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I Série - Número 2

Sexta-feira, 19 de Outubro de 1990

DIÁRIO da Assembleia da República

V LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1990-1991)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 18 DE OUTUBRO DE 1990

Presidente: Exmo. Sr. Vítor Pereira Crespo

Secretários: Exmos. Srs.
Daniel Abílio Ferreira Bastos
Vítor Manuel Caio Roque
Apolónia Maria Pereira Teixeira
João Domingos F. de Abreu Salgado

SUMARIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa de diversos diplomas.
A Assembleia deu assentimento à viagem de carácter oficial do Sr. Presidente da República a Espanha, nos dias 27 e 28 do corrente mês.
Foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre substituição de deputados do PCP.
Após a leitura do relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias procedeu-se ao debate da proposta de lei n.º 161/V - Organização Judiciária de Macau, que foi aprovada na generalidade. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Ministro da Justiça (Laborinho Lúcio), os Srs. Deputados Narana Coissoró (CDS), Alberto Martins (PS), Guilherme Silva (PSD), Barbosa da Costa (PRD), José Magalhães e José Manuel Mendes (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 5 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro Cordeiro Dâmaso.
Álvaro José Martins Viegas.
Amândio dos Anjos Gomes.
António Abílio Costa.
António Augusto Lacerda de Queirós.
António Augusto Ramos
António de Carvalho Martins.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José de Carvalho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Oliveira de Matos.
António Maria Ourique Mendes.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Armando Lopes Correia Costa.
Arménio dos Santos
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Manuel P. Baptista.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Casimira Gomes Pereira.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima
Domingos da Silva e Sousa.
Dulcínco António C. Rebelo.
Ercília Domingues M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco Mendes Costa.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Carlos Marta Saíres.
Jaime Gomes Mil-Homens.
JJoão Álvaro Poças Santos
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maças.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maria Oliveira Martins.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Augusto Pinto Barras.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria Antónia Pinho e Melo.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Leonor Beleza M. Tavares.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mary Patrícia Pinheiro e Lança.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rosa Maria Tomé e Costa.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Walter Lopes Teixeira.

Partido Socialista (PS):

Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques Antunes.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes Silva Braga.
António José Sanches Esteves.
António Manuel Henriques de Oliveira.
António Manuel de Oliveira Guterres.

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António Miguel de Morais Barreto.
Armando António Martins Vara.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Edite Fátima Marreiros Estrela.
Edmundo Pedro.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
Helena de Melo Torres Marques.
Henrique do Carmo Carmine.
Jaime José Matos da Gama.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Luís Costa Catarino.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Carneiro dos Santos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Laurentino José Castro Dias.
Leonor Coutinho dos Santos.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Maria do Céu Oliveira Esteves.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui António Ferreira Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
RRui Pedro Machado Ávila
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António da Silva Mola.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Alfredo Brito.
Domingos Abrantes Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Camilo Carvalhal Gonçalves.
Joaquim António Rebocho Teixeira.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Anastácio Filipe.
Maria lida Costa Figueiredo.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Rodrigues Pato.
Sérgio José Ferreira Ribeiro.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Isabel Maria Ferreira Espada.
José Carlos Pereira Lilaia.
Natália de Oliveira Correia.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Basílio Adolfo de M. Horta da Franca.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PEV):

Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Manuel Gonçalves Valente Fernandes.

Deputados independentes:

Carlos Matos Chaves de Macedo.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Maria Helena Salema Roseta.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - Deram entrada na Mesa e foram admitidos os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 588/V, da iniciativa do Sr. Deputado Vítor Crespo e outros, assinado por todos os partidos, sobre autonomia administrativa dos órgãos dependentes da Assembleia da República; projecto de lei n.º 589/V, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, sobre regime de competências e meios financeiros das freguesias, com vista à sua dignificação e fortalecimento, que baixou à 6.ª Comissão; projecto de lei n.º 590/V, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, que garante a membros das juntas de freguesia, em certos casos e condições, o exercício do mandato em regime de permanência, com vista ao reforço dos meios de actuação dos órgãos da freguesia, que baixou à 6.ª Comissão; projecto de lei n.º 591/V, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, que altera o processo de concessão de alvarás no âmbito da categoria de obras particulares quando essas obras não ultrapassem o limite de 8000 contos (altera o Decreto-Lei n.º 100/88, de 23 de Março), que baixou à 12.ª Comissão; projecto de lei n.º 592/V, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, que reduz a duração semanal do trabalho normal, que baixou à 10.ª Comissão; projecto de lei n.º 593/V, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, sobre aumento geral das reformas e pensões e modificação do sistema de cálculo, tendo baixado também à 10.ª Comissão; projecto de lei n.º 594/V, da iniciativa do Sr. Deputado Luís Filipe Pais de Sousa e outros, do PSD, sobre a elevação da vila de Cantanhede à categoria de cidade, que baixou à 6.ª Comissão; projecto de lei n.º 595/V, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, sobre valorização das prestações sociais em favor da infância, da juventude e da família, que baixou à 10.ª Comissão; projecto de lei n.º 596/V, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Lilaia e outros, do PRD, sobre limitação dos mandatos dos presidentes das câmaras municipais, que baixou à 6.ª Comissão; projecto de lei n.º 591/V, igualmente da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Lilaia e outros, do PRD, sobre candidaturas às eleições autárquicas apresentadas por grupos de cidadãos eleitores, que baixou também à (...)

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(...)6.ª Comissão; projecto de lei n.º 598/V, da iniciativa do Sr. Deputado Luís António Martins e outros, do PSD, sobre a criação da freguesia de Repeses no concelho de Viseu, que baixou à 6.ª Comissão; projecto de lei n.º 599/V, da iniciativa do Sr. Deputado Silva Marques e outros, do PSD, sobre extinção do Serviço de Coordenação de Extinção da ex-PIDE/DGS e Legião Portuguesa, que baixou à 3.ª Comissão; projecto de lei n.º 600/V, da iniciativa do Sr. Deputado Carneiro dos Santos e outros, do PS, sobre elevação de Fazendas de Almeirim à categoria de vila, que baixou à 6.ª Comissão; projecto de lei n.º 60l/V, também da iniciativa do Sr. Deputado Gameiro dos Santos e outros, do PS, sobre elevação da vila de Almeirim à categoria de cidade, que baixou à 6.ª Comissão; proposta de lei n.º 165/V, sobre alteração à Lei Eleitoral das Autarquias Locais, que baixou às 3.ª e 6.ª Comissões; proposta de lei n.º 166/V, que altera o regime de atribuições das autarquias locais e competências dos respectivos órgãos, que baixou à 6.ª Comissão; por último, a proposta de resolução n.º 41/V, que aprova, para ratificação, o Tratado de Auxílio Mútuo em Matéria Penal entre a República Portuguesa e a Austrália.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à apreciação do parecer e proposta de resolução da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, que é do seguinte teor:

A Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação da Assembleia da República, tendo apreciado a mensagem de S. Ex.ª o Presidente da República em que solicita o assentimento para se deslocar em viagem de carácter oficial a Espanha, nos dias 27 e 28 do corrente mês de Outubro, apresenta ao Plenário a seguinte proposta de resolução:

Nos termos do n.º 1 do artigo 132.º da Constituição, a Assembleia da República dá o assentimento à viagem de carácter oficial de S. Ex.ª o Presidente da República a Espanha, nos dias 27 e 28 do corrente mês de Outubro.

Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo, Helena Roseta e Raul Castro.

Srs. Deputados, há ainda um outro relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, que vai ser lido.

Foi lido. É o seguinte:

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos

Em reunião da Comissão de Regimento e Mandatos realizada no dia 17 de Outubro de 1990, pelas 15 horas, foram observadas as seguintes substituições de deputados:

Solicitadas pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português:

Cláudio José dos Santos Percheiro (círculo eleitoral de Beja) por Miguel Urbano Tavares Rodrigues (esta substituição é solicitada nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), por um período de seis meses, com início em 9 de Outubro corrente, inclusive];
Carlos Campos Rodrigues Costa (círculo eleitoral do Porto) por Júlio José Mendes (esta substituição é solicitada nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), por um período de seis meses, com início em 16 de Outubro corrente, inclusive].

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelo aludido partido nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

João Domingos F. de Abreu Salgado (PSD), presidente - Alberto Marques de O. e Silva (PS), vice-presidente-José Manuel M. Antunes Mendes (PCP), secretário - Manuel António Sá Fernandes (PSD), secretário - Alberto Monteiro de Araújo (PSD)-António Paulo M. Pereira Coelho (PSD) - Arlindo da Silva André Moreira (PSD) - Belarmino Henriques Correia (PSD)-Carlos Manuel Pereira Baptista (PSD)-Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) -Domingos da Silva e Sousa (PSD)-João Álvaro Poças Santos (PSD) - José Augusto Ferreira de Campos (PSD) - José Augusto Santos da S. Marques (PSD) - José Manuel da Silva Torres (PSD)-Luís Filipe Garrido Pais de Sousa (PSD) - Valdemar Cardoso Alves (PSD) - Helder Oliveira dos Santos Filipe (PS) - Júlio da Piedade Nunes Henriques (PS)-Mário Manuel Cal Brandão (PS) - José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP).

Srs. Deputados, está em apreciação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo, Helena Roseta e Raul Castro.

Srs. Deputados, vamos entrar no período da ordem do dia com a apreciação da proposta de lei n.º 161/V - Organização Judiciária de Macau.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente:-Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, quero solicitar à Mesa que seja lido o relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que foi aprovado por unanimidade, dada a sua utilidade e relevância e o tema.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa compreende a importância, a relevância e o facto de ter sido aprovado por unanimidade, mas, infelizmente, ainda não dispõe do relatório, a fim de que se proceda à sua leitura.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente:-Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, independentemente da importância do relatório, devo dizer que os nossos colegas que deverão ocupar-se desta matéria não estão presentes, uma vez que se encontram numa reunião de uma comissão com um Sr. Secretário de Estado.
Quero, pois, pedir à Mesa e a esta Câmara a interrupção da reunião por cerca de 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, por consenso, está interrompida a reunião por 10 minutos.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão. Eram 16 horas.

Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Maia Nunes de Almeida.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à leitura do relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sobre a proposta de lei n.º 161/V- Organização Judiciária de Macau.

Foi lido. É o seguinte:

Relatório e parecer sobre a proposta de lei n.º 161/V - Organização Judiciária de Macau

l - A alteração ao Estatuto Orgânico de Macau, votado por unanimidade na Assembleia da República em 17 de Abril de 1990, visou adequar o Estatuto do território às necessidades decorrentes do período de transição.
O Estatuto Orgânico aprovado passou a constituir o texto nuclear em vigor no território até 20 de Dezembro de 1999, aquando da assumpção do exercício de soberania da Região de Macau pela República Popular da China. A partir daquela data seguir-se-á como diploma constituinte do território uma lei básica da região administrativa especial de Macau, cujos princípios e políticas fundamentais permanecerão inalterados durante 50 anos.
2- O Estatuto Orgânico de Macau revisto incorporou clarificações e abriu espaços, no âmbito da localização e autonomização jurídicas que, devidamente potenciados, poderão contribuir para legar a Macau, com perdurabilidade, as bases de um ordenamento jurídico de inspiração portuguesa, mas adaptado às realidades económicas, sociais e culturais do território.
Aliás, essa abertura na localização e autonomização foi de modo impressivo afirmado na última revisão da Constituição da República Portuguesa quando esta proclama que «o território de Macau dispõe de organização judiciária própria, dotada de autonomia e adaptada às suas especificidades, nos termos da lei, que deverá salvaguardar a independência dos juizes».
3 - O Estatuto Orgânico de Macau exprimiu, no entanto, e desde logo, a sua adesão, e referência, aos princípios nucleares da independência dos tribunais e a sua exclusiva sujeição à lei, a incumbência dos tribunais de assegurar a defesa dos interesses legalmente protegidos, reprimir a violação da legalidade e diminuir os conflitos de interesses públicos e privados, bem como a inamovibilidade e irresponsabilidade dos juizes.
Foi, do mesmo modo, reconhecida a autonomia do Ministério Público e estatuto próprio a fixar em lei.
4 - A elaboração da lei de bases do sistema judiciário de Macau foi atribuída pela Constituição da República, Portuguesa à Assembleia da República, a quem cabe, por isso, definir a matriz estruturante da organização judiciária autónoma do território. A iniciativa da proposta de lei do Governo insere-se, assim, como um primeiro passo, e decisivo, na institucionalização de uma nova ordem judiciária para o território, que se quer perdurável nos seus fundamentos e valores matriciais.
O exercício da competência da Assembleia da República na definição do acto fundador de uma organização judiciária autónoma aconselha, só por si, uma interacção criativa com os órgãos de governo próprio do território de Macau, de modo a harmonizar consistentemente os princípios da soberania com os da autonomia e reconhecimento das especificidades do território.
5 - No quadro descrito, a troca de informações e esclarecimentos entre a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República e a Assembleia Legislativa de Macau visa trazer ao debate um acervo de contribuições que aprofundem as condições da deliberação parlamentar.
Sem prejuízo da particular relevância institucional do contributo da Assembleia Legislativa ou do Governo do território, são também de ponderar todos os contributos credíveis que possam enformar o trabalho legislativo. E desde logo as contribuições dos magistrados judiciais, dos magistrados do Ministério Público e da Ordem dos Advogados do território de Macau.
6 - Como explicitamente afirma a exposição de motivos da proposta de lei n.º 161/V, «as políticas sectoriais do território de Macau não podem deixar de ter em conta a natureza e estrutura política que a região administrativa especial de Macau comportará a partir de 1999» devendo os modelos de organização judiciária «revestir-se da flexibilidade e capacidade de evolução» que lhes permita, a par-
tir daquela data, acolher as políticas fundamentais previstas na Declaração Conjunta.
Neste quadro, «a reformulação do sistema judiciário deve orientar-se por duas dominantes estratégicas: por um lado, a que resulta da ordem jurídica que vigora no território; por outro, a que emerge do estatuto previsto para depois de 1999. Deverão, assim também, ter-se presentes as variáveis que o período de transição e o período que depois se lhe seguirá reclamam e as que, em qualquer caso, são próprias da plasticidade de qualquer sistema.»

