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Sexta-feira, 12 de Março de 1993 I Série - Número 47 1643

DIÁRIO Da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 2.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1992-1993)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 11 DE MARÇO DE 1993

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs. José Mário Lemos Damião
Vítor Manuel Caio Roque
José de Almeida Cesário
Alberto Monteiro de Araújo

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 276/VI e do projecto de deliberação n.º 58/VI.
Foi aprovado o voto n.º 67/VI - De pesar pela morte do escritor Manuel da Fonseca (PCP, PSD e PS), após o que usaram da palavra os Srs. Deputados Miguel Urbano Rodrigues (PCP), Raúl Rêgo (PS), Carlos Lélis (PSD). Isabel Castro (Os Verdes), Mário Tomé (Indep.) e Manuel Sérgio (PSN).
Na abertura do debate da interpelação n.º 8/VI - Sobre política geral, centrada na política educativa do Governo (PCP), intervieram o Sr. Deputado António Filipe e o Sr. Ministro da Educação (Couto dos Santos) e, em seguida, a diverso título, além destes oradores e dos Srs. Secretários de Estado dos Ensinos Básico e Secundário (Manuel Joaquim Azevedo), do Ensino Superior (Pedro Lynce) e dos Recursos Educativos (Bracinha Viieira), os Srs. Deputados José Cesário, Marília Raimundo, Maria Luísa Ferreira e Carlos Coelho (PSD), Manuel Sérgio (PSN), Ana Maria Bettencourt (PS), Isabel Castro (Os Verdes), Maria Julieta Sampaio (PS), Mário Tomé (Indep.), António Braga (PS), Octávio Teixeira (PCP), António Maninho (PS), José Calçada (PCP), Edite Estrela (PS), Apolónia Teixeira (PCP), Fernando Pereira Marques (PS), António Murteira (PCP), António José Seguro e Guilherme Oliveira Martins (PS), Carlos Lélis (PSD), Virgílio Carneiro, Pedro Passos Coelho e Pedro Roseta (PSD), Adriano Moreira (CDS) e Fernando de Sousa (PS).
Encerraram o debate o Sr. Deputado Octávio Teixeira (PCP) e o Sr. Ministro da Educação.
Entretanto, o Sr. Presidente anunciou a aprovação da Declaração sobre Timor Leste apresentada pela presidência dinamarquesa na 49.º Sessão da Comissão dos Direitos Humanos das Nações Unidas.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 40 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Abílio Sousa e Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Ana Paula Matos Barros.
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António do Carmo Branco Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Fernandes Alves.
António Moreira Barbosa de Melo.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Isilda Maria Renda Periquito Pires Martins.
Jaime Gomes Mil-homens.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João Álvaro Poças Santos.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Dias Madeira Gouveia.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel dos Santos Henriques.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Manuel Pereira de Almeida e Silva.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José António Peixoto Lima.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário de Lemos Damião.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís António Martins.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Alberto Bernardes Costa.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Martins Seguro.
António Luís Santos da Costa.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Edite de Fátima Santos Matreiros Estrela.

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Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
João António Gomes Proença.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Barbosa Mota.
José Eduardo Reis.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Paulo Martins Casaca.
José Rodrigues Pereira dos Penedos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Filipe Marques Amado.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Apolónia Maria Alberto Pereira Teixeira.
José Fernando Araújo Calcada.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
Juvenal Alcides da Silva Costa.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

Deputados independentes:

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Mário António Baptista Tomé.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (José Cesário): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 276/VI - Altera a Lei n.º 86/89, de 8 de Setembro (Lei de Reforma do Tribunal de Contas) (PCP) e projecto de deliberação n.º 58/VI - Fixa o elenco e a composição das comissões especializadas permanentes (apresentado pelo Presidente da Assembleia da República).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai ler o voto n.º 67- De pesar pela morte de Manuel da Fonseca, que, entretanto, deu entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (José Cesário): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O voto de pesar, subscrito pelo PCP, PSD e PS, é do seguinte teor: Morreu Manuel da Fonseca. 81 anos de vida, de cidadão, de escritor, de emérito contador de histórias apaixonadas.
Um dos maiores escritores do neo-realismo e da literatura portuguesa do século XX, Manuel da Fonseca deu voz, na sua prosa, na sua poesia, aos deserdados da vida, ao mundo rural das vastas planuras alentejanas, que tanto amava, à cultura e à voz avisada do povo português.
Lutador incansável contra todas as formas de injustiça social, Manuel da Fonseca contribuiu, com a sua pena e a sua acção de democrata indefectível, para a madrugada libertadora de Abril e para a construção do caminho da liberdade e da democracia.
Manuel da Fonseca deixou o mundo dos vivos, mas com os vivos fica para sempre o seu exemplo, a sua juventude, o seu humanismo, as suas estórias, os seus livros, a sua obra de cidadão e escritor.
Nesta hora de luto para a cultura portuguesa e para o País, a Assembleia da República guarda memória e presta homenagem a Manuel da Fonseca e apresenta aos familiares votos de sentidas condolências.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.

O Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há escritores que a crítica e o público colocam durante a vida na história das literaturas; outros há a quem, só depois de mortos, se reconhece o valor da obra.
Manuel da Fonseca foi em vida considerado, com justiça, um dos maiores escritores portugueses deste século, mas o apreço pela sua obra de poeta e novelista vai crescer com o rodar do tempo.
Talvez escritor algum tenha conseguido expressar como ele o Alentejo, com totalidade, a terra, o povo e as suas lutas - e digo-o como alentejano. Ele deu, como grande artista, força de revelação, nos seus livros maravilhosos, ao combate pela terra da gente alentejana e pela dignidade do combate que se prolongou na grande arrancada da reforma agrária e na sua defesa.

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Na despedida ao escritor, ao amigo, ao camarada, o Grupo Parlamentar do PCP envolve na homenagem o homem simples que amou intensamente a vida e lutou com tenacidade exemplar pela sua transformação numa perspectiva humanista e revolucionária na fidelidade a ideais eternos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl Rêgo.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS associa-se ao voto de pesar pela morte de Manuel da Fonseca e lembra o grande escritor neo-realista, autor da Seara de Vento, de Fogo e Cinzas, de Cerro Maior, que é o mais representativo da sua escola e do seu ambiente, que foi contra o conformismo e perseguido sistematicamente pelo ambiente de então.

Aplausos do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lélis.

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Diz-se que quem abrir um livro toca num homem - seja-me permitida a expressão "homem", ainda não corrigida da discriminação da linguagem, também para significar mulher.
Com a morte de Manuel da Fonseca os seus livros ganham outra dimensão - e não é a dimensão editorial a que quero referir-me. O texto para o autor é sempre um texto inacabado, porque este só está concluído quando ele absorve, esgota a ideia que lhe está subjacente na criação.
Nesta circunstância, já que a morte se substituiu à forca da ideia, o texto e o intertexto de Manuel da Fonseca ganham hoje uma forma definitiva. E tanto ele como todos nós sabemos, pelo seu texto escrito, que as palavras escritas ficam. Por isso, a sua obra, nesta forma definitiva, ganha outra dimensão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.º Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Associamo-nos a este voto de pesar por razões bem simples.
Para nós, a perda de Manuel da Fonseca é, em primeiro lugar, a perda de um cidadão toda a vida envolvido na defesa daquilo que considerou ser fundamental, ou seja, a justiça e a Uberdade do seu país.
Associamo-nos também a este voto de pesar porque foi a perda de alguém que foi, sem dúvida, um homem de cultura e que, pela sua extrema ternura, humanidade e simplicidade, é um amigo.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de associar-me a este voto de pesar pela perda de um grande homem, de um grande amigo, do escritor que, parece-me, conseguiu mostrar que não haveria Alentejo sem alentejanos, sem o assalariado rural, sem o homem que lutou durante séculos pela liberdade e pelo pão.
Manuel da Fonseca era um homem que amava profundamente os outros homens e as outras mulheres; amava profundamente a liberdade e definia-se a si próprio como um escritor que não gostava de escrever mas, sim, de viver, de viver com os outros, por isso era um extraordinário contador de histórias que deliciava quem estivesse com ele.
Finalmente, gostaria de lembrar uma frase que lhe ouvi num programa de televisão e que me parece paradigmática para todos nós. Disse ele, respondendo a Carlos Cruz: "Todas as sociedades estabilizadas são sociedades retrógradas."

O Sr. Presidente: - Para uma última declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Sérgio.

O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em Manuel da Fonseca o PSN saúda e lembra o escritor humanista, compreendedor e sentidor das profundas necessidades do nosso tempo, verdadeiro herói da cultura no sentido nobre e exigente desta palavra.
O homem da cultura não é um diletante nem uma enciclopédia deambulatória mas, sim, um homem a quem, primeiro de tudo, nada do que é humano lhe parece alheio.
Ao apontar o exemplo do homem que foi Manuel da Fonseca, o PSN tem a esperança de que, próxima ou remotamente, triunfe o princípio dialéctico da vida e do saber que é precisamente a cultura.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa fará chegar à família de Manuel da Fonseca este voto, associando-se totalmente ao seu sentido.
Manuel da Fonseca preenche um intervalo muito seu, muito próprio, na literatura portuguesa deste nosso tempo. Na verdade, um homem da literatura nunca morre mas, de qualquer forma, o seu desaparecimento físico é uma perda e é solidarizando-se com ela que a Mesa manifesta a sua inteira concordância com a Câmara.
Srs. Deputados, vamos entrar agora no período da ordem do dia de hoje, que, como sabem, é destinado ao debate da interpelação n.º 8/VI - Política geral centrada na política educativa do Governo (PCP).
Para proceder à intervenção de abertura do debate, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A situação da educação é de crise generalizada e todos o reconhecem! A demagogia dos membros do Governo, cada vez mais isolados e desacreditados, já não é capaz de esconder, perante os olhos dos Portugueses, a situação caótica que, a todos os níveis, caracteriza o sistema educativo nacional.
É a rede pública da educação pré-escolar que quase não existe; são as escolas do ensino básico que fecham; é a degradação das instalações dos ensinos básico e secundário; é a falta de ginásios, de equipamentos, de segurança e de pessoal nas escolas; é o desprezo pelo ensino especial; é uma reforma educativa a ser generalizada em condições inacreditáveis; é um sistema de avaliação dos alunos que ameaça vir a ter consequências gravemente perversas; é um sistema de gestão autoritária das escolas que se revela impraticável; é uma política de asfixia e

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descaracterização do ensino superior público; é a alienação de responsabilidades com a acção social escolar; é o escândalo da Lei das Propinas e das manobras para impor a sua aceitação; são as provocações às instituições universitárias; são as ameaças aos estudantes; é a ausência de qualquer diálogo construtivo com os professores; são as tentativas de transferir competências sem transferir meios para as autarquias; é o descontentamento de todos os intervenientes no sistema; 6 a imposição em vez de debate; é a incapacidade dos governantes para compreender o sistema educativo e a sua importância; são os insultos do Ministro da Educação à inteligência de todos o que se preocupam seriamente com a educação em Portugal e se indignam perante o preço que as gerações futuras vão ter de pagar pelas malfeitorias cometidas pelo PSD nos longos 13 anos que já tem de Governo e de responsabilidade exclusiva pela pasta da educação.

Aplausos do PCP e do Deputado independente Mário Tomé.

Os factores de instabilidade e de crise que se multiplicam em todos os graus de ensino são motivo de justificada preocupação para muitas famílias.
Mais do que julgar responsabilidades políticas individuais importa julgar 13 anos de uma política que afunda ministros atrás de ministros em sucessivas declarações de falência. O estado em que cada Ministro da Educação do PSD deixa o sistema quando cessa funções só é superado para pior pelo estado em que o deixa o seu sucessor quando é demitido.
Confrontando com o insucesso da sua política, o PSD baralha ministros e volta a dar, com resultados sempre lamentáveis mas previsíveis se se tiver em consideração que os seus reais objectivos, em matéria educativa, em obediência à sua estratégia neo-liberal têm sido basicamente quatro: primeiro, desvalorizar a escola pública e particularmente o ensino básico, universal e obrigatório; segundo, descapitalizar o ensino público, estrangulando o crescimento dos meios financeiros que o suportam e inculcando a ideia de que "quem quer educação, que a pague"; terceiro, responsabilizar pelo insucesso dos jovens e pelo fracasso do sistema de ensino os professores, os pais, as autarquias, os próprios jovens, todos, menos o Governo; quarto, realizar uma convergência totalmente fictícia do sistema educativo português com os sistemas educativos dos demais países da Comunidade Europeia em termos de "sucesso" na escola e de níveis de escolaridade realizados, fundada em estatísticas falseadas no seu real significado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Isso é falso!

O Orador: - Nestes 13 anos o que tem faltado em medidas estruturais que sirvam de suporte a uma reforma real do sistema, sobra em incoerência, em descoordenação e em discursos demagógicos. À incapacidade de diálogo, de que os governantes têm dado provas, soma-se uma inqualificável ignorância científica e técnica em matéria de educação.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): -Muito bem!

O Orador: - Temos a concepção de que o problema da educação em Portugal é mais de políticas do que de ministros. Não reconhecemos ao actual Ministro da Educação outro papel que não seja o de mero executor de uma política superiormente traçada que se opõe profundamente aos reais interesses nacionais e que, por isso, não hesita em sacrificar o investimento na educação e em pretender impor uma sociedade social e educativamente dividida, entre os que podem pagar o privilégio individual de estudar e os que, não podendo, se vêem remetidos ao insucesso e ao abandono escolar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - No entanto, não podemos deixar de salientar que a actuação do actual Ministro, não sendo politicamente inovadora, destaca-se pela mediocridade.
A recente entrevista publicada no Expresso, em sábado de Carnaval, e as recentes ameaças de que quem não pagar propinas n3o entra na função pública ...

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Isso é só notícia!... Não é verdade!

O Orador: -... tiveram o mérito de tomar todo o País consciente de que se está perante um ministro absolutamente desorientado, que não só não controla o que faz, como já nem sequer controla o que diz.

Vozes do PSD: - Isso não é verdade!

O Orador: - O Ministro da Educação põe todo o País a rir da tristeza das suas afirmações, quando afirma que só viu 20 ou 30 estudantes na rua a contestar a lei das propinas e quando fundamenta o aumento das mesmas no "carácter bíblico" do Programa do Governo, esquecendo o pequeno pormenor de não haver no Programa do Governo qualquer referência a propinas.
Agora, o que não dá vontade de rir, e não pode passar sem uma veemente condenação, é a recente ameaça - inacreditável! - de vedar o acesso à função pública aos estudantes que não pagarem propinas, o que revela da parte do Ministro da Educação um desconhecimento e um desprezo profundo pelas regras do Estado de direito em que vivemos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A aprovação, em 1986, da Lei de Bases do Sistema Educativo abriu uma perspectiva real de recondução da política educativa nacional ao respeito pelos princípios, valores e objectivos democráticos consagrados na Constituição da República.
O pleno reconhecimento pelo Governo, em 1987, dos atrasos gritantes do sistema educativo português em relação aos restantes países da Europa fariam acreditar que o Governo se empenharia em lançar um plano de desenvolvimento da educação em Portugal capaz de superar minimamente tão graves desequilíbrios.
Se alguém teve essa ilusão estará hoje seguramente desiludido! O plano de desenvolvimento do sistema educativo que, nos termos da Lei da Bases, o Governo deveria ter apresentado à Assembleia da República até Outubro de 1988 para lá ficou esquecido nalguma gaveta do Ministério.
Os objectivos constantes do relatório elaborado pelo Governo Português destinado a fundamentar a candidatura portuguesa ao PRODEP ficaram a anos-luz de ser atingidos.

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É legítimo que os Portugueses que continuam a ver os seus filhos sem jardins-de-infância, em instalações escolares sobrelotadas, sem equipamentos e sem instalações desportivas, e a braços com as drásticas limitações ao desenvolvimento do ensino superior público, peçam explicações ao Governo PSD sobre a forma como tem vindo a aplicar as verbas dos fundos comunitários destinadas ao desenvolvimento do sistema educativo português. Esta interpelação é o momento adequado para que o Governo o faça.

Aplausos do PCP.

Em 1993, Portugal continua a ter mais de um milhão de analfabetos literais.

A falta de desenvolvimento da rede pública de educação pré-escolar é um dos maiores escândalos educativos nacionais. Não é concebível que, em 1993, se continue a negar a quase 70 % das crianças portuguesas o acesso à frequência de um jardim-de-infância. Não é aceitável que o Governo vire as costas ao esforço de muitas autarquias na construção e manutenção de jardins-de-infância e não cumpra com as suas obrigações, deixando largas centenas de educadores em situação de desemprego e a maioria das crianças portuguesas sem possibilidades de aceder à educação pré-escolar.
A ausência também de qualquer preocupação da parte do Governo em relação ao ensino especial é um dos aspectos mais desumanos da sua política educativa. As crianças e jovens deficientes não encontram, na sua esmagadora maioria, qualquer resposta às suas necessidades educativas especiais ao nível do ensino público.
O Ministério da Educação não pode continuar a fingir que o ensino especial não lhe diz respeito. O acesso à educação e ao ensino é um direito de todas as crianças e jovens portugueses, sem excepção. O Estado tem a responsabilidade de assegurá-lo e o governo PSD tem a pesada responsabilidade de, deliberadamente, não fazê-lo.
O ensino especial é um sector de ensino que carece de ser particularmente apoiado. O Governo, no entanto, transfere quase exclusivamente as responsabilidades para entidades privadas e para instituições privadas de solidariedade social, ao mesmo tempo que nega os apoios indispensáveis para o seu funcionamento em condições adequadas.
As limitações impostas ao destacamento de professores para o ensino especial, a decisão de restringir os destacamentos para não ter de pagar aos professores destacados e os atrasos frequentes no pagamento de salários a estes professores, criando uma situação de justificado desânimo e de desmobilização, são procedimentos inqualificáveis que aqui repudiamos vivamente.

Aplausos do PCP.

No corrente ano lectivo o Governo decidiu generalizar a reforma curricular nos 2.º, 5.º e 7.º anos de escolaridade básica.
Prevista na Lei de Bases do Sistema Educativo, a reforma curricular deveria constituir um dos eixos fundamentais de democratização e modernização da escola portuguesa. Porém, a sua concretização decorre num quadro, profundamente lamentável, de incoerência e descoordenação, de falta de medidas estruturais que suportem uma reforma real, de falta de diálogo, de abundância de discursos demagógicos, e marcado por uma política de desvalorização e estrangulamento do ensino público.
A área-escola, que constitui o maior desafio proposto pelos novos planos curriculares face a uma tradição muito arreigada de compartimentação dos saberes, está a ser deficientemente concretizada. A sobrelotação dos espaços, a divisão dos tempos, o primado da lógica administrativa sobre a pedagógica na organização das escolas, a deficiente articulação horizontal entre os programas das várias disciplinas e a atrofia dos recursos educativos conduzem a actividades sem grande potencial inovador ou mesmo à ausência de qualquer acção.
Outros aspectos poderiam ainda referir-se criticamente. No entanto, é o novo sistema de avaliação dos alunos do ensino básico a opção mais discutível e de consequências mais profundas e gravosas no cenário da actual reforma curricular.
Ainda neste debate, o meu camarada José Calçada terá oportunidade de referir-se mais detalhadamente ao novo sistema de avaliação e às suas previsíveis consequências. Importa, no entanto, afirmar desde já que, na perspectiva do PCP, não se combate o insucesso escolar decretando administrativamente o sucesso e que o Estado não pode ficar bem com a sua consciência se se limitar a atribuir a muitos jovens portugueses no fim dos nove anos de escolaridade obrigatória não um diploma mas um certificado de frequência que socialmente não é mais do que um certificado de insucesso.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - As expectativas que a maioria dos professores, jovens e famílias alimentaram quanto à possibilidade de um sistema educativo melhor estão hoje profundamente abaladas. A frustração resultante de muitos aspectos desta reforma bloqueia o empenhamento criativo dos professores e dos alunos que é a principal força com que pode contar o progresso educativo.
O modelo de gestão de escolas que o Governo de há uns anos tem vindo a querer impor também pode contribuir em muito para esta frustração. Ao trocar a participação real dos professores, dos alunos, dos pais e da comunidade na direcção, administração e gestão das escolas, por um sistema assente na autoridade incontrolada de um director executivo que tudo pode e manda, com o esvaziamento dos órgãos participativos e democraticamente eleitos, o governo PSD procura transferir para o funcionamento das escolas os conceitos que preconiza para o funcionamento do Estado. A prática do PSD de transformar o aparelho de Estado mim mero prolongamento do seu aparelho partidário, de esvaziar os mecanismos de democracia participativa e de, em nome de uma suposta eficácia, utilizar métodos de gestão autoritária para abafar protestos e ocultar o que vai mal, essa prática tem uma tradução concreta na esfera educativa, que é o novo modelo de gestão das escolas.
Quem conhecer minimamente a situação das escolas preparatórias e secundárias nos principais centros urbanos do nosso país não pode deixar de se indignar com as condições em que estas escolas são obrigadas a funcionar: as 440 novas instalações desportivas prometidas no PRODEP não passam de uma miragem; a sobrelotação das escolas continua a ser um problema generalizado e que não está sequer em vias de resolução. A taxa média nacional de ocupação das escolas secundárias está 16 % acima da sua capacidade. Nos distritos de Lisboa, Porto, Setúbal, Braga e Coimbra, onde reside a maioria da população portugue-

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sa, a taxa média de ocupação das escolas secundárias oscila entre os 120 % e 130%.
Esta situação é ainda agravada por outros factores: a falta de equipamentos educativos básicos, as condições de degradação física e de insegurança de muitas escolas, a inconcebível escassez de pessoal auxiliar de acção educativa e de pessoal administrativo na generalidade das escolas.
Apesar de, ao contrário do que frequentemente afirma o Sr. Ministro, não podermos considerar encerrado o ciclo da quantidade, o problema da qualidade do ensino nas nossas escolas motiva as maiores preocupações. As condições em que a maioria das escolas funciona, as circunstâncias em que está a ser aplicada a reforma, o clima de instabilidade que a política do Ministério está constantemente a provocar no sistema educativo e a ausência de medidas de acção social escolar que compensem seriamente as dificuldades de aprendizagem e de frequência escolar dos alunos provenientes dos estratos sociais mais desfavorecidos, em nada contribuem para dissipar essas preocupações. Nestas condições, a escola portuguesa actual não é uma escola de sucesso, nem garante a igualdade de oportunidades no acesso e êxito escolar que constitui uma exigência unânime e uma necessidade social inquestionável.

Aplausos do PCP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O desenvolvimento do ensino superior é uma questão estratégica para o desenvolvimento nacional. Por toda a Europa se processa um amplo movimento de debate sobre o futuro do ensino superior.
Em Portugal, enquanto os verdadeiros interessados pelo progresso do ensino superior desenvolvem um debate de inegável importância sobre os seus problemas e perspectivas, o governo PSD decreta o aumento das propinas, deturpa o real sentido da autonomia universitária, lança provocações e ameaças sobre as universidades e faz alinhar a polícia de choque como resposta às manifestações dos estudantes contra o aumento das propinas, o que dá a imagem perfeita do conceito de diálogo adoptado pelo actual Ministro da Educação.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Que infeliz!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Caracterizamos como de verdadeira ofensiva contra o ensino superior público a política que o PSD tem prosseguido para o ensino superior.
Como poderíamos caracterizar de outra forma uma política que se tem traduzido na asfixia orçamental dos estabelecimentos de ensino superior público e de alienação das responsabilidades do Estado no seu financiamento?
Como poderíamos caracterizar de outra forma uma política de restrição deliberada do alargamento do ensino superior público, e particularmente do universitário, através de sistemas de numerus clausus, mais ou menos encapotados, que limitam drasticamente as possibilidades e introduzem graves injustiças no acesso ao ensino superior e que consolidam a posição de Portugal como o país mais atrasado da Comunidade Europeia ao nível da capacidade de oferta do ensino superior, mesmo considerando o crescimento anárquico e desprestigiante do ensino superior privado que esta política claramente incentivou?
O Governo bem pode manipular as estatísticas para aumentar a taxa de acesso ao ensino superior, fazendo crer que os objectivos propostos no PRODEP teriam sido atingidos. A verdade é que, mesmo considerando as vagas disponíveis no ensino superior privado, somadas às do ensino superior público, cujo crescimento tem sido diminuto, apenas 17 % dos jovens portugueses têm possibilidades de aceder ao ensino superior, sendo notórias as disparidades regionais nas possibilidades de acesso.
É de verdadeira ofensiva contra o ensino superior que se trata quando o Governo, afrontando claramente a autonomia universitária, impõe unilateralmente as suas regras na gestão financeira das universidades, quando tenta impor o aumento das propinas contra a vontade dos estudantes e dos próprios órgãos das universidades; quando, sem querer saber da opinião das próprias instituições, decide extinguir serviços sociais universitários e transferir esse encargo para as próprias universidades; quando ordena inspecções contra universidades que ousam manifestar a sua discordância em relação às medidas do Governo; quando celebra um pacto demagógico com alguns dirigentes associativos da JSD visando atingir a autonomia universitária e lançar estudantes contra professores; quando lança campanhas de denegrimento de universidades públicas e dos seus responsáveis, visando mal disfarçadamente abrir o caminho para soluções governamentalizadas de gestão das instituições de ensino superior público.
A obstinação do Governo em aumentar as propinas, agravada pelas recentes e absurdas ameaças feitas pelo Ministro da Educação, configuram uma situação particularmente grave.
O PCP manifestou-se desde o início contra o aumento das propinas, por ser uma medida contrária aos interesses nacionais, por se tratar de um primeiro passo no sentido de impor aos estudantes e às suas famílias o pagamento do chamado custo real do ensino e contrariar a progressiva gratuitidade do acesso aos graus mais elevados de ensino, que se encontra constitucionalmente estabelecida. E reafirma a sua solidariedade para com os estudantes do ensino superior e para com os órgãos escolares que, corajosamente, se têm pronunciado contra a Lei das Propinas e afirma a sua disposição para, na Assembleia da República, prosseguir na defesa da sua revogação.

Aplausos do PCP.

Ao nível da ciência e tecnologia, o nosso país atravessa também um período crítico. Todos os indicadores correntemente utilizados apontam para um atraso científico e tecnológico que nos separa largamente dos países e regiões mais desenvolvidos e que tem vindo a acentuar-se agravando os factores de dependência científica e tecnológica de Portugal.
A forma como se tem processado a aplicação do Programa Ciência; o estrangulamento financeiro dos laboratórios públicos e das instituições de ensino superior; a dependência excessiva das unidades de I&D do trabalho sob contrato; o processo de governamentalização e de burocratização centralizadora das decisões - retirando autonomia às instituições públicas no plano da orientação das respectivas áreas de actividade e favorecendo interesses particulares ou de grupo no âmbito das actividades a realizar ou das entidades a apoiar -, o desprezo quase total pelas ciências sociais e humanas ameaçam prolongar o atraso e agravar os efeitos da dependência que afligem a sociedade portuguesa.

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Presentemente, decorrem processos preocupantes, como o da imposta reestruturação do LNBTT e como o da extinção do INIC, que suscita profundas apreensões sobre o futuro da investigação científica no ensino superior.
Sr. Presidente, Sr. Deputados, Srs. Membros do Governo: O sector da educação atravessa uma tempestade. A incapacidade do Governo e da actual equipa ministerial para solucionar qualquer um dos grandes problemas com que a educação se confronta, a prepotência dos métodos que utiliza, o pseudodiálogo feito de arrogância e de imposição unilateral de medidas iníquas, a falta total de consideração por quaisquer ideias que não sejam as suas criaram uma situação que é de conflito aberto entre o Governo e praticamente todos os intervenientes no sector educativo.
No caso dos professores, são inúmeras as razoes de descontentamento. No ano que deveria ser da revisão do Estatuto da Carreira Docente, este continua na sua maior parte por regulamentar. Os deveres dos professores foram regulamentados, os direitos é que não. Foram criados obstáculos artificiais na progressão na carreira, designadamente no acesso ao 8.º escalão, foi roubado tempo de serviço a quase todos os professores na passagem para o novo sistema retributivo em 1989, os professores provisórios são eternamente preteridos na carreira e as condições de trabalho têm vindo permanentemente a piorar.
A manifestação já anunciada para 26 de Março, reunindo todos os sectores intervenientes no sistema educativo na contestação à política do Ministério da Educação, para a qual quero exprimir aqui a inteira solidariedade do PCP, exprime de forma cabal o estado existente no sistema educativo e constitui um reflexo do que temos vindo a afirmar. A política educativa do PSD é um rotundo falhanço e carece urgentemente de ser alterada.

Aplausos do PCP.

Sr. Ministro da Educação, faço a justiça de pensar...

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou terminar dentro em breve, Sr. Presidente.
Faço a justiça de pensar que nem sequer lhe passou pela cabeça nesta interpelação invocar a inevitabilidade da sua política face à inexistência de alternativas apresentadas pelo partido interpelante. O Sr. Ministro sabe que, tratando-se do PCP, esse argumento seria completamente absurdo e improcedente. O Sr. Ministro sabe que não houve praticamente medida alguma legislativa apresentada ou aprovada pelo Governo em matéria de educação que não tenha sido confrontada com iniciativas e propostas alternativas apresentadas pelo PCP.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Bastará lembrar que aguardam a oportunidade de ser debatidos nesta Assembleia projectos de lei do PCP sobre acesso ao ensino superior, visando a supressão do sistema de numerus clausus e a adopção de um sistema de ingresso compatível com a Lei de Bases do Sistema Educativo; um projecto de lei sobre gestão democrática das escolas que claramente se contrapõe ao modelo preconizado pelo Governo; um projecto de lei que alarga o âmbito de aplicação do Estatuto do Trabalhador-Estudante (sector social que o Governo pura e simplesmente ignora); um projecto de lei de revogação da Lei das Propinas; um projecto de lei-quadro da acção social escolar no ensino superior, visando o seu substancial reforço e o seu alargamento aos estudantes do ensino politécnico e do ensino superior privado; um projecto de lei sobre avaliação e acompanhamento do ensino superior, matéria sobre a qual o Governo muito promete mas nada propõe.
No momento em que realizamos esta interpelação, o PCP anuncia ainda a apresentação de dois novos projectos de lei: um sobre a rede pública da educação pré-escolar e outro sobre a criação de melhores condições para que os pais e encarregados de educação possam participar na vida das escolas e acompanhar a situação escolar dos seus filhos e educandos.
A viragem na política educativa do País que o PCP próprio não só é necessária e urgente como é de realização possível.
O PCP defende o rigoroso respeito pelo princípio constitucional da gratuitidade escolar, a valorização do ensino público e a aplicação de discriminações sociais positivas que permitam travar uma selecção escolar realizada cada vez mais com base em critérios de natureza económica e classista, de modo a inverter o sentido das crescentes desigualdades face ao direito a uma educação de qualidade para todos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não é possível vencer o atraso educativo do País sem um funcionamento em boas condições do actual sistema escolar, sem um conjunto de medidas de expansão sectorial e de modernização e de elevação da qualidade do sistema no seu conjunto; não é possível vencer o atraso educativo do País sem um aumento significativo das dotações orçamentais para o ensino público, sem a aplicação de financiamentos comunitários em programas estruturantes e sem que se procurem aproveitar também reservas de eficiência e de capacidade existentes no conjunto do sistema.
O PCP defende uma política que assuma a educação, a ciência e a cultura como vectores estratégicos para o desenvolvimento integrado do nosso país, que assegure um ensino de qualidade para todos os Portugueses e que seja um factor de elevação do nível cultural da população, da formação integral da pessoa humana e da afirmação de uma cidadania plena e criadora numa sociedade democrática.

