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22 DE MAIO DE 1992 2115

A outra é a tese que postula uma ligação entre a greve e a autonomia colectiva. Assim, o exercício do direito à greve viria a circunscrever-se aos interesses a defender pelo sindicato.
A verdade é que em ambos os casos se aceita que a conexão funcional entre o direito de greve e os interesses sócio-profissionais dos trabalhadores se verifica, quer quando estão em causa as condições de trabalho a praticar nas relações de trabalho que lhes dizem respeito, quer quando se trate de outros interesses dos trabalhadores.
Este alargamento do âmbito do entendimento dos interesses sócio-profissionais articula-se, alias, com a concepção hoje maioritariamente aceite de que as funções sindicais não se confinam a inaniria estritamente profissional.
É assim que mesmo a tese aparentemente mais estrita de Bernardo Xavier vem aceitar a licitude, por exemplo, de greves políticas e de solidariedade - claramente alheias à disponibilidade do empregador.
Ora, não se retira do preceito do n.º 1 do artigo 1.º do projecto uma conclusão avessa a esta doutrina. Convém sublinhar a diferença entre a expressão por ele utilizada: «promover ou defender interesses sócio-profissionais» e a do velho Decreto-Lei n.º 392/74.
Assim, não parece sustentável que uma correcta interpretação da disposição em causa restrinja o sentido constitucional da amplitude dos motivos de greve.
3 - A greve na função pública - O artigo 3.º do projecto remete para legislação especial «o exercício do direito à greve dos trabalhadores da função pública».
É, aliás, o que sucede com o artigo 12.º da Lei da Greve em vigor.
A diferença entre os dois preceitos reside no facto de o actual artigo 12.º enfatizar, em número autónomo, a garantia do direito à greve na função pública.
Tem sido considerações de oportunidade política e a concretização do princípio da igualdade aplicado aos trabalhadores que levam a admitir, em muitos ordenamentos jurídicos, a greve na função pública.
Esta permissão, a que Portugal adere na lei vigente em homenagem as razoes apontadas (e entre as quais se sublinha o princípio constitucional da igualdade) não é posta em causa pelo artigo 3.º do projecto, embora fosse de ponderar uma sua melhor precisão.
A especificidade da Administração Pública dita, ela própria, as características da regulamentação da greve em questão, o que justifica a dualidade de tratamentos legais.
4 - Greve de empresa (artigo 5.º) - Contrariamente à lei em vigor, o projecto vem considerar necessária a deliberação de greve pela assembleia de trabalhadores, sempre que o respectivo âmbito se defina por referência a uma única empresa (n.º 1 do artigo).
Este preceito vinca o carácter individual do direito à greve, cujo recorte jurídico é, no direito português, de grande subtileza.
Na verdade, a greve apresenta hoje, na lei, níveis colectivos e níveis individuais.
O direito de declarar greve identifica-se com uma permissão genérica de o fazer, a que subjaz a liberdade de associação e de expressão.
O direito de fazer greve é já um direito potestativo de adesão à declaração de greve.
O caminho de uma maior autonomia pessoal face aos sindicatos não infringe o texto constitucional.
Não pode extrair-se da Constituição um monopólio sindical de declaração da greve, como sucede relativamente à contratação colectiva (artigo 56.º, n.º 3).
5 - Pré-aviso (artigo 6.º) - A Lei da Greve institui a figura do pré-aviso (artigo 5.º), cujo prazo mínimo é de quarenta e oito horas e atinge em certos casos os cinco dias.
Se é certo que este requisito do pré-aviso não é universalmente consagrado e representa tendência contrária à de várias outras ordens jurídicas, não o é menos não representar ele num coarctar do exercício do direito de greve.
A diferença essencial entre a lei em vigor e o projecto, nesta maioria, reside no alargamento dos prazos do pré-aviso. Discutível no plano doutrinário, não é sustentável uma limitação ao exercício do direito a greve por esta via.
é - Negociações prévias (artigo 8.º) - Alarga o projecto o prazo do pré-aviso para oito dias, sempre que a deliberação do recurso à greve se insira em processo tendente à defesa ou promoção dos interesses colectivos profissionais dos trabalhadores envolvidos. Este alargamento do prazo não vulnerabiliza o exercício do direito à greve.
Nem, obviamente, se reconduz a um qualquer dever de paz social. Parece estar-lhe subjacente uma ideia de boa fé negocial, que - pese a discutibilidade da solução - assim se pretendeu juridificar.
7 - Serviços mínimos (artigo 10.º) - A delimitação dos serviços mínimos tem em conta a «satisfação de necessidades sociais básicas» e é exemplificativa a enumeração das empresas que se entendem prestadoras dos mesmos.
A normalização dos «serviços mínimos» não é isenta de escolhos. Terá sido Pera, em Lo sciopero nei pubblid servizi (Riv. Dir. Lav., 1978, h. 241) quem melhor os recortou: «Serviços utilizáveis pela generalidade das pessoas f...l cuja funcionalidade é inerente à salvaguarda de bens primários destinados a prevalecer sobre a autotutela de categoria.»
O objectivo essencial nestes casos é evitar que a satisfação de necessidades sociais impreteríveis sofra perigo e assim se possa afectar interesses básicos da comunidade.
Independentemente da bondade da solução técnico-jurídica encontrada, parece ser esta filosofia que preside à redacção dos artigos 10.º e 11.º do projecto.
8 - Piquetes de greve (artigo 12.º) - Restringe-se a liberdade de circulação dos piquetes de greve às áreas exteriores à empresa.
O problema de saber qual o âmbito geográfico de actuação dos piquetes de greve está longe de ser pacífico, designadamente na doutrina portuguesa.
Vêm-se afirmando como limites constitucionais à sua actuação os casos em que contendam com a liberdade de trabalhar dos trabalhadores que não aderiram à greve (situação que o artigo 12.º assegura). E discute-se a possibilidade da sua actuação dentro da própria empresa.
A falta de legislação adequada tem dificultado a dogmatização do tema.