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7 - Como é referido em IV do anexo I da Declaração Conjunta, relativamente à futura região administrativa especial de Macau (RAEM) serão salvaguardados os seguintes princípios e instituições:

O poder judicial será atribuído aos tribunais;
Existência de um tribunal de última instância na RAEM;
Consagração da independência dos tribunais no exercício do poder judicial e exclusiva sujeição à lei;
Respeito pelas imunidades dos juizes inerente ao exercício das suas funções;
Nomeação dos juizes dos tribunais da RAEM pelo chefe do executivo, sob proposta de uma comissão independente (integrada por juizes, advogados e personalidades de relevo locais) e na base de critérios de qualificação profissional;
Garantia de inamovibilidade dos juizes;
Afirmação da independência do Ministério Público (Procuradoria da RAEM) e do exercício das funções jurisdicionais que a lei lhe atribuir livres de qualquer interferência;
Manutenção do sistema vigente em Macau de nomeação e afastamento dos funcionários judiciais;
Possibilidade de estabelecimento de regras próprias, atenta a situação anteriormente vigente, para o exercício da advocacia.

8 - A proposta de lei n.º 16 l/V quer-se um diploma de bases com uma capacidade evolutiva, e suficiente plasticidade, para se ir adequando na sua concretização, e daí o deixar «propositadamente em aberto questões organizativas de significativo espectro».
Dos princípios enunciados e das soluções concretizadas no diploma recorta-se a consagração de uma organização judiciária própria que, no período de transição, garantiria a unidade do direito, com a possibilidade de recurso para os tribunais superiores da República, a consagração de uma autonomia judiciária no quadro da integração da comunidade jurídica de Macau na ordem jurídica portuguesa, uma solução de fiscalização financeira assente na existência de um tribunal de contas, na lógica da nossa tradição fiscalizadora, em detrimento de um eventual órgão independente especializado.
A ideia de um recurso de amparo para o Tribunal Superior de Justiça e uma solução de grande alcance e rasgo que consubstancia institucionalmente a salvaguarda dos direitos fundamentais contidos no Estatuto Orgânico, os quais são, naturalmente, e desde logo, os direitos, liberdades e garantias consagrados pela Constituição da República.
Garante-se, deste modo, a efectivação do direito no que se refere à protecção jurisdicional ampla dos direitos fundamentais, não só pela criação de condições institucionais legais, mas, ainda, pela valorização e reforço que a acção jurisprudencial induzirá.
9 - Na nomeação de magistrados o diploma aponta para uma lógica evolutiva que se referencia aos princípios da isenção, transparência e democraticidade e à inspiração do modelo previsto para a futura região administrativa especial. A essa mesma lógica se reportam, segundo a exposição de motivos, as normas respeitantes aos juizes, assessores e auditores judiciais.
É salvaguardada a autonomia do Ministério Público.
O sistema que vigora na República é tido como subsidiário e reserva de soluções e opções a que se reconduzirão as concretizações que a aplicação deste diploma poderá, eventualmente, suscitar.
10-A proposta de lei n.º 161/V mereceu análise da Assembleia Legislativa de Macau e a emissão de um parecer, aprovado por unanimidade, e enviado à Assembleia da República em 11 de Outubro último.
As preocupações dominantes da Assembleia Legislativa sintetizam-se na necessidade de «caminhar mais decididamente no sentido da autonomia judiciária de Macau», donde decorre um significativo conjunto de sugestões que se reproduzem na integra:
10.1-A explicitação de princípios gerais insusceptíveis de alteração por leis regulamentares, tais como a independência dos tribunais, a inamovibilidade dos juizes, a função do Ministério Público, as incompatibilidades dos magistrados, a necessidade de fundamentação das decisões judiciais e sua execução, a proibição de criação de tribunais especiais, o acesso ao direito e à justiça, a garantia de intervenção de tribunal colectivo e de juizes togados;
10.2 - A eliminação de remissões para leis da República e sua substituição pela adopção do conteúdo, no próprio articulado da lei, das normas para que se remete na proposta, ajustando-o às especificidades, realidades e necessidades do território;
10.3 -A integração de magistrados judiciais e do Ministério Público em quadros locais, de acordo com critérios objectivos de qualificação profissional:
10.4 - A instituição de uma entidade independente e autónoma dotada de profissionais especializados que possam com eficácia acompanhar criticamente e em permanência a gestão financeira da receita e do gasto público, em alternativa à solução preconizada na proposta de jurisdicionalizar a mera apreciação das despesas em função da sua conformidade com as normas que as autorizam;
10.5 - A flexibilidade de preceitos relacionados com a evolução do sistema, de modo a permitir uma optimização de meios, em substituição de esquemas rígidos de fixação de quadros de magistrados, bem como da imposição de criação imediata de tribunais de jurisdição especializada que poderão não se justificar num futuro próximo:
10.6 - A relegação de matérias conjunturais para legislação complementar, como a fixação dos quadros dos magistrados judiciais e do Ministério Público, vencimentos e outras formas de remuneração, regime de férias e licenças;
10.7 - A afirmação do princípio de que os vencimentos e outras remunerações dos magistrados devem ser estabelecidos pela Assembleia Legislativa de Macau, na óptica do equilíbrio geral da remuneração dos quadros locais, conforme lhe comete o Estatuto Orgânico;
10.8 - A referencia expressa aos mandatários judiciais, tal como sucede na Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais e como se aponta na Declaração Conjunta;

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10.9 - A adopção de uma solução equilibrada, de pendor local, quanto à criação de um único conselho judiciário, evitando a governamentalização da justiça, em substituição dos dois conselhos previstos na proposta;
10.10 - A substituição da fórmula preconizada para a definição da situação dos magistrados actualmente colocados em Macau, de modo a permitir-lhes a opção pelos quadros locais e a compatibilizar o termo das respectivas comissões de serviço com os interesses do território e com as suas próprias conveniências pessoais e familiares;
10.11-A reconsideração da norma relativa ao início de vigência e o estabelecimento de disposições transitórias que resultem da eventual aceitação das sugestões acima preconizadas.
11-Do exposto conclui-se que a proposta de lei n.º 161/V está em condições de subir a Plenário para debate na generalidade.
As soluções que se fixarem no debate na especialidade ganharão, por certo, uma maior e definitiva consistência, após a apreciação dos diversos contributos para a melhoria da lei, nomeadamente da parte da Assembleia Legislativa de Macau.

Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça (Laborinho Lúcio): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao regressar ao Plenário da Assembleia da República, ainda nos primeiros passos da última sessão legislativa desta Legislatura, seja-me permitido que renove os meus cumprimentos a VV. Ex.as e que, na pessoa de todos vós, saúde o povo português, que tendes por missão representar, formulando votos para que a convivência democrática entre nós estabelecida, alicerçada num diálogo crítico e num debate leal e transparente, possa prosseguir na busca das soluções mais adequadas ao funcionamento do Estado e na realização dos legítimos interesses dos cidadãos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Veio a Lei Constitucional n.º 1/89, inovando, determinar a actual redacção do n.º 5 do artigo 292.º da Constituição da República Portuguesa, por força do qual «o território de Macau dispõe de organização judiciária própria, dotada de autonomia e adaptada às suas especificidades, nos termos da lei, que deverá salvaguardar o princípio da independência dos juizes».
Nessa linha, entretanto, a Lei n.º 13/90, de 10 de Maio, alterando o Estatuto Orgânico de Macau, aditou ao princípio ali definido a permissibilidade de «ruptura na regra da integração dos tribunais de Macau na estrutura judicial da República Portuguesa», remetendo para a Assembleia da República a definição das bases do sistema judiciário a vigorar ali.
Cumpria, pois, elaborar a correspondente proposta de lei a submeter à discussão e aprovação parlamentares, o que agora ocorre, em tempo útil, dadas as exigências de um presente, aqui mais do que em qualquer outra circunstância, marcado pelo desenho de um futuro antecipadamente conhecido, mas, simultaneamente, no tempo possível, tendo em vista a necessidade de uma reflexão séria e aprofundada sobre o objecto a regulamentar, ele próprio de inequívoco sentido nacional.
Com efeito, havia que compatibilizar o diploma agora em debate com «princípios e valores próprios do ordenamento jurídico de Macau» e, bem assim, com «os traços característicos das instituições do território e as suas relações interorgânicas», colhendo um perfil institucional, quer na sua feição jurídica, quer no seu teor sociológico, à luz do qual fosse possível conceber e moldar o quadro organizativo que agora se propõe.
Foi assim que, retirando do espírito do anexo II à Declaração Conjunta do Governo da República Portuguesa e do Governo da República Popular da China sobre a questão de Macau a intenção de proporcionar condições que possibilitem uma transferência de poderes sem soluções de continuidade ou rupturas, se optou por revestir os modelos próprios da administração judiciária de flexibilidade e de capacidade de evolução, por forma a permitir-lhes, em 1999, assumir as políticas fundamentais previstas na Declaração Conjunta.
São, pois, factores de flexibilidade e de evolução os que pautam agora o texto que substancia a presente proposta de lei, que, como alguém já disse, «mais do que uma reforma, se trata de uma reconversão do sistema, segundo uma dominante prospectiva, em que cada vector tem de incorporar variáveis e obedecer a uma lógica de evolução».
Entretanto, como linha de rumo, balizando o espaço para a concepção do sistema, o anexo I à Declaração Conjunta definiu princípios e normas de organização relativas à futura região administrativa especial de Macau, nomeadamente: a atribuição aos seus tribunais do poder judicial da região administrativa; o exercício, pelo tribunal de última instância da região, do poder de julgamento, aí, em última instância; a independência dos tribunais e o estabelecimento, para os juizes, de imunidades apropriadas ao exercício das suas funções: a nomeação dos juizes pelo chefe do executivo, sob proposta de uma comissão independente a integrar por juizes, advogados e personalidades de relevo e com recurso a critérios de qualificação profissional; o afastamento dos juizes apenas com fundamento em incapacidade para o exercício das suas funções ou por conduta incompatível com o desempenho do cargo; a garantia de que o Ministério Público desempenhará as suas funções com independência e livre de qualquer interferência.
Por tudo isto, além das especificidades culturais gerais próprias do território, importava tomar como condicionantes da reformulação do sistema judiciário de Macau tanto a marca da ordem jurídica aí em vigor como a que resulta do estatuto previsto para depois de 1999, sempre numa perspectiva de variabilidade e de plasticidade que, sem pôr em causa a segurança dos mecanismos de transição, antes lhes conferisse a necessária adaptabilidade ao conjunto das mudanças a operar e cuja dinâmica se adivinha intensa.
Neste contexto se entendeu conferir à lei de bases da organização judiciária de Macau uma estrutura aberta, quer na sua relação com o presente, apelando para uma actividade de natureza regulamentar que se lhe seguirá e que lhe dará completude imediata, quer na sua projecção no futuro, onde ela mesma haverá que evoluir, recebendo gradualmente as aquisições do próprio ordenamento jurídico do território e integrando-as, então originariamente, no seu conteúdo.
Entretanto, porém, nada aconselha a que se decida diferentemente lendo, sobretudo, em conta a incoerência, a desactualização e a falta de harmonia que caracterizam (...)

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(...)ainda grande parte de sistema jurídico de Macau, cuja estabilização é condição indispensável à edificação de um sistema judiciário também ele estável, dada a natureza instrumental que, em última análisse, terá de se lhe reconhecer
Dir-se-á, assim, que entre a lei agora proposta e a formulação definitiva e acabada da moldura legal que enquadre o sistema judiciário de Macau, haverá que preparar-se todo um direito próprio da região para a transição, que, além do mais, venha a reter-se como matriz originária do sistema judiciário do território, então a fixar em termos definitivos.
De todo o modo, e a despeito disso, não só se garante, agora e já, a necessária estabilidade imediata, como se afirma claramente a autonomia requerida, ficando estabelecidas regras que não apenas asseguram a genuinidade democrática do sistema, como também a sua eficácia instrumental relativamente à ordem jurídica em que a lei vai operar.
Tomando em concreto e exemplificativamente algumas das soluções propostas, notar-se-á que ao mesmo tempo que se enunciam princípios que afirmam a autonomia da organização judiciária de Macau, definem o âmbito da função jurisdicional e estabelecem garantias de independência dos tribunais, também se acolhe a solução de regular matérias fundamentais, como sejam as que se prendem com a competência dos vários órgãos, fazendo-o por remissão para as normas correspondentes da organização judiciária da República, obedecendo aí à noção de que, vindo embora a lei de bases instalar a autonomia do sistema no território, não pode a República perder o domínio da sua gestão, valendo a solução como regra de segurança no imediato enquanto, como se disse, se não estabiliza o conjunto que enformará a ordem jurídica global de Macau.
Do mesmo modo, a aplicação subsidiária do Estatuto dos Magistrados permite, antes de uma fixação originária nos diplomas próprios do território dos princípios e regras aí previstos, uma análise evolutiva e cuidada dos valores a estabelecer localmente, esses, sim, justificadamente recuperáveis em sede de diploma definitivo.
São ainda razões que simultaneamente se prendem com condicionantes de natureza cultural e com suportes de feição jurídica, que justificam soluções como a que se propõe na previsão de tribunais mistos, estes previstos como assumidamente carecidos de regulamentação.
No primeiro caso, optando-se pela criação do tribunal de contas rejeita-se a alternativa, também possível, da auditoria, já pela inexistência de tradição semelhante entre nós, já pela sua estrutura pesada, admissível em Hong-Kong, mas inadequável ao sistema de contabilidade pública de Macau.
No que respeita aos tribunais mistos, ao mesmo tempo que se tem por correcta a sua inclusão no quadro da organização judiciária de Macau, também se tem por prematura a sua definição mais rigorosa, devendo aí aguardar-se a conclusão dos estudos de campo em curso a solicitação do próprio Governo de Macau e que fornecerão o contributo último para a sua mais adequada definição.
É também evolutiva de todo o processo que justifica tanto as normas relativas às nomeações dos magistrados como as que, se prendem com o regime de comissões de serviço e com o estatuto remuneratório respectivo.
Na verdade, não é a fixação ou localização indefinida dos magistrados oriundos dos quadros da República que se pretende, bem ao contrário, pelo que haverá que concluir-se serem as opções encontradas as que melhor se ajustam ao espírito real da transição.
Também por isso se não prevê o estabelecimento dos vencimentos e outras remunerações devidas aos magistrados pela Assembleia Legislativa de Macau, procedimento que, encontrando plena justificação no médio prazo, se não ajusta, por agora, à pertença daqueles aos quadros da República.
Duas notas se deixarão ainda, relativas à composição do Conselho Judiciário de Macau e aos poderes atribuídos ao Governador.
No primeiro caso, o conselho judiciário surge como um verdadeiro embrião para a transição, por isso se justificando a não inclusão, entre os seus membros, e antes de os tribunais do território serem investidos na plenitude e exclusividade da jurisdição, de magistrados de 1.ª instância, sempre em obediência ao propósito de não fixar os quadros da República em Macau.
Finalmente, tem-se por acertada a previsão dos poderes atribuídos ao Governador não apenas pela imposição das regras definidas na Declaração Conjunta, que cumpre respeitar, mas também pela natureza atribuída àqueles poderes, claramente vinculados e não discricionários, o que, na economia global do diploma, deixa salvaguardada a independência dos magistrados, garante a separação efectiva dos poderes político e judicial e não atinge a imparcialidade da função judicial, não sendo, por isso, legítimo falar de «governamentalização» da justiça.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na sua essência, a presente proposta de lei constitui um documento temporalmente oportuno, suficientemente explícito nos propósitos vinculados que previamente o determinaram e indubitavelmente aberto e flexível de modo a construir-se progressivamente, no seu trajecto, que corresponde afinal ao percurso da transição.
E ele, por outro lado, um documento essencial, com vocação histórica e de relevo nacional indesmentível, pelo que, porventura mais do que em tantos outros, aqui se justifica procurar-se um consenso amplo, tributário de discussão alargada que a todos motive.
Por isso que à profunda convicção por parte do Governo quanto à bondade dos princípios fundamentais que o enformam e das soluções estruturais a que chegou corresponde igual abertura ao prosseguimento da sua reflexão na especialidade onde outros possíveis contributos venham ainda valorizá-lo mais.
Será disso, eventualmente, um bom exemplo o artigo 32.º aqui proposto, cuja fórmula se aceitou na pressuposição da sua resultante consensual no território, mas que agora se sabe não colher a generalizada concordância anteriormente anunciada, nada obstando, por isso, à sua reapreciação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como quer que seja, o importante não será apenas que esta se tenha como uma boa lei, mas que pelo seu significado ela seja, realmente, uma lei de todos nós.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente:-Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Justiça: Em primeiro lugar, quero felicitar V. Ex.ª e o Governo pelo texto que hoje apresentam para apreciação nesta Câmara.