Aplausos do PCP e do Deputado independente Mário Tomé.

O Sr. Presidente: - Para, em nome do Governo, produzir a intervenção de abertura do debate, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação (Couto dos Santos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há mais de 2000 anos um dos grandes politólogos, Aristóteles, escrevia nas suas Políticas: "A educação actual não deixa de provocar embaraços. Não se sabe se se deve ensinar às crianças as coisas úteis à vida, ou as que tendem para a virtude, ou as altas ciências, sem as quais qualquer pessoa pode passar. Cada uma destas opiniões tem os seus partidários."
Ontem como hoje a educação é um tema tão embaraçante quanto estimulante.

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E é bom recordarmos o pensamento de Aristóteles que tanto influenciou a corrente tomista, serviu Hegel e alimentou as reflexões de Karl Marx sobre o valor de troca, num momento em que, graças ao Partido Comunista Português, temos a oportunidade de debater a política educativa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Um debate sobre a educação é, no entanto, um debate sobre a nossa própria sociedade e sobre a nossa capacidade para respondermos aos múltiplos desafios que a História nos lança.
Nestas condições, um debate sobre a política educativa não se pode limitar a responder a questões de curto prazo nem a orientações genéricas que ignorem a realidade económica e social.
Tendo presente estes pressupostos, e sendo esta Câmara o núcleo central e a expressão viva do pluralismo do nossos sistema político, é importante a abordagem, em espírito de abertura e de diálogo, das grandes questões com que se defronta a sociedade portuguesa, num momento em que temos, coerentemente, que combinar a nossa qualidade educativa com "a dimensão europeia da educação", cada vez mais presente face à necessidade de delimitarmos o que é "ser europeu no início do século XXI", como evidencia um recente e louvável trabalho do Deputado e académico Guilherme Oliveira Martins.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É com este sentimento que o Governo entende esta interpelação.
É com este espírito que o Governo entende este debate político e de ideias com a esperança, sempre viva, de que após esta sessão, o sistema educativo fique mais rico porque mais discutido, mais forte porque mais esclarecido, mais consensual porque mais assumido.
É que melhorar a educação nacional não pode ser uma "missão impossível"!
É, sem dúvida, uma "arte difícil", um trabalho persistente, uma verdadeira aposta neste mundo em mudança incerta, uma prática quotidiana sobre a qual pais, alunos e professores se interrogam constantemente.
Acresce que cada um de nós tem o seu sonho e o seu conceito ideal de educação, mas a realidade do quotidiano é mais complexa. Aí combinam-se movimentos que perturbam a nossa vida interior com as consequências das novas realidades, como as derivadas da generalização da escolarização, da angústia face ao mercado de trabalho, das hesitações e incertezas na constituição de família, dos problemas da droga e da SIDA, do papel da justiça, da alteração dos comportamentos culturais e desportivos face à sociedade de massas, às novas mobilizações que os valores pós-materialistas estão a suscitar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É esta realidade que não podemos ignorar. É uma realidade que toca na essência da educação porque toca na essência da vida.
E uma realidade que nos obriga, a todos, a repensar o sentido e valores da educação, valorizando a sua dupla função: a de aprender a ser e de aprender a saber, por forma a assegurarmos a formação integral do aluno, isto é, daquele ser que não se repete e que, como resulta do sentido etimológico da palavra, temos que ajudar a "conduzir para fora" da infância.
É este o desafio que temos perante nós, desafio que está bem presente na reforma educativa que estamos a construir.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta reforma, cuja execução estamos a concretizar e cujas principais inovações resultam de uma lei de bases aprovada por esta Câmara, não pode ignorar, no entanto, que num contexto internacional caracterizado por uma forte integração das economias e pela aceleração das mutações tecnológicas, a aposta na valorização dos recursos humanos torna-se o elemento fulcral para a criação de um clima propiciador do desenvolvimento económico e social.
A educação é, hoje, uma variável estruturante do desenvolvimento económico e social e, se queremos desenvolvimento com qualidade, precisamos de ter educação de qualidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esta aposta não pode, no entanto, ignorar as significantes alterações que o sistema educativo evidencia, consequência de diversos factores, de entre os quais releva a queda da taxa de natalidade e o aumento generalizado da taxa de escolarização.
Permitam-me que vos evidencie alguns, reportando-me aos últimos seis anos.
O ensino pré-escolar, embora longe do desejável, evoluiu significativamente e cobre cerca de 57 % das crianças entre os 3 e 5 anos, incluindo os estabelecimentos públicos e privados.

O Sr. António Filipe (PCP): - É falso!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Verdadeiro!

O Orador: - O número de alunos matriculados no 1.º ciclo do ensino básico diminuiu 30 % ao mesmo tempo que a taxa de escolarização subiu para 100 %.
O número de alunos matriculados no 2.º ciclo do ensino básico diminuiu 10 % ao mesmo tempo que a taxa de escolarização subiu para 95 %.
O número de alunos matriculados no ensino secundário aumentou 50 % e a taxa de escolarização subiu para cerca de 70 %.
Os alunos matriculados no ensino técnico e profissional aumentaram 600 %, abrangendo cerca de 350 escolas.
O ensino superior cresceu cerca de 250 %, elevando a taxa de escolarização para 28 %.
Por outro lado, as vagas à primeira matrícula no ensino superior atingem hoje cerca de 40 % da população jovem com 18 anos.
O pessoal docente cresceu cerca de 40 % no ensino básico e secundário e cerca de 25 % no ensino superior.
Estes dados são, de per si, suficientemente elucidativos e demonstram o salto qualitativo e quantitativo que alterou, radicalmente, o sistema educativo português nos últimos anos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 1993, o orçamento do Ministério da Educação representa cerca de 14 % da despesa pública e 6 % do PIB a preços de mercado - e se entrarmos em linha de conta com o ensino privado andará próximo dos 7 % do PIB.
Reconheçamos que é um valor significativo e que iguala os gastos com educação dos países europeus mais desenvolvidos.

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O Sr. Carlos Coelho (PSD): - São contas que o Sr. Deputado António Filipe não faz!

O Orador: -Estes dados são, também eles, claramente demonstrativos e evidenciam, inequivocamente, o espectacular crescimento do sistema e o enorme esforço de investimento que o País tem feito.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Embora se reconheça a necessidade de prosseguir o esforço de investimento no sector da educação, importa acompanhar tal processo com um investimento acrescido em capital educativo, científico e cultural.
Um elevado grau de educação permite assimilar melhor e dar resposta mais rápida a qualquer alteração nas correntes da procura de bens e de factores de produção, à introdução de novos processos produtivos ou à correcção de trajectórias que se revelem inadequadas face à evolução do contexto internacional.

Aplausos do PSD.

A educação torna-se, pois, um factor decisivo para as adaptações estruturais requeridas para que a sociedade e a economia portuguesa melhorem, num horizonte de médio prazo, o seu posicionamento e a sua capacidade competitiva face a uma economia internacional caracterizada por elevados graus de competitividade mas, simultaneamente, de turbulência e de incertezas.
Por isso a grande aposta tem de ser no sentido da eficácia e da qualidade sem pôr em causa, necessariamente, alguns aspectos quantitativos em certos subsistemas. Esta tarefa exigiu - e exige - a definição clara dos objectivos estratégicos e a programação rigorosa das metas a atingir.
Nesta perspectiva o Ministério da Educação definiu para os próximos anos os seguintes objectivos estratégicos: o aprofundamento da igualdade de oportunidades; o fomento da qualidade e da eficiência do sistema educativo e o reforço da qualificação dos recursos humanos.
É no desenvolvimento destes objectivos estratégicos que o Ministério da Educação tem em execução um conjunto de medidas fundamentais para o sistema e dos quais vale a pena destacar.
Elaboração, até final de 1993, de um programa para o desenvolvimento da rede de ensino pré-escolar a nível nacional, definindo claramente essa rede e desenvolvendo-a em colaboração com as autarquias e o sector particular e cooperativo, principalmente através da criação de apoios do Estado a conceder por contratos-programa.
Desenvolvimento do ensino particular e cooperativo não superior, com revisão do actual estatuto, melhorando os apoios às famílias já no próximo ano lectivo e integrando, desde já, esses estabelecimentos na rede escolar. Vamos, ainda, criar um programa de profissionalização dos professores deste sector do ensino através do reforço do apoio do Estado.
Concretização da Reforma do Sistema Educativo dando prioridade ao novo modelo de avaliação e ao reordenamento da rede escolar.
Mas a reforma, Srs. Deputados, ao alargar a escolaridade obrigatória para nove anos trouxe, em paralelo com o novo modelo de avaliação, profundas alterações ao quotidiano escolar.
O Ministério da Educação está consciente dessas alterações- físicas e qualitativas, psicológicas e quantitativas - e, por isso, preparou um conjunto de medidas que envolvem incentivos financeiros, técnicos e pedagógicos às escolas para apoio à aplicação do novo sistema de avaliação.
Simultaneamente e para responder a esta nova realidade temos em fase final de preparação um diploma sobre o regime de faltas e um outro sobre o regime disciplinar dos alunos.
Paralelamente decorrem acções de formação abrangendo mais de 60000 professores, ao mesmo tempo que estamos a promover a sua mais rápida profissionalização.
Já no próximo ano lectivo entra em funcionamento o novo ensino secundário, que, associado a uma política de alargamento da taxa de escolarização e ao aumento da oferta de formação tecnológica e profissional, permitirá uma maior diversificação do ensino pós-obrigatório.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O ensino superior, pela sua especificidade e pelos seus problemas, assume, para nós, relevância especial.
Neste sistema de ensino a aposta tem de ser feita, fundamentalmente, na qualidade e eficiência do sistema.
Muito há a fazer neste domínio.
Com efeito, nos últimos cinco anos o acesso ao ensino superior público, em termos de primeira matrícula, cresceu 50 %, enquanto o orçamento cresceu 270 % e os investimentos cresceram 390 %.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Estudos efectuados em algumas universidades mostram que, em média, mais de 50 % dos alunos matriculados não obtêm o diploma no período correspondente à duração normal dos cursos.
Em ordem a promover o sucesso escolar no ensino superior o Ministério da Educação está a avaliar as consequências negativas da elevada carga horária e da ausência de atendimento presencial dos alunos, revendo o sistema das unidades de crédito. Estamos a trabalhar com a Universidade do Porto e o Conselho de Reitores na preparação de um modelo de avaliação das universidades que poderá ser aplicado ainda este ano. Aumentámos os apoios da acção social escolar e esperamos, com o novo diploma, melhorar a eficácia do sistema. Vamos abrir, brevemente, as negociações com os sindicatos para revisão do Estatuto da Carreira Docente Universitária, valorizando e dignificando, ainda mais, a carreira docente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Na linha de rigor e na busca da confiança e estabilidade que o ensino superior exige, estamos a ultimar o modelo de contratos-programa a médio prazo, a outorgar com as universidades e institutos politécnicos.
O ensino superior politécnico vai merecer prioridade absoluta, nomeadamente nas suas componentes tecnológicas. A experiência mostra que ele constitui um dos instrumentos fundamentais para a promoção do desenvolvimento regional e é a forma mais rápida de inserção dos jovens diplomados no mercado de trabalho.
Até final do século, queremos duplicar o número de vagas à primeira matrícula neste sistema de ensino, cobrindo zonas do País até agora não privilegiadas. Assim, será criado o ensino politécnico nos distritos de Aveiro e

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Braga e desenvolvidos, entre outros, os existentes em Viseu, Bragança e Setúbal.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Também as escolas superiores de educação serão objecto de uma redefinição das suas funções educativas, tendo em conta as necessidades de formação inicial de professores e respondendo ao desafio, hoje presente, da sua formação contínua.
O ensino superior particular também nos merece especial atenção, já que a liberdade de ensinar não pode ser encarada como mero exercício do direito a criar estabelecimentos de ensino que ministrem cursos superiores.
O Estado demitir-se-ia das suas funções se permitisse que a liberdade de ensinar fosse entendida apenas como uma actividade lucrativa, despojada de exigências culturais, científicas e pedagógicas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Neste quadro, o Ministério da Educação tem em fase final de preparação as alterações ao Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo, que a recente prática aconselha, tendo presentes as diversas observações que os vários interlocutores do Ministério lhe fizeram chegar.

Aplausos do PSD.

Foi também nesta perspectiva de mudanças e da reforma educativa que se procedeu recentemente à reestruturação dos serviços do Ministério; reestruturação que assenta em dois vectores principais: dar maior operacionalidade e eficácia ao Ministério e racionalizar e valorizar os seus recursos humanos.
Trata-se de uma operação que visa aumentar os quadros técnicos dos serviços em cerca de 70 %, encaminhando-se o pessoal administrativo que não seja necessário aos serviços centrais para as carências existentes ao nível de outros serviços e das próprias escolas.

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Ministro.

O Orador: - No entanto, e porque há quem, à falta de outros argumentos, procure lançar a confusão...

O Sr. José Calçada (PCP): - O Sr. Ministro!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - São os senhores!

O Orador: -... e a instabilidade junto dos professores, convém esclarecer que esta reestruturação nada tem a ver com os professores. Todos eles fazem falta ao sistema, tendo em atenção, aliás, o esforço acrescido que o novo ensino secundário virá introduzir, neste âmbito.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os eixos que definimos, os parâmetros que indicámos, os vectores que enunciámos traçam-vos o diagnóstico actual do nosso sistema educativo e permitem-vos a clara percepção da orientação estratégica do Ministério da Educação. Mas o diagnóstico exige que delimitemos as áreas principais a que temos de prestar atenção: a natureza e a essência dos programas; o tempo consagrado à escola; a qualidade dos professores; e a exigência aos estudantes. Estas áreas dominam, também hoje, o conjunto dos sistemas educativos que se defrontam, como nós, com anseios diferenciados e expectativas acrescidas.
Importa assumir que educar é, acima de tudo, uma passagem de testemunho e uma obra que se realiza na História. É com este sentimento que entendemos a política educativa; é com esta percepção que queremos ser confrontados; é com a íntima convicção de que "o saber é uma riqueza que nunca se esgota", como escrevia esse grande português que foi o Padre António Vieira, que entendemos esta interpelação.
Estamos convictos de que todos sairemos mais ricos, para bem de Portugal, das nossas famílias, das nossas crianças e jovens, dos nossos professores e de cada um dos portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Isso está muito fraco, Sr. Ministro!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, os minutos que os oradores excederam no tempo disponível para o período de abertura serão deduzidos nos tempos de debate quer do PCP quer do Governo.
No entanto, antes de entrarmos no debate, que começa, naturalmente, pelos pedidos de esclarecimento e respectivas respostas, peço ao Sr. Secretário para anunciar as escolas que assistem hoje à reunião plenária.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, assistem hoje à reunião plenária 213 alunos da Escola Primária n.º 2 de Vialonga, no Forte da Casa, 47 alunos da Escola Preparatória do Feijó, 45 alunos da Escola Secundária Cidade Universitária, 50 alunos da Escola Secundária de Vale de Cambra, 65 alunos da Escola Secundária Marques de Castilho, em Águeda, e 30 alunos da Escola Secundária Henrique Medina, em Esposende.

O Sr. Presidente: - Apresento a todos os cumprimentos desta Câmara.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente da Comissão Eventual para Acompanhamento da Situação em Timor Leste, Deputado Adriano Moreira, teve a gentileza de entregar à Mesa o resultado da votação da Declaração sobre Timor Leste, apresentada pela Presidência Dinamarquesa, realizada hoje na 49.º Sessão da Comissão dos Direitos Humanos das Nações Unidas.
Como os Srs. Deputados sabem, trata-se de um texto onde se insiste com as autoridades indonésias para honrarem os seus compromissos e responderem plenamente ao enunciado consensual sobre Timor Leste, proferido no último ano na Comissão dos Direitos Humanos, e que termina da seguinte forma: "A Comunidade e os seus Estados membros apoiam totalmente as iniciativas recentes do Secretário-Geral para conseguir uma solução justa, compreensiva e internacionalmente aceitável da questão de Timor Leste, com pleno respeito pelos legítimos interesses e aspirações dos timorenses do Leste, na linha ou em concordância com os princípios da Carta das Nações Unidas."
Esta Declaração, que foi aprovada ao princípio da tarde, com 22 votos a favor, 12 votos contra e 15 absten-

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coes, é muito importante para nós, portugueses, porque é importante para o povo de Timor Leste.

Aplausos gerais.

Antes de dar a palavra aos Srs. Deputados inscritos para pedir esclarecimentos, quero lembrar que, hoje, vamos aplicar o novo Regimento da Assembleia da República, que regula esta matéria de forma diferente do anterior.
Assim, para o Deputado respondente, estão consagradas duas possibilidades: ou responde pergunta a pergunta, e disporá de três minutos, o que se verifica também em relação à intervenção do Deputado interrogante, ou junta as respostas, não podendo exceder, neste caso, cinco minutos. Esta matéria está clarissimamente fixada no Regimento da Assembleia República, que se aplica boje, pela primeira vez.
Feita esta prevenção geral, devo dizer que vou ser rigoroso no uso dos tempos.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado António Filipe, tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.

O Sr. José Cesário (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, lamento profundamente não poder felicitá-lo pela intervenção que realizou.
V. Ex.ª, na sua ânsia do catastrofismo e do derrotismo, ficou cego e, numa avaliação bem benevolente, devo dizer-lhe que obteve um estrondoso, um concludente chumbo na sua intervenção.

A Sr.ª Ana Maria Bettencourt (PS): - Isso já não existe, Sr. Deputado.

O Orador: - V. Ex.ª foi incapaz de perceber que a educação é, hoje, um processo dinâmico que não se compadece com populismos e demagogias.
V. Ex.ª foi incapaz de entender que a educação, hoje, não se pode resumir apenas ao papel do Estado, ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: -... pelo que trouxe aqui uma visão meramente estatista em relação ao processo educativo e à reforma educativa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Dir-lhe-ia que no momento em que os dinossauros saem do nosso país ainda cá deixam algumas recordações.

Aplausos do PSD.

O Orador: - Sr. Deputado António Filipe, V. Ex.ª proeurou caracterizar o sistema educativo e fazer uma análise do seu estado, mas esqueceu completamente a mudança que nele se operou.

O Sr. José Calçada (PCP): - Para pior!

O Orador: - E talvez seja isso que lhe dói, porque, ao apresentar determinadas críticas, não faz mais do que lamentar as mudanças que entretanto se operaram.

O Sr. José Calçada (PCP): - Para pior!

O Orador: - V. Ex.ª parece desconhecer a abertura que a escola tem hoje para o meio envolvente e a abertura que se procura conquistar, não a limitando apenas às suas paredes, aos seus muros...

O Sr. José Calçada (PCP): - Quando têm!

O Orador: -... e à vida das pessoas que estão dentro dela.
V. Ex.ª parece desconhecer o papel do professor em Portugal, actualmente, com uma carreira profundamente valorizada e virada para o futuro.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado desconhece o significativo aumento dos recursos postos à disposição da educação e da reforma e, fundamentalmente, omite o papel do aluno como centro de todo o sistema educativo. E essa é a questão que está em causa.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Isso é que é grave! O Sr. José Calçada (PCP): - Gravíssimo!

O Orador: - É que V. Ex.ª é incapaz de perceber que o sistema só funciona em função dos alunos e porque existem alunos!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, será possível que V. Ex.ª fale em escolas sobrelotadas e esqueça completamente o intenso esforço de construção, de reparação e de aumento do parque escolar que se verificou nos últimos anos?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo. Tem de concluir.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Será possível que se tenha esquecido da construção de 183 novas escolas e de mais de 5000 novas salas de aula para os ensinos básico e secundário?

Vozes do PSD: - É verdade!

O Orador: - Será possível que se tenha esquecido do esforço de dialogo...

O Sr. José Calcada (PCP): - Vide polícia!

O Orador: -... do Ministério da Educação no sentido do alargamento dos quadros de professores e de uma maior profissionalização dos mesmos?

O Sr. Presidente: - Peco-lhe para concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente, lamentando profundamente o pendor da intervenção do Sr. Deputado António Filipe e dizendo apenas que estamos hoje aqui para discutir real e verdadeiramente as questões educativas e não para nos deixarmos arrastar para a chicana parlamentar, porque ela, com certeza, não será útil nem à reforma, nem à imagem deste Parlamento.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Filipe deseja responder já ou no fim?

O Sr. António Filipe (PCP): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado, dispondo, para o efeito, de três minutos.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, de facto, farei as honras ao novo Regimento da Assembleia da República, respondendo de imediato ao Sr. Deputado José Cesário.
Sr. Deputado José Cesário, depois do que acaba de dizer, se me felicitasse pela minha intervenção, alguma coisa estaria mal. Portanto, fico muito tranquilo por não me ter felicitado.

O Sr. José Calçada (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado disse que lamentei as mudanças que estavam a verificar-se no sistema educativo. No entanto, aquilo que acabei de dizer foi que a reforma curricular era, digamos, imposta pela Lei de Bases do Sistema Educativo e, efectivamente, devia ser feita. Lamentei, isso sim, as precárias condições em que a reforma curricular está a ser aplicada e apontei, podemos dizer, a dedo, as críticas que temos a fazer-lhe, bem como ao actual sistema de avaliação.
Esta matéria ainda vai ser desenvolvida em posteriores intervenções do Grupo Parlamentar do PCP, ...

O Sr. José Cesário (PSD): - Ficamos à espera, Sr. Deputado.

O Orador: -... pelo que espero que os Srs. Deputados do PSD discutam connosco as questões que, em concreto e pertinentemente, colocarmos.
Em todo o caso, Sr. Deputado, há uma coisa que tem de ser dita. É que, apesar da política do Ministério da Educação, nem tudo é mau no sistema educativo. E nem tudo é mau porque temos alunos, professores, pais, encarregados de educação e funcionários não docentes de que nos podemos orgulhar, uma vez que, todos os dias, como quem faz omeletas sem ovos, realizam o verdadeiro milagre de fazer funcionar muitas escolas em condições extremamente deficientes. Por isso, quero prestar-lhes a minha homenagem.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Aplausos da Deputada do PCP Apolónia Teixeira.

O Orador: - Viemos aqui para discutir seriamente os problemas que afectam o actual sistema educativo e ainda esperamos ser correspondidos quer pelo Governo, quer pelo PSD.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Marília Raimundo.

A Sr.ª Marília Raimundo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, revelando uma visão catastrófica e estática do sistema educativo -...

O Sr. José Calçada (PCP): - Já disseram isso!

A Oradora: -... e repito, porque o Sr. Deputado António Filipe reiterou aqui, praticamente, ipsis verbis, aquilo que disse na reunião plenária de 23 de Janeiro de 1992-, V. Ex.ª usou os mesmos argumentos e colocou as mesmas questões. Tudo exactamente igual!
Na verdade, entre as afirmações que fez, disse o Sr. Deputado António Filipe nada de novo, mas, entre outras coisas, afirmou que a forma de aplicar os fundos comunitários no sector educativo, nomeadamente no (PRODEP) Programa de Desenvolvimento Educativo para Portugal é má.
Ora, gostaria de colocar-lhe a seguinte pergunta: entende o Sr. Deputado António Filipe que, no âmbito do PRODEP e do FOCO, o programa de formação contínua de professores, que vem dar sequência à Lei de Bases do Sistema Educativo -que o Sr. Deputado sempre louva-, e ao Estatuto da Carreira Docente, que vai pôr ao serviço da educação, nomeadamente no que respeita à qualidade de ensino e à reforma, verbas consideráveis, que aposta na inovação pedagógica, na regionalização e na autonomia das instituições, que salienta o associativismo e vai dar possibilidade aos professores de apostar na sua carreira, o dinheiro é também mal aplicado? Gostaria que respondesse a esta questão!
Gostava também que o Sr. Deputado me esclarecesse, uma vez que afirma que na educação há sempre uma imposição em vez de um debate (que o senhor louva), como é que justifica o diploma relativo à autonomia, o Decreto-lei n.º 43/89. Como é que há projectos educativos nas escolas? Como é que há, hoje, uma relação, que para nós evidente, entre a escola e a vida, entre a escola e a comunidade, que o Sr. Deputado se nega a ver? E como explica também o Sr. Deputado o sucesso, no desenvolvimento do ensino tecnológico, das escolas profissionais?
Não será isso também a continuação da reforma do sistema educativo, que o Sr. Deputado não quer, teimosamente, vislumbrar no nosso sistema de ensino?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Marília Raimundo, considero lamentável sermos obrigados a apresentar uma visão catastrófica do sistema educativo, mas referimos apenas os problemas de que temos conhecimento. Na minha intervenção, referi questões concretas que a Sr.ª Deputada não pode desmentir.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não é verdade!

O Orador: - É lamentável que os problemas persistam. Já noutras intervenções que tive oportunidade de fazer nesta Câmara referi alguns aspectos, agora novamente realçados, uma vez que, lamentavelmente, os problemas persistem. Ora, enquanto eles persistirem, continuaremos a denunciá-los. Disso podem os Srs. Deputados estar certos!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - De facto, é lamentável que as questões sejam as mesmas, mas se a Sr.ª Deputada consultar os

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cadernos reivindicativos dos professores de vários sectores, que trabalham no Ministério da Educação, verificará também que, desde há muito tempo, os problemas são os mesmos e o Ministério da Educação não dá qualquer resposta às legítimas reivindicações e aspirações desses professores. Portanto, não há que estranhar que as questões se mantenham!
Sr.ª Deputada, ainda bem que menciona o PRODEP, porque tenho aqui o relatório que o Governo elaborou em 1988 para apresentar a candidatura ao PRODEP, onde estabelecia os objectivos a atingir com esse programa.
Na verdade, neste relatório, o Governo estabelecia que, em 1992, designadamente na educação pré-escolar, se atingiria uma taxa de 75 % das crianças portuguesas. Onde é que ela está? Está em 30 %, meta que era atingida no ano passado.
Por outro lado, previa-se a criação de 569 centros escolares do 1.º ciclo e o Sr. Primeiro-Ministro anunciou o encerramento de 1500 e não a criação de 500. Previa-se que em 1992, com a aplicação do PRODEP, todas as escolas do ensino preparatório e secundário teriam instalações desportivas. Onde é que elas estão, Srs. Deputados? Evidentemente que não as vemos! Portanto, ainda bem que a Sr.ª Deputada falou no PRODEP, porque é muito importante lembrar que o Governo não correspondeu minimamente aos compromissos que havia assumido.
Quanto ao ensino tecnológico, o último exemplo que deu, Sr. Deputada, só posso dizer-lhe que é flagrante. Aquilo que também criticamos na reforma educativa é o facto de o ensino tecnológico estar a ser completamente preterido e a maioria dos professores dessa área ter zero horários, dada a subalternização que a actual reforma está a fazer da disciplina. É importante que a Sr.ª Deputada tenha lembrado isso!

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Marília Raimundo (PSD): - Mas não respondeu às minhas perguntas, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Luísa Ferreira.

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, entre as críticas generalizadas e profundamente desadequadas que V. Ex.ª aqui fez à actuação do Governo, incluiu referências à educação pré-escolar e, essencialmente, enfatizou a obrigação, a necessidade e a urgência de, concretamente, alargar a rede pública com a criação de mais lugares de responsabilidade do Estado na rede do Ministério da Educação.
Sem pôr em causa a necessidade do alargamento dessa rede que está ao dispor das crianças portuguesas e à qual o Governo está atento, conforme pudemos constatar pela intervenção do Sr. Ministro, fixar-me-ia na insistência de V. Ex.ª em exigir a intervenção única e directa do Estado na criação desses lugares.
Nem uma só vez V. Ex.ª falou na intervenção da sociedade civil, pelo que pergunto: e a sociedade civil, Sr. Deputado? Qual é o papel que reserva à intervenção da sociedade civil nesta tarefa nacional? Que papel considera o PCP dever caber às entidades vocacionadas para essa tarefa, tendo em conta as escolas onde, para além da finalidade pedagógica, está quase sempre presente uma forte componente social, que é evidente, por exemplo, quando nelas se recebem as crianças em horários condizentes com os horários de trabalho dos pais? Não lhe parece, Sr. Deputado, que o interesse público aconselha o reforço das redes do ensino particular e cooperativo, das redes das instituições de solidariedade social e de outras entidades vocacionadas, com reconhecida capacidade para cumprir os requisitos da qualidade exigidos?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Luísa Ferreira, agradeço as questões que me colocou, pois é importante saber que não põe em causa a necessidade, que reconhecerá, urgente de ser alargada a rede pública da educação pré-escolar, dado que o actual estado de cobertura dessa rede, 30 % incluindo a rede pública e os jardins-de-infância não públicos, é claramente insuficiente. Nesse aspecto, estou de acordo consigo!
Mas é evidente, Sr.ª Deputada, que não estou aqui para interpelar a sociedade civil e apenas terei, quanto muito, de lhe prestar homenagem por suprir, da forma como o vai conseguindo, as graves carências da rede pública a este nível e a falta de uma acção do Ministério da Educação ao nível da rede pública da educação pré-escolar. Na verdade, estamos aqui para interpelar o Governo e penso que concordará comigo de que, embora a rede pública seja fundamental no âmbito da educação pré-escolar, ela é praticamente inexistente, face às necessidades que existem.
Julgo ser importante lembrar - e fá-lo-emos ainda mais ao longo deste debate - que, há já vários anos, o Ministério da Educação vem anunciando a publicação de portarias, com vista à criação de lugares em jardins-de-infância, mas até agora nunca o fez. Para além disso, também não corresponde ao esforço que as autarquias têm feito com a construção de jardins-de-infância, cujo funcionamento vão assegurando exclusivamente com os seus próprios meios.
Sr.ª Deputada, a rede pública é fundamental nesta área e o Governo tem de ser confrontado com as suas responsabilidades. Para evitar a precocidade do insucesso escolar, é fundamental para o normal desenvolvimento educativo que as crianças portuguesas tenham acesso à educação pré-escolar e a universalidade desse acesso só será possível se existir uma rede pública que cubra as necessidades essenciais de toda a população a esse nível e desde que, evidentemente, não se lembrem de pôr as crianças a pagar propinas!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, o meu colega de bancada José Cesário disse que não o iria felicitar e V. Ex.ª ficou muito satisfeito. Deixe-me agora inverter o discurso: quero felicitá-lo, porque considero que com a intervenção que fez o Sr. Deputado António Filipe vai longe no Partido Comunista Português!
Na verdade, trata-se de uma intervenção bem de acordo com a ortodoxia do seu partido e que lhe augura um grande futuro nessa bancada, uma intervenção com os vícios que os meus colegas de bancada já tiveram ocasião de anotar e que, pela sua violência, agressividade e

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inverdade, em muitos dos aspectos que teve ocasião de referir, visa bem o objectivo político do PCP: aproveitar alguma agitação que, neste momento, existe sobre as questões educativas para fazer uma espécie de homicídio político sobre a figura do Ministro da Educação.
Com efeito, VV. Ex.ªs estão a tentar aproveitar-se de uma agitação conjuntural, aliás explicável e muito bem explicada, e que até o Sr. Deputado confessa quando, na sua intervenção, usa a expressão: "A equipa governativa está a atravessar uma tempestade." Esta ideia "conjunturalizada" da crise resulta, aliás, das suas palavras e não da nossa interpretação. Referi, sic, a expressão do Sr. Deputado António Filipe.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado António Filipe, entre as muitas questões que já lhe foram colocadas, gostaria de salientar a que respeita às incorrecções em relação ao desinvestimento do Estado, para afirmar que não é verdade que se esteja a desinvestir. Pelo contrário, está a aumentar-se o investimento. Quando fala em desresponsabilização do Estado não está a ser rigoroso. Desafio-o a dizer qual é o nosso parceiro da Comunidade Europeia que tem uma fada da despesa pública muito superior à nossa destinada ao investimento na educação. Desafio-o a dar um exemplo e um número. Desafio-o a fazer as comparações, que teve ocasião de referir na sua intervenção, com a CEE.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Você é capaz de fazer melhor!

