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Sábado, 29 de Abril de 1989 I Série - Número 72
DIÁRIO
Da Assembleia da República
V LEGISLATURA 2.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)
II REVISÃO CONSTITUCIONAL
REUNIÃO PLENÁRIA DE 28 DE ABRIL DE 1989
Presidente: Exmo. Sr. Vítor Pereira Crespo
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Apolónia Maria Pereira Teixeira
Rui dos Santos Silva
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 1O horas e 23 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.º 392/lV e 393/V.
Foram aprovados dois relatórios e pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos no sentido de não autorizar dois deputados a deporem como testemunhas em tribunal.
Prosseguiu o debate da revisão constitucional (artigos 40.º e
41. º).
Intervieram no debate os Srs. Deputados Herculano Pombo (Os Verdes), Jorge Lemos (PCP), Carlos Encarnação (PSD), 15abel Espada (PRD), José Magalhães (PCP), António Vitorino (PS), Vera Jardim (PS), Costa Andrade (PSD), Raul Castro (Indep.), Luísa Amorim (PCP), Assunção Esteves (PSD), Narana Coissoró (CDS), Almeida Santos (PS) e Adriano Moreira (CDS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 50 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 25 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados: Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alexandre Azevedo Monteiro.
Amândio dos Anjos Gomes.
Américo de Sequeira.
António Abílio Costa.
António Augusto Ramos.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge Santos Pereira.
António José de Carvalho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Oliveira de Matos.
António Maria Ourique Mendes.
António Mário Santos Coimbra.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio dos Santos.
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carla Tato Diogo.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Pereira Batista.
Carlos Manuel Sousa Encarnação.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Carlos Sacramento Esmeraldo.
Casimiro Gomes Pereira.
Cecília Pita Catarino.
César da Costa Santos.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos da Silva e Sousa.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Ercília Domingos M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Germano Silva Domingos.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Humberto Pires Lopes.
Jaime Gomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maçãs.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
José Mendes Bota.
José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Batista Cardoso.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel José Dias Soares Costa.
Manuel Maria Moreira.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria Antónia Pinto e Melo.
Maria Assunção Andrade Esteves.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Mary Patrícia Pinheiro Correia e Lança.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montai vão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Bento M. da C. de Macedo e Silva.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
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Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Gomes da Silva.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Rui Manuel P. Chancerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.
Partido: Socialista (PS):
Afonso Sequeira Abrantes.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Fernandes Silva Braga.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Manuel Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Martins do Vale César.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Edite Fátima Marreiros Estrela.
Edmundo Pedro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Luís Costa Catarino.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Carlos P Basto da Mota Torres.
José Eduardo Vera Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Florêncio B. Castel Branco.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Torres Couto.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rosa Maria Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
Ana Paula da Silva Coelho.
António Filipe Gaião Rodrigues.
António José Monteiro Vidigal Amaro
António da Silva Mota.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Ca rios Alfredo Brito.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Fernando Manuel Conceição Gomes.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João' António Gonçalves do Amaral.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Anastácio Filipe.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Luísa Amorim.
Maria de Lurdes Dias Hespanhol.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Renovador Democrático (PRD):
António Alves Marques Júnior.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
15abel Maria Ferreira Espada.
José Carlos Pereira Lilaia.
Rui dos Santos Silva.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
Basílio Adolfo de M. Horta de Franca.
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.
Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):
Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Maria Amélia do Carmo Mota Santos.
Deputados Independentes:
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Raul Fernandes de Morais e Castro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura dos diplomas entrados na Mesa.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Sr. Presidente, Srs . Deputados: Deram. entrada na Mesa, foram admitidos e baixaram à 6.ª Comissão os seguintes projectos de lei n.º 392/V, apresentado pelo Sr. Deputado António Mota e outro, do PCP, propondo a criação da freguesia de Sabrosa de Aguiar, no concelho de Vila Pouca de Aguiar; e n.º 393/V, apresentado pelo Sr. Deputado Manuel Cardoso e outros, do PSD
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e do PS, propondo a elevação da povoação de Moselos, no município de Santa Maria da Feira, à categoria de vila.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, gostaria de aproveitar a ocasião para lembrar que hoje, às 11 horas, haverá uma pequena conferência de líderes.
Como sabem, terminámos ontem a apreciação do artigo 39.º-A. Por isso vamos dar início, dentro de momentos, à discussão do artigo 40.º, relativamente ao qual agradecia que fossem fazendo as vossas inscrições.
Antes, porém, o Sr. Secretário vai proceder à leitura de um relatório da Comissão de Regimentos e Mandatos.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Srs. Deputados, um dos relatórios incide sobre um pedido do 3.º Juízo do Tribunal da Comarca de Torres Vedras e diz respeito ao Sr. Deputado Manuel Avelino. A Comissão de Regimentos e Mandatos pronunciou-se no sentido de não suspender o mandato do Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Pausa.
Como não há objecções, vamos proceder à sua votação.
Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Ainda no mesmo sentido vai o segundo relatório da Comissão de Regimentos e Mandatos, que não autoriza a suspensão do mandato da Sr.ª Deputada Carla Diogo, para comparecer na 2.ª Secção do Juízo de Polícia da Comarca do Porto.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Pausa.
Como não há objecções, vamos proceder à sua votação.
Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início à discussão do artigo 40.º
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar de Os Verdes apresentou, no seu projecto, uma proposta de alteração ao artigo 40.º, que consagra o direito de antena. Essa proposta visa a inclusão de um novo número neste artigo, que seria o n.º 4 do actual texto constitucional, no qual se consagraria o direito de antena para um elenco de associações que, neste momento, estruturam o tecido social português e que contribuem decisivamente para a formação da opinião pública. Seriam elas, em nosso entender, as associações
de ambiente, as associações juvenis, as associações de deficientes, as organizações femininas, as confederações e a federações cooperativas. É esta, basicamente, a nossa proposta.
Entendemos que, pelo papel que este lote de organizações tem hoje na sociedade portuguesa, seria de inteira justiça que a Constituição lhes consagrasse também o direito de antena nos principais órgãos da comunicação social.
É esta a apresentação básica que queria começar por fazer, mas caso se proporcione, durante o debate terei oportunidade de referir ainda outros aspectos que me parecem importantes.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, eis mais um desenvolvimento dos acordos PS/PSD em matéria de destruição de direitos fundamentais dos partidos da Oposição. Consideramos o texto do artigo 40.º um golpe drástico no direito de antena.
Creio que a primeira conclusão que podemos extrair do texto do acordo é que, também nesta matéria, há um decaimento global das posições do PS em matéria de comunicação social.
Entendemos que estas propostas não podem deixar de ser lidas no contexto global em que o sentido desta revisão aponta, ou seja, um sector público diminuído, fiscalizado por uma Alta Autoridade para a Comunicação Social, completamente governamentalizada.
Ao restringir o direito de antena apenas ao serviço público da rádio e da televisão o PS está, com esta sua posição, a facilitar, mais uma vez, a vida ao PSD, retirando espaço de expressão aos partidos da Oposição e permitindo um alargamento da expressão do PSD em termos de comunicação social.
Diríamos que esta posição do PS é tanto mais incompreensível quanto as posturas que vêm sendo assumidas pelo PSD ao longo destes últimos dias, e particularmente nesta última semana, deveriam levar os deputados socialistas a reconsiderar os termos em que se preparam para carimbar, juntamente com o PSD, um acordo com características tão negativas.
Portanto, a questão aqui fica, Srs. Deputados do PS e Srs. Deputados em geral. Porquê, neste momento e neste quadro, proceder a alterações de tão enorme gravidade num direito que devia ser considerado e consagrado no sentido do seu desenvolvimento e não da sua restrição?
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A bancada do PSD não podia deixar de fazer uma referência a esta intervenção do Sr. Deputado Jorge Lemos porque tudo aquilo que ele afirmou é exactamente o contrário do que ocorre.
Por acordo feito na Comissão Eventual de Revisão Constitucional, longe de se restringirem os direitos de antena, antes se alargaram esses direitos, designadamente os direitos da Oposição.
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Na regulamentação constitucional do direito de antena acrescentaram-se disposições, relativas ao direito de resposta e ao direito, de réplica política, o que significa que, pela primeira vez, algumas destas coisas estão consagradas na Constituição com uma amplitude que não existia nos processos constitucionais anteriores.
Tudo isto tem por finalidade dizer que, na verdade, é o próprio partido do Governo, vejam bem, que apoia estas medidas, é o partido do Governo que dá o seu assentimento ao alargamento da panóplia de meios de que a Oposição dispõe.
Não faz, portanto, qualquer sentido, não tem qualquer fundamento, a afirmação de restrição, a afirmação de limitação, as afirmações de que estamos atentar manipular ou de que estamos a tentar calar a voz às oposições, atitude que o PCP usualmente tem, usualmente manifesta e que aqui, hoje, mais uma vez acabou por tentar expressar a propósito deste artigo 40. º
Compreendemos que o PCP, em geral, não goste, não queira, não concorde, com as alterações que são feitas na Constituição no domínio da comunicação social. O que o PCP não tem é o direito de dizer inverdades, o que o PCP não, tem é o direito de fazer processos de intenção que nem sequer. se apoiam nos próprios textos da Revisão Constitucional.
O PCP goza do benefício da suspeição permanente, goza do beneficio. da contradita permanente em relação a tudo quanto é novo, em relação a tudo quanto é acordado, designadamente pelo PSD e pelo PS. É uma posição de principio, é natural que seja um vício, é natural, que se transforme num tique. Não temos nada contra isso pois cada um tem os vícios e os tiques que quer ter. O que não podemos, é deixar de manifestar a nossa total discordância com as afirmações produzidas e com a falta de verdade manifestada.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada 15abel Espada e o Sr. Deputado José Magalhães.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada 15abel Espada..
A Sr.ª 15abel Espada (PRD): - Sr. Deputado Carlos Encarnação, a questão que quero colocar-lhe relaciona-se, obviamente, com o artigo 40.º, em especial com o seu n.º 3.
Como o Sr. Deputado sabe, há relativamente pouco tempo tivemos oportunidade de receber do Governo uma proposta de lei que se. inseria nesta adaptação do texto constitucional às novas realidades da radiodifusão.
Na verdade, essa proposta de lei previa que o direito
dos partidos a tempos de antena na radiodifusão- fosse exercido apenas nas rádios de âmbito nacional e de âmbito regional de acordo, portanto, com o que está indiciado no artigo 40.º da proposta da CERC.
Desta forma, Sr. Deputado, e segundo as alterações ao texto da Constituição, os partidos políticos têm apenas direito a tempos, de antena nas rádios nacionais e regionais, o que significa que não têm direito, em qualquer acto eleitoral, a tempos de antena nas rádios locais.
Como o Sr. Deputado sabe, o PRD manifestou as suas dúvidas quanto a esta matéria, nomeadamente porque é de opinião que os actos eleitorais, em si, têm características diferentes. Podemos assumir que para eleições que sejam de nível nacional; como por exemplo, a eleição do Presidente da República ou á eleição
para a Assembleia da República, não faça muito sentido que as rádios locais tenham tempo de antena. Já não consideramos porém; a mesma coisa para as eleições autárquicas. Neste caso pensamos que, não havendo tempos de antena, a nível nacional, se justificaria, de algum modo, que se dispusesse de tempos de antena nas rádios locais.
Por, outro lado, pensamos que, neste momento, a receptividade que as rádios locais virão a ter por parte da população é ainda um mistério: Não sabemos se o impacto e a influência que as rádios locais vão ter na população levarão a que largas faixas de população sé limitem a sei apenas suas ouvintes, prescindindo da audição das rádios nacionais e das rádios regionais.
Se na realidade as rádios locais vierem a. abranger largas camadas da população, teremos de concluir que ó facto de não disporem de tempos de antena levará a que uma grande parte da população portuguesa não tenha acesso à informação. veiculada pelos partidos políticos durante as campanhas eleitorais.
Gostaria de saber Sr. Deputado; se é essa a interpretação que se deve dar ao n.º .3 do artigo.40.º, proveniente da CERC, ou se haver, possibilidade de, mesmo com este texto constitucional, consoante as in formações que recebamos relativamente à importância que as rádios locais venham a adquirir no. espectro radiofónico alterar este princípio para alguns actos eleitorais e para algumas circunstâncias, ou seja, se será possível quê. os partidos políticos venham a ter, nas rádios locai, os mesmos direitos que têm nas rádios nacionais e nas rádios regionais, pelo menos em algumas delas e em determinados actos eleitorais.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Encarnação responde já ou responde no fim?
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Respondo no fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP):- Sr. Deputado Carlos Encarnação, V. Ex.ª exibiu uma segurança e uma arrogância que decorrem, unicamente do facto de ter a expectativa de que o acordo, na parte respeitante, à comunicação social, continue a ser cumprido da forma como, lamentavelmente, ontem foi cumprido.
Dá-se mesmo ao luxo de afirmar, com um tom perfeitamente peremptório; que «são inverdades», que não é assim, não é assado... Sugiro a V. Ex.ª que tenha mais cuidado com o que diz, pois há uma análise que todos nós - podemos fazer, vendo os articulados, que infirma aquilo que V. Ex.ª aqui declarou tão peremptoriamente.
Eu percebo-o. V. Ex.ª está a imitar o Sr. Primeiro-Ministro! ... O Sr. Primeiro-Ministro, ontem saiu da Presidência da República e, de dedo esticado, apontou para o PS e disse: « O PS dá cambalhotas; o PS faz; o PS acontece; o PS, no fundo; é o responsável pela carga policial no Terreiro do Paço, etc.» E diz isto com um sentido de arrogância e de impunidade decorrente da expectativa de que o PS engula, engula, engula, até à última gota, o fel todo da taça.
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Compreendo que V. Ex.ª o queira imitar!... Traz para aqui o estilo do chefe, só que sem razão alguma. O chefe também não a tem, mas V. Ex.ª menos ainda, descontada a diferença de estatura e de posto!.
Risos.
No caso concreto do direito de resposta e do direito de antena, aquilo que este articulado opera, é de facto, uma redução. Reconheça V. Ex.ª, honesta e claramente, que há uma redução!... Cotejando o texto do articulado constitucional actual a redução é formal e expressa, decorrendo do facto de se omitir a aplicabilidade do direito de antena nas estações privadas. Este o primeiro aspecto.
Depois, há uma diferença de contexto!... É muito diferente falarmos no sector público com o nível, com o âmbito real que ele hoje tem e falarmos do campo, do universo que o PSD sonha como sendo o campo de aplicação deste direito de antena reduzido. VV. Ex.ªs pensam, desde logo, em camartelar uma componente fundamental do sector público de comunicação social, pensam em leiloar frequências de rádio e pensam, quiçá, em atacar a própria RTP quanto à sua dimensão e à sua integridade. Isto significa que, havendo um direito formalmente proclamado, o campo de incidência do direito é menor. Desmente V. Ex.ª isto? Se V. Ex.ª desmente isto então desmentirá que estamos aqui, no Hemiciclo, e dirá que estamos na China. Creio que há limites para o absurdo ou para o argumento contra os factos.
