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Sábado, 19 de Novembro de 1988 - I Série - Número 15
DIÁRIO
da Assembleia da República
V LEGISLATURA 2.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 18 DE NOVEMBRO DE 1988
Presidente: Exmo. Sr. João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu
Secretários: Exmos. Srs. Daniel Abílio Ferreira Bastos
José Carlos Pinto Basto da Mota Torres-
Cláudio José dos Santos Percheiro
João Domingos F. de Abreu Salgado
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 35 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 316/V.
Após terem sido lidos os relatórios das Comissões de Economia, Finanças e Plano, de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e de Assuntos Europeus, procedeu-se à discussão e votação, na generalidade e na especialidade, da proposta de lei n.º 73/V - Rectificação à Lei n. º 2/88, de 26 de Janeiro, que aprovou o Orçamento do Estado para 1988.
Intervieram no debate, a diverso título, incluindo declaração de voto, além do - Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Rui Carp), os Srs. Deputados Nogueira de Brito (CDS), José Castel-Branco (PS), Octávio Teixeira (PCP), João Cravinho (PS), Rui Machete, Gilberto Madail, Vieira de Castro e António Matos (PSD), Rui Silva (PRD), Helena Torres Marques (PS), Silva Marques e Carvalho Martins (PSD), Ilda Figueiredo (PCP), Gameiro dos Santos (PS), Jaime Soares é Carlos Encarnação (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 25 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 35 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adriano Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
António Abílio Costa.
António de Carvalho Martins.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José de Carvalho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Oliveira de Matos.
António Mário Santos Coimbra.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
rlindo da Silva André Moreira.
Armando Carvalho Guerreiro Cunha.
Arnaldo Ângelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carla Tato Diogo.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Sousa Encarnação.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Carlos Sacramento Esmeraldo.
Casimiro Gomes Pereira.
César da Costa Santos.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos da Silva e Sousa.
Ercília Domingos M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Francisco João Bernardino da Silva.
Gilberto Parca Madail.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Humberto Pires Lopes.
Jaime Carlos Marta Soares.
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maçãs.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José António Coito Pita.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
José Mendes Bota.
José Pereira Lopes.
Licinio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Batista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Mary Patrícia Pinheiro Correia e Lança.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Rui Manuel P. Chancerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Partido Socialista (PS):
Afonso Sequeira Abrantes.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes Silva Braga.
António, José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Manuel Oliveira Guterres.
António Miguel Morais Barreto.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Edite Fátima Marreiros Estrela.
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Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Luís Costa Catarino.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Florêncio B. Castel Branco.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Torres Couto.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
José Vera Jardim.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Ana Silva Medeiros.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul D'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Lino António Marques de Carvalho.
Luis Manuel Loureiro Roque.
Manuel Anastácio Filipe.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Luísa Amorim.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo S. de Sousa Moreira.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Rui dos Santos Silva.
Centro Democrático Social (CDS):
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.
Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):
Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Deputados Independentes (ID):
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Raul Fernandes de Morais e Castro.
O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas entrados na Mesa.
O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Apenas deu entrada na Mesa o Projecto de Lei n.º 316/V, da iniciativa do Sr. Deputado Jorge Lacão e outros, do Partido Socialista - Garantias de isenção e igualdade no processo de licenciamento de estações emissoras de radiodifusão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de entrarmos no período da ordem do dia, quero anunciar que pelas 11 horas deverão visitar a Assembleia da República, a título particular, três deputados das Cortes Espanholas, pelo que solicito a cada grupo parlamentar que designe um deputado para os acompanhar nessa visita.
Srs. Deputados, vamos entrar no período da ordem do dia, de que consta a discussão da Proposta de Lei n.º 73/V - Rectificação à Lei n.º 2/88, de 26 de Janeiro, que aprovou o Orçamento do Estado para 1988.
Estão na Mesa os Pareceres da Comissão Economia, Finanças e Plano, da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e da Comissão de Assuntos Europeus e a Mesa pergunta se os Srs. Deputados dispensam a leitura dos respectivos relatórios.
Pausa.
Como não há consenso, penso que os respectivos relatórios terão de ser lidos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima, para interpelar a Mesa.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, pensamos que não há dispositivos regimentais que obriguem a ler os relatórios e por isso continuamos a manter o nosso pedido para que se prescinda da sua leitura.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, quando algum partido exige a leitura dos relatórios das Comissões é da praxe fazê-la; o requerimento para que os pareceres fossem lidos foi apresentado pelo Partido Socialista. Portanto, vão ser lidos os referidos relatórios.
Foram lidos. São os seguintes:
COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO PROPOSTA DE LEI N.º 73/V
1 - A proposta de lei em apreciação apresenta um conjunto de alterações à Lei n.º 2/88 de 26 de Janeiro, que aprovou o Orçamento de Estado para 1988.
Com as alterações propostas, o défice orçamental passa de 471 milhões de contos para 457.1 milhões de contos, o que representa uma redução do défice inicial em 13.9 milhões de contos.
Esta diminuição do défice deve-se ao efeito consumado do acréscimo de Receitas e Despesas e que se reflecte na rubrica Passivos Financeiros - Títulos a Médio e Longo Prazo - crédito interno.
2 - As receitas fiscais aumentam 50 milhões de contos, assim distribuídas:
Contribuição Industrial 10 000 000 contos
Imposto Profissional 15 000 000 contos
Imposto s/valor acresct. 25 000 000 contos
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Além disso é aumentado em 5 900 000 contos o montante respeitante à previsão das retribuições provenientes da CEE.
3 - O acréscimo da Despesa deve-se a:
- Incertezas orçamentais da CEE 29 000 000 contos
- Fundo Extraordinário de Ajuda à Reconstrução do Chiado 5 000 000 contos
- Remuneração Extraordinária 8 000 000 contos
- Assembleia da República 180 000 contos
4 - São feitos ajustamentos necessários em sectores orgânicos, sem aumento da despesa total:
- Ministério da Saúde + 6 000 000 contos
- Ministério da Administração Interna + l 100 000 contos
- Ministério das Finanças - 6 000 000 contos
- Ministério da Defesa- l 100 000 contos
5 - A Proposta de Lei n.º 73/V reúne as condições necessárias para subir a Plenário da Assembleia da República.
O deputado relator,
António Carvalho Martins
O Presidente da Comissão,
Rui Manuel P. Chancerelle de Machete
COMISSÃO DE ASSUNTOS CONSTITUCIONAIS, DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS
Relatório
Proposta de Lei n.º 73/V (Rectificação à Lei n.º 2/88, de 26 de Janeiro que aprovou o Orçamento de Estado para 1988)
Ministério da Administração Interna
Ao mesmo tempo que apresentou à Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 74/V com que pretende aprovar o Orçamento do Estado para 1989, o Governo remeteu também a Proposta de Lei n.º 73/V, com vista à rectificação da Lei n.º 2/88, de 26 de Janeiro, que aprovou o Orçamento do Estado para 1988.
A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias recebeu em audiência o Senhor Ministro da Administração Interna, recolhendo dele explicações e esclarecimentos, no tocante ao seu Ministério, quer sobre o Orçamento do Estado para 1989, quer sobre a rectificação ao Orçamento do Estado
de 1988.
Ficou assim a Comissão habilitada a emitir o seguinte relatório e parecer:
Ministério da Administração Interna
Como resulta da "Exposição de Motivos" que precede a Proposta de Lei n.º 73/V, a rectificação pretendida traduz-se numa redução do défice inicialmente orçamentado e ainda pela necessidade de efectivar, entre sectores orgânicos (ministérios), algumas alterações.
No que ao Ministério da Administração Interna diz respeito transfere-se do Ministério da Defesa Nacional, onde havia sido anteriormente orçamentada, verba no valor de l 100 000 contos destinada a reforçar as dotações de pessoal dos orçamentos da Polícia de Segurança Pública e Guarda Nacional Republicana, para fazer face ao aumento de encargos decorrentes dos ajustamentos extraordinários de vencimentos do pessoal daquelas forças de segurança ocorridos em 1988.
Muito embora não inseridos directamente na parte orçamental do Ministério da Administração Interna, a proposta de lei de rectificação do Orçamento de 1988 regista ainda reforços de verbas destinadas a construção ou ampliação de cerca de 113 Quartéis de Bombeiros em todo o País, ao abrigo de Programas e Projectos do Ministério do Planeamento e Administração do Território, incluídos no PIDDAC, beneficiando-se assim um sector particularmente carecido na área das competências do Ministério da Administração Interna.
É quanto cumpre salientar no respeitante às incidências no âmbito do MAI da pretendida rectificação à Lei n.º 2/88, de 26 de Janeiro, que aprovou o Orçamento do Estado para 1988.
O Presidente da Comissão,
Mário Raposo
O relator,
Guilherme Silva
COMISSÃO DE ASSUNTOS EUROPEUS
Relatório
Sobre a proposta de lei n.º 73/V (alteração à lei n.º 2/88 de 26 de Janeiro que aprovou o OGE para 1988)
Relações financeiras Estado Português/Comunidades Europeias
1. Como é sabido, na altura da aprovação da Lei n.º 2/88, de 26 de Janeiro que aprovou o OGE para 88 não tinha sido ainda aprovado o orçamento da CEE pelo que não seria nunca possível avaliar com rigor os fluxos financeiros entre Portugal e as Comunidades.
Por outro lado, e na sequência dessa aprovação a alteração do sistema de recursos próprios vem determinar novas verbas afectas à Contribuição do Estado Português.
Assim, tornou-se necessário introduzir alterações no orçamento para 1988 com particular incidência nos seguintes pontos:
a) Reforço do orçamento do MPAT para o IAPMEI;
b) Reforço do orçamento do MAPA para o IFADAP;
c) Reforço do orçamento do MIE para o financiamento de projectos integrados no PEDIP.
2. Em síntese final dir-se-á que a alteração orçamental, ora em apreciação, não obstante a alteração de critérios quanto aos recursos próprios, traduz o reforço dos apoios financeiros
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comunitários a Portugal através dos seus diversos fundos cuja intensificação a proposta de lei do orçamento para 1988 também confirma.
3. Do ponto de vista dá Comissão de Assuntos Europeus, o diploma em análise está em condições de subir á- Plenário, reservando cada um dos partidos a sua posição para a discussão nessa sede:
O relator, António José Mota Veiga
O Sr. Presidente: - Par interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, embora não tenhamos sido nós a colocar objecções à não leitura dos relatórios, já que eles foram lidos. e incluem as declarações de voto, nomeadamente o da Comissão de Economia, Finanças e Plano, requeiro que a sua leitura se faça.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vão ser lidas as referidas declarações de voto.
Foram lidas. São as seguintes:
Relatório e Parecer da Comissão de Economia, Finanças: e Plano, relativos à Proposta de Lei - n.º73/V.
Declaração de voto do Grupo Parlamentar do PCP.
Os deputados do PCP votaram contra o Relatório e Parecer da Comissão peias seguintes razões essenciais:
1 .O relatório omite por completo as questões que, no âmbito da apreciação da proposta de lei, foram discutidas em. Comissão, designadamente, as consequências sobre o OE para 1988, decorrentes da decisão, do Tribunal Constitucional de declaração de inconstitucionalidade de algumas das suas normas.
2. Mesmo no âmbito do conteúdo estrito da proposta de lei, o relatório limita-se a resumir numericamente a Proposta do Governo o que, dada a natureza da matéria em causa e as responsabilidades da Comissão de Economia, Finanças e Plano, se tem de considerar insuficiente. Qualquer que sejam ò ângulo de análise e os juízos de valor que se façam sobre as alterações apresentadas: Assim, e designadamente:
Silencia-se o facto de a Comissão ter requalificado, e bem, a proposta, dada a não existência constitucional e legal da figura do «Orçamento rectificativo». b) Omite-se que o artigo 2.º da proposta de lei é manifestamente inconstitucional, por propor uma dotação de montante indefinido: c) Não se refere o facto de o Governo solicitar um reforço de dotação, no valor de - 9,8 milhões de contos, na sequência de um acordo inter-governamental que tem de ser aprovado para ratificação pela Assembleia da República, e que esse acordo não só ainda
não foi aprovado pela Assembleia da República como nem sequer nela deu entrada.
d) Nada se diz sobre o significado da proposta de dotação de 8 milhões de contos para fazer face à chamada «remuneração extraordinária de 1988».
e) Não se procede á qualquer análise das razões e dos montantes de aumento das previsões de cobrança das receitas fiscais, constantes do artigo 8.º da proposta de lei.
Os deputados do PCP, Octávio Teixeira - Carlos Carvalhas
Declaração de voto do Grupo Parlamentar do PS.
Os deputados do Grupo Parlamentar do Partido_ Socialista votaram contra o relatório e parecer em epígrafe, aprovados exclusivamente pelos deputados do Grupo Parlamentar do PSD, porque os referidos documentos não respeitam a sua finalidade essencial, qual seja a de contribuir para a boa preparação do debate e votação em Plenário.
O relatório omite a referência a importantes debates travados no seio da própria Comissão quanto à natureza e definição da finalidade da proposta, os quais levaram à substituição da sua designação.
Também se omitem os problemas suscitados, entre outros, pelo artigo 2 e pelo artigo 6.º, os quais infringem preceitos fundamentais de responsabilização, orçamental a cargo da Assembleia da República.
Igualmente não se faz a elucidação das novas previsões de receitas e suas consequências.
Para além disso, o relatório e parecer praticamente nada acrescenta que ilumine a discussão em Plenário.
São estas, entre outras, as razões que levam os deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista a não dar o seu voto aos citados relatório e parecer.
Pelo Grupo Parlamentar do PS, João Cravinho
O Sr. Presidente: - Srs: Deputados, a Mesa deseja anunciar que se encontram na Tribuna os Srs. Deputados das Cortes Espanholas, para quem pedimos uma
saudação especial.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente:- Antes de dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, a Mesa sugere que façamos o ponto da situação do debate por volta das 12 horas, para, decidirmos se interrompemos à horas regimental ou se bastará fazemos apenas um pequeno prolongamento que nos permita terminar este debate ainda durante o período da manhã.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr: Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: É com muita honra que apresento uma proposta de lei de alteração do Orçamento do Estado para 1988 que, ao
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contrário do que sucedeu quase sempre no passado, origina a redução do défice inicialmente orçamentado na Lei n.º 2/88, em quase 14 milhões de contos.
No passado, a Assembleia da República discutiu e aprovou orçamentos suplementares que levavam a mais défices resultantes de despesas a mais (as tristemente célebres «derrapagens ou buracos orçamentais e ou receitas a menos, são situações passadas, que não voltaram a suceder desde 1986). Bem pelo contrário. O sentido da Proposta de Lei n.º 73/V, agora em discussão, é totalmente oposto, porque é fundamental o recurso à revisão do Orçamento não seja determinada pela indisciplina financeira, porque dele resulta quer a desconfiança dos cidadãos na solidez da economia, quer a erosão dos suportes das instituições democráticas.
E porque é possível esta redução do défice de 1988 em quase 14 milhões de contos?
Como é possível que, ainda em 1988, o saldo orçamental «primário» (sem juros), passe a positivo em cerca de 0,3% do PIB, conforme anunciou recentemente o Sr. Ministro das Finanças?
A razão está em que o prosseguimento, pelo terceiro ano consecutivo, da «estratégia do progresso controlado» gizada pelo Sr. Ministro das Finanças, aprovada pelo Governo e confirmada pela Assembleia da República em finais de 1985 (faz agora 3 anos), conduziu a excelentes performances da economia portuguesa.
A razão ainda está em que a Administração Fiscal reagiu com mais eficácia do que nunca, ao desafio da modernização dos meios que o Governo lhe tem vindo a conceder desde 1986.
Porque se incutiu também nos serviços da Administração Central o espírito da disciplina na utilização dos dinheiros públicos, esperando-se que esse espírito passe para os restantes níveis da Administração, através do «efeito-demonstração».
Assim, do lado das receitas, estima-se agora, nos finais de 1988, cobranças adicionais de cerca de 60 milhões de contos, não obstante não se terem agravado as taxas dos impostos nem alterado as regras de incidência. Repito: o excelente andamento da economia portuguesa e o aumento da eficácia da Administração Fiscal são os grandes responsáveis pelo aumento das receitas e pela redução do défice.
Do lado das despesas orçamentais, as rectificações apresentadas visam dar solução a 4 ordens de questões: uma dotação para o Fundo Extraordinário de Ajuda à reconstrução do Chiado, de modo a que possam atingir-se os meritórios objectivos para o qual foi criado recentemente pelo Governo; a segunda ordem de questões prende-se a atribuição de uma remuneração extraordinária aos funcionários públicos que, conjugada com o aumento de 6,5% concedido no início do ano e a redução generalizada do horário de trabalho a partir de meio do ano, conduzirá a uma actualização salarial em 1988 de 9,5%, sem contar com a compensação da tributação do imposto profissional a que ficaram sujeitos os titulares de cargos públicos, nem a reestruturação das carreiras técnicas e técnica-superior, nem outras reestruturações específicas.
A terceira ordem de questões prende-se com a normalização orçamental das dotações necessárias a assegurar a comparticipação nacional ao pleno aproveitamento dos fundos comunitários e o reforço da contribuição financeira portuguesa para o novo recurso CEE, com parcial compensação do lado da receita.
É bom recordar que na altura em que foi preparado e votado o Orçamento do Estado para 1988 não era possível estimar essas verbas, dado que ainda se estava longe de chegar a acordo no seio da CEE (só em Maio deste ano foi aprovado o Orçamento da Comunidade para o corrente ano!) e só a partir dai foi possível estimar com rigor estes fluxos financeiros com a CEE.
A quarta ordem de questões relaciona-se com os ajustamentos necessários entre sectores orgânicos, da competência da Assembleia da República sem aumento da despesa total ou com contrapartida em receita a mais.
No Ministério da Saúde, mais de 6 milhões de contos, no reforço dos vencimentos extra da PSP e GNR mais 1,1 milhões de contos. Como compensação, em menos despesas no Ministério das Finanças, menos 6 milhões de contos, menos despesa no Ministério da Defesa Nacional, menos 1,1 milhões de contos e mais receita e mais reforço no Ministério das Finanças, mais 5 milhões de contos, mas com contrapartida plena idêntica no profissional cobrado sobre o vencimento dos funcionários públicos e outros servidores do Estado).
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a presente revisão de algumas rubricas da despesa e das estimativas, para melhor, de 4 receitas orçamentais pode o Governo apresentar ao Parlamento uma redução do défice em quase 14 milhões de contos (471 milhões de contos que era o que consta da Lei n.º 2/88 passa para 457 milhões de contos), assim prosseguindo as grandes tarefas programáticas do saneamento financeiro do sector público e o progresso da economia portuguesa, procurando conjugar as competências de cada órgão de soberania com a visão de que o Orçamento deve ser cada vez mais, um instrumento de gestão pública, num Estado Moderno que estamos a construir, para servir, cada vez melhor os portugueses, rumo à Europa de 1992.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Secretário de Estado do Tesouro, queria colocar-lhe duas questões, que suponho que serão de fácil resposta.
V. Ex.ª considerou, na sua intervenção, esta iniciativa do Governo como uma prova da boa performance do funcionamento, cada ano melhorado, dos serviços que têm a seu cargo a execução da política financeira.
Pergunto a V. Ex.ª se a explicação fundamental desta iniciativa não residirá antes e unicamente no que se passou em matéria de inflação?
Por outro lado, V. Ex.ª falou do reforço da dotação profissional no Ministério das Finanças para fazer face ao pagamento de uma remuneração extraordinária aos funcionários públicos, destinada precisamente a cobrir a erosão que as suas remunerações sofreram com a inflação. Por isso, pergunto a V. Ex.ª se nos poderá dar a indicação do regime, da regulamentação a que vai estar sujeita esta remuneração extraordinária. Do que é que se trata? Como vai ser paga? E em relação a que meses é que vai ser paga?
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Castel Branco.
O Sr. José Castelo Branco (PS): - Sr. Secretário de Estado, já quando na discussão do Orçamento para o
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Serviço Nacional de Saúde no ano de 1987, o Partido Socialista chamou a atenção para o facto de as verbas atribuídas para o Orçamento de Estado serem insuficientes para cobrir as necessidades e, por acréscimo, para a expansão dos serviços e insistimos neste aspecto em 1987, ao analisarmos o Orçamento de Estado para 1988.
O endividamento do Serviço Nacional de Saúde tem-se vindo a agravar, triplicou de 1985 para 1988, sendo nesse ano de 1985 da ordem dos 11 911 milhares de contos e no ano de 1988 da ordem dos 27 904 milhares de contos.
Disse agora o Sr. Secretário de Estado e já sabíamos pela leitura da proposta, que tinha havido uma transferência de 6 milhões de contos para o Serviço Nacional de Saúde.
Se considerarmos que em 31 de Dezembro deste ano a previsão do défice das Administrações Regionais de Saúde é 15 696 milhares de contos, e a dos hospitais de 11 085 milhares de contos, se considerarmos as monumentais diferenças, para mais, entre as previsões e a execução orçamental - como é, por exemplo, o caso do défice que tem um acréscimo de 22,4%, isto é, 5116 milhares de contos no que respeita aos medicamentos, e de 3728 milhares de contos no que se refere às ARS, com um défice para de 15 926 milhares de contos e dos hospitais, um défice para mais de 11 085 milhares de contos - o reforço de 6 milhões de contos, é, no fundo, uma ridicularia.
Em todo o caso, como a história não se faz só com os grandes factos, mas também com os pequenos factos, agradeceria que V. Ex.ª me esclarecesse, com o detalhe possível, qual o efectivo destino destes 6 milhões de contos.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, fica-lhe bem elogiar o Sr. Ministro das Finanças mas julgo que seria mais útil se analisasse mais clara e concretamente cada uma das propostas de alteração que o Governo apresentou à Assembleia, designadamente as que foram referidas durante a leitura do Relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano e das declarações de voto de alguns partidos.
Por exemplo, deveria ter explicado a forma como foi apresentada a proposta de alteração ao artigo 2.º, de onde é que surgiu a ideia da rectificação ao Orçamento do Estado, como foi possível a aprovação de uma dotação relativa a um acordo que, tendo que ser aprovado pela Assembleia da República, ainda não o foi. Eram estes aspectos que o Sr. Secretário de Estado deveria ter explicado porque, quanto aos elogios ao Sr. Ministro, como estão juntos todos os dias, podia fazê-los noutras ocasiões mais propícias.
Por outro lado, apesar da solicitação da Comissão de Economia, Finanças e Plano, já que ainda não deu uma explicação formal, conviria que o Governo informasse a Assembleia da República do que pensa sobre as consequências da decisão do Tribunal Constitucional, em termos do Orçamento do Estado para 1988.
Esta seria, também, uma óptima oportunidade para o Sr. Secretário de Estado nos dizer quando pensa o Governo apresentar uma nova proposta de alteração do Orçamento do Estado para 1988.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimentos tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, tenho duas perguntas simples e directas para lhe fazer e agradecia que as respostas fossem igualmente directas.
Em primeiro lugar, porque a razão é que o Governo, que sempre disse que faria um Orçamento por ano, sente a necessidade de vir à Assembleia apresentar esta "peça" que, de facto, é uma alteração, embora envergonhadamente lhe tenha chamado rectificativa, tendo sido, depois, obrigado a reconhecê-lo.
Isto é, o Sr. Secretário de Estado não explicou porque razão o Sr. Ministro das Finanças que "jurava por tudo", agora, "jura por nada".
Em segundo lugar, não percebi bem as palavras do Sr. Secretário de Estado. De facto, afirmou que tudo corre às mil maravilhas mas, se bem entendi o que está exposto na proposta de lei, está inscrito um aumento de 50 milhões de contos nas receitas e há uma diminuição de 14 milhões no défice. Logo, a despesa aumenta 36 milhões de contos!
Assim, é este o fundo da questão: esta proposta de alteração ao Orçamento de Estado aumenta ou não a despesa em 36 milhões de contos?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Srs. Deputados, responderei às questões pela ordem em que foram colocadas.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, ainda bem que confirma a boa performance da economia portuguesa. De facto, é devido a essa boa performance que, sem aumentos de taxas, sem aumento de incidências, apesar do mau ano agrícola e de circunstâncias externas adversas, no decurso de uma competência de que, constitucionalmente, o Governo é o único titular - a competência da execução do Orçamento do Estado -, conseguimos apresentar uma alteração orçamental visando reduzir o défice, ou seja, reduzir o esforço do financiamento do Estado na economia, libertando a sociedade civil.
Sr. Deputado, congratulo-me com a sua associação a esta perspectiva e esperemos que, tal como todas as instituições internacionais, continue a considerar que a economia portuguesa vai num óptimo caminho.
Como acabei de dizer na minha intervenção, a remuneração extraordinária para os funcionários públicos é uma medida que, conjugada com outras de política remuneratória e de emprego na função pública, conduzem a um forte aumento do poder de compra dos trabalhadores que, aliás, o Governo já tinha previsto no final do ano passado.
Portanto, nesta matéria, o Governo vai aprovar um decreto-lei em que esta remuneração extraordinária é concedida com justiça para os funcionários que auferem rendimentos mais baixos e por forma a que, sendo uma compensação, não constitua uma factor de pressão.
O recurso aos Certificados de Aforro é uma medida que vai beneficiar os funcionários porque o aumento remuneratório de 1,5% não incide sobre os vencimentos de 1987 mas, sim, sobre os vencimentos majorados
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de 1988. Além disso, esta compensação vai servir de base para actualização salarial de 1989 e, mais ainda, os funcionários públicos que recebem esta compensação extraordinária em Certificados de Aforro irão receber o produto da respectiva capitalização, ao fim dos seis meses de imobilização. Portanto, tudo isto acresce ao aumento da remuneração para os funcionários públicos.
O Sr. Deputado José Castel Branco referiu-se às verbas destinadas ao Serviço Nacional de Saúde e ao respectivo endividamento, mas penso que a questão deve ser posta totalmente ao contrário.
O Governo considera a Saúde um sector prioritário, dada a influência determinante do Serviço Nacional de Saúde e do aparelho de protecção social e de assistência através dos meios orçamentais. Neste caso, o Governo pretendeu reforçar, já em 1988, o orçamento para o Serviço Nacional de Saúde porque há compromissos do passado que tiveram que ser resolvidos e, além disso, o Governo está a reforçar os meios de alargamento do âmbito de protecção à saúde dos cidadãos. É exclusivamente com este intuito que surge esta verba de 6 milhões de contos, conjugada - nunca devemos esquecê-lo! - com o aumento da receita fiscal, o qual tornou possível este reforço.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira interrogou-me sobre a proposta de alteração ao artigo 2.º do Orçamento rectificativo. Na altura, aquela era a proposta possível relativamente à compensação da majoração do imposto profissional. Hoje, os Serviços da contabilidade pública estão em condições de considerar que, para todos os funcionários que servem o Estado aos diversos níveis da Administração Pública, a compensação, para efeitos de imposto profissional, rondará os 50 milhões de contos. Foi por essa razão que o Governo pediu a utilização desse mecanismo, que não tem nada de inconstitucional porque, como já tantas vezes aqui foi dito, o Orçamento do Estado deve obedecer à regra da anualidade mas não tem que obedecer nem à regra da gerência nem à do exercício. Aliás, Sr. Deputado Octávio Teixeira, sabe muito bem que, constitucionalmente, nessa matéria, o sistema orçamental português é o que se quiser e o legislador tem utilizado filosofias de orçamento de gerência e de orçamento de exercício.
Mas, entretanto, dado o conhecimento mais apurado da compensação ao imposto profissional que terá que ser dada até ao fim do ano, o Grupo Parlamentar do PSD, baseando-se em informações distribuídas esta semana à semana Assembleia da República, apresentou uma proposta de alteração, que, ao fim e ao cabo, vai dar ao mesmo, em termos de o Governo poder dispor da verba necessária para que tudo caminhe com regularidade até ao final do ano.
Quanto ao acordo intergovernamental, é um problema que o Sr. Deputado poderia pôr ao contrário: como é que a Assembleia poderia ratificar o acordo intergovernamental a nível da CEE se não tivesse cobertura orçamental? Podemos pôr o problema de uma maneira ou de outra; isso não interessa. O que interessa é que, embora nem todos os juristas consultados tenham considerado necessária esta rectificação em vias de ser agendada para apreciação em Plenário, ela é mais um modo que o Governo tem de associar a Assembleia da República às grandes decisões em matéria da Comunidade Económica Europeia e do Mercado Interno Europeu.
O Sr. Deputado também referiu "inconstitucionalidades no Orçamento de Estado para 1988". Dir-lhe-ei que, nos termos da Constituição e da jurisprudência do Tribunal Constitucional, o Governo acatará as decisões daquele Tribunal, conforme o Sr. Ministro das Finanças já teve oportunidade de anunciar mais do que uma vez, quer publicamente mais do que uma vez, quer publicamente quer à própria Assembleia. Simplesmente, o Governo não pode tomar qualquer iniciativa enquanto não conhecer o Acórdão do Tribunal Constitucional. Como o Sr. Deputado deve saber, aquele acórdão integra a jurisprudência das declarações finais das votações de vencido. Enquanto não forem conhecidos todos estes elementos, não podermos decidir. Se o fizéssemos, seria o mesmo que legislar "olhando pelo buraco da fechadura".
Finalmente, no que toca ao Orçamento do Estado para 1988, lendo a parte final das votações do Tribunal Constitucional - as únicas de que tivemos conhecimento por via muito oficiosa - ver-se-á que nem sequer foram pacíficas em matéria de fixação da doutrina, tendo havido declarações de vencido de quase todos os Srs. Conselheiros. Ora, mesmo tendo em conta somente essas perspectiva muito factual, verificar-se-á que essas declarações de inconstitucionalidade não terão efeitos práticos no Orçamento do Estado para 1988.
Mas há mais: pelas razões que já indiquei na minha intervenção inicial, respondendo simultaneamente à pergunta que me foi feita sobre quando é que será apresentado um Orçamento de Estado Suplementar, direi que o Governo não pensa, não pensou nem pensará em apresentar orçamentos suplementares com mais défice e até se antecipou a essa regularização dos fluxos financeiros da Comunidade Económica Europeia.
De facto, como disseram o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro das Finanças, não há orçamentos suplementares e este não o é no sentido doutrinário, porque não está previsto na Constituição nem na lei de enquadramento, não o é no sentido de agravamento do défice. Este Orçamento não suplementa o endividamento público mas encurta o recurso a esse endividamento. Daí que medidas deste tipo devem e podem ser tomadas frequentemente. Pena é que, tal como o Sr. Deputado Octávio Teixeira, o Sr. Deputado João Cravinho ainda se agarre a uma concepção clássica destas matérias, que é uma visão que já data do século passado e que não tem que ver com a filosofia do Orçamento como um instrumento de gestão.
O Sr. João Cravinho (PS): - O Sr. Primeiro-Ministro até já repreendeu publicamente o Sr. Ministro das Finanças!
Protestos do PSD.
O Orador: - Por último, o Sr. Deputado João Cravinho perguntou a razão da inexistência de um Orçamento Suplementar. Espanta-me a sua manifestação de perplexidade, mas dir-lhe-ei que precisamente neste diploma em que o défice é reduzido é que pode encontrar esses motivos. De facto, quer nos termos da Lei de Enquadramento do Orçamento de Estado quer nos da Constituição, o Governo tem que vir submeter estas alterações à Assembleia da República.
Por estas razões é que o Governo aqui está porque, de contrário, sem quebra de transparência, nem de
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disciplina, nem do respeito que lhe merecem as competências da Assembleia da República, o Governo poderia ter solucionado todas estas questões sem que tivesse que vir submeter à Assembleia da República esta figura de alteração à Lei do Orçamento do Estado para 1988. Quem tiver memória fraca basta-lhe consultar o Diário da Assembleia da República quanto aos debates do Orçamento do Estado para 1986, mas queria recordar algumas declarações de Srs. Deputados da oposição que, na altura, disseram que, de acordo com esta mesma filosofia, o Governo poderia e deveria vir à Assembleia neste processo que, não sendo a apresentação de um novo Orçamento, é um processo de meras alterações orçamentais que - é fundamental sublinhá-lo - visam reduzir o défice e introduzir mais disciplina nas finanças públicas.
Em suma, deveria considerar-se o Orçamento como um instrumento fundamental para a gestão das finanças públicas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Entre a data da apresentação da Proposta de Lei n.º 73/V, de alteração do Orçamento de Estado para 1988, e o dia de hoje em que se processa a sua discussão, registou-se um facto de importante significado e alcance político e orçamental que não pode, de modo algum, ser ignorado: a decisão do Tribunal Constitucional de declarar que a inconstitucionalidade de múltiplas normas inscritas naquele Orçamento.
