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I Série - Número 95
Quinta-feira, 20 de Junho de 1991
Diário da Assembleia da Républica
V LEGISLATURA 4.º SESSÃO LEGISLATIVA (1990-1991)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 19 DE JUNHO DE 1991
Presidente: Ex.mo Sr. Vítor Pereira Crespo
Secretários: Ex.mos Srs.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos P. Basto da Mota Torres
Apolónia Maria Pereira Teixeira
Daniel Abílio Ferreira Bastos
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 25 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.º 785/V e 786/V.
Na abertura do debate da interpelação n.º 21/V (PS), sobre política geral, usaram da palavra o Sr. Deputado António Guterres (PS) e o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território (Valente de Oliveira).
Depois, e a diverso título, intervieram, além dos Srs. Ministros dos Assuntos Parlamentares (Dias Loureiro), do Emprego e da Segurança Social (Silva Penedo) e do Planeamento e da Administração do Território (Valente de Oliveira) e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Oliveira e Costa), os Srs. Deputados José Pacheco Pereira (PSD), Nogueira de Brito (CDS), António Guterres (PS), Carias Brito, Octávio Teixeira, lida Figueiredo e Álvaro Brasileiro (PCP), Armando Vara (PS), João Corregedor da Fonseca (Indep.), Domingos Duarte Lima (PSD), Jorge Loção (PS), Cartas Lilaia (PRD), Manuel Filipe (PCP), Rui Alvarez Carp (PSD) e Manuel dos Santos (PS).
Encerraram o debate o Sr. Deputado Almeida Santos (PS) e o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
Foram aprovados, em votação final global, os textos finais da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativos às propostas de lei n.º 90/V (ARM) -
Definição dos critérios de fixação da indemnização a atribuir aos senhorios pela remição da propriedade da terra pelos colonos, 1S7/V - Regula a organização e funcionamento do Conselho Económico e Social [o texto também se refere ao projecto de lei n.º 560/V(PCP) - Concelho Económico e Social], 161/V - Lei da Organização Judiciária de Macau, 189/V - Lei de Bases de Protecção Civil, 202/V - Cria os Tribunais Administrativos do Circulo de Ponta Delgada e do Funchal (altera o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de Abril) e 165/V - Alteração à Lei Eleitoral das Autarquias Locais.
A proposta de lei n.º 200/V - Autoriza o Governo a estabelecer o regime de indemnizações às vítimas de crimes foi também aprovada, na especialidade e em votação final global, lendo usado da palavra os Srs. Deputados Odete Santos (PCP), Manuel da Costa Andrade (PSD) e José Magalhães (Indep.).
Finalmente, foi ainda aprovada, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n.º 191/V - Autoriza o Governo a legislar no sentido de alterar a Lei n.º 29/81, de 22 de Agosto (Lei de Defesa do Consumidor), tendo os Srs. Deputados Álvaro Dâmaso (PSD) e José Magalhães (Indep.) usado da palavra.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 20 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 25 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados: Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alexandre Azevedo Monteiro.
Álvaro Cordeiro Dâmaso.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
António Abílio Costa.
António Augusto Ramos.
António de Carvalho Martins.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge Santos Pereira.
António José de Carvalho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Oliveira de Matos.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Pereira Baptista.
Casimiro Gomes Pereira.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Domingos da Silva e Sousa.
Dulcíneo António Campos Rebelo.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Ercília Domingues M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Hilário Torres Azevedo Marques.
João Álvaro Poças Santos.
João da Costa Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maria Oliveira Martins.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
Luís António Martins.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Augusto Pinto Barros.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antónia Pinho e Melo.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Helena Ferreira Mourão.
Mana Manuela Aguiar Moreira.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mary Patrícia Pinheiro e Lança.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Gomes da Silva.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Macheie.
Valdemar Cardoso Alves.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Partido Socialista (PS):
Ademar Sequeira de Carvalho.
Alberto Alexandre Vicente.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Fernandes Silva Braga.
António Manuel Henriques Oliveira.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Edite Fátima Matreiros Estrela.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
Helena de Melo Torres Marques.
Henrique do Carmo Carmine.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Jorge Lacão Costa.
José Barbosa Mota.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Leonor Coutinho dos Santos.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
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Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui António Ferreira Cunha.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
António Filipe Cauto Rodrigues.
António da Silva Mota.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Alfredo Brito.
Carlos Vítor e Baptista Costa.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim António Rebocho Teixeira.
Uno António Marques de Carvalho.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Anastácio Filipe.
Manuel Rogério Sousa Brito.
Maria lida Costa Figueiredo.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Alexandre Manuel Fonseca Leite.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Maninho.
José Carlos Pereira Lilaia.
Rui José dos Santos Silva.
Centro Democrático Social (CDS):
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.
Deputados independentes:
Herculano da Silva Pombo Sequeira.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
José Manuel Santos Magalhães.
Maria Helena Salema Roseta.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura dos diplomas que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Reinaldo Comes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Deram entrada na Mesa, foram admitidos e baixam à 6.º Comissão os projectos de lei n.º 785/V - Criação da freguesia de Feijó no concelho de Almada, apresentado pelo Sr. Deputado José Reis, do PS, e 786/V - Elevação de Angeja à categoria de vila. apresentado peto Sr. Deputado Flausino da Silva, do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quero lembrar-lhes que togo à tarde, por volta das 18 horas e 30 minutos, procederemos a votações.
A sessão parlamentar de hoje é preenchida com a interpelação n.º 21/V, solicitada pelo PS. Segundo a regra das interpelações, teremos um parte de abertura, outra de debate e uma terceira de encerramento.
As intervenções de abertura estarão a cargo, por parte do PS, do Sr. Deputado António Guterres e, por parte do Governo, do Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território. Valente de Oliveira.
O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - Posso interpelar a Mesa. Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - Sr. Presidente, gostava de saber quem é, neste momento, o Primeiro-Ministro em exercício da República Portuguesa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª sabe-o tão bem como todos nós.
Srs. Deputados, vamos dar início à interpelação n.º 21/V (PS), sobre política geral.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - Permita-me, Sr. Presidente, que. antes de começar a intervenção, dirija a V. Ex.ª, a todas os colegas deputados, bem como aos membros do Governo, às Sr.ªs e Srs. Jornalistas e, ainda, a
as saudações do Grupo Parlamentar do Partido Socialista e lhes exprima o prazer e o privilégio que foi para mim conviver com eles nesta legislatura.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ao ouvir o Primeiro-Ministro, aqui ou no programa televisivo Primeira Página, ao analisar todas as intervenções dos membros do Governo e dos deputados da maioria nos últimos meses, encontramos pela frente um discurso codificado, reduzido a iras frases essenciais, sempre as mesmas, de uma confrangedora pobreza de conteúdo, tudo sacrificando às técnicas do marketing, as quais recomendam que, para ganhar eleições, é preciso repetir, repelir, matraqueando a cabeça dos Portugueses com uma espécie de martelo-pilão.
Em síntese, diz o Primeiro-Ministro, diz o Governo, diz o PSD: «O País está no bom caminho, tem havido crescimento económico, tudo isso se deve à estabilidade política e à competência do governo PSD.»
O Sr. José Silva Marques (PSD): - E é verdade!
O Orador: - Qualquer que seja a pergunta directa que se lhe dirija, qualquer que seja o tema em discussão - da mensagem presidencial à amnistia, da situação da comunicação social aos problemas da pobreza, do mau funcionamento das escolas à desorientação nas urgências hospitalares, das graves carências na habitação social ao gigantesco desperdício no Centro Cultural de Belém, dos inquéritos ao Ministério da Saúde aos perdões fiscais-, a resposta é sempre igual: o Primeiro-Ministro evita as questões polémicas, omite os problemas embaraçosos, assobia perante os escândalos, afivela o seu novo sorriso (por vezes ainda um pouco hirto, mas reconheço que com crescente à vontade) e repete as três fases salvadoras: «Pois então não estamos a crescer mais depressa do que a média europeia?»; «Pois não está o País no caminho certo?»; «Pois não temos a estabilidade política graças ao PSD?»
Há quem se resigne a aceitar como boas as técnicas do chamado «discurso eficaz». Há quem entenda que assim é que deve ser e que os governos devem tratar os Portugueses como quem conduz um rebanho.
Mas nós, socialistas, não queremos um país medíocre, condicionado e amedrontado.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - O PS não desistirá de fazer do debate político um debate sobre a substância dos problemas e de chamar os Portugueses a uma reflexão lúcida sobre o nosso futuro colectivo. O debate político tem de ser feito por homens com sinceridade e com emoção e não por manequins programados, que repetem, em sistema de play-back, uma cassete remetida pelas agências de publicidade.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Não se fala de desenvolvimento, de democracia, como quem vende uma pasta de dentes ou uma colecção de roupa interior para senhoras.
Os slogans fáceis não resistem às análises sérias.
Vejamos então, um a um, os slogans do PSD.
Diz o Primeiro-Ministro que o País deve a estabilidade ao PSD. Não é verdade! O governo PSD é que deve a estabilidade ao País. Devem-na também aos eleitores que lhe conferiram uma maioria absoluta e ao Presidente da República, como garante que é da estabilidade institucional.
Também o Partido Socialista entende que a estabilidade política é um factor positivo. Por isso, aliás, o PS pede hoje ao eleitorado que lhe dê confiança para governar a partir de Outubro nas mesmas condições que foram oferecidas ao PSD há quatro anos.
O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Mas não vai dar!
O Orador: - Se alguém pôs em causa, junto da opinião pública, a utilidade das maiorias absolutas, esse alguém foi o próprio «governo laranja» que, com a sua permanente tentação autoritária, ao tentar transformar maioria absoluta em poder absoluto, levou muitos a duvidarem hoje das vantagens das maiorias absolutas, face aos respectivos riscos.
Nós, PS, somos pelo governo da maioria, mas somos pelo respeito das minorias e pela salvaguarda dos direitos dos cidadãos e da sociedade civil contra os abusos do poder político.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Vangloria-se depois o Governo que o País tem crescido acima da média europeia. Cerca de 4,5 % ao ano, em comparação com os 3 % das Comunidades. Será isso assim tão excepcional?
A verdade é que, nos últimos 30 anos - e com excepção dos períodos de crise-, a economia portuguesa sempre cresceu acima das médias europeias. O que é natural, dado que as maiores economias da Europa atingiram já uma fase de maturidade de que nós ainda estamos distantes. Mesmo de 1974 a 1985- espantem-se, Srs. Deputados da maioria! - crescemos mais do que a média europeia cerca de l ponto percentual por ano.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Foi o socialismo!
O Orador: - Um cálculo rigoroso do efeito dos fundos comunitários no crescimento revela que a ajuda da CEE é responsável, em 1990, por 1,5 % do nosso crescimento. Nesse ano, Portugal cresceu cerca de 4,2 % e a Europa comunitária cerca de 2,9 %, em média.
Em conclusão, sem a ajuda da CEE, nas mesmas condições do passado, Portugal estaria, hoje, a crescer abaixo
da média europeia, apesar de vir sendo extremamente favorável o ambiente económico internacional envolvente.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Não somos nós que consideramos os méritos do Governo directamente proporcionais as taxas de crescimento da economia. É o PSD, é o Primeiro-Ministro. É o Primeiro-Ministro que tem de reconhecer que os verdadeiros méritos deste governo estão abaixo das médias europeias.
Em matéria de estatísticas, pode dizer-se que o Governo sofre de vista cansada. Vê alguns números ao longe - só os que lhe convêm -, mas tem uma enorme dificuldade para analisar ao perto as causas reais dos valores que cita. Ser-me-ia fácil arranjar uma miopia para contrapor a essa vista cansada! O Governo lembra um nível de emprego melhor que o europeu e eu posso mostrar uma inflação pior; avança o Governo com a redução do peso da dívida externa e eu ponho em evidência o agravamento do défice comercial; joga o Governo com os aumentos nas reformas e eu posso contrapor o aumento dos preços dos medicamentos. Mas não irei por aí. Não é essa a verdadeira questão.
A questão é a de que não basta o crescimento da economia. É preciso, sobretudo, que o País se desenvolva, se modernize e corrija os seus graves problemas de estrutura, que permanecem. E, aí, o panorama é preocupante. Em cinco anos das chamadas «vacas gordas», de vento que sopra a favor, de ajuda financeira maciça da Europa, os problemas decisivos do País pouco mudaram, para além do significativo investimento em infra-estruturas que os fundos comunitários vieram tornar possível.
Senão, vejamos: a agricultura portuguesa não está hoje muito melhor apetrechada para sofrer a concorrência internacional. Basta ir a um qualquer supermercado para ver o que é a invasão de produtos alimentares estrangeiros, mesmo daqueles em que, teoricamente, Portugal tem todas as vantagens; a indústria continua a depender, excessivamente, dos sectores tradicionais e a ter na mão-de-obra barata e no emprego precário a sua única vantagem comparativa para poder concorrer internacionalmente; o turismo explora, sobretudo, as franjas mais degradadas do mercado turístico internacional; não melhoraram significativamente - podemos mesmo dizer que, em vários aspectos, se deterioraram - as condições naturais e sociais do desenvolvimento; os problemas de ambiente que tínhamos há cinco anos subsistem hoje agravados; o mau funcionamento crónico de escolas e hospitais continua, e em muitos casos está mesmo pior; a habitação social foi esquecida; a burocracia aí está, impante como nunca.
Num único sector se realizaram avanços significativos na linha da modernização: no sistema financeiro. Mas, mesmo neste, não podemos omitir duas manchas negras de proporções gigantescas.
A primeira tem a ver com o surto de especulação bolsista de 1987, em que o Governo foi cúmplice activo da subida irresponsável das cotações e em que as declarações do Primeiro-Ministro e seus subordinados deram um impulso decisivo para a queda abrupta que se registou (queda dupla da média das bolsas internacionais). Foi um período em que se fizeram fortunas pessoais de milhões de contos, sem pagar um tostão de impostos ao Estado, à custa das pequenas poupanças de centenas de milhares de compatriotas nossos, que o Governo ajudou, objectivamente, a enganar.
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Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A segunda mancha tem a ver com a fornia como se processou, nos últimos tempos, a acumulação de lucros excessivos na banca, à custa das empresas produtivas e dos cidadãos em geral. O nosso país tem tido as maiores taxas de juro reais da Europa e os bancos das margens mais elevadas do mundo.
Pode mesmo afirmar-se que o Prof. Cavaco Silva e o Banco de Portugal puseram, durante um largo espaço de tempo, o País a trabalhar para os bancos! Ainda hoje, a incompetência na gestão das políticas leva a que três bancos comerciais portugueses, operando em off-shore a partir do Funchal, tenham chegado para desorientar a nossa política monetária, contribuindo para as condições que mantêm excessivamente altas as taxas de juro. É, à escala, uma espécie de caso DREXEL no mundo do Dr. Alberto João Jardim.
A tentativa, aliás tardia, para combater a inflação, unicamente à custa da valorização excessiva do escudo e do valor incomportável das taxas de juro, está a causar sérias dificuldades a muitos exportadores e a fazer abrandar o investimento privado em vários sectores da economia.
É por tudo isto que Portugal não está propriamente no bom caminho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Duas palavras agora sobre a competência do Governo.
Analisemos, para isso, o projecto que o próprio Governo considera o seu ex-libris (palavras do secretário de Estado responsável): o Centro Cultural de Belém.
Não vou falar do narcisismo dos que pretendem encavalitar o seu ex-libris em cima dos Jerónimos, indignando, justamente, os Portugueses e pondo os cabelos em pé aos técnicos da UNESCO.
Mas que dizer da imprevidência dos que, no poder desde 1985 e, desde então, sabendo da presidência portuguesa das Comunidades -, se atrasaram de tal maneira e se precipitaram depois de tal forma que a construção, por exclusiva responsabilidade do Governo e segundo o testemunho público do presidente da empresa que gere a obra, vai custar ao País mais 10 milhões de contos do que custaria se fosse feita em condições normais?
E que dizer da desorientação de um governo que, já no decorrer dos trabalhos, alterou significativamente as finalidades do projecto, introduzindo-lhe, nomeadamente, a possibilidade de fazer ópera, essa mesma ópera que, por ironia do destino, nem no Teatro Nacional de São Carlos consegue produzir regularmente?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Primeiro-Ministro e o PSD agora só falam do passado, do que fizeram e, sobretudo, do que querem fazer-nos julgar que terão feito. Mas o que está hoje em causa, decisivamente, é o futuro que queremos para o nosso país, é saber se lemos ou não uma ideia para Portugal.
Pela nossa parte, queremos, desde logo, uma democracia a sério, que seja um verdadeiro regime de liberdades públicas, e não o quadro onde se manifestam, impunes, alguns excessos de liberdade privada da clientela governamental.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Queremos, depois, uma estratégia clara para o desenvolvimento, assumida e definida em conjunto pela sociedade e pelo Estado.
Queremos que as políticas sociais não sejam um factor de desperdício e se concentrem na melhoria das condições de vida dos que verdadeiramente precisam, reformando o «Estado do bem-estar».
Queremos que Portugal participe na definição da Europa do futuro e não sofra apenas, passivamente, os efeitos do que os outros determinam.
Queremos, finalmente, dar conteúdo real à afirmação dos interesses portugueses no mundo: da nossa língua, da nossa cultura, de laços económicos mais duráveis e com efeitos a mais longo prazo nas relações de cooperação.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Vejamos, brevemente, uma a uma, estas cinco grandes componentes da nossa visão para o futuro do País.
A questão da democracia. Quando digo que queremos uma democracia a sério, não estou a dizer-vos que vivamos em ditadura. O voto continua a ser secreto e, sinceramente, eu não espero ser preso no fim deste debate!
Mas, Srs. Deputados da maioria, tem havido entre nós uma diferença fundamental, e era bom que deixasse de haver: enquanto para o PSD a democracia tem-se convertido, sobretudo, num instrumento para a tomada de poder, para o PS a democracia é o ar que se respira.
O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD):-Estão todos asfixiados!
O Orador: -Para o PSD a democracia parece estar ao mesmo nível das auto-estradas. Nós também queremos as auto-estradas, mas queremos, sobretudo - e ainda mais -, a democracia.
Aplausos do PS.
Os socialistas, tal como o Sr. Presidente da República, são exigentes quanto à qualidade do nosso sistema democrático. Para nós, a democracia não será totalmente a sério enquanto houver discriminação e medo nas empresas - e isso, hoje, acontece em Portugal.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador:-Para nós, a democracia não será totalmente a sério se não se criarem condições objectivas de pluralismo e de isenção na gestão dos órgãos de comunicação social do Estado...
Aplausos do PS e do deputado independente José Magalhães.
... e se a privatização dos mesmos continuar a ser feita em termos tais que conduzam à concentração da respectiva propriedade num número reduzido de grupos ligados ao «partido laranja».
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Não haverá uma democracia totalmente a sério enquanto as regras de financiamento da nossa vida política não forem claras, exequíveis e fiscalizáveis, acabando com a actual situação de opacidade, de incumprimento generalizado da lei e de completa hipocrisia, que favorecem o tráfego de influências e a corrupção,...
Aplausos do PS.
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... situação que a maioria do PSD quis que se mantivesse até ao fim da presente legislatura, fazendo orelhas moucas à nossa vontade e às nossas iniciativas.
O Partido Socialista será, em todas estas áreas, Fiel aos compromissos que aqui assumiu nos quatro anos desta legislatura.
A próxima maioria socialista aprovará estatutos da RTP e da RDP que as desgovernamentalização na sua gestão, anulará as decisões de atribuição de frequência de rádios regionais tomadas por este governo e submeterá a rigorosa apreciação os processos de privatização de jornais, em relação aos quais haja fundamentadas dúvidas quanto à transparência ou legalidade das decisões.
Aplausos do PS, do PCP e do deputado independente José Magalhães.
O PS compromete-se também a fazer aprovar um sistema de financiamento dos partidos políticos e dos actos eleitorais realista, transparente, rigoroso e fiscalizável pelo Tribunal de Contas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E não posso deixar de condenar, veementemente, o Primeiro-Ministro, o Governo e o PSD pelas suas atitudes em relação ao Sr. Presidente da República e à recente mensagem presidencial.
Aplausos do PS e do deputado independente José Magalhães.
A maioria impediu que a Assembleia da República desse seguimento às sugestões do Presidente da República, mas o Primeiro-Ministro nunca teve a coragem de dizê-lo porque tem medo do Presidente da República e da sua popularidade junto dos Portugueses.
Aplausos do PS e do deputado independente José Magalhães.
Por isso combate-o às escondidas ou por meio de interpostas pessoas, enquanto Finge manter o maior respeito institucional. Foi assim na questão de Angola, foi assim quanto à televisão, foi assim no convite armadilhado para inaugurar, fora de tempo, contra o parecer dos técnicos e a evidência dos descarrilamentos, a ponte ferroviária do Douro.
Aplausos do PS e dos deputados independentes Herculano Pombo e José Magalhães.
Os Portugueses saberão dar o devido valor àqueles que o medo faz refugiar na hipocrisia política.
Mas não queremos apenas uma democracia a sério, queremos também uma democracia participada, descentralizada e desburocratizada. A revisão constitucional veio, por nossa iniciativa, abrir as portas ao aprofundamento de um conjunto de direitos fundamentais dos cidadãos e à criação de outros verdadeiramente novos.
A maioria não permitiu concretizar estes direitos, preocupou-se mais com o segredo de Estado. Mas nós vamos insistir.
Em Outubro, para tudo isto, começará o futuro. E começará também para a criação das regiões administrativas e do reforço do papel dos municípios nas atribuições e nos recursos do Estado.
Segunda questão, Sr. Presidente e Srs. Deputados: a do desenvolvimento.
Uma nova estratégia de desenvolvimento, que não assente na mão-de-obra barata mas na valorização dos recursos humanos, exige que o País tenha ideias claras quanto às suas apostas de natureza tecnológica e quanto aos possíveis modelos de especialização produtiva que lhe interessa promover.
Disse o País e não apenas o Governo, porque o que está em causa é, verdadeiramente, uma nova relação entre o Governo e a economia. Os modelos de dirigismo estatal faliram e a aposta cega no mercado, a curto prazo, não corrige os vícios estruturais. A inovação que importa introduzir é a de concertação estratégica entre Governo, grupos empresariais e organizações representativas dos trabalhadores, articulando políticas que têm vivido desavindas (como as da educação, da formação profissional, do investimento público e do apoio ao investimento privado, da investigação científica e tecnológica) e articulando as políticas com as próprias lógicas de intervenção dos agentes económicos e sociais do progresso. Só assim o crescimento gerará um desenvolvimento equilibrado entre o homem e o ambiente natural, um desenvolvimento com crescente inovação cultural e tecnológica.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Dou-vos um exemplo: se queremos ter uma indústria nacional sofisticada nas tecnologias da informação é preciso que o Estado forme engenheiros em muito maior número, que se programe e se apoie mais decisivamente a formação profissional no sector, que se criem as condições para o apoio a verdadeiros centros de investigação nos grupos empresariais, que os instrumentos de intervenção do Estado - sistemas de incentivos, empresas - possam estimular e partilhar os riscos do imprescindível investimento privado nos projectos de ponta.
Somos um país pequeno na orla de um grande mercado. Tudo nos é possível, se soubermos especializarmo-nos, se apostarmos na qualidade mais do que nas produções massificadas, se aproveitarmos as oportunidades criadas pelos nichos de mercado onde possamos competir com eficácia, se pusermos a inovação, o design, a agressividade comercial, a arrastarem e a condicionarem o próprio processo produtivo.
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Muito bem!
O Orador: - Não vamos a lado nenhum desperdiçando o Fundo Social Europeu ou subsidiando com o PEDAP a compra de máquinas agrícolas necessárias para certas produções em zonas onde dentro de três anos estas serão inviáveis ou andando o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território a apoiar investimentos industriais que o Sr. Ministro da Indústria e Energia considera sem interesse para o nosso futuro.
Não podemos ter uma política de privatizações sem estratégia nem calendário claro, vendendo empresas públicas numa espécie de supermercado, em condições que beneficiam objectivamente os estrangeiros e que não ajudam ao desenvolvimento de grupos empresariais portugueses capazes de se afirmarem no quadro europeu.
A eficácia das políticas económicas passa também pela credibilidade dos que a aplicam. Que credibilidade tem um governo que, no seu programa, nos garantiu que estaríamos
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ao nível da inflação europeia em 1989, quando ficámos apenas-e digo «apenas» com ironia! - 8 pontos acima?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O terceiro grande problema a enfrentar é o da reforma do Estado-providência, afinal o da reforma das políticas sociais e das suas regras de financiamento.
Tenho afirmado, várias vezes, que o aspecto mais chocante da acção governativa do PSD se traduz no agravamento das desigualdades e injustiças sociais nos últimos cinco anos em Portugal, apesar da relativa prosperidade induzida por condições exteriores à economia portuguesa.
Temos um IRS que obriga os rendimentos do trabalho - os nossos rendimentos, Srs. Deputados! - a pagarem ao Estado até 40 %, mas que isenta ou, quanto muito, cobra 10 % às mais-valias da especulação imobiliária e financeira.
Tivemos, nestes cinco anos, um ritmo de construção de habitações sociais inferior ao do período mais agudo da crise económica, entre 1983 e 1985, em que houve que salvar o País da bancarrota.
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Muito bem!
O Orador: - O Governo criou um sistema de custas judiciais que afasia objectivamente os mais pobres do acesso à justiça. E. Srs. Deputados, sem justiça para todos também não há um verdadeiro Estado democrático!
Os leques salariais agravaram-se significativamente e os aumentos nas pensões de reforma são, em boa medida, compensados no agravamento do preço dos medicamentos.
As bolsas de pobreza continuam a existir, nalguns casos a alastrar, mas os mecanismos que as mantêm e reproduzem de pais para filhos persistem.
Tal como persistem os mecanismos que promovem as desigualdades entre o litoral e o interior do Pais, apesar do esforço que os fundos comunitários tem propiciado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com o envelhecimento das populações e com o encarecimento dos cuidados sociais em todos os países da Europa Ocidental tem vindo o «Estado do bem-estar» a entrar em crise. Torna-se cada vez mais difícil financiar, por via do Orçamento do Estado, a garantia a todos os cidadãos de um conjunto de direitos sociais cada vez mais aperfeiçoados. Reconhece-se mesmo que as classes médias, com maior acesso à informação e mais consciência dos seus direitos, acabam por se apropriar de uma parte comparativamente maior das ajudas sociais.
Também em Portugal este problema existe. A sua solução exige, quanto a nós, algumas inovações fundamentais.
Em primeiro lugar, a introdução de um princípio de selectividade nas prestações sociais, orientando-as, sempre que possível, para quem realmente precisa.
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, pela reforma de financiamento do sistema da segurança social, que não pode continuar indefinidamente a assentar de forma exclusiva nas contribuições dos trabalhadores e das entidades patronais em função dos salários pagos.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!
O Orador: - Duas pistas possíveis de solução: o caminho recentemente traçado pelo Governo Francês, fazendo recair parte do financiamento sobre um imposto aplicável a todos os rendimentos, ou a possibilidade de ligar as contribuições patronais, pelo menos parcialmente, ao valor acrescentado nas respectivas empresas e não apenas ao volume dos salários pagos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Em terceiro lugar, apoiando de forma decidida a participação da sociedade civil na cobertura dos riscos sociais, sobretudo através das formas de voluntariado e de associativismo não lucrativo, com larga tradição na vida portuguesa, onde, felizmente, as manifestações de solidariedade sempre tiveram grande expressão. Isto sem prejuízo, naturalmente, do livre desenvolvimento do sector privado lucrativo, desde que o não faça parasitando o sector público.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador:-Em quarto lugar, definindo prioridades claras para as políticas sociais, por forma a limitar os acréscimos globais dos respectivos custos.
Assim, nos próximos quatro anos, pensamos que a educação deve assegurar, prioritariamente, a realização da escolaridade obrigatória com indispensável qualidade em todo o País, a abolição da PGA (prova geral de acesso) e a redução progressiva do números clausus no ensino superior.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A política de saúde deve apostar na generalização efectiva do médico de família ao conjunto da população portuguesa, permitindo, com isso, a consulta no próprio dia e aliviando a pressão insuportável sobre as urgências hospitalares, com os sobre custos conhecidos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Deve também criar as regras que permitam, sem abusos, o fornecimento gratuito de medicamentos aos idosos de baixo rendimento e de doença crónica.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A segurança social, para além da reforma financeira, deve dar prioridade à introdução do rendimento mínimo garantido, destinado a eliminar as situações de extrema pobreza, felizmente já dirigido hoje a uma escassa parcela da população.
Aplausos do PS.
Na habitação social, duas orientações fundamentais: apostar na redução sistemática dos custos de construção, intervindo decididamente ao nível dos solos e incentivando o crescimento da produtividade, e estabelecer um programa significativo de habitação social para arrendamento, apoiando cooperativas, municípios e promotores privados e completando o estímulo à oferta com a introdução do subsídio de renda que permita o acesso das famílias verdadeiramente pobres e dos jovens casais de baixo rendimento aos fogos criados por este programa.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A quarta grande área de reflexão sobre o futuro tem a ver com a animação dos nossos interesses no quadro da construção europeia.
Portugal não pode continuar a assumir-se como um simples parente pobre que, de chapéu na mão, vai pedindo sempre mais ajudas, mas que abdica de ler uma voz activa na definição dos novos caminhos europeus.
Aplausos do PS.
Mas só tem voz quem tem ideias claras!
Nós não queremos uma Europa centrada sobre si própria. Queremos, sim, uma Europa que não renuncie às suas vocações atlântica e mediterrânica. Nós não queremos uma Europa obcecada com os problemas económicos e de segurança que vêm do Leste, mas, sim, uma Europa que compense a necessária atenção com o Leste, com uma política activa de segurança e de cooperação na bacia do Mediterrâneo, em particular com o Magreb, e com o reforço da sua cooperação com o Terceiro Mundo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Nós não queremos uma Europa economicista, tecnocraticamente gerida, em que a união monetária venha acentuar desigualdades entre centro e periferia, que transformem Portugal num país de contas certinhas, mas de onde os Portugueses voltem a ter de sair em grande número. É bom não esquecer o exemplo irlandês!... Não há espaço de moeda única em que se atenuem as desigualdades sem que um orçamento global forte transfira automaticamente apreciáveis recursos para as zonas mais atrasadas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A negociação, em concreto, da coesão económica e social, no quadro da futura união económica e monetária, é, por isso, a condição chave do êxito da nossa integração, tão importante como a necessária aproximação entro a inflação interna, a que o eleitoralismo do Governo não deixou dar prioridade, e a inflação média europeia.
Nós não queremos uma Europa cujas decisões sejam inteiramente dominadas pelos grandes países, mas, sim, que a evolução institucional, a prever no quadro da união política, assegure ao conjunto dos pequenos países uma real capacidade de intervenção.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - É essencial que a política agrícola comum olhe para sul, que os apoios à produção agrícola se orientem cada vez mais para subsidiar o rendimento dos agricultores mais desfavorecidos, que as regras de financiamento à modernização tenham em conta a realidade de uma agricultura em que a esmagadora maioria das explorações é muito pequena, tecnologicamente inadequada e gerida por agricultores envelhecidos e com escassa formação profissional. A inacção do Governo Português, neste campo, tem sido incompreensível e justifica a legítima indignação dos agricultores.
Aplausos do PS.
Para que haja uma solução para os nossos problemas orçamentais - que são reais! - é vital que uma parte importante dos fundos comunitários possa ser directamente integrada no próprio Orçamento do Estado. Exemplo significativo está na necessidade de alargar, e de alargar muito, a pane do Fundo Social Europeu destinada à educação. Como importaria reduzir, como a Espanha propôs, as chamadas «comparticipações nacionais».
É indispensável ainda abrir novas áreas de financiamento comunitário no domínio das políticas sociais, sob pena de que os apoios comunitários se transformem, pela necessidade de encontrar contrapartidas nacionais, em verdadeiros obstáculos ao desenvolvimento daquilo que, sendo essencial, não é elegível para o apoio de Bruxelas. O caso da habitação deve ser aqui uma prioridade negociai portuguesa.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Importa dar condições de verdadeira eficácia e unidade - o que até agora não existe! - aos critérios de incentivos ao investimento industrial, cujas contradições subsistem, e procurar conseguir de Bruxelas um programa similar para a construção civil, uma das áreas em que mais há a esperar em termos de modernização e ganhos de produtividade, ganhos esses quão importantes são para a nossa política de habitação.
Há que garantir que a definição de novas políticas comunitárias, com relevo para a do ambiente, tenha uma contrapartida significativa - e não apenas marginal - no financiamento pelas Comunidades do esforço que os países mais pobres terão de realizar para se adaptarem às normas europeias.
Provavelmente nem tudo isto poderá ser conseguido. Mas tudo isto tem de ser discutido no Parlamento e no País. Só um debate nacional autêntico legitimará as posições negociais portuguesas na construção europeia.
Aplausos do PS e dos deputados independentes Herculano Pombo, Jorge Lemos e José Magalhães.
Mas a política externa portuguesa não se esgota no quadro europeu. Somos um país de vocação universalista e é confrangedora a incapacidade que Portugal tem tido para afirmar no mundo a sua língua e a sua cultura. Deveríamos, pois, meditar no exemplo da vizinha Espanha!
Que dizer do reduzido número de leitorados de português em universidades estrangeiras e de leitorados preenchidos por brasileiros?
Que dizer da cooperação educativa com os países africanos de expressão portuguesa, reduzida a uma indigência verdadeiramente criminosa no número de cooperantes envolvidos, nos volumes do apoio em livros e material didáctico, na assessoria técnica às políticas educativas, e ainda ontem tivemos aqui alguns «trocos» citados pelo Sr. Secretário de Estado da Cultura?
Aplausos do PS.
Que dizer dos centros culturais portugueses que não existem ou que não funcionam, mesmo em países de língua oficial portuguesa?
Que dizer dos valores do nosso património espalhados pelo mundo, completamente deixados ao abandono, salvo no que diz respeito a algumas meritórias iniciativas privadas?
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - É confrangedora a forma como o Governo vai estiolando a presença cultural portuguesa no Oriente, particularmente em Goa.
No plano económico, às carências de meios junta-se a desorientação estratégica, a incapacidade de seleccionar as prioridades e as formas de cooperação que podem garantir relações mais profundas e duráveis no tempo.
Não basta participar em negociações de paz, por muito positiva que seja essa iniciativa (e nós não nos cansaremos de elogiar essa participação e os seus resultados!). É preciso ter audácia para definir uma política global de cooperação e atribuir-lhe o mínimo de meios que lhe dê conteúdo e expressão.
A triste odisseia da Comissão dos Descobrimentos, nomeada pelo Governo, é bem um símbolo de toda esta incapacidade!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Esta incapacidade provinciana é típica do «poder laranja», a incapacidade dos que não têm nem rasgo nem visão para afirmar no mundo os interesses de um povo, cuja história e cuja cultura parece, por vezes, não conseguirem compreender.
Aplausos do PS e dos deputados independentes Herculano Pombo, Jorge Lemos e José Magalhães.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O debate está aberto. Esperamos interessadamente a resposta do Governo. Gostaríamos de ler um governo à altura dos problemas que a oposição coloca, capaz de discutir connosco, de igual para igual, o nosso futuro colectivo.
Vozes do PS: - Mas não temos!
O Orador: - Ficaremos, seguramente, muito desiludidos se, em vez disso, nos vierem aqui dizer, outra vez, que o País deve a sua estabilidade ao PSD e que estamos no bom caminho, porque estamos a crescer acima da média europeia.
Vozes do PSD: - É verdade! Ao PS é que não o deve!...
O Orador: - Mais desiludidos ainda ficaremos se, a seguir, nos presentearem com outra demonstração do impacte da vista cansada no manusear das estatísticas!...
Sobre as questões mais delicadas, já sabemos que não nos vão dizer nada. O Sr. Primeiro-Ministro não deixa! O PSD não quer guerras com o Sr. Presidente da República. Porta-se com ele como os meninos traquinas que vão dando caneladas por debaixo da mesa, enquanto sorriem com ar prazenteiro para que as mães, neste caso os Portugueses, se não apercebam!
Aplausos do PS e dos deputados independentes Herculano Pombo, Jorge Lemos e José Magalhães.
A partir de amanhã, fechada a Assembleia da República, recomeçam as vossas visitas e inaugurações.
Podem descarrilar comboios, pode, sobretudo, o País ter de gastar milhões e milhões de contos a mais, mas o Governo não desistirá de inaugurar, antes das eleições, todas as obras que, naturalmente ou por atrasos que o
próprio Governo causou ou não previu, só ficariam prontas tarde de mais para o «eleitoralismo laranja»!
Srs. Membros do Governo, uma última recomendação: sempre que quiserem inaugurar alguma coisa que ainda não saibam se vai cair ou não, não se esqueçam de convidar o Sr. Presidente da República!
Aplausos do PS e dos deputados independentes Herculano Pombo, Jorge Lemos e José Magalhães.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado António Guterres, os Srs. Ministros dos Assuntos Parlamentares e do Emprego e da Segurança Social e os Srs. Deputados José Pacheco Pereira e Nogueira de Brito.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território.
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território (Valente de Oliveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No enunciado do motivo da interpelação, o Partido Socialista afirma querer apreciar a actividade global do Governo, em jeito de balanço, antes do encerramento dos trabalhos parlamentares.
A resposta sintética é a seguinte: Portugal experimentou, ao longo dos últimos seis anos - durante os quais foi governado pelo mesmo Primeiro-Ministro -, o mais longo período de crescimento e desenvolvimento, desde sempre.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Na verdade, ao longo desse período, o produto interno bruto cresceu a taxas médias anuais iguais a 4,5 %, apreciavelmente mais elevadas do que as verificadas na primeira metade da década e convenientemente maiores do que a média dos nossos parceiros comunitários, de modo a assegurar uma aproximação progressiva em relação aos seus níveis médios de prosperidade.
Mas não é só este indicador sintético que importa! Ele traduz muita coisa, naturalmente, mas não permite analisar a mudança que se foi operando nas expectativas dos Portugueses, baseada nas realizações que se foram consolidando e na confiança que todos foram adquirindo na resolução de problemas que pareciam crónicos e que, afinal, o não são.
Não vou falar dos salários em atraso, que eram uma chaga corrente e que hoje não constituem notícia, nem dos indicadores da mortalidade infantil, que, em poucos anos, levaram uma volta completa, descendo de 21,8 %,, em 1981, para 10,9 ºL, em 1990 (menos de metade, portanto).
Mas tenho de falar no desemprego, cuja taxa, igual a 4,7 %, é a mais baixa da Comunidade Europeia, com a excepção não significativa do Luxemburgo. O sector privado investiu muito e criou emprego em quantitativos tais - mais de 515 000 postos de trabalho desde o princípio de 1986 até ao final de 1990 - que pode dizer-se que, em muitos sectores, estamos em situação de pleno emprego ou mesmo de escassez de oferta de mão-de-obra. Mas, se os empresários investiram, foi porque se sentiram confiantes em relação ao futuro e estimaram a tal estabilidade que lhes permitiu fazer previsões e antever a realização de bons resultados. Nunca será de mais sublinhar a importância de tão baixo valor da taxa de desemprego: não são raras as situações, mesmo dentro da Comunidade Europeia, em que o seu valor é três ou quatro vezes o nosso. Se tal sucedesse, entre nós, a instabilidade social
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generalizar-se-ia e, com ela, tudo haveria de tremer. Os Portugueses são um povo trabalhador e cumpridor, que suporta mal a ideia de não levar um salário para casa e de ser socialmente assistido; os nossos compatriotas emigraram à procura de trabalho e suportaram as mais adversas condições, mas experimentaram o gosto de ter sucesso e habituaram-se à dignidade de se bastar a si próprios.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É por isso que damos tanta importância à criação de emprego e ao estímulo da capacidade de empreender. Ambos correspondem à vontade profunda dos Portugueses e ao sentido que eles dão à sua capacidade de realização pessoal.
A criação de riqueza é indispensável para ter algo para distribuir. Mas a forma como essa riqueza é gerada e depois distribuída não é indiferente para nós! É por isso que, na afectação dos dinheiros públicos, privilegiámos os recursos humanos e aquilo que, na gíria da profissão, se designa por «externalidades». O objectivo fundamental dessa acção conjunta é o de tornar viável a actividade económica, estimulando a vontade de empreender dos que tiverem iniciativa, assegurando aos que o fizerem a disponibilidade de uma mão-de-obra educada e profissionalmente bem formada e a todos a capacidade de realização pessoal, através de um trabalho bem remunerado e do acesso aos bens da cultura contemporânea. A construção de estradas, de portos, de aeroportos, de telecomunicações eficientes e de numerosos equipamentos de apoio à actividade produtiva e a preocupação com a energia e com os seus custos inscrevem-se todos no âmbito da redução dos custos exteriores às empresas e da resolução de problemas que os empresários não podem ultrapassar por si próprios. A prosperidade das empresas está na base da prosperidade das pessoas; por isso, é preciso assegurar que aquelas floresçam de modo a investir, inovando e garantindo a manutenção das vantagens comparativas conquistadas. É necessário, também, proporcionar a todos os indivíduos uma grande solidez de preparação pessoal, conciliando uma boa educação de base que autorize as reconversões que o progresso tecnológico toma inevitáveis com a formação que encaixa quem trabalha no seu posto e faz elevar a produtividade. Os resultados a este respeito têm, aliás, sido eloquentes: entre 1987 e 1990 a produtividade média experimentou um crescimento anual da ordem dos 4 %.
É nesse sentido que se está a fazer todo o possível para conseguir que os jovens fiquem mais tempo na escola e que, ao abandonarem o sistema educativo, vão munidos com conhecimentos e com hábitos de trabalho e atitudes que os façam inserir-se facilmente no mercado do trabalho e realizar-se pessoalmente. A partir de 1986 - já o disse nesta Câmara! - foram lançadas 245 novas escolas preparatórias e secundárias e ampliadas 113, alargando, assim, a capacidade disponível em mais de 164 000 lugares. Em relação ao ensino superior politécnico, a população discente passou de 4000 alunos, em 1987, para 27 000, em 1990, tendo-se quebrado os preconceitos que envolviam este ramo do ensino, ao mesmo tempo que se contribuiu para a fixação de quadros em cidades de tamanho médio, pela criação de institutos que oferecem saídas profissionais interessantes. Só nos últimos três anos foram criados seis novos institutos politécnicos.
A prioridade dada à educação é traduzida pelo crescimento do investimento nela feito, que aumentou 60 % entre 1985 e 1990. E os resultados vêem-se: as taxas de
escolarização do grupo etário dos 14 aos 18 anos subiram, entre 1985/1986 e 1990/1991, de cerca de 40 % para um valor à volta dos 70% (uma subida de 30%) e a percentagem de jovens entre os 18 e os 22 anos que frequenta o ensino superior passou de 13 %, em 1985, para 20 %, em 1990.
Não gostaria que passasse despercebida a referência que fiz ao novo factor em que é tido o ensino superior politécnico e à nova atitude social a seu respeito. Isso traduz, de facto, uma mudança em relação à sociedade preconceituosa que era a portuguesa ainda não há muitos anos atrás. Ela está, hoje, mais segura e confiante em si própria, o que lhe permite ser menos encamiçadamente defensora de privilégios estratificadores dos grupos sociais.
No que respeita a estradas, foram concluídos, entre 1987 e 1990, cerca de 330 km de estradas nacionais e encontram-se em curso obras em cerca de 380 km, dos quais 170 km de itinerários principais e 210 km de itinerários complementares. Ao longo daquele período, foram abertos ao tráfego 133 km de auto-estradas, prevendo-se que esse número, em 1991, seja da ordem dos 120 km. E, em correspondência, o parque automóvel cresceu a uma laxa média anual de 9 %, desde 1985.
É evidente que as estradas, as escolas, os hospitais e todo o surto de realizações materiais que estão a mudar a face do País têm a ver com o investimento público que fizemos. Se certas cidades do interior hoje retêm ou atraem a população é porque a sua acessibilidade em relação ao exterior melhorou ao ponto de tornar viável a localização de muitas novas actividades económicas e, também, porque as condições de vida oferecidas aos seus habitantes experimentaram uma alteração radical. Isso teve, naturalmente, a ver com a orientação muito selectiva que fizemos na afectação dos dinheiros públicos e das ajudas que recebemos da Comunidade Europeia.