Por outro lado, Sr. Deputado, fica-se aquém, suprime-se o direito do espaço. Verdade ou falso? Eu respondo verdade. Sugiro a V. Ex.ª, no caso de não ter reparado nesse pequeno aspecto e de isso ser um bónus do acordo, que nele repare.
Gostava que o Sr. Deputado Carlos Encarnação repusesse, pelo menos, além do seu contentamento, a verdade elementar dos factos. Dou-lhe esta oportunidade de fazê-lo.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria, mais uma vez, por responder à última intervenção, a do Sr. Deputado José Magalhães.
Se há coisas que o Sr. Deputado José Magalhães não pode dizer, de maneira nenhuma, é que há da minha parte uma tentativa de imitação do estilo, da figura, da estatura do Sr. Primeiro-Ministro. Não posso fazê-lo; o meu estilo é completamente diferente e V. Ex.ª, com toda a certeza, será o primeiro a reconhecer o excesso do que disse. No entanto, isso é natural V. Ex.ª excede-se muitas vezes e, também agora dou aqui prova disso. Fez uma «excursão» por outras coisas que não tinham nada a ver com o assunto em debate, fez uma excursão pelo Terreiro do Paço.. . V. Ex.ª gosta também de passear pelo Terreiro do Paço, isso é natural e normal, tem todo o direito de o fazer. Agora o que V. Ex.ª não tem é o direito de fazer comparações que são absurdas e comparações que não têm razão de ser.
O que eu afirmei foi que há figuras que são agora consagradas neste artigo 40.º e que antes não existiam, que há figuras que enriquecem, do ponto de vista dos
direitos, a panóplia de direitos que a Oposição tem. E isso V. Ex.ª, com certeza, não poderá negar.
Aquilo que V. Ex.ª me diz é o seguinte: bom, mas o serviço público vai ser diferente, o serviço público vai ter um âmbito diferente daquilo que existia na Constituição. Não estou muito certo disso, penso mesmo que o que se dará é exactamente o contrário daquilo que V. Ex.ª afirma.
Ó que V. Ex.ª diz é que o direito de antena vai limitar-se, fora dos actos eleitorais, a ser exercido através do serviço público. Com certeza!... Não haveria maneira de exercermos o direito de antena, quanto mais não fosse do ponto de vista técnico, se ele não fosse considerado da forma que o está no n.º 1 do artigo 40.º
Com isto responderia já à Sr.ª Deputada Isabel Espada. Há duas coisas completamente diferentes a considerar, uma o exercício do direito de antena, como sabe, nos termos constantes do n.º 1 do artigo 40.º, fora dos períodos eleitorais e outro o exercício do direito de antena nos períodos eleitorais, a que se reporta o n.º 3 do artigo 40.º
Como é evidente, em relação a este n.º 3, o texto proposto pela Comissão Especial de Revisão Constitucional é perfeitamente claro, ou seja, o que nele se diz é o seguinte: «Nos períodos eleitorais, os concorrentes têm direito a tempos de antena regulares e equitativos nas estações emissoras de rádio e televisão de âmbito nacional e regional, nos termos da lei.» Isto significa, portanto e em primeiro lugar, que o tempo de antena é, como é evidente, circunscrito e limitado - nem outra coisa poderia ser - às estações emissoras de rádio e televisão de âmbito nacional e regional; em segundo lugar e reportando-me outra vez à pergunta do Sr. Deputado José Magalhães, como V. Ex.ª vê, nestes períodos eleitorais não há a restrição constante do n.º 1.
Portanto, Sr. Deputado, tem de reler melhor os artigos do projecto da Comissão Eventual de Revisão Constitucional. É natural que V. Ex.ª não concorde com eles, como já lhe disse; é natural que sinta uma certa aversão por estes artigos, mas V. Ex.ª tem de lê-los melhor, tem de fazer mais um exercício.
Não lhe digo, como é evidente, para seguir o seu chefe. V. Ex.ª não segue o seu chefe, pois é uma pessoa que se reconhece por algum pequeno arrastamento em relação às teses naturais, normais e velhas de séculos do Partido Comunista Português. Elogio a sua juventude, a sua coragem, mas não vou dizer-lhe, de facto, que siga o seu chefe naquele desiderato cego de perseguir objectivos que as pessoas já não compreendem nos dias de hoje, porque são objectivos que ignoram as realidades do mundo. V. Ex.ª não pode ignorar tais realidades, mas deve, ao menos, saber a realidade com que lida, ou seja, conhecer o projecto de Revisão Constitucional..
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta da CERC para o artigo 40.º inova em alguns aspectos, na sequência do projecto de Revisão Constitucional apresentado pelo Partido Socialista, designadamente quando no seu n.º 1
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consagra o reconhecimento do direito de antena às associações representativas das actividades económicas.
Algumas delas já têm hoje direito a tempos de antena nos termos da legislação ordinária. Contudo, a forma de aplicação dessa legislação tem sido de alguma maneira, discriminatória.
Fica agora claro que todas as associações representativas das actividades económicas têm direito a tempos de antena, quer representem a iniciativa privada, quer representem outras formas de iniciativa económica, designadamente a iniciativa cooperativa, a quem deve ser reconhecido o direito de tempo de antena em condições de igualdade.
De igual modo, também no n.º 1 se faz referência a que os critérios de distribuição dos tempos de antena devem ser critérios objectivos e não subjectivos, na medida em que aqueles critérios que, hoje, são utilizados pela lei que consagra os direitos de antena não podem ser considerados como critérios totalmente objectivos ou como contemplando, à luz do princípio da igualdade, todas as realidades a que se refere este n.º 1 do artigo 40.º
Quanto às restantes alterações, elas decorrem no essencial da necessidade de adaptar o artigo 40.º a uma perspectiva liberalizadora do sector da comunicação social, designadamente da abertura da televisão à iniciativa privada.
Há uma garantia constitucional de tempos de antena fora dos períodos eleitorais; há uma garantia constitucional de tempos de antena nos períodos eleitorais.
Quanto à garantia fora dos períodos eleitorais, é uma garantia mínima na Constituição, na medida em que ela se refere à rádio e à televisão públicas o que não impede, naturalmente, que a lei venha a estabelecer outras formas de tempos de antena, fora dos períodos eleitorais, nas rádios e televisões privadas. Simplesmente, a diferente realidade das rádios e televisões privadas, a sua diversidade em termos de tempo de emissão e de condições de emissão, aconselham a que a consagração de tal direito seja feita através da modulação da lei ordinária, onde as soluções em concreto podem ser encontradas com maior precisão e detalhe do que através de uma norma constitucional abstracta, que se defrontaria sempre com algumas dificuldades como aquelas que foram assinaladas à proposta do Partido Socialista, nesta matéria, no decurso do debate na Comissão Eventual de Revisão Constitucional.
Nos períodos eleitorais, a Constituição passa a garantir tempos de antena regulares e equitativos a todos os concorrentes, quer nas estações emissoras de rádio quer nas estações emissoras de televisão, de âmbito nacional e regional, sem destrinça, abrangendo, portanto, quer o sector público quer o privado.
Trata-se de uma solução equilibrada e, naturalmente, quem seja contrário à perspectiva de liberalização do sector da comunicação social e da abertura da televisão à iniciativa privada verberará a lógica do artigo 40.º porque ela resulta, exclusivamente, das alterações que foram introduzidas nos artigos 38.º e 39.º
Nesse aspecto, compreendo o grito de justa revolta do Sr. Deputado José Magalhães contra os chamados «engolimentos indesejados». Com efeito, no passado houve quem tivesse de «engolir» sapos; houve quem preferisse elefantes; ainda hoje, um destacado líder partidário «engole», numa entrevista a um jornal, 40 anos de história do movimento comunista internacional. Bom, nós também temos «engolido» algumas posições.
Reconheço isso, mas uma coisa gostaríamos de declarar com toda a clareza: não nos impressiona que nos acusem por hipotéticas destruições de direitos; por decaimentos apocalípticos, como se estivéssemos a viver o Armagedão e dentro em breve entrasse por esta sala o Anti-Cristo.
Também não consideramos, e vemos com muita apreensão, que o Sr. Primeiro-Ministro dê de si próprio uma imagem de um político à deriva, de falta de sangue-frio, de falta de sentido de Estado, de precipitação em declarações, que, aliás, só o colocam numa situação ridícula. E o facto de se estar a fazer a Revisão Constitucional nesta Câmara é a demonstração mais cabal de que é completamente desprovida de sentido a acusação de que o Partido Socialista não tem sentido de Estado; é completamente absurdo que se venha invocar a posição do PS sobre a questão das polícias como demonstração de que o Partido Socialista estaria em posição delicada face às suas obrigações para com o País e o seu futuro, no momento em que o PS está a fazer a Revisão Constitucional e por isso afirmamos que nem acusações desse género, nem provocações de qualquer outro quadrante nos demoverão, tentando aproveitar a situação de tensão que existe entre o PS, como partido da Oposição - o que é natural - e o Governo. Nem umas nem outras conseguirão demover-nos de assumir as nossas firmes responsabilidades no plano do Estado, que é o da Revisão Constitucional.
Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente, Manuela Aguiar.
A Sr.ª Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados José Magalhães e Jorge Lemos.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado António Vitorino, creio que a sua intervenção não dá resposta às interrogações e ao «grito de revolta» - como V. Ex.ª quis chamar-lhe - que há pouco, em nome da bancada comunista, aqui foi lançado.
Com efeito, V. Ex.ª divide, no fundo, a intervenção em dois pontos, no segundo dos quais comenta a crítica às declarações do Sr. Primeiro-Ministro, de ontem, à saída de Belém. E critica em termos vigorosos, tais como: «um político à deriva», «falta de sentido de Estado», «um político que se coloca numa situação ridícula».
Bom, mas o problema é que esse «político que se coloca numa situação ridícula», «esse político à deriva e que tem falta de sentido de Estado» exige da parte do Partido Socialista o cumprimento, ponto a ponto, aqui, na Assembleia da República, do acordo político de Revisão Constitucional celebrado entre 14 de Outubro, nem outro contexto. E esse contexto mudou tanto que choca cada vez mais pessoas o facto de ele ser mantido assim e de ser «engolido» assim. A expressão não é ofensiva... É um facto, carimbado! Ainda ontem, à noite, tivemos aqui um exemplo - digamos - da incomodidade e da inconformação que isso produz na sua própria bancada. Isto é um facto objectivo.
Não só os militantes e dirigentes do Partido Comunista que alertam para este aspecto, não são só os militantes e dirigentes do PRD ou da ID ou do CDS, até em alguns pontos, que alertam para o absurdo que o
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acordo representa em muitos aspectos. É alguma coisa a que VV. Ex.ªs estão, aparentemente, insensíveis, embora seja generalizada. E é isso que nos deixa profundamente perplexos, sobretudo quando, passando aos factos, como é o caso agora do direito de antena e do direito de resposta, VV. Ex.ªs ladeiam as reduções efectivas de conteúdo constitucional e congratulam-se com coisas que, parece-me, não merecerem congratulação alguma.
Vou dar-lhe um exemplo, Sr. Deputado António Vitorino: V. Ex.ª dizia, em termos que são, aliás, invulgarmente simplistas e que eu estranho, que «é uma exigência da liberalização fazer cessar qualquer expressão de direito de antena em actividades privadas». E refere isto como se houvesse, pela própria natureza das coisas, uma incompatibilidade entre a natureza privada dessas entidades e a obrigação legal e constitucional de concessão do direito de antena.
Devo dizer que não percebo esse entendimento, essa filosofia, na medida em que a filosofia que o partido de V. Ex.ª tem sustentado, ou sustentou durante muito tempo, ou sustentou até agora, ou sustentou até ao debate da lei da rádio, nesta matéria, não foi incompatível com a imposição do direito de antena a entidades privadas. Mais: pelo contrário, nesse contexto, VV. Ex.ªs não decaíram dessa exigência. Surgem, agora e de forma simplista, a dizer: «Não, não. Privado e direito de antena são coisas visceralmente incompatíveis». Mas, porquê? Onde está inscrita, no céu ou nas estrelas, essa lei? Em sítio nenhum!
Não foi por acaso que a Constituição de 1976 apontou para a obrigatoriedade do direito de antena também nas entidades privadas. E porquê? Porque utilizam o éter, o espaço radioeléctrico, que é um bem público e que, como tal, ao ser utilizado, tem de ser acompanhado de um conjunto de contrapartidas e de encargos para aqueles que o usufruem.
Eis a filosofia basilar de que VV. Ex.ªs se dissociam. Nós não percebemos porquê e vemos nisso uma redução, tal como vemos uma redução perigosa nas outras componentes sobre as quais, aliás, o meu camarada Jorge Lemos o irá questionar.
Mas, o que pergunto, no fundo, ao Sr. Deputado António Vitorino, é como é que é possível que VV. Ex.ªs se gabem de serem coisas novas, coisas que estão na Constituição, como é o caso de tudo o que está no n.º 3 do vosso projecto, com uma restrição, aliás útil em relação ao texto constitucional, ao mesmo tempo que reduzem, claramente, o espaço do direito de antena nos meios de comunicação social. É isso que nós não percebemos e supomos não estar sozinhos, pelo contrário. Aliás, há provas de que estamos acompanhados e muito acompanhados, cada vez mais acompanhados.
Contudo, lamentamos que VV. Ex.ªs se deixem isolar nesse processo e cumpram, assim, acefalamente, o acordo.
A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado Costa Andrade pede a palavra para que fim?
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Para uma intervenção, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado. Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado António Vitorino, teremos que verificar, em primeiro lugar - e não queria deixar de reconhecer isto perante si -, que os aspectos inovatórios positivos que constam, agora, do artigo 40.º resultam, em grande parte, de propostas apresentadas pelo PCP. Por exemplo, o direito de réplica política que, como sabe, constava do texto original do projecto de Revisão Constitucional do Partido Comunista Português, foi, aliás, uma expressão utilizada pela primeira vez pelo PCP, que veio a ficar consagrada.
V. Ex.ª salientou também o facto de ter havido uma precisão quanto a considerar, em termos do n.º 1 deste artigo, a necessidade de que os critérios a definir por lei para atribuição do direito de antena sejam critérios objectivos. Estamos de acordo. E não é por aí que nós tecemos considerações negativas quanto ao acordo do PS/PSD...! Mas, se o Sr. Deputado António Vitorino tiver o cuidado de comparar o ponto de partida do Partido Socialista com o ponto de partida do PSD para este número, verificará que, no essencial, o que ficou inscrito em sede do artigo 40.º foi o texto proposto pelo PSD e que as propostas do Partido Socialista ficaram pelo caminho. Vejamos porquê: no texto do Partido Socialista não era atribuída qualquer divisão ou qualquer hipótese de consideração em moldes diferenciados relativamente ao direito de antena na rádio e na televisão públicas e aos demais meios de comunicação audiovisual. Consideravam, portanto - como, aliás, tinham vindo a considerar e no debate da Lei da Rádio, como já aqui foi citado, tomaram essa posição -, que havia que prestar um serviço público pela utilização de um bem do domínio público.
