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Sexta-feira, 22 de Janeiro de 1993

I Série - Número 32

Diário da Assembleia da República

VI LEGISLATURA

2.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1992-1993)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 21 DE JANEIRO DE 1993

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de diplomas, de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado André Martins (Os Verdes), a propósito da situação criada pelo aterro sanitário da serra do Pereiro, teceu críticas ao Governo pelo não cumprimento da legislação. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Adérito Campos (PSD).
O Sr. Deputado Duarte Pacheco (PSD) deu conta das conclusões saídas da Convenção Anual de Turismo do Oeste, realizada em Dezembro próximo passado, na Lourinhã, e abordou problemas diversos do concelho de Arruda dos Vinhos. Respondeu depois a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Alberto Avelino (PS).
A Sr.ª Deputada Helena Torres Marques (PS) responsabilizou o Governo pela crise que se vive no Alentejo, especialmente no distrito de Beja. No fim respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Lino de Carvalho (PCP).
A Sr.ª Deputada Odete Santos (PCP) referiu diversos problemas do distrito de Setúbal, criticando o Governo pela sua actuação.
Foram apreciados e aprovados os votos n.ºs 55/VI - De protesto pela aprovação de uma resolução do Parlamento Europeu defendendo a limitação das presidências rotativas aos cinco maiores países e a diminuição do número de línguas oficiais da Comunidade Europeia (Deputado independente Mário Tomé), 56/VI - De protesto, apoiando as posições assumidas pelos Deputados portugueses no Parlamento Europeu, contra a diminuição das línguas oficiais da Comunidade Europeia e a limitação das presidências rotativas (PSD) e 57/VI - De protesto, repudiando as reformas da Comunidade Europeia que visem restringir o exercício da presidência do Conselho Europeu e o uso das línguas nacionais (PCP). Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Helena Torres Marques (PS), Mário Tomé (lndep.), Rui Carp (PSD), Octávio Teixeira (PCP), Nogueira de Brito (CDS) e 15abel Castro (Os Verdes).
Foi ainda aprovado um requerimento do PSD, solicitando o adiamento da apreciação do voto n.º 58/VI - De pesar pelo recomeço da guerra em Angola e apelando ao diálogo e ao respeito pelos acordos e resultados das eleições (PS).

Ordem do dia - Foram aprovadas os n.ºs 18 a 20 do Diário.
O inquérito parlamentar n.º 6/VI - sobre a alteração alegadamente introduzida em decreto-lei por membro do Governo contra o recebimento de 120 000 contos (PSD), foi discutido e aprovado, tendo intervindo, a diverso título, os Srs. Deputados Pacheco Pereira (PSD), João Corregedor da Fonseca (Indep.), Almeida Santos (PS), António Lobo Xavier (CDS), Mário Tomé (Indep.), João Amaral (PCP), Guilherme Silva (PSD), Manuel Sérgio (PSN), Silva Marques (PSD), Nogueira de Brito (CDS) e 15abel Castro (Os Verdes).
Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 139/VI - Criação do Conselho Nacional de Juventude (PS) e l87/VI - Estatuto jurídico do Conselho Nacional de Juventude (PCP), tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados António José Seguro (PS), Carlos Coelho e Pedro Passos Coelho (PSD), António Filipe (PCP), Luís Nobre, Miguel Relvas e Fernando Pereira (PSD), Mário Tomé (Indep.), 15abel Castro (Os Verdes), João Calos Pinho (CDS) e José Apolinário (PS).
Entretanto, foram aprovados sete pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos, autorizando seis Deputados a deporem em tribunal como testemunhas e a arquivar o processo referente a um outro.
Foram rejeitados os projectos de resolução do PCP, n.ºs 44/VI, que recusa a ratificação do Decreto-Lei n.º 208/92, de 2 de Outubro - Autoriza o Serviço de Transportes Colectivos do Porto a subconcessionar a exploração de carreiras de transporte rodoviário de passageiros que ultrapassem o limite urbano da cidade do Porto (ratificação n.º 41/VI) e 47/VI, que recusa a ratificação do Decreto-Lei n.º 195-A/92, de 8 de Setembro - Extingue a empresa que gere o Teatro Nacional de São Carlos (ratificação n.º 44/VI).
0 Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Abílio Sousa e Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Ana Paula Matos Barros.
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António do Carmo Branco Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Femandes Alves.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
15ilda Maria Renda Periquito Pires Martins.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João Álvaro Poças Santos.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Eduardo Dias Madeira Gouveia.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Manuel Pereira de Almeida e Silva.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário de Lemos Damião.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Costa.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro António de Bettencourt Gomes.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Manuel da Igreja Raposo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Bernardes Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.

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Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
António Alves Martinho.
António Carlos Ribeiro Campos.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Martins Seguro.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Ribeiro Marques da Silva.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Gomes Ká.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José António Martins Goulart.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Eduardo Reis.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão.
José Rodrigues Pereira dos Penedos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Apolónia Maria Alberto Pereira Teixeira.
José Fernando Araújo Calçada.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Maria Odete dos Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
João Carlos da Silva Pinho.
José Luís Nogueira de Brito.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.
15abel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

Deputados independentes:

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Mário António Baptista Tomé.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: projectos de lei n.ºs 244/VI - Elevação de Rio Meão à categoria de vila (do Deputado do PSD Manuel Batista Cardoso e do Deputado do PS José Mota), que baixou à 6.ª Comissão, e 245/VI -Elevação de Souto à categoria de vila com a designação de São Miguel de Souto (do Deputado do PSD Manuel Baptista Cardoso e do Deputado do PS José Mota), que baixou à 6.ª Comissão; inquéritos parlamentares n.ºs 6/VI - Alteração alegadamente introduzida em decreto-lei por membro do Governo contra o recebimento de 120 000 contos (PSD) e 7/VI - Apreciação dos critérios de avaliação e processos de privatização das empresas públicas (PCP); projectos de resolução n.ºs 44/VI - Recusa a ratificação do Decreto-Lei n.º 208/92, de 2 de Outubro, que autoriza o Serviço de Transportes Colectivos do Porto a subconcessionar a exploração de carreiras de transporte rodoviário de passageiros que ultrapassem o limite urbano da cidade do Porto (PCP), 47/VI (PCP) e 48/VI (PS), ambas recusando a ratificação do Decreto-Lei n.º 195-A/92, de 8 de Setembro, que extingue a empresa que gere o Teatro Nacional de São Carlos.
Na última reunião plenária foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: à Secretaria de Estado da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado José Calçada; ao Ministério da Agricultura, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulados pelos Srs. Deputados 15abel Castro e António Murteira; ao Ministério do Emprego e da Segurança Social, formulados pelos Srs. Deputados Lino de Carvalho e Manuel Sérgio; à Secretaria de Estado da Segurança Social, formulados pela Sr.ª Deputada Apolónia Teixeira; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado Marques Júnior; ao Ministério do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Gameiro dos Santos; à Secretaria de Estado

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das Obras Públicas, formulado pelo Sr. Deputado Filipe Abreu; à Câmara Municipal de Vieira do Minho, formulado pela Sr.ª Deputada Apolónia Teixeira.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Olinto Ravara, na sessão de 12 de Março; Luís Peixoto, na sessão de 28 de Abril; João Carlos Duarte, na sessão de 26 de Maio; Apolónia Teixeira, nas sessões de 28 de Maio e de 16 de Outubro; Luís Filipe Madeira, na sessão de 16 de Julho; Macário Correia, na sessão de 27 de Outubro; Carlos Luís, na sessão de 5 de Novembro; João Amaral, na sessão de 10 de Novembro; Leonor Coutinho, na sessão de 10 de Novembro; Guilherme Oliveira Martins, na sessão de 17 de Novembro; José Calçada, na sessão de 19 de Novembro, e José Magalhães, na sessão de 15 de Dezembro.

0 Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Conforme prometi, em nome do Partido Ecologista Os Verdes, às populações das freguesias dos concelhos de Oliveira de Azeméis, São João da Madeira e Vale de Cambra, trago hoje à Assembleia da República um dos múltiplos e generalizados problemas que afectam as populações deste país, uma vez que quem é responsável por controlar o processo de deposição e tratamento de resíduos sólidos, incluindo os perigosos, não assume estas responsabilidades.
Quero, pois, deixar aqui o nosso apreço e saudação pela luta que aquelas populações, em defesa dos seus interesses e da segurança dos seus haveres, desencadearam ao longo dos primeiros 17 dias deste ano, até que as autoridades responsáveis se dignaram assumir responsabilidades que, de outra forma, certamente ainda hoje não assumiriam.
De facto, as populações estavam em contínua situação de desespero face à impossibilidade de consumir a água que ao longo de gerações sempre têm consumido e de fazer a rega dos seus campos, contribuindo assim para o desenvolvimento e riqueza daquela região.
Na verdade, já não é a primeira vez que trazemos casos desta natureza ao Parlamento. Lembro-vos o caso de Riba de Ave, que continua em tribunal, porque as autoridades competetentes não souberam, em devido tempo, cumprir e fazer cumprir a legislação que existe - que, aliás, foi elaborada pela maioria deste Parlamento e adoptada pelo Governo; o caso do rio Alviela, que é um problema que se continua a arrastar, apesar das múltiplas promessas feitas ao longo dos últimos anos, e ainda a luta e o esforço que as populações de Minde e Mira de Aire têm desenvolvido para ver os seus problemas resolvidos.
Assim, queremos deixar bem claro, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que não basta vir a esta Assembleia pedir desculpa às populações por não se ter agido em momento próprio, como aconteceu com um dos responsáveis eleitos daquela região que veio aqui pedir desculpa por só tão tarde ter tido conhecimento de uma situação para a qual as populações vinham alertando desde 1987, aquando do início do projecto de instalação do aterro sanitário da serra do Pereiro.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Depois de ouvir o Governo caracterizar o nosso país como um oásis, o Ministro do Ambiente e Recursos Naturais não se tem cansado de colorir o quadro com as cores mais vistosas, mas o pior é quando se desce da pintura à realidade e isso pode verificar-se pela amostra de água recolhida nas nascentes da serra do Pereiro - que está em cima da minha bancada e que, como poderão verificar, tem coloração, razão pela qual a população não pode consumir aquela água e teve de, inclusivamente, vender o gado porque a água não servia para consumo.
Assim, Srs. Deputados, em vez da sensação de bem-estar, de expectativa e confiança num futuro mais feliz, esta situação desperta nos cidadãos deste país manifestações, cada vez mais frequentes, de revolta e de desespero pelo quadro de cores bem negras com que a realidade pinta o seu dia-a-dia.
As populações, que são penalizadas por uma política que não passa de promessas e de propaganda, como é o caso da política do ambiente, sofrem na pele as consequêncías da incoerência, inoperância e incapacidade manifesta dos que, por acção ou por falta dela e em nome de interesses algumas vezes inconfessáveis, nada fazem e vêm sendo elas próprias as correctoras de verdadeiros atentados ao ambiente e à vida, deixando bem claro a irresponsabilidade de uma governação que não cumpre, não faz cumprir e não cria as condições para ser cumprida a legislação por si própria aprovada.
É esta a situação que a realidade nos demonstra nos vários domínios que têm a ver com a saúde e a qualidade de vida dos Portugueses. Por isso, a situação caracterizada no Livro Branco do Ambiente, elaborado em 1990, constatando uma degradação crescente da qualidade da água, do solo e do ar, só tem sido alterada para pior. Assim, fica claramente compreendida a expressão que o Ministro do Ambiente e Recursos Naturais utiliza quando é confrontado com factos e dados que demonstram a crescente degradação do estado do ambiente em Portugal, ao responder que, em Portugal, em comparação com outros países europeus, ainda se podem fazer opções em matéria de ambiente - opções políticas, certamente!
Contudo, tanto quanto nos é dado observar, essas opções do Governo e não apenas do Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, conduzem o nosso país e, prioritariamente, largas camadas da população portuguesa, a um empobrecimento crescente.
De facto, a situação criada pelo aterro sanitário da serra do Pereiro, no concelho de Oliveira de Azeméis, é um exemplo que ilustra bem as afirmações que acabei de fazer ao governo do PSD e à sua política.
O crescimento generalizado da poluição por todo o País e a utilização ou destruição de forma irracional dos recursos naturais, que, para além de serem património, representam parte da riqueza mundial, nacional e local, não pode continuar, como também não é admissível que estes recursos sejam geridos como se se tratasse uma mera propriedade privada por quem tem a responsabilidade de administrá-los.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: 0 problema da recolha, transporte e tratamento final de resíduos em Portugal é uma das questões que tem feito gastar mais tinta e papel, não porque os responsáveis pela resolução deste problema se tenham empenhado em amplas campanhas de sensibilização, reconhecendo a necessidade de maior empenhamento e envolvimento de todos, desde a Administração às empresas, passando pela população em geral, por forma a minimizar os efeitos negativos para a saúde pública e para o ambiente provocado pelo não tratamento adequado dos lixos que cada vez produzimos em maior quantidade e cada vez são mais perigosos, mas pelo contrário.

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Na verdade, este correr de tinta e consumo de papel resulta da situação de deixar andar milhões de toneladas de lixo por esse País fora sem tratamento adequado, levando as populações afectadas a manifestar-se contra as situações que grassam um pouco por todo o País de forma irresponsável. Foi o que aconteceu no primeiro dia do corrente ano quando as populações das freguesias de Ossela e Pindelo, no concelho de Oliveira de Azeméis, e da freguesia de Codal, no concelho de Vale de Cambra, decidiram pedir responsabilidades à Administração por esta não cumprir o que a legislação exige quanto ao funcionamento do aterro sanitário construído na serra do Pereiro para resolver o problema dos resíduos sólidos urbanos dos concelhos de Oliveira de Azeméis, São João da Madeira e Vale de Cambra, para o que estes se constituíram em associação de municípios e beneficiaram de co-financiamentos comunitários.
Embora exista legislação, os responsáveis pela recolha, transporte, tratamento e destino final dos resíduos, pela elaboração dos projectos dos aterros sanitários e pela fiscalização do seu funcionamento, tendo em conta efeitos negativos no ambiente, não se interessaram pelo problema e foram as populações daquelas freguesias que, perante a doença das pessoas e morte de animais provocada pela água de consumo que nasce na serra onde está instalado o aterro, se viu obrigada a defender com os próprios meios a sua vida e os seus e bens, barricando o acesso ao aterro e impedindo que lá fossem depositados mais resíduos, sem que o problema fosse resolvido ou houvesse garantias de que isso iria suceder, o que poderá acontecer esta semana.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: O que queremos dizer é que o responsável por esta situação e por muitas outras que têm acontecido e estão a acontecer por todo o País é a política incoerente e irresponsável deste governo do PSD.
É assim porque existe legislação, alguma dela aprovada na Assembleia da República e outra que teve origem no próprio Governo, que este Governo, em nome de uma política incoerente e irresponsável, repito, continua a não cumprir, a não fazer cumprir e a não criar as condições para que ela seja cumprida.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Este aterro existe naquele local, tem pareceres favoráveis relativamente à sua localização, mas a Direcção-Geral da Qualidade do Ambiente, entidade responsável pela fiscalização do seu funcionamento relativamente às suas consequências para o ambiente, não actuou de acordo com aquilo que é exigido pela lei: não foram feitas análises às águas durante o longo tempo em que o aterro funcionou e não houve controlo dos resíduos ali depositados. Aliás, as populações afirmam haver resíduos tóxico-perigosos naquele aterro, não sendo aí o local adequado para o seu depósito ou tratamento.
Por isso, Srs. Deputados, a responsabilidade tem de ser atribuída a quem a tem, perante a lei e perante o País. Temos eleitos pela população e são eles que devem assumir essas responsabilidades! É, pois, isto que estamos aqui a denunciar e a acusar!
Não basta vir aqui, à última da hora, dizer que se lamenta, quando o mal já está feito, quando se sabe que estes atentados poderão levar dezenas de anos para se recuperar - se isso for possível! - e não tendo de fazer os investimentos que neste momento as autarquias estão a fazer, designadamente com o abastecimento de água à população com canalizações que tiveram de comprar à última hora... Portanto, sem todos estes investimentos de última hora e investindo na prevenção dos factos, aquelas populações não teriam chegado à situação a que chegaram. Por isso, não é suficiente, Srs. Deputados, vir aqui pedir desculpa por não ter cumprido aquilo quer se deveria ter cumprido e a que se estava obrigado.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Adérito Campos.

O Sr. Adérito Campos (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado André Martins, confesso que estava a gostar da primeira parte da sua intervenção, especificamente no que se referia às questões relacionadas com a serra do Pereiro, que envolve, como muito bem citou, três concelhos do distrito de Aveiro. Claro que o Sr. Deputado descarrilou com o seu frenesím antigovemamental, na última parte da sua intervenção - aliás, de uma forma muito hesitante, porque o Sr. Deputado não está de facto muito ciente de algumas das considerações e imputações que aqui fez.
Obviamente, Sr. Deputado, que todos nós, designadamente a bancada do PSD, eu próprio, munícipe de um concelho abrangido por esta questão - o concelho de Vale de Cambra -, e o meu colega de bancada, Deputado Casimiro de Almeida, que na terça-feira aqui fez uma intervenção sobre esta matéria, estamos solidários com a forma e com o intuito das populações da zona de defenderem os seus interesses. Estamos perfeitamente solidários, de tal maneira que muito antes de o Sr. Deputado se interessar por esta matéria no local, já nós, e outras pessoas ligadas a áreas governamentais, tínhamos tido a oportunidade de acompanhar o problema, tentando encaminhá-lo de forma à sua resolução.
O que rejeitamos, Sr. Deputado, é a sua vontade de usar esta matéria como um porta-estandarte, através de situações alarmistas, na medida em que o Sr. Deputado invocou aqui algumas situações que são de claro alarmismo, designadamente quando referiu a existência de lixos tóxicos que poderiam estar depositados no local, sem que ainda haja provas do facto. Sr. Deputado, embora as populações o refiram, devo dizer-lhe que terá de esperar que as decisões aprovadas no último sábado à tarde, numa reunião com o Sr. Governador Civil de Aveiro, possam trazer alguma luz ou conclusão sobre o que efectivamente aí se passou.
O Sr. Deputado, de qualquer modo, foi um pouco mais prudente do que na terça-feira, no que se refere à imputação de responsabilidades em relação ao sucedido. É que na terça-feira fez determinado tipo de afirmações que agora não vem confirmar, porque aquilo que o meu colega de bancada lhe disse nessa altura é a pura verdade. O Sr. Deputado não pode estar a responsabilizar o actual Governo por uma situação de que ele não é responsável, como não pode estar aqui a tentar responsabilizar, inclusive, determinadas autarquias, porque muito esforço já elas fazem para resolver um problema comunitário grave.
O Sr. Deputado não pode estar aqui hoje a tentar, mais uma vez, acirrar ânimos, quando as próprias populações, no passado sábado à tarde, chegaram a acordo com entidades responsáveis autárquicas e com o Sr. Governador Civil de Aveiro no sentido de desbloquear este problema, que não é por certo fácil de resolver, nem queremos estar aqui a afirmá-lo.

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Porém, queremos registar aqui e de uma forma bem clara, o grande pacifismo, o grande espírito de colaboração das populações que, sem deixarem de defender intransigentemente os seus interesses, disseram que também querem colaborar na resolução efectiva do problema, rejeitando determinados tipos de aproveitamento que algumas forças quiseram fazer. Refiro-me, designadamente, ao pedido de esclarecimento que o Sr. Deputado André Martins aqui fez na terça-feira e à sua intervenção!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Deputado Adérito Campos, V. Ex.ª referiu que, de facto, a situação criada não é fácil de resolver. É verdade, Sr. Deputado! É isso que sempre temos afirmado, pois vale mais fazer investimentos prevenindo as situações do que deixá-las arrastar-se, criando-se situações como a que ali se criou e que agora poderá levar dezenas de anos para se resolver, podendo pôr em perigo o próprio desenvolvimento daquela região. 15to não é novidade nenhuma e temo-lo dito sempre!
Outra questão, Sr. Deputado, prende-se com o não termos ido à serra do Pereiro para nos aproveitarmos da situação. Fomos convidados para lá ir avaliar a situação e colaborarmos ...

Vozes do PSD: - Pois, pois!

O Orador: - Tenho uma carta, que posso mostrar ao Sr. Deputado, que nos foi enviada pela comissão de residentes. Foi nesse sentido que lá fomos e que nos comprometemos a trazer aqui, a esta Casa, este problema, atribuindo a responsabilidade a quem a tem.
Sr. Deputado, existem dois decretos-leis que dizem de quem é a responsabilidade do controlo da situação de funcionamento do aterro. A responsabilidade é do Governo, que é o que está na lei. Por que é que o Governo não a cumpriu?!

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado, dê-me essa água, que quero mandar analisá-la!

O Orador: - Com certeza, Sr. Deputado!

Neste momento o Sr. Deputado André Martins dirigiu-se à bancada do PSD e entregou uma garrafa com uma amostra de àgua de nascentes da serra do Pereiro.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No passado dia 18 de Dezembro realizou-se, na Lourinhã, a Convenção Anual de Turismo do Oeste.
Gostava de espelhar, nesta Casa, algumas reflexões que largas dezenas de hoteleiros, autarcas, técnicos de turismo, agentes de viagem e comunicação social da região realizaram ao longo de toda a sessão.
Esta Convenção foi um êxito em termos de participação, ao que não é alheio a nova filosofia da política de turismo desenvolvida ao longo de 1992, a qual conduziu a um novo sistema de incentivos financeiros, de onde sobressaí o S1FIT II.
Por parte dos participantes, foi notório o interesse em conhecer as linhas mestras desta política, não deixando de evidenciar as suas análises que, por serem legítimas, gostaria de reproduzir.
Primeiro, a coincidência entre hoteleiros e responsáveis pela política de turismo na necessidade de um reforço da formação profissional no sector.
Segundo, a satisfação pelas linhas gerais do novo sistema de incentivos, porque não exclui qualquer concelho do País, embora privilegie os do interior, porque a recuperação e a modernização das unidades hoteleiras existentes é considerado prioritário em relação à construção de raiz; porque a restauração é também contemplada neste novo sistema.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muitos dos anseios demonstrados pelos hoteleiros do Oeste mereceram a atenção dos govemantes e a nova política de turismo veio de encontro às suas expectativas, aliás, como foi perspectivado na intervenção que fiz no Plenário em Janeiro de 1992.
Com querer, força de vontade e diálogo entre empresários e responsáveis governativos encontram-se respostas para os problemas dos diversos sectores. É o que se tem vindo a passar num dos concelhos mais pequenos do Oeste - Arruda dos Vinhos.
Arruda, com uma área de 74 Km2, dispersa por quatro freguesias - Arruda, Arranhó, Cardosas e Santiago dos Velhos -, tem uma população de 10 000 pessoas.
Às portas de Lisboa, Arruda é um concelho eminentemente rural, de onde sobressaem dois sectores, ambos em crise - o vinho e a fruta.
A indústria é praticamente inexistente. A maior empresa do concelho faliu irremediavelmente em 1985 e nenhuma outra a veio substituir.
Um parque industrial chegou a ser projectado pela autarquia, mas também este abortou.
O sector terciário tem vindo a ganhar peso, quer na área financeira, quer no comércio, quer na restauração.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar de nos últimos anos se registar uma melhoria do nível de vida das populações de Arruda, similar ao que se passou no resto do Pais, o concelho vive uma situação de estagnação, contrariada unicamente pela acção perseverante da sociedade civil em cooperação contínua com o poder central.
Em primeiro lugar, refiro a acção social, onde um apoio intenso é prestado pela Santa Casa da Misericórdia da Arruda à infância, juventude e terceira idade, realça-se a recente inauguração, por parte do Sr. Secretário de Estado da Segurança Social, da ampliação da creche desta instituição. No mesmo dia foi lançada a primeira pedra do edifício que representará o crescimento do lar da mesma instituição.
De igual modo, foi assinado recentemente, entre a Santa Casa e a Administração Regional de Saúde de Lisboa, um protocolo que conduzirá à devolução do hospital ao seu legítimo proprietário, a Santa Casa, em condições que vão viabilizar a sua recuperação.
Em segundo lugar, quanto à protecção civil, não pode passar despercebido o novo quartel dos bombeiros voluntários, obra construída devido à muita perseverança e capacidade de prever o futuro da sua direcção, da qual destaco o Sr. Rui Silva.
Em terceiro lugar, refiro a educação, a qual é prestada por uma instituição semiparticular, o Externato Irene Lisboa, onde se ministra um ensino de qualidade aos jovens do concelho, e não só, até ao 12 º ano, estando projectada para breve a construção de novas instalações para o ex-

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ternato, as quais vão permitir a prática do ensino em condições ainda mais condignas.
Em quarto lugar, abordarei a área da juventude. A juventude do concelho de Arruda defronta-se com o grave problema da toxicodependência, ao qual muitos jovens sabem responder dedicando-se ao associativismo, de onde destaco a acção do Grupo de Escuteiros da Arruda e da Juventude Agostiniana. Mas esta resposta que os jovens sabem dar necessita de ser acompanhada por um estímulo que lhes indique que têm futuro em Arruda dos Vinhos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este espírito de força e de querer da sociedade civil tem merecido o apoio do poder central, mas mais há a fazer.
No sector agrícola, os empresários tentam a recuperação. À remodelação de castas, à introdução de novas técnicas de cultivo, é necessário associar um velho projecto da Associação de Regantes, o da construção de uma pequena barragem que permitirá uma melhor irrigação dos campos, e assim aumentar a produtividade. Temos a convicção de que o Ministério da Agricultura não desmotivará os agricultores do concelho.
No sector industrial anseia-se pela chegada de novos programas de apoio à indústria portuguesa, os quais contemplem este concelho, condição indispensável para a captação de empresas que garantam a criação de postos de trabalho, contribuindo para a fixação dos arrudenses na sua própria terra.
No turismo, o novo quadro já referenciado permite hoje a captação de investimentos para Arruda - isto se as autoridades locais souberem promover o seu concelho.
Mas, fundamental, para a recuperação da Arruda é necessária a construção de uma rede de vias de comunicação com qualidade, o que passa pela existência de um nó de saída no projectado IC n.º 11, que unirá Torres Vedras e Carregado, e por um prolongamento da CREL que viabilize uma ligação directa a este concelho.
Arruda dos Vinhos é afectada pelos custos da capitalidade. Submersa nas estatísticas do distrito de Lisboa, a realidade do concelho nem sempre é perceptível pelos gabinetes governamentais. No entanto, tenho a convicção de que o esforço das gentes de Arruda e o apoio do poder central superarão a paralisia da autarquia e conduzirão este concelho rumo ao desenvolvimento.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Avelino.

O Sr. Alberto Avelino (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Duarte Pacheco, pensava que o Sr. Deputado seria um eventual candidato à Câmara Municipal de Sobral de Monte Agraço e agora tive algumas dúvidas de se não o seria à de Arruda dos Vinhos, mas como citou o nome de um ex-colega nosso, Rui Silva, creio que já estão definidos os candidatos para Arruda dos Vinhos e Sobral de Monte Agraço.

O Sr. Silva Marques (PSD): - E porque não?!

O Orador: - Sr. Deputado Duarte Pacheco, V. Ex.ª mora, ou morou, em Sobral de Monte Agraço. Mora tão perto de Arruda dos Vinhos e tão longe da sua realidade!
Que pobreza!...

0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - V. Ex.ª produz uma intervenção a propósito de um encontro de circunstância, um encontro de turismo na Lourinhã, nesse dia 18 de Dezembro, para o qual nem sequer foi convidado o presidente da região de turismo e parece que as coisas não andam mal!... Por acaso, o presidente é do Partido Socialista ... Depois dá um saltinho da Lourinhã para Arruda dos Vinhos.
Tudo o que está feito é obra extraordinária do Governo central e - pasme-se! - obra extraordinária do Sr. Rui Silva. Eu pensava que o «tacho» que tinham oferecido a este senhor já chegava para a troca do PRD pelo PSD ... Sinceramente, pensava que assim era!

Protestos do PSD.

Mas não chegou. Tudo tem um preço e, de facto, esse é elevado! Certamente que esse senhor saberá corresponder, tentando ganhar a Câmara de Arruda dos Vinhos, o que vejo com alguma dificuldade.
Sr. Deputado, disse-lhe que, morando tão perto de Arruda dos Vinhos, estava longe da realidade porque enquanto V. Ex.ª falava eu ia tirando alguns apontamentos para o lembrar de algumas obras que o poder local, que sempre foi do PS - e continuará a ser, certamente -, produziu e que ainda estão muito «fresquinhas»: o sistema de adução de água, que, como sabe, era coisa que não existia por aqueles lados; o abastecimento de água à totalidade da zona norte de Arruda ...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Coisa insignificante!

O Orador: - O Sr. Deputado não é de lá, não conhece nada disto!

Risos do PS.

A nível de esgotos, diga-me o que está por fazer. Quanto à rede viária, ao nível de infra-estruturas municipais, dir-me-á também o que há a apontar.
Relativamente à «espinha dorsal» daquela zona, e da sua terra, Sobral de Monte Agraço, a IC n.º 11, que referiu, está prometida há vários anos. Porém, gostaria de a ver minimamente projectada e tornar-se realidade nos próximos quatro ou cinco anos.

Risos do PSD.

Gostaria, gostaria sim!
Sr. Deputado, devo dizer-lhe que o parque industrial não «abortou» por culpa da câmara; ele está «congelado», à espera que seja definido o traçado do IC n.º 11, como sabe, para se poder projectar as vias convenientes de acesso a este parque. E mais, certamente que concordará comigo em que não se deve fazer um parque industrial só pelo facto de se fazer, invadindo terrenos com grande aptidão agrícola, como é o caso de Arruda dos Vinhos, embora, como citou e muito bem, haja, de facto, uma crise acentuada no vinho e na fruta.
Assim, pergunto-lhe somente isto: será que foi também por causa da autarquia local que a agricultura de Arruda dos Vinhos ou do País está em crise?
Termino, lembrando que a sociedade civil, nomeadamente uma associação, está a acabar um pavilhão polidesportivo, em Março. Será que a Câmara Municipal de Arruda dos Vinhos não comparticipou em nada? E não teve também uma participação de cerca de 20 %, ou mais, no pavilhão dos bombeiros voluntários?

