia umas propostas subscritas por alguns senhores deputados, e no dia seguinte trazia outras propostas completamente diferentes, subscritas por outros senhores deputados.
A verdade é que a Lei n.º 142/85 só formalmente é uma lei quadro da criação de municípios. Esta lei quadro, ou pretensa lei quadro, foi feita no intuito exclusivo de ser uma lei travão para a criação de qualquer município, designadamente para a criação do município de Vizela.
Quanto ao n.º 4 do artigo 14.º da presente lei, todos se recordarão das circunstâncias em que ele apareceu; isto é, no último momento, como última tábua de salvação para vários compromissos tomados por alguns partidos para com a população de Vizela e para, de uma forma enviesada, se desculparem da não votação do concelho de Vizela nessa altura. Em suma, foi um dos espectáculos mais lamentáveis que houve nesta Câmara.
Por isso, não podia deixar de prestar aqui homenagem ao Sr. Deputado Agostinho Domingues pela intervenção que fez, a qual revela uma certa coragem política. Isto porque se absteve na votação desse n.º 4, sendo hoje o primeiro ou o segundo proponente do projecto de lei de revogação do n.º 4 do artigo 14.º da lei quadro da criação de municípios.
Entendemos que a criação de municípios necessita de um mínimo suporte legal; só que não é pela Lei n.º 142/85 que se poderá pautar a feitura de novos municípios. Isto porque, como disse há pouco, esta lei surgiu de várias pressões, de vários lobbies, quer económicos, quer autárquicos, quer políticos, quer partidários, e não teve como preocupação aquilo que deve presidir à feitura de uma lei geral e abstracta, isto é, uma visão nacional e não uma visão localizada, quer no espaço quer no interesse da criação dos municípios.
Porque assim é, emendemos que esta lei, da forma como está elaborada, não serve, sendo que, nessa medida, estamos de acordo com a sua revogação, designadamente com a revogação do n.º 4 do seu artigo 14.º e mesmo de toda a lei.
O artigo 3.º da Lei n.º 11/82 tem os princípios mínimos, parece-nos, em que pode e deve assentar a criação dos municípios.
Dir-me-ão que são poucos e que dão demasiada elasticidade. Estamos de acordo com isso, mas a verdade é que essa lei poderá ser preferível, apesar de ter tão pouca regulamentação, enquanto se não fizer uma lei quadro como deve ser feita, isto é, tendo em atenção que a lei deve ser abstracta e não estar puramente preocupada com um, dois, três ou quatro casos concretos. Isto porque sabemos que também não é só o caso de Vizela que está em causa. É certo que o que está hoje aqui subjacente é o caso de Vizela. Porém, todos os senhores deputados .sabem que outros casos há que estão dependentes do modo de resolução deste.
Portanto, há necessidade de uma lei quadro, mas a verdade é que esta não serve, pelas razões da sua génese e pelas razões objectivas que invoquei: Em primeiro lugar, porque não foi feita como lei quadro de criação de municípios, mas contra a pretensão exclusiva de um município de Vizela - e, em segundo lugar, porque não dá possibilidade de a Assembleia escolher livremente. Com efeito, a maior parte dos critérios só podem ser carreados através de departamentos governamentais, que podem, por motivos puramente técnicos, vir a precludir a vontade política desta Assembleia.
Nesta medida, o MDP/CDE entende dever votar favoravelmente os projectos de lei em apreço para assim poder abrir o caminho para a criação do município de Vizela.
Aplausos do MDP/CDE e do, PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, devo informar que o CDS me cedeu algum tempo de que dispõe, pelo que agradeço ao CDS.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A actual lei quadro da criação de municípios é bem a gota de água onde se reflecte uma das maiores incapacidades renovadoras do regime saído do 25 de Abril.
A actual organização administrativa local e regional tem um século e meio. Ela foi a resposta de um novo poder político às novas realidades e exigências do país de então. Entretanto, o País fez-se outro, mesmo durante o último meio século de ditadura.
Mas é outra a resposta do novo poder político? Não o tem sido. O Partido Comunista joga na exploração do mero bairrismo das populações, na desagregação do Estado, no fraccionamento da administração, sem cuidar, antes pelo contrário, se caminhamos para o progresso ou se para o agravamento da nossa pobreza e atrasos crónicos.
Vozes do PCP: - É falso!
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O Orador: - Os socialistas, como se vê, seguem-lhe os passos.
Quanto aos renovadores, o que posso desejar é que tão santo nome não seja em vão.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Deixe-se de marmelada!
O Orador: - Tem sido o PSD, apesar das suas várias vacilações conjunturais, o partido que se tem batido continuadamente pela construção de uma perspectiva positiva e correcta, ao menos minimamente correcta, de reforma da administração local e regional. É graças fundamentalmente a ele e também ao CDS que existe, aliás, uma Lei Quadro da Criação de Municípios, a qual ligou, e muito justificadamente, a criação de municípios à questão da regionalização, como garantia de não resvalamento para um imparável bairrismo estreitamente particularista e fragmentador.
Mas a própria lei quadro está longe de ter a natureza e a força de uma verdadeira reforma. Ela apenas encara a criação de novos municípios -o que hoje é sobejamente justificado, justo e necessário -, sem ousar, porém, tocar na outra vertente da questão: a da extinção ou, pelo menos, fusão de municípios.
Em 1500, os forais manuelinos foram a expressão do Portugal moderno, saído dos Descobrimentos e da afirmação do Estado. Quase três séculos e meio depois, em Portugal, como de resto na maior parte dos países europeus, a reforma do liberalismo veio lançar as bases da administração local e regional, que ainda hoje possuímos.
Na Europa, entretanto, o período posterior à última grande guerra trouxe uma nova vaga de reformas, respondendo à explosão urbana, à desertificação da agricultura e das zonas rurais e à necessidade da prestação de cada vez mais numerosos caros e eficazes serviços às populações e, simultaneamente, preservar o quadro de uma democracia preser..., aliás, participativa.
Risos do PCP.
É bem necessário preservar a democracia, sobretudo das vossas investidas destruidoras.
Na Suécia, nos anos 50, as comunas passam de 2281 para 279, tendo a reforma agrupado uma média de 2 a 5 comunas, havendo casos de 10 a 12 e mesmo de 18. A sua população média passou de 2800 habitantes, em 1940, para 30 000 habitantes, hoje. Na Alemanha, a partir dos anos 60, as comunas passaram de 24 386 para 8501; na Bélgica, também nos anos 60, de 2586 para 589; na Dinamarca, com a reforma de 1974, de 1299 para 275.
Todas estas reformas e outras, dada a sua decisiva importância, a sua grandeza, profundidade e complexidade, foram laboriosamente preparadas, em anos de intenso trabalho, por comissões governamentais constituídas por personalidades de reconhecido mérito. E mesmo, como foi o caso da Alemanha, por comissões de meros cidadãos ou instituições ligados à administração local.
Muitas vezes, as reformas tiverem um desenvolvimento e uma concretização voluntaristas, por simples adesão à fusão em agrupamentos maiores. Mas também se viu a reforma assumir com frequência a natureza obrigatória e imperativa, como foi o caso da Suécia, em 1973, onde a governação social-democrática operou uma das mais, senão a mais profunda das reformas europeias.
Mas também as grandes reformas portuguesas do passado foram fruto não de rasgos expeditos de trabalhos atabalhoados de umas tardes ou noites de suor cerebral dos nossos «doutores» ou sapientes tecnocratas, mas sim de anos de trabalhos intensos, tão humildes quanto persistentes. A reforma de 1836 pôde utilizar os trabalhos preparatórios e as propostas concretas de estudiosos, elaboradas desde 1822, ou seja, catorze anos, como humildemente o refere, no seu relatório, a própria comissão de nomeação governamental encarregada de produzir o projecto final.
São, pois, evidentes, sérias e fortes, de índole verdadeiramente reformadora e nacional, as razões que levarão o PSD a votar contra a alteração da actual Lei Quadro da Criação de Municípios, porque recusa um caminho errado, funesto para o futuro do País, de mera fragmentação e irracionalidade da administração local e regional.
O PSD não quer construir o passado, empurrar o País para trás; o PSD quer construir o futuro, um país de progresso e de melhorias nas condições de vida reais das populações, com uma administração local e regional que assegure, inseparavelmente, uma Administração que garanta a participação dos cidadãos, a identidade das comunidades, a eficácia e aumento dos serviços prestado ao País e às populações.
Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Devemos, porém, seguir os bons exemplos do nosso passado (e mesmo os do presente, embora noutros domínios: o projecto de reforma do Código de Processo Penal, que ainda hoje aqui se discutiu, resultou de mais de dois anos de trabalhos intensos de uma prestigiada comissão, nomeada pelo Governo, em 1983), assim como os bons exemplos dos países europeus.
Por isso, urge que seja constituída uma comissão credível que proceda, quanto antes, aos necessários trabalhos preparatórios e projecto de uma verdadeira reforma da administração local e regional e, nomeadamente, do ordenamento administrativo do País.
Aplausos do PSD e de alguns deputados do CDS.
Já na anterior legislatura, à falta da iniciativa governamental, que nos parece mais adequada para o efeito, apresentámos um projecto de lei com tal finalidade. Mas estamos certos de que o actual governo não deixará de o fazer, demonstrando também nesta tão importante questão, e uma vez mais, a sua verdadeira capacidade de governo de mudança efectiva, governo verdadeiramente reformador, capaz de formular, com clareza, frontalidade e globalidade, os grandes problemas nacionais e as respostas que o futuro de Portugal e dos Portugueses ansiosamente esperam e exigem.
Aplausos do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate.
Pergunto se vêem alguma objecção a que se proceda, desde já, à votação, ou se ela terá lugar na próxima terça-feira, às 18 horas, tal como o Regimento impõe.
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O Sr. António Capucho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, não dou consenso a que se proceda neste momento à votação. No entanto, não me opondo a que a Mesa, com o consenso dos grupos parlamentares; adie a votação, tal Como é regimental, para amanhã e não necessariamente para a próxima terça-feira, assim como também não vejo inconveniente a que se proceda hoje à votação, a uma hora pré-fixada por exemplo: às 24 horas, à l hora ou quando V. Ex.ª entender de qualquer modo, não dou consenso a que se vote agora de supetão.
Q Sr. Presidente: - Sr. Deputado, só posso pôr esta matéria à votação ou nos termos do Regimento que, no seu artigo 101.º, n.º 4, determina que a votação terá, lugar pelas 18 horas - e assim: ter-se-ia de aguardar até à próxima terça-feira -, ou então, segundo a proposta que o Sr. Deputado António Capucho; fez eu teria de obter, consenso imediato dos representantes dos grupos parlamentares para porventura, às 24 horas procedermos à votação.
Pergunto: há alguma objecção?
Pausa.
Vou tomar o silêncio da Câmara como aceitação da proposta que fiz, pelo que às 24 horas proceder-se-á à votação dos diplomas sobre a criação de municípios.
Srs. Deputados, vamos entrar na discussão conjunta na generalidade dos projectos de lei n.ºs 81/1V, apresentado pelo Sr. Deputado Independente. Lopes Cardoso, 83/IV, apresentado pelo Sr. Deputado Independente Ribeiro Teles, e 98/IV, apresentado pelo PCP, sobre a criação do município de Vizela.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr, Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, aceitamos entrar na discussão dos diplomas, atrás referidos; contudo, deve ficar claro que rejeitamos, de todo em todo e liminarmente, a possibilidade de se votarem esses diplomas. Admitimos que possa ter algum sentido prático a sua discussão, no pressuposto - se isso vier a acontecer - da eliminação do n.º. 4 do artigo 14.º da actual Lei Quadro da Criação dos Municípios; caso contrário há que aplicar essa lei na sua formulação actual, o que significa que os projectos concretos de criação de municípios não podem ter lugar sem a respectiva tramitação.
O Sr. João Amaral (PCP): - Isso é o que se verá!
O Sr. Presidente:- Penso que, não temos outro meio senão esse: primeiro, teremos de votar os diplomas apresentados sobre a Lei Quadro da Criação dos Municípios, e só na sequência do resultado da votação deste diploma é que podemos ou não tirar o proveito da discussão que vamos iniciar.
