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I Série - Número 39

Quinta-feira, 16 de Fevereiro de 1989

DIÁRIO da Assembleia da República

V LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 15 DE FEVEREIRO DE 1989

Presidente: Exmo. Sr. Vítor Pereira Crespo
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Vítor Manuel Caio Roque
Cláudio José dos Santos Percheiro
Daniel Abílio Ferreira Bastos

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.ºs 351/V e 352/V.
A Câmara reapreciou e aprovou, na generalidade, o Decreto n. º 127/V - Alteração à Lei n.º 14/87, de 29 de Abril (Lei Eleitoral para o Parlamento Europeu) -, tendo depois aprovado, na especialidade e em votação final global, uma proposta de substituição dos artigos N.º, 2.º e 3.º apresentada pelo PSD.
No debate intervieram, a diverso título, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho), os Srs. Deputados Carlos Brito (PCP), Jorge Lacão (PS), Montalvão Machado (PSD), Nogueira de Brito (CDS), António Guterres (PS), José Manuel Mendes (PCP), Silva Marques e Mário Raposo (PSD), Herculano Pombo (Os Verdes), Narana Coissoró (CDS) e Barbosa da Costa (PRD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira.
António Abílio Costa.
António de Carvalho Martins.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge Santos Pereira.
António José Caeiro da Motta Veiga.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Oliveira de Matos.
António Maria Ourique Mendes.
António Maria Pereira.
António Mário Santos Coimbra.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando Carvalho Guerreiro Cunha.
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carla Tato Diogo.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Pereira Baptista.
Carlos Manuel Sousa Encarnação.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Carlos Sacramento Esmeraldo.
Casimiro Gomes Pereira.
Cecília Pita Catarino.
César da Costa Santos.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos da Silva e Sousa.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Ercília Domingos M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Flausino José Pereira da Silva.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Gilberto Parca Madaíl.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Humberto Pires Lopes.
Jaime Gomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maçãs.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Angelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Batista Cardoso.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel José Dias Soares Costa.
Manuel Maria Moreira.
Maria Assunção Andrade Esteves.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Mary Patrícia Pinheiro Correia e Lança.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Bento M. da C. de Macedo e Silva.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Gomes da Silva.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Rui Manuel P. Chancerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

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Partido Socialista (PS):

Afonso Sequeira Abrantes.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes Silva Braga.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Manuel Oliveira Guterres.
António Miguel Morais Barreto.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Martins do Vale César.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Edite Fátima Marreiros Estrela.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
Helena de Melo Torres Marques.
João Barroso Soares.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Luís Costa Catarino.
José Apolinário Nunes Portada.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Florêncio B. Castel Branco.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Torres Couto.
José Socrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonor Coutinho Pereira Santos.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel António dos Santos.
Maria do Céu F. Oliveira Esteves.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
Ana Paula da Silva Coelho.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Alfredo do Vale Gomes Carvalhas.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Fernando Manuel Conceição Gomes.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria lida Costa Figueiredo.
Maria Luísa Amorim.
Maria de Lurdes Dias Hespanhol.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Renovador Democrático (PRD):

António Alves Marques Júnior.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Isabel Maria Ferreira Espada.
José Carlos Pereira Lilaia.
Natália de Oliveira Correia.
Rui dos Santos Silva.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):

Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Maria Amélia do Carmo Mota Santos.

Deputados Independentes:

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Maria Helena do R. da C. Salema Roseta.
Raul Fernandes de Morais e Castro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo que deu entrada na Mesa uma proposta de substituição ao artigo único do Decreto da Assembleia da República n.º 14/87, de 29 de Abril, que vai ser distribuído.
O primeiro inscrito para este debate é o Sr. Deputado Montalvão Machado. Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, na conferência de líderes, como V. Ex.ª se deverá recordar, ficou deliberado que seria dada ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares a primazia do uso da palavra.
Como o Sr. Ministro ainda não se encontra presente pedia, nos termos regimentais, a suspensão dos trabalhos por alguns minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o pedido é regimental, pelo que a sessão está suspensa.
Eram 15 horas e 21 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura dos diplomas entrados na Mesa.

O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: Projectos de Lei n.ºs 351 e 352/V, o primeiro apresentado pela Sr.ª Deputada Leonor Coutinho e outros, do PS, o segundo da iniciativa da Sr.ª Deputada lida Figueiredo e outros, do PCP, ambos relativos à lei de bases das comunicações, que, tendo sido admitidos, baixaram à 12.ª Comissão; Projecto de Lei n.º 352/V, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, que confere o direito de consulta prévia aos partidos da Oposição, no âmbito do respectivo estatuto, sobre matérias referentes às grandes opções de todos os planos de desenvolvimento económico e social e às orientações fundamentais dos planos e programas de desenvolvimento regional e sectorial que, tendo sido admitido, baixou à 6.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Lacão pede a palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, tendo em vista que só agora foi distribuída aos grupos parlamentares uma proposta de alteração, na especialidade, do decreto a cuja apreciação vamos proceder de seguida e que é necessário ponderar as implicações das alterações propostas, venho, em nome do meu grupo parlamentar, suscitar a necessidade de uma suspensão dos trabalhos por trinta minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o pedido é regimental, pelo que está suspensa a sessão.

Eram 15 horas e 27 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: - O Sr. Carlos Brito pede a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, foi-nos, finalmente, distribuído o texto das propostas de alteração apresentadas pelo PSD ao decreto em debate. Queria, por isso, que a Mesa me informasse se a apresentação deste conjunto de propostas significa que o PSD renunciou aos mecanismos confirmativos e optou, deliberadamente, pela via da alteração do decreto da Assembleia da República que foi vetado pelo Sr. Presidente da República e se, com este conjunto de alterações, passamos agora a outro processo legislativo, uma vez que estamos confrontados com uma nova lei, relativamente à qual se aplicam os dispositivos regimentais adequados.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Estamos esclarecidos!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a proposta de substituição é, em si, explícita, o Regimento é, em si, explícito.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Estamos esclarecidos! ...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Brito pede a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Para interpelar de novo a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, a resposta de V. Ex.ª é bastante esclarecedora...

Risos do PS e do PCP.

... e, em face dela, tomaremos as adequadas posições aquando da discussão, na generalidade, do conjunto de propostas apresentadas pelo PSD.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Narana Coissoró pede a palavra para que efeito?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, gostaria que V. Ex.ª definisse a metodologia que vai seguir, uma vez que ela não é explícita no Regimento.
Deparamo-nos, neste momento, com a seguinte situação: existe um decreto legislativo devolvido à Assembleia pelo Sr. Presidente da República, decreto que tem de ser aqui debatido para efeitos da segunda deliberação, conforme estipulado na Constituição. As propostas de alteração a esse decreto podem ser apresentadas até ao termo deste debate na generalidade, temos de debater aqui o decreto legislativo, quer seja para o confirmar, quer seja para sufragar as opiniões emitidas pelo Sr. Presidente da República ou decidir sobre qualquer outra solução.
Gostaria, portanto, que V. Ex.ª me informasse se vai ou não abrir o debate, na generalidade, sobre o decreto legislativo devolvido à Assembleia da República para efeitos de segunda deliberação.
Faço esta observação em virtude da resposta dada pelo Sr. Presidente ao Sr. Deputado Carlos Brito não ter sido suficientemente esclarecedora.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa deliberou por unanimidade, que se fará uma discussão, na generalidade, do decreto legislativo, nos termos do n.º 3 do artigo 165.º do Regimento.

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Informo, também, que já deu entrada na Mesa uma proposta de alteração para a discussão e votação na especialidade.
O que está, portanto, em questão é a reapreciação do decreto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, não percebi bem o que V. Ex.ª disse em relação ao n.º 3 do artigo 165.º do Regimento, o qual refere que «A votação na generalidade versa sobre a confirmação do decreto (...)»,
Haverá ou não haverá votação na generalidade, Sr. Presidente?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Tem de haver!...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, posso informado que vamos dar início à discussão na generalidade da reapreciação do decreto.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, o Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, o problema que se põe é o seguinte: tal como acontece com quaisquer outros diplomas legislativos terá de haver uma discussão e uma votação na generalidade, após o que se passará à fase de especialidade que tem regulamentação própria, prevista na lei. Consequentemente, o decreto agendado não pode deixar de ser votado na generalidade, pela segunda vez.
O facto de ter entrado na Mesa uma proposta de alteração na especialidade não quer dizer que, só por que o PSD a depositou na Mesa, o decreto tenha de ser alterado!... Essa proposta só será tomada em consideração aquando do debate na especialidade. Terá, pois, de haver uma votação que clarifique se a Câmara confirma ou rejeita o veto do Presidente da República. Pode suceder que confirme o decreto legislativo na sua pureza, sem alterações.
Nesse sentido, gostava, portanto, que V. Ex.ª me informasse qual o número de votos necessários para confirmar integralmente o decreto em análise.
Faço esta pergunta para interpretação do artigo 19.º do Regimento - e, neste momento, passo da figura de invocação do Regimento - que diz: «Compete ao Presidente relativamente a outros órgãos: d) Enviar ao Presidente da República, para os efeitos da alínea b) do artigo 137.º da Constituição, os decretos da Assembleia da República; (...)».
Assim sendo, em que termos enviará V. Ex.ª para o Sr. Presidente da República o decreto legislativo, para efeitos de promulgação obrigatória? Maioria absoluta de votos, isto é, 127 deputados ou maioria de dois terços de votos? Esta é a pergunta que faço, porque para o fluir do debate é preciso uma resposta clara.
O facto de haver uma proposta de alteração quando houver debate na especialidade não nos garante que na discussão na generalidade esta Câmara não confirme por inteiro o decreto devolvido à Assembleia da República, a não ser que V. Ex.ª saiba mais do que os deputados.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não tem razão, Sr. Deputado! Não impressione o Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Como o Sr. Deputado António Guterres pediu a palavra para interpelar a Mesa, responderei no fim a todas as interpelações suscitadas.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado António Guterres.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, na realidade, há pouco inscrevi-me para fazer uma interpelação à Mesa. No entanto, dado o que foi dito pelo Sr. Deputado Narana Coissoró, as questões que pretendia suscitar tornaram-se desnecessárias e aguardo serenamente a resposta do Sr. Presidente.

O Sr. José Puig (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Puig (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais gostaria de tecer algumas considerações relativamente àquilo que foi dito pelo Sr. Deputado Narana Coissoró.
Segundo o que consta nos artigos 165.º e 166.º do Regimento, só se pode saber com precisão se a Assembleia introduziu ou não alterações após a votação na especialidade. As alterações estão apresentadas e portanto não será na votação na generalidade que as vamos discutir ou votar.
Portanto, haverá que aguardar. Na realidade, após a votação na generalidade não se pode colocar a questão de saber se se vai enviar um novo diploma ao Sr. Presidente da República. Essa é uma questão que apenas se deverá colocar após a votação na especialidade. Só então saberemos se são ou não introduzidas alterações e veremos se se aplica ou não o n.º 2 do artigo 166.º do Regimento.
Este é o entendimento dos deputados da bancada do PSD.

Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Hermínio Martinho (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Hermínio Martinho (PRD): - Sr. Presidente, em nossa opinião, o que está em causa é um decreto que voltou a esta Assembleia com veto do Sr. Presidente da República e, por aquilo que temos estado a verificar, é óbvio que há grandes divergências na interpretação desta questão. Assim, para evitar o arrastamento desta situação indefinida, proponho ao Sr. Presidente que convoque de imediato uma conferência de líderes para ver se conseguimos ultrapassar esta situação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, convoco os presidentes dos grupos parlamentares e o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares para uma reunião no meu gabinete.

Está suspensa a sessão.
Eram 16 horas e 10 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 16 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a metodologia que iremos seguir é a seguinte: vamos agora apreciar o decreto na generalidade, com os tempos que já foram distribuídos aos grupos parlamentares, e fazer a votação na generalidade, ao que se seguirá a discussão na especialidade, tendo, para o efeito, sido distribuídos dez minutos a cada grupo parlamentar, e a respectiva votação na especialidade.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: S. Ex.ª o Presidente da República, no uso das suas competências constitucionais, entendeu devolver à Assembleia da República, para nova apreciação, o Decreto n.º 121/V que consubstancia alterações pontuais à lei eleitoral para o Parlamento Europeu.
Não se contesta, obviamente, o recurso a tal atitude, decorrente de uma prerrogativa inquestionável, importando antes desdramatizar aquilo que alguns sectores pretenderam empolar na busca de efeitos partidários de legitimidade pelo menos duvidosa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Escusam esses sectores de tentar provocar fissuras artificiais entre o Governo e os demais órgãos de soberania, seja a Presidência da República, seja a Assembleia da República: elementares razões de ética política e fundamentalmente o próprio interesse nacional não nos afastarão da linha de rumo adoptada e que passa pelo nosso empenho sério e continuado num correcto e profícuo relacionamento institucional com a Assembleia da República e com a Presidência da República.
Esta postura não nos inibe de, frontal e claramente discordar das razões aduzidas por S. Ex.ª o Presidente da República quando solicita a esta Câmara a reapreciação do decreto em apreço, razões que em nenhum passo se prendem com as soluções concretas adoptadas pela maioria e tão só em questões formais.
Em ordem a facilitar a correcta análise dos problemas em apreço, importa desde já conceder que apenas está posta em crise a alteração que alarga a capacidade eleitoral activa, já que os dois outros dispositivos alterados, concernentes às incompatibilidades e às inelegibilidades, foram votados unanimemente em sede de Comissão Especializada Permanente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: S. Ex.ª o Presidente da República chama a vossa atenção «sobretudo para a oportunidade» em que lhe é apresentado o texto legislativo, a menos de cinco meses das eleições para o Parlamento Europeu.
Convém, a propósito, esclarecer as razões que justificam esta situação.
Admitido em Maio de 1988 e aprovado na generalidade ainda na sessão legislativa anterior, o diploma só não foi ultimado em Julho passado porque algumas oposições solicitaram então insistentemente o respectivo adiamento argumentando que respeitava as eleições que só teriam lugar a um ano de prazo.
Em suma, fomos tolerantes, contemporizámos no adiamento e o resultado aí está. Pela minha parte penitencio-me pela ingenuidade de então não ter imaginado ser possível aos que requereram esse adiamento que viessem depois, com desplante, invocar a questão da oportunidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Neste contexto, não posso passar em claro a referência aos alegados «reparos críticos» supostamente suscitados no próprio Parlamento Europeu quanto à oportunidade de rever esta legislação.
Tratou-se Sr. Presidente, e Srs. Deputados, de uma lamentável atitude nada dignificante para quem a usou. De facto segundo estou informado a iniciativa em causa visava implicitamente a situação concreta de outro Estado comunitário e não continha uma só assinatura de deputados socialistas.
É no mínimo estranho que tenham sido socialistas a empunhar um instrumento que visava outras situações, virando-o contra uma iniciativa completamente diversa e que ocorria no seu próprio país.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ainda ontem o incidente terá sido cabalmente esclarecido no hemiciclo de Estrasburgo pelo eurodeputado radical autor da proposta primeiro ignorada e depois acarinhada pelos socialistas portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para além do argumento da oportunidade, refere S. Ex.ª o Presidente da República que não parecem «esgotadas todas as possibilidades de encontro de uma solução mais consensual».
Com o devido respeito, é importante referir-se que partilhamos da preocupação de se procurarem consensos tão alargados quanto possível designadamente nas matérias politicamente mais sensíveis.
É o que fazemos sistematicamente, embora muitas vezes, é certo, sem êxito.
Resta saber se a falta de consenso não resulta amiudadas vezes do escasso ou nenhum esforço que a Oposição desenvolve para se aproximar das nossas propostas.
Isto é, resta saber se a Oposição tem legitimidade para nos exigir aberturas ao consenso, se ela própria não se abre nem se procura aproximar minimamente das nossas posições!
O caso em apreço é disso exemplo claro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A proposta inicial do Governo, traduzindo o princípio que sempre defendemos, preconizava a atribuição do direito de voto a todos os eleitores portugueses residentes no estrangeiro independentemente do local de recenseamento.
Numa fase posterior e face às fortes reservas levantadas pela Oposição, o Grupo Parlamentar do PSD, numa atitude inquestionavelmente consensualizante, restringiu esse direito, no que se refere aos residentes fora do espaço comunitário apenas aos nascidos em território nacional ou que fossem filhos de progenitor português que ao tempo do nascimento se encontrasse em serviço do Estado português no estrangeiro.