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Responda-me a estas questões e verá que a situação não está tão estagnada quanto julga.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Graças à acção governativa! Se não fosse isso ... meu Deus!...

O Orador: - O Sr. Deputado é que talvez tenha estagnado por outras terras e não tenha visitado Arruda dos Vinhos nem as suas proximidades.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Avelino, vou responder-lhe muito rapidamente.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Não tem resposta para dar!...

O Orador: - Há mais de um ano que vim para esta Casa e desde essa altura tenho visitado todos os concelhos do Oeste.
No fim do ano passado, naquela mesma tribuna, fiz uma intervenção onde dei, perante todos vós, testemunho das minhas visitas. Elaborei também um relatório escrito que divulguei à comunicação social e posso oferecer-lho, se assim o entender.
Na passada semana estive três vezes em Arruda dos Vinhos, onde estive ontem novamente e no próximo sábado voltarei a lá ir, não vou só para ver alguns amigos mas também para conversar com as pessoas.
Acompanhei sempre, em todas as visitas ao concelho, a Sr.ª Governadora Civil e nas inaugurações que aí têm ocorrido tenho estado sempre presente. Por isso, talvez conheça essa realidade melhor do que o Sr. Deputado, pois, infelizmente, nunca o vi por lá nessas ocasiões.

Vozes do PSD: - Nunca está!

O Orador: - Em relação à segunda questão, o que é importante não é o que dizemos mas aquilo que as pessoas sentem. Fiz uma intervenção e o Sr. Deputado fez outra. Tenho a convicção absoluta de que, se perguntar a algum arrudense em qual é que ele se revê, é na minha e não na sua.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Venho hoje falar-vos do Alentejo, do Alto e do Baixo Alentejo, muito em especial do Baixo Alentejo. Porquê? Porque nesta «sociedade de sucesso» de que o Governo tanto se gaba, este é o mais gritante, o mais flagrante caso de insucesso verificado no País.

O Sr. Silva Marques (PSD): - isso não é exacto!

A Oradora: - Nos últimos anos o distrito de Beja foi a região que, de acordo com o último censo, mais população perdeu. É actualmente a região mais pobre do continente, a de mais baixo rendimento per capita, a de maior índice de disparidade, maior desemprego, menor percentagem de população nos sectores secundário e terciário, região onde a agricultura é ainda o sector dominante, mas que vive uma situação de crise anunciada e não enfrentada, resultante de vários erros acumulados, em que o Governo, é importante que se diga, é o maior responsável.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não apoiado!

A Oradora: - Conhecendo-se há já bastante tempo a evolução que a política agrícola comum iria ter, o Governo continuou obstinada e cegamente a apoiar a produção de cereais em regime de sequeiro. Estimulou, assim, uma produção que nestas condições está condenada a prazo, induzindo os agricultores a realizarem investimentos em maquinaria e outros equipamentos que em muitos casos deixarão em breve de ser necessários. Foram fundos comunitários e créditos, na maior parte hipotecários, que foram utilizados, não na reconversão do sector, mas no adiamento de uma morte anunciada.
E agora quem paga os empréstimos? Os agricultores? Com que dinheiro, se à situação de crise no sector se veio juntar a seca de 1992?! Vive-se no Baixo Alentejo em situação de moratórias que se prolongam sabe-se lá até quando, de pagamento de juros sobre juros, correndo os bancos o risco de se virem a tornar os maiores latifundiários do Alentejo.
Há algum tempo, um membro do Governo dizia que só faltava que os viessem a culpar pela seca. E se pela seca o Governo não é obviamente culpado, é-o, sem margem para dúvidas, pela falta de água.
A irresponsabilidade com que este assunto tem sido tratado pelo Governo é indesculpável.
Em 1985 o Governo presidido pelo Dr. Mário Soares decidiu, de forma irrevogável, arrancar com o projecto de Alqueva, utilizando os fundos comunitários tornados possíveis pela nossa adesão à CEE. Mas os governos do Prof. Cavaco Silva decidiram, com os pretextos mais diversos, parar com o projecto. E isto quando se sabe que a água é o bem mais essencial no final deste século, que sem água não haverá desenvolvimento possível para a região e que a sua falta desertifica cada vez mais, em termos ambientais e em termos populacionais.
Em 1989 houve a grande esperança de que, com o primeiro Programa de Desenvolvimento Regional, o Governo incluísse o projecto no respectivo Quadro Comunitário de Apoio, mas tal não se verificou.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não cumpriram!

A Oradora: - Repare-se que a CEE não propôs que os Estados membros elaborassem um Plano de Desenvolvimento Económico, mas um Plano de Desenvolvimento Regional para que o crescimento se realizasse de forma harmónica em todas as regiões do País e para que as regiões menos desenvolvidas crescessem mais depressa do que as mais desenvolvidas. No fundo, o que se propunha era a aplicação regional do principio de convergência real, agora tão falado a propósito da União Económica e Monetária.

lqueva era o projecto ideal, porque engloba de forma concertada os três fundos comunitários: o FEDER, para a construção das barragens e canais de rega, o FEOGA, para o financiamento da reestruturação da produção e dos no-

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vos circuitos de comercialização, e o FSE, para a formação dos novos quadros e dos novos agricultores especializados no regadio e nas novas culturas.
Nada foi feito e agora temos a seca e a inexistência de água armazenada suficiente para lhe fazer face, com todo o rol de consequências: a crise na produção agrícola e a crise nos outros sectores de actividade, em especial no dos serviços - comércio, empresas agro-industriais e banca -, que é inevitavelmente afectado pela falta de poder de compra da população que vive da agricultura.
Mas também o sector mineiro está em crise. As Pirites Alentejanas estão numa situação financeira crítica, que poderá levar ao seu encerramento, o que considero absurdo face à importância vital desta empresa no concelho de Aljustrel, ao montante de investimentos já realizados e à sua viabilidade económica. A situação actual da empresa resulta, em grande parte, da falta de água e de a empresa ter tido de realizar às suas custas um investimento não previsto para a captação e transporte da água necessária à sua laboração.
Também os pescadores de Mértola estão a ser afectados pela falta de água no Guadiana e a poluição que nele se verifica, o que lhes está a impedir a venda do peixe que nestas condições conseguem apanhar.
Face a esta situação, a que se deve juntar a partida dos alemães da Base Aérea de Beja e a falta de perspectiva dos trabalhadores portugueses que nela laboram, bem como do seu aproveitamento alternativo ligado ao desenvolvimento da região, justificam o grito de alarme que hoje aqui vos trago.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD chumbou na semana passada os projectos de lei para a criação das regiões administrativas, que o PS e o PCP aqui apresentaram, ...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - É incrível!

A Oradora: - ... tendo o PS proposto que as oito regiões do continente englobassem as do Baixo e Alto Alentejo. Tinha o PSD tido então a possibilidade de se abster, deixando os projectos descer à comissão parlamentar especializada para aí, com a sua maioria, introduzir as alterações que considerasse necessárias. Mas não!
Afirmando-se, assim, na prática contra a regionalização, o PSD chumbou os projectos. Por isso, acuso-o aqui de grave irresponsabilidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - A nossa região é noticia nos jornais, na rádio e na televisão, porque os seus habitantes, sobretudo das freguesias rurais dos concelhos da margem esquerda, passam fome.
A nossa região é aquela onde a droga mais está espalhada e cuja vendas, segundo dizem, mais crescem. É uma vergonha nacional e o reverso escondido desta «sociedade de sucesso».
No entanto, a fome e a droga não são causas mas, sim, consequências: consequências do desemprego, da falta de desenvolvimento, da falta de perspectivas.
Sabem quanto está inscrito no PIDDAC de 1993 para o distrito de Beja? Menos de 4 milhões de contos! Sabem que para Ferreira do Alentejo, por exemplo, estão previstos apenas 600 contos? E que para Grândola não est$ previsto nem um tostão? E que Palmela, por causa do projecto Ford-Wolkswagen, que não foi possível atrair para o Baixo Alentejo, tem, só por si, 10,7 milhões de contos?
Sabem quanto são os orçamentos para 1993 das únicas regiões que o País neste momento possui, os Açores e a Madeira? 164 milhões de contos, excluindo as transferências para as autarquias! E isto para um população que é inferior à do Alto e do Baixo Alentejo e para uma área que é nove vezes inferior à destas regiões em conjunto!
Quer Beja, quer Évora, quer Portalegre terão, de verbas do PIDDAC, em 1993, o equivalente a menos de três dias de receitas dos fundos comunitários!
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Esta situação não pode continuar, tem de ser enfrentada com sentido de responsabilidade, tanto mais que está neste momento em elaboração o segundo Programa de Desenvolvimento Regional e o respectivo Quadro Comunitário de Apoio. Do primeiro foram 2,3 milhões de contos gastos, dos quais 1,3 milhões foram dados pela Comunidade. Porém, na nossa região nada foi feito que alterasse estruturalmente as suas condições de desenvolvimento.
Não pode esta situação voltar a repetir-se com o novo Plano de Desenvolvimento Regional, até porque muito provavelmente este é o último programa deste tipo de que os países mais pobres da Comunidade irão usufruir.
Muita gente na região está consciente da situação que se vive, mas cada um por si é impotente para resolver o problema. É necessário que haja uma entidade que seja responsável pela realização e aplicação de um plano de emergência na região do Baixo Alentejo.
Na impossibilidade de se elegerem pessoas para esse fim, que se reuna quem na região melhor conhece os seus problemas e maior capacidade tem de os concretizar: Deputados, autarcas, partidos políticos, governador civil, associações de produtores e sindicais, escolas superiores, profissionais e secundárias, associações de desenvolvimento regional, todos os que quiserem, puderem e souberem colaborar para enfrentar responsavelmente a situação.
Para situações de crise mais profunda, só pode haver uma resposta: a das medidas mais fortes, ou seja, as mais altas comparticipações comunitárias, a mais baixas taxas de juro e os períodos de amortização mais longos, o maior apoio técnico possível e a maior divulgação das novas condições.
No entanto, isso não basta. É necessário que haja um órgão que seja responsável pela execução deste programa, que tenha capacidade de intervenção e a quem se possa pedir contas.
Por isso, deixo aqui um desafio e um convite: que os Deputados eleitos pelo Baixo Alentejo, os presidentes das câmaras e das asembleias municipais, das assembleias distritais, o governador civil, os responsáveis partidários, bem como as principais associações da região, se juntem para apresentar uma proposta ao Ministro do Planeamento e da Administração do Território e ao Governo; que esta medida seja realizada o mais breve possível, porque a região não pode esperar mais.
15to porque também queremos ser uma região da Europa em que os nossos filhos possam e queiram viver. Sem fome, nem desespero, mas em progresso e em esperança.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, que se inscreveu para pedir esclarecimentos, quero anunciar que estão entre nós, a assistir a esta reunião plenária, alunos da Escola Secundária de Passos Manuel e da Escola Secundária de Amares, aos quais apresento os nossos cumprimentos.

Aplausos gerais.

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Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Torres Marques, muito telegraficamente, quero apenas dizer que acompanhamos a Sr.ª Deputada nas suas preocupações quanto à grave situação do Alentejo, designadamente da margem esquerda, gravidade essa que poderá atingir foros de dramatismo nos próximos tempos.
Trata-se de uma situação que se radica em razões muito claras e objectivas: liquidação do processo produtivo agrícola, bloqueio ao processo de desenvolvimento da região, concretizado e materializado nas verbas do PIDDAC que a Sr.ª Deputada referiu, e um segundo ano de seca sem que o Governo tenha definido até agora uma política para a água.
Nesse sentido, tal como a Sr.ª Deputada, entendo que é necessária uma grande convergência de esforços de todos os Deputados eleitos pelo Alentejo e de todas as forças políticas e sociais da região, no sentido de - e gostava que me acompanhasse nesta reflexão - apresentar duas medidas: um programa de emergência que desde já possa fazer face a este segundo ano de seca e às carências que se adivinham e um programa de desenvolvimento a médio prazo, no quadro do PDR, onde a política da água, da gestão das recursos hídricos e do Alqueva assumam lugar de relevo.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra a Srª Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, quero registar o meu acordo com as suas propostas, que, no fundo, estão incluídas na minha intervenção, e dizer, uma vez mais, que lamento o facto de o PSD não se ter querido juntar a este esforço de desenvolvimento da região.
É absolutamente decisivo que não voltemos as costas a uma população que está a sofrer e que pode sofrer ainda mais no futuro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao próximo orador, quero lembrar aos Srs. Deputados que deu entrada na Mesa o voto n.º 55/VI, apresentado pelo Sr. Deputado Mário Tomé, o qual se relaciona com uma resolução aprovada pelo Parlamento Europeu no sentido de, designadamente, limitar as presidências rotativas da Comunidade Europeia aos cinco maiores países e diminuir o número de línguas oficiais da Comunidade. O voto foi distribuído e será submetido à votação no fim do período de antes da ordem do dia.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agora que se desfazem os oásis que não são mais do que frutos de miragens da política do PSD, aí estão os números do insucesso dessa política por todo o País e também no distrito de Setúbal.
Mais de 37 500 desempregados na península de Setúbal, uma taxa de desemprego que se estima em tripla da nacional, a juntar à evolução acelerada do desemprego em distritos como o do Porto e em regiões como a do Alentejo, onde a taxa de evolução ou de crescimento do mesmo atinge os 20 %.
De facto, na península e no distrito de Setúbal algumas empresas vão encerrando sem que se assista à necessária reestruturação e diversificação do tecido industrial.
Outras reduzem drasticamente o número de trabalhadores, nomeadamente através de despedimentos colectivos e de rescisões forçadas de contratos de trabalho. Casos exemplares são os dos sectores da indústria têxtil, da metalomecânica, da electrónica, da siderúrgica, da química e da automóvel.
Poderíamos aqui falar demoradamente, se tivéssemos tempo, dos casos da Viegas e Lopes, da Convex, da Firestone, da Seagate e da óleos de Santa Catarina que estão na origem do despedimento de mais de 2000 trabalhadores. Poderíamos falar também das ameaças de despedimento na Renault, da liquidação de postos de trabalho na Forsheda, na Telequipo, na Tronitec e na Sistel, ou ainda do sector químico, reduzido a metade dos trabalhadores, da Siderurgia Nacional, dos salários em atraso da Torralta e de outras 13 empresas, entre as quais a Solisnor, a Movauto, a Valfrio e a ENI, que não pagaram atempadamente o subsidio de Natal.
A crise que se reacende no distrito de Setúbal e que se vive por todo o País conduz inevitavelmente à denúncia da má gestão dos fundos disponibilizados, dizia-se, para o investimento e modernização da estrutura produtiva.
Como foram atribuídas e geridas as verbas destinadas à promoção do emprego, à formação profissional, à modernização do tecido industrial? Como foram utilizadas as verbas concedidas às empresas no âmbito da OID, do PEDIP e do FSE e as verbas da segurança social, representando contribuições dos trabalhadores no activo?
Nos últimos quatro anos, só no ramo das indústrias eléctricas, 19 empresas receberam do Governo, no âmbito do SIBR, 14 milhões de contos com vista à criação de 3483 novos empregos. Apenas foram criados 1300, que nem sequer cobrem os postos de trabalho destruídos com o encerramento da Timex (600) e da Seagate (840).
No entanto, esta é ainda uma pequena parte do escândalo. O Governo até concedeu subsídios a empresas fantasmas como a Norelco e a Portsol. A Seagate recebeu cerca de 80 000 contos para formação profissional, milhares que utilizou na formação de estagiários malaios e tailandeses, mas arrecadado o dinheiro e formados os estrangeiros, não para trabalhar aqui, aí vai ela de malas e bagagens para a Malásia deixando em situação aflitiva 840 trabalhadores e as suas famílias.
A Sistel recebeu cerca de 330 000 contos, mas em vez de criar os 16 postos de trabalho prometidos despediu 80 trabalhadores.
A Ford Electrónica recebeu 9 milhões de contos. Dos 1700 postos de trabalho previstos ficou-se apenas pelos 600. E a Indelma, a que pretende suspender temporariamente até 1100 trabalhadores e que se encontra num processo ilegal de lay off, a que liquidou, em 1992, 500 empregos, afinal recebeu do SIBR, do IAPMEI e do IEFP, aproximadamente, 925 000 contos, sem respeitar o compromisso de criar 355 postos de trabalho. E podemos ainda falar da Delco-Remy, dos milhões de contos recebidos; da Tronitec e de vários escândalos de que possuímos números, pois constam do Diário da República. O escândalo é de tal ordem que não se consegue evitar um primeiro desabafo: É fartar vilanagem!
De resto, o que se relata em relação ao distrito de Setúbal passa-se um pouco por todo o Pais. Por exemplo, aqui bem perto, no concelho de Cascais, assistimos ao encerramento da Ibervisão, da Samsung e da SMP. No

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Cacém, a Tudor-Pilhas, mesmo depois de encerrada, ainda é brindada e recebe um novo subsídio de 23 000 contos!
Esquartejada a presa, devorada a carniça, ei-las que partem, as multinacionais, para outros horizontes, em debandada. Para a Espanha, Alemanha e Inglaterra, onde vão investir, deixando para trás, sem remorso, desemprego, instabilidade e momentos difíceis para as famílias dos trabalhadores explorados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desfeita a miragem, torna-se visível o depauperamento da estrutura produtiva da nossa economia com os inevitáveis e graves reflexos para os detentores da força de trabalho. O sector terciário evoluiu, mas assenta nas importações de bens de consumo e equipamentos e não numa capacidade de oferta nacional às solicitações do mercado. O tecido industrial, como vimos, não se modernizou nem diversificou. Graças à degradação da agricultura, regiões como o Alentejo conhecem momentos dramáticos. Muitos assalariados rurais da margem esquerda do Guadiana encontram-se no desemprego. A fome retornou aos campos alentejanos onde se instalaram as coutadas. Vivem-se ali momentos dramáticos e situações de gritantes carências que as ajudas humanitárias tentam minorar.
Mas o que os trabalhadores reclamam são medidas de fundo - e entre elas, a concretização do plano do Alqueva - e não um trabalho empobrecido que ainda, por vezes, é oferecido para colocar os trabalhadores numa situação de maior dependência. Medidas de fundo para que do seu trabalho nasçam os frutos do progresso e do desenvolvimento; para que se abram os horizontes cerrados aos jovens, a esta juventude que, sentindo-se mal-amada pela governação PSD, denodadamente se bate para que não lhe roubem os sonhos.

Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação dos votos n.ºs 55/VI e 56/VI, apresentados pelo Sr. Deputado independente Mário Tomé e pelo PSD, respectivamente.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de esclarecer que o voto n.º 56/VI, apresentado pelo PSD, contém dois pequenos lapsos, que me permitia anunciar para que se faça a respectiva correcção. O primeiro lapso é de natureza ortográfica e diz respeito à palavra «rejeitado», que aparece no primeiro parágrafo escrita erradamente com g. O segundo lapso tem a ver com a palavra «assinaram», que altera um pouco o sentido do texto. Assim, no último parágrafo, onde se diz que «A Assembleia da República manifesta o seu expresso apoio às posições que os Deputados portugueses ao Parlamento Europeu assinaram contra a referida proposta [...]», deve corrigir-se para «assumiram».

(O orador reviu).

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

0 Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, apresento as minhas desculpas por não estar na Sala quando V. Ex.ª anunciou que iria proceder à apreciação e votação dos votos e, em segundo lugar, gostaria de saber se a Mesa vai proceder à leitura dos mesmos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, os votos já foram distribuídos pelas várias bancadas.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, em meu entender, seria aconselhável fazer-se a leitura, na medida em que os Srs. Deputados, na generalidade, não conhecem o conteúdo, mas V. Ex.ª decidirá.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, penso que não é necessário, porque os votos já foram distribuídos.
Entretanto, informo a Câmara que acabou de dar entrada na Mesa um outro voto que vai ser distribuído.
A partir deste momento, vou dar a palavra a cada um dos grupos parlamentares para se pronunciarem sobre os votos em apreciação e depois proceder-se-á à votação.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fm face dos dois votos apresentados, posso desde já anunciar que o PS votará a favor no que respeita às conclusões mas não aos considerandos.
Gostaria ainda de salientar que nos congratulamos com a posição assumida por todos os Deputados portugueses ao Parlamento Europeu, que votaram contra a proposta apresentada pelo eurodeputado socialista alemão. Congratulamo-nos também com o facto de, devido à nova revisão constitucional, o papel dos parlamentos nacionais ser decisivo nesta matéria.
Com efeito, ao Parlamento Europeu só cabe dar parecer sobre esta matéria e é aos parlamentos nacionais que cabe tomar posição e transmiti-la aos respectivos governos para que estes a assumam no âmbito do Conselho Europeu. Acontece que no Conselho Europeu cada país tem um voto e é determinante, pelo que a nossa posição é no sentido de o Governo Português manter a exigência de todos os Estados membros da Comunidade assumirem a presidência de forma rotativa e a de que a língua portuguesa continue a ser um património da Comunidade e uma língua oficial.
Além disso, consideramos que a Inglaterra não tem possibilidades de invocar o facto de ser um país grande para com isso dizer que presidiu bem à Comunidade. Todos reconhecem que a presidência inglesa foi um desastre.
Pelas razões referidas, a nossa posição é a de votar a favor as conclusões - não os considerandos - dos votos, porque entendemos que este assunto é demasiado importante em termos políticos para que se permitam manobras de aproveitamento partidário do que está em causa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito rapidamente, gostaria de dizer que me congratulo com os votos apresentados sobre este tema, pois, do meu ponto de vista, é muito grave que o Parlamento

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Europeu, de uma forma muito clara e com grande maioria, tenha aprovado orientações no sentido de limitar a equidade dos Estados que constituem a Comunidade Europeia, até porque isso representa um ataque à cultura e à originalidade dos Estados que a integram.
E foi, efectivamente, nesse sentido que apresentei o voto n.º 55/VI, esperando que a Assembleia o aprove, assim como os outros dois.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

0 Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Embora o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata não faça a sua política tendo em conta as notícias divulgadas na imprensa - o que, infelizmente, é evidente noutras bancadas deste Hemiciclo -, o nosso voto é bem claro e muito cuidadoso, pois baseia-se em estratos que a imprensa divulgou sobre a votação que se realizou, ontem, no Parlamento Europeu, relativa a uma proposta da autoria de um eurodeputado socialista alemão, que pretende, a prazo e ente outras medidas, reduzir as línguas de trabalho na Comunidade Europeia e limitar as presidências da Comunidade aos cinco maiores Estados membros. Ora, rejeitamos energicamente toda e qualquer proposta deste tipo!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Compreendemos o embaraço do Partido Socialista nesta matéria, porque - recordo-vos - os socialistas são o grupo mais numeroso no Parlamento Europeu.

Vozes do PSD: - muito bem!

O Orador: - Por isso, manifestamos alguma «compreensão» pelo facto de neste momento o Partido Socialista não ter apresentado qualquer voto sobre a matéria em causa.
Pela nossa parte, sempre defendemos os interesses nacionais, sejam eles de natureza económica, social ou cultural. Neste caso, o Partido Social-Democrata, nesta Assembleia ou no Parlamento Europeu, estará sempre na primeira linha da defessa dos interesses portugueses.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por dizer que vamos votar a favor os três votos que deram entrada na Mesa, na medida em que a intenção expressa por todos é idêntica.
Embora façamos uma leitura atenta de todas as informações, temos sempre a preocupação de, para além disso, quando tal se considera necessário, procurar obtê-las com exactidão. Embora na resolução aprovada ontem no Parlamento Europeu não tenha ficado expressa a ideia, ou sugestão - aliás, já apresentada num relatório inicial -, de limitação das presidências da Comunidade aos cinco maiores Estados membros, consideramos que se mantém a ameaça de isso vir a acontecer, porque todo o conteúdo da resolução é muito claro a esse respeito e deixa mesmo antever tal intenção. Para além do mais, a proposta do deputado socialista alemão, Klaus Hansh, já vem na decorrêncía de outras que apontam para a mesma situação e contêm os mesmos objectivos.
Aliás, gostaríamos também de chamar a atenção desta Câmara - daí a razão da apresentação do nosso voto - para o facto da questão relativa à redução das línguas de trabalho estar igualmente contida no relatório, onde se propõem alterações institucionais e à estrutura da União Europeia, que não interessam certamente a Portugal e merecerão, por isso, a rejeição da toda a população portuguesa e, designadmente, de todos os Deputados.
Nesse sentido, como consideramos que a parte resolutiva dos três votos é idêntica, iremos votar a favor de todos eles.
Entretanto, informo a Mesa de que fizemos uma pequena alteração na parte resolutiva do nosso voto, para que fique idêntico aos outros dois e não haja qualquer hipótese de discussão nesta matéria, que, em meu entender, deve ser consensual.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

0 Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 CDS aguardava o conhecimento detalhado da resolução aprovada no Parlamento Europeu para apresentar a sua posição, sobre a qual não há dúvidas, aliás, não pode haver dúvidas.
Estão confirmados alguns dos receios que nos levaram a formular, do modo como formulámos, as nossas propostas de revisão da Constituição. Estão confirmados os nossos receios no que respeita ao modelo federal que predomina em certos espíritos no que se refere à construção da Europa do futuro. É grave esta posição, pelo que ela representa em si e pela votação que recolheu no Parlamento Europeu.
Congratulamo-nos apenas com a posição tomada pelos Deputados portugueses, que souberam desvincular-se das suas obediências partidárias a nível europeu e tomaram, em conjunto, uma posição favorável ao País. Congratulamo-nos também com a iniciativa da Assembleia da República, embora considerássemos preferível poder discuti-la sobre o conhecimento concreto do texto da resolução aprovada.
De qualquer maneira, e se o Partido Comunista Português alterar a parte resolutiva do seu voto, a nossa disposição é no sentido de votar a favor todos os votos apresentados a esta Câmara.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15abel Castro.

A Sr.ª 15abel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Partido Ecologista Os Verdes saúda positivamente a entrada na Mesa destes três votos que, partindo de perspectivas de apreciação e de referenciais políticos e ideológicos extremamente diversificados, convergem num aspecto, para nós, de extrema importàncla: a preservação, a recusa e o protesto do Parlamento português pela atitude discriminatória que a resolução do Parlamento preconiza.
Em nosso entendimento, esta atitude vem ao encontro do nosso cepticismo e das reservas que tivemos oportunidade de manifestar aquando da discussão da ratificação do Tratado de Maastricht. As reservas e o cepticismo perante um caminho e uma opção de construção europeia que, do nosso ponto de vista, não acautelam, não salvaguardam a diversidade dos países, os seus interesses, a diversidade cultural e a defesa da língua como um dos aspectos centrais da defessa dessa mesma cultura.

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Portanto, não convergindo e não podendo subscrever os considerandos dos vários projectos, votaremos favoravelmente a parte resolutiva de todos.

O Sr. Presidente: - Estão encerradas as intervenções.

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da consideração.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, creio que a intervenção do Sr. Deputado Rui Carp só se justifica porque devia estar a pensar no que ia dizer e não ouviu a intervenção que fiz em nome do PS.
Donde, vou reforçar a posição que tomei. Em primeiro lugar, afirmei que estávamos com todos os Deputados portugueses, em especial com os socialistas, que - todos - votaram contra este projecto.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Não nos causa qualquer mal-estar, porque este parecer do Parlamento Europeu é um mero parecer que não vincula o País, e somos contra esta posição.
Concordará o Sr. Deputado que, provavelmente, muitos Deputados liberais do seu grupo parlamentar, no Parlamento Europeu, terão votado a favor desta proposta.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Mas não era isto que estava em causa. O que está em causa é saber o que é que os portugueses e os socialistas votaram no Parlamento Europeu e o que é que os Deputados no Parlamento português pensam sobre esta matéria. Os socialistas são contra e estamos muito bem nesta pele!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Uma vez que o Sr. Deputado Rui Carp não pretende dar explicações, quero informar a Câmara que deu entrada na Mesa o voto n.º 58/VI, sobre a situação em Angola, apresentado pelo PS, que vai ser distribuído. Vamos passar às votações dos votos que acabaram de ser apreciados. Vamos votar, em primeiro lugar, o voto n.º 55/VI, apresentado pelo Sr. Deputado Mário Tomé.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.

É o seguinte:

Voto n.º 55/VI

De protesto pela aprovação de uma resolução do Parlamento Europeu defendendo a limitação das presidências rotativas aos cinco maiores países e a diminuição do número de línguas oficiais da Comunidade Europeia.

O Parlamento Europeu aprovou por grande maioria uma resolução da autoria de Klaus Hansh, do Grupo Socialista, que defende a limitação das presidências
rotativas aos cinco maiores países - França, Alemanha, Grã-Bretanha, Itália e Espanha - e a diminuição do número das línguas oficiais da Comunidade Europeia.
A Assembleia da República, solidarizando-se com o voto contrário dos Deputados portugueses no Parlamento Europeu, não compreende que alegações ou razões de ordem funcional levem o Parlamento Europeu a pronunciar-se favoravelmente a orientações que põem em causa o princípio original da Comunidade, de equilíbrio e igualdade entre os Estados membros, subvertendo nomeadamente o enquadramento político dos objectivos de solidariedade e coesão.
A eventual limitação do número de línguas oficiais atenta contra a identidade e afirmação nacional e cultural dos países membros enquanto que a limitação do exercício das presidências aos cinco países maiores ofenderia, na sua essência, o sentido comunitário da União Europeia.
A Assembleia da República manifesta, pois, a sua profunda preocupação e expressa, em nome dos interesses do povo português, o seu desacordo com tal orientação.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o voto n.º 56/VI, apresentado pelo PSD.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.

È o seguinte:

Voto n.º 56/VI

De protesto, apoiando as posições assumidas pelos Deputados portugueses no Parlamento Europeu, contra a diminuição das línguas oficiais da Comunidade Europeia e a limitação das presidências rotativas.