Por outro lado, os Srs. Deputados do Partido Socialista mantinham a consagração do direito de espaço.
Bom, qualquer destes dois aspectos foi retirado. E porquê? Porque o PSD, no seu projecto, apenas previa que houvesse direito de antena no serviço público de rádio e de televisão e que não houvesse direito de espaço nas publicações noticiosas do sector público.
Ora bem, dizer, nestas condições, que este é um bom acordo, que o PS ganhou muito com este acordo, sobretudo se associarmos a essa sua consideração o facto do Sr. Deputado António Vitorino nos vir dizer que está subjacente a este artigo 40.º uma perspectiva liberalizadora, ou seja, a redução do espaço público de informação, significa isto ou não, Sr. Deputado, que há uma restrição de um direito dos partidos, designadamente dos partidos da Oposição? Ou seja, havendo menos sector público em termos de rádio e de televisão, havendo menos sector público em termos de imprensa escrita, o direito que estava previsto para todos os meios de comunicação social, públicos ou não públicos no caso do audiovisual, fossem apenas públicos no caso da imprensa escrita, reduz-se, imediatamente. E eu pergunto: como é que o Partido Socialista, sendo um partido da Oposição, neste quadro, encara como aspecto positivo o acordo que celebrou com o PSD, quando, nesta matéria - como acabei de demonstrar - é o texto do PSD e não o do PS que prevalece, pelo menos em 95%?
A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra Sr. Deputado António Vitorino.
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O Sr. António Vitorino (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Vou responder com muito gosto, começando em primeiro lugar, pelo Sr. Deputado Jorge Lemos.
Sr. Deputado, penso que, sendo - como, aliás, reconheço - um bom marxista-leninista e bom conhecedor do materialismo histórico e do materialismo dialéctico, é importante situar historicamente as afirmações.
A proposta do direito de réplica do projecto do PCP não é desta revisão. O PCP, nesta revisão, e sobre esta matéria, não apresentou nenhuma proposta. O Sr. Deputado Jorge Lemos deve estar a referir-se ao passado, a 1982.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Eu referi que o conceito de réplica política foi trazido para a discussão pública através de um projecto do PCP, apresentado, creio, por alturas de 1981, um projecto de lei de radiodifusão em que se consagrava a expressão «direito de réplica política». Como sabe, foi através das nossas intervenções em sede de comissão que a questão foi suscitada e que veio a ser consagrada, Sr. Deputado.
O Orador: - Era só para situar historicamente e, talvez também ajudá-lo a recordar que fomos nós, Partido Socialista, que propusemos no projecto da FRS a sua constitucionalização em 1982.
Quanto às restantes questões que levantou, passo a esclarecer, começando pelo direito de espaço, que foi, de facto, retirado da Constituição porque é um direito que nunca teve nem terá conteúdo prático. E por isso entendemos que a Constituição não se deveria quedar por afirmações proclamatórias e semânticas, em matéria de direito de espaço, ao qual, aliás, nunca foi dado qualquer conteúdo concreto ou objectivo na lei ordinária. Não há, portanto, nenhum decaimento nesta matéria. Trata-se, Sr. Deputado, de uma questão de realismo sobre aquilo que deve estar na Constituição face às realidades concretas com que nós nos defrontamos. Não é o facto de o legislador o não ter consagrado mas, sim, o problema de se entender que o direito de espaço não é um instrumento fundamental de intervenção política dos partidos da Oposição. Não o considero como tal, nem nunca o considerei.
Protestos do PCP.
Os Srs. Deputados, depois, falarão para o microfone que é onde eu gosto de os ouvir, porque são mais espontâneos.
Quanto à questão de eu ter feito uma intervenção simplista referente ao significado da alteração do artigo 40.º, devo dizer, Sr. Deputado José Magalhães, que há uma diferença muito grande entre fazer uma intervenção simplista como a minha e distorcer o que eu disse, como o Sr. Deputado, fez.
Eu não disse, Sr. Deputado, que havia uma incompatibilidade visceral entre a consagração constitucional do direito de antena para os meios de comunicação social privados e o seu reconhecimento prático. O que disse foi que a modulação das formas de concretização desse direito de antena devia ser feita, preferencialmente, através de lei ordinária porque poderia definir, com maior rigor, as condições dos tempos de antena em cada um desses meios de comunicação social privada, em função das suas condições objectivas de
emissão. Demos, até, vários exemplos na comissão quanto ao tempo de transmissão, dado que as rádios locais não tinham todas o mesmo número de horas de transmissão e em certas circunstâncias limite e absurdas, o tempo de antena a que seriam obrigadas, por via de lei, poderia vir a ser superior, inclusivamente, ao tempo de emissão que lhes estava destinado.
Sobre a referência deselegante que o Sr. Deputado José Magalhães entendeu fazer em relação à situação verificada ontem na bancada do Partido Socialista quanto à votação do artigo 39.º queria tranquiliza-lo. Nós, PS, respeitamos a liberdade de opinião dos nossos camaradas, respeitamos a divergência de opiniões. Nunca actuaremos contra os nossos camaradas, com processos disciplinares, pelo facto de eles não pensarem, aliás num ponto em concreto e muito limitado, da mesma maneira como pensa a maioria do grupo parlamentar e a maioria do partido. Nunca votaremos processos disciplinares contra eles. Assim todos pudessem dizer o mesmo.
A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, pede a palavra para uma intervenção?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sr.ª Presidente. É para responder, em termos de direito de defesa, à menção feita pelo Sr. Deputado António Vitorino quanto a uma alegada deturpação do conteúdo das afirmações feitas pelo mesmo.
A Sr.ª Presidente: - É regimental, pelo que lhe concedo a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado António Vitorino, compreendo que V. Ex.ª esteja tenso e crispado, mas sugiro - e faço a proposta bastante firme - que não me utilize nem à minha bancada como pára-raios...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - ..., porque aquilo que afirmei não foi deturpação alguma da solução legislativa a que VV. Ex.ªs chegaram no articulado que agora está em debate. Resumo a questão: o Partido Socialista admite que o direito de antena deixe de ser constitucionalmente obrigatório para as rádios e outras estações privadas. Admite-o e o Sr. Deputado António Vitorino não me acusará, com legitimidade - mas pudera fazê-lo se lhe apetecer e se estiver mal disposto, mas com legitimidade não o fará -, de ter deturpado a solução porque ela é realmente esta. Confessa-o o Sr. Deputado quando a seguir vem dizer «Não, é que a lei ordinária pode vir a estabelecer condições moduladas para o exercício de um direito de antena». Mas, se me permite, eu acrescento, não deturpando coisa alguma, se o legislador ordinário estiver disponível para instituir esse direito de antena, se o legislador ordinário, por maioria ordinária, estiver disposto a modulá-lo, etc, ou seja, se o PSD na presente conjuntura histórica estiver disponível para isso.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Pois claro!
O Orador: - Ora, o PSD, como bem demonstrou na Lei da Rádio, não está disponível para isso.
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O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Bem pelo contrário!
O Orador: - Portanto, ao aceitar em sede de Revisão, Constitucional uma solução deste tipo, que torna facultativo o direito de antena nas estações privadas, o PS viabiliza que o PSD diga «Não!»
Eu pergunto, Sr. Deputado António Vitorino, que acusação legítima de deturpação pode ser feita a quem diga isto. Nenhum! Creio que o tom que o Sr. Deputado adopta e o estado de espírito que revela não têm, de facto, causa nas minhas palavras. V. Ex.ª não tem qualquer razão para me invectivar, sobretudo em termos de crítica de «deselegância». Lamento, aliás, que a questão se tenha suscitado.
A Sr.ª Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr.ª Presidente, quase que seria desnecessário, na medida em que o Sr. Deputado José Magalhães, que é um parlamentar muito hábil, especializa-se em fazer o mal e a caramunha. É uma maneira de discutir estas coisas. Até aceito, digamos assim, o jogo nesse terreno.
Já agora gostava de dizer ao Sr. Deputado José Magalhães que o meu tom não resulta de qualquer tensão ou crispação. O que se passa é que estou com sono...
Vozes do PCP: - Nós já tínhamos percebido, Sr. Deputado.
O Orador: - Isto é para contribuir para uma veia que o Sr. Deputado José Magalhães tem muito saliente, que é a veia psicologista, que é a de fazer o diagnóstico dos estados de espírito dos adversários. Deve ser mais um contributo para uma corrente importante do pensamento português, o freudo-marxismo, que tem dado contributos importantes para esta Revisão Constitucional. Congratulamo-nos por isso.
Sr. Deputado José Magalhães, sejamos totalmente rigorosos. O Sr. Deputado José Magalhães, por quem eu tenho, aliás, muita simpatia e, permita-me que o diga, amizade, vai depois comigo ver a transcrição da acta e irá verificar que temos ambos razão.
O que o Sr. Deputado José Magalhães disse na primeira intervenção que fez foi rigorosamente isto: que eu tinha afirmado que havia uma incompatibilidade visceral entre a consagração constitucional de tempos de antena no sector privado e a sua tradução na legislação ordinária. Era por isso que eu não teria votado favoravelmente a consagração constitucional de tempos de antena na rádio e na televisão privadas. Foi isto que disse e foi isto que eu refutei, dizendo que não correspondia à verdade. O Sr. Deputado José Magalhães nesta sua segunda intervenção repôs a verdade dos factos. Assim, eu não fiz a afirmação que me atribuiu em primeiro lugar, pelo que acabamos por estar de acordo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Já percebi! Portanto, aceita a segunda crítica.
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, estão presentes test ré nós alunos da Escola Secundária Sebastião da Gama, de Setúbal, e da Escola Secundária Nuno Álvares, de Castelo Branco, a quem saudamos, esperando que esta assistência a uma sessão da Revisão Constitucional possa ser para todos interessante e profícua.
Aplausos gerais.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, penso que, de facto, é tempo de passarmos ao realismo, realismo esse que já foi hoje aqui invocado quanto à questão de sabermos se o proposto para o artigo 40.º alarga ou reduz o âmbito do direito de antena.
Existe um texto proposto pela CERC que, em nosso entender, numa primeira leitura e num primeiro cotejo com o antigo texto alarga este direito de antena. Basta referir, como disse aqui o Sr. Deputado António Vitorino, que este direito passa também a ser atribuído a associações representativas das actividades económicas. No entanto, dado que o espaço é substancialmente reduzido, dado que se remete para a lei ordinária a tipificação dos casos em que este direito de antena será exercido e dado que não podemos ignorar que ontem a Assembleia da República aprovou, por uma maioria de dois terços, constituída pelos Srs. Deputados do Partido Socialista, mas não todos, e pelos Srs. Deputados do PSD, uma Alta Autoridade de quem vai depender o exercício efectivo deste direito de antena, fica-nos apenas um contexto em que dificilmente poderemos admitir que daqui se alargou em alguma coisa este direito. Bem pelo contrário: infelizmente a prática virá a demonstrar que este direito que urgia alargar, consolidar e dignificar irá ficar substancialmente reduzido, indignificado e passará a ser aquilo que já era em grande parte uma chatice o direito de antena na televisão ou na rádio, uma imposição, uma pequenina esmola dada aos pobrezinhos para descansar a consciência dos mais ricos. E aqui os mais ricos são aqueles que têm acesso 24 horas por dia aos grandes órgãos de comunicação social, nomeadamente à televisão e às estações de rádio de âmbito nacional. São esses que agora dão uma esmola aos pobrezinhos, àqueles que não têm tido esse direito, que, embora consagrado, não está assegurado. Os pobrezinhos são neste caso praticamente todos os partidos da Oposição, são a totalidade das associações de ambiente, das associações juvenis, das associações femininas, das associações de estudantes, das associações de deficientes, de inúmeras associações que fazem, de facto, pulsar o País no dia-a-dia e que não têm sequer uns segundos na televisão para contar aquilo que estão a fazer, para aliciar o País para as suas propostas conforme é, em nosso entender, perfeitamente legítimo.
Era isso que pretendia a proposta do Partido Os Verdes: alargar a estas associações este direito já hoje consagrado na Constituição e dignificar aquilo que é ou deve ser um tempo de antena, um tempo fundamental para a formação da opinião pública. Hoje em dia quando, por exemplo, se anuncia na televisão um tempo de antena não falta quem mude de canal, não falta quem diga «aí vêm eles para nos chatear» ou não falta quem pense que esse tempo está a ser usurpado, nomeadamente a espaços de publicidade ou às telenovelas ou a outras coisas que teriam prioridade.
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E tudo isto, porquê? Porque não se tem feito um esforço no sentido da dignificação dos tempos de antena, que são tempos fundamentais para a formação da, opinião pública, desde que feitos com a dignidade que estes casos requerem. Uma associação, não pode ter dez segundos para contar ao país quem, é, onde mora e o que faz, não pode porque cai no ridículo. Culpa de quem? Não da associação, não da opinião pública, mas de quem fez a lei, de quem a aplica e de quem tem a obrigação no dia-a-dia de lhe dar conteúdo.
É, pois, neste contexto que vimos com extrema preocupação a redução efectiva do âmbito do direito de antena. É um direito fundamental. Quando numa Revisão Constitucional vimos deputados empenhados em reduzir direitos fundamentais temos que necessariamente ficar preocupados, temos necessariamente que fazer essa denúncia.
É pena que não se tenha aproveitado esta Revisão Constitucional para trazer o País real a este momento que vivemos, do processo de consolidação da democracia, para consagrar no futuro texto constitucional a necessidade e o direito de inúmeras associações hoje existentes, hoje implantadas, e que contribuem, de facto, para a formação da opinião pública, a terem tempos de antena em todos os órgãos de comunicação social, principalmente nos que têm expressão nacional e também nas rádios locais.
O problema das rádios locais tem sido aqui focado inúmeras vezes. Têm sido aqui feitas críticas contundentes ao PSD e à maneira como o Governo atribuiu as frequências das rádios locais. Não ouvimos até hoje nenhuma resposta do PSD. O silêncio neste caso é cúmplice daquilo que se fez, da enormidade que se fez, do desrespeito frontal pela lei, da arrogância que levou à atribuição das rádios locais praticamente só a elementos do PSD, atribuição essa precedida de todo um processo que eu próprio aqui denunciei a par de. outros deputados, quando se chegou a fazer consultas às sedes locais do PSD para saber de quem eram as rádios, que orientação política teriam para depois se proceder ao seu licenciamento. Gostaria que isto tivesse sido aqui desmentido, mas nunca o foi. Sei que é verdade, não fui só eu a afirmá-lo. Ainda não se levantou ninguém da bancada do PSD para desmentir que o processo de licenciamento das rádios não foi um processo, limpo. Não o foi e não têm a coragem de o desmentir. É pena que seja neste contexto, em que à falta de lisura e à falta de limpeza ainda se venha a associar um esforço, nomeadamente da bancada do Partido Socialista, para reduzir o âmbito deste direito de antena, para reduzir o âmbito do acesso dos partidos da Oposição e das associações cívicas que estruturam a sociedade portuguesa o acesso destas associações a tempos de antena, a tempos em que possam comunicar com o País que somos.
