Página 299
I Série - Número 12
Quarta-feira, 19 do Novembro de 1986
IV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1986-1987)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 18 DE NOVEMBRO DE 1986
Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral
Secretários: Exmos. Srs. Daniel Abílio Ferreira Bastos
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
Rui de Sá e Cunha
Jorge Manuel Lampreia Patrício
SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 25 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa de diversos diplomas, após o que foram aprovados os n.ºs 6, 7 e 8 do Diário.
Foram, depois, aprovados, três relatórios da Comissão de Regimento e Mandatos: um, não autorizando um Sr. Deputado do PS a prestar declarações em tribunal como testemunha; dois, autorizando um Sr. Deputado do PSD e dois do PS a prestar declarações em tribuna! como testemunhas; o terceiro, autorizando a Sr. º Deputada Maria Santos (Indep.) a exercer funções docentes a título gratuito.
Após a leitura do relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano pelo Sr. Deputado Ivo de Pinho (PRDJ, relativo às Grandes Opções do Plano para 1987 (proposta de lei n. º 43/IVJ e proposto de lei n. º 44/IV (Orçamento de Estado para 1987), foi lido e discutido um oficio da mesma Comissão, propondo que o debate da primeira proposta de lei não versasse a porte das Grandes Opções do Plano para 1987-1990. Intervieram nesse debate, a diverso título, além do Sr. Ministro de Estado (Eurico de Melo), os Srs. Deputados Ferraz de Abreu (PS), António Capucho (PSD), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Carlos Brito (PCP), Lopes Cardoso e Jorge Lacão (PS), José Carlos Vasconcelos (PRDJ e Nogueira de Brito e Gomes de Pinho (CDS), tendo sido, finalmente, aprovado um projecto de deliberação, apresentado pelo CDS, no sentido atrás referido no ofício da Comissão.
Iniciou-se, então, o debate dos propostas de lei, sobre o qual intervieram, a diverso título, além dos Srs. Ministros das Finanças (Miguel Codilhe), do Plano e Administração do Território (Valente Oliveira) e da Defesa Nacional/Leonardo Ribeiro de Almeida), os Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Carlos Brito (PCP), Nogueira de Brito (CDS), Octávio Teixeira (PCP), Cristina Albuquerque (PRDJ, Raul Castro (MDP/CDE), Carlos Carvalhas (PCP), Gomes de Almeida (CDS), José Seabra (PRD), José Manuel Tengarrinha (MDP/CDE), Ilda Figueiredo e Rogério de Brito (PCP), José Passinhos (PRD), João Amaral (PCP), Vasco Marques (PRDJ, Andrade Pereira (CDS), João Cravinho (PS), Soares Cruz (CDS), Helena Torres Marques, Domingos Azevedo, António Guterres e Miranda Calha (PS), Silva Lopes (PRD), Alípio Dias, Silva Marques e Próspero Luís (PSD), Ivo de Pinho (PRDJ, Lopes Cardoso e Eduardo Pereira/PS), Maria Santos/Indep.), Cavaleiro Brandão (CDS), Rui Machete (PSDJ, Gomes de Pinho (CDS) e Barros Madeira (PS).
0 Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 25 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio Gaspar Rodrigues.
Alberto Monteiro Araújo.
Alípio Pereira Dias.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
António d'Orey Capucho.
António Manuel Lopes Tavares.
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Pinto.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Próspero Luís.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Mendes Costa.
Francisco Rodrigues Porto.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
João Domingos Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
Página 300
300 I SÉRIE - NÚMERO 12
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
José de Almeida Cesário.
José Filipe de Atayde Carvalhosa.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Bota.
José Olavo Rodrigues da Silva.
José Pereira Lopes.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares de Lima.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Agostinho de Jesus Domingues.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
Américo Albino Silva Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Miguel Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
Helena Torres Marques.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Jorge Lacão Costa.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonel de Sousa Fadigas.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António João Percheiro dos Santos.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo de Paiva Campos.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
João Barros Madeira.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José da Silva Lopes.
Maria Cristina Albuquerque.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Rui de Sá e Cunha.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço da Silva.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Bento Aniceto Calado.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Estevão Correia da Cruz.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel dos Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Luís Manuel Loureiro Roque..
Maria lida da Costa Figueiredo.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Centro Democrático Social (CDS):
António Filipe Neiva Correia.
António José Tomás Gomes de Pinho.
António Vasco Mello César Menezes.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Henrique Manuel Soares Cruz.
José Luís Nogueira de Brito.
José Maria Andrade Pereira.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Manuel do Carmo Tengarrinha.
Raul Fernando Morais e Castro.
Deputados independentes:
António José Borges de Carvalho.
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Maria Amélia Mota Santos.
Página 301
19 DE NOVEMBRO DE 1986 301
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 259/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Raúl Junqueiro, do PS, sobre a criação da vila do Caramulo, o qual foi admitido e baixou à 10.º Comissão; projecto de lei n.º 296/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Rogério Moreira e outros, do PCP, sobre garantia do direito de associação dos jovens com menos de 18 anos, o qual foi admitido e baixou à 13.º Comissão; proposta de
resolução n.º 6/IV, da iniciativa do Governo, que aprova, para adesão, o Tratado da Comunidade Ibero-Americana de Segurança Social, assinado pelos Governos dos países que integram a área de acção da Organização Ibero-Americana de Segurança Social, em 17 de Março de 1982, na cidade de Quito, a qual foi admitida, tendo baixado à 8. º Comissão, e a proposta de lei n.º 46/IV, da iniciativa do Governo, que autoriza o Governo a continuar a execução dos programas
de reequipamento das Forças Armadas, a qual foi igualmente admitida, baixando à 7.º Comissão.
O Sr. (Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.º5 6, 7 e 8 do Diário, respeitantes às sessões plenárias de 30 e de 31 de Outubro e de 6 de
Novembro de 1986.
Estão em reclamação, Srs. Deputados.
Pausa.
Visto não haver quaisquer reclamações, dou como aprovados os referidos Diários da Assembleia da República.
O Sr. Secretário vai, de seguida, proceder à leitura de três pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos, sendo o primeiro o que se segue.
O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - Em referência ao ofício n.º 786/86, e na continuidade do ofício n.º 534/86 - processo n.º 168/83 - 2.º Secção, do
2.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Torres Vedras, de 6 de Junho passado, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado Alberto Manuel Avelino, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de não autorizar o referido Sr. Deputado a ser ouvido como testemunha no processo acima referenciado.
O Sr. Presidente: - Está em discussão, Srs. Deputados.
Pausa.
Visto não haver quaisquer inscrições, vamos proceder à votação deste parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai ler o segundo dos referidos pareceres.
O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - De acordo com o solicitado no ofício n.º 48 816 processo n.º 6941/86
4.ª Secção, da Directoria da Polícia Judiciária de Lisboa, de 8 de Agosto passado, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acerca dos Srs. Deputados Ruí Manuel P. Chancerelle de Machete, António de Almeida Santos e António Poppe Lopes Cardoso, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão decidiu emitir parecer no sentido de autorizar os referidos Srs. Deputados a serem ouvidos como testemunhas no processo referenciado.
O Sr. Presidente: - Está em apreciação, Srs. Deputados.
Visto não haver inscrições, vou submeter este parecer à vossa votação.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Presidente: - De seguida, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do último dos citados pareceres.
O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - A Sr.ª Deputada Maria Amélia do Carmo M. Santos, independente do Partido Os Verdes, veio requerer autorização, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 19.º da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), para exercer funções docentes na Escola Superior de Educação de Setúbal, a título gratuito.
Como resulta da disposição legal invocada, o exercício das funções docentes do ensino superior, quando celebradas a título gratuito, não é considerado exercício da função pública para efeito do disposto no n.º 1 do citado artigo 19.º, que fixa o regime das incompatibilidades dos deputados que sejam funcionários do Estado.
A Escola Superior de Educação de Setúbal é um estabelecimento de ensino superior.
Assim, a Comissão de Regimento e Mandatos entende que deve ser dada autorização para que a Sr.ª Deputada Maria Santos exerça, em regime de gratuitidade, as funções docentes naquela Escola Superior de Educação de Setúbal.
O Sr. Presidente: - Está em discussão, Srs. Deputados.
Pausa.
Em virtude de não haver quaisquer inscrições, vamos proceder à votação deste último parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar na segunda parte da ordem de trabalhos, com o início da discussão, na generalidade, das propostas de lei n.º5 43/IV e 44/IV, respectivamente das Grandes Opções do Plano e Orçamento do Estado para 1987.
Para introduzir o tema, peço ao Sr. Deputado Ivo Pinho o favor de ler o relatório da subcomissão mandatada para apreciar as propostas de lei sobre as Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1987.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
Página 302
302 I SÉRIE-NÚMERO 12
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, gostaria de saber se V. Ex.ª tem alguma informação sobre as razões da ausência do Governo no início do debate.
O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado, pois julgava até que o Governo já estava presente.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Então penso que seria cordial que se aguardassem uns momentos.
O Sr. Presidente: - Sem dúvida, Sr. Deputado. Vamos então aguardar uns momentos.
Pausa.
Srs. Deputados, visto que o Governo já se encontra presente, dou a palavra ao Sr. Deputado Ivo Pinho, a fim de que proceda à leitura do referido relatório.
O Sr. Ivo Pinho (PRD): - Relatório da subcomissão mandatada para apreciar as propostas das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1987.
I - O enquadramento macroeconómico das GOPs e do Orçamento do Estado para 9987
I - O enquadramento macroeconómico das GOPs e do Orçamento do Estado para 1987:
2 - As projecções e a política macroeconómico apresentadas no documento GOPs
9 - Introdução
O presente capítulo tem por objectivo analisar as propostas do Governo relativas ao enquadramento macroeconómico das Grandes Opções do Plano e do Orçamento para 1987.
A análise apresentada baseia-se fundamentalmente:
a) No documento que o Governo intitulou «Complemento Relativo às Grandes Opções do Plano para 1987, inserido no Quadro das Grandes Opções do Plano de Médio Prazo (1987-1990)». Esse documento é referido em tudo o que segue como «documento das GOPs para 1987»;
b) No relatório da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1987;
c) Em elementos e informações fornecidos nas reuniões da Comissão de Economia, Finanças e Plano com membros do Governo.
No presente capítulo não se levou em conta o documento intitulado «Grandes Opções do Plano para 1987-1990 e Grandes Opções para 1987» em virtude de:
A Comissão de Economia, Finanças e Plano, tendo em vista o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, ser da opinião, já aprovada em Plenário, de que a análise das Grandes Opções do Plano a Médio Prazo para 1987-1990 deve ser feita separadamente da das Grandes Opções do Plano para 1987;
De no documento «Grandes Opções do Plano para 1987-1990 e Grandes Opções para 1987» não haver nenhuma referência a objectivos ou actuações respeitantes, especificamente, ao ano de 1987, salvo em dois mapas intitulados «Despesa interna» e «Balança de transacções correntes», que também aparecem reproduzidos no relatório da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1987 e no documento das GOPs para 1987.
De acordo com as informações proporcionadas pelo Governo, a evolução da conjuntura económica para 1987 será caracterizada essencialmente por:
Crescimento do volume do PIB a uma taxa próxima da do ano corrente: este crescimento será dinamizado, sobretudo, pela procura interna (principalmente o investimento) e será acompanhado pelo afrouxamento do ritmo de aumento das importações;
Continuação da baixa da taxa de inflação, de aproximadamente 12 % em 1986 para 9 % no próximo ano;
Redução do superavit da balança de transacções correntes de cerca de 1100 milhões de dólares em 1986 para, aproximadamente, 600 milhões de dólares em 1987.
O relatório do Governo quase nada diz sobre as políticas que tenciona vir a pôr em prática para tentar conseguir a realização dos resultados programados. Não explica, por exemplo, que medidas ou que condicionalismos é que provocarão a aceleração projectada no ritmo de crescimento das exportações ou a expansão mais lenta do consumo privado.
Além disso, no texto das propostas das GOPs para 1987 não há quaisquer explicações ou orientações concretas sobre as políticas que o Governo pretenderá aplicar para corrigir os desequilíbrios estruturais na agricultura, na indústria, nas assimetrias regionais, nas finanças públicas, etc. Tudo o que se diz a esse respeito contém-se em três linhas, onde se aponta «que as opções de reforço da economia, combate ao desemprego, valorização dos recursos humanos e ordenamento do território abrangem cerca de 83 % dos investimentos do P1DDAC». Não se explica, porém, quais são as ligações entre cada um dos programas do PIDDAC e os objectivos referidos.
Poderá argumentar-se que o documento das GOPs para 1987 não contém nada sobre políticas de correcção dos desequilíbrios estruturais porque, essas políticas são tratadas na proposta de Grandes Opções do plano a Médio Prazo 1987-1990. Porém, essa proposta não contém indicações suficientemente precisas sobre a política económica que o Governo tenciona pôr em prática no próximo ano. Tudo o que nela se apresenta são objectivos muito genéricos, sem quaisquer referências concretas ao ano de 1987 e sem indicações suficientemente claras e precisas sobre os instrumentos e programas necessários para realizar os objectivos anunciados.
O documento das Grandes Opções do Plano para 1987 consagra apenas cinco páginas à política macroeconómica. Essas cinco páginas limitam-se a apresentar:
a) Dois quadros com estimativas para 1986 e projecções para 1987 das variações do volume e dos preços dos componentes da despesa global e do produto interno bruto e dos valores em dólares americanos das principais componentes da balança de transacções correntes;
b) A descrição dos dois quadros referidos na alínea anterior;
c) Duas páginas e meia com referências muito vagas, e nem sempre inteiramente consistentes, à política monetária, à política cambial, à política de rendimentos e à política de emprego.
Página 303
19 DE NOVEMBRO DE 1986 303
Nas secções seguintes analisam-se as indicações apresentadas na proposta das GOPs para 1987 relativas:
Às estimativas e projecções macroeconómicas do produto interno bruto, da despesa global e da balança de transacções correntes;
À evolução prevista para a inflação;
Às políticas monetária, cambial, de emprego, de rendimentos e de redução da inflação.
3 - Produto interno bruto e componentes da procura global
O crescimento do volume do PIB em 1986, estimado em 3,9%, não é muito superior ao que se registou em 1985 (3,3 %). Para 1987, o Governo prevê a taxa de crescimento de 4 %, o que corresponde a manter o mesmo ritmo do ano corrente.
º A projecção do PIB é o resultado da agregação das várias componentes da procura global. Interessa, por isso, analisar cada uma dessas componentes separadamente.
Consumo privado
Segundo o Governo, o consumo privado terá aumentado, em volume, 4,5 % no ano corrente, mas o seu crescimento virá a desacelerar para 3,4 % em 1987.
O documento das GOPs não apresenta qualquer explicação nem para a estimativa de 1986 nem para a desaceleração prevista para 1987.
Em face de informações dispersas sobre a evolução dos salários e pensões e sobre a fiscalidade, tem-se estimado que o rendimento disponível aumentará, pelo menos, 7 % em 1986, em termos reais. Essa estimativa e alguns indicadores parciais sobre o consumo (vendas de veículos automóveis e de gasolina, vendas a retalho, etc.) apontam para um crescimento do consumo privado provavelmente superior a 5 %, em vez dos 4,5 % apontados pelo Governo. O Governo forneceu explicações verbais para justificar a sua projecção, indicando que conta com um grande acréscimo da poupança dos particulares. É, porém, duvidoso que a melhoria da poupança tenha atingido proporções compatíveis com a taxa de crescimento estimada para o consumo privado.
Considera-se provável que, no próximo ano, a expansão em volume do consumo privado venha também a aproximar-se mais da taxa de 5 % do que da de 3,4 % apontada na projecção do Governo. Não se descortinam razões válidas para a desaceleração que o Governo prevê. $ de esperar que em 1987 o rendimento disponível continuará a subir significativamente, em termos reais.
Além disso, os efeitos da melhoria do rendimento disponível no ano corrente prolongar-se-ão por certo no ano próximo, em virtude do desfasamento entre os aumentos do rendimento e os aumentos por eles induzidos no consumo.
Consumo público
O Governo prevê o aumento do consumo público, em termos reais, à taxa de 1 %, tanto em 1986 como em 1987. É normal que haja uma significativa margem de imprecisão nesta área, principalmente por causa de dificuldades na determinação rigorosa do deflacionador a utilizar. Em qualquer caso, há indicações de que
em 1986 houve uma mais efectiva disciplina do consumo público do que em anos anteriores. Na projecção para 1987 não se entra em conta, por razões de técnica de contabilidade nacional, com o efeito da compra das fragatas. Se esse efeito fosse tido em consideração, encontrar-se-ia uma taxa de acréscimo do consumo público provavelmente superior a 5 %, em termos reais.
Formação bruta do capital fixo
Há ainda uma margem apreciável de incerteza sobre a evolução do investimento bruto em 1986. Nas Grandes Opções do Plano para 1986 o Governo havia previsto um acréscimo em volume da formação bruta de capital fixo de 10%. O Governo prevê agora que aquele crescimento será de 9%. Outras estimativas apontam para 801o ou até 701'o.
Para a projecção inicial de 10 % de crescimento da FBCF em 1986, o Governo admitia uma evolução de 20% no sector público administrativo, de 2% no sector empresarial do Estado e de 10 % no sector privado. Não obstante a carência de informação sobre a evolução do investimento por sectores institucionais, o facto de a execução financeira do investimento do sector público administrativo se dever situar abaixo dos 80% sugere que a evolução do investimento do sector privado deverá ter tido peso essencial na dificuldade em atingir a meta dos 10 % inicialmente previstos. Para 1987 o Governo projecta um crescimento real de 9,5 %, mas parece mais razoável prever que se ficará próximo dos 8,5 %. Embora o Governo não tenha fornecido este ano uma previsão da evolução da FBCF por sectores institucionais, os elementos oficiais disponíveis mostram uma perspectiva de subida de 4 % mais no sector público administrativo. Por outro lado, a proposta orçamental de significativa redução das dotações de capital para o sector empresarial do Estado permite admitir uma previsão de evolução do investimento neste sector, na melhor das hipóteses, da ordem de grandeza da inicialmente prevista para 1986 (2 %, em termos reais). Daí resulta que a subida de 9,5 % da FBCF prevista pelo Governo para 1987 depende, ainda mais fortemente que em 1986, de uma elevada taxa de crescimento do investimento do sector privado (da ordem dos 12 % a 13 % em termos reais). Em qualquer caso, será razoável projectar uma taxa relativamente elevada de expansão do investimento bruto, em face da recuperação acentuada que começou a verificar-se no mercado de habitação, do comportamento recente e projectado do investimento público, da expansão da procura interna e da apreciável melhoria que tem estado a registar-se nas taxas de rentabilidade das empresas. Muito dependerá, contudo, da evolução que vier a verificar-se nas taxas de juro.
Exportações
Durante o 1.º trimestre de 1986 o comportamento das exportações foi pouco animador. Posteriormente, houve melhorias significativas nesse comportamento. É ainda extremamente difícil apresentar, na base das informações disponíveis, uma estimativa sobre a taxa de crescimento que, de facto, se conseguirá para a totalidade do ano de 1986.
A estimativa do Governo de um crescimento em volume de 4,5 % parece razoável. Esta taxa deverá ser confrontada com as estimativas de aumentos, durante
Página 304
304 I SÉRIE-NÚMERO 12
o ano em curso, de 7,5 % e 6,5 %o no volume das importações de mercadorias, respectivamente no conjunto dos países industrializados e nos países da CEE.
Segundo as projecções do Governo, o ritmo de crescimento das exportações subirá para 5 % no próximo ano. Na falta de quaisquer justificações, fica-se, todavia, com dúvidas de que essa projecção seja realista. Prevê-se actualmente que a taxa de expansão da procura mundial de importações cairá de 7,5 07o para 5 % e que o ritmo de crescimento das importações da CEE se manterá à volta de 6,5 %, como no ano corrente. Não é, assim, nos factores externos que se espera encontrar o impulso para um crescimento mais rápido das vendas portuguesas ao exterior. Não é de antever também uma grande inflexão nos factores de ordem interna. Por um lado, a pressão da procura interna continuará, por certo, a fazer-se sentir com razoável intensidade. Por outro lado, embora as intenções anunciadas pelo Governo em matéria de política cambial não sejam nada claras, parece muito improvável que essa política venha a proporcionar um substancial estímulo às exportações.
Importações
O Governo estima que em 1986 o aumento do volume das importações virá a atingir 10,5 %. Todavia, neste caso também não são apresentadas quaisquer explicações para a subida tão significativa que é estimada. Segundo outras estimativas, o crescimento das importações em 1986 terá sido ainda mais acelerado: terá atingido cerca de 12 %. É provável que os principais factores desta subida acelerada tenham sido o comportamento dos preços relativos (uma vez que os preços dos bens importados parecem ter aumentado muito menos do que os dos bens de produção nacional), a expansão da procura interna (que terá ultrapassado 7,5 %) e a entrada na CEE (eliminação da sobretaxa sobre as importações, supressão das restrições à emissão de boletins de registo prévio de importações, etc.).
Segundo o Governo, a taxa de crescimento das importações cairá drasticamente para 6,5 % no próximo ano. Como em tudo o resto, o documento das GOPs não apresenta qualquer justificação para essa projecção. O Governo apresentou posteriormente uma explicação, em que argumenta que a subida das importações em 1986 foi devida a uma retoma de atrasos acumulados em anos anteriores e que esse fenómeno não se repetirá em 1987. Ela afigura-se, porém, pouco credível. Prevê-se que a procura interna continuará a subir a ritmo acelerado (provavelmente a uma taxa próxima de 5 %). Além disso, é de admitir que a política cambial não contribuirá muito para inverter a tendência de evolução desfavorável dos preços relativos da produção interna em relação aos da importação. Em tais condições, não se descortinam razões para esperar uma queda de, pelo menos, quatro pontos de percentagem na taxa de crescimento das importações.
4 - Emprego
A única referência ao emprego no documento das GOPs para 1987 é a da frase onde se diz no crescimento do emprego estará sempre dependente do comportamento salarial».
O Governo forneceu, todavia, a pedido da Comissão de Economia, Finanças e Plano, informações suplementares sobre emprego. Nelas se indica que o crescimento da produção, tanto em 1986 como em 1987, se fará essencialmente à custa de ganhos de produtividade e que se considerou uma contribuição nula do sector público administrativo na criação de postos de trabalho. Indica-se também que o emprego terá crescido 0,5 % em 1986 e que aumentará de 0,6 % a 0,8 % no próximo ano. Com essa evolução estima-se que a taxa de desemprego passará de 10 % em 1986 para 9,7 % a 9,8 % em 1987.
Não foram, porém, fornecidas quaisquer indicações sobre as políticas especificas na área do emprego aplicadas em 1986 ou projectadas para 1987 (organização do mercado de trabalho, subsídios de desemprego, formação profissional, etc.).
5 - Inflação
A taxa de inflação, medida pelo índice de preços no consumidor sem habitação, desceu, em termos de médias anuais, de 19,3 % em 1985 para um valor estimado à volta de 12 % em 1986. Para 1987 o Governo prevê uma nova descida da taxa de inflação para cerca de 8,5 % (o que corresponde a um aumento dos preços de 7 % entre Dezembro de 1986 e Dezembro de 1987).
A substancial baixa da inflação registada no ano corrente foi devida essencialmente à influência dos preços de importação. De facto, segundo os elementos apresentados no documento das GOPs para 1987, o deflacionador da procura total (11,2%) resultou da combinação entre o deflacionador de - 4 % para os preços da importação e o de 18 % para o produto interno bruto.
Acresce ainda que o deflacionador do produto interno bruto teria, por certo, sido mais elevado se os preços internacionais não tivessem baixado, por causa da queda dos preços do petróleo e de outros produtos primários e da desvalorização do dólar. De facto, sem a baixa dos preços internacionais, o índice de preços no consumidor teria subido mais. Em consequência, terá sido necessário que os aumentos salariais fossem mais elevados e que o ritmo da desvalorização cambial fosse mais acentuado.
Não parece que os factores internos de controle da inflação tenham tido grande peso. A política de procura global e, nomeadamente, a política monetária não foram de molde a combater a inflação, antes pelo contrário. Basta referir que em Agosto último o stock de activos financeiros líquidos totais (L) apresentava um crescimento de 23,5 % relativamente ao período homólogo do ano anterior e que o stock de M1 evidenciava uma subida de 34 % sobre o nível de doze meses antes.
O Governo tem posto grande ênfase na influência das expectativas de redução da inflação sobre o comportamento dos agentes económicos. Todavia, aparentemente, essa influência ter-se-á feito sentir apenas na evolução dos salários e na programação do crawling peg. Mas, como acima se refere, é de crer que a subida dos salários e do ritmo da desvalorização cambial teria sido significativamente mais acentuada se da baixa dos preços internacionais dos produtos importados não tivesse resultado um forte impacte desacelerador da inflação interna.
Página 305
19 DE NOVEMBRO DE 1986 305
À luz destas considerações, será difícil antever que a inflação continue a cair tanto como o Governo anuncia. O dólar já não baixará, por certo, muito mais. As
previsões sobre a evolução dos preços do comércio mundial apontam para uma subida de 1,4% em 1987, em termos de SDRs (direitos especiais de saque), após
uma descida de 9,3 % no corrente ano. O próprio Governo indica nas suas projecções que os preços, em escudos, das importações subirão a 10,5 %. Com essa
evolução, prevista para os preços das importações, não será possível atingir o objectivo do Governo para a taxa de inflação interna, a não ser que o deflacionador do PIB aumente apenas 8,6%.
Que razões farão esperar que o deflacionador do PIB caia bruscamente de 18 % no ano corrente para 8,6 % no próximo ano? O comportamento dos salários, tendo em vista os acordos estabelecidos no Conselho de Consertação Social, pode contribuir para a redução desse deflacionador, mas será extremamente difícil que, só por si, ele venha a bastar. Com o excesso de liquidez criado pela política monetária do ano corrente, será difícil esperar que a evolução das margens de lucro venha a ser compatível com os objectivos anunciados pelo Governo em matéria de inflação. E se começar a ficar claro esses objectivos não virão a ser atingidos, os sindicatos não deixarão de exercer pressões para saírem da trajectória de evolução salarial inicialmente considerada. O Governo tem, é claro, possibilidades de ir actuando sobre a inflação através da política cambial e dos preços controlados (nomeadamente preços dos principais produtos alimentares e preços das empresas públicas). Mas se tiver de o fazer em larga escala e durante muito tempo, acabaria por criar desequilíbrios nas contas externas, nas finanças públicas e na situação das empresas, que se tornariam insuportáveis ao fim de algum tempo.
Por tudo isto se conclui que a meta do Governo em matéria de inflação se afigura excessivamente ambiciosa e não parece nada compatível com a política monetária que tem estado a ser aplicada.
6 - Balança de pagamentos
Na proposta de lei do Orçamento para 1986, o Governo previa, inicialmente, que a balança de transacções correntes apresentaria, no corrente ano, um défice de 700 milhões de dólares. Posteriormente, o Governo alterou essa previsão para um défice de 300 milhões de dólares. No seu parecer sobre a mesma proposta de lei de orçamento, a Comissão de Economia, Finanças e Plano estimou que se conseguiria um superavit de 600 milhões de dólares. No relatório da proposta do Orçamento para 1987, o Governo estima agora que a balança de transacções correntes do ano em curso apresentará um superavit de 1100 milhões de dólares. Está, porém, generalizada a opinião, baseada em dados já apurados, de que aquele superavit poderá vir a atingir 1800 milhões de dólares.
As diferenças entre todas estas estimativas são devidas sobretudo às dificuldades em prever as variações da balança de pagamentos nas circunstâncias actuais. Torna-se, apesar disso, evidente que o Governo, nas suas estimativas, tem subestimado substancialmente o saldo positivo da balança de transacções correntes.
No próximo ano haverá, segundo as projecções do Governo, uma redução do superavit da balança de transacções correntes para 600 milhões de dólares. Outras estimativas admitem que o referido superavit possa ser, pelo menos, da ordem de 1200 milhões de dólares. Em qualquer caso, o superavit, nas contas correntes externas, virá por certo a baixar.
7 - Política monetária
O relatório das GOPs nada diz sobre a evolução da oferta monetária em 1986 e, quanto à política monetária para 1987, limita-se a três parágrafos do texto que podem sintetizar-se como segue:
a) Procurará conseguir-se a desaceleração do crescimento da oferta monetária, incidindo privilegiadamente no agregado Ml;
b) A fim de se conter a expansão da oferta monetária, o crescimento do crédito a empresas e particulares até Dezembro de 1987 não deverá estar muito afastado da taxa de inflação que então vier a verificar-se (cerca de 7 %);
c) O crescimento do crédito a empresas e particulares referidos na alínea anterior não com prometerá o financiamento do sector produtivo, que em virtude das melhorias previstas em matéria de autofinanciamento das empresas e das maio
res possibilidades de recurso a financiamentos através do mercado de capitais;
d) A política das taxas de juro procurará o equilíbrio entre a desejável diminuição dos encargos financeiros das empresas e a necessidade de
manter o nível adequado de remuneração da poupança e de não criar grandes desequilíbrios entre a oferta e a procura de crédito.
No relatório da proposta de lei orçamental acrescentam-se indicações sobre as taxas de crescimento dos principais agregados monetários.
A informação fornecida é nitidamente insuficiente para se poder fazer um juízo sobre a política monetária que o Governo se propõe seguir.
1 - Não foram fornecidos dados que permitam avaliar da composição projectada dos activos líquidos totais (L). Diz-se, por exemplo, que o controle da expansão da oferta monetária incidirá especialmente sobre M1, mas não se apresentam quaisquer indicações numéricas a esse respeito.
2 - É possível que o objectivo de crescimento dos activos líquidos totais em 15 % a 16 %, apontado no relatório da proposta de lei orçamental, seja razoável em face do crescimento programado do PIB, em termos nominais, de cerca de 13%. A projecção do Governo assenta no pressuposto de que, à semelhança do que tem acontecido em anos recentes, haverá uma ligeira melhoria da procura de activos líquidos em relação ao PIB, ou, por outras palavras, uma ligeira redução da velocidade - rendimento desses activos. Neste domínio o grau de incerteza é, porém, muito elevado, como, aliás, se reconhece no relatório da Proposta do Orçamento. Será de acrecentar que:
O desenvolvimento da procura de títulos no mercado de capitais (acções e obrigações) pode levar os agentes económicos a reduzir a sua procura de depósitos a prazo (contribuindo assim para o aumento da velocidade - rendimento da moeda);
Segundo os elementos disponíveis, a oferta de activos líquidos aumentou com grande rapidez, em 1986, à volta de 23 %. Esse crescimento, quando
Página 306
306 I SÉRIE-NÚMERO 12
comparado com a subida do nível de preços de 12%, leva a admitir, mesmo atendendo a que o nível do PIB subiu cerca de 4 %, que a expansão da liquidez tenha sido excessiva para permitir a baixa de inflação nos termos anunciados pelo Governo. Sobre esse aspecto, mais preocupante ainda tem sido o aumento de M1, que, em Setembro passado, se situava 36 % acima do valor homólogo de 1985. É verdade que esse aumento, anormalmente elevado, se deve, em parte, a factores estruturais (principalmente as dificuldades que um crescente número de bancos tem vindo a levantar à aceitação de depósitos a prazo). Apesar disso, permanecem fortíssimos indícios de que os saldos de liquidez nas mãos dos agentes económicos privados se tornaram super-abundantes. Se o ajustamento desses saldos para níveis mais normais se vier a fazer no futuro próximo, surgirão riscos de recrudescimento da inflação.
3 - Explica-se na secção relativa ao financiamento do sector público administrativo que, de acordo com a programação orçamental estabelecida, o crédito interno líquido a esse sector deverá aumentar cerca de 520 milhões de contos no decurso do próximo ano. Uma parte importante deste total será financiada através de instrumentos colocados fora do sistema bancário: títulos de dívida pública a médio e longo prazo e certificados de aforro. A aquisição desses instrumentos reflectir-se-á, porém, sobre a procura de liquidez total (L): é natural, por exemplo, que um aforrador que compra títulos a médio e longo prazo o faça, em parte, à custa da sua procura de bilhetes do Tesouro. Nestas circunstâncias, faz sentido considerar que a taxa de expansão para a liquidez total (L), projectada em 15 % a 16 %, deverá proporcionar os meios necessários para cobrir a totalidade do aumento do crédito interno líquido ao sector público administrativo, além das necessidades de financiamento das empresas e particulares. Simplesmente, o crescimento possível para o crédito a empresas e particulares terá, nessas circunstâncias, de ser apenas da ordem de 7 % a 8.%, como, aliás, o Governo indica. A questão que se põe é a de se saber se tal crescimento será suficiente para satisfazer as necessidades de financiamento das empresas e particulares e para alimentar a expansão da formação bruta de capital fixo de 20,7 % em termos nominais, como o Governo prevê. Há fortes riscos de o referido crescimento ser nitidamente insuficiente. A ser assim, terá de concluir-se que, por causa do elevado défice das finanças públicas, haverá que enfrentar duas opções, ambas pouco atractivas:
Ou aumentar a liquidez mais do que os 15 % a 16,5 % indicados pelo Governo, com riscos de aceleração da inflação;
Ou limitar substancialmente a oferta de crédito ao sector privado, com riscos de travar a expansão do investimento.
Já no decurso do corrente ano essa opção se pôs, como foi assinalado no relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano, relativo à Proposta de Orçamento para 1986. O Governo optou essencialmente pela primeira alternativa, uma vez que, como atrás se referiu, o agregado (L) cresceu 23 %. Daí resultou que se poderá ter formado um excesso de liquidez. O crescimento do crédito a empresas e particulares não foi tão limitado como se prevê para o próximo ano.
O Governo confia em que, em 1987, o aperto no crédito a empresas e particulares não levantará grandes problemas. Essa confiança merece, porém, as maiores reservas. Não se pode contar tanto como no .ano corrente com a margem de autofinanciamento das empresas. De facto, em 1986, o PIB terá aumentado, em termos nominais, de cerca de 22 % e para o ano aumentará de 13 %. A massa salarial aumentou cerca de 18 %, em 1986, e aumentará, por certo, pelo menos 13 % em 1987. Destes números e dos dados sobre a composição do rendimento nacional deduz-se que o excedente bruto da exploração terá aumentado cerca de 20 % em 1986 e só aumentará à volta de 12 % em 1987. Mesmo considerando o efeito da baixa das taxas de juro, torna-se duvidoso que a margem de autofinanciamento das empresas, combinada com um crescimento do crédito interno da ordem dos 7 %, seja bastante para financiar uma subida do PIB em 13 %o e uma expansão da formação bruta de capital fixo de 20,7 %.
4 - As indicações fornecidas no documento do Governo sobre a política das taxas de juro são muito pouca claras. Por outro lado, promete-se uma diminuição dos encargos financeiros das empresas, o que pressupõe a diminuição das referidas taxas. Não se explica, porém, se se trata de uma diminuição em termos nominais ou reais. É perfeitamente natural que se espere uma diminuição em termos nominais, em face da desaceleração da inflação. Mas para que a redução dos encargos financeiros sobre as empresas seja verdadeiramente efectiva, seria necessário que baixassem também as taxas de juro reais, que nos últimos meses têm sido pesadas, se medidas em relação à inflação esperada pelo Governo.
Por outro lado, o relatório das GOPs fala da necessidade de manter o nível adequado da poupança e de não criar grandes desequilíbrios entre a oferta e a procura da moeda, o que aponta para a manutenção de taxas de juro elevadas em termos reais.
Deste modo, as orientações apontadas para a política das taxas de juro no relatório das GOPs estão em conflito entre si. A conciliação dessas orientações será, por certo, muito mais difícil do que os textos governamentais podem fazer supor.
8 - A política cambial
As indicações sobre a política cambial, contidas no documento das GOPs, limitam-se a três parágrafos e são um resumo do que se expõe no n.º 12 do Relatório Geral do Orçamento de Estado para 1987.
Começa por se dizer que «a política cambial será gerida de molde a não contrariar objectivos para a taxa de câmbio compatíveis com os objectivos plurianuais para a inflação [...]». Acrescenta-se depois que «a política cambial não deverá constituir um elemento de proteccionismo da indústria nacional, desincentivador na procura de outros factores de competividade, com realce para os aumentos de produtividade». Finalmente, indica-se que «a política da taxa de câmbio deverá assegurar a manutenção de níveis adequados dos preços relativos dos bens transaccionáveis e não deterioração das margens na exportação».
As duas primeiras destas indicações estão em aparente contradição com a terceira. Não se sabe se o que o Governo quer dizer é que a política cambial neutralizará as diferenças entre a evolução dos custos nomi-
Página 307
19 DE IV®VEMBRO DE 1986
nais nas indústrias de bens transaccionáveis em Portugal e nos principais países nossos concorrentes, tendo em atenção as diferenças de produtividade. Se esta for a interpretação válida, concluir-se-á que a política cambial terá a orientação geral que, de uma forma geral, tem sido seguida ao longo dos últimos anos, embora com algumas interrupções. Se a interpretação for a de que se dará maior atenção aos problemas criados pela política cambial à redução da inflação, terá de concluir-se que essa política não favorecerá a «manutenção de níveis adequados de preços relativos dos bens transaccionáveis».
Compreende-se que alguns anúncios pelo Governo, em matéria de política cambial, podem, em certas circunstâncias, ser desestabilizadores e provocar efeitos negativos. Não se deve fazer, por exemplo, o anúncio antecipado de uma desvalorização. Mas a indicação das grandes orientações a seguir na aplicação do crawling peg tem sido feita, por vezes, até com grande precisão. Essa indicação, quando consistente com outras políticas, é, aliás, desejável e útil para os agentes económicos. As orientações contraditórias fornecidas pelo Governo no documento das GOPs pouco ou nada esclarecem e podem criar confusão e insegurança naqueles agentes (especialmente os exportadores e os produtores sujeitos à concorrência estrangeira no mercado interno).
9 - Política de refmentos
Tudo o que no documento das GOPs para 1987 se fornece sobre política de rendimentos pode ser sintetizado nas frases onde se diz:
Que se admite para 1987 o crescimento dos salários reais;
Que as actualizações salariais deverão continuar a ser referenciadas pela inflação e produtividade esperadas;
Que o crescimento dos salários reais deve ser moderado, de modo que o preço relativo do factor trabalho não desincentive o investimento de maior utilidade social.
3®7
Não há explicações sobre a evolução dos salários em 1986 nem sobre a taxa de aumento médio ou máximo dos salários reais proposta pelo Governo como orientação para 1987.
90 - A política orçamental
À semelhança do que tem acontecido noutros anos, é praticamente impossível avaliar o impacto, macroeconómico global da política orçamentar proposta para 1987.
Como já se salientou no relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano para 1986, não basta analisar o Orçamento do Estado. É necessário considerar também os orçamentos dos outros subsectores do sector público administrativo, por onde passam proporções elevadas das despesas públicas e dos impostos pagos pelos contribuintes. Uma análise limitada a receitas e despesas do Orçamento do Estado dá uma ideia totalmente distorcida da evolução e do peso das poupanças públicas, até porque algumas receitas e despesas desse Orçamento apareciam, em 1986, em. fundos e serviços autónomos ou nas autarquias locais e porque têm também havido variações em sentido contrário.
Acontece ainda que os dados sobre os orçamentos e as contas do sector público administrativo têm sido frequentemente revistos. Por isso, as comparações feitas com base nesses dados perdem frequentemente a validade ao fim de algum tempo.
Nestas condições, a apreciação sobre as variações dos principais agregados das finanças do SPA prevista para 1987 tem de ser feita com bastantes reservas. Tais variações são marcadamente diferentes, conforme forem apuradas em relação ao Orçamento inicial para 1986, ao Orçamento revisto para esse mesmo ano ou a estimativa de execução orçamental, como se mostra nos seguintes dados:
Orçamento do SPA de 1987 em relação a:
Variações anuais em percentagens:
Receitas correntes .........................
Impostos directos e cont. Segurança Social ...............................
Impostos indirectos ....................................................
Receitas totais ..... Despesas correntes .
Bens e serviços ........................................................
Subsídios a empresas ...................................................
Juros da dívida pública ................................................
Transferências correntes ................................................
Despesas de capital ........................................................
Despesastotais............................................................
Orçamento Orçamento
inicial revisto
de 1986 de 1986
12,2 13
12,8 13,5
16,9 14,8
12,4 13,4
5,8 7,8
6,3 15
- 12,7 - 12,7
- 0,6 0,6
16,1 12,3
23,1 13,3
8 8,6
Estimativa da execução orçamental de 1986
8,5 11,8
2,9
8,8 9,5
17,3 - 22,5
6,2
15,1
17,8
10,6
De entre estas taxas, as mais significativas são, sem dúvida, as que se referem à comparação entre os valores orçamentados para 1987 e a estimativa da execução orçamental em 1986. As estimativas da execução orçamentar em 1986 serão ainda, por certo, sujeitas a revisões consideráveis, mas fornecem indicações bastante
mais significativas que as dotações orçamentais iniciais ou revistas para esse ano. De facto, sabe-se já que a cobrança das receitas em 1986 excederá substancialmente as verbas orçamentadas, sobretudo no IVA e no imposto de produtos petrolíferos. Por outro lado, as despesas com juros da dívida pública ficarão significa-
Página 308
308 I SÉRIE-NÚMERO 12
tivamente aquém da dotação orçamental. Por isso, não fará sentido estar a estabelecer comparações com previsões orçamentais que hoje se sabe estarem largamente desactualizadas.
O Governo argumenta que, em 1987, a execução orçamental também ficará aquém dos valores orçamentados. Não há, porém, nenhuma garantia de que isso suceda, até porque não se poderá contar na mesma medida com os factores favoráveis que em 1986 actuaram no sentido da redução do défice em relação ao nível orçamental (baixa dos preços do petróleo, baixa das taxas de juro e suborçamentação das receitas do IVA).
Considerando a comparação entre os valores orçamentados para 1987 e as estimativas de execução em 1987, chega-se, não obstante as apreciáveis margens de imprecisão que não será possível remover, a algumas conclusões dignas de atenção:
a) Está previsto que os impostos indirectos subam 2,9 %; esta projecção está certamente errada; o Governo ainda não forneceu explicações para as dúvidas que lhe foram levantadas, a esse respeito;
b) O aumento extremamente elevado das despesas de bens e serviços em mais de -17 % não parece compatível com a expansão do consumo público em 1 %, em termos reais, como é previsto nas projecções macroeconómicas do Governo; é possível que a divergência seja, em grande parte, devida aos pagamentos relativos à aquisição de fragatas, mas, mesmo assim, não é de excluir que também haja erros;
O aumento substancial das transferências correntes será explicado, essencialmente, pelos ajustamentos que o Governo introduziu no nível das pensões da Segurança Social; falta saber se esse aumento será suficiente para acomodar tais ajustamentos;
d) A proporção do défice do SPA em relação ao PIB poderá, com probabilidade elevada, vir a subir no próximo ano, em vez de descer, como o Governo tem anunciado; o défice orçamentado para 1987 corresponde a 9,7 % do PIB, ao passo que a percentagem equivalente, calculada a partir das estimativas actuais da execução orçamental de 1986, é de 9,3 %; acresce que na Proposta de Orçamento para 1987 faltam, pelo menos, as despesas com contribuições para a CEE.
11 - Financiamento do défice do SPA
As necessidades brutas de financiamento do Estado para 1987 são estimadas pelo Governo em 616 milhões de contos (181,6 milhões de amortização da dívida e 434,5 milhões de financiamento do défice). Para satisfazer essas necessidades, o Governo solicita, na proposta de lei orçamental, autorizações para:
a) Contrair empréstimos internos até perfazer um acréscimo de endividamento directo interno de 383 milhões de contos (artigo 3.º); b) Contrair empréstimos externos até perfazer um acréscimo de endividamento directo total, no
exterior, equivalente a 300 milhões de dólares americanos (cerca de 51 milhões de contos à taxa de câmbio projectada de 170$ por dólar), em termos de fluxos líquidos (artigo 4.º, n.º 1).
Além disso, na mesma proposta, o Governo solicita autorizações:
a) Para contrair empréstimos internos até ao limite de 80 milhões de contos, para financiar empréstimos e outras operações activas do Tesouro (artigo 8.º);
ó) Para contrair empréstimos externos junto do Banco Europeu de Investimentos e do Banco Mundial até ao montante de 150 milhões de ECUs em cada uma das instituições e junto do Fonds de Rétablissement du Conseil de l'Europe, até ao montante de 100 milhões de dólares; o montante desses empréstimos destinar-se-á a financiar entidades incumbidas de execução de projectos diversos (artigo 4.º, n.º5 3 a 5);
c) Para serem contraídos empréstimos internos pelos governos das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, até ao limite de 15 milhões de contos (artigo 3.º, n.º 7).
Os mapas elaborados pelo Governo relativos ao Orçamento consolidado do sector público administrativo para 1987 apontam para défices previstos de:
4,3 milhões de contos nos serviços autónomos; 7,1 milhões de contos nos fundos autónomos; 30 milhões de contos na Segurança Social.
O relatório da proposta de lei orçamental não faz qualquer referência a estes défices nem ao seu modo de financiamento.
O previsto recurso do Estado ao crédito externo não parece muito necessário, em face das projecções de um superavit para a balança de transacções correntes durante o próximo ano. Admite-se, porém, embora essa explicação não apareça na documentação fornecida pelo Governo, que tal recurso seja justificado pela conveniência de criar uma margem de manobra adequada, sob o ponto de vista da balança de pagamentos total, para a redução substancial do endividamento externo das empresas públicas.
O aumento do endividamento líquido interno, considerando a parte relativa ao défice do Estado, às operações de tesouraria e às necessidades de financiamento dos fundos e serviços autónomos das Regiões Autónomas e da Segurança Social, atingirá quase 520 milhões de contos, de acordo com as projecções apresentadas.
Na secção sobre política monetária explica-se que um financiamento dessa ordem de grandeza ao sector público administrativo criará riscos ou de expansão excessiva de liquidez, com possíveis consequências inflacionistas, ou de restrição do crédito ao sector produtivo, com perigo de travagem do crescimento do produto interno e do investimento.
II - Análise das despesas
II - Despesas correntes
Assenta o presente parecer, antes de mais nada e obviamente, na análise do próprio texto da proposta de lei n.º 44/IV, bem como nos esclarecimentos que sobre eles foram dados, no âmbito da Comissão, por diversos membros do Governo, com destaque para os que compõem a equipa dirigente do Ministério das Finanças.
Página 309
Resulta, em seguida, dos contributos trazidos pelos pareceres das várias comissões especializadas da Assembleia que, no âmbito das respectivas competências, procederam à análise, sobretudo sectorial, da proposta, no contexto das Grandes Opções do Plano.
A) As despesas correntes, no contexto mais geral da despesa total
De acordo com o próprio relatório da proposta, a orçamentação das despesas terá obedecido a uma exigência «de rigor, sobretudo nas áreas das despesas que se revelem improdutivas, de modo a aperfeiçoar a estrutura da despesa e a reduzir o seu grau de inflexibilidade» (capítulo 17 do relatório).
Ainda de acordo com o relatório, tal exigência ter-se-á traduzido no facto de as despesas correntes apresentarem «um crescimento moderado, em termos nominais, correspondendo praticamente à estabilidade, em termos reais» (capítulo 18).
De qualquer modo, os quadros comparativos que acompanharam o relatório limitam-se a pôr em confronto valores nominais, não permitindo, por isso, uma apreciação completamente esclarecedora das variações operadas.
É esse o caso do quadro em que se faz o paralelo entre o crescimento percentual dos dois grandes grupos da despesa — despesas correntes e de investimento — e de onde resulta que as primeiras cresceram, no OE/86, 21,6%, enquanto que, nos termos da proposta, crescerão apenas 13,2 %.
E também quando, mais à frente, se comparam os vários grupos da despesa, já de acordo com a sua classificação funcional ou com a sua distribuição pelos vários departamentos da Administração Pública, mais investimentos do Plano, consideram-se tão-só verbas globais, o que permite tirar apenas conclusões sobre a respectiva variação em termos nominais.
O mesmo se dirá em relação ao facto de alguns elementos da despesa não serem considerados de modo uniforme, a propósito de todas as comparações que são feitas no relatório.
É o que se passa com a verba destinada a fazer face ao programa de aquisição de fragatas para a Marinha de Guerra, excluída do quadro I, em que se faz a comparação das várias componentes da despesa interna, a propósito do enquadramento macro-económico da proposta.
Também as verbas destinadas ao pagamento de pensões aos antigos servidores do Estado e a encargos com a ADSE são, num caso, consideradas como transferências em favor das entidades responsáveis pelos respectivos pagamentos e noutros como encargos com o pessoal. Assim, a primeira classificação prevalece no quadro em que se desenvolve o cenário de médio prazo para o OE (quadro IV, incluído no n.º 15 do relatório), enquanto que a segunda é a utilizada no quadro comparativo das diversas rubricas da classificação económica da despesa, tal como foram orçamentadas em 1986 e são agora propostas.
De qualquer modo, e mesmo em termos puramente nominais, o certo é que a verba global correspondente à soma das despesas correntes com as despesas de capital subirá 15,2%, de acordo com o proposto. Ora, a esta subida, em termos nominais, corresponde um crescimento real de 6,1 %, (utilizando como deflacionador a taxa de inflação prevista) e uma ponderação no PIB de 36,7%, sendo certo que a média de crescimento real anual, entre 1980 e 1986, foi de 5,6% e o peso no PIB é de 36% no OE do corrente ano de 1986.
E mesmo, excluindo da verba em causa o serviço da dívida pública directa, o que resulta é que o respectivo crescimento nominal será de 13,7%, correspondendo-lhe um crescimento real de 4,7 % e um peso no PIB de 24,27%, contra 24,1 % no corrente ano de 1986.
| Em milhares de contos | Percentagem do PIB | Crescimento | Crescimento | ||
1986 | 1987 | 1986 | 1987 | |||
1–Despesas correntes 1.1-Pessoal 1.2-Bens e serviços 1.3-Juros 1.4-Transferências correntes 1.5-Subsídios 1.6-Outras despesas correntes 2–Despesas de capital 3–Despesas correntes + despesas de capital | 1 210,3 352,8 64,9 385,1 298,6 80,3 28,5 342,5 1 552,8 | 1 369,4 418,3 93,7 425 327 90,7 14,7 420,6 1 790 | 28,06 8,18 1,51 8,93 6,92 1,86 0,66 7,95 36,01 | 28,1 8,58 1,92 8,72 6,71 1,86 0,30 8,64 36,71 | 13,14 18,57 44,37 10,36 9,51 12,95 -48,42 22,80 15,28 | 4,1 9,1 32,9 1,6 0,8 4 - 52,5 13 6,1 |
B) O comportamento da despesa corrente e dos seus elementos (classificação económica)
Aliás, a simples observação do quadro incluído na rubrica do relatório da proposta respeitante à análise da classificação económica das despesas permite concluir que todos os componentes das despesas correntes e das despesas de capital registam subidas mais ou menos significativas, à excepção, no que toca às primeiras, da verba correspondente a outras despesas correntes, em que se verifica um decréscimo de 48,4% em termos nominais e de 13,2% em termos reais, e, no que toca às segundas, da verba respeitante a activos financeiros (dotações de capital e concessão de empréstimos), que decresce também assinalavelmente.
Temos, portanto, um crescimento da despesa global resultante de um crescimento quase geral de todos os seus elementos componentes.
O aumento de 159,2 milhões de contos da despesa corrente representa um crescimento real de 4,1 % (utilizando o mesmo deflacionador) e um maior peso (embora só ligeiramente maior) em relação ao PIB. De 28% em 1986 passa-se para 28,1% em 1987.
Sendo certo, como já se deixou dito, que, no conjunto da despesa corrente, apenas uma das rubricas (de acordo com a classificação económica) regista uma descida considerável, em termos nominais (devida porventura à aplicação de critérios diferentes de classificação), verifica-se que o crescimento global fica a dever-se, principalmente, ao comportamento registado em matéria de despesas com aquisição de bens e serviços e com o pessoal.
Página 310
310 I SÉRIE - NÚMERO 12
Assim, e no que toca ao primeiro grupo referido (aquisição de bens e serviços), o crescimento em termos nominais é de 44,3 %, enquanto que em termos reais é de 32,9%, passando de 1,5% do PIB, em 1986, para 1,9%.
Mesmo excluindo das verbas orçamentadas com esta finalidade o total de 16 milhões de contos correspondente à compra de equipamento militar (abrange as fragatas), teremos um crescimento nominal de 19,7 % e um crescimento real de 6,4 %.
Por sua vez, no que se refere às despesas com pessoal, o seu crescimento, em termos nominais, é de 18,5 %, a que corresponde um aumento, em termos reais, de 9,1 % (ou de 5,4 %, se o deflacionador utilizado for o de 12,4 %), passando de 8,1 % para 8,5 % do PIB. E este crescimento da verba correspondente a despesas com o pessoal, embora abranja as importâncias destinadas a pensões e reformas de ex-funcionários e a transferências para a ADSE, reporta-se à inscrição orçamental de 1986, que poderá vir a revelar-se excedentária.
Deste modo, o total do consumo público, correspondente à soma das verbas do pessoal, aquisição de bens e serviços e outras despesas correntes, regista um acréscimo de 18 %, em termos nominais, e de 9 % em termos reais (ou de 4,9%, se o deflacionador utilizado for o de 12,4 % referido na proposta).
Crescendo, embora, também, em termos nominais, as outras componentes da despesa corrente têm porém um comportamento mais moderado.
Assim, o montante destinado a subsídios, onde se incluem as importâncias concedidas, a esse título, às empresas públicas, crescem, em termos nominais, 12,9 %, o que corresponde a um crescimento real de 4 % e representa a manutenção do peso de 1,8 % em relação ao PIB.
Quanto aos juros, crescendo, em termos nominais, 10,3%, registam um crescimento real de 1,6%, o que corresponde a uma descida da respectiva ponderação, no PIB, de 8,9 % para 8,7 %.
Finalmente, as transferências correntes em favor de fundos e serviços autónomos - como é o caso do Serviço Nacional de Saúde e da organização da Segurança Social, dotada de orçamento próprio - apenas crescem, em termos nominais, 6,71 %, o que corresponde um decréscimo real de - 2,1 %, ou mesmo de - 5,1 %, se o deflacionador for o de 12,4%.
No caso dos juros é evidente que a moderação revelada encontra a sua principal explicação na evolução prevista para a taxa de juro.
Já no que se refere às transferências correntes, a opção feita poderá vir a causar alguns problemas, conforme adiante se referirá com maior detalhe.