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Independentemente do mérito ou demérito do texto, que iremos analisar agora em Plenário e depois na comissão especializada, é prestado, a nível do Estado Português, um serviço patriótico que não pode deixar de reconhecer-se
Portugal está a preparar a sua retirada honrosa - e Deus queira que assim seja!-do território de Macau, deixando instituições e marcas profundas que podem perdurar para além do exercício da nossa soberania.
A este propósito, é com particular tristeza que digo que as coisas em relação à terra onde eu nasci, Goa, poderiam ter sido diferentes se há alguns anos atrás o Governo de então tivesse tido um comportamento deste género.
Apesar disso, ainda hoje vigora nessa terra o direito português nos seus institutos fundamentais, nomeadamente o direito de família, o direito das sucessões e parte do direito administrativo relativamente às comunidades aldeãs.
De facto, nessa altura não houve qualquer lei que garantisse a perduração e a aplicação do direito português naquele território, perdendo-se assim uma das oportunidades únicas para que nas costas do Índico, assim como agora relativamente às costas do Pacífico, se afirmasse plenamente a vitalidade de um direito moderno que as próprias populações, depois de quase 30 anos no exercício de soberania indiana, não esquecem e que fazem todo o possível -de acordo, aliás, com a própria vontade do Estado Indiano, que nunca quis combater essa vontade- para manter vivo o espírito de muitos dos seus princípios fundamentais.
Ora, isto é relevantíssimo, sabendo-se que a aplicação de um direito moderno é aceite no Oriente como uma manifestação cultural que nada tem a ver com o exercício de soberanias políticas diferentes - e aqui temos um exemplo claro de que a estruturação e a manutenção do direito moderno pode não ser -e não é!- contrário à transferência de soberanias.
Assim sendo, faremos tudo o que estiver ao nosso alcance para que esse direito se mantenha e para que a sua aplicação nos honre. Trata-se de um serviço que Portugal deve prestar a Macau, às populações locais e, acima de tudo, ao mundo! E, penso, não estou a ser exageradamente optimista, uma vez que o nosso direito é um dos melhores do mundo!
Sr. Ministro da Justiça, depois de o felicitar pela iniciativa que tomou -e penso que a Câmara também se felicita, pois vamos prestar um dos melhores serviços ao País, a Macau, e dar um exemplo da nossa economicidade do direito- quero colocar-lhe duas questões.
Em primeiro lugar, gostaria de saber por que razão é que na composição do Conselho Superior de Justiça de Macau não consta nenhum representante da Assembleia da República ou da Assembleia Legislativa de Macau, tudo se esgotando nos órgãos judiciários, nomeadamente num representante do Ministro da Justiça e numa personalidade designada pelo Presidente da República.
Resumindo, a minha pergunta é a seguinte: por que não faz parte desse Conselho Superior de Justiça de Macau um representante da Assembleia da República e um representante da Assembleia Legislativa de Macau?
Em segundo lugar, quero perguntar a V. Ex.ª -e a originalidade não é minha, pois esta é uma das queixas do Ministério Público de Macau- por que razão é que muitos dos preceitos constitucionais, como, por exemplo, a solidez das decisões, a publicidade das audiências, a proibição de constituição de tribunais especiais, a proibição de desaforamento, etc., não foram vertidos nesta lei
de bases, uma vez que, deixando de vigorar em Macau, no termo da nossa soberania, a Constituição Portuguesa poderá haver dúvidas -como já houve em relação à Lei Orgânica- sobre se alguns dos preceitos constitucionais estarão imanentes no espírito desta lei de bases. Não seria melhor vertê-los expressamente nesta lei?
Gostaria, pois, de saber se se tratou de uma opção ou se V. Ex.ª pensou que, sendo os princípios fundamentais basilares, não era preciso fazer isso. Esta é uma crítica do Ministério Público de Macau que me pareceu pertinente, à qual gostaria que o Sr. Ministro me respondesse.

O Sr. Presidente:-Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Se o Sr. Deputado me permitir, inverterei a ordem das questões que me colocou, porque a resposta à primeira permite também desenvolver um pouco mais, embora rapidamente, a ideia dos grandes princípios que presidiram à elaboração deste diploma.
Como tive ocasião de dizer na exposição anterior, o que se pretende, sobretudo, não é fixar, hoje e definitivamente, o sistema judiciário de Macau, mas, sim, estabelecer um processo que, no fundo, incorporará, se se quiser, três grandes fases.
A primeira, em que se aprovará e publicará a lei de bases do sistema judiciário de Macau, que é, como referi, uma lei aberta e, portanto, capaz de se autoconstruir ao longo do processo de transição; a segunda, que deve seguir-se imediatamente, é a da reconstrução de todo o sistema jurídico de Macau; a terceira, que, em certo sentido, será concomitante com esta na parte final, será a da construção definitiva do sistema judiciário de Macau.
É justamente este balanço de três fases sucessivas que, no fundo, justifica, na perspectiva do Governo, que se tenham tomado as opções que aqui se verificaram, quer, por um lado, o facto da atribuição da maioria das competências aos órgãos do território, por remissão para a legislação da República, quer, nomeadamente neste domínio, a não explicitação clara de alguns princípios tidos por nós, já hoje, como fundamentais e constantes do sistema jurídico que informa a organização judiciária portuguesa.
Isto porque nos pareceu sempre que era fundamental, neste momento, não fixar já, de uma forma clara e definitiva, num diploma próprio da região, um conjunto de princípios que, sendo para nós claramente assentes e assimilados, todavia, poderão ter de passar por uma análise pontual de natureza cultural mais antropológica, que nos permita ver até que ponto algumas nuances devem ser introduzidas, justamente porque se trata da fixação de um sistema que vai ficar na região e que vai perdurar no tempo. Assim o esperamos!
Não se trata, por isso, de uma leitura a contrario sensu como V. Ex.ª sabe hoje já em crise no domínio da metodologia jurídica, que nos permita concluir que o facto de não estar previsto significa que se deixou cair e que, portanto, não é fundamental que assim aconteça. Dar-lhe-ia apenas um exemplo: é para nós hoje claramente inequívoco que não deve ser permitido o desaforamento. É evidente que não passaria, obviamente, pela intenção do Governo propor algum dia para o País o regresso à permissibilidade do desaforamento, mas, por exemplo, em Hong-Kong o desaforamento é possível.
A questão está em saber até que ponto essa possibilidade que se verifica em Hong-Kong tem mais a ver com razões de filosofia-e, nessa altura, avançaremos clara-(...)

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(...)mente para a sua proibição - ou se, pelo contrário, tem mais a ver com razões pontuais concretas que devemos, do ponto de vista cultural local, conhecer mais profundamente para, depois e de uma vez por todas, assumir a posição que entendermos dever ser aquela que mais honra a República Portuguesa, por um lado, mas que tenha também mais exequibilidade no território, por outro.
São, no fundo, perspectivas desta natureza que levam, por um lado, à remissão para a legislação actualmente em vigor na República em alguns aspectos que são essenciais ao conteúdo do próprio diploma e, por outro, ao não estabelecimento, claro já neste momento, daquilo que, no fundo, constitui o património essencial da democracia do sistema judiciário português para a República.
Relativamente à constituição do conselho superior de justiça, ele não pode ser visto sem se compaginar com a filosofia que presidiu à criação e à constituição do conselho superior judiciário, porque, no fundo, temos, neste momento, um Conselho Superior de Justiça a ser alterado progressivamente, visto que é o conselho superior judiciário que constitui, neste diploma, o verdadeiro embrião para a transição.
Portanto, é naquele Conselho Superior Judiciário que progressivamente as instituições judiciárias vão encontrar o seu tecto.
O conselho superior de justiça tem claramente, neste momento, uma perspectiva de transição, podendo, eventualmente, vir a ser recuperado em definitivo numa fase final da organização judiciária, mas, neste momento, não o tem, e surge muito mais como uma instância tutelar e de recurso dentro do sistema judiciário do que propriamente o Conselho Superior Judiciário, esse, sim, com a projecção para vir a ser o grande órgão superior do sistema judiciário, e para aí, como V. Ex.ª sabe, estão previstos dois representantes da Assembleia Legislativa de Macau.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo chegou tarde e a más horas, mas lá chegou.
Aliás, em matéria de leis importantes para a República este Governo tem sido relapso, e já não vale a pena lembrar a sistemática e persistente inconstitucionalidade por omissão, que se mantém ao nível da protecção dos direitos do cidadão face à informática, pelo atraso de um ano face ao nosso projecto e de cinco meses desde o debate na generalidade. A Constituição da República não é, efectivamente, cumprida por este Governo em muitos domínios.
Pelo menos desde a aprovação das alterações ao Estatuto Orgânico de Macau, em 17 de Abril de 1990, o Governo tinha obrigação de apresentar a proposta de lei da organização judiciária de Macau.
Seis meses de atraso, isto é, meio ano, é particularmente grave numa situação para cuja institucionalização efectiva apenas temos nove anos.
O PS chamou várias vezes a atenção, nesta Assembleia, para o debate desta matéria e para a urgência da concretização da lei de bases da organização judiciária, pois cada dia que passa é um dia a menos na sua institucionalização. Ou, dito por outras palavras, cada dia que passa, ficando tudo como dantes, significa pilhar um dia ao futuro institucionalizado pela sedimentação autónoma das regras e órgãos de justiça portuguesa e da sua cultura.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo não tem assumido a urgência e a importância desta questão nacional. A lei de bases da organização judiciária é, provavelmente, o último grande passo que a República tem de dar para institucionalizar uma vida e um sistema jurídico feito a partir de Macau.
Isto sem prejuízo, obviamente, da competência que cabe ao Presidente da República, ouvido o Conselho de Estado e o Governo, na determinação do momento a partir do qual os tribunais de Macau serão investidos na plenitude e exclusividade da jurisdição, nos termos do Estatuto Orgânico.
A organização judiciária a criar tem de funcionar correctamente, sedimentar-se na sua localização e ser suficientemente testada e adaptada de modo que constitua um legado cultural ético e institucional pendurável em Macau. Não há tempo a perder, para além do já perdido.
O direito e a organização da justiça na sua apreensão, salvaguarda e defesa dos valores universalistas e das regras de igualdade dos cidadãos são, porventura, um legado maior, senão o maior legado, que os Portugueses podem deixar ao futuro de Macau e ao encontro da cultura chinesa moderna.
A elaboração da lei de bases do sistema judiciário de Macau e atribuída pela Constituição da República à Assembleia da República, a quem cabe, por isso, definir a matriz estruturante da organização judiciária autónoma do território.
O exercício dessa competência na definição do acto fundador de uma organização judiciária autónoma aconselha, por isso, uma interacção criativa e consistente com os órgãos de governo próprios do território de Macau, de modo a harmonizar o princípio da soberania com o princípio da autonomia.
A troca de informações e esclarecimentos entre a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República e a Assembleia Legislativa de Macau visa trazer ao debate um acervo de contribuições que aprofundem as condições da deliberação parlamentar.
Sem prejuízo da particular relevância institucional do contributo da Assembleia Legislativa do território ou do Governo do território, são também de ponderar, como nos diz o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, todos os contributos credíveis que possam enformar o trabalho legislativo. E, desde logo, as contribuições dos magistrados judiciais, do Ministério Público e da Associação dos Advogados de Macau.
Como justamente aponta a exposição de motivos da proposta de lei n.º 161/V, «as políticas sectoriais do território de Macau não podem deixar de ter em conta a natureza e estrutura política que a Região Administrativa Especial de Macau comportará a partir de 1999», devendo os modelos de organização judiciária «revestir-se da flexibilidade e capacidade de evolução» que lhes permita, a partir daquela data, acolher as políticas fundamentais previstas na Declaração Conjunta.
A proposta de lei pretende-se, assim, e também nesta base isso nos parece devidamente ajustado, um diploma de bases com uma capacidade evolutiva e suficiente plasticidade para se ir adequando na sua concretização, e daí o deixar-e bem- «propositadamente em aberto questões organizativas de significativo espectro» cujo desenvolvimento compete, nos termos do Estatuto, ao Governador do território, em exclusivo.

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Dos princípios enunciados e das soluções concretizadas no diploma recorta-se a consagração de uma organização judiciária própria que, no período de transição, garantirá a unidade do direito, com a possibilidade de recurso para os tribunais superiores da República.
Esta perspectiva aponta para a consagração de uma autonomia judiciária no quadro da integração da comunidade jurídica de Macau na ordem jurídica portuguesa, com o que concordamos.
Uma solução de fiscalização financeira assente na existência de um tribunal de contas, na lógica da nossa tradição fiscalizadora, é solução que, no entanto, deverá merecer atenta ponderação na especialidade, isto sem prejuízo das regras de isenção, imparcialidade e transparência no controlo dos gastos públicos, para que a proposta necessariamente aponta.
A ideia de um recurso de amparo para o Tribunal Superior de Justiça e seguramente uma solução de grande alcance e rasgo que consubstancia, de modo efectivo e ao nível procedimental, a defesa institucional e a salvaguarda dos direitos fundamentais contidos no Estatuto Orgânico, os quais são, naturalmente e desde logo, os direitos, liberdades e garantias consagrados pela Constituição da República.
É garantida, deste modo, a efectivação do direito no que se refere à protecção jurisdicional ampla dos direitos fundamentais, não só pela criação de condições institucionais legais, mas, ainda, pela valorização e reforço a que a acção jurisprudencial induzirá. O défice procedimental que a nossa República tem neste domínio pode aqui ganhar inspiração. Oxalá que este Governo venha finalmente a aderir a soluções que são correctas e adequadas, em geral, cuja aplicação, infelizmente, recusou para o território português.