O Tribunal Constitucional entendeu, por razões de segurança jurídica, ressalvar os efeitos já produzidos pelas gravíssimas inconstitucionalidades que o Governo foi praticando desde Janeiro de 1988.
É indisfarçavelmente importante o alcance da decisão, cujo conteúdo foi já oficialmente transmitido à Assembleia da República (aguardando-se apenas a divulgação de todos os seus fundamentos). Alguém pode ter dúvidas, por exemplo, sobre as implicações da declaração de inconstitucionalidade da chamada "dotação concorrencial"?
Recorde-se que, com a sua criação o Governo pretendia consagrar na ordem jurídica portuguesa, contra todas as normas constitucionais e orçamentais vigentes, o princípio de que as despesas do Orçamento do Estado deveriam concorrer entre si. Do que resultava que a Assembleia da República passaria a aprovar dois tipos de despesas, umas com cobertura e outras sem cobertura orçamental. Sendo certo, por acréscimo que a Assembleia ignoraria em qual daquelas categorias viriam a inserir-se as despesas que aprovasse.
A declaração de inconstitucionalidade da norma que criava aquela "dotação negativa" não pode deixar qualquer dúvida, a quem quer que seja, sobre o seu exacto alcance: primeiro, que todas as despesas inscritas no Orçamento do Estado têm que ter efectiva cobertura orçamental; segundo, que essa cobertura orçamental só pode revestir a forma das receitas orçamentalmente inscritas (nelas incluídas, logicamente, os empréstimos a obter). Isto é, a declaração de inconstitucionalidade da "dotação concorrencial" implica, necessariamente, a obrigatoriedade de a Assembleia da República (pois só ela tem competência constitucional para o fazer) votar uma alteração orçamental que estabeleça o equilíbrio do Orçamento do Estado para 1988, equilíbrio esse exigido pelo n.º 6 do artigo 108.º da Constituição e pelo artigo 4.º da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado. Esta é uma exigência constitucional a que a Assembleia da República não poderá subtrair-se. E é uma exigência a que o Governo não poderá fugir, pois é a ele que compete apresentar a correspondente proposta de lei.
Apesar de, na sequência da declaração que há poucos dias aqui fizemos sobre este assunto, o Grupo Parlamentar do PCP ter apresentado formalmente à Comissão de Economia, Finanças e Plano a necessidade de o Governo apresentar uma proposta de lei de alteração ao Orçamento, visando o expurgo das inconstitucionalidades agora confirmadas, e apesar de o Presidente da Comissão ter solicitado ao Presidente da Assembleia da República que o Governo fosse interpelado sobre as suas intenções, o Governo "aos costumes nada disse", pois não só não apresentou qualquer nova proposta como não se dignou, sequer, responder à questão que institucionalmente lhe foi colocada por este órgão de soberania.
Apenas se sabe, pelas declarações de Membros do Governo a órgãos de Comunicação Social, prestadas pelo Srs. Primeiro-Ministro e Ministro das Finanças e agora corroboradas pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento, que o Governo considera que nada tem que fazer, invocando que o Acórdão do Tribunal Constitucional não está publicado insinuando que não se lhe alcança o conteúdo constitucional.
Isto é, o Governo pretende escudar-se num excessivo formalismo jurídico para aproveitar o facto de o Tribunal Constitucional ter ressalvado os efeitos produzidos até à publicação do acórdão e para, quiçá, tentar eximir-se ao necessário expurgo das inconstitucionalidades.
Só por si, esta seria já uma posição merecedora de enérgica condenação política, designadamente pelo facto de as normas em questão sempre terem sido inconstitucionais, desde o momento em que foram propostas pelo Governo à Assembleia da República. Não foi a declaração do Tribunal Constitucional que as tornou inconstitucionais. O que aquele tribunal fez, com a competência que a Constituição lhe confere, foi declarar, com força obrigatória geral, que aquelas normas sempre foram, são e continuarão a ser inconstitucionais.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados: Há razões que justificam a suspeição de que o posicionamento do Governo tem intenções ainda mais condenáveis, visando defraudar a própria decisão do Tribunal Constitucional. Há indícios que o Governo pretende utilizar este compasso de espera para dar plena execução a algumas normas já oficialmente declaradas inconstitucionais, nomeadamente no que concerne à "dotação concorrencial" e às "operações activas" do tesouro. Isto é, o Governo pretende aproveitar-se da prudência usada pelo Tribunal Constitucional para continuar a fazer, até à data da publicação do Acórdão, aquilo que o tribunal já lhe fez oficialmente saber que constitucionalmente não pode ser feito.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Exactamente!
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O Orador: - Para além de mal-agradecido, a coberto de um excesso de formalismo que distorce e contraria o conteúdo essencial da decisão do tribunal, o Governo pretende continuar a praticar actos declaradamente inconstitucionais, defraudando a decisão do Tribunal Constitucional e a Constituição.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - A Assembleia da República não pode permitir que tais práticas se prolonguem. Mesmo os Srs. Deputados do PSD não podem, em consciência, deixar de criticar esta atitude do Governo. Útil seria para o Estado Democrático que o fizessem em sede própria, isto é, neste Plenário da Assembleia da República. E útil seria que o fizessem já, mais que não seja para pouparem tempo a esta Assembleia. Porque de uma coisa os Srs. Deputados, tal como o Governo, não conseguem livrar-se à face da legalidade constitucional: a da apresentação, apreciação, discussão e votação de uma nova proposta de lei de alteração ao Orçamento do Estado para 1988.
Ainda que seja apenas para repor o constitucionalmente exigível equilíbrio orçamental ou, na expressão do Sr. Presidente do Tribunal de Conta, para ser feito o necessário "ajustamento global" do Orçamento.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Importa agora analisar o conjunto de propostas de alteração ao Orçamento contidas na proposta do Governo. Desde logo convém afirmar que não estamos perante uma alegada rectificação do Orçamento do Estado ou de um orçamento rectificativo, pela simples razão de que essas figuras não existem no nosso ordenamento jurídico, constitucional e orçamental. Existem, apenas, alterações ao Orçamento do Estado. Nem mais, nem menos, ... como, aliás, o entendeu consensualmente a Comissão de Economia, Finanças e Plano!
Em segundo lugar, o Governo (esta prática faz parte, manifestamente, da sua actuação corrente) apresenta uma proposta de aumento da dotação para montante indeterminado, claramente inconstitucional, Sr. Secretário de Estado!
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O Governo não pode apresentar dotações de valor indeterminado, isso é contra a Constituição e a Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado,...
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Orador: - ... que é tão clara que os próprios deputados do PSD sentiram a necessidade de apresentar uma proposta alternativa devidamente quantificada, quantificação essa que, aliás, não aparenta dificuldade.
Mas assim sendo, por que razão o Governo não a fez desde logo, antes preferindo apresentar uma norma inconstitucional? Certamente por razões de natureza política, designadamente a preocupação permanente do Governo de rodear o Orçamento do Estado do maior obscurantismo, para mais facilmente o poder manipular.
Em terceiro lugar, e passando por cima de uma provocação gratuita à Assembleia da República no artigo 3.º, que não merece, sequer, ser discutida, mas pura
e simplesmente se exige a sua eliminação (de tal modo assim é que o próprio Grupo Parlamentar do PSD sentiu necessidade de a formalizar), o Governo propõe-nos uma coisa bizarra: que a Assembleia da República vote uma dotação orçamental de 9,8 milhões de contos, verba essa que decorre de um acordo entre governos dos países da CEE, acordo esse que tem de ser obrigatoriamente aprovado para ratificação por esta Assembleia da República. Sucede, porém, que o acordo, ainda não foi aprovado pela Assembleia da República nem sequer cá deu entrada, contrariamente à afirmação, tão peremptória quanto inverídica, que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento fez na Comissão de Economia, Finanças e Plano e reiterou agora aqui neste Plenário.
Aliás, recordo-lhe que existe um ofício aprovado, por unanimidade, pelos Srs. Deputados da Comissão dos Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação interpelando o Sr. Presidente da Assembleia da República precisamente no sentido de saber onde é que está o acordo que é desconhecido da Comissão.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Não é a verba ou a sua natureza que agora discutimos. O que não aceitamos é que o Governo, sem qualquer pudor, pretenda que a Assembleia da República colabore no espezinhamento de regras elementares de um Estado de Direito. Mais uma vez, os próprios deputados do PSD reconheceram que isto é demais. Só que desta vez a solução proposta não é, pura e simplesmente, solução. Para o PSD, se não se disser por que razão é necessária a dotação, já o impedimento jurídico-político se não coloca. É a táctica da avestruz, ou se quiser a situação do gato escondido com o rabo de fora. Assim não pode ser, Srs. Deputados. Solucione-se a questão de forma simples, mas clara e legal: eliminemos agora a proposta do Governo, e votemo-la na próxima alteração ao Orçamento de 1988 que o Governo necessariamente terá de propor. Entretanto apresente o Governo o acordo à Assembleia da República e requeira a sua atempada apreciação e votação.
Em quarto lugar, e face ao completo desaire que registou na sua meta de inflação, o Governo propõe um reforço da dotação para os vencimentos dos trabalhadores da função pública. Mas, com a inflação a 9,5% para que não haja perda das remunerações reais de cerca de 500 mil trabalhadores, impõe-se que o aumento a votar agora seja de 3%, isto é, o dobro do que o Governo propõe. É esse o conteúdo de uma das propostas do PCP, pois é esse o mínimo exigível. O que deve ser complementado, por um lado, com a correspondente transferência para as autarquias locais, para que estas possam fazer face a uma despesa não prevista, sendo que essa não previsão é da exclusiva responsabilidade do Governo. Por outro lado, impõem-se a obrigação do aumento da remuneração ser pago integralmente em numerário. Como é normal e legal. O Governo não pode obrigar ninguém, nem mesmo os trabalhadores da Função Pública, a financiar compulsiva e administrativamente o défice orçamental.
Vozes do PCP: - Muito bem!
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O Orador: - O que o Governo se propõe, com o pagamento em certificados de aforro, é uma prepotência sem arrimo constitucional e legal.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Em quinto lugar, é incompreensível, e não justificado pelo Governo, o aumento da previsão da cobrança de impostos em apenas 50 milhões de contos. Já que formalizou uma proposta de correcção das previsões, porque não as corrige correctamente, com verdade? Concretamente: Porque não inclui o substancial aumento de cobranças no imposto automóvel, e porque não corrige com verdade o aumento de cobranças no IVA? Aliás, os esforços do Governo para esconder o aumento das cobranças em IVA já atingiram o ridículo, quando o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais declarou, na televisão, e na Comissão de Economia, Finanças e Plano, que desconhecia valores que, pasme-se, já foram publicados no Diário da República, a mando do próprio Governo! Bem se compreendem tais diligências do Governo: pretende assim, em simultâneo, lesar as autarquias locais em vários milhões de contos e subavaliar as receitas fiscais para 1989 - ou para encher algum saco mais ou menos azul em ano de eleições ou para apregoar posteriormente que conseguiu uma substancial redução do défice orçamental. Só que tudo isto nada tem a ver com o rigor e clareza orçamentais nem com o cumprimento da lei. Por isso apresentamos a correspondente proposta de alteração.
Finalmente, uma constatação e uma pergunta. O Governo reconhece, agora, aquilo que o PCP afirmou há um ano: que as dotações para a saúde estavam subavaliadas e necessitariam de reforço. O reforço aí está, embora insuficiente pois que aumenta a dívida do Serviço Nacional de Saúde. Aguardemos que no Orçamento para 1988 idêntica e não menos necessária correcção seja efectuada pela Assembleia da República, logo no Orçamento inicial. A pergunta é a seguinte: porque não propõe o Governo o necessário reforço para as dotações da Educação? Designadamente, para cobertura das necessidades efectivas das universidades e para pagar as dívidas que durante o ano, acumulou junto dos fornecedores, nomeadamente os empreiteiros. Vai o Governo transferir a dívida para o próximo ano, ou pretende recorrer à manipulação da «dotação comercial», antes da publicação do Acórdão do Tribunal Constitucional?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.
O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, começo por me congratular por V. Ex.ª ter ingressado no grémio assaz restrito dos constitucionalistas desta Assembleia. Penso que é um facto que merece relevo porque V. Ex.ª, nas suas considerações, produziu nesse capítulo algumas afirmações extremamente interessantes.
Primeiro, V. Ex.ª cita o Acórdão do Tribunal Constitucional de que nós, neste momento, apenas temos uma ideia, através daquilo que nos foi facultado oficiosamente, isto é, o que está consignado no «Livro de Lembranças» do Tribunal. Portanto, não conhece, tal como nós, os seus fundamentos - suponho eu
- e além disso sabe que a decisão do Tribunal ainda não é vinculativa, embora possa ter algum tipo de efeito daí decorrente.
Segundo, sabe, porque o próprio Tribunal o disse, que nesta matéria se entendeu usar da faculdade excepcional consignada no n.º 4 do artigo 282.º da Constituição, isto é, limitar os efeitos da inconstitucionalidade apenas a partir do momento em que o Acórdão seja publicado. Por estas circunstâncias é que me parece difícil de sustentar, como V. Ex.ª o fez, duas questões.
A primeira tem a ver com as inconstitucionalidades terríveis, que põem em causa todo o sistema de funcionamento financeiro do País. Se assim acontece, certamente que o Tribunal não teria usado dessa faculdade. Justamente porque ponderou as vantagens e os inconvenientes é que entendeu ser preferível considerar que apenas a partir do momento da publicação do Acórdão é que a declaração de nulidade produziria efeitos, digamos assim.
A segunda questão, relacionada de algum modo com a primeira, diz respeito à ideia, em que V. Ex.ª insistiu muito, de que seria necessário apresentar uma alteração orçamental à Assembleia da República em resultado das decisões do Tribunal Constitucional. Talvez sim, talvez não. Tudo isto vai depender muito da maneira como o Tribunal fundamentar as suas decisões e da forma como terão de decorrer as eventuais acomodações e actos de execução do Acórdão. Ainda não sabemos como é que isso vai ser nem sabemos sequer a data em que vai ser publicado.
Há só um ponto em que estamos de acordo. O Tribunal Constitucional, pela importância que tem na estrutura constitucional portuguesa, merece-nos, com certeza, todo o respeito e exige que todos os órgãos de soberania - de resto, isso já foi afirmado tanto pelo Sr. Ministro das Finanças de uma maneira inequívoca como pelo Parlamento - vejam as suas decisões por um princípio de boa fé constitucional, obrigando-nos deste modo a encontrar as melhores soluções.
Neste ponto estamos de acordo e é por isso mesmo que o PSD apresentou as suas propostas de alteração à Proposta de Lei n.º 73/V.
Em resumo, gostaria que V. Ex.ª me explicasse se as suas críticas resultam do facto de já conhecer a fundamentação do Acórdão ou de presumir que ela seja num determinado sentido, porque penso que elas vão bastante mais além daquilo que neste momento sou capaz de deduzir do que conheço da decisão tomada.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, há ainda outros pedidos de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Respondo já ao Sr. Deputado Rui Machete, exclusivamente pela última questão colocada, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, gostaria de deixar muito claro que aquilo que disse foi resultado apenas do conhecimento que tenho do que foi publicado pelo Tribunal Constitucional. A insinuação...
O Sr. Rui Machete (PSD): - Não fiz insinuação alguma!
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O Orador: - ... que pretendeu fazer não é aceitável, não lhe fica bem e não é a sua maneira de ser normal.
O Sr. Rui Machete (PSD): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Rui Machete (PSD): - Peço imensa desculpa, mas não fiz nem penso que V. Ex.ª mereça qualquer insinuação desse tipo. O que eu disse, e repito, é que só conhecendo a fundamentação é que poderia, com segurança, deduzir o que deduziu. Como não conhece, pois suponho que ninguém no momento, além do Tribunal, a conhece, isso infirma as declarações que fez. Foi apenas o que pretendi dizer e não fazer qualquer tipo de insinuação.
O Orador: - Sr. Deputado, pelo menos, pareceu pretender insinuar. Portanto, quis deixar isso bem claro para que não houvesse qualquer dúvida. Mas, já agora, acabo por responder-lhe às restantes questões.
Relativamente à questão da gravidade das inconstitucionalidades, o Sr. Deputado sabe, melhor do que eu pois é jurista, que as alterações ao Orçamento e as operações de tesouraria ilegais são crimes de responsabilidade puníveis com prisão até um ano. Considera que isso não é grave?
Uma voz do PCP: - Não?!
O Orador: - A segunda questão tem a ver com o problema de a decisão ser vinculativa apenas após a publicação do Acórdão e da fundamentação.
Sr. Deputado, na minha intervenção fiz uma referência ao assunto e expus concretamente o exemplo da dotação concorrencial, mas volto a colocar novamente a questão. Qual é a dúvida que o Sr. Deputado Rui Machete tem sobre os efeitos da declaração de inconstitucionalidade da dotação concorrencial, em termos de equilíbrio orçamental? Tem alguma dúvida sobre isso? Foi sobre isso que me pronunciei foi isso que referi e foi aí que assentei a afirmação que fiz da obrigatória necessidade de apresentar uma nova proposta de alteração orçamental, mais que não seja para restabelecer o equilíbrio orçamental exigido pela Constituição e pela lei do enquadramento.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, com todo o respeito e desculpe-me a expressão, penso que enfiou o barrete que o Sr. Deputado Rui Machete lhe acabou de pôr. Isto porque o Sr. Deputado Octávio Teixeira escreveu e agora acabou por dizer que havia graves inconstitucionalidades, graves incumprimentos, etc; porém o que se está a passar neste momento, isso sim, são brutais inconstitucionalidades, mas por parte do Partido Socialista e do Partido Comunista. E porquê? Porque estão a extravasar a competência da Assembleia da República em matéria de execução orçamental e é brutal essa inconstitucionalidade porque já não é uma questão de interpretação que está por fazer à jurisprudência assente no Tribunal Constitucional, o qual, através de um Acórdão publicado no Diário da República, I Série, de 14 de Janeiro de 1987, diz simplesmente isto: «em sede de alteração do Orçamento do Estado a Assembleia da República não pode introduzir alterações às propostas do Governo». Ora, pode rejeitá-las, pode alterá-las um quanto, mas não pode alterar a sua qualidade.
No entanto, o que vemos aqui são os Srs. Deputados do Partido Comunista a acrescentarem alterações à receita e a outros impostos que não são tocados nem referenciados na proposta de lei do Orçamento do Estado e outros deputados a referirem-se a despesas que não são consideradas na proposta de alteração apresentada pelo Governo.
Onde é que está a inconstitucionalidade? Onde é que está a afronta à Constituição? Não há dúvida nenhuma, Sr. Deputado, veja o Acórdão do Tribunal Constitucional que foi publicado no Diário da República, I Série, de 14 de Janeiro de 1987, devido a uma atitude que a oposição assumiu em 1986 relativamente a uma alteração que o Governo apresentou à execução do Orçamento.
Aliás, não é matéria nova. Os grandes e iminentes juristas na área das finanças públicas têm escrito e publicado doutrinas relativas a essa matéria. Mas já que citou o Sr. Presidente do Tribunal de Contas desafio--o a citá-lo quando, numa entrevista a um semanário, disse que a dotação concorrencial não lhe parecia de maneira alguma inconstitucional.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - E depois?
O Orador: - Tenha calma, Sr. Deputado. Eu sei que a situação talvez não seja calma para si, mas gostamos de discutir isto com alma. E que a razão dá a calma, a falta de razão faz perdê-la.
Quanto à citação que fez de que a dotação concorrencial gera despesas sem cabimento... Mas que confusão, Sr. Deputado! É evidente que a dotação concorrencial não é mais do que a assunção orçamental, que é da competência própria do Governo, quer em termos constitucionais, quer através do artigo 20.º da Lei n.º 40/83. Esta lei também permite aquilo que o Governo propôs à Assembleia da República, dado que no artigo 2.º diz que «o Governo pode alterar o montante das despesas desde que tenha contrapartida em receitas». Foi essa alteração que o Governo apresentou à Assembleia da República e também, dentro do espírito de abertura que o Governo sempre tem manifestado, aceitou a alteração formal que os Srs. Deputados do PSD apresentaram.
Quanto ao mais e ao resto, Sr. Deputado, fico confuso quando oiço o Sr. Deputado querer explicar o que não tem explicação.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, este Orçamento é constitucional e é uma boa medida de gestão...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sim, sim!
O Orador: - ..., pelo que gostava era que o Sr. Deputado criticasse a redução do défice orçamental, mas vejo que não o pode fazer.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Gilberto Madaíl.
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O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi com atenção a intervenção do Sr. Deputado Octávio Teixeira, pelo que gostaria de lhe colocar duas questões e fazer algumas considerações.
O Sr. Deputado refere que o Governo tem vindo a manipular o Orçamento, cometendo gravíssimas irregularidades. A questão que colocamos - e que acho que tem que ser colocada não só em termos desta Câmara, mas em termos do País -, é saber se, de facto, «gravíssimas irregularidades» quer dizer aquilo que este Orçamento bem expressa e que é uma redução do défice, o que implica, consequentemente, uma melhoria na gestão das finanças públicas.
Quanto à dotação concorrencial, Sr. Deputado, - e como já foi dito - pensamos que é uma performance, pois as despesas são autorizadas pelo máximo e o Governo tem a obrigação, não diria a capacidade, de reduzir ao máximo as despesas públicas, que é o que toda a gente clama. De facto, trata-se de uma economia voluntária que tem, necessariamente, os seus reflexos no País e que o próprio país assim o entenderá.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Diga isso ao Roberto Carneiro!
O Orador: - Sr. Deputado, gostaria agora de colocar-lhe duas questões.
V. Ex.ª entende que um orçamento tem de ter um aspecto imobilista? Quer dizer, tem de ser exactamente aquilo que foi previsto, que foi inscrito em termos previsionais e se não tem de atender à própria evolução da conjuntura e da situação, de forma a poder-se introduzir, em qualquer momento, as melhorias e as adaptações que forem julgadas necessárias.
Finalmente Sr. Deputado, gostaria também de lhe perguntar - e espero que responda sinceramente se, de facto, este orçamento rectificativo representa ou não, em termos do nosso país, e pela primeira vez, uma redução apreciável do défice do Orçamento do Estado. É bom que isto seja dito, para que toda a gente possa compreender e entender qual é o sentido das questões que a oposição coloca: se, de facto, é para iludir o problema de redução do défice, se é para procurar colaborar na melhoria do Orçamento do Estado.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Secretário de Estado do Orçamento parece que está nervoso, pois parece que a razão não anda muito pelo lado para você se enervar tanto!
O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Os senhores é que têm razão para andar nervosos!
O Orador: - Sr. Secretário de Estado, vou responder-lhe, mais uma vez, brevemente, porque o tempo não é muito e aproveito também para, simultaneamente, responder ao Sr. Deputado Gilberto Madaíl.
Mais uma vez vou dizer aquilo que já há pouco afirmei ao Sr. Deputado Rui Machete em relação ao que quis significar com a «gravidade das inconstitucionalidades». Como tive oportunidade de referir nessa altura, as normas que foram declaradas inconstitucionais não, o são só pelo facto de terem sido declaradas pelo Tribunal Constitucional; elas já o eram desde o início e o tribunal apenas as declarou inconstitucional.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador - Por conseguinte, o que o Governo tem vindo a fazer é operações ilegais que, de acordo com a lei, são crimes de responsabilidade, dão direito a prisão.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Até 1 ano! O Orador: - Não acha que isso é grave?!
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Ainda vão parar à cadeia!...
O Orador: - Não acha que são inconstitucionalidades graves?
Risos e protestos do PSD.
Ainda por cima o Sr. Ministro das Finanças parece que está com um pouco de medo de ir para a prisão... Não tenha medo! O Sr. Secretário de Estado também não o tenha, não vale a pena!...
Protestos do PSD.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Quando isto for moralizado!
O Orador: - O Sr. Secretário de Estado, relativamente à inconstitucionalidade das propostas do PCP e do PS, foi buscar o célebre Acordão do Tribunal Constitucional.
O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Para vocês esse é mau! Esse acórdão é horrível!
O Orador: - Mas antes disso, Sr. Secretário de Estado, gostaria de lhe dizer que há pouco quis responder directa e imediatamente ao Sr. Deputado Rui Machete, para que não restasse a mínima dúvida sobre aquilo que parecia ser uma insinuação. Depois do esclarecimento da questão o Sr. Secretário de Estado vem referir o mesmo. Não lhe fica bem! Seria preferível não ter feito essas insinuações, qualquer tipo de insinuações, depois de terem sido desmentidas
Sr. Secretário de Estado ficava-lhe melhor que continuasse a fazer o que acabou de fazer há pouco, quando disse neste Plenário aquilo que tinha dito na comissão, ou seja, que já cá estava o acordo intergovernamental para aprovação, por ratificação, pela Assembleia da República. Esse acordo ainda não deu entrada, mas se deu entrada diga-nos qual é o número, pois a Assembleia desconhece-o.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Diga, diga!
O Orador: - Em relação ao problema da inconstitucionalidade da propostas do PCP e do PS, e no que se refere às nossas propostas, o que o Sr. Secretário de Estado que faz é escamotear a verba sobre o imposto automóvel. É que a questão essencial é essa. Porque
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é que o Sr. Secretário de Estado escamoteia o aumento do imposto automóvel e que o próprio Governo computa em treze milhões de contos? Porque é que escamoteia o efectivo aumento de cobrança do Imposto sobre o Valor Acrescentado? Porque é que só inclui 25 milhões de contos? Porquê? Explique-nos isso!
O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - É para não reduzir mais o défice!
O Orador: - É isso que a Câmara quer saber! O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado Gilberto Madaíl, vamos lá ver se nos entendemos. Ninguém critica, pelo menos não o fizemos, o facto de o Governo ter apresentado uma proposta de lei de alteração orçamental. E já agora um pequeno parêntesis: é preciso que fique claro, de uma vez para sempre, que não se trata de um orçamento rectificativo nem de um orçamento suplementar - esse problema já foi clarificado na Comissão de Economia, Finanças e Plano -, mas sim de uma alteração ao Orçamento, pura e simplesmente.
Ninguém crítica a apresentação dessa proposta de lei. O que criticamos é que, em resultado de um facto superveniente, que foi a declaração de inconstitucionalidade, o Governo não aproveite para fazer outras alterações.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Ou, então, porque é que o Governo não pediu o adiamento desta discussão para fazer tudo junto? Isto é que está a ser criticado.
Por outro lado, criticas-se também o conteúdo das propostas concretas da proposta de lei e não a apresentação desta.
Sr. Deputado Gilberto Madaíl, quanto à questão da redução do défice orçamental que, quer o Sr. Secretário de Estado, quer o Sr. Deputado, tentarem empolar no sentido de ser um facto histórico, sugiro-lhes apenas que reflicta bem porque é que desce o défice em termos de proposta de lei do Governo.
Olhe que não foi por poupança das despesas, mas por aumento de cobranças. E o aumento de cobranças significa que foram os contribuintes que pagaram mais e não que o Governo poupou. O Governo aumentou, em termos líquidos, as despesas em 42,3 milhões de contos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O aumento de receitas, aquilo que o «povinho» pagou a mais, e que o Governo aqui nos apresentou, foram 50 milhões de contos - por acaso, essa quantia é muito maior, é mais do dobro do valor que o Governo apresentou.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Por conseguinte, sugiro-lhe, Sr. Deputado, que reflicta, um pouco melhor antes de tornar a referir a questão da redução do défice.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em matéria orçamental, a falta de rigor, o malabarismo sem critério, a contabilidade criativa do Governo, à margem de regras mínimas de seriedade em finanças públicas, acabaram por levar o Governo à parede. Virou-se o feitiço contra os aprendizes do feiticeiro.
Hoje, o Governo está aqui a tentar disfarçar a sua capitulação, a sua derrota sem remédio no domínio orçamental: o «Orçamento-maravilha» de há quase um ano entrou em ruptura e «esbarrondou-se» na praça pública.
Com esta proposta de lei o Governo vem à Assembleia da República buscar o perdão da sua arrogância e da sua falta de seriedade orçamental. Não tenhamos dúvidas: ainda que o penitente o queira disfarçar, o que temos diante de nós é uma clara confissão de derrota, à espera de absolvição acrílica.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Muito bem!
O Orador: - Mas não poderá haver absolvição, ou salvação, sem a dignidade do reconhecimento do erro. É essa dignidade perante o País que o Governo não sabe ter, nem quer ter.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Temos de enfrentar a questão, porque razão é que foi necessário esta alteração orçamental?
Por três razões essenciais.
Em primeiro lugar, porque o Governo sabia, de ciência certa, que as famosas operações do tesouro consignadas no artigo 20.º do Orçamento se destinavam exclusivamente a esconder défice e eram, obviamente, inconstitucionais. O Governo não encontrou nenhum jurista reputado que quisesse dar-lhe um parecer favorável nessa matéria.
Aproximando-se a condenação, sem apelo nem agravo, do Tribunal Constitucional, o Governo quis fazer uma jogada de antecipação. Mas saiu-lhe o jogo furado. Repare-se que o Tribunal Constitucional tomou a sua decisão de inconstitucionalidade antes de o Governo ter tempo de levar até ao fim uma tão infantil encenação.
Em segundo lugar, o Governo apresentou um Orçamento, para 1988, que entrou em ruptura, porque o Governo quis esconder défice, subtraindo despesas essenciais e conhecidas como tal, desde a origem, mas não dotadas no Orçamento do Estado para 1988. É o caso do Serviço Nacional de Saúde, que mesmo com uma injecção suplementar de 6 milhões de contos, ainda ficará com défice oculto de mais de 16 milhões de contos.
Em terceiro lugar, o Orçamento do Estado para 1988 entrou em ruptura porque o Governo falhou estrondosamente, em mais de 50%, a sua meta de inflação, o que o obriga a fazer correcções, aliás muito parciais, às despesas com o funcionalismo público.
Inconstitucionalidades gritantes, insustentável défice oculto, falta de rigor e de seriedade na concepção do Orçamento do Estado para 1988, estas são as verdadeiras origens da proposta de alteração que temos perante nós. Sendo essa a génesis da referida alteração
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segue-se a sua inevitável natureza: esta proposta é uma confissão pública de irresponsabilidade e um pedido disfarçado de salvação, o «SOS» de um Governo náufrago e à deriva, totalmente perdido no mar dos seus próprios malabarismos de contabilidade criativa. O feitiço acabou por se voltar contra os aprendizes de feiticeiro!
É o prenúncio de uma viragem política mais geral. Sr. Primeiro-Ministro acabou-se! E o País todo começa a dar-se conta disso. Sr. Primeiro-Ministro, acabou-se!
Numa democracia que se deseja adulta não deverá ser possível enganar sempre toda a gente a todo o tempo. Por isso, hoje, o Governo está aqui impotente para esconder o seu fracasso. Que tenha ao menos a humildade de o assumir. O OE tem de deixar de ser uma cosmética da governamental vaidade do Estado; do governamental: o Estado sou eu!
O Partido Socialista apresentará e votará um conjunto de propostas de alteração e aditamento que visam restituir e devolver a dignidade perdida ao Orçamento, como instrumento credível de uma política de Estado. Destacarei algumas dessas propostas.
Começo logo com o artigo 1.º Não é tolerável que o Governo queira disfarçar as suas culpas, inventando uma alcunha, un petit-nom do Olá, para uma proposta de alteração do Orçamento do Estado. Trata-se de uma proposta de alteração nos termos da lei e não de uma rectificação.
O actual artigo 2.º proposto pelo Governo também não é constitucional, como já o reconheceu o Grupo Parlamentar do PSD.
Quanto ao artigo 6.º, as incertezas não são da CEE. As incertezas são do Governo e as inconstitucionalidades também. O artigo 6.º tem de respeitar a seriedade reposta pelo Tribunal Constitucional, não podendo retomar justificações perfeitamente inconstitucionais. Como se sabe, este artigo visa corrigir o défice oculto em flagrante violação da Constituição. Só aqui estão 26 milhões de contos de défice oculto.
É muito, mas é pouco perante o que ainda lá fica. O que lá fica é muito mais. Porque o défice oculto total do Orçamento do Estado para 1988 - e é hoje fácil prová-lo, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, se me derem a honra de pedir uma prova aritmética do que afirmei, fá-la-ei com gosto - é da ordem da centena de milhões de contos.
Proporemos e votaremos também uma correcção decente, porque é de decência que se trata, dos vencimentos dos funcionários públicos.