Face, porém, ao quadro descrito, uma primeira observação a fazer é a de que os juros, embora continuando a representar uma parcela importante da despesa corrente (31 %), deixam de constituir, em si, o factor de maior rigidez, impeditivo de uma alteração significativa da estrutura do Orçamento do Estado.
C) Os vários elementos da despesa corrente
(classificação orgânica e funcional)
No relatório da proposta faz-se uma comparação que consiste em avaliar o peso conferido a alguns sectores, num conjunto constituído pelo que se designa como correspondendo à «actividade realizada pelo Estado»,para concluir pelo predomínio da educação e cultura, com 11 % do total, da justiça, segurança e defesa, com 10,6%, e da saúde, com 10,2%.
Trata-se, porém, de uma comparação que se compreenderia a partir da elucidação do que se entende por «actividades realizadas pelo Estado», conceito que não encontra, de resto, correspondência, tal como é apresentado com a classificação funcional da despesa.
Cabe, com efeito, perguntar se a actividade prosseguida no âmbito do Ministério das Finanças e no quadro das atribuições que lhe são próprias - e que participará, no volume da despesa corrente, com um acréscimo de mais 20 %, em termos nominais - corresponde ou não a uma actividade que cabe ao Estado realizar, tal como se entende na proposta.
Por outro lado, o destaque conferido aos diversos agregados pode conduzir a algumas ideias menos acertadas, como seja, por exemplo, a que se reporta às despesas com a saúde.
Na verdade, e na linha do que se deixou já dito sobre o comportamento da despesa correspondente a transferências correntes, a parte destinada ao Serviço Nacional de Saúde cresce apenas 0,5%, em termos reais, o que significa uma diminuição da respectiva ponderação em relação ao PIB.
Tal comportamento encontra, aliás, reflexo no relatório da Comissão de Saúde e Segurança Social, onde são encarados com preocupação o crescimento nominal de apenas 1,4 % da verba destinada ao pagamento das comparticipações em medicamentos às farmácias; o crescimento em 7 %, também nominais, da importância para pagamento de serviços convencionados e o crescimento de 9,3 % (0,2 %, em termos reais) das verbas para consumos nos hospitais centrais e distritais (sendo certo que estão a entrarem funcionamento, nesta área, novas unidades que implicarão, naturalmente, acréscimos consideráveis na despesa). Do ponto de vista da política orçamental não é, de resto, menos preocupante a tendência revelada no orçamento do Serviço Nacional de Saúde para acomodar as insuficiências de dotações, fazendo passar um défice para o ano seguinte, défice que, na previsão de 1987, cresce 0,5 milhões de contos em relação ao que transitou de 1986 e que não integra o défice global do OE aprovado pela Assembleia da República.
Por outro lado, o predomínio, de acordo com a comparação feita no relatório da educação e cultura, com 11 % do total da despesa das actividades realizadas pelo Estado, não parece compatível com a decisão governamental de não considerar a educação como sector prioritário das despesas públicas, decisão de que se lamenta a Comissão de Educação, Ciência e Cultura no seu parecer.
Aí se consideram, de resto, como particularmente graves os cortes orçamentais nas verbas destinadas à Acção Social Escolar, à alfabetização e educação de adultos, ao ensino especial e à investigação científica nas universidades.
Finalmente, o destaque para o conjunto da justiça, segurança e defesa, a que cabem 10,6 % , não evita as profundas preocupações de que dá conta a Comissão de Defesa Nacional no seu parecer.
Aí se considera, na verdade, como escassa a verba correspondente à rubrica de combustíveis e lubrificantes, em cerca de 1 milhão de contos, e se chama a atenção para o facto de as despesas de manutenção e funcionamento dos diversos ramos evoluírem a uma taxa de variação de 4,3 %, o que significa um decréscimo, em termos reais, de 5,6%.
Página 311
19 DE NOVEMBRO DE 1986 311
A conclusão a tirar é, pois, a de que a expansão da despesa corrente, que, sem dúvida, caracteriza a presente proposta, não elimina factores de risco na perspectiva do crescimento do défice e resulta de variações que não podem considerar-se completamente esclarecidas com os elementos fornecidos à Assembleia.
III - Análise das receitas
III - Receitas correntes
1 - Do cotejo das receitas correntes, constantes da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1987, com o valor homólogo inscrito no Orçamento do Estado para 1986, decorre um crescimento de 25,3 %, que se explica, fundamentalmente, pela extensão dos valores constantes dos dois primeiros capítulos do orçamento das receitas do Estado, que integram os documentos em apreço.
Com efeito, numa primeira análise, as receitas fiscais previstas para 1987, agrupadas em impostos directos e indirectos, ascendem a 1034,0 milhões de contos, contra 783,1 milhões de contos em 1986, pelo que o seu peso, adentro das receitas correntes (isto é, das que constam dos oito primeiros capítulos do orçamento das receitas) se eleva de 86,72% em 1986 para 91,32% em 1987.
Por seu lado, o nível de fiscalidade, em sentido restrito, surge-nos igualmente, numa primeira aproximação, algo agravado, elevando-se de 18,12 % em 1986 para 21,12 % em 1987.
2 - Considerando, no entanto, as alterações legislativas operadas, o confronto supra-apresentado carece de significado, já que, em 1987, a sisa deixará de constituir uma receita da administração central para passar a pertencer às autarquias locais.
Por seu lado, em 1986, o período de cobrança do imposto sobre o valor acrescentado é inferior a doze meses, não surgindo ainda no Orçamento do Estado de 1986 o imposto sobre os produtos petrolíferos.
Considerando o que precede, isto é, abstraindo da sisa, do imposto sobre o valor acrescentado e do imposto sobre os produtos petrolíferos, em cada um dos anos económicos em apreço, constatamos que as receitas correntes em 1987 se quedam nos 632,4 milhões de contos, contra 673,8 milhões de contos em 1986.
Em particular no que concerne ao agregado das receitas fiscais que temos vindo a considerar, este deverá conhecer igualmente um ligeiro retrocesso em 1987, quando cotejado com o seu homólogo de 1986, diminuindo de 553,7 milhões de contos para 534 milhões de contos.
Do exposto decorre que cerca de 50 % das receitas fiscais que o Executivo espera arrecadar em 1987 respeitam a dois impostos indirectos (o IVA e o ISP) cuja cobrança se iniciou em 1986. Assim, ao longo de 1987 voltaremos a assistir a um crescimento da importância dos impostos indirectos no acervo das receitas fiscais.
Tal facto não deverá, porém, deixar de ser considerado no contexto de um eventual incremento da fracção do rendimento disponível, permitindo-se ao titular do rendimento uma opção entre poupança e utilização, na exacta medida em que aquele rendimento só será convertido em imposto na medida em que for despendido.
De facto, na proposta de orçamento agora apresentada à Assembleia da República o Governo aumenta a matéria colectável intacta na posse dos titulares do rendimento, que só será objecto de tributação, em princípio, no caso de utilização do mesmo, tudo dependendo, em última análise, da natureza das aplicações.
3 - Passando agora a analisar as principais componentes da receita corrente constantes da proposta de orçamento para 1987, esta Comissão é de parecer que as receitas que o Governo espera arrecadar, em sede de contribuição industrial e do imposto sobre o valor acrescentado, se mostram algo sobrestimadas.
Na verdade, não obstante ter-se assistido, ao longo do ano económico em curso, por um lado, a uma evolução crescentemente favorável da conjuntura económica, que, necessariamente, não se deixará de reflectir no lucro tributável das empresas, e, por outro, a importantes alterações da legislação em vigor em matéria de benefícios fiscais, julga esta Comissão que só muito dificilmente será atingido o objectivo fixado para 1987 no que respeita à contribuição industrial.
Também em matéria de imposto sobre o valor acrescentado se afigura a esta Comissão que a previsão avançada pelo Governo se mostra um pouco optimista, já que a plena consecução do objectivo fixado para 1987 - 348,5 milhões de contos - implicaria uma cobrança média mensal, ao longo do próximo ano económico, da ordem dos 29 milhões de contos.
No que concerne às demais componentes da receita fiscal, entende esta Comissão dever salientar o crescimento previsto para o imposto de consumo sobre o tabaco (mais 16,6 %), assim como para a participação nas receitas dos CTT (3,9 milhões de contos, contra 2,6 milhões de contos em 1986) e dos TLP (1,9 milhões de contos, contra 1,1 no ano em curso).
4 - Também no capítulo 03 do orçamento das receitas, «Taxas, multas e outras penalidades», no grupo 02, merece destaque a previsão efectuada para os juros de mora (5,5 milhões de contos, contra 3,5 milhões em 1986).
Nesta rubrica são relevados os juros de mora devidos pelas importâncias em dívida ao Estado quando pagas depois do prazo de cobrança «à boca do cofre», o que denuncia o propósito de recuperação de dívidas fiscais em atraso.
5 - No capítulo «Rendimentos da propriedade» importa salientar as rubricas orçamentais «Juros de instituições financeiras» (7,4) e «Juros de empresas não financeiras» (3,5 milhões de contos), que, praticamente, não tinham expressão no Orçamento do Estado para 1986, para além do montante que o Governo se propõe arrecadar, a título de participação nos lucros de instituições de crédito (38,5 milhões de contos, contra 24 milhões de contos em 1986).
6 - Seguem-se as transferências. Neste capítulo do orçamento das receitas (05) é relevado, além do mais, o reembolso das comparticipações provenientes de países estrangeiros respeitantes às despesas com infra-estruturas comuns - NATO.
Por outro lado, também é neste capítulo que devem ser escrituradas algumas das transferências provenientes das Comunidades Europeias, designadamente as restituições.
De facto, de harmonia com o acordado, a Comunidade restituirá à República Portuguesa, em 1987, 70 % do montante das entregas feitas, a título de recursos
Página 312
312 I SÉRIE - NÚMERO 12
próprios, provenientes da contribuição financeira, efectuada com base no produto nacional bruto, conforme dispõe o artigo 374. º do Tratado de Adesão.
Em 1986, a receita em apreço foi estimada em 22,3 milhões de contos.
Na proposta de lei do Orçamento do Estado para 1987, em análise, o Governo não procedeu, na área da despesa, à inscrição de qualquer dotação para a contribuição financeira a efectuar para a Comunidade.
Simultaneamente, do lado da receita, não encontramos a correspondente rubrica orçamental. Para o efeito, no n.º 8 do artigo 14.º da proposta de orçamento, o Executivo solicita autorização à Assembleia da República para proceder à inscrição da já referida dotação de despesa, líquida da respectiva restituição, no prazo de 60 dias após a publicação do Orçamento Geral das Comunidades Europeias para 1987.
De resto, no quadro facultado a esta Comissão, em que se descrevem os fluxos financeiros do Tesouro com as Comunidades Europeias, o Governo refere que a contribuição financeira, líquida de restituições, será superior à de 1986 (cerca de oito milhões de contos), tornando-se, no entanto, de difícil previsão, face ao estádio em que se encontra a preparação do Orçamento das Comunidades para 1987.
A proposta em apreço parece colidir, ab initio, com algumas das «regras clássicas» da organização do Orçamento, constantes da Lei n.º 40/83.
Assim, no que respeita ao orçamento das despesas, ficariam por preencher duas das principais funções que lhe são geralmente atribuídas, ou seja, a função autorização - só podem ser realizadas as despesas previstas no Orçamento - e a função limite - a dotação orçamental constitui o limite máximo da despesa -, embora se possa aceitar que, de um modo implícito, a primeira está contida na proposta de orçamento em apreço.
No que respeita à segunda, a sua falta de indicação expressa é minimizada pela circunstância de a determinação do seu montante ser exógena ao Executivo.
No que concerne à falta de inscrição da correspondente rubrica orçamental no orçamento das receitas, a questão afigura-se a esta Comissão mais simples, dada a circunstância de a restituição não revestir a natureza de uma receita fiscal, devendo-se a sua inclusão no Orçamento ao facto de este ser, além do mais, o quadro geral das receitas do Estado.
Na verdade, caso estivéssemos perante uma receita fiscal, estaríamos perante uma violação do «princípio da anualidade ou da legalidade orçamental», segundo o qual nenhum imposto pode ser cobrado sem se encontrar previsto no Orçamento, o que não é o caso.
A Comissão não pode deixar de recomendar que constem do Orçamento do Estado a totalidade dos fluxos financeiros com as Comunidades, independentemente da sua origem ou destino.
7 - Para finalizar a análise sumária que se tem vindo a efectuar às receitas correntes constantes no mapa I, anexo à proposta de orçamento em apreço, entende esta Comissão dever salientar a extensão revelada pelas rubricas constantes do capítulo 08 («Outras receitas correntes - Reembolso do custo de amoedação») - 3,2 milhões de contos, contra 765 000 contos em 1986. Nesta rubrica são escrituradas as receitas correspondentes às despesas efectuadas com a produção de moeda metálica inscritas no orçamento das despesas do Ministério das Finanças.
8 - Por último, a Comissão entende dever salientar que do orçamento das receitas, assim como do orçamento das despesas, não consta qualquer rubrica orçamental que reflicta a tributação dos funcionários públicos que o Governo se propõe realizar em 1987.
IV - Fiscalidade
IV - Sistema fiscal
IV.I - Conclusões de ordem fiscal
Da análise ao articulado da proposta do OE/87, no capítulo respeitante ao sistema fiscal, procurando determinar a sua coerência intrínseca, bem como a adequação à estrutura do sistema fiscal, tendo em conta a sua anunciada evolução, resultam as seguintes conclusões de ordem geral:
a) Trata-se, antes de mais, de uma proposta globalmente pouco inovatória, que reforça o reconhecimento implícito da incapacidade para proceder, em 1987, à reforma da tributação do rendimento, ao contrário do que foi previsto na lei orçamental de 1986, estranhando-se que o Governo não tenha fornecido qualquer justificação para este facto;
b) As modificações mais significativas que se pretende introduzir têm elevados custos administrativos e escassas potencialidades relativas se se destinassem apenas a vigorar durante um ano, admitindo que a reforma fiscal entraria em vigor em 1987;
c) A coerência e justiça do sistema continuam a ser sacrificadas a opções de fim imediato, como a manutenção de adicionais e impostos extraordinários;
d) As alterações em matéria de mercado de capitais assentam em medidas limitadas de estímulo da oferta e a uma sensível redução dos incentivos à procura, o que representa uma inversão relativamente a um curto período de incentivo em que se pretendeu privilegiar estas formas de aplicação de poupanças relativamente aos depósitos a prazo;
e) O OE/87 é omisso relativamente à orçamentação das receitas de natureza fiscal cobradas por fundos e serviços autónomos, contrariando 0 disposto no artigo 3.º, n.º 1, da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado;
f) Tendo sido dado apenas cumprimento muito limitado ao disposto no artigo 53.º do OE/86, que determinava o registo e avaliação das cobranças não efectuadas em virtude dos benefícios fiscais concedidos, bem como a comunicação da estimativa do seu valor, relação dos existentes e sua justificação, impõe-se:
Incluir no OE/87 um artigo de teor semelhante ao do artigo 53.º do OE/86;
Tornar prioritária a execução do referido artigo, de modo que a Assembleia da República possa receber os seus resultados até 31 de Maio de 1987.
Página 313
19 DE NOVEMBRO DE 1986 313
IV.2 - Análise de algumas medidas previstas na proposta
De entre as medidas previstas na proposta, a Comissão emite a seguir as suas conclusões sobre as seguintes:
IV.2.1 - Autorização de cobrança de impostos (artigo 15.º)
A autorização de cobrança de impostos é uma manifestação do princípio da anualidade orçamental em matéria tributária que não deve ser utilizada para introduzir, sob forma implícita, profundas alterações na tributação de vastos conjuntos de actividade, sejam eles quais forem. É o que sucede com o artigo 15.º da proposta. Com efeito, este artigo, ao autorizar a cobrança de todos os impostos de acordo com os códigos e demais legislação existente, contém, de forma implícita, o lançamento do Imposto sobre a Indústria Agrícola (IIA), suspenso há largos anos.
A liquidação do IIA, tal qual se prevê na legislação de 1963, seria tecnicamente incorrecta, dada a evidente desactualização dessa legislação face à evolução das realidades do sector. O Governo reconheceu isso mesmo ao pedir uma autorização legislativa para alterar o IIA, que lhe foi concedida nos termos do artigo 22.º da Lei do Orçamento do Estado para 1986. A Comissão de Economia, Finanças e Plano entende necessário saber se o Governo ainda pretende usar essa autorização legislativa.
IV.2.2 - Contribuição industrial (artigo 17. º)
É positiva a alínea a) do n.º 1 do artigo 17.º, na medida em que clarifica o limite de aceitação de donativos, no âmbito da alínea d) do artigo 16.º do Código da Contribuição Industrial.
Na alínea b) do mesmo n.º 1 é retirado o benefício fiscal concedido pelo Decreto-Lei n.º 182/86, de 10 de Junho, segundo o qual, em 1987, não seriam considerados como proveitos os rendimentos de títulos de dívida pública até ao montante de 10 000 contos.
As autorizações pedidas nos n.ºs 2 e 3 necessitam de ser acompanhadas de cabal explicitação caracterizadora das alterações previstas. Quanto à autorização pedida no n.º 4, conviria obter uma concretização do processo de definição das «regiões com especial incidência de desemprego», designadamente em conjugação com as transformações de que a economia portuguesa se encontra necessitada. Trata-se de matéria a que a Assembleia da República não poderá ficar alheia.
IV.2.3 - Imposto de capitais (artigo 18.º)
Pela alínea b) do artigo 18.º, o Governo pretende tributar os juros dos depósitos à ordem. Estará esta medida associada à futura liberalização das taxas desses depósitos?
IV.2.4 - Imposto profissional (artigo 19.º)
A alínea a) do artigo 19.º submete a imposto profissional as importâncias atribuídas aos empregados por conta de outrem, no exercício da sua actividade, por entidades que não a entidade patronal, retoma a solução consagrada na alínea e) do § 2.º do artigo 1.º do Código, na redacção do Decreto-Lei n.º 183-D/80, de 9 de Junho, de acordo com o OE/86. Na prática esta medida visa os cofres comuns dos trabalhadores dos casinos.
A alínea c) do proposto artigo 19.º, visando, aparentemente, combater a evasão fiscal dos profissionais liberais, é ineficaz e contrária ao consenso já estabelecido a este respeito entre os fiscalistas. Esta medida vem apenas criar dificuldades acrescidas aos profissionais com rendimentos reduzidos - os principais utilizadores das deduções - sem atingir os que auferem significativos rendimentos, que continuarão a utilizar como até aqui a apresentação de documentos.
Quanto à alínea e), a Comissão acha necessário aprofundar o que entende o Governo por «níveis mais realistas» das deduções fixas, a que se refere o n.º 2 e o § 2.º do artigo 10.º do Código do Imposto Profissional.
IV.2.5 - Imposto complementar (artigo 20.º)
Com a alínea a) do artigo 19.º, o Governo pede autorização para isentar, de 1987 a 1989, os rendimentos referidos no n.º 5 do artigo 6.º do Código de Imposto de Capitais. No presente contexto, a isenção por três anos carece de credibilidade suficiente. Por um lado, o Governo, flutuando nos seus critérios, sente-se à vontade para pedir a revogação de benefícios para o ano seguinte que ele próprio introduzira recentemente [ver alínea b) do artigo 17.º da presente proposta]. Por outro lado, garante que, em 1987 ou 1988, não se venham a formar na Assembleia da República maiorias contrárias a esta isenção.
Quanto à alínea b), trata-se de um retrocesso relativamente à orientação consagrada a partir de 1981, na medida em que os limites a partir dos quais há lugar á apresentação de declaração do imposto complementar privilegiam, relativamente, os contribuintes não casados.
IV.2.6 - Sisa e imposto sobre as sucessões e doações(artigo 22.º)
Na proposta da alínea a) do artigo 22.º, se é positiva a faculdade conferida ao contribuinte de requerer a fixação do factor de capitalização, pode revelar-se uma medida ineficaz em repartições cujas comissões de avaliação não funcionem ou em que o atraso seja tal que os requerimentos se mostrem ineficazes.
Melhor seria consagrar-se um prazo máximo para a realização da avaliação, a partir do qual qualquer avaliação teria de ser corrigida por aplicação de um coeficiente de desvalorização monetária.
A Comissão entende, quanto à alínea b), que se trata de uma correcção indispensável, dada a frequente alteração do regime legal do crédito/habitação.
IV. 2.7 - Regime aduaneiro (artigo 23.º)
A alínea a) do artigo 23.º renova a autorização concedida pelo artigo 28.º do OE/86. A Comissão pensa que o Governo deve esclarecer a Assembleia da República sobre as razões da sua não utilização em 1986.
A alínea, f) não respeita os requisitos do artigo 168.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, não se dando qualquer indicação sobre a estrutura do imposto a criar, mas apenas sobre a carga tributária resultante da sua conjugação com o IVA.
1V.2.8 - Imposto do selo (artigo 24.º)
A alínea a) do artigo 24.º, relativamente à parte final - altera-se o sistema de tributação -, suscita a necessidade de obter do Governo a explicitação do sentido e extensão da autorização pretendida.
Página 314
314 I SÉRIE - NÚMERO 12
Também a alínea b) põe a questão de saber por que razão o Governo não foi mais longe na eliminação ou isenção de artigos da Tabela Geral do Imposto do Selo; sobretudo naqueles casos em que à receita reduzida correspondem significativos inconvenientes de ordem burocrática e de relacionamento Administração/contribuintes.
IV.2.9 - Imposto sobre o valor acrescentado (artigo 25.º)
A alínea a) do artigo 25.º é uma disposição compreensível, dado o regime de que já gozam as obras de pintura, escultura, gravação, estatuária ou cerâmica.
A alínea c) repõe as medidas constantes do decreto recentemente declarado inconstitucional pelo Acórdão n.º 274/86 do Tribunal Constitucional (Diário da
República, de 29 de Outubro de 1986). A alteração visada pretende limitar o direito à isenção dás exportações efectuadas por adquirentes residentes no estrangeiro. A declaração de inconstitucionalidade deveu-se ao facto de o Governo não dispor da autorização legislativa que vem agora pedir.
IV.2.10- Imposto de compensação (artigo 29.º)
O sentido e a extensão da revisão que ó Governo pretende efectuar deverão ser concretizados, a fim de confirmar o pedido de autorização ao disposto no n.º 2 do artigo 168.º da Constituição.
IV.2.11 - Imposto de circulação e de camionagem (artigo 30.º)
Antes de mais, esta disposição traduz-se no não cumprimento da disposição do OE/86, na qual se previa a extinção ou reformulação do imposto de camionagem sobre veículos afectos ao transporte de mercadorias até ao final de 1986.
Além disso, pretendendo o Governo criar um novo imposto, recorrendo a autorização legislativa, deve ser, caracterizado o sentido e extensão da autorização a utilizar quanto aos elementos essenciais do imposto.
IV.2.12 - Mercado de capitais (artigo 31.º)
O número do artigo 31.º, visando um aparente estímulo à oferta pública de acções o regime criado; é menos amplo que o consagrado rio Decreto-Lei n.º 170/86, de 30 de Junho o qual concedia benefícios de redução da taxa de 50% e era menos exigente quanto aos requisitos para benefícios do regime.
IV.2.13 - Incentivos fiscais às sociedades de capital de risco (artigo 32.º)
O artigo 32.º prevê o alargamento dos benefícios fiscais concedidos às SCRs, relativamente ao consagrado no Decreto-Lei nº 17/86, de 3 de Janeiro, e os previstos no artigo 46.º do OE/86. A Comissão regista a iniciativa do Governo nesta matéria.
IV.2.14 - Regime fiscal dos certificados de consignação (artigo 33.º) .
A Comissão entende necessária uma melhor caracterização do regime a consagrar, nos termos do disposto sobre o regime de autorização.
IV.2.15 - Extinção de impostos (artigo 42.º)
O artigo 54.º do OE/86 estabeleceu que o Governo deveria propor, até 31 de Dezembro de 1986, a extinção dos impostos cuja vigência se mostrasse «desactualizada em face das realidades económico-sociais», o que, até ao momento, não foi feito. O artigo 42.º da proposta para 1987 visa, aparentemente, o cumprimento desse objectivo do artigo 42.º presente.
IV.2.16 - Regime contratual das contrapartidas fiscais (artigo 47º)
A Comissão é de parecer que se deve dar cumprimento, quanto a esta autorização legislativa, ao disposto no artigo 168.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, quanto a todos os elementos essenciais do imposto referido no artigo 106.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.
IV.2.17- Sociedades «holding» (artigo 48.º)
Trata-se de uma autorização legislativa, que deverá ser concretizada nos termos do artigo 168.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.
IV.2.18 - Profissionais de desporto de alta competição (artigo 5l.º)
A Comissão compreende os problemas que levam o Governo a propor este regime excepcional. Porém, tem dúvidas sobre as garantias existentes quanto à eficácia
e equidade relativa das normas propostas. Para além de se tratar de uma autorização legislativa que não preenche os requisitos do artigo 168.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, importa ter presente o seguinte:
a) Os profissionais de desporto de alta competição estão já sujeitos a tributação pelos impostos existentes, sendo a situação actual resultante da ausência de fiscalização;
b) Um regime privilegiado desta natureza não deveria ser completamente omisso face a outras profissões de duração curta. Refira-se, por exemplo, o caso da França, em que existe um regime tributativo especial aplicável a um conjunto de situações de duração curta.
IV.2.19 - Infracções tributárias (artigo 55.º)
As alíneas a) e b) do número do artigo 55.º representam a renovação da autorização legislativa concedida pelo artigo 60.º do OE/86, com um prazo de 90 dias, pelo que importa conhecer o motivo por que não foi usada.
Quanto à alínea c), a Comissão regista o seu carácter inovatório, visando proceder à adaptação, que nunca foi feita, do Código de Processo das Contribuições e Impostos às disposições constitucionais e ao direito substantivo, que tem sofrido significativas transformações.
IV.2.20 - Tributação dos cargos públicos (artigo 56.º)
A Comissão dá o seu apoio à tributação dos titulares de cargos públicos. No OE/86, o artigo 62.º dispôs o seguinte: «Visando a entrada em vigor do imposto único sobre o rendimento em 1987, o Governo promoverá as acções necessárias à tributação das remunerações dos funcionários e agentes da Administração
Página 315
19 DE NOVEMBRO DE 1986 315
Pública, magistrados judiciais, elementos das forças militares e titulares dos cargos políticos.» O Governo não está em condições de fazer entrar em vigor o imposto único em 1987. Este facto não inviabiliza a tributação dos titulares de cargos públicos em 1987, mas obriga a cuidadosa preparação para estas soluções manifestamente incorrectas. Por esse facto, a Comissão considera que a autorização legislativa pretendida pelo Governo é extremamente vaga, pelo que deverá ser solicitada a sua concretização, de acordo com o artigo 168.º, n.º 2, da Constituição.
V- Investimento público
V - Investimento do sector público
1 - Plano de Investimento e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central (PIDDAC)
No relatório sobre as GOPs e o Orçamento do Estado para 1986 a Comissão afirmava que a «significativa expressão (orçamentada) do investimento da Administração Central poderá colocar problemas importantes se for considerada a real capacidade de execução dos investimentos previstos». Os elementos disponíveis sobre a execução orçamental confirmam plenamente aquele alerta, já que a tradução financeira do PIDDAC de 1986 se deverá situar entre os 70% e 80 % .
Parece justificável manter a mesma chamada de atenção para o PIDDAC de 1987, já que a comparação dos valores orçamentados para 1987 com a execução financeira de 1986 aponta para uma evolução bastante mais acentuada do que a resultante de uma comparação dos valores orçamentados. Acresce que, como se verá, aumenta o peso das dotações para investimentos do Plano cuja execução não depende apenas da vontade da Administração Central, pois se trata de transferência para outros sectores, dependendo, portanto, da real existência de projectos e da capacidade de realização dos sectores destinatários, bem como, em boa parte, da efectiva transferência dos previstos recursos das Comunidades Europeias.
Ainda antes de entrar na análise mais circunstanciada do PIDDAC, impõe-se registar que não foram ainda introduzidas alterações à deficiente concepção do mapa VII, anexo ao Orçamento e relativo aos programas e projectos integrados no PIDDAC, continuando, pois, a omitir informações fundamentais, designadamente sobre a repartição espacial (regional) dos investimentos e sobre a componente de FBCF.
Os investimentos do Plano para 1987 ascendem a 161,3 milhões de contos (+ 17,7 % nominais que em 1986), dos quais 140,7 milhões de contos (+ 15,9%) financiados pelo Orçamento do Estado. Aqueles valores incluem 7,9 milhões de contos (+ 4,3 %a) relativos aos «programas integrados de desenvolvimento regional» (PIDRs) e 423 mil contos para os «investimentos intermunicipais» (+41 %). A parcela dos investimentos do Plano financiados pelo Orçamento baixou, de 1986 para 1987, de 90,4 % para 87,2 %, sendo a parcela restante financiada pelos «donativos de pré-adesão» em 1,4 % (2,7 % em 1986) e por «outras fontes» em 11,3 %a (6,9 % em 1986). Registe-se o decrescimento do financiamento do OE, apesar de nele se incluírem recursos dos fundos estruturais das Comunidades no valor (orçamentado) de 22 milhões de contos. Isto é, o crescimento dos investimentos do Plano não corresponde a um aumento proporcional do esforço financeiro pedido ao Orçamento do Estado.
A análise subsequente reportar-se-á, salvo indicação expressa, ao PIDDAC financiado pelo Orçamento do Estado deduzido dos PIDRs e dos investimentos intermunicipais. Sem que antes a Comissão não deixe de registar o significativo decrescimento real das dotações orçamentais para «programas integrados de desenvolvimento regional» (- 6,5 %, em termos reais), não tendo o Governo fornecido justificação ou explicação para esta evolução negativa. Na óptica da classificação económica das despesas assinale-se que apenas cerca de 39% do PIDDAC (cerca de 52 milhões de contos) corresponde a investimentos em terrenos, edifícios, construção e máquinas e equipamento, correspondendo cerca de 56% a transferências para outros sectores. O crescimento do peso relativo da rubrica «transferências» no conjunto dos chamados «investimentos do Plano» parece colocar a necessidade de clarificar e delimitar mais claramente este conceito, já que não se percebe bem a razão de incluir no PIDDAC alguns subsídios e comparticipações financeiras do Estado para o investimento privado, e nele não se incluírem, por exemplo, as dotações de capital para investimentos das empresas públicas, ou de se incluírem agora no PIDDAC os subsídios financeiros do «sistema de incentivos de base regional», quando anteriormente não eram contabilizados como investimentos do Plano os subsídios atribuídos, por exemplo, no âmbito do SIII. Aliás, o relatório da Comissão de Integração Europeia chama a atenção para um outro tipo de dualidade de critérios: «enquanto os projectos incluídos no PIDDAC Agricultura são inscritos no mapa VII do OE [...], sendo as contribuições do FEDER consideradas no total das fontes de financiamento, o Ministério da Indústria inscreveu cerca de 3 milhões de contos do Orçamento do Estado para co-financiar os sistemas de incentivos de base regional, mas não inscreve qualquer verba proveniente do FEDER».
São questões que a Comissão entende deverem ser ponderadas num futuro próximo pela Assembleia da República e pelo Governo.
No âmbito da análise do PIDDAC por ministérios (quadro II anexo) registam-se os decrescimentos reais nos Ministérios da Educação e Cultura 6,2%), do Plano e da Administração do Território (- 5,4%), do Trabalho e Segurança Social (- 23,3 %) e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (- 3 %), e a prática estagnação no Ministério da Saúde (+1,7%). Aumentam os investimentos nos Ministérios da Agricultura, Pescas e Alimentação ( + 57 % em termos reais), da Justiça (+25,6%) e da Indústria e Comércio (+ 16,3 %).
No que respeita à distribuição funcional do PIDDAC (quadro III) importa referir que a comparação com as dotações orçamentais de 1986 deverão ter na devida atenção a criação de uma nova categoria funcional relativa a «despesas de apoio». De qualquer modo, as principais conclusões que se podem tirar confirmam o essencial do que já ressaltava da distribuição do PIDDAC por ministérios. Assim, os sectores que registam maiores diminuições de dotações são os da educação, formação profissional, saúde, habitação e urbanismo, indústria e energia. Os maiores aumentos registam-se na agricultura, defesa e protecção do ambiente, investigação e desenvolvimento tecnológico e pescas.
Página 316
316 I SÉRIE - NÚMERO 12
A Comissão regista favoravelmente o reforço de dotação para investimentos nas áreas assinaladas. No entanto, não pode deixar de anotar o seguinte:
O aumento nominal de 9 milhões de contos, registado no Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, deverá ser confrontado com a inscrição no PIDDAC do Ministério de 12,5 milhões de contos de transferência para o sector privado, como comparticipações financeiras do Estado português para investimentos a co-financiar pela CEE, o que significa que o PIDDAC «tradicional» apresenta uma redução de 3,5 milhões de contos relativamente a 1986; aliás, o relatório da Comissão de Agricultura e Mar manifesta a sua preocupação, designadamente pela redução real do PIDDAC «nacional» para a agricultura e pelo facto de as transferências para o sector privado constituírem cerca de dois terços do PIDDAC, sem orientações e prioridades definidas, com graves riscos para o sobre e sub-investimento sectorial e para a correcção das assimetrias regionais;
O aumento das dotações para o sector das pescas não pode esconder, por um lado, o seu nível absoluto extremamente reduzido face às necessidades e ao interesse do sector para a economia nacional e, por outro lado, o facto de todo o PIDDAC para as pescas ser constituído por projectos anuaís, deixando subentendera inexistência de uma política de investimentos definida a médio e longo prazos; o relatório da Subcomissão das Pescas alerta, aliás, para a necessidade de inclusão no PIDDAC de programas de apoio à indústria de conservas de peixe e à pesca artesanal;
O aumento nominal de 2,5 milhões de contos nos investimentos do MIC é inferior à verba de 3 milhões de contos inscrita como participação financeira do Estado em programas que poderão vir a ser co-financiados pela CEE, co-financiamento esse que parece estar em dúvida, pois o próprio Governo não o consagra no Orçamento (cf. artigo 14.º, n.º 6, da proposta de lei do Orçamento);
O essencial da dotação prevista para o Ministério da Justiça corresponde a investimentos programados para 1986, já que apenas terão sido executados investimentos no valor de 450 mil contos dos 2,5 milhões orçamentados; de facto, e como refere o relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, «na apreciação da verba prevista não pode deixar de ser tido em conta o facto de o Ministério ter visto atrasado em cerca de um ano o seu esforço de investimento, com inerente arrastamento (e encarecimento) da generalidade dos projectos»; acrescentando de seguida «que foram eliminadas no PIDDAC 87 as segundas e terceiras prioridades e, em muitas áreas, maxime a relativa ao parque judiciário, os projectos subsistentes não contemplaram situações de extrema necessidade e degradação e diferiram mais uma vez obras constantes de planos de investimentos anteriores».
A Comissão não pode deixar de considerar negativamente a diminuição significativa de dotações para investimentos em sectores que, face à realidade nacional, sempre terão de considerar-se como prioritários. Designadamente os da educação, saúde, habitação e formação profissional. A evolução sectorial do PIDDAC parece mostrar, aliás, que o Governo não tem definida uma hierarquização das suas prioridades, colocando os investimentos do Plano, em boa parte, na dependência do destino funcional dos eventuais recursos comunitários. O que, no entender da Comissão, poderá provocar fortes e inconvenientes distorções no desenvolvimento equilibrado do País. Exemplo significativo dos perigos apontados é dado pelas dotações para formação profissional. À medida que crescem os
co-financiamentos da CEE para a formação profissional de reciclagem, o OE diminui significativamente as dotações para a formação profissional de base, não co-financiada pelas Comunidades.
Merece referência um outro aspecto do PIDDAC, qual seja o da execução prevista para 1986 e consequente reprogramação financeira dos programas em curso, bem como a magnitude financeira dos novos programas, a lançar em 1987, e respectivos compromissos para os anos futuros (quadro IV). A simples análise dos compromissos de dotações para 1987, constante do PIDDAC para 1986, e sua comparação com as dotações para obras em curso constantes do PIDDAC para 1987 mostra uma diminuição de 13,5 milhões de contos, a que deverá acrescentar-se o não executado em 1986 (que, de acordo com as indicações constantes do mapa VII, deverá rondar os 24 milhões de contos). Daqui decorre um manifesto arrastamento dos investimentos do Plano para os anos seguintes e a constatação de que parte do PIDDAC para 1987 corresponde a investimentos que, embora programados, não foram realizados em 1986. Por outro lado, os novos programas a lançar em 1987 montam a 29,3 milhões de contos, dos quais 7,6 milhões sem carácter plurianual. Os restantes 21,7 milhões de contos geram compromissos para 1988 no valor de 61,6 milhões de contos e de 192,3 milhões para os anos seguintes. Sendo certo que, pela sua própria natureza, os programas plurianuais sempre terão de comprometer recursos financeiros para os anos seguintes, o que se poderá contestar é que tais compromissos, nomeadamente os do ano imediato, assumam valores tão desproporcionais relativamente ao ano de lançamento. O que este ano se passa, por exemplo, com os programas de estradas é a esse respeito por demais significativo. É previsto o lançamento de 47 novos projectos, cada um deles dotado com 10 000 contos. Mas este valor de 470 mil contos compromete, para o futuro, 18 milhões de contos, dos quais 9 milhões já em 1988. Neste caso, como noutros exemplos que podem recolher no mapa vil, bem se poderá dizer que a dotação inscrita para 1987 apenas tem o significado do «lançamento da primeira pedra». Assim, a Comissão entende que a programação e orçamentação de projectos de investimento plurianuais deveria merecer do Governo uma mais cuidada ponderação, na dupla perspectiva da efectiva capacidade de execução anual e de mais adequada proporcionalidade entre as dotações inscritas para um ano e os compromissos emergentes para os anos futuros.
Página 317
19 DE NOVEMBRO DE 1986 317
Finalmente, a comissão entende manifestar objecções ao pedido de autorização formulado pelo Governo no n.º 2 do artigo 12.º da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1987.
As regras orçamentais e a própria programação monetária impõem que todos os investimentos do Plano, a executar em 1987, devam constar do respectivo Orçamento, não se vendo justificação técnica e jurídica para que parte da execução material e financeira do PIDDAC em 1987 venha a ser imputada ao ano de 1986.
2 - Investimento e financiamento do sector empresarial do Estado (SEE)
O Orçamento do Estado para 1987 não foi acompanhado de qualquer anexo informativo relativo às inter-relações financeiras entre o SEE e o Estado, apesar de no relatório sobre o OE/86 a Comissão ter frisado a insuficiência dos elementos de análise então fornecidos. Solicitado pela Comissão, por ofício de 24 de Outubro, a fornecer elementos relativos à versão provisória do Programa de Investimentos do SEE (PISEE), às respectivas fontes de financiamento e à distribuição por sector de actividade e empresas das dotações de capital, indemnizações compensatórias e subsídios, o Governo apenas procedeu ao seu envio no dia 13 de Novembro. Isto é, tais documentos só se tornaram disponíveis para a Comissão no passado dia 14, em plena fase de elaboração final do relatório da subcomissão para o efeito criada.
Assim, a análise a que agora se procederá terá de reflectir, necessariamente, a escassez de tempo, não imputável à Assembleia da República, de que a subcomissão dispôs para o respectivo estudo e aprofundamento. Acresce que os elementos tardiamente enviados, e contrariamente ao verificado com o OE/86, aglomeram, em verbas únicas, as dotações relativas a dotação de capital, indemnizações compensatórias e subsídios, com todas as dificuldades e inconvenientes daí emergentes para a sua análise. O que exige, ainda durante o processo de apreciação e votação do OE/87, um aprofundamento desta problemática de inegável importância.
O investimento previsto para o SEE em 1987 monta a 240 milhões de contos, o que representa uma significativa quebra real do inicialmente previsto para 1986: menos 7,8 %, em termos reais.
O Governo não forneceu quaisquer explicações que fundamentem tão acentuada diminuição do investimento do sector empresarial do Estado.
A Comissão entende não ter justificação a referida diminuição real do investimento, a menos que o Governo tenha em vista, tão-só e fundamentalmente, impedir o normal desenvolvimento do sector empresarial do Estado. No que respeita às dotações de capital para o SEE, o Governo propõe 14,5 milhões de contos - menos 62,8 % (nominais) que a verba inscrita no Orçamento de 1986. No que concerne às indemnizações compensatórias e subsídios, a dotação orçamental, de 37,5 milhões de contos, é inferior em 2,6 milhões (- 6,5 %) à inscrita no Orçamento para 1986. O Governo prevê ainda uma «dotação especial» de 8 milhões de contos para a modernização dos Caminhos de Ferro Portugueses (artigo 68.º da proposta de lei do OE), bem como admite a «possibilidade de complementar a dotação para aumentos de capital com a realização de operações activas», no valor de 8,5 milhões de contos.
A análise comparativa com as dotações para 1986 exige a não consideração dos 8 milhões de contos para a CP, por se tratar de uma «dotação especial», bem como a não consideração das eventuais operações de tesouraria, no valor de 8,5 milhões de contos: em primeiro lugar, porque não se entende o que seja uma dotação de capital «complementada» por um empréstimo; em segundo lugar, porque um empréstimo nada tem a ver com dotações orçamentais. Acresce que não se descortina, no articulado da proposta da lei, qualquer pedido de autorização para a realização das referidas operações de tesouraria (já que não estão incluídas no artigo 8.º), o que pressupõe que, a serem concretizadas, terão de vir a ser regularizadas até ao final de 1987, pelo que se tratará de meros empréstimos de curto prazo.
Por outro lado, haverá que deduzir às dotações de 1986 as relativas à EDP, Siderurgia Nacional, QUIMIGAL e SETENAVE (com excepção dos subsídios à construção naval), já que o Governo as não inclui em 1987, anunciando trazer «ao conhecimento da Assembleia da República» as respectivas soluções «industrial e financeira», de modo a que « os encargos com a reestruturação destas empresas - que deveriam ter sido já parcialmente suportados pelos orçamentos de anos anteriores - não pesem apenas sobre o orçamento de um ano».
Assim sendo, apontam-se os traços essenciais das dotações homólogas comparáveis:
A verba global de despesas com dotações de capital, indemnizações compensatórias e subsídios, baixa de 62,5 milhões de contos em 1986 para 52 milhões em 1987 (- 16,8 %, em termos nominais);
O essencial desta diminuição de dotações recai sobre as empresas de transportes, passando de 49 para 42,4 milhões de contos, afectando, designadamente, a Rodoviária Nacional, o Metro e a PORTLINE.
À Comissão não foram fornecidos elementos informativos que permitam analisar do cumprimento ou não dos contratos-programa assinados com as empresas públicas do sector de transportes. Mas as verbas inscritas para 1987, em indemnizações compensatórias, subsídios e dotações de capital parecem-lhe manifestamente insuficientes, o que é igualmente ressaltado pelo relatório da Comissão de Equipamento Social. Por outro lado, a não contemplação da PORTLINE com quaisquer dotações leva a Comissão a interrogar-se sobre o futuro que o Governo prevê para a marinha mercante nacional. A Comissão manifesta ainda preocupação sobre o futuro dos serviços municipalizados de transportes, até aqui subsidiados pelo ex-FETT e que, a partir do início de 1987, deixam de o ser sem qualquer substituição pelo Orçamento do Estado.
Finalmente, a Comissão lamenta que as anunciadas propostas para a EDP, SN, QUIMIGAL e SETENAVE não tenham sido apresentadas com o Orçamento do Estado para 1987, pois os encargos com a sua reestruturação sempre terão de pesar, ainda que parcialmente, no Orçamento de 1987. Pelo que é de pressupor que a sua apresentação, num futuro próximo, tenha de ser acompanhada de uma proposta de alteração orçamental.
Página 318
318 I SÉRIE - NÚMERO 12
- QUADRO I
Investimentos do PIDDAC
(IW escudos)
Orçamento do Estado Outras fontes
Ministérios Total
Receitas Crédito Outras fontes Total Donativos Outras
gerais externo pré-adestro
Presidência do Conselho de Ministros 1 380 916 419 084 - 1 800 000 - 664 593 2 464 593
Defesa Nacional 150 000 - - 150 000 - - 150 000
Finanças 77 000 - - 77 000 - - 77 000
Administração Interna ... ... ... ... . 300 000 - - 300 000 - - 300 000
Plano e Administração do Território 13 911 880 15 120 - 13 927 000 233 617 - 14 160 617
Justiça ... ... ... ... ... ... ... ... 3 500 000 - - 3 500 000 - - 3 500 000
Negócios Estrangeiros ... ... ... ... . 200 000 - - 200 000 - - 200 000
Agricultura, Pescas e Alimentação 16 355 692 1 998 648 - 18 354 340 942 691 476 225 19 773 256
Indústria e Comércio ... ... ... ... .8 535 083 2 164 917 - 10 700 000 - 747 340 11 447 340
Educação e Cultura ... ... ... ... ... 24 500 000 - - 24 500 000 - 45 500 24 545 500
Obras Públicas, Transportes e Comunicações
... ... ... ... ... ... ..... 35 748 450 7 335 750 - 43 084 200 240 000 12 760 500 56 084 700
Saúde ...... .... ...... 9 483 582 16 418 - 9 500 000 - - 9 500 000
Trabalho e Segurança Social ... ... 2 636 697 331 800 (a) 3 259 700 6 228 197 870 500 3 620 000 10 718 697
PIDRs ... ... ... ... ... ... ... ..... 6 866 542 1 050 618 - 7 917 160 - - 7 917 160
Intermunicipais ... ... ... ... ... ... . 423 000 - - 423 000 - - 423 000
Total ... ... ..... 124 068 842 13 332 355 3 259 700 140 660 897 2 286 808 _ 161 261 863
18 314 158
(a) Transferência do orçamento da Segurança Social.
QUADRO II
Investimentos do Plano
(Milhares de contas)
Variação (percentagem)
1986 1987
Descrição Orçamento Proposta Nominal Real (a)
Encargos Gerais da Nação 1 244 1 881 + 51 + 35,4
Defesa Nacional 51 150 - -
Finanças 80 77
Administração Interna - 300 - -
Justiça 2 500 3 500 + 40 + 25,5
Negócios Estrangeiros - 200 - -
Plano e Administração do Território ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ..... 16 229 17 130 + 5,5 - 5,4
Agricultura, Pescas e Alimentação
12 050 21 077 + 75 + 57
Indústria e Comércio ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... . 8 406 10 906 + 29,7 + 16,3
Trabalho e Segurança Social 7 372 6 301 - 14,5 - 23,3
Educação e Cultura 24 175 25 286 + 4,6 - 6,2
Saúde . : 8 996 10 204 + 13,4 + 1,7
Obras Públicas, Transportes e Comunicações ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... 40 350 43 649 + 8,2 - 3,0
Total 121 433 140 661 + 15,8 + 3,9
(a) Foi utilizado o detractor de 11,5% (0,4x10,3+0,6x12,4).
QUADRO III
Investimentos do Plano financiados pelo OE, por sectores
(Milhares de contas)
Variação (percentagem)
1986 1987 Nominal Real
Cultura . 1 691,9 2 727,4 + 61,2 + 44,6
Educação . 23 261,3 22 921,7 - 1,5 - 11,7
Formação profissional 5 285,8 3 968,1 - 24,9 - 32,6
Saúde . 7 792,7 7 477,1 - 4,0 - 13,9
Segurança Social 1 299,9 1 640,4 + 26,2 + 13,2
Habitação e urbanismo 10 401,6 6 582,3 - 36,7 - 43,2
Defesa e protecção do ambiente 1 805,5 2 751,6 + 52,4 + 36,7
Justiça . 2 160,3 2 469,6 + 14,3 + 2,5
Desporto e ocupação de tempos livres 1 384,8 1 338,9 - 3,3 + 13,3
Agricultura, silvicultura, pecuária 9 753,5 16 854,6 + 72,8 +55,0
Pescas 3 073,1 4151,5 + 35,1 + 21,2
Página 319
19 DE NOVEMBRO DE 1986 319
Variação (percentagem)
1986 1987
Nominal Real
Indústria 4 894,6 3 619,7 - 26,0 - 33,7
Energia 429,9 1 031,9 - 27,8 - 35,2
Turismo 913,2 150,0 - 83,6 - 85,3
Transportes e comunicações 28 891,4 33 630,1 + 16,4 + 4,4
Abastecimento e defesa do consumidor 153,0 113,0 - 26,1 - 33,7
Investigação e desenvolvimento tecnológico 2 567,1 4 891,2 + 90,5 + 70,9
Informação científica e técnica 161,2 463,5 - 60,1 - 64,2
Modernização da Administração Pública 2 085,6 2 453,8 + 17,7 + 5,6
Segurança e ordem pública - 1 357,8 - -
Área de Sines 1 674,9 4 200,0 + 150,8 + 124,9
Serviço da dívida e despesas de suporte 264,1 117,0 - 51,7 - 56,7
Dotações a desagregar 593,8 - - -
Despesas de apoio - 7 409,8 - -
Soma 113 593,9 132 320,7 + 16,5 + 4,5
QUADRO IV
Programação dos Investimentos do Plano
PIDDAC para 1986 PIDDAC para 1987
Ministérios Dotações para 1987 Compromissos para 1987
Orçamento Execução Compromissos
prevista para 1987 Projectos Novos projectos Projectos Decorrentes Decorrentes
anuais plurianuais em curso dos novos projectos de projectos
Plurianuais em curso
Presidência do Conse
lho de Ministros 1 155,0 1 237,8 993,3 - 15,0 1 785,0 30,0 1 270,1
Defesa Nacional 51,0 36,2 40,2 - 116,0 34,0 297,1 44,1
Finanças 80,0 - 27,0 - 77,0 - 50,0 -
Administração Interna - - - - 300,0 - 627,0 -
Justiça 2 500,0 450,0 3 239,6 - 827,2 2 672,8 2 558,9 3 879,3
Negócios Estrangeiros - - - 200,0 - - - -
Plano e Administração
do Território 12 564,0 10916,1 13 856,2 1 910,8 820,4 11 195,3 2 639,8 10 422,5
Agricultura, Pescas e
Alimentação 9 519,9 4 033,1 3 041,3 2 268,5 12 259,6 3 826,2 31 540,5 2 897,8
Indústria e Comércio 8 406,0 4 601,9 13 710,9 2 768,4 359,2 7 572,4 612,4 4 106,3
Trabalho e Segurança
Social 7 342,0 2 876,2 7 757,5 106,3 1 259,5 4 862,4 2 651,4 4 560,4
Educação e Cultura 23 757,0 22 735,6 21 545,5 153,0 1 096,3 23 250,7 2 432,5 23 233,0
Saúde 8 470,0 6 632,6 8 567,7 101,5 1 139,9 8 258,6 1 937,2 11 343,2
Obras Públicas, Transportes e Comunicações 39 528,0 35 368,1 43 742,0 125,0 3 353,1 39 606,2 16 186,2 32 010,7
Soma 1 113 372,9 88 887,6 1 116 520,2 7 633,5 21 623,2 103 063,6 61 563,0 93 767,4
Por memória: Os compromissos para os anos posteriores a 1988 decorrentes dos projectos novos a lançar em 1987 ascendem a 192,3 milhões de contos e os decorrentes de projectos em curso a 106,3 milhões de contos.
QUADRO V
PIDRs e Investimentos Intermunicipais
PIDRs Presidência do Conselho Ministros
Ministério do Plano e da Administração
do Território
MAPA MIC MTSS MEC Ministério da Saúde
MOPTC Total
Trás-os-Montes - 281,0 777,1 - - - - - 1058,1
Cova da Beira 25,0 390,0 667,6 - - 236,6 - - 1 320,3
Baixo Mondego . ..... .. .. - 1 258,9 488,7 - - 3,0 - 380,0 2 130,4
Entre Mira e Guadiana - 64,0 396,6 - - 354,1 199,4 45,0 1 059,1
Nordeste Algarvio - 498,1 102,6 - 65,4 103,8 35,1 - 805,0
Acções preparatórias - Alto
Minho 42,3 146,2 71,7 - - 50,3 37,0 - 347,5
Norte Alentejo 13,7 19,8 122,1 63,0 - 13,0 170,4 - 402,0
Ria Formosa - 16,0 96,1 142,7 8,0 25,0 261,7 140,0 689,5
Trás-os-Montes e Alto Douro - 105,2 - - - - - - 105,2
Investimentos intermunicipais - 4_23,0_ -- - - --430,0
Soma 80,9 I 3 203,2 I 2 722,5 205,7 r 73,4 I 785,8 703,6 I 565,0 8 340,2
Palácio de São Bento, 18 de Novembro de 1986. - O Coordenador da Subcomissão, Ivo Jorge de Almeida
Pinho.
t
Página 320
320 I SÉRIE - NÚMERO 12
Sr. Presidente, se me permite, leria agora o parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado. Aliás, peço-lhe que leia também as declarações de voto relativas ao relatório que foi lido.
O Sr. Ivo Pinho (PRD): - Certo, Sr. Presidente. Vou então começar por proceder à leitura das declarações de voto existentes, que são dos seguintes partidos: PSD, PS e CDS
Declaração de voto do PSD
O PSD vota contra o texto do relatório por lhe merecer as mais sérias reservas em algumas das conclusões formuladas, nomeadamente as constantes dos capítulos IV («Sistema fiscal») e V («PISEE»).
Declaração de voto do PS
O Partido Socialista, tendo em atenção a estrutura autónoma das Grandes Opções do Plano, considera necessário proceder à cisão da proposta de lei n.º 43/IV, sem prejuízo do debate e votação das matérias tratadas de acordo com os calendários previstos. Nesse sentido, considerou necessário separar a parte que remete para as Grandes Opções para 1987 da parte referente às Grandes Opções para 1987-1990.
Quanto a esta última parte, o Partido Socialista entende que a sua retirada da discussão e votação, segundo o calendário previsto, apenas poderá ter lugar mediante alteração da agenda, cabendo à conferência dos representantes dos grupos parlamentares deliberar sobre essa eventualidade, se assim o entender.
Na ausência de tal deliberação, o Partido Socialista entende que a agenda se mantém nos termos previstos, salvo se o Governo vier a tomar iniciativa suficiente em sentido diverso.
Declaração de voto do CDS
O CDS vota vencido o ponto do relatório respeitante ao investimento e financiamento do sector empresarial do Estado.
Com efeito, não há elementos suficientes que permitam concluir, como se conclui, no sentido da insuficiência das dotações que, a vários títulos, estão orçamentadas em favor das empresas públicas.
