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DIÁRIO

da ASSEMBLEIA

Quarta-feira, 11 de Março de 1987

PORTE PAGO

IV LEGISLATURA

REUNIÃO PLENÁRIA DE 10 DE MARÇO DE 1987

Presidente: Exmo. Sr. António Alves Marques Júnior

Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes

José Carlos Pinto Basto Mota Torres

Rul de Sá e Cunha

João Carlos Abrantes

SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 45 minutos.
Deu-se conta de diplomas entrados na Mesa.
A Câmara aprovou um voto de pesar pela morte do Prof. Paulo Quintela.
Sob a forma de Interpelação à Mesa, os Srs. Deputados Jorge Sampaio (PS). Carlos Carvalhas (PCP) e Magalhães Mota (PRD) referiram-se ao facto de o Governo não ter facultado à Assembleia o teor das propostas da Comissão da Comunidade Económica Europeia no que respeita às reformas que vão ser discutidas na Comunidade, tendo a este propósito os Srs. Ministros dos Negócios Estrangeiros (Pires de Miranda) e Adjunto e para os Assuntos Parlamentares (Fernando Nogueira) dado alguns esclarecimentos.
Após a leitura, pelo Sr. Deputado Silva Lopes (PRD) do relatório da Comissão de Integração Europeia sobre o Acto Único Europeu, realizou-se um debate em que intervieram, a diverso título, além dos Srs. Ministros dos Negócios Estrangeiros (Pires de Miranda), Adjunto e para os Assuntos Parlamentares (Fernando Nogueira), do Plano e da Administração do Território (Valente Oliveira) e os Srs. Secretários de Estado da Integração Europeia (Costa Martins) e do Desenvolvimento Agrário (Arlindo Cunha), os Srs. Deputados Lopes Cardoso (PS), Ilda Figueiredo (PCP), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Rogério de Brito (PCP), Cristina Albuquerque (PRD), António Osório e Carlos Carvalhas (PCP), João Cravinho e Jorge Sampaio (PS), António Feu e Paulo Campos (PRD), Jaime Gama (PS), Victor Crespo (PSD), Eduardo Pereira (PS), Magalhães Mota (PRD), Guido Rodrigues (PSD), António Esteves (PS), Adriano Moreira (CDS), Vasco Miguel (PSD), Carlos Lllaia (PRD), António Campos e José Frazão (PS), Carlos Laranjeira e Soares Cruz (CDS), Sá Furtado (PRD) e Carlos Brito (PCP).
Após votação na generalidade, na especialidade e final global do projecto de resolução n. º 38/IV - Acto Único Europeu (PRD, PCP, MDP/CDE e PS) - que foi aprovado, proferiu declaração de voto o Sr. Deputado Carlos Brito (PCP).
Entretanto, foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos relativo à substituição de dois deputados do PSD.
Foi também aprovado, na generalidade, o projecto de lei n. º 367/IV (PCP) - Institui um novo enquadramento legal à venda das bombas de carnaval, tendo em vista a segurança dos cidadãos e, em especial, das crianças.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 45 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Monteiro Araújo.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Manuel Lopes Tavares.
Arlindo da Silva André Moreira.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando Barata Rocha.
Francisco Hermínio Pires dos Santos.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Rodrigues Mata.
João Domingos Abreu Salgado.
João Manuel Nunes do Valle.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Augusto Limão de Andrade.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Bota.

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José Mendes Melo Alves.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís Jorge Cabral Tavares de Lima.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Américo Albino Silva Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Miguel Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Hermínio da Palma Inácio.
Jaime José Matos da Gama.
João Rosado Correia.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa.
José Apolinário Nunes Portada.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui Fernando Pereira Mateus.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
António Alves Marques Júnior.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
Bártolo de Paiva Campos.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Fernando Dias de Carvalho.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Emanuel Corujo Lopes.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo C. da Costa Carvalho.
Manuel Gomes Guerreiro.
Maria Cristina Albuquerque.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Paulo Manuel O. Guedes de Campos.
Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.

Partido Comunista Português (PCP):

António Anselmo Aníbal.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alberto de Brito.
Carlos Manafaia.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Carios Abrantes.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Estêvão Correia da Cruz.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Henrique Manuel Soares Cruz.
Joaquim Augusto Garcia M. Pinto.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Manuel Afonso Almeida Pinto.
Pedro José del Negro Feist.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Manuel do Carmo Tengarrinha.

Deputados independentes:

Maria Amélia Mota Santos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início a esta sessão, embora não esteja presente nenhum Sr. Deputado do CDS. Confirmei junto desde grupo parlamentar que não está presente nenhum Sr. Deputado, mas creio não haver inconveniente, cumpridos que foram os requisitos formais e regimentais, que se inicie a sessão.
O Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: o projecto de lei n.º 383/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Rogério de Brito e outros, do PCP, propondo condicionamento de plantação de eucaliptos, que foi admitido e baixa à 6.ª Comissão; o projecto de lei n.º 384/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Magalhães Mota, e outros, do PRD, sobre a responsabilidade criminal, dos titulares dos órgãos políticos, que igualmente foi admitido, baixando à 1.ª Comissão; o projecto de resolução n.º 37/IV, apresentado pela Comissão de Integração Europeia, sobre as medidas de execução, do Acto Único Europeu, que também foi admitido, e o projecto de resolução n.º 38/IV, apresentado pelo PRD, pelo PCP, pelo MDP/CDE e pelo PS, também sobre o Acto Único Europeu, que igualmente foi admitido.
Deu ainda entrada na Mesa um voto a que o Sr. Presidente vai fazer referência.

O Sr. Presidente: - Deu entrada na Mesa um voto de pesar pela morte do Prof. Paulo Quintela que, por acordo entre os vários grupos parlamentares, será agora lido e votado. Posteriormente, será considerado, em conferência de líderes, o tratamento a dar a este voto, com intervenções ou não dos diversos grupos parlamentares. Nesse sentido, peço ao Sr. Secretário o favor de ler o referido voto de pesar, de que o Sr. Deputado
Lopes Cardoso é o primeiro subscritor.

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O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

A Assembleia da República manifesta o seu mais profundo pesar pela morte do Prof. Paulo Quintela.
Mestre de muitas gerações académicas, homem de cultura, credor do respeito e admiração do País, que serviu como poucos, e da universidade a que deu o melhor de si mesmo, democrata que nunca escondeu o seu pensamento e sempre assumiu com indomável coragem a sua posição cívica, o Prof. Paulo Quintela permanecerá como exemplo imperecível.
No desaparecimento deste modelo de cidadão vertical e mestre universitário a Assembleia da República apresenta à Universidade de Coimbra e à família enlutada o seu mais sincero pesar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa vai pôr à votação este voto de pesar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do CDS.

Srs. Deputados, a Mesa não tem grandes dúvidas mas, de qualquer modo, confronta-se com a mesma situação de há pouco que não deixa de ser desagradável, pelo que gostaria de pôr novamente à consideração do Plenário o facto de darmos início a um debate desta importância - e penso que toda a gente o considera relevante -, não estando presente ninguém do Grupo Parlamentar do CDS. Contudo, penso que não poderíamos atrasar por mais tempo os nossos trabalhos e, embora lamentando esta situação, creio que temos mesmo de dar inicio à sessão, a menos que haja alguma objecção especial de algum dos Srs. Deputados.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, se não há ninguém do Grupo Parlamentar do CDS lá dentro, pois, entendo...

O Sr. Presidente: - A Mesa fez as diligências necessárias, contactou várias vezes o grupo parlamentar e informou, inclusivamente, que ia dar início aos trabalhos.

O Orador: - Não sei, Sr. Presidente, se houve algum problema. É que ainda ontem alguns Srs. Deputados pensavam que a sessão começava hoje às 15 horas e talvez tenha sido esse o motivo. Não sei ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, admito que essa seja a razão fundamental porque verifiquei que, de facto, ainda ontem pessoas das próprias direcções dos grupos parlamentares não tinham a certeza da hora a que teria início a sessão, mas isto foi referido e eu tive o cuidado, na sexta-feira, antes de interromper os trabalhos, de chamar mais uma vez a atenção para o facto de que o inicio dos trabalhos era às 10 horas e não às 15 horas, como é habitual.

Pausa.

Portanto, não havendo mais nenhuma objecção, vamos mesmo continuar e dar início aos trabalhos do período da ordem do dia, relativamente ao debate que hoje nos ocupa em especial. A este propósito gostaria ainda de informar os Srs. Deputados que, no que se refere aos tempos que foram distribuídos, o Governo, através do Sr. Ministro-Adjunto para os Assuntos Parlamentares, solicitou ao Sr. Presidente da Assembleia da República que o tempo do Governo fosse acrescido de mais quinze minutos, para os quais encontrou e deu as justificações que considerou pertinentes.
O Sr. Presidente deu conhecimento a todos os grupos parlamentares deste pedido e manifestando ele próprio, Sr. Presidente, que provavelmente não haveria objecções da parte dos grupos parlamentares e de certo modo, contando com a vossa generosidade, manifestou ao Sr. Ministro Adjunto que provavelmente a pretensão do Governo seria concedida.
A Mesa, portanto, concedeu mais quinze minutos ao Governo, já depois de ter falado com os diversos grupos parlamentares e, naturalmente, usará de alguma benevolência, mas uma benevolência que terá de ser racionalizada, relativamente aos outros partidos e relativamente ao tempo que lhes foi atribuído.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, a posição do Grupo Parlamentar do PS, como teve ocasião de comunicar ao Sr. Presidente da Assembleia da República e, esta manhã, ao Sr. Presidente em exercício, é de não obstar de maneira nenhuma à solicitação do Governo. Não temos nada a obstar e se o Governo considerasse necessário mais tempo que aquele que pediu, teria obviamente o nosso acordo, dada a importância da matéria em debate.
A questão para nós, no entanto, é que esta atribuição legítima de tempo suplementar ao Governo não deve ter como contrapartida a benevolência da Mesa em relação aos diferentes grupos parlamentares, mas deve ter um tratamento igual. E a posição do PS, que nós exprimimos e mantemos, é que se conceda ao Governo o tempo que ele solicite e se conceda aos diferentes grupos parlamentares, na respectiva proporção, o tempo que decorrerá do alargamento do tempo concedido ao Governo.
Neste quadro, não temos nada a objectar, tendo em conta a solicitação do Governo e a importância do debate.
Propomos que seja alargado o tempo do Governo e, proporcionalmente, o tempo acordado para os diferentes grupos parlamentares, que o usarão ou não, consoante entendam. Mas isso é um problema de cada um dos grupos parlamentares e não a contrapartida, que não pode ser, do nosso ponto de vista, uma maior ou menor benevolência por parte da Mesa.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Vou dar a palavra ao Sr. Deputado Magalhães Mota, que pediu para interpelar a Mesa, mas antes gostaria de dizer que não deveríamos gastar meia hora a discutir os tempos que foram atribuídos para intervir no debate.

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O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, há duas questões que pretendo colocar.
Em primeiro lugar, devo dizer que nada temos a objectar ao pedido do Governo no sentido de obter mais tempo do que aquele que foi acordado na conferência de líderes parlamentares e na qual o Governo também esteve presente. Aliás, pensamos que igual regra deve ser seguida em relação aos grupos parlamentares.
Em segundo lugar, gostaria de dizer que em relação à matéria estipulada para hoje e que consta da agenda que foi atribuída, pensamos que há um lapso, e para ele chamamos a atenção da Câmara. No ponto 1.2 da ordem do dia refere-se apenas a discussão do projecto de resolução n.º 32/IV, apresentado pelo PCP, relativo à aprovação do Acto Único Europeu. Ora bem, por arrastamento verifica-se a subida do projecto de resolução n.º 37/IV e, portanto, também ele deve ser discutido e votado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, o Sr. Secretário da Mesa que secretariou a conferência de líderes parlamentares informa-me que não houve consenso relativamente ao agendamento desse projecto de resolução a que o Sr. Deputado se refere.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, não houve consenso, mas houve marcação. Quer dizer, a regra seguida e assente nesta Casa é a de que quando há mais que um diploma sobre o mesmo assunto eles teriam, necessariamente, que ser discutidos conjuntamente. Ora, foi precisamente isso que resultou da conferência de líderes parlamentares depois de não ter havido consenso quanto ao agendamento do projecto de resolução n.º 37/IV em relação ao qual primeiro dois partidos e depois apenas um deles não deu esse consenso.
Verificou-se que o projecto de resolução n.º 32/IV, apresentado pelo PCP, tinha de ser agendado, discutido e votado, porque tinha todos os prazos regulamentares. Perante isso e o facto de ser regra desta Casa que dois diplomas sobre a mesma matéria são discutidos conjuntamente, o projecto de resolução n.º 37/IV deve ser discutido em conjunto com o projecto de resolução n.º 32/IV.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, apenas quero confirmar que, embora sem o nosso voto favorável, está agendado o projecto de resolução a que alude o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Presidente: - Certamente, Sr. Deputado.
Sendo assim, a Mesa corrige a ordem de trabalhos estipulada para hoje e ao ponto 1.2 acrescenta a discussão do projecto de resolução n.º 37/IV. Está, pois, encerrado este incidente.
Vamos agora passar à discussão do primeiro ponto da nossa ordem do dia.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, gostaria que a Mesa interrogasse o Governo - que se encontra amplamente representado neste debate - no sentido de saber se no início deste debate, cuja importância não é demasiado realçar, ele tenciona pôr à disposição desta Assembleia os documentos que balizam as propostas da Comissão da Comunidade Económica Europeia no que respeita às reformas que tanto neste como nos próximos anos vão ser discutidas na Comunidade Económica Europeia. Por toda a parte da Europa se têm discutido esse documentos e, oficialmente, a Assembleia da República desconhece-os por inteiro.
Assim, seria interessante saber se no início deste debate o Governo se encontra na disposição de, responsavelmente, facultar aos Srs. Deputados - que são pessoas responsáveis - o teor desses documentos e a evolução que os mesmos já tiveram.

O Sr. Presidente: - Pergunto aos Srs. Membros do Governo se têm algum elemento de informação complementar que possam dar ao Sr. Deputado Jorge Sampaio ou se não desejam pronunciar-se sobre esta matéria.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Pires de Miranda): - Sr. Deputado Jorge Sampaio, os documentos a que se refere não existem como tal; há documentos de trabalho, que ainda não são oficiais.
Na reunião que tive com as Comissões de Negócios Estrangeiros e Emigração e de Integração Europeia, tive oportunidade de - tal como certamente o Sr. Deputado se recordará - abordar os pontos principais que são focados nessas propostas internas da Comissão. Portanto, parece-me não ser oportuno torná-los públicos, isto sem prejuízo de na Comissão poder dar esclarecimentos adicionais.
Logo que os papéis da Comissão se transformem em papéis oficiais, eles não deixarão de ser postos à disposição dos Srs. Deputados.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Ministro, de facto fico um pouco surpreendido, porque durante as reuniões quer da Comissão de Integração Europeia quer da Comissão dos Negócios Estrangeiros e Emigração tivemos ocasião de ver que alguns Srs. Ministros tinham esses documentos. Isto parece uma brincadeira liceal, quer dizer, aquele senhor tem o caderno diário e eu não tenho...
Ora, isto não é assim! Nas revistas da especialidade, nos boletins de informação, nos artigos, nos meios de comunicação social, etc., todos sabem que o presidente da Comissão visitou todas , as capitais europeias exibindo esses documentos, tentando saber a opinião dos vários governos sobre essas propostas. Até já se sabe que há um documento subsequente, que é, digamos assim, a súmula feita pelo presidente da Comissão em torno desta documentação.

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Esta Assembleia está, desde já, colocada num dilema: ou tenta pelos seus canais - e isto porque todos nós nesta Câmara teremos certamente os nossos canais em Bruxelas e às vezes até na comunicação social de Bruxelas - obter os documentos que o Governo devia fornecer, de um ponto de vista responsável, ou então não podemos discutir aquilo que é a posição portuguesa relativamente às grandes linhas de reforma das Comunidades que estão em cima da mesa. Ora, é isto que é preciso esclarecer no início deste debate, sem nenhum interesse demagógico e com o propósito solene, que vai ser reiterado no decurso deste debate, de responsavelmente participarmos nesta discussão, que é nacional.
O Sr. Ministro diz que estes documentos são confidenciais; penso que não são e iremos demonstrá-lo. Mas, se é assim, não é preciso dizer mais nada e tiraremos as conclusões.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: - Sr. Deputado, não disse que os documentos eram confidenciais, eles são é reservados.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Óptimo!

O Orador: - Eles não são confidenciais, acredito que seja possível encontrá-los na comunicação social, mas parece-me que um governo responsável não deve dar a conhecer documentos que são reservados. O facto de eu ter alguns documentos dessa natureza não me permite entregá-los aos Srs. Deputados sem primeiro confirmar com a Comissão da Comunidade se o poderei fazer, porque me foram dados a título reservado. Ora, isto não quer dizer que em comissão eu não discuta com os Srs. Deputados todas as matérias que constam desses pontos e, logo que sejam considerados documentos possíveis de ser tornados públicos, eu os entregue.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, solicito a vossa colaboração e atenção para o assunto que nos traz hoje aqui. Nem sequer iniciámos a discussão desta matéria...

Vozes do PS: - Já, sim, Sr. Presidente!

O Sr. António Capucho (PSD): - Os tempos já estão a ser descontados!

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, o Governo, na reunião que teve connosco, mostrou esses documentos e teve uma postura diferente daquela que hoje está a ter aqui em público. Ora bem, a questão que se coloca é esta: mais uma vez o Governo está a denotar que ele é o único órgão de soberania nas relações com a CEE. Isso é inadmissível!
Mais uma vez vamos iniciar aqui um debate em que muita da informação que se vai debater teve de ser colhida em fontes de outros governos, que a transmitiram aos respectivos parlamentos, mas não do Governo Português. Matéria reservada é matéria que é da competência reservada à Assembleia da República e não são dadas informações para serem discutidas? Isso é inadmissível!
Sabemos que o Governo é relapso e avisamo-lo de que hoje depositaremos na Mesa da Assembleia da República um projecto de lei para que isto não volte a acontecer.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, este caso de os documentos serem reservados parece complicado em termos das relações externas do Estado Português, porque essa informação de reserva foi dada ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, que terá sido iludido na sua boa-fé.
A verdade é que o documento foi distribuído no Parlamento Europeu, circulou e até veio escrito em edição portuguesa. Por outro lado, há uma edição de uma segunda versão do documento, em francês e inglês, publicada em anexo ao Europolitique.
Sr. Ministro, se de facto este documento reservado anda assim em circulação e em tradução, quem iludiu a sua boa-fé?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: - Sr. Deputado Magalhães Mota, o Parlamento Europeu é uma instância comunitária e tudo se passou dentro das instâncias comunitárias.

Risos do PS, do PRD e do PCP.

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares (Fernando Nogueira): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor. Sr. Ministro.

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece-me que estamos aqui a «plissar» sem entrar verdadeiramente no balanço de um ano sobre a integração europeia. Creio que isso é que será o relevante e será a razão que determinou encontrarmo-nos aqui.
De resto, talvez se adivinhe, sobretudo nas palavras do Sr. Deputado do PCP, o desejo de criar aqui um caldo de cultura favorável para que a Assembleia legisle para, mais uma vez, invadir áreas da competência do Governo. Assim, gostaria de denunciar esta situação para que ela não passe em claro.
Os Srs. Deputados não têm razão nenhuma. Como é do vosso conhecimento, em 13 de Janeiro de 1987 o Governo oficiou ao Presidente da Assembleia da República o seguinte:

Tal como o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros tinha referido no dia 17 de Dezembro, durante o primeiro ano após a adesão portuguesa às Comunidades não se levantaram grandes dúvidas sobre quais os interesses dos Portugueses a

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defender. Já para o futuro há que definir grandes linhas, nomeadamente em relação a problemas novos, tornando-se de grande utilidade o diálogo com o Parlamento sobre estas questões.

Nessa mesma altura, o Governo disse ainda:

Assim, vem o Governo, através do gabinete de V. Ex.ª, solicitar a marcação de uma reunião dos responsáveis pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros com a Comissão de Integração Europeia para uma data posterior à vinda a Portugal do
Presidente das Comunidades Europeias, Sr. Jacques Delors, e anterior ao inicio de reuniões entre ministros da Comunidade Económica Europeia sobre os problemas referidos, o que aponta para
os primeiros dias de Fevereiro.

Esta reunião veio a ocorrer por iniciativa do Governo para tratar destas matérias no dia 10 do mês passado e o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros não se escusou a responder a qualquer uma das vossas perguntas nem a prestar-vos qualquer informação que fosse vosso desiderato colher. Que é que os senhores querem mais? Querem mais um conflito com o Governo?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para proceder à leitura do relatório da Comissão de Integração Europeia, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Lopes.

O Sr. Silva Lopes (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O relatório da Comissão de Integração Europeia sobre o Acto Único Europeu tem vinte e duas páginas e inclui também um anexo, com vinte páginas. Não é praticável nem seria apropriado ler aqui esse relatório na íntegra e muito menos o seu anexo. Terei, por isso, de me limitar a ler apenas algumas partes do relatório e apresentar uma ideia geral sobre outras.
O Acto único Europeu foi já discutido em duas sessões plenárias da Assembleia da República, em 7 de Fevereiro e em 17 de Dezembro de 1986. Os debates dessas duas sessões foram marcados com uma antecedência extremamente curta. A Comissão de Integração Europeia ficou, por isso, em ambas as referidas oportunidades, sem qualquer possibilidade prática de proceder a uma análise suficientemente desenvolvida das profundas consequências que o Acto Único pode vir a ter para o nosso país sob os aspectos económico, social e político.
O relatório agora apresentado pela Comissão de Integração Europeia procura colmatar essa deficiência, embora com naturais limitações. O seu objectivo é, basicamente, o de apresentar uma apreciação geral sobre as disposições do Acto Único Europeu que maiores repercussões podem ter sobre as actividades produtivas, a política social, o poder dos órgãos de soberania e as perspectivas de desenvolvimento económico do nosso país.
As disposições do Acto Único podem agrupar-se em três grandes grupos:

As que se referem as instituições comunitárias;
As que respeitem a novos desenvolvimentos da política económica e social das Comunidades;
As que tratam da cooperação dos Estados membros em matéria de política externa.

O relatório apresentado analisa apenas as disposições incluídas nos dois primeiros grupos que acabei de mencionar. A Comissão de Integração Europeia considerou que as disposições relativas à cooperação dos Estados membros em matéria de política externa não caem no âmbito da sua competência. De resto, essas disposições não foram incluídas no Tratado da CEE, ao contrário do que sucede com praticamente todas as demais disposições do Acto Único Europeu.
O presente relatório inclui um anexo com uma nota explicativa sobre a génese histórica e as principais disposições do Acto Único Europeu. A análise apresentada nesse anexo é de natureza essencialmente informativa, mas pareceu útil juntá-lo ao relatório, até porque não se dispunha até há pouco tempo de qualquer nota do Governo sobre o conteúdo das disposições do Acto Único. O Governo apresentou recentemente algumas explicações a respeito de tais disposições no seu documento sobre o balanço do primeiro ano da presença de Portugal nas Comunidades Europeias. Mas a análise contida no anexo do relatório da Comissão é mais completa, apesar das limitações que enferma, do que a análise apresentada no relatório do Governo.
Foi essencialmente com base na nota explicativa contida no anexo ao relatório da Comissão de Integração Europeia que se elaboraram os comentários contidos em tal relatório.
As informações utilizadas para a elaboração do relatório e do seu anexo foram em grande parte as que foram submetidas pelos governos de alguns dos Estados membros da CEE aos seus parlamentos e as que constam de relatórios produzidos nesses parlamentos. É de sublinhar o útil trabalho de compilação dessas informações realizado pelos serviços da biblioteca da Assembleia da República. A Comissão de Integração Europeia beneficiou também substancialmente das exposições que perante ela foram apresentadas pelos deputados ao Parlamento Europeu, Fernando Condesso (PSD) e Barros Moura (PCP). A informação fornecida do Governo Português foi praticamente apenas a que consta dos discursos pronunciados pelo Primeiro-Ministro e pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros nas sessões plenárias da Assembleia da República de 9 de Fevereiro e 17 de Dezembro, acima citadas.
Muitas das deficiências do relatório apresentado e do seu anexo são explicadas pela insuficiência das informações de que a Comissão de Integração Europeia dispôs, nomeadamente no que respeita às medidas mais recentes para concretização das orientações traçadas no Acto Único e às consequências dessas medidas para Portugal.
Para além da introdução, que corresponde basicamente ao texto que acabo de ler, o relatório da Comissão de Integração Europeia está dividido em sete secções, com os seguintes títulos:

Apreciação geral;
Disposições de natureza institucional;
O mercado interno;
A capacidade monetária;
A coesão económica e social;
A investigação e o desenvolvimento tecnológico;
A política de ambiente.

Nestas diferentes secções procura-se analisar os problemas que as disposições do Acto Único podem trazer para Portugal e procura-se apontar as questões que carecem de informações aos estudos adicionais.

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Em face das limitações de tempo que terão de ser observadas nesta minha exposição, não tentarei expor aqui, ainda que de forma resumida, o conteúdo dessas diferentes secções. Poderá, contudo, ficar-se com uma ideia sobre as linhas mestras da análise apresentada a partir das conclusões do relatório, que passo a ler na íntegra.
As consequências do Acto Único Europeu para Portugal dependerão em grande parte das medidas que vierem a ser adoptadas para concretização das orientações e princípios gerais estabelecidos nas suas disposições.
A análise do relatório põe em destaque os pontos seguintes:

a) O chamado «compromisso de Luxemburgo» continuará, por certo, em vigor, embora tudo leve a crer que a sua aplicação se venha a tornar mais difícil do que no passado;

b) O processo de decisão do Conselho das Comunidades tornar-se-á certamente mais célere e eficaz, graças à maior generalização das votações por maioria; subsistem, todavia, possibilidades de bloqueamento através do aditamento das deliberações por tempo indeterminado; em qualquer caso, muito ficará a depender do que vier a ser estabelecido no projectado regulamento do Conselho;

c) O reforço dos poderes do Parlamento Europeu, através nomeadamente do processo de cooperação, não é de molde a proporcionar uma solução adequada para o «vazio democrático» que resulta do facto de as decisões do Conselho das Comunidades não serem sujeitas ao controle a posteriori por órgãos parlamentares;

d) Muitas das medidas de realização do mercado interno terão profundas consequências sobre a economia nacional; torna-se por isso necessário que os serviços da administração portuguesa procedam aos estudos necessários à preparação das posições portuguesas nas deliberações do Conselho relativas à introdução dessas medidas e à introdução de soluções que atenuem as dificuldades provocadas pela maior liberalização da concorrência em sectores que até agora têm beneficiado de protecções;

e) O principio da coesão económica e social é de importância fundamental para o nosso país e deve ser considerado como um complemento indispensável das medidas de liberalização do mercado interno;

f) Enquanto não se proceder à reforma das finanças da Comunidade, haverá razões para recear que continuem a ser muito escassos os recursos afectos aos fundos estruturais da CEE; é de recear que não haja disponibilidades orçamentais suficientes para dar efectiva concretização, em escala substancial, ao principio da coesão económica e social e às novas políticas comunitárias previstas no Acto Único, nomeadamente para os domínios da investigação e desenvolvimento tecnológico e do meio ambiente.

Será necessário reduzir as dificuldades que a Assembleia da República tem sentido em obter informações adequadas sobre as medidas de execução do Acto Único e em preencher, ainda que parcialmente, o vazio

democrático que resulta do facto de não exercer qualquer controle a posteriori sobre as decisões do Conselho de Ministros das Comunidades.
Com esse objectivo, a Comissão de Integração Europeia discutiu uma proposta de resolução sobre elementos informativos necessários ao acompanhamento pela Assembleia da República das medidas de execução do Acto Único Europeu e sobre as orientações que devem ser observadas nessa execução. A proposta de resolução foi depois retomada numa proposta subscrita por deputados de alguns partidos políticos representados nesta Assembleia.

Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, e uma vez que foi referenciado na abertura dos trabalhos a ausência do CDS, gostaria de sublinhar que no início deste debate, que começou com a leitura do relatório da Comissão de Integração Europeia, já estava presente um Sr. Deputado do CDS.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo considera da maior utilidade o diálogo construtivo com a Assembleia da República. Temos prosseguido e intensificado esse diálogo em matéria de política externa, designadamente em reuniões - por vezes por iniciativa do Governo - nas Comissões Parlamentares dos Negócios Estrangeiros e da Integração Europeia. Só em 1987 já se realizaram quatro reuniões, o que mostra o interesse do Governo neste diálogo - contrariamente ao que parece poder concluir-se do relatório da Comissão de Integração Europeia quanto às informações prestadas aos Srs. Deputados. Mas os debates no Plenário, como aquele que agora se inicia, apresentam, também, as suas vantagens.
Na verdade, se não é adequado, aqui, descer ao pormenor técnico próprio do trabalho em Comissão, em contrapartida as afirmações produzidas no Plenário da Assembleia permitem mais fácil repercussão numa opinião pública naturalmente muito interessada em acompanhar e em aprofundar tudo o que diga respeito à integração em curso de Portugal na Europa comunitária. Tal interesse é, de resto, sinal inequívoco do empenhamento posto pelo País, nomeadamente pela sociedade civil, na adesão às Comunidades Europeias e em fazer desta nova situação uma oportunidade única de modernização e progresso.
Ora o empenho que o Governo põe no diálogo com esta Câmara sobre questões europeias tem muito a ver, também, com a circunstância feliz de, quanto à integração de Portugal nas Comunidades Europeias, bem como, aliás, quanto às outras grandes prioridades da política externa nacional, existir um largo consenso entre as forças democráticas, representadas no Parlamento em enorme maioria. Assim, é comum aos partidos democráticos o desejo de tornar um êxito a adesão de Portugal às Comunidades e de contribuir, dessa maneira, não só para a definitiva consagração da opção democrática do povo português e para acelerar a modernização do País, como para construir uma Europa mais unida e mais forte e, portanto, mais capaz de preservar os valores de liberdade que nos são caros. Estar na Europa comunitária traduz uma opção polí-

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tica dos Portugueses, opção que os partidos democráticos assumem inequivocamente desde há mais de dez anos.
Naturalmente que divergimos por vezes nos meios a empregar e nas medidas concretas a tomar - mas, Governo e partidos democráticos, apoiando o Governo ou na oposição, ninguém entre nós tem dúvidas quanto aos objectivos a atingir. E tal identidade de propósitos e de opções de base torna o nosso diálogo particularmente construtivo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que temos boas razões para nos congratularmos. Os catorze meses que decorreram desde a adesão de Portugal às Comunidades Europeias trouxeram-nos, de facto, a consoladora certeza de que entrámos com o pé direito. Para muita gente, em Bruxelas, fomos a «agradável surpresa», pois não estavam à espera que demonstrássemos tanta capacidade de resposta. Mas até a alguns de nós próprios tal demonstração de capacidade surpreendeu. Quem diria há um ano e tal que a Administração Pública portuguesa se movimentaria já com tanto à-vontade nos meandros comunitários e que fôssemos capazes de aproveitar, com tanta eficácia, os fundos comunitários que só afluiriam ao País caso apresentássemos, como apresentámos, projectos válidos e viáveis? Ou que o sector privado nacional se orientasse tão prontamente para as novas oportunidades, como ressalta, por exemplo, da aceleração das exportações para o mercado espanhol ou do número espectacular de empresários agrícolas que, nos últimos meses, se candidataram às ajudas comunitárias? Ou, ainda, que o nosso país fizesse ouvir a sua voz, de forma tão nítida, na formulação de posições comunitárias em matéria de política externa?
Para permitir um balanço objectivo do primeiro ano de Portugal nas Comunidades Europeias, o Governo elaborou e distribuiu um pequeno livro contendo os elementos mais relevantes registados em 1986. Os Srs. Deputados conhecem a publicação e, por isso, não vou entrar agora numa análise pormenorizada sobre esse primeiro ano. Lembrarei, apenas, que o desafio posto às energias nacionais pela adesão às Comunidades Europeias exige uma boa articulação entre a frente interna (essencialmente todo o conjunto de reformas a levar a cabo pelo Estado, pelas empresas e pelos particulares) e a frente externa, ou seja, a condução da «negociação permanente» em que, na prática, se traduz sempre a nossa integração na Europa Comunitária. No decurso deste primeiro ano de Portugal nas Comunidades - precisamente quando a novidade das tarefas poderia ser fonte de perturbação - foi possível conseguir, em medida muito apreciável, aquela articulação.
De um modo geral, poderá dizer-se que o País se foi habituando à vida comunitária - sem sobressaltos, com a normalidade e a naturalidade de quem se sente europeu e capaz de responder aos desafios que a integração coloca. Esta progressiva e natural integração da sociedade portuguesa nas Comunidades, nos mais variados planos em que ela se desdobra, constitui, porventura, o traço mais positivo do tempo decorrido após a adesão.
Na frente externa, que especificamente cabe ao Ministério dos Negócios Estrangeiros conduzir, foi possível concluir, com apreciável sucesso, negociações sobre vários pontos deixados em aberto ou não contemplados no Tratado de Adesão. Foi o que aconteceu, por exemplo, com as regras de origem nas trocas comerciais luso-espanholas, ou com o condicionalismo da exportação têxtil nacional - que, graças aos arranjos obtidos, entra hoje livremente nos países da Comunidade, à excepção de Espanha, e também nos mercados dos nossos antigos parceiros da EFTA. Igualmente se conseguiram resultados satisfatórios, e até porventura inesperados para muitos observadores, no quadro da superação do conflito comercial entre a CEE e os Estados Unidos. E negociaram-se igualmente os regulamentos indispensáveis à entrada em vigor do Programa Específico de Desenvolvimento da Agricultura Portuguesa - PEDAP, lançando-se simultaneamente as bases para se concretizar um programa destinado à indústria, o PEDIP. Concluiu-se, por outro lado, a revisão dos acordos da CEE com os países mediterrânicos, área delicada onde lográmos salvaguardar os nossos interesses.
Na frente interna, deram-se passos importantes para dinamizar os vários sectores face às novas perspectivas abertas pela adesão. É sectorialmente, e sobretudo ao nível microeconómico, que os grandes esforços de modernização têm de fazer-se. Claro que é importantíssima a função das directivas e políticas governamentais, bem como dos investimentos públicos em infra-estruturas. Mas o papel realmente decisivo cabe, em última análise, aos empresários.

E entre eles não excluo, como é evidente, os investidores estrangeiros, que convém atrair activamente, sobretudo quando tragam mercados de exportação e tecnologias, designadamente de gestão empresarial. Tudo o que fizermos neste sentido, e em particular no capítulo da adequada legislação e da desburocratização, será benéfico para o País.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O ano de 1986 fechou com um saldo positivo para Portugal de mais de 30 milhões de contos nos fluxos financeiros com a Comunidade. Refiro este número porque ele constitui, a vários títulos, um indicador significativo - e não porque considere que os efeitos dinâmicos da adesão na modernização da economia e da sociedade portuguesas se reduzam a esse tipo de contabilidade.

E trata-se de um indicador significativo porque não só as previsões iniciais dos próprios serviços apontavam para valores substancialmente mais modestos, como porque se chegou a levantar a hipótese, por vezes apresentada como uma quase inevitabilidade, de Portugal ser um contribuinte líquido para as Comunidades Europeias logo no primeiro ano de adesão.

Como se vê, tal hipótese, totalmente inaceitável como muitas vezes o afirmou o Governo, esteve longe de se concretizar. Mas isso não aconteceu por acaso ou por sorte: foi possível chegar a um saldo superior a 30 milhões de contos, graças a um esforço e a uma atenção constantes, de maneira a não deixar de aproveitar qualquer oportunidade susceptível de trazer benefícios para Portugal.

Assim continuaremos a proceder na «negociação permanente» de Bruxelas, conscientes de que estamos na Europa para, a ajudar a construir, sem dúvida, mas no pleno respeito pelos interesses nacionais que cabe ao Governo defender. Encaro, por isso, com confiança o nosso futuro na Comunidade, particularmente os próximos tempos, que serão de intensa negociação, certo de que os habituais profetas da desgraça continuarão a ser desmentidos pela realidade. Mas não escondo que

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vai ser difícil. Muito dependerá de nós, do nosso esforço, mas também existem factores importantes fora do nosso alcance.
Dois grandes temas, aliás, interligados, suscitam a nossa atenção prioritária: a concretização do Acto Único Europeu e as reformas de fundo nas finanças comunitárias.
Quanto ao Acto Único, foi, como se sabe, possível conseguir naquele documento a consagração expressa do princípio da coesão económica e social, isto é, do objectivo comunitário de contribuir para a redução das disparidades de desenvolvimento entre as várias regiões europeias, implicando uma intervenção activa para acelerar o crescimento das mais atrasadas. Este imperativo de coesão deve traduzir-se em medidas concretas, designadamente naquela que há-de levar à constituição efectiva de um grande e unificado mercado interno europeu. O Sr. Secretário de Estado da Integração Europeia irá referir-se, mais em pormenor, às incidências deste mercado para Portugal. Mas não quero deixar de sublinhar que, dada a estreita dimensão do nosso mercado nacional, o País em princípio só tem a ganhar com o derrubar de fronteiras comerciais e de entraves mais ou menos explícitos à livre circulação de bens e serviços. Não temos que recear a concorrência: somos tão bons e tão competitivos como os outros, desde que estejamos dispostos a encarar a sério o desafio europeu.
Mas é evidente que, dado o estádio de desenvolvimento da nossa economia, as providências tendentes à concretização do mercado interno europeu terão de ser seguidas por nós com grande atenção. Todas essas medidas terão de ser vistas pela Comunidade à luz do princípio da coesão. Nesse sentido foi já montada, no quadro da Administração Pública portuguesa, uma adequada estrutura de acompanhamento.
A realização do mercado interno europeu - que aplaudimos e desejamos - implica para Portugal um esforço adicional em relação às tarefas necessárias para dar cumprimento às obrigações do Tratado de Roma. Importa levar a cabo tal esforço, com tudo o que ele envolve de reformas internas. É a própria modernização do País que aqui se joga.
O objectivo de concretizar, até 1992, um grande espaço europeu onde circulem de facto livremente pessoas, bens, serviços e capitais, constitui um marco fundamental na construção da Europa do futuro. Mas esse objectivo não se esgota em si próprio. Interessa, afinal, construir a Europa dos cidadãos, onde cada pessoa sinta no concreto e no quotidiano a dimensão europeia da sua existência e quanto isso vale para a sua própria realização humana.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como membro das Comunidades, Portugal está naturalmente preocupado com os problemas que dificultam um mais rápido progresso de integração europeia, particularmente a bem conhecida crise financeira e orçamental.
O volume de recursos financeiros próprios da Comunidade é insuficiente e não permite concretizar, nos próximos tempos, as indispensáveis acções tendentes a obter a convergência das economias e, assim, a realização efectiva de um mercado interno europeu sem barreiras. Há, por isso, que aumentar recursos próprios, bem como caminhar no sentido de se adoptar, um critério mais justo (porque mais proporcional à riqueza de cada Estado membro) de captação de recursos.

Mas apenas aumentar recursos não chega: importa que se gaste melhor o dinheiro comunitário. Por isso o aumento de recursos próprios deverá ser acompanhado de compromissos sérios quanto à reforma dos fundos estruturais e da política agrícola comum.
Os pontos de vista indicados pela Comissão são um bom ponto de partida para aquilo que se revelará, sem dúvida, uma longa e dura negociação entre os «Doze».
Nestas novas batalhas, não diminuiremos o nosso empenhamento na defesa dos interesses nacionais. Mas gostaria de terminar sublinhando que do interesse de Portugal também faz parte o sucesso das Comunidades Europeias.
Os problemas que se levantam ao progresso da integração europeia não são fáceis. Mas não são insolúbeis, desde que haja vontade política e confiança no futuro da Europa.
Portugal entrou para a Europa comunitária, porque acredita no ideal europeu. Noutros tempos, fomos os grandes difusores da cultura e dos valores europeus no mundo. Agora, o nosso papel como europeus é outro, mas não necessariamente menos exaltante.
Continuaremos a saber estar à altura dos desafios.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Lopes Cardoso, Ilda Figueiredo, João Corregedor da Fonseca, Rogério de Brito, Cristina Albuquerque, António Osório, Carlos Carvalhas, João Cravinho e Jorge Sampaio.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, a minha pergunta é muito simples e concreta, mas parece-me pertinente no momento em que se inicia este debate.
É a seguinte: qual é a posição do Governo quanto à realização de eleições para o Parlamento Europeu?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, às consequências negativas da adesão no plano económico e social, para as quais temos vindo a alertar, somou-se uma inconstitucional governamentação dos processos com obstrução das normais competências da Assembleia da República, a proliferação de práticas secretistas, o uso eleitoralista pelo Governo dos fundos estruturais, a desarticulação das acções, nomeadamente no uso das verbas do Fundo Social Europeu, a multiplicação de negócios à sombra da adesão.
Talvez hoje aqui o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros possa esclarecer - o que o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social ainda não fez - a forma como têm sido utilizadas as verbas do Fundo Social Europeu.
Talvez hoje fiquemos a conhecer os resultados dos relatórios e auditorias sobre as acções financiadas pelo Fundo Social Europeu que o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social disse ter já em seu poder, na reunião preparatória que fez com a Comissão de Integração Europeia quando se preparava este debate.
Por outro lado, Sr. Ministro, como é sabido, os desequilíbrios externos da economia portuguesa, apesar de estarem momentaneamente anestesiados pela cotação do

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petróleo e outras matérias-primas, pela baixa das taxas de juro, continuam a pesar na economia portuguesa e acondicionar fortemente o crescimento futuro.
Ora, sabe-se que, de acordo com os últimos dados oficiais, em termos estruturais, a balança comercial de Portugal com a CEE passou, a um superavite de 1,2 milhões de contos para um défice de 68 milhões de contos (isto de Janeiro a Novembro), que não é explicado por desvios de comércio.

Tudo isto é tanto mais grave quando tudo aponta para que o défice da balança comercial em 1986 seja de menos 46 milhões de contos do que em 1985 e quando se sabe que os «ganhos» resultantes da baixa do petróleo e derivados, dos cereais e das oleaginosas ultrapassam os 150 milhões de contos.
Ora, tudo isto significa um grave agravamento estrutural da balança comercial portuguesa.
Pergunto, pois, como encara o Governo este agravamento estrutural da balança comercial com os países da CEE.
Como se sabe, o Acto Único agravou o problema das transferências de soberania, como é, aliás, sublinhado no relatório da Comissão, de Integração Europeia, hoje aqui divulgado. É que as diferenças de poder económico entre os Estados agravam a situação dependente dos mais atrasados.
Assim sendo, pergunto: não entende o Governo, inclusive para reforçar o poder negocial, e numa perspectiva de defesa do interesse nacional, que é essencial uma atitude de coesão institucional, o que implica um diálogo permanente e pronto com a Assembleia da República, de forma a permitir uma intervenção atempada desta, uma atitude que tem de ser em tudo contrária àquela que o Governo tem tido, como aliás ainda hoje aqui foi claramente demonstrado?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado
João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, ouvi a sua intervenção com toda a atenção e, entre outras coisas, V. Ex.ª disse que o País está habituado à vida comunitária sem sobressaltos, que a Administração portuguesa se movimenta muito bem nos meandros da CEE, que somos tão bons como os outros, desde que levemos a sério a integração europeia - no entanto, lançou dúvidas sobre a situação de desenvolvimento em que nos encontramos - e que é a própria modernização do País que está em causa.
Devo dizer, Sr. Ministro, que teremos de estar de acordo com muitas destas afirmações; contudo, temos de colocar-lhe algumas questões.