Os resultados preliminares do Censo 91 - conseguidos em tempo ímpar devido à montagem de uma organização exemplar-, além de mostrarem que crescemos, em 10 anos, cerca de 4,3 % (ultrapassando o número mágico dos 10 milhões, para sermos hoje cerca de 10,3 milhões), indicam também que a tendência para a «litoralização» da ocupação do espaço do continente está a abrandar. Em certas regiões, a expressão dessa tendência foi mesmo dividida por três ou por quatro. Tem, obviamente, de se fazer ainda muito para a contrariar, mas, pela primeira vez, nota-se um sinal claro de mudança, porque se conseguiu reter população em certos núcleos urbanos do interior. A receita está encontrada! Tem, agora, de se insistir nela e de reforçar a dose dos diversos tipos de investimento que permitiram alcançar resultados tão prometedores.
O investimento público assegurado pelo Plano de Investimentos e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central (PIDDAC) foi, entre 1986 e 1991, de cerca de 1000 milhões de contos, a preços correntes, representando cerca de 10 % do investimento total e 2,5 % do produto interno bruto. E a contribuição dos fundos estruturais comunitários para o investimento público e privado realizado no País foi de cerca de 550 milhões de contos.
Estes montantes permitiram que as taxas de crescimento do investimento fossem as maiores durante mais largo período de tempo que alguma vez já se verificou em Portugal. A taxa média anual de crescimento do investimento foi, entre 1986 e 1990, igual a 10,6 %. Isto quer dizer que o investimento público euro das tais «externalidades» indispensáveis ao estímulo e ao apoio do investimento
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privado e que reinou a confiança que permitiu aos agentes investidores particulares desencadearem muitas iniciativas que foram instrumentais na criação de emprego e, naturalmente, responsáveis pelas altas taxas de crescimento conseguidas.
A repartição daquele investimento, para utilizar a grande divisão que consta dos documentos que a Assembleia da República apreciou e aprovou, foi a seguinte: o PIDDAC Tradicional 85 % e o PIDDAC Apoios (estímulos ao investimento privado nos domínios da agricultura, indústria, comércio e turismo) foi de 15%. E, dentro do primeiro grupo, foram as infra-estruturas ligadas às acessibilidades e aos equipamentos de apoio à educação que levaram a maior fatia. Houve, assim, uma definição clara de prioridades. Os nossos planos e os nossos orçamentos nunca foram meramente incrementalistas das repartições de verbas do passado, furtando-se às dificuldades que as escolhas - e especialmente as escolhas muito nítidas - costumam levantar. A estratégia clara de facilitar a actividade económica e de promover os Portugueses através de uma educação robusta e de uma formação profissional adequada teve tradução explícita nos investimentos públicos realizados.
O modo como tudo foi feito traduz um estilo que também já demonstrou o seu acerto. Poderíamos ter concentrado os auxílios comunitários nas obras da administração central, arranjando bons argumentos ligados à facilidade e à eficiência da sua gestão para não alargar o número dos agentes realizadores. Mas nós entendemos que os benefícios do acesso a fundos destinados a acelerar o nosso desenvolvimento se deveriam alargar ao maior número, envolvendo na operação quem tivesse energia e vontade e fazendo sentir de perto aos nossos concidadãos, na sua vida de todos os dias, a mudança que a adesão à Comunidade Europeia pode, para eles, significar.
O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, vimos aprovada uma lei das finanças locais que consagra um mecanismo de evolução do Fundo de Equilíbrio Financeiro que o faz crescer à mesma taxa que o imposto sobre o valor acrescentado, associando desse modo a progressão das disponibilidades municipais à da riqueza criada.
Assim, na certeza de que os meios nunca serão considerados suficientes, garantimos a existência de disponibilidades acrescidas para fazer face às contrapartidas exigidas pelo aproveitamento dos auxílios comunitários.
O Fundo de Equilíbrio Financeiro passou de um valor de 65 milhões de contos, em 1985, para quase 158 milhões de contos, em 1991. Além disso, foram desenhadas fórmulas diversas de apoio, em matéria de crédito, que permitem a realização de investimentos avultados em infra--estruturas e equipamentos ligados ao desenvolvimento local.
Por outro lado, tivemos também a iniciativa de promover o aumento global das receitas fiscais dos municípios, bem como a transferência de novas receitas provenientes de impostos, como o da sisa, que se traduzem num acréscimo que as fez passar de 19 milhões de contos, em 1985, para 77 milhões de contos, em 1991.
Por outro lado ainda, é bom não esquecer que os municípios portugueses, ao contrário do que sucede com a maior parte dos nossos parceiros comunitários, beneficiam também da transferência de fundos europeus, demonstrando a confiança que nas suas estruturas o Governo tem para levar a cabo a vasta acção de desenvolvimento harmonioso do País que está em curso.
Os Portugueses vêem concretizar-se, perto de si, obras por que ansiavam há muitos anos, pondo-se mais facilmente em contacto com os locais de emprego ou de prestação de serviços. Isso não teria sido possível sem um envolvimento entusiástico dos autarcas! Não há soluções centralizadas bem sucedidas para a realização de uma operação tão vasta e tão profunda como a que levámos a cabo. Mas também não há sucesso sem a definição prévia de uma estratégia e sem o estabelecimento de prioridades claras nos investimentos que se fazem e nas acções que se empreendem. É por isso que insistimos tanto na elaboração dos planos directores municipais, estabelecendo o quadro geral da evolução pretendida, na decorrência dos quais se modelem os planos de orientação física geral ou de pormenor, distribuindo as actividades e fixando as condições em que elas ocupam o espaço.
Tendo promovido reuniões com todas as unidades de gestão dos programas operacionais regionais em curso e visto de perto como evoluiu e evolui a sua concretização, tentando ajudar a ultrapassar algumas das dificuldades que sempre surgem, posso dar à Assembleia da República um testemunho fundamentado da capacidade de realização da estrutura que montámos e que repousa muito na vontade e na participação de numerosos agentes, entre os quais se salientam os autarcas. Não fazemos, assim, exercícios teóricos de descentralização. Treinamos na prática a definição descentralizada de estratégias e de prioridades, preparando o caminho para a transferência de responsabilidades que muitas décadas de centralização fizeram puxar e teimosamente manter no topo da pirâmide administrativa.
Se articularem todas as vertentes da acção multímoda que temos vindo pacientemente a concretizar, VV. Ex.ªs dar-se-ão conta de que ela obedece a um desenho estratégico que associa o desenvolvimento à descentralização de responsabilidades e à participação dos cidadãos, nada fazendo com a precipitação que deitaria tudo a perder. Não cedemos, assim, às tentações tácticas de obtenção de resultados populares a curto prazo: o que está em causa é o futuro dos Portugueses, preparado numa ocasião ímpar, na qual temos alguns meios financeiros suplementares e beneficiamos de uma grande reserva de crédito e de respeito, conquistada por via de um trabalho aplicado e competente.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Temos recebido ajudas comunitárias, mas também nos aplicámos a negociá-las e a investi-las bem. O quadro comunitário de apoio relativo a Portugal apresenta a segunda melhor capitação de fundos entre as regiões menos desenvolvidas e com problemas de ajustamento estrutural. Na realidade, vimos ser-nos afectados 19,2 % dos recursos totais disponíveis que devem ser comparados com o valor de 14 % correspondente ao peso da população portuguesa no conjunto da população beneficiária pertencente àquelas regiões. Para confirmar o aceno da estratégia delineada na proposta que representou o nosso plano de desenvolvimento regional, vimo-la integralmente aceite pela Comissão da Comunidade, mesmo em componentes nunca anteriormente apoiadas. E ainda, para demonstrar como enunciámos claramente os problemas que se põem, vimos adoptadas pela Comunidade as iniciativas que lhe propusemos para aplicar meios que a Comissão tinha reservado para distribuir segundo os seus
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(...) próprios critérios: tal é o caso do Programa para as Regiões Transfronteiriças - INTERREG -, ontem assinado em Lisboa, do Programa para as Regiões Ultraperiféricas - REGIS -. aprovado a semana passada, e do projecto respeitante à distribuição de gás natural em Portugal.
Começa a ver-se o resultado da aplicação dos fundos que negociámos de forma competente e na concretização de cujos projectos estamos agora ocupados. Mesmo em modificações estruturais complexas, como é a atenuação das disparidades regionais, temos insistido de modo expressivo. A repartição global dos apoios concedidos pelo FEDER entre o litoral e o interior, nos primeiros cinco anos da adesão, permite constatar uma concentração significativa de meios nas zonas mais desfavorecidas do País. Com efeito, o interior absorveu 70 % das verbas canalizadas pelo FEDER para Portugal, contra apenas 30 % para as zonas relativamente mais desenvolvidas da faixa litoral entre Braga e Lisboa ou, se quisermos de outra forma, por cada 1000 contos investidos com comparticipação FEDER, 730 foram canalizados para as parles menos desenvolvidas do território. A capitação dos apoios FEDER foi assim de 63 contos no interior contra 26 contos no litoral. Isto demonstra que não fomos movidos somente por preocupações de crescimento, esquecendo o desenvolvimento. É evidente que sem o primeiro não há o segundo, mas nós tentamos não comprometer o primeiro, negligenciando o segundo!
Procuramos assegurar, além de um equilíbrio espacial, um outro intersectorial e, ainda, um outro interinstitucional, distribuindo encargos e responsabilidades por um grande número de agentes. Está, assim, garantida uma correcção das desigualdades regionais, ao mesmo tempo que se procura um reforço da coesão interna do País e da própria Comunidade. É esse o sentido da coexistência de mais de 70 programas operacionais, cuja coordenação não pode deixar de ser muito exigente, mas cujos resultados são claramente promissores.
Sr. Presidente, a inovação de ideias e de processos representa, para nós, uma preocupação constante. É por isso que apoiamos expressivamente os equipamentos que, no quadro das associações empresariais, estimulam as transferências tecnológicas e despertam a vontade de inovar. E, como não queremos permanecer como copiadores e pagadores de patentes relativas a inovações que outros inventaram e registaram, tendo detectado esta debilidade do nosso tecido produtivo conjugada com uma potencialidade evidente dos nossos investigadores científicos, fizemos a proposta - primeira na Comunidade - de apoio às nossas actividades neste domínio, obedecendo à mesma lógica geral. Investir nas coisas, mas, sobretudo, investir nas pessoas!
É com esta dupla vertente que está estruturado o Programa Ciência. Ele visa a formação avançada de recursos humanos e atende, de forma especial, à criação e reforço das infra-estruturas físicas de apoio às actividades científicas. A ciência e a tecnologia representam, hoje, um vector determinante do desenvolvimento económico e social e constituem um instrumento privilegiado de afirmação cultural e de cooperação. Por isso nos aplicamos a expandir a nossa comunidade científica e a apoiar os sectores que consideramos prioritários. Não negando meios aos projectos realmente válidos, usamos, também aqui, da mesma frontalidade que em tudo o resto e fazemos escolhas! Justificamos por que as fazemos, mas não iludimos ninguém acerca das prioridades que consideramos como mais adequadas. E porque perseguimos sempre o melhor, não tivemos dúvidas em solicitar um novo exame à nossa política científica e tecnológica, a realizar pela OCDE. Já começou a fase da recolha de dados; o exame propriamente dito terá lugar já no próximo mês de Julho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não gostaria que os números que referi e o rol que fiz das coisas boas que conseguimos, ao longo dos últimos anos, fosse interpretado como sinal de comprazimento connosco próprios. É a insatisfação permanente o que nos caracteriza e é de inconformismo a postura que julgamos como adequada para quem tiver responsabilidades públicas. Fizemos muito, mas há ainda muito mais para fazer! O que conseguimos permitiu ao País mudar de imagem e demonstrou aos Portugueses que não há barreiras intransponíveis, se todos se aplicarem na concretização de um projecto mobilizador e tiverem confiança nas suas próprias capacidades.
Nós fizemos a nossa obrigação e conseguimos induzir a confiança e o entusiasmo que levou uma grande parte dos nossos concidadãos a contribuir decisivamente para o desenvolvimento de todos. É isso que mais nos satisfaz!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, os Srs. Deputados Carlos Brito, Octávio Teixeira, Nogueira de Brito, lida Figueiredo, Rogério Brito, Álvaro Brasileiro, Armando Vara e João Corregedor da Fonseca.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado António Guterres, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Dias Loureiro): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado António Guterres: V. Ex.ª, logo no início da sua intervenção, anunciou que iria procurar fazer com a Câmara uma reflexão lúcida. Nesse sentido, eu quero analisar consigo alguns aspectos da lucidez da intervenção que aqui produziu.
A primeira coisa que queria registar é que Portugal inteiro, através da televisão, e os deputados, nesta Câmara, viram que, há oito dias, o Partido Socialista não foi capaz de responder, em cima da hora, ao Sr. Primeiro-Ministro. Registamos agora que necessitou de oito dias para preparar uma resposta que, afinal, como vamos ver, não é resposta nenhuma!
No entanto, Sr. Deputado, antes de lhe colocar a minha pergunta, gostaria de pontuar quatro ou cinco aspectos da sua intervenção.
Em primeiro lugar, o que V. Ex.ª afirmou em relação à estabilidade. O Sr. Deputado disse que a estabilidade não se deve ao Governo, mas, sim, aos eleitores. Só que V. Ex.ª está enganado, pois ela deve-se a ambos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Deve-se aos eleitores o facto de terem criado as condições para que haja estabilidade, mas deve--se ao Governo e demais órgãos de soberania não terem delapidado essas condições.
Mas a questão não é essa. A questão é a de saber, em relação à estabilidade, se ela foi boa ou má para Portugal,...
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Foi má!
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O Orador: -... e nessa questão V. Ex.ª não entrou. Nós dizemos que a estabilidade foi boa e por isso pedimos aos Portugueses, naquilo que deles depende, que a renovem em Outubro próximo. Esta, sim, é a questão!
Em segundo lugar, gostaria de pontuar uma afirmação com a qual estou inteiramente de acordo e que é o facto de V. Ex.ª, e porventura o PS, ter agora algum apreço e desejar mesmo para Portugal um governo de maioria. Como às vezes parecem dar a impressão de que não, registo neste caso, com muito agrado, que também o PS defende um governo de maioria para Portugal!
Um outro aspecto que desejo pontuar tem a ver com o que V. Ex.ª disse no que concerne às relações entre o Sr. Presidente da República, o Primeiro-Ministro e o Governo, de um modo geral. Nos últimos anos, foi sempre estratégia do Partido Socialista tentar criar a dissensão entre o Sr. Presidente da República, o Governo e o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Vítor Caio Roque (PS): - Não é verdade!
O Orador: - Foi, no entanto, uma tarefa que nunca conseguiram levar a cabo. Aliás, quero dizer-lhe que nunca a conseguiram levar a cabo porque quer o Primeiro-Ministro quer o Presidente da República viram o que era importante construir, como relação institucional entre ambos, para servir Portugal. Foi isso que viram, foi assim que fizeram e é assim que, seguramente, vão continuar a proceder! Pode porfiar o Partido Socialista, pode porfiar V. Ex.ª nesse caminho, mas não «levarão a nau a bom porto»!
O Sr. Mário Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Em quarto lugar, V. Ex.ª falou de uma estratégia de desenvolvimento.
Sobre este lema, não queria dizer muito, porque iremos ter tempo, ao longo do debate, de falar sobre estes assuntos. No entanto, queria, desde já, apenas notar uma coisa: V. Ex.ª, quando falou da democracia, no exagero da sua linguagem - notável, mas prejudicial para V. Ex.ª, penso eu -, deve ter gasto na economia do seu discurso, porventura, uma 10 páginas, só que para falar no desenvolvimento não gastou mais do que meia página, suponho, ou, porventura, uma página.
Protestos do PS.
O Sr. António Guterres (PS): - Respondo-lhe já a essa questão!
O Orador: - Aliás, falou do desenvolvimento com a demagogia de sempre e até afirmou: «Agora é o milagre!» «Agora o Partido Socialista faz tudo!» É a consulta no próprio dia; é a educação para todos!...
Sr. Deputado António Guterres, penso que o Partido Socialista devia ter algum decoro quando fala em certas matérias.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: -Já que se trata de um exercício de lucidez, o Partido Socialista faria muito bem se olhasse para a sua própria história! É que nesta questão do desenvolvimento, nesta questão das soluções sociais, o Partido Socialista não
devia esquecer-se que, quando teve oportunidade de fazer, quando os Portugueses lhe confiaram um mandato para realizar, produziu mais desemprego, perda do poder de compra, trabalho precário, não foi capaz de promover concertação social, ele.... Iremos, certamente, falar muito disso, mas não quero deixar de referenciar que a história do PS recomenda ao Partido Socialista, no mínimo, muito decoro quando fala destas matérias!
Referiu-se, de seguida, à construção europeia para falar de um país - pasme-se! - «de chapéu na mão». V. Ex.ª não encontrou melhor imagem que esta: «Um país de chapéu na mão.» Ó Sr. Deputado António Guterres, não é pelas mãos do Partido Social-Democrata que o País anda a pedir. No entanto, foram as mãos dos socialistas que andaram, «com um chapéu na mão», a pedir para Portugal! Quem não se lembra do «grande empréstimo»!? Este era um empréstimo de escassas centenas de milhões de dólares e o Partido Socialista, quando foi governo, teve de procurar no mundo inteiro um sindicato bancário que pudesse emprestar dinheiro a um país que, nessa altura, não tinha crédito para escassas centenas de milhões de dólares!
Aplausos do PSD.
Sr. Deputado António Guterres, não foi o Partido Social-Democrata nem o actual governo que trouxeram a austeridade e a recessão; não foi o actual governo que trouxe para Portugal o Fundo Monetário Internacional. V. Ex.ª fala de democracia, mas esta é, em primeiro lugar, a capacidade que temos de decidir por nós próprios. Porém, esse não foi o caso, quando esteve aqui, trazido por VV. Ex.ªs, o Fundo Monetário Internacional!...
V. Ex.ª cometeu, como, aliás, tem cometido ultimamente o seu partido, um profundíssimo abuso na linguagem que, de um modo geral, empregam. Excessiva no que diz respeito à liberdade que V. Ex/diz não existir, no que diz respeito... Aliás, V. Ex.ª empregou aqui uma expressão notável: «Depois de falar, não vou ser preso.» Sr. Deputado, para bem do Partido Socialista, VV. Ex.ªs deviam mudar de linguagem!
Terminarei a minha intervenção com uma pergunta.
No rol de desgraças que hoje, como sempre, o Partido Socialista só vê em Portugal, faço-lhe, Sr. Deputado António Guterres, um desafio destinado a ver da sua própria lucidez, bem como da do seu partido: é capaz de apontar apenas três coisas, três simples coisas, que tenha achado positivas, que tenha achado boas para Portugal e que possa imputar ao Partido Social-Democrata e ao seu governo?
Três coisas, apenas, Sr. Deputado!
Aplausos do PSD.
Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Maria Manuela Aguiar.
A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado António Guterres, como há mais oradores inscritos para lhe pedir esclarecimentos, pergunto se V. Ex.ª deseja responder já ou no fim.
O Sr. António Guterres (PS): - No fim, Sr.ª Presidente.
O Sr.ª Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado José Pacheco Pereira.
Neste momento, o deputado José Pacheco Pereira dirige-se para a Tribuna, sendo aplaudido pelo PSD.
Protestos do PS.
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O Sr. José Pacheco Pereira (PSD): - Sr." Presidente, Srs. Deputados: Nesta Casa, ainda são os deputados quem decidem do sítio de onde desejam falar.
Sr. Deputado António Guterres, ouvi com muita atenção a sua intervenção e penso que haverá muita coisa para discutir, e seriamente, retirado o nível retórico que há sempre nas intervenções deste tipo e o carácter abstracto do discurso do Partido Socialista, porque o Partido Socialista faz um discurso cuja relação não só com a sua própria acção como com a realidade é inteiramente abstracta não só naquilo que foi a sua responsabilidade como naquilo que são as soluções possíveis na realidade presente.
Mas, deixando isso, porque não lenho tempo para analisar esse aspecto de disfunção que existe no discurso socialista, gostaria de colocar um problema que, penso, é de fundo e que tem a ver com a linguagem política do Partido Socialista. Esse problema é o da enorme diferença entre a análise, a descrição e o retraio que o Partido Socialista faz do País e a percepção que o País tem de si próprio. £ se há, o problema que existe hoje, na actividade política do Partido Socialista, ele tem a ver com a enorme diferença de percepção que o País tem dos problemas que as pessoas sentem existir e aquilo que o País reconhece na descrição e no discurso político do Partido Socialista.
O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado António Guterres, até admito que, no inventário casuístico que faz das questões, possa ter razão numa ou noutra, mas não tem razão de certo na análise global e na extrapolação dos casos individuais para uma análise globalizada da situação do País.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Desse ponto de vista, o Partido Socialista coloca-se na situação de falar sozinho - e nem sequer me refiro às sondagens, deixemo-las de parte e vamos ver os estudos de opinião, os estudos sociológicos, a percepção que os Portugueses têm, no discurso sobre si próprios, da situação do País!
É difícil, neste momento, convencer os Portugueses de que se vive num período de grande conflitualidade social, porque se as centrais sindicais não se convencem dessa conflitualidade, muito menos o cidadão comum, que assiste a um ano, em grande parte, sem greves.
Protestos do PS.
Não é uma andorinha que faz a Primavera!
Mais: os senhores querem discutir este assunto seriamente, portanto presumo que têm consciência de que as greves diminuíram consideravelmente. E não se pode andar a «bater com a cabeça nas paredes» para tentar encontrar uma realidade social que não existe!...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Quanto às «injustiças sociais», os Srs. Deputados do PS falam, e com razão, do aparecimento de fenómenos da nova pobreza; mas esquecem-se de que o que caracterizava o País era a velha pobreza, fenómeno não circunscrito à realidade urbana, mas espalhado por quase todo o País, que, em grande parte, desapareceu do mapa social.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A nova pobreza é um fenómeno do próprio desenvolvimento, que surge em todos os países que fazem a transição do subdesenvolvimento para o desenvolvimento e que, se merece atenção social, evidentemente, não pode ser transformada no mesmo tipo de bandeira política que era a pobreza do País, em sentido lato, das pessoas que andavam descalças nos anos 30, o que justificava, no tempo do salazarismo, fazer campanhas contra o «pé descalço».
Essa realidade tem vindo a desaparecer e não há habilidades retóricas nem discursivas que convençam a maioria dos portugueses de que nos encontramos numa situação pior que a do passado.
Srs. Deputados do Partido Socialista, as pessoas não são parvas sobre a sua própria situação! Podem querer mais, podem ter mais expectativas, mas têm consciência de que a situação se alterou!
Os Srs. Deputados do Partido Socialista falam no «descalabro económico», mas como é que os senhores, como portugueses que respondem aos estudos sociológicos e às sondagens, que têm mais expectativas de vida, que são optimistas em relação ao seu futuro, que têm confiança económica real, mostrando-a na aplicação do vosso dinheiro - e esta é a «prova dos nove» daquilo que, no fundo, é a relação das pessoas com as poucas posses que têm -, como é que os senhores nos querem convencer, no vosso discurso, que existe uma sensação geral de «descalabro económico»?
O problema do Partido Socialista é o de que o seu discurso político é autista em relação à percepção que os Portugueses têm do seu discurso económico. Até posso admitir que o Partido Socialista queira prevenir os Portugueses, só que faz um discurso sobre a realidade que está a milhas da percepção dos portugueses comuns sobre essa realidade!
Com isso, Sr. Deputado António Guterres, bem pode falar para os políticos, para os jornais, mas dificilmente falará para o País!
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: -Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
Vozes do PSD: - Ah! Também vai falar da tribuna!
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Embora não sendo o intérprete privilegiado da opinião do povo português, como é o Sr. Deputado José Pacheco Pereira, entendo que, por razões mediáticas, também tenho que falar da tribuna. Confesso-o humildemente.
Risos
E também digo, Sr. Deputado José Pacheco Pereira, que começo por pedir ao Sr. Deputado António Guterres e ao Partido Socialista que não modifiquem este seu discurso, porque, devo dizê-lo, gosto dele.
Risos do PS.
Não é bem o discurso habitual do PS, não é o discurso palavroso, de abuso de dados estatísticos; combina uma certa ideia de desenvolvimento com a informação, a preci-
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(...) são e a preocupação de um conceito global do homem e da sua posição na sociedade. Gosto deste vosso discurso! O que realmente lamento 6 que, ao fim e ao cabo, a Assembleia não corresponda inteiramente a este tipo de discurso, porque o Sr. Deputado António Guterres fez um discurso preciso, com críticas precisas, com algumas precisões no programa para o futuro, mas não obteve uma resposta satisfatória. Ou antes: o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território fez-lhe a vontade, isto é, produziu exactamente o que ele previa que ia ser o discurso do Governo e, depois, o Sr. Deputado José Pacheco Pereira fez o discurso palavroso, que, normalmente, vem também da bancada socialista.
Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Gostou, mas não gostou!
O Orador: - Sr. Deputado António Guterres, agora acabaram-se os elogios. Vamos entrar na crítica ao seu discurso!
Apesar de ter feito um discurso de que gostei, V. Ex.ª não deixou de fazer transparecer nele aquilo que, no meu e no nosso entender, são vícios permanentes do seu partido e de que vou dar exemplos.
Em primeiro lugar, o vício da contradição. V. Ex.ª, quando falou de desenvolvimento - não sei se foi apenas uma pagina, porque ouvi uma parte do discurso na rádio-, assentou a estratégia do PS numa política de concertação, mas, um minuto antes, tinha dito, com ar de catástrofe, que campeiam a discriminação e o medo nos empregos.
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - E é verdade!
O Orador: - Sr. Deputado António Guterres, o que é isto?! Será que V. Ex.ª, como acontece com a sua colega de bancada Elisa Damião - a exemplo do que fez o nosso colega Jorge Lemos, que tem a justificação de não ter celebrado o acordo ortográfico-, rasga aqui o acordo económico de concertação social que celebrou e assinou?
Vozes do PS: - Nós não assinámos nada!
O Orador: - Qual é o vosso grau de fidelidade à concertação e às políticas de concertação? É essa?
Quando falava de discriminação e medo nos empregos. Sr. Deputado António Guterres, estava V. Ex.ª a pensar nas recentes medidas tomadas em matéria de legislação do trabalho, medidas que foram acordadas por elementos da sua bancada e aqui renegadas, aliás, numa posição algo dúbia, porque, depois, não apoiaram quaisquer medidas de substituição?
O segundo defeito que apontarei é o do silencio. V. Ex.ª disse muita coisa, não há dúvida alguma, referiu-se a muitos aspectos positivos e precisos, mas houve silêncios reveladores.
Criticou o Governo por ter uma política de conjuntura de ataque à inflação, através de remédios monetários, mas como é que VV. Ex.ªs fariam? Como é que atacariam conjunturalmente a inflação? Esperavam pelos seus remédios estruturais?
Estão à espera de nos sujeitar ainda a uma estabilidade mais «estável» do que esta?! Não me diga que está à espera de mais do que quatro anos, dos remédios da estrutura, do desenvolvimento, das correcções dos vícios estruturais, ou acha que há outros remédios?
Como é que VV. Ex.ªs atacaram esses males conjunturais quando estiveram no governo? Não foi também com estes «remédios monetários»?
Não caio no erro do Sr. Deputado José Pacheco Pereira, mas até lhe podia perguntar Sr. Deputado José Pacheco Pereira, o que é que dizia o presidente do vosso partido sobre o acordo a celebrar com o Fundo Monetário Internacional? Sei rigorosamente o que é que ele dizia: advogava-o!
No fundo, Sr. Deputado, os remédios são os mesmos, todos adoptam os mesmos remédios!
Finalmente, Sr. Deputado António Guterres, V. Ex.ª pretende fazer um discurso diferente, sem dúvida, mas lá está o Partido Socialista com «mais Estado».
Para já, o que V. Ex.ª nos prometeu aqui foi, caso ganhe as eleições, uma mão-cheia de impostos. E vou já dizer-lhe porquê. Em primeiro lugar, numa crítica muito comum a todos os membros do seu partido, disse que «o trabalho é laxado, através do IRS, de uma forma pesada, mas as especulações sobre o capital são taxadas apenas com 10 %». No entanto, V. Ex.ª não nos diz o que é que pretende fazer. Pretende baixar a carga fiscal sobre o trabalho ou pretende apenas subir a carga fiscal sobre o capital e a especulação?
E V. Ex.ª sabe e reconhece ou não que há uma razão para essa carga menor sobre o capital e a especulação? Se até falou no panorama triste do nosso mercado de capitais, então, sabe que as coisas estão, entre si, relacionadas.
Por outro lado, falou-nos em soluções para a segurança social, que vieram logo ligadas a um imposto novo sobro os rendimentos e a um imposto que, nas empresas, taxasse, além dos lucros, o valor acrescentado.
Portanto, Sr. Deputado, as novidades, no seu discurso, foram muito poucas, as do costume: «mais Estado», mais impostos!
Não, Sr. Deputado António Guterres! Assim suponho que não vamos lá! Não há qualquer novidade e, assim, não haverá correcção definitiva dos nossos males estruturais!
Aplausos do CDS e do PSD.
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa tem usado de alguma tolerância no tempo atribuído para pedir esclarecimentos, porque sabe que ele desconta nos tempos globais dos partidos. Mas tem de a temperar com algum rigor, porque, de qualquer modo, não se deve transformar um pedido de esclarecimento numa intervenção.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social.
O Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social (Silva Peneda): - Sr. Deputado António Guterres, uma primeira impressão que gostava que ficasse registada: o seu discurso tem títulos, tem agenda. Não estou a menosprezá-lo, mas tão-só estou a dizer que tem matéria e pontos importantes, que carecem de reflexão.
E o primeiro registo aqui fica: o PS vem, tarde, propor um debate centrado em questões sociais. E o que dele tiro, da pane do Partido Socialista, é, apenas e exclusivamente, uma longa lista de medidas que se transformam no agravamento do défice, por exemplo, do sistema de segurança social, sem nunca ouvir qualquer alusão às receitas.
O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Muito bem!
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O Orador: - Portanto, saúdo essa novidade do PS, muito embora não esteja acompanhada de soluções concretas. Mas, repito, os pontos agendados para a discussão são importantes.
Em segundo lugar, Sr. Deputado, gostava de dizer que, infelizmente noutras sedes, temos discutido muito mais essa matéria. Recomendo-lhe vivamente a leitura do documento da concertação social, onde muitas coisas do que disse estão bem desenvolvidas e bem consensualizadas entre os parceiros sociais e o Governo.
Mas há um aspecto que gostava de precisar em relação à sua intervenção: 6 o respeitante à parte em que se referiu ao alargamento da dimensão social no que tem a ver com a Comunidade Económica Europeia. Conhece a proposta formal que Portugal apresentou em sede de união política sobre essa realidade da dimensão social europeia? Se sim, também gostava muito de ouvir o seu comentário em relação ao texto apresentado pelo Governo Português.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Começo por aquilo que me parece importante, ou seja, pelas intervenções do Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social e do Sr. Deputado Nogueira de Brito, deixando para o Hm o fait divers de política sem grande conteúdo do Sr. Deputado José Pacheco Pereira.
Em relação às questões levantadas pelo Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social e com a seriedade que merece a forma como as colocou, dir-lhe-ei que o PS tem apresentado várias vezes e em varias sedes os lemas que hoje aqui abordei em matéria de política social - não são novos neste discurso-, que correspondem, na nossa perspectiva, às duas questões chave que temos de enfrentar e que passo a referir.
Uma delas, que não tem estado clara no discurso do Governo, é a questão da selectividade, uma questão difícil, cuja discussão, em profundidade, nos poderá levar muito longe.
A tendência, nas sociedades europeias, tem sido a da garantia universal de direitos a todos os cidadãos. Essa garantia custa cada vez mais cara porque esses direitos são cada vez mais sofisticados e porque as condições técnicas da sua satisfação são cada vez maiores.
Assim, a grande questão que temos de resolver é a de sermos capazes de, sem discriminações negativas, que seriam extremamente difíceis de aceitar pela opinião pública, conseguir reorientar a política social no sentido de ela se dirigir, sobretudo, a uma discriminação positiva, em favor daqueles que realmente precisam.
Isto tem uma vantagem em relação à manutenção de uma política de direitos generalizados para todos: conduz a uma apreciável redução de encargos. É por isso que, Sr. Deputado Nogueira de Brito, p conteúdo global da minha intervenção não é, necessariamente, um conteúdo de mais Estado, mas, sim, de nova filosofia nas relações sociais e na política social, valorizando até o papel dos instrumentos sociais e privados na cobertura dos riscos sociais, como, seguramente, terá ouvido.
Depois, há a questão do financiamento da segurança social, e em relação a este assunto penso que o actual sistema já encontrou os seus limites e precisa de ser corrigido. Porém, isso não é fácil, razão pela qual eu não disse qual era a solução e apenas apontei duas pistas.
A primeira tem a ver com a alteração da forma que as contribuições patronais têm seguido (de proporcionalidade aos salários), tendo em conta que a podutividade cresce, que cada vez as indústrias são mais de capital intensivo, pelo que parece lógico que isso seja corrigido, progressivamente, no sentido de o valor acrescentado poder ser incluído e não apenas os salários.
A segunda pista tem a ver com o financiamento do défice da segurança social pelo Orçamento do Estado em termos genéricos - aliás, lemos discutido este tema muitas vezes nesta Câmara - e apontei a solução do Governo Francos como uma das possíveis para meditar.
Devo dizer que, em matéria de política europeia, penso que o Governo Português tem sido tímido, nomeadamente na defesa da Carta Social, embora eu perceba essa timidez devido à necessidade de salvaguardar alguma competitividade da economia portuguesa numa primeira fase, pelo menos.
Mas aquilo que referi foi a questão da negociação para a coesão económica e social, que não tem a ver com a política social, mas, sim, com as relações entre a Europa mais desenvolvida e a menos desenvolvida. Quanto a esta matéria, conheço as propostas que o PS apresentou a esta Câmara em lermos de revisão dos tratados, mas não conheço as propostas do Governo; sei apenas que em Bruxelas - e sei estas coisas pelos outros governos, e não pelo Governo Português, o que é dramático. Aliás, sei coisas que se passam em Conselhos de Ministros em Bruxelas por via de governos estrangeiros e que o Governo Português não diz...
O Sr. Alberto Martins (PS): - Muito bem!
O Orador: - Mas, como estava a dizer, sei que, em Bruxelas, o Governo Português não apoiou as propostas espanholas, nomeadamente, que me pareciam extremamente positivas no sentido de reforçar as condições para a economia dos países do Sul, e apresentou algumas ideias, com pouca viabilidade, em relação a um novo fundo, que ninguém compreendeu muito bem o que era.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, devo dizer-lhe, tentando retribuir a sua gentileza, que, aliás, não subscrevo apenas quando disse que o meu discurso era distinto do PS, pois ele é igual...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Tem nuances, tem nuances!...
O Orador: - Mas, em todo o caso, devo dizer-lhe que o senhor representa - e digo-o com toda a sinceridade - a oposição mais séria, mais profunda e mais global que consigo encontrar nesta Câmara às ideias do PS e, se quiser, à concepção europeia social-democrata que o PS subscreve para os problemas portugueses.
Vozes do PSD: -Ah!... Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Srs. Deputados do PSD, não confundam isto com o vosso nome, que não tem nada a ver!...
De facto, o Sr. Deputado Nogueira de Brito tem sido a voz que, nesta Câmara, com mais coerência, tem defendido o modelo de análise alternativo ao nosso próprio modelo para os problemas da evolução da economia europeia e mundial, pelo que quero registar esse facto. Aliás, o
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Sr. Deputado Nogueira de Brito já várias vezes socorreu o Governo, quando ele se encontrava em manifesta dificuldade para contra-argumentar connosco em algo que tem a ver especificamente com esse modelo alternativo.
Quantas vezes a resposta às nossas interpelações ao Governo, por inibição deste, vieram da sua parte?!... Por isso, este confronto de ideias é, para nós, Sr. Deputado Nogueira de Brito, sempre muito estimulante.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Enfio e a coligação?!...
O Orador: - Devo dizer que 6 mais fácil fazer uma coligação com quem tem ideias, mesmo que sejam diferentes das nossas, porque isso permite um compromisso, do que com quem nunca se sabe o que 6 que vai fazer a seguir, como se viu.
Aplausos do PS.
Mas o Sr. Deputado Nogueira de Brito - e disse aqui algumas coisas importantes-perguntou-me como 6 que concilio a concertação estratégica com a discriminação e o medo nos empregos e o que é que eu queria dizer com isso. Ora, pretendo significar exactamente o mesmo que disse o Prof. Freitas do Amaral quando disse que, para muitos empregos, era preciso ter o cartão do PSD. Foi isto que quis dizer!
Isto tem a ver, sobretudo, com os empregos que estão sob a alçada directa ou indirecta do Governo e não com os empregos na generalidade das empresas privadas portuguesas, embora eu entenda-e não lenho dúvidas em afirmá-lo - que continuam a existir empresas onde se verificam situações de abuso do poder patronal e esse é um problema da realidade portuguesa.
Por isso mesmo, já tenho sugerido, tal como o meu partido, que seja criado um sistema de incentivos para as empresas que se disponham a cumprir um conjunto de compromissos sociais, nomeadamente de defesa dos direitos internos dos respectivos trabalhadores, tais como questões de informação e outras que não estão salvaguardadas na generalidade do nosso tecido empresarial.
Creio, pois, que o Estado deveria tratar preferencialmente, através de alguns incentivos, as empresas que se dispusessem a dar aos seus trabalhadores uma maior dignidade humana. Aliás, penso que nisto estou inteiramente identificado com o que tem sido dito pela minha camarada Elisa Damião, cujas posições subscrevo.
Quanto à questão da inflação e da forma como ela se combate, gostaria de dizer o seguinte: a inflação combate-se com um mix de políticas, como é evidente. E qual é o drama da situação portuguesa? O drama da situação portuguesa tem a ver com a forma como o «poder laranja» encara o Orçamento do Estado, visto que a questão do Orçamento do Estado e da coerência na política orçamental é uma questão central em tudo isto e o «poder laranja» tão depressa deixa resvalar o défice orçamental, como aconteceu no ano passado e como provavelmente acontecerá este ano - veremos! -, como se compromete com as Comunidades com o Programa QUANTUM, que será, porventura, excessivo nas restrições que promete para o futuro.
Assim, é preciso referir que o Prof. Cavaco Silva, apesar de estar sempre a dizer que não é preciso austeridade, na verdade, o que está a propor, comprometendo-se com Bruxelas, é um programa de austeridade para os próximos
anos, com mais impostos e com menos despesas sociais, porque esse é o resultado inevitável das projecções sobre o défice orçamental que foram apresentadas no Programa QUANTUM.
O que tem havido em Portugal é a tentativa de, com políticas contraditórias, contrabalançar umas coisas com as outras e por isso, de repente, as taxas de juros sobem excessivamente ou mantém-se o escudo alto por um período anormalmente longo, o que causa problemas as indústrias exportadoras, porque é a maneira mais fácil e imediata, embora nem sempre a mais eficaz, de corresponder às necessidades.
Além disto, quero também dizê-lo, muitas vezes, estas coisas também decorrem da simples incapacidade, isto é, as taxas de juro também não estão tão altas porque o Governo assim determina ou porque o Banco de Portugal o quer; em grande medida, estas coisas acontecem também por alguma incapacidade e inabilidade, como sublinhei.
Não queremos mais Estado, mas não abdicamos do Estado como corrector de injustiças sociais, e aí talvez haja uma maneira diferente de vermos as coisas.
Aplausos do PS.
Não pensamos que seja necessário mais impostos; dizemos é que tem de haver um imposto único sobre todos os rendimentos e não apenas sobre os rendimentos do trabalho. O que não faz sentido é que, à semelhança do que acontece em quase toda a Europa comunitária, não se somem os diversos tipos de rendimento para fixar os escalões e as taxas. Se somassem todos os tipos de rendimento, embora nas mais-valias com as correcções que o seu carácter específico justifica-e a propósito disto pode ler o nosso projecto de lei sobre este assunto -, seria possível desagravar globalmente os escalões e eventualmente algumas taxas.
Na verdade, não queremos mais Estado, mas, sim, um Estado de natureza diferente. De qualquer forma, Sr. Deputado Nogueira de Brito, o debate sobre estas matérias é sempre estimulante.
Sr. Ministro e Sr. Deputado Pacheco Pereira: Além da vista cansada quanto às estatísticas, os senhores revelaram hoje aqui uma enorme surdez, porque não ouviram o que eu disse e responderam ao discurso que julgavam que eu ia fazer.
Vozes do PS: - Exacto!
O Orador: -Nós não fomos surpreendidos pela vinda aqui, há uma semana, do Primeiro-Ministro, mas os senhores, hoje, foram surpreendidos com o nosso discurso e foram-no tanto que não lhe souberam responder!
Aplausos do PS.
E mais: quando o Sr. Ministro nos diz que a Câmara e o País não viram a nossa resposta, tem razão em metade: a Câmara viu, o País não, mas isso não depende de nós, infelizmente depende mais de vós!
Aplausos do PS.
Estabilidade? Com certeza que a estabilidade em si é um bem, e é por isso que também nós queremos um governo de maioria, e é natural que o CDS e o PCP não queiram que nem nós nem vós tenhamos um governo de maioria... A questão que está em causa é saber se a estabi-
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(...) lidade é ou não bem aproveitada e se a maioria absoluta se transforma ou não em poder absoluto.
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Muito bem!
O Orador: - Assim, o que dizemos é que o PSD não aproveitou essa estabilidade e tentou transformar a sua maioria absoluta num poder absoluto, como é reconhecido generalizadamente pelo País.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado José Pacheco Pereira, a surdez - que também é, certamente, psicossomática, tal como o autismo que referiu, visto que esta surdez tem, com certeza, a ver com o vosso zelo em defender as posições do Prof. Cavaco Silva - levou-o a dizer, por exemplo, que eu falei mais em democracia do que em desenvolvimento.
Sr. Deputado, estive a confirmar e são quatro páginas para uma questão e quatro para a outra! Mas, compreendo: falar de democracia é uma coisa que o incomoda profundamente, enquanto falar de desenvolvimento é uma coisa que, digamos, entra por um ouvido e sai por outro, não tem grande problema, nem se nota que se está a falar desse assunto...
Vozes do PSD: - Vocês têm a consciência pesada!...
O Orador: - Mas, quanto às comparações com o passado, Srs. Deputados, por amor de Deus, de uma vez por todas, assumam a honestidade intelectual de reconhecer como as coisas são: o PS esteve no poder convosco, para resolver um problema dramático causado por vós,...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: -... porque quem empurrou o Pais para a bancarrota foi um governo liderado por vós!
Aplausos do PS e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos e José Magalhães.
O PS esteve no poder convosco, recebeu um país em que o défice corrente era da ordem dos 13 % ao ano, o que era seguramente o maior défice do mundo nesse momento.
Vozes do PS: - Muito bem! Vozes do PSD: - Não apoiado!
O Orador: - O PS deixou um país equilibrado, os senhores receberam um país equilibrado,...
Vozes do PSD: - Não apoiado!
O Orador: -... os senhores receberam centenas de milhões de contos das Comunidades iodos os anos...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É verdade!
O Orador: -... e ainda se gabam dizendo que fizeram melhor do que nós tínhamos feito no passado. Francamente, já chega!
Aplausos do PS.
E ainda bem que Mário Soares teve credibilidade para que o chapéu que ele, nessa altura, teve de estender à Europa pudesse ser cheio com o indispensável para termos o que comer no dia-a-dia nesse período, como os senhores deviam saber!
Aplausos do PS.