Considerando notícias veiculadas por alguns órgãos de informação segundo os quais um eurodeputado socialista alemão teria apresentado uma proposta em nome do eurogrupo socialista no Parlamento Europeu, com que pretende reduzir as línguas de trabalho e a limitação das presidências rotativas, nas instituições comunitárias, com claro prejuízo para os Estados membros menos populosos como Portugal, proposta essa energicamente rejeitada por alguns eurodeputados portugueses, em especial o vice-presidente e eurodeputado do PSD António Capucho;
Considerando a necessidade de esta Câmara tomar uma posição enérgica contra essa iniciativa, solidarizando-se assim com os eurodeputados portugueses em defesa dos legítimos interesses nacionais.
Recordando que para matérias como essas é exigida a unanimidade dos Estados membros:
A Assembleia da República manifesta o seu expresso apoio às posições que os Deputados portugueses ao Parlamento Europeu assumiram contra a referida proposta, incumbindo ainda à Comissão de Assuntos Europeus o acompanhamento da evolução do assunto nas instâncias comunitárias, apetrechando-se com a documentação produzida a tal propósito.

Srs. Deputados, já foi distribuída a nova versão do voto n.º 57/VI, do PCP, e também o 58/VI, do PS.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

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O Sr. Presidente: - Sobre a votação?

O Sr. Manuel das Santos (PS): - Sobre o voto n º 57/VI.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, a minha bancada considera que, em bom rigor, poderíamos solicitar que se fizesse alguma discussão sobre este voto, uma vez que só agora nos foi dada a conhecer a versão final.
Quero também anunciar que o PS votará as conclusões apresentadas no voto do PCP sem ter rigorosamente nada a ver com os respectivos considerandos.

O Sr. Presidente: - Vamos então votar o voto n.º 57/VI, apresentado pelo PCP.

Submetido à votaçdo, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.

Voto n.º 57/VI

De protesto, repudiando as reformas da Comunidade Europeia que visem restringir o exercício da presidência do Conselho Europeu e o uso das línguas nacionais.

Considerando que na reunião plenária de ontem, dia 20 de Janeiro, o Parlamento Europeu aprovou uma «resolução sobre a concepção e estratégia da União Europeia na perspectiva do seu alargamento e da criação de uma ordem global à escala europeia»; Tendo em conta que essa resolução, nomeadamente:

Defende expressamente a natureza federal da União Europeia e o reforço do «seu próprio sistema institucional de carácter federal»;
Propõe a rápida elaboração de uma «Constituição para a União» que, designadamente, consagre a Comissão como «o executivo da União Europeia» e a participação do Parlamento Europeu «com iguais direitos e o mesmo peso que o Conselho, em todos os domínios da actividade legislativa da União Europeia e em todas as decisões relativas às receitas e despesas»;
Advoga a redefinição das «funções e natureza da presidência» do Conselho Europeu «tendo em conta as crescentes exigências em termos de continuidade e de presença no que diz respeito à representação no estrangeiro da União Europeia» e, bem assim, «a indispensável conclusão de uma acordo sobre a utilização técnica das línguas de trabalho».

A Assembleia da República Portuguesa entende oportuno manifestar publicamente o seu voto de repúdio de todas as «reformas estruturais e institucionais» da Comunidade Europeia que visem restringir o exercício da presidência do Conselho Europeu aos Estados membros mais ricos e de maior dimensão populacional e limitar o uso das línguas nacionais nos trabalhos das instituições comunitárias.

Srs. Deputados, gostaria de saber se já podemos passar à votação do voto n.º 58/VI.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de informar que vamos fazer chegar à Mesa, de imediato, um requerimento, ao abrigo do artigo 77 º do Regimento, que requer o adiamento do voto n.º 58/VI para a próxima sessão plenária,

(O orador reviu).

O Sr. Presidente: - O requerimento está formulado oralmente e, segundo o Regimento, podemos passar à sua votação sem qualquer discussão.
Vamos votar o requerimento que acabou de ser formulado.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, peço desculpa, mas, para votarmos o requerimento, gostaríamos que fosse tornado claro a que é que ele se refere.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do requerimento.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o requerimento é do seguinte teor:

Nos termos do disposto no artigo 77 º do Regimento, os Deputados abaixo assinados requerem o adiamento, para a próxima sessão, do voto n.º 58/VI, sobre Angola.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Almeida Santos, não há discussão.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, peço desculpa. Ficámos a saber que o voto é sobre Angola, mas talvez conviesse que fosse distribuído.

O Sr. Presidente: - já foi distribuído, Sr. Deputado.
Vamos agora votar o requerimento apresentado pelo PSD.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do PSN, votos contra do PS, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé e abstenções do PCP e do CDS.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca pediu a palavra para que efeito?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Sr. Presidente, só para declarar que farei chegar à Mesa uma declaração de voto relativamente aos três votos que foram votados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 5O minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em apreciação os n.ºs 18, 19 e 20 do Didrio, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 9, 11 e 12 de Dezembro próximo passado.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.

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Vamos iniciar a discussão do inquérito parlamentar n.º 6/VI sobre a alteração alegadamente introduzida em decreto-lei por membro do Governo contra o recebimento de 120 000 contos (PSD).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD apresenta à Assembleia da República a proposta de um inquérito parlamentar cujo objectivo é averiguar o seguinte: primeiro, se foi introduzida por ministro alteração, através de vírgula, em decreto-lei aprovado pelo Governo, contra o recebimento da quantia de 120 000 contos; segundo, em caso afirmativo, quando ocorreu tal facto e qual o ministro a quem o mesmo é imputável; qual o diploma a que se reporta a alteração referida; quais as consequências (benefícios e prejuízos) decorrentes de tal alteração e quais as pessoas ou entidades por ela visados.
Propomos igualmente que tal comissão de inquérito seja presidida por um membro de um partido da oposição e que os seus trabalhos sejam abertos à imprensa.
Estes são os estritos termos do nosso pedido de inquérito e nenhuns outros. A nossa intenção é clara. Trata-se de esclarecer a denúncia de um crime de corrupção, feita por uma jornalista especializada nestas matérias e produzida num programa popular de televisão, perante centenas de milhar de espectadores. Queremos que esse crime não fique impune.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Tomamos tal acusação como séria e presumivelmente fundada, pelo respeito que nos merece a comunicação social.

O Sr. Carios Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Trata-se não de uma acusação vaga mas bem precisa; descreve, sem margem para dúvidas, um caso de corrupção, identifica a qualidade do autor do crime - um ministro -, a quantia paga e o serviço prestado. É difícil imaginar que uma jornalista responsável fizesse este tipo de afirmações sobre matéria tão delicada sem ponderar as suas consequências. Se uma jornalista experiente e profissional se arriscou a fazê-las «sem provas», como disse, é porque, com certeza, tinha a profunda convicção da sua veracidade e confiança de que através da sua divulgação pública e do seu testemunho pessoal pudesse contribuir para o seu esclarecimento.
O inquérito parlamentar que propomos e a abertura de inquérito pelo Sr. Procurador-Geral da República dar-lhe-ão a oportunidade para esclarecer a denúncia que fez.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Antes de tudo, é esta a questão que teremos de averiguar e não nos deixaremos desviar por quem quer agora dela fugir ou obscurecê-la com processos de intenção. Quem quer fugir desta questão - de que houve uma acusação concreta a um acto de corrupção que tem que ser averiguado e punido - para outras, ou é porque é indiferente frente à corrupção ou porque não dá crédito às afirmações da jornalista.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, congratulamo-nos com a atitude do PS que, como partido que já assumiu responsabilidades governativas, tem consciência do papel perverso para a saúde da democracia a existência de suspeitas sobre os actos de governação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Temos igualmente a esperança que o PCP, que não é um partido complacente com a corrupção, seja capaz de ultrapassar as reservas que tem em relação àquilo que considera a duplicidade de critérios do PSD, para apoiar pelo seu mérito próprio esta iniciativa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, somos completamente incapazes de compreender o silêncio incomodado do CDS, um partido que se apresenta publicamente como o paladino da luta pela moralização da vida pública e que agora aparece indiferente a um eventual caso grave de corrupção.

Aplausos do PSD e do PS.

Do nosso ponto de vista, é condenável a posição do CDS, que considera as acusações feitas de «atoardas» jornalísticas, sem crédito e que mostra pouca disponibilidade para as esclarecer.

Vozes do CDS: - Não é verdade!

O Orador: - Esperemos que mude de posição.
É difícil compreender que o CDS permaneça dúplice nesta questão e se manifeste indiferente, ou a um caso de corrupção, se este for verdadeiro, ou mostre um laxismo imperdoável perante «atoardas» que atingem também os membros do CDS que foram ministros.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos aqueles que privilegiaram, neste caso, um hipotético pretexto para uma revisão da lei de imprensa manifestam uma estranha consciência de culpa. Na verdade, não estão a fazer um julgamento sobre a atitude do PSD, mas, sim, sobre a atitude da jornalista.
Aqueles que falam do «virgulagate», que fazem brincadeiras com as vírgulas, que omitem ou minimizam o conteúdo da acusação de corrupção que foi feita, estão todos, implicitamente, a dizer que não acreditam na veracidade das acusações realizadas e que não as tomam a sério. Concordam com o CDS que disse serem «atoardas» e que afirmou que a imprensa não é «para levar a sério».

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Obviamente, apenas se se verificasse serem as acusações da jornalista infundadas e falsas e pudessem, à luz da legislação vigente, permanecer impunes é que tal constatação poderia colocar a questão de direitos fundamentais dos indivíduos, como o direito ao bom nome, não estarem assegurados na legislação vigente.

Vozes do PSD: - Muito beml

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O Orador: - Mas não é esta a nossa posição. Tomámos como ponto de partida a acusação feita sem nos pronunciarmos sobre a sua veracidade. Tomámos à letra o que se diz na comunicação social. Não é o que se espera que façamos?

ozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E quanto à revisão da lei de imprensa, esta está inscrita no Programa do Governo, sufragado pelos portugueses e aprovado pela Assembleia da República. O PSD não precisa, pois, de qualquer pretexto para o fazer quando o considerar oportuno.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A tendência crescente em certos meios para tratar os detentores de cargos políticos como «eles», «os políticos», como se constituíssem uma casta a tratar com pinças e à distância, pode satisfazer muita inveja socializada e ressentimentos vários, mas faz parte de uma linguagem que dissolve os fundamentos do tecido democrático.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Compreende-se que haja quem não goste dos resultados das eleições nem das eleições, mas compreende-se menos que, a pretexto disso, se conteste a legitimidade do exercício do poder, quando emana dos votos e respeita a lei.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O PSD e eu próprio, que alguma responsabilidade pessoal tive em chamar a atenção para este caso, não aceitamos a linguagem, feita de insultos e violência verbal, cujo objectivo é claramente intimidatório em relação à liberdade alheia.

Aplausos do PSD.

Os insultos à iniciativa que tomámos e que obterá certamente um consenso muito para além de nós, chegaram ao ponto de a considerar «pidesca». Há muita gente neste Parlamento, no Partido Comunista Português, no Partido Socialista e no PSD, para quem a palavra «PIDE» não é uma metáfora engraçada, ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... como há também muita gente, neste Parlamento, neste Governo e neste País, que não acha «engraçadas» as histórias de corrupção.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os excessos de linguagem normalmente denotam fraqueza e há quem não esteja habituado a ser criticado e mostre grande arrogância para esconder as fraquezas próprias. Só faltava que, numa democracia, a liberdade de expressão ficasse apenas de um lado e a legitimidade democrática, resultado de uma escolha explícita do povo português, de que emana a nossa qualidade de membros de um órgão de soberania, fosse entendida como uma limitação ao direito de criticar tudo aquilo que entendemos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Fazêmo-lo às claras e de frente, como cidadãos que somos para além da efemeridade da nossa circunstância presente. O nosso combate é contra a apatia que começa a invadir tudo e todos e que inclui no seu centro uma grande indiferença ética. Existe apatia nas generalizações dos jornalistas metendo tudo no mesmo saco e mostrando duplicidade de critérios: umas vezes convém indignarem-se com a corrupção, outras brincar com ela. Existe apatia nos partidos políticos quando se imaginam ganhadores eternos ou perdedores eternos. Existe apatia na sociedade quando graves acusações são feitas e ninguém se indigna. Existe apatia quando se reage a elas e se é condenado por o fazer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esta apatia é o mais claro sinal de uma crise política nas democracias, que inclui uma crise de representação e uma crise de valores. Os políticos têm, sem dúvida, parte da responsabilidade, mas não são os únicos responsáveis. É com esta apatia que não queremos colaborar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A nossa luta é pelo valor das palavras e dos actos na democracia. Este é o património que todos os totalitarismos destroem em primeiro lugar. Para nós, dizer «eu sei» significa dizer que se sabe. Dizer que um ministro vendeu uma vírgula de um decreto por 120 000 contos significa denunciar um acto de corrupção. Actuámos, pois, em conformidade.

Aplausos do PSD e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Sr. Presidente, Sr. Deputado Pacheco Pereira, o problema da liberdade de informação é realmente um assunto delicado. Em democracia, o uso da liberdade de informação tem de ser responsável, e tem-no sido, de uma forma geral. Não defendemos, como é evidente, atitudes menos éticas, menos deontológicas, cujos autores terão de ser responsabilizados quando ultrapassam essas regras.
No entanto, V. Ex.ª proferiu algumas afirmações sobre as quais gostaria de obter esclarecimentos.
Pediu o Sr. Primeiro-Ministro ao Sr. Procurador-Geral da República a instauração imediata de um processo de investigação. Segundo a comunicação social publica, o Sr. Procurador-Geral da República, em resposta ao empenho solicitado pelo Primeiro-Ministro, ordenou já a abertura de um inquérito. A pergunta que faço ao Sr. Deputado Pacheco Pereira é a seguinte: porque não aguardar pela investigação da Procuradoria-Geral da República, em vez de estarmos a sobrepor os dois inquéritos?
A outra questão que pretendo colocar-lhe é mais preocupante e tem a ver com a revisão da Lei de Imprensa. Creio que a actual lei é democrática, suficiente e tem dado algumas boas provas. Diz, todavia, V. Ex.ª que qualquer dia revêem essa mesma lei, o que não deixa de causar apreensões. Gostaria, assim, que V. Ex.ª me dissesse em que sentido pretende revogar a lei. É que propor a revi-

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são da Lei de Imprensa é uma questão tão sensível que pode indiciar - não será com certeza o caso - a introdução de qualquer tipo de censura, contra o qual todos nós, em democracia, temos de nos manifestar, repudiando-o. Em que sentido pretende o PSD essa revisão?
Não se trata, aliás, de uma intenção nova. Pelo menos desde há uns dois anos, quando a imprensa começou a noticiar certos casos, que sentimos a intenção de o PSD rever a Lei de Imprensa. Em que sentido pretende o PSD rever essa lei?

(0 orador reviu).

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, digo-lhe, em primeiro lugar, que nada do que eu disse tem a ver com a liberdade de informação. Não é a liberdade de informação que está em causa: trata-se de averiguar ou de um caso de corrupção ou, se as acusações forem infundadas, de um caso de abuso de liberdade de imprensa. Não está em causa a liberdade de informação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - À segunda questão que me colocou respondo o seguinte: no momento em que existir um despacho de pronúncia resultante do inquérito iniciado pelo Sr. Procurador-Geral da República, o nosso inquérito parlamentar deixará com certeza de ter sentido, conforme está previsto no Regimento. Até lá, tem-no.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - E se não houver despacho de pronúncia?

O Orador: - Gostaria de dizer, em terceiro lugar, que fui muito claro no que afirmei: para nós, esta questão neste momento em nada tem a ver com a da revisão da Lei de Imprensa. Quem faz essa correlação está implicitamente a fazer um julgamento de valor sobre as declarações da Sr.ª Jornalista, admitindo que dessas declarações pode vir preocupação pública em relação a abusos de liberdade de imprensa. Não é o caso. A revisão da Lei de Imprensa consta do programa eleitoral do PSD e do Programa do Governo e foi sufragada no voto, decidida e votada na Assembleia da República. Os termos dessa revisão não podem ser antecipados, nem a sua discussão em nada tem a ver directamente com o caso vertente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almelda Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pacheco Pereira, o que V. Ex.ª disse não me merece qualquer espécie de consideração. Gostei até de o ouvir.
O que merece uma pergunta - e por isso me dirijo a si - é aquilo que não disse. É que o Sr. Deputado desconheceu - se é que teve conhecimento, como eu tive, desse facto - que foi tornado público que quer a Sr.ª Jornalista Helena Sanches Osório terá afirmado quer o Sr. Jornalista Paulo Portas terá reafirmado que o Sr. Deputado lhe teria dito que sabia quem era o ministro que tinha posto a tal vírgula, a vírgula mais cara da história da legislação portuguesa.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Então que o diga!

O Orador: - O Sr. Deputado não teria talvez o direito de silenciar esse aspecto, porque silenciando-o, quando tinha o dever de não o silenciar, mesmo juridicamente, pode justificar o aforismo popular de que «quem cala consente».

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - 15so mesmo!

O Orador: - Ora, calando e consentindo, corroborou, de algum modo, a acusação da forma genérica como foi formulada. O que lhe pediria é que não se silenciasse agora, depois desta minha interpelação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Almeida Santos, agradeço-lhe a oportunidade que me deu de esclarecer a questão suscitada, que tem uma explicação muito simples.
Por razões de boa educação, e como faço normalmente quando escrevo um artigo que se refira a uma pessoa que conheça, telefonei à Sr.ª Jornalista em causa, no dia anterior, avisando-a de que iria escrever um artigo sobre aquela matéria. No decorrer da conversa, cujo conteúdo integral não é para aqui chamado nem tem directamente a ver com a questão em causa, disse à Sr.ª Jornalista que desde há muitos anos conhecia um boato deste teor. Repito: um boato deste teor.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para usar do direito de defesa da consideração, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pacheco Pereira, porque o Sr. Deputado deturpou completa e conscientemente - não poderia ser de outra forma, vindo de quem vem - as minhas palavras de ontem, quero dizer-lhe desde já que ainda o Sr. Deputado não tinha aprendido estas lindas lições sobre democracia que transmitiu do púlpito ...

Vozes do PSD: - E onde é que o Sr. Deputado andava?

O Orador: - ... e já eu as conhecia e temia os ataques que poderiam sofrer de muitos lados e muitos caminhos que o Sr. Deputado conheceu.

Protestos do PSD.

A segunda questão que quero colocar-lhe - o CDS disse-o ontem aqui muito claramente - é a de que a intervenção do Sr. Deputado Pacheco Pereira é, por outro lado, desonesta - desculpar-me-á a força da expressão - porque os membros da bancada do PSD, incluindo vários dos seus vice-presidentes, sabiam que eu daria o meu consenso a que se votasse imediatamente e votaria a favor da criação dessa comissão.

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A única nota que o CDS quis introduzir, nessa altura e ontem, consistiu numa advertência à Câmara quanto à necessidade de proteger a dignidade do instituto do inquérito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Muito bem!

O Orador: - A Câmara protege a sua dignidade quando usa com cautela, com cuidado, o instituto do inquérito e quando o preserva. Sabemos que um inquérito como o que aqui está formulado, sejam quais forem os motivos, os fundamentos e as razões para que a classe política rasgue as vestes, se sinta indignada e ofendida com as afirmações da Sr.ª Jornalista Helena Sanches Osório e queira descobrir a verdade, seja qual for a nossa sanha, tem poucas possibilidades de ser levado à prática.

Vozes do PSD: - Como é que sabe?

Orador: - É a preocupação de eficácia que prejudica a dignidade do inquérito. Foi isso o que se disse.
O CDS também estranhou o surpreendente excesso de zelo. Repare-se em que todos os partidos representados nesta Câmara aceitaram os timings para esta discussão marcados pelo PSD, o que raramente acontece quando queremos criar uma comissão de inquérito em que seja visado um membro do Governo ou alguma personalidade do PSD. Esta é que é a verdade: nós, CDS, que o Sr. Deputado artificiosamente quis excluir dessa preocupação com a averiguação e a defesa da verdade, aceitamos votar no seu timing, quando e nas condições em que quer, apesar de o advertirmos das dificuldades em levar à prática este inquérito e dos prejuízos para a dignidade do instituto que ele implica. A verdade é que quando as coisas se passam de outra forma, isto é, quando queremos criar comissões para inquirir membros do Governo ou outras figuras públicas ligadas ao PSD, nunca esta celeridade se verifica.
A terceira afirmação que gostaria de fazer, em defesa da minha bancada, é a de que, embora criticando e achando infeliz e censurável a expressão da Sr.ª Jornalista Helena Sanches Osório, entendemos que frequentemente na linguagem política (ela nem exercia a sua função de jornalista) se fazem acusações para o ar que depois não são suportadas. Há outros, por exemplo, que recentemente vieram acusar os jornalistas de corrupção, dizendo que campeava a corrupção entre os jornalistas. Ninguém levou a sério. Não são coisas que se levem a sério, enquanto não forem indicadas concretamente.

Vozes do PSD: - É isso que queremos!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Lobo Xavier, desafio-o, quanto à primeira questão colocada, a ler a acta correspondente ao conteúdo da sua intervenção quando a questão foi suscitada nesta Assembleia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Refere o Sr. Deputado, em segundo lugar, que eu teria feito uma acusação de corrupção aos jornalistas.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Eu não disse isso!

O Orador: - Lamento que quem faça tais afirmações nem sequer se dê ao trabalho de ler o texto que é referido. Trata-se de um comentário sobre uma entrevista do subdirector do Expresso, no qual me limitei a reproduzir ipsis verbis, nos seus termos, no seu conteúdo e na sua forma, preocupações muitas vezes manifestadas pelo Sindicato dos Jornalistas, preocupações deontológicas muitas vezes manifestadas pelos jornalistas nos seus congressos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro requereu ao Procurador-Geral da República que interviesse no sentido de esclarecer se houve ou não algum ministro, em algum governo, que tivesse posto alguma vírgula nalgum ponto de alguma frase indefinida num decreto-lei, com alguma desconhecida finalidade, a troco de 120 000 contos. 15to em defesa da honorabilidade do Estado.
Parece-nos tarefa difícil, se não impossível, desde que não tenha a colaboração activa de quem afirmou saber da história, a jornalista Helena Sanches Osório. De qualquer forma, o Governo está no direito de zelar pela honra do convento.
Só não se percebe muito bem o tempo decorrido, de 15 dias, os necessários para o desencadeamento daquilo que considero uma campanha política que culminou com a proposta de inquérito do PSD, secundada pelo PS.
O que move o Governo e o PSD? Saber quem é o ministro ou atacar a jornalista, que nos habituou, aliás, a um trabalho sério e corajoso, ...

O Sr. Fernandes Marques (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - ... enfrentando agressões e agora inquéritos judiciais e parlamentares? Vingança contra jornalistas e órgãos de informação que incomodam um governo autoritário? Preparação de alterações restritivas à Lei de Imprensa e do agravamento de penas?
Será a liberdade de imprensa uma «força de bloqueio», mesmo quando tenha sido eventualmente excedida? Ou as forças de bloqueio que ameaçam o nosso país são exactamente o contrário, isto é, o compadrio, a influência, a cunha e a corrupção?
Num pais onde o que aflige notoriamente os cidadãos é a falta de transparência do Estado e os seus privilégios, acompanhada da falta de atenção aos direitos dos cidadãos, e não o abuso da liberdade de informação e de imprensa, a chamada classe política anda a queixar-se excessivamente de falta de respeito pelos seus interesses e direitos e a exigir respeitabilidade, não tanto em função dos seus actos positivos em beneficio da comunidade, mas da presunção de prestigio funcional e institucional.
O Governo e o PSD, em vez de andarem atrás da vírgula, deviam colocar os pontos nos ii quanto à corrupção, bem como dar instruções aos organismos que de si dependem para apoiarem a criação do conselho de imprensa, onde os cidadãos possam ter voz e ver aceites os seus protestos.

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Quanto a inquéritos parlamentares com a maioria do PSD, estamos conversados, desde que esta maioria concluíu que a culpa do desastre da Barragem do Maranhão tinha sido dos peixes.
Mas, se se descobrisse qual era a imprópria virgula e o seu ministro, ficava sempre espaço para a poética conclusão: «As vírgulas põem-se como quem respira!»

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para tomar posição sobre este pedido de inquérito é preciso determinar com exactidão o que pretendem efectivamente os seus autores.
Convém começar por recordar que, na justificação - feita aqui na terça-feira passada pelo Sr. Deputado Guilherme Silva - da apresentação deste inquérito, pelo PSD, as primeiras palavras foram sobre os limites da liberdade de imprensa. Creio que isto corresponde a tudo o que o Sr. Deputado Pacheco Pereira disse acerca do posicionamento do PSD.
Assim, a primeira questão é a liberdade de imprensa. Essa foi, aliás, a primeira confissão do PSD: o que visa questionar não é a falta de transparência ou a eventual corrupção de agentes do Estado, mas sim a acção da imprensa, dos jornalistas que investigam e denunciam casos de corrupção.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Vejamos a situação concreta. Ela baseia-se na comunicação social, mas apresenta uma especificidade determinante.
A generalidade dos casos de falta de transparência ou de fumos de corrupção relatados na comunicação social vêm com indicação de nomes, de factos, de documentos e de pistas. 15to é, são casos concretos que podem ser investigados e sobre os quais podem ser pedidos documentos e informações, com responsáveis e funcionários que podem ser chamados a depor sobre essa matéria. Para tanto, basta vontade política para o fazer.
Nesta situação - do inquérito parlamentar n.º 6/VI -, verdadeiramente não há nada! Não há suspeitos, não há documentos, não há responsáveis nem funcionários a ouvir. Pode dizer-se mesmo que não há caso.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - 15to é, o inquérito resume-se a uma única diligência possível: ouvir a Sr.ª Jornalista Helena Sanches Osório. Repito, esta é a única diligência possível.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas os promotores do inquérito sabem perfeitamente, além do mais porque isso foi claramente dito pela jornalista - e vem transcrito num artigo do Sr. Deputado Pacheco Pereira -, que não há qualquer prova. E cito a jornalista: «Nunca vou ter provas disso!»
Mais, os promotores do inquérito sabem que se não há provas, ninguém, mas absolutamente ninguém, vai dizer nomes, porque a inexorável consequência seria o visado processar quem dissesse o seu nome. Aí, com toda a razão.
Portanto, o inquérito começa e esgota-se na jornalista Helena Sanches Osório. Digo aqui aquilo que muitos pensam: o inquérito não é a nenhum caso concreto, não é a nenhuma vírgula e seu ministro, o inquérito é à jornalista Helena Sanches Osório.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Se o PSD visasse a moralização do Estado, porque escolheria uma hipótese em que não há nem visado, nem provas e nem sequer caso?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em muitas denúncias da comunicação social encontramos visados, documentos e factos concretos.
Tenho aqui vários recortes de imprensa. Por exemplo, o caso de um ministro que fez uma casa de 150 000 contos - mas isso não preocupou o PSD; o caso da adjudicação, por uma secretaria de Estado, de publicidade a uma empresa inexistente; o caso da subavaliação da Tranquilidade, para a vender «bem vendida», ou seja, mais barato, a um grupo económico; casos semelhantes ocorreram com a Império e a Mundial Confiança.
Em relação a estes casos, em que há visados, nomes, responsáveis e funcionários para ouvir, o PSD não faz nada. Mas, há muitos, muitos outros casos, aliás, trouxe um larguíssimo dossier de casos.
Por que razão, nestes casos, o PSD não manifestou a gana de inquirição que agora diz ter?

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem perguntado!

O Orador: - Aliás, em vez de gana de inquirição, o PSD - e esta é a história da duplicidade, já aqui assumida - já impediu várias vezes a Assembleia da República de investigar indiciados casos de falta de transparência e de corrupção.
Exemplos? Há exemplos de votos contra e de bloqueio e manipulação de conclusões. Exemplos de votos contra, dou dois: o voto contra um pedido de inquérito, apresentado pelo PCP, ao processo de privatizações - há muitos recortes de jornais sobre a matéria -, e o voto contra um pedido de inquérito, apresentado pelo PS e pelo CDS, às OPV de um grupo económico do norte. São dois casos muito interessantes ...
Agora, a título de exemplo de bloqueios, posso referir as conclusões do inquérito ao Ministério da Saúde, que são uma espécie de absolvição generalizada - urbi et orbi! E, no entanto, toda a gente vê o que se tem passado com aquele caso. Um outro exemplo de bloqueio foi a absolvição que foi feita em relação às questões do Fundo Social Europeu, ou ainda o arquivamento, sem mais, do processo dos perdões fiscais da Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais.
E vem a propósito lembrar este caso, uma vez que ainda ontem o jornal Público escrevia o seguinte: «O jornalista António Marinho revelou ontem [...] ter sido contactado [...] por alegados intermediários de Oliveira e Costa no sentido de apurar qual seria o seu preço para interromper as investigações relativas à intervenção do então Secretário de Estado [...] em despachos que perdoavam dívidas à Cerâmica Campos.»

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Ora, aqui temos um caso em que há nomes e pessoas a averiguar. Ou seja, Sr. Presidente e Srs. Deputados, há caso. E, diga-se de passagem, o caso não é pequeno!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Como se vê, o PSD não quer investigar seriamente os casos de falta de transparência e de corrupção. Com este inquérito, o PSD não pretende defender o Estado dos corruptos em nome da moralidade pública mas, sim, o Governo em nome de interesses partidários e corporativos - interesses da classe política - dos que denunciam a corrupção.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Este é um caso de paradigmas. Paradigmas construídos pelo próprio PSD.
O PSD quer fazer da jornalista Helena Sanches Osório um caso paradigmático, construindo um paradigma de jornalismo de investigação na própria jornalista. É o PSD quem o faz! E fá-lo, por ter sido ela a investigar os casos, como o do Ministério da Saúde ou do Fundo Social Europeu, por ter liderado, de alguma maneira, um combate contra as limitaçõés à liberdade de imprensa que o PSD projectava a propósito do segredo de Estado, etc., e porque quer mostrar de forma paradigmática o que sucede aos jornalistas de investigação.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por muito que o PSD diga agora o contrário, o que está em causa é a liberdade de imprensa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O que o PSD quer, a propósito deste caso, é a intimidação dos jornalistas e é abrir caminho à revisão da Lei de Imprensa.