Vozes do PS:-Muito bem!

O Orador:-No que se refere à nomeação de magistrados, o diploma aponta para uma lógica evolutiva adequada que se referencia aos princípios da isenção, transparência e democraticidade e à inspiração do modelo previsto para a futura região administrativa especial. A essa mesma lógica se reportam, segundo a exposição de motivos, as normas respeitantes aos juizes, assessores e auditores judiciais.
Esta é, obviamente, uma matéria de particular incidência prática cuja precisão na especialidade tem de ser consistentemente alcançada (e o Sr. Ministro acabou de fazer referencia a soluções que têm de ser devidamente ponderadas), para garantir a necessária adequação entre as soluções normativas e institucionais e as pessoas que as realizam, dando-lhes vida.
É salvaguardada também na proposta a autonomia do Ministério Público
A importância do órgão institucional encarregado de defender a legalidade não merecerá, porventura, contestação, ao menos se nos espelharmos no seu papel insubstituível, como o prova a recente intervenção do Ministério Público, em Portugal, na defesa da legalidade. Neste particular não deixaremos de evidenciar com suficiente ênfase a isenção e dignidade das actuações recentes do procurador-geral da República, que vivamente saudamos, na defesa da legalidade democrática.
O sistema que vigora na República é lido como subsidiário e reserva de soluções e opções que se reconduzirão a concretizações de aplicação deste diploma, as quais poderão, eventualmente, suscitar uma melhor ponderação.
A ponderação dos contributos trazidos ao debate, na especialidade, quer pela Assembleia Legislativa, quer, eventualmente, pelo Governo no território, darão às soluções a criar um definitivo grau de consistência, densificação e aplicabilidade.
O contributo dos magistrados judiciais, do Ministério Público e dos advogados de Macau na sua esfera própria tem também um alto grau de interesse nas soluções de localização da justiça em Macau.
O Partido Socialista dá por isso, sem reservas, o seu voto favorável na generalidade à proposta de lei apresentada pelo Governo e espera dela, na sua versão final, um decisivo contributo para sedimentar, a partir de 1999, a existência de uma porta cultural aberta na Ásia e onde perdurem relações de diálogo, de civilização e de amizade entre Portugal e a China.
Isso é possível se Macau for encarado com um tempo e um lugar no destino português.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): -Sr. Deputado Alberto Martins, ouvi com muita atenção a sua intervenção e quero dizer-lhe que, logo no início das suas palavras, quase adivinhei o conteúdo da mesma. E digo isto por uma razão muito simples: V. Ex.ª adiantou um tipo de crítica que só se faz quando não se têm outras, isto é, disse que o Governo tinha atrasado a apresentação desta proposta de lei à Assembleia da República.
Isso foi o indício de que V. Ex.ª, em relação ao conteúdo da proposta de lei, pouco teria a criticar, e a sua intervenção, até ao fim, assim o confirmou.
Quero dizer-lhe que foi com muito agrado que o ouvi. Preferi muito mais ouvir essa crítica do que ter ouvido o Sr. Deputado dizer que o Governo se tinha precipitado e trazido um diploma mal preparado, mal ponderado, feito de costas voltadas para Macau, sem ter tido o cuidado de recolher as sensibilidades dos sectores ligados à justiça em Macau, porque essa, sim, seria a crítica de fundo que, certamente, V. Ex.ª gostaria de ter feito, mas que não fez, limitando-se apenas a referir o atraso na apresentação do diploma.
Assim sendo, esclareça-me se não preferiu fazer esta crítica em relação ao aspecto temporal do atraso do que fazê-la em relação ao conteúdo da proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Deputado Guilherme Silva, constato, com natural curiosidade, que o Governo não respondeu à lentidão da apresentação da proposta de lei e, por interposta pessoa, V. Ex.ª vem responder a essa lentidão. Este é o primeiro momento da resposta que lhe quero dar.
O segundo momento é óbvio. Confesso que considero e reconheço que o Governo não faz tudo mal. No entanto, faz muitas coisas mal, faz coisas mal em excesso, mas não faz tudo mal.
Esta é uma proposta com credibilidade, elaborada com consistência, mas é tardia, porque tem seis meses de atraso num prazo de nove anos. É isso que eu lamento, sem, no entanto, deixar de dizer que o PS dará o seu (...)

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(...)contributo, aquando da discussão na especialidade, à melhoria eventual da proposta de lei.
Permita-me que lhe diga que não trouxe esta crítica pela primeira vez. Ela já poderia ter resposta útil e em tempo oportuno se os deputados do PSD tivessem aceitado a proposta que apresentámos de uma convocação extraordinária do Plenário da Assembleia da República para discutir a proposta de lei, quando esta já estava elaborada, e, contudo, os senhores não quiseram, falhando, assim, em meses, a possibilidade de dar um contributo mais significativo para a resolução dos problemas de Macau.
Por isso, Sr. Deputado, reflicta na crítica que me fez, porque ela não tem sentido.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Permite-me que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado, pois, certamente, pretende fazer a autocrítica que eu, desde já, aceito!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Deputado, quero apenas esclarecê-lo de que não se tratou de um atraso de meses, mas apenas de dias.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente:-Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, solicito à Mesa a interrupção dos trabalhos por um período não superior a 30 minutos.

O Sr. Presidente:-Srs. Deputados, o pedido é regimental, pelo que vamos interromper a sessão ato às 17 horas e 25 minutos.
Está interrompida a sessão.

Eram 16 horas e 55 minutos.

Após a interrupção, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Manuela Aguiar.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, declaro reaberta a sessão.

Eram 17 horas e 45 minutos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD):-Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Muito do que a futura região administrativa especial de Macau será vai depender das garantias que forem instituídas e institucionalizadas em relação aos direitos, liberdades e estatuto dos seus habitantes.
O legislador constituinte percebeu isso mesmo, tendo lido o cuidado de introduzir na 2.ª revisão constitucional a garantia de que «o território de Macau dispõe de organização judiciária própria, dotada de autonomia e adaptada às suas especificidades, nos termos da lei, que deverá salvaguardar o princípio da independência dos juizes».
A introdução no texto da Constituição de uma norma deste tipo vem, aliás, na sequência da Declaração Conjunta Luso-Chinesa sobre Macau, nos termos da qual serão instituídos tribunais próprios da RAEM -região administrativa especial de Macau-, que «serão independentes no exercício do poder judicial, livres de qualquer interferência e apenas sujeitos à lei», gozando os juizes «das imunidades apropriadas ao exercício das suas funções».
Prevendo a existência de uma organização judiciária própria, a Declaração Conjunta não pretendia estabelecer mais do que as garantias próprias de uma ordem jurídica ainda em gestação, com características muito especiais resultantes do encontro entre o Oriente e o Ocidente, ou seja, segundo as palavras felizes do Sr. Deputado José Magalhães, entre «o novo e o velho, o passado e o futuro».
No essencial, o que se pretende garantir são «todos os direitos e liberdades dos habitantes e dos indivíduos de Macau, estipulados pelas leis previamente vigentes», que, de acordo com a própria Declaração Conjunta, vão desde as liberdades pessoais à liberdade de expressão e associação, do direito de deslocação ao direito à greve, passando pelo acesso ao direito e à justiça e o direito à propriedade privada.
E não podia ser de outra maneira, já que é a organização judiciária que constitui a garantia principal do respeito pelos direitos fundamentais.
Sendo assim, ela deve exprimir e reflectir as características de uma sociedade e os valores por que optou. Por outras palavras, a organização judiciária a criar deve ser a organização judiciária de Macau, e não a de Portugal ou a da China.
O que nos move e nos preocupa, hoje e aqui, é o objectivo tão simples e, ao mesmo tempo, tão difícil de concretizar de dotar Macau de «pernas» para andar por si próprio, isto é, de dotar o território de Macau de meios e de instrumentos para construir o seu futuro mantendo a sua individualidade.
A revisão do Estatuto Orgânico de Macau teve também esta preocupação fundamental ao reforçar os princípios da localização e da autonomização da ordem jurídica nova em construção.
Garantir os direitos fundamentais e a identidade própria da futura RAEM e, naturalmente, um objectivo que nos preocupa muito mais do que o de preservar a presença portuguesa.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta de lei apresentada pelo Governo reflecte todas estas preocupações.
Com efeito, o Governo reconhece que os modelos a instituir devem «revestir-se de flexibilidade e de capacidade de evolução que lhes permitam, em 1999, acolher políticas fundamentais previstas na Declaração Conjunta».
Trata-se, no fundo, de adaptar a ordem jurídica vigente no território de Macau aos princípios fundamentais estabelecidos para o futuro estatuto de Macau, após a transferência da soberania para a República Popular da China.
Se há dois adjectivos adequados para qualificar a proposta de lei relativa à organização judiciária de Macau - até na própria expressão do Governo-, eles são: «flexível» e «plástica».
O Governo preocupou-se, pois, fundamentalmente, em definir a espinha dorsal do sistema, acalentando a esperança de que, pelo menos, o essencial se mantenha.
Esqueceu-se, porém, de que nada serve a espinha sem ligações aos membros e que estes sem aquelas podem fazer de um indivíduo um inválido.

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O Governo teve medo e ficou-se pela enunciação dos princípios gerais, abstendo-se de toda e qualquer pormenorização, fosse ela necessária ou não à exequibilidade dos princípios e à solidez do sistema.
É, aliás, o próprio Governo a reconhecer que «deixa propositadamente em aberto questões organizativas de significativo espectro».
No entanto, o que nos parece preocupante e que não estão em causa apenas questões de índole meramente organizativa.
Na verdade, até ao nível da enunciação de princípios fundamentais, a proposta de lei peca por omissão.
A Assembleia Legislativa e a Procuradoria da República de Macau identificaram um manancial deles: a independência dos tribunais, a inamovibilidade dos juizes, o estatuto e função do Ministério Público, as incompatibilidades dos magistrados, a fundamentação das decisões judiciais, a obrigatoriedade das decisões dos tribunais, da publicidade das audiências, da constituição de tribunais especiais, do desaforamento e da coadjuvação obrigatória de outras entidades.
Por outro lado, o diploma deixa em aberto questões tão essenciais como a do acesso à justiça e o estatuto dos funcionários judiciais, já para não falar das competências dos tribunais.
É certo que a via regulamentar é a indicada para responder a muitas questões, na medida em que se pretende que seja o próprio território a encontrar as soluções mais adequadas; no entanto, esta preocupação não pode ser confundida com outras, como seja a de garantir um quadro fundamental de referencias, e é destas que tratamos.
É, de resto, a este nível que se coloca a questão de saber se não será preferível integrar na lei de bases da organização judiciária de Macau princípios e soluções importantes das leis da República, adaptando-as como se impõe, em vez de se remeter para elas.
A remissão pura e simples, ao invés do que se pretende, pode, de facto. determinar a rigidez do sistema.
Trata-se, no fundo, de definir qual a amplitude da lei de bases e, consequentemente, do grau de autonomia inicial da organização judiciária de Macau.
Por outras palavras, o quadro de referências indispensável ao período de transição e de adaptação é o que está definido na proposta de lei apresentada pelo Governo ou deverá ser mais amplo e mais consistente?
A Assembleia Legislativa de Macau, assim como outras entidades, já lixaram a sua posição: é preciso garantir uma certa flexibilidade, mas não à custa da omissão de questões fundamentais.
Outras entidades deverão ser ouvidas, mas estamos certos de que as suas observações não se desviarão muito das que já foram tornadas públicas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O PRD considera esta uma questão de Estado e de interesse nacional e recusa-se a dar a este debate o tom e o pretexto para quaisquer guerrilhas político-partidárias com aproveitamentos eleitoralistas.
Macau significa para Portugal o fim de uma era, mas queremos que signifique também o início de uma outra que privilegie o convívio e a cooperação fraterna com os outros povos.
Acima de tudo, é necessário que Macau fique como exemplo e referencia dos valores humanistas e universalistas neste mundo demasiado conflituoso e receoso das diferenças de culturas e de sistemas.
Mas, para que isso seja possível, é preciso assegurar que o povo de Macau se reveja e se sinta portador desses valores.
Por outras palavras, que ele seja um agente e o verdadeiro destinatário dessas mudanças.
Daí a importância dos contributos dos órgãos de governo próprios de Macau, nomeadamente da Assembleia Legislativa, e de todas as entidades e instituições a que este processo, de uma maneira ou de outra, mais ou menos, diz respeito.
Estamos certos de que a discussão na especialidade permitirá encontrar as soluções mais adequadas.
Num processo como este, não nos podemos permitir experiências nem dar passos em falso. O consenso é necessário, mesmo imprescindível.
Devemos isso a nós mesmos, devemos isso ao mundo e à população do Macau.

Aplausos do PRD.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O debate que hoje realizamos sobre o futuro de Macau no tocante à organização judiciária é, sem dúvida, oportuno e reveste-se do mais alto interesse para o nosso país, para o território que administramos e para o relacionamento de Portugal com a República Popular da China.
Três factores essenciais condicionam a nossa discussão: um excelente quadro geral de referência, uma má proposta governamental e uma metodologia inteiramente correcta de debate parlamentar.
O quadro de referência resulta da Declaração Conjunta Luso-Chinesa, da Constituição da República, na redacção aprovada pela 2.ª revisão constitucional, e das novas disposições do Estatuto Orgânico de Macau. O objectivo último é, todos o sabemos, criar um sistema judiciário próprio, autónomo e adaptado às especificidades locais, investido na plenitude e exclusividade da jurisdição. A sensatez e a solidez das traves mestras e a qualidade, ou falta dela, dos protagonistas ditarão o futuro desse sistema: extinguir-se daqui a nove anos ou perdurar para além do ano chave de 1999, beneficiando, então, da aplicação do princípio «um país, dois sistemas» e das garantias de que a futura região administrativa especial de Macau gozará de «poder judicial independente, incluindo o do julgamento em última instância» e da legitimidade do uso concomitante da língua portuguesa nos tribunais, tudo como se encontra previsto na Declaração Conjunta.
A nova organização judiciária é, pelo menos, tão essencial como a nova ponte, o novo porto ou o futuro aeroporto. Com esta agravante: e que é certo e seguro que essas obras, se erguidas, como é preciso, lá ficarão, mas para construir a que hoje temos entre mãos precisamos de muito mais do que pedras e betão. A argamassa necessária e, fundamentalmente, humana e logo política e cultural. Para que nasça do chão carece de boa sementeira e de muitos cuidados. Não se improvisa, nem medra em climas inquinados.
A nossa discussão não pode, por isso, ser um tema esotérico «para-técnicos - muito-técnicos», nem um regalo de lobbies empenhados - muito empenhados - na defesa dos seus interesses parcelares. O que está em causa (...)