O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (Indep.):- Sr. Presidente, peço a palavra para dizer que, do meu ponto de vista, nada impede que a Assembleia vote, se assim o entender, os projectos de lei que agora vão ser submetidos à apreciação. Não vale a pena adiantar-me em grandes considerações; basta este facto simples: a Assembleia é, sempre soberana para aprovar estes projectos de lei, ainda que não alterem a lei quadro, pelo que a Assembleia, independentemente da alteração dessa lei, pode aprovar, os diplomas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E o PSD não pode opor-se a essa votação. Regimentalmente, o que o PSD pode é, no termo do debate ou quando entender oportuno, apresentar um requerimento tendo em vista, a baixa à Comissão destes projectos de lei e, nessa altura, o Plenário decidirá sobre ele. Mas nenhum grupo parlamentar, depois de agendada esta matéria, pode opor-se a que o debate se conclua no quadro regimental.
Portanto, Sr. Presidente, o caminho a seguir é este: iniciamos o debate e depois logo se verá aquilo que, em, relação, a ele, Plenário, no seu conjunto, vier a decidir.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Silva Marques (PSD):- Sr. Presidente, para que as coisas fiquem claras, não temos de aceitar à sugestão do Sr. Deputado Lopes Cardoso que é, aliás muito razoável - de requerer a baixa á Comissão dos diplomas.
Há questões, prévias, relativamente aos projectos de criação concreta de municípios, que nós colocamos e de que não abdicamos e no momento próprio agiremos em conformidade.
Sr. Presidente:.- Penso que o assunto não deve merecer mais considerações, pelo que vamos entrar na discussão dos diplomas:
O Sr. João Amaral (PCP); - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, é para sob a forma de interpelação, dizer que, embora pese o feitio preservativo que hoje o Sr. Deputado Silva Marques tem assumido neste debate, o facto é que a matéria está agendada sem nenhuma relação de hierarquia ou de dependência, e essa relação hierárquica, de dependência não pode ser assumida pela Assembleia, que é soberania e decidirá como quiser e entender, no momento exacto.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
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O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Presidente, concede-me a palavra para que se inicie o debate dos projectos de lei?
O Sr. Presidente: - Exacto, Sr. Deputado, é a primeira intervenção.
O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece aproximar-se do seu termo o longo debate que, por etapas sucessivas, tem vindo a desenrolar-se na Assembleia da República em torno da criação do município de Vizela.
Longo debate parlamentar que tem sido o aflorar nesta instância - a quem cabe a decisão última - da luta persistente e tenaz dos Vizelenses em favor do seu concelho; luta travada contra ventos e marés, contra o arrastar das burocracias, contra os interesses de uns e os temores de outros que, no decurso do tempo, se foram conjugando para manter a indecisão que não serve ninguém e a ninguém contenta.
Não é a primeira vez, no decorrer dos múltiplos debates que nos últimos anos pontuaram este lento processo, que tenho a oportunidade de manifestar o meu apoio à população de Vizela.
E devo dizer que, se esse apoio é da primeira hora em que como deputado fui chamado a pronunciar-me, em nenhum momento foi determinante da minha posição o facto de o município de Vizela corresponder a necessidades concretas das populações directamente interessadas, cujo quotidiano será, porventura, simplificado na comezinha e arreliadora burocracia de que também é feito, ou o facto de se tratar de uma unidade territorial onde as estruturas produtivas melhor se enquadrarão num todo com características de viabilidade diferenciadas em relação ao espaço autárquico em que actualmente se integram.
Tais factores, seguramente importantes, certamente reais, não bastariam, por si só e do meu ponto de vista, para imporem a criação do município de Vizela; para o imporem como algo de inelutável, algo que pode ir sendo protelado, mas algo que mais cedo ou mais tarde - e esperemos que mais cedo do que tarde - se tornará uma realidade.
Como não bastariam, por si só, as razões históricas, reais e autênticas que os Vizelenses invocam para inaugurarem os Paços do Concelho há tantos anos vazios, esperando os homens que tornarão viva essa casa, que transformarão os muros que hoje são história em paredes cobertas com os sinais da actividade e da participação das suas gentes na organização do seu dever colectivo.
A razão última que presidiu à posição que sempre foi a minha - traduzida no projecto de lei que aqui vos trago - é outra e, a meu ver, mais funda: é a de que não se pode, não se deve, governar contra a vontade das populações e, sobretudo, quando essa vontade se manifesta com a determinação e a tenacidade que tem sido a mais característica da luta do povo de Vizela pelo seu concelho. E não tem isto a ver só com o coração; tem a ver com a razão: a modernização e o desenvolvimento do País exigem um esforço colectivo, esforço que tem de ser eficaz, razoável e pensado, mas que só o será se for também sentido e levado a cabo com alegria e - porque não dizê-lo - com amor.
Descentralizar, regionalizar e, ao fim e ao resto, democratizar a decisão política perde este seu sentido último e fundamental se resultar de uma mera reestruturação administrativa, ditada de um qualquer Terreiro do Paço, onde ao esquadro e à régua da tecnocracia se sacrifique a vontade e o sentir das populações.
O estudo, a técnica, a planificação, são obviamente necessários, mas não chegam e não servem se não servirem os homens a que se destinam e se não puderem servir-se das suas capacidades, aproveitando o seu dinamismo, a sua força e a sua iniciativa.
Definidas as condições objectivas que determinam as estruturas regionais, há que conjugar essa matriz com outra, menos fácil de estabelecer, menos integrável em modelos por muito sofisticados que sejam e que diz respeito aos sentimentos e ao assentimento dos homens, para darem o seu entusiasmo, para se darem, para juntos assumirem o risco de as pôr de pé, para enfim/participarem na organização da vida da colectividade.
Há os que perante a vontade insofismável das populações tenderão a bater-se pelo primado dos índices, dos coeficientes, dos modelos pretensamente neutros e imparciais; pela minha parte, fiel, porventura, àquele mínimo de utopia que dá sentido à vida, teimarei em pensar que, para além do frio dos números, há o calor dos homens e que as construções teóricas só ganham vida quando encontram eco no sentir das gentes.
Foi esse o meu entendimento ao apoiar a luta dos Vizelenses.
É esse o meu entendimento hoje, quando parece aproximar-se o momento em que vão ver concretizado o que sonharam e vão poder dar corpo a uma autarquia que têm o direito, mais do que isso, que têm o dever de tornar mais viva, de tornar mais capaz de ser um exemplo, como um exemplo tem sido o empenhamento, a persistência e a energia que puseram na sua longa luta.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se não estivesse por de mais habituado a conhecer a distância que tantas vezes separa as petições de princípio dos actos concretos, os discursos e as proclamações da prática que os contradiz, atrever-me-ia a pensar que o reconhecimento do concelho de Vizela seria apenas questão de uma mão-cheia de minutos.
Na verdade, não é fácil imaginar que aqueles que se proclamam os arautos, os defensores intransigentes de uma democracia participada, tendo por suporte o sentir e a vontade inequívoca das populações, os defensores de um poder autárquico autêntico porque autenticamente participado e porque nele se revêem aqueles a quem deve servir, possam votar contra a criação do concelho de Vizela.
Como menos ainda se poderá entender que quem não cessa de invocar a ética como razão última da sua acção política e se não cansa de reclamar dos políticos em geral e dos deputados em particular atitudes claras, posições inequívocas respostas sem ambiguidades, possa vir a escudar-se no lavar de mãos da abstenção para se eximir a uma tomada de posição responsável assumida com a coragem e a frontalidade que todos os dias reclamam.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Muito bem!
O Orador: - Se tal acontecer - e quero acreditar que tal não acontecerá -, não terá porventura, sido ainda desta vez criado o concelho de Vizela, mas ficar-nos-á -como prémio de consolação- a certeza de que de algum modo se terá avançado na clarificação
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da vida política porque se terá avançado no caminho da desmontagem dos mitos que não resistem à prova dos factos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República, votando favoravelmente a criação do município de Vizela, fará mais do que, simplesmente, criar uma nova autarquia. Irá, na sua acepção mais rica e mais profunda, fazer democracia: porque fazer democracia é, antes de tudo, respeitar a vontade das populações.
Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Pára formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, creio que democracia é muito mais do que aquilo que o Sr. Deputado disse. Democracia é o respeito pela identidade das populações, sem dúvida, mas é também fornecer ao País um quadro de administração que responda às novas realidades e às novas exigências, que assegure ao todo nacional um futuro de mais progresso e de melhores condições de vida. Porque, Sr. Deputado, se não tivermos em conta esta vertente também decisiva da democracia, o povo' português nunca compreenderá a sua necessidade.
Por isso, não desligue a questão da democracia dos seus resultados concretos, das condições de vida concretas da população portuguesa.
Se democracia, em vez de mais progresso, de mais justiça, de melhores condições de vida e de saúde, de mais escolas, de mais repouso, de melhores vias de comunicação, trouxer mais miséria e mais pobreza à população portuguesa, então só alguns privilegiados, alguns nababos da situação, baterão palmas à democracia! A generalidade do povo português não lhe baterá palmas e virar-lhe-á as costas.
De qualquer forma, queria colocar-lhe algumas questões.
Se o Sr. Deputado apoia Vizela, então porque não apoia outros casos, outras aspirações claramente expressas pelas populações? Ou será que privilegia aspectos mais veementes de expressão? Porque não apoia Taipas? Porque não apoia Canas de Senhorim?
Risos.
Porque não apoia Ericeira, Samora Correia, etc.?
Sr. Deputado, sabe perfeitamente que vivemos hoje da reforma de 1836 feita por alguém insuspeito - Passos Manuel. Hoje, algumas das melhores coisas que nós temos no País vieram dele, inclusivamente a reforma do ensino.
Ora bem, ele extinguiu e criou municípios e é isso que caracteriza uma reforma, é a capacidade de dar expressão ao novo e de extinguir o velho e o que já não tem justificação. Ele extinguiu precisamente 498 municípios e criou 21, colocou o seu número em 351 relativamente aos 826 que existiam anteriormente.
Ora, Sr. Deputado, então qual é o seu critério de selecção? Porque e que o seu projecto de lei apenas tutela e contempla o caso de Vizela?
Sejamos coerentes! Dêmos uma resposta continuada a essa posição de princípio!
Outro aspecto, Sr. Deputado: hoje, no nosso país, há 93 com grande aglomerado populacional, e em 36 casos ela é mesmo superior às sedes respectivas do concelho. Isto não lhe diz nada? Não lhe diz que há que criar o novo porque é novo, não tendo os olhos no passado?
O Sr., António Capucho (PSD): - Muito Bem!
O Orador: - É este o problema da reforma. Mas a reforma irá por esse caminho que o Sr. Deputado nos aponta.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Deputado Silva Marques, começaria por lhe dizer que me fez uma pergunta que não lhe posso fazer a si, infelizmente, que é se a reforma vai pelo meu caminho. Não lhe posso dizer por que caminho vai a sua reforma, pois o Sr. Deputado não me aponta caminho nenhum.
Por outro lado, devo dizer que se Passos Manuel assumiu, na sua altura, posições progressistas, o Sr. Deputado, ao defender hoje Passos Manuel, está a renegar a herança que ele nos deixou dessa atitude progressista face à sociedade portuguesa, porque defender hoje a reforma de Passos Manuel é ser conservador.
Aliás, é o seu destino!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: -, O destino da direita é sempre conservar as conquistas da esquerda quando esta as aprofunda ou as ultrapassa. Está, pois, no seu papel, Sr. Deputado.
Protestos do PSD.
Quanto à questão que me colocou, é evidente, Sr. Deputado, que a democracia não se esgota no reconhecimento da vontade das populações, mas não há democracia sem o reconhecimento dessa vontade. Há, de facto, os que acreditam em que é possível fazer a felicidade das gentes contra a própria vontade dessas gentes e em nome disso tentam impor a sua vontade.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O que lhe digo, Sr. Deputado, é que, no meu entender, não há progresso de nenhuma ordem se ele não assentar no respeito pela vontade das populações. Portanto, a pedra de toque final da democracia é exactamente o respeito pela vontade dessas populações.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Se não defendo outras reivindicações nesta matéria tão justas quanto o é a reivindicação dos Vizelenses, é porque as desconheço. Porém, seguramente que há medida que delas tenha conhecimento com detalhe e me aperceba da sua justeza, não deixarei de as defender com a mesma veemência com que tenho defendido e defendo a elevação de Vizela a concelho.