Quando se diz que o País se tem movimentado sem sobressaltos, resta saber o que foi feito ao longo deste ano no que diz respeito à definição de várias políticas, tal como a política agrícola. É que continuamos a sentir grandes dificuldades porque o País não tem uma definição de política agrícola, mas apenas uma política de entrega de reservas na zona da Reforma Agrária a antigos latifundiários. Não temos uma definição de política, agrícola global; quanto a uma política de desenvolvimento económico, o Sr. Ministro também lançou dúvidas sobre a situação em que nos encontramos.

Há também falta de uma política de emprego - sentimos claramente o que se está a passar -, assim como de uma definição de uma política de ensino que facilite a preparação da nossa juventude para os desafios que a Comunidade nos vai impor cada vez com mais rigor e de uma política de desenvolvimento industrial.
Verifico que o Sr. Ministro da Indústria não está presente e creio que, num debate desta natureza, o Sr. Ministro faz falta para prestar certos esclarecimentos. Não vale à pena falar no PEDIP, mas a verdade é que não temos uma política de desenvolvimento industrial, um plano de desenvolvimento e nem sequer o Programa do Governo tem sido cumprido, programa esse com o qual, aliás, não estamos de acordo.
Sr. Ministro, perante tudo isto, que correlação de esforços tem o Sr. Ministro sentido entre os diversos sectores governamentais para que haja uma política global de desenvolvimento do País que facilite, inclusivamente, as suas actuações e intervenções no seio da CEE?
Numa das alíneas do relatório que o Sr. Deputado Silva Lopes leu é dito o seguinte:

Muitas das medidas de realização no mercado interno terão profundas consequências sobre a economia nacional e por isso torna-se necessário que os serviços da Administração portuguesa procedam aos estudos necessários à preparação das
posições portuguesas nas deliberações do Conselho relativas à introdução dessas medidas e à introdução de soluções que atenuem as dificuldades provocadas pela maior liberalização da concorrência em sectores que até agora têm beneficiado de protecções.

Sr. Ministro, esta é uma questão fulcral bastante importante e porque lhe damos bastante importância pergunto o que é que o Governo tem feito pára minorar os efeitos destas situações de forma a que haja um encontro de soluções que interessem a todo o País, globalmente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, sem qualquer orientação autónoma para a produção agrícola, subordinando a sua evolução aos preços comunitários, sem outras medidas estruturais que não sejam as comunitárias, cujo antagonismo é, em regra, por demais evidente face aos nossos interesses, sem propiciar um apoio técnico minimamente eficaz, o Governo vem agravando as más consequências da adopção da política agrícola comum.
Por esta via, não só se verificará o agravamento das nossas já elevadas carências em bens agro-alimentares essenciais, como se comprometerão as produções em que dispomos de auto-suficiência ou mesmo de algum excedente.
Sem quaisquer medidas de fomento que permitam renovar os nossos pomares, na sua generalidade decrépitos, assistimos à progressiva diminuição das produções e da qualidade. Nestas condições não é possível perspectivar qualquer capacidade competitiva.
O fomento dos frutos secos continua adiado e o fomento da produção de forragens secas e proteaginosas continua por se fazer, não se utilizando sequer os apoios comunitários disponíveis para o efeito.

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Em lugar de apoiar a produção e os produtores de leite, o Governo, através da política de preços e do desmantelamento do regime de exclusividade da recolha do leite por parte das cooperativas nas áreas organizadas, gera progressivas áreas marginais, onde a produção se tornará no curto prazo economicamente inviável, lançando na ruína milhares de produtores e provocando a queda acentuada da nossa produção.
O concentrado de tomate, um dos principais produtos das nossas exportações agrícolas, está perdendo mercado, sobretudo nos Estados Unidos da América, como consequência da aplicação dos montantes compensatórios. Às consequências económicas desta situação acresce, por arrastamento, a falência de indústrias e a ruína de milhares de produtores, cujos direitos o Governo se mostra incapaz de proteger, ignorando inclusive o mecanismo comunitário da retirada dos excedentes à produção.
A especulação propiciada pela abertura do nosso mercado à carne de ovino provocou já este ano a queda dos preços na produção de 430$ para 260$, sem que o consumidor retirasse qualquer benefício. Como é possível fomentar a produção nestas condições?
Por falta de dotação orçamental da comunidade, cerca de 70 % dos projectos relativos à transformação e comercialização de produtos agrícolas apresentados em 1986, foram transferidos para 1987.
A baixa taxa de projectos com financiamento convencionado acresce a manifesta incapacidade de realização dos projectos aprovados. De tal forma que, em relação aos programas da pré-adesão, o grau de realização queda-se pelos 7 %.
No que respeita ao financiamento às explorações agrícolas, mais de 50 % do montante global dos projectos apresentados concentra-se no Alentejo e no Ribatejo e Oeste. Em contrapartida, a Trás-os-Montes e à Beira Interior apenas cabem 17 %, às regiões Entre-Douro e Minho e Beira Litoral, 21,7 %, e ao Algarve, 16,6 % .
Do total dos projectos apresentados, pouco mais de 15 % absorvem mais de 50 % do correspondente montante global dos subsídios comunitários.
Afigura-se assim que a distribuição do investimento tende para um elevado grau de concentração e para a manutenção ou agravamento das assimetrias no que respeita à sua distribuição espacial.
Concluirei dizendo que distância entre o optimismo exteriorizado pelo Governo e a realidade dos factos! ...
Inconsciência, irresponsabilidade? Provavelmente ambas!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Albuquerque.

A Sr.ª Cristina Albuquerque (PRD): - Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, todos desejamos que o desafio europeu e a nossa adesão às Comunidades sejam um êxito. Mas para que assim seja é necessário que as relações com a Comunidade e os processos de negociação em curso sejam claros e que o País, esta Assembleia e os agentes económicos sejam devidamente informados.
Efectivamente, não basta que o Governo diga que o balanço do primeiro ano de adesão foi positivo; é necessário que o prove. Não basta que o Governo diga que os têxteis entram livremente nos mercados comunitários, quando existe o Protocolo XVII que consta

do Tratado de Adesão; não basta que o Governo diga que os têxteis entram livremente nos países da EFTA, quando existem protocolos de cooperação administrativa. É necessário que o prove e que o País conheça exactamente essa liberalização, isto é, que saiba o ponto em que ela vai.
Para isso entregámos na Mesa algumas perguntas, que esperamos sejam respondidas no decorrer deste debate.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Osório.

O Sr. António Osório (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, Srs. Membros do Governo: O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros veio aqui fazer a apologia da atitude intransigente, por parte do Governo, na defesa dos interesses de Portugal nas negociações com a Comunidade Económica Europeia.
Sabemos que há vários aspectos em que não podemos, de forma alguma, partilhar dessa opinião.
Concretamente, no sector automóvel, as pequenos unidades fabris de montagem estão todas elas ameaçadas pelos Protocolos n.º 18 e n.º 23 do Acto de Adesão.
Que atitude tem tomado o Governo no sentido de flexibilizar, por parte da CEE, a sua aplicação? É uma primeira pergunta que lhe deixo, Sr. Ministro.
O desregulamento das economias da CEE a dez, os excedentes, as crises estruturais, têm levado os órgãos comunitários a adoptarem um conjunto de decisões que vão no sentido de diminuir as capacidades de produção e do estabelecimento de quotas, com graves implicações para um país como o nosso com elevados défices de produção.
A pergunta que lhe punha era a seguinte, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: vai o Governo Português aceitar para a Siderurgia Nacional uma reestruturação que visa a redução das capacidades produtivas, o abandono do ferro de Moncorvo e cerca de 2000 despedimentos?
É sabido que a Comissão não aceitou o gravoso programa específico para o desenvolvimento da indústria portuguesa, vulgarmente conhecido por PEDIP, que lhe foi remetido pelo Governo Português. É sabido também que no Orçamento da CEE para 1987 não é inscrita qualquer verba para este programa, mas apenas uma pró-memória.
Estamos no segundo ano de transição e no segundo orçamento sem qualquer verba inscrita para a indústria. Vai o Governo aceitar que este ou um outro novo programa para a indústria venha a ser apoiado com verbas dos fundos estruturais, o que significaria a redução das verbas para outros sectores?
O Governo vai insistir no PEDIP ou vai apresentar outro programa?
Eram questões que gostaríamos de ver respondidas, Sr. Ministro.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

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O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, no livro branco que enviou à Assembleia da República, depois de previamente o ter distribuído pelos órgãos de comunicação social, na p. 113 - e passo a citar -, diz:

[...] foi fixado como objectivo do programa de reestruturação, modernização e desenvolvimento da frota pesqueira em Portugal o não aumento da capacidade global da frota [...].

Está escrito. O não aumento, Sr. Ministro? Portugal tem uma capacidade global excedentária? Pesca de mais na sua ZEE e nas águas comunitárias? Somos nós que esgotamos os recursos pesqueiros?
Mas o Governo não aceita só reduções de produção e quotas na agricultura, pescas e indústria. Vai mais longe e diz, para o País ouvir, que rejeita financiar excedentes da CEE a dez para os quais Portugal nada contribuiu, cedendo depois em Bruxelas, preparando-se para pagar a factura das matérias gordas vegetais - uma módica quantia de 12 a 13 milhões de contos (há documentos que o comprovam).
Em tudo o que é questionado, (Siderurgia Nacional, conservas de peixe, tomate, pesca artesanal) é a abdicação!
É a atitude de uma diplomacia que diz que os gregos protestam por tudo, mas que nós não. É a tal «agradável surpresa» de que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros aqui falava há pouco.
A nosso ver, é a postura do menino bem comportado. Tão bem comportado que o Sr. Primeiro-Ministro fez a sua campanha eleitoral afirmando que iria exigir a reconsideração de alguns dossiers do Tratado de Adesão. Fartou-se de repetir isto, está escrito, fê-lo na Televisão. Até agora não apresentou num um único processo para reconsideração.
O Governo, servil, abdica; distribuiu os fundos eleitoralmente pelas clientelas e o povo e o País pagam a factura. este o balanço.
Não duvidamos, portanto, Sr. Ministro, e fazemos nossas as suas palavras, de que em Bruxelas é de facto «uma agradável surpresa».

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Muito mal!

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Ministro, ouvi com atenção as suas palavras e, ouvindo-o, pensei que estaria noutro país. Não há problemas. Lendo o livro branco, continua a não os haver.
Gostaria apenas de pôr duas questões ao Sr. Ministro.
A primeira relaciona-se com as transferências de recursos. Diz o Sr. Ministro, e diz bem, que não basta transferir recursos, é fundamental aplicá-los bem.
O que se verifica no caso português, e este é talvez um dos principais problemas de fundo a que temos de dar resposta, é que existe um enorme défice de actuação da parte do Governo no seguinte aspecto: se formos ver o que representam as transferências de fundos comunitários, verificamos que, no caso português, eles representam cerca de 50 % dos recursos livres para políticas públicas. Isto é, enquanto em qualquer país

da Comunidade as transferências comunitárias não representarão mais de 5 % a 10 %, no caso português representam mais de 50 % dos recursos que ficam livres para novas iniciativas.
Perante isto, o Governo não tomando nenhuma iniciativa de preparação e programação do País, não tendo Plano, não sabendo o que fazer da indústria, passámos, no campo da formação profissional, de 3,5 milhões de contos em 1984 para cerca de 100 milhões de contos actuais, sem qualquer plano, sem qualquer programação ou prioridade.
Nestas condições, a transferência de recursos para a CEE é um verdadeiro bodo, não aos pobres, mas aos experts - que nem sequer são peritos -, é um bodo aos «espertos». É isso que se verifica em quase todos os campos.
Por força de ausência de plano do Governo, o que estamos aqui a criar é uma nova classe de intermediários que se passeia entre Lisboa e Bruxelas, entre Lisboa e o Terreiro do Paço, cobrando avenças espantosas.
É contra isto, Sr. Ministro, que gostaríamos de ter aqui a afirmação clara, por parte do Governo, de que dispõe de programas para a indústria, dispõe de um plano para a formação profissional, sabe quais são as prioridades. De outro modo, o País limita-se a seguir, pura e simplesmente, na trela das prioridades que forem determinadas em Bruxelas, agenciadas por clientelas, por «espertos» e por quem os acompanha na intermediação e nos lucros correspondentes.
Gostaria de ter resposta concreta para esta questão, a qual só pode ser dada através de uma programação.
Finalmente, Sr. Ministro, um ponto de somenos, mas que é extremamente importante do ponto de vista moral. O Sr. Ministro considerará que é uma provocação, que é um ponto sem interesse, mas eticamente é dos pontos mais graves deste primeiro ano.
Diz o relatório, na p. 182, que:

O ano de 1986 foi marcado por um contínuo esforço destinado a assegurar a integração de portugueses nos vários orgãos e instituições comunitárias.

Pergunto, Sr. Ministro, se para obedecer à verdade não estará o Governo disposto a corrigir esta frase, dizendo que o ano de 1986 foi marcado por um contínuo esforço para assegurar lugares a alguns amigos políticos e a alguns amigos pessoais.
Se for fazer a lista dos funcionários portugueses na CEE, estranhamente são todos PSD ou todos amigos - com raríssimas excepções que o Sr. Ministro citará logo aqui, mas não irá além de duas. Contei-as, Sr. Ministro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Ministro, V. Ex.ª referiu-se, como não podia deixar de ser, às virtualidades que a coesão económica e social representam no desenvolvimento do Acto Único Europeu.
Gostaria que V. Ex.ª esclarecesse a Câmara sobre o conteúdo, uma vez que de algum modo se trata de um conteúdo em aberto, ou sobre o sentido em que se vai orientar o Governo no preenchimento das várias

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vertentes negociais que esse conceito necessariamente pode comportar e em que sentido se pensa orientar a política negocial portuguesa numa matéria que, conforme se está a ver, vai ser absolutamente permanente.
Em segundo lugar, Sr. Ministro, e isso já foi aqui abordado, aquando da discussão do Acto Único Europeu, por um camarada meu, gostaria que V. Ex.ª dissesse a esta Câmara (e esperava tê-lo ouvido com mais detalhe) qual é o seu sentido quanto ao estado da articulação entre as várias facetas da Administração Pública no que respeita à integração europeia e quais são, no seu entender, se é que as há, as insuficiências de articulação entre a Direcção-Geral criada para esse efeito e os demais sectores da Administração com contactos directos em Bruxelas.
Em que sentido e com que instrumentos se têm - se é que se têm e, se se têm, com que carácter, positivo ou negativo - globalizado as intervenções de Portugal nesse domínio.
No que respeita à questão do aumento dos recursos próprios da Comunidade e da reforma dos Fundos Estruturais - e uma vez que como aqui referiu claramente V. Ex.ª tem acesso a todos os documentos - qual é a evolução (se é que há evolução) entre as primeiras apresentações dos documentos, segundo V. Ex.ª, a título reservado pelo Sr. Presidente Delors e aqueles que, porventura, se é que os há, já concitam uma nova reapreciação por parte da Comissão nesse domínio. Isto é, pergunto se já se detecta alguma evolução em relação aos primeiros documentos e, a ser assim, em que sentido é que ela já está indiciada.
Não entrando agora, por pudor, digamos assim, na famigerada questão do PEDIP, vendo a referência muito sucinta que lhe é feita no relatório do Governo e falando-se agora de uma nova iniciativa diplomática, gostaria que o Governo Português, na pessoa de V. Ex.ª, nos pudesse esclarecer quais são então os tipos de acções, os programas para que se solicita financiamentos, os sectores abrangidos, os fins de actuação, os prazos que se prevêem.
Finalmente, no que se refere à questão dos transportes, não havendo referência expressa às políticas de liberalização, nomeadamente no transporte aéreo que tem estado a ser discutido em Bruxelas, este Parlamento ignora tudo a esse respeito. Gostaríamos que V. Ex.ª esclarecesse a Câmara sobre qual é o sentido da posição do Governo Português nesse domínio.
Tratando-se, como aqui já foi dito pelo Sr. Deputado João Cravinho, de interrelacionar (e como) as políticas nacionais com as políticas comunitárias, qual é, no entender de V. Ex.ª, e perante as reformas estruturais da Comunidade, a articulação e as políticas nacionais que lhes correspondem.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento que, por lapso, a Mesa não tinha anunciado, tem a palavra o Sr. Deputado António Feu.

O Sr. António Feu (PRD): - Sr. Ministro, perante o quadro positivo que traçou do primeiro ano de adesão, gostaria de lhe perguntar se tem conhecimento do que se passa concretamente em relação ao sector das pescas e das conservas de peixe.
Com efeito, num sector, nomeadamente na pesca do atum, em que havia grandes perspectivas de desenvolvimento da nossa frota pesqueira, julgo ser do conhecimento do Sr. Ministro que só foram autorizados cerca de 25 % dos projectos apresentados.

Muitos outros projectos para modernização e reconversão da nossa frota pesqueira não tiveram seguimento, com a indicação de faltas de verbas da Comunidade.
Por outro lado, nos projectos autorizados, muitos deles envolvem a responsabilidade para os empresários da disponibilidade de verbas substanciais que uma indústria em crise não está em condições de satisfazer. Isto quer dizer que esses projectos só vão ser concretizados quando tenham a responsabilidade de grandes industriais ou grandes empresários que tenham disponibilidade financeira para satisfazer os fundos próprios que a Comunidade exige.
Em relação às conservas de peixe, a situação é mais grave. E isto até porque acontece um caso que é absolutamente discriminatório, na medida em que se fixou um contingente de direitos nulos para a exportação de conservas de sardinha para os países comunitários, em relação a Portugal, de 4000 t, o que representa um terço da nossa exportação para a Comunidade, quando Marrocos, que é um país que não faz parte da Comunidade, tem uma isenção de direitos nulos de 14 000 t.
Isto diz, de facto, da discriminação, em relação aos interesses comunitários, em que o nosso país está envolvido e em que estes sectores - pesca e conservas de peixe, nomeadamente - se encontram.
Por outro lado, Sr. Ministro, devo dizer-lhe que para o sector da pesca e das conservas de peixe este primeiro ano da adesão tem de ser visto com muitas apreensões, o que nos leva a perguntar onde está a capacidade negocial do Governo quando temos de enfrentar a concorrência de países como a França e a Espanha, que têm interesses no sector das pescas muito maiores do que os nossos.

O Sr. Presidente: - Terminaram os pedidos de esclarecimento. Antes de dar a palavra ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros para responder, se o desejar, gostava de informar a Assembleia que se encontram a assistir aos nossos trabalhos alunos e professores da Universidade Internacional para a Terceira Idade, para quem pedia uma saudação muito especial, fazendo votos para que a juventude de espírito seja uma constante.

Aplausos gerais.

Tem a palavra, para responder aos pedidos de esclarecimento formulados, se o desejar, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: Srs. Deputados, este debate vai ter lugar com a comparência de responsáveis por outras áreas governamentais e, portanto, muitas das respostas vão ser dadas por esses membros do Governo.
No entanto, desejava fazer o sumário dos pontos principais aqui focados e responder a alguns casos concretos apresentados por alguns deputados.
Começava pela pergunta do Sr. Deputado Lopes Cardoso sobre a realização de eleições para o Parlamento Europeu. Todos sabemos o que diz o Tratado. Nele se diz que durante o ano de 1987 deverá haver lugar a essas eleições. A lei terá de ser feita, obviamente, e ela é da responsabilidade da Assembleia. Mas, é evidente que se trata de matéria muito delicada e tem de haver convergência e discussão entre todos os orgãos de soberania - Presidência da República, Assembleia

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e Governo -, para que a lei e a concretização de eleições seja, feita da maneira mais apropriada. Temos ainda este ,ano para o fazer.
Neste momento nada mais posso adiantar. Estamos em Março, temos possibilidade de fazer as eleições até ao final do ano, como é dito no Tratado.
Quanto aos problemas postos pela deputada Ilda Figueiredo, do PCP, gostava de conhecer, para podermos actuar, quais são aqueles casos em que parece ter havido fraude na aplicação do Fundo Social Europeu: Não basta dizer que há fraude, temos de saber onde ela existe.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Permite-me que o interrompa, Sr. Ministro?

O Orador: - Desculpe, deixe-me acabar, se não se importa, minha senhora.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - É que o Sr. Ministro do Trabalho é que disse que tinha mandado fazer auditorias!

O Orador: - Ainda não temos os resultados dessas auditorias.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Posso fazer apenas uma breve interrupção?

O Orador: - Faça favor.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): -: No dia em que esteve na reunião da Comissão de Integração Europeia e de Trabalho, o Sr. Ministro disse que tinha recebido nesse mesmo dia os resultados das auditorias. São esses resultados que nós queremos conhecer.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: - O Sr. Ministro do Trabalho não deixará, na altura própria, depois de analisar os resultados destas auditorias, de dar a conhecer aos Srs. Deputados as conclusões a que tenha chegado.
No entanto, lembro que até agora as auditorias feitas pelas instâncias comunitárias não mostraram qualquer fraude.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Eu só pedi os resultados!

O Orador: - Sr.ª Deputada, tenha paciência. Não basta dizer que há fraudes, temos de as provar.
Quanto ao problema do défice da balança comercial, excluindo a Espanha, a nossa situação comercial com a Comunidade é absolutamente satisfatória.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Satisfatória!?

O Orador: - É! A Espanha é um novo membro, como nós, e naturalmente que, houve que juntar às contas o nosso comércio com a Espanha.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Exclui-se a Espanha, República Federal da Alemanha ...

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Esses países todos!

O Orador: - O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca falou sobre a modernização da economia. Julgo que não é num ano que se pode fazer o balanço completo da adesão de Portugal às Comunidades. O que não há dúvida é que a economia portuguesa, durante o ano de 1986, apresentou indicadores muito satisfatórios. Esta é a grande resposta que posso dar ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
Quanto ao problema do mercado interno, essa é uma matéria que vai ser tratada com mais detalhe pelo Sr. Secretário de Estado.
Este problema liga-se com a questão da liberalização, dos transportes aéreos - foi um dos aspectos aqui mencionados - e como acreditamos na concorrência, desde que esta tenha regras e tome em consideração a dimensão do País, pensamos que só nos será conveniente.
Portanto, tanto no problema dos transportes aéreos como no da concorrência em geral, tomar-se-á a posição que assegure a possibilidade de os operadores portugueses terem acesso a um mercado maior. Há, assim, problemas de tarifas, de direitos de tráfego, e tudo isso tem de ser condicionado de maneira a que não fiquemos limitados ao tráfego periférico, que é o que tem sucedido até agora.
Assim sendo, como acreditamos ser possível melhorar a performance dos operadores nacionais, é isso que vamos tentar; acreditamos que em concorrência somos capazes de ganhar. A não ser assim, ficaremos com o mercado periférico, que é o que, repito, temos tido até agora.
Não há, pois, razão para supor que não é possível concorrer nos grandes tráfegos europeus, entre a Europa Central e a periferia, entre cidades com muito maior tráfego do que aquele que se realiza para Lisboa. Portanto, acho que devemos sei optimistas quanto à nossa possibilidade de concorrer.
Quanto à questão colocada pela Sr.ª Deputada Cristina Albuquerque, julgo que o principal é responder-lhe que a realidade demonstra os resultados conseguidos. Com efeito, não há dúvida que, com excepção da Espanha, exportámos o que quisemos no sector dos têxteis, e foi sempre isso que foi dito.
No que respeita à não anulação do Protocolo n.º 17, tal não era possível. Na verdade, tal como a Sr.ª Deputada Cristina Albuquerque sabe muitíssimo bem, resolveu-se ir para uma solução que nos permitiu exportar sem qualquer restrição, com excepção da Espanha, tal como acabei de referir. E a prova disso são os resultados conseguidos.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - A opinião dos industriais não é essa!

O Orador: - Bem, nunca ouvi nenhuma opinião dos industriais contrária àquilo. que estou a dizer.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Basta ler os jornais!

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Ele só fala com três: os três grandes!

O Orador: - Quanto à questão posta pelo Sr. Deputado João Cravinho, naturalmente que existem muitos problemas. Porém, não há dúvida de que os resultados conseguidos no primeiro ano foram bastante satis-

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fatórios. Aliás, 1986 foi um ano em que a economia portuguesa teve, como acabei de referir, indicadores muito positivos.
Naturalmente que se poderá dizer que poderia ter sido melhor. Com efeito, é sempre fácil dizer isso, mas não nos podemos esquecer do que foi dito antes do início de 1986.
No que diz respeito à questão de o Fundo Social Europeu constituir um «bodo aos espertos», julgo que o primeiro ano de adesão se saldou positivamente. Contudo, não estou a querer dizer que todo o dinheiro tenha sido o melhor aproveitado possível; isso não era, com certeza, viável no primeiro ano - acho que temos de ser realistas. Do que não há dúvida é que houve transferências financeiras significativas.
Assim, penso que é melhor ter conseguido essas transferências do que não as ter conseguido ou ter conseguido transferências mais pequenas. Por outras palavras, conseguiu-se que o dinheiro fosse transferido e aplicado em Portugal. Naturalmente que nos anos seguintes iremos melhorar.
O Sr. Deputado João Cravinho sabe, pela sua experiência passada, o que terá sucedido noutros países e, portanto, não se deve espantar com eventuais deficiências que tenham surgido no referido primeiro ano na aplicação dessas transferências financeiras da Comunidade para Portugal.
Quanto à questão do preenchimento de cargos nas Comunidades, eu não faria comentários, pois esse é um problema bem conhecido.
Também não vou indicar os tais nomes que o Sr. Deputado João Cravinho queria que mencionasse. Não o vou fazer e julgo que todos os portugueses que lá estão são competentes e é isso que nos interessa.

Risos do PCP e do PS.

Foi, portanto, um critério de competência e não um critério partidário ou pessoal.
Quanto às questões levantadas pelo Sr. Deputado Carlos Carvalhas, queria dizer-lhe que o Governo não distribuiu à imprensa - e este é um pequeno parêntesis, mas talvez convenha esclarecer este ponto - a informação sobre o primeiro ano de adesão, agora concretizada neste livro, antes de o ter feito aos deputados. Portanto, isso não corresponde à verdade.
Nós não somos bem comportados...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Não são bem comportados!?

O Orador: - ... se quer dizer com «bem comportados» pessoas que aceitam o que as outras pessoas dizem e que são meninos bem comportados.
Nós não somos bem comportados, defendemos os nossos interesses e a prova está feita.

O Sr. António Osório (PCP): - Não se nota!

O Orador: - Isto porque não posso deixar de dizer que em Julho se podia prever, conforme alguns deputados e outros responsáveis afirmaram, que talvez Portugal viesse a ser contribuinte líquido, e realmente chegamos ao fim e verificamos que houve transferências líquidas da ordem dos 30 milhões de contos. É um erro de pontaria muito grande! É só isto que digo: tenho pena que tenham errado a pontaria em 30 milhões de contos, e essa é que é a verdade!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, o Governo sempre disse que isso não iria suceder.
Há uns que têm melhor pontaria do que outros - é a única conclusão a que se pode chegar e a que os portugueses certamente vão chegar.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - O Sr. Ministro Adjunto do Funchal deve ter errado a pontaria!

O Orador: - No que respeita aos problemas agrícolas, deixaria essa matéria para ser respondida por um colega meu.
Quanto à questão das matérias gordas, também focada pelo Sr. Deputado Carlos Carvalhas, o que posso dizer é que o que é importante é saber aquilo que se dá e aquilo que se recebe. Com efeito, não se pode fazer as contas dizendo apenas que vamos pagar algo; tem de se saber também o que é que vamos receber em troca.
Só lhe chamo a atenção, Sr. Deputado, para o facto de esta solução não nos agradar, pois, muito simplesmente, não nos agrada pagar mais. Porém a situação actual já tinha um custo para nós, ou seja, a manutenção dos stocks já custava dinheiro à Comunidade e isso já estava a ser suportado. Ora esta solução é melhor; é mais barata para nós. Não estou a dizer que nos fiquemos por aqui, mas o não escoamento das matérias gordas já tinha o seu custo, custo esse que, como é evidente, era suportado por nós.
Portanto, o que estou a dizer é que temos que encarar o problema nestas duas facetas. Assim, não estou a afirmar que nos fiquemos por aqui. Estou apenas a lembrar que o Sr. Deputado não deve esquecer este pequeno detalhe: o custo já estava a incorrer na Comunidade pela manutenção dos stocks de matérias gordas.
A solução proposta é mais barata, é, portanto, melhor, mas nós queremos ainda mais.
Quanto ao problema da coesão económica e social, naturalmente que ele é muito importante.
Nós discutimo-lo já na parte final do Acto Único Europeu, fizemos, juntamente com outros países, intervenções consideráveis sobre esse assunto e ficou expressa a necessidade de incluir a coesão económica e social como um dos primeiros objectivos do Acto Único.
Naturalmente que isso só se consegue com mais recursos financeiros. Aliás, como tive oportunidade de afirmar na Comissão, as ideias iniciais iam no sentido da duplicação dos fundos estruturais até 1992.
Para responder ao Sr. Deputado Jorge Sampaio, posso dizer-lhe que não há outros papéis, não há outras propostas. Estes assuntos estão a ser tratados nas reuniões do COREPER, que se estão a realizar semanalmente - julgo que duas vezes por semana - em Bruxelas. Portanto, estamos a discutir e a apurar o que é que cada um dos Estados pensa agora, confrontado com todos os outros. Na verdade, não há ainda qualquer evolução significativa.
Não deixaremos de colocar os nossos pontos de vista, como o temos feito até agora, aliás, com resultados, tal como o prova o que se conseguiu no ano de 1986.
Achamos que todas as medidas relacionadas com a introdução do mercado interno têm de ser ponderadas tendo em atenção a coesão económica e social. Isto é, ao decidir-se uma medida sobre o grande mercado europeu, há que ver se a aplicação dessa nova directiva trará, e em que medida, dificuldades ou benefícios para a coesão económica.

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Não podemos aceitar que isso seja feito, a fim de podermos actuar na área da coesão económica e social contrabalançando dificuldades que surjam na aplicação das medidas referentes ao, mercado interno.

Quanto ao mercado interno, o Sr. Secretário de Estado irá, como disse, fazer um sumário da situação, para os Srs. Deputados saberem qual a posição actual.
Devo também referir ao Sr. Deputado Jorge Sampaio que a Comissão Interministerial para a Integração Europeia tem funcionado bastante bem. É aí que se discutem e que se dirimem, a nível interministerial, os problemas, a fim de que a nossa posição em Bruxelas tenha em consideração todos os aspectos da política portuguesa.
No que respeita do PEDIP, também será feita, mais
tarde, uma pequena observação.
Quanto ao problema da pesca do atum, o Sr. Deputado António Feu sabe muito melhor do que eu que, o negócio do atum não tem sido bom. Esta é uma realidade.

Risos do PCP.

O Sr. João Corregedor da Fonseca(MDP/CDE): - O Feu vai à falência!

O Orador: - E não é bom pela simples razão de que há muito atum e, portanto, os preços baixam.
Assim, os empresários portugueses têm de decidir se querem estar nesse negócio ou noutro, sabendo qual é a situação actual dessa actividade. Portanto, melhor do que ninguém, os Srs. Empresários decidirão se querem continuar a pescar atum, pois, provavelmente, a venda do atum irá ser feita a preços muito baixos.
Naturalmente que essa é uma decisão que o Governo tem que considerar, mas vão ser os Srs. Deputados ... ou os Srs. Deputados quereriam que o Governo fosse dizer aos armadores de uma determinada localidade: não pesquem atum ou pesquem sardinha? Parece-me que serão eles, que conhecem o negócio, a tomar a decisão, tendo em atenção que hoje, como sabe muito melhor do que eu, o negócio da captura do atum não é muito compensatório.
Portanto, os empresários - e a sua inteligência tem-se orientado sobretudo nesse sentido - têm de escolher os bons negócios não se metendo em maus negócios.
Quanto ao problema das conservas de peixe, das sardinhas de Marrocos, tenho de concordar com o Sr. Deputado, pois essa foi, na realidade, uma área em que não foi possível conseguir aquilo que queríamos.
Porém, penso que se tem de olhar para estes problemas de uma forma global.
Com efeito, não concordámos com essa solução, mas o resultado global foi positivo. Isto sem prejuízo de continuarmos a tentar encontrar para esse problema das, exportações de conservas de peixe - sobretudo as de sardinha - uma solução mais satisfatória.
No entanto, lembro - o Sr. Deputado António Feu sabe isto muito bem - que Marrocos é um país importante, que tem relações muito antigas com a Comunidade. Além disso, como todos bem sabem, a Comunidade não é só feita de interesses económicos - há, por exemplo, interesses políticos - e os países da orla do Mediterrâneo são muito importantes; a estabilidade política daquela zona é indispensável para a estabilidade política da Europa. Portanto, há que considerar também esses aspectos, razão pela qual a Comunidade tem, por vezes, que fazer concessões a esses países, e fá-lo sobretudo no seu interesse global.
Por aqui me ficava agora. Outros membros do Governo - responderão e tratarão de outras matérias que, eventualmente, não tenham sido por mim abordadas.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação vai no sentido de solicitar da Mesa a permissão para o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, se quisesse - e estou certo de que quer -, responder à pergunta que lhe coloquei e a que não respondeu, por certo, por falha minha, isto é, por ter eventualmente formulado mal a pergunta.
O Sr. Ministro disse-nos que tínhamos até ao fim do ano para realizar as eleições e em princípio temos, todos nós o sabemos. No entanto, julguei que tinha perguntado uma outra coisa. Com efeito, o que gostava de saber era se Governo entende ou não que essas eleições têm de ser feitas até ao final do ano.
Era esta a pergunta que gostaria de ter formulado e que certamente não formulei com a clareza necessária para que o Sr. Ministro me pudesse responder de forma igualmente clara, precisa e concisa.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: - Sr. Deputado, essa é uma matéria que não se encontra enquadrada no debate que estamos a ter.
Respondi de maneira sintética e resumida ao Sr. Deputado e agora não estou em condições de lhe poder adiantar mais nada sobre tal assunto.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Estamos esclarecidos, Sr. Ministro!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Campos.

O Sr. Paulo Campos (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A integração de Portugal nas Comunidades Europeias é um daqueles raros momentos em que um povo pode ser protagonista da sua própria História e deve assumir por inteiro a condução do seu destino colectivo.
A evolução quotidiana no nosso país é profundamente condicionada pelo processo de adesão, e em tais termos e com tal clareza que ninguém pode ignorar que estamos hoje, em Portugal, a determinar o futuro de todo um povo.
Uma forte consciência de uma responsabilidade muito exigente deveria ser sentida por todos quantos vão participando no Poder, condicionando, por qualquer forma, as decisões necessárias e constantes no processo de adesão.
Redundantemente, deverá ter-se sempre presente a noção de que não é a importância de cada decisão que se deve considerar, mas sim a medida exacta das suas consequências.

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Todavia, nem sempre tem sido compreendida a dimensão verdadeiramente nacional com que tudo o que envolve o processo de integração deve ser considerado. Nem sempre se ultrapassaram as tentações de apropriação partidária de qualquer possível êxito negocial; nem sempre se resistiu à inclinação, quase tradicional, para um certo nepotismo no preenchimento de cargos onde apenas se impunha a competência de uma plena representação do Estado e não de quaisquer outros interesses; nem sempre se acautelaram, serenamente, reflectidamente, exigências nacionais, por se visarem concretizações de timings políticos de utilidade muito duvidosa; nem sempre tudo se faz para se saber o que era verdadeiramente o interesse nacional.
A tendência frequente para que cada um, individualmente ou em grupo, se considere e proclame fiel intérprete do sentir do povo português, impediu que se aprofundassem completamente quais as verdadeiras aspirações, quais as reais preocupações de toda a comunidade nacional.
No entanto, é o futuro colectivo que está em causa e que se vai construindo irreversivelmente, e é hoje perfeitamente transparente que o êxito de Portugal nas Comunidades depende mais, mas muito mais, da resposta com que todo o povo português reaja aos estímulos provocados pela integração, do que ao perfeccionismo de qualquer alínea, de qualquer regulamento.
Sustentamos que óptimos acordos em qualquer área só serão eficientes se for possível a sua plena aplicação prática.
Poderemos conseguir objectivos muito estimáveis em Bruxelas, que serão absolutamente inúteis, se é que não prejudiciais, caso não sejam aplicáveis em Vinhais ou em Vila do Bispo.
É determinante para a concretização das vantagens alcançáveis em todas as vertentes da adesão que se consiga a mediação ágil entre a reflexão dos «euro-lusocratas», sejam muito, pouco ou nada políticos, e o povo português trabalhador, empresário, escolar e reformado.
O desafio comunitário tem de ser assumido por todos os portugueses como a tarefa prioritária de toda uma geração, mas sempre compreendida como um desafio por nós lançado a nós próprios e não como uma imposição externa ou uma inevitabilidade do destino.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: estas considerações têm especial relevância se aplicadas à agricultura. O fluir do tempo em agricultura é mais repousado.
Medidas de fundo estruturais que hoje se implementam só são definitivamente avaliáveis, nas suas consequências, dentro de anos ou décadas. Por isso mesmo, em política agrícola exige-se atenta ponderação e estudo cuidadoso, mas também por isso mesmo se exige que não se perca mais tempo, porque aqui a recuperação do tempo perdido é mais lenta e mais difíceis as correcções de percurso. E há que reconhecer, como pesado dado prévio, que é enorme a distância que separa a agricultura portuguesa das agriculturas dos nossos parceiros comunitários.
Muito serenamente, consideramos que o espaço entre o êxito e o inêxito da nossa agricultura no processo de adesão é ínfimo: ou aproveitamos todas as vantagens do processo de integração, com toda a rendibilidade económica, social e cultural que a nossa capacidade de trabalho, de gestão e de imaginação permitam e a agricultura portuguesa recuperará rapidamente de

décadas de imobilismo e estará capaz de suportar o choque da plena integração comunitária, ou, se assim não acontecer, se desperdiçarmos os próximos anos em indefinições de objectivos determinados por egoísmos partidários, se desperdiçarmos os próximos anos em satisfação de interesses sectoriais, se desperdiçarmos os próximos anos em medidas imediatistas impeditivas de reformas de fundo, a agricultura portuguesa será inevitavelmente inviabilizada e restar-nos-á a ocupação dos objectivos de produção que nos forem impostos pelos nossos esmagadores concorrentes.
Ao longo de décadas e décadas destruíram-se progressivamente as potencialidades do sector agrícola numa visão tacanha de desenvolvimento industrial.
Deparamo-nos hoje com uma agricultura em que a dimensão da esmagadora maioria das explorações é inferior aos mínimos viabilizáveis e, no entanto, o número de explorações tem aumentado, agravando ainda mais a situação.
A inovação tecnológica é baixíssima e o sector está descapitalizado, mas o crédito, geralmente em condições desadequadas, é concedido sem que haja garantia de introdução de novas técnicas culturais.
A produtividade comparada com a dos demais países comunitários é impressionantemente baixa e tem vindo a evoluir negativamente.
A carga da população activa na agricultura, se comparada com a dos demais países da Europa comunitária, indicia assustadoramente a impossibilidade de garantir, a curto prazo, condições de vida à população agrícola portuguesa comparáveis às dos nossos parceiros, sendo certo que a perspectiva de drenar da agricultura para outros sectores não está à vista.
Num cenário realista, em que estes são apenas alguns dos traços mais marcantes, exige-se uma enorme capacidade de governação em criar soluções, em aproveitar oportunidades e em motivar todos os agentes intervenientes para nelas participarem. E aqui o Governo tem falhado. Com apenas um ano e poucos meses decorridos sobre a adesão não é fácil afirmar-se que os resultados negociados são globalmente negativos. A sua gestão é que, indubitavelmente, não tem sido positiva.
O Ministério da Agricultura continua a ser uma pesadíssima máquina altamente ineficiente e, apesar disso, o Governo, de cariz liberalizante, tem contraditoriamente descurado certos instrumentos financeiros quando se destinam ao apoio do sector privado.
Desconhecem-se as grandes prioridades de desenvolvimento sectorial e regional da nossa política agrícola o que pode propicionar agravamentos de desequilíbrios expressivamente existentes e, no entanto, o Governo, no seu programa, prometia, mas não cumpriu, planos de emergência para o sector.
A política de preços para os produtos agrícolas, em que Portugal tem, nesta fase, grande flexibilidade, permite que se mantenham culturas e práticas culturais de momento rendíveis, mas que se suspeita estarem condenadas a curto prazo e, no entanto, não são desencadeadas nenhumas acções de sensibilização dos agricultores para novas culturas e novos processos.
Por diversas vezes alertámos o Governo para a necessidade de dinamizar os serviços de extensão rural, mas a inoperacionalidade mantém-se tal como prevíramos durante o debate de apreciação do Orçamento do Estado para o corrente ano.