Aplausos do PCP e do Deputado independente Mário Tomé.

Srs. Deputados, vale a pena lembrar hoje que a mão que desenhou esta operação é a mesma que, ainda não há muito tempo, queria reunir os jornalistas de São Bento semanalmente, numa sala do PSD, com a intenção de lhes dar orientação de temas e opiniões.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP):- Bem lembrado!

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Falso!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É claro que se tem de chamar a atenção para questões de deontologia e responsabilidades - são, obvíamente, questões relevantes mas que têm os seus mecanismos próprios de fiscalização. Mas a batalha essencial que aqui se anuncia não é essa, nem é a de isolar as vítimas; porque vitimas a médio prazo são, nas intenções do PSD, a liberdade de imprensa e o direito à informação,
Conforme demonstrei, esta operação do PSD não é contra a corrupção. Vale a pena recordar que o PSD, pelo contrário, tem combatido poderes independentes do Estado, desde a Procuradoria ao Tribunal de Contas, entidades estas que tiveram acções decisivas concretas na defesa do interesse público, na luta contra a ilegalidade, pela transparência e contra os crimes de corrupção.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Da nossa parte, entendemos hoje, como sempre, que a luta contra a corrupção e pela moralização e transparência é uma prioridade. Sempre foi e será!
Suscitaremos aqui todos, todos os casos em que haja denúncias públicas de situações. Aliás, acabamos de entregar na Mesa da Assembleia da República um pedido de inquérito sobre o processo de privatizações. É preciso não esquecer que este processo era de tal ordem que houve um recorte de imprensa que diz que este processo é «um monumental cambão!»
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a defesa da liberdade de imprensa não é menos importante e a ela dedicaremos também todo o nosso esforço.
Aqui fica o alerta, que assumimos com toda a frontalidade.

Aplausos do PCP, de pé, do PS, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, V. Ex.ª fez referência à minha intervenção de terça-feira passada, quando justifiquei e anunciei o pedido de inquérito que o meu partido ia apresentar - a constituição, por requerimento, de uma comissão eventual.
Com efeito, referiu que aludi aos limites da liberdade de imprensa, mas já não que, quando fiz esse enquadramento legal de direitos fundamentais, designadamente o direito ao bom nome e à reputação e, por outro lado, à liberdade de imprensa e de expressão, também referi, claramente, que são conhecidas as regras em democracia por parte de quem assume funções políticas e públicas e que, em consequência, não se deve incomodar nem reagir negativamente às denúncias que, através da comunicação social, são feitas de eventuais irregularidades e de actos de menor honestidade por parte desses responsáveis. Fiz, inclusivamente, um elogio ao jornalismo de investigação enquanto forma de detecção e denúncia dessas situações, o que não impede, obviamente, de exigir que essa mesma actuação seja uma actuação responsável.
Queria, portanto, tornar claro que V. Ex.ª amputou a minha intervenção para tentar justificar as posições que hoje o seu partido, estranhamente, veio aqui tomar. Aliás, estranho essa atitude porque o Partido Comunista, como já foi referido, costuma ser um paladino da defesa da transparência e dos valores que, efectivamente, estão ligados à honestidade e seriedade na vida pública.
Mas, neste caso, constato que V. Ex.ª teve, de facto, dificuldade em ir ao interior do seu partido e da sua forma de estar buscar razões para justificar a posição que hoje toma. Inclusivamente, teve necessidade de chamar à colação posições anteriores do PSD em relação a outros pedidos de inquérito, o que prova que V. Ex.ª sente, efectivamente, dificuldades em, no seu terreno próprio, encontrar justificação para inviabilizar ou tomar uma posição contrária a este pedido de inquérito.

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Relativamente a essa matéria, traz à colação um argumento que é, de todo, impensável! V. Ex.ª diz: «Não há provas, e como não há provas não se justifica o inquérito.» Por amor de Deus! Os inquéritos judiciais e parlamentares desencadeiam-se em face de situações que são imputações de irregularidades ou de infracções graves, e é em função do seu desencadear que se apurará ou não se há ou não provas. Nunca se inviabiliza um inquérito, seja judicial seja parlamentar, a partir da afirmação de que não há provas! Nem sei, aliás, como conclui que não há provas.

O Sr. Mário Maciel (PSD): - Como é que sabe?!

O Orador: - V. Ex.ª pode ter a ideia de que a Sr.ª Jornalista em causa afirmou que não tinha provas. Ora, essa é uma questão completamente diferente de não haver provas do facto que ela referiu como sendo, eventualmente, verdadeiro.
Portanto, são, de todo, desculpas de mau pagador, para camuflar esta realidade, ou seja, a realidade de o Partido Comunista Português estar contra uma diligência parlamentar e judicial para apurar um caso que é denunciado como de corrupção.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - O Sr. Deputado João Amaral não dispõe de tempo, no entanto, a Mesa concede-lhe um minuto para responder ao pedido de esclarecimento formulado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, citei a intervenção do Sr. Deputado Guilherme Silva, e citei-a bem. O primeiro parágrafo da sua intervenção fala dos limites da liberdade de imprensa.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Primeiro fala da liberdade de imprensa, depois fala dos seus limites!

O Orador: - Deduzo daí, respondendo ao Sr. Deputado Pacheco Pereira, que a sua primeira preocupação foi exactamente essa.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É o contrário!

O Orador: - Em segundo lugar, esteja o Sr. Deputado tranquilo, pois somos pela moralização da vida pública, somos e continuaremos a ser contra a corrupção. Aliás, disse com muita clareza que colocaremos aqui todos, mas todos os casos de corrupção.

O Sr. Silva Marques (PSD): - 15so é uma contradição!

O Orador: - Pode estar perfeitamente descansado que terá de os votar, ...

O Sr. Mário Maciel (PSD): - 15so não nos incomoda!

O Orador: - ... a menos que siga a norma prudente - que muitos dos seus colegas por vezes seguem - de se ausentar em alturas estratégicas.
Finalmente, tomei a expressão «mau pagador» como uma espécie de autocrítica, aliás, essa do mau pagador a propósito de um caso de corrupção, até é uma piada de mau gosto!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É uma figura popular!

O Orador: - Mas, quanto ao caso concreto, a questão é que os senhores sabem que não há provas, nem visado, ...

O Sr. Mário Maciel (PSD): - Mas como é que sabe?

O Orador: - ... nem documentos, nem factos. Os senhores sabem que não há absolutamente nada!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, queira concluir.

O Orador: - É precisamente por o saberem que os senhores, com esta tranquilidade, apresentam na Assembleia da República o projecto de inquérito. Sabem que não é contra um caso de corrupção que vão actuar, mas sim contra a liberdade de imprensa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS já por duas vezes disse o que pensava, mas, apesar de tudo, gostaria de salientar mais algumas coisas.
Em primeiro lugar, o PSD, que chamou em seu auxílio e para a sua companhia tantos outros Deputados, para deixar o CDS isolado, acabou, afinal, por ficar ele próprio sozinho, porque todos os Deputados que têm falado da tribuna ou dos seus lugares têm sublinhado exactamente o que o CDS, serenamente, disse desde o principio, pelo que este assédio foi mal pago, estes Deputados foram mal agradecidos, mudaram de bloco.
Afinal, os que foram chamados para a companhia do PSD também pensam que este pedido de inquérito envolve os seus riscos, envolve problemas, em termos de dignidade desta Câmra e de praticabilidade. É que não há provas. E o problema não é só esse: não há factos, não há ofendidos. Não há corpo de delito, nem sequer há alguma acusação a fazer à jornalista Sanches Osório que não seja do ponto de vista deontológico e da sua responsabilidade cívica, pois ela nem sequer estava no exercício da sua função de jornalismo.
O que tenho a criticar, e faço-o vivamente, é que alguém com responsabilidade, por ser ouvida na opinião pública, como é o caso de uma jornalista de investigação, que detecta casos de corrupção, possa tomar a liberdade de, num momento privado, falar da forma como falou. O CDS condena essa intervenção da jornalista Sanches Osório, que ensombra muitas outras atitudes louváveis e trabalhos dignos e úteis para a democracia, que estão a seu crédito.
Em segundo lugar, o CDS diz que, de facto, esta atoarda, como chamei ao que a jornalista Sanches Osório disse - e, curiosamente, eu fui o mais agressivo para a própria jornalista em causa, apesar do que disse o Sr. Deputado Pacheco Pereira -, ofende a classe política. Bem basta a essa classe as acusações concretas, que se provam, sobre os actos de corrupção, quanto mais agora andar a ouvir as atoardas desse tipo!...
Se a classe política está ofendida e quer reagir, reagimos ao seu lado, como ela quiser: se querem um inquérito,

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também o queremos, mas advertimos que este inquérito pode cair no ridículo, pode ter um significado pouco menos do que pírrico, a começar pela introdução, ou seja, «[...] a fim de averiguar: se foi introduzida por ministro a alteração, através de vírgula, em decreto-lei aprovado pelo Governo contra o recebimento da quantia de 120 000 000$».

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - É essa a acusação!

O Orador: - Portanto, é esta a posição do CDS.
E só há uma forma de descobrir - e isso já aqui foi dito, e é verdade -: é se a jornalista Sanches Osório vier aqui dizer quem é o ministro e qual foi o decreto-lei. Mas ela não o fará, ...

Vozes do CDS: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Como é que sabe?!

O Orador:- ... porque, até agora, não cometeu um crime de difamação e, como não tem provas, não será uma comissão de inquérito que a obrigará a cair numa situação de difamação.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Sérgio.

O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Informar não pode ser igual a deformar. Ora, é evidente que, sob a aparência da liberdade, se drena toda a espécie de produtos deformadores da verdade e criadores de má fé, de ignorância, de conformismo. Há centrais de manipulação da opinião pública, que parecem ser corruptas e corruptoras.

Vozes do CDS: - Exactamente!

O Orador: - Tenho à minha frente o velho Tácito, que nos diz ser «inerente à própria vida em sociedade a tentativa de corrupção». Quer dizer, para Tácito, há possibilidade de haver corruptos e corruptores só porque se vive em sociedade. Aliás, tenho comigo o Germânia que refere o seguinte: «corrumpere et corrumpi saeculum appelatur». Quer dizer, pelo facto de se viver no século já se pode ser corrupto ou corruptor.
Portanto, não devemos espantar-nos por haver corrupção. No entanto, o amor do status quo e dos interesses que dele resultam; o amor do sensacionalismo do escândalo; o amor da mentira e do fantástico; a falácia de que o político, porque o é, perdeu a privacidade, passaram, aqui e além, a dominar a nossa vida em sociedade.
E a verdade? Essa vai subsistindo em certos círculos insubornáveis (nos quais se integram os jornalistas portugueses, na sua generalidade) que, por essa mesma razão, ou seja, por serem insubornáveis, lutam com a falta de recursos, com a concorrência desleal, de quem tem influências e dinheiro, com os tentáculos poderosos da intimidação e da absorção.
Mas como a verdade há-de ser a característica primeira de um Estado de direito, dai que o PSN aprove, vivamente, a constituição de uma comissão de inquérito em relação ao que já por aí se chama a «vírgulagate», mas, a propósito do pitoresco da virgula, que não se fique só pelas vírgulas, vamos aos discursos e até aos próprios silêncios, pois também se pode ser corrupto e corruptor silenciando.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Só as virgulas é pitoresco, dá vontade de rir! Só as vírgulas não, vamos também às palavras! É preciso que a preocupação da verdade em si e por si distinguem este Parlamento, para além dos revolucionários de pacotilha e dos «novos bárbaros» da informação, ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... na esperança de que, próxima ou remotamente, triunfe a aliança da vida e do saber, que é, precisamente, a honestidade.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já dissemos o essencial sobre este pedido de inquérito e não precisámos de reflectir muito, não tivemos dramas de hesitação alguma. Dissemos logo que votávamos este pedido de inquérito, como sempre votámos todos os inquéritos. E porquê? Porque é-nos muito difícil não partir do princípio de que Deputados responsáveis desta Câmara, sejam eles quais forem, não tenham o direito de inquirir o que consideram que precisa de inquirição.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Temos de ter é o cuidado, cada vez que propomos um inquérito, de saber se estamos a brincar aos inquéritos ou se estes se justificam ou não, porque nós votá-lo-emos sempre.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - No passado não foi sempre assim, nem todos têm esta atitude de votar, sempre, todos os inquéritos e alguns deles, que julgámos justificáveis, não tiverem a aprovação para poderem passar.
Lembro-me até, se a memória não me falha, que, no I Governo Constitucional, o Expresso publicou na primeira página um artigo que dizia: «Membro do Governo tem um depósito de 7000 contos na Suíça.» Quisemos fazer um inquérito e não o pudemos fazer! E, é claro, começámos a olhar uns para os outros, mesmo dentro do próprio Governo. Cada um, olhando para o outro, pensava: será aquele? Aquele não, é pobre! Será aquele? E eu, que era dos menos pobres, enfim, fui dos mais suspeitos na época. No fim, aquilo deu em nada, porque ninguém tinha 7000 contos na Suíça, penso eu, ou, pelo menos, não foi possível provar que algum ministro ou membro do Govemo os tivesse. Porventura, irá passar-se o mesmo agora, mas essa não é razão para que não se faça o inquérito.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado João Amaral não tem a qualidade de ex-ministro, porque, se a tivesse, estaria na posição em que me encontro agora, ...

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - ... porque considero que, estatisticamente, fui o que tive mais mercadoria para vender. Ninguém legislou mais do que eu, nem distribuiu mais vírgulas pelos textos legislativos.

Risos do PSD.

Portanto, considero-me sob suspeição. Logo, se a imputação de um facto desonroso ofende, a colocação de alguém sob suspeita de que o cometeu também ofende, como é óbvio!

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS):- Claro!

O Orador: - Ora, há aqui um universo definido: os Ministros. Não se sabe se o Ministro em causa é deste Governo, se de governos anteriores ou, até mesmo, do governo de Salazar. Não está esclarecido, embora o Sr. Deputado Raúl Rêgo, que já trata destes assuntos há cerca de 50 anos, tenha publicado livros com casos de denúncias de desonestidades no regime anterior, que nunca foram averiguados.
Portanto, a Sr.ª Jornalista Sanches Osório, que não é minimamente responsável, é mesmo responsável - e devo dizer que tenho por ela a consideração de que não diz coisas no ar -, deve ter partido da convicção ou de que sabe quem é que pôs a virgula e a vendeu ou de que alguém lhe disse que pôs a virgula e a vendeu, e ela acreditou. Deste modo, parece-me que, no mínimo, temos de dar à Sr.ª Jornalista Sanches Osório, por quem tenho a máxima consideração, até ver!, oportunidade de provar a verdade daquilo que afirmou, porque ou prova essa verdade e iliba-se de toda a responsabilidade, que transferirá para quem recair a imputação ou a responsabilidade do acto, ou, caso contrario, é a responsável por ter feito uma afirmação para qual não tinha suficiente fundamento factual.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É tão claro como isto e não vale a pena fazermos deste assunto uma questão de, sei lá, lesa pátria, porque factos como estes têm sido, como disse o Sr. Deputado João Amaral, relativamente corriqueiros. Inquéritos como este é que nunca foram corriqueiros e eu penso que têm de passar a sê-lo, pela razão simples de que uma das vantagens de votarmos este inquérito - e parece-me que isto escapou aos Srs. Deputados António Lobo Xavier e João Amaral - é a de, a partir de agora, ser mais difícil recusar o voto a um inquérito que se refira a um facto semelhante a este.

Aplausos do PS, do PSD, do CDS e do PSN.

O Sr. João Amaral (PCP): - Não escapou, não!

O Orador: - Estamos a criar jurisprudência, chamemos-lhe assim. A partir de agora, imputação de corrupção implica inquérito. Inquiramo-nos uns aos outros. Fiscalizemo-nos uns aos outros. Responsabilizemo-nos uns aos outros e colhamos o fruto do que temos andado a semear, não eu mas alguém, porque os ataques à classe política são a ordem do dia na nossa democracia. Há muito quem queira diminuir a classe política ...

Vozes do CDS: - É verdade!

O Orador: - ... e quem atire para cima dela responsabilidades que não tem! Estamos a colher o fruto dessas atitudes.
A classe política entrou em descrédito e, quando alguém lança uma atoarda, assim a classificou o Sr. Deputado António Lobo Xavier, de que houve um ministro que vendeu uma vírgula por uma fortuna, não só a sedução da caricatura, da vírgula, mas tudo o mais, leva as pessoas a acreditarem e a perguntarem: «Quem terá sido 0 malandro do ministro?» Não perguntam se houve ou não algum ministro que tenha feito este negócio.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Exacto!

O Orador: - Toda a gente está à espera de encontrar o patife do ministro que fez isso.
Bom, por isso não se diga que não há visados, pois há um universo de visados. Não se diga que não há ofendidos, porque há um universo de ofendidos. Não se diga que não há matéria factual, que não há corpo de delito, porque há uma afirmação responsável de uma jornalista que tem tanta responsabilidade como liberdade.
Desde que me lembro que existo politicamente, sempre me debati pela liberdade de imprensa e já nessa altura o Sr. Deputado Raúl Rêgo, uma vez mais, publicava artigos e mandava para o Sr. Presidente do Conselho o recorte da censura. A censura cortava-lhe uma frase e ele mandava o respectivo recorte para o Presidente do Conselho. Nunca ganhou nada com isso, mas o Presidente do Conselho não podia alegar desconhecimento do que lhe faziam todos os dias.
Ora bem, nós conquistámos essa liberdade e queremos que seja uma liberdade e não apenas um direito. Por isso se chama liberdade de imprensa, não sujeita a qualquer espécie de censura mas apenas sujeita àquilo que a lei - e a lei actual chega e cresce e, fundamentalmente o Código Penal, até é uma boa lei - classifica como abuso de liberdade de imprensa. Estamos ou não perante um caso de abuso de liberdade de imprensa? Lá está a Procuradoria-Geral da República para entender se o caso tem ou não essa gravidade. Nós é que não podemos ser indiferentes e creio que sempre que o fomos no passado, aí, sim, errámos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas também pergunto ao Sr. Deputado João Amaral por que é que, tendo ele, com certeza, há mais tempo, conhecimento de todos aqueles factos, não propôs, relativamente a cada um, um inquérito. Nós votaríamos esse inquérito, e espero que, de futuro, todos chamemos a nós a preocupação de requerer um inquérito para apuramento da verdade de cada acusação desta gravidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - 15to é o essencial que eu tinha a dizer. Mas quero ainda referir o seguinte: não podemos ser laxistas nesta matéria porque uma imputação injuriosa, mesmo quando não ofende, suja. E, na parte que me toca, não me limito a não querer ser ofendido, também faço questão em continuar a ter o nome limpo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ora bem, dito isto, quero pedir ao PSD que, se concordar, na alínea a) das conclusões, não em-

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pregue a expressão «através de virgula», porque é restritiva. É que a alteração pode não ser apenas por uma virgula. A virgula pode ser apenas a caricatura do
fenómeno.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Pode falar-se só em alteração!

O Orador: - A meu ver, deve ser-lhe dada uma redacção diferente, passando a constar, na referida alínea, por exemplo, a expressão «nomeadamente, através da
aposição de uma virgula em decreto-lei». E, sobretudo, não devem pôr «pelo Governo» mas, sim, «por Governo», porque «pelo» é «por o», o «o» é o que está em exercício de funções neste momento, não abrange os governos passados. E parece que a imputação abrange mais do que este Governo, pelo que vamos investigá-los a todos.

Aplausos do PS.

Deste modo, deve passar a utilizar-se a expressão «por Governo da República».
Dito isto, creio que disse o principal, sem paixão, sem fazermos disto uma guerra, meu Deus! Acho que a democracia deve funcionar normalmente através dos seus instrumentos e, num Estado de direito, é assim que deve ser. Quem se sente ofendido, reage pelos meios que a lei lhe oferece.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Eu senti-me ofendido e o mesmo aconteceu com o meu partido. Acho que a Sr.ª Jornalista Helena Sanches Osório está agora perante as suas próprias
responsabilidades: ou diz quem foi ou não o diz ou, inclusivamente, foge à questão dizendo: «Foi um boato. Não mais do que um boato. Referi isso apenas como um boato!». Muito bem, isso também serve, também desresponsabiliza, também desdramatiza, também é uma saída, embora continue a ser grave; de qualquer modo, será menos grave.
Se, na verdade, se poder apurar quem foi o «malandro» do ministro que vendeu uma vírgula por um preço tão exorbitante, com certeza que há-de ser fácil saber qual é o texto, qual foi a vírgula, que sentido teve a alteração pela via da vírgula ou de uma palavra ou outra e quem foram os beneficiários dessa falcatrua.
Portanto, com normalidade, com naturalidade, façamos funcionar o Estado de direito e a democracia aberta.

Aplausos do PS, do PSD e do PSN.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, estão inscritos os Srs. Deputados Silva Marques e Nogueira de Brito. O Sr. Deputado Almeida Santos tem muito pouco tempo para responder, mas com o seu poder de síntese vai conseguir fazê-lo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Almeida Santos, pedi a palavra para assinalar o facto de quanto, para nós, é importante ver que podemos estar em conjunto com um Deputado como o Sr. Deputado Almeida Santos - e também com o Partido Socialista - em questões nevrálgicas e fundamentais para o regime democrático.
Já aqui foi dito várias vezes, não apenas por mim mas também por outros colegas meus, e também da sua bancada, que há questões-chave do regime democrático em que os nossos dois partidos têm estado juntos, sem complexos. Penso que isso é fundamental para a consolidação das instituições democráticas e do futuro da democracia, porque não são poucos os inimigos e adversários da democracia, cada um procurando abrir o silo à sua maneira.
Não será por acaso, talvez, Sr. Deputado Almeida Santos, que certos políticos, eventualmente deste Hemiciclo e fora dele, sejam tão pressurosos a atacar a classe política, a considerar, inclusivamente, legítimo um ataque generalizado à classe política, sem que isso seja motivo de reacção, e tão pressurosos são quando procuram pôr em causa elementos do sistema democrático. E bem! Mas apenas desses cuidam.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Queira concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Já ouvimos aqui hoje um Sr. Deputado considerar que havia imensos caos de indícios de corrupção e que está agindo sobre eles. Não contestamos isso, embora, quanto se trata de votar aqui inquéritos, não abdiquemos do nosso direito de fazer um juízo. E do que se trata neste momento é saber ...

Risos do PCP.

Srs. Deputados, não abdicamos de fazer o nosso juízo. Por isso mesmo - e, neste ponto, eu não convirjo com o Sr. Deputado Almeida Santos - nós não abdicamos de fazer um juízo. De outra forma, não se devia sujeitar um inquérito a votos.
Por isso, neste ponto, a questão que se coloca é esta: há ou não fundamento? Quem achar que há, que vote a favor para que se faça um inquérito. O facto de não estar apenas em causa um sujeito concreto, e apenas um, de momento, não é fundamento? Nós pensamos que sim! É fundamento bem reforçado o facto de alguém ter posto genericamente em causa o conjunto dos agentes do sistema democrático - e reforço: do sistema democrático!

A pergunta que deve colocar-se é: será fundamento suficiente o voto a favor deste inquérito? Pensamos que sim, apesar de terem surgido aqui argumentos em sentido contrário, nomeadamente da bancada comunista, que defendeu que só haveria fundamento havendo um agente concreto. Disse mesmo que não havia caso. Ora, eu penso que há, sobretudo, caso, porque não estão apenas em questão indivíduos concretos mas, sim, a própria credibilidade do regime em que vivemos.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Almeida Santos, acompanho-o inteiramente nas suas palavras, nas suas preocupações, ...

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... no sublinhado que fez em relação ao importante precedente que a votação deste inquérito vai criar e que, com certeza, não vamos deixar de invocar.

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Em todo o caso, Sr. Deputado, gostaria que prestasse um esclarecimento, que considero importante, porque, além de ser um político e um parlamentar de mérítos reconhecidos, é também um jurista de méritos reconhecidos.
Sr. Deputado Almeida Santos, há dias, quando o problema foi aqui levantado, o Sr. Deputado Guilherme Silva colocou o problema de uma forma não inteiramente correcta, porque pôs a Assembleia a inquirir as afirmações, os actos da Sr.ª Jornalista Helena Sanches Osório.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não senhor!

O Orador: - Ou, pelos menos, levantou essa preocupação em primeiro lugar.
Hoje o PSD, cuidadosamente e pela voz do Sr. Deputado Pacheco Pereira, «fez agulha» e já não foi disso que tratou. Disse claramente: «Não vamos averiguar as afirmações da Sr.ª Jornalista em si e no que elas implicam mas, isso sim, a suspeita e a acusação expressa e implícita 'nas suas palavras.»
Porém, o Sr. Deputado Almeida Santos voltou a levantar-nos a dúvida, pelo que gostaria que V. Ex.ª, esclarecesse, além do mais, com a sua autoridade nesta Câmara, o que é que a Câmara vai inquirir: a acusação e a suspeita lançada sobre n ministros de terem vendido a alteração de um decreto por 120 000 contos ou a actuação da Sr.ª Jornalista Helena Sanches Osório? Uma coisa é o que vamos averiguar, outra coisa são as conclusões dos resultados da nossa averiguação.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado, como sabe que não se vai averiguar nada!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Ah! Não se vai averiguar nada!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra e consideração, na medida em que o Sr. Deputado Nogueira de Brito fez uma afirmação que não é correcta.

O Sr. Previdente (Ferraz de Abreu): - Nesse caso, V. Ex.ª aguarda a resposta do Sr. Deputado Almeida Santos aos pedidos de esclarecimento e depois dar-lhe-ei a palavra.
Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Silva Marques, agradeço-lhe a questão que me colocou, mas quero dizer-lhe que não gostei da expressão «estar em conjunto».

O Sr. Silva Marques (PSD): - Podemos alterar isso!

O Orador: - Altere, sim! É que há o voto coincidente, há a concordáncia, e tantas outras expressões. Esse fenómeno do voto coincidente tem acontecido em relação a todos os partidos: ora votamos com o PCP, ora com o CDS, ora com todos as outros.
Agora também lhe digo uma coisa: sempre que o PSD, em nosso critério, tiver razão, acredite que votaremos no mesmo sentido que ele. Não é naquele caso caricatural do decreto que dizia que dois e dois são quatro, porque isso é a caricatura, mesmo com alguma margem de discrepância.
É evidente que não é só o agente concreto que pode ser ofendido, uma vez que a ofensa não é só individual. O facto de ter sido dirigida a um universo de pessoas, a meu ver, torna mais grave a imputação, ...

O Sr. Silva Marques (PSD): - É isso!

O Orador: - ... pela simples razão de que se se dirigisse a um só suspeito seria, apesar de tudo, menos grave do que no caso de abranger 400 suspeitos. Há 400 pessoas que, porventura, se sentem incomodadas; de outra maneira, só se sentiria uma.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, interpretou bem, como é óbvio, o que eu disse. A Assembleia exerce o poder de inquérito, no uso das suas competências de fiscalização dos actos do Governo. Portanto, vamos apurar as responsabilidades do Governo.
Agora é um pouco bizantino - e desculpe-me a expressão - tentarmos distinguir se o podemos fazer sem dizer que vamos também inquirir as responsabilidades da Sr.ª, Jornalista. Ela é que nos vai dar os elementos. Vamos perguntar-lhe: «Diga lá, concretize, etc.» As duas coisas estão tão misturadas que, na verdade, a distinção quase não seria necessária, mas, já que colocou a questão, é evidente que vamos averiguar a responsabilidade de eventual ou eventuais membros do Governo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado Guilherme Silva, tem a palavra para defesa da consideração.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nogueira de Brito, estou certo de que V. Ex.ª não o fez com intenção, mas a verdade é que ou não ouviu com atenção a minha intervenção ou, efectivamente, não percebeu a forma explícita com que anunciei o inquérito que o meu partido ia pedir que fosse feito pela Assembleia da República, o que, aliás, foi confirmado pelo próprio teor do requerimento de constituição de uma comissão eventual de inquérito. Está perfeitamente claro o objectivo: apurar o facto que é imputado ao elemento que integra a Administração a nível do Governo - deste ou de outro que tenha existido no passado. Pretende-se apurar, exclusivamente, esse facto e não a conduta ou a conclusão que se possa tirar sobre a actuação da Sr.ª Jornalista Helena Sanches Osório. Como disse o Sr. Deputado Almeida Santos, as coisas são o verso e o reverso da mesma realidade, mas é preciso não confundir o objectivo que aqui foi anunciado pelo meu partido e o objectivo do inquérito parlamentar, nos termos, aliás, que o Regimento da Assembleia da República permite e exige.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, é evidente que sabemos que a figura da defesa da consideração e da honra é uma consequência do Regimento que temos. Não quis ofender, de maneira alguma, a consideração ou a honra de V. Ex.ª nem a do seu partido.
O que se passa é que V. Ex.ª começou a intervenção que fez terça-feira passada com o problema da liberdade de imprensa e do abuso de liberdade de imprensa. Sr. Deputado, não é isso que está em causa.

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O Sr. Silva Marques (PSD): - Mas pode estar, indirectamente!

O Orador: - A Sr.ª Jornalista Helena Sanches Osório não estava a exercer o seu múnus de jornalista quando proferiu essa afirmação que ofendeu potencialmente todos os ex e actuais ministros. Não se trata de um problema de liberdade de imprensa nem de abuso de liberdade de imprensa; poderá ser um problema de crime de difamação ou de injúria, e isso é que depois teremos de averiguar se existe ou não. É claro que vamos averiguar ...

Protestos do PSD.

A Sr.ª Jornalista Helena Sanches Osório estava na comunicação social, como V. Ex.ª pode estar, a responder a perguntas num programa televisivo, não estava a exercer a sua função de jornalista. A questão do crime que, porventura, tenha sido cometido ficará para depois. É claro que quem nos vai esclarecer vai ser a jornalista Helena Sanches Osório e eu espero que esteja também presente o Sr. Deputado Pacheco Pereira, que vai ser ouvido e que nos vai dizer qual o teor e o alcance do boato que se referia a esse caso.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15abel Castro.