O Orador: - É pouco rigoroso, Sr. Deputado Lino de Carvalho! Os discursos são desmontáveis, quando são pouco rigorosos!
Sr. Deputado António Filipe, falou muito das propinas. Não vou voltar à questão de fundo das propinas, ...

O Sr. José Calçada (PCP): - Não volte!

O Orador: -... pois já dissemos várias vezes que o PCP quer que os ricos tenham o ensino pago pelos pobres, mas gostaria de ler um texto do Governo que diz o seguinte: "A parte dos custos do ensino superior e dos serviços sociais universitários a cargo dos estudantes passará a ser suportada por estes, de acordo com o princípio segundo o qual as propinas a pagar e os beneficícios sociais a atribuir são fixados de modo a ter em conta o estatuto sócio-económico dos estudantes e do seu agregado familiar."
Pergunto-lhe, Sr. Deputado: é contra isto que luta? Pareceu-me ser, ao ouvir a sua intervenção! Mas registo que o texto que acabei de ler consta de um decreto-lei aprovado pelo Governo, em 1975, subscrito pelo Sr. Dr. Avelãs Nunes e assinado pelo, então, Sr. Presidente da República António Costa Gomes.

(O orador reviu.)

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Coelho, não é a minha intervenção que é violenta, o que é violento é a realidade que se vive no sistema educativo. De facto, não é possível caracterizar, de uma forma realista, os problemas do sistema educativo, sem utilizar alguma veemência de linguagem que fique, aliás, aquém da violência da própria realidade.
O Sr. Deputado perguntou-me se havia algum país da Comunidade Europeia que investisse mais na educação.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Que investisse muito mais!...

O Orador: - Eu pensei que fosse ao contrário. Se o Sr. Deputado me perguntar se há algum país que investe menos, eu digo: "Penso que não!"; se me perguntar quais são os que investem mais, eu digo: "Penso que todos!".

Risos do PCP.

Pareceu-me, com a sua pergunta, que estava a comparar a política do actual Governo com as concepções que defende, a nível do sistema educativo, o Sr. Prof. António José Avelãs Nunes, que foi Secretário de Estado do Ensino Superior.
Aquilo que conheço do pensamento e da intervenção do Sr. Prof. Avelãs Nunes, enquanto Secretário de Estado, e do pensamento dele actualmente é que ele tem, de facto, uma concepção profundamente antagónica da que defende o actual Governo sobre a política do ensino superior.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Está aqui escrito! Foi publicado no Diário da Republicai

O Orador: - Evidentemente, quem lançou a instabilidade que se vive actualmente a nível do ensino superior ou quem impôs às instituições do ensino superior as medidas que afectam as perspectivas de futuro, sem sequer as consultar, ...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Está a fugir à questão!

O Orador: - ... quem lançou toda a instabilidade, com a imposição de uma iníqua lei das propinas, não foi o Sr. Prof. António José Avelãs Nunes, enquanto Secretário de Estado, mas, sim, o Sr. Ministro Couto dos Santos, enquanto Ministro da Educação do Governo do Sr. Prof. Cavaco Silva.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Eu dou-lhe uma cópia!

O Sr. Presidente: - Terminaram as inscrições para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado António Filipe.
Neste momento, estão inscritos 14 Srs. Deputados para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Educação.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Sérgio.

O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, em primeiro lugar, julgo que devo denunciar o voluntarismo legislativo do Governo, que se traduz, numa primeira instância, numa violência fiscal, ao obrigar o cidadão, já colectado através do IRS (imposto único criado na presunção de nele se esgotarem as responsabilidades tributárias individuais), a uma duplicação deste mesmo imposto, através das propinas.

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Com as propinas, o Governo viola a Constituição, que preconiza a gratuitidade do ensino a todos os níveis e, ao mesmo tempo, manifesta implicitamente a autoconsciência da insuficiência do regime fiscal, uma vez que tem de socorrer-se da casuística administrativa para conseguir recursos de tesouraria e, eventualmente - quem sabe? -, para colocá-los ao serviço de uma política manipulatória.
Primeira questão, portanto: representam ou não as propinas uma violência fiscal, atendendo ao IRS e até à obrigatoriedade da gratuitidade do ensino, preconizada pela Constituição? É tão-só com aspectos administrativos e financeiros que o Governo prepara a escola do futuro?
Segunda questão: há cuidados especiais na articulação entre a universidade e o ensino politécnico e, afinal, entre todos os níveis de ensino, designadamente no que aos programas diz respeito, já que a cultura é um conjunto unitário e no ensino, em Portugal, há demasiada cultura sem raízes e muitas raízes sem cultura? Aliás, o que mais impressão me faz é que não está presente nos vários programas de ensino em Portugal aquilo que o Foucault já falava da episteme, ou seja, dos a priori culturais, que determinam, que singularizam, uma determinada época. É preciso ter isso em atenção, quando se fazem programas. Ou seja, tanto no ensino preparatório, como no ensino secundário, como no ensino universitário, deve estar presente a episteme do nosso tempo, o que não acontece, porque há descuido quando se estuda, quando se investiga e quando se legisla neste sector.
Ora, isto conduz-nos a uma terceira pergunta.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já passaram os três minutos.

O Orador: - Já acabei?

Risos gerais.

Então, só mais um minutinho, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Só mais meio minuto, Sr. Deputado.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, isto conduz-nos a uma terceira pergunta: como está a processar-se a avaliação da qualidade do ensino superior em Portugal?
Tanto o que nada mude como o que tudo mude constituem verdadeiro obstáculo à acção da reforma necessária e do desenvolvimento possível. São esses grupos que tudo tendo a ganhar e nada tendo a perder ou tudo tendo a perder e nada tendo a ganhar pretendem barrar o caminho ao progresso e à História. De que lado está o Governo? Decididamente, a sensatez não está a ser, como pretendia Descartes, a coisa mais bem repartida deste mundo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estou informado de que o Sr. Ministro da Educação vai responder em dois grupos, pelo que haverá sete intervenções de perguntantes e, depois, uma primeira resposta do Sr. Ministro.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Maria Bettencourt.

A Sr.ª Ana Maria Bettencourt (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Devo dizer que considero que o discurso do Sr. Ministro da Educação foi patético. Acredito nas reformas - aliás, toda a vida me tenho batido por reformas e nunca vi uma pessoa, que propõe ao País uma reforma, estar tão desencantado, isto já sem falar do partido que o sustenta, pois nem sequer se levantaram para aplaudi-lo.

Risos do PS.

Como é que o Sr. Ministro quer convencer este país de uma reforma que não acredita, se nem sequer falou nela?!
Sr. Ministro, exponha-nos o que vai pelo país em matéria de actual reforma. Diga-nos como é que quer avaliá-la

Vozes do PSD: -Já disse!

A Oradora: - O Sr. Ministro nada disse de importante sobre as coisas mais graves. O seu discurso foi uma colecção de números, do qual retiro três preocupações graves.
Primeira: há uma desorientação estratégica. O Sr. Ministro não sabe para onde é que vai.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - O PS é que está desorientado!

A Oradora: - Segunda: falta de meios para combater as desigualdades e prevenir a exclusão do sistema educativo.

Protestos do PSD.

Terceira: a qualidade. Não me parece que se esteja a caminhar para a qualidade.
Referi, em primeiro lugar, a desorientação estratégica, porque não existem planos para recuperar os atrasos nos sectores mais atrasados. O Sr. Ministro não apresentou propostas significativas. O Sr. Ministro sabe muito bem que temos atrasos de décadas, mas o Governo não vê esses atrasos. Pergunto: será preciso uma presidência aberta para se mostrar ao País a miséria ou a penúria das nossas escolas?

Aplausos do PS.

Risos do PSD.

Venha, então, essa presidência aberta, que será bem-vinda!

Protestos do PSD.

Portanto, a minha pergunta é esta: que metas?

Protestos do PSD.

Sr. Ministro, o vosso Governo está a hipotecar o futuro do País.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Estamos num momento muito grave de integração europeia, a competição vai ser feroz e o Governo não está a equipar os jovens portugueses para competir na Europa da livre circulação.
Referi, em segundo lugar, o agravamento das desigualdades, porque não existem projectos significativos, e vou levantar apenas duas questões, porque as outras serão abordadas por outros colegas.
Sr. Ministro, que projectos existem para diminuir as desigualdades na educação a nível das periferias,

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designadamente nas zonas urbanas, ou para melhorar a situação das escolas no mundo rural, que se encontram isoladas, sabendo nós que a dominância na política educativa tem sido o encerramento dessas escolas, o que é gravíssimo na medida em que provoca a desertificação do mundo rural?
Finalmente, referi-me à qualidade. Onde é que estão os meios para atingir a qualidade, nomeadamente para cumprir o diploma de avaliação? E isto já para não falar no ensino superior... Aliás, o Sr. Ministro tem perseguido as escolas em função do ratio professor/aluno e tem provocado uma preocupante destruição de recursos culturais e científicos. Devo dizer que estamos muito preocupados com a vida cultural das escolas e com a perseguição que está a ser feita em termos orçamentais e de ratio.
Sr. Ministro, responda-nos: isto é poupança, cosmética ou tem mesmo meios para melhorar a qualidade? É que se os tem não os disse!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, V. Ex.ª disse, na sua intervenção, quando se tentou situar um pouco ao nível do terreno, portanto, quando começou a falar de coisas concretas, que a educação era uma variável estruturante no desenvolvimento do País.
Uma vez que subscrevo esta opinião, pergunto-lhe como explica que, partindo deste pressuposto, haja efectivas reduções a nível de investimento na educação e que a educação e os recursos naturais, que são os jovens e as universidades, estejam a ser agredidos da forma como são.
Uma outra questão tem a ver com a desigualdade e a perspectiva com que o Governo entende este investimento, naquilo que diz ser o desenvolvimento do País, isto é, a questão das propinas. Se, efectivamente, o ensino é importante enquanto desenvolvimento de um país, não faz sentido que seja entendido numa visão paroquial e familiar que é tão-só um investimento da família. Portanto, é pela via fiscal - parece-me - que a igualdade pode construir-se e não desta forma artificiosa.
O Sr. Ministro também disse que há evolução na rede pré-escolar. Também eu penso que há evolução. De facto, o PSD, no Programa de Governo, falava em melhorar e alargar a rede pré-escolar, o PSD, enquanto Programa do Governo, deixava de falar e, neste momento, estamos numa situação - e isto já foi referido por muitos Deputados - cuja realidade é extremamente grave, pois, perante uma taxa comunitária de cobertura de cerca de 87 %, Portugal tem 30 %, da qual só cerca de 12 % é rede pública.
Portanto, Sr. Ministro, que política educativa para o pré-escolar e para quando, e durante quantos anos mais, a portaria, que há quatro anos espera ser assinada, para a criação de 800 lugares que as autarquias, com grande esforço, criaram do seu investimento, do seu escasso orçamento, portanto numa situação tão grave quanto esta?
Por outro lado, temos ainda a situação dos 200 educadores de infância que se encontram no desemprego.
Uma outra questão refere-se ao ensino especial. Se o Governo não quer gerar apartheid social, se não quer discriminar as famílias que têm filhos deficientes e que não têm condições para pagar a instituições privadas, como é que vai responder a esta questão? Que resposta vai ter em relação ao ensino especial?
Esta questão prende-se com uma outra que tem a ver com os professores que estão, neste momento, na situação de não destacados pelo Ministério e que passaram a estar requisitados. Trata-se de uma situação de desigualdade, uma vez que esses professores de segunda, apesar das promessas feitas aquando dos últimos atrasos salariais, viram os seus salários do passado mês de Janeiro atrasados.
Gostava que me esclarecesse, relativamente ao ensino artístico, que esteve omisso na sua intervenção, como é que ele vai ser articulado com o sistema de ensino em Portugal.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Julieta Sampaio.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, acabadas que foram as citações filosóficas, passemos ao concreto do sistema educativo português.
Omitiu o Sr. Ministro, no seu discurso, três aspectos: a forma como as escolas funcionam, o ensino especial, sobre o qual nem uma palavra foi dita, e o insucesso escolar versus aumento do trabalho infantil.
Quanto ao funcionamento das escolas, dir-lhe-ei, Sr. Ministro, que qualidade do ensino é e tem de ser sinónimo de autonomia financeira nas escolas. Que financiamento foi dado as escolas para o ano lectivo de 1992--1993? Que critérios teve o Ministério para atribuição desses financiamentos? Em termos de financiamentos, as escolas portuguesas estão na cauda dos países da OCDE.
As informações que temos em relação aos orçamentos destinados às escolas são no sentido de que o Ministério da Educação os atribuiu em electrodomésticos. Tenho na minha posse mapas que comprovam tal informação. Não sei se isso aconteceu a pedido das próprias escolas ou se o Sr. Ministro resolveu fazer de Pai Natal antecipado. Não sei mesmo se essas verbas em espécie não passam de algumas centenas de contos que não garantem nem qualidade nem igualdade de oportunidades, nem se porventura foram solicitadas pelas escolas.
No que respeita ao ensino especial, o Sr. Ministro nada disse. A situação que hoje se vive em Portugal, na área do ensino especial, é dramática. Nas salas devolutas pelo primeiro ciclo do básico são diariamente "depositadas", sem qualquer critério, crianças com idades compreendidas entre os 3 e os 15 anos, como se se tratasse de autênticos armazéns. Encontramos, por isso, deficientes profundos misturados com deficientes menos profundos. Não há qualquer professor especializado e os destacamentos não existem. Apenas auxiliares de educação, contratadas a termo, tomam conta dessas crianças.
Como explica o Sr. Ministro que não haja destacamentos de professores especializados, quando na maioria das salas ou, melhor, dos armazéns de depósito dessas crianças não há uma única professora especializada ou, quando a há, existe para 30 ou mais crianças? Como explica a falta de terapeutas ou professores de educação física, imprescindíveis a uma correcta integração dessas crianças? Como explica que, quando esse apoio especial existe, seja prestado apenas semanalmente e a horas a que as crianças já se encontram extremamente cansadas?
Sr. Ministro, o ensino especial é cada vez mais um ensino integrado. Será que o Sr. Ministro deseja que estas crianças sejam os futuros mendigos da segurança social?

Vozes do PS: - Muito bem!

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A Oradora: - Em relação, finalmente, ao trabalho infantil, o Sr. Ministro tem certamente um assessor de imprensa, que, naturalmente, lhe dá conhecimento diário do que se está a passar ao nível do aumento dramático do trabalho infantil. Esse fenómeno só acontece por a escola ser hoje uma escola de insucesso, um escola desmotivadora. Sabe o Sr. Ministro que as crianças estão a trabalhar na área da própria escola? Algum dia o Sr. Ministro informou a Assembleia da República e os sindicatos sobre os abandonos escolares que se verificam, sabendo que essa obrigação consta da lei com carácter de obrigatoriedade? Pelo menos a Comissão de Educação, Ciência e Cultura não tem conhecimento de que o Ministério da Educação tenha prestado essa informação.
Na verdade, Portugal necessita de um ministro da Educação capaz. Mas, infelizmente, o que temos - lamento dizê-lo - é um ministro "rapaz".

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, os pais, os professores, os funcionários e os alunos dizem, unanimemente, que a política de ensino é um desastre, que o Governo estimula yesmen, fiéis apenas a Deus e a Cavaco Silva, à imagem do porta-voz do Conselho de Ministros, e que o Governo não quer cidadãos com uma sólida formação científica, técnica e humanista que, com espírito crítico e ânimo transformador, impeçam a alienação e a hipoteca do País.
Para tanto, usa a demagogia, recusa o diálogo, usa a prepotência, ameaça com a vigilância e a violência e "faz ouvidos de mercador" a sugestões, apelos ou protestos. Nem sequer ouve o Conselho Nacional de Educação, que unanimemente se pronuncia contra as propinas.
As manifestações e protestos dos jovens revelam um profundo mal-estar social. Eles são as primeiras e indefesas vítimas e reflectem-no agudamente, tão agudamente como a picada de uma seringa de heroína. Hoje o jovem não sabe se entra na universidade; entrando, se tem condições objectivas para nela se manter; tendo-as, se lhes dão para aprender; aprendendo, se acaba o curso; acabando, se tem emprego; tendo-o, se corresponde ao curso que tirou; correspondendo ou não, se o emprego está garantido e por quanto tempo; se estiver garantido, com que finalidade e utilidade para um futuro que não seja numa selva mas numa sociedade solidária.
Coloco-lhe, por fim, três perguntas.
A medida, genuinamente salazarista, de proibir o acesso à função pública é efectivamente uma intenção de V. Ex.ª e do Governo ou não passa de um malévolo boato?
Os estudantes, nas suas manifestações, estão a ser sistematicamente filmados pela polícia, outra medida "pidesca". Que pensa o Governo fazer para pôr cobro a esta violação inaceitável do direito de os cidadãos se manifestarem livremente?
São mesmo 20 os estudantes que andam protestando contra a lei das propinas?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, saúdo, antes de mais, o eruditismo do Sr. Ministro da Educação, que hoje aqui nos trouxe um discurso carregado de algumas citações de autores interessantes.
Quero honrá-lo, citando um provérbio, a propósito da situação caótica que se vive na educação: "Quando o corsário promete missa e cera, mal anda o galeão." Ou seja: a educação vai tão mal que hoje o Ministro tem necessidade de prometer o que antes tinha negado.
Honrando também a citação de alguns filósofos, dir-lhe-ei que o mal é tanto e o Ministério está tão mal que essa - aprender a fazer o mal - é a ciência mais difícil. Ninguém pode esquecer que o maior responsável pela desordem, pela intranquilidade e pelo desinvestimento na educação é o Governo a que o Sr. Ministro pertence e o próprio Sr. Ministro. São muitos anos de desnorte, sem que ninguém saiba para onde vai a educação. É o Sr. Ministro capaz de nos dizer qual é a sua política e quais são as referências que moldam a sua actuação e a do governo do Professor Cavaco?
E que somos testemunhas de uma metodologia de acção política errática e casuística, à qual não podemos, evidentemente, ficar indiferentes. Que futuro nos reserva esta política, desenvolvida nestes moldes?
O que está em jogo é muito mais do que a tentadora gestão dos votos, é superior ao desempenho, de duvidosa eficácia política, de voltar uns contra os outros e "fazer o mal e a caramunha". O anúncio que o Sr. Ministro aqui nos veio fazer é um exemplo claro dessa contradição. O Sr. Ministro só dá o que tira, sendo interessante reflectir nisso. Tudo se resume ao "tira" e ao "dá". Tirou ordem e agora vem dizer que a quer dar. Tirou dinheiro e agora diz que vai dá-lo. Anunciou ir tirar os cursos a umas escolas e agora já os dá. Num dia é incendiário e levanta as chamas da revolta; no dia seguinte é bombeiro e aparece a apagá-las. Noutro dia é polícia e manda fechar cursos; logo no dia seguinte é empregado de mesa e serve tudo o que tirou numa bandeja. Num dia ninguém reprova por faltas; no dia seguinte já "chumbam" todos por faltas.
E assustadora a velocidade com que se contradiz, Sr. Ministro. Além disso, tudo o que dá tira, mas não dá nem mais um tostão este ano. Tirou no orçamento da educação para não fazer este ano, porque não coincidia com o ciclo eleitoral mais interessante para Cavaco. Já pensou o Sr. Ministro, por exemplo, em como é possível fazer a reforma educativa sem meios? Que gestão democrática é possível, como mandam a Constituição e a Lei de Bases do Sistema Educativo, sem os meios?
Para além de hipotecar o futuro do sistema educativo, que vale por dizer o futuro dos alunos, desacredita o Estado de direito, pois legisla o que sabe de antemão não poder exigir que se cumpra.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, o Ministério da Educação é talvez, hoje em dia, o ministério mais generalizadamente contestado e criticado a nível nacional e por todos os agentes -professores, pais, alunos. Não há ninguém ligado ao sector da educação que, a nível nacional - não estão em causa questões pontuais ou regionais -, não critique e conteste o Ministério, não só pela política que prossegue na área educativa mas também pela forma de

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actuação e pelas atitudes assumidas pelos responsáveis da educação, designadamente pelo Sr. Ministro.
Essa foi, aliás, uma das razoes fundamentais pelas quais elegemos a política educativa como tema central da presente interpelação, como certamente já terá compreendido. Julgamos que essa revolta generalizada a nível nacional é plenamente justificada. O meu camarada António Filipe teve já oportunidade de referir as razoes substanciais que levam a que haja queixas dos pais, contestação dos professores, repúdio por parte dos estudantes.
A própria política educativa é, na minha opinião, um paradigma de toda a política global do Governo, quer no âmbito da desresponsabilização do Estado em relação às questões sociais, quer no âmbito da orientação negocista que o Governo impõe a toda a sua actividade, designadamente no campo social e concretamente no campo educativo. Para além do mais, o sector da educação é um sector paradigmático de uma situação mais global da responsabilidade do Governo: a crise. O sector do ensino e o sistema de ensino estão em crise. O País também está em crise e a área do ensino é exemplo disso mesmo.
Estou de acordo com duas afirmações do Sr. Ministro. Disse o Sr. Ministro que esperaria que o debate não incidisse sobre questões pontuais ou conjunturais mas, sim, sobre questões de fundo. Disse também que as orientações de fundo são orientações fundamentais, com o que estou de acordo, pois penso ser isso que deve ser discutido.
O Sr. Ministro proferiu uma outra afirmação que igualmente gostaria de coonestar. Disse o Sr. Ministro que muito há a fazer no âmbito da qualidade do ensino superior. A minha única discordância reside no adjectivo: tiraria o "superior", para afirmar que muito há a fazer no âmbito da qualidade do ensino.

Aplausos do PCP.

Essa é, porém, uma questão da responsabilidade do Governo, porque o PSD tem a tutela do Ministério há 13 anos. Ora, o Sr. Ministro não pode dizer que em 13 anos não se consegue fazer nada ou pouco mais do que o que foi feito.
Coloco-lhe, Sr. Ministro, três questões concretas, porque se trata de questões de fundo e não de questões pontuais. É a orientação que está por detrás delas que gostaria de ver explicitada pelo Sr. Ministro.
Quando é que o Governo passa a encarar a educação como um investimento social e não como uma despesa de consumo?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Qual é a orientação de fundo que está na base das recentes afirmações do Sr. Ministro, ao ameaçar os estudantes que não paguem propinas de que não terão empregos na função pública?
Afirma o Sr. Ministro - esta é uma questão central, com a qual terminarei o meu pedido de esclarecimento - que, quando houver discordâncias entre a realidade e o Programa do Governo, quem tem razão é o Programa do Governo. Explique-nos esta afirmação, que corresponde a uma questão de fundo muito importante.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder ao bloco de pedidos de esclarecimento que acabaram de ser formulados, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por responder ao Sr. Deputado Manuel Sérgio, cujas considerações sobre as propinas se centraram na questão fiscal. Respondo ao Sr. Deputado, dizendo-lhe que para o Governo as propinas não são uma questão fiscal.
Quanto à questão da avaliação do ensino superior, o Sr. Deputado terá reparado, certamente - disse-o no meu discurso -, que estamos a trabalhar no sentido de o sistema vir a ser aplicado, provavelmente já este ano.
As questões culturais que o Sr. Deputado abordou constituem certamente uma preocupação na reforma curricular em curso.
Fiquei muito preocupado, Sr.ª Deputada Ana Maria Bettencourt, com a sua capacidade intelectual e os seus conhecimentos sobre educação. Isso deixou-me profundamente preocupado. Há duas razões de demagogia que não são aceitáveis, quando chego a esta Câmara e peço a todos os Srs. Deputados que dêem contributos para se construir e ter o melhor sistema educativo.
Devo dizer que estava à espera de mais e melhor da pane da Sr.ª Deputada. Quando avalia as políticas pelas palmas ou quando tem de recorrer a alguma muleta para justificar as contradições ou a sua voluntariedade política nas críticas ao Governo em termos de oposição, ou seja, quando precisa de alguma muleta para ser oposição, então algo me deixa preocupado, Sr.ª Deputada.
Aplausos do PSD.
Por todo o meu discurso perpassou a ideia - e poderá verificá-la pelas intervenções que os Srs. Secretários de Estado farão e eventuais respostas que possam dar - de que estamos preocupados com as questões com que as escolas se debatem nas áreas suburbanas e rurais. Os Srs. Secretários de Estado poderão explicitar muito melhor e de forma mais exaustiva o que estamos a fazer nessa matéria. A Sr.ª Deputada até sabe o trabalho que estamos a desenvolver, nomeadamente nalgumas escolas com graves problemas, que a Sr.ª Deputada conhece bem, do distrito de Setúbal.
No que respeita as questões colocadas pela Sr.ª Deputada Isabel Castro, diria que está fortemente tocada pela concepção política do sistema educativo que têm os seus parceiros políticos do lado.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - De que lado, Sr. Ministro?

O Orador: -Do seu lado direito, Sr.ª Deputada.
Daí que não haja muito a responder. Há apenas que corrigir que a taxa no ensino pré-escolar - afirmei-o no meu discurso - é, contando com o ensino privado, de 57 %...

O Sr. José Calcada (PCP): - Não disse!

O Orador: - Disse-o no meu discurso. O Sr. Deputado é que não o leu ou não ouviu!

O Sr. José Calçada (PCP): - Pode falar em 57 %, ou até em 60%!

O Orador: - Sr.ª Deputada Maria Julieta Sampaio, começo por agradecer e cumprimentá-la pelo elogio de juventude que me dirigiu.

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Quanto ao funcionamento das escolas-e a Sr.ª Deputada sabe-o - não há atrasos nos pagamentos.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Sr. Ministro, tenho aqui uma lista com todas essas escolas!

O Orador: - Aliás, por várias vezes, pedi-lhe que me dissesse quais são as escolas, que não há, com atrasos nos pagamentos.

Vozes do PS: - Há, sim senhor!

O Orador: - Todavia, há uma questão de fundo em relação ao Partido Socialista que me preocupa: para o Partido Socialista, desde que exista muito dinheiro inscrito, nem que seja para esbanjar, tudo vai bem! Por isso, recordámos ainda o estado a que chegou o País, quando vocês estiveram no Governo há uns oito ou nove anos atrás!

Aplausos do PSD.

Sobre as outras matérias, designadamente na área da educação especial, a Sr.ª Deputada sabe que estamos a trabalhar com dois ministérios e com as próprias instituições para resolver, em definitivo, esta questão. Em todo o caso, os meus Secretários de Estado aprofundarão mais esta questão.
Relativamente ao trabalho infantil, devo dizer, Sr.ª Deputada, que ele se combate, sobretudo, com condições e apego dos alunos à escola. Esta é a razão por que estamos a trabalhar no projecto de reforma e é por isso que o tal despacho foi feito. Os alunos, durante a escolaridade obrigatória, não devem ser excluídos da escola.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Estado tem, pois, de criar condições para que a escola seja o normal prolongamento da família. É isso que estamos a fazer! Nomeadamente, houve algumas críticas - ou por má interpretação ou por não perceberem o alcance - do seu partido em relação a este despacho.

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado Mário Tomé, de facto, desconheço essas violações dos direitos humanos de que falou. Agora, o que lhe garanto é que a minha fé na democracia e no sistema democrático permite-me viver com confiança no futuro, porque os tempos que o Sr. Deputado Mário Tomé conhece, uma vez que esteve nesses meios militares, não voltarão a Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Mas que grande resposta! Responda se a proibição do acesso à função pública é boato ou verdade!

O Orador: - Sr. Deputado, o Ministro da Educação e o Ministério já afirmaram que a única lei em vigor que existe sobre propinas é a que foi votada por esta Casa. É lá que está previsto tudo!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, estão esgotados os cinco minutos.

O Orador: - Qual a política, perguntava o Sr. Deputado António Braga...

Protestos do PS e do PCP.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): que fiz!

• Responda às perguntas

O Orador: - Sr. Deputado António Braga, em primeiro lugar, a sua pergunta mais parecia uma pequena intervenção que estava desfasada, certamente...

Protestos do PS e do PCP.

Não estejam enervados. Então eu é que sou o interpelado e vocês é que estão nervosos?!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, façam favor de guardar silêncio para que o Sr. Ministro possa concluir.

O Orador: - Sr. Deputado António Braga, se ler com atenção o meu discurso, certamente encontrará quais as linhas estratégicas de desenvolvimento da educação. Aí encontrara, desde o ínfimo pormenor, as linhas estratégicas de orientação do Ministério da Educação para os próximos anos.

O Sr. António Braga (PS): - Como é que explica este "sim" e "não"?! Quais são?!

O Orador: - Estão lá, Sr. Deputado. Talvez queira que repita o meu discurso mas, nesse caso, o seu partido terá de pedir uma interpelação sobre educação para que eu possa repetir o que já disse!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, peco-lhe que termine.

Vozes do PS: - Não, não, a lei foi votada pela maioria!

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente. Sr. Deputado Octávio Teixeira, o Partido Comunista, de facto, sonha com a agitação, ...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Vive na agitação!