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Fica assim demonstrado que o diálogo foi prosseguido e que ocorreu uma evidente abertura e concessão às teses mais restritivas da Oposição, sem que esta manifestasse reciprocamente qualquer abertura e aproximação no nosso sentido.
Seja como for, inviabilizado o consenso, subsiste inquestionavelmente a regra mais importante sobre a qual repousam os regimes democráticos: a regra da maioria.
E é preciso que fique muito claro que não seria nenhum escândalo nem sequer bizarro que se insistisse na proposta inicial do Governo.
Basta compulsar a legislação vigente nos nossos parceiros comunitários.
Vejam-se os seguintes casos:
Em França, os cidadãos residentes nos estrangeiro têm direito de voto e exercem-no por procuração ou nos consulados;
Na Alemanha Federal, votam, todos os residentes nos países da CEE e do Conselho da Europa e ainda os residentes há menos de 10 anos noutros Estados;
Na Grécia, os residentes no estrangeiro fora da comunidade podem exercer o direito de voto desde que o façam no seu país ou num consulado grego de qualquer Estado membro da CEE.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Exactamente!

O Orador: - Na Itália, os cidadãos residentes fora da comunidade podem também votar embora apenas no seu próprio país;
No Reino Unido, votam os cidadãos residentes no estrangeiro desde que recenseados no País nos cinco anos precedentes.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Exactamente!

O Orador: - Em Espanha, gozam de capacidade eleitoral activa os residentes no estrangeiro que exercem o seu direito nos consulados ou por correspondência;
Na Bélgica, os cidadãos residentes no estrangeiro têm direito de voto se estiveram inscritos no registo de uma Comuna belga e podem exercê-lo por correspondência;
No Luxemburgo, podem também votar, por correspondência, os residentes no estrangeiro.
Depois de anunciar estes oito modelos e para além do caso português, restam apenas três Estados que, de facto, não consentem em nenhuma situação o direito de voto dos seus cidadãos residentes fora do espaço comunitário.
Assim se vê que a proposta do Governo não só não se afasta como era próxima dos modelos adoptados pela maioria dos nossos parceiros europeus, cinco dos quais governados por maioria ou com a participação de partidos membros da internacional socialista.
A propósito importa desmistificar aquilo que foi circulado e que indiciava um supostamente enorme peso relativo dos eleitores abrangidos pelo alargamento da capacidade eleitoral activa.
Se todos estes votassem no mesmo sentido representavam apenas o equivalente a cerca de um terço de um só mandato ao Parlamento Europeu!
Sr. Presidente, Srs. Deputado: Perante tudo o que fica dito, não acredito que quem quer que seja neste hemiciclo pudesse agora, em consciência, recusar a confirmação do decreto em apreciação.
Apesar disso, entendeu a maioria, certamente em homenagem a superiores interesses do Estado apresentar uma proposta de substituição que, retomando na íntegra a posição de princípio dos social-democratas, difere a sua aplicação para as eleições que se seguirem às que têm lugar em Junho próximo.
Cai, redondo, o argumento da oportunidade.
Fica o princípio para o futuro, sempre adaptável designadamente se as comunidades decidirem entretanto harmonizar as legislações eleitorais dos Estados membros.
Passam os portugueses residentes no estrangeiro a saber melhor quem são os partidos que defendem e os que impedem o exercício dos seus direitos como cidadãos de corpo inteiro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Frustra-se o aparente júbilo daquelas formações partidárias que porventura apostaram em descobrir ou favorecer fissuras inexistentes no nosso relacionamento com a Presidência da República.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A uma reacção ditada apenas pelas razões que lhe assistem, preferiu a maioria apresentar uma solução que privilegia razões de Estado.
Com esta postura, a maioria prestigia-se e prestigia as instituições democráticas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados Narana Coissoró, Carlos Brito e Jorge Lacão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, não era seu jeito fazer o mal e a caramunha. Porém, hoje coube-lhe fazer esta figura.
Na verdade, no dia em que chegou aqui o veto presidencial e, antes mesmo de ele ser distribuído às bancadas parlamentares, já nos corredores os deputados da maioria eram os primeiros a dizer à comunicação social que não concordavam com o Sr. Presidente da República, em primeiro lugar, por razões de oportunidade e em segundo lugar, porque não concordavam com a maioria dos dois terços e até porque se tratava de uma autocrítica!
Quem criou fissuras não fomos nós, a Oposição, mas sim o próprio PSD que se dividiu entre si pedindo até pareceres verbais aos professores constitucionalistas e depois de renegando esses mesmos pareceres sobre se o Sr. Presidente da República tinha ou não direito de exigir dois terços do voto da Câmara. Fissuras, portanto, vindas da própria bancada da maioria e não devido a qualquer «cunha» metida pela Oposição.
Em segundo lugar, vai-se tornando cansativo o argumento de que a Oposição pediu que se adiantasse a votação da proposta governamental.
Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, a votação na generalidade deste debate foi feita no dia 8 de Julho de 1988 e até ao dia 21 desse mesmo ano não havia

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na comissão qualquer parecer nem trabalho feito na especialidade sobre o diploma.
Foi durante um almoço de trabalho a que todos nós fomos convidados pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, dois dias antes de terminar os trabalhos da Assembleia, que o Sr. Deputado Carlos Brito, com o apoio de toda a Oposição - portanto, também não vale o argumento de algumas oposições - disse que um dia seria completamente insuficiente para debater na especialidade o diploma votado na generalidade.
Foi esta consideração de que um dia não chegaria para se fazer o parecer para se discutir na especialidade todos os problemas - como agora a maioria vem reconhecer a importância e a oportunidade desse debate - que levou a que o Sr. Ministro desse o seu consenso a que esta votação passasse para o primeiro dia depois das férias parlamentares. Repito, a Oposição tomou o compromisso de que esse diploma seria o primeiro a ser agendado no fim das férias parlamentares, isto é, em Setembro de 1988, nove meses antes do período de eleições.
Portanto, foi a maioria que não preparou parecer que lhe cabia redigir, foi a maioria que não apresentou à 1.ª comissão o trabalho necessário para que logo em Setembro fosse votado esse diploma, e é agora a maioria que vem acusar a Oposição que solicitou, que pediu, que fez e não fez, etc. Enfim, arranja uma história para a comunicação social que não tem fundamento e que é absolutamente contrária aos factos. Essa é a verdade, é preciso recompô-la é preciso dizer que é a maioria que arrastou o processo para só em Outubro votar na especialidade o decreto legislativo que depois foi enviado ao Sr. Presidente da República.
Muito antes da Oposição se pronunciar sobre isso - e devo dizer que a Oposição nunca se pronunciou nem sobre a maioria necessária para a 2.º deliberação nem sobre as razões da oportunidade ou voto dos cidadãos emigrantes - foi o Sr. Primeiro-Ministro que disse que não concordava com o Sr. Presidente da República sobre a negação do voto aos emigrantes residentes fora da comunidade. Fê-lo à saída de Belém, na conferência de imprensa e tempo de antena de que dispõe todas as semanas para se dirigir ao país e criar as fissuras com o Sr. Presidente da República.
Se o Sr. Ministro não está recordado disso, é bom que peça as cópias das cassettes que foram gravadas sobre o que o Sr. Primeiro-Ministro disse sobre este problema quando saiu de Belém.
Isto é tudo quanto tenho a dizer e não poderei ser desmentido.

Vozes do PSD: - Não é assim!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado Narana Coissoró, confesso que não ouvi parte do pedido de esclarecimento, provavelmente por defeito do tom decibélico que V. Ex.ª imprimiu às suas perguntas - defeito da instalação sonórica, claro está! Como o Sr. Deputado deve calcular, não vou comentar nem conversas de corredor a que V. Ex.ª assiste e que aqui pretende reproduzir, nem almoços na York House.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É do domínio público!

O Orador: - Daquilo que disse vou apenas reter duas questões fundamentais: a primeira é a de que o Sr. Deputado pensa que dois dias são insuficientes para a Assembleia da República votar na especialidade três artigos, sendo certo que sobre dois deles recai unanimidade.

Risos.

Na opinião de V. Ex.ª, que certamente não é a mesma da desta Casa, foi tempo excessivo. Não sei muito bem como é que o Sr. Deputado poderá prestigiar o Parlamento com essa celeridade!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Viu-se hoje! O Orador: - Eu é que não sou!

O Sr. Narana Coissoró (PDS): - Levou oito meses para apresentar uma proposta nova!

O Orador: - Sr. Deputado, se levou ou não oito meses, o problema não é meu! V. Ex.ª afirmou que dois dias é pouco para discutir três artigos e dois deles são perfeitamente consensuais... Eu limito-me a comentar isso!
Em segundo lugar, gostaria de dizer que não retiro nem uma vírgula ao que há pouco referi. Estando previsto o agendamento para votação final global, pressupondo obviamente o debate dos tais três artigos em dois dias - coisa horrorosa! -, foi-me solicitado, no último dia do Plenário da sessão legislativa anterior (e foi-me pedido com o argumento de que só tínhamos eleições a um ano de distância), que isso ficasse para o início desta sessão legislativa. A questão da oportunidade foi determinante para tudo o que se seguiu, porque depois «Ai, meu Deus, que só estávamos a cinco meses de eleições!»
Já agora, Sr. Deputado, gostaria de dizer que nem o Sr. Presidente, nem o Sr. Primeiro-Ministro, nem eu próprio, nem nenhum membro do Governo, e suponho que ninguém da maioria, se coíbe de discordar de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República. E eu disse frontalmente dali daquela tribuna que discordava dos argumentos invocados por S. Ex.ª o Sr. Presidente da República.
No entanto, não deixo de corroborar a posição da maioria no sentido de assumir uma postura de Estado e de, tendo em conta tudo o que está em jogo, actuar em conformidade. Suponho que foi isso que a maioria fez ao apresentar uma proposta de substituição que considero oportuna e patriótica.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, também eu gostaria de lhe colocar três questões.
Em primeiro lugar, quero dizer que a minha bancada acha muito bem que o Governo desista, recue no seu propósito de introduzir uma profunda alteração na lei eleitoral para o Parlamento Europeu por razões de natureza política, largamente aduzidas pelos partidos

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da Oposição, e também por razões e implicações institucionais que são absolutamente evidentes. Esta matéria está, pois, fora de questão e a ela nos referiremos mais detalhada e alongadamente numa intervenção que faremos.
Agora, Sr. Ministro, o que não podemos aceitar é que o Governo e, provavelmente, o PSD queiram fazer cair sobre as oposições os vossos propósitos de fissura, uma vez que eles partiram do Governo e da maioria. Não queiram atirá-los sobre a Oposição.
Na verdade, o Sr. Ministro contou-nos aqui uma história, uma versão sua do que se passou no final da anterior sessão legislativa. Achou mal que o Sr. Deputado Narana Coissoró se tivesse referido ao almoço na York House; no entanto, foi o próprio Sr. Ministro que, logo a seguir, se referiu a episódios ocorridos nesse almoço, pelo que não vou ter necessidade de localizar onde se passaram estas trocas de impressões e estas discussões, uma vez que tanto o Sr. Ministro como Sr. Deputado Narana Coissoró já o fizeram.
Contudo, gostaria de, por um lado, confirmar muito do que foi dito pelo Sr. Deputado Narana Coissoró e, por outro, dizer que foi o Governo, através do Sr. Ministro, que pediu às oposições um acordo no sentido de se reunirem, à última hora, naquele próprio dia, isto é, no último dia da sessão legislativa, para aprovarem dois diplomas que interessavam ao Governo: um, na área do Ministério dos Negócios Estrangeiros - e, se quiserem, posso especificar - e o outro tinha a ver com esta lei eleitoral para o Parlamento Europeu.
O que dissemos foi que esta lei, apesar de ter poucos artigos, levaria muito tempo a discutir e que, além do mais, não estávamos aqui para fazer favores ao Governo. Contudo, tendo em conta os interesses institucionais, também dissemos que admitíamos que uma comissão, escolhida pelo Governo, pudesse reunir.
Ora bem, o Sr. Ministro foi pensar e, passado algum tempo, disse-nos que preferiam que fossem aprovado o diploma da área do Ministério dos Negócios Estrangeiros, que dizia respeito à carreira diplomática - e posso especificá-lo, se o Sr. Ministro quiser.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Exactamente!

O Orador: - Foi isso que aconteceu. A opção veio, pois, da parte do Governo. Nós, apesar de estarmos em desacordo em que a lei eleitoral para o Parlamento Europeu fosse abordada naquelas circunstâncias, apesar de tudo, admitíamos que uma comissão pudesse reunir para tentar discutir a lei.