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I SÉRIE - NÚMERO 53

O investimento é essencial para a modernização das explorações agrícolas e, todavia, é público o baixo grau de execução financeira de muitos programas, nomeadamente das ajudas de pré-adesão.
Faz-se um esforço bem intencionado na formação de jovens agricultores e criam-se mecanismos de apoio à sua instalação e, no entanto, perante a carência de terra com que se debatem, o Governo recusa-se a aplicar legislação sobre o aproveitamento mínimo dos solos agrícolas e a gerir racionalmente as largas áreas de que ele próprio dispõe.
Reclama o Governo que a oposição tem impedido iniciativas legislativas de fundo e, no entanto, das três medidas apresentadas pelo Governo à Assembleia apenas uma foi inviabilizada - a Proposta de Revisão da Lei de Bases da Reforma Agrária - e mesmo nesse caso há que imputar culpas ao Governo por ter insistido no seu agendamento, desperdiçando arrogantemente qualquer oportunidade de entendimento.
E é o próprio Governo que não cumpre promessas que repetidamente fez nesta Câmara de definir critérios definitivos para pagamentos de indemnizações na Zona de Intervenção da Reforma Agrária. Seria um passo positivo para que de uma vez por todas se entrasse no caminho da estabilização do Alentejo, assumindo-se a coexistência dos sectores diversos de propriedade.
Pode o Governo exibir uma extensa lista de êxitos no domínio agrícola obtidos com a intervenção comunitária, mas não passam de números de quadros, de mapas, de documentos. Mas não pode o Governo expor aqui com clareza quais foram os objectivos visados e qual o seu grau de concretização.
Visou-se diminuir o desequilíbrio da nossa balança alimentar? Em que grau? À custa de que culturas? Em que áreas? Que resultados se esperam?
Entende o Governo que é necessário diminuir a população agrícola? Em que zonas? Com que processos? Que resultados se esperam e para quando?
Fizeram-se e vão fazer-se grandes investimentos. Concretamente que efeitos se esperam? Por que é que é esta e não aquela a aplicação dos meios financeiros disponíveis?
Já foi dito ao agricultor que está a fazer trigo naquela exploração e que está a ganhar dinheiro se deve e pode continuar a fazer trigo e até quando e o que é que deve fazer quando tiver de mudar?
Já foi dito àquela cooperativa que pode introduzir novos benefícios para os seus associados e que para isso dispõe destes e daqueles auxílios?
Tantos e tantos exemplos que se poderiam invocar.
Este governo, ou antes, esta prática governativa, poderá continuar a falar no desafio europeu, poderá continuar a nomear êxitos negociais por tudo o que forem reuniões de mais diversa índole, mas enquanto persistir numa prática auto-suficiente de quem tem certezas e raramente se engana não será capaz de repercutir na sociedade portuguesa os benefícios obtidos pelos seus negociadores pela simples razão de que não é capaz de formular e defender uma política agrícola para Portugal inserido no espaço comunitário, mas que defenda as legítimas e muito específicas aspirações do povo português. Este governo não sabe se dura os quatro anos da legislatura nem sabe que um sobreiro leva décadas a atingir a plena maturidade.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A gestão interna dos assuntos relacionados com as comunidades europeias está hoje regulada em diplomas legais que se reportam, quer à estruturação da Direcção-Geral das Comunidades Europeias, quer à comissão interministerial incubida de acompanhar os assuntos europeus, ambos os organismos integrados no Ministério dos Negócios Estrangeiros.

A Assembleia da República, apesar da sua competência genérica na matéria e da existência de uma comissão especializada sobre o assunto, necessita fortemente, neste momento em que o processo de integração arranca de uma forma decisiva, de reforçar a sua participação na formulação das políticas comunitárias bem como no acompanhamento e fiscalização dos actos do Governo Português relacionados com a integração e com as Comunidades Europeias.

Nesse sentido o Partido Socialista vai de seguida apresentar na Assembleia um diploma, que visa criar mecanismos de reforço da participação da Assembleia da República na formulação das políticas comunitárias. Esse diploma consta basicamente de seis linhas de orientação: a transformação da actual Comissão Especializada na Integração Europeia numa Comissão das Comunidades Europeias; a criação de um arquivo documental dos serviços da Assembleia, especialmente incumbido, no seu âmbito próprio, de coligir informações sobre assuntos comunitários; regras de acesso, por parte do Parlamento, a documentação oficial portuguesa respeitante a assuntos comunitários; o dever de consulta do Governo em relação ao Parlamento de matéria comunitária, consulta essa que deve assumir feição obrigatória sempre que a Assembleia da República o solicite ou quando estejam em causa matérias da competência própria da Assembleia da República; a criação de um comité misto - Assembleia da República/Parlamento Europeu - constituído em partes iguais por deputados eleitos proporcionalmente pela Assembleia da República e pelos deputados portugueses ao Parlamento Europeu e rotativamente presidido por deputados de uma e outra das instituições parlamentares e ainda a elaboração de um livro branco anual respeitante à análise das políticas e da evolução comunitária, bem como das políticas portuguesas respeitantes à comunidade e ao processo de integração.

Sublinho que este diploma visa fundamentalmente realçar a importância da Assembleia da República na sua associação à elaboração das políticas comunitárias e, portanto, insere-se no reforço institucional da componente nacional da vida comunitária e que, naturalmente, é um diploma que visa, sobretudo, estimular a cooperação recíproca entre a Assembleia da República e o Governo. Não tem outro objectivo qualquer e é nessa dimensão que deve ser entendido. Não tem por objectivo travar o processo integrador ou criar-lhe dificuldades; visa, isso sim, integrar a Assembleia da República, ela própria na plenitude das suas funções constitucionais, na própria formulação global da política europeia e neste sentido estamos naturalmente abertos a todas as sugestões e ao diálogo com todas as forças parlamentares e também com o Governo para lhe introduzir as alterações adequadas, visando soluções eficazes, com vista a reforçar o papel da Assembleia da

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República e da cooperação entre o Parlamento e o Governo na formulação da política comunitária de Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há, neste momento, mais inscrições na Mesa.
A Mesa pensa que a falta de inscrições não significa que o debate esteja dado por encerrado.

Pausa.

Não há mesmo mais inscrições e permitia-me chamar a atenção dos Srs. Deputados de que o tempo disponível para as várias bancadas e para o Governo é de molde a podermos admitir a continuação da sessão para além daquilo que seria normal, pois há muito tempo disponível para este debate. Se anteciparmos o intervalo regimental corremos o risco de não recomeçar os trabalhos mesmo às 15 horas e de estes se prolongarem para além daquilo que seria desejável.
Mas se efectivamente não houver mais inscrições para este período da manhã - e pelos vistos parece não haver -, atrevia-me a propor, uma vez que é de admitir pela Mesa que alguma intervenção, especialmente preparada agora, possa ser, digamos, interrompida pela chegada da hora regimental do intervalo para almoço, que demos agora por interrompidos os trabalhos e que às 14 horas e 45 minutos estivéssemos todos aqui presentes para reiniciar o debate.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, havendo ainda tanto tempo disponível para intervir e não havendo inscrições, isso significa, pura e simplesmente, que o debate está dado por encerrado.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, queria informar que concordo com a hipótese lançada pelo Sr. Deputado Guido Rodrigues. Uma vez que o PSD não manifesta interesse em falar sobre um ano de adesão às Comunidades Europeias e, portanto, não inscreve nenhum deputado e havendo duas propostas de resolução na Mesa podemos submetê-las à votação.

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE)- Sr. Presidente, peço a palavra também para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros informou que o Governo vai ainda usar da palavra para explicar alguns aspectos de políticas sectoriais, nomeadamente da indústria e da agricultura. No entanto, o Governo

também não está inscrito e ficamos a saber também agora que o PSD não está interessado em debater esta problemática, porque diz que...

Protestos do PSD.

... não está interessado e tem receio com certeza, como se diz aqui e muito bem.
Portanto, Sr. Presidente, creio que esta intervenção do Sr. Deputado Guido Rodrigues é um pouco especulativa e das duas uma: ou aceitamos a proposta do Sr. Deputado Magalhães Mota e passamos a discutir o projecto de resolução ou o Sr. Presidente realmente interrompe os trabalhos para os recomeçarmos às 14 horas e 45 minutos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, depois da brilhante exposição do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, das completíssimas respostas que entendeu prestar a esta Assembleia...

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... e da ausência de intervenção por parte do PSD, reagiremos achando como uma graça a sugestão do Sr. Deputado Guido Rodrigues - uma má graça, mas certamente que o País entenderá com o rigor que tem que entender - ou reiteramos a sugestão de que possamos fazer aqui um compasso de espera e que reabramos os nossos trabalhos um pouco mais cedo, às 14 horas e 45 minutos. Talvez, nessa altura, o PSD já esteja em condições de dizer qualquer coisa sobre a adesão de Portugal às Comunidades Europeias e o Governo já esteja, também, em condições de nos dizer mais qualquer coisa, dado que na parte da manhã foi parco nas informações e nas respostas.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra só para informar o Sr. Deputado Jorge Lemos que, na realidade, o rigor que ele acaba de mencionar é o rigor que efectivamente verificámos no PCP. O Pais poderá verificar que esta manhã o PCP não tinha intervenções preparadas para discussão sobre a integração europeia.

Vozes do PSD: - Muito bem! Isso mesmo!

A Sr. Ilda Figueiredo (PCP): - Onde é que esteve esta manhã? Não ouviu a série de perguntas que colocámos?

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço a vossa atenção e colaboração. Gostaria de sublinhar o facto de que a Mesa deu conhecimento à Assembleia que não tinha mais inscrições na altura em que admitiu a hipótese de fazer o intervalo regimental e de reabrir os trabalhos mais cedo. Creio que, de uma forma razoável, esta proposta se mantém e se não houver nenhuma objecção por parte das várias bancadas...

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O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, era apenas para dizer que julgava ter acompanhado o debate do princípio ao fim, mas ficou-me uma dúvida: o PSD fez alguma intervenção esta manhã? Certamente que sim, pois perante a observação do Sr. Deputado Guido Rodrigues e face à ausência de intervenções de outros grupos parlamentares - que não o meu - é o que se depreende. Queria verificar se, de facto, foi lapso meu para ir consultar atempadamente o Diário e ler a intervenção do PSD.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Foi uma intervenção do homem invisível! ...

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou conceder a palavra ao Sr. Deputado Guido Rodrigues e dar por terminada esta discussão, porque penso que este tipo de intervenções não ajudam à continuação do debate.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para dizer ao Sr. Deputado Lopes Cardoso que constatámos todos e o País também que às 12 horas e 45 minutos, quinze minutos antes da hora regimental para o intervalo, não havia na realidade intervenções preparadas aqui na Câmara para a discussão deste assunto. Isto é que é a pura realidade e tudo o resto são palavras cruzadas.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - O Partido Socialista até interveio, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa vai fazer a seguinte proposta: anteciparemos de dez minutos o intervalo regimental, previsto para as 13 horas, e reiniciaremos os trabalhos às 14 horas e 45 minutos. Faço ainda um apelo para que os Srs. Deputados - desculpem a minha insistência - estejam presentes de forma a podermos reiniciar os trabalhos.
Entretanto, informamos que os vários grupos parlamentares e o Governo dispõem dos seguintes tempos, não contando com aqueles quinze minutos e com as devidas adaptações: o Governo, onze minutos; o PSD, quarenta e cinco minutos; o PS, vinte e oito minutos; o PRD, vinte e um minutos; o PCP, vinte minutos; o CDS, vinte e cinco minutos e o MDP/CDE, dezassete minutos.
Se não houver objecção por parte dos grupos parlamentares e do Governo daria por interrompidos os trabalhos.

Eram 12 horas e 50 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados, a Mesa aguarda inscrições para intervenções.

Pausa.

Srs. Deputados, a Mesa continua a aguardar inscrições para se poder prosseguir com o debate.

Pausa.

Sr. Deputado Eduardo Pereira, V. Ex.ª pede a palavra para que efeito?

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, será possível a Mesa informar quais os partidos que já intervieram, os que não intervieram e os que, exactamente por esse motivo, vão intervir.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, os partidos que já usaram da palavra para intervenções foram o PRD e o PS e para formularem perguntas o PS, o PRD, o PCP e o MDP/CDE.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, se se mantiver este impasse propomos que se realize rapidamente uma conferência de líderes para regularizar esta situação, a não ser que o CDS ou o PSD, que ainda não intervieram, usem da palavra agora.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - E o PCP? E o MDP/CDE?

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - O PCP já interviu através de quatro deputados!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Soares Cruz, V. Ex.ª pede a palavra para que efeito?

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, gostaria de fazer duas observações. A primeira no sentido de, em nome da minha bancada, pedir desculpa a V. Ex.ª e a toda a Câmara pelo facto de hoje a sessão ter começado da parte da manhã sem nenhum deputado do CDS. Tal facto deveu-se à situação de ter havido uma primeira informação de que a sessão começaria às 15 horas e, posteriormente, quando essa informação foi corrigida, ter havido uma deficiência de comunicação, o que originou que só muito tarde tivéssemos conhecimento desse facto.
A segunda observação ia no sentido de questionar a Mesa para saber se os 25 minutos de que dispomos contemplam também a nossa intervenção final.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo que o CDS dispõe, tal como acontece em relação a todos os partidos, é o tempo total para o debate.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Nesse sentido, informava V., Ex.ª e toda a Câmara de que o CDS apenas fará uma intervenção no final do debate, porque o tempo é bastante exíguo e, dado o interesse desta matéria para que a nossa intervenção seja convenientemente consubstanciada necessitamos de todo o tempo que nos é atribuído.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, penso que isto não é processo de gerirmos o nosso tempo. Se o CDS entende que o tempo é exíguo - e esse é o nosso ponto de vista - estamos dispostos a abordar essa questão em conferência de líderes, no sentido de se reverem os tempos atribuídos e alargá-los. De facto, consideramos estes tempos exíguos, mas não se pode é admitir o princípio de que os partidos se reservam para o final para fazerem as suas intervenções.
Há uma regra geral de funcionamento prevista regimentalmente de que as inscrições deverão ser feitas de modo a que se não repitam as intervenções. Se todos os partidos se reservam para o final, diria ao Sr. Deputado Soares Cruz que o final chegou neste momento pelo que o CDS deve fazer o favor de intervir. É que há-de haver um momento em que se chegará ao final e se nos colocarmos nessa posição o final é neste momento.
Se o Sr. Deputado apoia e sustenta a posição do nosso grupo parlamentar de que se deve rever os tempos e alargá-los, pela nossa parte vemos toda a utilidade nisso e estamos abertos a essa solução. Agora esta situação é que é inaceitável, porque então todos os partidos se reservarão para o final e nessa situação a Mesa deverá dar a palavra ao CDS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Victor Crespo, V. Ex. e pede a palavra para que efeito?

O Sr. Victor Crespo (PSD): - Sr. Presidente, para informar que a minha bancada não vê objecções em fazer, através da minha pessoa, uma intervenção neste momento.

O Sr. Presidente: - Assim sendo, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Crespo.

O Sr. Victor Crespo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em menos de um ano é esta a terceira vez que debatemos em plenário a questão da nossa integração na Comunidade Europeia. O que é um bom indicativo da importância que o assunto merece, o que não surpreende porque na Europa se joga a nossa modernização e progresso. O debate europeu vem-se fazendo e vai continuar. Pretendemos hoje olhar para o que conseguimos no primeiro ano e também para o futuro, procurando divisar quais as consequências e resultados e os caminhos de melhor os atingir.
Um debate sobre a Europa é acolhido com o maior interesse e entusiasmo pela minha bancada: este, e os que se seguirem, apenas desejando que se façam com o sentido do Estado que se exige numa questão de relevante interesse nacional.
A análise do ano que passou foi abundantemente feita e está contida em documento exaustivo e substancial apresentado pelo Governo, que foi acompanhado de múltiplos encontros Assembleia/Governo e de um debate interno no seio da Comissão, sobre o qual tenho o gosto de referir que se fez sempre com um espírito construtivo, em ambiente sereno e num discurso inteligente.

Ao nosso debate vieram juntar-se testemunhos insuspeitos que têm exaltado os resultados positivos que se alcançaram, o bom aproveitamento das facilidades comunitárias e a existência de orientações gerais adequadas.
É certo que a obra humana tem sempre algumas imperfeições, é sinal de vitalidade e salutar princípio desejar mais e melhor. Mas uma e outra coisa não nos impede de constatar a verdade dos factos: o primeiro ano de adesão foi bom. Basta reafirmá-lo.
Na história do progresso comunitário, como em tudo o mais, importa ter bem presente o ponto de partida e o de chegada para deles extrair o melhor caminho a prosseguir.
Conhecemos bem donde partimos, através da experiência deste primeiro ano. Sabemos quais os objectivos gerais a atingir. O percurso a percorrer não é, porém, linear. Temos que bem conhecer a topografia dos obstáculos e dificuldades a tornear. E não há uma definição precisa do ponto de chegada que é constituída por uma zona de geometria e contornos variáveis que engloba um conjunto de ideais sobre o que deve ser a Comunidade Europeia. Zona que se vai limitando com o tempo, à medida que prosseguem os debates e se forem interiorizando os resultados das experiências feitas. Que será sempre um somatório de avanços e recuos, como o demonstram os 40 anos passados. Zona de conceitos que se vai definindo à medida que sucessivas gerações forem adquirindo e vivendo a experiência europeia.
É nesse sentido que importa reflectir quanto às consequências do Acto Único, não, como por vezes se afirma, por o termos analisado insuficientemente no seu conteúdo e consequências concretas.
Importa não mistificar a revisão do Tratado de Roma. Mas é forçoso reconhecer que se pode ir mais fundo na análise do que nele está subjacente quanto à definição futura da Comunidade Europeia.
Não são a questão institucional, o novo processo de decisão e nem a introdução de novas políticas que são o cerne da questão. Mas antes a resposta a uma pergunta pertinente: que futuro para que Comunidade?
Dada a natureza do que está em jogo devemos olhar de frente para que se demovam indeterminações e dúvidas; para que não subsistam equívocos; para que as palavras que todos usamos encerrem conceitos idênticos.
Neste contexto, só ganharemos com um debate vivo e incisivo que ajude às clarificações necessárias. Debate que corresponde a mergulhar num espaço cultural novo; a criar novas mentalidades. Por isso ele dita uma multiplicidade de comportamentos individuais, mesmo dentro de cada família política. Há sensibilidades e atitudes que têm raízes no psicológico. Não será, por isso, de estranhar que o que aqui vos venho dizer tenha também alguns traços da minha maneira própria de ver e reagir quanto ao futuro comunitário.
O Acto Único é uma alteração importante ao Tratado de Roma, como é amplamente reconhecido. Mas não deixa de ser apenas um passo mais na reforma institucional da Comunidade que fixa orientações que se vinham a adivinhar, que consolida regras e práticas que o costume impôs.
O Acto Único não tem um significado mais profundo quanto à síntese europeia do que o Compromisso de Luxemburgo de 1966, a criação do Conselho Europeu em Dezembro de 1974, ou a institucionalização do Sistema Monetário Europeu, que data de 1978-1979.

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E nenhuma destas decisões deu origem a debates tão aprofundados nos parlamentos dos países membros, como a ratificação do Acto Único. Talvez porque este revestiu a forma de tratado, enquanto que as restantes nasceram de decisões e resoluções comunitárias.
E não deixa de ser significativo que sejam afinal aquelas mesmas decisões da década passada que, de certo modo, são desenterradas a pretexto da discussão do Acto Único. O relatório que a Comissão de integração Europeia aprovou maioritariamente dedica-lhe grande espaço. Esta problemática é, no entanto, a maior parte dás vezes, posta de forma enviezada, ficando-se por argumentos marginais nem sempre cheios de carência.
E isto porque se não vai ao problema de fundo que tem a ver com a visão do contrato europeu.
O debate sobre a validade do Compromisso do Luxemburgo é ocioso. O Acto Único integra a visão fundamental daquele compromisso, excluindo, naturalmente, as preversões da sua prática, e conduz à sua pureza os processos decisionais do Tratado de Roma.
Não surpreende por isso que ao atacar o problema pelo seu lado acessório se tomem posições contraditórias quanto à regra de unanimidade. Ora se teme, ora se deseja. Ora se acha útil, ora perigosa.
A visão pessimista, que aliás integra todo o relatório da Comissão de Integração Europeia, acaba por exsudar um conjunto de receios. Não conseguimos perceber em definitivo quais as posições do PS e do PRD sobre a regra da unanimidade. Tal como ela hoje existe, já que a do PCP é clara, por ser contrário à integração.
Da questão da unanimidade/maioria passa-se - a nosso ver bem - para as questões mais essenciais: a da eventual perda da soberania em resultado das decisões comunitárias e o controle parlamentar - uma e outra tratadas de forma imperfeita.
O que define a supranacionalidade é a transferência de competências dos Estados em proveito de uma outra entidade jurídica e não á exigência que um processo de decisão seja maioritário ou por unanimidade.
A Comunidade continua a ser, fundamentalmente, um centro de concertação entre Estados, o que não chega, só por si, para lhe dar uma especificidade política.
É verdade que todos os contratos ou acordos criam interdependências. As interdependências entre as nações são um dado adquirido da vida moderna dos povos. E não é por via delas que se põe em causa a sua soberania - pelo contrário. Os isolamentos levam sempre a uma falta de progresso, fomentam os atrasos, tornam os países mais vulneráveis e mais dependentes, logo, menos soberanos.
Qualquer negociação, bilateral ou unilateral, é uma interdependência assumida que traz proveito e vantagens às partes envolvidas, naturalmente com aspectos de mais e de menos agrado de cada uma delas. Importa apenas que o acordo no seu conjunto seja favorável. E se porventura o não fosse ou se deixasse de o ser existiria sempre um recurso último: a sua denúncia.
Daí que também se não justifiquem os receios sobre as implicações da participação na CEE quanto à diminuição de competências da Assembleia.
De resto não deixa de ser incoerente que aqueles mesmos que temem aquilo a que chamam «défice democrático» estejam abertos a aumentar as competências do Parlamento Europeu.

É que na Europa democrática da Comunidade os governos são responsáveis perante o parlamento. As suas acções estão sujeitas ao controle parlamentar, ainda que a posteriori, o que não sucederia se as competências hoje do Conselho - logo dos governos passassem para o Parlamento Europeu. Dar a este Parlamento os poderes que os mais receosos propõem teria inevitavelmente como consequência reforçar a dimensão da entidade política europeia, no que se contradizem.
Julgo ter deixado claro que se pode cair de paradoxo em paradoxo se não formos ao fundo das questões.
O Compromisso do Luxemburgo nasceu e traduz a ideia gaulista da «Europa das Pátrias», procurando pôr termo aos planos Fouchet de 1961-1962 sobre a União dos Estados Europeus. E estas duas perspectivas não podem coexistir como meta final. E quem não se decidir por uma ou por outra não pode, coerentemente, teorizar a Europa do futuro.
É evidente que se compreende o embaraço de alguns perante o verdadeiro significado do que resta no Acto Único do Compromisso do Luxemburgo.
É que, naturalmente, sabem que aquele Compromisso não impediu o reforço na entidade política europeia através da criação do Sistema Monetário Europeu, doze anos depois, que na sua formulação original, conseguida na Resolução do Conselho Europeu de 5 de Dezembro de 1978, se propunha criar um «sistema definitivo» que «comportará [...] a criação do Fundo Monetário Europeu e implicará a utilização plena e inteira do ECU como reserva e instrumento de pagamento».
Não se chegou lá nem sabemos se algum dia se chegará. Porém, isso, sim, era entrar pelos domínios da soberania.
Nestas coisas da Europa ainda há os que se deixam impressionar pelas falas do velho de aspecto venerando que no Restelo perguntava:

Não tens cidades mil, terra infinita
Se terras e riquezas mais desejas?

Pela nossa parte encontramo-nos do outro lado, mais próximo das recentes palavras de Torga: que aconselha que entremos na Europa «utilizando os mesmos métodos e práticas que eles usam, na agricultura, no comércio e na indústria, regidos pelas mesmas leis sociais que os governam [... ] (e) o façamos conscientemente e apenas como enriquecimento do que fomos e somos, sem perda de nenhuma das virtudes que nos caracterizam e dão jus a um posterior destino só por nós talhado. E que um dia, depois de sedimentadas as emoções da aventura, nos possamos orgulhar de ter estado idênticos a nós próprios, à altura do desafio, e sejamos capazes de escrever, com o mesmo génio de outrora, uma nova peregrinação, desta vez portas a dentro, igualmente inverosímil e verdadeira».
Somos dos que não tememos ir mais além no caminho de uma integração política consciente.
Com a determinação que as condições aconselham.
Hoje mais instante em face dos acontecimentos recentes no seio dos grandes blocos que exercem influência decisiva ,no sistema planetário.
Sem perder as suas características e compromissos, a Europa democrática precisa de se reafirmar e encontrar a posição a que histórica e culturalmente tem direito. O que só conseguirá se houver uma autêntica cooperação no mercado, na indústria, na criação cien-

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titica e cultural e numa postura de defesa. Em suma, se se criar um espaço interno e solidário, uma coesão económica e social no âmbito de uma real
coparticipação política.
Uma Europa excessivamente economicista permite, e mesmo leva, a uma Europa a múltiplas velocidades e de geometria variável. Uma Europa que seja uma entidade cultural e política só se constrói na coesão e só pode evoluir para uma velocidade comum, o que implica que os mais retardados tenham um acrescido momentum inicial que reduza e unifique o ponto de chegada. Nós optamos pela segunda hipótese.
Por tudo isto, porque a adesão às Comunidades é a grande questão nacional dos dias de hoje, que vai ditar a nossa vida colectiva por anos e anos, entendemos que não devia ser discutida no contexto da pequena política própria de um dado momento.
É uma questão que ultrapassa governos e legislaturas. A integração europeia é, além do mais, uma matéria que reúne um enormíssimo consenso na sociedade portuguesa, a favor da qual se tem manifestado a grande maioria dos partidos desta Casa.
Não admira que tivéssemos desejado que o debate sobre os problemas europeus se situasse na discussão das questões essenciais e que levasse à escolha dos melhores caminhos para atingir o fim almejado.
Porém, quiseram as oposições que assim não fosse, arrastando para este debate propostas de resolução e projectos de lei sobre os quais o Partido
Social-Democrata tem uma posição extremamente crítica.
Não me debruçarei sobre o projecto de lei n.º 381/IV, da iniciativa do PRD, sobre «Intervenção da Assembleia da República em matérias respeitantes à participação de Portugal nas Comunidades Europeias», por o meu partido ir apresentar um recurso da sua admissibilidade por inconstitucional. Facto que em si basta para demonstrar até que ponto foi o Partido Renovador Democrático no afastamento de consensos tão essenciais para uma bem sucedida integração na Europa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Fiquemo-nos pelas propostas de resolução.
Nada temos - antes pelo contrário - contra o proclamado desiderato de se fomentar um conhecimento aprofundado pela Assembleia do que se passou ou vai passar-se.
Mas não bastam as palavras que se dizem; não podemos ser ingénuos. A iniciativa tem um objectivo político indiscutível e insofismável que repudiamos. E que é desmentido pelos factos. Nunca as questões europeias foram debatidas tão amiúde e aprofundadamente como na vigência deste governo. Nunca houve tanta troca de documentação e informação como agora.
Não são os défices de relacionamento que podem ter ditado as propostas de resolução.
São uma crítica não disfarçada e injustificada ao Governo que se inscreve numa estratégia de confronto. Que a ser aprovada corresponderia a mais um passo na perturbação do normal funcionamento do Estado, que vai sendo prosseguida com preserverança pelos partidos da oposição que se sentam à nossa esquerda.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Resolver obrigar o Governo a fornecer os documentos oficiais comunitários seria um acto gratuito não fora o seu significado. As propostas que a Comissão das Comunidades no exercício do seu poder de iniciativa apresenta oficialmente ao Conselho são publicadas, e obtêm-se com toda a facilidade chovem-nos por todos os lados.
A dificuldade que podemos ter não reside na sua falta, mas na profusão de documentos que mal temos capacidade para digerir, como sempre acontece no âmbito das organizações internacionais. Podemos, além disso, dispor, em breve, dessa documentação de uma forma mais disciplinada e tratada através do sistema computorizado em montagem na Assembleia da República que nos coloca em contacto com bancos de dados. De resto, a disponibilidade dessa documentação é provada pelo excelente documento preparado pela Assembleia, sobre «Um ano de integração europeia». Nem se pode falar na falta de informação pelo Governo quanto às suas orientações e políticas.
E é preciso não esquecer que, se tal acontecesse dispunha a Assembleia da República de mecanismos suficientes para suprir todas as lacunas.
Não está portanto em causa garantir um bom relacionamento nesta matéria entre o Governo e a Assembleia, sobre o que todos estamos de acordo.
A questão é outra e é política.
Mais uma vez se pretende trazer para o foro da Assembleia matéria da competência governamental, violando o princípio da separação e interdependência dos órgãos de soberania.
Seguindo os caminhos que o PS, PRD e PCP têm vindo a trilhar, procura-se identificar fiscalização política - que é inegavelmente uma competência da Assembleia- com uma capacidade de decisão ou co-decisão em competências do Governo, o que é inconstitucional, e para nós é inaceitável.
Mesmo deixando, por um momento, de lado a questão dos princípios, o que se propõe, se fosse aceite, prejudicaria os interesses nacionais por limitar e diminuir a capacidade negociai do País.
Ninguém pode conseguir bons resultados, numa negociação, tolhido de todo o espaço de manobra, quando se é forçado a adoptar posições rígidas e inflexíveis condicionadas por pré-negociações a outro nível, que ainda por cima inevitavelmente iriam cair no domínio público.
As posições de defesa de interesses precisam de evoluir à medida que surgem as propostas e reacções dos interlocutores.
Não está fora das práticas negociais começar por exigências onde se sabe que se vai ceder para fazer ganho de causa noutros pontos, mais importantes, que pode não interessa levantar de início.
É verdade que há que ter à partida uma noção exacta do que se pretende e fixar os objectivos principais; e nisso é imprescindível obter um apoio generalizado, e o Governo manifestou expressamente esse desejo e disponibilidade à Assembleia. Mas tem de ser deixada toda a possibilidade de subtileza negociai para os atingir.

ao contrário do que muitas vezes se pretende fazer crer, não reforça a posição negociai, seja de quem for, exigir resultados que ultrapassam a possibilidade da sua execução, tarefa votada ao inevitável insucesso.
Os trabalhos preparatórios para uma negociação não podem ser outra coisa senão trabalhos preparatórios - passe a lapalissada. Exigir a sua análise é um
contra-senso.

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Tudo isto nos parece tão evidente que só mais uma tentativa de trazer para as negociações comunitárias questões de política interna pode justificar o teor das propostas de resolução apresentadas. O que a nosso ver é lamentável, a integração europeia devia estar à margem das pequenas guerras da conquista do poder.
Estou certo que nenhum dos partidos que apoiam os projectos de resolução as aceitaria, ou respeitaria, se tivesse a seu cargo a condução dos negócios do Estado. São propostas incontinentes. Esta atitude só pode ter uma leitura política por mais paradoxal que ela pareça. Significa que a oposição à esquerda do PSD renunciou ao exercício do poder por um bom par de anos. Quem aspira a ser Governo não se pode permitir criar situações autolimitadoras e impeditivas da normal gestão do Estado, com a natureza das propostas apresentadas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Embora já habituados a algumas piruetas, mesmo assim, não deixaria de ser bizarro que conscientemente se propusesse hoje o que amanhã teria de se repudiar. A menos que esses partidos sintam que não irão deter em breve o poder, limitando-se a optar pela co-decisão; a defender um executivo de carácter «convencional» e não um sistema de governo parlamentar, o que é totalmente contrário ao nosso sistema político.
E não se diga que é abusiva a nossa conclusão. Temos visto o PS e o PRD jogar ao ió-ió da crise e das eleições, indecisos e sem bússola que os oriente. Ternos visto a dança dos encontros que se salda por frustrantes declarações de empurra para outrem de iniciativas políticas que desejariam tomar. Temos visto a falta de horizontes que está a conduzir a grupusculizações que voltejam em torno de um só ponto: o pavor de deixar governar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Posições que por tão obscessivas estão a levar à irracionalidade. Vivendo nós uma situação de governo minoritário, se aquele pavor tivesse razão de ser, fosse legítimo e aceite pela população, era aí, nele, que se poderia ir buscar o melhor argumento e pretexto para derrubar o Governo. E satisfazer meia dúzia de frustações reprimidas. Só que as oposições sabem que o não podem fazer, que não há razões para isso. Daí o seu desespero, que, sendo companheiro de mau aviso, leva a que se queira transformar um debate, que à partida genericamente se desejava construtivo, em mais um capítulo na procura dê distorções constitucionais e na demanda do inadequado e inaceitável.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Apesar disto, felicitamo-nos por termos dedicado o dia de hoje a tratar da adesão à Comunidade.
O choque da adesão foi neste primeiro ano favorável e positivo e continuará a sê-lo nos anos que se vão seguir, a clareza das posições de cada um, ainda que delas possamos divergir, vai certamente ajudar-nos a melhor ultrapassar aqueles aspectos menos favoráveis e mais delicados que não tardarão a surgir, talvez mesmo antes do fim do presente ano.
Porém, munidos com os consensos básicos adquiridos, apoiados na vontade dos Portugueses e na acção do Governo, estaremos certos que seremos capazes de conseguir os nossos objectivos fundamentais. Pela parte do PSD não nos pouparemos a todos os esforços para o conseguirmos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formularem pedidos de esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados Silva Lopes, João Corregedor da Fonseca, Eduardo Pereira e Carlos Carvalhas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Lopes.

O Sr. Silva Lopes (PRD): - Sr. Presidente, a intervenção do Sr. Deputado Victor Crespo levanta dúvidas que, se fôssemos aqui a enumerar completamente, tomariam uma parte importante do debate. Não poderei, portanto, fazer pedidos de esclarecimento sobre todos os pontos da intervenção do Sr. Deputado que me levantam dúvidas; vou apenas escolher alguns, uma vez que é impossível tratar de todos.
O Sr. Deputado Victor Crespo, ao querer apontar presumíveis contradições no relatório da Comissão de Integração Europeia, falou, entre outros aspectos, no problema do vazio democrático e disse que o relatório da Comissão aprovado por maioria tinha ideias pouco claras a respeito deste problema, uma vez que não se sabia se se haveria de dar mais poder ao Parlamento Europeu ou aos parlamentos nacionais.
Quanto a este aspecto, gostaria de perguntar ao Sr. Deputado onde é que está a contradição. É que o problema do vazio democrático existe pelo facto de as decisões do Conselho de Ministros da CEE não serem controladas nem pelo Parlamento Europeu nem adequadamente pelos parlamentos nacionais, nomeadamente pelo Parlamento Português - apesar de tudo, nos outros países ainda há algum controle que no nosso país não existe e que o Governo pelos vistos continua a querer recusar.

O Sr. António Esteves (PS): - Muito bem!

O Orador: - As decisões do Conselho em muitos casos não são depois sancionadas ou fiscalizadas pelo Parlamento Europeu e da maneira como as coisas estão actualmente também não são sancionadas pelos parlamentos nacionais. O que pretendemos - e este é um dos pontos que assinalámos no relatório - é que haja controle por uma das duas instituições. Enquanto o Parlamento Europeu não tiver mais poder é necessário que haja mais poder por parte dos parlamentos nacionais. Pergunto, portanto, onde está a contradição.
A segunda questão que gostaria de lhe colocar refere-se à troca de informação. E chega a ser inconcebível que oiçamos aqui dizer que o Governo nos tem fornecido muito informação. Ainda esta manhã tivemos aqui o caso, verdadeiramente incrível, de um ministro nos vir dizer que o «Relatório Delors» é considerado reservado. Um relatório que foi entregue a todos os parlamentos da CEE, que está em todos os meios de comunicação social e que foi comentado em todos os jornais, para termos aqui conhecimentos dele tivemos que andar a obtê-lo por vias que não a governamental.

Vozes do PRD: - Muito bem!

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O Orador: - Gostava de saber do Sr. Deputado Victor Crespo se os outros parlamentos não receberam o «Relatório Delors», o «Documento Verde», sobre a política agrícola comum, ou o «Livro Branco», sobre as políticas do mercado interno. E nós o que recebemos?

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Nada!

O Orador: - O que temos recebido são declarações vagas e pobres - a que aliás o Sr. Deputado Victor Crespo tem assistido - feitas pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros ou pelo Secretário de Estado da Integração Europeia, que aliás estão registadas. Portanto, quem quiser ver a qualidade e o conteúdo dessas declarações pode ir ver as actas da Comissão de Integração Europeia.
E também gostava de saber se as três ou quatro frases que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros nos disse sobre o «Relatório Delors» substituem as 40 páginas desse Relatório.
Uma outra questão tem a ver com o reforço da intervenção do Parlamento em discussões relativas aos assuntos da CEE.
O Sr. Deputado Victor Crespo, como membro da Comissão de Integração Europeia, certamente que, tal como todos nós, teve reuniões com a Comissão de Legislação Comunitária do Parlamento Irlandês e com a do Parlamento Inglês e sabe que existem comissões análogas noutros países. Gostava de lhe perguntar se acha que o projecto do PRD exige algo mais do que aquilo que se exige no Parlamento Inglês, no Irlandês, no Francês, etc. Será que nesses países há, também, um propósito de se levar a luta política interna para o plano comunitário? Ou será que nesses países se tem um conceito de democracia bastante diferente do que tem o Governo ou o PSD nesta matéria?

Aplausos do PRD, do PS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Deputado Victor Crespo, ouvi atentamente a sua exposição e se, inicialmente, V. Ex.ª expressa os seus conceitos filosóficos sobre a CEE - muito bem, tem todo esse direito -, logo a seguir passa atacar partidos - também tem esse direito - e, pelo menos por duas vezes, declara que «temos que ir ao fundo das questões». Assim, gostaria de lhe fazer duas perguntas.
O Sr. Deputado Victor Crespo acha que realmente se têm feito todos os esforços para se promover um maior e cada vez mais necessário desenvolvimento do País perante os desafios da nossa adesão à Comunidade e não só? Entende que, na realidade, este governo tem actuado de forma assim tão positiva que nos leve a sermos tão optimistas? Por exemplo, no sector do ensino, de que V. Ex.ª é um profundo especialista, e nos sectores da indústria, da agricultura, das pescas, dos transportes e mesmo das comunicações, V. Ex.ª entende que o Governo tem actuado de forma assim tão positiva, Sr. Deputado Victor Crespo? Isto é tanto mais grave quanto não é certo que assim seja e também porque a CEE nos obriga a um esforço cada vez maior. Se se prosseguir neste caminho que está a ser trilhado, V. Ex.ª não acha que Portugal poderá vir a ser prejudicado e incapaz de se defender perante a agressividade dos outros parceiros da CEE?

Creio que não é esta a primeira vez, Sr. Deputado Victor Crespo, que lhe coloco a questão de que, até 1992, Portugal tem de se preparar para o chamado «grande mercado interno». Perante esta necessidade, gostava de saber se Portugal deve ou não, através de uma política de desenvolvimento com programas realistas, preparar-se convenientemente para aproveitar as nossas capacidades e potencialidades, sendo certo que este governo nem sequer tem sabido aproveitar convenientemente a conjuntura internacional altamente favorável.
Já agora, referir-me-ei à sua declaração - que não esperava acerca da existência de «uma estratégia de confronto» a propósito de possíveis projectos de resolução que viremos a ter que discutir ainda hoje. Com certeza que se referia a uma «estratégia de confronto» da Assembleia para com o Governo. É evidente, Sr. Deputado, que se for o Governo a fazer esta declaração podemos discuti-la, mas é aceitável porque o Governo está no seu papel. Agora, ouvir isto dito por um deputado parece-me um pouco exagerado. Pergunto-lhe, então, onde é que está a «estratégia de confronto» e por que razão é que um deputado desta Câmara, responsável como V. Ex.ª é, está contra os poderes da Assembleia da República. O Sr. Deputado entende ou não que a Assembleia da República deve ser devidamente informada, em tempo útil, dos trabalhos preparatórios elaborados pela Administração Portuguesa, sobre as propostas da Comissão das Comunidades Europeias e sobre as análises e debates ao nível do Conselho dessas Comunidades relativos à concretização das orientações e das políticas do Acto Único Europeu, como sejam a elaboração do novo regulamento para o funcionamento do Conselho, a reforma dos fundos estruturais da CEE, a eventual participação de Portugal nos esquemas de cooperação monetária, etc.?
Sr. Deputado, não acha que seria mais útil para o Governo, para a Assembleia da República e para o País que essas informações viessem atempadamente de forma a permitirem debates úteis com o Governo, mais úteis do que os que têm acontecido, com base numa maior e mais profunda informação? Um debate dessa natureza na Assembleia da República, entre si e também com o Governo, não acha que poderia ser altamente positivo para todos nós, Sr. Deputado? Como é que o facto de se pedirem informações ao Governo e de se debaterem questões momentosas de interesse para todo o País pode ser classificado como sendo uma «estratégia de confronto», Sr. Deputado?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Deputado Victor Crespo, nesta bancada, conhecemos as posições do Governo nesta área e também conhecemos o papel de «colchão» que faz o PSD em relação a estas questões, mas não conhecemos a posição do PSD. Nem V. Ex.ª nem nenhum dos seus colegas da Comissão de Integração Europeia expôs, alguma vez, na Comissão as suas próprias posições, as posições do seu partido em relação a questões desta gravidade.
O Sr. Deputado diz que « a adesão é a grande questão dos dias de hoje, não pode ser discutida na pequena política». Mas, Sr. Deputado Víctor Crespo, que outra

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coisa têm feito os representantes do PSD na Comissão que não seja discutir os grandes problemas que ali têm sido colocados na pequena política?
O Sr. Deputado diz que, em menos de um ano, é a terceira vez que debatemos os problemas da CEE. Sr. Deputado, nunca discutimos o problema da CEE neste Plenário! O que aconteceu foi a marcação, por duas vezes, sem tempo de preparação e sem esclarecimento, de um debate a propósito do Acto Único Europeu. Estávamos a tentar, hoje, discutir estes problemas pela primeira vez e, para isso, precisaríamos de um ou dois dias e não dos 40 minutos que VV. Exª destinam à intervenção de um partido de oposição como é o nosso, a fim de o amordaçarem no debate destas questões. Precisávamos de mais tempo, aqui e em Comissão.
O Sr. Deputado Victor Crespo diz que «há matérias que são de decisão governamental e que não podemos, de forma nenhuma, estar a dialogar mais do que temos feito. O Governo está totalmente à disposição da Assembleia, para dialogar». Sr. Deputado, apesar dos seus esforços, o Governo apareceu, esporadicamente, antes deste debate e, levando em conta que, em termos parlamentares, sexta-feira é véspera de terça-feira, apareceu na sexta-feira para dar esclarecimentos que já não puderam ser levados em consideração.
A pergunta é só esta: qual é a proposta que, em nome do PSD, o Sr. Deputado Victor Crespo quer apresentar neste Parlamento para pautar as relações entre o Governo e a Assembleia nas relações com as Comunidades?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Venha ela!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Deputado Victor Crespo, algumas das questões que lhe queria pôr foram já formuladas, pelo que só sublinharei uma questão.
O Sr. Deputado gabou a excelência das relações de muitos governos dos países da CEE com os respectivos parlamentos. Ora, o Sr. Deputado tentou «branquear» a acção deste Governo, pois é membro da Comissão de Integração Europeia e sabe o que tem sido a pobreza franciscana das informações que este governo tem prestado, não desconhece a razão da gravação das reuniões da Comissão e sabe que não têm sido dadas informações concretas, como já aqui foi demonstrado. A não ser que se quisesse referir ao nível da intervenção do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros na última reunião da Comissão de Integração Europeia, em que este até referiu que «se pudesse, a CEE punha-nos a todos com farda de empregados de café»!
Portanto, Sr. Deputado Victor Crespo, ao tentar «branquear» a atitude do Governo e apesar de ser membro do partido do Governo, penso que não deveria ter feito uma intervenção que eu só não classifico de hipócrita porque estamos na Assembleia da República e deixo ao Sr. Deputado a bondade de a classificar. Mas pergunto-lhe se, em matéria de integração europeia, este governo tem, ou não actuado como se fosse o único órgão de soberania, agindo sozinho,

I SÉRIE - NÚMERO 53

tendo, portanto, a responsabilidade dos malefícios que este ano se poderão verificar em relação às matérias que já aqui expusemos.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Crespo.