O Sr. Deputado José Pacheco Pereira disse que falo de desgraças. Isso não é verdade, fiz uma análise da situação do País extremamente equilibrada e até apontei várias coisas positivas. Não neguei os aspectos positivos da situação portuguesa, o que neguei foi o mérito substancial deste governo nesses aspectos positivos, o que são duas questões completamente diferentes.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Descontem os senhores os efeitos dos termos de troca favoráveis a Portugal, nos últimos cinco anos em relação aos cinco anos anteriores, descontem os efeitos da entrada de verbas da CEE, e vejam como é que Portugal estaria. É só isto que eu digo! Isto é claro e indesmentível, técnica e politicamente!
Aplausos do PS e dos deputados independentes Jorge Lemos e José Magalhães.
E a prova de que tenho a lucidez de reconhecer que este governo também faz coisas positivas é que vou dar-lhe quatro exemplos, embora me tenha pedido apenas três, para que veja a generosidade com que trato este governo.
Risos do PS.
Em primeiro lugar, a participação nas negociações de paz em Angola foi positiva...
Vozes do PSD: - Também era melhor!
O Orador: - Bem, então não querem exemplos? Estou a dá-los!
Aliás, ale devo dizer-lhes, provavelmente, é esta parle da minha resposta que logo à noite aparece na televisão, mas isso, paciência!, é a vida e eu já estou habituado a estas coisas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, a fase inicial do secretário de Estado J. Pimenta,...
Risos gerais.
... Carlos Pimenta, peço desculpa, do secretário de Estado Carlos Pimenta - aliás, não quero que seja estabelecido nenhum paralelo e tenho a maior simpatia pessoal por ele.
Mas, como estava a dizer, a fase inicial do secretário de Estado Carlos Pimenta na política de ambiente, na política de sensibilização do País para o problema ambiental. Só é pena que, depois, essa sensibilização se tenha perdido e mais nada lenha sido feito...
Em terceiro lugar, quero referir o contributo do PSD para a revisão constitucional, que também é um aspecto positivo,...
Vozes do PSD: - Ah, pois!...
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O Orador: -... e, finalmente, alguns passos na modernização do sistema financeiro.
Aí tem, Sr. Ministro, quatro coisas positivas que este governo fez. Aliás, não há nenhum governo no mundo que só faça coisas negativas e os senhores também não são excepção. Mas, a verdade é que, como hoje aqui foi provado, em média, os senhores são, infelizmente, muito piores do que a generalidade dos governos europeus.
Aplausos do PS e dos deputados independentes Jorge Lemos e José Magalhães.
O Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social: - Sr.ª Presidente, peço a palavra para defesa da consideração.
A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social: - Sr. Deputado António Guterres, fiz-lhe uma pergunta muito objectiva, isto é, se conhecia a proposta do Estado Português em termos de reforma dos tratados no que tem a ver com a dimensão social.
O Sr. Deputado teve a franqueza de dizer que não conhecia. No entanto, pergunto ainda: V. Ex.ª conhece-a?
O Sr. António Guterres (PS): - Sim, sim.
O Orador: - Então, se conhece, gostaria de saber a sua opinião sobre isso.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Ministro, se trata da proposta que foi entregue, há um mês, na Comissão de Assuntos Europeus, respondo que conheço.
O que lhe disse não foi que não conhecia essa proposta, mas, sim, que não tinha falado disso no plano social, mas da coesão económica e social. E em relação a essa questão, referi que não conhecia a reacção do Governo Português às propostas espanholas, tendo tomado conhecimento dela através dos contactos informais que temos com outros governos europeus.
Vozes do PS: - Muito bem! Vozes do PSD: - E as francesas?!
O Orador: - Sr. Deputado, só para terminar, aqui fica a razão da minha pergunta sobre esse documento. É que existe uma parte do seu discurso onde fala do alargamento das funções do Fundo Social Europeu e está uma proposta do Governo sobre esse ponto há mais de um mês nesta Assembleia da Republica.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. José Pacheco Pereira (PSD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para defesa da honra e consideração.
A Sr.ª Presidente: a palavra.
Sr. Deputado Pacheco Pereira, tem o Sr. José Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Deputado António Guterres, compreendo que nalgumas matérias não lhe convenha responder porque, sobre elas, normalmente, o Sr. Deputado é silencioso. Mas gostava de dizer-lhe o seguinte: ouvi com muita atenção o seu discurso. O Sr. Deputado é, talvez, de todos os deputados do Partido Socialista, aquele que tem maior capacidade de retórica, mas deixe-me dizer-lhe que essa capacidade é normalmente utilizada para disfarçar os impasses políticos de que V. Ex.ª tem plena consciência.
O Sr. Deputado senta-se ao lado do Sr. Dr. Jorge Sampaio a fazer propostas do ponto de vista económico e social e V. Ex.ª sabe bem, em primeiro lugar, que são completamente demagógicas e contraditórias - por exemplo, o abaixamento da taxa de juro, a diminuição do preço dos medicamentos, o aumento do preço das pensões, a criação de um subsídio de renda de casa, etc.
Vozes do PSD: - Uma casa para todos!
O Orador: - Sr. Deputado, ao mesmo tempo, na mesma sessão legislativa, V. Ex.ª propõe medidas que sabe serem completamente contraditórias, que não estão contabilizadas e que se destinam, única e simplesmente, a tentar criar uma imagem favorável do Partido Socialista na opinião pública. O Sr. Deputado há-de convencer-me da honestidade intelectual de dizer ao País, não que ele vive em ditadura, mas que vive em pré-ditadura, que é o discurso que o Sr. Deputado Alberto Martins fez no outro dia e que V. Ex.ª acabou por roçar, hoje, na sua intervenção.
Os senhores querem convencer os Portugueses de que há um governo que lhes está a tirar os direitos democráticos.
Vozes do PS: - É verdade!
O Orador: - E o problema essencial, até nem discuto a substância da questão,...
Vozes do PS: - Ora bem!
O Orador: -... é que os Portugueses não sentem que vivem em ditadura e dizem-no todos os dias. Esse é que é o problema do Partido Socialista.
Por último, Sr. Deputado António Guterres, os senhores, em 1982, na revisão constitucional, adiaram por vários anos tudo aquilo que eram as medidas e as reformas estruturais de fundo. Isso nada tem a ver com a situação internacional,...
Aplausos do PSD.
... nada tem a ver com a competência e a capacidade dos governos. Isso foi uma medida política, cujos custos, centenas de milhões de contos, os senhores fizeram pagar ao País, foram empregues em empresas colocadas numa situação de falência à custa do desenvolvimento dos Portugueses, por razões de estrita política que não tem nada a ver com a conjuntura internacional nem com a capacidade governativa.
Aplausos do PSD.
E sobre isso os senhores, que fazem a análise retrospectiva, não dizem uma linha! Não dizem nada sobre aquilo que deveriam ter feito no tempo em que tinham condições políticas para o fazer e quando tinham o apoio do PSD, nomeadamente quanto ao arrendamento, à reforma agrária, às privatizações. Não tiveram a coragem política de o concretizar, fazendo pagar ao País os custos desse adiamento.
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A Sr.ª Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - O Sr. Deputado José Pacheco Pereira não fez. propriamente, uma defesa da honra, usou mais este sistema: vai para a frente, leva pancada, volta atrás,... tenta arremeter de novo,... leva pancada, tenta arremeter de novo!... Ficaremos aqui o resto do dia, mas cada vez que vier saio-lhe a terreiro!
Risos do PS.
Aliás, ainda bem que falou, porque me tinha esquecido de responder a um aspecto relativamente ao Sr. Ministro. Trata-se das relações entre o Sr. Presidente da República e o Governo.
Afirmo aqui, serenamente, perante o País, que o Governo tem procurado desrespeitar a figura do Sr. Presidente da República. Fê-lo na questão de Angola, na questão da televisão e é uma armadilha o convite dirigido à inauguração da ponte sobre o Douro.
Aplausos do PS.
Mas vamos ao que interessa.
O Sr. Deputado referiu-se à retórica e à honestidade intelectual.
Sr. Deputado José Pacheco Pereira, lenho muita pena de lhe dizer que, nem numa matéria, nem noutra, sinto grande necessidade de receber lições suas.
Risos do PS.
Quanto à retórica nesta Casa, penso que o Sr. Deputado José Pacheco Pereira devia pôr um pouco a mão na consciência e, em matéria de honestidade intelectual, gostaria de dizer-lhe que pode pegar no meu discurso que não encontra, nesse aspecto, uma única falha.
Por outro lado, Sr. Deputado, não disse, nem digo, que vivemos em pré-ditadura. Não vivemos em pré-ditadura. O que digo é que o governo do PSD aproveita todas as margens possíveis para condicionar o funcionamento da democracia aos seus interesses próprios e que isso introduz situações que não são consentâneas com uma noção de democracia a sério. É a noção que tenho.
Embora haja países no mundo que vivem em ditadura e países que vivem em democracia, nem todas as democracias têm a mesma qualidade como nem todas as ditaduras têm a mesma ferocidade.
O que digo é que, no contexto actual da situação internacional, não seria possível, em Portugal, viver em ditadura, mesmo que o PSD quisesse - e às vezes quase nos fica a dúvida... Mas é evidente que tudo quanto o PSD pode fazer para limitar o funcionamento pleno da democracia, tem-no feito.
Vozes do PS: - Muito bem! Protestos do PSD.
O Orador: - Quanto à questão do tempo que leva a evolução das ideias em cada um dos partidos, Sr. Deputado, devo dizer-lhe que em muitas coisas fizemos essa evolução mais depressa do que os senhores. Já não temos o marxismo no nosso programa enquanto os senhores ainda lá o têm - parece que vai desaparecer agora.
Quanto à matéria das privatizações, permita-me que lhe diga que a performance privatizadora não é reveladora assim de tanta urgência. Portanto, quando tenta atribuir ao Partido Socialista todos esses encargos, penso que se olhasse um bocadinho para dentro verificaria que tem de repartir as culpas connosco.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sr. Ministro Valente de Oliveira, ouvi com toda atenção, como é meu hábito, o seu discurso e, embora já se tenha falado bastante de surdez, fiquei um pouco com a sensação de que estávamos perante uma conversa de surdos.
Na verdade, enquanto o Partido Socialista falou da política geral, o Sr. Ministro respondeu com um discurso sectorial; o Partido Socialista propôs uma balanço global da política do Governo e o Sr. Ministro respondeu com um balanço da política do seu Ministério.
Sabemos que o Sr. Primeiro-Ministro pensa que lhe basta vir, de seis em seis meses, à Assembleia da República para desempenhar as suas obrigações parlamentares e, ainda para mais, neste momento, como sabemos, o Sr. Primeiro--Ministro está no Cairo à espera de ser recebido pelo Sr. Presidente Mubarak. No entanto, o Governo poderia ter encontrado uma forma de responder ao desafio que foi lançado pela oposição, neste caso, pelo Partido Socialista, e ter vindo aqui fazer, de facto, um discurso abrangente, um discurso global, um discurso de balanço da acção governativa, porque era esse o desafio que estava colocado e era o que se justificaria agora, no final da Legislatura.
É claro que muitas das questões colocadas pela intervenção do Partido Socialista, e que, posso dizer-lhe, correspondem até a preocupações gerais da oposição, não foram respondidas pelo seu discurso, mas, sim, depois, um pouco improvisadamente, pelo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e pelo Sr. Deputado Pacheco Pereira. No entanto, não era isso que se exigiria por parte do Governo, numa atitude responsável, de balanço, em final de legislatura, perante a Assembleia da República.
A questão das relações do Governo com o Sr. Presidente da República deveria ter sido respondida pelo Governo, pela voz autorizada de quem aqui o veio representar, nesta resposta à interpelação do Partido Socialista.
Em relação à questão das liberdades, que agora suscitou este debate entre o Sr. Deputado Pacheco Pereira e o Sr. Deputado António Guterres, o Governo deveria intervir, sabendo que ela tem sido colocada insistentemente pela oposição.
O Governo entende, então, que a democracia é como as auto-estradas, como acusou o Partido Socialista?! O Sr. Ministro não tem nada a dizer em relação a essa questão?! E em relação à tentação de transformar a maioria absoluta em poder absoluto, em relação ao autoritarismo de que a oposição globalmente acusa o Governo, este nada tem a dizer sobre essas matérias?! Em relação à comunicação social, o Governo nada tem a responder às acusações que se fazem quanto à sua manipulação - que é pública-, à sua privatização a favor dos correligionários do PSD para a formação de um grupo laranja na comunicação social?!
Penso que é estranhíssima a resposta do Governo em relação à interpelação sobre política geral, efectuada pelo Partido Socialista.
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Sr. Ministro, quero dizer-lhe que, na sua intervenção, respondeu ao menos que foi proposto pelo Partido Socialista. Pergunto: quem é que vai responder ao mais?
O Sr. Ministro refugiou-se nas questões do seu ministério, voltou aos slogans conhecidos, como o crescimento médio de 4,5 %, as obrigações de que o Governo se desempenhou, etc. Mas nós não contestamos o crescimento. Aliás, na interpelação que fizemos ao Governo sobre matéria semelhante a esta em que incide a interpelação do Partido Socialista, reconhecemos esse crescimento.
A questão concreta que lhe coloco, no final da Legislatura, é a seguinte: entende o Sr. Ministro que o crescimento- geralmente reconhecido por todos nós - teve correspondência nos níveis de bem-estar dos Portugueses? Esse crescimento não se repercutiu favorecendo as velhas fortunas, os «velhos-ricos», que são, agora, talvez, ainda mais ricos, dando também origem a um sector de novos-ricos que ostentam a fortuna da maneira que se vê nas ruas das nossas cidades, e, por outro lado, mantendo-se a velha pobreza, que o Sr. Deputado Pacheco Pereira dizia que essa havia desaparecido? Então não se mantêm os pedintes, os mendigos, a esmola, a sopa dos pobres, os que dormem nos portais de Lisboa e do Porto? Não se mantém tudo isso? Aos milhares, muitos milhares, como todos conhecemos...
Sr. Ministro, e a nova pobreza, a pobreza encoberta, a pobreza que não se ostenta, dos que têm meio emprego, das mulheres que regressaram a casa e que agora não são consideradas desempregadas mas domésticas, a pobreza dos que vivem numa situação precária em relação ao emprego, a pobreza dos que vivem com o salário mínimo nacional? E essa imensa pobreza dos mais de l milhão de portugueses que vivem com a reforma mínima? Isso não se mantém e, em muitos aspectos, não se agravou até, porque entretanto as novas fortunas imprimiram um novo consumismo na sociedade?
Era esta questão concreta que gostava que o Sr. Ministro aprofundasse.
Ontem, na interpelação sobre política geral centrada nas questões da cultura, retomou-se uma velha ideia de António Sérgio, de que é muito mais importante a política em relação às «pedras vivas» do que em relação às «pedras mortas». Naturalmente que o Governo exalta a sua política em relação às «pedras vivas», mas faz as inaugurações das estradas e das auto-estradas - «pedras moitas». Pergunto-lhe: qual é a política do Governo em relação às «pedras vivas»?
Essa é a grande questão que importava hoje esclarecer. Quais são as medidas a favor das «pedras vivas»? As «pedras vivas» vivem melhor ou pior? Na nossa concepção é que não vivem melhor e o Governo não é capaz de provar o contrário. O Governo não é capaz de provar que o crescimento se repercutiu numa melhoria estabilizada do bem-estar dos Portugueses.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: -Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): -Sr. Presidente, Sr. Ministro: Sobre o discurso do Governo em relação à abertura do debate sobre política geral, as questões fundamentais estão ditas, pelo que não voltaria a esse tema. O Sr. Ministro preferiu refugiar-se em temas bastante circunscritos, aliás, como era previsível, como vai sendo norma do Governo. Isto é, preferiu, ao fim e ao cabo, tentar, com o discurso da quantidade, iludir os problemas centrais, que são os da qualidade. E é nesse sentido que eu gostaria de debruçar-me sobre três ou quatro aspectos referidos pelo Sr. Ministro.
O primeiro aspecto tem a ver com o problema do emprego. Não se vai contestar a evolução da taxa de emprego ou de desemprego que tem sido apresentada oficialmente - a questão não interessa em termos numéricos, em termos de pormenor -, mas há uma questão central, que, mais uma vez, tem a ver com a qualidade, sobre a qual importaria que o Sr. Ministro reflectisse. Admito até que o Sr. Ministro não tenha possibilidade, em termos de tempo disponível, de analisar todos os dados estatísticos do Instituto Nacional de Estatística, mas, no mínimo, terá obrigação, julgo eu, de fazer uma apreciação, ainda que relativamente sucinta e rápida, dos documentos elaborados pelo Departamento Central de Planeamento. E quer o INE quer o DCP, muito recentemente, aliás, divulgaram os elementos relativos à evolução do trabalho efectivo na economia portuguesa, nos últimos anos. Ora, a diferença, em relação à taxa de evolução do emprego, como é normalmente medida, é enorme, é um terço. Isto não lhe diz nada? Isto não lhe diz, fundamentalmente, que, nos seus grandes números, o emprego tem estado a ser criado à custa do part-time, para além de outros aspectos de precariedade?
O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Não tem os números!
O Orador: - Sr. Deputado, depois falaremos sobre isso. Estou, precisamente, a falar nos números oficiais!
O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Isso é inventado!
O Orador: - Sr. Ministro, isso não tem a ver com o facto de algum do emprego, registado estatisticamente em termos de emprego, não ser emprego efectivo, como os cursos de formação profissional e outros parecidos?
O Sr. Ministro disse, a dada altura: «A distribuição de riqueza criada não é indiferente para nós.» Repara-se que não é indiferente! Os dados dos últimos cinco anos mostram claramente que não é indiferente para o Governo, pela forma como o faz, a distribuição da riqueza. Mas o Sr. Ministro precisa de completar essa sua afirmação, dizendo que tal não é indiferente porque essa distribuição, de acordo com o que o Governo quer e tem praticado, qualquer que seja o elemento que se considere, quer a distribuição funcional quer a pessoal, é em desfavor das pessoas, em desfavor dos trabalhadores e em benefício dos lucros.
O segundo aspecto tem a ver com a taxa de crescimento do investimento. O Sr. Ministro veio falar da laxa média de crescimento dos últimos cinco anos, mas escamoteia, mais uma vez, um problema de qualidade, que é fundamental e básico. A taxa média de crescimento começou com 15 % e nos dois últimos anos caiu para 6 %. Em 1990 conseguimos ter uma taxa de evolução do investimento inferior à da República Federal Alemã, um país que está, de longe, muito mais desenvolvido que o nosso. Isto não lhe diz nada, Sr. Ministro?
Vozes do PCP: - Muito bem!
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O Orador: - Sobre isto o Sr. Ministro nada tem a dizer? Não está a ver as implicações que isto tem para o futuro, para o desenvolvimento sustentado da economia portuguesa? Então, isto escamoteia-se, cala-se?!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - A última questão está relacionada com os problemas dos fundos comunitários, que lhes são tão caros - o célebre cesto das ineficiências, como o Sr. Ministro gosta de referir, que nos faz correr o grave risco de perdermos algumas centenas de milhões de contos dos fundos comunitários postos à disposição de Portugal, por ineficiência e incapacidade de os utilizar. Mas o cesto das ineficiências é superior a isso, uma vez que tem também a ver com a concentração dos fundos que estão a ser utilizados e a ser distribuídos em muito poucos sectores e em muito poucas empresas.
Quer um exemplo concreto, Sr. Ministro?
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: - Quero, sim!
O Orador: - Sr. Ministro, 50 % dos fundos comunitários canalizados pelo SIBR para o distrito de Setúbal, até ao final de 1990, foram para três empresas, que, por acaso, são empresas estrangeiras, e não estou, logicamente, a incluir o projecto Ford/Volkswagen.
As ineficiências têm ainda uma terceira vertente, bastante grave - e o Sr. Ministro referiu-se a elas sem as enunciar-, que é o problema das OID. Sr. Ministro, é uma ineficiência grave o que está a acontecer.
As operações integradas de desenvolvimento estão, uma a uma, a deixar de ter qualquer elemento de integração para tentar diminuir as ineficiências, em termos de aplicação. Ou seja, estão a transformar-se, uma a uma, em meros reforços dos FEDER destinados às autarquias locais, que fazem muito bem em aproveitar esses recursos, para que se não percam; porém, perde-se todo e qualquer elemento integrante dessas operações, o que é gravíssimo para o futuro de Portugal.
Já agora, para terminar, quero registar que, desta vez, o Sr. Ministro, o Governo, esqueceu-se de fazer qualquer referência ao problema da inflação, eventualmente porque saíram ontem os resultados referentes a Maio.
Vozes do PCP: - Muito bem! Vozes do PSD: - Não são maus!
A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, há pouco, quando disse que V. Ex.ª correspondeu à expectativa do Sr. Deputado António Guterres, queria dizer - pois já o tenho dito mais de uma vez, porque é verdade - que V. Ex.ª trata bem com a Assembleia da República, razão por que ela tem consigo uma relação positiva, e penso que o Fim de legislatura é uma altura adequada para o salientar novamente.
Mas V. Ex.ª fez aqui o discurso da estatística, o discurso da obra pública, deixando a maior pane do discurso da estabilidade para o seu colega, Ministro da Presidência e da Defesa Nacional, que, aquando da resposta a uma questão colocada, abordou mais longamente esse tema.
Quanto ao discurso da estatística, V. Ex.ª utilizou realmente o da estatística seleccionada, como dizia o Sr. Deputado António Guterres.
A questão que colocamos nesta matéria, Sr. Ministro Valente de Oliveira - não discutindo o que de positivo é revelado pelos índices, que têm tido um comportamento positivo, que não podemos nem queremos esconder e, de resto, congratulamo-nos com eles -, é saber se há, efectivamente, subjacente ao crescimento, ao desenvolvimento (porventura, induzido pelo crescimento), à evolução positiva do índice do emprego, se há realmente subjacente a estes índices uma verdadeira correcção estrutural da nossa economia.
Sabemos quais são as deficiências estruturais da nossa economia; têm sido inventariadas, lemos conversado e discutido sobre elas e não há desentendimentos - e até, a propósito delas, inventaram-se expressões, como «défice virtuoso», de que falava o ministro Cadilhe, etc.
Pergunto: o Sr. Ministro está convicto de que há realmente uma correcção estrutural que não seja aquela que resulta da obra pública, de que vamos falar já a seguir? Isto é, a nossa estrutura produtiva está efectivamente corrigida? E não será antes o contrário, Sr. Ministro? O comportamento da balança comercial, que não é um índice referido por VV. Ex." com frequência, antes pelo contrário, e que o Sr. Ministro das Finanças até procura escamotear e esconder com outros índices, não revelará o contrário, ou seja, que a nossa estrutura produtiva continua assente nas mesmas actividades, que não são as que permitem precisamente uma correcção? Isto é, esperar-se-á que a grande correcção venha do investimento estrangeiro, designadamente o projecto Ford/Volkswagen? É daí que ela virá? E o apoio que o Estado Português vai prestar a esse projecto estará apto a que ele realmente represente uma correcção duradoura e estável da nossa estrutura produtiva, ou será o contrário?
A segunda questão que lhe coloco tem a ver com as obras públicas.
Sr. Ministro, realmente não negamos o que de positivo se tem feito no domínio do lançamento de infra-estruturas de comunicação e de transportes. Isso é verdade!
Simplesmente, o Sr. Ministro tem uma postura de discurso «fontista» - e a sua própria postura física ajuda-o. V. Ex.ª faz um discurso «fontista» nesta Câmara mas, no entanto, nós sabemos, Sr. Ministro, que esse período da nossa história democrática foi de grande realização de obra pública que acabou por não ter reflexos positivos na nossa actividade produtiva. Se formos comparar, proporcionalmente, o que, porventura, se fez nessa altura, concluímos que é ainda muito mais do que aquilo que se está a fazer agora. E, na altura, também o fizemos com auxílio externo, embora, digamos, de muito piores condições, porque era através de financiamentos de empréstimos. De qualquer modo, o que se fez foi de grande volume, mas não de grande impacte na nossa estrutura produtiva.
Relativamente a esta matéria, gostaria que o Sr. Ministro tecesse algumas considerações sobre um possível impacte das infra-estruturas e da obra pública na nossa estrutura produtiva e sobre um outro efeito perverso, que, normalmente, anda ligado à obra pública e a uma questão que foi hoje aqui ventilada, que é a do «folhetim» da ponte ferroviária sobre o rio Douro, embora não vá mais tratar desse problema, pois os técnicos já se apaziguaram, suponho, e já disseram que tudo estava bem.
Simplesmente, quero saber o seguinte, Sr. Ministro: não há, ligada à obra pública, uma preocupação de inauguração
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(...) conjuntural, de conjuntura política? E, Sr. Ministro, essa preocupação de inauguração tem tido alguma repercussão em termos de custos? O Sr. Ministro não nos poderia falar um pouco sobre isso? Isto porque consta que tem tido um grande reflexo em matéria de custos, e aí, Sr. Ministro, a relação custo-benefício, para além de, porventura, se conservar a maioria, é de nenhum benefício!
Gostaria que o Sr. Ministro nos falasse também sobre isso, ou seja, que nos dissesse se a obra pública não terá também esse apêndice, o apêndice inaugural, e se ele não estará também a ser traduzido em termos de números e de custos.
Quanto à estabilidade, deixo-a para mais tarde, Sr. Ministro. Tencionava realmente falar sobre a maneira como VV. Ex.ªs geriram ou desbarataram a estabilidade, mas fá-lo-ei no tempo que nos restar para uma pequena intervenção.
A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada lida Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, gostaria ainda de voltar ao campo social para, muito sucintamente, lhe colocar duas questões.
A primeira questão tem a ver com o emprego das mulheres e não lhe vou falar das discriminações que persistem e que até se agravam, mas, sim, expressamente de uma outra questão, a baixa da taxa de actividade feminina.
O Sr. Ministro, que fez comparações entre 1981 e a actualidade, sabe que a taxa de actividade feminina baixou de 1981 para cá, uma vez que nessa altura era superior a 41 % e que hoje é inferior ou ronda os 40 %, quando, na nossa sociedade, tudo fazia prever que essa taxa iria crescer, tal como aconteceu noutros países da Europa.
Porém, em Portugal, ela baixou e isso tem um significado. A precariedade do emprego significa a falia de condições de trabalho que as mulheres enfrentam no dia-a-dia, mas também a falta de estruturas sociais de apoio à família, a falta de creches, de infantários, de escolas infantis. E sobre isto o que diz o Sr. Ministro?
Ainda no campo social, e falando de ensino, o Sr. Ministro referiu alguns números que têm a ver com o ensino superior, dizendo que, em 1985, a taxa era de 13 % e que agora é de 20 %.
Sr. Ministro, o relatório que o Ministério da Educação elaborou para fundamentação do PRODEP, em 1988, referia que, em Portugal, a taxa de frequência do ensino superior era de 11 % -11 % e não 20 % - em 1987/1988, ou seja 118000 alunos. Como é que agora pode dizer que ela é de 20 %, se isso implicaria haver 230 000 estudantes no ensino superior?! Onde é que eles estão, Sr. Ministro?
Um outro campo, que lhe é muito caro, tem a ver com o do poder local.
Sr. Ministro, é espantoso que lenha conseguido falar do censo e dos seus resultados, do trabalho que foi feito, e não tenha dado uma palavra sobre o trabalho que as juntas de freguesia tiveram de desenvolver para que o senhor pudesse dispor dos números que hoje referiu. Mas mais espantoso ainda é que, além de não ter dito uma palavra sobre isso, nada tenha feito para que as juntas de freguesia pudessem dispor de mais meios, de uma maior descentralização, para que os seus autarcas pudessem ter direito ao regime de permanência, uma aspiração fundamental para a resolução de muitos problemas das populações locais.
Uma outra questão tem a ver também com o Fundo de Equilíbrio Financeiro e o financiamento das autarquias. O Sr. Ministro referiu números, apontou crescimentos, mas esqueceu-se de referir que é devido às sucessivas subavaliações do IVA, feitas nos Orçamentos do Estado, que as autarquias deixaram de receber, nos últimos três anos, mais de 30 milhões de contos - de facto, deixaram de receber muitos mais milhões de contos, porque o Governo nunca lhes pagou aquilo a que tinham direito, de acordo com a Lei das Finanças Locais, em termos das isenções de impostos que foram feitas, cuja receita reverte para as autarquias locais.
E isto é tão dramático, Sr. Ministro, que, no momento em que o nosso país pode dispor de fundos comunitários para a elaboração de projectos, nomeadamente no campo ambiental - um aspecto tão caro às autarquias, ao contrário daquilo que o Governo tenta fazer crer-, muitas autarquias estão a braços com problemas sérios de comparticipação nos projectos financiados pelos fundos comunitários e são obrigadas a desistir de alguns deles por falta de meios financeiros.
Não considera o Sr. Ministro que era fundamental proceder, pelo menos, a um aumento intercalar do Fundo de Equilíbrio Financeiro, passando-o de 157,5 milhões de contos para 180 milhões de contos, de forma a permitir que o nosso país pudesse aproveitar devidamente os fundos comunitários e desse um passo importante na produção de desenvolvimento?
Um outro aspecto que, neste momento, opõe o Governo às autarquias locais é o das estradas ditas secundárias, que fazem as ligações inter-regionais, e cujo avanço na reparação é fundamental para o desenvolvimento do interior do País. Tendo em atenção que a recuperação dos 12 000 km de estradas ditas secundárias se estima em 60 milhões de contos, o Sr. Ministro não considera que é inadmissível insistir com as autarquias para que elas assumam o compromisso de pagar essa recuperação?
A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Brito.
O Sr. Rogério Brito (PCP): - Sr. Ministro, embora me pareça compreensível a selectividade que revela a sua intervenção para sobrevalorizar aspectos mais positivos em detrimento de outros menos positivos, apesar de estes pesarem muito mais no saldo final, gostaria de colocar duas questões que têm a ver com o sector da agricultura, que consumiu já 200 milhões de contos provenientes dos fundos comunitários.
Na verdade, apesar disto, em termos de resultados, verificamos que, no final da primeira etapa de adesão à Comunidade Económica Europeia, a insuficiência produtiva do País aumentou de tal forma que o défice da balança alimentar se agravou de 97 para 234 milhões de contos e o défice da balança agro-florestal agravou-se de 68 para 148 milhões de contos. Por outro lado, em termos da eficiência do sector, verificamos ainda que a produção bruta total diminuiu a uma taxa média anual de 9 %; o valor acrescentado bruto diminuiu a uma taxa média anual de 3,7 %; o rendimento agrícola diminuiu e o rendimento dos agricultores também, e de tal forma que o peso das explorações agrícolas que integram os escalões de mais baixo rendimento da Comunidade (até 4000 ecus/unidade de trabalho) é de 87 %, enquanto em 1985 era de 85 %, e na Comunidade é apenas de 37 %.
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Como é que se justifica, Sr. Ministro, que os senhores, sistematicamente, falem nas virtualidades de uma política agrícola que ainda não conseguiu alterar um único traço do agravamento de um sector que, em termos económicos e sociais, tem uma incidência decisiva no desenvolvimento económico e social?
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Brasileiro.
O Sr. Álvaro Brasileiro (PCP): - Sr. Ministro, ligada à agricultura e também aos problemas sociais, gostaria de colocar-lhe uma questão, pelo que começo por referir um exemplo do que está a acontecer no concelho da Colega, onde 240 produtores de tomate, pertencentes aos concelhos da Chamusca, Almeirim e Alpiarça, estão apavorados com o que se está a passar na fábrica de transformação de tomate que pertence à Junta de Freguesia da Azinhaga do Ribatejo, concelho da Colega.
Com efeito, esta fábrica assinou contratos com esses produtores, que possuem uma área de plantação equivalente a 750 ha, cuja produção média de tomate está calculada em cerca de 48 milhões de quilogramas. A administração da fábrica não aparece, a campanha está à porta e as máquinas não estão preparadas para funcionar, a cultura pode ser perdida e a ruína destes agricultores avizinha-se.
Os trabalhadores pertencentes à referida fábrica não têm qualquer garantia, pois os salários estão em atraso. Então, Sr. Ministro, há ou não salários em atraso?
Que diz a isto o Sr. Ministro?
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Vara.
O Sr. Armando Vara (PS): - Sr. Ministro, certamente, reparou que a sua intervenção não gerou grande expectativa na bancada do Partido Socialista. De facto, V. Ex.ª repeliu um discurso que tem feito inúmeras vezes, sem surpresas, sem qualquer novidade, até porque foi, claramente, antecipado pela intervenção do presidente do meu grupo parlamentar.
Na verdade, o Sr. Ministro voltou a referir o crescimento, mas devido ao peso que traz sempre na consciência relativo ao insucesso clamoroso que é a falta de desenvolvimento do interior e de combate às assimetrias, referiu apenas alguns números e elementos relacionados com esses aspectos. Aliás, é por essa razão, por só ter referido o censo que acaba de ser feito, mas de que ainda não se conhecem os resultados totais, e ainda por ter referido alguns elementos relacionados com o combate às assimetrias, que estou a intervir.
Em primeiro lugar, gostaria de dizer que todos os elementos de que disponho e todos os estudos que tenho acompanhado indicam exactamente o contrário daquilo que o Sr. Ministro aqui veio referir. Aliás, a divulgação feita dos resultados do censo revela, de novo, a existência de elementos perturbantes e preocupantes sobre o que está a acontecer em zonas do interior, nomeadamente em Trás-os-Montes e no interior alentejano, pois, em vez de demonstrar que a tendência litoralizante, referida pelo Sr. Ministro, está a abrandar, demonstra, pelo contrário, que está a aumentar a tendência desertificante de zonas que têm a ver com o interior de Trás-os-Montes e do Alentejo.
Por outro lado, o Sr. Ministro também referiu que 70 % dos investimentos do FEDER estão a ser canalizados para o interior e só 30 % para o litoral, o que contradiz tudo o que foi dito aquando do debate sobre o quadro comunitário de apoio, onde se revelou claramente que 80 % dos investimentos provenientes dos fundos europeus iam ser investidos no litoral e apenas cerca de 20 % no interior. Por essa razão, na altura, tivemos a oportunidade não só de dirigir uma carta ao Sr. Primeiro-Ministro como de, em inúmeros debates, chamar a atenção para o que estava a acontecer, dizendo que sem regionalização, sem reforço dos municípios e do poder local em geral e sem um forte aumento dos investimentos no interior, tudo não passava de hipocrisia, pelo que a modernização não se faria e muito menos no interior.
Termino dizendo que o combate às assimetrias é, claramente, um caso de insucesso deste governo, na medida em que não foram tomadas medidas necessárias para que ele acontecesse.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Sr. Ministro, depois de ouvir V. Ex.ª fico, cada vez mais, com a ideia de que este governo perfilha, deliberadamente, uma política neoliberal - e o neo-liberalismo, como V. Ex.ª sabe, caracteriza uma ideia de falsa modernização.
Em minha opinião, é evidente que é necessário reflectir profundamente sobre os caminhos do nosso país, as estruturas sociais e económicas e o seu futuro imediato. É evidente que o neo-liberalismo, que este governo perfilha, não é de agora e coloca-lhe o problema de ter de criar uma ideologia própria.
Em 1988, ou seja, há cerca de três anos, o neo-liberalismo, sem preocupações sociais - é bom fixar -, representava um ponto alto em alguns países, como na Inglaterra, de que o Sr. Prof. Cavaco Silva tanto gosta, mas com os resultados que também existem em Portugal e que estão à vista, isto é, com maiores distorções e problemas sociais.
Hoje, essa prática evidencia nítidos sinais de declínio e reflecte-se particularmente na contestação generalizada, em diferentes áreas de pensamento, sobre os resultados que vem produzindo, contestação que se vê e é detectável, nomeadamente, em Portugal.
Sr. Ministro, tomei algumas notas durante a sua intervenção e retirei as conclusões seguintes: em Portugal, faltam casas. Isto foi dito por todos os oradores. Agrava-se a situação da habitação em Portugal e não vejo como é que este governo faz frente a este problema, a não ser através da Caixa Geral de Depósitos, que tem créditos limitados para a habitação mas gasta dezenas e dezenas de milhões de contos na construção de um edifício mastodôntico, que pouco serve. Seria bom sabermos quanto é que aquele edifício do Campo Pequeno vai custar...
Em Portugal, faltam empregos. V. Ex.ª diz que a laxa de desemprego é baixa, mas, Sr. Ministro, diga isso a centenas de milhares de famílias que lutam por um emprego... A taxa será baixa, mas existem centenas de milhares de famílias atingidas com a falta de emprego e muitas centenas de milhares de famílias sob a ameaça de desemprego, com contratos de trabalho a prazo de um mês, três semanas e alguns até de dias.
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Em relação ao ensino, creio que é ofensivo traçar-se um panorama tão brilhante como V. Ex.ª fez. Sr. Ministro, diga isso aos milhares de famílias que não podem pôr os filhos a estudar por falta de meios. A situação do ensino é cada vez mais grave e é contraditória com o optimismo revelado por V. Ex.ª
Já agora, gostaria de saber se o Sr. Ministro da Educação virá a esta Câmara para dar algumas explicações ou se anda também pelos campos de futebol, pois através de dados estatísticos que possuo e que terei muito gosto em dar-lhe, Sr. Ministro, constatei que, depois do Sr. Prof. Cavaco Silva, ele é o ministro mais fotografado em campos de futebol e outros do género.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Se o Sr. Deputado fosse o Futre também era fotografado!
O Orador: - V. Ex.ª fala na pobreza. Quanto à pobreza, é evidente que quem tem dinheiro, tem educação, habitação e ensino. E já que se fala nesta situação, chamo a sua atenção para a distribuição da riqueza. De facto. Sr. Ministro, as classes mais desfavorecidas são duramente atingidas. A este propósito, refiro um estudo recente, subsidiado pela insuspeita Fundação Luso-Americana, que conclui que há 11 % de ricos e de muito ricos ao lado de 50 % de pobres e muito pobres. Isto está publicado, Sr. Ministro!
Há cerca de quatro anos, a CEE calculava que, em Portugal, os pobres correspondiam a 30 % da população. Hoje, correspondem a 50 %!
Existe também um outro estudo sobre pobreza urbana, promovido pela Caritas e elaborado por duas figuras insuspeitas de grande capacidade intelectual e de grande seriedade, o engenheiro Bruto da Costa e a Dr.º Manuela Silva. Nele, perante números arrepiamos, diz-se que a pobreza se radicou em Portugal, não diminuiu e a tendência é para aumentar. Sr. Ministro, como compatibiliza a sua alegria com esta situação real e este problema gravíssimo?
Em relação à inflação, V. Ex.ª nada disse e, hoje, o Diário de Notícias publicou que, em Maio, ela atingiu já os 12%.
Seria bom que V. Ex.ª nos esclarecesse sobre todos estes aspectos que acabei de referir, uma vez que não adiantou uma linha sequer sobre a inflação, a pobreza e as situações sociais inquietantes, que obrigam a greves como as que hoje ocorrem. Aliás, se tiver oportunidade de ler os jornais de hoje verá mais anúncios de greves para este país... Mas, Sr. Ministro, apesar de tudo isto, V. Ex.ª fala da estabilidade governativa, que, afinal, corresponde a uma instabilidade social cada vez mais grave.
A Sr.ª Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território.
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: - Srs. Deputados, fico muito grato pelo interesse que W. Ex." demonstraram em face da minha intervenção.
Por razões de falta de tempo, não vou responder uma a uma às perguntas. Darei uma resposta geral, focando cada um dos pontos das perguntas, até porque algumas delas têm intercepções.
Efectivamente, se ouviram com cuidado, terão verificado que a minha intervenção não foi sectorial. Falei em obras públicas e em educação; falei em emprego e em evolução tecnológica; abrangi problemas de desenvolvimento e falei no crescimento.
Não falei, de facto, nas relações do Governo com o Sr. Presidente da República porque, suponho eu, elas não constituem problema. Tem havido entre eles uma relação equilibrada, de respeito mútuo, e com resultados positivos para o País.
Não falei de questões de comunicação social porque o tema já tem sido tratado abundantemente e porque aquilo que o Sr. Deputado Carlos Brito referiu, a manipulação, é coisa que eu sei não haver.
Não falei da questão da pobreza, um assunto que parece preocupar muitos dos Srs. Deputados, mas aquilo que o Sr. Deputado Pacheco Pereira há pouco referiu é perfeitamente verdade. Os núcleos de pobreza - que não negamos serem uma realidade, cuja existência muito nos preocupa e que tudo estamos a fazer para irradicar - não se espalham, de uma forma disseminada e difusa, ao longo de todo o território. Situam-se, fundamentalmente, nas coroas suburbanas de Lisboa e do Porto, onde os recém--emigrados, ao contrário dos de antigamente, já não constituem verdadeiras comunidades. Estamos, porém, a tecer os laços de verdadeiras comunidades que tem de ficar, efectivamente, nessas coroas. É aí que há, neste momento, graves problemas.
Como é que o fazemos? Fazemo-lo tentando evitar o avolumar de pessoas nessas áreas suburbanas, por retenção, nos locais onde elas habitam. E isso está a acontecer.
O Sr. Deputado Armando Vara não leu o resultado do Censos, pois se o tivesse feito teria verificado que aí se diz que o fenómeno da litoralização continua, mas que as taxas são, em várias regiões do País, de um terço ou um quarto, o que significa ter-se conseguido, pelo menos, travar a situação e até invertê-la; significa também que os instrumentos de ordenamento do território, pacientemente, vão conformando novos comportamentos de localização, estão a dar resultado e a reforçar tanto as cidades de tamanho médio como a retenção dessa população. A intenção é não agravar a situação, porque depois, quando cá chegam, verificam-se todos esses efeitos que preocupam os Srs. Deputados e que também nos preocupam. Não negamos que elas existem, o que asseguramos é estarmos a fazer coisas para debelá-las.
Aplausos do PSD.
Quanto à questão do emprego feminino, suponho que está mais do que resolvida, a muitos títulos.
Sr.ª Deputada lida Figueiredo, tenho aqui o estudo das mulheres no emprego, uma análise feita em Novembro de 1990, e dele vou ler o seguinte extracto: «A população activa feminina tem acusado um crescimento constante, especialmente no período 1989-1990, em que o crescimento foi mais acentuado. Em 1990, 2.º trimestre, as mulheres representavam 43,5 % da população activa total.» Não é suficiente? Não?!...
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Leia os dados do INE. Isso que se refere é outra coisa!... É o número de mulheres empregadas e não a taxa de actividade!...
O Orador: - Tem de se fazer mais, mas o que sucede é que não podemos mudar de um dia para o outro uma tendência muito instalada na sociedade portuguesa, ou seja, a do não trabalho da mulher.
Quanto à questão das mudanças estruturais além das obras públicas, ó Sr. Deputado Nogueira de Brito, eu lenho
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a impressão de que faz uma grande injúria ao Fontes Pereira de Melo dizendo que ele era meramente um construtor de obras públicas e, ainda por cima, de obras públicas pouco eficazes!...
Se ler os orçamentos que o Fontes Pereira de Melo apresentou nesta Câmara verificará que ele não era tão cego e tão obstinado na questão das obras públicas como pensa, tal como verá, quando aparecer um livro que eu próprio e o Sr. Engenheiro e Deputado João Maria Oliveira Martins encomendámos para comemorar o centenário da morte desse primeiro-ministro, figura dinâmica da sociedade portuguesa. Mas, Srs. Deputados, deixemos a injúria ao homem e à sua memória!
O que devo dizer é que, neste momento, não há qualquer espécie de política cega de obras públicas. Aliás, pedia ao Sr. Deputado o favor de voltar a ler aquilo que eu disse e reparar na ênfase que damos aos recursos humanos, à inovação, à mudança que tarda no comportamento e nas reacções das pessoas.
Há pouco o Sr. Deputado Octávio Teixeira colocou a questão do prolongamento de alguns incentivos. Sr. Deputado, o apoio que damos à actividade produtiva tem, naturalmente, muito a ver com as reacções que observamos nos comparsas. Nós não podemos dizer a um empresário que quer fabricar malhas ou outro tipo de confecções que não pode fazê-lo, porque o condicionamento industrial já não existe há muito tempo! Podemos, sim, dar a esse empresário incentivos para fazer o resto. Mas o problema é que depois os outros dizem que é melhor fazer confecções do que não ter emprego. Então, e se aparecerem pessoas a querer emprego, nós dir-lhes-emos: «Tem de criar-se emprego, mas nos sectores que nos interessam»?...
