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Série - Número 7

Segunda-feira, 3 de Novembro de 1986

PORTE PAGO

DIÁRIO da Assembleia da República

IV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1986-1987)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 31 DE OUTUBRO DE 1986

Presidente: Exmo. Sr. António Joaquim Bastos Marques Mendes

Secretários: Exmos. Srs.

Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto Basto da Mota Torres
Rui de Sá e Cunha
José Manuel Maia Nunes de Almeida

SUMÁRI0. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 40 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos e da entrada de diversos diplomas.
O Sr. Deputado Malato Correia (PSD), a propósito do Ano Europeu de Segurança Rodoviária que se comemora, falou da necessidade de adopção de medidas que diminuam o elevado número de acidentes de viação e, no fim, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Horácio Marçal (CDS).
O Sr. Deputado Agostinho Domingues (PS) teceu considerações sobre a defesa da língua portuguesa.
O Sr. Deputado José Manuel Mendes (PCP) evocou o poeta Cesário Verde.

O Sr Deputado Vasco Marques (PRD) referiu-se ao reconhecimento internacional que é feito ao trabalho realizado pela TAP-Air Portugal.
O Sr. Deputado António Mota (PCP) chamou a atenção da Câmara para o ocorrido em Fortunho (Vila Real), em resultado da intenção do Governo de encerrar as linhas férreas transmontanas, e para a situação em que se encontram os trabalhadores da Mina da Borralha.
O Sr. Deputado Armando Fernandes (PRD), congratulando-se com o trabalho realizado pela comissão instaladora do Hospital Distrital de Santarém, apelou ao Governo para que aumente as verbas inscritas no PIDDAC para o ano de 1987 a ele destinadas.
O Sr. Deputado António Osório (PCP), relatando a forma como decorreu no Porto a «Marcha da Paz», criticou a RTP por não ter feito a cobertura do acontecimento.
Sr. Deputado António João de Brito (PRD), no seguimento de uma intervenção feita em sessão anterior pelo Sr. Deputado Malato Correia (PSD), criticou o protocolo assinado entre a Ministra da Saúde e a Santa Casa da Misericórdia de Évora para alienação a esta instituição do Hospital do Patrocínio. Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado já referido e do Sr. Deputado Vidigal Amaro (PCP).
O Sr. Deputado Alberto Araújo (PSD), a propósito da recente visita efectuada por membros do Governo, autarcas, governadores civis e outros responsáveis ao vale do Douro, chamou a atenção para vários problemas daquela região.
O Sr. Deputado João Teixeira (PSD) teceu considerações sobre o conflito que opõe taxistas portugueses e espanhóis.

Ordem do dia. - Foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos não autorizando a suspensão do mandato da Sr. º Deputada Margarida Borges de Carvalho (PSD) a fim de ser julgada no 4.º Juízo Correccional de Lisboa, bem como sejam ouvidos, como declarante e assistente, o Sr. Deputado Almeida Santos (PS) e, como testemunha de acusação, o Sr. Deputado Rosado Correia (PS).
Iniciou-se a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 140/IV (PSD) - Obrigatoriedade do parecer prévio vinculativo das câmaras municipais para o licenciamento de jogos e diversões públicas. Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Silva Marques (PSD), Magalhães Mota (PRD), João Amaral (PCP), Silva Martins (PSD) e Agostinho de Sousa (PRD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e IO minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Monteiro Araújo.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio Anes de Azevedo.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.

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150 I SERIE - NUMERO 7

Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Cecília Pita Catarino.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Próspero Luís.
Francisco Mendes Costa.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
Henrique Rodrigues Mata.
João Domingos Abreu Salgado.
João Luís Malato Correia.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim da Silva Martins.
José Assunção Marques.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Filipe de Atayde Carvalhosa.
José Francisco Amaral.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Bota.
José Mendes Melo Alves.
José Olavo Rodrigues da Silva.
José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Licinio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares Lima.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Ferreira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
Américo Albino Silva Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Frederico Vieira de Moura.
António Miguel Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Helena Torres Marques.
Hermínio Palma Inácio.
Jaime José Matos da Gama.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raúl da Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Agostinho Correia de Sousa.
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo de Sousa Pereira.
António João Percheiro dos Santos.
António Lopes Marques.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo de Paiva Campos.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
João Barros Madeira.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Torres Matos de Vasconcelos.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Luís Correia de Azevedo.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo da Costa Carvalho.
Maria Cristina Albuquerque.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.
Victor Manuel Lopes Vieira.

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Partido Comunista Português (PCP):

António Anselmo Aníbal.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Bento Aniceto Calado.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel dos Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
António Vasco Mello César Menezes.
Eugénio Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Francisco Manuel Menezes Falcão.
Henrique José Pereira de Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João Gomes de Abreu Lima.
João da Silva Mendes Morgado.
José Augusto Gama.
José Maria Andrade Pereira.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Manuel do Carmo Tengarrinha.

Deputados independentes:

Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Maria Amélia Mota Santos.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte

Expediente Petição

N.º 100/IV, da iniciativa do cidadão Luís Guilherme Branco, residente na Póvoa de Santa Iria, que expõe a sua situação de antigo funcionário dos Serviços de Saúde de Moçambique e pede o seu reingresso na função pública.

Foi distribuído à 10.º

Interna e Poder Local.

Comissão - Administração

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Na última sessão foram apresentados os seguintes requerimentos: ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado João Teixeira e outros; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Raul Junqueiro, António Esteves, Aloísio da Fonseca e Roleira Marinho, respectivamente; ao Ministério das Finanças (4), formulados pelo Sr. Deputado Gomes de Pinho; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Vidigal Amaro; aos Ministérios do Trabalho e Segurança Social e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (2), formulados pelos Srs. Deputados Luís Roque e Jerónimo de Sousa; a diversos ministérios (3), formulados pela Sr.ª Deputada Maria Santos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai enunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: o inquérito parlamentar n.º 4/IV, apresentado pelo PCP - refere-se ao polémico processo de aquisição de centrais digitais -, tendo sido admitido e baixado à 9.ª Comissão; a ratificação n.º 111/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Jorge Lemos e outros do PCP, referente ao Decreto-Lei n.º 358/86, de 27 de Outubro - Estabelece o regime disciplinador da alienação de participações ou bens e instalações detidos pelo Estado em empresas de comunicação social -, tendo sido igualmente admitida; o projecto de lei n.º 284/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Armando Vara, do PS - propõe a criação da Região Demarcada dos Vinhos Ribadouro -, tendo sido admitido e baixado à 6.ª Comissão; o projecto de lei n.º 285/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Armando Vara, do PS - propõe a elevação da povoação de Sendim à categoria de vila -, tendo sido admitido e baixado à 10.ª Comissão, e o projecto de lei n.º 286/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Raul Junqueiro e outros do PS, referente à instalação de antenas - foi admitido, baixando à 1.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser aberta a uma, a qual se manterá aberta até às 11 horas e 45 minutos, a fim de se proceder à votação, por escrutínio secreto, do parecer da Comissão de Regimento e Mandatos acerca do pedido de suspensão do mandato da Sr.ª Deputada Margarida Borges de Carvalho, para ser julgada no 4.º Juízo Correccional de Lisboa.
O parecer da Comissão vai no sentido de não autorizar o julgamento da Sr.ª Deputada, e, portanto, quem estiver de acordo com o parecer votará «sim», quem entender que a Sr.ª Deputada deve ser autorizada a responder em juízo votará «não»; haverá também a hipótese da abstenção.
Assim sendo, convido para escrutinadores os Srs. Deputados Daniel Bastos, Américo Salteiro e Jorge Patrício.

Pausa.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Malato Correia.

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O Sr. Malato Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 1986 - Ano Europeu da Segurança Rodoviária. Esta pequena frase que, repetidamente, aparece nos écrans da televisão, reflecte, por si só, uma preocupante realidade: a ausência de segurança rodoviária, que, de uma maneira geral, atinge as estradas da Europa. Mas se este problema merece a maior atenção nos restantes países, em Portugal é da maior acuidade, já que temos hoje um dos maiores índices de sinistralidade, com uma elevadíssima taxa de mortalidade e morbilidade. Em 1983, o número de acidentes de viação foi de 55 535, com 2368 mortos e 41 561 feridos; em 1984, 55 449 acidentes, com 2027 mortos e 43 264 feridos; em 1985, 58 162 acidentes, com 2046 mortos e 41 127 feridos - a crueza dos números fala por si.
Os acidentes constituem a terceira causa de mortalidade em Portugal e na Europa, imediatamente depois dos acidentes cardiovasculares e das neoplasias, constituindo a primeira causa de morte da zona etária que corresponde à idade produtiva da vida, entre os 18 e os 60 anos, com predomínio dos grupos mais jovens, geralmente com família a seu cargo. Está definido que, por cada morte por acidente rodoviário, há 15 vítimas com lesões graves e 30 com lesões ligeiras.
Dos três vectores que interferem no acidente - rede viária, veículo e homem -, é sobre este que centro as atenções, já que, em última análise, é sempre ele - o agente do acidente; é sempre ele, a sua família, a sociedade e o País que sofrem as consequências, que vão da morte e invalidez às repercussões psicológicas, económicas e sociais.
A constatação do que foi afirmado conduz, obrigatoriamente, à tomada de medidas urgentes e, sobretudo, eficazes para obter a redução do número de acidentes e das suas consequências. O problema é vasto e complexo, requerendo acções pluridisciplinares para a sua solução.
As causas do acidente, por ordem decrescente, são: manobras perigosas, distracções, desobediência à sinalização, álcool, excesso de velocidade, de onde pode inferir-se que o baixo nível de educação, em geral, e de civismo, em particular, está na génese da maioria dos acidentes.
Mas se a sua prevenção começa com a educação dos jovens para uma adequada inserção na sociedade logo nos primeiros anos de vida, não é menos verdade que esta educação/formação deve manter-se ao longo do desenvolvimento e ser cada vez mais exigente, passando por critérios rigorosos para a obtenção da carta de condução e fiscalização do cumprimento das regras estabelecidas, quer para os condutores, quer para os peões, que, pelo motivo de andarem a pé, não deixam de ter direitos, mas também deveres.
Seria injusto não reconhecer as acções desenvolvidas pelas várias entidades, nomeadamente pelo Ministério da Educação, Prevenção Rodoviária Portuguesa e entidades fiscalizadoras de trânsito, mas não será exagero pedir uma maior disponibilidade de meios para que essas e outras entidades intensifiquem as acções e, como atrás referi, elas se tornem mesmo eficazes. Porém, com todo o realismo, deve ter-se a consciência de que, mesmo dispondo dos meios mais aperfeiçoados e que pluridisciplinarmente actuam no sentido de reduzir o número de acidentes, eles inevitavelmente continuarão a suceder-se. Por isso será obrigatório considerar fundamentais as vertentes curativa e de reabilitação, para conseguir a diminuição da mortalidade e morbilidade e melhoria do coeficiente acidente/invalidez. É aqui que os serviços de saúde desempenham um papel de fundamental importância, pois um sistema integrado de emergência médica reduz, segundo a Organização Mundial de Saúde, em 20% a mortalidade e morbilidade por acidente.
Em 1965 lançou-se, em Portugal, o embrião do que é hoje o Instituto Nacional de Emergência Médica, dependente do Ministério da Saúde, e que, com as suas funções técnico-normativas, tem desempenhado um papel importante na coordenação da actividade pluridisciplinar própria de um sistema integrado de emergência médica. A acção fundamental que tem desempenhado tornar-se-á ainda mais marcada quando se implementar a regionalização dos seus serviços, o que facilitará a formação dos técnicos intervenientes no sistema e permitirá um melhor entrosamento entre as várias componentes e os serviços hospitalares.
Porém, se o espaço entre o acidente e o hospital começa a estar preenchido, embora susceptível de um aperfeiçoamento que se deseja contínuo e permanente, cumpre ultimar e publicar a carta hospitalar. Para além da categorização dos hospitais, absolutamente necessária, o País não pode manter, de uma forma inconsciente e irresponsável, serviços ditos de urgência em tudo quanto é sítio. É o desperdício fabuloso dos dinheiros públicos, é uma frustração para os técnicos que aí trabalham sem condições e uma burla para os doentes que, vítimas de acidentes ou doença súbita, são transportados para serviços que não dispõem, na maioria das vezes, de meios técnicos e ou humanos de que necessitam.
Uma placa que anuncia um serviço de urgência hospitalar implica uma enorme responsabilidade, porque pressupõe a existência de meios necessários para que, nas valências previamente determinadas e anunciadas, exista capacidade real para tratar os doentes. Ora, mesmo que as medidas sejam impopulares, há que ter a coragem de definir, de um modo claro e tecnicamente correcto, os hospitais em que os verdadeiros serviços de urgência se justifiquem. Repito, é urgente que, com economia de meios, se prestem melhores serviços às populações, mesmo àquelas que eventualmente protestem.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, um acidentado, quando sobrevive, na grande maioria dos casos não acaba a sua via sacra à saída dos serviços de urgência. Os acidentes de viação ocasionam quase sempre fracturas e traumatismos que requerem uma recuperação atempada e correcta. De nada vale uma assistência de recuperação atempada se não for correctamente instituída, como de nada valerá uma recuperação correcta se não for conseguida em tempo útil.
Reconhecendo, pois, que de uma recuperação dependerá uma mais rápida reinserção do acidentado na sua vida habitual, com todas as consequências positivas que daí advêm, necessário se torna que as estruturas de saúde disponham de serviços de fisiatria capazes de dar resposta às necessidades crescentes do sector, sob pena de a sociedade ter de suportar, definitivamente, diminuídos físicos, que o não seriam em qualquer outro país civilizado e evoluído.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com a esperança de que possa reduzir-se o número de acidentes nas nossas estradas e que possam atenuar-se as consequências dos acidentes inevitáveis que hoje aqui fiz esta breve intervenção.

