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I Série - Número 80

Quarta-feira, 18 de Junho de 1986

PORTE PAGO

DIÁRIO da Assembleia da República

IV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1985-1986)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 17 DE JUNHO DE 1986

Presidente: Ex.(tm) Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Exmos. Srs.

Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto Basto da Mota Torres
Rui de Sá e Cunha
Jorge Manuel Lampreia Patrício

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos, das respostas a alguns outros e dos diplomas e petições entrados na Mesa.
Foi dado conhecimento à Câmara dos resultados das eleições para o Conselho Superior de Defesa Nacional e para o Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações.
Foi lido e aprovado um voto de pesar pela tragédia que vitimou as populações do Caramulo e designadamente da região de Águeda, tendo produzido declarações de voto os Srs. Deputados Manuel Alegre (PS), Vieira Mesquita (PSD), Zita Seabra (PCP), Rui Silva (PRD) e Horácio Marçal (CDS).
Os Srs. Deputados Valdemar Alves (PSD), Horácio Marçal (CDS) e Azevedo Gomes (PSD) produziram intervenções em que manifestaram profundo pesar pelas vitimas do incêndio ocorrido no Caramulo e que atingiu as populações de Águeda, Sever do Vouga e Anadia e alertaram a Camará e o Governo para a premência de se implementarem medidas urgentes e eficazes na defesa da floresta portuguesa.
O Sr. Deputado Dias de Carvalho (PRD) alertou para os problemas de saúde das regiões a sul do Tejo e de Castelo Branco, nomeadamente para a profilaxia do bócio endémico, e salientou a necessidade de promover o desenvolvimento da agricultura nas regiões do interior.
O Sr. Deputado Marques Mendes (PSD) falou sobre a derrota da selecção portuguesa no México.
O Sr. Deputado Ribeiro Teles (Indep.) criticou o Estado pela política florestal até hoje prosseguida.
A Sr.ª Deputada Odete Santos (PCP) alertou a Câmara para o número crescente dos trabalhadores com salários em atraso.
O Sr. Deputado Agostinho Domingues (PS) referiu-se à importância do acordo de unificação ortográfica da língua portuguesa para a manutenção e defesa do património linguístico português.
O Sr. Deputado Armando Fernandes (PRD) falou sobre as graves carências de pessoal e de material a nível dos cuidados médicos e de saúde na região do Ribatejo, nomeadamente no distrito de Santarém.
Foi lido e aprovado um voto de pesar pela morte de Jorge Luis Borges, apresentado pelo PRD.
Foi igualmente tido e aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de um deputado do PSD.

Ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 69 a 74 do Diário.
A Câmara aprovou uma proposta de deliberação no sentido de prolongar os trabalhos até ao dia 25 de Julho de 1986.
Após leitura, pelo Sr. Deputado João Abrantes (PCP), do relatório e parecer da Comissão de Administração Interna e Poder Local, iniciou-se a discussão na generalidade do projecto de lei n. º 194/IV (CDS) sobre o estatuto social do bombeiro.
Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Andrade Pereira (CDS), Magalhães Mota e Rui Silva (PRD), João Abrantes (PCP) e Silva Marques (PSD).
Entretanto, procedeu-se à votação final global da proposta de lei n.º 18/IV - agrava as sanções penais aplicáveis em caso de incêndios florestais - que foi aprovada. Produziram declarações de voto os Srs. Deputados Armando Lopes (PS), José Magalhães (PCP), José Carlos Vasconcelos (PRD), Vieira Mesquita (PSD) e Andrade Pereira (CDS).

O Sr. Presidente encerrou a sessão, eram 19 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Monteiro Araújo.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
Amândio Anes de Azevedo.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Jorge de Figueiredo Lopes.

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António Manuel Lopes Tavares.
António Paulo Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Mendes Costa.
Francisco Rodrigues Porto.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Luis Esteves Bairrão.
Henrique Rodrigues Mata.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João José Pimenta de Sousa.
Joaquim da Silva Martins.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Filipe de Athayde Carvalhosa.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Mendes Bota.
José de Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Luís Jorge Cabral Tavares Lima.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Américo Albino Silva Salteiro.
António Domingues de Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António José Sanches Esteves.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
Jaime José Matos da Gama.
Jorge Lacão Costa.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonel de Sousa Fadigas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo de Sousa Pereira.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo de Paiva Campos.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Eurico Lemos Pires.
Defensor Oliveira Moura.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco, Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho;
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
João Barros Madeira.
Joaquim Carmelo Lobo.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Torres Matos Vasconcelos.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Fernando Pinho da Silva.
José Luís Correia, de Azevedo.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo da Costa Carvalho.
Maria Cristina Albuquerque.
Maria da Glória Padrão. Carvalho.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Tiago Gameiro. Rodrigues Bastos.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Lopes Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Manuel da Silva Osório.

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António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Sérgio José Ferreira Ribeiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
António José Tomás Gomes de Pinho.
Eugénio Nunes Anacoreta Correia.
Henrique José Pereira de Moraes.
Horácio Alves Marçal.
José Maria Andrade Pereira.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Pedro José Del Negro Feist.
Manuel Fernando Silva Monteiro.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
João Manuel Caniço Seiça Neves.

Deputados independentes:

António José Borges de Carvalho.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte:

Expediente Carta

De Armando Rodrigues, residente em Lisboa, referente à problemática da actualização das rendas, determinada pelo Decreto-Lei n.º 13/86, de 23 de Janeiro, solicitando que o prazo previsto no n.º 6 da Lei n.º 46/85 seja alterado para 60 dias.

Ofícios

Das Assembleias Municipais de Lagos e Espinho, referindo-se às competências que devem existir nos presidentes dos órgãos autárquicos, para emitirem os cartões de identidade para uso dos respectivos membros;
Da Assembleia Municipal do Porto, enviando cópia da moção aprovada por unanimidade na reunião realizada no dia 21 do passado mês de Maio, manifestando o seu repúdio pelos actos de agressão física de que têm sido vítimas alguns Srs. Deputados e a sua solidariedade para com todos os que estão no exercício dos seus mandatos;
Da Câmara Municipal de Sintra, remetendo extracto de parte da acta da reunião ordinária do passado dia 21 de Maio, em que foi aprovada por maioria uma proposta para que seja revogada a Lei das Rendas a que se refere a Portaria n.º 227/86;
Da Junta de Freguesia de Runa, Torres Vedras, remetendo um exemplar com a tomada de posição daquela Junta relativamente à poluição do rio Sizandro e solicitando que sejam tomadas providências para debelar a situação existente, que é grave para as populações.

«Telexes»

Da Cooperativa Agrícola dos Lavradores de Águeda, representando mais de 6000 agricultores naquele concelho, dando conta da assembleia geral realizada após a catástrofe do incêndio que provocou a perda de vidas e de bens materiais, solicitando que sejam tomadas providências locais e outras a nível nacional para se evitarem tais calamidades.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas, requerimentos e respostas a requerimentos entrados na Mesa.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os requerimentos seguintes: Na sessão do dia 11 de Junho de 1986; ao Ministério das Obras Públicas e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado António Mota; ao Ministério da Educação e Cultura, formulados pelos Srs. Deputados Luís Roque e José Tengarrinha; a diversos ministérios (3), formulados pelo Sr. Deputado Seiça Neves; à Junta Autónoma de Estradas, formulado pelos Srs. Deputados Álvaro Brasileiro e Sérgio Ribeiro; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado José Lello; ao Ministério da Indústria e Comércio, formulado pela Sr.ª Deputada Maria Santos; ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, formulado pela Sr.ª Deputada Helena Torres Marques e outros; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Manuel Alegre e Rodrigues da Mata, e à Secretaria de Estado para os Assuntos Fiscais, formulado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira.
Na sessão do dia 12 de Junho de 1986: ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelos Srs. Deputados Sérgio Ribeiro e Álvaro Brasileiro; a diversos ministérios (2), formulados pelo Sr. Deputado Custódio Gingão e outros; ao Ministério da Educação e Cultura, formulados pelos Srs. Deputados António Osório, Agostinho Domingues, Duarte Lima, Barbosa da Costa e Carlos Brito; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Daniel Bastos; ao Governo (2), formulados pelo Sr. Deputado Carlos Carvalhas; a diversos ministérios (4), formulados pelo Sr. Deputado Luís Roque; a diversos ministérios (3), formulados pelo Sr. Deputado Gomes de Pinho; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Roleira Marinho, Oliveira Carneiro e Aloísio da Fonseca; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pela Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha; aos Ministérios da Agricultura, Pescas e Alimentação e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (2), formulado pelo Sr. Deputado José Manuel Mendes; ao Governo (3), formulados pelo Sr. Deputado Francisco Armando Fernandes; a diversos ministérios (6), formulados pelo Sr. Deputado António Feu; ao Ministério

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da Saúde (2), formulados pelo Sr. Deputado Defensor Moura; ao Ministério da Educação e Cultura (3), formulados pelo Sr. Deputado Bártolo Paiva Campos; ao Ministério do Plano, e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado António Sousa Pereira; ao Ministério da Administração Interna,, formulados pelos Srs. Deputados Arménio Ramos de Carvalho e Carlos Sá Furtado; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado José Seabra, e aos Ministérios da: Justiça e da Saúde (2), formulados pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Carlos Brito e Margarida Tengarrinha, na sessão de 21 de Novembro; Rogério Moreira, na sessão de 19 de Novembro; Rogério Moreira, na sessão de 19 de Novembro; Maria Santos; nas sessões de 7 de 1 Fevereiro de 20 de Maio; Carlos Manuel Luís, nas sessões de 27 de Fevereiro e 11 de 1 Março; Barbosa da Costa, na sessão de 4 de Março; António Paulouro e Barros Madeira, na sessão de -6 de Março; Sousa Pereira, nas sessões de 10 de Março e 22 de Abril; Rodrigues da Mata, na sessão de 11 de Março; Dias de Carvalho, nas sessões de 13 de Março e 22 de Abril; Oliveira e Silva, na sessão de 14 de. Março; Raul Junqueiro, na sessão de 15 de Abril; Ramos de. Carvalho e, Sá Furtado,; na sessão de 22 de Abril; António Tavares, e Miguel Relvas, na sessão de 24 de Abril; José. Magalhães e outros, nas sessões de 24 de Abril; Silva Marques e outros, na sessão de. 24 de Abril; Mário Maciel, na sessão, de 13 de Maio e Margarida Tengarrinha, na sessão de 23 de Maio.
Deram entrada na Mesa e foram admitidos os seguintes diplomas: ratificação n.º 76/IV, do Sr. Deputado Carlos Lilaia e outros do PRD - relativa ao Decreto-Lei n.º 130/86, de 7 de Junho, que aprova a Lei Orgânica do Ministério do Plano e da Administração do Território; projecto de lei n.º 240/IV, do Sr. Deputado Abílio Gaspar Rodrigues e outros do PSD - propõe a criação da freguesia de Gouxaria, com sede na povoação de Gouxaria, no concelho de Alcanena -, que baixa à Comissão de Administração interna e Poder Local (10.ª Comissão); projecto de lei.n.º 237/IV, do Sr. Deputado Nogueira de Brito e outros do CDS - propõe indemnizações por actos terroristas -, que baixa à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª Comissão); projecto de lei n.º 238/IV, do Sr. Deputado Rui Rabaça Vieira do PS - propõe a elevação à categoria de cidade da vila da Marinha Grande -, que baixa à 10.ª Comissão; projecto de lei n.º 239/IV, da Sr.ª Deputada Independente Maria Santos propõe a criação de espaços verdes urbanos -, que baixa à Comissão de Equipamento Social e Ambiente (9.ª Comissão); proposta de lei n.º 32/IV, da Assembleia Regional, da Madeira -; propõe transferências entre o Orçamento do Estado e o orçamento regional -,- que baixa à Comissão de Economia, Finanças e Plano (5.ª Comissão).
Deram ainda entrada na Mesa, encontrando-se distribuídas às respectivas Comissões, as seguintes petições: Petição n.º 53/IV, de Armando Teixeira da Silva, residente em Santa Maria, da Feira, solicitando que a comissão competente se, pronuncie sobre a eventual ilegalidade surgida na Junta de Freguesia de Santa Maria da Feira, quanto à ocupação do cargo de presidente; Petição n.º 54/IV, de João da Silva Mendes Morgado e outros, residentes na Quinta da Cerca, Lamego, expondo a situação média existente no Hospital Distrital de Lamego e solicitando providências adequadas para que o mesmo não venha a ser, dentro em pouco, um centro de saúde para os primeiros socorros.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura das actas dos actos eleitorais que se efectuaram na sessão plenária do passado dia 12 do corrente mês.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Srs. Deputados, são do seguinte teor as actas dos referidos actos eleitorais:
Aos 12 dias de Junho de 1986 procedeu-se na reunião plenária da Assembleia da República à eleição para o Conselho Superior de Defesa Nacional, tendo votado 214 deputados e obtidos os seguintes resultados:
Votos: sim, 134; não, 60; abstenções, 19; nulos, 0, e brancos, 1.
Verificados estes resultados, considera-se que o candidato Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira não obteve a maioria qualificada de dois terços necessária para a respectiva eleição.
Aos 12 dias de Junho de 1986 procedeu-se na reunião plenária da Assembleia da República à eleição para o Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações, tendo votado 214 deputados e obtido os seguintes resultados:
Votos: sim, 157; não, 41; abstenções, 15; nulos, 0, e brancos, 1.
Verificados estes resultados, considera-se que o candidato José Anselmo Dias Rodrigues obteve a maioria qualificada de dois terços necessária para a sua eleição.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, indo ao encontro do sentimento dos grupos parlamentares, a Mesa apresenta um voto de pesar, que vai ser lido de seguida, para dele tomarem conhecimento. No final, após ter sido submetido à votação, cada grupo parlamentar disporá de três minutos para se pronunciar em declaração de voto.
O voto de pesar apresentado pela Mesa é do seguinte teor:

Foi com profunda tristeza que o País viveu angustiadamente a tragédia dos fogos que assolaram a região de Águeda. Na sua fúria destruidora queimou bens e valores, semeando a intranquilidade e a angústia por entre as populações da zona do Caramulo.
Estes sofreram a perda de vidas que a voragem do fogo não poupou.
Doze dos seus denonados bombeiros pagaram com a vida a coragem da sua disponibilidade posta ao serviço dos outros.
Foi preço que mergulhou o País na derrota amarga de um pesadelo consumado. Outros foram também devorados pelas chamas e o luto e até amargura cobriram seus povos com o manto negro da desolação.
O Plenário, fazendo-se voz dessa tristeza e expressando os seus sentimentos para com as famílias das vítimas daquela tragédia, formula o seguinte voto de pesar:

A Assembleia da República, sentindo a dolorosa tragédia que vitimou as populações do Caramulo e designadamente da região de Águeda, apresenta as suas sentidas condolências às

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famílias das vítimas e acompanha-as na sua dor; manifesta a sua solidariedade às prestimosas e humanitárias corporações de Águeda e Anadia que perderam na tragédia os seus corajosos sacrificados bombeiros; faz sua a tristeza que domina as autarquias locais que sofreram grandes perdas humanas e a todos transmite o seu profundo pesar.
Vamos proceder à votação do voto de pesar que acabou de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas algumas breves palavras. São palavras de um aguedense que partilha a dor e o luto do povo da sua terra mas também a sua indignação e o seu apelo para que nada fique na mesma.
Em primeiro lugar, uma palavra contra o fatalismo. Portugal não está condenado a arder. Os seus bombeiros não estão condenados à catástrofe permanente. É possível prevenir o fogo, combatê-lo e vencê-lo; é possível defender as florestas, as pessoas, as culturas e os bens. Para tal, é preciso que esta questão seja encarada como uma prioridade nacional que mobilize a vontade política, os recursos e as medidas adequadas.
Em segundo lugar, uma palavra contra o egoísmo. Os bombeiros de Águeda e de Anadia, os de Armamar, os de todo o País, deram-nos e dão-nos todos os dias uma lição de generosidade, de solidariedade, de sacrifício da vida pela vida. Não podemos responder-lhes com lágrimas efémeras nem com discursos de circunstância.
Há medidas que podem e devem ser tomadas já, nomeadamente a fixação, por lei, do seguro do bombeiro e de uma pensão para as famílias dos que morrem no seu posto. Não se trata de caridade nem de respostas isoladas deste ou daquele governo. Trata-se de dar uma expressão legal à solidariedade nacional devida àqueles que fazem das suas vidas um exemplo constante de desinteresse e de dádivas.
Em terceiro lugar, uma palavra sobre a situação dramática em que ficaram os bombeiros de Anadia. Eles perderam homens, viaturas e material. Deram tudo e ficaram praticamente sem nada. Sacrificaram-se pelos outros, por Águeda, por todos nós. É a vez de o País ser solidário com eles. Deixo aqui este alerta e este apelo a todos os órgãos de soberania e a todos os Portugueses.
Proponho, inclusivamente, se tal for possível, a contribuição da Assembleia da República para a aquisição de uma viatura para os bombeiros de Anadia.
Em quarto lugar, todos estamos de acordo quanto à necessidade de agravar as penas aplicáveis aos incendiários. Ë uma exigência nacional, mas não basta punir a mão que ateia o fogo. É preciso combater, desmascarar e punir muito mais duramente aqueles que aliciam ou pagam os agentes directos. Esta é uma questão fundamental.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não podemos ficar pelo de braço armado do crime. Temos de declarar guerra à hierarquia de responsabilidades, interesses e benefícios ligados à
catástrofe incendiária por fogo posto. Temos de combater sobretudo os escalões superiores da organização de fogo posto e os seus grandes beneficiários.
Para isso, é necessário completar as medidas de prevenção e repressão por um conjunto de mecanismos capazes de pôr termo aos benefícios económicos que estão por detrás do fogo posto. São, entre outros, os mecanismo previstos num projecto apresentado pelo meu partido, de que sou subscritor, tendo como objectivo impedir o duplo corte e proibir a exportação de matéria-prima lenhosa. Só assim se desmotivarão os interesses económicos que transformaram o incêndio florestal numa «nova indústria», à custa dos interesses nacionais, da destruição de vidas, de florestas e de culturas.
Finalmente, o País tem de ser dotado o mais urgentemente possível dos meios modernos indispensáveis ao combate ao fogo. Não podemos estar à mercê dos aviões de Espanha, cuja solidariedade, aliás, se agradece e se regista.
Mais do que aviões para uma guerra que não há, precisamos de aviões para a guerra que temos: a guerra ao fogo. Trata-se, também aqui, de uma prioridade e de uma exigência nacional.
Que se corte onde tiver de se cortar, mas que nada se poupe para dotar Portugal dos meios indispensáveis para combater um flagelo que está a destruir o seu património e a enlutar as famílias portuguesas.
Contra o fatalismo, o egoísmo, a burocracia, saibamos responder com actos, medidas, meios e vontade política, para que não se repita Armamar nem Águeda, para merecermos os que souberam dar as suas vidas pela vida!

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira Mesquita.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD, sem prejuízo de uma intervenção de fundo que um colega meu de bancada irá fazer, votou favoravelmente este voto de pesar porque tem presente, nomeadamente, «O último acto de tragédia», como titula um jornal de ontem, 16 de Junho, a fotografia e a descrição noticiosa do luto que mais uma vez atingiu os bombeiros voluntários portugueses, vítimas do violento incêndio, presumivelmente criminoso, que assolou devastadoramente a serra do Caramulo e veio enlutar numerosas famílias, e causar prejuízos matérias incalculáveis.
«Águeda: a tragédia volta à floresta» - também, assim, um outro jornal epigrafou o desastre nacional dos incêndios florestais que na passada semana deflagraram, igual e supostamente ateados por mão criminosa, em Sintra e em Águeda, com as dramáticas consequências conhecidas, que se saldaram em perdas de preciosas vidas humanas e avultados prejuízos de ordem material.
Curvamo-nos, com reverência, perante a dor dos familiares enlutados e testemunhamo-lhes, nesta hora de tristeza o nosso mais sentido pesar.
Ao erguermos a nossa voz nesta Assembleia, recordamos que, no passado dia 8 de Maio, fizemos uma intervenção sobre a necessidade e urgência da adopção de medidas punitivas de direito penal adequadas à gravidade dos crimes de incêndio em florestas e matas. E terminamos fazendo um apelo aos Srs. Deputados para

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a premência de aprovar com maior celeridade a proposta de lei do Governo sobre o agravamento das sanções penais em casos de incêndios florestais, uma vez que faltava então «menos de um mês para a época normal de fogos que todos desejaríamos, se possível, eliminar de vez».
Permita-me dizer, Sr. Presidente, Srs. Deputados, como lamentamos profundamente que a nossa actividade legiferante no aperfeiçoamento de uma proposta de lei não tenha sido conseguida por forma a aprovar atempadamente uma proposta de lei desta natureza,...

Vozes do PRD: - Não apoiado!

O Orador: - ... tanto mais que procurámos dar o nosso contributo adiantando, em sede de discussão na especialidade, dois sucessivos textos com propostas de redacção da futura lei de prevenção e repressão dos crimes de incêndio.
Termino endereçando, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, as nossas sentidas condolências às famílias enlutadas, que tanto sofrem neste momento. Saibamos - saiba esta Assembleia da República -, com a urgência necessária, tratar dos vivos, porque o futuro a todos pertence.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com profundo pesar que o Grupo Parlamentar do PCP e eu própria, como deputada pelo círculo de Aveiro, nos desejaríamos associar a este voto pela catástrofe que enlutou as populações de Águeda e Anadia.
Dezasseis vidas ceifadas de onze bombeiros voluntários das corporações de Águeda e de Anadia e quatro populares, para além de um desaparecido, e hectares e hectares de floresta ardidos! A desolação, a dor e o desespero foram a marca, das populações nestes dias de luto. É com profundo respeito que nesta Assembleia desejamos prestar homenagem aos bombeiros caídos neste fogo horrível de Águeda. Mas isso não chega! Aquilo que pudemos ouvir aos bombeiros desesperados e cansados que choravam os seus colegas era uma firme exigência de medidas, de soluções. Pelo nosso lado, queremos afirmar que o Grupo Parlamentar do PCP está na inteira disposição de colaborar imediatamente para que a Assembleia da República tome todas as medidas legislativas que estão nas suas competências para obviar à situação criada por milhares de hectares ardidos durante os meses de Verão.
Consideramos que seria inadmissível que podendo, como pode, a Assembleia da República contribuir para minimizar algumas das consequências desta catástrofe dos incêndios, não o fizesse com toda a brevidade, mas achamos igualmente inaceitável que o Governo, pela voz do Sr. Primeiro-Ministro, alije, para cima da Assembleia da República as responsabilidades políticas que ao Executivo competem.

Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Aproveito para comentar uma intervenção há pouco feita, dizendo que, da parte do nosso grupo parlamentar, fizemos ontem mesmo a proposta para que hoje ficasse agendada a votação final global da proposta de lei que está pendente de votação na Assembleia da República. Creio que essa é a vontade global da Câmara e dos deputados que aqui estão.
Em relação ao incêndio de Águeda, é necessário, agora, com brevidade apoiar as famílias dos bombeiros que pereceram ou ficaram incapacitados neste incêndio. Que se não arraste, como. tem sucedido noutros casos, por anos e anos, a espera das famílias às indemnizações a que têm direito! Mas é ainda urgente repor imediatamente as viaturas dos Bombeiros de Águeda e Anadia que ficaram destruídas, sob pena de estas corporações ficarem sem meios para fazer frente a novos incêndios.
Choremos os mortos, homenageemos a coragem e a abnegação destes homens que perderam a vida em defesa do povo e do País. Mas que não se fique por aí! Tomemos igualmente medidas para evitar que Águeda e Armamar se repitam. Para isso, não chega aumentar a pena do criminoso que acende o fósforo. É preciso tomar medidas sérias e corajosas face àqueles que fazem fortuna à custa da destruição das florestas. Quando outros países fizeram isso acabaram com a maioria dos incêndios. São necessárias medidas legislativas e medidas penais.
Simultaneamente, e usando a expressão do comandante dos Bombeiros de Águeda, é urgente «planificar a floresta». Se em Águeda as rajadas ciclónicas do vento queimaram numa noite uma extensão brutal, o que é certo é que, sem a planificação da floresta, esse perigo será uma constante.
Nenhuma destas medidas, porém, será eficiente se o País e os bombeiros não dispuserem dos meios técnicos necessários a um eficaz combate aos incêndios. O nosso país tem uma originalidade pouco comum. A quase totalidade dos seus bombeiros são voluntários. Como se pode admitir que não tenham os meios e a protecção social necessária? De quem são as responsabilidades de os escassos meios aéreos de que o País dispõe só estarem prontos a funcionar durante um período que alguém decretou? É inadmissível tamanha irresponsabilidade!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Defender a floresta é defender uma das grandes riquezas nacionais; defender as vidas dos bombeiros e populares é uma obrigação e uma responsabilidade que é criminoso descurar. Juntamos, pois, o voto do Grupo Parlamentar do PCP ao dos outros grupos parlamentares e a todas as homenagens às vítimas desta tragédia e apresentamos sinceras homenagens, às famílias dos mortos, mas fazêmo-lo com total disponibilidade para contribuir para acabar com estas acções criminosas, que ceifam vidas e bens e ameaçam de destruição completa a floresta em Portugal.

Aplausos do PCP, do PS e do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.

O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de iniciar a minha intervenção, gostaria de fazer um pequeno reparo que, suponho, passou aos anteriores oradores.
É que o número de bombeiros já falecidos neste momento é de treze, havendo um desaparecido. A tentativa de encontrar esse bombeiro está neste momento a ser efectuada pelas corporações de Anadia e de Águeda

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e pelos homens-rãs, pois supõe-se que ele tenha desaparecido no rio Águeda e o seu corpo ainda não apareceu. Há neste momento treze bombeiros mortos, um desaparecido e três civis mortos.
Como é do conhecimento de alguns, sou um cidadão ligado às associações de bombeiros já desde há vários anos e tenho vindo a acompanhar e a partilhar das preocupações não só dos bombeiros da minha associação como também dos bombeiros de Portugal em geral. Não me é fácil, antes me sendo bastante penoso, ter de vir mais uma vez a esta Câmara solidarizar-me com um voto de pesar, que votámos, como é lógico, favoravelmente, pela morte de mais catorze homens que desinteressadamente continuam a servir o seu semelhante, com um espírito de sacrifício que é inigualável em funções idênticas por todo o Portugal.
Uma pergunta se nos coloca: foi em Armamar há dois anos e em Águeda este ano, e esta Câmara, em Junho, já está a expressar um voto de pesar pela morte de catorze bombeiros e três civis. O que irá acontecer em Julho, Agosto e Setembro, que, como todos sabemos, é a época crítica dos fogos, pois as florestas estão secas e ressequidas, sendo nessa altura que os fogos são maiores, mais numerosos e mais perigosos?
Tive já oportunidade de alertar esta Câmara, em mais do que uma intervenção, para a necessidade de se criarem situações de prevenção e vigilância. Se elas não forem criadas não vamos chegar ao fim da época estival de 1986 com treze mortos e um desaparecido. Vamos ter, com certeza, dezenas de mortos, vão morrer mais bombeiros, os homens vão voltar a entrar nas matas sem saber se voltam e as mães, os pais e os filhos vão voltar a perder os seus entes queridos.
Quero deixar aqui bem expresso que se não forem criados e alertados os mecanismos para que a prevenção e a segurança das nossas florestas sejam de facto uma realidade - como já na semana passada salientaram responsáveis do Serviço Nacional de Bombeiros- será impossível combater-se o flagelo dos incêndios nas nossas florestas. Vamos continuar a ter matas a arder, a nossa fauna e a nossa flora destruídas e bombeiros mortos nas nossas florestas.
Como disse, não me é fácil exprimir a minha angústia neste momento face à dramática e trágica situação da morte de catorze companheiros meus. Eles morreram; não posso fazer mais do que deixar aqui bem expresso o meu pesar e o meu sentimento.
Que todos nós - é essa a nossa incumbência, a nossa responsabilidade - evitemos que situações destas se possam vir a repetir não só durante o ano de 1986 mas também para o resto da vida, para que o futuro dos bombeiros não seja atingido de forma tão alarmante como tem vindo a ser até este momento!

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.

O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS tinha um voto de pesar para apresentar a esta Câmara, mas resolveu retirá-lo para dar oportunidade a todos os partidos de se expressarem em relação à tragédia que vitimou Águeda no passado fim-de-semana, como já aqui foi referido por outras bancadas.
Quem viveu, como eu e outros deputados aqui presentes neste Plenário, o drama de Águeda não pode ter ficado insensível àquilo que se passou.
Vimos arder florestas, casas, escolas, vimos homens ficarem transformados em autênticos carvões. Um drama que só quem de perto esteve junto dele poderá ter a consciência plena da sua gravidade. Esta Assembleia e os organismos públicos têm de realmente tomar as medidas - como já aqui foi referido - para que se evitem situações destas.
Temos uma intervenção para fazer, pelo que não nos vamos alongar mais, mas queremos, neste momento, dar o nosso total apoio ao voto de pesar e expressar aqui o nosso voto para que de futuro se tomem medidas para se evitarem situações e tragédias como esta.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Valdemar Alves.

O Sr. Valdemar Alves (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma vez mais a tragédia desabou sobre as mártires populações dos concelhos de Águeda, Sever do Vouga e Anadia.
Uma mão criminosa ou, pelo menos, descuidada destruiu o fruto de longos anos de trabalho de muitas famílias.
Uma mão criminosa ou, pelo menos, descuidada lançou no desespero inúmeras famílias, que viram as suas florestas, as suas casas, os seus animais domésticos, o seu dinheiro, as suas escolas serem devorados pelas chamas.
Uma mão criminosa ou, pelo menos, descuidada lançou, com um simples gesto, várias famílias na dor, no luto inconsolável ao verem dezasseis dos seus filhos serem calcinados pelas labaredas impiedosas.
Foram dezasseis irmãos nossos que, em dádiva total na defesa dos bens e da vida dos seus semelhantes, se viram, em rápidos instantes, imolados pelo fogo insaciável.
Todos choramos de alma a sangrar estas vidas.
Todos nós sentimos na carne o horror desta tragédia.
Às famílias destas heróicas vítimas, de um modo especial aos seus pais, esposas, filhos e irmãos, em meu nome pessoal e do Partido Social-Democrata aqui deixamos o testemunho público do nosso imenso pesar.
Que o exemplo das suas sacrificadas vidas não se apague no esquecimento humano, que o seu holocausto supremo possa ser motivo de meditação para todos nós e jamais possa haver alguém, por descuido ou maldade, capaz de provocar horrores como este.
De facto, só quem, como eu, viveu mais de vinte e quatro horas consecutivas no meio dos bombeiros e populares que denodadamente combatiam as chamas, pode avaliar todo o alcance deste drama.
Só quem viu aqueles rostos tisnados pelo calor, os lábios gretados pela sede, os olhos vermelhos pelo fumo, os músculos retesados pelo esforço, as lágrimas de desespero a cada recuo estratégico, os gritos de encorajamento ecoando pelos montes e encostas, pode compreender tamanha dação de irmãos nossos, fossem bombeiros ou populares.
Venceram o fogo, mesmo quando parecia este o vencedor irredutível.
Mas neste campo de batalha ficaram dezasseis corpos calcinados e milhares de hectares de floresta destruída. O País e todos nós estamos mais pobres.

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Numa gigantesca manifestação de dor prestámos-lhes a nossa última homenagem e dissemos-lhes que a sua memória perdurará, o seu exemplo jamais se apagará das nossas almas.
E se, por um lado, louvamos a presença do Sr. Presidente da República e do Governo, representado pelo Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna no local do sinistro e nas cerimónias fúnebres, bem como a decisão da rápida atribuição do seguro e pensões de sobrevivência aos familiares dos bombeiros falecidos, pensamos que outras medidas ainda poderão e deverão ser tomadas.
Umas de carácter imediato, outras a curto prazo.
De entre as primeiras, reputamos de primordial importância a recuperação dos salvados e o repovoamento florestal das áreas ardidas.
Abertura de depósitos onde as propriedades possam colocar as madeiras queimadas, pagas a preços justos e preestabelecidos, é tarefa a implementar de imediato.
Nesta tarefa deve o Governo exigir a colaboração das fábricas de celulose e outras indústrias capazes de consumir esta matéria-prima.
Mas, repito, não poderemos perder demasiado tempo.
Não podemos, como aconteceu há anos, andar a criar comissões que demorem meio ano a organizar postos de recepção de madeira e depois funcionaram dois meses apenas.
Se não encontrarmos soluções rápidas poderemos atrasar a recuperação florestal por vários anos com os consequentes prejuízos para a economia nacional.
Se as madeiras não forem rapidamente cortadas, estas rebentarão de forma deficiente, inutilizando o material futuro.
Contudo, os agricultores não poderão proceder a cortes necessários se não tiverem a certeza da colocação e pagamento das madeiras, que lhes permitam, pelo menos, cobrir as despesas.
Deveríamos, por outro lado, aproveitar esta oportunidade e a disposição das populações para se proceder à abertura de asseiros mestres minimamente dimensionados que permitam acessos fáceis aos socorros em futuros casos de emergência.
Os serviços florestais regionais e locais, devidamente mandatados, poderiam desenvolver intensa acção de sensibilização junto das populações no sentido destas não deixarem de pé os esqueletos das árvores mas antes procederem ao seu corte sistemático e organizado de modo a permitir um repovoamento florestal capaz e rentável.
Não somos um país suficientemente rico para nos darmos ao luxo de deixar cerca de 15 000 ha de terreno serem reflorestados ao sabor da natureza.
Temos ainda um largo capital de disponibilidade e capacidade que não podemos enjeitar. Os órgãos autárquicos, as corporações de bombeiros e outros organismos locais devidamente interessados num plano bem elaborado poderão desenvolver acção de enorme importância, em tempo útil.
Basta ver como todos se comportaram nestes últimos dias. Ainda decorriam os funerais dos nossos queridos mortos e já equipas percorriam o terreno avaliando os custos materiais e sociais desta calamidade cujo relatório preliminar deverá ser hoje mesmo conhecido.
Mas a curto prazo há medidas a tomar, providências cautelares de futuras situações calamitosas como esta.
Águeda dispõe de um aeródromo, cujos custos de conclusão e manutenção serão irrisórios quando comparados com os prejuízos que o concelho e, consequentemente, o País, sofrem. E não me refiro apenas aos serviços que este aeródromo poderia prestar servindo de base de apoio aos serviços aéreos de combate aos incêndios refiro-me também à sua utilização, ao longo de todo o ano, no apoio à indústria e turismo da região. Não tenho dúvidas de que se trataria de um investimento altamente reprodutivo.
Por outro lado, somos possuidores de uma zona florestal de grandes dimensões onde se torna indispensável criar, tal como lá fora, uma toalha de água que permita acorrer com um ataque rápido e eficaz às zonas incendiadas. Daí a necessidade, a curto prazo, de se construir uma barragem-dique no rio Alfusqueiro, justificável ainda pela única possibilidade de se regularizar o caudal do rio e o aproveitamento hidro-agrícola, inserido como está no aproveitamento do Vouga lagunar e serrano.
Breves sugestões estas, que nem a emoção com que vivemos estes dias lhes retira rigor e validade.
Assim todos nós, órgãos de soberania nacional, o queiramos, assim todos nós, representantes deste martirizado povo, não nos contentemos com visitas simpáticas, com lindas «poses» para os fotógrafos e para a televisão, com palavras de belo efeito no momento, mas que, se esvaem mais rápidas que o fumo que sufoca e mata.
Srs. Deputados: Falei-vos com o coração a chorar, com o mesmo coração que viveu directamente com as populações as horas dramáticas do último fim-de-semana.
Mas não queria continuar a chorar. Queria poder voltar a sorrir com o sorriso do povo, com o rever-descer das nossas florestas, com a certeza de que ninguém morreu em vão.
Confio nos homens que detêm o Poder, seja na Assembleia da República, no Governo ou nas autarquias locais; confio que todos vamos dar as mãos, e assim unidos, tal como morreram os nossos bombeiros num exemplo de solidariedade ímpar, seremos capazes de reparar os atrozes efeitos desta «dantesca tragédia» e prepara um futuro sem pesadelos.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.

O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Deveria comemorar-se no nosso país, no passado dia 15, o Dia Mundial do Bombeiro.
Em vez das comemorações que tivessem por base uma alegre e sã convivência, apanágio dos soldados da paz, esse dia foi marcado infelizmente, em toda a zona centro do País e mormente em Águeda e Anadia, por cerimónias fúnebres que sob a presidência de S. Ex.ª o Presidente da República e com membros do Governo e elementos desta Assembleia da República, se realizaram naquelas terras bairradinas.
Tudo começou numa noite cálida de Verão, de sexta-feira, dia 13.
Mais uma vez as matas da região de Águeda, que vão até às faldas do Caramulo, foram pasto de chamas. Chamas violentas, devoradoras de árvores, da fauna, de casas de habitação, de escolas, de viaturas e para cume da tragédia, de quinze vidas humanas.

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Espectáculo dantesco, em que o fogo, insaciável na sua marcha destruidora, tanto aniquilava a mera urze, como um pinheiro, um eucalipto, uma viatura ou um homem.
O fogo ali estava, novamente, numa cadência rítmica anual, a reduzir a cinzas os parcos haveres, de alguns, que vivem do que o solo lhes dá, como produto do seu labor e do seu suor.
E as bravas, as valiosas corporações de bombeiros e os populares lutavam, assistiam impotentes, estupefactos, incrédulos, entre as lágrimas e a ira, no desalento de quem sopeja a culpa de consentir no seu seio, mãos porventura criminosas, a soldo, que riscam o fósforo assassino.
Repetiu-se Sintra, repetiu-se Armamar, repetiu-se Águeda.
É o fogo que alastra, é o alarme que soa é o bombeiro -o soldado da paz- que, para salvar o que não é seu, se levanta da cama sem se despedir da mulher e dos filhos, porque está em causa defender haveres dos outros e arriscar nessa defesa com ideias nobres, muitas vezes o único haver seu, que é a sua vida plena de pujança para poder dar sustento ao seu agregado familiar de parcos recursos.
O bombeiro é a dedicação permanente e constante. É o oásis do altroismo personificado, na sociedade, materialista em que vivemos.
Por tudo isso nós lhe prestamos, aqui neste Parlamento a nossa homenagem, a nossa admiração e a nossa gratidão.
Agora em Águeda, doze bombeiros morreram. Juntaram-se-lhe no caminho da morte mais três civis, que também pereceram como se archotes fossem, só porque o seu íntimo, lhes ditou para saírem das suas casas para salvar os seus pais idosos e doentes.
Cinza, pó e morte, cobriram os solos de Águeda e Tondela, a que há a juntar a bravura e dedicação dos homens de Anadia, bem como o esforço estóico de quase todas as corporações da Beira Litoral e Beira Alta.
Foram aproximadamente 70 km2 de áreas destruídas, algumas delas não refeitas de sequelas de incêndios anteriores.
Foram cinco freguesias atingidas: Águeda, Aguadão, Castanheira do Vouga, Macieira de Alcobra e Préstimo, no concelho de Águeda e uma parcela de São João do Monte, do concelho de Tondela.
Foram tornadas inoperativas para combater fogos florestais, de grande dimensão, as corporações de Águeda e Anadia, em consequência da destruição de várias viaturas de tipo todo o terreno.
Foram queimados pastos, animais e cereais.
Desapareceu uma povoação - Carvalhal do Préstimo e ficou destruída a escola do Avelal de Baixo.
A desolação, o desânimo e o luto, são agora os frequentadores daquelas paragens.
O cômputo dos prejuízos causados por este incêndio, após cálculos elaborados por comissões especializadas, eleva-se aproximadamente a um milhão e meio de contos, incluindo nestas verbas as indemnizações das companhias seguradoras às famílias das vítimas da tragédia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este é o panorama genérico do que vivemos, numa região industrial mas lambem agrícola, onde a terra não pára porque as pessoas querem estabilidade e progresso.
Mas nós neste país, não podemos continuar indefinidamente a chorar os mortos. .
Portugal e de uma vez para sempre tem de pensar nos vivos e de proporcionar melhores condições de vida e segurança às populações.
O Governo e todos os órgãos de soberania têm de deixar, de uma vez por todas, de debitar para a comunicação social frases galantes e bonitas, para passar sem tibiezas a desenvolver uma acção urgente de impacte, para a defesa da floresta portuguesa.
Não é fácil a missão, mas o certo é que não podemos continuar a assistir impávidos e serenos, Verão após Verão, a este espectáculo desolador e frustrante, que é o queimar-se um dos mais ricos patrimónios que temos -a floresta- e continuarmos a chorar a morte, daqueles que abnegadamente lutam contra o instituto devastador do fogo e quiçá contra o crime.
Temos de ter a consciência plena que há que implementar medidas urgentes e eficazes, como seja:
Aquisição de aviões-tanques, e pessoal devidamente treinado e especializado, que se reabasteçam, em voos rasantes, nas superfícies aquáticas;
Legislação que regule com carácter de obrigatoriedade o regime de plantação das matas, a sua limpeza e a sua área de protecção;
Apoios financeiros aos agricultores que façam reflorestações de acordo com a lei;
Implementação de uma verdadeira política pedagógica, a começar pela escola, em prol da defesa da floresta;
Ocupação das forças militares e militarizadas na vigilância das matas;
Apoio às autarquias que apresentem programas de construção de novas vias de acesso, ou outros, que completem uma melhor prevenção dos incêndios, tal como seja a construção de aeroportos, de pequenas albufeiras, etc.;
Actualização dos meios de que dispõem os bombeiros dotando-os não só com viaturas adequadas mas também de quartéis operacionais e de meios de comunicação eficazes;
Aperfeiçoamento e melhoria da Segurança Social dos bombeiros e familiares;
Agravamento das penas para os incendiários.
Estas são, Sr. Presidente e Srs. Deputados, algumas das medidas que genericamente sugerimos ao Governo, que sabemos estar atento a esta problemática, e até a esta Assembleia da República, que hoje discute, inclusive, um estatuto dos bombeiros, apresentado pelo CDS.
Não ficaremos mais pobres se gastarmos 3 milhões de contos em três aviões-cisternas de combate a incêndios.
Ficaremos sim mais empobrecidos se continuarmos a assistir indiferentemente à destruição das matas e das vidas portuguesas, numa autêntica política de terra queimada.
O Governo terá certamente vontade de tomar medidas concretas. Pois vamos todos, homens responsáveis deste país, despir a nossa capa partidária e abertamente, isentamente, colaborarmos na elaboração de leis com carácter nacional e de imediata prática de aplicação, para que da nossa acção resulte um Portugal mais rico e próspero, a bem das populações verdadeiramente trabalhadoras, autêntico sustentáculo deste nosso Portugal, que todos deveremos querer moderno, europeu e fraterno.

Aplausos do CDS, do PSD, do PS e do PRD.

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Azevedo Gomes.

O Sr. Azevedo Gomes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No termo da intervenção que fiz em nome do meu grupo parlamentar na sessão plenária da Assembleia da República de 9 do passado mês de Maio, em que se concluiu a discussão na generalidade da proposta de lei n.º 18/IV, do Governo, e do projecto de lei n.º 28/IV, do Partido Socialista, relativos ambos à catástrofe incendiária que vem saqueando o nosso continente, a primeira agravando penas para os agentes directos e outros, o segundo criando mecanismos que cortem cerce os grandes benefícios económicos do saque, usufruídos por uns tantos, tive ocasião de dizer textualmente:
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista, se manteve a decisão de fazer subir para discussão na generalidade em Plenário o projecto de lei n.º 28/IV, pelas razões ponderosas referidas desde início, e cuja justeza o futuro se encarregará de comprovar, não deixa, igualmente, de compreender os melindres que a objecção do PRD pôs em destaque, relativamente ao n.º 1 do artigo 1.º de um articulado elaborado antes da nossa adesão à CEE.
Assim sendo, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não se escusa a requerer... a baixa do texto à Comissão de Agricultura e Mar, para aprofundamento da questão que motiva a objecção do Partido Renovador Democrático.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista está profunda e sinceramente empenhado em gerar os consensos necessários para que, finalmente, os órgãos de soberania façam aquilo mesmo que, nesta matéria, o País deles espera há vários anos, ou seja: a prova iniludível da sua vontade política e da sua capacidade de acabar com o pesadelo nacional que a devastação da nossa floresta pela catástrofe incendiária constitui.
Infelizmente a prova das razões que assistiam ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista não se fez esperar e chegou brutal!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nessa mesma sessão de 9 de Maio foi votada e aprovada na generalidade a proposta de lei do Governo n.º 18/IV, sobre penas, tendo baixado à Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para tratamento na especialidade, como é do Regimento; para um tratamento que lhe conferisse outra qualidade, colmatando lacunas de peso, evidentes, e corrigindo anomalias não menores, como não deixou de reconhecer o próprio Sr. Ministro da Justiça ao referir que eram pertinentes críticas contidas no relatório-parecer da Comissão de Agricultura e Mar.
Estão prontos, tanto o texto final da Comissão dos Assuntos Constitucionais e Direitos, Liberdades e Garantias sobre a proposta de lei n.º 18/IV, como o parecer da Comissão de Integração Europeia sobre o projecto de lei n.º 28/IV; faltará, quanto a este último, tão-só o relatório-parecer da Comissão de Agricultura e Mar para sua discussão e votação na generalidade.
Em matéria de incêndios florestais, a Assembleia da República está a cumprir bem a sua função, a dar boa medida de que tem bem presente a sua responsabilidade, e de que nela «mora criatividade e vontade política paia idealizar, discutir e votar vias eficazes para repor o incêndio na floresta nos níveis de normalidade [...] acabando, assim, com o seu actual carácter actual de factor de uma catástrofe nacional, cujos custos sociais, económicos, ambientais, políticos», e para além de tudo em vidas humanas, o País não está em condições de continuar a suportar.
É esta a realidade objectiva, é esta a verdade dos factos. Todos nós, Sr. Presidente e Srs. Deputados, sabemos isto.
Assim sendo, como é possível que o Sr. Primeiro-Ministro se tenha aproveitado do clima de dor nacional e da repulsa imensa do povo português perante mais um drama decorrente da catástrofe incendiária para pretender lançar sobre a Assembleia da República mais um onda de suspeição e de descrédito?