Agora, o que para mim é claro, ou melhor, o que para mim é fácil de entender sob um determinado ponto de vista mas é difícil de entender sob outro ponto de vista,
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é que quem se reinvindica do poder local - e o poder local e a autarquia local, em meu entender, só têm sentido quando correspondem a muito mais que índices ou a números, quando correspondem a um sentimento real das populações - possa, em nome de construções teóricas (que ainda por cima afirma, mas nem sequer contribui para que se criem), recusar a construção dessas autarquias quando elas correspondem de forma inequívoca ao sentir e à vontade dessas populações.
Há aqui uma contradição de fundo a que dificilmente o Sr. Deputado - como os outros que teoricamente se reinvindicam do poder local e na prática negam aquilo que deve ser a essência desse poder local - conseguirá escapar.
O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Isso é metodologia!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ribeiro Teles.
O Sr. Ribeiro Teles (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em seguimento da iniciativa legislativa do PPM de 1981, apresentamos de novo a esta Assembleia um projecto de lei que retoma a criação do concelho de Vizela.
Fazemo-lo convencidos de que estamos a dar um importante passo em frente no processo de regionalização, na necessária descentralização do nosso país, na reafirmação do poder local.
Fazemo-lo porque estamos a dar resposta às legítimas aspirações do povo de Vizela que, vivendo há muito num teatro geográfico bem definido, o moldou com o seu trabalho e a sua iniciativa.
Estão largamente preenchidas as condições necessárias para a restauração do município de Vizela.
A criação do novo concelho será a consagração legal da vontade, democrativamente expressa, de um povo que existe como comunidade natural e histórica e como tal quer conquistar um futuro próprio e digno dentro da Nação a que pertence.
Não podemos compreender o sentido sublime da Pátria a que pertencemos, nem garantir a unidade do todo nacional, sem possibilitar a diversidade, nas formas e dimensões que a história e a cultura vão propondo.
A unidade de Portugal foi possível devido à acção esclarecida dos reis e à vontade do povo. Venceram-se barreiras geográficas e vincadas diferenças civilizacionais.
17 de Setembro de 1982, pela decisão praticamente unânime das assembleias das nove freguesias interessadas apenas se registou uma abstenção numa dessas assembleias.
Em 11 de Maio de 1982, o projecto de lei do PPM é adiado por proposta do PSD e baixa à Comissão Regimental de Administração Interna com a condição de voltar ao Plenário da Assembleia no prazo máximo de 60 dias com ou sem a existência de uma lei quadro de criação de municípios.
Já em 30 de Abril o referido projecto de lei tinha sido adiado por falta de quórum.
Em 18 de Janeiro de 1983, a Assembleia da República rejeita o projecto de criação do concelho de Vizela por 102 votos contra 113.
O PPM defende um municipalismo vivo de dinâmico. Para nós, o município é um dos elementos fundamentais da organização administrativa e política do nosso país, com particular relevância social e cultural nas relações entre os Portugueses.
O município está intimamente ligado à génese de Portugal e constitui ainda hoje um foco de irradiação de vida urbana e de convivência e solidariedade. Portanto, nos dias de hoje, é necessário reforçá-lo e dar-lhe vida e não estagná-lo nem paralizá-lo.
A segurança e independência das nações depende em muito da progressiva humanização do território e do bom uso dos seus recursos, o que só será possível completando o quadro municipal, sem o diminuir com um quadro regional.
A limitação do espaço físico e dos recursos de que dispomos e a ocupação efectiva e permanente do todo o território obrigam, portanto, à criação de um novo órgão autárquico: a região, que não pode existir sem o município vivo e dinâmico.
Portugal só se continuará a afirmar como entidade independente e vocacionada para o serviço da humanidade se respeitar a polimorfia do seu território e a liberdade e consequente diversidade dos pequenos povos que o constituem.
Ë afirmando este conceito e verificando esta realidade que demos e continuaremos a dar o nosso apoio às pretensões do povo de Vizela. Ao fazê-lo realizamos um acto de fé e de esperança no evoluir cultural da sociedade portuguesa.
Se condenámos muitos dos excessos que se têm verificado ao longo do calvário que tem sido a luta pela restauração do concelho de Vizela; se está afastada e diluída no tempo a individualidade das terras de Ribavizela até à data da sua incorporação em 1408 no concelho de Guimarães; se a reforma de Mouzinho da Silveira, para além do seu alcance pragmático, não podia compreender a necessidade natural da criação de novos municípios, não podemos hoje, no entanto, deixar de reconhecer a legitimidade e viabilidade da aspiração dos vizelenses a constituírem de novo um município.
Já em 1869 um grupo deles pede protecção ao rei D. Luís I e a inclusão de Vizela no concelho de Lousada, se não fosse possível desde logo a criação do município.
Em 1905 é construída a sede para o novo município e os esforços para a sua restauração vão-se repetindo (1931, 1964, 1975, 1977) até que o PPM, em 5 de Maio de 1981, apresenta nesta Assembleia o projecto de lei de criação do concelho de Vizela acompanhado desde 17 de Setembro de 1982.
A criação das regiões é portanto indispensável para que se verifique o desenvolvimento integrado de todo o nosso país. Desenvolvimento que só se pode concretizar à escala da região enquanto esta for a síntese dos condicionalismos geográficos históricos e culturais que a caracterizam.
O desenvolvimento económico e social só é possível se se basear no desenvolvimento das regiões e numa correcta organização política e administrativa das comunidades instaladas no território que possibilite: a autenticidade das relações naturais, a autenticidade das correlações voluntárias entre os homens e a sociedade; a autenticidade das relações entre os homens e as coisas que definem o ambiente e o espaço físico, e a satisfação das exigências sócio-económicas do tempo actual.
A regionalização só deve ser feita de baixo para cima, exigindo a participação e a vontade, democraticamente expressa, dos povos interessados. É necessário que a lei traduza estas verdades elementares.
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O vale de Vizela, Onde se integram as nove freguesias que desejam constituir o município, constitui uma área geográfica perfeitamente definida e é uma zona intensamente industrializada/Vizela e o seu povo constituem, na realidade, uma daquelas pátrias indispensáveis à existência da grande pátria. Uma República na grande democracia que desejamos ser.
Só a defesa de um bonapartismo centralizador poderá justificar os obstáculos que se tem vindo a colocar à regionalização democraticamente realizada de baixo para cima e à criação de novos municípios.
A Lei Quadro dos Municípios não; deve ser um travão à regionalização nem um obstáculo à legitíma expressão do poder local, exclusivamente, inventada para inviabilizar a criação de novos municípios fora do litoral e das áreas metropolitanas. Não deve, portanto, servir para reforçar o centralismo e aumentar o desequilíbrio já existente entre, as áreas urbanas, e desenvolvidas do litoral e o interior do nosso país.
Alguém se lembrou de que não existia uma lei-quadro de municípios ou de que era necessária a criação prévia das regiões administrativas para se fundar o Município da Amadora?
Sempre temos defendido que a criação de novos municípios, suficientemente dimensionados, é um estímulo e incentivo para a criação das regiões.
O município tem uma vocação especialmente objectivada no desenvolvimento urbano, enquanto que a região permitirá uma melhor, utilização de todos os recursos do território.
A criação das regiões promoverá, um povoamento harmónico do nosso país, bem como um mais justo equilíbrio económico e social, entre o litoral e o interior, entre a cidade, vilas e aldeias.
O concelho de Vizela ficará, em importância económica, situado na primeira metade dos concelhos do País.
A criação do concelho de Vizela valorizará a região do Ave, cuja capital natural é a cidade de Guimarães, é será, um elo indispensável, um incentivo necessário para a rápida constituição da região do Ave.
A região do Ave será um instrumento necessário ao desenvolvimento dos concelhos que virão, a integrar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No dia 9 de Maio deste ano as Assembleias de Freguesia de Santa Maria de ínfias, São Salvador de Tagilde, São Paio de Vizela, Santo Adrião de Vizela, Santa Comba de Regilde, Santa Eulália e Santo Estêvão de Barrosas, bem como as Juntas de Freguesia de São Miguel e de São João das Caldas de Vizela, por inexistência das respectivas assembleias, confirmaram plenamente a adesão ao projecto, de criação do concelho de Vizela.
Por conseguinte, a criação do concelho de Vizela resulta da vontade democraticamente expressa dos povos das nove freguesias:
Aplausos do PS, do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos.
Há que encarar o problema com toda a frontalidade. Esta Assembleia não pode desconhecer o País real tem de encarar a dinâmica desse País real.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a criação do município de Vizela, a restauração do município de Vizela, mais do que oportuna, só tem uma palavra: é justa.
Aplausos do PS, do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.
O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr. Deputado Ribeiro Teles, V. Ex.ª fez aqui a reafirmação do poder local, disse que estavam reunidas as condições para ser criado o município de Vizela e que não se deve governar contra a vontade do povo. Gostaria, pois, de saber se o Sr. Deputado concorda com as medidas de força que se tomaram em Vizela, que tentaram desestabilizar e desrespeitar a ordem pública, as forças militarizadas e o Governo.
V. Ex.ª não foi deputado aquando da última sessão legislativa, mas recordo que o Partido Socialista não apresenta agora qualquer projecto de lei. Unicamente dois' deputados independentes - e um sei que já não o é -, apresentam projectos. Porém, não houve nenhum deputado do ,Partido Socialista que apresentasse um projecto de lei de criação do município de Vizela. Mas é bom recordar - e o Sr. Deputado Ribeiro Teles deve saber - que na última legislatura o concelho de Vizela, não foi criado talvez por culpa exclusiva dó Partido Socialista; que, à última hora, apresentou aqui uma «lei travão», que, com a criação das regiões administrativas, impediu que o município de Vizela fosse criado.
Vozes do PS: - É falso!
Vozes do CDS: - É verdade!
O Orador: - E se não se deve governar contra a vontade popular, como justifica V. Ex.ª que o município de Vizela seja criado com a integração de freguesias? É que o Sr. Deputado focou os pareceres das assembleias de freguesia que vêm dos projectos, mas gostaria de ser esclarecido sobre o seguinte: na freguesia de Santa Comba de Regilde aparece, um dia, uma declaração do presidente da Assembleia de Freguesia a dizer que concorda com a criação e, passado cinco dias, no ofício dirigido ao presidente da Câmara Municipal, o mesmo presidente da Assembleia de Freguesia disse que não houve qualquer reunião para a criação do município de Vizela.
Finalmente, gostaria de saber se ao PS não acusará a consciência de vir agora, aqui, pela mão de dois deputados independentes - um já não é - defender este diploma da criação do município de Vizela.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ribeiro Teles.
O Sr. Ribeiro Teles (Indep.): - Sr. Deputado Horácio Marçal, creio que as questões que me colocou foram muito oportunas.
É evidente que não concordo com nada que seja ilegal que se pratique neste país. Nunca defendi excessos nem concordei com muitos dos excessos que se verificaram em Vizela. Não concordei na própria altura em que eles se fizeram e, como há pouco declarei na intervenção que fiz, também condenei esses excessos.
No entanto, para trás desses excessos está a verdade de um povo que quer ter a autonomia que lhe dá o direito a ter uma vida municipal autónoma e livre. Essa é que é a realidade que temos que encarar; não é andarmos à volta do problema, desconhecermos o problema,
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cairmos nos meandros do que se passou e não atentar na única realidade que está na nossa frente e que é a realidade democraticamente verificada de que o povo de Vizela tem condições para que Vizela seja um município. A Assembleia quer travar essa realidade, ou seja, quer que um povo que tem todo o direito a constituir um município não o possa fazer? Esta é a pergunta que coloco a toda a Assembleia e não unicamente ao Sr. Deputado. Esta é a pergunta que está de pé até à votação.
Não era deputado aquando da última legislatura, mas creio que quem apresentou a lei travão, ou antes, o travão da lei de enquadramento, foi o Governo e não o Partido Socialista.