É, designadamente, o que se passa com a economia de custos, em matéria de aquisição de combustíveis, e ainda com os valores que o Governo informou que iria afectar a um programa especial de recuperação de quatro empresas do sector não financeiro.
Irei de seguida, finalmente, proceder à leitura do parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano, o qual é do seguinte teor:
As propostas de lei n.ºs 43/IV, das Grandes Opções do Plano a Médio Prazo - 1987-1990 e das Grandes Opções do Plano para 1987, e 44/IV, do Orçamento do Estado para 1987, deram entrada na Assembleia da República no dia 15 de Outubro.
Os anexos informativos que a proposta de lei do Orçamento do Estado deve integrar, nos termos do artigo 11.º da Lei do Enquadramento, deram entrada na Assembleia da República na mesma data, com excepção do orçamento consolidado do sector público administrativo.
A Comissão recebeu, no decorrer dos seus trabalhos, vários elementos informativos adicionais, oportunamente solicitados ao Governo e enviados oficialmente, como a seguir se indica, tendo recebido outros através de membros do Governo que reuniram com a Comissão:
Ofício sem número, do Gabinete do Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares, em 29 de Outubro: «Complemento relativo às Grandes Opções do Plano para 1987, inserido no quadro das Grandes Opções do Plano a Médio Prazo (1987-1990)»;
Ofício n.º 811/86, do Gabinete do Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares, em 29 de Outubro: «Rectificações a alguns quadros e anexos dos mapas das propostas de lei de Orçamento do Estado, alterações ao texto da proposta de lei das Grandes Opções do Plano 1987-1990 e Grandes Opções do Plano 1987 e emendas do mapa vil da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1987»;
Ofício sem número, do Gabinete do Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares, em 3 de Novembro: «Desenvolvimento do Orçamento do Estado para 1987, por ministérios (vols. I e II) e execução orçamental dos fundos e serviços autónomos de 1985 (vols. I e II)»;
Ofício n.º 837/86, do Gabinete do Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares, em 4 de Novembro: «Apresentação variante do mapa VII da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1987, que estabelece a distinção entre projectos novos e projectos em curso e outras pequenas rectificações»;
Ofício n.º 6745/86, do Gabinete do Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, em 4 de Novembro: «Desdobramento, por programas, do PIDDAC/87 e elementos referentes aos programas integrados de desenvolvimento regional»;
Ofício n.º 6754/86, do Gabinete do Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, em 5 de Novembro: «Nota sobre o orçamento consolidado do sector público administrativo, nota sobre os 'meios financeiros provenientes de acordos de defesa', boletim mensal da Direcção-Geral da Contabilidade Pública de Dezembro 1985, 'Conta da Segurança Social - 1985', mapa `Despesas globais por agrupamentos económicos - Execução orçamental do ano económico de 1986 - Janeiro a Setembro' e boletim mensal da Direcção-Geral da Contabilidade Pública de Junho de 1986»;
Ofício n.º 6936/86, do Gabinete do Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, em 11 de Novembro: «Orçamento da educação, por acções, 1987»;
Página 321
19 DE NOVEMBRO DE 1986 321
Ofício n.º 6942/86, do Gabinete do Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, em 11 de Novembro: «Fluxos financeiros com as Comunidades Europeias»;
Ofício n.º 7003/86, do Gabinete do Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, em 13 de Novembro: «Elementos sobre a previsão do serviço da dívida pública para 1987, designadamente as taxas de juro variáveis previstas e evolução de câmbios»;
Ofício n.º 7030/86, do Gabinete do Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, em 13 de Novembro: «Emprego em 1986 e 1987, importações em 1986 e 1987, mapa de subsídios e indemnizações compensatórias e dotações de capital para o SEE, versão provisória dos investimentos do SEE, com indicação das partes de financiamento, estimativa das operações activas do Tesouro a realizar em 1987 e execução do programa de reequilíbrio financeiro da Região Autónoma da Madeira»;
Ofício n.º 7034/86, do Gabinete do Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, em 14 de Novembro: «Rectificações às Grandes Opções do Plano 1987-1990 e Grandes Opções do Plano 1987 (quadros)».
A conferência dos representantes dos grupos parlamentares decidiu, nos termos regimentais, estabelecer o seguinte calendário para apreciação e debate das propostas de lei das Grandes Opções do Plano e Orçamento do Estado:
Elaboração dos pareceres pelas comissões especializadas - até 12 de Novembro;
Elaboração do parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano - até 17 de Novembro;
Debate na generalidade em plenário - 18, 19 e 20 de Novembro;
Debate e votação na especialidade na Comissão de Economia, Finanças e Plano - de 21 a 29 de Novembro;
Debate e votação na especialidade em plenário e votação final global - 2, 3 e 4 de Dezembro.
A Comissão de Economia, Finanças e Plano reuniu no dia 24 de Outubro, para discussão da metodologia a seguir na apreciação das propostas de lei das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1987, tendo decidido criar uma subcomissão eventual para elaboração do relatório e parecer, coordenada pelo deputado Ivo Jorge Pinho e constituída pelos seguintes deputados:
Alípio Pereira Dias e Fernando Próspero Luís, do PSD;
João Gomes Cravinho e Helena Torres Marques, do PS;
Ivo Jorge Pinho e José Silva Lopes, do PRD;
Octávio Augusto Teixeira e Carlos Alberto Carvalhas, do PCP;
Luís Nogueira de Brito e António Vasco de Mello, do CDS;
João Corregedor da Fonseca, do MDP/CDE.
A subcomissão reuniu pela primeira vez no dia 24 de Outubro, tendo estabelecido o calendário de reuniões a propor aos membros do Governo que entendeu ouvir, decidindo ainda proceder à audição de especialistas sobre aspectos específicos no âmbito das GOPs e do Orçamento do Estado.
Com vista à apreciação das propostas de lei e à elaboração do relatório e parecer a apresentar à Comissão de Economia, Finanças e Plano, a subcomissão realizou as seguintes reuniões de trabalho:
Dia 29 de Outubro - com a presença do Sr. Ministro das Finanças;
Dia 30 de Outubro - com a presença do Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território;
Dia 31 de Outubro - com a presença do Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação;
Dia 3 de Novembro - com a presença da Sr.ª Ministra da Saúde;
Dia 4 de Novembro - com a presença do Sr. Ministro da Educação e Cultura;
Dia 5 de Novembro - com a presença do Sr. Ministro da Indústria e Energia;
Dia 11 de Novembro - com a presença dos Srs. Secretários de Estado do Orçamento, do Tesouro e para os Assuntos Fiscais e com a presença dos Srs. Ministros das Finanças e do Plano e da Administração do Território;
Dia 12 de Novembro - com a presença do Sr. Prof. Alfredo de Sousa.
A subcomissão não pôde ouvir o Sr. Governador do Banco de Portugal, conforme interesse manifestado, pelo facto de o Governo não ter acedido à solicitação que a subcomissão havia formulado nesse sentido.
A Comissão de Economia, Finanças e Plano recebeu os relatórios, que se anexam ao relatório da subcomissão, emitidos pelas Comissões Parlamentares de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, Segurança Social, Saúde e Família, Trabalho, Educação, Ciência e Cultura, Agricultura e Mar, Defesa Nacional, Negócios Estrangeiros e Emigração, Equipamento Social e Ambiente, Administração Interna e Poder Local, Integração Europeia, Condição Feminina e Juventude.
A Comissão recebeu ainda, nesta data, o parecer do Conselho Nacional do Plano, o qual, naturalmente, não pôde ser apreciado.
Tendo em conta a particular complexidade da matéria a apreciar, a subcomissão deliberou atribuir a cada um dos grupos parlamentares abaixo indicados a responsabilidade pela elaboração de relatórios parciais, incidindo sobre as seguintes temáticas:
Enquadramento macro-económico e política orçamental Partido Renovador Democrático (deputado José da Silva Lopes);
Análise das despesas - Partido do Centro Democrático Social (deputado José Luís Nogueira de Brito);
Análise das receitas - Partido Social-Democrata (deputado Alípio Pereira Dias);
Página 322
322 I SÉRIE- NÚMERO 12
Fiscalidade - Partido Socialista (deputado João Gomes Cravinho e deputada Helena Torres Marques);
Investimento público - Partido Comunista Português (deputado Octávio Augusto Teixeira).
Os relatórios referidos foram apreciados pela Comissão, tendo sido aprovados depois de beneficiarem da introdução de alterações consequentemente aceites.
Por manifesta falta de tempo não foi possível efectuar uma análise suficientemente aprofundada do trabalho produzido, nem eliminar algumas sobreposições entre os vários textos, nem proceder à desejável harmonização de aspectos de redacção do relatório final. Não surpreenderá, portanto, que possam surgir, em aspectos específicos, discordâncias entre os membros da Comissão.
O relatório elaborado pela subcomissão mereceu o voto favorável dos Grupos Parlamentares do Partido Socialista, do Partido Renovador Democrático, do Partido Comunista Português, do Centro Democrático Social e do Movimento Democrático Português, e os votos contra do Partido Social-Democrata. Oportunamente, serão entregues declarações de voto - acabei de as ler há pouco - por parte do Partido Social-Democrata, Partido Socialista e Partido do Centro Democrático Social.
Finalmente, a Comissão de Economia, Finanças e Plano é de parecer que a parte da proposta de lei n.º 43/IV, que explicita as GOPs para 1987, bem como a proposta de lei n.º 44/IV, estão em condições de ser apreciadas, nos termos regimentais.
É tudo, Sr. Presidente, e já não é pouco.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Ivo de Pinho, agradeço-lhe o sacrifício feito.
Srs. Deputados, levo ao vosso conhecimento o teor de um ofício que recebi do Sr. Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano. É o seguinte:
Questionada sobre a sua posição em matéria de votação da proposta de lei n.º 43/IV, a Comissão de Economia, Finanças e Plano entendeu, com a abstenção do PSD, que, na sequência do parecer dado pela 1.ª Comissão sobre o assunto e da apresentação complementar pelo Governo de um texto autónomo explicitando as GOPs para 1987, a Assembleia deve dividir a proposta, em conformidade com o disposto no n.º 3 do artigo 149.º do seu Regimento.
Nestes termos, o debate deverá prosseguir imediatamente, de acordo com o calendário previsto, versando sobre a proposta de lei n.º 43/IV na parte em que remete para as Grandes Opções para 1987 e sobre a proposta de lei n.º 44/IV.
Quanto ao debate da parte da proposta de lei n.º 43/IV respeitante às GOPs para o período de 1987-1990, caberá à conferência dos representantes dos grupos parlamentares deliberar sobre o respectivo agendamento.
O texto transcrito foi aprovado por unanimidade.
Em consequência deste ofício, convido os representantes dos grupos parlamentares para uma conferência à 17 horas e 30 minutos.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Entendemos que, de acordo com o n.º 3 do artigo 149.º do Regimento da Assembleia da República, é ao Plenário da Assembleia da República que compete discutir o parecer enviado a V. Ex.ª pela Comissão de Economia, Finanças e Plano, e não à conferência de líderes.
O Sr. Presidente: - O parecer que V. Ex.ª referiu é o ofício que acabei de ler?
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Exactamente, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Precisamente por isso é que convidei os representantes dos grupos parlamentares para uma conferência, para que depois se possa propor ao Plenário aquilo que a conferência vier a deliberar. E isto apenas para evitar uma discussão que, segundo penso, será facilitada através daquilo que a conferência de líderes decidir.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, concordo com a sugestão apresentada pelo Sr. Deputado Ferraz de Abreu.
No entanto, penso que o assunto não merece mais debate, embora, segundo o Regimento, mereça votação por parte da Assembleia, pois deverá ser ela a decidir se devemos ou não fazer a cisão. Ou seja, se confirmarmos esta deliberação - e não este parecer, como foi apelidado -, apresentada pela Comissão de Economia, Finanças e Plano, iniciaremos imediatamente o debate das Grandes Opções do Plano para 1987 e, depois, a conferência de líderes apenas se terá de pronunciar sobre o eventual agendamento, em fase posterior, das Grandes Opções do Plano a médio prazo.
Penso que esta é a posição que deve ser assumida!
O Sr. Soares da Cruz (CDS): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Se se entende isto como uma deliberação sujeita à confirmação por parte do Plenário, então, Sr. Deputado, vou consultar a Mesa.
Entretanto, dou a palavra ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca que também pretende pronunciar-se sobre esta matéria.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, o Governo terá ainda de usar da palavra e, concerteza, e depois disso, terá de se sujeitar às perguntas dos diversos grupos parlamentares. Ora, em vez de convocar os representantes dos grupos parlamentares para as 17 horas e 30 minutos, de acordo com o que foi decidido na Comissão de Economia, Finanças e Plano, creio que seria melhor suspender agora a sessão e convocá-la para as 12 horas e 30 minutos, recomeçando os trabalhos às 15 horas.
Página 323
19 DE NOVEMBRO DE 1986 323
Assim, decidiríamos, desde já, sobre o melhor método a seguir. Caso contrário, vamos perder bastante tempo a discutir o problema aqui, pondo-se depois a questão de se saber a que horas é que o Sr. Ministro vai falar e quando é que se vai iniciar o debate.
Repito: parece-me que, para um debate desta natureza, era preferível irmos agora para a conferência de líderes resolver este problema e começarmos os trabalhos às 15 horas.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta que nos é apresentada, através de uma deliberação da Comissão de Economia, Finanças e Plano, em meu entender, corresponde exactamente àquilo que foi deliberado na conferência dos líderes parlamentares. No entanto, surge agora uma sugestão num sentido um tanto diferente, por parte do Partido Socialista.
Pela nossa parte estamos disponíveis para considerarmos esta sugestão feita pelo Partido Socialista, embora não nos pareça que seja adequado fazer essa consideração aqui em Plenário, pois, com vantagem, essa questão poderia ser abordada numa conferência de líderes parlamentares.
Em todo o caso, parece-nos que a deliberação da Comissão de Economia, Finanças e Plano comporta duas partes: a primeira, que recomenda a cisão da Proposta de Lei sobre as grandes opções, separando as grandes opções a médio prazo das grandes opções para 1987 - creio que em relação a esta parte estamos todos de acordo, não havendo nenhuma objecção; a segunda parte, diz respeito ao momento em que deve ser considerada a votação da parte da proposta de lei que se refere às grandes opções a médio prazo. Suponho que é sobre esta segunda parte que incidem as dúvidas, as objecções e a nova sugestão do Partido Socialista. Creio, no entanto, que poderíamos reservar a discussão dessa parte para uma conferência de líderes parlamentares.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tomando em consideração o que foi referido, a Mesa entende que não deve submeter à votação este requerimento, pois se porventura ele for votado e aprovado, terá sempre que ser remetido para a conferência de líderes, porque o respectivo texto assim o diz - resulta do texto que a conferência de líderes terá que se pronunciar sobre esta matéria. Sendo assim, por que razão é que havemos de estar aqui a discutir se, de qualquer modo, pela sua discussão e consequente aprovação, teremos de, em conferência de líderes, determinar o conteúdo da deliberação que aqui for tomada?
Tem a palavra o Sr. António Capucho.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, permita-me discordar da opinião de V. Ex.ª, pois se o Plenário confirmar a deliberação da Comissão de Economia, Finanças e Plano, estaremos prontos a iniciar o debate sobre as Grandes Opções do Plano e Orçamento do Estado para 1987 e, depois, na conferência de líderes proposta por V. Ex.ª para as 17 horas e 30 minutos ou amanhã, pois deixa de ser urgente, logo se fará o eventual agendamento, para momento ulterior, das Grandes Opções do Plano a médio prazo.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Mas, de facto, se neste momento confirmarmos por votação aquilo que decidiu a Comissão de Economia, Finanças e Plano, estaremos prontos para começar imediatamente este debate, sem mais delongas.
O Sr. Presidente: - A Mesa também entende que, independentemente dessa votação, deveremos iniciar de imediato o debate.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, pela nossa parte concordamos com a interpretação - pois parece-nos que não pode haver outra - do Sr. Deputado António Capucho quanto a quem compete decidir da cisão da proposta de lei que está agendada. O artigo 149.º do Regimento da Assembleia da República é claro: é a Assembleia que decide. Tem de haver um voto do Plenário para decidir a cisão, não podendo ser decidida na conferência de líderes parlamentares. Outra questão que se coloca é que a conferência de líderes parlamentares não pode decidir do desagendamento, pois está agendada a discussão da proposta do Governo e esta inclui as opções a médio prazo, não podendo ser desagendadas senão por decisão da própria Assembleia ou se o Governo - e é uma pergunta que deixo ao Governo - estiver disposto a retirá-las da discussão.
Portanto, a questão que colocamos vai no sentido de saber se o Governo está disposto a retirar as opções a médio prazo da proposta de lei.
Em segundo lugar, a bancada do PS gostaria, antes de retomar qualquer decisão sobre esta matéria, de ouvir a opinião do Governo sobre a própria metodologia proposta pela Comissão de Economia, Finanças e Plano, isto é, da eventual cisão e do modo de discutir as duas parcelas que constituem o todo que está agendado para esta sessão da Assembleia da República, que são as Grandes Opções do Plano e Orçamento do Estado para 1987 e de médio prazo.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos pois pôr este texto à votação...
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra ainda para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço-lhe desculpa se, porventura, não interpretei bem o sentido da iniciativa que o Sr. Presidente ia tomar. No entanto, devo dizer que se ia colocar à votação o parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano...
O Sr. António Capucho (PSD): - Não é o parecer!
O Orador: - Não é o parecer! É que o Plenário não tem de votar o parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano, porque os pareceres que as comissões elaboram e que acompanham os projectos ou pro-
Página 324
324 I SÉRIE- NÚMERO 12
postas de lei são elementos instrutórios relativamente a esses projectos ou propostas de lei, não sendo objecto de deliberação formal por parte do Plenário.
Nesse sentido, se o Plenário vier a tomar alguma deliberação não será com base no parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano, que regimentalmente não vota, mas sim num eventual requerimento que venha a ser apresentado na Mesa para que haja ou não cisão do documento da proposta de lei sobre as Grandes Opções do Plano apresentada pelo Governo.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para tentar deslindar esta confusão.
Não vamos votar nenhum parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano, como é evidente e muito bem disse o Sr. Deputado Jorge Lacão. O que vamos votar é uma proposta da Comissão de Economia, Finanças e Plano no sentido da cisão, ou seja, é o ofício que a comissão dirigiu a V. Ex.ª, propondo que a cisão seja feita, nos termos de uma deliberação interna. Ora, se realmente a interpretação da Mesa é que essa decisão só pode ser tomada em Plenário, vamos votar.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para interpelar a Mesa e para fazer algumas considerações acerca desta questão processual.
Em primeiro lugar, gostaria de lembrar que foi a conferência de líderes que deu instruções, naturalmente através do Sr. Presidente, para a Comissão de Economia, Finanças e Plano apresentar esta proposta ao Plenário. Como tal, não faz sentido que o Plenário venha agora contestar, pois -repito- foi a conferência de líderes parlamentares, onde estão representados todos os partidos, que deu instruções à Comissão de Economia, Finanças e Plano para, em primeiro lugar, proceder à cisão dá proposta de lei e, em segundo lugar, para apresentar uma proposta ao Plenário, para que este consagrasse essa cisão e o procedimento que a conferência de líderes e a Comissão entenderem adoptar.
Também gostaríamos de ouvir a posição do Governo, embora nos pareça desnecessária.
Devo ainda dizer aos deputados, do Partido Socialista que, se passarmos imediatamente à votação, só poderemos votar de acordo com as expectativas que temos, isto é, de acordo com o trabalho que foi adiantado na conferência de líderes, relativamente à metodologia do debate, e na Comissão de Economia, Finanças e Plano. Não podemos fazer outra coisa.
Estamos, pois, disponíveis para considerar a nova sugestão trazida a Plenário pelo Partido Socialista, mas numa conferência de líderes ou numa outra sede, por exemplo na Comissão de Economia, Finanças e Plano. Aqui será difícil rever toda a posição em que nos encontramos. Além disso, todo o debate está pensado para discutirmos só as Grandes Opções para 1987, foi assim que pensámos o debate na conferência de líderes e foi nessa perspectiva que dividimos os tempos. Naturalmente que uma modificação, agora, levará a alguns ajustamentos. Não somos contra isso e estamos disponíveis, porém precisamos é de ter alguma possibilidade de trocar impressões inclusivamente com os outros grupos parlamentares.
O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos.
O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, parece-nos claro o que resulta do já decidido na conferência de líderes e que não pode ser rectificado neste Plenário. O que consta da agenda é o início da discussão, na generalidade, sobre as Grandes Opções do Plano e o Orçamento do Estado para 1987. Portanto, não há que desagendar nada, há sim que cumprir a agenda.
Se se entende que deve ser votada a proposta - e não sei se estou a qualificá-la correctamente - da Comissão de Economia, Finanças e Plano, então façamo-lo. Não se pode é falar em desagendamento, quando muito haverá que ratificar o agendamento já feito.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, pedi a palavra para dizer que a bancada do Partido Socialista dá o seu acordo a que seja votada a proposta de cisão da proposta de lei apresentada pelo Governo. Mas se tal acontecer, em nosso entender, os dois textos em que foi cindida a proposta do Governo deverão ser debatidos e discutidos conjuntamente com o Orçamento do Estado.
Risos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, há pouco manifestei que - talvez não o tivesse feito da forma mais curial, pois estas questões não se devem colocar a terceiros por interposta pessoa, nomeadamente através da Mesa, mas era o único meio que eu tinha de o fazer - para a nossa bancada era importante conhecer (e coloquei a questão) o sentimento do Governo em relação a esta metodologia. Por isso, solicitava à Mesa que desse oportunidade ao Governo, se essa for a sua vontade, para nos esclarecer sobre esta matéria.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, realmente inscrevi-me para me pronunciar sobre esta matéria. No entanto, suponho que o Sr. Deputado Lopes Cardoso colocou uma questão ao Governo e, como o que eu pretendia era apresentar a V. Ex.ª as razões e a conveniência da votação do projecto de resolução que acabei de entregar à Mesa, penso que essa apresentação beneficiaria com o esclarecimento da questão colocada pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso.
Página 325
19 DE NOVEMBRO DE 1986 325
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para manifestar a minha estranheza pela posição assumida pelo Partido Socialista. Isto porque, se votarmos favoravelmente a proposta da Comissão, que diz especificamente que o debate deverá prosseguir imediatamente, de acordo com o calendário previsto, versando sobre a proposta de lei n.º 43/IV, na parte em que remete para as Grandes Opções para 1987, e sobre a proposta de lei n.º 44/IV, isto é, sobre o Orçamento do Estado, obviamente que caberá à conferência de líderes parlamentares deliberar sobre o agendamento para fase ulterior do debate da proposta de lei n.º 43/IV, no que respeita às Grandes Opções do Plano a médio prazo.
Francamente que não percebo qual é a dúvida!
Quanto à posição do Governo, já a conhecemos, uma vez que remeteu este um ofício à Assembleia, que V. Ex.ª enviou para os grupos parlamentares, e se conhecemos a sua posição por que é que se está agora a pedir-lhe que explique outra vez aquilo que já sabemos?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado.
O Sr. Ministro de Estado (Eurico de Melo): Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo mantém a proposta original que se encontra agendada.
O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra ainda para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, congratulo-me porque suponho que houve clarificação com o debate.
Risos do PSD e do CDS.
Srs. Deputados, tenham calma!
Em primeiro lugar, esclarecemos que o parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano sobre as propostas de lei não é um texto susceptível de votação aqui em Plenário, pelo que o que teremos de votar aqui será o último texto apresentado pela Comissão, isto se lhe dermos o valor de requerimento, para que nessa qualidade possa ser aqui votado.
Sucede que este texto, com o valor de requerimento, apresentado pela Comissão de Economia, Finanças e Plano, é desdobrável em três questões claramente distintas.
A primeira delas, que corresponde ao primeiro parágrafo, vai no sentido de conferir à Assembleia a possibilidade de tomar iniciativa de dividir, para efeitos de votação - e sublinho, dividir -, a proposta de lei relativa às grandes opções de médio prazo. Ora, o Governo acaba de nos informar que não tem intenção de, pela sua parte, tomar a iniciativa de divisão desta proposta de lei.
Assim sendo, surge uma outra questão, isto é, a Assembleia pode tomar a iniciativa de votar favoravelmente a divisão do texto em duas propostas de lei, ficando ainda para resolver se, apesar disso, elas são discutidas em complementaridade e em simultâneo ou se uma delas é agendada para momento ulterior ao debate que vamos travar.
O facto de o Governo nos dizer que, pela sua parte, não tem intenção de tomar a iniciativa de desdobrar a proposta significa que é seu desejo que se faça a discussão, na generalidade, do documento único que o Governo apresentou. E, se assim é, pode ocorrer que a Assembleia da República aceite a posição do Governo, pelo menos quanto à possibilidade de apreciar e debater em conjunto a matéria sobre as grandes opções de médio prazo e sobre as grandes opções anuais sem que isso implique a necessidade de as votar conjuntamente. Isto, embora possa ocorrer no final do debate uma votação separada para cada um destes dois textos.
Portanto, não basta deliberar sobre se dividimos ou não as propostas de lei, mas importa também deliberar sobre se mantemos o agendamento, mesmo que ocorra cisão acerca delas.
Por isso, é necessário que estes vários aspectos fiquem clarificados antes de fazermos a votação, para sabermos se, em primeiro lugar, votamos apenas a divisão da proposta e se, em segundo lugar, votamos favoravelmente a manutenção do agendamento das duas propostas ou se também aí se fará uma distinção quanto ao momento de apreciação e discussão, na generalidade, de cada uma delas.
Como o Governo as quer discutir em conjunto - é o que infiro da tomada de posição governamental, se o Governo não tiver uma palavra diferente a dizer sobre isto -, pode ocorrer que haja da nossa parte disponibilidade para, embora cindindo as propostas, podermos vir a fazer o debate, em conjunto, de ambas.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, ainda pretende usar da palavra?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Pretendo, sim, Sr. Presidente. Agora, depois do que ouvi e que não trouxe novidade nenhuma, já estou em condições para apresentar o projecto de resolução do CDS.
Risos do CDS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Na realidade, o Sr. Deputado Jorge Lacão gostou muito de se ouvir neste momento; fez bem!
Todavia, devo dizer-lhe que o seu partido está informado acerca do conteúdo desta intervenção do Sr. Ministro de Estado. O Governo já ontem nos disse, por carta, que mantinha o que tinha feito, o que, em meu entender, já é muito, pois o Governo já cindiu o seu documento em duas partes. E este foi o nosso entendimento na Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Havia, agora, que o cindir formalmente, em termos do articulado da proposta de lei n.º 43/IV. Foi isso que a referida Comissão entendeu que devia ser feito, isto é, que a Assembleia o deve fazer por várias razões, que se prendem com o próprio processo de discussão
Página 326
326 I SÉRIE - NÚMERO 12
desta proposta de lei, como, por exemplo, o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, a forma como as várias comissões especializadas se pronunciaram sobre a proposta, a forma como o Governo acabou por aceitar apresentar um texto autónomo das Grandes Opções para 1987, embora complementarmente - como foi gosto dos meus colegas do Partido Social-Democrata dizê-lo e afirmá-lo.
Por isso, o que acontece é que a Comissão é de opinião que se deve proceder à cisão, isto porque entende que a Assembleia, neste momento, não está em condições de proceder a outro tipo de discussão e votação.
Nessa conformidade - aí V. V. Ex.ªs têm razão -, o que a Comissão proferiu foi um parecer, e nós subscrevemos já uma proposta para a Assembleia votar, no sentido de fazer a cisão, devendo ser votada imediatamente. Assim, Sr. Presidente, solicito à Mesa que a coloque à votação.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Muito bem!
O Orador: - Já ontem na Comissão entendemos que não havia razão para a discutir...
O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Discutimo-la na Comissão de Economia, Finanças e Plano, quando elaborámos o parecer que foi lido a este Plenário!
Em seguida - tem razão o Sr. Deputado Jorge Lacão, foi a parte útil do seu discurso - temos de discutir o agendamento da outra parte da proposta e isso é da competência da conferência de líderes parlamentares.
Considero que a proposta feita, com espírito construtivo, pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca é importante. Estamos perto do meio-dia, pelo que a conferência de líderes parlamentares deve reunir imediatamente e pronunciar-se, para já, sobre o agendamento imediato que nos vai ocupar já a seguir, isto é, sobre o agendamento mediato ou imediato, como quiserem, da outra parte da proposta de lei n.º 43/IV.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Perante a cisão da proposta, a conferência terá de reunir novamente e era oportuno que reunisse agora, pois já são 12 horas e 40 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos terminar esta discussão, pois penso que já não terá grande interesse.
Vamos considerar o ofício que recebemos da Comissão de Economia, Finanças e Plano como sendo uma proposta. E, como tal, a Mesa vai submetê-lo à votação.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, dá-me licença que o interrompa?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço-lhe desculpa e lamento dizer-lhe que não podemos proceder à votação de seguida.
O texto que a Mesa recebeu como sendo um ofício da Comissão de Economia, Finanças e Plano só seria susceptível de votação se, por consenso dos grupos parlamentares, fosse entendido como sendo um requerimento. Sucede que, nas próprias palavras do Sr. Deputado Nogueira de Brito, se demonstrou que esse ofício não tem o valor de requerimento e foi por isso que o CDS tomou a iniciativa de apresentar um requerimento para ser votado. Portanto, é esse requerimento que devemos votar e não o ofício da Comissão.
Vozes do CDS- - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, realmente, estou confrontado com uma situação muito delicada.
Primeiro, o ofício que recebi da 5.ª Comissão não é um projecto de resolução. Era minha intenção tomá-lo como tal, pelo entendimento que julguei colher junto da Câmara, mas juridicamente não se trata sequer de uma proposta de resolução, É apenas um ofício em que se dá conhecimento ao Presidente da deliberação tomada pela 5.ª Comissão. Se, porventura, considerarmos o conteúdo do ofício recebido como sendo um projecto de resolução, pois então votar-se-á.
Verifico que o Sr. Deputado Jorge Lacão levanta dificuldades de ordem formal quanto ao entendimento de este ofício ser interpretado como projecto de resolução. Sendo assim, sigo-lhe as passadas, pois, efectivamente, não se tratando de um projecto de resolução, não haverá que ser posto à votação. Mas há um projecto de resolução, apresentado pelo CDS, que é do seguinte teor:
Os deputados abaixo assinados requerem, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 149.º do Regimento da Assembleia da República, a cisão da proposta de lei n.º 43/IV, de modo a permitir a discussão e votação separada das Grandes Opções do Plano para 1987.
Srs. Deputados, é este o projecto de resolução para submeter à votação da Câmara.
Para fazer uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, era para solicitar uma interrupção dos trabalhos por 30 minutos.
Vozes do PSD: - É boicote!
O Sr. Presidente: - Está concedida a interrupção, mas, entretanto, convido os representantes dos grupos parlamentares a deslocarem-se ao meu gabinete para efectuarmos uma conferência acerca deste problema.
Srs. Deputados, está interrompida a sessão por 30 minutos. Retomaremos os trabalhos às 13 horas e 15 minutos.
Eram 12 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, declaro reaberta a sessão.
Eram 13 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai ler uma proposta que foi apresentada na Mesa.
Página 327
19 DE NOVEMBRO DE 1986 327
Foi lida. É a seguinte:
Os deputados abaixo assinados requerem, ao abrigo do disposto do n.º 3 do artigo 149.º do Regimento, a cisão da proposta de lei n.º 43/IV, de modo a permitir a discussão e votação separada das Grandes Opções do Plano para 1987.
A discussão e votação das grandes opções do plano a médio prazo serão agendadas ulteriormente, ouvida a conferência dos representantes dos grupos parlamentares.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, como o Plenário e todos os senhores deputados sabem, após a apreciação de um parecer votado pelo Plenário, vindo da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias, tornou-se evidente a faculdade regimental de que dispunha a Assembleia da República para, se assim o entendesse, vir a cindir em dois textos a proposta de lei inicialmente apresentada pelo Governo.
Aliás, o requerimento que acaba de ser lido pelo Sr. Secretário corresponde, no seu primeiro ponto, a uma proposta neste sentido.
Todavia, há um outro problema que ainda não foi suficientemente dilucidado. O Governo - ouvimo-lo, há pouco, através de um seu representante - sustenta o desejo de manter unida a sua proposta de lei.
Vozes do PSD: - Não é isso!
O Orador: - Embora a Assembleia da República tenha um entendimento diferente acerca deste ponto, verificámos que, politicamente, o Governo deseja poder discutir separadamente as grandes opções do plano a médio prazo e as para 1987. Pela nossa parte, não temos nenhum receio político em fazê-lo desta forma. Porque também não temos nenhum receio político em que se saiba, desde já, qual a posição do Partido Socialista sobre o conteúdo, quer das grandes opções do plano a médio prazo quer das Grandes Opções para 1987.
Nesse sentido, entendemos que a circunstância de ambas estas matérias estarem agendadas para hoje impõe que estas estejam ao abrigo do princípio da estabilidade da ordem do dia. Como é sabido, o princípio da estabilidade da ordem do dia só pode ser alterado por unanimidade, não dos representantes dos grupos parlamentares, mas dos deputados presentes no Plenário. Nos termos do artigo 56.º do Regimento da Assembleia da República, basta que um único deputado suscite o problema da estabilidade da ordem do dia para que não possa ser desagendada uma matéria que tenha sido agendada para esse dia.
Pela nossa parte, porque não temos nenhum receio político de discutir as Grandes Opções do Plano a Médio Prazo ou as Grandes Opções do Plano para 1987, mantemo-nos fiéis ao princípio da estabilidade da ordem do dia e, nesse sentido, não podemos aceitar o n.º 2 do requerimento que acabou de ser lido, porque, sendo anti-regimental, é susceptível de impugnação, e, como tal, não pode ser objecto de deliberação pela Assembleia da República.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos.
O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, vou ser muito rápido, porque entendo que há um requerimento apresentado na Mesa para votação e penso que não é altura de se fazer considerações laterais a seu pretexto ou a seu propósito. Isto porque, com certeza que a posição dos partidos se aferirá por outros critérios que não o do receio político de votar o que quer que seja. E nem compreendo a que propósito vêm agora estas considerações.
Penso que esta Assembleia tem que se prestigiar e que é de entrar de imediato, na votação desse requerimento.
No fundo, a questão que aqui se põe é a de que o povo português não aceitará que continuemos a discutir um regimento ou que os deputados sejam tão pouco inteligentes que ainda não tenham compreendido o que se passa. Portanto, já se compreendeu qual a matéria que está em votação e deve passar-se à votação, porque esta discussão não pode prolongar-se mais.
Obviamente, o que está em causa não é o princípio da estabilidade da ordem do dia. O que consta da agenda de hoje é a discussão na generalidade sobre as Grandes Opções do Plano para 1987. Portanto, a nossa proposta é que se passe, de imediato, à votação da proposta de resolução.
Aplausos do PRD e do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, também somos de opinião que se deve passar imediatamente à votação. Em todo o caso, como houve outros partidos que resolveram explicitar a sua posição antes de votarem, entendemos que também temos o direito de o fazer.
Quanto a nós, as Grandes Opções do Plano de Médio Prazo são um documento grave, que merece a nossa viva e total oposição. Foi por isso mesmo que fomos considerando que não era oportuno misturar o seu debate com o do Orçamento Geral do Estado e o das Grandes Opções do Plano para 1987.
Acresce que, como todos poderão verificar, nos seus pareceres, as comissões permanentes da Assembleia da República praticamente não fazem referências às Grandes Opções do Plano de Médio Prazo. Acresce que a distribuição dos tempos de intervenção para o debate não levou em conta a discussão destas. Acresce ainda que na Assembleia da República se foi criando a convicção de que a matéria que se iria debater neste período seria apenas as Grandes Opções do Plano para 1987.
Creio que não seria legítimo nem adequado fazer nestes dias o debate das Grandes Opções do Plano a médio prazo, já que não iríamos fazer um debate mas, sim, uma mascarada de debate. Talvez seja isso que o Governo quer e talvez seja por isso que insiste em afirmar que mantém a sua proposta de lei. Mas não é isso que queremos e entendemos que não é isso que a Assembleia da República deve querer. Em torno das Grandes Opções do Plano a médio prazo a Assembleia da República deve fazer um debate sério, honesto, fundamentado, em que as posições dos partidos resultem claras, surjam como um serviço ao País e não constituam um expediente de mera luta partidária e parlamentar.
Página 328
328 I SÉRIE- NÚMERO 12
É essa a nossa posição e, embora com uma grande disponibilidade para levarmos em consideração as posições dos outros partidos, designadamente a do Partido Socialista, como ainda há pouco afirmámos na conferência de líderes parlamentares, há uma coerência na nossa posição que é a de termos assumido compromissos na conferência de líderes parlamentares e, depois, na Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Mantemo-nos fiéis a esses compromissos, mas afirmando claramente que é devido à nossa oposição às Grandes Opções do Plano a médio prazo que entendemos que não devem ser discutidas agora.
Pensamos que seria bom que outros partidos deixassem a sua posição acerca das Grandes Opções do Plano a médio prazo tão clara quanto a nossa.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, serei muito rápido.
O MDP/CDE entende que a Câmara deve passar à votação do projecto de resolução do CDS e, uma vez que o Governo não retirou a proposta de lei das Grandes Opções do Plano a médio prazo, entendemos também que deve ser convocada uma conferência de lideres o mais depressa possível e deve marcar-se o agendamento desta matéria ainda para o mês de Dezembro, de forma que esta discussão fique concluída até ao último dia de sessão antes das férias do Natal.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, era para fazer uma interpelação à Mesa, lamentando que se tivesse gerado uma discussão, que acabou por gastar uma parte substancial do nosso precioso tempo, a propósito de um requerimento que regimentalmente não tem discussão.
Insisto para que a Mesa ponha à votação o requerimento...
Uma voz do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... que, aliás, resulta de um amplo consenso dos grupos parlamentares e que representa a estabilidade desejável da ordem de trabalhos, a qual também resulta de um processo de preparação da discussão desta matéria que julgávamos que poderia ter obstado a estes incidentes.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, só que não estamos em presença de um requerimento, mas de um projecto de deliberação. O requerimento tem uma outra feição.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, posso pedir a V. Ex.ª que me permita ler o texto que deu entrada na Mesa?
O Sr. Presidente: - Já foi lido, Sr. Deputado.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Bom, nós não tínhamos dúvida nenhuma de que se tratava de um requerimento, mas se a Mesa tem...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, foi essa a designação que V. Ex.ª lhe deu, mas a Mesa não é obrigada a aceitar a terminologia dos textos que lhe são enviados. E entendo que se trata, realmente, de um projecto de deliberação. A Assembleia da República vai manifestar-se através de um projecto de deliberação.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - É o entendimento da Mesa, Sr. Presidente, não é o nosso.
O Sr. Presidente: - Pois sim, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, era para formalizar, sob a forma de interpelação à Mesa, uma metodologia de votação.
Tendo em atenção, pelas razões que já fundamentei, que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não receia debater, com profundidade e com o devido fundamento, as Grandes Opções do Plano a médio prazo, requeiro à Mesa que sejam votados em separado os dois pontos do projecto de deliberação apresentado, tendo em vista que o ponto n.º 1 será votado ao abrigo do n.º 3 do artigo 149.º do Regimento da Assembleia da República. Essa deliberação será válida se reunir maioria de votos.
Dado que, nos termos do n.º 1 do artigo 56.º do Regimento da Assembleia da República, para que a deliberação seja válida tem de ser tomada por unanimidade da Assembleia, se não o for, o n.º 2 do projecto de deliberação não fará valimento.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não é esse o entendimento da Mesa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - O princípio da estabilidade da ordem do dia não está ferido pelo facto de o n.º 3 do artigo 149.º permitir essa cisão, Sr. Deputado.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, suponho que não haverá inconveniente por se requerer a votação dos dois números em separado.
Quanto às consequências que deduzi sobre a votação do n.º 2 desse requerimento, solicitava ao Sr. Presidente o favor de me esclarecer se, nos termos do n.º 1 do artigo 56.º do Regimento da Assembleia da República, não se impõe a consequência de que, sendo esse número aprovado, a deliberação do adiamento eventual do agendamento não poderia verificar-se, apenas e só, se não houvesse votos contra.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa entende que está garantida a estabilidade da ordem do dia, na medida em que a divisão, para efeitos de votação e discussão, não põe em causa a estabilidade do agendamento.
Srs. Deputados, vamos passar à votação e, segundo foi requerido pelo Partido Socialista, vamos dividir o texto do projecto de deliberação em dois números.
Certamente que o Sr. Deputado Gomes de Pinho permitirá que possam ser atribuídos os n.ºs 1 e 2 a cada um dos parágrafos do texto.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, já permito tudo, desde que se vote.
Página 329
19 DE NOVEMBRO DE 1986 329
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Secretário vai ler o n.º 1.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes):
Os Deputados abaixo assinados requerem, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 149.º do Regimento da Assembleia da República, a cisão da proposta de lei n.º 43/IV, de modo a permitir a discussão e votação separada das Grandes Opções do Plano para 1987.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos, Ribeiro Telles e Borges de Carvalho e a abstenção do PSD.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - É o seguinte o texto do n.º 2:
A discussão e votação das Grandes Opções do Plano a médio prazo serão agendadas ulteriormente, ouvida a conferência dos representantes dos grupos parlamentares.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Borges de Carvalho e os votos contra do PS e do deputado independente Ribeiro Telles.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a sessão vai ser suspensa e recomeçará às 15 horas, com a intervenção do Sr. Ministro das Finanças.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, era para fazer uma interpelação à Mesa e ainda ao abrigo do direito regimental de ver aclarada uma interpretação do Regimento da Assembleia da República, para dizer e insistir junto da Mesa e do Sr. Presidente chamando a atenção para a circunstância de o n.º 1 do artigo 56.º implicar que a alteração de uma matéria agendada só se poder verificar não havendo votos contra.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Não é essa a questão.
O Orador: - Sucede, Sr. Presidente, que nesta votação houve votos contra, pelo que inferimos o nosso direito de podermos continuar a debater as Grandes Opções do Plano a médio prazo nas discussões que se vão seguir.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa nada tem a opor às afirmações que V. Ex.ª queira fazer durante os debates, pois é inteiramente livre para se poder pronunciar sobre o que entender e quiser.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Como o Sr. Presidente compreenderá, se o vamos fazer é partindo do princípio de que essa matéria está agendada para a ordem do dia da presente sessão parlamentar. E é deste ponto que não podemos fugir. A matéria está agendada na ordem do dia e vamos cumprir o agendamento que está feito.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão suspensos os trabalhos até às 15 horas.
Eram 13 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 25 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai ser lido um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.
Foi lido. É o seguinte:
Comissão de Regimento e Mandatos
Relatório e parecer
Em reunião realizada no dia 18 de Novembro de 1986, pelas 12 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:
1 - Solicitada pelo Partido Socialista:
Hermínio da Palma Inácio (círculo eleitoral de Lisboa), por Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues. Esta substituição é pedida nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), por um período de dezoito dias, a partir do dia 17 de Novembro corrente, inclusive.
2 - Solicitada pelo Partido Renovador Democrático:
Agostinho Correia de Sousa (círculo eleitoral de Viana do Castelo), por Luís Augusto Pestana Mourão. Esta substituição é pedida nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), a partir do dia 18 de Novembro corrente a 5 de Dezembro, inclusive.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
A Comissão: Secretário, Rui de Sá e Cunha (PRD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) João Domingos Fernandes Salgado (PSD) - José Maria P. Coutinho (PSD) - Álvaro José Rodrigues de Carvalho (PSD) - Carlos Manuel Luís (PS) - Carlos Alberto Correia Rodrigues Matias (PRD) - Vasco da Gama Fernandes (PRD) (em substituição) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - José Manuel Antunes Mendes (PCP) António José Borges de Carvalho (CDS) - João Cerveira Corregedor da Fonseca (MDP).
Página 330
330 I SÉRIE - NÚMERO 12
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Pausa.
Não havendo inscrições, vamos votar.
Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Rui Oliveira Costa e Ribeiro Telles.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças (Miguel Cadilhe): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Faz por estes dias um ano que o Programa do Governo foi apreciado por V. Ex.ªs e houve ocasião, nesse mês de Novembro de 1985, de apreciar a proposta do Governo de uma estratégia de progresso controlado para Portugal, de modo a fazer crescer e modernizar a economia, combater o desemprego, reduzir a inflação, corrigir as causas estruturais do défice externo, diminuir o défice do sector público - tudo a médio prazo.
É salutar que nos interroguemos sobre o cumprimento desta promessa do Governo no seu primeiro ano. A resposta é simples. Em vez de retrocesso, tem havido progresso bem visível no crescimento da economia, na melhoria do nível de vida das famílias e na confiança dos empresários e investidores. Em vez de descontrole, tem havido regulação controlada, sem erros de activismo da política económica e com passos decisivos no sentido da redução da inflação, da disciplina orçamental e da flexibilização dos mercados. Em vez de mera gestão conjuntural da economia, tem havido visão estratégica, a vários anos, no modo de lidar com a inflação, o desemprego, o investimento, o défice público, o défice comercial externo; para todas estas variáveis fundamentais e para diversas outras com elas conexadas tem o Governo trajectórias recomendáveis para os anos de 1986 a 1990 e dispõe o Governo de uma bateria de instrumentos de política macro-económica ajustados e reajustáveis aos objectivos em causa.
Há, pois, estratégia, há progresso e há controle não no sentido pejorativo e retrógrado deste último termo, mas sim no sentido positivo e moderno que lhe é dado pela teoria macro-económica quando fala nas políticas de afinação ou regulação da procura e oferta globais e com elas pretende evitar os excessos de velocidade, as derrapagens, as travagens bruscas e as inversões de marcha na economia.
A própria concertação social é uma forma, por excelência, de controle - talvez dissesse de autocontrole e os resultados conseguidos no Conselho de Concertação Social - maxime o acordo de 29 de Julho passado - têm sido classificados, não por nós, também por terceiros, de avanço notável.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sintonizar a economia portuguesa com a conjuntura externa é outra forma de controle fundamental, como seja, por exemplo, explorando bem os frutos da boa conjuntura externa como a presente embora pareça haver quem os considere «fruto proibido» e afirme ter o Governo caldo em pecado por aproveitar a conjuntura.
Srs. Deputados: Permitam que o diga de novo. Há estratégia, há progresso e há controle; finalmente, há esta conjunção em Portugal.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Raramente a tivemos ou nunca a tivemos neste grau e com esta solidez ao longo dos doze anos de democracia...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... em que quase sempre vivemos umas vezes com estratégia mas sem progresso, outras vezes com progresso mas sem estratégia ou sem controle, outras vezes ainda com controle mas sem progresso.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - 1986 foi o primeiro ano de efectivo cumprimento da nossa estratégia de progresso controlado. Seguramente, 1987 vai ser o segundo ano.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sobre 1986, os factos são indesmentíveis, os juízos de valor, esses, variam, naturalmente, mas há quem teça, com autoridade na matéria, juízos como os seguintes, a respeito de Portugal - 1986 e 1987: «O domínio do emprego foi travado e a taxa de desemprego baixou ligeiramente pela primeira vez desde há longos anos.»
Outra citação da mesma fonte: «A formação bruta de capital fixo conheceu um desenvolvimento favorável. Após uma queda acumulada de 25,5 % em termos reais durante os mesmos anos precedentes, ou seja, 1983 a 1985, os investimentos cresceram na ordem dos 8 % em volume em 1986 e uma taxa comparável a esta, talvez mais elevada, está projectada para 1987.
O nível e a expansão rápida da dívida pública levaram as autoridades portuguesas a projectar para 1986 uma forte redução da necessidade de financiamento da Administração Pública. No passado, a política orçamental tinha sido gerida numa óptica de curto prazo, que tinha provocado distorções na afectação dos recursos» - continuo a citar, senhores deputados -, «nomeadamente suportando empresas públicas não rentáveis e exercendo um efeito de aperto sobre o sector privado. As autoridades portuguesas prosseguiram o objectivo de saneamento a médio prazo das finanças públicas, baseado, em particular, sobre uma maior transparência das contas da administração central, um esforço de controle das despesas públicas, a introdução de um novo sistema de estímulo fiscal aos investimentos e a cobertura da necessidade de financiamento dó sector público com recurso acrescido ao mercado.»
Desculpar-me-ão, mas continuo a citar: «O Governo, que entrou em funções no Outono de 1985, estabeleceu precisamente como objectivo prioritário o relançamento do investimento e a melhoria das condições do crescimento económico através do saneamento das finanças públicas, da eliminação do desvio da inflação portuguesa em relação ao resto da Comunidade, o plano micro-económico e a adaptação acrescida dos mercados.»
Página 331
19 DE NOVEMBRO DE 1986 331
Citando ainda: «Em 1987, a eliminação dos desequilíbrios subjacentes na economia deverá marcar progressos significativos. Para isso, as necessidades de financiamento do sector público, variável estratégica determinante, serão sensivelmente reduzidas. O esforço de moderação das despesas de funcionamento e a limitação das subvenções às empresas públicas deverão ser mantidos. E no mesmo caminho irá o combate à evasão e fraude fiscais.
Estas condições são indispensáveis para assegurar a realização de um objectivo ambicioso em matéria de alta de preços (inferior a 10 % para 1987), uma evolução dos salários reais compatível, conforme o espírito do acordo tripartido concluído em Junho último no Conselho de Concertação Social» - continuo a citar -, «com uma melhoria da competitividade da economia portuguesa e também da sua inserção, em boas condições, no Mercado Comum alargado.»
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Acabo aqui as citações. Julgo que valeram a pena porque foram extractos do «relatório económico anual para 1986 e 1987», da Comissão das Comunidades Europeias, ontem mesmo apresentado ao Conselho de Ministros das Finanças, em Bruxelas. São notícias de que sou apenas portador, directamente de Bruxelas, para os senhores deputados da Assembleia da República em Portugal.
Aplausos do PSD.
Risos.
O Sr. Mendes Bota (PSD): - Não gostam de ouvir verdades!
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Já tinham chegado!
O Sr. Mendes Bota (PSD): - Mal-agradecidos!
O Orador: - São notícias que não dependem da vontade do Governo de Portugal.
E trago ainda alguns indicadores reais: a importação de máquinas - que é um significativo indicador de como vai o investimento em Portugal - apresenta mais de 10 %, em volume, nos nove primeiros meses de 1986, comparado com o período homólogo de 1985; as vendas de veículos comerciais, que também têm muito a ver com o investimento, aumentaram, em número, 31 % no mesmo período (nove primeiros meses de 1986); as vendas de cimento e aço, um indicador construído pelo Banco de Portugal, apresentam, em volume, mais 9 % nos nove primeiros meses; os concursos adjudicados de obras públicas do sector público alargado apresentam mais 32%, em termos reais. Estes são bons indicadores de como vai o investimento em Portugal.
Srs. Deputados, o Orçamento do Estado para 1987 - tal como o de 1986 - constitui uma das manifestações mais expressivas da estratégia de progresso controlado. VV. Ex.ªs conhecem a trajectória de médio prazo que estabelecemos para a gradual redução do défice das finanças públicas.
O peso do défice público tem de ser visto, obviamente, na sua expressão relativa e no seu modo de financiamento. Quanto ao modo de financiamento, tem o Governo evitado a monetização do défice em 1986 e assim prosseguirá em 1987. Trata-se de uma atitude qualitativa essencial, que o Governo assumiu em pleno.
Quanto ao peso relativo do défice, ainda há que distinguir entre os valores orçamentados e os valores efectivos. Temos procurado seguir regras de ouro da orçamentação pública, que recomendam prudência quer na previsão das receitas, quer na dotação para as despesas que independam da vontade do Governo, como os juros da dívida pública. E essas regras de ouro recomendam ainda severidade na dotação para as despesas compreensíveis, sem, todavia, cair no irrealismo que venha, a seguir, suscitar «défices ocultos»; pelo contrário, a dotação para as despesas, quando bem orçamentada e bem executada - em obediência às regras do cabimento e da contenção -, há-de originar sempre uma margem de economias, ao longo do ano, digamos de 2 % ou 3 % ou mais, conforme a natureza das despesas em causa.
Ou seja, e em suma, o grau de execução num orçamento do Estado bem elaborado e bem executado há-de ser algo inferior a 100 % do lado das despesas e algo superior a 100 % do lado das receitas. Um orçamento bem elaborado e bem executado não pode levar a outra coisa. Foi assim em 1986: o défice do Estado orçamentado era 10,8 % do PIB e o défice efectivo estima-se que seja cerca de 2 % abaixo daquele nível.
E assim será em 1987: o défice do Estado orçamentado é 8,9 % do PIB e o défice efectivo estimável poderá ser da ordem dos 8 % a 8,5 % do PIB.
Comparando valores homólogos, portanto, o défice orçamentado passa de 10,8 % do PIB em 1986 para 8,901o em 1987. E o défice efectivo estimado passa de 9,8 % em 1986 para 8 % a 8,5 % em 1987.
Srs. Deputados, desculpar-me-ão citar tantos números, certamente fastidiosos num discurso de apresentação do Orçamento do Estado, mas receio que haja uma tentação - ainda que remota - de usar perigosamente as margens de segurança legítimas e sadias que existem na proposta de Orçamento do Estado para 1987.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A proposta de Orçamento do Estado para 1987 é prudente, na medida indispensável para evitar derrapagens. O défice efectivo de 1987 não vai ser maior, seguramente, que o défice orçamentado no início do ano; muito provavelmente vai ser menor. Quem poderá, nesta Câmara, deixar de apoiar um tal procedimento?
Por incrível que pareça, fazer défices públicos não é difícil, difícil é deixar de os fazer.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - O Governo encontrou o Estado numa dinâmica de défices. Quebrar e inverter a dinâmica dos défices não foi tarefa simples, mas estamos convencidos de que o conseguimos em 1986 e estamos certos de que o conseguiremos em 1987 ...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... com o excelente apoio dos dirigentes da função pública e com o elevado sentido do interesse nacional dos senhores deputados.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro das Finanças, os seguintes Srs. Deputados: João Corregedor da
Página 332
322 I SERIE - NÚMERO 12
Fonseca, Carlos Brito, Nogueira de Brito, Octávio Teixeira, Cristina Albuquerque, Raul Castro, Carlos Carvalhas, Gomes de Almeida, José Seabra, José Manuel Tengarrinha, lida Figueiredo, Rogério de Brito, José Passinhas, João Amaral, Vasco Marques, Andrade Pereira, João Cravinho, Soares Cruz, Helena Torres Marques, Domingos Azevedo, António Guterres e Miranda Calha.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Ministro das Finanças, V. Ex.ª disse na sua intervenção que há uma estratégia de progresso controlado. Di-lo com grande felicidade e declara que há estratégia, há progresso e há controle e diz ainda que, finalmente, há esta conjunção em Portugal. Mas não é essa a nossa opinião, Sr. Ministro, porque, ao contrário do que diz...