A Sr.ª 15abel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Os Verdes gostava também de se posicionar relativamente a este pedido de inquérito parlamentar e, para isso, começava por fazer dois considerandos.
Em primeiro lugar, a liberdade é, do nosso ponto de vista, um direito fundamental que importa preservar; contudo, ela não é, para nós, um valor abstracto. Daí que, em nosso entender, ela deva ter, e tem, uma componente de responsabilização em todas as actividades, mas, fundamentalmente, em relação a quem optou por intervir na indústria da comunicação e a quem está, por opção, na comunicação social como jornalista.
A simples designação «comunicação social» já tem em si um significado, isto é, que se visa prosseguir uma função de formar a opinião e de esclarecer as pessoas, pelo que, do nosso ponto de vista, tão grave é a calúnia como a omissão informativa dos factos.
Em segundo lugar, o valor que atribuímos à necessidade de um combate à corrupção, que é, para nós, um valor importante da transparência dos órgãos e do exercício do poder.
Várias vezes aqui manifestámos a importância que atribuímos a esse combate à corrupção. Lembro, por exemplo, que o Partido Ecologista Os Verdes foi contra a extinção da Alta Autoridade contra a Corrupção, porque, no seu entender, não estavam criadas condições que garantissem que esse combate tinha outros meios para poder prosseguir.
Em conclusão, diria que esse combate à corrupção não tem, para nós, o sentido da imunidade relativamente a quem exerce o poder, qualquer que seja o nível a que o faça.
É, pois, tendo em consideração estes dois aspectos que situo o pedido de inquérito que o Grupo Parlamentar do PSD apresentou na passada terça-feira e que agora estamos a discutir.
Não posso deixar de considerar o carácter excepcional e a celeridade da maioria e do Governo, que, de facto, é manifestamente invulgar, em querer, numa situação como esta, acautelar o bom nome das instituições, o que, aliás, é legítimo e, por isso, não contesto.
Interrogo-me, no entanto, e, por certo, muitos outros portugueses o farão também, sobre o porquê de tal celeridade.
Numa sociedade onde os casos de corrupção são «o pão nosso de cada dia» e entraram de tal modo no nosso quotidiano que há uma certa convivência pacífica com eles e, portanto, uma banalização que acaba por significar um atenuar da força dessas questões, não deixa de constituir para nós um motivo de perplexidade o modo desusado e inédito como este inquérito e este apuramento de responsabilidades é aqui colocado.
Porque assim é e porque penso que já foi referida a forma como o Sr. Deputado Guilherme Silva, na terça-feira, colocou essa questão, vou referir-me a outro aspecto que hoje esteve presente na intervenção do Sr. Deputado Pacheco Pereira, ou seja, a forma, que caracterizo como desdenhosa, ele se referiu a uma jornalista que fez uma afirmação e que ele caracterizou como especializada nessa matéria.
Sem que isto signifique a concordância com o modo como a questão foi tratada pela cidadã em causa e sem que, do nosso ponto de vista, haja concordância com esse facto, porque se trata de uma jornalista que tem sido corajosa - concorde-se ou não ideologicamente com as suas atitudes - e que tem trazido para as páginas dos jornais questões que são incómodas ao poder, parece-me haver aqui um tratamento singular.
Foi aqui levantada a hipótese de passar a haver uma nova atitude por parte deste Parlamento em relação aos casos de corrupção. A ver vamos! Muitos outros casos surgirão, com certeza, por isso poderemos ver, pelo seu posicionamento, como é que os partidos, no futuro, irão comportar-se, não só na viabilização dos inquéritos mas também da sua própria conclusão, porque julgo que não se credibiliza um Parlamento com uma conclusão como aquela a que se chegou no inquérito parlamentar ao vazamento da albufeira do Maranhão.
Parece-me, assim, que o que está em causa e o que se quer pôr no banco dos réus é uma jornalista, é a liberdade dos jornalistas, a sua frontalidade e a sua ousadia, porque o que se quer - e daí a nossa grande reserva - é ter não jornalistas pautados por um código de ética que os leve a abordar as questões com frontalidade mas um conjunto de escrivãos e economistas de serviço, obedientes, acéfalos e dependentes do poder. Essa é a nossa preocupação!
Pensamos que aquilo que está em jogo é a liberdade de expressão e a liberdade de jornalistas poderem, livremente, exercer a sua actividade. Daí dizermos que nos parece descabido este inquérito.
Não votaremos contra ele pela simples razão de que Os Verdes, por princípio, nunca votam contra a realização de qualquer inquérito.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, como não há mais inscrições, dou por encerrado o debate sobre este pedido de inquérito, que será votado na hora regimental para as votações.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de vários pareceres da Comissão de Regimentos e Mandatos.

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0 Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, em virtude da informação prestada pela 1.ª Secção do Tribunal Judicial de Oeiras, a Comissão de Regimento e Mandatos decidiu emitir parecer no sentido de arquivar o processo referente ao Sr. Deputado Rui Gomes Silva (PSD).

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está em discussão.
Não havendo inscriçóes, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral e João Corregedor da Fonseca.

0 Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 4.º Juízo dos Juízos Criminais da Comarca de Lisboa, a Comissão de Regimento e Mandatos decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Jaime Gama (PS) a depor, como testetnunha, por escrito [artigo 624.º, n.º 2, alínea a) do CPC], num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votaçdo, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral e João Corregedor da Fonseca.

0 Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 3.ª Secção do Tribunal Criminal da Comarca do Porto, a Comissão de Regimento e Mandatos decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Puig (PSD) a prestar declarações num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral e João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Fábrica de Condutores Eléctricos Diogo d'Ávila, L.da, a Comissão de Regimento e Mandatos decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD) a depor, como testemunha, num processo disciplinar instaurado à trabalhadora Maria Teresa de Goullon d'Ávila.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral e João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo, 2.ª Secção, do Tribunal Judicial da Comarca de Barcelos, a Comissão de Regimento e Mandatos decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Fernando Santos Pereira (PSD) a depor, como testemunha, num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral e João Corregedor da Fonseca.

0 Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 2.ª Secção do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, a Comissão de Regimento e Mandatos decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira (PS) a depor, como testemunha, num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos Deputados independentes Freitas do Amaral e João Corregedor da Fonseca.

0 Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Repartição de Finanças do 8.º Bairro Fiscal de Lisboa, a Comissão de Regimento e Mandatos decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Magalhães (PS) a ser inquirido, como testemunha, num processo de transgressão que se encontra pendente naquela repartição.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos Deputados independentes Freitas do Amaral e João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, vamos dar início à segunda parte do período da ordem do dia, com a discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 139/VI - Criação do Conselho Nacional de Juventude (PS) e 187/VI - Estatuto Jurídico do Conselho Nacional de Juventude (PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O tema da nossa ordem de trabalhos é bastante simples e concreto. Trata-se de atribuir o estatuto jurídico ao Conselho Nacional de Juventude.
0 Conselho Nacional de Juventude existe de facto desde 1985 e culminou num longo processo de mais de três anos, onde uma comissão verdadeiramente representativa, composta por todo o leque de organizações de juventude, desde as organizações partidárias às organizações sindicais, de estudantes, empresariais e também de prestação de serviços, entenderam por bem reunir-se e trabalhar em con-

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junto para criarem uma plataforma de entendimento, de reflexão e de debate, mas que, simultaneamente, servisse dois objectivos essenciais.
O primeiro objectivo seria o de representar, perante os poderes instituídos, como interlocutor ou como parceiro social, as organizações de juventude de âmbito nacional.
O segundo objectivo era o de preencher uma lacuna, ou seja, o de fazer com que os jovens portugueses, através das suas organizações nacionais de juventude, pudessem ter oportunidade de serem representados nos fóruns europeus e internacionais.
Na altura em que, pela primeira vez, sobe a esta Câmara o debate sobre a atribuição do estatuto jurídico ao Conselho Nacional de Juventude, gostava de relembrar aqui os nomes de Carlos Coelho, José Apolinário, Jorge Ferreira, Fernando Calado Lopes, Manuel Monteiro, Pedro Pinto e outros tantos, que deram os seus préstimos para a criação do Conselho Nacional de Juventude e para que, pela primeira vez, em Portugal, organizações de diferentes sectores e, sobretudo, de actividades pudessem trabalhar conjuntamente entre si. É justa e merecida esta homenagem!
Durante vários anos, o Conselho Nacional de Juventude teve o seu percurso, semelhante a todas as instituições, com altos e baixos, com gente que lhe ofereceu os seus préstimos e também com gente que desacreditou o seu próprio funcionamento.
Mas o que é certo é que o Conselho Nacional de Juventude é hoje uma realidade e foi reconhecido pelo Govemo como parceiro social para as questões de juventude. Esse reconhecimento não foi feito apenas em meros discursos, Srs. Deputados: foi feito, por duas vezes, em programas de Governo aprovados nesta Câmara e também, por diversas vezes, inscrito no programa eleitoral que o PSD apresentou aos Portugueses e que por eles foi sufragado. A própria Assembleia da República aprovou legislação para que o Conselho Nacional de Juventude pudesse, representando os jovens portugueses, transmitir as suas posições em órgãos tão importantes como o Conselho Nacional de Educação.
Pergunta-se então, porquê só agora, decorridos todos estes anos, desde 1985, é que o Conselho Nacional de Juventude precisa de ter um estatuto jurídico. Sr. Presidente e Srs. Deputados, a resposta é simples: porque há organizações de juventude que o compõem e que não têm personalidade jurídica, entre as quais destaco as organizações de juventude partidárias.
Haveria, pois, a possibilidade de resolver o problema da legalização de três maneiras: ou por escritura pública, o que poria em causa um dos princípios mais caros às organizações de juventude, que é o da sua autonomia, nomeadamente perante os partidos políticos; por decreto-lei, o que o vincularia a um Governo preciso; ou por uma lei da Assembleia da República, como aconteceu, por exemplo - para citar um caso concreto -, na nossa vizinha Espanha, onde foi objecto de uma lei das Cortes espanhola.
Solicita-se, pois, à Assembleia da República que dote uma realidade existente, o Conselho Nacional de Juventude, de estatuto jurídico; aliás, o próprio Parlamento já reconheceu que o Governo lhe atribui o estatuto de parceiro social.
Quando o fazemos, não estamos a pensar num tratamento privilegiado para o Conselho Nacional de Juventude mas, sim, a exigir a esta Câmara que preste um tributo à expressão mais importante e qualitativa das organizações de juventude em Portugal.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Muito bem!

O Orador: - O que se pede a esta Câmara é que dignifique, com este acto, o associativismo juvenil no nosso pais, que «legalize», ao atribuir este estatuto jurídico ao Conselho Nacional de Juventude, um dos maiores e mais importantes pilares que fundamentam e alicerçam uma política global de juventude em Portugal.
Tem sido dito por todos os quadrantes - ministros e oposição, Conselho Nacional de Juventude e organizações de juventude - que uma política global de juventude só tem sentido se for definida e executada quer pelos jovens quer pela administração central. Vamos então honrar esse compromisso e fazer com que o Conselho Nacional de Juventude tenha em Portugal a oportunidade e a possibilidade de responder a este desafio.
Ontem, na tomada de posse, o Presidente Bill Clinton pediu que, a troco de novas oportunidades que quer proporcionar à América, os americanos pensem numa nova fórmula de co-responsabilização. Quando hoje pedimos à Câmara que atribua estatuto jurídico ao Conselho Nacional de Juventude, estamos também a exigir às organizações de juventude em Portugal que sejam mais co-responsáveis na definição e na execução da política de juventude. De facto, ao pedirmos maior co-responsabilização, não encontramos qualquer razão para que este estatuto seja rejeitado.
Falámos há pouco em política global de juventude e eu gostava de reafirmar que essa política deve assentar no respeito pela independência e pela autonomia do movimento associativo. Nesse sentido, também entendemos que um dos pilares dessa política global de juventude é a coordenação intersectorial. Ora, qualquer governo com os instrumentos de que dispõe, nomeadamente o próprio Instituto da Juventude, que não é co-gerido de acordo com as conclusões do Conselho da Europa, não fugirá à tentação de manipular a participação dos jovens portugueses, se não existir um Conselho Nacional de Juventude forte, eficaz e autónomo financeira, política e administrativamente. O que está em causa não é discutir o «Portugal dos pequeninos»; o que está em causa é a essência da democracia!
Dissemos aqui várias vezes - e tornamos a repeti-lo - que a democracia não pode ser exercida apenas de quando em quando, de quatro em quatro ou de cinco em cinco anos através do voto; a democracia exerce-se permanentemente. Como podemos nós solicitar às novas gerações que sintam a essência da democracia, que se juntem a nós na participação democrática e cívica se não lhes dermos oportunidades e não reconhecermos que, no mínimo, têm direito a participar, a expressar a sua voz e, sobretudo, que têm direito a dialogar com o Governo quanto à execução e à definição dessas política de juventude?
No momento em que as fórmulas tradicionais de participação política estão em desuso e que há uma crise de representatividade ou da forma como representantes do povo actuam faz sentido que esta Câmara honre este compromisso para com as novas gerações. É, pois, em nome da democracia, das gerações vindouras, de um Portugal mais participado, de uma política de juventude mais co-responsabilizada no aprofundamento da democracia e em honrar os tantos e tantos discursos que fazemos à participação e ao protagonismo dos jovens portugueses que o Partido Socialista tem a honra de trazer a esta Câmara um projecto de lei que espera ver aprovado por unanimidade, solicitando que se faça justiça. A justiça

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que pedimos é que seja honrada a dignidade e autonomia do movimento associativo e que o Conselho Nacional de Juventude possa ter, finalmente, eatatuto jurídico!

Aplausos do PS e do Deputado independente Mário Tomé.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carbe Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, coloco-lhe duas questões muito simples. A primeira, para agradecer-lhe, desde logo, a referência simpática que fez no seu discurso ao trabalho que eu e muitos outros jovens sociais-democratas desenvolvemos em representação da JSD no Conselho Nacional de Juventude e também para perguntar se não considera o Sr. Deputado que o património desse esforço e desse empenhamento cauciona e legitima as posições que a JSD e o PSD, sobre os projectos de lei que, em concreto, foram apresentados na Mesa, não deixarão de tomar ao longo deste debate.
Em segundo lugar, desejo pedir uma aclaração de parte do seu pensamento relativamente ao modo como concebe a função dos órgãos de soberania num Estado de direito democrático como o nosso. O Sr. Deputado António José Seguro, se a memória me não falha, disse que qualquer governo não recusaria a tentação de manipular os jovens portugueses. Ora, como jovem, enquanto secretário-geral da JS, mas também e particularmente como Deputado, preocupa-me que tenha esta visão pervertida das instituições democráticas no nosso país.
Com que fundamento é que considera que qualquer governo não recusaria a tentação de manipular os .jovens portugueses? Essa expressão chamou-me a atenção porque não estava, de certo, a incluir apenas os governos, de partidos diferentes do seu, mas também a integrar aqueles que foram ou serão liderados por socialistas. Quais as razões que o levam a entender esta postura tão pervertida dos órgãos de poder na nossa sociedade?

(0 orador reviu).

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, disse V. Ex.ª que só agora se colocava a questão do estatuto jurídico do CNJ na medida em que, ao longo destes anos, revelou-se existir um conjunto de organizações membros do CNJ que não detinham personalidade jurídica, tendo destacado para esse efeito as organizações partidárias de juventude. De seguida, apontou três saídas possíveis para uma única situação que, no seu entender, justifica o projecto de lei que subscreve, que é a de dar existência jurídica ao CNJ: a escritura pública, a possibilidade de decreto-lei e de lei da Assembleia da República.
Partindo do princípio de que essa é a grande motivação para a apresentação do projecto de lei, isto é, dotar de personalidade jurídica o Conselho Nacional de Juventude, gostava que me explicasse por que razão excluiu a escritura pública. É que a organização a que presido, a JSD, por via da sua autonomia, mas também por força da sua vinculação ao PSD, nunca deixou de assumir contratações jurídicas e é possível às organizações, dentro do seu espaço de autonomia, adquirirem, através do seu próprio partido, personalidade jurídica. Não há qualquer impedimento nisso, nem creio que a Juventude Socialista tivesse dificuldade em fazê-lo por intermédio do seu próprio partido.
Gostava, portanto, que me respondesse a esta questão: por que é que eliminou com tanta facilidade as outras possibilidades, mormente a escritura pública?

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por responder ao Sr. Deputado Pedro Passos Coelho. Quando afirmou que partia do princípio de que era esse o objectivo, quero que também parta do final - o único objectivo que nos traz aqui é o da atribuição de estatuto jurídico ao Conselho Nacional de Juventude.
Em resposta à pergunta por que é que só agora se coloca a questão do estatuto jurídico e, das três hipóteses, por que razão utilizámos esta, excluindo, nomeadamente, a escritura pública, gostava de dizer-lhe que, em primeiro lugar, honramos os compromissos que assumimos. Durante muitos anos, no interior do Conselho Nacional de Juventude, houve um debate para saber a quem deveria pertencer a iniciativa de elaborar um anteprojecto de lei sobre esta matéria, sendo claro para todos nós, particularmente as organizaçclas partidárias de juventude, que a sede de atribuição do estatuto jurídico ao Conselho Nacional de Juventude deveria ser o Parlamento. Nessa altura, entendeu-se que essa iniciativa deveria caber aos Deputados jovens de cada grupo parlamentar e foi só por a JSD ter decidido recentemente, há cerca de 10 meses, sair do Conselho Nacional de Juventude, porque não havia fundamentos para continuar a validar esse compromisso, é que a Juventude Socialista e o Grupo Parlamentar do PS tomaram esta iniciativa.
Porquê excluir a escritura pública? É simples, Sr. Deputado! Como sabe, as organizações de juventude, tais como a JSD, a Juventude Socialista, a JCP, a Juventude Centrista, o departamento de juventude da UGT e a própria Interjovem, não têm personalidade jurídica. Assim sendo, teria de haver uma delegação por parte dos respectivos partidos para que a atribuição de personalidade jurídica se efectivasse, o que, a acontecer, implicaria uma co-responsabilização dos partidos em todos os actos praticados pelas próprias organizações de juventude.
Ora, como prezamos muito a nossa autonomia, entendemos que não devíamos fazê-lo por escritura pública sem que isso signifique, no entanto, que cultivamos a desconfiança em relação aos partidos, pois a verdade é que temos muito gosto em estar no interior do Partido Socialista e temos uma relação muito boa quanto à autonomia quer de uns quer de outros.
Porém, o mais importante, Sr. Deputado, é que entendemos que até hoje a definição e, sobretudo, a valorização das políticas de juventude em Portugal tem sido feita em terrenos alheios ao próprio Parlamento. O Parlamento é o centro da democracia em Portugal, pelo que nos parecia importante associar esta Câmara à valorização de um acto importante de dignidade para o movimento associativo. Foi precisamente neste sentido, para que os Portugueses percebam que a política de juventude não é património de quem quer que seja, que é uma validação e um reconhecimento do protagonismo dos jovens, que quisemos, Grupo Parlamentar do PS, tomar esta iniciativa dando execução à letra da própria Constituição.

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Quanto às duas perguntas colocadas pelo Sr. Deputado Carlos Coelho, não acredito, em relação à primeira, porque o conheço assim como a vários membros da JSD que participaram no interior do Conselho Nacional da Juventude, que o vosso esforço, a vossa abnegação, o vosso empenho e, principalmente, o apoio político que deram ao Conselho Nacional de Juventude pudesse servir, alguma vez, de crédito para virem tomar posições futuras. Não foi isso que o Sr. Deputado disse e também não penso assim! Por essa razão, devo dizer-lhe que não encontro quaisquer fundamentos na posição da JSD ou na do PSD para inviabilizarem a atribuição do estatuto jurídico ao Conselho Nacional de Juventude.
Acredito no esforço que, nomeadamente, V. Ex.ª fez quando era líder da JSD para que o Conselho Nacional de Juventude fosse uma realidade, tendo abdicado muitas vezes, não de princípios mas de estratégias que, porventura, não eram as mais correctas, mas que visavam que o Conselho Nacional de Juventude pudesse corresponder aos princípios e aos fins pelos quais foi implementado. Nessa altura, a JSD era outra, apostava no diálogo entre as organizações de juventude e não tinha uma postura arrogante, pelo que acredito sinceramente que não há crédito nem património que justifiquem o facto de a JSD e o PSD terem hoje uma posição diferente.
Quanto à segunda questão, pergunta-me o Sr. Deputado o que é isso da manipulação e que perspectiva poderíamos ter em termos globais e genéricos da perversão das instituições. Sr. Deputado, a perversão das instituições e, nomeadamente, a manipulação está à vista! É o seu próprio Governo que a utiliza e tanto assim é que o Conselho Nacional de Juventude recebe há três anos o mesmo montante inscrito no Orçamento do Estado e deixou de constar dos programas de Governo. Por outro lado, o Conselho Consultivo da Juventude não tem reunido e a verdade é que o discurso da juventude já foi mais sentido ... Se quiser que lhe dê mais exemplos, poderei fazê-lo, mas estou convencido de que, em consciência, não só o Sr. Deputado como outros que se sentam na sua bancada concordam comigo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito regimental de defesa da consideração da minha bancada.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Deputado António José Seguro, dos muitos debates que, ao longo dos anos, travámos nesta Casa não me recordo de alguma vez ter tido necessidade de recorrer, nestes termos, a esta figura da defesa da consideração.
Há duas questões que não posso deixar passar em claro.
Em primeiro lugar, Sr. Deputado, não pretendo trazer para esta discussão créditos do passado em relação àquilo que fiz no CNJ. Aliás, devo dizer que na minha memória não tenho registos de particular abnegação. Levámos a cabo um esforço conjunto numa instituição, não dou por perdido o tempo que investimos nessa estrutura e, creio, aquilo que fizemos foi bem feito. Não penso sequer que neste momento esteja em causa avaliar esse esforço, esse passado, essa história, essa memória ou o próprio CNJ. 15so ficará, com certeza, mais claro para a Câmara depois da intervenção que o meu colega de bancada, Deputado Fernando Pereira, vai fazer. Não está, pois, em causa o CNJ! 15so estará, seguramente, presente no discurso das organizações de juventude, mas não é isso que está hoje em discussão na Assembleia da República, por vossa iniciativa e do PCP. O que está aqui em causa é saber se a Assembleia da República deve aprovar uma lei própria para o CNJ. Não quero, Sr. Deputado, entrar por esse debate, dado que ele será tratado pelos meus colegas e por Deputados de outras bancadas.
Mas não é legítimo invocar esse passado, que, repito, é um passado do qual não nos arrependemos, para tentar condicionar as nossas posições em relação a esta matéria. Uma coisa não influencia a outra!
E, Sr. Deputado António José Seguro, permita-me que seja um pouco mais duro em relação à afirmação que fez sobre o Governo. V. Ex.ª produziu aqui (julgo que por excesso de discurso) uma afirmação que me parece grave, dado que referiu que todos os governos faziam tentativas para manipular os jovens portugueses. Não temos uma visão inocente do poder,...

O Sr. Mário Torne (Indep.): - Antes pelo contrário!

O Orador: - ... não somos naifs na interpretação nem dos fenómemos históricos nem dos sociais nem, naturalmente, do funcionamento dos agentes políticos, mas também não temos essa interpretação perversa dos órgãos de soberania na nossa sociedade. Não vimos o governo, qualquer ele que seja, como uma estrutura destinada a manipular os cidadãos, os jovens.
Em bom rigor, seria de esperar que a oposição, na avaliação que fizesse do Governo, se preocupasse mais, neste particular, em colocar a tónica na avaliação geral da política do Governo no domínio da juventude. Sintomaticamente, não foi essa a vossa iniciativa. O que está hoje aqui em causa não é a avaliação de toda a política de juventude - e, seguramente, sobre essa matéria muito haveria que dizer - mas, sim, uma questão muito particular, muito isolada, muito limitada desta matéria e que respeita ao estatuto jurídico do Conselho Nacional de Juventude.
Sr. Deputado, cada um de nós, na nossa prática política, tem tendência para avaliar as realidades em função da experiência mais próxima que tem. Como é natural, quando nós falamos no «governo» pensamos mais nos governos do PSD, pelo que acho razoável que o Sr. Deputado pense naqueles que foram de inspiração socialista.

(0 orador reviu).

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. Antônio José Seguro (PS): - Sr. Deputado Carlos Coelho, tive alguma dificuldade em perceber onde é que V. Ex.ª discorda das palavras que proferi. Diz que o PSD não tem uma visão inocente do poder, afirmação essa através da qual se pode concluir que concorda que todo o poder tem uma tentação manipuladora.
O que está aqui em causa é a capacidade de gestão de fugir a essa tentação e ir ao concreto, elaborando políticas globais de juventude, garantindo a autonomia e os meios de independência para o movimento associativo.

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Na minha intervenção tive o cuidado de não fazer diferenças, de não fazer uma avaliação sobre as políticas de juventude. Aquilo que gostava era que, nesta Câmara, nos unisse o propósito de dignificar o movimento associativo e, neste caso concreto, de atribuir o estatuto jurídico ao Conselho Nacional de Juventude.
Acredito que aí há muitas razões que nos façam unir, pelo que, como o nosso propósito não é o de dirimir nem o de criar uma guerra entre a sua bancada e a nossa sobre esta matéria mas, sim, o de unir esta Câmara na atribuição desse estatuto, tive esse cuidado.
Há pouco citei uma série de exemplos de como este Governo não foge à tentação de manipular os jovens portugueses. Em Portugal existe hoje uma política de juventude? Não existe, Sr. Deputado! Os ministros fazem um discurso de co-gestão no Conselho da Europa, mas quando se trata de dar co-gestão ao Instituto da Juventude não dão! Quando há pouco tempo o Sr. Ministro Marques Mendes saiu do Fórum Estudante, que se realizou na FIL, disse: «É impensável uma política de juventude sem uma forte componente de autonomia do movimento associativo.» Só o montante de verbas que está previsto no Orçamento do Estado para iniciativas ou projectos apresentados à Secretaria de Estado é maior do que as verbas para o apoio às associações nacionais de juventude!... Como é então possível ter uma política de juventude? Como é que é possível pedir aos jovens uma participação autónoma, livre, empreendedora e criativa se os senhores é que definem as regras e dizem quando e quanto é o dinheiro que atribuem? O dinheiro não é vosso, Srs. Deputados! O dinheiro é do povo, é dos contríbuíntes, é daqueles que pagam.
Para o vosso projecto de sociedade as organizações de juventude ou têm sentido ou não. Para nós, socialistas, que acreditamos que, para além das infra-estruturas (das auto-estradas, do cimento, ...), há em cada portugués o direito de sonhar, há em cada jovem o direito de protagonizar, de se sentir um cidadão de corpo inteiro, isso tem sentido, mesmo que para os senhores seja uma utopia. E é em nome desse sentido que acreditamos na participação, é em nome de uma sociedade que se questiona, que tem poderes que fazem contrapoder aos poderes legalmente instituídos num exercício, em cada momento, de equilíbrios fundamentais para um desenvolvimento sustentado da sociedade portuguesa que entendemos que o movimento associativo deve ser valorizado. Na Dinamarca há 70 % de jovens associados; em Portugal há uma taxa passiva de 20 %! Como sabe, durante estes últimos anos a taxa de associativismo não foi impulsionada. E porquê? Porque a visão deste Governo, quer queira quer não, Sr. Deputado - e sei que lhe custa ouvir isto -, é uma visão manipuladora!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, interrompemos esta discussão para dar início às votações dos projectos de resolução n.ºs 44/VI e 47/VI, do PCP, e do inquérito parlamentar n.º 6/VI, que foi debatido hoje.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, desejo lembrar que, relativamente à ratificação do Decreto-lei n.º 195-A/92, de 8 de Setembro, que extingue a empresa que gere o Teatro Nacional de São Carlos, deu entrada na Mesa um projecto de resolução do PS, que é idêntico ao do PCP, pelo que pedia a V. Ex.ª que, na altura própria, os dois fossem votados em conjunto.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, esses projectos de resolução serão postos à votação pela ordem de entrada na Mesa.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do projecto de resolução n.º 44/VI, do PCP, que recusa a ratificação do Decreto-Lei n.º 208/92, de 2 de Outubro - Autoriza o Serviço de Transportes Colectivos do Porto a subconcessionar a exploração de carreiras de transporte rodoviário de passageiros que ultrapassem o limite urbano da cidade do Porto (ratificação n.º 41/VI).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS, votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé e as abstenções do PSN e do Deputado independente Freitas do Amaral.

Srs. Deputados, vamos agora votar o projecto de resolução n.º 47/VI, do PCP, que recusa a ratificação do Decreto-lei n.º 195-A/92, de 8 de Setembro - Extingue a empresa que gere o Teatro Nacional de São Carlos (ratificação n.º 44/VI).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS e do PSN, votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé e a abstenção do Deputado independente Freitas do Amaral.

Srs. Deputados, o projecto de resolução n.º 48/VI, do PS, está, pois, prejudicado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, há pouco quis precisamente evitar esse prejuízo que V. Ex.ª acaba de anunciar e que me parece lógico.
O que pedi foi que, havendo dois projectos de resolução exactamente iguais sobre esta matéria, e não se opondo nenhum grupo parlamentar, eles fossem votados em conjunto.
De qualquer forma, fica registado que o PS também apresentou um projecto de resolução de recusa de retificação do Decreto-Lei n.º 195-A/92, de 8 de Setembro, que extingue a empresa que gere o Teatro Nacional de São Carlos.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, a Mesa confirma que deu entrada na Mesa o projecto de resolução do PS, no entanto, não o submete à votação dado ter ficado prejudicado com a rejeição do projecto de resolução do PCP.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço de novo a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra,

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O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, em bom rigor, o nosso projecto de resolução não está prejudicado porque, independentemente do conteúdo do mesmo, por vezes a origem da iniciativa, tal como se tem verificado ao longo da história parlamentar, altera o sentido de voto das diversas bancadas, Não sabemos, por exemplo, se o PSD, não se louvando na nossa iniciativa, não deseja votar o nosso projecto de resolução ...