Quanto à questão da freguesia a que o Sr. Deputado se referiu, tenho um documento -que posso mostrar- dessa Junta de Freguesia em que se diz que há unanimidade na criação do município de Vizela. Creio que o que está em causa neste aspecto da criação do município não é Vizela mas sim o futuro de Portugal e um pouco o futuro da democracia.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Após a discussão travada em torno da lei quadro dos municípios, com os resultados que se conhecerão em breve, sobe a Plenário, uma vez mais, formalmente, a questão da elevação de Vizela a concelho. Importa pouco, decerto, fazer a história esmiuçada do que, no passado, ocorreu nesta Casa, no hemiciclo e fora dele, como processo de impedir a conformação legislativa de uma realidade que o tempo e a vida tornaram irreversível.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - É agora a hora para, operando a ruptura com os procedimentos inaceitáveis de maiorias divorciadas das aspirações populares, reparar os erros, não defraudar expectativas legítimas, prestigiar a democracia, tão esterilizada pelos obseuros jogos do poder.
Vizela regressa a São Bento com a força das causas meritórias, ao cabo de decénios de porfia sem desfalecimentos, esteiada num enorme apoio das suas gentes, multiformemente expresso, reiteradamente renovado. As nove freguesias previstas no projecto de lei do PCP afirmaram e afirmam, através dos seus órgãos representativos, como ainda há escassos dias aconteceu, a vontade inequívoca de se constituírem em município, o que preenche, a nosso olhos, as exigências constitucionais e legais do apuramento das posições concretas dos interessados.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Não desvalorizaremos, contudo, as impressionantes demonstrações de querer colectivo, nunca anemiadas pelos sucessivos obstáculos ou pelo escalracho das promessas não cumpridas, que os povos vizelenses souberem assumir nas diferentes situações e conjunturas, fenómeno invulgar, impregnado de vitalidade democrática, ao qual se não pode opor a indiferença ou a obstrução sistemática.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Um regime debilita-se, desacredita-se, deixa-se corroer quando, sentando-se do País real, prefere a sobranceria, a arrogância, o autoritarismo bloqueador à lucidez de dar corpo às necessidades e aos anelos das populações; quando privilegia clientelismos partidários, bairrismos estéreis que urge desactivar, os negócios de uns punhados de caciques e poderosos em detrimento da provada voz das massas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Eis o que, na sequência dos actos eleitorais que permitiram a actual composição da Assembleia da República, não pode conjecturar-se, sob pena de graves consequências. Fundas e estimáveis foram as esperanças postas nas modificações registadas em Outubro último. Impõe-se não as frustrar nem combalir com titubeações.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos.
Como aceitar, na verdade, a desconsideração pela sucessiva pronúncia de milhares de pessoas das autarquias minhotas que integrarão o novo município? O movimento organizado ou espontâneo dos Vizelenses junta todas as famílias ideológicas e partidárias, independentemente de credos e convicções religiosas, de camadas sociais e projectos individuais. Exprime-se por unanimidade, o que é apreciável por quem quer que conheça os dados do real e se não baste nem ludibrie com os fumos que fazem espiralar por detrás das cortinas os arquitectores de obtusidades em favor de castas e comanditas.
Opor a estes e a outros factos indesmentíveis os argumentos que a Câmara e o País ouviram à saciedade, afigura-se, no mínimo, insensato. As maiorias pretéritas mudaram constantemente de táctica, rebuscando e inventando expedientes torpedeantes.
Entrou primeiramente em cena a lei quadro da criação dos municípios. O PCP teve oportunidade de tornar claro que ela se destinava a obstruir a criação de novas autarquias do tipo daquela que hoje consideramos e que era, à luz do entendimento das normas constitucionais, aberrante. Funcionou e cumpriu o seu papel como manobra dilatória, mas morreu na tumba das coisas irrelevantes e de má nota.
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Brandiu-se em seguida o espantalho da ausência de requisitos e efectivou-se a montagem de regras processuais espartilhantes, quando é certo que a realidade municipal, para quem tenha destas coisas um entendimento informado e culturalmente fundamentado, se não pode medir por critérios puramente aritméticos e tem de atender ao que é vivo, ao que é pulsátil no viver das comunidades, valorando elementos de natureza histórica, geográfica e social que nenhum dos Srs. Deputados poderá, sob pena de incorrer em grosseira atitude, fazer caber em qualquer saco redutor incapaz de conduzir a nada o que tem a força de existir autonomamente.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
Chegaria, entretanto, a oportunidade da arguição de que a restauração do concelho de Vizela abriria a
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porta a uma hemorragia inestancável de pretensões similares. Ainda há pouco, em termos um tanto canhestros, pudemos ver o repristinar deste, velho argumento - como quem tira coelhos de uma cartola.
Em longos anos de existência do Parlamento, após o 25 de Abril, criou-se apenas o Município da Amadora e as pretensões concretas que foram formuladas serão, naturalmente, consideradas à luz de critérios que atendam as reivindicações das populações, mas também à subsistência dos dados que apresentam. A Câmara, se alguma coisa tem revelado, é prudência, sensatez, lucidez e sensibilidade legiferadora, não o contrário - só não vê isto quem está de olhos vendados ou manifestamente tocado por intenções obscuras que nem sequer apetece qualificar.
Por último, ataralhoucadamente, fizeram os Srs. Deputados, da direita estourar o foguete da regionalização - apareceu no n.º 4 do artigo 14.º da lei quadro dos municípios. Mas, apesar da extensa cornucópia de palavras com que p trouxeram à Câmara, a verdade é que, até hoje, só o PCP avançou com um projecto de lei tendo em vista a regionalização do País; um projecto de lei estribado em concepções concretas.
Aplausos do PCP.
que não visam modelar um facto à medida de clientelas políticas, antes intentam dar expressão a entidades pautadas pela dimensão histórica, aferidas pela vivência concreta e determinadas pelo rigor e pela ciência, que a política permite e instiga. É preciso, pois, Srs. Deputados, não falar a trouxe-mouxe da regionalização, mas avançar com ela através dos enunciados normativos que urgem e de uma posição que seja, ela própria, consentânea com a dignidade do cargo que se assume.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Vem do pântano do retrogradismo, apesar das roupagens com que tenta travestir-se, a obstinação do PSD e do CDS contra a população que nos reúne hoje a esta hora noctuma.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Obrigado, Sr. Deputado.
O Orador:.- E traduz uma concepção do Poder e do Estado alicerçada no menosprezo pela participatividade democrática autêntica e no sobrevalorar, por motivos que conhecemos, das vindicações dos poderosos, agentes que o alimentam.
Só assim se percebe que, a torto e a direito, se invoquem é condenem as realizações de massas, apodadas de pressões antidemocráticas, enquanto se ocultam ou, branqueiam as pressões, essas, sim, poderosas e efectivas, exercidas nos corredores sombrios da governação pelos potentados do obscurantismo.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
Caíram, todavia, uma a uma, as máscaras, incredibilizando quem as afivelou. Permanecem, entretanto, com intocável coerência, o sentido e a substância da luta dos que interpretam na actualidade, de modo massivo e intrépido, o anseio, de gerações e gerações de vizelenses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As posições que claramente assumimos não contendem em nenhum domínio com os interesses, as ambições e a grandeza de outras autarquias dó distrito, que respeitamos e defendemos, tendo em vista a sua legitimidade e o seu desenvolvimento.
A viabilização e a vivescência do Município de Vizela não afrontam nem enfraquecem ou desnutrem, seja em que plano for, os seus vizinhos, com os quais é medular se estabeleçam relações fecundas de cooperação e saudável entendimento. Assim pensam os homens e as mulheres responsáveis, capazes da serenidade da reflexão consciente onde quer que habitem. Assim terá de pensar um Parlamento arguto, ponderado despreconceituoso, municiado de informação e boa fé.
Militam por Vizela as longas raízes histórico-culturais das suas evidências: as infra-estruturas de que dispõe; a completude dos requisitos elementares a exigir a cabal justificação de um processo célere de instalação do aparelho administrativo da autarquia a criar e inúmeras outras circunstâncias que, em momentos anteriores, chamamos à colação do debate. Tanto basta para que, em sintonia com o PCP e com o projecto de lei que representou na Mesa, este hemiciclo ponha termo, prestigiando-se, a uma triste história e faça, finalmente, com alegria plena desfraldar as bandeiras do município vizelense. É que, para lá de tudo, elas vitoriarão, também o regime democrático e o 25 de Abril.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e do deputado independente Lopes Cardoso.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado José Manuel Mendes, apesar de tudo, tento levar as suas palavras a sério.
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Falou V. Ex.ª em serenidade e em reflexão consciente. Anotei!
Pois bem, pergunto: quem foi conscientemente reflectido é quem foi inconscientemente irreflectido? Quem, foi sereno ou quem foi precipitado? Sabe-se em nome' de quê: do simples manobrismo político ou de um autêntico desejo de construir uma perspectiva de futuro para o seu país? Parece-me bem que essas precipitações decorrem, antes, da" primeira motivação.
De qualquer modo, quem fez a asneira? O autor dó vosso projecto de regionalização de 1977 ou O autor do vosso actual projecto de regiões? Quem fez á besteira: o outro ou este?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado José Manuel Mendes, sem que as explique, as suas palavras de serenidade é dê reflexão consciente não tem qualquer sentido que não o do manobrismo fácil e destrutivo, que nada trará, de bom ao futuro de Portugal.
Aplausos do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado José. Manuel Mendes.
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O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - O Sr. Deputado Silva Marques acaba de fazer o seu número.
Aplausos do PCP. Protestos do PSD.
O Orador: - Não se excitem, Srs. Deputados. Não me farão perder a serenidade.
Registo que o Sr. Deputado Silva Marques, talvez por se entreter demasiado com a Newsweek, não teve oportunidade de ler convenientemente o projecto de lei apresentado pelo PCP, o que explica o desastre da intervenção que acaba de produzir.
Dir-lhe-ei apenas, para não fazer deste episódio um facto que possa ser minimamente relevante, o seguinte: o projecto de lei do PCP, visando a regionalização, atende a realidades que são aferidas em termos histórico-culturais, em termos sociais, em termos políticos e em termos do rigor e do cientificismo com que trabalhamos estas matérias. Nada disto tem a ver com o concelho de Vizela, que pode hoje, como podia no passado, em nosso entender, ser criado, que deve ser criado e que não deixará de o ser por muitos que sejam os números de mau Parque Mayer que o Sr. Deputado Silva Marques traga a esta Câmara.
Aplausos do PCP.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Magalhães Silva.
O Sr. Magalhães Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As pretensões da elevação de Vizela a concelho têm tido um tratamento tão complexo nesta Assembleia que não se pode estranhar, também por isso, a paixão que o tema desencadeia, quer nesta Câmara quer no seio das comunidades directamente envolvidas e, quiçá, no País. Com efeito, a assunção plena das responsabilidades que cabem a este órgão de soberania teve já momentos de certo surrealismo político aquando de anteriores discussões neste hemiciclo, que julgo não terem sido as mais coerentes e que de algum modo exacerbaram ainda mais as já de si antagónicas maneiras de ver resolvido o problema em questão. Forjaram-se expectativas, aliciaram-se pessoas que de boa fé corresponderam ao chamamento com a sua presença e especulou-se com a frustração que alguns sabiam poder acontecer, mas que antes não exteriorizaram por conveniências de ocasião.
É com esta complexa carga psicológica de ontem, que de algum modo nos atinge também hoje, que se volta a discutir a elevação de Vizela a concelho. Neste interregno foi publicada a lei quadro da criação de municípios, à luz da qual, penso, vão ser apreciados os projectos de lei em discussão, embora compreenda mal como foi possível o seu agendamento.
De acordo com o disposto no n.º 4 do art. 14.º da Lei 142/85, de 18 de Novembro, a criação de novos municípios só poderá efectivar-se após a criação das regiões administrativas. Na altura foi interpretada esta alínea como sendo o remeter do processo para as calendas gregas. Todavia o tempo virá a demonstrar que assim não é. Hoje a regionalização do País apresenta-se como irreversível e a curto prazo. E é tanto assim que pelo menos dois partidos políticos têm já entregues na Mesa da Assembleia, ou em vias disso, projectos de lei quadro das regiões administrativas.
A sensibilização geral, mesmo ao nível da opinião pública, para a discussão desta problemática é um facto, tudo apontando, pois, para que tal discussão e aprovação se faça e se dê assim cumprimento aos artigos 250.º, 256.º e seguintes da Constituição.
