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5020 I SÉRIE-NÚMERO 103

Quero recordar que fui preso com 15 anos de idade. Fui condenado num tribunal militar aos 15 anos - situação que me parece que é única no nosso país - a um ano de cadeia e a perda de direitos políticos por cinco anos, o que é uma coisa verdadeiramente absurda.
Quando vim do Tarrafal (depois de ter cumprido esse ano de cadeia e de ter voltado a ser preso um ano depois de ter expiado a primeira pena e de ter em seguida cumprido mais 10 anos de cadeia) quando saí da cadeia repto aos 27 anos falei com algumas pessoas que então estavam perfeitamente em sintonia com o regime de Salazar e que não acreditaram no que me tinha acontecido. Não acreditaram e achavam que não podia ser. De facto não faziam a menor ideia da natureza de alguns dos crimes que foram praticados.
Naturalmente que dou o meu apoio e repito sem qualquer reticência ao projecto do PCP. Mas não posso deixar de sublinhar como sublinhei, que é pena que ele não tivesse sido assumido sem qualquer reserva, por todos os partidos. Penso que é altura de todos os democratas em geral assumirem em relação a este problema uma outra perspectiva, a perspectiva de que entendem que o acto da resistência foi transcendente foi importante e que a democracia deve muito àqueles que resistiram independentemente das suas convicções políticas e do campo em que se situaram. Há um dever de gratidão que em muitos aspectos não esta satisfeito.
O caso do Tarrafal, por exemplo foi sempre mal encarado. Foi sempre mal perspectivado. Foi atribuída uma pensão vitalícia aos homens sobreviventes do Tarrafal que é transmissível às viúvas. Foi-lhes atribuída essa pensão vitalícia a título de serviços especiais de serviços extraordinários prestados à democracia e à liberdade. Mas esqueceu-se de um aspecto muito importante, é que continua actual e que os presos do Tarrafal trabalharam durante todo o tempo 8 horas por dia.
Ora o Estado português é um Estado de Direito e tanto na ordem interna como na ordem externa assumiu os compromissos e as responsabilidades do anterior regime. Assim, penso que devia ter sido encarado este problema com outro enfoque porque o trabalho que foi realizado no campo de concentração independentemente da sua qualidade - muitas vezes era um trabalho só para castigar os presos - não foi pago.
O regime salazarista encobriu o seu crime maior, que foi a criação de um campo de concentração numa ilha escondida do arquipélago de Cabo Verde. Nas prisões portuguesas aqui do continente naturalmente que o governo fingia respeitar as leis internacionais, fingia respeitar disposições que obrigavam os vários governos (o governo português até onde sei não subscreveu essa o ençao) que tinham presos políticos a não os sujeitava a trabalhos nas prisões.
Na realidade em Caxias, em Peniche, ou em Angra do Heroísmo os presos não foram obrigados a trabalhar. Mas os do Tarrafal foram. Criou-se para tanto uma disposição jurídica especial, criou-se um regime especial ou seja uma colónia penal - que não tem qualquer significado para presos políticos - para justificar o crime de obrigar os presos a trabalhar sem lhes pagar.
Esse aspecto não está devidamente analisado pelo Estado democrático. Tenho a certeza que se os ex-presos do Tarrafal se dirigissem ao Tribunal Internacional de Haia (o Tribunal dos Direitos do Homem) ele lhes dava razão. O Estado português seria obrigado de facto a cumprir e a pagar aquilo que na realidade não pagou «O trabalho dos presos».
Desculpem o calor com que falo nestes problemas. Não sou um homem de ódios. Todos os que me conhecem o sabem. Sou um homem extremamente tolerante. Proeuro compreender as coisas. Mas falo com alguma emoção porque dadas as circunstâncias não posso deixar de o fazer.
Quero dizer que aceito perfeitamente este projecto com a alteração que lhe foi introduzida pelo PCP e que resultou da discussão com as restantes bancadas em particular com a bancada da maioria e que levou a que o subsidio actual não seja acumulável. Sou um homem do 18 de Janeiro. Já tenho uma subvenção igual ao ordenado mínimo nacional, derivada do facto de ter sido um dos prisioneiros do campo de concentração do Tarrafal. Aceitaram que fosse transmissível às viúvas o que eu acho perfeitamente justo.
De qualquer modo quero lembrar aqui uma coisa, atribuiu-se uma pensão às viúvas dos homens do 18 de Janeiro que ainda são vivos. Muito bem! E então as viúvas se ainda existem dos homens do 18 de Janeiro que morreram no Tarrafal Porque é que são excluídas dessa subvenção? Isto parece-me um verdadeiro absurdo! Na realidade isto quer dizer que as viúvas dos homens de 18 de Janeiro que ainda estão vivas virão eventualmente a ser beneficiadas (por receberem uma pensão se sobreviverem aos maridos) em relação as outras cujos maridos morreram no Tarrafal há já bastantes anos e que tiveram de suportar sozinhas as dificuldades decorrentes desse facto.
Na generalidade e até mesmo com as alterações introduzidas no diploma do PCP dou o meu apoio mas penso que deveriam ser introduzidas algumas correcções designadamente esta. Esta pensão vitalícia é igualmente válida tanto para as viúvas dos participantes da Revolução de 18 de Janeiro que morreram no Tarrafal como para as viúvas dos que por outras razões ali faleceram. Parece-me que isto é de elementar justiça.
Portanto termino com um apelo à compreensão de todas as bancadas dando naturalmente uma vez mais o meu apoio sem qualquer reserva a este projecto de lei apresentado e bem pelo PCP embora com pena de ele não ter sido apresentado por todos.

Aplausos do PS, do PRD, do PCP, do CDS e do Deputado Independente João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos tem a palavra, o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Deputado Edmundo Pedro, o PRD já fez a sua intervenção no sentido de manifestar a sua adesão a este projecto com as considerações de que provavelmente na especialidade se poderão introduzir algumas modificações - aliás - creio que algumas ficaram patentes nomeadamente as que foram referidas por último na sua intervenção.
Contudo utilizo a figura de pedido de esclarecimento mais para sublinhar um aspecto que me parece muito importante e que tem sido provavalmente esquecido ignorado ou desconhecido da generalidade das pessoas

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