Falta de comunicação é também um desrespeito pelo direito que o País tem a ser informado, a conhecer a realidade do País através dos órgãos de comunicação social. Sem isto nunca teremos uma opinião pública adulta, bem formada, nunca a nossa democracia será saudável a 100% e é pena.
Vozes do PCP: - Muito bem!
Pausa.
A Sr.ª Presidente:. - Para um pedido de esclarecimento tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.
O Sr. Vera Jardim (PS): - Sr. Deputado Herculano Pombo, na CERC já tive ocasião de debater este problema com V. Ex.ª Julguei que o tempo passado tivesse contribuído com alguma meditação para que V. Ex.ª corrigisse o alvo da sua tentativa, a todos os títulos louvável, de dar voz a uma série de interesses, hoje qualificados genericamente como interesses das minorias. V. Ex.ª insiste em que o dar a voz a esses interesses se deve fazer pelo acesso a tempos de antena. Na minha perspectiva isso daria como consequência que V. Ex.ª teria naturalmente centenas ou milhares de associações deste tipo, de ambiente, juvenis, de deficientes, femininas, consumidores, etc - e muitas outras aqui faltam e poderíamos multiplicar isto por muito -, teria uma televisão e uma rádio em que os spots de segundos se multiplicariam para dar abertura a este direito de antena. Não lhe parece que é um alvo muito mais acertado, muito mais correcto e; atrevo-me a dizer, muito mais consentâneo com os princípios que V. Ex.ª mesmo defende e tem defendido muitas vezes com muito brilho e grande vigor no que diz respeito a este direito das minorias a serem ouvidas exigir; pelo contrário, uma- real abertura dos meios de comunicação social a todos esses, interesses representados por este tipo de associações, associações no sentido jurídico ou até associações inorganizadas? Não lhe parece que o nosso alvo - e digo nosso porque aí estou inteiramente consigo - deve ser o de exigir da televisão, exigir da rádio a abertura a esse palpitar da vida real do País e não o da exigência de direitos de antena, muitas vezes secos, muitas vezes não chamando a atenção do público - como V. Ex.ª muito- bem sabe -, muitas vezes reduzidos a um abrir e fechar de boca praticamente seguido? Não lhe parece que é através de colóquios, de debates e sobretudo da abertura da televisão, mas também da rádio, a debates vivos, com forças vivas a debater isso, que é esse o seu alvo e deveria ser esse o seu alvo?
A Sr.ª Presidente: - Para responder tem a palavra Sr. Deputado Herculano Pombo.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Muito obrigado Sr. Deputado Vera Jardim pela questão que me coloca e também pelas referências que fez ao que tem sido o meu trabalho.
Gostaria de lhe dizer o seguinte: não me parece que deva corrigir o alvo. Eu creio é que neste momento a sociedade portuguesa. não tem com que atirar ao alvo. O Sr. Deputado diz que é preciso exigir da televisão. 15so é verdade: é preciso exigir da televisão, da rádio e dos jornais, mas isso é o que eu passo a vida a fazer. Eu passo a vida a fazer queixas ao Conselho de Imprensa e ao Conselho de Comunicação Social. Portanto, passo a vida a atirar ao alvo com as armas que a Constituição neste momento me dá. Aquilo que prevejo é que. vou ficar desarmado dessas pobres armas que hoje tenho. Essas armas foram as únicas com que pude atirar algumas fisgadas, que terão incomodado eventualmente alguns órgãos de comunicação social porque não cumpriram o seu dever de me dar. a mim e a outros o direito de exercermos o direito de resposta, o direito a sermos ouvidos naquilo que temos para
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dizer. É o silêncio, e não o mal-dizer que nos incomoda. Temos nos levantado contra isso.
Á este propósito temos que atirar a vários alvos para conseguirmos acertar no objectivo. Aquilo que proponho é que sejamos criativos, que o legislador ordinário seja criativo. Para que o legislador ordinário possa ser criativo a consagrar mecanismos que permitam o acesso dessas organizações a tempos de antena é preciso que na Constituição haja esta garantia. A Lei Fundamental tem que garantir o direito de antena. Se depois o legislador ordinário vem dizer que são cinco segundos por ano ou que são dez minutos de 10 em 10 anos há que ser criativo e encontrar as formas para o fazer. Nem todos os tempos de antena são chatos. Devo recordar, por exemplo, que o PSR conseguiu fazer tempos de antena interessantes, que levaram as pessoas a vê-los intencionalmente. É importante dizer isso porque a barreira da chatice dos tempos de antena sofreu, através de algumas forças políticas, uma ruptura. Há forças políticas - e não quero aqui mencionar mais nenhuma - que se empenham, mercê da consciência de que os tempos de antena são importantes, que não têm que ser chatos, mas que devem ser um espaço digno de comunicação com o País, na sua dignificação e têm conseguido que a opinião pública os veja com agrado e deles aproveite.
Sejamos criativos até a legislar ou principalmente a legislar para que, de facto, os direitos não sejam só consagrados em letra mas também na prática e exercidos no dia-a-dia.
A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr.ª. Presidente, em aditamento àquilo que a nossa bancada já teve ocasião de esclarecer em relação a esta matéria gostaria apenas de deixar aqui duas notas, que valem também como resposta a alguns dos contributos entretanto trazidos ao debate.
A nossa posição em relação a esta matéria caracteriza-se pelos seguintes pontos: em primeiro lugar, a solução apontada pela comissão especializada não é a solução que o PSD propunha. Oxalá fosse! Se alguns partidos estiverem dispostos a subscrevê-la nós repô-la-emos imediatamente em votação.
Pelo contrário, parece-me que há aqui contributos com vários étimos. Já se discutiu aqui de onde é que vem a ideia de um direito de réplica. Saber se foi o Partido Comunista ou o Partido Socialista é uma questão que não nos interessa. Oxalá que a ideia tenha vindo do Partido Comunista para que ele se reveja um pouco nas soluções finais e perca nesta medida razão na parte em que diz que as soluções que se adivinham são apenas soluções do PSD, o que não corresponde minimamente à verdade.
O nosso juízo sobre o artigo em questão é francamente positivo. De facto, entendemos que é uma solução de franca racionalidade e de relativa plasticidade, sem prejuízo da consistência dos direitos de antena.
É uma solução de racionalidade desde logo na perspectiva de uma Constituição adaptada e atenta à realidade que vamos ter, a qual se apresenta diferente daquela com que a ordem jurídica constitucional teve de conviver até aqui. Vamos, portanto, conviver com uma realidade diferente a nível dos meios de comunicação social, nomeadamente com a emergência pujante
de iniciativas de carácter privado no domínio da comunicação social, como já se prova em matéria de rádio e mesmo de comunicação escrita.
Assim, face a esta nova realidade, a Constituição não podia deixar de ter uma resposta sua, a qual tinha de ir no sentido de não estender ao privado, pelo menos com carácter de injunção constitucional, deveres ou obrigações que cumprem fundamentalmente ao Estado, ao qual está atribuída, em primeira instância, a tarefa de mediatizar o necessário esclarecimento da opinião pública.
Naturalmente que se dirá ser esta uma posição extremamente liberal e, como tal, indefensável.
Dou por boa a objecção, mas respondo no sentido de se encontrar precisamente aí um campo aberto à diversidade de entendimentos e de importações que, em resultado do jogo democrático, venham a aceder ao poder.
Se no poder estiver, por exemplo, o PCP, terá naturalmente uma tendência menos liberalizante e penso que, portanto, fará duas coisas: por um lado, ampliará o sector público para, por essa via, aumentar os tempos de antena que o sector público já garante; por outro lado, num exercício legítimo (se para tanto for mandatado pelo povo...)-, comprimirá a liberdade dos próprios detentores privados e aumentará as suas obrigações de contribuir para o esclarecimento público.
Esta seria uma atitude que o Partido Comunista tomaria. No entanto, partidos com impostação diferente tomarão outra atitude. Daí que esta seja, do nosso ponto de vista, a solução mais racional e adequada.
Dirá o PCP: pois é, isso é bonito, mas a lei é o PSD! Assim, se o PSD quiser... Se...
No entanto, este é um aspecto sobre o qual nós, legislador constituinte, nada podemos fazer para ajudar o PCP; é um ponto em relação ao qual estamos de mãos atadas. Com efeito, se o PCP não adivinha a possibilidade de ser legislador, essa será uma limitação congénita do PCP que não podemos minimamente superar - aliás, nem estaremos dispostos a isso...
Por conseguinte, e como há pouco referia, esta é a prova de que estamos perante um solução racional, do ponto de vista do que se deve entender por uma Constituição num Estado de direito democrático, a qual tem de dar resposta aos problemas de uma sociedade aberta.
Porém - importa também acentuá-lo -, as soluções que se adivinham reforçam a consistência dos direitos.
Por um lado, alarga-se o espectro e o universo dos sujeitos activos do direito de antena, aditando-se as organizações representativas das actividades económicas, nas quais entram entidades e instâncias que estão muito para além das associações sindicais e profissionais. E estou a pensar privilegiadamente, por exemplo, no sector cooperativo.
Por outro lado, também como indício de consistência e de aumento do direito de antena, não podemos subvalorizar o aditamento do novo direito de réplica política, bem como a consistência que a estes direitos é adscrita quando se exige que o direito de antena e o direito de réplica tenham idêntica duração e, sobretudo - e aqui está uma novidade importante - idêntico destaque ao das atitudes ou das iniciativas do Governo.
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Por tudo isto, Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, é que entendemos que a solução que se adivinha é uma solução racional, constitucionalmente correcta e adequada, que vai maximizar, também neste ponto que é o da comunicação social, o livre funcionamento de um verdadeiro Estado democrático, porque aberto à pluralidade e ao jogo das forças plurais, sem prejuízo, e, pelo contrário, com reforço significativo da consistência dos direitos de antena e de, réplica, nos termos e com a dimensão que eles devem ter a nível constitucional.
Uma Sr.ª Deputada do PRD perguntou se isto prejudicava a possibilidade de, nas eleições autárquicas por exemplo, as rádios locais concederem tempos de antena É óbvio que não. É uma tarefa a que o legislador dará resposta e dá-la-ia de acordo com o seu entendimento e com a sua própria política de comunicação social. Aquilo que a Constituição deve fazer é garantir mínimos de esclarecimento da opinião pública e esses mínimos estão assegurados com a proposta da comissão cuja votação se adivinha.
A Sr.ª Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados José Magalhães, 15abel Espada e Herculano Pombo.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Costa Andrade, compreendo que V. Ex.ª tenha feito o exercício de auto satisfação que agora nos trouxe. Agora, qualificar esta solução como racional, maximizadora de várias virtudes, aberta à pluralidade e ao jogo das forças, é pura ironia, conhecendo nós a prática, a filosofia, a postura do PSD nesta matéria tanto no terreno da lei ordinária como no da acção bruta e prática do quotidiano.
Reconheço, e a bancada do PCP reconhece, que o PSD propunha muito mais e ainda pior! 15to é, o PSD propunha, por exemplo, que a Constituição deixasse de garantir sequer aos partidos políticos o direito a terem tempos de antena regulares e equitativos em período eleitoral.
O PSD nesta matéria tem uma posição mais eliminatória do que aquilo que foi contemplado: não queria o direito de réplica política, mas vai haver expressa consagração do direito de réplica política; não queria o alargamento às entidades cooperativas, mas vai haver alargamento às entidades cooperativas. Contudo, fica com a possibilidade de delimitar, em termos concretos, na lei ordinária, os diversos contornos, os outros eventuais candidatos à obtenção de tempo de antena e, mais do que isso, se não quiser tempos de antena nas rádios e estações privadas, não haverá tempos de antena porque eles são puramente facultativos constitucionalmente.
Quanto a nós, essa posição é extremamente grave! Evidentemente, o PSD congratula-se com isso mas chamava a sua atenção para um outro aspecto. Quando o Sr. Deputado saúda a emergência de um novo quadro da comunicação social como propicio à liberdade de expressão das diversas correntes de opinião, como propicio ao confronto de opiniões, coloco-lhe a seguinte questão: Sr. Deputado, esse quadro a que V. Ex.ª se refere caracteriza-se por quê? Caracteriza-se pela emergência de grupos económicos no domínio da formação de televisões e de rádios privadas. E isso supõe meios económicos, meios financeiros, possibilidades de intervenção.
Proclamar em abstracto a liberdade de intervenção, a liberdade de acção, a liberdade de actuação de todos nós, como se, para se arrancar com uma televisão privada, fosse simples - nós os três formamos rapidamente assim... (o orador «estalando» os dedos), com crédito automático, uma estação, os meios necessários - é uma abstracção e, mais do que isso, é uma hipocrisia, porque não é assim que as coisas se passam.
E a existência do direito de antena é uma garantia institucional, uma garantia importante de que as diversas categorias de cidadãos, as diversas correntes de opinião, possam ter acesso a meios para expressão das suas opiniões e das suas posições. É uma importante garantia institucional da liberdade de expressão!
Ora, ao decair-se de uma solução, como a actualmente plasmada na Constituição, que estabelece essa barreira e esse princípio e que outorga essa garantia aos cidadãos, é um golpe que se pratica na própria liberdade de expressão.
As outras considerações que o Sr. Deputado exprime são considerações jocosas. O Sr. Deputado diz: «Mas que falta de confiança..., então, não há-de ser alterada a actual situação que deu uma maioria absoluta ao PSD?!» Ó Sr. Deputado, é óbvio que sim! Mas a nossa preocupação é que VV. Ex.ªs pretendem fazer a Revisão Constitucional neste momento, repito, neste momento! Pretendem consuma-la e o PS dispõe-se, apesar de tudo a avançar para esse efeito.
Portanto, se isso acontecer; no plano imediato, será o Governo, com o inefável Dr. Albino Soares, com o Primeiro-Ministro Cavaco Silva, com o indistinguível Ministro Nogueira, que irá gizar a solução e arriscamo-nos a que gize a solução legal em termos semelhantes àqueles que hoje, por exemplo, constam da Lei da Rádio que são escandalosamente parciais.
A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo, pelo que lhe peço que conclua.
O Orador: - Termino, Sr.ª Presidente.
Por isso mesmo, Sr. Deputado, compreenderá que não possamos subscrever o exercício de pseudo optimismo um tanto farisaico que V. Ex.ª aqui nos serve, cientes de que o Governo PSD vai obter armas que virará contra a liberdade de opinião. Nós resistiremos, nós continuaremos a insistir, mas não nos podemos congratular com o facto de o PS aceitar conceder-vos essas armas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Costa Andrade, deseja responder já, ou no final?
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Responderei no final, Sr.ª Presidente...