Risos do PSD.

Portanto, em bom rigor, ele não está prejudicado.
Deixo, pois, esse problema à consideração da Mesa e de V. Ex.ª

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, a Mesa acredita que as várias bancadas são coerentes. Quanto a mim, essa incoerência não é de admitir, sobretudo quando tão próxima da votação anterior.

O Sr. Manuel das Santos (PS): - Sr. Presidente, como já verificámos no debate anterior, isso pode ser relevante para efeitos da estatística das votações coincidentes entre os vários grupos parlamentares.

Risos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, esse problema já está suficientemente esclarecido, pelo que vamos de seguida proceder à votação do inquérito parlamentar n.º 6/VI, do PSD, sobre a alteração alegadamente introduzida em decreto-lei por membro do Governo contra o recebimento de 120 000 contos.
O Sr. Secretário vai proceder à leitura da alteração que foi introduzida no texto inicial do referido inquérito.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, essa alteração é do seguinte teor:

a) Se foi introduzida por ministro, nomeadamente através de aposição de uma vírgula, em decreto-lei aprovado por Governo da República, contra o recebimento da quantia de 120 000 contos, alteração do sentido do texto legal.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu) - Srs. Deputados, vamos proceder à votação deste inquérito parlamentar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS, do PSN e do Deputado independente Freitas do Amaral, voto contra do Deputado independente Mário Tomé e as abstenções do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca pediu a palavra para que efeito?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep): - Para informar que vou entregar na Mesa uma declaraçIo de voto por escrito.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Fica registado, Sr. Deputado.
Retomando o debate que estava a ter lugar antes das votações, para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam que inicie a minha intervenção enviando uma saudação fraterna a todas as organizações de juventude que integram o Conselho Nacional de Juventude (CNJ), sem cuja iniciativa este debate nunca se realizaria, e a todos os membros da direcção do CNJ, que assistem a este debate e que tanto se empenharam para a sua realização.
O agendamento para hoje do debate sobre o projecto de lei do PCP, que atribui personalidade jurídica ao CNJ e define o respectivo estatuto, conjuntamente com um projecto de lei do PS que visa basicamente o mesmo objectivo, constitui para nós motivo do regozijo. O debate de hoje corresponde a uma necessidade sentida pelo CNJ desde a sua fundação e constitui uma reivindicação de sempre dos seus dirigentes e das organizações juvenis que o integram. Motivo de regozijo também, na medida em que a apresentação do projecto de lei do PCP hoje em debate decorreu de um compromisso assumido pela Juventude Comunista Portuguesa para com o Conselho Nacional de Juventude, que integra e que ajudou a formar, de, na Assembleia da República, através dos jovens comunistas que integrassem o Grupo Parlamentar do PCP, dar corpo a uma iniciativa legislativa que, de acordo com o consenso obtido no próprio CNJ, tornasse possível o debate que hoje realizamos e abrisse o caminho para a atribuição de personalidade jurídica ao Conselho Nacional de Juventude.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A ideia de constituir um Conselho Nacional de Juventude em Portugal, um tanto à semelhança dos comités nacionais de juventude que já existiam na maioria dos países europeus (sublinho «países europeus» e não apenas países da Comunidade Europeia), remonta ao inicio dos anos 80.
Em 27 de Janeiro de 1983 17 organizações juvenis de âmbito nacional subscreveram um documento elaborado por consenso, a que chamaram «Bases gerais de constituição do Conselho Nacional de Juventude», e deram início aos trabalhos de uma chamada comissão pró-CNJ que ao longo de dois anos e meio, e integrando todas as organizações nacionais de juventude interessadas em participar nos seus trabalhos, elaborou e aprovou, sempre por consenso, os estatutos do CNJ, abrindo o caminho à sua efectiva constituição em Julho de 1985.
Apesar de inspirado na existência de comités de juventude congéneres em outros países, o CNJ português não se apropriou de qualquer modelo anteriormente existente. A configuração que tem hoje o CNJ em Portugal resulta de um processo de elaboração estatutária profundamente democrático, originalmente traçado pelo diálogo aberto entre as mais significativas organizações juvenis portuguesas de âmbito nacional e que constitui um património exclusivo do associativismo juvenil português, uma prova da sua maturidade e um resultado edificante do relacionamento democrático entre os jovens e as suas organizações mais representativas.
O CNJ não se constituiu com o objectivo de congregar em si todas as expressões do associativismo juvenil, nem com a finalidade de se constituir em qualquer federação de associações juvenis. O CNJ nunca se propôs abafar qualquer forma ou expressão de associatismo juvenil, nem tão-pouco limitar a independência ou a liberdade de opinião própria de cada uma das organizações que o integram. O CNJ foi criado para acrescentar algo ao associativismo juvenil e não para o limitar fosse no que fosse. O CNJ desenvolveu as suas actividades e afirmou-se como uma

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realidade na sociedade portuguesa com pleno respeito para com as associações juvenis que o integram e que o não integram, ou porque entendem não o dever integrar, ou porque não sendo de âmbito nacional não cumprem os requisitos indispensáveis para esse efeito.
0 CNJ foi criado por organizações juvenis de âmbito nacional, com o objectivo de constituir um espaço de diálogo, de intercâmbio de posições e pontos de vista entre elas, de reflectir sobre as aspirações da juventude portuguesa, nomeadamente promovendo o debate e a discussão sobre a sua situação e problemática; de contribuir para o incentivo e o desenvolvimento do associatlvistno juvenil; de se assumir conto interlocutor perante os poderes constituídos e reivindicar o direito de consulta sobre todos os assuntos que respeitem à juventude portuguesa em geral; de apoiar técnica e cientificamente as organizações aderentes; de assumir uma posição de diálogo e intercâmbio com organizações estrangeiras congéneres; de publicar e apoiar a divulgação pública de trabalhos sobre juventude.
Com estes objectivos, o CNJ congrega organizações de juventude representativas de vários sectores da vida juvenil que tenham entre os seus objectivos o desenvolvimento sócio-cultural dos jovens e se identifiquem com os valores da democracia.
Do ponto de vista da JCP, organização juvenil a que me honro de pertencer e que integra o Concelho Nacional de Juventude, o CNJ tomou, ao longo da sua existência, atitudes merecedoras de crítica e atitudes merecedoras de elogio. Por diversas vezes divergimos publicamente de posições assumidas pelos órgãos próprios do CNJ, mas afirmamos sem qualquer hesitação que a acção global do CNJ tem sido positiva e que tem cumprido um importante papel no desenvolvimento e na afirmação autónoma do associativismo juvenil portugués.
Ao longo dos sete anos e meio que leva de existência, o CNJ tem vindo a ser geralmente reconhecido como um interlocutor válido, embora nunca exclusivo - e muito bem -, quando se trata de exercer direitos de consulta sobre assuntos respeitantes à juventude portuguesa em geral.
Assim, o papel do CNJ tem vindo a ser crescentemente reconhecido. Não apenas de facto, mas também de direito. 0 CNJ tem sido reconhecido por todos os governos que se sucederam desde a sua criação como um «parceiro social» válido para o debate de assuntos de interesse juvenil. 0 CNJ foi chamado a emitir opinião sobre diversos assuntos junto de vários órgãos de soberania. Tem participado em reuniões, com alguma regularidade, com a Comissão Parlamentar de Juventude, quer por solicitação do CNJ, quer a convite da Comissão. Tem participação no Conselho Nacional de Educação por força de lei desta Assembleia. Tem participação no Conselho Consultivo de Juventude por força de decreto-lei do Governo. Tem participação no Conselho Nacional do Projecto Vida por força de resolução do Conselho de Ministros. Outros exemplos poderiam ser dados no plano nacional.
No plano internacional, o CNJ desenvolve uma acção de intercâmbio com estruturas congéneres de outros países, que muito têm prestigiado o associativismo juvenil português. Integra desde há vários anos o Comité Europeu dos Conselhos Nacionais de Juventude (CENYC) e o Fórum de Juventude das Comunidades Europeias. Promove a participação de várias associações juvenis portuguesas em iniciativas de carácter internacional e desenvolve uma importante acção de relacionamento bilateral entre conselhos nacionais de juventude, de que é exemplo o protocolo de colaboração com o Conselho de Juventude de Espanha.
Perguntar-se-á então se neste quadro as iniciativas legislativas hoje em discussão não terão um efeito meramente simbólico. A pergunta é legítima dado o pleno reconhecimento de facto de que o CNJ já usufrui, mas a resposta é negativa. A aprovação pela Assambieia da República de um estatuto jurídico do CNJ terá um efeito político que é evidente e que é dignificante para o CNJ, mas tem um efeito jurídico essencial. Atribuirá ao CNJ a personalidade jurídica que ele não tem, ao contrário do que acontece com a generalidade dos conselhos nacionais de juventude europeus.
Da parte do CNJ, dos titulares dos seus órgãos estatutários, das organizaçães que o integram, o problema da personalidade jurídica do CNJ é uma preocupação já antiga e em torno da qual existem consensos de há muito firmados.
Sendo o CNJ uma entidade de natureza estritamente associativa e, portanto, de direito privado, depara com um obstáculo na sua constituição como pessoa colectiva. É que, sendo integrado exclusivamente por entidades colectivas, algumas de entre elas não possuem personalidade jurídica. É precisamente o caso das organizações partidárias de juventude que baseiam juridicamente a sua existência na Lei dos Partidos Políticos, na qualidade de estruturas autónomas sem personalidade jurídica própria.
Daí que a solução, desde sempre consensual no âmbito do CNJ quanto à forma de aquisição da sua personalidade jurídica, seja a reivindicação de um diploma legal que expressamente lha atribua. Diploma que, de preferência, fosse uma lei da Assembleia da República, elaborada com a colaboração do CNJ e contando com o consenso de todos os grupos parlamentares. De entre as soluções possíveis, é esta a mais digna para o Estado Português e a mais dignificante para o CNJ.
O projecto de lei apresentado em Abril de 1990 pelo Grupo Parlamentar do PCP, e que, retomado na presente legislatura, se encontra hoje em debate, corresponde a um anteprojecto de estatuto jurídioo que a JCP, na qualidade de membro do CNJ, colocou à consideração da direcção e dos restantes membros como primeiro contributo concreto para ultrapassar o problema da falta de personalidade jurídica do CNJ. A sua apresentação nesta Assembleia da República pelo Grupo Parlamentar do PCP foi, portanto, precedida de uma auscultação dos interessados, que revelou em geral um bom acolhimento da iniciativa.
0 projecto lei do PCP define o CNJ como uma pessoa colectiva de direito privado sem fins lucrativos, de acordo, aliás, com a sua origem e natureza, respeitando as suas finalidades e formas orgânicas tal como se encontram definidas nos respectivos estatutos, e estabelece, inovatoriamente, um conjunto de direitos e regalias do CNJ face ao Estado considerando o seu relevante papel social e a importância que deve ser dada ao apoio ao associativismo juvenil e às suas expressões mais significativas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estão hoje dois projectos de lei submetidos á apreciação da Assembleia da República. O do PCP, que acabo de apresentar, e um outro do PS, já aqui apresentado. São projectos com muitas semelhanças e com algumas (poucas) divergências, que serão certamente ultrapassáveis. Não serão as diferenças de opinião, neste caso pontuais, entre a JCP e a JS, que inviabilizarão a definição do estatuto jurídico do CNJ, quando os consensos essenciais sobre esta matéria estão de há muito adquiridos.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: O desfecho deste debate é aguardado com natural expectativa por todos os que se interessam pelo CNJ e pelo desenvolvimento do associativismo juvenil em Portugal. O CNJ já ultrapassou sete anos de existência sem personalidade jurídica e entretanto afirmou a sua identidade e autonomia e dignificou-se pela sua acção nos planos nacional e internacional. Assim continuará a ser, seja qual for o resultado deste debate. O associativismo juvenil em Portugal tem forças suficientes para levar por diante as realizações em que se empenha, seja com vento a favor, seja contra ventos e marés. O CNJ é e continuará a ser uma das suas importantes realizações.
O CNJ, plataforma de diálogo e entendimento entre as associações juvenis de âmbito nacional mais significativas, espera que a Assembleia da República lhe confira o reconhecimento legal que há muito reivindica e que inequivocamente merece. Mais de sete anos à espera de um diploma legal que o reconheça é uma situação injusta para o CNJ e para o associativismo juvenil que ele representa. Temos hoje uma oportunidade de corrigir essa injustiça. Faço votos para que não a desperdicemos.

Aplausos do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente Mário Tomé.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Nobre.

O Sr. Luís Nobre (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, ouvi com muita atenção a apresentação do projecto de lei do PCP, mas fiquei com uma dúvida quase insanável, que tem a ver com a forma jurídica com que o PCP pretende dotar o futuro CNJ.
No vosso projecto de lei diz-se apenas que o CNJ é uma pessoa colectiva sem fins lucrativos. V. Ex.ª acabou de afirmar que será uma pessoa de direito privado sem fins lucrativos.
Ora bem - se possível, acompanhe-me no raciocínio -, afirmando o vosso projecto de lei, ao contrário do que nos parecia, que não pretende criar uma nova associação de carácter público mas apenas criar uma pessoa colectiva de direito privado, gostaria que respondesse à seguinte questão: como é que a característica que leva VV. Ex.as a recusarem a hipótese de haver uma escritura pública, isto é, o facto de haver membros do CNJ que não têm personalidade jurídica, se vai reflectir na própria vida do CNJ? Ou seja, como é que, após a constituição do CNJ por lei da Assembleia da República, serão exercidos na plenitude, com direito a recursos contenciosos, os direitos dos membros sem personalidade jurídica? Ou ainda, como é que, por exemplo, um membro sem personalidade jurídica pode recorrer de uma decisão da direcção ou da assembleia geral do CNJ sem ser com a capa do partido político em que legitimamente está integrado?
É esta a questão que lhe suscito porque se se tratasse de uma pessoa colectiva de carácter associativo e pública então o estatuto jurídico do CNJ teria graves lacunas da forma como é proposto por VV. Ex.as E uma delas seria não determinar os requisitos mínimos de adesão dos membros dessas mesmas organizações.
Aliás, V. Ex.ª, há bem pouco tempo, e quando se tratou de outra associação pública - a Ordem dos Advogados -, defendeu, e muito bem, quanto a nós, a existência da fixação dos requisitos mínimos, mas agora defende o contrário.
Daí que lhe pergunte como explica esta contradição.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, responderei de imediato porque a pergunta não levanta qualquer problema e fica desde já «arrumada».
Sr. Deputado Luís Nobre, esta questão está resolvida há muitos anos no CNJ. Aliás, se há alguns anos atrás V. Ex.ª tivesse tido a oportunidade de representar a JSD no CNJ teria percebido como este problema se resolveria e teria percebido a razão por que a forma considerada mais adequada desde sempre pelo CNJ - esta questão já se discutia ainda o CNJ não estava constituído - para a atribuição de personalidade jurídica era precisamente um diploma legal específico. Todavia, esse diploma poderia ser um decreto-lei, embora essa forma legal não fosse considerada muito conveniente pelo Governo, que na altura interveio nesta discussão, nem pelo CNJ. Portanto, a melhor forma é uma lei da Assembleia da República.
E a razão por que assim deve ser explica-se muito facilmente. Se V. Ex.ª tivesse lido o projecto de lei do PCP verificaria que não se trata de criar nenhuma associação de carácter público. Aliás, discutiu-se muito se o CNJ deveria ter natureza de direito privado ou público mas o CNJ nunca se concebeu a si próprio como fazendo parte da Administração, dado ser uma estrutura que nasceu de uma expressão associativa espontânea das associações juvenis portuguesas.
Porém, quando aqui discutimos o Estatuto da Ordem dos Advogados, a que V. Ex.ª se referiu, estávamos a discutir o estatuto de uma associação de natureza pública dotada de poderes de autoridade e que faz parte da Administração. Mas esse não é o caso do CNJ. Este foi criado por associações juvenis que são entidades de natureza privada, de direito privado e, como tal, será, quando o for, pessoa colectiva de direito privado.
Assim, não há qualquer problema de recursos contenciosos porque estes são interpostos perante a Administração e não é de nada disso que se trata.
Vejamos agora o problema da efectivação de responsabilidade do CNJ em termos jurídicos, ou como é que uma entidade sem personalidade jurídica poderá fazer valer os seus direita. Ora bem, esta questão sempre se poderia ter colocado desde que há CNJ e desde que é integrado por associações que não têm personalidade jurídica mas não é um problema do CNJ.
É evidente que a efectivação de qualquer responsabilidade social do CNJ será mais fácil se este tiver personalidade e certamente V. Ex.ª concordará comigo. Todavia, o problema das associações que fazem parte do CNJ e não têm personalidade jurídica diz respeito às próprias associações e que, evidentemente, se resolve no seu âmbito. Creio que no quadro das associações político-partidárias não se põe em cima da mesa a resolução desse problema. 15to é, as associações políticas partidárias têm existido legalmente como estruturas autónomas dos respectivos partidos ao abrigo da Lei dos Partidos Políticos e não têm questionado esse problema e provavelmente assim continuarão.
Sr. Deputado Luís Nobre, por este motivo não vejo que haja qualquer problema com essa questão. Se V. Ex.ª tivesse acompanhado as trabalhos do CNJ há uns anos atrás teria percebido, dado que os representantes da JSD sempre defenderam esta solução.

Risos do Deputado do PSD Carlos Coelho.

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É curioso que o Sr. Deputado Carlos Coelho, que agora sorri perante a minha argumentação, enquanto esteve no CNJ, sempre considerou como mais adequada a adopção de uma lei da Assembleia da República para a atribuição de estatuto jurídico ao CNJ. O Sr. Deputado Carlos Coelho participou durante muitos anos nesta discussão e sempre considerou - e certamente não me desmentirá - que não haveria qualquer problema jurídico em ser uma lei da Assembleia da República a atribuir personalidade jurídica ao CNJ. A JSD poderá agora colocar problemas políticos, mas não os venha camuflar com problemas jurídicos que não existem.

Vozes do PCP: - Muito bem.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Relvas.

O Sr. Miguel Relvas (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, começo por realçar que em relação a mim V. Ex.ª não terá o argumento da tradição histórica que invocou em relação ao meu colega Luís Nobre. Aliás, poderia fazer referencia a um determinado momento da vida do CNJ em que a Juventude Comunista Portuguesa o abandonou.
Mas começo por me congratular com o facto de V. Ex.ª ter reconhecido que o fundamental para credibilidade do CNJ lhe advém do empenhamento e do reconhecimento que tem por parte das organizações que o compõem mais do que daquilo que lhe pode advir de um acto legislativo. Penso que esse é um bom princípio. Aliás, o Sr. Deputado António Filipe utilizou a expressão «de preferência» para considerar que seria o melhor caminho e não foi tão taxativo como o Sr. Deputado António José Seguro.
No entanto, independentemente do reconhecimento do CNJ, V. Ex.ª reconhece ou não um forte investimento feito ao longo dos últimos sete anos pelo Estado no CNJ? Relembro-lhe aqui o subsídio definido, em Orçamento do Estado, os apoios financeiros do Cartão Jovem e, fundamentalmente, os acordos bilaterais que o CNJ estabelece anualmente com o Instituto da Juventude.
Uma outra questão que queria colocar-lhe, é esta: Sr. Deputado António Filipe, reconhece ou não que, aquando da adesão do CNJ ao CENYC, uma das principais imposições seria a de que, em relação às organizações partidárias que compunham o CNJ, houvesse uma cobertura de todo o leque partidário - o que, em princípio, também hoje é uma situação que não sucede?

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - O Sr. Deputado Miguel Relvas fez bem em colocar as questões que colocou. Em primeiro lugar, em relação à do investimento que se faz em relação ao CNJ, dir-lhe-ei que é um facto inequívoco que o Estado tem reconhecido (e dei exemplos disso na minha intervenção) a existência do CNJ e, mais do que isso, tem atribuído ao CNJ direitos de representação do associativismo juvenil português, ou da parte do associativismo que ele representa, em órgãos importantes - referi-me ao Conselho Nacional de Educação, ao Conselho Nacional do Projecto Vida e ao próprio Conselho Consultivo da Juventude - e também tem participação no Cartão Jovem. Em relação ao Cartão Jovem, teremos, contudo, qualquer dia, algo para conversar, na medida em que sabemos que há razões de queixa do CNJ quanto à forma como está a ser gerido o Cartão Jovem - mas não é isso o que estamos agora aqui a discutir, teremos ocasião de o fazer noutro momento.
O que é um facto é que se já houve algum investimento por parte do Estado no CNJ, esse investimento tem vindo a decair a olhos vistos, e V. Ex.ª não me desmentirá se eu disser que a dotação atribuída este ano no Orçamento do Estado para apoio ao CNJ é igual, em termos nominais, à que foi atribuída há dois anos atrás. Portanto, tem havido, inequivocamente, uma falta de apoio do Estado em relação ao CNJ, um decréscimo real muito significativo do apoio, ao que não é alheio (falemos em boa verdade!) o facto de a JSD estar oonjunturalmente amuada com o CNJ e ter decidido abandoná-lo! E, ao ter decidido abandoná-lo, decidiu também alterar radicalmente, dando uma volta de 180º, as posições que sempre defendeu.
Infelizmente, a JSD está a enveredar por uma via que é comum ao governo PSD: a de que todos aqueles que discordam de qualquer posição que ele tome são contra ele, portanto há que combatê-los. E a posição que a JSD está a tomar em relação ao CNJ é uma forma muito grave de autismo político e de autismo em relação àquele que é o sentimento generalizado da juventude portuguesa, o que é extremamente grave. Estou convencido de que, daqui a alguns anos, a JSD se arrependerá muito de estar a tomar agora as posições que está a tomar em relação ao CNJ, indiciando, inclusivamente, que lhe irá negar a atribuição de estatuto jurídico.
Os Srs. Deputados não pensem que o CNJ vai acabar se a Assembleia da República não aprovar os projectos que estão neste momento em apreciação. O CNJ continuará e a Assembleia da República é que perderá a oportunidade de corresponder a expectativas que o associativismo juvenil português tinha em relação a este órgão de soberania. Em todo o caso, infelizmente!
O Sr. Deputado Miguel Relvas colocou objecções relativamente ao CENYC, mas não me consta que haja qualquer objecção por parte do CENYC em relação à continuação do CNJ neste órgão. Inclusivamente, sei que o CNJ terá decidido que um dos membros da sua direcção seja candidato a um lugar na direcção do CENYC, pelo que creio que não se colocará qualquer problema a esse nível.
Para concluir, e porque há pouco não respondi a uma questão que o Sr. Deputado Luís Nobre me tinha colocado - porque é que o CNJ não faz uma escritura pública -. muito rapidamente dir-lhe-ei que poderia fazê-lo, mas optou par não o fazer na medida em que considera que quem integra o CNJ não é o cidadão A, B ou C, individualmente considerado, mas sim associações juvenis. Seria, pois, muito mais digna e muito mais correspondente com a real natureza do CNJ a existência de um diploma que, especificamente, lhe atribuísse personalidade jurídica, reconhecendo a sua natureza de expressão associativa, de emanação exclusiva do associativismo juvenil português. É por isso que o CNJ optou deliberadamente por não fazer a sua escritura pública.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): -Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira.

O Sr. Fernando Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Decidiu a Conferência de Representantes dos Grupos Parlamentares agendar para hoje os projectos

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de lei n.ºs 139/VI e 187/VI sobre o Conselho Nacional de Juventude. Julgo que alguns dos Srs. Deputados poderão perguntar: o que é o CNJ? O que pretendia ser? O que conseguiu ser? E, sobretudo, o que é que a Assembleia da República tem a ver com tudo isto?
O CNJ pretende ser o conjunto das organizações de juventude de carácter nacional, muito embora nele coexistam organizações de jovens, departamentos de juventude e ainda associações que prestam serviços a jovens. Criado há cerca de sete anos, veio a beneficiar do reconhecimento do Estado e da participação em diversas instituições criadas por lei ou por decisão do Governo, tal como o Conselho Nacional de Educação, o CASES, ou o Conselho Consultivo da Juventude, entre outros.
E o que é que os proponentes invocam?
Invocam que esse apoio continuado justifica que a Assembleia da República, por lei especial, atribua personalidade jurídica a este conjunto de associações juvenis. Deixarei para os juristas a discussão sobre se esta proposta é ou não razoável sob o ponto de vista técnico.
Quero deixar bem claro aqui que ela não faz sentido sob o ponto de vista político. Desde logo porque, mesmo sem uma lei da Assembleia, o CNJ constituiu-se, arranjou sede, participou nos órgãos que já referi e aplicou os apoios que o Estado todos os anos lhe concedeu. Desde logo também porque o CNJ, que veio solicitar a nossa atenção para uma eventual lei, não revela um consenso sobre esta questão. Que eu saiba, quer a JS quer a JCP participam no CNJ. Mas não subscrevem o mesmo projecto de lei. Têm projectos diferentes. O CNJ, nas suas posições públicas e nas reuniões que teve connosco, não optou nem por um nem por outro.
Devemos ser nós a optar por um modelo que a própria organização visada não soube, não quis ou não conseguiu escolher?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A JSD contribuiu directamente para o fortalecimento do CNJ. Vários dos seus dirigentes empenharam-se no seu processo de criação e institucionalização. Pouco antes de sair apresentámos propostas de alteração ao seu funcionamento e à sua estrutura. Verificámos então que, embora a maioria das organizações concordasse com as posições que defendíamos, a necessária maioria estatutária de quatro quintos bloqueava a viabilização das nossas propostas. E, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não fomos os únicos que nos desvinculámos do CNJ. Outros fizeram-no também. E alguns que não o fizeram suspenderam por várias vezes a sua participação. Hoje apenas três das organizações de juventude dos seis partidos parlamentares participam no CNJ, o que corresponde tão-só a menos de 40 % da representação nesta Assembleia.
Mas importa sublinhar ainda que o facto da JSD já não participar nesta estrutura em nada interferiu no relacionamento do CNJ com os órgãos do Estado e com o Governo. O CNJ continuou a ser apoiado técnica e financeiramente, continuou a beneficiar de importantes apoios ao abrigo dos programas bilaterais com outros países e continuou a participar nos diversos órgãos em representação da juventude portuguesa.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A JSD, pelo seu lado, não fez desta circunstância nenhuma questão de combate político. Antes pelo contrário, quando nos desvinculámos do CNJ, afirmámos que não nos empenharíamos na criação de outro CNJ. Repetimos e reiteramos esse compromisso. Mas a criação desta ou doutras estruturas associativas deve depender apenas e tão-só da vontade das próprias organizações de juventude. Não pode, nem deve, constituir decisão da Assembleia da República!
E se estivermos, por lei, a criar um CNJ onde a maioria das organizações de juventude não se reconheçam? Os projectos apresentados, ao não fixarem critérios de adesão e ao remeterem essa matéria para os estatutos, podem ajudar a limitar o CNJ às organizações que dele já fazem parte.
E se estivermos, por lei, a consagrar uma realidade que não é sentida pela generalidade dos jovens portugueses? Para que o fosse, seria necessário que os jovens portugueses soubessem da existência do CNJ, da substância das suas propostas, do trabalho que realiza e com ele se pudessem directamente identificar e envolver. O CNJ, para os jovens que o conhecem pelos órgãos de comunicação social, assemelha-se a um órgão burocrático-administrativo que não consente a criatividade, a irreverência e o gosto pelo diferente que ainda caracterizam a juventude.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O CNJ ignorou, de facto, que a esmagadora maioria dos jovens portugueses não se reconhecem integrados em qualquer tipo de organização, seja ou não de juventude. Acções e campanhas de fomento do associativismo juvenil deveriam ter constituído uma das prioridades da acção do CNJ de forma a que, reforçando a representatividade das organizações membros, reforçasse também a sua própria representatividade. E, porventura mais importante que o seu alargamento a outras organizações nacionais que preenchem os requisitos de adesão, impunha-se o alargamento a outras realidades do movimento associativo juvenil, tanto ao nível regional como local. Também aqui o CNJ se esgotou excessivamente nas 18 organizações que o compõem, sem olhar para a realidade exterior que exigia a sua atenção e a sua intervenção.
Depois do entusiasmo e da simpatia generalizadamente reconhecidos após a institucionalização, não há dúvida que o CNJ, por falta de afirmação, não conseguiu vencer a fasquia da credibilidade junto dos jovens.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A acompanhar estes dois projectos de lei não existe uma pressão nacional a reclamar a sua aprovação. De facto, na consulta pública que sobre um projecto foi realizada pela Comissão Parlamentar de Juventude só três ou quatro organizações manifestaram à Assembleia a sua concordância com a iniciativa.
Srs. Deputados, onde está a posição das restantes organizações nacionais de juventude que integram o CNJ mas que não se sentiram motivadas, interessadas ou mobilizadas para nos fazer sentir a necessidade desta lei?

O Sr. Antônio José Seguro (PS): - E a das propinas? E a da PGA?

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não há um apelo nacional para a aprovação desta lei porque o CNJ não conseguiu ainda valer mais do que as organizações que individualmente o integram. O CNJ, apesar do esforço desenvolvido nos tempos mais recentes, não cresceu em legitimidade social, na eficácia interna, na maturidade que as suas responsabilidades impunham perante os jovens, as suas organizações membros e a sociedade.