O Sr. Presidente: - Queria terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Esta é a verdade.
Também é verdade, Sr. Ministro, que, na presente legislatura, dependeu, em larga medida, de deputados da maioria a maior ou menor celeridade em relação à discussão e votação, na especialidade, desta lei. Não houve qualquer obstrução por parte dos partidos da Oposição.
Posso dizer-lhe mais: esta lei subiu ao Plenário no primeiro dia disponível, depois da discussão e votação do Orçamento do Estado, lei em relação à qual todos nós conferimos prioridade.
Esta é a verdade, Sr. Ministro. Foi assim que se passou. Não queiram encontrar pretextos para atacar os partidos da Oposição, porque neste caso a responsabilidade, se existe, é inteiramente vossa.
Finalmente, gostaria de dizer que são muito elucidativas as comparações que fez com a legislação de outros países nesta matéria.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Essas comparações, Sr. Ministro, falam por si.
Muito obrigado por as ter trazido ao Plenário da Assembleia da República.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação à intervenção do Sr. Deputado Carlos Brito apenas importa reter uma questão para mim fundamental: é que, no essencial, não há contradição entre a versão que contou dos acontecimentos e aquilo que eu disse. A minha versão é verdadeira - aliás, por definição, eu não minto nem oculto a realidade.
A verdade é esta: do meu ponto de vista, não é eticamente aceitável que se invoque a questão da oportunidade relativamente a um adiamento de um agendamento que, segundo a versão de V. Ex.ª, decorre de um consenso, e não de uma solicitação expressa da Oposição - e a minha versão não é inteiramente coincidente, mas também não é contraditória -, em que eu anuo no sentido de não forçar, digamos assim, o agendamento para Junho do ano passado, na justa medida em que me dizem que estamos a um ano de eleições e que vamos perfeitamente a tempo se agendarmos o diploma a partir de Outubro. Repito, não é eticamente aceitável que depois se venha, a partir de Outubro, a partir do momento em que a própria lei está em discussão, invocar a questão da oportunidade. Por isso referi na intervenção que acho essa posição eticamente inaceitável.
Se me passasse pela cabeça que isso iria ser invocado, jamais teria anuído consensualizar, se V. Ex.ª prefere, que o diploma fosse adiado. Isto porque era relativamente fácil ao Governo sensibilizar a maioria para que «despachasse» um diploma com três artigos, dois dos quais eram votados unanimemente, como sabe, havendo apenas a questão da capacidade eleitoral activa.
Congratulo-me com o facto de V. Ex.ª, sobre a questão da capacidade eleitoral activa, se ter regozijado com os exemplos que eu trouxe. Devo dizer que não quis pôr nenhum exemplo dentro da algibeira. Podia ter escolhido apenas três ou quatro em que, de facto, há uma universalidade, digamos assim, no direito de voto que é concedida aos emigrantes, por quanto, em relação aos outros três ou quatro, esse direito é restritivo, vai mais no sentido da proposta de alteração que o Partido Social-Democrata, oportunamente, apresentou nesta Casa.
Ao contrário, eu quis elencar os nove casos, se não estou em erro, que não vedam totalmente o direito do voto aos seus emigrantes para mostrar, como disse na

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intervenção, que não há nada da bizarro quer na proposta inicial do Governo quer na proposta de alteração, que depois fez vencimento, da autoria do Partido Social-Democrata.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, uma lei eleitoral é, por natureza, numa lei estruturante do Estado e do regime democrático. Foi em nome da razão de ser deste aspecto que o Sr. Presidente da República, na sua mensagem dirigida à Assembleia, suscitou a oportunidade de um consenso à volta de uma matéria que, pela sua delicadeza, deve ser um factor de coesão e não de dissensão na comunidade política.
O que agora se repara é que a solução para que aponta o PSD e, com ele, o próprio Governo radicaliza ainda mais a solução aprovada um Junho.
Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, não acha um acto de irresponsabilidade de Estado responder à sugestão de consenso ideal do Sr. Presidente da República como a solução política e institucionalmente ainda mais radical do que a anterior?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado Jorge Lacão, fiquei maravilhado com a sua intervenção. Isto porque não supunha que o Partido Socialista, pela boca de V. Ex.ª que, certamente, como dirigente da sua bancada, o está a representar neste momento, fosse capaz de ser tão imaginativo em classificar a proposta de alteração do Partido Social-Democrata. Não a classifico minimamente assim.
De facto, era de supor que o Partido Socialista pretendesse, fosse qual fosse a proposta de alteração do Partido Social-Democrata, considerá-la como radicalizante em ralação ao diploma inicial. Não consigo fazer esse esforço. Sou muito terra a terra, sou muito linear.
A proposta parece-me manifestamente...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Agradeço-lhe, Sr. Ministro, ter-me permitido a interrupção.
A proposta apresentada pelo PSD remete para a solução actualmente em vigor no que diz respeito à capacidade eleitoral activa e essa é a relativa ao processo eleitoral para a Assembleia da República. Significa isto que a solução legislativa para que aponta o PSD atribui a capacidade eleitoral activa a, todos os emigrantes, residam eles na Europa ou fora dela; não há qualquer restrição. Se não era esta a intenção do PSD, então é porque formulou muito mal a sua proposta.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, não vou retirar um milímetro àquilo que eu disse. A questão que está a suscitar, certamente, será analisada em sede de especialidade.

Risos do PS.

Ainda bem que mantêm a vossa disposição.
Aquilo que tenho a dizer é que não interpreto a proposta dessa maneira, a não ser que não tenha dito tudo o que sabe, que é isso que penso que aconteceu.
V. Ex.ª sabe perfeitamente que a proposta do Partido Social-Democrata prevê que as eleições de 18 de Junho próximo, se o Sr. Presidente da República entender marcá-las para essa data - e julgo que terá de fazê-lo - ir-se-ão regular pelas normas aplicáveis às eleições anteriores, ou seja, só votarão os emigrantes recenseados no espaço comunitário.

Vozes do PS: - E depois?!

O Orador: - Depois? Depois - penso que o PSD fez muito bem - vivam os princípios!... Já não podem invocar a questão da oportunidade, Srs. Deputados do Partido Socialista, porque é só daqui a cinco anos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Espero que a questão já não seja invocada. Aliás, tive oportunidade de referir que admito perfeitamente que o «depois», o daqui a cinco anos, possa ser alterado em sede de revisão do código eleitoral, em sede de acordo resultante das negociações em curso a propósito da revisão constitucional, em sede de harmonização das relações eleitorais, que, porventura, as comunidades, no meu ponto de vista, desejavelmente, deveriam iniciar.
Mas, para o futuro, não aplicável às eleições de 18 de Junho - é essa questão de Fundo -, fica expressa a questão de princípio, sem que isso fira o problema, que tanto a vós como ao Sr. Presidente da República afligiu, da oportunidade, ou seja, de estarmos a alterar, a cinco meses de distância, aquilo que os senhores dizem ser uma regra do jogo. O meu ponto de vista é o de que já estava, de facto, alterado no pensamento de todos...

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Ministro, uma vez que já esgotou os três minutos.

O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Penso que a questão de fundo era a de sabermos se devíamos ou não anuir a um ajustamento ao diploma, em ordem a que as próximas eleições de 18 de Junho tivessem uma alteração à regra vigente para a eleição anterior.
O Grupo Parlamentar do PSD entendeu, certamente por razões de Estado, não alterar essa regra ou, pelo menos, propõe à Câmara que não altere essa regra, mas retoma a posição de princípio.
E, em relação a essa posição de princípio que retomam, penso, de resto, que não vão ficar sozinhos, porque outros partidos democráticos, nesta Câmara e fora dela, têm manifestado a sua posição de que concordam com o alargamento generalizado do voto também

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para o Parlamento Europeu aos emigrantes recenseados fora da Comunidade Europeia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Governo esgotou o tempo e o Partido Os Verdes cedeu tempo ao Partido Comunista Português.
Informo ainda a Câmara que se encontra na galeria destinada ao Corpo Diplomático, acompanhada com a delegação portuguesa da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, a Sr.ª Deputada do mesmo Conselho, Catherine Lalumiére, candidata a Secretária-Geral daquela organização.

Aplausos gerais de pé.

Para um intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Montai vão Machado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.ªs e Srs. Deputados: Entendeu o Sr. Presidente da República, como é sua prerrogativa, exercer o direito de veto em relação ao diploma de que ora nos ocupamos.
Em consequência disso, e conforme ao artigo 139.º da constituição, o Sr. Presidente da República solicitou nova apreciação do diploma por esta câmara em mensagem fundamentada.
Nessa mensagem, importa salientá-lo porque será esse o ponto que mais nos interessa, não é posto em causa o fundo do problema, isto é, o exercício do direito de voto por todos os portugueses e não apenas por alguns. Entre portugueses, nós, social-democratas, não queremos, seja em que matéria for, fazer quaisquer distinções. Para nós, não existem portugueses de primeira e de segunda!

Aplausos do PSD.

Certamente o que o Sr. Presidente da República também assim o pensa, como aliás o já disse várias vezes.
Pedir aos emigrantes que enviem para Portugal as suas poupanças, solicitar-lhes que invistam em Portugal as suas economias, entusiasmá-los até a ajudar em campanhas eleitorais e, na hora de alguns votos de maior relevância negar-lho, é atitude que nunca tivemos nem haveremos de ter. É atitude que se não coaduna com o respeito que nos merecem os portugueses e, por isso e também, os emigrantes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os emigrantes não são, em nada, menos do que nós! São gente que trabalha, que as mais das vezes abandona a família, que lá fora se ufanam
- e de qualquer maneira! - da sua qualidade de portugueses. São gente que, sentindo falta de espaço cá dentro o procuram lá fora, numa legítima busca de melhoria de vida. Daqui, o nosso respeito por eles.
Daqui, a afirmação de que não será por nossa culpa que, algum dia e em qualquer circunstância, os consideramos menos do que nós.

Aplausos do PSD.

A mensagem enviada a esta Assembleia pelo Sr. Presidente da República fundamenta-se em duas circunstâncias: Possibilidade de uma maior reflexão para eventual obtenção de um maior consenso; relativa proximidade do acto eleitoral previsto no diploma.
Será mais do que evidente que não é nosso propósito criar qualquer conflito com o Sr. Presidente da República. Respeitamos S. Ex.ª como ele nos respeita a nós. A regra do respeito recíproco foi sempre, para nós, um pilar da democracia.
Mas não deixará de dizer-se, em legítima defesa do voto do Partido Social-Democrata, única força política que votou o diploma em causa, que não é por nossa culpa que se verificaram aquelas objecções.
Hão-de fazer-nos a justiça de que reflectimos, e bem, sobre o nosso voto.
Como ninguém deixará de reconhecer que nunca nos furtámos ao diálogo, em longas e intermináveis conversas, só que o consenso não foi possível. E não o foi precisamente porque, quanto ao fundo do problema, nós temos uma posição diferente da de algumas oposições: Nós queremos que os emigrantes votem, sempre e em todas as eleições; as oposições não querem que os emigrantes votem em algumas dessas eleições.

Aplausos do PSD.

Não é um problema de teimosia ou capricho! É, isso sim, o entendimento que nós temos quanto aos direitos de todos os portugueses e não apenas de alguns.
Só que, e por vontade livremente expressa pelo povo, nós social-democratas representamos uma larga maioria dos portugueses. Temos muito mais portugueses ao nosso lado do que todas as oposições juntas ao lado delas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E isto tem que ter um significado! E o significado é o de que, quando em divergência, tem que funcionar, legítima, democrática e constitucionalmente, a regra da maioria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No que respeita à proximidade relativa ao acto eleitoral também, e sempre com o devido respeito, algo se poderá dizer. Tal como já aqui foi referido o diploma em apreço entrou na Assembleia da República acerca de um ano.
Foi discutido e mais discutido, há larguíssimos meses e esteve agendado para fins de Junho do ano passado. Aliás, o Sr. Ministro do Assuntos Parlamentares já referiu as causas que levaram à sua votação naquela altura e, portanto, não vou reflectir mais sobre esse assunto.
Assim sendo, como já disse, e não é demais repeti-lo, não queremos criar nenhum conflito com o Sr. Presidente da República! Nem sequer aqui vou perder tempo com o problema da necessidade de dois terços ou apenas da maioria simples para que o diploma passe.
Quero dizer, isso sim, que ninguém com responsabilidades dentro do meu grupo parlamentar, aquando do veto deste diploma por S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, defendeu, fosse onde fosse, qual deveria ser

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a maioria necessária para que o diploma aqui passasse novamente, antes pelo contrário. Posso dizer-lhes que eu próprio, em declarações que prestei a alguns órgãos de comunicação social, disse muito claramente que oportunamente nos pronunciaríamos sobre esta matéria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas este problema está hoje posto de lado, porque apresentámos uma proposta de substituição ao diploma em apreço tendo em vista os interesses do País, dos portugueses, do Parlamento Europeu e de todos nós.
A proposta que apresentámos, com a melhor das boas vontades, para resolver este problema - repito, com a melhor das boas vontades - afastará os fundamentos das objecções que foram postas. Já poderá haver mais consenso e já haverá, certamente, mais tempo.
Coerente consigo próprio é esta a posição do partido Social-Democrata.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimento, os Srs. Deputados Nogueira de Brito e António Guterres.

em a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Montalvão Machado, houve no discurso de V. Ex.ª, uma vez mais, não digo o intuito mas um descuido que levou esta matéria a confundir as oposições. Entendemos que isso não é correcto e, portanto gostaria de esclarecer esse ponto.
V. Ex.ª sabe quem se tem batido sempre para que em todas as eleições os emigrantes portugueses tenham o mesmo direito de voto que os cidadãos residentes no território nacional é o CDS...

Risos do PSD.

A boa disposição dos Srs. Deputados da maioria enche-me de júbilo, porque pela expressão do Sr. Primeiro-Ministro que vi hoje no jornal julguei que houvesse aqui uma disposição diferente... Ainda bem que não! É o Parlamento a autonomizar-se e eu congratulo-me com isso, obviamente!
Sr. Deputado Montalvão Machado, em que é que funcionam de modo diferente as razões que avançou para que o direito de voto fosse igual em relação aos portugueses de segunda geração emigrados noutros países que não os comunitários?
Porque razão é que o PSD recuou nesta solução? Será que há emigrantes de primeira e emigrantes de segunda? Será que uns contribuem para o equilíbrio da nossa balança de pagamentos e outros contribuem, porventura, menos? Será que uns necessitam de ser mais encorajados do que outros? Ou não será o contrário?

O Sr. Silva Marques (PSD): - V. Ex.ª não leu a proposta de alteração que apresentámos!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Montalvão Machado deseja responder já ou no fim?

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, agradeço-lhe a observação que fez em relação à minha intervenção.
Em primeiro lugar, gostaria de dizer-lhe que na intervenção que fiz não usei a expressão «as oposições» mas sim «algumas oposições» e, em segundo lugar, que me congratulo extraordinariamente com o facto de o CDS vir aqui dizer que sempre tem defendido o direito de voto dos emigrantes.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Temos um projecto!

O Orador: - Sr. Deputado, eu estou tão calmo! , Espero que os senhores também o estejam, nomeadamente o Sr. Deputado Narana Coissoró que me parece estar muito enervado!...

Risos do PSD.

Sr. Narana Coissoró (CDS): - Principalmente com as cambalhotas!...

O Orador: - Sr. Deputado, não há cambalhotas nenhumas! O que há é, acima de tudo, da nossa parte, a compreensão do interesse nacional, que, porventura, o senhor não tem; há, por parte da maioria, uma tentativa de consenso, aliás pedida pelo Sr. Presidente da República na mensagem que dirigiu à Assembleia e que a maioria compreendeu bem, mas que segundo me parece o senhor, não compreendeu; não há aqui um recuo mas sim uma tentativa de obter uma solução para este problema que, aliás, é delicado.
Por tudo isto espero, Sr. Deputado Nogueira de Brito, que os senhores desta vez votem connosco.

