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Sexta-feira, 8 de Janeiro de 1993 I Série - Número 26
DIÁRIO da Assembleia da Republica
VI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1992-1993)
REUNIAO PLENÁRIA DE 7 DE JANEIRO DE 1993
Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
Belarmino Henriques Correia
Alberto Monteiro de Araújo
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a tacão às 15 horas e 30 minuto:.
Deu-te conta da entrada na Maga da proposta de lei n.º 42/VI e da ratificação n.º 56/VI.
Foi rejeitado, na generalidade, o projecto de lei n.º 8/VI- Reduz a duração semanal de trabalho normal (PCP). Intervieram, a diverso título, os Srs. Depurados Jerónimo de Sousa (PCP). José Puig (PSD). João Proença (PS) António Lobo Xavier (CDS), Odete Santos (PCP), João Corregedor da Fonseca (Indep.) André Martins
(Os Verdes), Artur Penedos e Laurentino Dias (PS), Octávio Teixeira (PCP), Manuel Sérgio (PSM) e Mário Tomé (Indep.)
Entretanto, foi aprovado um pascer da Condado de Regimento e Mandatos sobre substituição de um Deputado de PS.
A Câmara rejeitou ainda o voto n.º 49/VI - De saudação aos autarcas portugueses (PS) e aprovou as votos n.º 50/VI - De pesar pela morte de Francisco Ferreira (PSD) e 51/VI - De protesto pela violência verificada em recintos desportivos (PCP).
0 Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 5 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Abílio Sousa e Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Ana Paula Matos Barros.
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Fernandes Alves.
António Maria Pereira.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Elói Franklin Fernandes Ribeiro.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
15ilda Maria Renda Periquito Pires Martins.
Jaime Gomes Milhomens.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Eduardo Dias Madeira Gouveia.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João Manuel dos Santos Henriques.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Manuel Pereira de Almeida e Silva.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Borregana Meireles.
José Mário de Lemos Damião.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Costa.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Pedro António de Bettencourt Gomes.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp. Rui
Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Manuel da Igreja Raposo.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Maninho.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Martins Seguro.
António Luís Santos da Costa.
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António Ribeiro Marques da Silva.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Edite de Fátima Santos Matreiros Estrela.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Helena de Melo Torres Marques.
João António Gomes Proença.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José António Martins Goulart.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota. José Eduardo Reis.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Maria Teresa Dia Santa Clara Gomes.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Apolónia Maria Alberto Pereira Teixeira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
José Fernando Araújo Calçada.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Carlos Marins Peixoto.
Maria Odete dos Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
João Paulo de Castro Morais Gomes.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
André Valente Martins.
15abel Maria de Almeida e Castro.
Partido da Solidariedade Nacional (PSN):
Manuel Sérgio Vieira e Cunha.
Deputado independente:
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, a proposta de lei n.º 42/VI - Autorização ao Governo para legislar em matéria de defesa da concorrência, que baixou à 7:, e a ratificação n.º 56/VI (PCP) - Decreto-Lei n.º 293/92, de 30 de Dezembro, que estabelece o regime jurídico dos corpos de bombeiros profissionais.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, da ordem do dia de hoje consta, ao abrigo do artigo 62.º do Regimento, a análise do projecto de lei n.º 8/VI, que reduz a duração semanal de trabalho normal, da iniciativa do Grupo Parlamentar do PCP.
Para uma primeira intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP, neste início de ano de 1993, ao exercer o seu direito de marcação e agendamento para Plenário do seu projecto de lei, que visa a redução do horário semanal de trabalho para as 40 horas, tem como objectivo central corresponder a uma das mais fundas e justas aspirações de centenas de milhar de trabalhadores portugueses.
A veracidade desta afirmação é sustentada em razões históricas e na luta do movimento operário português e confirmada pelas centenas de pareceres de organizações de trabalhadores constantes do relatório da Comissão Parlamentar de Trabalho, Segurança Social e Família, que se traduz numa das mais amplas consultas públicas até boje realizada pela Assembleia da República.
Temos consciência de que esta nossa opção de agendamento vai contra os ventos dominantes que fustigam, limitam e desregulamentam direitos sociais e laborais, que constituíram importantes conquistas dos trabalhadores, algumas até antes de Abril, e davam dimensão avançada à justiça social e à própria democracia.
Que por aqui passaram, com o aval da maioria PSD e do seu governo, uma impressionante lista de leis antilaborais, como a lei dos despedimentos, do despedimento por inadaptação, da desregulamentação dos horários de trabalho, da imposição da arbitragem obrigatória, da eliminação da protecção aos representantes eleitos pelos trabalhadores, de novos condicionamentos ao direito a férias e ao trabalho por turnos, da proliferação e legalização da precaridade e, mais recentemente, a mutilação do exercício do direito à greve.
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Esta sanha contra o edifício jurídico-laboral provoca tremendas sequelas e consequências práticas no mundo do trabalho.
O dedo acusador da história não deixará de registar o resultado concreto de uma política de injustiça social e desumanizada, que tem vindo a ser prosseguida pelo governo de Cavaco Silva.
A componente social e laboral é intrínseca à democracia. Mas pode-se, em democracia, transformar o exercício de direitos colectivos num acto de alto risco, assumir o cargo de dirigente, de delegado sindical ou membro de uma comissão de trabalhadores num acto de coragem, como acontece hoje em centenas de empresas, já que são alvos primeiros das rescisões, despedimentos, da discriminação salarial e profissional? Que os excedentários, os disponíveis, os inadaptados, «os velhos que já não prestam», os improdutivos, sejam tantos que a nível da segurança social já exista 1,7 trabalhadores no activo por cada reformado, pensionista ou pré-reformado?
Que na lista de excedentários do Governo ainda faltam 50 a 100 000 da função pública, 10 000 bancários, 5000 ferroviários, 30 000 trabalhadores dos têxteis, milhares de outros nos sectores da cortiça, das pescas, na TAP, na RTP, na indústria da metalomecânica pesada, na Siderurgia Nacional, na EDP, nos Cimentos, na Marconi, na Setenave, na indústria vidreira, nos matadouros públicos, na EPAC, no Teatro de S. Carlos, na Petrogal?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Que hoje milhares de trabalhadores aduaneiros estejam a receber, ou em vias de receber, cartas de despedimento, ficando sem emprego, sem profissão, sem saber em que condições ficam, com que apoios, com que indemnizações, com que futuro?
Que da serra nos chegam os alertas dos mineiros da Panasqueira, onde a multinacional da Beraltin está a fasear os despedimentos, após receber vultuosos subsídios do Estado Português, numa zona dependente da mina, com capacidade de exploração rentável para mais de 20 anos do único filão de volfrâmio da Europa comunitária? Para onde vão esses mineiros? Para a Covilhã, confrontada com a crise dos têxteis? Para as cidades do litoral, perdendo o emprego, as casas, a sua aldeia, as suas raízes? Ficam sem saída como ficaram os mineiros de Jales?
Estes milhares de homens e mulheres, novos demais para ir para a reforma e velhos demais para arranjar emprego, são atingidos pelo «síndroma da inutilidade», como afamava uma equipa de jornalistas da revista do jornal Público. Nesse excelente trabalho, que constitui um grito de alerta, fala-se «dos batalhões de desempregados, de nunca empregados, de mal empregados, dos que trabalham já fora de horas, sem remuneração, sem feriados nem fins-de-semana, obrigados a abdicar de férias e regalias de conquistas históricas, dos que começam a sentir-se excedentários de fora para dentro, a sentir-se responsabilizados porque passaram a vida inteira a dar o seu melhor à empresa e se deixaram ficar. Veja-se o que se diz aos vidreiros da Stephens e aos aduaneiros, ficaram em actividades condenadas; repare-se o que se argumenta sobre os trabalhadores da função pública, não se actualizaram; recorde-se o que se responde aos operários têxteis, ficaram fora de moda, perderam a imaginação, envelheceram; veja-se como se marginalizam os criadores, os artistas, os cientistas».
Enquanto alastram os excedentários e disponíveis, cresce o trabalho forçado e a exploração de crianças, os jovens saltitam entre um curso de formação e um contrato a prazo, o recibo verde torna-se numa instituição, querem-se jovens dóceis, não sindicalizados, passivos.
Aliás, logo na primeira greve realizada pelos trabalhadores da CP, a administração, animada pelas alterações à lei, transforma os serviços mínimos em serviços máximos, violentando até os próprios pressupostos que serviram de argumentação ao PSD para mutilar a Lei da Greve, ameaçando com processos disciplinares em massa.
Simultaneamente, o Governo aplica a redução dos salários aos trabalhadores da Administração Pública em 5 %. Com um à-vontade impressionante vem à praça pública pressionar os patrões - como se estes precisassem de ser pressionados - para que se limitem os aumentos salariais a 6 %, ameaçando com falências e despedimentos.
Á duplicação dos fundos comunitários o Governo contrapõe a duplicação de sacrifícios para os trabalhadores portugueses, arquitecta e protagoniza o trabalho sem direitos, promove uma sociedade com novas inseguranças, novos excluídos, marginalizados e subsidiados.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este quadro, rude mas real, que só peca por defeito, pode criar uma aparente contradição se confrontada com este nosso projecto de lei, de conteúdo socialmente justo, viável e credível.
Não é só por isso, mas também por causa disso, que esta iniciativa é justa e oportuna! Como alguém afirmou, este é o pior dos tempos, mas é também o «melhor dos tempos».
Os fascinantes avanços do homem nos domínios da ciência e da técnica devem contribuir para a melhoria das condições de vida e de trabalho e colocar no eixo dos benefícios desses fascinantes avanços o homem social.
A tendência histórica para a redução social de trabalho necessário à produção de bens e serviços é hoje aprofundada com a revolução científico-técnica, que, ao elevar a produtividade de trabalho, cria condições objectivas a uma acentuada e rápida redução do tempo de trabalho.
O nosso projecto de lei propõe a redução do tempo de trabalho e, consequentemente, o aumento dos tempos livres, perspectivado para uma melhor articulação entre o tempo de trabalho, a formação e a organização de horário, que compatibilizam o trabalho com as necessidades familiares e individuais dos trabalhadores.
O próprio PSD, consciente desta tendência, incluiu no seu manifesto eleitoral de 1991 a redução do horário de trabalho para as 40 horas. Posteriormente, assina, em sede de concertação, a redução faseada, mas perverte este avanço através do Decreto n.º 309/91, que, por via da chamada flexibilização do horário, permite que a duração normal do trabalho semanal atinja as 50 horas. E não se diga que fizemos a leitura por metade do manifesto do PSD, que nunca teve a coragem de dizer que queria a flexibilização dos horários para as 50 horas por semana.
A tendência histórica da redução do horário de trabalho verifica-se em, praticamente, todos os países da Europa comunitária, estando já na ordem do dia a semana das 35 horas. Esta questão é inseparável da Europa social.
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Aliás, a Sr.ª Vasso Papandreu, comissária para os Assuntos Sociais, em forais de 1992, constatando que, pela primeira vez, o Conselho de Ministros do Emprego não incluía na ordem de trabalhos o ponto da limitação semanal do tempo de trabalho nos países da Comunidade Económica afamava: «Estamos no fim do ano de 1992 e nas vésperas do Mercado único. As nossas esperanças não foram concretizadas. 15to é muito mau para a Europa porque se a Europa não for social não penso que possa existir.»
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Na Organização Internacional de Trabalho sucederam-se as convenções no sentido da redução do horário, sendo de destacar que já em 1969, através da Recomendação n.º 166, era fixado o princípio da redução progressiva da duração normal de trabalho, por forma a que esta atingisse as 40 horas por semana sem qualquer diminuição dos salários dos trabalhadores.
O nosso projecto de lei, nas suas soluções, propõe-se alcançar dois objectivos fundamentais. Pretende um aumento para o trabalhador do tempo destinado ao repouso e aos lazeres, permitindo-lhe uma maior disponibilidade para a sua participação na vida política e cívica, para a sua elevação cultural e para dar mais tempo à família e à própria comunidade.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O abaixo assinado, subscrito por cerca de 13 000 mulheres têxteis, que chegou a estar, na anterior legislatura, em apreciação na Comissão de Trabalho, constituía um testemunho vivo da justeza de tal objectivo.
Uma segunda vertente tem a ver com a partilha do emprego, já que ninguém consegue ocultar que, face à introdução de novas tecnologias e lesando os custos de mão-de-obra, a produção, o aumento da produtividade, a existência em Portugal de uma mão-de-obra qualificada no desemprego, a necessidade de uma organização de trabalho mais racional, é possível, com a redução, um aumento de oferta de emprego. O próprio governo do PSD, no preâmbulo de uma proposta de lei, reconhecia esta necessidade.
Quem se sustente no lucro imediatista e maximalizado, na mão-de-obra barata e precarizada, nas jornadas de trabalho prolongadas, não se identificará com este projecto de lei. Mas, por acaso, será nas empresas mais bem estruturadas e com horários de trabalho reduzidos que maior é o grau de produtividade e menor o número dos acidentes de trabalho?
Alguém faz contas, ou fez contas, dos custos humanos, económicos, sociais e psíquicos a que conduzem as prolongadas jornadas de trabalho, não isentas de responsabilidades na sinistralidade e no aumento das doenças profissionais?
Outro factor que justifica a iniciativa do PCP é o tempo de trajecto até ao local de trabalho e o grau de penosidade dos transportes.
Não se encontrando disponíveis os dados sobre o tempo de deslocação casa/local de trabalho, a nível do País, serve de referência um inquérito promovido pelo Ministério do Emprego e da Segurança Social em três concelhos do distrito de Lisboa, em 1989. Donde, 62 % dos trabalhadores gasta mais de uma hora para chegar ao local de trabalho.
A pressão demográfica e o aumento do tráfego, nos últimos anos, conduz a que o tempo de trajecto seja hoje ainda maior. Na zona onde habito, milhares de trabalhadores consomem 10 horas por dia da sua vida para ir, estar e vir do emprego. E necessário andar nos transportes públicos para perceber que são muitos aqueles que chegam a casa cansados, saturados, vendo no trabalho não uma fonte de realização mas um penoso sacrifício.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entendemos, no nosso projecto de lei, que a redução da duração do trabalho deve ter em conta a sua natureza, o seu grau de penosidade, perigosidade ou insalubridade. Este é um principio de aceitação generalizada. Por exemplo, a Recomendação n º 116 da OIT, sobre a redução da duração de trabalho, estabelece que deverá ser dada prioridade às actividades e profissões que impliquem mais fadiga física e intelectual ou comportando riscos para a saúde dos trabalhadores.
Ressalta aqui o trabalho nocturno.
Segundo um estudo da mesma Organização, o trabalho nocturno, tal como se pratica actualmente, provoca sempre fadiga excessiva e, multas vezes, uma enfermidade psicossomática de origem profissional (neuroses, úlcera digestiva). A carga mental da ocupação e o envelhecimento do trabalhador constituem, neste contexto, factores agravantes. Por outro lado, o trabalho nocturno perturba a vida familiar e é visto com hostilidade por um número crescente de trabalhadores.