O Orador: -... e é sintomática a observação feita pelo Sr. Deputado António Filipe a pretensas manifestações. Devo dizer-lhe que este sonho com a agitação não é bom para a instituição democrática nem para o País. O Sr. Deputado sabe-o, como Deputado responsável que é!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os paradigmas da educação são hoje diversos, pelo que aconselhava o Sr. Deputado a reflectir e a debruçar-se sobre eles. Daí resultaria, certamente, alguma mudança de orientação ou, pelo menos, no posicionamento político do Sr. Deputado em relação à sociedade portuguesa.
Sr. Deputado, a educação já é um investimento para o Governo.
Em segundo lugar, quanto à questão do acesso à função pública, já lhe disse que & lei existente é só uma e,

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em relação à questão do Programa do Governo, não faço comentários a comentários de jornalistas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos prosseguir com os pedidos de esclarecimentos.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, na sua intervenção inicial V. Ex.ª falou em espírito de abertura e de diálogo. Ora, V. Ex.ª e o seu Ministério têm manifestado uma total incapacidade em motivar e envolver nas transformações que o sistema educativo deve ter, na reforma, todos os agentes educativos: as crianças e os jovens antes de mais, os trabalhadores da educação, quer sejam auxiliares da acção educativa, administrativos ou professores, mas também os pais e os autarcas.
No caso dos professores, até parece que eles não são essenciais à reforma do sistema. Veja-se, por exemplo, a forma como são tratadas as questões da carreira docente e as respostas que os professores têm dado à frente da sede do Ministério, na Avenida de 5 de Outubro!
Sr. Ministro, vejamos, concretamente, algumas situações: quanto aos números relativos à educação pré-escolar, não há acordo - não pode haver - entre os nossos dados, os dos sindicatos e os do Ministério da Educação. Há, todavia, acordo quanto a um aspecto: "a não existência da educação pré-escolar é factor de insucesso". Neste ponto, estamos todos de acordo!
Há ainda a acrescentar que a generalização do acesso à educação pré-escolar constitui, em nosso entender, também um aspecto de prevenção de exclusão social, Sr. Ministro. Porém, o Ministério da Educação nada faz para aumentar essa rede. Assim, vejamos: em 1992 foram colocados nove educadores de infância no quadro único, após o concurso de Janeiro. E este ano. Sr. Ministro, quantos vão ser colocados?
Por outro lado, abrir concursos sem criar os lugares a preencher é um bluff, é uma fraude, Sr. Ministro!

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ainda no que se refere à educação pré-escolar, consta que há no Ministério da Educação quem pense em encerrar a formação inicial dos educadores de infância. Quer dizer: construíram-se e equiparam-se as ESE, com o contributo financeiro de outros países, escolas essas que têm demonstrado grande qualidade no ensino que ministram.
Assim, a rede pré-escolar é deficiente e a solução é não formar mais professores!... Que tem a dizer sobre isto, Sr. Ministro?

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Li, no Jornal de Notícias do passado dia 8, a seguinte afirmação: "A educação não vai pagar a factura da desertificação humana do interior" - palavras do Sr. Secretário de Estado Joaquim Azevedo.
Ó Sr. Ministro, então V. Ex.ª não acha que a educação é também factor de desenvolvimento? E a solução para as escolas isoladas será, única e exclusivamente, o seu encerramento? De facto, encerrar escolas no interior do
País por critérios unicamente economicistas é também uma forma de exclusão social.

(O orador reviu.) Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calcada (PCP): - Sr. Presidente. Sr. Ministro da Educação, o seu discurso nada trouxe de novo, o que era de esperar. Mas - e isso já era mais inusitado - o que solicitou a esta Câmara foi uma forma de cumplicidade acrílica, que naturalmente é de esperar da parte da bancada do PSD, mas que seria absurdo esperar da parte da totalidade da Assembleia.
O Sr. Ministro limitou-se a repetir à exaustão uma listagem de intenções, que tem vindo a encher o inferno do sistema educativo nacional. Vá lá que o Sr. Ministro nos poupou ao refrão dos contribuintes e, só por isso, lhe estamos gratos, como contribuintes, que também somos, e como membros desta Casa!...
Quanto ao seu optimismo quase genético, sempre fácil de assumir no domínio das intenções futuras e sempre útil como passar de esponja sobre as realidades duras do presente, não sabemos, nem ninguém sabe nesta Câmara - e, sinceramente, tenho muitas dúvidas se o Sr. Ministro realmente o sabe - onde é que se situa a sua fonte. Sr. Ministro, concretamente: o que é que pensa fazer com as crianças que vierem a ser expulsas do 9.º ano com mero certificado de frequência?

O Sr. Ministro da Educação: - "Expulsas"?

O Orador: - Sim, Sr. Ministro, eu disse expulsas! Há muitas formas de assumir a expulsão, evidentemente!
O que é que pensa responder aos pais das crianças que no final do presente ano lectivo decidam, eventualmente, recorrer da avaliação feita aos seus educandos, tendo em conta não questões internas às próprias escolas mas a contínua instabilidade transportada para dentro delas, por forcas das mais contraditórias decisões com origem no próprio Ministério?
Estou a caricaturar, Sr. Ministro? Quer exemplos? Aqui vão: umas vezes há faltas, outras não, depois volta a haver; ora se afixam pautas, ora se deixa a sua publicitação ao critério das escolas e até, Sr. Ministro, se chega a enviar-lhes um fax onde, em instruções adicionais, se assume que "se chegar atrasado às escolas, então é melhor que nem dele tomem conhecimento".
Sr. Ministro - e agora é a minha vez de falar dos contribuintes-, os 12 milhões de contos atirados para contratos de associação com o sector privado, que, aliás, já foi alvo de um requerimento feito ao Governo, se não estou em erro, em princípios de Novembro e do qual, é claro!, ainda não obtive qualquer resposta, esses 12 milhões de contos atirados para contratos de associação, dizia eu, não todos, evidentemente, mas incluindo zonas onde o ensino público possui capacidade de resposta quantitativa e qualitativa e se encontra até escandalosamente subtilizado, onde estão?

O Sr. Presidente: - Peço que conclua, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, na preparação desta nossa interpelação, foi-nos dado contactar com as mais variadas entidades e foi-

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-nos possível apurar um significativo consenso nacional quanto à necessidade de pacificação do sistema educativo e quanto ao facto de o Ministério em nada contribuir para tal. Pergunto: o Sr. Ministro isolou-se do País ou o País
- um ingrato, é claro! - isolou-se do Sr. Ministro?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Para acabar, Sr. Ministro - e isto tinha de ser -, a questão das propinas. Aquela coisa - não sei como chamar-lhe - do não acesso à função pública para aqueles que não pagarem as propinas será que quer significar outras duas coisas: primeira, os alunos podem afinal chegar ao fim dos seus cursos sem pagar propinas e depois é que é o problema e, segunda, não estamos perante uma nova versão apriorística da "lei dos disponíveis"? Isto é, o Sr. Ministro das Finanças e seu colega Braga de Macedo despede aqueles que já estão dentro do sistema; o Sr. Ministro nem espera que eles lá entrem!...

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Edite Estrela.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Sr. Presidente. Sr. Ministro da Educação, depois da sua entrada de erudição, esperava que tivesse tido uma saída diferente! Afinal, verificámos que o alarido foi de montanha, mas o resultado foi um raquítico rato!
No que diz respeito à política da língua e no que se refere ao Instituto Camões nem sequer uma pequena palavra. Essa omissão tem, naturalmente, uma leitura, depois da pompa e circunstância que rodeou a sua criação. Significará que já está o Ministro arrependido ou que não acredita nos efeitos do Instituto Camões? Que o Governo não tem uma política da língua já nós o sabíamos, nem a nível interno nem externo!
No que diz respeito ao ensino da língua materna, à sua falta de qualidade, estamos todos elucidados.
No que diz respeito a uma estratégia de promoção e valorização internacional da língua portuguesa, também não vemos que o Governo a tenha, o que é lamentável. Não basta dizer que se tem, é preciso provar que existe.
Relativamente ao Instituto Camões, não basta tê-lo criado, como disse, com pompa e circunstância, é preciso sabermos para que é que vai servir, quais as prioridades, quais as opções, com que critérios e com que recursos.
Por isso, Sr. Ministro, deixo duas perguntas concretas, e espero que me responda.
Primeira: qual o calendário previsível para o arranque dos institutos e centros culturais no estrangeiro, quais as prioridades e em que moldes é que vão funcionar e vão ser criados? É que não basta declarar que está aberto, é preciso dizer também o que significa abrir.
Segunda: o modelo orgânico desses institutos e centros culturais, que são extensões do Instituto Camões, será semelhante ao de outros institutos com delegações no estrangeiro, como, por exemplo, o Instituto do Comércio Externo Português (ICEP)?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Apolónia Teixeira.

A Sr.ª Apolónia Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, como já aqui denunciámos, Portugal é dos países da Comunidade com mais baixa taxa de cobertura de educação pré-escolar, cerca de 70 % das crianças portuguesas não têm acesso a um jardim-de-infância, publico ou privado.
Por sua vez, muitas autarquias locais construíram e equiparam jardins-de-infância que continuam a aguardar a criação de lugares; mais de 800 lugares aguardam, há quatro anos, que V. Ex.ª, Sr. Ministro, publique as respectivas portarias e a abertura dos correspondentes concursos. Enquanto isto, mais de 2000 educadores de infância continuam no desemprego.
Vai ou não, Sr. Ministro, libertar os 800 lugares que mantém bloqueados? É ou não verdade que o Ministério da Educação, ao abrir um concurso sem vagas, tomou público um concurso-fantasma para educadores de infância?
Perante este quadro da situação do ensino pré-escolar, mantém V. Ex.ª a intenção de mandar encerrar 230 jardins-de-infância?
O Sr. Ministro veio a terreiro com a reestruturação do Ministério da Educação - a Lei Orgânica, recentemente aprovada em Conselho de Ministros. Confirma-se a extinção de diversos organismos. De entre estes, destaco, não só pela sua importância mas, sobretudo, pela ligeireza com que estes organismos são extintos no quadro deste diploma, os centros de medicina pedagógica e o Instituto de Apoio Sócio-Educativo, atitude reveladora do profundo desconhecimento das funções e importância destes organismos para a comunidade escolar.
Os centros de medicina pedagógica são um projecto de reconhecido mérito, mesmo a nível internacional, pela sua intervenção pluridisciplinar na escola, ao garantirem as populações escolares de Lisboa, Porto e Coimbra o apoio médico, psico-pedagógico e social especializado. A consumar-se a extinção, V. Ex.ª vai destruir as expectativas das populações atingidas e determinar um nivelamento "por baixo" da intervenção em saúde escolar, quando esta constitui um ponto fundamental da reforma educativa.
Sobre esta extinção foram consultados os técnicos e a comunidade escolar, que, assim, se verá privada deste apoio? Com esta medida, não considera o Sr. Ministro que está a desperdiçar um potencial adquirido pela formação técnico-científica, que permitiu uma prática específica de anos de intervenção directa na escola e na comunidade? Como vai ser assegurado o futuro dos técnicos em função das suas atribuições funcionais e da sua própria carreira?
O Instituto de Apoio Sócio-Educativo integra, entre outros, o apoio sócio-educativo, a acção social complementar e o Departamento da Rede Nacional de Residências. Com este diploma, o Ministério da Educação extingue um organismo com uma importância vital no apoio social aos estudantes, designadamente na alimentação, no alojamento, na prevenção de acidentes e outros apoios complementares.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Mesmo que, eventualmente, algumas áreas sejam distribuídas para outros serviços, como vai V. Ex.ª equacionar a acção sócio-educativa em todas as suas vertentes de apoio social? Qual o destino do Departamento de Acção Social Complementar (ex-Obra Social)- infantários, jardins-de-infância, centros de férias

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para crianças e jovens, actividades de tempos livres e sócio-culturais aos jovens e restantes serviços de apoio aos funcionários do Ministério da Educação? Qual o futuro dos funcionários dos organismos que V. Ex.ª pretende extinguir ou mesmo dos que vai fundir ou racionalizar?
Por último, Sr. Ministro, não será que o verdadeiro objectivo desta reestruturação é, afinal, a diminuição drástica do número de funcionários do seu Ministério, ...

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peço que conclua, pois não pode fazer uma intervenção sob o pretexto de estar a fazer um pedido de esclarecimento.

A Oradora: - Sr. Presidente, vou tentar concluir.

... ao prever uma redução de 45 % no número de lugares no quadro, ou seja, passar dos actuais 5460 lugares para 2966, quando, nos serviços centrais do seu Ministério, continuam fora do quadro centenas de funcionários com vínculo precário?!
Por último, como explica, então, esta incógnita: se vai reduzir a cerca de metade os funcionários do seu Ministério, para onde vão os 2000 trabalhadores da segurança Social, que a Sr.ª Secretária de Estado do Orçamento disse, na semana passada, neste Hemiciclo, ir enviar para o sector da educação?

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - A Sr.ª Secretária de Estado disse isso!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.

O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, o único clássico que vou citar é V. Ex.ª, que disse aqui que um dos seus objectivos estratégicos é o fomento da qualidade. Deve estar, pois, de acordo de que um sistema educativo que menospreze o ensino artística é um sistema truncado e obsoleto, desfasado das exigências da formação integral dos indivíduos na sociedade actual.
A Lei n.º 46/86 já parecia reconhecer tal facto e, nesse mesmo sentido, surgiu o Decreto-Lei n.º 344/90, que remetia para diplomas que deveriam desenvolver e regulamentar as diversas áreas. Desde Outubro de 1991, existem quatro projectos de decreto-lei, que, entretanto, até já foram apreciados pelo Conselho Nacional de Educação. Que é feito deles, Sr. Ministro?
No que concerne ao ensino superior e politécnico nesta área, a leitura do Orçamento do Estado para 1993 é de molde a suscitar legítimas interrogações quanto ao empenhamento do Governo na superação urgente das enormes carências estruturais e docentes e quanto ao esforço que pretende desenvolver na formação de profissionais e de professores especializados.
Num estilo telegráfico, Sr. Ministro, quais são os princípios e os objectivos do Ministério da Educação nesta matéria? Como se articula a política do Ministério da Educação neste domínio com a política prosseguida pela Secretaria de Estado da Cultura? Vai Portugal continuar a estar condenado a importar músicos estrangeiros, se quiser ter orquestras? A depender unicamente de produções estrangeiras para poder oferecer aos Portugueses espectáculos de ópera? A pedir aos artistas e aos criadores carolice, sacrifícios e teimosia, dando-lhes muito pouco em troca? A frustrar a criatividade e o talento das jovens gerações?
Em resumo, Sr. Ministro: vai Portugal continuar, no domínio das artes, a ser um país dependente, menorizado e ultraperiférico, só europeu na retórica e na fanfarronice de um sucesso que só existe na demagogia do Governo?
Sr. Ministro, agradecia que respondesse a estas perguntas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Murteira.

O Sr. António Murteira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, V. Ex., praticamente, não se referiu ao papel do poder local e da futura regionalização em matéria de educação, quando a experiência mostra que, para o êxito de uma reforma democrática do sistema educativo, é preciso contar com a intervenção desses poderes e, sobretudo, perspectivar um relacionamento novo entre eles e o Governo.
Mais de um milhão de analfabetos - creio que 1,1 milhões - constituem um sinal de alerta muito forte, indicando-nos que algo não estará bem.
A relação do Governo com as autarquias não pode continuar a assentar no facto consumado, na omissão e na arbitrariedade.
Medidas avulsas e imposições para com as autarquias, em matéria de educação, não constituem, nem nunca poderão constituir, o método eficaz e democrático, a base certa e sólida, para a indispensável coordenação, cooperação e clara definição de competências e meios entre poder local e o poder central.
Assim, o Grupo Parlamentar do PCP pergunta-lhe:

Pensa o Governo criar, e quando, as regiões administrativas e chamá-las a ter um adequado papel na reforma do sistema educativo?
Pensa o Governo proceder a uma delimitação clara de competências e meios, com um actualizado enquadramento legislativo, entre as autarquias e o Governo?
Acha ou não o Governo que toda a transferência de competências para as autarquias, desde instalações, pessoal, acção social escolar, apoio em material, etc., deve ser previamente negociada e acompanhada pelos respectivos dispositivos legais e regulamentares, dos necessários poderes de gestão e de meios financeiros?
Pensa o Governo que esses meios financeiros devem acrescer ao FEF, em parcela autónoma actualizada anualmente ou tem outra forma?
Pensa o Governo analisar com as autarquias a melhor forma e os meios para a solução do analfabetismo que atinge mais de 1,1 milhões de portugueses?
Finalmente, Sr. Ministro, pensa o Governo analisar com as autarquias a questão do ensino obrigatório, de forma a serem definidas competências e disponibilizados meios que permitam alcançar o objectivo traçado?
Resumindo, Sr. Ministro, está o Governo de acordo com estes seis pontos que o PCP aponta para um novo relacionamento entre ele e o poder local em matéria de política de educação ou que alternativa democrática apresenta? E, se está de acordo, quando pensa iniciar, de forma efectiva, o processo de trabalho conjunto com o poder local?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

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O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, estava inscrito para fazer uma intervenção; no entanto, peço à Mesa que considere sem efeito essa minha inscrição, porque a intervenção do Sr. Ministro da Educação motivou-me a pedir-lhe esclarecimentos.
Sr. Ministro, faço-lhe este pedido de esclarecimento - acredite sinceramente - pelo respeito que lhe tenho como pessoa e não pelo facto de ser, hoje, Ministro da Educação de Portugal.
Acho, sinceramente, que o Ministro da Educação veio aqui apresentar o plano de actividades do seu Ministério, mas mais parecia um ministro das Obras Públicas da área da educação do que, propriamente, um homem visionário, um homem que tem uma ideia sobre o que deve ser a educação para o futuro deste país.
Sinceramente, estamos todos preocupados com a agitação que existe nas escolas portuguesas, particularmente no ensino superior, mas hoje ficámos mais preocupados, porque ficámos sem saber o que é que existe como ideia no Ministério da Educação.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro da Educação segue a linha do seu Primeiro-Ministro. Ele, nesta terça-feira, deu uma conferência de imprensa, onde mostrou o desnorte do Governo...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não apoiado! O Dr. Jorge Sampaio disse o contrário!

O Orador: -... e V. Ex.ª, nesta Assembleia da República, acompanhado pela batuta da bancada do PSD, apenas veio demonstrar que não há política de educação em Portugal. Nós compreendemos essa atitude!
Mas há um mérito que V. Ex.ª tem, que é o de disfarçar - e bem! - o fardo e o sacrifício que é ter de aceitar o pedido do seu amigo Professor Cavaco Silva para continuar a ser Ministro da Educação.
Que saudades eu tenho, Sr. Ministro, do tempo em que V. Ex.ª era Secretário de Estado da Juventude! Que saudades eu lenho da sua coragem e da sua frontalidade de assumir a política como risco!
O Sr. Ministro da Educação veio aqui apenas tentar "tapar o sol com a peneira", pois às propinas disse "nada".

A Sr.ª Ana Maria Bettecourt (PS): - Muito bem!

O Orador: - É incrível que, pela primeira vez, no ensino superior em Portugal V. Ex.ª tenha todos contra si. Está sozinho com o Primeiro-Ministro, com o PSD, com alguns membros do Governo e com a JSD.

Aplausos do PS.

Não tem mais ninguém consigo! O próprio Conselho Nacional da Educação, que foi criado através de uma lei desta Assembleia da República, lhe recomendou por unanimidade - por unanimidade, Sr. Ministro! - que não aplicasse a Lei das Propinas este ano, mas o senhor está mais interessado em continuar com a sua teimosia do que, propriamente, em que regresse às universidades portuguesas a paz que tem de existir, para que os estudantes possam aprender e os professores ensinar.
Gostava de lhe perguntar duas ou trás coisas muito concretas, mas peco-lhe que não fuja a responder-lhe. Prefiro que não me responda, mas não fuja!
É verdade que existe algum diploma que vá impedir o acesso à função pública dos estudantes que não paguem propinas? Se há, diga qual é e, se não há, desafio-o, em nome do Grupo Parlamentar do PS, a elaborar esse diploma.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo, agradeço-lhe que acabe.

O Orador: - Sr. Presidente, pedia-lhe a mesma tolerância que deu ao Sr. Ministro da Educação nas respostas aos restantes Deputados.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não posso fazê-lo. Aliás, peço desculpa à Câmara se me excedi, mas a tolerância de tempo não foi dada apenas ao Sr. Ministro da Educação, foi também dada ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, tendo sido resultado de várias distracções.
Gostaria, pois, que o Sr. Deputado cumprisse os três minutos.

O Orador: - Sr. Presidente, agradeço a sua tolerância para fazer apenas mais duas perguntas ao Sr. Ministro da Educação.
Sr. Ministro, gostaria de obter resposta às perguntas que lhe vou colocar, porque não basta andar a chantagear os estudantes portugueses. É preciso, concretamente, que se dialogue, que se fale com eles.

A Sr.ª Ana Maria Bettencourt (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro prometeu aqui várias vezes - e o mesmo aconteceu com o seu antecessor, Diamantino Durão, e outros - que a acção social escolar, em Portugal, devia ser objecto de um grande consenso. Ora, esperávamos que os senhores apresentassem uma iniciativa que pudesse ser considerada como uma proposta de lei de bases da acção social escolar. Entretanto, soubemos pelos jornais que o Sr. Ministro e o seu Governo aprovaram um decreto-lei, de que esta Câmara não tem conhecimento.
Sr. Ministro, as duas perguntas que lhe coloco são as seguintes: o que vai fazer quanto à Lei das Propinas? O que vai fazer em relação à iniciativa sobre a acção social escolar?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação. Para tal dispõe de cinco minutos.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, tentarei ser breve, sendo algumas respostas dadas pelos Secretários de Estado nas intervenções que irão fazer a seguir.
Sr. Deputado António Martinho, o diálogo sempre existiu, continuará a existir e existirá no Ministério da Educação.
Quanto ao encerramento de escolas, desconheço-o. Nunca encerrámos escola alguma por razões economicistas. Nunca! Essa decisão é sempre tomada em diálogo com as próprias autarquias. Dou, assim, resposta à questão que foi colocada acerca do diálogo com as autarquias.
Sr. Deputado José Calçada, relativamente aos inquéritos, o Ministério da Educação tem procurado responder-

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lhes. A nossa média de resposta é de cerca de 60 dias e a media de resposta global é de cerca de 65 %. Vamos procurar melhorar o nosso objectivo de informar esta Câmara.
Em resposta à questão sobre o ensino pré-escolar, convido-o a consultar a lista de inscrição das crianças no GEP do Ministério da Educação.
Diz o Sr. Deputado que não há nada de novo para si. Certamente! A concepção de Estado que o Sr. Deputado José Calçada tem é completamente diferente. Decerto que a forma como o Deputado vê o sistema educativo e a intervenção do Estado é diferente. O que esperava de novo? Aliás, isso traduz uma certa desorientação política nas suas concepções de Estado, que em nenhuma parte do mundo se verificam. Certamente, gostaria de ter uma pequena ilha, aqui, nem que fosse uma câmara, uma região, onde pudesse testar esse modelo.

Risos do PCP.

A sua aversão ao ensino particular e cooperativo já a tinha notado noutros tempos. O Governo respeita esse ensino...

O Sr. José Calçada (PCP): - Como se vê!

O Orador: -... e reafirma aqui mais uma vez: vai continuar a apoiar o ensino particular e cooperativo como uma das formas do direito de ensinar no sistema educativo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à questão sobre o sistema de avaliação e expulsão, um dos Srs. Secretários de Estado aqui presentes irá esclarecê-la, porque creio que há muita confusão na cabeça do Sr. Deputado que não deveria existir.

O Sr. José Calcada (PCP): - Isso há! Há muita confusão!

O Orador: - Surpreende-me que um homem da educação tenha essa confusão.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Ministro, só me faço eco do País!

O Orador: - Não o estava a querer descurar, mas penso que o Sr. Deputado estava a sonhar, talvez.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É um sonhador!

O Sr. José Calçada (PCP): - Esperemos que não!

O Orador: - Quanto à questão do acesso à função pública, creio que foi empregue a técnica de que uma mentira dita tantas vezes há-de passar a ser uma verdade. E o Sr. Deputado vem novamente com isso por causa do acesso à função pública. Mas quando responder ao Sr. Deputado António José Seguro referir-me-ei de uma forma mais clara a essa questão.
Sr.ª Deputada Edite Estrela, não me debrucei muito sobre o Instituto Camões porque funciona bem e está a responder à política da língua para o País. E bem!
A Sr.ª Deputada colocou-me também uma questão relativa aos centros. Terei todo o gosto em mandar-lhe rapidamente o programa aprovado, onde está listado o conjunto de centros, onde e quando os pretendemos abrir. Relativamente ao estatuto desses centros, como sabe, decorre da própria lei que será um estatuto de verdadeira autonomia administrativa, financeira e de intervenção. É essa a nossa perspectiva acerca dos centros Camões a abrir por esse mundo fora.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A Sr.ª Deputada Apolónia Teixeira levantou a questão dos jardins-de-infância que aguardam a criação de 800 lugares. A resposta consta do meu discurso. É necessário definir, a nível nacional, para o ensino pré-escolar, uma política global, que deve ser assumida de uma vez por todas. Não havia, até hoje, uma vertente clara que definisse essa política. É isso que estamos a fazer e é aí que se inserem os 800 lugares de que falou.
Mas ouço, sistematicamente, dizer aqui que o Ministério dispensa recursos ligados ao ensino. Não é verdade! O Ministério reafirma que os recursos na área do ensino, sobretudo professores, de todos os níveis de ensino, são todos necessários ao sistema, e é nesse quadro global que estamos a trabalhar, não só na sua profissionalização como também na sua efectivação. Precisamos de todos os quadros para o sistema. Aliás, isso é uma consequência lógica da reforma.
Em resposta à questão acerca do IASE, dir-lhe-ia que essa é a sua visão centralista do Estado. A acção social escolar, tal como hoje é feita, faz-se através das direcções regionais.

A Sr.ª Apolónia Teixeira (PCP): - E os centros de medicina pedagógica?

O Orador: - Respondo já a uma outra questão que me colocaram sobre a regionalização, da desconcentração e descentralização dos serviços. Estão, neste momento, descentralizadas todas as funções do Ministério da Educação, através das direcções regionais.
Quanto aos centros de medicina pedagógica, Sr.ª Deputada, enquanto nós vemos o País todo V. Ex.ª vê apenas os concelhos de Lisboa, Porto e Coimbra. Nós vemos o País todo, numa concepção global da política de saúde escolar e não apenas de pequenas áreas da saúde escolar.

A Sr.ª Ana Maria Bettencourt (PS): - Não se nota!

O Orador: - Sr. Deputado Fernando Pereira Marques, o ensino artístico será abordado pelo Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário. No entanto, recordo-lhe que já uma vez lhe disse que estamos a trabalhar sobre os quatro diplomas que referiu. O grande atraso desses diplomas resultou do facto de terem estado muito tempo em análise no Conselho Nacional de Educação, ...

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, peco-lhe que termine.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
É que tratava-se de quatro diplomas a serem analisados pela primeira vez e, necessariamente, o Conselho Nacional de Educação precisou de tempo para reflectir sobre eles. Agora o Ministério está a recolher todas as sugestões que lhe fizeram chegar para encontrar a solução final.

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Sr. Deputado António Murteira, estamos em diálogo com as autarquias locais no que diz respeito a transferências de competências, pelo que esse é um assunto que está em aberto. Ò diálogo tem sido muito franco e positivo e espero que se mantenha. Pelo nosso lado, estamos cada vez mais receptivos a esse diálogo, queremos fazê-lo e promovê-lo.
Sr. Deputado António José Seguro, penso que desistiu da sua intervenção porque teve, certamente, vergonha de dizer perante os seus colegas de bancada que ficou esclarecido.

Risos do PS.

Já vi que, de educação, Sr. Deputado, não posso esperar muito de si. Mas, com o tempo, talvez quando deixar de ser rapaz e for mais adulto...

Risos do PS.

... possa dar algum contributo em termos de educação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Peço que conclua, Sr. Ministro.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente. O Sr. Deputado estava certamente distraído quando ouviu o meu discurso.

O Sr. António José Seguro (PS): - Coloquei-lhe duas perguntas!

O Orador: - Não ouviu o discurso ou estava distraído, porque, inclusive, quando fala no ensino superior, esquece-se que fomos ao ponto de clarificar a política do Governo para o ensino superior universitário e, politécnico. Essa política, até final do século, ficou aqui claramente explanada. Devia estar distraído.
Em relação ao diploma sobre as propinas, já aqui disse e reafirmo, o único que existe é a Lei n.º 20/92. E esse o único diploma.
A acção social escolar, Sr. Deputado, foi discutida durante seis meses com todas as associações de estudantes, federações académicas, houve reuniões, que duravam quase um dia inteiro, no Ministério de Educação, ...

O Sr. António José Seguro (PS): - E a Comissão de Educação, Ciência e Cultura da Assembleia da República?

O Orador: -... com todas as associações de estudantes do ensino superior, da enfermagem, do politécnico. Todas participaram no elaboração do diploma.

O Sr. António Filipe (PCP): - E agora vamos ter todas a dizer mal dele!

O Orador: - E também o Conselho de Reitores e o Conselho Coordenador dos Politécnicos. Todos estiveram envolvidos na discussão, que foi alargada.

O Sr. Presidente: - Durante as duas intervenções do Sr. Ministro, e a propósito delas, inscreveram-se, para defesa da honra ou da consideração, os Srs. Deputados Ana Maria Bettencourt, Maria Julieta Sampaio, Manuel dos Santos e António José Seguro. Nos termos do novo Regimento, que se aplica hoje pela primeira vez, os Srs. Deputados terão direito a usar da palavra para esse efeito no termo do debate em curso, isto é, no fim da interpelação.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O País está inquieto com a situação da educação em Portugal.
Esta é a realidade. Basta falarmos com os professores, com os alunos, com os pais, com os cidadãos comuns. Falta, efectivamente, uma política educativa - e, se dúvidas houvesse, aí estão as mudanças de discurso, a sucessão de avanços e recuos, a fuga sistemática aos debates importantes, a precipitação da aplicação de determinadas medidas, e tudo isto tendo como pano de fundo uma continuidade perversa: a insensibilidade para a prioridade que tem de ser a educação.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): -Muito bem!

O Orador: - Lembremo-nos aqui da fragilidade da posição do Governo quando se discutiu o Orçamento para 1993 - a educação foi, quer se queira quer não, de algum modo, um parente pobre, sacrificada no altar de uma convergência nominal estreitamente considerada. No entanto, como será possível responder ao desafio da livre circulação de pessoas na Europa sem mais educação? É de uma tarefa nacional que se trata. Uma tarefa nacional que tem de ser levada a cabo - sem demagogias fáceis e com os olhos postos no País e nas suas necessidades de desenvolvimento. Não tenhamos dúvidas: sem uma aposta muito forte na educação, o que exige a mobilização da sociedade e dos agentes educativos, não é possível responder, com rigor e espírito de justiça, aos problemas que nos estão postos numa sociedade em mudança, profundamente condicionada pela abertura ao exterior e pela modernização.

Aplausos do PS.