Aplausos do PSD.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Nós, não!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Deputado Montalvão Machado, falemos claro!...

Vozes do PSD: - Ah!...

O Orador: - O PSD andou durante quinze dias a medir forças com o Sr. Presidente da República...

Vozes do PSD: - Ah!...

O Orador: - ... e quando percebeu que estava isolado perante o País e que ia perder - e as hesitações ao longo deste período são bem claras - recuou mas nesse recuo há um balanço para um novo afrontamento.
Ora, tendo consciência de que o Sr. Presidente da República invoca dois argumentos - o da oportunidade e o do bom senso - os senhores recuam aparentemente no argumento da oportunidade para se colocarem numa posição de fundo ainda menos consensual

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e mais radical que claramente afronta o Sr. Presidente da República.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Deputado António Guterres, não é verdade que tenhamos andado quinze dias a medir forças com ninguém e muito menos com S. Ex.ª o Sr. Presidente da República.
É evidente que somos um grupo parlamentar consciente, estudámos e pensámos no problema que abarcamos em toda a sua extensão, procurámos ver todas as suas vertentes e, portanto, não decidimos de supetão nem por questões meramente partidárias. E volto a dizer o que já referi há pouco: temos, sobretudo, em vista o interesse nacional e só depois o interesse partidário...

Vozes do PSD: - Muito bem! Risos do PS e do CDS.

O Orador: - Esse vosso riso significa que talvez para vocês seja o contrário!
Aplausos do PSD.
O Sr. Deputado António Guterres disse que ao fim destes quinze dias de guerrilha, digamos assim, o meu partido recuou. Ora, posso dizer-lhe que o Grupo Parlamentar do PSD pensou no problema, na mensagem enviada pelo Sr. Presidente da República, no interesse nacional, na solução para este problema, no sair deste problema airosamente, para toda a gente e não apenas para nós, por conseguinte esta proposta não é a criação de um novo afrontamento ao Sr. Presidente da República.
Sr. Deputado, há pouco fui bem claro quando afirmei que não está nem nunca esteve no nosso propósito criar conflitos nem afrontamentos com o Sr. Presidente da República.

Aplausos do PSD.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Os senhores é que afrontam o Presidente da República e criam conflitos a todo o momento!
Neste momento assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Marques Júnior.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Advertimos o Governo e o PSD, ao longo do processo legislativo, do atoleiro político, institucional e jurídico em que se movia ao tentar concretizar, aproveitando a transitória maré da maioria absoluta, o velho sonho de introduzir modificações em benefício próprio no quadro normativo que regula as eleições em Portugal.
Em vão. Indiferente às vozes do bom senso, repristinando uma argumentação zarolha e sem esteio credível, a bancada que sustenta o Executivo de Cavaco Silva impôs, não sem alguns episódios de permeio, um diploma em que altera o regime eleitoral vigente para
deputados ao Parlamento Europeu. Em que sentido? Esquecendo, por ora, as mudanças no domínio das inelegibilidades e incompatibilidades, o que se quis foi outorgar capacidade eleitoral activa aos «cidadãos portugueses recenseados em Estados não pertencentes às Comunidades Europeias, desde que nascidos em território nacional ou que sejam filhos de progenitor português que ao tempo do nascimento se encontrasse em serviço do Estado português no estrangeiro».
Alargava-se, assim, o horizonte dos votantes, sem acautelar as especificidades de que se reveste a intervenção política dos emigrantes, à revelia da lógica constitucional, em oposição aos sistemas praticados pelos países integradores da CEE, num momento em que se procede, nesta Casa soberana, à revisão da lei fundamental do País.
Com efeito, o desplante com que o PSD perpetrou antecipar-se ao debate em curso, dentro e fora da CERC, em matéria de inegável melindre confirma a voracidade que dita os seus comportamentos, mas comprova também a confrangedora fraqueza da sua carta de princípios: prosseguir fins, até os mais obscuros, sem olhar a meios. Se os escolhos lhe acodem ao caminho, trata, expeditamente, de os remover, sem sequer ponderar o seu peso real. Diálogo com a Oposição? Para quê se uma gorda maioria se nutre das suas reservas, mesmo que putrescentes? Respeito pelas regras elementares da acção política? Coisas fora de moda que o yuppismo cavaquista não comporta. Conformação à Constituição da República? Isso é preocupação menor, irrelevante, típica de quem se pauta por preconceitos. Vai daí, com eleições à porta, procura a rápida mutação da sua moldura enquadradora, por forma a operar os resultados previsíveis da multiplicação dos votos, estabelecendo o direito de eleger representantes do povo português segundo traçados de uma intolerável engenharia-veículo de propósitos que não são sérios.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Já inúmeras vezes se disse mas vale a pena reiterar, ainda que de passagem, que não existem as condições mínimas de igualdade para a disputa de eleições, pelos diferentes partidos, em parte do universo da emigração. A afirmação é pertinente quando se pensa na realização de campanhas e jornadas de propaganda, quando nos interrogamos sobre quais os mecanismos de fiscalização dos actos eleitorais ou sobre a fiabilidade dos cadernos de recenseamento, quando se pede que, a municiar quaisquer intuitos inovadores, se deposite nas mãos dos deputados o resultado dos estudos e projecções feitos com base em soluções variadas.
O Governo não logrou, no decurso do debate, que já vai longo, fornecer elementos credíveis, técnica e politicamente adequados, em defesa da sua dama. A orchata do Primeiro-Ministro, tragada e expelida também pelos seus porta-vozes, pretendendo, a partir da evidência de que não há portugueses de primeira e de segunda, imputar à Oposição Ímpetos discriminadores, é primária, azeda, inconsistente. Quem escamoteia realidades como a do abismo que separa, no terreno, uma eventual parada comicieira do PSD, em Rhode Island ou na Cidade do Cabo, e a inviabilidade material de uma candidatura de esquerda, designadamente do PCP, chegar aos compatriotas que residem e trabalham nos Estados Unidos ou na África do Sul, não

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tem a legitimidade mínima para combater os que, como nós, se posicionam responsavelmente face aos problemas, reflectindo sobre a sua complexidade, obliterando iníquos desejos de índole stricto sensu partidário.
Não foi por acaso que o legislador constituinte estatuiu uma cota restrita de representação parlamentar para os eleitores dos círculos da Europa e de fora da Europa, obstando a que uma reprodução mecanicística dos métodos quantitativistas distorcesse o perfil político da Assembleia da República, apurado de acordo com a média mais alta de Hondt após prévia correcção à pura proporcionalidade. Nem foi por acaso que se excluiu, por exemplo, do colégio eleitoral para o órgão unipessoal que é a Presidência da República o contigente dos emigrantes, sem que tal haja alguma vez significado menosprezo pelo seu estatuto, tão carecido, a tantos níveis, de discriminações positivas que o Conselho de Ministros não é capaz de fomentar.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Estavam e estão em causa valores relevantíssimos de protecção à genuinidade das opções democráticas e, perante eles, como sempre se entendeu, outros de harmonização sem os postergar.
A tentativa esbracejante do PSD - espelho e reflexo, aliás, da quase muda mas crescente inquietação com que antolha as próximas eleições para o Parlamento Europeu - visa, ao arrepio do bem fundado constitucional, robustecer a sua massa de votos com porções oriundas dos que, pelos custos da distância, mais à mercê se acham de toda a instrumentalização indébita, da problemática da integração, dos concretos detalhes de que deve sempre revestir-se a atitude de Portugal no contexto em que foi inserido. E isto, Sr. Presidente, Srs. Deputados, quando as instâncias europeias apropriadas não obtiveram ainda uma aproximação sensível a regras de uniformização, quando se não conhece, à escala dos países membros, legislação comparável à que se quer contrabandear entre nós, quando, em sólido documento institucional, o Parlamento Europeu se manifesta adverso, inequivocamente adverso, aos propósitos laranjas. Podem os Srs. Deputados Manuel Pereira e seus colaterais ter retirado - coagidos ou intactos, tanto vale - as suas assinaturas de entre as que subscreveram o texto; o facto é que ele existe, é um referente indeclinável e as miúdas peripécias dos agremiados de Cavaco Silva não relevam.
«A alteração das leis em matéria eleitoral reveste-se sempre de um especial cuidado, importância e significado», sublinhou S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, ao opor o veto político ao decreto saído desta Assembleia, facultando uma consideração menos imediatista e sôfrega aos seus autores. Ao sinalizar a intempestividade, a ausência de consensos e de paradigma europeu, esse veto presidencial propiciou ao PSD um são regresso à terra firme da maturidade idónea.
Pertence-lhe a palavra, como é óbvio. Se persistisse na arrogância, na desmesura, no afrontamento, não atingiria a necessária maioria de dois terços dos deputados presentes, no Hemiciclo, aquando da votação que irá ter lugar, assim liquidando o pobre diploma que parturejou. Diga-se, a propósito e não para tomar parte numa querela hermenêutica que só caricatura se vislumbra, que é para nós indiscutível que o Decreto n.º 127/V só poderia, nos termos em que se acha
lavrado, ser mantido se a câmara preenchesse os requisitos do artigo 139.º, n.º 3, da Constituição da República. Nem um só especialista advogou hipótese contrária. Os patéticos esforços das habituais juristas que aconselham o - ou se deixam aconselhar pelo - Professor Cavaco Silva, não passam de histrionismo de fancaria, perfeitamente risível.
Não valem substanciais comentários as declarações em prol da não aplicabilidade do n.º 3 do artigo 139.º da Constituição. Não valem, igualmente, as ortopédicas - e fragilíssimas! - botas com que o Primeiro-Ministro julgou calçar, na manhã de hoje, através do «Diário de Notícias», os pés do barro das pretensões do PSD: confundir o que é a explicitação de uma evidência com a plausibilidade de um pretexto para esgrimir «a contrário» é a pura, provada e definitiva des-razão. O acordo de revisão constitucional celebrado entre o PSD e o PS, apenas sela, nesta matéria, o já selado. Não há malabarismo interpretativo que desbloqueie a bancada governamental.
Por isso até, afigura-se-nos significativo de desnorte inescondível, o comportamento do PSD. Em vez de, arrumada e serenamente, sanar o que é sanável, à luz do dia e sem psicodramas, o partido maioritário apostou numa encenação de ópera bufa, a que não faltaram picantes eventos: a clausura do segredo num círculo restritíssimo de dirigentes, o «suspense que faz supor o estrondear de um foguetório de arromba para pacóvio adorar, os ministérios policiais, as dilacerações de um Presidente de Assembleia que a opinião pública vê constrito e manietado, a batuta do «Mestre» oculto a autorizar, nas páginas de um jornal, as suas hostes parlamentares a pensar, e, por último, o rebentar pífio de uma autêntica bicha de carnaval de fraquíssima potência.
As alterações apresentadas, no início da sessão, pelo Grupo Parlamentar da maioria representam um visível recuo face ao que havia imposto à Assembleia. Não vingaram, portanto, as intenções de jogo viciado, locupletamento indevido com uma massa expressiva de votos rendível mascambilha legislativa. Congratulamo-nos com o facto, que se traduz no efectivo averbar de uma derrota na conta-corrente do partido do Governo. No entanto, o projecto tortuoso mantém-se. E mantém-se afrontosamente, também com Presidência da República, a dois níveis, para os quais chamamos, desde já, a atenção da Câmara: primeiro, obrigar a uma espécie de aparente vazio legal, preenchível por norma ou normas adrede votadas por dois terços forjados com panóplias de chantagem e pressão política; segundo, postular a subsidariedade da actual legislação para a Assembleia da República, transcorridos os 180 dias do artigo 3.º da novíssima lei em incubação, com o que se julga alargar o colégio eleitoral activo, a curto prazo, mesmo para lá do que constava do artigo 3.º do decreto vetado. A esta leitura derradeira voltaremos em sede de especialidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Decreto n.º 127 da V legislatura passa, assim, na sua formação originária, à história, com toda a fanfarra de despautérios. E passa sem direito à menor vénia. As acções diversionistas, seja qual seja a sua natureza, não impedirão que o Presidente da República, de plena posse dos seus

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poderes, arrede da ordem jurídica, como nós começamos já por fazê-lo, o espécime indigno que, muito em breve, ajudaremos a inumar.
Aplausos do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - Uma vez que o sinal vermelho apareceu em tempo que pode, naturalmente, ter suscitado a atenção da Câmara, tendo, aliás, a Mesa sido sensibilizada para isso, informo os Srs. Deputados que, para além do tempo marcado, coincidente com o tempo disponível do PCP, Os Verdes tinham, entretanto, o que foi anunciado previamente, cedido três minutos ao PCP, que o gastou na intervenção do Sr. Deputado José Manuel Mendes.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Prescindo do uso da palavra na medida em que V. Ex.ª já esclareceu a questão que levantou.

O Sr. Presidente: - Para pedidos de esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados Mário Raposo e Silva Marques.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Raposo.