Está a operar-se uma grande mudança, mas a verdade, Sr. Deputado, é que todos defendem, com grande empenhamento, as duas situações: há os que afirmam que «não deve dar-se nem mais um centavo a quem só quer criar emprego em sectores que podem agravar o nosso perfil produtivo» e há outros que dizem que «têm de dar-
se incentivos a qualquer um que crie emprego». Ora, nós temos procurado estudar e conciliar esta questão.
Temos também feito uma progressiva modificação do perfil da actividade industrial, o que, na parte que toca aos agentes, só se consegue fazer com grande lentidão. Nós não pretendemos substituir-nos aos empresários, mas muita coisa tem sido feita nesse sentido.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira critica os incentivos, de montante apreciável, que estão a ser concedidos a certas indústrias estrangeiras, mas esquece-se de que essa intenção de apoiá-las vai exactamente no sentido de colmatar a insuficiência de diversificação que o Sr. Deputado Nogueira de Brito tanto defende.
Essa reconversão é, no entanto, lenta! Como é que estamos a fazê-la? O sistema de incentivos distingue bem os ramos e a relevância industrial de cada projecto. Mais: queremos fazer algo de muito directo na parte respeitante à ciência e tecnologia. Efectivamente, definem-se os sectores prioritários da ciência e tecnologia para poder ter-se uma indução junto do círculo produtivo.
Temos sido muito criticados, mas temos a certeza de que é esse o caminho que temos de percorrer. Os sectores prioritários, as indústrias de informação precisam dos tais engenheiros e de muita investigação. É isso que está a ser feito! Aliás, esse foi um dos quatro sectores eleitos como prioritários.
Ora bem, estas coisas constituem, efectivamente, as mudanças estruturais e é por essa razão que se designam como tal. O Sr. Deputado diz que elas não estão a ser feitas, mas isso não é verdade! Estão a sê-lo pacientemente, como, aliás, têm de ser feitas todas as mudanças estruturais!
Sr. Deputado Nogueira de Brito, a sua experiência no sector das obras públicas é grande e V. Ex.ª sabe muito bem o que acontece às grandes obras. Para efeitos de classificação rápida, elas podem dividir-se nas que são executadas em 1000 dias e nas que o são em 600 dias. Ora, quem toma decisões numa determinada data sabe que três anos depois tem as inaugurações para fazer. O que é que quer, Sr. Deputado? Nós tomámos posse há cerca de quatro anos, portanto faça as contas! Na maior parte das obras que fizemos, os tais 1000 dias estão agora a aproximar-se. Isso é um defeito? Não, Sr. Deputado! Isso só significa que não nos preocupamos em «olear as pequenas engrenagens», com obras de 100 ou de 300 dias, ou seja, com pequenas coisas! Isso significa que, quando começámos a tratar disto, pensámos nas mudanças estruturais e enveredámos pelas grandes obras. Que estejam agora a passar os 1000 dias ou os 1100 dias e comecem a «cair» as inaugurações é uma circunstância feliz, fundamentalmente, para os Portugueses, que não para nós!
Aplausos do PSD.
Sr.ª Deputada lida Figueiredo, na minha intervenção, que foi acusada de ser muito pormenorizada e recheada de dados quantitativos, eu não podia referir tudo. É evidente que lenho o maior prazer em prestar homenagem ao trabalho das juntas de freguesia na realização do Censos 91 que muito contribuiu para que conseguíssemos faze-los em tempo recorde. Aliás, esse trabalho é, também ele, a benefício das decisões que temos de tomar para o progresso da sociedade portuguesa.
O sector do ensino foi muito referido e criticado. Os Srs. Deputados que fizeram essas críticas e que referiram esse sector devem estar muito distraídos porque há um movimento de investimento e de renovação nas escolas - só nos últimos três anos foram iniciados 100 novos cursos superiores! É preciso não estar atento ao que se passa no País para se dizer que as mudanças não se estão a operar.
A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - É exactamente ao contrário. É por andar por lá e ver como as escolas funcionam mal!
O Orador: - As mudanças estão a operar-se, mas compreendo que a solução desses problemas não seja muito agradável para a oposição.
Sr. Deputado Armando Vara, a regionalização está num ponto de arranque. Foi aqui, por unanimidade...
Bom, vejo que o Sr. Deputado está distraído a falar com os colegas e não me ouve... Não lhe interessa muito a resposta, mas, de qualquer das formas, vou dá-la para ficar registada no Diário.
O Sr. Armando Vara (PS): - Estou a ouvi-lo, Sr. Ministro.
O Orador: - Como sabe, Sr. Deputado, depois de pacientes negociações conseguimos chegar a uma lei quadro a partir da qual se vai arrancar de forma muito adequada. Não irei repetir o discurso que aqui fiz nessa altura, mas sempre lhe direi que esse é um assunto muito melindroso que tem de ser conduzido com toda a ponderação apesar
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de o diploma aprovado por esta Câmara ser um diploma muito equilibrado, que vai permitir fazer tudo como deve ser. Vir dizer que não, que nós não conseguimos fazer as coisas por falta de regionalização, é cegar-se relativamente àquilo que está mais do que estabelecido.
Suponho que dei uma panorâmica geral daquilo que são as vossas preocupações, e por isso o meu discurso não foi sectorial, mas geral. No entanto, não desci a provocações de chicana parlamentar, que não interessam neste momento. Tive, sim, a preocupação de demonstrar que aquilo que se está a fazer tem por trás uma estratégia de longo prazo, pois não colhemos - nem queremos - frutos de curto prazo, nem concessões de facilidade. O meu discurso não é de circunstância, nem é para segundas expectativas; é um discurso que dá conta das acções estruturamos que se estão a fazer no País.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado Nogueira de Brito pediu a palavra para que fim?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Para defesa da honra e consideração da bancada.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Vai defender a honra do Fontes Pereira de Melo!
Risos do PSD.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Ministro, V. Ex.ª disse que eu, na minha pergunta, linha injuriado a memória de Fontes Pereira de Melo e, por isso, quero repor a verdade.
Longe de nós a intenção de injuriar a memória de Fontes Pereira que Melo, que até invocamos como denominação de um dos institutos criados para apoio da actividade do CDS!...
Sr. Ministro, o que pretendo dizer-lhe, elogiando Fontes Pereira de Melo, porque o esforço que ele fez, em condições adversas em que teve de recorrer fundamentalmente ao crédito externo para fazer uma obra de infra-estruturas muito mais relevante do que a que W. Ex.ª estão a fazer agora, é que esse esforço teve uma eficácia de reduzido alcance na estrutura produtiva.
E porquê? Porque essa obra assentava - porventura, tal como agora - numa estabilidade, que por sua vez assentava em pressupostos falsos e numa bipolarização falseada das forças políticas portuguesas. Desta forma, depois, a obra não pôde ter continuidade, pois faltaram-lhe os instrumentos que lhe permitiriam ter essa continuidade nos reflexos da estrutura produtiva. Assim, no meu entender, ela não teve reflexos assinaláveis na estrutura produtiva do País proporcionais ao esforço que envolveu. Isso é verdade!
O Sr. Ministro fez algumas referências ao emprego, mas lembro-lhe que os países que, efectivamente, alteraram a sua estrutura produtiva suportaram piores taxas em matéria de emprego, mas suportaram-nas não menosprezando, no quadro da segurança social, o problema da protecção do emprego, isto é, não o subalternizando, como nós temos feito, mas sustentando-o.
É que, para incentivar sectores produtivos a mudarem a estrutura produtiva do País - e não podemos ter «o sol na eira e a chuva no nabal» -, temos de diminuir as consequências dessas mudanças através de políticas verdadeiramente concertadas e coordenadas, e isso é o que não tem acontecido!
A Sr.ª Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território.
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, aquilo que estamos a tentar fazer é - e disse-o na minha intervenção, por isso peco-lhe o favor de reler o meu discurso -, para além de apostarmos nas obras públicas, apostarmos também nos homens. Isto está claramente dito no meu discurso, ou seja, é tão importante investir nas coisas como nas pessoas, pois são elas que vão mudar todas as coisas no País, são elas que vão ajudar a fazer aquilo que o Sr. Deputado Nogueira de Brito pretende que se faça.
Quanto à referência que o Sr. Deputado fez, há pouco, da consequência da actuação sobre as obras públicas, não posso estar mais de acordo com ela, porque actuar só sobre isso é amputar a sociedade dos seus principais agentes.
Mas cuidado com a questão da flexibilidade e da pouca importância que dá a uma taxa de desemprego elevada. Os Portugueses suportam mal uma taxa de desemprego elevada - e ela é vulgar em Espanha, onde, durante muito tempo, foi da ordem dos 19 % e se for para a Andaluzia verá que ela chega aos 35 %.
Ora, uma taxa de desemprego de 35 % em Portugal significaria a instabilidade social e seria intolerável. De maneira que aquilo que estamos a fazer é tentar conciliar estas situações - como o Sr. Deputado Nogueira de Brito disse no seu pedido de esclarecimento-, adaptando as circunstâncias aos Portugueses e tendo sempre em conta que os Portugueses toleram mal o desemprego e o facto de serem assistidos socialmente.
Na verdade, os Portugueses o que querem é ter a dignidade de receber um salário e de levá-lo para casa. Aliás, foi isso que deu resultado na península de Setúbal, isto ó, resolvemos primeiro os problemas da dignidade e, como já disse, parle da população está a levar para casa o salário.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, vamos interromper os nossos trabalhos, que recomeçarão às 15 horas. Está suspensa a sessão.
Eram 13 horas e 75 minutos.
No recomeço da sessão, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Vítor Crespo.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 25 minutos.
Informo a Câmara de que estão inscritos, para produzir intervenções, os Srs. Deputados Octávio Teixeira, Domingos Duarte Lima, Jorge Lacão e Carlos Lilaia e ainda que às 17 horas e 30 minutos a sessão será interrompida, por cinco minutos, para se proceder à entrega do prémio «Reportagem Parlamentar» referente à 3.º sessão legislativa da V Legislatura (1989-1990) ao jornalista Fernando Antunes.
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O Sr. António Guterres (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, penso que é importante sublinhar, sem outro objectivo que não seja o de explicar por que é que as diversas bancadas estão como estão. É que, salvo erro, neste momento há 10 ou 11 comissões reunidas, estando igualmente reunido o Conselho de Administração.
Isto apenas para que não cause estranheza nas pessoas o facto de as diversas bancadas, sejam elas quais forem - e esta observação tanto é válida para a minha própria bancada como é para as outras-, estarem consideravelmente «desguarnecidas».
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, apenas posso confirmar aquilo que acaba de dizer. De resto, essas reuniões vêm referidas no Boletim Informativo e são do conhecimento geral.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Numa interpelação ao Governo sobre política geral, em fim de sessão e a poucos meses de novas eleições gerais, importa que se enfatizem, como um dos traços caracterizadores do seu comportamento, manifestas concepções autoritárias do Governo e do PSD e que, desse facto, se retirem as necessárias ilações.
Nunca, depois do 25 de Abril de 1974, se assistiu a uma tão grande escalada governamentalizadora das instituições e do aparelho de Estado; nunca foi tão evidente a perversa identificação dos interesses de um partido com os interesses do Estado.
O sectário controlo partidário da comunicação social do sector público não resiste a qualquer confronto com situações anteriores. Assim, aumentaram as dificuldades de acesso dos partidos da oposição à televisão e à rádio públicas e privatizaram-se jornais em benefício de «interesses laranja».
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!
O Orador: - A passividade e a submissão da maioria parlamentar aos ditames do Governo permitiram que este invadisse sistematicamente as áreas de competência da Assembleia da República, transformando a autorização legislativa em norma e a proposta de lei substantiva em excepção, esvaziando de conteúdo a competência fiscalizadora do Parlamento.
A autonomia do poder local democrático foi afectada por ingerências abusivas do Governo e a sua capacidade de acção fortemente limitada pela persistente asfixia financeira a que o Governo o submeteu.
A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Exactamente!
O Orador: - Designadamente, após as eleições presidenciais de Janeiro passado, são múltiplos os factos demonstrativos das intenções do Governo de remeter o Presidente da República a um papel meramente protocolar e de esvaziar as suas competências constitucionais em matéria de defesa nacional e de política externa.
A mensagem presidencial sobre o estado da comunicação social pública foi, pelo Governo, tratada com arrogância, insolência e cinismo. Acordado que foi em 1989, o regime de autonomia financeira da Presidência da República continua bloqueado pelo Governo.
Enfim, o Governo não se eximiu mesmo de deturpar uma lei, já depois de promulgada pelo Presidente da República, e perdeu todo o pudor com a apresentação à Assembleia da República da proposta de lei alcunhada de «segredo de Estado».
Srs. Deputados, sublinhando de forma inequívoca o carácter antidemocrático do governo do PSD, o pacote laborai é, simultaneamente, uma síntese dos aspectos mais marcantes da política anti-social do Governo e da reiterada violação dos direitos dos trabalhadores constitucionalmente consagrados.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Essa aberração antidemocrática ó uma das principais peças condenatórias da política do Governo e exige a sua imediata revogação, logo após as próximas eleições legislativas.
Estes e muitos outros exemplos, como a tentativa de alteração da legislação eleitoral de acordo com os interesses do PSD, o processo de privatizações e de liquidação da reforma agrária e as situações que conduziram às lutas sociais de estratos profissionais que nunca o tinham feito anteriormente, como os magistrados e a PSP, põem a nu, afinal, uma característica essencial dos cincos anos de governo maioritário do PSD: a tão apregoada estabilidade governativa significa, afinal, uma profunda desestabilização do regime democrático, da situação social e da organização económica do nosso país.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje, como ontem, o Governo apresenta-nos o crescimento económico dos últimos cinco anos como a «jóia da coroa» da sua acção governativa. Como noutras ocasiões já o afirmámos, não seremos nós a contestar esse crescimento. Mal fora, aliás, que, com as condições externas e as centenas de milhões de contos de fundos comunitários de que o País dispôs, não tivesse havido crescimento económico.
O Governo, porém, continua o omitir e a sofismar a questão central: que o crescimento económico foi acompanhado da acentuação da condição periférica e dependente da estrutura e especialização produtivas, da persistência dos desequilíbrios ecológicos e das assimetrias regionais e do agravamento das desigualdades e das injustiças sociais.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Ainda há dois dias o INE veio a público confirmar que os elementos já apurados do recenseamento em curso «reflectem profundas assimetrias regionais» e que «continua o processo de litoralização do espaço português», motivado, fundamentalmente, pela procura de uma oportunidade de emprego.
Do mesmo modo que muito recentemente o relatório do banco central veio reafirmar que, quer se analise a distribuição funcional quer a distribuição do pessoal, o rendimento nacional tem sido cada vez mais injustamente repartido, beneficiando os lucros das grandes empresas e os jogadores da economia de casino.
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O Governo olvida e escamoteia os problemas com que se defrontam muitos empresários portugueses, por efeito do excessivo nível de taxas de juro do crédito bancário, ao mesmo tempo que faz aprovar medidas fiscais contrárias às orientações do Banco de Portugal quanto à entrada de capitais externos para aplicações rentistas, dificultando, assim, o controlo da liquidez monetária e a possibilidade de redução daquelas taxas de juro.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador:-Enfim, as declarações do Ministro das Finanças sobre a inconveniência da entrada, nos tempos mais próximos, do escudo no mecanismo cambial do SME não são mais que a confissão da falência da política do Governo no combate à inflação, ainda ontem confirmada com os dados relativos ao mês de Maio. Significa, afinal, o confessado insucesso na convergência nominal com os restantes países comunitários, sendo certo que, quanto à convergência real, essa está cada vez mais longe.
É, enfim, a orientação eleitoralista da política económica e financeira que leva o Governo, contra os interesses da economia nacional, a prolongar o nível especulativo dos preços dos combustíveis líquidos, aguardando um momento mais próximo das eleições de Outubro para proceder à exigível baixa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos últimos anos, vivemos tempos de oportunidades perdidas, com um Governo que impediu um Portugal mais justo e mais democrático. Quando era possível corrigir desigualdades e injustiças, o Governo acentuou-as; quando se tomava necessário dar uma nova dimensão participada e participativa à democracia, o Governo partidarizou, instrumentalizou, concentrou, governamentalizou.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Em nome da estabilidade governativa, ressurgiram manifestações de autoritarismo preocupantes, mas também aqui se pode dizer que «este é o pior dos tempos» ou que «este é o melhor dos tempos».
Em 6 de Outubro, o povo português pode retomar os caminhos para uma vida melhor, numa sociedade mais justa, solidária e democrática!
Aplausos do PCP e do deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Domingos Duarte Lima.
O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo,
Sr.ªs e Srs. Deputados: É com particular agrado que o meu grupo parlamentar saúda a iniciativa do Partido Socialista de promover esta interpelação ao Governo, centrada em política geral, neste encerramento de legislatura.
Partido Socialista e restantes partidos parlamentares que nós também aproveitamos, neste fim de sessão, para cumprimentar, com todo o respeito democrático, pelo confronto frontal que aqui tiveram connosco, pela colaboração que deram para que a democracia se enraizasse em Portugal, de uma forma mais viva ao longo destes quatro anos, e, também, pelo estímulo que nos deram para podermos apresentar e melhorar todas as iniciativas que tivemos nesta Câmara.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Democraticamente, é salutar que o principal partido da oposição peça contas, com regularidade, ao Governo e ao partido que o apoia, particularmente no termo do seu mandato. Ë imperioso que um e outro - Governo e partido apoiante - lhe prestem essas contas, a ele e aos restantes partidos com assento nesta Câmara - sede primeira da democracia representativa.
Estamos, pois, em fim de mandato e aquilo que nos é legitimamente exigível é que demonstremos se cumprimos ou não os compromissos, as metas e os objectivos a que nos vinculámos, em 1987, perante os Portugueses.
Esta delimitação da matéria é uma operação prévia a qualquer discussão, já que bem se compreenderá que não nos pode ser exigido que respondamos pelo incumprimento de compromissos, objectivos e desejos - por muito válidos que sejam - que não foram os nossos, nem o foram, sequer, da maioria do povo português, que pelo voto afirma as suas preferências.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - É porque, de facto, frequentemente, a oposição critica-nos por não termos promovido políticas e iniciativas legislativas que foram o seu compromisso eleitoral e não o nosso!
Essas iniciativas e essas políticas deverão propô-las, de novo, aos Portugueses, no próximo mês de Outubro, e procurar legitimar e fundar a sua execução na vontade popular, no futuro.
Em 1987, propusemo-nos promover alguns objectivos que considerámos ambiciosos, por cujo cumprimento queremos e devemos ser julgados; garantir a recuperação económica do País de forma sustentada, assegurando uma base sólida de riqueza nacional; promover o seu desenvolvimento equilibrado; modernizar as suas estruturas jurídicas e económicas, assegurando uma integração harmoniosa na Comunidade Económica Europeia; aumentar, de forma gradual, mas segura, a justiça social e o bem-estar dos cidadãos, e afirmar o nome de Portugal no mundo.
A questão que tem que nos ser colocada é a de saber se cumprimos ou não estes objectivos - e estes são os únicos a que estávamos vinculados pela vontade popular.
Não nos pode - ou, pelo menos, não nos deve - ser pedido que respondamos por que razão não foram cumpridos determinados compromissos eleitorais do PS, do PCP ou de outras forças políticas - dignos, naturalmente, de respeito, mas não sufragados maioritariamente pelo voto popular.
Esses partidos deverão, previamente, garantir a legitimação para governar e porem, depois, em prática as suas políticas.
Nos debates que se têm travado nesta Assembleia, particularmente nos últimos meses, o Governo e o PSD fizeram prova abundante quanto ao cumprimento escrupuloso dos seus compromissos.
Que nos responde e que contesta hoje o PS? Numa palavra simples: que falhámos no cumprimento desse compromisso.
Di-lo de uma forma mais suave e menos bruta que nos primeiros dois anos da V Legislatura, mas di-lo, mesmo assim!
Naqueles dois primeiros anos, o PS criticou tudo, sem critério e, algumas vezes, sem coerência, quase sempre por arrastamento das criticas dos agentes sociais, das quais foi
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caixa de ressonância, mesmo quando os interesses em jogo eram contraditórios, como aconteceu quando, num dia, assumia como suas as críticas das confederações patronais, para, no dia seguinte, assumir igualmente as críticas contrárias das confederações sindicais.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Nesta segunda fase da Legislatura - aquela, no fundo, em que começaram a ser mais evidentes os resultados da acção governativa e mais patente o seu reconhecimento, inclusive internacional-, o PS mudou de disco, cantando a música de outro modo: ele haveria, até, crescimento económico, o que não havia era desenvolvimento nem verdadeira modernização; claro - reconhece o PS - que se verifica uma melhoria nas condições de vida dos Portugueses... Contudo - diz a seguir -, ter-se-ão agravado muito as desigualdades e as injustiças sociais; ele não nega que aumentou o investimento, afirma, porém, que não se percebe para quê, já que continuará hipotecado o futuro do País; reconhece que há progressos no domínio da infra-estruturação, mas isso não é mérito nosso, resultará, antes de mais, do maná comunitário; para cúmulo de tudo isto, considera que foi o Governo muito arrogante e incapaz de dialogar e que, por isso, deve estigmatizar-se a maioria absoluta com o anátema de querer exercer, nefandamente, o poder absoluto, como também já aqui foi dito, esta manhã, pelo
Sr. Deputado António Guterres...
Estes serão, em resumo, os cinco «pecados capitais» apontados ao Governo e à maioria. Vale a pena responder-lhes um a um.
Primeiro, saber se, para além do mero crescimento económico, há ou não desenvolvimento, há ou não modernização.
E vale a pena, a este respeito, contrapor a evidência das coisas à evidência das palavras, porque as coisas «são», enquanto as palavras apenas «dizem».
E que nos diz a evidência das coisas? Para o efeito, citarei aqui alguns números que o Sr. Deputado António Guterres não queria que citássemos, porque, nestes casos, os números são um pouco como o sal e a pimenta da política.
Aliás, VV. Ex.ªs, quando lhes interessa, citam os números. Por exemplo, quando vos interessa dizer que a meta da inflação não foi cumprida, citam os números, mas, quando querem falar do investimento ou do crescimento económico ou da melhoria da política governativa, no que diz respeito às prestações sociais, aí, é a conversa aborrecida dos números que VV. Ex.ªs não querem ter!
Mas, com vossa licença, referirei alguns números: entre 1986 e 1990, a produção nacional portuguesa aumentou 25 % em termos reais, isto é, descontado o valor da inflação, o que significa um crescimento anual de 4,6 % ao ano; a produção per capita aumentou 23 %; criaram-se mais de 450 000 postos de trabalho, tendo o desemprego baixado de 9 % para 4,5 % da população activa; o investimento cresceu a uma taxa média anual de 12 %; a produtividade média anual do trabalhador português subiu 2,7 %; o rendimento real disponível das famílias subiu 20 %; o consumo privado aumentou 27 %; construíram-se 1300 km de estradas, estando ainda em construção cerca de 500 km; lançou-se a construção de 420 escolas, com capacidade para albergar mais 300 000 alunos; as despesas com a educação serão, em 1991, em termos reais, o dobro das de 1985; aumentou substancialmente o número de jovens com acesso aos ensinos básico e superior; começaram a sentir-se os primeiros efeitos e, para utilizar a linguagem do último relatório da OCDE, dos investimentos de modernização na agricultura e na indústria, assistindo-
se aos primeiros sintomas de verdadeira reconversão estrutural.
Se o que fica dito, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não é desenvolvimento, então o Partido Socialista é de outra galáxia e deve ir para lá disputar as eleições!...
Aplausos do PSD.
Segundo, saber se agravaram ou, pelo contrário, se diminuíram as desigualdades sociais.
As sociedades mais desiguais começam por ser as que têm mais desemprego. Que maior drama haverá para um chefe de família do que não ter garantido um posto de trabalho e um salário condigno?
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Muito bem! E essa questão!...
O Orador: - Talvez o único drama superior seja o de ter esse posto de trabalho e não receber, durante meses a fio, o salário a que tem direito. Uma e outra são situações do passado, encontrando-se o nível do desemprego próximo daquilo que, tecnicamente, é considerado o limiar mínimo.
Mas também a perda do poder de compra dos salários - situação de que todos nos lembramos nos anos de inflação galopante - é um factor de agravamento das desigualdades. Também esse indicador cresceu 14 %, entre 1986 e 1990, o mesmo se podendo dizer para as prestações sociais, nomeadamente as pensões de reforma e invalidez ou o abono de família, com aumentos reais que variaram entre 80 % e 114%%.
A evolução estática, que normalmente é aqui invocada e que privilegia casos isolados - que são reais, naturalmente- de injustiças sociais, perante as quais ninguém se pode sentir satisfeito, não são o indicador correcto. Os factos enunciados demonstram, pois, que também esta acusação é infundada.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Terceiro, saber se hipotecou ou não o futuro do País.
Será que se agravaram, com as políticas que foram promovidas, as condicionantes que pesam sobre o desenvolvimento, a prazo, do País? Também aqui, e mais uma vez, não tem o PS razão!
Entre 1985 e 1990-com a ligeira excepção de 1988-, as contas externas apresentaram sempre saldo positivo. A dívida externa, situada, no ano de 1985, em 80 % da produção nacional, representou, em 1990, apenas 30 % da mesma produção. As reservas do Banco de Portugal, como é sabido, quase triplicaram, pelo que é possível afirmar, com rigor e sem demagogia, que, sob o ponto de vista do desenvolvimento sustentado, é inatacável a política seguida até aqui.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Quarto, a tristíssima e niilista, às vezes, acusação de que os progressos no domínio da infra-estruturação resultaram das concessões alheias, mais do que do esforço próprio. É mesmo ter em pouca conside-
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ração o trabalho dos Portugueses, esta paranóia de teimar em dizer que tudo quanto é mau é culpa nossa e que tudo quanto é bom é graça alheia!...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Ora é sabido, Srs. Deputados socialistas, que nas relações internacionais - e para abordar a questão dos fundos comunitários-, normalmente, não há lugar para a magnanimidade, sendo mais acertado dizer, antes de tudo, que os fundos comunitários resultaram do nosso esforço e da nossa habilidade negociai, devendo, de seguida, acrescentar-se que os fundos comunitários são uma parcela minoritária da despesa global com o investimento público,...
O Sr. Francisco Antunes da Silva (PSD): - Muito bem!
O Orador: -... cuja percentagem mais significativa provém do Orçamento do Estado, quer dizer, do bolso e do sacrifício de todos os portugueses.
Desvalorizar esse sacrifício é uma desconsideração - naturalmente, involuntária... - que o PS comete para com os nossos concidadãos, e nós repudiamo-la! O mérito é nosso, não é do Governo nem do PSD, mas dos Portugueses, que acreditaram que Portugal tem futuro e não apenas passado.
Aplausos do PSD.
Quinto, o triste chavão da arrogância e da falta de diálogo.
Hoje, já poucos levam a sério este refrão. Duvido mesmo que, intimamente, o próprio PS o leve a sério, depois da demonstração que aqui foi feita, na passada semana, pelo Primeiro-Ministro e que, de resto, é corroborada por todas as sondagens de opinião, em que a preocupação dos Portugueses com o pluralismo na comunicação social e com as liberdades públicas vem em último lugar em relação a todas as outras preocupações.
Não há arrogância e falta de diálogo quando mais de dois terços das propostas de lei de iniciativa governamental foram aprovadas, na Assembleia, com os votos favoráveis ou a abstenção dos partidos da oposição. Mais: quando um largo número de propostas - meritórias, com certeza! - da própria oposição tiveram aqui o voto favorável do PSD.
Não há arrogância ou falta de diálogo quando se assinam três acordos sociais consecutivos, fazendo concordar confederações patronais e sindicais quanto aos grandes objectivos e metas da política macro-económica e quanto a um vasto conjunto de matérias que a ultrapassam. O mundo, os factos e os acontecimentos de que, a este respeito, aqui falou, esta manhã, o Sr. Deputado António Guterres não fazem parte da realidade portuguesa. São uma ficção construída para dar consistência ao seu discurso.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Muito bem! O Orador: - É tempo de arranjarem outro refrão.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - É a fantasiosa galáxia!...
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Com a convicção e com a segurança que os factos nos evidenciam, afirmamos, pela nossa parte, que cumprimos, nesta V Legislatura, o essencial do compromisso que prometemos honrar perante os Portugueses.
Em vós, Srs. Deputados socialistas, que sois interpelantes, também muitos portugueses depositaram esperanças e expectativas, havemos de reconhecê-lo! Os que vos deram o seu voto, confiadamente, esperaram que chegásseis ao fim desta legislatura com mais credibilidade para serdes alternativa e exercer responsabilidades na governação.
O Sr. José Silva Marques (PSD): -Não me cheira!...
O Orador: - Também vós, por isso, sois chamados a responder. E, pela mesma razão, neste final de legislatura, me atrevo a interpelar o interpelante.
Por que não sois, hoje, alternativa credível de governo?
Por que não se agitam e não se comovem os Portugueses com as vossas propostas, ao fim de quatro anos de oposição - que considerais um êxito - e de governo de maioria absoluta - que considerais um fracasso completo?
Por que não regurgitam de gente aquelas galerias, no frémito do genuíno apoio popular que, nesta altura, vos devia estar reservado?
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Vão todos para a manifestação às 19 horas e 30 minutos!
O Orador: - Por que deixais o vosso líder, à semelhança do El Gordo espanhol - permita-se-me a expressão -, transformar-se na miragem de uma choruda taluda para todos os portugueses, associando, de forma irresponsável, a sua fotografia ao chavão banal e enganador do «mais»: mais casas, mais saúde, mais educação... E menos impostos?...
Por que não explicais o essencial: onde arranjar mais dinheiro - essa coisa mesquinha sem a qual os governantes não conseguem cumprir as suas promessas - para garantir tanta fartura?
Aplausos do PSD.
Finalmente, perguntamos: por que não está aqui, nos últimos dias da Legislatura, o vosso líder?
Por que não estão os outros líderes, os que acusam o nosso de vir poucas vezes à Assembleia da República, mas que é, afinal, ao que parece, o único que cá vem?
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O nosso líder não é deputado! Deixe essa demagogia para o Primeiro-Ministro!...
O Orador: - Porque não quis, porque pensava que devia de ser, em 1987, deputado pelo PSD e não quis empenhar-se com o CDS, mas isso é problema dele e vosso.
O vosso líder deveria estar hoje aqui, perante a representação nacional, anunciando o destino que reservaria aos Portugueses se os governasse a partir de Outubro.
Permiti, Srs. Deputados socialistas, que vos retribuamos a frontalidade democrática com que soubestes opor-vos à maioria, que apoiou o Governo ao longo destes quatro anos, e que vos digamos, olhos nos olhos, que o vosso líder não está aqui porque falhou!
Falhou, lá onde também tem responsabilidades executivas!
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Falhou na maior Câmara do País, que prometeu revolucionar num ano, mas que deixa em estado caótico, infernal mesmo, ao fim de ano e meio de mandato.
Vozes do PS: - Olhe que não!...
O Orador: - É por isso que ele nunca quer falar da Câmara, pois, se tivesse coisas para falar dela, fá-lo-ia, Srs. Deputados.
Aplausos do PSD.
O Orador: -Falhou, ao não conseguir levar à prática, numa câmara municipal, aqueles milagres que anuncia abundantes e fartos no Governo.
Falhou no essencial daquilo que o levou a cometer aquele gesto, que muitos, então, consideraram heróico e romântico, e que hoje consideram fatal. A sua candidatura à Câmara de Lisboa tinha como objectivo evidenciar os seus dotes como executivo e como governante, mas o seu exercício, pelo contrário, evidenciou apenas a sua hesitação, a sua indecisão crónica e a sua impressionante incapacidade política.
Aplausos do PSD.
Por isso, concluímos, Srs. Deputados, que falhou onde devia cumprir. Será, portanto, normal que os Portugueses lhe não reconheçam crédito no Governo para onde pretende alcandorar-se.
Vozes do PS: - O PSD perdeu aí!
O Orador: - Perdemos na Câmara Municipal e aceitamos essa minoria!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Mas perderam!... O Sr. João Salgado (PSD): - Você também lá está!...
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Ao fim de 10 anos, perderam, apesar de todo o anticomunismo!
O Orador: - É verdade! Perdemos para a Câmara de Lisboa e por isso estamos a pedir contas!
Compreendereis que será legítimo que muitos se interroguem, apoderados de inquietação: «Como poderia ser um bom primeiro-ministro quem não conseguiu ser um bom presidente de câmara?»
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: -E compreendereis, igualmente e por isso, que neste final de sessão vos deseje, Srs. Deputados socialistas, que regresseis em Outubro, após as eleições, com a segurança de poder contar, de novo, com o Prof. Cavaco Silva como Primeiro-Ministro de Portugal.
Aplausos do PSD. Vozes do PS: - Safa!
O Orador: - Será a segurança do País! Será por isso, também, a vossa segurança! Afinal - e parafraseando um conhecido slogan -, vocês merecem...
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inscreveu-se o Sr. Deputado Jorge Lacão para defesa da honra e consideração da sua bancada.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - É para defesa da consideração da minha bancada e para dizer ao Sr. Deputado Duarte Lima que, desta vez, linha começado bem o seu discurso, pena é que o tenha acabado mal.
O líder do meu partido não está aqui, não pela razão que referiu, «de que falhou», mas, sim, pela razão evidente de que não está aqui porque ganhou!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Esse é, como o Sr. Deputado quis dizer, o facto indesmentível.
Mas ao contrário do líder do meu partido que, não estando a exercer o cargo de deputado, aqui não tinha de estar, o Primeiro-Ministro, no momento em que o principal partido da oposição interpela o Governo em balanço de legislatura, em nome daquilo que, há poucos dias, aqui lhe ouvimos, que era o respeito e a consideração pelo trabalho parlamentar, deveria ter sabido organizar a sua agenda para estar, hoje, aqui presente e responder pelo trabalho de legislatura, tal como o Governo, hoje, aqui está a ser interpelado...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: -... e, sobretudo, Sr. Deputado Domingos Duarte Lima, para não termos de ouvir abordagens com total falta de rigor, como aquela que, agora mesmo, da sua boca ouvimos!
Acerca dos fundos estruturais, acerca daquilo que, supostamente, seria o menor significado da contribuição dos fundos estruturais para o investimento nacional, pergunto se tem ideia de qual o volume global de investimentos orçamentado, no ano passado, para este ano. Se não tem esse número ao seu alcance, tenho todo o prazer em dizer-lho aqui: o número do PIDDAC para 1991 é de 261 milhões de contos.
Sabe o Sr. Deputado Domingos Duarte Lima qual a verba dos fundos estruturais a transferir no ano de 1991? São 250 milhões de contos. É exactamente o dobro da capacidade de investimento, que, assim, se alcança por via dos fundos estruturais para o nosso país.
Como pode, então, o Sr. Deputado Domingos Duarte Lima falar do impacte de 15 %? Necessariamente não sabia do que estava a falar!
O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Eu não falei em 15 %!
O Orador: - Porque o impacte dos 15 % é a transferência para apoio ao investimento privado, Sr. Deputado.
Quando quiser voltar a citar os números, tenha a noção de qual a natureza dos números que está a citar.
Vozes do PS: - Muito bem!
Entretanto, reassumiu a presidência a Vice-Presidente Afaria Manuela Aguiar.
A Sr/Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Domingos Duarte Lima.
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O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Sr. Deputado Jorge Lacão, foi patente na explicação que deu o facto de que eu não feri nem a sua consideração ou honra nem a da sua bancada. Limitei-me a fazer algumas críticas, que, como calcula, tenho o direito de fazer, pois os Srs. Deputados não podem estar à espera de que eu esteja nesta bancada para lhes «cantar madrigais»!...
Se os senhores entendem que devera dirigir as críticas mais frontais e adequadas em cada momento ao Governo e ao partido que o apoia, reconhecer-me-ão o mesmo direito. Penso, no entanto, que terá sido a necessidade de procurar uma figura regimental que o levou a utilizar a da defesa da consideração.
Quanto à sua afirmação de eu ter começado bem e acabado mal, fico sempre à espera que me digam isso, porque normalmente a sua bancada faz-me sempre esse cumprimento. Daí que eu não estranhe a afirmação.
O Sr. António Guterres (PS): - Normalmente dizemos que começa mal e acaba pior!
O Orador: - Disse o Sr. Deputado que o líder do meu partido não se encontra aqui presente porque ganhou. Devo dizer-lhe - com a devida vénia ao Sr. Deputado António Guterres, que hoje, pela qualidade da sua intervenção, se assumiu quase como um líder de partido - que concordo que ganhou. Oportunamente registámos esse facto nesta Câmara. Através de uma intervenção por mim proferida logo após as eleições autárquicas, eu próprio saudei a vitória do Partido Socialista nas eleições autárquicas, de uma forma geral, e na Câmara Municipal de Lisboa, em particular. Não é isso o que está em causa.
Sucede é que ele poderia estar aqui presente. Isso esteve, aliás, para acontecer, mas, segundo parece, desmarcou a sua presença à última hora em virtude de o Primeiro--Ministro ter vindo antes. Os senhores deixaram efectivamente que os jornais dissessem que ele viria cá, o que, de resto, não ocorreria pela primeira vez, porque há uns meses atrás, pelo facto de ter ganho, não deixou de aqui vir, como é do seu conhecimento.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Desapareceu logo!
O Orador: - Isso não é desculpa. Seria importante que ele aqui estivesse...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Para falar com quem? Vozes do PSD: - Consigo, Sr. Deputado!
O Orador: - Para falar com todos nós, Sr. Deputado Narana Coissoró. Talvez nem seja para falar com o Sr. Deputado Narana Coissoró, porque o Sr. Deputado já tem todas as explicações dadas e não necessita de que ele lhe dê mais. Está conversado!...
Não é desconhecido de ninguém que, para além de ser uma tentativa de resolver um problema interno do Partido Socialista, o líder do vosso partido se candidatou à maior câmara municipal do País, onde realmente teve o mérito de ganhar e obter uma votação que lhe deu essa vitória, para mostrar que tinha créditos como governante.
Vozes do PS: - E tem!
O Orador: - Mas é disso que ele não quer falar, pois sempre que lhe falam da Câmara Municipal ele diz que «não estou aqui por causa disso». Se tivesse obras e acções concretas para mostrar, ele falaria certamente da Câmara Municipal. É esse problema que chamo à colação.
Aplausos do PSD.
Vozes do PSD: - Onde estão as obras?
O Orador: - Quanto às alegadas «abordagens de falta de rigor» sobre os fundos estruturais, o Sr. Deputado Jorge Lacão anda a aprender mal a lição que lhe está a dar o candidato x de Bruxelas!...
Risos do PSD.
Desde logo não falei em qualquer impacte de 15%, afirmação que não consta da minha intervenção. O que eu disse nessa intervenção foi que, falando da totalidade do investimento público em Portugal, a componente maioritária não é a dos fundos estruturais.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - V. Ex.ª pelo contrário, agregou ao valor que enunciou o dos fundos estruturais, que, como deverá saber, não contam sequer para a componente do investimento.
Não há, pois, falta de rigor na abordagem do assunto. Houve mau entendimento da sua parte e, se alguma falta de rigor existiu, foi certamente da parte de V. Ex.ª
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: -Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Convoco a vossa atenção para os desafios do desenvolvimento, nesta época de vésperas do mercado interno comunitário, quando Portugal está a usufruir de excepcionais apoios financeiros em resultado das transferências operadas por via dos fundos estruturais de incentivo ao desenvolvimento regional, à orientação agrícola e à formação.
Para o PSD, tudo parece ficar a dever-se ao talento do Primeiro-Ministro e dos seus pares no Governo. Se tão pródigos são em suscitar comparações das laxas de crescimento actual com as de anos anteriores, é muito curioso que nunca lhes ocorra referir os factos decisivos que ontem marcaram as condições do Portugal de hoje - refiro-me, naturalmente, à própria adesão de Portugal à Comunidade Europeia, verificada sob a égide de Mário Soares, cuja capacidade política de antecipar o futuro marcou um dos momentos mais decisivos da nossa história democrática e permitiu abrir à sociedade portuguesa horizontes de progresso ainda há poucos anos insuspeitados.
Vozes do PS: -Muito bem!
O Orador: - O PSD, porém, já nos habituou a não saber fazer justiça.
Mais do que tudo, é lamentável que o Primeiro-Ministro se permita distorcer grosseiramente a verdade do processo português de integração comunitária ao sabor dos seus objectivos de propaganda, sem limites para a demagogia e sem respeito pela verdade.
O Primeiro-Ministro reivindica como mérito especial do seu governo, como alegado talento da sua capacidade
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negocial junto da Comissão Europeia, a passagem para o dobro das verbas dos fundos estruturais aplicáveis a Portugal. Mas aqui, na Assembleia da República, interpelado sobre o valor de tal afirmação, vimos o Primeiro-Ministro fugir deliberadamente a todos os problemas postos em torno dos impactes da aplicação do quadro comunitário de apoio em Portugal.
O Primeiro-Ministro - reconheça-se - está a «fazer escola» em Portugal. Faz da política um acto de espectáculo permanente, com total desprezo pela autenticidade do confronto político e numa compungente desvalorização do papel das ideias no domínio da acção política.
O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!
O Orador: - Acredito, todavia, que vale a pena persistir em conduzir a política ao domínio ético da verdade. As realidades nacionais não confirmam os discursos do Primeiro-Ministro. Para quem possa persistir na dúvida, há que encarar tais realidades, e delas aqui se dão notícia.
Em primeiro lugar, a duplicação dos fundos estruturais não é mérito especial deste governo, mas consequência do Acto Único e da decisão de criação do mercado interno comunitário e como medida destinada pela CEE a incrementar de forma acelerada o desenvolvimento económico e social das regiões mais atrasadas da Comunidade.
Em segundo lugar, a aprovação do quadro comunitário de apoio para Portugal, integrando na sua aplicação todo o território nacional, nada teve a ver com uma particular diligência deste governo. Resultou, simplesmente, de uma necessidade indisfarçável em face dos nossos baixos índices de desenvolvimento, comparativamente aos demais países da Comunidade. Só no ano em curso Portugal poderá beneficiar de mais de 250 milhões de contos, pelo menos tanto como o total do investimento público inscrito no Orçamento do Estado. Algum governo no passado usufruiu de tais facilidades?
Em terceiro lugar, se face à Grécia, por exemplo, os índices de distribuição de verbas atribuídas per capita são idênticos, comparativamente à Irlanda, terceiro país em que se regista a aplicação integral de um quadro comunitário de apoio, mas onde os índices de desenvolvimento são inequivocamente superiores aos nossos, Portugal receberá, todavia, em média, menos 50 contos por habitante, o que manifestamente não deixa dourar o Governo dos fartos êxitos negociais de que, a torto e a direito, tanto se tem reivindicado.
Em quarto lugar, tendo a reforma dos fundos estruturais entrado em vigor em Janeiro de 1989 e o quadro comunitário de apoio para Portugal sido aprovado em Outubro do mesmo ano, é politicamente indesculpável que a sua orgânica de funcionamento, exclusivamente dependente do Governo e por sua exclusiva inércia, só tenha entrado em funcionamento nos finais de 1990, contribuindo assim para atrasar drasticamente a execução da maioria dos programas operacionais pensados para um período de cinco anos e na prática já reduzidos a um ciclo de três.
Em quinto lugar, e mais uma vez em nome do rigor, não é admissível que os discursos do Governo continuem a flutuar ao sabor das conveniências, de tal forma que quando o Primeiro-Ministro quer auto-exaltar os méritos da acção governativa diminui o significado das transferências comunitárias, reportando-as à verba de 550 milhões de contos, mas, quando o Governo quer ufanar-se dos êxitos de negociação, fala então, pela boca da Secretária de Estado do Desenvolvimento Regional, em 860 milhões de contos de compromissos já garantidos.
Que significa a discrepância: diferença de saldos líquidos ou graves falhas de execução?