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(...)é uma questão crucial para a opinião pública, para todos nós e para a população de Macau: é saber se em Macau vão existir ou não verdadeiros tribunais servidos por magistrados capazes de imporem o respeito pela lei, opondo-se, se necessário, aos contrapoderes, quaisquer que sejam, vigorosos na defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, eficazes no controlo da administração, suficientemente fortes para evitar que ela se transforme em «superpoder» violador da divisão de poderes e do primado do direito, não transparente, imune à crítica dos cidadãos e à fiscalização institucional. É isto que está hoje em debate, aqui, no preciso momento em que na República Popular da China se desenham os contornos da futura lei básica do território. Temos plena consciência disso e também das nossas responsabilidades legítimas e irrenunciáveis.
Em Maio, a Assembleia da República deliberou dar luz verde à realização pelos órgãos do território de reformas modernizadoras. Não se consagrou apenas uma política de localização legislativa. Foi-se muito mais longe e deu-se às leis locais uma ampla possibilidade de prevalência sobre as leis portuguesas.
É bom de ver que uma má judicatura pode distorcer ate aos limites da aberração um sistema em si mesmo justo e que, neste ponto, foi aprovado por unanimidade.
A nossa responsabilidade e, pois, a de construir velozmente uma ordem jurídica e um aparelho de justiça que obedeçam aos requisitos adequados e assim sejam aptos a sobreviver ao abrigo do parágrafo 4.º da Declaração Conjunta, concebidos em termos tais que legitimem e ajudem a impulsionar no futuro a assistência jurídica do Estado Português à Região Administrativa Especial de Macau e criem até condições para não tomar virtualmente improvável o convite a magistrados portugueses para exercerem funções no aparelho judicial então operativo, como admite a cláusula IV do anexo I à Declaração Conjunta.
Resumido assim o repto, desde logo avulta, Srs. Deputados, a modéstia e a imperfeição da base de trabalho consubstanciada na proposta de lei n.º 16 l/V.

Quanto à metodologia de apreciação parlamentar, proposta por nós -c aprovada por unanimidade, gostaria de sublinhá-lo-, consistiu em promover a mais ampla consulta até hoje realizada junto da comunidade jurídica de Macau. Quisemos ouvir todos e tudo com a máxima atenção para que a Assembleia da República possa ponderar soberanamente em função dos desígnios nacionais e dos nossos compromissos internacionais, decidindo em tempo com realismo, isenção e clareza.
Congratulamo-nos com o facto de o apelo à participação ter sido plenamente correspondido. Os pareceres emitidos pela Assembleia Legislativa, pelos magistrados, pelos advogados do Macau, são fortemente críticos em relação à proposta do Governo, mas -o que quer que se pense sobre eles- têm o valor democraticamente irrecusável do exprimir frontalmente e em letra de forma opiniões, argumentos e alternativas. Isso e tanto mais saudável quanto durante meses a incerteza, o secretismo, a intriga e o boato reinaram, enquanto, em mal identificados gabinetes ocidentais e orientais, se parturejavam sucessivas versões do texto que agora foi publicitado com plena transparência. Curiosamente, o Sr. Ministro da Justiça não aludiu a esses pareceres e a essas vozes, que, todavia, são relevantes!
A consulta agora realizada foi uma medida verdadeiramente estabilizadora, tão essencial para a criação de confiança como essa outra que ontem mesmo foi aprovada pela 3.ª Comissão, quando fixou um calendário e uma metodologia segura e transparente para o processo legislativo em curso: na próxima quarta-feira, audição do Sr. Procurador-Geral da República e do presidente do Tribunal de Contas; quinta-feira, diálogo com a Assembleia Legislativa de Macau; sexta-feira, reunião de trabalho com o Secretário-Adjunto da Justiça de Macau e, posteriormente, com o Sr. Ministro da Justiça, se este assim entender. As votações correspondentes deverão ter início e termo na semana seguinte. O atraso é tanto que só nos é consentido, Srs. Deputados, o tempo estritamente necessário para salvaguarda da prudência e segurança das soluções e para a superação de consideráveis dificuldades.
Digo «consideráveis dificuldades» com a certeza de pecar por defeito, porque são na verdade enormes. É a isto que gostaria agora de aludir.
Em primeiro lugar, sucede que essas dificuldades acabam de ser agravadas pelo Governo. Na verdade, representantes de Portugal, dependentes do Governo, aceitaram recentemente subscrever um protocolo, até hoje secreto, de criação de um grupo misto luso-chinês de acompanhamento permanente até 1999 dos problemas da administração da justiça em Macau.
É um compromisso de enormes implicações. É um compromisso de tão enormes implicações que não pode passar sem reparo: primeiro, que tenha sido assumido como foi; depois, que sobre ele o Governo não tenha dado de imediato explicações à Assembleia da República nem procedido a diligências prévias cautelares junto do Parlamento, através do ministro competente ou, quiçá, até através do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros; mais incompreensível ainda e que se mantenha silêncio hoje sobre a matéria, como se ela não tivesse operado uma alteração significativa do quadro em que a nova organização judiciária vai ser edificada e, logo, do quadro em que a decisão da Assembleia da República e do Presidente da República vão ter de ter lugar.
Por razões de Estado, e apenas por elas, queda-se aqui o reparo, mas não a exigência de clarificação na sede própria, essencial para que este processo não sofra bloqueamentos adiante, que teriam consequências gravíssimas.
Há que sublinhar, em segundo lugar, as difíceis condições que caracterizam o ponto de partida das reformas.
Um aparelho judicial cria-se para servir necessidades e elas não estão inventariadas, como acabou de reconhecer o Sr. Ministro da Justiça. Para funcionar bem, exige reformas de grandes códigos processuais e substantivos - e estas marcam passo por falta de adequados consensos num quadro político, em geral muito instável.
Faltam também os novos protagonistas do futuro sistema, adequadamente formados, bem qualificados, armados contra a corrupção, imunes à dependência económica e política, assim como o adequado ensino jurídico superior e médio, curricularmente adaptado.
Por outro lado, a esmagadora maioria daqueles a quem a justiça se dirige não falam português nem o entendem, falam chinês ou são mesmo cidadãos da República Popular da China. Pouco mais de uma dúzia de magistrados portugueses administram a parcela de jurisdição residual que não está a cargo dos tribunais sediados em Lisboa. Nenhum deles domina a língua chinesa. Não há um único magistrado local, pela origem, pela etnia, pela formação, nela vivência específica. Faltam os juristas bilingues. As traduções para chinês da legislação vigente dão os pri-(...)

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(...)meiros passos e tropeçam a cada momento em conflitos que de semânticos logo passam a políticos e de pequenos logo se convertem em factores de crise diplomática bloqueadora.
Acresce que subsistem na ordem jurídica de Macau velhos fósseis jurídicos herdados do século XIX português, relíquias ineptas, dificuldades inacreditáveis de determinação das leis vigentes (chega a ser necessário discutir, e muito seriamente, se a certos crimes de corrupção e aplicável o Código Penal vigente em Portugal ou a lei local, por exemplo; há, como aliás reconheceu o Sr. Ministro da Justiça, incoerência, falta de harmonização, para não dizer mesmo pior), o controlo judicial das finanças públicas é uma verdadeira aberração e a jurisdição constitucional uma raridade. Proliferam meios informais de resolução de litígios, formas brutais de justiça privada, é o mesmo que dizer injustiças motivadoras de escândalo público. Se a força pura ou a força da pataca puderem fazer fraca a forte lei, seguramente, Srs. Deputados, reduziriam a pó uma lei fraca.
Por isso é que temos de evitar que tal ocorra no caso vertente. Daí também o melindre das opções a tomar. Sobre essas opções deixo três brevíssimas notas.
Em primeiro lugar, a Constituição e o Estatuto Orgânico quiseram evitar dois perigos situados em pólos opostos: enjeitou-se, por um lado, a cópia mecânica do modelo organizativo que preside à estruturação e funcionamento dos tribunais portugueses, porque de nada, mas mesmo de nada, serviria o transplante -não medrariam em solo chinês figuras que até entre nós estiolam, como o Sr. Ministro da Justiça bem sabe, face à aplicação claudicante da nova organização judiciária-; vedou-se, por outro lado, a criação de estruturas que, pela sua dependência e falta de isenção, pudessem desmerecer o nome honrado e honroso de tribunais. A proposta do Governo tropeça entre uma coisa e outra, pelo que há que pô-la firmemente no ponto constitucionalmente desejado. É esse o nosso voto.
Em segundo lugar, trata-se de aprovar uma lei de bases, mas não a lei básica do território (disso todos temos consciência), nem uma lei de autorização em branco. As opções fulcrais hão-de primar pela nitidez e densidade do recorte, fidelidade a princípios constitucionais basilares, realismo, exequibilidade e flexibilidade. A lei serve para enquadrar uma transição para a autonomia plena, por isso mesmo deve distinguir claramente o ponto de partida, o ponto de chegada e o caminho de percurso.
Saliento apenas três implicações desta filosofia.
O Estatuto Orgânico prevê que o Presidente da República corte o «cordão umbilical» hoje existente entre o aparelho judicial local e os tribunais da Republica. A isto se tem chamado «comutação» - termo importado da linguagem eléctrica. Mas a norma tem uma redacção sibilina e tem sido mal interpretada. Não se trata de, no último minuto, nas vésperas de Dezembro de 1999, cortar a «energia» da rede judicial da República para só então passar a alimentar o sistema a partir de uma bateria completa de «geradores» judiciais locais. O Presidente da República tem o poder-dever de ir suprimindo progressivamente as restrições à plenitude e exclusividade da jurisdição dos tribunais de Macau, sucessiva e provavelmente por esta ordem: primeiro, os actos do governador e dos secretários-adjuntos em matéria fiscal, administrativa e aduaneira deverão deixar de ser julgados em Lisboa; segundo, deverão cessar as competências do plenário do Supremo Tribunal Administrativo; terceiro, perderá poderes o plenário do Supremo Tribunal de Justiça e o plenário das suas secções criminais; quarto, o Tribunal Constitucional começará por perder competências de fiscalização da legalidade e só por último deverá cessar as suas funções de fiscalização da constitucionalidade, garantia suprema do respeito pela ordem constitucional. Cabe à presente lei de bases precisar os critérios e prioridades da devolução de todos estes poderes, mas a proposta não o faz.
Outra característica de uma boa lei de bases é a de que deve balizar adequadamente o processo de regulamentação, desde logo respeitando as regras de divisão de poder entre órgãos do território. O artigo 37.º da proposta da lei, Srs. Deputados, reserva ao Governador a elaboração dos diplomas intercalares de adaptação das leis processuais vigentes no território. Sucede que, nos termos do Estatuto Orgânico, essa matéria é também da competência da Assembleia Legislativa de Macau. Sabendo-se que há, neste momento ainda, um conflito sobre essa matéria, a solução que o Governo propõe é, além de antiestatulária, politicamente muito imprudente, pelo que deve ser repensada.
Por outro lado, é preciso não esquecer que a lei deverá ser regulamentada por fases e em função de um quadro de necessidades que pode alterar-se muito e que vai exigir processos negociais complexos, lentos e incertos. A Assembleia da República deve ter esse factor em conta.
A terceira e última nota visa tão-só sublinhar que a proposta pode e deve ser prudentemente densificada quanto aos grandes princípios e revista profundamente quanto ao estatuto dos magistrados e auxiliares de justiça. As alternativas à técnica usada para delimitar as competências dos tribunais devem ser cuidadosamente testadas. Injustificáveis omissões devem ser colmatadas - no tocante à formação, aos requisitos e critérios de nomeação, aos direitos e deveres e garantias dos magistrados, ao recorte de certas categorias de tribunais, ao regime de exercício da advocacia, ao enquadramento das relações entre magistrados e funcionários, às condições técnicas e materiais de apoio. Devem, evidentemente, ser mantidos aspectos positivos como a aposta nos meios não jurisdicionais de composição de conflitos, o recurso de amparo para defesa de direitos fundamentais e a genuinidade de uma fiscalização financeira que combata a má gestão, o desperdício e a corrupção.
Srs. Deputados, sabemos o que há a fazer e o prazo de que dispomos. Tudo exige que vençamos o desafio de dotar Macau de uma organização judiciária aberta ao futuro.
Por tudo o que expus, o Grupo Parlamentar do PCP não pode votar favoravelmente esta proposta de lei, mas tal facto não só não diminui como intensifica o nosso empenhamento no êxito deste processo legislativo. Esse êxito é, sem duvida, um desígnio nacional, a que nos associamos de pleno.

Aplausos do PCP.

Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado José Magalhães, dada a importância desta matéria, V. Ex.ª (...)