Protestos do PSD.
O Orador: - Pelo que se vê, o PSD vai utilizar o estilo normal no debate de matérias tão importantes como esta, Sr. Presidente.
Mas, como ia dizendo, não é essa a nossa opinião porque, ao contrário do que diz o Sr. Ministro, há condicionamentos e há restrições. Na nossa opinião, há mais desemprego, há menos postos de trabalho, há menos desenvolvimento.
Também diz V. Ex.ª que sobre 1986 os factos são indesmentíveis e, neste ponto, Sr. Ministro, damos-lhe inteira razão.
O Sr. Ministro fez uma longa citação do relatório da Comissão das Comunidades, mas, já agora, convinha saber, Sr. Ministro, como é feito esse relatório, convinha que soubéssemos qual é a participação das autoridades portuguesas, nomeadamente do Ministério das Finanças, na sua elaboração e quem fornece os dados ao Conselho das Comunidades.
A propósito, nesse relatório diz-se que a formação bruta do capital fixo conheceu um desenvolvimento favorável e a esse respeito vou-lhe fazer a seguinte pergunta: A fixação de objectivos para a política económica deve ter base numa correcta avaliação da situação conjuntural em causa, sob pena de os contornos definidos pela política económica para o ano seguinte não passarem de um mero exercício aritmético sem qualquer aderência à realidade e, portanto, nulo de eficácia. Sendo assim, Sr. Ministro, perguntava-lhe como pode o Governo afirmar (Orçamento do Estado, p. 2, quadro I) que a formação bruta de capital fixo (FBCF) vai evoluir em 1986 a um ritmo de 9 % em volume? É ou não verdade que a FBCF em construções, que representa mais de 55 % do total - o Banco de Portugal aponta para 56 % -, não registará no ano em curso um crescimento superior a 3 %? É ou não verdade que o consumo de cimento cresceu apenas 2,8 % no período de Janeiro a Setembro de 1986 contra o mesmo período de 1985? E mais, que esta taxa de aumento foi obtida com evoluções de + 3,8 % no 1. º trimestre, + 5,7 % no 2.º trimestre e - 0,7 % no 3.º trimestre, o que denota uma interrupção forte numa dinâmica de recuperação do sector da construção que se vinha fazendo sentir no 1.º semestre?
0 Sr. Duarte (Lima (PSD): - Traz o recado escrito!
O Orador: - Por outro lado, é ou não sabido que o clima de investimento evidencia uma atonia e um marasmo bem patente, o que levou à publicação recente do sistema de incentivos ao investimento de base regional e à realização de uma sessão pública no Porto onde o Sr. Ministro das Finanças enunciou medidas tendentes a incentivar o investimento que na altura tardava a arrancar? Aliás, esta reunião realizou-se depois de o Sr. Ministro ter pedido uma série de informações ao seu e a outros ministérios.
Não será que o valor de 9 % para o crescimento da formação bruta de capital fixo em 1986 mais não é do que uma tentativa de mostrar que a previsão do Governo (+ 10%) não falhou, já que dela tanto se falou?
Já agora, Sr. Ministro, ia-lhe falar sobre uma outra questão, que é a da inflação. Os objectivos centrais que o Governo diz prosseguir em 1987 são a redução da inflação e o reforço do investimento produtivo. Vejamos o que se passa com a inflação: as previsões governamentais apontam para 8 % a 9 %, em termos médios anuais, e para 7 % entre Dezembro de 1986 e Dezembro de 1987 e gostaríamos que o Governo explicasse por que razão se fixa o objectivo de 8 % a 9 % em termos médios anuais, já que...
O Sr. António Capucho (PSD): - Isto é um massacre autêntico!
O Orador: - ... o Governo afirma que a política monetária não será expansionista e que a política de rendimentos admite um crescimento positivo dos salários reais avaliados com a inflação esperada, mas que esse crescimento terá de ser balizado pelos ganhos de produtividade, o que, em termos práticos, significa não agravamento de custos para as empresas. Em hipótese cautelar, os preços em dólares dos bens importados serão de 5 %, sem dúvida hipótese pouco realista, pois a inflação esperada pela OCDE e tornada pública em 1987 será de cerca de 3%. Se os encargos financeiros vão ser atenuados e a carga fiscal reduzida, se a política cambial «aponta», sem o afirmar expressamente, para o fim ou para o abrandamento muito sensível da desvalorização mensal ou trimestral do escudo, o que, em termos de custos, se traduzirá em não agravamentos, se o emprego, face ao pouco e vago que sobre esta variável se escreve, no mínimo, vai estagnar em 1987 e o desemprego vai aumentar, pergunto, Sr. Ministro, por que razão técnica se admitem ainda 8 % a 9 % de inflação em termos médios anuais? Não poderia e não deveria o Governo ser mais ambicioso neste objectivo?
Uma voa do PSD: - Isto é uma intervenção!
O Orador: - No contexto definido, quem vai lucrar com tais níveis de inflação? Qual, em suma, a compatibilização do objectivo da inflação com as políticas definidas?
Sr. Presidente, creio que ocupei mais tempo do que aquele de que dispunha para pedir esclarecimentos, mas peço-lhe que o desconte no tempo total do meu partido.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo VV. Ex.ªs de que, quando excedem o tempo de um pedido de esclarecimento, o excedente é descontado nos tempos globais. Em todo o caso, peço-lhes o favor de
Página 333
19 DE NOVEMBRO DE 1986 333
restringirem os pedidos de esclarecimento apenas aos três minutos regimentais, porque se não fazem intervenções e prejudicam necessariamente os outros senhores deputados que também pretendem formular pedidos de esclarecimento, embora, como já referi, não haja prejuízo de maior, visto que os tempos são globais.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Ministro das Finanças, a política económica proposta pelo Governo para 1987 não traz, a nosso ver, a esperança de melhores
dias para o nosso povo.
A análise das propostas de lei governamentais e os debates com os membros do Governo mostram, ao contrário do optimismo e do triunfalismo do discurso do Sr. Ministro das Finanças, que o Governo se prepara, como já aconteceu em 1986, para
desperdiçar uma conjuntura excepcionalmente favorável, que permitiria, se outra fosse a política, relançara economia e melhorar as condições de vida do nosso
povo.
Em nosso entender, isto não acontece porque o Governo está manifestamente dominado por outras preocupações que não são o interesse nacional. Para
o Governo, o que conta é a cruzada para destruir as transformações democráticas trazidas pelo 25 de Abril e os jogos partidários e eleitoralistas para o poder.
Pergunto se será isto a tal estratégia e o tal progresso!
E se não, vejamos: como se compreende que não tendo diminuído o desemprego, sendo cada vez maior o número de empresas em dificuldades, encerradas ou
à beira do encerramento, como se verifica no meu círculo eleitoral, com empresas conserveiras e de cortiça no Algarve, estando o Governo obrigado por acórdão
do Tribunal Constitucional a executar em 1987 a lei contra os salários em atraso, como se compreende, repetimos, que o Governo reduza mesmo em termos
nominais as verbas destinadas a subsídios de desemprego, apoios a emprego, lay-off, ao fundo de garantia salarial, apoio à reestruturação industrial e salários
em atraso?
Será isto a tal estratégia e o tal progresso?
Como se compreende que em 1987 a maior parte das rubricas e das despesas públicas com a educação e a cultura vão diminuir, em termos reais, em relação a
1986, quando é hoje um dado adquirido pelo pensamento moderno - e, julgo que será também pelo socialismo moderno de que os senhores agora se reivindicam - que o desenvolvimento económico depende directamente da educação, da cultura e da formação profissional? É isto a estratégia, é isto o progresso?
Como se compreende que, na presente conjuntura, o PIDDAC para 1987 apresente decréscimo, mesmo em termos nominais, em áreas decisivas como a educação, a saúde, a habitação e o urbanismo e a indústria e a energia? Isto é estratégia ou é progresso?
O Governo perdeu, em 1986, a batalha do investimento, como o Sr. Ministro já reconheceu ao desabafar que «o investimento não se decreta». Vai perdê-la
também em 1987 e peço ao Sr. Ministro que acompanhe o meu raciocínio: o Governo não assegura o investimento nas empresas públicas porque, por razões ideológicas, quer sufocá-las e liquidá-las; mas o Governo também não é capaz de incentivar o investimento privado, porque é minoritário, belicoso, temperamental e de cruzada ideológica e isso não dá confiança nem mesmo aos grandes interesses económicos que o Governo quer defender. Não será assim, Sr. Ministro das Finanças?
Em termos da economia nacional, este Governo tornou-se num beco sem saída. É por isso mesmo que nós defendemos que as forças democráticas devem demiti-lo e substituí-lo para assegurar saída e solução para os problemas nacionais.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Isso é que é um beco sem saída!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Ministro das Finanças, V. Ex.ª fez aqui uma intervenção partindo do princípio de que esta Câmara tinha toda um determinado estilo de pensamento e V. Ex.ª preveniu contra os riscos do expansionismo exagerado, do défice exagerado.
Tendo em atenção as palavras do Sr. Deputado Carlos Brito, diria que V. Ex.ª fez um discurso «em câmara esquerda fechada» (risos) - a esquerda moderna a falar à esquerda antiga.
Risos e aplausos do CDS.
O Orador: - Expandir sim, mas não expandir demais, défice sim, mas não défice a mais, disse V. Ex.ª
Mas V. Ex.ª ter-se-á esquecido de que há aqui quem pense de forma rigorosamente contrária e quem entenda que, apesar de tudo, já há alguma derrapagem neste Orçamento do Estado, derrapagem que não devia haver: há despesa a mais, há crescimento a mais, há, apesar de tudo, em termos de ponderação em relação ao PIB, défice a mais, há amortização a menos, Sr. Ministro! É isto que entendemos.
E, além disto, entendemos que há peso a mais do défice público sobre o crédito global concedido à economia e há crédito a menos para as empresas e para os particulares, que há confiança a mais nessas empresas e nesses particulares para que sejam eles a expandir a economia.
Não acha, Sr. Ministro, que há, nesta medida, uma outra perspectiva para encarar o Orçamento do Estado e que, na perspectiva actual, há algo de incoerente nesse mesmo Orçamento do Estado?
Aplausos do CDS e do deputado Ivo de Pinho (PRD).
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Ministro, uma das tónicas do Orçamento do Estado apresentado pelo Governo é o empolamento global de determinadas dotações para apresentar um empolamento global do nível de despesas. Sucede que alguns destes empolamentos contradizem claramente o discurso público do Governo e designadamente o discurso do Sr. Ministro das Finanças. É o caso, nomeadamente, da política
Página 334
334 I SÉRIE - NÚMERO 12
cambial, matéria em que o Sr. Ministro afirma que para 1987 vai prosseguir a regressividade da desvalorização, isto é, a diminuição da desvalorização em termos de taxa de câmbio efectivo, mas, em termos orçamentais, para o Orçamento do Estado, propõem-se cotações das principais moedas a taxas que implicam uma desvalorização do escudo superior à registada em 1986.
Convinha que o Sr. Ministro nos esclarecesse sobre em quem é que devemos acreditar, se no discurso do Governo que está no Orçamento, se no discurso do Sr. Ministro das Finanças.
Um outro exemplo é o do empolamento das despesas através da evolução prevista para as taxas de juro nos mercados externos para as principais moedas, designadamente para o iene, o dólar e o marco.
Sucede que, para efeitos orçamentais, o Governo aponta taxas de juro extremamente mais elevadas do que aquelas que estão previstas nos mercados financeiros internacionais, e mesmo do que aquelas que são previstas pela própria Comissão das Comunidades concretamente, em relação ao marco e ao iene até inverte o sentido da evolução prevista.
Assim, gostaria que V. Ex.ª explicasse à Assembleia da República por que é que o Governo tem perspectivas diferentes, em termos de taxas de juros, das dos meios financeiros internacionais e mesmo das da própria Comissão das Comunidades.
Um segundo tipo de questões: contrariamente ao que se verificou com o Orçamento do Estado para 1986, o Governo recusou-se, até agora, a apresentar à Assembleia da República os estudos do Gabinete de Estudos Fiscais do Ministério das Finanças que conduziram à inscrição das receitas orçamentais. Porquê, Sr. Ministro? Receia que a Assembleia comprove a sub-avaliação de algumas receitas?
Um terceiro e último tipo de questões: o Sr. Ministro referiu a dificuldade em reduzir os défices. Mas, Sr. Ministro, com uma envolvente externa extremamente favorável, com a introdução do imposto sobre o valor acrescentado e com a não execução financeira dos investimentos do Plano, V. Ex.ª ainda crê que é possível aumentar os défices? Mesmo em termos especulativos, o Sr. Ministro ainda coloca essa hipótese? Isso parece-me por demais irrealista!
Ainda a propósito desta questão dos défices, uma última questão: o Governo aponta para um défice, em 1986, de 424 milhões de contos, quando é certo e sabido que ele será de facto inferior a 400 milhões de contos. Por que é que mantém essa previsão? Para, com base nesse défice fictício, continuar a empolar o défice previsto para 1987? Apenas para tentar inibir a Assembleia da República de apresentar as correcções necessárias a este Orçamento? Gostaria, Sr. Ministro, que me desse as explicações necessárias.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Albuquerque.
A Sr.ª Cristina Albuquerque (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: Tendo em conta que o ano de 1986 foi caracterizado por um conjunto de negociações sectoriais no âmbito da Comunidade cujos resultados e os seus efeitos económicos não foram devidamente divulgados pelo Governo; tendo em conta que o Orçamento para 1987 mantém essa prática, não incluindo qualquer dotação para as contribuições portuguesas para a Comunidade; tendo ainda em conta que o Orçamento aprovado agora no Parlamento Europeu e que será discutido proximamente em Conselho de Ministros da Comunidade inclui apenas um item simbólico em que está inscrita uma pequena verba para estudar a questão do PEDIP e que, na proposta de Orçamento aqui em discussão, não está inscrita qualquer verba relativa ao PEDIP: pergunto a V. Ex.ª se o Governo está preparado para informar esta Assembleia sobre a situação líquida previsível de Portugal em relação à CEE no próximo ano.
Pergunto ainda a V. Ex.ª, Sr. Ministro, se a não inscrição na proposta de Orçamento de qualquer verba relativa ao PEDIP significa a aceitação por parte do Governo Português de que o PEDIP não existe como programa autónomo.
Gostaria ainda de saber o que tem o Governo a dizer-nos sobre a contribuição portuguesa para o FED. A quanto montará essa contribuição? Em que rubrica da proposta orçamental está ela inscrita?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: Tem sido afirmado repetidamente, inclusive pelo Sr. Primeiro-Ministro, que o Governo se preocupa com o bem-estar dos Portugueses e com a situação das camadas mais desfavorecidas.
Uma do PSD: - E é verdade!
O Orador: - Não é isto que a prática evidencia.
Assim, a única medida para a criação de postos de trabalho é a que consta do artigo 17.º, n.º 4, do Orçamento, mas surge em termos tão ambíguos e restritos que deixa de ser credível, na medida em que se limita às regiões «com especial incidência de desemprego», e apenas a estas, deixando ainda ao Governo a sua definição.
Por outro lado, a rubrica orçamental que inclui os subsídios de desemprego e apoio ao emprego, lay-off, garantia salarial e salários em atraso, apresenta uma redução, em relação a 1986, de cerca de 5 milhões de contos! E não se pode esquecer que somente cerca de 25 % dos desempregados têm acesso ao respectivo subsídio.
Acresce que a percentagem do défice da Segurança Social (correspondente aos regimes não contributivo, parcialmente contributivo e da acção social) coberta por transferência de valores do Orçamento do Estado, que foi em 1986 de 35,1 %, desce, em 1987, para apenas 31,2%, o que significa, por isso, uma redução de 4,1 % .
Finalmente, mantém o Governo a situação insólita de, através da introdução do IVA aos artigos de luxo, como caviar, pedras preciosas (risos do PSD e do CDS) ou tecidos de seda natural, não ser aplicada a taxa de 75 % que vigorava no imposto de transacções, mas sim uma taxa de 30 %, que é a que vigora presentemente, até à revelia do disposto no artigo 107.º, n.º 4, da Constituição?
É esta a propalada política a favor das camadas mais desfavorecidas?
Página 335
19 DE NOVEMBRO DE 1986 335
Vozes do MDP/CDE: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro das Finanças, tenho estado a dar a palavra aos senhores deputados que se inscreveram para formular pedidos de esclarecimento. Mas se V. Ex.ª desejar responder aos pedidos já formulados pode fazê-lo.
O Sr. Ministro das Finanças: - Responderei no final, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Ministro das Finanças, quero colocar-lhe três questões, sendo a primeira a seguinte: a política do Governo, contida nas GOPs e no Orçamento do Estado, pode sintetizar-se em duas grandes alíneas: uma política de benefícios para as grandes empresas e transaccionais, através de incentivos e subsídios, e uma política de estrangulamento do sector empresarial do Estado, visando o seu desmantelamento.
As EPs vão pagar este ano 575 milhões de dólares de juros da dívida externa, mais do que a República, o Banco de Portugal e as empresas privadas. O Orçamento, para ajudar à festa, diminui o investimento, as dotações de capital e as dotações para as indemnizações compensatórias. Isto é a asfixia deliberada e premeditada das EPs e, assim, pergunto-lhe por que é que o Governo, em 1987, quer obrigar as EPS a diminuirem o investimento real em 8 %.
Quanto à transferência das contas públicas, gostaríamos de lhe perguntar, Sr. Ministro, que transparência é esta, quando o Governo não inscreve a contribuição financeira para a CEE no Orçamento e persiste com o argumento de que o Orçamento das Comunidades ainda não está aprovado, mas, esquecendo-se do argumento, inscreve a receita dos fundos. Que transparência é esta?
Em segundo lugar, e ainda em relação a esta questão, é sabido que a contribuição financeira para a CEE, este ano, é de mais de 5 milhões de contos; é uma despesa limitada e, portanto, é necessário trazer aqui uma nova proposta de lei - quando é que o Governo apresenta aqui a proposta de alteração orçamental?
Em relação aos êxitos de que o Governo fala, vejamos: a formação bruta de capital fixo fica aquém daquela estimativa, já revista, aqui apresentada pelo Governo. Não há arranque sensível e muito menos sustentado da construção civil e obras públicas. E chamo a sua atenção, Sr. Ministro, para que o índice composto de vendas de cimento e ferro, nos oito meses, é de 1 % e não de 9%, como aqui afirmou, por lapso, ou prestando uma falsa informação...
Em segundo lugar, V. Ex.ª afirmou que o PIB vai ficar sensivelmente igual ao do ano passado. Porém, no plano social é o que se conhece e nos outros sectores arrasta-se a crise. Por exemplo: um ano depois, o Governo, que tem 40 milhões de contos de maquinaria na Siderurgia, não é capaz de resolver o problema desta empresa; em relação à indústria naval, a situação é de todos conhecida, e quanto à modernização da marinha mercante... Pergunto, Sr. Ministro, o que é que o Governo fez às excepcionais condições externas? Onde é que estão as indústrias novas? Onde é que está a modernização do País?
Sr. Ministro, convenhamos que não há nem progresso, nem regulação, nem estratégia! ...
A última questão que lhe ponho é se, perante o desbaratamento das condições favoráveis, perante a vossa política, não é tempo de a Assembleia da República lhe dizer basta!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Almeida.
O Sr. Gomes de Almeida (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: Foi anunciado que o Governo acordou com os sindicatos da função pública afectos à UGT uma actualização salarial para 1987 de cerca de 11,7 % , a que irá acrescer o aumento de outras prestações pecuniárias em percentagens superiores àquela, o que, tudo considerado, significará um aumento da massa salarial de cerca de 12%.
Ora, o Conselho Permanente de Concertação Social acordou em que a actualização dos salários a vigorar nos doze meses subsequentes a 1 de Janeiro de 1987 seria de 9 %, percentagem a que se acresceria, havendo-a, a margem do aumento previsto da produtividade.
Assim sendo, a questão que coloco ao Sr. Ministro das Finanças é a de saber se, sem reforma administrativa, o Governo prevê um incremento de produtividade no sector público administrativo de cerca de 3 %, ou, diferentemente, se a actualização salarial firmada para a função pública exprime uma alteração significativa das perspectivas abertas pelo acordo estabelecido no Conselho Permanente de Concertação Social.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Seabra.
O Sr. José Seabra (PRD): - Sr. Ministro das Finanças, disse V. Ex.ª, no decurso da intervenção que fez, que a política orçamental tinha, até aqui, sido definida numa óptica de curto prazo e que o Governo entende dever defini-la numa óptica de médio prazo.
Pois bem, a unidade e a universalidade são duas das regras que devem enformar o Orçamento do Estado, enquanto a transparência, a legalidade e o rigor são componentes integrantes do processo de elaboração e execução orçamental aos diferentes níveis da Administração.
Este governo tem-se esforçado por aplicar estes conceitos em alguns níveis, esquecendo-se entretanto de os utilizar noutros. Refiro-me concretamente aos serviços e fundos autónomos, e daí a minha pergunta: por que razão não aparecem integrados no Orçamento de Estado os fundos do Cofre dos Conservadores, Notários e Funcionários de Justiça e do Cofre dos Tribunais?
Se existem problemas específicos difíceis de resolver, por que não apresentou o Governo um plano de calendarização adequado? Isto numa óptica de tratamento, a médio prazo, e de integração, como solução final, sendo sabido que o próprio Governo se comprometeu a promover, no decurso do ano de 1986, acções destinadas a estabelecer um regime financeiro para os Cofres adequado aos princípios da referida unidade e universalidade do Orçamento do Estado.
Página 336
336 I SÉRIE - NÚMERO 12
O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Vice-Presidente Carlos Lage o favor de me substituir na presidência.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Tengarrinha.
O Sr. José Manuel Tengarrinha (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: Em primeiro lugar, permitam-me estranhar a ausência do Sr. Primeiro-Ministro neste debate, dada a dignidade e a importância de que ele se reveste, pois, sem menosprezar a importância do Sr. Ministro das Finanças, penso que a importância e a dignidade deste debate exigiriam a presença permanente do Sr. Primeiro-Ministro.
Creio que, ao levantar a primeira questão, estou a interpretar de algum modo uma dúvida que ficou por esclarecer ao longo da perturbação gerada, por responsabilidade do Governo, durante a primeira parte deste debate. Sabe-se que foi irregular a maneira como 0 Governo apresentou os documentos a esta Assembleia, sabe-se como esses documentos contrariaram disposições da Constituição e sabe-se ainda como, demonstrando boa vontade, a Assembleia proeurou remediar essa falha do Governo, apesar de - e assistimos a isso esta manhã - o Sr. Ministro de Estado ter reafirmado a disposição de o Governo apresentar aquele documento.
Sr. Ministro das Finanças, é evidente que cada um de nós poderá ter uma interpretação sobre as causas que deram origem a este incidente. É evidente que ele é grave, pois num acto de tanta responsabilidade e dignidade como este, que é um dos actos mais dignos e responsáveis cometido em qualquer sessão legislativa, podemos dizer que é grave que isto tenha perturbado os nossos trabalhos. E atrás de nós fica a seguinte dúvida: que intenção terá o Governo ao insistir na apresentação - como esta manhã disse - de um documento desta natureza, não atendendo à recomendação que lhe foi feita pela Comissão responsável no sentido da alteração deste documento? Qual será a intenção política? Tenho a minha interpretação, outros senhores deputados terão interpretações diversas, mas gostaria que o Sr. Ministro me esclarecesse.
Uma outra questão diz respeito às Comunidades Europeias. Parece-nos de facto incompreensível que nos documentos em apreciação não se faça qualquer análise, digna desse nome, à experiência de integração europeia entretanto ocorrida e ainda menos às perspectivas que nesse campo se oferecem ao nosso país.
Para quem tanto tem proclamado as excelências da adesão, não se percebe por que não foi feita uma tal análise económico-financeira das consequências e das condicionantes da adesão. Será que o Governo tem alguma coisa a ocultar sobre isso? Será que o Governo, à semelhança de outros anteriores, tenta não apresentar à Assembleia as informações para que ela se não possa pronunciar sobre o assunto?
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Carlos Lage.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada lida Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: Um dos aspectos mais injustos da política governamental é a política de distribuição de rendimentos.
Apesar de a envolvente externa da economia ser altamente favorável, a participação dos rendimentos do trabalho no rendimento nacional continua a descer.
De facto, e tendo em conta os dados já disponíveis para 1986, é possível verificar que, enquanto a massa salarial cresceu à volta de 18%, os lucros e outros rendimentos do capital aumentaram mais de 26%.
Será que a estratégia de progresso e apoio aos desprotegidos de que o Sr. Ministro e o Governo falam é cada vez mais para o capital, cada vez menos para quem trabalha?
Mas esta situação é ainda mais grave para as camadas mais desfavorecidas da população. Por exemplo, dos cerca de 500 000 desempregados, oficialmente registados, receberam subsídio de desemprego menos de 70 000.
Dos tão propagandeados aumentos extraordinários das pensões em Setembro foram beneficiados apenas 360 000 dos mais de 1 900 000 reformados e pensionistas e com aumentos cuja média não ultrapassou os 603
por mês.
Mas, de tudo o que tem sido propagandeado era bom que o Governo esclarecesse de que está à espera para proceder a um aumento geral das pensões e reformas de forma que a pensão mínima seja sempre igual ou superior a 50 % do valor mais elevado do salário mínimo nacional, aumentando-se igualmente o montante das restantes pensões de acordo com o novo valor da pensão mínima. Era igualmente bom que esclarecesse qual o aumento previsto para o salário mínimo nacional e para o abono de família e outras prestações complementares.
E já agora, Sr. Ministro das Finanças, poderia explicar do que está à espera para baixar o preço do leite e do pão?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.
O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: Não serei eu quem irá duvidar de que o Governo tem uma estratégia de investimento e desenvolvimento, no caso concreto para a agricultura. Simplesmente, o Governo não explicita essa estratégia e, assim, gostaria que o Sr. Ministro o fizesse, sobretudo porque penso que o Governo não deixará de definir tal estratégia em parâmetros de racionalidade sectorial e espacial.
Aliás, quando o Sr. Ministro falava nesta estratégia, lembrei-me de um facto que julgo que não é sequer possível de polémica, de tal forma ele é factual e concreto: tive presente o investimento que decorrerá da aplicação do Regulamento Comunitário n.º 355, que, como o Sr. Ministro sabe, se insere numa área extremamente importante da infra-estruturação da produção agrícola.
Ora, a realidade demonstra que em relação aos projectos enviados para Bruxelas, que representam, em termos de investimento, 19 milhões de contos, às cooperativas do sector primário caberão menos de 10 % do total e às empresas e particulares directamente ligados à agricultura caberão menos de 9 % do total, cabendo tudo o resto a grandes importadores e intermediários que intervêm nos circuitos ligados ao comércio dos produtos agrícolas e a grandes indústrias.
Página 337
19 DE NOVEMBRO DE 1986 337
Em termos espaciais verifica-se que 80 % desse investimento incide sobre as regiões do Douro Litoral, Aveiro e Ribatejo Oeste e em termos sectoriais verifica-se, por exemplo, que em relação ao investimento no sector da indústria das cortiças um único grupo empresarial absorve mais de 80 % do total do investimento previsto para esse sector.
Por exemplo, falando-se em termos de regionalização das matanças no nosso país, e prevendo-se um matadouro regional para o Montijo, verifica-se que o investimento em matadouros particulares, ainda para o Montijo, ultrapassa o milhão de contos. Pergunto se tudo isto é uma excepção à racionalidade da estratégia de investimento do Governo, ou, então, se sou eu que tenho uma visão profundamente errada acerca dessa estratégia e dessa racionalidade.
Era isto que gostaria que me explicasse, pois não consigo encontrar racionalidade e parece-me, pelo contrário, haver um desbaratar dos recursos económicos e financeiros e um agravamento conducente, por um lado, a sobreinvestimentos em determinados sectores e, por outro, a subinvestimentos noutros e à agudização de todas as assimetrias regionais. Se estou enganado, gostaria que o Sr. Ministro me corrigisse.
Vozes do PCIP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Passinhas.
O Sr. José Passinhas (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: Apenas um curto e simples pedido de esclarecimento relativo ao orçamento para o sector de Defesa Nacional.
Foi a Assembleia da República informada pelo Governo, através do Sr. Ministro da Defesa, que seria enviada, em tempo útil, a lei de programação militar para que esta pudesse ser apreciada em articulação com o Orçamento do Estado para 1987, nos termos precisos da Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas, lei que inscreverá os programas de reequipamento e de infra-estruturas a médio prazo, concretamente para o quinquénio de 1987-1991, bem como a programação dos encargos financeiros necessários à respectiva materialização.
Pese embora o anúncio feito, ainda não foi esta Assembleia da República confrontada com a referida lei de programação militar, apesar de se inscrever neste Orçamento a verba de 1,5 milhões de contos destinada à sua fase de implantação.
Decorre desta situação que, uma vez mais, nos confrontamos com a necessidade de discutir algumas rubricas do Orçamento para a Defesa Nacional num total desconhecimento dos objectivos, do conteúdo dos programas abrangidos e do volume global dos encargos, o que colide frontalmente com o estipulado na lei quadro das leis de programação militar.
Assim sendo, pergunto ao Sr. Ministro o seguinte: numa perspectiva de rigor, que deve caracterizar o Orçamento de Estado, como se pode compreender que a Assembleia da República seja confrontada com verbas destinadas à programação militar quando este Parlamento ainda não votou, nem tão pouco apreciou, a lei de programação militar e não sabe que incidências globais ela terá no Orçamento do Estado?
Aliás, esta questão é tanto mais pertinente quanto é certo que, mesmo admitindo que a referida lei seja apresentada ao Parlamento - como parece que já foi - antes da votação na especialidade do Orçamento do Estado para 1987, ela não poderá, em tempo útil, ser apreciada e aprovada, o que, quanto a nós, vem apenas realçar, uma vez mais, algumas incongruências de todo um processo político em matérias de elevado significado nacional, acentuando neste sector alguma falta de rigor político e orçamental.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Ministro, reporto-me a uma das opções fundamentais do Orçamento, ou seja, à parte relativa à defesa nacional, salientando duas características preocupantes: por um lado, as verbas para funcionamento normal (onde se incluem as verbas para treino operacional e para a capacidade de sustentação) evoluem a uma taxa de cerca de 9,5 %, salientando-se o baixíssimo valor da evolução da previsão das despesas de manutenção e funcionamento, que aumentam 4,3 %, o que significa, em termos reais, como é salientado pelo relatório da Comissão de Economia, uma diminuição de 5,6 %, e, por outro lado, a evolução nominal da despesa resulta na sua maior parte do aumento da despesa com as fragatas e do aumento das despesas CEIOTAN, com compensação em receita, despesas que, na sua maior parte, tal como sucede com as resultantes de contrapartidas, são canalizadas para a Marinha e para a Força Aérea.
Esta segunda característica levanta uma questão institucional e que consiste em o Governo insistir em apresentar o orçamento da Defesa desinserido do planeamento de infra-estruturas de defesa e de reequipamento das Forças Armadas. Isto é, sem a lei de programação militar a que, por força da Lei da Defesa Nacional e da Lei n.º 1/85, está obrigado. O que significa que o orçamento da Defesa Nacional, tal como está apresentado e tal como é sublinhado no relatório da Comissão Parlamentar, não corresponde às exigências constitucionais e legais decorrentes das competências da Assembleia da República e prima pela ausência de conteúdo explicitado quanto ao quadro das missões das Forças Armadas, do sistema de forças e do dispositivo.
Só que, se isto é gravíssimo, mais grave ainda é o baixíssimo valor de evolução da despesa de funcionamento normal, que no que toca aos valores de funcionamento e manutenção tem mesmo evolução negativa, como já referi, o que me leva directamente à pergunta que pretendia formular: afinal, Sr. Ministro, qual é a política de defesa nacional do Governo? Entende o Governo a relevância e valor nacional das missões das Forças Armadas ou pretende, por esgotamento de meios de funcionamento, reduzir o seu papel? Mas, se é isso que pretende, por que não o diz claramente? Ou prefere, por falta de coragem, a política do facto consumado?
O País, esta Assembleia, as Forças Armadas, reclamam, Sr. Ministro, uma resposta clara, muito clara, a esta questão.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Marques.
Página 338
338 1 SÉRIE - NÚMERO 12
O Sr. Vasco Marques (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Gostaria de formular ao Sr. Ministro das Finanças duas questões relacionadas com as empresas públicas de transporte, e a primeira diz respeito aos contratos programa.
Pensa o Governo actualizar até ao fim do corrente ano os contratos programa para as empresas públicas de transportes, por forma a serem cumpridos pelas partes envolventes durante 1987?
A segunda pergunta está relacionada com os subsídios de indemnizações compensatórios e dotação de capital para o mesmo sector.
Em conformidade com a informação prestada pelo Governo, o montante dos subsídios e indemnizações compensatórias para as empresas públicas é de 37,5 milhões de contos. Todavia, o montante dos recursos financeiros transferidos para as empresas públicas tuteladas pelo Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações ascende a 54,7 milhões de contos e, para além dos 37,5 milhões já referidos, serão transferidos outros recursos, a título de dotação para aumentos de capital, admitindo-se que sejam feitas certas operações activas com empresas transportadoras. Nestes termos, solicito que seja explicitada a natureza das verbas que serão transferidas para as empresas transportadoras.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Andrade Pereira.
O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: O CDS há muito que vem defendendo a necessidade de uma profunda reforma administrativa que, além do mais, venha dar lugar a uma drástica redução das despesas correntes da Administração.
O gigantismo do nosso aparelho administrativo é, por um lado, asfixiante da capacidade de iniciativa dos portugueses e, por outro, impede o desenvolvimento livre e responsável da nossa vida colectiva, absorvendo ainda a maior parte do esforço fiscal pedido aos contribuintes.
É verdade que, neste domínio, o Programa do Governo não assumiu tão claramente como noutras aquela posição que vínhamos defendendo, mas, ainda assim, nele se inscreveu, sob o título «Modernização Administrativa», que o essencial neste âmbito é a orientação global do Governo em matéria de despesas públicas e que estas têm de ser contidas.
Ora, conjugando isto com algumas medidas não coactivas de desvinculação de funcionários - em alguns casos altamente chocantes e inconvenientes, como o dos magistrados do Supremo Tribunal de Justiça -, fomos levados a admitir que o Governo estaria no caminho certo. É pois com verdadeira surpresa e agastamento que verificamos que o Orçamento do Estado para o próximo ano prevê um acréscimo, em relação ao Orçamento do Estado do ano em curso, de 9,1 %, em termos reais, das remunerações de funcionários e que o montante das despesas públicas, não contando com as das empresas públicas, é superior a 50 % do produto interno bruto.
Quer isto dizer, e esta é a pergunta concreta, Sr. Ministro, que o Governo desistiu do propósito de manutenção das despesas públicas?
Quer isto dizer que o Governo já abandonou o lema «menos Estado e melhor Estado», expressão que, não sendo original, tantas vezes foi usada pelo Sr. Primeiro-Ministro?
Vozes do CIDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Ministro das Finanças, queria dizer-lhe que o sentido de voto do Partido Socialista dependerá das respostas que o Governo souber dar a um certo número de questões precisas.
Risos do PSD.
Voz do PSD: - Isso já foi anunciado, Sr. Deputado!
O Orador: - Em primeiro lugar, dependerá da apresentação de contas claras e transparentes, nomeadamente das contas de 1985, dos orçamentos clarificados e não mistificados de 1986 e 1987 e dos elementos macroeconómicos que o Partido Socialista pediu na Comissão de Finanças e que ainda não recebeu.
O Partido Socialista fará ainda depender o seu voto do facto de saber se o Governo está disposto a restabelecer a qualidade dos quadros macroeconómicos e das projecções macroeconómicas que não têm credibilidade e são totalmente erradas nas suas diversas componentes, revendo-as uma a uma.
O Partido Socialista fará também depender o seu voto do facto de saber se o Governo está disposto a corrigir a subavaliação dos impostos indirectos, nomeadamente do ISPE e IVA, afectando as receitas assim obtidas a cinco sectores precisos, sem prejuízo de se manter ou até de se reduzir o défice, que são: reforço da educação, reforço da investigação e desenvolvimento, subsídio de desemprego, incentivos ao investimento privado e cooperação.
O Partido Socialista quer saber se o Governo está disposto a desligar as GOP para 1987 da sorte - certamente má - que as GOP para 1987-1990 vão ter e, portanto, se não condicionará o Plano para 1987 à votação negativa a que certamente as GOP para 1987-1990 virão a ter.
O Partido Socialista quer ainda saber se o Governo está disposto a comprometer-se - não só por lei, porque, pelos vistos, o Governo não se compromete por lei, mas ao menos que valha a sua palavra perante a Câmara no sentido de se fazerem aqui os debates que não foram feitos no ano passado e a que o Governo estava obrigado por lei relativamente às GOP de 1986. Nomeadamente, refiro-me aos debates sobre o Plano Energético, sobre o PCEDE e sobre o Plano Nacional de Desenvolvimento Regional, a que agora se acrescentam os debates sobre o PEDIP e sobre as empresas públicas.
O Partido Socialista quer saber se o Governo se furta, em conjunto com todas as forças políticas aqui representadas e em cooperação com todas elas, a fazer um debate sério, aprofundado e crítico, de verdadeiro interesse nacional, sobre o que se vem fazendo ou não com a CEE. Não queremos usar a figura da interpelação, a não ser que o Governo a isso nos obrigue por se recusar a entender esse debate como um debate de sentido nacional, optando por entendê-lo apenas como uma luta partidária, uma vez que o Governo parece entender que foi apenas ele próprio. e o PSD a aderir à CEE e que são as suas clientelas quem deve beneficiar dessa adesão.
Página 339
19 DE NOVEMBRO IDE 1986 339
Compromete-se ou não o Governo a cooperar lealmente num debate que deve ter lugar o mais urgentemente possível?
São estas as perguntas que me queria fazer e, repito, da sua resposta dependerá o sentido do voto do Partido Socialista.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.
O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Ministro das Finanças, foi com alguma preocupação que, ao analisarmos as propostas de lei n.º 5 43/IV e 44/IV, vimos omitidas as grandes linhas orientadoras das modificações estruturais que, necessariamente, terão de ser introduzidas na agricultura face à nossa adesão à CEE. Não sabemos se o Governo as omitiu por querer ou se foi por falta de tempo, porque estava muito mais preocupado em cumprir o calendário para apresentar o Orçamento, facto de que, depois, fez grande propaganda.
Não sei se foi com essa preocupação que o Governo omitiu este aspecto, que, como V. Ex. e sabe, é muito importante.
De qualquer modo, gostaríamos de saber como, quando e onde vão ser aplicadas as verbas vindas da Comunidade e aquelas que o próprio Estado Português tem de ter disponíveis para investir na agricultura. Que modificações estruturais se vão introduzir e onde vão ser introduzidas?
Temos algumas preocupações, nomeadamente na área da comercialização dos produtos agrícolas, e é escusado referi-las aqui porque basta atentarmos naquilo que se passou nos últimos meses com o escoamento de produtos cerealíferos (trigo e milho), do tomate, etc.
Enfim, não temos propriamente as preocupações já aqui manifestadas de saber para onde vão essas verbas, temos muito maior preocupação em saber como vai ser fiscalizada a sua aplicação e se o Governo tem, de facto, hipóteses de as poder vir a fiscalizar, de as poder vir a orientar e de as poder tornar de interesse nacional.
Por último, depois de muito vasculhar o orçamento do Estado para 1987, não consegui vislumbrar verbas que contemplassem o pagamento das indemnizações a expropriados rurais.
Gostaria de saber se o Governo continua a querer distribuir aquilo que não é seu, porque ainda não o pagou - contínua a dispor das terras pertença dos proprietários espoliados -, se continua a querer fazer daquilo que foi feito há muito pouco tempo, ainda este Verão, quando o Governo, mais uma vez numa atitude altamente publicitária, para não dizer demagógica, distribuiu terras a pequenos agricultores sem sequer se preocupar em sanar alguns contenciosos, que hoje penso que são quase insanáveis.
Gostaria, pois, que V. Ex.º, Sr. Ministro das Finanças, me desse algumas respostas, pelo menos na matéria que lhe diz respeito. Agradecia também o favor de transmitir ao Sr. Ministro da Agricultura, hoje aqui ausente, algumas das nossas preocupações que dizem respeito à respectiva área.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr. a Deputada Helena Torres Marques.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Ministro das Finanças, V. Ex.ª diz que vivemos umas vezes com estratégia mas sem progresso e outras com progresso mas sem estratégia. Há uma certeza: vivemos sempre com o PSD!
Sr. Ministro, em qual destas situações estávamos quando o Dr. Sá Carneiro era Primeiro-Ministro?
Sr. Ministro, na Comissão de Economia, Finanças e Plano já tínhamos concluído que estávamos perante um orçamento elaborado com pouco rigor, tínhamos constatado que não eram credíveis as previsões relativas à evolução do consumo privado, do consumo público, da formação bruta de capital fixo, das importações, das exportações, da inflação. As previsões destas variáveis não pareciam credíveis, quer face à sua evolução recente quer face às medidas de política enunciadas, e agora o Sr. Ministro das Finanças vem dizer-nos que também o défice orçamental não está correcto.
Já tínhamos verificado, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, que uma comparação entre a percentagem do défice em relação ao produto interno bruto prevista no Orçamento do Estado para 1987 e a por nós estimada para 1986 mostrava que o défice aumentaria, não só em valor absoluto mas também em valor relativo.
O Sr. Ministro vem agora dizer-nos que afinal, em 1987, o défice não será de 9,7 % do PIB mas de 8 % a 8,5 %. Também já o sabíamos; em 1987 o défice não será de 434 milhões de contos mas muito provavelmente de 390 a 394 milhões, e até lhe posso dizer quais as rubricas em que se reduzirão as despesas: as despesas de bens e serviços estão, provavelmente, sobreavaliadas em 33 milhões de contos, o investimento em 7 milhões e os juros da dívida pública em 4 milhões.
Será, Sr. Ministro, que o seu discurso deverá ser tomado como uma nova proposta do Governo?
Afinal, que défice vamos votar? O que se contém na proposta do Orçamento do Estado para 1987 ou o défice efectivo para 1987 - passe o paradoxo, mas o termo foi seu , Sr. Ministro?
É que se não se alterar a proposta orçamental, fica-nos uma certeza, a de que também para este Governo fazer défices não é difícil; a sua proposta é a do maior défice orçamental de sempre!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Domingos Azevedo.
O Sr. Domingos Azevedo (PS): - Sr. Ministro das Finanças, foi com alguma mágoa que verifiquei, ao longo de toda a sua intervenção, de introdução do Orçamento do Estado, o facto de não se ter referido - salvo uma citação do relatório - ao actual sistema fiscal português.
Foi com muita mágoa que constatei esta ausência de referência ao actual sistema fiscal português, porque é conhecido que, neste País, paga impostos quem muitas vezes menos possibilidades tem de os pagar.
É conhecida no País a situação degradante a que chegou o sistema fiscal português. No entanto, analisando o Orçamento do Estado para 1987, verificamos que o Governo se limita a coser remendos mal cosidos, a deitar mais remendos numa coisa que já não os comporta.
E quando o Sr. Ministro diz que há uma estratégia controlada, permito-me perguntar-lhe: qual a estratégia do seu Governo no âmbito da fiscalidade? É a estratégia da situação actual, do imposto sobre as
Página 340
340 1 SÉRIE - NÚMERO 12
sucessões e doações ter orçamentados apenas 9 800 000 contos quando o imposto profissional tem orçamentados 90 milhões de contos? É este o tipo de estratégia, Sr. Ministro, sabendo nós que ó imposto profissional, na sua componente mais vasta, é pago por pessoas de baixos rendimentos? É essa a estratégia do Governo de V. Ex.ª?
V. Ex.ª diz que há uma estratégia controlada, mas analisado o PIDDAC do Ministério das Finanças, vemos, com muita tristeza, que ele não contém qualquer verba para a informatização de um* serviço capital na captação e liquidação dos impostos, que é a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos.
Sr. Ministro, é impossível este departamento, de importância capital, continuar a funcionar nos moldes em que tem funcionado até hoje e é com muita mágoa que não vejo uma única verba considerada nesse domínio.
Quando fez a citação do relatório, V. Ex.ª disse que houve combate à fraude e à evasão fiscal.
Sr. Ministro, dito desta maneira, isto pode parecer que convence alguém, mas desafio-o a dizer concretamente, perante esta Câmara, que medidas de combate à fraude e à evasão fiscal foram tomadas, de facto, na vigência do Governo a que V. Ex. a pertence. O que foi feito, Sr. Ministro, resume-se a uma simples palavra: nada!
E no Orçamento do Estado para 1987, que estamos a discutir actualmente, o Governo apenas nos propõe uma coisa: uma autorização legislativa, que vem transitando de sucessivos orçamentos, para definição de tipos legais de crimes fiscais. Do meu ponto de vista, esta autorização não tem uma definição clara nem uma penalização forte dos evasores, dos fraudulentos, daqueles que praticam a fraude e a evasão fiscal com a intenção e o conhecimento de que as estão a praticar.
Ora, sem uma revisão correcta no domínio da penalização da evasão fiscal não é possível fazer-se algo de válido nesta matéria.
O Governo teve, durante 'um ano, uma autorização legislativa para esse efeito. O que produziu nessa matéria, Sr. Ministro? Nada!
V. Ex. e referiu-se que o Governo olha ou, pelo menos, atende aos sectores mais carenciados da população portuguesa. Sobre isto peço-lhe apenas que compare a mutação da riqueza no País: aquela que é tributada em sede de imposto sucessório rende 9 800 000 contos, enquanto a força do trabalho, a força dos trabalhadores, dá ao Estado 90 milhões de contos. Temos dificuldade em classificar isto de justiça fiscal...
Pergunto, Sr. Ministro: que combate à fraude e à evasão fiscal tem produzido este Governo e o que se propõe produzir no âmbito deste Orçamento?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Ministro das Finanças: Quero aproveitar esta oportunidade para lhe manifestar o desacordo frontal do PS em relação à política governamental de incentivos ao investimento empresarial e, nomeadamente, ao investimento privado e ao carácter irrisório das verbas previstas no PIDDAC para as comparticipações financeiras ao investimento industrial.
Prever cerca de três milhões de contos - salvo desconhecimento de algum saco azul bem escondido para o conjunto dos incentivos destinados aos objectivos de reestruturação sectorial, de modernização, de criação de empregos, de correcção dos desequilíbrios regionais e de utilização racional da energia é duplamente ridículo. Ridículo pela exiguidade da verba, ridículo por esta não ter sido corrigida quando, com a queda do PEDIP em Bruxelas, foi posta em causa a componente adicional da CEE.
O Governo pretende inserir as suas políticas numa filosofia económica liberal e tem utilizado a retórica da privatização como sua arma ideológica preferencial.
Só que tal retórica não tem tradução útil num Governo que não cria ou não desenvolve os instrumentos indispensáveis ao crescimento rápido do investimento privado, que o PS considera elemento fundamental do processo de recuperação e desenvolvimento do País.
Em primeiro lugar, o Governo recusa, em absoluto, a utilização da política cambial como instrumento de defesa da competitividade externa da economia, o que, afirmado com tal extremismo - apesar de um princípio que reconhecemos correcto - contribui para afugentar o investimento nos sectores virados para a exportação.
Em segundo lugar, o Governo manteve o País, durante um ano inteiro, sem nenhum sistema de incentivos ao investimento efectivamente em vigor. O resultado está à vista. O ano económico mais favorável a Portugal nas últimas décadas saldou-se por um aumento, embora ligeiro, do desemprego, como as estatísticas oficiais recentemente confirmaram. E não venha argumentar-se com a legislação laboral, dado o papel omnipresente dos contratos a prazo.
Em terceiro lugar, o Governo continua a privilegiar os incentivos fiscais, sem reconhecer que, entre nós, eles servem pouco para tornar viáveis os projectos essenciais ao desenvolvimento e levam, sobretudo, a que os projectos, já de si rentáveis - e que em qualquer caso se realizariam -, venham a não pagar impostos por largos anos.
Em quarto lugar, o Governo definiu uma lei quadro de incentivos à reestruturação de sectores em crise que gerará inevitavelmente desemprego, por nada prever no campo das acções complementares de segurança social, formação e reciclagem profissionais, apoio à reinstalação de trabalhadores, na diversificação regional de actividades, nos prémios de emprego para a criação de novos postos de trabalho que absorvam os excedentes inevitáveis.
Em quinto lugar, o Governo aprovou um esquema de incentivos de base regional que é confuso, burocrático, fortemente restritivo, penalizador de PME e esquema totalmente não competitivo face aos nossos principais concorrentes na CEE, a Irlanda e a Espanha.
O PS, Sr. Ministro, está disposto a colaborar com todos os partidos desta Câmara e com o Governo, numa revisão geral dos sistemas de incentivos, dando-lhe clareza, coerência e eficácia, para que se rompa o círculo vicioso e se criem postos de trabalho com o ritmo indispensável para que, de facto, se combata o desemprego e, sobretudo, se combata a praga terrível do desemprego juvenil.
Entretanto, o PS apresentará amanhã, na Mesa da Assembleia da República, um projecto de lei que procura corrigir os aspectos mais caricatos do sistema de incentivos de base regional e manifesta, desde já, o seu empenhamento no reforço significativo das dotações orçamentais referentes aos instrumentos de apoio ao investimento privado, bem como às empresas públicas capazes de apresentar projectos úteis e rentáveis. Está o Governo disposto a aproveitar estas sugestões?
Página 341
19 DE NOVEMBRO DE 1986 441
O Sr. Presidente: - O último deputado inscrito para pedir esclarecimento ao Sr. Ministro das Finanças é o Sr. Deputado Miranda Calha, a quem dou a palavra.
O Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Ministro, vou colocar-lhe uma questão pontual, muito simples.
Neste Orçamento do Estado o Governo propõe um regime excepcional para os profissionais do desporto de alta competição. Poderá ser uma ideia interessante; no entanto, gostaria que o Sr. Ministro nos esclarecesse sobre quais as garantias quanto à eficácia e equidade relativa das normas para que se aponta.
Em segundo lugar, os profissionais do desporto de alta competição estão já sujeitos à tributação através dos impostos existentes. Se a situação actual é, porventura, resultante da ausência de fiscalização e se, no fundo, o proposto não passa de uma autorização legislativa, o que é que o Governo pretende com estas medidas excepcionais? Como pensa pô-las em prática?
Aliás, e já agora, Sr. Ministro das Finanças, como é que define ou caracteriza um profissional de desporto de alta competição?
Em terceiro lugar, o Governo não se lembrou de incluir neste regime privilegiado outras profissões de duração curta. Na verdade, a matéria é muito mais vasta do que apenas este sector. O que pensa o Governo sobre isto?
Entretanto, retomou a presidência o Sr. Presidente Fernando Amaral.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro das Finanças, se desejar responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram formulados, tem a palavra para esse efeito.
O Sr. Ministro das (Finanças (Miguel Cadilhe): Sr. Presidente, gostaria de referir que tenho perguntas de 22 senhores deputados...
Vozes do PSD: - Só! ...
O Orador: - ... e muitas delas não incidem na generalidade mas sim na especialidade.
Por isso, começaria por lhe perguntar, Sr. Presidente, se essas perguntas são consideradas como devendo ser respondidas hoje ou se devem ser remetidas para a discussão na especialidade, uma vez que V. Ex.ª não fez qualquer referência sobre isto.
V. Ex.a, Sr. Presidente, considera que estas perguntas cabem na discussão na generalidade?
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, V. Ex.ª responde agora às perguntas que desejar e pode, porventura, remeter a resposta de outras para ocasião posterior. Isso fica ao seu critério, Sr. Ministro.
O Orador: - Sr. Presidente, o tempo de que disponho é o tempo ordinário ou dá-me tempo extraordinário?
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, V. Ex.ª dispõe de 105 minutos para responder (risos), isto é, no decorrer da sessão de hoje o Governo dispõe ainda de 105 minutos e V. Ex.ª gerirá este tempo como julgar mais conveniente.
O Orador: - Sr. Presidente, nesse caso vou poupar o máximo de tempo, por forma que os meus colegas de Governo possam também responder aos senhores deputados.
Começarei por responder ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, que me colocou várias questões.
V. Ex.ª referiu que não acredita que a formação bruta de capital fixo em Portugal seja de 9 % em 1986.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Está errado! É falso!
O Orador: - O Sr. Deputado não acredita que isso seja possível, diz que é uma tentativa do Governo para enganar os agentes económicos e o País.
Sr. Deputado, vou repetir os indicadores que expus perante a Câmara no início desta tarde, quando fiz o discurso de apresentação do Orçamento do Estado: importação de máquinas, mais 10 %, em volume, nos nove primeiros meses de 1986; vendas de veículos comerciais, mais 31 %, em número; vendas de cimento e aço, mais 9 %, em termos reais (indicador composto do Banco de Portugal); concursos adjudicados de obras públicas, mais 32 %, em termos reais. '
Sr. Deputado, com estes indicadores, se o investimento vai mal, então não sei ler indicadores económicos e, provavelmente, o Sr. Deputado poderá dar-me uma ajuda nessa matéria.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Dou mesmo!
O Orador: - Sei que o senhor é um enciclopedista, mas vou passar adiante...
Risos do PSD.
O Sr. Deputado acha que somos pouco ambiciosos, que poderíamos ir mais longe, quando previmos que a inflação, em 1987, pode ser de 8% ou 9%.
O Sr. João Corregedor da (Fonseca (MDP/CDE): Sim, sim!
O Orador: - Bom, se temos credibilidade nas metas macroeconómicas que fixámos para 1986, 1987 e anos seguintes e temos tido essa credibilidade -, é porque, por um lado, somos ousados, e, por outro, somos prudentes e ainda porque, ao mesmo tempo, associamos a essas metas instrumentos de política económica que são considerados como de valia suficiente.
O Sr. João Corregedor da (Fonseca (MDP/CDE): Ou especulativa!
O Orador: - Temos demonstrado que sabemos comandar esses instrumentos e temos sabido criar um clima de confiança, que é o mais importante para que as metas económicas sejam atingidas. Aliás, este clima de confiança é o melhor de há doze anos a esta data e apenas para me referir ao período de vida em democracia.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - É falso!
O Orador: - Quanto à meta relativa à inflação para 1987 (8% ou 9%), devo dizer-lhe que tenho inteira segurança de que ela vai ser conseguida.
