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3338 I SÉRIE - NÚMERO 83

Se lermos a doutrina acerca desta matéria em Espanha, na Itália, em França, verificamos que todos os autores são unânimes em considerar que há uma tendência dos governos para sobrelevarem ao direito à greve dos trabalhadores os tais interesses imediatos, mas essenciais, das populações, para ultrapassar aquilo sobre o que, em boa hermenêutica -e isso consta mesmo de várias decisões dos tribunais (basta ver, aqui ao lado, a vizinha Espanha)-, o Tribunal Constitucional já várias vezes teve de se pronunciar, ou seja, sobre esta medida da requisição. Não me referi ao actual governo, em especial, mas disse que, ao longo da nossa história constitucional recente, verificámos uma série de usos desta figura da requisição civil que, por vezes, são manifestamente não adequados à situação em causa. Sobretudo são não adequados, desde logo, quando os governos começam por ameaçar com a requisição civil, em vez de esperarem pela posição tomada pelos trabalhadores e pelas associações sindicais quanto aos serviços mínimos. Este é, desde logo, um primeiro erro a apontar.
Por outro lado, diz o Sr. Deputado que a lei que temos é clara. Bem, V. Ex.ª terá a sua opinião e eu tenho outra. O que me cumpre, neste momento, carrear são elementos a meu favor. V. Ex.ª disse que a lei é clara, mas não mostrou elementos a seu favor; eu trago estes: já, pelo menos três vezes, a Procuradoria-Geral da República teve de pronunciar-se sobre o problema da requisição civil - pareceres que V. Ex.ª certamente conhece ... Os pareceres da Procuradoria-Geral da República andam um pouco a «navegar à bolina», andam a ver se encontram uma situação em que possam pegar para transmitirem uma doutrina clara, mas esses pareceres são quase todos unânimes. Sobretudo o parecer que mais largamente se ocupa desta questão, e até faz um estudo de direito comparado, diz que estas questões nem sempre são claras.
Mas a nossa lei é pouco clara e vou explicar por que é que, em minha opinião, ela é pouco clara. Como V. Ex.ª bem sabe, faz parte da doutrina jurídica, em matéria de direitos fundamentais, que um direito fundamental pode sofrer limitações ou restrições nos casos em que haja outros direitos fundamentais que estejam ou possam estar em causa com a violação desse mesmo direito.
Ora bem, temos como assente, naturalmente, que o direito à greve é um direito que está na nossa Constituição, é reconhecido como um direito fundamental dos trabalhadores que -e faço um parêntesis- não foi posto em causa por nenhum dos projectos de lei de revisão constitucional. Lá continuam exactamente com o mesmo enunciado, salvo no projecto de lei do CDS, em que se vem precisamente chamar a atenção para a salvaguarda das tais necessidades essenciais, um pouco à semelhança do que faz a Constituição Espanhola.
Mas, dizia eu, a nossa lei não é clara porque não nos dá critérios para existir ou não direito à requisição civil. Quais poderão ser esses critérios? Temos duas hipóteses: uma é a de fazer um enunciado taxativo e não é vir dizer quais são as empresas, porque isso está manifestamente ultrapassado pela própria lei da greve, que vem enunciar outras que não correspondem àquelas que vêm na lei da requisição civil, dizendo ainda «nomeadamente», portanto, admite que há outros sectores.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Exacto!

O Orador: - Dirá V. Ex.ª que é difícil e eu também acho, mas não é novo. Sabe que, por exemplo, na Bélgica há um enunciado taxativo, que poderei mostrar-lhe, se tiver curiosidade em conhecê-lo.
Outra maneira de resolver o problema é elencar os valores que, podendo ser afrontados pelo exercício do direito à grave, se sobrepõe a este. Foi esta a preocupação dos autores do projecto de lei, seguindo, aliás, doutrina, jurisprudência, decisões da Organização Internacional do Trabalho. Os três valores que elencámos -a vida, a segurança, a saúde- são unanimemente aceites como valores fundamentais, como direitos fundamentais que podem justificar restrições ou limitações ao direito à greve.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa não dispõe de inscrições.

Pausa.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, peço desculpa por este pequeno intervalo, que decorreu do facto de estarmos a considerar a nossa intervenção; agora já estamos em condições de intervir. Sr. Presidente, Srs. Deputados: A apresentação desta iniciativa legislativa permite, sem prejuízo de consulta pública às organizações dos trabalhadores de um debate mais aprofundado em termos de generalidade e especialidade, recolocar na ordem do dia a questão do exercício do direito à greve tal como está inscrito na Constituição e na lei.
Na ordem do dia ainda porque na recente intervenção do Governo nalguns conflitos laborais a nível de empresa, sector e particularmente na greve geral de 28 de Março, este demonstrou falta de imparcialidade e de objectividade e, pior que isso, praticou actos violadores desse direito fundamental, tanto na requisição civil como na definição dos serviços mínimos a prestar durante a greve.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Todos!

O Orador: - Na ordem do dia ainda porque na origem de todo este processo esteve o pacote laborai que, depois da aprovação da autorização legislativa no passado dia 14 de Abril e que se encontra ainda em apreciação na Presidência da República, conhece uma nova fase rocambolesca, com o Governo a publicar em separata para discussão pública o projecto que constituía o anexo dessa mesma autorização legislativa.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Notável!

O Orador: - Bem se pode dizer que é pior a emenda que o soneto.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Bem lembrado!

O Orador: - Primeiro, reconhece assim o Governo que a proposta de autorização legislativa é formalmente inconstitucional porque não teve a prévia discussão pública no seio das organizações de trabalhadores.

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