O caso é que, ao afirmar-se que a taxa de execução ronda actualmente os 70 %, em tal percentagem estão a incluir-se os adiantamentos aos projectos aprovados, na ordem dos 40 % do respectivo valor, o que evidentemente significa laxas de execução real a níveis preocupantemente baixos.
O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!
O Orador: - Bem pode, pois, dizer-se que, em face do que o Governo gosta de chamar a sobra feita», o mais que existe é sobretudo obra atrasada e em grande medida por fazer.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mesmo sem o confessar, o Governo sabe que assim é. Teme as consequências dos falhanços de execução em face de um perigo que espreita: o perigo do corte de verbas nos envelopes financeiros inicialmente estabelecidos.
Por isso - é a sexta observação-, o Governo tenta convencer em Bruxelas os serviços da Comissão (e é caso para dizer, em face das dificuldades em que se meteu, oxalá que o consiga) a considerar que o valor dos adiantamentos efectuados seja desde logo havido como despesa efectiva para efeitos de taxa de execução e, consequentemente, de mobilização de verbas.
A engenharia financeira poderá assim permitir, se o permitir, disfarçar as grandes dificuldades em que vai navegando a concreta utilização dos fundos comunitários. Mas o que não disfarçará é a má gestão do Plano de Desenvolvimento Regional.
Com efeito, é indisfarçável que a versão originária do Plano de Desenvolvimento Regional, de cuja aplicação integral o Governo tanto fez profissão de fé, se encontra largamente subvertida com a mobilização de verbas para efeitos e programas inicialmente não previstos, como o caso dos 90 milhões de contos de comparticipação no projecto Ford/Volkswagen.
O Governo tem o direito de, em cada momento, procurar reequacionar as prioridades do apoio ao investimento, mas não tem o direito de alterar prioridades de investimento em programas e projectos aprovados sem explicar claramente ao País quais as áreas, os critérios e as consequências dos cortes de financiamento que inevitavelmente terão de verificar-se.
Em sétimo lugar, deve o Governo meter mãos na consciência, dar-se conta e dar-nos conta de que a manipulação dos números não pode servir como instrumento permanente de manipulação política.
Que sentido tem, por exemplo quanto ao PEDIP, dizer--se que o programa está a ser aplicado a 100 % quando é certo que os investimentos efectivamente concretizados são menos de metade do valor dos compromissos estabelecidos? Isto porque o Governo não tem - nunca teve! - uma política e uma estratégia de reconversão industrial consequentes e porque as taxas de juro praticadas no mercado, em tantos casos acima dos 25 %, neutralizam frequentemente os virtuais efeitos positivos dos co-financiamentos aprovados, deitando por terra as melhores intenções de investimento por parte dos empresários portugueses.
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A conclusão simples 6 a de que o Governo anda manifestamente à deriva, abrindo e fechando programas de apoio e mecanismos de incentivo sem tradução em qualquer estratégia consistente de modernização industrial.
Dou o seguinte exemplo: se, por um lado, acordando à última hora em Março de 1991, aprova para o sector têxtil do vale do Ave um sistema de incentivos à diversificação industrial, é de levantar as mãos ao céu verificar que para a região o respectivo programa operacional está a menos de 10 % de execução e que dos prometidos 26,5 milhões de contos para a OID do Vale do Ave - dos quais 3 milhões são para a educação e 18 milhões para os transportes - tudo ou quase tudo continua por concretizar, ilustrando bem as inconsequências do Governo, que persiste em gerir operações regionais de desenvolvimento a partir de lógicas de decisão e financiamento totalmente enquistadas no Terreiro do Paço.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A oitava observação é esta: dispondo, como dispôs, de uma inequívoca estabilidade política, da solidariedade institucional do Presidente da República e, no caso, do próprio apoio dos partidos da oposição, este governo, que quis ser o das reformas estruturais, deixou por fazer a reforma da regionalização, acto político indispensável ao desenvolvimento do País, sem o qual as desigualdades e as assimetrias regionais vão inelutavelmente continuar a agravar-se.
Aplausos do PS.
Não regionalizou, nem descentralizou!
Em matéria de finanças locais foi, como se viu, o mais completo fiasco. Ainda assim, o investimento nacional de iniciativa autárquica, com - é evidente! - apoio comunitário, cresceu 12% ao ano, uma taxa superior à que o Governo tem para oferecer quanto à sua capacidade de investimento público.
Daí que - e esta constitui a nona observação - a verdade, a nudez crua da verdade, tenha acabado por se impor como um escândalo, um escândalo verdadeiro que o Governo, por mais que queira, não poderá esconder por mais tempo.
O País real, após seis anos de governação contínua do PSD, está mais desequilibrado quanto à sua estrutura de desenvolvimento.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Foi o que insistentemente dissemos e, mais uma vez sem êxito, como se viu, inquirimos aqui ao Primeiro-Ministro. Treze dos 18 distritos do continente estão drasticamente a perder população, a envelhecer, a recuar quanto à sua taxa de participação na formação do produto interno.
Os resultados provisórios do Censos 91 já conhecidos, para quem ainda teimasse em não acreditar, aí estão como uma bomba a estilhaçar os pretensos resultados do Governo em matéria de desenvolvimento equilibrado do País: 70 % da população portuguesa - 70 %, Srs. Deputados! - está concentrada, numa tendência sempre a crescer, nas áreas da Grande Lisboa e do Grande Porto. É a litoralização total! Dentro desta faixa, como nunca, verifica-se a máxima concentração nas zonas metropolitanas, deixando cada vez mais ao abandono e à desertificação 80% do território nacional!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr.ª Presidente e Srs. Deputados: Consinta-se-me uma décima e última observação: a total e demonstrada incapacidade do Governo para combater as assimetrias e as desigualdades agravou em Portugal a condição de um país em ameaça de roturas profundas, num caso, por abandono e desertificação e, no outro, por excesso de concentração populacional.
O liberalismo económico cego, a ausência de estratégias de modernização, a economia tantas vezes limitada à especulação financeira, a ausência de políticas de solidariedade, a burocratização e o centralismo são as causas omnipresentes de tão grande falhanço.
O peso dos falhanços do governo de Cavaco Silva - e se assim não for que me desmintam!... - está a abater-se como problemas multiplicados sobre as autarquias locais, onerando para além dos limites do tolerável as responsabilidades e as tarefas dos municípios.
Pode alguém ainda dizer ou, quando menos, pensar que tudo não passa de meras críticas da oposição? Será que para alertar as consciências será sempre necessária uma mensagem presidencial?
Sinceramente não o creio. Mas creio firmemente que tudo no domínio político é necessário fazer para acabar com este estado de coisas. Essa é uma responsabilidade do PS que assumimos e assumiremos com todo o gosto!
Aplausos do PS e do deputado independente José Magalhães.
A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Embora possa ser considerada uma iniciativa basicamente determinada por razões eleitoralistas, o certo é que a presente interpelação acaba por permitir, mesmo que no penúltimo dia dos trabalhos parlamentares, a formulação de uma avaliação da actividade governativa no decurso da presente legislatura.
Procuraremos aproveitar, construtivamente, a oportunidade que se nos depara.
A questão de saber se o Executivo governou globalmente mal ou bem afigura-se-nos extremamente redutora no quadro de uma análise crítica, mas séria, do que foi feito, do que leria sido possível fazer e do muito que ficou por realizar. Deixaremos esse tipo de apreciação para os correligionários do maniqueísmo.
O nosso objecto consiste em identificar, analisando-os, os pontos fortes e fracos da acção governativa.
E consabido que o Governo dispôs nesta legislatura de condições soberanas, porventura irrepetíveis, mesmo num horizonte de longo prazo, para resolver muitos dos problemas críticos que condicionam o desenvolvimento do País. Mas, infelizmente, falhou em alguns domínios.
A crítica geralmente mais invocada refere-se ao insucesso registado no combate à inflação. É evidente que a intervenção do Governo em matéria de contenção das tendências altistas dos preços foi extremamente deficitária. É, porém, necessário reconhecer que, sobretudo já neste ano, se tem vindo a registar uma melhoria da situação, que, a manter-se, poderá permitir que, em lermos homólogos, a taxa de inflação em 31 de Dezembro de 1991 não exceda os 12 %.
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É claro que, quando nos recordamos do triunfalismo inconsequente das garantias então concedidas pelo ex-ministro das Finanças, temos de reconhecer que se ficou muito aquém do prometido - segundo a primeira versão do PCEDED, de que todos nos recordamos, a inflação seria da ordem dos 8 % a 9 %, em 1987, e dos 4 % a 6 %, em 1988.
Em todo o caso, há que ponderar que se desadministrativaram muitos preços e que o Governo não dispõe hoje da possibilidade de intervir, pelo menos directamente, no mercado monetário, mormente no controlo da massa monetária em circulação e na fixação das taxas de juro, factos estes que, conjugados, limitam acentuadamente os instrumentos ao dispor do Governo para combater a inflação.
A tendência para a retracção dos ritmos de crescimento dos preços que se vinha registando é positiva e tem de ser firmemente afirmada pela actuação governamental. Se tal não suceder, é pouco provável que da nossa adesão plena à união económica e monetária - a qual terá de fazer-se, independentemente das nossas vontades, no limite dos próximos dois anos - venham a resultar consequências favoráveis para se prosseguir o crescimento económico sem graves consequências ao nível do desemprego.
Ponto igualmente fraco da acção governativa é o que se refere às insuficientes e desconexas intervenções efectuadas em matéria de modernização da Administração Pública. Independentemente de se reconhecerem os progressos registados nalguns sectores, há que sublinhar a incapacidade revelada pelo Governo para promover e aplicar uma política global e coerente de modernização da Administração Pública central e local.
Em consequência disso, e a manter-se inalterada a situação, é praticamente certo que determinados sectores - como, por exemplo, o sector dos serviços aduaneiros e associados - entrarão em colapso aquando da plena formação do mercado único europeu.
Surpreende, a propósito, que o Governo não tenha definido e hierarquizado prioridades estratégicas num domínio de intervenção tão sensível e tão antecedente e subordinante do processo de desenvolvimento do País.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sendo o principal recurso e a primeira das vantagens comparativas de que o País dispõe a qualidade do seu capital humano, é incompreensível que os muitos milhões de contos já gastos em programas de formação e reciclagem não se tenham traduzido no desejável e necessário acréscimo dos níveis médios de qualificação técnica e tecnológica da nossa força de trabalho.
Tal facto - que é indesmentível - não fica a dever-se a constrangimentos financeiros ou à ausência de participação dos interessados. Trata-se, antes, de mais uma incapacidade: a de saber afectar recursos a prioridades estratégicas definidas em função de políticas sectoriais hierarquizadas.
Se, em matéria de política de emprego, a confiança e o crescimento económico que se logrou obter acabaram por potenciar a criação de muitos postos de trabalho, o certo é que o Governo não soube conceber, organizar e implementar uma política activa de mão-de-obra que incorporasse, como sector estratégico, a formação e a reciclagem profissionais.
Os resultados estão à vista e manifestam-se, designadamente, nas vulnerabilidades competitivas do nosso sector exportador.
Não podemos continuar a assentar a nossa competitividade externa no preço do factor trabalho. Precisamos, isso sim, de incrementar o valor acrescentado nacional dos produtos que exportamos no binómio tecnologia/qualificação da própria mão-de-obra.
Não é desagradável saber-se que as autoridades comunitárias admitem que a aplicação dos fundos estruturais em Portugal não foi, apesar de tudo e dos muitos desperdícios havidos, globalmente mais negativa do que em outros países. Mas isso é apenas um mero paliativo para más consciências; isso, de facto, não resolve problema nenhum. É preciso, é necessário, é possível, fazer mais e melhor.
Também no que respeita ao necessário ajustamento e adaptação do nosso tecido empresarial se pode concluir que a acção governativa ficou aquém do desejado.
Obviamente, foi um erro admitir que o liberalismo económico resolveria certos problemas bem fundos, heranças pesadas, da nossa estrutura produtiva. Confiar cegamente na capacidade de adaptação racional dos pequenos e médios empresários portugueses, num contexto balizado por parâmetros que, até há pouco, eram praticamente desconhecidos pela generalidade dos agentes económicos, foi uma opção que pode custar cara ao País.
O Estado, que foi, durante muitos e muitos anos, o verdadeiro patrão - mas não, infelizmente, o grande «capitão de indústria»- da actividade económica nacional, não poderia ter-se divorciado dos problemas sentidos por uma falia considerável do tecido empresarial português.
Sabe-se que, por força das regras e directivas comunitárias, certos tipos de apoio e incentivos financeiros estavam condenados. Mas tal não impedia que a retirada do Estado nessa matéria não tivesse sido substituída pelo reforço dos sistemas institucionais de informação, mormente nos domínios técnico, tecnológico e comercial.
As pequenas e médias empresas (PME) agrícolas e industriais foram praticamente abandonadas à sua sorte, sendo que tal postura pode vir a ter consequências particularmente graves no futuro.
E o que é que se passou no País em matéria de educação? Ter-se-á feito tudo quanto era possível e necessário?
Não desconhecemos que a transformação do sistema educativo português não é tarefa fácil, dados os vícios e heranças do passado, bem como a multiplicidade de agentes envolvidos. Em todo o caso, há aspectos em relação aos quais não pode deixar de formular-se um amplo conjunto de reservas,/nomeadamente face à filosofia da reforma educativa preconizada e consubstanciada na Lei de Bases do Sistema Educativo. Referirei apenas duas dessas reservas.
Em primeiro lugar, a alteração do estatuto dos professores não resolveu os problemas, nem da classe profissional, nem dos utentes dos serviços, e constitui hoje uma das grandes razões do bloqueamento da reforma.
Por outro lado, o investimento na vertente educativa continuou a ser manifestamente insuficiente para satisfazer as necessidades, verificando-se o aumento das carências qualitativas ao nível dos recursos materiais e humanos. Basta ver o que actualmente se passa com o ensino superior para verificar que o grande aumento do número de vagas se deve ao ensino particular, sendo que a iniciativa privada não abrangeu, pelos seus custos - isto é extremamente importante-, praticamente nenhuma área do ensino técnico e científico, cujos profissionais são os mais procurados pelas empresas que procuram modernizar-se e
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(...) dotar-se de capacidade competitiva, essencial ao desenvolvimento do País.
O Ministério da Educação não deu nenhum contributo determinante para alterar a oferta qualitativa da mão-de-obra portuguesa no contexto da internacionalização da economia portuguesa, perpetuando assim as dificuldades estruturais de afirmação dos quadros e das empresas portuguesas.
Quanto à comunicação social, não podemos deixar de acentuar as debilidades das políticas seguidas pelo Governo.
A substituição dos órgãos fiscalizadores da independência e isenção da informação face ao poder político e económico por uma entidade que, apesar de aparentemente ter as mesmas funções, oferece menores garantias de credibilidade - como os últimos tempos tem mostrado à saciedade - constituiu um dos aspectos mais perniciosos desta política.
O outro aspecto que importa realçar mais uma vez, já que nos preocupa sobremaneira, prende-se com a alienação do sector público de comunicação social num sentido que começa a potenciar a concentração da propriedade dos meios de informação, originando outras formas de dependência contrárias à letra e ao espírito da Constituição.
Não podíamos, naturalmente, deixar passar sem referência o problema da saúde, para dizer que os conflitos permanentes (agora em surdina) com os profissionais de saúde, que os avanços e recuos sistemáticos em questões essenciais - como a das urgências hospitalares - e que a não descentralização eficaz dos serviços de saúde e a adopção de modelos de gestão inadequados revelaram uma certa dificuldade do Governo em definir estratégias e políticas coerentes nesta área.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Durante este período de acção governativa, reduziram-se quantitativamente os desequilíbrios regionais, mas os mesmos alteraram-se qualitativamente.
Vive-se hoje em pior qualidade de vida em muitas zonas das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto e o interior do País debate-se com um sério problema demográfico.
Em matéria de ordenamento do território, regrediu-se, de forma muito significativa, nos últimos anos, voltando a dominar a perspectiva de «mobilar o espaço», em vez de se tomar o ordenamento territorial como o grande ponto de discussão, de resolução de conflitos e de integração espacial das políticas sectoriais. A articulação entre essas políticas não existem e o ordenamento do território é cada vez mais o plano rodoviário e o PEDIP.
No plano conceptual domina o vazio absoluto, com a desactivação de organismos que tinham a seu cargo a incentivação e coordenação científicas, como foi o caso CIUR.
A elaboração dos planos directores municipais assumiu um carácter imperativo, que se saúda, mas, ao mesmo tempo, os municípios estão a fazer planos para áreas onde, por certo, se irão localizar grandes projectos, sem que lhes sejam dadas as mínimas indicações acerca da localização e dos seus impactes.
Sem se dar conta disso, mesmo algumas preocupações relativas às questões regionais vão «sorrateiramente» desaparecendo do quadro legal. Por isso, aqui se referem as recentes alterações ao regulamento do SIBR, com o consequente reforço da componente industrial, em detrimento da componente regional.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Mau seria que não registássemos com agrado que muitas das orientações e medidas preconizadas na declaração de princípios do PRD e no nosso programa foram concretizadas pelo Governo.
Em matéria de protecção civil, fomos nós que, no decorrer desta legislatura, demos o grande impulso, nomeadamente através da realização de uma interpelação, devendo registar-se a receptividade do Governo às nossas propostas, sendo prova disso, entre outras, a apresentação e discussão de uma proposta de lei de bases de protecção civil e a criação de um grupo de trabalho para a revisão da lei orgânica do Serviço Nacional de Bombeiros.
Em matéria social, e apesar de se poder ter ido muito mais longe, não podemos deixar de realçar alguma sensibilidade revelada pelo Governo relativamente às nossas propostas, que se traduziram em iniciativas concretas relativas às camadas da população mais carenciadas, como sejam as dos idosos e das crianças. Hoje, apesar de tudo, os reformados e as crianças têm um estatuto melhor - pelo menos ao nível legislativo - que se traduz na garantia de alguns direitos fundamentais.
Em matéria de regionalização, propusemos, desde sempre, um processo gradual, que, numa primeira fase, poderia ser consubstanciado numa lei quadro. Embora a lei aprovada não nos satisfaça plenamente, ela constitui, sem dúvida alguma, um primeiro passo importantíssimo e o reconhecimento das nossas teses.
O mesmo se diga em matéria de educação. Na verdade, sem o incentivo e a contribuição do nosso grupo parlamentar e sem a receptividade do Executivo e do partido que o apoia, não teria sido possível produzir a Lei de Bases do Sistema Educativo, que constitui hoje, sem dúvida alguma, o pilar fundamental da reforma do sistema educativo, a par de outras leis, como, por exemplo, a Lei da Autonomia das Universidades e da Lei de Bases do Sistema Desportivo.
Em matéria de privatizações, registamos uma maior selectividade do Governo e um recurso maior à figura do concurso público, como, por várias vezes, propusemos.
Em matéria de indemnizações, a recente proposta de lei do Governo, aprovada por esta Câmara, acolheu a posição de princípios do PRD, constituindo, no concreto, um pequeno primeiro passo no sentido de resolver este problema.
Em matéria de Orçamento do Estado e de Grandes Opções do Plano, há a registar a aceitação, por parte do Governo, de alguns princípios e de algumas propostas, porque, continuadamente, nos batemos no sentido de introduzir um maior rigor nas respectivas elaboração e execução.
Em matéria de reforma do sistema político, teremos de referir o reconhecimento generalizado de que é preciso acabar com o monopólio dos partidos na vida pública portuguesa. A aceitação pelo Governo das nossas propostas, tendentes a permitir as candidaturas de independentes aos órgãos das autarquias locais e de limitar os mandatos dos presidentes das câmaras municipais, constituiu a aproximação mais significativa e evidente do PSD às teses que sempre defendemos.
Finalmente, em matéria de integração europeia, nomeadamente ao nível da realização da união económica e monetária e da união política, em relação às quais sempre defendemos uma posição de prudência e até de reserva, apraz-nos verificar que o Governo, apesar de algumas hesitações momentâneas, se pautou pela mesma postura.
Em muitas outras áreas, desde a defesa à cooperação externa, passando pelas áreas laborai, cultural, económico-financeira e da comunicação social, fizemos inúmeras sugestões e propostas - umas mais relevantes do que outras - que foram, em parte, aceites, contribuindo assim
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(...) para melhorar aspectos - alguns significativos - da governação.
Permitam-me acabar este capítulo dizendo que nos é particularmente grato que o Governo comece, ainda que timidamente, a compreender os benefícios fiscais como instrumento mais útil de desenvolvimento e execução de políticas de desenvolvimento.
Este é apenas um exemplo da concretização de um princípio que nos é caro e que começa também a ser reconhecido pelas outras forças políticas: o Estado não pode resolver ou atenuar os desequilíbrios e assimetrias e os conflitos de interesses existentes na sociedade portuguesa, interferindo directamente nos mecanismos de regulação das relações sociais, económicas e culturais. Pelo contrário, o Estado tem de criar condições e abrir caminhos para a livre expressão e desenvolvimento da sociedade civil. Por outras palavras, o Estado não pode continuar a insistir em substituir-se à sociedade civil.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Cremos ter demonstrado que, embora em grau variável, pudemos influenciar positivamente, a governação. Fizemo-lo - como, de resto, 6 amplamente reconhecido - quando possuímos um grupo parlamentar considerável e soubemos, apesar da sangria quantitativa que sofremos, continuar a honrar, no possível concreto, os compromissos que assumimos perante o eleitorado que em nós acreditou. Estamos, pois, cientes de ter cumprido e, por isso, estamos tranquilos.
Em 1985, poucos previram a importância e a influência que teríamos na definição de algumas das reformas estruturais do País. Porém, hoje, todos aqueles que fizerem uma análise séria acerca da evolução do País nos últimos sete anos, que compararem o que era Portugal em 1985 e o que é em 1991, chegarão, necessariamente, à conclusão de que a nossa humilde intervenção foi um factor importante dessa evolução.
Perante isto, sentimo-nos particularmente felizes pelos resultados alcançados, sob todos os pontos de vista sempre em condições absolutamente adversas.
A nossa experiência ensinou-nos que não é preciso exercer o poder político para mudar as coisas. Muitas vezes é a postura de todos os dias, a simples forma de estar na vida e de encarar as coisas, que as faz mudar.
Este é, no fundo, o nosso legado político. Não vale a pena insistir de novo no facto de termos conseguido introduzir, no pensamento e no discurso político, nas leis da República definidoras das bases essenciais do Estado de direito democrático, um conjunto de ideias novas fundamentais, nomeadamente ao nível do exercício e das garantias dos direitos fundamentais dos cidadãos.
Apesar de simples e muitas vezes discreto, o nosso papel foi importante. Apesar de não termos exercido todas as prerrogativas do poder, demonstrámos que é possível, através de uma postura séria e de uma prática persistente, contribuir para mudar Portugal.
Aplausos do PRD.
A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social.
O Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na última intervenção que proferi perante esta Câmara, no passado dia 9 de Abril, demonstrei, em termos quantitativos, que, no domínio social, Portugal tem evoluído de modo positivo nos últimos anos. Não vou, por isso, hoje repetir o comportamento verificado em alguns indicadores no domínio do emprego, das prestações sociais, da acção social, ou até daqueles indicadores, bem objectivos, que dão claramente conta da evolução do poder de compra das famílias portuguesas.
Os Srs. Deputados sabem muito bem que qualquer análise séria sobre a evolução social de uma comunidade ou de um país exige uma perspectiva dinâmica. A análise fotográfica ou instantânea não serve para esse efeito, uma vez que não mostra o que é, de facto, essencial: as tendências de evolução.
A bondade das políticas no domínio social têm de ser julgadas pelas tendências que apresentam em termos de indicadores bem objectivos. Isto é: de onde partimos e onde estamos. Dessa comparação, e só dessa, é que se pode aferir se estamos ou não no caminho correcto; dessa comparação, e só dessa, é que se poderá validar ou não as políticas seguidas.
Antes, e só para citar alguns aspectos, aquilo que caracterizava o percurso da sociedade portuguesa, nos seus elementos mais fáceis de quantificar em termos sociais, era: mais desemprego; mais precariedade de emprego; perda real de poder de compra dos salários; perda real de poder de compra das pensões; salários em atraso.
Felizmente que para todos nós, para o País, toda essa evolução negativa pertence ao passado. A situação, que era quase endémica, inverteu-se claramente nos últimos cinco anos. O património desta época mais recente é, precisamente, o inverso do que se verificava no passado.
Durante os últimos cinco anos houve mais emprego, menor precariedade no emprego, ganhos reais no poder de compra dos salários e ganhos reais no poder de compra dos pensionistas. Esta é uma realidade quantificável e que não pode ser desmentida.
Poderia acrescentar hoje mais e mais dados, muito objectivos, que claramente demonstram que o País cresceu economicamente e que, paralelamente, se desenvolveu no sentido da concretização de mais justiça social e da possibilidade de aplicação de uma maior igualdade de oportunidades. Todavia, já fiz essa demonstração, nesta Câmara, em 9 de Abril passado. Não vou por isso repetir, a não ser que me peçam esclarecimentos.
Hoje proponho-me ir directamente às ideias - tão do agrado do partido interpelante. E o partido interpelante teve-as, e boas, numa dada época. Não tenho pejo de o afirmar e é até muito justo que o diga, já que é ao partido interpelante que também muito se deve da democracia plena e da liberdade que hoje vivemos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A minha geração é credora do esforço desenvolvido numa difícil batalha, onde, com muita coragem e conjuntamente com outras forças políticas democráticas, o Partido Socialista foi também um vencedor.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Foi um tempo importante e decisivo. Foi um tempo em que o País, claramente e como um todo, ganhou. Foi um tempo em que os Portugueses viram, com muita esperança, os totalitarismos definitivamente arredados. Felizmente que, para todos nós, nem a liberdade, nem a democracia, estão hoje ameaçadas.
O que hoje nos interessa, Srs. Deputados, é concretizar, no quotidiano, as esperanças e as expectativas que foram
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(...) criadas por esse novo mundo anunciado de liberdade, de mais justiça social e de mais igualdade de oportunidades. Sabemos que essa tarefa consiste em muita coisa, mas não será, seguramente, conseguida apenas através de discursos gongóricos.
Para além do conhecimento do país real, o que hoje conta são, sim, as ideias, mas também a concepção e a concretização de uma estratégia adequada que as leve à prática.
Nada é pior em política do que fomentar expectativas, alimentar esperanças e, passado pouco tempo, verificar que, não sendo atingidas nem conseguidas, nem umas nem outras, resta apenas o desalento, a perda de esperança, a frustração.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Pelo contrário, quando se alimentam perspectivas ambiciosas e realistas, ao atingir-se um primeiro patamar de concretização, pode gerar-se um efeito multiplicador que entusiasma e galvaniza e permite, sucessivamente, colocar ao nosso alcance uma e outra meta, progressivamente mais e mais ambiciosa.
A postura, hoje muito mais exigente, da sociedade portuguesa perante as questões sociais é o sinal mais claro desta caminhada. Estamos agora numa nova fase. Antes, o caminho foi quase sempre para trás ou de estagnação. Mas vamos à ideia fundamental. E para lá chegar, quero começar pelo emprego.
Os mais de meio milhão de novos postos de trabalho criados nos últimos cinco anos não resultaram de decisões administrativas - claramente. Os empregos produtivos - e esses é que interessam - criam-se nas empresas.
No entanto, as empresas só surgem e se desenvolvem quando há espírito empresarial. E a existência de espírito empresarial depende de muitos e complexos factores. Alguns são de natureza económica e nitidamente objectivos. Mas outros, e bem decisivos, são de natureza subjectiva, entre eles se contando um muito importante: a confiança. E, Srs. Deputados, a generalização da confiança numa sociedade é muito do resultado do trabalho político, no sentido mais nobre do termo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Esse foi, durante os últimos anos, o objectivo maior - e bem
conseguido - do actual governo e da maioria que o suporta.
Aqui têm, Srs. Deputados, a tradução, em termos muito práticos, de uma ideia que pode, por alguns mais distraídos, ter sido entendida apenas como um simples slogan, mas que é uma ideia de fundo: apostar nos Portugueses.
O emprego é apenas um indicador do estado de saúde de uma economia. Porém, não é, nem deve ser, tudo. A qualidade desse mesmo emprego é também essencial. E felizmente que, para todos nós, a precariedade do emprego vem baixando em Portugal.
As decisões do Governo foram importantes, mas tenho-as para mim como as menos relevantes. A explicação para os dados fornecidos pelo Instituto Nacional de Estatística no ano de 1990, onde, pela primeira vez, a contratação a prazo baixa abruptamente, reside, fundamentalmente, na distensão das tensões sociais e na confiança mútua que foi sendo possível ir restabelecendo entre empregadores e trabalhadores.
Foi possível, porque acreditámos nos Portugueses e nos protagonistas sociais, desenvolver-se, como nunca, um complexo exercício de diálogo e concertação social que nos deve orgulhar como povo.
O último acordo económico e social, por muitos considerado histórico, marca claramente uma nova era de relacionamento entre parceiros sociais e Governo. É, claramente, uma prova de maturidade cívica que honra os seus protagonistas.
O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Há, claramente, um assumir de responsabilidades por todas as partes. Não se pense, contudo, que a concertação social, com o acordo celebrado, está consolidada. Com efeito, há ainda, neste domínio, muito caminho a percorrer.
Se a nível confederai foi possível estabelecer plataformas de consenso muito apreciáveis, em domínios que eram quase tabu ainda há bem pouco tempo, há pela nossa frente um enorme desafio a enfrentar, qual seja o de transpor para a vida quotidiana das empresas esse mesmo estado de espírito.
Essa é, seguramente e em termos sociais, uma batalha do futuro que vale a pena viver politicamente. Isto é, concretizar a ideia de empresa não apenas como o local de criação de riqueza, mas também como o lugar onde a realização profissional e pessoal de todos os que nela colaboram venha a ser uma prática quotidiana.
Acreditamos - disso demos provas como ninguém - nas virtualidades da concertação social. É um caminho seguramente mais difícil, muito mais exigente, mas é o único que corporiza a ideia fundamental de apostar nos Portugueses.
O Sr. Adérito Campos (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Mas onde a aposta nos Portugueses valeu a pena foi no domínio da acção social.
Quem percorre hoje o País não pode deixar de ficar surpreendido com o crescimento de equipamentos sociais que por todo o lado vão sendo criados, destinados à infância, à juventude, à terceira idade e aos deficientes.
Quero claramente dizer que se durante os últimos cinco anos se construíram mais equipamentos que durante todo o tempo para trás, o mérito não é exclusivamente do Governo. Todo esse trabalho foi, em larga medida, o resultado do empenho, do entusiasmo e da muita dedicação que, a nível de voluntariado social, existe no nosso país.
Pela nossa parte, apenas nos apercebemos, porque conhecemos bem o país real, da energia latente e disponível que existia na nossa sociedade e que estava ávida de ser mobilizada.
Ao contrário de outras épocas, em que o Estado interveio de forma abusiva, por exemplo nas misericórdias, castrando iniciativas, pretendendo uniformizar processos e funcionalizando o que nasceu para ser livre, nós preocupámo-nos que cada uma dessas instituições fizesse a sua própria história, moldada nos padrões culturais daqueles que pretende servir.
Foi um soltar de amarras. Foi a atitude que resulta da noção de que o Estado, por mais organizado e eficiente que possa ser, nunca poderia dar o que para nós é fundamental em lermos de solidariedade: a componente afectiva. E essa não se decreta; sempre existiu como uma das ca-
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(...) racterísticas do nosso povo. Só que dantes foi abafada, enquanto agora pode mostrar-se.
Mais uma vez foi uma aposta, e ganha claramente, como as outras, pelos Portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os problemas sociais não se resolvem pelo manuseamento de manuais. O conhecimento e a experiência que esses manuais podem fornecer são, com certeza, úteis, mas não chegam.
Os problemas sociais resolvem-se fundamentalmente no terreno. Daí a explicação também para a ampla descentralização que conferimos à acção social.
Não se trata, como alguns propalam, da demissão do Estado das suas responsabilidades. Pelo contrário, trata-se de, perante a complexidade de problemas que há para resolver, tentar gerar efeitos de convergência entre todos aqueles que, de um modo ou de outro, podem contribuir para a sua resolução.
As questões sociais não são tarefas para «solistas», por mais «virtuosos» que sejam.
Sem quebra da consideração que tenho pelo Sr. Deputado António Guterres (e talvez até por isso...), V. Ex.ª, na sua intervenção de hoje, não foi senão uma abelha na chuva... A intervenção do PS na abertura deste debate foca a pretensa falta de selectividade de algumas políticas.
Sabe o Sr. Deputado que a política de formação profissional, decisiva na valorização de recursos humanos e importantíssima na reconstrução tecnológica, é fortemente selectiva? Sabe o Sr. Deputado que, a este respeito, estão definidas prioridades sobre o que deve e não deve ser feito? Sabe o Sr. Deputado que tudo isso foi preparado numa base consensual, com todos os parceiros sociais?
Abordou o Sr. Deputado a questão do financiamento da segurança social, mas omitiu uma grande reforma feita nessa matéria pelo actual governo, qual seja a criação do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social.
Esta reforma só significa isto: o novo sistema deixou de ser totalmente redistributivo. Há hoje um elemento de capitalização que não pode ser considerado despiciente.
Falou o Sr. Deputado em soluções inovadoras, a primeira das quais tem a ver com a selectividade nas prestações sociais.
Sr. Deputado, quer melhor exemplo dessa selectividade qual seja o aumento verificado nas prestações sociais referentes às pensões mínimas, sempre proporcionalmente superior a todas as outras? Quer melhor tradução das orientações a favor de quem realmente precisa?
Outra ideia, pretensamente inovadora, que o Sr. Deputado apresentou: o maior empenho da sociedade civil na cobertura dos riscos sociais.
Sr. Deputado, aconselho-o a ir ver a evolução dos fundos de pensões nos últimos anos. Já agora, veja também que foi com este governo que, pela primeira vez, se estabeleceram acordos de cooperação efectivos com as uniões das misericórdias e das instituições particulares de solidariedade social.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado, a ideia do envolvimento da sociedade civil é boa, mas é nossa como ideia e fomos nós que a levámos à prática!
Aplausos do PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pelo nosso lado, temos convicções fortes; temos um ideário sólido e actual; temos apetência pela acção. Acreditamos nos Portugueses e temos a sua confiança.
Iremos, pois, continuar um projecto que já deu provas e que, por isso mesmo, é portador, não só de esperanças, mas, sobretudo, de muitas certezas, a maior das quais tem a ver com o sentimento de que a divergência e o combate político não são apenas condições de um regime democrático formal.
O tempo de hoje exige-nos muito, mas muito mais. Exige-nos que da divergência se faça a convergência para o que é fundamental: Portugal e os Portugueses.
Nós estamos aí!
Aplausos do PSD.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Vítor Crespo.
O Sr. Manuel Filipe (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Manuel Filipe (PCP): - Sr. Presidente, durante estes anos, nunca abusei de nenhuma figura regimental para poder fazer qualquer tipo de intervenção. O meu partido, neste momento, não tem tempo, mas gostaria muito de fazer uma pergunta ao Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social. Assim, se houver da parte da Mesa alguma benevolência...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, para não perdermos tempo, vou dar-lhe uns segundos para que possa fazer a sua pergunta.
O Sr. Manuel Filipe (PCP): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, V. Ex.ª acabou de dizer que nada é pior em política do que fomentar expectativas.
No entanto, continuo na expectativa de saber quando é que é publicada a revisão da tabela nacional de incapacidades.
Em 1988, V. Ex.ª disse-me que essa tabela seria publicada no final desse ano. Depois, disse-me que ela será publicada no l.º trimestre de 1990 e, a 9 de Abril desse ano, disse-me que seria publicada em Maio.
Por fim, respondeu-me a um requerimento, dizendo-me que os médicos que estavam a preparar a revisão dessa tabela estavam todos doentes!
Sr. Ministro, pelo menos, diga que são as seguradoras que não querem que a tabela seja publicada, porque devem milhões de contos aos cidadãos portadores de deficiência. Ao menos, diga qualquer coisa de verdade sobre isto - é o que lhe peço!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social.
O Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social: - Sr. Deputado Manuel Filipe, tenho muito gosto em lhe responder a essa pergunta e, nesse sentido, concretizar também as suas expectativas.
A tabela das incapacidades, na sua versão integral, que é um grosso volume, está concluída. A versão integral ficou
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pronta em 25 de Maio de 1991 e será, imediatamente, posta à discussão pública com o atraso de que me penitencio e de que assumo a responsabilidade. V. Ex.ª compreenderá certamente que se trata de um trabalho técnico exaustivo, que envolveu muita gente e que é de um elevado grau de tecnicidade.
Devo dizer que V. Ex.ª, com as suas constantes intervenções, contribuiu também para que eu pressionasse muito mais a equipa técnica encarregada dessa tarefa. Felizmente, deu resultado, está pronta, brevemente será posta à discussão pública.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Com tempo cedido pelo PSD, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs.
Deputados: Antes de mais, quero agradecer ao PSD e à direcção da sua bancada a generosidade de me terem concedido algum tempo, para que eu possa intervir neste debate, o que demonstrou e demonstra, como vamos verificar pela minha curta intervenção, um grande espírito de isenção.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Na sequência das questões que coloquei esta manhã ao Sr. Deputado António Guterres e ao Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, Valente de Oliveira, intervirei agora começando por tratar um tema que foi aqui abordado pelo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e que versou uma questão muito querida ao PSD, neste momento: o tema da estabilidade.
Suponho mesmo que a estabilidade vai ser o motivo principal do PSD para a campanha que se avizinha. O PSD vai, realmente, fazer campanha em nome da estabilidade, pois vai pedir estabilidade governativa aos Portugueses. E o Sr. Ministro Dias Loureiro disse que, efectivamente, a estabilidade de que o Governo goza não é apenas devida ao mesmo Governo, mas, principalmente, ao eleitorado.
Diria que, para pormos essa questão muito a claro, deveremos dizer que a estabilidade é devida, em primeiro lugar, ao PRD, que apresentou aqui aquela célebre moção de censura, em Abril de 1987, com uma falta de oportunidade absolutamente gritante e a quem VV. Ex.ªs devem a votação maciça de 1987.
Depois, ela é também devida ao PS, que, também com uma enorme falta de oportunidade, teve um voto suicida ao votar favoravelmente essa moção de censura do PRD.
É ainda devida ao Sr. Presidente da República, que, com a prudência aconselhada pelo decurso do primeiro mandato, fez uma interpretação restritiva dos seus poderes e não incomodou o Governo.
Finalmente, ela é devida a essa magnífica maioria de deputados do PSD, que tantas vezes tiveram de calar as suas consciências e as suas convicções para votar a favor do Governo.
No entanto, VV. Ex.ªs consideram-se os obreiros da estabilidade! Já não poderão fazer muito, pois amanhã terminam os nossos trabalhos, mas, se ainda pudessem, seria caso para lhes lembrar que VV. Ex.ªs são os grandes obreiros da estabilidade!
Mas o que fez o Governo desta estabilidade - para a qual também contribuiu, sem dúvida nenhuma, não inutilizando estes contributos que lhe foram trazidos por forças alheias?! De certo modo, o Governo desbaratou-a, uma vez que desbaratou os benefícios que tinha da estabilidade.
Perguntar-se-á: como é que a desbaratou e hoje tanto se reclama dela?
A resposta é muito simples: em quatro anos de governo, que são os que interessam, porque são os que se seguem à votação de 1987, o Governo teve dois ministros da Defesa, dois ministros das Finanças, dois ministros da Justiça e dois ministros da Saúde.
Terá tido só uma política em cada um destes sectores? Mentira!
Teve duas políticas de defesa, duas políticas de finanças, duas políticas de saúde e duas políticas de justiça! Não é isto verdade? É rigorosamente verdade! Basta, por exemplo, ouvir os lamentos diários do ex-ministro Miguel Cadilhe para verificar que houve, efectivamente, duas políticas na área das finanças.
Ao mudar de ministro das Finanças, o próprio Governo gerou uma enorme instabilidade nessa área, porque gerou o tempo necessário de adaptação do novo ministro, que definiu uma nova política. Perante os malefícios da política antiga?! Não o sabemos! O público há-de julgá-lo! Mas, pelo menos, perante a política orçamental completamente desastrosa que foi a do anterior ministro das Finanças. (Evidentemente que sem culpa do Sr. Deputado Rui Carp. Este parêntesis é-lhe devido. Vamos ver qual será a política orçamental que se avizinha!)
Na justiça, tivemos também duas políticas diferentes. Tivemos um ministro a tentar fazer o que o outro não fez e a tentar sanar os inconvenientes da reforma do Código das Custas Judiciais, mas que, só no fim, conseguiu produzir qualquer coisa -e muito pouco-, qual seja um diploma muito mal escrito e muito mal engendrado, que nos veio aqui trazer outro dia, sobre uma reforma aparente da justiça penal em Portugal.
Na defesa, tivemos rigorosamente duas políticas diferentes! Ou, então, não tivemos política nenhuma até uma dada altura na actuação deste governo e, depois, tivemos uma política. Efectivamente, agora há uma política, com a redução do serviço militar obrigatório, com a lei da organização das Forças Armadas, que só nos aparece aqui no fim da Legislatura, e com várias medidas que foram tomadas.
Mas para quê estabilidade?! Para aparecer aqui com as medidas importantes e estruturantes no fim da Legislatura?! É muito mau!
Na saúde tivemos, também, rigorosamente, duas políticas. Que o digam os Srs. Deputados peritos na matéria, que, mal saiu a anterior ministra, tiveram logo possibilidade de tomar uma atitude diferente - e melhor - em matéria de Lei de Bases da Saúde. Atente-se no que diz e no que omite nos seus discursos o actual ministro da Saúde sobre a anterior política do seu ministério.
Em consequência, poderemos falar rigorosamente de estabilidade? Suponho que não!
Foi a instabilidade na estabilidade, que é realmente um conceito novo ao qual temos de nos habituar!
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Isso tem o seu que de positivo!
O Sr. Presidente: - Queira abreviar, Sr. Deputado.
O Orador: - Dados todos estes factos, pergunto: estabilidade para quê? Aí já vale a pena contar mais um
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ano e meio de actuação do Governo, quando este era não maioritário, porque esse tempo serviu para preparar reformas fundamentais que, no entanto, aparecem nesta Assembleia só no fim da Legislatura.
Já falei de algumas, mas poderemos falar de outras.
Por exemplo, da reforma do mercado financeiro, que só é publicada a escassos meses do fim da Legislatura e que nem teria de vir à Assembleia, pois era uma questão que decorria no âmbito do próprio Governo. Ou, por exemplo, da legislação laborai, que, apesar de tudo, só se consegue publicar no fim da Legislatura. Ou, ainda, na lei quadro da regionalização, sobre a qual o Governo hesitou, e em que teve também duas políticas rigorosamente diferentes, que só aparece, também, no fim da Legislatura. Ou, ainda, da lei da organização das Forcas Armadas, de que já falei.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira abreviar.
O Orador: - Vou já acabar, Sr. Presidente. Com a sua benevolência, vou acabar imediatamente.
Mas, como estava a dizer, aconteceu que a estabilidade, para além de ter fundamentado expectativas da parte dos cidadãos - e, nesse sentido, foi boa porque permitiu gerir a própria vida do País -, é, realmente, mais aparência do que realidade.
Para além disso, temos de concordar, o Governo fez mal algumas coisas.
Qual é, por exemplo, a estratégia da política de privatizações? É uma estratégia de racionalização da vida económica e da economia do País? Não! É uma estratégia de angariação de meios financeiros! É, pura e simplesmente, isso!
Por isso é que não são tomadas as devidas cautelas em matéria de destino das empresas públicas; por isso é que se hesita perante certos processos de alienação que conduziriam a resultados mais favoráveis; por isso é que se recusa uma ligação efectiva e coerente entre o problema das indemnizações se o problema das privatizações.
Quanto à política orçamental, o que é que se fez nesta matéria? Gerou-se uma desgraça com a única medida que se tomou em matéria de reforma administrativa, que foi a medida respeitante ao sistema remuneratório da função pública. O que se gerou foi uma estabilidade orçamental, cujos contornos só vamos poder conhecer quando aparecerem as contas do ano de 1991.