Ao contrário do que certas vozes propalam, salvo uma meia dúzia de fanáticos que sempre aparecem nestas situações, Guimarães não tem em relação às pretensões de Vizela uma atitude de obstrução cega. O que pretende é ver os seus interesses regionais intactos quando surgirem os novos modelos regionais, necessariamente fomentadores de desenvolvimento e progresso a que legitimamente aspiram as suas gentes. Admito que haja aqui alguma utopia que, se quisermos, se pode comparar àquela que nutrem os que em Vizela pensam que após a criação do concelho o maná virá com as trovoadas de Maio e o mel substituirá a cristalina água das fontes daquele rincão minhoto.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - As laboriosas gentes de Guimarães têm o direito de ver na regionalização uma fonte de progresso e bem-estar. Por outro lado, todos reconhecerão que as dificuldades no seu avanço se prendem com posicionamentos adversos, que se adivinham, de cunho regional e local. É por todos entendermos isto que não podem ser interpretadas de outro modo, que não o da defesa dos seus próprios interesses, as posições dos órgãos autárquicos de Guimarães e da sua população em geral Guimarães pretende pois chegar ao momento das grandes definições da política de desenvolvimento regional com o peso e a dimensão a que a sua população fez jus. Pensamos que é um direito legítimo que nos assiste e só à luz destes princípios se pode compreender o comportamento dos vimaranenses nesta matéria. Retalhar o concelho significa de negativo para o berço da nacionalidade não a criação do município de Vizela mas a evidente inferiorização do seu peso regional no dirimir de opções que necessariamente e a curto prazo nos vão bater à porta. Tendo em conta estes princípios, bater-nos-emos de uma forma responsável por aquilo que julgamos ser os direitos de toda uma comunidade que não quer outra coisa senão o progresso e o bem-estar conquistados à custa do seu trabalho.
O modo ordeiro como se têm comportado as gentes de Guimarães tem de ser interpretado como um sinal mais e nunca como um sinal menos. Vive-se com paixão este problema a nível local e seja-me permitido pedir que ninguém negligencie a ponderação que tem sido característica fundamental dos modos de protestar até agora assumidos. Está em causa uma comunidade de 150000 habitantes, que tudo tem feito de um modo civilizado para defender a sua causa e que pretende tão-só acautelar o seu progresso futuro em novas formas de divisão administrativa do País.
Criem-se as regiões administrativas, dê-se a Guimarães o peso que, com as suas potencialidades actuais, lhe cabe como pólo de intervenção inter-regional e Vizela será concelho, já que os entraves do bairrismo doentio, que residualmente possam existir de parte a parte, terão expressão insignificante e não constituirão obstáculo de monta aos anseios dos Vizelenses.
Aplausos do PSD e de alguns deputados do PRD.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados é chegada a hora acordada para se proceder a votação dos projectos de lei n.º 95/IV do PCP e 82/IV do PS.
O Sr. Presidente: - V. Ex.ª pede a palavra para que efeito Sr. Deputado Carlos Brito?
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente e para interpelar a Mesa e de seguida fazer uma sugestão.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente a minha interpelação e no sentido de saber se ainda estão muitos oradores inscritos para intervir sob e este ponto da ordem do dia.
Suponho que não haverá muitos dado que os tem pôs são bastante limitados pelo que me permita fazer a sugestão de concluirmos primeiro a discussão desta matéria e de as duas orações serem feitas conjunta mente Isto a menos que as inscrições sejam em g ande numero e portanto tarde muito a votação dos projectos de lei relativos a criação do município de Vizela Senão parece me que o melhor seria concluirmos primeiro a discussão e juntarmos as votações relativas às duas matérias da ordem do dia.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado até ao momento estão ainda inscritos os Srs. Deputados mas não sei se mais alguém se pretende inscrever.
De qualquer modo fica feita a sugestão de V. Ex.ª no sentido de que as votações se façam no termo deste debate.
Pergunto aos representantes dos grupos parlamentares se tem alguma objecção a que se proceda desta forma.
O Sr. António Capucho (PSD): - Pela nossa parte não há acordo Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então visto que há objecções vamos proceder à votação dos diplomas relativos à Lei n.º 142/85, Lei-Quadro dos Municípios.
Vamos começar por votar o projecto de lei n.º 95/IV apresentado pelo PCP que revoga a lei-quadro na sua totalidade.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente pergunto porque é que V. Ex.ª não coloca os projectos de lei a votação pela ordem da sua apresentação.
O Sr. Presidente: - Apenas porque este que acaba de referi pretende uma revogação total da lei quadro enquanto o outro revoga apenas um número de um artigo.
É uma questão de lógica Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sentou-se logo
É uma questão que o Sr. Deputado não compreende.
O Sr. Presidente: - De contrário poderíamos porventura cair numa situação incompreensível dado que este diploma que acabei de anunciar espera a sua revogação total.
Vamos então votar na generalidade o projecto de lei n.º 95/IV.
Submetido a votação foi rejeitado com votos contra do PSD do PS do CDS e de 17 deputados do PRD votos a favor do PCP do MDP/CDE dos deputados independentes Lopes Ca doso e Maria San tos e de 5 deputados do PRD e as abstenções dos deputados independentes Ribeiro Teles e Ferreira do Amaral de 1 deputado do PS e de 14 deputados do PRD.
O Sr. Presidente: - Vamos agora votar na generalidade o projecto de lei n.º 82/IV apresentado pelo PS que revoga o n.º 4 do artigo 14.º da Lei-Quadro dos Municípios.
Submetido à votação foi rejeitado com votos contra do PSD do CDS de 14 deputados do PRD e de 1 deputado do PS votos a favor do PS do PCP do MDP/CDE dos deputados independentes Lopes Cardoso Ribeiro Teles Ferreira do Amaral e Maria Santos e de 4 deputados do PRD e a abstenção de 20 deputados do PRD.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente dá-me licença que interpele a Mesa?
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente presumo que em face do resultado das votações que acabaram de ter lugar não ha possibilidade legal de se votar os projectos de lê que estão neste momento em discussão embora eventualmente ela possa ser levada até ao fim das intervenções do Srs. Deputados que estão inscritos. Mas é evidente que não pode haver lugar na votação.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado esse não e o meu entendimento. Aliás esse assunto já foi discutido em conferencia de lideres onde se chegou a conclusão de que a Lei-Quadro dos Municípios tem precisamente a mesma natureza e quadro vinculativo que qualquer outra lei desta Assembleia na medida em que são leis ordinárias.
Como não ha qualquer hierarquia entre uma lei quadro e esta que porventura venha a aprovar se a questão depende apenas da coerência com que o Plenário venha a manifestar-se. Mas isso é da responsabilidade da Mesa.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Dá-me licença Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favo.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente a opinião que V. Ex.ª acaba de emitir é respeitável mas há opiniões igualmente respeitáveis em sentido contrário. Alias essa é a máxima de um ilustre constitucionalista o Dr. Canotilho que nas suas anotações ao articulado constitucional defende precisamente a te e confiança. Com efeito ele considera que as leis particulares que ao contra uma lei-quadro votada pela Assembleia da Republica estão fé das de inconstitucionalidade.
Como o Sr. Presidente não obstante a douta é responsável opinião de V. Ex.ª ha outras opiniões em sentido contra regulamentos especiais.
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O Sr. Presidente: - Agradeço a sua observação, Sr. Deputado Silva Marques, mas, segundo penso, o quadro de raciocínios que estabeleceu, invocando o Dr. Canotilho, não se aplica a esta situação. Pelo que sei, ela tem uma outra fundamentação.
Sr. Deputado Costa Andrade, V. Ex.ª pede a palavra para que efeito?
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, é evidente que as leis têm todas a mesma hierarquia - pelo menos pode admitir-se essa tese. Simplesmente, o que vai acontecer é que vai haver uma declaração de vontade da Assembleia da República sobreponível e antagónica com outra.
Vozes do PCP: - Exactamente!
O Orador: - Isto é, vai agora votar-se, em sede de especialidade, algo que, em relação ao mesmo ponto concreto, poderá contradizer a declaração de vontade da Assembleia da República.
A Assembleia da República acaba de votar a manutenção de um artigo de lei segundo o qual «todos os municípios a criar obedecerão a determinados requisitos».
Portanto, a Assembleia da República manifestou-se neste sentido e o problema que ponho é este: pode agora dizer-se que em relação a um determinado município as coisas podem ser diferentes?
Não tinha quaisquer dúvidas se se votasse a questão da criação do município de Vizela independentemente da lei quadro. Um acto legislativo em relação a um facto concreto pode perfeitamente contrariar e revogar uma lei quadro. Nesse caso entender-se-á a vontade: «a lei ulterior revoga a lei anterior».
Mas agora o problema não é esse. O problema é que, a menos que sejam decorridos os prazos legislativos e constitucionais normais, pode acontecer que, em relação ao mesmo ponto concreto, àquele da lei geral que concerne ao caso preciso de Vizela, venha a produzir--se uma declaração de vontade da Assembleia da República de sentido contrário.
Devo dizer honestamente que não tenho ideias muito claras neste sentido, mas estou seriamente preocupado, inclusivamente com o prestígio da Assembleia da República numa questão como esta.
Aplausos do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Costa Andrade, é natural que V. Ex.ª esteja preocupado. Certamente que outros Srs. Deputados também estão, e irão manifestá-lo através do princípio da coerência que deverão demonstrar precisamente para a garantia da dignidade daquilo que aprovam.
Todavia, abono-me precisamente nas palavras de V. Ex.ª quando começou por dizer que estas leis não estão hierarquizadas, visto que se encontram no mesmo plano. Com efeito, elas são iguais e têm o mesmo poder e força vinculativa.
Assim sendo, penso que o facto de aprovarmos a manutenção da lei quadro não inibe que a Assembleia da República venha a manifestar-se noutro sentido.
Em todo o caso, vou consultar os membros da Mesa.
Pausa.
Srs. Deputados, vamos prosseguir o debate.
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, queria só saber se o incidente está encerrado.
O Sr. Presidente: - Está sim, Sr. Deputado. Sr. Deputado Gomes de Pinho, V. Ex.ª pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, peço desculpa de voltar a levantar esta questão, mas pareceu-me que o Sr. Presidente invocou, em abono da tese defendida pela Mesa, a existência de um consenso na conferência de líderes sobre esta matéria.
Vozes do PCP: - Não, não!
O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado. O que disse foi que invocava o meu testemunho. Aliás, já na conferência de líderes tinha exposto que, quanto a mim, a lei quadro não tinha grande razão de ser, na medida em que ela tem precisamente a mesma natureza, a mesma força vinculativa que qualquer outra lei da Assembleia da República.
O Orador: - Portanto, não houve nenhuma deliberação da conferência de líderes sobre essa matéria, não é verdade?
O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado. O assunto foi debatido apenas e tão-só nesta medida.
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Fernando Conceição.
O Sr. Fernando Conceição (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estão em debate vários projectos de lei visando a criação do concelho de Vizela. Retoma-se, assim, iniciativa partidária anterior. Como deputado pelo círculo de Braga, não posso alhear-me do problema, que encaro numa dupla perspectiva - a concelhia e a distrital.
Mas antes, seja-me permitido fazer uma breve consideração, aliás no seguimento de intervenções de outros senhores deputados.
Em Novembro de 1985, pela Lei n.º 142/85, a Assembleia da República legislou no sentido de estabelecer parâmetros definidores das condições de viabilização de novos concelhos e condicionar a criação destes à prévia determinação das regiões administrativas.
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Estranhamente, ou talvez não, apenas seis meses depois, alguns senhores deputados pretendem revogar, aquela lei, no todo ou, pelo menos, numa parte. Significa isto que novos dados foram presentes, susceptíveis de modificar aquele posicionamento? Será o caso de terem surgido solicitações de criação de novos municípios? Ou, mais simplesmente, quer-se aproveitar o novo quadro parlamentar para criar dificuldades ao Governo? Será a continuação de um processo que já vem de longe, é que pode ser enquadrado numa política global de contestação?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dar provimento aos projectos agora em discussão acarretará várias consequências, quer a nível concelhio quer a nível distrital:- Assim; por um lado, desencadeará uma reacção em cadeia inevitável. Surgirão noutros concelhos iniciativas do mesmo tipo, contribuindo para enfraquecer concelhos existentes, sem com, isso, se criarem zonas suficientemente fortes para fazer face a novas condições de desenvolvimento. Lembro, por exemplo, que está para breve a assinatura de um projecto conjunto das Câmaras de Santo Tirso, Vila Nova de Famalicão, Guimarães e Fafe, visando o lançamento de acções conducentes ao progresso de toda a área.