O Sr. Mário Raposo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Mendes: Entendo ser importante a vertente tribunícia desta Assembleia, por mim sempre encarada e ouvida com grande agrado, creio que, na dualidade de posições entre a maioria - qualquer maioria que seja - e as minorias, deve haver por norma um debate aberto, veemente e, até, aguerrido.
Entretanto, o Sr. Deputado acaba de proferir algumas afirmações que considero, não diria «indébitas», mas indevidas, já que diz que a maioria que neste momento existe, invocando designadamente o «cavaquismo» - a figura de Cavaco Silva -, engendrou este plano maquiavélico para defraudar a verdade do voto em sede de eleições para o Parlamento Europeu. Face a isso, pergunto ao Sr. Deputado qual foi a posição do Partido Social-Democrata, desde o primeiro momento, quanto ao voto dos emigrantes. E olhando ali, exactamente para o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, recordo perfeitamente, que, quando presidente do Grupo Parlamentar do PSD, teve ocasião de sustentar por parte da bancada do PSD, exactamente essa mesma posição, ou seja, a posição que o PSD continua coerentemente a manter. Isto do mesmo modo que - como não tive reticência nem reserva em lembrar - que o PCP tinha sido coerente com a posição por ele sempre assumida.
Portanto, para sustentarmos as nossas razões, para fazermos valer os nossos direitos de argumentação, na minha perspectiva, nem teremos que - mesmo no jeito literariamente conseguido do Sr. Deputado José Manuel Mendes - bolsar palavras ou ideias ou propósitos menos justos e adequados para o contraditor - no caso a bancada do Partido Social-Democrata. Direi, aliás, que se algum dos debates nesta Câmara foi mais aceso, mais dialogado, com maior somatório das razões de parte a parte sobre alguma matéria, terá sido, exactamente sobre esta. E salvo erro, por banda da bancada do PCP, interveio o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
Consequentemente, pergunto ao Sr. Deputado José Manuel Mendes, porquê, por que razão o Sr. Deputado José Manuel Mendes, ao arrepio da sua habituai metodologia argumentativa, arremessa com essas armas que, na verdade, são perfeitamente inadequadas à circunstância? O PSD limita-se a sustentar a posição que sempre sustentou e que não é uma posição conjuntural mas, sim, de base; é uma posição de ideologia; é uma posição de ideário; é uma posição, sobretudo, face ao universo de Portugal, universo esse que se não confina a este lusíada rectângulo.
Incidentalmente, e para terminar, e, portanto, sem ser já um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado José Manuel Mendes, diria que, obviamente, nunca esteve no ânimo do PSD perspectivar qualquer conflito com o Sr. Presidente da República. E por mais conflitos que as oposições queiram engendrar, que queiram congeminar, que queiram visionar entre este diploma e a posição assumida pelo PSD quanto a ele e ao Sr. Presidente da República, eles falecem por completo. O PSD assumiu uma posição. Estava na sua postura de sempre. O Sr. Presidente da República usou de um direito que ninguém questionou e que não fez inquinar, num milímetro só, as magníficas relações institucionais de boa cooperação que existem entre três órgãos de soberania: a Assembleia da República - no caso através de maioria do PSD -, o Governo e o Sr. Presidente da República.
Incidirá, portanto, o meu pedido de esclarecimento sobre esta matéria e sobre as motivações que terão levado o Sr. Deputado José Manuel Mendes a sair fora da sua linha habitual de argumentação - que tanto parece sobressaltar alguns quando, no fundo, se trata de um diploma fundamentalmente técnico. Gostaria, portanto, de saber qual era a razão dessa sua «deviance» - recheada de adjectivos e qualificações inapropriados.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Mendes: Por que é que o Sr. Deputado, em vez de argumentar, insulta? Nós teremos discutido este assunto fora do sítio próprio. Mas que mal tem isso? Que mal tem que tomemos posição individualmente? V. Ex.ª não toma, não tem tomado, mas a culpa é sua! O que é que o Sr. Deputado pensa acerca do sucessor do seu secretário-geral? Não o tem dito, nenhum jornal fala disso.
Nós falamos, independentemente das posições da minha bancada e do meu partido. O Sr. Deputado tem é inveja de nós e por isso insulta. O Sr. Deputado diz que são responsáveis. Então, isso significa que foi responsavelmente que os senhores, anos atrás, recusaram a democracia parlamentar no nosso país pela via da voz do seu secretário-geral. Foi responsavelmente que o fizeram ou, afinal, os senhores mudam tantas vezes de responsabilidade que são, pura e simplesmente, irresponsáveis por definição? Sr. Deputado José Manuel Mendes, por que insulta em vez de argumentar? O que é que o perturba, Sr. Deputado? Peça a palavra no interior do seu partido se, por acaso, ainda tem direito a ela.

Aplausos do PSD e protestos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradecia que as manifestações se contivessem dentro daquilo que é regimental e próprio da discussão nesta Casa, mas que permitissem, de facto, as intervenções dos Srs. Deputados.
Para responder às questões colocadas, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes, para o que dispõe de dois minutos.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Mário Raposo: A circunstância de se reconhecer coerência à atitude do PSD não ilegítima a leitura e a qualificação política que qualquer partido faz acerca dela.
Aquilo que pude afirmar, na intervenção em nome da bancada do meu partido, não foi mais do que a reposição do quadro de pensamento que, pela positiva, nos norteia desde a primeira hora, e que, na vertente crítica, sempre fizemos recair sobre as propostas originárias de várias famílias da direita portuguesa, com particular destaque para o Partido Social-Democrata.
Não se trata, pois, de respeito pela postura parlamentar, nem sequer de menoscabo das regras de relacionamento entre todos nós, mas apenas e tão só de, com vivacidade certamente, mas também com rigor, caracterizar o que é a intenção determinante de um partido, que é o partido maioritário.
O Sr. Deputado Mário Raposo referiu apenas uma questão nevrálgica: a de se outorgar ou não a todos, indiscriminadamente, e todos os emigrantes e em todas as condições, o voto para o Parlamento Europeu bem como para outras eleições que não as destinadas à composição da Assembleia da República. Sabemos que a atitude do PCP não é coincidente com a do PSD, o que não significa desconsiderar os emigrantes ou sequer estabelecer entre eles diferenças. Significa, sim, atender à realidade e, enfrentando-a com precisão e sem demagogia, talhar, em termos institucionais, as leis mais capazes e mais perfeitas. Recordo, entretanto, que, apesar da coerência, esta velha, muito velha posição do Partido Social-Democrata renasce das cinzas como um fogo muito vivaz de cada vez que se aproximam actos eleitorais e sempre que está em dificuldades.
A intervenção do Sr. Deputado Silva Marques é irrelevante na economia do debate e na óptica da matéria. Teve de fazer a sua pirueta anticomunista. É natural. Não viria, de forma nenhuma, a esta Câmara intervir sem ter que enveredar por esses caminhos, que são os seus. Lembrar-lhe-ia, apenas e em jeito terminal, uma vez que, de resto, nem sequer tenho tempo para me alongar em considerações, que o Sr. Deputado Silva Marques, seguramente, tendo em conta os seus interesses peculiares, não é capaz sequer, de conjecturar qualquer hipótese de substituição para o Professor Cavaco Silva à frente do PSD.

Aplausos do PCP e risos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Silva Marques, pede a palavra para interpelar a Mesa?

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não, Sr. Presidente. É para defesa da minha consideração.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado José Manuel Mendes acabou de dizer que eu não tinha qualquer hipótese de configurar uma alternativa ao Sr. Professor Cavaco Silva como Primeiro-Ministro e como líder do meu partido. Isso é verdade. Com efeito, não existe neste momento no quadro do campo político em que me insiro, uma personalidade que justifique sequer pensar numa alternativa ao Sr. Professor Cavaco Silva, dadas as virtudes e as qualidades que ele revelou até hoje de forma inquestionável. Só que o Sr. Deputado José Manuel Mendes não está na mesma posição que eu relativamente ao seu partido. Deve haver, pelo menos, um milhar de alternativas ao actual secretário-geral!

Aplausos do PSD e risos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Julguei que o Sr. Deputado Silva Marques iria tirar da carteira, do bolso ou de qualquer sítio escuso um nome para substituir o Professor Cavaco Silva. Não foi isso que aconteceu, mas fez uma outra coisa também esperável; ou seja: o Sr. Deputado Silva Marques tinha de fazer, terá de fazer sempre, tem de fazer de vez em quando, o panegírico político do Professor Cavaco Silva, seja pelo que for, em que circunstâncias for e a troco de tudo e de nada. Fê-lo, está feito agora, de novo certamente com proveito. Não vale a pena dizer mais nada.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Tire o Sr. Deputado do bolso um secretário-geral para o seu partido.
Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Em declaração justificativa do voto negativo expresso pelo PS sobre o decreto, que agora se reaprecia, tive ocasião de sublinhar o conjunto de razões que no entendimento do PS, inviabilizariam a entrada em vigor do diploma, devido ao modo insustentável como atenta contra princípios fundamentais da nossa ordem constitucional com destaque, desde logo, para o princípio da independência nacional e para o princípio da legalidade democrática.
Vivemos, felizmente, num Estado de direito democrático, à luz do qual a validação de um processo legislativo comporta diversos momentos de apreciação entre os quais avulta o juízo independente do Presidente da República e, quando suscitada, a função fiscalizadora do Tribunal Constitucional.
O funcionamento articulado do sistema constitucional de repartição de poderes tem a virtualidade de permitir que os maximalismos de uma maior política não descambem em fonte arbitrária de direito.
Saudamos por isso, no veto do Sr. Presidente da República, a manifestação saudável da sua função moderadora, garantia por excelência do regular funcionamento das instituições democráticas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - E fazemo-lo com tanta maior convicção quanto é certo que, no passado, o PS já manteve e já modificou posições originárias na decorrência de veto presidencial. Sempre com abertura de espírito e sentido das responsabilidades. Sempre com total consideração pelo papel institucional do Presidente da República e valorização política dos fundamentos expressos nas mensagens dirigidas ao Parlamento.
Atento, uma vez mais, às posições do Sr. Presidente da República, o PS regista a preocupação expressa pelo facto de uma matéria de direito eleitoral, atinente, por natureza, aos próprios fundamentos do regime democrático, não ter logrado um grau de consensualização suficiente de modo a constituir-se como factor de coesão das instituições democráticas em lugar de dissensão na comunidade política.
O PS regista a preocupação do Sr. Presidente da República e com ela vivamente se congratula.

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por ser entendimento dos socialistas - e acharem os socialistas que deveria ser entendimento de todos os democratas - a valorização do consenso em todos os domínios estruturantes do Estado democrático. Por ser certo depender a dignidade das instituições, o prestígio dos seus titulares e a eficácia dos seus órgãos do grau de aceitação dos destinatários das suas injunções. Por ser evidente não ter o PSD sabido revelar, em matéria de tanta delicadeza, pela afectação que implica no estatuto da cidadania activa e, portanto, na dimensão da comunidade política, um verdadeiro sentido de Estado, uma verdadeira responsabilidade de Governo.
Com efeito, o percurso pleno de contradições e obscuridades, trilhado pelo PSD ao longo do presente processo legislativo, se de algo tem sido revelador, é de um mal disfarçado propósito de fazer das instituições do Estado trofeus de partilha do partido maioritário, exclusivamente destinados a perpetuar condições hegemónicas de poder.
As democracias vivem, sem dúvida, da vontade do eleitorado. Mas tendem a sossobrar, sempre que o clientelismo eleitoral se arroga no direito de manipular os princípios e as regras que condicionam e regulam a expressão da vontade popular.
É por isso que as constituições se rodeiam das maiores cautelas na definição dos princípios e regras de direito eleitoral, constituindo normas muitas delas, com a natureza de autênticos direitos e garantias fundamentais. Como, evidentemente, sucede na ordem jurídico-constitucional portuguesa, a qual preserva condições de liberdade, de igualdade, de não discriminação e de eficácia de fiscalização em todo e qualquer processo eleitoral.
O PSD, porém, optou por legislar de costas voltadas para os princípios constitucionais de direito eleitoral, desprezando-os tanto como aos argumentos de quem - como o PS - insistentemente lhe recomendava bom senso no domínio político e responsabilidade no plano institucional.
O resultado estava à vista de todos. Só não se afigurou visível à cegueira do PSD, cuja insensibilidade a valores essenciais de protecção do regime democrático lhe permite apreciar como factores de somenos importância justamente os que se traduzem em garantia de genuinidade e autenticidade dos actos eleitorais.
São conhecidas as motivações invocadas pelo PSD e o seu propósito de superar o que qualifica como uma divisão entre «portugueses de primeira» - os cidadãos portugueses com direito a voto - e «portugueses de segunda» - os cidadãos portugueses sem capacidade eleitoral. O que estaria em causa - dizia-se - era uma decisiva opção pela «identidade de Portugal, de todos os portugueses que constituem a pátria portuguesa, quer vivam na Europa quer noutra qualquer parte do mundo».
Repare-se, porém, no erro de partida. Associando a identidade da pátria à universalidade da nação e esta à extensão, sem reserva, do direito de sufrágio, o que o PSD pretende, afinal, é pura e simplesmente refundar o País e o Estado, na medida em que com projecção em todos os órgãos representativos pretende refundar, por inteiro, a comunidade política e seu corpo eleitoral.
É verdade que a solução final patenteada no decreto veio subordinar a atribuição do direito de sufrágio aos portugueses residentes fora da Europa à condição do seu nascimento em território nacional. Mas então na lógica do PSD, de acordo com os princípios sustentados pelo PSD, a solução que escolheu só pode ser tida como uma solução chocante na medida em que dissolve os princípios que defende no contraditório das soluções que adopta e vem confirmar, pela sua própria mão, a tese discriminatória de que há, afinal, «portugueses de primeira» e «portugueses de segunda» e admitir a conclusão de que a pátria portuguesa estaria de se exprimir na grandeza de uma identidade nacional acima das fronteiras e dos continentes.
Não vale a pena enfatizar - tão evidente ela é - a nostalgia de império que tal pensamento revela. Mas vale a pena sublinhar que a nação, enquanto unidade de história e de cultura não se confunde necessariamente com o povo enquanto realidade social e realidade jurídica de uma comunidade politicamente organizada em Estado. É por isso que uma nação pode existir antes do Estado ou subsistir para além do Estado. E é por isso, identicamente, que um Estado, para existir, carece de um território no âmbito do qual exerça senhorio, soberania, condição de eficácia de uma ordem jurídica e, portanto, de uma independência nacional.

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ora o que o PSD não pode fazer é prosseguir uma nostalgia imperial e com ela comprometer a independência do Estado português, república soberana assente na vontade do povo organizado em comunidade política cuja, sede territorial é inexorável limite de eficácia das suas leis.
Na verdade, pergunto: como é possível sustentar o alargamento da capacidade eleitoral e, portanto, da extensão do povo como sede do poder político e do poder soberano para limites que se não adequam, minimamente, com a possibilidade de o Estado garantir as exigências que a comunidade política instituiu como fundamentais para preservar a natureza democrática do regime?
A pergunta não tem resposta positiva à luz do princípio democrático. E por isso digo que as posições do PSD se revelam, nesta matéria, suspeitas de um populismo demagógico de compatibilidade muito duvidosa com valores fundamentais da democracia.

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Numa outra perspectiva revelam-se igualmente falaciosos os argumentos de identidade entre a solução proposta nas eleições para o Parlamento Europeu com a existente nas eleições para Assembleia da República.
Aqui, os votos da emigração, seja qual for a sua variação quantitativa, não se traduzem em mais do que quatro deputados, quota de 1,6% da representação nacional. Além, a solução proposta admite a conversão integral de votos em mandatos num círculo nacional único.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Isso é que é justo!