Quanto às receitas, o Governo prevê aumentos de receitas de mais de 80 milhões de contos, são bastante mais do que essas, mas o próprio Governo, pelo seu punho, escreve em documento oficial que a previsão é de 80 milhões de contos, mas inscreve apenas 50 milhões. Será para ter a possibilidade de corrigir o desastre da dotação concorrencial? Repare-se ainda que o erro da previsão das receitas é da ordem dos 407o em termos incrementais. Para quem nunca erra, é muito, muito mesmo. Um erro de previsão de 40% aqui, de 50% na inflação, de 50 a 100% em tudo o mais. Para quem nunca erra é muito, muito mesmo!
Mas, pior do que isso, o Governo «esqueceu-se», lamentavelmente, que ao aumentar a previsão de receitas do IVA em 25 milhões de contos, tem também de aumentar a transferência do FEF para as autarquias locais no montante de 6,4 milhões de contos. Isto é assim por lei.
O PS apresenta uma proposta para corrigir esta ilegalidade e não é possível votar a previsão do aumento de receitas, nos termos da lei, sem ao mesmo tempo fazer a correcção do Fundo de Equilíbrio Financeiro para as autarquias.
Finalmente, dado que o Governo só corrige algumas inconstitucionalidades, ficamos à espera do segundo orçamento, ou da segunda alteração orçamental.
Mas temos de formular desde já um apelo, e um apelo sério, como parte de uma instituição que representa aqui um valor essencial da democracia: o valor da seriedade. Que nunca mais o Governo e o PSD tentem fazer aprovar um Orçamento «pintado» como o fizeram para 1988. É que, de facto, um défice oculto da ordem dos 100 milhões de contos compromete a dignidade do Estado, de quem o propõe e de quem o vota.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.
O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Deputado João Cravinho, em primeiro lugar, quero dizer que vou reler a intervenção que V Ex.ª acabou de fazer porque não acredito em coisas que aqui proferiu. E não acredito porque, além de não serem justas, são tremendamente injustas.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não diga!
O Orador: - Mas, mais grave do que isso, faltam à verdade. V. Ex.ª sabe isso, mas não o quer dizer!
O Sr. João Cravinho (PS): - Ainda bem que disse que ia reler a intervenção!
O Orador: - A interpretaçâo que faço da intervenção que o Sr. Deputado produziu é a de que a oposição, cheia de debilidades, de vez em quando, faz aqui uma tentativa de transformação de enormes fraquezas em pequeníssimas forças.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É que, Sr. Deputado João Cravinho, existe uma diferença abismal entre a discussão que hoje estamos a fazer e discussões que, versando sobre a mesma matéria, foram feitas no passado. Ora, nessa altura, o Sr. Deputado estava aqui e sabe que, sistematicamente e em anos sucessivos, o que se fazia no Parlamento eram alterações por motivo de derrapagens orçamentais. V. Ex.ª sabe isso e, portanto, não pode desmentir tal facto.
O Sr. Deputado sabe perfeitamente que em 1986 o défice orçamental foi cumprido, assim como o de 1987, e ficou a saber que em 1988 houve uma redução de défice de 14 milhões de contos. Mas vamos partir do princípio que esta importância nem é significativa! Porém, isso tem um enorme simbolismo - e não há oposição que lho retire que é a inversão de uma tendência terrível: até
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agora, o Estado ou não cobrava aquilo que devia cobrar ou, pior ainda, gastava mais do que aquilo que inicialmente previa.
Das palavras de VV. Ex.ªs não vai haver eco algum, pela simples razão de que a proposta de lei tem números e os números são extremamente claros: trata-se de uma redução do défice em 13,9 milhões de contos! Pergunto, pois, ao Sr. Deputado João Cravinho se tem argumentos contra os números.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Cravinho, há mais oradores inscritos para formular pedidos de esclarecimento. V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, prefiro responder já por consideração para com o Sr. Deputado Vieira de Castro.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Deputado Vieira de Castro, habituei-me sempre, e mantenho as mesmas razões para assim pensar, a ouvir por parte de V. Ex.ª intervenções sempre dignas. Assim, creio que a intervenção que agora produziu resulta do facto de ter sido confrontado com números, ideias que estão longe de ser as que o Sr. Deputado terá que defender aqui e que, inclusivamente, terá considerado.
O Sr. Deputado perguntou se tinha argumentos ou números. Pois bem, Sr. Deputado, devo dizer que neste Orçamento há muitos números, mas não há argumentos; é de uma pobreza franciscana!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Franciscana?
O Orador: - Retiro a expressão «franciscana» e digo que é de uma pobreza «pobreza».
Quanto ao relatório e parecer elaborado pelo PSD e exclusivamente votado por esse partido, a unanimidade é geral; não há argumentos!
Este Orçamento, como é próprio de todos os Orçamentos, tem números, mas tem números contra argumentos; tem números que omitem argumentos; tem números que fogem de argumentos!
É verdade que este Governo tem feito uma gestão que aqui nos apresenta, como sendo a vanglória da redução do défice. Porém, já aqui foi dito que as despesas aumentaram 42,3 milhões de contos, as receitas aumentaram 50 milhões de contos mais o que vem da CEE. Essa é que é a realidade da questão!
Gostava de saber como é que seria se o Governo não tivesse tido o bambúrrio das receitas que não soube prever e se não tivesse tido a arte de fazer aprovar, pelo seu grupo parlamentar, um défice oculto adicional de 80 milhões de contos. E espanta-me que o Sr. Deputado não me tenha perguntado como é que chego a esse número. Não me quer perguntar?
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Matos.
O Sr. António Matos (PSD): - Sr. Deputado João Cravinho, para além do que já disse o meu colega de bancada, gostaria de me situar num ponto concreto daquilo que o Sr. Deputado referiu.
V. Ex.ª disse que entrou em ruptura e que se esbarrondou o Orçamento de há um ano. Ora, se isso é verdade, há quem se esbarronde por gastar mais do que aquilo que poupa! Portanto, aquilo que o Sr. Deputado tentou dizer é que este Governo se esbarrondou por poupar mais do que aquilo que gastou!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - De outra forma, o que o Sr. Deputado pretende dizer é que a contabilidade nacional, de uma empresa, ou de uma família, podem ser vistas desgarradamente apenas por um lado, isto é, pelo lado do crédito ou pelo lado do débito. Ora, eu entendo que devem ser analisadas através do saldo. Aquilo que acontece é que um Orçamento é uma previsão de despesas e de receitas e o que é importante fazer é que as receitas dêem para as despesas e, sobretudo, aquilo que este Governo fez, ou seja, que as receitas sejam mais que as despesas. De outra forma, aquilo que acontece é que desde 1979 até 1985, se formos comparar o défice orçado e o executado, vemos que houve sempre derrapagens orçamentais. Em 1986 e 1987 não houve derrapagens orçamentais e este ano há, inclusivamente, uma melhoria nas contas públicas. Esse é que é o cerne desta discussão, porque o resto são as tais maquilhagens e as operações de cosmética que os Srs. Deputados pretendem fazer.
Na realidade, este ano verifica-se uma melhoria, isto é o saldo é que interessa! E se houve um aumento de receitas e as despesas foram inferiores, o delta, isto é, o acréscimo de uma e de outra salda-se por um valor positivo, coisa que já não acontecia desde 1984. É isto que o povo português tem que saber: durante cerca de 10 anos houve agravamento das despesas em relação às receitas; em 1986 e 1987 executou-se; e este ano conseguiu-se uma melhoria.
Portanto, o que o povo português tem que saber é que isto aconteceu com este Governo. Estes é que são os argumentos. O resto é maquilhagem e cosmética orçamental!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr. Deputado João Cravinho, V. Ex.ª gosta de ser engraçado, mas não tem graça nenhuma, em especial quando fala da falta de seriedade deste Governo. Remeto-o, pois, para a gestão orçamental que colegas do partido de que o Sr. Deputado faz parte fizeram no passado; remeto--o para os défices ocultos que foram criados nas gestões socialistas, com operações de tesouraria sem cobertura orçamental nem comunicação à Assembleia da República.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Uma voz do PS: - Isso foi com o Dr. Alípio Dias, que era do seu partido!...
O Orador: - Remeto-o para a forma encapotada de reduzir os juros da dívida pública através de taxas impostas aos credores - sector empresarial do Estado
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e outros; remeto-o, enfim para o comportamento que o PS teve quando, em Novembro de 1985, o Governo do Prof. Cavaco Silva veio aqui regularizar todas as operações de tesouraria e a oposição, na altura com poder maioritário nesta Câmara, impediu que tal fosse feito, pelo menos em grande parte.
O Sr. Deputado referiu-se às operações de tesouraria que constam do artigo 20.º Essa foi uma forma que o Governo teve de resolver a questão. Qual era a outra solução, Sr. Deputado, sabendo nós como sabemos que os mecanismos da CEE não se compadecem com prazos demasiado extensos para absorver os fundos do seu Orçamento? A isto o PS não respondeu!
Já aqui ouvimos o Governo ser criticado por haver receita a mais, por ter poupanças na despesa, porque previu a mais, porque não previu, enfim, uma grande confusão que só desmerece quem faz as críticas!
As transferências que se incluem nas propostas do PS são claramente inconstitucionais, mas creio que o bom senso e a vontade maioritária desta Câmara irão resolver esta questão já em sede de votação. Na verdade, os Srs. Deputados do PS não se estão a comportar dentro daquilo que o Tribunal Constitucional fixou em jurisprudência em matéria de execução orçamental. Esquecem esses factores! Tenho pena que não saibam ler os documentos! Já sei que não são juristas, já sei que não são contabilistas, mas, ao menos, peço que façam um esforço, no sentido de lerem os documentos oficiais, para lerem, ao menos, o Diário da República.
O Sr. Deputado João Cravinho disse que o Governo esbarrondou com este Orçamento. Registo que o Sr. Deputado considera que a redução do défice do Orçamento do Estado, em sede de execução orçamental, é esbarrondar o Orçamento. Sabemos o que é que o PS costuma fazer em matéria de orçamentos, de derrapagens e buracos orçamentais! Portanto, essa conclusão só fica bem ao Governo!
Aliás, Sr. Deputado João Cravinho, isso é natural, pois um partido que não consegue gerir as finanças próprias, como conseguiria geria as finanças do País.
Aplausos do PSD. Protestos do PS.
O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra ao abrigo da defesa da honra do PS.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Secretário de Estado, é absolutamente intolerável que V. Ex.ª, que concebia como uma pessoa educada, e certamente o será, tenha utilizado o debate sobre o Orçamento Suplementar para fazer uma inqualificável ingerência naquilo que é a vida interna do Partido Socialista e que, em termos de moralidades pública, está vedada a um membro do Governo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Temos, todavia, uma grande qualidade, Sr. Secretário de Estado: no último congresso do Partido Socialista exibimos as nossas contas, as razões do défice e declarámo-lo publicamente!
E dizemos mais, Sr. Secretário de Estado: se V. Ex.ª e o partido de que faz parte quiserem discutir, em termos de Estado, as questões transcendentes do financiamento da actividade política em Portugal, estamos, como sempre estivemos, abertos a isso!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Portanto, não descemos a fazer considerações do pormenor sobre as receitas ou as despesas do PSD. Tal está-nos vedado em termos democráticos! Aceitamos que VV. Ex.ªs são pessoas sérias e, portanto, temos o direito de exigir que nos considerem do mesmo modo.
Estamos, pois, disponíveis que se trave um debate, no sentido de se discutir esta questão do financiamento do Estado e esperamos que o Sr. Primeiro-Ministro, à semelhança do que se fez noutros países da CEE, tenha a coragem de vir, publicamente, discutir esta matéria com todos os partidos representados nesta Câmara.
Não digo mais nada sobre aquilo a que V. Ex.ª desceu neste debate parlamentar.
Aplausos do PS, do PCP, do PRD e do CDS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado do Orçamento deseja dar explicações?
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Não, Sr. Presidente. O que eu disse ficou dito.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Deputado António Matos, registo a sua concepção doméstica das finanças públicas e privadas. Percebi que tinha uma mapa na mão que esclarece o assunto e, certamente, vê-lo-ei em Comissão; portanto, a seu tempo, aprofundaremos esse assunto. Não tenho a mesma visão do Sr. Deputado, mas, assim que entrem na Comissão de Economia, Finanças e Plano todos os elementos, teremos oportunidade de continuar um diálogo, que tem sido sempre cordial e esclarecedor para todos os membros dessa Comissão.
Quanto ao Sr. Secretário de Estado, devo dizer que percebo perfeitamente a razão por que é que o Sr. Deputado Alípio Dias, este ano, não está cá. Não quis vir! V. Ex.ª vem cá sempre atacá-lo, infamá-lo, vem dizer: «vejam como sou brilhante e como aquele senhor que ali está é, de facto, sei lá o quê». É desagradável! São questões internas do PSD, que, enfim, têm aqui uma expressão pública, mas penso que é extremamente deselegante para o seu antecessor, que, aliás, ao passar-lhe a pasta, suponho, que lhe ensinou algumas coisas importantes...
Vozes do PS: - Muito bem!
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Mas faltaram outras!
O Orador: - ... - o Sr. Secretário de Estado foi o primeiro beneficiário disso, tal como o Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Primeiro Ministro.
Vejo deputados, seus colegas, a quem o Sr. Secretário de Estado vem hoje verberar publicamente: «vejam
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lá o que eles fizeram. Votaram umas coisas infames!». Não se faz, Sr. Secretário de Estado! Deixe essa roupa suja para a sua casa, não a traga para a Assembleia e, muito menos, misture no seu «TIDE» e no seu «OMO» o Partido Socialista!!...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Esperava, que um dia, um deputado do PSD levantasse a voz, porque sentia a sua honra e consideração ofendidas, e que o Sr. Deputado Alípio Dias descesse do seu Banco e viesse aqui varrer a testada. Mas não desce! Não descem, sobem!....
Risos do PS.
Quanto à questão colocada, no sentido de saber como é que era possível prever as incertezas de CEE, Sr. Secretário de Estado, temos uma acta desta Assembleia, registada, gravada, autenticada, publicada, em que um Sr. Secretário de Estado do Ministério da Agricultura veio dizer que eram quatorze milhões e não sei quantos escudos - os mesmos que estão aqui - e, depois às quatro horas da manhã, não aguentando mais, confessou (está lá escrito): «Bom, recebi instruções para dizer que são operações de tesouraria. O ano passado não eram, mas este ano são. O que é que hei-de fazer? Está aqui!». Isto está publicado. O Sr. Secretário de Estado, certamente, não leu nem deu as instruções, eu sei! Isso responde à questão que o Sr. Secretário de Estado levantou.
Ainda que não tivesse servido essa confissão, imagine, Sr. Secretário de Estado, tão cheio de razão, tão ciente da sua verdade, que veio o Tribunal Constitucional dizer que são ilegais, são inconstitucionais. Abono na doutrina de que estamos para ver o alcance exacto disto o que não quer dizer que sejamos tão analfabetos que não percebamos o que lá está escrito são normas que foram consideradas inconstitucionais, apesar de o Sr. Secretário de Estado dizer que são excelentes e ter perguntado o que é que o Governo deveria fazer. As incertezas e as inconstitucionalidades são do Governo!
Quanto às ilegalidades ou inconstitucionalidades que o Sr. Secretário de Estado disse que nós propomos, como sabe, a primeira coisa que o orçamento deve respeitar são as obrigações de lei, não é verdade? Ora bem, segundo o artigo 9.º, n.º 1 da Lei n.º 1/87 - Lei das Finanças Locais -, quando altera a previsão de receita do IVA, tem, correspondente e obrigatoriamente, de se alterar o Fundo de Equilíbrio Financeiro. É de lei! Tenho pena, Sr. Secretário de Estado, que a lei exista! Era tão bom que não houvesse leis, não é verdade?!...
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, é altura de fazermos o ponto da situação.
Como ainda faltam três horas de debate, interrompemos a sessão às treze horas e retomamos os trabalhos, se houver acordo, às 14 horas e 30 minutos.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir um esclarecimento à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - O Sr. Presidente disse que faltavam ainda três horas de debate. Pergunto se esse tempo que referiu é na base das quatro horas e trinta minutos previstas.
O Sr. Presidente: - Exacto. Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (PSD): - Recordo à Mesa que essas quatro horas e trinta minutos de destinam à discussão da proposta de lei na generalidade. Como ainda falta a discussão na especialidade, deverão faltar, seguramente, mais do que as três horas que o Sr. Presidente referiu.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho): - Sr. Presidente, peço desculpa mas, de facto, na nossa bancada não conseguimos ouvir a sugestão que V. Ex.ª deu sobre a continuação dos trabalhos. Ouve-se muito mal as palavras da Mesa.
O Sr. Presidente: - Eu repito, Sr. Ministro.
A minha sugestão vai no sentido de interrompermos os trabalhos às 13 horas e continuamos à 14 horas e 30 minutos, visto ter-se admitido, em princípio, que, prolongando um pouco a sessão, o debate terminaria hoje de manhã, o que é impossível.
Quanto à interpelação do Sr. Deputado Lopes Cardoso, a indicação que a Mesa dispõe é a de que o tempo de duração do debate é de quatro horas e trinta e cinco minutos, o que quer dizer que faltam 3 horas e 3 minutos de debate.
Durante o intervalo, a Mesa vai procurar saber o que é que a conferência de líderes decidiu quanto ao debate na especialidade, que, aliás, não foi ainda requerido à Mesa, como é do Regimento.
Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.
O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Proposta de Lei n.º 73/V, apresentada pelo Governo para rectificação da Lei n.º 2/88, de 26 de Janeiro, que aprovou o Orçamento do Estado para 1988, integra a categoria das alterações orçamentais previstas e reguladas no artigo 20.º da Lei n.º 40/83, de 13 de Dezembro, a chamada Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado. Nestes termos, do ponto de vista jurídico, não deveria merecer atenção particular e, por outro lado, não aumentando o défice, pelo contrário diminuindo, tão pouco pareceria justificar qualquer especial regozijo por parte da oposição, pois não lhe dá cabedal de queixa fundamentado para atacar o Governo.
A circunstância, porém de, entretanto, já após a entrada da proposta de lei da Assembleia da República, este órgão de soberania ter sido informado pelo Tribunal Constitucional do decidido em 3 de Novembro de 1988, nos Autos de Fiscalização Abstracta n.º 23/88, da 1." Secção, e relativos ao Orçamento do Estado para 1988, veio colocar alguns problemas jurídicos delicados à proposta de alteração agora em discussão e, certamente, como teremos ocasião de analisar na altura
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oportuna, à própria proposta de lei do Orçamento do Estado para 1989, problemas que não podemos nem devemos ignorar e que requerem a ponderação do Parlamento.
Gostaria de, em relação a alguns desses pontos, dedicar, em seguida, a minha atenção, deixando para outros colegas meus de bancada a análise, do ponto de vista económico-financeiro, da Proposta de Lei n.º 73/V. E quero fazê-lo com o propósito extremamente sereno de vermos o exacto alcance e a posição em que estamos, porque se trata de matérias de grande delicadeza e responsabilidade.
O Tribunal Constitucional limitou-se a comunicar a parte decisória do seu Acórdão sobre o Orçamento de 1988, devidamente registada no seu Livro de Lembranças, mas ainda desacompanhada da respectiva fundamentação. Fê-lo, certamente, por considerar que a importância da matéria aconselhada que a Assembleia tome conhecimento da decisão o mais cedo possível, antes ainda da utilização da sua elaboração e posterior publicação.
Em matéria de tamanha monta e melindre, o Tribunal decidiu usar da faculdade excepcional que lhe dá o artigo 282.º, n.º 4 da Constituição e, por isso, limitou os efeitos da declaração de inconstitucionalidade «por forma a salvaguardar a validade dos actos de natureza financeira ou orçamental praticados até à data da publicação do Acórdão».
Gostaria de recordar que o artigo 282.º, n.º 4 da Constituição - artigo que trata dos efeitos de declaração de inconstitucionalidade ou da ilegalidade - diz que «quando a segurança jurídica, razões de equidade ou interesse público de excepcional relevo, que deverá ser fundamentado, o exigirem, poderá o Tribunal Constitucional fixar os efeitos da inconstitucionalidade ou da ilegalidade com alcance mais restritivo do que o previsto nos n.ºs l e 2». Sabem que esses n.08 l e 2, como é uma declaração de inconstitucionalidade e não uma anulação das normas legais, levam a que se considere a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral, produzindo efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional ou ilegal e determinando a repristinação das normas que ela, eventualmente, haja revogado.
Em face destes dados que são conhecidos podem extrair-se, desde logo, a meu ver, as seguintes ilações: Primeiro, enquanto o Acórdão não for publicado, não existe qualquer dever jurídico especificamente decorrente da natureza jurisdicional da decisão que imponha a observância da doutrina nela expendida.
Segundo, o desconhecimento em que ainda nos encontramos da fundamentação do Acórdão - este ponto é muito importante e, por isso, há pouco me referi à intervenção do Sr. Deputado Octávio Teixeira, eventualmente, em termos infelizes e quero, mais uma vez, reiterar que não fiz insinuação alguma, que aliás, a personalidade do deputado, evidentemente excluiria -, sabido como é que neste tipo de decisões a ratio decidendi é essencial para a compreensão do exacto alcance do decidido, impede-nos de ter uma noção clara de toda a extenção da doutrina fixada pelo Tribunal, bem como dos limites precisos em que as normas objecto de apreciação foram declaradas nulas.
Terceiro, a circunstância de o Acórdão usar da faculdade excepcional de limitar os efeitos da inconstitucionalidade do ponto de vista temporal ao momento em que o Acórdão é publicado levam, por outra parte, a considerar extemporâneo e até violador do decidido por aquele Venerando Tribunal praticar quaisquer actos de execução do Acórdão antes da mencionada publicação, pois que, no fundo, como bem se compreenderá, tal se traduziria, afinal de contas, em realizar uma aplicação retroactiva que contraria precisamente aquilo que é ordenado na decisão.
Isto é, se o Acórdão diz que é só a partir da data da publicação que se deve cumprir aquilo que nele é decidido, fazer antecipadamente, antes dessa data, actos de execução do Acórdão equivale, em última análise, a violar aquilo que é decidido no Acórdão.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por esse motivo, afigura-se-nos carecer de fundamento e construir mesmo, embora por forma certamente não querida, um desrespeito ao Acórdão a proposta de deliberação da Assembleia da República apresentada pelo Partido Socialista em recente conferência de imprensa.
Quarto, poderia assim parecer que o conhecimento que o Parlamento tem da decisão do Tribunal Constitucional não teria quaisquer consequências de ordem jurídica ou prática até que fosse feita a publicação do respectivo Acórdão. Tal não é, porém, a nossa opinião.
Uma coisa, é considerar as normas que foram objectos do Acórdão; outra, é ponderar que efeitos é que a circunstância de conhecermos a doutrina do Tribunal Constitucional, na medida em que a conhecemos, na medida restrita que consta da parte decisória do Acórdão em que podemos interpretar, é útil para a elaboração de novas normas, e é de novas que, neste momento, estamos a tratar.
Por isso, repito, parece-me inoportuno e até desrespeitador do Acórdão estarmos a ponderar se há actos de acomodação ou execução do Acórdão que devam ser praticados antes. Nós não sabemos qual é o alcance, não sabemos, inclusivamente, o momento em que o Acórdão é publicado e, portanto, mesmo quando o Sr. Deputado Octávio Teixeira diz «bem, mas o equilíbrio orçamental vai ter de ser assegurado», não sabemos como é que, efectivamente, na prática, as coisas vão surgir, que acomodações é que o próprio Acórdão fará e quais os actos que vão ser prejudicados com a publicação do Acórdão e que levarão a eventuais alterações do equilíbrio orçamental. Neste momento é ainda prematuro, é um facto futuro e incerto quanto ao momento a publicação do Acórdão, pelo que não podemos, com essa base, estar a orientar os nossos trabalhos.
Mas, repito, outra coisa é o que respeita ao futuro, às normas que vão ser elaboradas agora e elas dizem respeito, quer à proposta de lei agora em discussão, quer, naturalmente, também à proposta de lei do Orçamento do Estado para 1989. É que há razões que assentam nos princípios da boa fé constitucional e até da concordância prática, na interpretação das normas da lei fundamental, que aconselham vivamente, no que respeita à discussão que agora estamos a proceder, a que se tomem em consideração as posições já líquidas que se podem inferir da decisão jurisdicional.
Foi por isso mesmo que o Grupo Parlamentar do PSD, em total cooperação e concordância com o Governo, apresentou algumas propostas de alteração à proposta presentemente em discussão.
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Como sabem, essas propostas dizem respeito a três artigos: o primeiro é justamente para corrigir a indeterminação das verbas e a indeterminação temporal que consta do artigo 2.º da proposta de lei do Governo e que agora, com um melhor conhecimento, já é possível precisar, visto que a proposta de lei foi apresentada em Outubro e estamos a discuti-la no final de Novembro.
Em segundo lugar, quanto à questão - que, de resto, também foi objecto de considerações pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira - do n.º 2 do artigo 6.º em que, como sabem, era referido na proposta de lei «deve ser reajustada, por via orçamental, em mais de 9 milhões e 800 mil contos a contribuição do Estado português para o orçamento comunitário de 1988» e acrescentava-se: «..., na sequência da nova decisão sobre recursos próprios e de acordo intergovernamental, a ratificar pela Assembleia da Republica», não sou dos que pensam que as normas em matéria orçamental sejam imutáveis e que não devemos tomar em consideração os novos factos resultantes da adesão à CEE, que introduzem algumas dificuldades que ainda a Lei de Enquadramento Orçamental e a própria Constituição não tomaram em consideração. É um pouco um fenómeno paralelo àquele que acontece em matéria de distribuição de competências, dentro da estrutura constitucional entre diversos órgãos de soberania que, de algum modo, terá de ser reequacionada e até em alguns pontos corrigir-se as consequências resultantes da adesão à CEE, porque, de contrário, poderia haver alguns efeitos não queridos. Nesta matéria restrita orçamental estamos num tipo de fenómeno do mesmo género.
Por isso mesmo, porque se torna perfeitamente dispensável a espécie de justificação que é dada na parte final do n.º 2 do artigo 6.º, propusemos, pura e simplesmente, a sua supressão, porque nada impede, de acordo com as normas orçamentais em vigor, que se preveja uma verba precisa, embora o seu efectivo gasto possa ser eventual, na medida em que depende de um facto que é futuro e incerto.
Eis como algo que foi apresentado como extremamente grave por parte do Governo se reconduz a uma simples rectificação de carácter técnico sem grandes problemas.
Gostaria, por último, de dizer que me parece importante - talvez neste momento do debate seja útil dizê-lo - sublinhar, uma vez mais, que são problemas de boa fé constitucional, verfassungstreue, como dizem os autores alemães que têm estudado estes problemas, que justificam que tomemos em consideração aquilo que diz, na parte que já conhecemos e em que é aproveitável, na medida em que ainda não temos a fundamentação, o Tribunal Constitucional e não nos perdermos, nesta matéria delicada e difícil a que todos os partidos, à Assembleia da República e ao Governo interessa, em quezílias relativamente marginais.
Por isso é que gostaria que a proposta do PSD fosse claramente interpretada como motivada e justificada por esse propósito de encontrarmos uma solução em relação a questões que têm indiscutível delicadeza e dificuldade e que, pela primeira vez, aqui estamos a ser confrontados com elas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado Rui Machete, não vou repisar aquilo que já referi sobre a questão do n.º 2 do artigo 6.º A situação é clara! O PSD sentiu necessidade de retirar de lá a justificação, não por não gostar da redacção, mas, porque - alguma razão houve - sentiu necessidade de o fazer. E, com certeza que foi uma razão ponderosa, pois não é com frequência que o PSD vem fazer propostas de alteração em relação a diplomas apresentados pelo Governo, por isso deverá ter havido razões ponderosas e nós compreendemos que o sejam.
Com toda a sinceridade lhe digo, ou repito, que, de facto, isto não resolve o problema, independentemente da delicadeza de algumas questões relacionadas com a adesão à CEE que têm de ser ponderadas em termos orçamentais.
Mas isto não pode é justificar que o Governo ainda não tenha apresentado a esta Assembleia o acordo intergovernamental, pois este já foi feito há vários meses. Isto não pode ser esquecido, pois trata-se de uma questão política que tem a ver com a própria relação jurídica no País.
O Sr. Deputado referiu - e não o vou citar, porque não tenho presente quais foram exactamente as suas palavras - que o Tribunal Constitucional entendeu necessário informar antes da publicação do Acórdão. Penso que terá tido razões ponderosas tendo em atenção a natureza dos factos e das normas consideradas inconstitucionais e, portanto, sentiu a necessidade de informar antes da publicação do Acórdão.
Ora, Sr. Deputado, esta é a grande questão que se nos coloca. O Tribunal Constitucional teve razões ponderosas para apresentar esta decisão antes de o Acórdão ser publicado. Essas razões têm muito a ver - e do nosso ponto de vista não podem ser desligadas - com o espírito que conduziu o Tribunal Constitucional a ressalvar os efeitos já produzidos, havendo, portanto, aqui uma conduta de boa-fé do Tribunal Constitucional.
Mas digo-lhe muito frontal e claramente: o problema é que parece não haver - e disso há indícios claros, como já referi - essa boa-fé por parte do Governo. Quero com isto dizer que o Governo pretende, escudado no formalismo jurídico, dizendo que a aplicação do Acórdão é só a partir do dia da sua publicação, não corresponder a essa boa-fé do Tribunal Constitucional e continuar a praticar actos que sabe, desde já, que são inconstitucionais.
Sr. Deputado Rui Machete, posso ate dar-lhe dois exemplo.
Por um lado, as declarações prestadas pelo Sr. Ministro da Educação na Comissão de Educação, Ciência e Cultura no sentido de que, para pagar aos empreiteiros e para dar o dinheiro que falta às universidades, precisa de ir buscar cerca de 5 milhões de contos que lhe foram retirados pela dotação concorrencial e, se calhar, ainda precisa de ir buscar mais algum dinheiro a outros Ministérios.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Cerca de 2 milhões de contos ao FEDER!
O Orador: - Por outro lado, no dia 2 de Novembro em documentos fornecidos pelo Governo aparece a distribuição da dotação concorrencial com a indicação de que «estes valores são susceptíveis de correcção permanente», o que significa que podem continuar a
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ser alterados. É isto que está em causa, porque se o Governo estivesse de boa-fé estes valores não eram «susceptíveis de alteração» uma vez que, de acordo com o decreto de execução orçamental publicado pelo Governo, em Setembro, está feita, em definitivo, a distribuição da dotação concorrencial. É este o problema da boa-fé que existiu da parte do Tribunal Constitucional e que não existe do Governo.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.
O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, julgo que é difícil ter a garantia de qual é a interpretação exacta a dar à intenção da comunicação que o Tribunal Constitucional fez à Assembleia. Se a ideia do Tribunal fosse a de que tudo se deveria passar exactamente a partir do momento do conhecimento da decisão, como se o Acórdão tivesse publicado, então, tínhamos uma certa contradição entre aquilo que é a parte decisória do Acórdão - que já conhecemos
- e aquilo que, afinal de contas, resultaria dessa comunicação imediata, pois era um pouco como substituir-se à comunicação.
Penso que numa matéria como a questão das finanças públicas e do equilíbrio do Orçamento todos os Tribunais Constitucionais - isto é, de resto, uma questão que é discutida na doutrina, como sabe - têm um particular cuidado, porque sabem que uma aplicação demasiado estrita, resultante exclusivamente dos princípios, pode ter consequências, do ponto de vista financeiro, extremamente graves. Há até um celebre artigo de um autor alemão, Wogel, que explica claramente algumas dessas consequências face à jurisprudência alemã. Em Portugal, julgo que foi isso que, provavelmente, levou o legislador constituinte a conceder essa faculdade, que é excepcional, porque é contrária à ideia do princípio da declaração de nulidade.
Portanto, não penso que seja razoável interpretar a comunicação do Tribunal para dizer que tudo se passa como se o Acórdão já estivesse publicado e, inclusivamente, dada a fundamentação, porque em matéria de declaração de inconstitucionalidade o problema da fundamentação da sentença, ao contrário do que acontece nas decisões normais dos restantes tribunais, com excepção das sentenças administrativas do Supremo Tribunal Administrativo, é extremamente importante para percebermos o seu exacto alcance.