Peritos da OIT revelam que cada 15 anos de trabalho nocturno determinam um envelhecimento prematuro de cinco anos, que no decurso dos anos gera a intolerância progressiva. Ora, em sectores como os têxteis, a indústria do tabaco e do papel, matérias plásticas, químicas e petrolíferas mais de 40 96 dos seus trabalhadores trabalham regularmente à noite.
Um dos argumentos que o patronato mais esgrime para não reduzir os horários é o do agravamento dos custos salariais.
Confunde-se deliberadamente o custo salarial unitário com o custo salarial global. Trata-se de realidades diferentes.
A redução não determina necessariamente um agravamento do custo, podendo, aliás, devido ao aumento da produtividade, redução do absentismo e do desgaste psíquico, compensar os encargos do recurso a mais trabalhadores.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Aliás, vem a talhe de foice lembrar que é o Governo e o Primeiro-Ministro quem proclamou aos quatro ventos que nunca os lucros tinham crescido tanto, isto no ano em que se começou a reduzir a duração do horário semanal de trabalho.
Procurámos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, fazer um projecto sério e viável. Transformado em lei, não pretendemos a sua aplicação de supetão. Para a generalidade das empresas é previsto um espaço de tempo de seis meses, suficientemente amplo para se processar a reorganização do trabalho, e salvaguardamos a especificidade dos sectores da agricultura, silvicultura e pecuária.
Estamos certos que, devido à luta e à capacidade de negociação da contratação colectiva, são hoje já muitos os trabalhadores portugueses que disfrutam da redução do horário de trabalho para o nível das 40 horas, numa média global de 42 horas. Uma decisão positiva da Assembleia da República corresponderia ao curso das coisas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
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O Orador: - Terá o nosso projecto de lei as soluções todas? Claro que não. Não necessitará da contribuição dos Deputados de outras bancadas, tal como foi dada pelas organizações dos trabalhadores durante o debate público? É evidente que sim.
O risco que se come é que o PSD continue a ouvir mais o Governo do que a sentir o pulsar da vida e as aspirações de quem trabalha. E não se venha com o inaceitável argumento de que a questão está mais ou menos tratada a nível do Conselho Permanente de Concertação Social.
Em primeiro lugar, mau seria que este órgão de soberania se transformasse numa secção ou cartório notarial do Conselho Permanente de Concertação Social, condicionando os grupos parlamentares na iniciativa.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, e colocando as coisas a esse nível, importa recordar que, por exemplo, aquando do Acordo Económico e Social de 1990, de onde emanou o pacote laboral, o governo do PSD acordou em não tocar na Lei da Greve, o que não impediu o PSD de apresentar aqui um projecto de lei, que condicionou e mutilou tal direito.
O PSD não pode pretender «sol na eira e chuva no nabal», demonstrando afinal que, para si, a concertação constitui apenas um instrumento de política desregulamentadora e antilaboral.
E quando se coloca na ordem do dia o prestígio da Assembleia da República e dos Deputados, é nestes momentos, é nestas decisões, em matéria de justiça social, que este órgão de soberania também ganha ou perde prestígio perante a sociedade.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Somos daqueles que entendemos que o trabalho, com direitos e como fonte de realização humana, é a base essencial para o progresso e o desenvolvimento, devendo constituir uma vertente indispensável da democracia.
A redução da jornada semanal de trabalho, que marcou a evolução histórica do movimento operário português e mundial nesta época moderna, pode conhecer, e deve conhecer, novos avanços, constituindo também ela um estimulo à modernização do próprio aparelho produtivo no quadro do espaço europeu onde nos inserimos.
Uma visão conservadora de deixar que as coisas fiquem como estão, assentes na sobrexploração, nos horários prolongados, nos salários baixos, na sacralização do lucro máximo, na utilização dos avanços da ciência e da técnica para despedir, é comprometer o próprio futuro. Ou pior ainda, como faz o PSD, baixar uma hora se os trabalhadores aceitarem trabalhar 50 horas seguidas.
É necessário, para compreender este projecto de lei, entender as aspirações e a vida das pessoas, dos trabalhadores e trabalhadoras, que olham os seus locais de trabalho como algo de penoso, com deslocações penosas, num revisitar do poema da «Maria cansada que sobe a calçada», sem tempo de conviver com os filhos, com a família, de falar, de participar, de fruir, refugiadas em casa com tempo sobraste só para a telenovela, para dormir e recomeçar com mais cansaço, recusando que exijam de si aumentos de produtividade e o empenhamento na vida da empresa.
Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O PCP, com este projecto, quer dar uma contribuição positiva à sociedade.
A Assembleia da República dirá!
Aplausos do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Puig.
O Sr. José Puig (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, ouvi com extrema atenção a sua intervenção e, sem embargo de deixar para depois a análise política e global que o meu grupo parlamentar entende sobre este projecto de lei, gostaria desde já de colocar-lhe algumas questões, para que todos nós possamos ficar um pouco mais esclarecidos.
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado disse que a Lei da Greve foi um atentado à concertação. Como, Sr. Deputado?!
Como é possível este tipo de afirmações se a Lei da Greve, para além de outras questões, ou seja, para além de tentar harmonizar determinados direitos fundamentais - e isso não vem agora propriamente ao caso -, devolve à negociação entre representantes dos trabalhadores e representantes da entidade empregadora um aspecto que não estava regulamentado, o dos serviços mínimos, questão que, repito, não estava regulamentada e, como tal, ficava perfeitamente e apenas ao critério do Governo, depois de iniciada a greve, determinar quais eram os serviços mínimos.
Assim, aquando das alterações à Lei da Greve, há alguns meses, possibilitou-se aos parceiros sociais, através do diálogo e da concertação social, o entendimento quanto aos serviços mínimos, antes de esse aspecto ser devolvido à Administração. É ou não valorizada, desta forma, a negociação, o diálogo e a concertação social?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, na sua intervenção, referiu muitas cartas de despedimento. Pergunto-lhe: como é isso possível numa altura em que é reconhecido, quer nacional quer internacionalmente, por todos meios, por todas as instituições, que vivemos na chamada situação do «pleno emprego»?
Risos do PCP.
O que temos de fazer é um grande esforço para que se mantenham os níveis e as taxas de emprego actuais.
Como é, pois, possível que se dê um enquadramento desse género numa intervenção política nesta Assembleia da República, que se quer responsável?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Deputado falou também no manifesto eleitoral de 1991 do PSD, dizendo que «prometeram as 40 horas e, afinal, esqueceram-se; agora já não cumprem nada disso!»
Sr. Deputado, tenho comigo o nosso manifesto eleitoral, que se intitula «Portugal no Bom Caminho», e que, relativamente a esse assunto, diz o seguinte: «[...] propõe-se a melhora das condições da prestação de trabalho através de [...] entre outras [...] o fomento da negociação colectiva, tendo em vista, nomeadamente, a redução do
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horário de trabalho para 40 horas semanais, através da negociação colectiva, a par da reorganização concertada do: tempos de produção de trabalho e de lazer».
Protestos do PCP.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Promessas, promessas!
0 Orador: - Sr. Deputado, o Acordo Económico e Social, assinado no Conselho Permanente de Concertação Social em 19 de Outubro de 1990, diz expressamente: «Compromete-se o Governo a legislar brevemente, até Janeiro de 1991, no sentido máximo de 44 horas semanais.» Está cumprido, está legislado, foi aqui aprovado!
Além disso, pretendia-se fomentar, no âmbito da negociação colectiva, a redução do horário de trabalho, progressiva e gradualmente, de modo a que seja possível atingirem-se as 40 horas em 1995.
Se o Sr. Deputado quer saber, dir-lhe-ei, a propósito, que, ao contrário da imagem que dá - no preâmbulo do vosso projecto de lei isso está bem expresso, pois os senhores enunciam quatro ou cinco sectores cuja duração semanal de trabalho está muito próxima das 40 horas -, não só esse trabalho de redução, no âmbito da negociação colectiva, está a correr muito bem, como têm sido cumpridos os pontos que são acentuados no Acordo Económico e Social no sentido de se reduzir uma hora por ano, o que irá significar que em 1995 estaremos nas 40 horas semanais.
Os senhores não confiam na sociedade civil e nas instituições representativas dos trabalhadores e dos empresários, nem querem libertar a sociedade civil. Querem, sim, que todos estes objectivos sejam atingidos através da tutela, da intervenção legislativa, da obrigação. Nós não pretendemos que eles sejam atingidos assim, sendo certo que a prática, a realidade, o quotidiano está a mostrar que temos razão, pois as coisas estão a correr neste caminho.
Vozes do PSD: - Muito bem!
0 Orador: - Coloco-lhe agora duas perguntas, em termos de especialidade, quanto ao projecto de lei apresentado pelo PCP, mais concretamente no que respeita aos artigos 5.º e 6.º
Diz o artigo 5 º, no seu n.º 1, que «não é exigível o pagamento do trabalho suplementar se a entidade patronal provar que não determinou a sua prestação prévia e expressamente» - esta parte, como o Sr. Deputado bem sabe, reproduz a lei que existe sobre a matéria- «e provar, simultaneamente, que não se opôs, por si ou pelo superior hierárquico do trabalhador, à sua prestação». Assim sendo, o empresário que não se opôs à prestação do trabalho extraordinário não tem de o pagar, mas provavelmente o que se lhe opõe tem de o pagar. Deve haver qualquer lapso na formulação desta norma, para a qual gostaria de obter uma explicação por parte do Sr. Deputado.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não é nada disso!
0 Orador: - Mas gostaria que fosse o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa é a ele, e não á Sr.ª Deputada, que me estou a dirigir a explicar esta dúvida.
Em relação ao artigo 6 º do vosso projecto de lei, pergunto ao Sr. Deputado se sabe que o artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 421/83 foi pura e simplesmente revogado - o que, aliás, corresponde também a um compromisso assumido no Âmbito do Acordo Económico e Social - há pouco mais de um ano, em Outubro de 1991, por via, salvo aro, do Decreto-Lei n.º 383/91. Pergunto-lhe, em suma, se, não existindo já esse artigo 8.º e, em consequência, o ónus do pagamento dos 25 % sobre o trabalho extraordinário, VV. Ex.ªs o pretendam recriar agora Sabe o Sr. Deputado que esse preceito já não está em vigor e que esses 25 % já não se aplicam e não são pagos nem pelo trabalhador nem pela entidade empregadora? Qual é, então, o sentido desta repristinação da norma avançada no vosso projecto?
Falarei deste assunto na intervenção que irei produzir daqui a pouco, mas gostaria que mo esclarecesse desde já.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Proença.
O Sr. João Proença (PS): - Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, diria que o Sr. Deputado ligou, e bem, o problema do horário de trabalho ao do emprego, pois trata-se de duas variáveis que estão estreitamente ligadas. Numa altura em que o desemprego atinge, em termos europeus e mundiais, níveis extremamente elevados, assume muita importância a luta do movimento sindical pela redução do horário de trabalho.
Em Portugal, infelizmente, também as perspectivas de emprego no futuro se apresentam sombrias. É o que se passa na área da Administração Pública, na qual o Governo, com o diploma dos excedentes, aponta claramente pata mecanismos de pré-despedimento, e no caso, em geral, da situação económica e do fraco crescimento, que irá necessariamente originar um acréscimo do nível de desemprego, sem que se vislumbre da parte do Governo qualquer preocupação em adoptar uma política activa virada paia o crescimento e para o emprego atente-se, por exemplo, no caso da bacia do Ave.
Apontou ainda o Sr. Deputado, e bem, o problema da qualidade do emprego, tendo também referido o problema de uma certa tentativa permanente do Governo em instrumentalizar a concertação social, de que é exemplo evidente a recente Lei da Greve. Ao contrário do que o Sr. Deputado José Puig acaba de dizer, a Lei da Greve não está a conduzir a uma negociação entre sindicatos e empregadores. Está, sim, a fazer com que o Ministério do Emprego e da Segurança Social, de uma forma claramente ilegal, se interponha na negociação entre sindicatos e empregadores, que a Lei da Greve fixa, como sucedeu com o recente caso da Rodoviária Nacional, a propósito do qual foi o Ministério a fixar os serviços mínimos, sem negociação.
A pergunta que pretendo fazer ao Sr. Deputado Jerónimo de Sousa tem um pouco a ver, justamente, com a concertação social e com a necessidade de adaptação dos horários de trabalho.
A adaptação dos horários de trabalho não é só uma necessidade das empresas, é também uma necessidade dos trabalhadores. Salientou o Sr. Deputado, como exemplo, as longas horas que diariamente os trabalhadores perlem na deslocação entre a caca e o local de emprego.
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Veja-se ainda a necessidade de combater o trabalho resultante, por exemplo, da abertura de estabelecimentos comerciais ao domingo. Veja-se a necessidade de permitir à população em geral o acesso a certos serviços e o ter os serviços abertos em horas não necessariamente equivalentes às horas normais de trabalho. A vida exige justamente a necessidade de adaptação de horários, também por vezes ligada à própria política de emprego. É necessário criar novos postos de trabalho, muitas vezes com a utilização dos equipamentos já existentes, o que implica realmente a adaptação de horários com vista a permitir uma melhor utilização de equipamentos e, por vezes, um trabalho mais longo a nível das empresas.
Por isso, a redução do horário tem de ser vista não apenas numa perspectiva legal, que é extremamente importante. É importante limitar a duração máxima do trabalho, como é importante fixar, e rapidamente, as 40 horas semanais como horário máximo de trabalho. Mas também há que caminhar, por vezes, no sentido da adaptação dos horários de trabalho por via da negociação colectiva, associando necessariamente a redução a essa adaptação dos horários de trabalho.
O que pergunto ao Sr. Deputado Jerónimo de Sousa é o seguinte: como vê o Sr. Deputado a questão da redução e adaptação dos horários de trabalho?
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.
O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, um dos aspectos mais importantes da sua intervenção foi o da justificação da oportunidade da presente iniciativa.
Se bem entendi - o Sr. Deputado dirá se entendi bem ou mal -, a sua justificação da oportunidade deste diploma liga-se às perspectivas sobre a situação do emprego nos próximos tempos. No meu entender, falta outro dado quanto à questão da oportunidade. É que quem vir apenas as perspectivas do emprego para justificar a oportunidade desta iniciativa esquece outros dados concretos da situação económica, sobretudo a situação de recessão, segundo uns, ou de pré- recessão ou à beira da fronteira da recessão, segundo outros, que o próprio Grupo Parlamentar do PCP tem gritado nesta Câmara, ...
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Afirmado!
O Orador: - ... tendo até muitas vezes - justiça lhe seja feita - analisado o assunto do ponto de vista dos empresários e, assim, das entidades patronais.
Nessa perspectiva, a oportunidade da iniciativa parece-me mal justificada pelo Sr. Deputado. Gostaria, pois, de o ouvir a esse respeito, se quiser ter essa bondade.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Grave acusação essa! Tomarem o partido dos patrões ... Eu não deixava passar isso!...
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seguindo a ordem pela qual foram formulados os pedidos de esclarecimento, começaria por responder ao Sr. Deputado José Puig.