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Se todos quantos interferem na circulação rodoviária meditarem nas causas e consequências dos acidentes e na responsabilidade que lhes cabe, talvez se consiga o que tanto se deseja: um futuro com segurança rodoviária.

Aplausos do PSD.

O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Peço a palavra para um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Horácio Marçal! (CDS): - Sr. Deputado Malato Correia, ouvi com bastante atenção a sua intervenção sobre o problema da segurança rodoviária e concordo com muito do que foi dito pelo Sr. Deputado sobre a necessidade de uma maior disponibilidade de meios, que devem ser implementados pelos Ministérios da Saúde e da Educação, para que haja uma emergência médica eficaz no tratamento dos sinistrados, que, infelizmente, vão aparecendo nas estradas portuguesas. Com efeito, preocupa o meu grupo parlamentar, e creio que todos os portugueses, aquilo que se vai passando, no dia a dia, nas estradas portuguesas. Creio que devem, realmente, ser criadas medidas eficazes, para que, em primeiro lugar, se previna o acidente.
Na verdade, V. Ex.ª focou o grande grau de sinistralidade das nossas estradas, mas creio que nem sempre se tem tido cautela quando se fazem os seus traçados - constatamos o que se verifica na estrada nacional n.º 1, na zona do meu distrito, na qual os acidentes são constantes, diários, pouco se tendo feito para evitar tal situação. Todos nós temos conhecimento de que muitas dessas estradas foram feitas para um trânsito realmente intenso, sem se ter tido a preocupação de fazer passagens aéreas para peões e que as crianças das escolas - muitas estradas situam-se perto de escolas - se vêm obrigadas a atravessar as estradas sem qualquer protecção - chamo a atenção do Governo para esse facto.
A pergunta que queria fazer ao Sr. Deputado visa o problema que focou da carta hospitalar e da carta sanitária. Esse problema foi levantado aqui por mim há já quase um ano, no sentido de que antes de se tomarem medidas eficazes no aspecto da saúde se devia fazer um levantamento das cartas sanitária e hospitalar. Não temos, na verdade, qualquer conhecimento do que se passa relativamente a essa questão, embora nos conste, através da comunicação social, que se está a proceder a esse levantamento.
Assim, gostaríamos de saber o que é que se passa quanto à carta hospitalar, porque soam determinadas vozes dizendo que há hospitais que vão regredir - é o que se passa, por exemplo, em relação ao Hospital de Aveiro -, mas não se sabe quais os que vão regredir e quais os que vão ser promovidos.
Portanto, Sr. Deputado, seria bom que o Governo nos elucidasse quanto ao problema da carta hospitalar, a fim de que soubéssemos onde conduzir os sinistrados quando sucederem esses acidentes, quais são os hospitais mais apetrechados e quais as valências que têm para poderem tratar os sinistrados que, infelizmente, vão surgindo nas estradas portuguesas.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Malato Correia.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Sr. Deputado Horácio Marçal, obviamente que as preocupações que referiu são aquelas que estão transcritas na minha intervenção.
Referi, exactamente, que, das três vertentes - rede viária, veículo e homem -, me tinha debruçado mais sobre o homem, porque, fundamentalmente, é ele o agente da causa do acidente e - o que preocupa mais - é ele quem sofre as consequências desse acidente.
Sobre a rede viária estou de acordo consigo, mas julgo que neste momento está a desenvolver-se um esforço muito grande no sentido de recuperar a rede viária e de a melhorar substancialmente, o que é um factor positivo e que merece louvores da parte de todos.
Quanto às cartas hospitalares, como V. Ex.ª sabe, no Governo anterior houve um primeiro projecto de definição de carta hospitalar, esteve em discussão e, com certeza, levantou óbices - o País vive apaixonadamente tudo quanto se refere a regionalização e ao retirar de categorias aos hospitais ou a outra instituição qualquer, pois as populações sentem-se muito afectadas.
No entanto, referi também na minha intervenção que era urgente a definição da carta hospitalar e dos hospitais que deveriam possuir um verdadeiro serviço de urgência. Isto porque mesmo que as medidas fossem impopulares, tal vinha beneficiar mesmo as populações que eventualmente protestassem.
Sr. Deputado, neste momento julgo que o Ministério está a desenvolver esforços no sentido de publicar essa carta hospitalar e julgo que já foram definidos hospitais de grau 1. Foram, de facto, retiradas algumas regalias a alguns hospitais, com o que concordo perfeitamente na maioria dos casos.
Obviamente que o País, em termos globais, é de tal maneira assimétrico no seu desenvolvimento que penso não dever ser considerada apenas uma «lei A», ou uma lei única para todo o País. De facto, tem de se atender às assimetrias, à certificação de certos distritos, etc., até para implementar serviços de saúde com aproveitamento de recursos, mas que sejam, ao mesmo tempo, polarizadores da fixação das populações em determinadas zonas.
Agora, com o que estou inteiramente de acordo é que seja reduzido fortemente o número do que hoje se consideram serviços de urgência - é preferível uma rede viária capaz e uma rede hospitalar definida em termos de distâncias, em termos de densidade populacional, considerando as assimetrais que já referi.
Portanto, quando esses hospitais dispuserem efectivamente de serviços de urgência a sério, com capacidade de resposta em relação aos acidentes e às doenças súbitas que aparecem, sou de opinião, Sr. Deputado, que, em menor número, devem existir esses serviços de urgência - menos serviços de urgência, mas de melhor qualidade. Daí beneficiarão os técnicos, o País, com a economia de meios, e os doentes, que não serão «bolas de ping-pong», a ser transportados de uns serviços para os outros, porque, afinal de contas, nenhum deles tem capacidade para resolver os problemas.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Domingues.

O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A consciência da importância da língua portuguesa vai felizmente aumentando. A defesa do português deixou de estar confiada apenas aos filólogos e aos humanistas. Hoje o mundo da economia sabe bem o alcance do domínio da língua materna.

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154 I SÉRIE - NÚMERO 7

Nunca será demais recordar que o facto de o português ser língua oficial de diversos Estados lhe confere um lugar destacado na Comunidade das Nações. Prevê--se mesmo que o português, nas primeiras décadas do século XXI, estará entre as primeiras línguas do mundo, não só pelo número de locutores como pela importância geoestratégica e económica dos Estados lusófonos.
Língua de Portugal e, simultaneamente, do Brasil, de Angola, de Moçambique, etc., como ainda uma das línguas oficiais de várias comunidades internacionais, o português tem de ser objecto de redobrada atenção como produto para consumo interno e para exportação, se é permitido usar uma linguagem comercial.
Foi recentemente publicada a Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovada em Julho por esta Assembleia. Aí se reconhece o papel da língua como valor nacional de primeira grandeza e se apontam princípios orientadores do seu ensino e da sua divulgação.
No artigo 22.º preconiza-se que a criação e manutenção de leitorados de português em universidades estrangeiras se faça «sob orientação de professores portugueses», na clara intenção de associar ao ensino da língua a estrangeiros a valorização da cultura nacional.
Aposta-se num forte estímulo à divulgação e estudo da língua e cultura portuguesas no estrangeiro, nomeadamente através da criação de cadeiras e de centros de estudos portugueses.
No artigo 47.º está consignado que o ensino da língua materna se fará em todas as disciplinas, sem prejuízo da especificidade da língua portuguesa.
O Ministro José Augusto Seabra determinou, por sua vez, no Despacho n.º 215/ME/84, algumas directrizes relativas ao ensino do Português. Transcrevo, pela sua importância, os n.ºs 1 e 4:

1 - Considerar as disciplinas de Português e de Literatura Portuguesa como disciplinas que merecem especial atenção e acompanhamento quanto a condições de recrutamento e de docência, quer no que se refere à prioridade a atribuir nessas áreas aos licenciados em estudos portugueses, no quadro das suas habilitações legais, quer em termos de inspecção pedagógica.
4 - Introduzir em todas as formas de avaliação de qualquer disciplina um coeficiente de valoração que tenha em conta a competência linguística demonstrada no uso do idioma.
Para além de ser uma reconhecida autoridade em matéria de língua e cultura portuguesas, Augusto Seabra era e é militante do PSD. Herdou o ministério de um ministro PSD e deixou-o a outro PSD. Desta vez é PSD toda a equipa, incluindo a Sr.ª Secretária de Estado do Ensino Básico e Secundário. Apesar disso, o Despacho n.º 215/ME/84 permanece letra morta. Já era de esperar a desatenção pela Lei de Bases do Sistema Educativo, que o Governo podia conhecer desde há meses, pelo menos através do Grupo Parlamentar do PSD. Mas o despacho do Ministro Seabra foi publicado em Janeiro de 1985! Não parecia dever ficar esquecido.
Conjugando o disposto no n.º 7 do artigo 47.º da Lei de Bases com o n.º 4 do Despacho n.º 215/ME/84, conclui-se imperativamente o seguinte:

1.º Os professores de Ciências da Natureza, de História, de Geografia, etc., assumirão a consciência de que, sendo a língua portuguesa o veículo dos conhecimentos e dos conteúdos específicos da ciência da sua especialidade, eles são também professores de língua portuguesa. Desde o léxico às estruturas sintácticas, passando pela ortofonia e ortografia, grande pode e deve ser o contributo das várias disciplinas escolares para o ensino-aprendizagem do Português.
2.º As capacidades de interpretação e de expressão em português constituirão o factor de avaliação em todas as disciplinas. Por exemplo, o professor de Filosofia, como qualquer outro, não poderá escusar-se a tomar em conta o nível da exposição das ideias, nomeadamente a estruturação do conjunto, a ligação das partes, a correcção morfo-sintáctica e ortográfica, a propriedade da linguagem, porque os conteúdos ministrados são inseparáveis da forma linguística adoptada.
Nada disto é sequer muito complicado ou inovador. É apenas uma pequena revolução no ensino do Português. Obriga todos os professores, sem diminuir as responsabilidades do professor de Português. Pelo contrário, cria a este outras obrigações. Ao professor de Português passa a exigir-se a prática efectiva da inter-disciplinaridade. Normas claras devem passar a regulamentar a ligação das aprendizagens de Português nas várias disciplinas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos se queixam de que o ensino do português não anda bem. Dentro e fora da escola é baixo o nível dos utentes da língua. Não são só os erros ortográficos e as infracções à morfo-sintaxe; é a incapacidade de interpretação de textos e de redacção das mensagens mais vulgares em situações concretas.
É urgente adoptar medidas de dignificação da língua portuguesa como um dos valores essenciais do património cultural nacional e como instrumento de comunicação de mais de 150 milhões de falantes dispersos pelo mundo.
É urgente defender o português da sua degradação acelerada. É urgente pôr à disposição da língua os meios necessários à sua actualização e adaptação às novas tecnologias, sem o que continuará todos os dias a ser ultrapassada pelas línguas mais influentes.
Há condições mínimas para travar um combate sério de valorização do português, a começar pelas nossas escolas. Ficaram acima explanados os pontos de vista contidos na Lei de Bases do Sistema Educativo e no despacho do ex-Ministro José Augusto Seabra. Terá este Governo capacidade e vontade política para as pôr em prática? Tudo leva a crer que não.
O governo do Prof. Cavaco Silva e, em perfeita consonância, a equipa do Ministério da Educação não se mostram interessados em resolver os problemas do País. Apontam falsas soluções na mira de dividendos eleitorais. O Sr. Ministro da Educação e a Sr.ª Secretária de Estado do Ensino Básico e Secundário conhecem as causas estruturais do baixo aproveitamento dos alunos em Português. Em vez de enfrentarem a situação com eficácia, provocam os encarregados de educação e os alunos com o Despacho n.º 32/EBS/86, já aqui analisado pela Sr." Deputada Maria da Glória Padrão. O Sr. Ministro e a Sr.ª Secretária de Estado estarão mesmo convencidos de que promovem a qualidade do ensino-aprendizagem do português impondo a reprovação num ano escolar a alunos que, embora tendo aproveitamento em todas as outras disciplinas, são deficientes em língua materna? Não é mais justo e mais económico assegurar um reforço lectivo a esses alunos sem perda de ano, como de resto está previsto no n.º 3 do esquecido Despacho n.º 215 do Ministro Seabra?

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Gostaria de poder encontrar na base do Despacho n. º 32/EBS/86 apenas falta de imaginação e desconhecimento da realidade escolar. Mas ele nasce de preconceitos de um nacionalismo estreito e ultrapassado.

Vozes do P§: - Muito bem!

O Orador: - Os espíritos conservadores têm da língua e da pátria concepções abstractas e imobilistas. Não foram esses quem deram «novos mundos ao mundo». À perspectiva nacionalista acanhada, os homens do progresso contrapõem a perspectiva universalista da língua como um organismo vivo em permanente transformação e como ponte para novas culturas e novos saberes.
Passemos, porém, à realidade escolar.
s crianças e os jovens dos meios familiares e sociais menos cultos possuem normalmente menor domínio da língua. É sabido que a competência linguística do falante depende essencialmente do ambiente cultural em que se insere. Acontece ainda que os saberes das crianças dos meios rurais e fabris não são suficientemente valorizados pela cultura padronizada que enforma o sistema escolar. Por outro lado, são quase nulos o acesso à leitura e a fruição da mesma nos meios familiares de baixa instrução. Isto não significa, como a realidade comprova, que esses alunos não tenham hipóteses de recuperação. Precisam é de mais tempo para aprenderem aquilo que os meninos privilegiados - os nossos filhos, Srs. Deputados! - receberam sem esforço desde o momento do nascimento. Em vez disso, este Governo decreta a grande solução: reprová-los o mais depressa possível!
Este despacho em nada contribui para melhorar o ensino do português. Além disso é socialmente injusto, por acentuar as desigualdades sociais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A Lei de Bases do Sistema Educativo, em obediência aos imperativos constitucionais, determina a obrigação de se criarem condições de igualdade no acesso à escola e no sucesso escolares. Este despacho, pelo contrário, abre caminho para um maior insucesso escolar, com a agravante de não produzir quaisquer efeitos positivos.
Não se pense, porém, que os filhos da classe média revelam grande aproveitamento em Português. As estatísticas mostram o contrário. Vai ser entre esses alunos que se revelarão as situações mais contrastantes de bom aproveitamento em outras disciplinas e deficiência em Português. Nesses casos, o acompanhamento do aluno, até durante as férias, em vez da perda de todo o ano escolar, parede ainda mais fácil.
Será que o Ministério não será capaz de reconhecer o erro crasso desta medida?
A revogação imediata do despacho tranquilizaria os encarregados de educação e os próprios professores de Português, que recusam transformar a língua portuguesa em agente punitivo. Não resisto a transcrever aqui uma passagem de um artigo de Odete Santos, investigadora em Teorias de Comunicação, publicado no semanário O Jornal, de 17 de Outubro próximo passado. Segundo a articulista, a medida anunciada, em vez de fazer do Português uma transdisciplina, na medida em que serve de suporte às outras aprendizagens, «seria obstáculo à recuperação da nossa escola
para o sucesso escolar que tarda em obter, factor de agudização de injustiças sociais, e [...] acusaria o total desprezo por princípios teóricos do domínio das ciências do Homem que enformam e sustentam modelos pedagógicos e comunicativos que urge fazer instaurar na escola de hoje».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não são causa menor do insucesso escolar dos alunos as graves lacunas e insuficiências de formação dos professores de Português. O Ministério sabe-o, mas faz de conta que não!...
Dada a limitação de tempo, enumero, telegraficamente apenas algumas das medidas mais urgentes que, em minha opinião, devem ser tomadas para defesa da língua portuguesa como património nacional e instrumento privilegiado da nossa comunicação dentro e fora do território pátrio:

1.º Atenção prioritária à formação de professores de Português.
2.º Publicação de um grande dicionário que inclua o léxico científico e técnico, de modo a corresponder às exigências das tecnologias de informação. Há alguns bons trabalhos parcelares. Impõe-se uma obra de conjunto, a cargo de equipa especializada, com dedicação exclusiva e permanente a essa ingente tarefa.
3.º Exigência de provas de português falado e escrito para os locutores da rádio e da televisão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - 4.º Extensão do Português a todos os alunos do 12.º ano, com programas cujos objectivos estejam centrados na boa compreensão e produção de enunciados orais e escritos.

5.º Exigência, dentro de alguns anos, de prova de português no acesso ao ensino superior para todos os candidatos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O português está na ordem do dia também por causa do acordo ortográfico. Por minha parte, já fiz nesta tribuna algumas reflexões sobre essa matéria. É uma questão em que não pode haver vencedores e vencidos, ou melhor, a língua portuguesa tem de ser o único vencedor. Isso implica um estudo profundo do problema em todas as suas componentes. Cada um dos 250 deputados deve formar uma opinião bem fundamentada de modo a emitir o voto que melhor defenda a língua portuguesa e os superiores interesses de Portugal.
Não me parece que seja matéria de consciência, mas de Ciência (com maiúscula) e de ciência política.
Talvez por isso, já se ouvem vozes em defesa da liberdade de voto sobre a ratificação do acordo ortográfico.
São questões da maior importância que merecem a atenção e a reflexão de todos os responsáveis. Há que procurar o diálogo e tentar consensos alargados. Os nossos antepassados, que nos legaram uma língua nobre, e as gerações vindouras, a quem cabe engrandecer o património recebido e enriquecê-lo com novos contributos, esperam de nós um esforço sério.
Saibamos corresponder.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados António Osório e Joaquim Domingues. Acontece, todavia, que o Sr. Deputado Agostinho Domingues já não dispõe de tempo para responder, pelo que pergunto aos dois Srs. Deputados que referi se mesmo assim desejam usar da palavra para pedir esclarecimentos.

O Sr. António Osório (PCP): - Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Joaquim Domingues (PSD): - Sr. Presidente, atendendo a que o Sr. Deputado Agostinho Domingues já não dispõe de tempo e também que não há possibilidade de cedência de tempo por parte do meu grupo parlamentar, prescindo do pedido de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cinco minutos, nesta Câmara política, para evocar um poeta. Cinco minutos apenas, tão ocupados ou alheados andamos que para mais não são as estrelas propícias. Que perdure, ainda assim, o sinal agora emitido.
Ele disse, o poeta: «Se eu não morresse, nunca! E eternamente buscasse e conseguisse a perfeição das cousas!»
Morto, em nós vive e por nossa voz incita à arquitectura do belo, do justo, do autêntico, essa impostergável porfia da nossa precariedade vingada. Vivo, porque assim o quiseram sucessivas gerações e assim o queremos, continua o seu percurso desafiador, insubmisso, transfigurativo.
Chamava-se Cesário, filho de José António e Maria da Piedade; pereceu, verde nos anos, grande e imperecível na obra, há um século, três meses e doze dias. Partilhou as fundas inquietações sociais e estéticas dos audazes do seu tempo, assumindo a ruptura com as retóricas do romantismo desviçado do último quartel de oitocentos, opondo-se à poética dessorante do sentimentalismo convencional. Povoou os seus versos de gente com vísceras, novos referentes, construções inusitadas. Fecundou de modernidade antimodística o ventre da literatura pátria. Trouxe à convivência de cada um os operários calceteiros e a engomadeira irmã de tantas tísicas definhando de solidão e abandono, os camponeses, os negociantes, os piqueniques de burguesas, os simples, olhados sem miserabilismo, nem o véu fácil da lágrima piedosa, os cenários múltiplos do quotidiano, os entes concretos e os fantasmas de entre sonho e pesadelo. E, numa emoção solidária mas desprovida dos excessos de representação formal, cantou--os assim:
Povo! No pano cru rasgado das camisas Uma bandeira penso que transluz! Com ela sofres, bebes, agonizas; Listrões de vinho lançam-lhe divisas, E os suspensórios traçam-lhe uma cruz!
E assim também:
Vazam-se os arsenais e as oficinas; Reluz, viscoso, o rio, apressam-se as obreiras; E num cardume negro, hercúleo, galhofeiras, Correndo com firmeza, assomam as varinas.
Ou ainda:
Em pé e perna, dando aos rins que a marcha agita,
Disseminadas, gritam as peixeiras;
Luzem, aquecem na manhã bonita,
Uns barracões de gente pobrezita
E uns quintalórios velhos, com parreiras.

Bom tempo. E os rapagões, morosos, duros, baços,
Cuja coluna nunca se endireita,
Partem penedos, voam-lhe estilhaços.
Pesam enormemente os grossos maços,
Com que outros batem a calçada feita.