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE. Vozes do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - Como é possível que o Primeiro-Ministro daquele mesmo governo que revogou, pelo Decreto-Lei n.º 3/86, de 2 de Janeiro, um dos mecanismos necessários para pôr termo ao saque da nossa floresta por intermédio do fogo, e que não tendo revogado o outro mecanismo igualmente necessário pura e simplesmente o não aplica, se atreve a procurar lançar uma nova onda de suspeição e de descrédito sobre a Assembleia da República, exactamente quando esta se encontra a trabalhar, e bem, para colmatar a incompetência do Governo e a sua falta de vontade política nesta matéria?

Aplausos do PS, do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PRD.

Como é possível que isto aconteça quando se trata do Primeiro-Ministro de um governo que não implementou sequer a tempo uma resolução de Conselho de Ministros (n.º 42-A/25, de 30 de Setembro) que descongelou 500 vagas de guardas florestais do quadro de pessoal do Ministério da Agricultura, sabendo embora da imperiosa necessidade de o fazer, face às funções por eles desempenhadas e à penúria da situação presente (apenas uns 450 guardas, com idade média superior talvez a 45 anos)? De um governo que regateou até a verba de 200 000 contos, já calculada pelo mínimo, para limpeza das matas, apenas atribuindo para o efeito 120 000 contos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Como é possível que o Primeiro-Ministro de um governo que só teve em mente elaborar uma proposta de lei para agravar as penas dos agentes directos do fogo posto e daqueles que danifiquem ou inutilizem material de combate ao fogo, ignorando o cerne do problema em causa, se atreve a querer lançar sobre a Assembleia da República uma onda de suspeição e de descrédito exactamente numa altura em que a deveria louvar?
Ao grande pesar, e ao luto, que se abateram sobre todos nós por mais um drama provocado pelo incêndio na floresta, adiciona-se, na minha bancada, uma outra tristeza e um outro pesar: aqueles que resultam de Portugal ter à frente do seu governo um Primeiro-Ministro que, não respeitando um momento de dor

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nacional, o aproveita para, com profunda injustiça e desmedida demagogia, tentar lançar sobre a Assembleia da República uma onda de suspeição e de descrédito que, na realidade, a verdade é esta, o envolve, ao Sr. Primeiro-Ministro e ao seu governo.

Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.

Necessário se torna que tomemos aqui plena consciência disso e connosco toda a população.

Aplausos do PS, do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Dias de Carvalho.

O Sr. Dias de Carvalho (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A saúde pública resulta de um conjunto de actividades organizadas para manter, proteger ou melhorar a saúde do indivíduo, do grupo ou da população no meio em que vivem. Baixo nível de saúde é sinónimo de atraso económico, cultural e social, não só das populações mas também dos responsáveis políticos que não têm promovido as medidas possíveis para quebrar este ciclo.
Como prova do que acabo de afirmar basta descrever o que se passa em Portugal com a profilaxia do bócio endémico, doença caracterizada pelo aumento do volume da tiróide e causado por carência de iodo.
Estudos realizados por uma equipa de médicos do Instituto Português de Oncologia, e concluídos em 1983, demonstraram a existência do bócio endémico ao sul do Tejo, nos concelhos de Nisa, Portalegre, Mourão, Odemira, Ourique, Castro Verde, Almodôvar, Monchique e Silves, o que quer dizer que mais de 10% das crianças em idade escolar têm bócio.
Nestas zonas afectadas impõe-se a profilaxia da endemia com a administração de sal iodado. Apesar dos elementos da equipa que procedeu ao estudo (constituído pelos Drs. Luís Botelho, Luís Sobrinho, Oliveira, Gonçalves e Antunes), aliás médicos altamente diferenciados e conhecedores desta matéria, terem feito diligências junto do Ministério da Saúde, a fim de se iniciar a profilaxia nas zonas indicadas, o Ministério tem respondido com indiferença total e como se a resolução deste grave problema não fosse da sua inteira responsabilidade.
E devolvidos três anos continuamos a aguardar as medidas que se impõe.
Situação semelhante ocorre no concelho de Oleiros e parte dos concelhos da Sertã, Vila de Rei, Fundão, Proença-a-Nova e Castelo Branco, onde eu próprio estudei a endemia do bócio, esta muito mais grave que a existente nos concelhos a sul do Tejo. O estudo foi concluído em 1966. Nos cinco anos seguintes, travámos a luta possível, com o então Ministério da Saúde de Salazar, para que fossem tomadas as medidas que se impunham. Foi difícil dada a ignorância, o desinteresse pelo bem-estar das populações. Os relatórios eram metidos nas gavetas e a censura encarregava-se de cortar os artigos que o delegado de Saúde de então, Dr. José Lopes Dias, e eu próprio, procurámos escrever na imprensa regional, denunciando tal situação.
Só com a chegada ao Ministério do Prof. Gonçalves Ferreira, personalidade altamente conhecedora dos problemas da saúde pública, foi possível tomar as medidas há muito reclamadas.
A redução da endemia foi espectacular.
A percentagem de crianças em idade escolar afectadas era de 51%, passados dois anos reduziu-se para 20% e passados seis anos para 7%. Presentemente o sal iodado está a ser distribuído muito irregularmente e apenas em sacos de 50 kg. Esta situação não pode manter-se sobe pena de perdermos os resultados alcançados. Tem de recomeçar a distribuição regular de sal em embalagens de 1 kg.
Os sacos de 50 kg ficam abertos muito tempo, expondo o sal à luz que decompõe o iodo introduzido.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Porque carecem as decisões necessárias à situação que acabamos de descrever tanto a sul do Tejo como no distrito de Castelo Branco?
Será pelo desinteresse ou será porque falta ao Ministério um Gonçalves Ferreira?
O Departamento dos Cuidados de Saúde Primários, herdeiro da antiga Direcção-Geral de Saúde, deve ser um sector do Ministério altamente especializado em saúde pública e nas técnicas de educação para a saúde, por isso chefiada por um especialista da carreira de saúde pública.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A falta de responsabilidade política que vai caracterizando a vida portuguesa permite que assim não seja, pois sempre há a desculpa que o responsável não saiba e o culpado foi o assessor.
Hoje, dada a grande evolução tecnológica e a responsabilidade que os governos têm na condução da vida dos cidadãos, os problemas resolvem-se com determinação e técnica e não com voluntarismo inconsequente.
Infelizmente, o desinterese ou a incapacidade, semelhante às que acabámos de descrever, existem igualmente no Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação.
Como é do conhecimento geral, é urgente investir na nossa agricultura.
Se a necessidade é geral, ela é premente nas regiões do interior onde, sem uma acentuada melhoria das estruturas agrícolas, sem um esforço sério da formação e de preparação dos agentes do desenvolvimento e sem um esforço de recursos financeiros, os agricultores do interior não conseguirão suportar as baixas dos preços de 6% a 8% ao ano que os seus produtos irão sofrer durante os primeiros cinco anos de adesão.
Sabemos também que os regulamentos da CEE, sobretudo o n.º 797, prevêem tratamento especial para as regiões desfavorecidas, reconhecendo, portanto, que as estratégias de desenvolvimento, terão de ser diferentes de região para região, já que as potencialidades agrícolas e a realidade sócio-agrária, o são também.
Em muitas regiões do interior acrescem ainda as dificuldades decorrentes do minifúndio. É portanto imperioso implementar rapidamente o programa específico de desenvolvimento da agricultura portuguesa (PEDAP), a fim de podermos candidatar-nos ao respectivo fundo, única forma pela qual os agricultores locais verão minorados os inconvenientes da adesão.
Aos directores das direcções regionais de agricultura cabem responsabilidades acrescidas neste período de transição.
Existe uma vasta zona florestal degradada onde é urgente pôr em execução um programa de desenvolvimento-ordenamento da floresta, com aproveitamento

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integral de todas as suas potencialidades - madeira, resina, caprinicultura, agricultura, piscicultura, caça, turismo, protecção eficaz contra incêndios, etc...
Para toda esta vasta zona florestal, que inclui os concelhos da Sertã, Vila de Rei, Mação, Oleiros, Proença-a-Nova, existe um programa de desenvolvimento, que prevê o investimento de 2 500 000 contos durante os próximos dez anos, assim como existe um programa de desenvolvimento para a zona de Gouveia, que prevê o investimento de 2 200 000 contos. Se considerarmos o total da CEE, do Estado e das contribuições dos agricultores, as importâncias referidas nos dois programas totalizam 4,7 milhões de contos nos dez anos de duração dos programas, dos quais 2 700 000 contos representarão a reentrada no País da nossa contribuição para o orçamento comunitário.
Se não soubermos aproveitar, em tempo útil, estas possibildades é evidente que nos transformaremos em contribuintes líquidos.
Será que os actuais dirigentes políticos estão conscientes de que, com as suas incapacidades ou desinteresses estão a obrigar os agricultores, de uma zona altamente deprimida, a contribuírem para ainda um maior desenvolvimento dos seus parceiros da Europa desenvolvida! Onde está a eficácia da governação de que todos os dias ouvimos falar?
Para além destes estudos, é necessário completar e promover o desenvolvimento do regadio de Idanha-a-Nova, iniciado há mais de 30 anos e ainda não terminado, o da Cova da Beira, que apesar de todos os investimentos promovidos e até alguns já realizados, não possui ainda um plano de acção global que permita um programa de desenvolvimento.
Não se promove também o estudo necessário à reestruturação e reconversão do olival, de que a zona da Beira Baixa é muito rica.
Para o desenvolvimento de todos os projectos torna-se ainda necessário pôr em funcionamento eficaz os serviços de extensão rural que devem actuar, como primeira prioridade, no desenvolvimento de um esquema de enquadramento associativo dos agricultores.
Os agricultores da Beira queixam-se de que nada está a ser implementado e olham com apreensão o seu futuro. Se o responsável pela Direcção Regional da Agricultura da Beira Interior não se interessa pelo desenvolvimento da nossa região ou não é capaz de dinamizar as acções para a elaboração e execução dos programas necessários ao desenvolvimento será melhor dar lugar a técnicos interessados no nosso desenvolvimento e que sejam capazes de dinamizar as acções necessárias. Se tal não acontece arriscamo-nos a perder ou a gastar improdutivamente os 12 000 000 de contos do fundo da CEE atribuídos à nossa região.

Aplausos do PRD, do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está ainda bem viva na retina da maioria dos portugueses, mesmo daqueles que nem são grandes apaixonados do futebol, a humilhante derrota sofrida há dias pela selecção de futebol de Portugal frente à sua congénere de Marrocos, derrota que acabou por ser o culminar de todo um processo eivado de peripécias.
Não nos surpreende que apareçam uns tantos a dizer que quem teve a culpa foram os jogadores, enquanto outros a atribuem à equipa técnica e outros dizem que ela cabe por inteiro à direcção da Federação Portuguesa de Futebol.
Aos primeiros, face às conhecidas e tão discutidas posições que assumiram, quando já no México, ou a declarações que prestaram; à segunda, porque não escolheu os melhores jogadores, porque não apresentou a equipa adequada ou porque não adoptou as tácticas que se impunham; à terceira, porque não foi dialogante, permanecendo numa posição de grande radicalismo perante as reivindicações dos jogadores, ou porque não soube adoptar as condutas mais ajustadas às circunstâncias.
A par disto, também já começam a surgir uns tantos a descortinar desculpas para o desaire, sem esquecer até o árbitro do último jogo - que, sendo irlandês e tendo a Inglaterra interesse no resultado desse jogo, não actuou com isenção - porque nem assinalou, a poucos minutos do início da segunda parte, uma grande penalidade contra os marroquinos por falta sobre Sousa, dentro da grande área.
Enfim, de tudo isto, e muito mais, se vai ter ainda de ouvir e de ler muito, e durante bastante tempo.
Tenho para mim que as referidas desculpas não constituem razão bastante ou suficiente para justificar o que sucedeu no México com a equipa portuguesa.
E direi mesmo que o que aí se viu poderá ter sido, se é que não foi, a parte visível de algo muito mais sério.
As razões são necessariamente mais profundas, impondo-se que os poderes públicos - especialmente o Ministério da Educação e Cultura - que contribuíram com o dinheiro de todos nós no correcto apoio à selecção, tendo em vista o dever que a esta cabia de representar condignamente o País, actuem rápida e energicamente no sentido do apuramento de todas as causas e razões, tornando-as conhecidas dos Portugueses, e adoptando de pronto e sem tibiezas todas as medidas que se impuserem.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E quando dizemos selecção não nos referimos apenas aos jogadores que se deslocaram ao México, mas a todos quantos os acompanharam e a quem, de perto ou de longe, tem a ver com tudo quanto à selecção das quinas diz respeito.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Diz o nosso povo, e com razão, que não há fumo sem fogo. Por isso, quando os jogadores tomam a posição que tomaram, fora de tempo e a rondar a chantagem, algo terá existido que carece ser devidamente apurado e explicado aos Portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quando dirigentes e jogadores, coabitando no mesmo hotel, se ignoram, numa demonstração de que homens que devem estar irmanados em servir a mesma causa não são capazes de se comportar como tal, revelando um desinteresse pela causa comum que aí os levou, quando técnicos actuam - ou, pelo

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menos, dão a aparência disso - ao sabor de pressões de jogadores ou de terceiros, algo de grave se passa que carece ser apurado e explicado.
Quando muito tempo antes há dirigentes que vão vários dias para o México a fim de preparar a instalação da selecção mas não são capazes de preparar as coisa de molde a que a equipa nacional uma vez no México, encontre equipas de futebol à altura com quem possa treinar, algo está profundamente errado, sendo urgente apurar e explicar os respectivos motivos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Vai propor um inquérito parlamentar?

O Orador: - Aceitamos que os jogadores que integraram a equipa nacional deram dentro das quatro linhas o máximo possível; só que todo o condicionalismo envolvente da nossa representação não permitiu, por razões psicológicas e outras, que esse fosse o máximo possível em circunstâncias normais para competições deste nível.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quem recorda ainda o Mundial de Inglaterra de 1966, e sabe os cuidados que os então seleccionados, treinador e dirigentes puseram ao serviço da equipa representativa de todos nós, antes e durante esse Mundial, tem de concordar que existe uma diferença abissal, a qual carece de ser devidamente explicada.
Quem recorda esse mesmo Mundial de há 20 anos e se lembra, por exemplo, do que ocorreu no jogo com os coreanos, tem necessariamente de constatar que comportamentos tão díspares têm de ter uma causa, mesmo que se pretenda dizer - o que em grande medida considero muito discutível - que era diverso o nível técnico dos nossos jogadores.
Os Portugueses não aceitam, nem podem aceitar, que se brinque às selecções, pois o nome e o prestígio de Portugal estão em causa, e o nome desta nossa gloriosa pátria multissecular requer muito brio e respeito; se alguém ainda pensa que provas como os campeonatos do Mundo ou da Europa são meros pretextos para umas passeatas, ou sabe-se lá mais o quê, então, pelo amor de Deus, não lhe chamem selecção de Portugal, mas limitem-se a chamar-lhe outra coisa qualquer.
Representar Portugal, seja em que domínio for, aquém ou além-fronteiras, é uma honrosa tarefa, que, por mais pesada que seja, tem de ser desempenhada com uma dedicação sem limites e com a plena noção do nobre serviço que se presta.
Não se exige que a selecção de futebol ganhe todos os jogos, que se qualifique sempre e que vença os torneios. Não; mas exige-se, isso sim, que todos quantos partem de Portugal ostentando o símbolo das quinas, que não apenas os jogadores, tenham a exacta consciência do que esse símbolo significa.
Quem pelos ecrãs da televisão ou pelas transmissões radiofónicas assiste aos jogos quer sentir que, independentemente do resultado final dos jogos, todos quantos oficialmente se deslocaram estão efectivamente a representar com dignidade o País que é nosso, e de que muito nos queremos continuar a orgulhar.
O futebol em particular, mas o desporto em geral, são algo do nosso património moral, educacional e cultural, e por isso, não pode andar ao sabor do acaso.
Por isso, impõe-se que de tudo o ocorrido se tirem ilações para o futuro e se reflicta sobre o que se passou; porém, para tanto impõe-se uma total clarificação e apuramento de tudo quanto sucedeu, adoptando os responsáveis todos os meios ao seu alcance, dando das respectivas conclusões pleno conhecimento ao País.
E tenhamos plena consciência da inadmissibilidade da afirmação de jogadores quando se permitem dizer que não voltam a representar a selecção nacional enquanto se mantiver a actual direcção da Federação Portuguesa de Futebol, assim como da inadmissibilidade das afirmações do presidente dessa direcção quando publicamente refere também que esses mesmos jogadores não serão chamados a essa mesma selecção -que é nacional- enquanto ele se mantiver no exercício do cargo.
Será possível, sem mais, considerar responsáveis afirmações do género?
E, senhores deputados, não se esqueça que Portugal foi o único país do grupo de que fez parte que não esteve representado na recepção oficiai oferecida às quatro selecções respectivas. Porque significativo, também não pode nem deve ser guardado na gaveta das coisas a esquecer.
Cada um, na sua função, tem de dar provas cabais de que é capaz de saber agir de molde a prestigiar o País que representa.
O sucedido no México, todos os reconhecem e afirmam, não está apenas nos resultados traduzidos em vitórias ou derrotas, mas está muito para além disso, pelo que não pode ser arquivado no dossier dos assuntos que o tempo resolve ou há-de resolver.
Todos confiam, portanto, que vai haver coragem para ir ao fundo da questão, tendo-se presente que a representação portuguesa no Mundial do México fazia parte, e bem, de uma das preocupações do Programa do Governo no âmbito do respectivo sector, Programa que esta Câmara viabilizou e com o qual se tornou co-responsável.
Como português, como pessoa que durante mais de um quarto de século viveu por dentro e serviu a causa do futebol, não posso, nem devo, calar-me, e daí o apelo que deixo formulado, pois falar-se apenas em reflexões, sem acção, poderá acabar por deixar que tudo continue na mesma, e não é isto que os Protugueses querem e esperam.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ribeiro Teles.

O Sr. Ribeiro Teles (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De novo se abateu sobre nós uma grande tragédia motivada por incêndios florestais. Em menos de um ano, 26 bombeiros e alguns civis já perderam a vida no combate ao fogo. Sentimos imenso, conjuntamente com as famílias atingidas, a morte dos entes desaparecidos.
Para além dos danos materiais já sofridos, árvores, casas, escolas e até uma povoação e do perigo que correram e correm algumas aldeias e casas isoladas, há que repensar o problema da doesta em toda a sua profundidade, se queremos obviar a repetição cíclica do sucedido e a dimensão dos fogos que é cada vez maior.
É certo que muitos destes incêndios têm origem criminosa. É preciso, portanto, encontrar quem os ateia e castigar exemplarmente não só os que directamente os provocam mas também os que, por detrás, pagam ou incentivam tais acções.