É evidente que eu não disse que a Lei da Greve é um atentado à concertação. O que afirmei, na minha intervenção, foi que o Governo e o PSD utilizam a concertação como instrumento da sua própria política anti-social e antilaboral, o que é coisa diferente. Neste sentido, quando digo que o Grupo Parlamentar do PSD quer «sol na eira e chuva no nabal», quero dizer, antes de mais, que, para tentar «sacar. o pacote laboral, na altura da discussão e aprovação do Acordo Económico e Social de 1990, aceitaram com os parceiros sociais, nomeadamente com as federações sindicais, que a Lei da Greve era intocável. Aceitaram isso, mas depois o PSD tomou a iniciativa de limitar, condicionar e mutilar o direito à greve. Já direi com que fundamento esta acusação.
Depois, quando algum grupo parlamentar apresenta alguma iniciativa sobre matérias que já estiveram em apreciação no Conselho Permanente da Concertação Social, vem o Sr. Deputado com a tese de que, aqui d'el-rei, isso está a ser discutido no Conselho e não vaie a pena o PCP mexer nesse assunto, porque se trata de uma questão entre os parceiros sociais e o Governo. Não aceitamos que este órgão de soberania e os nossos direitos constitucionais e legais sejam condicionados pelas decisões do Conselho Permanente da Concertação Social, até para prestígio da Assembleia da República. Recusamos também a própria governamentalização desta Assembleia em relação a questões que consideramos de grande importância, nomeadamente a dos direitos dos trabalhadores.
Em relação à Lei da Greve, penso - sem qualquer ofensa - que o Sr. Deputado deveria estar calado. O Sr. Deputado João Proença deu aqui o exemplo concreto da Rodoviária Nacional e eu acrescentei o caso da CP. Então os senhores, que são pelo menos Estado e pela valorização da contratação colectiva e da negociação e concertação entre as partes, fazem uma lei que permite um grande intervencionismo do Governo, do Estado, na definição dos serviços mínimos e nem sequer esperaram pela negociação entre as partes tanto na Rodoviária Nacional como na CP, tendo sido a administração, num caso, e o Ministério do Emprego e da Segurança Social, no outro, a impor os serviços mínimos?!
O Sr. José Puig (PSD): - Não é verdade!
O Orador: - E, como era inevitável, o que foi imposto não é nada serviços mínimos. Requisitar quase 50 % dos trabalhadores visa, no fundamental, os tais serviços máximos, para liquidar, descaracterizar e enfraquecer o próprio direito à greve. Se cerca de 50 % dos trabalhadores são requisitados para preencher os serviços mínimos, é de perguntar qual pode ser o êxito ou impacte de uma greve. Esse era o objectivo que estava escondido nas vossas propostas e que aqui foi hipocritamente camuflado durante o próprio debate das alterações à Lei da Greve.
No que respeita à questão dos despedimentos, pensei que o Sr. Deputado iria refutar a longa e impressionante lista que li, da tribuna, na minha intervenção, pois seria profundamente agradável para mim ouvir o Sr. Deputado dizer, nomeadamente, que eu estaria a mentir, que o Governo não está minimamente a prever que na função pública existam 50 a 100 mil trabalhadores sujeitos a caírem na situação de excedentários, que actualmente os trabalhadores aduaneiros não estão a receber cartas de despedimento, que nem sequer é verdade que o decreto que visava as indemnizações e a protecção social ainda não tenha saído, que nas minas da Panasqueira não está a
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acontecer o que referi. Se o Sr. Deputado tivesse vindo descansar-me sobre estas situações, ficaria muito contente, mas a verdade é que não foi capaz de rebater um único caso indicado, nem sequer de uma única empresa, em relação aos despedimentos que o Governo pretende executar.
Pensamos ainda que, quando se discute o emprego, não se deve falar só na quantidade mas também na qualidade. O Sr. Deputado sabe, como eu, que basta um jovem trabalhar durante um mês num curso de formação ou numa OTL ou apenas algumas horas por semana para ser logo considerado empregado, sendo certo, por outro lado` que os senhores retiraram as trabalhadoras domésticas das estatísticas que apresentaram sobre os desempregados. É fácil manipular os dados.
Mas, mesmo ã luz da sua interpretação, é ou não verdade que está previsto o aumento do desemprego em Portugal? Pode o Sr. Deputado afamar, na Assembleia da República, que a tendência será para a diminuição do desemprego ou irá, efectivamente, o desemprego aumentar em Portugal?
O Sr. José Puig (PSD): - Se for pelo caminho deste projecto de lei, então vai aumentar muito!
O Orador: - Era sobre catas questões que gostaria de ouvir o Sr. Deputado. Mas não o ouvi e fiquei profundamente preocupado.
Ainda quanto á questão da concertação social, que o Sr. Deputado atira um pouco para o lado dos parceiros sociais, creio que o Sr. Deputado é jovem mas pouco audacioso, porque efectivamente, como Deputado da República, deveria considerar que esta Assembleia só se prestigia quando toma iniciativas positivas no sentido de contribuir para que os direitos dos trabalhadores sejam reconhecidos e ampliados.
Ficava-lhe bem, como jovem, ter esta audácia. Muitas vezes, discute-se aqui o comportamento dos políticos e da própria Assembleia da República, bem como a necessidade de defender o seu prestigio, mas é através de tomadas de posição como a sua que a Assembleia da República se desprestigia e não por causa deste ou daquele aumento salarial ou de vencimento! Antes, é através das medidas antipopulares assumidas pela Assembleia, particularmente derivadas da vontade da própria maioria.
Não me venha agora com a questão da tutela do Estado! Posso dar-lhe mais um exemplo porque, enfim, o Sr. Deputado pode não perceber muito destas questões laborais, embora lhe reconheça o mérito de participar muitas vezes na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família.
Mas, Sr. Deputado, pergunto-lhe que hipocrisia é esta: tanta desregulamentação, tanta questão para os parceiros sociais, e, afinal, foram os senhores que aprovaram a Lei da Arbitragem Obrigatória, onde se impõe aos trabalhadores e aos sindicatos que a aceitem, limitando e condicionando a própria liberdade da contratação colectiva! Então como é, Sr. Deputado: há dois pesos e duas medidas?! Ou seja, a Assembleia não deve lutar para reduzir p horário de trabalho mas já deve aprovar medidas que imponham a arbitragem obrigatória e a própria tutela do Estado em relação a alguns direitos dos trabalhadores?!
Em relação aos artigos 5.º e 6.º do nosso projecto - particularmente em relação ao artigo 6.º -, tem razão por que, de facto, essa medida foi revogada. Em todo o caso, gostaria de lhe lembrar que este projecto de lei
foi apresentado há bastante tempo, esteve em apreciação pública e o seu processo decorreu na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família. É evidente que houve uma revogação da norma que acabou por referir, mas ao ouvir o Sr. Deputado com essa tão boa e tão grande vontade até fiquei a acreditar que o PSD ia deixar passar, na generalidade, o nosso projecto de lei para, depois, na especialidade, fazer-lhe as correcções necessárias.
Fica, pois, registada essa preocupação. Confio nessa disponibilidade da bancada do PSD, que seria, com certeza, muito importante. De facto, na discussão na especialidade, como já referi na minha intervenção, estamos abertos a qualquer iniciativa no sentido de melhorar o próprio texto.
Sr. Deputado João Proença, é evidente que subscrevo a primeira parte da sua intervenção, na medida em que comungamos das mesmas preocupações pelos fenómenos que estão a ocorrer no mundo do trabalho. Só uma Assembleia de costas viradas para o mundo do trabalho pode não ter a sensibilidade para o que está a acontecer, nomeadamente na função pública e noutros sectores, cuja situação constitui uma realidade preocupante no nosso país, em resultado de uma política global por parte do governo do PSD.
Aliás, deixe-me que lhe diga que, com profunda preocupação, muitas vezes, não ouço da sua bancada essas preocupações salutares, ao contrário do que aconteceu agora. Com efeito, os trabalhadores necessitam que a sua oposição a esta política tenha correspondência também aqui, no plano da própria Assembleia da República.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Quanto à questão da adaptação do horário de trabalho pela via negociação, penso que podemos estar de acordo que haja possibilidades de adaptação, em conformidade com os interesses dos trabalhadores e com a capacidade negocial dos sindicatos. Agora o que não entendemos e não podemos aceitar é que, mantendo-se a prestação semanal do trabalho com horários dos mais altos em termos da Europa comunitária, se avance - com esta medida desregulamentadora da flexibilização do horário de trabalho - para as 50 horas por semana. Como sabe, já houve uma proposta por parte do patronato da construção civil neste sentido. Ou seja, assim que o Governo abriu a porta, aí estão sectores do patronato a tentarem aplicar regimes de horários demasiados prolongados. É evidente que tal joga com a vida das pessoas, provocando uma cada vez maior desumanização das relações de trabalho.
Em relação a esta matéria, o Sr. Deputado José Puig saberá tão bem como eu que, muitas vezes, os trabalhadores aceitam a rescisão e a indemnização porque estão cansadas de uma vida inteira de trabalho onde novas inseguranças, novos medos e novos sacrifícios lhes são exigidos. Ora, isto leva, com certeza, a que as indemnizações e rescisões se processem de uma forma acelerada e até quase passiva por parte dos trabalhadores.
Entendemos que o local de trabalho deveria ser uma fonte de realização humana e um local onde era bom estar e onde deveria haver empenhamento dos próprios trabalhadores no desenvolvimento da empresa, o que na realidade não acontece, pois não são criadas condições objectivas para que eles se sintam realizados nesse mesmo local de trabalho. Posto isto, pensamos que a contribuição do nosso projecto vai precisamente nesse sentido, ou seja,
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no de permitir aos trabalhadores uma vida melhor e condições de trabalho mais dignas.
Quanto à questão da oportunidade, levantada pelo Sr. Deputado António Lobo Xavier - que talvez não tenha percebido bem -, dir-lhe-ia que é num quadro de ofensiva, de ataque aos direitos dos trabalhadores que contrapomos uma medida positiva, procurando que o direito à redução do horário de trabalho se verifique aqui, neste País concreto, em virtude da grande - na nossa opinião, que, com certeza, não será a sua- ofensiva levada a cabo contra esses mesmos direitos dos trabalhadores. Não é só por isso, mas também, que pensamos que existe esta oportunidade.
Por outro lado, a questão das dificuldades económicas é, no nosso entender, outra consequência desta política do Governo. Não quererá o Sr. Deputado, com certeza, que num quadro de dificuldades haja uma parte que pague os seus custos. Ora, o que o Governo está precisamente a fazer, como já referi, é a acrescentar à duplicação dos fundos a duplicação dos sacrifícios dos trabalhadores portugueses.
Não podemos, pois, aceitar que todos os problemas sejam resolvidos, designadamente os das próprias empresas, à custa do sacrifício dos direitos dos trabalhadores, da sua dignidade e dos seus salários.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Esta é uma contradição que o Governo tem de resolver, porque se, de facto, recebeu a tal duplicação dos fundos, numa perspectiva de desenvolvimento e modernização que devia ter em conta o próprio tecido económico e empresarial, como é que a solução mágica encontrada pelo governo do PSD se traduziu na contenção dos salários, no aumento dos despedimentos, excedentes e disponíveis, criando situações realmente dramáticas para milhares e milhares de trabalhadores?!
Portanto, essa questão económica também tem a ver com a política global do Governo.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao próximo orador inscrito, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de Deputados.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição do Sr. Deputado Crisóstomo Teixeira, do PS, para o período compreendido entre 7 e 29 de Janeiro corrente, inclusive, pelo Sr. Deputado José Leitão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos Deputados independentes Freitas do Amaral e Mano Tomé.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Puig.
O Sr. José Puig (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Todos nós, os que acreditamos na estabilidade e paz social, na conjugação de esforços como a melhor forma de alcançar objectivos nacionais, apreciamos e estimulamos as apostas e o investimento no diálogo e concertação social.
A este respeito, permito-me relembrar um excerto do último programa eleitoral do PSD: aí se propõe a melhoria das condições de prestação de trabalho, através, entre outras, do «fomento da negociação colectiva tendo em vista, nomeadamente, a redução do horário de trabalho para 40 horas semanais, a par da reorganização concertada dos tempos de produção, de trabalho e de lazer».
Por outro lado, para quem se reveja e reconheça o alto significado do Acordo Económico e Social, celebrado a 19 de Outubro de 1990, em sede do Conselho Permanente de Concertação Social, convirá não esquecer algumas das suas passagens: em primeiro lugar, «o Governo compromete-se a desenvolver esforços no sentido da entrada em vigor do horário máximo nacional de 44 horas semanais, em 1 de Janeiro de 1991.»
Este compromisso foi cumprido e mostra-se concretizado mediante a Lei n.º 2/91, aprovada nesta Câmara em 13 de Dezembro de 1990 e promulgada em 31 do mesmo mês.
Mais adiante, consta ainda do Acordo em apreço: «O Governo e as Confederações signatárias acordam no seguinte calendário, a ser desenvolvido no quadro da negociação colectiva, visando articular a adaptabilidade dos horários de trabalho, necessária ao melhor funcionamento das empresas, com um ritmo visando atingir as 40 horas em 1995 e tendo como linhas orientadoras, entre outras, um ritmo de redução de uma hora por ano ou outro estabelecido na negociação colectiva».
Este foi o consenso gerado entre os parceiros sociais subscritores do Acordo, em função de preocupações comuns em volta da melhoria das condições de prestação de trabalho, bem como, por outro lado, da modernização e reforço da competitividade das empresas, da manutenção dos níveis de emprego existentes, tudo para a criação de condições que permitam a continuação do crescimento dos salários reais.
Deve registar-se o espírito responsável e realista dos representantes de trabalhadores e empresários que subscreveram o Acordo Económico e Social. Nenhum deles reivindicou ou optou pelo braço de ferro em tomo de reformas bruscas, com pés de barro e consequências nefastas, do género das preconizadas e assumidas nos tempos não muito remotos da «revolucionarite aguda». Todos tiveram consciência da necessidade de reformas graduais, com bases sólidas e com pés de verdade para poderem caminhar.
Desde já deve sublinhar-se que os compromissos estabelecidos, no âmbito do Acordo, de intervenção legislativa, têm sido, sem excepção, cumpridos pelo Governo e pela maioria que o apoia. Assim sucedeu, como já referimos, com a redução do período normal de trabalho prevista na Lei n.º 2/91, com a alteração do limite anual do trabalho suplementar, com a revogação das taxas de 25 % para a segurança social e incidentes sobre a prestação de trabalho suplementar.
Esta taxa, prevista e instituída pelo artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 421/83, foi eliminada pelo Decreto-Lei n.º 398/91, de 16 de Outubro, que revogou aquele dispositivo legal. Não se entende, desta forma -e o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa já disse que foi um esquecimento -, o conteúdo do artigo 6.º do projecto de lei em debate, que repristina o artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 421/83, impondo novamente o ónus do pagamento da taxa de 25 % à entidade empregadora.
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A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Ah! Pois aí é que está ...