O Orador: - Nas eleições para a Assembleia da República adoptou-se como critério de integração das comunidades portuguesas no estrangeiro o de uma representação condicionada, apta, por um lado, a valorizar política e simbolicamente uma identidade nacional de projecção universalista mas a garantir, por outro, a capacidade da comunidade politicamente organizada decidir como autonomia o seu destino.
As pretensões do PSD tão pouco encontram acolhimento nos casos de alguns países de emigração tradicional mas que nem de longe nem de perto se equivalem ao destino de diáspora portuguesa. Deveriam, em todo o caso, ser meditadas as suas soluções e a responsabilidade de Estado que revelam na disciplina dos respectivos processos eleitorais. Ao PSD não mereceram a mínima consideração legislativa soluções como as que impedem o voto por correspondência, condicionam o exercício do direito de voto ao não afastamento do País por períodos determinados de tempo, vinculam ao voto em território nacional ou, quando no estrangeiro, o subordinam a exercício presencial nas embaixadas e nos consulados.
Tantas e tão gritantes desatenções vão-nos, afinal de contas, revelando a disposição do PSD igual à de um Frei João Sem Cuidados - sem cuidados na preservação de fundamentais imperativos democráticos e mesmo sem cuidados na defesa dos interesses dos emigrantes portugueses que tão insistentemente diz defender.
Francamente, que melhor defesa poderia o Estado português garantir aos portugueses residentes nos Países da Comunidade - afinal aqueles para quem a Comunidade é uma realidade viva - do que adoptar, para as eleições europeias, o princípio da residência conjugado com o princípio da reciprocidade? Deste modo, Portugal assumiria uma atitude de forte autoridade moral e política na construção da Europa dos cidadãos e, em consequência, na defesa de um estatuto de verdadeira igualdade para os cidadãos portugueses residentes e integrados nos países comunitários.
Esta é, de resto, a solução defendida por todos os partidos socialistas e social-democratas membros do Parlamento Europeu e ainda, recentemente, reafirmada com a aprovação, em Bruxelas do seu manifesto Comum Europeu.
O PSD, porém, já nos habituou à ideia de que para si a social-democracia é um emblema, sendo conservador o seu guia-prático.
Assim se explica que ao desafio construtivo e empenhado do PS o PSD tenha respondido negativamente. Assim se demonstra como uma retórica equivocamente orientada para as expectativas dos emigrantes no fundo esconda um desinteresse real pela realização dos seus legítimos interesses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Face à oportuníssima chamada de atenção por parte do Sr. Presidente da República, na linha de preocupações vivamente sentidas e manifestadas no âmbito do Parlamento Europeu, quanto à inconveniência de alteração de um regime eleitoral, à vista do próprio acto eleitoral, confesso a minha surpresa pelo teor das declarações públicas, oriundas da bancada do PSD, e já hoje do Governo, sugerindo ser a culpa do facto assacáveis às oposições.
Efectivamente, o PS concorreu, no âmbito da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias...

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou tentar terminar rapidamente, Sr. Presidente. Para que o PSD pudesse meditar e rever o conteúdo originário da proposta governamental, de todo em todo imprestável. Foram essas diligências que, efectivamente, fizeram transferir da 1.ª para a 2.ª sessão legislativa a votação final global. Mas meditem os Srs. Deputados do PSD no conteúdo normativo que em Junho último pretenderam votar e concluam, sem esforço, que na mesma linha de preocupação revelada na sua mensagem, o Sr. Presidente da República encontraria na versão originária e nas posições relativas dos partidos políticos razões redobradas para exercer o veto. Vai certamente encontrá-las na solução que o PSD enunciou renovar.
Face à versão final do decreto ainda em apreciação, reconhece-se simplesmente o facto de o PSD ter recuado, em Janeiro de 1989, para soluções por si próprio vivamente combatidas em Junho de 1988. E se o facto algo demonstra não é uma abertura de maioria aos argumentos das oposições.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Antes exprime uma tentativa mal esquiçada de resolver incongruências legislativas com outras de não menor significado e, identicamente, à míngua de quaisquer garantias de legalidade e eficaz controlo do processo eleitoral.
Restaria agora ao PSD sair do isolamento em que se colocou evitando esbarrar no muro, ou seja, na insuperável exigência constitucional da maioria qualificada de dois terços para confirmação do decreto.
Mas, finalmente, a proposta de substituição hoje apresentada representa um espantoso acto de malabarismo do Governo e do PSD.
A solução proposta revela-se como o que é: politicamente absurda e juridicamente aberrante. Visando uma nova solução legislativa, a prazo de seis meses, de novo retroage para a solução apresentada em Maio, ou seja, a que confere direito de voto, sem restrições de capacidade e sem limitações de efeito e, por isso, é um adiamento acompanhado de um agravamento. E um acto político de irresponsabilidade do Estado levado até às últimas consequências.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino de imediato, Sr. Presidente.
E, em última análise, um acto de inamistosidade política e institucional para com o Sr. Presidente da República, visando impor uma solução ainda mais gravosa do que a anterior, que inviabiliza, em definitivo, qualquer hipótese de consenso.

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Razão pela qual se adivinha que o processo vai, infelizmente, continuar em clima de grande controvérsia institucional. Infelizmente!

Aplausos do PS, do PCP, de os Verdes e dos Deputados Independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para pedir esclarecimentos, está inscrito o Sr. Deputado Silva Marques, que dispõe de dois minutos.
A Mesa informa que o PS ultrapassou em dois minutos e trinta segundos o tempo de que dispunha para intervir.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, acabo de ser informado de que o Governo já não dispõe de tempo que, por isso, solicitava à Mesa que concedesse ao Governo, que se calou com a luz vermelha - a mesma generosidade que concedeu aos partidos que continuaram a falar depois do aparecimento da luz vermelha.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, não houve da parte da Mesa qualquer generosidade. Com efeito, o Sr. Deputado Jorge Lacão ultrapassou em dois minutos e trinta segundos o tempo de que dispunha para a sua intervenção, mas a Mesa ainda não tem possibilidades técnicas que lhe permitam impedir essas situações.
No entanto, tive o cuidado de ao 1.º , ao 2.º e ao 3.º minutos, avisar o Sr. Deputado Jorge Lacão.
De qualquer modo, por razões de equidade, estou disponível para conceder tempos análogos aos outros partidos e ao Governo.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, é para esclarecer melhor o sentido da minha interpelação.
Com efeito, não contestei que V. Ex.ª usasse do critério que muito bem entendeu no sentido de proporcionar ao Sr. Deputado Jorge Lacão mais dois minutos e trinta segundos de intervenção, após o aparecimento da luz vermelha, não falando já nos vários minutos que a Mesa concedeu aos outros Srs. Deputados que intervieram, aliás, uma prerrogativa que o Governo não utilizou, porque se calou com a luz vermelha.
No entanto, já agora, apenas solicito à Mesa que, na parte em que houve excesso de tempo dos outros partidos, o Governo também possa ser contemplado, porque poderíamos até enriquecer o debate com pedidos de esclarecimento ou outras intervenções.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, já há pouco referi que a Mesa iria também alargar essa extensão de tempo aos outros partidos e ao Governo, embora tenha avisado o Partido Socialista e todos os outros partidos quando atingiram o 1.º, o 2.º e o 3.º minutos após o aparecimento da luz vermelha.
Neste momento, ainda não existem possibilidades técnicas para separação dos tempos, mas tem sempre existido permissibilidade para os partidos utilizarem mais algum tempo e a Mesa tem procurado ser equitativa.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Presidente, acabo de saber que o meu grupo parlamentar dispõe de sete minutos. Estou inscrito para uma intervenção e preciso apenas de cinco minutos, pelo que cedo ao Governo os dois minutos excedentes.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de esclarecer a Mesa e o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares de que o PCP ultrapassou o seu tempo mais desfrutou de quatro minutos que lhe foram cedidos dois pelo PRD, e dois pelo Partido Os Verdes.
Assim, penso que o meu partido não está numa situação de favor em relação à Mesa, mas não será da nossa parte que haverá qualquer intransigência ou posição radical no sentido de o Governo não poder dispor de tempo para que possa esclarecer-se, cabalmente, perante a Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, considerando o tempo de que o PS dispôs, a Mesa concede ao Governo mais dois minutos e trinta segundos, dentro do espírito com que estamos a funcionar, sem um rigor extremo, mas procurando que se mantenham os tempos globais, como se deseja.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Jorge Lacão, ainda bem que abordou a questão do Estado e da nação, mas gostaria de lhe dizer que quanto a essa matéria o Partido Social-Democrata tem um ponto de vista absolutamente diferente do vosso.
O Sr. Deputado considera que o Estado deve ocupar-se apenas de uma parte da nação, e pior, que deve

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reconhecer apenas uma parte dos filhos da nação, os que vivem no território.
Nós estamos profundamente em contradição com essa tese.
De facto, V. Ex.ª defende a tese clássica do socialismo, que oscila e, sobretudo, privilegia o internacionalismo, onde não há nações fora das fronteiras do Estado.
Nós estamos totalmente em oposição a essa tese. Será por isso, também, e não por acaso que os Srs. Deputados são socialistas e nós social-democratas, seguindo uma social-democracia que não pertence à Internacional Socialista e, por isso, hoje digo: Ainda bem!

O Sr. Caio Roque (PS): - Ainda bem que não pertence!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão a quem solicito que seja breve, dado os condicionalismos de tempo.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, antes de responder ao Sr. Deputado Silva Marques, gostaria de agradecer à Mesa a tolerância que usou para comigo aquando da minha intervenção.
Sr. Deputado Silva Marques, V. Ex.ª não percebeu rigorosamente nada do que eu disse...

Uma voz do PS: - É normal!

Risos.

O Orador: - ... na medida em que o Partido Socialista reconhece a nação na sua identidade histórica e cultural. O Partido Socialista deseja que o Estado saiba reconhecer a razão de ser da nação e se dirija à nação no seu conjunto.
Mas o que o Partido Socialista gostaria de saber é se o corpo eleitoral politicamente organizado deve ser necessariamente todo aquele que se relaciona com a Nação. E esta é uma questão totalmente diferente, e é nesta diferença essencial que vai toda a incompreensão do Sr. Deputado Silva Marques.
Se V. Ex.ª, Sr. Deputado Silva Marques quiser clarificar melhor os seus pontos de vista existem bons manuais de Ciência Política e de Direito Constitucional, pelo que tenho todo o gosto em remetê-lo para os respectivos autores.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró, que dispõe de quatro minutos.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Srs. Deputados: Ao iniciar esta intervenção, a bancada do meu partido não quer deixar de prestar homenagem ao Sr. Presidente da República pelo estilo da mensagem com que fez preceder o seu veto, pelos argumentos que invocou, sem beliscar quem quer que seja pela certeza dos argumentos que utilizou, mais do âmbito da política legislativa do que propriamente do direito constituído, e pela forma digna e superior como se manteve durante
todo o período em que, foi diariamente afrontado pela maioria sobre os seus argumentos.

Protestos do PSD.

A nossa posição sobre esta matéria é clara.
Somo o primeiro e o único partido que apresentou no projecto de revisão constitucional uma alteração para expressamente dar o voto aos emigrantes na eleição do Presidente da República e nos outros actos eleitorais.
Nenhum outro partido, e principalmente o PSD que tanto nos copiou no seu projecto de revisão constitucional foi capaz de adoptar esta nossa ideia e fazê-la sua.

Protestos do PSD.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - O Sr. Deputado já está esquecido do Dr. Sá Carneiro!

O Orador: - Em segundo lugar, a nossa posição na questão material quanto à lei eleitoral é conhecida.
Estamos com o primeiro projecto do PSD, que corresponde ao nosso próprio projecto, onde não se faz a distinção entre emigrante de primeira e de segunda geração.
Louvo-me nas palavras do Sr. Deputado Mário Raposo que, juntamente com o CDS, defendeu a ideia de que não deveria haver esta situação na diáspora entre primeira e segunda geração, dizendo que, «por uma questão de patriotismo» - e não vamos temer em usar esta palavra -, temos que dar o direito a todos os emigrantes sem distinção.
É com agrado que reli hoje de manhã esta sua intervenção e foi exactamente porque o PSD, por oportunismo - outras razões nós não conseguimos descortinar -, no debate na especialidade recuou e tirou aos emigrantes da segunda geração o voto para as eleições para o Parlamento Europeu, que a lei não mereceu a nossa concordância. Não temos qualquer razão para mudar o nosso voto, estamos com o nosso projecto e igualmente estamos com as declarações do PSD aqui tomadas no primeiro debate na generalidade. Na versão actual que corresponde às alterações que foram anunciadas na especialidade mas não podemos concordar e por isso na generalidade votaremos contra.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Leu o artigo 3.º?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O senhor é que não o leu como sempre!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo, para o que dispõe de cinco minutos.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em meu entender, nunca antes, como hoje a fábula latina do mons parturíens terá tido tanta aplicação.
De facto o PSD, nas últimas semanas, numa dinâmica de teimosia e de confrontação, como aqui já foi dito, fez constar que se bateria em duelo à espada pelos

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princípios que diz defender e por uma determinada solução. Na hora da verdade o PSD apareceu armado de canivete e chamou a isso uma postura de Estado. É lamentável!
Decidiu ainda não perder tempo entre a escolha dos dois terços e da maioria absoluta, decidiu-o aqui mesmo e sobre a hora. Preferiu essa perda de tempo fazer o choradinho dos portugueses de primeira e de segunda, coitadinhos dos que tiveram de partir por falta de espaço - como se o País nas últimas horas tivessem encolhido, embora não tivesse chovido!
Para que conste e para que fique registado, o PSD, como aqui também já bastantemente ficou provado, acaba de criar não portugueses de primeira, de segunda e de terceira - porque esses já estão criados, existem de facto -, mas duas categorias de emigrantes: os emigrantes de primeira e os emigrantes de segunda. Também isso aqui ficou provado!
Mas o que me preocupa neste momento é o que pensarão os portugueses de primeira, de segunda e de terceira, que existem no território continental, nas regiões autónomas e por essa comunidade lusíada fora, da bizarria deste debate. É que nem sequer faltaram as pitorescas e costumadas intervenções do Sr. Deputado Silva Marques.
Será que este foi o debate que foi possível «servir» a este país que o esperou com ansiedade? Honrou-se, assim, a missão da Assembleia da República? Tememos bem que não! Mas para que conste, a nossa posição, a posição que vimos estudando e que aqui queremos deixar clara sobre aquilo que nos foi pedido pelo Sr. Presidente da República, não poderia deixar de ser outra que não a que decorre de toda a doutrina a este respeito extensamente despendida por todos os constitucionistas da nossa praça.
De facto, quando ocorre, como nestas circunstâncias, uma lacuna constitucional, a lacuna deverá ser integrada por via de analogia e não por outras vias. É esta a posição que aqui queríamos deixar clara para que conste.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Qual é a doutrina?