O Sr. Victor Crespo (PSD): - Nas perguntas que me foram dirigidas existe, efectivamente, uma questão recorrente que passa por todos os Srs. Deputados e, portanto, a resposta que vou dar ao Sr. Deputado Silva Lopes também constituirá parte das respostas aos outros Srs. Deputados que, depois, procurarei completar.

Basicamente, o Sr. Deputado Silva Lopes fez-me três perguntas. Uma destas foi sobre o défice democrático parlamentos nacionais/Parlamento Europeu. Surpreende-me que o Sr. Deputado tenha colocado a posição da forma que o fez. Julgo que fui relativamente claro naquilo que disse ao afirmar que entendo que as questões da Comunidade Económica Europeia devem ser tratadas da forma mais consensual possível quando se trata dos grandes objectivos. Onde eu divirjo completamente é quando se vai para outros campos. Sr. Deputado Silva Lopes, quer queiramos quer não, é evidente que os governos de todos os países da Europa Ocidental dependem dos parlamentos, pois são derrubáveis pelos parlamentos, são susceptíveis de crítica política e são susceptíveis de controle, o que não aconteceria se transitassem para o Parlamentos Europeus certos poderes que, hoje, residem no Conselho Europeu ou no Conselho de Ministros. Nestas circunstâncias, esse controle pelo parlamento nacional não poderia fazer-se de maneira nenhuma, o que me parece óbvio, embora eu não esteja a advogar que não haja um reforço das competências do Parlamento Europeu.

O Sr. Deputado vem com um problema que, aliás, recorre noutras perguntas, segundo o qual, comparando com a de outros países, a nossa situação é mais desfavorável. Quero dizer-lhe que isso não é exacto, pois estive nalgumas reuniões e tive ocasião de ler alguns textos . É evidente que na maior parte dos parlamentos e no momento da ratificação se exige que os governos façam relatórios ao parlamento que, normalmente, são anuais. Também no nosso caso e este ano se fez isso.

Curiosamente, um dos casos mais citado é o da França. Sobre este, Sr. Deputado Silva Lopes, se me permite, queria dizer-lhe só uma coisa pelas consequências que teria. Como sabe, na prática da Comunidade, quando os problemas «aquecem», quando são mais complexos, passam do Conselho de Ministros para o Conselho de Chefes de Estado e de Governo, ou seja, passam para o Conselho Europeu. Como o Sr. Deputado sabe, no caso francês, o Presidente da República é que é o representante no Conselho Europeu e só muito recentemente, por razões de co-habitação, é que aquele se faz acompanhar pelo Primeiro-Ministro. Mas, mesmo assim, é o Presidente da República que toma a maior parte das decisões no Conselho Europeu e essas são as grandes decisões. Ora, acontece que os Presidentes da República não são responsáveis perante os parlamentos. Portanto, o caso francês, apresentado como paradigmático da situação do controle parlamentar, é aquele onde, curiosamente, este controle é o mais enfraquecido. Ao apresentar este exemplo, quero levar

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a um extremo e por analogia que muitos dos raciocínios que se fazem acerca desse controle parlamentar não têm validade nenhuma.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Deputado Victor Crespo, naturalmente que o sistema constitucional francês é diferente do português e são conhecidas as responsabilidades do Presidente da República no sistema constitucional francês. Em todo o caso, até pela sua vivência pessoal em França, o Sr. Deputado não desconhece a existência de críticas internas em relação a esta posição. Falar-se-ia, por exemplo, de um livro conhecido que foi um best-seller e que, com certeza, o Sr. Deputado não deixou de adquirir. Refiro-me a A Direita Absoluta, a propósito da crítica ao Presidente Valéry Giscard D'Estaing e ao seu papel na condução da política externa francesa.
Em segundo lugar, a questão extremamente importante que se prende com as relações da política externa francesa e com a Comunidade é em relação à associação do Primeiro-Ministro e às publicações que têm sido feitas e ao debate que, em termos do Parlamento Francês, foi feito acerca da discussão da posição francesa no Parlamento Europeu e acerca do Acto Único Europeu. Sr. Deputado, ainda esta semana saiu um livro sobre esta matéria, que o Sr. Deputado certamente não desconhece, em que esse ponto foi discutidíssimo e, embora não sendo talvez um bom exemplo, o Parlamento Francês tem exigido com grande eficácia que lhe sejam prestadas contas sobre a posição da França em relação às negociações europeias.
Com certeza que não será necessário invocar perante o Sr. Deputado a posição francesa em relação à política agrícola comum, que é suficientemente conhecida através da imprensa, para justificar qual o controle que os Franceses exercem sobre as suas posições na Comunidade Económica Europeia.

O Orador: - Sr. Deputado, evidentemente que, apesar de terem pontos comuns, sei que todos os sistemas, todos os governos são diferentes, pois todos os países têm Constituições diferentes, e não é isso que me preocupa. Limitei-me a pegar no argumento que é utilizado e mostrei-lhe a sua outra face. O que nos apresentam, sempre, são as situações que existem lá fora e eu tentei demonstrar que estas não são tão claras e tão líquidas que permitam que se tirem as conclusões que pretendem tirar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mais: é evidente que o problema da discutibilidade, da análise, do aprofundamento das questões da integração europeia - reafirmo-o - é uma necessidade, porque ultrapassa governos e legislaturas e é um problema para 10, 20, 30 anos, e muito mal iríamos se não houvesse um acordo tão perfeito quanto possível. Mas não é isso que está em causa, não é que não haja acordo quanto aos princípios, às grandes linhas e aos objectivos a atingir. O problema é o da accountability.

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O Sr. Eduardo Pereira (PS): - É o problema da responsabilidade pelos actos!

O Orador: - Não é o problema da responsabilidade pelos actos. Esse era o problema que eu estava a pôr quanto à situação francesa, em que o Presidente da República Francesa pode realizar um acto que não é directamente fiscalizável pela Assembleia Nacional Francesa. Mas é evidente que as questões da política externa francesa e da política de integração europeia são discutidas, lá como aqui. Fazemos agora o terceiro debate sobre esta questão e a minha crítica fundamental foi por termos desvirtuado este debate, por não termos deixado que fosse feito nos termos em que eu julgaria ou, pelo menos, gostaria de poder fazer, atrelando-lhe questões - essas, sim, é que me levaram a reagir e a repudiar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao problema da informação, é daqueles que nunca se podem demonstrar: ou há a mais ou há a menos.
Apresentei como exemplo, um exemplo claro, os «livros amarelos» que a própria Comissão e a Assembleia da República editaram, contendo toda a documentação necessária.
Falou no Relatório Delors. Eu não sei se ele existe nos outros parlamentos ou não. Pertenço a este Parlamento não pertenço a outros e, por isso, não sei se está ou se não está. Não sei se está ou se devia estar ou se não devia estar... ! Penso, porém, que o Sr. Ministro foi claro hoje de manhã quando disse que ainda só se tratava de um documento de trabalho e que logo que fosse um documento oficial e nacional, seria publicado no jornal oficial nas quotas COM.
Portanto, Sr. Deputado, é evidente que temos acesso a toda a informação oficial e, através dela, podemos fazer toda a crítica política e apontar toda a responsabilização política do Governo.
Claro que se trata de um juízo de valor sobre as declarações dos membros do Governo que vieram à Assembleia da República! É evidente que se quisermos ser completamente objectivos não há nunca nenhuma informação que possa satisfazer todos os interesses! Não há informações perfeitas, completas e absolutas, particularmente quando se está a pensar num ponto mais além! Mas que eu saiba, as perguntas feitas tiveram resposta adequada e na medida do possível, dado o conceito que essas perguntas encerravam.
Portanto, não vejo que exista um défice suficiente de informação que justifique a medida tomada ou a apresentação de propostas de resolução ou de projectos de lei.
É evidente que procurar estabelecer um bom relacionamento interpares é defensável. Sempre o defendi, continuo a defender e ainda agora tive ocasião de o fazer. Só que as iniciativas tomadas têm uma carga política! Não vale a pena ignorar! Elas têm a carga de uma censura e de uma exigência ilegítima em relação àquilo que se passou. Este é o ponto de vista da minha bancada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Essa é a razão por que discordo delas, e não tanto pelo que as resoluções contêm, pois nalguns pontos até as posso subscrever, embora noutros

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obviamente que não, como tive ocasião de dizer - aliás, não posso subscrever erros, como é o caso do ponto 2 da resolução do PRD, que contém um óbvio lapso e por me parecer que tem o contrário do que pretendia dizer, nem sequer a refen.
O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca levantou um problema...

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Metafísico!

O Orador: - ... que não é metafísico, como disse o meu colega, só que tenho uma perspectiva completamente diferente.
Os Srs. Deputados pensam que dignificar o Parlamento é empurrá-lo para os sítios onde não pode funcionar bem. A minha posição é completamente contrária: dignificar o Parlamento é levá-lo para aquilo em que pode funcionar bem.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Seguimos, pura e simplesmente, aquilo que sucede em todos os parlamentos europeus: essas discussões estão no ar!
No entanto, que eu saiba, em lado nenhum fiscalização corresponde a co-decisão. Ora, aquilo que se pede nas resoluções e aquilo que se tem vindo a pedir, de algum tempo a esta parte, corresponde a uma co-responsabilização Parlamento/Governo que vai no sentido contrário do dos interesses do próprio Parlamento, porque, como se sabe, para se co-responsabilizar, analisar ou avaliar é preciso estar de fora. Se se mete dentro, não se pode fazer isso, pois anula-se a responsabilidade fundamental do Parlamento que é, pura e simplesmente, fiscalizar. Fiscalizar com dureza e com objectividade, se se quiser, mas fiscalizar, não co-decidir.
E esse é o ponto fundamental da minha divergência. Como parlamentar e para dignificar o Parlamento não gostaria que fôssemos empurrados por uma situação minoritária que está a degradar a estrutura do poder político em governos parlamentares. E essa foi a razão da objecção que levantei.
A proposta é muito simples, é aprofundar aquilo que já temos vindo a fazer, porventura, com deficiências.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O tempo de que dispunha está exaurido, mas - se o Sr. Presidente me der licença - gostaria de fazer um comentário sobre a afirmação aqui feita de que o Governo aparece esporadicamente nos debates.
Ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas, que classificou a minha intervenção com um adjectivo, quero dizer que, não adjectivando eu as intervenções dos outros colegas, me abstenho de comentar aquela afirmação. A minha intervenção foi o que foi. Está escrita e vale o que vale.
Sr. Deputado Eduardo Pereira, quero dizer que, embora reconhecendo que a vinda de membros do Governo na sexta-feira foi um tudo ou nada tardia, também não podemos deixar de reconhecer que as explicações dadas nessa reunião - a que o Sr. Deputado, naturalmente por razões muito ponderosas, não pôde estar presente - foram as possíveis, que a reunião se prolongou por toda a tarde e que os membros do Governo têm outros afazeres entre os quais a defesa dos nossos interesses em Bruxelas nas Comunidades.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Vice-Presidente Marques Mendes o favor de me vir substituir por alguns momentos e convoco os líderes dos grupos parlamentares para uma breve reunião no Gabinete do Sr. Presidente.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.

Neste momento, assumiu a presidência o Vice-Presidente Marques Mendes.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Como não vejo neste momento o Sr. Deputado Victor Crespo na sala aguardarei o seu regresso para lhe fazer alguns comentários.
No debate aqui ocorrido, aquando da discussão do Orçamento de Estado e das grandes opções tive ocasião, em 20 de Novembro, de chamar mais uma vez a atenção para o modo como se devia encarar a participação de Portugal na CEE.
Disse então: «[...] representa ela - essa participação - um decisivo e globalizante objectivo estratégico e nacional. Mas a integração não pode ser vista com a auto-satisfação governamental própria de quem parece considerar que o País está apenas numa simples associação de interesses económicos. Ocorre num momento chave para a definição e consolidação de uma nova posição de Portugal perante o mundo. Tem por isso de ser vista como a emanação externa, activa e participada, de um projecto nacional de modernização e desenvolvimento que, sem nisso se consumir por inteiro, conceba a frente externa como o natural e necessário prolongamento desse projecto, na medida em que com ele e por ele se reafirmam valores e objectivos permanentes do Estado, se projecta o nosso contributo, salvaguardando os interesses específicos, na construção europeia, aí se colhendo os apoios e as contrapartidas, negociadas por quem tudo deve fazer para adquirir capacidade real de intervenção no plano comunitário.»
Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: É nesta perspectiva responsável que encaramos este debate, em boa hora solicitado, digo mesmo justamente pressionado, pela Comissão de Integração Europeia, e sem cuja iniciativa ele se não realizaria, pelo menos no quadro e nas condições em que decorre.
Encontra-se aqui o cerne de uma primeira e decisiva observação quanto à concepção do Governo sobre o relacionamento institucional em matéria de tão decisiva importância.
Durante mais de um ano, o Governo informou pouco - várias vezes praticamente nada - a Assembleia, quer sobre a sua estratégia europeia, quer sobre os vários eventos de interesse nacional que se desenrolavam, apesar de insistentemente chamado a fazê-lo.
Descontando a preparação do Orçamento e uma ou outra manifestação de presença, quase simbólica, foi na iminência deste debate que se sucederam, porque pedidas, as presenças ministeriais, se mobilizaram gabinetes e estruturas da Administração, se dactilografaram

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páginas de números e de texto. Tudo para os Srs. Deputados e, o que é a um tempo estimulante e grave, por causa dos Srs. Deputados, que afinal - ao que parece - assim perturbaram a paz rotineira, própria da desinformação.
Culminou tudo na apresentação pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros do documento de balanço, obviamente para fazer frente ao debate parlamentar, uma vez que o próprio título da publicação adopta praticamente a há muito anunciada primeira parte desta discussão. Mas, em contrário do que aconteceria em qualquer democracia ocidental, em idênticas circunstâncias, o balanço foi também objecto de uma operação de relações públicas fora do Parlamento e à revelia dele. Facto consumado, pois, para os senhores parlamentares, que desse modo ficariam como entidades sobrantes e dispensáveis de um processo que legítima e responsavelmente desencadearam. Só que não é, não pode, nem será assim.
Mais um pequeno e significativo episódio dos nossos costumes, na interpretação que lhes dá um Governo a propósito da causa nacional que é a da integração europeia.
Como se o Governo, qualquer governo afinal, pudesse prescindir do papel que, em todas as legítimas dimensões e não fora delas, cabe à representação nacional nesta área de que depende o nosso futuro colectivo.
Abordarei, em primeiro lugar, o balanço do primeiro ano da integração, de uma forma necessariamente sumária, logo de grandes linhas.
Apresento à consideração da Assembleia da República, em nome do meu grupo parlamentar e como anexo à minha intervenção, um extenso documento sobre análise desse balanço e também um documento sobre as virtualidades, as orientações e políticas no quadro do Acto Único Europeu. No final desta intervenção, entregá-lo-ei na Mesa.
Um debate sério e construtivo sobre as consequências da adesão de Portugal às Comunidades Europeias terá de centrar-se mais no exame das políticas mediante as quais serão atingidos os objectivos básicos da opção europeia do que na mera análise dos resultados porventura já obtidos nas diversas vertentes influenciáveis pelo novo enquadramento comunitário.
Seria naturalmente mais fácil, como fez o Governo no documento distribuído, pegar nas diversas áreas cobertas pela acção comunitária e proceder à discussão caso a caso dos acontecimentos ocorridos desde a adesão. Afastamos, contudo, essa metodologia por ela traduzir uma visão superficial e parcelar do processo de integração europeia, que encaramos não apenas como a participação numa entidade com competências mais ou menos limitativas dos poderes nacionais, mas antes como o meio privilegiado para a promoção do desenvolvimento económico do País e do bem-estar dos Portugueses e para a participação na grande tarefa do futuro que é a da construção europeia.
A opção que consistiria em analisar os diferentes indicadores macroeconómicos, tentando evidenciar a evolução - positiva ou negativa - imputável à adesão, também se nos não afigura correcta. Basta atentar na importância decisiva que outros factores, tais como a conjuntura internacional favorável e os efeitos benéficos da política de estabilização prosseguida nos anos anteriores, tiveram na nossa economia, para tornar impossível qualquer tipo de análise que pretendesse isolar os efeitos directamente provocados pela aplicação das regras comunitárias.

Também não enveredamos pela solução fácil das conclusões puramente subjectivas, como sejam as relativas a diversos comportamentos, à imagem externa do País, ao grau de envolvimento nas discussões comunitárias ou à apreensão do ideal europeu.
Haverá, igualmente, que resistir à tentação de contabilizar os resultados da adesão no curto prazo através dos fluxos financeiros. Que Portugal não tenha sido contribuinte líquido da Comunidade no primeiro ano é tranquilizante, ainda que a hipótese de o ser assumisse foros de escândalos internacional. Mas também não basta ser beneficiário líquido, afigurando-se em particular necessário que os fundos agora postos à nossa disposição sejam canalizados para os projectos mais adequados aos atrás assinalados objectivos básicos da adesão, ou seja, tanto o desenvolvimento global do País e a atenuação das disparidades regionais, como a distribuição justa das novas disponibilidades por toda a população e não apenas por alguns privilegiados.
A forma mais realista de procurar retirar algumas ilações da experiência adquirida em prazo tão curto consiste na análise daquilo que foi feito e do que falta fazer para que a adesão às Comunidades Europeias se traduza no sucesso desejado e no qual nos empenhamos.
É hoje um lugar comum dizer que a entrada de Portugal para um espaço constituído por países mais desenvolvidos representa um tremendo desafio. Logo, o choque da adesão é inevitável e a questão fulcral reside pois na adopção das medidas mais apropriadas para evitar que esse choque provoque perturbações económico-sociais susceptíveis de comprometer o sucesso da opção europeia, do mesmo passo que permita avançar nos nossos desenvolvimento e modernização.
Foi justamente para dosear, em termos adequados à realidade nacional, o grau e os modos dessa abertura que se negociaram as medidas de transição constantes do Acto de Adesão. Tais medidas visam, essencialmente, proteger os sectores mais vulneráveis à concorrência externa, durante o período considerado suficiente para se ajustarem ao novo condicionalismo comunitário. Contudo, a natureza gradual da maioria dessas medidas tem por objectivo a conciliação do interesse em amortecer o choque provocado pela referida abertura com a necessidade de activar a adaptação estrutural.
É, assim, natural - e não pode ser escamoteado - que no primeiro ano do período de transição ainda tenha prevalecido o elemento de protecção assegurado pelas citadas medidas. Não é, pois, de estranhar a ausência de perturbações assinaláveis, nem este facto pode ser interpretado, como parece pretender o Governo, como uma gestão adequada da transição. Trata-se apenas de um efeito normal, desejado e conseguido pelos negociadores.
A situação ocorrida em 1986 não invalida, porém, que se siga com redobrada atenção a evolução nos próximos anos, uma vez que o desmantelamento progressivo da protecção ao longo do período de transição acabará por alterar este estado de coisas. Nada impede que o impacte da adesão se sinta mesmo durante a fase de aplicação das medidas específicas de transição. O que importa, Srs. Deputados, acima de tudo é criar as condições para que a integração dos sectores da nossa economia influenciáveis pela adesão se faça com o mínimo de perturbações. Este objectivo atinge-se, segundo a

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nossa opinião, por um esforço de ajustamento estrutural, ainda por nós comandado, em todas as áreas em que o nosso atraso face aos padrões comunitários é mais notório. E é aí que o Governo falhou de forma clara.
Pensamos que não pode haver ilusões a este respeito. Ou as modificações estruturais têm lugar em devido tempo - isto é, dentro dos limites consentidos pela estreita margem que a transição concede - ou a tão falada «integração harmoniosa» não será conseguida, o que trará custos sociais dificilmente suportáveis.

Uma voz do PS: - Muito bem!

O Orador: - Acresce que a aplicação do Acto Único Europeu obrigará a um esforço redobrado de adaptação no período consignado para a transição geral. Ora, mesmo tendo em conta as importantes espectativas criadas - e que permanentemente teremos de valorizar - pelo reforço da coesão económica e social, é no plano interno que se situa acção decisiva, em particular através da definição, sem hesitações nem ambiguidades, das políticas que propiciarão o máximo aproveitamento das virtualidades assim abertas. Para que servirá batermo-nos pelo acréscimo dos recursos comunitários vocacionados para a melhoria das estruturas, se continuar por definir, em especial através de adequadas estratégia e planificação, a forma como se aplicarão os meios assim postos à nossa disposição? Como poderia aliás o Governo fazê-lo sem políticas estruturalmente nacionais e sem Plano, que viu reprovado nesta Assembleia da República?
Que balanço se poderá, pois, fazer do ocorrido em 1986 neste decisivo capítulo das adaptações estruturais?
Haverá, em primeiro lugar, que manifestar a nossa perplexidade perante a ligeireza com que, na informação distribuída, o Governo aborda toda esta vertente do processo de adesão. Em vão aí se procurará qualquer referência às orientações adoptados nas grandes áreas mais directamente influenciáveis pela adesão e, bem assim, às acções prioritárias já desencadeadas ou a desencadear no quadro das políticas sectoriais. Em vez disso, o Governo enumera, de forma desgarrada e sem critério, as matérias onde se registaram desenvolvimentos em 1986, privilegiando a mera rotina de execução em deterimento da análise selectiva em função da importância relativa das diferentes áreas. Este comentário é particularmente pertinente nos capítulos dedicados à agricultura e à indústria, em que a pobreza da informação ultrapassa todos os limites. A titulo de exemplo, cite-se a omissão de qualquer referência a alguns sectores produtivos de grande importância e comprovada vulnerabilidade, ou ainda o conteúdo ridículo dos parágrafos dedicados aos restantes sectores sujeitos ao regime por etapas.
Mas mais grave, revelador e imperdoável se nos afigura a desconexão patente no campo estrutural, em que a análise se centra no mero somatório dos fluxos financeiros, ignorando-se por completo o enquadramento interno dos projectos que beneficiam dos financiamentos. Pela informação disponível poderá constatar-se a incapacidade no aproveitamento dos fundos no domínio vital da modernização das, empresas, o que não é de estranhar perante as confessadas faltas de um programa de desenvolvimento regional e do sistema de estímulos a vigorar no âmbito deste programei.

Outra omissão de monta é a relativa aos sectores onde são previsíveis as maiores dificuldades em virtude das novas condições de concorrência. Em nosso entender, não basta assinalar a defesa de alguns deles através da invocação da cláusula de salvaguarda. Torna-se necessário ir mais longe e indicar as medidas tomadas para que os sectores em causa se tornem competitivos no fim do período de vigência da protecção assim assegurada.
A total ausência de informação em todos estes domínios revela, à sociedade, a incapacidade do Governo na definição de uma estratégia global para o aproveitamento da dilação que o período de transição proporciona. Pelo teor da informação que forneceu, parece, na verdade, que o Governo está mais apostado em gerir, como pode e sabe, a crise, do que em promover as reformas de fundo de que o País tanto carece e sem as quais, repete-se, a adesão não será nem o que pretendemos nem o projecto mobilizador das capacidades nacionais.

É urgente, Srs. Deputados, introduzir uma nova metodologia na abordagem das questões suscitadas pela interacção europeia, privilegiando acima de tudo a informação atempada e sem sofismas nas áreas de maior importância para o País. Também, neste capítulo, o ano transacto não deixou boas recordações. Como aliás já foi denunciado no relatório da Comissão Parlamentar de Integração Europeia - e apesar dos esforços em contrário do Sr. Deputado Victor Crespo, o relatório nesse ponto permanece inteiramente de pé, o que é bem patente -, a Assembleia da República tem tido acesso à informação de forma parcelar e desconexa, o que se encontra bem patente no documento agora circulado pelo Governo, cujo conteúdo vago e impreciso não permite às restantes forças políticas formular um juízo completo sobre as implicações da adesão na sua globalidade.

Em documento anexo a esta intervenção e por forma mais detalhada, examinámos, com a profundidade possível, o relatório apresentado pelo Governo. Iremos distribui-lo aos grupos parlamentares com toda a simpatia. Aí deixámos numerosas críticas, múltiplas insuficiências, ausências estratégicas significativas.

Com a preocupação patriótica de quem faz parte, e parte importante, da comunidade nacional; com o propósito de aprofundar e vitalizar, em todos os momentos e circunstâncias, as energias, o esforço e a criatividade nacionais ao serviço de um projecto de modernização e desenvolvimento, em que se consubstancia, afinal, a oportunidade histórica da nossa integração nas Comunidades; com a convicção mobilizadora de que Portugal tem de assegurar, quando não de reivindicar, a sua específica contribuição em todos os passos conducentes à construção europeia, ajudando a definir-lhe os contornos, os ritmos e os limites; com a responsabilidade de quem, iniciou, acompanhou e concluiu o processo conducente à adesão e com o sentido nacional de quem concebe o futuro democrático dos Portugueses, no quadro da justiça, do progresso, da solidariedade e da paz, como objectivo estratégico essencial, e que decisiva parte dele se há-de jogar na Europa a que pertencemos. É tendo em conta este quadro que podemos afirmar sem rebuço, mas também sem nenhum prazer, que este ano europeu nos reforçou a convicção de que estamos perante um Governo seco de ideais e de ideias, incapaz de globalizar e empreender, perante os novos estímulos abertos pelo

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Acto Único, um redobrado impulso na política europeia de Portugal, a realizar em simultâneo - pois assim teria e terá de ser - com as reformas estruturais indispensáveis à modernização do País e ao próprio sucesso da adesão.
Esta incapacidade de fundo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, tentativamente disfarçada por uma colossal máquina de propaganda e por uma sistemática ocupação do aparelho de Estado a todos os níveis (a que se junta a manifesta partidarização nas indicações para as principais nomeações de quadros comunitários, porque são nomeações nacionais), é grave e patentemente desajustada à necessidade, que as vicissitudes do processo comunitário postulam, de um protagonismo interno e externo capaz de fomentar, ou de realizar mesmo, os consensos nacionais indispensáveis ao fortalecimento das nossas participação e dimensão no relacionamento externo do País. Urge, portanto, perguntar: qual foi, qual pretende ser e qual será com este Governo o contributo de Portugal para o aprofundamento e a realização do projecto comunitário, nas suas vertentes múltiplas, tantas delas em gestação permanente? E quais são, para o Governo, os limites na realização desse projecto que considera compatíveis com a defesa dos interesses nacionais?
Qual é a posição do Governo sobre o futuro institucional da Comunidade, na dupla perspectiva dos nossos interesses e da nossa indispensável participação na construção europeia?
Qual é, afinal, ou qual pretende ser, a posição do Governo quanto às grandes reformas de que a Comunidade carece, e cuja discussão se iniciou já, desde o seu financiamento futuro à reestruturação dos fundos comunitários, à reforma da política agrícola comum? E como pretende o Governo compatibilizar quaisquer eventuais posições nesses domínios (a supor que existam, eventualmente baseadas em estudos que esta Assembleia da República desconhece) com as políticas nacionais, globais e sectoriais, de que também não nos demos conta?
Como é possível o Governo esconder, ainda, de toda a oposição - hoje, dia 10 de Março - os documentos apresentados pela Comissão e seu Presidente sobre as reformas da Comunidade?
Qual é, afinal, o teor substantivo da nossa participação na cooperação política europeia, instrumento básico e referencial de coerência para a política externa dos Estados membros, motor indispensável à consecução para a Europa de um novo, acrescido e indispensável peso político? E o Médio Oriente? A segurança europeia? O desarmamento? Os direitos do homem? As relações CEE-COMECON? A África do Sul? A Namíbia? A perspectiva governamental portuguesa quanto à política comunitária de cooperação para o desenvolvimento? Que tem o Governo dito, em nome de Portugal, sobre tudo isto? Se tem dito algo, gostaríamos de conhecer em pormenor, para responsavelmente podermos avaliar com a profundidade indispensável.
As perguntas, as interrogações profundas não teriam fim.
Tudo isto, Srs. Deputados, porque responsável e construtivamente não queremos mais um país que só espera receber, que só contabiliza, que só aguarda, que apenas se mantém na expectativa dos sucessos de outrem.

Queremos, em suma, contribuir, participar, construir, cooperar. Queremos aceitar riscos e desafios. Queremos afinal ser nós próprios, um povo, uma história, uma cultura. Queremos abrir as portas para o nosso desenvolvimento, queremos uma nação desenvolvida e um Estado moderno, aberto e plural, dignamente actor e agente de uma Europa moderna e unida. E isto porque também não desejamos para Portugal quaisquer hesitações nem tibiezas sobre o que, a partir dessa posição positiva, queremos da Europa, de agora e do futuro, e sobre o que deverá ser Portugal dentro dela.
Por isso, o PS protesta uma vez mais pela forma redutora como o Governo tem olhado para, e agido, nesta matéria.
É por isso que neste momento, e uma vez mais, o Partido Socialista manifesta publicamente a sua disponibilidade que está claramente evidenciada na segunda parte do dossier que acabaram de entregar aos grupos parlamentares - para contribuir, por todas as formas ao seu alcance, no interior do País ou na frente externa, para a explanação e o reforço das posições nacionais vitais em tudo quanto respeite às matérias da integração e da construção europeias. Mas para isso, e além do mais, são necessários a informação, o debate e a participação de todas as forças políticas, sociais e culturais interessadas.
Deixemos o debate corriqueiro e de confronto! Encetemos um diálogo construtivo e profundo entre a Assembleia da República e o Governo! Não olhemos para isto de outra forma que não seja a da necessidade imperiosa e nacional de dar a este diálogo uma nova dimensão responsável, de que saia fortalecido o sentido europeu de Portugal!
Exigem-no as forças políticas, sociais e culturais interessadas. Exige-o o interesse nacional mais profundo. Pensamos que o Governo não pode nem deve furtar-se a compreendê-lo.
Aplausos do PS e do PRD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Crespo.

O Sr. Victor Crespo (PSD): - Sr. Deputado Jorge Sampaio, disse algumas coisas com que estou inteiramente de acordo, nomeadamente sobre a necessidade de se fazerem as alterações estruturais em devido tempo. Nesse sentido, pergunto-lhe se o PS está disponível para, quer em sede de revisão constitucional, quer em outra legislação, aceitar disposições consentâneas com os parâmetros europeus no sector da agricultura e empresarial.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram formulados, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Deputado Victor Crespo, é pena - e V. Ex.ª sabe a estima que tenho por si - que este debate não tenha dado a possibilidade de se aprofundarem estas questões entre todos os grupos parlamentares e, com certeza, com o Governo.
Penso que a disponibilidade do Partido Socialista, no que respeita à democracia portuguesa, à sua evolução e modernização, é total. Sempre o foi, sempre o será.

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O Sr. Victor Crespo (PSD): - Não se nota!

O Orador: - E não há uma vírgula que permita
afastarmo-nos disso.
Desçamos, portanto, ao concreto, e aí veremos, Sr. Deputado Victor Crespo.
Pela minha parte, o que sempre me recusei a dar foi cheques em branco.
Sabemos todos que o País precisa de se modernizar, precisa de intercalar as suas políticas nacionais com as políticas europeias, precisa de preservar a possível dose de autonomia na definição dessas políticas, precisa de beneficiar da CEE e de ajudar a construção europeia como país independente.
Citei a indústria, mas porque não também a agricultura, a educação e, tudo isso!? Tudo isso está em aberto; a estruturação real do País para desafiar as grandes questões do desenvolvimento está em aberto.
VV. Ex.ª, não tanto o PSD, mas, com certeza, o PSD e o Governo que dele emana, têm tido oportunidades excepcionais.
Essas oportunidades excepcionais e a forma como se tem feito uso delas, sobretudo na perspectiva - digamos assim - de gerar as plataformas possíveis capazes de dinamizar os grupos sociais, as classes - se assim se quiser -, os sindicatos, as entidades patronais, tudo isso, em torno de projectos mobilizadores de desenvolvimento, nós estamos nisso, Sr. Deputado Victor Crespo.
O que tem sido pena - e foi esse o sentido da minha intervenção - é o tempo que temos perdido em torno dessas matérias.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Não disse nada de concreto!

O Orador: - É por isso que recusamos o confronto
simplista e que recusamos que toda e qualquer iniciativa deste Parlamento - que são iniciativas de enlace das grandes questões nacionais, de alerta para a necessidade de participarmos na sua solução - seja vista, por VV. Ex.ª e, sobretudo, por V.Ex.ª, que é um homem culto, nesta perspectiva de confronto Governo/Assembleia da República.
Visamos mais longe, Sr. Deputado: visamos os Portugueses, visamos a justiça, o progresso, o nosso desenvolvimento.

Para isso, V. Ex.ª tem, como muitos deputados aqui presentes, à sua disposição o nosso contributo.

Aplausos do PS e de alguns deputados do PRD.

Vozes do PSD: - Não respondeu a nada!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Comunista Português foi dos primeiros partidos a exigir e depois a unir a sua voz às outras formações políticas por um novo debate sobre as implicações do Acto Único Europeu, em que se avaliasse as primeiras consequências da integração e o relacionamento institucional sobre esta matéria.
No entender do Partido Comunista Português, o balanço da adesão confirma plenamente as prevenções, críticas e objecções que oportunamente fizemos.

Entendemos por isso mesmo que constitui exigência nacional a renegociação dos tratados de adesão. E, no plano imediato, consideramos como mínimo a obtenção de medidas que garantam que Portugal não seja um contribuinte liquido das Comunidades, não venha a ter de, financiar excedentes comunitários para os quais em nada contribuiu, não venha a reduzir produções e limitar capacidades segundo ditames comunitários contrários aos interesses nacionais.
Por tudo isto consideramos este debate necessário e oportuno - uma boa ocasião para que a Assembleia da República faça uma análise suficientemente desenvolvida e responsável das profundas consequências que o Acto Único terá para o nosso país.
Este debate deverá servir também para colmatar a falta de respostas do Governo relativas a aspectos essenciais do impacte da adesão. Lamentavelmente, Srs. Deputados, muita informação, quer a utilizada no debate do Acto Único, quer a que se encontra no actual relatório da Comissão de Integração Europeia, teve de ser colhida não em informações do Governo Português mas nos relatórios apresentados por governos de outros Estados membros da CEE aos respectivos parlamentos. A verdade é que, no tocante ao Acto Único, a Assembleia da República foi colocada praticamente perante um facto consumado - um Governo bem comportado em Bruxelas que não queria ser o último a apresentar a ratificação e jurava a pés juntos que até ao fim de 1986 todos os outros ratificariam, o que afinal não se verificou nem com a Grécia, nem com a Irlanda, cujo processo ainda decorre. Isto é tanto mais grave quanto Portugal foi confrontado neste caso com uma verdadeira «renegociação do Tratado de Adesão» feita por iniciativa da CEE a Dez, de que resultam, além do mais, novas limitações à soberania nacional.
A visão que o Governo aqui nos trouxe sobre estes factos e sobre o primeiro ano da adesão é em tudo oposto à realidade.
O chamado «livro branco de balanço», agora azul, do primeiro ano de adesão, previamente apresentado aos órgãos de comunicação social, não traduz a verdade, revela sim que a primeira preocupação deste Governo é a sua autopropaganda. Mas o livro é tão branco, tão imaculado, que pouco se fica a saber do balanço económico e social das primeiras implicações do Tratado de Adesão.
Quem julgasse que aí iria encontrar um balanço, mesmo global que fosse, das consequências da integração para a agricultura, pescas ou indústria enganava-se redondamente.
Mas era isso que se exigia. Era o mínimo que se poderia esperar, se estivéssemos perante um governo sério e responsável. Mas não estamos. Por isso, o balanço fica-se por apreciações parcelares à mistura com « spots publicitários» daquilo que considera grandes êxitos.
É, aliás, a prática a que o Governo nos vem habituando. Não há Ministro ou Secretário de Estado que chegue à Portela, vindo de Bruxelas, que não proclame que a sua acção foi um êxito.
Chegam mesmo a afirmar que éramos obrigados a dar 100, mas que agora já só teremos de dar 90 ... E, enfaticamente, proclamam a vitória... e o País... paga...!
O balanço económico e social continua por fazer. O que o povo português gostaria de saber é como é que o Governo explica e encara, por exemplo, o agravamento estrutural da balança comercial.

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Os dados referentes aos onze meses de 1986 mostram que a balança comercial de Portugal com a CEE a Onze passou de um superavit de 1,2 milhões de contos, para um défice de 68 milhões, o que não é explicado por desvio de comércio.
Agravaram-se os saldos com praticamente todos os países mesmo com aqueles que são positivos. Alguns passaram de positivos a negativos (Bélgica); outros tiveram uma enorme acentuação negativa: Itália, RFA, Espanha.
E não venha o Sr. Ministro da Indústria - que ainda aqui não esteve - afirmar que as nossas exportações para Espanha têm um maior valor acrescentado, pois o que nos interessa é a exportação com uma maior transformação nacional e não a exportação das multinacionais, ou de produtos de elevado valor acrescentado estrangeiro, finalizado no País por verdadeiras empresas «aperta-porcas». Aliás, em termos globais, o que os dados provisórios mostram é o aumento do peso das exportações tradicionais, sem alteração do padrão das exportações.
Ora, o agravamento estrutural é tanto mais grave quanto se estima que de 1985 para 1986 a diferença, para menos, dos défices não atingirá os 50 milhões de contos. O que, se tivermos em conta que só a baixa do petróleo e derivados, cereais e oleaginosas trouxeram um «ganho» estimado em mais de 150 milhões de contos, facilmente se verifica o nível do agravamento e as suas consequências futuras.
Sobre isto o Governo nada diz. Esconde o substancial agravamento estrutural dos desequilíbrios externos e acena com os milhões dos fundos, muito aquém das suas previsões iniciais, como se os fluxos financeiros entre Portugal e a CEE se confinassem às relações entre o Estado Português e o Orçamento das Comunidades.
E a produção nacional? E as actividades que caem nas mãos dos estrangeiros (indústria farmacêutica, têxtil, turismo, etc .. ..)? E a sobre e subfacturação?
O que todos os índices mostram é que em 1986 se acentuou a substituição da produção nacional pela produção estrangeira, com as inevitáveis consequências na utilização dos recursos nacionais, no desemprego e na dependência. E tudo isto perante a inqualificável insensibilidade do Governo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O desregulamento das economias da CEE a Dez, os excedentes (a manteiga, stockada corresponde a mais de um pacote de 250 g por cada cidadão do globo e só o leite em pó dava para oferecer 6 l de leite a cada criança - até aos 14 anos - da América Latina), as crises sectoriais estruturais têm levado os órgãos comunitários a tomar decisões no sentido de diminuir as capacidades de produção e o estabelecimento de quotas.
Só que o problema essencial de Portugal é o contrário: é o grande défice agro-alimentar e industrial mesmo em relação ao seu consumo interno.
O eixo de uma verdadeira política de desenvolvimento tem de assentar no aumento da produção. Por isso, uma política nacional e um governo que defenda os interesses nacionais não pode aceitar a diminuição da sua produção agrícola «estratégica» (carne, leite, cereais, oleaginosas), a redução da área de uso agrícola e a expansão da floresta industrial (eucaliptização) de forma indiscriminada e em regime de monocultura.

É inaceitável para o País um plano de reestruturação da Siderurgia Nacional que, para além de abandonar o ferro de Moncorvo, inclua a «redução de 90 000 t da capacidade de produção anual nele prevista», com os consequentes despedimentos (cerca de 2000) e a perda de milhões de contos de material já comprado.
É inaceitável que o Governo não tenha ainda revisto a quota de produção de açúcar de beterraba sacarina, o que, a manter-se, dará somente para uma unidade fabril produtora.
As reduções de produção são do interesse de muitos países da CEE, mas não são, seguramente, do interesse de Portugal.
Por isso, é de pasmar que, num país que importa pescado, com uma frota envelhecida, o Governo, no livro branco que enviou à Assembleia da República, afirme, a p. 113, que foi, cito, «fixado como objectivo de reestruturação, modernização e desenvolvimento da frota em Portugal: o não aumento da capacidade global da frota... ».

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - É um escândalo!

O Orador: - O não aumento Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros? É Portugal que tem uma capacidade excedentária em relação à sua ZEE, às águas comunitárias ou ás águas de países terceiros? Isto é simplesmente inqualificável. E o exemplo de um governo e de uma diplomacia que se gaba em Bruxelas de não ser como os Gregos, que protestam por tudo. O seu figurino é o de «menino bem comportado» como se a CEE fosse uma instituição caritativa. Mais, o Governo até se antecipa às exigências do Tratado, perante o sorriso incrédulo dos seus parceiros.
Srs. Deputados, se são inaceitáveis reduções de produção para as quais um país tem aptidão e não produz sequer o suficiente para o seu mercado interno, é absolutamente rejeitável que um país como Portugal venha a pagar os custos dos excedentes da CEE a Dez para os quais em nada contribuiu.
E sobre isto não se ponha o Governo já de cócoras, fingindo no País que está preocupado, mas cedendo em Bruxelas, ao mesmo tempo que avança com a «esperteza saloia», à laia de desculpa, de que pagando mais também recebe mais. O Governo sabe que, não só não é assim, como tais pagamentos coincidem com o fim das restituições em que o País, a manter-se o que consta dos tratados, corre o risco de ser um financiador líquido do orçamento comunitário. Ora, se depois vier a negociar para o não ser, virá a ceder e a perder noutros campos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não cabe numa curta intervenção o balanço e a análise das perspectivas e consequências futuras da integração e do Acto Único.
Mas há factos e interrogações que não podem deixar de ter uma referência e uma resposta.
Apontemos alguns.
A CEE não aceitou o PEDIP que lhe foi remetido pelo Governo Português. No Orçamento da CEE para 1987 não está inscrita qualquer verba para este programa mas apenas um «pró-memória».
Estamos no segundo ano de transição, no segundo orçamento, sem apoios específicos para a indústria portuguesa. O Governo Português não pode continuar a ter uma atitude de abdicação ou vir a aceitar que a indústria seja financiada pelos fundos estruturais, o

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que implicaria a redução de verbas noutros domínios. O Governo tem a obrigação de informar esta Assembleia da República sobre o ponto da situação do PEDIP ou do PENIC. É também incompreensível que o Governo deixe arrastar a situação das conservas de peixe portuguesas, que, como sabe muito bem, se encontram numa situação de desvantagem, quer em relação aos países da CEE mediterrânicos, quer, inclusive, em relação a Marrocos. Este é um ponto a exigir renegociação imediata.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O mesmo se passa com as indústrias de tomate, a perderem, inclusive, mercados tradicionais como o dos EUA. Desconhece o Governo que uma boa parte da produção da última campanha ficou a apodrecer na terra com grandes prejuízos e ruína de muitos agricultores?
Nas suas «farroncas» o Governo afirma que o orçamento comunitário em 1986 permitiu assegurar na generalidade os principais fluxos de interesse para o nosso país. Sem nos determos nos verdadeiros escândalos da aplicação das verbas do Fundo Social Europeu nem no que se passou com o FEDER em relação às autarquias, vejamos os financiamentos agrícolas.
O apoio às explorações agrícolas ainda não começou a ser aplicado. Mas da sua selectividade resulta, na prática, dadas as exigências de financiamento, que mais de 50 % das explorações não beneficiarão dele. Depois, na sua política de liquidação da Reforma Agrária e de estrangulamento das UCPs, o Governo está a impedir o acesso destas aos programas de financiamento.
Na transformação e comercialização de produtos agrícolas, os beneficiados foram no essencial os grandes industriais, intermediários e importadores. Por falta de dotação orçamental foram transferidos para 1987 mais de 70 % dos projectos (do Regulamento 355).
Quanto à capacidade de realização, as ajudas de pré-adesão são um exemplo esclarecedor.
Na primeira fatia (tranche) o grau de realização é de 11% e em relação à segunda fica-se nos 6%!
O programa vitivinícola, - em matéria de reestruturação, pouco mais abrange do que 10 % da área total de vinhas do País. No entanto, o Governo toma a dianteira para acabar com o produtor directo (vinho americano).
O programa olivícola, em matéria de reestruturação e renovação, também só atinge 10 % da área. Mas em contrapartida promove o arranque de quase 20 % do olival. Para o Governo, tudo isto são grandes êxitos e vitórias. .
Aumenta a diferença de preços entre os produtos agrícolas nacionais (mais caros) e os da CEE, o que vai implicar uma gravíssima redução do nível de rendimentos dos agricultores portugueses. Mas o Governo, na sua demagogia, não se mostra preocupado. Os preços podem ser acertados nos últimos anos do período de transição, e o último a sair que feche a porta. É uma atitude irresponsável, Srs. Ministros.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Não se pode aceitar a diminuição dos já depauperados rendimentos dos agricultores, nem a
sua concretização futura.