A
Página 342
342 1 SÉRIE- NÚMERO 12
O Sr. Deputado e alguns seus colegas já duvidavam quanto à nossa meta de inflação para 1986. Agora fazem silêncio sobre o facto de termos conseguido cumprir essa meta e vêm levantar dúvidas quanto a 1987.
A nossa política anti-inflacionista assenta em quatro grandes pilares: política cambial, política de taxas de juro, política de rendimentos e concertação social e, finalmente, expectativas anti-inflacionárias. Este último ponto é, de longe, o mais importante de todos. Mas sabe, Sr. Deputado, é preciso saber fazer as coisas para conseguir gerar expectativas consistentes com as nossas metas e temos dado mostras disso nos últimos doze meses.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Deputado Carlos Brito referiu que o desemprego alastra em Portugal, que o emprego não cresce.
Bom, no 3. º trimestre de 1986 a taxa de desemprego foi de 9,6%.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Olhe que não!
O Orador: - A própria Comunidade Económica Europeia, através de sua Comissão - que se preza de ser independente relativamente aos Governos dos Estados membros -, disse que, pela primeira vez, desde há muitos anos, o desemprego desceu em Portugal em 1986 e vai continuar a descer em 1987.
Aplausos do PSD.
Vozes do PCP: - Não, não!
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Baixa a actividade!
O Orador: - Sei que custa muito ao Partido Comunista Português ver um governo conseguir, sem recurso a meios totalitários, baixar o desemprego... Custa muito ...
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Mandando as mulheres para casa!
O Orador: - Quanto às dotações para subsídio de desemprego e outros fins análogos, o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social responderá a essa questão melhor do que eu.
Disse o Sr. Deputado que as dotações para a educação e para a saúde descem em 1987, mas devo dizer-lhe que o que na realidade acontece é que, em relação à educação, a sua dotação cresce em 1987, como aliás já tinha acontecido em 1986, o que fez com que agora a base fosse mais elevada.
Agora, não vos vão pedir que tenhamos a mesma taxa de crescimento em 1987 como tivemos em 1986, porque, repito, a base é mais alta.
Quanto à saúde, a verdade é que a sua dotação cresce bastante em 1987. De resto, a Sr.º Ministra da Saúde tem dado provas de que sabe gerir muito bem os meios que lhe são afectos.
Aplausos do PSD.
Como Ministro das Finanças gostaria de deixar esta palavra singela, mas muito positiva, e certamente que, depois, a Sr.º Ministra da Saúde responderá mais cabalmente sobre o seu sector.
No que se refere ao investimento privado, Sr. Deputado Carlos Brito, sei que V. Ex.ª e o seu partido gostariam de ver o Governo decretar que «ficam os empresários do País obrigados a fazer crescer o investimento, em 1987, em 10%». Só que isso não existe em economia de mercado, Sr. Deputado...
O Sr. Deputado disse também que somos um Governo sem saída... Sem saída para o Partido Comunista, é claro!...
Aplausos do PSD.
Passo agora a responder ao Sr. Deputado Nogueira de Brito - é sempre bom mudar assim de um lado para o outro...
Risos do PSD.
... e responder a perguntas que são quase da mesma natureza.
Despesa a mais, crescimento a mais, défice a mais... Enfim, o Sr. Deputado acha que, para 1987, temos disto tudo a mais.
Queria V. Ex. a que andássemos mais depressa na redução do défice e do peso do sector público em Portugal. Devo dizer-lhe que temos uma projecção a médio prazo (cinco anos) para a sua redução gradual. A nossa posição, Sr. Deputado, é de gradualismo e não de maximalismo, como parece ser a sua.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não é, não! ...
O Orador: - Nestas matérias, como noutras, da economia é bom que se ande devagar mas firmemente, sem dar passos atrás. Ora, dar um salto nessa matéria era a seguir voltar atrás, Sr. Deputado!
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não, não!
O Orador: - Quanto à incoerência das nossas propostas, acho que o Sr. Deputado, inteligente como é, não foi sincero, pois sei que V. Ex.º entende que as nossas propostas são muito coerentes.
Risos do PSD.
Disse o Sr. Deputado Octávio Teixeira, a propósito da dotação para juros da dívida externa - e volto a virar-me para este lado -, que não são aceitáveis os nossos pressupostos quanto a dois factores desta dotação, nomeadamente a taxa de juro e as taxas de câmbio. Quanto às taxas de câmbio, acha V. Ex.ª que elas deveriam ser diferenciadas, isto é, por um lado o câmbio do dólar e por outro o câmbio das outras moedas em que está expressa a nossa dívida externa.
Sr. Deputado, já dissemos na Comissão que este pressuposto dos câmbios não é tão importante como isso para fins dos juros da dívida externa, pois, se descermos o câmbio do dólar, subimos nos vasos comunicantes, isto é, os câmbios das outras moedas em que está expressa a nossa dívida externa...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não, não!
0 Orador: - ... e há aqui compensações.
Página 343
19 DE NOVEMBRO DE 1986 343
No que respeita à taxa de juro, devo dizer-lhe que assumimos um pressuposto prudente. Já tive ocasião de dizer, não só agora, na minha intervenção, como noutras ocasiões, que a nossa orçamentação é feita com regras de ouro, de boa orçamentação, para evitar que haja derrapagens. Sr. Deputado, praticamente já passámos o ano de 1986 e até agora não houve derrapagem orçamental, isto é, ainda não apareceu uma proposta de lei de orçamento suplementar.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Mas tem de aparecer!...
O Orador: - Vamos ver, Sr. Deputado... Já sei que esse é o seu desejo!...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não é desejo, é certeza!
O Orador: - O Partido Comunista Português fica satisfeito quando o Governo tem de apresentar, a meio ou no fim do ano, um orçamento suplementar, porque isso é uma prova de que o Governo está a derrapar. Mas este Governo ainda não derrapou nem vai derrapar até ao fim do ano.
Aplausos do PSD.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Já derrapou, já!
O Orador: - Não vai derrapar nem em 1986 nem em 1987.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, eu sei que isto é uma forma nova de estar nas finanças públicas e na governação, mas o Sr. Deputado tem de se pôr em dia! ...
Risos do PSD.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Consigo é impossível!
O Orador: - O Sr. Deputado Octávio Teixeira considera ainda que a nossa estimativa do défice efectivo de 1986 está acima daquilo que irá ser o défice efectivo final. Bom, Sr. Deputado, esta é a nossa estimativa neste momento; há dois meses atrás a nossa estimativa era diferente e daqui a dois meses será seguramente outra.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Anda sempre atrasado dois meses! ...
O Orador: - Não sei quem é que anda atrasado, Sr. Deputado, não sei... Parece-me que o País tem concluído outra coisa...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A Sr.ª Deputada Cristina Albuquerque pôs-me uma questão sobre o orçamento da Comunidade Económica Europeia relativamente à qual apenas lhe posso dizer que só nas próximas semanas - talvez em Dezembro - o Governo poderá ter bases seguras quanto ao orçamento das Comunidades. O conselho da ECOFIN (Reunião dos Ministros da Economia e das Finanças da Comunidade Económica Europeia) reunirá novamente a 8 de Dezembro e o do orçamento ainda antes dessa data. Portanto, com certeza que nessa altura teremos informações sobre a matéria. Para já apenas lhe posso dizer que o que temos é muito inseguro, salvo as dotações em matéria de fundos que resultam das comissões, onde as estimativas são relativamente seguras.
Quando ao PEDIP (Plano Específico de Desenvolvimento da Indústria Portuguesa), devo dizer que as negociações em matéria de desenvolvimento da indústria portuguesa continuam. Por que razão estar a estragar aquilo que deve ser cuidadosamente negociado? Ainda ontem entreguei ao Ministro das Finanças britânico, presidente da ECOFIN, uma carta do Governo português sobre o desenvolvimento industrial.
Vamos devagar, Sr. Deputado, vamos certos de que vale a pena negociar com a Comunidade Económica Europeia sobre esta matéria.
No entanto, peço-lhe que coloque essa pergunta ao Sr. Ministro da Indústria e Comércio.
Passo agora a responder ao Sr. Deputado Raul Castro - e vou no sexto senhor deputado...
O Sr. João Amaral (PCP): - Olhe que são 250! ...
O Orador: - Disse V. Ex. e que não existem medidas em matéria de desemprego. Bom, Sr. Deputado, como já tive ocasião de dizer, o resultado está à vista! A nossa política de redução de custos unitários de produção, que é fundamental, situa-se do lado da oferta e dirige-se precisamente ao investimento e à criação de postos de trabalho. É por aí que temos de ir, pela redução dos custos unitários de produção. Isto tem a ver com a política cambial, com a política de taxas de juro, com a política fiscal e com a política de rendimentos.
Mas, para além daquilo que já conseguimos, há umas quatro ou cinco condições fundamentais para que o desemprego seja reduzido nos próximos quatro ou cinco anos. A primeira destas condições é a possibilidade de flexibilizar os mercados de trabalho...
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Oh! ...
O Sr. José Magalhães (PCP): - É original! ...
O Orador: - ... matéria na qual a legislação laborar tem uma palavra decisiva a dizer.
A segunda condição é a formação profissional, onde temos de investir fortemente, e nos próximos anos isso vai acontecer, a começar já em 1987.
A terceira das condições é uma política de rendimentos adequada à modernização e crescimento da economia portuguesa e também ao emprego, pois está mais do que provado que salários demasiado elevados protegem os actuais empregados, mas geram desemprego em vez de criá-lo. Salários altos de mais impedem o aumento do emprego.
No que diz respeito à questão das dotações do Ministério do Trabalho e Segurança Social, peço-lhe que a coloque ao ministro desse sector.
Quanto ao IVA que incide sobre os artigos de luxo, se a memória não me falha, Sr. Deputado, é a segunda vez que V. Ex.ª me coloca esta questão nesta Câmara e é a segunda vez que vou dar esta resposta: taxas demasiado elevadas sobre qualquer espécie de artigo só geram economia subterrânea e, para além disso, estamos obrigados a uma aproximação ao que se passa na Comunidade Económica Europeia.
Página 344
344 1 SÉRIE - NÚMERO 12
Em síntese, são estes os argumentos para que o 1VA que onera os artigos de luxo não tenha uma taxa de 80 % ou 100 %, como me parece estaria no espírito do Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Deputado Carlos Carvalhas falou na asfixia do sector empresarial do Estado. Estamos, nesta matéria, em oposição radical em relação ao Partido Comunista e também, em parte, ao CDS.
O sector empresarial do Estado tem, para 1987, as dotações que, segundo os nossos cálculos, são suficientes sem serem excessivas. O crescimento da economia, por um lado, e a redução dos encargos financeiros, por outro - e esta redução nas empresas públicas é substancial porque estas empresas são as mais endividadas da economia portuguesa -, leva a pensar que as empresas públicas têm, em 1987, aquilo que devem ter. .E não vão investir ao ritmo dos últimos doze anos, pois investiram de mais e muito mal, portanto, não vão cometer novamente erros desse género.
No que se refere à questão Comunidade Económica Europeia/Orçamento do Estado para 1987, penso que a ela já me referi em parte quando respondi à Sr.º Deputada Cristina Albuquerque. Quanto à transferência líquida do Orçamento do Estado para 1986 para a Comunidade Económica Europeia, posso dizer que este ano ela implicará mais cerca de 700 mil contos. Certamente que o Governo não precisará de o incomodar com uma proposta de lei sobre a matéria, pois acorrerá a esta despesa com uma contrapartida dentro do Orçamento. Portanto, o Sr. Deputado pode estar descansado. É claro que não vamos deixar de pagar à Comunidade Económica Europeia, mas isto é uma «gota de água» no «oceano» das despesas públicas.
Questionou-me o Sr. Deputado Gomes de Almeida sobre os salários na função pública, questão à qual respondo dizendo que o crescimento dos salários é de 11,5 % na tabela salarial e que o crescimento da massa salarial está estimado em 11,6 %
Sr. Deputado, com um crescimento dos preços de 9 % entre Janeiro e Dezembro de 1987 a produtividade cresce não 3 % mas sim 2,5 % - e vai desculpar-me que lhe diga que é uma soma, mas não é algébrica, pois tem de se fazer uma multiplicação.
De facto, esperamos que a produtividade na função pública cresça à volta de 2,5 %, tendo em conta que em 1987 não haverá aumento de efectivos, mas, pelo contrário, redução dos mesmos, como aliás já ocorreu em 1986.
O Sr. Deputado não acredita que na função pública, apesar do subemprego que lá existe -- mas é preciso ter em conta que isso já está incorporado na base -, seja possível em 1987 fazer crescer a produtividade em 2,5 %, mas nós acreditamos.
O Sr. Deputado José Seabra colocou-me uma questão sobre os cofres do Ministério da Justiça. Devo informá-lo de que existe um projecto de decreto-lei que dará autonomia financeira clássica aos cofres do Ministério da Justiça, matéria sobre a qual certamente o Sr. Ministro da Justiça terá muito gosto em responder.
Mas, já agora, gostaria de chamar a atenção do Sr. Deputado que no próprio relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias se reconheceu expressamente que este ano foi feito um esforço concreto de racionalização e clarificação do sistema dos cofres do Ministério da Justiça. A lei de reconversão orgânica está pronta; só que não é de um sopro que se corrigem características que já vêm de há longos anos.
Portanto, sugiro ao Sr. Deputado a leitura deste relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
O Sr. Deputado José Tengarrinha diz que lamenta o facto de o Sr. Primeiro-Ministro estar ausente.
Sr. Deputado, o que é que V. Ex. a me diria se hoje o Ministro das Finanças, em vez de ter feito o discurso que fez, tivesse lido perante a Câmara um relatório geral sobre a proposta de lei do Orçamento do Estado para 1987?
Sr. Deputado, foi algo análogo que aconteceu hoje de manhã! Estivemos aqui durante a manhã inteira a ouvir a leitura do relatório e do parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano, coisa que poderíamos ter feito em casa com muito gosto e muito proveito. O Sr. Primeiro-Ministro esteve aqui toda a manhã e só por um impedimento de força maior não pode estar presente no início da tarde. Portanto, Sr. Deputado, o significado da ausência do Sr. Primeiro-Ministro é só este.
No que diz respeito ao balanço financeiro com a Comunidade Económica Europeia em 1986, devo dizer-lhe que ele é seguramente positivo, e terei muito gosto em fazê-lo noutra altura.
A Sr.ª Deputada lida Figueiredo falou da distribuição do produto em 1986.
Sr.ª Deputada, fale não só da distribuição do produto em termos de PIB, mas também em termos de rendimento disponível. Faça as suas contas, mas não esqueça que, para além de tudo o mais, em 1986 os salários reais cresceram como nunca, salvo aquela loucura de 1975, em que a produtividade desceu, os salários reais subiram e depois, claro, viu-se o que aconteceu nos anos seguintes.
Em 1986, os salários reais, em termos líquidos, subiram ainda mais.
Sr. Deputado Rogério de Brito, V. Ex.ª pôs questões sobre a estratégia para a agricultura e também sobre as dotações que vêm da Comunidade Económica Europeia e a forma como elas são distribuídas entre cooperativas agrícolas, empresas privadas, etc.
Certamente que o Sr. Deputado compreenderá que esta matéria deverá ser posta, com certeza com maior pertinência, ao Sr. Ministro da Agricultura. Por isso, peço-lhe que o faça logo que ele esteja cá presente.
Quanto à racionalidade da nossa estratégia, ao sobreinvestimento ou subinvestimento, conforme os sectores, devo dizer ao Sr. Deputado que quem orienta o investimento numa economia de mercado - e estou a considerar o investimento produtivo, o investimento empresarial - tem de ser o mercado. O Governo pode e deve dar algumas orientações, alguns sinais, alguns incentivos, mas não pode determinar como, quando e onde se investe e se desinveste. E quando o Governo quer «meter o nariz» no assunto, resultam os tais desastres económicos, alguns dos quais ainda estão bem presentes na nossa memória.
Claro que o investimento público em infra-estruturas é orientado e determinado pelo Governo. Contudo, isso não acontece com o investimento público empresarial. Mesmo numa empresa pública - tipicamente empresa e não serviço público - o investimento deve ser orientado predominantemente pelo mercado.
O Sr. Deputado José Passinhas disse que a proposta de lei de programação militar ainda não está na Assembleia.
Página 345
344 19 DE NOVEMBRO DE 1986
Bom, posso dizer-lhe que o quadro, quanto à elaboração deste diploma, foi definido pela Assembleia da República, e, como sabe, nela têm de participar várias entidades, designadamente o próprio Conselho Superior de Defesa Nacional. No entanto, peço-lhe que coloque a pergunta ao Sr. Ministro da Defesa, que, com certeza, lhe responderá com muito mais propriedade do que eu.
O Sr. Deputado João Amaral afirmou que o Governo não tem uma política de defesa nacional.
A defesa nacional merece ao Governo a maior consideração, tal como a política de saúde, a política de educação, a política de redução do défice e do peso do sector público em Portugal. Não há prioridade absoluta para a defesa nacional.
O Sr. Deputado Vasco Marques perguntou-me sobre empresas públicas e transportes.
Peço-lhe, Sr. Deputado Vasco Marques, que coloque essa pergunta depois, na especialidade. Sempre lhe direi, todavia, o seguinte: as empresas de transportes levam o grosso da coluna das dotações do Orçamento do Estado para o sector empresarial do Estado, e pensamos que têm dotação suficiente; designadamente a modernização dos caminhos de ferro está inserida numa programação de médio prazo. Mas o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações responderá a esta questão com mais propriedade do que eu.
O Sr. Deputado Andrade Pereira falou das remunerações de pessoal, que parece que crescem em excesso em 1987, o que denunciaria, pois, um aumento dos efectivos de pessoal da função pública e, por outro lado, a não modernização da função pública. Sr. Deputado, o aumento das remunerações de pessoal no Orçamento do Estado para 1987 resulta, em grande parte, do reforço das dotações para pensões e para a ADSE. Não depende da vontade do Governo, antes sendo o crescimento natural do sistema, o que também acontece com a bonificação das pensões pela aposentação voluntária antecipada de 1986.
Sr. Deputado João Cravinho, o Partido Socialista fez uns pedidos de elementos macroeconómicos, aos quais, segundo o que o Sr. Deputado diz, o Governo não respondeu. O Sr. Deputado tem bem presente que me entregou pessoalmente, numa reunião da Comissão de Economia, Finanças e Plano, um rascunho seu e pessoal e que me disse que o pedido formal haveria de seguir de imediato. Ontem estive em Bruxelas, mas no sábado, quando saí do meu gabinete, o seu pedido ainda não tinha aparecido. A resposta está a ser construída, porque o pedido era de facto muito longo e o rascunho, Sr. Deputado, lia-se mal.
Risos do PSD e do CDS.
Quanto aos impostos indirectos, o Sr. Deputado diz que estarão suborçamentados. Sr. Deputado, a nossa regra de ouro - já a disse tantas vezes - é a de orçamentar com prudência, tanto do lado das receitas como do lado das despesas, de tal modo que, na execução do Orçamento, o efectivo resulte nas receitas em mais de 100 %u do Orçamento e nas despesas em menos de 100 % . Assim, o défice final efectivo há-de ser menor do que o défice orçamentado. Esta é uma regra de ouro que tentámos cumprir e cumprimos em 1986, e que tentaremos cumprir em 1987; vamos consegui-lo certamente.
Quanto aos debates da Assembleia da República sobre o PCEDED e outros programas, o que aconteceu foi que, na lei das Grandes Opções do Plano para 1986,a Assembleia da República, no exercício da sua soberania, introduziu um artigo ditando ao Governo o seguinte: «Fica o Governo obrigado a apresentar, para apreciação na Assembleia da República, as suas grandes opções em matéria de programa energético, programa de conecção estrutural do défice externo e desemprego» - e dizemos que também do desemprego, pois o programa é nosso « e programa de desenvolvimento regional.» Diz-se que «fica o Governo obrigado», mas, como o Sr. Deputado sabe, nem esta é a melhor forma de trabalharmos em conjunto nem sequer daqui resulta a vinculação para o Governo de apresentar estes programas ao longo de 1986, já que não há nem poderia haver prazo estabelecido.
Já agora digo-lhe o seguinte: o programa de correcção estrutural do défice externo e do desemprego (PCE DED) está na fase finalíssima de elaboração. De qualquer modo, por muito importante que seja um programa, o fundamental são os resultados conseguidos ao longo deste ano de 1986 em matéria de inflação, de disciplina orçamental, de crescimento económico e de combate ao desemprego.
O Sr. Deputado Soares Cruz falou também da agricultura, das expropriações e do contencioso à volta desta matéria. Peço-lhe, Sr. Deputado, que coloque esta pergunta ao Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação, o qual, mais uma vez, responderá com mais propriedade do que eu.
À Sr.ª Deputada Helena Torres Marques direi que estratégia, progresso e controle não terá havido, ao longo destes últimos doze anos de democracia, neste grau e com esta solidez, em nenhum outro ano. Disse-o no meu discurso.
Mas a Sr.ª Deputada pergunta, com certo cinismo: «E então no governo Sá Carneiro?» Sr.º Deputada, Sá Carneiro morreu ainda o Governo não tinha feito um ano de duração. O que lhe posso dizer é que não afirmei isto com ar categórico - e posso lê-lo, se quiser -, mas que lhe disse que talvez neste grau e com esta solidez não terá havido um clima de confiança e uma estratégia de progresso controlado deste tipo.
Devo dizer-lhe que em 1980 houve algo muito comparável a isto. Temos, por exemplo, o indicador objectivo de confiança nas famílias portuguesas e na economia em geral, que agora aponta para o mesmo nível atingido em Outubro/Dezembro de 1980. Mas, Sr.ª Deputada, as circunstâncias em 1980 eram muito diferentes das que temos agora.
Vozes do PS e do PCP: - Ah!
O Orador: - Agora, por exemplo, estamos na Comunidade Económica Europeia. Em 1980, ainda estávamos a limpar a casa das ameaças e dos fantasmas de uma economia totalitária.
Aplausos do PSD.
Quanto aos défices efectivos e orçamentados não vou repetir o que já disse tantas vezes. Parece que ou a Sr.ª Deputada ainda não entendeu as regras da boa orçamentação ou, então, custa-lhe ver um governo a fazer disciplina nas finanças públicas.
O Sr. Deputado Domingos de Azevedo perguntou qual era a nossa estratégia fiscal. Sr. Deputado, a reforma fiscal já vem de há longos anos e todos os governos, incluindo os do Partido Socialista, falam dela. Estamos a fazer a reforma fiscal com grande eficácia, mas em silêncio.
Página 346
346 1 SÉRIE - NÚMERO 12
Dentro de algumas semanas, Sr. Deputado, a Assembleia da República terá. aqui uma proposta de lei-quadro - a primeira desde que estamos em democracia - da reforma fiscal. Na altura, o Sr. Deputado falará certamente com muito mais pertinência e propriedade e, uma vez que é um conhecedor de matéria fiscal, teremos muito gosto, muito interesse e muito proveito em ouvi-lo.
Quanto ao imposto profissional, somos os primeiros a reconhecer que ele é pesado e temos vindo gradualmente - mais uma vez é o gradualismo que se impõe a baixa-lo. O que fizeram os governos do Partido Socialista em matéria de imposto profissional? Ele cresceu de ano para ano, não actualizaram os seus escalões, não baixaram as taxas ou até as subiram, criaram adicionais!
Sr. Deputado, vamos, ao longo dos próximos anos, progressivamente, reduzir a carga fiscal e parafiscal sobre os rendimentos do trabalho, de modo que essa carga fique em níveis razoáveis; pois estamos acima destes. Só que isto não se pode fazer num ano e o Sr. Deputado sabe que isso poderá ter impacte muito nefasto sobre o consumo privado, aquela variável macroeconómica que nos preocupa a todos.
Quanto às medidas de combate à fraude e evasão fiscais, o Sr. Deputado diz que não vê nada. O Sr. Secretário de Estado para os Assuntos Fiscais responder-lhe-á oportunamente, mas, contudo, direi que nesta matéria não interessam atitudes espectaculares de perseguição ou de tiros na rua.
O Sr. Domingos de Azevedo (PS): - Não brinque com coisas sérias!
O Orador: - Quanto à informatização, o Orçamento do Estado para 1987 dota a administração fiscal com uma verba avultadíssima. Só para modernização, por exemplo, estarão nele cerca de mais uns três milhões de contos. Pela primeira vez, apostamos forte na modernização da administração fiscal, porque fazer reforma fiscal não é só mexer no sistema fiscal, mas também na Administração.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Quanto à riqueza e ao imposto sucessório, estou de acordo consigo, Sr. Deputado. Só que não é só em 1986 e 1987 que o imposto sucessório é baixíssimo, pois esse facto já vem de há longos anos. O Sr. Deputado quer que mudemos tudo de uma só vez e, porque não o fazemos, somos os responsáveis por todos estes anos de «contemplativismo» fiscal?
O Sr. Deputado António Guterres fez um longo discurso, do qual é difícil retirar algumas perguntas. Mas tenho muito gosto em ouvi-lo.
Risos do PSD.
Em relação aos sistemas de incentivos fiscais, do Governo, o Sr. Deputado queria mais, mas, quando o Partido Socialista está no Governo, não sei bem se é isso o que acontece. O que acontece é que os incentivos fiscais não têm impacte nas despesas emergentes ou nas receitas cessantes porque o sector produtivo fica relativamente intimidado com a presença do Partido Socialista no Governo, não investe e não tem incentivos.
Risos do PSD, do PS e do CDS..
É fácil legislar assim, com muito mais incentivo fiscal; mas...
Quanto à política cambial, considerou-a inadequada porque não defende a economia. Sr. Deputado, já disse tantas vezes que, nos últimos seis ou sete anos ou menos, a política cambial foi uma política cambial que teve por vezes a sua razão de ser, mas que, em linha geral, foi negativa para a economia portuguesa, porque criou um falso proteccionismo, quer do lado das importações quer do lado das exportações. E quando temos proteccionismo a mais, é a modernização que fica adiada.
Aliás, Sr. Deputado, levantámos as barreiras comerciais ou outras precisamente porque queremos modernizar a economia. Ora, numa economia aberta, não tem sentido que mantenhamos proteccionismo através da política cambial.
Há também' uma outra razão: é que a política cambial, como tinha estado a ser seguida até Novembro do ano passado, era alimentadora da inflação em Portugal. Quebrámos o ciclo vicioso da inflação/desvalorização e é também por aí que passa o resultado que estamos a conseguir em matéria de inflação.
Depois, a política cambial que vinha sendo seguida antes do nosso Governo implicava a fraqueza sistemática do escudo. Nós, Sr. Deputado, estamos apostados em pôr o escudo com solidez em 1988.
Quanto às questões do Sr. Deputado Miranda Calha sobre os profissionais de alta competição e os impostos profissional e complementar a eles respeitantes, se o Sr. Deputado me conseguir provar que o actual sistema fiscal e a actual administração fiscal têm eficácia para pôr alguns contribuintes como estes a pagar devidamente os seus impostos, o Governo só agradecerá a sua sugestão. Todavia, se a memória não me falha, quando o Sr. Deputado foi Secretário de Estado dos Desportos num governo em que o seu partido poderia ter feito muito sobre a matéria fiscal que incide nos profissionais da alta competição desportiva, não fez nada, quando a situação de fuga aos impostos já era existente nessa altura. E se nada fizermos, ela continuará a existir.
O que pedimos é uma solução razoável para esta situação. Se os profissionais de alta competição têm uma vida activa relativamente muito curta, então temos de tributa-los com um regime especial. Como? Incentivando a sua propensão à poupança e dando um tratamento privilegiado às suas contribuições para fundos de pensão, seguros profissionais, seguros de saúde, etc.
Termino por agora e os Srs. Deputados desculpar-me-ão por não ter respondido mais qualificadamente às perguntas colocadas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para exercer o direito de defesa, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando me respondeu há pouco, sob a aparência de uma grande cordialidade, o Sr. Ministro das Finanças ofendeu-me pessoalmente e não posso deixar de lhe chamar a atenção para o facto.
O , Sr. Eduardo Pereira (PS): - Não merecia!
O Orador: - O Sr. Ministro deu a entender à Câmara que eu, acusando o Governo de incoerência
Página 347
19 DE NOVEMBRO DE 1986 347
na proposta de Orçamento, entendia, na realidade, que não havia incoerência na proposta, isto é, que eu pensaria uma coisa na Assembleia e outra fora dela. Desafio o Sr. Ministro a provar que eu alguma vez falei de coerência na proposta de Orçamento, sendo certo que, quando tive oportunidade de o fazer, ou seja, depois de a conhecer minimamente, sempre falei ao Sr. Ministro de incoerência nesta proposta.
Passo a explicar, Sr. Ministro: falei de incoerência a propósito de dois temas fundamentais.
Em primeiro lugar, falei de incoerência quanto ao facto de o Orçamento implicar um decrescimento do crédito a empresas e particulares, que cresce a uma taxa inferior à da inflacção, e simultaneamente prever um esforço de investimento por parte do sector privado, que implica uma taxa de formação de poupança de 32,5 %. Sei o que é que o Governo pensa nesta matéria. Simplesmente, o que o Governo pensa sobre esta matéria releva de uma aparelhagem psicológica que costuma utilizar e também de uma série de efeitos em cadeia que duvido que se produzam em 1987. É por isso que falo de incoerência a propósito de comprimir o crédito às empresas e aos particulares e esperar daquelas e destes uma grande contribuição para a formação de investimento. Esta é a primeira incoerência.
A segunda incoerência é a seguinte: ainda agora, nas respostas que deu a um dos senhores deputados, o Sr. Ministro das Finanças disse que na política de compressão, ou seja, na política de contenção do Orçamento, não convinha operar por saltos bruscos, mas o Governo dá-nos a entender que vai operar por saltos bruscos. Porventura não será este, mas outro Governo, que terá de dar o salto. É que o Sr. Ministro, que felizmente nos fornece uma perspectiva de evolução de diversas variáveis orçamentais num período de médio prazo, prevê uma evolução para despesas com pessoal e aquisição de bens e serviços de crescimento, e de crescimento franco, em 1987, que é num caso de crescimento muito reduzido em 1988 e de decrescimento noutro caso, que é o da aquisição de bens e serviços.
E já não me refiro ao célebre caso das fragatas quando falo de crescimento franco da verba para aquisição de bens e serviços em 1987. Esse é outro caso de incoerência.
Era a isto que me referia, Sr. Ministro, e V. Ex.ª nunca me ouviu dizer que havia coerência nestas duas linhas.
Vozes do CBDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo que se encontra nas galerias um grupo de 87 autarcas do concelho da Guarda, os quais, com a presença do Sr. Presidente da Câmara Municipal e do Sr. Presidente da Assembleia Municipal, vieram visitar-nos e apresentar-nos cumprimentos.
A eles manifestamos o nosso acolhimento, saudando-os na forma habitual.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Lopes.
O Sr. Silva (Lopes (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A minha intervenção vai concentrar-se essencialmente sobre as Grandes
Opções do Plano para 1987. Na parte final farei também algumas referências a aspectos gerais da política orçamental para o próximo ano.
Sabemos todos que o Governo criou uma situação extremamente controversa quando apresentou, juntamente com a proposta de Orçamento para 1987, um documento em que disse incluir simultaneamente as Grandes Opções do Plano a médio prazo para 1987-1990 e as Grandes Opções do Plano anual para 1987.
Essa situação poderia ter sido remediada com toda a facilidade se o Governo tivesse aceitado cindir a sua proposta de lei das Grandes Opções do Plano em duas propostas autónomas: uma para as GOPs de 1987 e outra para as GOPs a médio prazo. O Governo recusou, porém, a cisão e teve de ser a Assembleia da República a decidi-la com base nas suas prerrogativas constitucionais.
Ao procurarmos compreender esse procedimento do Governo encontramos duas possíveis razões.
Uma é a de que o Governo terá pretendido evitar que a Assembleia da República discuta com a profundidade adequada a sua proposta de Grandes Opções do Plano a médio prazo para o período de 1987-1990. Se a discussão dessa proposta se fizesse conjuntamente com a das GOPs para 1987, a Assembleia da República, a braços com a complexa tarefa de apreciar o Orçamento durante o curto período de tempo que para esse efeito dispõe, não teria tido possibilidades práticas de discutir a proposta de GOPs a médio prazo com a atenção e o desenvolvimento que ela bem merece.
Uma outra razão explicativa da atitude do Governo pode ser a intenção de criar mais um episódio de conflito com a Assembleia da República, no prosseguimento de uma prática que já se vai tornando habitual.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Tendo em vista a decisão já tomada pela Assembleia da República nesta área, a minha análise sobre as GOPs para 1987 baseia-se no documento intitulado «Complemento relativo as Grandes Opções do Plano para 1987, inserido no quadro das Grandes Opções do Plano a médio prazo (1987-1990)». É a esse documento que estarei a fazer referência sempre que na parte restante desta intervenção eu mencionar a proposta das GOPs para 1987. A minha análise basear-se-á também na proposta do Orçamento para 1987.
A informação e as orientações contidas nas GOPs para 1987 são extremamente insuficientes. Elas não poderão, porém, ser completadas pelo texto das GOPs a médio prazo, até porque esse texto não tem referências concretas e objectivos a atingir em 1987 ou a programas de política económica a executar nesse ano.
No documento com a proposta das GOPs e para 1987 há apenas cinco páginas dedicadas a política macroeconómica que o Governo pretende aplicar no próximo ano.
Nessas páginas encontram-se estimativas e projecções macroeconómicas sobre a despesa nacional e a balança de pagamentos que merecem fortes reservas, como se explica no relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano. É verdade que, com o instrumental estatístico disponível no nosso país, haverá sempre margens para erros e para debates à volta de valores como os que o Governo apresentou. Mas as estimativas do Governo, além de não aparecerem devidamente justi-
Página 348
348 1 SÉRIE- NÚMERO 12
ficadas no documento das GOPs, nem sempre parecem compatíveis com as informações já disponíveis. Em relação às projecções para 1987, encontra-se uma situação semelhante: a proposta do Governo não fornece indicações sobre as políticas necessárias para concretizar tais projecções, apesar de algumas delas implicarem inflexões significativas em relação às tendências do ano corrente.
Uma vez que esta matéria é tratada com desenvolvimento no relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano, limitar-me-ei a mencionar alguns aspectos particularmente significativos.
Em primeiro lugar, a proposta das GOPs subestima o crescimento do consumo privado em 1986 e não aponta quaisquer medidas de política económica orientadas para o objectivo programado de afrouxar o ritmo de crescimento desse consumo no próximo ano.
Em segundo lugar, é provável, em face dos dados sobre as contas do sector público administrativo, que as taxas de aumento do consumo público estejam significativamente subavaliadas, principalmente nas projecções para 1987.
Em terceiro lugar, admite-se que a expansão das importações no próximo ano venha a ser substancialmente mais acentuada do que o Governo projecta. Ao mesmo tempo, não se descortinam razões válidas para prever a aceleração do ritmo de crescimento das exportações projectadas nas GOPs.
Em quarto lugar, é já praticamente certo que o excedente da balança de transacções correntes em 1986 será muito superior à estimativa de 1100 milhões de dólares comunicada pelo Governo, admitindo-se que ele possa chegar a 1,8 milhões de dólares ou mesmo mais.
Além de apresentar estimativas e projecções da credibilidade por vezes duvidosa, a proposta das GOPs diz muito pouco sobre as políticas económicas que o Governo se propõe aplicar em 1987. Como se refere no relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano, as orientações expostas sobre política monetária e sobre política cambial são extremamente vagas e nem sempre parecem consistentes. As indicações sobre políticas de emprego e de rendimentos são quase inexistentes. Aparte as dotações do PIDDAC que aparecem na proposta de Orçamento, não há na proposta das GOPs quaisquer orientações sobre as políticas sectoriais a aplicar em 1987 na indústria, na agricultura, na correcção dos desequilíbrios regionais, etc.
Nestas circunstâncias, com uma proposta de GOPs que apresenta estimativas e projecções económicas altamente discutíveis, e que quase nada diz sobre as políticas económicas que o Governo tenciona aplicar no próximo ano, é questão de se perguntar: para que servem as GOPs que o Governo propõe para 1987?
Será que a sua aprovação vai obrigar o Governo a seguir um determinado tipo de política económica, em vez de outro qualquer, nos domínios monetário, cambial, agrícola, industrial, etc.? Será que as projecções macroeconómicas apresentadas pelo Governo terão algum valor operacional? Ou constituirão essas projecções um simples exercício numérico, que poderia ser substancialmente diferente sem que daí resultassem consequências de ordem prática?
Estas questões têm relevância não só em relação às GOPs de 1987 mas também às GOPs de outros anos. As propostas das GOPs de anos anteriores terão sido porventura mais satisfatórias do que as que agora temos perante nós, mas mesmo assim poderemos perguntar: tiveram elas utilidade prática? Poderá dizer-se que, ao aprová-las, a Assembleia da República traçou balizas à política económica do Governo? De que valeu, por exemplo, a aprovação pela Assembleia da República em Abril passado das GOPs para 1986, se o Governo só em Outubro submeteu ao Conselho Nacional do Plano o projecto do Plano para 1986 e até agora, a pouco mais de um mês do fim do ano, ainda não publicou esse Plano, em total desrespeito pelo artigo 2.º da Lei n.º 10/86, que fixou a data limite em 30 de Junho de 1986?
Há apenas duas áreas em que a preparação de pianos no nosso país tem tido alguma significação, mesmo assim bastante variáveis de ano para ano: a dos PIDDACs e a dos PISEEs. Mas o que mais interessa nos PIDDACs é a sua expressão financeira e esta aparece no Orçamento. As orientações que presidem à elaboração desses planos podem muito bem ser incluídas no relatório da proposta orçamental. Quanto aos PISEEs, a sua história tem sido atribulada. Em muitos casos eles têm sido publicados com enormes atrasos (por vezes até no fim do ano a que se aplicam). O actual governo nem sequer elaborou um PISEE para 1986. Limitou-se a publicar despachos avulsos que aprovam os investimentos de várias empresas públicas, consideradas individualmente. Além disso, o Governo não se deu ao trabalho de incluir quaisquer orientações relativas ao PISEE na sua proposta das GOPs para 1987. Enviou apenas um quadro com indicação dos «subsídios, indemnizações compensatórias e dotações de capital para o sector empresarial do Estado previstos para 1987» e um mapa com a «versão provisória dos investimentos do sector empresarial do Estado em 1987, com indicação das fontes de financiamento». O envio desses dois mapas só teve lugar a 12 do corrente, ou seja quase um mês depois da data prevista para a apresentação das GOPs, e, mesmo assim, porque foi expressamente solicitado pela Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Em face do que acabo de expor, interrogo-me:
Ao discutir e votar as GOPs, estaremos nós, os deputados da Assembleia da República, atentos ao seu verdadeiro significado prático?
Ou estaremos apenas envolvidos numa liturgia que nos é imposta pela Constituição, mas que é vazia de consequências efectivas sobre a política do Governo?
Em face das respostas que se encontrarem para estas interrogações, eu penso que a Assembleia da República deverá debruçar-se, não necessariamente agora, mas em ocasião mais oportuna, sobre os preceitos constitucionais relativos às Grandes Opções do Plano, incluindo não só os planos anuais mas também os planos a médio e a longo prazo, que, aliás, nunca existiram desde que o imperativo constitucional foi introduzido.
No que se refere especificamente às grandes opções anuais, a Assembleia deveria, a meu ver, encarar uma das duas alternativas seguintes: ou estabelecer em lei própria qual deve ser o conteúdo das propostas de lei das Grandes Opções do Plano anuais apresentadas pelo Governo, à semelhança do que sucede em relação às propostas de Orçamento, reguladas pela lei do enquadramento orçamental, ou entender, pura e simplesmente, que, numa futura revisão constitucional, se deverá eliminar a referência às Grandes Opções do Plano anual, porque o possível conteúdo da lei que aprove essas grandes opções pode ser incluído no Orçamento, especialmente no respectivo relatório e mapas anexos.
Página 349
19 DE NOVEMBRO DE 1986 349
Como referi atrás, o que a proposta das GOPs para 1987 nos diz sobre a política económica do Governo é pouco e é discutível. Essa política merece ser detalhadamente analisada no contexto da discussão actualmente em curso nesta Assembleia.
Com o tempo disponível, não terei possibilidades de comentar adequadamente toda as grandes orientações da actuação governamental na esfera macroeconómica. Por isso, vou limitar-me apenas a alguns aspectos particulares.
Sabemos que essa actuação do Governo se desenvolveu numa conjuntura excepcionalmente favorável. Partiu-se no fim de 1985 de uma situação em que a balança de pagamentos já estava equilibrada graças ao plano de estabilização de 1983-1984, em que a inflação já estava a descer substancialmente e em que a actividade produtiva já tinha começado a recuperar da crise imposta pelas medidas de estabilização dos anos anteriores. Encontrou-se em 1986 um condicionalismo externo extraordinariamente propício, como já não se verificava no nosso país desde há mais de uma dúzia de anos. Em períodos anteriores, nomeadamente por ocasião do primeiro e segundo choques petrolíferos, a economia nacional foi vitimada por subidas do preço do petróleo, por altas taxas de juro, por elevadas cotações do dólar, por pressões inflacionistas e por recessões económicas nos países industrializados. Em 1986 sucedeu precisamente o contrário: a inversão em todas as variáveis mencionadas trouxe ao nosso país uma melhoria sem precedentes nos termos de troca com o exterior. Daí resultou um aumento de, pelo menos, uns 5 % no poder aquisitivo da produção nacional ou o que é o mesmo no volume de recursos que o nosso país pode utilizar sem se endividar externamente. Uma tal melhoria, numa escala nunca antes verificada num só ano, permitiu que tivéssemos a possibilidade de beneficiar ao mesmo tempo de um superavit substancial na balança de transacções correntes, de aumentos significativos no nível de vida da população, de subidas na poupança nacional, de redução nas dificuldades orçamentais e de baixa da inflação.
O Governo tem tendência a afirmar que a evolução positiva da conjuntura económica se deve mais à sua acção do que aos condicionalismos externos que atrás mencionei. O Governo exagerará na afirmação dos seus méritos próprios, mas não seria fácil, mesmo que paca isso houvesse tempo, proceder aqui a uma análise objectiva sobre o que nas melhorias da situação económica é devido à política governamental ou à viragem quase miraculosa registada nos factores externos atrás apontados.
Há porém, duas áreas da política económica que tem vindo a ser posta em prática que merecem um comentário especial: a política de controle da inflação e a política orçamental.
Os progressos substanciais em matéria de inflação registados no ano corrente devem-se essencialmente à baixa dos preços internacionais, como se refere no parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano. Segundo os elementos fornecidos pelo Governo, o deflacionador da procura é estimado para 1986 em 12,6 %, contra aproximadamente 19 % no ano anterior. Essa baixa da inflação é, todavia, explicada fundamentalmente pela descida nos preços das importações que o Governo estima em 4%, mas que alguns técnicos estimam em mais de 7 %. Por seu turno, o deflacionador do produto interno bruto subiu, segundo o Governo,
cerca de 18 %. Se os preços do comércio internacional tivessem evoluído à mesma taxa do ano anterior - isto é, se tivessem descido 1 % em termos de direito especiais de saque, em vez de terem baixado 9,3 % - a taxa de inflação da procura interna teria sido, pelo menos, de 16%, mantendo-se inalterados os outros condicionalismos. Mas, em tal hipótese, os outros condicionalismos não se teriam mantido: se a taxa de inflação não fosse de 12 %, os aumentos salariais teriam por certo mostrado tendência para serem maiores e a reapreciação da taxa de câmbio teria de ter sido mais rápido para não se agravarem as dificuldades competitivas da indústria nacional. Isto quer dizer que se os preços internacionais tivessem evoluído ao mesmo ritmo de 1985, já de si bastante mais favorável que o dos anos precedentes, teria sido difícil, com as políticas que o Governo seguiu, evitar uma taxa de inflação interna muito inferior a 19 %, ou seja, muito inferior à do ano anterior.
Este cálculo mostra que a baixa da taxa de inflação deve muito pouco à política governamental. Pode até sustentar-se que essa política, em vez de reforçar o aproveitamento das condições externas excepcionalmente favoráveis para baixar a inflação, poderá ter criado condições para que o ritmo da subida dos preços venha a recrudescer no futuro. Não é com políticas como as que foram aplicadas em 1986 que chegaremos aos objectivos anunciados pelo Governo de uma taxa de inflação de 6 % em 1988. A razão desta afirmação está sobretudo na falta de controle adequado que se tem estado a verificar na política monetária. Não é preciso ser-se monetarista para concluir que o aumento de 24 % entre o princípio e o fim de 1986 no total de meios líquidos financeiros em poder do público só muito dificilmente será compatível com as metas de inflação anunciadas pelo Governo.
É verdade que as previsões neste domínio são falíveis, principalmente no que respeita às variações a curto prazo, por ser difícil projectar a procura de moeda e outros activos financeiros. Mas mesmo assim, é de admitir que se tenha criado um excesso de liquidez, que, se vier a ser injectado na procura interna no futuro próximo, provocará a reaceleração da inflação, em vez da sua descida, como o Governo promete. Essa reaceleração da inflação pode, é claro, ser reprimida temporariamente à custa de controles de preços, por exemplo, os preços das empresas públicas ou os preços subsidiados pelo INGA, mas, nesse caso, poder-se-iam criar desequilíbrios perigosos na esfera produtiva ou nas contas com o exterior.
A falta de controle adequado da oferta da moeda deve-se essencialmente às necessidades de financiamento do défice do sector público. O Governo diz no relatório da proposta de lei orçamental que esse défice vai diminuir em proporção do PIB, mas a hipótese contrária afigura-se bem mais provável, como se refere no parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano. Deve sublinhar-se, porém, que não é possível por agora fazer afirmações categóricas a este respeito: o que interessa é a execução orçamental efectiva, e em 1987 virão por certo a verificar-se diferenças substanciais em relação ao Orçamento, à semelhança do que tem acontecido no passado.
Em qualquer caso, perdeu-se em 1986, e continuará por certo a perder-se no próximo ano, uma ocasião única para reduzir significativamente o desequilíbrio das finanças públicas sem ter de enfrentar dificuldades
Página 350
350 1 SÉRIE - NÚMERO 12
muito sérias. A ocasião era excepcionalmente favorável, graças à entrada em vigor do IVA e à baixa dos preços dos produtos petrolíferos, que proporcionaram uma subida substancial da receita dos impostos indirectos; graças à queda das taxas de juro, que aliviou as despesas com a dívida pública, e graças à entrada na CEE, que terá proporcionado um saldo financeiro positivo ao Orçamento do Estado. O Governo preferiu, todavia, aproveitar essas condições únicas, que não voltarão a repetir-se tão depressa, para enveredar pelo caminho mais fácil e mais atractivo, de aumentar as despesas públicas em proporções bem superiores às de anos anteriores ou às que poderão ser conseguidas em anos futuros.
Entretanto, vai-se reconhecendo que o peso dos défices orçamentais está a criar cada vez maiores dificuldades à economia nacional. O próprio Governo refere que o financiamento ao sector produtivo terá de ser apertado por causa do volume de fundos absorvidos no financiamento do sector público administrativo. Além disso, queixa-se do elevado peso dos juros da dívida pública nas despesas e no défice orçamentais. No ensaio sobre a evolução das contas públicas do Orçamento do Estado até 1991, apresentado no relatório da proposta de lei orçamental, o Governo reconhece a necessidade de redução progressiva do défice dessas contas. Deixa, todavia, as reduções de tal défice para ser efectuada em 1988 e nos anos seguintes, ao passo que em 1987 continua a manter a política de facilidades na despesa que já caracterizou a política orçamental de 1986.
A posição que aqui defino a favor de uma maior contenção nas despesas públicas não significa que a Assembleia da República, sempre que aprove uma proposta orçamental, deva ficar impedida de aumentar algumas dotações para despesas dessa proposta. A Assembleia da República não tem grandes condições técnicas para cortar as despesas que lhe são propostas pelo Governo: não tem informações adequadas sobre as necessidades que essas despesas vão satisfazer, nem sobre a forma como as despesas são administradas. As dificuldades da Assembleia da República para cortar despesas não a devem obrigar, porém, a aceitar as propostas orçamentais do Governo sem lhe introduzir quaisquer alterações. Essas alterações são mais praticáveis na área dos aumentos de despesa, e por isso é natural que seja nessa área que elas têm lugar.
A Assembleia da República deve, porém, no entender do PRD, usar a sua capacidade para decidir do aumento das dotações para aumentos e despesas, embora o tenha de fazer com muita moderação. Foi isso que se fez em relação ao Orçamento de 1986, embora o Governo tenha procurado transmitir à opinião pública uma informação contrária. Por outro lado, o Governo pode sempre evitar que das decisões da Assembleia da República sobre aumentos das dotações para despesas venham a resultar agravamentos do défice. Bastar-lhe-á que corte nalgumas despesas que considere menos necessárias.
O Sr. Ministro das Finanças afirmou há pouco: «Fazer défices não é difícil. Difícil é deixar de os fazer.» Estamos de acordo. Simplesmente, o Governo continua a preferir fazer défices. Apesar das condições excepcionalmente favoráveis para se produzir o défice, ele não será em 1987 muito inferior ao de 1986; ele pode até ser superior, como estou convencido que pode acontecer.
Por causa da persistência dos enormes défices ano após ano, Portugal é, juntamente com a Itália, a Bélgica e a Irlanda, um dos quatro países da Europa Ocidental onde a dívida pública tem já mais peso em termos relativos: se considerarmos o conjunto do sector público administrativo, esse peso traduz-se por cerca de 110 % do PIB, de acordo com os números fornecidos pelo Governo. O ratio comparável para o conjunto dos países da Europa Ocidental não chega a 60%. A este respeito vale a pena citar o recente relatório económico anual para 1986-1987 da Comissão das Comunidades Europeias que o Sr. Ministro das Finanças já aqui referiu. Nesse relatório - e esta é uma transcrição que o Sr. Ministro das Finanças não fez- diz-se que em Portugal, tal como na Itália, na Bélgica, na Grécia e na Irlanda, «a persistência de défices orçamentais excessivamente elevados e o nível da dívida pública exigem que o saneamento das finanças públicas seja uma das prioridades da política económica».
O relatório da proposta de Orçamento reconhece que essa prioridade existe. Simplesmente, o Governo perde agora, neste curto período de bonança excepcional das condições económicas externas, uma ocasião única para concretizar tal prioridade. Deixa-a para mais tarde, ainda que assim se torne mais difícil roer os ossos resultantes das dificuldades que as reduções do défice sempre impõem. Será que o PSD, à semelhança do que aconteceu com as suas actuações em governos anteriores, espera que os ossos venham a ser roídos por outros?
Aplausos do PRD, do PS, do PCP, do CDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados Alípio Dias e Silva Marques.
O Sr. Alípio Dias (PSD): - Sr. Deputado Silva Lopes, ouvimos com o maior apreço a intervenção que formulou e devo dizer-lhe que em muitos aspectos estou inteiramente de acordo com V. Ex.a, concretamente na parte inicial, quando se refere à necessidade de uma clarificação do que se deve entender por GOPs e à necessidade de uma lei de enquadramento para as GOPS.
Todavia, há um aspecto da sua intervenção que gostaria que clarificasse. Se bem entendi, V. Ex.ª referiu que em 1986 este Governo perdeu uma oportunidade soberana de reequilibrar as finanças públicas ou, pelo menos, de lhe dar um forte incremento no sentido do reequilíbrio das finanças públicas. Gostaria, pois, que V. Ex.ª precisasse melhor este passo da sua intervenção, porque, apesar de tudo, julgo que foram feitos progressos sensíveis no sentido do reequilíbrio das finanças públicas. Concordo que a conjuntura é extremamente favorável, concordo em que há condições que há muitos anos não existiam em Portugal, mas, mesmo assim, julgo que poderia concretizar melhor o seu pensamento.
Vozes do PSBD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Silva Lopes, segui com toda a atenção o discurso que
Página 351
19 DE NOVEMBRO IDE 1986 351
V. Ex.ª produziu, até porque não tendo qualquer pretensão de dominar as matérias da especialidade de V . Ex.ª, procurei ansiosamente encontrar no seu discurso uma crítica construtiva, um esforço de elaboração de uma resposta alternativa de um partido que não é um partido que apoia o Governo - isto, dentro de um quadro geral da utilidade do debate político -, mas a verdade é que não o consegui. É por isso que peço a V. Ex.ª que o tente fazer em termos de resposta ao meu modesto e humilde pedido de esclarecimento.
Aquilo que, em primeiro lugar, sobressaiu aos meus olhos como observador leigo nas matérias da especialidade foi um grande esforço por parte do Sr. Deputado Silva Lopes em sustentar uma tese já conhecida e que é esta: os resultados positivos, e que sem esforço podemos classificar de espectaculares ao longo do exercício do actual Governo, são virtude não do próprio governo, mas das circunstâncias envolventes. Isto é, o Sr. Deputado considera que os méritos não são do Governo: não negou inteiramente os méritos do Governo, pois disse «não são tanto os méritos do Governo», mas voltou a essa tese.
Ora, eu direi, Sr. Deputado, que estamos quase na utilização absurda da tese de que o que determina o comportamento dos homens são as condições objectivas e não a sua subjectividade. Não creio, pois, que o Sr. Deputado tenha esta filosofia da interpretação da vida e por isso mesmo parece que tem de haver um esforço na tentativa da redução dos méritos do Governo. Mas foi isto que registei como uma nota e saliência do discurso do Sr. Deputado.
Destaquei ainda um outro aspecto, que diz respeito às considerações que o Sr. Deputado fez acerca dos dispositivos constitucionais sobre as Grandes Opções do Plano. Aí devo dizer-lhe que sigo as considerações que fez. Mas então, reveja-se a Constituição, e espero que o Sr. Deputado e o grupo parlamentar de que faz parte façam uma revisão no sentido que acabou de preconizar, porque, de facto, em grande parte estamos a ser vítimas do sistema constitucional que actualmente temos. Como o Sr. Deputado sabe, essa matéria foi sobretudo obra de uma visão estatístico-colectivizante do funcionamento da economia e das instituições em democracia aberta.
O Sr. Deputado referiu que o Governo - e voltou também a esse ponto como já anteriormente outros deputados tinham voltado está, tendencialmente, a fazer despesa a mais ou, pelo menos, a manter défices a mais.
No ano passado, o partido a que V. Ex. e pertence e os restantes partidos da oposição tiveram uma atitude de aumentar as despesas, aumentar o défice. Ora, este ano vão fazer cortes nas despesas, vão fazer cortes no défice? Esta é uma pergunta concreta para a qual também gostaria de encontrar uma resposta concreta.