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada 15abel Espada.
A Sr.ª 15abel Espada (PRD): - Sr. Deputado Gosta Andrade, V. Ex.ª elogiou, por um lado, o texto que ficou consagrado pela CERC relativamente ao artigo 40.º, mas elogiou também, e elogiou mais, e declarou a sua preferência, pelo texto inicial do projecto do PSD.
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Cotejando os dois textos vê-se, efectivamente, que haverá diferenças algo substanciais no que diz respeito ao n.º 2, uma vez que no texto da CERC foi incluído o direito á réplica política e a consagração de que os critérios do direito de resposta e de réplica política às declarações políticas do Governo teriam duração e destaque igual ao tempo de antena e declarações do Governo, tendo o Sr. Deputado por essa mesma razão acabado por elogiar esta última parte do novo texto que não constava do projecto do PSD.
O Sr. Deputado disse também que, relativamente ao texto do projecto do PSD, se houvesse partidos que aderissem a ele, não teriam dúvidas algumas em o repor novamente e em o aprovar em detrimento do texto da CERC actualmente consagrado.
O Sr. Deputado quer dizer com isso que continua a achar que não deve ser consagrado, no texto constitucional, que o direito de resposta e de réplica política têm forçosamente de ter duração e destaque igual ao do tempo de antena e das declarações do Governo? Ou o Sr. Deputado considera que não faz sentido que os partidos representados na Assembleia da República tenham o direito de réplica política? É que estas eram duas questões que não estavam consagradas no projecto do PSD. Por outro lado, e se assim não é, o que é que o Sr. Deputado iria retirar do texto da CERC?
Vou colocar novamente a questão que se refere às rádios locais, porque queria ouvir do Sr. Deputado, e para que ficasse em acta, que, efectivamente, por parte do PSD, há disponibilidade para se chegar a uma solução legislativa, venha ela de onde vier, no sentido de que as rádios locais também tenham tempos de antena, ou seja, que os partidos políticos tenham direito a tempos de antena nas rádios pelo menos em algum tipo de eleições, como, por exemplo, nas eleições autárquicas. Gostava de saber qual é a disponibilidade do PSD para, no futuro, consagrarmos uma solução deste tipo.
A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Deputado Costa Andrade, quero fazer-lhe uma pergunta muito rápida e que, penso terá uma resposta também ela rápida e simples.
O Sr. Deputado ressaltou das melhorias introduzidas, em seu entender, no actual texto constitucional, a da consagração do direito de resposta e de réplica política às declarações políticas do Governo, de duração e destaque iguais aos dos tempos de antena e das declarações políticas do Governo. À primeira vista, parece ser uma melhoria, mas, para ficar convencido, quero pedir-lhe a sua opinião.
Sei que isto tem que ser, depois, concretizado em lei ordinária, mas, já agora, gostaria de ouvir a sua opinião: acha o Sr. Deputado que daqui decorre que todos nós, partidos da Oposição (os cinco partidos da Oposição que aqui estão) passarão a ter tempos iguais, até nos telejornais? Ou seja, cada vez que o Governo num telejornais fez uma declaração política - e fá-lo todos os dias e várias vezes - seremos também nós, partidos da Oposição, chamados ao mesmo telejornal, com o mesmo destaque, com duração igual, a dar resposta a estas declarações políticas?
Se é isto que a Constituição quer dizer, é bom! Se não é isto, não é nada!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães pede a palavra para interpelar a Mesa, suponho.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr.ª Presidente, gostaria só de sublinhar, para efeitos de acta, que aludi, na minha intervenção e na minha pergunta ao Sr. Deputado Costa Andrade, a uma proposta do PSD restritiva ao direito de antena em período eleitoral. Essa proposta não é de eliminação, é uma proposta de restrição do direito de antena às estações nacionais com exclusão, pois, das regionais e locais. Digo isto por uma questão de exactidão.
A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Começarei por responder às duas últimas perguntas, pois o seu conteúdo é relativamente sobreponível, com uma resposta extremamente simples, e, aviso-os já de antemão, porventura chocante, mas que só o é para quem não nos acompanhou na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. Portanto, a minha resposta é a seguinte: não sei nem quero saber! O que vai ser a legislação ordinária, aqui, ao fazer a Revisão Constitucional, não me preocupa nem nesta nem noutras matérias.
Estou a contribuir para fazer uma Constituição garantindo o livre jogo democrático e pluralista e remetendo para o legislador ordinário a competência que eu aqui não tenho. Nem eu nem ninguém, aqui, tem competência de substituir ao legislador ordinário. Aqui temos apenas competência de legisladores constituintes ou de Revisão Constitucional. O que o legislador ordinário fará, é com ele. Sei lá se cá estarei, ou não. O problema é dele. Não posso vincular-me aqui por ninguém, porque não represento sequer aqui o PSD em termos de legislador ordinário.
O que estamos a fazer é uma Constituição que garanta ao PSD, ao PS, ao PCP, aos Verdes, ao PRD e ao CDS a possibilidade de pôr em prática o seu programa. Chegarão lá, ou não, por via eleitoral?! E aqui entro já na resposta ao Sr. Deputado José Magalhães, que diz que isso é jogozo. Então, pensarmos que o PCP chega ao poder por via democrática é anedota?!...
Risos.
Protestos do PCP.
Não sou eu que o digo. É o PCP que diz: «Se o Sr. Deputado põe o problema nesses termos, de um dia o PCP legislar de acordo com os seus poderes, o senhor está a contar anedotas!» Confesso que não. Admito, como democrata, a possibilidade de um dia o PCP chegar ao poder. Se o senhor considera isso uma anedota, estou mais tranquilo...
Risos do PSD e do CDS.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado.
O Orador: - Faça favor.
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O Sr. José Magalhães (PCP): - O Sr. Deputado Costa Andrade, est modus in rebus! Aquilo que evidenciei foi precisamente o contrário do que V. Ex.ª está a suscitar.
Todos os dias dizemos ao PS: «Atenção, porque a aprovação de uma norma deste tipo concede ao PSD instrumentos de poder infinitamente perigosos para o PSD, no plano imediato, conduzir a. sua acção.» E é isso que nos preocupa. Não nos preocupa nada a questão de haver uma alternativa de poder ao PSD. Desejamos isso, trabalhamos ardentemente para isso e isso não nos parece nada jocoso, parece-nos até muito importante, empenhamo-nos profundamente nisso e, mais ainda, empenhamo-nos na nossa participação nessa alternativa de poder ao PSD!
O que é jocoso é V. Ex.ª, contente como é óbvio pelo facto de o PSD lhe dar esses instrumentos, procurar escamotear que, no plano imediato, quem os vai usar é o inefável Dr. Albino Soares e o PSD.
O Orador: - Mantemos a mesma ruptura hermenêutica entre nós e o PCP, que consiste no seguinte: nós continuamos a afirmar esta verdade comezinha e simples (e ainda não desisti de conseguir trazer o debate para esta metodologia) que é o facto de estarmos a fazer uma Revisão Constitucional para este Governo e para todos os governos. E quando nós, na trajectória histórica desta Constituição - que, .pensamos, vai ser longa porque esta Constituição já vem de 1976 e todos nós lhe desejamos um vida muito longa e para a qual não estamos a ver fim (graças a Deus não estamos a ver fim para a democracia) -, falamos do Governo em abstracto, o PCP só vê, como o Governo, o Professor Cavaco Silva. Deus o ouça!
Risos do PSD.
A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raul Castro (Indep): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Pensamos que a apreciação desta matéria coloca previamente a questão da comparação dos textos dos projectos do PS e do PSD. É que, efectivamente, aquilo...
Neste momento regista-se um burburinho na Sala.
A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa de o interromper.
Solicito aos Srs. Deputados que façam silêncio, que criem na Sala as condições necessárias para que possamos prosseguir o debate e ouvir, como ele merece, o orador.
Sr. Deputado Raul Castro, queira prosseguir.
O Orador: - Como dizia, parece-me que a questão do artigo 40. º passa previamente pelo exame comparativo dos projectos do PS e do PSD e depois, também, pela comparação com o texto dito da CERC, e melhor dito, o texto do acordo entre o PS e o PSD que aqui é trazido para nós verificarmos quem é que cedeu e quem é que viu vitoriosos os seus pontos de vista.
E, se compararmos o projecto do PS e o do PSD em dois aspectos essenciais, que são o direito de antena na rádio e na televisão e o espaço nas publicações jornalísticas, verificamos que, efectivamente, quem cedeu foi o PS nestes dois fundamentais domínios do direito de antena. Eles deixam de estar consagrados na Constituição. Eram propostos pelo PS mas o PSD não os aceitava, portanto, foi o ponto de vista do PSD que triunfou.
Daqui resulta que a versão dita da CERC, que: é a última versão do acordo PS/PSD, é uma versão gravemente restritiva do direito de antena que agora está aqui em discussão. E parece-nos, Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, que não se pode argumentar em favor de tão graves malefícios, argumentando com alguns benefícios locais.
Quer dizer, poderemos nós dizer que ó facto de as cooperativas passarem a ter direito de antena pode justificar que se elimine o direito de antena nas futuras televisões privadas? Nós sabemos que o PS, nesta revisão, defende a abertura da televisão à televisão privada. Ao adoptar a tese do PSD do serviço público de rádio e televisão, o PS, portanto, conscientemente, eliminou o direito de antena das futuras televisões privadas. E poderá isto ser compensado pelo direito de antena como conferido às cooperativas? E o direito de réplica poderá compensar o desaparecimento do espaço jornalístico que o PS propunha e que abandonou em face da posição do PSD?
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Parece-nos que este texto final do acordo, que vem da CERC é gravemente restritivo e cujos benefícios não podem servir para ocultar os graves inconvenientes e restrições que na realidade este texto traz ao direito de antena.
A Sr.ª Presidente: - Pára uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Amorim.
A Sr.ª Luísa Amorim (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: De facto, lamentamos e consideramos que é uma pena que não seja consagrada na Constituição a proposta de Os Verdes que contemplava, para além das associações do ambiente, juvenis; de deficientes, confederações e federações cooperativas às associações de mulheres. E o nosso desapontamento, advém da circunstância de pensarmos que tinha dignidade constitucional o facto de se dar voz às organizações de mulheres.
São como todos sabemos 52% da população, são cada vez mais parte activa na vida produtiva, na vida cultural e na sociedade civil. E aqui, nesta Casa, onde tanto se fala em sociedade civil, é estranho que não se dê espaço a tal, nomeadamente quando se considera que, a nível dá defesa dos direitos das mulheres, muito há a fazer no sentido da mudança de mentalidades, de contrariar os modelos culturais que ainda inferiorizam e marginalizam a mulher e ainda quando a própria convenção pela eliminação das discriminações que atingem as mulheres prevê um destaque cada vez maior às associações de mulheres.
Por outro lado, tenho pena que a Sr.ª Deputada Assunção Esteves, como mulher, não esteja a ouvir a minha intervenção, porque, de facto, é estranho e faz-nos pensar no peso dás mulheres na qualidade das deputadas em relação à sua sensibilidade para a problemática das mulheres. 15so faz-me ainda pensar no discurso de V. Ex.ª no dia 8 de Março, em que apareceu aqui, na Assembleia, como paladina da defesa dos direitos das mulheres, o que me obriga a questionar se V. Ex.ª acredita, na verdade, nos discursos que faz,
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ou está de tal modo vinculada ao seu partido que a posição que tem, na defesa dos direitos das mulheres, é uma posição demagógica, de discursos em períodos comemorativos!?
Quando se trata de consagrar esses direitos na Constituição ou na própria lei ordinária, V. Ex.ª acredita naquilo que diz?
Pergunto-lhe se acredita, face à experiência concreta que temos neste momento, que a lei da televisão e da rádio, apesar das organizações de mulheres terem insistentemente pedido para terem tempo de antena, têm impedido as associações de mulheres de se expressarem.
Considera ou não que é importante as associações de mulheres terem um espaço exactamente para a transformação das mentalidades, para tentar alterar os modelos culturais?
Também estranho a posição do PS, que apoiou, aquando do projecto do estatuto das associações de mulheres, a reivindicação desse estatuto, o tempo de antena para as organizações de mulheres. Na altura todas as organizações de mulheres presentes no Conselho Consultivo da Comissão da Condição Feminina, inclusive do PSD e do CDS, defenderam o direito de tempo de antena para as associações de mulheres. Aquilo que me pergunto é se, de facto, acreditam que, não tendo a lei ordinária considerado esse aspecto, que ele não deve ter dignidade constitucional para vir consagrado na Constituição!?
Sr.ª Deputada Assunção Esteves, se acredita na continuidade do seu discurso de 8 de Março (que aliás saudei como um bom discurso), não ficando no terreno das palavras, pensa V. Ex.ª que há condições nesta Casa para que a lei ordinária seja alterada de modo a que não sejam apenas, como está no texto constitucional, os partidos políticos, as organizações que tenham actividades económicas, as organizações sindicais e profissionais a terem direito de antena e que deixe de ser restritiva a possibilidade de alargamento desse direito também às associações de mulheres. V. Ex.ª acredita que isso é possível?
Gostaria igualmente de saber qual é a posição de coerência do PS face à posição que assumiu em relação à defesa do estatuto das associações de mulheres.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Assunção Esteves. A Mesa não regista outros pedidos de esclarecimento.
Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Sr.ª Presidente, não é propriamente para um pedido de esclarecimento, seria mais para uma pequena intervenção, mas pode interpretar-se como um pedido de esclarecimento em que não deixarei de fazer algumas considerações importantes na sequência da «provocação» da Sr.ª Deputada do PCP.
Em primeiro lugar, quero perguntar à Sr.ª Deputada com que legitimidade vem dar lições ao PSD a propósito da introdução constitucional de uma matéria destas quando o seu partido não fez nenhuma proposta de alteração a este artigo. Esta é a primeira questão.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - A proposta estava na Mesa!
A Oradora: - Das duas uma: ou o PCP não fez uma proposta de alteração a este artigo, e não tem legitimidade para nos dar lições nesta matéria, ou Os Verdes não têm a autonomia de que aqui se reclamam, e esses dois grupos partidários são uma e a mesma coisa!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Ora essa!...
A Oradora: - Outra questão que lhe quero colocar, Sr.ª Deputada, está conexionada com a alusão que fez ao meu discurso do Dia Internacional da Mulher. Não deve com certeza a Sr.ª Deputada ter ouvido tudo o que eu disse, ou então reteve selectivamente apenas aquilo que lhe interessava: a dado momento do meu discurso disse que rejeitava para a mulher, numa sociedade democrática, uma atitude auto-segregadora e auto-marginalizante que só poderia prejudicá-la e que, em matéria de defesa dos direitos das mulheres, eu acreditava sobretudo nas virtualidades do regime democrático.
Nesse sentido, Sr.ª Deputada, devo dizer-lhe que, como mulher e como pessoa ligada também ao Direito, considero desnecessário e mesmo desaconselhável que uma proposta deste tipo venha a ser inserida na Constituição.