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(...) falou aqui durante 15 minutos e 6 segundos. Eu, como pertenço a um grupo parlamentar muito pequeno, disponho apenas de seis minutos, dados pelo Regimento, para fazer uma intervenção. Ora, como realmente não posso falar sobre uma matéria tão importante em seis minutos, vou gastar esse tempo a perguntar-lhe duas ou três coisas muito importantes, que me parece que ficaram de fora da sua intervenção.
Portanto, o CDS não faz qualquer intervenção sobre esta matéria, não porque não tenha ideias mas porque não tem tempo.
Em primeiro lugar, gostaria de questionar o Sr. Deputado sobre algo que passou inteiramente ao lado da sua exposição - embora levemente o tenha aflorado-e que diz respeito ao direito local.
V. Ex.ª esteve no território de Macau e sabe que 90% da justiça passa ao lado dos tribunais, isto é, todo o direito civil da população chinesa, no que diz respeito ao direito das pessoas, ao direito da família, ao direito das sucessões, ao direito da propriedade, e regulado pelo direito local. O direito chinês, o direito cantonês, ou qualquer que elo seja, tem órgãos judiciais próprios, que não são reconhecidos pelo Estado Português como tais, mas que existem com uma estrutura e cuja justiça e decisões são acatadas pela colectividade e com força definitiva.
Esta lei não tem qualquer provisão para legitimar esta justiça chinesa.
No ultramar, este problema era normalmente resolvido através dos chamados «juizes municipais», em que o administrador do concelho investido em funções de juiz municipal, e assistido por dois assessores nativos, chancelava as decisões locais dos autóctones, desde que estas não fossem contrárias à ordem pública portuguesa. Se houvesse penas torturantes, penas indignas ou, por exemplo, práticas que o direito português julgava - e bem! - contrárias àquilo que a Constituição de 1933 clamava «contrárias aos dilames da Humanidade», o juiz português, nessa altura, podia cassar essa decisão e fazê-la substituir por outra.
Não vejo nesta organização judiciária qualquer mecanismo de afirmação da soberania. Sendo a administração da justiça um dos atributos da soberania e a sua legitimação feita, soberanamente, por juizes, estes continuarão a ser clandestinos, havendo uma justiça paralela muito maior no território de Macau à justiça legal, verdadeira, soberana...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, V. Ex.ª sabe que, regimentalmente, o tempo para pedir esclarecimentos é de três minutos.
Uma vez que o Sr. Deputado aludiu a esse ponto, queria lembrar-lhe que há pouco fez um pedido de esclarecimento de 6,6 minutos. Não lhe chamei a atenção no termo dos cinco minutos, porque nessa altura V. Ex.ª estava a trocar impressões com o Sr. Deputado.
Portanto, não e totalmente legítimo dizer que o CDS tinha seis minutos para uma intervenção. Teve, efectivamente, 13 minutos e agora gastou mais 3,4 minutos do seu tempo global. O Sr. Deputado poderá ir até aos cinco minutos, com as consequências inerentes ao facto.

O Orador: - Sr. Presidente, se com as duas perguntas que fiz gastei o meu tempo e se só me restam dois minutos, não tenho, como é evidente, tempo para fazer uma intervenção.

V. Ex.ª dirá que o Grupo Parlamentar do CDS, porque é pequeno, não deve fazer perguntas. É isto que é o Regimento!...
Como o Sr. Presidente tirou-me a palavra, talvez volte a perguntar qualquer coisa mais tarde.
Esta pergunta que fiz parece-me importante e gostaria de obter uma resposta do Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): -Sr. Deputado Narana Coissoró, a minha grande curiosidade era a de saber se o Governo se pronunciava ou não sobre as questões que suscitei, designadamente quanto à famosa questão do texto a que aludi e relativamente à qual nem o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, que, como é óbvio, não está aqui - e também não poderia vir num instante, num avião, para responder-nem o Sr. Ministro da Justiça ou, até mesmo, o Sr. Secretário de Estado, que responde a tudo (portanto, também poderia responder a isto), volun-tariaram qualquer esclarecimento institucional. Isso não aconteceu! É muito curioso!
A questão colocada pelo Sr. Deputado tem mais a ver com uma questão de especialidade e de filosofia do diploma. A lógica da revisão do Estatuto Orgânico de Macau, a lógica da localização, é a da produção modernizadora do máximo de leis que seja possível, adequadas às especificidades do território, com capacidade de perdurar para absorver e transformar as realidades locais, e não para alimentar uma separação, um «enconchamento», uma vivência dual em dois mundos, como o das colónias portuguesas no passado. Não é isso que se quer, mas precisamente o contrário! É por isso compreensível que o Estatuto Orgânico de Macau não tenha ido por aí e é por isso compreensível, e não surpreende, que a lei não vá por aí!
Agora, o silêncio do Governo, francamente, surpreende--me!...
Vão ser dadas explicações complementares pelo Deputado José Manuel Mendes, que ainda fará uma outra intervenção em nome da bancada, pelo que o Sr. Deputado Narana Coissoró ainda terá ocasião de fazer outras perguntas instrumentais para fruição da sua bancada.

O Sr. Presidente:-Para uma intervenção, está agora inscrito o Sr. Deputado Narana Coissoró, que dispõe de 2,8 minutos.
O Sr. Deputado quer fazer uma intervenção ou aguardar para pedir esclarecimentos, que é o que, aliás, tem feito até agora?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, é óbvio que, em relação a uma matéria tão importante como esta, não vou fazer uma intervenção de 2,8 minutos.
Talvez utilize esse tempo para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro, que, certamente, irá fazer um discurso de encerramento para responder a todas as questões que foram aqui colocadas. Nessa altura, usarei eventualmente da palavra.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Todos esta-(...)

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(...)mós conscientes de que legislar para Macau, nesta actual fase transitória do território, não é tarefa fácil. E se tivermos presente, neste momento, que esta proposta de lei se destina a regular a organização judiciária de Macau, teremos ainda maior consciência da dificuldade e do melindre das matérias que têm de ser contempladas neste diploma.
Daí que, naturalmente, o Governo tenha optado por não precipitar a apresentação de uma qualquer proposta de lei feita sobre os joelhos e trazida à Assembleia da República com rapidez, mas sem aprofundamento, sem maturação e reflexão, e tenha, efectivamente, adoptado a posição, que felizmente adoptou, de trazer um diploma muito bem pensado, muito reflectido e com soluções que contemplam as especificidades de Macau.
O Governo tem em vista - porque esse é também um outro aspecto que nesta legislação tem de ser tomado em conta - a circunstância de termos, face à Declaração Conjunta, a possibilidade de esta legislação vigorar para além do período transitório, quando o território de Macau passar para a soberania chinesa e for criada ali uma região administrativa especial com regime próprio.
Alguns Srs. Deputados que me antecederam levantaram alguma reserva e preocupação por esta legislação poder vir a ser mantida, pelo menos nos seus traços gerais, e dever e ser desejo nosso que assim seja, aquando da instauração da região administrativa especial de Macau, integrada na soberania chinesa.
O Sr. Ministro da Justiça disse aqui que esta não era, necessariamente, a lei de bases de organização judiciária do território de Macau intocável, até essa passagem, em 1999, para a administração chinesa.
Naturalmente que a própria aplicação desta lei de bases de organização judiciária e sua posterior regulamentação pelos órgãos de governo próprios do território de Macau dará elementos de reflexão já sobre o terreno, já sobre a sua própria execução, e, a seu tempo, serão introduzidas alterações, aí sim, já com a preocupação definitiva dessa fase que se seguirá à integração do território de Macau na soberania chinesa.
Este diploma surge por imperativo constitucional. O artigo 292.º, n.º 5 da Constituição estabelece que: «O território de Macau dispõe de organização judiciária própria, dotada de autonomia e adaptada às suas especificidades, nos termos da lei, que deverá salvaguardar o princípio da independência dos juizes».
Este diploma surge também por imperativo da Declaração Conjunta, que é, para todos os efeitos, um texto de direito internacional que vincula Portugal. É, pois, também em cumprimento dessa Declaração Conjunta que a proposta de lei de organização judiciária de Macau surge e é apresentada à Assembleia da República.
Mas o diploma surge ainda como imperativo ditado pelo próprio Estatuto Orgânico, que foi revisto na passada sessão legislativa da Assembleia da República e que contém também disposições que prevêem a criação de uma lei de bases de organização judiciária para Macau.
É ainda em cumprimento do Programa do Governo que esta proposta de lei aqui surge, na Assembleia da República. Efectivamente, no Programa do Governo afirma-se que um dos aspectos importantes da política externa que merecerá a sua especial atenção será a execução do acordo luso-chinês sobre Macau, procedendo-se, após ratificação parlamentar, à instauração dos mecanismos previstos no acordo para o período de transição.
É, pois, também em cumprimento deste imperativo do seu próprio Programa que o Governo traz à Assembleia da República a proposta de lei de bases da organização judiciária de Macau.
Foi aqui salientado pelo Sr. Ministro da Justiça - e consta exaustivamente da própria exposição de motivos do diploma - a filosofia, os princípios que o inspiram e as preocupações que veiculam no sentido de ser instaurada uma organização judiciária em Macau que garanta os direitos, liberdades e garantias não apenas neste período de transição mas, também, repito, para além do período em que Portugal manterá a administração do território.
Será, no entanto, interessante salientar alguns desses princípios: a atribuição do poder judicial a tribunais próprios; a localização no território de um tribunal de última instância; a independência dos tribunais e o estabelecimento de imunidades para os juizes; a nomeação dos juizes pelo chefe do executivo, sob proposta de uma comissão independente a integrar por juizes, advogados e personalidades de relevo e com recursos a critérios de qualificação profissional; o estabelecimento de prerrogativas de inamovibilidade; a garantia de que o Ministério Público desempenhará as suas funções com independência e livre de qualquer interferência; o recurso de amparo, que incide particularmente no âmbito dos direitos, liberdades e garantias; a instituição de um tribunal de contas, que garantirá a transparência por parte da Administração numa área tão sensível em qualquer parte, com especial particularidade naquele território.
Contrariamente ao que aqui se referiu, parece-me que o diploma não é, efectivamente, um mau diploma. Aliás, essa foi apenas uma opinião, isolada, do Sr. Deputado José Magalhães, que, com preocupações perfeitamente pertinentes relativas ao futuro do território de Macau e da sua população, extravasou largamente o âmbito deste diploma e levantou um leque de questões, que, obviamente, deverão merecer - e merecem, com certeza! - a atenção do Governo, mas não em sede desta lei de bases de organização judiciária.
A Assembleia da República tem a perfeita consciência da urgência que para o território de Macau este diploma representa e, nesse sentido - como também já aqui foi referido pelo Sr. Deputado José Magalhães - na 3.ª Comissão, onde foi elaborado e aprovado o relatório, da autoria do Sr. Deputado Alberto Martins, portanto ainda antes de o diploma baixar à Comissão para a discussão na especialidade, já foi calendarizada a audiência de várias entidades, designadamente representantes dos órgãos de governo próprios de Macau, membros da Assembleia Legislativa de Macau, o Sr. Secretário-Adjunto para a Justiça, bem como o Sr. Procurador-Geral e o Sr. Presidente do Tribunal de Contas. Isto para que sejam auscultadas as entidades que têm particular ligação a estas matérias e particular conhecimento sobre elas.
Há, portanto, uma conciliação da celeridade, por um lado, com o querer fazer, com a profundidade e a cautela necessária a esta discussão e aprovação na especialidade, numa fase posterior deste diploma, por outro.
Nesta mesma linha de preocupações, a respectiva comissão solicitou pareceres à Associação dos Advogados de Macau, aos Srs. Juizes de Macau, aos Srs. Magistrados do Ministério Público, que tiveram já o ensejo de enviar as suas pertinentes observações e o estudo sobre este diploma, que, naturalmente, a Comissão terá em conta aquando da discussão na especialidade.

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O próprio Sr. Ministro da Justiça, ainda há pouco, me referia a sua disponibilidade para, se necessário, vir, ele próprio, à Comissão para aí dar o seu contributo, acrescido àquele que já deu aquando da elaboração do próprio texto do diploma e da sua intervenção feita aqui, no Plenário.
Portanto, estamos conscientes de que o que está em causa é uma questão de Estado: a repercussão no futuro e as marcas que Portugal quer, necessariamente, deixar naquele território.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Mercê do acordo entre Portugal e a República Popular da China, consubstanciando em Declaração Conjunta dos governos dos dois Estados, o território de Macau encontra-se numa fase de transição e sob administração portuguesa até 20 de Dezembro de 1999, data em que a República Popular da China voltará a assumir o exercício da soberania sobre o que, então, passará a designar-se por Região Administrativa Especial de Macau.
A conjuntura que vive o território, a par de razões decorrentes da Declaração Conjunta, impuseram a necessidade de introduzir significativas alterações no seu Estatuto Orgânico e também a aprovação da lei de organização judiciária de Macau, agora em discussão.
Srs. Deputados, nestes próximos nove anos de administração portuguesa e posterior integração do território de Macau na República Popular da China, ainda que em regime administrativo especial, estarão em causa a sorte e o futuro de muitos milhares de pessoas que, portugueses ou não, têm de ver asseguradas as liberdades, direitos e garantias fundamentais, legado ético e moral de que, pelo seu cariz universal, o Estado Português não pode abdicar.
Por assim ser, da nossa parte, e na linha do que aconteceu já com a proposta de lei n.º 139/V, apresentada pela Assembleia Legislativa de Macau, que operou a alteração do Estatuto Orgânico daquele território, podemos adiantar que a Assembleia da República, sem prejuízo de algum pragmatismo que a situação específica e conjuntural de Macau impõe, não deixará de acautelar, mais uma vez, a salvaguarda dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos residentes em Macau.
O facto de, em conformidade com a Declaração Conjunta, após a integração do território na República Popular da China, «as leis, os decretos-leis, os regulamentos administrativos e demais actos normativos», previamente vigentes em Macau, manterem-se em vigor, salvo no que contrariar a lei básica e no que vier a ser objecto de emendas por parte do futuro órgão legislativo da região administrativa especial de Macau, impõe particular cuidado na elaboração legislativa de diplomas destinados a Macau, o que bem se reflecte no diploma em apreciação, sem prejuízo de alguma correcção na especialidade.
Não era pensável, nem viável, nem adequado, particularmente nesta fase transitória e revestindo Macau características específicas completamente distintas das que se registam em Portugal, que não pudesse dispor de uma organização judiciária própria e autónoma.
É a eficiência do Estado Português, enquanto administração, e a dignidade de Portugal, enquanto país, que estarão em causa em Macau não só nos próximos nove anos como também depois disso, face ao juízo que há-de sempre fazer-se do nosso comportamento, da obra, do exemplo, da cultura e da influência que lá tivermos deixado.
Macau, entre todos os territórios que estiveram sob administração ou tutela de Portugal, constitui, sem dúvida, uma excepção quanto à forma como nos estabelecemos e assumimos o papel de potência administrante.
Não se tratou, como é sabido, de uma conquista por mera força das armas, nem de uma ocupação visando submeter outras terras e outras gentes a poder estranho. A nossa presença legitimou-se em tratado ou acordo que alguns historiadores qualificam como espécie de «arrendamento perpétuo».
Tal circunstância deve constituir motivo bastante e razão histórica suficientemente estimulante para que, também, ao retirarmo-nos da administração do território, de forma pacífica e cordata, que a Declaração Conjunta e os instrumentos por ela criados garantem, o façamos com a dignidade exigida a um Estado-Nação secular que soube reconquistar, nos últimos anos, um prestígio perturbado por um interregno de má memória.
Não podemos esquecer-nos que este virar de página na história de Macau, em curso nos próximos nove anos, é também um virar de página da própria história de Portugal.
De todos os que tenham, neste período, responsabilidades no processo que conduzirá à cessação da administração portuguesa no território dependerá a forma como a história virá a registar o fim de uma presença activa de Portugal no Oriente, que tanto o fascinou e onde se manteve durante mais de cinco séculos, colhendo ensinamentos, valorizando e enriquecendo a cultura lusíada, mas também levando o profundo sentido humanitário do nosso povo, que tem caracterizado marcadamente a nossa forma de estar no mundo.
A proposta de lei n.º 161/V, além de decorrer do imperativo constitucional, insere-se neste conjunto de preocupações e trará a Macau uma organização judiciária capaz de, em período difícil e complexo, garantir a maior eficiência e rigor das instituições, pelo que merecerá o voto favorável do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata e a afirmação da total disponibilidade para, em sede de discussão na especialidade, ouvir os órgãos de governo próprios e entidades representativas dos sectores ligados à justiça e à vida judiciária e forense de Macau.