O Sr. Deputado colocou ainda ao Governo uma questão contundente, que foi a seguinte: em termos de operacionalidade, para que servem as GOPs para 1987 - e isto porque V. Ex.ª entendeu que elas não tinham operacionalidade. Ora, V. Ex. e deixou sobre si mesmo igual contundência relativamente à intervenção que fez. Em termos de operacionalidade, para que serviu a intervenção de V. Ex.a?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Lopes.
O Sr. Silva Lopes (PRD): - Sr. Deputado Alípio Dias, V. Ex.ª disse que em relação ao equilíbrio das finanças públicas houve progressos sensíveis e referiu ainda o facto de eu não ter reconhecido os esforços que o Governo fez para conseguir reduzir o défice das finanças públicas.
De facto, houve este ano alguma redução do défice - não há dúvida nenhuma em relação a esse aspecto, pois os números mostram-no claramente -, mas, como disse na minha intervenção, foram circunstâncias externas extremamente favoráveis que proporcionaram essa redução. Houve a entrada em vigor do 1VA, que proporcionou um enorme aumento dos impostos indirectos; houve a entrada em vigor do imposto sobre produtos petrolíferos, que, graças à posição tomada por esta Assembleia da República, proporcionou enormes rendimentos, e houve a baixa das taxas de juro, que proporcionou enormes economias nas despesas da dívida pública. Portanto, por todas estas razões, havia condições automáticas para se conseguir uma enorme redução do défice. Ora, se o Governo não tivesse aumentado tanto as despesas, a redução do défice tinha sido maior. É evidente que o Sr. Deputado Alípio Dias não admite que eu tivesse alguma vez proposto que o défice tivesse passado para zero; o que eu digo é que o défice podia ter sido mais pequeno se o Governo tivesse mostrado mais contenção nas despesas.
Se me perguntar que despesas é que eu acho que se deveriam ter cortado, a verdade é que não estou em condições de responder porque não tenho o aparelho administrativo na mão. Só quem está no Governo é que sabe quais sãos as despesas mais dispensáveis, aquelas onde há mais desperdícios, onde há mais abusos. O Sr. Deputado, que foi Secretário de Estado do Orçamento, tem a esse respeito muito mais informação do que eu e, portanto, saberá muito melhor do que eu onde é que as despesas se poderiam ter cortado com grande benefício para o País.
Contudo, pelas informações fragmentárias que vamos obtendo daqui e dali sobre os subsídios que um determinado secretário de Estado deu a não sei quem e sobre os gastos que se fazem num serviço onde não se produz nada, sabemos que há possibilidade de se cortarem certas despesas com ganho para toda a comunidade nacional.
O Sr. Deputado Silva Marques colocou muitas mais questões. Pediu-me para eu apresentar aqui uma alternativa ao Governo. Certamente queria que eu trouxesse um orçamento feito de casa!
Risos.
Já disse que para se fazer um orçamento é preciso ter um serviço às ordens e, neste momento, o serviço está às vossas ordens, e não às minhas. Portanto, só os senhores é que podem fazer um Orçamento, não somos nós.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orados: - Faça favor.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado, este Governo tem posto os seus serviços à disposição da oposição. Portanto, não é por falta de números que VV. Ex.as não podem fazer uma proposta alternativa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Página 352
352 1 SÉRIE- NÚMERO
O Orador: - Sr. Deputado, tenho números a mais, mas não tenho os números todos que queria.
Risos.
Com isto não quero dizer que o Governo não tenha mostrado colaboração em fornecer certos números, mas a verdade é que também nos tem fornecido muitos números irrelevantes e tem retido alguns números que são de importância fundamental.
O Sr. Deputado disse que eu tinha feito um grande esforço para demonstrar que os resultados positivos da actual situação económica provem da conjuntura externa e não da acção do Governo. Ora, devo dizer que não fiz grande esforço algum; acho que isso é tão evidente que não vale a pena fazer grande esforço. Mencionei algumas estatísticas para provar que a baixa da inflação foi um simples resultado aritmético da baixa dos preços de importação e, numa análise numérica que fazemos das componentes da inflação, não conseguimos descobrir um pouco da influência do Governo.
O que procurei demonstrar não foi que este ano se pudesse ter conseguido uma taxa mais baixa do que a que o Governo conseguiu - admito que esta taxa foi razoável. Contudo, podia ter-se seguido uma política monetária mais prudente, o que implicaria um défice mais pequeno, para que a inflação não corresse riscos de recrudescer no futuro, como estou convencido que vai acontecer. Considero que a política monetária que o Governo seguiu este ano é extremamente imprudente.
O Governo pode, durante o ano de 1987, disfarçar a inflação. Basta manter a taxa de câmbio sobreavaliada, ainda que com prejuízo para as indústrias nacionais, basta deixar as empresas públicas perderem mais dinheiro, obrigando-as a ter preços a baixo dos custos, basta dar mais subsídios através do INGA e de outros fundos análogos para manter certos preços de bens essenciais controlados, etc. Portanto, durante um ano o Governo tem possibilidades enormes de chegar à taxa de inflação que anunciou. O pior é o que vem depois! Já vimos, em 1980-1982, o que é que foi a política de facilidades! Houve facilidades durante três anos que depois se pagaram em 1983 e 1984 da maneira como todos nós sabemos.
Ora, não quero dizer que, por enquanto, se estejam a criar desequilíbrios como esses. O que digo é que, para se manterem as perspectivas de inflação que o Governo anuncia com a política monetária e orçamental que está a seguir, corremos o risco de voltar a práticas dessas.
O Sr. Deputado colocou também uma questão relativa às GOPs e disse que o melhor era que na próxima revisão constitucional o PRD comungasse das opiniões do PSD a este respeito, e ainda bem que colocou essa questão para eu clarificar a minha opinião. Em primeiro lugar, devo dizer que não tomei posição sobre se a referência às GOPs anuais deve ou não ser eliminada da Constituição, apenas disse que há duas alternativas que devem ser consideradas.
Pessoalmente, não vejo grande inconveniente em que se elimine da Constituição a referência às GOPs anuais, mas já não tenho a mesma opinião a respeito das GOPs a médio e a longo prazo.
Creio que o Plano faz falta para o sector público administrativo e para o sector público empresarial. Não se pode voltar a um Plano abrangente, do estilo de há quinze anos, mas ...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Silva Marques (PSD): - O que V. Ex.ª está a dizer é correcto e também penso que é útil, mas isso não é o conteúdo institucional das GOPs. O conteúdo institucional das GOPs é qualquer coisa de muito diferente.
O Orador: - A Constituição não define isso claramente. Por isso é que proponho que a Assembleia da República estabeleça uma lei de enquadramento para as GOPs. É uma boa ideia e talvez essa discussão se faça agora a propósito das GOPs a médio prazo.
O Sr. Deputado disse ainda que, uma vez que eu critico o Governo por fazer despesas a mais, espera que não aumentemos as dotações para as despesas, que não façamos o mesmo pecado que fizemos no ano anterior. Ora, pelos vistos, o Sr. Deputado não esteve atento à intervenção que fiz, pois estão lá as explicações todas e não vale a pena repeti-las.
O Sr. Deputado concluiu dizendo que, se em termos de operacionalidade as GOPs não servem para muito, para que é que serviu o meu discurso. Sr. Deputado, espere mais uns dias!
Aplausos do PRD, do PS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Tengarrinha.
O Sr. José Manuel Tengarrinha (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Assembleia da República é hoje chamada a debater em Plenário as propostas de lei sobre as Grandes Opções do Plano e sobre o Orçamento do Estado para 1987. É este, sem dúvida, um dos momentos mais altos de qualquer sessão legislativa, pelas consequências que decorrem para o País e para a vida dos Portugueses, bem como pelas responsabilidades que impendem sobre os partidos políticos chamados a pronunciar-se.
Assumem, pois, particular gravidade os aspectos irregulares, perturbadores, que antecedem o início deste debate, que seria desejável se processasse com inteira normalidade. Com efeito, o Governo apresentou à Assembleia da República, sob a forma de proposta de lei, um diploma intitulado < Grandes Opções do Plano (1987-1990) e Grandes Opções do Plano para 1987», pretendendo assim envolver opções concretas para o período de um ano num texto vago e difuso no tempo, como é o Plano a médio prazo.
Em nosso entender, o Governo violou o disposto nos artigos 93.º e 94.º da Constituição da República e, designadamente, o n.º 1 deste último artigo, ao impossibilitar a Assembleia da República de < aprovar as grandes opções correspondentes a cada Plano». Na verdade, do disposto naquelas normas constitucionais ressalta que a estrutura do Plano compreende, por um lado, o Plano a médio prazo, que contém os programas de acção globaís, sectoríais e regionais, e, por outro, o plano anual. Não poderemos deixar de admitir que o Governo actuou assim com o intuito de, mais uma vez, provocar uma confrontação com o Parlamento, apontá-lo como responsável por qualquer eventual atraso e, em última instância, comprometê-lo com o que na realidade se apresenta com o cariz de um plano governativo.
Página 353
19 DE NOVEMBRO DE 1986 353
Perante as posições assumidas por alguns grupos parlamentares, veio o Governo entregar, cerca de quinze dias depois, um texto que classificou de «Complemento relativo às Grandes Opções do Plano para 1987», inserido no quadro das GOPs de médio prazo 1987-1990. Ora, para ser inteiramente regular o seu comportamento, teria o Governo de classificar este documento como uma proposta de lei e submetê-la à apreciação do Conselho Nacional do Plano, o que não fez. E só ontem os grupos parlamentares tiveram conhecimento de um ofício do Ministro Adjunto, no qual se declara que o chamado «Complemento» faz parte integrante da proposta de lei n.º 43/IV.
Perante esta irregular actuação do Governo, viu-se a Assembleia da República confrontada com o seguinte dilema: o que ia ser debatido e o que ia ser votado? Conviria ainda saber se o tal «Complemento» foi ou não aprovado em Conselho de Ministros, já que não está subscrito pelo Primeiro-Ministro nem, no ofício que o acompanha, se faz qualquer referência a que tenha sido aprovado em Conselho de Ministros, o que é exigido pela Constituição [artigo 203.º, alínea c)].
Estamos, sem dúvida, perante um conjunto de dificuldades levantadas pelo Governo à Assembleia da República. Prova bem evidente disso foi a perturbação provocada nos trabalhos quando do início do debate. Pode dizer-se que uma boa parte de razão, pelo menos, tinha qualquer dos grupos parlamentares ao apresentar propostas alternativas de discussão, cindida ou conjunta, do documento, perante a indisponibilidade do Governo para apresentá-lo regularmente, como lhe competia. É ao Governo, e só ao Governo, pois, que cabem as responsabilidades por este quadro pejado de irregularidades e nada dignificante para um acto que é um dos de maior importância de qualquer sessão legislativa.
E lembro-lhe, Sr. Ministro das Finanças, que ficou sem resposta a pergunta que há pouco lhe fiz sobre as verdadeiras intenções políticas desta irregular actuação do Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao apreciarmos o texto das Grandes Opções do Plano, não deixa de surpreender-nos, antes de tudo, a roupagem formal que o envolve. Da qualidade deste não nos recordamos de qualquer outro presente à Assembleia da República.
E se é, obviamente, um documento menor, que compromete os responsáveis pela sua elaboração, não deixa de ser também constrangedor para quem tem de apreciá-lo. Prosa de mau estilo e pior gramática - como os nossos antigos diziam - ou, acrescentaríamos, um texto sobressaltado por constantes e dolorosos impactes com a sintaxe. E isto quando a língua portuguesa é precisamente erigida como a primeira das grandes opções. Não conhecemos, também, de texto desta natureza tão farfalhudo em frases rutilantes que puxam dos seus pergaminhos literários com um gosto mais que duvidoso ao serviço de ideias comezinhas e simples, de um optimismo de tipo farmacêutico, sem dúvida inspiradas pelo grande mestre Pangloss. Em alguns aspectos o texto roça mesmo o humor - não sabemos se involuntário. Mas é difícil acreditar que se digam coisas como «Portugal não pode continuar a ser Portugal sem ser português» sem que, pelo menos, haja a intenção desleal de competir com o senhor de La Palisse, que, como é geralmente admitido, quinze minutos antes de morrer ainda estava vivo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O documento que o Governo apresentou como sendo as Grandes Opções do Plano para 1987-1990 e Grandes Opções do Plano para 1987 é um documento genérico, sem metas quantificadas (salvo raríssimas excepções) nem temporais. Apresenta um conjunto de orientações sobre a sua actuação futura, mas sem indicar, de uma forma minimamente concreta, como prevê passá-las à prática. No fundo, estas opções poderiam ser apenas para 1987, ou ser para 1987-1990, ou ainda para 1987-1995, ou qualquer outra data. São intemporais. Aproximam-se mais de um programa do Governo, embora para tal continuem a ser demasiado gerais.
Mas esta sua característica não a torna menos inócua: expressa, de uma maneira clara, um plano de inversão do nosso sistema actual pela forma mais conservadora; pretende aniquilar o sector empresarial do Estado e criar condições para que os grandes grupos económicos nacionais e estrangeiros voltem a ter o domínio total da economia, como também resulta claramente da própria orientação do Orçamento do Estado para 1987.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Muito bem!
O Orador: - E isto com prejuízo não apenas dos trabalhadores e da população em geral, mas também do vasto sector das pequenas e médias empresas, em que em grande parte se apoia a economia portuguesa, bem como da nossa já tão comprometida independência nacional.
Um tal projecto não poderá ser concretizado, porém, sem profundas alterações na vida social e no sistema político.
Em primeiro lugar, transformações na legislação laboral que conduzam a consideráveis restrições dos direitos dos trabalhadores e da liberdade de intervenção das suas organizações representativas. E é curioso ver como no documento este ataque é camuflado com um conceito de empresa e de relação de trabalho que só encontra paralelo com o estatuto do trabalho nacional, fascista, de 1933. Basta lembrar, deste estatuto, o artigo 5.º sobre «espírito de paz social», o artigo 7.º, § 4.º, sobre o «espírito de cooperação», o artigo 22. º, em que se defende que «o trabalhador é colaborador nato da empresa onde exerça a sua actividade e é associado aos destinos dela pelo vínculo corporativo» e comparar com o texto das Opções quando, por exemplo, se diz que «a concepção da empresa» assenta num «espírito de corpo» (diríamos quase corporativo), em que «empresários, quadros e assalariados se sintam mobilizados para a prossecução de objectivos essenciais comuns». Estamos, na verdade, perante um texto que defende conceitos e valores próximos de um dos mais significativos documentos do regime fascista.
Um tal projecto não poderá ser concretizado, também, sem alterações no sistema político e nas características do poder. Por aí passa o agravamento, a que se tem vindo a assistir, do controle ideológico no aparelho do Estado, das tentativas de silenciamento e subordinação dos órgãos de comunicação social estatizados, da alteração da legislação eleitoral que visa estreitar o leque de opções dos cidadãos e permitiria a uma qualquer força conservadora manter-se longa e artificialmente no poder.
Página 354
354 1 SÉRIE - NÚMERO 12
Estas apreciações gerais, embora centradas no primitivo texto enviado pelo Governo, mantêm-se pertinentes, na medida em que o Executivo, ao enviar o segundo texto complementar, reconheceu que as opções agora em discussão para 1987 representaram a explicação do que já estava implícito no texto anterior. E o próprio Ministro de Estado, esta manhã, ao ser expressamente interpelado sobre esta matéria, voltou a confirmar tal entendimento do Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Todos estaremos provavelmente de acordo em que nos encontramos perante documentos da maior importância para o curso social e político do País nos próximos meses. Uma boa parte dos Portugueses estão atentos e conscientes sobre o que esta Assembleia irá decidir. Nenhum de nós escapará, mais tarde ou mais cedo, ao veredicto popular. Nem nenhum de nós escapará, mais tarde ou mais cedo, à responsabilidade de ter facilitado ou contrariado uma solução política mais consentânea com os interesses da maioria dos Portugueses.
Aplausos do MDP/CDE, do PCP, de alguns deputados do PS e da deputada independente Maria Santos.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Ministro das Finanças, Srs. Ministros: O Sr. Ministro das Finanças falou-nos dos auto-apregoados êxitos da sua política económica. Analisemo-los então.
Vejamos se os resultados obtidos se devem à política do Governo ou aos factores externos que lhe são estranhos. Isto é, se com as condições externas idênticas às de 1985 (preço do petróleo, taxas de juro, cotação do dólar) os valores dos principais agregados macroeconómicos atingiram ou não, em 1986, melhores resultados.
As excepcionais melhorias nos termos de troca, completamente alheias à acção do Governo (na ordem dos 10 pontos) e a baixa das taxas de juro internacionais (cerca de 2 pontos) só por si acarretam uma transferência de rendimentos para o País e uma melhoria no saldo da balança de transacções correntes (BTC) superior a 2 mil milhões de dólares.
Ora, o saldo da BTC, que o Governo estimava inicialmente em menos 700 milhões de dólares, e que na última informação o Sr. Ministro das Finanças já aponta um resultado positivo de 1700 milhões, ficaria, se não fosse aquele ganho excepcional, com um resultado bem inferior aos 411 milhões de saldo positivo em 1985.
A Comissão da CEE, no seu relatório anual, publicado em 17 de Outubro - que o Sr. Ministro trouxe hoje aqui como uma grande novidade, e que só traduziu em parte -, estima que só pela baixa do preço do petróleo de 27 dólares o barril, média ano, para os 15 dólares há, para os países da CEE, um ganho de cerca de 1 ponto, em média, no PIB, de 0,5 pontos no emprego e de menos 1,5 pontos nos preços. E Portugal está acima da média.
A taxa de crescimento do PIB, que o Governo estimava em 4% e agora em 3,9 %, tem, pelos factores externos, um acréscimo de 1 ponto. O que significa que se situaria nos 2,9%, resultado inferior ao de 1985 (3,3 %). Quanto à taxa de inflação, o que os dados
mostram é que em 1985 ela decresceu 10 pontos e que este ano só decresce 7 pontos. Sem os ganhos externos só teria descido de 1 a 2 pontos, o que, mesmo descontando o efeito do IVA, é manifestamente insuficiente. A taxa de inflação poderia estar agora a um nível inferior a dois dígitos se o Governo tivesse diminuído atempadamene as taxas de juro e o preço dos combustíveis industriais, se tivesse praticado uma outra política, nomeadamente cambial, e isto sem ter necessidade de estrangular a economia, de apertar o cinto, como foi feito no ano passado.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Se passarmos dos agregados macroeconómicos para os sectores, o panorama mantém-se desolador. A indústria naval afunda-se na crise. Não há modernização da frota da marinha mercante ou pesqueira. Projectos de inegável interesse nacional continuam engavetados. A nossa especialização acentua-se nos produtos vulgarizados e de baixa tecnologia. Tornamo-nos progressivamente num país produtor de slips, alpercatas e eucaliptos.
Por isso, é caso para perguntar, o que é que o Governo fez aos milhões resultantes de excepcionais condições externas? Onde estão as indústrias novas? Onde está a substituição da produção estrangeira pela produção nacional?
Um Governo que se autoproclama de eficiente, há mais de um ano que não aponta nenhum caminho, por exemplo, para a Siderurgia e mantém no Seixal 40 milhões de contos de maquinaria a deteriorar-se.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - É um escândalo!
O Orador: - Se passarmos ao plano social, o que a realidade nos mostra é que aumentou o trabalho precário e o desemprego - que se mantêm como doença crónica -, os salários em atraso e os índices de pobreza; e que, apesar do aumento dos salários reais, estes ficaram aquém dos ganhos de produtividade e das taxas de lucro.
Agravou-se, mais uma vez, a distribuição do rendimento nacional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo anunciou pública e sonoramente que pela primeira vez tinham sido entregues na Assembleia da República umas Grandes Opções a Médio Prazo e o Orçamento do Estado dentro dos prazos. Quem não tem memória curta, e quem conhece os factos, sabe que se trata de uma dupla mentira. Aliás, quanto à entrega dos documentos dentro dos prazos legais, é sabido que o Governo só há poucos dias entregou documentos a que legalmente estava obrigado, e que ainda hoje esta Assembleia da República não dispõe de informação que este se comprometeu a transmitir.
Mas detenhamo-nos sobre os documentos em questão.
A política económica contida nas Grandes Opções do Plano e no Orçamento do Estado pode sintetizar-se em duas orientações essenciais:
a) Política de benefícios para as grandes empresas e transnacionais (28 milhões de contos de incentivos fiscais e 21 milhões de contos de subsídios para as empresas privadas), com o agravamento da carga fiscal sobre rendimentos do trabalho;
Página 355
19 DE NOVEMBRO DE 1986 355
b) Política de estrangulamento para as EPs, visando o seu desmantelamento e entrega. As EPs, por terem sido obrigadas a recorrer ao crédito externo, pagaram em 1985 575 milhões de dólares de juros, mais do que a República, Banco de Portugal e empresas privadas, tudo junto.
Ora, este Orçamento, para ajudar à festa, impõe-lhes uma quebra no investimento e inscreve menos 63 %, nominais, para as dotações de capital e menos 6,5 % para as indemnizações compensatórias.
Paralelamente, vai buscar 5,8 milhões aos CTT/TLP e de participação nos lucros das instituições de crédito e das EPs cerca de 42 milhões de contos! É a asfixia premeditada, para criar o clima ao seu desbaratamento.
Estes são os objectivos concretos do Governo.
Quanto aos restantes, este é parco nas quantificações. Serviu-lhe de lição o ano passado. Previa um défice de 700 milhões de dólares na BTC e vai ter um saldo positivo de mais de 1800 milhões. Previa uma taxa de investimento de 10 %, reduziu-a depois para 9 %, e esta nem sequer deverá atingir os 8 %, o que obrigou o Sr. Ministro das Finanças a exclamar, em desabafo, que «o investimento não se decreta».
A Sr.ª Ilda (Figueiredo (PCP): - Isso é que é o rigor do Governo!
O Orador: - Dizia que a taxa de inflação seria de 14%, e esta vai rondar os 12%. Fixou uma taxa de crescimento do PIB de 4%, e este ficará nas imediações, mas por razões totalmente diferentes das apontadas pelo Governo (em vez das exportações foi o consumo interno a principal fonte do resultado).
Em face destes desaires compreende-se que o Governo nas GOPs/87 tenha fugido às quantificações. Que nos tenha apresentado uma volumosas Opções a médio prazo, texto ideológico, retrógrado e reaccionário, que com falsidades, meias verdades e algumas ideias feitas procura fazer a história e apontar o futuro. Não nos deteremos neste texto, que virá a ser agendado, nem no famoso conceito «de arco periférico todos os países do sistema europeu que servem de apoio à presença dos Estados Unidos na Europa», o que nos dá um quadro claro do que é a política externa deste Governo.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Também não nos deteremos sobre as leis do trabalho flexíveis, as empresas flexíveis, os sistemas de transportes flexíveis, nem nos debruçaremos sobre a posição de Portugal, «ponte com portagem», pois não cremos que os franceses e alemães para entrarem em contacto com angolanos e moçambicanos precisem de falar com os Portugueses; nem debateremos o não menos famoso «novo conceito de empresa», bafiento e corporativista.
A Sr.ª fida Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Muito menos iremos arrolar as grandes máximas dignas de um conselheiro Acácio ou de um biógrafo Zagalo de que «Portugal não poderá continuar a ser Portugal sem ser português»; ou a caracterização do País como «mais europeu na África, mais africano na Europa, mais continental em pleno Atlântico e mais atlântico no continente europeu», ou ainda aquela de que «a Europa também se vê do mar», a que só faltou acrescentar, quando não há nevoeiro.
O Sr. José Magalhães (PCP): - E mais juízo!
Risos do PCP.
O Orador: - Ficaremos tão-só com as poucas quantificações.
Segundo as GOPs, o crescimento do PIB em 1987, em volume, será próximo do do último ano, o que significa que com tal ritmo nem no fim do século atingiremos o actual produto per capita dos países mais próximos (Espanha).
Tal crescimento será, segundo o Governo, acompanhado pelo afrouxamento do ritmo das importações. Já para 1986 dizia o mesmo e o que se verificou foi o aumento significativo do peso destas (cerca de 31 % da procura total).
O Governo procura justificar o aumento por «uma maior propensão à importação decorrente do novo enquadramento internacional (adesão à CEE)». Só que, contrariamente ao que diz o Ministro das Finanças, estes efeitos não se produzem de uma só vez. Quanto à aceleração projectada na taxa de crescimento das exportações, o Governo é omisso em relação às políticas que tenciona pôr em prática para a conseguir. E seria interessante que o Governo o fizesse, tanto mais que para 1987 a CEE estima manter as importações ao mesmo nível de 1986 e o Japão e países da OPEP estimam quebras sensíveis.
O Governo também é omisso em relação às políticas que vai seguir para corrigir, como diz, os desequilíbrios estruturais na indústria, na agricultura, ou para corrigir as assimetrias regionais. Não há mesmo ligação ou tradução financeira entre as GOPs e o Orçamento.
Quanto ao PIDDAC, e deixando de lado as visíveis preocupações do Governo com os «lançamentos das primeiras pedras», é significativo que na comparação por sectores haja decréscimos, mesmo nominais, na educação - que ainda no ano passado era uma primeira prioridade -, na habitação e urbanismo, na indústria, na energia e na saúde. Para 1986 dizia o Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território, que está aqui presente, que as opções prioritárias seriam as rodovias, as escolas e a água. Então como é que se compreende que estas prioridades se tenham esgotado num ano, pois para 1987 aqueles três sectores têm decréscimos reais? Será que o problema das escolas, das rodovias e dos recursos hídricos está resolvido?
Esta é outra questão que os documentos evidenciam. É que o Governo não tem uma política para a educação e muito menos uma política nacional para a agricultura, indústria ou pescas. O ser ou não prioridade, o haver ou não mais investimento fica desde já, como o comprova a educação, dependente dos fundos da CEE. Portugal fica, assim, a reboque da política ditada por Bruxelas, que no essencial visa, através dos fundos estruturais, reduzir produções e capacidades produtivas, em excesso na CEE, a 10, mas deficitárias ou insuficientemente exploradas no nosso país.
As relações entre Portugal e a CEE, nomeadamente no que diz respeito aos fluxos monetários (pagamentos e recebimentos), continuam a ser muito pouco claras.
Página 356
356 1 SÉRIE - NÚMERO 12
Na maioria dos casos o Governo não informa ou informa deficientemente sobre o que se está a passar.
Ainda agora persiste em não incluir no OE a contribuição financeira para a CEE, com o argumento de que o orçamento ainda não está aprovado. Mas esquece-se do argumento quando inscreve no OE as suas estimativas de receitas provenientes dos fundos estruturais. É um álibi que nada tem a ver com a transparência das contas públicas. É mais uma atitude de afrontamento das instituições que o Governo insiste em prosseguir.
Mas não é só quanto ao Orçamento do Estado para 1987 que o Governo é parco nas informações. É o também em relação ao efectivado.
Só há poucos dias é que o Governo confirmou, depois de por nós ter sido invectivado, que a contribuição financeira bruta deste ano para a CEE será acrescida de 5 milhões de contos; que do FEOGA orientação, garantia e FEDER só se recebeu menos 15,9 milhões do que o Governo dizia no Orçamento de 1986; que dos 7,2 milhões de contos das ajudas de pré-adesão o Governo só realizou 1,8 milhões; que dos 7 milhões que dizia irem para as autarquias até aos fins de Outubro foi somente 1 milhão e 88 mil contos.
É mais uma prova da transparência, eficiência e capacidade do Governo.
E se analisarmos os pagamentos realizados, quer em relação às autarquias quer em relação á agricultura, verificamos que mais de 75 07o foram feitos no litoral, o que, para quem disse querer corrigir as assimetrias regionais, é um bom sintoma...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar das muito favoráveis condições externas de que dispôs e dispõe, este governo mostra-se incapaz de dar resposta aos problemas e necessidades mais urgentes do País, quer no plano social, quer no plano económico, quer no plano financeiro.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Lá se vão as promessas!
O Orador: - Preocupado com a sua sobrevivência, o Governo procura, sobretudo, satisfazer as suas clientelas, em controlar os grandes órgãos de comunicação social, delapidando meios essenciais ao saneamento financeiro e ao desenvolvimento.
Os documentos aqui em apreço são dois instrumentos da política classista do Governo que nada têm a ver com os interesses nacionais.
A Assembleia da República está em condições de os corrigir pontualmente, mas não poderá endireitar o que torto está desde nascença.
Esta constatação, que é comum às diversas forças democráticas aqui representadas, mostra à evidência que não basta a convergência pontual para correcções pontuais. Mostra que é necessário ir mais além. Que é necessário cortar «o mal pela raiz», que é necessário e urgente a convergência para um novo governo, um governo democrático, com uma política democrática ao serviço dos Portugueses e de Portugal.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem palavra o Sr. Deputado Alípio Dias.
O Sr. Alípio Dias (PSD): - Sr. Deputado Carlos Carvalhas, ouvi com atenção a sua intervenção e devo dizer que assistimos a uma longa divagação sobre a execução da política económica do Governo em 1986.
O Sr. Deputado proeurou retirar aqui e além méritos, mas julgo que não foi capaz de demonstrar que, em matéria de inflação, de emprego, de crescimento económico e de reequilíbrio das contas externas, a política económica do Governo em 1986, para além do esperado num ou noutro capítulo, não está a alcançar os objectivos que se pretendiam atingir.
Depois, referindo-se à balança de transacções correntes, disse que houve sucessivas indicações de possíveis saldos ao longo de 1986 e, concretamente, referiu-se às empresas públicas.
Em matéria de empresas públicas referiu, em particular, um ponto que gostaria de questionar, porque queria que isto ficasse claro para esta Câmara. Pergunto: será que as dívidas foram contraídas em 1986 ou em anos anteriores? Será que, ao invés do que se verificou em anos anteriores, no ano de 1986 se está a assistir ao contrário na área das empresas públicas, isto é, à substituição de empréstimos externos por empréstimos internos?
Julgo que talvez valesse a pena clarificar este aspecto para, de uma vez por todas, tentarmos evitar aqueles ataques sistemáticos que vão aparecendo relativamente à política do Governo face às empresas públicas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Deputado Alípio Dias, devo dizer-lhe que é muito fácil demonstrar o que eu aqui disse: se pegar no relatório que o Sr. Ministro das Finanças aqui trouxe - e que só traduziu em parte verifica que lá estão feitas as contas. O barril de petróleo passou de 27 dólares (média/ano) para 15 dólares; veja agora, sem falar dos outros ganhos, quanto é que se transfere de benefícios, quer a nível de emprego, quer de inflação, quer de balança de transacções correntes.
Se o Sr. Deputado, que certamente, tal como eu, também teve acesso aos métodos de cálculo da Comissão, os aplicar a Portugal - aliás, isso até está feito -, verifica que o mérito do Governo é zero. Os ganhos nas relações de troca são de cerca de 10 pontos e nas taxas de juro são de 2 pontos, o que significa, em relação à balança de transacções correntes, um ganho de 2 mil milhões de dólares. Ora, se o Governo vai ter um saldo positivo externo de 1800 milhões de dólares, isso significa que se o não tivesse tinha um saldo negativo ou nulo. No ano passado houve um saldo positivo de 411 milhões de dólares!
Qual foi então o mérito do Governo? Onde é que ele está? São precisas mais demonstrações? Sr. Deputado Alípio Dias, acha que isto não chega? Quer que lhe demonstre agora o restante? Ou não quer perceber?
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Já percebeu!
O Orador: - Em relação às empresas públicas, pergunta: «Então as dívidas foram feitas por este Governo ou foram feitas pelos governos anteriores?» É claro que sabemos que o PSD não esteve nos governos anteriores ...
Risos do PCP.
Página 357
19 DE NOVEMBRO DE 1986 357
Até sabemos que em 1980 o Sr. Secretário de Estado do Orçamento não era o Sr. Deputado Alípio Dias, mas era Ministro das Finanças o actual Sr. Primeiro-Ministro, e pode demonstrar-se - aliás , o Sr. Deputado sabe isso- que o grande salto na dívida externa das empresas públicas foi feito em 1980 com o ministro Cavaco Silva e que nesse ano, por decreto, obrigou as EPs a recorrerem ao crédito externo, arcando com os aumentos das taxas de juros. Por isso é que as empresas públicas em 1986 estão a pagar 575 milhões de dólares de juros, ou seja, mais do que a República, mais do que o Banco de Portugal, e mais do que as empresas privadas. Andam a asfixiar as empresas públicas para depois dizerem: «Elas encontram-se assim!» Nomeiam para lá os gestores que se sabe e depois é fácil dizer: «Dão prejuízos, vamos entregá-las ao capital privado.»
Esta é uma política premeditada, é uma política planeada de asfixia das empresas públicas para servir as clientelas do Governo.
Vozes do PCIP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A posição de princípio do CDS em relação aos documentos hoje em discussão é do conhecimento público, divulgada, como foi, através de comunicado da sua comissão política.
E digo, de princípio, porque é evidente que o modo como decorrer a discussão em que a Assembleia está presentemente empenhada, as atitudes e os esclarecimentos, designadamente sobre as intenções do Governo, que forem tomados e produzidos pelos vários intervenientes poderão ser determinantes na posição final do meu partido.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Orador: - De qualquer modo, essa posição terá sempre em linha de conta os seguintes parâmetros fundamentais:
O CDS é um partido da oposição, na exacta medida em que não tem com o partido que sustenta o Governo qualquer acordo de incidência parlamentar ou com qualquer outra incidência;
O CDS é um partido que faz uma oposição construtiva e coerente, no sentido de não perder nunca de vista os superiores interesses nacionais e de não renegar, também, por motivos puramente tácticos, as posições que, ao longo da sua intervenção na vida política portuguesa, tem vindo a sustentar;
O CDS é um partido realista, o que significa que tem, neste caso, como sempre, consciência simultaneamente da importância do papel da Assembleia da República no desenvolvimento do processo político democrático e das suas reais possibilidades de intervenção no processo orçamental;
O CDS tem consciência plena de que, com os meios presentemente ao seu dispor, a Assembleia só limitadamente pode exercer os amplos poderes que lhe foram conferidos em matéria de aprovação orçamental.
É tendo tudo isto em atenção, e em atitude de profundo respeito pela Assembleia, que o CDS formará a sua opinião, que será anunciada pelo presidente da sua comissão política na intervenção com que da nossa parte encerraremos a participação no debate.
Assim sendo, e de acordo com os elementos disponíveis, o CDS considera que as propostas, tal como vão ser discutidas e votadas, têm a seu favor o facto de terem sido apresentadas tempestivamente, no prazo previsto, dando com isso aos cidadãos a ideia de que os órgãos do poder político não estão, pelo facto de o serem, furtados ao cumprimento da lei.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Como já tive ocasião de dizer, o CDS, que tem vindo a salientar a necessidade, do ponto de vista da institucionalização do novo regime democrático, de dotar finalmente o País com um governo de legislatura, não quer deixar de registar o facto como factor positivo do presente processo orçamental.
Mas, para além da pontualidade e de um maior cuidado técnico posto na sua elaboração e apresentação, estas propostas não têm a seu favor se não alguns aspectos que representam a continuidade de melhoramentos introduzidos ou preparados com o Orçamento do Estado para 1986 e as Grandes Opções do Plano e que então aqui também assinalámos.
É o que se passa com a desmonetarização da dívida e com a sua maior explicação e ainda com o maior peso conferido às despesas de investimento em detrimento das despesas correntes.
Simplesmente, é precisamente a continuidade que constitui, em nosso entender, o aspecto mais preocupante da proposta: as novidades, apesar de serem em número reduzido, esgotaram-se no ano passado. Agora o Governo limita-se a prosseguir dentro do modelo de política financeira que vem sendo seguido ao longo dos últimos anos.
E, pior do que isso, prosseguir significa neste momento, pelo menos, desperdiçar uma oportunidade que poderá não se repetir nos tempos mais próximos.
É realmente difícil, todos o admitem, reunir um conjunto de circunstâncias tão favoráveis como foram, sem dúvida, as que este ano de 1986 constituíram o contexto em que evoluiu a economia portuguesa.
Mas o que a proposta agora em apreciação representa é a manutenção, pelo menos por mais um ano, da mesma estrutura orçamental e com ela dos mesmos estrangulamentos estruturais da economia portuguesa.
Quer isso dizer que não nos libertaremos, por enquanto, da terrível sequência: mais despesa, mais impostos pagos, mais dívidas, mais juros a pagar.
Em suma, mais Estado e, portanto, menos iniciativa, menos solidariedade espontânea, menos sociedade continuarão, apesar de tudo, a dominar a vida nacional.
O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Não apoiado!
O Orador: - É o que resulta, com efeito, de se tratar de um orçamento que cresce em todas as suas componentes: cresce, antes de mais, e desde logo, a despesa global (15,2% em termos nominais e 6,1 % em termos reais), como resultado do crescimento das suas duas componentes fundamentais, a despesa corrente (mais 4,1 % em termos reais) e a despesa de capital (mais 13 % em termos reais).
Página 358
358 1 SÉRIE - NÚMERO 12
Perante tal ordem de grandezas, impõe-se esclarecer as razões que levam a despesa, principalmente a despesa corrente (de funcionamento), a crescer, sendo certo que o Governo considera desejável que assim não seja e propõe-se mesmo reduzir drasticamente tal crescimento, mas só a partir do próximo ano de 1988. Isto se cá estiver, é claro!
Risos do CDS e do PSD.
Ora, a resposta é clara e simples: a despesa de funcionamento cresce porque cresce o consumo público e principalmente as despesas com pessoal (mais 9,1 % em termos reais) e as aquisições de bens e serviços (mais 32,9 % em termos reais). Quer dizer, é a máquina da Administração Pública que, alimentando-se já a si própria, ocupa cada vez um espaço maior. Não pode, com efeito, continuar a imputar-se, ao serviço da dívida, a maior responsabilidade pela rigidez do nosso orçamento: as despesas com juros sobem apenas 1,6% em termos reais.
Mas, crescendo a despesa, tem de. crescer a receita, e é por isso que os Portugueses vão fornecer em 1987 ao Estado, entre impostos directos e indirectos, uma receita fiscal que é superior em 32 % à de 1986.
O valor dos impostos directos sobe, em conjunto e em relação ao orçamentado para o corrente ano, 9,2 %, enquanto os indirectos crescem 16,9 %, devendo a estes dois subconjuntos adicionar-se o novo imposto sobre os produtos petrolíferos, criado já este ano e mantido na proposta do Orçamento para 1987.
Cresce, pois, significativamente o volume de impostos cobrados, com destaque para aqueles que incidem sobre os consumidores. E o certo é que o Governo se limita a confessar a sua incapacidade para introduzir a reforma da tributação directa que anunciara, nada propondo em substituição capaz de aliviar, de modo efectivo, a tributação sobre o rendimento das famílias e das empresas.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Muito bem!
O Orador: - As medidas de actualização de escalões que aparecem propostas em sede de profissional e complementar constituem um pouco mais do que benefícios ilusórios tendo em conta a taxa de inflação, que, apesar de tudo, desvalorizou os rendimentos, que constituirão a sua base da tributação.
A par disso, o único desagravamento em favor das empresas consiste na redução a metade de um imposto que já deveria ter desaparecido, porque criado para fazer face a circunstâncias excepcionais que não correspondem minimamente á situação vívida em 1986 e prevista para 1987: o famigerado e aplicado retroactivamente, no início, imposto extraordinário sobre os lucros.
Preocupante ainda é o modo como vai entrar em vigor o imposto sobre a indústria agrícola, sem preparação adequada dos potenciais contribuintes, e a falta de clareza com que é anunciada a tributação do funcionalismo público, sem que se conheça o tipo de medidas que, na circunstância, colocarão os tributados ao abrigo de uma efectiva diminuição de rendimentos.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Finalmente, não pode deixar-se em claro uma certa fluidez usada em matéria de isenções,
o que sem dúvida será um factor negativo em termos de recuperação da confiança; a manutenção do adicional sobre as sucessões e doações e a permanência de impostos indirectos disfarçados, que são os liquidados e cobrados no âmbito da ainda presente organização de coordenação económica.
Segue-se, pois, que nesta matéria, que atinge directamente a bolsa e o sentido de justiça dos Portugueses, o Governo nada fez de novo, limitando-se a avançar com a tributação do funcionalismo e a preparar-se para criar no Ministério das Finanças uma imensa máquina inquisitorial.
Aplausos do CDS.
Mas o crescimento da despesa não implica só o crescimento dos impostos; implica também a manutenção de um défice elevado, que, em face da execução do Orçamento do Estado para 1986, é natural que mantenha o seu peso no produto interno bruto e que contribuirá para o crescimento da dívida para 3,365 milhões, ou seja para 65,5 % do mesmo produto interno bruto.
É certo que este montante global inclui agora as dívidas do ex-Fundo de Abastecimento, o que consideramos positivo, mas não é menos certo que o tipo de orçamento que nos é proposto não permite que se faça um esforço mais significativo de amortização e, portanto, da sua redução.
Quando nos lembramos de que, em 1974, a dívida do Estado correspondia apenas a 18 % do produto interno bruto e vemos que vai agora passar para os 65,5 %, ficamos com uma ideia mais clara sobre a distorção que as políticas financeiras têm introduzido na vida portuguesa e sobre a carga enorme com que estão a afectar e a hipotecar o futuro dos nossos concidadãos.
E um défice elevado (434,4 milhões de contos no Orçamento) significa não só que cresce a dívida, como também que vai diminuir o crédito ao dispor das empresas e dos particulares, o qual deverá evoluir a uma taxa inferior à da inflação (7 % a 8 %), conforme se prevê, quando o crédito líquido ao sector público vai subir entre 17,5 % e 18,5 %.
Restarão como consolo aos potenciais mutuários as palavras do Sr. Ministro das Finanças, que, apesar de lhes atribuir menos crédito, confia principalmente neles para sustentar o esforço de investimento previsto.
Risos do CDS.
Ora é precisamente desta sequência infernal de mais despesa, mais impostos, mais dívidas que o CDS entende que deveríamos começar já a ser libertados, especialmente tendo em conta as especiais condições de conjuntura em que vivemos.
Mas não o somos, e, antes pelo contrário, nos confronta o Governo com uma política de continuidade e fá-lo, porque lhe faltam as condições e os meios políticos para encarar de frente os grandes obstáculos à normalização da vida financeira portuguesa.
Começa, com efeito, o Governo por se mostrar incapaz de delinear uma política global e coerente de reforma administrativa, sendo certo que a única medida proposta nesse domínio, o já célebre artigo 10.º da proposta, consegue ser ainda mais pobre do que aquela que consta no Orçamento do Estado deste ano e que visa substituir.
Página 359
19 DE NOVEMBRO DE 1986 359
E entretanto nada se diz sobre os resultados da aplicação do plano de reformas antecipadas, reincidindo-se na proposta restritiva feita em 1986, felizmente corrigida pela Assembleia. E também nada se diz sobre o plano de transferência de agentes excedentários, nem sobre as razões que levam a subir consideravelmente a verba para tarefeiros no ano de 1987.
E à incapacidade para equacionar e resolver os problemas da reforma administrativa junta-se a falta de frontalidade perante os problemas graves que, como é hoje. indisfarçável, se avolumam já na área da saúde e começam a despontar na área da segurança social.
Aqui, o Governo afecta verbas que pouco crescem em termos reais ( + 0,5 % na saúde e - 2,5 % na segurança social), ao mesmo tempo que aumenta benefícios, como é o caso das pensões e reformas, e tem de fazer face à entrada em funcionamento de novas unidades hospitalares de elevado consumo.
Mas nada nos diz, ou di-lo de modo indirecto, e sobretudo em encontros com a imprensa, sobre a relação existente entre tal atitude orçamental no tocante à despesa e o conjunto de medidas - que aplaudimos - inseridas no artigo 49.º do articulado, sobre seguros e fundos de pensões.
Pensa o Governo caminhar decididamente no sentido de permitir formas de solidariedade natural e espontânea que lhe permitam aliviar o peso de intervenção do Estado neste domínio?
Tem um plano para substituir por formas de solidariedade geradas na sociedade os esquemas do Estado providência? Se o tem, é bom que o diga e que abandone os atalhos por onde, sem dúvida, está em vias de se meter.
E a mesma falta de frontalidade nos surge a propósito de outro grande tema que, para mal dos pecados dos Portugueses, continua a ter importância capital na discussão do Orçamento. Refiro-me ao sector empresarial do Estado.
Em termos de inscrição orçamental, a verba global destinada ao conjunto de despesas com dotações de capital, indemnizações compensatórias e subsídios decresce de 16,8 %, em termos nominais.
Simplesmente, o Governo nada nos diz sobre o valor das poupanças feitas em combustíveis, sendo certo que as diminuições de preço operadas benificiam grandemente as empresas do sector público não financeiro.
E também não esclareceu devidamente o montante das operações de tesouraria - pasme-se! - que anunciou à última hora e com que vai completar as dotações orçamentais - são 8,5 milhões ou 14 milhões? Precisamos de o saber!
E do mesmo modo não esclareceu a natureza e os montantes envolvidos no plano - também de última hora - de recuperação dos elefantes brancos que são a Siderurgia, a Quimigal, a EDP e a SETENAVE.
Finalmente, nada disse de concreto sobre o montante exacto a transferir para empresas da comunicação social.
Tudo ponderado, ficamos com a ideia de que se dá com uma mão o que se tira com a outra e que o coro de lamentações da esquerda parlamentar - da antiga, é claro! ...
Risos do CDS.
... não tem aqui qualquer razão de ser, uma vez mais.
Não há, pois, um plano consistente para diminuir o peso do sector empresarial no conjunto do Estado, como resulta de não nos ter sido anunciado, com a proposta do Orçamento do Estado, o programa das alienações de participações, da transformação da natureza das estruturas empresariais e da extinção de empresas. É tudo isto que falta - e que é muito, no entender do CDS - que não permite mudar e que por isso preocupa o meu partido.
Mas dir-se-á : face a tudo isto, que proporia o CDS? - isto para descanso do Sr. Deputado Silva Marques...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Fico atento à resposta!
Risos.
O Orador: - O CDS proporia um orçamento que não crescesse, mas diminuísse, com as reformas estruturais possíveis já neste momento, em que descessem a carga fiscal e o peso da dívida e em que se encontrassem contrapartidas, por exemplo na alienação de um património que não é hoje, como já não era ontem, mais do que um fardo para o Estado e para os Portugueses.
Aplausos do CDS.
Isto era o que proporíamos para já.
Para logo, a constituição de uma maioria coerente para governar coerentemente e com estabilidade o País.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, estão inscritos os Srs. Deputados Próspero Luís, Alípio Dias e Silva Marques.
Tem a palavra o Sr. Deputado Próspero Luís.
O Sr. Próspero Luís (PSD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, V. Ex.ª referiu que a previsão de aumento de crédito para as empresas particulares, sendo inferior à inflação, não é suficiente para o acréscimo de investimento que se prevê.
Pergunto: não acha V. Ex. e que os empresários portugueses, os verdadeiros empresários portugueses, terão de aplicar capital de risco nos seus investimentos? Ou será isso feito apenas à custa do financiamento, continuando as empresas descapitalizadas?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alípio Dias.
O Sr. Alípio Dias (PSD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, ouvi atentamente a sua intervenção e devo dizer-lhe que só na parte final percebi melhor o que pretendia atingir. É que o Sr. Deputado não apresentou um plano muito concreto para mais rapidamente se atingir um reequilíbrio das finanças públicas.
Há pouco o Sr. Ministro das Finanças disse-nos que tinha um plano a médio prazo, plano esse que visava um reequilíbrio gradual das finanças públicas. V. Ex.ª manifestou nesta Câmara a sua insatisfação pelo ritmo previsto para 1987 e fez algumas considerações de natureza genérica. Todavia, e salvo melhor opinião - ou talvez eu estivesse desatento -, não conseguiu apontar directamente o caminho a seguir. Num caso ou noutro, citou que carecia de elementos de informação em
Página 360
360 1 SÉRIE- NÚMERO 12
matéria de empresas públicas. Admito que V. Ex.ª tenha tido muito trabalho - e eu tenho tido oportunidade de apreciar parte desse trabalho -, mas gostaria de lhe lembrar um ofício emanado do Gabinete do Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares em que se dava conta de uma possível distribuição quer das indemnizações compensatórias quer dos aumentos de capital, etc., para as empresas públicas, incluindo a parte da comunicação social. Pelo menos esta parte o Sr. Deputado não teve, certamente, tempo de ler.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, o período de tempo compreendido entre o momento em que V. Ex.ª me chamou a atenção e o final da sua intervenção foi rapidíssimo. Isto é: a formulação da proposta alternativa foi um simples esboço.
Pergunto: para quem tem uma concepção liberal da economia, em que há uma relação implacável entre o trabalho e a remuneração, não lhe parece que uma nova maioria em que eventualmente os senhores estivessem seria uma remuneração excessiva para tão pouco trabalho?
Risos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - O Sr. Deputado Próspero Luís repete na questão que pôs a afirmação que nos tem sido repetidamente feita pelo Sr. Ministro das Finanças e que consta dos elementos do próprio relatório: a taxa de poupança tem de subir 32,5 % para que os particulares e as empresas consigam fazer o esforço de investimento que lhes está distribuído no Plano. Felizmente que o Plano é só indicativo, e o Sr. Ministro das Finanças sossegou-nos quando hoje disse que não tencionava decretar que as empresas e os particulares fizessem esse esforço.
Mas o Sr. Deputado Próspero Luís sabe muito bem qual é a estrutura financeira das nossas empresas. Ora então eu pergunto-lhe: o conjunto de medidas proposto pelo Governo e a «inconfiança» que ele procura inspirar nas empresas e nos particulares será suficiente para, no ano de 1987 - e não vou mais longe, não vou ao plano de médio prazo -, inverter esta situação que faz apoiar o investimento principalmente no financiamento colhido externamente e não no investimento em capital de risco? Ainda por cima V. Ex.ª sabe como se passam. os nossos movimentos bolsistas; sabe que as operações no mercado secundário superam as do mercado primário e que o Ministério das Finanças está a dosear com muito cuidado a chegada de papel à Bolsa.
Portanto, Sr. Deputado Próspero Luís, não vejo que seja realista o optimismo do Governo. Isto é menos crédito, é o crédito a subir menos do que a inflação para as empresas de particulares e o grande esforço de investimento sobre eles. O Governo faz bem em pensar que o grande esforço de investimento tem de ser feito por esses agentes, porque do esforço de investimento do Estado já todos estamos fartos.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Ao Sr. Deputado Alípio Dias devo dizer que não nego que o ofício que referiu tenha chegado à Comissão. No entanto, pergunto-lhe se esse ofício, no que respeita ao plano de recuperação das quatro empresas, nos dá alguma indicação concreta. Não dá, Sr. Deputado Alípio Dias. Isso ficou por esclarecer e o que eu há pouco disse foi que não estava esclarecido. Eu não disse que não estava por esclarecer a distribuição entre dotações de capital, subsídios e indemnizações compensatórias. Não foi isso!
Nesse ofício fala-se em três milhões e meio de contos de operações de tesouraria, mas na véspera foi-nos dito que eram catorze milhões de contos. E que essa matéria de operações de tesouraria é um pouco «mágica», tanto podem ser oito, como catorze, como quinze milhões de contos, Sr. Deputado. Portanto, quanto a essa matéria não disponho de elementos correctos.
O que digo é que temo que o Governo tenha aqui vindo suscitar a ira da « esquerda antiga» para nada. Esteja sossegada a «esquerda antiga» porque o sector público empresarial, com todas estas componentes, vai ficar como estava, Sr. Deputado, e é isso que nos preocupa.
Finalmente, pelo que vejo, o Sr. Deputado Silva Marques manifestou a sua enorme fé no chamado «mercado eleitoral». Sr. Deputado Silva Marques, nem sempre a lógica de mercado é uma lógica absoluta. Concordamos com isso. Devo dizer-lhe que nem sempre o valor usado no cenário político português, que é o valor da coerência, tem sido devidamente remunerado nesse mercado. Porém, temos fé de que o há-de ser e, portanto, mantemo-nos onde estamos.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tema palavra o Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território.
O Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território (Valente de Oliveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia decidiu esta manhã que só deveria discutir o que o Governo apresentou como complemento de informação ao documento sobre as Grandes Opções do Plano a médio prazo, referindo elementos específicos respeitantes ao ano de 1987 e que passou a designar, a partir de então, por Grandes Opções do Plano para 1987.
Temos boas razões para continuar a insistir no enquadramento das opções de curto prazo em opções de médio prazo e, portanto, para considerar as nove grandes opções que apresentámos como constituindo o quadro de referência do que vier a fazer-se no próximo ano.
Justificarei adiante por que nos parece dever assim acontecer, em termos estritamente lógicos. Mas, para que se entenda a construção do documento inicial, naturalmente indispensável para compreender o complemento de informação, permito-me fazer algumas considerações prévias.
As questões económicas não podem ser tratadas à parte de todas as outras facetas sociais, culturais, políticas, éticas, artísticas... da vida colectiva. As aspirações dos Portugueses formam um sistema e os recursos de que dispõem constituem outro sistema, sendo nossa obrigação propor-lhes o conjunto de engrenagens mais eficaz para mobilizar o segundo de modo a maximizar a satisfação do primeiro.
Página 361
19 DE NOVEMBRO DE 1986 361
Quando me refiro a um sistema, faço-o no sentido técnico do termo, quer dizer, um conjunto de elementos com interacções, afectando cada um todos os restantes e, em contrapartida, sendo por eles também afectado. Ora, para compreender um sistema é preciso tomar em linha de conta todos os seus elementos, deixando de fora somente aquilo que, na realidade, pode ser considerado como «enquadramento», tomado em conjunto na sua relação com o sistema.
Mas os dois sistemas - o das aspirações e o dos recursos - são complexos e dinâmicos. Cada um é composto por numerosos elementos em evolução, que as condições da vida actual tornam muito rápida, reclamando daqueles que sucede deterem o poder de decisão uma interpretação aguda e oportuna do que constitui o conjunto de aspirações e uma percepção rápida e tempestiva do modo como se podem mobilizar os recursos disponíveis para as alcançar.
Teria sido muito mais fácil para o Governo seguir alguns dos caminhos tradicionais na definição das Grandes Opções.