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No entanto, não podemos deixar de salientar que o clima de. extensas zonas do nosso país é de características mediterrânicas, favorecendo os criminosos, os imprevidentes e as causas mais ou menos naturais que provocam os fogos.
A política florestal que tem sido consentida (há muito o venho afirmando), não atende às características biofísicas do nosso país nem às condições climatéricas que, com maior ou menor acuidade, todos os Verões se repetem, mas apenas à obtenção de um lucro fácil e rápido.
Temos consentido numa política florestal errada e estamos a pagar a factura de tal política.
Os povoamentos extremos de resinosas e de eucalipto ocupam, continuamente enormes extensões, o que, em condicionalismos do mosaico geográfico do nosso país, é completamente errado.
A própria natureza e a constituição simplista e oportunista dos povoamentos facilita o aparecimento dos focos e a propagação dos incêndios.
Não existem, nem ninguém parece interessado em instalar, as estruturas territoriais de defesa e protecção das matas e das populações rurais.
Não se procura conseguir uma íntima relação e um mosaico conveniente entre as áreas cultivadas, as matas de protecção e os povoamentos de produção que devem coincidir no mesmo teatro geográfico. Não se constróem acessos, nem aceiros, nem postos de vigia.
Só tem interessado a máxima produção de madeira para a indústria de celulose, no mais curto intervalo de tempo, em qualquer lugar ou em qualquer situação.
Chegam as divisas mas vai-se o solo vivo, que é o sangue da Nação. As populações abandonam os campos e as aldeias, porque não ficam nas serras a ver crescer o pau e a apagar os fogos. O deserto avança irresistivelmente e a herança que deixaremos aos Portugueses que nos hão-de seguir poderá ser a fome, o desemprego, o despovoamento e a redução drástica da população.
Há que modificar radicalmente a política florestal, enquanto é tempo, constituindo uma rede de matas de protecção e produção de madeiras de qualidade para a indústria do mobiliário e construção civil. Matas que devem proteger e enquadrar a agricultura e a pastorícia. Há que defender e proteger o montado de sobro e de azinho. Há que criar sebes vivas de compartimentação e de protecção dos campos. Há que limitar gradualmente a dimensão dos povoamentos florestais extremos existentes.
Enquanto não seguirmos esta política, resumidamente apontada, a tragédia continuará todos os Verões e o nosso país ficará cada vez mais pobre.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

O Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Chegaram ao seu destino os representantes dos trabalhadores vidreiros da Marinha Grande.
Numa forma de luta inédita e corajosa, trabalhadores de um país de Abril, lutando por Abril, transportaram pelas estradas da Europa a condenação de uma política de um governo apostado no retrocesso, desfolhando ao contrário as páginas de um livro onde os trabalhadores deste país escreveram desenvolvimento, paz, prosperidade.
Soubemos, nomeadamente pela comunicação social estrangeira, da onda de solidariedade que mitigou o sacrifício dos trabalhadores vidreiros da Marinha Grande. Soubemos da condenação vivia de um governo que na chaga dos salários em atraso parece recriar-se e alimentar-se.
Talvez por isso, talvez porque a imagem real de um povo que sofre e luta reventou as fronteiras e chegou lá fora na imagem de uns homens cansados mas confiantes, talvez por isso, o Governo veio, apressadamente, em nota oficiosa, afirmar que o número de trabalhadores com salários em atraso tem vindo a decrescer consideravelmente. E também porque na OIT a CGTP apresentou os dados recolhidos sobre o número de empresas com salários em atraso que, apenas em sete distritos, totalizam 88 467 trabalhadores em 751 empresas. Se acrescentarmos a estes distritos todos os restantes, vemos que o número de trabalhadores com salários em atraso e o número de empresas nessa situação são muito superiores àquele referido na nota oficiosa do Governo.
Com esta nota oficiosa pretende o Governo combater a péssima imagem de um poder que nada faz para debelar a grave crise social que se atravessa.
Pretende, manipulando números, fazer crer que tudo se vai regularizando, que o Governo tomou as providências legislativas adequadas à cicatrização da ferida, que o Governo vai resolver o problema dos salários em atraso. Isto no preciso momento em que o Diário da República publica a lei sobre salários em atraso, aprovada por esta Assembleia e aplaudida, no essencial, pelos organismos representativos dos trabalhadores.
Mas o Governo sabe que nada se vai regularizando, sabe que a par dos salários em atraso se assiste ao encerramento de empresas, à falência de outras, a rescisões de contratos de trabalho através da coacção sobre os trabalhadores, sabe que há proliferação do trabalho clandestino, sabe que se assiste ao agravamento da situação dos trabalhadores. O Governo sabe-o e, apesar disso, não desiste; e não desiste mesmo da tentativa de subversão da própria Constituição da República através da liberalização dos despedimentos em letra de lei.
O Governo nada resolveu e foi ínfimo o número de trabalhadores que recorreu aos mecanismos do Decreto-Lei n.º 7-A/86. No distrito de Lisboa, por exemplo, apenas 4,8% de trabalhadores, de três sectores de actividade, se viram obrigados, pela miséria, a requerer a aplicação do diploma do Governo. E ainda, como revela um estudo parcelar feito pela União dos Sindicatos do Distrito de Lisboa, ao mesmo tempo que os salários em atraso se mantêm, encerram no distrito 41 empresas em sete sectores de actividade, e, em resultado do encerramento, mais 1486 trabalhadores foram colocados no desemprego. São trabalhadores que o Governo abate ao número de trabalhadores com salários em atraso, mas que vão acrescer ao número de desempregados.
Aqui bem perto, num distrito que estava em quarto lugar quanto ao número de trabalhadores com salários em atraso e em terceiro lugar quanto ao número de desempregados - o Distrito de Setúbal - a crise social agrava-se de dia para dia. O fim do mês e o dia do pagamento do salário é aguardado com angústia por muitos dos trabalhadores que ainda recebem salário, no receio de se verem colocados no número dos que trabalham e não recebem.

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É que em Setúbal o drama dos trabalhadores sem salários mora lado a lado connosco. Vemo-los em piquete, diariamente, à porta, por exemplo, de uma empresa paralisada desde Janeiro de 1985: a Mecânica Setubalense. Trata-se de uma empresa do ramo da latoaria. Alguns são trabalhadores da empresa há mais de 30 anos.
Em Maio de 1983 os trabalhadores paralisaram, já nessa altura, para reclamar o pagamento dos salários em atraso. Eram na altura 350 os trabalhadores da empresa. Hoje mantêm-se ao serviço 230, porque entretanto a renda de casa para pagar, as crianças para alimentar, as graves dificuldades levaram alguns a voltar costas a uma empresa que é rentável e que pode dar um contributo, que não é de somenos, para o desenvolvimento do distrito.
De facto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, hoje as empresas de conservas de peixe, no concelho de Setúbal, estão a importar as embalagens de Espanha. Isto enquanto mesmo ao lado a Mecânica Setubalense, com carteira de encomendas, com exportação, designadamente para Marrocos, se encontra encerrada. Entretanto, regista-se que a lata utilizada nas conservas de peixe representa mais de 40% do custo total do produto embalado.
Enquanto esta riqueza se perde, ao mesmo tempo que se escoa por um fio de angústia a vida dos trabalhadores e a das suas famílias, chegam-nos ecos de negócios pouco claros da administração da empresa com a banca nacionalizada. Chegam-nos ecos da denúncia dos trabalhadores, ao mesmo tempo que exigem que a empresa seja salva, que se negoceie a dívida da mesma à banca nacionalizada, que se viabilize a empresa - porque ela é efectivamente viável - e que assim se salvem os postos de trabalho daqueles que têm, neste momento, mais de 16 meses de salários em atraso.
O Distrito de Setúbal é fértil em exemplos. Distrito com extraordinárias capacidades económicas, com extraordinários recursos naturais, seria contra ele que mais assanhadamente se viraria a política de direita.
Passamos o portão da Parry e onde dantes nascia o barulho de um estaleiro em actividade hoje temos o silêncio e a censura dos braços inertes que há mais de 15 meses não se estendem para o envelope que contém a subsistência de muitas famílias.
Os trabalhadores da Parry lutaram pela viabilização da empresa e apresentaram propostas. A resposta deste governo foi o silêncio. Depois o engavetar de um projecto sobre a reestruturação dos pequenos estaleiros no estuário do Tejo.
A resposta às exigências de viabilização foi a decisão do Governo de apresentar a empresa à falência. Daqui para diante tudo é incerto para os trabalhadores da Parry and Son.
Tudo menos a certeza de que este governo não quis, mesmo contra a opinião do conselho de administração da empresa, viabilizar a Parry and Son.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não há nota oficiosa que possa destruir o que os nossos olhos vêem. Nem discursos que possam apagar o escândalo que constituiu o pedido de intervenção da Polícia de Segurança Pública nas instalações da Petroquímica e Gás de Portugal, numa altura em que os trabalhadores se encontram em greve e em que nenhum conflito existe, a não ser o que opõe os trabalhadores ao conselho de gerência.
A segurança das instalações é assegurada pelos trabalhadores em greve - diz a lei. E assim o tem feito os trabalhadores da Petroquímica. O pedido de intervenção da Polícia de Segurança Pública - que se retirou depois de constatar que não havia motivo para a sua intervenção - mais não é que uma forma de coagir, de amedrontar, de fazer desistir do exercício ,de um direito constitucionalmente previsto e que os trabalhadores usam para obter a satisfação de reivindicações justas.
A Petroquímica e Gás de Portugal é uma empresa com uma situação económica favorável. A sua produtividade tem vindo a aumentar de ano para ano. Reduziu-se o número de trabalhadores. Reduziu-se o trabalho suplementar de cerca de 39% nos últimos três anos. A taxa de absentismo baixou, 33,5%.
Os trabalhadores, conhecedores da situação da sua empresa, exigem aumentos salariais da ordem dos 20,5%. O conselho de gerência, tentando cumprir um tecto salarial aconselhado pelo Governo - porque não é nem pode ser cumprido - não vai além de uma proposta de 15,5%.
Esta divergência impunha negociações. Mas assim não entendeu o conselho de gerência, que está surdo, e é a sua surdez e a sua insensiblidade às justas razões dos trabalhadores que forçam estes a lançar mão da sua última arma, a greve, a que com sacrifício recorrem, conscientes, no entanto, de que é o conselho de gerência da Petroquímica o único responsável pelas perturbações que a população de Lisboa vai sentir.
Dialogar é fácil para os trabalhadores, é fácil para quem tem a justiça do seu lado. Incómodo é para quem sabe não ter argumentos a carrear para o diálogo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes são apenas - poucos - exemplos que bem demonstram a justiça da luta dos trabalhadores e a sem razão de quem pretende apagar dos ecos dos jornais, com notas oficiosas, as notícias da crise.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quero levar ao conhecimento de VV. Ex.ªs que hoje da parte da manhã recebi - aliás, com muito prazer - uma delegação de autarcas do concelho de Gouveia.
Acompanhada pelo Sr. Presidente, pelos presidentes da junta de freguesia e representantes da assembleia municipal bem como da assembleia de freguesia, essa delegação de autarcas veio à Assembleia da República não só para prestar as suas homenagens mas também os seus cumprimentos a todos os Srs. Deputados e já tive oportunidade de lhes agradecer essa gentileza. Porém, esses autarcas encontram-se nas galerias da Assembleia da República e agradecia o favor de os Srs. Deputados os saudarem na forma habitual pela maneira gentil e sobretudo pela posição que assumiram ao virem ao Parlamento nesta jornada de visita para melhor conhecimento dos trabalhos parlamentares.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Domingues.

O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou abordar a questão do acordo ortográfico e da língua portuguesa.

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Em 12 de Maio passado, no Rio de Janeiro, delegações de Estados lusófonos assinaram um acordo de unificação ortogrfica da língua portuguesa.
Especialistas de vários países de expressão oficial portuguesa estiveram de acordo sobre um texto cujo objectivo é encontrar uma escrita comum aos vários Estados lusófonos.
Para glória da Lusitânia, que a engendrou, temos uma língua que, em vez de estar confinada a 10 milhões de habitantes, é instrumento de comunicação de mais de 150 milhões. Muitos teimam em fechar os olhos a esta realidade, ou então gostariam que 10 milhões de habitantes determinassem as regras da fala e da escrita de 150 milhões.
Hoje são sete Estados independentes que adoptam o português como língua nacional. Isso é para nós um privilégio incalculável. Se atentarmos um pouco no que representa o facto de a nossa língua ser o veículo de uma cultura e de uma civilização junto de povos e de etnias tão diferentes, não podemos deixar de ficar possuídos de um legítimo orgulho nacional. Muito mais importante que possuir um império geográfico é manter o património linguístico-cultural implantado nos quatro continentes. Nenhum cidadão português, verdadeiramente patriota, pode deixar de sentir a grandeza nacional deste legado dos nossos maiores.
É a esta luz que tem de ser entendido o recente acordo ortográfico que a Assembleia da República em breve será chamada a ratificar ou a recusar.
A delegação portuguesa, presidida pelo Prof. Jacinto Nunes, foi recebida pela Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura, a quem prestou esclarecimentos sobre os termos e os objectivos do acordo. Entre outras coisas, os deputados presentes puderam certificar-se das razões da metodologia adoptada pela delegação nacional e, sobretudo, desfazer equívocos quanto à coesão da equipa. Integrada esta por especialistas de indiscutível mérito e nome nacionais, todos os elementos afirmam a sua total adesão ao texto final acordado.
Significará isto que, presos de argumentos de autoridade e competência, tenhamos de curvar a nossa razão e abdicar do espírito crítico? De modo nenhum. Pelo contrário, é obrigação de todos nós analisar cuidadosamente o acordo ortográfico. Não podemos, porém, avaliá-lo devidamente sem ter em conta os objectivos que presidiram à sua elaboração.
Não se chegou a um acordo ortográfico por necessidade de alterar a língua. As línguas nem sequer se alteram dominantemente pela escrita. As nossas escolas não exigiam qualquer mudança na ortografia da língua. É certo que os alunos vão cometendo alguns erros desnecessários, como quando escrevem «rectaguarda» por retaguarda ou «reflete» por reflecte, ou se esquecem de alguns hífens dispensáveis, mas isso já não são males maiores para quantos desvalorizaram a ortografia em favor da compreensão e da expressão das ideias e sentimentos.
O acordo ortográfico fez-se por uma outra razão muito simples: encontrar uma só grafia para os textos em língua portuguesa em instâncias internacionais, como a CEE, e nos sete Estados independentes que foram colónias de Portugal.
Os Estados recentemente tornados independentes não põem problemas de autonomia gráfica. Estavam sujeitos à norma escolar portuguesa e, por isso, os desvios a esse nível não se fizeram sentir. As diferenças são de natureza lexical, mas essa questão nada tem a ver com as normas ortográficas.
Bem diferente, é o caso do Brasil. Mais de século e meio de independência nacional não podia deixar de acentuar diferenças mesmo de natureza ortográfica. À diversificação da fala naturalmente correspondeu a adopção de normas de escrita diferentes. A soberania brasileira pôde legitimamente determinar que «campónio» se escreva com acento circunflexo, como nós mandamos escrever «campónio» com acento agudo, e ortografar «fato» como nós ortografamos «facto». Manda quem pode e o Brasil é soberano!
Mas queremos ou não que os textos escritos sejam impressos de forma a tornarem-se acessíveis em Portugal e no Brasil, na CEE, em Angola, em Moçambique, etc.? Preferíamos que se acentuasse a divergência entre o português de Portugal e o português do Brasil? Quem ganhava? Com certeza, não ganhava o geograficamente o mais pequeno. Mas atenção: com este acordo, ganhamos mesmo nós. Cedemos no acessório, para preservar um património de oito séculos de história. A partir da entrada em vigor do acordo - caso esta Assembleia o ratifique - os alunos das nossas escolas podem ler sem preocupação os grandes escritores brasileiros. Terá diminuído significativamente a probabilidade de contaminação pela grafia diferente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Deputados eleitos pelo povo, não podemos ficar, todavia, insensíveis às reacções ao acordo ortográfico. Gerou-se um sentimento de animosidade contra o acordo. Parece ter despertado uma autêntica cruzada em defesa da puridade linguística. Por minha parte, nunca tinha assistido a manifestações de tanto carinho pela língua-mãe! A etimologia é incensada. O próprio latim é agora invocado, mesmo por quem não faz ideia nenhuma do que seja a língua de Lácio. Proponho solenemente que estes bons sentimentos sejam acolhidos. A ocasião é propícia. Se o Ministério da Educação a desperdiçar será réu de lesa-língua!
O acordo de unificação ortográfica é uma necessidade de superior interesse nacional. Com ele alguma coisa se sacrifica. Encontremos então as compensações possíveis e necessárias. Defendamos a língua contra, por um lado, as atitudes de conservadorismo mais ou menos inconsciente e de patriotismo menos esclarecido, e, por outro, da ignorância que todos os dias contribui, essa sim, para a progressiva degradação da língua nacional.
Em intervenção aqui produzida há dois anos preconizei alguns remédios para emendar os nossos descuidos para com o português. Talvez seja mais fácil agora encontrar eco para esse alerta. Não será boa altura para reintroduzir o latim no curso complementar do secundário, retirado levianamente e com tão graves consequências para a formação intelectual e linguística dos estudantes de humanísticas? A aprendizagem do latim fornece bases seguras para o domínio etimológico e para a evolução fonética e semântica das palavras.
Uma outra solução para defender a língua está na rigorosa aprendizagem da língua portuguesa oral.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se para Portugal a razão maior, do acordo reside no objectivo de uniformizar, quanto possível, o português escrito, de forma a conferir-lhe eficácia como instrumento de comunicação, pode e deve aproveitar-se a oportunidade para encurtar alguma distância entre a oral e a escrita. Nem

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sempre, porém, os dois objectivos são conciliáveis. A supressão dos acentos das proparoxítonas ajuda à uniformização luso-brasileira, mas embaraça a leitura. Noutros casos, a transcrição ortográfica aproxima mais a grafia da pronúncia.
Sem estar em causa a validade das mais diversas opiniões sobre a oportunidade ou a inconveniência do acordo ortográfico, suponho que todos temos consciência da necessidade de defender a língua portuguesa contra a sua degradação. Em vez de nos prendermos a pormenores do acordo ortográfico, importa desdramatizar a questão e cuidar de aumentar a competência linguística dos falantes.
Não é a primeira vez que faço considerações sobre a diferente importância da língua oral e da língua escrita. Alguns dos problemas mais complicados do acordo reflectem essa dicotomia. O desaparecimento das consoantes mudas é o caso mais exemplar. Sacrifica-se a etimologia, mas torna-se mais fácil a aprendizagem da escrita.
Esperemos que o Ministério da Educação e Cultura esteja atento à preservação dos verdadeiros valores da língua nacional. Em vez de discursos de retórica balofa e patrioteira sobre a língua nacional, importa investir seriamente na defesa do património linguístico português. Em 17 de Maio de 1984 apontei algumas das medidas urgentes. Permito-me agora acentuar apenas a importância a conceder à aprendizagem oral da língua e referir de novo a imprescindibilidade de bons dicionários e gramáticas acessíveis ao grande público. Estas duas questões adquirem relevo específico na perspectiva do acordo ortográfico.
O ensino das línguas vivas conheceu uma verdadeira revolução com a descoberta do valor da oralidade e dos métodos áudio-visuais. O primeiro da escrita, incluindo a grafia em si mesma e a ortografia, sofreu algum abalo.
Não se trata de menosprezar a linguagem escrita. Trata-se tão-só de valorizar a oralidade na sua autonomia e como instrumento de apreensão e compreensão da escrita.
Dois consagrados linguistas franceses, Genouvrier e Peytard, numa obra traduzida entre nós, acentuam a singularidade e a importância da língua oral. Escrevem eles: «A mensagem oral utiliza elementos informadores que a mensagem escrita só encontra de maneira indirecta e imperfeita: as entoações, as pausas, o ritmo, os acentos de intensidade são extremamente importantes para a compreensão da mensagem pelo receptor.»
Mas a oralidade, para além do seu valor autónomo, é também fase de preparação para a escrita. Da sua autonomia tratei suficientemente em Maio de 1984. Interessa-me agora o seu carácter subsidiário e preparatório da escrita.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A criança encontra na família a sua primeira escola de língua materna. Do nível cultural da família dependem em grande medida as bases da estruturação do saber linguístico da criança. Da aquisição das estruturas morfo-sintácticas ao vocabulário, passando por uma articulação progressivamente correcta, a criança recebe o suporte da língua nacional. A grande discriminação cultural dos agregados familiares marca indelevelmente os falantes. Há que encontrar formas compensatórias para as discriminações negativas.
A fase pré-primária da escolaridade pode ser uma óptima ocasião de aprendizagem da língua materna. Entre os 3 e os 6 anos de idade, à criança devem ser proporcionadas as melhores condições de desenvolvimento da sociabilidade. A expressão verbal oral é instrumento fundamental do relacionamento da criança com os outros.
Num momento em que a Assembleia da República se prepara para consagrar na Lei de Bases do Sistema Educativo a importância da educação infantil, apontando prioridade à sua expansão, é tempo de reflectir sobre o papel da pré-primária na aprendizagem da língua materna. Mas dissipemos todas as dúvidas: trata-se de dar continuação à «escola» da família e do meio circundante da criança, de aperfeiçoar a linguagem oral desta e não de fazer qualquer iniciação à escrita. Também por isso se preconiza que os jardins-de-infância estejam a cargo de educadores de infância e não de professores do ensino primário. Isso pressupõe preparação adequada dos educadores de infância. O Ministério da Educação deveria desde já definir as disciplinas do 12.º ano ou de um ano vestibular para acesso aos cursos de educadores de infância. Disciplina básica tem de ser a língua portuguesa com um programa definido de acordo com os objectivos da aprendizagem da língua na fase etária dos 3 aos 6 anos.
A escola superior de educação encarregar-se-á naturalmente de articular interdisciplinarmente e de aprofundar esses conhecimentos, conferindo o devido relevo aos ramos da linguística como a sócio-linguística e a psico-linguística. Um educador de infância tem de faiar correctamente a sua língua, conhecer com rigor as estruturas morfo-sintáticas, distinguir o vocabulário de base do vocabulário mais complexo e ter a capacidade pedagógica necessária à orientação sem magistério das crianças para o aperfeiçoamento da sua própria expressão verbal. Do domínio oral do vocabulário e das estruturas linguísticas depende significativamente a futura aquisição da língua escrita. Erros frequentes - lamentavelmente ouvidos nesta Assembleia - como «houveram» em vez de «houve» começaram a haver «por começam a haver» «imerviu» por «interveio», «disse de» por «disse que», «intervido» por «intervindo» são deturpações da língua que podem e devem ser corrigidas desde muito cedo. Se o educador ou o professor cometerem eles próprios essas e outras faltas, estarão a ser modelos do disparate. Mas mais importante que a formulação correcta é o alargamento do universo vocabular da criança. Se for dada prioridade no lançamento da pré-primária às zonas cultural e socialmente mais desfavorecidas, como defende um projecto de lei apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, maior terá ainda de ser o cuidado posto na formação dos educadores de infância.
Trabalhar exclusivamente a face oral da língua exige metodologia própria, bom conhecimento das estruturas linguísticas, iniciação na psico-linguística, etc. Deixo aos especialistas o aprofundamento destas matérias. A nós, políticos, cabe a responsabilidade da auto-sensibilização e do alerta para a sua importância bem como a de criar as condições, nomeadamente as financeiras, para renovar desde a base o ensino da língua materna. Não escasseiam os meios humanos disponíveis ao nível dos formadores de formadores. Dêem-se-lhes as condições materiais para o efeito. O momento é oportuno.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A língua é um património histórico. Transmitida de geração em geração, cabe a cada uma das novas gerações preservar o legado e enriquecê-lo.

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Preocupados em tornar a língua instrumento flexível e adaptado às circunstâncias dos povos - é o caso dos novos Estados de língua portuguesa - corremos, sem dúvida, o risco de fracturas com o passado ou de obscurecimento das raízes. É a velha luta entre a fidelidade às etimologias e a adequação ao uso maioritário das camadas medianamente cultas. Também aqui se impõe uma atitude de grande equilíbrio.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O acordo ortográfico assinado na Academia de Letras do Brasil transporta uma carga simbólica: o Brasil, como primeiro Estado lusófono emancipado da Mãe-Pátria, é bem a ponte entre o legado linguístico multissecular e a língua actual e actualizada dos falantes dos novos Estados independentes. Saibamos colher o significado e o imenso alcance para Portugal dera nossa língua ser a língua de vários continentes e de novos Estados abertos a um futuro promissor.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Fernandes.