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Maia Nunes de Almeida.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Duas palavras que são, simultaneamente, de regozijo e de lamento. De regozijo, pelo modo geral como este debate decorreu; de lamento, por, pela votação anunciada, não termos podido colher o consenso que esta proposta de lei, por razões nacionais, obviamente procurava.
Fomos acusados de ter tardado no tempo a apresentação do diploma. Mas, aí, ou se legislava apressadamente e este Governo colhia o aplauso da oposição ou se legislava com rigor e este país colherá o aplauso da história.
Para nós, foi claro que era esta a opção que devia assumir-se e preferimos que um dia a história aplauda este país, independentemente de se saber qual o governo que (...)

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(...)produziu este diploma, do que, conjunturalmente, este Governo obter o aplauso da oposição por causa de um diploma que a história recusaria.

Aplausos do PSD.

É justamente por isso que não foi sem alguma perplexidade que ouvi a intervenção do Sr. Deputado José Magalhães. E se faço uma intervenção pessoalizada, é, obviamente, pelo respeito institucional que V. Ex.ª me merece.
Começou por dar, como símbolo do progresso físico da transição, o futuro aeroporto de Macau e eu esperei que o discurso de V. Ex.ª simbolizasse ou a segurança da aterragem ou o golpe de asa do voo acabado de levantar!...

Risos do PSD.

Afinal, vi-o reduzido mais ao oriental jet-foil, caracterizado, normalmente, por muita pressa e muita água, porque aquilo que resulta do discurso de V. Ex.ª é uma prévia definição da margem de partida e uma prévia definição da margem de chegada.
É importante chegar ao lado de lá depressa e dizer que se não votava a lei. Não importava a água do trajecto!
E para fundamentar a conclusão de que não votaria a lei, V. Ex.ª fala de um protocolo secreto, que não existe; fala de um conjunto de articulações, de harmonizações e de incoerências do sistema jurídico de Macau, que eu próprio referi, mas que, evidentemente, não cabe ao Governo da República corrigir. V. Ex.ª mistura causas próximas com causas remotas e com ausência de causas; constitui o percurso a partir desse conjunto - esse, sim, incoerente e desarmónico - de razões e pretende fazer crer que a incapacidade do Governo, não legislando onde não deve, e o secretismo do Governo, não manifestando o que não deve, acabam por ser razões perfeitamente espúrias para justificar a chegada à margem contrária e dizer que o grupo parlamentar que representa não vota a lei.
É pena que assim seja! É pena que o avião, esse sim, que esta proposta de lei consubstancia, ao aterrar em Macau, leve uma inclinação negativa por não transportar no seu bojo, representadamente, todo o povo português.

Vozes do PSD:-Muito bem!

Há, todavia, um aspecto importante: é que se, de facto, a actividade legislativa de Macau é, neste momento, fundamental, mas se não cabe ao Governo da República intervir directamente na sua elaboração, porque a questão é nacional e porque o facto de se tratar de uma questão nacional não significa que devamos ficar no discurso patriótico da afirmação mas na prática concreta da sua realização, o Governo da República está claramente disponível para colaborar com o governo do território nessa tarefa gigantesca de harmonizar, de tornar coerente e actual o sistema jurídico de Macau.
Por isso, essa manifestação é, simultaneamente, a demonstração de que, ao contrário do que foi dito pelo deputado que representou o Grupo Parlamentar do PRD, o Governo não demonstra medo em legislar.
O Governo legislou na perspectiva nacional da transição. O Governo não legislou partindo da ideia de que Macau é um pequeno Estado português mas, isso sim, partindo da ideia de que Macau tem uma estrutura cultural própria, está no processo dinâmico de transição, e é no sentido da história que a legislação pontual deve ser elaborada.
O Governo sentiu e percebeu isso, assumindo claramente que a lei de bases, que hoje apresenta para discussão, é um instrumento fundamental mas susceptível de mudança, portanto colocado no ritmo e na filosofia própria de qualquer processo sério de transição.
Por outro lado, o processo é dinâmico na velocidade que tem de se lhe imprimir, mas é também dinâmico na cultura que lhe subjaz. E se todos estamos claramente de acordo - e aqui espero que estejamos todos!-perante a ideia de que é fundamental que o traço cultural decisivo da cultura portuguesa perdure em Macau, também, porventura, todos estaremos de acordo com a ideia de que não podemos transportar para Macau as nossas soluções numa perspectiva chauvinista que, no fundo, se identifique com qualquer perversão etnocentrista, seja do ponto de vista cultural seja do ponto de vista judiciário.
Queremos um sistema que, culturalmente, arranque de uma raiz, que é nossa, mas que nos não leve a invadir o espaço cultural dos outros, onde o futuro se construirá permanentemente e onde, um dia, teríamos, como imagem de nós próprios, apenas uma tentativa canhestra e mal conseguida de impor, forçadamente, uma cultura que, como é óbvio, não seria aceite por aqueles que continuam a produzir a sua própria cultura, que é deles mesmos, e que têm, evidentemente, o direito democrático e cultural de prosseguir.
O importante era, pois, garantir um trajecto que mostre, sobretudo a Macau, e sobretudo à República Popular da China, que Portugal é um país e um povo sério, que tem uma dimensão ética que arranca de uma história de muitos séculos e que se projecta no tempo sempre em termos de universalidade de intervenção e de partilha de cultura, mas nunca numa, eventualmente considerada deslocada no tempo, tentativa de colonização espúria, no final do século.
Não é isso que está em causa. O que se propõe é que fiquemos abertos, em nome do traço cultural que tivemos o direito de transportar, evidentemente, à evolução cultural do povo chinês que, no fundo, aceitou, também ele, respeitar a dicotomia um Estado/dois sistemas. Para isso, esta lei é clara e inequivocamente uma boa lei.
Porque nós próprios entendemos que o debate tem de ser generalizado e que, não sendo ela uma lei definitiva, é susceptível de ser corrigida, aqui viemos claramente apresentá-la na generalidade e aqui abrimos imediatamente a possibilidade de a enriquecer na sua discussão na especialidade. Assim, gostaria de perceber politicamente, no verdadeiro sentido da dimensão ética da política, por que razão esta lei, nacional e histórica, não é aprovada por unanimidade.

Vozes do PSD:-Muito bem!

O Orador: - Não é que nos preocupe que o não seja nem que falte ao Governo legitimidade por não o ser. É que, no fundo, há um traço indelével, que arranca no início da nossa história e se projecta no futuro de sempre e que consiste em saber aquele momento exacto, aquele tal, que por isso mesmo é histórico, em que ou estamos todos do mesmo lado ou o lado das maiorias conseguidas é sempre um lado que permite brandir argumentos políticos de ocasião mas que não deixam no futuro uma imagem credível daquilo que somos enquanto gente.

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Esta, como vos propus, era uma lei vocacionada para ser uma lei de todos nós. Não é pelo facto de eventualmente haver quem assim não entenda que ela vai ficar na História como sendo apenas uma lei de alguns, porque tem a força suficiente, enquanto tal, para ser realmente a lei de todos. E é com essa ideia que o Governo certamente sairá hoje do Plenário.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PCP): Peço a palavra, Sr Presidente

O Sr. Presidente:-Para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, dados os termos da intervenção do Sr. Ministro da Justiça, peço a palavra para o exercício normal do direito de defesa.

O Sr. Presidente:-Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Ministro da Justiça, fiquei um tanto surpreendido com a intervenção de V. Ex.ª, embora muito honrado pelo facto de me ter abrangido em cerca de dois terços do seu conteúdo total, que foi, aliás, enxuto.
A sua intervenção surpreendeu-me, desde logo, por V. Ex.ª cometer o erro primário de confundir o princípio com o fim. De facto, quem tanto cogitou sobre porto de chegada e porto de partida, jet-foil e nau caravela quinhentista, foguetão e sei lá o quê, V. Ex.ª-de resto, jurista que é e parlamentar que se vai tornando - tinha o dever de não confundir a votação na generalidade com a votação final global e o mundo de esperança que há entre o cais de partida e o cais de chegada. Conquistem VV. Ex.as a nossa confiança para à chegada irmos todos! Mas, naturalmente, isso depende não apenas de nós mas também de vós, isto é, do facto de o vosso jet-foil não deitar demasiado óleo na água, pois a nossa preocupação, Sr. Ministro, e o óleo na água!
Em segundo lugar, Sr. Ministro, gostaria também que V. Ex.ª talvez reconsiderasse esse terrível jeu de mots, que é o de fazermos todos nós, uns dias uns e outros dias outros, de napoleões, com a ideia de «Entra V. Ex.ª na História!», bradando depois o outro «Não, nunca ficará na História!» e ainda respondendo o outro «Não, não, quem nunca ficará na História, mas nas masmorras da História, é V. Ex.ª, que é réu pela oposição!».

Não vale a pena, Sr. Ministro, entrarmos por esse caminho! Reconheça simplesmente o facto de a proposta vir criticadíssima.
Com efeito, a consulta feita ao território revelou um enorme somatório de interrogações. No colóquio feito, em Junho, no território - no qual, de resto, também participaram o Sr. Deputado Alberto Martins e outras pessoas, seguramente nem todas apostadas em cavar a destruição do Governo - encontrámos, preocupados, várias fragilidades, sendo certo que o que nos preocupava não era tanto o facto de demonstrar que o Governo é o pior de todos os governos do Mundo, embora o possa ser, mas sim encontrar na proposta brechas prejudiciais à realização dessa obra, que eu seria capaz de resumir, de facto, como V. Ex.ª o fez: «criar raízes que doem frutos localmente adaptados.» Perfeito, é isso!
O que estamos a dizer, Sr. Ministro, é que o tubérculo que VV. Ex.as aqui trazem corre o risco de, implantado em solo chinês, não dar essa árvore que nós desejaríamos, mas um resultado negativo. Foi nesse sentido que alertámos e foi esse todo o sentido da nossa intervenção.
O terceiro aspecto é o de V. Ex.ª ter dito aqui - e registamos - que não há protocolo nenhum. Repito: V. Ex.ª disse que não há protocolo nenhum. Com isso, V. Ex.ª assume uma responsabilidade institucional muito grande perante a Assembleia da República e o País, porque, se se vier a provar que há protocolo algum, seja um, dois ou até três -estou a lançar os números ao acaso-, então V. Ex.ª, por desinformação própria, terá incorrido, naturalmente, em responsabilidade perante a Assembleia da República, numa matéria que é de interesse nacional.
Sugiro, portanto, ao Sr. Ministro que, se é para ir por aí, a conversa fique por aqui, podendo continuar noutra sede, por razões de Estado.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado, uma vez que já esgotou os três minutos de que dispunha.

O Orador: - Então, Sr. Presidente, Srs. Deputados, a conversa continuará por outros meios e o Sr. Ministro da Justiça poderá ir à comissão conquistar o terço que falta para essa unanimidade tão desejada. Mas, para isso, teremos de discutir, ouvir e ponderar atentamente as dificuldades. Se elas forem resolvidas satisfatoriamente, terá o voto favorável do PCP, tal como aconteceu em relação ao Estatuto Orgânico.
E deixe essa questão da História, porque nós também lá estamos, sentados, como toda a gente. A questão é que seja bem.

Vozes do PCP:-Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Deputado José Magalhães, gostaria que não entrássemos, agora evidentemente pela minha parte, numa série de contra-ataques. E, friso, apenas estou a dizer que eu não vou fazer isso embora me pareça que V. Ex.ª tem de si, com certeza. a noção suficiente para perceber que um membro do Governo dispenda com V. Ex.ª dois terços da sua intervenção. Faço-o com a convicção de que com V. Ex.ª vale a pena dispender dois terços da intervenção de um membro do Governo. Fi-lo, por isso, com o maior prazer.
Por outro lado, há o jogo de palavras afirmativo e o jogo de palavras omissivo. Terei feito um jogo de palavras afirmativo com a História; V. Ex.ª fez porventura, porque não se terá apercebido disso, um jogo de palavras omissivo e colocou na minha boca a afirmação de que não há protocolo. A minha afirmação foi a de que não há protocolo secreto.

Vozes do PCP: - Mas há protocolo!

Vozes do PSD:-É claro!

O Orador: - É óbvio que há e que resulta, como V. Ex.ª disse, da própria declaração conjunta, não havendo, evidentemente, qualquer secretismo à volta dele.

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O Governo tem emitido comunicados sempre que o grupo de ligação funciona e esses comunicados são, portanto, do conhecimento...

O Sr. José Magalhães (PCP):-Não são do conhecimento da Assembleia, Sr. Ministro!