O Orador: - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A redução do horário semanal de trabalho tem sido articulada, no âmbito da negociação colectiva, com a adaptação da sua prestação às nova; realidades económicas e sociais, tudo muna perspectiva global da empresa em que a lógica do consenso e da harmonização de interesses prevalece na prossecução de objectivos comuna, objectivos estes que se enquadram no sentimento generalizado da necessidade das empresas portuguesas melhorarem os seus níveis de produtividade e competitividade, acentuada nestes tempos de construção do Mercado único Europeu, dados os riscos de uma concorrência em que os respectivos factores de distorção vão sendo significativamente esbatidos.
Certo é que alguns sindicatos, poucos e felizmente cada vez menos, se recusam a participar na negociação colectiva neste quadro, preferindo reivindicar a redução do horário de trabalho isoladamente, sem admitir a sua integração com factores de adaptação.
São os sindicatos que, aliás, se encontram integrados em certa central sindical que se automarginalizou do Acordo Económico e Social. Para estes, continua a prevalecer a velha lógica da conflitualidade, das conquistas e das batalhas, assentes nos conceitos marxistas de luta de classes.
É nestas águas que navega igualmente o Partido Comunista e é nesta lógica que se insere o projecto de lei hoje em apreciação. Com efeito, a sua aprovação representaria um rude golpe na negociação colectiva, na concertação social, na conjugação de esforços dos parceiros sociais com vista à prossecução, de uma forma gradual, estável e progressiva, dos objectivos comuns de modernização empresarial, de melhoria dos salários mais, de manutenção do pleno emprego.
Com este golpe e com esta lógica que os comunistas mantêm, de olhos vendados e de costas voltadas para o mundo, nós, os social-democratas, clara e decididamente, não pactuamos.
Aplausos do PSD,
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Odete Santos, João Corregedor da Fonseca, André Martins, Jerónimo de Sousa e Artur Penedos. Para o efeito, tem a palavra a Sr! Deputada Odete Santos.
Por outro lado, Sr. Deputado José Puig, é capaz de me explicar, perante a revogação do artigo 6.º do Decreto-Lei de 1983, que trabalho extraordinário as entidades patronais são obrigadas a pagar. É só até 200 horas por ano? De facto, o seu podido de esclarecimento, há pouco formulado, foi de certo modo infeliz neste aspecto. É que o Decreto-Lei n.º 409/71 consagrava um regime. que os tribunais aplicavam, segundo o qual se os trabalhadores prestassem trabalho extraordinário, na medida em que da( tinha resultado enriquecimento para a entidade patronal, esta era obrigada a pagá-lo, ainda que fosse alegar que não tinha dado ordens para que esse trabalho fosse executado.
Contudo, com esse decreto-lei de 1983 chegou-se à vergonha de dizer que se a entidade patronal não determinou o trabalho não era obrigada a pagar! Ora, sabemos bem como é que o trabalhador consegue arranjar testemunhas na empresa de que houve uma determinação ... Talvez agora V. Ex.ª que esteve descuidado a ler os diplomas - entenda o que o nosso artigo quer dizer. Ou seja, não colhe que a entidade patronal vá ao tribunal dizer que não determinou o trabalho porque, de facto, determinam-no e, depois, dão essa desculpa.
Mas, realmente, a pergunta que lhe faço é a seguinte: até que número de horas é o trabalhador obrigado a prestar trabalho? Se forem prestadas mais de 200 heras por ano a entidade patronal é obrigada a pagá-las? Faço esta pergunta na medida em que, com a revogação do artigo 6.º, criaram propositadamente um vazio.
Por outro lado, V. Ex.ª sabe em que data entrou em vigor o decreto-lei que revogou o artigo 8.º? Pois não sabe, aliás, vi que não sabia ... Entrou em vigor em 1 de Dezembro de 1991!
O Sr. José Puig (PS): - Disse-lhe que foi há mais de um ano!
A Oradora: - Ora, o nosso projecto deu entrada na Mesa em 7 de Novembro. Para além disso, que sirva de esclarecimento o que o Sr. Deputado disse daquela tribuna: é que VV. Ex.as revogaram a norma que previa a obrigação do trabalhador descontar para o Fundo de Desemprego, mas aproveitaram para revogar também a obrigação correlativa da entidade patronal, porque a vossa filosofia, como provarei na minha intervenção, é a de facilitar o trabalho extraordinário.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
A Sr! Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Puig, vou fazer-lhe pedidos de esclarecimento brevíssimos. Aliás, a sua intervenção não me suscita muito mais.
Sr. Deputado, podia explicar à Câmara e aos Portugueses como é que o Governo tenciona fomentar na negociação colectiva a redução do horário de trabalho até às 40 horas semanais. É através da arbitragem obrigatória? O árbitro do Ministério do Emprego vai pender para esse lado? Concretamente, pedia-lhe que explicasse isso, uma vez que na sua intervenção e nos pedidos de esclarecimento por si formulados 6á pouco se manifestou totalmente contra qualquer intervenção do Estado em matéria do direito do trabalho: .ceada um que se amanho, os trabalhadores que se amanhem, porque o Governo nada tem a ver com isso!»
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Sr. Presidente, Sr. Deputado José Puig, V. Ex.ª falou de estabilidade e de paz social, de diálogo e de concertação social. Entendo que estas palavras não têm sentido e custa continuar a ouvi-las por serem lugares comuns. É que há cada vez mais despedimentos, mais exploração, mais excedentes e disponíveis, há cada vez mais trabalho precário, as condições de vida dos trabalhadores são, na generalidade, mais fracas e a instabilidade é cada vez maior para muitos milhares de famílias. Com certeza que V. Ex.ª não vai desmentir o que estou a dizer!
A redução do horário de trabalho é uma reivindicação social, justa, que os trabalhadores deste país há muito perseguem e V. Ex.ª sabe que, em muitos sectores, os trabalhadores portugueses são, em bom rigor, explorados pelo patronato.
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Este Governo, apoiado pelo PSD, faz tábua rasa das questões eminentemente sociais deste pais - é um Governo que só cuida de questões monetaristas e que só se preocupa com cifrões. V. Ex.ª falou de paz social, eu falo também de justiça social, da qual o Governo -repito- faz tábua rasa, porque o que diz não corresponde à realidade.
O Sr. Deputado José Puig pareceu extasiado, numa intervenção anterior, ao utilizar um papel de propaganda eleitoral ao seu partido: foram feitas promessas, mas V. Ex.ª sabe que elas nunca serão cumpridas.
Ora, neste domínio, segundo o que o Sr. Deputado disse, prometeu-se reduzir progressivamente a duração semanal do trabalho para 40 horas e não se venha falar aqui da concertação social, porque gostava que V. Ex.ª me explicasse como é que. compatibiliza todas as afirmações que fez com o disposto no Decreto-Lei n.º 398/91, segundo o qual a duração normal do trabalho semanal pode atingir 50 horas, não esquecendo os abusos e já aqui foram apontados alguns que todos sabemos que ocorrem um pouco por todo o lado.
Também gostava de saber como é que compatibiliza o que afirmou com a seguinte situação: tenho no meu gabinete, aqui na Assembleia da República - e certamente que V. Ex.ª terá no seu - pareceres de organizações de trabalhadores de todo o País que se mostram favoráveis a um projecto de lei desta natureza contra as arbitrariedades governamentais e do patronato que possibilitam a exploração da duração do trabalho.
(O orador reviu.)
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Puig, entendemos que esta iniciativa do PCP, relativa à redução da duração semanal do trabalho para 40 horas, é não só justa como necessária. Pensamos, e o conhecimento da realidade demonstra-o, que os países não podem desenvolver-se apenas à custa dos trabalhadores e verifica-se que, ao longo da história, as organizações que se preocupam e estudam as relações do trabalho e o desenvolvimento histórico das sociedades têm concluído e proposto a necessidade da redução do tempo de trabalho normal, realidade que tem sido acompanhada igualmente pelo avanço do conhecimento cientifico e tecnológico.
Portugal faz parte da Comunidade Europeia e o horário de trabalho semanal praticado é superior ao da maioria dos países comunitários. No entanto, na sua intervenção, em representação do PSD e também por força de imposições do Governo que sustenta, o Sr. Deputado veio aqui dizer para deixarmos os representantes dos trabalhadores e empregadores negociar e afastarmos a responsabilidade da Assembleia da República e do Governo, ou seja, deixar andar as coisas. Naturalmente que isto em nada prestigia a Assembleia da República nem o nosso país junto da comunidade internacional.
Pensamos que o crescimento que o seu Governo tem anunciado nos últimos anos para o nosso país não pode ser conseguido, como até aqui, à custa de salários baixos e da exploração acrescida dos trabalhadores portugueses relativamente aos europeus.
Sr. Deputado, com esta situação, em vez de Portugal estar no pelotão da frente da Europa, como o seu governo e partido tanto têm propalado, verificamos que se encontra cada vez mais na cauda da Europa.
Gostava de dar-lhe apenas um exemplo, que é do conhecimento público. Numa consulta feita a grandes empresas multinacionais, concluiu-se que Portugal era um dos países onde havia melhores e mais fáceis condições de investimento, por a mão-de-obra ser barata, o que só é possível à custa das condições e da qualidade de vida dos trabalhadores portugueses.
O Sr. Presidente: - Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Assim, gostava de saber se o PSD vai desresponsabilizar-se da tarefa de, através da aprovação de uma lei que compete à Assembleia da República, implementar este processo de igualitarização de situações como as que se vivem nos países da Comunidade Económica Europeia, designadamente em Espanha. Se este país vizinho serve de exemplo em tantas situações, será que também não deveria servir neste caso, possibilitando que o PSD apoiasse, como já aqui foi solicitado pelo proponente, a viabilização deste projecto para que na discussão na especialidade ele pudesse ser melhorado.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Puig, gostava de começar por fazer algumas considerações, à laia de protesto, em relação aos adjectivos com que qualificou o nosso projecto de lei. Eles não são ofensivos vindos de quem vêm; maiores dificuldades vindas das classes dominantes sentiu o movimento operário mundial quando se iniciou - e já passaram mais de 90 anos - a luta pela redução do horário semanal de trabalho e, se elas foram obrigadas a ceder, tal não ficou a dever-se a uma dádiva, mas por força da luta dos trabalhadores.
Dou de barato esses adjectivos, mas gostava de saber se o Sr. Deputado considera que as 501 organizações de trabalhadores, das mais representativas a nível nacional, que subscreveram e apoiaram o nosso projecto de lei são os terríveis revolucionários que referiu e que resolveram apoiar o projecto de lei do PCP. Entende que, nomeadamente as organizações católicas que apoiaram de uma forma' geral esta iniciativa do PCP, são terríveis organizações revolucionárias que apenas querem entalar o PSD?
Mais, o Sr. Deputado crê que os governos da Europa comunitária- e, se quiser, até incluo o da Grécia, país que, infelizmente, está mais próximo do nosso - são perigosos revolucionários quando aceitam, por exemplo, que hoje já se fale em 35 horas de trabalho semanal?
São assim tão revolucionárias, utópicas e com «pés de barro» as soluções vertidas no nosso projecto de lei?
Uma última questão. Creio que é, no mínimo, eticamente discutível, para não dizer condenável, que o Sr. Deputado venha aqui criticar e automarginalizar uma organização, como a CGTP, representativa no plano social e na vida nacional. A CGTP tomou uma opção e não me cabe a mim representá-la neste debate, porque não fui credenciado para o efeito. Creio, no entanto, que o Sr. Deputado demonstra ter um carácter autoritário quando considera que esta organização se automarginalizou por não estar de acordo com algumas das medidas propostas pelo Governo. Quer isto dizer que quem não está de acordo com o Governo é contra o regime democrático e contra as soluções justas? Então, basta estar em desacordo com o Governo para se ser automaticamente marginalizado?
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É preocupante este discurso, ainda para mais vindo de si, Sr. Deputado José Puig, pois apesar de ligado a questões laborais deste tipo, considera marginalizada esta poderosa organização sindical devido 8 posição de firmeza que tomou em relação are horários de trabalho.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Por último, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Penedos.
O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, na sua intervenção, o Sr. Deputado José Puig referiu que o Governo tinha cumprido, ao nível legislativo, tudo o que se referia ao Acordo Económico e Social de 1990. Deve tê-lo feito por distracção, porque, de facto, o Acordo não está cumprido. Faltam cumprir dois ou três aspectos que, para uns, poderão não ter muita importância, mas que consideramos serem extremamente importantes.
Um dos aspectos que não está resolvido tem a ver com a justiça e a resolução dos conflitos laborais.
Como é do domínio público, pois toda a sociedade portuguesa o sabe, qualquer conflito laboral que vá para tribunal tem um período de resolução que oscila entre três e cinco anos. Gera-se, assim, uma situação perfeitamente insustentável para aqueles que dependem de um vencimento, de uma única forma de vida, do que resulta do seu trabalho e que, numa situação destas, certamente se encontrarão em grande dificuldade.
Outro desses aspectos relaciona-se com a questão da segurança social, que está a ser discutida neste momento no Conselho Económico e Social.
Refiro-lhe apenas estes dois aspectos para lhe mostrar que, de facto, o Acordo Económico e Social não foi todo cumprido, apesar de terem sido feitas as coisas com carácter positivo.
Mas há um aspecto extremamente importante que o Sr. Deputado aqui aflorou e que resulta da aplicação de um princípio que tem por objectivo adaptar os horários de trabalho em Portugal, de forma a que, em 1995, sejam atingidas as 40 hora: semanais. Esse objectivo das 40 horas parece ser, ao nível da afirmação política, a vontade dos maiores partidos portugueses ou, pelo menos, dos partidos com maior representação na sociedade portuguesa.
No entanto, há um dado que é importante a reter, pelo que gostaria que o Sr. Deputado fosse capaz de responder, clara e objectivamente, à questão que lha vou colocar.
Sendo verdade que se pretende caminhar no objectivo da adaptação dos horários de trabalho para as 40 horas semanais até 1995, e sendo também verdade que até ao momento apenas dois ou três sectores de actividade conseguiram, por via da negociação colectiva, essa mesma redução, como é que o Governo e o seu partido pretendem intervir no sentido de criar condições para que, ao nível da negociação colectiva, seja efectivamente possível atingir nessa altura a redução real do horário de trabalho para as 40 horas?
Era esta, concretamente, a questão que lhe queria colocar, pois é com dados objectivos e com respostas claras relativamente a esta matéria que poderemos saber se vai ser ou não possível que patrões, empregados e Governo, enquanto protagonistas da gestão tripartida de um acordo económico e social, serão ou não capazes de concretizar aquilo que é a afirmação do dia a dia.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Puig.
O Sr. José Puig (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação à primeira pergunta que a Sr.ª Deputada Odete Santos me colocou - o que é que o PSD ou o Governo vão fazer para se chegar, através da negociação, até às 40 horas semanais -, quero fazer algumas considerações e penso com isso responder ou, pelo menos, focar a maior parte das questões que me foram colocadas,
Disse também o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca que a redução do horário de trabalho é uma reivindicação social justa; igualmente, o Sr. Deputado André Martins afirmou que tal redução é justa, assim como o Sr. Deputado Jerónimo Martins.