É desnecessário e a prova a Sr.ª Deputada tem-na implícita na sua intervenção: em primeiro lugar, porque a legislação ordinária tem todas as margens de liberdade de modo a consagrar para as mulheres as possibilidades de realizar, na prática, a igualdade que constitucionalmente já lhe está assegurada; em segundo lugar, porque - e digo-lhe isto relativamente ainda à primeira parte da minha intervenção - porque entendo que, no fundo, o reclamar pelas mulheres de um direito de plena igualdade, não deve confundir-se com uma espécie de militante que acaba por lhe assinalar um estatuto de clara menoridade.
Sr.ª Deputada, o artigo 40.º é suficiente para garantir às mulheres e a quaisquer associações a possibilidade de se manifestarem publicamente sobre o que são e sobre o que pretendem porque vivemos numa sociedade democrática, o que é suficiente. Creio, aliás, que as nossas diferenças de posição têm muito a ver com uma crença ou descrença na sociedade democrática, e com diferentes leituras dos mecanismos da sociedade democrática. Eu não confundo, Sr.ª Deputada, direitos de mulheres com militantites auto-segregadoras e é por isso que não me pronunciei no âmbito desta proposta de Os Verdes.
Aplausos do PSD.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, ao abrigo da disposição regimental de defesa da honra, desejava pedir explicações à Sr.ª Deputada Assunção Esteves por palavras que acabou de dizer.
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A Sr.ª Presidente: - Nos termos regimentais invocados, tem a palavra, Sr. Deputado. Para o efeito dispõe de dois minutos.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Deputada Assunção Esteves, quero dizer-lhe que levo as palavras que acabei de ouvis em consideração do seu
estado de exaltação, aliás público e notório nesta intervenção.
Protestos do PSD.
... e desde já considero que o terá dito levada apenas pelo facto de estar manifestamente nervosa, o que é um direito seu.
Saberá porquê e não lhe pergunto, nem me compete a mim sabê-lo, no entanto, não posso deixar de reprovar o facto de ter tentado penalizar a imagem pública
de um partido como o Partido Os Verdes, a propósito de coisas com que não está de acordo com a intervenção ou a falta de intervenção, neste caso, da bancada
do PCP.
Penso que terá exagerado e que teria tido oportunidade com outra serenidade, de encontrar outra argumentação que não obrigasse a minha pessoa agastar consigo e nesta matéria - é a primeira vez que o faço ao abrigo desta figura - um tempo que me é extremamente precioso porque desconta no meu tempo pára rever a Constituição e para ajudar neste processo de revisão e melhoria do texto constitucional.
Apenas queria de si uma explicação, porquanto não gostaria de ver a sua voz, que é uma voz esclarecida (metálica, como alguns á classificam,- mas apesar de
tudo simpática e muitas vezes amarga) juntar-se à voz de outros, como, por exemplo, um fascista, conhecido e reputado que considera que Os Verdes são comunistas, que os que lutam contra os eucaliptos são comunistas, que os que querem formar um sindicato da PSP são comunistas e são ainda comunistas todos aqueles que não são do Governo ou que não gostam da Nato ou que não gostam, enfim...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não gostavam!
O Orador: - ..., que os pacifistas são comunistas.
Estou-me a referir a um ilustre articulista de determinado meio de comunicação social que diz que «tudo isto são manipulações dos soviéticos, que já conseguiram... »
A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo.
O Orador: - Concluirei rapidamente, Sr.ª Presidente.
«... que já conseguiram pôr 42 comunistas verdes no parlamento alemão, que já conseguiram pôr dois no parlamento português e estão a subverter o universo».
Não gostava de ver a sua voz junta a estas «vozes de burro que ao céu não chegam»!
A Sr.ª Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Esteves.
A Sr.ª Assunção Esteves (PSD):- Sr.ª Presidente, é só para dizer ao Sr. Deputado Herculano Pombo, que eu não imaginava que tivesse um eco tão alargado o facto de me referir a um excessivo entusiasmo da Sr.ª Deputada Luísa Amorim por uma proposta que não era própria. Apenas tenho a dizer ao Sr. Deputado o seguinte: o ónus de distinção entre Os Verdes e o PCP cabe aos Verdes e cabe ao PCP. Mão temos tido provas disso. Esperamos que as venhamos a ter.
Vozes do PSD: --Muito bem!
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: - Para responder ao pedido de esclarecimentos da Sr.ª Deputada Assunção Esteves, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Amorim.
A Sr.ª Luísa Amorim (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Assunção Esteves: A minha «provocação» - e foi V. Ex.ª que entendeu como provocação - é uma «provocação» solidária de quem acredita que é absolutamente essencial que as deputadas na Assembleia da República assumam um
discurso coerente e empenhado na defesa dos direitos das mulheres porque acredito na democracia. Devo dizer-lhe que, de facto, nem da sua bancada nem do
seu partido, recebo pessoalmente, nem em termos do meu partido, lições em relação à democracia...
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - É esse o vosso mal!
A Oradora:- E não recebo por várias razões: por que a Sr.ª Deputada efectivamente conheço-a agora e o meu partido não existe de agora, e se a democracia existe neste país muito deve ao meu partido por muito
que isso não agrade.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Viu-se em 77!
A Oradora: - Porque, isto é a História, e a História feita pelos homens que, de facto, encheram as cadeias e lutaram pela democracia e pela, liberdade não inventam os senhores!
O Sr. José Magalhães -(PCP): - Muito bem!
A Oradora: - Portanto, a democracia e a liberdade que nos permite poder exprimir a diferença de opiniões foram conquistadas individual e colectivamente. Não reivindicamos ter sido os únicos; mas também não permitimos que os senhores nos excluam da História. Daí que a crença na sociedade democrática de que a Sr.ª Deputada falou, não só pessoalmente a testei e a provei, como não é V. Ex.ª, com a sua juventude e com toda a confiança na democracia (também eu acredito na democracia e não estou a pôr em causa a sua confiança na democracia), que me vem dar lições nem individuais nem colectivas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
Vozes do PSD: - É esse o vosso mal!
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A Oradora - Em relação à legitimidade, quero responder-lhe que o PCP não apresentou nenhuma proposta, mas apoiou a proposta de Os Verdes, conforme também não apresentou...
Uma voz do PSD: - Oxalá os senhores fizessem o mesmo!
A Oradora: - ... noutros terrenos e apoiou propostas de outros partidos quando considerou que eram correctas e justas, incluindo do PSD!
Portanto, não perdemos legitimidade por, em terreno próprio, que é aqui no Plenário, apoiarmos e salientarmos a importância da dignidade constitucional de consagrar a possibilidade de as associações de mulheres e outras terem espaço de intervenção e voz a nível do tempo de antena.
Uma voz do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Em relação à militantite auto-segregadora, há então uma coisa que não percebo no seu discurso. Reconheceu o tempo histórico da importância das organizações feministas, no papel que elas tiveram, na defesa dos direitos das mulheres. Há coisas que hoje são património cultural das sociedades democráticas e que foram conquistadas - eventualmente com o seu conceito auto-segregador - e, portanto, organizaram-se associações específicas de mulheres.
Com efeito, foi essa militantite auto-segregadora que permitiu que V. Ex.ª, que é uma jovem, neste momento, assuma direitos de igualdade (inclusive o direito ao voto) que lhe parecem tão evidentes, mas que custaram a vida a algumas dessas militantes femininas e sufragistas.
Se V. Ex.ª conhece a história...
A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Sr.ª Deputada, posso interrompê-la?
A Oradora: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Presidente: - Sr.ªs Deputadas Luísa Amorim quer para o facto de ela poder permitir uma interrupção.
A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Não tomará muito tempo à Câmara, Sr.ª Presidente.
É que essas formas de luta marginal, passe o termo, fazem sentido fora da sociedade democrática. Foi isso o que eu disse também no meu discurso...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Fora?!...
A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - ... dentro da sociedade democrática podem ter laivos de militantite que são contraproducentes.
A Sr.ª Deputada refere-se às sufragistas e à sua luta e tem toda a razão fora do contexto democrático. Dentro do contexto democrático tem efeitos contraproducentes e são muitas vezes desaconselháveis. É a minha posição!
A Oradora: - Sr.ª Deputada...
A Sr.ª Presidente: - Sr.ª Deputada Luísa Amorim, peco-lhe que seja breve porque esgotou o seu tempo.
A Oradora: - Vou ser muito rápida.
Sr.ª Deputada Assunção Esteves, não me queira dizer que todos os movimentos feministas que existiram em Inglaterra, nos Estados Unidos e que continuam hoje a existir em França, nos Estados Unidos, na Alemanha, etc, não se inserem em sociedades democráticas!
Por outro lado, não percebo como é que V. Ex.ª analisa as medidas do Parlamento Europeu e a própria Convenção que foi ratificada por Portugal, que apontam no sentido da importância nas sociedades democráticas das associações de mulheres. E V. Ex.ª ainda continua a ter um entendimento de que isso é militantite auto-segregadora!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Mas eles, o PSD, lá no Parlamento Europeu defendem isso!
A Sr.ª Luísa Amorim (PCP): - É um discurso cá e outro lá!
A Sr.ª Presidente: - Está inscrito, para uma intervenção o Sr. Deputado Herculano Pombo. Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, esta será a última e brevíssima intervenção sobre a nossa proposta do artigo 40.º
Há pouco esqueci-me de referir, mas ainda bem que a Sr.ª Deputada Luísa Amorim o fez, que o nosso projecto de Revisão Constitucional foi julgado como um óptimo projecto que poderia trazer à Constituição a consagração de novos direitos, exactamente por ter a proposta de aditamento do n.º 4 do artigo 40.º e foi assim considerado numa reunião da organização não governamental da Comissão da Condição Feminina, onde estavam mulheres de todos os partidos, de todas as organizações e onde as mulheres têm um papel real e uma palavra a dizer.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Não eram constitucionalistas, essas mulheres!
O Orador: - Foram essas mulheres, não fui eu, que fizeram esse elogio ao projecto de Os Verdes e foi essa organização que teve o cuidado de, em carta dirigida ao meu grupo parlamentar, dizer que reputavam como extremamente positiva esta nossa tentativa de consagrar um novo número no artigo 40.º
É, pois, uma questão simples de considerar que o projecto é bom por aquilo que contém, e não é bom ou mau conforme a consciência de quem o analisa, que infelizmente foi o que a Sr.ª Deputada Assunção Esteves acabou por fazer. Hoje acordou com má consciência em relação aos Verdes, vou esperar por outras horas - horas mais fastas - para que a sua consciência em relação ao projecto de Os Verdes seja outra, e não venha aqui ilegitimamente que Os Verdes tenham de fazer no Hemiciclo prova da sua diferença em relação ao PCP.
Sr.ª Deputada Assunção Esteves, Os Verdes não têm que fazer prova de coisíssima nenhuma porque não são acusados de coisíssima nenhuma. Isto tem que ficar muito claro: não precisamos que o PSD, ou ninguém, nos venha dar um pedigree de ecologistas. Está aqui a nossa prática, está a nossa prática política no dia-a-dia. Não somos nós que andamos a dar «cacetadas» no pessoal que arranca os eucaliptos, somos nós que os arrancamos, calha bem!...
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A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Mas não sou eu!
O Orador: - Somos nós os ecologistas que estão contra o campo de tiro de Alcochete; somos nós que criticamos a Secretaria de Estado do Ambiente por não
Ter política de ambiente; somos nós que trazemos aqui os ministros, quando eles «se portam mal», para lhes perguntar como é que eles fazem para dizerem que têm
política de ambiente e degradam o ambiente.
Afinal, somos nós os ecologistas. Para que é que temos de fazer prova, como se isto fosse um Tribunal, de que somos diferentes dos comunistas? Somos
diferentes dos comunistas! Está à vista. Somos diferentes dos social-democratas, dos socialistas e de todos.
Nós até pugnamos pelo direito à diferença; para que as nossas diferenças sejam polemicadas, e respeitadas ou teria eu agora que provar aqui a V.Ex.ª alguma
coisa que V. Ex.ª não saiba já. Eu espero por outras horas.
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições para a discussão do artigo 40.º, pelo que vamos passar à discussão do artigo 41. º
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Presidente, pedi a palavra; apenas para comunicar à Mesa que retiramos a nossa proposta para o artigo 40. º
A Sr.ª Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Ferreira(PSD): - Sr.ª Presidente, gostaria de fazer idêntico pedido à Mesa, relativamente ao aditamento para o n.º 4 do artigo 40.º, do projecto
10/V.
A Sr.ª Presidente: - Está retirado; Sr. Deputado.
Srs. Deputados está em discussão o artigo 41.º
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP foi o único partido que adiantou propostas de aperfeiçoamento da Constituição em matéria de liberdade de consciência, de religião e de culto.
É certo que durante os debates, o Sr. Deputado Sottomayor Cardia viria a apresentar uma proposta que, todavia por ser extemporânea, não pôde, em muitos
aspectos, ser considerada, por exceder o âmbito daquilo que é constitucionalmente admissível face às regras que regem o processo da Revisão. Constitucional.
Em todo o caso; o debate que travámos na comissão, cobre o sentido e limites da liberdade de consciência e de religião, revelou que o quadro português
garante, em condições altamente satisfatórias, todas as dimensões da liberdade de consciência, de religião e de culto. É um ponto consensual que só originou polémica, até hoje, em aspectos periféricos ou secundários, mormente aqueles que se relacionam com a liberdade de, aprender e de ensinar e com a possibilidade da criação, de escolas com determinada orientação ligadas, directa ou indirectamente, a confissões religiosas.
Quanto à tutela jurídica das atitudes em matéria religiosa, incluindo a liberdade de não professar qualquer religião e de não praticar qualquer acto de culto, quanto a outros aspectos co-envolvidos na própria liberdade de consciência de religião, a Constituição é uma casa ampla na qual se podem reconhecer as diversas correntes de opinião e, desejavelmente, todas as confissões religiosas.
O PCP propôs apenas um aperfeiçoamento e esse aperfeiçoamento é tendente a garantir constitucionalmente o segredo. religioso, o segredo dos ministros- de qualquer religião ou confissão religiosa, estabelecendo, em termos peremptórios, a sua inviolabilidade.
Esta proposta foi objecto de apreciação na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional e em 20 de Dezembro do ano passado, o PSD disse: «Não!»
Não disse não, votando contra; disse não, abstendo-se. E disse não abstendo-se; porque à puridade, ou publicamente, não pode deixar de reconhecer que esta
é uma proposta justa. O debate do Código de Processo Penal provou que, neste ponto, é extremamente importante adoptar todas, mas todas, as cautelas. E qual
quer dúvida sobre, a possibilidade de introdução de mecanismos de quebra do segredo religioso dos próprios ministros de qualquer religião, poria em perigo,
num ponto sensível; todo o edifício da liberdade religiosa em Portugal.