Sr. Deputado, pode ter perfeitamente acontecido que o Tribunal Constitucional pode ter dito para consigo que esta matéria das dotações concorrenciais, por hipótese, uma vez que foi a este assunto que V. Ex.ª se referiu, é uma matéria complicada. Inclinando-se provavelmente por maioria, não sei bem, para entender ao contrário do que outros especialistas pensam de que não se trata de uma dotação negativa, mas que viola os princípios orçamentais - interpretação que, por exemplo, V. Ex.ª lhe deu -, o Tribunal quer fixar uma doutrina, sem pretender criar perturbações maiores ao funcionamento da máquina do Estado. Finalmente querendo que, para o futuro isso não aconteça, mas não tendo um meio de o fazer, senão, naturalmente, declarando a inconstitucionalidade da norma, e para evitar esses efeitos danosos, lança mão do n.º 4 do artigo 282.º da Constituição.
Se essa foi a interpretação do Tribunal Constitucional - provavelmente, foi assim que pensou -, então, toda a argumentação que V. Ex.ª expendeu é justamente contrária ao efeito pretendido pelo Tribunal e, provavelmente, o que este pretende é que se fixe a doutrina, mas que não se perturbe a vida pública financeira do País por essa circunstância.
Ora, Sr. Deputado, isto leva-me a pensar que as afirmação que V. Ex.ª fez acerca da gravidade do comportamento do Governo - que até tipificou do ponto de vista penal, esquecendo-se que é preciso que haja um problema de dolo para que o tipo penal seja preenchido (praticamente todos os governos anteriores cometeram o mesmo tipo de infracções a admitir que o sejam) - não preocupou o Tribunal. Foi um outro tipo de preocupação que motivou a sua decisão e, por isso mesmo, é que as considerações que V. Ex.ª fez, salvo o devido respeito, não me parecem ter o fundamento na intenção com que o Tribunal fez a comunicação da sua decisão.
Aplausos do PSD.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - O Sr. Secretário de Estado do Orçamento gostaria de dar um esclarecimento à Câmara sobre uma questão que emergiu desta troca de intervenções entre os Srs. Deputados Rui Machete e Octávio Teixeira. Se os oradores que estão inscritos não levassem a mal, e porque se trata de uma informação brevíssima, o Sr. Secretário de Estado usaria da palavra nesse sentido.
O Sr. Presidente: - Se não houver objecções, dou a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - O esclarecimento que gostaria de dar à Câmara relaciona-se com a parte final do n.º 2 do artigo 6.º da proposta de lei, quando se diz que «o Orçamento é reajustado em mais 9,8 milhões de contos, na sequência da nova decisão sobre recursos próprios e do acordo intergovernamental a ratificar pela Assembleia da República». Ou seja, o Governo visa com esta norma criar a cobertura orçamental suficiente para que a Assembleia da República, em fase posterior, ratifique a proposta de resolução, aprovada no Conselho de Ministros em final de Outubro, e que tem que ver com o acordo intergovernamental entre os representantes dos Estados membros, aprovado a 24 de Julho de 1988, relativo aos adiantamentos, por conta das verbas devidas, após a entrada em vigor da decisão sobre os recursos próprios das Comunidades, cujo texto original em português consta em anexo a essa proposta de resolução.
Quando estive na Comissão tinha conhecimento desta resolução e da sua aprovação, só que em termos formais ela aguarda na Presidência do Conselho de Ministros que a Assembleia da República aprove esta norma da Lei do Orçamento do Estado para dar a respectiva cobertura orçamental. Aliás, tivemos a preocupação, e para que não houvesse dúvidas, de escrever «a ratificação pela Assembleia da República». Portanto, primeiro a Assembleia
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da República aprova esta alteração ao Orçamento e, depois, ratifica, se assim for a sua vontade, a resolução do acordo intergovernamental.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Para além disso estar invertido, a Assembleia é que aprova para ratificação.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por um esclarecimento relacionado com o arsenal de acessórios, barretes e foguetes que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento trouxe hoje à Assembleia da República.
Quero esclarecer que não participei no elogio da performance da política financeira do Governo. Deixo inteiramente esse monopólio ao Sr. Secretário de Estado e ao partido da maioria, partido seu apoiante. Apenas referi o elogio que V. Ex.ª tinha feito - foram os tais foguetes - a essa política.
Na sequência de algumas intervenções que hoje foram feitas, seria bom que o Governo, para além de ter desaconselhado o voto na proposta do PSD para o n.º 2 do artigo 6.º, esclarecesse quais são as razões do mérito da sua política financeira. Isto para um Governo que não tem feito mais do que, ou melhor tem feito bastantes mais coisas, fazer crescer constantemente a despesa e a partir do ano passado ou deste ano não tem feito mais do que fazer crescer a receita fiscal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Entraria agora na discussão da proposta de alteração do Orçamento. Em relação a ele começaremos por colocar uma questão.
A presente iniciativa é o resultado do que se impõe no artigo 20.º da Lei de Enquadramento Orçamental?
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - É!
O Orador: - Se o é, como diz o Sr. Secretário de Estado - é uma confissão útil, porque é a confissão - teremos que lamentar que, usando as palavras, o Governo tenha tentado camuflar uma alteração do Orçamento necessariamente aprovada pela Assembleia, travestindo-a de simples rectificação coisa de somenos, ou seja, considerando-a como simples correcção de um lapso cometido: pequeno lapso de milhões de contos, mas lapso!
Risos do PS.
Mas se não é imposta pelo cumprimento da Lei de Enquadramento do Orçamento porque razão é que o Governo a apresenta? Aliás o próprio Governo tem dúvidas em relação a uma grande extensão dela, foi o Sr. Secretário de Estado que o disse há pouco.
Para fazer propaganda daquilo que considera uma boa performance da sua política financeira, ou seja, da redução do défice de que os Srs. Deputados do PSD se têm hoje gabado tão insistentemente?
Ou para evidenciar um dos aspectos em que falhou a sua política económica? Em suma: canto de vitória ou gesto de mea culpa? Cristão, aliás, que nos agrada!
Conhecendo como conhecemos o estilo do Sr. Ministro das "Finanças, que infelizmente não está agora presente, inclinamo-nos mais para a primeira hipótese, ou seja, para considerar que o célebre Orçamento rectificativo é, na intenção do Governo, um misto de canto de vitória e de preparação de um patamar mais adequado para lançamento do Orçamento de 1989. Qual patamar? Perguntarão, porventura, os deputados mais desprevenidos - porventura todos os da bancada do PSD.
Ao que responderei tratar-se do patamar das receitas, capaz de disfarçar, ao menos em parte, o extraordinário e brutal crescimento da função fiscal sobre os cidadãos portugueses metodicamente organizada nos últimos tempos pelo Governo.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Muito bem!
O Orador: - Preparação que começou com os agravamentos deste ano, disfarçados no Orçamento aqui proposto em Novembro e que agora, depois de sofridos pelo contribuinte, são revelados de modo a não resultar tão grande o crescimento imposto pelo único imposto que aí vem, mas ainda sem toda a verdade, para não assustar demasiado os portugueses.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - É isso mesmo!
O Orador: - Em nosso entender, porém a iniciativa rectificadora não pode deixar de ser considerada como uma confissão de fracasso, muito embora concebida como canto de vitória e manobra táctica.
Sobre isso me deterei antes de terminar, regressando agora à questão da necessidade da iniciativa para dizer que há, pelo menos, um aspecto desta proposta em que a mesma se justifica sem dúvidas para ninguém.
É a que corresponde ao artigo 6.º que, no fundo, representa o acatamento parcial da decisão do Tribunal Constitucional respeitante ao artigo 20.º da Lei n.º 2/88, de Janeiro passado.
Mas sendo assim, e agora dirijo-me principalmente ao Sr. Deputado Rui Machete, resulta absurdo que o Governo apoiado pela maioria, force o Parlamento a votar um orçamento que enquanto documento de alteração, pode ser objecto de dúvidas levantadas aqui pelo Sr. Secretário de Estado e teima em não aproveitar a oportunidade para alterar aquilo que hoje todos sabemos que deve ser alterado.
Pior do que absurda, a iniciativa do Governo, que insiste em manter o acatamento apenas parcial de uma decisão que já conhece, arrisca-se a aparecer como acto de desrespeito pelo órgão competente para apreciar a inconstitucionalidade.
O Governo, apoiado pela maioria, como que faz uma escolha no conjunto de decisões que integram as conclusões do Acórdão, sobrepondo-se ao tribunal que o proferiu.
É isso que entendemos ser mais negativo nesta iniciativa, atentas as circunstâncias em que acabou por ser apreciada e votada pela Assembleia.
E por muito que o Sr. Deputado Rui Machete e outros insistam no contrário, continuo a entender que a questão do respeito pela decisão do tribunal, nesta sede de alteração da lei orçamental, nada tem a ver com
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a parte do Acórdão em que é salvaguardada a validade dos actos de natureza financeira e orçamental praticados até à data da sua publicação.
Não podia, de resto, ser de outro modo, sob pena de a decisão introduzir o verdadeiro caos na vida financeira do País. Fez, por isso, muito bem o Tribunal ao utilizar a possibilidade prevista no n.º 4 do artigo 282.º da Constituição, restringindo a eficácia da sua decisão. Fez muito bem e estamos todos de acordo!
Mas a questão não é porém essa, mas outra muito diferente, e consiste em saber se a Assembleia deve discutir e votar uma alteração ao Orçamento sabendo que alguns dos seus dispositivos foram considerados inconstitucionais pelo órgão competente, sem ter esse facto minimamente em consideração. Isto é, claro, sem pôr em causa o dispositivo de salvaguarda incluído no Acórdão.
Como ajuizará o País toda esta situação e que ideia ficará a fazer - ou confirmará - sobre o relacionamento entre os vários órgãos de soberania e sobre o respeito com que são encaradas pelo Governo e pela Assembleia as decisões dos tribunais.
Não será, concerteza, um juízo favorável, e é a todos os títulos lamentável que se não aproveite a ocasião para apagar a impressão negativa que, apesar de tudo, ficou do modo como foram recebidas e comentadas as decisões de inconstitucionalidade do Verão passado.
Por isso, tenho de confessar que começo a estar um pouco farto de defender a Assembleia - porque o faço - de acusações motivadas por actos cuja responsabilidade não nos pertence.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas voltemos ao problema da caracterização da proposta: canto de vitoria rectificativo ou alteração imposta pela falha das previsões. Como já disse, penso que não poderá deixar de ser também uma confissão de fracasso.
Com efeito, e se o analisarmos bem, o documento que nos é proposto é sobretudo uma consequência da derrapagem na meta a atingir este ano para a inflação.
O Sr. Gameiro dos Santos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - É essa a razão de ser do artigo 2.º sobre a compensação pela tributação dos cargos públicos; do artigo 3.º sobre as dotações para esta Assembleia; do artigo 4.º sobre o ajustamento extraordinário nos vencimentos dos militares e forças de segurança; do artigo 7.º com reforços destinados a permitir a actualização correcta das remunerações dos funcionários e o funcionamento do Serviço Nacional de Saúde. É esta, no fundo, a razão para o generalizado aumento da despesa que se verifica e nos é confirmado por esta alteração.
E é também essa a razão que explica o esforço das previsões respeitantes às colectas da contribuição industrial e dos impostos profissionais e sobre o valor acrescentado, este último avaliado, aliás, com demasiada modéstia. É o tal disfarce, isto é, a tal tentativa de não assustar demasiado o contribuinte que paga.
Pena é que se não tenham previsto outros reforços, como é o caso do FEF cuja dotação sofreu, com a excessiva modéstia, da previsão respeitante ao IVA e como é, principalmente, o caso de remuneração extraordinária que não chega para cobrir o diferencial da inflação.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E pena é, também, que não se aproveitando para corrigir as inconstitucionalidades, se tenham cometido outras na própria alteração, como é o caso do artigo 2.º com uma dotação de montante indefinido e do n.º 2 do artigo 6.º em que se invoca um acordo internacional ainda não regularizado.
Trata-se, de qualquer modo e sem dúvida, de uma confissão de alguns falhanços! Assim o registamos e votaremos em conformidade. Ou melhor, trata-se do retrato da actuação deste Governo: mais despesa e, portanto, mais Estado e mais receita, ou seja, mais impostos a pagar pelos cidadãos.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.
O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Por não ter percebido bem o sentido em que o Sr. Deputado Nogueira de Brito, na sua argumentação sobre o tema da inconstitucionalidade, verbera o Governo, gostava que me esclarecesse sobre algumas dúvidas.
Em primeiro lugar, e unanimemente, toda a doutrina, por razões óbvias, concorda que não é possível conhecer o exacto alcance das declarações de nulidade feitas por um Tribunal Constitucional, sem que, do mesmo passo, se tenha conhecimento da sua fundamentação. É uma questão pacífica. Ora, neste caso, nós ainda não a conhecemos.
Em segundo lugar, mesmo admitindo a interpretação que V. Ex.ª parece dar, da qual até podemos vir a comungar, de que a limitação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade diz apenas respeito aos problemas dos actos praticados ao abrigo das normas, e só a esses, pareceu-me, que V. Ex.ª pretende inferir daí a necessidade que o Governo tem - e a Assembleia, necessariamente, lhe dará sequência - de vir, após o Acórdão do Tribunal Constitucional e através de um acto novo, dizer que normas tais e tais desaparecem o ordenamento jurídico.
Ora, isso não é verdade. Essas normas desaparecem pela simples circunstância do Acórdão, pelo que nem o Governo nem a Assembleia devem vir tocar nessa matéria e substituir-se. Só e exclusivamente podem fazê-lo naquilo que diga respeito a actos de acomodação. E, quanto a estes, insisto, não conhecendo ainda os fundamentos, que não são propriamente oditerdicta, mas sim a ratio decidendi, nós não podemos fazê-lo.
Terá V. Ex.ª razão se me disser o seguinte: «Ah! Mas nestas novas normas que aqui estão postos existem normas inconstitucionais.» Nesse caso, e é por isso que apresentámos as correcções que nos pareceram convenientes, acho que V. Ex.ª tem razão.
Quanto àquelas normas que o Tribunal declare inconstitucionais, mas que o Governo agora não as retome, não é necessário fazer mais nada pois essas são claramente reconhecidas, sem necessidade de operar algum acto constitutivo, como não tendo, desde sempre, existência no ordenamento jurídico, pela simples força obrigatória geral da decisão do Tribunal.
Portanto, não percebo, com toda a sinceridade, a argumentação que V. Ex.ª expendeu.
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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, visto que há mais um pedido de esclarecimento, deseja responder já ou no fim?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - No fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Gilberto Madaíl.
O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - Sr. Presidente, só para referir que, das declarações do Sr. Deputado Nogueira de Brito, resulta, ao fim e ao cabo, como em todos os debates que aqui têm sido feitos, a mesma coisa: procurar desviar a atenção do que é essencial para outros problemas, que, apesar da sua respeitabilidade, como é o caso da inconstitucionalidade, não invalidam o que temos vindo a dizer.
O Sr. Deputado questiona sobre a razão pela qual o Governo apresenta esta proposta. Obviamente, Sr. Deputado, que se houve um aumento de despesas, algumas delas não controláveis, na área da despesa, e se houve, também, um aumento de receitas, estas sim, devido ao bom funcionamento da economia, parece que esta alteração orçamental está mais que justificada.
Portanto, Sr. Deputado, trazer para aqui apenas a história da inconstitucionalidade - respeitável, como já disse -, aproveitando para, mais uma vez, se mexer e se criticar a reforma fiscal, numa espécie de barragem, para tapar os olhos à opinião pública e ao país, penso que não é uma forma construtiva de oposição e, neste sentido, desejava dizer ao Sr. Deputado que já não há dúvidas nenhumas, quer no País, quer internacionalmente, sobre a boa gestão que o Governo tem feito da coisa pública. E o mesmo sucede quanto à área financeira.
O Sr. Deputado não subscreveu os elogios à política financeira do Governo. Mas, Sr. Deputado, não gostaria de o ter feito?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ainda bem que V. Ex.ª, Sr. Deputado Rui Machete, só salientou a falta de fundamentação. É que tem-se salientado tanto os votos de vencido que, realmente, chego-me a convencer que se vai dar cumprimento ao Acórdão pelos «votos de vencido» e não pelos «votos que fizeram vencimento». V. Ex.ª parece que, agora, colocou bem a questão, pois não está à espera dos «votos de vencido».
Mas, Sr. Deputado Rui Machete, concordo que é importante conhecer a fundamentação e nisso estamos de acordo. Simplesmente, conhecemos as conclusões e devemo-nos interrogar se realmente essa norma de salvaguarda está incluída nas conclusões, como está, por que é que o Presidente do Tribunal terá sentido necessidade de fazer conhecer rapidamente as conclusões ao Sr. Presidente da Assembleia da República, e suponho que também, aos Srs. Primeiro-Ministro e Ministro das Finanças? Porquê? Esta é a questão. E V. Ex.ª diz-me, agora: não conhecemos a fundamentação. Mas, Sr. Deputado, a fundamentação está escrita e, porventura, nem sequer está manuscrita como sucede com as conclusões, que são apuradas na sessão, enquanto que a fundamentação foi proposta à sessão e ali discutida.
Ora, se o Sr. Presidente do Tribunal nos deu a conhecer as conclusões, por que não lhe pedimos a fundamentação? Porque não adiamos dois dias esta discussão? Dirá V. Ex.ª que isso é completamente inútil, porque muito embora concordando com a tese que eu defendi, de que a salvaguarda respeita apenas aos actos de execução das normas declaradas inconstitucionais - eu estou inteiramente de acordo com as salvaguardas e até me espanto que V. Ex.ª tenha salientado como argumento a salvaguarda, porque este Acórdão tinha, obviamente, que conter uma salvaguarda, senão era um desastre completo -, o cumprimento do Acórdão pode não se bastar com o desaparecimento, puro e simples, das normas, mas pode comportar a sua correcção.
Pode comportar algo de muito semelhante ao que acontece com o artigo 6.º da proposta de lei do Governo, pode, inclusivamente, comportar algo que tenha a ver com a manuseamento do próprio défice e da receita que existe neste momento e que até já sabemos que existe.
Portanto, Sr. Deputado, tudo isto pode ser feito à semelhança do que se passou com as propostas rectificativas que o Governo fez, quando recebeu declarações prévias de inconstitucionalidades do Tribunal Constitucional, no verão passado.
Há alterações rectificativas que podem resolver o problema da inconstitucionalidade e, desse modo, poderia haver muita coisa a fazer neste domínio.
É, pois, lamentável que tendo nós conhecimento do vício de inconstitucionalidade, que já está declarado, não aproveitemos a oportunidade para tratar dele, quando estamos a alterar o Orçamento em relação ao qual foram declaradas as inconstitucionalidades.
A questão para mim, Sr. Deputado Rui Machete, é de relacionamento entre órgãos de soberania.
O Sr. Rui Machete (PSD): - Permite-me que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado Rui Machete.
O Sr. Rui Machete (PSD): - O que V. Ex.ª propõe é que aceleremos a publicação do Acórdão do Tribunal Constitucional para depois agirmos, mesmo que isso signifique, por hipótese, perturbação profundíssima do Orçamento de 1988.
O Orador: - Sr. Deputado Rui Machete, suponho que poderia não significar isso. Ainda ontem, na Comissão, admitimos acabar esta discussão só na próxima quarta-feira. E admitimo-lo todos! Mas suponho que se realmente tivéssemos diligenciado pela obtenção da fundamentação, podíamos todos ter adiantado um pouco e dávamos ao país a imagem de que, efectivamente, havia plena consciência de funções e perfeito relacionamento entre os vários órgãos de soberania.
Sr. Deputado Gilberto Madaíl, certamente que V. Ex.ª não queria falar das receitas, porque receita a mais não precisa de alteração do orçamento. V. Ex.ª queria era falar das despesas e, aí, tem razão.
No entanto, não quero deixar de dizer-lhe que o Sr. Secretário de Estado, em relação a alguns aspectos incluídos na alteração, por exemplo, considera que eles eram susceptíveis de não estar sujeitos à necessidade de
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aprovação pela Assembleia, porque tinham, porventura, compensação em acréscimo de receita, daquela que está prevista no n.º 4 do artigo 20.º da lei de enquadramento orçamental.
Portanto, Sr. Deputado, é evidente que não é essa a minha posição - é até a posição do Governo -, pois nem para tudo o que aqui está seria necessário vir à Assembleia, porque o Governo podia bastar-se a si próprio. Ora é em relação a isso que me questiono. Agora, Sr. Deputado, é indiscutível que esta proposta de alteração pressupõe a alteração da inflação e não outra coisa. Com efeito, é a inflação que produz a receita e que provoca alguns acréscimos de despesa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um requerimento solicitando a avocação pelo Plenário da votação na especialidade da Proposta de Lei n.º 73/V.
Vamos, de imediato, submetê-lo a votação.
O Sr. Deputado Lopes Cardoso, tem a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, entendo que o mínimo de regras não faz mal a ninguém. É que não podemos estar a votar a avocação ao Plenário da discussão na especialidade, sem sabermos se a proposta de lei vai ser aprovada na generalidade. Pode suceder um rebate de consciência da bancada do PSD. Essa avocação só tem sentido depois da aprovação na generalidade.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado teria razão se este requerimento não fosse aprovado, pois poderíamos acabar a discussão na generalidade ainda esta manhã; se ele for aprovado, naturalmente, vamos interromper os nossos trabalhos e vamos continuar de tarde.
Esta é a razão por que a Mesa quer proceder já à votação. Todavia, se não houver acordo, a Mesa não a porá o requerimento a votação. Contudo, a intenção era esta.
O Sr. Deputado Luis Filipe Meneses pede a palavra para que efeito?
O Sr. Luis Filipe Meneses (CDS): - Sr. Presidente, embora discordando da argumentação do Sr. Deputado Lopes Cardoso, o Grupo Parlamentar do PSD não vê inconveniente em reter esse requerimento até à votação na generalidade.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, continuaremos os nosso trabalhos às 14 horas e 30 minutos, hora que se propõe para recomeço dos trabalhos, atendendo a que hoje é sexta-feira. Se houver acordo, assim se fará.
Não havendo objecções, está suspensa a sessão.
Eram 13 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.
O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Presidente, apenas para um pequeno esclarecimento: é que estava inicialmente prevista a participação do Sr. Deputado Silva Lopes, do nosso grupo parlamentar, na discussão desta matéria. Infelizmente, um facto imprevisto impediu o Sr. Deputado Silva Lopes de hoje poder estar presente nesta Câmara para a discussão da Proposta de Lei n.º 73/V. É um facto que todos teremos que lamentar, dado a que a alta qualidade técnica que todos reconhecemos ao Sr. Deputado Silva Lopes muito abonaria para um melhor esclarecimento do objecto do documento em apreciação.
No entanto, o Sr. Deputado Silva Lopes não quis deixar de dar a sua colaboração na discussão desta matéria e, na minha qualidade de membro do Grupo Parlamentar do PRD, pediu-me que lesse um texto por ele escrito, o que passo a fazer.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A discussão da Proposta de Lei n.º 73/V é, do ponto de vista do PRD, prematura e poderia ser evitada. Sabemos que já todos que o Orçamento que o Governo e a maioria do PSD fizeram aprovar nesta Assembleia, em Dezembro do ano passado, contém várias inconstitucionalidades.» Não conhecemos ainda as fundamentações do Acórdão do Supremo Tribunal Constitucional, mas não custa prever que a Assembleia da República terá de votar correcções à lei orçamental para 1988 a fim de a tornar conforme com os preceitos da Constituição.
A introdução dessas correcções representará aquilo a que até aqui tem sido chamado de aprovação de um Orçamento suplementar. Assim tudo indica que vamos ter de discutir e votar dois Orçamentos suplementares para 1988, quando teria bastado um, se o Governo tivesse adiado esta discussão para daqui a umas duas ou três semanas após o Acórdão do Supremo Tribunal Constitucional ter sido publicado no Diário da República. O Governo tinha garantido formalmente que este ano não havia nenhum Orçamento suplementar. Afinal, pelos vistos pretende dois.
Todavia, o Governo procura sempre evitar que a opinião pública se aperceba dos seus fracassos. Por isso, recorre à técnica da mistificação, designando as alterações que agora estamos a discutir como «Orçamento rectificativo» em vez de «Orçamento suplementar», embora consagrada pelo uso, não está especificada na lei.
Mas o neologismo «Orçamento rectificativo» também não tem existência legal e, além disso, nem sequer está consagrado pelo uso. Devemos todos interrogar-nos: porque é que o Governo do Partido Social-Democrata designou como «Orçamento suplementar» as alterações que, em 1985, propôs ao Orçamento desse ano e propõe agora uma denominação diferente para alterações que são exactamente do mesmo tipo? Será que bastará mudar o nome às coisas para que o Governo fique liberto da acusação de não ter cumprido a sua promessa formal de não apresentar um Orçamento suplementar para 1988?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Como atrás disse, o lógico seria que discutíssemos as alterações orçamentais que temos perante nós conjuntamente com as alterações que serão necessárias para corrigir os vícios de inconstitucionalidade do Orçamento vigente. O Governo recusou essa via, provavelmente por razões de propaganda, a fim de ir disfarçando a gravidade da situação que provocou ao executar, durante praticamente todo o ano corrente, um Orçamento inconstitucional e ao fazer que
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a sua maioria aprovasse nesta Assembleia inconstitucionalidades de tão profundas consequências. Mas o que mais nos preocupa não é a propaganda. O que mais nos preocupa é que, neste momento, o Governo esteja provavelmente a cometer, ainda, inconstitucionalidades com base no argumento de que o Acórdão do Supremo Tribunal Constitucional não está ainda publicado no Diário da República.
Do ponto de vista legal, a posição do Governo não pode ser atacável mas, do ponto de vista ético, pode ser profundamente criticável. Segundo tudo indica, o Governo está a aproveitar-se, abusivamente, da decisão do Tribunal Constitucional de não atribuir efeitos retroactivos ao seu acórdão. Gostaríamos de estar enganados. Mas se assim não for, como é de recear, e uma vez que já sabemos ter o Tribunal Constitucional declarado a inconstitucionalidade do preceito da lei orçamental de 1988 relativo a empréstimos para operações de Tesouraria, será aceitável que se façam novas operações de Tesouraria, enquanto aquele preceito não for corrigido? Poderá o Governo garantir-nos que suspendeu todas as operações deste tipo depois de as conclusões do Supremo Tribunal Constitucional terem chegado ao conhecimento desta Assembleia e do público? Poderá o Governo garantir-nos que suspendeu também todas as demais operações orçamentais reguladas também todas as demais operações orçamentais reguladas pelos artigos da lei orçamental em relação aos quais surgiram problemas de inconstitucionalidade? Esperamos que essas garantias nos sejam dadas. Se o não forem, teremos de concluir que o Governo tem estado a aproveitar-se de sofismas legais para manter uma actuação contrária às mais elementares regras de dignidade e lisura que devem ser observadas por um órgão de soberania.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.
O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Deputado Rui Silva, estou francamente embaraçado porque V. Ex.ª anunciou que iria ler uma intervenção redigida pelo Sr. Deputado Silva Lopes que não pode estar presente neste debate. Ainda assim, atrevo-me a dizer algumas palavras sobre a intervenção que o Sr. Deputado acabou de ler. Naturalmente que aquilo que eu teria para dizer seria diferente se estivesse presente o autor do discurso.
Trata-se de aspectos muito simples. Logo no início da intervenção, ouvimos dizer que o Governo terá que apresentar um outro Orçamento do Estado suplementar. Isso faz pressupor que o Sr. Deputado Silva Lopes conhecerá não apenas as conclusões como também a fundamentação e o teor dos votos dos Srs. Juízes do Tribunal Constitucional. Dado que o Sr. Deputado Silva Lopes apenas conhece, seguramente, a conclusão do Acórdão do Tribunal Constitucional, é desprovida de qualquer fundamento a afirmação de que o Governo virá apresentar à Assembleia um Orçamento suplementar: após a publicação do referido Acórdão ver-se-á, até lá não se pode afirmar nada sobre essa matéria.
Em segundo lugar, na sua intervenção, o Sr. Deputado Silva Lopes parece insurgir-se contra o facto de o Governo ter denominado esta proposta de lei de «rectificação ao Orçamento do Estado para 1988».
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Que não existe!
O Orador: - No entanto, logo a seguir, o Sr. Deputado utiliza a figura do Orçamento do Estado suplementar, a qual também não existe. Neste caso, é o PSD que se insurge em relação ao Sr. Deputado Silva Lopes.
Esta questão não merece o tempo que com ela, estamos a gastar porque, em sede da Comissão de Economia, Finanças e Plano, já foi decidido que doravante se utilizará a figura das alterações às Leis do Orçamento do Estado, consagrada pela lei do enquadramento orçamental.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - O Sr. Deputado Rui Silva, teve a sinceridade de dizer que tinha procedido à leitura de um texto elaborado pelo Sr. Deputado Silva Lopes. No entanto, a questão que lhe vou colocar é de senso comum.
Como base na sabedoria do Tribunal Constitucional segundo a qual as declarações de qualquer inconstitucionalidade só produzem efeitos práticos a partir da respectiva publicação, o Sr. Deputado criou a suspeição de que o Governo estava a fazer umas operações inconstitucionais. Não vou discutir práticas nem normas das finanças públicas porque, como recordo, o Sr. Deputado Rui Silva afirmou que a intervenção não tinha sido redigida por si próprio, no entanto, abordarei somente as questões no plano do senso comum.
O Sr. Deputado falou das operações de Tesouraria, mas não é isso que está em causa em matéria das operações activas do Tesouro. O que está em causa é que o Governo utilizou um instrumento legal que já tinha sido criado por um Governo de maioria socialista e que tinha a ver com a realização de operações activas para apoiar determinadas situações, estando em causa, muitas vezes, o bom nome e a soberania da República.
Imagine, Sr. Deputado, que há uma empresa pública que tem que honrar um compromisso externo em que o Estado é avalista. Poucos dias antes de ter que honrar esse compromisso externo - de dois, três ou quatro milhões de contos -, cuja falta provocará a resolução de toda a dívida, a qual pode ser de 200 ou 300 milhões de contos, essa empresa pública não consegue honrar o compromisso. Então, o Estado intervém através de uma operação activa, injectando capacidade de capital na empresa para que ela honre o seu compromisso. Ora, se não pode haver operações activas, se muito menos, não se podem utilizar operações de tesouraria, como é que o Sr. Deputado resolveria esta situação de soberania, de interesse da República e da boa imagem das empresas do Estado perante o exterior?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.
O Sr. Rui Silva (PRD): - Gostaria de começar por referir que, ao longo dos três anos em que tenho estado nesta bancada, assisti a várias intervenções do Sr. Deputado Silva Lopes. Por acaso, só hoje verifiquei que, quer os Srs. Deputados, quer o Governo, com todo o cuidado, só hoje resolveram formular pedidos de esclarecimento.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares:(António Capucho): - Isso é falso!
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O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Consulte o Diário da Assembleia da República!
O Orador: - Até parece que nas questões postas pelos Srs. Deputados está latente o receio de ouvir as explicações do Sr. Deputado Silva Lopes. Claro que tanto os Srs. Deputados como o Governo podem dizer que não é assim, mas sou obrigado a dizer que é, e estou convencido de que muitos estarão de acordo comigo.
Protestos do PSD.
Sr. Deputado Vieira de Castro, é do domínio público e desta Assembleia que foram consideradas várias inconstitucionalidades no que se refere ao Orçamento do Estado para 1988. Também é bem certo que o acórdão ainda não está publicado - daí a razão da nossa questão -, mas tudo leva a crer que as razões dessas inconstitucionalidades virão a ser publicadas, esperando-se que cheguem ao conhecimento público no prazo de uma a duas semanas. É bem certo que estamos à beira da discussão do Orçamento para 1989 e as razões estão implícitas. No entanto, somos de opinião que se trata de uma antecipação que traz alguma tese falaciosa quando hoje se discute uma alteração a um Orçamento que tem por base várias inconstitucionalidades, não escritas mas declaradas. É esta a nossa posição, assim como a que também tem sido defendida por outros partidos com assento na Assembleia, nomeadamente a nível da Comissão Parlamentar de Economia, Finanças e Plano.
Quanto à pergunta que o Sr. Secretário de Estado colocou, responder-lhe-ei que, logicamente, não somos de opinião que se deva considerar que, por interesse nacional, nada deve ser feito podendo ser lesadas empresas públicas. No entanto, não tem sido prática deste Governo, por várias vezes, tornar essa situação activa e dinâmica no dia a dia. A questão que colocamos é, pois, a de saber se essas operações de tesouraria deverão ou não ser consideradas neste caso concreto. Foi esta a questão colocada pelo Sr. Deputado Silva Lopes, foi a situação que coloquei perante a Câmara e que o Sr. Secretário de Estado poderá colocar, se assim o desejar, numa próxima intervenção, nomeadamente a nível da própria discussão do Orçamento do Estado em que o Sr. Deputado Silva Lopes poderá estar presente.