Torna-se, pois, fundamental encarar a educação como uma peça essencial na estratégia de desenvolvimento e como um factor activo de justiça e igualdade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No entanto, a que se assiste? O sistema educativo, em Portugal, não corrige as injustiças sociais, antes as agrava. Esta é a realidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Basta olharmos para os elementos relativos ao insucesso escolar. Os factores sociais, económicos, regionais e culturais pesam fortemente, e muito mais do que muitas vezes se pretende. Não há igualdade de oportunidades e é na escola que isso se sente com especial acuidade (a começar, como já aqui foi referido, no ensino pré-escolar e no ensino especial). Isto com todas as consequências negativas que são, naturalmente, conhecidas de todos.
Há, pois, um grito de aleita que tem de ser dado, uma vez que, se se mantiver a insensibilidade em relação às

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injustiças e à exclusão no sistema escolar, nos arriscamos a estar a criar um Portugal dividido e vulnerável. E não poderemos ser insensíveis à gravíssima hipoteca das gerações futuras de que a política do Governo é responsável.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Muito bem!

O Orador: - A que se assiste nas nossas escolas? À dúvida, à hesitação, à desmotivação, à desmobilização! Veja-se o caso da aplicação do novo sistema de avaliação- posto em prática sem um período necessário de experiência. Eis um exemplo que merece uma especial reflexão à luz da necessidade de introduzir mecanismos concretos que visem a maior justiça e a igualdade de oportunidades. Faltam meios para as escolas aplicarem o novo sistema de avaliação. Faltam os apoios necessários aos alunos com dificuldades. E o certo é que, em nome da justiça, tais apoios tem de ser dados pelas escolas e não pelas famílias, através de explicações ou outros apoios externos que só, como todos sabem, agravam as desigualdades. Não é sustentável esta situação.

Aplausos do PS.

Faltam meios, faltam apoios (onde estão os professores de apoio que o sistema prevê?), faltam recursos orçamentais para as escolas. E não se invoque o argumento do despesismo. Não se invoque, mais uma vez, este argumento. Na educação há necessidades básicas para satisfazer e o Governo não pode continuar a agir através de uma "política de avestruz". Nem se argumente com os fundos comunitários, pois a experiência do PRODEP suscita-nos fundadas preocupações - a uma concepção correcta sucedeu-se uma aplicação descaracterizadora.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sem meios e apoios, a escola não pode funcionar. A escolaridade obrigatória é posta em causa na sua eficácia, na sua qualidade e na sua justiça - e a reforma do sistema educativo sofre um sério revés. É este o ponto em que nos encontramos! E quanto menos a escola funcionar mais as desigualdades se agravam e sabemos bem como é que os sistemas educativos desresponsabalizadores geram desigualdades e favorecem a marginalização cultural, profissional e, naturalmente, social.
E, se o faço com veemência, tal deve-se ao facto de qualquer atraso ou qualquer "marcar passo" em matéria educativa ter sempre efeitos multiplicados negativos nas gerações futuras. O Sr. Ministro, os Srs. Membros do Governo sabem perfeitamente que isto é exactamente assim.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pelo que, é fundamental, e neste contexto, favorecer o desenvolvimento de competências básicas a partir do sistema educativo, garantir rigor e exigência na organização da aprendizagem, favorecer as pedagogias activas e os projectos pedagógicos abertos e diversificados, com uma autêntica avaliação aferida do sistema e métodos que evitem a penalização dos alunos.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Muito bem!

O Orador: - Eis os temas de um debate que tem de ser feito no sentido da mobilização e da motivação, da igualdade de oportunidades e da qualidade.
Dignifiquem-se os professores, corrijam-se as injustiças do estatuto da carreira docente. E a questão não é puramente remuneratória, como bem se sabe. É de condições práticas!
E a universidade? E o ensino superior? Abandone o Governo a via perigosa e teimosa aqui denunciada pelo Sr. Deputado António José Seguro, burocrática e cega de centrar a sua política na aplicação de uma má lei, inconstitucional, ainda por cima, como é a das propinas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não há condições de aplicação dessa lei. Há meses que o Partido Socialista o vem dizendo. E onde está a resposta? Nas ameaças, no anúncio de inconstitucionais medidas de retaliação, que o Sr. Ministro- e muito bem - aqui desmentiu, e nós registamos, aqui, esse desmentido!
Onde está o novo regime de financiamento das universidades? Que condições concretas se pensa poder reunir para avançar de modo realista na avaliação do ensino superior? Há sinais. Pois bem, aguardemos que esses sinais se concretizem. E a acção social escolar? O que se pretende fazer no concreto, para além das medidas simbólicas?

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!

O Sr. António José Seguro (PS): -Muito bem!

O Orador: - Falta, pois, espírito de mudança e de justiça, o que se repercute na desmobilização e na desmotivação dos professores e nas perplexidades que se sentem, a cada passo, na sociedade.
Acuso, pois, o Governo, aqui e agora, de insensibilidade para a prioridade educativa...

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - ... e para as questões de injustiça social, de exclusão, de desigualdade. Não bastam as boas intenções nem as boas vontades, são precisos actos concretos e solidariedade no próprio Governo para pôr em prática a autêntica, a verdadeira prioridade educativa.

Aplausos do PS.

O Orador: - Não esqueçamos que, no que toca à acção social escolar, partimos de muito baixo! Não existe, praticamente, acção social escolar em Portugal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É a herança socialista!

O Orador: - A tarefa educativa é nacional, já o disse. Ultrapassa, pois, em muito, as questões quotidianas do debate político. Onde estão respostas? Onde está a política? Onde está o discurso coerente? Onde está o necessário suplemento de alma, que é fundamental para pormos a educação em primeiro lugar na política, em Portugal?

Aplausos do PS.

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Não basta ao Governo fazer golpes de rins ou limitar-se a tentar fazer ilusória concertação. É tempo, no fundo, de passarmos às questões essenciais!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lélis.

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins, às vezes as pessoas são mais vítimas das suas qualidades do que dos seus defeitos. Parece-me que isso teria acontecido, ainda que reconheça a importância dos conceitos na sua intervenção feita, não digo fora de prazo mas a hora tardia, neste longo debate e em que o tom de voz excedeu o próprio contexto das afirmações. Mas a educação, Sr. Deputado, sabemos nós, é "um comboio a apanhar em andamento". Na educação, nem as férias, na figuração desse comboio, são os "apeadeiros". O Sr. Deputado concordará que antes o impossível era pedir a "quadratura do círculo", hoje o mesmo pedido é no sentido de que se transforme tudo sem tocar em nada. O próprio Sr. Deputado António Filipe, há pouco, referia-se elogiosamente àqueles que "faziam omeletas sem ovos"!
O certo é que ouvi dizer aqui que quanto mais se bate no Ministério da Educação menos deixamos de gostar da própria educação. Ela é, por si própria, pelos seus envolventes, pelos seus princípios e valores, pelos seus conceitos, que também aqui traduziram, até mesmo o conceito de educação como indústria de investimento.
Sr. Deputado, não conheço país que, na área da educação, tivesse resolvido as suas, sempre formuladas e renovadas, interrogações. Ora, como não estamos na cidade de Platão mas nesta cidade de homens e mulheres, parece-me que mais vale ter políticas sectoriais num contexto global do que ausência de política e medidas avulso em cada área.
É claro que depois, no terreno - e este Ministério tem-no feito-, é preciso fazer alguma coisa que não seja cedências. O Ministério da Educação tem feito coisas sem cedência, porque estas, em política, têm um preço. Trata-se não de ceder mas de fazer acertos; trata-se de procurar estar atento e de dar razão, com a generosidade de quem dá e com a capacidade de fazer a gestão daquilo que se dá, reconhecendo sempre que também é um perigo ter razão antes do tempo e da prova. O PS, como partido da educação, ...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: -... aliás, como o maior partido da oposição, ...

Vozes do PS: - Tinha dito muito bem!

O Orador: - O acto falhado tem outra explicação, Srs. Deputados. É que nós interrogamo-nos "quem é quem", quem não participou na sua bancada...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lélis, faça favor de concluir.

O Orador: - Peço alguma tolerância, Sr. Presidente. E já que falamos da possibilidade de dar razão, de estarmos atentos, gostaria que as sensibilidades existentes no seu partido se pusessem de acordo, fizessem cedências, dessem razão, para depois, eventualmente, também podermos dar razão - e nesta minha afirmação, provocada por si, não há o pecado de ingerência.
Dada a circunstância e a hora, não farei qualquer pergunta ao Sr. Deputado, e por duas razões: em primeiro lugar, por ser hoje levada a cabo a primeira aplicação do novo Regimento, e, em segundo, porque procuramos gerir o nosso tempo um pouco melhor do que VV. Ex.ªs...

Vozes do PS: - Nós também, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lélis, a tolerância tem de ter limites...

Risos do PS. Peco-lhe que conclua.

O Orador: - Fico-me pela troca de impressões, porque, em termos de valores e de princípios, com tempo reservado, falará o meu colega Pedro Roseta, na certeza de que os princípios, os valores e os programas decorrentes do seu discurso contam imenso mas que as leis, só por si, nunca bastaram para criar educação.
Uma outra observação, não forçosamente dirigida a si, Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins: não se pode defender o que é óbvio com o mesmo entusiasmo de quem pretenda ter o direito de dizer eureka.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Carlos Lélis não me fez propriamente uma pergunta, pelo que limitar-me-ei, naturalmente, a cumprimentá-lo.
No entanto, aproveito para dizer-lhe, Sr. Deputado, que o entusiasmo que coloquei na minha intervenção é próprio de uma Câmara política e para agradecer o seu lapso, ao considerar - e muito bem - o Partido Socialista como o partido da educação.

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Sensibilidade para a educação!

O Orador: - O que só nos louva, e com muito orgulho, mas não queremos reivindicar só para nós essa qualidade, o que pretendemos é que esta seja a Câmara da educação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário.

O Sr. Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário (Manuel Moreira Azevedo): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O subsistema dos ensinos básico e secundário cresceu a um ritmo vertiginoso nos últimos 20 anos, apesar da perda de mais de 350 000 crianças no 1.º ciclo do ensino básico, no mesmo período.

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Entretanto, ao longo destes 20 anos aumentou a complexidade organizacional, os contextos culturais e sociais mudaram substancialmente, os conhecimentos científicos e tecnológicos evoluíram bastante, os valores e as referências deslocaram-se para novos paradigmas e, neste quadro, as organizações escolares interrogam-se sobre os rumos a tomar.
Em meados dos anos 80 Portugal estruturou uma lei de bases e ergueu uma reforma do seu sistema educativo. Muitos outros países o fizeram e fazem, um pouco por todo o mundo.
A reforma do sistema educativo português foi objecto de muito estudo e ponderação, de alargados debates, de intenso diálogo social e, de forma gradual, experimentou-se um vasto conjunto de medidas, desde 1988 a 1992.
O empreendimento não é fácil, todos o reconhecem. O desafio é nacional e a tarefa está, e estará, sempre incompleta. Haverá sempre limitações difíceis de ultrapassar, novos obstáculos a vencer e uma diversidade de ritmos a respeitar. Os intervenientes directos contam-se por milhões, as escolas dispersam-se capilarmente por todo o território e ninguém possui a verdade sobre os melhores caminhos a percorrer.
Neste quadro, é compreensível que, chegado o momento de aplicar a reforma em cada escola e em todas as escolas - e é esse o momento em que agora estamos -, cresçam os conflitos, se espalhem as dúvidas, se avaliem e corrijam normas, se ergam novas resistências à mudança. Este é o momento propício para se desenvolverem quatro tipos de atitudes: a descrença, a hesitação, a desistência e a procura incessante.
Os profetas da descrença, apesar de poucos, bradam alto. Perante as dificuldades intrínsecas à melhoria de um sistema social tão complexo como o educativo, haverá sempre quem, perante a mudança, seja o arauto da desgraça

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Trata-se de uma presença permanente na nossa cultura, que muito pouco beneficiou a regeneração nacional em cada desafio da sua história.
A hesitação e a dúvida são naturais e compreensíveis. A informação adequada e adaptada à diversidade dos actores sociais implicados na reforma constitui, cada vez mais, uma prioridade. O risco que todos corremos é o de tomarmos sistemáticas estas posturas. Por isso, muito haverá a fazer no esclarecimento, diálogo e debate.
A desistência é a atitude típica dos vanguardistas envergonhados e dos que declinam a sua participação social perante as dificuldades que surgem, e são muitas, sobretudo na hora da aplicação, em cada escola, das medidas estudadas, experimentadas e avaliadas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Muitos há que propuseram, oralmente e por escrito, medidas concretas para a melhoria do sistema educativo português e que, na hora da sua aplicação recuam, pedem para que se desista, clamam veementemente pelo regresso da escola do passado, agarrados que estão a ideologias inconsequentes.

Aplausos do PSD.

Outros há que imploram que se remeta a concretização das medidas da reforma para quando houver uma escola ideal, como se a história se construísse a olhar as mudanças sociais como fruto das benesses dos deuses e não como construções limitadas e até contraditórias dos homens.
A quarta atitude é a da procura incessante, a da busca tenaz de caminhos concretos, irrecusavelmente, em diálogo social e necessariamente em tensão e em conflito. A atitude de procura pressupõe a abertura de espírito, o diálogo com a crítica, mas também se fundamenta na crença nas pessoas, na persistência na procura de saídas para o labirinto das dificuldades, na avaliação e correcção dos percursos e na humildade, apanágio de todos os construtores de edifícios sociais e de obras humanas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A reforma do sistema educativo processa-se no seio destas e de outras atitudes. O Governo reafirma que existe um rumo para a reforma, que mais e melhor educação e ensino não se obtêm seguindo profetas da descrença, não se atingem entrando no futuro às arrecuas e com medo das dificuldades, só se constróem, passo a passo, com diálogo, informação e formação, com a mobilização de todos os Portugueses para apostar naquilo que de mais precioso temos, perante as incertezas do futuro: a educação e o ensino, com qualidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É necessário unirmos esforços, sem nunca perdermos o espírito crítico, em torno de alguns eixos que estruturam a reforma educativa: os novos currículos e programas; a formação contínua dos professores; o reordenamento da rede escolar; a modernização da direcção e gestão das escolas; o reforço da formação técnica, profissional e artística dos jovens; a renovação pedagógica do ensino básico; o relançamento da educação pré-escolar; e a autonomia e desestatização progressiva das escolas.
Pela sua pertinência para este debate abordaremos de seguida, de modo mais detalhado, quatro destes eixos.
Comecemos pela formação contínua de professores, pois este talvez seja o âmbito em que a comunidade nacional mais esperanças deverá depositar, enquanto instrumento particularmente dotado de eficácia em ordem à melhoria do ensino e das aprendizagens.
Na verdade, melhorar o desempenho profissional dos professores é algo que está ao alcance de todos os docentes. Ao longo do País nasceu, nos últimos cinco meses, uma rede de centros de formação contínua, resultante da associação das escolas.
Pela primeira vez está de pé um programa de formação contínua com condições concretas para se desenvolver ao longo da década de 90, no exacto momento em que se estendem a todas as escolas as primeiras medidas da reforma do sistema educativo.
Em segundo lugar, referimos o relançamento da educação pré-escolar.
A par das iniciativas actualmente existentes deve-se prosseguir um novo caminho, que evite os escolhos e as limitações da estatização da educação pré-escolar. Após uma avaliação rigorosa das dificuldades encontradas nos últimos anos, o Ministério da Educação está em condições de apresentar, até ao fim do presente ano lectivo, um programa de desenvolvimento da educação pré-escolar. Não negando os meios financeiros para o crescimento da oferta, entendemos dever apostar mais na capacidade de mobilização das instituições sociais locais, dos pais, dos educadores e das autarquias.

Aplausos do PSD.

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O Sr. António Martinho (PS): - Nem aos professores querem pagar!

O Orador: - Em terceiro lugar, sublinhamos a vertente da renovação pedagógica do ensino básico.
Todos sabemos que o nosso ensino básico, agora prolongado para nove anos, sobretudo no seu 1.º ciclo, carece de um grande esforço de renovação pedagógica. No final do século XX, não podemos isolar numa redoma a escola básica selectiva do princípio do século, como se não fosse possível desfazer este equívoco nacional.
O ensino básico em nenhum país do mundo desenvolvido tem como fim seleccionar os mais aptos. Esta Câmara sabe-o bem, porque lhe consignou, de forma veemente, na lei de bases, a tarefa de promoção de todos os portugueses à aquisição das competências e dos conhecimentos básicos.
Perante as naturais dificuldades de aprendizagem de um conjunto de cidadãos, a escola básica não pode continuar a contrapor remédios administrativos. Para isso servem as repartições administrativas e não as escolas. As escolas servem para educar e ensinar e para tratar, pedagogicamente, as dificuldades de aprendizagem das crianças e dos adolescentes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Para apoiar normativamente esta mudança de rota do nosso ensino básico é que se instituiu um novo regime de avaliação dos alunos.
Quero aproveitar este debate para frisar, perante os Srs. Deputados, que o novo sistema de avaliação nada tem a ver com qualquer abolição do regime de faltas ou com a passagem automática de ano.
O regime de faltas contínua em vigor, não tendo sofrido qualquer alteração. A única medida que foi tomada tem a ver com as consequências da passagem dos 14 para os 15 anos, da idade limite até à qual os cidadãos são obrigados a frequentar a escola. Como está estipulado há 20 anos - e de outro modo não poderia ser -, nenhum cidadão é expulso da escola, mesmo por excesso de faltas injustificadas, enquanto está dentro dos limites etários em que o Estado o obriga a frequentar a escola, agora até aos 15 anos de idade.

O Sr. António Braga (PS): - Nunca ninguém falou nisso!

O Orador: - A legislação sobre faltas justificadas e injustificadas em nada foi alterada, contrariamente aos boatos lançados por alguns. A assiduidade é um dever dos alunos, que é necessário cumprir, pois a sua ausência provocará, certamente, quebras na aprendizagem e pode conduzir à reprovação em qualquer ano.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sobre a passagem de ano, convém deixar claro que este sistema institui uma nova etapa na progressão escolar, na avaliação no final de cada ciclo de estudos. Em cada trimestre, em cada ano de escolaridade e em cada fim de ciclo, os professores confrontam a evolução dos alunos com os objectivos definidos. Se, no termo de cada ano de escolaridade, existir um real afastamento face a estas metas, o aluno pode ter de repetir o ano, em qualquer ano de escolaridade, excepto no 1.º Se, no fim do ciclo, nos 4.º, 6.º e 9.º anos o aluno não tiver atingido as metas consignadas para o ciclo será obrigado à permanência de um ou dois anos mais, em cada ciclo. Isto diz expressamente a nova legislação, que muitos comentam sem nunca terem lido uma linha sequer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas refere também que a escola deverá ajudar todos os alunos, sem excepção, a aprenderem, a desenvolverem-se e a integrarem-se socialmente, com duas únicas limitações: as próprias capacidades dos alunos e os meios disponíveis nas escolas.
Temos de ser muito exigentes. O drama é que alguns confundem exigente com selectivo. Ser exigente connosco próprios, como o povo com o futuro, requer, antes de mais, apoiar todas as crianças, particularmente as que têm mais dificuldades em aprender.
É evidente que esta mudança de tratamento das dificuldades de aprendizagem não se operará da noite para o dia. Demorará certamente muitos anos. Mas o desafio é irrecusável, sob pena de Portugal não conseguir largar do cais da exclusão a que pode continuar a condenar um terço da sua população, ao favorecer o seu afastamento do acesso a um benefício social elementar, como é, e será, cada vez mais, o ensino básico.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A nossa preocupação central continua a ser a da qualidade. Em nada, nem por mecanismo algum, o Ministério da Educação pretende solucionar por via administrativa o insucesso escolar. De tal modo estamos disso certos que vamos lançar, pela primeira vez na história da educação nacional, todos os anos, uma aferição nacional de conhecimentos: a qualidade e o nível das aprendizagens melhora ou não? Os alunos estão realmente a aprender melhor e em maior número?
Todos os anos os Portugueses terão informações rigorosas sobre estes resultados. Começaremos pela língua materna e pela matemática. Não temos medo dos resultados, ...

Vozes do PS: - Não!...

O Orador: -... porque, quaisquer que eles sejam, são para melhorar de seguida, servem para mobilizar a comunidade nacional, para responder melhor ao desafio da instrução e da educação os pais, os alunos, os professores, as autarquias, as associações de cidadãos e as empresas.
Além disto existe um conjunto vasto de medidas de apoio à aplicação dos novos normativos sobre a avaliação.
Ainda no que se refere ao ensino básico, está revisto o sistema de apoio financeiro às crianças portadoras de deficiência. Vão ser aumentadas e reorganizadas as equipas de educação especial e ser oferecidas aos mais de 4000 professores, que trabalham na educação especial, exclusivamente, novas oportunidades de formação contínua.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em quarto lugar, destacamos o reforço do ensino técnico e profissional.
No âmbito desta reforma educativa, Portugal deu um salto qualitativo indesmentível na sua capacidade de for-

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mar os técnicos intermédios, que tanta falta fazem ao desenvolvimento do País. Em 1985, apenas 1 % da população que estudava, após o 9.º ano, o fazia em cursos técnicos, profissionais e artísticos. Em 1993, os jovens portugueses que frequentam estes cursos são já perto de 55 000, o que equivale a 20 % de toda a população que frequenta o ensino após o 9.º ano.
Hoje, os mais de 350 centros escolares, que continuamos a apetrechar e a instalar condignamente, constituem a base para Portugal elevar, ainda nesta década, de 20 % para 40%, o número daqueles que, concluído o ensino básico, querem prosseguir a sua formação nestas vias.
A reforma do sistema educativo que empreendemos, como se vê, não é, nem será, uma obra da 5 de Outubro mas o resultado do esforço de todos os portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permanecem em construção grandes desafios da reforma do sistema educativo. Dois deles poderão trazer importantes melhorias nos próximos anos: refiro-me à modernização da direcção, da administração e gestão das escolas e ao reordenamento da rede escolar.
Por outro lado, a educação multicultural e a integração de crianças e jovens de diferentes etnias constitui uma outra prioridade da reforma educativa. Mais de 400 projectos pedagógicos de integração cultural são apoiados pelo Ministério e 30 escolas com particulares problemas de integração étnica estão a ser alvo de um programa especial de intervenção nos meios suburbanos.
A reforma do sistema educativo tem um rumo, o Governo vai prosseguir a sua aplicação com tranquilidade, em clima de diálogo social, com transparência e abertura de espírito, com os meios financeiros adequados, consciente de que muito há a fazer e de que agora apenas estamos a dar os primeiros passos na generalização a todas as escolas do País de uma dinâmica qualitativa, que há-de ir vencendo lentamente a descrença, o imobilismo, a inércia e o medo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário, aproveito a sua intervenção não só para dizer algo mais sobre a reforma educativa que ainda não tivemos oportunidade de dizer, como também para deixar claro que ninguém é contra uma reforma educativa. Aliás, se há matéria consensual na sociedade portuguesa é exactamente neste campo. Porém, onde quase toda a gente coincide é na crítica à actual forma, não tanto pela forma em si mas, sobretudo, pela forma como a reforma está a ser aplicada no terreno.
Portanto, a crítica que faço é às condições em que a reforma está a ser aplicada.

O Sr. António Braga (PS): - Há falta de condições!

O Orador: - E poderei dar exemplos concretos.
Como é que a área-escola, que constitui o maior desafio - e tive oportunidade de o dizer na minha intervenção- proposto pelos novos planos curriculares, face a uma tradição muito arreigada de compartimentação dos saberes, está a ser concretizada? Muito mal, na maior parte dos casos! Em muitas situações, nem há mesmo qualquer acção ao nível da área-escola. E porquê? Porque os espaços estão sobrelotados, porque existe ainda um primado da lógica administrativa sobre a pedagógica na organização das escolas, porque há uma articulação horizontal deficiente entre os programas das várias disciplinas e uma atrofia manifesta dos cursos educativos. Com isto não há área-escola que resista!
Sr. Secretário de Estado, referirei ainda alguns aspectos, relativamente à reforma educativa, que são, em nossa opinião, criticáveis.
Em primeiro lugar, a dimensão excessiva de alguns conteúdos a aprender contradiz os princípios de aprendizagem activa subjacentes à própria reforma. São incompatíveis.
Em segundo lugar, é manifesto que faltam os novos programas de inglês. Quando é que eles aparecem? Não está a ser generalizada a disciplina de Desenvolvimento Pessoal e Social. A disciplina de Educação Tecnológica está a ser subalternizada e há, como já tive oportunidade de dizer, muitos professores em inactividade forçada, com horários zero.
O Sr. Secretário de Estado disse aqui - e com isto termino - que a reforma não é para aplicar em escolas-ideais. Pois não, Sr. Secretário de Estado! O problema é que com as escolas que temos V. Ex.ª não aplica qualquer reforma Nem o Sr. Secretário de Estado, nem ninguém!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário.
O Sr. Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, é interessante registar que a reforma educativa já não é criticada na sua concepção mas na sua aplicação no terreno.

O Sr. António Braga (PS): - Não é nada disso!

O Orador: - É fácil criticar, porque a sua aplicação no terreno é difícil e estará sempre inacabada. Como sabe, as medidas a tomar são vastíssimas, e certamente que Portugal terá de responder a este desafio durante muitos anos.
Por outro lado, gostava de dizer-lhe que não tem grande sentido a questão que invocou relativa aos espaços para que a área-escola se não desenvolva, pois a maior parte das suas manifestações não carece de quaisquer espaços. É uma questão que tem muito mais a ver com actividades interdisciplinares, grande parte das quais organizada fora das escolas; são actividades inter-turmas, completamente diferentes, de articulação transdisciplinar. Ora, isso nada tem a ver, na essência, com a questão que levantou, pois a área-escola é uma área disciplinar nova que vai ser desenvolvida com todo o apoio e empenho do Ministério.
No que diz respeito ao desenvolvimento pessoal e social, gostava de dizer-lhe que se estivéssemos a andar depressa o senhor seria o primeiro a criticar esse facto. A educação para os valores, Sr. Deputado, é uma questão fundamental e exige, da nossa parte, um cuidado extremo no desenvolvimento desta disciplina que pode traduzir-se num fenómeno de formação ideológica das nossas crianças, adolescentes e jovens.

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O Sr. António Filipe (PCP):- N9o avançaram com medo que nós criticássemos?!

O Orador: - Quanto à educação tecnológica, gostava de dizer-lhe que está a ser revista a inserção desta disciplina nos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico. O Ministério da Educação disse-o publicamente, por escrito, às escolas e até ao final deste ano lectivo vai ser anunciada a respectiva alteração curricular, pois temos em vista alargá-la a todos os alunos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Valha a verdade dizer-se - e reconhecer-se - que, se há algo em que os sucessivos Governos do Sr. Prof. Cavaco Silva tem sido hábeis, é no «lavar as mãos» relativamente a situações gravosas que eles mesmos criaram e incentivaram. É uma prática antiga, uma espécie de imagem de marca, que tem vindo a acompanhar o Sr. Primeiro-Ministro e os Governos que tem chefiado nos mais variados domínios da acção governativa e da vida nacional; é como uma impressão digital.
Sem a preocupação de sermos exaustivos, lembremo-nos do desgraçado desenlace do «casamento» do bloco central, atirando para cima do seu cônjuge de ocasião não apenas as culpas da má convivência matrimonial mas também o ónus do divórcio, quase como se o casamento não tivesse existido. Lembremo-nos do modo subtil como o Sr. Primeiro-Ministro, socorrendo-se da original figura do «gato por lebre», deixou bem claro na televisão o «conto do vigário» que a febre da bolsa representou, não sem que antes as teorias do capitalismo popular tivessem varrido as ilusões de milhares de pequenos aforradores e enchido os bolsos de alguns (poucos) especuladores com alguns (muitos) milhões de contos. Lembremo-nos ainda - e, de tão recentes, estes acontecimentos quase nos dispensam o apelo à memória - da rábula revisteira produzida, escrita, encenada e representada pelo Sr. Primeiro-Ministro que, com o título Fim à bagunça dos dinheiros públicos no Centro Cultural de Belém!, continua a provocar saudáveis gargalhadas nas mais vastas plateias do País e - o que é fundamental para os critérios culturais deste Governo - com assinalável sucesso de bilheteira. Finalmente, fomos há poucos dias informados pelo Sr. Braga de Macedo de que, se não fosse a política financeira desenvolvida pelo Sr. Miguel Beleza (um perigoso oposicionista) no Banco de Portugal (esse polvo cujos tentáculos o Governo ainda não conhece em absoluto), os agricultores portugueses viveriam felizes para sempre e as nossas empresas industriais desconheceriam o significado da palavra falência.
Meu Deus, como se pode ir tão longe no caminho do despudor político?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o novo modelo de avaliação que está a ser implementado no ensino básico - modelo esse consignado no Despacho n.º 98/A-92 - é, ele também, um exemplo de despudor. Trata-se de um normativo legal de tal modo desadaptado das realidades educativas e sociais do País que, das duas, uma: ou é fruto de uma absoluta ignorância ou é a expressão de uma demagogia sem freio.
Em nome de excelentes princípios, como o da subordinação do ensino à aprendizagem e o da adaptação do processo educativo a cada criança, ele próprio viola liminarmente esses princípios quando, por sua vez, não tem em conta a realidade do país a que se destina. Toda a gente sabe que a pior frustração não é a que resulta da existência de incapacidades próprias mas, sim, das que artificialmente derivam do facto de as crianças e os jovens se verem confrontados com objectivos e metodologias desajustados do seu nível etário e das circunstâncias individuais e sócio-económicas em que não podem deixar de operar.
Permitir-me-ia afirmar, como analogia, que todos estamos de acordo quanto as enormes virtualidades da utilização dos meios audiovisuais no processo de ensino-aprendizagem, mas certamente que os não utilizaríamos com crianças cegas ou surdas. O exemplo pode parecer-nos caricatural e mesmo amargo, mas é uma imagem rigorosa para podermos apreender as razões por que o novo modelo de avaliação, por baixo do verniz das aparências pedagógicas, nos afronta com as realidades de uma demagogia pura e dura.

O Sr. António Filipe (PCP): -Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o novo modelo de avaliação para o ensino básico é uma fraude! Uma fraude pedagógica, o que já seria grave, e uma fraude social e política, o que é bem pior.
O Sr. Ministro e o Governo sabem perfeitamente que, com este modelo, estão a atirar para as escolas uma responsabilidade que elas, infelizmente, e ao contrário do que sem dúvida gostariam, não estão em condições de assumir. Sabem igualmente que a criação dessas condições ou a sua ausência são, antes de tudo, da responsabilidade do poder central. Sabem ainda que, a acompanhar esta desresponsabilização do Estado e do Governo na consecução de uma política educativa que responda aos anseios e às necessidades das populações e do País, facilmente transformam as escolas e particularmente os docentes em bodes expiatórios de uma situação que, no essencial, os ultrapassa.
Quando se diz no presente normativo de avaliação que a escola deve garantir o sucesso e que este é, em grande medida, consequência da existência de apoios específicos elaborados à imagem de cada aluno e que, assim sendo, a retenção - o chumbo, na linguagem vernácula - deve assumir foros de excepcionalidade, nunca nos passou pela cabeça que este Ministério seria capaz de elevar o óbvio a tão grande altura. Será que este Ministro pensa que, no dia anterior ao da publicitação deste profético despacho, os docentes encaravam a escola como uma luta pelo fracasso, olhavam insolentemente as dificuldades dos seus alunos e os abatiam ano a ano sem dó nem piedade e que no dia seguinte ao da publicitação, iluminados como Paulo no caminho de Damasco, subitamente lhes foi revelado o caminho para o qual até então estavam cegos? Acreditará o Sr. Ministro que a História da Educação em Portugal será no futuro dividida pelos especialistas em duas grandes eras, a a.C.S. e a d.C.S., ou seja, a antes-de-Couto-dos-Santos e a depois-de-Couto-dos-Santos?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, «uma árvore não é a floresta», e é bem verdade; «uma andorinha não faz a Primavera», e é igualmente verdade. Seria assim absurdo, objectivamente absurdo, e insustentável, politicamente insustentável, olharmos a política geral deste Governo à luz das pretensas qualidades

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que enformariam o novo modelo de avaliação dos alunos do ensino básico. O contrário, sim, parece-nos absolutamente legítimo e justo. Esgravatando o verniz a que já atrás nos referimos, o novo modelo de avaliação surge--nos como aquilo que efectivamente 6, ou seja, uma peça hipócrita que se encaixa perfeitamente no puzzle do conjunto da política governamental.