Aedo dos impulsos fundamentais para a mudança e a inovação, menestrel da inconformação e do rigor, cantor inigualável de Lisboa, do quotidiano da urbe e dos seus contrastes, Cesário influenciou, determinantemente, os Pessoas e Gomes Ferreiras, das nossas cintilações duradoiras, os que, por diversas veredas e opções, sobretudo no quadro do realismo, fizeram e continuam fazendo os sobressaltos enriquecedores da arte que nos ajuda a gostar de viver.
De acções escassas e omissões significativas se têm matizado as comemorações em curso do centenário. É essa uma face simétrica da do descaso, do descuidar dos vivos agentes do amanhã das grandezas colectivas. Porque é duro o facto, e seguramente condenável, na circunstância se refere. Pugnaremos para alterar os traços da moldura cinzenta e melhor honrar o Autor, que nos é tão vizinho e fraterno, do nós e das cristalizações.
Cinco minutos, Sr. Presidente, Srs. Deputados. Decerto parcos para memorar um poeta. Um nome que mora entre os que, de modo inquestionável, profundo e metamorfoseador, dão luz hialina ao Portugal que somos. Oxalá bastantes, apesar de tudo, para gerar as necessárias repercussões dinamizadoras.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Marques.

O Sr. Vasco Marques (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta minha intervenção visa chamar a atenção desta Assembleia para um facto de grande prestígio para o nosso país: o reconhecimento do trabalho, altamente especializado em várias áreas, realizado pela nossa transportadora nacional a TAP-Air Portugal.
É habitual que referências a esta empresa pública nos órgãos de comunicação social se verifiquem aquando de conflitos laborais (inexistentes há muito tempo); por ocasião da substituição dos seus gestores (e já houve, desde 1974, mais de meia centena de ocupantes dos cargos adminstrativos); ou sempre que algum cidadão - o que acontece com alguma frequência - vem a público defender a sua reprivatização.
Num país como o nosso, por norma considerado como exportador de mão-de-obra não especializada, direi mesmo semelhante à que se encontra disponível no terceiro mundo, é de realçar o prestígio que tem sido granjeado pelos trabalhadores da TAP.
A título exemplificativo, e que constitui o cerne desta minha intervenção, quero realçar a grande capacidade demonstrada no âmbito da manutenção e engenharia da nossa transportadora aérea nacional, no respeitante a inspecções periódicas e também a grandes inspecções de aeronaves.

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Refira-se a propósito que a TAP termina, em Março do próximo ano, um contrato que firmou com a companhia americana Federal Express (FEC), para execução de 35 grandes inspecções, dirigidas fundamentalmente às estruturas de outros tantos Boeing 727-100;
Este contrato, assinado em Março de 1984, resultou de um concurso internacional alargado a cerca de 30 companhias, das quais foi seleccionado um grupo de onze finalistas distribuídas pela Europa, Ásia e Estados Unidos.
A capacidade técnica para a realização do trabalho, a reconhecida qualidade de execução, os preços apresentados e a capacidade para cumprimento dos prazos de entrega inicialmente previstos foram factores determinantes para a escolha da TAP.
Trata-se do maior desafio feito aos serviços técnicos de manutenção e engenharia da TAP e que obrigou à preparação, em curto espaço de tempo, de toda uma infra-estrutura pessoal e material necessária a um trabalho tão exigente como este.
Cada um dos aviões é sujeito a uma inspecção à estrutura metálica e aos «sistemas avião» do tipo de grande manutenção, cujo intervalo de inspecção se situa, nomeadamente, entre as 18 000 e as 20 000 horas de voo.
Simultaneamente, são aplicadas várias modificações em número de homens-horas (12 000 Hh) muito maior que a média da indústria requer para uma inspecção deste tipo.
Em resumo, a mão-de-obra utilizada tem sido da ordem dos 40 000 homens-horas por avião, despendida no período de imobilização previsto de 34 dias.
A execução deste contrato, a cumprir integralmente, tem sido, para a TAP-Air Portugal, excelentemente conseguida, quer nos aspectos de optimização dos recursos humanos disponíveis, quer no que se refere aos seus resultados económicos. Efectivamente, estão nele envolvidos 400 postos de trabalho, 110 dos quais foram subcontratados para atender à organização de trabalho requerida pelos prazos de entrega.
Este contrato, integrado num conjunto de actividades de venda de serviços a terceiros, permite rentabilizar, de uma forma harmoniosa, a capacidade de mão-de-obra disponível na manutenção e engenharia da transportadora aérea nacional.
Com efeito, neste período de três anos verificou-se a entrada ao serviço da TAP de doze novos aviões que, substituindo os mais antigos, resultaram numa diminuição, a médio prazo, de carga de trabalho atribuída ao nível da grande manutenção da empresa. Adicionalmente, esta actividade contribuiu para a ocupação dos postos de trabalho da mão-de-obra subcontratada, nos números já referidos.
Por outro lado, a facturação final aponta para uma receita de 6,5 milhões de contos, pagos em dólares, para o total dos 35 aviões, dos quais 4,5 milhões representam a contribuição da mão-de-obra com a correspondente entrada de divisas.
Em termos económicos, o contrato tem sido extremamente favorável, pois sem ter necessitado de qualquer investimento suplementar, a facturação global paga completamente os custos totais, saldando-se por uma confortável margem de lucro.
O sucesso deste contrato aumentou significativamente o prestígio internacional dos serviços técnicos de manutenção e engenharia da TAP, ao mesmo tempo que permite prever a consolidação deste tipo de actividade, dentro das disponibilidades que resultam do suporte à operação da própria empresa.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Peço aos Srs. Deputados que ainda não votaram o favor de o fazer.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Mota.

O Sr. António Mota (PCP): - Sr. Presidente, antes de mais, queria esclarecer que a intervenção que vou produzir devia ser feita pelo meu camarada Joaquim Gomes. Acontece, porém, que ele teve de ausentar-se, pelo que serei eu que a vou ler.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em visita de trabalho ao distrito de Vila Real, feita pelo meu grupo parlamentar, tivemos contacto com dois acontecimentos que não podemos deixar de trazer ao conhecimento desta Assembleia.
O primeiro destes acontecimentos diz respeito à agressão de que foi vítima a população de Fortunho, no passado dia 29 de Setembro. Neste dia, a população desta localidade, conhecendo as intenções do Governo e da administração da CP de encerrar as linhas férreas transmontanas de via reduzida, entre elas a linha do Corgo, estranharam que não tivesse aparecido, nesse dia, o comboio que aí devia passar por volta das 17 horas e 30 minutos.
Tomando este facto como prova de concretização do encerramento da linha, a população tomou as medidas que lhe pareceram mais adequadas para conseguir que alguém responsável, fosse da administração da CP, fosse da Câmara Municipal ou do Governo Civil, se dignasse a dar-lhe explicação sobre o que se estava a passar.
Com surpresa geral, em vez de alguém para dialogar, apareceu uma força especial da GNR que, sem mais explicações, espancou brutalmente quem lhe apareceu pela frente.
Hão há qualquer exagero quando se afirma que a força da GNR que interveio nos acontecimentos espancou brutal e indiscriminadamente todos os que ficaram ao seu alcance. Pudemos testemunhar em mais de uma dezena de mulheres, homens e jovens marcas bem reveladoras da brutalidade desses espancamentos, tendo alguns dos agredidos, pelo menos quatro mulheres, recebido tratamento hospitalar.
Como é de calcular, a indignação era grande, tanto mais que logo no dia seguinte, 30 de Setembro, o Sr. Presidente da Câmara de Vila Real, dialogando então com a população, para salvar as aparências, dizia que tinha sido um rebate falso, porque afinal o comboio que a população reclamava não tinha circulado porque um vagão não tinha luz conveniente.
Sendo assim, e se foi esta a razão por que o comboio não circulou, cabe perguntar por que razão é que não foi o Sr. Presidente ou qualquer outra entidade a explicá-la antes de a agressão se ter consumado.
Será, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que é este o tipo de diálogo que o Sr. Primeiro-Ministro e o seu Governo tanto apregoam?
Seja como for, o que a população de Fortunho, com quem dialogámos, quer saber é quem ordenou o desencadeamento de tal violência contra si. Por que se agride uma população que, apenas e pacificamente, quer que lhe assegurem um serviço público que, mesmo arcaico, ajuda a minorar o isolamento em que se encontra?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O 25 de Abril e a Constituição deram aos Portugueses o direito a serem ouvidos quando os seus interesses estão em causa. A esta Assembleia compete velar para que tal direito seja assegurado.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto ao segundo acontecimento, não menos insólito do que o de Fortunho, tomámos contacto com ele numa visita que se fez à mina da Borralha. Esta mina, propriedade da multinacional Beralttin, paralisou a sua laboração em 15 de Janeiro deste ano, com a garantia de que o seu encerramento teria a duração de quatro a seis meses. Porém, mais de nove meses são passados sem que aos trabalhadores seja dada qualquer satisfação quanto aos seus postos de trabalho e, naturalmente, quanto ao seu futuro.
São mais de cinco centenas e meia de trabalhadores da mina que, juntamente com os seus familiares - somam aproximadamente 2500 pessoas -, foram votadas ao abandono e à miséria que já se instalou em muitos dos seus lares. E o mais grave é que ninguém aparece para lhes dizer se a mina encerrou definitivamente, se voltará a abrir e quando.
Isto tem vindo a criar uma tal indefinição que os trabalhadores não sabem o que fazer em relação à manutenção da mina. Alguns, com esperança que ela reabra, têm ido voluntariamente trabalhar na sua manutenção e segurança, o que já custou a vida a um mineiro, no passado dia 26 de Setembro.
Por outro lado, tal como acontece com os postos de trabalho, também em relação às habitações, ninguém responde ou assume responsabilidades. As casas ou estão já em ruína ou para lá caminham aceleradamente. Os mineiros têm razões para recear que algumas das casas não resistirão a mais este Inverno, que está à porta. Os perigos de desastre são grandes e as crianças são muitas. Porém, às reclamações e angústias dos mineiros ninguém responde. Cada entidade abordada diz que as responsabilidades lhe não cabem. Trata-se de um jogo sujo e perigoso que é necessário denunciar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: da nossa estada em Trás-os-Montes ficou-nos a certeza de que até mesmo em zonas isoladas ninguém, minimamente esclarecido, pode acreditar em política de desenvolvimento, tão apregoada pelo actual Governo, quando se verifica uma verdadeira razia em tudo o que é produção de riqueza. Em Trás-os-Montes e Alto Douro, no que diz respeito à exploração mineira, ao que parece, a política do Governo é a de não deixar pedra sobre pedra. Borralha, Arcozelo, Vale das Gatas, Montesinho, Ribeira, já foram. Que irá a seguir?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os mineiros e as suas famílias estão extremamente preocupados com o seu futuro. Esta Assembleia tem de compartilhar destas preocupações.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Fernandes.

O Sr. Armando Fernandes (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já nesta Câmara aflorei as graves carências com que se debate o novo Hospital Distrital de Santarém. Novo edifício, velho nos problemas, mesmo assim, em escassos dez meses, a comissão instaladora conseguiu proceder à sua transferência e pô-lo a funcionar de maneira que se pode considerar modelar. Decerto este meu juízo de valor será partilhado pelos membros da Comissão Parlamentar de Saúde, Família e Segurança Social, os quais acompanhei em visita feita a esta unidade hospitalar, na passada quarta-feira.
Os Srs. Deputados dessa Comissão puderam observar in loco o trabalho produzido, sendo-lhes também facultado um amplo esclarecimento acerca dos graves problemas existentes, mormente no respeitante a futuros investimentos em termos estruturais, quadros de pessoal e a articulação com a Administração Regional de Saúde.
Hospital em fase de instalação, precisando ainda de grande número de equipamentos a fim de todos os pisos e valências serem colocados à disposição dos utentes, vê-se contemplado no PIDDAC, para o ano de 1987, com a irrisória verba de 26 000 contos.
Apetece perguntar: está o Governo interessado ou não em desbloquear o estrangulamento que tem afectado o Hospital Distrital de Santarém?
Se não está, e se está interessado em satisfazer as necessidades sanitárias das populações servidas por aquele estabelecimento hospitalar, necessário se torna aumentar substancialmente aquela verba nesse sentido. Daqui lanço um apelo aos Srs. Deputados da Comissão de Saúde para me acompanharem em tal pretensão.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Osório.