Verá que as razões serão as mesmas e que estamos convictos daquilo que estamos a dizer.
Aplausos do deputado Caio Rogue (PS).
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Esta proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 1988 que o Governo nos apresentou é, no entender do PS, dos maiores erros políticos cometidos pelo Prof. Cavaco Silva.
Risos do PSD.
A displicência com que foi preparada e apelidada de rectificativa, pelo Governo, demonstram à evidência a já mais do que reconhecida falta de consideração que
o Governo tem pela Assembleia da República em geral, e pelo grupo parlamentar que o apoia, em especial.
É que o que Governo fez não se faz, Sr. Presidente e Srs. Deputados: esta proposta de alteração orçamental está de tal modo mal elaborada e nela o Governo cria situações de tal maneira absurdas que chega a ser difícil de acreditar que seja verdade. E no entanto são verdades factuais às quais o Governo não foi, até agora, capaz de responder. Isto para não falar das novas inconstitucionalidades de que vem imbuído - parece que o Governo não sabe fazer Orçamentos que não sejam inconstitucionais - e que o próprio PSD já teve de corrigir.
Vou evidenciar apenas dois dos aspectos mais importantes.
O primeiro refere-se à correcção dos vencimentos da Função Pública, consequência do falhanço desastroso da previsão da taxa de inflação para 1988.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Tendo o Governo assinado no Acordo de rendimentos e preços para 1988, uma cláusula de salvaguarda em que se comprometia a compensar os funcionários públicos de eventuais desvios na taxa de inflação, incluiu nesta revisão orçamental, de forma completamente disfarçada, num artigo em que a epígrafe é (note-se bem!) «Serviço Nacional de Saúde e despesas excepcionais», uma verdade de oito milhões de contos destinada a reforçar a dotação provisional do Ministério das Finanças.
Assim, bem escondida, como que envergonhada, lá aparecia a anunciada correcção aos vencimentos dos funcionários públicos, noticiada pela comunicação social, já que o preâmbulo desta proposta de lei, à semelhança do que tem vindo a acontecer com outras, deve ter sido elaborado por uma empresa de marketing, pois repete slogans publicitários e nada explica sobre o conteúdo da proposta.
Foi na Comissão Parlamentar da Economia, Finanças e Plano que o Governo esclareceu a situação que é, reparem bem, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a seguinte: a correcção será apenas de 1,5%, quando já há a certeza que a diferença entre o aumento da Função Pública e a taxa de inflação em 1988 é de pelo menos 3% e só será paga em numerário até ao valor de doze contos. Acima desta verba será paga em certificados de aforro não transmissionáveis durante seis meses.
O Governo considera este valor suficiente, porque entretanto aprovou a redução de uma hora semanal no horário de trabalho dos funcionários.
Quer isto tudo dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o Governo se preparava para dizer o seguinte aos funcionários públicos: peguem lá dez contos, trabalhem menos doze minutos por dia e não me venham dizer que não vos repus o poder de compra que perderam durante o ano!
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Esta proposta é verdadeiramente indigna. Então é com uma dezena ou menos de contos num ano e uns minutos a menos de trabalho por dia que os funcionários vêem reposto o seu poder de compra?!
E para aqueles em que o aumento seja superior a doze contos, gente rica está bem de ver, já que ganham
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60 contos brutos por mês? Estes vão receber certificados de aforro porque certamente não precisam do dinheiro, ficando-lhes a possibilidade de oferecer à família como prenda de Natal.
Uma voz do PSD: - Isso! Isso!
A Oradora: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Esta situação só não é completamente risível, porque é profundamente triste e em muitos casos dramática. Ela envolve situações familiares, pessoais e profissionais que têm de exigir de todos nós, Governo e Assembleia da República, muito mais respeito e consideração.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - É uma proposta indigna que todos nós deputados temos o dever de corrigir, como sinceramente espero que o façamos.
E o que se passa com os funcionários das Regiões Autónomas? Não terão também eles direito a ver corrigido o seu vencimento?
Certamente o terão, mas à custa dos orçamentos das respectivas Regiões. E portanto, em consequência do erro do Governo do Prof. Cavaco Silva, lá teremos o Dr. Alberto João Jardim e o Dr. Mota Amaral a inventar receitas - vindas e sabe-se lá donde, depois do esforço eleitoral - para poderem comprar certificados de aforro e assim pagarem aos seus funcionários.
Uma voz do PS : - Eles vêm cá!
A Oradora: - Mas também nestes casos haverá que proceder a revisões dos respectivos orçamentos, já que esta medida não podia ter sido prevista no início do ano.
Imagine-se o embaraço político destes governos ao constatarem que assim que virem aprovados os respectivos Programas do Governo, terão de ir pedir autorização às respectivas Assembleias Regionais para mais um Orçamento suplementar, figura regimental que ainda existe nas Regiões Autónomas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo Srs. Deputados: Este erro do Governo não tem, porém, só estas consequências: é que funcionários públicos, não são só os da Administração Central e Regional, são também os da Administração Local de quem o Governo pura e simplesmente se esqueceu.
Parece inacreditável, mas pelo menos os deputados que pertencem à Comissão Parlamentar da Economia, Finanças e Plano, sabem que é verdade.
Quanto perguntámos ao Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território como iriam ser corrigidos os vencimentos dos funcionários das autarquias, a resposta foi: não sei.
Não sei, diz o Ministro responsável!
Então quem deve saber? Mas isto não é importante? Estamos a brincar com instituições e pessoas?
As Câmaras Municipais dizem que não têm dinheiro, nem obrigação de suprir os erros do Governo, nem possibilidades legais de fazer mais revisões orçamentais, e que nestas condições não pagam esta correcção aos seus funcionários, muito menos em certificados de aforro comprados ao Estado.
E é uma posição compreensível. Até agora as Câmaras tiveram em média um crescimento nominal do FEF de 1,9%, o que significa uma perda real de receitas
superior a 7%, consignaram todas as suas receitas, de acordo com orçamentos aprovados pelas respectivas Assembleias Municipais, mesmo assim aumentaram os seus funcionários em 6% como mandava a lei, e fizeram na maioria dos casos as duas revisões orçamentais previstas por lei. Em resumo cumpriram as suas obrigações.
Vem agora o Governo de forma encapotada dizer que como se enganaram na previsão da inflação, as Câmaras que se desembarassem e resolvam mais este problema.
Mas como, perguntam as Câmaras e perguntamos nós? O Governo só sabe responder «não sei».
Mas nós sabemos, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: corrigindo outro enorme erro do Governo nesta proposta de lei e aplicando, pura e simplesmente, a lei das finanças locais em vigor. E esta não é sujeita a interpretações. Para que fosse absolutamente clara a sua aplicação desta vez inclui uma fórmula, facílima de interpretar e de aplicar como posso testemunhar, pois fui eu que a elaborei e mereceu não só a aprovação do Governo, como de todos os grupos parlamentares. E essa fórmula diz-nos que o FEF em cada ano cresce quanto crescer o valor do IVA previsto no Orçamento do Estado.
E o segundo grande erro deste Governo, é que prevê agora nesta proposta de lei um aumento do IVA de 25 milhões e lhe tira as consequências. Quer dizer que a previsão do IVA em 1988 cresce mais 7% do que o previsto inicialmente e neste sentido há apenas um caminho a seguir: corrigir na mesma proporção o FEF para 1988.
O Governo, porém, seguiu em todo este processo, métodos ínvios: na elaboração do Orçamento do Estado para 1988, prevê um crescimento mínimo do IVA, assim limitando as receitas das autarquias, já que era este o princípio definido na lei das finanças locais. Depois cobraria muito mais receitas, mas não entregaria a parte correspondente às autarquias.
Só que cometeu o erro de, para poder fingir que gere bem e que até reduz o défice orçamental, corrigir, ainda que para valores que todos sabemos estarem bastante aquém da realidade, o valor do IVA.
E agora os Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados do PSD, se quiserem ser coerentes, tem que utilizar o argumento que tanto invocaram no final do ano passado, ou seja, «aplique-se a lei da finanças locais» e consequentemente têm de votar a nossa proposta de aumento de 6,4 milhões nas receitas do FEF. Ao fazermos isto, não estaremos fazendo qualquer favor a ninguém, mas, apenas, a cumprir uma obrigação legal.
E assim também os municípios poderão cumprir a sua, e corrigir os vencimentos dos seus funcionários.
A leviandade com que esta revisão orçamental foi preparada, só não nos espanta por vir de um Governo que foi capaz de praticar doze inconstitucionalidades no Orçamento que ainda está em vigor, embora tenha sido bem avisado para o não fazer.
Está nas nossas mãos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, fazer desta proposta de lei um diploma legal que não nos envergonhe.
O PS apresentou neste sentido as propostas de alteração que a análise desta revisão orçamental torna necessárias, cumprindo assim o seu dever.
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Que todos sintamos, ao votá-las, que estamos a ser merecedores da confiança que os eleitores em nós depositaram e do respeito que a nós próprios nos devemos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Matos.
O Sr. António Matos (PSD): - Sr.ª Deputada Helena Torres Marques, desejo apenas fazer um registo.
Se bem percebi - e é isto que gostaria de ver bem esclarecido -, na opinião da Sr.ª Deputada este foi o maior erro político do Governo Cavaco Silva. Ora, se realmente este foi o maior erro político do Governo Cavaco Silva - quanto a nós isto nem sequer é erro político...
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Há outros!
O Orador: - ... -, mas a ser verdade aquilo que diz, então isso foi a passagem de um bom atestado ao Governo do Prof. Cavaco Silva.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Que gracinha!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr.ª Deputada Helena Torres Marques, com todo o respeito, estamos habituados às suas desatenções relativamente a estas coisas da lei, e só assim podemos justificar a alusão ao preâmbulo da proposta de lei. As leis não têm preâmbulos, são acompanhadas de exposições de motivos - suponho que já o devia saber.
Risos do PS e do PCP.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Olhe, eu não sabia!
O Orador: - Está-se sempre em boa altura para aprender, Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não sabia e ando nisto há 40 anos!
O Orador: - Às vezes há quem ande muito mais anos e nunca consiga aprender estas coisas tão simples.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - De notas internas é que a gente não sabia. Agora que a proposta de lei não tenha preâmbulo,... por amor de Deus...
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peco-vos que deixem o Sr. Secretário de Estado formular o pedido de esclarecimento.
O Orador: - Dizia eu que se a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques lesse o terceiro parágrafo da exposição de motivos, e não do preâmbulo da proposta
de lei, veria que o Governo faz alusão à retribuição extraordinária de 1,5% aos funcionários públicos.
Portanto, essa retribuição extraordinária não está encapotada, consta do articulado e da exposição de motivos.
Mas o que me enche de espanto é que a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques apresente agora uma teoria relativamente à lei das finanças locais que considero, no mínimo, desastrosa do poder financeiro e da autonomia financeira, diria mesmo, mais, do auto-Governo do poder local, que é uma das grandes conquistas do 25 de Abril.
A Sr.ª Deputada Helena Torres Marques sabe muito bem que a lei das finanças locais, em matéria de Fundo de Equilíbrio Financeiro, relaciona o seu aumento com o do imposto sobre o valor acrescentado e a tese que a Sr.ª Deputada aqui apresentou daria tão só isto: se o Governo apresentasse uma proposta de lei de alteração ao Orçamento com menos receita de IVA isso teria como consequência, numa situação sempre possível no futuro, como aconteceu no passado em governos socialistas, em que as receitas fiscais ficavam abaixo do previsto, dizia eu, que isso teria como consequência, a reposição, por parte das autarquias locais, das transferências que recebiam do Orçamento.
É isso que a Sr.ª Deputada Helena Torres está, pura e simplesmente, a defender neste momento.
O Sr. Presidente: - Faça favor de terminar, Sr. Secretário de Estado.
O Orador: - Sr. Presidente, foi-me retirado algum tempo disponível, mas termino já.
Sr.ª Deputada, isto é uma situação de teoria e espero que não volte a acontecer. Não voltará, com certeza, a acontecer com os governos sociais-democratas. Mas diria só isto: essa teoria redundaria que em 1989 as transferências para as autarquias seriam muito inferiores aquelas a que terão direito. É isso que querem com certeza, mas não é isso que o Governo e o Partido Social-Democrata querem. É por isso que a maioria das autarquias locais votam social-democrata e não socialismo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra à Sr.ª Deputada Helena Torres Marques para responder, desejo esclarecer o Sr. Secretário de Estado que o tempo do diálogo à margem do Regimento não foi contado.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Deputado António Matos, agradeço-lhe a sua pergunta porque não só me permite esclarecer o que disse como me vai dar mais hipóteses de explicar melhor a minha ideia.
Disse, e volto a dizer, que esta proposta de alteração ao Orçamento de 1988 foi um dos maiores erros políticos deste Governo.
O que acontece é que o Governo tinha de fazer mais despesas e por isso veio à Assembleia da República com esta revisão orçamental. O Governo não tinha de registar os aumentos de receitas, que aliás, são muito maiores do que aqueles que estão aqui indicados. Não tinha!
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Mas como tinha de vir aqui pedir-nos autorização para gastar mais quis fazer uma flor, que foi baixar o défice.
Risos do PSD.
Os senhores só falam nesse aspecto como se só esse fosse importante. Falar na baixa do défice é só no fim do ano quando realmente se vir tudo aquilo que os portugueses pagaram a mais do que seria natural. É essa medida que faz baixar o défice.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Muito bem!
O Orador: - Mas o grande erro político surge porque se lançou uma guerra de Sul a Norte do País incluindo as Regiões Autónomas. O Governo esqueceu--se dos funcionários da Administração Local.
O Sr. António Matos (PSD): - Não!
A Oradora: - Esqueceu-se! O Sr. Deputado estava na Comissão de Economia, Finanças e Plano e ouviu, tão bem como eu, o que disse o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território. Quando lhe perguntámos o que é que iria acontecer aos funcionários das autarquias» respondeu «não sei» e por acaso acrescentou: «assumo um compromisso: antes do dia 18 digo como é». Mas, também por acaso, não cumpriu o compromisso.
Vozes do PS: - Isso é normal!
A Oradora: - O certo, neste momento, é que se não corrigirmos estes erros do Governo, todos nós, nós e os senhores, não sei como é que os funcionários da Administração Local de todo o País vão ver corrigidos os seus vencimentos.
Como é que os funcionários da Administração Regional vão ver corrigidos os seus vencimentos? Como é que todos os funcionários públicos vão aceitar um pagamento de dez contos para repor o seu poder de compra?
Os senhores estão convencidos de que é dando 10 contos a um funcionário e dizendo-lhe «pronto não fale mais nisso que o seu poder de compra está recomposto» que se resolve a situação?
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Trabalham menos uma hora!
A Oradora: - Doze minutos a menos por dia no horário de trabalho!? Como se isso ajudasse a recuperar o poder de compra!
O Srs. Deputados, se isso não é um erro político de palmatória, então o que é?!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Erros políticos são convosco e não connosco!
A Oradora: - Além disso, o Governo não sabe tirar as ilações das propostas que faz.
Digo-lhe muito sinceramente: este Orçamento está mal feito! Na minha perspectiva foi feito sobre o joelho.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Esta orçamento não tem consideração por esta Casa, mas, sobretudo, não tem consideração pelos deputados do PS. Os senhores já tiveram de fazer propostas de substituição de artigos que são inconstitucionais; os senhores tiveram de votar doze inconstitucionalidades, e muitos de vós sabiam que o eram.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Não!!!
A Oradora: - O que estes senhores fazem! Há pouco quando aqui foi dito que não se podia votar na especialidade antes da sua votação na generalidade, o Sr. Secretário de Estado riu-se. Riu-se porque, na perspectiva dele, os senhores estão aí para votarem tudo quanto vier do Governo. Portanto, está tudo ganho! Nem é preciso discutir!
Ora, mais respeito, senhores!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Ai! Ai! Está a exagerar!
A Oradora: - Isto é um erro político grave que não deveria ter sido cometido. Foi uma leviandade.
Sr. Secretário de Estado, muito sinceramente, vou dizer-lhe aquilo que já tenho dito várias vezes: efectivamente a muitos membros do Governo faz falta terem sido deputados. Tenho a convicção de que se os senhores tivessem sido deputados não fariam muitas das afirmações que fazem que o vosso comportamento seria diferente e que teriam outro respeito pelo método de funcionamento desta Casa.
Quero dizer-lhe que tenho por hábito, por feitio, ler a tentar documentar-me, isto é, de estudar bem os assuntos. O senhor já me conhece à muitos anos e devia ter essa percepção. Portanto, não estive desatenta à justificação.
O Sr. Secretário de Estado, então um assunto tão importante, como o da correcção dos vencimentos da Função Pública vem num artigo misturado com o Serviço Nacional de Saúde?!
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - É para tratar da saúde dos funcionários!
A Oradora: - Assim como o n.º 3! Como se isso não tivesse qualquer importância! Mas o senhor diz que não, que é dado o relevo, a importância e a atenção devida!?
Depois falou da lei das finanças locais. Poupe-me! Se há coisas que sei é, precisamente, da lei das finanças locais...
Vozes do PSD: - Calma! Não sabe nada! Isso é ainda mais grave!
A Oradora: - Vou ler-lha, Sr. Secretário de Estado...
Vozes do PSD: - Leia!
A Oradora: - Por acaso o senhor não fez parte da Comissão que a elaborou, mas fez o Secretário de Estado da Administração Local.
Devo dizer-lhe - repare bem nisto - que por termos estudado o assunto com todo o cuidado é que estamos perfeitamente convencidos de que temos razão.
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Inclusive, já falamos com deputados do PSD que estão a analisar o assunto e parece-lhes que temos razão. O que eu disse e o que está escrito na lei é o seguinte:
(...) O FEF é calculado em cada ano pela seguinte fórmula (...) em que o IVA do ano n é o valor do imposto sobre o valor acrescentado previsto no Orçamento do Estado e o do ano n-1 (n menos um) é o valor previsto no ano anterior.
No meu texto, a que o senhor ainda não teve acesso, até sublinhei a palavra «previsto», sempre insisti «previsto» e até sublinhei. Ora bem, suponha que os senhores tinham aumentado as receitas de outros impostos que não o IVA do ano n. Eu não ía aqui invocar este argumento. Mas não é isso. O que a lei refere não é o valor real da cobrança do IVA.
Supondo que os senhores vão cobrar muito mais IVA do que está previsto no Orçamento inicial ...
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento : - E se for menor?
A Oradora: - ... mas que nesta correcção - e por isso é que isto é um erro -, os senhores não falavam no IVA, então este argumento não existia. Mas já que os senhores decidiram, para fazer «esta flor», incluir os 25 milhões de contos no IVA, agora a previsão do IVA é esta. Sr. Secretário de Estado, se a previsão do IVA é esta, comparando a previsão do IVA nesta proposta de rectificação do Orçamento com a previsão do IVA no Orçamento anterior, há que corrigir este valor. Isto é uma consequência legal, nada há que alterar.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Dá-me licença que a interrompa?
A Oradora: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr.ª Deputada, nós não estamos a discutir o Orçamento do Estado para 1988, estamos a discutir uma alteração em sede de execução orçamental. Se neste caso uma alteração do IVA fosse inferior ao previsto, a Sr.ª Deputada admite a devolução das verbas que foram transferidas a mais para as autarquias?
Vozes do PSD: - Ah!
A Oradora: - Eu não percebo porque é que os Srs. Deputados do PSD estão tão contentes com uma hipótese de redução das receitas das Câmaras Municipais. Então o Sr. Secretário de Estado acabou de dizer que a maior parte das Câmaras são do PSD!?
Não está previsto na lei das finanças locais - os deputados que discutiram comigo este assunto em Comissão recordar-se-ão - a possibilidade de devolução de verbas por parte das Câmaras porque estes valores são sempre em termos de previsões ... pode não haver aumentos, mas não há valores negativos porque a própria lei não o permite. O que nós estamos a calcular, Sr. Secretário de Estado, é este valor que está aqui e foi aquele que os senhores disseram. Isto é uma revisão orçamental para o futuro, o que fica inscrito no Orçamento para 1988 é este valor do IVA e para este valor do IVA....
Pausa.
Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados do PSD, agradeço a maior atenção para este assunto. Tenho o maior gosto em facultar a lei ao Governo, que eu tenho aqui e que se calhar ele não tem. O que a lei faz é a comparação com previsão. Como os senhores incluíram uma alteração na previsão do IVA, então teremos de tirar as consequências que são devidas. Os senhores não as tomaram em consideração, foi um erro político grave, as Câmaras têm de saber que os senhores fazem esta proposta mas não souberam tirar as conclusões.
Pode ser que o PSD corrija este erro do Governo e, portanto, não venha a ter as repercussões que pode ter se ele não for corrigido. Mas peço-vos, Srs. Deputados, tomem bem atenção ao que estou a dizer: nós não estamos a fazer mais do que propor uma aplicação directa da lei.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Silva Marques pede a palavra para que efeito?
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da consideração visto que a Sr.ª Deputada nos dirigiu diversas invectivas que no meu sentimento puseram em causa a nossa dignidade de deputados.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada: Sejamos mais sóbrios no auto-elogio.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Essa agora!
Aplausos do Sr. Deputado João Cravinho (PS).
O Orador: - Muito bem, muito bem... As palmas do Sr. Deputado João Cravinho pressupõem que os seus discursos se alterarão substancialmente no futuro.
Risos e aplausos do PSD.
Sr.ª Deputada Helena Torres Marques, nenhum de nós é perfeito. O facto de sermos democratas não significa que sejamos perfeitos. Por maioria de razão, o facto de serem socialistas não significa que sejam perfeitos. Espero!
Sr.ª Deputada, isto tudo para lhe dizer que, em matéria de imperfeições e no meu modesto juízo, a Sr.ª Deputada ultrapassou todos os limites. Compreendo que foi em circunstâncias datadas historicamente, mas ultrapassou-os, e quando a Sr.ª Deputada põe em causa a nossa dignidade de deputados dizendo que estamos aqui para votar tudo, Sr.ª Deputada, mesmo que votássemos tudo votávamos coisas muito melhores do que aquelas que a Sr.ª Deputada não só votou (e eu também), mas subscreveu, preparou e de que foi co-autora no Governo do Bloco Central. Recordo-lhe os limites que a Sr.ª Deputada ultrapassou decerto, naquele momento, tomada por um alor de patriotismo para tudo justificar.
A Sr.ª Deputada foi co-autora de um dos mais graves abaixamentos do financiamento real das autarquias, a Sr.ª Deputada não mexeu uma vírgula em termos de descentralização e de transferência de competências, mas, Sr.ª Deputada, eu guardei para o fim o record das suas, e das minhas, ultrapassagens dos limites: nós
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votámos, e a Sr.ª Deputada foi co-autora, de um imposto retroactivo que nem sequer Salazar ousou determinar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O PSD votou a favor, mas nós votámos contra!
A Sr.ª Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.
O Sr. Helena Torres Marques (PS): - Sr. Deputado e meu querido amigo Silva Marques: Francamente, nem pensava responder-lhe porque acho que o senhor disse isso porque chegou agora, ainda não tinha dito nada e queria dizer qualquer coisa.
O Sr. Deputado sabe tão bem como eu que se há assunto onde os senhores realmente foram desautorizados por este Governo foi em matéria orçamental.
Ao fazerem-vos votar um Orçamento que tinha doze inconstitucionalidades... É que os senhores realmente estão dispostos a votar tudo.
O Sr. Silva Marques (PSD): - E o imposto retroactivo?
A Oradora: - O Sr. Deputado refere-se ao imposto retroactivo. Eu assumo tudo, pois até fui eu que o fiz, penso é que talvez o Sr. Ministro António Capucho que se encontra na bancada do Governo, e que na altura era ministro, e que portanto fazia parte do Conselho de Ministros - eu não tinha acesso a isso - talvez fosse capaz de dar uma explicação muito mais segura do que aquela que eu estou a dar. De qualquer maneira, gostaria de lembrar, já que os senhores gostam tanto de invocar os anos anteriores, que quando nós, em conjunto, fizemos parte do Governo do Bloco Central, tínhamos a bancarrota, feita pelos senhores.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - E tudo quanto foi feito para apertar o cinto foi em consequência daquilo que os senhores fizeram quando estiveram no Governo antes de nós, e que nós, numa situação extraordinariamente difícil, conseguimos vir a equilibrar. Daqui a algum tempo as pessoas hão-de ter consciência disso.
Sobre aquilo que eu fiz como Secretária de Estado, com o óbvio acordo da vossa bancada parlamentar, refiro só isto, Sr. Deputado: pergunte aos presidentes das Câmaras - e há alguns na sua bancada - o que é que acharam da minha intervenção como Secretária de Estado. Talvez a ideia que tenham seja exactamente contrária à do Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carvalho Martins.
O Sr. Carvalho Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Orçamento é uma previsão. As receitas e as despesas que dele constam não são passadas, nem actuais, mas futuras. Ora o futuro é incerto. Por vezes ocorrem situações imprevisíveis, que condicionam ainda mais o futuro.
Mas o Orçamento, como é óbvio, destina-se a ser executado. No âmbito da execução orçamental, durante o ano financeiro, as receitas são liquidadas e arrecadadas de harmonia com a inscrição nas rubricas orçamentais próprias e em princípio cobradas nessa conformidade embora a cobrança possa ser efectuada para além dos valores inicialmente previstos no Orçamento. Por seu turno as despesas são assumidas, autorizadas e pagas em correspondência com as necessárias dotações orçamentais, nas quais as despesas têm cabimento. Tais dotações são para efeito consideradas como limite máximo a utilizar na realização das despesas.
O Orçamento enquanto previsão pode não cobrir situações imprevistas que venham a ocorrer durante o ano e a que a Administração Pública tem que fazer face. É portanto, necessário que o Orçamento seja revisto no sentido da introdução de alterações, que façam frente aos novos condicionalismos. É porém fundamental que as alterações propostas não sejam determinadas pela indisciplina financeira. E quando as alterações orçamentais se traduzem num aumento de despesa total do Orçamento ou dos seus sectores orgânicos ou funcionais, estas só podem ser efectuadas por lei da Assembleia da República.
O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Proposta de Lei n. º 73/V - Efectivação à Lei n.º 2/88, de 25 de Janeiro, que aprovou o Orçamento do Estado para 1988 - tem a singularidade de, pela primeira vez, as alterações apresentadas serem para diminuir o défice orçamental inicialmente proposto, apesar da ocorrência de algumas despesas adicionais, como, por exemplo, as respeitantes às designadas incertezas orçamentais da CEE, ao incêndio do Chiado e à remuneração extraordinária dos funcionários públicos.
O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Convém recordar que em Portugal houve muitas alterações orçamentais durante os últimos 15 anos, mas nenhum teve este aspecto significativo: «redução do défice inicialmente proposto».
Uma voz do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Analisando os últimos 7 anos, facilmente se chega à conclusão que houve derrapagem orçamental em 1982, 1983, 1984 e 1985. Durante estes anos não houve cumprimento do défice inicialmente proposto, exigindo orçamentos suplementares. Em 1982 o défice executado sobre o inicialmente orçamentado teve um desvio de 11,2% para mais, em 1983 um desvio de mais 11,8%, em 1984 de mais 45,1%, em 1985 de mais de 45,2%, demonstrando uma clara indisciplina financeira do Estado.
A situação inverteu-se a partir do 1986.
Em 1986 cumpriu-se inteiramente o défice inicialmente proposto, o que quer dizer que não houve necessidade de orçamentos suplementares. Mais: em 1986 o défice executado sobre o inicialmente orçamentado teve uma diferença para menos de 4,3% e em 1987 de 0,7% demonstrando uma clara disciplina financeira na execução orçamental.
O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - Muito bem!
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O Orador: - Em 1988, com a Proposta de Lei n.º 73/V, são as seguintes as alterações apresentadas: do lado das receitas, há um crescendo de 50 milhões de contos de impostos e de 5,9 milhões de contos provenientes de restrições da Comunidade Económica Europeia. O crescimento dos impostos deve-se fundamentalmente ao bom andamento da economia portuguesa e às acções que o Governo tem levado a cabo desde 1987 para a modernização/dinamização da Administração Fiscal dando-lhe mais eficácia, tornando-a mais eficiente.
Do lado da despesa há um acréscimo de 42,2 milhões de contos. Este acréscimo deve-se fundamentalmente às incertezas orçamentais da CEE - como é do conhecimento de V. Ex.ª o Orçamento da Comunidade Económica Europeia só foi aprovado em meados de 1988 -, à criação do Fundo Extraordinário de Ajuda à Reconstrução do Chiado e à Remuneração Extraordinária dos Funcionários Públicos, havendo ainda ajustamentos entre sectores orgânicos, sem aumento da despesa total.
Em suma, as alterações propostas contribuíram para a redução do défice em 13,6 milhões de contos, diminuindo o défice global em percentagem do PIB de menos 2% em 1985 para menos 7,9% em 1988 e consequentemente o ritmo de crescimento da dívida pública que é fundamental controlar.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A execução orçamental exige acompanhamento, avaliação, disciplina e rigor, componentes essenciais de qualquer processo de planeamento, sem o qual não é possível obter o objectivo proposto: «cumprir o Orçamento de Estado e manter ou melhorar o défice previsto».
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: No seguimento da intervenção do meu camarada Octávio Teixeira, pretendo ainda chamar a atenção para dois importantes problemas. É que, em vez de aproveitar a alteração ao Orçamento do Estado de 1988 para corrigir a mão e fazer justiça aos trabalhadores da Função Pública e às autarquias locais, o Governo optou pela continuidade da sua política de degradação das condições de vida dos trabalhadores e pela sobrecarga das autarquias locais com novos encargos sem a correspondente transferência de meios financeiros.
Todos temos presente que no OE/88 o Governo afectou, de forma grave, os trabalhadores da Administração Pública, nomeadamente através da fixação de 6,5% nos aumentos salariais, argumentando com uma hipotética taxa de inflação de igual montante. Mas quem duvida neste momento que a inflação se aproxima dos 9,5%? Então não seria de esperar que o Governo aproveitasse esta alteração orçamental para fazer o necessário ajustamento de 3% nos salários para repor o poder de compra dos trabalhadores? Como se pode argumentar com uma diminuição no horário de trabalho? Como se pode entender, se não como provocatória, a proposta de aumento de apenas 1,5% condicionando à letra j) a possibilidade do seu recebimento em numerário e obrigando os outros trabalhadores a esperar seis meses para trocar papel por dinheiro?
Mas não se fica aqui. O Governo traça já a continuidade da mesma política no OE/89. E esta medida não aparece isolada. Aí está novamente o tecto salarial de 6% baseado numa hipotética taxa de inflação. Aí estão outra vez as autorizações legislativas em branco para alterar aspectos fundamentais do regime jurídico da função pública, fazendo tábua rasa das recentes declarações de inconstitucionalidade do OE deste ano - e não digam que não as conhecem, Srs. Deputados! Aí estão novos propósitos repressivos, mais factores de instabilidade no emprego e a continuação da degradação do poder de compra.
O que se passa com as autarquias locais é idêntico. Aliás, já hoje se falou aqui nisto. No OE/88 o Governo aumentou o Fundo de Equilíbrio Financeiro apenas 1,9% e agora quer obrigar as autarquias a suportar os novos encargos decorrentes do ajustamento salarial dos trabalhadores da Administração Local. Simultaneamente, indicia a continuidade de política no OE/89 com a transferência para as autarquias locais de novos encargos com pessoal (impostos, Caixa Geral de Aposentações, Montepio dos Servidores do Estado) e de novas competências sem a transferência dos correspondentes meios financeiros, como, aliás, sublinha o parecer da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente. Aguardamos que os Srs. Deputados do PSD que souberam reconhecer estas lacunas do OE/89 em matéria de finanças locais, votem agora, em coerência, as propostas que vamos apresentar para suprir as irregularidades das propostas de lei de alteração ao OE/88 e do OE/89 em matéria de finanças locais.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Neste momento, em sede de debate da alteração ao OE/88, apresentamos propostas que, por um lado, visam fazer justiça aos trabalhadores de toda a Administração Pública e, por outro, impedir que as autarquias locais sejam confrontadas com novos encargos sem a correspondente transferência de meios financeiros.
Assim, propomos um reforço de verba de mais oito milhões de contos para garantir um aumento salarial de 3% aos trabalhadores da Função Pública e a transferência de 1,5 milhão de contos para as autarquias locais visando garantir a verba necessária para que possam fazer face ao aumento salarial de 3% dos trabalhadores de Administração Local.