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Assumindo a desresponsabilização do Estado na criação de condições propícias ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem, alienando essa responsabilidade para cima da comunidade educativa em nome de um falso reforço da autonomia, cultivando ilusórias expectativas de sucesso nos alunos e nas famílias e sujeitando os docentes à pressão social daí derivada há apenas um objectivo, esse sim, que este normativo pretende atingir e à luz do qual foi radicalmente elaborado - a poupança. É o célebre fado do dinheiro dos contribuintes em cuja interpretação o Sr. Ministro se especializou.
Forçoso é reconhecer que o Sr. Ministro e a sua equipa se esmeraram com este novo modelo em criar um cenário pedagógico quase credível atrás do qual pudessem acobertar a sua já famosa luta contra o desperdício e contra o despesismo. E fizeram contas auxiliados, sem dúvida, pelo Sr. Braga de Macedo...

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - O Sr. Ministro!

O Orador: -... e, provavelmente, mas disso não estamos certos, pelo Sr. Miguel Beleza.
«Temos de atirar para fora do subsistema do ensino básico com esses 230000 repetentes que nos andam a atravancar e a gastar o nosso querido dinheiro», terá dito o Sr. Ministro da Educação. E continuou: «É que equivalem a 230 escolas secundárias de 1000 alunos, com edifícios, com equipamento, com manutenção, com pessoal não docente.» Os Srs. Secretários de Estado ouviam-no, embevecidos, possuídos daquele estupor de quem pressente que pode tomar uma boleia para a entrada na História com H (maiúsculo). O Sr. Ministro Couto dos Santos, esse, já havia transposto a soleira da primeira perna do H. E foi já meio-dentro-meio-fora que, no trânsito do transe, exclamou: «Já sei. Passamo-los todos.»

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - Que disparate!

O Orador: - «Todos transitam. Nem mais um chumbo nas escolas. Quero um normativo progressista. Ao fim de nove anos, quero todos na rua. Só os milhões que eu vou poupar com isto!... O Braga vai ficar verde de inveja. E as estatísticas para a Comunidade, já pensaram no impacte que isso vai ter? Quanto às condições, bem, isso depois logo se vê. Não pertenço àqueles que não tem fé na criatividade dos professores, na capacidade nacional do desenrascanço, na autonomia, na disponibilidade da comunidade educativa... Quanto a mim, vou já fazer o despacho. E não tenho mais nada a ver com isso!»

Protestos do PSD.

E sumiu-se, entrando definitivamente por baixo do traço horizontal do H da História.
Sr. Ministro Couto dos Santos, permita-se-me fazer um parêntesis: o que acabei de dizer não tipifica esta nem outras intervenções. Pretendo deixar claro que não implicou nenhuma intenção ofensiva para o Sr. Ministro nem para a pessoa que o Sr. Ministro também é e apenas deve ser perspectivado como reflexo político do profundo descontentamento que o desnorte deste Ministério está a provocar por todo o País. Sr. Ministro Couto dos Santos, as caricaturas não mentem, limitam-se a acentuar os traços mais marcantes de uma realidade!
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, igualmente instrutiva é a análise das relações, e das ralações, entre este Governo e o ensino particular e cooperativo, nomeadamente ao nível do superior.
O ensino particular e cooperativo, desde logo no plano constitucional, tem o direito à existência, pelo que o Estado tem o dever de criar para tal as condições necessárias e suficientes, quer actuando junto das instituições educativas, quer das famílias. Neste preciso enquadramento, tão-pouco o ensino particular e cooperativo deve ser considerado como um mal menor, mas tal posicionamento, positivo e inequívoco, não pode constituir-se em argumento ou álibi para uma encapotada e progressiva desresponsabilização do Estado no domínio da implementação quantitativa e qualitativa do sistema educativo público e, nomeadamente, no da densificação da rede escolar como resposta - igualmente imperativa no plano constitucional - às necessidades das populações e do País.
Na verdade, o ensino particular e cooperativo não pode assentar a sua razão de ser no demissionismo e no laxismo conscientemente assumidos pelo Estado em relação ao ensino público e sim viver em função da sua qualidade intrínseca ou da sua necessidade objectiva.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O caso do ensino particular e cooperativo superior é, salvo excepções que não passam exactamente disso, um exemplo claro desta situação perversa que, em última análise, o não dignifica e desfigura - situação na qual este Governo e este Ministério da Educação tem assumidas e graves responsabilidades no plano político e social. Desde logo porque, ao abrigo de uma política de desinvestimento no ensino público, permitiu a criação objectiva de condições propícias à proliferação das universidades privadas (vamos chamar-lhes assim), mais conhecidas no mundo académico ou no submundo e, particularmente, no mundo dos negócios, como «Universidades T2»: no hall, funcionam os serviços administrativos, na cozinha os laboratórios, num quarto o gabinete do reitor (esse, tem de constituir um cenário minimamente convincente) e no outro quarto as salas de aula, funcionando em regime rotativo e de sessões contínuas, em estilo de ocupação à hora, num modelo perfeito de promiscuidade institucional, científica e pedagógica. Ninguém sai dignificado deste processo, nomeadamente, o ensino particular e cooperativo e o Governo.

O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!

O Orador: - E o ensino particular e cooperativo já começou a percebê-lo, particularmente quando o Governo, através do Sr. Ministro da Educação, numa atitude hipócrita e moralista de quem não tem nada a ver com o assunto (atitude a que nos tem sistematicamente habituado), pressionado por sucessivos escândalos finalmente transferidos para a comunicação social se viu compelido a desencadear uma operação de charme junto dos recla-

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mantes, mobilizando a Inspecção-Geral de Educação no sentido de «pôr as coisas nos eixos».
O Governo e o Sr. Ministro da Educação, uma vez mais, atiram a pedra e escondem a mão, apontam como bodes expiatórios aqueles mesmos que anteriormente incentivaram, lançam a suspeição indiscriminada sobre a generalidade do ensino particular e cooperativo superior, misturam no mesmo saco os que nele trabalham seriamente e os que dele não fazem senão um negócio sem regras...

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - Olhe que não!

O Orador: -... e governamentalizam de maneira verdadeiramente escandalosa uma instituição como a Inspecção-Geral de Educação que, também ela, teria saído deste processo talvez irremediavelmente chamuscada e instrumentalizada não fora a sensatez, a capacidade técnica, o rigor e a isenção da generalidade dos inspectores que não confundem o seu dever de obediência e de lealdade com ilegítimas posições de subserviência.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto aos alunos, são eles as grandes vítimas de toda esta escandalosa situação. Frustradas as suas legítimas expectativas de acesso ao ensino público, atirados para as mãos de um sector privado completamente liberalizado por força da irresponsabilidade governamental vêem-se agora milhares deles confrontados com habilitações inexistentes, com cursos suspensos, com os curricula por oficializar, com transferência forçada de área geográfica e com as mais variadas situações de indefinição, causadoras de graves prejuízos materiais, profissionais e morais e que apenas ao Governo e ao Ministério podem ser politicamente imputados.

Aplausos do PCP.

Felizmente que, assustados com o volume da revolta dos estudantes e das suas famílias, os bons espíritos acabam sempre por se encontrar e, à hipocrisia moralista do Ministério da Educação, vem agora juntar-se a preocupação de estruturas locais do PSD quanto à sorte dos estudantes e das instituições de ensino superior disseminadas pelas aldeias e vilas de quase todo o País. É claro que há quem olhe para estas recentíssimas preocupações do PSD como um acto de pré-campanha eleitoral autárquica ou ainda, no fundo, como a expressão do velho sentimento de que «não devemos morder a mão que nos alimenta».
Tudo indicia que, com estas novas inflexões, «a montanha nem um rato vai parir». O mau ensino particular e cooperativo superior vai continuar a fazer chorudos negócios, já que «a ocasião faz o ladrão»; o bom ensino particular e cooperativo superior vai ter agora maiores dificuldades em afirmar-se, dada a onda de suspeição generalizada que este Governo sobre ele lançou, sendo caso para dizer «livrem-me dos meus amigos que com os meus inimigos eu aguento-me bem». Finalmente, porque «o rei vai nu», o Ministério pensa ter conseguido com toda esta encenação o pretexto necessário para atingir o seu verdadeiro objectivo - a escalada a favor de um entendimento restritivo da autonomia universitária no ensino superior público, a chantagem financeira sobre as universidades públicas, a menorização da sua dignidade e do seu peso institucional numa operação mal conduzida e previsivelmente condenada ao fracasso e de que a malfadada lei das
propinas não é senão um episódio, importante, sem dúvida, mas muito mais como sintoma do que como doença. Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, verdade seja que este Ministro não está a tentar levar a cabo senão o que o ex-Ministro Roberto Carneiro concebeu e o ex-Ministro Diamantino Durão não teve sequer tempo de realizar; verdade seja que, em atitude de rara humildade conceptual e pessoal, se apressa a dizer-nos que «o Programa do Governo tem sempre razão» e, se procede assim, ...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Leituras atrasadas de sábado!

O Orador: -... se calhar, fá-lo para não dar espaço de manobra a que o Sr. Primeiro-Ministro se comporte com ele como o Sr. Braga de Macedo com o Sr. Miguel Beleza. Aceita, enfim, auto-anular-se, mas, que diabo, que lhe tirem o tapete, isso não! Ele, que tão diligentemente se apressou a designar por utentes aqueles a quem nós, até agora, nos havíamos habituado (retrogadamente, claro) a chamar alunos; ele, que tão desinibidamente passou a apelidar de serviços aquilo que nós (prisioneiros da maldita tradição) julgávamos possuir a dignidade de instituições educativas; ele, que ousou olhar para o sistema educativo com a mesma óptica inovadora com que se olha para uma qualquer companhia fornecedora de gás, ou de electricidade, ou de água, ele não mereceria que o Sr. Primeiro-Ministro lhe retirasse o tapete. Daí o maximalismo - só na aparência inábil, na verdade, inteligente - com que se cola à globalidade da política governamental. E, por uma vez, o Sr. Ministro tem razão!
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, na verdade, o que está em causa não é um ministro, não é sequer um ministério é, sim, uma política governamental para um sector determinado, a Educação...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: -... e o seu principal responsável, o Sr. Primeiro-Ministro. Trata-se, em rigor, de uma questão cultural, ou seja, trata-se da falta de cultura democrática deste Governo, com tudo o que isso implica.

Aplausos do PCP e do Deputado do PS Luís Filipe Madeira.

Que o Sr. Ministro da Educação se confronte com um problema de «democracia oftalmológica crónica» que apenas lhe permite ver 20 ou 30 estudantes na rua a protestarem contra a iniquidade das propinas; que o Sr. Secretário de Estado da Cultura nos leve a repensar o conceito que dá o nome à sua Secretaria de Estado quando tranquilamente nos refere os concertos para violino de Chopin; que o Sr. Primeiro-Ministro se sinta ligeiramente embaraçado quando, descansando no aconchego do seu lar, se vê forçado a escolher entre dois Thomas, o Mann e o Moore, como eventuais autores da Utopia e com esse embaraço deixa cautelosamente em branco o fecho do seu exercício cultural de palavras cruzadas, tudo isto nos levaria a uma natural compreensão da fragilidade dos homens, que todos devemos assumir e mesmo a um melhor entendimento da sua humanidade profunda se não fossem as consequências nefastas que, no caso em apreço, se transferem para o exercício autoritário e arrogante do poder político.

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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, numa tradução depurada do saudoso Professor Paulo Quintela (que aproveito para aqui, e deste modo, também homenagear) há um belo poema de Brecht, com apenas dois versos, que me permito de memória citar nesta Assembleia, porque julgo espelhar com o maior rigor a arrogância política deste Governo e a sua insensibilidade a questões fundamentais como são as que se prendem com a política educativa Aqui vos deixo o poema, através de Paulo Quintela: «O povo não gosta do governo. Mude-se o povo».

Aplausos do PCP e do Deputado do PS Luís Filipe Madeira.

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - Mas o povo gosta do Governo e já o provou!

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Virgílio Gameiro, Marília Raimundo e Pedro Passos Coelho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Virgílio Carneiro.

O Sr. Virgílio Carneiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Calçada, se Ferreira de Castro fosse vivo e presenciasse o seu discurso era capaz de usar a mesma expressão que pôs na boca de uma das suas personagens quando observou a floresta amazónica: «Esgotou-se a minha capacidade de espanto!»

Aplausos do PSD.

De facto, a minha capacidade de espanto esgotou-se (e, se calhar, não só a minha!) perante tais enormidades, perante tal capacidade de deturpar as coisas, perante o tal complexo de petulância e superioridade que quis imprimir, se calhar por defeito profissional como inspector - o que ainda é mais grave!

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E isso não se pode conceber numa altura em que devemos privilegiar a civilização e, neste caso concreto, a educação.

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD):- Muito bem!

O Orador: - Em educação, Sr. Deputado, a letra das leis, sobretudo no que respeita à avaliação de todas as normas jurídicas, só por si não reforma. A interpretação tem de ser flexível e a execução adequada às diferentes circunstâncias e meios sócio-económicos e culturais em que as diferentes escolas se inserem. Para que haja, efectivamente, reforma é preciso um espírito novo em todos os agentes da educação, quer no que respeita ao cargo quer no que respeita ao lugar que ocupam.

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Todos nós sabemos que nem todas as escolas têm os mesmos recursos - e isto é válido em toda a parte do mundo - e, por isso mesmo, é preciso olhá-las com essas diferenças e procurar atenuá-las. É isso que o Governo tem feito!

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD):- Muito bem!

O Orador: - Mas isso não justifica que não haja cuidado, que não haja trabalho, que não haja rigor, que não haja preocupação em fazer com que os alunos beneficiem de um ensino melhor, de uma educação melhor para obterem sucesso.
Por aquilo que V. Ex.ª acabou de dizer, parece que as leis, sobretudo a que respeita à avaliação, deveriam dirigir-se apenas às escolas de poucos recursos. É isso que se depreende, Sr. Deputado! As que têm mais recursos pertenceriam, pois, a outro mundo.
Não será que a legislação deveria apontar para soluções mais desejáveis para que cada escola fizesse um esforço para ir o mais longe possível? As carências e as dificuldades que os professores vão indicar com vista a um melhor apoio aos seus alunos não serão um veículo para melhor apetrechar as escolas que ainda não o estão? Não será esta proposta de avaliação um meio para facilitar - como muito bem disse o Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins - os métodos que menos penalizem os nossos alunos?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Marília Raimundo.

A Sr.ª Marília Raimundo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Calcada, gostaria de saber se reconhece ou não o direito à liberdade de ensinar e de aprender.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É um direito consagrado na Constituição!

A Oradora: - Reconhece ou não o papel que as escolas de ensino particular e cooperativo desempenharam em todo o País, sobretudo na altura em que, até no interior do País (e principalmente aí), não havia outro tipo de escolas?

O Sr. José Calçada (PCP): - Nada disse em contrário!

A Oradora: - Sr. Deputado, é preciso que estas questões sejam respondidas de uma forma clara. Nós - e o Sr. Deputado sabe-o! - defendemos um ensino particular e cooperativo de qualidade, ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - ... como, aliás, ainda recentemente, aquando do último congresso que teve lugar em Fátima, o Sr. Ministro teve ocasião de explicitar.
V. Ex.ª também sabe que essa liberdade de ensinar e de aprender tem de ser praticada em todas as escolas dentro do espírito da reforma.
Gostaria, pois, que esclarecesse esta questão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Calçada, gostava de o cumprimentar pela sua arrogância, o que também faz falta na oposição. Desde que não seja excessiva, creio que é bom ver algu-

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ma arrogância, aqui e acolá (quanto mais não seja porque retira argumentos a toda a gente), também na oposição.

Vozes do PCP: - Também na oposição?!

O Orador: - Também na oposição porque, muitas vezes, esta acusa o Governo de ser arrogante e, como tal, não deixa de ser bom verificar que, por vezes, o espelho não funciona só para o Governo, reflectindo-se também na própria oposição.
Queria-o cumprimentar, muito sinceramente, pela sua despreocupação, que, aliás, ficou bem nítida quando acusou o Governo, a propósito do ensino particular e cooperativo, de atirar a pedra e de esconder a mão. O Sr. Deputado teve a preocupação de mostrar mais a mão do que fazer a crítica. A verdade é que a intervenção do PCP, pela sua voz, mais parecia uma interpelação ao Governo na sua generalidade do que à política educativa.
Em relação à política educativa, o Sr. Deputado colocou a questão do ensino particular e cooperativo e do suposto desinvestimento que o Estado fez no ensino público. V. Ex.ª sabe, com certeza, que o ensino público superior, nos últimos quatro ou cinco anos, em termos de oferta para os jovens portugueses, duplicou; V. Ex.ª sabe também que, nestes últimos quatro ou cinco anos, foi possível fazer aquilo a que se chama a democratização ou a tendência para a generalização do acesso ao ensino superior, quer através do aumento substancial da oferta no ensino público, quer através do ensino particular e cooperativo.
A primeira pergunto que coloco é a de saber se o Sr. Deputado entende que essa foi uma opção deficiente do passado. Isto é, V. Ex.ª pensa que seria preferível manter apenas, por parte do Estado, o nível exigível e possível de aumento de democratização do ensino público, inviabilizando a que se fez, do meu ponto de vista, para o ensino particular e cooperativo?
A segunda questão que quero colocar-lhe é a de saber se acha ou não que é muito mais importante discutir, nesta altura, se a avaliação a que já se procedeu no ensino particular e cooperativo para corrigir situações que não estão bem, para aumentar a qualidade desse nível de ensino, deve ou não ser agora transportada para o ensino público. Não acha que essa questão é muito mais pertinente do que agitar supostos fantasmas do passado a propósito do ensino particular e cooperativo, que o Sr. Deputado muito subtilmente atacou?
Gostaria também de perguntar se não acha muito mais importante que se aplique a todos aqueles estudantes que estão nesse tipo de ensino níveis de acção social escolar idênticos àqueles que se processam para o ensino público, do que vir agora discutir se o ensino é de má qualidade ou se a saída profissional para os estudantes que o frequentam é mais «negra» do que no ensino público.
A pergunta que, em suma, queria fazer-lhe é se o PCP está mais preocupado em mostrar a mão do que em encontrar soluções, quer para os jovens portugueses, quer soluções educativas e de ensino no nível do superior.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Calcada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, em primeiro lugar, gostaria de agradecer a clarificação da utilização da palavra «também» que citou, quando se referiu à existência de orna eventual arrogância na oposição. Ficámos esclarecidos sobre isso!
Quero também deixar muito Claro - e isso ficou nítido, desde logo, na minha intervenção, pelo que não fiquei à espera que a Sr.ª Deputada Marília Raimundo colocasse o problema - que defendemos, com toda a convicção, a dignidade do ensino particular e cooperativo, com tudo o que isso implica, como está constitucionalmente consagrado, pois não fazemos mais do que a nossa obrigação.

Vozes do PSD: - Não parece!

O Orador: - Se não parece isso é outro problema.
Só que não temos, em relação a ele, o comportamento ambíguo que o Ministério da Educação e este Governo ultimamente têm assumido.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quero que isto fique perfeitamente claro!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Algumas questões fundamentais deveriam anteceder todas as outras num debate sobre a política educativa.
A política em apreciação está ou não a promover os valores comuns aos Portugueses? Cumpre ou não o objectivo essencial de toda a acção política - a promoção da dignidade de cada português enquanto pessoa, dos seus direitos, do seu bem-estar, do desenvolvimento integral da sua personalidade?
Está o Governo a dar cumprimento ao seu Programa aprovado por esta Assembleia e utiliza, por forma adequada, os meios que esta pôs, para tanto, à sua disposição?
Na verdade, são os valores que dão sentido à vida em comunidade, a toda a acção individual. Não é possível a qualquer sociedade dispensar a vigência de valores colectivos, pois cada pessoa não se consegue realizar na sua dimensão meramente individual.
A questão do sentido é, boje, essencial.

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - O poder, a acção política sem sentido, sem valores é mera gestão que não pode dar resposta às expectativas multifacetadas. Ainda que os meios materiais fossem ilimitados - como parece resultar das ideias de alguns Srs. Deputados da oposição - seria sempre gerador de permanente insatisfação e mesmo frustração.

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - O poder político tem, pois, obrigação de assumir os valores colectivos da comunidade.
Temo que os partidos da oposição continuem a trazer aqui uma visão fundamentalmente tecnocrática (embora, por vezes, disfarçada), transformando esta discussão de opções políticas fundamentais em mero catálogo de reivindicações não hierarquizadas.

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É que se o objectivo da acção política é o respeito e a promoção da dignidade de toda a pessoa humana e dos seus direitos, como reconhece o artigo l.º da Constituição, os valores que a Lei Fundamenta] consagra são a liberdade, a justiça, a solidariedade, a igualdade de direitos e oportunidades, sem esquecer a paz e os valores que têm a ver com a identidade nacional multissecular.
A educação é instrumento essencial para a liberdade de cada pessoa, fornecendo instrumento para as opções conscientes e devendo permitir a escolha entre projectos alternativos na educação permitindo desenvolver o sentido da responsabilidade e do respeito pelos direitos dos outros. Voltarei adiante à questão da liberdade, a propósito da liberdade de aprender e de ensinar, mas referirei desde já que a formação pessoal e social e a educação cívica, que estão a ser introduzidas nas nossas escolas, são peças fundamentais dessa educação para a liberdade, porque seria impensável que fossem instrumentos de dirigismo ideológico.
Tem a política educativa promovido a justiça e a igualdade de oportunidades corrigindo as desigualdades sociais e regionais herdadas do passado? Assegura a igualdade de oportunidades no acesso a todos os níveis de ensino, incluindo o superior, e a todos os géneros de ensino, incluindo o particular e cooperativo?
Durante décadas foram raros os que tiveram acesso à educação pré-escolar, o que introduzia, logo de início, um forte elemento de discriminação.
Deve, por isso, sublinhar-se o esforço realizado nos últimos quatro anos nesse domínio: a taxa de acesso dos que estão na faixa etária correspondente passou de 32 % para mais de 50 %. Se é certo que ainda há que progredir para atingir os níveis dos países mais desenvolvidos, parece claro que estamos no caminho que aí nos poderá levar em poucos anos.
Também no ensino básico havia uma questão muito grave, embora diferente, a dos abandonos, que tinha como consequência a existência de milhares de jovens que abandonavam o sistema sem qualquer diploma. Parecia que mesmo a escolaridade obrigatória visava seleccionar os mais aptos e não promover todos enquanto pessoas. O incremento da acção social escolar, mas, sobretudo, o reforço do apoio pedagógico que está a ser desenvolvido, aponta para que se regeneralize o cumprimento da escolaridade obrigatória. O alargamento efectivo da escolaridade totalmente gratuita - seja qual for o género do ensino escolhido, de acordo com um diploma de 1990, do anterior governo - é indispensável para assegurar a referida igualdade de oportunidades para todos, e que será alcançada por aqueles que entraram no sistema em 1987-1988.
É que, como veremos adiante, em matéria de educação, não é possível resolver os problemas de imediato por uma impossibilidade lógica e material. Todavia, aquilo que os Srs. Deputados da oposição parecem querer é resolver, em curto espaço de tempo, tanto importa que sejam quatro, cinco ou 10 anos, o que é uma impossibilidade lógica total, problemas que têm a ver com gerações e que não têm solução no espaço de poucos anos. VV. Ex.ªs pedem não direi a lua mas sim a impossibilidade.
A nível do ensino secundário, a diversificação das vias de formação pós-obrigatória - os ensinos profissional e técnico-profissional - vieram abrir novas oportunidades. Também aqui, em oito anos, o número de alunos subiu cerca de 50 % e no técnico-profissional mais de 600 %.
Finalmente, no ensino superior o crescimento foi rápido e hoje já cerca de 28 % dos jovens a ele tem acesso.
Ora, esta taxa de escolarização coloca-nos ao nível da média dos países europeus desenvolvidos, o que prova que a igualdade de oportunidades foi substancialmente alargada, se bem que naja que alargar mais, que reforçar a acção social escolar para assegurar a igualdade no acesso as instituições, nomeadamente àquelas que não pertencem ao sector público e onde há neste momento uma discriminação económica em favor dos mais favorecidos.
Também o valor da solidariedade tem de ser promovido através da política educativa. Nenhuma sociedade pode desenvolver-se se não progredir na solidariedade a todos os níveis. Mas a solidariedade tem de ser religada à sociedade, como tem proposto Michel Rocard e como já o disse aqui uma vez. Se o Estado tiver o papel central para pôr de pé as estruturas das solidariedades, os grandes sistemas nacionais devem ser concebidos como o suporte de uma solidariedade de base que deve ser alargada e completada através de outros sistemas complementares mais descentralizados e de acções levadas a cabo por relações sociais concretas.
Que são as novas solidariedades se não a ultrapassagem do Estado providência e a afirmação pela sociedade inteira da ética da solidariedade renovada e aprofundada?
É o valor da solidariedade que exige um esforço acrescido no campo do ensino especial dirigido aos deficientes, continuando e alargando a política prosseguida, mas baseando-se evidentemente nas iniciativas da sociedade civil. E o valor da solidariedade exige também que o apoio social dependa das condições do agregado familiar. A própria igualdade exige que se trate igualmente os que são iguais, mas que se faça uma discriminação positiva em fazer dos que são desiguais.
É por tudo isto que é aceitável que alguns suportem uma parte dos custos do ensino superior em benefício de outros, como já aqui ficou claro no debate havido em Maio do ano passado.
Mas a educação tem como objectivo o desenvolvimento integral de cada homem enquanto pessoa, capaz de adquirir conhecimentos e de aderir a valores, de apreciar, agir e inovar, decidir.
O direito ao desenvolvimento foi consagrado em 1986, na Resolução n.º 41/128 da Assembleia Geral da ONU, em que, logo no artigo 1.º da declaração anexa sobre o direito ao desenvolvimento, este é definido como um direito inalienável do homem que reconhece que cada pessoa humana e todos os povos são titulares do direito a participar e contribuir para usufruir do desenvolvimento económico, social, cultural e político, através da qual todos os direitos humanos e as liberdades fundamentais podem ser completamente realizados.

Aplausos do PSD.

Trata-se, pois, de um direito da pessoa e de um direito de cada povo, de um direito individual e de um direito colectivo como outros direitos, que, para o seu exercício, pressupõem a existência de outros homens em comunidade e que só com eles e neles podem ser exercidos. Mas é evidente que têm de ser exercidas em complementaridade e nunca em antagonismo, ou seja, a pessoa não pode ser esmagada pelo direito colectivo.
Sem esta concepção ampla de desenvolvimento, que deve ser sustentável, isto é, incluir os aspectos ambientais e a preservação dos recursos naturais, correm-se os riscos do mau desenvolvimento reduzido a mero crescimento económico, com os efeitos perversos que gera, assente

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como está numa filosofia individualista e neoliberal que repudia e que julga erradamente que a comunidade pode progredir pelo triunfo dos mais fortes.
Referirei ainda um direito da pessoa, de extrema importância no nosso tempo, o direito à diferença, também ele individual e colectivo. O artigo 3.º da Lei de Bases do Sistema Educativo determina que este sistema se organiza «de forma a assegurar o direito à diferença, mercê do respeito pelas personalidades e pelos projectos individuais da existência».
Este direito tem repercussões importantíssimas na nossa concepção de educação. O tempo do centralismo uniformizador não é mais aceitável. Tem de haver projectos educativos próprios em cada estabelecimento de ensino - seja ele particular ou público - que, sem perder de vista os valores e a integração nacional e mesmo a dimensão europeia da educação, permita a cada aluno desenvolver a sua própria personalidade, tendo em conta o contexto que o rodeia.

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, congratulo-me vivamente que no ensino secundário se projectem desenvolver opções adequadas ao contexto económico, cultural e regional em que cada escola se situa; por isso, congratulo-me também que se preveja uma crescente autonomia de todas as escolas, que permita que o seu projecto educativo venha a ser adoptado pelo conjunto de cada comunidade escolar, tendo em conta a sua própria realidade, incluindo a sua realidade envolvente; por isso, congratulo-me ainda com o reconhecimento da liberdade de aprender e ensinar não só dentro das escolas públicas, mas incluindo o direito de criação e manutenção de escolas particulares e cooperativas paralelas às do Estado que garantam, nos termos do Pacto Internacional dos Direitos Económicos, Sócias e Culturais e do Protocolo Adicional à Convenção Europeia dos Direitos do Homem, o direito - essencial - dos pais à escolha do género de educação para os seus filhos.
Portanto, concordo com o que o Sr. Ministro da Educação afirmou, há poucos dias, no encerramento do IV Congresso do Ensino Particular e Cooperativo, isto é, que cabe ao Estado proporcionar às escolas particulares o apoio técnico, científico, pedagógico e financeiro que garanta progressivamente a igualdade de oportunidades no acesso ao ensino público e particular.

A. Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - Apoiado!