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Sem ser destrutivo, mas frontal, há que perguntar: que apoio tem o CNJ dado às organizações que o integram? Que espaço de esperança para os jovens portugueses foi capaz de protagonizar? Por que grande aspiração da juventude portuguesa foi capaz de lutar? Que batalha perdeu na luta por alguma aspiração da juventude portuguesa? Porque vem diminuindo a sua representatividade? Porque se reduziu a sua credibilidade?
Sr. Presidente e Srs. Deputados: A resposta a estas questões, como a outras, só pode ser encontrada e suprida pelo próprio CNJ, enquanto expressão livre de associativismo, e não pela Assembleia da República. Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se assim é, porque que os partidos proponentes apresentaram estas iniciativas? Sinceramente, estou convencido que pensaram que nos iam embaraçar. Nada de mais errado! Com a mesma determinação com que a JSD não se empenha na criação de uma alternativa, que recusa estratégias de destruição do CNJ e que considera que ele deve merecer o justo apoio do Estado, deixamos claro que não concordamos com o acto legislativo proposto.
Srs. Deputados da JS e da JCP, o facto de não nos termos entendido dentro do CNJ, não justifica que considerem dever ser a Assembleia da República a resolver este diferendo. A lei não é solução.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - A lei não é a solução?! Então qual é a solução?

O Orador: - A força e a credibilidade do CNJ não dependem da aprovação pelos Ss. Deputados de uma norma legal. A força e a credibilidade do CNJ dependem da representatividade dos que o integram e da sua capacidade de intervenção junto dos jovens portugueses

Vozes do PSD - Muito bem!

O Orador: - De facto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, faltam a estes projectos a ambição própria dos jovens. Estão eivados de um confortável egoísmo que reclama autonomia mas sem risco, que quer garantir a participação de todos os jovens, mas de forma controlada, uma representatividade legal, mas sem ser representativa, em suma, um estatuto que não deve ser dado por lei porque só deve ser, e só faz sentido que seja, permanentemente conquistado na sociedade junto dos jovens portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Deputado Fernando Pereira, julgo que há aqui uma questão que tem de ser esclarecida e, depois de ter ouvido as declarações, sob a forma de pedido de esclarecimento, dos Srs. Deputados Carlos Coelho e Luís Nobre relativas às intervenções anteriores, senti-me obrigado a inscrever-me de imediato para fazer este pedido de esclarecimento, dado que ainda não percebi o que é que mudou na posição dos Deputados do PSD e dos Deputados indicados pela JSD para as listas do PSD nesta matéria.
Tenho comigo um livro, publicado há 10 anos, escrito sob a orientação do Sr. Deputado Carlos Coelho, e no qual participaram, entre outros, alguns ilustres dirigentes da JSD, tais como Carlos Miguel Coelho, Carlos Pimenta, Pedro Passos Coelho, Miguel Macedo e Silva, João Granja, José de Almeida Cesário, Paulo Pereira Coelho, Pedro Pinto - quase todos os que estão sentados nessa bancada. Numa determinada parte, diz o seguinte: «a juventude no Estado (...): é natural que saudemos com interesse e regozijo a presença de jovens em órgãos e níveis de responsabilidade da estrutura do Estado, não só porque cremos que, assim, os problemas da juventude poderão ter outro tratamento, mercê da pressão exercida por estes eventuais porta-vozes, mas também porque vimos defendendo que, na necessária reforma global do Estado e da sociedade, a decrepitude de algumas gerações administrativas constitui entraves significativos ao progresso e à inovação». Mais à frente sustenta a necessidade de uma Secretaria de Estado da Juventude e de um Conselho Nacional de Juventude o qual, neste documento, intitulado «Projecto político para a juventude portuguesa», era defendido como sendo um órgão que representaria as organizações de juventude portuguesas e que deveria ser obrigatoriamente ouvido de seis em seis meses sobre a execução da política de juventude e os critérios da atribuição de subsídios. Era esta a filosofia inicial da JSD e de alguns dos ilustres Deputados da bancada do PSD sobre o Conselho Nacional de Juventude.
10 anos passados, oolocado perante a intervenção do Sr. Deputado Fernando Pereira, colocado perante as diferentes declarações públicas dos Deputados do PSD, fiquei sem saber o que é que mudou! A JSD e os Deputados do PSD entendiam que o CNJ deveria ser um instrumento da política do Governo? Ou o que se passou foi que, numa determinada fase, quando o CNJ pretendeu assumir um espaço de intervenção política e social, deixou de ser cómodo para o Governo pelo que, nessa fase, o Governo entendeu retirar do seu programa a qualificação de parceiro social e a JSD deixou de estar interessada no projecto CNJ? O que é que mudou, Srs. Deputados?
Eu não entendo que esta discussão seja feita na base de «afinal, quem é que conhece o CNJ, não há um grande movimento nacional sobre esta matéria!» Não julgo que a questão da juventude possa ser colocada em termos de um qualquer «acne de Estado», como um articulista da nossa praça em tempos escreveu. Julgo que, tal como lemos livros do Tintin, «dos 7 aos 77 anos», também as questões políticas de juventude passam por uma integração social, e, portanto, por dar espaço de participação às diferentes estruturas, quer de jovens, quer trabalhando com jovens, pelo que acho que faz sentido a existência do CNJ. E a existência de um articulado específico - artigo 70.º da Constituição - sobre juventude, o fomento ao associativismo juvenil, deve ter uma consagração prática, e daí a iniciativa legislativa do PS.
Diga-me, portanto, Sr. Deputado, o que é que mudou na posição da JSD em matéria de CNJ.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Manuel Maia.

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Deputado Fernando Pereira, infelizmente não posso contrariar os seus argumentos porque não ouvi argumentos nenhuns! De facto, não apresentou argumentos sólidos na argumentação que proeurou expender quanto à inutilidade ou quanto à incon-

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veniência de uma lei da Assembleia da República, apenas usou argumentos políticos, pelo que é somente a esses que me posso referir. Há uma coisa curiosa: não sei como é que a JSD conseguiu, em tão pouco tempo, encontrar tantas críticas para fazer ao CNJ! A partir do momento em que a JSD amuou com o CNJ e deixou de fazer parte dele, o CNJ passou a ser tudo quanto era mau ao cimo da terra!

Vozes do PSD - Não é verdade!

O Orador: - Inclusivamente, para o PSD o CNJ agora não é representativo de coisa nenhuma! O que é curioso é que quando a JSD lá estava com mais 15 organizações o CNJ era plenamente representativo, mas agora que a JSD não está mas estão lá 17 organizações o CNJ deixou de ser representativo!

O Sr. Fernando Pereira (PSD): - Onde é que isso está na minha intervenção?

O Orador: - Sr. Deputado, não está na sua intervenção! Está no meu pedido de esclarecimento! É evidente que V. Ex.ª não o disse, porque isso era contra si! Mas para o PSD quando a JSD lá estava com mais 15 organizações o CNJ era representativo, mas agora que estão lá 17 organizações mas não a JSD deixou de o ser! Portanto, ficamos a saber que a JSD é o árbitro das elegâncias e da representividade da juventude portuguesa!...
Mas o problema não é o da representatividade, mas sim o de que o CNJ reivindicou para si o direito de debater questões da política de juventude que são incómodas para o Governo e para a JSD; o problema é que o CNJ chegou à conclusão - imaginem! - que a PGA era uma prova absurda. Ora, essa foi uma conclusão incómoda para a JSD, para quem a PGA sempre foi a «menina dos seus olhos». O CNJ começou a debater os critérios de apoio ao associativismo juvenil português e a JSD sentiu-se incomodada com isso.
No entanto, percebo o raciocínio, isto é, se o governo PSD/Cavaco Silva entende que não deve dialogar com ninguém por que é que a JSD há-de dialogar com outros jovens e com outras organizações juvenis? Assim, a JSD amuou, bateu com a porta, e agora o CNJ tem todos os defeitos que existem ao cimo da terra!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Pereira, o primeiro aspecto que quero sublinhar é o facto de se ter dito aqui que a lei não é solução, afirmação que, sendo feita nesta Casa, é um pouco insólita.
Em segundo lugar, chego à conclusão, face ao vigor com que defende a actuação desta Assembleia em função das movimentações exteriores - com o que, aliás, concordo inteiramente -, de que o PSD se vai preparar para atender a toda a grande movimentação estudantil em relação às propinas e a outras reivindicações semelhantes.
Finalmente, o Sr. Deputado reconheceu, na sua intervenção, o importante papel do CNJ, quer a nível nacional quer internacional. Mais: sublinhou a criatividade que o CNJ deve ter e a forma como deve participar. Assim, pergunto-lhe porque é que a JSD, em vez de se manter de fora, não volta para o CNJ, dando todo o seu contributo, toda a sua participação, imaginação e criatividade. Por outro lado, por que é que o PSD não apoia estes dois projectos e depois, em sede de comissão, contribui, com a sua actuação, para que a lei, de facto, dê sustentação jurídica ao estatuto necessário para o CNJ?

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15abel Castro.

A Sr.ª 15abel Castro (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Pereira, o meu pedido de esclarecimento é muito simples e decorre das intervenções anteriores. Penso que, no discurso do PSD, há algo de contraditório. Por um lado, fala-se - e não especificamente neste debate, porque penso que o PSD nesta discussão tem fugido um pouco a esta questão - em fazer agir os parceiros sociais e os movimentos de opinião, isto é, em fazer agir autonomamente os cidadãos organizados e, por outro, o PSD arroga-se o direito de fazer leituras, relativamente à pouca importância e ao pouco peso que, segundo o PSD, o CNJ hoje tem a nível de intervenção na vida portuguesa, quando diz que ele é pouco imaginativo, criativo e interventor, ou seja, que tem um papel apagado. Penso que isto é contraditório. Gostaria que o Sr. Deputado me dissesse se pensa que é a ausência da JSD da organização que lhe retira esse papel. Mais: gostaria de saber se, do seu ponto de vista e do do seu partido, o papel do CNJ se contabiliza e se interpreta à luz do somatório dos partidos e das juventudes partidárias que o compõem, ou se muitas outras organizações que lá estão representadas, que não se revêem nem se reflectem necessariamente nos partidos políticos, têm, também elas, um papel porventura bem mais importante do que as próprias juventudes partidárias na afirmação do espaço que o CNJ, do nosso ponto de vista, muito correctamente preenche.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Pereira, em primeiro lugar, parece-nos completamente irrealista dizer-se que o CNJ não é conhecido pelos jovens portugueses. Digo-lhe só isto: se dessem ao CNJ 50 % da verba que o Instituto da Juventude, através do Gabinete do Secretário de Estado da Juventude, gasta em publicidade, o CNJ, só com esses 50 %, com certeza, seria mais conhecido do que o próprio Instituto da Juventude.

Protestos do PSD.

Não se enervem, Srs. Deputados!
A minha segunda questão tem a ver com o seguinte: o Sr. Deputado Fernando Pereira disse que uma das razões que levava a JSD a não aprovar qualquer destas iniciativas era a de não haver um amplo apelo nacional. Ó Sr. Deputado, e quando houve um apelo nacional a propósito da PGA e das propinas, os senhores mudaram alguma coisa?! Quero, pois, confrontá-lo com mais esta incoerência da política
seguida pela JSD e pelo PSD nesta matéria.

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A terceira e última questão é a seguinte: o PS não lhe pede que a JSD e o PSD mudem de opinião sobre o CNJ; não pede mesmo que entrem para o CNJ. O que pedimos - porque os senhores são maioria e, por isso, estamos dependentes da vossa posição nesta matéria - é que se honre as associações juvenis que fazem parte do CNJ o os milhares de jovens que são membros de associações de escutismo, de associações de prestação de serviços, das partidárias, das sindicais e das profissionais. São esses que neste momento pedem que o CNJ tenha um estatuto jurídico. Sinceramente, o que queremos não é estabelecer um confronto que nos divida mas, sim, atribuir um estatuto jurídico ao Conselho Nacional de Juventude. Peço-lhe que reconsidere sobre isso.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira.

O Sr. Fernando Pereira (PSD): - Sr. Presidente, começo por agradecer as perguntas que me colocaram.
Sr. Deputado José Apolinário, não fomos nós que mudámos, mas o senhor. Hoje está mais velho, sob o ponto de vista da nossa prática política. Nós não, porque continuamos a deixar ...

O Sr. António José Seguro (PS): - Foi ele que escreveu o livro?

O Orador: - Não, fomos nós. Mas, se calhar, V. Ex.ª nunca escreveu nenhum. Diga-me o que pensa e deixe-se de fazer chicana política!

O Sr. António José Seguro (PS): - Mas já plantei uma árvore!

O Orador: - Também já plantei muitas!

O Sr. António José Seguro (PS): - Só me falta escrever um livro e fazer um filho.

O Orador: - Bem, nesse aspecto, não posso ajudá-lo ...

Risos do PSD.

É que os senhores confundiram as coisas. Nós não dissemos que o CNJ, hoje, já não valia nada. Os senhores é que estão a falar do CNJ como se ele estivesse aleijado, não demonstrando sequer respeito por vós próprios, que dele fazem parte. O CNJ não tem necessidade de vir à Assembleia da República pedir uma legitimidade para existir, quando, afinal, ele já existe!
V. Ex.ª apresenta aqui um projecto de lei para a criação do Conselho Nacional de Juventude ...

O Sr. António José Seguro (PS):- Estatuto jurídico, Sr. Deputado!

O Orador: - Desculpe, Sr. Deputado, mas o que está escrito no projecto - e trata-se de um documento oficial - é «criação do Conselho Nacional de Juventude». Pelos vistos, aquilo que V. Ex.ª escreve, para além do livro, é com erro, e tenta transformá-lo em letra de lei.

Risos do PSD.

De facto, o que está aqui estrito é «criação do Conselho Nacional de Juventude». A verdade é esta e, sob esse ponto de vista, também não ...

O Sr. António José Seguro (PS):- Fale do essencial!

O Orador: - Mas isto é essencial, porque trata-se de um projecto de lei e, como V. Ex.ª diz, estamos aqui para fazer leis.
Sr. Deputado António Filipe, relativamente ao que mudou e ao facto de não criticarmos quando lá estávamos, quero dizer-lhe que fui um dos últimos representantes da JSD no CNJ. E, nessa altura, com a excepção de uma ou duas assembleias gerais, raramente havia quórum, mas, se V. Ex.ª ler as actas, enoontrará lá as críticas feitas peia JSD. E há pouco referi-me também a esse aspecto.
O problema é que V. Ex.ª, tal como o Sr. Deputado José Apolinário - que, mal me viu subir para a tribuna, pediu a palavra -, não ouviu a minha intervenção e colocou-me perguntas, previamente feitas, a propósito de aspectos que não referi. É que eu não disse nada disso! O que disse, e volto a ler-lhe um excerto da minha intervenção, foi que «com a mesma determinação com que a JSD não se empenha na criação de uma alternativa, que recusa estratégias de destruição do CNJ e que considera que ele deve merecer o justo apoio do Estado, deixamos claro que não concordamos com o acto legislativo [...]». E posso dizer-lhe por que é que não concordo com o acto legislativo, Sr. Deputado. O CNJ já está constituído, tem uma garantia constitucional de associação, e o senhor vem aqui pedir que nós ...

O Sr. António José Seguro (PS): - Está a fugir à questão.

O Orador: - Não estou, não! É que os projectos em discussão representam um excesso de intervenção legislativa, que é exactamente o que os senhores nos estão a pedir, ...

O Sr. António Filipe (PCP): - Nós não pedimos, propomos!

O Orador: - ... num espaço de liberdade constitucionalmente consagrado, que é o direito de associação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ao propor aqui legislar para a autonomia do CNJ, como V. Ex.ª disse, estamos a legislar contra a própria autonomia do CNJ, porque a autonomia do CNJ e o direito de associação estão consagrados na Constituição.

O Sr. António José Seguro (PS): - 15so é outra história!

O Orador: - Desculpe, Sr. Deputado, mas trata-se de um direito de liberdade negativa e, não sendo o CNJ uma associação pública - ideia esta que tinha muita razão de ser, mas o Sr. Deputado António Filipe esquivou-se à questão quando o Sr. Deputado Luis Nobre ...

O Sr. António José Seguro (PS): - Não percebo o que é que chama de um direito de liberdade negativa.

O Orador: - Lá fora terei todo o prazer em explicar-lhe o que é um direito de liberdade negativa.

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O Sr. António José Seguro (PS): - Explique-me agora!

O Orador: - Como dizia, o Estado, através destes projectos, acabava por intervir na autoconstituição, na autoorganização e na autogestão do CNJ.
A verdade é que o CNJ já existe, e os senhores vêm aqui pedir que ele seja novamente criado. Se quiserem, façam uma escritura pública! O CNJ sempre funcionou, e não é necessária a intervenção do Estado para regular nada disto.
O PS vai mais longe, ao dizer, no artigo 6.º, que o Estado tutela e coordena, mas que o dinheiro deve ser atribuído ao CNJ, que, por sua vez, o distribuirá às suas organizações. Posto isto, não sei quem é que terá mais impulsos «controlistas»: se o Governo - que até tem apoiado o CNJ -, se o PS!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. António José Seguro (PS): - Já vamos abordar esse assunto, Sr. Deputado!

O Orador: - Quando quiser, Sr. Deputado!
O Sr. Deputado Mário Tomé referiu ser insólito o facto de eu ter dito que a lei não era solução. Não é insólito e já expliquei porquê! V. Ex.ª disse, mais à frente, que tínhamos fechado a porta ao termos saído do CNJ. Sr. Deputado, nós não virámos a cara à luta! Proponho-lhe - e, inclusivamente, também sou da opinião de que o CNJ tem pernas para andar, mesmo sem a lei - que a organização de juventude da UDP também passe a fazer parte do CNJ, porque seria uma participação positiva.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Vocês estão a perder o comboio da juventude!

O Orador: - Nós já lá estivemos e já de lá saímos. Portanto, provavelmente estaremos à frente também nessa matéria. A UDP já lá devia estar! Mas o Sr. Deputado, se quiser, em alternativa, poder-me-á dizer quais as razões por que é que ainda lá não estão representados.
Sr.ª Deputada 15abel Castro, devo dizer-lhe que reconhecemos o papel importantíssimo das organizações que não estão representadas no CNJ. A confusão é que quem tentou partidarizar e quem está a tentar transformar a não aprovação do estatuto jurídico do CNJ pela Assembleia numa questão político-partidária não são as organizações não partidárias de juventude mas, sim, as organizações partidárias de juventude, que querem fazer politiquices com isto e ter uma bandeira lá fora.

Aplausos do PSD.

É evidente que a história do CNJ tem tido guerras deste género! O Sr. Deputado António José Seguro sabe muito bem que tem sido assim e as razões por que a JSD saíu do CNJ - até porque elas ficaram lá bem expressas! O nosso empenhamento era tão grande que, modéstia à parte, quando eu era secretário-geral da JSD, tanto o presidente, Pedro Passos Coelho, como o secretário-geral da JSD estavam lá! Foi o empenhamento total no CNJ! E V. Ex.ª sabe muito bem por que é que Pedro Passos Coelho saiu do CNJ um ano e meio antes de ter saído da JSD. Não sei se valerá a pena dizer à Câmara por que é que ele saiu ...

O Sr. António José Seguro (PS): - O Sr. Deputado deve dizer tudo!

O Orador: - Então vou dizer-lhe: porque tivemos, para eleger um representante da juventude portuguesa no Conselho Nacional de Juventude, numa instituição democrática, de fazer uma votação de braço no ar, por proposta de V. Ex.ª, quando era também o seu nome que estava em causa. 15to magoa-me, principalmente a minha consciência de democrata, até porque já tinha ouvido aqui muitas vezes o seu partido criticar - e como sou jovem fui aprendendo - os métodos utilizados noutros partidos.
Não sei se deixei de responder a alguém, mas se o fiz ...

O Sr. José Apolinário (PS): - A mim! Não respondeu ao que mudou!

O Orador: - O que é que mudou? Não mudou nada, continuamos! Tanto é que não obstaculizamos nem vamos obstaculizar! Está dito, o Sr. Deputado é que não quis ouvir, pois, pelos vistos, até já tinha a pergunta feita - aliás, ela era fácil e o Sr. Deputado escusava de ter trazido a cábula ...

Risos do PSD.

Bom, quanto à pergunta que V. Ex.ª me formulou, devo dizer-lhe que respondi ainda da tribuna, ou seja, estamos a apoiar ...

O Sr. José Apolinário (PS): - Eu trouxe a prova!

O Orador: - Exacto! Continuamos a achar que o Conselho Nacional de Juventude tem validade e não precisa que seja a Assembleia da República a dar-lhe estatuto jurídico, nem tão-pouco a criá-lo, porque aquilo que a JS veio aqui pedir foi a criação do Conselho Nacional de Juventude, que já existe.

Aplausos do PSD.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaria de dizer que o Sr. Deputado Fernando Pereira foi incapaz de responder às perguntas colocadas pelo Sr. Deputado José Apolinário e às minhas e, em segundo lugar, quis fazer de um assunto sério um assunto menos sério - aliás, estamos habituados a que o Sr. Deputado utilize essa forma para tratar os assuntos, mas nós não fazemos isso!
Assim, considero de menos dignidade para esta Câmara e para os Deputados o facto de o Sr. Deputado Fernando Pereira ter trazido aqui assuntos estritos do Conselho Nacional de Juventude, ...

Vozes do PSD: - Foi você que pediu!

O Orador: - ... que tem determinadas regras, o que lá se passa dentro de determinado espírito. Com certeza que, sobre Conselho Nacional de Juventude, o seu interior e o seu relacionamento com as próprias secretarias de Estado e gabinetes, todos teríamos muito que contar! ...

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Quando o Sr. Deputado Fernando Pereira estiver disponível para falar sobre todas as relaçõas dos Deputados da JSD, de dirigentes da JSD, que trabalham ou que trabalharam em gabinetes, que receberam e que ainda recebem dinheiro por elaborar documentos e outras matérias, ou seja, quando o Sr. Deputado Fernando Pereira, a JSD e o PSD quiserem, nesta Câmara, dar tempo suficiente para discutir ...

O Sr. Jorge Paulo Cunha (PSD): - Peçam um inquérito!

O Orador: - ... as relações entre as pessoas que ocupam lugares nas organizações de juventude e o próprio Estado, então pode ter a certeza que por parte do PS será dado todo o apoio a essa iniciativa.
Porém, o Sr. Deputado não tem o direito de, no momento de uma discussão séria, no momento em que o objectivo é a atribuição do estatuto jurídico ao Conselho Nacional de Juventude, vir utilizar meias verdades sobra esta matéria!

O Sr. Jorge Paulo Cunha (PSD): - Não serão três quartos de verdade?!

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira.

O Sr. Fernando Pereira (PSD): - Sr. Presidente, depois daquilo que o Sr. Deputado António José Seguro disse, acabei por não saber qual foi a figura regimental ao abrigo da qual usou da palavra.
A verdade é que expliquei por que razão a JSD tinha saído do Conselho Nacional de Juventude; eu é que fui provocado e tive de ouvir que a JSD falou cá fora, bateu com a porta e não teve a coragem de, dentro da organização, esgrimir por aquilo que achava correcto. Não é isso!
Quando eu disse que, se quisessem, explicaria a razão pela qual tínhamos saído, isto quando, tínhamos o empenhamento a nível de algumas figuras da Comissão Nacional de Juventude, lançaram-me um repto para eu dizer tudo e, sendo ,assim, fi-lo! Na verdade, não sei se o facto de obrigarem alguém a fazer uma votação de braço no ar é ofensivo, mas a circunstância de me terem obrigado a fazer isso, quando está em causa uma pessoa, ofendeu-me. Portanto, o ofendido foi eu na altura!
O Sr. Deputado disse também que fiz chicana com uma questão séria ... Bom, de facto, não sou eu que venho para aqui dizer que vou andar por aí com um canhão insuflável atrás das pessoas, não é a mim que vêem fazer teatro à porta ... E mais: Sr. Deputado, desde que estou na política, sempre fui eleito e, apesar de nada ter contra aqueles que trabalham e é justo que sejam remunerados por isso, a verdade é que eu ainda não era profissional da política - que hoje sou e assumo - já o Sr. Deputado António José Seguro estava num gabinete governamental ...

O Sr. António José Seguro (PS): - Mas que gabinete governamental?

O Orador: - Portanto, quando quiserem fazer essa discussão, nós também a fazemos!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da consideração.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço imensa desculpa por ocupar V. Ex.ª e a Câmara nesta hora ao usar esta figura regimental, particularmente na sequência de uma figura idêntica usada por outro Sr. Deputado, mas há questões que não podem passar em claro.
De facto, o Sr. Deputado António José Seguro tem todo o direito de, como Deputado e secretário-geral da JS, trazer a esta Câmara os projectos de lei que entender, por melhor ou pior que seja a sua fundamentação, e tem todo o direito de contraditar os Deputados das restantes bancadas relativamente às opiniões e posturas que cada um, no âmbito da sua liberdade, entender produzir perante a Câmara.
Contudo, o Sr. Deputado não tem o direito de fazer algo que ainda hoje, durante a nossa reunião, todos, inclusivamente com o voto favorável do PS, ajudámos a denunciar e que é um costume que está introduzido em alguns sectores da sociedade portuguesa: o de lançar acusações sem as fundamentar, ...

O Sr. Jorge Paulo Cunha (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... o de fazer insinuações sem provar, o de fazer da ofensa ao bom nome uma arma essencial do debate político. Nós recusamos essa prática, esse estilo, não o aceitamos, e entendemos que o Sr. Deputado António José Seguro tem a responsabilidade de, nomeadamente depois de na sessão de hoje ter votado a favor do inquérito parlamentar n.º 6/VI, não ser conivente com essas práticas, que ainda há pouco ajudou a denunciar.
De facto, não é a primeira vez que o Sr. Deputado António José Seguro faz a insinuação de que há alguma coisa de ilegal, de imoral, entre a ligação da JSD ou do PSD a gabinetes ministeriais - aliás, o Sr. Deputado Fernando Pereira já teve ocasião de dizer a esse propósito que se alguém trabalha deve ser remunerado.
Porém, a forma como o Sr. Deputado coloca as questões é, do ponto de vista ético, lançando um ónus de suspeição sobre pessoas - aliás, já tivemos ocasião de, várias vezes, desmontar, sob o ponto de vista político, essa aleivosia nunca provada que o Sr. Deputado António José Seguro e outras organizações tentaram lançar de excessiva conivência entre a JSD e os corredores do poder, mas sempre ficou provado que isso não em verdade.
Sr. Deputado António José Seguro, se nesta Câmara o senhor faz as afimações que fez e continua a fazer, então tem a obrigação ética, política e moral de prová-las, e é esse o desafio que quero lançar-lhe.

(O orador reviu).

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. Antônio José Seguro (PS): - Sr. Deputado Carlos Coelho, pensava que essa sua intervenção de defesa da consideração não fosse dirigida a mim, mas ao seu componheiro de bancada, Sr. Deputado Fernando Pereira, porque foi ele que produziu a acusação de «quando eu trabalhava num gabinete de um ministro». Ora, como

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nunca trabalhei num gabinete de um ministro, senti-me ofendido e pensei que a pergunta que o Sr. Deputado colocava, nomeadamente a defesa da consideraçáo, era para que o Sr. Deputado Fernando Pereira explicasse em que gabinete de ministro é que trabalhei.
Assim, gostava que ficasse claro que nunca trabalhei em gabinete de nenhum ministro, ao contrário, e torno a referir, de muitos antigos e actuais dírigentes da JSD. E não veja, Sr. Deputado, nenhuma ilegalidade nesta matéria; está sim relacionada com comportamentos éticos, com aquilo de que eu há pouco falava, a tentativa de manipular o poder. Sobre essa matéria, quando quiserem, poderão ler as declarações que tive oportunidade de proferir na Comissão de Juventude, aquando do debate na especialidade do Orçamento do Estado, e terei todo o gosto (foi o repto que lancei ao Sr. Deputado Fernando Pereira), quando houver tempo para falar em pormenor sobre essas matérias, em trazer uma lista de actuais e antigos dirigentes da JSD que estão com funções em gabinetes de ministros.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero começar por saudar as oportunas e necessárias iniciativas legislativas do PS e do PCP. O Conselho Nacional de Juventude (CNJ) íntegra 18 associações de juventude, partidárias e não partidárias, e tem conseguido juntar à mesma mesa as mais diversas perspectivas e opiniões da juventude portuguesa.
O CNJ é a mais ampla plataforma do País e por isso é um bom exemplo dado pela juventude a todos nós. Por estas razões, o CNJ é reconhecido e respeitado como parceiro, com assento no Conselho Nacional de Educação, no Conselho Nacional do Projecto Vida, no Conselho Consultivo da Juventude e é ouvido previamente em decisões do Instituto da Juventude.
Por isso, lamentamos o seu abandono pela maior organização partidária da juventude, a JSD. Mas ainda mais lamentável é a afirmação saída do seu último congresso, de que «a JSD é a única e fiel representante dos jovens portugueses»! Com esta posição, a fidelidade da JSD é menos aos jovens portugueses e mais ao governo do PSD.

O Sr. António José Seguro (PS) - Muito bem!

O Orador: - Onde está o respeito da JSD pela democracia e pelo pluralismo?!
A JSD manifesta um preocupante incómodo em se sentar lado a lado não só com outras juventudes partidárias mas, principalmente, com associações de juventude da mais diversa índole, representantes da rica diversidade de opções e de organização da juventude portuguesa.
Quanto à matéria concreta das projectos, considero que o financiamento deve continuar a ser feito directamente às associações e não através do CNJ e que a definição dos fins do CNJ deve ser da sua própria competência, nos seus estatutos. Desta forma se garantirá a autonomia própria das associações e a capacidade própria do CNJ.
Finalmente, considero que a aprovação, na generalidade, destes projectos, que atribuem ao CNJ o seu estatuto jurídico, é de grande importância, nomeadamente quando os jovens são empurrados para acções de violência de índole antidemocrática e racista. A dignificação e o reforço do CNJ como importante plataforma de participação democrática de juventude - reconhecida nacional e internacionalmente -, com a sua voz própria e plural, será um poderoso alicerce para o próprio futuro da democracia no nosso país.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15abel Castro.