Mas, analisemos este assunto do seguinte modo. Primeiro ...
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Jerónimo Martins, não!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Tem sempre os patrões na cabeça!
O Orador: - Apenas citei o que me disseram. Agora é que vou passar a emitir a minha opinião, Sr. Deputado, tenha calma. Citei apenas o que tinham dito diversos Deputados.
Vozes do PCP: - Citou Jerónimo Martins!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Tem sempre os patrões na cabeça!
Vozes do PSD: - O Sr. Deputado é Jerónimo de Sousa.
O Orador: - Não tenho dúvidas, Jerónimo de Sousa?!
Vozes do PSD: - Jerónimo de Sousa e não «Martins».
O Orador: - Foi Martins que eu disse? Talvez sejam familiares e daí a minha confusão. Tem até algumas parecenças.
O Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, quando fez o seu pedido de esclarecimento, mostrou que não ouviu com muita atenção a minha intervenção. Ora, penso que merecia isso, pois ouvi a sua com a maior atenção, pois tenho por si um certo apreço pessoal, como é do seu conhecimento, e, portanto, merecia pelo menos isso.
Não há dúvida, quero que fique bem claro, que o problema das 40 horas de horário semanal de trabalho é uma questão justa, é uma reivindicação dos trabalhadores que é correcta e que deve ser concretizada. Mas, no nosso interesse nós trabalhadores - a aí está a nossa divergência em relação aos meios utilizados -, deve ser concretizada gradual e progressivamente, com bases sólidas, de modo a que os custos desta adaptação não venham a reflectir-se, em termos de perdas de emprego e de salários - que surgem logo a seguir às padas de competitividade e de produtividade das empresas, sobre os trabalhadores e as suas famílias.
É sobre os meios utilizados que não estamos de acordo. Entendemos que, do modo como o PCP propõe estas alterações, esta redução para as 40 horas tem «pés de barro» e vai repercutir-se negativamente na pró
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Ainda a propósito de tudo isto, Sr. Deputado Artur Penedos, respondo já à questão que me colocou, de como é que o Governo vai fazer para que se possa atingir o ano de 1995 com uma redução real do horário de trabalho para as 40 horas semanais.
Em primeiro lugar, através do diálogo e da concertação social.
Em segundo lugar, estão a ser atingidos actualmente, na negociação colectiva, esses objectivos. O projecto de lei do Partido Comunista, no seu preâmbulo, aponta para quatro anos. Ora, a realidade é a que conhecemos, polo que essa redução deve ser feita à média de uma hora por ano e, portanto, este ano o horário de trabalho deverá ter apenas uma hora menos do que as 44 previstas na Lei n.º 2/91.
Em terceiro lugar, deixemo-nos de ilusões, pois só será possível conseguir esses objectivos através de instrumentos macro-económicos. 15to é, sem o aumento da produtividade e da rentabilidade, sem poder de concorrência das empresas portuguesas, nunca mais, por mais leis que façamos, conseguiremos que este e outros objectivos, por mais importantes que sejam, como os salários reais e segurança social, possam ser alguma vez atingidos. Sem esse enquadramento, serão esses níveis de competitividade, de pleno emprego, como há pouco lhe disse, que serão perfeitamente deitados por terra e prejudicados irreversível e irremediavelmente por este método de mudanças bruscas e de intervenção legislativa, como o PCP agora propõe.
É esta a nossa convicção. Temos a nosso favor, aliás, a prática dos últimos anos. Quando se adoptaram esses métodos pagámos bem caro - principalmente os trabalhadores - nos anos seguintes. Com os métodos que actualmente estão a ser seguidos os resultados são bem diferentes, em beneficio dos próprios trabalhadores, e estão bem à vista.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Ah! Ah! Vá perguntar aos trabalhadores da Torralta!
O Orador: - Em relação a algumas questões concretas, a Sr.ª Deputada Odete Santos disse que tinhamos revogado a taxa de 25 %. Repare, revogámo-la quer para o trabalhador quer para a entidade empregadora. Não é segredo nenhum.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - E a gente repõe para os patrões!
O Orador: - O Sr. Deputado Jerónimo de Sousa há pouco disse que foi esquecimento e que também queriam revogar. Agora a Sr.ª Deputada diz que só queriam revogar para o trabalhador. Mas por que é que tínhamos de estar agarrados ainda a estes conceitos marxistas? Srs. Deputados do PCP, gostava que me explicassem como é que o prejuízo e o constante agravamento de ónus e impostos para as empresas beneficia os trabalhadores? A realidade, os tempos da história mostraram que não! As coisas não funcionam assim. Se as empresas abrirem falência vai tudo para o desemprego.
Risos do PCP.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Mesmo assim elas abrem falência! Para que é que publicaram o Código das Falências?
O Orador: - O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca perguntou como é que compatibilizo, depois deste discurso a favor da concertação social - foi, de facto, a única pergunta concreta que me fez -, o Decreto-Lei n.º 398/91, segundo o qual a duração normal do trabalho semanal pode atingir 50 horas, com o tal acordo económico e social. Vou dizer-lhe como é que o faço: lendo o acordo económico e social, coisa que o Sr. Deputado não fez...
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Não lhe fiz a pergunta assim!
O Orador: - ... e que lhe vou ler, por causa disso! Diz o mesmo Acordo Económico e Social: «Visando atingir e tendo como linhas orientadoras um limite de duas horas diárias além do horário normal e de 50 horas por semana, sendo a computação global feita, em princípio, em três meses». É este o Acordo a que se chegou em termos de trabalho suplementar. Estão aí expressos, o Governo comprometeu-se a transcrevê-los através de intervenção legislativa. É assim, tão facilmente, que compatibilizo esse decreto-lei com o Acordo: lendo, coisa que o Sr. Deputado não fez. Agora, até o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca os compatibiliza perfeitamente. A lei e o Acordo, mas primeiro é preciso lê-los.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - O seu discurso não tem nada a ver com esta lei!
O Orador: - Quanto à questão que me coloca o Sr. Deputado André Martins - e que penso também ser a única -, sobre a média comunitária e o facto de Portugal estar abaixo, em termos de horário semanal, da média comunitária, isso é verdade.
Por isso, fazemos este esforço no sentido de caminhar - que entendemos correcto e que protagonizamos da maneira que cremos ser a melhor para se atingir o próprio objectivo - para as 40 horas semanais.
Refiro-lhe apenas, só como pormenor, e a propósito das 50 horas semanais, do trabalho suplementar e das dificuldades que daí possam surgir, que isso existe ainda só sob a forma de proposta, mas vai ser elaborada dentro de pouco tempo uma directiva comunitária em que todos os países estão de acordo. Será assim que serão feitos os cálculos na Comunidade: a média semanal de trabalho será feita, pelo menos, em meio ano, ou seja, todos estão de acordo em que durante uma semana, duas ou um mês até, haja médias muito mais altas, ...
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - 15so não quer dizer que seja muito bom!
O Orador: - ... Pelo que, portanto, se permitirá o trabalho suplementar. Alguns têm previsões destas médias acima das 50 horas, mas há aqui divergências porque vários países defendem um ano e outros só meio ano.
Temos de ter, portanto, em atenção a flexibilidade e o espírito de adaptação que em toda a Europa comunitária existe em relação a essa prestação de trabalho e é isto que defendemos aqui.
Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, não disse que a CGTP-IN está a ser marginalizada de coisa alguma. O que afirmei foi que se automarginalizou. Parece-me evidente que todos perceberam isso, não fomos apenas nós, foi toda a opinião pública, e se se automarginalizou não foi do Governo, nem é isso que nos preocupa. O que é
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preocupaste e manifestei a minha opinião sobre isso, no sentido de expressar essa preocupação - é que se automarginalizou do esforço conjunto da esmagadora maioria dos empresários e dos trabalhadores deste país para atingirem determinados níveis de protecção no emprego, de melhoria das condições de trabalho, de aumento do nível de produtividade e de rentabilidade das empreses.
Aplausos do PSD.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Não apoiado! Está a deturpar as palavras e os factos!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.
O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O tema da redução da duração do horário semanal de trabalho normal tem sido amplamente discutido nesta Câmara por via de diferentes projectos ou propostas de lei que mereceram apreciação em sessão plenária da anterior legislatura, designadamente os projectos de lei n.ºs 361 e 592, respectivamente, do PS e do PCP, bem assim como da proposta de lei n.º 93/V.
Este facto parece querer dizer que tem havido produção legislativa adequada e atempada em ordem a acompanhar utilmente o objectivo da redução da duração do trabalho, visivelmente sugerida pela dinâmica social e legítima aspiração dos trabalhadores.
Ora, não é verdade! Tem abundado a discussão sobre esta matéria, mas não se tem legislado em conformidade. Melhor exemplo para esta situação é a constatação simples de que desde o Decreto-Lei n.º 409, de Setembro de 1971, em que se fixou o limite máximo nas 48 horas semanais apenas veio alterar-se tal limite para 44 horas semanais, por via do Decreto-Lei n.º 348/91, de 16 de Outubro.
Convenhamos que, ainda que se trate - e estamos de acordo - de matéria de grande sensibilidade, verdade é que a maioria parlamentar não tem demonstrado capacidade sequer para apreciar as propostas que a oposição vem apresentando.
O PS apresentou, vai para trás anos, um projecto de lei no sentido da redução progressiva do limite máximo da duração semanal do trabalho.
Então, estávamos perante legislação que continha ainda o limite das 48 horas e pretendia-se que esta Assembleia apreciasse e votasse não apenas a redução imediata para as 44 horas mas também a progressiva redução deste limite para o objectivo definido aí, de 40 horas semanais, como, aliás, se prevê no projecto de lei do PCP, ora em discussão.
Este projecto do PS não foi aprovado, pois teve os votos contra da maioria do PSD.
Na oportunidade desse debate o Governo e o PSD - este justificando assim o seu voto negativo sustentaram que esta era uma matéria cuja cadência de evolução devia ser marcada pelos parceiros sociais, podendo o legislador assumir apenas, quando necessário, a normativização de certos consensos. Ou seja, dizia então o Governo e o PSD: «Meus senhores, não devemos inviabilizar o debate e o provável acordo na concertação social e por isso não vamos aprovar nenhum projecto de lei.» Assim fizeram!
15to, apesar de não negarem o carácter progressista e de prudente evolução controlada e gradual, que o PS pretendia ver assumido, através desse mesmo projecto de lei.
Poder-se-ia agora discutir da validade de tal disposição, significar que, desta forma, mais não se pretende ou obtém que a memorização da função da Assembleia da República nesta matéria, como poderá, eventualmente, argumentar-se que não devemos ser indiferentes à evolução que, em sede de concertação, se vai ou, simplesmente, pode consensualmente obter.
Não é essa, em nosso entender, uma questão essencial para este debate, hoje. Tanto mais que acertado será considerar que sede privilegiada para obter consensos evolutivos, relativamente a tona matéria tão sensível como é a da duração do trabalho, que cumpram o mais fielmente possível com o seu enquadramento numa política económica e social, é, sem dúvida, a concertação social.
É inegável para nós, PS, que deve privilegiar-se a via da contratualização, o que significa dizer, da definição pelos empresários e trabalhadores, sem constrangimentos ou tutelas administrativa, da melhor e mais adequada solução para os diversos sectores de actividade, quanto à duração do trabalho,
A redução e adaptação do tempo de trabalho é uma questão complexa que pode, no entanto, se adequadamente promovida, ser um dos principais instrumentos de uma política activa de emprego e um importante contributo para o melhoramento das condições de vida e de trabalho.
É verdade que o progresso tecnológico, ao nível da empresa, permite reduzir o tempo de trabalho e, simultaneamente, suscitar a necessidade de plena utilização dos equipamentos, mas também é certo que a redução do tempo de trabalho permite salvaguardar empregos ameaçados, sendo mesmo viável em períodos de recessão económica e de processos de reestruturação industrial. É também verdade que uma melhor organização do horário de trabalho permite naturalmente que a empresa obtenha ganhos de produtividade ou de competitividade. Se procedermos a uma análise comparativa simples entre Portugal e os demais países da Comunidade Europeia constata-se tuna diferença acentuada, e para pia entre nós, quanto à média de duração do trabalho.
Por outro lado, sendo as durações semanais do trabalho em Portugal mais diversificadas que na Europa, tal facto resulta na manutenção de acentuados factores de injustiça, designadamente para as profissões mais penosas e, quantas vezes, pior retribuídas. Não espanta, portanto, que a redução da duração semanal do trabalho seja, desde há muito, uma justa aspiração dos trabalhadores, em busca de uma melhor qualidade de vida não apenas por via da garantia de tempos de repouso mas também pela garantia evidente do seu direito individual à saúde e à segurança.
Estas considerações enformam, aliás, as preocupações consensuais contidas no Acordo Económico e Social outorgado em Outubro de 1990. E impõe-se que aqui se ressaltem algumas das medidas, que do Acordo constam, quanto ao limite máximo da duração semanal do trabalho, e cito: «O Governo e as confederações signatárias acordam no seguinte calendário, a ser desenvolvido no quadro da negociação colectiva, visando articular a adaptabilidade dos horários de trabalho, necessário ao melhor funcionamento das empresas, com um ritmo que visa atingir as 40 horas, em 1995, e tendo como linhas orientadoras: um ritmo de redução de uma hora por ano ou outra estabelecida na negociação colectiva; um dia de descanso obrigatório e um dia de descanso suplementar que pode ser repartido e passível de regime diferenciado a fixar pela negociação colectiva.»
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Convencionou-se também, como medida a implementar, o estabelecimento de compensações a conceder a trabalhadores sujeitos a trabalhos penosos, perigosos ou outros pela diminuição da duração semanal do trabalho. E acrescentou-se também a intenção de revogação da necessidade de autorização administrativa para a redução da duração do trabalho.
Estas e outras disposições de vontade foram outorgadas em concertação social em 1990 e estamos já em 1993.
É inevitável, assim, acrescentarmos à nossa reflexão uma palavra de balanço, passados que são mais de dois anos, para dizer que pouco se terá evoluído no sentido acordado, nomeadamente em relação a questões que são essenciais e que exigem uma gradualização atempada. 15to, para que não se venha a dizer, em 1995, «mão» a propostas que, eventualmente, se limitem a repor as decisões do acordo económico e social, alegando nessa altura serem precipitadas ou pouco avisadas. E não se esqueça que o Acordo Económico e Social é um acordo tripartido, outorgado entre o Governo e as representações dos empresários e trabalhadores.
O Governo não é, assim, parte neutra, tanto mais que, e sem prejuízo do privilégio a conceder à negociação colectiva, disposições há que, sobretudo, respeitam à vontade política do Governo e da maioria que o apoia, vontade essa que, por força do Acordo, se tornou em obrigação.
Impõe-se assim não apenas o acompanhamento da evolução nas diferentes áreas de contratualização como também o conhecimento da vontade do Governo de assumir ele próprio a sua responsabilidade na ausência de melhor solução.