Onde estão as medidas estruturais? Onde está a modernização do País?
O Governo não pode fazer da política agrícola a guerra social, a reconstituição do latifúndio ou a política agrícola de Bruxelas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em relação às pescas, é sabido que o novo plano estrutural para o sector exclui apoios à frota artesanal. Era de todo o interesse que a Assembleia da República fosse informada sobre qual foi a posição do Governo Português no respectivo Conselho de Ministros: se considera uma vitória a exclusão da frota artesanal ao acesso aos «apoios» estruturais.
Também seria interessante que nos explicasse porque é que a CEE «chumbou» praticamente todos os projectos de atuneiros e de truticultura portugueses e não o fez em relação aos espanhóis e franceses; que nos explicasse por que é que os projectos relativos à indústria conserveira não foram contemplados em 1986; por
que é que os navios espanhóis autorizados a pescar o atum voador são fixados em função de um conceito de «barco tipo», noção totalmente arbitrária; que nos explicasse se é um grande êxito que Portugal tenha ficado nas águas da Noruega com uma quota inferior (bacalhau-cantarilho) à que detinha antes da adesão. Tudo isto são os grandes êxitos?!
O Governo deve dar explicações à Assembleia da República. Em todos estes malefícios agiu sozinho, como se fosse o único órgão de soberania. É, por isso, o único responsável.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É uma realidade que as limitações à soberania nacional são acrescidas com o Acto Único.
As suas consequências são profundas. Ninguém as pode ignorar. E que faz o Governo? Limita-se a emitir uns quantos votos pios. Afirma que a concretização do Acto Único deve ser acompanhada da coesão económico-social, quando sabe que não foram destinadas verbas para a sua efectivação, como reconhecem diversas comissões do Parlamento Europeu. No entanto, as 300 medidas do livro branco da Comissão estão prontas e vão avançando.
O PCP exige que a liberalização do mercado interno seja precedida - precedida, repito - de medidas concretas de desenvolvimento e promoção das regiões mais atrasadas...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - ... de uma política efectiva de combate ao desemprego, de medidas de protecção da nossa economia, de uma política de desenvolvimento independente. Portugal deve utilizar medidas de salvaguarda e exigir programas, acções e compensações específicas antes de qualquer liberalização do mercado interno. É o mínimo.
A atitude de abdicação do Governo Português perante a CEE, quer nos aspectos económicos, financeiros e sociais, quer no seguidismo ou como porta-voz da Administração Reagan em matéria de política externa (caso das sanções à África do Sul, política em relação à África) compromete gravemente a posição

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negocial, a imagem e o futuro do País e a dignidade nacional. O PCP intervém e intervirá a todos os níveis para defender os interesses nacionais e para defender os valores e a especificidade da cultura portuguesa, para que Portugal tenha a sua voz independente e prestigiada no contexto internacional. Daí, a nossa posição em relação ao Acto Único e a justificação da apresentação pelo PCP de um projecto de resolução sobre o seu alcance e consequência.
Importa, por outro lado, assegurar um pleno exercício dos poderes da Assembleia da República em matérias comunitárias. Sr. Deputado Victor Crespo. Nesse sentido, depositarei no termo desta intervenção um projecto de lei que visará garantir a atempada comunicação à Assembleia da República dos principais actos em elaboração nas instâncias comunitárias, a fim de que esta possa avaliar as suas consequências para Portugal e emitir previamente as tomadas de posição que entenda necessárias à defesa do interesse nacional. O Governo não pode continuar a usurpar competências que são da Assembleia da República. Proporemos igualmente a criação, no âmbito da Assembleia da República, de uma comissão mista que tenha funções de controle e em que tenham também assento deputados do Parlamento Europeu, com funções de articulação cuja utilidade e necessidade são generalizadamente consideradas inquestionáveis.
Mas não se pode ficar por aqui - urge renegociar!
O próprio Primeiro-Ministro fez a sua campanha eleitoral exigindo a reconsideração de alguns dossiers da adesão à CEE. Onde está essa reconsideração? Onde está um só ponto onde tenha sido questionado o interesse nacional, em que o Governo Português não tenha abdicado? É a CEE no seu interesse e não Portugal que faz a renegociação permanente. Esta é a realidade que os factos comprovam.
O PCP entende que no quadro actual se impõe a resoluta renegociação das cláusulas mais gravosas do Tratado de Adesão, não deixando de apresentar em breve um conjunto de iniciativas com propostas concretas com vista à sua efectivação. Entendemos que a exigência dessa renegociação é cada vez mais premente e necessária, que é uma exigência nacional.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Para nós é uma condição primeira de qualquer política de desenvolvimento, a defesa dos nossos valores e dos nossos recursos, a defesa da soberania e da independência nacional.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Integração Europeia.

O Sr. Secretário de Estado da Integração Europeia (Costa Martins): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para melhor compreensão da natureza e dimensão do objectivo comunitário que visa a realização do grande mercado interno, julgo oportuno, neste momento, recordar os antecedentes e o enquadramento em que foi estabelecido o Acto Único Europeu.
Em primeiro lugar, há que referir que a revisão dos Tratados de Roma e de Paris, operada através do Acto Único Europeu, foi determinada fundamentalmente pelos sucessivos alargamentos da Comunidade, que transformaram substancialmente a fisionomia económica e social do espaço comunitário, e ainda, pela necessidade de relançar as iniciativas no sentido da construção da união europeia.
De resto, mesmo sem o fenómeno dos alargamentos, a Comunidade carecia já de um novo projecto que readequasse as políticas comuns à nova realidade económica e promovesse novas políticas comunitárias, destinadas a reconquistar para a Europa um lugar predominante no contexto internacional.
Do mesmo passo havia a generalizada convicção de que o tecido institucional da Comunidade deveria ser revisto, especialmente no que dizia respeito ao grau de intervenção das várias instituições e, consequentemente, ao processo de decisão.
Foi nesta linha que, nos últimos dez anos, surgiram várias iniciativas que tinham como objecto a modulação de um novo e mais ambicioso projecto europeu. É o caso do relatório Tindemans sobre a União Europeia nos anos 70 e, mais recentemente, do projecto Spinelli, que o Parlamento Europeu aprovou por esmagadora maioria no inicio de 1984, e que, de resto, constituiu sempre um referencial marcante na negociação do Acto Único Europeu.

A revisão dos tratados recentemente consagrada teve, pois, como objectivo fundamental, a realização de um grande salto qualitativo em direcção à União Europeia: por um lado, reunindo um novo empenhamento político em torno do aprofundamento do fenómeno de integração e, por outro lado, modulando o seu próprio projecto de desenvolvimento e de afirmação no contexto mundial.
Assim, pode dizer-se que o Acto Único Europeu é marcado por cinco grandes linhas de orientação: a realização do mercado interno, o reforço da coesão económica e social, a resposta ao grande desafio tecnológico, a intensificação da coordenação das políticas económicas e da cooperação monetária e a institucionalização da cooperação política europeia.
Neste contexto, o resultado obtido, para alguns muito distante dos objectivos de fortalecimento da Europa comunitária, para outros excessivamente ambicioso, não constitui mais do que um compromisso que traduz um denominador comum possível entre interesses marcadamente divergentes e concepções diferenciadas sobre o futuro da Comunidade.
Em termos muito breves, será talvez oportuno recordar qual foi a posição assumida por Portugal durante a negociação do Acto Único. Defendemos então, com clareza, o aprofundamento da integração europeia, nas suas múltiplas vertentes económica, social, cultural, institucional e política, no entendimento de que por via disso seria também Portugal beneficiado. Defendemos também o tratado de adesão, como baliza fundamental para garantir a transição, de modo a evitar que as reformas a realizar pudessem pôr em causa as medidas transitórias e as derrogações temporárias estabelecidas para a nossa integração na Comunidade.
Mas, acima de tudo, procurámos assegurar que o Acto Único trouxesse um novo e decisivo contributo para a recuperação das regiões mais atrasadas do espaço comunitário, permitindo-nos novas oportunidades para o desenvolvimento económico e social do nosso país.
O Acto Único Europeu contempla, pois, os seguintes elementos fundamentais: processo de decisão mais eficaz e mais participado pelas diversas instituições

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comunitárias, de que são exemplos expressivos o alargamento de aplicação da regra da maioria qualificada e o sistema de cooperação com o Parlamento Europeu; realização até ao fim de 1993 de «um espaço sem fronteiras internas», assegurando a livre circulação de mercadorias, das pessoas, dos serviços e dos capitais; reforço da coesão económica e social, com vista a reduzir a diferença entre as diversas regiões e o atraso das regiões menos favorecidas; resposta ao grande desafio tecnológico, através de um esforço comum de investigação e desenvolvimento que aumente as bases científicas e tecnológicas da indústria europeia e que favoreça o desenvolvimento da sua competitividade internacional; acção no domínio do ambiente, visando preservar, proteger e melhorar a qualidade do ambiente e assegurar uma utilização prudente e racional dos recursos naturais; promoção da melhoria das condições de trabalho para a protecção, segurança e saúde dos trabalhadores e harmonização das condições existentes neste domínio, e, finalmente, institucionalização da cooperação política europeia.
É indiscutível que o mercado interno constitui uma das peças fundamentais do Acto Único, não tanto porque introduza alguma inovação conceptual significativa, mas sobretudo porque define um horizonte temporal bem determinado para a sua realização e consagra os instrumentos necessários a esse fim.
Com efeito, as alterações do contexto interno e externo da economia europeia, ocorridas nos últimos anos, especialmente devido às mutações tecnológicas e à emergência de concorrência dos novos países industrializados, fizeram renascer a ideia das virtualidades do grande mercado interno.

Quais são, então, os objectivos da realização do mercado interno? Essencialmente os seguintes: unificar os doze mercados nacionais para os transformar num mercado único sem fronteiras; transformar esse grande espaço num mercado em expansão, dinâmico e flexível, que permita a utilização óptima de todos os recursos; aproveitar as virtualidades de um grande mercado como factor de desenvolvimento, relançando a economia europeia e criando novas oportunidades de emprego.
Com vista à prossecução destes objectivos, foram agrupadas acções nas seguintes categorias: eliminação das fronteiras físicas - motivação de ordem eminentemente política, cujo objectivo é a abolição dos controles alfandegários ou de polícia, mas reforçando a cooperação em matérias de segurança e saúde pública; eliminação das fronteiras técnicas - autênticas barreiras que põem em causa os princípios da livre circulação das pessoas, das mercadorias, dos serviços e dos capitais; eliminação das fronteiras fiscais - verdadeiras distorções da concorrência intra-comunitária, exigindo a harmonização dos impostos indirectos com vista a atingir a neutralidade fiscal no interior da Comunidade.
A realização do mercado interno apresenta evidentes virtualidades, quer do ponto de vista do interesse comunitário, quer do ponto de vista nacional, mas não é isenta de riscos, particularmente para os sectores que revelam maior vulnerabilidade.
Não se ilude, de facto, que a realização do mercado interno - sendo objecto inquestionável na caminhada para a união europeia - vai envolver um considerável esforço de adaptação às estruturas administrativas e às economias de todos os Estados membros, mas com especial impacte nos Estados de estruturas e economias mais débeis.

Foi nesse sentido que Portugal, durante a negociação do Acto Único Europeu, se empenhou na previsão de medidas transitórias e derrogações temporárias que podem ser introduzidas com vista a minimizar a amplitude do esforço que certas economias devem suportar durante o estabelecimento do mercado interno. O artigo 8. º-C do Acto Único toma em devida consideração estas preocupações, permitindo a aplicação de medidas transitórias ou derrogatórias especialmente definidas para os Estados que enfrentam particulares dificuldades.
Mas Portugal não deve ter neste domínio uma estratégia meramente defensiva. Dotado de um reduzido mercado nas suas fronteiras nacionais, medianamente industrializado, tendo fronteira com um único Estado membro cujas tradições proteccionistas são bem conhecidas, tem todo o interesse e vantagem em ganhar acesso a um amplo mercado unificado.
De resto, é importante recordar que as exportações se têm revelado como o factor mais dinâmico do nosso crescimento económico, claramente acima da procura interna. Nos últimos dez anos a elasticidade das exportações em relação ao produto interno bruto mais do que duplicou relativamente à década anterior, indiciando o carácter estratégico que o acesso aos mercados externos apresenta para a economia portuguesa. A realização do grande mercado alargado na CEE deve, pois, ser vista também, e sobretudo, à luz do desafio que se nos coloca para incrementar a nossa penetração no interior desse mercado.
Tendo em conta as nossas características, Portugal deve defender uma evolução harmónica e progressiva do mercado interno, evitando descontinuidades e assimetrias de tratamento entre os diversos domínios em questão. O mercado interno deverá resultar num compromisso final equilibrado que traduza os objectivos consagrados no Acto Único Europeu, e não apenas, parcialmente, os interesses pontuais de alguns Estados membros.
A consagração de um «espaço sem fronteiras» valoriza particularmente o conceito de concorrência, exigindo aos vários parceiros uma acção dinâmica para assegurar posição cimeira no confronto competitivo. Isto é, a realização do mercado interno levanta também uma exigência acrescida de modernização da nossa economia, sem o que as assimetrias regionais se poderão até agravar.
Assim, os avanços na construção do mercado interno terão de ser acompanhados de uma acção. profunda de modernização da nossa economia.
Refira-se, a este propósito, que é também nesta perspectiva que Portugal vem negociando um programa de apoio à modernização da indústria portuguesa, tal como está previsto no acto de adesão.
A comissão das Comunidades tem em preparação uma proposta sobre este assunto.
Não assumindo uma atitude de obstrução sistemática à realização do mercado interno alargado, Portugal avalia caso a caso, após apreciação pelos departamentos sectoriais competentes, a necessidade de negociar medidas específicas. É o que vem sendo feito nas múltiplas frentes em que se desdobra este dossier normalização dos produtos industriais, eliminação de entraves técnicos ao comércio, ambiente, movimentos de capitais, controles nas fronteiras, harmonização fiscal, mercados públicos, etc.

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Em 1986, mesmo antes da entrada em vigor do Acto Único Europeu, a Comunidade desenvolveu alguns esforços para avançar na realização do mercado interno. Os resultados alcançados foram manifestamente limitados, dando clara indicação quanto às grandes dificuldades que se levantam à prossecução deste objectivo até 1993.
Para as directivas que levantaram problemas de adaptação ao nosso País foram negociadas derrogações até ao fim de 1992, como foi o caso dos fornecimentos públicos, da liberalização dos movimentos de capitais e do conjunto de medidas sobre os produtos farmacêuticos.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: um dos aspectos mais relevantes do Acto Único é a consagração do princípio da coesão económica e social no artigo 130-A, abarcando a um tempo duas orientações básicas:

A promoção do desenvolvimento harmonioso do conjunto da Comunidade, envolvendo uma perspectiva de crescimento da economia europeia; e
A redução das disparidades entre as diversas regiões e a recuperação do atraso das regiões menos favorecidas.

Este principio, tornado indispensável pela alteração do perfil económico e social da Comunidade após o alargamento à Grécia, Espanha e Portugal, vê a sua importância acrescida pelo facto de se assumir como elemento de equilíbrio face à construção do mercado interno.

A procura de etapas mais evoluídas da integração económica, como será o caso da realização do «espaço único sem fronteiras» e, ulteriormente, da união económica e monetária, só será exequível sem tensões políticas e sociais, se se alcançar uma maior convergência das economias dos Estados membros, garantindo um conjunto mais coeso e equilibrado.
Não devemos ter, da coesão económica e social, uma visão meramente mercantil, esperando obter uma simples compensação financeira em função do grau de atraso económico.
A coesão económica e social terá de ser princípio presente em todas as políticas e acções da Comunidade, e não apenas no que respeita aos fundos comunitários. Trata-se, portanto, de um conceito que tem de ser assumido por todos os Estados membros e traduzir-se num projecto indutor de desenvolvimento nas regiões que apresentam mais dificuldades.
Assim, a acção comunitária a desenvolver neste domínio deverá articular-se estreitamente com as iniciativas nacionais, regionais e locais, em ordem a assegurar-lhe um efeito multiplicador que ultrapasse a mera expressão dos fluxos financeiros envolvidos.
Será através deste princípio do Acto Único que Portugal poderá assegurar irreversivelmente um dos grandes objectivos da sua opção europeia: o desenvolvimento acelerado e sustentado da sua economia.

Aplausos do PSD.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Marques Júnior.

O Sr. Presidente: - Não havendo pedidos de esclarecimento, tem a palavra para uma intervenção o Sr. Deputado Silva Lopes.

O Sr. Silva Lopes (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Na intervenção que aqui vou apresentar, tratarei de três pontos:
Em primeiro lugar, o balanço do primeiro ano da participação de Portugal na CEE; em segundo lugar, as medidas de concretização das disposições do Acto Único Europeu; e por fim, a participação da Assembleia da República no processo de elaboração da legislação comunitária que afecta o nosso país.
Começo assim com o balanço do primeiro ano da participação de Portugal na CEE.
O Governo enviou-nos a esse respeito um relatório que merece um comentário positivo. Foi esta a primeira vez que o Governo nos forneceu informação por escrito sobre muitas das questões mais relevantes do nosso relacionamento com as Comunidades Europeias. Estamos tão mal acostumados em matéria de informações proporcionadas pelo Governo sobre a CEE que o relatório que agora recebemos terá de ser assinalado.
Devo deixar uma palavra de apreço para o trabalho desenvolvido pela Biblioteca da Assembleia da República na recolha de informações sobre a nossa participação na CEE.
O relatório apresentado pelo Governo é, como disse, um documento que merece ser assinalado e que tem utilidade. A análise e as indicações que nele são apresentadas nem sempre podem, porém, ser consideradas suficientemente satisfatórias.
Em primeiro lugar, algumas das questões de maior importância para o nosso país são tratadas de forma muito sumária e demasiado vaga.
Em compensação, outros aspectos de importância secundária, são objecto de exposições muito detalhadas. Assim, por exemplo, são enumerados ao longo de três páginas todos os colóquios, conferências e seminários realizados no quadro do programa de divulgação sobre a CEE. Em contrapartida, quando se trata dos regulamentos da política agrícola comum promulgados em 1986 nada se diz sobre as suas implicações para a agricultura nacional. Ficamos com razões para supor que muitos desses regulamentos vão ter reflexos importantes na rentabilidade e na competitividade das nossas produções agrícolas, mas ficamos sem conhecer a natureza e o alcance de tais reflexos. Ficamos sem saber quais as vantagens que os referidos regulamentos nos trazem, quais as dificuldades que nos criam, quais as mudanças que nos impõem ou quais os esforços de adaptação que nos exigem.
O que acabo de dizer a respeito dos regulamentos agrícolas poderia estender-se a outros domínios abrangidos pelo relatório do Governo.
Uma outra deficiência importante do mesmo relatório é que ele nem sempre é suficientemente objectivo. O exemplo mais significativo sob este aspecto é certamente o dos fluxos financeiros entre Portugal e a CEE. O relatório mostra-nos que em 1986 esses fluxos apresentaram um saldo positivo para Portugal equivalente a 30 milhões de contos. O Governo tem apresentado esse resultado perante a opinião pública como uma grande vitória da sua actuação. Além disso tem extraído dele a ilação de que se enganaram todos os que advertiram quanto ao risco de Portugal se vir a tornar contribuinte liquido da CEE dentro de alguns anos se se mantivessem as regras presentes.
Nenhuma destas posições do Governo é correcta.
Em primeiro lugar, o saldo de 30 milhões de contos nas transferências financeiras com a CEE não é uma vitória pela qual nos devamos rejubilar tanto como o

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Governo pretende. Há razões para crer que o saldo poderia ter sido substancialmente maior se tivesse havido mais eficácia na utilização dos recursos comunitários a quê Portugal tem acesso.
O pouco que vamos conseguindo saber faz-nos admitir que o montante total da utilização dos recursos do FEDER foi satisfatório. A acção desenvolvida pelas autoridades portuguesas nessa área merecerá mesmo uma apreciação positiva. Já a utilização dos recursos do Fundo Social suscitará algumas reservas, não tanto quanto ao montante das transferências obtidas, mas principalmente quanto à natureza, eficácia e custos de muitos dos projectos financiados. É, porém, a utilização de recursos destinados ao sector agrícola que levanta mais reparos.
Pelo que tem transparecido, essa utilização tem ficado muito aquém dos níveis que poderiam ter sido alcançados se não houvesse tanta ineficácia do lado português. Em Dezembro passado, o Diário de Noticias, que conseguiu ter acesso a um documento oficial que a Assembleia da República não teve conhecimento, publicou um artigo em que, além do mais, se referia:

Cerca de 2 milhões de contos colocados pela CEE à disposição de Portugal ao abrigo da primeira tranche de ajudas de pré-adesão não foram até ao momento utilizadas.
Quanto à primeira tranche, existem convenções assinadas há mais de um ano em que o grau de execução dos projectos é de 0% a 2%. Um deles, velho de três anos, está realizado em apenas 40%.

Este é um pequeno exemplo, mas será bem significativo do muito que nos é escondido pelo Governo.
Um outro ponto importante que interessa assinalar, a propósito das transferências financeiras, é o da comparação da experiência portuguesa com a da Grécia e da Irlanda durante o primeiro ano da sua adesão à CEE. De acordo com um estudo elaborado pelo deputado do PRD ao Parlamento Europeu, Marques Mendes, os saldos positivos conseguidos pela Grécia e a Irlanda no primeiro ano da sua adesão à CEE corresponderam a cerca de 0,9 % das despesas totais da Comunidade. A percentagem equivalente para Portugal não chegou a 0,6 %, ou seja, cerca de um terço a menos do que a daqueles dois países.
Como acima referi, o Governo tem mostrado a tendência para exibir o saldo positivo conseguido em 1986 nas transferências com a CEE como prova de que não há razões para nos preocuparmos quanto ao futuro de tais transferências. Ora, o problema é que, não obstante o resultado de 1986 e o saldo provavelmente ainda mais elevado que se venha a registar em 1987; o risco de Portugal se tornar em contribuinte líquido da Comunidade, daqui a quatro ou cinco anos, continua a persistir. Esse risco só desaparecerá na medida em que se consiga a modificação das regras existentes em matéria de orçamento e de preços agrícolas na CEE. Estou certo que essa modificação acabará por concretizar-se. O Governo terá, todavia de desenvolver esforços para atingir esse objectivo.
Para isso deverá reconhecer que o problema existe; em vez de continuar a procurar transmitir à opinião pública a ideia falsa de que não há justificação para as posições dos que, como eu têm vindo a apontar a necessidade de um novo enquadramento para as nossas relações financeiras com a CEE, destinado a evitar que a prazo nos transformemos em contribuinte líquido para o respectivo orçamento.

Ao apreciar o balanço do primeiro ano da nossa participação na CEE é necessário - como aliás aqui foi sublinhado - que não olhemos apenas para as transferências financeiras. Esse é um aspecto muito parcial, embora relevante, do nosso relacionamento com as Comunidades. Se acima o referi com algum desenvolvimento foi porque o Governo sobre ele tem insistido muito nas suas declarações políticas.
Não devemos todavia perder de vista que, o fim de se fazer o balanço da integração de Portugal na CEE, há essencialmente que procurar saber qual está a ser o impacte dessa integração na produção nacional no volume e estrutura dos investimentos, no comércio externo, no poder competitivo das empresas, no nível do emprego, na evolução dos salários, na eficácia da Administração Pública, no progresso tecnológico, na política social, etc.
A experiência de um ano é demasiado curta para que, com base nela, possamos estabelecer desde já uma avaliação, ainda que provisória, dos resultados da adesão à CEE.
Além disso, muitas das mais sérias dificuldades dessa adesão só virão a ser sentidas daqui a alguns anos. Só daqui a quatro anos é que a agricultura passará a estar mais exposta a concorrência comunitária em virtude de passagem à 2.º fase do processo de transição por etapas aplicado aos produtos agrícolas mais importantes. Analogamente, só daqui a cerca de cinco ou seis anos é que estaremos plenamente expostos aos efeitos das medidas de liberalização do mercado interno, principalmente naqueles domínios em que conseguimos períodos transitórios mais largos.
Apesar de, nestas condições, ser por agora impossível traçar um balanço apropriado da participação de Portugal na CEE, eu desejaria chamar a atenção para dois pontos que considero fundamentais, mas sobre os quais nada se diz no relatório do governo.
O primeiro diz respeito a falta de um programa ambicioso de reestruturação e modernização do sector agrícola. Muito pouco está a ser feito para permitir que as arcaicas estruturas agrícolas portuguesas enfrentem os desafios competitivos que virão a surgir dentro de alguns anos por causa da concorrência da CEE, incluindo, em particular, a da Espanha. Não há actuações suficientemente decisivas em domínios como a formação profissional, o associativismo agrícola, o emparcelamento, os investimentos em infra-estruturas, as melhorias tecnológicas, etc. ...
O segundo ponto que interessa sublinhar é o do insuficiente dinamismo dos investimentos no sector exportador. Portugal tem vantagens potenciais comparativas na exportação de produto industriais intensivos em mão-de-obra. Seria de esperar, por isso, que fossem atraídos investimentos estrangeiros substanciais para projectos orientados no sentido da exportação para outros mercados da Comunidade.
Isso não sucedeu contudo até agora, ao contrário do que parece ter sido a experiência da nossa vizinha Espanha. As razões desta situação merecem estudo atento. Não sabemos, porém, se este problema está a preocupar o Governo ou se estão a ser preparadas análises neste domínio, para explicar a situação referida.
Passo agora ao segundo dos pontos da minha intervenção que referi no início: o que respeita às medidas de concretização do Acto Único Europeu.
Para poder acompanhar a concretização das orientações e políticas estabelecidas no Acto Único Europeu, a Assembleia da República precisará de receber

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informações que até agora lhe têm faltado sobre os trabalhos preparatórios, as propostas e as negociações relativas à introdução das medidas necessárias a essa concretização. Daí a justificação para o projecto de resolução submetido ao Plenário de hoje para votação. Sem as informações exigidas nesse projecto de resolução, a Assembleia da República continuaria a não ter quaisquer condições para apreciar os actos do Governo e da Administração relativos a concretização das disposições do Acto Único. A Assembleia da República ficaria assim impedida de exercer nesse domínio a competência de fiscalização que a Constituição lhe atribui. Por seu turno o Governo ficaria numa posição anticonstitucional se continuasse a não fornecer as informações necessárias ao exercício daquela competência.
Em face de tudo isto, há razões para nos inquietarmos com a oposição do Governo e do PSD ao projecto de resolução sobre o fornecimento à Assembleia da República de informações semelhantes às que são recebidas pelos parlamentos de outros países da CEE.
Será que os que tomam essas posições entendem que as questões de integração europeia constituem um domínio onde o Governo tem o direito de divulgar o que quer, quando quer e como quer? Será que o Governo deverá poder continuar a dizer, como o fez ainda hoje, que são reservados para a Assembleia da República os documentos da Comissão da CEE que os outros parlamentos das Comunidades recebem com regularidade?
Entro agora no terceiro e último ponto da minha intervenção: o da participação da Assembleia da República na discussão dos projectos de legislação comunitária. Os parlamentos de praticamente todos os países da Comunidade e o Parlamento Europeu têm insistido, repetidamente, sobre o problema da falta de fiscalização democrática adequada sobre as decisões do Conselho de Ministros das Comunidades.
No nosso país, verificamos que a Assembleia da República tem poderes para elaborar leis e recusar a ratificação de decretos-leis emanados do Governo Português, mas nada pode fazer em relação aos casos em que ela afecta interesses da vida nacional.
A solução aplicada na maior parte dos países da Comunidade para fazer face ao vazio democrático que assim se manifesta é a de proporcionar aos parlamentos nacionais a possibilidade de emitirem pareceres sobre os actos legislativos a discutir e a votar pelo Conselho de Ministros das Comunidades. Para esse efeito, aqueles parlamentos recebem todas as informações relativas à preparação e discussão dos projectos de legislação comunitária e seleccionam de entre tais projectos aqueles que considerem de maior interesse, para sobre eles emitirem parecer.
Os pareceres aprovados pelos parlamentos são depois transmitidos aos respectivos governos, com vista à definição das posições que estes entendam sustentar no Conselho de Ministros da Comunidade.
A Comissão de Integração Europeia dispõe de informações detalhadas e precisas sobre o que se passa na generalidade dos países da Comunidade neste domínio e considerou que entre nós deveria ser adoptada uma solução semelhante. Com esse objectivo, a Comissão apresentou já há vários meses uma proposta de modificação do Regimento da Assembleia da República que envolveria nova definição das suas funções. Todavia, essa proposta, embora necessária, não é, só por si, suficiente. Daí, o projecto de lei apresentado pelo PRD e também pelo PS e pelo PCP, sobre a intervenção da Assembleia da República no estudo de projectos de legislação comunitária.
Em relação ao projecto do PRD será conveniente sublinhar os seguintes aspectos:

l) Ele procura introduzir uma solução que é corrente nos outros países da CEE. Essa solução é considerada em tais países como uma componente essencial do poder de fiscalização parlamentar sobre as actividades governativas. Não há razão para que em Portugal não adoptemos uma solução do mesmo tipo;
2) Se a proposta do PRD for aprovada, a Assembleia da República não virá a pronunciar-se sobre todos os projectos de Legislação comunitária a respeito dos quais obtenha informação, até porque não terá os meios necessários para o efeito. A Assembleia da República tenderá naturalmente a seleccionar de entre os referidos projectos apenas aqueles que considere de maior interesse pelo seu impacte sobre o nosso país;
3) O projecto de lei apresentado pelo PRD, não procura de forma alguma invadir a área de competência do Governo em matéria de negociações com a CEE. Os pareceres a aprovar pela Assembleia da República nos termos desse projecto não terão carácter vinculativo. É óbvio que as negociações no âmbito do Conselho de Ministros da CEE, nem sempre permitirão que as posições recomendadas em pareceres da Assembleia da República sejam acolhidas nas decisões da comunidade. De resto, o Governo nem sequer terá necessariamente que perfilhar aquelas posições, embora a Assembleia da República possa posteriormente extrair daí as conclusões políticas que considere apropriadas.

Estas anotações tornam claros os objectivos e o alcance do projecto de lei do PRD. Esse projecto procura essencialmente introduzir um mecanismo de participação da Assembleia da República na preparação dos actos legislativos e das políticas comunitárias semelhantes aos que vigoram na maior parte dos outros países da CEE. Sem essa participação a Assembleia da República continuaria marginalizada, tal como até aqui, em matérias de importância fundamental para o nosso país e ficaria tolhida no exercício da competência de fiscalização que a Constituição lhe atribui.
Sabemos que o Governo e o PSD são contrários à solução proposta. Essa posição e a recusa sistemática da prestação de informações adequadas à Assembleia da República sobre o que se passa na CEE conduzem-nos a interrogações sobre a concepção do Governo acerca do funcionamento dos mecanismos da democracia em Portugal. Democracia não é influenciar a opinião pública através da manipulação de algumas informações, da recusa de outras e da insistência em slogans simplistas que por vezes atraiçoam a verdade.

Vozes do PRD e do PS: - Muito bem!

O Orador: - A democracia exige que os problemas do futuro de Portugal, incluindo os que resultam da participação na CEE, sejam discutidos em profundidade com todos os representantes do povo, eleitos para a Assembleia da República. Até agora o Governo não

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se tem mostrado disposto a aceitar esta exigência do regime democrático no que respeita às nossas relações com a CEE.
Pelo contrário, tem-se furtado ao envio das informações de que a Assembleia da República carece para exercer as suas competências ou, quando muito, tem fornecido algumas informações de forma muito vaga e muito incompleta. Os projectos de lei agora apresentados à Assembleia da República por três partidos da oposição sobre esta matéria procuram acabar com este estado de coisas. Procuram pôr-nos nesse domínio ao nível dos outros países da CEE.
Façamos votos para que o Governo acabe por reconhecer a necessidade de colaborar nesse objectivo.

Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, devo avisá-los de que foi estabelecido consenso na conferência de líderes de que não haveria o intervalo regimental. Aproveitava, também, para informar que às 18 horas procederemos a uma votação, conforme está agendado.
Não havendo pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: um aspecto que aqui já foi hoje várias vezes ventilado refere-se ao Fundo Social Europeu. O Fundo Social Europeu contribuiu significativamente em 1986 para a formação profissional e o apoio ao emprego no nosso país.
Uma vez concretizada a adesão, foram apresentados no decurso de 1986, à Comissão das Comunidades pedidos de contribuição do Fundo Social Europeu em número significativo, sinal de que os organismos vocacionados para a formação profissional e apoio ao emprego, bem como as próprias empresas, estavam conscientes da importância de que se revestia a utilização de tal fundo estrutural. Basta dizer que o montante total dos projectos apresentados ao Fundo por entidades portuguesas atingiu em 1986 os 47,2 milhões de contos.
Em 7 de Maio de 1986 a Comissão das Comunidades aprovou os pedidos de contribuição referentes a 1986, tendo o nosso país beneficiado de um montante de 31,6 milhões de contos, a favor de
845 unidades que se propuseram desenvolver 1695 projectos para o apoio ao emprego e formação profissional de 154 634 pessoas.
Nos termos da tramitação em vigor, foram transferidos para Portugal, em 1986 15,4 milhões de contos, a título de adiantamento, ou seja a quase totalidade do adiantamento total previsto, ficando a transferência da verba remanescente dependente da maior ou menor rapidez com que as entidades responsáveis pelas acções apresentem o pedido de pagamento do saldo, acompanhado obviamente dos relatórios de execução respectivos, bem como dos correspondentes documentos comprovativos. Queria voltar a referir que o pagamento dos saldos implica a apresentação do relatório de implementação dos projectos, bem como dos documentos comprovativos.
A aplicação das verbas visa fundamentalmente os jovens: com efeito o próprio Regulamento do Fundo dispõe que a contribuição para as acções a favor dos jovens não poderá ser inferior a 75 % dos créditos do Fundo.

No ano de 1986 os projectos implementados no nosso país beneficiaram cerca de 113 000 jovens, dos quais cerca de 50 000 desses obtiveram emprego. Consideramos tal resultado de grande valia e encorajador para o futuro.
A natureza jurídica das entidades que promoveram as acções distribuiu-se da seguinte forma: 172 organismos públicos, 134 entidades privadas sem fim lucrativo e 539 entidades privadas com fim lucrativo.
No que toca à classificação das acções nos termos das decisões da Comissão de Abril de 1985 a 1986, a verba mais significativa, 19,3 milhões de contos, destinou-se à formação de jovens com qualificações insuficientes ou inadaptadas, seguida de 5 milhões de contos para a formação de trabalhadores inseridos na reestruturação de empresas na sequência de modernização tecnológica ou de alterações profundas de procura no sector e ainda 2,6 milhões de contos na formação de trabalhadores de pequenas e médias empresas cuja qualificação se torne necessária face à introdução de novas tecnologias ou à aplicação de novas técnicas de gestão.
De realçar ainda as acções destinadas à contratação em empregos suplementares, experiência de trabalho ou de criação de actividades independentes, às quais se destinaram 1,4 milhões de contos em favor de 21 102 jovens à procura de emprego e de 6053 desempregados de longa duração (com mais de doze meses de desemprego).
São ainda de referir as acções de formação profissional de pessoal formador, de conselheiros de orientação profissional ou técnicos de colocação ou de agentes de desenvolvimento para a promoção de iniciativas locais, no montante de 484 milhares de contos.

O balanço que fazemos do aproveitamento deste Fundo estrutural pelo nosso país é altamente favorável:
O nosso país foi na sua totalidade considerado como região de prioridade absoluta, o que implica uma taxa majorada na intervenção do Fundo, critérios mais flexíveis de apreciação das prioridades e, além disso e não dispiciendo, é o nosso o único país que beneficia da amortização a seis anos das verbas aplicadas nos centros de formação profissional, mesmo aqueles que foram construídos antes da adesão.
Em segundo lugar, a resposta dos organismos ligados à formação profissional e às empresas foi extraordinária, o que levou à apresentação do elevado número de candidaturas que mencionámos e à sua aprovação em grande parte. Não fora assim e tivéssemos nós procurado elaborar previamente grandes dossiers estratégicos, estudos minuciosíssimos, e não teria o País conseguido ver aprovado em Bruxelas o volume de apoio que se verificou, não teria o País marcado uma posição de partida perante o Fundo, o que nos conduziria a no futuro estarmos em séria desvantagem perante os países nossos parceiros da Comunidade. Se não tivéssemos procedido assim, teríamos caído no erro da Grécia que no primeiro ano beneficiou de um número ínfimo de candidaturas ao Fundo Social Europeu e desse facto se tem vindo a ressentir ainda hoje.
Em terceiro lugar, o País aproveitou as múltiplas estruturas produtivas existentes para a formação e para candidatura ao Fundo Social Europeu. Não se fez a estatização da formação, o que consideramos salutar, pois havendo equipamentos dispersos numerosos há que os aproveitar e não que os marginalizar em nome de uma pretensa planificação estatizante da formação.

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Em quarto lugar, sabemos que alguns defendem a teoria de que as acções de formação a financiar pelo Fundo Social Europeu deveriam ser prioritariamente destinadas ao ensino, aos estabelecimentos de ensino, que dispõem de organização e capacidade de formação multiplicadora.
Sem querer agora discutir o mérito desta tese, no nosso entender redutora, temos de nos cingir às regras do Fundo Social Europeu. E estas regras apontam para a formação nas empresas e nos organismos a ela vocacionados, e não para o apoio ao ensino, que é, no entender das Comunidades, da responsabilidade dos Estados membros.
O ano de 1986 na utilização do Fundo Social Europeu como no dos outros fundos estruturais foi um ano de experiência, um ano em que se proeurou firmar uma posição de partida para o País.
No ano que corre procurará o Governo aproveitar os ensinamentos desta experiência inicial por forma a optimizar os mecanismos de acesso e orientar os projectos no sentido dos objectivos de política económica que visamos alcançar.
O Governo procurará - estamos certos - acompanhar ainda mais de perto a implementação dos projectos em curso, por forma a garantir o seu êxito e a sua manutenção dentro dos parâmetros iniciais aprovados.
Nesta como nas restantes matérias relativas à utilização dos fundos estruturais o Governo defendeu a todo o transe o interesse nacional e conseguiu uma optimização importante na utilização dos recursos à nossa disposição.
Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

O Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - O Sr. Deputado Guido Rodrigues, na sua intervenção, regozijou-se com toda a acção desenvolvida pelo Governo quanto à formação profissional e, nomeadamente, quanto à utilização das verbas do Fundo Social Europeu. No entanto, como o Sr. Deputado sabe, há milhões de contos envolvidos nessa pretensa formação profissional; há milhares de jovens que estão neste momento a descobrir o logro em que caíram quando, após acções ditas de formação profissional, ficaram no desemprego sem qualquer perspectiva de futuro, alguns mesmo tendo deixado a escola para irem para essas acções, julgando que a partir daí tinham assegurado o emprego, e que hoje estão no desemprego.
Por outro lado, sabe-se que não existe qualquer política articulada de formação profissional, de emprego e de ensino. Não há qualquer articulação entre estes três aspectos. É a desarticulação total; é o caos completo em todo este campo.
Mas, para além disso, não existe qualquer fiscalização e acompanhamento da forma como estão a ser utilizados esses milhões e milhões de contos. O Sr. Deputado sabe como este problema tem vindo a preocupar, nomeadamente, vários deputados desta Assembleia, como tudo isto tem vindo a ser sucessivamente colocado ao Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, como tardam as respostas e, sobretudo, as medidas tendentes à clarificação de todo este processo.

Será que o Sr. Deputado conhece já, por exemplo, resultados das auditorias que o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social disse que tinha em seu poder? Aliás, já tive ocasião de perguntar ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros se era hoje que esta Assembleia iria ser informada desses resultados. Será que está disponível para quaisquer medidas a tomar, nomeadamente visando uma fiscalização eficaz e um conhecimento claro e transparente de toda esta situação?
Sr. Deputado, são milhões e milhões de contos que estão em causa; é necessário que esta Assembleia conheça exactamente a sua utilização.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, referi na minha intervenção especificamente que o ano de 1986 foi, na realidade, o ano de arranque. Foi o ano em que tínhamos de defender intransigentemente a posição do País perante os fundos estruturais. E foi isso que na realidade se fez.
Disse também na minha intervenção que no decorrer do ano de 1987, o Governo procuraria orientar e acompanhar, mais de perto ainda, os projectos que forem candidatos às verbas do Fundo Social Europeu. É isso que sei, que julgo a Sr.ª Deputada também saberá e que o Ministério do Trabalho e Segurança Social está a fazer.
Relativamente ao facto de a Sr.ª Deputada ter dito que não há fiscalização da utilização destas verbas, isso não corresponde à realidade. O Instituto de Emprego e Formação Profissional e o Departamento para os Assuntos do Fundo Social Europeu estão a acompanhar a utilização dessas verbas e ainda ontem nos jornais, nomeadamente no Diário de Notícias, a Sr.ª Deputada poderia ter lido que foram detectados julgo que cinco ou seis casos concretos de desvios à utilização de verbas do Fundo Social Europeu.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Afinal sempre há desvios!

O Orador: - Isso constitui prova mais que provada, prova mais que evidente de que o Governo está cônscio da situação, está cônscio da importância das verbas que estão em causa e está a acompanhar todos estes problemas no interesse nacional.
Por outro lado, dizer que não há política articulada de formação profissional é opinião da Sr.ª Deputada. Eu não tenho a mesma opinião.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Claro que não tem!