O Sr. Armando Fernandes (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao longo destes meses de actividade como deputado tenho dedicado particular atenção, como é minha primacial obrigação, aos problemas existentes no distrito por onde foi eleito: o distrito de Santarém. E de entre os muitos problemas um sobressai de forma particularmente significativa: o da má assistência sanitária às populações.
Ou por ingenuidade ou por estultícia, era minha convicção terem as intervenções dos deputados peso suficiente para os governos lhes prestarem a devida atenção, não curando de saber qual a sua bancada, procurando os governos resolver os problemas levantados através das formas consignadas no regimento: intervenções ou requerimentos. E assim, intervim aqui mesmo sobre a situação existente nó Hospital Distrital de Santarém, e quanto a requerimentos formulei dez.
Hoje a ingenuidade desapareceu, a estultícia também, não me restando dúvidas de os governos só ligarem ao que lhes interessa, e no respeitante ao caso em apreço isso interessa-lhes pouco. Isto porque as minhas intervenções não mereceram qualquer resposta e, ao invés, a prestação de cuidados de saúde no Ribatejo às populações agravou-se consideravelmente. Senão, vejamos:

Hospitais distritais:

Abrantes.

Inaugurado recentemente e tendo custado mais de 2 milhões de contos, não funciona na sua totalidade, estando alguns pisos fechados por falta de pessoal de enfermagem. Os doentes não são internados por inexistência de vagas e faltam diversas especialidades.

Torres Novas:

Instalações deficientes. Sobrecarregado, e mais o vai ser com o encerramento dos hospitais concelhios da periferia.

Tomar:

Instalações deploráveis. Segundo o governador civil de Santarém, dentro de dez anos o problema estará resolvido. Até lá não sabemos responder.

Hospital Distrital de Santarém:

Alguns pisos fechados. Afogado em doentes por virtude de receber doentes dos hospitais centrais e concelhios. Graves carências de pessoal. Disfuncionamento em muitas especialidades. Este hospital poderia exercer maior actividade se houvesse uma política de saúde realista, tendo em conta as necessidades das populações. A administração proibiu a marcação de consultas por telefone, telegrama e carta. Os custos desta decisão para a população são óbvios.
Os requerimentos feitos ao Ministério da Saúde acerca da situação nos hospitais distritais não lograram resposta desse mesmo Ministério.

Hospitais concelhios:

Apesar de não termos conhecimento da existência de um plano de estruturação da rede hospitalar a nível nacional, a administração regional de saúde entregou às Misericórdias os Hospitais de Alcanena e do Entroncamento e, ao que sabemos, apresta-se para fazer o mesmo em Rio Maior.
O Hospital Concelhio de Almeirim debate-se com diversos problemas, indo desde a falta de pessoal, passando por uma gestão deficiente e desembocando na forma pouco cuidada como são atendidos os seus utilizadores.
Sabemos da existência de um inquérito mandado instaurar, pelo então Ministro Maldonado Gonelha, ao conselho de gestão do Hospital da Chamusca. Os resultados desse inquérito continuam no segredo dos deuses.
Requerimentos sobre estes hospitais concelhios foram efectuados ao longo dos meses; a resposta ainda não chegou, decerto pôr deficiência postal!
Os centros dê saúde funcionam em condições deficientes e com problemas de falta de pessoal. A cobertura aos meios rurais não é completa e muitos doentes optam pelos hospitais distritais porque quando estão doentes não tem consulta e quando têm consulta não estão doentes... E quanto os hospitais ficam superlotados, os especialistas nos centros de saúde vão deixando de aparecer porque não lhe pagam as deslocações. Os requerimentos enviados a tempo ao Ministério lembrando a existência dos problemas agora focados também não mereceram o devido esclarecimento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os exemplos referidos podiam ser multiplicados, e uma realidade (bem negra por sinal) é evidente: para as populações do distrito de Santarém ainda não chegou a saúde a que têm direito. Quando acontecerá?
As intervenções feitas por mim receberam um olímpico desprezo por parte do Ministério da Saúde. Só me resta dizer: a ingenuidade foi-se; sou coriáceo, razão por que vou continuar a lutar pelo direito à saúde e por todos os direitos que pertencem ao povo ribatejano.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o PRD acaba de apresentar na Mesa, um voto de pesar pelo falecimento de Jorge Luís Borges e gostaria de saber se algum dos grupos parlamentares põe objecção a que ele seja votado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Dá-me licença que interpele a Mesa, Sr. Presidente?

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O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que não fazemos qualquer objecção a. que esse voto de pesar seja votado desde que as declarações de voto sejam feitas no período de antes da ordem do dia da próxima sessão.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Aliás hoje seria impossível fazerem-se declarações de voto dado que já não há tempo.
Vai, então, ser lido o voto de pesar.

Foi lido. É o seguinte:

Voto de pesar

A morte de Jorge Luís Borges, embora não inesperada, constitui um profundo golpe e uma perda irreparável para a literatura e a cultura universais. Escritor genial, a sua obra ficará como uma das mais portentosas criações verbais das letras de todos os tempos e referência obrigatória do nosso tempo.
Cidadão do mundo e argentino de nascimento, se é certo que Jorge Luís Borges sempre se mostrou avesso à política, pelo menos activa, não o é menos que levantou a sua voz contra a ditadura feroz que oprimiu o seu país e sempre manifestou a sua esperança - citamos - em que «desapareçam as diferenças augustiosas na repartição da riqueza», desejando que - voltamos a citar - «um dia tenhamos um mundo sem fronteiras e sem injustiças».
A tudo isto acresce, para nós, o facto de o grande escritor agora desaparecido ser descendente de portugueses, de Moncorvo, e de se manifestar muito interessado em investigar essas suas origens, a que se referiu designadamente ao escrever num poema:
Nada ou mesmo pouco sei dos meus maiores portugueses, os Borges: vaga gente que mantém na minha carne, obscuramente, os seus hábitos e vigores, os seus temores.
Aliás, Jorge Luís Borges por diversas formas manifestou a sua amizade por Portugal, onde é bem conhecido e admirado, e que visitou mais do que uma vez, a última das quais em Outubro de 1984.
Pelo muito sumariamente exposto, o PRD propõe que a Assembleia da República manifeste o seu profundo pesar pela morte de Jorge Luís Borges.

O Sr. Presidente: - Vamos votar, Srs. Deputados.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Teles.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

Foi lido. É o seguinte:

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos

Em reunião realizada no dia 17 de Junho de 1986, pelas 17 horas foi apreciada a seguinte substituição de deputado solicitada pelo Partido Social-Democrata:

José Pereira Lopes (círculo eleitoral de Castelo Branco) por Fernando Barata Rocha. Esta substituição é pedida nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), por um período não inferior a quinze dias, a partir do dia 17 de Junho corrente, inclusive.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo aludido partido no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

A Comissão: Secretário, Rui de Sá e Cunha (PRD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Adérito Manuel Soares Campos (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - João Domingos Fernandes Salgado (PSD) - António Marques Mendes (PSD) - Henrique Rodrigues da Maia (PSD) - Mário Manuel Cal Brandão (PS) - Carlos Alberto Carreira Rodrigues Matias (PRD) - Vasco da Gama Fernandes (PRD) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - António José Borges de Carvalho (CDS).

O Sr. Presidente: - Está em apreciação, Srs. Deputados.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Teles.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entrando agora no período da ordem do dia, submeto à vossa aprovação os n.ºs 69 a 74 do Diário respeitantes às reuniões plenárias de 15, 16, 20, 22, 23 e 27 de Maio findo.

Pausa.

Dado não haver objecções, consideram-se aprovados.

Por consenso estabelecido em conferência de líderes, vou submeter à vossa consideração uma proposta de deliberação, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

Proposta de deliberação

A Assembleia da República, tomando em consideração os trabalhos pendentes nas comissões permanentes para efeito de votação final global e

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ainda o desejo de apreciação de diplomas e outras iniciativas agendadas para discussão em Plenário, delibera, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 48. º. do Regimento, prolongar os seus trabalhos, que poderão prosseguir até ao dia 25 de Julho de 1986, para aqueles referidos efeitos e cumprimento da agenda já estabelecida.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

Dado não haver inscrições, vamos votar.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência do MDP/CDE e dos deputadas independentes Maria Santos e Ribeiro Teles.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar agora na segunda parte do período da ordem do dia com a apreciação do projecto de lei n.º 194/IV, apresentado pelo CDS, sobre o estatuto social dos bombeiros.
O Sr. Deputado João Abrantes, relator da Comissão de Administração Interna e Poder Local, vai proceder à leitura do relatório e parecer respectivo.

O Sr. João Abrantes (PCP): - É do seguinte teor o relatório e parecer da Comissão de Administração Interna e Poder Local relativo ao projecto de lei n. º 194/IV, do CDS, sobre o estatuto social dos bombeiros:

I

A aprovação de um estatuto social dos bombeiros vem sendo sucessivamente reclamada pela Liga dos Bombeiros Portugueses, constituindo conclusão constante dos congressos que se vêm realizando regularmente.
Com o projecto de lei n.º 194/IV, o CDS adianta as soluções que entende adequadas para figurarem num «estatuto social dos bombeiros».
Tornando-se urgente a aprovação da legislação sobre a matéria -, acentua-se entretanto o interesse determinante da participação, na sua elaboração dos destinatários, por intermédio da Liga dos Bombeiros e suas estruturas.
O CDS tomou a iniciativa de submeter o projecto de lei à discussão pública, remetendo-o às 445 corporações de bombeiros, à Liga dos Bombeiros Portugueses e ao Serviço Nacional de Bombeiros.
O processo de discussão pública ainda não está concluído, já que só no próximo dia 28 de Junho se realizará uma reunião de delegados, no quadro da Liga dos Bombeiros Portugueses, com vista ao debate da matéria.
Assinale-se ainda, na perspectiva da análise global dá matéria, que existem três outros projectos pendentes relativos a bombeiros é corporações de bombeiros, e que são os seguintes: projecto de lei n.º 147/IV (PRD), sobre concessão de pensões de preço de sangue e por serviços excepcionais e relevantes; projecto de lei n.º 148/IV (PRD), sobre seguro de pessoal dos corpos de bombeiros, e projecto de lei n. º 232/IV (PCP), sobre obrigação do pagamento pelo Estado do serviço de transporte de doentes, prestado por bombeiros.
Torna-se nítida a coincidência de alguns desses projectos com matérias constantes do projecto de lei do CDS.

I

O projecto de lei n.º 194/IV propõe-se definir o estatuto social dos bombeiros.
O estatuto aplica-se «a todos os bombeiros portugueses, integrados de forma voluntária ou profissionalizada em corpos de bombeiros» - artigo 1.º, n.º 1 (definição e âmbito).
Contudo, ressalva-se a sua aplicação aos bombeiros sapadores ou municipais (artigo 1.º n. º 2), em tudo o que contrarie legislação já consagrada nos diplomas orgânicos dos serviços públicos.

III

(Considerações gerais)

1. 1. - As corporações de bombeiros sempre se subordinaram a Regulamentos dos Corpos de Bombeiros, designadamente os resultantes do Decreto n.º, 38 439, de 27 de Setembro de 1951 (que revoga o Decreto 35 857, de 11 de Setembro de 1946), e da Portaria n.º18 031, de 31 de Outubro de 1960; actualmente vigoram nas corporações de bombeiros regulamentos internos pormenorizados e actualizados, aprovados pelo Serviço Nacional de Bombeiros.
1.2 - A legislação existente nesta matéria e regulamentos dela derivados afiguram-se-nos mais detalhados e com maior rigor nas soluções que preconizam.
1.3 - Existe, em vigor, considerável volume de legislação avulsa sobre bombeiros que assim se manterá dispersa, sem articulação ou enquadramento, enquanto a experiência acumulada aconselha a sua análise conjunta. A não ser assim subsistirão a indefinição do Estatuto Jurídico das Associações Humanitárias e o Regulamento de Disciplina dos Corpos de Bombeiros.
1.4 - Não é visível a preocupação de articulação do projecto de lei com legislação futura que tenha em conta os aspectos de definição de tratamento entre bombeiros voluntários, municipais e sapadores, designadamente quanto ao estatuto a aplicar a cada corporação (associativo ou instituição pública).

IV

(Considerações ao articulado)

2 - Não está previsto o quadro de comando, em vigor em todos os corpos de bombeiros, por força de regulamento interno aprovado pejo SNB (artigo 3.º, n.º 1).
2.1 - Não há participação dos corpos gerentes, das associações de bombeiros voluntários na aprovação dos quadros, o que contraria os estatutos dessas associações, da mesma forma que não estão definidas as competências dos comandos das corporações na elaboração dos seus quadros (artigo 3.º, n.º 2). Afigura-se-nos que estas entidades estão em melhores condições de determinar as suas necessidades em pessoal em função das áreas geográficas cobertas, da dimensão das manchas florestais e aquícolas e da importância das rodovias.

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2.2 - Idênticas considerações sobre a movimentação dos quadros de pessoal (artigo 4.º, n.º 1).
2.3 - A condição prevista na alínea a) do artigo 5.º é incompatível com o estatuto constitucional da cidadania.
2.4 - O previsto na alínea b) do artigo 5.º contraria os regulamentos internos das corporações, que actualmente prevêem a admissão para o quadro auxiliar com a idade de 14 anos.
A manter-se esta limitação ficarão excluídos jovens que fazem a sua formação cívica nas associações de bombeiros, como cadetes, aspirantes, elementos de fanfarra e de serviços auxiliares.
2.5 - Não se define a quem é prestada a informação anual a que se refere o artigo 12.º
2.6 - A extensão de direitos sociais aos bombeiros da forma como é proposta criará situações que é necessário ponderar, designadamente:
2.6.1 - É necessário definir a quem cabe a responsabilidade pelo pagamento de quotizações, à ADSE, por exemplo: como serão atribuídos os vencimentos para cálculo das quotas mensais, sendo certo que se poderão criar desigualdades entre bombeiros de uma mesma classe, em função das suas ocupações profissionais (artigo 16.º, n.º 6);
2.6.2 - Face ao proposto no artigo 16.º, n.º 8, afigura-se necessário definir as obrigatoriedades de dispensa de serviço por parte das empresas e prever medidas que acautelem a prestação do tempo de serviço nas corporações de bombeiros;
2.6.3 - Parece conveniente conhecer a posição das entidades militares quanto à aplicabilidade prática do proposto no n.º 10 do artigo 16.º, quanto à prestação do serviço militar obrigatório fora da instituição militar.
2.7 - Outros direitos e regalias de que gozam os bombeiros, propostos no artigo 17.º, criam a necessidade de definir quem regulamenta esses direitos, que mecanismos compensatórios vão ser criados, como se estabelecem as prioridades para acesso às regalias previstas, bem como a atenuação dos reflexos dos encargos para a administração local com a aplicação do diploma, no que concerne ao n.º 5 do citado artigo.
2.8 - A atribuição de pensão de sangue está regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 404/82, de 24 de Setembro, e pelo Decreto-Lei n.º 413/85, de 18 de Outubro.
A alteração agora proposta refere-se apenas à necessidade do parecer favorável do SNB.

V

(Parecer)

O projecto de lei n.º 194/1 V, do CDS - Estatuto Social dos Bombeiros -, está em condições de ser apreciado em Plenário.

Palácio de São Bento, 17 de Junho de 1986. - O Relator, João Carlos Abrantes. - O Presidente da Comissão, João Amaral.

Este relatório foi aprovado por unanimidade na reunião havida hoje da Comissão de Administração Interna e Poder Local, tendo-se registado a ausência do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Andrade Pereira.
Entretanto, solicito ao Sr. Vice-Presidente Marques Júnior o favor de me substituir na presidência da Mesa.
Neste momento assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Marques Júnior.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Temos grande admiração e carinho pelo bombeiro, particularmente, pelo bombeiro voluntário!
Num mundo em que o homem se sente tentado, cada dia mais, a pautar a sua conduta, a determinar os seus actos, a encaminhar os seus passos pela bússola dos interesses materiais, o altruísmo, a abnegação, o amor e a solidariedade humanas são valores que se agigantam e que, profundamente, reverenciamos.
E quando, como é o nosso caso, se entende que há tarefas sociais que o Estado, por muito que o queira, não é capaz de desempenhar cabalmente, porque exigem amor ou heroicidade que não se pagam, o respeito e gratidão devidos aos executores de tais tarefas impõe-se-nos.
Estamos a pensar em todos os bombeiros, mas confessamo-lo, estamos a pensar sobretudo nos bombeiros voluntários, que são a esmagadora maioria, pois das 448 corporações existentes em Portugal, 380 são de bombeiros voluntários. O nosso país é de todos os países europeus aquele que maior percentagem tem de bombeiros voluntários. O que, tendo, porventura, a ver com a formação cristã das nossas populações, traduz sentimentos de humanitarismo, de arreigado espírito de solidariedade social, de disponibilidade para socorrer o semelhante, que importa preservar.
E não chega que, ciclicamente, quando os incêndios atingem maiores ou mais dramáticas proporções, o País acorde estremunhado da modorra quente do Verão e se lembre que existem bombeiros. Não chega chamar-lhes «soldados da paz» e fazer-lhes promessas. Não chega, quando um desses heróis tomba na luta contra o fogo que consome haveres e outras vidas, arranjar um ar fúnebre, apresentar condolências e prometer ajuda à família enlutada.
É preciso desencadear campanhas de educação das populações orientadas no sentido de evitar situações potencialmente geradoras de incêndios.
É preciso investir mais em meios de prevenção e atempada detecção de incêndios, quiçá, por exemplo, e a título de mera sugestão, obtendo o concurso do Exército na limpeza das matas e não impondo essa obrigação aos proprietários, que, na maior parte dos casos, não dispõem de capacidade económica para isso.
É preciso pôr ao alcance dos bombeiros a necessária qualificação técnica e dotar as corporações dos meios materiais que possibilitem acção eficaz. O que, se em alguns casos exige consideráveis - mas rentáveis - investimentos, noutros impõe apenas a abolição de anacrónicas burocracias.
Tudo isso facilitaria a função dos bombeiros, reduziria os riscos a que estão sujeitos ou diminuiria o número das calamidades a que têm de acorrer e que os têm obrigado a um esforço excessivo, susceptível de levar ao desânimo e esgotamento o homem normal.
Mas é preciso também que a sociedade não seja ingrata para os bombeiros, para esses homens generosos, humildes e abnegados, cujo lema «vida por vida» tem sido de um terrífico realismo nos últimos tempos.
Pensávamos assim antes de Armamar e de Águeda. Pensamos assim hoje por tristíssimas multiplicadas razões.

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Por isso e com o objectivo de saldar parte dessa enorme dívida de gratidão que a sociedade tem para com os bombeiros, respondendo ao apelo da Liga dos Bombeiros Portugueses, o Grupo Parlamentar do CDS apresentou o projecto de lei, cuja discussão ora se inicia.
Trata-se de atribuir ao bombeiro um estatuto social que o dignifique, que lhe confira direitos e regalias, cujo custo, quando for caso disso, seja suportado por toda a comunidade.
Por isso, a parte essencial do projecto de lei é a que constitui o capítulo IV, subordinado à epígrafe «Dos deveres e direitos dos bombeiros».
Mas antes disso, entendeu dever definir-se, ainda que de forma esquemática e quase sempre por remissão para a legislação aplicável, o conceito de bombeiro, a organização de quadros e condições de provimento, a qualidade e o termo do serviço, por se reputar necessária uma referência ao suporte humano da actividade relacionada com a prestação de socorro de pessoas e bens. Mas trata-se apenas da referência, que se crê indispensável, ao bombeiro como nasce e morre enquanto tal e como destinatário do Estatuto que se define.
Não se curou da Regulamentação dos Corpos de Bombeiros, nem do seu Estatuto Disciplinar, matérias que ainda hoje se acham reguladas pelo Decreto n.º 38 439, de 27 de Setembro de 1951, indiscutida que ficou a proposta de lei n.º 112/11 que o governo apresentou em 1982 e que versava sobre a primeira daquelas matérias.
São matérias importantes na vida das corporações, cuja disciplina carece de urgente revisão, mas que se considerou inconveniente tratar conjuntamente com o estatuto social, por deverem antes constituir diplomas autónomos.
Insisto, porém, que a parte nodal do projecto de lei é o já referido capítulo IV. Aí se enumeram os deveres gerais dos bombeiros (artigo 15.º), que vão desde o dever de exercer com competência, zelo e assiduidade o cargo que lhes estiver confiado até ao dever de aumentar a sua cultura geral e especial e cuidar da sua instrução no que respeita às matérias que interessem à função exercida, passando, entre outros, pelo dever de usar com correcção o uniforme que lhes couber.
Aí se definem os direitos gerais dos bombeiros (artigo 16.º), que vão desde o poder-dever de exercer o cargo em que tiver sido legitimamente provido até ao direito de não ser disciplinarmente punido sem ser previamente ouvido em processo adequado, sem esquecer o direito de, a par de outros, frequentar cursos adequados ao seu aperfeiçoamento com a devida compensação a prestar pelo Serviço Nacional de Bombeiros.
Elencam-se, depois, (artigo 17.º) outros direitos e regalias, que têm a ver com a utilização de transportes públicos, com o acesso à habitação arrendada ou própria, com o acesso às cooperativas de funcionários, com o preenchimento de lugares nas autarquias e nos organismos estatais e com o seguro de acidentes pessoais a contratar pelas câmaras municipais.
Por último (artigo 18.º) estabelece-se o direito à percepção de pensões de sangue por parte das famílias dos bombeiros que venham a falecer por acidente ocorrido no exercício da actividade de bombeiro ou por doença contraída no desempenho do mesmo. É certo que, nos termos do Decreto-Lei n.º 404/82, de 24 de Setembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 413/85, de 18 de Outubro, já é possível a atribuição de pensão de preço de sangue nos casos de falecimento ou incapacidade do bombeiro a que a morte ou incapacidade tenha sobrevindo em consequência da prática «de acto humanitário ou de dedicação à causa pública». Com o artigo 18.º do projecto em apreciação tem-se em vista, por um lado, aumentar o número de casos em que a pensão será devida e, por outro lado, tornar a sua concessão dependente do parecer do SNB.
Na atribuição de direitos e garantias aos bombeiros fomos, assim se crê, equilibrados. Generosos e parcimoniosos, a um tempo. Generosos, porque assim o impõem o respeito, a admiração, a homenagem e o reconhecimento de que os bombeiros são credores junto da comunidade. Parcimoniosos, porque se quer evitar uma situação de excessivo privilégio, incompatível com o espírito nobre, desinteressado e altruísta dos bombeiros, sobretudo dos voluntários.
Não se ignora que circulou em alguns grupos parlamentares um «parecer» supostamente proveniente do SNB, que formula um juízo negativo sobre o projecto de lei em apreciação. Dizemos supostamente proveniente do SNB, pois que, nos termos do artigo 8.º, alínea I) da Lei Orgânica do SNB, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 418/80, de 29 de Setembro, a competência para emitir pareceres cabe ao Conselho Superior dos Bombeiros e sabemos, de ciência certa, que este órgão não reuniu para o efeito.
De qualquer modo, cremos úteis algumas observações sobre tal «parecer». Em primeiro lugar, a afirmação de que o projecto de lei «não corresponde aos anseios dos bombeiros» só pode provir de um daqueles espíritos iluminados que -noutros tempos ou noutras paragens - pensam pelos destinatários das normas. É que o Grupo Parlamentar do CDS enviou cópias do projecto de lei a todas as corporações de bombeiros do País solicitando sugestões que, a ser aprovado na generalidade, pudessem enriquecer o futuro diploma na fase de apreciação na especialidade. Ora, das respostas recebidas, resulta justamente o contrário do que se afirma no tal «parecer».
Assim, e a título meramente exemplificativo, a Federação dos Bombeiros do Distrito de Viseu, que agrupa 30 corporações, depois de se referir à recepção do projecto, saúda este grupo parlamentar «por tal iniciativa, tratando-se, como se trata, de um assunto de grande importância para os bombeiros deste país, assunto este que já se arrasta há algum tempo e que urge solucionar».
A Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Queluz, depois de afirmar que se congratula com todas as iniciativas parlamentares que visem melhorar a eficácia e o prestígio das corporações, diz que «o projecto de lei, agora em apreço, contemplando na generalidade esses objectivos, merece, obviamente, o nosso apoio».
A Associação Humanitária dos Bombeiros do Porto afirma-nos que «após atenta leitura do projecto de lei cumpre-nos informar que concordamos na generalidade com tudo o que ele contém».
A Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Cuba diz: «Lemos atentamente o projecto de lei que esse grupo parlamentar vai submeter à apreciação da Assembleia, estamos inteiramente de acordo com todos os pontos nele focados, fazendo votos para que o mesmo vingue e não fique nas gavetas do poder.»