Um deles corresponderia a acrescentar ao rol, sempre inesgotável, das aspirações mais umas tantas e definir linhas de política fáceis de enunciar mas difíceis de concretizar, deixando a população embalada na ilusão de que o céu estava ao seu alcance e de que o Governo estava a trabalhar afincadamente para o atingir. Isso corresponderia a não propor a escolha de coisa nenhuma e seria a demonstração de que, afinal, não se sabia governar porque, nunca é demais insistir, em que «governar é escolher». Nesse caso ter-se-ia feito um extenso rol de medidas que, no conjunto, a todos contentaria, acentuando-se, então, na discussão no Parlamento, e .muito justamente, a incapacidade do Governo para identificar o caminho mais adequado, servindo-se cada força política das aspirações e dos instrumentos que mais consonantes fossem com os seus princípios ideológicos, deixando o Executivo sem uma orientação clara para prosseguir a sua acção e a população, em geral, e os seus agentes motores, em particular, sem saber em que direcção se estaria a avançar.
O resultado seria extremamente ineficaz.
Uma segunda alternativa consistiria na produção de um texto hermético e sintético, acessível a meia dúzia de especialistas, procurando no conforto fictício de equilíbrio de um modelo econométrico a justificação para o apontar de uma via falsamente inteligente e redutora da variedade do sistema e, naturalmente, muito vulnerável, no seu conjunto, por via da vulnerabilidade das projecções a médio prazo das variáveis exógenas e da ingenuidade da crença na permanência da estrutura de modelos que só podem servir como auxiliares na interpretação da complexa realidade que nos circunda. Tratar-se-ia, então, de adoptar uma atitude tecnocrática, no sentido pejorativo do termo, que implica o recurso a instrumentos de concepção sofisticada e matematicamente elegantes, como cortina de fumo para a insegurança ou para a incapacidade do planeador, na sua compreensão do sistema. O recurso a esta via determinaria críticas severas e merecidas, simultaneamente de ingenuidade e de arrogância. Mas, pior do que isso, induziria na população, em geral, o sentimento de que os políticos consideravam o desenho do futuro como coisa só para iniciados e o divórcio entre políticos e população não tardaria, com todo o cortejo de consequência alienantes que se conhecem. Tal como diz o título do livro famoso, nós cremos que «a política é para todos»... e praticamos.
Recusando o buffet que a todos serviria sem servir a ninguém e a falsa magia tecnocrática que a poucos ou a ninguém convenceria, dispusemo-nos a enfrentar
as críticas, dizendo qual é o nosso entendimento acerca do que julgamos mais conveniente para o povo português, na fase excepcionalmente sensível em que nos
encontramos da nossa vida como nação independente.
A história mostra que há épocas, habitualmente curtas, em que os acontecimentos se sucedem ou precipitam e as oportunidades se oferecem em número e em
intensidade que, sejam ou não aproveitadas, determinam as condições da vida do grupo durante um larguíssimo período. É evidente que o sentido dessa determinação é positivo ou negativo conforme se aproveitem
ou não as oportunidades que favorecem o progresso. -
A responsabilidade é de quem detém o poder na ocasião em que elas se oferecem; e nós não lhe queremos fugir.
Por isso nos abalançámos a produzir um documento que identificasse a situação actual, sublinhando os principais problemas que se põem à comunidade nacional e submetesse à sua consideração o que entendemos como principais pontos de amarração da política a seguir no futuro próximo.
Cada político tem «a sua ideia» acerca do que é e do que deve ser o País. É evidente que há muita gente que anda na política sem ter essa ideia; mas esses não são políticos.
Nós não nos furtámos a dizer nem como entendemos o País neste momento nem como julgamos que ele deve ser.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Vá dizer isso ao PSD.
O Orador: - Ma não se julgue por isso que somos tão ingénuos que pensemos que «uma sociedade se muda por decreto»... Nem por lei! ... As forças que a movem têm, felizmente, muitas origens e lançaram as suas raizes em pontos muito profundos no tempo. Mas elas podem ser orientadas de modo a actuarem de forma convergente e, portanto, com resultante muito mais eficaz, se os seus agentes não divergirem muito acerca da ideia que têm do caminho a prosseguir. Nem é necessário que elas tenham todas a mesma direcção. Basta que os principais agentes não puxem cada um para seu lado. A nossa história dá abundantes exemplos dos resultados do exagero dessas divergências, da transformação em casos políticos de meras dissensões pessoais ou da importância pública de sensibilidades feridas. E, particularmente no último século e meio, ela mostra bem como o País perdeu oportunidade por exarcebar tudo isso, deixando alguns a suspirar por fórmulas autoritárias que já demonstraram não corresponderem aos sentimentos profundos do povo português.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O texto que agora é só de enquadramento e que vos propusemos, Srs. Deputados, não é normativo do que é ser português. Nele discorre-se acerca do que nos parecem ser os seus atributos e as suas virtualidades para justificar as opções que fazemos. As escolhas que vos propomos não são adequa
Página 362
362 1 SÉRIE - NÚMERO 12
das nem a escandinavos nem a polinésios. Elas foram pensadas para os Portugueses e para os problemas que eles têm de enfrentar neste final de século.
Se damos valor à língua, à cultura e ao património, como grande opção, é porque- nos parece. que elas podem constituir virtualidades, nos termos latos em que estas se entendem no conceito estratégico de .defesa nacional, que, de maneira mais simples, correspondem àquilo que se pode mobilizar para a sobrevivência e para o desenvolvimento da comunidade nacional. Mas também lhe demos importância por nos parecer que, no quadro actual, há forças exógenas que podem ir atenuando essas virtualidades e, progressivamente, contribuir para a sua mutação. Não nos podemos esquecer de que a própria adesão à Comunidade Europeia reclama, para nosso bem e, afinal, para bem da própria Comunidade, que acentuemos a sua diversidade interna, mantendo-nos como somos e pondo ao serviço de todos as nossas potencialidades próprias.
Se apontamos o reforço das estruturas do Estado democrático como opção é porque estamos convencidos de que ele corresponde à vontade generalizada e profunda do povo português, mas que a liberdade; valor fundamental em que ele assenta, precisa de segurança para dela se desfrutar e que, num outro ângulo, a organização que lhe corresponde tem de ser eficaz; tanto no que respeita à formulação da vontade colectiva, a todos os níveis, como à execução das deliberações que a esses níveis se tomarem.
Se nos preocupamos em valorizar .ò papel de Portugal no mundo não é, naturalmente, com nenhuma aspiração hegemónica em mente, mas com a ambição justa de obter melhores condições de vida pára os Portugueses. Por isso, no seu âmbito, propomos coisas tão diversas como a investigação e o conhecimento aprofundado dos. nossos recursos. naturais e das formas como os poderemos explorar, mantendo no tempo as vantagens comparativas que eles eventualmente possam ter; e, numa outra perspectiva, a mobilização das contribuições para o desenvolvimento do País das inúmeras energias desaproveitadas nesse sentido, que significam as comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo fora, desejosas de reforçarem connosco laços de colaboração e de afecto, para nosso bem e afinal também para o delas, porque estão sempre em causa valores intangíveis a que é preciso dar apreço.
Não é necessário procurar longas justificações para o que se propõe para corrigir os grandes desequilíbrios estruturais de que padecemos: as balanças alimentar e energética deficitárias tornam-nos extremamente vulneráveis na autonomia da nossa capacidade de decisão e as disparidades regionais são injustas. Por isso propomos que se abordem frontalmente estas questões, aliás a tratar, com pormenor operacional, noutro tipo de documentos coerentes com o. plano de desenvolvimento a médio prazo, de que estas Opções representam o enunciado de grandes metas orientadoras.
Quando se junta o reforço da economia ao combate ao desemprego é para tornar patente que pretendemos conseguir os aumentos de produtividade que nos hão-de garantir a permanência das vantagens comparativas das nossas actividades económicas; sem fazer pagar a todos uma factura demasiadamente gravosa no domínio do emprego. Isto só se conseguirá fazendo despertar energias latentes na capacidade de empreender dos portugueses; mas, porque a actuação tem de ser rápida, permitimo-nos reflectir sobre a forma de conciliar a pressa e a eficácia de actuação com o que parecem ser os dotes mais notáveis dos Portugueses, apontando algumas soluções nesse sentido. Subsiste a questão de fundo, que é a de erigir, em valor socialmente reconhecido e estimado, o sentido da iniciativa e do empreendimento que leve cada um a sentir-se responsabilizado por «também» fazer andar o barco, juntando à dos outros a força da sua inteligência, do seu saber e da sua vontade.
A isso tudo está profundamente ligado o novo conceito de empresa que gostaríamos de ver generalizado e em que a co-responsabilização substitui o confronto, em que as energias se somam e não se anulam, em que as posições se nivelam e não se exaltam.
A isso tudo está também ligada a valorização dos recursos humanos que apresentámos como grande opção. A educação e a formação profissional são as portas que abrem todas as outras portas do progresso. A observação do passado e do presente mostram que as oportunidades de realização pessoal surgem, com maiores probabilidades, àqueles que estão robustecidos por uma educação que os torna autónomos e lhes permite uma adaptação contínua às circunstâncias que a evolução acelerada dos nossos dias impõe. Mas não olhemos para os homens como recursos que fazem girar á máquina da economia. Colocamo-los a todos no centro do processo de desenvolvimento e, por isso alargamos a, ambição e designamos por «valorização» um vasto conjunto de acções que engloba, naturalmente, não só a educação e a formação profissional mas se estende também à informação, à participação na vida colectiva, ao comando das iniciativas que a fazem mover, ao empenhamento nas soluções que passam a ser de todos.
Vozes do PSD:- Muito bem!
O Orador: - Está neste caso o envolvimento do maior número nas instituições que cuidam do desporto, da cultura, da saúde, da protecção civil, do apoio aos idosos e às crianças e de muitos outros domínios que a experiência mostra lucrarem muito com a mobilização das contribuições voluntárias dos cidadãos.
A Sr.ª Ilda (Figueiredo (PCP): - Nós gostávamos de saber onde estão as verbas para fazer tudo isso.
O Orador: - O Estado não pode continuar a absorver funções que uma vida colectiva mais intensa do que a passada e pais exigente, em termos de nível e de qualidade, nos vai reclamar. O Estado não pode suportar esse acréscimo, em termos materiais, e não deve fazê-lo por razões de qualidade e de estilo na prestação desses serviços. Há, na nossa comunidade, maior capacidade de doação pessoal do que os fanáticos da estatização dos serviços sociais imaginam; e a «funcionarização» desses serviços nunca permite alcançar nem as economias nem a qualidade que um sistema descentralizado e fomentador da congregação de iniciativas privadas garante.
Vozes do PSID: - Muito bem!
O Orador: - Por isso os dinheiros públicos devem ser, reservados para estimular o aparecimento dessas contribuições voluntárias, em que o sentido de solida-
Página 363
19 DE NOVEMBRO DE 1986 363
riedade social ganhe relevo, mas não para a tarefa impossível de satisfazer todas as necessidades sociais à custa do contribuinte, que não pode ser mais penalizado com novas cargas fiscais.
Considerações do mesmo tipo sobre o nível e a qualidade de vida dos portugueses fizeram-nos enunciar como grande opção o ordenamento do território. Há disfuncionamentos patentes do nosso sistema urbano e há atentados de efeitos irreversíveis sobre o património natural ou construído que herdámos. O desafio que, neste domínio, se nos põe corresponde à criação de verdadeiras comunidades e à conciliação do desenvolvimento com a protecção. Não há verdadeiro desenvolvimento sem protecção; este é um dos fundamentos do desenvolvimento civilizado que pretendemos.
Todavia, havendo muitos numerosos agentes com interesses conflituosos entre si, o exercício da compatibilização de todos eles com os meios escassos de que se dispõe levou-nos a considerar este sector como prioritário, dando-lhe a dignidade de uma grande opção, em cuja consecução todos se devem empenhar, para benefício dos portugueses que hoje vivem e em atenção daqueles que hão-de nascer.
Percorridas, deste modo, as nove opções que enunciámos, pode ver-se que elas também representam um sistema com inter-relações bem marcadas entre si. Elas formam um conjunto coerente e inteligível. Elas constituem uma estrutura em que pode assentar um programa de acção eficaz para os Portugueses e para o final desta década. Não dizem o que eles devem ser, mas explicitam por que é que, sendo eles o que são, elas correspondem às opções mais convenientes para um programa de acção que se há-de desenvolver ao longo dos próximos anos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Suscitou controvérsia a questão formal da apresentação, num único documento, das Grandes Opções de médio prazo e da Grandes Opções para 1987. O Governo, em correspondência a uma solicitação da Assembleia da República, enviou um complemento de informação, referindo elementos específicos respeitantes ao ano de 1987, mas esclarecendo, até no título do documento, que os considerava inseridos no quadro das Grandes Opções de médico prazo.
Fê-lo, aliás, em cumprimento de uma recomendação do Conselho Nacional do Plano, que considerou deverem ser «explicitadas as previsões para 1987 relativamente aos grandes agregados macroeconómicos». De facto, fizemos muito mais do que isso. Porém, mais importante do que a questão formal de deverem ser dois documentos distintos a tratar das Grandes Opções, a curto prazo ou a médio prazo, parece-me ser o da possibilidade de fazer opções que sejam grandes e de as referir a um lapso de tempo curto.
É óbvio que não estou a contestar a relevância da distinção entre planos anuais e plurianuais, associando os primeiros ao orçamento de cada ano. Mas não é novidade para ninguém que os planos anuais não dispensam que lhes ande associada uma perspectiva plurianual para poderem ser avaliadas as consequências, nos anos seguintes, de certas decisões que ultrapassam nas despesas aquilo que se investe num determinado ano. A distinção entre compromissos e pagamentos há muito que é adoptada em muito lado, tornando patentes as vantagens dos instrumentos plurianuais para ordenar as despesas daquilo que é, de facto, plurianual na sua execução.
Ora, se o enquadramento das despesas, ou dos compromissos, tende a ser cada vez mais generalizadamente apreciado numa perspectiva temporal que cubra o período de execução dos empreendimentos que se estendem ao longo de vários anos, mais justificadamente tem de se ver, numa perspectiva dilatada no tempo, um documento que, na sua concepção, está a montante de um plano, por só referir as grandes opções que eles hão-de explicitar. A menos que não se queira que as opções sejam grandes...
Havendo, então, necessidade de referir os investimentos de um ano a um quadro temporal em que estejam claramente patenteados os compromissos para os anos subsequentes, e sendo ambição de todos, políticos e técnicos, possuir planos «deslizantes» no tempo que mostrem, de modo claro, como se repercutem no futuro as decisões tomadas em determinado momento, mais justificado se torna referir as grandes escolhas a um horizonte que seja mais dilatado do que qualquer dos períodos requeridos pelo mais longo dos investimentos que constar de um plano. Tudo isto para dizer que, em boa lógica, não pode haver distinção entre as Grandes Opções para 1987 e as Grandes Opções para 1988, e anos seguintes, porque os empreendimentos que lhes corresponderem em planos ou em programas de execução, para serem bem administrados, têm de ser vistos numa perspectiva temporal que a todos englobe.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: --Admito que esta questão está a ser aflorada agora porque a Assembleia da República não foi anteriormente confrontada muitas vezes com a necessidade de discutir um documento sobre as Grandes Opções a médio prazo, conciliando-a com a discussão do Orçamento do Estado e com o postulado na Constituição relativamente a grandes opções para um único ano. A estabilidade dos governos tem, às vezes consequências insuspeitadas...
Mas foi exactamente para cumprir com o preceituado que intitulámos a proposta de lei com referência às Grande Opções do Plano para 1987-1980 e às Grandes Opções do Plano para 1987, o que, em termos práticos, concilia a nossa obrigação com a nossa interpretação do que é a forma correcta de traduzir uma grande opção. Esta, para ser efectivamente grande, tem de ser sempre, pelo menos, de médio prazo. Ou, se quisermos, de outra forma, as opções anuais ou são desagregações anuais de grandes opções plurianuais, que para serem devidamente entendidas têm de ser apreciadas na sua plurianualidade, ou então são pequenas opções. É por isso que julgamos que para as grande opções serem, de facto, enquadrantes dos planos plurianuais ou anuais têm de ter sempre horizonte dilatado no tempo. E é evidente que, tanto em termos lógicos como em termos práticos, as grandes opções podem e devem ser revistas todos os anos, na mesma perspectiva de carácter « deslizante» no tempo que propugnamos para os planos. As razões sãos as mesmas: pode ir-se esboçando uma mudança de «enquadramento» do sistema; pode-se ir adquirindo um melhor conhecimento do «sistema» (a conjugação destes dois factos pode tornar opções mais ambiciosas ou distintas); pode sobrevir um acontecimento que altere de forma súbita ou o «enquadramento» ou o «sistema» ...
Página 364
364 I SÉRIE - NÚMERO 12
O enunciado das grandes opções tem boas razões para uma hierarquia entre a ambição temporal e de conteúdo das grandes opções, dos planos e dos programas, não nos deixando enlear nas malhas de argumentações jurídicas com arquitectónica imaginativa, mas pouco aderentes à prática executiva de todos aqueles instrumentos.
Seria grave que o Governo confundisse planos de médio prazo com planos anuais, especialmente quando estes têm de estar associados ao Orçamento do Estado para cada ano. Mas que o Governo diga que as suas Grandes Opções para 1987 devem ser colhidas no mesmo documento que define as Grandes Opções para o período que vai desde 1987 a 1990 só demonstra que as suas escolhas têm perspectiva, que a sua acção é projectada com fôlego e que sabe integrar projectos em programas, deduzir programas de linhas de política e definir estas em consonância com verdadeiras poucas mas grandes opções.
Vozes d(r) PSD: - Muito bem!
Vozes do PS: - Muito bem?
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A justificação dos atributos temporais das Grandes Opções é, naturalmente, importante. Mas, muito mais do que isso é, em termos políticos, do maior significado que haja alguém que se queira recusar a discutir um documento em que se trata do nosso futuro colectivo invocando argumentos formais e não ligando ao seu conteúdo. Apresentámos mais do que nos era exigido, englobando no mais o menos a que éramos obrigados, justificando claramente que não se pode pensar em grandes opções para um ano porque para elas serem de facto opções grandes têm de ver mais longe.
Importante é também, em termos políticos, que quase só se tenha criticado o documento por destacamento de frases sobre as quais se ironizou, recusando sobre ele reflectir e dizendo que ele é obra de sonhadores.
Srs. Deputados: Assumimos o sonho, se ele for mobilizador e ajudar a despertar todas as forças que estão adormecidas na sociedade portuguesa.
Aplausos do PSD.
Assumimos o sonho, se ele constituir um referencial em torno do qual se organize, de modo eficaz, a acção de todos aqueles que devem contribuir para o progresso do País e que, afinal, somos todos nós.
Uma voz dm PSID: - Muito bem!
O Orador: - Assumimos o sonho, se ele for capaz de desencadear um interesse constante de todos os portugueses pelo nosso futuro colectivo.
O que incomoda alguns é que o sonho parece começar a tornar-se realidade.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, pediram a palavra os Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca, Carlos Carvalhas, Ivo de Pinho, José Manuel Tengarrinha, Lopes Cardoso, Eduardo Pereira e Maria Santos.
O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca já não tem tempo, por isso será certamente em função do tempo de amanhã que lhe dou a palavra o que não se vai repetir, espero.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Julgava que ainda tinha tempo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Corregedor dai Fonseca (MDP/CDE): Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, perante as suas declarações, nomeadamente a última, ficamos cientes de que o Governo está interessado em que as Grandes Opções do Plano para 1987-1990 sejam discutidas nesta Câmara. Essa também é a nossa opinião. Só esperamos, Sr. Ministro, que nem o Governo nem o grupo parlamentar que o apoia venham impedir o agendamento rápido - já para Dezembro - deste importante debate, quer em comissão quer em plenário.
Sr. Ministro, queria pôr-lhe duas ou três questões. Diz-se nas Grandes Opções do Plano que «se quer romper com o modelo industrial tradicional, canalizando o desenvolvimento através da intervenção indirecta de mecanismos integrados, por exemplo, em relação à reestruturação industrial». Pergunto-lhe Sr. Ministro, o seguinte: para além da legislação existente sobre incentivos, quais são as medidas que o Governo pensa aplicar para atingir o equilíbrio sectorial de que se fala?
Também gostava, Sr. Ministro, que me dissesse se o Governo baseia a infra-estrutura tecnológica de apoio ao desenvolvimento industrial nos chamados «centros tecnológícos» - e o Sr. Ministro, às vezes, tem falado nisto. Eu gostava de saber o que leva o Governo a confiar tão fortemente no êxito da gestão dos centros tecnológicos pela comunidade empresarial, em tão diversos âmbitos, desde a verificação da qualidade até à investigação aplicada. É a experiência dos centros tecnológicos já existentes, Sr. Ministro?
Conhecidas que são as dificuldades de algumas associações industriais para acompanharem o processo de constituição, o que é que permite ao Governo - e era uma pergunta para a qual gostava de ouvir a sua resposta - considerar que vai concluir em 1987 a criação de mais cinco centros tecnológicos?
Um outro aspecto importante, Sr. Ministro: o Governo não apresenta quaisquer linhas de política relativamente às empresas públicas do sector produtivo e o Sr. Ministro, no seu discurso, pouco ou nada referiu. Para além de não se conhecerem os mecanismos de controle que vai pôr em prática para o acompanhamento do sector público produtivo em 1987, que medidas políticas vai aplicar nas acções de racionalização, flexibilização, investimento, aumento de eficiência e produtividade desse sector?
Finalmente, Sr. Ministro, se, como ainda se refere, «a realidade económica [estou a citar] que resulta da integração de Portugal na CEE consistir no parâmetro fundamental de modelo económico de enquadramento do programado desenvolvimento industrial», como se pode compreender que não haja um esforço relevante por parte do Governo para proporcionar à indústria melhores condições para a sua adaptação ao mercado interno alargado, que a CEE pretende ver criado até 1992?
Página 365
19 DE NOVEMBRO DE 1986 365
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Ministro do Plano, V.º Ex.ª disse que nas Grandes Opções do Plano há poucas quantificações: as quantificações são para os planos, porque o que interessa nas Grandes Opções do Plano são as grandes orientações. Bom, nestas Grandes Opções do Plano a médio prazo o estilo não é muito feliz, mas, para além do estilo e da crítica velada que me parece querer fazer ao Ministro das Finanças com aquela dos «modelos para disfarçar a segurança», temos de dizer, Sr. Ministro do Plano, que há mesmo documentos com excepções retrógradas, corporativistas... e ficamos por aqui!
Risos do PSD.
Bom, mas deixemos lá as Grandes Opções do Plano e passemos a coisas mais comezinhas.
Por que é que o Sr. Ministro do Plano não publicou o Plano para 1986? Por que é que o plano que apresentou no Conselho Nacional do Plano, em 2 de Outubro, tem dois parcos mapas, com dados desactualizados e que estão errados, pois nem sequer são consentâneos ou coincidentes com aqueles que vêm no documento das Grandes Opções e com o relatório do Orçamento do Estado?
Então, nem nas Grandes Opções, nem nos planos, nem nos planos a médio prazo nos fornecem os dados de que necessitamos? ... Fugir de, dados é com este Governo!
Ainda em relação às coisas comezinhas, vai questioná-lo sobre as assimetrais regionais. Como é que o Sr. Ministro explica que das verbas pagas pelo FEDER às autarquias e à agricultura 75 % do que já está efectivamente realizado fique no litoral? É isso corrigir as assimetrias regionais?
Bem ficamos por aqui, porque o tempo é escasso; ficamos por aqui, porque as Grandes Opções do Plano, essas tais grandes opções, vão ser votadas noutra altura e o Sr. Ministro podia ter-nos poupado e podia ter-se poupado a fazer esse discurso que vai ter de repetir. Mas, já agora, também lhe digo que continua a ser digna do conselheiro Acácio aquela grande frase que o Sr. Ministro disse: «para serem grandes têm de ver mais longe».
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ivo de Pinho.
O Sr. Ivo de Pinho (PRD): - Sr. Ministro, não é tanto uma pergunta que quero fazer-lhe, mas um comentário a uma afirmação sua, coma qual, evidentemente, não posso estar de acordo. Aliás ficaria mal se não lhe exprimisse esse desacordo.
Referiu o Sr. Ministro a sua discordância relativamente às falsas magias tecnocráticas.
Sr. Ministro, quero dizer-lhe que, em meu entender, os números só são inúteis quando existem de per si, pois são preciosos para fundamentar ideias.
Senão utilizarmos números, ao denunciar as magias tecnocráticas o Sr. Ministro abre mão a que lhe façam críticas sobre magias literárias.
Sr. Ministro, pergunto-lhe, pois, se não considera como altamente redutor nas Grandes Opções do Plano a médio prazo o facto de não nos ter fornecido, nem ter tido a preocupação de elaborar, cenários estratégicos quantitativos que nos expliquem e explicitem o teor das transformações e do voluntarismo que é inerente às ideias qualitativas que constam desse documento.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Ministro do Plano, V. Ex.ª gastou uma parte importante do seu discurso a falar das Grandes Opções do Plano a médio prazo; uma outra parte para justificar esse facto, na base de que não tem sentido encarar as opções anuais desligadas no enquadramento a médio prazo e, para terminar, manifestou a sua estranheza pelo facto de haver quem se recuse discutir o conjunto das Grandes Opções neste longo quadro que o Sr. Ministro traçou.
Dir-lhe-ia que, pela nossa parte, Partido Socialista, concordamos com o Sr. Ministro quando diz que as opções anuais devem decorrer daquilo que é o quadro das opções a médio prazo e que não faz sentido, sobretudo havendo opções a médio prazo, discutir as opções a curto prazo, ignorando e não debatendo essas opções a médio prazo.
Quanto à estranheza manifestada pelo Sr. Ministro, lembro-lhe que se neste momento não estamos formalmente a discutir as Grandes Opções para 1987-1990 e que isso se deve ao voto desta Assembleia, nomeadamente ao voto do partido que apoia o Governo, no sentido de recusar essa discussão da forma «estranha» que o Sr. Ministro atribui a essa atitude.
Dir-se-á, porventura, que houve aqui uma desarticulação entre a posição do Governo e a do partido que, nesta Câmara, o apoia.
Sr. Ministro, creio que pensar e fazer esta análise de uma forma superficial seria uma ingenuidade da nossa parte. Julgo que não houve qualquer desarticulação, mas a procura de uma situação cómoda, que permite ao Sr. Ministro vir aqui dissertar sobre as Grandes Opções a médio prazo, o que, de certo modo, inibirá as bancadas, no respeito pela decisão da Assembleia, de discutirem esse plano, mas que, de qualquer forma, evita ao Governo o veredicto da Assembleia sobre as opções de médio prazo, e foi isso o que se pretendeu evitar.
Aplausos do PS.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, desejo usar da palavra ao abrigo da figura regimental de defesa da honra.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, com a nossa abstenção inviabilizámos, objectivamente, a discussão concomitante dos dois documentos, mas fizémo-lo nos seguintes pressupostos: em primeiro lugar, tendo em conta que o Governo remeteu à Assembleia da República um ofício, que é do conhecimento de V. Ex.ª, o qual, no fundo, é a individualização das Grandes Opções do Plano para 1987; em segundo lugar, entendendo que, perante a posição assumida pelos vários partidos em conferência de líderes, era um facto consumado que iríamos ter a discussão das Grandes Opções do Plano para 1987, o que, aliás, ficou claro hoje de manhã nas intervenções produzidas em Plenário pelos demais partidos da oposição, para além do de V. Ex.a
Página 366
366 I SÉRIE - NÚMERO 12
Portanto, o nosso voto foi perfeitamente coerente.
De resto, não há qualquer desarticulação.
V. Ex.ª sabe que consideramos que o Governo é o Governo, o partido é o partido, e não têm ambos de estar necessariamente de acordo. Contudo, não é esse o caso.
O caso é o de que, se houve desarticulação, foi, eventualmente, entre o presidente do grupo parlamentar de V. Ex.ª e os seus vice-presidentes.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, não obstante esta tirada final de humor por parte do Sr. Deputado António Capucho, em seguida não vou
invocar a honra da minha bancada para me defender.
O Sr. Deputado não ofendeu a honra da minha bancada, da mesmo forma que não ofendi a honra da bancada do Sr. Deputado. Contudo, reconheço que há que
recorrer a essa deturpação das figuras regimentais para que possamos continuar a intervir.
Sr. Deputado António Capucho, digo-lhe que, em primeiro lugar, o Governo aceitou cindiras propostas, mas não aceitou retirá-las a ambas -disse-o esta
manhã, pela voz do Sr. Ministro do Estado.
Eu não disse que tinha havido desarticulação, pelo que não se defenda de uma acusação que lhe não fiz.
Pelo contrário, eu disse que o PSD e o Governo tinham estado perfeitamente articulados nesta atitude, ao encontrarmos a situação que permitiria ao Governo evitar o veredicto da Assembleia sobre as Grandes Opções
a médio prazo.
Sr. Deputado, discutir as Grandes Opções do Plano a médio prazo quinze dias depois de discutirmos as opções anuais é uma metodologia absurda, conforme acabou de ser demonstrada, ao longo da sua intervenção, pelo Sr. Ministro do Plano. E não sei se, ao fazê-lo, o Sr. Ministro do Plano terá ofendido a honra da sua bancada. Se o fez, Sr. Deputado António Capucho, peça ao Sr. Presidente que lhe permita exercer o direito de defesa perante o discurso do Sr. Ministro do Plano.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Ministro do Plano, não vou manifestar, uma vez mais, a satisfação que teríamos tido em discutir as Grandes Opções do Plano a médio prazo, com as quais, na sua substância, não estamos de acordo, mas que
teríamos tido a possibilidade de analisar, discutir e votar.
O que não percebi, pelo que gostaria que o Sr. Ministro me explicasse, fora sua intervenção depois do que se passou esta manhã.
A minha sensação era a de estar a ver um filme com a banda sonora de um outro filme. As duas coisas não jogavam uma com a outra, isto é, houve uma acção
e o Sr. Ministro, que estava «em off», contou uma outra história, que não tinha nada a ver com a história que estava a ser vivida.
Se o Sr. Ministro solicitava o poder de sonhar, quem lhe cortou os sonhos foi a bancada do PSD, ao não deixar que a discussão tivesse lugar.
Risos do PS.
Há ainda uma coisa que não percebi e que o Sr. Ministro ainda não explicou. $ a seguinte: não vamos discutir as Grandes Opções do Plano a médio prazo, mas as Grandes Opções do Plano são de médio prazo, 1987-1990.
Qual é a opinião do Sr. Ministro: podemos discuti-las até ao final do ano? Vê interesse nisso? Discutimos as Grandes Opções do Plano de 1987-1990 condicionadas pela análise e discussão que vamos ter ou apresentará uma para o período de 1988-1991?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr. a Deputada Maria Santos.
A Sr.ª Maria Santos (Indep.): - Sr. Ministro, na IX Opção começa-se por dizer que «o nosso país tem vindo a desarrumar-se de forma grave» e, então, o Governo diz-nos «que o eixo fulcral da definição política do ordenamento do território é o sistema urbano».
Adianta, depois, que «o mercado fundiário é um importantíssimo instrumento, havendo, pois, que o favorecer», isto para que «a vida ganhe a graça de viver o que o bulício urbano pode trazer». Peço-lhe desculpa, Sr. Ministro do Plano, mas isto mais me parece um texto de um anúncio de uma urbanização.
Risos do PS.
Depois, diga-se entre parêntesis, que, no nosso entendimento, na política do ordenamento do território, prevista nesta IX Opção, há um peso excessivo da valorização do urbano em detrimento de uma maior incidência de reflexão, mesmo que teórica, sobre o rural.
Mais adiante, o Governo imagina, bucolicamente, «o aspecto rural pautado pelo compasso da Natureza e das estações do ano». Pergunto: isto não será um fascínio pelo mercado fundiário?
Em relação às questões correntes de ordenamento do território que vêm expressas na IX Opção, o que me impressiona é que o Governo omite instrumentos fundamentais para prosseguir os objectivos a que alude em palavras, ou seja, omite a questão da regionalização.
Como é possível um ordenamento do território sem a regionalização? Por outro lado, como é possível um ordenamento do território quando várias políticas sectoriais, pelas quais o Governo tem optado, são elas próprias factores de desordenamento? Aqui, refiro a questão da política industrial, a reconversão de Portugal em vazadouro da poluição europeia e o dito paraíso que Portugal será para as empresas de celulose.
Uma outra questão prende-se com o facto de o Sr. Ministro ter falado nas perspectivas macroeconómicas das Grandes Opções do Plano. Mas, o Sr. Ministro gestor de um ministério com muita importância, que engloba várias secretarias de Estado, não poderá fazer uma reflexão, ainda que sucinta, sobre a execução do PIDDAC para 1986 nas várias Secretarias de Estado e do que está previsto para 1987, nomeadamente no que diz respeito à área do ambiente?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cavaleiro Brandão.
Página 367
19 DE NOVEMBRO DE 1986 367
O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Sr. Ministro, confesso que a consideração pessoal que nos merece, a mim particularmente, não me deixava fazer prever que lhe estivesse reservado este desagradável papel.
Desagradável, porquê? Por que ainda esta manhã a Assembleia interpelou repetida, sucessiva e insistentemente o Governo para que, da parte de V. Ex.ªs, obtivéssemos uma posição clara sobre a cisão ou não cisão das Grandes Opções do Plano.
A resposta foi curta, rápida, fugaz, por parte do Sr. Ministro Eurico de Melo e V. Ex.a, nessa altura, omitiu o desenvolvimento que agora nos propiciou.
De maneira que é óbvio e me parece inelutável que se suceda um conjunto de intervenções como aquela que ouvimos agora. Isto é: este discurso que sentido teve, Sr. Ministro? É a recusa de hoje de manhã em dar uma resposta clara? É. a. recusa em relação a uma decisão que democrática e regimentalmente foi aqui tomada esta manhã? É a poupança daquele tempo de que há-de precisar para repetir este mesmo discurso quando tivermos de debater as Grandes Opções do Plano a médio prazo?
É difícil entender! ...
É evidente que há mais coisas difíceis de entender, ou, porventura, não.
O Sr. Ministro acabou por se ocupar exclusivamente da questão das Grandes Opções do Plano a médio prazo e, sobretudo, por se ocupar com loas, com um desvelo e um ardor em relação a tudo quanto seja plano e planeamento.
Em boa lógica, Sr. Ministro, este discurso deveria ser apagado do Diário, sem prejuízo do devido respeito para com V. Ex.a, porque ele se desinsere, pura e simplesmente, da ordem de trabalhos.
É verdade que, para nós, também fica claro que V. Ex.º distingue entre grandes opções e pequenas opções, entre as GOPs e as POPs...
Risos do PS.
... mas, Sr. Ministro, verdadeiramente, aquilo que sobra é o «ardor ilimitado» que V. Ex.ª aqui nos trouxe a respeito do Plano e da planificação. Esse ardor poderá não explicar que o PSD é uma esquerda moderna, mas explicará que é, sobretudo, uma esquerda recente.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quero pôr à vossa consideração o seguinte problema: o Sr. Presidente do Grupo Parlamentar do MDP/CDE também pretende formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro do Plano, mas não dispõe de tempo. Ora, a título excepcional, acham VV. Ex.ªs que se poderão conceder os necessários 3 minutos, que serão descontados no tempo de que o MDP/CDE dispõe para amanhã?
Pausa.
Não havendo qualquer objecção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Tengarrinha.
O Sr. José Manuel Tengarrinha (MDP/CDE): Sr. Ministro, a questão que lhe quero colocar insere-se no domínio da investigação e desenvolvimento tecnológico.
Quando caracterizam o sistema de ciência e tecnologia português, as Grandes Opções do Plano apontam para a sua vulnerabilidade, expressa em indicadores vários, como, por exemplo, o montante das verbas actualmente afectas à investigação e desenvolvimento, excessivo peso do Estado nestas despesas relativamente ao sector privado, número total de investigadores, a débil interacção entre organismos estatais (v. sistema produção e consequente dependência tecnológica externa).
O texto acrescenta ainda que têm faltado coordenação e directivas nacionais precisas para a orientação daquelas verbas e que tem faltado igualmente uma grelha de critérios para avaliação e selecção de projectos do I&DE elegíveis para financiamento.
Para remediar estes males o complemento relativo às Grandes Opções do Plano para 1987 faz ascender as despesas em investigação científica a 4895 milhares de contos, estando 2364 milhares a cargo da Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, o que significará que a verba a cargo desta instituição sofre um aumento de 250 %.
Sr. Ministro, claro que é de louvar o crescimento do montante afecto ao I&DE! ... Porém, não deverá esquecer-se que, partindo-se, como se parte, de um plafond muito baixo, a subida prevista não permite ir além dos 0,4% do PIB. Ora, como deve saber, as organizações internacionais competentes desde há anos que vêm propondo o mínimo de 1 % do PIB para os países em desenvolvimento.
Mas o que neste momento importa realmente interrogar é a questão da estratégia, dos instrumentos que o Governo terá intenção de utilizar para a aplicação das verbas e, para além disso, dos critérios que fundamentam a repartição dessas verbas.
As Grandes Opções do Plano não passam de generalidades.
Parece acreditar-se na participação do I&DE nos programas da CEE como contributo significativo para a modernização da economia, pelo acesso que permitiria a novas tecnologias. Fala-se dessa oportunidade, dessa participação, como ocasião única. Fala-se nos últimos projectos, mas sabe-se que é marginal o significado da participação portuguesa nos projectos comunitários, projectos esses que são orientados para domínios estratégicos que garantam a competitividade externa da CEE, o que quer dizer que os verdadeiros actores do processo são as grandes empresas e instituições científicas dos países europeus mais industrializados.
Sabe-se, também, que é largamente inferior a capacidade do tecido económico português para absorver os resultados da investigação e desenvolvimento tecnológicos realizados na Europa.
É verdade que entre as grandes opções se inclui o propósito de dinamizar o sistema cientifico e tecnológico através do reforço do investimento, do apoio e lançamento de programas específicos de apoio à acção das universidades, programas de sensibilização, utilização do CIT para reforçar o aparelho produtivo nacional. Certamente que estes objectivos permitirão justificar a canalização das verbas, mas o que não se vêem nas Grandes Opções do Plano são os mecanismos que o Governo vai utilizar para o pretendido reforço e estímulo do sistema.
Haverá lugar a estudos de base que permitam fundamentar políticas e atribuir financiamentos ou prosseguir-se-á a política do mecenato, apoiado, por vezes, em critérios de duvidosa cientificidade?
Página 368
368 I SÉRIE - NÚMERO 12
Quais as estruturas que vão articular o sistema de CIT e o sector produtivo, sabendo nós como as tentativas anteriores foram mais ou menos frustrantes?
Como se pretende introduzir o novo espírito científico no sistema educativo?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Plano.
O Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vou ter tempo para responder, uma a uma, a todas as questões de que tomei nota, mas acontece que algumas delas, nomeadamente esta última que foi colocada pelo Sr. Deputado José Manuel Tengarrinha, vão ser amanhã objecto de intervenção, quando falar do PIDDAC, portanto, nessa altura, terei oportunidade de falar concretamente sobre a parte específica da investigação científica.
Alguns dos aspectos referidos serão mais adequadamente dirigidos a colegas meus, mas não deixarei de os transmitir, nomeadamente no que respeita aos centros tecnológicos e às empresas públicas, ao Sr. Ministro da Indústria.
Há aspectos que são de âmbito das relações internas do Parlamento, nos quais não me vou meter refiro-me, nomeadamente, a grande parte das questões colocadas pelos Srs. Deputados Lopes Cardoso e Eduardo Pereira. Aguardaremos o veredicto da Assembleia para, depois, podermos falar acerca dele.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Achamos melhor!
O Orador: - Quanto à questão dos modelos, que me foi colocada pelo Sr. Deputado Ivo Pinho, devo dizer que tenho uma grande parte da minha vida ocupada com a elaboração e o tratamento de modelos, pelo que sei as virtualidades dos mesmos e como os devemos trabalhar com «pinças».
Sei, portanto, as alegrias e as limitações dos modelos. Não tenho nada contra eles, antes pelo contrário. Talvez isto seja uma reflexão de alguém que lhes conhece as limitações, mas o que lhe posso dizer é que vejo que há lugar para aplicação de modelos quando se trata de fazer planos e programas, pois nessa ocasião há lugar para compatibilizações, para fazer grandes opções.
Há pouco o Sr. Deputado Silva Lopes falou muito da necessidade de esclarecer o conteúdo das Grandes Opções., Vendo eu as Grandes Opções como decisões estratégicas a montante da elaboração de planos e modelos, é uma reflexão ex ante relativamente à construção de modelos que propus refazer.
Não tenho nada contra os modelos, mas acho que eles devem ser limitados ao ambiente, exactamente nos termos em que referiu, para fazer cenários criticados pelo bom senso das pessoas que vêem para além dos modelos.
Por isso, estou em desacordo, o que não quer dizer que - e passo à referência feita pelo Sr. Deputado Cavaleiro Brandão - eu tenha uma fé insuspeitada em tudo quanto á incondicional, em tudo quanto é planeamento. É evidente que não tenho.
Relativamente ao «ardor» a que se referiu, penso que hoje se fez uso e abuso da palavra «planeamento». Com efeito, actualmente, quando queremos dizer «coordenação de acções», chamamos-lhe planeamento.
Talvez valesse a pena reformular a semântica. De qualquer das formas, se por planeamento se engloba a coordenação de todas as acções que implicam gastos, aí sim, digo que tenho um ardor ilimitado nessa coordenação, pois é a mais difícil de fazer de entre qualquer outra operação. Se por plano se entende o seguimento cego de algo que foi definido pelo tal modelo por que tenho respeito, mas com limitações de uso, pelas suas consequências, então, estou de acordo consigo.
De todo o modo, o «ardor ilimitado» deve ser entendido no sentido da coordenação de todos os instrumentos a que a Administração Pública tem acesso.
Creio que hoje vou ficar por aqui, pois amanhã terei oportunidade de voltar a abordar algumas das questões colocadas hoje, nomeadamente no que respeita ã política regional e aos recursos naturais.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.
O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A discussão e votação das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1987 realizam-se num contexto político muito diferente da ambiência dos debates do Orçamento para 1986. A experiência de mais de um ano de um governo de maioria relativa, minoritário em confronto com a soma das oposições, firmou-se. Tornaram-se também conhecidas as virtudes e as inevitáveis limitações da forma escolhida, bem como o estilo de governação deste executivo. Pode, assim, agora, a Assembleia da República debater em maior profundidade as opções macroeconómicas propostas pelo Governo para 1987 e as suas concretizações nas receitas e despesas do Estado sem se distrair com as sequelas de contendas eleitorais, que já vão longe.
Acresce ainda, para este clima novo, um outro factor. Nos períodos de escassez, quando «não há pão», diz o povo que «todos ralham e ninguém tem razão». Felizmente, a convergência da política de austeridade do anterior governo e o são realismo da política económica do governo actual - ambos norteados pela prossecução do interesse nacional -, em conjugação com uma envolvente externa extremamente favorável, no que respeita aos preços do dólar e do petróleo, permitem olhar o presente sem os dramatismos das premências inadiáveis ou das diminuições do que já é essencial.
Estão, assim, reunidas as condições para que se abandone a demagogia fácil e as cassetes a que alguns partidos nos habituaram e para ir ao fundo das questões, enriquecendo a análise dos problemas com a diversidade natural das perspectivas de cada partido. Discutamos, pois, as opções políticas fundamentais e a coerência das políticas que as pretendem realizar, apresentando alternativas quando disso for o caso. Abandonemos efeitos cénicos de gosto duvidoso e práticas de «chicana» processual que não prestigiam a Assembleia.
A oposição, melhor, as oposições encontram-se perante um repto que não podem iludir: ou aceitam as propostas fundamentais do Governo, embora naturalmente criticando aqui ou além a coerência das medidas que as visam implementar, ou se, pelo contrário,
Página 369
19 DE NOVEMBRO DE 1986 369
as rejeitam, devem fazê-lo claramente, apresentando uma solução construtiva e assumindo a responsabilidade política da sua atitude.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não seria claro, nem ajudaria à transparência do sistema político e, por consequência, à compreensão do cidadão comum, dizer maioritariamente que o Orçamento não serve, sem ter a coerência de, no voto, o vir a rejeitar. Tão-pouco representa força de ânimo, mas apenas tibieza calculista, refugiar-se nas águas turvas da abstenção. Sejamos firmes e frontais: se sim, sim; se não, não.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E, quanto a nós, face à presente proposta, a posição a tomar não é difícil. Este orçamento confirma que o governo que apoiamos merece continuar a governar. Dizemo-lo não por mero imperativo de solidariedade partidária, mas pela prova evidenciada, o que, como é natural, não exclui, aqui e além, dúvidas quanto a certas soluções ou o desejo de introdução de correcções de detalhe.
O exame global do Orçamento, para além do mérito não dispiciendo, pela sua raridade nos tempos pós-revolucionários, de ter sido apresentado no prazo constitucionalmente previsto, revela, desde logo, duas qualidades altamente positivas: a bondade, a escolha acertada dos objectivos prioritários, por um lado, e a continuidade da política económica, dos fins que o Governo, desde o início do seu programa, pretende alcançar, pelo outro.
Constituem grandes objectivos da política macroeconómica para 1987 o reforço do investimento produtivo e do emprego e a redução da inflação, desacelerando-a para uma taxa média anual entre 8 % e 9 % . O produto interno bruto, que cresceu em 1985, 3,3 % e em 1986 3,9 % , crescerá 4,4 % em 1987, de acordo com a previsão.
Pretende ainda o Governo que esses desideratos sejam alcançados com um aumento moderado do consumo privado e com um crescimento das exportações em taxa correspondente à da procura mundial. A política cambial deverá acomodar-se a estes propósitos.
Para que este cenário seja possível tornar-se-á necessário - refere a proposta de lei orçamental - conter o défice orçamental, conseguindo para as despesas correntes taxas de crescimento real próximas de zero e mantendo o crescimento real das despesas de capital a uma taxa correspondente à do crescimento do PIB.
Em termos ideais, todos desejaríamos que o crescimento económico se acelerasse com incremento do emprego e que a inflação fosse ainda mais drasticamente reduzida. Mas a política é a arte do possível e as metas propostas parecem realistas. Ponto é que sejam alcançadas. A questão nevrálgica, sobre a qual as opiniões, tributárias das correspondentes ideologias, se cindem, é esta: vamos consegui-lo com mais Estado ou com menos Estado?
O Governo propõe uma óptica de redução do peso do Estado pela contenção de despesas correntes e pela moderação no investimento público. Para aqueles que, como nós, pensam que é vital para o País, nesta encruzilhada da sua história, ter uma economia dinâmica e flexível, que promova os mais aptos e sancione os incapazes, esta escolha é correcta.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Seria... !
O Orador: - Para os que, acima de tudo, privilegiam uma igualdade cega, que equipara os diligentes e os preguiçosos, os competentes e os incompetentes, os criadores de inovação e de progresso e os conformistas, que se limitam à imitação de ideias alheias, esta política é um escândalo. Esquecem os que tudo querem nivelar por baixo e, por isso, usam os mecanismos castradores da burocracia estiolante que promoverão uma sociedade de iguais, mas igualmente de medíocres.
A nossa dúvida não está, pois, na opção feita, que nos parece essencialmente correcta e digna de aplauso. A nossa interrogação reside em o financiamento das despesas correntes e do investimento no sector público administrativo se nos afigurar vir a absorver uma percentagem excessivamente elevada do crédito total disponível.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Criam-se, deste modo, dificuldades ao investimento por parte das empresas, o qual deverá ter uma taxa de crescimento real da ordem dos 9,5 % para ser compatível com o modelo.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Muito bem!
O Orador: - A baixa das taxas de juro - sobre a qual compreensivelmente não temos dados precisos aumentará o autofinanciamento das empresas, as quais verão a sua carga fiscal ligeiramente aliviada. Mas, não se podendo aumentar substancialmente a oferta de crédito, pelos riscos inflacionistas que traria, torna-se difícil conseguir que uma expansão do crédito interno da ordem dos 7 % permita um crescimento na formação bruta de capital fixo de 20,7 %.
Também nos parece necessário, neste contexto, dar uma grande atenção à estruturação do mercado de capitais e à dinamização da oferta de títulos, eliminando alguns efeitos perversos de certas disposições do importante diploma sobre as sociedades comerciais, recentemente entrado em vigor.
Reconhecido que é nas empresas que assenta, no entendimento do Governo e no nosso, a estratégia do desenvolvimento esperado, compreende-se que a dúvida posta sobre o efeito do crowding out tenha relevância.
Sabemos, aliás, que o Governo teve consciência clara do problema, até pela preocupação que manifestou com a articulação entre a programação monetária e a política orçamental, e sabemos qual a resposta que deu, em termos do comportamento esperado da poupança e das empresas. Mas, por razões cautelares e, sobretudo, de coerência com a filosofia política professada, parecer-nos-ia importante que se tivesse feito um esforço suplementar na diminuição das despesas. A privatização e a desregulamentação, para além de proclamadas, devem ser aplicadas como medidas importantes, decisivas mesmo, da reforma administrativa. Só por aí, provavelmente, se poderia aliviar significativamente a carga fiscal, o que neste Orçamento, em termos globais, ainda não acontece.
Página 370
370 1 SÉRIE- NÚMERO 12
Colocada a dúvida - que vai no sentido da restrição das despesas e da austeridade, e não no sentido das facilidades, por aumento do crédito interno ou externo ou por emissão de moeda -, devemos reiterar o nosso apoio aos objectivos preconizados pelo Governo. Pretendemos reforçar as garantias da sua consecução - que julgamos vital -, e não o contrário. A confiança dos investidores e dos empresários também se ganha por estes sinais indiciadores do reforço da coerência das políticas adoptadas.
Dúvidas de menor âmbito ou propostas de alteração de pormenor ficarão para a discussão na especialidade. Na sua generalidade, as medidas e políticas apresentadas merecem-nos, assim, aprovação. Através delas reforçaremos o aparelho produtivo da nossa economia e o nosso bem-estar. Outros meus colegas de bancada terão, de resto, oportunidade de, ainda na generalidade, abordar alguns sectores específicos da actividade económica.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, já tivemos oportunidade de dizer, aquando da apreciação por esta Câmara da moção de confiança apresentada pelo Governo, que é preciso que as políticas económicas durem o suficiente para que se possa ajuizar da sua valia. Só um governo de legislatura, um governo cujo mandato não seja abrupa e precocemente interrompido, pode realizar uma política coerente e cujos resultados sejam palpáveis. Nas eleições gerais o povo dará o seu veredicto. O eleitorado sancionará os que não se assumirem com frontalidade e julgará, pelas suas obras, aqueles que governem com rectidão e honestidade. A forma como este orçamento será votado e a forma como será executado constituem elementos fundamentais para esse juízo popular. Por mim, não tenho dúvidas sobre o sentido desse mesmo julgamento.
Aplausos do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ivo Pinho, também para uma intervenção.
O Sr. Ivo Pinho (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Há anos que a Assembleia da República não tinha oportunidade de discutir, nos prazos legalmente fixados, uma proposta de lei orçamental. Teve-a este ano. O PRD congratula-se com o facto.
Infelizmente, a proposta de lei n.º 44/IV não foi acompanhada de todos os elementos considerados indispensáveis à sua apreciação, verificando-se inclusivamente que até às vésperas da data limite fixada para a apresentação do relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano deram entrada na Assembleia elementos informativos do maior interesse para a discussão da referida proposta, os quais, naturalmente, não puderam ser objecto de tratamento apropriado; é, designadamente, o caso da informação relativa ao sector empresarial do Estado.
Esta disfuncionalidade não é nova, mas tem de ser urgentemente superada. Para tal, é absolutamente imprescindível que se modifiquem certas atitudes, substituindo-se o afrontamento sistemático e a desconfiança pelo diálogo colaborante. E é também necessário que, aproveitando-se o ensejo permitido pela revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado - tarefa em ultimação na Comissão de Economia, Finanças e Plano -, se defina e estabeleça, com clareza e com realismo, a natureza da informação de que a Assembleia carece para realizar adequadamente a sua missão e, bem assim, a tipologia a que deve obedecer a sua apresentação.
Pela nossa parte, estaremos disponíveis e determinados para contribuir para a consecução dos objectivos aludidos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Frustraram-se, uma vez mais, as expectativas daqueles que, como nós, aguardavam que a proposta de lei orçamental evidenciasse alguma conexão com o conteúdo das chamadas < Grandes Opções do Plano». Com efeito, continua a verificar-se uma notória ausência de integração e, mesmo, de articulação entre objectivos e políticas de desenvolvimento e a política orçamental. Tal circunstância é tanto mais de lamentar quanto o Governo dispunha dos meios necessários e parecia dispor da vontade política requerida para o efeito. É surpreendente que, depois de se ter tido a coragem de analisar e equacionar - embora de forma altamente controversa- os problemas de fundo da sociedade portuguesa, não se tenham definido os instrumentos necessários para a mudança e se tenha, inclusivamente, elaborado uma proposta de lei orçamental manifestamente refractária aos alegados propósitos de transformação e adaptação estrutural.
A proposta de lei orçamental para 1987 é um documento «neutro» em termos políticos e inócuo em termos sócio-económicos. É um documento que nada cria, nada inova e nem sequer dá sequência a acções iniciadas na proposta de lei orçamental para 1986, visando a clarificação das finanças públicas. Verifica-se, com efeito, que as prioridades sectoriais, em vez de determinarem a orçamentação, são determinadas por ela, que o cego e indiscriminado sistema de rateio das dotações entre departamentos da Administração continua a ditar condutas e que o mérito e eficácia social das despesas não é devidamente ponderado.
Em matéria de clarificação das finanças públicas, não se concretizaram intenções que haviam sido enunciadas, como, por exemplo, a integração, no Orçamento do Estado, dos Cofres do Ministério da Justiça, chegando-se, inclusivamente, ao ponto de retroceder em matéria de contabilização orçamental dos meios financeiros que sejam receita efectiva e que decorram de acordos de defesa.
A proposta de lei em apreço é, pois, um instrumento exclusivamene orientado para a consecução de um objectivo - e de uma obsessão - absorvente, qual seja o de se chegar, em 1991, a um défice das finanças públicas da ordem dos 5 % do PIB. Mas será que a prossecução desse objectivo - cuja justeza se não discute - não admite mudanças na nossa gestão orçamental? Não será mais fácil - e socialmente mais útil - prossegui-lo num quadro genérico de referências que privilegie uma conexão clara entre objectivos, políticas, programas e orçamentos e que equacione e questione o interesse social de certas despesas?
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - A grande rigidez que, indiscutivelmente, condiciona, em Portugal, a elaboração do Orçamento não pode ser o eterno álibi para que governos que não são de gestão utilizem a política orçamental basicamente para gerir o presente sem perspectivas de futuro.