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lido um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.
Foi lido. É o seguinte:

Relatório e parecer da Comissão
de Regimento e Mandatos

Em reunião realizada no dia 10 de Março de 1987, pelas 16 horas, foram observadas as seguintes substituições de deputados:
Solicitadas pelo, Partido Social-Democrata:

Abílio Gaspar Rodrigues (círculo eleitoral de Santarém), por Mário da Silva Coutinho Albuquerque. Esta substituição é determinada nos termos da alínea e) do n.º 1. do artigo 4.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), a partir do, dia 6 de Março corrente, inclusive.
José Pereira Lopes (círculo eleitoral de Castelo Branco), por Fernando Barata Rocha. Esta substituição é efectuada a partir do dia 9 de Março, inclusive, por ter sido eleito deputado ao Parlamento Europeu.

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.

Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

A Comissão: Secretário, Rui de Sá e Cunha (PRD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - José Maria Peixoto Coutinho (PSD) - António Marques Mendes (PSD) - Henrique Rodrigues da Mata (PSD) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Mário Manuel Cal Brandão (PS) - Jaime Manuel Coutinho Ramos (PRD) - Vasco da Gama Fernandes (PRD) - Jorge Manuel de Abreu Lemos (PCP) - José Manuel Antunes Mendes (PCP) - João Cerveira Corregedor da Fonseca (MDP/CDE).

Vamos votar.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, na continuação do nosso debate, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Esteves.

O Sr. António Esteves (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: De entre todos os sectores da actividade económica as pescas e conservas são sem dúvida os mais mal tratados após a adesão de Portugal às Comunidades.

Fazendo alguns comentários breves sobre o assunto e tendo em conta as informações prestadas pelo Governo, somos obrigados a constatar que, em matéria de recursos externos, a adesão se mostrou muito pouco favorável. É justo reconhecer que no documento distribuído o próprio Governo reconhece o insucesso.
É, por exemplo, uma evidência que a frota portuguesa da pesca do bacalhau perdeu as quotas de pesca que antes detinha na ZEE do Canadá, sem que a Comissão encare qualquer compensação para Portugal.
Também a Comissão Europeia não celebrou quaisquer acordos com países como a Mauritânia e Marrocos, cujas águas têm grande interesse para Portugal.
No que respeita à política estrutural tem de sublinhar-se que, enquanto a frota portuguesa precisa de aproveitar melhor os recursos da Zona Económica Exclusiva nacional e precisa de ocupar estas águas antes do termo dos períodos transitórios, constata-se que a CEE recusou todos os projectos, com excepção de um, de construção de novos navios que pretendem explorar espécies migradoras na Zona Económica Exclusiva nacional, enquanto que, meses antes, a Comissão havia concedido um número exagerado de licenças aos Espanhóis para aproveitar esses mesmos recursos em águas portuguesas.
As informações do Governo referem oito acções de redução definitiva da capacidade da frota, mas não especificam que o abate de oito navios bacalhoeiros se deve às dificuldades encontradas por Portugal na Zona Económica Exclusiva canadiana na sequência da adesão à CEE.
Com isto, a capacidade da frota portuguesa foi reduzida sem ter aumentado, em compensação, outros ramos da pesca.
Mais chocante ainda foi a situação a que se chegou na indústria de conservas de peixe, que atravessa hoje uma crise como nunca viveu.
Sou deputado pela região do Algarve, onde esta questão assume o maior melindre.
Das largas dezenas de fábricas de conservas que ali existiam estão hoje em laboração uma escassa meia dúzia, e mesmo assim atravessando as maiores dificuldades.
Começa a ser incompreensível para empresários e trabalhadores que, no campo da exportação, países como Marrocos tenham condições mais favoráveis de penetração na CEE do que Portugal, que é país membro.
Enquanto Portugal pode exportar 5000 t de conservas sem pagamento de direitos a quota de Marrocos é três vezes superior.
Os importantes interesses em jogo exigem uma rápida revisão desta situação.
Temos todo o direito de exigir uma rápida renegociação para o sector visto que são conhecidos os apoios que vêm sendo prestados a indústrias congéneres do sul da Europa, nomeadamente da França e da Itália.
Como se tudo isto não bastasse, acresce que a Comissão não aprovou, nas suas duas decisões de 1986, qualquer projecto de investimento da indústria de conservas de peixe.
Teremos que reconhecer que no sector das pescas e conservas o insucesso do Governo foi total.
Gostaríamos finalmente de deixar uma nota de estranheza pelo facto de o maior insucesso no primeiro ano de adesão acontecer exactamente na área em que, a nível da Comissão, é responsável um português. Não porque entendamos que, por ser português, o enge-

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nheiro Cardoso e Cunha devesse fazer alguns favores aos seus compatriotas, mas porque, tratando-se como se trata de uma profunda situação de injustiça para Portugal, o Sr. Comissário, conhecendo como ninguém na CEE a, situação do sector, tinha a estrita obrigação de em conjunto com o Governo Português promover as políticas necessárias à correcção dos flagrantes desequilíbrios que acabamos de referir.

Aplausos do PS e de alguns deputados do PRD e do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Feu pediu a palavra para um pedido de esclarecimento?

O Sr. António Feu (PRD): - Sr. Presidente, não é propriamente para um pedido de esclarecimento, mas pretendo usar esta figura regimental para me associar inteiramente à intervenção que o Sr. Deputado António Esteves fez no que diz respeito à indústria de pescas e à indústria das conservas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. António IFeu (PRD): - Sr. Deputado, alguns problemas que levantou já tinham sido aqui referidos por mim quando fiz a pergunta ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros. Queria, no entanto, fazer mais uma referência em relação à pesca no Canadá.
A frota portuguesa, que tinha uma actividade tradicional nas águas sob jurisdição do Governo Canadiano, neste momento, pescando fora das águas canadianas, se tem que recorrer à terra mesmo para deixar, por exemplo, um marinheiro doente sofre enormes pressões e obstáculos para, inclusive, poder demandar um porto canadiano. Este problema não tem sido resolvido e essa dificuldade, que não tem sido ultrapassada pelo Governo, é um grande problema para a frota portuguesa que pesca mesmo fora das águas canadianas.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O balanço da adesão portuguesa à CEE não pode dissociar-se de um balanço que tem necessariamente de ser feito sobre a actuação governamental durante o último ano.
Um balanço desta natureza não pode, nem deve, circunscrever-se apenas a meras questões contabilísticas. Impõe-se tomar um conhecimento aprofundado sobre a realidade social no nosso país, sobre o desenvolvimento económico, financeiro e tecnológico, sobre os programas que teriam de ser implementados e que visassem o desenvolvimento do nosso país.
Muitas perguntas há a fazer e têmo-las colocado; e muitas dúvidas temos sobre a eficácia governamental exactamente sobre a acção desenvolvida no primeiro ano que decorreu sobre a entrada de Portugal na Comunidade Europeia.
Apresentamos alguns exemplos.
O Governo não promoveu uma política agrícola realista de aproveitamento das nossas potencialidades, tendo optado erradamente pela confrontação na zona da Reforma Agrária, entregando reservas a antigos latifundiários e promovendo este seu tipo de actuação o desemprego e dificultando uma actuação positiva que estava a ser posta em prática pelos trabalhadores rurais daquela zona.

O Governo não promove uma política de emprego, verificando-se, antes pelo contrário, o aumento do desemprego e a diminuição dos postos de trabalho; existe, sem dúvida, uma grande instabilidade de trabalho no nosso país.
O Governo não apresentou até agora um qualquer programa industrial, e não vale a pena referirmo-nos agora ao tão celebrado PEDIP.
Aliás, já de manhã, Sr. Presidente e Srs. Deputados, assinalei a ausência do Sr. Ministro da Indústria. Seria útil tê-lo entre nós para lhe colocarmos algumas questões. O que se passa neste sector é altamente preocupante, uma vez que o Governo só se mostra interessado em atacar o sector empresarial do Estado, que consideramos como o verdadeiro motor de arranque da nossa economia, que deve ter o apoio da iniciativa privada verdadeiramente interessada no desenvolvimento do País e não apenas em meros interesses especulativos.
O Governo não promove uma formação profissional e empresarial adequada, o que é grave, tanto mais que se impõe, neste campo, um trabalho, árduo sem dúvida, de modificação da mentalidade de muitos dos nossos empresários habituados ao paternalismo, ao subsídio e, infelizmente, habituados à obtenção de lucros rápidos e especulativos, sem terem em conta, muitas vezes, os verdadeiros interesses nacionais. E muitas vezes o seu tipo de actuação prejudica realmente o nosso país.
Entende o MDP/CDE que a iniciativa privada pode e deve ocupar um lugar de relevo no desenvolvimento do País. A propósito, há que fazer uma pergunta: o que foi feito, até agora, por este governo para promover as pequenas e médias empresas?
No livro branco do Ministério dos Negócios Estrangeiros sobre o primeiro ano de adesão de Portugal à CEE pode ler-se, na p. 114, que o Conselho Europeu, em Março de 1985, acentuou a necessidade de se promover as PMEs no quadro de uma estratégia de crescimento e de emprego. Na sequência daquela orientação foi aprovado um programa de acção da comunidade para as PMEs, em torno do qual se deverão articular numerosas acções, tanto no plano comunitário como no plano nacional.
Os dois grandes objectivos de acção comunitária para responder aos problemas e necessidades das PMEs são:

Contribuir para a formação de um ambiente favorável administrativo, regulamentar, cultural e social, na perspectiva do grande mercado interno europeu;
Dar uma contribuição positiva às medidas de capitalização e de flexibilidade das PMEs, tanto no que respeita à criação de novas empresas como no que se refere ao desenvolvimento das empresas existentes.

Pois, apesar das preocupações da Comunidade quanto às PMEs, o que se tem feito, nomeadamente por este governo, para defesa deste sector tão importante para o País e que ocupa uma enorme percentagem dos nossos agentes económicos?
O que se sabe, isso sim, é que as PMEs em Portugal estão a ser lesadas, atingindo gravemente um sector vital do País. São muitas as PME's que sofrem com a prática política do Governo. E o número de falências tem aumentado. É bom não esquecer que o conceito e a estrutura das PMEs da Comunidade em geral não é o mesmo de Portugal. Uma PME na Europa não é, com certeza, uma PME em Portugal.

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Outro dos sectores que deveria merecer particular atenção ao Governo, atenção redobrada devido ao acordo celebrado com a CEE, diz respeito às pescas, e já aqui focado, nomeadamente, pelo Sr. Deputado António Esteves. Diz o Governo que, na Comissão de Integração Europeia da Assembleia da República, tem prestado esclarecimentos sobre a nossa adesão à CEE.
Mas a verdade é que o Governo não nos deu respostas claras sobre o que se passa com o sector pesqueiro, com certeza uma das nossas principais preocupações. Nem se melhora, nem se moderniza a nossa frota, sem se promove a protecção, a melhoria e conhecimento da nossa zona económica exclusiva. A realidade é bem desagradável: continuamos a importar pescado e os problemas dos pescadores agravam-se dia a dia, sem que se vislumbre uma melhoria a breve prazo. Enquanto a situação piora, a frota, os estaleiros e as potencialidades, por exemplo, da Companhia Portuguesa de Pesca apodrecem no Tejo. A situação agravou-se com a periclitante situação do sector das conservas de peixe, já aqui também focada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não nos manifestamos contra a CEE. O que nos move neste debate e na nossa prática política, no MDP/CDE, é a necessidade de vermos defendidos com rigor os nossos interesses e vermos posta em prática uma política de desenvolvimento global que concorra para a melhoria substancial da nossa situação económica, financeira, social e cultural. O que não tem acontecido.
A «estratégia de progresso controlado» do Governo falhou. O Governo tem demonstrado incapacidade para avançar a resolução dos problemas do País, o que está a agravar as tensões políticas e sociais, como hoje mesmo se está a verificar com a marcha de trabalhadores da Reforma Agrária sobre Lisboa, e, ao que parece, estão a desenrolar-se acontecimentos bastantes negativos junto a Vila Franca de Xira, por força da actuação de autoridades policiais, que estão a criar problemas a esta marcha digna e perfeitamente legal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação global do nosso país neste ano que passou sobre a nossa entrada na CEE e também, por mero acaso, ao fim de um ano de actuação governamental é muito grave, e tanto mais grave quanto é certo que a nossa integração na CEE deve obrigar a um esforço muito grande por parte do nosso país.
Portugal necessita de ver modificada a política levada a efeito por este governo. Caso contrário, a manter-se o caminho até agora trilhado, dentro de pouco tempo ver-nos-emos confrontados com tais atrasos, que dificultarão, ainda mais, a posição do nosso país no âmbito da CEE, nomeadamente para fazer frente aos amplos desafios que a implementação do mercado único vai com certeza provocar.

Aplausos do MDP/CDE, do PCP e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser submetido à votação, na generalidade, o projecto de lei n.º 367/IV, do PCP, que institui um novo enquadramento legal à venda de bombas de Carnaval, tendo em vista a segurança dos cidadãos e, em especial, das crianças.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência da deputada independente Maria Santos.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca pede a palavra para que efeito?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, quero informar que entregarei na Mesa uma declaração de voto por escrito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Brito deseja usar da palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, desejo anunciar que, nos termos regimentais, vamos entregar na Mesa o requerimento de baixa à Comissão do projecto de lei agora aprovado.
Para o caso de o Sr. Presidente desejar submeter à votação esse mesmo requerimento, informo que o prazo que nele solicitaremos será de 30 dias.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, desejo interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, para ganharmos tempo informo que se o requerimento se refere a uma baixa à 1.ª Comissão e se o prazo é de 30 dias, estamos disponíveis para o votar de imediato.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se não houver qualquer objecção, uma vez expressas as indicações de que se trata de uma baixa à 1.ª Comissão por um prazo de 30 dias, vamos proceder à votação deste requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência da deputada independente Maria Santos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: No momento em que são celebrados o ponto mais recente da chegada que é o Acto Único e os 30 anos do Tratado de Roma, os quais lidam fundamentalmente com a definição de um grande espaço económico, aquilo que o Manifesto para o Ano 2000 dos Democratas Cristãos Europeus considera e proclama como a maior realização da aventura europeia é o seguinte: «Nunca em três decénios a Europa conheceu um tal período de paz. A audácia política e o génio criador de Konrad Adenauer, de Alcide de Gasperi, de Robert Schuman, transformaram decisivamente a face da Europa; por isso, lançaram um apelo a todos os cidadãos da Europa, e em particular à juventude, para trabalharem, consequentemente, para a realização de uma Europa mais solidária, mais unida, mais capaz de promover o desenvolvimento e paz, de assegurar a liberdade e dar a cada um oportunidades iguais para a sua realização.»

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Esta proclamação, que é fiel ao projecto do Tratado de União Europeia, votado pelo Parlamento Europeu em 14 de Fevereiro de 1984, não pode esconder que se as tradicionais agressões interiores de uma guerra civil tradicional podem considerar-se eliminadas na Europa livre, por uma mudança e decisão nova dos seus membros, não pode dizer-se o mesmo da paz exterior, que continua fundamentalmente dependente de decisões exteriores nas quais mal participa ou de todo não influi. É por isso que, aprovando tudo quanto tenha por efeito o estabelecimento e alargamento de zonas desnuclearizadas, a eliminação da corrida aos armamentos, o desarmamento geral e equilibrado de todas as espécies de armas convencionais, químicas ou biológicas, para que finalmente o «desenvolvimento seja o novo nome da paz», como disse Paulo VI, não podemos deixar de adiantar o seguinte: temos de considerar alarmante que o último ano tenha sido marcado por uma simultânea propaganda maciça daquilo que se afirma ser a nova linha de Moscovo, cujo líder tem mais tempo de antena no Ocidente e entre nós do que qualquer força partidária, e que isso seja acompanhado de um igual ataque à decisão e credibilidade das forças ocidentais, pelo sistemático ataque à fiabilidade dos dirigentes do Estado, que foi a estaca da recuperação europeia, que sejam aprofundadas na opinião pública todas as razões pelas quais a solidariedade atlântica pode ser diminuída e constantemente evidenciados motivos destinados a desarmar o edifício doutrinal e prática da maior força ocidental capaz de movimentar as energias da sociedade civil europeia desde o Atlântico aos Urais, que é a igreja católica dirigida por João Paulo II.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Tudo conjugado, e avaliado em comum, torna claro que do exterior se tem o objectivo de fazer crescer o isolamento e dependência da Europa Ocidental, use-se ou não o nome de finlandização, e continuaremos a perguntar quem autorizou um oficial das forças armadas portuguesas a tomar uma parte activa e institucionalizada nesse evidente processo de deterioração, uma pergunta que, visto o tempo já decorrido sobre a data em que foi feita neste Parlamento, faz supor que tem uma resposta difícil, ou, o que seria pior, que não pode ter resposta.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Concordamos com Pflimlin quando, fazendo o balanço de 1986, dá ênfase aos problemas da política externa das comunidades e insiste nestes objectivos, a respeito dos quais pouco ou nada sabemos da política do Governo Português. Esses objectivos são: conter a corrida aos armamentos, tendo em vista reduzir a metade as armas nucleares estratégicas, eliminar as armas nucleares de alcance intermédio, interditar as armas químicas no mundo inteiro, reduzir de maneira equilibrada as armas convencionais e tornar efectivas as medidas destinadas a repor a confiança; realisticamente, considera que a iniciativa de defesa estratégica (IDS) deve ser abrangida pela regra de que nenhum sector do sistema de defesa nuclear de uma das partes deve ser unilateralmente subtraído ao processo de negociações; reconhece que o acordo directo entre os EUA e a URSS é fundamental; convida a Comunidade a tomar iniciativas próprias nos contactos com a Europa do Leste que contribuam para o desarmamento e para criar zonas desnuclearizadas no Norte e Centro da Europa; considera fundamental o respeito pelos acordos SALT II, para evitar o aceleramento incontrolado da corrida aos armamentos, e condena a continuação dos ensaios de armas nucleares, preconizando um tratado de interdição de tais ensaios. O Parlamento Europeu inquieta-se justificadamente com o terrorismo, que ultrapassa os quadros nacionais, consolidando a variável estrutural do medo, que faz parte da conjuntura europeia, e incita a dar seguimento às decisões tomadas em 15 de Setembro passado pelo chamado Grupo de Trevi encorajando as comunidades à iniciação de uma negociação directa entre as partes em conflito no Médio Oriente, dentro de um quadro internacional apropriado, aceite pelos interessados, porque todos os países estão conscientes de que o terrorismo internacional está, pelo menos, em parte ligado aos conflitos dessa área. Trata-se, enfim, de reconhecer de que existe uma relação, viciosa mas indiscutível, entre desenvolvimento e segurança, e que os recursos que as circunstâncias obrigam a gastar neste último domínio são insubstituíveis para colmatar as debilidades dos recursos necessários para assumir o presente e construir o futuro projectado. No que toca ao presente, à Europa concreta, para satisfazer a necessidade de relançar o crescimento e criar empregos, pela real criação do mercado interior até 1992, desenvolvendo a iniciativa e assegurando a cada trabalhador e a cada empresa as perspectivas abertas de que necessitam; para relançar o sistema monetário europeu e dar ao ECU uma função de verdadeira moeda europeia; para organizar a solidariedade, a coesão económica e social da comunidade; para empreender as reformas estruturais financeiras da Europa, adoptando os recursos próprios às novas necessidades depois do alargamento para o Sul, com a entrada de Portugal e Espanha, e para desenvolver as novas políticas que são reconhecidamente necessárias; acelerar a comunidade europeia da ciência, investigação e tecnologia e para que os países europeus retomem o seu lugar num mundo cada vez mais competitivo; para proteger a qualidade de vida através de uma política que ultrapasse as fronteiras, e que o acidente de Tchernobyl mostrou ser urgente e inadiável, sendo necessário actualizar o Tratado EURATOM, cuja capacidade é ineficaz; para adoptar a política agrícola comum às novas exigências da sociedade, para que a agricultura desenvolva produções de qualidade e reforce a salvaguarda do espaço rural, apoiando as empresas agrícolas familiares, para assegurar aos agricultores um nível de vida equitativo. Este presente é assumido em função de um projecto de futuro que pretende, pela unidade europeia, a convergência económica que garanta um crescimento equilibrado e a diminuição e eliminação do desemprego: dar aos europeus direitos efectivos na sua vida quotidiana, na formação escolar, universitária e profissional, construindo uma sociedade ao serviço do homem que respeite a igualdade de direitos entre os homens e as mulheres, que garanta a segurança e a paz dos europeus em face dos desafios exteriores, com um poder próprio de defesa no quadro da Aliança Atlântica, desenvolvendo o nosso futuro solidariamente com os países em desenvolvimento, e, pelo que a nós respeita, com os países de expressão oficial portuguesa.

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O PPE, em que se integram as democracias cristãs, reconhece, em face do programa da Comissão para 1987, que a Comunidade atravessa uma crise financeira que a ameaça de asfixia e paralisa o desenvolvimento de políticas comuns; teme os efeitos aparentes do retardamento do processo de integração, mas considera positivas as seguintes proposições: a realização do mercado interior, que leve às economias dos Estados membros o quadro e os meios necessários à retoma de um crescimento equilibrado e reestruturado; a, emergência, paralelamente, de uma dimensão social europeia, complemento necessário ao esforço económico europeu, que incluí medidas compreendendo igualdade de direitos
entre homens e mulheres; o reforço dos instrumentos destinados a favorecer a coesão económica e social, em particular a integração dos fundos estruturais, cujos meios serão acrescidos e cujas modalidades serão desconcentradas para serem eficazes; a adaptação dos meios financeiros da CEE às exigências do Acto Único e às novas políticas que inaugura; a reforma da política agrícola comum por uma transparência dos mercados agrícolas dentro do respeito dos objectivos do Tratado, assim como de um rendimento conveniente
das empresas familiares; insistir sobre a urgência de uma decisão respeitante ao financiamento do programa quadro plurianual tecnológico; o reforço das relações entre as instituições comunitárias. Em suma, as grandes questões pendentes no ano de 1986, que foi o do alargamento das Comunidades, parecem ser estas: o dossier do Acto Único, animado pelo objectivo do «espaço sem fronteiras», para 1992; um programa de investigação e tecnologia; a extensão do voto à maioria qualificada; o alargamento dos poderes do Parlamento Europeu, que em muitos domínios o obteve graças ao processo de cooperação com o Conselho, numa segunda leitura das propostas legislativas; á decisão do Parlamento de lutar pela instituição da união europeia, sob um princípio proclamado pelo falecido Altiero Spinellí nestes termos: «Daqui em diante, a linha de separação entre as forças do progresso e do conservadorismo não será mais a linha tradicional entre a direita
e a esquerda, mas entre os que utilizam o poder de que dispõem para promover a unificação europeia e os que o empregam com o fim de provocar a restauração das soberanias nacionais agressivas.» Temos algumas vezes ouvido de fonte idónea que não é o problema da soberania que está em causa, mas vemos que não é essa a opinião de Spinelli, de Pflimlin e do Parlamento Europeu. Num processo europeu em que os factores exógenos, e sobretudo a defesa com os seus encargos, condicionam grandemente as dificuldades orçamentais, com os seus reflexos na política agrícola comum e na
definição das novas políticas em que concordamos pelo Acto Único, este problema exige certamente a atenção sem falhas do Governo; a informação sem omissões da opinião pública, fornecida em termos de discurso eficaz que não seja o discurso eleitoral, mas sim o discurso nacional; a legitimidade da representação no Parlamento Europeu, nos termos previstos pelas obrigações internacionais assumidas. Esta representação e o cumprimento das obrigações internacionais assumidas, implicam que se proceda imediatamente às eleições nacionais para o Parlamento Europeu, obrigação que tem andado envolvida no silêncio. Justamente, porque somos a favor da estabilidade governativa e entendemos que, nas circunstâncias actuais, eleições gerais internas apenas serão provocadas quando e se o Governo o quiser, não existe qualquer razão pragmática, das que costumam beneficiar os partidos no poder, para que se continue a adiar o cumprimento dessa obrigação internacional assumida. São eleições que não têm nada a ver com eleições internas, não têm nem podem esperar por estas nem esperar que estas eleições internas sejam provocadas pelas conveniências temporais de quem tem na sua mão escolher entre a estabilidade governativa ou a consulta ao eleitorado. Todos sabemos dos incómodos das pessoas que podem ser invocados a respeito de quaisquer eleições. Mas todos sabemos que em casos como o das Comunidades esse facto é tomado em conta ao assumir os compromissos internacionais, e, tomados estes, não há outra coisa a fazer senão cumpri-los. Contra o cumprimento dessa obrigação não podem ser invocados interesses partidários, nem oportunidades governamentais, nem considerações sobre as disposições participativas do eleitorado. Pura e simplesmente existe a obrigação, internacionalmente assumida, de proceder a eleições para o Parlamento Europeu, e são precisamente os partidos que defendem a estabilidade governativa os mesmos que coerentemente devem exigir que essa obrigação seja cumprida, contribuindo para tornar inequívoco perante uma opinião pública constantemente sujeita a informações contraditórias, que pelo seu lado nada farão para que o valor da continuidade governativa seja abandonado e que, portanto, não estão no seu horizonte eleições internas, a que sejam ligadas as eleições para o Parlamento Europeu. É dentro da estabilidade política interna, sem que as paixões partidárias afectem excessivamente um acto que tem a ver com o destino e situação de todos, que a obrigação internacional assumida de fazer eleições para o Parlamento Europeu deve ser cumprida e sem delongas.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Após um ano de adesão, ainda é cedo para se fazer balanços, mas valerá certamente a pena fazer um balanço, numa perspectiva séria e inventariadora, da nossa política comum, o povo português tem direito a saber o que efectivamente se fez, e nós temos o dever de contribuir para que essa informação lhe seja fornecida.
Dispomos de vários mecanismos para nos mantermos informados, sem nos emiscuirmos no campo ou no âmbito da acção de outros órgãos legalmente constituídos. Tudo quanto a nós se deve passar no restrito campo das balizas de actuação já estabelecidas. Por
isso, se por um lado estamos plenamente de acordo que se proceda nesta sede a debate com a prioridade e dignidade que o compatibilize com a importância que este tema tem, também não deixaremos de tirar as respectivas ilações políticas se esses objectivos não forem conseguidos.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Um dos, temas mais badalado na Comunidade é o da agricultura e entre nós também muito se tem especulado à sua volta, sem se ter a coragem de fazer uma análise prévia às características específicas deste, sector, que podemos traduzir em alguns indicadores mais vulgares, como reduzido crescimento da produção, baixa produtividade da terra, elevada percentagem,

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de população activa idosa e um parco nível de investimento, que são mais que suficientes para nos darem uma imagem que, para além do referido, decorre ainda da reduzida dimensão e elevado fraccionamento das explorações, de um deficiente ordenamento cultural do território, de sistemas de produção tecnicamente pouco evoluídos, de sistemas de comercialização profundamente distorcidos e de pouca formação profissional.
Perante esta realidade, quem com o mínimo de conhecimento e bom senso reivindica mudanças de fundo, a curto prazo, são com certeza, os que têm na sua posse a varinha de condão. Nós, sociais-democratas, não pertencemos ao mundo da magia nem sequer ao da demagogia.
Assim, para nós, tudo tem de ser planeado no tempo, com toda a dedicação e apoio de quem comanda e trabalha neste sector.
O grande desafio que, portanto, se põe à agricultura portuguesa face à integração da CEE é a transformação de um sector estagnado num sector sólido e altamente produtivo, o que implica uma estratégia de desenvolvimento bem definida, a qual foi claramente expressa pelo Governo, mas que vale a pena referir: aumentos significativos nas produtividades, em termos quantitativos e qualitativos das diferentes actividades, nomeadamente daquelas em que se possa tirar partido das vantagens comparativas existentes; encurtar e racionalizar o espaço que medeia entre os produtores e consumidores; aumentar a competitividade da cadeia agro-alimentar através de inovações tecnológicas, diversificação da gama de produtos e melhoria da qualidade dos mesmos; criação e incremento das acções que visem dotar as explorações agrícolas das infra-estruturas indispensáveis a um melhor aproveitamento das suas potencialidades, nomeadamente através de obras de rega, drenagem, electrificação e caminhos rurais; aumento da mobilidade da terra e rejuvenescimento da população agrícola, com vista à melhoria gradual da estrutura fundiária; incentivar a criação das estruturas organizativas associadas ao processo de desenvolvimento agrícola, com destaque para as organizações de produtores; incrementar e melhorar a informação orientada, a formação profissional e a investigação aplicada.
Naturalmente que isto pressupõe um adequado enquadramento nas estratégias e nos programas de desenvolvimento regional.
Esta estratégia está a ser concretizada, visto dispormos, em virtude da adesão à CEE, de um razoável leque de instrumentos de realização de natureza material, financeira e organizativa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pese embora a disciplina de produção imposta pela PAC, decorrente da existência de excedentes estruturais, conseguiu-se no processo de negociação da adesão, face à especificidade do sector agrícola português e ao seu baixo nível de desenvolvimento, encontrar uma forma - período de transição «misto» - que visa permitir, sem choque, a posterior aplicação de toda a legislação e políticas comunitárias. Assim, os produtos agrícolas com maior capacidade competitiva e que não apresentam problemas estruturais à aplicação da PAC ficam sujeitos à transição clássica, enquanto que os produtos considerados mais sensíveis, que representam mais de 80 % da nossa produção (leite, cereais, vinho, etc.), ficam sujeitos a uma transição por etapas que pode ter uma duração de cinco a sete anos. Em relação a estes produtos as disposições nacionais são dominantes e os mecanismos comunitários são introduzidos gradualmente e a partir do inicio da segunda etapa.

E será assegurado, por via de medidas complementares necessárias, que da harmonização dos preços não advirão decréscimos de rendimento. Por isso, é decisivo apostar nos aumentos de produtividade e no desenvolvimento estrutural.

Também no âmbito da política sócio-estrutural, para além da aplicação a Portugal, a partir da data de adesão, de toda a regulamentação comunitária horizontal, o reconhecimento da existência de problemas específicos levou ao estabelecimento do PEDAP - Programa Específico de Desenvolvimento da Agricultura Portuguesa (Regulamento CEE n.º 3828/85).

Este programa visa a melhoria da situação estrutural do sector agrícola através de um investimento global de mais de 210 milhões de contos durante um período de dez anos, em que a comparticipação global da Comunidade se situa em 700 MECUs.

Atendendo, igualmente, às características do sector vitivinícola, foi instituído um programa específico para Portugal para o melhoramento das estruturas vitivinícolas (Regulamento CEE n.º 2239/86) que visa, por um lado, a melhoria das estruturas de base da vinha e, por outro, incentivar o abandono definitivo de determinadas áreas ocupadas com aquela cultura. A área total a beneficiar é de 45 000 ha.

O Regulamento CEE n.º 797/85, aplicado a Portugal através do Decreto-Lei n.º 172-G/86, agora ajustado pelo Decreto-Lei n.º 79-A/87, e do Decreto Regulamentar n.º 24-B/86, visa a concessão de ajudas aos investimentos nas explorações, bem como ajudas à realização de medidas complementares de modernização; entrou em funcionamento em Portugal em 1 de Setembro de 1986; incentiva principalmente os agricultores a título principal e os jovens e não existe qualquer discriminação relativamente às pequenas explorações. Este regime diferencia igualmente os níveis de ajuda segundo a região a que respeitam: regiões desfavorecidas (cerca de 80% do território nacional) e regiões não desfavorecidas.
Mesmo «os famosos» 50 % de agricultores «excluídos» por não serem a título principal (conforme diz o PCP) podem entrar no mesmo regulamento através das ajudas nacionais. Só pode afirmar o que afirma o PCP quem nunca leu a legislação ou se recusa a dizer a verdade.

Neste momento já foram apresentados, no âmbito do Regulamento CEE n.º 797/85, 1700 projectos correspondentes a um investimento de cerca de 11 milhões de contos. Destes, foram já aprovados 282 projectos em que o montante de subsidio aprovado atinge 688,3 mil contos.

Considera-se de destacar a percentagem significativa de projectos aprovados para jovens agricultores, cerca de 33 % do número global e em que o montante do subsidio aprovado ascende a cerca de 300 000 contos, ou seja, quase metade dos subsídios concedidos até finais de Janeiro.
O Regulamento CEE n.º 355/77 visa a melhoria das condições de transformação e comercialização dos produtos agrícolas. Os projectos apresentados no âmbito deste regulamento têm tido um nível de ajuda de 66 %

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sob a forma de subsídio em capital e em que a comparticipação do FEOGA é de 50 %, sendo os restantes 16 % a cargo do Estado Português.
Para o futuro, foram estabelecidos dois níveis de prioridade, com consequentes diferenciações de apoio financeiro.
Ao abrigo deste regulamento foram aprovados 53 projectos em que o investimento atingiu 7,2 milhões de contos e em que a comparticipação comunitária e nacional foi, respectivamente, de 3,36 e 1,1 milhões de contos.
O PEDAP - Regulamento CEE n.º 3828/85 engloba um conjunto de acções que, pela sua natureza, poderão contribuir significativamente para a resolução dos principais problemas e, estrangulamentos do sector agrícola; visa criar as infra-estruturas de desenvolvimento, regadios, caminhos, electrificação rural, obras de drenagem até à formação profissional, extensão rural e investigação aplicada. .
No âmbito do PEDAP foram já aprovados pela Comunidade seis programas específicos - regadios tradicionais, electrificação, caminhos rurais e agrícolas, drenagem e conservação do solo, olivicultura e acção florestal - cuja execução começou em, 0utubro. A importância que o Governo atribuiu a este programa está bem patente na dotação do Orçamento do Estado para 1987, no valor de 4 milhões de contos, que adicionada à comparticipação comunitária é dos aderentes ao programa atingirá um investimento no valor de 11,8 milhões de contos.
Porém, as ajudas do FEOGA não se têm limitado à componente estrutural (FEOGA - Orientação), pois, na componente preços e mercados (FEOGA - Garantia) e relativamente aos produtos sujeitos à «transição clássica», designadamente girassol, tabaco, ovinos e caprinos, azeite e tomate, a agricultura portuguesa receberá, por conta do ano agrícola 1986-l987, cerca de 7 milhões de contos e, em termos de fluxos, entram 4,4 milhões de contos.
Verifica-se que, em 1986, as intenções de investimento (projectos apresentados com montantes consolidados) na agricultura e agro-indústrias ascenderam a 42 milhões de contos, ou seja, cerca de cinco vezes as verificadas em 1985, que foram de 8,7 milhões de contos.
Com a aprovação, como esperamos, durante o corrente ano, dos diplomas de aplicação dos Regulamentos n.º 2239/86 (reestruturação e reconversão da vinha) e 1035/72 (ajudas às organizações de produtores que se constituam para comercialização dos produtos provenientes dos seus associados) ficará completa a legislação de acesso às ajudas comunitárias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Embora se reconheça que ainda é necessário um maior esforço na formação e informação dos agentes interessados, um ano após a adesão podemos afirmar, de consciência tranquila, que o balanço é inequivocamente positivo, especialmente tendo em conta que, em agricultura, um, ano é
muito pouco para tirar conclusões.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Deputado Vasco Miguel, depois de ter ouvido uma ladainha bastante completa sobre os benefícios da adesão, posso concluir que V. Ex.ª está perfeitamente informado para me poder responder a duas questões que a sua intervenção me suscitou e que passo a expor.
Em primeiro lugar, relativamente à contribuição de Portugal para o financiamento dos chamados excedentes de manteiga - que se presume serem neste momento de cerca de 3 milhões de contos e para os quais o nosso país em nada contribuiu -, gostaria de perguntar-lhe se também tem conhecimento de quais foram as contrapartidas que o Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação negociou ou pensou negociar relativamente a esta contribuição.
Este é um aspecto relativamente importante, tendo em conta não só as posições que Portugal assumiu no passado sobre esta matéria, como também aquelas que os espanhóis têm tomado nestes últimos dias.
Pergunto-lhe, igualmente, se tem conhecimento se na próxima reunião da ECOFIN poderemos vir a obter ainda - e friso ainda - qualquer contrapartida financeira quanto a esta matéria.
A segunda questão que lhe quero colocar tem a ver com a posição portuguesa em relação à proposta da comissão de introduzir uma taxa sobre os azeites e os óleos vegetais. Assim, gostaria de saber quanto é que Portugal irá pagar para o orçamento comunitário.
Por outro lado e a título de contrapartidas, pergunto-lhe se tem conhecimento de estimativas que permitam saber quantos milhares de produtores de azeite com pequenos olivais viriam a ser beneficiados pelas ajudas à produção previstas nesta mesma proposta.
Considero que estas duas questões são importantes - a dos custos e a dos eventuais benefícios - para podermos perceber qual é, efectivamente, a posição de Portugal sobre esta matéria, que, tanto quanto julgo saber, é contrária à da comissão.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Deputado Carlos Lilaia, diria que V. Ex.ª aproveitou a oportunidade para fazer uma intervenção ou então para sugerir ao membro do Governo relacionado com esta área que lhe responda às questões formuladas.
No entanto, quero dizer-lhe que, pela clareza com que expôs estes assuntos, está muito mais bem informado do que eu no que diz respeito à ladainha que pronunciei ali da tribuna. Dou-lhe os meus parabéns pela informação ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente quero apenas solicitar à Mesa um esclarecimento sobre se o Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Agrário irá ou não produzir hoje alguma intervenção.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a informação que a Mesa pode dar é a de que neste momento não há qualquer inscrição.

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O Sr. Rogério de Brito (PCP): - É que ficou uma série de respostas por dar por parte do Governo e o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros disse que elas seriam dadas pelo seu colega da tutela. Portanto, continuamos a aguardar essas respostas.

O Sr. José Magalhães (PCP): - E ao que parece
vamos ter que continuar a aguardar!...

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares (Fernando Nogueira): - Sr. Presidente, permite-me que interpele a Mesa?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Gostaria de saber quanto tempo é que o Governo ainda tem disponível, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Governo dispõe neste momento de onze minutos.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, pressupondo, talvez indevidamente, que a pergunta feita pelo Sr. Ministro tem a ver com uma questão de gestão de tempo e com a possibilidade de os membros do Governo intervirem em função do tempo disponível,
adiantaria que, pela parte da bancada do Partido Socialista e para que o Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Agrário ou qualquer outro membro do Governo possam intervir para esclarecer esta Assembleia, não temos nenhuma objecção a que lhes seja concedido o tempo necessário para esse efeito.

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, se a Mesa e a Câmara estiverem de acordo, aceitamos a oferta preconizada pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso e, nesse caso, posso garantir que o Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Agrário usará da palavra com base nessa concessão de tempo que a Assembleia quiser ter a bondade de fazer ao Governo, desde que esse tempo não seja descontado no tempo que o Governo tem disponível, reservando-se, naturalmente, o Governo o direito de escolher o momento em que o referido Sr. Secretário de Estado irá intervir.

Pausa.

O Sr. Presidente: - A Mesa continua a aguardar inscrições.
Entretanto e em termos de informação complementar, vou referir os tempos ainda disponíveis. Assim e contando com aqueles quinze minutos e com os tempos proporcionais para os vários partidos que já foram atribuídos, o Governo dispõe de onze minutos, o PSD de um minuto, o PS de onze minutos, o PRD de sete minutos, o PCP de oito minutos, o CDS de dezoito minutos e o MDP/CDE de onze minutos.
A Mesa continua a aguardar inscrições.

Pausa.

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Dá-me licença que interpele de novo a Mesa, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, se nenhum dos Srs. Deputados, nomeadamente dos partidos da oposição - uma vez que o partido que apoia o Governo só dispõe de um minuto -, manifesta intenção de intervir e se for aceite a sugestão que foi feita pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso de que não contaria o tempo da intervenção do Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Agrícola, então solicito à Mesa que inscreva o referido Sr. Secretário de Estado para intervir. Isto, repito, desde que o tempo que ele gastar não for descontado no tempo de que o Governo ainda dispõe.

O Sr. Presidente: - A Mesa não põe objecções, pelo que, se também não as houver por parte de nenhum dos Srs. Deputados, considera inscrito, para intervir, o Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Agrário.

Uma vez que não há objecções, tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Secretário de Estado.

Informo-o, entretanto, de que, como é óbvio, não tem um tempo ilimitado para intervir, pelo que lhe peço que intervenha dentro de um tempo que se possa considerar razoável.

O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Agrário (Arlindo Cunha): - Não espero demorar mais do que seis ou sete minutos, Sr. Presidente. Procurarei balizar-me às perguntas que me foram dirigidas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero agradecer o tempo que me concederam, passando, já de seguida, a esclarecer algumas questões que foram colocadas hoje de manhã, as quais sintetizei, não de uma maneira exaustiva, mas apanhando aquilo que me pareceu mais relevante, nas seguintes críticas ao Governo: liberalização pelo Governo da recolha de leite nas zonas de recolha organizada, restrições impostas à exportação de concentrado de tomate, queda dos preços nos ovinos, elevado número de projectos candidatos ao Regulamento n.º 355 que não foram financiados em 1986, concentração de projectos do Regulamento n.º 797 nalgumas regiões do País, particularmente no Alentejo, Ribatejo e Oeste, e não existência de uma política agrícola orientadora.

Quanto à liberalização da recolha de leite, os Srs. Deputados sabem bem que ela decorre do Tratado de Adesão e que o que o Governo está a fazer não é mais do que uma programação faseada daquilo que aí se diz. Temos até 1991 o tempo necessário para, gradualmente e de uma forma estável, fasear essa liberalização.

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I SÉRIE - NÚMERO 53

No que diz respeito às restrições à exportação de concentrado de tomate, os Srs. Deputados sabem certamente que o artigo 304.º do Tratado de Adesão prevê o pagamento de montantes compensatórios. É evidente que o Governo não se sente feliz com esta situação, mas quero lembrar que em Junho de 1986 o Governo conseguiu que o FEOGA - Garantia pagasse restituições aos exportadores portugueses para todos os destinos, à excepção do Canadá, Estados Unidos e Porto Rico.
No que se refere à questão dos ovinos, com certeza que os Srs. Deputados também sabem que existe um prémio variável à produção que visa preencher a diferença que se verifica anualmente entre o preço de base e o preço médio de mercado. Por outro lado, também estão certamente informados de que, em 1986, esse prémio era de 4,2 ECUs por ovino e que, no Conselho Agrícola de Dezembro, o Governo, através de negociações, conseguiu elevá-lo para 7,2 ECUs.
Sobre o Regulamento n.º 355 gostaria de referir que se trata de um regulamento que funciona por plafonds indicativos por Estado membro. Nesta base, os projectos que não foram nem aprovados nem reprovados em 1986 transitam para o ano seguinte.
É evidente que, como qualquer outro país membro, estamos condicionados pela existência do plafond, mas, curiosamente, os Srs. Deputados não se referiram ao facto, que convém aqui lembrar, de Portugal ter aproveitado até ao último centavo o plafond de que dispunha. De resto, os números já foram aqui referidos hoje
pelo Sr. Deputado Vasco Miguel.