Foi no sentido de acautelar que isso não possa acontecer, no sentido de reforçar a Constituição neste ponto, que o PCP se moveu, o que, de resto, exprime a visão que nós temos do processo de Revisão Constitucional, que serve, precisamente, para este tipo de aperfeiçoamento e não deve servir para a destruição de aspectos fulcrais da própria identidade constitucional.
Esta é a nossa postura e a questão que gostaria de colocar, nesta sede e neste momento, é se o PSD, que se mostra intransigente em relação àquilo que qualifica
como conquistas suas no processo de Revisão Constitucional, está disponível ou não, neste momento, para admitir que este aperfeiçoamento seria um utilíssimo
aperfeiçoamento em termos de compleição da Constituição num domínio muito sensível.
Portanto, a minha intervenção tem o sentido de dirigir, em última analise, uma pergunta a bancada do PSD, considerando que é este o momento de discutir e de decidir e que a votação indiciaria praticada na CERC não é irreversível. Pela nossa parte, desejaríamos profundamente fique não fosse irreversível e daqui apelo nesse sentido...
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado, Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado José Magalhães, o pedido de esclarecimento que quero fazer é curto e é exactamente para tomarmos em consideração a posição do nosso voto.
Uma vez que não há nenhuma definição jurídica, legal ou mesmo social (das ciências sociais) sobre o que seja a «confissão religiosa», poderia o Sr. Deputado José Magalhães dizer como é que, no caso concreto, podemos dizer que há uma confissão religiosa.
Repito, Sr. Deputado: uma vez que não há, nem constitucionalmente, nem na lei, nem nas ciências sociais, que eu tenha conhecimento, uma definição, não digo rigorosa, mas, pelo menos, aproximativa, do que
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seja uma confissão religiosa, gostaria que o Sr. Deputado me dissesse como é que podemos interpretar esta expressão «confissão religiosa».
Faço esta pergunta de boa-fé, exactamente em face do seu argumento de que no processo penal o segredo do ministro da confissão religiosa não deve ser quebrado. Embora seja um argumento que me toca, gostaria de saber como é que interpreta a expressão «confissão religiosa».
A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Narana Coissoró, a pergunta que V. Ex.ª formula é de resposta extremamente simples.
A Constituição, no seu artigo 41.º, que é aquele ao qual o PCP pretende aditar este normativo, alude à liberdade de consciência de religião e de culto e alude igualmente, no seu n.º 5, à garantia da liberdade de ensino de qualquer religião, praticada no âmbito da respectiva confissão, o que quer dizer que a Constituição já hoje equaciona a questão que V. Ex.ª me colocou.
Quer dizer, constitucionalmente, temos que buscar, pelos critérios de interpretação normais em Direito Constitucional, qual seja o conceito constitucional de religião, o conceito constitucional de acto de culto, o conceito constitucional de confissão religiosa e, portanto, o PCP, nesta matéria, não inova. A nossa inovação não consiste nisso.
O conceito de confissão religiosa que o PCP usa é o mesmo que, hoje, a Constituição usa. O PCP alude a tudo aquilo que, nos temos da Constituição portuguesa em vigor, possa considerar-se confissão religiosa. Aí não inovamos absolutamente nada.
Obviamente, a Constituição não tem uma definição taxativa e in extenso da noção de confissão religiosa, o que também não é necessário, porque a Constituição não tem uma definição taxativa in extenso de ambiente, ou de vida. A Constituição não tem, em si mesma, sendo uma matriz, todos os conceitos em linguagem, em codificação e em conceptologia constitucional. Por vezes, utiliza técnicas de remissão, por vezes, define, através de conexões, os conceitos que ela própria utiliza, pelo que o PCP, nesse ponto, não inova. A nossa inovação consiste em garantir aos ministros das religiões o direito à inviolabilidade de segredo «e parece-me que isso deveria merecer, não apenas o apoio, mas até algum entusiasmo da vossa parte.
A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados e Sr. Deputado José Magalhães: Vou intervir muito sucintamente - como me parece que todos devemos fazer, na medida em que estamos a criar uma situação, em matéria de consumo de tempos, que pode, na verdade, ser complicada na ponta final desta discussão -, para confirmar o nosso voto favorável relativamente à proposta do PCP, embora não o acompanhemos no entusiasmo e no mérito que lhe atribui.
A lei é confirmativa de um valor que nos parece relevante e é nessa medida que o nosso voto é favorável, mas não acrescenta nada aquilo que já está na Constituição.
A Constituição salvaguarda a inviolabilidade da integridade moral e este mesmo artigo refere que a liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável. Portanto, nessa medida, não acrescenta rigorosamente nada. Em todo o caso, se um ligeiro toque de forma puder congregar também o voto de outros partidos que na primeira fase não votaram favoravelmente, poderia talvez dizer-se, em vez de segredo próprio dos ministros (porque não é um segredo próprio dos ministros), segredo de natureza confessional.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É isso!
O Orador: - Eles não têm segredo por serem ministros, não é próprio. Portanto, se quiséssemos uma redacção melhor, seria: «O segredo confessional dos ministros de qualquer religião ou de qualquer culto é inviolável.» Talvez assim pudéssemos congregar a aprovação genérica deste preceito, muito embora se trate, na verdade, de um preceito confirmativo de valores que já estão salvaguardados na Constituição.
A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Vou intervir muito brevemente e só porque fomos interpelados directamente, tanto pelo PCP como pelo PS.
Abstivemo-nos na comissão e vamos manter este voto de abstenção. Entendemos que esta Constituição (é assim que nós a pensamos, porque não a queremos confeccionar) é uma Constituição aberta que garante a todas as pessoas a liberdade de exercício e de prática e a liberdade de consciência, de religião, o que está assegurado no artigo 41.º Também entendemos que o segredo próprio dos ministros de qualquer religião ou confissão é inviolável, é um valor fundamental.
No entanto, confrontamo-nos aqui, segundo o nosso ponto de vista, com uma atitude um pouco semelhante àquela com que nos confrontámos aquando do direito à diferença: confrontámo-nos com uma ideia de carácter positivo, com uma referência importante a que o legislador ordinário deve prestar particular atenção. No caso concreto do processo penal, em que o problema já se pôs na ordem jurídica portuguesa, já foi resolvido quando se trata de o juiz exigir ou impor a quebra do segredo confessional.
Só que estamos aqui perante uma situação um pouco idêntica à do direito à diferença, uma ideia contra a qual ninguém pode estar, mas sobre cuja inserção no texto constitucional ainda não vimos bem todas as suas implicações neste momento. É que esta inviolabilidade, com este carácter absoluto, na medida em que vai introduzir na ordem jurídica portuguesa, e com a consistência própria do direito constitucional, um direito a uma inviolabilidade do segredo cujos limites nós não vemos bem, pode, eventualmente, causar mais dificuldades e mais perturbações do que vantagens. Em Portugal, não há, a nível da ordem jurídica, problemas neste domínio; os problemas que se puseram foram correctamente resolvidos e foram-no no sentido que o PCP propõe. Levar esta matéria ao Direito Constitucional sem melhor estudo e sem melhor identificação dos contornos e das implicações da conexão das diferentes
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organizações de carácter religioso, que são muito diversas na sua expressão quantitativa (não digo na sua dignidade porque isso não nós compete a nós julgar), poderia, eventualmente, criar mais problemas em vez de os resolver.
Só por esta razão, Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, nos abstemos. Não é a ideia em si que está em causa, mas sim uma falta de consciência, de que não fomos,
nem estamos devidamente esclarecidos de todas as implicações que uma proposta como esta traria à ordem jurídica portuguesa.
A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Costa Andrade, a intervenção de V. Ex.ª não deixa, apesar de tudo, de suscitar alguma perplexidade, porque V. Ex.ª é especialista em Direito Processual Penal, como todos nós sabemos e, portanto, não terá grande dificuldade em aferir algumas dás implicações da proposta do PCP.
Quais são as implicações perversas? É que a grande interrogação que há que formular em relação a propostas deste tipo é se têm implicações perversas, porque quanto às implicações positivas todos somos capazes de as ver. Proclamamos a inviolabilidade, e isso tem implicações em relação ao Processo Penal, em relação à actuação das polícias, em relação ao poder do Estado, em relação à atitude dos próprios particulares, uma vez que há eficácia em relação a terceiros. Tudo isto são implicações positivas, aliás a. Lei .Processual Penal estabelece isto.
A elevação à Constituição e à dignidade inerente deste princípio, que implicação perversa é que tem? Nenhuma! Não tem nenhuma implicação perversa! Portanto, .V. Ex. 1 tem medo de quê? Do desconhecido? Do buraco negro? Do vértice supremo? Do infinito? Não há nenhum medo! Se VV. Ex.ªs estão de acordo com o direito à inviolabilidade destes ministros de religiões, se não fazem exclusões em relação a esta matéria, que não se confunde, obviamente, com actividades ilícitas de seitas que se dedicam à lavagem de cérebros, etc, é evidente que não há nenhum inconveniente na introdução deste dispositivo, pelo contrário, há todas as vantagens. Portanto, a vossa atitude é uma atitude de recusa política de uma solução desejável, mas é inexplicável!
A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD):- Diz um, eminente filósofo português actual, Miguel Baptista Pereira, que «toda a liberdade é mistério e é abismo». Também a liberdade de consciência e de religião pode. confrontar a sociedade e o Estado com algum mistério e com algum abismo.
Nós não queremos, porque respeitamos a liberdade de consciência e de religião, sindicar o modo como se exerce e o modo como se pratica a religião. Respeitamos esse aspecto noutro espaço fundamental do mistério e do abismo para que a liberdade aponta: Mas, como Estado, temos de ter muitas cautelas no que toca à projecção de todo esse abismo e de todo esse mistério para a ordem jurídica máxima - a ordem jurídica constitucional.
Os problemas com que a ordem jurídica portuguesa se tem havido nesta matéria, tem-nos resolvido com grande razoabilidade e em temos consensuais. É desta forma que interpreto o sentido da Câmara já que as soluções são consensuais. Portanto, uma proposta como esta não responde, em primeiro lugar, a uma necessidade, não é necessária neste momento. Em segundo lugar, comporta, como, eu disse, alguns perigos...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Quais?
O Orador: - ... os perigos da projecção desse «mistério» e desse «abismo» na ordem jurídica constitucional.
Não gostaria de concretizar mais este ponto de vista pelo menos nesta sede, mas fico-me por aqui: toda a liberdade de confissão, toda a liberdade de exercício,
alguma cautela merece no que toca à projecção desse exercício na ordem portuguesa máxima - na ordem jurídico-constitucional.
A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.
O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Julgo que o CDS não, pode deixar de dizer uma palavra nesta matéria. E a primeira coisa que me ocorre neste debate é que, ao definir estes preceitos suponho que, consciente ou inconscientemente, todos estão a pensar na Igreja Católica, na confissão é nos limites do segredo que a confissão envolve. Embora não o digam, este é, o peso histórico do País é esta é a sua prática. É isto que certamente está, consciente ou inconscientemente, no espírito de todos os intervenientes.
Nós consideramos, e não omitimos isso, que o fenómeno religioso é fundamental. Pensamos que uma das crises terríveis da nossa época e desta passagem para o século XXI foi o facto de a nossa evolução científica e, técnica não ter sido acompanhada da evolução da época, que sé atrasou, é do desenvolvimento dos princípios religiosos nesse domínio. Por esse facto enfrentámos esse vazio. Logo, estamos sempre de acordo com todas as iniciativas que nos ajudem a preencher esse terrível vazio da nossa época. Simplesmente, também queria lembrar que o facto de ser esta a tradição e de ser este o dado cultural que está na consciência de todos ou no inconsciente de todos, não pode ser acompanhado, da gaite dos católicos, da ideia de que têm um privilégio que não pode ser estendido a outra forma qualquer de estabelecer relações com a divindade de qualquer outra confissão. Não pode haver privilégio exclusivo dos católicos!
Houve mesmo uma experiência ocidental gravíssima, durante a última Guerra: a mobilização dos exércitos ocidentais que tiveram de criar instituições de assistência de todas as confissões religiosas às suas tropas. E não é razoável para homens que estão no mesmo risco que tivessem privilégios diferentes os que haviam de dar-lhe a assistência indispensável para esse acto último e indefinido, e, portanto, isso é um peso no sentido da igualdade de todas as confissões e de todos os seus
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ministros. Espero que este ponto seja perfeitamente claro para nós todos.
Mas, justamente, a própria Igreja Católica, na sua evolução última, afasta toda a dependência ou relação com o poder político e com os instrumentos políticos de organização do Estado. Ela quer mergulhar na sociedade civil e, por consequência, é no tratamento da sociedade civil que há-de encontrar a igualdade de tratamento que as outras confissões têm.
Acontece que pelo que à Igreja Católica respeita, a Concordata salvaguarda a sua tradição e a sua prática. É um acordo entre entidades de Direito Internacional (se vamos discutir se são realmente dois Estados, deixamos isso a especialistas, já que aqui não faltam) mas é fora do texto constitucional que se encontra o tratamento que acha adequado para a sua função. Efectivamente, penso que estabelecido o princípio geral da liberdade de consciência de religião e de inviolabilidade do culto, independentemente de podermos buscar, nos dias que nos faltam para a votação, outras redacções, como aqui já foi sugerido pelo Sr. Deputado Almeida Santos, que tornem mais explícito este princípio geral, é para a lei comum que nós devemos deixar a regulamentação destas matérias. E vou-lhe dizer concretamente porque é que entendo que este princípio diz respeito a todas as confissões e porque é que nenhuma tem privilégio especial; será de lei comum, de acordo internacional que virá o tratamento especial.
E digo que isto é importante para Portugal, neste momento sobretudo, porque o pluralismo religioso português está a acentuar-se aceleradamente. Só quem está desatento ou não tem informação é que não sabe do número de confissões religiosas que se estão a implantar em Portugal! E essas confissões, em geral, merecem atenção, não pela sua dimensão quantitativa, mas pelo que de qualidade representam na comunidade. Por consequência, esse fenómeno, ficaria melhor entregue à lei comum - que deve olhar à evolução da sociedade - do que a um texto constitucional que impeça o legislador comum de estar atento à modificação que é rápida e constante, da sociedade a que pertencemos. De modo que, se a Câmara entender - penso que isso ficaria como interpretação de que este princípio de liberdade, de consciência, de religião, de culto e a sua inviolabilidade (como aqui já foi sustentado) dá um direito igual a todas as confissões como tal reconhecidas, sem privilégios especiais porque o estatuto de cada uma virá da lei comum -, penso que seria mais prudente para o Estado remeter paia a legislação comum esta matéria, em vez de estabelecer um princípio constitucional.
Em todo o caso, o CDS sente-se na obrigação de meditar, nos dias que faltam para a votação, sobre se não será mais importante uma nova redacção ou se esta, com esta interpretação, é suficiente para as necessidades actuais do País.
Vozes do CDS: - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr.ª Presidente, poderia ter tomado a palavra para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Adriano Moreira, uma vez que a
intervenção do Sr. Deputado do CDS motiva este curto comentário ao culminar em interrogações.