Sabemos, para já, que a parte mais substancial da despesa está sujeita a surpresas, que não são anuais, mas que são quase mensais, provocadas precisamente por esse novo sistema remuneratório, que, aliás, é a única medida conhecida de reforma administrativa tomada por este governo.
Isto é o Governo.
E o PS? O partido interpelante, apesar de tudo, continua com saudades do sector público, continua a querer dar preferência à distribuição sobre a produção e continua a considerar baixa a taxa de funcionalização do País e a encontrar saídas para tudo ou para quase tudo no aumento da despesa e no simultâneo aumento dos impostos.
Está, alias, nestas matérias, em grande consonância - de bloco central - com o Governo! Porque, nesta matéria de impostos, muito teríamos a falar e é pena que o Governo não venha aqui explicar esse projecto que (em carteira, e que vai ser terrível para os Portugueses, que é o novo código das avaliações. É pena não podermos contar aqui com a presença do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, para este nos poder fazer uma promessa...
Vozes do PSD: - Está ali na bancada do Governo!
O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado. O Sr. Deputado tinha direito a falar durante um minuto e pouco, o PSD cedeu-lhe dois minutos e já vai em dez minutos!
O Orador: - Isto é tudo a crédito do PSD, Sr. Presidente. Pode crer que é tudo a crédito do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tenho de gerir o tempo e, portanto, peco-lhe que abrevie a sua intervenção, porque, caso contrário, terei de lhe cortar a palavra.
O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente.
Para terminar, apenas queria pedir ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que afinal está presente, que nos pudesse aqui prometer que não vai dar essa terrível «facada» nas costas dos contribuintes!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Sr. Silva Marques (PSD): - A propósito, qual foi a política do CDS?!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Dê-nos mais dez minutos que já lhe contamos!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tenho aqui uma lista de nomes que passarei a ler Srs. Deputados Domingues Duarte Lima e Rui Alvarez Carp, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e Sr. Deputado António Guterres. Quanto me é dado saber, o Sr. Deputado António Guterres pediu a palavra para defesa da consideração, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais para outra matéria e os outros casos para pedidos de esclarecimento.
O Sr. Domingues Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, o CDS não tem tempo, mas admito que algum partido lhe possa ceder tempo para permitir o pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Rui Alvarez Carp. De outra maneira, não lhe poderei dar a palavra.
Como a defesa da consideração tem prioridade sobre as outras figuras regimentais do uso da palavra, tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, como não tenho tempo que lhe possa ceder, a única forma de prolongar o prazer de o ouvir é defender a minha consideração, para que o Sr. Deputado Nogueira de Brito tenha a oportunidade de dar explicações.
Protestos do PSD.
Defendo, de facto, a minha consideração e a da minha bancada, dizendo-lhe que não esteja com receio, porque não é nossa intenção aumentar o défice público, a carga fiscal ou a despesa pública proporcionalmente ao produto. Em relação a isso, pode estar tranquilo.
Protestos do PSD.
Mas a minha consideração sentiu-se algo tocada por não o ter ouvido falar de dois temas que consideraria muito
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(...) interessantes, que são o da estratégia de privatizações deste governo e o de saber se há, ou não, efectiva discriminação na sociedade portuguesa em geral entre o empresário português e o estrangeiro, quanto às privatizações, ao acesso ao crédito e a outras formas de apoio do Estado. Efectivamente, ficaria muito mais tranquilo se o pudesse ouvir dissertar um pouco sobre este tema.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado António Guterres, a convicção que fica das vossas intervenções é a de que realmente VV. Ex.ªs apostam sempre num aumento da despesa e nunca proporcionam à Câmara ideias sobre a redução da despesa, ou seja, não apresentam contrapartida ao aumento da despesa.
É certo que há melhorias que todos desejamos, mas temos a noção de que não podem ser conseguidas de imediato. No sistema de segurança social, na política de habitação, etc., todas essas melhorias só poderão ser conseguidas com o aumento da despesa sem contrapartidas, ou antes, com contrapartida em impostos.
Mas, hoje, finalmente, o Sr. Deputado António Guterres foi muito claro, porque nos disse concretamente que impostos tencionava aumentar para poder fazer face a essa despesa. Esse esclarecimento é importante, porque, pelo menos, ficamos a saber que V. Ex.ª não tenciona aumentar o défice - aumenta a despesa, mas também aumenta os impostos. É como o Governo, isto é, como o Sr. Secretário de Estado Oliveira e Costa, que aumenta os impostos e aumenta a despesa, quer dizer, ele não aumenta a despesa, só aumenta os impostos, mas cabe-lhe essa tarefa desagradável.
Quanto à política de privatizações, ela tem um objectivo que é o da angariação de meios financeiros, o que distorce completamente essa política. Não visa, pois, o objectivo da maior racionalidade económica nos sectores que vão ser privatizados, porque eles estão sujeitos a formas geradoras de irracionalidade económica e são geridos sem racionalidade económica ...
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Não diga isso!
O Orador: - Ah, o Sr. Deputado, que é contra as indemnizações, (em de fazer mea culpai Está contra o Governo e contra a maior parte da sua bancada! O Sr. Deputado José Silva Marques também pensa que as empresas públicas são bem geridas!
O Sr. José Silva Marques (PSD):-Não, não! Só algumas!
O Orador: - Ora, não é esse o objectivo. E, não sendo esse o objectivo, geram-se desigualdades no acesso ao capital que se privativa entre nacionais e estrangeiros, o que é mais que patente. Quase tudo o que se privatizou está, por uma via ou por outra, nas mãos de estrangeiros, neste momento! E o que se sustenta na lei não passa à prática: o reservar uma parte do capital para vender aos nacionais não se consegue concretizar, porque não há poupança com vocação empresarial nas mãos de portugueses, nem se faz nada para haver.
O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, estamos confrontados com um problema que é o da falta de tempo do CDS para responder a perguntas adicionais e não queremos invocar figuras regimentais, como a defesa da honra, porque ele não ofendeu a nossa honra nem a nossa consideração. Ele foi injusto para com ele próprio, porque também deu um contributo importantíssimo para a estabilidade e, por essa razão, não queríamos que ele fosse triste para férias.
Assim sendo, o meu colega Rui Alvarez Carp vai fazer-lhe um pedido de esclarecimento e nós cederemos dois minutos ao CDS - além daqueles que já cedemos, há pouco - para ele poder responder.
O Sr. Presidente: - Vou dar a palavra ao Sr. Deputado Rui Alvarez Carp para pedir esclarecimentos, mas, desde já, informo que vou dar exactamente dois minutos ao CDS para responder, porque temos mantido uma certa linha de coerência relativamente aos tempos.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Alvarez Carp.
O Sr. Rui Alvarez Carp (PSD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, V. Ex.ª, hoje de manhã, fez uma intervenção que até mereceu os nossos aplausos, porque distinguiu claramente uma política económica reformista, social-democrata, de uma política económica intervencionista e socialista.
De facto, quando zurziu a bancada dos ilustres deputados do PS, conseguiu também associar-se à visão que temos da política económica habitual do PS.
Relativamente à intervenção que acabou de fazer, lamento dizer a V. Ex.ª que já não foi tão feliz ou, pelo menos, seguiu uma linha de crítica que poderíamos apelidar de «tiro no próprio pé».
É que, por exemplo, quando V. Ex.ª diz, a dado passo, que houve dois ministros das Finanças com duas políticas, quero relembrar-lhe as recentes declarações do anterior ministro das Finanças, relativamente à união económica e monetária -e V. Ex.ª poder-me-á corrigir, se o entender-, no sentido de avisar os agentes políticos, quer os do Governo, quer os da oposição, para os perigos de uma entrada abrupta, não negociada e não discutida profundamente, no mecanismo cambial do sistema monetário europeu.
Portanto, esse alerta do Dr. Miguel Cadilhe vai coincidir perfeitamente com a política económica que o Sr. Ministro das Finanças, naturalmente comungando da posição do Governo Português, tem tido em Bruxelas.
Quanto ao desbaratar desta oportunidade da adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia, V. Ex.ª também manifesta um certo esquecimento - suponho que apenas decorrente da luta política - daquilo que têm sido as afirmações dos comissários europeus e da própria Comissão das Comunidades como um todo, ao classificar como um grande êxito a entrada de Portugal para a Comunidade e a forma como Portugal tem utilizado, não só os fundos estruturais, mas também a própria natureza de Estado membro da Comunidade Económica Europeia.
Finalmente, põe em causa o interesse da estabilidade. V. Ex.ª está, portanto, a perguntar s(estabilidade, para quê?». V. Ex.º defende, então, que não é bom ter estabilidade?! Sobre isso, nada me espanta, porque, afinal de contas, V. Ex.ª está a seguir aquela que é a linha estratégica
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fundamental da direcção do seu partido, pois o CDS, neste momento, aceita fazer coligações, seja com quem for, e afirma peremptoriamente que é mau existirem governos maioritários. ou seja, é mau a estabilidade política.
Ou seja, V. Ex.ª, infelizmente, acaba por acompanhar a direcção do seu partido, quando diz que o que é bom é haver instabilidade. Isso significa que o que é bom é que o País não progrida e se atole na discussão inútil, no debate permanente e na instabilidade política.
Nesse aspecto, V. Ex.ª manifesta um grande sentido de solidariedade com a direcção do seu partido, o CDS, mas, por outro lado, também manifesta uma grande falta de compreensão acerca do que, realmente, interessa ao nosso país.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Rui Alvarez Carp, devo dizer-lhe que, muitas vezes, V. Ex.ª pensa melhor do que a «voz do PSD», mas o que V. Ex.ª fez desta vez foi um sofisma curiosíssima.
O que pretendi demonstrar é que maioria nem sempre é igual a estabilidade. VV. Ex.ªs tiveram duas políticas de defesa, de finanças, etc., ou seja, a maioria não produziu estabilidade. Mas nós valorizamos a estabilidade, de tal maneira que nos sacrificamos às mais estranhas alianças para a conseguirmos.
Risos do PSD.
Isso é que é rigoroso e já aconteceu.
O Sr. Ruí Alvarez Carp (PSD): - É, como se costuma dizer, «Maria vai com as outras».
O Orador: - Não, Sr. Deputado! Não é «Maria vai com as outras», porque «as outras» é que vão connosco, com a «Maria».
Risos do CDS e do PSD.
Sr. Deputado Rui Alvarez Carp, o nosso grande problema foi sempre esse: é que, sendo poucos, onde estamos, mandamos nós.
Risos do CDS e do PSD.
O Sr. Deputado afirmou também que não existiam duas políticas das finanças. Sr. Deputado, V. Ex.ª, com certeza, não tem ouvido o Dr. Miguel Cadilhe, por quem, aliás, a minha admiração tem crescido em proporção directa ao tempo que medeia entre a sua saída e o momento actual! Em suma, cada vez o admiro mais! Quando ele saiu daqui estava na minha cota zero e, agora, está numa cota elevadíssima!
É que quanto às privatizações, chave da política do Ministério das Finanças, o Sr. Dr. Miguel Cadilhe critica o Governo da primeira à última linha, e fá-lo com tanta razão que, agora, o Governo até já vai adoptar a política dele, pois vai, realmente, considerar o acesso ao crédito externo em condições privilegiadas. Quanto às indemnizações, a crítica é, pois, rotunda e total: diz que o Governo procede mal, porque devia pagar indemnizações justas, já que tem meios e dinheiro para o fazer. Portanto, desmente completamente a atoarda que tem sido posta aí a circular aos quatro ventos.
Quanto à política orçamental, como V. Ex.ª sabe, o ex-ministro Miguel Cadilhe obrigou a pôr em prática uma política orçamental que conduziu a terríveis angústias, deixou o orçamento como deixou, e, depois, este ministro teve de tentar impor uma política de rigor. Mas, agora que as eleições vão precipitar novamente o rigor no cano do esgoto, vamos ver como é que os Portugueses vão pagar toda esta brincadeira depois de Outubro.
Posto isto, Sr. Deputado Rui Alvarez Carp, está mais do que demonstrado que quem tinha razão era eu.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está previsto fazermos uma interrupção dos nossos trabalhos às 17 horas e 30 minutos. Olhando para o painel dos tempos, julgo que podemos concluir a parte da nossa agenda de hoje correspondente ao debate, fazer depois a interrupção e, posteriormente, o encerramento.
Neste momento, há dois oradores inscritos, pelo que podemos fazer a interrupção um pouco depois das 17 horas e 30 minutos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Oliveira e Costa): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ò Sr. Deputado Nogueira de Brito aludiu a um tema que motiva esta minha intervenção, que, de resto, será curta.
Estranho sobremaneira que, nesta altura, tenha aparecido na comunicação social e também pela voz do Sr. Deputado a referência ao código de avaliações. Trata-se de um documento de trabalho que foi produzido no âmbito da Comissão de Reforma Fiscal,...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Mas ele existe!
O Orador: -... que, numa primeira versão ainda muito como anteprojecto, foi rejeitada e retomada. Há quase três anos tive a oportunidade de a ler com atenção e de determinar os procedimentos a seguir relativamente a esta matéria.
Julgo que há todo o interesse que este assunto seja clarificado, porque, como todos sabem, hoje em dia, as avaliações são feitas através de comissões, cada uma com o seu critério próprio, que varia de concelho para concelho, pelo que há grandes divergências.
Importa, pois, encontrar um elemento comum, através de uma forma mais ou menos complexa, que, por meio da introdução de elementos fundamentais das propriedades rústicas ou urbanas, permita fazer uma avaliação com um grande grau de objectividade.
Consequentemente, trata-se de afastar a componente de subjectividade num processo que é importante para os contribuintes. Logo, o código de avaliações, que há-de surgir um dia, mas que ainda está longe, vai determinar que haja prédios cuja contribuição vai baixar e outros cuja contribuição pode subir.
Na orientação que dei, em 23 de Janeiro de 1989, que continha cinco pontos - não a lerei agora para não ocupar muito tempo e porque já tive oportunidade de dizê-lo nesta Assembleia, há cerca de oito meses-, em síntese, decidia-se que era preciso: fazer o carregamento de todas as matrizes; a seguir, em função de alguns concelhos, era necessário seleccionar umas tantas e introduzir esses elementos, bem como os dos processos de avaliação; comparar os dois elementos em função de uma fórmula ainda de projecto; verificar as diferenças; afastar as
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(...) posições extremadas e reencontrar novamente um caminho de aproximação. A partir daqui, deveria proceder-se a um questionário de inquérito junto dos proprietários seleccionados, para que fossem actualizados os elementos que tinham sido colhidos, a fim de se fazer um novo ensaio para a respectiva comparação.
Após estes procedimentos e a afinação da fórmula, teríamos de fazer baixar as taxas, pois não é pensável que se aplique as que hoje vigoram a uma avaliação actualizada no futuro, portanto, têm de baixar - a taxa de 1,3 % terá de baixar para 0,4 % ou, eventualmente, para 02 %. Por consequência, há uma dupla aproximação: enquanto o valor sobe, a taxa tem de descer.
A partir daqui, estaremos em condições de apresentar à Associação de Municípios Portugueses um trabalho sério, profundo, testado, sobre a matéria.
Se se acertar alguma metodologia a seguir, para pôr em prática um código de avaliações, então, sim, estaremos em condições de apresentar a esta Câmara um pedido de autorização legislativa, que se entende que só pode prosseguir se houver consensualidade quanto à proposta apresentada. Se assim não for, não haverá código de avaliações.
Fiquem os Srs. Deputados e os Portugueses cientes de que não tomaremos nenhumas medidas precipitadas. Gostaria de salientar, muito claramente, este aspecto, que julgo nuclear, e comparar um pouco com o que procurou fazer-se aquando da reforma fiscal.
É que, neste último caso, antes de se terem apresentado as tabelas de reduções à matéria colectável e à colecta, unhamos ensaiado o universo global de contribuintes e, a partir daí, sabíamos com certeza o que estava a acontecer.
Também entendemos indispensável que, no futuro, quando for aprovado um código de avaliações por consensualidade, haja a certeza do que acontecerá a cada um dos portugueses proprietários da sua própria casa, quer esta seja de habitação própria, quer seja alugada.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: -Para que fim, Sr. Deputado?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, é para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, é para saber se a Mesa não considera necessário registar e sublinhar, de uma forma muito especial, a afirmação que foi feita pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de que a solução final, em matéria de avaliações, irá ser submetida ao consenso da Assembleia da República.
O Sr. Rui Alvarez Carp (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, é muito importante que isto fique registado.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, está registado, até porque, naturalmente, ficou na gravação, para além de que todos nós o ouvimos e também registámos.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - E os senhores vão ter de votar isto que é para depois não poderem fazer campanha à parte!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, antes de iniciar a minha intervenção, pedia a V. Ex.ª e à Mesa que tivesse perante o meu discurso a mesma condescendência que teve na gestão do tempo relativamente ao CDS. Espero, aliás, não ultrapassar longamente o tempo que o meu partido ainda tem disponível.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa espera que V. Ex.ª utilize apenas o seu tempo, que não o ultrapasse.
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Com o aproximar das eleições legislativas de Outubro, com a Assembleia da República em funcionamento limitado e uma parte da comunicação social (nomeadamente a televisão) condicionada e ao serviço do Governo, não é difícil prever a tónica do discurso político oficial.
Tudo cresceu com Cavaco Silva - até o nariz do Ministro Ferreira do Amaral quando vai à televisão anunciar os sucessos que teremos em 1997.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O País bateu todos os records na Europa e, mesmo no mundo, só terá ficado atrás do Chile, o que foi pena.
De tanto insistir no seu discurso, o Governo começa a enredar-se nele e só a manipulação informativa e o indecoroso abuso de certos meios lhe mantém ainda alguma eficácia.
Mas é impossível enganar todos durante todo o tempo.
A Sr.ª Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!
O Orador: - O quotidiano da maioria dos portugueses aí está para desmentir o triunfalismo de Cavaco Silva e seus ministros.
A opinião pública já é mais difícil de enganar, e ainda bem, pois todos sabemos quanto uma democracia se fortalece com uma opinião pública consciente e interventora.
Este é, aliás, um dos milagres do nosso regime e da nossa cultura: o milagre da resistência à manipulação, ao engodo, ao eleitoralismo e ao abuso do poder.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E não se diga que me pronuncio exclusivamente em matéria de fé.
Todos os indicadores tangíveis, incluindo os eleitorais mais recentes, reflectem descontentamento, reflectem desilusão, reflectem vontade de mudança.
Apreciemos, por exemplo, a reclamada questão da concertação social.
O Governo apresentou o acordo social como uma vitória da sua capacidade de diálogo.
Oculta ou minimiza a precariedade das soluções concertadas, que é a consequência da sua incrível propensão para o não cumprimento.
As greves de hoje mesmo aí estão a confirmá-lo.
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Mas tão importante como esses sinais tangíveis de (des)concertação, aí está, também, a proposta de enquadramento institucional da concertação, que o Governo aprovou, a maioria benzeu e esta Câmara ratificará, seguramente, nas próximas vinte e quatro horas.
Refiro-me, obviamente, ao Conselho Económico e Social.
O Primeiro-Ministro não cumpriu a sua palavra!
Prometeu que a composição do Conselho reflectiria devidamente o peso das confederações sindicais e patronais. Assim teria de ser para que a sua natureza fosse, eminentemente, económica e social.
O Primeiro-Ministro comprometeu-se, de igual modo, com a valorização da Comissão de Concertação Social - este foi, aliás, um dos elementos essenciais para o estabelecimento do acordo social.
A proposta governamental ignorou este compromisso e só a reacção pronta e firme dos parceiros (que chegaram a ameaçar com a denúncia do acordo social) evitou males maiores.
A natureza (precariedade e simulação) dos compromissos do Governo ficou, no entanto, bem evidente.
Por estas e outras razões, o PS anuncia que reverá esta lei logo que tenha condições políticas para o fazer.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Por estas e outras razões, o PS acusa o Governo de simulação contratual e de má fé quando se atribui uma vocação para a concertação social.
Analisemos, agora, a questão, tão badalada pelo Sr. Primeiro-Ministro, das taxas de juro que oneram o investimento produtivo e a actividade económica da maioria das empresas portuguesas.
Confrontado com uma realidade incontornável, o Primeiro-Ministro fez, ao seu jeito, o discurso da superficialidade.
O desafio das altas taxas de juro era fácil de vencer: bastava que as empresas reclamassem da banca taxas mais equilibradas.
O Sr. Primeiro-Ministro ignorou as reais condições da economia portuguesa e, sobretudo, o equilíbrio possível entre um aparelho produtivo debilitado e dependente e a banca fortalecida e poderosa, recolhendo os frutos da sua política monetária restritiva e seleccionadora.
Os resultados aí estão: o dinheiro escasseia no sistema produtivo e abunda no sistema financeiro.
As taxas de intermediação (os lucros da banca) atingem facilmente (e realmente) os 14 ou 15 pontos percentuais, o rendimento real dos depositantes ou é nulo ou não tem significado, boa parte dos activos já hoje é, virtualmente, pertença do sistema financeiro.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Os milhões de contos de lucros da banca, provenientes quase exclusivamente da rubrica de juros e equiparados, já integram o fatalismo português.
A abundância de recursos e a ostentação do sistema bancário é uma afronta às dificuldades do dia-a-dia dos empreendedores tradicionais e dos jovens com ideias criativas.
Não julgue o Sr. Primeiro-Ministro que os agentes de progresso deste país ignoram esta realidade ou desculpabilizam o Governo.
Não há quilómetros de auto-estrada ou metros de carril ferroviário, inaugurados apressadamente - sabe o Orçamento a que custos -, que compensem o descontentamento e a frustração.
O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!
O Orador: - Os pequenos e médios empresários, os quadros das empresas, os trabalhadores mais esclarecidos e os pequenos depositantes fazem uma avaliação correcta da situação e, sobretudo, seleccionam e atribuem correctamente as responsabilidades. Não há propaganda governamental que o anule.
O PS desafia o Governo a concretizar políticas de correcção desta situação; políticas que permitam situar, a curto prazo, a laxa média de juro suportada pelo sistema produtivo para a. criação de riqueza, em 5 ou 6 pontos percentuais acima da taxa média de inflação, como, aliás, sucede na maioria dos países que servem à propaganda oficial para as suas comparações disparatadas relativamente a níveis de crescimento e desenvolvimento.
O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!
O Orador: - Falemos agora de outros «sucessos» do Governo.
Por exemplo, as privatizações.
Apesar dos variados alertas mantém-se uma situação inaceitável.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A transparência é insuficiente, como ficou claramente demonstrado no caso da CENTRALCER (que se mantém por esclarecer), no caso do BPA, no caso da venda da participação pública do Jornal de Notícias, no caso da privatização recente do Diário de Notícias.
A inexistência de uma alternativa ajustada ao real desenvolvimento e modernização da economia portuguesa e a ausência de vontade de reestruturação do sector público empresarial remanescente mantêm-se e acentuam-se.
O primado da lógica financeira (arrecadação das receitas) acentua-se e agrava-se, pois, como é reconhecido pelo próprio Ministro das Finanças, é natural, face à exaustão dos recursos, que os objectivos (250 milhões de contos em 1991) sejam cada vez mais difíceis de atingir.
Paralelamente, o Governo pretendeu satisfazer uma parte do seu eleitorado, corrigindo a lei de indemnizações.
Incapaz de assumir, verdadeiramente, as prioridades nacionais de desenvolvimento e de ataque às desigualdades, quis anular alguns focos de descontentamento, mas fê-lo de maneira desastrosa e ineficaz.
Anunciando que corrigia as indemnizações, realmente o que pretendeu foi ver-se livre do problema delicado resultante do funcionamento das comissões arbitrais e, precavendo-se contra eventuais dificuldades no futuro, limitou o acesso à arbitragem a maiorias significativas do capital a indemnizar.
Em suma, mais uma vez, sacrificou os interesses de um número significativo de pequenos aterradores.
A modernização do aparelho produtivo e o aproveitamento dos fundos comunitários destinados à modernização da indústria constam, também, obrigatoriamente, do léxico propagandístico do discurso oficial.
A realidade, infelizmente, é bem diferente.
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As queixas vêm de todos os lados. Curiosamente, também aqui as queixas surgem, predominantemente, dos responsáveis pelas empresas de pequena e média dimensão e dos sectores mais carenciados de modernização e reestruturação, como os têxteis e o calçado.
Nalguns programas de apoio, apesar da manipulação oficial dos dados, o Governo não chega a utilizar metade dos recursos disponíveis, embora tudo o que se pode seja gasto com a propaganda e o elogio.
O SINPEDIP (Sistema de Incentivos do PEDIP) não é o sucesso que se apregoa: dos seus quatro grandes capítulos, apenas dois são relevantes para uma verdadeira mudança qualitativa do nosso tecido industrial.
Ora, quer o subcapítulo «Aquisição e desenvolvimento de tecnologia» quer o subcapítulo «Gestão da qualidade e protecção do ambiente», tem um peso ligeiro na aplicação total do subprograma.
Em conjunto representavam, segundo os últimos elementos disponíveis, apenas 9 % do número de projectos aprovados e 8 % do investimento no âmbito do SINPEDIP (3,5 milhões de contos).
A este assunto, e com mais detalhe, o PS voltará oportunamente para desmascarar o monumental embuste criado à volta do apregoado sucesso da aplicação do PEDIP.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um dos maiores logros do actual governo é, inquestionavelmente, a reforma fiscal.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - De uma reforma fiscal esperar-se-ia um regime de impostos não burocratizado, transparente, assegurando a defesa do contribuinte, gerador de um esforço fiscal suportável e, sobretudo, equitativamente distribuído pelos contribuintes.
Aplausos do PS.
Nada disto se verifica na sequência do arremedo de reforma fiscal da responsabilidade do Governo.
A política fiscal, porque é essencialmente penalizadora dos que trabalham e da classe média em geral, é, aliás, um elemento gerador de profundas desigualdades na sociedade portuguesa.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O cidadão merece pagar impostos de acordo com a sua real capacidade tributária.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O cidadão merece ter meios de defesa graciosos contra a prepotência da administração fiscal.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O cidadão merece ser esclarecido e informado quanto aos seus direitos e obrigações.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O cidadão merece que o produto dos seus impostos reverta, efectivamente, para a criação de melhores condições de vida, para uma saúde melhor, para um ensino de maior qualidade e para uma segurança social mais forte.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Não é correcto nem socialmente justo penalizar fiscalmente quem trabalha e ignorar os que fazem fortuna à custa da especulação e das mais-vahas.
Aplausos do PS.
Não é tolerável que as receitas dos impostos continuem, ano após ano, a crescer consideravelmente mais que a laxa de inflação e que o principal contributo para essa subida provenha da fiscalidade sobre os rendimentos do trabalho.
Não é aceitável que a previsão da cobrança dos impostos directos cresça, entre 1990 e 1991, cerca de 45 %, passando de 622 milhões de contos para 891 milhões de contos.
E, sobretudo, é criticável que o Governo prepare legislação fiscal nas costas dos contribuintes, protelando a sua divulgação e discussão pública por exclusiva subordinação aos calendários eleitorais.
Aplausos do PS.
Estou, obviamente, a referir-me ao já famoso código de avaliações, que revela bem a natureza das políticas fiscais deste governo e, bem assim, o respeito que lhe merece a justiça tributária.
O Sr. José Carneiro dos Santos (PS): - Claro que isso é só para depois das eleições!
O Orador: - O projecto de código de avaliações, que o Governo preparou em segredo, é um grave atentado às expectativas e direitos adquiridos dos cidadãos e gerará, se for aplicado, inevitavelmente, uma revolta fiscal.
O Governo tem de esclarecer - e aqui se lança o repto para que o faça - o que realmente pretende em matéria de avaliações e não pode enganar os contribuintes, fazendo-lhes a propaganda de uma reforma fiscal e preparando-lhes, na clandestinidade (mas com aplicação diferida para depois das eleições),...
O Sr. José Leito (PS): - À socapa!
O Orador: -... um dos maiores e mais injustos agravamentos fiscais de que há memória na vida pública portuguesa.
Em resposta directa ao Sr. Secretário de Estado, informo-o de que o Governo não pedirá nenhuma autorização legislativa porque, a partir da próxima legislatura, o Governo não estará aqui. O PS jamais apoiará uma medida desta natureza.
Vozes do PS: - Muito bem! Protestos do PSD.
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como diz o povo, «já gastei demasiada cera com tão ruim defunto!».
Uma voz do PSD: -Já fez foi demasiada cera!
O Orador: - Estamos preparados todos (nós, os cidadãos com especial responsabilidade política e, de uma maneira geral, os eleitores) para a ofensiva propagandística do Governo.
Sabemos que o milagre do crescimento económico de Cavaco Silva e o neofontismo de Ferreira do Amaral vão constituir os elementos essenciais daquela ofensiva.
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Afirmamos hoje, como sempre, que o crescimento económico, resultado da estabilidade política e dos apoios comunitários, não gerou o desenvolvimento social e acentuou as desigualdades existentes na sociedade portuguesa.
Não podem ignorar-se as manchas de pobreza urbana que, dia-a-dia, alastram junto das grandes metrópoles, como não pode ignorar-se o agravamento da crise que se instalou em determinados sectores económicos carenciados de modernização e reestrutura.
A riqueza nacional é maior (mais de SOO milhões de contos ficamos a devê-los aos nossos parceiros comunitários), mas a sua distribuição é, cada vez mais, injusta porque cada vez se concentra mais numa minoria de portugueses.
Há, também, formas de pobreza relativa que são as que correspondem à incapacidade de satisfazer as expectativas que nos foram criadas ou de anular o fosso que nos separa do vizinho.
Não julgue o Governo que pode ocultar esta realidade e fugir à justa sanção política dos Portugueses.
Aplausos do PS.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: -
Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Secretário de Estado?
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: -
Sr. Presidente, é para defesa da consideração.
O Sr. Presidente: - Para defesa da consideração, tem, então, a palavra o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: -
Sr. Deputado Manuel dos Santos, há um ditado popular que diz que «a maior cegueira é dos que não querem ver».
Com efeito, o Sr. Deputado é totalmente cego, desde logo, quando fala no «logro da reforma fiscal» e diz que a carga fiscal recai sobre os trabalhadores.
Ao contrário, ao longo destes anos, o certo é que, desde a implantação daquela reforma, o peso da carga fiscal sobre os trabalhadores tem vindo a diminuir sempre e sistematicamente. De tal maneira tem sido assim que, no ano de 1989, a carga fiscal média foi de 9,9 % e, no ano de 1990, pelos dados de que disponho, é de 9,7 %. Isto significa que a carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho continua a descer.
Mas o Sr. Deputado não quer ver nem sequer quer dar-se ao trabalho de ler.
Na verdade, o Código do Processo Tributário, que saiu recentemente e que entra em vigor dentro de poucos dias, consagra um amplo leque de garantias aos contribuintes, inclusivamente, a reclamação graciosa e o apoio jurídico para as suas reclamações.
Agora não disponho de tempo para apresentar-vos o referido código. No entanto, vou publicar um artigo sobre esta matéria e, posteriormente, enviá-lo-ei ao Sr. Deputado. Assim, já que não quer ler aquele código, ao menos que leia um artigo que lhe levará cinco minutos.
O Sr. Deputado referiu-se, ainda, ao código de avaliações. Ora, seguramente, além de cego, o Sr. Deputado é surdo. É que, ainda há pouco, afirmei, muito claramente, que um código de avaliações não se faz sem cima do joe-
lho», que implica, necessariamente, um trabalho aturado e profundo, que é o de manipular 20 milhões de matrizes, o que não pode ser feito nem em um, nem em dois, nem em três anos. Aliás, quando produzi esse despacho, fiz um cálculo que apontava para um prazo de cinco anos.
Mas também afirmei que este governo ou qualquer outro que seja liderado pelo PSD - friso bem este pormenor, Sr. Deputado - não avançará com um código destes, com as implicações, a importância e o sentido de justiça que lhe está subjacente, porque afasta a componente de subjectividade que, hoje, é o apanágio comum das avaliações.
Portanto, repito que um código destes será presente à Assembleia da República e será decidido por consenso geral de todas as bancadas, para que não haja dúvidas e para que não possa haver nenhuma bancada a aproveitar-se da situação.
Aliás, suponho que se se fizer o que está previsto; será uma honra para todos aprovar um código que se traduzirá em justiça.
Quero que fique muito bem frisado e que, de uma vez por todas, se afaste a demagogia daqueles que dizem que o código de avaliações não avançou por razões eleitorais. Está dito, há anos, que não é essa a razão e reafirmo categoricamente que assim será no presente e no futuro.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Secretário de Estado, eu até estou de acordo com V. Ex.ª Tive recentemente um problema de surdez que me custou imenso a resolver, porque tive de pagar uma quantia significativa, na medida em que exijo recibos e o médico que me atendeu, dada a carga fiscal que recaía sobre ele, fez-me um preço extremamente avantajado. Felizmente que a consulta deu bons resultados e agora ouço muito bem e tão bem o ouvi que respondi directamente: disse-lhe que V. Ex.ª não estará aqui a partir de Outubro para pedir uma autorização legislativa. Não tenho sobre isso qualquer espécie de dúvida e, portanto, respondi-lhe directamente isso.
O senhor falou muito em consenso, mas é significativo que queira o consenso para as situações difíceis e depois de elas serem publicitadas na comunicação social, como é o caso do código de avaliações, é estranho que não tenha pedido o consenso para outras coisas, digamos, mais agradáveis. Ou o senhor pede o consenso para tudo ou não pede para nada!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Portanto, já não é a primeira nem a segunda, nem a terceira vez - e não vou concretizar por respeito pessoal a V. Ex.ª e por respeito político à Câmara - que, no seu ministério e no âmbito da sua responsabilidade política, se corrigem situações depois de elas serem conhecidas da opinião pública. Até admito que a questão do código de avaliações venha a ser corrigida, só que antes de ser corrigida foi denunciada, foi publicitada e foi conhecida dos Portugueses. Ora, a partir de agora tudo é fácil. Eu gostava de vê-lo a ter de corrigir as situações antes de elas serem conhecidas.
V. Ex.ª referiu-se ainda ao Código do Processo Tributário e eu continuo a pensar - parece que bem acompanhado, pelo menos, por algumas pessoas que não vou
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(...) citar, paia não as comprometer- que, apesar de tudo, essas garantias dos contribuintes não estarão tão bem consignadas e consagradas como diz. Aliás, ele ainda não entrou em vigor, V. Ex.ª acabou de dizer que vai entrar em vigor não sei em que dia. Portanto, a validade e a sensibilidade do meu discurso mantém-se. De facto, neste momento, não há defesa dos contribuintes! Isso é inequívoco!
Mas os senhores tiveram, pois, muito tempo para proceder nessa matéria. De resto, nós apresentámos um projecto alternativo que os senhores recusaram liminarmente. Portanto, podiam ter resolvido esta questão há muito tempo, mas não o fizeram.
Ainda relativamente ao código de avaliações, quero dizer-lhe que há já uma situação concreta que foi corrigida mais de uma vez, porque fizemos, no âmbito da Comissão de Economia, Finanças e Plano, por iniciativa do PS e com amplo consenso, a necessária correcção, que foi a questão de Reguengos de Monsaraz. Essa é uma situação concreta que, volto a dizê-lo, foi corrigida no limite.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Aliás, com o Conselho Económico e Social a história foi praticamente a mesma e não vale a pena estar aqui a repeti-la.
A verdade é que se não tivesse sido descoberta essa questão, hoje verificava-se uma situação extremamente grave no concelho de Reguengos de Monsaraz; seria uma situação concreta decorrente de uma lei que o senhor tinha na gaveta e que ninguém conhecia.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Rui Alvarez Carp inscreveu-se para pedir esclarecimentos, no entanto, o Sr. Deputado Manuel dos Santos já não dispõe de tempo para responder.
Pausa.
Como o PSD informou a Mesa de que cede dois minutos ao Sr. Deputado Manuel dos Santos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Alvarez Carp.
O Sr. Rui Alvarez Carp (PSD): - Meu caro amigo, deputado Manuel dos Santos, V. Ex.ª teve oportunidade de nos recordar a figura da baixa da taxa de juros. Fez-me lembrar uma afirmação do líder do vosso partido que, perdoem-me a expressão, pode ser considerada uma das maiores calinadas económicas que foram ditas na discussão política nos últimos tempos - isto sem qualquer desprimor e desrespeito por ele, porque certamente alguém o aconselhou, uma vez que não é economista - e que foi a de um candidato a líder de um governo, membro da CEE, prometer, pura e simplesmente, a baixa das taxas de juro se vier a ser governo.
Esta afirmação é uma calinada que ou foi um mero esquecimento ou, então, será melhor substituir os seus mais directos consultores económicos. Talvez isto possa contribuir para, pelo menos, desagravar um pouco esses conselhos que têm sido dados e que mostram à evidência que são da pior qualidade possível.
Com efeito, quanto a dizer que promete a baixa das taxas de juro se for governo,... eu até gostaria que o Sr. Deputado Manuel dos Santos desse aqui o exemplo de um governo europeu que possa fixar administrativamente tal baixa.
Por outro lado, também foi boa ideia ter citado o Conselho Económico e Social. Porque quando o Governo trouxe aqui a proposta de lei que propunha a constituição desse Conselho, aliás, aprovada por unanimidade, com o projecto de lei do PCP, o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território referiu bem que queria que esta proposta tivesse o máximo de consenso e a máxima participação dos partidos aqui representados. Foi assim que sucedeu: dos 18 artigos, 14 foram aprovados por unanimidade, tendo 15 deles sido aprovados com o voto favorável do PS. Se isto não é trabalhar em consenso e em concertação, numa matéria de regime como é a da estrutura do enquadramento do Conselho Económico e Social, então, o que é? V. Ex.ª já prometeu que iria alterar isto... Pois, VV. Ex.ªs, em vez da concertação, gostam mais da desconcertação e da instabilidade.
Finalmente, V. Ex.ª falou de várias outras matérias, entre elas a dos custos ferroviários. Gostaria, pois, que nos dissesse qual era o orçamento aprovado para a ponte de Vila Nova de Gaia e por quanto é que ela ficou.
Mas há aqui um aspecto que é fundamental. VV. Ex.ªs podem ter grandes qualidades retóricas - e tem-nas -, mas não podem, e não conseguiram, neste debate, mais uma vez, desmentir aquilo que é evidente. É que hoje em dia há, em primeiro lugar, um optimismo generalizado da população e dos agentes económicos relativamente à economia portuguesa e à condução geral da política pública e, em segundo lugar, que as grandes reformas estruturais, prometidas praticamente desde o 25 de Abril, foram feitas incluindo a reforma fiscal, sem prejuízo de serem melhoradas de forma progressiva. E aqui cabe-me a palavra para salientar o extraordinário e histórico trabalho positivo que o Dr. José Oliveira e Costa leve nessa qualidade de principal condutor da reforma fiscal.
Aplausos do PSD.
Quão longe vamos dos adicionais aos impostos de má memória e ião longe já estamos hoje dos célebres impostos retroactivos sobre os rendimentos dos trabalhadores.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos, dispondo, como já disse, de dois minutos cedidos pelo PSD.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Deputado Rui Alvarez Carp, julgo que me colocou, fundamentalmente, três espécies de questões. A primeira teve a ver com a «promessa» - e o senhor é que lhe chamou promessa - da baixa das taxas de juro, feita pelo secretário-geral do meu partido e que eu próprio, de algum modo, reproduzi, embora não exactamente nos termos em que o senhor referiu.
V. Ex.ª tentou dizer que as nossas responsabilidades no processo de integração na CEE implicavam a impossibilidade de uma actuação administrativa sobre as taxas de juro. O senhor sabe muito bem que não é assim, lemos ainda um período de derrogação em que isso poderia ser feito, mas não é essa a questão essencial. É que ninguém afirmou que ia baixar administrativamente as taxas de juro...
Vozes do PSD: - Está escrito!
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O Orador: - Se me derem tempo, leio-vos o que está escrito, pelo menos no meu discurso.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Ora leia, leia!
O Orador: - O que foi dito é que o PS se responsabiliza por políticas que, inevitavelmente, conduzirão à baixa da taxa de juros,...
Vozes do PSD: - Oh!...
O Orador: -... como aliás conduziram em todos os países da Europa.
O senhor esteve há pouco tempo comigo em Espanha, num congresso com empresários e políticos, e ouviu dizer que a taxa de intermediação não é superior a S ou 6 pontos percentuais e que a taxa activa média de juro não é superior a S ou 6 pontos percentuais relativamente à média da inflação. Então, é porque isso é possível. Nós sabemos, da teoria económica, que isso é possível, desde que as políticas sejam correctas.
Ora bem, o Sr. Primeiro-Ministro não tem dito que vai corrigir as políticas; o Sr. Primeiro-Ministro tem é dito «vão ao banco» - e a mim apetecia-me dizer vão ao Totta-...
Risos.
...«pedir o abaixamento das taxas de juro». Isto é que é demagogia e irresponsabilidade!
Aplausos do PS.
Relativamente ao Conselho Económico e Social, quando for altura de votar, explicaremos por que é que vamos votar contra a proposta.
E o senhor sabe perfeitamente que a nossa discordância não se situa exclusivamente no problema da representação tal qual a pôs. É que, embora esse seja um dos elementos fundamentais para nós, há outros elementos de discordância, nomeadamente a não representação da Associação Nacional de Municípios e a representação inviezada dos interesses locais. Aliás, sabe-se por que é que os senhores não querem a representação da Associação Nacional de Municípios: é porque ela é dirigida por um socialista e tem uma maioria de câmaras socialistas. Se não, queriam. É óbvio!
Estes são, como sabe, elementos fundamentais nos quais se baseia a nossa discordância.
Por outro lado, os senhores só corrigiram a lei porque alguns parceiros sociais vieram cá ameaçar que acabavam com o acordo social. Nessa altura, nós aceitámos colaborar, juntamente convosco -e não digo com quem para não comprometer ninguém-, numa maquillage da lei que permitisse minimamente evitar uma catástrofe social.
Sabe muito bem que é assim, por isso não me alongo mais sobre essa questão.
Quanto às reformas estruturais, não sei quais foram as que os senhores fizeram.
O Sr. Rui Alvarez Carp (PSD): - Todas!
O Orador: - Mas não fizeram a mais importante que referi no meu discurso: a modernização do aparelho produtivo. E tiveram, para isso, milhões e milhões de contos!
Protestos do PSD.
E o Sr. Ministro da Indústria e Energia apenas nos explicou, ontem, que o projecto Ford/Volkswagen serve para fazer um carro de sete lugares, com não sei quantos sistemas de embraiagem, com travões ABS, que não sei o que é, porque só guio carros e meto gasolina, mais nada, não tenho essa especialidade, e não nos explicou como é que um projecto dessa natureza se enquadra numa política global de desenvolvimento do País e numa política industrial que este governo defende face ao interesse nacional. E não explicou porque não sabe!
Portanto, as reformas estruturais mais importantes não estão feitas!
Aplausos do PS.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, linha sido acordado em conferência de líderes a realização de uma interrupção para que os deputados e os membros da comunicação social pudessem assistir à atribuição do prémio de jornalismo parlamentar.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado antecipou-se, porque a Mesa ia anunciar isso mesmo. Srs. Deputados, está interrompida a sessão.
Eram 17 horas e 55 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão. Eram 18 horas e 20 minutos.
Vamos dar início à fase de encerramento desta interpelação. Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.
O Sr. Almeida Santos (PS):-Srs. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A minha primeira constatação é que a direcção da bancada do PSD, face à dimensão da derrota, desertou!
Aplausos do PS.
Na legislatura que finda tivemos dois governos e dois primeiros-ministros. Até à derrota do PSD nas eleições autárquicas, um governo e um primeiro-ministro que, errando embora, tiveram a coragem de governar, isto é, de desagradar. Depois da derrota nas autárquicas, o Primeiro-Ministro e o seu governo demitiram-se de governar. E erigiram em prioridade nacional a reconquista da maioria absoluta que desde então passaram a considerar perdida. Viria mais tarde a bastar que fosse clara, o que envolve alguma obscuridade.