No que diz respeito à concentração espacial dos projectos
candidatos ao Regulamento n.º 797, VV. Ex.ª saberão, com certeza, que nos primeiros tempos após a aplicação de um novo instrumento de política agrícola se reflectem particularmente as diferentes dinâmicas de desenvolvimento existentes a nível do País. Não estamos nada preocupados em concluir que o Alentejo ou o Ribatejo exprimiram essas dinâmicas, mas sim em criar dinâmicas semelhantes noutras regiões do País.
Já agora, terá interesse referir que dos 747 projectos que entraram em Fevereiro deste ano - quase tantos como desde Setembro até Fevereiro - cerca de 30 % localizam-se na região de Entre Douro e Minho. Estes 30% são não só em termos de número, como em termos de volume de investimento.
Os Srs. Deputados que neste debate se referiram à agricultura tiveram mais o cuidado de sublinhar aquilo que não se fez do que aquilo que se fez. É natural, tendo em consideração que estão na oposição.
Não obstante, devo dizer que sabemos o que é que falta fazer e que temos à nossa frente ainda quase três anos para cumprir o que falta em relação ao nosso Programa de Governo.
Referiram-se os Srs. Deputados, com maiores ou menores variações, à pretensa inexistência de uma política agrícola. A este respeito, convirá lembrar que dispomos das regras balizadoras para a evolução dos preços e para o comércio externo de produtos agrícolas. Aliás, poder-se-á invocar que se dispomos destas regras é porque o Tratado de Adesão as especifica. É um facto, mas a verdade é que dispomos delas e estamos a utilizá-las.

Por outro lado, dispomos de instrumentos de incentivo aos investimentos produtivos - nas explorações, assim como de instrumentos para a aplicação de medidas complementares de modernização dessas mesmas explorações; quer em termos individuais, quer em grupo. Dispomos também de instrumentos que permitem a reestruturação e a reconversão de culturas tão importantes como o são o olival e a vinha. Dispomos ainda de instrumentos de apoio à florestação e à reabilitação da floresta degradada, bem como de instrumentos para a execução de infra-estruturas destinadas à criação de economias externas para as explorações em sectores tão importantes como sejam os caminhos, a electrificação, os regadios, a drenagem dos solos, etc.
Dizem os Srs. Deputados que isto não é mais do que a aplicação dos instrumentos comunitários. Ainda bem que não nos criticam por não aplicarmos em Portugal esses instrumentos.
Poderão, porventura, afirmar que estas medidas e estes instrumentos que citei não constituem medidas e instrumentos de política agrícola? Não serão também instrumentos e medidas de política agrícola as medidas de que dispomos de suporte, de garantia e de ajudas nos produtos que estão sujeitos a autorização, por etapas ou clássica, em termos de mercados e de preços? Gostaria de deixar estas perguntas aos Srs. Deputados.
Falaram também frequentemente em, orientações, extensão rural, apoio técnico, etc.
Já em debates anteriores tivemos ocasião de dar alguns esclarecimentos sobre estes assuntos, mas, em particular, gostaria de dizer que para que as orientações sejam eficazes terão de decorrer de trabalhos integrados feitos ao nível de espaços homogéneos - em princípio, zonas agrárias ou conjuntos de zonas agrárias -, os quais não podem ser inventados; têm, sim, de ser feitos com tempo. Em Abril deste ano estará pronto um programa no âmbito do PEDAP que visa enquadrar e financiar este tipo de trabalhos.
O apoio técnico à agricultura será reforçado com a aplicação de um programa, financiado igualmente pelo PEDAP, que queremos aplicar a partir do início do 2.º semestre e que visa dotar as associações agrícolas de meios técnicos para a execução de projectos e detenção de outras informações úteis aos agricultores associados.
Falaram também os Srs. Deputados num programa de modernização da agricultura, quando os Srs. Deputados se recusaram a discutir nesta Câmara as Grandes Opções do Plano, nas quais o Governo apresentava algumas linhas estratégicas para o desenvolvimento do sector agrícola.

Aplausos do PSD e protestos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.

Peço desculpa, mas tenho de referir este aspecto, porquanto foi, aqui dito que o Governo não dispunha de nenhum programa de reconversão da agricultura, quando, a verdade é que tínhamos linhas estratégicas para essa reconversão a prazo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As afirmações de certas pessoas sobre a política agrícola fazem-me lembrar um filósofo que passou a sua vida à procura da verdade com uma lupa. Foi um sacrifício inglório o desse filósofo, que afinal terá passado tantas vezes pela verdade sem ter reparado nela.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Para terminar, gostaria de responder a uma das perguntas que há pouco foi feita pelo Sr. Deputado Carlos Lilaia e que estou habilitado a esclarecer. Refiro-me à questão da taxa sobre os óleos vegetais.
Como o Sr. Deputado sabe, trata-se de uma proposta da Comissão enquadrada no pacote de preços para 1987-1988 que não foi ainda discutida, nem sequer abordada a nível de nenhum conselho agrícola. Será com certeza discutida e votada no decorrer deste mês e do próximo.
Portanto, a posição portuguesa nunca foi transmitida, mas posso dizer que, à partida, temos, naturalmente, reservas a esta medida, dado que receamos que, no futuro, ela venha a afectar os fluxos financeiros. Já expusemos verbalmente à Comissão estes receios, mas, como lhe disse, oficialmente nunca levantámos a questão pela simples razão de que ela nunca foi discutida em nenhum conselho agrícola.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Lopes Cardoso, António Campos, José Frazão, Rogério de Brito, João Corregedor da Fonseca, Paulo Campos e Carlos Lilaia.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Pretendia solicitar à Mesa que esclarecesse o Sr. Secretário de Estado que se as Grandes Opções não foram discutidas foi porque, em primeiro lugar, o partido que apoia o Governo votou o seu adiamento e, em segundo lugar, porque o Governo a que o Sr. Secretário de Estado pertence as retirou, impossibilitando a Assembleia de as discutir.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Gostaria de fazer algumas perguntas concretas no terreno da agricultura portuguesa.
V. Ex.ª sabe que há uma grande diferença entre a agricultura da Europa e a agricultura portuguesa. Ora, dado que V. Ex.ª transporta o problema da Europa para Portugal, gostaria de saber se os interesses nacionais estão defendidos neste transporte e nessa aplicação de dinheiros.
A primeira questão é no sentido de lhe pedir que me informe das três primeiras prioridades que definiu para o investimento no Regulamento n. º 797.
Como segunda questão gostaria que me dissesse quais as três primeiras prioridades para o Regulamento n.º 355, ou seja, para a indústria agro-alimentar.
A terceira pergunta consiste em saber o que é que o Sr. Secretário de Estado já fez no Ministério da Agricultura no que diz respeito às zonas produtoras de cereais, e isto porque se sabe que o Sr. Secretário de Estado está a pagar 42$ aos produtores, enquanto o valor na Europa, por exemplo, do trigo é de 26$ a 27$ e no mercado livre é de 12$ ou de 13$ o quilo.

Pergunto-lhe: que é que já fez para informar os agricultores das reconversões ou que é que já fez para esse sector ser reconvertido não só na produção de milho como na produção de trigo?
A quarta pergunta que lhe coloco consiste também em saber o que é que o Ministério da Agricultura já fez para conseguir juntar mais-valias à produção, tendo em conta a anarquia dos circuitos comerciais e os diferenciais entre a produção e o consumidor que nalguns produtos ultrapassam os 300 % ou 400 % ! Chamo-lhe a atenção de que no sector das frutas e dos legumes entre os preços pagos à produção e o consumidor vão diferenciais nesta ordem de percentagem por mim referida.
Uma quinta questão, muito concreta, tem a ver com o facto de a CEE ter financiado os mercados de origem. Pergunto: que tem sido feito para os mercados de origem trabalharem junto das associações de produtores do movimento cooperativo ou na criação de entrepostos que abastecerão esses mercados de origem?
Uma outra questão: a CEE reforma os seus agricultores. Essa reforma tem planos de grandes reformas para os seus agricultores. Há meses que o Governo anda a negociar com a CEE a reforma dos agricultores portugueses! Gostaria de saber quando sai o decreto-lei e qual a reforma que o Governo aceitou para os agricultores portugueses com mais de 55 anos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Frazão.

O Sr. José Frazão (PS): - O INE realiza regularmente, de dez em dez anos, os recenseamentos às explorações agrícolas. No último recenseamento, em 1979, apurou-se que existiam 760 000 explorações em Portugal. O Programa do Governo refere que existem neste momento 950 000 explorações e o Sr. Primeiro-Ministro confirmou recentemente em Aveiro este número: falou em 950 000 explorações. Ora se nós tínhamos já uma estrutura fundiária degradada, mais degradada ela estará!
Existe assim uma tendência que é contrária àquela que se verifica nas Comunidades! Nas Comunidades assiste-se ao redimensionamento e à ampliação da área das explorações. Por cá, assiste-se ao contrário!
Que é que o Ministério da Agricultura pensa fazer para inverter esta tendência enormemente perigosa?
O meu camarada António Campos já referiu as Directivas n.º 170, 72, 60 e 69 no sentido de as converterem em lei nacional. Para quando o decreto-lei sobre as indemnizações para o abandono voluntário da actividade agrícola?
Se consultarmos as estatísticas da CEE, verificamos que o grau de auto-abastecimento da maior parte das culturas se situa a um nível superior a 100, mas em algumas o índice é, contudo, muito baixo. Refiro, por exemplo, as gorduras vegetais, cujo índice de auto-abastecimento é de 40 %, e os citrinos, cuja média é de 45 %. Pergunto: que é que a investigação nacional está a fazer para encontrar novos biótipos no sentido de aumentar a produtividade das culturas, por exemplo em relação ao cártamo e às árvores de fruto?
Por último, pergunto: que é que o Governo pensa fazer ao Regulamento n.º 251/69, que trata das ajudas à citricultura? Temos possibilidades de desenvolver a cultura dos citrinos e o Governo Português está alheio a esta possibilidade!

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Secretário de Estado, vou ser muito rápido.
Suponho que, seguramente, num ponto o Sr. Secretário de Estado estará de acordo comigo e eu consigo: a importância que tem, em todo o processo de adaptação da agricultura portuguesa à integração nas Comunidades Europeias, a informação veiculada junto dos agricultores.
Sr. Secretário de Estado, se a memória não me falha,
em finais de Junho do ano passado o Governo publicou o Decreto-Lei n.º 172-G/86, que revertia para a ordem interna a matéria contida no Regulamento n.º 797 da Comunidade Económica Europeia.

Rapidamente se constatou a incompatibilidade entre muitos dos artigos do decreto-lei em causa e do regulamento da CEE, a ponto de tornarem imperiosa a sua reformulação. Até aqui tudo bem, diria porventura o Sr. Secretário de Estado! Até aqui tudo mal, direi eu. Pouco importa, pois a verdade é que o Governo foi conduzido a reformulá-lo. Existe já um diploma para publicação - se é que não está já publicado -, o Decreto-Lei n.º 79-A/87, que revoga, na prática, o Decreto-Lei n.º 172-G/86, e altera todo o quadro.
Ora, o Governo desencadeou o seu processo de publicidade e de informação junto dos agricultores na televisão com referência expressa ao Decreto-Lei nº 172-G/86, que, na prática, já está alterado, e revogado.
Sr. Secretário de Estado, será esta a melhor maneira de levar junto do agricultor uma informação clara, acessível e compreensível ou será mais um contributo para que, de facto, o nosso agricultor não saiba entender-se nem desembaraçar-se na selva dos regulamentos da Comunidade e do direito derivado e dos regulamentos que regulamentam os decretos que transferem para Portugal as directivas da CEE?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Secretário de Estado, algumas considerações em relação às suas respostas.
Começo por dizer que, pelo menos nos casos do leite, do tomate e de outros - pelo menos esses dois tenho-os bem presentes -, o Sr. Secretário de Estado começou por justificar o que se está a passar como uma consequência da CEE.
Diria que se sistematicamente invocamos para determinados malefícios que recaem sobre a nossa agricultura e os nossos agricultores as causas da integração na CEE ou do Tratado de Adesão, teremos então de chegar à conclusão de que, efectivamente, é difícil defender uma integração e depois justificar todos os malefícios como consequência da mesma.
Passemos agora a questões concretas.
Em relação ao leite, devo dizer-lhe, Sr. Secretário de Estado, que a liberalização do leite ou a extinção do regime de exclusividade, ao contrário do que V. Ex.ª afirma, não era uma inevitabilidade - nem é - se o Governo tivesse vontade política de defender o regime. Porquê? Porque há precedentes dentro da própria Comunidade Económica Europeia. Veja-se o caso da Inglaterra com a Milk Board.

Em relação ao tomate e ao problema dos montantes compensatórios, Sr. Secretário de Estado, a questão é que nós devemos negociar e defender intransigentemente interesses nossos. A verdade é que nós, por causa dos montantes compensatórios, mesmo com as restituições à exportação, que acabaram por não abranger os nossos principais mercados - os Estados Unidos da América, o Canadá e depois os países da EFTA -, estamos a perder uma, boa- fatia do mercado.
Chamar-lhe-ia ainda a atenção, Sr. Secretário de Estado, para o facto de não se ter referido ao outro aspecto que lhe suscitei, em matéria de tomate, que foi o da utilização do mecanismo de retirada dos excedentes de tomate na produção, que não só não se justifica não tenha sido aplicado no ano transacto como não se justificará que este ano volte a não ser aplicado.
Admira-me que o Sr. Secretário de Estado da Alimentação e o Sr. Ministro da Agricultura tenham dito que até nem sabiam deste mecanismo. É grave que isto aconteça.
Em relação aos ovinos, dir-lhe-ei, Sr. Secretário de Estado, que o prémio atribuído não é, com certeza, para cobrir as consequências da especulação que, efectivamente, o circuito intermediário dos grande negociantes impõe. Ou seja, a quebra do preço à produção de 430$ para 260$ não é compensada com o prémio atribuído. Mais: invocando o sistema dos próprios preços comunitários, diria que aqui estes preços baixaram e muito o preço mínimo previsto e garantido à produção. Deveria ter havido uma intervenção por forma a evitar que os intermediários se aproveitassem do excesso de oferta que ainda foi agravada com a injecção de uma importação dentro do mercado.
Em relação à política agrícola o Sr. Secretário de Estado diz que dispomos de regras balizadoras: o Tratado de Adesão e os instrumentos relativos à reconversão do olival, da vinha, etc. Sr. Secretário de Estado, as medidas da política agrícola comum na sua maior parte - certamente que o Sr. Secretário de Estado não questionará isto - são altamente conflituosas em relação aos nossos interesses. Se assim não fosse, não teríamos o período de transição.
Portanto, trata-se de medidas que, a serem aplicadas, por si só não correspondem, necessariamente, às necessidades nacionais.
Por outro lado, sempre lhe direi que, por exemplo, os problemas do olival e do vinho não se resolvem com uma medida que actua apenas sobre cerca de 10 % de qualquer das áreas ocupadas por estas culturas em dez anos. Certamente que isto é insuficiente.
Finalmente, para assegurar apoio técnico aos produtores não basta dotar as associações de agricultores de técnicos que as vão apoiar. Grandes áreas deste país, designadamente as mais subdesenvolvidas, não têm organização cooperativa. O Estado não pode abdicar da sua obrigação de garantir um serviço de extensão rural.
É isso que o Estado não está a fazer, quando já o poderia ter feito há muitos anos. O PADAR está em vigor desde 1983 e ainda não foi - implementado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): A adesão de Portugal à CEE, como todos nós sabemos, veio encontrar a nossa agricultura em grande

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atraso relativamente aos restantes países comunitários quando encaramos e comparamos a maioria dos nossos produtos agrícolas em termos de qualidade, quantidade e preço, ou seja, em termos de competitividade com os produtos desses países.

Este facto constitui a maior ameaça aos nossos agricultores que, pelas suas características, dificilmente conseguirão superar a crise que se avizinha, que tem de ser encarada pelo País no seu conjunto porque a todos afectará, muito especialmente os agricultores.

Com efeito, havendo cerca de 30 % da população activa na agricultura - e já foi dito agora que há 950 000 explorações -, tudo o que é afectado desfavoravelmente irá repercutir-se numa desaceleração de outros sectores económicos com agravamento do desemprego e do nível de cobertura do abastecimento alimentar pelas nossas produções agrícolas.

Perante isto, Sr. Secretário de Estado, e perante a falta de uma política agrícola global neste país que seja verdadeiramente credível, perguntava-lhe o seguinte: verificando-se que, quer por insuficiência de informação e de habilitação, quer por limitações decorrentes da dimensão e tipo de explorações agrícolas, cerca de 85 % dos agricultores portugueses ver-se-ão impossibilitados de recorrer aos apoios concedidos pela CEE no âmbito do Regulamento n.º 797, que pensa o Governo fazer para apoiar esses cerca de 85 % dos agricultores portugueses? Vai abandonar estes agricultores à sua sorte, sabendo que neles assenta a maior parte da produção agrícola portuguesa? Que tipo de actuação política vai o Governo implementar?

Por outro lado, assumirá o Governo a responsabilidade de poderem ser atirados para o desemprego muitos destes agricultores, sabendo que não estão criadas alternativas de emprego em outros sectores de actividade?

Uma outra questão que lhe gostava de colocar diz respeito à extensão rural. É impensável, como todos nós sabemos, uma grande alteração no sector agrícola sem o concurso de uma organização de extensão rural que permita um constante contacto com os agricultores, motivando-os para a mudança, levando-lhes a inovação técnica, a gestão, ouvindo os seus problemas e propondo o seu estudo aos organismos próprios e ainda encorajando e apoiando associações de aldeia, em especial as cooperativas, que vão permitir multiplicar os esforços extensionistas, constituindo pólos de irradiação permanente e permitindo organizar serviços de apoio aos agricultores.

Creio que os serviços de extensão rural, Sr. Secretário de Estado, não são tão bons como isso! Perguntava-lhe: considera o Governo possível determinar e accionar medidas apropriadas à nova situação do mercado alargado e de forte concorrência internacional, mantendo o imobilismo dos serviços do Ministério e sem criar um verdadeiro serviço de extensão rural que osculte, informe e apoie esses agricultores?

Por último, Sr. Secretário de Estado, uma pergunta para a qual gostávamos de ouvir a sua resposta. Continuará o Governo a arranjar pretextos políticos e expedientes administrativos para manter as cooperativas da Reforma Agrária artificialmente impedidas de se candidatarem aos apoios da CEE, sabendo que muitas delas têm condições para responder aos estímulos técnicos e financeiros que lhe forem proporcionados, com aumentos de produção e capacidade concorrencial?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Campos.

O Sr. Paulo Campos (PRD): - Sr. Secretário de Estado, em termos de diagnóstico, há várias áreas de convergência. Com efeito, creio que estaremos todos de acordo que um dos múltiplos problemas maiores com que se debate a nossa agricultura é o do envelhecimento da respectiva população.
Exactamente por isso, existem apoios para a formação e primeira instalação de jovens agricultores.
O Sr. Secretário de Estado por certo não ignora que o que se está a passar é que os jovens agricultores, depois de estarem em condições de iniciar a sua actividade e de ascenderem à sua primeira instalação, deparam-se com uma dificuldade, que é a de não terem terra. E não a têm porque, de facto, há uma grande carência de oferta de terra.
Simultaneamente, o Sr. Secretário de Estado sabe que existe legislação em vigor que permite que o Estado intervenha nos casos em que a terra agrícola está a ser mal utilizada. Com certeza que também deve saber qual a posição assumida pelo Sr. Ministro da Agricultura perante a Câmara e que é a de assumir a responsabilidade da não aplicação dessa legislação.
Ora, se essa legislação fosse aplicada poderia reverter para utilização, pelos jovens agricultores, de toda uma larga área que, neste momento, está a ser mal aproveitada e conseguir-se-ia assim um duplo benefício: primeiro, haveria um melhor aproveitamento dessas largas áreas; segundo, utilizar-se-ia todo o investimento que está a ser feito pelos jovens agricultores, permitindo, nomeadamente, que através dele se introduzissem nessas áreas novas técnicas de cultura.
Como é que o Sr. Secretário de Estado justifica que o Governo continue a recusar-se a aplicar essa legislação que está em vigor?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Secretário de Estado, na resposta que deu relativamente à questão formulada pelo Sr. Deputado Vasco Miguei sobre a taxa respeitante aos azeites e óleos vegetais, acabou por confirmar a justeza da pergunta que coloquei àquele Sr. Deputado.
O Sr. Secretário de Estado falou de alguns receios, mas não explicitou a razão desses mesmos receios.
Concretamente, sobre esta questão colocarei ao Sr. Secretário de Estado as mesmas perguntas que coloquei ao Sr. Deputado Vasco Miguel.
Penso - e o Sr. Secretário de Estado fará o favor de me corrigir se assim não for - que o que se pode indiciar da posição de Portugal relativamente a esta matéria é que o nosso país está contra esta taxa. Portanto, qual a razão de ser desses receios?
Há já alguma estimativa de quanto irá pagar Portugal para o orçamento comunitário a titulo desta mesma taxa?
Por outro lado, quantos milhares de produtores de azeite com pequenos olivais viriam a ser beneficiados pelas ajudas à produção previstas nessa mesma proposta?
Quanto às questões respeitantes aos excedentes de manteiga, relativamente às quais o Sr. Secretário de Estado não respondeu, gostaria de juntar à questão que

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coloquei ao Sr. Deputado Vasco Miguel uma outra no sentido de saber se sobre esta matéria a posição do Sr. Ministro da Agricultura é exactamente coincidente com a posição do Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado
Carlos Laranjeira.

O Sr. Carlos Laranjeira (CDS): - Sr. Secretário de Estado, como é que entende poder fazer um emparcelamento sem ter um banco de terras?
Como é que entende que, como é o caso concreto do Baixo Mondego, o Estado seja o maior proprietário de terras e não as possa trocar nem vender e estar já com um projecto de emparcelamento em desenvolvimento?
Quanto à extensão rural, talvez não fosse muito conveniente falarmos em termos positivos; porque ela é uma verdadeira catástrofe para não dizer que é uma miséria.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Muito bem!

O Orador: - Há toda a urgência em reformular tudo o que se encontra em «extensão rural». Com efeito, a extensão rural não funciona e quando funciona funciona mal. Umas vezes não anda porque os automóveis não têm gasolina, outras vezes porque está avariada e outras vezes ainda porque estamos próximos do fim-de-semana.
Gostaria de dizer ao Sr. Secretário de Estado que, em termos de extensão rural, sou uma das vitimas, na medida em que, como director cooperativo e associativo, o seu Ministério recusou a vinda de técnicos para trabalharem nas, organizações a que pertenço.
Este é um facto concreto, indesmentível e que me parece não ser abonatório das afirmações feitas.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto aos mercados de origem, estamos com o «carro á frente dos bois» unicamente para aproveitar os fundos que vêm da CEE.
Não estamos a andar com o ritmo que desejamos. É conveniente que o mercado de origem seja feito rapidamente, mas também não é menos necessário que se avance rapidamente.
Isto não é propriamente uma crítica, mas um apelo, um desejo de um director cooperativo e associativo.

Vozes do CDS e do PRD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Agrário, a quem a Mesa concede dez minutos.

O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Agrário: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Procurarei responder à maior parte das questões que me foram colocadas - e foram muitas!
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado António Campos, devo dizer o seguinte: fui claro na minha intervenção ao afirmar que, para dar uma orientação clara ao agricultor - e, no meu entende r- não deve ser uma orientação mas um conselho técnico que permita ao agricultor fazer uma escolha entre várias
soluções alternativas que se lhe colocam -, temos de dispor de trabalhos a nível integrado de um espaço, pois, caso contrário, tratar-se-á de um conselho fútil, que não serve para nada.
Nesse sentido, temos de dispor de estudos integrados a nível de zonas dos PIDRs ou de zonas agrárias.
Como sabe, estamos a trabalhar num novo instrumento de política agrícola regional que são os programas de desenvolvimento agrícola regional, PDARS, onde pretendemos, por um lado, quantificar infra-estruturas numa óptica integrada a serem financiadas pelo PEDAP e, eventualmente, algumas delas financiadas pelo FEDER e, por outro lado, definir perfis de investimento produtivo face às condições endofo-climáticas e face à situação de mercado.
É neste contexto que estamos a trabalhar.
Este ano, como sabe, demos prioridade à criação da legislação de acesso e agora vamos aperfeiçoar os instrumentos.
Como também sabe, a filosofia básica do Regulamento n.º 797 é uma filosofia liberal e que, por esse mesmo regulamento, não impõe qualquer restrição a não ser em alguns sectores que nele vêm balizados e que são, entre outros, o da produção de leite para além de certos limites, bem como as questões das aves e dos ovos.
Em relação ao Regulamento n.º 355, aconselho o Sr. Deputado a ler um despacho conjunto dos Srs. Ministros das Finanças e da Agricultura, despacho esse que saiu na semana passada e que define os critérios internos que Portugal vai ter em conta a partir de agora pára financiar projectos que se candidatam ao Regulamento n. º 355, critérios esses que nos vão dar orientações no sentido de sabermos quais os projectos que são prioritários e quais os que o não são.
Em relação às questões colocadas relativamente à grande margem que há entre produtores e consumidores (e, portanto, existe aí um grande campo de economias que é rapado por alguém, que não os agricultores nem os consumidores) encaminho-os para encontrar a resposta neste despacho conjunto, em que damos a máxima prioridade - logo as maiores taxas de ajuda no Regulamento n.º 355, isto é, 50 do FEOGA e 16 do Estado membro, o que dá um total de 66 - a estes projectos que se enquadrem em estruturas de comercialização.
Em relação à reforma dos agricultores, haverá a dizer que a Comunidade elaborou um documento que tem vindo a sei discutido desde Junho do ano passado e que se traduz em alterações ao Regulamento n.º 797 e no qual uma das medidas preconizadas era a de reintroduzir a Directiva n.º 72/160, que há pouco foi aqui referida mas que, como sabem, deixou de ser aplicada quando se elaborou o Regulamento n.º 797.
Uma vez que foi notada a falta dessa directiva a nível da Comunidade, começou-se a pensar em reintroduzi-la no Regulamento n.º 797.
O que se passa é que, neste momento, estão a decorrer as discussões, a respectiva aprovação ainda não se efectivou e a Comunidade disse ao Conselho Agrícola que vai introduzir essa directiva num programa que está a elaborar de ajudas directas aos produtores e na sequência das propostas «Delors».

Deixámos claro que o que interessa a Portugal são as pré-reformas, não para os casos em que haja não-cultura mas para os casos em que haja reestruturação e sucessão.

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Isso ficou claro (aliás, constava já do compromisso acordado em Dezembro) e dissemos à Comissão que de forma alguma aceitávamos que fossem goradas as expectativas que nos foram criadas. Isto é o que, neste momento, posso dizer relativamente às reformas.
O Sr. Deputado José Frazão citou números sobre as explorações agrícolas e devo dizer-lhe que não conheço nenhuns outros números oficiais que não os do Recenseamento Agrícola de 1969, pelo que não me pronuncio sobre isso.
O Sr. Deputado Lopes Cardoso colocou uma questão curiosa relativa ao facto de estarmos a dar uma informação na televisão com base num decreto-lei e agora ir sair outro.
Sr. Deputado, a resposta é muito simples: fomos exacerbadamente criticados por não darmos informações aos agricultores e agora íamos esperar não sei quanto tempo até que saísse novo decreto-lei? Não. O que interessa aqui é o conteúdo. O facto de agora sair um decreto-lei de correcções decorre do facto de, quando negociámos com a Comunidade a Directiva n.º 126-G, a Comunidade ter sido lenta a aprová-la mas ter-se comprometido a reembolsar-nos a partir de 1 de Setembro. Assim sendo, não íamos esperar pela aprovação formal da directiva.
Sabíamos à partida que a Comunidade tinha algumas reservas, as quais nos foram comunicadas, mas estávamos já em Setembro e não podíamos esperar mais.

Por isso, e para não fazer confusão aos próprios agentes económicos, este decreto-lei incorpora estas alterações que são completamente marginais, que não afectam em nada as ajudas previstas no decreto-lei anterior.
O Sr. Deputado Rogério de Brito colocou a questão do monopólio do leite em termos de nós termos aceitado uma liberalização. Ora, esta questão não deverá ser colocada no foro deste governo. Tenho que ser franco! Nós aceitámos uma situação que decorria do Tratado e que era a liberalização do sistema de recolha. A partir desse momento, não tivemos outra solução senão executá-la. A menos que pense - e eu sei que pensa - em termos de revisão do Tratado.
Sobre os mecanismos da retirada do tomate, está certamente a referir-se ao tomate fresco, produto que, em Portugal, tem um regime de transição por etapas. Ora, nós não aplicamos em Portugal os limites comunitários nesse domínio.
Em relação ao comentário que fez de que a reconversão do olival e da vinha não se resolve com 10%, isso é um facto. Mas já se resolve alguma coisa, sobretudo nos casos mais dramáticos.
Por outro lado, devo lembrar-lhe que, no âmbito do «797», as pessoas podem candidatar-se a investimentos na vinha desde que, como sabe, tenham licenciamento.
Foram também aqui levantadas várias questões sobre a extensão rural. Toda a gente sabe que se trata de um projecto que vem de 1978 e se os senhores, há cinco anos, estivessem a discuti-lo, estariam na mesma. Convém dizê-lo! O que acontece é que no âmbito do PADAR - e no ano passado ele foi aqui referido quando se falou da falta de viaturas - nós detectámos um grande estrangulamento e, por isso, se compraram no ano passado 112 viaturas para que os técnicos se pudessem deslocar junto dos agricultores. É um comentário que faço a este respeito.

Temos consciência de que a extensão rural é um instrumento de trabalho fundamental. Aliás, como verão, a filosofia de todos os regulamentos é extremamente regionalizada, passa pelos serviços regionais, e nós temos consciência de que é necessário dar-lhes meios e instrumentos de trabalho.

Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, como sabe, o Regulamento n.º 797, que é neste momento o nosso instrumento de ajuda à produção, prevê que as pessoas que se candidatem tenham um património fundiário, que pode ser próprio, arrendado ou adquirido por documento de cedência gratuita.
Se se enquadrarem nestes casos, não há qualquer dificuldade legal...

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - E em relação ao estatuto da terra?

O Orador: - Estou a falar-lhe de uma questão comunitária que estamos a discutir. Aliás, esta resposta aplica-se, em parte, ao Sr. Deputado Paulo Campos, que fez também um diagnóstico, com largas margens de sintonia com o que penso...

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Estou a dizer-lhe que não se passa o estatuto das terras às cooperativas!

O Orador: - A questão do estatuto das terras é, como sabe, uma questão que ultrapassa a problemática da integração europeia. Na parte que nos cabe, o que temos feito, no âmbito da integração europeia, é dar instrumentos suficientemente estimulantes aos jovens agricultores para que consigam arranjar terra e dedicar-se a uma exploração.
O Sr. Deputado Carlos Lilaia perguntou-me quais as principais razões da nossa posição e eu tive o cuidado de dizer que essa posição não era ainda formal, mas sim, digamos, uma reflexão interna. Bom, ela deriva, basicamente, de três questões.

Em primeiro lugar, esta taxa onera os consumidores portugueses, que são já os mais pobres das Comunidades, e, em segundo lugar, esta taxa, que tem atrás dela um mecanismo de retorno para fomentar a produção de oleaginosas, não nos beneficia, na medida em que somos grandes consumidores e pequenos produtores, em termos relativos.

Estas são duas razões fundamentais que invocamos para que tal situação não nos interesse à partida, pois, numa reflexão provisória, a estimativa muito grosseira que se fez daria um número à volta de 10 milhões de contos.
Relativamente à questão da manteiga, a minha interpretação é que não há divergência entre as posições que leu nos jornais - imagino eu - dos Srs. Ministros das Finanças e da Agricultura, Pescas e Alimentação.
Quando o assunto foi debatido no Conselho Agrícola, a título provisório, porque tinha que ir a outras instâncias, a nossa posição foi a de dizer claramente que Portugal simpatizava com um programa que visasse acabar com os stocks em excesso, já que isso nos interessa - ninguém o pode pôr em causa - para desanuviar um mercado em que dentro de quatro anos iremos estar em pleno, além de que - e isso é uma questão fundamental - Portugal jamais poderia ser penalizado por este programa.

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Terceira questão: nesse Conselho Agrícola, Portugal disse que o assunto seria mais correctamente discutido no foro do Ministro das Finanças.
Foram estas as três questões que colocámos sobre o assunto.
Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado Carlos Laranjeira - refiro-me em particular à questão dos protocolos -, direi que, como sabe, temos tido vários protocolos com várias cooperativas e associações, em que temos cedido técnicos. Só numa federação agrícola temos cedidos 30. A nossa intenção - e refiro-me à FENACAM - é reconverter estes protocolos para este programa do PEDAP, que visa conceder ajudas a associações e cooperativas a fim de empregarem quadros técnicos. Queremos que o Estado deixe de ser o patrão de tudo. Queremos que o Estado, mesmo em termos de extensão, seja o enquadrador, forme os formadores, faça o acompanhamento, dê a informação e a formação aos extensionistas, mas desejamos também que estes sejam empregados das próprias cooperativas. É também para isto que as cooperativas e as associações servem.

O Sr. António Campos (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, pretendia apenas formular um agradecimento ao Sr. Secretário de Estado, bem como para referir um pequeno pormenor.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Secretário de Estado, penso ter compreendido bem. Quer dizer, o Sr. Secretário de Estado tem cerca de 1 milhar de projectos do «797», que envolvem cerca de 6 milhões de contos, mas não tem, de facto, nenhum plano.
Portanto, cada um investe como quiser, mesmo que não seja a favor da agricultura portuguesa. Muito bem!
Segunda questão: o senhor não me explicou a questão fundamental. Por exemplo, à zona do Alentejo é uma zona de cereais e neste momento V. Ex.ª paga a 42$ os cereais que na Europa estão a 26$ e no mercado livre a 13$ ou a 14$. O que é que V. Ex.ª já fez? Não tem problemas de consciência por estar a enganar centenas de milhares de agricultores sem lhes explicar que, a partir de 1991, ser-lhes-á aplicado o preço da CEE? O que é que o Governo já fez para ir em defesa, por exemplo, dessa região?

O Sr. Paulo Campos (PRD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Campos (PRD): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Campos (PRD): - Sr. Presidente, tenho uma dúvida sobre a qual o Sr. Presidente talvez me possa esclarecer..

Acontece a todos nós querermos por vezes dizer uma coisa e não a formularmos bem. E eu estou com dúvidas se de facto disse, na pergunta que coloquei ao Sr. Secretário de Estado, aquilo que efectivamente pretendia dizer. O que eu queria dizer, e que perguntei ao Sr. Secretário de Estado, consistia em saber a razão pela qual o Governo se recusa a aplicar a legislação sobre utilização mínima dos solos agrícolas e por essa via a disponibilizar terra para os jovens agricultores.
Como o Sr. Secretário de Estado não respondeu a esta questão, estou na dúvida se de facto terei perguntado isto ou não, embora pense que perguntei. Talvez o Sr. Presidente me possa esclarecer.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, só depois da leitura do Diário da Assembleia da República é que poderia esclarecê-lo convenientemente.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Se o Sr. Secretário de Estado não pode esclarecer o Sr. Deputado Paulo Campos, eu posso fazê-lo, louvando-me na intervenção que o Sr. Ministro da Agricultura aqui fez. Não aplica a lei porque a considera desestabilizadora e não a revoga...

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa mas não lhe dei a palavra.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Tem razão, Sr. Presidente. Peço desculpa.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Centraremos esta nossa intervenção apenas em aspectos respeitantes à agricultura, pois entendemos ser o sector agrícola, nesta fase da nossa vida comunitária, a prioridade das prioridades.
Já aqui foi dito, mas nunca será exagero repeti-lo, que os diversos sectores da vida agrária portuguesa muito pouco ou nada sabem com o que podem contar para fazer face às dificuldades que terão de enfrentar com a nossa adesão ao Mercado Comum.
Com a entrada de Portugal na CEE, a agricultura portuguesa passou a dispor de uma política agrícola a PAC.
Na verdade, após anos de indefinição ou de arremedos de políticas agrícolas, o País fez, neste domínio, uma opção de base quando em Junho de 1985 assinou o Tratado de Adesão às Comunidades Europeias. Em consequência desta adesão passou a dispor daquilo que não tinha - uma política agrícola.
Assim, de um dia para o outro, deixaram de ter sentido algumas atitudes ou reacções que vinham sendo habituais entre nós e que sé podem simbolizar em alguns exemplos, genéricos mas significativos.

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A nível oficial, ouvia dizer-se a alguns responsáveis, depois do exercício de funções, que não tinha sido possível fazer mais e em profundidade devido à inexistência de uma política agrícola, coerente e continuada em Portugal; a nível privado e profissional ouvia dizer-se aos agricultores a mesma coisa e depois, provavelmente como consequência lógica, assistimos ao desencadear de pressões políticas para que os governos, por decisão unilateral, viessem a subir os preços dos produtos agrícolas ou a introduzir subsídios no mecanismo dos preços como modo de compensarem a falta de rentabilidade, momentânea ou estrutural, das explorações agrícolas nos principais ramos da produção.
Tudo isto, e muito mais, deixou de fazer sentido em Portugal, Estado membro de pleno direito, mas também de plenos deveres, das Comunidades Europeias.
A PAC, pelo seu modo de funcionamento e processo de gestão, pela sua estrutura jurídica e institucional, pela sua natureza, obriga-nos a uma mudança radical de mentalidade e de procedimentos.
Para começar, impunha-se que tivéssemos tomado uma série de opções que teriam como objectivo fundamental a recuperação e o relançamento para o futuro da agricultura portuguesa.
Até agora, podemos afirmar que nada de concreto foi feito.
A negociação, não tendo sido óptima, foi a possível dentro dos condicionalismos que a envolveram, pois encontrou uma Comunidade a braços com enormes problemas internos, entre os quais destacamos graves desequilíbrios orçamentais, uma PAC com excedentes estruturais em quase toda a produção agrícola, cuja necessidade de escoamento agrava fortemente o problema orçamental, entre muitos outros.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Foi, portanto, no meio deste quadro negro que nos encontrámos, com a necessidade imperiosa de produzir, aumentando substancialmente as nossas produções, sabendo que se o não fizermos seremos inevitavelmente contribuintes líquidos da Comunidade na área dos mercados agrícolas.
Na realidade, conseguimos equilibrar a balança, mercê de uma boa negociação, com algumas derrogações favoráveis a Portugal no campo de aplicação da legislação estrutural comunitária durante o período de transição.
Ora, tendo as negociações sido as possíveis, e, repetindo, no nosso entender não foram más, o aproveitamento dos seus resultados dependerá, naturalmente, daquilo que soubermos fazer organizadamente em Portugal e daquilo que soubermos defender organizadamente em Bruxelas.
Assim, a integração de Portugal na CEE poderá ser boa ou má, consoante o uso que soubermos dar ao período de transição de que dispomos e, como envolvente, às opções que soubermos fazer atempadamente.
É neste campo que algo muito preocupante se passa.
Decorrido um ano sobre a assinatura do Tratado de Adesão, nada há quanto à certeza sobre o grau de conhecimento e de mobilização dos agricultores portugueses e mesmo de muitos técnicos do próprio Ministério da Agricultura relativamente ao que estamos a fazer dentro da CEE e que partido tirar da nossa presente situação de Estado membro.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Não nos esquecendo que fazemos parte de um conjunto, há que urgentemente optar por uma estratégia de desenvolvimento agrícola que se venha a implementar ao longo do período de transição e que terá necessariamente de se basear nos diferentes tipos de instrumentos e fundos de natureza sócio-estrutural, a que Portugal tem acesso, e estar orientada para a criação de condições favoráveis à transformação tecnológica e estrutural da agricultura portuguesa, de forma a promover a expansão de sistemas produtivos no contexto de uma política restritiva de preços.
Assim, depois de analisar os três tipos de estratégias de desenvolvimento que mais têm sido sugeridos: estratégia de manutenção de rendimentos; estratégia de substituição de importações ou a estratégia de especialização de produção agrícola, e ponderadas as três alternativas, as suas vantagens e desvantagens, há que concluir que só uma outra estratégia de desenvolvimento agrícola, orientada simultaneamente para um crescimento com eficiência da produção agro-alimentar e florestal adequada às potencialidades ecológicas e para a obtenção de um ritmo aceitável de ajustamento estrutural, poderá ser considerada não só realizável mas também desejável.

Ela terá de ser capaz de criar, ao longo do período de transição, as condições indispensáveis ao desenvolvimento de alternativas de produção e de emprego compatíveis com uma utilização racional dos recursos nacionais e com uma minimização dos custos do processo de transformação das estruturas agrícolas.
O sucesso ou insucesso de uma estratégia de desenvolvimento deste tipo irá depender, fundamentalmente, da forma como se conseguir conciliar as diferentes acções de apoio aos sistemas de produção, às empresas e às regiões que poderão apresentar no curto/médio prazo vantagens comparativas no contexto da CEE (potenciais ganhadoras) com as acções de apoio àqueles sistemas, empresas e regiões que só terão condições de se tornarem competitivos no médio/longo prazo ou cuja manutenção se justifique pela necessidade de se assegurar a sobrevivência de actividades e regiões sem outras alternativas (potenciais perdedoras).

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Por outras palavras, o êxito ou inêxito desta estratégia dependerá, no essencial, da forma como os centros de decisão responsáveis pela política agrícola portuguesa souberem adequar, aos diferentes tipos de agricultura do País, os vários instrumentos de política sócio-estrutural e os recursos financeiros disponíveis ao longo do período de transição da adesão.
A correcta articulação dos diferentes tipos de ajudas comunitárias e dos vários programas específicos negociados para o desenvolvimento da agricultura portuguesa exigirá, em nosso entender, o lançamento urgente de programas de desenvolvimento agrícola regional (PDAR).
Estes PDARS, aplicados a regiões relativamente homogéneas, incluirão um conjunto diversificado de acções, com e sem carácter de investimento e de âmbito empresarial e colectivo, orientadas para os seguintes objectivos:

a) A reorientação, reestruturação e reforço dos sistemas de agricultura regionais, de acordo com um adequado ordenamento agrário, com vista

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I SÉRIE NÚMERO 53

a assegurar quer a sua competitividade futura quer a viabilização das actividades agrícolas. e florestais nas zonas mais desfavorecidas;
b) A adaptação gradual das estruturas agrícolas das regiões às novas condições de produção e mercado;

c) A reestruturação profunda das instituições ligadas à actividade agrícola regional de forma a assegurar quer o reforço e a dinamização das organizações de produtores quer a adaptação e
mobilização das estruturas do Ministério da Agricultura .