O Sr. António Osório (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Milhares de pessoas desfilaram no passado sábado no Porto na Marcha da Paz que se integrou no grande movimento mundial que constitui o Ano Internacional da Paz, correspondendo, assim, ao apelo da Assembleia Geral da ONU.
A Marcha da Paz foi convocada por dezenas de organizações religiosas e sindicais, por colectividades e autarquias, por associações de estudantes e contou com apoio e participação de largas dezenas de personalidades e deputados de vários partidos com assento na Assembleia da República.
Desfilaram pelas ruas do Porto dezenas de milhares de pessoas empunhando dísticos alusivos à luta pela paz, pelo fim da corrida aos armamentos, contra a guerra nuclear.
Homens e mulheres das mais variadas condições sociais e ideológicas deram as mãos e uniram-se num mesmo ideal: em defesa da paz, para um mundo melhor e mais fraterno, para uma cooperação pacífica entre todas as nações do mundo. Os povos de todo o mundo têm consciência dos perigos que pairam sobre a humanidade com a corrida aos armamentos, a nuclearização do espaço, a utilização de armas químicas e nucleares.
Foi por esta razão que milhares e milhares de pessoas se juntaram nesta marcha da paz, lutando para dar aos seus filhos uma vida livre da guerra, uma vida de paz.
São temas importantes que dizem respeito à vida de milhões e milhões de pessoas que só por si justificariam que a RTP tivesse uma palavra, uma imagem, para mostrar ao País que neste Ano Internacional da Paz também o povo do Porto disse não à corrida aos armamentos, não às armas nucleares em Portugal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Queria deixar aqui o nosso firme protesto pelo facto de a RTP não ter feito a cobertura desta importante e significativa iniciativa popular.

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A RTP, que é sempre tão solícita a divulgar e a justificar a política da corrida aos armamentos e da tensão internacional, propagandeando de forma escandalosa as acções do imperialismo norte-americano, esquece o seu próprio país, o povo que a vê e as iniciativas que contribuem para a paz. Daí o meu protesto e a exigência que a RTP actue com isenção e objectividade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António João Brito.

O Sr. João Brito (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na sessão desta Câmara do passado dia 23 foi trazido ao conhecimento de VV. Ex.ªs, pelo Sr. Deputado Vidigal Amaro, um comportamento polémico da administração central que deixou perplexas as entidades directamente relacionadas com a questão em causa, designadamente o conselho de gerência do Hospital Distrital de Évora, a autarquia e outros sectores da opinião pública ligados à saúde. A população em geral, essa, continua a desconhecer por completo as razões que terão justificado a amputação ao Hospital Distrital de parte integrante do seu património.
Estou a referir-me, Sr. Presidente e Srs. Deputados, ao protocolo assinado entre aquele membro do Governo e a Misericórdia de Évora visando a entrega das instalações inacabadas do vulgarmente designado «Hospital do Patrocínio», cujos uso e gestão passaram, com carácter definitivo, para a referida Santa Casa da Misericórdia, suportando o Estado todas as despesas de construção e equipamento da futura unidade hospitalar.
Permitam-me, Sr. Presidente e Srs. Deputados, uma sucinta descrição dos factos que envolveram o Hospital do Patrocínio, desde a sua génese até ao momento em que, descricionariamente e sem ouvir absolutamente ninguém, a Sr." Ministra da Saúde decidiu efectivar aquele arbitrário acordo de gestão.
A ideia da criação de um centro de tratamento e prevenção do cancro nasceu há cerca de 30 anos quando, por subscrição pública e pela doação de 5000 contos pelo engenheiro Eugénio de Almeida, se conseguiram juntar cerca de 6000 contos para o início das obras do referido Hospital.
O projecto foi na altura amplamente incentivado, quer pela generalidade dos eborenses e alentejanos, a quem se destinava, quer pelas entidades intervenientes, ou sejam a Fundação do Patrocínio, a Liga Portuguesa contra o Cancro e os Ministros das Obras Públicas, da Educação e da Saúde, e ainda pela Câmara Municipal de Évora, que, a título de doação, cedeu os terrenos necessários para a sua construção.
Por diversas razões, onde avultam as de ordem financeira, foram suspensas as obras, até que uma comissão, criada pelo Secretário de Estado da Saúde, com o acordo dos Secretários de Estado das Obras Públicas e do Ensino Superior, se pronunciou no sentido de que não se justificava a construção de um centro anti-canceroso na cidade de Évora e que o destino mais adequado para o terreno e construção já iniciada seria a sua cedência ao Hospital Distrital de Évora, prevenindo-se a instalação dos serviços oncológicos no Hospital Distrital, de acordo com a escritura de doação do terreno feita pela Câmara Municipal.
Por escritura pública de 20 de Outubro de 1980, a Liga Portuguesa contra o Cancro doou ao Hospital Distrital de Évora o prédio de que era legítima proprietária, bem como as benfeitorias nele existentes, com o objectivo exclusivo de ampliação das insuficientes instalações do Hospital Distrital, mantendo assim as intenções dos doadores já referidos. Por despacho do Secretário de Estado da Saúde, de 17 de Setembro de 1980, foi o Hospital autorizado a receber tal doação. Na verdade, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o conselho de gerência do Hospital Distrital de Évora apresentou, oportunamente, o seu programa global, do qual fazia parte integrante o Hospital do Patrocínio, tendo este sido aprovado por despacho de 7 de Abril de 1983 do Secretário de Estado da Saúde.
Parecia, pois, pacífica a integração do Hospital do Patrocínio no plano global do Hospital Distrital, dando resposta às solicitações da região, em termos da correspondente ampliação e melhoria do Hospital de Évora, que, só por meros artifícios estatísticos, apresentará uma taxa de ocupação baixa (64%, e não 55%, como aqui já foi incorrectamente referido). Na verdade, no cálculo dessa taxa tem-se entrado em linha de conta com cerca de 100 camas existentes na parte velha do hospital onde estão instaladas as medicinas. A própria Sr.ª Ministra da Saúde, noutra ocasião, reconheceu verificarem-se nesta parte do hospital condições degradadas e desumanas.
Muitas vezes, ao povo do meu distrito foi prometido o desbloqueamento das verbas necessárias para que as obras recomeçassem e Évora, como é de justiça, passasse a dispor de um mais amplo e moderno complexo hospitalar.
Mas de promessas meramente eleitoralistas e demagógicas não se passou, até que esta Câmara aprovou, através da proposta de lei n.º 16/IV, uma dotação orçamental de 70 milhões de escudos, inscrita no Orçamento do Estado para 1986, com vista à primeira fase das obras de conclusão do Hospital do Patrocínio de Évora, impropriamente inscrita com aquela designação, pois o Hospital do Patrocínio, enquanto tal, não tinha naquela data existência legal, mas, como ficou claro, era parte integrante do Hospital Distrital de Évora.
Ao tomar esta atitude, o Governo não só inviabiliza a resolução, a curto ou médio prazo, de alguns problemas graves com que o Hospital Distrital actualmente se bate - nomeadamente o da desumanidade das condições em que funcionam alguns serviços -, como compromete seriamente as suas possibilidades de crescimento, decorrentes de uma previsível necessidade de transformação em hospital regional.
Pelos factos expostos e pelas consequências previsíveis não só de duplicação de serviços como da ampliação futura do Hospital Distrital de Évora, salvaguardando que não se põe em causa a idoneidade da Santa Casa da Misericórdia para cumprir o acordo estabelecido, irei requerer ao Governo que explique as razões de tão insólita e inexplicável actuação, ao mesmo tempo que protesto pela forma, no mínimo deselegante, com que a Sr." Ministra da Saúde premiou aqueles que, empenhada e abnegadamente, têm posto ao serviço do Hospital Distrital e da população de Évora a sua competência, honestidade e sentido de solidariedade social.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Malato Correia e Vidigal Amaro.

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Acontece, porém, que o Sr. Deputado João Brito já não dispõe de tempo...

O Sr. Malato Correia (PSD): - Sr. Presidente, nesse caso, fico inscrito para, em oportunidade mais consentânea com a disponibilidade de tempo do Sr. Deputado João Brito, lhe colocar algumas questões e esclarecer algumas dúvidas que ele colocou, até sobre a rendibilidade do hospital.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Presidente, o nosso grupo parlamentar ainda dispõe de algum tempo, e, como penso que este assunto é importante, poderemos dispensar dois minutos ao Sr. Deputado Malato Correia para colocar as suas questões; eu demoraria apenas um minuto com a minha pergunta e cederíamos o resto do tempo disponível do PCP ao Sr. Deputado João Brito, para responder.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vidigal Amaro, o Partido Comunista Português dispõe de tempo cedido pelo MDP/CDE?

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O PCP dispõe então de cinco minutos, dos quais reserva um para pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Vidigal Amaro, cede dois minutos ao Sr. Deputado Malato Correia e os restantes ao Sr. Deputado João de Brito.
Tem a palavra o Sr. Deputado Malato Correia.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Sr. Deputado João de Brito, a sua intervenção vem na sequência da intervenção que há dias produzi, mostrando a necessidade de elaborar uma carta hospitalar em Portugal, para que, com economia de meios, se prestem melhores serviços à população portuguesa.
Se alguém tem interesse em que haja bons serviços hospitalares no Alentejo, nomeadamente em Évora, esse alguém sou eu, como alentejano. Obviamente que isso não me impede de ser crítico em relação àquilo que a maior parte dos portugueses são e que há pouco referi, isto é, são de um bairrismo - de certo modo desejável, mas por outro lado exagerado - que não se justifica e que até dificulta a elaboração de uma verdadeira e lógica carta hospitalar.
Se se fizer a distribuição do número de camas pelo número de habitantes que tem o distrito de Évora e a população a que ela presta assistência, verificar-se-á que as 400 e tal camas de que dispõe actualmente o Hospital de Évora são suficientes, isto se o Hospital de Évora for considerado como devem ser considerados todos os hospitais portugueses: verdadeiras empresas de prestação de serviços, no bom sentido do termo. Mas o que é preciso é tornar rendíveis essas camas.
Estou de acordo consigo quando diz que há uma parte do Hospital que ainda hoje não dispõe de bons meios de instalação e de hotelaria para que as populações tenham o devido acolhimento. No entanto, não é isso que justifica englobar no Hospital Distrital mais
cerca de 200 camas (neste momento não sei exactamente o número de camas que o Hospital do Patrocínio contém), que não vão ser necessariamente aproveitadas. Iríamos ter gastos supérfluos, que deveriam ser aproveitados, com muito maior rendibilidade, noutras zonas de países tão carenciados. O que devemos é modernizar a parte velha do Hospital de Évora e depois rendibilizar todo o Hospital.
Garanto-lhe que o que não tem interesse são os 56% que referi aqui, há dias, tal como não tem interesse os 64% que o Sr. Deputado refere. Ambas são taxas mínimas de ocupação.
Um hospital de primeira linha, como é o Hospital de Évora, deve preocupar-se em ter, no mínimo, cerca de 80% de taxa de ocupação, ficando cerca de 20% para os serviços de urgência. Um hospital deve sempre reservar, em média, 20% de camas para o serviço de urgência.
Sr. Deputado, gostaria ainda de lhe dizer que estarei sempre a seu lado no sentido de tornar rendíveis as camas que ainda hoje se encontram disponíveis no Hospital de Évora. Porém, peco-lhe que não leve a mal que a Misericórdia de Évora fique a explorar o hospital de retaguarda que é o Hospital do Patrocínio, pois a génese do Hospital, como disse há pouco, não tem nada a ver com aquilo que hoje é o Hospital do Patrocínio de Évora. O Hospital do Patrocínio era para fins oncológicos, mas está muito longe de ser utilizado para isso neste momento.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Deputado João de Brito, em primeiro lugar, quero dizer-lhe que me congratulo com a sua intervenção e, em segundo lugar, quero colocar-lhe duas questões muito rápidas.
A primeira questão diz respeito à gestão do Hospital do Patrocínio. Diz-se que o Hospital vai ter camas a mais e que essas camas não são necessárias. Como o Sr. Deputado visitou o Hospital, pergunto-lhe se as condições que existem nas enfermarias de medicina são humanas e se aí se pode fazer boa medicina. Haverá camas a mais para o Hospital e a gestão será má, mas, então, fazendo outro hospital com duplicação de serviços, raios X, análises - um hospital a que chamam não sei o quê e não sei se será da rectaguarda ou de vanguarda -, as camas deste já não são a mais? Umas camas do outro lado da rua, geridas por outra entidade, não serão também a mais? Isto será uma boa gestão?
Outro problema que se coloca é o problema do futuro. Temos de pensar no futuro, na regionalização, pois por mais que queiram ou não queiram a regionalização terá de ser um facto e a região alentejana há-de ser constituída. O Hospital de Évora fica no centro da região alentejana e há-de ser um futuro hospital regional. O Sr. Deputado não concorda com este raciocínio? Há-de haver serviços que não caibam em Beja nem em Portalegre e não será por causa disto que se terá de desenvolver o Hospital Regional em Évora, por estar no centro da região alentejana?
Para terminar, pergunto-lhe por que é que o protocolo já feito entre o Governo e o Hospital Distrital de Évora em que se aprovava o programa realizado não