Página 371
19 DE NOVEMBRO DE 1986 371
Acresce que também não é aceitável que a proposta de lei orçamental tenha sido elaborada com tão elevados graus de indeterminação. Este novo factor limitador decorre de o Governo não ter incluído na proposta de lei n.º 44/IV uma estimativa, ainda que grosseira, das incidências orçamentais dos fluxos financeiros com a CEE. Em vez disso, o Governo optou pelo compromisso de inscrever, nos termos do n.º 8 do artigo 14.º da proposta em apreço, o montante da contribuição financeira do Estado Português. É, aliás, discutível a legalidade desta disposição, uma vez que ou já estão inscritas contrapartidas no Orçamento - e conviria saber onde - ou haverá acréscimo de despesa e deverá ter lugar uma alteração orçamental da exclusiva competência da Assembleia.
Por outro lado, o. número de pedidos de autorização legislativa formulado no articulado revela-se manifestamente excessivo, sendo, por isso, legítimo concluir que o Governo se afirma mais por aquilo que tenciona vir a fazer do que por aquilo que assume o compromisso de fazer.
Acresce que, como o Governo não concretizou vários pedidos de autorização legislativa aprovados na discussão do Orçamento para 1986, tem que admitir-se que uma situação idêntica possa ocorrer em 1987.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Após as considerações gerais formuladas, procurarei, no que se segue, passar em revista a proposta de lei n.º 44/IV. Deter-me-ei apenas na análise dos grandes números e das ideias e ou critérios que os fundamentam.
Não me referirei ao enquadramento macroeconómico do Orçamento, na medida em que esse assunto já foi objecto de uma intervenção por parte de um colega de bancada. Abordarei, sucessivamente, as despesas, as receitas e o investimento público.
Antes, porém, afigura-se-me pertinente formular uma observação prévia sobre as dificuldades com que se defronta o analista que pretende fazer um estudo comparado dos valores constantes da proposta de lei orçamental para 1987 e do orçamento corrigido de 1986. Tal tarefa é altamente problemática, devido a factores de ordem vária, entre os quais avultam as tradicionais discrepâncias de classificação orçamental entre as ópticas da contabilidade pública e das contas nacionais e a reclassificação de certas rubricas da despesa.
Conviria que, no futuro, houvesse a preocupação de fornecer uma explicação detalhada sobre as incidências de factores como os referidos nos valores constantes da proposta de lei orçamental. É que, a não ser assim, terá de passar a citar-se, casuisticamente, o número dos quadros que são objecto de análise, uma vez que para as mesmas rubricas são frequentemente fornecidos valores distintos:
Passo, seguidamente, à análise das despesas.
Considerarei, na análise comparada, os valores do orçamento revisto de 1986, muito embora não desconheça que os mesmos foram alterados, em mais de 20 milhões de contos, por créditos especiais da exclusiva competência do Governo, incluindo reforços com compensação em receita consignada. Eis, senhores deputados, mais uma razão para retermos a nossa atenção apenas no essencial ...
As despesas totais - com exclusão da contribuição financeira para a CEE e das contas de ordem - registam, em termos reais, um crescimento moderado cerca de 2,9%, utilizando o deflactor do PIB.
Esse crescimento é conseguido, exclusivamente, à custa da expansão das despesas de capital, que acusam um crescimento de 11,4%, utilizando o deflector da FBCF. As despesas correntes apresentam uma taxa de crescimento negativa (- 0,3), utilizando o deflactor do consumo público.
A este nível de agregação nada de essencial haveria a objectar à evolução descrita. O mesmo não sucede, porém, quando a análise incide sobre valores mais desagregados. Assim, nas despesas de capital verifica-se que o crescimento mais forte se regista na rubrica «Passivos financeiros», e não na rubrica « Investimentos», a qual se expande à taxa real de apenas 3,4%. Também as «Transferências para o sector público» evidenciam uma taxa moderada de crescimento que se situa somente um pouco acima da média do crescimento das despesas de capital. Nota-se, desde já, que a rubrica «Activos financeiros» - onde figuram as dotações para as EPs - sofre um pronunciado decréscimo. Quanto às despesas correntes, é de salientar que só as «Despesas com pessoal» registam um crescimento positivo, apresentando «Juros» e «Transferências» um crescimento real de sinal negativo.
O crescimento, relativamente animado, das despesas com pessoal - cerca de 5 % -não pode ser imputado, no essencial, como pretende o Governo, às maiores dotações para pensões e reformas dos funcionários e para a ADSE. O que, em boa verdade, se verifica é uma sobreavaliação da respectiva dotação.
Estará o Governo a pensar que a actualização salarial se irá processar algo acima dos previstos 12 % a 12,5 % ou será que iremos assistir, incredulamente, à expansão dos efectivos da função pública, designadamente dos chamados «tarefeiros», cuja dotação orçamental, aliás, cresce em exponencial em relação à do ano precedente? Ou tratar-se-á, simplesmente, de um erro de previsão que o Governo está disposto a corrigir?
Quanto às despesas por ministérios, afigura-se útil salientar alguns aspectos que, de resto, são mencionados nos relatórios das várias comissões parlamentares. Permito-me aqui abrir um parêntesis para referir a qualidade da generalidade desses relatórios. Apesar disso - ou talvez por isso- os representantes do PSD nas várias comissões votaram quase sempre contra. Se refiro este facto é porque considero que ele constitui elucidativa expressão de certas atitudes a que aludi no início da minha intervenção. Fecho o parêntesis.
Aplausos do PRD.
O Orador: - De entre os aspectos que reputo relevantes avultam os seguintes: em matéria de trabalho, é de assinalar o pronunciado decréscimo da verba destinada a subsídios de desemprego, apoio ao emprego, lay-off, fundo de garantia salarial, apoios à reestruturação industrial e salários em atraso. Afiguramse, igualmente, insuficientes as verbas destinadas à inspecção do trabalho e à higiene e segurança; no tocante à Segurança Social, é importante notar que o défice previsto para 1987 monta a cerca de 30 milhões de contos, ou seja, a 7 % do défice do Estado.
Este défice segue-se a um défice efectivo, em 1986, que se estima atingir apenas - 3,4 milhões, quando o défice previsto para 1986 foi de - 26,2 milhões. Esta diferença entre défices previsto e efectivo decorre, basicamente, de as contribuições cobradas terem excedido largamente as cobranças orçamentadas e isso em resul
Página 372
372 1 SÉRIE - NÚMERO 12
tado de o Governo ter protelado, deliberadamente; a data de entrada em vigor da taxa social única prevista no artigo 74.º da Lei n.º 9/86 para, alegadamente, evitar o quase sempre presente fantasma do «disparo» do consumo privado (num aparte, permitam-me que registe que, ao que parece, este fantasma não esteve presente quando recentemente se deliberou aumentar as pensões). Como este expediente não poderá ser usado em 1987, é de admitir que, se não for significativamente melhorada a eficiência do sistema de segurança social, o respectivo défice efectivo venha a ser superior ao défice previsto.
Quanto ao Serviço Nacional de Saúde, haverá que referir, em primeiro lugar, que a Assembleia teve razão quando, na discussão da proposta de lei orçamental para 1986, considerou que as dotações então atribuídas eram insuficientes. Também agora se nos afigura que o défice previsto para o Serviço Nacional de Saúde em 1987 - cerca de - 15,3 milhões de contos - será claramente ultrapassado, devido, designadamente, aos insuficientes créditos orçamentais atribuídos à comparticipação nos medicamentos e nos consumos nos hospitais distritais e centrais. A circunstância de a actualização de remunerações vir a ser suportada pela dotação provisional não parece abonar em favor da desejável transparência das finanças públicas nem é tecnicamente defensável. É que não é por ocultar despesas que os défices deixam de surgir.
Em matéria de educação, ciência e cultura, afigura-se que, entre outras, as verbas destinadas à acção social escolar, ao ensino especial e à investigação científica nas universidades são manifestamente insuficientes.
Que ligação haverá entre as verbas atribuídas a este sector e a prioridade que é concedida, no plano dás ideias e no âmbito das GOPs, à valorização dos recursos humanos?
Em matéria de defesa nacional, como justificar que o Governo continue a não apresentar uma lei de programação militar que fundamente e explicite a proposta orçamental?
Das observações efectuadas pode retirar-se um denominador comum: há razões fundadas - porque fundamentadas - para supor que alguns créditos orçamentais terão de ser reforçados. Eis, mais uma vez, o tradicional espectro do orçamento suplementar a condicionar a desejada clarificação das finanças públicas.
Uma última referência, ainda em matéria de despesa, para a classificação funcional. A análise comparada surge prejudicada pela não desagregação da rubrica «Outros serviços económicos» - cuja dotação monta a 6,2 milhões de contos - mas é possível afirmar que, como, aliás, seria de esperar, são praticamente irrelevantes as alterações estruturais observadas de 1986 para 1987. Em todo o caso, valerá a pena destacar o ganho de peso relativo da «Segurança e ordem pública», da «Defesa nacional» - apesar, mas certamente não por causa, da insuficiência dos créditos orçamentais atribuídos pelo Governo - e das operações da dívida pública. Em contrapartida, perdem peso - 1,8 pontos percentuais - os «Serviços económicos», facto que parece conflituar com as opções consistentes na «Correcção dos grandes desequilíbrios estruturais» e no «Reforço da economia».
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em matéria de despesa fico-me por aqui. Outros colegas de bancada voltarão, na especialidade, ao assunto. Passo às receitas.
As receitas de capital não são comparáveis, uma vez que não são previstas transferências com origem nos fundos e serviços autónomos.
Por outro lado, nas receitas correntes não fiscais não se encontram contabilizadas as restituições da CEE. Deter-me-ei, portanto, na análise das receitas fiscais, mas como este assunto será objecto de uma intervenção específica por parte de um colega de bancada, procurarei ser breve.
Segundo informação prestada pelo Governo à Comissão de Economia, Finanças e Plano, as cobranças totais em 1986 deverão exceder as previsões em cerca de 20 milhões de contos.
Este facto torna ainda mais elucidativo o modesto aumento, em termos reais, previsto para as receitas fiscais em 1987. Esse acréscimo é, de resto, conseguido exclusivamente à custa de três impostos indirectos: os direitos de importação, o IVA e o imposto de consumo sobre o tabaco.
Face ao exposto, tem de admitir-se que as receitas fiscais estarão, com a actual dimensão da base tributária e com o actual nível de carga fiscal, no limiar do seu pico máximo. Esta conclusão é importante em vários sentidos e aponta, nomeadamente, para a necessidade de se prosseguir e intensificar o combate à evasão e fraude fiscal.
Um outro aspecto que merece destaque prende-se com o rigor da previsão da evolução das receitas de certos impostos. Há razões para admitir que certas receitas, designadamente a da contribuição industrial, estejam sobreavaliadas. Tome-se, a título paradigmático, o caso da contribuição industrial. Se é certo que - como afirma o Governo - o maior controle sobre a actividade produtiva das empresas inerente ao tratamento da informação permitido pelo IVA constitui um poderoso instrumento de controle da evasão fiscal, também o é, afirmamo-lo nós, que o custo previsto dos benefícios fiscais - que montará a 28,5 milhões de contos em 1987 - cerceará, substancialmente, as cobranças da contribuição industrial.
Nestas condições - e tendo em conta que o número de benefícios fiscais incidentes sobre a contribuição industrial quase atinge a meia centena - não será algo arriscado admitir um crescimento nominal de 44% na receita deste imposto?
Uma última mais importante referência tem que ver com a enorme dependência que a cobrança fiscal passa a ter em relação a apenas dois impostos - o IVA e o ISP - que representam, por si só, quase metade das receitas fiscais previstas para 1987. Este facto tem, naturalmente, consequências não negligenciáveis, mormente nas que se ligam à desejável equidade do sistema fiscal.
De um sistema fiscal cuja reforma, pacientemente, se aguarda, lamentando-se embora que o Governo - decerto por desejar tudo resolver de uma vez por todas no quadro da citada reforma - deixe, inexplicavelmente, arrastar situações que poderia já ter solucionado.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Antes de passar à análise do investimento público, impõe-se formular uma conclusão: com despesas subavaliadas e com receitas sobreavaliadas ou, na melhor das hipóteses, na vizinhança do seu limite máximo, tudo parece indicar que, ao contrário do que seguramente vai verificar-se no ano em curso - em que o défice efectivo do SPA deverá ser de cerca de
Página 373
19 DE NOVEMBRO DE 1986 373
- 400 milhões de contos em vez dos quase - 500 milhões inicialmente previstos -, se assistirá em 1987 a um défice efectivo mais próximo do défice previsto. A ser assim, poderá ficar comprometido o objectivo do Governo consistente na redução do peso do défice no PIB.
Analisarei, seguidamente, de forma necessariamente sintética, o PIDDAC e tecerei algumas considerações sobre os escassos elementos disponíveis relativos ao PISEE.
Excluindo as dotações para os PIDRs o montante global do PIDDAC atinge 153 milhões de contos, dos quais 132,3 são dotações do capítulo 50 do Orçamento do Estado. O crescimento destes relativamente a 1986 é, pois, de 16,7 % em termos nominais ou 3,9 %, em termos reais, utilizando o deflactor do consumo público.
Este acréscimo é, porém, inferior ao resultado dos encargos previstos com projectos iniciados em 1986 e anos anteriores, acrescidos dos encargos com novos projectos a iniciar em 1987, que montam a cerca de 29 milhões de contos. Tal facto mostra que houve uma reprogramação dos projectos a que não terão sido alheios os atrasos na execução e a pouca consistência de alguns deles. A Assembleia não tomou conhecimento da citada reprogramação.
O cálculo da taxa de execução do P1DDAC não pode efectuar-se em moldes rigorosos, na medida em que se desconhece o grau de execução dos projectos cuja conclusão ocorreu em 1986. Apesar disso, o Governo pede, no artigo 12. º, n.º 2, da proposta de lei, autorização para utilização dos saldos desses projectos até 31 de Março de 1987... Aliás, o citado artigo 12.º introduz um grau de incerteza que retira todo o alcance à apreciação do mapa VII. Acresce que, ao contrário do que sucedeu na proposta de orçamento para 1986, nem sequer se prevê, na proposta em apreço, a obrigatoriedade da publicação das alterações à programação da execução financeira do PIDDAC no Diário da República.
As análises comparadas tornam-se difíceis quando o Governo altera a sua orgânica, como aconteceu de 1985 para 1986, ou a classificação sectorial, como aconteceu neste ano, com a criação de um abrangente sector, denominado «despesas de apoio», que surge dotado com uma verba de 7,2 milhões de contos.
Por outro lado, mais importante do que analisar o PIDDAC para 1987 é tentar quantificar as suas incidências futuras.
Os encargos previstos com os projectos do actual PIDDAC atingirão em 1988 155 milhões de contos, representando um acréscimo de 17,5 % superior, portanto, ao verificado este ano. Só os projectos a lançar em 1987 vão provocar um acréscimo global do conjunto do programa em quase 300 milhões de contos!
Esta técnica de «meter o pé na porta» é bem conhecida e os seus resultados são quase sempre perversos, sobretudo quando, como é o caso, não se dispõe de um verdadeiro quadro orientador susceptível de imprimir coerência a projectos com incidência no ordenamento do território e no desenvolvimento sectorial.
Em nosso entender, é imperioso rever a natureza, o sentido e o alcance do PIDDAC e proceder à sua reprogramação. É que, se não se reprogramar o P1DDAC, teremos em 1988 as verbas destinadas à agricultura a duplicarem, os transportes, comunicações e meteorologia e a saúde a registarem uma taxa de crescimento razoável e sectores como a educação, as pescas e a investigação científica e o desenvolvimento tecnológico a diminuírem o seu peso em termos relativos. Quem poderá, seriamente, garantir que essa evolução é a que mais convém ao País?
Ainda a este propósito, interrogo-me sobre o sentido que fará incluir no PIDDAC uma dotação de 1,13 milhões de contos para um «Programa de indemnizações compensatórias nas regiões desfavorecidas» ou uma dotação de 1,8 milhões de contos para fazer face aos incentivos de base regional.
Também em matéria de PIDR se tem vindo a, assistir, na prática, a uma recondução automática de despesas sem que se conheça, com o necessário rigor, o que foi executado e o que está efectivamente programado. Curiosamente, vão-se criando novos PIDR's sem que se beneficie da experiência que já se possui e sem fazer uma avaliação prévia da eficácia das despesas neles previstas.
Mas voltemos ao PIDDAC, para formular mais dois comentários. O primeiro refere-se à impossibilidade de determinar, com rigor, quais as verbas efectivamente afectas a investimentos e a despesas de desenvolvimento. Se construirmos a classificação económica das despesas subjacente ao PIDDAC, verificamos que quase metade da verba total respeita à rubrica «Transferências - sector público». Como se desagrega e ventila esta dotação, que atinge 57,3 milhões de contos? A quanto montarão, nesta verba, as despesas com pessoal?
O segundo comentário prende-se com a aleatoriedade da programação financeira do PIDDAC. Como se justifica que haja ministérios em que aumenta o crédito global a votar relativamente aos projectos em curso, quando o mesmo deveria reduzir-se por a previsão agora feita não incluir os projectos terminados em 1986?
Quanto ao PISEE, existem duas boas razões para ser muito sintético. Em primeiro lugar, os elementos fornecidos pelo Governo, para além de chegarem tarde, são lacunares e reconhecidamente indicativos. Em segundo lugar, um colega de bancada formulará uma intervenção sobre o assunto.
O investimento previsto para o sector empresarial do Estado, em 1987, monta a cerca de 240 milhões de contos, o que se traduz num decréscimo significativo, em termos reais, relativamente ao investimento previsto para 1986. Dir-se-á que tal evolução é coerente com a política que o Governo tem anunciado pretender prosseguir relativamente ao sector empresarial do Estado. No entanto, a limitação do investimento no sector público - administrativo e empresarial - coloca a questão de saber como irá ser concretizada a meta anunciada nas Grandes Opções do Plano perra o crescimento da FBCF. Cálculos simples mostram que o investimento privado terá de crescer, em termos reais, a uma taxa da ordem dos 13 %. Será que o Governo considera que um tal objectivo se consegue, basicamente, emitindo «sinais» de confiança para os agentes económicos? Se é certo que a projecção da FBCF é, como afirma o Governo, um misto de «modelo» e de vontade política, também o é que a projecção só se concretizará se o investimento surgir. E se o investimento privado reagir mais a factos do que a sinais e vontades, como irá o Governo actuar? É ou não previsível que um investimento do sector público empresarial do Estado venha a ser mais vultoso para que possa ser alcançada a taxa de crescimento prevista na FBCF?
Página 374
374 I SÉRIE - NÚMERO 12
A transferência de recursos para as empresas públicas obedece a critérios claros: em primeiro lugar, serão indemnizadas as' empresas prestadoras de serviços públicos ou semipúblicos pelos preços políticos que praticam; o remanescente será afecto a subsídios à exploração, admitindo-se a possibilidade de complementar as dotações para o aumento de capital estaturário com a realização de operações activas, nos casos em que a recuperação financeira das empresas se afigure provável.
Pena é que à clareza de critérios - obviamente discutível, quer na sua filosofia de base quer no tocante à desejável e alegadamente desejada clarificação das finanças públicas - não corresponda a necessária transparência na informação quantitativa fornecida. De facto, não é feita a discriminação, por empresa, entre subsídios e indemnizações compensatórias e dotações de capital, circunstância que constitui um injustificável e injustificado retrocesso relativamente à informação que .acompanhou a anterior proposta de lei orçamental.
Resta, pois, comentar os números agregados.
A primeira referência é, no fundo, a que consta do relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano: os recursos alocados às empresas públicas, sendo manifestamente inferiores, em termos reais, aos que foram transferidos em 1986, não potenciam o saneamento financeiro da generalidade das empresas nem propiciam o seu relançamento em bases estáveis.
Por outro lado, e não obstante cerca de 80 % dos recursos orçamentais (incluindo as operações activas do Tesouro) se destinarem ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, é manifestamente controverso que os mesmos sejam bastantes para assegurar o cumprimento dos objectivos consignados nos contratos-programa assinados com as empresas públicas do sector dos transportes.
Quanto aos 8,5 milhões de contos relativos a operações activas do Tesouro, não restam dúvidas de que se destinam à concessão de empréstimos às empresas públicas. Em empréstimos se deverá traduzir também o apoio financeiro à «solução industrial e financeira» para a EDP, a Siderurgia Nacional, a Quimigal e a Setenave, que o Governo se propõe trazer à Assembleia. A não ser assim, tal solução - que se aguarda com expectativa- teria que ser acompanhada por uma proposta de alteração orçamental.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Vou concluir, sintetizando as conclusões principais que retemos da análise da proposta de lei orçamental n.º 44/IV:
Registámos com agrado o facto de estarmos a discutir, atempadamente, a proposta do Orçamento, de Estado para 1987, mas lamentamos a insuficiência e o envio tardio de elementos informativos necessários à sua adequada apreciação;
A proposta em apreço configura um orçamento táctico, rotineiro, de natureza marcadamente extrapolatória, que nada cria, nada inova, nada transforma. É um orçamento de continuidade na evolução e é também um orçamento de evolução na continuidade;
Face à provável subavaliação de certas despesas e sobreavaliação de determinadas receitas, há razões fundadas para admitir que, ao contrário do que vai suceder este ano, o défice efectivo do sector pública administrativo em 1987 se aproximará do défice previsto, o que representará um acréscimo relativamente ao défice efectivo de 1986 e, consequentemente, a não concretização do objectivo consistente na redução do peso do défice no PIB;
O PIDDAC carece de urgente revisão e reprogramação, sob pena de vir a criar-se uma dinânima imparável da despesa com incidências perversas na correcta afectação dos recursos públicos;
O PISEE ainda não é nada e pode acontecer que venha a ser muito pouco. Os recursos orçamentais que serão transferidos para as empresas públicas afiguram-se insuficientes para apoiar a necessária reorganização do sector público produtivo.
Estamos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, na presença de uma proposta de lei orçamental que aposta no « depois logo se vê... ». Nestas condições, parafraseando o título de um livro recentemente publicado, retorquimos, em função do acolhimento que o Governo vier a conferir a certas propostas de alteração: «À noite a da próxima quinta-feira- logo se vê»...
Aplausos do PRD, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS e do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos confrontados com o problema resultante de uma certa indisciplina no aproveitamento dos tempos. O PRD, que dispunha apenas de 10 minutos, ultrapassou em 21 minutos o tempo que lhe estava atribuído, o que veio necessariamente prejudicara oportunidade de outros Srs. Deputados intervirem neste momento, para o que, aliás, tinham toda a legitimidade.
Um deles era o Sr. Deputado Jorge Sampaio, do Partido Socialista, que se vê assim impossibilitado de fazer agora a sua intervenção, quando, aliás, o PS ainda não teve oportunidade de hoje produzir uma intervenção. Segundo informação de que disponho, penso que a sua intervenção, Sr. Deputado Jorge Sampaio, demorará cerca de 20 minutos. É assim, Sr. Deputado?
O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, não tendo as qualidades do maratonista Carlos Lopes, penso que a minha intervenção demorará à volta do tempo que referiu. Contudo, se os Srs. Deputados assim o entenderem e tiverem paciência de me ouvir, não me importo nada de produzir hoje a minha intervenção, o que, evidentemente, arrastará a sessão para além das 21 horas. Pela minha parte, estou disponível.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, muito obrigado pela sua generosidade.
Por outro lado, o Sr. Ministro da Defesa Nacional tem todo o interesse em fazer hoje a sua intervenção, que demorará cerca de 8 minutos, porque amanhã está impossibilitado de a produzir devido a afazeres inadiáveis.
Os 8 minutos caberiam ainda dentro deste período até às 21 horas, pelo que, contando com a generosidade do Sr. Deputado Jorge Sampaio, pergunto se os Srs. Deputados estão na disposição de permitir que o Sr. Ministro da Defesa Nacional use da palavra. Há alguma objecção a que assim se proceda, Srs. Deputados?
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
0 Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
Página 375
19 DE NOVEMBRO DE 1986 375
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, estamos nessa disposição, mas achamos que primeiro deve falar o Sr. Deputado Jorge Sampaio e depois o Sr. Ministro da Defesa Nacional. Com o conjunto destas intervenções gastamos vinte e pouco minutos e podemos terminar por volta das 21 horas e 30 minutos, resolvendo assim esta situação.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, razões profundas de ordem económica inibem-me de algum modo de permitir que a sessão ultrapasse as 21 horas e 10 minutos. Por esta razão preferia que os tempos em falta hoje fossem acrescidos aos tempos de amanhã.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, se V. Ex.ª não tiver hoje essas razões de ordem económica, vai tê-las amanhã ou depois de amanhã.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, depois explico a V. Ex.ª a razão por que assim é...
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, dá-me licença?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, V. Ex.ª já apresentou as questões que eu ia referir à Câmara, mas gostaria de voltar a fazer um apelo ao Partido Socialista no sentido de permitir que, se o Sr. Deputado Jorge Sampaio não se importa de aceitar a troca, o Sr. Ministro fale já de seguida.
Contudo, Sr. Presidente, isto iria seguramente colidir com a questão que V. Ex.ª pôs, de não acabarmos antes das 21 horas e 30 minutos, aliás como o Sr. Deputado Eduardo Pereira acabou de referir.
Realmente o Sr. Ministro da Defesa Nacional, tanto quanto sabemos e tal como V. Ex.ª informou a Câmara, tem amanhã, em representação de Estado, afazeres inadiáveis, pelo que não sei como vamos resolver esta questão, sendo certo que se não encontrarmos uma solução poderá esta Assembleia ficar privada da intervenção do Sr. Ministro da Defesa Nacional.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Sampaio, apesar da excelente generosidade de que deu provas, se a intervenção de V. Ex.ª demora 20 minutos, poderá usar da palavra, a sessão terminará às 21 horas e 10 minutos e a intervenção do Sr. Ministro da Defesa Nacional ficará prejudicada. Se entretanto V. Ex.ª entender que o Sr. Ministro da Defesa Nacional poderá usar da palavra para produzir a sua intervenção, que segundo me informaram demorará cerca de 7 ou 8 minutos, procederia desta forma, com prejuízo da intervenção de V. Ex.a, que ficaria para amanhã.
O Sr. Jorge Sampaio (PS): - É evidente, Sr. Presidente, que não podemos ficar privados da palavra do Sr. Ministro da Defesa Nacional, sobretudo quando se trata de razões de Estado que o impedem de estar aqui amanhã.
Como não tenho essas razões de Estado, se a saúde não me faltar, amanhã aqui estarei. Por mim, com certeza que o Sr. Ministro da Defesa Nacional deve falar hoje.
0 Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.
Tem então a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional.
O Sr. Ministro da Defesa Nacional (Leonardo Ribeiro de Almeida): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como VV. Ex.as, penso, sabem, a minha presença na Assembleia da República tem sempre o valor de um reencontro. Apresento a todos os Srs. Deputados os meus cumprimentos e neste momento agradeço especialmente ao Sr. Deputado Jorge Sampaio a sua compreensão e a toda a Câmara a possibilidade de me permitir que produza esta, realmente breve, intervenção.
Não quereria, em todo o caso, deixar de pedir a VV. Ex.ªs que a vossa compreensão fosse extensiva ao tempo que eventualmente fosse necessário para qualquer pedido de esclarecimento que entendessem dever fazer-me.
Não ficaria completamente tranquilo de consciência se um grau de compreensão deste tipo me permitisse usar da palavra sem que todavia depois me pudessem ser pedidos os esclarecimentos que VV. Ex.as entendessem.
Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados: Apresentou o actual Governo, oportunamente e dentro do prazo legal, a sua proposta de lei do Orçamento do Estado para 1987. Na sequência desse facto e em obediência a critério já usualmente seguido, o Ministério da Defesa Nacional forneceu à Comissão Parlamentar de Defesa todo o conjunto complementar de informações que, objectivamente, permitiram aos Srs. Deputados que a integram mais pormenorizado conhecimento do mesmo.
E foi ainda possível dar sobre a proposta de orçamento da defesa nacional mais detalhada informação sobre o seu conteúdo e estrutura, em reunião pessoal realizada com os membros da Comissão Parlamentar de Defesa Nacional.
Julgo, portanto, que esse conjunto de acções, em que muito gostosamente o meu gabinete e eu próprio colaborámos, facilitará a missão que neste momento me proponho.
Por essa razão, a minha intervenção será breve e incidirá particularmente e apenas sobre as grandes linhas que presidiram à elaboração da proposta que agora cabe a este plenário discutir e votar.
O orçamento da defesa nacional para 1987 prevê despesas no montante global de 134 967 831 contos, ou seja, em números redondos, 135 milhões de contos.
E deve dizer-se desde já que não é legítimo, para obter comparação menos favorável, excluir dele arbitrariamente qualquer das verbas que o compõem para por essa via encontrar uma expressão percentual desfigurada da realidade.
O orçamento da defesa nacional que agora se apresenta à consideração de VV. Ex.", longe de ser um «orçamento de continuidade», constitui um verdadeiro «orçamento de inovação e de modernidade».
Ele inclui, para além da previsão normal das despesas correntes de funcionamento, a quantia de 16 milhões de contos destinada à execução do reequipamento das Forças Armadas - quer a já definida nesta Câmara, e que se consubstanciou na Lei n.º 34/86, quer a que agora consta da proposta de lei de programação militar já apresentada nesta assembleia.
E embora não seja essa lei objecto, aqui e agora, de apreciação pelo plenário, parece perfeitamente razoável que se esclareça o seguinte: segundo a calendariza-
Página 376
376 1 SÉRIE - NÚMERO 12
ção prevista, a Lei de Programação Militar, nos termos da sua lei quadro, tem como pressupostos a definição prévia das missões específicas das Forças Armadas, do sistema de forças e do dispositivo, sendo certo que os dois primeiros destes textos carecem de confirmação do Conselho Superior de Defesa Nacional. Eles foram elaborados com tempo, mas a reunião do Conselho Superior de Defesa Nacional, que chegou a estar prevista para Agosto, acabou por só se poder realizar no dia 1 de Setembro.
Quer dizer: só em 1 de Setembro ficaram definidos os textos que eram pressupostos da elaboração da lei e nessa altura, com o cuidado e o critério que felizmente caracterizam as suas acções, já o Governo vinha preparando o Orçamento do Estado.
A Lei de Programação Militar tem uma elaboração específica, mais complexa do que o processo legislativo normal, porque exige que o Chefe do Estado-Maior de cada ramo das Forças Armadas elabore o seu próprio programa, que depois o apresente em conselho de chefes e que ele seja consolidado pelo Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas. De seguida tem de ser submetido à apreciação do Conselho Superior Militar, depois carece de parecer do Conselho Superior de Defesa Militar e só então o Governo, se esse parecer for unânime e favorável - como realmente foi tem legitimidade para a sua aprovação.
Porque entretanto prosseguia a elaboração do Orçamento do Estado, tornou-se evidente que era impossível incluir e fazer acompanhar o Orçamento do Estado desta lei, pelo que houve o cuidado de incluir então no Orçamento a verba que deve ser contemplada - e é - na Lei de Programação Militar e que está em perfeita coincidência com o texto da mesma.
Estas foram as razões pelas quais a Lei de Programação Militar não acompanhou o Orçamento do Estado. Estas razões já foram tornadas públicas e a lei neste momento já está acompanhada dos relatórios que o artigo 5.º da lei quadro exige, pelo que chego a interrogar-me sobre se afinal de contas, perante esta situação perfeitamente compreensível e razoável, o que cria mais azedume é que a lei, embora tenha vindo a tempo, não tenha sido apresentada na mesma altura em que o foi o Orçamento do Estado ou que o Orçamento, pela primeira vez desde há muitos anos neste país, tenha sido apresentado dentro do prazo legalmente previsto.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Foram, portanto, essas diligências e a trabalhosa organização e valorização dos cerca de 90 programas que compõem a lei, acrescidas da circunstância de se tratar pela primeira vez da apresentação de uma lei deste tipo, que determinaram tudo quanto acabo de expor.
O Governo fixou previamente - como não podia deixar de ser - o montante global utilizável nos cinco anos de vigência dessa lei: usou-se o critério de estabelecer o montante total de 16 milhões de contos para o Orçamento do Estado de 1986, e igual quantia para os restantes, indexada segundo os valores da inflacção prevista para cada um deles.
Isto significa que o Governo se obrigou a incluir, nos orçamentos da defesa nacional, para despesas de programação militar, e ao longo de cinco anos, o total de 89 126 000 contos.
Assim, podemos dizer, Srs. Deputados, que é um novo ciclo que se inicia na estrutura do orçamento da defesa nacional, neste próximo ano de 1987.
Trata-se, portanto, de um projecto orçamental virado para o futuro, que procura dar - e dará certamente às nossas Forças Armadas os meios mínimos necessários para assegurar a sua eficácia e até por aí corresponder às suas legítimas aspirações.
$ crítica fácil dizer-se que, no que toca ao orçamento corrente, isto é, relativo a despesas de funcionamento normal, o aumento é mais modesto.
Não se nega o facto.
Mas é legítimo esperar que melhores disponibilidades futuras permitam, em breve prazo, aumentar significativamente esta vertente orçamental.
De resto, ao corresponder por esta forma às necessidades de reequipamento e modernização das nossas Forças Armadas, o Governo, se lhe dá equilibrada concretização, está ainda a cumprir os imperativos que resultam da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas e da lei quadro da programação militar.
Repito: o orçamento da defesa nacional, que à vossa consideração se submete, é um orçamento de modernidade e de verdadeiro e evidente aumento de eficácia das Forças Armadas.
Só o não vê quem não quer ver.
Ele constituí o maior aumento percentual em valor nominal desde 1980 e, em termos reais, do último decénio.
O aumento que vem de referir-se resulta, pois, e fundamentalmente, das despesas afectadas à modernização das Forças Armadas.
Mas, pese embora - como já se disse - ser menor o aumento das despesas de funcionamento normal, ele é ainda superior à inflacção esperada para 1987.
Srs. Deputados: não é possível, pelo tempo limitado de que disponho, e que, por razões evidentes, ainda mais quererei limitar, apresentar-vos todos os aspectos que gostaria de tratar e definir nesta minha intervenção. Mas um ou outro gostaria ainda de focar.
O presente orçamento da defesa nacional, pela forma como se encontra organizado, apresenta, em relação ao anterior, uma diminuição sensível - de 57 % para 52,2 % - do peso das despesas com pessoal, em relação ao montante global das despesas do Ministério. Reconhece-se, todavia, que as despesas de pessoal não deixam de representar ainda, no presente orçamento, um peso que urge reduzir em relação aos restantes sectores que o compõem.
No entanto, a sua diminuição passa, inevitavelmente, por uma reestruturação e redimensionamento das nossas Forças Armadas. Uma tarefa dessa natureza é, por si mesma, complexa e delicada; terá de obedecer a estudos profundos e a análises necessariamente demoradas. Muitas dificuldades haverá mesmo que vencer pelo caminho.
Mas a um princípio ela deverá obedecer, o que se pode denunciar desde já: a melhoria qualitativa que se pretende deve conduzir à existência de umas Forças Armadas integradas, no equilíbrio da capacidade operacional dos ramos que as compõem, com uma estruturação e definição dos meios que a cada um e a todos confira idêntica eficácia, sem prejuízo das especificidades que os caracterizam.
Embora a Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas tenha já quatro anos de vigência, foi, apesar de tudo, o actual governo, pelo Ministério da Defesa
Página 377
19 DE NOVEMBRO DE 1986 377
Nacional, que promoveu a definição do conceito estratégico militar, das missões específicas e do sistema de forças, tendo o Ministro da Defesa Nacional aprovado o dispositivo. Esses textos serão a ossatura da actividade futura das Forças Armadas.
Por outro lado, a publicação da lei orgânica do Ministério da Defesa Nacional será certamente instrumento indispensável para a reestruturação que venho de referir. Não será tarefa fácil e, por isso mesmo, será mais aliciante.
Srs. Deputados: perante o orçamento da defesa nacional que ora vos apresento, duas atitudes são possíveis: a dos que tudo censuram e vertem «lágrimas de crocodilo» sobre um orçamento que sempre consideram insuficiente; a outra, que se afigura saudável, pela qual é forçoso reconhecer que o Governo, ao apresentá-lo com os montantes que compreende, efectua um gigantesco esforço financeiro para dotar as Forças Armadas do equipamento que merecem a competência e a dedicação dos seus servidores. Este Orçamento procura e consegue, pois, o equilíbrio entre a política global de contenção do défice no médio prazo e a satisfação das necessidades essenciais e prioritárias da instituição militar.
Cumpre ainda que se sublinhe o seguinte: as Forças Armadas são, sem dúvida, a instituição que, em primeiro linha, defende a Nação de qualquer ameaça externa e garante a independência da Pátria. Mas se em tais casos são as armas o argumento dissuasor e decisivo - e por isso é preciso tê-las e sabê-las manejar -, não é menos certo que a vontade de defesa resulta muito, e também do desenvolvimento do espírito cívico e do culto dos mais caros valores que nos definem como Pátria.
E essa, a vontade inquebrantável de lutar pela nossa independência e pela nossa liberdade, há-de ser fruto do desenvolvimento integral de todos e de cada português, o mesmo é que dizer do seu progresso cultural, moral, cívico e económico. E lutar por esse desenvolvimento é um dever de Estado que recai sobre todos nós.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A defesa nacional não se esgota, portanto, na defesa armada - ela é um dos seus vectores.
Mas porque é, sem dúvida, ela a garante última da nossa liberdade e soberania, eis a razão pela qual o Governo dedicadamente se empenha (dentro dos limites das possibilidades de uma Pátria que outros quase arruinaram) na sua modernização, acréscimo de eficácia e defesa no seu prestígio e dignidade.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Muito me fica por dizer, mas não quero abusar do tempo de VV. Ex.a' Estou, porém, à vossa disposição para quaisquer esclarecimentos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Ministro da Defesa, não quero crer que a forma um pouco abrupta como V. Ex.º foi levado a intervir se traduza numa
memorização das questões da defesa nacional neste debate. Portanto, penso que seria útil, dentro dos limites do razoável, que ele se pudesse prolongar, para que V. Ex. e pudesse esclarecer a Câmara sobre questões que se suscitam e em relação às quais continuamos a ter fundadas dúvidas. Assim, e muito sucintamente, irei colocar-lhe duas questões.
A primeira é a de saber se V. Ex.ª considera que o orçamento da defesa é aquele que as Forças Armadas entendem como o estritamente necessário ao cumprimento das missões que a Constituição lhes atribui, mesmo na ausência de um conflito militar.
Julgo importante que neste debate fique claro qual é a perspectiva que as Forças Armadas têm sobre o orçamento da defesa que estamos agora a discutir aqui.
A segunda questão, que me parece igualmente importante, é a seguinte: a dado passo da sua intervenção V. Ex. e disse que, provavelmente, a breve prazo - creio que foi a expressão que utilizou - poderia vir a ser suprida a eventual exiguidade das verbas, designadamente em termos de despesas correntes, que se consta existir no actual orçamento das Forças Armadas. Assim, gostaria de lhe perguntar se esse juízo implica, na perspectiva do Sr. Ministro da Defesa, a possibilidade de um orçamento suplementar destinado a suprir essas deficiências ou se, quando refere o «breve prazo», V. Ex. e está a pensar no Orçamento para 1988.
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra para formular pedidos de esclarecimento, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Naturalmente que é um pouco difícil, depois do alcance que teve a introdução deste debate neste momento, não deixar de dizer aquilo que é preciso dizer agora, pese embora o tempo que tal possa levar.
Sr. Ministro da Defesa, a questão que aqui está colocada é muito simples: V. Ex.ª entendeu caracterizar a posição da Comissão Parlamentar da Defesa Nacional, quando analisou o orçamento da defesa nacional, como uma posição de «azedume», não tenha qualquer dúvida sobre isso, pois está registado no Diário da Assembleia.
Foi no quadro daquilo que é dito peia Comissão Parlamentar de Defesa Nacional - e não tenho mandato para defendê-la - que V. Ex.ª considerou que a postura da Comissão foi uma postura de «azedume», nomeadamente quando - e disse-o - excluiu arbitrariamente certas verbas para fazer comparação com as verbas do ano anterior. Disse que não era legítimo aquilo que é perfeitamente legítimo para comparar verbas de funcionamento normal. Referiu mesmo as «lágrimas de crocodilo» - são expressões suas, Sr. Ministro - e a crítica fácil. E tudo para quê?
Sr. Ministro, devo dizer-lhe que foi numa posição de diálogo franco com V. Ex.«' que a Comissão de Defesa Nacional se colocou, o qual correspondia a uma postura responsável perante uma questão de interesse nacional, como o era a questão das opções que estavam a ser feitas em matéria de defesa nacional e foi nesse quadro que o relatório elaborado pela Comissão Parlamentar de Defesa foi apresentado.
Existem críticas ao Orçamento e críticas reais fundamentadas. Vamos a elas.
Sr. Ministro, pode ser fácil dizer ou vir aqui com números acerca do que é ou pode ser a lei de progra-
Página 378
378 1 SÉRIE- NÚMERO 12
mação militar apresentada pelo Governo, mas o que é facto é que a Assembleia da República já há muito tempo reclama essa proposta de lei. E,devo dizer-lhe, Sr. Ministro, que se ela apareceu não foi por boa vontade dos governos! Ela apareceu por insistência construtiva da Assembleia da República, que quer assumir com clareza as responsabilidades do Estado em matéria de defesa nacional. Portanto, se o Sr. Ministro e o seu governo apresentaram essa proposta de lei, devo dizer-lhe que isso foi uma vitória da Assembleia da República e não do Governo.
A segunda crítica vai no sentido de lhe dizer que não subestime as questões do funcionamento das Forças Armadas, as quais representam neste momento uma questão central. Se a capacidade de treino operacional e de sustentação das Forças Armadas corre riscos pelo baixo valor de evolução das despesas de manutenção e funcionamento, então são as opções centrais em matéria de defesa nacional que estão em questão. Se as Forças Armadas, de alguma forma, em múltiplos contactos que tiveram com a Comissão Parlamentar de Defesa Nacional - e não estou a falar do que foi dito nem daquilo que deixou de ser dito na imprensa -, têm sucessivamente levantado essa questão, é porque de facto ela merece toda a atenção por parte dos responsáveis políticos.
O Sr. Ministro caracterizou o orçamento do seu Ministério dizendo que era de modernidade; no entanto, a Comissão caracterizou-o como um orçamento de continuidade e eu sustento isso. Este é um orçamento de continuidade, que não corresponde às questões centrais, às questões mais importantes que se colocam em termos das necessidades das Forças Armadas e da defesa nacional.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem A palavra o Sr. Deputado Ricardo Barros.
O Sr. Ricardo Barros (PS): - Sr: Ministro da Defesa, disse V. Ex.ª na intervenção que acabou de produzir que este era um orçamento de inovação e modernidade. Ora, como é que V. Ex. e explica esta sua afirmação quando, dos quadros que nos foram fornecidos, sabemos que a verba destinada ao treino operacional dos três ramos das Forças Armadas é de tal forma reduzida que as reservas estratégicas podem, de facto, ser postas em causa? ... A não ser que se efectuem sem prejuízo de utilização! ...
Como é que V. Ex.ª explica que este orçamento da defesa nacional seja moderno e grandemente inovador?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Defesa.
O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Começo por dizer ao Sr. Deputado João Amaral que, quando me referi às «lágrimas de crocodilo», obviamente que não estava de maneira nenhuma a referir-me a si em especial nem a nenhum dos membros da Comissão!
O Sr. João Amaral (PCP): - Nem à Comissão?!
O Orador: - Nem à Comissão, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Então, á quem é que se estava a referir?
O Orador: - O Sr. Deputado sabe perfeitamente que nos últimos tempos tem havido todo um universo de censuras e de lamentos por parte de pessoas que nada têm a ver com a Comissão de Defesa - tanto quanto julgo, pelo menos estou absolutamente convencido disso - no sentido de fazerem apreciações desse tipo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - E vem à Assembleia da República referir-se a essas pessoas?
O Orador: - O Sc. Deputado João Amaral sabe perfeitamente que o meu relacionamento com a Comissão de Defesa tem sido de tal maneira franco, leal e aberto que, se eu tivesse de dizer isso a respeito da Comissão, dizia-o clara e expressamente. Mas, de certeza, não me estava a referir à Comissão Parlamentar de Defesa.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Ministro, posso fazer-lhe uma pergunta?
O Orador: - Com certeza, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Ministro, a questão que se levantou aqui refere-se a questões concretas que o Sr. Ministro colocou. O Sr. Ministro disse que o Orçamento não era de continuidade; no entanto, isso está escrito no relatório da Comissão; disse que tinham sido excluídas verbas, fazendo com base nisso comparações, mas 'isso foi feito na Comissão, e disse ainda que tinham sido vertidas «lágrimas de crocodilo» em torno de questões concretas de política de defesa, e com isso queria referir-se ao que foi feito na Comissão. Não foram vertidas as «lágrimas», mas sim formuladas críticas.
Então o que disse não se refere ao relatório da Comissão, Sr. Ministro?
O Orador: - Sr. Deputado, na Comissão com certeza que não lho podia dizer, porque a Comissão só emitiu o relatório muitos dias depois de ter estado comigo!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não se percebe! Não joga!
Uma voz do PS: - Isto promete!
O Orador: - Sr. Deputado, embora não me tivesse preocupado com uma análise exaustiva do parecer da Comissão de Defesa Nacional em termos de números, não deixarei de sublinhar que aí se diz que se regista um aumento global de 21,74%, decorrente da aquisição das fragatas, do CEIOTAM, etc. A seguir acrescenta-se: «Com efeito, excluídas as verbas atrás referidas, mais a que se reporta à lei de programação militar anunciada, e comparando com o Orçamento de 1986, igualmente expurgado dessas rubricas, o aumento real do Orçamento do Estado para 1987, no capítulo da defesa nacional, é de 8,5 01o. Portanto, conclui-se que o aumento real é de 9,66%.»
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Há uma grande diferença!
O Orador: - Posso ainda citar-lhe, a título exemplificativo, o ponto 5.2, que diz: «As despesas de funcionamento normal com pessoal evoluem a uma taxa
Página 379
19 IDE NOVEMBRO DE 1986 379
de variação de 11,44%. Esta revela-se inferior ao índice de crescimento previsto para a massa salarial da função pública, que virá a ser da ordem dos 11,5% a 11,6%.»
Este cálculo foi feito tomando como base toda a globalidade das despesas com pessoal, mas para que o cálculo fosse legítimo tinham de se tomar apenas as remunerações certas e permanentes e as pensões de reserva. Se o Sr. Deputado fizer o cálculo com esta base, verifica que as únicas que estão ligadas nestes termos dão um aumento percentual de 12,58 %. O Sr. Deputado sabe perfeitamente que nas rubricas das despesas com o pessoal entram variadíssimas rubricas que não têm influência neste ponto. Neste sentido, o cálculo não foi bem feito.
Sr. Deputado, disse-lhe há bem pouco tempo que o próprio Ministro da Defesa e o Governo nunca estão satisfeitos com os orçamentos que atribuem, não só em relação às Forças Armadas, como também em relação a todos os sectores da Administração Pública.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faz favor, Sr. Deputado.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Ministro, queria só esclarecer que não disse que as Forças Armadas estavam ou não satisfeitas. Não fiz esse juízo e, em primeira análise, é ao Governo que compete fazê-lo.
O que perguntei é se V. Ex.ª entendia que as Forças Armadas consideram que este orçamento é o estritamente necessário para que elas possam cumprir as missões que lhes atribuem a Constituição e a Lei de Defesa Nacional. É isso que quero saber, porque, para nós, esse é um juízo fundamental.
É claro que, normalmente, como qualquer outro departamento da Administração Pública, as Forças Armadas consideram que seria desejável ter mais verbas. Mas essa não é a questão fundamental. Porque, Sr. Ministro, se as Forças Armadas consideram que os meios que lhes são atribuídos para funcionamento não são os estritamente necessários para que cumpram as suas missões, então estamos perante uma situação extremamente grave, que põe em causa princípios fundamentais da segurança nacional. E não aceito que perante uma situação dessas punhamos a questão como sendo uma opção a fazer entre a saúde ou educação e defesa, como, aliás, já aqui foi feito. Essa não é uma opção legítima. E por isso, Sr. Ministro, para o juízo final que faremos sobre o Orçamento, é fundamental que saibamos qual é o grau de satisfação das necessidades essenciais das Forças Armadas em matéria de funcionamento.
O Orador: - Sr. Deputado, posso responder-lhe.
Estou convencido de que o aumento atribuído este ano às despesas de funcionamento, sem corresponder, realmente, ao que seria desejável para que este pudesse ser mais amplo e mais eficaz, vai corresponder à realização dos propósitos e das missões fundamentais de que as Forças Armadas estão incumbidas, pelo zelo com que sei que estas administram, distribuem e utilizam as verbas que lhes são concedidas. Tenho toda a certeza de que estas missões serão realizadas com limitações, mas sem prejuízo das mesmas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado, no que respeita à sua outra pergunta, como apontei na parte final da minha intervenção, disse-lhe que esperava que uma recuperação económica do nosso país constituísse uma sucessiva prosperidade financeira e económica que nos próximos anos, tanto quanto possível e sem necessidade de orçamentos suplementares, permita atribuir maiores e melhores possibilidades de acção às Forças Armadas e a todos os outros sectores da Administração Pública. Tenho essa esperança e estou na plena convicção de que este governo o vai conseguir, com a eficácia que tem revelado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral, para interpelar a Mesa.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, suponho que o conteúdo das observações que foram feitas ao relatório da Comissão de Defesa Nacional e a importância da matéria que temos em debate, nomeadamente face às críticas que lhe têm sido formuladas, mereceriam que não ficássemos circunscritos a este debate tardio e, naturalmente, limitado. Assim, já que o Sr. Ministro da Defesa Nacional não estará disponível na quarta-feira, proporia que o debate acerca destas matérias pudesse prosseguir na quinta-feira.
Esperaria que, tal como a estou a formular neste momento, também o Sr. Ministro entendesse esta questão como sendo uma questão de Estado que tem a ver com um aspecto importante das opções que, ao assumir o Orçamento, o Estado Português faz em torno das questões de defesa nacional, na medida em que inscreve verbas para esse fim.
Sr. Presidente, propunha, portanto, que este debate pudesse prosseguir na quinta-feira, com eficácia e com utilidade para a questão central e importantíssima que estamos a discutir.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, está feita a sugestão.
Queria informar a Câmara de que, para o debate de amanhã, o Governo dispõe de 91 minutos, o PSD de 107 minutos, o PS de 101 minutos, o PRD de 44 minutos, o PCP de 65 minutos, o CDS de 62 minutos e o MDP/CDE de 19 minutos.
Sr. Ministro da Defesa Nacional, pretende usar da palavra?
O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Sr. Presidente, queria só dizer ao Sr. Deputado João Amaral, bem como a toda Câmara, que é evidente que estou à vossa inteira e completa disposição.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, já terminou?
O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Sr. Presidente, se se requer para quinta-feira o adiamento da continuação dos pedidos de esclarecimento, com certeza que, por agora, terminei, embora me parecesse que seria curial que todas as perguntas me fossem feitas na continuação da minha própria intervenção.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, informo V. Ex.ª de que não há mais pedidos de esclarecimento para além dos que já foram formulados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
Página 380
380 1 SÉRIE- NÚMERO 12
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, não subscrevendo inteiramente a sugestão que foi formulada, porque, além do mais, parece que não é regimental, perguntaríamos ao Sr. Ministro da Defesa Nacional se poderíamos contar com a sua presença nesta Câmara na quinta-feira, porque teríamos intervenções a fazer em matéria de política de defesa nacional e gostaríamos que aquelas pudessem ser objecto de debate e de confronto com as teses que o Sr. Ministro aqui defendeu.
É apenas nesse sentido que gostaríamos de poder ter a confirmação de que o Sr. Ministro estará presente na próxima quinta-feira.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, considerando a intervenção de V. Ex. e como uma interpelação à Mesa, digo-lhe que está aceite a sugestão e certamente o Governo irá considerar a possibilidade de lhe dar resposta ou não.
O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Sr. Presidente, pese embora o facto de não ter legitimidade para discutir figuras regimentais, como já disse e repito, não
deixo de me colocar na plena disposição da Assembleia.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, nada mais havendo a tratar por hoje, declaro encerrados os trabalhos. Recomeçaremos amanhã às 10 horas.
Eram 21 horas e 30 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Paulo Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Henrique Rodrigues Mata.
João Álvaro Poças Santos.
João José Pimenta de Sousa.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim da Silva Martins.
José Angelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Mendes Melo Alves.
Licínio Moreira da Silva.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Moreira.
Valdemar Cardoso Alves.
Partido Socialista (PS):
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Magalhães Silva.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Carlos Manuel Pereira Pinto.
Eduardo Ferro Rodrigues.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
João Rosado Correia.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Manuel Torres Couto.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Partido Renovador Democrático (PRD):
António Eduardo de Sousa Pereira.
Carlos Correia Gago.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
José Carlos Torres Matos de Vasconcelos.
José Luís Correia de Azevedo.
José Rodrigo da Costa Carvalho.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Vítor Manuel Ávila da Silva.
Vítor Manuel Lopes Vieira.
Partido Comunista Português (PCP):
João Carlos Abrantes.
José Manuel Antunes Mendes.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Centro Democrático Social (CDS):
Abel Augusto Gomes de Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Henrique José Pereira de Moraes.
Hernâni Torres Moutinho.
João Gomes de Abreu Lima.
João da Silva Mendes Morgado.
Joaquim Rocha dos Santos.
Narana Sinai Coissoró.
Deputado independente:
Rui Manuel Oliveira Costa.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Adérito Manuel Soares Campos.
Amândio Anes de Azevedo.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
João Luís Malato Correia.
José de Vargas Bulcão.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Página 381
19 DE NOVEMBRO DE 1986 301
Partido Socialista (PS):
Jaime José Matos da Gama.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Partido Renovador Democrático (PRD):
António Alves Marques Júnior.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Eurico Lemos Pires.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Fernando Pinho da Silva.
Luís Augusto Pestana Mourão.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Joaquim Gomes dos Santos.
Octávio Rodrigues Pato.
Centro Democrático Social (CDS):
Eugénio Nunes Anacoreta Correia.
Horácio Alves Marçal.
José Augusto Gama.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
OS REDACTORES: José Diogo - Maria Amélia Martins Maria Leonor Ferreira.
Página 382
PREÇO DESTE NÚMERO: 294300
Depósito legal n. º 8818/85
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.