Quando existe um movimento internacional de redução de agrupamentos do tipo concelhio, nós, pelo contrário, queremos a sua proliferação?
Tenha-se presente ainda que a concretização do projecto, agora em discussão, poderá, em muitos casos, determinar, a médio ou longo prazo, a descaracterização ou a eliminação de concelhos. É esta já a preocupação, por exemplo, do presidente da Câmara Municipal de Lousada.
Por outro lado, não se esqueça - e um grupo de pessoas de Canas de Senhorim já o recordou - que os critérios adoptados, na Lei n.º 142/85 e que pareciam adaptados, desde logo, para o aso de Vizela - poderiam e deveriam ser, também alterados para, desse, modo mais, facilmente, poderem enquadrar outro, tipo de petições. Diziam eles - e talvez com razão.-- que não poderíamos ficar adstritos a dados puramente numéricos será o alargamento ,da contestação daí resultante à Lei Quadro dos Municípios.
Mas outra ordem de considerações posso fazer: se, outrora, o isolamento levava à autarcia, as interligações Cada vez maiores, conduzem à ruptura daquela e à abertura para pensar e resolver os problemas em contextos mais alargados. Daí a preocupação com a criação de regiões.
Ora, nesta perspectiva, Guimarães está bem posicionada para tornar-se, um pólo de desenvolvimento regional, pela sua inserção ma zona do vale do Ave, pela existência de serviços e de meios humanos capazes de arrancar para o progresso; económico-social e cultural de uma área que alberga cerca de 400 000 habitantes. Mas, para poder estar presente na hora do traçar das grandes linhas de desenvolvimento regional, o concelho de Guimarães não pode fragmentar-se. A solidariedade dos elementos deste conjunto possibilitará a atracção para esta sub-região dos meios materiais e dos serviços indispensáveis a uma maior riqueza e bem-estar da sua comunidade. E esta área desempenhará assim o papel a que geograficamente está destinada: alternativa, ao Porto e elo de, ligação e de desenvolvimento com Trás-os-Montes.
Estas as razões que levaram um professor universitário, que se debruçou sobre este problema, a afirmar que a fragmentação do concelho de Guimarães seria prejudicial, ao futuro de toda a região.
E noutro passo, aquele professor afirmava que no, vasto conjunto a criar,- havia a possibilidade de criar subpólos de desenvolvimento, pelo agrupamento de algumas freguesias. E que seria esse o caso de Vizela.
Aliás, nem outro tem sido o sentido dos responsáveis de Guimarães que defendem uma batalha a vencer em duas fases: em primeiro lugar, a obtenção de um maior espaço de acção, criador de maior riqueza e meio de maior bem-estar para as suas gentes e em segundo, a determinação, neste todo, de pólos de desenvolvimento, dotados>dòs indispensáveis serviços e outros meios técnico-financeiros, um dos quais seria Vizela.
:Sr Presidente, Srs. Deputados: Como deputado pelo círculo de Braga uma outra 'preocupação me ocupa: qual a situação do distrito neste caso? Apenas um dos projectos é claro - o novo concelho integrar-se-ia no distrito de Braga. Mas será assim? O Porto aceita esta decisão? As freguesias que pertenciam a concelhos do distrito do Porto tornarão; sua aquela posição?
Creio, Sr. Presidente e , Srs. Deputados, que esta questão não pode também, ser adiada. Ao querer-se criar um novo concelho, há que determinar, ao mesmo, tempo, o distrito a que vai pertencer.
Embora, mantendo-se quadro distrital, como preceitua a Constituição da República, vão ser alterados os limites de distritos e os órgãos próprios deveriam previamente ser ouvidos, o que, não sucedeu.
Vozes do PSD:.-Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Considerando que as exigências de- progresso não se compadecem com a proliferação de pequenos concelhos e que não podemos alhearmos do problema distrital, que os mesmos podem criar, votarei contra os diplomas em discussão.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira e Silva.
O Sr. Oliveira e Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De novo sobe a este plenário o caso de Vizela, expresso agora em três projectos de lei, que, em consonância com a aspiração multisecular dos povos daquela área, reclamam mais uma vez a restauração do seu concelho.
As intervenções de diversas bancadas desta Assembleia, na II Legislatura como na III Legislatura, a todos deram conta da persistente luta que aqueles povos tem desenvolvido ao longo dos tempos para recuperar a sua autonomia municipal.
A afirmação dessa- vontade colectiva, que uniu sucessivas gerações no empenho pela concretização do mesmo anseio, constitui sem dúvida e só por si uma excepcional razão histórica, que sempre nos incitou a olhar de um ângulo favorável o reconhecimento do direito reclamado pelo povo vizelense. Mas não são menos, importantes as razões político constitucionais que militam em abono, da sua pretensão.
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É sabido que a Constituição que nos rege aposta no poder local como factor de consolidação e de constante revigoramento da nossa democracia.
Mas, como já tivemos oportunidade de acentuar nesta Assembleia, aquele poder tem forçosamente de conceber-se numa perspectiva dinâmica, sensibilizada para a evolução e progresso das sociedades, para as crescentes exigências da vida dos povos, para a multiplicidade dos seus interesses e necessidades, que se tornam dia a dia mais complexos e que exigem respostas cada vez mais numerosas e diversificadas.
O aumento demográfico, a intensificação do aproveitamento do território, a sua utilização para os mais variados fins, em suma, o crescimento humano e das actividades sociais gera necessariamente o aparecimento e o desenvolvimento de comunidades, mais ou menos restritas dentro do espaço nacional, que aglutinam cidadãos com necessidades colectivas específicas, que os próprios, devidamente organizados, poderão, melhor do que ninguém, satisfazer. É neste contexto que o poder local e a sua expansão encontram a sua legitimidade e razão de ser.
Trata-se de uma realidade tão palpável que nem o próprio regime derrubado em 25 de Abril se escusava a reconhecê-la e, por isso, aparentava dar-lhe resposta em diversos preceitos do Código Administrativo.
Só que o poder autárquico significa fundamentalmente autogestão de interesses comunitários, participação democrática das populações na satisfação de circunscritas necessidades colectivas e isso é, obviamente, incompatível com o feroz centralismo que caracteriza todas as ditaduras.
Por isso, o imobilismo e a consequente estagnação da vida administrativa, que se verificaram durante o velho regime, foram sempre, como não podia deixar de ser, circunstâncias adversas à criação de novas autarquias.
A rigidez e inflexibilidade da compartimentação administrativa constituíram, assim, no plano da administração local, o corolário de um regime avesso a todas as transformações, quer no plano interno quer no externo, teimosamente votado à tentativa de perpetuar a sua ordem imutável em toda a parte, tanto nas colónias como no território nacional.
A Revolução de 25 de Abril deveria ter operado uma profunda mudança de perspectiva na problemática da função de novas autarquias.
A criação, quando devidamente fundamentada, de novas freguesias ou municípios deveria ser encarada como um imperativo democrático, como uma resposta inevitável aos estrangulamentos a que o velho regime sujeitou durante quase meio século a vida autárquica para impedir o acesso das populações ao exercício efectivo do poder local.
Deveria, por isso, o advento de novas freguesias e municípios ser recebido como um avanço no processo da democratização do País, saudando-se o enriquecimento da sua vida administrativa com a participação de novos autarcas, que anseiam consagrar-se, mediante uma prática democrática, à prossecução de interesses comunitários ou utilidades colectivas.
O que importa acautelar, como também já tivemos oportunidade de dizer, justamente a propósito de Vizela, é que se respeitem sempre os pressupostos em que deve assentar qualquer projecto de dilatação do poder local: a criação de uma nova freguesia ou município postula, antes de mais, a existência de um aglo-
merado populacional, com vontade política inequívoca de se assumir como autarquia e com capacidade e possibilidades de exercer as competências e prosseguir as atribuições que a lei comete aos respectivos órgãos, desde que seja de presumir que desse exercício autónomo resulte manifesto proveito para os respectivos povos.
O que pressupõe, por via de regra, que estes se reclamam de necessidades colectivas que são já difíceis de satisfazer - ou que só mais precariamente poderão ser satisfeitas no quadro da velha autarquia.
As necessidades e conveniências dos povos e a sua vontade e aptidões para as satisfazerem devem, assim, constituir os principais alicerces de toda arquitectura do poder local.
É, pois, nestes termos, que o regime da criação de autarquias, entendido como corolário dos princípios de descentralização administrativa, pode e deve dar satisfação aos anseios populares e oferecer, simultaneamente, um importante contributo para o reforço do sistema democrático.
Esta é uma posição de princípio, quê se radica, aliás, na nossa tradição municipalista e a valoriza como um dos factores democráticos da própria formação do País. Cientes, por isso, como ensina Gama Barros, de que a história das instituições municipais é a verdadeira história do povo português, consideramos essa tradição, não como uma obra acabada, que nos tenha sido legada apenas com o encargo de a conservar e venerar, mas antes como uma organização viva e dinâmica, com a flexibilidade bastante para continuamente se adaptar e responder a nível concelhio às novas exigências da vida colectiva.
Ora, todos sabem que, a par de um adequado contexto geográfico, e das excepcionais razões históricas a que já se aludiu o desenvolvimento económico, social e cultural dos povos que se congregam para reclamar a autonomia de Vizela, sem afectar de algum modo a viabilidade dos municípios de origem, proporciona condições de sobra para que se constitua um próspero concelho, com perspectivas para o futuro que se avantajam às da maioria dos nossos municípios rurais.
Pelo que, sucintamente, deixo exposto, o Partido Socialista votará na generalidade os projectos de lei, que propõem a criação do concelho de Vizela.
Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vizela está a tornar-se no «calcanhar de Aquiles» e no ponto de fissuras várias nesta Assembleia. Vem acontecendo desde 1982 - e então começou por quase partir a Aliança Democrática com a apresentação da proposta do PPM sobre a criação do concelho de Vizela - e hoje parece, pelas votações já efectuadas, estar quase a partir o novel partido.
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - O que é isto?
O Orador: - E isto porque se entrechocam interesses poderosos, quer de ordem económica e política, quer de ordem puramente regional. Verifica-se, até, que dentro de algumas bancadas há posições divergentes quanto a este problema, conforme a origem geográfica dos senhores deputados.
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Vizela é hoje, nesta Assembleia, um caso: de dominação política. Os municípios, portugueses são constituídos, como se sabe, por uma sede e por várias freguesias, o que não acontece noutros países onde o poder local é distribuído igualmente por todos os aglomerados populacionais, quer tenham 100, quer tenham 10 milhões de habitantes. São todos concelhos, tal como acontece, por exemplo, em França com a mairies, onde problemas deste género nunca poderiam acontecer.
E aqui arriscar-me-ia a dizer que, neste momento e quanto ao caso de Vizela, não há nesta Assembleia seis partidos mas antes dois: o partido de Guimarães e o partido de Vizela.
Vozes do PSD: - Não apoiado!
O Orador: - O partido dos dominadores e o partido dos dominados.
ozes do PSD: - Isso é abusivo!
O Orador: - O MDP/CDE, como sempre, desde 1982, neste, processo está com os dominados, está com Vizela, porque é um caso ímpar no nosso país, e neste caso no da reivindicação de municípios. Não me venham dizer que há outros casos e que há outros aglomerados populacionais que também querem ser municípios e que têm tanto ou mais direito que Vizela.
Vizela tem um processo já longo, desde há quatro ou cinco anos, que demonstrou cabal, profunda e realmente - por vezes por maneiras menos ortodoxas, que não apoiamos de maneira nenhuma -, que a população do futuro concelho, das freguesias que esperam hoje - ou um dia - vir a integrar o novo concelho, tem uma apetência real e efectiva para ser concelho. E tem-na independentemente das suas posições profissionais ou ideológicas, dos seus credos religiosos ou políticos. Tem-na em conjunto, como uma vontade colectiva extremamente forte. São essas as aspirações profundas da população de Vizela que nós não podemos deixar de apoiar.