O Governo e o PSD têm, por exemplo, de dizer se entendem ou não que se estão a criar condições objectivas para que se atinja o objectivo previsto e anunciado da redução para 40 horas semanais de duração de trabalho.
Acrescente-se também que o envolvimento de Portugal no quadro da construção europeia e do Mercado único implica um maior e efectivo empenhamento na normalização das diferenças e do necessário ajustamento para os níveis médios comunitários. E estas obrigações reportam não apenas aos limites máximos da duração semanal do trabalho como também à organização do tempo de trabalho, tendo em vista a melhoria das condições de vida.
Aponta nesse sentido, aliás, a última directiva comunitária sobre duração do trabalho, repouso diário, semanal e anual, trabalho nocturno e protecção em matéria de segurança e saúde. Não devemos ignorar que não é apenas a redução da carga semanal de trabalho que se impõe mas também uma necessária e inovadora gestão desse tempo de trabalho, da sua flexibilidade, do trabalho nocturno e suplementar, de acordo com a realidade sócio-económica do nosso país.
A redução do tempo de trabalho e a introdução de novas tecnologias são ao mesmo tempo a ocasião e o meio de modernizar a organização do trabalho, melhorando as suas condições e adaptando os métodos de produção às condições económica e técnica modernas.
É assim, por um lado, um meio importante para, sob as suas diversas formas, conter a carga individual de trabalho e ao mesmo tempo melhorar as condições de exercício e, por outro, evitar que as modificações da organização do trabalho acarretem perda de postos de trabalho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos um longo caminho a percorrer nesta área. Os limites máximos, bem como as medidas legais ou contratuais da duração semanal do trabalho, em Portugal, estão ainda distantes das médias comunitárias. E convém não esquecer, sob pena de injustiça e de desconsideração, que as médias nacionais, entre 34 e 44 horas semanais, ocultam situações profundamente negativas, pois é nos níveis mais altos que se situam, exactamente, as profissões com exercício mais penoso ou duro. Ás profissões pior remuneradas e de maior desgaste físico correspondem ainda, em Portugal, uma maior carga horária de trabalho, facto que não pode deixar de nos merecer atenção para que se promova a alteração, que é, obviamente, de justiça. E se a esta reflexão acrescentarmos o facto de as profissões que têm horários menos pesados - estamos a lembrar-nos, por exemplo, dos serviços, como a banca e os seguros - se vêm confrontadas permanentemente com a obrigação de excederem o seu horário normal, permanecendo mais tempo no seu trabalho, concluiremos que as médias nacionais são bem mais altas e gravosas para os trabalhadores do que os próprios números parecem dar a entender.
Tudo justifica e aponta para a oportunidade de definir, de forma efectiva e clara, o sentido da evolução da redução do horário semanal do trabalho e questões que lhes são adjacentes, como o descanso semanal, o trabalho extraordinário, o trabalho por turnos, entre outros. Tanto mais, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a Comunidade Europeia não tardará a impor, por via normativa, soluções diferentes das actualmente consagradas na legislação nacional, desde logo porque tais obrigações podem alterar significativamente as condições de concorrência no âmbito dos países comunitários. Referimo-nos, por exemplo, a questões como a higiene e segurança nos locais de trabalho, a formação profissional permanente, a participação dos trabalhadores e, sobretudo, a gestão e duração do tempo de trabalho.
A redução do tempo de trabalho deve sempre associar-se directamente com a organização e gestão desse mesmo tempo, pois só por essa via se cuida do bem-estar e saúde dos que trabalham e do equilíbrio necessário à boa gestão empresarial. Só assim se promove não apenas a qualidade de vida dos trabalhadores e suas famílias como também se assegura a competitividade e produtividade da empresa, ambos inquestionáveis valores de natureza económica e social.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A redução para 40 horas da duração semanal do trabalho, prevista no projecto de lei em discussão, é um objectivo que importa atingir e que, como atrás dissemos, o PS já propôs no projecto de lei n.º 361/V, da anterior legislatura.
Já então dizíamos que era inaceitável que, por acção conjugada da lei e da convenção colectiva, a duração semanal do trabalho em todos os outros Estados membros da Comunidade Europeia não ultrapassasse as 40 horas e que em Portugal tal estivesse ainda longe de acontecer.
Por isso é que, interpretando o objectivo da redução do trabalho não só como cumprimento de uma aspiração justa dos trabalhadores portugueses mas também como medida viabilizadora e privilegiada de modernização da empresa e do progresso social, se propôs a gradualização da redução do horário. Atingir-se-ia assim o objectivo pretendido sem minimamente pôr em causa ou sequer permitir que se questionasse a produção e a competitividade da empresa. Não foi aprovado, como os Srs. Deputados bem sabem, este projecto do PS.
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Entretanto, a duração semanal do trabalho foi reduzida para 44 horas e não obstante na fundamentação do Decreto-Lei n.º 348/91, de 16 de Outubro, se defender a redução progressiva, nada se define no seu articulado, ficando simplesmente balizado o limite máximo de 44 horas.
De então para c$, a evolução - linda que escassa ao nível da contratação colectiva permitiu avançar em alguns sectores para o limite das 40 horas, e estamos a falar desde logo do sector do vestuário que definiu redução progressiva para 40 horas até 1995, dos sectores da construção civil que fixou o calendário de redução até 1995 e da agricultura igualmente com projecção de redução para 40 horas, mas esta já para 1994.
A conjugação destes avanços na contratação colectiva, como o projecto do PS a que fizemos referência, com o constante do Acordo Económico e Social a que o Governo se vinculou e, bem assim, como o projecto de lei do PCP hoje em discussão transporta-nos à conclusão simples de que todos nos declaramos favoráveis à redução da duração semanal do trabalho - designadamente para as 40 horas não coincidindo, no entanto, na extensão temporal e no método a adoptar para tal medida.
Importa reter a contratualização de tal limite, já hoje definido em alguns, mas poucos, sectores, e o prudente princípio, por nós definido, da gradualização efectiva da redução para obviar a eventuais riscos de quebra de competitividade ou produção nas empresas.
Nessa medida, o PS está de acordo com a redução da duração semanal do trabalho para 40 horas, objectivo que igualmente defendeu em iniciativa legislativa própria, e mostra-se disponível para procurar em sede de especialidade consensualizar o faseamento da sua aplicação.
O projecto de lei propõe, quanto ao descanso semanal, que o mesmo deverá ser de dois dias seguidos nos casos em que, para além de um mínimo de um dia e meio de descanso semanal obrigatório, for estabelecido, através de negociação colectiva, o direito a meio dia de descanso suplementar.
Crê o PS que existem condições para que esta possibilidade sugerida no diploma agora em discussão deva ser de facto implementada, não apenas naqueles casos mas generalizadamente, fixando-se o princípio dos dois dias de descanso semanais, para o que, aliás, aponta o já outorgado em concertação social.
No trabalho por turnos em regime de laboração contínua e de trabalhadores que prestem serviços que não podem ser interrompidos, designadamente os guardas, as vigilantes e os porteiros, é, sem dúvida, necessário que se encontre solução legislativa no sentido de o dia de repouso vir a acontecer imediatamente antes ou depois do período de descanso semanal. Por outro lado, sendo o trabalho por turnos potencial ou genericamente mais prejudicial aos trabalhadores quanto à sua pessoal, familiar ou cívica disponibilidade, justo será que se lhe criem condições menos gravosas para a sua efectivação.
O trabalho extraordinário, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é também uma matéria de actualidade não tanto ao nível dos princípios ou das razões justificativas da sua prestação mas, essencialmente, ao da responsabilidade ou da obrigação do seu pagamento pelas entidades patronais.
São conhecidas inúmeras situações em algumas áreas de trabalho, designadamente na dos serviços - e cito, por exemplo, os seguros ou a banca - em que, quase diríamos, naturalmente, que os trabalhadores são instados a prolongar a sua prestação de trabalho em trabalho
suplementar, sem que vejam ml prestação compensada com a retribuição correspondente, o que é, obviamente, inaceitável.
Debateremos, no entanto, a proposta contida no articulado do projecto lei, que não nos parece adequadamente rigorosa, para atingir os fins que ela própria se lhe reconhece e pretende.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A redução da duração semanal do horário de trabalho e a beneficiação legal de matérias que lhe são conexas, é uma questão que se impõe não apenas por corresponder a uma justa reinvidicação dos trabalhadores portugueses mas também porque significará um factor de correcção de desigualdades, sem deixar de impulsionar uma gestão de tempo de trabalho racional e moderna.
Acresce que na adequação da realidade portuguesa ao contexto do mercado comunitário, ao contrário do que sistematicamente se tem feito, implica que a componente social da integração se valorize e tal não é possível sem que se assegure a melhoria das condições de vida dos cidadãos.
Importa por isso que, sem prejuízo de considerarmos que a contratualização e a negociação em sede de concertação social constituem um meio privilegiado para a concretização desses objectivos, não nos quedemos todos, e em especial o Governo, numa expectativa passiva e inaceitável, que só resulta em prejuízo para o País.
O PS reafirma a sua disponibilidade e, mais ainda, a sua vontade política de participar numa solução legislativa consensual, de aplicabilidade coerente e prudente, mas efectiva, que confira ao problema da duração e gestão do tempo de trabalho o seu papel de importante instrumento da política empresarial e de emprego e que potencie uma melhor produtividade e valorização dos nossos recursos humanas.
Queremos assegurar às empresas e aos trabalhadores o regime de trabalho adequado para que, rapidamente, alcancemos os níveis de produção, a qualidade de trabalho e de vida das empresas e dos cidadãos dos demais países da Comunidade Europeia, no verdadeiro caminho de progresso e desenvolvimento social, que queremos para Portugal.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.
O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate vai morno, ...
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Queria que jogássemos á pancada?!
O Orador: - ... Porque este tema tem sido uma decorrência nesta Câmara,
A redução do período normal de trabalho é um assunto que somos chamados ciclicamente a debater nesta Câmara e é certo, conceda-se, que tem sido tema de conversa e de debate também em outros sítios sociais e políticos, não só em Portugal como também na Europa Ocidental.
Quanto ao resultado deste debate, pode dizer-se que constitui um dado assente e definitivamente adquirido, porque está contido no consenso verificado por todas as forças sociais e políticas dos mais diversos quadrantes. Toda a gente está de acordo quanto à meta de um limite
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máximo de 40 horas semanais, objectivo que, quando for atingido, nos colocará a par da maioria dos países desenvolvidos. Mas, em Portugal, este tema tem sido, por vezes, tratado sem grande proveito e sobretudo sem grande elevação, visto ser, muitas vezes, tratado mais como uma arma de arremesso político do que como uma preocupação social fundamental deste ou daquele actor do nosso sistema político.
As posições e as soluções apresentadas, quanto a este assunto, têm pecado muitas vezes por simplismo, por alguma leviandade e por uma intenção, e diria, quase mediática. A economia portuguesa não ombreia, como a maior parte dos países industrializados e desenvolvidos, em muitos dados, em muitos factores e em muitos índices, pelo que o CDS é contra estas reformas desequilibradas que pretendem transformar o nosso país num pais desequilibrado do ponto de vista social e económico, do crescimento e do das prestações.
Não faz sentido ter um sistema social, nomeadamente quanto à duração do trabalho, que ombreie com os países mais desenvolvidos e ter, por exemplo, um sistema fiscal semelhante ao dos países em vias de desenvolvimento ou um sistema de segurança social em crise e também mais semelhante ao dos países em vias de desenvolvimento. Não faz sentido desarmonizar os progressos, sejam eles destinados a quem quer que seja.
Portanto, a economia portuguesa não só não está a par das economias europeias que apresentam esse sistema de horário de trabalho nem nos parece que, neste momento, tenha capacidade de absorção de um choque estrutural como o que o Partido Comunista pretende introduzir.
Entendemos que o Acordo, quanto ao resultado, está bem, mas que o modos operandi, que o caminho em direcção a essa meta é pausado, ponderado e cauteloso, pelo que não nos resta qualquer dúvida de que este não é o timing, a oportunidade, para o que o PCP nos vem propor, muito pelo contrário, a aprovação deste projecto de lei poderia criar na nossa estrutura económica, actualmente débil, como é reconhecido por todo o lado, um sobressalto de consequências dificilmente imagináveis, que, seguramente, redundariam em desfavor tanto de empresários como de trabalhadores. A ilusão do Partido Comunista é a de que este novo regime iria favorecer o emprego, aumentar a procura de emprego. É uma ilusão, porque para isso o PCP precisaria de um outro projecto de lei, um que obrigasse as empresas a empregar, uma vez que o clima actual não é esse, infelizmente - e aqui não partilho do optimismo do PSD. O clima actual é de reestruturação e de ameaça de desemprego, por razões de racionalidade económica.
Logo, neste quadro e neste ambiente, este projecto do PCP não faz sentido e existem exemplos de que assim é.
Os Srs. Deputados do PCP disseram aqui, várias vezes, que este projecto e este regime estavam ligados à situação do emprego, é evidente que assim é, só que ninguém sabe qual é o tipo de relação que existe entre o encurtamento da duração do trabalho semanal e a situação do emprego. Conhecem-se alguns casos históricos em que a situação foi negativa para os trabalhadores, como é, por exemplo, o de França, e sabe-se que as empresas reagem de modo diferente a esta situação. Sabe-se isso, em geral e em abstracto, mas, em concreto, no clima de pré- recessão económica, que é o existente em Portugal, é provável que este regime, a ser aprovado, não tivesse qualquer efeito benéfico sobre o emprego, que nesta situação as empresas reagissem todas ou melhorando a sua capacidade produtiva,
através de inovações tecnológicas, ou transigindo com uma redução da produtividade, da sua capacidade produtiva e da sua competitividade paradoxalmente, numa altura em que ela constitui um desafio.
Nesta como em muitas outras matérias, é bom que a Assembleia da República fixe um princípio,' uma meta, mas não é bom que queira marcar o ritmo, que será estabelecido por acordo, com flexibilidade, entre os interessados, em sede de concertação social, no diálogo entre as empresas e os trabalhadores que, de facto, já produziu alguns resultados úteis, mesmo neste domínio.
Não vemos, portanto, qualquer razão para acelerar aquilo que ficou acordado em sede de concertação social. Pelo contrário, neste momento, em Portugal, o que vemos são razões para pôr em dúvida se conseguiremos atingir o objectivo que está nesse Acordo tão depressa quanto todos querem.
Risos do PCP.
De resto, não é por decreto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que se altera a realidade da economia nacional. O Partido Comunista sabe-o bem e, por isso, se permite apresentar uma iniciativa deste tipo, confiando, porventura, na sua não aprovação.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Não apoiado!
O Orador: - Uma vez mais este tema é invocado, única e exclusivamente, como arma de arremesso, para contentamento de alguns lobbies, ainda que bastante respeitáveis, como operação - se quiserem - de concertação com a CGTP- Intersindical.