Em conclusão, Sr. Presidente,, Srs. Deputados, a adesão de Portugal à CEE implicou a aceitação da política agrícola comum, o que obriga a importantes modificações económicas e sociais e até políticas.
É sabido que o desenvolvimento sócio-económico global do, País se não conseguirá sem um grande esforço de desenvolvimento da agricultura. Portugal tem, pois, que colocar no primeiro plano da actuação governamental a política agrícola, promovendo o aumento da produtividade é da produção de alimentos e de matérias-primas essenciais para o abastecimento interno e dos produtos susceptíveis de serem exportados, sob a óptica da política agrícola comunitária.
Isso implica um esforço gigantesco a desenvolver segundo uma estratégia adequada às circunstâncias que a adesão proporciona.
A estratégia de desenvolvimento agrícola a preferir terá de ser capaz de contribuir para garantir, a médio-longo prazo, a competitividade da generalidade dos nossos sistemas de agricultura, a melhoria gradual e sustentada das condições de vida e de trabalho da população agrícola portuguesa e o desenvolvimento das regiões mais desfavorecidas (quase 80 % do território
português).
O sucesso dessa estratégia dependerá da forma como se vier a proceder à aplicação dos diferentes tipos de recursos financeiros e das medidas de política sócio-estrutural de que Portugal irá beneficiar nos próximos anos.
A eficácia das transformações que venham a ser realizadas com a aplicação de tais recursos e medidas dependerá, por sua vez, essencialmente, do reforço e dinamização das organizações de produtores, da reestruturação e mobilização das estruturas centrais e regionais do Ministério da Agricultura e da capacidade que umas e outras, organizações e estruturas, vierem a demonstrar na identificação, preparação e implementação de conjuntos articulados de acções de diversa natureza adaptadas à resolução dos problemas específicos de cada tipo de subsectores, de estratos de agricultores e de regiões do País.
Faltaria à verdade se afirmasse que, passado um ano sobre a data da adesão, se caminha em Portugal já firmemente no sentido atrás indicado.
Na realidade, estamos ainda muito longe de atingir o ritmo acelerado do esforço que nos é pedido. Esperamos que se não perca mais tempo e se recuperem rapidamente os atrasos verificados.

É forçoso que se criem sem demora as condições psicológicas para que o povo português confie nas suas próprias potencialidades e acredite que pode, à custa do seu trabalho e da solidariedade dos seus novos parceiros, alcançar rapidamente os níveis de desenvolvimento já atingidos pelos Estados membros das Comunidades Europeias.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território (Valente de Oliveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A decisão, apoiada pela maioria das forças políticas representadas nesta Câmara, de concretizar o projecto político de adesão de Portugal à Comunidade Europeia conduziu a um processo que, pela sua própria natureza e pelas implicações que comporta, encerra matéria de tão variadas dimensões e de tanta complexidade que o horizonte temporal de um ano é demasiado curto para que se possa efectuar qualquer tipo de balanço definitivo.
Trata-se de dar sequência a uma opção eminentemente política e de profundo significado na nossa vida colectiva.
O lapso de tempo de um ano permite, quando muito, sopesar alguns elementos tangíveis do processo de integração, dos quais os fluxos financeiros serão, talvez, os indicadores mais expressivos.
Mas há que ter a consciência de que esse aspecto é apenas uma das dimensões de todas as que são determinantes na construção do nosso futuro colectivo no quadro da Comunidade Europeia.
Seria cómodo para o Governo vir ao Parlamento procurar circunscrever a discussão ao balanço muito positivo que, por exemplo, é revelado pelo comportamento, a favor de Portugal, do conjunto dos fundos estruturais. Com efeito, a nossa administração, em geral, soube ter o desembaraço necessário para, com surpresa de muitos, apresentar resultados muito satisfatórios.
Mas, porque a questão é mais vasta, valerá a pena que comece por me debruçar sobre os elementos menos tangíveis deste primeiro ano de adesão.
Não surgiu o caos económico, nem a ruptura comercial, nem a confusão que alguns previram. Com naturalidade, mas com firmeza, soubemos ultrapassar os naturais obstáculos que nos foram surgindo.
Mantivemos uma postura de grande rigor e não cedemos em nenhuma circunstância a tentações, muitas vezes aliciantes, de disfarçar a realidade. Todas as iniciativas e projectos que apresentámos receberam, na sua grande maioria, palavras de apreço; noutros casos, foram as expressões de surpresa que surgiram relativamente à forma rigorosa e competente como soubemos formular as nossas propostas. Numa palavra: ocupámos com naturalidade o lugar que nos foi reservado e já mostrámos que não vamos ser elementos passivos na construção da nova Europa que se avizinha. O primeiro ano de adesão veio fundamentalmente confirmar o que para nós era uma certeza: soubemos dar os primeiros passos num complexo processo de integração, não nos deixando confundir ou diluir mas, pelo contrário, confirmando que será através da afirmação determinada dos nossos próprios pontos de vista que ajudaremos a enriquecer a construção do mosaico coerente de diferenças que hoje é o espaço europeu.
A consagração do direito à diferença - atitude permanente dos que acreditam que é na liberdade e na criatividade de cada um e dos diferentes grupos que o desenvolvimento assenta as suas bases - demonstra hoje, no conjunto dos valores europeus que se esboçam, uma verdade que há muito os Portugueses adquiriram.

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É possível a integração com o enriquecimento do todo por acrescentamento da sua variedade, sem perda de individualidade e sem anulação de nenhuma das partes.
Não temos, do processo de integração, a visão mesquinha que consiste apenas em aproveitar os dinheiros que a mesa conjunta mais forte pode proporcionar a parente pobre. Nem somos oportunistas para só querermos aproveitar a inércia do movimento de um grande bloco económico, sem contribuir com a nossa força, o nosso engenho e as nossas relações para o seu dinamismo e progresso. Entendemos que a nossa contribuição para a construção de níveis de integração cada vez mais elevados do espaço comunitário será tanto mais eficaz quanto mais próximos nos situarmos dos padrões de desenvolvimento vividos por grande parte dos nossos parceiros e, por isso, conferimos uma importância muito especial à concretização de uma política coerente de desenvolvimento para que possamos crescer relativamente mais depressa do que os outros. Como dizia, no título, um jornal francês da outra semana, temos a consciência de que se nos exige uma «marcha forçada para nos juntarmos ao pelotão»; mas não regatearemos esforços nesse sentido por sabermos que isso contribui para o nosso próprio progresso e, afinal, também para o da Europa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No primeiro ano de adesão verificaram-se factos concretos, com dados irrefutáveis, de que Portugal caminha, pelo seu próprio esforço, na recuperação da distância que o separa da maioria dos parceiros comunitários. Não vou aqui insistir no que é reconhecido por instâncias internacionais insuspeitas. Sublinho apenas que 1986, tendo sido um ano caracterizado por resultados muito positivos na evolução da nossa economia, teve também, por via disso, o mérito de mostrar a todos, com factos, que muito rapidamente nos iremos aproximar dos indicadores de desenvolvimento da média europeia.
Após estas considerações brevíssimas sobre a parte que considero mais substancial do início de um novo caminho, passarei à componente mais quantificável do primeiro ano da vida comunitária.
Fá-lo-ei, naturalmente, na perspectiva, não somente do crescimento económico, mas, especialmente, na do desenvolvimento.
Em 1986, o Governo definiu uma política clara no que respeita ao crescimento económico e formulou orientações não menos precisas no que respeita à concretização mais exigente das acções de desenvolvimento.
Assim, sendo certo que os dois conceitos andam associados e que não haverá desenvolvimento se não se verificar crescimento, proeurou-se, durante 1986, orientara política de desenvolvimento segundo vectores convergentes susceptíveis de assegurar a consequência da acção dos diferentes agentes. Nas actuais circunstâncias, e no que respeita à política de desenvolvimento, o elemento mais frágil, vulnerável e de ultrapassagem mais complexa tem a ver com a compatibilização das acções pertinentes, quer dentro da Administração Pública e aos vários níveis desta, quer da conjugação desse esforço com o realizado pelo sector privado.
Por isso, insistimos na necessidade de se prepararem exercícios de síntese onde for possível e desejável, tendo como referência uma adequada desagregação espacial.

Mas estamos certos de que tal esforço, dando resultados somente a médio prazo, poderia ser invalidado se desde já, não se avançasse deliberadamente com actuações decisivas em determinados domínios. Assim seleccionámos o desencravamento físico e a gestão dos recursos hídricos como as componentes a favorecer na acção governativa em 1986.
Para esses sectores se orientaram os meios disponíveis nacionais, tendo-se curado de fazer convergir para eles a parte mais importante dos que nos foram facultados pela Comunidade Europeia. Assim, basta ver que, do total dos compromissos assumidos pelas Comunidades em 1986 e no que respeita ao FEDER, mais de 51 % referem-se a vias de comunicação e mais de l7% orientam-se para obras de saneamento básico.
Não basta afirmar que Portugal viu aprovados créditos de mais de 57 milhões de contos para projectos do foro do desenvolvimento regional. É também necessário verificar que a distribuição desse montante por sectores reflecte, de forma bem nítida, as prioridades que defendemos com as mais desejáveis em termos de desenvolvimento.
Ainda no domínio da política de desenvolvimento regional preparámos um esquema de processo de decisão que prevê com pormenor mas com eficiência quem faz o quê e como no que respeita ao acesso ao FEDER. Hoje o que se discute - e isto após um ano de adesão - é, fundamentalmente, o encurtamento dos prazos da percolação dos fluxos financeiros desde as instâncias comunitárias até aos destinatários. Quer dizer: no que respeita ao FEDER, situamo-nos já, em termos institucionais, no aperfeiçoamento de «sub-rotinas». Também sem alardes, com toda a naturalidade, em Dezembro de 1986, foi apresentado, em Bruxelas, um primeiro conjunto de candidaturas para l987 que envolve projectos, a que corresponde um montante de investimento de cerca de 115 milhões de contos.
Não nos contentamos, todavia, com a aprovação dos projectos entretanto apresentados. Sabemos que a tendência do próximo futuro tende a valorizar as acções integradas, procurando corresponder, assim, a uma das nossas maiores preocupações em termos de desenvolvimento. Por isso, além de prosseguirmos com a preparação de programas integrados em moldes cada vez mais exigentes, diligenciámos no sentido de se abordar uma área que sabemos ser difícil, com vista a ser preparada a primeira operação integrada de desenvolvimento na Comunidade - a península de Setúbal.
Recebemos das instâncias comunitárias a aprovação dessa operação e o correspondente financiamento para os estudos entretanto desencadeados.
Avançámos com uma segunda operação - o Norte Alentejano -, cujas negociações já se iniciaram e cujo epílogo, dado o adiantado dos trabalhos, não pode ser outro senão o conseguido para a península de Setúbal.
Na altura própria, justificámos o porquê destas opções. Elas correspondem à preocupação de procurar mobilizar todas as energias disponíveis para, valorizando os recursos endógenos, proporcionar uma crescente animação da actividade económica, criando emprego e distribuindo-o de forma a não serem gerados fenómenos migratórios assinaláveis dentro do nosso próprio espaço territorial.
Mas a construção de um conjunto de infra-estruturas, nomeadamente de estradas, se pode representar um impulso considerável em termos de desenvolvimento, não esgota as acções que visam o seu

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estímulo de uma forma auto-sustentada. A perspectíva da mobilização dos recursos endógenos traduz uma forma de aproximação que, conjugada com a promoção constante dos recursos humanos, conduz à garantia de permanência das vantagens comparativas que um dia e em determinado sector se adquiriram. Por isso as nossas debilidades básicas têm de ser objecto de preocupação permanente; prova da nossa atenção neste domínio é dada pela participação activa que demos à preparação dos programas comunitários Valoren, no campo da energia, e Star, no sector das telecomunicações. Para referir alguns números, além da menção ao nosso envolvimento muito empenhado na elaboração dos normativos regulamentares comunitários, direi que, no âmbito do Valoren já foram apresentados 738 projectos, a que corresponde um investimento de 23 milhões de contos.
Sem um conhecimento exaustivo dos nossos recursos e sem o domínio das tecnologias de transformação ficará sem sentido a intenção de valorização dos recursos endógenos. Por isso se aumentaram, de forma significativa, os recursos disponíveis para investigação e com a participação portuguesa, foram aprovados pela Comunidade cinco projectos na área das tecnologias de informação (Esprit), um na área das telecomunicações (Race), dois na da biotecnologia, cinco na das energias não nucleares, treze na da saúde e segurança e três no quadro do programa Estimulação.
Dentro do programa Eureka, Portugal já aderiu a três projectos existentes e aguarda-se que sejam anunciados mais dois projectos já acordados.
Do que referi, fica claro que o sucesso do processo de desenvolvimento não resulta de uma acção mais ou menos isolada de um sector ou de um grupo, mas sim da convergência que a execução de múltiplas acções pode vir a determinar em relação a objectivos previamente definidos. Por isso, insistimos tanto na integração de acções e não fugimos às dificuldades que a conjugação de numerosos agentes implica. O processo de desenvolvimento é também um processo pedagógico, para todos os intervenientes. Ninguém, em Portugal, pode dizer que o Governo se tem furtado a qualquer esforço neste sentido, mesmo àqueles que, por não constituírem solução de facilidade, algumas vezes determinam alguma impopularidade.
Não valerá a pena, a este respeito, referir longamente a conveniência do esforço a desenvolver no sector primário, nomeadamente na agricultura. Se, no que respeita ao investimento público, tal orientação se tornou bem expressiva no aumento de meios postos à disposição do sector, o ano de 1986 tornou possível aprofundar e dar consistência à lógica do modelo do Tratado de Adesão, assente no equilíbrio e complementaridade entre uma transição por etapas que «isola» durante cinco anos os nossos mercados mais sensíveis e o esforço de reconversão estrutural que permite a necessária modernização agrícola.
Passo sobre o que já foi referido pelo Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Agrário e vou terminar com algumas referências à parte dos recursos humanos.
Já apontei a importância da valorização constante: dos recursos humanos. Foi por isso que o Ministério da Educação absorveu a maior fatia do PIDDAC em 1986 e que continuou em níveis absolutos semelhantes em 1987. Mas, em conjugação com a elevação do nível de base de preparação dos Portugueses, têm de ser
encontradas, com rapidez, soluções que os tornem mais aptos a exercer uma profissão, pois está provado que encontra emprego com mais facilidade quem tiver preparação adequada e que, por outro lado, a permanência no tempo das vantagens comparativas a que me referi obriga a um esforço constante neste domínio.
O desenvolvimento passa, assim, por, um largo e diversificado conjunto de acções, sendo pré-condição de sucesso o tipo de investimento que se fizer nos nossos recursos humanos. Por isso, o sistema educativo e de formação profissional são elementos determinantes do tipo de desenvolvimento que pretendemos.
A este respeito, e no que se refere às relações com a Comunidade Europeia, Portugal viu aprovado um volume significativo de projectos por parte do Fundo Social Europeu, correspondente ao desenvolvimento de 1695 projectos a favor do emprego e da formação profissional de mais de 150 000 pessoas.
Situando-nos apenas no que é quantificável e associando a esses valores alguns tipos de comportamento bem identificados, não podem restar dúvidas que hoje em Portugal se verifica um clima de confiança bem reflectido nos indicadores objectivos conhecidos.
Mas comecei a minha intervenção por pôr a questão da adesão à Comunidade Europeia como uma questão política de profundas e complexas implicações e acrescentei uma ideia que considero fundamental: a consciência clara que temos do papel activo que Portugal pode desempenhar na construção dessa Europa.

Voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esta afirmação não serve somente para o médio prazo. Ela já deu mostras de existir em 1986 e terá forçosamente uma expressão reforçada em 1987, especialmente se tivermos em conta a lógica da coesão económica e social. As novas responsabilidades que desta ideia decorrem obrigam a encarar, desde já, no seio da Comunidade, um conjunto de reformas de grande envergadura, quais sejam as de adaptar as antigas políticas a todos os novos conhecimentos e realidades: a reforma da política agrícola comum como resposta às novas condições de produção e de critérios de garantias de preços; a reforma dos fundos estruturais no sentido de os transformar em verdadeiros instrumentos do desenvolvimento económico; a reforma das regras financeiras em vigor, no sentido de se assegurar uma disciplina orçamental mais rigorosa ... , são estes alguns dos aspectos a que já em 1987 daremos a nossa contribuição.

Fá-lo-emos na convicção de que estamos a mexer com assuntos que podem proporcionar um salto qualitativo, cujo carácter vital tem de ser insistentemente sublinhado, no sentido de que, da forma como se proceder, dependerá, em larga medida, a oportunidade oferecida às economias europeias - Portugal incluído - de meios de ultrapassar os défices com o exterior e de encontrar as vias de um crescimento económico mais forte e, por isso, gerador de maior emprego.
Para nós a questão é clara: não é possível pensar na criação de um grande mercado sem fronteiras, nem ele funcionará correctamente, se, a nível comunitário, não se criarem, desde já, os instrumentos que permitam evitar os desequilíbrios que hoje ainda se verificam e que, sem dúvida, afectam a competitividade e o crescimento do conjunto.

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Dito de outro modo: os instrumentos comunitários devem deixar de ser considerados apenas como elementos de compensação financeira. Eles têm de assumir, ao lado das políticas nacionais dos Estados membros, um papel cada vez mais relevante para a convergência das diferentes economias.
1987 será, seguramente, um ano de profundas reformas no seio da Comunidade. Nelas participaremos com a tranquilidade de quem soube com naturalidade e dignidade ocupar o seu lugar, com o sentido responsável de membro activo e solidário dessa Comunidade.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas 1986 serviu já para demonstrar como, sem arrogâncias nem oportunismos, o Governo soube interpretar o papel que cabe a Portugal no quadro da Comunidade, carreando naturalmente benefícios para si próprio mas não deixando de demonstrar que ao ter feito a opção europeia ele não enjeita as suas responsabilidades nem se furta à contribuição activa e empenhada na procura de soluções comuns para os problemas que afinal acabam, também, por ser comuns.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados Sá Furtado e João Cravinho.
O Governo já não dispõe de tempo para responder, já excedeu largamente o seu tempo, mas penso que a Mesa não verá inconveniente em que o Governo responda depois às perguntas feitas pelos Srs. Deputados.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Sá Furtado.

O Sr. Sá Furtado (PRD): - Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território, não me parece que o Governo tenha uma política industrial coerente no sentido de envolver empresas portuguesas no programa Valoren.
Contudo, esta minha opinião poderá ser fruto do meu desconhecimento e é neste sentido que pergunto a V. Ex.ª se, sobretudo no que diz respeito às minicentrais hídricas, tem algum projecto que leve à incorporação substancial de know-how português e de produção portuguesa na construção dessas minicentrais.
A outra questão que gostaria de lhe colocar também se prende com esta mesma problemática e tem que ver com o programa Eureka.
Disse V. Ex.ª que as nossas equipas de investigadores têm dado uma contribuição em projectos de investigação.
Assim sendo, pergunto ao Sr. Ministro o seguinte: qual é a percentagem em que pensa que essa intervenção dos investigadores portugueses poderá ter tradução na nossa produção? Isto é, até que ponto o trabalho dos nossos investigadores vai ser aproveitado pela indústria nacional?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravlnho (PS): - Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território, devo dizer que gostei do seu discurso. O Sr. Ministro regressou, se assim se pode dizer, ao seu excelente plano doutrinador...

Vozes do PSD: - Muito beml

O Orador: - ... e produziu com clareza ideias que poderíamos aceitar, que são consensuais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Já o fez quando apresentou aqui o Programa do Governo - e eu recordo-me. Simplesmente, o Programa do Governo foi há, praticamente, um ano e meio.
Por outro lado, um governo não é chamado a produzir discursos, mas a fazer; um governo não é chamado a fazer apenas o discurso da boa doutrina, mas, sobretudo, aqui no caso concreto, o da acção.
É neste plano que gostaria de lhe dizer, Sr. Ministro, que, em primeiro lugar, a sua boa doutrina terá de ser difundida no seio do Governo, em particular no seio de alguns ministros e ministérios que hoje estão aqui ausentes: a Agricultura, a Indústria e as próprias Finanças.
No entanto, uma vez que essa tarefa excede as nossas possibilidades, isto é, convencer o Governo de algo que seja óbvio e evidente, terei de fazer um comentário mais directo às suas palavras, no que elas têm de aspecto executivo.
Assim, devo dizer que me pareceu que o Sr. Ministro foi fundamentalmente o Ministro da Administração do Território e, agora, no final, o Ministro da Investigação e Desenvolvimento Tecnológico. Porém, não foi o Ministro do Plano. É que V. Ex.ª sabe, tão bem ou melhor do que eu, que não há planos que estejam à altura do seu discurso, e ao fim de um ano e meio era tempo para que os houvesse e para que não tivesse desaparecido deste país o Ministério do Plano.
Nós não temos Ministério do Plano, temos Ministro da Administração do Território e temos um super-Ministro das Finanças, a caminho não sei de quê, agregando a si as próprias funções de planeamento. E se algumas dúvidas houvesse, bastava ler o chamado PCEDE nos seus vários capítulos - enquadramentos macroeconómicos, estratégia de desenvolvimento controlado, agricultura, indústria, transportes e sabe-se lá o quê.
Por outro lado, quando temos um Ministro do Plano que não é Ministro do Plano e um Ministro das Finanças que faz o Plano o resultado é sempre o de que - a experiência histórica deste país mostra-o - o seu discurso não é aceite, pois é um discurso que não é compreendido, que não é desejado, que é contraditório com o discurso e com os valores que dominam, no caso, um pensamento tecnocrático de índole e raíz financeiras.
Assim se sucedem as contradições mais variadas. Por exemplo, o Sr. Ministro fala-nos de recursos endógenos, de recursos humanos, e o que se verifica é que não existe a menor programação, o menor pensamento coordenado. Existe sim a mais completa descoordenação, aquilo que eu hoje definia como o mais completo «bodo aos espertos», precisamente no campo dos recursos humanos, que é a peça central do seu discurso.
O Sr. Ministro fala de administração do território em conjugação com o desenvolvimento endógeno...

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, se me permite, utilizaria o meu tempo para evitar fazer interrupções. E como o Sr. Ministro já se encontra também num uso excepcional de tempo, responderia de uma vez só.

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O Sr. Presidente: - Tem mais um minuto, Sr. Deputado.

O Orador: - Não poderei usar o meu tempo, Sr. Presidente...?

O Sr. Presidente: - Não tem já tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Bem, então, Sr. Ministro, vamos a telegramas.
Que é feito do sistema de incentivo de base regional? Segundo se diz, há um conflito entre o Ministério da Indústria, o Ministério do Plano e uma realidade incontroversa em qualquer caso: não existe. O que existe foi revogado por uma carta, se bem entendo assim, de um director-geral a comunicar a Bruxelas o PEDIP nas suas implicações com aquilo que o Sr. Ministro disse.
Quanto a Setúbal, o que sabemos é, pura e simplesmente, que há 22 000 contos para resolver, neste momento, o drama de Setúbal. Tanta propaganda para 22 000 contos...
O que se sabe de concreto quanto à coerência do Governo nesse campo é que Setúbal não tem prioridade no sistema de incentivos de base regional. O Governo deu-lhe a menor das prioridades e diz agora que Setúbal é prioritário: descoordenação.
Quando se fala da investigação científica, importante... eu sei que isto não é culpa do Sr. Ministro, mas é culpa do Governo.
A Comissão das Comunidades - vergonha profunda nossa! - chama a atenção de Portugal para o facto de haver lugares na DG-12 que devem ser preenchidos por portugueses, não havendo a menor resposta do País porque, pelo que parece, o «alto comissário» para a colocação dos especialistas portugueses não terá ninguém de interesse próprio nessa matéria.
Sr. Ministro, poderíamos abordar muitos outros campos, mas gostaria apenas de lhe dizer que concordo com o seu discurso, acho boa a sua doutrina, acho péssima a ignorância em que este governo mantém a doutrina do Sr. Ministro.

Aplausos do PS e do PRD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território: - Começo por responder ao Sr. Deputado Sá Furtado com números. Acerca do programa Valoren, devo dizer-lhe que já foram aprovados 23 586 000 contos, num total de 738 projectos, que estão já comprometidos e aprovados. Isto sem qualquer espécie de publicidade especial, o que significa que, efectivamente, as pessoas estão atentas.
A segunda pergunta que formulou é de alcance mais amplo: qual a percentagem do trabalho dos investigadores portugueses que pode ser incorporada? Este é um assunto que merece naturalmente uma longa elaboração.
Como o Sr. Deputado sabe muito bem, não se pode medir essa percentagem com precisão. Mas devo dizer-lhe que estamos atentos a tudo quanto pode ser instrumento de facilidade e de aproveitamento desses trabalhos. Ouvimos os investigadores e o ponto mais
importante que grande parte deles focou em relação ao aproveitamento do seu trabalho diz respeito ao apoio financeiro ao, registo de patentes, porque parece que, efectivamente, é aí que reside a grande parte do desaproveitamento ou da canalização para outros meios desse registo de patentes.
Quero sublinhar, que estou empenhado em resolver essa questão, arranjando modo diversificados e adequados a cada um dos sectores e aos graus potenciais de sucesso e sabendo nós que, das patentes registadas, pouco mais de 10 %, na melhor das hipóteses, tem resultados práticos positivos.
Portanto, Sr. Deputado, a percentagem que pode ser incorporada é muito difícil de calcular, pelo que não lhe vou responder, pois ninguém a sabe. Porém, posso dizer-lhe que estamos a fazer todos os esforços para garantir que essa percentagem seja a maior possível, atacando nos pontos em que ela se pode atacar.

O Sr. Sá Furtado (PRD): - Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Sá Furtado (PRD): - Agradeço-lhe a interrupção, Sr. Ministro.
Relativamente à primeira questão que lhe coloquei, o que eu quis perguntar não era qual o total do quantitativo envolvido nos projectos, era quanto é que o Sr. Ministro estimava que poderia ser a incorporação da produção nacional, sobretudo no que diz respeito às minicentrais hídricas.

O Orador: - Sr. Deputado Sá Furtado, como pode imaginar, a resposta para ser precisa não pode ser dada aqui. Naturalmente que registo a sua pergunta, a qual vai exigir fazer um grande inventário para que lhe possa responder. Não gosto de dizer coisas no ar, de forma que, oportunamente, terá um cômputo, digamos, de todos estes projectos, aqueles que dizem respeito ao minihídrico, e daquilo que poderá vir a ser efectivamente essa percentagem de que fala. Neste momento, para ser honesto, não lhe posso responder.
Sr. Deputado João Cravinho, quero agradecer-lhe as suas amáveis palavras, mas suponho, por reconhecer a boa doutrina do Governo, que há-de chegar também o tempo em que vai reconhecer a boa acção do Governo. Teremos tempo para que haja essa constatação, que a todos nós nos agradaria muito, principalmente vindo de um técnico tão ilustre como o é V. Ex.ª.
No que se refere à aparente desarticulação que acha e que vê em todas as peças de um conjunto em que não vê inteligência nem coordenação comuns, estou seguro de que as há-de acabar por encontrar porque efectivamente desistimos - por razões óbvias e de prática anterior que não conduziu a nada, como sabe muito bem por ter experiência disso - de abordar o grande plano em conjunto com todos os sectores e estamos, mais modestamente, mas com preocupação de maior eficácia, a ver o que é que se pode fazer em cada uma destas parcelas.
É evidente que a coordenação aparecerá e estamos já a procurar que ela apareça com a coerência que referiu. Não pense que há diversidade de pontos de vista entre o Ministro das Finanças e o Ministro do Plano e da Administração do Território, porque este último colaborou na elaboração do PCEDE tal como o Ministério das Finanças colabora em outras elaborações.

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O que acontece com o sistema de incentivos - que foi o segundo maior ponto que referiu - é que este sistema está a funcionar tal como foi possível no ano passado. Ele ainda está em vigor e nós, tendo a certeza de que há desequilíbrios muito grandes no espaço português, queremos melhorar esse sistema de íncentivos. É o que vamos fazer através de um sistema mais ambicioso, que iremos negociar a seu tempo. Ora, também aqui não há qualquer espécie de divergência entre O Ministro da Indústria e Comércio e o Ministro do Plano e da Administração do Território, o que há são acertos de pormenor em matéria de mecânica da própria condução dos projectos a beneficiar.
Quanto a Setúbal, efectivamente os 22 000 contos não se destinam a resolver o grande problema de Setúbal mas meramente ao respectivo estudo. Contudo, o Governo, tendo em atenção que efectivamente há uma grande urgência de actuação, já resolveu, em Conselho de Ministros, que se deveriam escalonar, em diversas etapas, acções com um período curtíssimo de implementação e para isso já foi decidido nomear um delegado do Governo para a recuperação económica, o que significa que não há outra ambição que não seja atacar os problemas mais urgentes, com a preocupação de encontrar soluções muito eficazes e pragmáticas.
Ao mesmo tempo, o programa de médio prazo continuará a ser elaborado nos termos em que está actualmente e foi para esse programa que se consignou a verba de 22 000 contos. Já tenho dito muitas vezes, bem como o Sr. Secretário de Estado, para não se minimizar a dimensão do problema com esta verba, porque os 22 000 contos nunca foram destinados a outra coisa que não fosse o estudo da região de Setúbal. Vamos, naturalmente, dar-lhe o maior dos seguimentos e suponho que isso também acontecerá em muitas outras áreas.
Outro ponto que referiu foi o da inexistência de planos. Sr. Deputado, devo dizer-lhe que planos de gabinete, bem feitos mas inconsequentes, vi muitos, assisti ao fracasso de muitos e verifiquei a frustração de muitos dos técnicos que os elaboraram.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Assim, estou cada vez mais ciente de que um programa integrado deve envolver todos os agentes que têm uma palavra potencial de acção no decurso do projecto, pelo que hoje não tenho qualquer espécie de hesitação em dizer que é preciso muito tempo e trabalho de convencimento para chegarmos a coisas que sejam eficazes. E só quando atingirmos aquilo que se atingiu, por exemplo no Norte Alentejano, em que os programas de actividade de câmaras municipais foram eleitos na decorrência do próprio plano conjunto, é que teremos uma parte importante dos agentes envolvidos, convencidos e participantes.
Assim, neste momento estou mais preocupado, bem como todos os que no Ministério colaboram nos planos (desde as comissões de coordenação regional aos técnicos dos gabinetes de apoio técnico e das câmaras municipais, até às instâncias centrais), em articular mais e em focar mais a nossa atenção no processo do que no produto, mais na maneira de fazer e no como fazer do que propriamente naquilo que pode ser um instrumento interessante para mostrar para fora mas que não é eficaz como instrumento de acção.

Para terminar, gostaria de renovar os agradecimentos pelas referências que fez ao discurso, assegurando-lhe, porém, que a execução está em consonância com o discurso e que para tal faremos todos os esforços porque, atendendo a tudo o que foi feito anteriormente, é evidente que não ficaria satisfeito se houvesse uma falta de sintonia entre as duas posições. Portanto, é evidente que faremos todos os esforços para que a parte prática seja ainda melhor do que a teórica.

Aplausos do PSD.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Cravinho, pede a palavra para que efeito?

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, se me permite, como o Sr. Ministro nos deu esclarecimentos importantes, alguns do domínio comum mas outros ignorados desta Assembleia, só gostaria de fazer uma única pergunta, em 30 segundos, e, assim, o Sr. Ministro esclareceria com certeza a Assembleia acerca da matéria mais importante de todas...

Vozes do PSD: - Outra vez?!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Cravinho, não lhe posso conceder mais tempo. A razão é simples: o Sr. Ministro, isto é o Governo, já tem quase 40 minutos a mais do que o tempo inicialmente previsto, para além dos quinze minutos que foram rateados por todas as bancadas. Por este andar, nunca mais terminaríamos. De facto, em termos regimentais, o Sr. Deputado João Cravinho faria uma pergunta que não poderia ter resposta do Sr. Ministro, até porque ele não esteve a fazer uma intervenção mas, sim, a responder a pedidos de esclarecimento.
Deste modo talvez estejamos a privar a Câmara de uma pergunta muito pertinente e de um esclarecimento muito adequado, mas agora a Mesa não transige mais e dá por terminado o debate sobre esta matéria por se terem esgotado os tempos regimentais de todas as bancadas.
Srs. Deputados, vamos passar à votação dos projectos de resolução...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença que faça uma interpelação à Mesa?

O Sr. Presidente: - Para fazer uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, era para perguntar qual é a metodologia que vai ser usada neste processo de votação.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a metodologia que vai ser usada e que creio ser a adequada e a regimental, é a seguinte: vamos pôr à votação o projecto de resolução n.º 32/IV (PCP), na generalidade, na especialidade e, depois, haverá a votação final global; a seguir e da mesma forma, submeteremos à votação o projecto de resolução n.º 38/IV (PS, PRD, PCP e MDP/CDE). Relativamente a este último diploma, poremos logo a seguir à votação duas propostas de aditamento, apresentadas pelo Partido Socialista.

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O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, era para continuar a fazer a interpelação à Mesa.
Nos termos da informação que o Sr. Presidente acaba de prestar à Câmara e tendo em conta os trabalhos da Comissão que conduziram à apresentação de uma proposta de resolução subscrita por vários, partidos e, ainda, atendendo à apresentação desta última ao Plenário para votação, vamos retirar a nossa própria proposta de resolução. Fazêmo-lo porque consideramos que cumpriu a sua missão, tanto no aspecto do fundo como no da forma; no
aspecto do fundo, porque deixou bem clara a nossa posição nesta matéria, no aspecto da forma, porque ajudou a viabilizar a votação do projecto da Comissão.
Assim, vamos votar ,o projecto de resolução da Comissão, que retém alguns dos nossos pontos de vista.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

Risos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, portanto, é retirado o projecto de resolução n.º 32/IV, apresentado pelo PCP.
Passamos, então, à votação do Projecto de resolução n.º 38/IV, que não é da autoria da Comissão mas que é subscrito por vários partidos e que, de qualquer modo, terá recuperado parte de uma proposta de projecto de resolução da Comissão de Integração Europeia. Creio que o texto é do conhecimento de todos os Srs. Deputados, pelo que se poderá prescindir na sua leitura.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos passar à votação.
Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 38/IV.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e do deputado independente Ribeiro Telles, votos contra do PSD e do deputado independente Borges de Carvalho e a abstenção do deputado do CDS Carlos Laranjeira.

Srs. Deputados, vamos votar, na especialidade, o projecto de resolução n.º 38/IV:

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e do deputado independente Ribeiro Telles, votos contra do PSD e do deputado independente Borges de Carvalho e a abstenção do deputado do CDS Carlos Laranjeira.
É o seguinte:

Projecto de resolução sobre o Acto Único Europeu n.º 38/IV

Nos termos do artigo 159.º, alínea b), da Constituição e do artigo 5.º, alínea b), do Regimento, os deputados abaixo-assinados apresentam o seguinte projecto de resolução:

A Assembleia da, República:

Considerando o debate sobre o Acto Único Europeu realizado na reunião plenária da Assembleia da República de 7 de Fevereiro de 1986;
Tendo em conta os resultados da votação sobre o mesmo Acto Único Europeu na reunião plenária da Assembleia da República de 17 de Dezembro de 1986;
Sublinhando que as consequências do Acto Único Europeu para Portugal dependem em grande parte da concretização que for dada às orientações e princípios gerais traçados nas novas disposições do Tratado da CEE;

aprova a seguinte resolução:

1 - Será indispensável que, nas decisões do Conselho de Ministros das Comunidades relativas à definição e aplicação das medidas para realização do mercado interno, o Governo Português procure fazer ter na devida conta, em harmonia com o disposto nos artigos 8.C e 130.ªa 130.E do Tratado da CEE:

As diferenças entre o grau de desenvolvimento da economia portuguesa e a maioria dos outros países da CEE;
As dificuldades especiais, sobretudo no plano social, da transição para uma concorrência mais activa em alguns sectores produtivos da economia portuguesa;
A necessidade de articular estreitamente a introdução de medidas de liberalização do mercado interno com a concretização do princípio de coesão económica e social, nomeadamente através de programas financeiros específicos de montantes muito mais substanciais do que os que têm sido possíveis na actual situação orçamental da Comunidade.

2 - Podendo a aplicação da nova redacção do artigo 49.º do Tratado da CEE vir a prejudicar a realização do princípio da livre circulação dos trabalhadores, deverá o Governo fazer as diligências necessárias para procurar conseguir que o novo regime venha a limitar na prática o referido principio.
3 - A Assembleia da República deve ser devidamente informada, em tempo útil, dos trabalhos preparatórios elaborados pela administração portuguesa, das propostas da Comissão das Comunidades Europeias e das análises e debates ao nível do Conselho dessas Comunidades relativas à concretização das orientações e políticas do Acto Único Europeu, nomeadamente as que se referem:

À elaboração de um novo regulamento para o funcionamento do Conselho;
Aos princípios e regras na base dos quais serão definidas as competências de execução da Comissão;

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As medidas respeitantes à realização do mercado interno da Comunidade, ao seu impacte sobre a economia portuguesa e às medidas transitórias de salvaguarda ou adaptação que serão necessárias para o nosso pais;
À eventual participação de Portugal nos esquemas de cooperação monetária previstos no Acto Único;
A reforma dos fundos estruturais da CEE e à afectação de mais recursos financeiros a esses fundos, em harmonia com o princípio de coesão económica e social;
Ao estabelecimento de programas para o desenvolvimento dos países e regiões mais pobres da Comunidade, com especial destaque para os planos específicos de apoio a sectores produtivos nacionais ou a políticas para promover o crescimento e a estabilização da economia portuguesa;
Aos programas plurianuais de investigação e desenvolvimento tecnológicos das comunidades europeias e aos projectos específicos neles englobados que se revistam de interesse para Portugal;
As iniciativas respeitantes à política de ambiente da Comunidade e ao seu impacte sobre as actividades produtivas e à protecção do ambiente em Portugal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar agora à votação de uma proposta de aditamento apresentada pelo PS, no sentido de, imediatamente após «Assembleia da República» e antes do primeiro considerando, se incluir a expressão: «reafirmando a importância da integração de Portugal nas Comunidades Europeias e o seu empenhamento na construção da Europa», passando assim a constituir o corpo do projecto de resolução.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PRD, do CDS e do deputado independente Ribeiro Telles, votos contra do PCP e do MDP/CDE e as abstenções do PSD e do deputado independente Borges de Carvalho.

Srs. Deputados, vamos agora votar uma segunda proposta de aditamento apresentada pelo PS, no sentido de, no final do n.º 2, ser acrescentada a expressão: «que traduziram de forma inequívoca o empenhamento na construção europeia que atrás se refere».
Assim, a redacção do n.º 2 passará a ser a seguinte: «Podendo a aplicação da nova redacção do artigo 49.º do Tratado da CEE vir prejudicar a ... ».

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, posso interrompê-lo?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, V. Ex.ª foi induzido em erro, e a culpa foi nossa, pela forma como a proposta está redigida. O que se pretendia dizer - e peço a atenção da Câmara para isto - refere-se ao segundo considerando e não ao n.º 2.

Assim, a proposta que fazemos, relativamente ao segundo considerando, é a seguinte: «tendo em conta os resultados da votação sobre o mesmo Acto Único Europeu, na reunião plenária da Assembleia da República de 17 de Dezembro de 1986, que traduziram de forma inequívoca o empenhamento na construção europeia que atrás se refere».
Julgo que todos os Srs. Deputados ficaram esclarecidos. Peço desculpa ao Sr. Presidente e à Câmara, pois, de facto, a forma como estava redigida a proposta de aditamento induzia a uma interpretação diferente daquela que lhe pretendíamos dar.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.
De facto, a mesa defrontava-se com uma pequena dificuldade, que era um português um bocado arrevesado, mas creio que a Câmara está suficientemente esclarecida face a esta proposta de aditamento.
A Mesa vai corrigir a proposta no sentido daquilo que foi apresentado pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso. Assim sendo, penso que não será necessário repetirmos a leitura da mesma. Vamos votar a proposta de aditamento.

Submetida à votação, foi aprovada com votos a favor do PS, do PRD, do CDS e do deputado independente Ribeiro Telles, votos contra do PCP e a abstenção do PSD e do deputado independente Borges de Carvalho.
É a seguinte:

Propõe-se o aditamento no final do segundo ponto do seguinte inciso:

Que traduziram de forma inequívoca o empenhamento na construção europeia que atrás se refere.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação final global desta proposta de resolução.

Submetida a votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e do deputado independente Ribeiro Telles e votos contra do PSD e do deputado independente Borges de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP votou a favor da proposta de resolução, em votação final global, porque as duas alterações introduzidas no texto, por proposta do Partido Socialista, reportavam-se aos considerandos e não implicavam com a parte resolutiva da proposta de resolução, que acabámos de aprovar.
Dai a votação do PCP, em consequência das posições tomadas no decorrer deste debate.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, antes de encerrar a sessão, vou anunciar a ordem de trabalhos da nossa próxima reunião plenária, que se realizará na quinta-feira, dia 12, pelas l5 horas, da qual constará o período de antes da ordem do dia e o período da ordem do dia, em que serão discutidos os projectos

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de lei n.º 3/IV, do PCP, 315/IV, do CDS, e 323/IV, do PS, sobre subsidio de desemprego aos jovens candidatos ao primeiro emprego.
Srs. Deputados, nada mais havendo a tratar, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 40 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
António Paulo Pereira Coelho.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Miguel M. Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando Barata Rocha.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Flausino Pereira da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Mendes Costa.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
João Álvaro Poças Santos.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Olavo Rodrigues da Silva.
José de Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Valdemar Cardoso Alves.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
António Cândido Miranda Macedo.
António Domingues Azevedo.
António Magalhães Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Helena Torres Marques.
João Cardona Gomes Cravinho.
José Barbosa Mota.
José Manuel Torres Couto.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonel de Sousa Fadigas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raúl da Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Agostinho Correia de Sousa.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Eduardo de Sousa Pereira.
António João Percheiro dos Santos.
Arménio Ramos de Carvalho.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Fernando Pinho da Silva.
José Luís Correia de Azevedo.
José Torcato Dias Ferreira.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Victor Manuel Lopes Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Dias Lourenço da Silva.
Bento Aniceto Calado.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Cláudio José Santos Percheiro.
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Carlos José Machado L. Pereira.
Eugénio Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Henrique José Pereira de Moraes.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
José Augusto Gama.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Narana Sinai Coissoró.

Deputados independentes:

Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
António José Borges de Carvalho.
Rui Manuel Oliveira Costa.

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Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Antunes da Silva.
Manuel da Costa Andrade.

Partido Socialista (PS):

Alberto Marques de Oliveira e Silva.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
José Luís do Amaral Nunes.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.

Partido Renovador Democrático (PRD):

António Maria Paulouro.
José Carlos Torres Matos Vasconcelos.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.

Partido Comunista Português (PCP):

António Vidigal Amaro.
Custódio Jacinto Gingão.
João António Gonçalves do Amaral.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

António José Tomás Gomes de Pinho.
João Gomes de Abreu Lima.
João da Silva Mendes Morgado.
José Maria Andrade Pereira.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

Raul Fernando Morais e Castro.

Os REDACTORES: Cacilda Nordeste - José Diogo - Ana Maria Marques da Cruz.

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PREÇO DESTE NÚMERO: 272$00

Depósito legal n. º 8818/85

IMPRENSA NACIONAL - CASA DA MOEDA, E. P.

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