Governar passou a ser um regabofe propiciatório de potenciais apoios; desagradar foi proibido; e o livro de cheques do Primeiro-Ministro passou a prodigalizar os óbulos, com direito a filme na televisão, para que conste.
Tomado de febre ambulatória, o Primeiro-Ministro passa por São Bento as quintas-feiras (até ver!). No resto da semana celebra missa no altar da demagogia, transmitida aos fiéis pela fidelíssima TV. Surpreendendo tudo e todos passou a sorrir e a forçar gestos de simpatia instintiva que, talvez por isso, saem postiços. O know-how do Dr. Soares a beijar as crianças é indiscutivelmente melhor!
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Reivindicações antes julgadas injustas recebem agora um «porque não»? Aumentos salariais que antes detonavam greves provocam agora o seu «aborto». A febre inauguracionista, com fanfarra, discursos e muito povo, à moda antiga, foi retomada: a tempo, antes do tempo e a destempo, por vezes com direito a bis.
Agora, parece que até com risco de descarrilamento e convite ao Presidente da República para descarrilar também!... E não assistimos hoje, aqui, à confusão entre um discurso político e uma listagem de obras?! O Telejornal passa todos os dias o mesmo filme: «Cavaco no país das maravilhas.» Tivemos o maior crescimento do mundo! Não estamos orgulhosos? - Eu não estou, é claro! - O discurso é repetitivo, auto-elogiativo, ególatra. Antigamente, os feitos militares deviam-se aos generais; os feitos políticos creditavam-se aos reis. Volta a ser assim: a dívida imensa que temos para com o nosso Primeiro-Ministro (todas as obras públicas, todos os aumentos salariais, todas as leis, todas as glórias) só é amortizável em termos de imortalidade! Verdadeiramente orwelliano!
A última peça dessa pseudogovernação cénica tivemo-la aqui, na Assembleia. Após quatro anos de conduta claramente antiparlamentar, o Primeiro-Ministro veio jurar amor ao Parlamento. Fazer, segundo alguns, o seu próximo tempo de antena.
Não é positivo para ele que a reacção tenha sido de genérica surpresa. Mas se há facto que não pode ser sofismado é o seu desapego à instituição parlamentar. Se a respeitasse, não teria feito tudo quanto fez para desprestigiá-la! Não espartilhava o diálogo nem o inutilizava por recurso a votações sistematicamente devotas e unidireccionais! Não cortava o voo dos mais importantes projectos e propostas das oposições pela única razão de provirem delas! Não consentia na anulação do seu poder de fiscalização política dos actos do Governo! Não boicotava a eficácia das comissões de inquérito! Não neutralizava o instrumento ratificativo, transformando-o em carimbo chancelar! Não convertia o Governo em órgão legislativo por excelência, abusando das leis de autorização legislativa! Não dava tanto trabalho ao Tribunal Constitucional, respeitando mais escrupulosamente a Constituição! Não escamoteava as naturais competências do Tribunal de Contas, que da Assembleia depende, nem desvalorizava as suas decisões e os seus juizes! Não sujeitava parlamentares dignos de todo o respeito à desrespeitosa exigência pública de um regime de ponto e de uma declaração de obediência à ordem partidária estabelecida!
Depois de tudo isto, vir aqui dizer-nos que «o Governo contribuiu para o reforço do regime democrático e o aperfeiçoamento das instituições» soaria a defesa pelo absurdo, se não fosse pura e simples desfaçatez. Os elogios chegam tarde de mais para poderem ser sinceros.
Só a este Primeiro-Ministro lembraria elogiar esta Assembleia por ter aprovado 143 propostas de lei do Governo! Será que legislar bem é carimbar? Só um devoto dos aspectos quantitativos da vida, expressa em fanatismo pelo crescimento, com secundarização dos qualitativos, poderia permitir-se medir a excelência de uma legislatura pela quantidade das leis aprovadas.
Antes de proferir semelhante enormidade, um humanista recordaria a máxima conhecida de Tácito: «Corruptissima republica plurimae leges» (quanto mais numerosas são as leis mais corrupta é a República). E os que identificam os excessos burocráticos com delírios de sobre-regulamentação, tão típicos dos ordenamentos liberais, poupariam os elogios para o comedimento em legislar!
Preferia eu um primeiro-ministro mais verdadeiro! Aliás, uma forma de deturpar a verdade, já aqui hoje realçada, é a reincidência abusiva com que o Primeiro-Ministro e os seus tenores - alguns ouvimos, aqui, hoje - comparam abstractamente o que não é comparável: os indicadores económicos até 1985 e a partir de 1985.
Assim, candidamente, veio aqui dizer-nos: «Temos de tomar como termo de comparação o ponto de partida.» Mas comparação de quê, Srs. Deputados? Das conjunturas e respectivos resultados? Vamos a isso! Só dos resultados não é minimamente sério.
Talvez a máquina de calcular, em que o Primeiro-Ministro fia as suas tão famosas certezas, não dê para mais. Mas a necessidade de uma relacionação crítica, além de exigências de honestidade elementar que a máquina de calcular não tem, reconduzem-nos à sabedoria de Sócrates: «Não só é impossível tratar igualmente o que é desigual, como convém saber a que nível se estabelece a comparação.»
Convido o Sr. Primeiro-Ministro, em nome da verdade que deve aos Portugueses, a comparar as situações de verdadeira emergência cambial, no contexto da mais grave crise recessiva do nosso tempo que os governos socialistas tiveram de enfrentar, com a conjuntura pós-recessiva por ele herdada.
Sopesadas as conjunturas, compare, então, os resultados para que os Portugueses fiquem habilitados a concluir quem fez e não fez o que devia, quem abusou de fazer o que não devia e quem ficou e não ficou aquém do que podia.
Aplausos do PS.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - E o défice orçamental?!
O Orador: - Tendo, assim, metido a mão na verdade, ou seja, na consciência, reconheça também, uma vez por todas, que os resultados imputáveis ao chamado «governo do bloco central» o são também ao seu próprio partido, que dele fez parte por metade, pelo que, nessa medida, o PSD faz comparações consigo mesmo! E mais: admita que o ponto mais negativo dos indicadores económicos foi, sem dúvida, atingido por um governo do seu próprio partido, aliás na sequência de erros de um ministro das Finanças que se chamava Cavaco Silva e que teve artes de fugir a tempo!
Aplausos do PS e do deputado independente Jorge Lemos.
Um pouco mais de respeito pela verdade conduziria também o Primeiro-Ministro a ser mais rigoroso quando afirma que «somos o país do mundo que mais cresceu».
Não é verdade que os nossos 4 % ou 4,5 % de crescimento do produto sejam o Everest do crescimento. O Japão, a Irlanda, a Alemanha e até a Espanha, sem falar em alguns países do Terceiro Mundo, que para o efeito não contam, cresceram mais e mais significativamente, já que com pontos de partida acima do nosso. Mas, ainda que fosse, sempre seria imputável ao empurrão da CEE - onde o então secretário-geral do PSD não quis entrar! - uma fatia de 1,5% a 2%.
O Primeiro-Ministro sentiu-se autorizado a prometer a nossa colagem ao pelotão da frente no decurso de um próximo mandato. Com que verosimilhança e com que seriedade? Com a que resulta do facto de, nos últimos dez anos, termos recuperado, em relação à média comunitária, o
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(...) percentual de l ponto no poder de compra? É a este ritmo que o Primeiro-Ministro tenciona disputar o sprint daqui a quatro anos?
A questão não está tanto em saber se crescemos muito ou pouco, mas se crescemos bem ou se crescemos mal.
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Muito bem!
O Orador: - Se todos os nossos parceiros cresceram, por que não haveríamos, nós também, de ter crescido? E crescemos a benefício de quê e de quem? Atenuaram-se as discriminações sociais e as assimetrias regionais? Foi mitigada a pobreza? Os chamados «novos-pobres» são uma figura de retórica? Novos que se sobrepõem aos velhos, Sr. Deputado Pacheco Pereira!
Modernizou-se com algum significado o aparelho produtivo - pergunta já aqui hoje formulada? A indústria nacional está preparada para o caich as catch can do ring do mercado? A nossa agricultura ficou adulta? Melhoraram significativamente a educação, a saúde, a justiça, a habitação? É mais saudável o ambiente? Espevitou a investigação? Animou a cultura? Qual o significado qualitativo do crescimento só quantitativamente medido?
A resposta é desoladora. Tudo se confinou, para desespero dos mais desprotegidos, à saturnal de uma política de neofontismo fachadista e ao «banquete» de um excepcional afluxo de capital estrangeiro, mais atraído pela especulação do que pelo investimento reprodutivo.
Nada disso impediu que os serviços de justiça tenham continuado a ser morosos e passassem a ser muitíssimo mais caros.
Os serviços de saúde estão menos comparticipados pelo Estado, mais imolados as soluções lucrativas, mais embrulhados em borbulhas eleitoralistas que os tribunais tentam rebentar.
A política de educação, aquém dos prometidos 6 % ou 7 % do produto, está mais discursiva do que concretizadora, superficial, tecnocrática, coutada de insucessos, suprema mistificação da legislatura que finda.
Aplausos do PS.
A política ecológica torna-se mais do que nunca insensível ao suicídio colectivo em que se tomaram os modelos de crescimento do capitalismo sem alma.
A política cultural mostra-se mais Contista e mais inculta, tendo por ex-libris o contentor de vaidade do pátio dos Jerónimos.
As políticas de que mais depende a valorização do homem não foram beneficamente influenciadas pelo crescimento verificado. O Governo permitiu-se corrigir Protágoras: «É o cifrão, não o homem, a medida de todas as coisas.»
Aplausos do PS e dos deputados independentes Helena Roseta, Jorge Lemos e José Magalhães.
Em resumo: este governo malbaratou uma oportunidade histórica e irrepetível de fazer que Portugal desse um salto em frente. Não deu! Mas, sim, poucos passos miudinhos e muita propaganda. O País, significativamente, não mudou. Ternos menos democracia e mais eucaliptos!
É hoje inconcebível um crescimento sem qualificativo e sem destinatário. Recusa-se, a justo título, o crescimento pelo crescimento, o crescimento unidimensional do homo económicas, e às cegas medições do crescimento do produto sobrepõem-se medições do desenvolvimento humano de que o crescimento do PNB é apenas um dos elementos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - No relatório recentemente elaborado pelo PNUD lá aparece Portugal com os seus 17 % de analfabetos e - laranja amarga! - a liderar o pelotão da média liberdade, Sr. Deputado Pacheco Pereira. Expulso, pois, do lote dos países da alta liberdade!
O Primeiro-Ministro, esse, continua agarrado às receitas do compendio liberal, último dos convictos de que o crescimento traz, só por si, a justiça social, sem que o Estado tenha de defender os fracos do esmagamento pelos fortes. Só que a utopia liberal foi experimentada, reexperimentada em versões neo, e carrega consigo os estigmas do seu próprio fracasso!
A «mão invisível» não produziu resultados positivos que se vejam. Privilegiou a liberdade económica às restantes liberdades e foi insensível, como o nosso Primeiro-Ministro parece ser, às exigências da dignidade humana.
Aplausos do PS.
Para além disso, perfilha modelos de crescimento que não preservam os equilíbrios e as reservas naturais de que depende a continuação da vida sobre a Terra. Por exigência de uma estreita mentalidade crescimentista, não tem um discurso ecológico nem revela acalentar as correspondentes preocupações.
Igualmente, não tem discurso cultural que reflicta as angústias do nosso tempo. O seu discurso é culturalmente estéril e reflecte o fascínio pelas performances da tecnologia. Sabemos acaso o que pensa sobre o futuro de um mundo em acelerada mudança? Que preocupações alimenta sobre a problemática da aldeia planetária? Sabemos ao menos o que pensa - depois que deixou de pensar pela cabeça da Sr.ª Thatcher - sobre a construção da Europa? Ou sobre a explosão demográfica? Ou sobre o aborto, a contracepção, a inseminação artificial, os bancos de esperma, as mães de empréstimo, a engenharia genética?
Ou será por não ter ideia sobre nada disso que recusa debates com os seus próximos Challangers? Faço esta pergunta com a autoridade de quem, sendo ministro de Estado e não especialista na matéria, com ele aceitou debater na TV - a desafio seu! - a sua própria política financeira no governo de Sá Carneiro!
Aplausos do PS e dos deputados independentes Helena Roseta, Jorge Lemos e José Magalhães.
Disse-nos agora que cada um deve subir pelos seus próprios méritos. Que méritos emprestaria aos seus adversários nas respostas que estes houvessem de dar a quem os inquirisse? Num debate perante os eleitores algum dos participantes deixaria de exercitar méritos exclusivamente seus? E o debate não é da essência da democracia? Não é, antes de mais, uma obrigação perante os eleitores? Digamos tudo: não é uma condição de transparência e de verdade?
Uma das formas de distanciamento da verdade é também a fuga à seringa com aquilo que a gente sabe. O Primeiro-Ministro é exímio nesse exercício atlético.
Risos.
Primeiro exemplo: a propósito da revelação de que o Governo tem na gaveta, para depois das eleições já aqui
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(...) foi referido isso!-um novo assalto à bolsa dos contribuintes, a propósito da reavaliação dos imóveis para efeitos de contribuição predial -agora crismada de autárquica para que o odioso recaia sobre as autarquias-, veio à televisão dizer-nos, com extrema candura, que nada tem a ver com isso. É assunto do interesse exclusivo das autarquias! E as malditas autarquias tão caladas!...
Segundo exemplo: está, aí, a agredir tudo e todos o absurdo diferencial, também já aqui referido, entre os juros activos e passivos da intermediação bancária. Para uma taxa de inflação da ordem dos 13 % - o maior fiasco deste governo! - taxas de operações activas de 30 % e mais! Algumas falências nascem aí, outras já nasceram. Mas os ratios dos bancos ganham solidez e as privatizações clientela.
O Primeiro-Ministro sabe que aquele diferencial 6 politicamente enorme, economicamente castrante, socialmente injusto e sacrifica a economia nacional a uma episódica necessidade de sobrenutrição da banca.
Pois bem, ele também nada tem a ver com isso. É assunto que só diz respeito ao Banco de Portugal. E a gente sem saber de nada!
Terceiro exemplo: é a sua resposta aos deputados que aqui exigiram a demissão do director do 1.º canal da RTP, pela inqualificável atitude de responder, e responder atacando, à mensagem que o Presidente da República enviou à Assembleia da República. Tratava-se de uma questão entre órgãos de soberania, com aquele director a meter-se de permeio, em tempo de antena auto-atribuído e de duração dupla da transmissão televisiva de pequenos nacos da própria mensagem do Presidente.
Disse o Primeiro-Ministro momentaneamente formalizado: «Mas o que me pedem é uma ilegalidade!»
Esta nova fuga à seringa insulta a inteligência dos interlocutores, além da própria. É óbvio que não estava em causa um acto formal de demissão daquele director pelo Primeiro-Ministro!
O que estava em causa era o que o provedor de Justiça colocou em causa. Teve o funcionário a concordância - previa ou posterior - do conselho de administração que o designou e é competente para o destituir? Teve essa concordância do conselho de administração, a cobertura - prévia ou posterior- do Governo, entidade que o designou e é competente para o destituir?
Esta e só esta é a questão, para alem de o incidente ter posto também em causa o sistema não partilhado da designação dos órgãos de gestão da RTP e da RDP. A seringa continua no ar e o Primeiro-Ministro não pode continuar indefinidamente a fazer exercícios de fuga. Quando o Presidente da República é desrespeitado, é a República que o é.
Aplausos do PS.
A reforma fiscal foi aqui sobejamente tratada pelo meu camarada Manuel dos Santos. Porém, queria só referi-la pela simples razão de que ela é mais uma mentira sustentada, pois por mais que isso custe ao Governo e aos elementos aqui presentes.
Mas a lógica do homem, que nunca nos enganou, é que pagamos mais, rendemos mais, mas, apesar de tudo, temos menos impostos.
É, portanto, de agradecer.
A reforma fiscal, como se sabe, nasceu coxa O imposto por ela criado não é, nem único, nem igualmente progressivo, nem contribuiu para diminuir as desigualdades sociais, como é exigência constitucional.
Se, para além disso, julgarmos que ela penaliza discriminatoriamente os médios rendimentos, e beneficia os altos, sobretudo quando resultantes de lucros especulativos, em detrimento dos baixos, segura é a suspeita de que o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Secretário de Estado leram a Ilha dos Pinguins, de Anatole, e resolveram seguir o aviso de S. Mael: «Contribuir é ignóbil, (pertence à canalha pagar.»
Como se vê, Srs. Deputados, não foi só nas políticas sociais que este governo falhou. Falhou também ficando aquém das metas atingidas nas políticas económicas e financeiras. Aí, onde pretende ser doutor, aí onde concentrou toda a sua complacência; aí onde se situam preocupações que se sobrepõem a tudo o mais, o Governo falhou.
Descontadas as inverdades, descontados os sofismas e a gabarolice sem fronteiras de comedimento, o Governo falhou a oportunidade, o grande salto qualitativo que a fortuna colocou ao seu alcance.
Sempre me colheu propenso à dúvida a conhecida afirmação de Demóstenes de que «rara coisa é a verdade». Assim tanto? - duvidava eu!
Ao ter de concluir que a mentira faz o ninho mesmo nas torres mais altas, dou razão ao maior de todos os oradores.
Napoleão disse um dia: «Melhor do que eu? É difícil!»
Risos do PS e do CDS.
Foi modesto, apesar de tudo.
O que se retira do discurso e do comportamento do Sr. Primeiro-Ministro corrige o pequeno corso: «Melhor do que eu? É impossível!»
Não é, nem será!
Aplausos do PS e dos deputados independentes Helena Roseta, Jorge Lemos e José Magalhães.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção de encerramento, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No final desta legislatura, em jeito de balanço, resolveu o Partido Socialista interpelar o Governo.
No encerramento deste debate, podemos afirmar: o Partido Socialista apareceu aqui, na maior parte do tempo, a reafirmar o que sempre disse, e, no resto tempo, falou de algumas coisas novas, falou do futuro, tentou esboçar, valha a verdade, vagamente, embora, uma solução socialista para os desafios do futuro.
No que toca à reafirmação de posições reiteradamente assumidas - como ainda agora aqui foi feito - ao longo destes quatro anos, pouco haverá de novo a dizer como resposta.
Já sabemos há muito tempo que o Partido Socialista não atribui qualquer mérito ao Governo no aproveitamento das condições de estabilidade; já sabemos há muito tempo que. para o PS, o País não vive um momento de modernização e desenvolvimento; já sabemos há muito tempo o que pensa o PS sobre os fundos comunitários; já sabemos que para o Partido Socialista, o pouco que de positivo consegue vislumbrar da obra deste governo o atribui à conjuntura, ao tempo de «vacas gordas», como repetidamente afirma.
Não devemos, por isso, perder tempo com estas posições do PS. Já lhe demos, em múltiplas ocasiões, as respostas
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(...) que, aliás, não conheceram nunca réplica válida. Temos fundadas razões para pensar que os Portugueses não têm das coisas a mesma visão porque são inteligentes e não sofrem, tenho a certeza, nem de miopia nem de vista cansada.
Aplausos do PSD.
Sobre estes aspectos não importa, portanto, reeditar debates que já estão feitos, tanto mais que não falta muito tempo para que os Portugueses digam de sua justiça.
Mas há, disse, os aspectos novos, os que falam do futuro e estiveram também em debate nesta interpelação. Foram trazidos pelo entusiasmo pessoal do Sr. Deputado António Guterres que, perante o marasmo do seu partido, fez o discurso de contracorrente.
Para além do que aqui, sobre esses aspectos novos, foi considerado, gostaria de, neste momento em que o debate se encerra, tecer algumas considerações. Gostaria, sobretudo, de sobre eles fazer o que me parece a mais fundamental das considerações.
Quando um partido político fala de projectos e do futuro, o requisito primeiro sobre que é preciso ajuizar é o da sua credibilidade. Não nos passa pela cabeça afirmar que o PS não seja capaz de redigir um programa, de elencar um conjunto de acções a levar a cabo, de fazer sobre um e outro inflamados discursos. Isso não está em causa. O que está em causa e de que é importante curar é da credibilidade do Partido Socialista.
E qualquer exercício sério sobre a credibilidade não dispensa uma visita ao passado, não dispensa uma avaliação histórica. E felizmente que, neste caso, a podemos fazer. O Partido Socialista foi partido liderante do poder em vários momentos. E é à luz do passado, desse passado de partido com responsabilidades governativas, que lemos de avaliar as propostas e os projectos sobre o futuro.
E temos de fazê-lo com objectividade, para o que nem seria necessário o apelo do Sr. Deputado Almeida Santos.
O Partido Socialista exerceu o poder sozinho, primeiro, com o CDS, depois, e em coligação com o PSD, a seguir.
Os resultados destes governos foram sempre idênticos. E, por isso, ao fim de pouco tempo, os governos de coligação que referi tiveram a mesma sorte: acabaram porque os parceiros do PS lhes puseram fim.
E porque o denominador comum destes governos é sempre o Partido Socialista, que os liderou a todos, e porque os de coligação acabaram por vontade dos seus parceiros, que saíram por discordarem, e porque, finalmente, para só falar do PSD, está provado que este, quando sozinho, é capaz de fazer melhor, de fazer muito melhor ou mesmo bem, podemos então afirmar, com objectividade, que os resultados que estes governos produziram com a marca indelével do Partido Socialista.
O Sr. Vítor Caio Roque (PS): - É preciso não ter vergonha!
O Orador: - E constituem hoje não só um referencial indispensável para avaliação de qualquer programa ou proposta do PS mas também um elemento indispensável ao julgamento sobre a credibilidade do Partido Socialista.
Aplausos do PSD.
Método que, aliás, sempre usaram os Portugueses no julgamento do Partido Socialista.
O CDS foi parceiro do Partido Socialista num governo que, por iniciativa daquele, caiu, e, pouco depois, ganhava com o PSD as eleições que o PS perdia; o PSD foi parceiro do Partido Socialista num governo de que também quis sair, e, do mesmo modo, pouco tempo depois, ganhava as eleições ao Partido Socialista.
E, por favor. Srs. Deputados do Partido Socialista, não venham dizer que isto se deveu, em ambos os casos, à falta de lucidez dos Portugueses, que foram incapazes de fazer uma análise crítica de condições desiguais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vamos fazer esse exercício e curar de saber da credibilidade do Partido Socialista para falar do futuro.
Procuremos ver, numa retrospectiva desapaixonada, o resultado para o País do exercício do poder socialista.
O Sr. Vítor Caio Roque (PS): -Este discurso é igual ao de Macau!...
O Orador: - Podemos, então, estabelecer a comparação com estes últimos anos em que os sociais-democratas exercem o poder governativo.
A primeira coisa que podemos afirmar é que se algo de positivo ficou do poder socialista, foi apenas o resultado de opções nacionais irrecusáveis, a cuja força ninguém de bom senso resistiria.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Foi só a adesão à CEE?!
O Orador: - Em tudo o mais, naquilo que foi iniciativa própria, naquilo que deixou a marca de uma característica singular, o resultado não foi famoso, pelo contrário. O País, para os socialistas, foi um campo de experiências frustrantes, foi uma sucessão de equívocos, que tivemos todos de, duramente, sofrer.
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
Vejamos, primeiro, as suas soluções económicas.
Das soluções económicas socialistas ficaram as noções da incapacidade, da ligeireza, do subsídio a fundo perdido ou do imposto retroactivo.
Protestos do PS.
Das soluções económicas socialistas permanece uma incontestável imagem de exagero, de descontrolo, de sacrifício injusto.
Das soluções económicas socialistas permanece a teimosia, de anos e anos, em não encarar o problema das privatizações, o adiar de outras questões que eram reformas profundas e necessárias, a política dos curtos e incertos passos, a inexistência de orientação e de horizonte.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Das soluções económicas socialistas ficou o retrato de um país a pedir, condenado a continuar no caminho do endividamento, dependente sempre, dramaticamente dependente, quantas vezes, da ajuda de terceiros de boa vontade.
Das soluções económicas socialistas, ficou a caricatura dolorosa do português de cinto apertado, percorrendo um longo túnel que, ao fundo, não linha senão uma centelha de luz como miragem.
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Das soluções económicas socialistas ficou-nos a sensação de que o Pais não dependia dos Portugueses, mas dos outros.
As soluções económicas socialistas constituíram o primeiro sinal sobre a capacidade que não têm para acreditar nos Portugueses.
Mas, para ser objectivo, para fazer a comparação nos moldes em que o Sr. Deputado Almeida Santos quer que seja feita, o Partido Socialista justifica tudo isto com aquilo que chama de conjuntura económica difícil.
Não vou debater a questão. Vou até dar de barato...
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados...
O Orador: - Srs. Deputados, até vou conceder, dizendo que sempre que o PS foi governo a conjuntura era difícil e não era a melhor...
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É comparar as duas condições que o Sr. Deputado Almeida Santos tem com esta!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos num acto relativamente formal, que suo os actos de encerramento.
Srs. Deputados de todas as bancadas, agradecia que criássemos as condições próprias para continuarmos o nosso debate.
O Orador: - Srs. Deputados, pois bem, fica pelo menos provado que o Partido Socialista não é capaz de governar em situação de dificuldade...
Aplausos do PSD.
A conjuntura não era a melhor-dizem. Concedamos!...
Mas, então, os governos não existem para dar a volta às coisas? E o PS alguma vez se questionou se fez tudo o que devia ter feito para vencer esse desafio difícil? Já alguma vez o Partido Socialista se interrogou sobre os efeitos daquilo que ele próprio criou? Já se interrogou sobre os malefícios que poderia ter evitado se tivesse dado o seu acordo, ao PSD, nomeadamente, para a revisão do sistema económico na revisão constitucional de 1982?
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
O PS já se interrogou sobre se tudo não poderia ler sido diferente se tivesse dado o seu acordo às reformas estruturais por que tanto clamou o Prof. Mota Pinto?
Aplausos do PSD.
Não, Srs. Deputados. Sobre isto, o Partido Socialista não se interroga. E agora, porque as eleições se aproximam, o Partido Socialista decide proclamar algumas das ideias que tem sobre a economia portuguesa, decide dizer que já está convertido ao espírito de mercado, fala em números, já cita as economias europeias, já se atreve a discutir projecções. Só que responde apressado e engana-se nas contas.
Tudo visto, trata-se da quadratura do círculo e os impostos n9o chegam nem para uma parte pequena da ilusão socialista.
Decididamente, no passado como agora, a economia e o Partido Socialista andam de costas voltadas.
Mas, se o Partido Socialista tem estado tradicionalmente ligado à crise, à inflação incomportável, às taxas de juro proibitivas, à redução do investimento, numa palavra, à recessão e à austeridade, talvez os seus méritos tenham sido outros.
Vamos, então, ver.
O mais importante das soluções socialistas funda-se, dizem, na solidariedade.
Se assim é, as medidas que os socialistas tomaram no seu passado recente deveriam ter conduzido a um esforço conseguido neste domínio. Os factos, também neste caso, o não confirmam. O que os factos abundantemente demonstram é que as soluções sociais do Partido Socialista resultaram, sempre, em aumento do desemprego, em diminuição do poder de compra, em perda acentuada das pensões sociais, em incremento da debilidade dos rendimentos, justamente daqueles que mais débeis são.
Aplausos do PSD.
E não foram lambem as soluções sociais do Partido Socialista que promoveram o trabalho precário? Agora o Partido Socialista fala do sistema de segurança social e das suas preocupações. E eu pergunto: Mas foi por acaso a «conjuntura difícil» que obrigou o PS a manter a visão estatal de segurança social, que desincentivou, quando não fez estiolar, a tradicional e generosa iniciativa da sociedade? Já se interrogou o PS sobre se o momento difícil de que fala não recomendaria política oposta?
E agora dizem também: «A inovação que é importante introduzir é a da concertação estratégica entre governos, grupos empresariais e organizações representativas dos trabalhadores.»
Porque não foram, então, capazes de fazer concertação social quando foram poder? Foi a «conjuntura difícil» que o impediu? Ou foi o facto de não terem sido capazes de a fazer que tornou mais difícil a conjuntura?
Aplausos do PSD.
Não é verdade, para o mundo inteiro, que em tempos de crise é mais fácil e exigível a um governo promover a concertação?
Agora falam de uma saúde melhor, de consultas marcadas no próprio dia.
Mas não é verdade que foi a solução estratégica do PS quanto à saúde que reduziu o sistema a um nível degradante, injusto e desumano?
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - E fê-lo porque era «difícil a conjuntura económica?». Já se interrogou sobre se não aconselharia justamente o contrário?
Por tudo isto, a mirífica resposta que o Partido Socialista hoje apresenta é um exercício de pura demagogia, que mais do que qualquer outro fala eloquentemente da saudade - e só - que o PS tem do poder.
Aplausos do PSD.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se o Partido Socialista não foi capaz de promover a criação de riqueza e se não foi igualmente capaz de criar ou sequer indiciar uma sociedade mais justa e mais solidária, talvez noutro campo tenham as suas ideias feito vencimento.
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Vejamos. Vamos falar de outro tipo de questões de que tanto fala hoje o PS. Como fez, aliás, abundantemente neste debate.
O País foi sempre desigual. Sempre cresceu a ritmos diferentes nas diversas regiões. Manteve sempre desfasamentos graves entre o litoral e o interior e sempre se caracterizou pela falta de investimento infra-estrutural básico.
Nesta matéria, o que a verdade histórica impõe que se diga é que não foi a solução socialista de desenvolvimento que ficou ligada aos grandes projectos que têm por base novas opções energéticas ou assentes em novas vias de comunicação ou telecomunicações.
Não foi a solução socialista de desenvolvimento que foi responsável pelo actual reequilibro dos investimentos efectuados no litoral e no interior; não foi a solução socialista de desenvolvimento que conseguiu concentrar nas regiões com menores índices de desenvolvimento um número mais adequado de recursos; não foi a solução socialista de desenvolvimento autora de apoios a sectores industriais não tradicionais e com componentes de valor acrescentado nacional de maior peso; não foi a solução socialista de desenvolvimento a promotora de coesão interna. Mas agora o PS diz, como disse aqui esta manhã: «Em Outubro começa o futuro. Como começará também o futuro da criação das regiões administrativas...»
Mas não consta das soluções socialistas de desenvolvimento a aprovação de qualquer lei quadro de regionalização enquanto o PS foi poder. Foi também a «difícil conjuntura» que o impediu? Então, se os tempos eram difíceis, se justificavam nomeadamente o melhor aproveitamento dos recursos endógenos que a regionalização há-de propiciar, por que a não fizeram nessa altura?
Aplausos do PSD.
Mas, conceda-se ainda, se o Partido Socialista não conseguiu, comprovadamente, oferecer, também, uma ideia de desenvolvimento harmonioso do País, se o não tomou mais próximo entre si, talvez tenha sido outro o seu objectivo primeiro e essencial.
Procuremos então, Sr. Presidente e Srs. Deputados, ainda e sempre com recurso à memória, desvendar outros caminhos.
O Partido Socialista afirmou sempre - e hoje aqui o fez, de novo - a sua grande preocupação com a dimensão e o prestígio externo do País. Pode dizer-se, creio, que tudo não passou disso mesmo: uma grande preocupação.
A solução socialista para a nossa afirmação internacional deparou sempre com enormes obstáculos. Portugal não tinha crédito, reduzia-se a olhos vistos o seu prestígio, desdenhava-se da capacidade dos Portugueses.
A estratégia estava errada. Quando foi poder, a solução socialista para a nossa afirmação externa passou sempre mais pelo jogo das internacionais do que pelo esforço do prestígio de um país, possuidor de uma história própria e de laços de amizade e cooperação construídos no mundo inteiro.
Aplausos do PSD.
Pareceu sempre mais importante, aos olhos do Partido Socialista, a afirmação de partilha do socialismo do que o estabelecimento de sólidas relações Estado a Estado. A solução do Partido Socialista para a nossa afirmação internacional esbarrava sempre na fronteira das famílias políticas europeias.
Por isso, e por exemplo, a solução do Partido Socialista não conseguiu nunca avançar um passo na resolução dos problemas dos países africanos de expressão oficial portuguesa e na relação destes com Portugal.
Aplausos do PSD.
A solução socialista, neste domínio, produziu o afastamento, manteve a falta de diálogo, em nada contribuiu para uma evolução em harmonia e em paz. E temos de perguntar, Srs. Deputados do Partido Socialista: foi a «difícil conjuntura» que a tanto os obrigou?
Que culpa teve, em tudo isto, Srs. Deputados do Partido Socialista, a «difícil conjuntura» que sempre escolhem para tudo justificar?
Aliás, ainda recentemente, o PS deu, nesta matéria, eloquentes exemplos: a incerteza socialista, que se traduziu na oscilação entre a timidez e o exagero, nunca poderia ser responsável por uma atitude de grande equilíbrio, como a que veio a ser seguida pelo País durante a Guerra do Golfo.
De forma igual, a solução socialista para a nossa afirmação internacional seria a base inevitável do insucesso português no aumento do nosso papel dentro das Comunidades.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Continuemos ainda por momentos nesta busca em que nos embrenhámos. Talvez as contribuições positivas do PS se encontrem algures, porventura acima destas preocupações sectoriais.
O Partido Socialista foi sempre pressionado por outros partidos democráticos para tomar medidas quanto à reforma do Estado e à inovação nas áreas da participação democrática. A verdade histórica manda dizer que as soluções socialistas não incluíram, senão depois de muita insistência do PSD e da opinião pública, qualquer alteração na relação de poder subsequente à revolução.
Só a insistência de outros partidos democráticos, da opinião pública ou de factos internacionais levaram o PS, com muitos anos de atraso, depois de perdas irrecuperáveis, à co-autoria de soluções que há muito se impunham.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Quem não sabe que as soluções socialistas bloquearam durante muitos
anos - anos demasiados - a resolução de querelas sobre o sistema económico? Só há pouco tempo, muito pouco tempo, reconheceram a justeza dos que clamavam por essas alterações.
Quem não sabe que as soluções socialistas sempre recusaram a diminuição do sector público na comunicação social? Preferiram mesmo fechar jornais para reestruturar, dentro do Estado, o sector.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Com muito tempo de atraso vieram a aderir ao princípio que há muito se impunha: o princípio da privatização.
Agora vêm dizer coisas novas: «Uma maioria socialista aprovará estatutos da RTP e da RDP que desgovernamentalizarão a sua gestão...». E dizem mais: «O PS compromete-se também a fazer aprovar um sistema de financiamento dos partidos políticos e dos actos eleitorais, que seja realista, transparente, rigoroso e fiscalizável por entidade independente...»
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Está bem! Sem mais apreciações - e muitas merecia - pergunto-lhes: mas foi a «difícil conjuntura» que os impediu de fazer quando eram poder?
Aplausos do PSD.
Como isto muito mais se poderia afirmar se tempo houvesse.Quem não sabe, como exemplo último, que as soluções socialistas não admitiam a adopção do instituto do referendo, como forma de alargar a participação dos cidadãos? Também neste contexto só tardiamente acabaram por se render à evidência.
O Partido Socialista, em questões determinantes, fez sempre da teimosia razão e da obstrução princípio.
O que podemos, seguramente, concluir é que o Partido Socialista nunca teve uma visão a prazo do País e se tem limitado a reagir a estímulos externos. O que podemos seguramente concluir é que, mesmo dando de barato que a conjuntura era difícil, o PS se encarregou - e só - de a complicar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece-me demonstrado o que tentamos provar. Falta ao PS um requisito essencial para poder falar do futuro: credibilidade.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A história é eloquente e resiste bem a discursos mais ou menos inflamados, mais ou menos retóricos.
Bem pode o PS falar de um futuro cheio de sol que não ficará na sombra a história que, desde a Governo, escreveu.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Portugal é hoje um país diferente. Mudou muito nestes últimos cinco anos.
Mesmo que nos limitássemos a estabelecer uma comparação entre aquilo que o Partido Socialista reconhece como resultado positivo da acção deste governo e aquilo que decorreu das experiências socialistas, este governo ficaria a ganhar. E, por isso, a ganhar ficou Portugal.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Os Portugueses estão hoje em condições de avaliar melhor quanto perderam com a instabilidade e as demoras, as teimosias e as hesitações, e quanto ganharam com a estabilidade e o rigor.
O Partido Socialista vai tendo cada vez mais dificuldade em negar que Portugal não está diferente e melhor. É até por isso que trouxe o futuro ao seu discurso. Cai, porém, no erro, como fez hoje, mais uma vez, de afirmar que tudo se deve à conjuntura, à facilidade que o tempo trouxe, que tudo se deve, como disseram, a este tempo de «vacas gordas». Como se enganam! Não para mal de Portugal e dos Portugueses. Como se enganam para o seu próprio mal!
Sr. Presidente, Srs. Deputados, e, muitos especialmente, Srs. Deputados do Partido Socialista: O Portugal que hoje somos e as expectativas que como país legitimamente podemos ter não são fruto de conjunturas. O Portugal que hoje somos e nos orgulha é fruto do esforço de um povo, das condições de confiança e estabilidade que soubemos criar. Porque a questão, Srs. Deputados do Partido Socialista, não é uma questão de vacas, gordas ou magras, é a expressão do trabalho, do rigor, da vontade e do risco e da coragem de ser capaz.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dou por encerrado o debate da interpelação ao Governo n.º 2 l/V (PS), sobre política geral.
Entrando no processo de votações, vamos, em primeiro lugar, proceder às votações finais globais.
Srs. Deputados, vamos votar o texto final elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à proposta de lei n.º 90/V (ARM) - Definição dos critérios de fixação da indemnização a atribuir aos senhorios pela remição da terra pelos colonos.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo, Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca e Valente Fernandes.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do texto final da Comissão de Economia, Finanças e Plano, relativo à proposta de lei n.º 157/V - Regula a organização e funcionamento do Conselho Económico e Social e ao projecto de lei n.º J60/V (PCP) - Conselho Económico e Social.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PRD e do CDS, votos contra do PS e do deputado independente Marques Júnior e abstenções do PCP e dos deputados independentes Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
Srs. Deputados, vamos passar à votação final global do texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à proposta de lei n.º 16l/V - Lei da Organização Judiciária de Macau.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do CDS e dos deputados independentes Helena Roseta e Marques Júnior e abstenções do PCP e dos deputados independentes Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
O Sr. José Magalhães (Indep.): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (Indep.): - Sr. Presidente, gostaria que ficasse registado no Diário que o texto da proposta de lei, que o Sr. Presidente referiu...
O Sr. Presidente: - Foi alvo de uma emenda, que foi distribuída a todos os grupos parlamentares.
O Orador: - E essa emenda diz respeito ao artigo 10.º, n.º 6.
O Sr. Presidente: - Foi distribuída e já está incluída no processo.
Entretanto, reassumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Maria Manuela Aguiar.
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação final global do texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à proposta de lei n.º 189/V - Lei de Bases de Protecção Civil.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do PRD, votos contra do PS, do PCP e dos
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(...) deputados independentes Helena Roseta, Jorge Lemos, José Magalhães, Marques Júnior e Raul Castro e a abstenção do CDS.
Vamos agora proceder à votação final global do texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à proposta de lei n.º 202/V - Cria os Tribunais Administrativos do Círculo de Ponta Delgada e do Funchal (Altera o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de Abril).
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo, Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca e Valente Fernandes.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global do texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à proposta de lei n.º 165/V - Alteração à Lei Eleitoral das Autarquias Locais.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do PRD, votos contra do PS, do PCP e dos deputados independentes Helena Roseta, Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro e a abstenção do CDS.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr.ª Presidente, uma vez que já fizemos muitas votações finais globais, e algumas importantes, e dado que vamos agora passar às votações na especialidade, penso que teria cabimento procedermos às declarações de voto em relação às votações já concluídas.
A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, não há consenso, e a Mesa entende que o não deve fazer até porque esses outros textos serão também objecto de votação final global.
Vamos, então, passar à votação, na especialidade, da proposta de lei n.º 19 l/V - Autoriza o Governo a legislar no sentido de alterar a Lei n.9 29/81, de 22 de Agosto (Lei de Defesa de Consumidor).
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, há uma outra proposta de lei que (em a ver com a alteração da Lei n.º 29/81, que é proveniente da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, relativamente à qual foi elaborado um parecer na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, tendo dele resultado a sugestão da apresentação de uma proposta de aditamento, que seguiu em anexo ao ofício que a referida Comissão enviou para a Mesa, com vista a que a proposta de lei de autorização legislativa do Governo incorporasse a pretensão veiculada pela Assembleia Legislativa Regional dos Açores, ficando assim prejudicada a proposta de lei daquela assembleia.
Assim, sugeria à Mesa que passasse à votação da proposta de lei seguinte, e que procurasse localizar a proposta de aditamento em causa.
A Sr.ª Presidente: - É o que se fará, Sr. Deputado.
Vamos, então, passar à votação da proposta de lei n.º 200/V - Autoriza o Governo a estabelecer o regime de indemnizações às vítimas de crimes.
Foram apresentadas, pelo PCP, duas propostas de substituição aos artigos 2.º e 3.º, que já foram distribuídas.
Para as apresentar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odeie Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP):-Sr.! Presidente, Srs. Deputados: Lamentavelmente, o PSD - e não sei se o CDS estava cá na altura da votação - rejeitou um projecto de lei que apresentámos sobre a protecção das vítimas de crimes. E fê-lo, para meu espanto, já que o próprio Ministro da Justiça admitiu que se pudesse aditar à proposta de autorização legislativa algumas das propostas constantes do projecto de lei do PCP.
E mais espantada fiquei porquanto muitas das propostas que tínhamos no nosso projecto de lei foram aprovadas por unanimidade por esta Assembleia, em relação ao projecto de lei sobre a protecção das mulheres vítimas de violência, que tinha disposições exactamente iguais às constantes deste - é capaz de ser uma discriminação contra o homem, uma actuação destas tão dissemelhante, por parte do PSD!
Mas, uma vez que foi rejeitado o nosso projecto de lei, entendemos propor, como substituição ao artigo 2.9, a remissão para os tribunais judiciais da decisão acerca da indemnização a pagar pelo Estado, a título definitivo ou provisório, porque entendemos que a competência não deve pertencer ao Ministro da Justiça e que é extraordinariamente perigoso que o Governo, através do seu ministro da Justiça, possa ler acesso aos amplos meios de informação que a proposta contém, em relação à vida privada do cidadão.
Portanto, o sentido da alteração que propomos ao artigo 2.º é que a indemnização seja decidida pelos tribunais judiciais.
A proposta de alteração ao artigo 3.º decorre da proposta de alteração anterior, uma vez que não faria sentido que se mantivesse a referência, no final do artigo 3.º, à comissão que o Governo engendrou para resolver sobre a questão das indemnizações, que devem pertencer ao foro judicial.
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, não há propostas de alteração ao artigo 1.º
O Sr. José Magalhães (Indep.): - Dá-me licença, Sr.ª Presidente?
A Sr.ª Presidente: - Para que fim, Sr. Deputado?
O Sr. José Magalhães (Indep.): - Para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.
Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (Indep.): - Sr.ª Presidente, gostaria de interpelar a Mesa para que se pudesse clarificar se, quer oriundas do Governo, quer da bancada do PSD, surgiram propostas de alteração neste domínio, porque, como acabou de ser sublinhado pela Sr.ª Deputada Odete
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Santos, durante o debate na generalidade, concluiu-se, por unanimidade, que o texto originário da proposta de lei não era adequado sequer para exprimir os pontos de vista que o Governo considera pertinentes neste domínio.
Portanto, Sr.ª Presidente, apelaria para que se criassem as condições, se é que é possível a esta hora e nestas circunstâncias, para que surgissem essas propostas, sob pena de alguma confusão normativa, que é indesejável, e propunha-me também usar da palavra brevemente sobre o fundo da questão na altura própria.
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa não dispõe de quaisquer outras propostas de alteração além das já referidas, ou seja, das propostas de substituição, apresentadas pelo PCP, relativas aos artigos 2.º e 3.º da proposta de lei.
Srs. Deputados, vamos, pois, proceder à votação do artigo l.º da proposta de lei n.º 200/V.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo, Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos, Marques Júnior e Valente Fernandes.