Naturalmente que está implícito nestas propostas o princípio do pagamento em numerário a todos os trabalhadores do aumento salarial proposto. É inadmissível qualquer outra solução!
Pela nossa parte, tudo fazemos para que, através do debate desta proposta de lei, seja possível fazer justiça aos trabalhadores da Função Pública e às autarquias locais.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.
O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, V. Ex.ª abordou uma questão que nos é
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particularmente grata. Aliás, felizmente, há um enorme leque de questões da governação que nos são gratas, particularmente na área económica, porque V. Ex.ª sabe que instituições de qualificação que ninguém questiona são unânimes em afirmar que a evolução da situação economia do nosso país, porventura contra a vontade de alguns, não tem paralelo, por exemplo, entre os países da OCDE.
V. Ex.ª referiu que o Governo estava particularmente interessado em lançar a instabilidade no emprego. Certamente foi por distracção que a Sr.ª Deputada fez essa afirmação, pois não creio que tenha sido por ausência de informação. Gostaria, pois, que a Sr.ª Deputada justificasse a sua afirmação, sendo dado que, há três ou quatro dias, tivemos conhecimento da taxa de emprego, que actualmente é de 6,1%. Como pode, portanto, afirmar que o Governo está interessado em criar instabilidade no emprego?
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, gostaria que V. Ex.ª dissesse em que termos e ao abrigo de que legislação - e devo lembrar que a Assembleia da República aprovou a primeira lei das finanças locais, a Lei n.º 1/79, que o partido de que a Sr.ª Deputada faz parte também votou favoravelmente - ficou alguma coisa prescrita relativamente à compensação às autarquias locais, às regiões autónomas, resultante das actualizações salariais anuais que os governos fazem mediante um processo negocial com os sindicatos.
Em segundo lugar, gostaria que a Sr.ª Deputada dissesse quanto é que foi essa compensação, se é que ela existiu, desde 1979 até agora. Gostaria, pois, de saber se, no passado, houve algum compromisso, alguma doutrina, alguma legislação que leve a essa situação.
Em relação aos trabalhadores da Função Pública, gostaria que Sr.ª Deputada dissesse se não considera que nestes últimos três anos o compulsar das actualizações salariais dos funcionários públicos, mesmo não considerando reestruturações, reclassificações, melhorias do exercício da sua carreira profissional, redução do horário de trabalho, etc, não redundou no único aumento real do poder de compra que estes tiveram desde a aprovação da Constituição da República, salvaguardando o ano de 1980 que, por sinal também teve um Primeiro-Ministro que era social-democrata.
Gostaria que respondesse a estas duas questões.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado Vieira de Castro, basta conhecer um pouco da realidade deste país para saber como tem aumentado a instabilidade no emprego, e também basta ler algumas estatísticas para verificar o aumento dos contratos a prazo - isto, falando no geral, já que o Sr. Deputado me fez uma pergunta no geral e não em relação à Função Pública. No entanto, era à Função Pública que eu me referia.
Voltando a responder no geral, devo dizer que a realidade nos mostra que quaisquer novos empregos que hoje sejam criados, são-no, em regra geral, com contratos a prazo. Daí, o aumento da instabilidade! Na realidade, hoje o contrato efectivo diminui para os trabalhadores que pela primeira vez arranjam ou mudam de emprego e o que domina é o contrato a prazo, é a instabilidade!
Na Função Pública, o articulado do Orçamento do Estado em 1988 e também a proposta que aparece para 1989 indicia, em vários pedidos de autorização legislativa, este princípio do aumento da instabilidade e da repressão aos trabalhadores da Função Pública. Aconselho o Sr. Deputado a ler com cuidado a proposta de lei que foi apresentada pelo Governo para 1989 e também a que foi aprovada em sede de Orçamento do Estado para 1988, incluindo duas alíneas que foram declaradas inconstitucionais, como o Sr. Deputado sabe. Foi, pois, sobre isso que falei na intervenção que fiz.
Sr. Secretário de Estado, aquando do debate do Orçamento do Estado para 1988, tivemos ocasião de discutir o problema das finanças locais e do Fundo de Equilíbrio Financeiro, e da forma como em 1988 as autarquias foram seriamente afectadas pelos erros de previsão do Governo em relação ao IVA, por exemplo, em relação a 1987, e as consequências que isso teve na diminuição do FEF em 1988 em termos reais das transferências do Orçamento do Estado para as autarquias locais nesse mesmo ano.
É, pois, nesta situação, Sr. Secretário de Estado, que achamos - e referi isso expressamente - que, num ano em que o FEF foi apenas de 1,9% e a taxa de inflação vai no número que conhecemos, é inadmissível sobrecarregar as autarquias com novos encargos. É nesta situação que se impõe um mínimo de justiça às autarquias locais e que se impõe que seja o Estado, o Poder Central, a assumir esta responsabilidade. Foi essa a justificação que apresentei... de qualquer modo, o Sr. Secretário de Estado poderá ler melhor a minha intervenção...
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Não respondeu à minha pergunta!
A Oradora: - Sr. Secretário de Estado, estou a responder-lhe de acordo com a argumentação que usei e de acordo com aquilo que é justo para as autarquias locais. É ou não verdade que as autarquias locais tiveram, este ano, em termos reais, uma diminuição do Fundo de Equilíbrio Financeiro? Então, em 1988 foi ou não de 1,9% a transferência do FEF para as autarquias locais? O senhor sabe que sim! A taxa de inflação está ou não no nove e tal por cento? Então, há ou não uma diminuição em termos reais?
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Dá-me licença que a interrompa, Sr.ª Deputada?
A Oradora: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado, pode ser que agora V. Ex.ª tenha descoberto novos números!
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr.ª Deputada, coloquei duas questões em relação às quais gostaria que me respondesse. No entanto, relativamente à questão que neste momento está em causa, direi que este ano as autarquias locais tiveram um aumento das
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receitas fiscais na ordem dos 487o devido à boa máquina da Administração Central...
A Oradora: - Algumas autarquias locais!
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Os grandes aumentos do FEF foram em 1986/1987 termos reais!
Portanto, Sr.ª Deputada, não baralhe e responda às questões que coloquei. É isso que agradeço!
A Oradora: - Desculpe que diga, mas quem está a baralhar é o Sr. Secretário de Estado! V. Ex.ª sabe perfeitamente que esse aumento das receitas fiscais em relação às autarquias locais se refere a meia dúzia delas e pouco mais, e que a generalidade das autarquias locais tem como receita fundamental o Fundo de Equilíbrio Financeiro. Portanto, sabe que estas autarquias locais tiveram uma diminuição brutal, em termo reais, do Fundo de Equilíbrio Financeiro. É, pois, nesta situação que consideramos que é necessário fazer justiça a todas as autarquias locais, e não apenas a algumas. Para isso, é necessário não obrigar a assumir novos encargos por erros constantes de previsão do Governo em relação às metas a que ele próprio se propõe, neste caso à inflação e ao cálculo do IVA.
Em relação à Função Pública, o problema que se coloca é o mesmo. Quem se enganou na previsão da taxa de inflação foram os senhores e não nós; não foram os trabalhadores da Função Pública que disseram que a taxa de inflação ia ser de 6,5%... Aquando do debate que aqui teve lugar, alertámos para o facto de que esta vossa taxa de inflação, essa vossa meta de 6,57o, só ia servir de tecto salarial e de travão aos aumentos salariais! Hoje, a realidade demonstrou que foi precisamente isso o que se passou! O que os senhores fizeram com os 6,5% foi um tecto salarial.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Porém, hoje, em vez de virem aqui emendar a mão e fazer justiça aos trabalhadores da Função Pública, aparecem com uma proposta que é uma autêntica provocação a eles. Assim, não, Sr. Secretário de Estado!
Aplausos do PCP.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Não me respondeu!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos termos do n.º 3, alínea a) do artigo 1.º da Lei n.º 1/87 - Lei das Finanças Locais -, o Imposto para o Serviço de Incêndios constitui uma receita municipal.
Para além da receita deste imposto que as câmaras municipais cobram directamente do munícipes que não têm seguros contra incêndio, as companhias seguradoras cobraram uma taxa de 6% os Seguros contra Incêndio e de 2% sobre os Seguros Agrícolas e Pecuários, receitas estas posteriormente transferidas para as autarquias locais por intermédio do Instituto de Seguros de Portugal.
Nos termos da lei, tendo as companhias seguradoras cobrado em 1987 um montante do Imposto para o Serviço de Incêndios de cerca de 700 000 contos, o Instituto de Seguros de Portugal deveria ter feito a distribuição da referida verba pelas autarquias locais no ano de 1988.
Sabendo que, regra geral, as autarquias locais procedem à distribuição destas verbas pelas associações de bombeiros sediadas na sua área, o não recebimento em
1988 do imposto cobrado em 1987 vai traduzir-se num elevado prejuízo para os bombeiros portugueses.
Para além do atraso na regulamentação do Estatuto Social do Bombeiro, da redução do nível de comparticipação do Estado no financiamento à construção de quartéis de bombeiros, da diminuição das verbas previstas na proposta de lei do Orçamento do Estado para 1989 para a construção de quartéis de bombeiros, do atraso deliberado na revisão do Acordo sobre Transporte de ambulância, da proposta de tributação em IVA das viaturas e equipamentos utilizados pelos bombeiros em acções de socorro e salvamento, o Governo não quer cumprir a lei, ao recusar-se a fazer a distribuição pelas autarquias locais do montante do Imposto de Incêndios arrecadado pelas seguradoras.
Perante tão grave injustiça, o Partido Socialista, interpretando os legítimos interesses dos bombeiros portugueses, vem propor um aditamento à Proposta de Lei n.º 73/V, de forma a que as autarquias sejam reembolsadas de um montante nunca inferior à verba que lhes foi distribuída pelo Instituto de Seguros de Portugal em 1987 e que é de cerca de 660 mil contos.
Os bombeiros portuguesas, fartos de palavras, esperam as acções. Oxalá que, desta feita, o PSD aprove esta proposta apresentada pelo Partido Socialista, a bem do bombeiros portugueses.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.
O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Deputado Gameiro dos Santos, não vou propriamente pedir-lhe esclarecimento mas, utilizando essa figura regimental, associar--me inteiramente à sua intervenção.
Aproveito esta oportunidade para perguntar ao Sr. Deputado Gameiro dos Santos como é que pensa que com as tão já hoje faladas «operações de tesouraria» a que os bombeiros terão de recorrer para fazer face aos seus problemas financeiros durante um ano, porque as verbas que nos são consignadas são manifestamente insuficientes, face às necessidades com que nos vemos confrontados - e digo «vemos», porque faço parte de uma associação de bombeiros e sou um dos responsáveis pela sua gestão -, podemos gerir condignamente as nossas associações de bombeiro? Como é que pensa que com actos destes, quando fazemos os nossos orçamentos iniciais e prevemos uma verba que nos estará, eventualmente, consignada e que oficialmente deveria ser dotada, podemos gerir condignamente as nossas associações de bombeiros quando as verbas que estão estipuladas legalmente - e lei é lei - não nos são entregues?
Gostaria de, uma vez mais, chamar a atenção dos Srs. Deputados do Partido Social Democrata - como, aliás, tenho feito em vezes anteriores - para a necessidade de, nesta Câmara, termos a responsabilidade de,
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definitivamente, começarmos a olhar para os bombeiros portugueses com a dignidade que eles merecem.
A proposta que foi apresentada é o mínimo que se pode fazer para quem já deveria ter na sua posse esta verba. Alguns poderão dizer: «É insignificante». Pois é!, mas para os bombeiros, há muitos anos, tudo tem sido insignificante e tudo o que lhes seja dado é um apoio que todos nós temos obrigação de prestar.
Gostaria também de referir que, uma vez mais, em Comissão chamámos a atenção para as verbas que estão consignadas na proposta de lei do Orçamento do Estado para os bombeiros. Recordo-me que são menos de 1000 contos por cada associação de bombeiros, menos de 1000 contos, repito, e, no próximo ano, os bombeiros, de acordo com o IVA, vão ser tributados 8% sobre todo o material que for adquirido.
Esperamos que, durante a discussão da proposta de lei do Orçamento do Estado, essa verba possa vir a ser alterada e que aos bombeiros seja também dado o adicional - que é obrigatório - a que têm direito.
O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr. Deputado Gameiro dos Santos, a minha primeira questão é preambular, já que estamos a utilizar essas figuras.
Sr. Deputado, se analisar os orçamentos de funcionamento e do PIDDAC, nos últimos 3 anos, pode concluir que o Governo tem dado particular importância e prioridade ao reforço dos meios, equipamento e segurança dos bombeiros, enfim a toda a sua actividade. Compare com períodos homólogos ou com o que entender e poderá ver que os recursos afectos à área das corporações de bombeiros têm sido, como nunca foram, fortemente reforçados, nos últimos 3 anos.
Mas não é isso que está em causa. Percebo o efeito que o Sr. Deputado quer ter, mas penso que vai até ser contraproducente. O Sr. Deputado devia ter em atenção que tudo o que disse deverá ser dito aquando da discussão da proposta de lei do Orçamento para 1989. Isto porque, neste momento, a proposta que o Partido Socialista entregou na Mesa da Assembleia é claramente inconstitucional e até iria atrasar a execução desta alteração orçamental.
Sr. Deputado, posso citar, se quiser, mas consulte o Acórdão do Tribunal Constitucional de 19 de Novembro de 1986 sobre a competência da Assembleia em matéria de propostas de alteração apresentadas pelo Governo em termos de Orçamento. Essa sua norma é inconstitucional, Sr. Deputado.
Podia ter poupado todo este trabalho à Assembleia se tivesse reservado essa norma, que depois se verá se é ou não justa, equilibrada e coerente, para a discussão da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1989. Agora, é só fogo de artifício, Sr. Deputado!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Começarei por responder ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento - o Sr. Deputado Rui Silva não vai aborrecer-se, com certeza - utilizando as suas últimas frases, que são verdadeiramente lamentáveis. Quem é que tem andado a fazer fogo de artifício ao longo destes anos, Sr. Secretário de Estado? Tem sido o Governo. O Governo é que tem andado a fazer fogo de artifício, porque, designadamente, o Sr. Primeiro-Ministro inaugura os quartéis de bombeiros e aparece nas primeiras páginas dos jornais, assim como no Telejornal, mas, em 1988, não foi capaz de resolver um único problema, um único, repito, colocado pelos bombeiros portugueses.
Protestos do PSD
Parece que incomodo os deputados do PSD! Protestos do PSD.
É que isto incomoda, de facto, e o peso na vossa consciência é muito grande!...
E vou continuar a utilizar as palavras do Sr. Secretário de Estado. Disse o Sr. Secretário de Estado que eu deveria ter poupado este trabalho à Assembleia da República. O que era bom é que o Governo tivesse poupado o Partido Socialista a ter de ser forçado a apresentar, nesta Câmara, esta proposta porque, tendo sido o Governo alertado, há largos meses, para este problema, não foi capaz de lhe dar a solução adequada.
Gostaria de lembrar, porque aqui se encontra uma testemunha, que é o Sr. Ministro António Capucho, que eu próprio, em meados do ano de 1988, lhe coloquei algumas questões e até lhe pedi que intercedesse junto de membros do seu Governo para receber a Liga dos Bombeiros Portugueses a fim de que estes problemas fossem discutidos.
Para que não restem dúvidas - aliás, já o disse numa intervenção que fiz na semana passada, e ninguém o desmentiu, porque é verdade -, devo dizer que o Sr. Ministro da Administração Interna foi colocado perante este problema em meados de Junho de 1988, assumiu, perante a Liga dos Bombeiros Portugueses, o compromisso de que iria dar solução e, quando chegou ao Congresso de Barcelos, pura e simplesmente, nada disse. Até hoje - e já estamos quase no fim do mês de Novembro -, o Governo nada disse a este respeito.
Já agora, Sr. Secretário de Estado, lanço-lhe um repto: por que é que o Governo não assume e não faz a transferência destas verbas para os bombeiros? Assuma-a! Nós não temos problemas em relação a isso. O que queremos, acima de tudo, é que se faça justiça e parece-me que é isso que o Governo não tem feito para com os bombeiros.
Disse o Sr. Secretário de Estado que as verbas têm vindo a ser reforçadas. Sr. Secretário de Estado, quase me atrevia a dizer-lhe que, se calhar, não leu a proposta de lei do Orçamento do Estado para 1989!. .. O Sr. Secretário de Estado não reparou que as verbas destinadas a financiamentos para quartéis de bombeiros decresceram 10% em relação à proposta de lei do Orçamento do Estado para 1988? Não leu isso!
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Não é verdade!
O Orador: - Então, julgo, temos de lhe oferecer uma máquina de calcular para fazer as contas, porque, parece-me, já nem contas sabe fazer!...
Vozes do PSD: - Eh! Eh!
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O Orador: - Até estou a gostar de ouvir a bancada do PSD. De facto, é o peso na consciência, são os remorsos que começam a vir à superfície. Nesta matéria, os remorsos vão começar a aparecer-vos.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço o favor de fazerem um pouco de silêncio.
O Orador: - Quanto à questão levantada pelo Sr. Deputado Rui Silva, devo dizer que ele, como homem que vive estas coisas dos bombeiros, sabe que estas verbas são muito importantes. Aliás, a maioria das autarquias deste país utiliza estas verbas para as distribuir pelos bombeiros, e vou dar-lhes três exemplos: Câmara de Sintra, do PSD; Câmara de Loures, do PCP; Câmara de Matosinhos, do PS. Se têm dúvidas, perguntem! Estas verbas, embora nalguns casos não sejam de grande monta, apesar de tudo, têm significado em associações de bombeiros que vivem com orçamentos reduzidos. Acima de tudo, trata-se de verbas que são já quase consideradas receitas tradicionais dos bombeiros.
É lamentável que o Governo não atente esta situação, como, aliás não o tem feito em relação a nenhum dos grandes problemas que os bombeiros levantaram em 1988. Isso é que tem de ser dito e denunciado.
O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma rápida interpelação à Mesa e, particularmente, um esclarecimento à Câmara, que penso ser útil, em relação a esta questão de bombeiros.
O Sr. Presidente: - Se quer usar da palavra para uma interpelação, tem a palavra; se é para prestar um esclarecimento, já não lha posso dar, na medida em que não é regimental.
O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - Sr. Presidente, uso então da palavra para uma intervenção.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente ao problema que foi aqui posto e que tem a ver com os bombeiros, é óbvia - e tem sido demonstrado à saciedade - toda a preocupação que os bombeiros têm merecido, e de que são credores, da parte do Governo. Basta ver, Sr. Presidente e Srs. Deputados, os quartéis que ultimamente têm sido feitos e que nada ficam a dever aos seus homólogos da CEE, quartéis de boa qualidade e com bons equipamentos em que o apetrechamento dos bombeiros se está a fazer de uma forma condigna. Ora, isto não quer dizer, obviamente, que o Governo não deva continuar a apoiar os bombeiros.
Quero é relembrar - porque foi aqui dito que os bombeiros não têm merecido da parte do Governo a atenção de que são merecedores - a alteração à legislação que vigorava em que, na matriz de distribuição das verbas do Totobola e do Totoloto, a participação dos bombeiros foi extremamente reforçada. Isto é importante ser salientado e dito, porque se trata de verbas extremamente apreciáveis que foram tiradas a outras associações e a outras áreas, que também eram importantes.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - O Sr. Deputado Gilberto Madaíl veio tentar, sem o conseguir, naturalmente, lavar a face da sua bancada. Aliás, é pena que outros homens que estão nessa bancada, que conhecem os problemas dos bombeiros e que concordam com o que eu aqui disse não tenham levantado a voz.
Gostaria de lembrar ao Sr. Deputado que deve ler as conclusões do Congresso Nacional dos Bombeiros Portugueses, que se realizou em Barcelos. Estão cá, nesta Câmara. Peça-as e leia-as. Há-de reparar que não se está a fazer oportunismo político, mas, pura e simplesmente, a elucidar sobre os grandes problemas dos bombeiros portugueses.
Quanto aos quartéis, Sr. Deputado, de facto, as verbas estão a diminuir em vez de aumentar e o nível de comparticipação, como já disse, tem vindo a diminuir sucessivamente, e tem sido o Governo do PSD que o tem feito. Passou primeiro de 80% para 10% e é curioso que, quando a Liga dos Bombeiros Portugueses, junto de Sr. Ministro, foi solicitar que o nível de comparticipação devia voltar aos 80%, passados dias, o Governo, em vez de proceder ao aumento, reduziu para 60%. De facto, não há dúvida nenhuma de que a actuação do Governo tem sido em favor dos bombeiros. Gostava, pois, que o Sr. Deputado me esclarecesse estas questões.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Gilberto Madaíl, há mais pedidos de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?
O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - No fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.
O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Deputado Gilberto Madaíl, não queria, de maneira nenhuma, monopolizar esta conversa em torno do problema dos bombeiros, embora pense que ele é de extrema importância.
No entanto, é bem verdade - e tenho-o afirmado publicamente em todos os órgãos de comunicação social - que, como um dos responsáveis por uma associação de bombeiros em Portugal, verifiquei que foram feitos alguns melhoramentos e seria injusto na nossa parte senão o disséssemos.
Vozes do PSD: - Ah!...
O Orador: - Quero, no entanto, referir, que esses melhoramentos não são suficientes e explico-lhe por que razão. Tivemos no Orçamento do Estado para 1986 a verba de novecentos mil contos para os Bombeiros; em 1987 a verba foi de um milhão e quatrocentos mil contos, mas passou para o Serviço Nacional de Bombeiros a responsabilidade dos meios aéreos, o que lhes
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tirou seiscentos mil contos, ficando, portanto, oitocentos mil contos, ou seja, baixou 10%; este ano temos uma verba de cerca de um milhão e seiscentos mil contos vão para os meios aéreos ficando mil contos para o Serviço Nacional de Bombeiros distribuir por 433 corporações de bombeiros.
Protestos do PSD.
Srs. Deputados, desculpem mas terão que me ouvir, pois eu estou a gerir uma casa dessas há dez anos - modéstia à parte - e sei exactamente como é que nós temos as mesmas dificuldades.
Paralelamente, é-nos imposto o imposto de capitais e a partir de l de Janeiro vamos passar a pagar IVA na aquisição de material. Tudo isto são despesas a que bombeiros não conseguem fazer face!
Os melhoramentos que se têm verificado não acompanham os agravamentos que têm sido impostos aos Bombeiros. É esta sensibilidade que tenho tentado trazer a esta Câmara, alertando para o facto de o Sr. Ministro da Administração Interna de então, Eng. Eurico de Melo, ter confirmado que os bombeiros poupam a Portugal 16 milhões de contos no voluntariado. Então, como é que se entende que recebam apenas 107o dessa verba para distribuir por cerca de 400 corporações?
Em tudo o que tem sido feito na aquisição de material e nos próprios quartéis de bombeiros - e assumo que estes têm, de algum modo, melhorado, embora as verbas tenham baixado - há um esforço por parte das direcções dos bombeiros que, ao melhorar as partes operacionais (e aí, com toda a razão) em desfavor das sociais, que são bastante mais dispendiosas, têm conseguido, desta forma, fazer melhores quartéis com menos dinheiro. Tem sido com esforço que as direcções o têm conseguido.
No entanto, Sr. Deputado, não há dúvida absolutamente nenhuma de que todas as despesas que se têm verificado à volta das corporações de bombeiros não têm, de maneira nenhuma, sido acompanhadas pela outra parte, e recordo o Estatuto Social dos Bombeiros pedindo desculpa por o voltar a referir.
Não se entende, apesar de todas as dificuldades existentes - e já o assumi em conversas tidas com o Sr. Ministro da Administração Interna -, como é que se está dois anos para regulamentar uma peça - desculpe-me a expressão - fundamental para que a salvaguarda, subsistência e sobrevivência dos bombeiros esteja perfeitamente adequada à função que executam.
Não podemos, de maneira nenhuma, porque isso seria injusto, não confirmar os melhoramentos que têm sido feitos; no entanto, eles não são suficientes. Há mortes, há bastantes mortes, infelizmente, há inválidos, há pessoas que continuam hoje a ter sérias dificuldades face às mortes provocadas por aqueles anos desastrosos de 1986 e 1987 e lamentavelmente as coisas não estão resolvidas.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Soares.
Vozes do PS e do CDS: - Não pode fazer pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Gameiro dos Santos!
O Orador: - Vou fazer um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Gilberto Madaíl.
VV. Ex.ªs devem saber, bem como o Sr. Deputado Gameiro dos Santos - e não vou fazer a apologia da minha pessoa - que, se calhar, dentro desta Câmara nunca passou um indivíduo que possa, com tanto conhecimento de causa, falar dos Bombeiros de Portugal. Não vou citar-lhes o meu currículo, porque é desnecessário para VV. Ex.ªs...
Já referi em várias intervenções, e numa em que fui aplaudido pela minha bancada, os grandes problemas que afligem os Bombeiros de Portugal. Fi-lo consciente do papel que representamos na sociedade e consciente daquilo que nós, sociais-democratas, sabemos que são os problemas dos Bombeiros de Portugal.
Aplausos do PSD.
Nunca utilizei demagogia nem utopia e, acima de tudo, nunca quis partidarizar esta questão nesta Câmara e certamente que nenhum de nós, daqueles que defendem conscientemente os bombeiros, quer que isso aconteça ninguém quer partidarizar a estrutura dos Bombeiros de Portugal.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Os Srs. Deputados Gameiro dos Santos e Rui Silva sabem, por um lado, quais são as minhas opções e convicções e, por outro, quais são as convicções e a vontade de resolver os problemas dos bombeiros portugueses, por parte da bancada e do Governo social-democratas.
Se for preciso trarei ao conhecimento de VV. Ex.ªs quem têm sido, através da Liga dos Bombeiros Portugueses e das estruturas nacionais dos bombeiros, os ministros que têm merecido dessas estruturas mais apoio e consideraçâo. Eles são, com certeza, os ministros sociais-democratas, porque foram eles que, conscientemente, têm vindo, ao longo dos tempos, num ano, dois ou três, a tentar resolver os problemas dos Bombeiros de Portugal que demoravam dezenas de anos a resolver por ministros de outros Governos.
Sr. Deputado Gilberto Madaíl não quero político-partidarizar os problemas dos Bombeiros. Certamente, os Srs. Deputados que aqui têm trazido à liça estes problemas sabem que sei muito e se começar a falar farei com que aquilo que eles aqui apresentam não passe de puras banalidades. Não me obriguem a fazer isto! É nesta Casa que haveremos de resolver e ajudar a resolver os problemas dos Bombeiros de Portugal, mas não da forma como alguns o querem fazer, porque essa é a errada. Aliás, tenho a certeza que os Bombeiros também não vos agradecerão essa forma, porque eles estão acima das querelas político-partidárias.
Aplausos do PSD.
O Sr. Jaime Soares (PSD): - Sr. Deputado Gameiro dos Santos, não vou fazer a apologia...
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Gilberto Madaíl.
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O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - Srs. Deputados, tal como referiu o meu colega de bancada Jaime Soares, não quis com a minha intervenção partidarizar o debate, mas penso que era injusto estar aqui a fazer-se uma crítica à actuação do Governo nesta área sem que se dissesse alguma coisa daquilo que tem sido feito. Portanto, não é uma questão de partidarizar mas sim uma questão de pôr as coisas como elas são.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado Gameiro dos Santos, não se trata de uma questão de oportunismo político, porque o problema dos Bombeiros - e eu estive, de alguma forma, ligado a ele - é grave, mas também não vamos ignorar as realidades que tem sido feitas, por exemplo, e tal como citei, na área das comparticipações do Totobola e Totoloto e, recentemente, a campanha que está em curso por parte da GALP e que está a trazer algumas receitas para os Bombeiros.
Penso que todos estamos irmanados no sentido de apoiar os Bombeiros e não vamos é tirar louros de coisas que não devemos tirar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 73/V. Se os Srs. Deputados estão de acordo aguardemos três minutos para que estejam reunidas as condições para podermos votar.
Pausa.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, tratando-se de matéria de grande importância, gostaríamos de ver se estão reunidas as condições para que se possa proceder à votação, designadamente em número de presenças.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à contagem. Peço, pois, aos Srs. Deputados o favor de se manterem nos seus lugares.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se presentes 118 deputados, sendo cento e três do PSD, quatro do PS, oito do PCP, um do PRD e dois do CDS, pelo que não temos quórum para votação.
O Sr. Deputado Carlos Encarnação pede a palavra para que efeito?
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Para, interpelando a Mesa, Sr. Presidente, solicitar o cumprimento do artigo 21.º do Estatuto dos Deputados.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem! É justo! Tem de se castigar!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à contagem nominal dos deputados.
Pausa.
O Sr. Deputado João Cravinho pede a palavra para que efeito?
O Sr. João Cravinho (PS): - Apenas para interpelar a Mesa no sentido de saber se o processo de votação foi dado por inconcluso neste preciso momento e se se passa à aplicação do artigo 21.º do Estatuto dos Deputados.
Risos.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Pedimos a todos os Srs. Deputados que se portem com a dignidade que a Câmara merece.
Aplausos do PSD.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Menezes.
O Sr. Luis Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, não quero fazer comentários ao triste espectáculo que acabamos do presenciar. No entanto, sem pretender interferir na forma como V. Ex.ª dirige os trabalhos, penso fazer sentido que se cumpra o que o meu colega Carlos Encarnação pediu em relação à contagem nominal das presenças, mas antes que se volte atrás, ao processo de contagem de presenças em função dos Srs. Deputados que voltaram a entrar no Plenário.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Cravinho pediu a palavra para interpelar a Mesa?
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, há pouco interpelei a Mesa, só que não obtive resposta...
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, embora extemporaneamente, desejo saber se o processo de votação da Proposta de Lei n.º 73/V foi dado como concluído, passando-se agora, pura e simplesmente, à aplicação do artigo 21. º do Estatuto.
Risos do PSD.
O Sr. Presidente: - Exacto, Sr. Deputado. Foi feita a contagem dos deputados quando tal foi requerido. Acontece, porém, que continuam a entrar deputados de todos os partidos vindos das Comissões.
Srs. Deputados, a Mesa interroga o Plenário se deve ou não considerar válida a informação que acabo de transmitir, isto é, a de que chegaram vários deputados vindos das Comissões.
A ser assim, temos quórum para votar.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Caio Roque.
O Sr. Caio Roque (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho a impressão de que estamos aqui a assistir a um triste espectáculo por parte da maioria...
Protestos do PSD.
O que acontece é que tanto eu como outros dois Srs. Deputados fomos avisar os nossos colegas para
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virem para a Sala para votar e no regresso deparámos com este triste espectáculo.
Risos do PSD.
É vergonhoso o que se está a passar aqui, e, como tal, para que me acusem, de uma vez por todas, de ter provocado a falta de quórum, eu vou retirar-me neste momento, porque não gosto de fazer parte de espectáculos tristes.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró para interpelar a Mesa.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, nesta confusão, pareceu-me que um dos deputados da primeira fila da bancada do PSD tinha pedido que se procedesse à contagem nominal.
Desejava lembrar-lhe que, nos termos do Regimento, a votação nominal só pode ser pedida por requerimento assinado por um décimo dos deputados. Portanto, Sr. Presidente, desejava saber se V. Ex.ª tem na Mesa uma requerimento assinado por um décimo dos deputados a pedir a contagem nominal.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Encarnação pediu a palavra também para interpelar a Mesa?
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, não gostaria de corrigir o Sr. Deputado Narana Coissoró, mas ele obriga-me a isso.
Com efeito, o que pedi foi o cumprimento, pura e simplesmente, do artigo 21.º do Estatuto dos Deputados, o que não tem nada a ver com isso.
Permito-me, entretanto, dizer ao Sr. Presidente que, em virtude de terem entrado deputados na Sala, gostaria que V. Ex.ª procedesse de novo à contagem a fim de verificar se temos ou não quórum.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, como o PSD compreenderá, noutra situação não poderíamos aceitar que, depois do que foi dito pelo Sr. Deputado Carlos Encarnação, ou seja, considerado e anunciado pela Mesa que não havia quórum para votação e tomada a decisão pelo Sr. Carlos Encarnação de invocar o artigo 21.º do Estatuto, que se pudesse repetir qualquer contagem porque, como o Sr. Deputado Carlos Encarnação sabe, o artigo 21.º só pode ser invocado depois de se ter verificado a falta de quórum e para efeito de registo de faltas e não de reencontra para efeitos de votação.