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foi efectuado? O Sr. Deputado tem conhecimento de estudos efectuados para que esse programa fosse, pura e simplesmente, rasgado e não fosse efectuado?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António João de Brito.

O Sr. António João de Brito (PRD): - Em primeiro lugar, quero registar com muito agrado o facto de o Sr. Deputado Malato Correia não estar em desacordo comigo.
Penso que o Sr. Deputado Malato Correia - desculpe-me falar assim - talvez não conheça muito bem a realidade que é o Hospital Distrital de Évora, talvez nunca lá tenha estado...

O Sr. Malato Correia (PSD): - Já lá estive, sim, Sr. Deputado.

O Orador: - Então, se já lá esteve, com certeza que conhece as condições completamente desumanas e totalmente degradadas da parte onde funcionam as medicinas, e, mesmo assim, ainda lá estão cerca de 100 camas! Mas, se o Sr. Deputado já não se recorda bem, posso mostrar-lhe, bem como a qualquer Sr. Deputado que o deseje, um conjunto de fotografias, que tenho aqui, tiradas esta semana quando visitei o Hospital - estive lá o dia inteiro!
De qualquer forma, penso que quando se fala numa taxa de ocupação tão baixa se está a seguir um raciocínio que, quanto a mim, se baseia num artifício estatístico. Por um lado, contam-se com as 100 camas da parte degradada do Hospital e, por outro, não se entra em conta com uma coisa que também penso ser importante que é o facto de, como sabe, o quadro do Hospital não estar completo e haver muitos serviços de especialidade que não têm médico, e, portanto, os doentes nem sequer entram no Hospital, sendo imediatamente encaminhados para os hospitais centrais.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Sr. Deputado, em primeiro lugar, agradeço-lhe ter-me permitido a interrupção. Em segundo lugar, pergunto-lhe se me sabe dizer se existe lista de espera para a entrada no Hospital de Évora, quer na medicina, quer nas outras especialidades, nomeadamente cirúrgicas.

O Orador: - Não lhe posso responder concretamente, Sr. Deputado.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Posso responder-lhe eu, apesar de julgar que não conheço bem o Hospital. Não há lista de espera.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Aí é que está!

O Orador: - Como dizia, não posso responder concretamente a essa pergunta, mas é natural que não haja lista de espera, como o Sr. Deputado refere, pois os doentes para certas especialidades nem sequer vão já ao Hospital Distrital de Évora, sendo imediatamente encaminhados para os hospitais centrais. Como o Sr. Deputado sabe, em saúde a oferta determina a procura.
Ora, se o Sr. Deputado estabelecer - tenho aqui elementos para o Sr. Deputado consultar quando quiser, aliás, tenho um dossier sobre o Hospital Distrital de Évora - uma correlação entre a taxa de ocupação global do Hospital e a percentagem de preenchimento do quadro médico, constata uma relação directa positiva, isto é, à medida que uma variável aumenta, a outra também aumenta. Isto significa que existe uma relação directa positiva entre a oferta de médicos e a evolução da procura. Aliás, de 1983 para 1986 passa-se de uma taxa de ocupação de 50,9% para 64%, como resultado do aumento do número de médicos do Hospital.
Se o Sr. Deputado quiser, ainda lhe posso referir algumas das especialidades que neste momento não existem no Hospital e que seria extremamente importante que existissem. Refiro-lhe, concretamente, que não existe qualquer médico de neurologia, neurocirurgia, otorrinolaringologia e estomatologia.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a uma vai ser encerrada, pelo que, se algum Sr. Deputado ainda não votou, agradecia o favor de o fazer de imediato. Peço, depois, aos Srs. Escrutinadores o favor de apurarem a contagem.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Araújo.

O Sr. Alberto Araújo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O vale do Douro viveu nos dias 24 e 25 do corrente mês dias históricos para o seu futuro com a viagem em que participaram membros do Governo, autarcas, governadores civis e responsáveis dos vários níveis e sectores que têm a ver com o vale do Douro.
Em Maio do corrente ano fiz nesta Tribuna uma chamada de atenção desta Assembleia e do Governo para a necessidade de construção de uma estrada marginal do rio Douro.
Se os sonhos nos permitem ampla liberdade de expansão, a realidade amarra-nos ao possível de cada hora.
Se bem que o rio Douro justifique e mereça uma estrada marginal, com características de via rápida pelo menos do Porto até Barca de Alva, quisemos limitar a nossa pretensão à estrada Porto-Régua.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, nesta hora de arrancada para a Europa, dá-se preferência, e muito bem, aos projectos que servem regiões.
Uma via rápida Porto-Régua, que fosse verdadeiramente marginal, não há dúvida que seria o motor de desenvolvimento de uma vasta região.
Comecemos pela Região Demarcada do Douro, onde se produz o já histórico e mundialmente conhecido vinho do Porto.
A Região Demarcada do Douro, com a sua sede na cidade da Régua, estende-se por uma área de 250 000 ha. Abrange 22 concelhos e 150 freguesias.
Na sua quase totalidade, o vinho do Porto tem de passar pelas cidades do Porto e Gaia e são milhões de litros que têm de fazer o percurso Régua-Porto.
Quem pode calcular o valor económico e social de uma ligação europeia Régua-Porto?
O vinho do Porto é uma das maiores riquezas nacionais, e muito custa verificar que não tem a servi-lo pelo menos uma boa estrada.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados, a nossa estrada na Europa não se pode fazer só com simpósios, seminários e congressos - que achamos muito importantes.
A nossa entrada na Europa precisa de estradas, precisa de muito boas estradas, que rompam os estrangulamentos, que abram as portas ao progresso, que sejam um fluir e refluir de civilização e riqueza.

Mas há mais.

A via rápida Régua-Porto colocava quase no litoral - e dizemos «quase» porque esta é a palavra exacta - uma vasta região presa no seu isolamento de zona interior. Referimo-nos à região de Santa Marta de Penaguião, Lamego, Régua, Armamar, São João da Pesqueira. Para esta vasta região, estar na Régua passaria a ser estar praticamente no Porto, e com tudo o que significa estar no Porto e no Grande Porto.
Mas ressalta agora, uma consequência ligeira.

O percurso Régua-Porto significa o romper dos diques do isolamento de uma vastíssima região, que tenta dar alguns passos no sentido do progresso e que se vê manietada por dificuldades quase intransponíveis.
Queremos com isto referir os concelhos de Mesão Frio, Resende, Baião, Cinfães, Marco de Canaveses, Castelo de Paiva, Penafiel, Paredes e Gondomar.
São três estâncias termais: Moledo (na Régua), Are-gos (em Cinfães) e São Vicente (em Penafiel). Com todas as suas instalações hoteleiras, que acabam por ter apenas uma ocupação sazonal.
São as estalagens de Santiago, em Gondomar, Douro à Vista, em Melres, e Miradouro, em Entre-os-Rios, e o Convento de Alpendurada, em Marco de Canaveses.
São as indústrias de pedra, que dão um contingente notável de carga para exportação.
São as indústrias da madeira, que têm necessidade de atingir o mar, para alcançarem a almejada exportação - e são um valor notável e que merece carinho.
São os vários produtos agrícolas, que, para viverem e sobreviverem, precisam de alcançar o litoral e os seus mercados e receber de lá tudo o que precisam para se expandirem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, deixamos para o fim o turismo.
Bem podemos dizer que o turismo do Douro, prenhe até à saciedade de potenciais riquezas, é um zero.
O turista é portador de riquezas, mas é um ser humano que está em férias, em tempo de repouso. Não aceita pois, como regra, as viagens incómodas, maçadoras e demoradas, por mais atractiva que seja a riqueza paisagística e monumental que lhe ofereçamos.
Uma via rápida é um convite, uma tentação, um atractivo para o turista, que pode ver e apreciar muito em pouco tempo e de maneira cómoda.
Fizemos em Maio um apelo à Assembleia da República e ao Governo, tendo este correspondido, criando uma comissão para o aproveitamento turístico do vale do Douro, ao mesmo tempo anunciando uma linha de crédito, «que é das mais favoráveis existentes no País», para projectos de aproveitamento turístico, nomeadamente termalista, e que serão investidos no vale do Douro, em 1987, 10 milhões de contos nas comunicações ferro e rodoviárias, com destaque para esta última.
Façamos a promoção e progresso do Douro e da sua gente.
Mas, para que o Douro se promova e progrida, demos-lhe condições de vida e não de morte, condições de riqueza e não de pobreza.
Condições de liberdade e não de encarceramento.
E, num esforço de caminhada para um futuro melhor, repitamos sempre e sempre: promoção e progresso para o Douro e a sua gente!

Aplausos do PSD, do PS e do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira. Dispõe de três minutos, Sr. Deputado.

O Sr. João Teixeira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito sinteticamente, gostaria de trazer aqui o conflito de que tem feito eco a comunicação social, sobretudo a do Norte do País.
O conflito entre taxistas portugueses e espanhóis que teve a sua expressão mais acentuada e a primeira publicamente conhecida no passado mês de Agosto, quando os taxistas portugueses se viram forçados a recorrer a manifestações junto das fronteiras do Norte (Valença e Vila Verde de Raia) como forma de denunciar o tratamento de que estavam a ser vítimas por parte das autoridades espanholas, poderá agudizar-se em extensão e gravidade, dado que decorridos alguns meses sobre o despoletar do problema este ainda não foi solucionado, e se esta morosidade se mantiver.
Tal situação, como é compreensível, afecta sobremaneira os industriais de táxis das zonas fronteiriças, quer no aspecto económico, quer mesmo no que respeita à dignidade profissional, pois que as autoridades espanholas, invocando uma disposição legal daquele país datada de Dezembro de 1949 e até aqui nunca aplicada na prática, movem autêntica perseguição e caça aos nossos compatriotas taxistas quando em circulação naquele país.
A disposição legal em causa, reforçada com uma ordem ministerial de Março de 1972, proíbe os taxistas portugueses de transportar cidadãos espanhóis no seu território, bem como o de entrar vazios ou com familiares, entre outras medidas restritivas, como, por exemplo, apanhar ou ir buscar portugueses a qualquer ponto de Espanha, mesmo que familiares e transportados gratuitamente. Tal situação é insustentável, sobretudo na medida em que os taxistas espanhóis não têm da parte portuguesa quaisquer restrições ou limitações similares, o que resulta numa flagrante e inaceitável diferença de tratamento em enorme prejuízo dos nossos compatriotas, situação que se não seria aceitável noutro contexto, muito menos se compreenderá que exista entre países da Comunidade Económica Europeia, onde o princípio da livre circulação e livre actividade é fundamento comunitário.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, mais não pretendem os taxistas portugueses do que a igualdade de tratamento entre os profissionais dos dois países, e é nesse sentido que vão todas as suas reivindicações, que, além de justas, devem constituir motivo de preocupação no âmbito das relações bilaterais dos países ibéricos e cuja satisfação é um imperativo a concretizar no mais curto espaço de tempo, a fim de evitar a degradação desta insuportável situação. Tal desiderato poderá atingir-se, no entender dos interessados, ou pela eliminação, por parte das autoridades espanholas, das restrições existentes (o que seria a solução melhor e menos polémica) ou, na impossibilidade daquela, pela aplicação por parte das autoridades portuguesas de iguais medidas de restrição e fiscalização, de forma a traduzir na prática tratamento absolutamente igual.