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Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - E, para terminar, a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Ponta Delgada diz que não pode «deixar de felicitar os deputados do CDS por pretenderem resolver algumas das mais chocantes injustiças que se verificam em relação aos soldados da paz».
Mas o «parecer» é, porventura, ainda mais infeliz quando refere que o Estatuto do Bombeiro deverá contemplar um leque de situações mais amplo, como sejam, exemplifica: situação profissional no âmbito das ocupações profissionais normais; situação de emprego; situação em relação à prestação de serviço militar; situação habitacional; situação relacionada com a utilização de transportes públicos; situação de doença, de incapacidade, e situação familiar em caso de morte.
Só que, relativamente à situação profissional no âmbito das ocupações profissionais normais, se pronuncia o n.º 8 do artigo 16.º do projecto, onde expressamente se diz que é direito e poder dos bombeiros «receber integralmente o seu vencimento e ser considerado para todos os efeitos legais, em matéria de trabalho, o serviço prestado às instituições».
Sobre a situação de emprego dispõe o n.º 4 do artigo 17.º, que atribui aos bombeiros em igualdade de aptidões e condições, prioridade para o preenchimento de lugares nas autarquias e organismos estatais.
Refere, depois, a situação em relação à prestação de serviço militar mas, justamente, o n.º 10 do artigo 16.º prevê que o serviço militar obrigatório, e a partir do período de instrução, possa ser prestado nas unidades mais próximas da corporação, quando esta faça prova da necessidade de pessoal efectivo e possa tal serviço ser prestado sob a responsabilidade directa do comandante do corpo activo, segundo directrizes e regulamento da autoridade militar.
Quanto à situação habitacional, é o n.º 2 do artigo 17.º que atribui aos bombeiros a regalia de ter «prioridade em concursos de arrendamento de habitação dos serviços estatais ou municipais e facilidades de crédito para compra de habitação própria».
Não vou maçá-los com mais enumeração, mas relativamente a todos os pontos que se referem no «parecer» há soluções propostas no projecto que ora se apresenta. O tal «parecer» a que me referi termina fazendo a proposta de que se deve continuar a reflexão. Só que os bombeiros sabem que essa reflexão dura há vários anos. Sabem que em cada ano, no seu congresso nacional, se lhes promete que está para breve a publicação do seu estatuto social, mas continuam sem ver satisfeita a sua velha aspiração.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do CDS tem a humildade de admitir que o projecto de lei apresentado pode não ser um modelo de perfeição. Admite sem dificuldade que, quer as sugestões recebidas das cooperações de bombeiros, da Liga e até do SNB, quer as achegas de outros grupos parlamentares podem melhorar o texto e valorizar o conteúdo.
Não admite, contudo, que, mesmo com o anúncio de que se espera pela perfeição, se perca a oportunidade e se adie por mais tempo o pôr à disposição dos bombeiros um instrumento legal que contribui para a sua dignificação social, que é um testemunho do reconhecimento da comunidade e que é até um preito de
homenagem à memória dos que, no afã da entrega, tombaram no campo da luta pela defesa dos bens e pessoas dos outros.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Encontram-se inscritos para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Andrade Pereira os seguintes Srs. Deputados: Magalhães Mota, Rui Silva, João Abrantes e Silva Marques.
Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Deputado Andrade Pereira, a certo passo da sua intervenção referiu-se, salvo erro citando uma intervenção de uma associação de bombeiros, aos processos que se perdem nas «gavetas do poder» e era precisamente a propósito do que se perde nas «gavetas do poder» que queria questioná-lo.
Todos pensamos que é importante um estatuto social do bombeiro, mas V. Ex.ª considera que é suficiente uma tal medida, quando dois meses depois da aprovação do Orçamento do Estado para 1986 ainda estão por desbloquear as verbas concedidas para equipamento dos bombeiros?
Pergunto-lhe ainda se pensa que é possível, por via administrativa ou burocrática, ilegalizar incêndios, decretar que só podem ocorrer a partir de determinada época do ano e, como tal, impedir que os meios aéreos apoiem os bombeiros? Isto é, quando as medidas se perdem nas «gavetas do poder» acha legítimo que qualquer poder considere que a única medida possível de apoio aos bombeiros é o agravamento das penas por incêndios florestais?

Vozes do PRD e do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.

O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Deputado Andrade Pereira, estamos de acordo em que não seria pertinente adiar por muito mais tempo a introdução de um diploma, tal qual este, um estatuto social dos bombeiros. Como o Sr, Deputado afirma, e muito bem, o apelo da Liga dos Bombeiros tem tido eco junto não só da opinião pública, como dos órgãos responsáveis. No entanto, gostaria de lembrar que nem os bombeiros são a Liga e nem é só a Liga que representa os bombeiros e como isso é referido no preâmbulo do seu projecto - «e citarei a preciosa colaboração da Liga dos Bombeiros Portugueses e do seu presidente» -, gostaria de lhe colocar as seguintes questões: O Serviço Nacional de Bombeiros foi consultado? As federações foram consultadas? As assembleias de delegados foram consultadas? As próprias associações, os seus comandos e direcções foram consultados? Suponho que não e falo por mim que sou membro de uma associação de bombeiros e só tive acesso a este projecto após a sua introdução nesta Câmara. Aliás, tive o cuidado de perguntar a outros elementos que fazem parte não só das federações como das assembleias de delegados e todas desconheciam completamente tal consulta.
No entanto consideramos pertinente este projecto e estamos dispostos a colaborar para que, em sede de especialidade, possa ser aperfeiçoado.

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Quanto às saudações que o Sr. Deputado referiu, feitas por várias corporações de bombeiros, é lógico que tudo o que puder vir melhorar a situação actual será sempre bem-vindo.
Embora o Sr. Deputado tenha tido a humildade - honra lhe seja feita- de considerar que este não era um projecto acabado, mas que teria forçosamente de ser aperfeiçoado, não posso deixar de lhe colocar uma questão: Não acha que se se tivesse tido o cuidado dê introduzir um projecto legislativo mais coerente, mais correcto, mais profundo, mais acabado se evitaria uma perda de tempo, já que em sede de especialidade ele terá de ser aperfeiçoado? Não acha que se os elementos ligados às associações e federações de bombeiros tivessem tido acesso a este projecto, ele poderia hoje estar aqui mais completo, não tão omisso de certos articulados e não se perderia, em sede de especialidade, tanto tempo?
Referiu-se a um juízo negativo do Serviço Nacional de Bombeiros de que pessoalmente não tive conhecimento, pese embora o facto de ter tido o cuidado de perguntar a um elemento do Serviço Nacional de Bombeiros (SNB) se concordava ou não com este projecto. Sinceramente, a resposta obtida foi tão vã, que acabei por não perceber se o SNB concordava ou não por .inteiro com este projecto e por isso reafirmo a minha pergunta: fez ou não questão prévia ao SNB para a elaboração deste projecto, o que já por si implicaria e. desmistificada esta Câmara quanto ao tal juízo negativo do SNB que o Sr. Deputado referiu?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.

O Sr. João Abrantes (PCP): - O Sr. Deputado Andrade Pereira começou por referir e louvar a actuação dos bombeiros voluntários, cuja organização considerou única em todo o mundo na estrutura de combate aos incêndios. De alguma forma, começo por estranhar que, ao ler um parecer de uma associação de bombeiros voluntários, tenha lido apenas a parte que considerou importante e omitido algumas considerações desse ofício em que se diz designadamente:

A elaboração do presente projecto de lei só teve em consideração os esclarecimentos prestados pela Liga de Bombeiros Portugueses, constituída essencialmente por comandantes de corporações, com uma visão própria dos problemas, mais de âmbito operacional, esquecendo-se das 448 corporações existentes, 380 das quais pertencem às associações humanitárias.

E logo, a seguir - para contrariar um pouco as afirmações do Sr. Deputado - essa mesma associação escreve:

Não podemos deixar de estranhar e lamentar que, em todo o articulado do projecto de lei n.º 194/IV apresentado à Assembleia da República, nenhuma referência seja feita às associações humanitárias de bombeiros voluntários em número de 380 e que são quem suporta a existência de idêntico número de corporações.
Aqui, de facto, radica uma das grandes contradições deste diploma: - o Sr. Deputado reconhece o grande peso das associações humanitárias de bombeiros voluntários, mas depois, esta legislação, em quase tudo, pretende apenas impor medidas e regalias que têm mais a ver com os bombeiros sapadores e municipais do que propriamente com os bombeiros voluntários.
O projecto de lei faz remissões para a legislação vigente mas, sem pretender entrar já na discussão da especialidade, chamo à atenção para o facto de as condições previstas no articulado contrariarem em grande parte aquilo que existe e regulamenta as associações de bombeiros, designadamente quanto à não previsão de um quadro de comando - que existe em todas as associações - e à participação dos corpos gerentes, por força estatutária, nessa mesma organização..
Ainda uma outra questão, que tem a ver com uma proposta relativa à situação do limite de idade: chamava a atenção, do Sr. Deputado para o facto de a saída do bombeiro por limite de idade ser contemplada actualmente com a sua integração no quadro honorário, o que não acontece neste projecto de lei do CDS.
Uma outra questão, ainda, relativa à questão da escolaridade obrigatória: como é que o CDS prevê a integração de dezenas - senão centenas - de bombeiros por todo o país que não sabem ler, que pertencem aos quadros das associações e que a elas prestem um contributo valioso, igual ao prestado pelos seus outros camaradas?
Por outro lado, o Sr. Deputado referiu que foram pedidos pareceres a todas as corporações. Porque não aceitou então o CDS a sugestão da Liga dos Bombeiros Portugueses, designadamente no sentido de aguardar por um prazo de 45 dias e que, afinal, seria muito inferior pois sabemos que vai haver em Tomar uma reunião de delegados da Liga para tratar especificamente esta questão? Parece-nos uma atitude apressada, sem, no entanto, deixarmos de reconhecer a preocupação e a necessidade de estabelecer um estatuto social para os bombeiros. De qualquer modo não pode servir como desculpa o facto de a Liga e as estruturas dos bombeiros virem exigindo, desde há muito, a aprovação de um estatuto. E um facto que esse problema tem sido adiado, mas agora havia como que um compromisso e, aliás, tinha sido feito um pedido muito concreto ao CDS para que esperasse por esta opinião.
Em relação aos pareceres que o Sr. Deputado diz ter recebido, gostaria de chamar a atenção para uma outra questão: as associações de bombeiros têm uma cadeia hierárquica pela qual se regem e, certamente, o envio de pedidos de pareceres directamente a essas associações poderá criar alguns problemas a essas mesmas associações. E muitas delas, conheço-as pessoalmente, não vão exprimir a sua opinião sem o acordo dos órgãos que as tutelam.
Por último, gostaria de saber como é que o CDS pretende ultrapassar a inconstitucionalidade apontada na alínea a) do artigo 5.º....

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Inconstitucionalidade?

O Orador: - Sim,. Sr. Deputado, ouviu bem - inconstitucionalidade essa que o projecto de lei do CDS prevê, relativamente à cidadania portuguesa.

O Sr. António Capucho (PSD): - Tão previdentes!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

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O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Andrade Pereira, o meu pedido de esclarecimento é no sentido de saber a razão profunda da pressa do CDS no agendamento desta matéria, sendo certo que órgãos altamente representativos dos destinatários e beneficiários dela vos pediram um maior tempo de reflexão.
isto porque se a iniciativa do CDS exprime, sem dúvida, algo com que todos estamos de acordo - o mérito dos bombeiros e dos serviços que eles prestam ao País -, ela ofusca, por isso mesmo, esse mérito que todos deveríamos pôr em evidência. E ofusca - o não só através da forma apressada e da falta de auscultação adequada - de que os próprios interessados se queixam - mas também através do próprio articulado, que sofre de vícios vários, alguns deles já aqui referidos, dos quais coloco em relevo um que, a meu ver, é fundamental e que é o da tendência do vosso projecto no sentido de uma «funcionalização» do serviço de bombeiros.
Ora, se isso viesse a acontecer, teríamos como resultado que o vosso projecto se viraria contra tudo o que há de mais virtuoso no mérito do serviço de bombeiros, que é o humanitarismo espontâneo e intrínseco em que ele assenta.
Daí o meu pedido de esclarecimento, mas não vou insistir mais no assunto. Aliás, haverá ainda uma intervenção do PSD sobre a matéria.
Para terminar, quero apenas registar um facto que muito nos apraz e que é a presença do Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna neste debate, o que é bem significativo do apreço e da atenção com que o Governo, e nomeadamente o Sr. Ministro de Estado, segue os assuntos que dizem respeito aos bombeiros portugueses. Assim é, sobretudo se nos lembrarmos, que o Sr. Ministro seguiu pessoalmente a tragédia de Águeda, esteve no terreno e isso é motivo redobrado do nosso apreço por tal atitude, que não podíamos deixar de saudar aqui.

Aplausos do PSD.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Suspeitava que o Governo não tinha pressa, mas se o PSD também não tem, isso é bem pior!

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento formulados, tem a palavra o Sr. Deputado Andrade Pereira.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Com todo o gosto responderei às questões que me foram colocadas e, aliás, o simples facto de varias questões terem sido colocadas reflecte justamente o interesse que esta matéria tem, como era previsível que tivesse face aos infaustos acontecimentos tão recentemente ocorridos.
Relativamente à questão que colocou o Sr. Deputado Magalhães Mota, gostaria de dizer que não estou mandatado para lhe responder. É que, sem bem percebi, as questões que me colocou devem ser colocadas ao Governo e, como V. Ex.ª muito bem sabe, não tenho qualquer mandato ou qualquer título que me permita responder em nome dele.
Na verdade, o Sr. Deputado coloca a questão de saber porque é que não estão desbloqueadas verbas que deveriam ter sido atribuídas, porque é que há anacrónicas burocracias e, sobretudo, se não há outras medidas legislativas a tomar para além de fazer aprovar um estatuto social dos bombeiros.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Deputado dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Não foi exactamente isso que perguntei, pois, infelizmente, conheço a opinião do Governo! O Governo teve o cuidado de dizer que a única medida que considerava adequada era o aumento das punições para os incendiários!
O que lhe perguntei foi a sua opinião, Sr. Deputado. Perguntei se V. Ex.ª não pensa que também é necessário desbloquear as verbas, tomar outras medidas, etc.

O Orador: - Obviamente, Sr. Deputado, e creio que havia algumas passagens na intervenção que produzi que apontavam nesse sentido. Quando fiz uma referência a «anacrónicas burocracias» tinha justamente em vista o que se passou agora em Águeda e que foi devido, sobretudo, a não terem sido usados meios aéreos por não estarmos ainda na época de incêndios e existir um protocolo que impede a utilização dos meios aéreos da Base de São Jacinto fora dessa época, que só se inicia a 20 de Julho.
É evidente que há imensas medidas legislativas a adoptar e eu lamento profundamente que não se faça um esforço grande no sentido de se conseguir que todas essas medidas sejam tomadas. Aliás, não há só medidas legislativas que é necessário adoptar, há também práticas educativas, que referi, no sentido de haver um empenhamento geral em diminuir este mal que é o excesso de incêndios.
O Sr. Deputado Rui Silva fez notar que a Liga não representa todos os bombeiros. Bom, tanto quanto sei a Liga representa todos os bombeiros voluntários - pelo menos ela autodenomina-se a única confederação dos bombeiros voluntários portugueses.
De qualquer modo, quero esclarecê-lo de que no preâmbulo do projecto há uma afirmação que está escrita e que, obviamente, não retiro. Compreendo que as pessoas tomem as atitudes que entendam tomar e até eu, que já tenho alguma experiência da vida, sei quantas vezes é preciso fazer um pouco de «marcha atrás». Mas, de todo o modo, a afirmação está escrita e eu não sinto necessidade nenhuma de a retirar.
Quanto a saber se foram ouvidos o Serviço Nacional de Bombeiros e as corporações, peço imensa desculpa se não foi ouvida a corporação de bombeiros a que o Sr. Deputado pertence, mas o Grupo Parlamentar do CDS teve a preocupação de enviar uma cópia do projecto de lei a todas as corporações. É possível que os elementos de informação de que dispomos sobre a identificação de todas as corporações não estejam perfeitamente actualizados ou que haja qualquer lapso e daí tenha resultado não lhe ter sido enviado o documento. De qualquer modo, houve, efectivamente a preocupação de enviar o projecto a todas as corporações de bombeiros.
É verdade que o diploma não foi enviado ao Serviço Nacional de Bombeiros e cremos que não tinha de ser. Este não é um processo legislativo de consulta, mas sim uma consulta que o grupo parlamentar entendeu dever fazer para estar mais preparado a fim de, em sede de especialidade, poder ter um manancial de sugestões que permita aperfeiçoar o diploma que apresentámos.

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Por outro lado, também não me parece que a afirmação feita pelo Sr. Deputado de que a circunstância de se fazer uma maior reflexão anterior permitiria, depois, que a aprovação na especialidade fosse mais rápida, pois creio que há iniciativas legislativas muito perfeitas, oriundas de todos os grupos parlamentares e até do Governo, que se arrastam bastante tempo pelas comissões para apreciação na especialidade.

Vozes do CDS: - Muito bem!

Ò Orador: - O Sr. Deputado João Abrantes começou - por me surpreender por ter tido a preocupação de dar conta da importância dos bombeiros voluntários. É que aí estamos, surpreendentemente, de acordo!
Dei conta de quanto o Grupo Parlamentar do CDS considera importante o papel dos bombeiros voluntários no contexto dos bombeiros portugueses, não só porque efectivamente estes são constituídos por uma esmagadora maioria de bombeiros voluntários mas também porque a sua natureza e a solidariedade social que está por trás da sua actuação são algo que, por estar de acordo com os princípios que o CDS defende, merece o nosso aplauso.
O Sr. Deputado fez depois a afirmação de que o projecto do CDS contém várias medidas que têm mais a ver com os sapadores do que com os bombeiros voluntários. Bom, salvo o devido respeito, V. Ex.ª está enganado.
Se só houvesse bombeiros sapadores ou se houvesse apenas bombeiros sapadores e bombeiros municipais, seguramente que o CDS não tinha esta iniciativa legislativa, pois estes estão já suficientemente acautelados. As medidas que se prevêem são para beneficiar os bombeiros voluntários, que estão ainda longe de ter a sua situação devidamente acautelada.

O Sr. João Abrantes (PCP): - Onde é que isso está escrito?

O Orador: - Quanto à ausência de quadros de comando, também na minha intervenção referi que no projecto em análise não se diz nada sobre os quadros dos bombeiros nem sobre medidas disciplinares, exactamente porque se entende que o estatuto social do bombeiro deve ser apenas constituído por grandes bases gerais de integração do bombeiro na sociedade e não deve confundir-se com o tratamento de outras matérias que, como referi, importa actualizar na sua regulamentação.
Quanto à escolaridade obrigatória, gostaria de referir que é óbvio que ninguém quer que os bombeiros que não têm a escolaridade obrigatória se vão embora e deixem de prestar o seu contributo. É óbvio que o que se pretende é que os novos bombeiros, esses sim, tenham a escolaridade obrigatória e não àqueles que já o são.
Queria só referir ao Sr. Deputado, para o esclarecer, que realmente a Liga dos Bombeiros não pediu que a discussão fosse adiada. A Liga dos Bombeiros disse apenas que ia fazer um plenário no dia 28 e que só depois disso daria um parecer, não tendo pedido qualquer tipo de prazo. Pelo contrário, em conversa pessoal, admitiu que se poderia ir andando com a discussão na generalidade, pois aquilo que resultasse desse plenário no dia 28 poderia ser apreciado na especialidade.
Por último e quanto à inconstitucionalidade, perdoará o Sr. Deputado, mas realmente através de uma leitura atenta do artigo 5.º verá que não há inconstitucionalidade nenhuma! Ou se assim for, temos de ter aqui um curso de inconstitucionalidade! Mas não me pronunciarei agora sobre isso...

O Sr. João Amaral (PCP): - Porquê?

O Orador: - Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado Silva Marques, em primeiro lugar, quero dizer-lhe que, com as limitações próprias das pessoas que o fizeram, este projecto já anda a ser estudado há alguns meses..

Vozes do PCP: - Não parece!