Porém, tendo presente que estamos a tratar de uma matéria de importância fundamental para o País, dada a ausência dos deputados do PSD e a maneira atabalhoada como a questão aqui foi tratada, e não querendo nós ser acusados de estar a impedir que o País possa ver aprovada ou rejeitada uma alteração ao Orçamento para 1988, se houver quórum, Sr. Presidente, não será por parte da nossa bancada, - voltamos a dizer «não constitui um precedente», - que se levantarão objecções a que se proceda à votação.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, neste momento, encontram-se presentes 129 deputados pelo que temos quórum e vamos proceder à votação, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 73/V.
Submetida a votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, votos contra do PS, do PCP, do PRD e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca e a abstenção do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontra-se na Mesa um requerimento do PSD, solicitando a avocação a Plenário da discussão e votação na especialidade desta proposta de lei.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Gostaria, Sr. Presidente, que fosse clarificado junto dos proponentes deste requerimento se ele se refere apenas à avocação das matérias constantes do n.º 2 do artigo 14.º da Lei de Enquadramento do Orçamento, isto é, se se trata apenas da avocação das despesas.
Conviria que isto ficasse claro porque há matérias de especialidade que não são avocáveis porque pertencem ao Plenário.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Essa interpretação está correcta, ou seja, trata-se da avocação das despesas.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Face a este pedido de esclarecimento e à resposta dada pelo Sr. Deputado Carlos Encarnação, solicito à Mesa que clarifique a aceitação, pela generalidade da Assembleia, da aplicação, nesta matéria, da Lei do Enquadramento Orçamental.
O Sr. Presidente: - Algum dos Srs. Deputados deseja pronunciar-se sobre a proposta do Sr. Deputado Nogueira de Brito?
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares pediu a palavra para interpelar a Mesa. Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho): - Sr. Presidente, uso da palavra nesta parte do debate para dizer apenas que é inútil responder ao Sr. Deputado que acaba de intervir. O Sr. Deputado Narana Coissoró, que toma parte na conferência de líderes, sabe e podia esclarecer, que isso já foi esclarecido nessa sede não sendo necessário estarmos aqui novamente a fazê-lo.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Agora já se sabe!
O Orador: - V. Ex.ª sabe que o Sr. Presidente em exercício não assistiu a essa conferência de líderes e provavelmente não sabe. Teria que ir buscar as súmulas, o que daria muito trabalho e não vale a pena.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, creio que, perante estes esclarecimentos, podemos passar à votação do requerimento.
Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de «Os Verdes».
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos à discussão na especialidade. Há duas propostas de alteração ao artigo 1.º...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, neste caso dir-se-á que os últimos são os primeiros. E que o artigo 1.º terá de ser o último a ser votado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lida a proposta de alteração ao artigo 2.º da Proposta de Lei n.º 73/V, apresentada pelo PSD.
Foi lida. É a seguinte:
Artigo 2.º Compensação da tributação dos cargos públicos
É reforçada em 5 milhões de contos a dotação específica de 45 milhões de contos inscrita no capítulo 60.º do orçamento do Ministério das Finanças para compensar, em 1988, o imposto profissional sobre os titulares dos cargos públicos, dando-se como contrapartida o correspondente aumento da cobrança do mesmo imposto.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Pausa.
Como não há inscrições, vamos votar.
Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de «Os Verdes».
O Sr. Presidente: - Vai ser lida uma proposta de alteração ao artigo 3.º, apresentada pelo PSD.
Foi lida. É a seguinte:
Artigo 3.º
Encargos gerais da nação
É reforçado em 180 000 contos o valor da transferência a efectuar para o orçamento da Assembleia da República.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Pausa.
Visto ninguém pretender usar da palavra, vamos votar.
Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de «Os Verdes».
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A brevíssima declaração de voto que vou fazer refere-se às duas votações a que acabámos de proceder.
Votámos favoravelmente as alterações propostas pelo Partido Social Democrata aos artigos 2.º e 3.º da proposta de lei porque, num caso, retiram a inconstitucionalidade de que sofria e padecia a proposta de lei e, no outro, retiram aquilo a que já me referi como sendo uma provocação gratuita à Assembleia da República.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar às propostas de alteração ao artigo 6.º...
Pausa.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira pretendia que se votassem os artigos da proposta de lei, mas a Mesa pôs à votação as propostas de alteração e só no fim é que poria à votação os artigos da proposta de lei que não fossem objecto de propostas de alteração para não perturbarmos a leitura das propostas de alteração.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, nada tenho contra a questão. Porém, julgo que seria mais natural discutirmos e votarmos os artigos da proposta de lei e, à medida que fossem aparecendo propostas de alteração, analisá-las-iamos. No mínimo, sempre se evita a hipótese de, na parte final, nos esquecermos de algum artigo.
O Sr. Presidente: - De acordo com o artigo 157.º do Regimento, a Mesa vai continuar com a discussão e votação das propostas de alteração apresentadas.
Nessa conformidade, informo a Câmara que em relação ao n.º 2 do artigo 6.º, o PS apresentou uma proposta de eliminação e o PSD uma proposta de alteração, que vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
Artigo 6.º
2 - É reajustada, por via orçamental, em mais 9 800 000 contos a contribuição do Estado português para o Orçamento Comunitário de 1988.
O Sr. Presidente: - Está em discussão esta proposta de alteração ao n.º 2 do artigo 6.º, apresentada pelo PSD.
Pausa.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como já aqui foi referido aquando do debate na generalidade, este é o momento - agora que estamos a votar especialidade - para chegarmos a conclusões definitivas.
A proposta de lei do Governo vem, salvo o devido respeito, pôr o «carro diante dos bois», isto é, o Governo vem pedir à Assembleia da República que vote uma determinada verba na perspectiva de um acordo que compete à Assembleia aprovar ou não e que ainda há-de vir aqui porque por enquanto é plenamente desconhecido.
É evidente que isto não é um processo curial e não podemos aceitar, sem mais explicações, que as coisas se passem assim. De outro modo, são atropelados os
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direitos da Assembleia da República, as suas competências exclusivas, e chegamos à caricata situação de estarmos a votar «futuros».
Percebo que o Governo tenha uma grande consideração pela Bolsa, pelo «mercado de futuros», mas suponho que esse mercado ainda não entrou no processo legislativo, pelo que, de maneira alguma, pode ser aceite.
Neste momento, a Assembleia da República tem direito a uma explicação por parte do Governo sobre o que consiste o acordo, quando é a que a Assembleia o vai votar e por que razão e que ele não está presente. Como é que se pede à Assembleia que, no fundo, vote em branco, em nome de um acordo futuro, que um dia poderá ou não reprovar nos seus fundamentos e nas suas expressões concretas?
Suponho não ser pedir muito que, em nome do respeito que se deve à Assembleia da República - e não é em relação a nenhuma das bancadas em particular, mas à Assembleia da República como órgão de soberania -, está situação seja esclarecida.
É, pois, com toda a cordialidade que peço ao Governo que nos ilumine!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Já esta manhã tive ocasião de dizer, durante a minha intervenção, que este problema não pode ser visto de forma leve e talvez imponderada, na medida em que, provavelmente, envolverá problemas de inconstitucionalidade estar a votar uma dotação para uma despesa que não está criada. É que não se trata de reforço de uma dotação; utiliza-se é a mesma rubrica e inclui-se esta verba porque há um facto novo que é um acordo que tem de ser aprovado pela Assembleia da República.
Não vou ater-me já à hipótese de esta proposta vir a incorrer no artigo 14.º da Lei n.º 34/87, que diz que o titular de cargo político a quem, por dever do seu cargo, incumbe dar cumprimento a normas de execução orçamental e conscientemente as viole: «a) contraindo encargos não permitidos por lei (...)». Não vou pôr essa questão, mas coloco problemas de constitucionalidade.
Como já referi esta manhã, o Governo pode vir a assumir os compromissos que, em tempo oportuno, já tomou, porque até ao final de Dezembro teremos ainda mais um mês e, nessa altura poderemos votar a proposta sem qualquer inconveniente em relação a esse compromisso. Porém, para repor a questão na sua legalidade, terá, primeiro, de se fazer a votação para a aprovação do acordo intergovernamental.
Solicitamos, pois, ao Governo e ao Grupo Parlamentar do PSD que responderem a questão, porque não há prejuízo de o compromisso assumido pelo Governo não vir a ser cumprido. Agora, temos é que nos circunscrever ao cumprimento das regras legais, o que não é pouco.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, por lapso, a Mesa não pôs à discussão e votação, em primeiro lugar, a proposta de eliminação do n.º 2 do artigo 6.º, apresentada pelo Partido Socialista, o que vai fazer de seguida.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, é para dizer que o problema de fundo da nossa proposta é exactamente o que estávamos a discutir.
Como há uma disposição regimental que leva a dar prioridade à proposta de eliminação do PS, proceder-se-á conforme a Mesa mandar e com o nosso total acatamento. Contudo, permanecem as questões de fundo que foram postas no sentido de esclarecer a Câmara a fim de se fazer uma votação consciente, pelo que seria bom obtermos os respectivos esclarecimentos.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, se continuarmos a discutir este assunto, gostaria de fazer uma pergunta ao Governo.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não conhecemos o acordo e o Governo diz-nos que precisa de 9 milhões e 800 mil contos para fazer face a ele.
Ao menos, o Governo é capaz de nos dizer porque é que esta verba é de 9 milhões e 800 mil contos e a que é se destina? Por que razão o Governo pede autorização à Assembleia para dispender esta verba num acordo cujo conteúdo não conhecemos nem nos é explicado? Como é possível a Assembleia votar a dotação de uma verba que não diz respeito a nada, que é um conjunto vazio? Porquê 9 milhões e 800 mil contos, Sr. Secretário de Estado?
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria tentar sensibilizar, mais uma vez, os Srs. Deputados do PSD e os Srs. Membros do Governo. Nesse sentido, lerei um ofício, de há dois dias, da Comissão de Negócios Estrangeiros Comunidades Portuguesas e Cooperaçâo aprovado por unanimidade por todos os Srs. Deputados presentes, incluindo os do PSD.
Este ofício, dirigido ao Sr. Presidente da Assembleia da República, é do seguinte teor:
Tendo presente o texto do n.º 2 do artigo 6.º da Proposta de Lei n.º 73/V, a Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação entende salientar a V. Ex.ª o seguinte:
a) A comissão desconhece o teor do acordo intergovernamental citado.
b) A comissão lembra que, nos termos constitucionais, à Assembleia da República cabe aprovar os acordos e tratados internacionais para posterior ratificação do Presidente da República e não ratificar acordos como constam do texto da proposta de lei supracitada.
Foi uma comissão parlamentar que aprovou por unanimidade este ofício. Julgo que isto poderá ter algum
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significado. Embora eu próprio não faça parte desta comissão, não me é difícil concluir que, com este ofício, a Comissão de Negócios Estrangeiros quer dizer que, não conhecendo o acordo, precisa de o ter para poder discuti-lo e votá-lo. Só depois é que poderá estar disponível, clara e naturalmente, o dinheiro para cumprir esse acordo.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A informação que o Sr. Deputado Octávio Teixeira acaba de prestar à Câmara é fundamental. Pena é que o Sr. Deputado Dias Loureiro, Presidente da Comissão Parlamentar de Negócios Estrangeiros e Secretário-Geral do partido maioritário, não esteja presente para a confirmar, porque, com certeza, que foi ele que assinou esse ofício.
Penso que a questão se põe em dois planos diferentes e, nessa perspectiva, conviria que a esclarecêssemos.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira invocou duas ordens de argumentos.
Em primeiro lugar, estamos a votar uma dotação orçamental que não conhecemos nem sabemos a que se destina, isto é, embora se destine a cumprir um acordo, este não é do nosso conhecimento. Em segundo lugar, o Sr. Deputado invocou também uma questão de responsabilidade criminal. Ora, suponho que esta questão resulta resolvida com a inscrição orçamental nesta proposta de lei que hoje vamos aprovar. Portanto, convém «separar as águas».
Mas o que se passa é que, no seu afã de resolver os problemas do Governo, o PSD alterou o artigo 6.º e eliminou a referência ao acordo que ía ser ratificado. Efectivamente, parece-me que foi «o gato escondido com o rabo todo de fora»! De facto, na sua ingenuidade, o Governo fazia referência ao acordo que estava por ratificar mas neste texto não se faz referência a coisa nenhuma, e suponho que isso é pior.
Assim, já sabemos qual é a opinião do Governo nesta matéria. De facto, em relação ao velho problema da galinha e do ovo, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento optou por começar pela dotação orçamental e só depois ratificar o acordo. À Assembleia e aos Srs. Deputados, em perfeita consciência e sem interferência das questões partidárias, cabe decidirem se a Assembleia deve votar primeiro o acordo e depois a inscrição orçamental, ou se, pelo contrário, deverá votar primeiro esta e depois aquele. Esta é a questão que, agora, está posta à nossa consciência.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria simplesmente perguntar ao Governo se, no seu entendimento, uma vez votada esta verba, dispensa, depois, a ratificação do acordo, visto que, se assim não for, estaríamos a ratificar no vazio. Suponho que é esse o entendimento. Ou não é? Admito que não seja porque isto é uma monstruosidade óbvia e estou a raciocinar por absurdo.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Farei uma curtíssima intervenção, apenas para tentar responder ao Sr. Deputado João Cravinho.
É evidente que, primeiro, faremos a votação da dotação orçamental. O acordo pode vir ou não a conseguir-se, portanto, depois ratificar-se-á.
Vozes do PCP: - Espantoso!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Deputado Carlos Encarnação, como acabou de dizer, está disposto a votar esta verba sem conhecer o acordo e, se calhar, sem o vir a ratificar mais tarde.
Mas, Sr. Deputado, é capaz de me esclarecer por que razão a verba é de 9 milhões e 800 mil contos?
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, é apenas para referir que, obviamente, não vou entrar neste debate em matéria de «galinha e ovo» ou de «o carro diante dos bois»,na justa medida em que o assunto já foi tratado pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento durante o debate na generalidade. No entanto, para que não reste nenhuma dúvida - perfeitamente legítima -, é óbvio que o Governo remeterá o acordo à Assembleia e, por coincidência, posso anunciar que dará entrada na próxima segunda ou terça-feira.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, confesso que não estou a invocar nenhuma disposição específica do Regimento.
Remetendo o assunto para a Mesa direi o seguinte: face à declaração do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, o mínimo que se poderá pedir é que esta votação seja adiada para o momento em que, na segunda ou terça-feira, os Srs. Deputados tenham a possibilidade de ver esse famoso documento, A não ser que o «cheque em branco» já seja de tal maneira pressuposto que mesmo a declaração oficial do Sr. Ministro não o impeça.
O Sr. José Castel Branco (PS): - Muito bem!
Pausa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira esclarecer se, com a sua interpelação, pretendeu fazer um requerimento à Mesa ou se se tratou de uma mera sugestão sua.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, suponho que é uma questão de decência, sob a forma de um requerimento à Mesa.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Cravinho, para a Mesa aceitar um requerimento, ele deverá ser apresentado pó escrito e ter a assinatura de dez Srs. Deputados.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, V. Ex.ª permite que haja uma pequena interrupção para que se proceda a essa cerimónia?
Pausa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado João Cravinho formulou um requerimento sem eficácia processual em termos regimentais. V. Ex.ª, Sr. Presidente, dirigiu-se ao Sr. Deputado, concedendo-lhe um tempo, que ... enfim ... é difícil de classificar porque não existe regimentalmente.
Em resumo, Sr. Presidente, em termos de eficácia processual, o Sr. Deputado João Cravinho apenas formulou um desejo, portanto, os trabalhos devem prosseguir.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, a Mesa ainda não tinha concedido absolutamente nada.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Ah! Óptimo! Então, peço desculpa.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, é para pedir uma interrupção de meia hora, nos termos regimentais.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é regimental, portanto está concedida.
Srs. Deputados, está interrompida a sessão por 30 minutos.
Eram 17 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa anuncia que, por consenso, foi decidido que baixam à comissão até à próxima quarta-feira, quer a proposta de alteração do PSD, quer a proposta de eliminação do PS, ambas relativas ao n.º 2 do artigo 6.º, não se procedendo hoje à respectiva votação.
Srs. Deputados, vamos passar à apreciação do artigo 7.º relativamente ao qual deu entrada na Mesa uma proposta de aditamento e uma proposta de substituição apresentada pelo PCP, que vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
Proposta de Substituição. Artigo 7.º
1 -
2 -
3 - É ajustada em mais 16 milhões de contos a verba inscrita no capítulo 60 do Orçamento do Ministério das Finanças, em «dotação provisional», «outras despesas correntes», para fazer face à remuneração extraordinária de 1988.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, o Partido Socialista apresentou uma proposta de eliminação do n.º 3 deste artigo 7.º Assim, creio que a nossa proposta tem que ser analisada antes da do PCP.
A nossa é uma proposta de um artigo novo com o título «Correcção dos vencimentos da função pública» e cujo significado é a anulação do n.º 3 do artigo 7.º Dado que a nossa proposta elimina o n.º 3, segundo me parece, terá que ser analisada em primeiro lugar.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, essa proposta foi apresentada com a denominação de «proposta de aditamento».
A Oradora: - Exactamente, Sr. Presidente. No entanto, como é uma proposta de um artigo novo, provavelmente está mal explicado, pelo que deveria ter sido chamada proposta de eliminação porque, em parte, elimina o n.º 3 mas depois, acrescenta aspectos novos. No entanto o efeito prático é o da eliminação deste n.º 3.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o Partido Socialista aceita que a Mesa emende o título para «proposta de substituição»?
A Oradora: - Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, o CDS também apresentou uma proposta de artigo novo cujo efeito prático é o da substituição do n.º 3 do artigo 7.º
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, também a vossa tem o título de «Proposta de aditamento». «Assim, o CDS permite que a Mesa corrija e escreva «proposta de substituição»?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sim, Sr. Presidente.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Tema a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, o que se passa é que há três partidos, o PCP, o CDS e o PS, que apresentaram propostas de substituição relativamente a este artigo 7.º e creio que as três podem
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ser discutidas em conjunto enquanto que a respectiva votação será, certamente, por ordem de entrada na Mesa.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada é exactamente assim que se fará.
Srs. Deputados, vamos começar pela apreciação da proposta de substituição do PCP ao n.º 3 do artigo 7.º
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como explicámos durante o debate na generalidade, consideramos insuficiente a verba proposta pelo Governo para alteração dos vencimentos dos trabalhadores da administração pública.
Todos sabemos que, este ano, a taxa de inflação se vai situar e, 9,5% e não em 6,5%, como o Governo anunciou para 1988. Portanto como o aumento salarial dos trabalhadores foi estabelecido em 6,5%, para poder acompanhar o aumento do índice de preços, deve aumentar 3% e não 1,5% como propõe o Governo.
É nesse sentido que propomos que seja ajustada em mais 16 milhões de contos a verba inscrita no Capítulo 60 do orçamento do Ministério das Finanças. Porém, se também quisermos ter em conta os trabalhadores da Administração Local a verba a ajustar será de 17,5 milhões de contos. Por isso, incluímos 1,5 milhão de contos a transferir ao Capítulo 60 para as autarquias locais. É verdade que o processo poderia ser conjunto, não levantamos qualquer objecção a que assim se faça, pelo que pomos isso à consideração dos Srs. Deputados, a fim de se tentar encontrar a melhor solução que faça justiça aos trabalhadores de toda a Administração Pública, não esquecendo os das autarquias locais que já foram este ano tão injustamente considerados no Orçamento do Estado de 1988.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Para justificar a nossa proposta, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - A nossa proposta tem três números e eu gostaria de explicitar cada um deles.
Primeiro diz que o aumento é de 3% - não vale a pena explicar, pois já todos entenderam porquê -, mas em numerário, o que significa que excluímos o pagamento em certificados de aforro.
O segundo tem a ver com o consequente reforço orçamental daqui decorrente.
Quanto ao terceiro, gostaria de referir que este ano as verbas transferidas do Orçamento do Estado para as Regiões Autónomas não sofrem qualquer correcção, nem sequer a da inflação prevista pelo Governo. É provável que as Regiões Autónomas tenham grandes dificuldades em encontrar recursos financeiros para satisfazer este objectivo.
Neste sentido, propomos, face às verbas que estão inscritas no Orçamento destinadas às Regiões para pessoal, feito o cálculo de 3% - são os valores que aqui estão inscritos -, que se transfiram 215 mil contos para a Região Autónoma da Madeira e 235 mil contos para a Região Autónoma dos Açores.
É a justificação. Parece que é perfeitamente plausível e, por isso, esperamos o acordo de todas as bancadas.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para justificar a nossa proposta.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Srs. Deputados, no n.º 1 do artigo novo da nossa proposta, limitamo-nos a alterar a verba proposta pelo Governo elevando-a para o dobro, o que consideramos ser a actualização correcta em função da inflação. Esclarecemos que ela se destina a fazer face à correcção dos vencimentos e não a uma remuneração extraordinária da Função Pública. Pretendemos com isso obter o mesmo efeito, que foi declarado pelo Partido Socialista, de evitar o pagamento por outras formas, que não a correcção do vencimento.
Incluímos um n. º 2 na nossa proposta, que poderemos, neste momento, integrar no n.º 1, por forma a evitar qualquer acusação de inconstitucionalidade, dado que se trata de matéria não prevista no diploma do Governo!, acrescentando aos 16 milhões de contos os montantes destinados às regiões Autónomas, pois seria obviamente injusto não os considerar autonomamente, pelo menos em termos quantitativos.
Portanto, a proposta passaria para 16 450 mil contos e teria uma referência às Regiões Autónomas.
Sr. Presidente, o CDS apresentará imediatamente uma proposta nesse sentido. De qualquer maneira, trata-se de um artigo novo que se destina a substituir o n.º 3 do actual artigo 7.º e será constituído apenas, digamos, pelo corpo do artigo.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Gostaria de dizer que o PS concorda com a proposta do CDS e que apresentaremos uma proposta conjunta, dentro desta lógica.
O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr.ª Deputada. Aguardamos a sua entrada na Mesa.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta de substituição, do n.º 3 do artigo 7.º, apresentada pelo PCP.
Submetida a votação, foi rejeitada, com votos contra do PSD, votos a favor do PCP e do Deputado Independente João Corregedor da Fonseca e abstenções do PS, do PRD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa aguarda a entrada da proposta de substituição conjunta, do PS e do CDS.
Pausa.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à leitura da proposta de substituição, do PS e do CDS.
Foi lida. É a seguinte:
É ajustada em mais 16 milhões e 450 mil contos a verba inscrita no Capítulo 60 do Orçamento do Ministério das Finanças, em «dotação provisional», «outras despesas correntes» para fazer face à correcção dos vencimentos da função pública, incluindo os funcionários que prestam serviço na Administração das Regiões Autónomas.
O Sr. Presidente: - Está em votação.
Submetida a votação, foi rejeitada, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do PRD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lida uma proposta de aditamento a este artigo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de dizer que a proposta que há pouco fiz era no sentido de incluir estes 1,5 milhões de contos nos 16 milhões de contos, que perfazem 17,5 milhões de contos. Tinha já sido posta à consideração esta proposta, mas talvez não tenha sido suficientemente clara e a Mesa não se tenha apercebido.
Assim fica agora expresso que a proposta de substituição que há pouco votámos incluía estes 1,5 milhos de contos.
O Sr. Presidente: - Portanto, está prejudicada a proposta de aditamento.
A Oradora: - Exacto, Sr. Presidente.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Maia Nunes de Almeida.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em relação ao artigo 8.º foi apresentada pelo PCP uma proposta de substituição.
Sr.ª Deputada Helena Torres Marques, pede a palavra para que efeito?
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Eu penso que normalmente discutimos e votamos primeiro as despesas e depois as receitas. Ora, como o artigo 8.º diz respeito às receitas parece-me que devíamos continuar a votar, primeiro, os novos artigos em relação às despesas e a, seguir, votávamos os artigos correspondentes às receitas.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa está de acordo naquilo que proporcione uma maior celeridade dos trabalhos.
A indicação que existe na Mesa é que se faça a discussão dos artigos pela ordem numérica.
Vai ser lida a proposta de substituição relativa ao artigo 8.º, apresentada pelo PCP.
Foi lida. É a seguinte:
Artigo 8.º
Receitas fiscais
É aumentada em 103 milhões de contos a previsão da cobrança das receitas fiscais, na sequência dos resultados já obtidos em execução da política fiscal, nos termos seguintes:
a) Contribuição Industrial 10 milhões de contos
b) Imposto Profissional 15 milhões de contos
c) Imposto Sobre o Valor Acrescentado 65 milhões de contos
d) Imposto Automóvel 13 milhões de contos
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta intervenção é para fazer, brevemente, a apresentação da proposta e solicitar uma alteração.
A nossa proposta teve em vista que a correcção da previsão do aumento de receitas fosse feita com mínimo de verdade, já que o Governo resolveu abrir o processo, sob a forma de alteração orçamental, da correcção das previsões de receitas, entendemos que é lógico, é justo e exigível que essa actualização de previsão se faça de forma clara e correcta.
Em relação ao Imposto sobre o Valor Acrescentado, propomos que, em vez dos 25 milhões de contos apresentados pelo Governo, a previsão seja de 65 milhões de contos. Srs. Deputados, dir-lhes-ei que estamos a ser mais do que prudentes porque, de facto, os elementos oficiais já conhecidos sobre a evolução das cobranças do IVA, em 1988, ultrapassarão mesmo este valor que agora propomos.
A verdade é que pela proposta do Governo haveria mais 64 milhões de contos de receitas do que aquilo que estava previsto. Ora, o que acontece é que só até final de Junho já foram cobrados mais de 60 milhões de contos.
É esta a razão da nossa proposta de alteração da verba para o aumento de receitas do Imposto sobre o Valor Acrescentado. E propomos isto para que, no próprio Orçamento para 1989, possamos partir de bases sãs, quer no que respeita à análise do défice, quer no que respeita à análise das receitas efectivas, quer, ainda, no que respeita à análise das transferências a que as autarquias legalmente terão direito.
Em relação à alínea d) «imposto automóvel», também aqui a nossa previsão está feita com prudência, com a prudência idêntica àquela que o Governo utiliza no relatório do Orçamento para 1989, onde o próprio Governo prevê que, em 1988, vai receber mais 13 milhões de contos, do que aquilo que estava previsto. No entanto, como se levantaram dúvidas sobre a possibilidade de ser ou não constitucional a inclusão desta rubrica sobre o imposto automóvel, solicitamos à Mesa que a alínea d) da nossa proposta seja eliminada e que
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onde está «103 milhões de contos» passe a constar «90 milhões de contos».
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, relativamente ao artigo 8.º também está em apreciação uma proposta de aditamento apresentada pelo Partido Socialista e que é do seguinte teor:
d) Imposto sobre automóveis - 15 milhões de contos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A razão porque propusemos esta alínea, resulta do facto de no próprio relatório que o Governo apresentou à Assembleia da República se referir que a cobrança deste imposto, este ano, vai exceder em muito as verbas que estão previstas.
Portanto, não havia qualquer razão para que, numa altura em que estamos a rever receitas, também não fosse revista esta, em termos de clarificação orçamental. Mas uma vez que esta proposta pode vir a ser interpretada como inconstitucional, pelas razões que já foram fundamentadas, retiramo-la bastando-nos a proposta que o PCP apresentou sobre esta matéria.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a proposta do PS foi retirada, continuando à vossa apreciação a proposta de substituição apresentada pelo PCP, com alteração introduzida pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira de supressão da alínea d) e de substituição do valor de 103 milhões de contos por 90 milhões de contos.
Srs. Deputados, não havendo mais pedidos de palavra encerramos o debate desta proposta de substituição e passamos...
Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, pela a palavra para que efeito?
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, utilizando a figura da interpelação à Mesa, queria dizer que o Governo podia ter uma palavra em relação a esta proposta, até porque sobre o mesmo assunto apresenta outros valores.
Desta forma, gostaríamos de saber, após o tempo que já passou, no seguimento da entrada da proposta na Assembleia da República e tendo em conta os dados oficiais actualmente disponíveis, se o Governo não está a pensar rever a sua própria proposta e ou os Srs. Deputados do PSD a votar a proposta que apresentamos.
O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, tem a palavra.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr. Presidente, apesar de o Sr. Presidente já ter declarado que estava encerrado o debate sobre esta matéria, por respeito para com a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, esclareço que o Governo considera que na Comissão de Economia, Finanças e Plano, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais respondeu cabalmente às questões que foram colocadas sobre a previsão das receitas.
É evidente que o Governo só apresentou previsão de receitas em relação às que tiveram as variações mais importantes. É evidente que do extensíssimo mapa das receitas do Orçamento umas ficarão ligeiramente acima outras ficarão ligeiramente abaixo, mas mencioná-las todas constituiria praticamente um novo Orçamento. Pensamos que a proposta do Governo é equilibrada, é prudente e espelha bem quais são as grandes variações das receitas fiscais durante a execução, sublinho bem, do Orçamento do Estado para 1988.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Teixeira pede a palavra para que efeito?
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, julgo que o Sr. Secretário de Estado fez uma intervenção e, nesse sentido, pretendo fazer pedidos de esclarecimento.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, como V. Ex.ª referiu que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais explicou cabalmente o cálculo da previsão do aumento das receitas na Comissão de Economia, Finanças e Plano, tanto quanto me recordo, na comissão ele apenas disse que desconhecia os valores que há pouco referi. Ora, como esses valores que constam da II Série, Suplemento ao n.º 160, do Diário da Assembleia da República, gostaria de saber se é isso o que o Sr. Secretário de Estado considera suficiente para a explicação das verbas que se propõem e das que não se propõem.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, do que se trata é da publicação de contas provisórias do Estado para 1988 e não de contas definitivas.
Ora, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais melhor do que ninguém, pois é ele quem trabalha no «miolo» das receitas fiscais, sabe se as receitas são ou não equilibradas. Ele já as confirmou e a verdade é que não estou em condições senão de respeitar, sublinhar e reforçar a sua cabal informação em sede de Comissão de Economia, Finanças e Plano.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrado o debate, pelo que vamos passar à votação da proposta de substituição ao artigo 8.º, apresentada pelo Grupo Parlamentar do PCP.
Submetida a votação, foi rejeitada, com votos contra do PSD, votos a favor do PS, do PCP, do PRD e do Deputado Independente João Corregedor da Fonseca e a abstenção do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados vai ser lida uma proposta de aditamento de um novo artigo, subscrita pelo PS.
Foi lida é a seguinte:
Entrega aos Municípios do Imposto para o Serviço de Incêndios.
1 - Nos termos do número 3 da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 1/87 (Lei
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das Finanças Locais), o Governo transferirá para as autarquias, até ao próximo dia 31 de Dezembro de 1988, o montante global de 659 250 639$00, dando como contrapartida igual montante de receitas por transferência do Imposto de Incêndios cobrado pelo Instituto Nacional de Seguros de Incêndios e nos Seguros Agrícolas e Pecuários.
2 - O montante a atribuir a cada município é o que consta do Mapa I anexo.
3 - O Governo tomará as providências necessárias para conformar o Orçamento Privativo do Instituto de Seguros de Portugal ao disposto no n.º 1.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há pouco assistimos a um vivo debate sobre este tema que, pelo menos, demonstrou que os bombeiros têm, em todas as bancadas desta Câmara, defensores que se empenham a fundo na defesa das condições mínimas do desempenho da sua missão.
Certamente que o Governo não deve querer alhear-se desse movimento de mobilização em volta da criação de condições mais favoráveis aos bombeiros e, nestas circunstâncias, julgo que serviria os interesses da Câmara, do Governo e do País se todos por consenso, aceitássemos que este artigo voltasse à comissão.
Nessas condições, o Governo teria oportunidade de expor mais profundamente o que tenciona fazer e, inclusivamente, tomar iniciativas que viabilizem a defesa dos interesses dos bombeiros numa perspectiva nacional.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, continua em apreciação esta proposta de aditamento de um novo artigo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito: - Sr. Presidente, creio que se devia considerar a proposta que foi feita pelo Sr. Deputado João Cravinho, no sentido de este tema regressar à comissão, de modo a ser apreciada juntamente com o Governo.
Portanto, creio que a sugestão feita pelo Sr. Deputado João Cravinho deveria ser tomada como requerimento oral, a fim de ser votado.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, a Mesa não tem que tomar em consideração sugestão alguma. Na verdade, trata-se de uma intervenção que foi ouvida por todas as bancadas e, como tal, são estas que, em função do que ouviram, se devem manifestar.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.
O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, apenas gostaria de comunicar que o Grupo Parlamentar do PSD não vê inconveniente em que a proposta em questão baixe à comissão.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, também gostaria de dizer que não levantamos objecções a que a proposta baixe à comissão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver nenhuma oposição a que esta proposta baixe à comissão, vai ser lida uma proposta de aditamento de um novo artigo, apresentado pelo PS.