O Orador: -... quer relativamente à localização de quadros, quer relativamente à tradução de diplomas legislativos.
Não há, pois, protocolo secreto nem qualquer secretismo nesse tipo de funcionamento, e o importante é que fique registado como tal.
Relativamente ao jet-foil, há um aspecto importante a referir. Sou, evidentemente, mais jurista do que parlamentar, embora porventura não seja bem nem uma coisa nem outra. Sei que não é agora que fica definitivamente tomada a posição quanto à votação final da lei, mas também sei que há um sentido real na votação de hoje, ou seja, na votação na generalidade. Esse sentido real é um sentido político que, em função da lei que estamos a discutir, tem uma dimensão nacional. Não se trata aqui de um maior ou menor conhecimento jurídico, mas de um maior ou menor relevo dado por VV. Ex.as, enquanto parlamentares, à votação de um diploma como este que é proposto neste momento e nesta circunstância.
Continuo a reafirmar, exactamente como disse inicialmente, que seria bonito, não apenas no sentido estético, mas também no sentido político do termo, que hoje, na generalidade, com o peso que essa votação tem, esta proposta de lei fosse aprovada por unanimidade. Mas, como é óbvio, não estou a pedir que isso aconteça, nem muito menos me passaria pela cabeça que houvesse agora uma reconversão de posição por parte do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português. Não tenho é dúvidas de que isso daria realmente uma maior expressão a um aeroporto que todos sabemos qual é e onde queremos chegar. Mas assim deixar-nos-á ainda um pouco de espaço na tentativa do percurso da discussão na especialidade, que, essa sim, não gostaria de identificar com um trajecto de jet-foil.
Era isto, no fundo, o que pretendia dizer. Creio que não há, no aspecto do mecanismo de transporte, um desacordo absoluto. O que me parece importante é o fim a atingir. E, relativamente ao fim a atingir, pensava que hoje ele começava a ser atingido. Infelizmente, não o é. Espero que mais tarde o seja em absoluto.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Umas breves notas, espécie de declaração de voto prévia para esclarecimento e proveito do Sr. Ministro da Justiça, no termo da intervenção do PCP.
Já enunciámos, no presente debate, com o comedido detalhe que se impunha, as posições que assumimos relativamente ao articulado concreto em apreço e as suas insuficiências, imprudências e incúrias. Rastreados os problemas, haverá que encontrar, na sede própria - a 3.ª Comissão - e através da metodologia sadia já aqui também avançada, as soluções justas, com vista à instituição de um sistema judiciário perdurável, autónomo e qualificado em todas as suas vertentes: na da integração e formação de quadros, como na do respeito impreterível por regras de independência e de eficácia.
A nosso ver, a proposta de lei, tomando laxista a lógica da flexibilidade perante as vicissitudes do processo previsto até 1999, carece de uma efectiva substanciação, de um maior rigor na prognose dos nódulos complexos em que urge acautelar desvios e de um amplo melhoramento técnico.
A intervenção produzida em nome da bancada do Governo não erradicou nenhumas das nossas dúvidas. Bem pelo contrario, deixou de pé a necessidade de uma laboração consequente nas instâncias que vão seguir-se.
O lavrar de uma boa lei da organização judiciária de Macau é, a todos os níveis, essencial. Mais ainda: quando pensamos nas responsabilidades de Portugal durante todo o período de transição, cabe à administração portuguesa a gestão escrupulosa da imagem do País, até nas mínimas práticas quotidianas. Tudo o que se fizer no sentido da transparência dos actos públicos correntes e da projecção dos valores de cultura, civilização e humanidade, que são o nosso molde, será positivo. Melhor será indeclinável.
Afirmamo-lo hoje, tal como no passado. Aquando, por exemplo, da última revisão constitucional, mediante contributos incisivos e fomentando uma vasta ponderação: aquando das diversas circunstâncias em que reclamámos urgência para a apreciação de uma lei orgânica judiciária com os contornos posicionais que defluem da intervenção exaustiva ainda há instantes expendida pelo meu camarada José Magalhães: aquando dos momentos em que, a propósito do Estatuto Orgânico ou de realidades pontuais, quisemos potenciar, pelas excelências, que não pelo desacerto, a força dos sinais da nossa presença ancestral no território.
É que, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, nesta sede importa bem menos o discurso tonitroante, pleno de galhardia, autoconvicto e apropriatório em relação à história, e bem mais a consecução, momento a momento, das actuações que deixarão de nós um percurso indelével. É neste sentido que agiremos. Completamente à margem do dilema fatal - mas inconvincente - em que o Sr. Ministro se afirmou colocado: ou o Governo agia celeremente e tinha os aplausos da oposição, ou o Governo agia com rigor e tinha os aplausos da História. Outra hipótese avulta, emerge e se confirma: a de o Governo não ter agido celeremente, e, por isso, não merecer os aplausos da oposição, e não agir com o rigor que lhe mereça os aplausos da História, se não formos capazes de aqui corrigir o que, a nosso ver, vem incorrectamente formulado.

Vozes do PCP:-Muito bem!

O Orador: - Apresentamos votos para que a lei a produzir pela Assembleia da República acentue os procedimentos de idónea administração da justiça, de controlo das actuações do poder, de combate a comportamentos incoonestáveis de um isento e sólido poder judicial.
A benefício de inventário, exprimiremos, no termo da análise da generalidade, uma judicação precisa e, concomitantemente, a disposição para, na audição de todos os interessados, fazer rumar, nas acções de especialidade, a nau a bom porto, ou seja: à unanimidade desejável - desejada pelo Sr. Ministro da Justiça e também por nós - mas que tem cursos, os cursos de uma dialogia sã, (...)

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(...) de uma completa e despreconceituosa disponibilidade para o maior dos acertos. Então, sim, ela expressará, de forma iniludível, o senso político da votação da Câmara, uma vez que o indício que agora se desenha com uma abstenção não traduz apenas uma não inviabilização mas, além disso, um empenhamento na acção concreta. Esta indiciação não pode servir para adubar as ilações definitivas e um pouco rotundas que se pretendem.
Na votação final global, estamos certos, será possível, se o Governo se aproximar de muitas das necessidades de melhoramento que aqui sinalizámos, adoptar uma postura que seja a contento de todos. De nós próprios, em primeiro lugar. E daqueles que julgamos serem os interesses primordiais de Portugal, aqui e em tudo quanto se prende com a transição de Macau, com o seu regime de especificidades até 1999 e para além dele.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o tempo em excesso utilizado pelo PCP foi-lhe cedido pelo Partido Socialista.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Quero apenas deixar uma nota terminal, suscitada pela intervenção do Sr. Ministro da Justiça, que me deixou preocupado, sobretudo com o seu apelo ontológico à História e apelo, desde logo, por coisa tão pouca: uma proposta de lei.
Habituei-me, porventura como muitos dos Srs. Deputados presentes nesta Sala, a que os apelos à História fossem feitos, basicamente, em dois momentos: a História me julgará ou a História me absolverá, daqueles que, em determinado momento, tinham razão e não tinham a força e daqueles que faziam da História uma evocação epopeica e tinham força a mais. Penso que o Sr. Ministro da Justiça não está em nenhum destes casos, nem a matéria de uma proposta de lei embrionária é razão para tanto. Diria, antes, que foi uma fuga para a frente do Sr. Ministro da Justiça, inconsistente e de efeito fácil.
A História somos todos nós e, nesta matéria, não haverá História para julgar-nos. É coisa pouca! O que vai ser julgado pela História vai ser feito em momento posterior, quando encontrarmos, globalmente e todos, solução sobre esta matéria.
O Sr. Ministro da Justiça falou também na questão do tempo e é bom que nos entendamos sobre ela. Esta questão do tempo não é chegar atrasado à pontualidade de um emprego de funcionário público!... Esta questão do tempo é uma «pilhagem» do futuro à cultura portuguesa. Só temos nove anos para a transição do território!... Já entrámos no desconto!... O Governo perdeu seis meses, o que em nove anos é muito! Portanto, esta questão do tempo é uma questão decisiva, pois, como o Sr. Ministro da Justiça disse, e bem, a organização judiciária de Macau é um processo gradual, evolutivo, testado, participado, condicionado e, por isso, o tempo é urgente.
O que nós pedimos não foi que ele se fizesse depressa, foi que se fizesse rapidamente e bem. E tinham meios para isso!
Como o Sr. Ministro da Justiça sabe tão bem como eu ou porventura melhor, esta e talvez a décima versão de um projecto de lei sobre a matéria!... As condições para ela ser publicitada estavam garantidas!... O Governo agiu com lentidão e fez perder tempo à cultura portuguesa, à organização judiciária portuguesa, ao futuro da nossa existência em Macau, e disso V. Ex.ª não se livra.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Quero apenas dizer duas palavras, muito breves, para referir dois pontos essenciais que, aliás, acabam por se reconduzir a um só: o do tempo e o da História.
Relativamente à perspectiva histórica que pretendi atribuir a este diploma, creio que é claro para o Sr. Deputado que eu não me inscrevia, como V. Ex.ª acabou por dizer, em nenhuma dessas posturas, também elas históricas, que conhecemos ao longo da história política.
Simplesmente, a área em que estamos a intervir a partir deste diploma - e de variadíssimos outros que se lhe sucederão-é, para todos nós, uma área de intervenção histórica, de projecção no futuro e de construção da própria História. E quando aqui falei de História, falei sempre, e sobretudo, neste trajecto comum de todos nós na construção dessa História. Não houve a reivindicação de uma História afirmada pelo poder de um qualquer grupo político mais ou menos legitimado num determinado momento, houve um convite.
Aliás, mais do que um convite, houve um apelo a que todos déssemos um passo decisivo na projecção histórica da nossa actividade ao longo destes anos, mas que, de algum modo, ela se vá construindo ponto por ponto e este é, obviamente, um dos pontos sobre os quais essa História se constrói. Era apenas isto! Era, no fundo, uma leitura de solidariedade para a História e não uma leitura da História contra a solidariedade de quem quer que seja.
Em segundo lugar, relativamente ao problema do tempo, não se podem contar seis meses a partir da última alteração do Estatuto Orgânico de Macau. Primeiro, porque era necessário conhecê-lo, saber quais eram as incidências definitivas nessa alteração e, depois, discorrer legitimamente sobre elas. Não se podia, previamente, ter preparado um texto legal que, no fundo, há-de ser decorrente de outro, quando se desrespeita o órgão legislativo que, por sua própria natureza, tem por missão legislar. O que diria o Parlamento de um governo que tivesse, na gaveta, preparado um diploma que teria de ser decorrente de outro que o Parlamento devia aprovar?!
O Governo agiu como devia agir, deixou que o Parlamento aprovasse o diploma que tinha de aprovar e, depois, estudou-o, analisou-o e, na decorrência das alterações introduzidas no Estatuto, apresentou a proposta de lei que agora está em discussão.
Os Srs. Deputados lembrar-se-ão, porventura, que, aquando da última interpelação ao Governo nesta Assembleia da República na área da justiça, eu próprio disse que a lei estava pronta para poder ser discutida mas que tinha havido, da parte do Governo de Macau, a ideia de que ela podia dilatar-se para o início da sessão legislativa que agora começou. E aqui está a lei no início da sessão legislativa, aberta à discussão do Parlamento.
Por outro lado, os Srs. Deputados sabem ver, no concreto, quais foram as alterações que, por último, foram introduzidas nesta proposta de lei e percebem que, por (...)

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(...) exemplo, discutir a questão de saber se deve haver um tribunal de contas ou uma auditoria não é questão de somenos importância!... Por isso é importante que a opção que venha a ser consagrada seja uma opção que pressuponha estudos prévios, que não havia, que tiveram de ser desenvolvidos e que nos levam, por isso, a poder reafirmar que ela é uma proposta de lei apresentada com rigor.
Por isso, não nos atrasámos seis meses no processo de transição; ganhámos todo o tempo, que fica sempre na História, permitam-me que o repita, que é incalculável e que não se perdeu por se ter feito bem. E esse tempo, que nunca pode ser medido, nunca é usado a favor de ninguém. Ficará sempre, apesar de tudo, como uma tranquilidade de alma daqueles que, tendo feito bem, têm a certeza que podem pelo menos reivindicar para si a possibilidade de não serem acusados de ter deixado que se fizesse mal, permitindo que se medisse realmente na História o tempo ganho por se tivesse agido com qualidade.
Fizemos esse esforço e, portanto, mais uma vez, o tempo conflui com a História e o tal futuro, um dia, dirá se sim se não, mas não para nos julgar, porque, no fundo, seremos todos porventura suficientemente humildes para aceitarmos que o julgamento da História não incidirá sobre cada um de nós pessoalmente mas institucional e solidariamente.
Neste momento, por acaso ou não, somos nós, em concreto, que temos o dever de intervir, de legislar e de ser rigorosos. É apenas nesse sentido - simples, mas com um laivo democrático que me parece evidente-que faço o apelo à História para nos responsabilizar no futuro e faço um apelo ao tempo para continuar a afirmar que agimos em tempo útil e em tempo possível, como disse na minha intervenção inicial.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrado o debate relativo à proposta de lei n.º 161/V.
Antes de proceder à votação, na generalidade, da referida proposta, quero informar os Srs. Deputados de que a sequência das respostas às perguntas a fazer ao Governo na sessão de amanhã é a seguinte: em primeiro lugar, maiorias relativas à defesa nacional; em segundo lugar, matérias referentes ao Ministério dos Negócios Estrangeiros: em terceiro lugar, matérias sobre segurança social; em quarto lugar, matérias no âmbito da saúde e, em último lugar, matérias relativas à Secretaria de Estado do Ambiente e Defesa do Consumidor. Dentro de momentos, vai ser distribuído o respectivo documento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares (Carlos Encarnação): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, na conferência de líderes, tinha solicitado a V. Ex.ª que a primeira pergunta a ser colocada fosse ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, devido à necessidade que o Sr. Ministro tem em se ausentar logo a seguir. Tinha pedido também que a última pergunta fosse feita ao Sr. Ministro da Defesa Nacional.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, corrijo a informação que dei. Porém, quero dizer-lhe que me limitei a ler um ofício que me foi agora entregue.
Srs. Deputados, dada esta informação, vai ser distribuído o ofício com as indicações complementares que acabam de ser fornecidas.
Vamos, então, proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 161/V - Organização Judiciária de Macau.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD e do CDS e a abstenção do PCP.

Srs. Deputados, amanhã realizar-se-á uma sessão de perguntas ao Governo, que terá início às 10 horas.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 5 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Alexandre Azevedo Monteiro.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
António José Caeiro da Mota Veiga.
António Maria Pereira.
Cecília Pita Catarino.
Dinah Serrão Alhandra.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Henrique Nascimento Rodrigues.
José Angelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Luís Bonifácio Ramos.
José de Vargas Bulcão.
Luís Amadeu Barradas do Amaral.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Rui Gomes da Silva.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
José Ernesto Figueira dos Reis.

Partido Comunista Português (PCP):

Lino António Marques de Carvalho.
Manuel Rogério Sousa Brito.

Partido Renovador Democrático (PRD):

António Alves Marques Júnior.
Rui José dos Santos Silva.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.

Página 62

I SÉRIE-NÚMERO 2 62

António Jorge Santos Pereira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Flausino José Pereira da Silva.
José Júlio Vieira Mesquita.
Manuel Maria Moreira.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.

Partido Socialista (PS):

António de Almeida Santos.
António Poppe Lopes Cardoso.
João António Gomes Proença.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
Manuel António dos Santos.

Partido Comunista Português (PCP):

Ana Paula da Silva Coelho.
Carlos Vítor e Baptista Costa.
João António Gonçalves do Amaral.
Júlio José Antunes.
Maria de Lourdes Hespanhol.
Maria Luísa Amorim.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

José Lufe Nogueira de Brito.

Deputado independente:

Raul Fernandes de Morais e Castro.

Os REDACTORES:

José Diogo
Isabel Barral
Maria Amélia Martins.

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