Primeiro, quanto à filosofia e à postura subjacentes à proposta apresentada pelo PCP, trata-se da postura e da filosofia, exclusiva e puramente constitucionais, que, evidentemente, consagram um princípio de igualdade que reconhece igualmente, como é óbvio, as diferenças e que trata cada qual segundo a sua própria natureza, dimensão e expressão, o que é a própria definição de igualdade. A norma aplica-se, pois, num contexto de pluralismo religioso e com esta filosofia que é constitucional. Nesta medida, não inovamos absolutamente nada.
Segundo, quanto à fórmula utilizada, estamos abertos à consideração de outras formas. Aliás, o Sr. Deputado Almeida Santos adiantou um contributo. O Sr. Deputado Adriano Moreira aponta, no fundo, para uma outra redacção. O que nos preocupa não é, de facto, a formulação em concreto, mas se essa ideia de Revisão Constitucional é viável, desejável e positiva.
Pela minha parte, insistiria em defender a causa de uma solução constitucional, considerando-a ainda e sempre positiva pela razão seguinte: podemos modelar a fórmula de maneira a remeter para o legislador ordinário, como sempre terá de ser, a dilucidação de diversos aspectos que, em concreto, será necessário estabelecer. Por exemplo, hoje o Código de Processo Penal, no artigo 135.º, entre outros, estipula: «Os ministros de religião ou confissão religiosa (...) podem escusar-se a depor sobre os factos abrangidos por aquele segredo», e no n.º 4 do mesmo artigo especifica: «Não há possibilidade de quebra do segredo religioso», ao contrário do que acontece - infelizmente, aliás - com o segredo dos advogados, dos médicos, dos jornalistas e de outros profissionais. Repare-se que esta solução não seria em nada incompatível com a fórmula que o PCP propõe, e menos ainda com qualquer outra ainda mais cautelosa.
Creio que haveria alguma vantagem em que se firmasse consenso em torno dessa ideia, por forma a tornar esse princípio um princípio constitucional, não porque a Constituição não apele e não implique essa solução, uma vez que é também meu entendimento, assim como desta bancada, que na realidade implica. Seria um atentado gravíssimo à liberdade religiosa se os tribunais ou as autoridades policiais, sob qualquer pretexto, utilizassem os meios coactivos para extrair factos em segredo e em segredo religioso. Seria, de facto, um atentado gravíssimo. Penso até que, de resto, seria mesmo impensável que ele ocorresse entre nós.
Mas, em matéria de liberdade religiosa, diria que nos tempos modernos tudo o que a Constituição prevê é impensável. Isto é, a Constituição, hoje, fazendo eco de conquistas de muitos séculos de evolução, e alguns bastante difíceis e cruentos, consagra a liberdade de consciência. Trata-se de uma coisa simples e normal, respiramo-la, é oxigénio, não sabemos concebê-la de forma diferente, tal como consagra a liberdade de religião e como garante que ninguém seja perseguido pelas suas crenças ou pelas suas opções religiosas. É normal, é banal, é impensável que seja assim! Bom, mas é constitucional. E não é menos difícil encontrar uma formulação como a que temos na Constituição, por exemplo, no artigo 41.º, n.º 3, do que encontrar esta fórmula: «Ninguém pode ser perguntado por qualquer autoridade acerca das suas convicções ou práticas religiosas, salvo para recolha de dados estatísticos não
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individualmente. identificáveis, nem ser prejudicado por se recusar a responder». Mas o que é isto? 15to é absoluto, é gravíssimo. O legislador ordinário a certa altura não pode perguntar o que é que cada qual aspira ou não. Se é ateu militante ouse é ateu moderno. Se é niilista, se acha que Deus morreu ou que está vivo é permanece sobre todos nós. Nefanda questão! Mas não é, não é uma nefanda questão, está resolvida constitucionalmente e foi difícil resolvê-la constitucionalmente.
Deste modo, apelamos a que esse esforço se faça também em relação a esta questão. E não confundimos este aspecto com a distinção necessária, que é preciso fazer, entre confissões religiosas e aquilo a que se chamou, com felicidade, os parasitas de Deus - é óbvio que em relação a esses o legislador ordinário e os poderes públicos hão-se ter de estabelecer a adequada fronteira - e aquilo que são actos ilícitos, porque atentam contra a liberdade intima que cada um tem de se autodeterminar, pelo que devem ser, obviamente, incriminados e sancionados. Mas essa distinção tem. de ser feita em outra sede.
Mas se os Srs. Deputados entendem configurar uma norma deste tipo e acrescentar-lhe «nos termos da lei», estou perfeitamente de acordo, teriam o consenso do PCP para esse efeito. Seria uma boa benfeitoria para a Constituição da República Portuguesa, até porque seria consensual...
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vitor Crespo.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa informa que a proposta avulsa relativa ao artigo 41.º, apresentada pelo Sr. Deputado Sottomayor Cardia, foi retirada.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.
O Sr. Adriano Moreira (CDS): -- Sr. Deputado José Magalhães, devo dizer que apreciei profundamente. á maneira como V. Ex.ª interveio nesta matéria, que me parece merecedora do respeito e da profundidade com que tem sido tratada no Parlamento, e não queria deixar de lhe acrescentar que essa preocupação com os parasitas de Deus não é genérica, não é apenas dos Sociólogos mas também é dos católicos. Lembro-me de. o ilustre Francisco Gentil, que tinha muito espírito, inteligência é alguma graça, ter dito que encontrava que os católicos do seu pais estavam divididos em praticantes, não praticantes e profissionais, e estes, na opinião dele, eram mais. Aliás, era pela mesma linha que ele se dirigia.
Não querendo, no entanto, perder a oportunidade de dizer ao Sr. Deputado o quanto apreciei a profundidade e a serenidade com que abordou este problema, queria ainda evidenciar que uma dás questões que me preocupa, do ponto de vista da segurança da sociedade civil, em primeiro lugar, e do estado que tem a sua expressão na Constituição, é a forma religiosa que a contra cultura tem assumido em muitos lugares. Espero que o Sr. Deputado não atribua qualquer sentido pejorativo a esta expressão, pois procurei a expressão mais breve para designar o fenómeno que tenho em vista.
Na verdade, não podemos alhearmo-nos do facto de que a contra cultura marginal não a critica, nem a inventiva, da qual todos havemos de estar dependentes sempre, felizmente, mas a contra-cultura negativa, destrutiva tem assumido, em tantos lugares, a forma de confissão religiosa para abrir o seu caminho. É este o meu problema, pelo que toca à definição rigorosa da garantia e parece que toda a Câmara está de acordo e a forma que deve revestir na Constituição.
Vamos então procurar, talvez, uma redacção melhor, vamos talvez confiar no legislador ordinário, que dependerá de nós de qualquer maneira.
No entanto, penso que o debate foi um bom serviço prestado à sociedade, portuguesa e devemos agradecer a quem o suscitou.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP ): - Sr. Presidente, em bom rigor o CDS não fez um pedido de esclarecimento, mas expressou a posição que assume no debate. Parece-me que é uma postura construtiva e apenas me resta não aditar razões, que essas estão averbadas e definidas, mas fazer de novo o apelo a que as diversas bancadas e, em especial, a bancada do PSD, uma vez que nesta matéria sé tem mostrado mais possuída de dúvidas, para que aproveite o período de interrupção dos trabalhos que se seguirá a este debate para procurar meditar numa solução que seja reciprocamente satisfatória e que contemple não só os aspectos em que há propostas positivas, mas também as dúvidas que foram adiantadas. Creio que teríamos bastante a ganhar com a conjugação dessa vontade afirmativa e dessa vontade de adoptar cautelas. Por mim, insisto na ideia da remissão para a lei, é uma salvaguarda que pode ser utilizada.
O Sr. Deputado Almeida Santos adiantou uma formulação alternativa em relação à qual estaríamos disponíveis para aderir. Assim, se o Sr. Deputado Costa Andrade e a bancada do PSD vierem a poder formular em outros termos, ainda igualmente satisfatórios e construtivos, uma solução legal, pela nossa parte consideraríamos que isso teria sido um resultado excelente do esforço de Revisão Constitucional desencadeado pelo PCP em Outubro de 1987.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas uma pequena intervenção em termos telegráficos, uma vez que o PSD voltou a ser interpelado para revelar a sua postura neste momento do debate. Neste sentido, e sem prejuízo da riqueza e da profundidade do debate, em que muito aprendemos, estamos firmemente convencidos de que o. resultado do debate só nós reconforta no sentido da nossa posição, segundo a qual não é necessária nem é, talvez, conveniente dar desde já uma resposta em termos de direito constitucional. E vou tentar explicar em termos muito claros por quê.
Sob a aparência do contrário, a nossa postura é a de que, em termos de liberdade de consciência e de religião, vai mais longe, é a de que, em sede de Direito Constitucional, está mais no sentido da defesa da liberdade, porque o que resulta deste debate é que todas as bancadas dizem: bom, há distinções a fazer, e uma coisa serão as confissões, outra serão as seitas, outra ainda pequenas seitas. Há, de facto, distinções a ser feitas e nós aqui e agora não nos sentimos legitimados
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a fazer essas distinções, porque a nossa postura nem é em termos quantitativos, nem sequer, como foi sugerido, em termos qualitativos. Não nos assumimos com o direito de sindicar em termos de qualidade qualquer confissão religiosa, nem em termos quantitativos, e muito menos em termos qualitativos.
Assim, ou se estabelecem já distinções que seriam perigosas ou se toma uma atitude como a nossa.
Do nosso ponto de vista, a liberdade de expressão e de confissão religiosa está aí cercada de uma barreira
- e repito uma fórmula já utilizada - de abismo e de mistério. Se a quisermos respeitar em toda a plenitude não podemos fazer distinções. Se não fizermos as tais distinções, em que todos estamos de acordo, a norma torna-se inconveniente. Por estas duas razões, penso que a nossa posição é
— permitam-nos o direito de pensar assim - a mais correcta do ponto de vista do Direito Constitucional e a mais consonante com a liberdade de consciência religiosa em sede constitucional.
—
A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Costra Andrade, continuo com alguma surpresa em relação à maneira como o Sr. Deputado vai reagindo aos diversos contributos para o debate e, concretamente agora, ao próprio contributo da bancada do CDS.
Sr. Deputado diz: «Todos nós acabámos por corroborar a necessidade de fazer distinções, logo a Constituição deve continuar a não ter uma menção específica a esta matéria.» É um argumento perigoso, porque, se reparar, a própria Constituição já no artigo 41.º, consagra precisamente uma redacção que alude a confissões, a igrejas, a comunidades religiosas e, no entanto, suponho que V. Ex.ª não sustentará, por exemplo, que os diversos grupos com carácter de seitas que se escudam em coisas a que chamam religiões e que, por exemplo, drogam, pressionam e violam a própria consciência de jovens e de outras pessoas, tenham direito ao tratamento previsto no artigo 41.º da Constituição. No entanto, V. Ex.a, como jurista que é, se analisar o artigo 41.º da Constituição não encontra nele uma distinção tabelar entre parasitas de Deus e confissões religiosas. Ela não está lá tabelarmente, mas está lá!
A mesma coisa aconteceria em relação a este texto ou a um texto ainda melhor do que este para o qual V. Ex.ª se dispusesse a contribuir. O Sr. Deputado diz: «Isso é o abismo e o mistério, não projectemos mais o abismo e o mistério naa Constituição». Mas respondo-lhe que o que está em causa é precisamente o contrário, isto é, o nosso reino, o nosso, deputados, o nosso, titulares de órgãos do poder político, o nosso reino é deste mundo. Portanto, não é do abismo e do mistério que devemos curar, é, pelo contrário, da certeza possível e da segurança jurídica. E nesse campo da certeza e da segurança importaria dar mais certeza e mais segurança ao estatuto dos ministros das confissões religiosas e das religiões em relação a essa questão específica do segredo que é um importante instrumento para o seu múnus espiritual e uma importante garantia para os membros das diversas comunidades religiosas. Se V. Ex.ª não adita à Constituição essa precisão ou essa explicitação, essa sobregarantia é uma perda para os membros das confissões religiosas e para os ministros das religiões. Era essa perda que não gostaríamos que se viesse a verificar pela simples menção de que V. Ex.ª não deseja abrir para o abismo e para o mistério. Não! Pelo contrário, queríamos que V. Ex.ª fechasse as portas do abismo e do mistério, que podem ameaçar, em certas circunstâncias, a liberdade religiosa e o segredo religioso, fechasse essas portas, inventando - dá trabalho, mas vale a pena - uma fórmula certa e segura como é própria, não do autor da Bíblia - porque não é isso que está em causa - mas do legislador na Assembleia da República em Revisão Constitucional, que tem o dever de ser preciso, rigoroso, económico, exacto e defensor de certos valores muito estimáveis, como é o caso da liberdade religiosa.
Assim, apelamos a que V. Ex.ª considere isso durante o fim de semana, já que agora está indisponível.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Apenas por uma questão de correcção para com o Sr. Deputado José Magalhães, gostaria de dizer que, obviamente, a minha não resposta deve-se ao facto de, honestamente, não ter mais nada a acrescentar em relação ao que já disse. Penso que o Sr. Deputado entendeu assim.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que damos por encerrado o debate sobre o artigo 41.º Na próxima quarta-feira entramos na discussão do artigo 46.º
Informo ainda a Câmara que a nossa próxima sessão plenária é na terça-feira, dia 2 de Maio, com período de antes da ordem do dia com a duração de 90 minutos destinado a declarações políticas e outras intervenções, que decorrerão durante os 60 minutos iniciais. Nos 30 minutos restantes proceder-se-á à votação do voto de protesto apresentado pelo Partido Socialista na sessão de quarta-feira passada, seguindo-se as declarações de voto dos grupos parlamentares, dispondo cada um deles de três minutos para esse efeito.
Do período da ordem do dia constará a discussão do projecto de lei n.º 365/V, da iniciativa do PS, que altera o Estatuto da Aposentação. Às 19 horas e 30 minutos proceder-se-á à votação dos pedidos de inquérito parlamentares n.ºs 12/V e 14/V, da iniciativa do PSD e do PCP, PS, PRD e CDS, respectivamente, seguindo-se as declarações de voto para o que cada grupo parlamentar dispõe de três minutos.
Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a sessão.
Eram 12 horas e 50 minutos.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira.
António José Caeiro da Motta Veiga.
António Maria Pereira.
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Carlos Alberto Pinto.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Flausino José Pereira da Silva.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Partido Socialista (PS):
António Domingues Azevedo.
António Miguel de Morais Barreto.
João Barroso Soares.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria do Céu Fernandes Esteves.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Domingos Abrantes Ferreira.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Natália de Oliveira Correia.
Deputados Independentes:
Carlos Mattos Chaves de Macedo.
Maria Helena Salema Roseta.
As REDACTORAS: Maria Leonor Ferreira - Cacilda Nordeste - Ana Maria Marques da Cruz.