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É nesta perspectiva e na expectativa de que os responsáveis pelo sector já consciencializaram e equacionaram o problema, estando a decorrer as démarches com vista à sua resolução, que o Grupo Parlamentar Social-Democrata e muito particularmente os deputados do PSD do círculo de Vila Real deixam aqui este alerta para a situação, que é também, e sobretudo, um apelo para a urgência de que tal resolução carece, por estarem em causa interesses de cidadãos portugueses, com particular incidência na zona fronteiriça em que nos inserimos, afectando uma classe de profissionais que não podem ser abandonados à «guerrilha» de uma concorrência desigualmente protegida por normas e regras discriminatórias que não têm sequer em conta as realidades actuais.

Aplausos do PSD.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, independentemente da votação por escrutínio secreto que está a decorrer, e que será anunciada oportunamente, a Mesa põe à consideração da Câmara a parte final do mesmo relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos a que o Sr. Secretário vai fazer referência.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - Srs. Deputados, a Comissão de Regimento e Mandatos é ainda de parecer não autorizar que sejam ouvidos, como declarante e assistente, o Sr. Deputado António Almeida Santos e, como testemunha de acusação, o Sr. Deputado João Rosado Correia, no processo em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há inscrições, vamos votar.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos à apreciação do projecto de lei n.º 140/IV (PSD) - Obrigatoriedade do parecer prévio vinculativo das câmaras municipais para o licenciamento de jogos e diversões públicas.
Sr. Deputado Mendes Bota, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Presidente, era para solicitar a suspensão dos trabalhos por 30 minutos, ao abrigo das disposições regimentais.

O Sr. Presidente: Srs. Deputados, está, então, suspensa a sessão por 30 minutos. Retomaremos os trabalhos às 12 horas e 40 minutos.

Eram 12 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 12 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lida a acta do escrutínio acabado de efectuar-se relativo ao parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

Foi lida. É a seguinte:

Acta

Aos 31 dias do mês de Outubro de 1986, no Plenário da Assembleia da República, procedeu-se à votação do parecer da Comissão de Regimento e Mandatos acerca do pedido de suspensão do mandato à Sr.ª Deputada Aurora Margarida de Carvalho Santos Borges de Carvalho, a fim de ser julgada no 4.º Juízo Correcional de Lisboa, tendo sido apurados os seguintes resultados:

Votantes - 144;
Votos sim - 126;
Votos não - 15;
Votos abstenção - 2;
Votos nulos - 1.

Verifica-se, assim, que o referido parecer foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Presidente da Comissão Parlamentar de Administração Interna e Poder Local solicitou-me que, a título excepcional, convoque os Srs. Deputados que fazem parte da referida Comissão para uma reunião a realizar na próxima segunda-feira, dia 3, pelas 15 horas e 30 minutos, na qual estará presente o Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna.
Srs. Deputados, vamos prosseguir os nossos trabalhos iniciando a apreciação do projecto de lei n.º 140/IV.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, se V. Ex.ª me permite, pretendo apenas fazer um reparo. É que temos uma intervenção sobre o projecto de lei n. º 140/IV, mas é verdade que existe um texto alternativo da Comissão. Acontece que pelo menos uma parte das bancadas, após ponderação e reflexão, deixou de dar o seu acordo ao texto alternativo.
Se não houvesse qualquer objecção por parte das outras bancadas, poderia ser retirado o texto de substituição apresentado pela Comissão. Portanto, se V. Ex.ª não registasse qualquer objecção por parte das outras bancadas, seria retirado desta discussão o texto alternativo.
Se assim não for, é evidente que, chegado o momento oportuno, votaremos contra o texto alternativo e a favor das propostas de alteração que entretanto apresentámos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há um texto alternativo, apresentado pela Comissão, e o Sr. Deputado Silva Marques sugere agora a retirada deste texto, se houver consenso sobre isso por parte das outras bancadas.
Solicito, pois, às outras bancadas o favor de se pronunciarem sobre a sugestão agora apresentada.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

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O Sr. Magalhães Moía (PRD): - Sr. Presidente, temos dúvidas em saber exactamente o que é o texto alternativo da Comissão. Temos presentes propostas de alteração subscritas por vários Srs. Deputados, mas não dispomos do texto alternativo proveniente da Comissão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, tenho no meu processo o texto de substituição, apresentado pela Comissão de Administração Interna e Poder Local, datado de 24 de Outubro de 1986, com o título «Projecto de lei n.º 140/IV: texto de substituição».
Creio, pois, que foi a este texto que o Sr. Deputado se referiu.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, pela nossa parte, entendemos que é, pelo menos, insólito que seja retirado um texto alternativo de uma Comissão.
Por mim só poderá ser retirado pela entidade própria, que é a Comissão. Se fora caso de convocar a Comissão para o efeito de se debater com profundidade toda esta matéria, dadas as hesitações do PSD - que foi, aliás, quem sugeriu as alterações que deram origem ao texto alternativo e que parece agora não se entender nem com o texto alternativo nem com o texto originário -, e até que o PSD saiba o que quer, então fá-lo-ei. Mas não me parece que seja bom método retirar um texto aprovado pela Comissão só porque há três ou quatro deputados que assim o entendem.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de mais nada, quero dizer-lhes que só a entidade autora é que pode retirar o texto alternativo, ou seja, a Comissão de Administração Interna e Poder Local, a menos que seja solicitado - e o Plenário concorde - que a Comissão reúna para se pronunciar sobre isso.
Não sendo assim, teremos de prosseguir os nossos trabalhos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - É evidente que V. Ex.ª, Sr. Presidente, tem razão.
Eu só perguntei se havia objecções por parte das outras bancadas. Como temos seguido aqui o princípio de derrogar, por vezes, os princípios regimentais no caso de não haver objecções, eu perguntei se haveria objecções. Existindo essas objecções, não se derrogam os princípios regimentais.
Solicito, por isso, a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que ponha em discussão o projecto de lei n.º 140/IV. Se houver intervenções far-se-ão, se não houver passar-se-á à votação.
Pela nossa parte, votaremos contra o texto alternativo e a favor das nossas propostas de alteração, pelo que não há qualquer dificuldade.

O Sr. Presidente: - Portanto, há o texto base, o texto alternativo e propostas de alteração!?

O Sr. Silva Marques (PSD): - Exactamente.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Martins.

O Sr. Silva Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 140/IV, da iniciativa do PSD, tem objectivos bem claros no que se refere à introdução da obrigatoriedade dos pareceres prévios das câmaras municipais para o licenciamento dos jogos de perícia e outras diversões públicas, pois, sem desejar introduzir novas dificuldades, nem tão pouco burocratizar e moralizar, criando disposições legais adequadas para melhor se poder acautelar e evitar tanto as eventuais perturbações no funcionamento da Administração como os flagrantes e escandalosos prejuízos sociais delas possivelmente decorrentes.
Nesta iniciativa o Partido Social-Democrata preocupou-se em auscultar as entidades directamente envolvidas nesta problemática, de molde a obter um articulado que, por um lado, desse corpo ao espírito que esteve na base da feitura do projecto de lei e, por outro, viesse servir da melhor forma as populações.
Queremos também pôr em relevo o facto de, por esta via, estarmos a dotar as câmaras municipais de um dispositivo legal que melhor lhe permita defender, na sua área de jurisdição, os valores comunitários e o interesse público.
Uma das virtudes deste diploma resulta de, sem complicar o processo burocrático que diz respeito à habitual apreciação dos pedidos de licenciamento, introduzir uma garantia de que a voz dos legítimos representantes das comunidades tenha um efeito útil e de que, dessa forma, dê aos autarcas não só uma renovada credibilidade, como legítimos representantes livremente eleitos pelas populações, mas também e simultaneamente uma acrescida e mais clara responsabilização.
Por isso mesmo este diploma é profundamente inovador, porque descentraliza para as autarquias locais uma maior responsabilidade e capacidade político-administrativa no controle de uma maior moralização e gestão mais efectiva das suas comunidades.
Assim, pelas considerações expostas, o Partido Social-Democrata espera que esta Câmara o acompanhe na votação favorável desta iniciativa legislativa.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Silva Martins, a pergunta que lhe quero colocar á a seguinte: Na concepção do PSD, em relação à competência da Câmara, qual o valor que tem a ausência de parecer? Concretamente, aplica-se os princípios gerais do direito administrativo e o regime geral consignado no Decreto-Lei n.º 100/84, isto é, a falta de parecer significa indeferimento tácito?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Martins.

O Sr. Silva Martins (PSD): - Sr. Deputado João Amaral, respondo-lhe que, efectivamente, não tem efeito de indeferimento tácito.

O Sr. João Amaral (PCP): - Porquê?

O Orador: - Porque foi alterado. Depois de auscultadas as outras entidades, entendeu-se que seria uma solução...

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O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amara! (PCP): - Pode-me dizer quais foram as outras entidades que foram consultadas e em que princípios baseia a postergação dos princípios gerais de direito administrativo e, nomeadamente, o regime do Decreto-Lei n.º 100/84?

Amaro (PCP): - Isso é difícil de o Sr. dizer!

O Orador: - Trata-se, realmente, de um parecer, e o indeferimento tácito não tem nada a ver com esse parecer.
Neste momento, a nossa proposta é precisamente a resultante de uma solução intermédia entre a iniciativa legislativa proposta pelo Sr. Deputado Silva Marques, do PSD, e a resolução e conclusão a que tínhamos chegado anteriormente na própria Comissão.

O Sr. João Amaral (PCP): - Não percebi nada!

O Orador: - Entendeu-se, pois, que era uma solução intermédia que, efectivamente, também acautelava todos os objectivos que em princípio pretendíamos salvaguardar e acautelar.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho de Sousa.