Não há -dir-me-ão - uma lei quadro onde se possa integrar este caso de Vizela. Há pouco foi feita a votação e verificou-se que esta Câmara rejeitou as alterações à actual Lei n.º 184/82.
Mas, como já foi aqui dito a vontade última do legislador é a vontade que prevalece. Se esta Câmara entender dever criar, mesmo assim, o concelho de Vizela não vemos que haja obstáculos de ordem legal para que isso acontecesse porque será por uma lei desta Assembleia até posterior e, portanto, como última vontade legislativa que ela será criada. Não há hierarquias de leis a não ser entre leis constitucionais e leis ordinárias.
Entre duas leis ordinárias, sejam leis quadro ou outras leis, não há, em princípio, quaisquer hierarquias cê, como sabem, a última vontade da Assembleia aquela que, em princípio, prevalece.
Por todas as razões aduzidas, não só agora mas ao longo de todas as' intervenções que o meu grupo parlamentar tem. feito sobre este assunto, o MDP/CDE irá votar favoravelmente os três projectos de lei referentes à criação do concelho de Vizela.
Aplausos do MDP/CDE, do PS, do PCP e dos deputados independentes Maria Santos e Lopes Cardoso.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais inscrições, dou por encerrado este debate.
Entretanto, deu entrada na Mesa um requerimento que vai ser lido.
Foi lido. É o seguinte:
Requerimento
Os deputados abaixo assinados requerem:
a) A votação conjunta dos projectos de lei n.º 81/IV, n.º 83/IV e n. º98/IV;
b) Nos termos do artigo 103.º, n.º 2, do Regimento, que a votação seja nominal.
O Sr. Presidente: - Vamos votá-lo, Srs. Deputados.
Submetido, à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do MDP/CDE, dos deputados independentes Ribeiro Teles, Maria Santos e Lopes Cardoso, e de 16 deputados do PRD, votos contra de 7 deputados do PSD, de 4 do PRD e de 2- do CDS e abstenções do PSD, do CDS e de 11 deputados do PRD.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de interpelar a Mesa no sentido de saber quem são os subscritores desse requerimento, o que, aliás, devia ter sido anunciado previamente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, subscrevem este requerimento 27 deputados, sendo a maioria deles do Partido Socialista.
Srs. Deputados, a Mesa vai fazer a chamada para procedermos à votação, nominal conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 81/IV ;(deputado independente Lopes Cardoso); 83/IV (deputado: independente Ribeiro Teles) e. 98/IV (PCP).
Procedeu-se ò chamada, tendo a votação sido a seguinte:
Votos contra:
Abílio Gaspar Rodrigues (CDS).
Adérito Manuel Soares Campos (PSD)
Adriano Silva Pinto (PSD).
Alberto Monteiro Araújo (PSD).
Alexandre Manuel, da Fonseca Leite (PRD).
Álvaro Barros Marques de Figueiredo (PSD).
Amândio Anes de Azevedo (PSD).
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira (PSD).
Ana da Graça Gonçalves C. Antunes (PRD).
António Filipe Neiva Correia (CDS).
António Joaquim Bastos Marques Mendes (PSD).
António José Tomás Gomes de Pinho (CDS).
António Magalhães da Silva (PS).
António Manuel Lopes Tavares (PSD).
António Maria Paulouro (PRD).
António d'Orcy Capucho (PSD).
António Paulo Pereira Coelho (PSD).
António Roleira Marinho (PSD).
António Sérgio Barbosa de Azevedo (PSD).
Arlindo da Silva André Moreira (PSD).
Arménio dos Santos (PSD).
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Arnaldo Ângelo Brito Lhamas (PSD).
Aurora Margarida Borges de Carvalho (PSD).
Belarmino Henriques Correia (PSD).
Cândido Alberto Alencastre Pereira (PSD).
Carlos Alberto Narciso Martins (PRD).
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho (PSD).
Cecília Pita Catarino (PSD).
Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD).
Dinah Serrão Alhandra (PSD).
Domingos Duarte Lima (PSD).
Domingos Silva e Sousa (PSD).
Fernando Dias de Carvalho (PRD).
Fernando Dias Carvalho Conceição (PSD).
Fernando José Alves Figueiredo (PSD).
Fernando José Próspero Luís (PSD).
Fernando José Russo R. Correia Afonso (PSD).
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira (PSD).
Francisco António Oliveira Teixeira (PSD).
Francisco Armando Fernandes (PRD).
Francisco Jardim Ramos (PSD).
Francisco Mendes Costa (PSD).
Francisco Rodrigues Porto (PSD).
Guido Orlando Freitas Rodrigues (PSD).
Henrique José Pereira de Moraes (CDS).
Henrique Luís Esteves Bairrão (PSD).
Henrique Manuel Soares Cruz (CDS).
Henrique Rodrigues Mata (PSD).
Hernâni Torres Moutinho (CDS).
Horácio Alves Marçal (CDS).
João Álvaro Poças Santos (PSD).
João Barros Madeira (PRD).
João Domingos Abreu Salgado (PSD).
João Gomes de Abreu de Lima (CDS).
João José Pedreira de Matos (PSD).
João José Pimenta de Sousa (PSD).
João Luís Malato Correia (PSD).
João Maria Ferreira Teixeira (PSD).
João da Silva Mendes Morgado (CDS).
Joaquim Carneiro de Barros Domingues (PSD).
Joaquim da Silva Martins (PSD).
José de Almeida Cesário (PSD).
José Ângelo Ferreira Correia (PSD).
José Assunção Marques (PSD).
José Augusto Gama (CDS).
José Augusto Santos Silva Marques (PSD).
José Caeiro Passinhas (PRD).
José Carlos Pereira Lilaia (PRD).
José Filipe Atayde Carvalhosa (PSD).
José Francisco Amaral (PSD).
José Guilherme Coelho dos Reis (PSD).
José Júlio Vieira Mesquita (PSD).
José Luís Bonifácio Ramos (PSD).
José Manuel Rodrigues Casqueiro (PSD).
José Maria Andrade Pereira (CDS).
José Maria Peixoto Coutinho (PSD).
José Mendes Bota (PSD).
José Mendes Melo Alves (PSD).
José Miguel Anacoreta Correia (CDS).
José Pereira Lopes (PSD).
José da Silva Lopes (PRD).
José Vargas Bulcão (PSD).
Licínio Moreira da Silva (PSD).
Luís António Damásio Capoulas (PSD).
Luís António Martins (PSD).
Luís Manuel Costa Geraldes (PSD).
Luís Jorge Cabral Tavares Lima (PSD).
Luís Manuel Neves Rodrigues (PSD).
Manuel da Costa Andrade (PSD).
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão (PSD).
Manuel Ferreira Martins (PSD).
Manuel João Vaz Freixo (PSD).
Manuel Joaquim Dias Loureiro (PSD).
Manuel Maria Moreira (PSD).
Manuel Tomás Rodrigues Queiró (CDS).
Mário Jorge Belo Maciel (PSD).
Mário de Oliveira Mendes dos Santos (PSD).
Miguel Fernando Cassola Relvas (PSD).
Narana Sinai Coissoró (CDS).
Reinaldo Alberto Ramos Gomes (PSD).
Rui Alberto Limpo Salvada (PSD).
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos (PRD).
Valdemar Cardoso Alves (PSD).
Vasco Francisco Aguiar Miguel (PSD).
Virgílio de Oliveira Carneiro (PSD).
Vítor Manuel Ávila da Silva (PRD).
Vítor Manuel Lopes Vieira (PRD).
Vítor Pereira Crespo (PSD).
Vitorino da Silva Costa (PRD).
Votos a favor:
Agostinho Correia de Sousa (PRD).
Agostinho de Jesus Domingues (PS).
Alberto Marques de Oliveira e Silva (PS).
Aloísio Fernando Macedo Fonseca (PS).
Américo Albino Silva Salteiro (PS).
António de Almeida Santos (PS).
António Anselmo Aníbal (PCP).
António Dias Lourenço Silva (PCP).
António Eduardo Andrade Silva Pereira (PCP).
António Lopes Marques (CDS).
António Manuel Carvalho F. Vitorino (PS).
António Manuel da Silva Osório (PCP).
António Monteiro de Almeida Taborda (MDP/CDE).
António Pope Lopes Cardoso (Indep.).
António da Silva Mota (PCP).
António Vidigal Amaro (PCP).
Armando dos Santos Lopes (PS).
Augusto Martins Ferreira do Amaral (Indep.).
Belchior Alves Pereira (PCP).
Carlos Alberto Raposo Santana Maia (PS).
Carlos Alberto Rodrigues Matias (PRD).
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas (PCP).
Carlos Alfredo de Brito (PCP).
Carlos Campos Rodrigues Costa (PCP).
Carlos Cardoso Lage (PS).
Carlos Manafaia (PCP).
Carlos Manuel Luís (PS).
Carlos Manuel Natividade Costa Candal (PS).
Carlos Manuel Pereira Pinto (PS).
Cláudio José Santos Percheiro (PCP).
Custódio Jacinto Gingão (PCP).
Domingos Abrantes Ferreira (PCP).
Eduardo Ribeiro Pereira (PS).
Fernando Henriques Lopes (PS).
Francisco Barbosa da Costa (PRD).
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles (Indep.).
Jerónimo Carvalho de Sousa (PCP).
João António Gonçalves do Amaral (PCP).
João Carlos Abrantes (PCP).
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu (PS).
João Rosado Correia (PS).
Joaquim Gomes dos Santos (PCP).
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Joaquim Jorge de Magalhães Mota (PRD).
Jorge Lacão Costa (PS).
Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP).
Jorge Manuel Lampreia Patrício (PCP).
José Apolinário Nunes Portada (PS).
José Carlos Pinto Basto Mota Torres (PS).
José Luís do Amaral Nunes (PS).
José Luís Correia de Azevedo (PRD).
José Manuel Antunes Mendes (PCP).
José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP).
José Manuel Marques Carmo Tengarrinha (MDP/CDE).
José Manuel Santos Magalhães (PCP).
José Rodrigues Vitoriano (PCP).
José dos Santos Gonçalves Frazão (PS).
Júlio Meirinhas Santana (PS).
Leonel de Sousa Fadigas (PS).
Luís Manuel Loureiro Roque (PCP).
Manuel Alegre de Melo Duarte (PS).
Manuel Alfredo Tito de Morais (PS).
Manuel Rogério de Sousa Brito (PCP).
Maria Amélia do Carmo Mota Santos (Indep.).
Maria Ilda Costa Figueiredo (PCP).
Maria Margarida Tengarrinha (PCP).
Maria Odete Santos (PCP).
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia (PS).
Mário Manuel Cal Brandão (PS).
Octávio Floriano Rodrigues Pato (PCP).
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos (PRD).
Raul da Assunção Pimenta Rego (PS).
Raul Fernando Sousela Costa Brito (PS).
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira (PCP).
Rui do Nascimento Rabaça Vieira (PS).
Vasco da Gama Lopes Fernandes (PRD).
Vasco Pinto da Silva Marques (PRD).
Zita Maria de Seabra Roseiro (PCP).
Abstenções:
António Magalhães Barros Feu (PRD).
Arménio Ramos de Carvalho (PRD).
Bártolo de Paiva Campos (PRD).
Carlos Artur Sá Furtado (PRD).
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa (PRD).
Eurico Lemos Pires (PRD).
Fernando Monteiro do Amaral (PSD).
Jaime Manuel Coutinho Gomes S. Ramos (PRD).
José Alberto Paiva Seabra Rosa (PRD).
José Carlos Torres Mota de Vasconcelos (PRD).
José Emanuel Corujo Lopes (PRD).
José Fernando Pinho da Silva (PRD).
José Rodrigo Carneiro da C. Carvalho (PRD).
Roberto de Sousa Rocha Amaral (PRD).
Rui José dos Santos Silva (PRD).
Rui de Sá e Cunha (PRD).
Durante a votação verificaram-se manifestações de protesto nas galerias, tendo o Sr. Presidente mandado evacuar parte destas.