O Orador: - Estas instituições devem ter um elevado nível de autonomia pedagógica para que sejam mais inovadoras, sendo certo que a fiscalização, que ninguém discute, e a avaliação a posteriori devem exigir e vigiar a correcta aplicação dos apoios concedidos. Mas, para lá da fiscalização do Estado, exige-se um esforço contínuo para melhorar a qualidade, o que inclui necessariamente a auto-avaliação e a auto-correcção de práticas pedagógicas. E aqui os Srs. Deputados incorrem numa contradição que me parece evidente: falam muito na autonomia das escolas, mas depois dá a impressão que querem que seja o Estado a fazer tudo.
Presto neste momento a minha homenagem às instituições da sociedade civil, que foram inovadoras e que cobriram áreas do País abandonadas, que cobriram a educação pré-escolar, o ensino especial e outros sectores muito difíceis, como o do apoio a crianças em risco, como pude mais uma vez constatar ontem ao participar no 10.º aniversário da criação do Instituto de Apoio à Criança que quero saudar desta tribuna.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É que há Srs. Deputados que parece não quererem perceber que vendo as coisas na perspectiva da pessoa - e nós somos personalistas - o que importa é que haja educação de qualidade acessível, não tem de ser estadual, pois isso é um resíduo de uma ideologia jacobina e estatizante que boje, felizmente, está em queda em todos os países democráticos.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma sociedade que promova o autêntico desenvolvimento do homem todo e de todos os homens não pode ter por força motora o êxito material individual nem sacrificar-se aos mitos da hora, como foi, num passado ainda recente, o messianismo de uma determinada classe e que deu os resultados que deu. Hoje são outros mitos, «os mitos da crença no progresso, indefinidamente linear da humanidade, do imperativo absoluto da revolução técnico-científica ou, sobretudo, da necessidade de um Estado omnipotente e omnipresente», como tão bem referiu Manuel Antunes. Terá de ter como força motora a fidelidade criadora ou recriadora aos valores a que me referi. Mas para além dos valores e do pluralismo cada vez mais necessário, gostaria de abordar a questão da qualidade do ensino.
Estamos conscientes que é uma questão vital que não se resolve com palavras, com decretos, nem sequer com dinheiro. Se depende alguma coisa dos laboratórios, bibliotecas e videotecas, centros pedagógicos, pavilhões desportivos e outros equipamentos, depende muito mais da vontade de todos os que participam no processo educativo, antes de mais dos professores. Esta é a razão suficiente para apostar fortemente na sua valorização profissional.
No novo quadro de apoios comunitários o programa FOCO, de formação contínua, garantirá o apoio às acções e aos centros de formação. As acções recentemente iniciadas têm por isso suscitado grande adesão e merecem todo o nosso aplauso.
Estranho nada de positivo ter ouvido sobre a reestruturação dos serviços do Ministério. Iniciada há alguns anos, com a desconcentração e descentralização dos serviços, ela permitiu um apoio directo e mais próximo das escolas através das direcções regionais. Os serviços centrais ficaram hiper-dimensionados e havia que transformá-los em unidades tecnicamente aptas para apoio à decisão política e avaliação a posteriori das medidas tomadas.
Mas, se há que estranhar este silêncio, há outras questões, outras interrogações que deixo aos partidos da oposição.
Porquê esta generalização a todo o sistema, a todas as escolas, de críticas pontuais? Este maniqueísmo do tudo mal, do preto contra o branco, retira credibilidade às vossas críticas, quando a realidade, como todos sabemos, não é assim. A realidade tem tons graduados e que variam de área para área, de escola para escola, e quando é certo que nem a maioria nem o Governo caíram no vício oposto - ao qual, aliás, me oporia fortemente- de dizer que tudo é branco, que tudo vai bem e que estamos no melhor dos mundos.

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Aliás, nas visitas que os Deputados membros da Comissão de Educação, Ciência e Cultura realizaram, no âmbito do programa de segurança nas escolas, puderam verificar como a realidade é tão diferente de caso para caso e às vezes dentro da mesma localidade.
Por que não referiram, nesta visão distorcida da realidade, o esforço da comunidade nacional para melhorar a educação, bem expresso na percentagem da despesa pública que lhe dedica (14 %) e do PIB (16 %), valores próximos da média dos países da Comunidade Europeia?
Como é possível, nos dias de boje, uma visão estatista que ignore o papel que a sociedade civil tem e que ainda quer, ao arrepio de todas as democracias, embora disfarçadamente, reestatizar a educação, nomeadamente a educação pré-escolar e o ensino especial, duplicando esforços e recursos, esquecendo que a melhor e menos onerosa solução é o Estado apoiar essas iniciativas.
Como é possível exigir mais meios para a reforma e querer, ao mesmo tempo, alargar o ensino estatal por forma a cobrir todas as necessidades de toda a população, mantendo um aparelho central muito pesado? Não ouviram, há dias, Michel Rocard lembrar que o aumento da despesa pública não só não resolve os problemas como antes os pode agravar? Porquê nada dizerem sobre as consequências para o sistema - espanta-me, digo-lhes francamente, não os ter ouvido falar nisto - da nova realidade demográfica nacional que, devido à queda da natalidade, levou à diminuição, em oito anos, das matrículas do l.º ciclo do ensino básico em 30 % e de 10 % no 2º ciclo? Como discutir a realidade e as políticas que a ela se destinam, esquecendo-a? Porquê o silêncio sobre o alargamento no acesso ao ensino e as melhores condições que porporcionaram a muitas dezenas de milhares de portugueses- e os portugueses são pessoas, não são números-, ...

Aplausos do PS.

... construindo, em quatro anos, 183 escolas, ampliando 161 no total de 5300 novas salas?
Porquê insistir neste imediatísmo tecnocrática que se reduz a reclamar mais dinheiro para tudo, como se a política pudesse esgotar-se no enunciado de um elenco indeterminável de necessidades, que é uma atitude própria dos técnicos e não dos políticos que têm de optar e hierarquizar? Porquê este vezo positivista de julgar que tudo se pode resolver, instantaneamente, com leis, que a magna tarefa da educação cabe só ao aparelho político ou à administração central, quando a educação é por essência tarefa que cabe a todos, desde as famílias aos agentes educativos, às autarquias, à sociedade civil.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Calçada (PCP):- Menos ao Governo!...

O Orador: - A responsabilidade pela educação ultrapassa o Governo, porque o inclui, mas é de todos.
Porquê insistir, também, em processos de intenção - que não os identifica, Srs. Deputados -, seja a propósito da avaliação, seja a propósito das pretensas consequências que acarretariam o não pagamento de propinas, carreando para aqui meros impulsos mediáticos, mostrando que alguns se preocupam demasiado com a aparência.
Porquê esta contradição insustentável de dizer querer ter uma visão moderna, exigir a qualidade e responder com o estatismo, com a reivindicação pontual de tudo ao mesmo tempo, quando em política querer tudo fazer ao mesmo tempo é a melhor maneira de nada fazer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em conclusão, quero sublinhar a importância central da escola na educação, que vem logo a seguir à família, não só na sua função de instrução, destinada a transmitir conhecimentos e informações, capacidades técnicas, mas principalmente como ambiente vital e lugar privilegiado para a formação e o crescimento humano e espiritual do Homem.
É necessário pôr de novo, no centro da vida da escola, não só os programas, mas, sobretudo, a pessoa de cada aluno - citei João Paulo II há poucos dias num congresso de professores.
Reafirmamos a prioridade da educação, incluindo, evidentemente, a promoção da nossa língua no mundo. Consideramos que a importância da educação é fundamental para o desenvolvimento cultural, social e económico de cada português e de Portugal. Sabemos que a educação é, por essência, uma obra sempre inacabada, que tem de ser adaptada constantemente à renovação das novas gerações.
É esse o desafio que nos exige um consenso e um realismo a bem de todos aqueles que em conjunto aqui representamos.

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É preocupante que um debate sobre o ensino, neste fim de século, aconteça tendo como ponto de referência das inquietações públicas a questão das propinas.
Ainda não fomos conduzidos à circunstância de acrescentar ao quadro das contestações o estatuto remuneratório do pessoal docente universitário, que será o resultado do estímulo do adoptado método comparativo com a remuneração do Primeiro-Ministro, porque no ensino as razões de queixas são antigas, muitas e talvez com maior fundamento.
De tudo resulta que a actualidade e natureza destas questões (propinas e remunerações) alarma quanto à capacidade anímica de o País arrancar no sentido de entrar efectivamente no grupo das chamadas Winning Nations, onde algum discurso ocasional nas coloca, de quando em vez, com discordância dos factos. E, todavia, quando se alinham as variáveis que, no conceito mais corrente, definem uma nação capaz de responder à competição mundializada, e de entrar no grupo dos contribuintes líquidos para o desenvolvimento e harmonia globais dos povos, regiões e Estados, a educação aparece sempre em primeiro lugar.
No debate internacional não se encontram referências de valia sobre a questão das propinas, mas encontram-se muitas sobre o estatuto do pessoal docente, sobre a autonomia universitária, sobre o funcionamento das instituições e sua relação com a liberdade de investigar e ensinar, sobre o efectivo direito e a real liberdade de aprender, e sobre a

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natureza e qualidade das instituições públicas e privadas intervenientes no processo.
Sugerimos que, para avaliar de algum modo a nossa capacidade de enfrentar o desafio mundial, é necessário pôr o acento tónico do empenhamento público nestes problemas de fundo, para que a questão das propinas deixe de parecer e aparecer como a mãe de todos os conflitos. No caso de ser impossível repor uma hierarquia consistente das questões, temos fortes motivos para nos inquietarmos quanto ao futuro.
Um dos pontos críticos da conjuntura portuguesa é o da posição relativa das instituições públicas e das instituições privadas do ensino superior, e o seu relacionamento dentro do sistema geral. Talvez o IV Congresso do Ensino Particular e Cooperativo permita finalmente vislumbrar o aparecimento de um novo estado de espírito.
Antes da Constituição vigente, já existiam estabelecimentos privados do ensino superior, no geral com o nome de institutos, os quais atravessaram o período revolucionário e continuam num exercício que não tem atraído reparos, conferindo os graus de licenciatura; uma universidade católica, enquadrada pelo regime concordatário, serviu de ponto de referência e de inspiração durante o mesmo período, e continuou a crescer até hoje em autoridade.
A disfunção aparece vinculada ao proliferar de estabelecimentos privados da segunda geração, que se legitimaram com os direitos e liberdades de ensinar e aprender, e geralmente quiseram a qualificação universitária. É necessário notar previamente que tais estabelecimentos prestaram à comunidade nacional um serviço frequentemente com deficiências visíveis, mas numa época e numa área definidas, em primeiro lugar, pela circunstância de que o Estado não prestava serviço nenhum. Todavia, depois de tantos anos de empirismo não pode adiar-se mais a correcção dos defeitos, suficientemente diagnosticados, para conseguir que a rede pública e a rede privada se complementem.
Na rede privada da nova geração aconteceu que o princípio da liberdade de ensinar, o qual deriva da legitimidade dos pluralismos das concepções do mundo e da vida, foi muitas vezes superado pela simples concepção da economia de mercado, a inspirar respostas rápidas para uma procura explosiva, inflaccionada esta pela crise da rede pública. Aconteceu mesmo que, neste caso, foi a oferta que rapidamente condicionou a procura, porque a procura foi constrangida a escolher entre uma oferta construída com atenção aos custos de produção, e visando uma amortização acelerada. Sendo irrecusável que a crise da rede pública estava entre as causas dessa superação da liberdade de ensinar pelo anunciado direito de intervir no mercado da educação; sendo certo que o exercício, mal regulado, dessa intervenção submeteu frequentemente a procura juvenil a uma oferta estruturada pelos investidores em função da contenção dos custos, e apenas nas áreas de menores investimentos: é também inerente a este sistema que o consumidor pague os custos, como tem acontecido com punição frequente das famílias de menores recursos.
Tudo visto, parece evidente que a primeira injustiça clamorosa a remediar é que a simples insuficiência da oferta pública remeta tantas dezenas de milhares de estudantes para a rede privada, por essa falta de capacidade de Estado, e não pelas diferenças de concepção de vida que justificam a liberdade essencial de ensinar.
Já vimos neste Parlamento que esse facto atinge milhares de estudantes que correspondem ao critério de excelência, cujas famílias pagam impostos como as dos que o
Estado acolhe, e todos ao abrigo de uma Constituição que orienta para o ensino tendencialmente gratuito. É por isso que parece limitado o conceito que transfere da experiência da rede privada para a rede pública o conceito empresarial dos custos, em nome da proclamada injustiça dos pobres pagarem para os ricos. Todo o vasto sector dos que apenas procuram a rede privada porque o Estado os não recebe, não obstante a própria excelência da sua preparação, ficam excluídos de tais preocupações, não obstante o dever tributário cumprido por igual.
Não parece assim indicado recorrer tão erradamente ao direito natural para dar outra imagem à injustiça decorrente das insuficientes capacidades do Estado, porque a modesta doutrina das taxas é suficiente para lidar com a actualização, usando mais contabilidade e menos demagogia
A autonomia universitária parecia suficiente para, nessa base, lidar com esses problemas, poupando-nos à situação em que estamos de ter uma lei que deve ser obedecida por respeito ao princípio do Estado de direito, mas que suscita a justa contestação derivada dos errados fundamentos, do limitado grupo ao qual pretende fazer justiça potencializando a injustiça dos rejeitados pela rede pública, das autonomias feridas, e do limitadíssimo remédio que pode trazer ao financiamento das universidades e dos serviços sociais.
Um dos preceitos da ética universitária é ter a cacapidade de reconhecer o erro, de proclamar com alegria o avanço que se traduz em ter percebido o erro, e trabalhar na formulação de nova hipótese. O legislador maioritário, tratando-se neste caso das universidades, poderia excepcionalmente adoptar a mesma regra. Insistindo em que a maior injustiça está na situação dos rejeitados pela rede pública, lembramos que, recentemente, Ciem Sunter, escrevia sobre o desafio da investigação e do ensino: «uma aproximação mais radical seria abandonar qualquer divisão de sectores. Em vez disso, o Estado deveria emitir vauchers para todos os pais, e que eles poderiam usar em nome dos filhos, na escola da sua escolha».
A política em formação na Europa comunitária, liderada pela actual presidência, pretende que esta doutrina seja ampliada em termos de os pais europeus poderem enviar os filhos para as escolas de qualquer país da Comunidade, usando o cheque escolar que o seu governo lhe abonará em função dos custos que não sofre. Sabemos que países com os recursos portugueses não poderiam adoptar tal sistema sem um fundo exterior, ou mesmo com ele, mas conviria meditar sobre a doutrina do cheque escolar para fins domésticos, a qual doutrina propusemos há anos a esta Câmara, porque ela ajuda a compreender que a regulação das propinas legalmente em vigor precisa de se relacionar melhor com a justiça, e que a maior das injustiças está na maneira como o sistema condena tantas dezenas de milhares de alunos, grande número deles com excelência, a renunciar ao direito de entrar na rede pública do ensino por falta de capacidade física da rede, tal como os obriga a submeterem as vocações à oferta privada disponível, tal como expropria as famílias dos tributos pagos regularmente para tal fim, tal como finalmente se inquieta com a justiça para alguns usando os dinheiros pagos por todos.
Por isso nos parece que é tempo de ultrapassar as questões da intendência, e tratar da tarefa difícil que é racionalizar globalmente a rede privada e a rede pública do ensino superior.
E talvez deva começar-se por reconhecer que: primeiro- os objectivos da investigação e do ensino, sistematizados designadamente por Scheling, Humboldt, Jaspers,

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Ortega, Braga da Cruz, Ferrer Correia, Veiga Simão, e que somam a investigação sistemática e descomprometida da verdade à relação estrutural com a sociedade, à dinamização de processos de mudança, à criação de elites especializadas e lideranças sóciopolíticas, dificilmente se mantêm reunidos na mesma instituição, antes sito minoria as que o conseguem; segundo - o modelo da universidade funcional em alastramento, desenvolvido por Dréze e Debelle sobretudo depois da crise de Maio de 1968, procura com dificuldade harmonizar as solicitações divergentes da educação humanista e da formação profissional superior, terceiro - esta teoria de insuficiências abre espaço ao transnacionalismo, noticiando Artur Lall (1971) que foram apresentados à ONU mais de duas centenas de propostas do modelo World University; quarto - a Europa é um espaço que verá crescer esse transnacionalismo em várias linhas.
Todo isto parece aconselhar a reconhecer o seguinte: I - Não podemos deixar de racionalizar globalmente a rede privada e a rede pública, problema prioritário para responder simultaneamente à exigência dos modelos funcionalistas e ao desafio transnacional: II - Uma falta de resposta atempada cria condições de debilidade para a defesa da própria identidade nacional; III - É necessário reconhecer o facto de as funções de ensinar - investigar -, divulgar a cultura, não se reunirem já em todos os estabelecimentos, públicos ou privados, mesmo universitários, e que os critérios de avaliação e excelência, assim como a definição dos incentivos e custos, devem variar em atenção a esse facto, racionalizando a afectação dos meios escassos; IV - A avaliação do sistema deve ser global e subordinada à exigência da excelência dos estabelecimentos sem excepção; V - O recrutamento e a circulação do pessoal docente entre as instituições deve respeitar regras gerais de qualificação que assegurem a equivalência da qualidade e à justa circulação dos estudantes; VI - A plurititularidade do pessoal docente deve em regra assentar em protocolos estabelecidos entre estabelecimentos das redes públicas e privadas, não sendo de excluir instituições que englobem simultaneamente estabelecimentos públicos e privados.
Outra das pequenas regras desejáveis é que deveríamos ter mais tempo para dedicar a estes problemas, que já têm constrangimentos suficientes para dispensaram os das grelhas regimentais. Repetimos, apenas, que a autonomia universitária que se destina a servir a criatividade responsável, independente de constrangimentos externos, exige que o Estado entenda e pratique que as dotações financeiras não são doações com eventuais gratas contrapartidas políticas, são distribuições dos recursos de que apenas 6 gestor, assim como a universidade deve entender e praticar que o seu único privilégio é servir a Nação.

Aplausos do CDS.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Barbosa de Melo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior.
O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior (Pedro Lynce): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A sociedade portuguesa tem experimentado, nos últimos anos, mudanças profundas que influenciam, inevitavelmente, o modo de vida e as próprias expectativas dos cidadãos.
Um sector onde se tem vindo a concretizar uma significativa mudança é, sem dúvida, o do ensino superior. Mudança importante e que importa serenamente analisar, sob pena de não assumirmos, acima de tudo, as nossas responsabilidades de cidadania.
Tendo presente os grandes eixos de desenvolvimento do sistema educativo defendidos pelo Ministério da Educação, passaremos a delimitar os grandes objectivos do ensino superior.
Assegurar o crescimento do ensino superior público, em termos de oferta de cursos e de números de vagas, nomeadamente nas áreas das ciências exactas, ciências empresariais, tecnologias e artes. Garantir a qualidade do ensino, como contributo para uma melhor formação humana e cultural. Criar condições para uma mais acelerada qualificação do pessoal docente. Promover uma maior equidade, itensificando o apoio social aos estudantes. Reforçar os mecanismos de mobilidade dos estudantes, dos docentes e dos investigadores, designadamente entre os diversos países da Comunidade e promover, através de incentivos, a melhoria da organização e da administração das instituições.
Permitam-me que vos enumere algumas das medidas que têm vindo a ser tomadas, ou que prevemos tomar a curto prazo, na prossecução destes objectivos:
Está concluído o diploma legal que regulamenta a acção social no ensino superior, merecendo destaque a maior representatividade que é assegurada aos estudantes nos órgãos de gestão e de fiscalização em matéria da acção social, bem como a criação de um mais eficaz sistema de fiscalização.
Foram assinados alguns contratos-programas, e outros estão em preparação com as instituições de ensino superior para a construção de residências para estudantes, prevendo-se triplicar o número de camas nos próximos três anos.
Foi revisto o valor da bolsa máxima, equiparado ao ordenado mínimo nacional, e foi assumido o compromisso de duplicar a oferta do número global de bolsas no próximo triénio.
Infra-estruturas, área onde o investimento tem registado o maior crescimento, para elaboração de projectos visando a melhoria da qualidade e a expansão em determinadas áreas, nomeadamente quanto a centros de documentação, gabinetes para professores e salas de estudo para os alunos.
Quanto ao financiamento do funcionamento, no ano findo, foram concedidos todos os reforços requeridos pelas instituições, desde que fundamentados, conforme parecer favorável da Comissão de Diagnóstico e Acompanhamento, em que têm assento representantes das universidades e dos institutos politécnicos, podemos adiantar que, com base na mesma metodologia, estarão concluídas dentro de dias os ajustamentos definitivos do Orçamento para 1993.
Retomar-se-á, de seguida, a preparação de contratos-programas plurianuais, com as universidades e institutos politécnicos, de modo a eliminar distorções, introduzir correcções estruturais e definir metas, bem como os meios para as atingir, processo este que esperamos concluir durante o 1.º semestre do corrente ano.
Do mesmo modo, encontra-se em fase de conclusão um conjunto de alterações ao estatuto do ensino superior particular e cooperativo, tendo em conta as sugestões recebidas e a experiência acumulada, para, salvaguardando as liberdades de aprender e de ensinar, se contribua para a melhoria da qualidade do ensino ministrado.

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Ainda que a preocupação principal esteja centrada na melhoria da qualidade, não desconhecemos as necessidades de expansão ainda existentes em determinadas1 áreas, assim como a localização mais apropriada do ensino superior. Em colaboração com os institutos superiores politécnicos, está em estudo a redefinição da rede do ensino superior politécnico.
Não podemos contudo esquecer os problemas pedagógicos que actualmente preocupam os estudantes, nomeadamente as taxas de aproveitamento verificadas em determinados cursos.
Em colaboração com as instituições do ensino superior, docentes e discentes, o Ministério da Educação irá continuar a apoiar estudos sobre as causas e meios necessários para reduzir as taxas de repetência e lançar um programa, a título experimental, para colmatar esta situação, porque, para além dos custos a mais que ela está a gerar para o sistema, preocupam-nos, acima de tudo, as marcas indeléveis que deixa no ser humano e que não podemos ignorar.
Assim, empenhadamente, procuramos realizar a exigência constitucional, que é também para nós uma exigência ética da igualdade de oportunidades, não apenas no acesso ao ensino superior mas também do sucesso no ensino superior.
Paralelamente, lançou-se um programa de estágios em empresas, como incentivo à formação complementar dos estudantes, o qual tem deparado com ó melhor acolhimento e que vamos prosseguir.
Procurando garantir a mobilidade dos estudantes entre os diversos graus de ensino superior no País, avançaremos para a revisão e generalização a todo ô ensino superior do diploma relativo às unidades de crédito, de modo a permitir às instituições as adaptações necessárias, enquanto, a nível internacional, insistiremos no reforço de todos os programas comunitários que contribuam para este fim, casos dos programas ERASMUS, LÍNGUA, COMETI e TEMPUS.
Recorde-se, entretanto, que Portugal, nesta linha de actuação, já nos anos lectivos de 1991-1992 e de 1992--1993, criou complementos de bolsa para os estudantes que se candidataram ao programa ERASMUS.
Para nós, porém, uma universidade voltada para o século XXI está longe de se esgotar, no seu dia-a-dia, com as actividades pedagógico-científicas. Para além do «saber», no mundo altamente competitivo em que vivemos, a componente do «ser» começa a ter cada vez mais importância. O desenvolvimento pleno e harmonioso que desejamos para o nosso estudante passa também pelo apoio às actividades circuns-escolares, caso das culturais e desportivas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Para além da necessidade de promover uma melhor formação científica e cultural dos- docentes, impõe-se prosseguir no sentido da dignificação da função docente, designadamente no tocante à clarificação do regime de prestação do serviço docente, à melhoria dos mecanismos de avaliação pedagógica e ao reforço das garantias dos candidatos nas provas académicas. Para este efeito, irá proceder-se à revisão das estatutos da carreira docente do ensino superior, estando já agendada, para daqui a dias, o início da sua discussão com as Organizações sindicais. Está, entretanto, em preparação, em colaboração com o Conselho de Reitores e o Conselho
Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, a revisão dós quadros de pessoal, matéria que se prevê concluída até ao final de 1993.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Passados quase cinco anos sobre a aprovação nesta Câmara da lei de autonomia das Universidades, é tempo para, com a experiência colhida, aprofundarmos o modelo autonómico.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Ministério da Educação está bem consciente de que as opções vertidas no edifício normativo da lei da autonomia universitária estão ainda incompletas, já que duas das suas traves-mestras não estão ainda decididas. Referimo-nos ao financiamento e à avaliação das universidades, no que estamos a trabalhar.
No que se refere ao sistema de avaliação do ensino superior, é nossa firme convicção de que este tem de generalizar-se a todos os estabelecimentos de ensino superior - públicos e públicos. Assim, para além dos documentos e pareceres já elaborados por diversos grupos de trabalho, instituições ou órgãos consultivos, foi criado um grupo de trabalho para ultimar a versão final, em íntima colaboração com o Conselho de Reitores e a Universidade do Porto. Entretanto, a Universidade do Porto avançou, desde já e a título experimental, com a aplicação de um modelo de avaliação, r Estamos convictos, pois, de que estão criadas as condições para, a breve prazo, se avançar no sentido de um diploma que venha a merecer a aprovação generalizada das nossas instituições de ensino superior, tanto públicas como privadas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Seja conciso e claro!

O Sr. António Filipe (PCP): - Vou tentar ser conciso e claro, como sugeriu o Sr. Deputado Carlos Coelho.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, centraria as minhas questões em dois aspectos da sua intervenção.
Em primeiro lugar, na alusão feita pelo Sr. Secretário de Estado ao crescimento do número de vagas no ensino superior público, a que, segundo V. Ex.ª, iremos assistir no futuro. Fazemos votos para que essa promessa seja uma realidade e não aconteça o mesmo que com outras aqui já feitas por membros do Governo, pois já nos habituámos a ouvir prometer nesta Assembleia o alargamento, para os anos seguintes, do acesso ao ensino superior público.
Além disso, o Sr. Secretário de Estado conhece, com certeza, porque acompanha estes assuntos, os dados, divulgados numa recente conferência promovida pelo Conselho Nacional de Educação, sobre a evolução do acréscimo de vagas no ensino superior público, onde se demonstra - e quem o faz é o, até há bem pouco tempo, director do Gabinete de Estudos e Planeamento do Ministério da Educação, ou seja, alguém que conhece por dentro o sistema educativo português - que esse acréscimo de vagas foi de 1,9 %, em 1988, de 4,1 %, em 1989, de 2,6 %, em 1990, de 2 %, em 1991, e de 1,3 %, no ano lectivo de 1991-1992.
Portanto, aí revela-se que o acréscimo de vagas no ensino superior público não tem sido, de facto, aquele que

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os membros do Governo têm apontado. Daí que continue a ser uma reivindicação geral da sociedade portuguesa o acréscimo de vagas no ensino superior público. Esperemos que esta promessa passe do Diário da Assembleia da República para a realidade.
Uma outra questão refere-se à acção social escolar para o ensino superior. O Sr. Secretário de Estado veio aqui prometer a construção de mais residências. Mais uma vez, devo dizer-lhe que não é o primeiro nem o segundo - provavelmente, nem o quinto nem o sexto - membro do Governo responsável por esta área que aqui vem dizer que, agora, nos anos seguintes, é que vai ser, que agora é que vão construir residências e até já têm vários protocolos assinados e compromissos firmados. E sempre que é nomeado um novo membro do Governo, diz-se rigorosamente o mesmo, sem que nada avance. Por isso, mais uma vez aqui digo: vamos ver se será desta!
Relativamente à acção social escolar, temos mais uma preocupação. O Sr. Ministro disse, há pouco, que esta questão tem sido discutida com as associações de estudantes, mas nos contactos que fizemos para a preparação desta interpelação, quer com estudantes, quer com reitores das universidades, só ouvimos preocupações quanto a esta matéria. Preocupações, designadamente da parte de responsáveis por instituições de ensino superior, que, cientes das dificuldades financeiras derivadas do modelo de gestão financeira que o Governo obriga as universidades a seguir e da forma como, tarde e a más horas, o Executivo disponibiliza as verbas a que as universidades têm direito, já estão a antever que os problemas da acção social vão ser misturados com os de gestão financeira.
Finalmente, são muitas as preocupações que registamos, quer de reitores, quer de associações académicas, quanto a este assunto.
Não compreendemos, pois, que diálogo é que o Sr. Ministro encetou ou que consequências ele vai ter, quando, relativamente aos aspectos concretos do diploma aprovado em Conselho de Ministros, só notamos preocupações.
Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, seria muito interessante que, face aos projectos de lei já apresentados nesta Assembleia pelo PCP, relativamente à acção social escolar no ensino superior e à avaliação e acompanhamento das universidades, o Governo viesse aqui discutir connosco as suas opções a esse nível.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior.

O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, muito rapidamente, quero apenas fazer duas observações.
Em primeiro lugar, os números que o Sr. Deputado referiu não correspondem à realidade. Se, eventualmente, quiser, terei muito gosto em oferecer-lhe um gráfico, que, este sim, confirma a realidade.
Em segundo lugar, devo dizer-lhe que, à semelhança do que vem acontecendo, nós fazemos e os outros falam.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nos últimos três meses, foram assinados contratos-programa com diversas universidades - Universidade do Minho, Universidade da Beira Interior e alguns institutos politécnicos -, já havendo acordo para a construção de 700 camas, construção essa que já teve início.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O sistema educativo português, para o qual ainda não foi definida uma política séria e objectiva de longo prazo, sujeito a uma centralização excessiva, continua bloqueado por um conjunto de estrangulamentos estruturais que o Governo não foi ainda capaz de anular.
Insuficiente, ineficaz e perverso, o nosso sistema educativo é caracterizado por um parque escolar mal dimensionado e altamente degradado, por uma notória baixa de produtividade, forte abandono escolar, elevados índices de insucesso, desfasamento entre a idade dos alunos e o nível do ensino e por uma manifesta falta de justiça social.
Em Portugal, continua a não haver um ensino de qualidade e uma efectiva igualdade de oportunidades para todos os jovens, para já não falarmos no facto de a escola não preparar convenientemente a nossa juventude para o ingresso na vida activa e para a mudança.
Deixando para outra oportunidade o debate global sobre a educação, que o tempo disponível o não permite, levantemos, por agora, dois ou três problemas que o Sr. Ministro deve esclarecer e que se prendem com o insucesso escolar, o novo sistema de avaliação e as inevitáveis propinas, em espírito de abertura e de diálogo e sem o jacobinismo que o Sr. Deputado Pedro Roseta teme.
Que medidas está a tomar o Governo para combater o abandono escolar e o insucesso educativo?
Sabe o Ministro que as raízes do insucesso e abandono escolares são de natureza económica, social e cultural e que, se não houver uma política destinada a atacar esses problemas, o insucesso e o abandono vão continuar? Ou será que se pretende resolver estas questões com o novo sistema de avaliação dos alunos, que se revela desajustado da nossa realidade escolar?
Vou dar-lhe dois ou três exemplos que demonstram as condições de funcionamento das nossas escolas e as carências de toda a ordem que continuam a afectar as nossas crianças.
Primeiro: Na semana passada, fui confrontado na estação das Devesas, em Gaia, com um grupo de quatro crianças que me procuraram vender o jornal da sua escola - uma simples página fotocopiada - por 100$. Perguntei-lhes para que queriam o dinheiro e eles responderam que era para dar à professora para esta comprar o material escolar necessário para eles poderem trabalhar.
Segundo: Em Caíde de Rei, esta semana, fechou o refeitório da escola aí existente, por não dispor das verbas necessárias ao seu funcionamento.
Terceiro: No concelho de Gaia, apenas 55 % da população escolar dispõe de alimentação gratuita, uma vez que a autarquia não dispõe de meios financeiros para suportar as despesas com a alimentação das crianças.
Como é que o Sr. Ministro pode falar na passagem do ciclo da quantidade para o ciclo da qualidade, quando efectivamente o sistema educativo português ainda não conseguiu resolver os problemas básicos que afectam a nossa escolaridade obrigatória?