Neste clima, com estas motivações e com este ambiente, o CDS não dará a sua aprovação ao projecto de lei do PCP.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Lobo Xavier, terei de ser muito rápido, no entanto, gostaria de lhe colocar algumas questões. E centrar-me-ia, ao fim e ao cabo, naquilo que é o tema fulcral, a que o CDS se agarra e, aliás, também, em boa parte, o PSD - para rejeitar o nosso projecto de lei.
Gostaria de começar por dizer-lhe que apresentámos este projecto de lei com a perspectiva de que pretendemos que ele seja aprovado. Se hoje for rejeitado, insistiremos, nos termos regimentais e quando for oportuno, para que ele seja novamente discutido e faremos novamente uma tentativa no sentido da sua aprovação. Não desistiremos enquanto não conseguirmos a redução do horário semanal máximo para 40 horas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Mas a questão central, a que o Sr. Deputado se agarrou, é o problema da competitividade. Mas há aí um sofisma que já há pouco foi levantado pela bancada do PSD, sobre a questão da produtividade. É que quando os senhores falam na produtividade apenas pensam e apenas se referem à chamada produtividade aparente, à chamada produtividade do trabalho e esquecem os outros
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factores de produtividade e os outros factores da competitividade.
O Sr. Deputado António Lobo Xavier faz tanta acusação ao projecto de lei do PCP, dizendo que podia lançar as empresas na falência, e cala aquilo que está neste momento a suceder em termos de competitividade das empresas portuguesas, quer pela política monetária, quer pela política cambial! O Sr. Deputado cala a ausência de investimento nos chamados factores dinâmicos de competitividade, decorrentes, fundamentalmente, da política do Governo, não apenas das políticas monetária e cambial e de outras políticas macro-económicas, mas também porque os empresários são pouco incentivados a fazerem investimentos para aumentar a sua competitividade, precisamente porque têm o recurso fácil a uma mão-de-obra barata e que, ainda por cima, trabalha muito mais do que nos outros países comunitários!
Estas questões é que são centrais. E não pode ser, como o CDS pretende - aliás, mostrou-se mais papista que o papa, considerando papa, neste caso concreto, o PSD -, dizendo que considera que nem em 1995 se deve reduzir o horário de trabalho para 40 horas semanais. É normal que o CDS pense assim!
Mas o Sr. Deputado António Lobo Xavier não entende que é altura de se dizer não a que sejam exclusivamente os trabalhadores a suportarem os custos dos erros das políticas e os custos dos erros de gestão dos empresários?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.
O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, por vezes V. Ex.ª não me ouve bem, mas a culpa será minha, com certeza.
Em primeiro lugar, e para responder a uma dúvida de pormenor, quando falei em 1995 e nas dúvidas sobre a possibilidade de se atingir essa meta, não fiz isso com o sentido de uma condenação. Sou a favor dessa meta, mas o que temo é que se levantem obstáculos a ela que, porventura, algum dia, não sejam superáveis. Portanto, é uma questão de cepticismo e não uma questão de juízo de valor sobre a meta, o que fiz questão de salientar claramente.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira está enganado, pois não insisti na questão da produtividade mas, sim, na questão da competitividade. E é injusto que o Sr. Deputado diga V. Ex.ª está, porventura, virado para a bancada errada- que eu e, designadamente, o CDS temos calado os factores que, ligados à política económica do Governo, têm prejudicado a competitividade. Ainda há poucos dias, não foi outro o leit motiv das minhas intervenções a propósito do Orçamento do Estado e disse-o também agora.
Não há qualquer razão para acelerar o ritmo do processo de chegada a essa meta, por razões internas da conjuntura portuguesa, à qual estão ligadas, obviamente, os juros, o custo da energia e a política monetária. Não tenho a menor dúvida sobre isso!
Esperava que tivesse dito claramente que, do meu ponto de vista, esta medida o que constitui é mais uma agressão a essa situação e aos dados com que as empresas contam para reagir e para se adaptar. Se do seu ponto de vista esta medida não é uma agressão, do meu trata-se de mais uma agressão, de mais um escolho e de mais um obstáculo com que os empresários se defrontariam, se ela, porventura, viesse a ser aprovada.
O Sr. Presidente:- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Sérgio.
O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: O carácter de penosidade, desde sempre associado ao trabalho, encontra eco na própria decomposição etimológica do vocábulo trabalho (Tri-Palliare - Três paus que mortificavam os detidos).
Esta ressonância mortificante do trabalho nunca deixou de constituir um factor semântico e psicológico de desvalorização da actividade do homem, tomada na sua acepção mais lata.
O trabalho braçal, a que se tem predominantemente associado a extensa legião do operariado, não pode, contudo, pelo facto de socialmente menos dotada ou fisicamente mais exigente, ser considerado como algo menor e enxovalhante e que, só por isso, importe reduzir a todo o custo.
Antes do mais quero, pois, fazer a minha declaração de apreço e respeito pela dignidade de todo o trabalho, independentemente da expressão que assuma, porque é profundamente errado, creio, assentar exclusivamente numa perspectiva mecânica do trabalho, reducionismo que implica inevitavelmente. a sua desvalorização.
É o trabalho, enquanto expressão equilibrada, aceite e psicologicamente assumida da actividade humana, que importa promover.
O trabalho só tem aquela dimensão penalizante porque está desumanizado, porque não é o homem todo que trabalha mas apenas algumas partes especificas são obrigadas a desenvolver uma actividade, mais ou menos mec9nica, para que, por esta via, seja possível assegurar a sobrevivência.
Mas a instalação social da dicotomia trabalho - descanso, se tomada de forma absoluta, pode revelar-se igualmente perigosa. É que sugere a ideia de que ou se está ocupado com o trabalho obrigatório ou se está em descanso, isto é, sem fazer nada.
Importa, pois, que o próprio momento do trabalho seja valorizado porque enquadrado na multímoda motricidade do homem.
Mas reconhece-se, por outro lado, que a excessiva duração do trabalho, de qualquer tipo, com o ferrete psicologicamente condicionante da obrigatoriedade, absorve uma taxa exagerada e desproporcionada de energias, não deixando às pessoas espaço para a fruição lúdica e para outros modos de actividade humana. A propósito do ludismo, havia muito a dizer. O jogo é, inclusive, o principio de toda a cultura e de toda a criatividade, mas a palavra jogo é muito desvalorizada na nossa civilização predominantemente capitalista e mecanicista.
É por isso que não basta reduzir o tempo de trabalho, é preciso que essa redução implique uma outra e mais criativa disponibilidade.
É esta falta de garantia pedagógica e cultural que se nota na proposta apresentada, embora se reconheça que a mudança de mentalidades não se decreta.
Em qualquer caso, o PSN considera um passo positivo a diminuição do horário de trabalho, desde que a crescente dispensabilidade da mão-de-obra não venha a gerar uma multidão consumida pelo tédio e pelo desemprego da alma.
O PSN, ponderando as vantagens deste passo, embora não lhe atribua o valor absoluto que o PCP parece atribuir-lhe decide votar a favor deste projecto de lei.
O Sr. Silva Marques (PSD): - O Sr. Deputado rejeita o elogio ao ócio do Sr. Paul Lafargue?!
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O Orador: - O Sr. Deputado já está desactualizado!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É apenas para, aproveitando o minuto que me resta, saudar a apresentação deste projecto de lei pelo PCP e lembrar que, nesta altura em que se está aqui a discutir a redução do horário de trabalho semanal para 40 horas, há pressões do patronato para que, nomeadamente no comércio, se passe para 48 horas semanais, o que está a motivar um protesto generalizado dos trabalhadores.
A situação actual propicia o excesso de horário sem compensação, com os trabalhadores sem garantias de direitos nem de emprego a verem-se obrigados a ceder a essas pressões.
A redução do horário semanal para as 40 horas será um factor de pressão a favor da moralização do trabalho nas empresas e do comportamento do patronato e responde a uma necessidade dos trabalhadores, confrontados com mais desgaste, com o envelhecimento precoce, físico e psíquico, com doenças cardiovasculares e nervosas, com o problema dos transportes e com a falta de tempo de descanso, que os debilitam imenso.
Quando os ritmos aceleram na procura da produtividade, à custa do trabalho, como é que se podem aguentar tais ritmos durante os mesmos tempos de trabalho?
Considero que a redução do horário de trabalho é uma questão base da qualidade de vida, que não se opõe à concertação social, pois deve ser um parâmetro legal para a condicionar.
As promessas do Governo e do PSD, nomeadamente, para compensarem o famoso pacote laboral relativamente à higiene e segurança social e à redução progressiva do horário de trabalho, estão por cumprir. O PSD tem aqui uma boa oportunidade para cumprir a sua palavra e dar o passo que ainda não deu, apesar das promessas e apesar da Europa.
Vozes do PCP e de Os Verdes: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seja qual for o ângulo por que se debata a questão da redução do horário de trabalho em Portugal, a conclusão que se pode tirar envergonha o Governo e o PSD e bem poderia ser o mote para um novo Mestre Gil, que, convidado a festejar um qualquer evento do Ano Novo, por exemplo as «Janeiras», não deixaria de comentar. «Nunca vi Governo tal, em especial, tão notável de memória!» E seguir-se-ia, no conhecido estilo vicentino, acompanhado, quiçá,, do conhecido cavaquinho, o rol de medidas que assinalariam as verdadeiras características de excepção deste Governo.
Em três tempos, o Governo apadrinhou, legalizando-o, o trabalho precário; liberalizou os despedimentos; empurrou os trabalhadores para a contratação a prazo, para o trabalho à tarefa e à peça e para as subempreitadas (fornalha do trabalho clandestino); facilitou os despedimentos colectivos e aumentou o limite máximo de horas de trabalho suplementar permitidas, deixando, inclusivamente, a seguinte interrogação, não respondida pelo Sr. Deputado José Puig: com a revogação do artigo 6.º do Decreto-Lei n .º 421/83, de 2 de Dezembro, que trabalho extraordinário é que as empresas são obrigadas a pagar? Se forem feitas mais de 200 horas por ano, as empresas são obrigadas a pagar esse trabalho? Sintomaticamente, esta questão não foi respondida.
O Governo retirou também, aos trabalhadores que prestassem trabalho suplementar, a possibilidade de gozar descanso compensatório, num verdadeiro atentado contra a sua saúde física e psíquica; protelou, noutros casos, para um alargado período de 90 dias, a obrigação de conceder descanso compensatório, para um período em que esse descanso já não cumpre o objectivo da recuperação da saúde dos trabalhadores; tornou possível que o dia de descanso complementar fosse gozado de forma repartida ou diferenciada, pondo em riso o gozo continuado de dois dias ou de dia e meio seguidos de descanso; prepara-se ou, pelo menos, diz que se prepara até para, ao mesmo tempo que ataca determinados dias festivos do nosso calendário, desviar a comemoração de alguns feriados - isto tem a ver com esta questão; sancionou a compra, pelas entidades patronais, a baixo custo, de dias de férias; permitiu a banalização do trabalho aos sábados e a expansão do trabalho ao domingo; através de uma completa omissão quanto a infra-estruturas sociais de apoio à família, tornou inevitável o recurso ao trabalho a tempo parcial e alimentou o parasita do mundo laboral, os «alliens salários em atraso», que se multiplicam nas entranhas de trabalhadores - vão ao distrito de Setúbal e a( encontrarão muitos trabalhadores com salários em atraso ...
Quando o Sr. Deputado José Puig disse que estávamos em pleno emprego e que tudo confia da melhor forma do mundo, eu disse-lhe: «vá à Torralta, vá perguntar aos trabalhadores que têm os salários de Novembro e Dezembro em atraso e que não sabem se, no fim do mês, vão receber os de Janeiro! Vá perguntar-lhes se a situação é boa! » Este é apenas um exemplo.
Os salários em atraso estão aí de novo. De facto, eles nunca desapareceram, estavam amortecidos, mas, com este Governo, encontram boas condições para tornar a irromper em força.
O Governo impõe salários baixos, retirando aos trabalhadores o poder de compra. Mesmo aqueles que, como François Dalle, em França, se manifestaram negativamente pela redução do horário de trabalho, afirmaram que os salários tinham de participar no dividendo da nação. Não é o que acontece aqui! Se tivermos em conta as últimas estatísticas de base da Comunidade quanto aos salários dos operários das indústrias transformadoras, verificamos que, desde 1987 até 1990, Portugal, comparativamente com a Dinamarca, Alemanha, França, Irlanda e Holanda, regista o menor crescimento de ganhos médios horários brutos.
Relativamente à Dinamarca, o pais em que mais se ganhava em Outubro de 1990, Portugal (o pais em que menos se ganha no elenco dos países atrás referidos) atribui ao operário português apenas 15 % do ordenado do operário dinamarquês.
Convinha, de facto, fazer aqui estas referências porque as principais objecções levantados pelo PSD aos anteriores projectos de lei apresentados pelo PCP quanto à redução do horário de trabalho - e convém lembrar também que, em 1989, já discutimos aqui esta matéria- eram ameaças com uma catástrofe para os direitos dos trabalhadores, caso os mesmos projectos de lei tivessem vencimento.
Afinal, os projectos de lei não foram aprovados, a semana normal de trabalho de longa duração (como já o
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salientava, em 1985, a OIT em relação a Portugal) manteve-se e o Governo avançou com a concretização dos seus propósitos, retirando direitos conquistados e criando todos os mecanismos legais que possam vir a tornar possível a retirada de outros direitos.
Mais ainda: o Governo, mantendo longa a duração semanal do trabalho, avançou com medidas que noutros países só são reivindicadas pelo grande patronato como compensação pela redução do trabalho. Em Portugal, não precisou de haver uma redução para serem tomadas essas medidas.
Na verdade, o alargamento das possibilidades de prestação do trabalho suplementar (e todos sabemos como o trabalho precário empurra os trabalhadores para a obediência às determinações da sua prestação e mesmo à sua prestação gratuita), a compra do direito a férias, os turnos de 12 dias, a supressão do descanso compensatório, o alargamento do prazo para o gozo do mesmo, a repartição do gozo dos dias de descanso, o trabalho a tempo parcial, cumprem o objectivo de permitir ao grande patronato um período maior de tempo de utilização dos equipamentos e maiores ganhos.
O que é que os trabalhadores ganham com isto? Melhores salários? Não! Melhores condições de trabalho? Não! Bem pelo contrário, como é óbvio.
Os trabalhadores perdem: perdem na sua saúde física e psíquica e na sua estabilidade familiar; perdem as crianças e os jovens, com uma menor presença do pai e da mãe; perde, afinal, o País, porque, com tais medidas e com o agravamento dos ritmos de exploração, os ganhos de produtividade não podem aumentar.
A longa semana de trabalho, a que acresce o tempo de transporte, as longas horas passadas nos transportes públicos retiradas ao tempo de descanso, ajudam mesmo a provocar a alta taxa de sinistralidade laborar que o nosso pais apresenta.