O Sr. Presidente: - O resultado da votação foi o seguinte: votaram 203 senhores deputados, tendo havido 109 votos contra, 78 votos a favor e 16 abstenções, pelo que os diplomas foram rejeitados.
Senhores deputados, os nossos trabalhos começam logo, às 10 horas, com a discussão do projecto de lei n.º 165/IV, do PRD, respeitante a candidaturas às eleições autárquicas apresentadas por um grupo de cidadãos eleitores.
Está encerrada a sessão.
Era l hora e 10 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
António Manuel Lopes Tavares.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
João Luís Malato Correia.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José de Vargas Bulcão.
Luís António Martins.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Partido Socialista (PS):
Alberto Manuel Avelino.
Américo Albino Silva Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Gonçalves Janeiro.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Eduardo Ribeiro Pereira.
José Apolinário Nunes Portada.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonel de Sousa Fadigas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Carlos Alberto Narciso Martins.
José Caeiro Passinhas.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
António Dias Lourenço da Silva.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
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16 DE MAIO DE 1986 2625
Centro Democrático Social (CDS):
Abel Augusto Gomes de Almeida.
Eugénio Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Horácio Alves Marçal.
João da Silva Mendes Morgado.
José Augusto Gama.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Narana Sinai Coissoró.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
José Manuel do Carmo Tengarrinha.
Deputados independentes:
Augusto Martins Ferreira do Amaral.
Maria Amélia Mota Santos.
António José Borges de Carvalho.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.
Partido Socialista (PS):
António Cândido Miranda Macedo.
Helena Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
José Barbosa Mota.
José Manuel Torres Couto.
Victor Manuel Caio Roque.
Partido Renovador Democrático (PRD):
António Alves Marques Júnior.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Maria Cristina Albuquerque.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Partido Comunista Português (PCP):
Octávio Augusto Teixeira.
Centro Democrático Social (CDS):
José Luís Nogueira de Brito.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Declaração de voto enviada à Mesa para publicação sobre o parecer da 1.º Comissão relativo à admissão da proposta de lei n.º 21/IV (Autorização para o Governo legislar em matéria de processo penal).
l - Ao requerer à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias a apreciação preliminar dos problemas de constitucionalidade suscitados pela proposta de lei n.º 21/IV, o PCP visou alertar a Assembleia da República para a necessidade de expurgação atempada dos normativos susceptíveis de representar diminuição das garantias dos cidadãos e reforço indébito dos poderes policiais. Pretendeu-se, acima de tudo, acautelar que não venham a ser transpostas para o futuro Código de Processo Penal soluções fortemente limitadoras dos direitos dos cidadãos, anteriormente propostas à Assembleia da República, no quadro da chamada lei de segurança interna (LSI), em particular as relativas a buscas, apreensões, revistas e medidas similares. Teve-se em mente o imperativo de não fomentar excessos policiais cuja dimensão foi recentemente comprovada em relatório revelado pelo Sr. Provedor de Justiça.
2 - O debate travado em Comissão (e no Plenário) permitiu aprofundar o conhecimento dos contornos e implicações das medidas questionadas pelo PCP, verificando-se serem justificados os juízos de censurabilidade de vários graus e concluindo a Comissão pela necessidade de em todos os casos acautelar soluções que garantam a plena jurisdicionalidade do processo e a capaz salvaguarda dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos.
O parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, ao sublinhar estes aspectos, representa um contributo positivo para que o amplo trabalho a realizar em torno da nova lei de processo penal assente em parâmetros correctos e tome como meta a plena realização dos direitos dos cidadãos, tal qual se encontram constitucionalmente consagrados.
Por isso os deputados do PCP deram o seu voto favorável ao parecer, sem embargo de continuarem a entender que a restrição da decisão parlamentar sobre o novo Código à mera aprovação de uma autorização legislativa acarreta uma indesejável diminuição.
O PCP registou, todavia, a completa rejeição pela Comissão da ideia de que a restrição do âmbito da decisão deva acarretar uma restrição dos debates parlamentar e público. Esses debates devem ter lugar amplamente, com o contributo de especialistas, a participação dos futuros aplicadores (magistrados e advogados), a explanação de opções pelos membros da comissão de reforma que preparou durante anos o texto em apreço, a informação dos serviços responsáveis pela investigação, etc.
Por outro lado, a Comissão exprimiu o entendimento de que, havendo autorização legislativa, esta deverá conformar-se plenamente com as exigências do artigo 168.º, n.º 2, da Constituição. Adiantou, porém, na circunstância, uma ideia inovadora que se afigura de grande importância: a Assembleia deve, neste caso do Código de Processo Penal, usar vigorosamente a sua capacidade conformadora dos poderes a que o Governo vai aceder. Para isso, deverão ser usados, além dos meios habituais, esse outro instrumento que é a estatuição de limites negativos, proibições concretas que eliminem excepções que o Governo pretende às regras de defesa das liberdades necessárias.
3 - O PCP considera necessária e urgente a aprovação de um novo Código de Processo Penal cujo êxito, porém, depende da atempada adopção de providências que assegurem diversos pressupostos de eficácia (sobretudo quanto a meios humanos, técnicos e financeiros) e da cuidadosa ponderação e correcção de certas opções do diploma proposto pelo Governo. O que em qualquer caso não poderia aceitar-se seria a conversão do Código de Processo Penal num depósito de soluções claramente rejeitadas na anterior legislatura no quadro do debate da chamada «lei de segurança interna», sendo preocupante o mutismo governamental quanto à articulação entre o Código de Processo Penal e a anunciada LSI.
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l SERIE — NUMERO 69
Donde a importância da afirmação contida no parecer segundo a qual«qualquer texto legislativo a aprovar na especialidade, mesmo sob a forma de autorização legislativav 'deverá assegurar o cumprimento das disposições constitucionais atinentes às garantias individuais., de processo penal definidas na lei funda-.mental». ;•'••. . • • •, :< • • .
Foi com, esse objectivo que o PCP requereu o debate agora realizado e nestes termos votou,o parecer, elaborado pela l.3'Comissão. , . , ..•:..
Assembleia da República. — Os Deputados do PCP: José Magalhães — José Manuel Mendes. '• ' '
Declaração de voto enviada para a Mesa, para publicação, relativa à votação, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 95/IV e 82/IV. : '
Votei favoravelmente o,projecto de lei n.º 95/IV e .abstive-me em relação à votação, do projecto1 de,lei n.º 82/IV, por entender que: . .. .. .. .-. • , i-(i
a)"A Lei-Quadro de Criação de Municípios não
• tem por objectivo ou virtude o ordenamento'do
território. Se assim- fosse; 'e de acordo 'com- os
conceitos mais ou menos rigorosos utilizados,
a lei conduziria à extinção de municípios;
' b) A lei não tem valor-diferente das outras leis è,
por isso, a Assembleia,'.mantendo embora os
critérios constantes 'de uma lei- quadro, pode
soberanamente decidir para além-dos limites que
ela estatui. •. • : • i: . T . . '• C",
, , , , , ... \
Tenho assim por. inútil a referida ,lei. ..• •» .º»
Assembleia'da República: — O''Deputado dó PRD, J. J. Magalhães Mota. ''.º'• ' '
Declarações de voto enviadas para a Mesa, para publicação, relativas à votação dos projectos de lei n.ºs81/IV, 83/IV,e 98/IV, relativos à criação do concelho de Vizela:
Sempre defendi, como o fiz ainda hoje• na minha intervenção, que a criação de municípios deve estar condicionada a uma lei quadro claramente normativa das condições exigidas para a-criação de novos concelhos. • . • • •.º,
• Na anterior legislatura prestei o meu máximo contributo à elaboração.de um diploma adequado>às realidades locais. • '.,,!:• , , :.
Perante a imposição do'parceiro de coligação
— o PSD;— que, através do expediente de condicionar a criação de novos concelhos à existência das regiões administrativas, proeurou apenas iludir os anseios da população de Vizela;.colaborei-na apresentação de um projecto de, lei, visando retirar ^..acrescento espúrio e de má fé. Esse projecto de .lei acaba de ser rejeitado pelo Plenário. . , ..,•••. ,,/.•
A criação do concelho de Vizela,, na generalidade, .não obsta-a que possam ser satisfeitos os -requisitos constitucionais -da criação de novos .municípios.
De qualquer forma, está em causa uma legítima expectativa das gentes de Vizela, sistematicamente goradas. : , • .-, ..º-,/
Entretanto, a conflitualidade entre os povos de. Vizela e Guimarães tem atingido proporções insuportávejs num regime democrático. Uma das grandes virtudes 'das instituições autárquicas reside na criação de condições
de participação dos cidadãos-nos, assuntos :públicos do seu directo interesse. O grave conflito existente entre Vizela e Guimarães impede,essa participação..1
O problema de Vizela exige dó,, regime democrático solução urgente. Por quanto, fica exposto, votei a favor dos projectos de criação' do concelho de Vizela. ,..,,-,.º. - ,'_.
Palácio de São Bento, 16 de < Maio de 1986. — O Deputado do-PS;'Agostinho Domingues.º '
Votei favoravelmente a criação do •• concelho de Vizela, em coerência com votações no mesmo sentido, na sequência de anteriores debates, e pelos fundamentos que, em intervenções então feitas, tive ocasião de expor. '• '"' x "'."',,'. . ' ~':: ' '
(Diário da Assembleia'* da República,* j'.ª série, n.º 88, de 12 de Maio'de'1982', p. 3691','e ï:'a serie, n.º.70, de 3 de .Fevereiro de 19.84, p. 3158, nomeadamente.) ' .....º.«'• l
Palácio'de São Bento, ' 15 de Maio.de 1986. —.O
Deputado do PRD,1'Joaquim J.ºMagalhães Mota. '
.1 . ' . j' :... . • -
Abstive-me na votaçãó;'da criação do ^concelho de Vizela por duas.ºrdens.de1 razões, contraditórias-entre SÍ. ..º.,,>:•
1 — Pesava para mim e pesa fortemente num sentido positivo da criação: • - -í J.º - • ••' • . • • •
a) A vontade expressa, -longa e coerentemente, pela população de Vizela; , , ,_
b) A presunção, por informações empiricamente colhidas,-.de que Vizela,recolhe condições para
ser concelho.
. " * • '.º..º..º r., ')'•• '
.. :r ' ,v . •'. . • : . ' ,- .
2 — Pesa negativamente..quanto à mesma-criação:
a) Não tei 'sido' cumprido o artigo 249.º da Constituição da República que para a criação de ' autarquias • exige'a consulta prévia aos órgãos das autarquias abrangidas, sem ó que este vício de procedimento gera inconstitucionalidade) (segundo parecer' dos Constitucionalistas Gomes, Canotilho e- Vital Moreira);
.^ --ò)-Não ter havido rejatório,ou parecer da Comissão de Administração Interna e .Poder Local nem tão-pouco ter entendido durante a discussão em Plenário argumentos com objectividade ou a enunciação de parâmetros significan-
• . ;• nes tendentes a essa criação.
Assembleia da República. — O Deputado do PRD, Sá Furtado.
•" Votei 'contra' por considerar que os interesses da "população de Vizela, aliás-como de'outras populações,
-•serão melh'or-servidos num projecto global de-regïonâ-' lização:'.- • •>•*• • '- • •• - ...;•• • , . v .~r . . ' •:.» r •?. •••:..•'• ...i Assembleia.da República.,— O Deputado.do PRD, ..Carlos Martins, ., ,-
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Rectificação ao n º 65 (8 de Maio de 1986)
No sumário, col. 2.ª, 1. 17, onde se lê «[...] e do projecto de lei n.º 18/IV [...]» deve ler-se «[...] e do projecto de lei n.º 28/IV (...]».
Na p. 2423, col. 2.ª, 1.33, onde se lê «[...] e do projecto de lei n.º 38/IV [...]» deve ler-se «[...] projecto de lei n.º 28/IV [...]».
Na p. 2423, col. 1.ª, 1. 22, onde se lê «[...] projecto de lei n.º 38/IV [...]» deve ler-se «[...] projecto de lei n.º 28/IV [...]».
Os REDACTORES: José Diogo - Ana Maria Marques da Cruz - Maria Amélia Martins.
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PREÇO DESTE NÚMERO 266$00
Depósito Legal n.º 8818/85
PORTE PAGO.
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.