O Orador: - Não saiu melhor porque as pessoas que fizeram esse estudo são realmente pessoas limitadas.
Mas a verdade é que há organismos dependentes do Estado que andam a estudar isto há muitos anos. Pelo menos, há uma proposta do governo de 1982 e nessa altura dizia-se que o estatuto social do bombeiro iria sair dentro de poucos dias, mas tal não aconteceu...
Por outro lado, este projecto está nesta Câmara há mais de um mês, o que poderia já ter possibilitado a reflexão suficiente.
Quanto à possível tendência para a funcionalização do serviço de bombeiros, quero dizer que ela não existe, pelo contrário; em nosso entender, o respeito e a admiração que os voluntários nos merecem apontam exactamente no sentido contrário, e já há pouco tive a franqueza de admitir que se há algum ponto na redacção do artigo 6.º deste projecto de lei que aponta no sentido da funcionalização, pois, necessariamente que isso está muito a tempo de ser objecto de reflexão e correcção.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como sabem, estava agendada para as 18 horas a votação final global da proposta de lei n.º 18/IV. No entanto, há um pequeno atraso na dactilografia do documento que saiu da Comissão Especializada e, se não houver inconveniente, atrasaremos um pouco a votação, dando ao mesmo tempo oportunidade aos senhores deputados que estão presentes nas várias comissões para virem para a Sala.
Se não houver qualquer objecção, dou assim, a palavra ao Sr. Deputado que está inscrito a seguir e após a. sua intervenção passaremos à votação final global da proposta de lei.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva, para uma intervenção.

O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Presidente, antes de proferir a minha intervenção, gostaria de lhe pedir autorização para referir a presença nesta Câmara de uma pessoa que desde sempre demonstrou o seu interesse por toda a problemática que existe ao redor dos bombeiros portugueses. Refiro-me ao Sr. Padre Victor Melícias, aqui presente e conhecido de todos os que estão ligados aos bombeiros.

Aplausos gerais.

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Pela sua presença, pelo seu interesse que tem demonstrado pelos bombeiros, o nosso muito obrigado.

Aplausos gerais.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 194/IV, que hoje vamos apreciar e votar na generalidade, versa matéria de particular significado e responsabilidade, dado o âmbito da sua extensão e o grau de justiça que implicará a sua entrada em vigor. Refiro-me ao estatuto social dos bombeiros.
Raras são as assembleias de delegados, reuniões de federações ou simples encontros de comandos de associações que na sua agenda não conste a matéria hoje em discussão.
Nas conclusões dos congressos da Figueira da Foz e Viana do Castelo realizados respectivamente de 6 a 10 de Outubro de 1982 e 25 a 30 de Setembro de 1984, foi referido claramente, nas suas conclusões, a prioridade de elaboração de um estatuto social dos bombeiros. A promulgação de um diploma que dignifique o homem bombeiro e a nobre missão que desempenha já há muito ultrapassou a fase da necessidade para se tornar num acto de justiça que definitivamente coloque no lugar que merece quem tão nobre missão executa.
A entrega nesta Câmara de um projecto que visa essencialmente conceder direitos, benefícios e regalias aos bombeiros portugueses não poderia deixar de receber da nossa bancada uma inegável simpatia e incondicional apoio. No entanto, e antes de entrar na análise concreta do seu articulado, não poderei deixar de fazer um pequeno reparo.
Como membro directivo de uma associação de bombeiros voluntários, tenho, há já alguns anos, vindo a acompanhar e a partilhar das necessidades e preocupações, que infelizmente continuam a ser muitas, não só das nossas associações e dos seus membros do corpo activo como também das próprias direcções. A prová-lo está a intervenção que proferi nesta Câmara em Fevereiro passado, acompanhada da introdução legislativa de dois projectos de lei sobre seguros de pessoal e atribuição de pensões de sangue.
Aquando da visita do Sr. Presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses à Comissão de Administração Interna e Poder Local, ficou por este bem clarificado que qualquer iniciativa que versasse alteração das situações vigentes dos bombeiros portugueses deveria, a bem, ser precedida de uma consulta aos respectivos órgãos responsáveis, nomeadamente Liga dos Bombeiros Portugueses, Serviço Nacional de Bombeiros e respectivas federações, o que, na lógica, se entende, dado competir a estes organismos gerir em termos técnico-administrativos o funcionamento de fundo das diversas corporações de bombeiros, com uma percepção clara, inequívoca e imediata das necessidades e carências existentes. Como é referido no preâmbulo deste projecto, o seu subscritor cita a «preciosa colaboração da Liga dos Bombeiros Portugueses e do seu presidente».
É bem certo que não ousaríamos pôr em causa tal afirmação. No entanto, e como conhecedor dos objectivos tantas vezes referidos por aquele organismo para o conteúdo da matéria que deverá conter um estatuto social dos bombeiros, bem como da necessidade prévia de se ajustarem alguns regulamentos, tais como regulamento dos corpos dos bombeiros, estatuto disciplinar, regulamento de ordem unida, regulamento de fardamento, regulamento jurídico e a construção e funcionamento da escola nacional de bombeiros, permite-me perplexidade quanto à participação activa e eficaz como deveria ser, não só da Liga dos Bombeiros Portugueses mas também do Serviço Nacional de Bombeiros, na elaboração deste projecto.

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Não desejo, porém, que com esta tomada de posição se deduza que contesto a pertinência, exigência, e até alto grau de nobreza do legislador, ao apresentar um diploma desta natureza, apenas como bombeiro paisano que também sou, cidadão há já largos anos dedicado à nobre causa que é prestada à sociedade pelos nossos bombeiros, não posso deixar de salientar a minha tristeza ao verificar que os verdadeiros interesses e anseios, já tantas vezes expressos por quem de direito, fossem preteridos por uma inexplicável e apressada vontade, embora bem intencionada, mas vaga e incompleta apresentação de trabalho.

Voz do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Para muitos dos presentes não será novidade; para quem desconhece esclarecerei que para nós, homens ligados aos bombeiros independentemente da sua função, é ponto de honra que dos portões dos quartéis para dentro, ideologias políticas e interesses partidários são palavras que não constam do nosso dicionário.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Os bombeiros ajudam quem os solicita, socorrem quem precisa, não perguntam para onde vão, de onde vêm nem quem são. É justo e imperioso que retribuamos do mesmo modo.
Um estatuto social dos bombeiros acarreta uma responsabilidade tal, que por si só justifica uma audição prévia, pelo menos, aos titulares dos órgãos sociais, ao Serviço Nacional de Bombeiros, ao seu inspector superior e respectivos inspectores regionais, aos presidentes das federações e assembleias de delegados distritais. A prová-lo está marcada uma reunião a efectuar em Tomar, no próximo dia 28 do corrente, onde estarão presentes delegados de todos os distritos do continente e regiões autónomas para discutirem, entre outros assuntos, o conteúdo e objectivos que deverá conter o estatuto social dos bombeiros.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Numa simples análise ao articulado deste diploma direi apenas que em alguns aspectos apresenta algumas lacunas que entre outras interessa referir e que, em sede de especialidade, poderemos aperfeiçoar e a introduzir.
Assim, nada consta sobre quadros honorários, corpos de bombeiros femininos e corpos de fanfarras que hoje já representam elevada expressão numérica das nossas corporações.
A situação profissional dos bombeiros voluntários terá de estar perfeitamente clarificada. São do conhecimento geral as represálias a que estão sujeitos os bombeiros voluntários por parte de entidades patronais quando se ausentam do seu posto de trabalho para assistirem a actos de socorrismo. As faltas, carreiras e licenças deverão constar especificamente do seu estatuto.

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A utilização de estabelecimentos militares, tais como oficinas gerais de fardamento e equipamento, para a confecção de uniformes e calçado.
A situação habitacional deverá prever a construção de bairros para uso exclusivo de bombeiros, iniciativa esta já tomada pela Câmara Municipal de Oeiras.
A terceira idade dos nossos bombeiros, que após 30 ou 40 anos de serviço gratuito prestado à sociedade, só porque já não têm capacidades operacionais são esquecidos sem sequer terem, quantas vezes, um lar ou uma simples cama para desfrutarem, calma e merecidamente, os anos de vida que lhe restam.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: As corporações de bombeiros são a mais antiga e mais numerosa forma de associativismo do nosso país. São 30 000 homens e 380 corporações de voluntários que poupam ao Estado, só em salários, cerca de 10 milhões de contos por ano. É justo e urgente que a estes homens e mulheres o Estado proporcione medidas justas e compensatórias. Em sede de especialidade o Partido Renovador Democrático empenhar-se-á nó seu melhor para que se reponha justiça, se encontre consenso e se atinjam os anseios de quem tudo dá, até a própria vida, sem nada, ou quase nada, pedir. Os soldados da paz, os bombeiros de Portugal.

Aplausos do PRD, do PSD, do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - para pedir esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Andrade Pereira.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Pedi a palavra para prestar homenagem ao Sr. Deputado Rui Silva, na sua qualidade de bombeiro voluntário - qualidade de que só há pouco tive notícia - e para lhe dirigir uma palavra de agradecimento pela colaboração que ofereceu para o debate na especialidade.
Por último, queria só perguntar-lhe - esta é a última questão que lhe coloco - se considera que, neste processo legislativo aqui na Assembleia da República, se impunha ou era obrigatória a audição do Serviço Nacional de Bombeiros. Na verdade, creio não ser necessário, mas gostaria de saber a sua opinião.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.

O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Deputado Andrade Pereira, suponho que tal audição não seria obrigatória mas seria desejável.
O Serviço Nacional de Bombeiros é o organismo que neste momento superintende, em termos administrativos e financeiros, todas as corporações de bombeiros e o seu contributo só poderia valorizar este diploma.
Quando refiro o Serviço Nacional de Bombeiros não me refiro a ele isoladamente. Já no pedido de esclarecimento que lhe formulei há pouco referi que considero - e mantenho a minha ideia - que tudo aquilo que pudesse vir já definitivamente no conteúdo deste projecto, encurtaria, em termos de timing, o tempo da discussão que iremos ter na especialidade.
Portanto, mantenho o que disse: seria desejável que o Serviço Nacional de Bombeiros procedesse a uma prévia apreciação do diploma.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.

O Sr. António Capucho (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, pensei que V. Ex.ª tinha anunciado que a seguir à intervenção acabada de produzir iríamos proceder a votação final global da proposta de lei.

O Sr. Presidente: - É verdade, Sr. Deputado. Porém, o relatório só chegou agora e foi pedido que se tirassem fotocópias para serem distribuídas pelos grupos parlamentares.
Entretanto, concedi a palavra ao Sr. Deputado João Abrantes, com o objectivo de aproveitar o tempo da melhor forma. Se não virem inconveniente nisso, procederíamos como acabei de referir.

Pausa.

Visto não haver qualquer objecção, tem a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.

O Sr. João Abrantes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Administração Interna: Os tristes acontecimentos do último fim-de-semana vieram trazer ao debate que hoje se realiza sobre o estatuto social dos bombeiros uma acrescida actualidade e importância.
A tragédia que vitimou quinze vidas em Águeda, a menos dê um ano dos acontecimentos em Armamar, numa altura em que o Verão ainda mal começou, traduzem a necessidade de desencadear acções que evitem o deflagrar do fogo e tornem mais eficaz e, sobretudo, menos perigosa a tarefa daqueles que o combatem.
Neste fim-de-semana, os valorosos soldados da paz demonstraram bem as dificuldades com que lutam e a falta de meios com que se debatem.
É urgente que se criem as condições que estimulem o exercício da função de bombeiro, sobretudo a do voluntário que envolve '380 corporações das 450 existentes e um total de mais de 30 000 homens, e é necessário que se diminua ao máximo o risco dessa actividade.
Não basta reconhecer que com a acção do voluntariado o País economiza anualmente 8 milhões de contos como afirmou o responsável governamental da Administração Interna nesta Assembleia.
Por parte do Governo, entendemos que muito pouco tem sido feito.
Os bombeiros portugueses têm vindo a reclamar ao longo dos anos a necessidade de serem dotados de meios capazes de fazer frente ao flagelo que em cada ano constituem os fogos.
E apontam como urgente a necessidade de criação de linhas de crédito, a taxas reduzidas, para a aquisição dos seus equipamentos, o estabelecimento de prémios reduzidos de seguros de viaturas e pessoal, a isenção de impostos nos equipamentos adquiridos, o estabelecimento de regras respeitantes aos quadros de pessoal das associações, fixando valores e disciplinando as regalias e deveres dos seus assalariados, a criação de mecanismos que obriguem à inscrição no Orçamento do Estado da transferência de verbas para as câmaras municipais provenientes da arrecadação do imposto de incêndios, cobrado pelas seguradoras e á obrigatoriedade legal de transferir totalmente essas verbas para as corporações de bombeiros da sua área, contemplando

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de igual modo os corpos municipais, quando existam, e os voluntários, e rejeitar a eventual integração numa só lei dos conceitos e regulamentações de segurança interna e protecção civil.
Da análise que fazem, recomendam a urgente promulgação de diplomas que definam o estatuto jurídico das associações humanitárias, o estatuto social dos bombeiros, regulamentos dos corpos de bombeiros, disciplinar, de ordem unida, de fardamentos e legislação sobre seguros de pessoal e de viaturas.
Em toda a legislação a aprovar, exigem a participação dos seus legítimos representantes, consubstanciados na Liga dos Bombeiros Portugueses.
Resulta, pois, que um estatuto social dos bombeiros deve congregar estas aspirações e resultar num estatuto digno e adequado, definido com ampla participação da Liga das corporações e bombeiros onde fiquem consagrados, designadamente, a articulação entre o emprego e a actividade de bombeiro, o apoio justo e humano às suas famílias de acordo com os relevantes serviços que os bombeiros prestam ao País e à defesa do seu património, o estabelecimento de adequado seguro e a atribuição de pensões de preço de sangue, a definição dos equipamentos de segurança a adoptar como forma de diminuir o risco da sua actividade, etc.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como é possível conceber que apesar dos alertas da Liga dos Bombeiros Portugueses e, do início dos fogos, o Governo não tenha despoletado o sistema de vigilância e de meios de apoio de combate aos incêndios? Os anteriores incêndios verificados em diversas zonas do País indiciaram a catástrofe. Mas o Governo esperava nos gabinetes o dia l de Julho.
A verdade é que a Liga dos Bombeiros Portugueses, em Maio, manifestava a sua preocupação pela falta de conhecimento, da maioria dos delegados, quanto às linhas de orientação para a nova campanha, a insuficiência de meios humanos e materiais em algumas áreas e quanto à transferência das verbas necessárias para que o Serviço Nacional de Bombeiros assuma as novas responsabilidades da transferência de meios de combate a incêndios florestais da Direcção-Geral das Florestas para o sector de bombeiros, e também sublinharam «as diferenças de características entre as várias regiões e a necessidade de se encontrarem soluções que garantam a eficácia das acções de combate nesta fase de transferência».
Os incêndios florestais não podem ser o pretexto para a política de demagogia.
É necessário punir severamente os que ateiam o fogo, mas, acima de tudo, importa ir até ao fundo e conhecer os autores morais e as redes de interesses que estão por detrás dos incêndios.
E tardam as medidas concretas!
As verbas do Orçamento do Estado destinadas ao Serviço Nacional de Bombeiros não estão ainda desbloqueadas. Ainda a semana passada foi possível ouvir um responsável da Direcção-Geral das Florestas dizer que não há postos de vigilância na serra de Monchique, porque ainda estão bloqueadas as verbas!
Discutindo hoje a Assembleia da República matéria relativa aos direitos dos bombeiros, importa também introduzir no debate a razão por que se dão e repetem estas catástrofes e quais as medidas que se devem tomar de imediato.
Cabe ao Estado, como vimos repetindo desde há anos, a promoção de uma política florestal que faça da floresta um bem social estimado e protegido por todos; cabe-lhe igualmente dotar os agentes locais (bombeiros e autarquias) dos meios de protecção, defesa e preservação da floresta, para que se torne possível a todos desfrutar desse bem.
Feito o diagnóstico onde estão pois os bloqueamentos? Desde logo, na falta de um ordenamento florestal que tenha em conta a realidade do País e das populações e que não sirva interesses das multinacionais.
A substituição da floresta tradicional de uso múltiplo pela floresta industrial e a sua incompatibilização com formas tradicionais de exploração é dos principais factores de agressão que conduziram ao actual estado de coisas.
Por outro lado, faltam as medidas para a limpeza das matas, para a sua vigilância e protecção.
Urge a implementação de sistemas de vigilância e detecção, com a dotação de meios de comunicação adequados à ligação entre esses postos de vigia, com a criação de acessos eficazes através das manchas florestais e sempre que o fogo eclodir há que ter os agentes do seu combate devidamente equipados para o efeito.
O aproveitamento desses meios deverá caber a um organismo eficaz que centralize a acção do combate a incêndios.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP vem, desde 1978, a prestar um contributo válido às questões que se prendem com a floresta e a sua protecção e com o apoio aos bombeiros, quer através de intervenções de divulgação e alerta das conclusões dos congressos nacionais de bombeiros, quer através da apresentação de projectos de lei.
Foi assim em 1978, com a apresentação do projecto de lei n.º 117/I, no qual se propunha a criação de um serviço nacional de estaleiros de recepção e tiragem de material lenhoso, e depois em 1980, com o projecto de lei n.º 392/I, em que se visava a criação de bases da organização das florestas para a defesa contra incêndios.
Apresentámos recentemente um projecto de lei que visa resolver as situações de asfixia financeira criadas às corporações de bombeiros com a não actualização das taxas de transportes em ambulâncias.
De igual forma, entendemos ser de grande utilidade para a prevenção dos incêndios nas florestas o lançamento de uma campanha a nível nacional de educação e sensibilização das populações na preservação do nosso património florestal. Essa campanha deveria envolver os meios mais amplos da comunicação social (RTP, RDP, imprensa escrita) e nela deveriam ser ministrados ensinamentos sob a forma de utilização da floresta que temos e de como evitar a sua destruição.
Pensamos ser igualmente importante o envolvimento das camadas mais jovens da população na salvaguarda do património florestal que possuímos; isso deveria ser feito com a inclusão de jovens no programa de ocupação de tempos livres nos postos de vigilância a implementar nas manchas florestais necessárias, bem como a sua colaboração na limpeza das matas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A aprovação do estatuto social dos bombeiros tem vindo a ser reclamada pela Liga dos Bombeiros Portugueses em sucessivos congressos.
O projecto de lei n.º 194/IV, do CDS, pretende aplicar o estatuto social a todos os bombeiros portugueses, integrados de forma voluntária ou profissionalizada em corpos de bombeiros, ressalvando logo de seguida a sua aplicação aos bombeiros sapadores ou municipais, em tudo o que contraria a legislação em vigor.

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As soluções apresentadas pelo partido proponente devem ser ponderadas, nomeadamente quanto à exigência da cidadania portuguesa de origem para pertencer aos corpos dos bombeiros, o que se nos afigura incompatível com o estatuto constitucional da cidadania à participação de corpos gerentes e comandos na definição e movimentação dos quadros de pessoal, à possibilidade de admissão de jovens no quadro auxiliar a partir dos 14 anos, como actualmente acontece com cadetes, aspirantes, elementos de fanfarra e serviços auxiliares.
Por outro lado, o presente projecto de lei parece desconhecer a legislação já existente, que deveria ser objecto de análise conjunta, para que, com rigor, o novo estatuto corresponda aos interesses dos bombeiros e das suas corporações.
O novo estatuto social dos bombeiros só pode ser elaborado com a participação efectiva da Liga dos Bombeiros Portugueses, das corporações e dos bombeiros portugueses. Tal como refere o relatório da Comissão em 28 de Junho, efectuar-se-á uma reunião de delegados da Liga com vista ao debate da matéria.
A Assembleia da República tem de ter em consideração as conclusões deste encontro e ouvir atentamente os destinatários das medidas que, preconiza.
Por fim, queremos deixar bem expressa a nossa disponibilidade para a rápida aprovação de um conjunto de medidas legislativas, algumas das quais já entregues na Assembleia, que venham ao encontro das inúmeras necessidades dos soldados da paz..

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há inscrições para pedidos de esclarecimento, pelo que vamos interromper aqui este debate para proceder à votação final global da proposta de lei n.º 18/IV, que agrava as sanções penais aplicáveis em casos de incêndios florestais.
Creio que a Mesa está dispensada de ler o texto final, aprovado na especialidade, da proposta de lei n.º 18/IV. Já foi entregue a todos os grupos parlamentares fotocópia deste texto e, portanto, se não houver nenhuma objecção, passaremos de imediato à votação.

Vamos votar.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência da Sr.ª Deputada independente Maria Santos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Armando Lopes, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Armando Lopes (PS): - Sr. Presidente, tenho uma declaração do voto para ler ou para apresentar na Mesa, como V. Ex.ª entender; se puder, leio-a; se não puder, apresento-a.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se a minha interpretação do Regimento não está errada, neste caso, as declarações de voto só podem ser apresentadas por escrito. Não é verdade?

Uma voz: - Não, não é verdade!

O Sr. Presidente: - Portanto, a minha interpretação está errada. O Sr. Deputado tem a palavra para fazer a sua declaração de voto.

O Sr. Armando Lopes (PS): - Depois de larga discussão, a proposta de lei do Governo foi aprovada na Comissão de Assuntos Constitucionais...

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Peço desculpa de o interromper, Sr. Deputado, mas, pelos vistos, este assunto não é pacífico e o Sr. Deputado Magalhães Mota pediu a palavra. Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para interpelar a Mesa, porque penso que, de facto, a interpretação do Regimento feita pelo Sr. Presidente é correcta. O consenso estabelecido entre os grupos parlamentares é que levou a que se voltassem a fazer declarações de voto orais a seguir a votações finais globais, mas essa interpretação, consensual e que começa a estabelecer tradição, não é perfeitamente regimental.

O Sr. Presidente: - Devo dizer que registo com muito agrado, em termos pessoais, a interpelação do Sr. Deputado Magalhães Mota.
Para dar rapidamente continuação aos trabalhos, dou a palavra ao Sr. Deputado Armando Lopes, pedindo desculpa pela interrupção.

O Sr. Armando Lopes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois de larga discussão, a proposta de lei do Governo foi aprovada na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Sofreu aí diversas alterações importantes.
A mais significativa de todas foi a de fazer punir os chamados autores morais dos incêndios, ou seja, todos aqueles que incitarem ou determinarem outrem à prática do crime para obterem uma recompensa ou vantagem, um enriquecimento para si ou para terceiro, ou ainda para causarem prejuízo a outrem.
Na verdade, a proposta de lei do Governo silenciava completamente a punição dos autores morais. E se, por aplicação dos princípios gerais, eles viessem a ser punidos sê-lo-iam com uma pena igual à dos incendiários directos, esses maluquinhos ou semiloucos, de quem toda a geme desconfia serem comandados ou determinados por outros a troco de meia dúzia de escudos.
Com a alteração feita no texto da proposta de lei do Governo, por sugestão do Partido Socialista, o novo texto não só pune expressamente esses autores morais como lhes fixa uma pena mais grave do que a prevista para os chamados autores materiais dos incêndios.
Com efeito, enquanto a pena para os autores materiais é de três a dez anos de prisão, a pena agora fixada para os autores morais fixa, como limite mínimo, a pena de seis anos de prisão.
Desejamos salientar que as penas ora fixadas para todos os crimes foram estabelecidas por acordo unânime de todos os partidos. Só quanto às coimas e a dois artigos que as regulamentam é que o PCP se absteve.
Por acordo de todos os partidos, foram estabelecidas reservas às punições ora fixadas e que a proposta de lei do Governo também não previa.