A Sr., 15abel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que a situação e aquilo que hoje se equaciona neste Parlamento é muito claro. Há duas iniciativas de dois grupos parlamentares que, no essencial, convergem, já que as diferenciações que têm são secundárias, na corporização daquilo que é uma velha reivindicação do CNJ, ou seja, a atribuição de um estatuto jurídico a esse mesmo CNJ.
Penso que hoje o PSD está um pouco a tentar colocar as coisas de outra forma, pois não se trata de o PSD reconhecer o valor do CNJ, não é isso que se lhe pede nem é isso que as organizações que o compõem querem. Estas não precisam que o PSD venha reconhecer a importância do seu trabalho e da sua intervenção na sociedade portuguesa porque ela existe e constrói-se no dia-a-dia, e, portanto, não precisa da concessão de ninguém o reconhecinento deste facto. Ele está implantado no nosso quotidiano, existe no agir conjunto das associações mais diversas, no espaço aberto que o CNJ é. Essa não é a reivindicação que os dois projectos colocam, nem é esse o sentido e a necessidade que o CNJ hoje coloca a este Parlamento.
E insisto em referir que o CNJ tem uma importância que extravasa o seu próprio peso. Penso que as juventudes políticas que nele estão representadas aglutinam outros sectores importantes do agir político na sociedade portuguesa, nomeadamente os sindicatos, as igrejas e outras associações de jovens.
A questão que se coloca, tão-só, é a de saber se o reconhecimento, que por palavras tem vindo a ser feito, da importância do CNJ, das organizações de juventude e do movimento autónomo de juventude na definição em conjunto de políticas para a juventude, é capaz de ir além, dando um novo passo através da atribuição de um estatuto jurídico.
E porquê o reconhecimento de um estatuto jurídico? Porque o estatuto jurídico significa a passagem a definitivo de aspectos que hoje, na vida interna do CNJ, têm um carácter transitório e colocam barreiras à sua intervenção diária, nomeadamente barreiras fiscais, tempo de antena, e o reconhecimento efectivo do seu papel como parceiro social.
É este o desafio que se coloca a esta Câmara; é este o posicionamento que deve ser assumido.
Em nosso entendimento, as reservas que o PSD tem colocado são as reservas que os constrangimentos orçamentais dos últimos três anos têm vindo a significar, ou seja, reconhece-se o CNJ mas, do ponto de vista financeiro, inviabiliza-se a sua efectiva possibilidade de participação.
Por outro lado, a asfixia financeira do CNJ acaba por inviabilizar, na prática, a possibilidade de uma intervenção que se diz e se requer mais criativa, mais abrangente e mais enriquecida.

O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não há asfixia financeira, Sr.ª Deputada!

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O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos Pinho.

O Sr. João Carlos Pinho (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos hoje em apreciação nesta Câmara os projectos de lei n.ºs 139/VI - Criação do Conselho Nacional de Juventude (PS) e 187/VI - Estatuto Jurídico do Conselho Nacional de Juventude (PCP).
O CNJ, criado e existente de facto desde 1985, nunca existiu de direito. Trata-se de um órgão que tem servido como plataforma de diálogo e intervenção das associações e organizações de juventude perante os poderes instituídos.
No entanto, ao longo da ainda curta história do Conselho Nacional de Juventude, houve algumas dissidências que culminaram no abandono por parte de algumas organizações de juventude, nomeadamente de organizações partidárias.
Afigura-se-nos que, apesar de a juventude afecta ao nosso partido ter sido uma das organizações que abandonou o CNJ, é útil que se possa dotá-lo de um estatuto jurídico, até como forma de o legitimar como parceiro social da juventude no nosso país.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Desde há muito tempo a esta parte a Juventude Centrista reclama operacionalidade e eficácia ao CNJ. Entendemos que o estatuto jurídico que resultará dos projectos de lei em apreço é um passo significativo para o alcance dos objectivos que desejamos.
Todavia, o diploma em discussão é demasiadamente ambicioso, ao ponto de confundir um espaço de diálogo com a responsabilidade da execução das políticas de juventude, transformando o CNJ numa superstrutura tutelar e fiscalizadora das actividades das suas organizações membros.
Dai que, num futuro próximo, aconselhemos algumas alterações aos diplomas em discussão.

O Sr. António José Seguro (PS): - Boa postura!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (José Manuel Mala): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou ser breve, dado o adiantado da hora, mas gostaria de salientar desde já que não pedi a palavra para exercer o direito de defesa da consideração depois da intervenção do Sr. Deputado Fernando Pereira por respeito para com o Regimento e a referida figura regimental, na medida em que quer eu quer a minha bancada não fomos directamente ofendidos na consideração. Mas, sinceramente, apeteceu-me - e se existisse essa figura regimental tê-la-ia usado - pedir a palavra em defesa da elevação do debate, porque entendo que com a intervenção do Sr. Deputado Fernando Pereira ele não se elevou em nada. O que se viu aqui foi a Assembleia da República dar um triste espectáculo perante os jovens que assistem a este debate e perante o País, que poderá vir a tomar conhecimento dele.

Protestos do PSD.

O Orador: - Creio, portanto, que não foi um momento particularmente feliz da actividade desta Assembleia e que o CNJ merecia mais respeito por parte dos Srs. Deputados que intervieram no debate.
Não posso também deixar de fazer alguns reparos ao que o Sr. Deputado Fernando Pereira disse. Em primeiro lugar, um reparo de pormenor, mas que considero importante: o Sr. Deputado disse várias vezes que quer o PS quer o PCP vinham pedir a esta Assembleia que dotasse o CNJ de um estatuto jurídico.

O Sr. Fernando Pereira (PSD): - Está enganado, Sr. Deputado!

O Orador: - Disse isso várias vezes!
É preciso que fique bem claro que não viemos cá pedir nada, mas apenas propor, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, que a Assembleia da República aprove dois projectos de lei, um do PCP e outro do PS, cujo objectivo é o de dotar o CNJ, não daquilo que o Sr. Deputado disse, mas de personalidade jurídica, definindo-lhe também um estatuto jurídico.
E a propósito desta matéria, penso que o Sr. Deputado fez uma tremenda confusão quando se referiu ao facto de o CNJ ter reconhecido o seu direito de associação na Constituição e na lei. É evidente que tem e foi por isso mesmo que ele se constituiu, tal como se constitui qualquer associação juvenil neste país. Não é preciso, evidentemente, existir uma lei da Assembleia da República para que qualquer associação se constitua. Aliás, pensava que esta confusão já estava desfeita há muito tempo!
Porque o que propomos é que a Assembleia da República dote o CNJ de personalidade jurídica, que ele não tem. É apenas essa a questão! Felizmente não é preciso autorização da Assembleia da República para que qualquer associação se constitua legalmente.
O Sr. Deputado estranhou eu não o ter questionado sobre o conteúdo da sua intervenção. É evidente que perguntei sobre o que o Sr. Deputado não disse, porque quanto ao que disse eu ouvi-o perfeitamente, estive com toda a atenção e, portanto, não precisava de esclarecimentos.
Para terminar, gostaria apenas de dizer que sempre estive convencido de que não seria possível, a propósito do CNJ, a Assembleia da República dar um espectáculo tão pouco edificante como aquele a que há pouco assistimos. Em meu entender, a questão está política e juridicamente clarificada. Não há, pois, qualquer obstáculo consistente à aprovação de qualquer uma das iniciativas legislativas e, mesmo que isso se verificasse, ele poderia ser eliminado durante a discussão na especialidade.
Logo, não há qualquer problema do ponto de vista jurídico; o que há, muito claramente, é um veto político da JSD ao reconhecimento do estatuto jurídico do CNJ e à atribuição de personalidade jurídica a este órgão por parte da Assembleia da República.
Creio, assim, que esta questão está por demais clarificada e não vale a pena insistir mais nela. Felizmente que a JSD não veta a existência do CNJ, porque não pode fazê-lo, como, aliás, não pode vetar qualquer outra expressão do associativismo juvenil.
Contudo, um veto político leva-nos a colocar a seguinte questão: o que é que a JSD tem contra o CNJ? O que é que existe de tão profundo que justifique esta oposição? O que é que leva a Assembleia da República a negar ao CNJ aquilo que, durante tantos anos e com a participação da JSD, se concluiu por consenso? Todos sabemos que o CNJ sempre funcionou na base de uma regra de consenso muito alargado e sempre se considerou, com a anuência da JSD, que era a solução mais adequada.

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Na verdade, os Srs. Deputados não podem, até porque se o fizerem utilizam um argumento que se vira contra vós, vir dizer que o problema do CNJ é devido a falta de representatividade. Se o problema é esse, porque a JSD saiu, então a JSD mantinha-se lá e o CNJ já não tinha falta de representatividade. Esse argumento vira-se, obviamente, contra quem o invoca.
Mas que pretendia a JSD? Que o CNJ, perante os problemas e a política da juventude, fosse cego, surdo e mudo? A JSD pretendia, porventura, que o CNJ não tomasse posições que, de alguma forma, pudessem contrariar concepções políticas de juventude que são defendidas pelo Governo e pela JSD? É evidente que ninguém pode exigir isso ao CNJ. Ninguém pode exigir a qualquer entidade, e muito menos a uma entidade associativa formada por jovens, que abdique dos seus direitos mais elementares e da sua liberdade de expressão e pensamento.

0 Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.

0 Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, agora é que eu vou exibir a cábula a que há pouco se referia o Sr. Deputado Fernando Pereira e, ao contrário do que o Deputado aqui trouxe, ou seja, digamos que uma estratégia do PSD e dos Deputados da JSD em desvalorizar o debate em torno da questão do CNJ, gostava de contribuir positivamente para aquilo que julgo que deve e pode ser o papel do CNJ na sociedade portuguesa.
Julgo que faz sentido este agendamento do Partido Socialista sobre o estatuto jurídico do Conselho Nacional de Juventude por três ordens de razão: em primeiro lugar, porque aponta para a autonomia e responsabilização do movimento associativo juvenil; em segundo lugar, porque é um contributo para a participação e cidadania dos cidadãos, no caso dos mais jovens; em terceiro lugar, porque se trata de uma questão de representação.
Julgo que todos os grupos de interesses procuram hoje transformá-los em algo assumido politicamente, reconhecido pelas estruturas de poder, quer executivo quer legislativo.
Vivemos uma fase de grandes mutações societais em que o indivíduo sente a necessidade - e a isso também é estimulado - de organização para fazer valer os seus interesses e os seus anseios. Inclusive, do lado do poder, já se caracterizou a determinação da vontade política, no quadro das modernas sociedades, como um poder aberto. 0 pluralismo e a diversidade conduzem-nos a aceitar esta tensão criadora entre o poder e a sociedade organizada como tal, em busca do ponto de equilíbrio possível.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se escrevi este texto há alguns anos defendendo aquilo que entendia ser o papel do CNJ e se também assumo algumas das críticas aqui formuladas sobre a necessidade de melhorar o seu funcionamento no sentido da participação do chamado associativismo informal, do associativismo regional, julgo que toda essa vontade de melhorar o funcionamento do CNJ não é suficiente para cortar pela raiz as iniciativas ora apresentadas.
A meu ver, Srs. Deputados do PSD, a questão coloca-se em termos bastante claros: a de saber se o CNJ continuará a viver em resultado da benesse do Governo, portanto de uma vontade conjuntural e em função de o Governo o colocar ou não na sua ordem de prioridades, de apoiar ou não as actividades do CNJ - questão que nada tem que ver com o apoio às viagens e ao intercâmbio internacional, porque
essa é uma obrigação do Estado, consagrada noutro articulado do texto constitucional -, portanto saber se o CNJ viverá na dependência do poder, seja ele qual for, ou se, pelo contrário, terá «pernas para andar» autonomamente.
A iniciativa do PS, podendo ser discutível do ponto de vista técnico, visa dar dignidade ao CNJ em termos de lei, solução, aliás, também adoptada em Espanha, não sendo, pois, uma solução virgem no quadro dos diferentes países europeus. Há aqui uma preocupação de dignificar o carácter de representação de interesses do CNJ entre as diferentes estruturas juvenis, sem com isso diminuir o espaço de intervenção próprio de cada uma das organizações que o compõem, de cada um dos componentes do associativismo, quer de âmbito nacional quer regional, local ou por projecto. Por exemplo, um conjunto de jovens que se organizem para comemorar uma grande iniciativa útil para a valorização do País e dos jovens também deverá ser apoiado e ter esse enquadramento associativo.
É, pois, nessa perspectiva que deve ser entendido o agendamento feito pelo Partido Socialista e não na perspectiva destrutiva e derrotista que aqui nos foi presente pela bancada da maioria.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A problemática fundamental é, pois, a que se coloca sobre o acesso à cultura, à participação por parte dos próprios jovens. E se hoje temos sinais na sociedade portuguesa que levam à necessidade de dar espaço a essa participação, como foram os eventos em torno da PGA, contra as propinas, de solidariedade com Timor, movimentos que só por si representam que há essa sede de participação, a melhor forma de o Estado dar enquadramento institucional a essa participação é valorizar uma plataforma alargada das estruturas organizadas ao nível de juventude. Para isso não vejo que haja outra solução que não seja a de valorizar, do ponto de vista legislativo, o papel do Conselho Nacional de Juventude. É nesse sentido que deve entender-se a iniciativa dos socialistas - e, segundo penso, também a do PCP e não numa perspectiva de partidarização deste debate.
Acerca da intervenção há pouco produzida de que esta era uma «discussão politiqueira», quero dizer-vos que acompanhei as questões do CNJ com algum desprendimento, dado que é exactamente esse tipo de abordagem que quebra e abre um fosso de diálogo entre as organizações partidárias e os jovens que estão lá fora, isto é, entre as organizações partidárias e não partidárias.
Talvez seja por esse espírito que o CNJ ainda não alcançou aquilo que todos dizemos defender, mas que, afinal, a bancada da maioria neste momento recusa dar, ao anunciar o seu voto contrário às iniciativas legislativas ora em discussão.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

0 Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por especificar bem que, ao contrário do que alguns Srs. Deputados aqui pretenderiam dar a entender, não existe qualquer contencioso, nem público nem privado, de espécie política ou outra, entre a JSD e o CNJ.
A JSD participou, desde 1980, na comissão pró-CNJ, através daquele que era então o seu presidente, António

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Lacerda. A partir de 1983 retomou o processo, que entretanto esmoreceu, com um conjunto de outras organizações, então através do Sr. Deputado Carlos Coelho e desde essa altura também por mim próprio, de forma mais irregular no início e mais assídua nos últimos anos. Emprestámos uma grande confiança e um grande empenho pessoal em que o Conselho Nacional de Juventude pudesse constituir-se não apenas como uma plataforma de diálogo e entendimento entre a realidade juvenil associativa mas também como um parceiro social com vitalidade própria.
As discussões internas dentro do CNJ sobre esta questão foram feitas com total liberdade. Muitas das especulações e reflexões à volta deste desejo, que foi sincero, foram feitas por mim próprio, pelo Sr. Deputado Carlos Coelho e por muitos outros membros da JSD, como de outras organizações partidárias de juventude.
Significa isto que a JSD, quando abandonou o CNJ, não o fez de uma forma precipitada, não o fez com qualquer amuo, não o fez senão com algum lamento. Foi uma deliberação tomada em congresso, na qual se deixava bem claro que era desejo da JSD que o CNJ frutificasse e que não nos oporíamos, com amuos, a que o CNJ se desenvolvesse. Não tivemos, desde o tempo em que abandonámos o Conselho Nacional de Juventude, qualquer mau relacionamento ou perda de relacionamento nem com as organizações que dele fazem parte nem com os dirigentes do CNJ. Não é, pois, o Conselho Nacional de Juventude que aqui está em discussão, nem sequer o empenho que a JSD sempre colocou em que esta plataforma frutificasse.
Não existe sequer, ao contrário daquilo que aqui pretenderam atribuir-nos, qualquer arrogância. Se havia um compromisso claro que a JSD assumiu no passado no interior do CNJ é o de que não utilizaria a maioria do PSD para impor um estatuto jurídico ao CNJ. Este foi o grande compromisso que assumimos no seio do CNJ.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

0 Orador: - Afirmámo-lo numa altura em que algumas organizações tomaram a dianteira com excessos de protagonismo, pretendendo trazer à Assembleia, sem antes ter sido submetido a discussão dentro do CNJ, um projecto de estatuto jurídico. Refiro-me, muito concretamente, à Juventude Comunista Portuguesa. Nunca tomámos essas iniciativas e sempre assumimos o compromisso de que nunca utilizaríamos a maioria do PSD para impor um modelo de Conselho Nacional de Juventude. Se esta não fosse uma atitude sincera, não teríamos imprimido todo o empenho em que o que não dependeu desta Assembleia, mas do Governo, fosse tido por crescimento do Conselho Nacional de Juventude no reconhecimento que o Estado e o Governo lhe foram conferindo.
O que, todavia, os Srs. Deputados com certeza não devem pretender é que a JSD venha à Assembleia ser compulsivamente obrigada a votar favoravelmente um disparate.
Os Srs. Deputados não pretendem, com certeza, coagir-nos a votar a existência legal do CNJ - que já existe e que pode constituir-se de livre vontade enquanto entidade jurídica própria, como foi aqui reconhecido -, alegando que as suas organizações não têm possibilidade de o fazer. Se essa é a grande razão que motiva a apresentação dos projectos de lei, então devo dizer-lhes, com toda a sinceridade, tal como o reafirmei ainda hoje à direcção do CNJ, que, de facto, não podem contar connosco.
0 CNJ valerá - espero que com grande sucesso - por aquilo que as organizações e as pessoas que o representam quiserem que seja! A JSD não fechou portas para o futuro nem quer confundir as questões. Com efeito, estaremos sempre ao lado do CNJ enquanto ele valer por isso, mas não nos peçam para vir à Assembleia da República encontrar uma lei que o possa tutelar e, sobretudo, que lhe possa dizer «os senhores não conseguem ter uma existência jurídica por que não querem; pois bem, nós vamos forçá-la!»

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente (José Manuel Maia): - 0 Sr. Deputado António Filipe pediu a palavra para que efeito?

0 Sr. António Filipe (PCP): - Para pedir esclarecimentos, Sr. Presidente. Mas receio que o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho não disponha de tempo para responder...

0 Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Não receie, Sr. Deputado, porque realmente não tem!

0 Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, creio que para formular o pedido de eesclarecimento não usarei tod

o tempo de que disponho, pelo que poderei ceder o restante ao Sr. Deputado, se entender responder.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, creio que deve ficar claro o seguinte: o Sr. Deputado disse que o PSD nunca utilizaria a maioria de que dispõe na Assembleia da República para impor um modelo ao CNJ. Ora, pela nossa parte nunca, em nenhum outro momento nem agora, nos propusemos fazer isso.
Como tive oportunidade de esclarecer na minha intervenção, o projecto de lei que aqui apresentámos em 1990, e que agora retomámos, baseou-se num anteprojecto que foi submetido previamente a discussão no âmbito do Conselho Nacional de Juventude - nessa altura a JSD ainda o integrava. Portanto, eventualmente, alguns dos Srs. Deputados ainda se lembram desse processo e, por isso, sabem que foi um projecto bastante discutido no âmbito do CNJ e que reuniu até algum consenso.

0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não o nosso!

0 Orador: - Ora, é evidente que não poderíamos, dada a minoria de que dispomos na Assembleia da República, impor coisa nenhuma neste órgão de soberania. Podemos, quanto muito, propor, e há, obviamente, uma maioria que decide. Assim, aceitando essa regra - e dado o consenso que existiu sobre esta matéria -, pensámos que fosse possível, através da apresentação de uma proposta, aliás já discutida no CNJ, que os grupos parlamentares se entendessem e chegassem a um consenso sobre o projecto de lei. É claro que não impomos nada que não esteja já previsto a nível do estatuto do CNJ ou das suas bases gerais.
Portanto, o que o projecto de lei n.º 187/VI propõe, para além do reconhecimento da personalidade jurídica do CNJ, é reconhecer, sob forma legal, aspectos essenciais que já constam dos actuais estatutos do Conselho Nacional de

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Juventude. Não é, pois, verdadeira a ideia de que pretendíamos tutelar ou impor qualquer modelo ao CNJ.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Tem a palavra para responder, se assim o desejar, o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, agradeço a questão que colocou, mas sobretudo a possibilidade que me dá de utilizar o seu tempo para responder.
De facto, durante muito tempo discutiu-se internamente, no CNJ, a possibilidade de haver um estatuto jurídico. Nessa altura várias organizações, nomeadamente a sua, manifestaram a intenção de apresentar um anteprojecto de criação de estatuto jurídico para o CNJ. Foi justamente durante esse debate, antes ainda de apresentar qualquer proposta, que a JSD assumiu o compromisso de não utilizar a maioria para aparecer na Assembleia da República com um projecto próprio.
Ora, tal deixou subentendido que o CNJ não poderia dar-se ao luxo de ver um estatuto jurídico aprovado ou recusado pela Assembleia da República que não tivesse o seu consenso generalizado.
Quero dizer-lhe, caso não se recorde, que quando a Juventude Comunista apresentou o seu projecto no Conselho Nacional de Juventude, na minha opinião ele teve o parecer negativo da Juventude Social-Democrata. E, portanto, não pense que se trata de uma questão nova ou de uma birra nossa agora neste momento, porque não é.
A contrario, no entanto, aproveito a possibilidade que me deu ao fazer-me esta pergunta para lhe dizer que a Juventude Centrista, depois de ter saído do Conselho Nacional de Juventude, recusando esse estatuto jurídico, veio desafiar publicamente outras organizações, nomeadamente aquelas a que pertencemos, a criarem um conselho nacional de juventude alternativo. Não sei como é que, agora, vai conciliar essa posição com o entendimento que aqui foi expresso pelo CDS, de que é possível que, daqui a algum tempo, apareça um novo projecto de lei com um novo estatuto jurídico para outro conselho nacional de juventude?!
Para finalizar, e para responder de forma cabal à sua questão, entendemos que o associativismo juvenil e as organizações de juventude não têm de estar mais reguladas e mais enquadradas legalmente do que já estão, quer pelo Estado quer pelo seu regime jurídico.
Entendemos que no dia em que estas organizações quiserem, por necessidade de afirmação, contrair uma personalidade jurídica, o podem fazer. Se nós estivéssemos dentro do Conselho Nacional de Juventude e o achássemos indispensável, fá-lo-íamos com certeza.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostava de aproveitar esta intervenção final para reafirmar as posições do Partido Socialista e da Juventude Socialista.
O único objectivo que nos levou a apresentar, nesta Câmara, este projecto de lei foi o de fazer justiça a um Conselho Nacional de Juventude - que existe, que trabalha com coisas positivas e negativas - com a atribuição de um estatuto jurídico.
Como as votações, quer do nosso projecto de lei, quer do do Partido Comunista, não vão ser feitas hoje, torno a fazer um apelo ao partido da maioria para que não confunda o funcionamento da instituição com a necessidade de ela ter um estatuto jurídico, e para que estes dias, que inclusivamente coincidem com o fim-de-semana, possam ser dias produtivos de reflexão, para que VV. Ex.as possam alterar a vossa posição e honrar compromissos que todos nós assumimos nos discursos políticos.
O Sr. Deputado António Filipe disse aqui, e muito bem, que, a maior parte das vezes, a juventude anda alheada das formas de participação. Não é só um problema do Conselho Nacional de Juventude, é um problema de todas as organizações, e sobretudo, porque não dizê-lo, das organizações de juventude partidárias.
Seria um bom momento para reflectirmos no sentido de saber porque é que tantos jovens andam afastados dessas formas de participação. Penso que o Estado, o Governo e todos nós que temos responsabilidades não nos devemos demitir dessa avaliação e, sobretudo, de reconhecer quais são as causas e, porventura, necessariamente alterá-las.
Em segundo lugar, em nome da bancada do Partido Socialista, gostávamos de saudar a posição do CDS. Este partido tem uma organização de juventude que saiu do Conselho Nacional de Juventude primeiro do que a Juventude Social-Democrata. Na altura saiu por razões, porventura, menos sustentáveis do que aquelas que a própria Juventude Social-Democrata teve ...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Eles já saíram! Está a falar para a bancada vazia!

O Orador: - No entanto, o CDS e a Juventude Centrista teve a oportunidade de fazer a separação das águas: pode ter uma posição sobre o Conselho Nacional de Juventude, mas isso não impede que ele possa ter um estatuto jurídico.
Terceira e última questão: o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho disse aqui «não nos peçam, não nos obriguem a votar um disparate». Sr. Deputado, não só nunca faríamos isso, como também não estamos na presença de um disparate, ..

Vozes do PSD: - De dois!

O Orador: - ... estamos na presença do reconhecimento de um Conselho Nacional de Juventude.
Nesse sentido, gostava de lhe dizer que não obrigamos ninguém, os senhores é que, infelizmente, com a maioria que têm, obrigam, nesta matéria, a que as organizações que compõem o Conselho Nacional de Juventude fiquem com menos razões para a prática do associativismo.
E tem de ficar claro que quem bloqueia são os senhores!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quem utiliza a força da maioria para evitar a simples atribuição de um estatuto jurídico são os senhores, se não fizerem essa reflexão.

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Mas o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho disse outra coisa mais grave, isto é, disse que é necessário ter uma lei que tutele o Conselho Nacional de Juventude.

O Sr. Carios Coelho (PSD): - Não! Disse o contrário!

O Orador: - Gostava de dizer que da parte dos socialistas não é essa a intenção ao apresentarmos este peojecto de lei.
Por último, Sr Presidente e Srs. Deputados, temos pena que a obtenção do estatuto jurídico do Conselho Nacional de Juventude não passe por esta Assembleia da República. Não será por isso que o Conselho Nacional de Juventude não terá a sua personalidade jurídica. Mas queremos que fique claro que se o PSD e a JSD não alterarem a sua posição, este será mais um caso a somar a tantos outros existentes no passado recente em que coincidem as posições da JSD e do Governo e vice-vera.
Nós entendemos que este é um bom momento para que a JSD descole do poder. Fazemos-lhe este apelo e estamos convencidos que o fim-de-semana, como tempo de pausa, de recuperação e propício a apanhar um pouco de ar fresco, permitirá, com certeza, uma reflexão, pelo que, cremos, na terça-feira votarão a favor da atribuição de estatuto jurídico ao CNJ.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - A solução é sua, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente (José Manuel Maia) - Sr. Deputados, chegámos ao fim do debate, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 139/VI e 187/VI. A votação far-se-á no próximo dia 26.
A próxima sessão terá lugar na próxima terça-feira, com um período de antes da ordem do dia e um período da ordem do dia, para o qual está agendado o inquérito parlamentar n.º 7/VI, da iniciativa do PCP, e as petições n.ºs 92/IV, lO/V, 214/V, 295/V e 312/V.
Sr. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 25 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa à votaçâo do inquérito parlamentar n.º 6/VI (PSD)

A exigência do PSD em criar uma comissão de inquérito parlamentar para inquirir da veracidade da afirmação produzida pela Sr.ª Jornalista Helena Sanches Osório no decurso de uma entrevista na RTP não deixa de suscitar dúvidas.
Dúvidas essas fundamentadas em duas ordens de razões: primeiro, porque o presidente do referido partido e actual Primeiro-Ministro solicitou ao Procurador-Geral da República que abrisse um processo de investigação, o que efectivamente aconteceu. Por esse motivo, não se vê razão para, paralelamente à actuação da Procuradoria-Geral da República, a Assembleia da República desenvolver um novo inquérito.
Por outro lado, a comissão proposta pelo PSD carece de objecto. Não há caso concreto para inquirir e os proponentes tem disso perfeita consciência. Com esta iniciativa, o que o PSD pretende é pressionar a comunicação social, nomeadamente a mais incómoda, que tem proporcionado ao público em geral tomar conhecimento de alguns casos reprováveis promovidos por personalidades com funções de grande responsabilidade, que a nossa democracia tem o dever de rejeitar e de condenar.
Daí o sentido do meu voto.
Acresce ainda o facto de não ser nova a intenção do PSD em rever a Lei de Imprensa, o que origina preocupações à classe jornalística já que uma revisão precipitada e em obediência a intuitos claramente políticos por parte da maioria pode indiciar uma tentativa de se criarem mecanismos repressivos ou censórios inaceitáveis.
A Lei de Imprensa pode e deve ser melhorada mas nunca num sentido antidemocrático.
Contudo, quando o PSD impõe uma comissão de inquérito visando apenas a jornalista Helena Sanches Osório impede, ao mesmo tempo, a criação de idênticas comissões, como aconteceu com a que dizia respeito à investigação parlamentar sobre todo o processo de privatizações. E também o Primeiro-Ministro Cavaco Silva, o Governo em geral e o PSD não se têm preocupado em solicitar à Assembleia da República inquéritos parlamentares para determinar a veracidade de variadíssimos escândalos de corrupção que são regularmente noticiados.
Por esta atitude se verifica que a verdadeira intenção do PSD e do Primeiro-Ministro será, tão-só, a de exercer uma pressão intolerável sobre os jornalistas.
Ao defender a liberdade de informação também sou defensor intransigente de prática de um jornalismo responsável, vivo, preocupado em informar com total respeito pela ética e por valores culturais e humanos que se sobreponham a certas tendências sensacionalistas, negativas, que nada respeitam. Portugal é um dos países com menos leitores de jornais pelo que há toda a necessidade de os produtos jornalísticos não serem de menor qualidade ou manipuladores da opinião pública.
E muito grave será que o poder político tente impedir que jornalistas responsáveis possam exercer o seu direito constitucional de informar com rigor, isenção e independência.

O Deputado independente, João Corregedor da Fonseca.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Parido Social-Democrata (PSD):

António José Caeiro da Mota Veiga.
António Maria Pereira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
João Manuel dos Santos Henriques.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Manuel Nunes Literato.
Luís António Martins.
Manuel Castro de Almeida.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
António Alves Marques Júnior.
António Luís Santos da Costa.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
João Maria de Lemos de Meneses Ferreira.
Luís Filipe Nascimento Madeira.

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Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.

Deputado independente:

Diogo Pinto de Freitas do Amaral.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

José Pereira Lopes.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Pedro Domingos de Sousa e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.

Partido Socialista (PS):

António Poppe Lopes Cardoso.
Edite de Fátima Santos Marreiros Estrela.
João António Gomes Proença.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Mário Manuel Videira Lopes.
Rogério da Conceição Serafim Martins.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBI1CA.

DIÁRIO da Assembleia da República

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