Foi lido. É o seguinte:
Reforço do Fundo de Equilíbrio Financeiro por aumento da previsão de receitas do IVA.
1 - Por aplicação conjugada do artigo 9.º da Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro, e do disposto no artigo 8.º da presente lei, o montante do Fundo de Equilíbrio Financeiro para 1988 é fixado em 97,6 milhões de contos.
2 - As transferências financeiras a que se refere o número anterior são repartidas entre corrente e de capital, na proporção de 60% a 40%, respectivamente.
3 - O montante global a atribuir a cada município no ano de 1988 é o que consta do mapa VI anexo.
4 - Excepcionalmente em 1988 serão permitidas três revisões ao orçamento municipal.
O Sr. Presidente: - Está em apreciação.
Pausa.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta dá conteúdo legal às afirmações que já fiz aquando da discussão na generalidade de, mais uma vez, voltar a chamar a atenção da Câmara para este aspecto.
A proposta que é feita representa, exclusivamente, a aplicação textual da lei das finanças locais.
Gostaria ainda de chamar a atenção do Governo para o seguinte facto: esta proposta não representa, em termos globais, qualquer acréscimo de despesas para o Estado, se considerarmos os Orçamentos do Estado para 1988 e para 1989, porque, obviamente, esta verba que as câmaras, por direito, irão receber em 1988 já não a poderão receber em 1989, visto que ela será deduzida em 1989. Daí que esta proposta não tenha qualquer significado em termos de Orçamentos do Estado para 1988 e para 1989.
Contudo - e isto é muito importante -, esta proposta vai possibilitar às câmaras resolverem os problemas dos funcionários da Administração Local.
Este assunto talvez seja demasiado técnico para estar a ser aqui tratado, pelo que sugiro que também esta proposta baixe à Comissão para aí a podermos analisar.
O Sr. Presidente: - Continua em discussão. Não havendo mais inscrições, dou por encerrada a discussão desta proposta pelo que passamos à votação.
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A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, e quanto ao requerimento oral que formulei?
O Sr. Presidente: - Vamos então votar o requerimento feito pela Sr.ª Deputada Helena Torres Marques, com vista a que a proposta de aditamento de um artigo novo, que há pouco foi lida, baixe à Comissão.
Submetido a votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do PRD, do CDS e do Deputado Independente João Corregedor de Fonseca.
O Sr. Presidente: - Vamos agora votar a proposta de aditamento de um artigo novo, apresentado pelo PS.
Submetida a votação, foi rejeitada, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do PRD, do Deputado Independente João Corregedor da Fonseca e a abstenção do CDS.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma declaração de voto.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, não há declarações de voto na discussão na especialidade.
Srs. Deputados, chamo a vossa atenção para ver como...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, se me permite peço a palavra para fazer uma muito breve intervenção. Estamos em matéria de discussão do Orçamento e eu gostaria de fazer uma intervenção.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, deixa-me, ao menos, pôr qualquer coisa à discussão?!...
Risos.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, não queria usar a figura regimental da interpelação à Mesa, mas até posso usá-la.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, perante esta decisão da Mesa, gostaria de dizer que estamos num processo de discussão orçamental que o Regimento continua a manter e que tem um processo específico. Neste caso, o debate não se rege pelo processo normal de discussão das leis.
Já no início desta discussão coloquei uma questão à Mesa que me pareceu ter sido menos considerada, menos ponderada pela mesma e que era a de começar por se discutir todas as propostas de alteração e só depois as propostas do Governo.
A meio do debate introduziu-se ainda uma outra alteração, que foi a de passarmos das despesas para as receitas e depois das receitas para as despesas.
Sr. Presidente, o processo orçamental tem regras próprias e específicas e é conveniente que não continuemos a embrulhar tudo isto. Neste momento, temos um processo regimental, em termo quantitativos, relativamente pequeno e talvez não nos percamos; no entanto, se utilizarmos este método para um processo orçamental normal, isto é, para a discussão de um Orçamento inicial, julgo que nos perderemos completamente e que não há razão para deixarmos de continuar a manter
a lógica do processo específico que é regimental e legal, do Orçamental do Estado.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Octávio Teixeira poderá ter razão. É uma chamada de atenção à Mesa.
Sr. Deputado, no quadro do Orçamento do Estado para 1989, cujo início está previsto para a próxima quarta-feira, iremos ter isso em atenção, para podermos possibilitar o cumprimento do Regimento e para fazer que se privilegie e dê condições para o bom funcionamento da Assembleia.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa, na mesma linha da intervenção do Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, estamos a discutir, em Plenário, o que normalmente, de uma forma mais ordenada - permita-me que lhe diga -, costumamos fazer na Comissão de Economia, Finanças e Plano, ou seja, estamos aqui a seguir as regras - que, penso, não foram alteradas - para a discussão e votação em Comissão.
Ora, nessa Comissão sempre fizemos declarações de voto e até gostaria de lhe dizer Sr. Presidente, que já hoje foram feitas várias declarações de voto. Vamos mudar o Regimento a meio da discussão? Vamos mudar a forma de discutir a meio da discussão, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Helena Torres Marques, nesse caso, tendo já sido feitas declarações de voto, a Mesa não tem dúvida - e temos de considerar que está a presidir quem não esteve presente ao longo da sessão - de lhe dar a palavra para uma declaração de voto.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Agradeço, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Gostaria que ficasse registado que se acabou de votar contra a aplicação da lei de finanças locais, como textualmente está prevista.
Gostaria que ficasse registado que quando foi o aumento de 1,9% o PSD invocou que o aumento não podia ser maior, porque a lei não o permitia. Agora, a lei permite e o PSD não quer aumentar as receitas das câmaras. Sendo assim, as câmaras terão grandes dificuldades - ou não será mesmo possível - em fazer a correcção dos vencimentos dos funcionários da Administração Local, ou seja, os Srs. Deputados do PSD acabaram de votar contra a possibilidade de as câmaras terem meios para pagar aos seus funcionários, acabaram de votar maiores dificuldades para as câmaras do País e para todos os funcionários da Administração Local. Que fique registado!
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, solicito a vossa ajuda para a continuação dos nossos trabalhos. Se os Srs. Deputados estão de acordo, passaremos, de seguida, à votação do artigo 2.º da proposta de lei e assim sucessivamente.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, se não me engano, saltou-se a votação de uma proposta de substituição. Trata-se da proposta do PS que propõe a eliminação do n. º 2 do artigo 6.º que já foi votada, propõe a substituição do n.º 1, deste artigo. Como não estava bem referido na proposta, penso que isso deve ter complicado a análise da Mesa.
Assim, na nossa proposta propomos a alteração da epígrafe e do n.º 1 do artigo 6.º Penso, portanto, que devemos discutir estes assuntos.
O Sr. Presidente: - A Mesa não consegue identificar a proposta a que a Sr.ª Deputada se referiu, pelo que lhe peço o favor de a ler para que possamos identificar.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - A proposta é relativa ao artigo 6.º...
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, muito obrigada, mas já conseguimos identificar a proposta a que se referiu.
Sr.ª Deputada, a proposta é relativa ao artigo 6.º?
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, trata-se de uma proposta de substituição da epígrafe e do n.º 1 do artigo 6.º
O Sr. Presidente: - Este artigo baixou à comissão, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Peço desculpa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação na especialidade, começando pelo artigo 2.º da proposta de lei.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, teremos que começar a partir do artigo 4.º, uma vez que os artigos 2.º e 3.º já foram votados.
O Sr. Presidente: - Assim se fará, Sr. Deputado. Srs. Deputados, está em apreciação o artigo 4.º da proposta de lei. Como não há inscrições, vamos passar à votação.
Submetido a votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do CDS e do Deputado Independente João Corregedor da Fonseca e a abstenção do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão do artigo 5.º Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de, numa pequena intervenção, fazer notar que este Governo que tanto quer acabar com os fundos e serviços autónomos, vai criando todos os dias ou, pelo menos, todos os anos, mais um desses fundos e quando aparece algum problema vem dizer que não consegue resolver se não criar fundos e serviços autónomos. É um Governo que, de facto, não tem coerência, neste ponto!
É evidente que votaremos as disposições em causa, sem qualquer problema. Todavia, pensamos que um Governo que faz a «cruzada» no sentido de dar unidade ao Orçamento, poderia ter encontrado outras soluções.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr. Deputado João Cravinho, perante uma calamidade como aquela que sucedeu ao Chiado, em que o Governo tomou uma decisão, assumiu uma responsabilidade, fez comparticipar os poderes autárquicos prejudicados e os representantes dos interesses que foram afectados pelo incêndio do Chiado, cria um fundo que não tem as mesmas características dos outros fundos, como o Sr. Deputado poderá ver ao consultar o decreto-lei que o criou - aliás, já publicado há bastante tempo. Para além disso gestão desse fundo está confiada a um conselho consultivo composto por várias entidades, tudo isto num espaço de tempo bastante curto, que poderá ser prejudicado se, por absurdo, houvesse um protelamento na aprovação e publicação desta alteração à Lei do Orçamento. Perante estas circunstâncias, o Sr. Deputado João Cravinho vem criticar o Governo, dizendo que, simultaneamente, com a extinção de alguns fundos, o Governo, cria outro fundo que, aliás, tem um prazo de vigência limitado no tempo!
Quero acreditar que só por distracção é que o Sr. Deputado João Cravinho pode elencar o Fundo para a Reconstrução do Chiado com outros fundos, aqueles que todos queremos acabar e temos estado a extinguir. Mas o Sr. Deputado avança com algumas soluções? Não as conheço!
O que foi importante neste caso foi o facto de o Governo ter agido com transparência, rapidez e em solidariedade, isto é um aspecto essencial!
Quando aos outros aspectos, se há alguma critica a fazer quanto à criação deste fundo, gostava que o Sr. Deputado João Cravinho a fizesse aqui e agora e avançasse as tais soluções alternativas mais eficazes, mais transparentes e mais operacionais.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Secretário de Estado, não confundamos as coisas!
Aplaudo, sem qualquer reserva, a rapidez com que o Governo veio trazer auxílio a este caso e nada daquilo que eu disse é contra isso.
Referi-me, simplesmente, à forma e o Sr. Secretário de Estado tem que concordar, por uma razão lógica,
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que não há uma forma única e que a adoptada pelo Governo, não é, por definição e só por isso, e a priori, a melhor de todas.
Parece-me que esta era uma boa ocasião para afirmar confiança no poder local e penso que a Câmara de Lisboa poderia receber, por via directa, uma parte razoável desta verba.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Isto faz parte do fundo!
O Orador: - Penso que era ocasião de olhar as formas concretas que o Governo tem para intervir em caso de catástrofes a calamidades que nos atingem, que não podem ser previstas no caso concreto, mas em que pode ser prevista a modalidade de intervenção.
Sabemos que em Portugal a prevenção civil está num estado calamitoso e catastrófico. Portanto, era talvez a altura de pensar num modo de intervenção que permitisse na generalidade - e não perante cada caso concreto - actuar rápido.
Sr. Secretário de Estado, não infira daquilo que eu disse qualquer crítica à oportunidade e a presteza do Governo, e não é agora ocasião para estar a analisar esse assunto.
De qualquer maneira, penso que o Governo cumpriu e quem cumpre merece, com certeza, consideração e não que tenhamos uma perspectiva acrítica que englobe neste cumprimento o elogio de tudo e qualquer coisa.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, entendamo-nos. Aquilo que quero dizer é que este ano temos três calamidades e então críamos três fundos: o Chiado, a Segurança Social e a dívida pública ... Bom, vamos lá ver se o Governo tem um pouco mais de imaginação e se está mais coerente consigo próprio!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados vamos votar o artigo 5.º da proposta de lei.
Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de «Os Verdes» e o Deputado Independente Raul de Castro.
É o seguinte:
Artigo 5.º
Incêndio do Chiado
É concedida uma dotação de cinco milhões de contos ao Fundo Extraordinário da Ajuda e Recuperação do Chiado (FEARC), a qual se destina a viabilizar o apoio, pelo Orçamento do Estado, à reconstrução e revitalização das áreas afectadas pelo incêndio naquela zona.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o artigo 6.º baixou, também, à comissão, segundo o consenso anteriormente estabelecido.
Está em apreciação o artigo 7.º da proposta de lei.
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Castel Branco.
O Sr. José Castel Branco (PS): - Sr. Presidente, aquando na discussão na generalidade, tive ocasião de pedir ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento que me elucidasse sobre qual o destino que foi dado aos seis milhões de contos que foram transferidos para o Serviço Nacional de Saúde. O Sr. Secretário de Estado
do Orçamento teve a bondade de não responder à minha pergunta, tendo posteriormente acrescentado, embora não me lembre exactamente das palavras, mas que seria como que uma espécie de prova de boa vontade, no sentido de indicar que os Orçamentos do Serviço Nacional de Saúde seriam considerados, uma vez que desta matéria se tratava, como prioritários.
É claro que, agora, com a citação de alguns números vou incomodar um pouco a Câmara, dado que não me parece que sejam exactas as palavras do Sr. Secretário de Estado, quando diz que, efectivamente, dá prioridade ao Serviço Nacional de Saúde, ou seja, ao Ministério da Saúde em geral.
A verdade é que, no Orçamento para 1988, previa-se uma expansão dos serviços da ordem dos 10,86%. Todavia, penso que a realidade não foi esta, como vou tentar demonstrar.
Com efeito, para 1987, o financiamento do Estado foi de 173 902 milhares de contos. Deduzindo o défice de 1986, que foi de 14 695 milhares de contos, restava para aquele ano 159 207 milhares de contos.
Por sua vez, o financiamento do Estado em 1988 foi de 192 470 milhares de contos. Deduzindo o défice de 1987 que foi de 22 798 milhares de contos, e os valores transferidos para o IPO e para o Instituto Gama Pinto, na altura também transferidos para o Ministério da Saúde, da ordem dos 3500 milhares de contos, restavam, para gastos do ano, 166 162 milhares de contos.
Acontece que isto corresponde a uma variação de 4,3% e não aos 10,687o anunciados. Isto é, um valor que estava abaixo da inflação prevista pelo Governo e pelo menos 50% abaixo em relação à taxa real de inflação.
Dizia o Sr. Secretário de Estado que havia prioridade para o sector da saúde e a transferência dos seis milhares de contos era um sinal nesse sentido. Penso que nada menos exacto e pergunto: como é que se compreende que seja prioritário um sector onde o défice cresce à razão de 5000 milhares de contos por ano e o financiamento do Orçamento do Estado cresce, é facto, mas cresce cada vez menos?
Assim - e peço desculpa por citar tantos números -, o financiamento do Estado para 1989 será de 227 441 milhares de contos. Deduzindo o défice de 1987 restará, para o ano, 199 537 milhares de contos, isto é, um diferencial de 5,43.
Considerando a despesa total prevista e comparando 1988 com 1989, crescimentos tão elevados do ponto de vista económico, e menores taxas de crescimento em termos de financiamento significam, a meu ver, um endividamento crescente do Serviço Nacional de Saúde, cujo défice se aproximará, no fim do próximo ano, dos 34 000 milhares de contos e uma sobrecarga de participação dos utentes, já que as receitas próprias passaram de 6744 milhares de contos em 1986 para 14 011 milhares de contos em 1988.
Em suma, crescente endividamento do sector, tendo como consequência uma menor participação do Estado e uma maior participação de utentes. Onde está, pois, Sr. Secretário de Estado, a prioridade?
Para terminar, e tendo em conta os elevadíssimos valores das verbas em jogo, insisto em que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento tenha a bondade de responder à questão que lhe coloquei: qual o destino dos 6000 milhares de contos que foram transferidos para o Serviço Nacional de Saúde?
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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A nossa posição em relação ao artigo 7.º decorre, naturalmente, do debate que já aqui realizámos, ou seja, consideramos que as verbas que constam dos n.ºs 2 e 3 do artigo 7.º são insuficientes, nomeadamente para o Serviço Nacional de Saúde e para os trabalhadores da Administração Pública. Como consideramos que estas verbas são insuficientes, ir-nos-emos abster na votação do artigo 7.º
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, para poupar uma declaração de voto e manter alguma coerência no funcionamento dos trabalhos, desejo dizer que a nossa posição é mais pragmática. Com efeito, também considerámos que a verba do n.º 3 é insuficiente e, como o Sr. Deputado Castel Branco já demostrou à saciedade, nada sabemos sobre a suficiência da verba do n.º 2.
A questão traduz-se no facto de não querermos associar o nosso voto à inviabilização destas dotações. Isto significa a tal confissão de fracasso por parte do Governo e nós sofragamo-la com o nosso voto. Vamos votar favoravelmente.
O Sr. Presidente: - Para prestar esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr. Presidente, é apenas para esclarecer os Srs. Deputados Castel Branco, Ilda Figueiredo e Nogueira de Brito.
É evidente que a visão que estão a fazer do Serviço Nacional de Saúde é exactamente contrária aos interesses dos utentes dos sistemas de saúde em Portugal, porque os Srs. Deputados estão a ter uma visão incrementalista baseada nas ineficiências multiplicadas por um índice qualquer, que tem a ver com muito mais ineficiências.
O que se tem passado é que o Governo social-democrata, herdando dívidas, herdando ineficiências, herdando injustiças para os utentes do Serviço Nacional de Saúde e, até, dos outros sub-sistemas de protecção à saúde, introduziu normas de racionalidade, de modernização e de reforço dos cuidados de saúde em Portugal.
Lamento que os Srs. Deputados que acabaram de intervir tenham uma visão meramente incrementalista e não numa visão do que é a verdadeira prestação de saúde aos cidadãos portugueses.
Todavia, se quiserem fazer um debate - e penso que não é esta a sede própria nem estou à vontade, naturalmente, para discutir as políticas sectoriais e os projectos da saúde, pois não é essa a parte que me cabe -, apenas posso dizer que deve ser, com certeza, um debate interessante. De qualquer modo, irão ter, em sede de discussão do Orçamento para 1989, a resposta cabal e adequada do Governo, no sentido que o Orçamento do Serviço Nacional de Saúde cresce muito, e irá continuar a crescer, sendo dos que mais absorve as prioridades do Governo para 1989. Essa é a verdade nua e crua que vai ser provada no Orçamento para 1989.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, agradeço-lhe muito os esclarecimentos que tentou dar, e é realmente com V. Ex.ª que tem que se fazer esta discussão do Orçamento do Ministério da Saúde.
Isso é verdade e nós até já desistimos de a fazer com a Sr.ª Ministra da Saúde, porque ela não nos consegue explicar, por exemplo, um défice acrescido que todos os anos passa de um orçamento para outro. Este é realmente um orçamento global e V Ex.ª, nessa medida não está, com certeza, em condições de dizer para o que é e para o que não é, apesar de lhe terem justificado o pedido das verbas, e só quanto a esse aspecto é que estará em condições de o fazer.
O que acontece, Sr. Secretário de Estado, é que nós não temos uma posição incrementalista, pois o que vemos é que há deficiências acrescidas no pagamento de serviços a terceiros, há atrasos em pagamentos, há um défice que cresce todos os anos e que passa dum ano para o outro, e que continua a não ser cabalmente explicado à Câmara. É V. Ex.ª, de facto, que tem de se debruçar sobre a doença do Orçamento do Ministério da Saúde, para ver se lhe consegue ministrar uma terapêutica que o consiga pôr são.
É evidente que nós sabemos que há vários trabalhos em curso, há a revisão constitucional em curso, mas, para já, não lobrigamos política nenhuma que possa considerar-se terapêutica adequada para a doença do orçamento do Ministério de Saúde.
O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado José Castel Branco.
O Sr. José Castel Branco (PS): - Sr. Presidente, quero pedir-lhe que me esclareça se o Sr. Secretário de Estado fez uma intervenção ou se me pediu esclarecimentos, pois eu tinha feito uma intervenção.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa considerou uma intervenção.
O Sr. José Castel Branco (PS): - Sr. Presidente, nesse caso peço a palavra para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Castel Branco (PS): - Sr. Secretário de Estado, devo dizer a V. Ex.ª que, apesar de tudo, continuo sem saber qual é o destino dos 6 milhões de contos.
Por outro lado, também queria dizer-lhe que não corresponde à verdade o que o Sr. Secretário de Estado acaba de dizer que o Orçamento do Estado para 1989 - que, aliás, já estivemos a discutir na Comissão de Saúde - seja, de facto, um orçamento de expansão para o Serviço Nacional de Saúde. Antes pelo contrário, penso que é fortemente contracionista.
Gostaria também de dizer ao Sr. Secretário de Estado que os números que lhe dei e que de resto fundamentam
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perfeitamente a minha intervenção, foram feitos de uma forma extremamente simples, com operações de somar, subtrair e regra de três simples, a partir de elementos que foram fornecidos à Comissão de Saúde pela Sr.ª Ministra da Saúde e de uma máquina de calcular que, em princípio, estava a funcionar bem.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Secretário de Estado, quer no n.º 2, quer no n.º 3, ou seja, o que se refere ao Serviço Nacional de Saúde e o que se refere aos trabalhadores da Administração Pública, foram assuntos tratados aquando do debate do Orçamento do Estado para 1988 e já nessa altura foi afirmado, nomeadamente pela minha bancada, que as verbas então apontadas pelo Governo eram insuficientes.
Hoje, o Governo reconhece, de alguma maneira, essa insuficiência. Mas reconhece mal, porque continua a insistir em não ter em conta a verdade dos números e a realidade da situação.
É ou não verdade que para 1989 os senhores apontam para a continuação desta política dos 6% para a Administração Pública, no crescimento das remunerações salariais e também no Serviço Nacional de Saúde com verbas que continuam a ser insuficientes?
Certamente que daqui por um ano estaremos aqui a fazer um debate idêntico em relação ao Orçamento do Estado para 1989.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Secretário de Estado, espero que entenda a questão que vou colocar-lhe.
Como é natural, o Sr. Secretário de Estado, está aqui a ser solicitado para responder a questões de Serviço Nacional de Saúde, que suponho que ignora e com toda a legitimidade.
O Sr. Secretário de Estado sabe dos défices, das razões dos défices não! Na organização do Governo, o responsável político dessas pastas, o ministro ou os secretários de Estado, é que o sabem e é evidente que o Sr. Secretário de Estado está aqui com a maior das boas vontades a esclarecer a Câmara, dentro do que conhece e a prestar os esclarecimentos vários que lhe são solicitados.
Simplesmente, Sr. Secretário de Estado, não seria curial e normal, não seria desejável que, em termos da discussão na especialidade de alterações orçamentais ou do Orçamento, estivessem aqui presentes os membros do Governo ou membro do Governo com a responsabilidade directa na pasta que está em causa?
Parece-me que era! Não houve possibilidades de estar aqui presente o membro do Governo em causa? Ora, seria bom que de futuro se acautelasse este relacionamento do Governo com a Assembleia, de modo a que não tivesse-mos que colocar o Sr. Secretário de Estado na posição que vem desempenhando com grande brilho, como se pode bem compreender, mas com uma manifesta afectação da sua saúde.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
Vozes do PS: - Está nervoso!
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Srs. Deputados, não estou nervoso! Talvez esteja é um pouco cansado de ouvir coisas que pensava que já não se ouviam nesta Casa!
Relativamente ao que a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo disse, esqueceu-se que, nos termos regimentais, não estamos a discutir o Orçamento do Estado para 1989, mas sim uma alteração ao Orçamento para 1988.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - O senhor é que falou nisso!
O Orador: - O Sr. Deputado José Castel Brenco disse que foi com base numas contas de somar e subtrair... Ó mal é esse! É que uma gestão orçamental moderna já não se faz só com contas de somar e subtrair. Faz-se com técnicas de gestão orçamental, faz-se com análises de custos é isso que está a ser feito no sector da saúde em 1988.
Portanto, a discussão do Orçamento do Estado para 1989 vai ser a altura ideal para confirmarmos que o orçamento da saúde até poderia não ter crescido em termos meramente nominais em 1989 e ser razão e força para dizer que o sistema de assistência à saúde ia melhorar. Bastava tão só que os custos fossem diminuindo, bastava tão só que houvesse a racionalização que está a ser empreendida no sistema de saúde em Portugal, ao contrário dos tempos socialistas. Por exemplo, peço ao Sr. Deputado José Castel Branco e ao Sr. Deputado João Cravinho que, até à discussão do Orçamento para 1989, consultem e vejam o que se passa em termos de encargos com a assistência medicamentosa.
Ela está a ser racionalizada! Estão a ser combatidas as fraudes, as ineficiências. Tenho aqui, por exemplo elementos do sub-sistema que é a ADSE: em Setembro, os encargos foram reduzidos em 5,5%, relativamente ao período homólogo, e em Outubro 0,8%.
Como vão longe os tempos da governação socialista em que os encargos cresciam 25% ao ano com a assistência à saúde. E porquê? Porque foram introduzidas normas de racionalização que os governantes socialistas do sector da saúde souberam introduzir a seu tempo e que poderiam ter trazido grandes prejuízos aos utentes, se o Governo social-democrata não tivesse invertido essa tendência, que poderia ser calamitosa para a protecção à saúde em Portugal.
O Sr. José Castel Branco (PS): - Mas nós não tirávamos benefícios aos utentes!
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O Orador: - Alterámos e vamos continuar a alterar, para que a saúde em Portugal seja cada vez melhor e mais bem protegida.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrado o debate sobre o artigo 7.º e vamos passar à sua votação.
Submetido a votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS e as abstenções do PS, PCP, PRD e do Deputado Independente João Corregedor da Fonseca.
É o seguinte:
Serviço Nacional de Saúde e despesas excepcionais
1 - São anulados, no capítulo 60 do orçamento do Ministério das Finanças, os montantes de 5 200 000 contos e de 800 000 contos em, respectivamente, «Bonificações de juros» e «Subsídios a empresas públicas e participadas».
2 - É atribuído o montante de 6 milhões de contos ao Departamento de Gestão Financeira dos Serviços de Saúde, para reforço financeiro do Serviço Nacional de Saúde, com contrapartida nas anulações a que se refere o número anterior.
3 - É ajustada em mais de 8 milhões de contos a verba inscrita no capítulo do orçamento do Ministério das Finanças, em «Dotação provisional», «Outras despesas correntes», para fazer face à remuneração extraordinária de 1988.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à apreciação do artigo 8.º
Submetidos a votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, votos contra do PS, do PCP, do PRD e do Sr. Deputado Independente João Corregedor da Fonseca e a abstenção do CDS.
É o seguinte:
Receitas fiscais
1 - É aumentada em 50 milhões de contos a previsão da cobrança das receitas fiscais, na sequência dos resultados já obtidos em execução da política fiscal, nos termos seguintes:
a) Contribuição industrial - 10 milhões de contos;
b) Imposto profissional - 15 milhões de contos;
c) Imposto sobre o valor acrescentado - 25 milhões de contos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão o artigo 9.º da proposta de lei
Como não há inscrições, vamos passar à votação, Srs. Deputados.
Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de «os Verdes».
É o seguinte:
Comunidades Europeias
É aumentado em 5 900 000 contos o montante respeitante à previsão das restituições provenientes das Comunidades Europeias.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a apreciação das propostas relativas ao artigo 1.º fica adiada para a próxima sessão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, não temos nada contra esse adiamento, só que a proposta apresentada pelo PCP está, de facto, mal classificada e assumimos a responsabilidade desse erro.
Nesse sentido, deve reclassificar-se, passando a ter o título de «proposta de emenda» dado tratar-se, apenas, de uma emenda ao artigo 1.º e não de uma substituição.
Assim, solicitamos a requalificação para que seja votada a proposta de emenda do PCP, ficando para a próxima sessão a discussão do artigo l.º com o texto que resultar desta votação.
Portanto, repito que solicitamos agora a votação da nossa proposta de emenda, substituindo-se a palavra «rectificado» por «alterado».
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa propôs que ficasse adiada para a próxima sessão a apreciação tanto do artigo 1.º como das respectivas propostas de alteração -, de aditamento, de substituição ou de emenda.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado, pensamos que seria preferível proceder-se, agora à votação da proposta de emenda apresentada pelo nosso partido.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, também está nesse caso, a proposta do CDS que é igualmente uma proposta de alteração.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Helena Torres Marques, penso que o Partido Socialista também apresentou uma proposta em relação ao artigo 1.º, só não sei se haverá mais alguma alteração a fazer-lhe, à parte a mudança da palavra «rectificado» por «alterado».
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, chamo a atenção para a epígrafe que terá de ser alterada.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo nada em contrário, vamos passar à apreciação das propostas de alteração ao artigo 1.º
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.
O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, julgo que a doutrina defendida pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira só é válida em relação à proposta apresentada pelo PCP e não em relação à do Partido Socialista visto que esse partido propõe, além disso, uma alteração num quadro. Portanto, esta proposta deveria ser votada aquando da votação do artigo 1.º
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, é para dizer que o quadro que pretendemos ver incluído fazia parte de uma proposta que não mereceu
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a aprovação da Câmara e, portanto, pensamos que pode ser votada a epígrafe e a alteração que está expressa no princípio da nossa proposta, tal como acontece com as do PCP e do CDS, e que creio ter merecido já o consenso da Comissão de Economia Finanças e Plano e de toda a Câmara.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em apreciação três propostas de emenda relativas ao artigo 1.º, subscritas pelo PCP, pelo PS e pelo CDS.
Nos três casos, a epígrafe é emendada passando da palavra «rectificação» para «alteração» e, depois no corpo do artigo, onde está a palavra «rectificado», deverá ler-se «alterado».
Srs. Deputados, como não há inscrições, vamos passar à votação destas três propostas de emenda, apresentadas, respectivamente pelo PCP, e pelo PS e pelo CDS, apenas no que toca à epígrafe e à emenda da palavra que já referi.
Submetidas a votação, foram aprovadas, com votos a favor do PS, do PCP, do PRD, do CDS e do Deputado Independente João Corregedor da Fonseca e a abstenção do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a próxima sessão terá lugar na quarta-feira, 23 de Novembro, pelas 10 horas.
A ordem dos trabalhos será constituída, em primeiro lugar, pela continuação do debate na especialidade dos restantes artigos da Proposta de Lei n.º 73/V e a respectiva votação final global, seguindo-se-lhe a apreciação e votação do primeiro Orçamento Suplementar da Assembleia da República e, em terceiro lugar, a apreciação da Proposta de Lei n.º 74/V - Orçamento de Estado para 1989 e da Proposta de Lei n.º 75/V - Grandes Opções do Plano para 1989/1992 e Grandes opções do Plano para 1989.
Além disto, a reunião de conferência de líderes, que terá lugar na próxima terça-feira, poderá vir a agenciar matéria directamente conexa com o diploma que hoje esteve em apreciação, a qual não pôde ser agendada por ainda não ter dado entrada na Assembleia da República.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, é apenas para colocar a hipótese de trocar a ordem dos factores. Aliás, trataremos desse assunto na conferência de líderes mas agradecia que não ficasse com carácter definitivo a ordem dos trabalhos que V. Ex.ª anunciou para a próxima sessão, ficando admitida a hipótese de se trocar essa ordem.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, então a conferência de líderes pronunciar-se-á definitivamente sobre esse problema.
Não havendo mais nada a tratar, está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 25 minutos.
Entraram durante a sessão os Srs. Deputados:
Partido Social Democrata (PPD/PSD):
António José Caeiro da Motta Veiga.
António Maria Pereira.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Arménio dos Santos.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Mendes Costa.
Jaime Gomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
José Angelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Luis Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Leonardo Eugénio Ribeiro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Maria Assunção Andrade Esteves.
Paulo Manuel Pacheco Silveira.
Partido Socialista (PS):
João Cardona Gomes Cravinho.
José Barbosa Mota.
Maria do Céu Fernandes Esteves.
Maria Helena do R. da C. Salema Roseta.
Partido Comunista Português (PCP):
Ana Paula da Silva Coelho.
Carlos Alfredo Brito.
Fernando Manuel Conceição Gomes.
João António Gonçalves do Amaral.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Natália de Oliveira Correia.
Centro Democrata Social (CDS):
Basílio Adolfo de M. Horta de Franca.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social Democrata (PPD/PSD):
Adérito Manuel Soares Campos.
Álvaro Cordeiro Damaso.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira.
António Abrantes Pereira.
António Roleira Marinho.
Carlos Alberto Pinto.
Cecília Pita Catarino.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Flausino José Pereira da Silva.
Henrique Nascimento Rodrigues.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
OS REDACTORES: Maria Amélia Mortais - José Diogo - Ana Maria Marques da Cruz.
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DIÁRIO da Assembleia da República
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