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Uma diz respeito aos trabalhos preventivos e outras operações que, segundo o estado dos conhecimentos e da experiência da técnica florestal, se mostrem indicados e forem levados a cabo, de acordo com as regras aplicáveis, por pessoas qualificadas ou pessoas devidamente autorizadas a empreendê-los com intenção de combater incêndios, prevenir, debelar ou minorar a deterioração do património florestal ou garantir a sua defesa ou conservação.
Outra reserva diz respeito ao não sancionamento - com as pesadas coimas que foram previstas - daqueles que fizerem queimadas, que fizerem fogo, fumarem ou lançarem foguetes, desde que tomem as necessárias previdências adequadas.
Qualquer destas reservas se justifica por si. Seria absurdo punir os trabalhadores que em matas, por exemplo no Inverno ou mesmo em fins de Setembro, quando já está frio, fizessem uma simples fogueira para se aquecerem ou aquecerem as suas refeições, obviamente tomando as necessárias cautelas.
Seria absurdo também punir quem atravesse de automóvel uma mata e vá a fumar, isto ainda que transite numa estrada nacional e com os vidros fechados.
Havia, na proposta de lei do Governo, exageros que a Comissão, por unanimidade, corrigiu, pelo que não pode tornar-se qualquer partido como responsável pelas alterações, quando elas foram estabelecidas por unanimidade.
Supomos que o novo texto em que se transformou a proposta de lei é um bom trabalho, prevendo penas muito mais graves que aquelas que resultariam da aplicação pura e simples do Código Penal.
Pena foi que não pudesse hoje votar-se também o projecto de lei n.º 28/IV, do PS, que visa travar o interesse nos incêndios florestais com medidas de fundo, que visam eliminá-los na sua origem.
Quando tal projecto de lei vier a ser aprovado por esta Assembleia, essa praga dos autores morais dos incêndios florestais perde o interesse no seu desencadeamento e os incêndios florestais diminuirão, com certeza, em número.
Fazemos votos para que esse projecto de lei venha a ser aprovado rapidamente.

Aplausos de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs, Deputados: De forma atempada, e após ter levado a cabo um trabalho de reflexão, que a minha bancada gostaria de sublinhar, a Assembleia da República acaba de aprovar por unanimidade - facto que consideramos positivo - um novo regime legal do qual é legítimo esperar, creio, um reforço do combate àqueles que, de forma criminosa, vêm delapidando o património florestal português e ceifando, assim, indirectamente, ou, por vezes, deliberadamente, vidas de inocentes ou daqueles que se dedicam ao combate às chamas.
Gostaria de sublinhar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que em torno desta proposta de lei se desenvolveu, no âmbito da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, um trabalho profícuo. É para isso que serve o trabalho das Comissões.
Infelizmente, esse trabalho foi necessário e consumiu-nos algumas horas por causa da própria fragilidade da base de trabalho de que partimos.
Esse trabalho de destrinça, feito nesta Comissão, conduziu à correcção daquilo que eram aspectos considerados negativos e mesmo susceptíveis de criarem perigosas confusões e perturbações no combate aos incendiários, que é necessário capturar e punir.
Foi assim que fizemos a destrinça entre os casos de incêndios voluntários, deliberados, em que a intenção criminosa merece ser elevadamente punida, e os casos de mera negligência.
Foi também assim que levámos a cabo uma severíssima punição dos autores morais, em que todos devemos reconhecer o factor principal e o aspecto mais grave da actual situação em Portugal. Foi a eles que esta proposta passou a dedicar atenção fulcral no plano penal e isso é, quanto a nós, um contributo positivo do trabalho na especialidade, ao qual juntámos, naturalmente, o nosso labor.
Por outro lado, dedicou-se particular atenção à destrinça das situações que possam registar-se no impedimento ou na dificuldade do combate aos incêndios, sendo certo que poderá haver uma gradação muito vasta de situações, devendo, pois, os tribunais considerar com rigor as situações concretas, para o que ficam agora munidos dos instrumentos legais absolutamente imprescindíveis e sem a confusão legal que eivava a proposta governamental originária.
Não se pôde corrigir, porque era incorrigível, o facto de o Governo ter incorporado no conjunto destes preceitos legais normas meramente contra-ordenacionais, que têm o direito de emanar por si só e que o Governo havia já tido o dever de corrigir, se fosse seu entendimento, sem mais dependência, sem outro calendário que não o seu próprio, sem envolver esta Assembleia nesse processo. Isso era incorrigível e não ficou corrigido.
As coimas hoje em vigor são aquelas que o Governo queria propostas, com certas correcções que a Comissão introduziu, deferindo-se aos presidentes das câmaras competência para as aplicar, solução cujo processo de aplicação também suscitará por parte desta Casa uma reflexão em termos adequados.
Pela nossa parte, exprimimos através do voto especializado o nosso ponto de vista sobre esta questão.
Finalmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, cabe perguntar se aquilo que aqui fizemos vale de alguma coisa e devo dizer que não valerá de nada, de absolutamente nada - o que é gravíssimo - se não for acompanhado de uma acção nos planos organizativo, técnico e financeiro. Não valerá de nada se nos aparelhos de investigação se continuar a registar dificuldades que são conhecidas por todos. Não valerá de nada enquanto a Polícia Judiciária tiver 400 lugares vagos por preencher e 397 viaturas das quais um substancial número não «mexe». Esta situação é da inteira responsabilidade do Governo, que, neste momento, tem meios financeiros - assim tenha vontade política - para a ultrapassar.
Por outro lado, esta solução legal agora aprovada não produzirá por si só o efeito que todos queremos que produza se não for também acompanhada de medidas que desbloqueiem o funcionamento dos tribunais.
É impossível que uma lei tenha penas elevadas e ad terrorem se na sua aplicação prática os incendiários conseguem escapar às malhas legais e isto não resulta de culpa e não envolve acusação cega aos nossos magistrados judiciais e do Ministério Público, que, de resto, seria descabida.

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O sistema, com as suas carências, o sistema judicial, com as suas lacunas e com os seus problemas é que tornam, neste momento, impossível um eficaz combate àqueles que prevariquem nesta área que tanto nos sensibiliza e questão é que nos mova a adoptar medidas, em particular ao Governo que tem uma competência fulcral na esfera da gestão da justiça e que, com tantos aspectos negativos, a vem arrastando.
Creio que é muito grave, e com alguma apreensão nos apercebemos do que estava a suceder, que em torno desta questão se gere qualquer atitude de apelo à lei de Lynch, à justiça pelas próprias mãos, ou à desconsideração dos factos reais que conduzem à destruição da floresta.
É preciso distinguir situações, localizar autores e não concebemos que o Ministro da Administração Interna e do Poder Local possa, por exemplo, declarar que há redes organizadas promotoras dos fenómenos que tanto nos chocam sem que, de imediato, assuma perante o País a responsabilidade política de as detectar, desmantelar e sancionar severamente, nos termos da lei, os seus responsáveis.
Não é possível abrir a boca em geral a acusações de crime sem apresentar perante o País os responsáveis por esses actos. Consideramos irresponsável uma atitude de acusação não acompanhada de uma atitude de desmantelamento e de demonstração da realidade perante o País - com caras, nomes, e responsabilidades daqueles que levam a cabo esse trabalho.
Finalmente, tudo quanto fizermos no plano penal não chegará, como muitos outros senhores deputados já hoje aqui adiantaram, se não adoptarmos medidas eficazes no plano técnico de reordenamento florestal e no plano do apoio técnico, financeiro e organizativo àqueles que têm a floresta portuguesa nas mãos. Todos a temos nas mãos, em certo sentido, mas alguns têm especiais responsabilidades. Este aspecto tem sido acentuado aqui e creio ser indesligável da questão penal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É impossível pensar em punições graves para quem destrua os materiais de combate aos incêndios sem que pensemos também em que precisamos desse mesmo tipo de material. Neste plano, são absolutamente necessárias e indispensáveis, mais do que palavras caras, mais do que ameaças, mais do que avisos de carácter político e penal, medidas concretas, medidas financeiras, acções determinadas com calendários fixados, verbas desbloqueadas e uma dinâmica de combate técnico e político às causas reais dos fogos que atormentam o País.
É pensando neste conjunto que o Grupo Parlamentar do PCP aprovou hoje esta lei, da qual esperamos um contributo positivo para debelar este mal que todos condenamos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos de Vasconcelos.

O Sr. José Carlos de Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD votou favoravelmente a lei agora aprovada e quero destacar que, em nossa opinião, ela representa uma substancial melhoria em relação à proposta de lei inicialmente apresentada, designadamente nos seguintes aspectos: a proposta de lei apresentava alguns agravamentos de pena absolutamente inadmissíveis, em especial o que previa uma pena de dez a vinte anos para aqueles que danificassem material destinado a combater os incêndios, o que, além do mais, contrariava todo o equilíbrio e estrutura do nosso Código Penal.
O diploma agora aprovado agrava substancialmente como a nosso ver se impunha - as penas aplicadas àqueles que dolosa ou negligentemente provocam incêndios, mas fá-lo com outro equilíbrio e, sendo este um segundo aspecto, agravando especialmente as penas dos que se apelidavam de «autores morais», isto é, daqueles que são ainda mais responsáveis do que as mãos que põem o fogo e que são os cérebros com interesses de qualquer ordem designadamente económica, provocando criminosamente esse flagelo que, como ainda agora se verificou, atinge mesmo a forma de assassínio.
O diploma agora aprovado é pois um avanço que nos apraz registar. A Assembleia aprovou-o em tempo que nos parece útil e com a celeridade possível. O PRD defendeu na Comissão que, como se impunha, ela concluísse celeremente os seus trabalhos - como o fez - e aproveitamos para salientar que nos parece inadmissível que o Sr. Primeiro-Ministro, embora não imputando expressamente culpas a esta Assembleia, de forma indirecta, o tenha parecido querer fazer, numa atitude que tem de merecer a nossa reprovação.

Aplausos do PRD e de alguns deputados do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira Mesquita.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A lei sobre agravamento de sanções penais e transformação de contravenções puníveis com multa em contra-ordenações com consequentes coimas, aumentadas nos respectivos montantes, agora aprovada por esta Assembleia, representa um importante passo no sentido da potenciação do carácter preventivo a dissuasor relativamente a todos aqueles que com motivações criminosas se preparassem para atingir, através do incêndio, bens de valor incalculável, podendo até de tais actos resultar, como frequentemente tem acontecido nos último anos, a perda de vidas humanas.
Não se pense, porém, que o diploma ora aprovado não contém medidas punitivas significativas, embora o agravamento não tenha ido tão longe quanto desejávamos, visto entendermos que as penas constantes da proposta de lei do Governo seriam as mais harmonizadas, designadamente com o sentir enraizado do povo sofredor do flagelo dos incêndios e com o direito europeu nesta matéria.
Mostrou-se, no entanto, razoável e conveniente ter de admitir o relativo abaixamento das penas e das coimas propostas em virtude de considerações de ordem técnica e prática que, respectivamente, têm a ver com a dosimetria das penas do actual Código Penal e com o poder-dever de quem julga, que não deverá sentir-se inibido, à partida, pelo exagero, peso das penas que, nomeadamente, poderá impelir para absolvições ou suspensões de penas, com grave prejuízo do sentido pedagógico e persuasivo do que deverão ser as condutas correctas que se desejam e se têm como normais na sociedade portuguesa e que a lei procura tutelar.

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A patologia criminosa, já suficientemente diagnosticada na nossa sociedade, apesar das razões atrás aduzidas, sempre nos levariam a estabelecer agravamentos superiores aos da presente lei. No entanto, a força dos consensos em matéria de Direito Penal não deixariam de nos obrigar, dentro de limites aceitáveis - como foi o caso - a conceder a vantagem ao máximo divisor comum.
Como diz o velho ditado, «depois de casa roubada, trancas à porta», e daí o ter-se notado um certo nervosismo de consciência menos tranquila para vir agora apressar, através da aprovação global final verificada há pouco, um diploma entrado nesta Assembleia há cerca de três meses, votado na generalidade há mais de um mês e trabalhado em comissão especializada com o maior empenhamento e sentido de urgência pelo Grupo Parlamentar do PSD.
A todos nós deve responsabilizar a adopção das medidas adequadas para que casos como o de Águeda não se repitam, sendo por isso motivo de congratulação a medida legislativa agora aprovada pela Assembleia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Andrade Pereira.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Acaba de ser aprovado, em votação final global, o diploma que agrava as sanções penais aplicáveis aos incendiários.
O CDS votou a favor e congratula-se com a circunstância de tal diploma ter sido aprovado por unanimidade. É que, não sendo um instrumento decisivo, é seguramente um instrumento importante na luta contra os incêndios dolosamente causados no nosso país.
Aliás, temos uma razão particular para nos congratular após esta votação final global: é que, com o texto final, após um cuidado trabalho levado a cabo pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, viemos a reconhecer quão pertinentes tinham sido as considerações que tínhamos produzido no debate na generalidade.
Na realidade, quanto ao quadro penal, tínhamos dito que considerávamos que era importante que ele fosse profundamente agravado, ainda que prejudicando a coerência do edifício penal português, porque se impunha um tratamento-choque para estes casos. Apesar de tudo, pensámos que talvez conviesse não ir além do dobro dos limites actualmente fixados no Código Penal e isso veio afinal a registar-se.
Chamámos também a atenção para o problema da autoria moral do crime e ele veio a ser contemplado no texto final agora aprovado.
Chamámos ainda a atenção para o problema dos inimputáveis porque, preocupados com a experiência dos tribunais, não queríamos que ficasse sem cobertura jurídica o problema do piromaníaco que, uma vez julgado, mas posto em liberdade exactamente por ser inimputável, pode ir, a seguir, pegar novo incêndio, tendo ficado consagrada uma disposição que justamente contempla essas situações.
Em suma, cremos que se fez um bom trabalho e, apesar de tudo, com bastante celeridade, dado o processo normal de funcionamento desta Câmara.
Queremos terminar esta curta declaração com um voto mais: o de que a intenção do legislador, ao aprovar estas medidas, seja plenamente atingida, isto é, que o número e o dramatismo dos incêndios em Portugal venham a decrescer.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminadas as declarações de voto respeitantes à proposta de lei n.º 18/IV, deveríamos reiniciar o debate do projecto de lei n.º 194/IV, do CDS, sobre o estatuto social dos bombeiros. No entanto, é interpretação da Mesa que terá havido um acordo entre os grupos parlamentares no sentido de a sessão terminar às 19 horas. Nesse caso, ficam registadas todas as inscrições para intervenções, que serão produzidas oportunamente. A próxima sessão terá lugar na quinta-feira, dia 19, pelas 10 horas, terá período de antes da ordem do dia e do período da ordem do dia constará a continuação da discussão do projecto de lei n.º 194/IV e a discussão dos projectos de lei n.º 87/IV, do PCP, sobre direito da réplica política, e n.º 20/IV, do CDS, sobre cheque de ensino.
Srs. Deputados, creio que por hoje é tudo.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 5 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio dos Santos.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando Barata Rocha.
Fernando José Próspero Luís.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
João Luís Malato Correia.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Mendes Melo Alves.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.

Partido Socialista (PS):

Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
António Carlos Ribeiro Campos.

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3056 I SÉRIE - NÚMERO 80

António Magalhães Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Carlos Alberto Raposo Santana Mata.
Helena Torres Marques.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Rosado Correia.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Manuel Torres Couto.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Victor Manuel Ávila da Silva.

Partido Comunista Português (PCP):

João António Gonçalves do Amaral.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
António Vasco Mello César Menezes.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
João Gomes de Abreu de Lima.
José Luis Nogueira de Brito.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

José Manuel do Carmo Tengarrinha.

Deputado Independente:

Gonçalo Pereira Ribeiro Telles.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Fernando Monteiro do Amaral.
José Francisco Amaral.
Manuel da Costa Andrade.
Mário Júlio Montalvão Machado.

Partido Socialista (PS):

António de Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Gonçalves Janeiro.
António Miguel Morais Barreto.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Roberto de Sousa Rocha Amaral.

Partido Comunista Português (PCP):

António da Silva Mota.

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Domingos Abrantes Ferreira.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa
Joaquim Gomes dos Santos.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Margarida Tengarrinha.

Centro Democrático Social (CDS):

João da Silva Mendes Morgado.
José Augusto Gama.

Deputados Independentes:

Augusto Martins Ferreira do Amaral.
Maria Amélia Mota Santos.

Rectificações

- 1 -:Ao n.º 67, de 10 de Maio de 1986 - Intervenção do deputado do CDS Neiva Correia:

Na p. 2489, col. 1, 1. 18 a 20; onde se lê «isso não nos pode deixar de sentir que tem de haver consequências neste ponto. E não poderemos deixar de alinhar [...]» deve ler-se «isso não pode deixar de ter consequências neste ponto. E não poderemos, assim, deixar de alinhar [...]».

Na mesma pagina e coluna, 1. 40 e 41, onde se lê «frequência dos seis?» deve ler-se «frequência dos seis».

Na mesma página e coluna, 1. 44 e 45, onde se lê «frequência da instrução primária que, nesse tempo, não existia» deve ler-se «frequência da instrução primária»;

Na mesma página, col. 2, 1. 31 e 32, onde se lê «com a frustação causada nos alunos e nas famílias, pelas consequências [-... ]» deve ler-se «com a frustração causada nos alunos e nas famílias pelas consequências [...]».

Na p. 2490, col. 1, 1. 31, onde se lê «192 escolas primarias» deve ler-se «192 escolas primárias, ou seja, 19 escolas primárias para uma escola preparatória».

Na mesma página e coluna, 1. 60 a 62, onde se lê «Em resumo: não há quaisquer condições para nesta rede de escolas primárias se ensinar mais do que a instrução primária [...]» deve ler-se «Em resumo: na nossa rede de escolas primárias não há quaisquer condições para se ensinar mais do que a instrução primária [...]».

Na mesma página e coluna, 1. 65 e 66, onde se lê «Por outro lado, e pelo contrário, com mais algumas escolas do tipo semelhante às do preparatório» deve ler-se «Pelo contrário, na segunda opção, isto é, ligando o preparatório ao ciclo geral do secundário, com mais algumas escolas do tipo semelhante às do preparatório».

2 - Ao n.º 70, de 17 de Maio de 1986: Na p. 2650, col. 2, na lista dos deputados que faltaram à sessão, deve eliminar-se o nome do deputado do CDS Joaquim Rocha dos Santos, que na data da reunião plenária, 16 de Maio, já não se encontrava em funções.

3 - Ao n.º 74, de 28 de Maio de 1986 - Intervenções do deputado do PRD Alexandre Manuel:

Na p. 2794, col. 2, 1. 49 e 50, onde se lê «Uma intervenção muito breve para uma situação curiosa» deve ler-se «Uma intervenção muito breve para comentar uma situação curiosa».

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18 DE JUNHO DE 1986 3057

Na mesma página e coluna, 1. 52, onde se lê «em forma de publicidade» deve ler-se «sob a forma de publicidade».

Na mesma página e coluna, 1. 57, onde se lê «- como já foi aqui afirmado por mais de uma vez -» deve ler-se «- como já aqui foi afirmado, por mais de uma vez, pelo meu partido -».

Na p. 2795, col. 1, 1. 1 a 3, onde se lê «A questão que agora queremos levantar é meramente técnica e, mais do que isso, é o símbolo de como esta questão das empresas públicas é geralmente tratada» deve ler-se «A questão que agora queremos levantar, mais que técnica, constitui bem o símbolo de como a questão das empresas públicas é geralmente tratada».

Na mesma página e coluna, l. 7, onde se lê «Vejamos rapidamente» deve ler-se «Vejamos a questão».

Na mesma página e coluna, 1. 12, onde se lê «2,6% a 7% do capital» deve ler-se «2,67% do capital».

Na mesma página e coluna, 1. 15, onde se lê «eventual compra destes 52,9%» deve ler-se «eventual compra dos 52,9% agora postos à venda».

Na mesma página, col. 2, 1. 29 e 30, onde se lê «Tenho realmente pouco tempo para responder» deve ler-se «Disponho de pouco tempo para responder».

Na mesma página e coluna, 1. 31 a 33, onde se lê «Queria só recordar, relativamente à questão do Sr. Deputado Jorge Lacão, que afirmei na parte inicial que estivemos perante uma atitude pouco curial» deve ler-se «Apesar de tudo, direi ao Sr. Deputado Jorge Lacão que, como afirmei na parte inicial da minha intervenção, estamos, de facto, perante uma atitude pouco curial».

Na mesma página e coluna, 1. 34 a 38, onde se lê «É efectivamente isso que eu tenho para dizer, foi uma atitude que eu - delicadamente - chamei de pouco curial da parte do Governo. Ë evidente que não estamos minimamente de acordo, e fi-lo para denunciar essa situação que não me pareceu correcta» deve ler-se «É efectivamente isso que eu tenho para dizer neste momento: foi uma atitude que -delicadamente - classifiquei de pouco curial por parte do Governo. E, porque não estamos de acordo com ela, denunciei a situação».

Na mesma página e coluna, l. 39 a 44, onde se lê «Em relação ao Sr. Deputado Vieira Mesquita, quero dizer simplesmente que a questão é mais do que uma questão legal e eu fui mais longe na minha intervenção: falei na desvalorização das acções - e aqui é que foi o ponto principal da minha intervenção -, acções essas que [...]» deve ler-se «Em relação ao Sr. Deputado Vieira Mesquita, quero dizer que a questão, mais do que legal, tem a ver -e esse foi o ponto principal da minha intervenção- com a desvalorização de acções que [...]».

Na mesma página e coluna, l. 46 a 51, onde se lê «para além dessa falta de curialidade por parte do Governo, que eu continuo a considerar que existe - e não estou a pôr em causa nenhuma atitude legislativa, ou seja, a legalidade ou não da questão -, quis apenas acentuar uma questão que me parece pouco clara» deve ler-se «para além da ausência de curialidade por parte do Governo, que eu continuo a considerar que existiu, não pus em causa a atitude legislativa, mas a delapidação do sector público».

AS REDACTORAS: Cacilda Nordeste - Maria Amélia Martins.

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PREÇO DESTE NÚMERO 126$00

Depósito legal n. º8818/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

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