O Sr. Silva Marques (PSD): - O senhor é que me saiu um pitoresco!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa para o que dispõe de oito minutos.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No uso das competências que constitucionalmente lhe estão reservadas, entendeu o Sr. Presidente da República vetar o Decreto n.º 127/V, que postula alterações à lei eleitoral para o Parlamento Europeu.
Na mensagem que, sobre o assunto, enviou à Assembleia, o Presidente da República considera, nomeadamente, a inoportunidade da alteração da referida lei no momento em que nos encontramos a menos de cinco meses das eleições para o Parlamento Europeu e, bem assim, o reduzido apoio parlamentar obtido pelo citado decreto em matéria cuja importância justificaria consensos mais alargados.
Aliás, ao devolver o Decreto n.º 127/V à Assembleia, para nova apreciação, o Presidente tomou em conta - e cito - «a necessidade de fortalecer a vida democrática através de um especial reforço de diálogo e concertação em matéria de direito eleitoral».
É, exactamente, neste ponto que, a nosso ver, se situa a chave da questão.
Já várias vezes referimos que uma das pechas, que reputamos de fundamental, da actuação do Governo tem consistido em forçar a extemporânea incorporação, no ordenamento jurídico interno, de normas e disposições que se não têm revelado consensuais mesmo nos países que já integram a Comunidade Europeia desde a sua constituição. Isso tem sucedido sempre que, para a consecução dos seus objectivos ou para facilitar as suas acções, o Governo vê na importação de orientações, normas e directivas, sólido pretexto ou generoso «alibi».
Estamos, novamente, perante um caso semelhante: trata-se, agora, de impor uma alteração da lei eleitoral para o Parlamento Europeu, esgrimindo-se com a necessidade, de assegurar a participação de todos os portugueses espalhados pelo mundo na escolha dos representantes portugueses no Parlamento Europeu. Ninguém duvidará da justeza de tal propósito mas, decerto, não é por acaso que não se regista uniformidade de pensamento e acção, na matéria em apreço, por parte de muitos países que integram a CEE. E que, no caso vertente e na actual situação, o que está em causa não é tanto o exercício de um direito incontestável que assiste aos não residentes mas, antes, a forma de o mesmo ser exercido em condições que assegurem a transparência de processos e a igualdade de oportunidades na aplicação de tal direito. Ora, sobre estas questões, a proposta do Governo nada cria ou inova optando por reforçar uma figura - o voto por correspondência - que a prática tem revelado ser permeável a tentações potencialmente viciadoras dos resultados dos sufrágios.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O argumento, aduzido pelo PSD, de que as responsabilidades pela tardia apresentação, para promulgação, do diploma em referência lhe não podem ser assacadas, obviamente não colhe. O argumento seria válido se, noutros casos, o PSD não tivesse imposto a sua força de partido maioritário para lograr os seus desígnios. Pretende-se, agora, sustentar que, afinal, por serem, por uma vez, tolerantes, estão a pagar por isso é, no mínimo, assumir-se, grotescamente, a figura de bode expiatório. Em boa verdade, o PSD não sentiu força política - admitindo que tinha vontade - para promover a conclusão atempada do processo de alteração da lei eleitoral, talvez porque, tacitamente, reconheceu que o diploma que elaborou é imperfeito, lacunar e, porque não dizê-lo, demasiadamente prenunciador de um eleiçoarismo inaceitável.
Como quer que seja, contra factos não há argumentos e, por isso, o próprio Parlamento Europeu, mediante resolução, acaba de se pronunciar contra tal qualquer modificação das leis eleitorais nos Estados membros durante o semestre que precede as eleições.
Mas a questão que, aqui e agora, importa analisar é a de saber se o PSD está ou não disposto a aceitar - e a assumir - o «especial esforço de diálogo e concertação» que o Presidente da República refere.

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Também aqui o argumento aduzido é frágil porque assenta numa vulnerabilidade da Constituição que resistiu à revisão de 1982 - refiro-me ao facto, de objectivamente, aquela não estatuir a necessidade de uma maioria qualificada para a aprovação da matéria regulada pelo decreto em apreço embora, em conformidade com o disposto na alínea g) do n.º 3 do artigo 139.º da Constituição se exija - e cito - «maioria de dois terços dos deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções» para a confirmação do voto por parte da Assembleia da República.
Sustenta, agora, o PSD que, aquando da assinatura do acordo de Revisão Constitucional, foi claro para os partidos contratantes, que a Constituição não exigia, de facto, maioria qualificada para ultrapassar o veto presidencial nesta matéria. Mas, então, perguntamos nós, se foi essa a interpretação, por que subscreveu o PSD a cláusula que, no acordo de revisão, exige uma maioria qualificada para, em caso de veto, se confirmar o voto da Assembleia quanto a alterações à lei eleitoral para o Parlamento Europeu? Resta-nos aguardar que o Partido Socialista - que, ao subscrever a necessidade de uma maioria qualificada no acordo de revisão, deixou claro que, de facto, aquela não era exigida pela Constituição para a confirmação do voto parlamentar - saiba, agora, não apenas assumir o futuro rejeitando liminarmente o passado mas, também, persuadir o seu parceiro de revisão de que este é um bom motivo para o «diálogo e para a concertação», se exprimem livre e abertamente para se atingir os consensos partidários e a coesão social de que o País tanto carece.
Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dou por encerrado o debate na generalidade relativo ao Decreto da Assembleia da República n.º 127/V.
Peço aos serviços que avisem os Srs. Deputados, que se encontram nas Comissões de Assuntos Europeus, de Revisão Constitucional e de Defesa Nacional, para comparecerem no Plenário pois vamos entrar no período de votações.

Pausa.

Srs. Deputados, vamos passar à votação, na generalidade, do Decreto da Assembleia da República n.º 127/V - Alteração à Lei n.º 14/87, de 29 de Abril (Lei Eleitoral para o Parlamento Europeu).
Submetido a votação, foi aprovado, com os votos a favor do PSD e votos contra do PS, do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e dos Deputados Independentes João Corregedor da Fonseca e Helena Roseta.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar um requerimento subscrito pelos Srs. Deputados do PSD, que foi distribuído.
Submetido a votação, foi aprovado, com os votos a favor do PSD e abstenções do PS, do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e dos Deputados Independentes João Corregedor da Fonseca e Helena Roseta.
É o seguinte:
Ao abrigo do artigo 155.º do Regimento, os deputados abaixo assinados requerem que o Plenário evoque a si, na presente reunião, a votação na especialidade do Decreto da Assembleia da República n.º 127/V, em reapreciação.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, na conferência de representantes dos grupos parlamentares realizada esta tarde ficou estabelecido que para a discussão na especialidade fosse atribuído o tempo de dez minutos para cada grupo parlamentar e para o Governo.
Vamos, portanto, dar início à discussão, na especialidade, da proposta de substituição, apresentada pelo PSD, em relação ao Decreto da Assembleia da República n.º 127/V.
Estão abertas as inscrições.

Pausa.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, desejo colocar à Mesa a questão de saber se vamos discutir artigo por artigo, tendo em conta as normas constantes do diploma proposto, ou se vamos discutir globalmente e, portanto, se os tempos serão fraccionados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tanto quanto me pareceu pela discussão que tivemos na conferência de líderes faríamos, na especialidade, uma discussão global, e pelos acenos de cabeça dos Srs. Deputados, creio que o entendimento é nesse sentido. Portanto, iremos fazer uma discussão global e o tempo disponível para cada grupo parlamentar e para o Governo será de dez minutos.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, se não há inscrições para a intervenção no debate passa-se à votação.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso é rigoroso. Simplesmente, o normal é solicitar as inscrições, que, no fundo, é o que a Mesa tem estado a fazer, mas se não houver inscrições teremos naturalmente de chegar a essa conclusão.
Portanto, solicito, mais uma vez e pela última, a todas as bancadas que queiram, o favor de se inscreverem.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

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O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, interpelo a Mesa no sentido de suscitar a V. Ex.ª o seguinte: efectivamente, não nos inscrevemos porque é de regra que uma proposta carece de ser sustentada por quem a apresenta.
A nossa expectativa é que o PSD, que apresentou uma proposta de substituição, sustente e explique o fundamento técnico-jurídico e político-constitucional dessa proposta.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o que a Mesa pode fazer e está a fazê-lo é solicitar inscrições.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para dar um pequeno esclarecimento ao Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Deputado Jorge Lacão, na minha intervenção já disse as razões da apresentação do nosso requerimento e por isso não queremos perder tempo com uma outra intervenção.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se não houver inscrições e não dou muito mais tempo para isso, dou por encerrado o debate.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma intervenção.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que houve um equívoco na intervenção acabada de produzir pelo Sr. Deputado Montalvão Machado, líder da bancada do PSD, tanto mais que se referiu a um requerimento, pois o que estamos a apreciar é uma proposta de alteração subscrita por deputados da maioria.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Oh!

O Orador: - Há seguramente um equívoco, até porque a intervenção inicial do Sr. Deputado Montalvão Machado não esclareceu minimamente o que se pretendia com as modificações em apreço.
De todo o modo, numa primeira intervenção que não preclude outras, gostaria de adiantar algumas primeiras posições em nome do Grupo Parlamentar do PCP.
O articulado em discussão contém alterações em duas áreas centrais: uma primeira, a das inegibilidades e incompatibilidades, visando modificar o regime hoje constante da Lei n.º 14/87 e, uma segunda, no tocante à capacidade eleitoral activa, visando revogar o artigo 3.º dessa lei, com efeitos diferidos 180 dias após a publicação do diploma hoje entrado no Hemiciclo.
No que concerne ao primeiro elenco de questões, a posição que sempre assumimos foi a de aceitar uma uniformização com o universo eleitoral substantivo e adjectivo que o direito das Comunidades conhece nesta matéria. Não vemos razão para alterar o nosso posicionamento nem o pensamento que sempre manifestámos, e, por isso mesmo, a proposta se transforma em alguma coisa de menos polémico, muito embora se compreenda que, neste momento, as mudanças introduzidas tendem a viabilizar importantes instrumentos de acção política ao PSD e ao seu Governo.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não se trata nada disso!

O Orador: - O segundo núcleo problemático é, sem dúvida, nevrálgico. O mecanismo intentado pelo PSD é efectivamente tortuoso e visa, como tive oportunidade de dizer na intervenção que produzi em sede de generalidade, essencialmente, garantir uma de duas coisas: ou um imenso espaço de barganha político-normativa, a realizar a propósito de um eventual Código Eleitoral ou de qualquer legislação extravagante que deva ser elaborada conjuntamente com o PS para preencher o requisito dos dois terços; ou, pior ainda, procurar, na aparência de um vazio legal, fazer com que as eleições para o Parlamento Europeu tenham, por aplicação subsidiária do artigo 1.º da Lei n.º 14/87, um regime em tudo idêntico ao da Assembleia da República.
Ora, esta intenção é, em absoluto, de reprovar. Em primeiro lugar, porque as diferentes eleições têm traços de especificidade que importa acautelar. Desde logo, não é possível, sem mais conjecturar, a criação de círculos para o Parlamento Europeu, da Europa e fora dela, à semelhança do que ocorre para a Assembleia da República em que, como é sabido, há uma quota de apenas quatro deputados (dois mais dois) a serem eleitos pelo todo do universo da emigração.
A não convertibilidade imediata deste modelo para as eleições destinadas a deputados ao Parlamento Europeu faz com que qualquer solução que vise a mera aplicação subsidiária do artigo 1.º da Lei n.º 14/87 se assuma como um golpe político-jurídico de consequências e de latitudes bem mais amplas do que aquelas que eram originariamente propostas pelo Governo e pelo PSD. Estamos frontal e clarividentemente contra este tipo de solução, quer de um ponto de vista técnico, quer de um ponto de vista substancial.
Saliente-se que, de qualquer forma, a circunstância de irem decorrer as eleições próximas para o Parlamento Europeu à luz da lei vigente, não nos impede de pensar o universo que o partido do Governo prefigura para o tal período que há-de seguir-se aos 180 dias posteriores à publicação da presente lei. Lei, diga-se de passagem, que é nova e que terá de ser considerada em todos os seus aspectos, como agora estamos, na realidade, a fazer.
A nosso ver, aquilo que importa relevar é o regresso do PSD, de um ângulo de vista meramente conceptual, àquelas que eram as suas ideias anteriores ao primeiro recuo formulado para a aprovação daquele que viria a ser o decreto vetado pelo Sr. Presidente da República. E esta tentativa significa exactamente um

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novo afrontoso avanço que, felizmente, se seguiu à derrota sofrida na votação que tivemos oportunidade de produzir.
Tal como está formulada, a solução do PSD não é compaginável com uma escorreita leitura da Constituição da República, com uma hermenêutica rigorosa que se faça das regras elementares do nosso direito eleitoral.
Por isso mesmo, nós iremos, na altura apropriada, manifestar, através do voto, a rejeição integral dos artigos 2.º e 3.º que vêm agora subscritos pelos deputados do Grupo Parlamentar do PSD. Ulteriormente, se for caso disso, voltaremos a intervir por especificação dos mesmos ou outros aspectos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A primeira palavra é para o silêncio do PSD.
O PSD é apanhado nesta matéria como um aluno cábula que procura fazer uma partida ao professor e depois, envergonhadamente, procura que a partida passe porque não tem qualquer argumento substantivo para justificar a sua atitude.
Efectivamente, Srs. Deputados, já é mau que o Partido Social-Democrata apresente as iniciativas que apresenta, mas que o Partido Social-Democrata não tome consciência política de que essas iniciativas vão bulir com o cerne dos valores democráticos e que qualquer iniciativa que tenha a ver com a essência da prática democrática merece profunda discussão política, merece consideração pelos argumentos dos interlocutores, que o PSD revele total insensibilidade nestes aspectos, dá a imagem de marca que o PSD quer assumir para si próprio. E essa imagem de marca só pode ser a de uma total insensibilidade a aspectos essenciais dos próprios valores democráticos.
Começa, por isso, a não nos surpreender minimamente que, perante o apelo do Sr. Presidente da República, uma matéria institucional de tanto relevo, como a de uma lei eleitoral, deva merecer disponibilidade para um consenso máximo possível e que a este apelo o PSD se feche num mutismo absoluto e que, mais do que isso, apresente uma solução legislativa que vai retroagir para a solução mais radical que até hoje o PSD já defendeu, solução essa que implica, em teoria, Srs. Deputados, poder conferir o direito de voto a mais de 3 milhões de portugueses de primeira, de segunda ou de subsequente geração, estejam em que continente estejam, residam em que território residam e qualquer que seja o regime político a que estejam subordinados em função dos países da sua própria residência.
Para os Srs. Deputados do PSD é totalmente indiferente que haja portugueses, e há, virtualmente, com fenómenos de segunda geração que conhecemos, que nem sequer falam a língua portuguesa. É completamente indiferente que em função dos fenómenos, e são muitos, da dupla nacionalidade possa haver portugueses a votar de acordo com as regras do Estado Português, e simultaneamente a votar de acordo com as instituições do Estado dos países de que são também nacionais. Tudo isto é indiferente para o PSD, mas o que espanta é que o PSD entre em contradições das quais nem sequer se apercebe.
Por exemplo, Portugal mantém a assinatura de uma convenção com o Brasil, o Tratado de Amizade Luso-Brasileira, nos termos do qual quando um cidadão português exerce direitos políticos no Brasil perde, em contrapartida, a capacidade de exercer esses direitos em Portugal.
Pergunto-vos, Srs. Deputados do PSD: então Portugal e o Brasil não são o exemplo mais típico de que dois país devem manter, por razões históricas, o laço mais essencial e de maior unidade? Se a resposta a esta pergunta for afirmativa, como penso que tem de ser, a contradição é absoluta na medida em que aos cidadãos portugueses residentes no Brasil, se aí exercerem o direito de voto, se vai impedir de exercer o direito de voto em Portugal. Em contrapartida, se estiverem nos Estados Unidos da América podem-no aí exercer, e podem também exercê-lo para o Estado português.
Trata-se de uma contradição institucional absoluta. É, em consequência, uma verdadeira irresponsabilidade de Estado, como também é uma irresponsabilidade que o PSD não cure de saber se o Estado português tem ou não condições para garantir a todos os cidadãos portugueses eleitores, e simultaneamente a todos os candidatos que se apresentem ao acto eleitoral, os princípios de direito eleitoral, começando pelo princípio da liberdade de propaganda, pelo princípio da igualdade de oportunidade de todas as candidaturas, pelo princípio da imparcialidade das entidades públicas, pelo princípio de atribuição de competência aos tribunais portugueses para exercerem o grau de eficácia necessário de fiscalização de um processo eleitoral.
Todos estes princípios de direito eleitoral, essenciais para garantir o princípio democrático, essenciais para garantir o princípio da soberania nacional, são liminarmente rasgados pela indiferença do PSD.
Srs. Deputados do PSD, a vossa iniciativa, hoje, é muito grave politicamente. Ela representa um verdadeiro atentado ao espírito e aos valores das instituições democráticas. Os senhores têm de assumir plenamente a responsabilidade dos vossos actos.