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Analisemos, agora, o novo sistema de avaliação. Uma das principais mudanças - em meu entender, a mais importante -, introduzida pelo novo sistema de avaliação reside no desenvolvimento dos sistemas de apoio e complementos educativos para os alunos que se debatem com dificuldades.
A igualdade de oportunidades, o direito ao acesso e ao sucesso no ensino básico não são conseguidos se os alunos forem tratados da mesma maneira.
Para dar uma resposta diferenciada às diferentes necessidades do aluno, torna-se necessário desenvolver programas de apoio e complemento educativo que permitam aos alunos vencer as dificuldades que sentem.
De todas as medidas previstas no novo sistema de avaliação, as medidas de apoio e complemento educativo são aquelas que maior influência terão na organização das escolas e do seu ensino, exigindo planificação adequada e recursos materiais e humanos consideráveis.
Assim sendo, perguntamos: quem vai garantir a execução de tais programas de apoio e complemento educativo? O professor? Que tempo tem disponível, se as horas compreendidas entre o seu horário lectivo e as trinta e cinco horas que o Ministério da Educação afirma competirem-lhe são destinadas para a formação contínua? Quais os espaços e horas disponíveis para tais programas?
E o aluno? Vai ser obrigado a permanecer trinta ou trinta e cinco horas semanais na escola?
Quais os meios postos à disposição das escolas para desenvolverem este tipo de acções, se muitas vezes nem as folhas de papel existem em quantidade suficiente?
Finalmente, as propinas. O Sr. Ministro, sem compreender ou poder aceitar que a lei das propinas já deveria ter sido suspensa, disse, recentemente, aquilo que já tínhamos afirmado a propósito do ensino superior, isto é, que o problema das propinas é apenas uma gota no oceano dos problemas que afectam o ensino superior.
É verdade! Concordamos inteiramente consigo. Então, por que é que começou justamente pelas propinas, ignorando os verdadeiros problemas do ensino superior, o estabelecimento de regras claras de financiamento através de contratos-programa plurianuais, a criação de um efectivo sistema de apoio social escolar, a revisão do estatuto da carreira docente universitária, a revisão do estatuto do ensino superior particular e cooperativo, a avaliação das universidades e o urgente enquadramento da investigação no âmbito das escolas do ensino superior?
Por que será que o Sr. Ministro começou pelo acessório, pela medida avulsa e imediatísta das propinas, terminando com o clima de paz que, apesar de tudo, existia nas universidades e que se torna imprescindível para que a reforma do ensino superior possa, efectivamente, ser concretizada?
É com o ambiente que existe, hoje, nas nossas universidades que o Ministro da Educação pretende levar a efeito a reforma do ensino superior?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não se pode afirmar retóricamente que o sector da educação é um dos instrumentos de política mais importantes da nossa integração na Comunidade Europeia. É preciso, sobretudo, ter vontade política para resolver os graves problemas que continuam a afectar o nosso sistema educativo e que se encontram bem identificados, sob pena de pormos em causa o futuro da nossa juventude, e, portanto, o futuro de Portugal, na Europa a que pertencemos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Recursos Educativos.

O Sr. Secretário de Estado dos Recursos Educativos (Bracinha Vieira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A gradual aplicação no terreno da reforma educativa em que o Governo se tem empenhado é naturalmente acompanhada por uma racionalização da gestão de recursos e uma reafectação dos mesmos em função das tendências observadas a nível da população escolar e das mutações decorrentes de novas exigências para a consecução de uma mais elevada qualidade da educação.
Constituindo os recursos educativos, e em particular os recursos humanos, o suporte do sistema, também neste domínio o Ministério da Educação definiu políticas claras, pré-ordenadas à execução da reforma, que irei abordar muito sucintamente.
No âmbito das medidas tendentes a elevar a qualidade do ensino, o Ministério da Educação tem procurado proporcionar aos professores condições para a sua profissionalização, verificando-se que o número de docentes profissionalizados cresceu, em quatro anos, cerca de 40 %, aproximando-se, hoje, a respectiva percentagem de 70 % do universo total dos docentes em efectividade de funções.
O Ministério da Educação irá acelerar este processo, ao longo dos próximos anos, com a colaboração das instituições de ensino superior para tal vocacionadas, por forma que esta importante componente da qualidade do sistema seja devidamente incentivada.
Ontem mesmo, iniciou-se a distribuição pelos sindicatos e por outras entidades intervenientes no processo de um projecto de diploma que reestrutura os grupos de docência dos ensinos básico e secundário e revê o elenco das habilitações para a docência, ajustando-as às realidades da reforma e dos novos currículos, bem como à evolução dos conteúdos dos cursos do ensino superior que dão acesso à docência.
Indo ao encontro de uma velha expectativa dos docentes, mas também de necessidades duradouras do sistema, o Ministério da Educação propõe-se vincular, em quadros de zona pedagógica, os professores contratados com mais de quatro anos de serviço prestados em anos lectivos consecutivos no mesmo grau e nível de ensino. Dar-se-á, assim, mais um passo no sentido da estabilização do corpo de professores, desfazendo-se, deste modo, de forma iniludível, os boatos postos a circular, há alguns tempos atrás, sobre o eventual despedimento de professores.
Por outro lado, deu-se seguimento ao negociado com as forcas sindicais, no respeitante ao acesso dos professores ao 8.º escalão, e concluíram-se os estudos necessários à revisão da Portaria n.º 1218/90, de 19 de Dezembro, em termos de corrigir as distorções e ambiguidades existentes naquele diploma que regulamenta a contagem e recuperação do tempo de serviço para efeitos de progressão na carreira, carreira que se pretende valorizar e dignificar, o que implica um compromisso forte e um grande empenhamento dos professores, num contexto que assegure um equilíbrio harmonioso entre os seus direitos e os seus deveres.
No quinquénio 1987-1992, teve lugar um sério esforço no sentido de aumentar a oferta de estabelecimentos de ensino, por forma a colmatar a maior pane das carências que então subsistiam.
No final do ano lectivo em curso, o total das escolas preparatórias, C+S e secundárias, ultrapassará 1000 uni-

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dades, prevendo-se a entrada em parque, até 31 de Agosto próximo, de 40 novas escolas.
No futuro, manter-se-á um esforço sustentado de investimento, fundamentalmente direccionado para o reordenamento da rede escolar, apostando fortemente na construção de escolas básicas integradas e de instalações próprias adequadas ao desenvolvimento do novo modelo do ensino secundário.
Conferir-se-á igualmente carácter prioritário à construção de equipamentos para a educação física e o desporto escolar, bem como à reabilitação do parque existente, à humanização dos espaços educativos e ao apetrechamento das escolas em bibliotecas, laboratórios, salas de trabalhos oficinais e outros equipamentos de apoio pedagógico e didáctico que contribuam para melhorar e facilitar as aprendizagens.
É no subsistema do ensino secundário, no qual a taxa de escolarização vem felizmente aumentando de forma muito rápida, que se verifica um maior coeficiente de utilização das infra-estruturas educativas, exigindo um criterioso investimento na construção e ampliação de novos equipamentos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O sistema educativo, sendo uma primeira prioridade assumida pelo Governo, não pode, todavia, deixar de ter em conta os constrangimentos existentes hoje e os encargos que irão recair sobre as futuras gerações. O poder político deve, em qualquer circunstância, assumir-se como o guardião e o defensor dos grandes objectivos nacionais de longo prazo - dos quais depende a renovação económica e cultural da sociedade portuguesa - face às exigências do presente, por muito que estas pressionem os decisores políticos.
Assinale-se que, no período de 1985 a 1993, as despesas de funcionamento da educação foram multiplicadas por cinco, apesar da desaceleração recente que demonstra que o rigor orçamental não é incompatível com a busca da qualidade.
O exemplo do que se passou em 1992 foi encorajador: as medidas de racionalização adoptadas, no sentido da maior eficiência do sistema, permitiram chegar ao fim do ano económico com todas as dívidas saldadas, incluindo as do ensino superior, e sem qualquer necessidade adicional de financiamento por recurso a orçamento suplementar, como esta Assembleia, porventura com alguma surpresa, pôde constatar.
Não se diga, como referiu o meu amigo e ilustre Deputado Guilherme Oliveira Martins, que se sacrificou o orçamento da educação à convergência nominal. Não há trade que possível entre estes dois objectivos. Um orçamento rigoroso para uma educação exigente é a proposta que o Ministério da Educação faz para que Portugal possa atingir o pelotão da frente da Comunidade.
Uma referência, ainda que brevíssima, ao PRODEP-FEDER, cujo ritmo de execução atingiu a velocidade de cruzeiro em 1992. A taxa de execução financeira foi, naquele ano, de 87,7 %, verificando-se, pela análise da execução global daquele programa, em termos acumulados, que no final de 1993, último ano do PRODEP I, a sua execução deverá aproximar-se dos 100 %.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A reforma educativa está em marcha, de forma gradual mas com firmeza e coerência, apoiada numa gestão de recursos que se pretende cada vez mais rigorosa e exigente, naturalmente sujeita ao debate democrático e ao controlo político desta Assembleia, para além do controlo jurisdicional exercido pelo Tribunal de Contas.
Estamos certos de que o empenhamento de todos os intervenientes, em primeira linha dos professores, a par da corresponsabilização da escola e do meio económico-social e cultural que a envolve na construção de autênticas comunidades educativas, darão cabal resposta a este desafio histórico que o País está vivendo.
Do êxito da reforma educativa depende não só a salvaguarda e o aprofundamento de valores que nos são caros, como o reforço da identidade nacional, a igualdade de oportunidades, a liberdade no respeito pela diferença e a coesão social, com o também o melhor posicionamento de Portugal perante a Europa e o mundo no limiar do século XXI.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Nos termos do n.º 3 do artigo 92.º do Regimento, vou dar a palavra aos Srs. Deputados que, na devida altura, se inscreveram para defesa da honra ou consideração.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Maria Bettencourt.

A Sr.ª Ana Maria Bettencourt (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sr. Ministro, esta defesa da honra, assim requentada, já é mais complicada, mas como o senhor disse que eu precisava de uma bengala, gostaria de responder-lhe que não preciso de bengala nenhuma! De bengala precisa o Sr. Ministro, que recorreu aos clássicos, enfim, para dar outra envergadura ao seu discurso, que não a teve, de facto!...
Já tenho reparado que o Sr. Ministro fica muito incomodado com as perguntas do PS e demostrou-o...

Risos do PSD.

Aliás, já várias pessoas me perguntaram por que é que o Ministro da Educação reage dessa maneira ao discurso dos socialistas...! Bom, creio que é por colocarmos questões de fundo para as quais não encontramos resposta, nomeadamente sobre as estratégias de desenvolvimento.
Houve um PRODEP em 1990, mas nunca mais houve um plano de desenvolvimento da educação em Portugal, o PRODEP foi esquecido e o Sr. Ministro sabe muito bem que isso é verdade.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peco-lhe para circunscrever a sua intervenção à finalidade para a qual pediu a palavra.

A Oradora: - Com certeza, Sr. Presidente.
Na verdade, há alguns projectos interessantes, mas a maior parte dos projectos necessários foram esquecidos.
Ouvimos o discurso do Sr. Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário sobre as reformas, no qual respondeu, e bem, a algumas das questões que eu tinha colocado, mas é pena que haja algumas contradições, ...

O Sr. António José Seguro (PS): - É que há divisões no Governo!

A Oradora: - ... nomeadamente quanto aos métodos para aplicação do discurso bonito que fez.
Gostei do discurso do Sr. Secretário de Estado e, aliás, defendo alguns aspectos do modelo de avaliação que referiu, mas este é completamente utópico se não existirem os meios e o Governo não foi capaz de dizer como é que

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vai, nomeadamente em termos de orçamento e de organização das escolas, resolver esse problema.
As escolas portuguesas não estão organizadas para aplicar este método de avaliação, embora creia que ele é possível de implementar, mas gostaria que os senhores explicassem como, pois continuamos sem saber como é que este método é possível, com que organização das escolas, com que recursos, com que meios.
O Sr. Ministro falou também na existência de experiências interessantes, nomeadamente no distrito de Setúbal, para prevenção do abandono escolar. Bom, conheço essas experiências, mas elas são pontuais e fazem-se graças ao esforço dos professores e dos conselhos directivos de diversas escolas, pois não existem políticas a nível nacional para a prevenção do abandono escolar nem de correcção das desigualdades nas periferias e no mundo rural.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Ministro para dar explicações, se assim o desejar, vou ler o normativo aplicável nesta circunstância, isto é o artigo 84.º do Regimento:

1 - Quem solicitar a palavra deve declarar para que fim a pretende, não podendo usá-la para fim diverso daquele para que lhe foi concedida.
2 - Quando o orador se afaste da finalidade para que lhe foi concedida a palavra, é advertido pelo Presidente, que pode retirá-la se o orador persistir na sua atitude.
Srs. Deputados, gostaria, pois, que o uso da palavra por parte daqueles que a solicitaram para defesa da honra se limitasse ao que regimentalmente está previsto neste preceito.
Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, vou ser muito rápido.

Sr.ª Deputada Ana Maria Bettencourt, nas respostas, reajo sempre em função da qualidade da pergunta!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito de defesa da honra e consideração, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Julieta Sampaio.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Sr. Ministro da Educação, primeiro do que tudo, cumpre-me cumprimentá-lo porque compreendeu perfeitamente que não quis ofender ninguém quando me referi à questão do rapaz. Parece que a sua bancada não o entendeu assim, mas ainda bem que o Sr. Ministro entendeu, está aqui com fair play e percebe perfeitamente o que as palavras representam no jogo político.
Em segundo lugar, devo dizer que não estou a defender a honra mas a consideração relativamente às afirmações que produzi quanto ao financiamento das escolas e que o Sr. Ministro colocou em causa há pouco.
Peco-lhe muita desculpa mas o que mencionei é verídico, está escrito e posso ler-lhe, uma por outra, as rubricas afectadas por esse financiamento, se V. Ex.ª assim o entender: Escola Preparatória de Vale de Cambra, um balcão em inox; Escola Preparatória Domingos Capela, uma máquina de lavar. Escola Preparatória de Arouca, um fogão; Escola Secundária de Arouca, uma trituradora...
É o que está aqui, foi aquilo que foi fornecido às escolas! Não sei se são estes os únicos financiamentos que as escolas têm para aplicação da reforma e do novo sistema de avaliação e gostava realmente de ser esclarecida sobre isto.
Não inventei nada, Sr. Ministro, e peco-lhe que não duvide das afirmações que aqui fiz, pois nem eu, com certeza, viria a esta Câmara, para um debate com a seriedade que este deve ter, sobre o sistema educativo, fazer afirmações das quais não estivesse plenamente consciente.
Por outro lado, quero lamentar que, repito, num debate desta importância e tendo o Partido Socialista aqui colocado questões muito concretas sobre assuntos que consideramos muito importantes - o ensino especial, o financiamento das escolas e, ainda, o abandono escolar, que tem como motivo principal o aumento do trabalho infantil -, que o Sr. Ministro tivesse respondido tão rápida e superficialmente, pois considero que estas questões mereciam respostas muito profundas.
O Sr. Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário referiu-se a algumas das questões que levantei, esquecendo, é óbvio, o ensino artístico, mas considero mesmo assim que não foram tratadas com a profundidade que se impõe num debate destes. Por isso, passo a entregar ao Sr. Ministro as perguntas que lhe coloquei e espero que tenha a bondade de me responder por escrito.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr.ª Deputada Maria Julieta Sampaio, não pus em causa os documentos, o que coloquei em causa foi a existência real do que consta desses documentos.
Quanto às restantes perguntas, vou fazer um dossier com os quatro discursos, mandar-lho-ei, e certamente encontrará aí muitas respostas. Depois responderei por escrito às suas questões.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Já tenho aqui as intervenções!

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito de defesa da honra e consideração, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Ministro da Educação, quero dizer-lhe muito claramente que não aceito o tratamento com que V. Ex.ª me mimoseou nas respostas às questões que lhe coloquei.
Considero que tive a seriedade de fazer a diferença e, nomeadamente, de lhe fazer perguntas objectivas e penso, com sinceridade, que quer o nosso relacionamento pessoal quer o relacionamento político que deve existir no interior desta Câmara não mereciam o tratamento que o Sr. Ministro me deu, sobretudo sendo V. Ex.ª o Ministro da Educação!

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Prescindo, Sr. Presidente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está concluído o debate relativo à interpelação n.º 8/VI - Sobre política geral, centrada na política educativa do Governo (PCP), pelo que vamos entrar na fase de encerramento.
Para fazer a intervenção final do partido interpelante, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Não foi fácil ao Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português a escolha do tema para esta interpelação, exclusivamente porque boje é quase ilimitado o conjunto de questões e problemas, de âmbito nacional, que concorrem entre si, na disputa pela prioridade de opção para serem objecto de debate público e de apresentação de propostas de solução.

Aplausos do PCP.

Desde a gravidade da situação económica do País aos problemas do desemprego e da insegurança no emprego; da crescente violação dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e das instituições aos temas da corrupção e da fragilização e distorção do regime democrático; da dramática situação dos idosos em Portugal aos problemas da toxicodependência e da segurança dos cidadãos ou aos da pobreza e crescente marginalização e exclusão sociais que afectam camadas cada vez mais largas da população portuguesa.
Optámos, desta feita, por uma interpelação sobre a política educativa, porque o sector da educação é um exemplo da gravidade dos problemas que atingem cada vez mais a vida nacional, em que são patentes e iniludíveis as responsabilidades do Governo e generalizada e massiva a contestação à política governamental por parte de todos os intervenientes e interessados no processo; porque a política educativa e de ensino, que vem sendo prosseguida pelo PSD há longos 13 anos, tem constituído um dos instrumentos paradigmáticos da política do Governo de acentuação crescente das desigualdades, injustiças e marginalizações sociais, da política de desresponsabilização do Estado das incumbências sociais que constitucionalmente lhe são cometidas, da ofensiva governamental contra os princípios da democratização e da autonomia das instituições, do economicismo, do neo-liberalismo, do negocismo e do individualismo desenfreado que predominam na orientação política do Governo e do PSD; porque a educação está em crise e é um espelho da crise mais geral que grassa pela sociedade portuguesa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Optámos, ainda, por realizar esta interpelação, porque, como o debate hoje realizado abundantemente o comprovou, na área da educação é notória a incapacidade política do Governo e patentes a crescente desorientação e o avolumar das manifestações concretas do autoritarismo congénito do Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No âmbito da preparação desta interpelação, o Grupo Parlamentar do PCP contactou com organizações representativas de estudantes e de pais, visitou escolas e dialogou com conselhos directivos, reuniu com sindicatos de professores e com autarcas, ouviu reitores e altos responsáveis do Conselho Nacional de Educação.
Deparámos com o descontentamento generalizado, com protestos pela degradação de estruturas e do sistema, com contestações à política do Governo, com manifestações de indignação e repúdio pela ausência de diálogo e pela prepotência do Ministério da Educação, com a preocupação profunda com os rumos actuais do sistema educativo e com as suas pesadas consequências para o futuro do País.
Aplausos à política do Ministério não ouvimos, nem sequer encontrámos qualquer optimismo, ainda que prudentemente moderado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não os esperávamos ouvir, porque o diagnóstico dos graves problemas existentes nas escolas e a indisfarçável degradação do sistema de ensino são por demais evidentes e preocupantes, como abundantemente foi mostrado e demonstrado durante esta interpelação, e marcam negativamente o presente e o futuro da juventude actual.
Só a miopia política do Ministro da Educação não o deixa enxergar esta realidade, tal como não lhe permitiu ver as enormes manifestações dos jovens estudantes, por todo o País e mesmo à frente do seu Ministério, primeiro contra a PGA e agora contra as propinas, nem certamente o autorizará a tomar conhecimento da «marcha pela educação» que os professores, os alunos, os pais e os funcionários anunciam realizar no próximo dia 26.
Persiste o atraso do sistema educativo do País. A crescente desresponsabilização do Estado em relação a ele é contrária as aspirações de progresso da sociedade, em particular às da juventude, e às necessidades objectivas do desenvolvimento económico, social, científico, tecnológico e cultural do País.
Como já hoje afirmaram camaradas meus, a razão central desta política de desresponsabilização prosseguida pelo Governo entronca na sua estratégia de mercantilização do saber e de transformação do ensino num mercado regido pelas regras e pela lógica do lucro.
A educação é, cada vez mais, reduzida à categoria de despesa improdutiva, em vez de ser considerada como investimento social reprodutivo.

O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O ensino e a formação, ao invés de serem encarados como factores decisivos do desenvolvimento, são tratados como meros produtos comercializáveis, só acessíveis a quem tenha capacidade económica para os consumir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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1690 I SÉRIE-NÚMERO 47

O Orador: - É uma manifestação insofismável das concepções retrógradas do Governo e do PSD, nesta como noutras áreas, que agrava ainda mais os factores de discriminação classista, já existentes na educação, e que, contrariando a elevação do nível educativo da generalidade da população, lesa fortemente o desenvolvimento económico e social do País e o futuro dos Portugueses.
Como foi amplamente reafirmado no debate de boje, o PCP rejeita frontalmente o ensino mercantilista e classista que o Governo, aceleradamente, quer impor ao País e condena, sem rodeios, a sua política educativa.

Aplausos do PCP.

Os jovens necessitam de um ensino que os prepare para a vida, o País exige um sistema educativo de qualidade, democratizado no acesso e na gestão, que se imponha como factor de desenvolvimento e de progresso social.
Contrapomos ao neo-liberalismo e ao negocismo do Governo a firme exigência do respeito pelos princípios constitucionais da garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar, da inalienável incumbência do Estado de garantir a todos os cidadãos o acesso aos mais elevados graus de ensino e da gratuitidade progressiva do ensino a todos os níveis.
Assumimos a democratização do ensino público, como questão modal da política educativa nacional.
Propomos a valorização do ensino público e o aumento dos apoios que permitam travar uma selecção escolar assente em critérios de natureza cultural, económica e classista e reivindicamos, inequivocamente, a revogação da lei das propinas.
Defendemos um sistema educativo concebido para formar e não para seleccionar e que desenvolva e qualifique todas as crianças e jovens e não apenas uma elite.
Propomos um conceito de escola como centro educativo que estimule as capacidades e potencialidades de todos, mediante espaços de aprendizagem formal e não formal que promovam o sucesso escolar efectivo.
Somos pela desgovernamentalização e desburocratização da administração do sistema educativo, descentralizando-o de facto e não apenas desconcentrando funções para estruturas burocráticas periféricas.

O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Propomos a revalorização da função docente, nomeadamente pela revisão negociada dos estatutos da carreira docente e remuneratório, pela garantia da estabilidade e realização profissionais e pelo exercício dos seus direitos, incluindo o direito à participação no processo da reforma educativa.
Defendemos a atribuição aos estabelecimentos de ensino de todos os graus, meios e condições para o pleno exercício da autonomia específica que lhes é conferida por lei.

Aplausos do PCP.

Em suma, o PCP propõe e defende um sistema de ensino e uma política educativa distintos e alternativos aos do Governo.
O generalizado movimento de protesto e contestação dos estudantes e dos pais, dos professores e dos funcionários contra a política do Governo no sector da educação reflectir-se-á, possivelmente, em alterações na actual equipa ministerial. Aliás, uma crise económica já hoje terá conduzido à demissão do vice-governador do Banco de Portugal e, provavelmente, do próprio governador. Mas, como a experiência o demonstra, não é com a mera substituição cíclica de ministros ou secretários de Estado, nem com a permanente multiplicação de promessas que não se cumprem, que se dá resposta às instantes e graves questões da educação e do ensino e às reivindicações da juventude estudantil e de todos os restantes intervenientes no processo educativo.
Essa resposta só será conseguida com uma profunda alteração da política educativa do País, com a substituição de uma política - dá responsabilidade do PSD e do Primeiro-Ministro - que colide frontalmente com as necessidades nacionais e com as aspirações de estudantes, professores e pais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A interpelação de hoje mostrou, uma vez mais, que a política educativa do Governo não serve e hipoteca o futuro do País...

O Sr. José Calçada (PCP): - Muito bem!

O Orador: -... e que há uma política alternativa que assume a educação, a ciência e a cultura como sectores estratégicos para o desenvolvimento integrado do País e da sociedade portuguesa.

A Sr.ª Apolónia Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Continuaremos a pugnar para que essa alternativa possa concretizar-se.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para a intervenção final, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este momento final da interpelação não é nem um tempo de alegações nem, tão-só, um tempo de síntese. É também um momento em que recordamos que há, precisamente, 18 anos, em 11 de Março de 1975, o partido interpelante assumiu a liderança do sistema político português e tentou, felizmente sem êxito, implantar em Portugal um sistema monista, pretensamente igualitário, certamente totalitário e, conscientemente, cego à história e à sociedade portuguesa.

Aplausos do PSD.

Foi um tempo que importa não esquecer, de forma a que essas tentações se não repitam, como, aliás, se pode depreender da referência a alguns movimentos de pretensas «agregações de massas» com finalidades, exclusivamente, políticas.
Com efeito, foi o tempo-e aqui faço referência, parafraseando declarações do Sr. Deputado António Filipe, esta manhã, à comunicação social - em que o PCP desmantelou o sistema de ensino e lhe retirou, na realidade, quer todos os «parafusos» quer mesmo todas as «porcas».

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12 DE MARÇO DE 1993 1691

O Sr. José Calçada (PCP): - Salvo seja! Ainda ladearam algumas!...

O Orador: - Fê-lo de forma fria e calculista, com a profunda convicção de que estava a criar mecanismos duradouros, que poderiam subsistir para além desse momento histórico e permitir a sua perpetuidade no poder.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas, nesta interpelação, uma vez mais, ficou demonstrada a falta de soluções criativas e credíveis do PCP, a falta de ideias consistentes, a ausência de uma verdadeira reflexão estimulante sobre o sistema educativo português.
Uma vez mais o Governo veio, aqui, demonstrar a coerência da política educativa que vem prosseguindo, a firmeza das nossas convicções, para, em diálogo com o conjunto dos agentes, construirmos o horizonte educativo do século XXI.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É que, Srs. Deputados, as opções que, boje, estamos a tomar apenas irão frutificar no dealbar do século XXI.
Passada que foi a data apontada como fatídica por George Orwell, em 1984, é o momento de nos interrogarmos sobre os cidadãos que as nossas escolas, o nosso ensino, estão a ajudar a criar.
Esta reflexão, necessariamente desapaixonada e realista, não pode alhear-se das condições sociais em que se desenvolve a acção educativa, nem pode esquecer-se do conjunto dos flagelos modernos, que atingem, significativamente, as crianças e os jovens.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje, como ontem, assumimos a nossa radical diferença em relação ao Partido Comunista Português.

O Sr. José Calcada (PCP): - Tal e qual como nós!

O Orador: - À manipulação das consciências opomos o pluralismo educativo; ao estatismo burocratizante opomos a liberdade de aprender e a de ensinar; ao igualitarismo de fachada opomos uma política de promoção da igualdade no acesso a todos os graus de ensino.

O Sr. António Filipe (PCP): - É o que se tem visto!

O Orador: - Urge acabar, sim, com o sentido utilitarista da educação, que, ao transformá-la num bem de consumo, acaba por apenas encarar o indivíduo em detrimento da pessoa, gerando expectativas e anseios de difícil satisfação, criando abismos entre a dimensão profissional e a dimensão cultural e cívica da educação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Urge iniciar uma nova etapa de racionalização e selecção. No momento em que a escola vai ganhando progressiva autonomia face à Administração - no
ensino superior como nos ensinos básico e secundário -, cabe ao Estado o exercício de um verdadeiro poder regulador, garantindo a qualidade pedagógica e científica e assegurando o pluralismo educativo que é a matriz do sucesso na educação.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): -Muito bem!

O Orador: - É que a afirmação cultural, económica e social de um país é função exponencial da qualidade do sistema de ensino. E a qualidade não depende de um Governo, mas de um compromisso entre o poder político e a sociedade civil; de um diálogo entre a Administração e os agentes educativos; da participação dos pais e das famílias; do empenho dos professores...

O Sr. José Calçada (PCP): - Estão todos empenhados!

O Orador: -... e da confiança dos alunos, para em liberdade, com autonomia e responsabilidade, prepararmos, hoje, e com esta filosofia, o sucesso do amanhã. Sucesso que começa, necessariamente, em cada um de nós!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dou por encerrado o debate relativo à interpelação n.º 8/VI.
A nossa próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 10 horas, e terá como ordem do dia a apreciação dos inquéritos parlamentares n.0' 8 - Sobre a responsabilidade governamental na manutenção e promoção a elevados cargos da Administração Pública de elementos indiciariamente pertencentes a associação criminosa envolvida no desvio de verbas do Fundo Social Europeu e as garantias de defesa de credibilidade do Estado Português (PS), 9/V1 - Sobre as circunstâncias e responsabilidades dos casos e do tratamento dado na fronteira a certos cidadãos estrangeiros, particularmente do Brasil e dos PALOP (PCP) e IO/VI - Sobre a extensão, natureza e implicações nas irregularidades, ilegalidades e operações de traficância política na gestão pelo Governo e pela Administração Pública de subsídios provenientes de fundos comunitários e outras verbas públicas destinadas à reconversão e modernização da agricultura portuguesa, bem como à intervenção nos mercados agrícolas (PS).
Lembro, entretanto, aos Srs. Deputados que se o Governo e os grupos parlamentares esgotarem os tempos atribuídos, o debate terá a duração de cerca de 3 horas e 30 minutos.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 40 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

António de Carvalho Martins.
António José Caeiro da Mota Veiga.
António Maria Pereira.
Cecília Pita Catarino.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.

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1692 I SÉRIE - NÚMERO 47

Francisco João Bernardino da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
José Angelo Ferreira Correia.
José Manuel Nunes Liberato.
José Pereira Lopes.
Manuel Maria Moreira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Pombo Cosia.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Rui Manuel Parente Cbancerelle de Machete.
Vítor Manuel da Igreja Raposo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
António Carlos Ribeiro Campos.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Elisa Maria Ramos Damião.
Helena de Melo Torres Marques.
3José Manuel Santos de Magalhães.
Rogério da Conceição Serafim Martins.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Jerónimo Carvalho de Soma.
Maria Odete dos Santos.

Centro Democrático Social (CDS):

José Luís Nogueira de Brito.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

António Paulo Martins Pereira Coelho.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Hilário Torres Azevedo Marques.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
José Macário Custódio Correia.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro António de Bettencourt Gomes.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Simão José Ricon Peres.

Partido Socialista (PS):

Eduardo Ribeiro Pereira.
Jaime José Matos da Gama.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Maria Teresa Dona Santa Clara Gomes.
Raúl Fernando Sousela da Costa Brito.

Partido Comunista Português (PCP):

João António Gonçalves do Amaral.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.

Deputados independentes:

Diogo Pinto de Freitas do Amaral.

Rectificação ao n.º 41, de 26 de Fevereiro

No frontespício, aquando da indicação dos Srs. Secretários da Mesa, onde se lê «José Eduardo Reis» deve ler-se «José Ernesto Figueira dos Reis».

A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA.

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1694

Depósito legal n.º 8818/85

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