É o seguinte:
Artigo l.º Fica o Governo autorizado a criar um tipo legal de crime no quadro da legislação sobre a indemnização pelo Estado de vítimas de certos crimes violentos e a estabelecer a respectiva pena, que não excederá três anos de prisão ou multa, bem como a introduzir uma nova disposição no Código de Processo Penal para permitir a concessão de uma indemnização provisória ao lesado, quando o tribunal disponha de elementos bastantes.
Srs. Deputados, vamos proceder seguidamente à votação da proposta de substituição relativa ao artigo 2.º, apresentada pelo PCP.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do PRD, do CDS e dos deputados independentes Helena Roseta, Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
Era a seguinte:
Fica ainda o Governo autorizado a legislar sobre o adiantamento pelo Estado das indemnizações aos lesados, ainda que a título provisório, sendo a mesma decidida pelos tribunais judiciais, os quais disporão de poderes para requerer informações de processos penais ou em poder de quaisquer serviços públicos, incluindo a administração fiscal e instituições de crédito.
Passamos à votação da proposta de substituição relativa ao artigo 3.º, apresentada pelo PCP.
A Sr.ª Odeie Santos (PCP): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente, para, sob a forma de interpelação à Mesa, clarificar a referida proposta de substituição do artigo 3.º
A Sr.ª Presidente: - A Mesa tinha entendido que a Sr.ª Deputada já concluíra a apresentação da proposta.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Gostaria, no entanto, de voltar a clarificá-la, para evitar possíveis confusões.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr.ª Presidente, diria que, ao propormos a substituição da parte final do artigo 3.º da proposta de lei em apreço, tivemos em vista acabar com a comissão prevista no artigo 2.º A reparação estadual aqui referida é a reparação estadual supletiva a arbitrar pelos tribunais judiciais.
Sugeriria, assim, para clarificar, que a redacção da parte final da nossa proposta de substituição do artigo 3.º passasse a ser a seguinte: s... e, por outro, a dotar a ordem jurídica da reparação estadual supletiva das vítimas de crimes, a arbitrar pelos tribunais judiciais.»
A proposta do Governo relativa ao artigo 3.º, sem pés nem cabeça e repleta de confusões, foi já aqui suficientemente debatida aquando do debate na generalidade. Veremos, quando da execução da autorização legislativa, a que é que vai dar origem!...
O Sr. Manuel da Costa Andrade (PSD): - Peço a palavra, Sr.! Presidente, para, sob a forma de interpelação à Mesa, pedir um esclarecimento à Sr.ª Deputada Odeie Santos.
A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel da Costa Andrade (PSD): - Sr.ª Deputada Odete Santos, confesso que não percebi bem o alcance da sua intervenção.
No que toca à chamada indemnização supletiva, designação aqui adoptada por conveniência e economia de meios, à falta de melhor conceito, e por copyright do
Sr. Deputado Nogueira de Brito, pareceu-me ter a Sr.ª Deputada proposto que essa reparação estadual fosse da competência das autoridades judiciárias em processo penal, designadamente o tribunal.
Se o sentido da intervenção da Sr.ª Deputada era esse, o nosso voto será clara e objectivamente no sentido negativo, pois entendemos que não deve, pelo menos, ficar vincado em termos de autorização legislativa que a chamada reparação supletiva seja necessariamente judicial. Pelo contrário, entendo pessoalmente que essa indemnização não deve ser atribuída pelo tribunal, mas por uma instância à margem dos tribunais, sendo certo que, obviamente, quer a indemnização provisória, quer a indemnização definitiva, devem ser arbitradas pelo tribunal. A chamada indemnização supletiva, essa, não deve ser feita pelo tribunal. Se a intenção da proposta do Partido Comunista é dar esse sentido ao artigo 3.º, sentido esse que não resulta explícito da proposta de substituição, teremos, então, de votar contra ela.
Se, ao invés, não é esse o sentido da referida proposta de substituição, terei, então, de honestamente acentuar que, não obstante nada me opor à proposta, ela em nada melhora a proposta apresentada pelo Governo. Quando pela primeira vez li a proposta, demonstrei logo a minha disponibilidade para a aceitar, mas, confrontando-a agora com o texto do Governo, constato que ela não o altera significativamente nem o melhora: na parte em que é explícita, não o melhora; na parte em que traz implícita uma outra intenção, não podemos concordar com ela.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Vítor Crespo.
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O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado Manuel da Costa Andrade, a sugestão que fiz refere-se efectivamente à proposta relativa ao artigo anterior, que os Srs. Deputados «chumbaram».
Parece-nos, no entanto, que este sistema de reparação ficará melhor sintetizado na expressão «reparação estadual das vítimas de crimes». Não há qualquer outra intenção na proposta, que Ficará com essa redacção.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel da Costa Andrade.
O Sr. Manuel da Costa Andrade (PSD): - Sr.ª Deputada Odete Santos, volto a salientar que nada nos opõe à proposta de substituição apresentada pelo Partido Comunista, mas que ela nada adianta na pane em que altera a correspondente proposta do Governo, ao referir, a seguir à expressão «indemnização provisória», o seguinte: «quando, para o efeito, o tribunal disponha de elementos bastantes, e, por outro, a dotar a ordem jurídica da reparação estadual das vítimas de crimes». Não vale a pena afastarmo-nos da redacção constante da proposta de lei, porque, em rigor, a fórmula utilizada na proposta do PCP nada acrescenta. É que a expressão «reparação estadual das vítimas de crimes» abrange os três tipos de reparação aqui em causa, ou seja, a chamada reparação supletiva, a provisória e a definitiva. Qualquer um destes tipos de reparação pode ser «reparação estadual das vítimas de crimes».
Por estas razões, votaremos contra a proposta de substituição apresentada pelo Partido Comunista.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados e, em particular, Srs. Deputados Manuel da Costa Andrade e Guilherme Silva: Lamento o facto de não se chegar a um consenso para uma formulação inequívoca nesta matéria. Todavia, o Sr. Deputado Manuel da Costa Andrade adiantou já a ideia que, sintetizada, daria uma boa norma.
Aquilo que a proposta governamental não faz é distinguir inequivocamente, como o Sr. Deputado Manuel da Costa Andrade sublinhou, entre três realidades: a indemnização definitiva, a indemnização provisória - as quais só podem ser decididas jurisdicionalmente - e aquilo que o Sr. Deputado Nogueira de Brito qualificou como «indemnização supletiva», a qual pode ser objecto de outras metodologias que acautelem a independência, a fidedignidade e, como é evidente, os direitos dos cidadãos.
Francamente, não vejo por que razão é que isto não pode ser dito em bom e escorreito português e por que é que vamos aprovar um texto que não exprime, em português meridiano, aquilo com que todos estamos de acordo! Francamente não percebo e, na minha opinião, acho que valia a pena perder um minuto a redigir um texto assim!
O Sr. Manuel da Costa Andrade (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel da Costa Andrade (PSD): - Em relação à proposta de alteração do PCP, já elencámos as razões que nos levam a votar contra a mesma. Porém, fazê-mo-lo sem oposição de princípio, já que nos parece que tal proposta não melhora, na pane em que dela se afasta, o texto da proposta de lei.
Não dispomos da proposta para que aponta o Sr. Deputado José Magalhães. De qualquer modo, do nosso ponto de vista, e pelo menos no que valha como fonte hermenêutica para a interpretação e aplicação da autorização legislativa, concordamos inteiramente com o sentido que acaba de ser referido pelo Sr. Deputado José Magalhães.
Na realidade, penso que tudo o que está em causa aponta para esta distinção de uma tripla categoria de indemnizações, que o Governo, através da autorização legislativa, plasmará, em concreto, como bem entender.
De todo o modo, se for apresentada uma proposta de alteração, dispor-nos-emos a considerá-la. Porém, não o sendo, fica, da nossa parte, e pelo menos, este contributo, o qual, apesar de tudo, reputamos útil como contributo hermenêutico para a futura actualização, em termos de lei, na sequência da autorização legislativa.
Por conseguinte, pela nossa parte, e salvo se surgir uma proposta, será esta a última palavra.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, por aquilo que percebo, julgo que está em elaboração uma proposta de substituição do artigo 3.º, pelo que sugeria que votássemos desde já os artigos 2.º, 4.º e 5.º desta proposta de lei n.º 200/V.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Solicitamos a votação em separado, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos então votar o artigo 2.º da referida proposta de lei.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, votos contra do PCP e do deputado independente Raul Castro e abstenções do PS, do PRD, do CDS e dos deputados independentes Jorge Lemos, José Magalhães e Marques Júnior.
É o seguinte:
Art. 2.º Fica ainda o Governo autorizado a criar uma comissão, presidida por um magistrado judicial a indicar pelo Conselho Superior da Magistratura, com competência para proceder à instrução dos pedidos de indemnização pelo Estado e emitir o correspondente parecer, para decisão do Ministro da Justiça, a qual disporá de poderes para requerer informações e documentos constantes de processos penais ou em poder de quaisquer serviços públicos, incluindo a administração fiscal e instituições de crédito.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do artigo 4." da proposta de lei.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo, Helena Roseta, João Corregedor da Fonseca e Valente Fernandes.
É o seguinte:
Art. 4.º O diploma a aprovar no uso da autorização legislativa estabelecerá que, dentro dos limites da
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indemnização que prestar, o Estado fica sub-rogado nos direitos dos lesados contra as pessoas obrigadas a indemnizar e determinará as condições em que o Estado pode exigir da vítima o reembolso de indemnizações que lhe tenha pago.
Srs. Deputados, passamos agora à votação do artigo 5.º
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD e do CDS e abstenções do PCP e dos deputados independentes Jorge Lemos, José Magalhães, Marques Júnior e Raul Castro.
É o seguinte:
Art 5.º A presente autorização legislativa tem a duração de 120 dias.
Entretanto, aguardamos a ultimação da proposta de substituição do artigo 3.º
Pausa.
Sr. Deputado Manuel da Costa Andrade, uma vez que a referida proposta de substituição já está pronta, solicitava a V. Ex.ª que fizesse o favor de a ler.
O Sr. Manuel da Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, vou ler uma proposta de substituição relativamente à qual estabelecemos aqui um acordo, considerando o sentido que tem uma proposta de autorização legislativa como esta, definidora das balizas máximas de utilização e que, nesses limites, o Governo utilizará na medida em que entender por conveniente.
Assim, a proposta de substituição em apreço, que mantém o fundamental do artigo 3.º, diz o seguinte: «A autorização legislativa a que se referem os artigos anteriores visa garantir, por um lado, a seriedade da dedução do pedido de indemnização, através da punição de informações falsas ou inexactas dos requerentes, e a permitir que, no processo penal, sem prejuízo da indemnização definitiva, possa ser concedida pelo tribunal ao lesado que se constitua parte civil uma indemnização provisória, quando, para o efeito, se disponha de elementos bastantes, e, por outro lado, a dotar a ordem jurídica de mecanismos que permitam uma reparação estadual de emergência, com carácter supleavo, das vítimas de crimes de violência.»
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Odete Santos, esta proposta prejudica a do PCP?
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, a proposta do PCP mantém-se.
A proposta que ouvi ler não acaba com aquilo que de pior consideramos nesta proposta de lei - por isso votámos contra -, isto é, a questão da comissão presidida pelo Sr. Ministro da Justiça, o que, inclusivamente, quando se permite que peça certidões de processos em segredo de justiça, violará o segredo de justiça dos processos. Aliás, creio mesmo que a proposta contida no artigo 2.º é inconstitucional.
De qualquer modo, esta proposta de substituição apresentada pelos Srs. Deputados José Magalhães e Jorge Lemos, ao contrário do que acontecia com a nossa proposta relativa ao artigo 2.º e já rejeitada, não toca o fundo da questão.
Nestes termos, a nossa proposta não está prejudicada e deverá ser votada.
Quanto à proposta que acabou de ser enunciada pelo Sr. Deputado Manuel da Costa Andrade, iremos abster-nos.
O Sr. Presidente: - Assim sendo, procederemos à votação das propostas de substituição por ordem de entrada.
Em primeiro lugar, vamos votar a proposta de substituição do artigo 3." apresentada pelo PCP.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PSD, votos a favor do PCP e dos deputados independentes Jorge Lemos, José Magalhães, Marques Júnior e Raul Castro e abstenções do PS, do PRD e do CDS.
Era a seguinte:
Art. 3.º A autorização legislativa a que se referem os artigos anteriores visa garantir, por um lado, a seriedade da dedução do pedido de indemnização, através da punição de informações falsas ou inexactas dos requerentes, e a permitir que, no processo penal, possa ser concedida ao lesado que se constitua pane civil uma indemnização provisória, quando, para o efeito, o tribunal disponha de elementos bastantes, e, por outro, a dotar a ordem jurídica da reparação estadual supletiva das vítimas de crimes, a arbitrar pelos tribunais judiciais.
Srs. Deputados, vamos agora votar a proposta de substituição do artigo 3.º apresentada pelo PSD, pelo PS e pelos deputados independentes Jorge Lemos e José Magalhães.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do CDS e dos deputados independentes Jorge Lemos e José Magalhães e abstenções do PCP e dos deputados independentes Marques Júnior e Raul Castro.
É a seguinte:
Art. 3.º A autorização legislativa a que se referem os artigos anteriores visa garantir, por um lado, a seriedade da dedução do pedido de indemnização, através da punição de informações falsas ou inexactas dos requerentes, e a permitir que, no processo penal, sem prejuízo da indemnização definitiva, possa ser concedida pelo tribunal ao lesado que se constitua parte civil uma indemnização provisória, quando, para o efeito, se disponha de elementos bastantes, e, por outro lado, a dotar a ordem jurídica de mecanismos que permitam uma reparação estadual de emergência com carácter supletivo das vítimas de crimes de violência.
Srs. Deputados, assim sendo, fica prejudicado o artigo 3.º da proposta de lei. Estamos, portanto, em condições de passar à votação Final global da proposta de lei n.º 200/V.
Vamos votar, Srs. Deputados.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do CDS e dos deputados independentes Jorge Lemos e José Magalhães e abstenções do PCP e dos deputados independentes Marques Júnior e Raul Castro.
Srs. Deputados, estamos em condições de voltar à proposta de lei n.º 191/V - Autoriza o Governo a legislar
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no sentido de alterar a Lei n.º 29/81, de 22 de Agosto (Lei de Defesa do Consumidor). Não havendo propostas de alteração para o artigo 1.º, vamos votá-lo, Srs. Deputados.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD e do CDS e abstenções do PCP e dos deputados independentes Jorge Lemos, José Magalhães, Marques Júnior e Raul Castro.
É o seguinte:
Artigo 1.º É concedida autorização ao Governo para legislar no sentido de alterar a Lei n.9 29/81, de 22 de Agosto (Lei de Defesa do Consumidor), adequando-a ao ordenamento comunitário e ao novo enquadramento constitucional.
Srs. Deputados, quanto ao artigo 2.º há duas propostas de aditamento. Assim sendo, vamos votar o artigo 2.º constante da proposta de lei.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo, Helena Roseta, Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Raul Castro e Valente Fernandes.
É o seguinte:
Art. 2.º O sentido e a extensão fundamentais da legislação a elaborar ao abrigo da presente lei são:
a) Estabelecer uma definição de consumidor a partir do critério do destino «não profissional» dos bens e serviços adquiridos, possuídos ou utilizados;
b) Assegurar o dever dos profissionais de prestarem informação cabal aos consumidores, salvaguardando a posição contratual destes;
c) Reforçar as garantias ao dispor do consumidor face a práticas comerciais agressivas;
d) Desenvolver os direitos e prerrogativas das associações de consumidores, designadamente na defesa de interesses difusos;
e) Reforçar a protecção jurídica dos consumidores e facilitar o seu acesso à justiça através da criação de entidades não jurisdicionais de composição de conflitos;
f) Estabelecer um conjunto de garantias de serviços a prestar pós-venda, pelos fornecedores de bens de longa duração, por prazo não inferior a cinco anos;
g) Possibilitar a pronta intervenção da Administração nos casos de ofensa grave aos direitos dos consumidores, retirando do circuito comercial os bens ou prestações de serviços em causa.
Srs. Deputados, vamos votar as propostas de aditamento a este artigo 2.º, a primeira das quais consta do aditamento de uma alínea h), subscrita pelos Srs. Deputados Álvaro Dâmaso e Guilherme Silva.
Para apresentar a proposta, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Dâmaso.
O Sr. Álvaro Dâmaso (PSD): - Sr. Presidente, como ainda há pouco disse o Sr. Deputado Guilherme Silva, relativamente a esta proposta de aditamento, a Assembleia Regional dos Açores apresentou uma proposta que visa
alterar a lei que o Governo também pretende agora ver alterada através da autorização legislativa que aqui apresentou, no sentido de que seja permitido, na Região Autónoma dos Açores, o funcionamento das associações de defesa do consumidor com todos os seus poderes, designadamente poderes de representatividade.
O que sucede é que o número mínimo necessário de associados para esse efeito é demasiado elevado, atendendo à população da Região Autónoma dos Açores ou mesmo atendendo à população das duas Regiões Autónomas.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Aquilo que nós fizemos, aproveitando a autorização legislativa, foi a apresentação de uma proposta a introduzir nessa mesma autorização legislativa que permita ao Governo redefinir as condições de aplicação da lei nas Regiões Autónomas - e sublinho «Regiões Autónomas» porque a alargámos às duas Regiões. Daí, a circunstância de se ter retirado o quantitativo fixado na proposta da Região Autónoma dos Açores pois não seria razoável que se estendesse esse número também à Região Autónoma da Madeira. Daí, também, que tivéssemos ficado apenas pela expressão «por forma a reduzir o número necessário de associados».
Penso que com esta explicação os proponentes da outra proposta de aditamento para esta alínea K) terão compreendido a razão por que não se refere o número de 500 associados.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Como já referi, há também uma outra proposta de aditamento de uma alínea h) a este artigo 2.9, apresentada pelos Srs. Deputados Jorge Lemos e José Magalhães.
Para apresentar a proposta, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães. Peco-lhe que seja breve, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (Indep.): - Mais do que isso, Sr. Presidente, esta intervenção será verdadeiramente da dimensão de um relâmpago.
Não percebo por que é que o Sr. Deputado Álvaro Dâmaso, que está a aprovar uma autorização legislativa, não quer fixar um número. Porque o legislador não pode confessar, face ao n.º 2 do artigo 168.º da Constituição, que não sabe qual é o montante ou a directriz que vai fixar para o Governo. Isto é, a Assembleia da República não pode dizer ao Governo que reduz o número de associados necessários para que se seja associação representativa.
E uma autorização indelimitada, mais exactamente porque o Governo pode reduzir de 1500 para 1490, de 1 500 para 1489, de 1 500 para 1, ou seja, é de bitola absolutamente indelimitada. O que a Assembleia Legislativa Regional dos Açores sugeriu - e bem - foi que esse número fosse fixado em 500 cidadãos, o que é perfeitamente razoável, é concreto e cumpre a Constituição. Fazer uma autorização indelimitada, salvo melhor opinião, não me parece bem. Os Srs. Deputados, em consciência, decidirão.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
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A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero muito simplesmente dizer que vamos votar favoravelmente esta proposta de aditamento, apresentada pelo Sr. Deputado Álvaro Dâmaso, embora, tal como referimos no debate na generalidade, consideremos que toda a questão do número necessário de associados, para efeito de reconhecimento do direito de representatividade, deveria ser revisto no todo nacional, dado que o número que é exigido para as associações com representatividade nacional, para poderem usufruir de todos os direitos que estão previstos na lei, ou seja, 7500 associados, é um número muito exagerado. Portanto, pensamos que este princípio deveria ser reconhecido para todo o território nacional.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, então, votar a proposta de aditamento, subscrita pelos Srs. Deputados Álvaro Dâmaso e Guilherme Silva, de uma alínea h) ao artigo 2.º da proposta de lei n.º 191/V.
Submetida â votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do PCP, do PRD, do CDS e do deputado independente Raul Castro e abstenções dos deputados independentes Jorge Lemos e José Magalhães.
É a seguinte:
A) Redefinir as condições de aplicação da presente lei nas Regiões Autónomas, nomeadamente, por forma a reduzir o número necessário de associados para efeito de reconhecimento do direito de representatividade.
Assim sendo, a outra proposta de aditamento, apresentada pelo Srs. Deputados Jorge Lemos e José Magalhães, de uma alínea h) ao artigo 2.º da proposta de lei n.º 191/V fica prejudicada.
Vamos de seguida votar o artigo 3.9 da proposta de lei n.º 191/V.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo, Helena Roseta, Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Marques Júnior e Valente Fernandes.
É o seguinte:
Art. 3.º A autorização concedida pela presente lei tem a duração de 90 dias.
Srs. Deputados, vamos passar à votação final global da proposta de lei n.º 191/V.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do PCP, do PRD, do CDS e do deputado independente Raul Castro e abstenções dos deputados independentes Jorge Lemos e José Magalhães.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, o diploma que falta votar é de votação complexa e demorada. Conforme já tive hoje oportunidade de dizer em conferência de líderes, o meu grupo parlamentar realiza hoje o seu jantar de confraternização. Nesse sentido, solicitamos o adiamento desta votação para amanhã, visto que ela seria incompatível com a realização do nosso jantar.
O Sr. Presidente: - O que o Sr. Deputado acabou de referir é exacto e razoável. Portanto, procederemos a essa votação amanhã.
Entretanto, para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Ávila.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Sr. Presidente, como é do conhecimento desta Câmara e de V. Ex.ª, em 31 de Maio do ano transacto foi aprovada a segunda proposta de revisão do Estatuto dos Açores.
Como também é do conhecimento de V. Ex.ª, no dia 15 deste más fez um ano que foi inaugurada solenemente a sede da Assembleia Legislativa Regional dos Açores. Na altura, V. Ex.ª proferiu um discurso em que, a dado passo, dizia que era com mágoa que não levava consigo, já aprovada, essa proposta de revisão do Estatuto dos Açores. Mas dizia mais, Sr. Presidente. Dizia que, no entanto, tinha como dado adquirido que, até ao fim dessa sessão legislativa - a anterior a esta, Sr. Presidente -, tal aprovação seria conseguida.
Ora, porque a presente sessão legislativa está prestes a acabar - e até a própria legislatura -, a minha interpelação é no sentido de perguntar a V. Ex.ª se tem algum conhecimento de que, pelo menos por parte do Grupo Parlamentar do PSD, haja alguma iniciativa de que essa proposta de lei, que «jaz», há bastante tempo, na comissão respectiva, possa ainda vir a ser objecto de alguma votação.
É que, no último domingo, tivemos uma conversa com o Sr. Ministro da República para os Açores acerca desta matéria.
Ora, posso adiantar à Câmara que um dos assuntos que o traz preocupado - esta é uma matéria muito séria, Srs. Deputados - é a hipótese de que se, por qualquer motivo, a Assembleia Legislativa Regional dos Açores tiver de ser dissolvida, não haver mecanismos legais que prevejam a convocação de eleições antecipadas.
Assim, peço a V. Ex.ª, encarecidamente, que utilize os seus bons ofícios no sentido de que, ainda durante a presente legislatura, a comissão respectiva possa votar este assunto.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, efectivamente, confirmo que afirmei a minha mágoa por não ler levado essa proposta já aprovada. No entanto, não fui concreto ao ponto de dizer que considerava a respectiva aprovação como um dado adquirido, antes fui mais prudente, tendo afirmado que tinha a esperança de que tal pudesse ser feito.
Aliás, verifico que o Sr. Deputado Guilherme Silva acaba de pedir a palavra para também se pronunciar sobre esta matéria.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, é só para dizer que todos nós lamentamos que, durante a presente legislatura, não tenha sido possível aprovar muita da legislação que gostaríamos, designadamente em sede da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, a qual, como se sabe, tem grande acumulação de trabalho.
No entanto, quero dizer ao Sr. Deputado Rui Ávila que não tenho presente que o seu próprio grupo parlamentar tenha tomado qualquer iniciativa, pelo menos recente, em sede daquela comissão, no sentido de privilegiar o agen-
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damento dessa matéria, o que, naturalmente, teria sido tomado em devida nota na programação dos trabalhos da Comissão.
O Estatuto dos Açores é um diploma de extrema importância e muito sério. Com pena nossa, a sua análise e apreciação na especialidade não se compadecerá com um agendamento um tanto apressado de trabalhos cujo termo está previsto para amanhã.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr, Deputado Mário Maciel.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, é para prestar um esclarecimento à Câmara, sob a forma de interpelação à Mesa.
É que o Sr. Deputado Rui Ávila deixou no ar a questão da hipótese de uma eventual dissolução da Assembleia Legislativa Regional dos Açores e a da inexistência de mecanismos constitucionais que possam acudir a essa situação.
Gostaria de informar a Câmara que, em sede de revisão constitucional, formulei uma proposta para que esta matéria ficasse resolvida, a qual foi rejeitada pelo Partido Socialista.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não vamos continuar esta discussão durante muito mais tempo. Assim, apenas darei a palavra aos Srs. Deputados Rui Ávila e Alberto Martins, que já se encontram inscritos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Ávila.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Sr. Presidente, não quis criar nenhum facto político, antes pelo contrário, mas tenho de prestar dois esclarecimentos.
O primeiro ao Sr. Deputado Guilherme Silva, que sabe perfeitamente que, quer o Sr. Deputado Mário Maciel, quer eu próprio, nos dirigimos à Comissão a propósito desta matéria. Sabe, também, que, primeiro pela intervenção do Sr. Deputado Mário Maciel, em Novembro, e, mais tarde, em Janeiro deste ano, o agendamento ficou acordado entre todos os grupos parlamentares presentes naquela comissão. Sc, depois, o Sr. Presidente não agendou a respectiva apreciação, isso já nada tem a ver comigo nem com o meu grupo parlamentar.
A segunda questão, dirigida ao Sr. Deputado Mário Maciel, é a seguinte: o Partido Socialista, em sede da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, apresentou a sua própria proposta de revisão do Estatuto dos Açores, não tendo sido apoiada pelo Grupo Parlamentar do PSD, na altura ainda maioritário nessa Câmara.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão inscritos, para interpelar a Mesa, os Srs. Deputados Alberto Martins e António Oliveira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, uso da palavra simplesmente para dar nota ao Sr. Deputado Guilherme Silva, como presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que o Grupo Parlamentar do PS está disponível para uma sessão de trabalho, amanhã de manhã, no sentido de ultimar o Estatuto dos Açores. E isso é possível!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado António Oliveira.
O Sr. António Oliveira (PS): - Sr. Presidente, vejo-me forçado a fazer nova interpelação dado que a natureza do requerimento apresentado há dois dias determinava que o mesmo fosse votado imediatamente.
V. Ex.ª disse, no início do processo de votações, quando eu fiz sinal à Mesa, que não seria necessário fazer a interpelação à Mesa e como tal não me deu a palavra, portanto, pelos gestos e pela sua resposta ficámos entendidos. Só que, tanto quanto entendi, seria entre as votações na generalidade e as na especialidade que teria lugar a votação desse requerimento.
Porém, nessa altura, não era V. Ex.ª que estava a presidir aos trabalhos, razão pela qual não quis levantar a questão. Entretanto, verifico que estamos em risco de V. Ex.ª dar esta sessão por encerrada sem que, mais uma vez, o requerimento seja votado.
Nestas condições, requeira oralmente, se possível, que o requerimento seja votado de imediato.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, efectivamente coloquei a alternativa - e confirmo - de o requerimento ser votado amanhã ou durante as votações de hoje.
Simplesmente, como sabe, a organização destes problemas não têm sido fáceis, razão pela qual - tal como o Sr. Deputado também afirmou - não fizemos a votação do requerimento na sessão de hoje. Assim, julgo que o mais sensato, dadas as condições, será votá-lo logo no início da sessão de amanhã, como primeiro ponto.
Entretanto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, o problema, que é um problema técnico de funcionamento do Parlamento, consiste em que amanhã é o último dia de sessão desta sessão legislativa.
Ora, como o requerimento diz respeito a uma votação na generalidade, que ficou por fazer, se esse requerimento apenas vier a ser apreciado amanhã, isso poderá significar que, apesar de ele poder vir a ser votado favoravelmente, se esgote a utilidade dessa votação pela simples razão de já não ser possível convocar a comissão que, na especialidade, deveria apreciar o projecto de lei que está subjacente ao pedido de votação desse requerimento.
Sendo este o problema técnico, estando o requerimento pendente ao tempo que está, já que o que está em causa é criar ou não, ainda nesta legislatura, o museu ferroviário do Entroncamento, a nossa insistência é no sentido de que o requerimento possa ser apreciado agora e, caso seja votado favoravelmente, a Comissão possa amanhã retirar daí as devidas consequências. Caso contrário, se a votação só tiver lugar amanhã, corre-se o risco de tomar inútil o acto praticado no Plenário.
O Sr. Presidente: - Não deixo de reconhecer alguma validade ao argumento do Sr. Deputado Jorge Lacão, simplesmente também apelo para a sua compreensão.
Como sabe, amanhã a sessão terá lugar de manhã e de tarde, e será dedicada à apreciação das Contas Gerais do Estado, ao projecto de lei sobre a amnistia, que pode ser relativamente complexo, e ainda um longo período de votações.
Se, tal como sugeri, votássemos o requerimento logo no início dos trabalhos, o tempo «técnico» seria tanto como o de hoje para resolver o problema.
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Acontece também que, com toda a franqueza, não vejo que entre agora e amanhã de manhã seja possível dar qualquer seguimento a esta matéria.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, reconheço que os argumentos de V. Ex.ª também têm razão de ser. Nesse sentido, contarei com a boa diligência da Mesa para, amanhã, caso o requerimento venha a ser aprovado, se poder ainda proceder às votações subsequentes.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se o requerimento for aprovado, inscreveremos, na sequência das votações, a matéria relativa a este assunto.
Para formular declarações de voto, estão inscritos os Srs. Deputados Manuel dos Santos, Ilda Figueiredo, Carneiro dos Santos, José Magalhães e Júlio Henriques.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, desejo que Tique registado em acta que, em nome do Partido Socialista, entregarei na Mesa uma declaração de voto a propósito da votação que fizemos relativa ao Conselho Económico e Social.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, também entregarei na Mesa uma declaração de voto sobre a posição do Partido Comunista relativamente à alteração à Lei Eleitoral das Autarquias Locais.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carneiro dos Santos.
O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Sr. Presidente, também entregarei na Mesa uma declaração de voto sobre a Lei de Bases da Protecção Civil.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (Indep.): - Sr. Presidente, sei que darei uma satisfação enorme a V. Ex.ª anunciando que também entregarei na Mesa o texto da declaração de voto sobre a Lei de Bases da Organização Judiciária de Macau.
Lamento que não estejam reunidas condições para o fazer oralmente pois leria muito gosto em fazer os fundamentos da votação de alguns dos partidos que se pronunciaram sobre esta lei, que é fundamental para o futuro de Macau.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Henriques.
O Sr. Júlio Henriques (PS): - Sr. Presidente, dado o particular melindre da matéria da votação que fizemos relativamente à proposta de lei n.º 165/V - Alteração à Lei Eleitoral das Autarquias Locais, e porque tinha uma pane da nossa declaração de voto anotada em meros apontamentos, se V. Ex.ª me permitir, eu completá-la-ia e, amanhã, faria entrega dela na Mesa, por escrito.
O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Aliás, é perfeitamente regimental.
rs. Deputados, voltaremos a reunir amanhã, quinta--feira, às 10 horas.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 20 minutos.
Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação
Votámos contra a Lei de Bases de Protecção Civil porquanto:
1 - O Governo exagerou nas medidas de carácter excepcional, designadamente na que determina a mobilização civil indiscriminada de indivíduos em caso de calamidade, a qual, colidindo com o regime estabelecido no estado de sítio e de emergência, é de duvidosa constitucionalidade.
2 - O PSD recusou incluir na secção II, «Competência do Governo», a obrigatoriedade de o Primeiro-Ministro informar o Presidente da República especificamente sobre a política de protecção civil.
3 - O PSD recusou a entrada da Associação Nacional de Municípios na Comissão Nacional de Protecção Civil, o que não se compreende, já que cabe aos municípios a coordenação loca! dos grandes objectivos de protecção civil.
O Deputado do PS, Carneiro dos Santos.
O Partido Socialista, tendo apresentado à Assembleia da República um projecto de lei sobre «alterações à Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais», que veio a receber o n.º 611/V, ali preconiza o que considera serem três objectivos fundamentais para o poder local democrático: possibilitar a apresentação de candidaturas aos órgãos do município por grupos de cidadãos independentes; aperfeiçoar alguns mecanismos da lei eleitoral para os órgãos das autarquias locais, regulando, designadamente, a eleição da junta de freguesia; regulamentar em moldes que ofereçam «verdade» o regime do financiamento e controlo dos gastos eleitorais.
Em sede de comissão, deu o PS, empenhadamente, sérios contributos ao debate, sem lograr vencimento quanto ao essencial, face à maioria PSD, que, reconhecendo por certo o mérito das nossas propostas, actuou, como de costume, de forma «obediente» e vencedora das teses do Governo. É assim que, por exemplo, não abdica o PSD da sua fórmula de cálculo quanto ao número de cidadãos proponentes de candidaturas. E o limite máximo (agora 7500) inviabiliza, na prática, o que diz ser um objectivo importante de «participação efectiva dos cidadãos» na vida política local. Só por ironia...
Insistem o Governo e o PSD na limitação a três do número de mandatos consecutivos dos presidentes das câmaras (facto em si de duvidosa constitucionalidade) limitador da liberdade de escolha pelos cidadãos eleitores e cerceador do direito de «eleger e ser eleito».
Não dão, o Governo e o PSD, acolhimento às nossas propostas visando a «transparência» em matéria de financiamento e controlo dos gastos eleitorais.
Por tudo isto, o Partido Socialista votou contra a proposta de lei n.º 165/V. Coerentemente, só podia ser este o sentido do seu voto.
Fica bem claro, pois, que o Partido Socialista se pronuncia a favor das candidaturas de cidadãos independentes a todos os órgãos das autarquias locais, de uma forma aberta, não limitadora, e antes simplificadora do processo.
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Ao contrário, manifesta a sua oposição à limitação administrativa do número de mandatos dos presidentes das câmaras municipais.
O Deputado do PS, Júlio Henriques.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao votar contra a proposta relativa ao Conselho Económico e Social, o Partido Socialista mais não fez que continuar a sua defesa permanente do diálogo e da concertação social.
Foi o PS que propôs a criação do Conselho Económico e Social no quadro da revisão constitucional.
O Conselho Económico e Social deveria ter condições de estabilidade, de credibilidade, de organização e funcionamento, que permitissem um efectivo diálogo social. Tal não vai acontecer, por culpa exclusiva do Governo e do PSD, que recusaram o diálogo com os outros partidos, na procura de um consenso alargado. O PS mostrou a sua disponibilidade, mas a arrogância e a incapacidade do Governo tal não permitiram.
E o resultado está à vista. Cria-se um conselho que na sua génese tem a experiência do Conselho Nacional do Plano, por todos reconhecido como falhado. A visão do Governo e em particular do Ministro do Plano é a de um organismo que, de uma maneira cómoda, permita uma audição alargada sobre os planos nacional e sectorial. É essa uma visão totalmente contrária à da criação de um órgão cujos membros dialoguem entre si e possam acordar um parecer de qualidade, com efectivos contributos para a melhoria das políticas económicas e sociais.
Não é isso que o Governo quer. Por isso procura um conselho governamentalizado, em que, de um total de 51 membros designados, o Governo e o PSD designam directamente um mínimo de 17, ou seja, provavelmente mais de um terço.
Do mesmo modo, o Governo e o PSD continuam o seu ataque ao poder local, marginalizando à partida as regiões e o órgão autárquico mais representativo, a Associação Nacional dos Municípios Portugueses.
Acresce ainda que o Governo e o PSD limitam exageradamente a representação das confederações sindicais e patronais diminuindo, assim, as próprias confederações. Com efeito, em todos os conselhos existentes nos países europeus e na própria Comunidade, a sua representação varia entre 50 % e dois terços. Em Portugal será, no máximo, de 28 %, inferior, portanto, a um terço.
O PSD rejeitou ainda a inclusão de representantes dos interesses diversos, nomeadamente da juventude, apenas aceitando o nosso contributo quanto à inclusão de um representante das associações de jovens empresários.
Na área da concertação social o PSD, por instruções escritas do Ministro do Plano, aprovou uma proposta que violava o compromisso do Primeiro-Ministro e o tão apregoado Conselho Económico e Social, rejeitando ao mesmo tempo propostas do PS e do PCP que o respeitavam.
Por exigência dos parceiros sociais o Governo e o PSD sentiram-se obrigados a respeitar o que assinaram, forçando uma nova votação na Comissão de Economia.
Também aqui mostraram que não querem a concertação social e que da mesma apenas lhes interessa um aproveitamento eleitoral.
Os Deputados do PS: Manuel dos Santos - Hélder Filipe - Carneiro dos Santos -João Proença - José Apolinário.
Votámos contra o pacote de alterações à Lei Eleitoral das Autarquias Locais porque, apesar de terem ficado pelo caminho algumas pretensões de alteração do sistema de eleição dos órgãos autárquicos, designadamente a pretensão do PS quanto ao sistema de eleição dos vogais das juntas de freguesia, o PSD insistiu em aprovar alterações inconstitucionais como é o caso da inelegibilidade do presidente da câmara para um quarto mandato.
Por outro lado, quanto à consagração da possibilidade de os cidadãos eleitores apresentarem listas às eleições dos órgãos municipais (câmara e assembleia municipal), embora o PCP sempre tenha defendido e proposto tal solução, ao contrário do PSD e também do PS, que votaram contra a sua consagração constitucional na 2.ª revisão constitucional, consideramos que esta proposta agora é de duvidosa constitucionalidade.
De facto, a Constituição refere e tipifica as candidaturas ao não admitir explicitamente que grupos de cidadãos independentes se apresentem às eleições municipais. Daí que na especialidade tivéssemos optado na votação dessa norma pela abstenção.
No entanto, não podemos deixar de assinalar que o PSD dificulta a possibilidade de os cidadãos eleitores apresentarem listas às eleições dos órgãos autárquicos, chegando a prever que seja necessário mais subscritores (até 7500) do que a criação de um partido político (5000). Daí o nosso voto contra.
A Deputada do PCP, Ilda Figueiredo.
1 - O texto final da Lei da Organização Judiciária de Macau tem o supremo mérito de ser... final. No termo de mais um ano de gestação a lei rompeu caminho através das instituições, sinuosamente, sem transparência nem fundamento visível quanto a muitas soluções.
Não a ver aprovada no termo da Legislatura seria adiar por mais tempo o que já fora por de mais adiado, com graves consequências. Aprová-la com a redacção resultante dos últimos esforços representava viabilizar um trabalho de desenvolvimento e regulamentação local, no qual será possível mitigar alguns dos defeitos da lei consagrada.
Optei decididamente por esta solução após ter contribuído em Abril de 1991 para o adiamento da votação respectiva.
2 - Congratulo-me com o facto de a reponderação propiciada ter permitido superar alguns aspectos francamente deficientes ou mesmo abertamente erróneos.
Lamento que tenham subsistido soluções absurdas ou quase inexplicavelmente inadequadas.
3 - O texto.
a) Não incorpora desertificações principológicas propostas de muitos quadrantes. Mas a verdade é que elas decorrem da Constituição. O legislador local pode reproduzi-las, se entender, dando cumprimento a um duplo escalão ou paradigma: o constitucional e o fixado pela lei de bases.
b) Optou-se por não fazer remissões para leis da República, vasando-se os conteúdos materiais respectivos - aspecto útil e positivo pelo qual batalhámos.
c) Foram supridas lacunas quanto à fiscalização das contas, vazando-se os normativos, hoje constantes do Estatuto Orgânico (cuja caducidade era prevista pelo artigo 48.º do EOM).
d) Fixou-se prazo para recurso das decisões do Governador e secretários-adjuntos (artigo 17.º).
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e) Mantiveram-se as competências do pleno das secções do STA nas matérias não previstas nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 15.º
f) Foi consagrado o recurso de amparo, o que é positivo, apesar de se saber que há que encontrar uma boa tradução em chinês de tal figura (o que por alguns é julgado impossível).
g) Não foram acolhidas pertinentes sugestões locais quanto: à composição dos conselhos responsáveis pela gestão das magistraturas; às remunerações dos magistrados (domínio em que a solução adoptada prima por aberrações); ao regime das comissões de serviço de magistrados em exercício; às disposições subsidiárias; às nomenclaturas de certos cargos (v. g. PGA).
h) Foi aprovado um regime de concentração de competências no TSJM que, se necessário, permite que esta ocorra de forma gradual faseada.
i) Deu-se ao CJM competência disciplinar em relação a todos os magistrados de 1.ª instância.
f) Clarificou-se que o Governador só tem competência para emitir as adaptações processuais estritamente necessárias (salvaguardando as competências da Assembleia Legislativa de Macau).
l) Politizou-se excessivamente a composição dos Conselhos da Magistratura, o que é grave, uma vez que tal opção é combinada com a nomeação de magistrados pelo Governador.
m) Previu-se, erroneamente, que as duas magistraturas elejam um só representante no CM (o que confere supremacia à que conjunturalmente for numericamente mais significativa).
n) Insistiu-se em soluções esdrúxulas: a sessão solene anual (4.º/2), a alusão a um dificilmente imaginável contencioso aduaneiro (5.º/l), um Tribunal de Contas para o qual tinha sido concebida uma alternativa consistente, adaptada e susceptível de perdurar, um número de juizes do TSJM excessivo, a estranha figura dos sauditores» (que a legislação de desenvolvimento terá o pesado encargo de materializar), etc.
o) Não se aproveitou para aprovar disposições cuja relevância seria significativa num contexto em que a lei básica do território está em adiantado estado de elaboração.
4 - O texto final, nestas condições, não propicia um quadro ideal para uma prática capaz de sobreviver a 1999, mas faculta parâmetros úteis à localização desejada, desde que o desenvolvimento da lei seja mais adaptado ao território do que a lei de bases agora aprovada.
É um difícil desafio que cabe agora aos órgãos locais.
Faço votos de que cumpram melhor do que se logrou no esforço agora concluso.
O Deputado Independente, José Magalhães. Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Álvaro José Martins Viegas.
António Augusto Lacerda de Queirós.
António Costa de A. Sousa Lara.
António José Caeiro da Mota Veiga.
António Maria Ourique Mendes.
António Maria Pereira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Armando Lopes Correia Costa.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Antunes Gomes.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Francisco Mendes Costa.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maçãs.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugénio Ribeiro de Almeida.
Luís Amadeu Barradas do Amaral.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Meneses Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel Albino Casimira de Almeida.
Manuel José Dias Soares Costa.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria João Godinho Antunes.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Leonor Beleza M. Tavares.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rosa Maria Tomé e Costa.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Alberto Manuel Avelino.
António José Sanches Esteves.
António Miguel de Morais Barreto.
Armando António Martins Vara.
Carlos Cardoso Laje.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Luís Costa Catarino.
Jorge Paulo Sacadura Coelho.
José Apolinário Nunes Portada.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Oliveira Carneiro dos Santos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
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3278 I SÉRIE-NÚMERO 95
Laurentino José Castro Dias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Pedro Lopes Machado Ávila.
Partido Comunista Português (PCP):
Ana Paula da Silva Coelho.
João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Mana de Lourdes Hespanhol.
Maria Odete Santos.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Natália de Oliveira Correia.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
Basílio Adolfo de M. Horta da Franca.
Deputados independentes:
António Alves Marques Júnior.
Manuel Gonçalves Valente Fernandes.
Raul Fernandes de Morais e Castro.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Flausino José Pereira da Silva.
Joaquim Fernandes Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
Licínio Moreira da Silva. Walter Lopes Teixeira.
Partido Socialista (PS):
António Domingues de Azevedo.
António Poppe Lopes Cardoso.
artido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Domingos Abrantes Ferreira.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Deputado independente:
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Os REDACTORES: Isabel Barral - Maria Amélia Martins - Maria Leonor Ferreira - José Diogo - Cacilda Nordeste - Ana Marques da Cruz.
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