Mas o Governo, escarnecendo das reivindicações dos trabalhadores, fez mais: puxou de uma esmola, juntou as migalhas do «festim» e atirou-as aos trabalhadores. Reduziu de 48 para 44 horas semanais o horário de trabalho, num quadro largamente ultrapassado pela negociação colectiva. Porém, não se esqueceu (nem poderia, de facto, esquecer-se) de apresentar a sobremesa no .banquete»: veio tornar possível que, em certas semanas, se trabalhe 50 horas, uma aspiração, aliás, já antiga do grande patronato. Com isto, mais uma vez, o Governo quer tornar possível uma maior utilização do equipamento das empresas.
E que riram de tudo isto os trabalhadores? Limitações na disponibilidade do seu tempo, redução dos seus tempos livres, instabilidade na sua vida social e familiar, limitações na sua participação na vida política, associativa e cultural, maior dependência relativamente aos detentores das riquezas, ao diktat da entidade patronal.
Assim, podemos, de facto, concluir que temos um Governo de excepção (no pior sentido, é claro!), que caminha ao arrepio dos tempos, das aspirações e conquistas dos trabalhadores, prejudicando, com estas políticas, a modernização das empresas e do País.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É claro que hoje também se pode reeditar a argumentação de que seria prejudicial para os trabalhadores tomar essas medidas. Sempre que ouço esses argumentos lembro-me de que se Molière fosse vivo gostaria, com certeza, de convidar um dos Srs. Deputados que faz essa afirmação pua o papel de Tartufo. De facto, e talvez melhor do que Molière, VV. Ex.ªs poderiam representar muito bem a hipocrisia que o autor quis criticar na sua peça.
Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
Também não queria deixar de fazer uma referência às promessas eleitorais do PSD, que, de resto, o Sr. Deputado José Puig se encarregou de ler aqui. De facto, o Sr. Deputado não trouxe nenhuma achega às acusações que foram aqui feitas de hipocrisia. O Governo promete que vai intervir na negociação colectiva para fomentar as 40 horas de trabalho semanal. Mas o Governo promete para cumprir? Que meios quer utilizar? É através da arbitragem obrigatória? É através do árbitro do Ministério do Emprego e da Segurança Social? É esse árbitro que vai impor as 40 horas semanais? Todos nós conhecemos os lobbies a que o PSD obedece e que respeita quando aqui vota iniciativas legislativas.
Temos então de concluir que, quando o Governo prometeu que ia fomentar essa negociação colectiva, sabia que isso não era verdade, pelo que estava a enganar, a tentar captar votos. Faço esta afirmação porque, logo após os votos arrecadados, portanto em 1991, apresentou um pacote de medidas altamente lesivas irara os trabalhadores.
Esquecem-se os que argumentam com razões puramente economicistas que a questão da redução do tempo de trabalho não pode ser apenas analisada do ponto de vista dos custos a cargo das empresas - isto consta até de uma proposta de resolução apresentada no Parlamento Europeu em 1986. Mas quem assim se esquece da vida dos trabalhadores e de que estes têm direito a usufruir amplamente das novas tecnologias, não ganhará nada com isso, porque o mundo não caminha para a visão pessimista do Admirável Mundo Novo, de Huxley. Não haverá reservas de seres humanos, subservientes às novas tecnologias. A ciência e as suas conquistas são universais. Aliás, elas só foram possíveis com o trabalho e é ao trabalho que as mesmas se dirigem.
Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Puig.
O Sr. José Puig (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, a primeira questão que gostaria de colocar-lhe é esta: o seu discurso sobre os salários em atraso, o desemprego, etc., já é habitual. É sempre essa a tónica das suas intervenções? É que dás duas uma: ou V. Ex.ª vive neste país mas não neste tempo ou não tem aqui a cabeça! Se tem a cabeça neste país tem-na, com certeza, em 1975 e não deu conta das evoluções que se verificaram depois disso. Creio que deve ter a sua cabeça num qualquer país de Leste . .
Em relação à questão que focou, e que agora repetiu, de eu não ter falado em quem paga o trabalho suplementar e não ter mencionado quem pagava o trabalho suplementar, porque essa norma da legislação de 1983 tinha sido revogado, confesso que me esqueci de a abordar e vou dizer-lhe porquê: é que a achei tão sem sentido, tão sem fundamento que até me esqueci de lhe responder.
Senão, vejamos: o artigo 6.º - agora revogado - dizia, no seu n.º 1, que a prestação de trabalho suplementar tem de ser prévia e expressamente determinada pela entidade empregadora sob pena de não ser exigível o respectivo
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pagamento. E, Sr.ª Deputada, veja o que diz o decreto-lei que a revoga, ou seja, que não é exigível o pagamento de trabalho suplementar cuja prestação não tenha sido prévia e expressamente determinada pela entidade empregadora. 15to é, mudando umas palavras, o sentido, o texto e o objectivo são exactamente os mesmos. Neste caso, em relação às 200 horas, não há qualquer alteração com esta revogação e não é posto em causa qualquer direito mais ou menos importante dos trabalhadores.
A Sr.ª Odete Santos (PC): - Ainda bem que respondeu isso!
O Orador: - Aliás, penso que todas as bancadas excepto a de V. Ex.ª já chegaram a consenso quanto ao fim, havendo divergências apenas quanto aos meios e ao timing. Aliás, perante um excerto do vosso projecto de lei, quero mostrar-lhe que as divergências estão bem determinadas por alguns excessos pelos quais vós, Deputados do PCP, tendeis a enveredar.
Assim, diz o n.º 3 do artigo 6.º do vosso projecto de lei que nos casos de prestação de trabalho em período de descanso obrigatório, que num artigo anterior passava a ser de um dia e meio, o trabalhador terá direito ao período legalmente fixado como descanso semanal obrigatório num dos três dias úteis seguintes. Ou seja - e peço que me responda para me certificar que é esse o vosso entendimento -, se num sábado de tarde, tendo em conta o período de descanso obrigatório de um dia e meio, um trabalhador efectuar trabalho suplementar de duas ou três horas, fica com direito a um dia e meio de descanso remunerado dentro dos três dias úteis seguintes?
Se é esse o vosso entendimento, que claramente ressalta deste normativo, então esse facto permite-nos dizer que o PCP, se visse as suas propostas sempre aprovadas, destruiria a economia num instante. Todavia, se não é esse o vosso entendimento esclareça-me, pois, nesse caso, o articulado estará mal redigido.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Puig, ainda bem que pediu esclarecimentos porque esse facto revelou que quem .estava a leste» era V. Ex.ª e isso fê-lo cair na armadilha. Sr. Deputado, o que disse em relação ao descanso e ao trabalho extraordinário - que tem de ser determinado prévia e expressamente- revela que VV. Ex.as estão de acordo com uma solução, que hoje é lei, que vai prejudicar os trabalhadores e facilitar o trabalho extraordinário gratuito.
Assim, se o trabalhador não conseguir provar- e normalmente não há testemunhas, pelo que se torna difícil - que a prestação de trabalho foi determinada prévia e expressamente, presta trabalho extraordinário e não recebe nada por isso. Aliás, é o que já acontece.
Sr. Deputado José Puig, quando pedir esclarecimentos tenha mais cuidado para não cair no alçapão que lhe colocaram aos pés e em que V. Ex.ª, ingenuamente como uma criança tonta de olhos vendados, caiu. Aliás, foi isso mesmo que aconteceu.
Protestos do PSD.
Sr. Deputado José Puig, relativamente ao descanso semanal compensatório, tenho muita pena que V. Ex.ª venha dizer que a solução do Decreto-Lei n.º 409/71 - velha de 22 anos! -, que previa o descanso num dos três dias imediatos, seja, afinal, tão revolucionária. 15to é, VV. Ex.as ainda estão pior do que aqueles que idealizaram e fizeram o diploma de 1971 ! E isso que quer afamar nesta Câmara? Que ainda está mais atrás? Aliás, essa afirmação também ficou clara na sua objecção.
Todavia, Sr. Deputado José Puig, essas afirmações tornam-se habituais quando, lá fora, se torna hábito uma prática que deita os direitos dos trabalhadores para o caixote do lixo. E V. Ex.ª, quando fez essa afirmação, revelou que não conhece o País, ou conhece mas vem para aqui dar uma noção cor-de-rosa da realidade, que efectivamente não tem essa configuração e cor.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminou o debate sobre o projecto de lei n.º 8/VI - Reduz a duração semanal de trabalho normal (PCP), que, nos termos regimentais, vai ser votado, na generalidade.
Submetido d votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS e votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
Srs. Deputados, passamos agora à votação do voto n.º 49/VI - De saudação aos autarcas portugueses, apresentado pelo PS.
Submetido d votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do CDS, de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
É o seguinte:
A organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais, subordinadas aos princípios constitucionais da autonomia e da descentralização democrática da administração pública.
Ocorre que as autarquias locais têm vindo, nos últimos anos, a ser objecto de medidas políticas, legislativas e financeiras que se traduzem numa progressiva asfixia da sua autonomia democrática e comprometem os objectivos de descentralização administrativa e de dignificação do seu estatuto em razão da melhor realização dos legítimos interesses e do bem-estar das populações.
A presença, na, Assembleia da República, de uma vasta representação dos autarcas portugueses, na sequência de várias acções de sensibilização pública definidas no quadro da Associação Nacional dos Municípios, deve constituir motivo de profunda reflexão e de empenhamento na solução dos problemas de poder local.
A orientação persistentemente prosseguida pelo Governo e as mais recentes declarações do Primeiro-Ministro são, todavia, reveladoras de grande insensibilidade às dificuldades das autarquias e aos anseios das populações locais.
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Visando contribuir para desenvolva no País um espírito de solidariedade entre todas as instituições representativas e reconhecendo ao poder local um
papel insubstituível no desenvolvimento do País, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do PS, propõem o seguinte voto de saudação:
A Assembleia da República saúda os autarcas portugueses, manifesta-lhes o seu
apreço pelo trabalho desenvolvido ao serviço das populações e exprime-lhes a sua solidariedade pelos objectivos da sus acção em defesa dos princípios constitucionais da autonomia e da descentralização, reconhecendo a urgência de
uma reforma estrutural profunda que, de força modernizadora, concretize a atribuição aos municípios de novos níveis de competência, associados a um novo regime de finanças locais, num quadro de efectiva dignificação do estatuto do poder local.
Srs. Deputados, procederemos agora à votação do voto n.º 50/VI - De pesar pela morte de Francisco Ferreira, apresentado pelo PSD.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS e do PSN, votos contra do PCP e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé e a abstenção de Os Verdes.
É a seguinte:
Faleceu no dia 1 de Janeiro Francisco Ferreira, conhecido como «Chino da CUF».
A sua vida atravessou todo o nosso século e simbolizou muito da sua história. Jovem operário da CUF, participou nas lutas e reivindicações sociais da população do Barreiro. Como militante político travou, nas árduas condições de clandestinidade a que obrigava a repressão do regime autoritário, um longo combate contra a ascensão do fascismo e da ditadura que o fez passar pela Espanha durante a guerra civil e pela URSS durante a II Guerra Mundial, em momentos de grande dificuldade pessoal e familiar.
Na URSS, não foi apenas um militante realizando tarefas políticas, mas também um operário e, nessa condição - que sempre referia com orgulho -, pode aperceber-se da realidade opressiva do totalitarismo do regime comunista.
Coerente com essa experiência, regressou a Portugal, conduziu, depois do 25 de Abril, um combate pelo esclarecimento da verdade do «socialismo real». Fé-1o em condições de muita dificuldade, mas com uma grande determinação e dignidade pessoal.
Teve ocasião de ver, após 1989, o desmoronar do sistema de poder soviético e o emergir da liberdade e da democracia na Europa de Leste e na ex-URSS, confirmando assim muitos dos seus pontos de vista e a realidade cruel de muitas das suas descrições.
A Assembleia da República exprime pois o seu pesar pela morte de Francisco Foreira.
Srs. Deputados, vamos votar o voto n.º 51/VI - De protesto pela violência verificada em recintos desportivos, apresentado pelo PCP.
Submetido á votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
É o seguinte:
Todo o País tem vindo a assistir, nos últimos tempos, a cenas deploráveis nos recintos em que se realizam espectáculos desportivos envolvendo os clubes mais representativos do futebol nacional. Tem sido frequente, durante e após a realização de diversos jogos de futebol, a prática de actos de agressão e vandalismo por parte de indivíduos identificados como «claques» de importantes clubes desportivos, que exibem, com propósitos ostensivos, bandeiras e símbolos nazis e de movimentos de carácter racista e xenófobo e que praticam comprovadamente actos de violência organizada.
Se não for travado o crescimento deste fenómeno, poderemos ver, a breve prazo, os campos de futebol como palco privilegiado de acções de violência com consequências irreparáveis.
É imperioso aduar antes que tal aconteça.
Repudiando profundamente que o papel educativo que devia estar associado à prática desportiva seja subvertido pela apologia e prática da violência nos estádios de futebol e que clubes desportivos de inquestionado prestigio nacional e internacional se vejam associados à difusão desses valores antisociais, a Assembleia da República, reunida no dia 5 de Janeiro de 1993, considerando o dever de prevenir a violência no desporto que incumbe constitucionalmente ao Estado: apela aos dirigentes desportivos para que tomem medidas enérgicas destinadas a impedir a instrumentalização das «claques» dos respectivos clubes por grupos violentos, neonazis ou de natureza racista e xenófoba; chama a atenção para a necessidade de uma acção preventiva, por forma a impedir a prática de acções violentas e a ostentação de simbologia apologista do crime e da violência nos recintos desportivos.
Srs. Deputados, a Mesa comunicará à família de Francisco Ferreira o voto de pesar pela sua morte aqui votado e quanto ao voto de protesto relativo à violência verificada em recintos desportivos, uma vez que é referido aos clubes mais representativos do futebol nacional, este será enviado à Federação Portuguesa de Futebol.
Srs. Deputados, terminámos, por hoje, os nossos trabalhos. A próxima sessão plenária terá lugar amanhã, dia 8, petas 10 horas, tendo como ordem do dia a apreciação da proposta de lei n.º 40/VI, que altera o Estatuto da Ordem dos Advogados.
Está, pois, encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 5 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Adriano da Silva Pinto.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
António do Carmo Branco Malveiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Caeiro da Motta Veiga.
Cecília Pita Catarino.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Farpando José Antunes Gomes Pereira.
Perlo Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Francisco João Bernardino da Silva.
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982 I SÉRIE - NÚMERO 26
João José Pedreira de Matos.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
José Manuel da Silva Costa.
José Manuel Nunes Liberato.
José Pereira Lopes.
Leonardo Eugênio Ramos Ribeiro de Almeida.
Luís Carlos David Nobre.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Domingos de Sousa e Holstein Campilho.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Partido Socialista (PS):
Jaime José Matos da Gama.
João Maria de Lemos de Meneses Ferreira.
José Rodrigues Pereira dos Penedos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Centro Democrático Social (CDS):
João Carlos da Silva Pinho.
Deputados independentes:
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Mário António Baptista Tomé.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
João Álvaro Poças Santos.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Partido Socialista (PS):
Alberto Manuel Avelino.
António de Almeida Santos.
António Manuel Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Cardoso Lage.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
Partido Comunista Português (PCP):
João António Gonçalves do Amaral.
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