Aplausos do PS e do Deputado Independente João Corregedor da Fonseca.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Marques Júnior.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É preciso esclarecer o que é que estamos a votar e é preciso justificar a votação.
Quando da votação final global do decreto legislativo não votámos a favor daquele projecto que fazia a distinção entre emigrantes residentes fora dos países da Comunidade de primeira e de segunda geração.
Agora, o que estamos a votar é uma coisa completamente diferente. Aqui, o PSD faz autocrítica e regressa à lei actualmente em vigor para esta próxima eleição, indo ao encontro dos desejos manifestados pelo

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Sr. Presidente da República e de acordo com os princípios elementares de direito eleitoral que postulam que, perto das eleições ou pelo menos um semestre antes das eleições as leis eleitorais não devem ser modificadas. Quanto à solução que o PSD dá para depois desta eleição parlamentar, remetendo para legislação da Assembleia da República nos termos do artigo 1.º da Lei n.º 14/87, isto é, sem fazer qualquer distinção entre os emigrantes da Comunidade e fora da Comunidade e entre os de primeira e os de segunda geração, estamos inteiramente de acordo e, por isso, votaremos, na especialidade, a favor destas modificações.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Manuel Mendes pediu a palavra para que efeito?

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para formular uma nova intervenção.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado, informando-o de que dispõe de quatro minutos.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É óbvio que o PSD pode adoptar as posturas e as estratégias de bancada que muito bem entender. Pode inclusivamente optar pelo silêncio, o que não quer dizer que a Oposição esteja impedida de, sobre tal opção, elaborar um juízo concreto. Do nosso ponto de vista, o silêncio do PSD não é de oiro nem é de prata, é de chumbo.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Pior!

O Orador: - Isso significa que, perante a derrota que foram obrigados a engolir, os deputados da maioria se vêem agora na circunstância de procurar fazer passar uma nova legislação que viola princípios fundamentais do nosso direito eleitoral e que, exactamente porque têm consciência disso, não se sentem à vontade nem para uma diatribe, nem para uma peripécia parlamentar sem sentido, nem para justificar o que não é justificável.
Nós acusámos o partido do Governo em nome da bancada do PCP - e outros deputados, o fizeram - de ter, nesta matéria, uma posição que não é séria, que visa, sem acautelar aspectos absolutamente centrais levar a que uma massa enorme de emigrantes vote, no futuro, sem quaisquer espécies de controlo ou de limite, para o Parlamento Europeu e também para outros importantíssimos órgãos da soberania em Portugal. Acusámos o PSD de, na nova proposta, regredir à formulação inicial de que havia abdicado não em nome do consenso mas de um certo possibilismo. E o PSD mantém-se calado face a tais acusações.
Podemos, portanto, concluir que, prosseguindo a atitude segundo a qual todos os fins legitimam todos os meios, aquilo que a bancada maioritária pretende é a consagração de um qualquer regime, a prazo, mesmo que já não possa ser para amanhã, que sirva o seu sonho de perpetuação no poder. Acusações deste teor, que são graves, não suscitam qualquer comentário, o que quer dizer, com toda a clareza, que o PSD não tem resposta.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E ao não ter respostas, faz do seu silencia já não apenas um silêncio de chumbo mas também uma silêncio de estrume intelectual.

Protestos do PSD.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há por vezes, um certo tipo de linguagem de que nos devíamos tentar abster de o utilizar nesta Câmara.
Sr. Deputado José Manuel Mendes, a sua ponta final foi, desculpe que lhe diga, infeliz e, portanto, espero que não se repita.
Entretanto, pediram a palavra os Srs. Deputados José Manuel Mendes e Montalvão Machado.
O Sr. Deputado José Manuel Mendes pediu a palavra para que efeito?

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, certamente o Sr. Deputado Montalvão Machado vai ratificar em tom seguramente ainda mais veemente, aquilo que o Sr. Presidente acaba de dizer. A explicação que tenho para dar, utilmente, e para poupar tempo à Câmara, deverá ficar para depois. Portanto, preferia que o Sr. Deputado falasse primeiro do que eu.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Montalvão Machado.
O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Manuel Mendes: Ë evidente que a nossa bancada reconhece a todos os Srs. Deputados desta Casa o direito de dizerem aquilo que entenderem. Mas há uma coisa que exigimos, e exigimos porque também somos fiéis no cumprimento dessa exigência para com os outros: é que as pessoas sejam correctas, educadas e respeitem os outros.
Sr. Deputado José Manuel Mendes, sabe que sou seu amigo e que o considero há muito tempo e nunca esperei que V. Ex.ª terminasse a sua alocução de forma pouco correcta, pouco delicada e pouco educada como acabou.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Montalvão Machado, Srs. Deputados: Entendo que devo uma explicação à Câmara.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não deve nada!

O Orador: - O que pretendi exprimir, metaforicamente...

Risos.

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1402 I SÉRIE - NÚMERO 39

..., foi alguma coisa que tem a ver com aqueles estádios de incubação intelectual em que o poder de resposta imediata não é possível. Só isto.
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Esteja calado!

O Orador: - E, reconduzidos, ao estrito entendimento do que foi uma metáfora corrente suponho não subsistir qualquer razão para o Sr. Presidente da Assembleia da República nem para o Sr. Deputado Montalvão Machado reiterarem as críticas que me formularam.

Protestos do PSD.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Devia ter ficado calado!

O Sr. Presidente: - Uma vez que não há inscrições, peço aos serviços de apoio que solicitem a presença dos Srs. Deputados que estão nas comissões para se proceder à votação.
Está encerrado o debate na especialidade.
O Sr. Deputado Jorge Lacão pede a palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço desculpa mas estava de braço erguido antes de o Sr. Presidente ter anunciado o encerramento do debate para pedir a palavra para uma segunda intervenção, dado que ainda disponho de algum tempo.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Agora que foi anunciada a votação é que pede a palavra?!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, encerrei o debate porque nem eu nem a Mesa nos apercebemos de qualquer pedido de palavra.
Está, pois, encerrado o debate, solicitando a presença dos Srs. Deputados que se encontram fora do Hemiciclo para que possamos proceder à votação.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, quero dizer que, tal como o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, o PS fala verdade por definição. Efectivamente, o Sr. Deputado Jorge Lacão pediu a palavra antes de o Sr. Presidente dar por encerrado o debate.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não pus em dúvida que o Sr. Deputado pedisse a palavra. O que determinei, em boa-fé, é que o debate estava encerrado e mantenho a posição porque é uma regra mínima do jogo, tendo dado todas as oportunidades para que as pessoas se tivessem manifestado. Nada mais do que isto.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, admito perfeitamente que tenha sido com toda a boa-fé que tenha encerrado o debate. O que já me custa
a compreender é que, sabendo que houve uma inscrição por parte do PS antes desse encerramento, o Sr. Presidente não corrija o erro cometido.

Vozes do PS: - Muito bem! Vozes do PSD: - Não, não!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, podíamos entrar agora numa regra que nada tem a ver com o Regimento mas, apesar de tudo e considerando a natureza do debate, vou conceder a palavra.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, há pouco quando usava da palavra, na Tribuna, o Sr. Presidente instou-me a concluir e reconheci, posteriormente, que tinha ido além do tempo que, regimentalmente, me estava atribuído, pelo lhe agradeci a generosidade que usou para comigo.
Queira, agora, desculpar-me mas o Partido Socialista tem direito a dez minutos, neste debate. Tinha suscitado o seu direito de intervenção antes de o Sr. Presidente ter encerrado o debate. Portanto, neste momento, apenas temos de reconhecer que V. Ex.ª fez justiça a uma regra regimental elementar que consiste em cada partido ter direito a esgotar os tempos que lhe estão atribuídos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uso da palavra, em parte, para repor alguns dos argumentos a que há pouco aludi. E uso da palavra, Srs. Deputados do PSD, escandalizado pela vossa atitude, na medida em que essa atitude é a demonstração mais perfeita da insensibilidade democrática perante um problema democrático essencial. E os Srs. Deputados do PSD têm de compreender que qualquer democrata na Assembleia da República não possa aceitar, não possa conformar-se com a atitude de auto-suficiência hoje aqui reveladas, na medida em que essa atitude de auto-suficiência é duplamente gravosa. É gravosa pela indiferença que representa perante o estímulo institucional do Sr. Presidente da República num convite ao diálogo e ao consenso. Perante a mensagem do Sr. Presidente da República suscitando o diálogo e o consenso o PSD responde pelo silêncio e pela auto-suficiência das suas posições. Noutra perspectiva, a da solução normativa que o PSD apresenta confrontado com acusações frontais de que essas soluções colidem com princípios constitucionais que são fundamentais para o direito eleitoral e que, portanto, obrigam, em boa consciência política, a que estas acusações sejam consideradas eventualmente rebatidas. Não é essa a conduta do PSD que, bem pelo contrário, age numa total indiferença perante os próprios valores constitucionais e, como partido maioritário, tinha o dever prioritário de ser o primeiro a respeitar, pelo seu exemplo e pela sua conduta política.
Infelizmente, o exemplo do PSD é o de quem não está interessado em contribuir para garantir os princípios essenciais do Estado democrático e, nessa justa medida, de quem não está interessado em manter um clima de relacionamento institucional perfeito entre as instituições desse mesmo Estado democrático.

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O PSD tem uma atitude que, sendo juridicamente absurda, é politicamente chocante. O que vai ficar para a história deste debate é a subordinação do PSD a um clientelismo demagógico sem precedentes e a uma incapacidade intelectual em assumir as responsabilidades pelas atitudes politicamente atentatórias do próprio ordenamento constitucional português.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, vamos passar à votação e é patente que, com essa votação, vai vencer a maioria dos votos do PSD. Seguramente o que o PSD não conseguiu demonstrar é que tenha qualquer razão a assistir ao peso dos seus próprios votos.

Aplausos do PS, do PCP e do Deputado Independente João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa não anotou quaisquer outras inscrições. Está encerrado o debate.
Antes de dar início à votação, gostaria de saber se há consenso para que se faça a votação conjunta, na especialidade, dos artigos 1.º, 2.º e 3.º
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, pela nossa parte, propomos que ponha à votação o artigo 1.º separadamente e, depois, os artigos 2.º e 3.º em conjunto.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo propostas em contrário, assim se fará.
Vamos, então, passar à votação do artigo 1.º da proposta de substituição, apresentada pelo PSD.
Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Sr. Deputado Independente Raul Castro.

É o seguinte:
Artigo 1.º

Os artigos 5.º e 6.º da Lei n.º 14/87, de 29 de Abril, passam a ter a seguinte redacção:

Artigo 5.º

Inelegibilidades São inelegíveis para o Parlamento Europeu:

a) Os cidadãos abrangidos por qualquer inelegibilidade prevista em normas comunitárias aplicáveis;
h) Os cidadãos abrangidos por qualquer das inelegibilidades gerais previstas na legislação aplicável à eleição de deputados à Assembleia da República.
Artigo 6.º
O exercício do mandato de deputado ao Parlamento Europeu é incompatível:
a) Com as qualidades referidas no n.º l do artigo 6.º do Acto Comunitário de 20 de Setembro de 1976, bem como quaisquer outras disposições comunitárias em vigor;
b) Com o desempenho efectivo de cargos a que se referem as inelegibilidades previstas no artigo anterior;
c) Com o desempenho efectivo dos cargos de membro do Governo, de órgãos de Governo próprios das regiões autónomas, do Governo ou da Assembleia Legislativa de Macau, de Governador Civil ou Vice-Governador Civil e de Juiz do Tribunal Constitucional.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos agora à votação dos artigos 2.ª e 3.º

Submetidos a votação, foram aprovados, com votos a favor do PSD e do CDS e com votos contra do PS, do PCP, do PRD, de Os Verdes e dos Srs. Deputados Independentes João Corregedor da Fonseca e Helena Roseta.
São os seguintes:

Artigo 2.º

É revogado o artigo 3.º da Lei n.º 14/87, de 29 de Abril.

Artigo 3.º

O artigo 2.º produz efeitos 180 dias após a publicação da presente lei, aplicando-se às próximas eleições para o Parlamento Europeu a capacidade eleitoral activa constante da Lei n.º 14/87, de 29 de Abril.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos à votação final global desta proposta de substituição do PSD.

Submetida a votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS e com votos contra do PS, do PCP, do PRD, de Os Verdes e dos Srs. Deputados Independentes João Corregedor da Fonseca e Helena Roseta.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar por terminada a sessão, quero relembrar aos grupos parlamentares a necessidade de fornecerem à Mesa os nomes dos elementos que ainda faltam para completar a composição das várias comissões parlamentares permanentes.
A sessão de amanhã terá início às 15 horas com a seguinte ordem de trabalhos: período de antes da ordem do dia e período da ordem do dia no qual se procederá à apreciação da Proposta de Lei n.º 83/V - Benefícios fiscais em sede de IRS, IRC e CA.
Srs. Deputados, não havendo mais nada a tratar, está encerrada a sessão.
Eram 19 horas.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Arménio dos Santos.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Mendes Costa.
Cuido Orlando de Freitas Rodrigues.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.

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1404 I SÉRIE - NÚMERO 39

José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Ferreira Martins.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

José Barbosa Mota.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.

Partido Comunista Português (PCP):

António Silva Mota. Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Domingos Abrantes Ferreira.
Manuel Anastácio Filipe.

Centro Democrático Social (CDS):

Basílio Adolfo de M. Horta da Franca.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
António José de Carvalho.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Germano Silva Domingos.
Henrique Nascimento Rodrigues.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
Margarida Borges de Carvalho.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Socialista (PS):

Alberto de Sousa Martins.
Jaime José Matos da Gama.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Barreirinhas Cunhal.
Lino António Marques de Carvalho.

A REDACTORA: Cacilda Nordeste.

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