O Sr. Agostinho de Sousa (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projecto, contrariamente àquilo que pode parecer, não é só o que os três artigos retratam, aliás, no nosso entendimento, de maneira menos feliz.
Surgido e concretizado sem grandes ondas, muito discreto e com pouca roupa, passaria quase despercebido na sua aparente singeleza, até pelo aparente toque de arejamento e de renovação que exibe - sublinho «aparente» - ao atribuir às câmaras municipais o poder decisivo de deferir ou indeferir a concessão ou a renovação do licenciamento. Felizmente que o projecto chega ao Plenário para sofrer as transformações ajustadas. Tomá-lo como nos aparece seria um grave equívoco, como procurarei evidenciar.
É essencial que se clarifique previamente uma situação de melindre. O que está em causa, em essência, não é a transferência para as câmaras de poderes decisórios, porque, se assim fosse, apoiaríamos o projecto com mais ou menos correcções.
Todavia, este bombom dado ao poder local, que, numa associação menos pura de ideias, até poderia ser visto como um jogo de perícia e de diversão, deve avaliar-se e valorizar-se num outro quadro. O problema tem uma natureza, limites e alcance que o projecto não revela e, muito menos, resolve.
O jogo está a tornar-se um dos imperadores deste País. Lentamente apodera-se dele, sobretudo de uma parte do país mais vulnerável, da juventude e das pessoas de economia débil. As máquinas de diversão integram já o sistema. Pelo uso indevido que delas se faz, pelo degrau que representam no acesso aos jogos de azar e pela atracção descontrolada que mobilizam,
constituem autenticamente, no quadro em que funcionam, uma praga nacional cuja projecção, em termos de danos, reclama medidas de simétrica importância e responsabilidade e não «medidazinhas».
Com as autorizações para as zonas de jogo das Pedras Salgadas e de Tróia, passámos a ter mais casinos do que dias de semana; o número de salas de bingo aproxima-se da meia centena; os casinos clandestinos não param; a lotaria continua, o totobola estabiliza; e o totoloto revoluciona. O jogo cresce na razão directa da crise como um seu apêndice parasita. As máquinas já conquistaram o seu lugar no carrossel.
Infelizmente, este projecto passa ao largo destas questões, carece da dimensão mínima adequada para operar correcções convincentes e enferma de uma perspectiva e de um alcance claramente redutores, com a agravante de alimentar a falsa ideia de um reforço de confiança no poder local. Não pode ser um aspecto favorável em aparência, aliás distorcido, que o pode tornar credível e viável. Calçou-se a luva limpa, mas não se lavou a mão.
Uma solução que se apoia numa simples vertente de transferência de poderes finais de uma para outra autoridade, mas que se alheia de toda uma realidade social e económica envolvente, ignora a leitura, as conclusões e a intervenção de psicólogos, educadores, pais, sociólogos, economistas, políticos e a influência dessas áreas, não fixa sequer critérios objectivos de decisão e não mede riscos políticos, não se destina seguramente a atenuar de facto e menos a eliminar os vícios de uma situação degradada e complexa.
Mais do que corresponder a uma conveniência de actuar sobre o momento, constituir um trabalho de fingimento e se alhear de realidades decisivas, é susceptível de pôr em causa o próprio crédito e prestígio desta Assembleia.
Há uma discordância e uma revolta mais ou menos veemente e generalizada da população contra o que acontece neste domínio. Ex.ª - pode dizer-se - uma questão nacional sensível. A opinião pública espera e exige de nós um remédio bastante e, sobretudo, com a eficácia e a dignidade intelectual, moral e institucional adequadas.
Se o nosso receio é especialmente o de enfrentarmos a nossa consciência, a responsabilidade política de uma opção não é ignorável. Os cidadãos e as próprias autoridades directa ou indirectamente envolvidas neste problema interrogar-se-ão legitimamente sobre o valor, a qualidade e a eficiência desta escolha. É mais um teste à nossa responsabilidade.
Inclusive, não se tomam em linha de conta os efeitos paralelos ou os que, por arrastamento, se geram em torno do fenómeno a nível familiar, escolar e social: a atracção pela marginalidade, os vícios na formação de adolescentes e jovens, a proliferação de negócios de droga e de prostituição, o contrabando e as fugas à tributação. Poupemo-nos, Srs. Deputados, aos protestos justificados lesivos do crédito institucional. Basta-os o que os nossos detractores manipulam.
Mas ainda há um outro risco: a proliferação indiscriminada de máquinas e a sua instalação anárquica têm uma autoria política bem definida. Quem provocou a doença deve assumir bem caro o seu tratamento e não querer arrastar terceiros inculpados para uma solidarização na permanência atenuada do vírus.

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166 I SÉRIE - NÚMERO 7

Devemo-nos reservar, sim, sobretudo, uma tarefa de erradicação dos erros de fundo e da sua profilaxia. Isto faz parte das nossas preocupações e objectivos, na certeza de que será possível uma benéfica concertação de esforços com os restantes partidos nesse sentido.
A aprovação deste diploma significaria, assim, uma identificação e uma aprovação tácita de todo um estado de coisas existente e seria louvá-lo e mesmo justificá-lo.
O Governo dispõe de meios e de competências para resolver o assunto a esse nível, se assim o entender.
Não retocamos o optimismo no que não admite esperança nem é coerente. Assumiremos tão-só os nossos erros e as nossas culpas e dispor-nos-emos a resolver realmente o assunto.
Chamaria ainda a atenção para o próprio teor do projecto, que não refere quaisquer critérios objectivos de definição de jogos e não melhora as condições de licenciamento. Pelo contrário, coloca as decisões na dependência de critérios puramente subjectivos e abre a porta a toda a espécie de arbitrariedades e de consequentes injustiças. Assistir-se-á depois, porventura, ao espectáculo das deliberações contraditórias em concelhos próximos, às reclamações, ao recurso a manobras para ultrapassar até situações idênticas com tratamentos distintos, e não só.
Pensamos, por isso, que as presentes medidas são uma mera cortina de fumo com que se pretende ignorar o incêndio que de facto existe.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados Silva Marques e João Amaral. Acontece que o Sr. Deputado Agostinho de Sousa não dispõe de tempo para responder. O PSD só dispõe de um minuto e já ultrapassámos a hora regimental de terminar a sessão.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, é para sugerir a V. Ex.ª que permita que sejam formulados os pedidos de esclarecimento e as respectivas respostas antes de encerrar a sessão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, teria muito gosto nisso, mas a verdade é que não posso abrir nenhum precedente.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, quando a conferência de líderes parlamentares fixou os tempos, fê-lo na pressuposição de que do trabalho da Comissão e de todo o trabalho que tinha sido desenvolvido em relação a este aspecto resultou um texto aprovado por unanimidade - sublinho -, à vista de toda a gente e com conhecimento integral de todos os grupos parlamentares. A pressuposição era justa, dado o trabalho que foi realizado pela Subcomissão e que envolveu várias reuniões.
Neste quadro, solicito ao Sr. Presidente que, antes de interromper os trabalhos, convoque para tempo oportuno uma conferência de presidentes dos grupos parlamentares para ser reponderada a substituição de tempos, dado que a situação é substancialmente diferente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, creio que não valerá a pena estarmos a prolongar este incidente.
Ficam inscritos para formular pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados Silva Marques e João Amaral e, na hipótese de a reunião da conferência de líderes - que terá lugar na próxima quarta-feira, às 15 horas - alterar os tempos, ser-lhes-á concedida a palavra conforme o que ficar estipulado. Caso os tempos não sejam alterados, mantê-los-emos.

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Presidente, apenas gostaria de confirmar a posição do PCP. O PSD acha que esta matéria não é tão pacífica como inicialmente aparentava e, portanto, dá todo o seu apoio à reponderação dos tempos de que os grupos parlamentares possam dispor para voltarmos a discutir esta matéria na próxima semana.

O Sr. Presidente: - Comunico, mais uma vez, aos representantes dos grupos parlamentares que na próxima quarta-feira, às 15 horas, haverá uma conferência de líderes para se abordarem estas questões.
Segunda-feira, terça-feira e quarta-feira da semana que vem serão os dias dedicados às comissões e a próxima reunião plenária terá lugar na quinta-feira, às 15 horas, com pedido de antes da ordem do dia. A primeira parte do período da ordem do dia diz respeito à eleição da Comissão de Apreciação dos Actos do MAP e, tal como ontem foi decidido, à apreciação do parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre as Grandes Opções do Plano, caso a conferência de líderes parlamentares não chegue a outra conclusão. Da segunda parte do período da ordem do dia constará a continuação da agenda estipulada para hoje.
Está encerrada a sessão.

Eram 13 horas e 10 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

António Manuel Lopes Tavares.
António Paulo Pereira Coelho.
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
João Álvaro Poças Santos.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Luís Bonifácio Ramos.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

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Partido Socialista (PS):

António Manuel Azevedo Gomes.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando António Martins Vara.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.

Partido Renovador Democrático (PRD):

José Fernando Pinho da Silva.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.

Partido Comunista Português (PCP):

Jorge Manuel Lampreia Patrício.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
António José Tomás Gomes de Pinho.
Manuel Fernando Silva Monteiro.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Álvaro José Rodrigues Carvalho.
Carlos Alberto Pinto.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Jardim Ramos.
João José Pimenta de Sousa.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Júlio Vieira Mesquita.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.

Partido Socialista (PS):

António Domingues de Azevedo.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Rosado Correia.
Jorge Lacão Costa.
José Barbosa Mota.
José Manuel Torres Couto.
Leonel de Sousa Fadigas.
Rui Fernando Pereira Mateus.

Partido Renovador Democrático (PRD):

António Magalhães de Barros Feu.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Eurico Lemos Pires.
Fernando Dias de Carvalho.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Dias Lourenço da Silva.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Rodrigues Pato.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

José Luís Nogueira de Brito.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.
Pedro José Del Negro Feist.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

Raul Morais e Castro.

Deputados independentes:

António José Borges de Carvalho.
Rui Manuel Oliveira Costa.

Declaração de voto do PSD relativa à votação do voto de pesar pela morte do poeta Ruy Cinatti, aprovado na sessão de 16 de Outubro (1.ª série, n.º 1, de 17 de Outubro de 1986):
De acordo com as notícias necrológicas, faleceu Ruy Cinatti - poeta, engenheiro agrónomo, antropólogo [... ]
Mas, para quem -nómada, ilhéu ou peregrino - viveu sob o signo da viagem, mais adequado seria falar de passagem ou trânsito, senão mesmo de retorno ou de regresso.

Quando eu partir, quando eu partir de novo,
A alma e o corpo unidos,
Num último e derradeiro esforço de criação;
[...] Então pertencer-me-ei.
[...] E eu serei o senhor da minha própria liberdade.

Tendo recorrido os caminhos e os lugares da aventura histórica portuguesa, Ruy Cinatti perfez o roteiro do reencontro consigo mesmo.
Pois que, mesmo não sendo «deste mundo», franciscanamente o amou, em busca da unidade onde se reintegra todo o disperso.

[...] morre e ultrapassa-te, integra-te e prossegue! ... Pois não há outro caminho para quem procura conjugar as vias do exterior e do interior numa única direcção do ser.

E, tal como em Camões e Pessoa, a ilha simbolizou aí o termo da errância pessoal e colectiva, na harmoniosa superação das contradições e dilaceramentos que marcaram o percurso:

Suave, doce, lânguida ilha
Aberta como flor na distância do mar,
[...] Atende, espera! ... Minha alma suspensa
Em ti respira - corola do mar.

Ao caminhante que atravessou a pluralidade do real, ter-se-á finalmente revelado a Ilha dos Bem-Aventurados, como a

[...] um náufrago que as ondas arrojaram à praia
E acordou no paraíso.

Quando a inquirição acerca da nossa identidade como povo e Estado retoma o centro das nossas preocupações, face aos novos desafios que se nos levantam, o passamento de Ruy Cinatti alerta-nos para um testemunho que não terá sido suficientemente atendido.
Assim, e neste contexto, nos associamos ao voto de pesar oportunamente proposto pelo PRD.

Assembleia da República, 16 de Outubro de 1986. - O Deputado do PSD, Joaquim Domingues.

As REDACTORAS: Maria Leonor Ferreira - Ana Maria Marques da Cruz.

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PREÇO DESTE NÚMERO: 70$00

Depósito legal n. º 8818/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

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